Sl!lllllllllÍl« IBflHHl «IP H. IÉ «111 ■■■■■■I 1111 JHHh ■Ix' I . *M ti ihauvard QK265 .L59 Gray Herbarium Purchase August 1970 Recéived l Cj U-u_q/ . I S O % . BOLETIM DA COMSSiO GEOGRÂPHICA E GEOLÓGICA DO ESTADO DE S. PAULO N. 5 CONTRIBUIÇÕES PARA A BOTÂNICA PAULISTA REGIÃO CAMPESTRE MEMORIA DAS EXCURSÕES BOTÂNICAS DE 1887, 1888 e 1889 •*3^<**« •*£»'£*• S. PAULO: LEROY KING BOOKWALTKK TYPOGRAPHIA KING 1890, , L5cl 308 ^ CONTRIBUIÇÃO PARA A FLORA PAULISTA BEGIÁO CAMPESTRE POP ALBERTO LOEFGRE N I O conjuncto dos vegetaes que cobrem o extenso território do Estado de S. Paulo, apresenta por sua natureza extraordinária variedade em suas particularidades, attento a posição geographica e as diíferenças da topographia. Como este Estado é atravessado pelo trópico do Capricórnio, d^ahi resulta uma divisão em parte intratropical e parte extratropical, determinando, a priori , diíferenças climatéricas que exercem sempre grande influencia sobre o carac- ter da vegetação. As differenças de altitude desde o nivel do mar até a altura de mil e tantos metros, constitue outro factor importante para imprimir á flora feições particulares. Accresce a isso as diíferenças na estructura geológica e a dis- tribuição de suas montanhas, deixando entre si, ora planaltos for- mando campos extensos, ora valles profundos sulcados de rios caudalosos, alimentados por uma complexa rede hydrographica, reunindo desta forma n'uma área relativamente limitada uma diversidade de condições que em outros paizes raro apparecem. O naturalista incumbido da grandiosa tarefa de investigar, descrever e coordenar essa inexgottavei riqueza de vegetaes, sen- te-se á primeira vista dominado por uma sensação de pequenez e impotência diante do estupendo cháos de formas, de espécies que se lhe apresentam, obrigando-o antes de tudo, a organisar um plano syst-ematico e methodico de trabalho. E eífectivamente, o explorador botânico no Estado de S. Paulo não pode produzir trabalho algum de valor, nem apresentar resul- tados satisfactorios ou dar uma ideia exacta da distribuição chárac- teristica desta multidão de vegetaes, sem plano previamente tra- çado. Reconhecendo essa verdade foi que, por indicação do nosso o illustrado chefe Dr. Orville A. Derby,iniciamos os nossos trabalhos com o estudo da flora dos campos. -J> CO CSJ CD (157) 6 VALLE bo RIO PARANAPANÉÍIA Não duvidamos que essa causa contribua para a conservação delles no estado de campo, c em certos casos até para transformar em campo sujo, terras que sem as queimas talvez não passassem de mattas ou capoeiras. Porém, não explica o facto de um modo satisfactorio e geral, porquanto os campos já existiam quando o povoamento do paiz, relativamente recente, ali trouxe o fogo afim de limpar a superfície, fertilizal-a com as cinzas e provocar uma vegetação tenra e apropriada para os animaes de criação. Segundo as nossas observações, suppomos antes que é isso eífeito de muitas causas actuando conjuntamente e que, si separa- das, talvez não produzissem essa formaçSo especial, porquanto os terrenos adjacentes differem sempre mais ou menos em sua topo- graphia ou em sua composição. Julgamos, pois, que essas causas devem ser procuradas principalmente na própria origem destes campos, na sua estructura geológica, composição mineralógica do solo, configuração topographica e condições climatéricas. Com relação a origem dos campos já confessamos a nossa incompetência, mas esperamos que com a continuação dos esme- rados estudos de nossos collegas geólogos, este ponto em breve ficará devidamente esclarecido, assim como sua estructura geoló- gica e composição mineralógica, que vão sendo por elles estudadas e portanto melhor conhecidas. Mais adiante, ao descrever os differentes campos referir-nos-hemos a esses estudos, dando a classificação conforme estabelecida pelo Dr. Gonzaga de Campos. A topographia dos campos paulistas é por toda parte a mesma, e observamos que elles limitam-se aos terrenos chatos, sem depres- sões nem fortes declividades, occupando em geral os planaltos entre as principaes bacias hydrographicas, e nunca observamos campos em terrenos accidentados ou montanhosos. Parece estar em contradicção, o facto de que quasi todos os campos do Estado se acham sulcados por valles, as vezes, bem profundos, mas estes valles, são antes accidentes secundários devidos á excavaçÕes pelas aguas do que verdadeiras depressões orographicas ; pelo menos em muitos lugares nos campos de Ita- petininga, de Jaboticabal e Casa-Branca adquirimos plena certeza disso. Para isto contribue muito a espessura, algumas vezes extraor- dinária, da camada terrosa que facilmente é excavada pelas aguas subterrâneas, como a provam os profundos desmoronamentos denominados Vossorocas commumente formadas nas fontes dos riachos ou pequenos arfluentes. Deste facto pode se concluir que em geral ha infiltração rápida, de modo que a agua fica bastante affastada da superfície do solo, diíficultando naturalmente o desenvolvimento de uma vegetação mais alta, ávida de humidade regular e favorescendo plantas que, por adaptação, acostumaram-se a passar longo tempo sem outra humidade que a da atmosphera. (160) COMMISSÂO GEOGRAPHICA E GEOLÓGICA 7 Por isso acontece quasi sempre que comprida? restingas de vegetação alta, acompanham as margens dos ribeirões e córregos que cortam o campo, não podendo subir os barrancos ou encostas por serem estas em geral enxarcadas até uma certa altura a qual indica ahi a linha d'agua do subsolo. Em cima dessa linha o ter- reno conserva-se completamente secco, parecendo atérepellir uma invasão d^quella vegetação estranha ao campo. Este mesmo facto' observa-se também em lugares onde não ha barrancos ou encostas inclinadas, como nas depressões chatas entre os morros suaves. Em geral o terreno ahi é banhado por agua que não tem sahida ou que constitue uma fonte, ou já forma o leito de um riacho ou regato manso. Em qualquer dos casos, forma-se sempre nestes lugares uma espécie de vegetação robusta e alta, as vezes até com caracter de matta virgem, a que dá-se o nome de capão que segundo Martius quer dizer — ilha de ver- dura. (*) Estes capões são sempre rodeados de brejos cuja vegetação baixa, unida e áspera se destaca de um modo singular tanto da vegetação alta dos capões como da vegetação do campo. Que a topographia realmente é uma das cousas principaes de differenciação entre campo e matta, não pode ser posto em duvida e esta nossa observação vemos perfeitamente confirmada pelo sábio botânico Dr. A. Grisebach que na sua obra La vegetation du globc, traduzida do allemão pelo Dr. P. de Tchiatchef, volume II, pa- gina 58i, diz : « Toutefois o)i se Iromperait beancoup si Von voulait se fonder « sur ces contrastes geologiques, qui coincident avec la « séparation de denx domaines végétaux et modifient « nécessairement la nature de la terre végètale, pour « conclure d une connexion directe entre ces deux ordres « de phénomènes. Cest ptutòt dans la configuration « plastique du Brcsil et dans les subdirisions climatériques « quelle determine, que git l 'unique cause des formatwns « des campos et des forfts vierges. » Uma vez formados os campos, as difficuldades de uma mu- dança na vegetação devem sem duvida accentuarem-se cada vez mais, porquanto em planícies como aquellas que os constituem, e cuja vegetação baixa ou rasteira, pouca ou nenhuma humidade produz, as estações são muito mais regulares do que em terrenos accidentados e cobertos de vegetação alta, e as differenças clima-* tericas entre cada estação, são ahi mais pronunciadas de modo a serem as chuvas mais regulares, apparecenio em épDcha deter-; ? P Ssgundo outros sua etymologia ó : Caá— matto e poau— redondo. (161) 8 VALLE DO RIO PARANAPANEMA minada, deixando os campos pelo resto do anno quasi sem outra humidade além do abundante orvalho, um dos maiores benefícios destas zonas. Ora, sabe-se perfeitamente que é na entrada da estação secca e fria, ou nos mezes autumnaes que a maior parte das arvores e da vegetação alta fructifica e se lhe soltam as suas sementes, e dest'arte aquellas que acertam de cahir no campo encontram um solo, já frio, secco e endurecido, desfavorável a germinação, até impedindo-a, e atrophiando o pequeno embryao que precisa de chão macio de húmus, coberto por folhas seccas e de detrictos em decomposição, desenvolvendo calor, e n\ima sombra permanente. No campo é justamente o contrario que se dá, porque em geral nem chegam as sementes até o chão limpo, cahem por vezes em moitas espessas de capim ou de plantas rasteiras as quaes impos- sibilitam-lhes o desenvolvimento, formando um tapete impene- trável pelo entrelaçamento de suas raizes finas e ramificadas em cabelleirra. Por varias vezes também observamos que ainda quando con- seguem cahir sobre terra nua e começam a germinação, a pequena e tenra plantula não achando as condições necessárias acaba logo por definhar, seccar e finalmente morrer, gozando apenas de uma vida ephemera. Si, porém, consegue enraigar-se, assim mesmo não escapa ás queimas que annualmente devastam os campos, silificando-lhes e endurecendo cada vez mais a superfície. Destas circumstancias desfavoráveis resultou naturalmente uma adaptação especial dos vegetaes acontecendo que a própria flora dos campos constitue mais uma causa não desprezivel para conservar-lhes o próprio caracter. Em alguns vegetaes desappareceu quasi o tronco aéreo para dar lugar á um tronco subterrâneo, grosso e cheio, verdadeiros denositos ou provisões de agua, como em todas as Garobeiras CTiifrnoniaceas) Cajueiros (Anacardiaceas) Jalappas (Apocyna- ceas) e muitas Leguminosas ; sabido como é que são em geral as raizes das plantas campestres as mais procuradas por suas virtudes medicinaes ; outros revestiram-se de um systema piloso, até completo desapparecimento da epiderme verde, afim de melhor reter a humidade do orvalho, como muitas Euphorbiaceas (Ve- lame etc.) Apocj-naceas, Compósitas, Amarantaceas e até varias Graminaceas ; a outra? ainda desenvolveu-se-lhes extraordinaria- mente a casca como em varias Erj-throxylaceas e Ternstrceme- riaceas, adquirindo ao mesmo tempo folhas extremamente rigidas e coriaceas. Muitas vezes encontram-se troncos superficialmente carbonisados, vegetando viçosamente, protegidos pela casca. A adaptação mais interessante talvez consista na construcção das sementes das plantas componentes da flora dos campos, a maior parte das quaes além de dotadas de innumaros meios de transporte, seja pelo vento, seja pelos animaes ao> quaes se agsr- (102) COMMISSAO GEOGRAPHICA E GEOLÓGICA 9 ram, possuem em geral uma extraordinária capacidade de resistên- cia contra influencias atmosphericas e mecânicas, visto a sua ordiná- ria pequenez,dureza e extrema elasticidade, germinando num tem- po muito mais curto do que as de vegetaes arborescentes,o que as subtrahe á influencia das más condições atmosphericas, e faculta- lhes aguardar sem prejuízo a vinda de tempo mais favorável para seu desenvolvimento. Entretanto ha exemplos de que as mattas ou capoeiras que beiram os campos avançam, ganhando terreno, e que os próprios campos se transformam primeiro em cerrados e depois em mattas quando não sujeitos a frequentes queimas e como prova desta asserção podemos mencionar o lugar denominado Cerradão, dis- tante cerca de 7 kilometros de Itapetininga,estendendo-se por quasi 14 kilometros e atravessado pela estrada de Tatuhy na direcção NS sobre uma chapada perfeitamente plana. Este cerradão está hoje bastante denso, ao passo que ha 5o annos ou mais lá não havia um só arbusto cuja altura fosse de dois metros, como foi-me aftirmado por muitos moradore= antigos do lugar. E1 preciso mencionar que este chapadão é continuação da serra do Capão Alto, onde se communica com uma magnifica matta virgem, e que a transição da matta para o cerradão se effec- tua quasi que insensivelmente. Muitas vezes também acontece que moradores pobres esta belecem-se no campo e ali fazem as suas roças, mas como nunca plantam no mesmo lugar dous annos em seguida, occupam em pouco tempo grandes extensões que abandonam, e as quaes nunca mais perdem o caracter especial que a cultura lhes imprimiu. Taes lugares reconhece-se immediatamente por causa da ca- poeira baixa que substituiu a vegetação campestre e que se destaca do resto do campo, contendo as vezes arvores e outros represen- tantes de zonas totalmente diversas. Além das differenças de aspecto superficial que os campos apresentam eom relação as outras zonas, ha ainda a circumstancia de que elles não são inteiramente iguaes entre si, apresentando as vezes caracteres bem diversos de uma para outra região. Estabelecendo, pois, uma comparação entre as varias zonas campestres que até agora visitamos, verifica-se que apezar da se- melhança apparente que á primeira vista offerecem, um