CASTAGNA, Paulo. Uma relação democrática entre pesquisadores e acervos de manuscritos musicais no Brasil: necessidade ou utopia? In: LIMA, Sônia Albano de. Faculdade de Música Carlos Gomes: retrospectiva acadêmica. São Paulo: Musa Editora; A Faculdade, 2005. p.64-78. (Biblioteca aula, v.8. Musa música) ISBN: 85-85653-82-5.
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Redsumo. Até meados da década de 1980 não existia, no Brasil, uma diferenciação no tratamento dos acervos musicais e não-musicais, tendo sido ambos tratados com metodologia muito pró- xima, basicamente originária da biblioteconomia. Os estudos musicológicos, até então, estavam quase totalmente focados em autores e obras, sendo raras as iniciativas ligadas aos acervos onde tais obras eram encontradas. Com isso, os acervos musicais, na melhor das hipóteses, acabavam recebendo um tratamento superficial e pouco especializado, mas na maioria das vezes nem chegavam a essa fase, permanecendo desorganizados e sujeitos ao extravio total ou parcial. A partir de 1984 começaram a surgir as primeiras preocupações ligadas a acervos musicais, com discussões em torno do acervo do Museu da Música de Mariana (MG), que se abria ao público naquele mesmo ano (I ENCONTRO, 1984), embora os primeiros esforços empreendidos em sua organização e catalogação tenham sido majoritariamente empíricos. Também não se pode deixar de perceber a defasagem da preocupação arquivístico-musical no Brasil em relação aos países desenvolvidos e mesmo aos países hispano- americanos, considerando-se que essa tendência já existia na Europa desde o século XIX e que em Lima (Peru), em 1982, surgiam as primeiras propostas de catalogação de manuscritos musicais latino-americanos, no Primer Grupo Regional de Estudio de la Musicología Histórica en América Latina (NEVES, 1998). Os primeiros reflexos dessa tendência, no Brasil, surgiram como proposta para um “Sistema Nacional de Arquivos Musicais”, durante o Encontro de Musicologia do II Festival Latino-Americano de Arte e Cultura realizado em Brasília no ano de 1989 (NEVES, 1998), mas que, além de tardio em relação às próprias iniciativas hispano-americanas, acabou não resultando diretamente em nenhuma iniciativa concreta. Não se pode negar, contudo, o pioneirismo de José Maria Neves, que participou da elaboração desse documento, na defesa do estudo sistemático dos acervos musicais, em lugar da abordagem meramente extrativista ou colecionista que vigorou até pelo menos o final da década de 1980 (NEVES, 1993).