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MENDES DOS REMÉDIOS

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LITERAIURA PORTUGUf

DESDE AS ORIGUNS ATÉ A ATUALIDADE

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EMPfiESA INTERNACIONAL EDITORA Lrtòoa - Potio - CoimWn . Ilii dr. Jav,:iro

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TIPOGRAFIA LUSITÂNIA Kaa dl Mearift, 73- PORTO

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HISTÓRIA

LITERATURA PORTUGUESA

miRODUÇRO

Sumário: 1. Hi&tória da literatura; sea âmbito: sitaaeSo geográfica, raça, tra- dição e meio. ^2. Sentido em qne aqui se emprega. 3. Antologia por- tognèsa. 4. Divisíiío da história da literatura portnguésa. 5. Critério deáta divieSo. 6. Esquema geral.

1.— História da literatura; seu âmbito. Kstudar a história da

litenitnra dum pai» é estudar os documentos em prosa ou em verso apreciáveis pelo seu valor intrínseco ou pela hxxtx, forma ; é conhe- cer a vida dos homens que os escreveram, especialmente na parte tjue ela ajuda a entendO-los c interpretá-los*» Neste sentido não é, no fundo, senão uma íace e uma parte da história geral, mas é talvez; aquela que melhor e mais completamente traduz o génio e os costu- mes duma nação, o espírito, o caracter e as tendências duma socie- dade ^. As literaturas, como as línguas, que lhes servem de instru- mento. Bam venladeiros organismos sujeitos a fases de origem, des- envolvimento e decadência. Como manifestação da vida dum povo acompanham este na ^ua actividade histórica. A íormaçílo embrioná- ria dum paít?, a sua situação geográHca, o clima, a raça ou raças que entraram na sua constituição, bem como as suas lutas e conc^ístas, o progresso ou retrocesso na marcha geral da sua existência, as glórias <|ae o corGani, as amarguras que o contristam, numa palavra o palpitar de toda a sua vida, vam reflectir-se na obra dos seus filhos maÍ8 ilustres. Assim, estudando a situação geográfica do nosso pais, a Bua extensa co<fta marítima povoada de portos e em admirável j)0«i<;ão para ser ura entreposto universal, as suas múltiplas varieda- des de relevo e de terrenos, a sua rica fauna e flora, tudo isto dis- pondo-nos e en^'aminhando-nos para a vida marítima e colonial, tornando-nos ao mesmo tempo aptos, pela variedade de recursos, para o desenvolvimento duma bela civilização *; atendendo por outro

1

2

Petit df; Jalleville, Ilisi, de la Ht. franç., eh. i. Poinsard, Le Portugal Inconnu, Paris, 1910, pá^. 9.

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*

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HISTÓRIA DA LITaSATURA POSTUGUtSA

lado ao fundo étnico, que é um misto do ccmzamento complicadis- flimo do selvagens da época quaternária cora iberos, lígures, fenícios, celtas, cartagineses, romanos, suevos, godos e árabes predominando, ao que parece, os velhos troncos iberos modificados pelos elementos arianos'; tomando ainda em linha de conta a tradição e o meiOf que nos fornecem uma grande quantidade de idéas e inspiram muitos dos nossos costumes impondo-se-nos ás vezes despoticamente, embora quási sem nós darmos por isso *, melhor compreenderemos as gran- des fases literárias do nosso pais e as suas figuras mais representati- vas, pois que assim temos estudado os grandes factores donde derivam as carateristicas do nosso povo: o factor geográfico o meio, o factor etnográfico a raça, o factor psicológico a educação.

2. Sentido em que aqui se emprega. Considerada sob

este ponto de vista a literatura é rigorosamente o que lhe chamou De Bonald a expressão da sociedade, lias nao ó sob este aspecto amplo e lato que aqui a estudamos; se o fosse equivaleria a tei*mos de mencionar todas as manifestações do espírito, todos os conhecimen- tos humanos expressos pela palavra escrita.

O termo literatura toma-se aqui num sentido mais restrito, como sinónimo de Humanidades ou Bdas-Letras, compreendendo sobretudo o estudo da l^oesia, da Eloqmncia e da História, Uma história da literatura portuguesa deve, pois, registar, embora de forma sucinta, todas aquehis individualidades que se tornaram notáveis pelos seus escritos, em proBa ou verso, sobre qualquer daquelas espécies ou nas suas congéneres a critica^ st, filologia, a arqueologia, o romance, etc, etc. Nào compete a um traball)0 desta ordem mencionar tudo quanto em língua portuguesa foi escrito desde as orí<;ens ató nossos dias. Essa funçrio pertence antes ás Hisfúrias literárias e aos Di- cionários hihlio(jrf'ificos, como sucede para o francês com a Histoire littrraire de Ia France inici ida na primeira metade do scc. XVlll pe- los Boneditiiios, para o italiano com a Sforia delia Lit. Italiana de Tiraboschi, como o fez Teiiítul para a Literatura T^atina, eorno o sam para nós a Bihliofika Lusitana de 13arbosa .Macjiado ou o Dicionário Bihliográjlco de Inocêncio da Silva, etc. lu^potimoa estudámos a Literatura como sinónima de Belas-Letras abrangendo o que provoca evocações iniapiiati^as, excitações sentimentais, oinoçocs estéticas, no dizer de Lanson. Lto é o essencial. Podem advir-lhe aeidentalmente

» Rylvío Romero e J. Ribeiro, Cowprndio de história rfa Lit, Drasi^ icirn^ Kio de Janeiro, lí)Oí), pág. xxxvi. * L. Poinsard, 06. ctt,, 16.

XKTBODDÇAO

pela linguagem ou pelo estilo outros elementos, ma« aqailo lhe é próprio e peculiar. O que é preciso conhecer, antes de mais, sam os qae deixaram nome imorredouro na cultura literária de Portugal e que como tais sam considerados seus filhos mais gloriosos, porque por eles se criou eterno e grande o nome da Pátria querida. A his- tória da literatura portuguesa apresentar-nos-há os nomes desses be- neméritos, 08 factos principais da sua vida e as suas obras mais im- portantes e mais dignas de serem conhecidas e imitadas. £' um campo vastissirno e dos mais curiosos e instrutivos.

O estudo da Literatura é, pois, profundamente scientifíco. Re- montando a Sainte-Beuve, que agrupou as suas críticas em volta dum ^ande nome, por ex., de Chateaubriand e do meio em que êle vi- vea, a Taine que nos seus estudos literários dos Países-Baixos e da Inglaterra e noutros partia da idóa do meioj da raça, e do momento ^ completa-se com Brunetière que mostra o valor dum novo elomento a evolução j que nos permite avaliar o encadeamento dos factos literário». Por outro lado surgiu tambv^ra o conceito estético com a criação desta sciência por Baumgarten (1762) e a sua divulgação por Guyau, ITennequin, etc, até á sua aplicação ao campo literário por Bouterwpck, Bellerman, Sismondi e outros. De modo que se chegou a um conceito inteiramente novo da História literária que, alargan- do-lhe o âmbito, tornou a missão do historiador muito mais dificultosa pela complexidade de investigações a que terá de proceder fazendo que ele seja, por vezes, simultaneamente, nâo simples historiador, mas filólogo, arqueólogo, crítico, esteta, etc.