exame mais detido faz logo salientar particularidades, que de outro modo facilmente passariam despercebidas. Essas particularidades, é verdade, pouco ou nada affectam o aspecto geral do campo, mas, como resultam da diversidade na preponderância de certas famílias de vegetaes que ahi habitam, (163) 10 VALLE DO RIO PARANArANEMA são de facto uma espécie de padrão ®u Índice da maior ou menor prestabilidade do terreno, de ponto de vista agrícola, e por isso mesmo de uma importância não pequena. Dedicamos portanto ao estudo dessas differenças locaes, uma attenção especial e chegamos a conclusão de que resultam princi- palmente de duas causas : a composição mineralógica do solo e a altitude sobre o nivel do mar, não tomando em conta as condições topographicas que são communs a todos os campos deste Estado. As differenças no caracter vegetativo dos campos q Je tem por origem a composição mineralógica do solo são naturalmente as principaes, pois, que delias depende o valor dos terrenos para a agricultura ou industria pastoril. Para a classificação dessas diversidades dos campos seguimos a divisão estabelecida pelo nosso illustrad) collega Dr. Luiz Gon- zaga de Campos. A zona campestre ao redor de Itapetininga e Tatuhy pertence segundo o Dr. Campos, ao horizonte geológico denominado de Itapetininga onde predominam os schistos e calcareo com peder- neira ou silex, provavelmente da formação carbonifera e contendo alguns fosseis. A parte superficial destas rochas produziram pela sua decom- posição uma terra argilosa e fértil. Por isso os campos desta zona são geralmente bons e mais próprios talvez para cultura do que para pastagens, parecendo-nos que o cultivo de cereaes ali daria melhor resultado que a criação. Nestes campos a flora é relativamente pouco variada, predominando plantas não forragei- ras como Compósitas, Mahaceas, Apocynaceas , Asclepiadaceas, e Labiatas ; as Graminaceas, si bem que muito desenvolvidas, são todavia representadas por poucas espécies, e as Leguminosas se acham em manifesta minoria o que parece indicar que o campo ali escaseia de compostos de cal, indispensáveis para a maior parte dos vegetaes que servem de alimento á criação. Parte dos campos de Rio-Claro e Limeira são da mesma zona, porém com mais calcareo porquanto já ahi abundam uma porção de Leguminosas que não achamos em Tatuhy nem Itapetininga. Quasi o contrario se dá na zona de Araraquara, dentro da qual consideramos o grande campo de Feijão, o de Brotas, o da es- tação de Fortaleza, de Araraquara e de Jaboticabal. Pertence toda esta zona á outro horizonte geológico, denominado de Botucatú e os seus campos são de grés desaggregado e de augito-porphyrita que apparece em manchas maiores ou menores, principalmente de Araraquara em diante, até Jaboticabal, constituindo solo de verdadeira terra roxa, referida provavelmente á épocha triasica. Parte destes campos, especialmente os de Feijão, de Brotas e 4a Fortaleza são muito arenosos e inclinados para um só lado onde (164) COMMISSÃO GÈOGRAPHICA E GEOLÓGICA lí apresentam a configuração de antigo leito de rio no qual corre ainda, ou melhor, espraia-se um ribeiro de pouca agua que no tempo chuvoso forma uma várzea. Parece isso indicar acção mais demorada de grandes massas de agua a que também se pode talvez attribuir a agglomeração da areia. Estes terrenos são muito permeáveis, friáveis e inconstan- tes, porém muito mais variadas na sua flora. Existem nestes campos, principalmente para o lado de Jabo- ticabal e mesmo perto de S. Carlos do Pinhal, maiores ou menores manchas de terra roxa, sobre que se desenvolveram então cerrados altos de uma vegetação variadíssima e exhuberante. Em toda a extensão que visitamos d^sta zona, até Jaboticabal, predomina a familia das Leguminosas, e as Gramiiiaceas são ali muito melhor representadas pelo menos quanto ao numero de espécies. E"1 nestes campos que temos visto as maiores várzeas, isto é, terrenos mais ou menos alagadiços e sempre planos, conservando uma humidade constante do solo e desenvolvendo uma vege- tação que diífere completamente do resto do campo e dos capões em geral. Nestes lugares pouco apreciados ou menos aproveitáveis abundam as plantas não forrageiras como Cyperaceas, Juncaceas, Avaceas, algumas Typhaceas, certas espécies de Utriculariaceas, Gentianaceas e grande variedade e quantidade de Eriocaulaceas e as vezes, em numero avultado certos Erj'ngiums,\nc\usive algu- mas espécies de Ericaceas dos géneros Gajylussacia e Leucothoe, que muito contribuem para dar á paisagem o caracter particular dos bruyères europeus ou nr\es como se chamam em Portugal. Os musgos, tanto das Brjyaceas como das Hepáticas são raros no chão e habitam de preferencia os arbustos e arvores em com- panhia de lichens e da singular Barba-de-páo (Bromeliacea? : Til' landsia usneoides L.), dando um aspecto frio e quasi que polar á vegetação. Os capões que se encontram nestas várzeas quasi nunca são irregulares e apresentam na sua base uma forma ellipsoide ou cir- cular, a vegetação cresce-lhes em altura de fora para dentro for- mando ás vezes um perfeito cone. Encontra-se ahi quasi que infallivelmente o interessante Pinho do brejo (Magnoliaceoe. Ta- lauma ovaía. A St. Hil:) e a celebre Casca d'Anta (Winteracex. Drimys Winterii Forst), muitas Tolygonaceas, Melastomaceas e sempre a singularissima palmeirinha chamada Guaricanga (Geo- noma sp.J assim como grande variedade de Rubiaceas, Mehaceas e as vezes até a Baunilha (Orchidacea). Exceptuado o campo de Jaboticabal, todos os mais desta zona parecem-nos menos apropriados para uma cultura immediata e (165) 12 VALLE DO RIO PARA&APAKÉMÀ muito mais próprios para a criação, pela abundância em espécies das duas principaes famílias de vegetaes forrageiros, as Gramina- ceas e as Leguminosas. Todavia não exclue em absoluto certas e determinadas cultu- ras, porquanto desenvolvendo-se ali a inductria pastoril em escala grande e de conformidade com os preceitos modernos da sciencia, haverá necessariamente abundante producção de adubos orgânicos e portanto de primeira qualidade, cuja applicação permittirá qualquer cultura própria, não dependendo esta da posição e da jemperatura como acontece com a lavoura do café. A este mesmo horizonte pertencem também os campos de Casa Branca, Batataes e Franca, até o valle do Rio Grande, por- que além da sua estructura geológica que no essencial é a mesma, a flora é tão igual e offerece tão pequenas differenças que quem visitar o campo de Jaboticabal e depois o de Batataes, julgar-se-ha ainda no mesmo logar. A única differença, de valor agrícola, talvez consista em serem os campos de Jaboticabal mais estragados ou mais quei- mados, havendo nelles também extensões muito maiores invadi- dos pela implacável Barba de bode. Além disso distinguem-se os campos de Batataes especialmente por sua rede hydrographica de malhas muito mais cerradas. A riqueza de agua é ali muito maior visto a abundância de regatos e de corregosinhos, de que resulta naturalmente maior numero de capões, desenvolvendo-se estes ao longo dos cursos d'agua, ou nas suas fontes, e constituindo sempre nas depressões vegetação alta, as vezes com as proporções de mattas pequenas. Por esta feliz distribuição de campo e de capões e pela favo- rável composição mineralógica do solo que, por assim dizer, per- mitte quasi toda espécie de cultura, assim como pela altitude de 800 á 1000 metros onde a geada não attinge, estes terrenos são bastante aptos para a colonisação, pois, não lhes faltam, nem escasseiam os dous elementos principaes para o colono indepen- dente— agua e lenha — e até madeira para construcção. A sua fertilidade não pode ser contestada em vista dos resultados magni- ficos já obtidos no plantio de vários cereaes e frutos, não obstante experiências ainda relativamente poucas. Em Casa Branca vimos e examinamos algumas lindas plan- tações de café e de uvas, no meio do campo, e por conselho nosso, dous distinctos cavalheiros dali já seguiram o exemplo e estão plantando no — campo limpo. Continuando nas considerações acerca das differenças produ- zidas pela composição do solo, distingue-se mais uma terceira zona de campo, de valor agrícola inferior á segunda descripta, mas cuja Hora não differe tanto quanto se podia suppor, a principal diffe- rença consistindo no desenvolvimento e aspecto de sua vegetação. (166) GòMMtSSÃO GEOGRAPIIICA E GEOLÓGICA ÍÚ Comprehende esta zona outros campos como os que se esteri- dem ao Sul da Capital, quasi chegando até a Serra do mar, subindo ao NO pelo Sorocaba até Porto Feliz e a L e NE talvez até Taubaté ou mais longe. Delles só visitamos os de Sorocaba e Ypartema; E' ainda ahi a base de grés, alternando com poucos schistos argilosos sem pederneira ou silex e com menor occurrencia de roehas eruptivas. Segundo o Dr. Campos pertencem ao horizonte geológico de Porto Feliz, provavelmente da formação carbonífera inferior ou talvez Devoniana superior e portanto ainda mais antiga que as precedentes. A vegetação nestes campos é muito mixta e como já disse- mos, differe bastante no aspecto, porque quasi todas as espécies que colhemos nestes campos são menos desenvolvidas e mais ra- chiticas que nos outros. Vimos por exemplo as graminaceas, capim flecha {Trislachya leiostacliya N. ab E.) e o capim flechinha (Tvistacliya chtysotrix Nab K.) que nos campos de Araraquara e Jaboticabal attingem as vezes a altura de dous metros, no campo de Sorocaba apenas chegarem a o, 5o e 0,80. A vegetação é, além disso, muito mais lenhosa e suas folhas mais coriaceas do que em outros campos e podemos citar a pequena malvacea Seda serratifoha L. que em Araraquara e Itapetininga tem uma pequena raiz herbácea, no campo de Ypanema apresen- tar quasi tubérculos sublenhosos. Pelas informações colhidas e que confirmam plenamente as nossas observações, acreditamos que estes campos pouco se prestam para cultura, excepto certos lugares onde o solo for mais argiloso, como temos visto na estação da Villeta, onde ha algu- mas plantações bonitas, mas conseguidas com bastante tra- balho. Pode ser que mais tarde alguma cultura especial alli se possa desenvolver, porém, parece-nos que os campos desta zona são antes destinados para industria pastoril. A altura sobre o nivel do mar exerce sobre os campos de S. Paulo uma influencia relativamente pequena, porque as diffe- renças de altitude também não são muito grandes, ficando quasi todos elles entre 600 e 700 metros, e poucos estão abaixo ou acima desta cota, com excepção da zona que começa em Batataes, formando o planalto entre rio Pardo e o rio Sapucahy, e cuja altura oscilla entre 800 e 1000 metros. Também o campo de Franca, entre Sapucahy e Rio Grande, é muito alto, estando em eertos lugares acima de 1000 metros, porém, cahe muito até che- gar á beira do Rio Grande, cuja altura é de 5o8 metros, nessa direcção. Nestes campos a vegetação é quasi idêntica á dos campos de Jaboticabal, e nem se nota differença no porte das plantas, o que talvez pode ser attribuido a uma espécie de compensação de ai- (167) 14 VALLE DO RIO PARANAPANÉMA tura pela latitude, pois esses campos acham-se effectivamenté mais ao Norte. Diverso, porém, é o que se dá nos campos onde ha mudança repentina de altitudes, como no campo da Fortaleza e na peque- na área sobre o Morro Chato ha 24 kilometros SE de Araraquara, bruscamente elevados a mais de 800 metros ou cerca de 100 me- tros acima dos campos circumvisinhos. Nestes lugares a flora muda sensivelmente no aspecto, ainda que pouco com relação ás espécies. As espécies das graminaceas augmentam em numero e a vegetação toda se torna mais contrahida, contorcida e um pouco rasteira. Não conhecemos ainda os campos de Jordão e Bocaina, mas affirmam-nos que a flora alli é inteiramente es- pecial. Gomo consequência da diíferença de altitude, seria de esperar que a temperatura também apresentasse differenças proporciona- das, mas parece que assim não é ; ao contrario vimos que nos campos altos de Batataes e Franca, a geada é quasi que desconhe- cida, ao passo que em Itapetininga, Tatuhy, Rio Claro, Arara- quara e Jaboticabal as geadas são frequentes. Entretanto quer nos parecer que as médias da temperatura pouco differem e sup- pomos isto ser devido á posição mais ao norte dos primeiros cam- pos onde a temperatura não pôde descer até ao O e também não se eleva tanto por causa da altitude, havendo deste modo uma espécie de compensação que iguala ás médias. Esperamos poder verificar isto pelas observações meteorológicas ; por emquanto, porém, bas,:amo-nos nas observações do illustrado Frei Germano d'Anecy, que dão como média para a Franca 19.5, o que corres- ponde exactamente com as observações que nos são fornecidas de Tatuhy, das quaes se infere uma média de iq°,6 em dois annosde observação. As estações do anno são bem