3. AntOlOQÍd portuguâsa. jVIas nào podemos nem deve- mos liraitar-nos ao estudo hio-blio gráfico dos escritores portugueses. Ao lado desse conhecimento, que é indispensável, a lição colhida da própria leitura das obras que imortalizaram seus autores ó, antes de tudo, necessária e útil. Por isso damos no nosso trabalho larira parte aos documentos, que constituem uma verdadeira Antologia de prosa e poesia desde as origens até á atualidade, e que sam tanto mais im- portantes quanto a raridade de muitos dos livros portiigiiese^, bem como a sua reprodução cuidadosa e esmerada, torna ainda mai> difi- cultosa a liçKo e aproveitamento que deles pode e deve de tirar-.^e. Não esqueçamos, porem, que este livro representa un) moro subsídio. Como compêndio ou manual nao passa do síntese de idtas cohijdcris- simas. O seu estudo tem de ser acompanhado de esforços próp;io.s, base de todo o saber.

^ 4. Divisão da História da literatura portuguesa. A

história da nossa literatura pode considerar-se dividida em tre» gra ades épocaa^ marcando três grandes correntes de ideias doniiuantej :

8 BIBTÓBUL DA LITBEA.TUBA PORTUOUâSA

I Medieval abrangendo os séculos xii a xv ; II Clássica compreendendo os sécalos xvi a xix ; 111 Romântica, que principia em 18:^5.

Nestas três épocas fica abrangida a vida literária do nosso pais :

a) primeiro, uma fase de infância ou de iniciação, período das origens em que a língua sai pouco a po^po^ através de formas múltiplas^ do latim popular, do qual, como em outro logar vimos, ela com as suas congéneres novi-Iatinas deriva ^ A literatura ensaia tam- bém os seus primeiros voos ; os documentos literários que possuimos deste período, a princípio irregulares e até mesmo, por vezes, inin- teligíveis, gradual o sucessivamente se acentuam e caraterizam. Até 1245, reinado de D. Sancho ii, o que pode chamar- se o período proto-hiytórico da literatura, em que se faz uso duma língua ainda na sua infância; cora D. Afonso iil abrese uma éra de progresso, a língua começa a íixar-se, os pensamentos que ela é chamada a traduzir sam ingénuos, graciosos, cheios de vivacidade, embora a prosa seja ainda hesitante e a versificação muitas vezes dura e pouco regular. Nesta época, que denominamos Medieval, predomi- nam por um lado os Trovadores, em grande parte influenciados pela corrente que provinha da Provença, por outro os Cronistas, domi- nados pela grande ligura de Fernão Lopes.

bj Inicia-se em seguida o Classicismo, época a principio do «5- jylendor e virilidade o em que as obras clássicas dos gregos e latinos, impostas pelo lícnaHci mento, sam o modelo e o guia de todos os espíritos cultos. Cria-se a Epopeia nacional; funda-so o Teatro. A lítigua entra abertamente numa fase histórica, definida e regular; toma formas amplas e opulentas nas obras dos que chamamos os clássicos dòs séculos xvi e xvii, auxiliados ou secundados na fixação dessas f(>rmas pelos gramáticos, como Fernão de Oliveira e JoSo de Barros.

Uma tríplice corrente italiana no século xvi, espanJwla no XVII e francesa no xviir, atravessa sucessivamente esta época, á qual com propriedade compete a designaçiio de clássica por durante ela se fazer sempre sentir o predomínio das literaturas grega e latina. Mas a energia e vigor de estilo que assinalam as obras de muitos dos escritores desta primeira fase, que bem pode chamar-se áurea, a louçania e pintoresco que traduzem na sua linguagem, vêem a decair na afectação e agudeza dos conceitos e no artifício dos sentimentos postos em jogo pelos escritores cultistas ou gongoristas do século XVII. Pelos meados do srculo xvill opera-se uma reacção: é o período do Arcadismo. E' a França que nos os cânones por onde

í Cfr. a noBsa Introdução á Historia da Literatura Porttiguêêa^ 3.* ed., Coimbra, 1911, 1 vol.

IHTRODUÇ^O

se guiam os autores portugueses, entre os quais alguns, como Bocage, Filinto 6 Tolentino sam verdadeiros precursores da época imediata.

c) Por último temos a terceira época a Romântica, em que se estabelece a fusão dos antigos elementos medievais com os populares e tradicionais. Iniciada sob a poderosa acção de Garrett e Herculano a breve trecho os exageros dos sequazes, os ultra-roman- ticos, provoca a reacção dos Dissidentes e com ela a dissolução das escolas literárias.

Temos, pois

J Época Medieval abrangendo os séculos xii a XV e compreen- dendo as Eliscolas: 1.*) dos Trovadores ou Provençal 1200-1385. Ini- ciada pelo tempo de D. Sancho i, isto é, pelos primeiros anos do sé- culo xiii termina com o começo das empresas marítimas, a entrada numa nova fase histórica. 2.*) Epoea dos Poetas Palacianos e Cro- nistas I38Õ-1521, isto é, desde a subida ao trono de D. João i até á morte de D. Manoel.

II Época Clássica desde o século xvi até o xviii e compreen- dendo: 3.*) Escola Quiiihentista ou Italiana 1521-1580, a edade áurea da nossa vida literária, assinalada pelos dois grandes génios Camões e Gil Vicente; 4/) Escola Seiscentista ou Gongórica 1580- 1700, que marca a supremacia do gosto espanhol, esterilizando mui- tos dos nossos bons engenhos; 5.") Escola Arcadica 17©0-1825, o período das Academias e Arcádias, em que muito se trabalhou pela restauração da língua e do bom ^osto literário.

III Época Romântica iniciada com a publicação do Camões & da D. Branca de Almeida Garrett.

E' claro que estas divisòes ou outras congéneres não téem uma rigidez matemática nos seus limites definidos com precisão.

Seguidas mais ou menos desde o sábio helenista francês Boison- nade, que em 1806 escrevia «para que a história literária seja con- venientemente tratada é preciso dividi-la em certas idades, cada uma das quais tenha sua feição particular», salvam-sc nas suas linhas gerais.

5. GritérfO desta divisão. A divisão que acabamos de fazer não é isenta de defeitos, parecendo antes e nem sempre com rigor mais adequada a uma divisão de história da poesia portu- guesa do que a uma divisão da história geral da literatura. Por outro lado como que amesquinha a originalidade da nossa literatura pondo em relevo as correntes estranjeiras a que ela se subordinou ou pelas quais se deixou guiar.

Mas além de que nenhuma classificação, era princípio, é isenta de defeitos, deve ponderar-se que ela oferece vantagens didáticas ffj disting:nindo e acentuando com nitidez as fases predominantes da evolução literária, bj delimitando épocas, cuja distinção é efectiva e:

10 HISTÓRIA DX LITBRÀTUIU POBTCGUÊSA

real, c) e prestando-se, por isso, a uma melhor fíxaçSto da parte de quem a estuda. Por outro lado, quando falamos em correntes estran- jeiras nao queremos dizer que elas se{am o elemento principal e fiin- damental da nossa literatura. Em todos os países houve sempre na Bua vida de espirito uma ou outra corrente de imitação. E* um fa- ctor secundário, contia «agente, prestes a desaparecer deante doutro mais intenso. O que fica sempre, o que é primordial e basilar é o que deriva da própria natureza, do próprio organismo social. Quando Bou- terweck em 1804,* Sismondi em 1829* e Wolff em 1843^ se referi- ram á falta de originalidade da Literatura Portuguesa ou á sua de- pendêncií^ de literaturas estranj eiras nào existiam ainda publicados os Cancioneiros, por ex., e facilmente se atribuíam a espanhóis obras nossa?, como os romances de Amadis e do Palmeirim.