caracterisadas nos campos e as differenças de uma para outra muito pronunciadas. Mas estas differenças tem apenas um valor secundário, por influirem so- mente no aspecto e no desenvolvimento suecessivo da vegetação. Pode-se dizer que durante o período do crescimento das plantas campestres, cada mez tira ou ajunta ao campo um caracter novo, seguindo-se os mezes como outros tantos vestuários. Quem visitar os campos nos mezes de Junho, Julho ou Agosto, logo antes ou logo depois das queimas, nada conhece da sua belleza, porque nesta época estão elles cobertos por esqueletos de arbustos, hervas biannuaes e capins seccos, por entre os quaes surge aqui e acolá alguma anonacea, myrtacea, euphorbiacea., malvacea ou compósita de folhas não caducas, coriaceaas, cor verde suja ou pardas, pela tomentosidade que as revestem, e no meio de tudo isto, moitas infindas de capim carbonisado. Aguardando, porém, a estação própria, ou voltando depois das primeiras chuvas, quando acordados os germens que repou* (168) COMMISSÃO GEOGRAPHICA E GEOLÓGICA 15 savana na terra, o campo muda quasi de noite para o dia, e como por encanto surgem do seio da campina milhares de plantulas, das quaes nem vestígio havia antes. Em serie determinada e parecendo obedecer á uma lei immu- tavel, succedem-se as diversas cores de suas inflorescencias, apre- sentando gradativamente os innumeros matizes da inexgottavel palheta da natureza. Sendo as Labiadas e as Compósitas as primeiras que em regra apparecem, a cor azul e roxeada predomina no primeiro período, pouco misturado com o amarello das Leguminosas, Oxa- lideas e certas Compósitas. Em seguida o amarello vence á medida que se desenvolvem as Vochysiaceas, Malpighiaceas, Ochnaceas e Caesalpiniadeas, para, por sua vez, dar lugar ao branco cândido das Myrtaceas, Malvaceas, Rubiaceas e Te- rnstrceemiaceas ; dahi passa para o roxo das novas Leguminosas- e Compósitas de mistura com as lindas Me lastomaceas e terminando com o vermelho em todos os matizes. Neste período também grande parte de Graminac^as flores- cem, balouçando suas bellas paniculas argênteas entre as mages- tosas Dipladenias, Tibouchinas, Wedddias,Lippias , Gomphrenas, Macrosiphontas , Hehcteres e mil outras. E1 o período mais en- cantador da vida vegetativa do campo, porém, de pouca duração, porque sobrevindo as chuvas de Dezembro e Janeiro, acabam com as tenras flores, e penetrando no solo, fazem nascer as innumeras Mouocotyledoneas das famílias Lilíaçece e Iridacece. Infelizmente ainda não tivemos tempo de esperar no campo esta nova phase da vida de suas flores, de modo que este ultimo grupo não se acha bem representado no nosso herbario. Em todo o caso esperamos logo poder preencher esta lacuna dos nossos estudos sobre a flora campestre. Em consequência desta successão de cores preponderantes na vegetação camprestre, differentes viajantes botânicos que visi- taram os campos em épocas diversas, descreveram como particu- laridade a cor que observaram como predominante na região por occasião de sua passagem, e eis a razão pela qual o grande mestre St. Hilaire diz que nos campos de Itapetininga predomina a cor azul, ao passo que nos campos de Minas Geraes é a amarella e a vermelha. E1 apenas differença de época. Mas, segundo observação feita, estas épochas ou estas succes soes não parecem fixas senão talvez para um e mesmo lugar, por- que em vários campos observamos differença de tempo no appa- recimento de vegetaes conhecidos e colleccionados. Nos campos de Casa Branca e Batataes essa differença assig- nala-se por um atrazo de 2 mezes, de modo que quando esperá- vamos encontrar ahi uma certa espécie em flor, muitas vezes nem botão havia ainda, (169) 16 VALLE DO RIO PARANAPANEMA Uma pequena comparação melhor elucidará o que queremos dizer. ÉPOCA DE FLORESCÊNCIA Hyptis multiflora, Po hl. Salvia rígida, Benth. Eupatorium amygdalinum, Lam. Salada campcstris, Walp . Zeyhera montana, Mart He lie ter es sacar olha, St. Hil. Fiplocarpha rotundifoha, Baker . Eremanthus spliceroccphalus, Baker Dipladenia illu siris, Mu 11 . Caryoear Brasiliensis , L . Itapetininga Agosto n Agosto e Set. Agosto Jul. e Agosto Setembro » Outubro Batataes Outubro Novembro Outubro » Novembro Outubro Out. e Nov. Dezembro E1 bem provável que essa differença de época seja consequên- cia de irregularidadee da estação, porquanto nos campos referidos tão pouca chuva cahira até então que as queimas se prolongaram até o fim de Novembro. Além disso encontramos grande numero de vegetaes sem flor, que no anno anterior tinham aliás florescido, e eram os biannuaes. Sentimos bastante ainda não dispor de observações sufifi- cientes para estabelecer a distribuição das chuvas, que é um elemento indispensável para a apreciação do valor agrícola destas zonas. Mas, como o nosso serviço é muito novo, espe- ramos em poucos annos poder dizer alguma cousa de positivo a respeito. III A collecção de plantas seccas que trouxemos da nossa pri- meira excursão a Itapetininga e Tatuhy, não pôde ser considerada completa, nem perfeitamente característica desta zona toda, por-: que o numero de 5i2 espécies talvez não represente mais do que a terça ou quarta parte das que realmente habitam aquelles camr pos ; entretanto fizemos o que era possível durante os poucos mezes que lá trabalhamos, tratando sempre de obter tudo que havia no campo e d-e preferencia as espécies que melhor represen- tassem as particularidades daquella flora. Podemos dizer o mesmo da segunda collecção de 692 espécies que obtivemos na escursão em 18S8, para a zona de Rio Claro e (170) COMMISSÃO GEOGRAPHICA E GEOLÓGICA 17 Jaboticabal, porém, com a differença que naquella occasiao já podiamos incluir 296 espécies observadas como habitando as duas zonas, de modo que as 692 espécies só representam as plantas que ainda não figuravam no herbario. Da terceira excursão em 1889 trouxemos apenas 028 espécies novas, isto é, ainda não colhidas por nós. A este numero deve- mos acrescentar mais 414 espécies ali observadas e communs as zonas percorridas anteriormente e portanto já colleccionada^. Explica isso o numero relativamente pequeno de plantas acha. das, e prova ao mesmo tempo que as colheitas anteriores foram talvez mais completas que ousávamos suppor. Acresce também que o anno passado foi muito irregular em relação a sua meteoro- logia, de sorte que as queimas poderam ainda. continuar até o mez de Novembro, atrazando muito o desenvolvimento dos vegetaes. Assim mesmo estamos longe de querer affirmar que a nossa collecçao representa já toda a flora campestre. Ao contrario sup- pomos que muito falta ainda, e o que nos dá maior certeza disso é sabermos que ha uma grande quantidade de plantas bi-annuaes que ainda não encontramos sinão em estado vegetativo, assim como muitos arbustos perennes que por causa das frepuentes queimas só excepcionalmente chegam a florescer. Como resultado inevitável da riqueza e variedade da vegetação campestre, apresenta-se seria difficuldade para de um modo abso- luto determinar os caracteres verdadeiramente especificos da sua flora, e corre-se facilmente o risco de apreciar como taes, caracte- res que apenas tem valor secundário. A causa disso temos que procurar não só no pequeno numero de representantes de certas espécies as quaes somente em alguns lugares se acham accidental- mente agglomeradas, enganando n^m exame supperficial, como talvez mais ainda por causa de haver no campo, grande numero de espécies que ao mesmo tempo habitam os cerrados e cerradões, e por conseguinte não podem ser consideradas como características dos campos. O único meio, pois, de chegar a uma apreciação mais ou menos exacta da verdadeira flora campestre, é estabelecer uma separação ou divisão entre as espécies que só se encontram nos campos, espécies que habitam simultaneamente os cerrados e cer- radões e finalmente espécies que só accidentalmente lá se acham. Tanto quanto permittem as pequenas collecções que até hoie obtivemos, e o incompleto estudo que pudemos fazer, dividimos as plantas que conhecemos daquellas zonas em 3 cathegorias : A. Incolce, ou puramente campestres, isto é, que não temos observado senão no campo. B. Simultaneoe ou espec;es que encontram-se tanto no campo como nos cerrados e cerradões. Ç. Casaales ou que não pertencem a flora campestre e só accidentalmente se acham no campo, (171) 18 VALLE DO iUO PARANAPNEMA iSas três excursões que até agora temos feito, visitamos três zonas, das quaes duas podem ser consideradas como perten- centes-ao mesmo horizonte geológico, segundo a divisão do nosso illustrado collega Dr. Campos. Entretanto não podemos englobar in totum as collecçoes destas duas zonas, porque embora não exista differença geologicamente fallado, ha comtudo necessidade de uma separação, visto esta zona ser constituída de uma parte essencialmente arenosa e outra argilosa o que produz uma diversidade manifesta na vegetação das duas partes. Estabelecemos por isso uma divisão botânica que tenha por base essa diversidade de accordo com o que observamos no terreno, e obtemos assim, em vez de divisão das excursões, a divisão se- guinte das plantas do nosso herbario, ou melhor, das localidades onde foram colhidas. r Campos de Itapetininga e tt • ,. r i • ~ j T^ 4.- ■ t ) Tatuhy com terrenos mais ar- Honzonte Geológico de Itapetininga 1 < ., J ,, ° ] gilosos que arenosos (da I? ' excursão). r Campos do Rio-Claro,Bro- , _ TT J tas, Fortaleza, St* Rita, S. Si- [Campos arenosos II ■[ m&Q e dos dc ^rara. Horizonte quara (ia e 3a excursão) Geológico de Botucatú / f Campos de Jaboticabal, Mo Campos argilosos III J SY Guassú, Casa-Branca, Ri- j beirão Preto, Batataes e ^ Franca ( 2a e 3a excursão ) Distribuindo então as plantas das nossas collecçoes, segundo esta classificação das zonas percorridas, de combinação com a divi- são acima estabelecida para a habitação das espécies, chegamos ao resultado abaixo por nós apresentado apenas como provisório e sujeito a modificações resultantes de posteriores observações e estudos mais demorados. A collecção da ia zona foi, como já mencionamos, de 5i2 espécies. A segunda collecção foi de 692 espécies e a terceira foi de 328. Para a zona II temos que deduzir da segunda collecção. 268 espécies pertencentes á zona III e obtemos assim para zona II 424 espécies a que devemos accresccntar ainda 182 já encontradas na primeira excursão e mais 208 da terteira excursão, entre as colhi- das e observadas, perfazendo um total de 820 espécies 4'aquella zona UJ, (172) COMMISSÁO GEOGRAPHICA E GEOLÓGICA 19 Para a zona III resta em primeiro lugar 268 espécies da segun- da excursão e mais 216 da terceira, que com 386 ali observadas perfazem o total de 870 espécies reconhecidas na zona III. A distribuição fica então como se segue : ZONA I ZONA II ZONA III A. Campestres B. Simultaneae C. Casuales — 278 ou 54.3% 168 » 32.8 » 66 » 12.9 » 315 ou 38.4% 438 » 53-4 » 6y » 8.2 » 492 ou 56.6% 2 54 » 29.2 » 124 » I4.2 » 512 » 100 » 820 » 100 » 87O » IOO » Por falta de material de comparação e de litteratura botânica necessária, ainda não podemos dar uma lista detalhada das espé- cies colhidas, e temos de nós limitar á uma determinação das famí- lias e géneros, excepto nos casos que a classificação pode ser feita com auxilio da Flora de Martius, da qual aliás faltam-nós varias partes. Sendo, além disso, o nosso especial objectivo, o de tratar dos campos, occupar-nos -hemos por agora somente com as plantas pu- ramente campestres, excepto para as zonas onde as Simultaneae não podem ser excluídas totalmente por não haver limite determi- nável. Neste caso estão os campos arenosos quasi todos, na sua maior parte parecendo estabelecer uma transição entre campo e cerrado. Distribuindo em famílias as espécies campestres que trouxe- mos das excursões temos : Para a primeira zona 278 espécies pertencentes á, 198 géneros e 52 famílias. Para a zona segunda, 3 15 espécies em 216 géneros e 61 fami- lias. Para a zona terceira 492 espécies em 259 géneros e 97 famí- lias. A tabeliã que se segue contem as famílias principaes que de um ou outro modo são características para todas as zonas, servin- do também para pôr em evidencia a maior ou menor frequência delias em uma e outra zona. Escolhemos para esta tabeliã de preferencia aquellas que por sua constante occurrencia são eífectivamente próprias do campo, assignalando como dwersas, todas as que apezar de sempre habi- tarem os campos nunca ahi abundam e nem contribuem para dar- lhes feição particular. E taes são por exemplo : as Campamilaceas, Gentianaceas, Alsinaceas, Passtfloraceas, Aristolochiaceas, Cucur- bitaceas, Connavaceas, Cunomaceas eíc. etc (173) 20 VLLE DO RIO PARANAPANEMA FREQUÊNCIA DAS FAMÍLIAS EM PORCENTAGEM Compósita; Leguminosa; Graminacae Euphorbiacere Asclepiadacea; Labiata; Cyperacea; Rubiacea; Verbenacea; Myrtacea; Solanacea; Melastomacea; Convolvulacea; Sterculiacea; Anacardiacea; Erythroxylacea; Ternstrcemeriacea;. Famílias diversas . SONAS I 19. Ic /o 10.1 » 8.6 » 47 » 3-9 3-6 3-6 3-6 » » » » 3-2 » 2-5 » 0 0 » 1.8 » 1.8 » 1.8 » 1.8 » 1.8 » 0.7 » 25.2 » II III 12.8% 18.4% 20.8 » 11.7 » 5.8 » 12.8 » 4.9 * 3.8» 1.6 » 2.8 » 2.1 » 37» 1.3 » 4.8 » 7.0 » 2.2 « 1.5 » 1.8 » 3.0» 2.3 » 1.5 » 2.4 « 4.8 » 1.6 » 37 " 2.3 >) 0.9 » 1.8 « 1.3 » 1.6 » 0.4 » 1.8 « 0.6 » 1.0 » 25.0 » 23.2 » Uma ligeira inspecção deste quadro approximativo, faz logo resaltar as diíFerenças e as similhanças entre as três zonas. Considerando os campos do ponto de vista de sua utilidade presente e futura, podemos dizer que até agora, só uma applicação se lhes tem dado, a da industria pastoril. As famílias vegetaesque nesta industria representam o papel mais importante, são princi- palmente duas : a das Graminaceas e a das Leguminosas. A família das Graminaceas tem uma porcentagem bastante grande nas zonas I e III, e o motivo de ser esta porcentagem maior na zona III é, como já foi dito, o de ter-se-lhe incluído as espécies reconhecidas das outras zonas, representando, na verdade, menos do que nas zonas I e II juntamente. O que, porém, surprehende, é a grande predominância das Leguminosas na zona II, parecendo-nos isto devido talvez á maior riqueza em compostos calcareos nos campos arenosos. Que a família das Compósitas occupam o primeiro lugar nas duas zonas mais argilosas, não é para estranhar, visto ser essa fa- mília a mais rica em espécies de todos os dicotyledones, favorecida como é pela construcçao de suas sementes que podem ser transpor- tadas a grandes distancias e que resistem a tudo. Constituída tam- bém em sua maior parte de plantas herbáceas e sublenhosas que facilmente se adaptam as condições de vida do campo, ella deve forçosamente prevalecer. (174) COMMISSÃO GEOGRAPHICA E GEOLÓGICA 21 Já mencionamos que a classificação ainda não está acabada, com excepção das espécies encontradas na Martii Flora Brasilien- sis. Em todo caso podemos desde já enumerar algumas espécies mais frequentes e que especialmente merecem ser mencionadas. Como Compósitas predominantes pela quantidade de seus in- divíduos, ou que por alguma especialidade se tornam notáveis, te- mos as seguintes espécies : Aspilia setosa. Grisebach » foliacea. Baker. Baccharis tridentatã Vahl : » articulata Pers. » stenocephala Hook & Arns ; » aphylla D. C. » artemisioides Hook & Arns. » incisa » » » Chaptalid piloselloides Baker » nutans Hernshy. Eremanthus sphccrocephalus Baker Eitpatorium amygdalinum Lam : o campestre » Gynopsis oblongifolia Baker Isostigma peuccdanifolium Less .* Mikania lasiandra? D.C. » officinalis Ttptocarpha rotundifolia Baker Tnchocline eriopus » Vernonia brcvifolia Less. » obovata » » simplex. » Estas espécies são as mais vulgares e formam, para assim di- zer, o grosso da família ; embora de muito pequeno ou talvez ne- nhum valor para a industria pastoril. Na Europa dá-se o mesmo facto, porque nenhuma espécie desta vasta família é cultivada co- mo planta forrageira e quasi todas ellas são desprezadas pelo gado, que somente em occasião de grande secca e consequente falta de outras plantas melhores, as come indistinctamente. Felizmente não se lhes conhece propriedades toxicas. Para as industrias tambcm não tem valor e não nos consta que alguma seja empregada para fins industriaes. O único merecimento que uma ou outra espécie possa ter, e este também as mais das vezes duvidoso, seria por certas virtudes medicinaes, o que faz com que algumas figuram na medicina do- mestica. São em geral as menos frequentes e pouco ou nada con- tribuem para dar alguma feição ao caracter geral do campo. (175) 22 VALLE DÓ RIO PARANAPANEMÂ As que temos na collecção e que gozam de uma certa reputa- ção são as seguintes : Baccharis trldentata Vahl ; (carqueja folhuda) » articulata Pers. (carqueija) » gemslelloides » (carqueija) Todas estas espécies gozam da fama de tónicas e febrífugas, sendo a primeira também empregada em cosimento como efficaz na moléstia da retenção das ourinas. Chaptaha integnfoha Baker (Língua de vacca) O sueco das folhas pisadas tem propriedades balsâmicas e é empregado no curativo de feridas. E' também reputada febrífuga, em cosimento. Elcphantopits scaber L. (Suçuayá) E1 uma planta muito preconisada. As folhas são reputadas su- doríficas em cosimento e a raiz é empregada como poderoso febrí- fugo. Raiz e folhas juntas dizem ser especifico contra elephantiasis e syphilis no primeiro estado. Mikania qfficmahs. Martius (Coração de Jesus) E1 considerada febrífuga e tónica, pelo que é empregada nas febres inte iminentes e em dyspepsias. Temos, de facto, mais algumas espécies aiém destas mas não pertencem a flora campestre. Bem que não haja emprego especial nas industrias para as Compósitas do campo que conhecemos, ha todavia muitas delias que com grande vantagem podiam figurar nos jardins como plan- tas de ornamento. O jardineiro hábil e conhecedor da sua arte com facilidade podia augmentar suas bellezas e crear variedades que até podiam tornar-se objectos de uma exportação, visto que na Europa o gosto pela floricultura é muito desenvolvido. Como mais notáveis entre as que temos visto, podemos men- cionar : Matisia coccinea. S. Hil : Trepadeira sublenhosa com folhas alternas, compostas; verde brilhante na face superior e albocanescentes no dorso (avesso) ; flo- res em capítulos grandes, com as ligulas da margem côr de fogo (coccineas). E1 de facillimo cultivo e pega em qualquer lugar, prestando-se muito para caramanchões e para cobrir portaes. (176) COMMISSÃO GEOGRAPHICA E GEOLÓGICA 23 Isostigma peucedanifolium Less. (Cravo do campo) Planta herbácea de raiz grossa, sublenhosa, ae vezes lenhosa ; folhas lineares, compostas, irregulares, de cor verde claro e ba- saes ; flor em capitulo terminal com ligulas recortadas côr de pur- pura escura. Vernonia grandiflora Less. Planta herbácea, erecta, de caule simples, liso ; folhas sessis, lineares, inteiras, coriaceas glabras, capítulos floraes grandes mul- tifloraes ^40-60^ de côr roxa azulada, desprendendo agradável aro- ma de resedd. Gnaphalium purpureum L. par : spathulatum. Lam. Planta herbácea erecta, caule e folhas argênteo lanosas, folhas oblongo spathuladas, de ápice arredondada, flores em capítulos terminaes rodeadas de bracteas em forma de escamas de brilho bronzeado metallico. E' uma das mais bellas espécies que habi- tam os campos e não é rara. Esta espécie pôde facilmente tornar-se planta ornamental de primeira ordem, especialmente para ramalhetes, visto possuir as propriedade das sempre vivas. E1 prima-irmã da celebre Gnapha- lium leontopodium L. (Edelweiss em allemão) que em geral cresce nas mais inaccessiveis escarpas dos alpes da Suissa, e cuja procu- ra já tantas vidas custou. Hoje, porem, é ella cultivada em grande escala de modo que sua acquisiçao é muito fácil. Eremanthus sph&rocephalus. Baker Subarbusto, sublenhoso ; folhas pecioladas, rígidas, coria- ceas, ovatas ou cordato-ovatas, de margem sinuosa ou subintegra. Toda planta é revestida de uma tomentosidade branca levemente pardacenta. Flores em capítulos agglomerados, longe pecioladas, formando espheras de cor roxa azulada e terminaes. E1 uma planta que immediatamente chama a attenção do via- jante porque destaca-se de um modo saliente sobre o fundo verde da campina, tornando-se por isso de um effeito ornamental notá- vel. Accresce que é pouco exigente e de cultura facillima. E' bian- nual, mas pôde talvez tornar-se perenne. Em numero de espécies, o segundo lugar é occupado pela fa- mília das Leguminosas, especialmente das sub-familias, Papiliona- ceae e Mimosaceae, porem, em quantidade de indivíduos é muito inferior a família precedente. De muitas espécies houve bastante difficuldade para encontrar três exemplares como era de mister para a collecção, e de outras apenas logramos, encontrar um ou dous indivíduos, (177) 24 VALLE DO RIO PARANAPANEMA Assim mesmo ha varias espécies que são muito communs, e entre ellas destacamos as seguintes : Aeschynomcm falcata D.C. Calliandra macrocephala. Benth. Centrosema rotundifolium Mart : Clitoria Guyanensis Benth. Collcea scarlatina Mart. (Guitello ou Beija-flôr) Crot alarga flavicoma Benth. » holosencea Nees E Mart. » striata D. C. (Todas tem o nome de Guiso de CascaveD Desmodium adscendens D. C. » axifiare » » uncinatum » Lupinus subscssilis Benth. Phaseolus lineares H. B. K. Stj-losanthes bracteata Vog. » Guiancnsis » O género Mimosa é mujto representado e delle achamos 47 espécies que ainda não podemos classificar. Estamos de algum modo embaraçados para emittir opinião sobre o valor agrícola dos representantes desta família, primeiro porque nenhuma das que encontramos pertence á espécie ou géne- ro cultivado na Europa e mais ainda porque das poucas que vimos cortadas pelo gado^ se não deprehende preferencia alguma da parte dos animaes. Golhemos numerosas informações a respeito ; mas nenhuma nos induz a admittir esta família como representando papel de for- rageira, propriamente dita. Todavia mencionaremos as que vimos cortadas frequentemen- te pelo gado e que talvez com cultura possam tornar-se úteis. Não pudemos colher nomes populares para estas plantas, o que também prova que o povo lhes liga pouca importância. Centrosema rotundifolium Mart. Planta rasteira herbácea, vulgarissima, foliolos 3 — 5, ovato- orbiculares, obtusas, aspero-pubescentes, pedúnculo uni-trifloro, flores vermelhas pequenas. Desmodium adscendens & C. » àxillare D. G. » uncinatum I), G. Plantas herbáceas, as vezes sublenhosas, de folhas ovato lan- çeoladas — D. uncinatum, — ou orbiculares — D. adscendens — ou tanto (178) COMMISSÃO GEOGRAPHICA E GEOLÓGICA 25 de uma como de outra forma — D. axillare, as vezes pubescentes, as vezes lisas membranaceas ; flores em geral vermelho-claras ou mais escuras. Na Flora de Martins, D. axillare não é mencionada como per- tencente ao Estado de S. Paulo e tem o nome indígena de Mundu- bi — rana (mindubi? — rana), nome que nunca aqui encontramos. Lupinus subsessilis Benth. Planta herbácea, deitada, não rasteira, molle, folhas em geral ovatas, molles, inteiras, flores vermelhas pallidas. Stjdosanthes bracteata Vog : Planta herbácea ; rhizoma crassa, lenhosa, caules numerosos, erectos ; folhas ellipticas, até lineares, agudas ; flores em espigas ca- pituli-formes, fortemente bracteadas, amarellas. Stylosanthes Guyanensis Sw: Planta herbácea, erecta ou ascendente mais ou menos pubes- cente, foliolos oblongos lanceolados, acuminados, flores como a St : bracteata, amarellas. Estas ultimas duas espécies são talvez as mais procuradas, e nos campos de Araraquara onde predomina. St : Guyanensis pare- ceu-nos cortada pelo gado, de preferencia pelos cavallos e muares. Nos campos de Casa Branca, St: bracteata é a mais frequente e tem a mesma preferencia do gado. Além destas existem algumas espécies de Crotalaria também comidas, mas ainda não temol-as classificadas. Dos géneros Bait/iinia, Cássia e Mimosa, nenhuma espécie en- contramos que mostrasse ter servido de pastagem. Apezar de tu^o isso ainda não podemos anirmar positivamen- te que não ha plantas forrageiras indígenas nesta família, ao menos até que tenhamos algumas analyses sobre o valor nutritivo destas e outras espécies ( * ). O Em todo caso nào deixa de ser nica indicação do valor nutritivo do ter- reno, a predominância das Leguminosas principalmente na zona II que è bastante arenosa. S»be-se agora que as Leguminosas possuem a faculdade de assimilar o azoto directamente da atmosphera por intermédio de microorganis- mos, o que explica o facto de elles abundarem em terrenos de quasi área pura. E«ta observação repousa aliás sobre uma experiência em grande escala ef- fectuada na Allemanha por um sr Schultz que durante 15 annos suecessivos cultivou Lupinus sem adubação alguma azotica, acontecendo que no fim deste, período, a porcentagem do azoto contido no terreno, era maior do que no terre- no das outras culturas que tinham sido adubados como de costume. Concluiu-se disso que os Lupinus tinham assimilado o azoto do ar e com elle enriquecido a terra onde foram cultivados. Sobre este facto baseou-'e então um novo systema de agricultura, que con- siste em cultivar Leguminosas herbáceas ou subherbaceas, para armazenar azo- to e por meio do arado enterral-as como adubo verde para cultura de graminar ceas e outras, que tiram seu azolo somente da terra. (179) 26 VALLE DO RIO PARANAPANEMA De espeeies com valor para a industria, só podemos apresen- tar as do género índigo/era, que o povo denomina instinctivamente Anil, e das quaes se preparava antigamente o Índigo, industria que hoje está completamente abandonada. Poucas são também as espécies reputadas medicinaes e co- nhecemos apenas as seguintes : Periandra dulcis. Martius. (Alcaçuz) Arbusto lenhoso de i a 2 metros ; foliolos quasi sesseis obova- to-oblongas, sublanceoladas, glabras encima e de nervuras salien- tes embaixo ,• flores em racemos terminaes de cor azul-claro, as vezes bastante escuro ou roxeado. A raiz é exteriormente preta, interiormente amarella e de gosto doce, um pouco amargoso. E1 empregada com vantagem em moléstias de peito, catarrhaes etc. Cássia cathavtica, Mart. (Senne do campo) Subarbusto pequeno, todo hirto viscoso, folhas de 4 — 12 pares de foliolos, oblongos, obtusos, ou pouco agudos, também pubes- centes viscosos ; flores relativamente grandes e amarellas. Empregam-se as folhas como laxante brando, especialmente para crianças. Costumase fazer o chá bem doce. Cássia sp : {Raiz preta, Araraquara, Raiz de Corvo, Casa Branca) E' um arbusto de 1 metro, lenhoso, folhas bijugas, foliolos asymmetricos, coriaceos, verde-eccuros, flores grandes, amarellas. A raiz é rasteira, muitas vezes de mais de um metro de com- primento, de diversas grossuras, de epiderme intensivamente pre- ta e lenho amarello de gemma de ovo. O extracto alcoólico é reputado infallivel nos casos de morde- duras de cobra, e varias pessoas afflrmam que entra na composição da conhecida preparação denominada Vegetalina. Como vê-se pelo quadro é só em terceiro lugar que vem as Graminaceas, em todo caso uma das mais importantes famílias da vegetação campestre, tanto pela abundância de seus indivíduos como pelo papel saliente que representam na economia agrícola. Nas três excursões colhemos 84 espécies das quaes julgamos apenas 56 como puramente incolce. Alem destas observamos mais 39 espécies que infelizmente nunca encontramos em estado de flo- rescência ou fructificação perfeita, sendo por conseguinte quasi im- possível de serem classificadas aqui. Nem todas as espécies apparecem com a mesma abundância nem são ellas espalhadas igualmente sobre um e mesmo campo. (180) COMMISSÀO GEOGRAPHICA E GEOLÓGICA 27 Ao contrario, costumam antes apparecer em manchas, maio- res ou menores, mais ou menos afastadas uma das outras, e pou- cas são aquellas que se encontram algum tanto por toda a parte. Das que costumam ser mais abundantes e que em geral se acham mais espalhadas, ou se encontram occupando extensões maiores, notamos especialmente as seguintes : Aristida pallens H. B. K. » recurvata » » implexa » Chloris radiaia Elionurus latijlorus N. ab. E. Eragroslis lugens » Lcplochloa vir gata P. de Beauvais. Leptocoryphium lanatum N. ab E. Panicum capíllaceum » »> Echinochloena » » repandum » Paspalum conjugatum var pubescens. Bergius. » crisanthum Nab E. » mandiocanum Trin : a elliipticum. » Neesii Kunth. » pectinaium N. ab E. Polypogon elongatus H. B. K. Tristachya chrysothrix Nab. E. D leiostachya » De todas as Graminaceas que habitam nossos campos, as do grupo das Pankeas, e principalmente as do género Aristida, são as mais ricas em indivíduos como seja Aristida pal/ens H. B. K. que as vezes cobre extensões enormes. Também nenhuma gra- minacea ha cujas sementes, alem de dotados de excellentes meios de locomoção, germinam com tanta rapidez, porquanto em expe- riência por nós effectuada com estas sementes, postas entre baetas humedecidas, verificamos que germinavam em pouco mais de dous dias. De cincoenta sementes empregadas para a experiência, obti- vemos como termo médio de germinação, 53 horas. Ao mesmo tempo, somos informados que estas sementes pa- recem ter uma vitalidade infinita, porque sendo por qualquer cau- sa subtrahidas ás condições em que devem germinar, conservam ainda, depois de annos, a faculdade germinativa. Sementes inclusas em torrões de barro usado rpara rebocar casas, germinavam muitos annos depois, com a queda do reboco, e se ha observado igualmente que outras por acaso agarradas á pan- nos ou roupas, guardadas por muito tempo, não perderam sua vita- lidade mas desenvolveram-se perfeitamente, estabelecidas as con- dições necessárias. (181) 2S VALLÈ DO RIO PARANAPANÈMA Esta graminacea é a Barba de bode vulgar, mais conhecida co- mo praga inútil e por isso desprezada ; mas apezar dessa fama, não deixa de constituir uma pastagem regular, ao menos emquanto tenra, e de muito proveito para os carneiros segundo algumas in- formações. Não ha duvida que esta planta é uma praga uma vez apode- rando-se do terreno. Em todo caso constitue ella uma espécie de padrão que pela sua presença accusa, de um modo irrefutável, a esterilidade ou esgotamento superficial do terreno e ao mesmo tem- po, torna-se a mais eloquente prova do procedimento anti-econo- mico e destruidor do homem, pois é a primeira planta puc costu- ma apparecer nos campos estragados e talvez a única que resista as frequentes queimas. Considerando agora as graminaceas na nossa collecçao em re- lação ao seu valor nutritivo, devemos confessar que muito pouco se conhece ainda, e as informações a respeito obtidas são em geral tão vagas e tão contraditórias que não offeiecem ponto algum de partida para formar uma opinião definitiva. Accresce que nenhuma analyse existe ainda sobre graminaceas deste Estado. Destacando, porém, as graminaceas que vimos especialmente procuradas pela criação, organisamos a seguinte lista, sem duvida muito incompleta, e que indica ao mesmo tempo o successivo ap- parecimento delias, porquanto cada espécie parece ter sua épocha própria de vegetação em que é procurada, talvez por estar então mais tenra, reconhecido como está que o gado regeita as gramina- ceas em flor. Os números romanos que acompanham os nomes indicam as zonas onde estas graminaceas appareccm em maior quantidade ou preponderância. Eliônurus latiflorus. N. ab. E. / c II Paspalum maiidiocanum Trin. a ellipticum I » conjugatum var pubcsccus Berg ; / e li. Panicum capillaccum Lamp .• I e II. Paspalum erisanthum N. ab. B. /, II c III Paspalum pectinatum N. ab. B. I, II e III Polypogou cio ugal us H. B. K. /, II c III Leptockloa virgata P. de Beauvais II Panicum Echinolcena N. ab E. / e II Ti istachya kiostadiya » III » cluysothrix » III A primeira é a mais precoce de todas, reputada pastagem ex- cellente. Não a encontramos na zona III talvez por causa da épo- cha em que lá estivemos. Na zona de Itapetininga attribue-se o maior valor nutritivo ao Panicum capillaccum Lamk. vulgarmente denominado capim tni- (182) COMMlSSÂO GEOGRAPHÍCA E GEOLÓGICA 29 moso, que irregularmente cobre o terreno, e informaram-nos que esta graminacea tende a desapparecer. E' isto provavelmente devi- do ao nenhum trato das pastagens e parece-nos ao mesmo tempo um indicio de que ella não tem a força necessária para vencer as outras na luta pela existência e que carece de trato para prosperar como todos as plantas mais tenras e delicadas. Alem disso, falta el- la completamente na estação da secca e não resiste ao pisar dos animaes. Por isso julgamola pouco própria para objecto de cultu- ra, maximé em extensões como as dos campos naturaes. De quantas podem ter real valor especifico para o agricultor ou creador, as duas avenaceas, TristacJiya leiostacliya N. ab E. ou capim flecha, e a T. chrysotknx N ab E. capim flexinha são indu- bitavelmente superiores. Pertencem ambas com especialidade a zona de Araraquara — Jaboticabal, achando-se também na zona de Casa Branca e Franca. O capimflecha é uma das nossas maiores graminaceas, cres- cendo até a altura de dous metros e mais. O seu colmo é adocica- do e con*;erva-se verde e tenro até a fructificação ; as folhas com- pridas de um a dous centímetros de largura são um tanto ásperas mas muito procuradas pelo gado. Não fora a altura desta planta po- der-se-ia tomal-a pela aveia legitima, tanto parece-se com ella no estado de fructificação. Não duvidamos que, racionalmente cultiva- da, suas sementes possam tornar-se apropriadas para o mesmo uso, até substituir, a aveia do estrangeiro. Admitte dous cortes, pelo que serve muito como feno. Entretanto parece-nos que tanto o capim flecha como o flechi- nha exgottam depressa o solo e carecem de adubos, pelo menos de três em três annos, para não serem logo vencidos e substituídos pela barba de bode. E' de facto um inconveniente ; mas que tal se- ria uma planta que nada tirasse da terra e ainda assim fosse excel- lente forragem ? Voltaremos ao capim flexinha mais adiante. Ha mais duas graminaceas muito communs, ainda que não campestres, em todo caso merecem ser mencionadas. A primeira é a Anatlievium bicorne P. de Beauvais, vulgar- mente denominada sapé e por todos conhecida. Esta graminacea occupa as vezes extensões notáveis, porém, como já dissemos, é rara no campo propriamente dito. Apparece em geral nos lugares de mattas devastadas e sempre em terreno mais argiloso que areento. Nos campos artificiaes de Limeira e Rio Claro, que succederam as mattas virgens devasta- das afim de plantar milho para criação de porcos, o sapé é quasi a única planta forrageira, e considerada como regular, ao passo que em todo outro campo é ella totalmente desprezada. A segunda é uma graminacea pequena, rasteira, que encon- tra-se por toda parte : ao pé das habitações, nas ruas das cidades, no meio do campo e mesmo á beira dos caminhos em mattas. (188) 30 VALLE DO RIO PARANAPANEMÁ E1 conhecida pelo nome de Pé de gallinha e não é outra senão o Cynodon dactylon Pers : sobre a qual o sr. Jacome no Rio de Janeiro escreveu interessantes artigos, publicados no «Jornal do Commercio» do mez de Julho de 1887. Não ha negar que esta gra- minacea tenha muito valor nutritivo e que sua resistência contra influencias atmosphericas e mecânicas seja superior a da do capim mimoso e outros, mas tanto ella como qualquer outra não pode resistir ao nenhum trato, e a falta de trabalhos com os pastos, como é geral ainda neste Estado. . A grande questão da industria pastoril deste Estado e de que depende seu desenvolvimento, é obter plantas forrageiras que sof- fram o menos possível da secca e da geada e que se desenvolvam de modo a supplantar os outros vegetaes de menor valor ou inúteis, que surgem conjunctamente, fornecendo em todas as épochas do anno uma forragem sã e nutriente á criação, seja verde, seja em forma de feno. Mas por emquanto tal esperança ainda pertence ao domínio das utopias, em virtude do systema até hoje seguido tanto na lavoura propriamente dita, como na industria pastoril. Em todo paiz onde essa industria constitue uma das principaes fontes de renda, reconhece-se que por fértil que seja a terra, mais cedo ou mais tarde esgotar-se-ha e jamais se espera que os campos ou prados produzam infinitamente sem trato algum ou sem resti- tuição das substancias que as plantas absorveram. Ao contrario, naquelles paizes, a industria pastoril constitue uma verdadeira agricultura, e cuida-se com esmero na conservação das pastagens, sejam estes campos naturaes, sejam prados artifi- ciaes ou cultivados, constituindo então o que talvez se possa cha- mar lavoura mixta, na qual toda a producção de adubos que o gado fornece é aproveitado sem perda alguma. Segue-se naquelles paizes principalmente dois methodos, dependentes da extensão da propriedade e das condições pecu- niárias do lavrador ou criador, o methodo de roteamento e o me- thodo do descanço. O primeiro é geralmente empregado pelos proprietários pe- quenos que tem necessidade de aproveitar cada parcella do seu terreno, e consiste no cultivo alternado de vegetaes differentes, destinados a tirar do solo certas e determinadas substancias, sem prejuízo das culturas que devem succeder. Ha roteamento de dous, de trez, e até de quatro annos, sendo a parte por ultimo cultivada, entregue á pastagem para depois de um certo tempo entrar em roteamento novo. Este methodo ; si bem que muito proveitoso, por emquanto não se torna necessário applicaraos campos do Estado deS. Paulo onde ha proprietários que possuem ás vezes superfícies de muitas léguas quadradas. Ahi o segundo methodo, que passamos a expor, prestaria consideráveis vantagens. (184) COMMISSÃO GEOGRAPHICA E GEOLÓGICA 31 Consiste elle na divisão dos prados em certo e determinado numero de parcellas, entregando-se ao gado de cada vez uma só ou mais destas parcellas, conforme o numero de cabeças e tama- nho da propriedade. Ao passo que estas parcellas forem devas- tadas, muda-se o gado para outras, de sorte que exgottada a ultima, a primeira já esta em condições de supportar a criação. Cada parcella utilisada deve logo ser limpa das hervas inúteis, replantada onde for de mister e adubada si fòr preciso. E' de crer que que na prati:a as cousas não sejam tão fáceis como acabamos de expor, porque, em primeiro lagar as divisões do campo devem ser taes que o gado as não transponha ou arrombe facilmente ; mas talvez ahi o arame farpado ainda uma vez pro- vasse bem. Demais, cuTipre tratar das parcellas que os animaes abando- nam, o que de facto acarreta certos