Descontemop, portanto, a parte inegável de imitação dos gran- des modelos estranjeiros e ainda nos ficará muito e em todos os gé- neros com que afirmar uma honrosa independência literária. Esta- belecido assim o cri tório da divisíio n2lo inconveniente era aceitá-la. Obedecendo ainda ao critério pedagógico seguimos quanto possível a exposição cronológica mantendo dentro dela a seriação dos géneros característicos, de forma a ressaltar de tudo um quadro geral e a síntese harmónica e perfeitamente bem estabelecida da nossa evoluçSo literária.

6, Esquema geral- No quadro seguinte contêem-se e har- monizam-se entre si as claksificaçoes mais adoptadas pelos autores.

' Gesfíhichie der portuq. Poesie und Bercds amJ:eit, Gottingen, 1805 (Vol. 4.° da Gesf*h. der Porfie und Beredsnmkeit).

* De Ia litt. du Midi de VEurope, Paria, 4 vols.

•^ Ziir Gesch. der Fort. Lit. na MiUelaJter in HaViache AUg, Liít. Ztiluiuf, Mai 18 lo^ nos. 87-í)l) trad. fr. de Du iMéril Jourvnl des Savants de Normaridie, Caeir, 3844) reimpr. nos Sludien zur Gcsc/i. des sp. und port, NcUional LitL , Berlin, 1859.

X»TSODUÇA«

11

QUADRO DA HISTÓRIA DA LITERATURA PORTUGUESA

Época Madieval.

I D. Afonso Henriques (1128-1185) I D. Sancho E X l D. Afonso II

€9CoU dos Cro-J D. íjancho It vadoree ou pro- l D'. Afonso III vençal (1200-1 385) ]£)r Denís

U. Afonso IV

. Pedro I D. Fernando I (13Ô7-1383)

II

>. João I (1885-1433)

eecoU dos poeUs\ ^' ^^^*^*® palacianos e dos < D. Afonao V Cronistas / D. João U (1385-1521) [ j) ^^^anoei (1495-3521)

í aa.^i?íí-«K«, i ^' J*^^^ "^ (1521-1557) I Bscola quinnen* 1 ,^ c u *• - tísta ou italUna< ^' Sebastião

(1521-1580) / D. Henrique (1578-1580)

IT

Filipe I (1580-1598) II UI

»

II

Época Clássica.. /8scola 9ei8centí8-(£^ João IV

xvi-xvui) . Wa ou gongórica J * .^

*^ ' I nriRn-lTOO^ /D. Afonso VI

D. Pedro n (1683-1706)

Cxvi

68C0U francesa ou arcádica

(1700-1825)

D. João V (1706-1750)

D. José I

D. Maria I

D. João VI (1816-1826)

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t^^^a Romântica \ ^^ 1 D. Pedro V

Época «omaniica^^^j^^^^^^^^

(^»^) / (Desde 1825) ^' ^"'^ ^

D. Pedro IV (1826-1834; D. Maria II

D. Carlos I

D. Manoel II (1008-1910)

I

ÉPOCA MEDIEVAL

(xil-xv)

Quadro sinótico do movimento poUlico, social

e literário correspondente á 6ecota dos Crovadores ou provençal

I

Monarcas portugueses

D. Afonso Henriquea 1128-1185

D. Saiicho I Il85-12r2

D. Afonso II 1212-1223

I>. Sancho II 1223-1248

I>, Afonso llí 12481279

D. Denis ' 1279-1325

D. Afonso IV 1325-1357

D. Pedro 1 1357-13G7

D. remando 1367-1;)83

II

Sincronismo político e social

lOOõ Kesolve-se a 1.* expedição das Cruzadas nj Concílio de Clerraont, a instâncias de Pedro o Eremita.

1099 Tomada de Jerusalém pelos cristãos sob o comando de Godofredo de Bu- lhões.

1187 Tomada de Jerasalém aos cristãos por Saladino.

1205 Franceses e venezianos tomam Constantinopla e fundam o chamado Im- pério latino do Oriente , que acaba em 1261.

1903 Descoberta da bússola por Flávio Gioio, de Amalfi.

1132 Abolição da Ordem dos Templários.

1321 Invenção da p<!)lvora.

1328 PrímeiraB invasões dos turcos na Euiopa.

1336 Nascimento do Tamerlan.

1362 Oi turcos criam a milicia dos janízaros.

III

Sincronismo literário

ESPANHA

Efltabelece-se o ciclo dos Poemas do Cid, oriando-se em volta de Rodrigo Díss Bivar (1040-1099), o Od invulnerável, o afamado Campeador^ persona^íein lení-Jendária, toda a efervescência liíer.lria, que a FraD7a teve para Carlos Aia* ffio. Merecem citar-se :

16 IIIBTÓllIA DA UTEBJLTtrità PORTUGUESA

D. Afonso o Sábio (1221-1284:) aator das Cantigas de Sania Maria , pti« biicadas, depois de seis sécalos, pela R. Acad. Espanoia i>ob a diiecçâo do Mar- quês de Valmar (Madrid, 1889, 2 vols. ) dois códices no Escarial. Do prin- cipal deles é qae se fez a ed. da Academia qae reproduz as miniaturas cromo- litográâcamente. Sam 428 composições escritas em honra da Virgem e consti- tuem uma fonte riquíssima para o estudo da poesia trovadoresca', sendo sob este aspecto como para o estudo da língua um subsidio importante a pôr ao lado dos cancioneiros portugucsen, como eles escrito em galego e reflectindo as tendên- cias da época. Das obras históricas mencionaremos a Estaria d'Espanna oo Crónica generai QompoBtsi de 1260 a 12G8 por ordem e traça dele. Outra é a Grande et general Estaria, quo ficou por acabar. A obra de maior importâneia do Aforso X é Las sitte partidas em qae trabalharam vários autores, documento preciosiasimo histórico, social, linguistico, literário, e sobretudo legal. Donoso Cortês disse que as três obras mestras da idade-média sam a Catedral de Colo- nia, a Divina Comedia e as Partidas.

Pbdko Lópbz PB Atvla ( 1332-1407) autor -do celebrado poema Rimada de Palácio e

JuiN Ruiz (■{- 1351), m?í\% Qov\\\e(í\áo ^\o nome ÚQ Arcipreste de Hita, cujas obras (Do «Libro de buen An\or» trad. portug. dos fins do séc. xtt (Holalinde Rev, de Filologia Esp. i, líil4) misturam orações á Virgem com sátiras á corte pontificia, dissertações dogmáticas, batalhas alegóricas e graciosas fábulas, que se podem lêr no tomo lvii da Biblioteca de Rivadeneyra.

Nào esqoeçámoí memorar a tragi-comédia de Calisto e Melihea, maiscc^ nhecida pelo nome de Celestina, em 21 actos, quo teve grande influência na eclo- são do drama espanhol e em outros ramos literários.

FRANÇA

A França tem aestc período a primasia literária, criando a poesia prO'-^ veyiçalj que iriadion para toda a Kuropa. Estabclece-se a luta entre a língua de oi'l e a língua de oc ( segundo a maneira por que se exprimia a afirmação oU no norte, oc no sul ), eom predomínio final daquela. Os poem(is sam históricos ou cavalheirescos e a arte dramática inicía-se com os mistérios^ o mais notável dos quais é de Joio Miciibl. Temos ainda Villehardouin Chr o?ii que. {I20b^ 1203) ; Gautier de Coincy MiracUs de Notre Dame ( 1230 ), GuiHaurac de Lorris 1.* p. do lioman de la Rose ( 1237).