trabalhos, aos quaes ainda não se deu começo neste paiz e que por conseguinte ainda não esta nos seus hábitos. Não podemos entrarem pormenores, além do mais, porque o nosso objectivo se limita em demonstrar que nada inhibe ao este Estado de seguir os exemplos das nações antigas e adiantadas nesta industria, por achar-se em condições das mais favoráveis. O assumpto mais é do agrónomo especialista do que do botânico. Todavia não duvidamos que com algum esforço seria bem fácil melhorar as pastagens existentes eliminando pouco a pouco os vegetaes nocivos ou indifferentes, e, por meio de cortes á fouce em épocha própria, impedir a fructificação das graminaceas peren- nes, deixando as produzir sementes, unicamente em annos deter- minados. Porém, em S. Paulo, o único meio até hoje empregado para melhorar as pastagens e limpal-as das plantas inúteis, tem sido o fogo, que não ha negar é o mais expedito, mas que forçosamente deve enfraquecer os prados, e até inutilisal-os, porque uma das consequências inevitáveis é o progressivo endurecimento da camada superficial do solo. A causa principal deste facto está na silifi- cação continua da superfície onde agglomera-se cada vez mais a silica insolúvel dos colmos das graminaceas e cyperaceas queimadas, e quanto mais repetidas forem as queimas tanto mais accumu- la-se a silica das cinzas e tanto mais impenetrável se torna a terra. As plantas reapparecidas se mostram também cada vez mais ás- peras e siliciosas. contribuindo desta forma para o continuo endu- recimento do terreno. Além deste grave inconveniente, o fogo iestróe continua- mente uma grande porção de sementes, tanto de plantas nocivas como d^ boas, favorecendo mais o desenvolvimento das que em geral, nenhum valor possuem quanto ao mérito das pastagens, deixando-as intactas por terem suas raizes, de ordinário tão profundo que o calor as não attinge e portanto as não destróe, dahi (185) 32 VALLE DO RIO PARANAPANEMA resultando predominância de arbustos lenhosos que em pouco tempo transformam pastagens boas em pastos ou campos sujes. Ouvimos muitas vezes tallar dos grandes trabalhos gastos na formação de pastos ou cultivados ; mas um pequeno exame do lugar, quasi sempre moslrou-nos que taes trabalhos se limitavam á uma plantação de mudas, de espaço em espaço, e isso mesmo sem ao menos ter revolvido, nem adubado convenientemente o terreno. O máximo de trabalho dispendido fora o amontoar aqui e acolá um pouco de bagaço de canna ou de palha de café que na sua decomposição, antes devia queimar as plantas que se achavam por debaixo, do que contribuir para fertilizar a terra. Em seguida soltara ali o gado, sem dividir a área nem tomar precaução alguma, deixando os animaes pisar, arrancar e estragar á vontade. A resultante desigualdade no crescimento das plantas, e falhas em vários lugares, attribuiam-se de preferencia a má qualidade do terreno, que diziam ser muito manchado. Esta pouca importância que se liga á conservação e trato das pastagens em geral tem sido provavelmente uma das causas de ainda não ter havido melhoramento sensível das raças de gado no Estado, apezar de contínuos cruzamentos com animaes importados e de raças excellentes. Gontribue também muito, não só para o desenvolvimento de certas moléstias, como até para a morte de muitos animaes que durante o inverno não acham alimento suffi- ciente no campo, procurando supprir essa falta com plantas dos cerrados e capoeiras, onde muitas vezes ingerem vegetaes tóxicos que lhes causam a morte ; e é facto sabido que o maior numero de casos de gado hervado coincide com a estação da secca. Mas antes de terminar a família das Graminaceas ', temos de enumerar certas espécies de mais ou menos valor industrial. A espécie principal talvez seja o sapé que ultimamente tem sido empregado com muita vantagem no fabrico de papel no Salto de Ytú. Serve, "além disso, para cobrir casas para que é muito em- pregado. Uma outra de valor menor e emprego ainda muito limitado é o capim denominado, capim moerão. Panicum vilfoides N. ab E. que se utiliza para trançar chapéos, pequenos cestos e outros objectos. A parte empregada é o internodio entre a espiga e o ultimo nó do colmo. Este internodio tem ás vezes o comprimento de 3o centímetros, prestando-se muito bem depois de achatado. Os objectos fabricados podem em seguida ser alvejados por meio do enxofre. Possuímos na collecção algumas tranças muito finas e bem trabalhadas. E1 além disso muito vulgar e podia facilmente ser objecto de pequena industria caseira. O capim flecha é riquíssimo em cellulose e podia perfeitamente ser explorado, (186) COMMISSÃO GEOGRArHICA E GEOLÓGICA 33 Nesta grande familia não faltam as espécies ornamentaes e. muitos são realmente tão beilas e delicadas, que fariam honra ao mais elegante ramalhete ou bouquct MackarU Na nossa collecção temos as seguintes com especialidade : Brisa Neesii Docll'. (Capim trigo) Chloris r adi ata Swartz Eragrostis íugens E. ab E. » rufescens Schulte. »> Vahlii N. ab E. a sejuncta. Eriauthus saccharoides Mi eh : Leptochloa virgata P. de Beauvais Panicum sulcatum Aubl : Polypongon elongatus H. B. K. Tristachya chrysothrix N. ab E. (Capim flcchinha) A primeira é uma. gra/uinacea robusta cujo colmo attinge até um metro de altura. Sua florescência em semipanicula tem as cariopses pesadas na ponta de pedúnculos finíssimos que se movem ao sopro da mais leve brisa. Chloris radiata, Eragrostis rufescens e E. Vahlii, são mais delica- das e primam pelas espigas unidas em palma portando cílios finos e quasi transparentes. A mais bonita talvez é a Tristachya chrysothrix, cujas cariopses douradas possuem cílios longos finos e azues, e tem a vantagem de não perder a côr quando secea, como provam exemplares de dous annos na nossa collecção. Próximos parentes das Graviinaceas^ a familia das Cyperaceas distingue-se essencialmente pelo colmo anguloso, sempre com- pacto, nunca oco e só raras vezes nodoso. São plantas ásperas, de tecido fibroso desenvolvido e de nenhum valor como forragem. Preferem um solo húmido, até enxarcado, razão porque poucas espécies achamos no campo, onde ellas não contribuem para dar caracter algum. Como puramente campestres, de campo secco, só achamos as seguintes : •tv Platylepis B) asiiiensis Kth : Rhynchospora capillifolia Boeckeler » leucantha » nova espécie » Warmingii » Scirpits Hwnboldtii Spr : » paradoxas, Boeck ; (187) 34 CONTRIBUIÇÕES PARA A BOTÂNICA PAULISTA e como habitantes constantes dos campos húmidos ou nas baixadas onde se formam poças ou pequenas lagoas na estação chuvosa ; Hcliochaiis capillacea Kunth : » grandis Boeck : » Loefgrcniana » nova espécie Rhynchospora Paulcnsis » » » » áurea Vahl : Scirpiís Loefgrenianus Boeck : nova espécie Já mencionamos que as referidas espécies não representam papel algum como forragem. O mesmo quasi podemos dizer com relação a industria, sendo todavia possível que por causa de suas fibras talvez venham a ter emprego no fabrico do papel. Na medicina não nos consta que alguma tenha sido empregada. A família que pela sua abundância em espécies tem logar immediato ás Grammaceas é a das Euphorbiaceas. Em certa épocha, logo após as queimas suas espécies dão sempre um caracter especial ao campo. Porém, como costumam apparecer em grupos, em certas partes do campo, modificam somente aquelles lugares sem comtudo influir sobre o campo todo. São plantas muito resistentes e supportam seccas prolongadas em consequeticia da tomentosidade que quasi sempre lh'as cobrem. E' uma familia que de um modo admirável soube adaptar-se á vi- da campestre e ás suas condições climatéricas extremas. Muitas ve- zes possuem grossas raizes lenhosas que formam depósitos de agua e seu revestimento tomentoso retém a miníma parcella do orvalho que felizmente é bastante abundante no campo. O mesmo revestimento também as abriga do frio e attenúa a acção do fogo. Alem disso possuem quasi sempre sementes duras que lhes ga- rantem a conservação da espécie. Como plantas forrageiras naturalmente são imprestáveis e a maior parte contém princípios tóxicos. Entretanto nenhuma obser- vamos que fo^se cortada pelo gado, e parece provável que os ani- maes instinctivamente as evitam. Entre as mais vulgares e que raras vezes faltam, notamos as seguintes ; Croton antisyphiliticns Mart. (Herva mular) » Pai th anus Muell. » compressas Lam. » campestris Muell. (^Velame do campo ) » grandicelum 2 ar : Algcrnonii Muell, » incertas Muell, » Ypanemensis » (188) còMmissão geogkaphica e geológica 35 Euphorbia ccecorum Mart. (^Herva andorinha^ » Brasiliensis Muell. » se tosa Muell. Julocroton Ackermannius Muell. » lanccolatus » » Riedelianus » » solanaceus » Gomo espécies industriacs, nenhuma podemos apontar como habitando o campo, apezar de haver muitas nos cerradoes, cuja descripção por conseguinte não cabe aqui. Na medicina domestica empregam-se varias delias, gozando todas das mesmas propriedades anti venéreas, especialmente : C. antisyphilitiais ou herva mular e C. campestris on velame do campo. As pequenas Euphorbia coecoram e E. Brasiliensis tem ambas o nome de Herva andorinha e são empregadas para banhar os olhos em casos de ophtalmias assim como para abreviar a maturação dos blepharites. A família das Asclepiadaccas como pastagem no campo é toda inútil e contem muitas espécies nocivas, até toxicas. As seguintes são as mais frequentes, sem comtudo influir no aspecto geral da flora, por se acharem em geral muito disseminadas. Asclepias Cuvassavica L„ C Official da sala) Asclepias cândida Vell. Araujia seriei/era Brot- : (Paina do campo, cipó sapo) Blepharodus Une ar is Dne. Hemipogon setaceus » Me Unia Hilária) ia Fourn : Nautoma niunmularia Dne. e muitas espécies do género Oxypetalum. Todas ellas tem sueco leitoso, pegajoso e de gosto desagradá- vel, pelo que são evitadas"pelo gado. Como especialmente toxica, tem-se Asclepias Curassavica L. (Official da sala. Ipecacuanha falsa, Cega olho. Mata olho e Camará bravo) Planta herbácea, caule liso, folhas ovato-lanceoladas, oppostas, lisas, excedendo as umbellas, flores em umbellas, vermelhas bri- lhantes, bracteadas. E1 considerada muito venenosa para o gado, porém, rarissi- mo é que os animaes a comam, salvo em occasiões de grande sec- ca, quando ainda tenra e escondida entre outras plantas. (189) 06 CONTRIBUIÇÕES PARA A BOTÂNICA PAI LISTA E1 planta fibrosa podendo suas fibras serem perfeitamente utilisadas na industria têxtil. As sementes são providas de feixes de cilios longos, alvos e sedosos, os quaes já vi utilisados no enchi- mento de travesseiros e pequenos colchões. Gomo planta medicinal é ella empregada em vomitórios por- que suas raizes possuem propriedades eméticas. E\ porém, precizo muita cautella na dose que sendo grande torna-se toxica. E' desta propriedade que Ih? vem o nome de Ipecacuanha falsa ou brava. O sueco leitoso que contem é algum tanto cáustico, provocan- do iníiammacões fortes nos olhos. Dahi o nome de ccça-olho ou mata-olJio. Outra espécie industrial é a chamada Patuá do campo, Aravjia sertafera, também denominada Cipó sapo : Planta trepadeira, sublenhosa, folhas lanceoladas, de base truncada, glabras, em cima verdes embaixo glaucas farinhentas. Flores brancas regulares, frueto folliculo ovoideo grande. E' mui- to fibrosa, e as fibras resistentes e sedosas. Deve ser de muito fácil cultura. A família das Labialas, habita de preferencia os cerrados e ca- poeiras sendo pouco numerosas as espécies exclusivamente cam- pestres, até duvidamos que haja alguma espécie que o seja no sen- tido restricto. Assim mesmo contribuem muito para dar no campo uma cor predominante em certas épochas, devido ao grande numero de seus indivíduos. As mais communs, e que encontramos por toda parte são : Eriopc crassiprs Benth. var macropliylla. Glcchon cúiata » « marifolia » var canescens. ffjpiis carpinifolia » « mui ti flora Pohl. « "oerbencefolia Mart. Kethia denudata Benth. Ocimum nudicanle » Salina rígida » t)e nenhuma destas espécies podemos mencionar qualidades industriaes e relativamente poucas também são ns que se conside- ram medicinaes. Conhecemos as seguintes : Jivptts multoflora. Pohl. Planta herbácea, arbustiva, caule tomentoso, folhas curta- mente peeioladas, ovatoredondas, serradas, emeima pubescentes, embaixo albotomentosas, veias salientes. Flores em capítulos paniculados, albos. A infusão de suas folhas é muito preconisada em attaques de gotta. Hyptis vcrbouvfolia. Mart. (190) COMMÍSSAO GEOGRAttíICA E GEOLÓGICA 37 Planta herbácea, caule quasi deitado com a extremidade as- cendente, folhas subsesseis, oblongo-ovatas, dentadas, base arre- dondada, pubescentes-villosas. Florecencia em capitulos pequenos, azulados. E' considerada excitante até aphrodiziaca, emmeniagoga e abortiva. Approveitam-se tanto as folhas como o raiz. Ocimum nudicaule. Benth : Planta