ITÁLIA

Os ensaios e tentativas da língua italiana que nos aparecem em documen- tos interessantes como em I fiorettidi Saneio Franciescho; o Tesoretfo de B. Latíni (1220-1295), que foi embaixador de Florença na corte de Afonso x; as poesias de Guido Cavalcanti (por 12iV.»-130i.)), de Cino de Pistoia Íl270-l.'í37) sam eclipsados pela obra prodigiosa do Oantk Aliguieri (12<>r>132l) de Flo- rença, n. 3 anos depois do nosso D. D»nis. Suas obras principais: De monarquia (1311) acompanhada da Vila nuora. do Cancionero e do Convito. Mas o seu tra- balho capital é a Diviva Comedia formada de trôs partes: Inferno (3t eimtos\ Purgatório (33 c. ) e Paraíso (33 c.) 1(X) cantos, em tercetos endee«iâ)labo8, cuja inspiração inicial, pelo menos, se deve á sua paixão por Beatriz, [b^m português: A. J. Viale Inferno c. i-ii in— Mem. da Acad., i, p. 2.*; c. iii in Insí. IX, p. 297-30Í); c. v in Aimaes das Sc. e Letras, cl. 2.", t. 1.**, p. 185 c seg., traduções depois reunidas n^ Misc. helénico -literária (18<i8) e, definiti- vamente, nas Tentativas dantescas (X^S^:)-^ Domingues Ennes, O Inferno,., ilustrado ^om as celebres grav. de G. Doré.. , acompanhado do texto italiano^ Lisboa, 1887, um vol. ; J. Pinto de Campos, Lisboa, 1886 A Divina Co*

llíTB0T>Uç2o 17

nédia... Yemuo portug. comentada e anotada; F. M. Esteves Pereira, Fran- iiêea de JUmini,.. e as suas veraòeê em lingica portuguesa, Coimbra, ]915, Ifoih)

Daictb teve, sobretudo, doas sacesaores ílastres :

Pbtb4bcba (1304-1374) qae escrevea odes, sonetos e canções revestindo-as maia ricas formas de dição c estilo. As suas Rime e os Trionfi inspirados Lanra, elevam o sentimento e a paixão erótica ao sen mais alto grán.

BoccActo (1313-1375) coleccionador do Decamerone^ novelas licenciosas lauto a«i goato da época. O titulo é um helenismo composto «dez dias». O autor imagina dez pessoas retiradas nama casa solitária para fngir da peste de Fio- iCDça as qaais, para passar o tempo, narram contos, um por dia, e por pessoa, ealacando-se todos no entrecho e no eorcdo.

INGLATERRA

Chaccbr (1328-1400) considerado como o pai da poesia inglesa coinpus rá.rioe poemas, o melhor dos qaais, embora incompleto, é Canterbury Tales, contendo vinte e três contos muito apreciáveis pela riqueza e colorido do estilo.

ALEMANHA

Este país -sofre a influência da poesia provençal, sendo os seus cantores designados pelo nome de Minnesingers (cantores de amor) e Meistersingers (meâtres cantores), poetas líricos dos séculos xii e xiii que nos seus Lxe.ds can- tavam principalmente o amor elevado a um verdadeiro culto.

Os Nihelungos obra anónima, cheia de maravilhoso, sam uma fonte inex- gotáve! de inspiração. Téera duas partes : a 1.* narra o amor de íSigfrido e Crimhiida e a 2.* a vingança que esta toma dos assassinos daquele. Â acr-rio passa-se no tempo de Atila (súc. 5.°}. Ahebelungcnlied aam a condensaçào das lendas referentes a esta época, ou seja de muitos cantares que deverào ser ou oon têmpora neos ou pouco posteriores aos acontecimentos, e outroa mais moder- Doe. Aão ao sabe quando se formou a compilação muito maie antiga, sem dúvida, oce o poema hoje conhecido, o qual não é senTio a sua última forma ama niíini- fe»taeâo sint*ética completamente literária. Em geral tem-se como da segunda aietaíc do séc. xn ou princípios do xui e tem sido chamada a lixada alcmà.

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CAPÍTULO I

Escola dos Trovadores ou Provençal

(1200-1385)

Somárlo : 7. Idade proto-histórica da lingna portagiiêsa 8. Origem da lite- ratura portaguêsa 9. Situação politica da Provença—IO. Origem e difa- eão da poesia provençal. Cansas gerais 11. Causas da difusão cm Por- togai 12. Caracter da poesia provençal 13. Arte poética provençal 14. Trovadores, segreis e jograis 15. Antiguidade dos trovadores cm Por- tugal— 16. D. Denis 17. D. Pedro 18. Outros trovadores— 19. Origem dos Cancioneiros 20. Cancioneiro da Ajuda 21. Cancioneiro da Vati- cana 22. Cancioneiro Colocci-Brancuti— 23. Importância doa cancioneiros 24. Primeiros ensaios históricos- '25. Livro de Linhagons 2'). No- velas de Cavalaria— 27. Ciclo Carolingio— 2S. Ci'.*lo Bretão— 29. Ciclo Greco-Latino 30. Ciclo dos Aroadises— 31. Fabulas e lendas 32. Do- camentoB apócrifos.

POESIA

7. Idade proto-hlstórlca da língua portuguesa. O fa- cto determinante do aparecimento e forraaçfto da língua portuguesa, e a seguir da respectiva literatura, é a constituição da nacionalidade, cílios fundamentos começam a estabilizar-se desdo 1093 com o casa- mento dn Conde D. Henrique com D. Teresa, filha de D. Afonso vi de Castela.

Os primeiros documentos escritos em língua carateristicamente portaguesa datam do último quartel do século xii. Anteriormente, a rontar do século IX, o que se nos depara é somente, por entro as várias formas do latim popular, um ou outro termo português, como pode vêr-se nos documentos publicados nos Portugaliae Monumenta niâiorica, no Eliusidario de Santa Rosa Viterbo, nas Dissertações tronológiccLS e criticas de João Pedro Ribeiro e noutros trabalhos do género.

JE' o período do português arcaico, que decorre até meados do féculo XVI caraterizado pela instabilidade de formas c singularidades

20 HIBTÓRU DA LITERATI7R1 POBTUduASA

fonéticas c sinláticas, que nitidamente o destinguem do português mo- deiíio, que vai do século xvi á atualidade ^.

Quanto mais nos afastámos do século xii, mais as formas portu- guesas se tornam numerosas, próprias e definidas. Mas nuo é de tais documentos, que interessam em primeira linha ao filólogo e ao gra- mático, que aqui temos de ocup;ir-nos. O que nos importa conhecer «am 08 trabalhos literários, embora envolvam simultaneamente um problema linguístico, e é deles, sob esse aspecto considerados, que passamos a tratar.

8. Origem da literatura portuguesa. Pode dizer-se que

^ literatura portuguesa nasceu na Provença. E' que é preciso ir procurar a ori;^em dos nos?os primeiros documentos literários, docu- raentos em ver.so, como o sam, em geral, os da iníTmcia de todos os povos. De nos voiu com o caracter e feição especial dessa poesia, que tam notável influencia exj^rceu na nossa vida literária, a forma « o ritmo, que sam a essência da arte poética. Transplantíida da província meridional da França para o nos.so país, essa poesia amo- rosa, cheia ào sentimento e de vida, recebeu em Portugal a centelha do cnlusiasmo, tornou-se querida de todos e por isso mesmo popular.

9. Situação política da Provença. Mas o que era a

Provenra e como se tornou ela o fúco da poesia a que indelevelm'jnte ligou o seu Tiome?

A Provença depois da desraembraçao do império de Carlos ]\ín:L>iio foi eirvada a reino («STÍh, passando posteriormente (1)4-:)) a ter o simples título de condado. Sob o governo de Raimundo Beran- guer e dos seus sucessores uma série feliz de circunstanciai políti- cas e >0(.'iais trouxe um notável proc^resso material e moral á antii^a província. As Jiberdades políticas e municipais, o gosto da cavalaria, das artes e das letras, a apropriaç«HO da sciencia dos árabes, toriiá- ram-na esse fúeo de luz, que irradiou snbre toda a Europa inundaeues de poesia e de amor. Iniciada com ÍTuilherme de Poitiers (1087-1127) o trovador mais antigo que se conhece, tem o seu período de des- envolvi inento de lOlHJ a 1140; a idade de ouro de 1140 a li25<.» e a decadcncla de 1250 a 12U2, segundo Diez, o que lhe "dá uma durarão aproximada de dois séculos.

^ Para o^tc estndo histórico da lín«:na podem vèr-se: Dr. Kibeiro do Vas- concelos— GnfrtL hi.ftonca da Liv(f"'i rortnffnèftd^ Parirf, líW; Leite de Vaa- coiiccios 7'c,r/o« arch., Lidboa, líiu-S, e Lições de Fhilolo(/ia^ IIUU KpipHanio

ditos dos sCcs. XIl-XV, Porto, 18í<tí, etc.

CÁpfrULO I BSOOLA D08 TROTADOBBB 21

O casamento de !Rai mundo Beranguer iii, o Grande, conde Barcelona, com D. Dulce, filha e herdeira de Gilberto, conde de Provença, cansou a união, eob o mesmo cetro das duas províncias (1113) e preparou d(v longe a irradiação, que acontecimentos posterio- res largamente tornaram conhecida *.

10. Origem e difusão da poesia provençal. Causas

QfiraiS. A poesia provençal teve origens cláíssicas? Inapirar-se-ía sobretudo em Ovidio, cujas obras, como os Amores, encerram todas a8 t('oria9 queridas do Minntssang, como a psicologia do amor desde o normal ao mórbido, como o conceito divinizador da mulhfír? etc. i\o oonfrilrio, nSo dove nada a essa cultura e nasceria na própria idâlii-mélia, dí* íbnt?s populares? Terá origens germánicHís ? * Seria inrtuenciala pela corrente arábica, de que testemunho a descoberta iniprevi>ta no Musou Asiático à(\ Petrográdo do Cancioneiro do Abencuzmau? ' Sam pontos ainda nao inteiramente solucionados. Melhor conhecida c a forma como essa poesia chegou até nós, como, tn^nspondo f\H Astúrias e o reino do Ijião veiu engran lecer-se em Ponuíral. Foi dos países cis-pirenaicos da língua d'oc, sob a égide de soberanos ilustrados que íjovernaram simultaneamente a Provença e o conl.vlo de Barcelona e cingiram posteriormente a coroa do Ara- pio t^ue, na opiniSo dos romanistas, proveio o gosto e o interesse pela [^•í^sia palaciíina, que se comunicaram primeiro a Navaira e Castela, dí^pois a Liào, para finaluiente atingirem á última hora a nova mo- narqiiia portuícu^•^a, desagregada do r^ino galego-liones nos últimos auos do século XI*. K assim observamos que nos priíniiiros reinados da monarquia nós trovávamos á provençal e está a carta do Mar- 0'i^ de iSantilIana (K>U8-l4ò8) para fazer de que primeiro e me- lhor qne ninguém o fizemos em todas as Espanhas e de que na mesma corte de Castela o português era a língua da poe^ia culta. *

^ Esta divisão das suas liahas gerais é exacta, confirma Ant^jade. « Morre n<íracomo os que sam amados dos deaaes !». Les TrbubadourSf leurs vies, leura «ttfrex, leur inffuence, Paris, 1908. pág. 20.

E. Gorra, Origini^ êpiriíi e forme delia poesia amorosa di Provenza t*eiyndô U pia recevú indagint, 1910.

^ O Md único foi reproduzido fotograficamente a expensas do Barão de (knz\mr{r (lítrlin, 189*)) e estudado por D. J. Ribero y Tarragó cm 1912 no ^i^scarw) da soa recepção na Real Acad. Esp.

* D. Carolina Miehaêlis, Canc. da Ajitda^ ir, 689.

í) <»*Mphní tT^stemunho de Santiliana encontra-ae na Carta mi Proémio •iirigidaiio CondestAvííl de Portngal e drz o scçainte: « K dps|nif»3 f.illaron cdta **V que rtayor se ilania, e el arte comnn, creo, en loà reynoa de (xallicia o Pcrtojçal, domíe non os de dobdar que el exercieio de las sciônciaá mas que en BÍn^nas otras re_s?ioní*3 ni provincial de Eapauasfí n^ostnmbró ; on tanto grado *í«e non ha rniTjiio qne qoalesquier decidorcs e trovadores destas partes (agora &t!fl«n Casteiianos, Andalnces o de la Estremadura) todos sud obras cornponian

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22 HISTÓRIA DA LITBRATDSÀ PORTUGUESA

A Itália e a Alemanha^ a Inglaterra e a França, a Espanlia e Portugal, todas aceitaram essa corrente poética iniciada pelos tro- vadores ,e por eles tornada conhecida e estimada. Para essa difas.to concorreram :

aj 08 guerreiros que nos séculos xi a xm partiram para as cru- zadas ;

b) os trovadores e jograis que visitavam as cortes estranjeira» eu 08 solares dos ricos-homens e assistiam Ab romarias célebres ;

c) os casamentos dos príncipes, que levavam consigo o séquito dos seus menestréis;

d) a escolha de prelados francos, gauleses, anglo-norraan- dos e flamengos para as catedrais das cidades reconquistadas aos Mouros;

e) a vinda de colonos para repovoação de terrenos devasta- dos. Etc.

11. Causas da difusão em Portugal. Em Portugal,

álêm destas, outras causas atuaram no estabelecimento e difuhuo da poesia provençal.

Sam conhecidas as circunstancias políticas, que deram em re- sultado a constituição de Portugal como reino independente (1114). Art lutas empenhadas nessa empresa e as regalias oferecidas aôs qliie nela colaboravam atraíam os cantores guerreiros, que encontravam campo onde exercitar o seu génio poético e os seos instintos belico- sos. Por outro lado armadas de cruzados, dirigindo-se Terra-Santa, aportaram algumas vezes a Lisboa e muitos dos trovadores, que nelas vinham, ficaram residindo no nosso país. O asilo quo nas cortes dos reis e nos paços dós nobres encontravam esses trovadores não poderia também ser estranho a Portugal *.

D. Afonso Henriques em llõO casou com D. Mafalda, filha de Amadeu ii, conde de Sabóia. Ora a corte do Sabóia era vassala e vezinha da Provença e por isso é de presujnir que a princesa, que esposava o monarca português, trouxesse consigo para a nova resi- dência o gosto da poesia cavalheiresca dos trovadores.

Foi na mesma curte da Provença que D. Sancho i procurou aquela que esposou em 1178, D. Dulce, filha de Raimundo Beran- guer IV, conde de Barcelona e de sua mulher D. Petronilha, rainha de AragSo. A datar desta aliança, as relações entre as cortes de

en lensriia gnlloga (o portuguesa). E aun destos es cierto rescebimos los nona- bree dol arte, asy como : maestria mayor e menor, eneadenados, lexapren e mansobre». Cfr. Menendez v Pelayo, Avtologia de Poetas líricos^ v, 1894^ pág. 18. Trad. portng. dos Ãmiae» da^ JSc. e L., Lisboa, 3868, 284-305; e Th. Braga, Poetas PoJac, Porto, 1871, 161-169.