herbácea de caule simples, nú ; folhas ovato-redondas approximadas á base do caule, flores em racemo alongado, pedun- culadas, vermelhas róseas. Suas raizes são consideradas como sudorífico etflcaz, diuréticas e antispasmodicas. A importante família das Rubiaceas a que o estado de São Paulo deve em grande parte a sua prosperidade, também se acha representada nos campos, mas como em geral carece de muita sombra e humidade, suas espécies ahi são poucas em relação ao numero das que habitam os cerrados e as mattas. Por isso tam- bém não representam papel algum, e raras são as que se encontram em alguma quantidade. As espécies principaes das que achamos exclusivamente no campo, são : 1 1 espécies do género Borrcria que não podemos classificar por falta do respetivo fascículo da flora de Martius. Reconhece- mos, porem, « Borrcria tendia. [Ch. & Schl. « verticillata G. W. F. Meyer « angustifolia Ch. & Schl : Borrcria capitata. Vi. C. (Poaia do campo) Declieuxia cordigera Mart : var genuína. (Sete sangrias) Palie oure a rigida Mart. Psychotria xantophylla Muell. (Douradinha) Relburnium liirtum Schumann. Rudgea wburnioides Benth : J46fc (Cotó-Cotó) Como industriaes não conhecemos espécie campestre alguma» porém, quasi todas são tidas por medicinaes e a população do in- terior faz delias frequente uso e as vezes até abuso. Não são muito raras as intoxicações produzidas por varias espécies ministradas pelos curandeiros que neste Estado censtituem uma classe numerosa e perigosa. (191) 38 CONTRIBUIÇÕES PARA A BOTÂNICA PAULISTA As mais usadas são : Psychotnà Xantophylla Muell. (Douradinha) Subarbusto de caule simples, anguloso ; folhas oppostas subsesseis, ovatas agudas, base obtusa ou subcordata, coriaceas, intenso amarefiadas, flores bracteadas, albas, de bracteas amarellas. E1 empregada em rheumatimos, inchação dos membros, dores nos ossos e debilidade proveniente de syphilis inveterada \Martius, matéria medica). Attribue-se-lhe também as propriedades da Digi- talina para moderar os movimentos do coração e das artérias. São sempre as folhas em infusão que se empregam. Rudgea viburnioides Benth. (Gotó-Gotó) Em S. Paulo esta planta chama-se Cotò-Cotò, em Minas-Geraes tem o nome de Chade Bugre e em Goyaz se a denomina Congonha de Gentio. E1 um arbusto lenhoso, elegantíssimo, muito apropriado para planta de ornamento, attingindo as vezes uma altura de 3 metros. Tem folhas oppostas, de peciolos curtos, oblongas, ellipticas ou levemente lanceoladas, rigidas, grandes, verde escuras, bri- lhantes emeima, claras, pubescentes em baixo, flores albas, gros- sas, em paniculas terminaes. Goza quasi das mesmas propriedades que a precedente, porém é mais considerada como antisyphilitico infallivel. São as folhas que se uzam. Borreria capitata D. C. (Poaia do campo) Planta herbácea, perenne, de muitos caules erectos ou ascen- dentes ; folhas lanceoladas ou oblongas agudas, as vezes mucrona- das, inflorescencia capitata e axillar, flores pequenas, brancas. E' usada como emético fraco, mas que em alta dose torna-se perigosa, produzindo convulsões e até a morte. Da planta denominada Hcrva de rato, não temos obtido obser- vações exactas, e todas as informações que delia temos são con- traditórias e pouco precizas. Também não pertence ao nosso es- tudo de agora porque não é planta campestre e habita de prefe- rencia capoeiras antigas e mattas, especialmente a beira dos córregos. No herbario temos cinco espécies diversas com o mesmo no- me popular, pertencentes aos seguintes géneros : Psychotria, Pa- licurea e Mapouria. Segundo a flora de Martius deve ser Psychotria Marcgravu Spreng : Ramos cylindricos, folhas oppostas, brevemente pecioladas, oblongo-ovatas, molles e verde escuras. Inflorescencia em panicu- (192) COMMISSÃO GEOGRAPHICA E GEOLÓGICA 39 las corymboso-thyrsoideas. Flores de base amarella e pétalas pur- púreas. é E' vulgar e temol-a visto em muitos lugares, porém só em Mogy-guassú foi ella chamada Herva de rato. Com relação as suas propriedades toxicas, só sabemos que produz o que se chama tympanite no gado, consistindo numa incha- ção do ventre, em geral seguida de asphyxia. As Verbenaceas formam uma família de importância muito re- lativa, especialmente no que diz respeito á suas qualidades forra- geiras ; na industria ou medicina pouco ou nada delias se aprovei- ta. Entre as espécies que colhemos no campo muito poucas se distinguem por algum valor especial, mas contribuem para augmentar o efteito do aspecto superficial do campo na épocha de sua florescência. As espécies que observamos como as mais frequentes no cam- po são ; Lantana Brasiliensis Link « Camará L. « lilacina Delf. Lantana mixta L. Todas ellas com o nome de Camará ou Cambará. Stacliytarplictta dicliotoma V a h 1 . « vernoniac folia Cham. Ambas com o nome de Herva Gervão. Todas as espécies do género Lantana são estimadas pelo gado e tidas como forragem regular. O nome de Camará ou Cambará é genérico para todas as espécies assim como para algumas Compó- sitas cujas folhas tem certa similhança. Como espécie industrial emprega-se a Herva Gervão on Get- bâo, para tingir de preto tecidos de lã e algodão fabricados a mão pela população do interior em alguns lugares. Como medicinal costuma-se empregar Stacliytarphetta verbe- niaefolia Cham : especialmente nas contusões fortes, applicando- se uma espécie de cataplasma feita das folhas. A infusão das folhas é considerada poderoso remédio contra rheumatismo e externa- mente para lavagem de ulcerações. A familia das Myrtaceas é uma das mais frequentes nas re- giões campestres, especialmente pela abundância de indivíduos de cada espécie. Pertencem ao numero das plantas lenhosas e resis- tentes que nenhum valor representa para a industria pastoril, e cuja presença no campo o torna sujo. São também difíceis para destruir e possuem as vezes raizes extraordinárias. Entretanto são sempre indicio de que o terreno é bom porque as espécies trans- plantadas para jardins exigem boa terra para prosperar, (1.93) 40 CONTRIBUIÇÕES PARA A BOTÂNICA PAULISTA Talvez nenhuma das outras familias campestres contribuam de um modo tão saliente para imprimir aos campos onde habitam uma feição tão particular como ella, ao m;:nos em certa cpocha. Todas suas espécies tem flores brancas, cândidas e algumas delias na épocha da floração, cobrem-se litteralmente de flores e suas pé- talas caducas que juncam o solo ao redor, formam um tapete na- tural, lindíssimo, produzindo um effeito que só pode ser devida- mente apreciado por quem já teve occasião de ver os campos ou prados de paizes frios, na epocha do desapparecimento da neve, que ainda aqui e acolá, forma montículos ao redor das moitas de arbustos e outras plantas perennes. Principalmente ao anoitecer a illusão é completa e o viajante julga-se transportado para uma campina de paiz frio no começo da primavera. Entretanto são poucas as espécies que habitam exclusivamen- te o campo, a maior parte habita simultaneamente os campos cer- rados e mattas. Das que possuímos na collecção só as seguintes po- dem ser mencionadas como campestres propriamente ditas : Hcxacldamys humilis Berg. var tomentosa. (Ubá-peba) Psidium incanescens Mãrt. (Araçá felpudo) Psidium radie a ns Berg. (Uvalha do campo) Todas estas espécies tem fruetos comestíveis e raras são as que fazem excepção. De varias espécies servem as folhas para cor- Uime. Na flora de Martius não encontramos mencionada como espé- cie achada no estado de S. Paulo, a interessante Hexachlamys hu- milis Berg : E1 talvez o mencr arbusto fruetifero que é conhecido como planta lenhosa, porque temos visto exemplares que attin- giam apenas uma altura de cinco centímetros, parecendo as folhas sahirem directamente do chão, entretanto tem ellas caule grande, porém sempre subterrâneo. Encontramos muitos exemplares com 20 a 3o flores e mais tarde achamos vários pés com 4 fruetos de três a três e meio centímetros de diâmetro. São muito saborosos e contém um acido agradável e refrescante. Não nos consta o emprego na medicina de alguma myrtacea campestre. A família das Solanaceas se comportam do mesmo modo que as myrtaceas, poucas espécies relativamente e grande abundân- cia em indivíduos, porém, ao contrario das tnyrtaceas, as Sola- naceas são antes um signal de certa degeneração ou estrago do campo, augmentando á medida que este se torna mais e mais imprestável. (194) COMMISSÃO GEOGRAPHICA E GEOLÓGICA 41 São quasi todas nocivas c devem ser rigorosamente elimi- nadas. Não conhecemos uma só espécie que seja exclusivamente cam- pestre, porque todas que temos observado encontramos também em cerrados e cerradÕes. Entretanto mencionamos as seguintes que ao menos sempre são encontradas no campo ainda que não exclusivamente. Sol anu m grandiflutum R. & P. (Fructa de lobo) Solanum atropurpurcum Schrank (Juá vermelho ou espinhoso, ou mirim) Solanum ciliatum Lam. (Arrebenta-cavallos) E' difficil dizer qual destas espécies é a mais vulgar, porque a primeira além de oceupar grandes extensões dos campos de Li- meira e de Rio Claro, c encontrada por toda a parte onde temos estado. A ultima também apparece a cada passo, destacando-se es- pecialmente depois das queimas, quando seus fruetos redondos, esbranquiçados pelo fogo ainda presos ás pontas dos caules carbo- nisados, balouçando ao mais leve vento, parecem milhares de ovos vivos e disseminados sobre a campina. E' reputada toxica, e suas folhas novas produzem a tvmpanite, de que raras vezes escapam os animaes acommettidos. A respeito da Fructa de Lobo ha muitas e diversas opiniões. Emquanto alguns a reputam extremamente nociva e perigosa como p : ex : o Mm. Sr. Dr. Domingos Freire, outros dizem-rTa ser co- mestível e muitos atrirmam que cm certos lugares é muito empre- gada para fabrico de marmcllada. Nada de positivo podemos di- zer a respeito, porém, certo é, que já temos experimentado uma fatia da fructa madura e achamos-lhe um sabor muito igual ao do marmello ; alem disso, a fructa guardada, exhala o mais agradável aroma de maçã. À família das Mdastomaccas representa no campo o papel dos indifferentes, porque não tem propriedades especiaes e apenas con- tribuem para o aspecto geral com as suas flores ornamentaes de cores vivíssimas, distinguindo-se especialmente o género Tibou- china, uma Cambessedesía (C. Ilicifolia D C.) e algumas do géne- ro Microliaa, dasquaes ainda não pudemos fazer a classificação por ter chegado muito tarde a parte da flora de Martius que trata del- ias. Vários auetores descrevem certas espécies como industriaes, em- pregados na tinturaria e outras na medicina, porém, por mais que tenhamos procurado obter informações a este respeito, nada conseguimos. O facto destas e outras plantas não terem nomes in- dígenas ou vulgares, é uma prova de que o povo não as emprega, 42 CONTRIBUIÇÕES PARA A BOTÂNICA PAULISTA As Convolvulaceas formam outra família que também habita por toda a parte, sendo quasi todas ou, mesmo todas as suas espé- cies communs ao campo e ao cerrado. De espécies que parecem ser campestres achamos as seguintes : Jacqitcmontia crioccpliala Meissn Evokntlus saiceus Swartz Ipomoca polymotpha Choisy » prostrata. Meissn. das quaes nenhuma informação podíamos obter com relação á sua nocividade ou utilidade. A única propriedade é que são todas ornamentaes. A familia das Sterculiaceas é muito pouco representada no campo, e pouco também contribue para o caracter geral. En- tretanto tem suas espécies certas propriedades utilisadas pela população. As espécies que encontramos com alguma frequência e que raras vezes faltam são principalmente as seguintes : Wallheira communis, St. Hilaire ( Douradinha ) Biittneria scalpellata Pohl vartypica Schum : He lie ter es ovata^ Lam. ( Sacarolha ) Helic teres sacar o! ha, St. Hilaire ( Rosca para mulas ) Destas espécies parece-nos Biittneria scalpellata Pohl var typica Schum : merecer alguma attenção, porque em toda a parte onde a encontramos é sempre cortada pelo gado, mesmo ao pé de toceiras de capim tenro, deixado intacto, o que parece indicar a sua pro- cura com certa preferencia e portanto talvez tenha algum valor do ponto de vista agricolo. E' um subarbusto annual, herbáceo, rigido, de o,3o-o,6o, m. de altura, de caule erecto ou subrerecto, quadrado na base7tornan- do-se pentagonal mais para cima, verde, com ângulos amarellos e provido de espinhos pequeninos e curvos. As folhas são coriaceas e dispostas em serie de 2/5 com peciolo dobrado e semialado de 4 a 6 centímetros de comprimento, sobre um a um e meio centímetro de largura, e com estipulas filiformes O limbo attinge ás vezes até i3 centímetros de comprimento, sobre um a um e meio de largura, tornando-se menores perto das inflo- rescencias. São glabras, linearo-lanceoladas e agudas com 3-5 nervuras salientes e anastomoseadas. Pedúnculos axillares