' Th. Braga, Canc. Portug. da Vaticana, introd.

CAi'ÍTULO 1 KSCOLA DOS TliOVADOUES 23

Portugal e ÂragSo íôram cada dia mais estreitas. Â necessidade de conter em respeito os reis de Castela n£o era talvez estranha a estes sentimentos, mas também é certo que isso vinha a redundar em favor da iaflaência em Portugal da poesia trovadoresca ^.

Pacificadas as latas tendentes a consolidar a nova monarquia autónoma, e a seguir com D. Denís a poesia provençal adquire còm D. Afonso in o seu maior desenvolvimento, o seu maior brilho e a fua maior fecundidade.

A idade áurea desta poesia no nosso pais ó a Afonsina até 1280; o período Dionisiaco, até ISOO, se lhe não equipara. Àquele é no dizer de D. Carolina Michaèlis^ meio dia, este é tarde, a Em- bora D. Denís seja de facto, individualmente, o mais fecundo entre todos 08 trovadores de amor. . . a plêiade de fidalgos que o circunda, incluindo os jograis que afluem á sua corte é muito menos numerosa e nem de longe possúe o brílho, a originalidade, o viço e fervor da

Íae poetou em volta de Afonso iii; e príncipalmente junto ao sábio de íaatela» '.

D. Afonso III vivera durante treze anos (1235-1248) em França c de com os numerosos fidalgos, que o acompanharam^ trouxe o gOsto de trovar, que durante mais de trinta anos de governo desen- volveu e fomentou.

Por essa época começava a Universidade de Paris a tornar-se conhecida e admirada. Dela saia a luz que deslumbrava e atraía todos os países do sal da Europa.

O seu contacto^ mantido durante tam longo tempo, não podia ser infructífero para D. Afonso iii.

Também é que êle vai procurar o mestre e educador de seu filho e herdeiro D. Denís que teve educação esmerada, toraando-se ^k próprio cultor apaixonado da poesia.

A estas circunstancias que concorreram para o desenvolvimento <ia poesia provençal a juntar a nossa vezinhança com a Galiza, solar das antigas musas espanholas e estreitamente relacionada com ^ gente portuguesa.

Nessa regiSío nSo se cultivava com menos entusiasmo a poesia pTovençal.

A esta proximidade geográfica junte-&e também a afinidade da liogoa, que se tomou tipica dos trovadores, a língua poética por ex-

* Baiet, Leê Troubíídourê et leur ivfliience sur Ia liierature du micli de fíwope, ete. Paris, 1867, oág. 193; Milá y Fontanals, Obras Completas, u, De ^ trovadore» tn Eêpaãa, Bareelona, 1889. Sobre as relações entre Portugal e Angio Marque» de Ayerbe Discursos na Real A, de la Historia, Madrid,

< Cone, da Ajuda, u, 600.

24 HTBTÓRIA DA L1TBBATUSA POBTaOITÊSA

celência, aquela que, na opinião de todos, era a mais apta para ex- primir as idéas galantes e cavalheirescas do tempo ^.

Nào era o provençal, nem o castelhano; era outra considerada então de superiores condições musicais e por isso mesmo preferida para todas as poesias sagradas ou profanas que se destinavam ao canto.

Esta língua araoldou-se de tal sorte á imitação dos provençais, que adoptou grandf^ parte do seu vocabulário, como a sua variedade 6 riqueza métricas «.

Poetas, fossem provençais, galegos ou portugueses empregavam muitos termos comuns, como: sol (somente), puTiar (pugnar), mesura^ ufan, coyta, (queixa, pesar), osmar (conjecturar) adubado (disposto, decidido), aqneí, aqu&ste, as íórmas Ih (ill) e nh (gn), etc. *.

Esta língua que, no dizer de Raynouard, precedeu e preparou a formaçJio das línguas particulares a cada uma das nações da Eu- ropa meridional, iiào podia deixar de ser um laço poderoso ligando entre si todos os trovadores desta escola galaico-portugiiesa, tendo então, como tem hojo, tam intimas relações, e uma o outra tendo a mesma comum origem como uma simples leitura comparativa o evi- dencia *.

12. Carácter da poesia provençal. Mas o que era essa

poesia provençal, que foi a primeira inspiradora dos catitos portu- guescH? Era, neicundo a expressão apropriada de Villemain, a liber- dade de imprensa dos tempos feudais ^. Os apóstolos dessa liberdade foram os trovadores. Eles se encarregaram de levar a toda a parte as idéas de egualdade e fraternidade, que os uniam. Reis, príncipes, grandes senhores, bardes, ricos cavaleiros, ou simples lilhos do povo, desde que composessem trovas, todos eram admitidos na mesma con- fraternidade. O gosto de trovar era sinal de distinção, que todo o bom cavaleiro timbrava de possuir. Trovar era cumprir uma missão civi- lizadora. De país em país, de castelo em castelo, o trovador era o pioneiro audaz, que, com o pensamento na sua dama, espalhava muí-

' Aincdée Pagès, Auzíolb March et ses predeeeaseurê» Eêsai êur la poésie amoureuse et phiheophique cn Catalogue aux XIV, et XV, eihdes. Paris, 1912, pág. 123.

^ Menendez y Pelayo, Avtologia de Poetai liricQs cnstellanoa, etc., Ma- drid, 1890, I, pág. Lxxxiv.

•» B:\ret, Lea Trouhadoura^ etc, cit., pág. 190.

•* A. Jeanroy, Lea origmea de la poéaie lyrique en France, Paris, 1904, 1 vol. Alem dos textos originais pablicados de inaitos trovadores, exee- ienfes selectas para o estudo da língua provençal, como a de K. Bartsch, Chrea- ^Offiatie provençaU, 6." ed. 1904, 1 vol. ; C Appel, Provenzalische Chrestomatie, 1907, 1 vol. ; e outras que podem vêr-se em J. Auglade, Les íroifhadour8f}k cit.

" V, Balaguer, Loa trovadorea^ i, pág. 71, Madrid, 1882.

CIFÍTULO : EBCOUL DOS TBOYADOBBS 25

tas idéaS) que dulciâcavam os costames. A glória, a independência e o amor brotavam naturalmente dos seus cantos. Á dignidade da mulher foi por êles elevada a uma espécie de culto. Cantando -a sob nomes supostos BelveeeTy Mielz de donna, Delfim Bsl-Miralh, Mieux qtie Dame, etc., cercavam-na sempre dum alto respeito, de que se mos- traram orgulhosos procurando sobresair aos jograis quer com expe- dientes formais, estilísticos e métricos (donde trobar cltis, rims cars)^ quer com a novidade do conteúdo. Para isso adestravam-se nas Esco- las, onde cultivavam as sete artes liberais, em especial a Gramática e a Dialéctica, o que liga o Minnesang, a poesia lírica ás doutrinas filosóficas debatidas nas escolas superiores do tempo ^

13. Arte poética provençal* Os trovadores tiveram uma arte poética variadíssima. A det-ígnaçào de verso (palavra) era aplicada a quaisquer composições metrificadas, qiie depois vinram a ter nomes ^•óprios. A estrofe é uma coh7'a ou talho; a repeíiyào duma rima reframy o fecho finda. Compor versos é trobar e fazer música para êles ensoar, fazer o som. Uma poesia é uma cantif/a, ura cantar ^ canção, *. Uma das grandes preocupações do trovador era a música de que w) podemos fazer hoje idéa imperfeita, embora conli» çánios exemplares do género ' e os instrumentos de que se serviam *. Elementarmente o que importa conhecer sara as estrofes principais:

a) Canção (chan&ó), o mais nobre dos góneroí*, próprio dos cavaleiros, por oposição a todas as espécirs de composição em verso. Admitia versos e rimas variadas e termirava por uma estrofe ou tornada; quando fácil e curta denominava-se cançoneta (ckansonetaj ; bavia ainda a meia canção (mxeg chansó).

b) Sirventea, slrventesca, sirvente, compo>içrío crítica e satírica, que derivou o nome ou do fim a que era destinada engrandecer. e louvar os senhores feudais (Diez, Bartsch), ou da origem canto de servente ou soldado mercenário e aventureiro (Mover). Tamb'"ra

* Escolas de. poesia, oade aprendesaem propriamente a arte de trovar nâo as houve, cimo nunca existiram também as afamadas Cortes de Amor. Veja-ae Pio Rajna, I.e Coríi (TAmore, Milíio, 1890; Crei*eÍTii, Per Ja (/umtioíie delle Corti (VAmore, Padna, 1891. A lenda proveio da Art d'Aiiue.r de Amln'' le Cha- p«lain, do SBC. xiii e encontrou era Raynonard o sen priínííiro defensor Z^e.-? ircuhado'irê et deê cours d^amoar, Paris, 1(S17. O sr. Prof. T. Braga ainda dí-ftíude, quando Gaston Paris liá muito a*í julgou definitivamente..

* E. Monaci, traítato dt poética porto //tesa e^^iffírutc. nH Canz ( ol/ir.y na Misc. di FU e Lina., 417-423; Lang, Daa LicAcri/, dcs k<'>i(i'/.^ Dt.ns, Halle, 1894.

^ Beck, Die Melodien dcs Tro^ihadours, Straplturg, 1Ç<)8 ; /'/., Ta mu- «9«« deê trovbadours^ ê. a. ; P. Aubry, Trouveres et trouhadoura^ 1909 na cole- cção •Les masiciens célebres..

* J. Riauo, Criticai & bibUographiccU notes on carbj apauM musiCj Londres, 1887.

26 mSTÓBU. DA LITB&ATtmA POSTVOUKSA

havia mieg-sirvenie e chansó sirvente ou chans mesclatz. Era consi- derada em segundo plano pelos trovadores, mas tera para nós grande interesse por nos dar idéa dos costumes e cousas daquele tempo, ajudando a compreender muitas circunstancias históricas.

c) Descort, descordo, desacordo ou por ser ordinariamente escrito em diversas línguas, ou por causa da irregularidade da medida dos versos, era uma poesia amorosa em que o poeta lamentava alguma paixão não correspondida. O trovador Raimbaut de Vaquières escreveu um descort era cinco línguas ou dialectos, uma por estrofe ; a última ó composta de dez versos, sendo dous em cada língua.

dj TeiisàOy iensCj contense^ género muito usado pelos provençais, consistia num diálogo ou controvérsia entre dois trovadores em que cada qual defendia e sustentava um tema e que costumava sujeitar-se á decisão dum árbitro. As rimas do 'que propunha a questíío deviam ser conservadas pelo rival. Tomava o nome de jocx-partítz quando dois trovadores dividiam o assunto; se entravam mais de dois dizia^e torneyamens, e se o assunto era amoroso j o cx- enamorais. Eis alguns temas destas discussões poéticas : 1) quem se conduz melhor o que nFio pode resistir á nocí^ssidade de falar na sua dama, ou o quo, sem falar, pensa muito nela? 2) como se prova mais o amor duma dama? Confessando-o e publicando-o por todas as partes como timbre de glória, ou guardando-o no lundo da alma, como se oculta um tesouro ? 3) dois maridos ciumentos. Um possúe uma mulher bela e cheia de mérito, o outro uma feia o grosseira: velam sobre elas com igual solicitude. Qual dos dois é menos censurável \

e) Góneros mais simples, mais ligeiros, mas nem por isso des- pidos de menos graça e sentimento eram o phinh, planrf, ospécie de lamentaçíto ou elegia amorosa; alba e serenaj cantos da manha e da tarde; pastoreia^ idílio ou cgloíra outre o potHa e uma pastora ou guardadora do gado; bailada ou hailia se sn ocupava de bailes, bar- carola se tratava de assuntos maritimos, e cantigis de rumar taj eujo nome indica ciaram onte o objí^cto.

No Tratado de Poética do ( anc. Col.-Br, ainda se citara nomes como rífoelhaj jorjnete sertoiro^ dohre, wordohre, seguir ^ cantigas de mestria e de refram. Nao se citam outros góneros de que exomplos nos cancioneiros can(^'oí»8 de gueixa {Vat. 573), de loiiror {\'at. ÕT-J), a Mnria {Br. \\b% Partiwen ( Kcrí. 82ô), Lais, {Br. 1, í), 5), etc.

fj Para nós as poesias mais formosas do quantas nos legou a lírica provençal, sam indiibitávelnionte as cantigas de anfor, as de amigo, e as que quando tomam feição satírica se denominam de es- cárneo e 7ii ai- dizer.

1 Balaguor, Los Trovadores, ob. cit., i, 3.

CJLPÍTULO I B8C0LA DOS TROYADORBfl 27

Cantigas de amor dirigidas pelo apaixonado á mia senhor, fre- nwm mia senlior^ do cunho pa,lacianOy e cantigas de amigo contendo JamentoB e qaoiKas dirigidas pela mulher ao seu amigOy ao amado, confidências feitas para desoprimir o coração ás suas companheiras^ áa mães, ás irmãs. Ligeiras, fáceis, graciosas, estas qualidades no- tam-se sobretudo nos cantares paralelisticos, bailados paralelisticos ou encadeados j em que a me^ma idéa obedecendo a uma contextura rítmica de feição ingenuamente popular se repete pelas mesmas palavras ; por termos sinónimos, mas de sons diferentes ; por palavras diversas, mas adrede dispostas a dar maior variedade e íjaça á composição. A forma estrofica é a mais simples possível dístico ou tristico com refram. As rimas sara muitas vezes assoantes, em regra graves (íemininas), em contraste absoluto com a cantiga de mestria, que exigo rimas agudas (masculinas). E exige uma sin- taxe complicada, frequentemente de ata finda, ao passo que nos gé^ neros populares cada verso é uma proposição \

Nascidas entre o povo as paralelisticas furam usadas pelo^ Tíossos melhores trovadores e vemo-las representadas na obra dq grande Gil Vicente ' para se manterem através os séculos na poesia! popular.

Encontramos exemplos de todos estes géheros noa nossos can- cioneiros medievais, como veremos ácôrca dos principais nos docu- mentos adiante transcritos nos respectivos logares da Antologia.

14. Trovadores, segrels e jograis. Três classes de poe- ta.?. « Trovador era o que cultivava a poesia e a música criando ou inveuUmdo obras novas, como dilletantej isto é, com inteira indepen- dência, por gosto, sem idéa al^^uraa de luero. Segrel era o qun fazia daartí^ de trovar uma profissão aceitando paga pelas suas composi- çíVs. Jogral era aquele cujo ofício consistia em tanger vários instru- mentos de música e em cantar versos alheios, tendo-lho este mister i^frvido de ponto de partida para também inventar sons novos e lavrar cantíiras novas. O trovador era homem de corte, filho d^algo. O jf^gral vilão de nascimento ; o segrel ou jogral da c*orte era, na maioria dos casos, um dos nobres desqualificados. Como trovar era o único termo técnico e simples, que caracterizava o trabalho mental do poeta e compositor, e trova o nome genérico da criação poética, o titnlo trovador competia em bia lógica, e por isso aplic;iva-se <íomumente a todos quantos, de facto, trovavam, aceitassem ou não o prémio do seu saber, fossem de que nascimento fossem » ^,

t D. Carolina Michaolia, fíev. de FiL Eftp., 1^15, p:ig. 262. ' Cfr. J. J. Nunes, Chrestomathia^ cit. , pág. clvu. Li., Aa cantijas parnldíêt*cas em Gil Vicente, Lisboa, 1910.