e pubescentes. O tubo da calyce tem um millimetro de compri- mento e os lacinios são lanceolados e acuminados, de cor branca. As pétalas attingem até 5 mm. de comprimento, côr de purpura. O cuculo quasi de um millimetro é provido de duas azas e um (196) bOMMISSÃO GEOGRAIHICA E GEOLÓGICA 43 prolongamento filiforme ; os tubos estaminiferos quasi adnatos ; o pistillo é subgloboso, tuberculoso e com estigma cincolobado. A fructa é capsula secca, achatada com cinco sementes e revestida de espinhos. Tem 8 mm. de altura sobre um centímetro de diâmetro maior. E"1 uma planta muito esparsa no campo e em parte alguma achámos quantidade delia, parecendo-nos sempre muito procurada pelos animaes, porque só por um acaso, num vallo inaccessivel ao gado pudemos obter um exemplar perfeito para a collecçao. As sementes não estavam maduras, na occasião de modo que ainda não nos foi possível cultival-a para obter quantidade sufficiente á analyse de suas propriedades. Tão pouco havia quem nos desse informação, apezar de varias pessoas já saberem que a criação gosta delia. Uma circumstancia que nos parece digna de nota é que o exemplar que temos no herbario, ainda hoje, depois de 3 annos de secco se conserva como se fosse fresco e colhido ha poucos momentos. As duas espécies de Helicteres que chamam-se ora, Sacarolha ora Rosca para mulas fornecem fibras e são plantas ornamentaes. Na medicina domestica só empregam-se estas duas ultimas espécies como emollientes e peitoraes. Da família Anacavdiaccs. » Camarca pídchella Gr : Ochnaceac. Ouratca spectabilis (Mart.) Engb. Oxalidaceac. Oxalis hitsutissima. Mart. E. Zuce. (Azedinha do campo) Polygalaceae . Polygala comaia. Mart. (Poaya do campo) « Acanthochladus Brazihensis. Klotseh. (Laranjinha) Rluwinaceae. Frangida polymorpha. Reiss. Scrophulariaccac. Scoparia dulcis L. (Tapixaba) Styracaceac. Styrax venosumD. C. Thvmclcaceac.Daphnopsis Brazjliensis Mart. (Embira branca) Umbclliferae Eryngium clegans. Cham. (Lingua de tucano) Vochysiaceae. Amplálochia (Qualea) cordata. Mart. (Páo terra) Longe de ser esta lista completa, não podemos dar mais espé- cies para não incorrer no erro já apontado de considerar campes- tres, vegetaesque não o são no sentido restricto que propuzemos. Muitas delias são medicinaes, ou empregadas como tal, as principaes são : Para tudo Estimulante e tónico, emprega-se a raiz. /alapa rosca, /. vermelha c /alapa branca. São todas reputadas purgativas e depurativas devido a um sue- co leitoso contendo um alcalóide e uma resina. Emprega-se sempre a raiz que é grossa e tuberculosa. (200) COMMISSÃO GEOGRAPIIICA E GEOLÓGICA 47 Bolsa de pastor Antivenereo, tanto a raiz como as folhas. Algodoeiro do campo E1 empregada com muita vantagem em infusão, nos casos de irritação intestinal das crianças, assim como para resolução de abscessos. A raiz é grossa e tuberculosa, podendo facilmente con- fundir-se com o rhuibarbo do commercio. Cipo capa-hovicm, cipó caboclo As folhas, em banho, são muito empregadas para resolução de abscessos e em casos de orchite. Congonha do campo E' muito empregada em dysenterias rebeldes e para tingir de preto. Contém grande quantidade de tannino e autores ha que a c»mparamcom a Rhizoplwra ManglcL.. em riqueza de tannino. Poaya Constitue um emético muito fraco e quasi sem eííeito. Empre- ga-se a raiz em infusão. Taptxaba ou Tapichiba E' emolliente e calmante. Empregado em casos de inflamma- ção interna. Embiva branca E1 considerada uma das plantas mais venenosas que ha no campo. Do liber muito desenvolvido fornece também material fi- broso porá cordas etc. Língua de tucano Tida por diurética e empregada na retenção das urinas. Essa qualidade é negada por muitos. II l De ser o campo habitrdo por tantas plantas, pertencentes á famílias tão diversas como as que acabamos de enumerar, e do facto reconhecido destes vegetaes todos desenvolverem-se com vi- gor á despeito das queimas e da chuva relativamente escassa em certas épochas do anno, deprehende-se a larga provisão de subs- tancias que a terra possue próprias para a vida vegetal, e estranho é o ouvir-se dizer, a cada passo, que o campo é inteiramente im- prestável. (201) • 48 CONTRIBUIÇÕES TARA A B.OTANICA PAULISTA Ainda mais quando em muitos lugares, no meio do campo, onde as vezes se acha uma habitação, as hortas e os pomares con- tradizem de um modo terminante essa opinião. As hortaliças c as arvores fruetiferas estão ahi sempre viçosas, e por mais de uma vez vimos até cafeeiros, tão frondosos e carregados como nos melhores cafezaes se não encontra. E1 verdade que nestas plantações se ha empregado certa som- ma de trabalho, porém, este consistio apenas na limpeza superfi- cial da terra, sem revnlvel-a, no abrir covas para as plantas e em deitar nellas um pouco de estrume animal, não fermentado, nem preparado. Feito isto, nenhum trabalho mais ha, a não ser um rá- pido e imperfeito capinar, de vez em quando. Idêntico resultado, obtem-se com o mesmo trabalho cm qual- quer parte do campo, segundo muitas informações. Exceptuamos todavia os campos puramente arenosos. Devemos entretanto mencionar que estas habitações são sem- pre collocadas perto de algum córrego ou riacho, para evitar a ne- cessidade de abrir poços, de modo que não podemos obter infor- mações exactas sobre as condições de agua no campo, e falta-nos este elemento importante para uma apreciação mais preciza. Não sabemos, pois, com certeza qual a profundidade media em que a agua pode ser encontrada. Em todo o caso existe agua no campo ; porque segundo nos informaram os collegas da secção geológica, a estruetura da quasi totalidade dos campos do Estado de S. Paulo por elles examina- dos, deixa prognosticar com certeza a existência de um lençol de agua subterrânea, em maior ou menor profundidade. Mas, ainda que muito grande esta profundidade e se tenha de recorrer ao emprego de poços artesianos que tão excellentes resul- tados deram em muitos paizes onde a agua só pode ser encontrada a 100 e 120 metros abaixo da superfície, assim mesmo é serviç > remunerador, porque a maior despeza consiste na acquisição do apparelho depois largamente coberta pelos benefícios que traz. Não se podendo fazer a despeza necessária com os poços ar- tesianos, tem toda a propriedade o emprego das bombas rotativas movidas por animaes. O sr. Amédeé Boitel no seu excellentc livro sobre Herbages et prairíes naturelles 1887, falia largamente destas bombas dizen- do que nos campos da Algéria são ellas o único meio de irrigação ao mesmo tempo as mais simples e as mais económicas porque os próprios camponezes as fabricam e concertam, e apezar de gros- seiras, «cette machine grossiêr donne un effet utile que n\itteignent dzs nos machines hydrauliquesles plus perfectionnées.» Nos campos de Casa Branca e Batataes estes poços são per- feitamente praticáveis, porque alli a agua está perto da superfície. Na estação de Batataes, em quasi novecentos metros de altitude, e no meio do campo, a agua acha-se em geral á 45^-60 palmos da (202) COMMISSÃO GEOGRAPIIICA E GEOLÓGICA 491 flor da lerra, e no mesmo campo na altitude de io5o metros, no lugar denominado Alto Alegre ha sempre agua o ôo — 8o palmos abaixo da superfície. Em Casa Branea a agua acha-se á mesma distancia, e no meio do campo ha até varias pequenas lagoas, ou tanques naturaes que attestam a existência de uma camada impermeável subterrânea. Por mais de uma vez ouvimos dizer que o Estado de São Paulo não preciza destes pequenos recursos, porque possue ainda- muita terra para café, e que não ha cultura alguma que possa conv parar-se em lucros com a do cafeeiro. E' isso uma verdade incontestável, mas ao mesmo tempo não se deve esquecer que neste Estado existe maior área ainda de ter- renos não próprios para esta cultura, e que desta forma continua- riam inaproveitados e sem rendimento algum. Emquanto S. Paulo não tiver mais que milhão e meio de ha- bitantes, relativamente pouca differença faz, mas com augmento da população crescem as necessidades, e como nem todos podem habitar os centros de consumo nem serem colonos, não possuindo fortuna sufficientc para comprar terrenos próprios para café e es- perar de três a cinco annos para a primeira colheita, torna-se in- dispensável o approveitamento de terrenos, que além de outras vantagens, são mais fáceis para trabalhar e onde os insttumentos agrícolas hão-de substituir o braço e por conseguinte eliminar, oui reduzir ao minimo, a despeza inevitável com os salários altos. E' também provável, que si ninguém quizesse plantar cereaes- ou mantimentos, o café talvez não forse sufficiente para por si só* supprir todas as necessidades do Estado de São Paulo. Por isso parecem-nos taes objecções puramente sophisticas, con- tribuindo para desprestigiar o trabalho e desanimar o pequeno- lavrador. Dá-se aqui exactamente o que por occasião da íntroducção da; batata na Irlanda ; os camponezes oppunham-se tenazmente, alie- gando que : nem seus pães, nèm seus avós tiveram necessidade del- ta, c por isso elles também podiam perfeitamente passar sem aqucl- la novidade. Hoje, a batata, é na Irlanda o que o feijão é no Brazil. Estando os campos quasi sempre próximos da lavoura de ca- fé, nada obsta que sejam aproveitados como complementar por meio da lavoura mixta e é fácil prever que com a continuação do systema agrícola actual, sem adubos, pouco a pouco a lavoura afasta-se dos centros commerciaes, augmentando desproporciona- damente as despezas de condução, já objecto de queixa e desanimo entre os lavradores. Ao passo que introduzindo a lavoura mixta, aproveita-se ainda por muito tempo os cafezaes velhos, diminuem- se, e ate eliminam-se as causas de falhas do café que são uma con- (203) -50 CONTRIBUIÇÕES PARA A BOTÂNICA PAULISTA sequencia natural e fatal da falta de restituição de materiaes gastos pelo vegetal, matérias essas que precizam de annos para se forma- rem da terra por intermédio dos agentes atmosphericos. Este pe- ríodo corre todo improductivo, sendo mais ou menos longo segun- do a natureza dos lugares. A falta principal é, pois, de adubos naturaes que com a la- voura mixta e systematica seriam produzidos em abundância, e além dos lucros pelo augmento na producção do café, haveria ou- tros, talvez não menores. Falta ao Estado de S. Paulo o queijo, falta-lhe a manteiga e também a carne. A carne que aqui se con- some é má, e além de tudo, enormemente cara e não accessivel a todas as classes da sociedade, mesmo porque ha pouca. A lavoura mixta dar-nos-ia tudo isso, de combinação com a pequena lavoura, a qual só poderá occupar os terrenos desprezados pela cultura do café. Neste caso se acham muitos dos nossos campos. Dentre os que vimos nas zonas de Iapetininga, Tatuhy, Jabo- rtÍcal, Casa Branca e Batataes, e de cuja flora acabamos de fazer li- .geiro esboço, não podemos fazer escolha, por parecerem-nos todos i igualmente bons e destinados para a lavoura mixta, isto é, lavoura de cereaes e criação conjunctamente. Sabido é que toda e qualquer 'lavoura intensiva, depende da quantidade de adubos de que dispõe. Estabeleceu-se até o seguinte axioma agrícola de que: não ha la- ^voura sem adubos, não ha adubos sem g~ado, nem gado sem pastos. O terreno campestre também otíerece a vantagem de ser bara- : to e de ordinário fácil para trabalhar. Uma vez desbravados os i campos, prestam-se estes para o serviço do arado, e os trabalhos tornam-se cada vez mais leves. Demais, a sua acquisição é fácil e o , pequeno lavrador ou colono europeu encontraria ahi quasi as mes- mas condições que no seu paiz de origem. A única diíficuldade tal- wez provenha da necessidade da irrigação em certa quadra do an- i no ; mas ainda assim, não vemos razão bastante que justifique um . completo abandono. Bis, em largos traços, o que observamos nas excursões, e o que nos cumpria fazer, faltando, aliás, para um estudo agronómico como seria de mister, as analyses das amostras de terra que colhe- mos, as medias das temperaturas e das precipitações aquosas, os cálculos de trabalhos a executar, sua despeza e seu provável ren- dimento, assim como comparações das ditYerentes culturas. '204) COM MISSÃO GEOGKAPIIICA E GEOLÓGICA 51 Mas trabalhos desta ordem devem ser emprehendidos por es- pecialista, porque cahem fora das attribuiçÕes do botânico pro- priamente dito, e como o Estado de S. Paulo já possue uma esta- ção agronómica, a cargo de profissional de reconhecida competên- cia como o dr. F. Dafert, julgamos acertado cingirmo-nos á estas ligeiras observações, reunindo apenas notas e material para auxi- lio dos especialistas, e volvendo a nossa attenção com especialidade para a parte scientifica da botânica, como é a botânica systematica *e a physiologica. (205) New York Botanical Garden Library QK 265 .L59 gen Lofgren, Alberto/Contribuicoes para a bo 3 5185 00047 4930 •te-