D. Carolina Michaeiis, Caiic. da Ajzida, ii, 629.

28 HISTÓRIA DA UTBRATUBA PORTUGUESA

E assim ó que Temoe reis, príncipes, nobres e senhotes, rico* e orgulhosos, nivelarem -se com indivíduos saídos da humilde classe do povo. Guilherme vii. Conde de Poitou e ix Duque de Aquita.- nia ', o primeiro entre todos, e outros poderosos figuram ao lado de Bernard de Ventadour, filho dum forneiro do castelo, de Marca- brun exposto, de Guido de Folquet, filho dam obscuro cavaleiro, etc. *. Clérigos, monges íiigidos do claustro, engrossam esta falange de can* tores, qiíe tam poderosamente influiram na civilizayPio moderna. *

15.— Antiguidades dos trovadores em Portugal. Os do- cumentos que atualmente possuímos levam-nos a admitir que os primeiros poetas portugueses remontam ao último qnai;t(^I do í<<jc. xu ou princípios do século Xlil. Um tal JoFlo Soareis de Paiva é eitrulo como trovador nSlo muito depois da batalha de Ourique (11;^9) e a poesia mais antiga que possuímos alcança o ano de 11^0 e é obra do trovador Pai Soares, de Taveiroos (na Galiza). A poesia atribui la a D. Sancho l feita, parece, sob a inspiração d* célebre D. fiaria Pais Ribeiro, a « Ribeirinha » como na nossa liibturia ó conhecida, * per- tence ao período 1194-111)1).

Notícias de haver jograis na corte encontrámo-las reinnnt-uulo a D. Sancho l, que em 11 9o. fazia doações de umas terri-^ a dois deles um tal Bonamis o um Acomj)anl ado ^ prom^-tendo ô\í^í>> em róbora ou como emolumento unu arreyncdiUu, o que signiiica um en- tremes p a que se pode chamar a primoir.i peçM teatral da nossi lite- ratura dramática ^ A' volta de 1250 D. Afonso iii mamlivi» a Imitir na corte somente três jograis, segundo lemos no Tleginienfo da Casa JSecd: « El- Rei aia três jorrares em sa casa e nom mnis ; e o jo- gral que veer de cavalo doutra terra (ou se<>rel) de- lhe Kl- Rei ataa cem... (maravedis) ao que chus ( = mais, (io lat. plus) der, e non mais, se lho dar quiser» ^. E o que pareee induhitíivel é ([iio, como ponderámos, as poesias contidas no (Jane. da Ajuda sam, ua maio- ria, seuào na totalidade, obra de trovadores afonsinos e ]:r'^-afonsi- nos. O nosso maior trovador é, porém, D. Denís destacando admirá-

' A. Jeanroy puhlicon as Poéêieê de GuiUnumt 7A', Paris- Toulouse, 1905.

* J. An^ladí', J.es 2'rouhndour8^ ob eit. p/j^, oi.

'* O tij)0 do Trovador í' d^^scrito iw.aUx pa.--^iiLri'in e(''Iuljre d^» Hiuíira : onv> «jue aia cursado cortíis do Keyt?s e coii ^rand<s Hcuorcs, y nnli'.»* íi i;ilií'">, e gracioso, e cortr^, e polido^ donoso, e <)ne t«'Uf;-a mid, c azular, o sal, e aire e donaire <*n su razonar, e outrosi qu« sea aniad«u-, e íju" siomure 8(í prefie e se Gnga de sí^r enamorado; porque es opinion do inuflios s.ihioá (pi<í todo oníe que sca enamorado, conCiene a saber, ({U(í amo a ípiinn dcbe, e como dt'b(* e donde deba, atiirmaii e dieen que el tal de todas huenas doctrina-í es d«»t.ido,

* Conde de Sabugosa, Donau de te.mpoa tdos, JJí-boa, 1912.

^ D. Carolina Michaelis, Canc. da Ajada^ ii, TóS: Conde de Sabugosa, «b. cit., pág. 32.

* Port. Mon. Iliêí, Leges, pág. 199.

CilPÍTULO I ESCOLA D08 TK0TAD0BB8 29

velmente dessa plêiada de poétaa que partindo do trovador Soares de Paiva, ainda do séc. xii, ou melhor, com mais segurança, de Sancho l (f 1212), chega até 1354, ano era que falece D. Pedro, conde de Barcelos, não alcançando portanto século e meio.

Í6. D. DENIS (127í)-J32ú) merece ser citado em primeira logar. Ele recebeu dos seus dois mestres Ayméric d'Ebraid (f 129Õ) e D. Domingos Jardo, ambos ilustres, uma educação literária tam completa, que se pode contar como o mais sábio monarca do seu tempo. Ayméric era filho dum ^entilhomera francês, natural de Cahor9, na Aquitania, chamado Guilherme d'Ebrard, senhor de S. Sul- pício, em Quercy, vezinho, por conseguinte, do célebre Guiraut de Bonielh, de quem conhecia os versos e cuja língua decerto falava ^. O monarca português fi$-lo bispo de Coimbra logo no primeiro ano do seu reinado em 1279. D. Domingos Jardo, bispo de Évora e mais tanle de Lisboa desde 1201, estudara na celebérrima Universidade de Paris -. Tais foram es heraens a quem D. Denís deveu a cultura e ê desonv4#l vi mente dos seus dotes naturai-í. Dessa cultura dào pleno te&temimho muitos factos do seu reinado, como o mandar traduzir p'ira pextuguôs as leis das Sete Partidas^ a Créulca geral ou Histe- ria de Espanha, de Afonso o 8,íbi«. e afc do árabe a História e (ie^fjrajia da Penínsida, do m<í>uro Razis d'^ (\ird«va, traduçrio que fdi fí»)ta pelo s<'U capelão Gil Pires '. Prova evidente dessii cultura é também a fundação dos Esfwhs geraes ou Universidade promul- gada por um diploma solene de l de mar(^'0 de 129<'^ *.

A sua corte tomou-se o foco duma intensa vida literária, vindo jê^rais e trovadores dr^ GaHza, LiTio e Castela, acolher-se á sua som- bra. A sua morte foi um rude golpe dado á poesia trovadoresea c«^mo deixa perceber o plardi^ que o jogral Johain (de Leen) eonipiís a e^s/; prop<Í8Íto:

* E. Baret, Les trouhadours, cit.

'^ Biogr. linhaii ura poneo lendárias em F. Dcusílado, KdiKuidords Portng., An^ra, 1909, pá^. 289-276.

' O original árabe é desconliecidn; um (íxomplar da trad. |)i>-.4iii-n An- àt^. de Resende, talvez o mesmo que no sr^t». xvm an-iava na Livnuia do (,'f»nde íi<» Vimieiro e qae desapareceu no ferrcnioto de 175."). Cfr. Nic. Antitnin, fiihL Hi*p. Vttn^^ I, 1. VI, €Xii, n." 80 e CoUecção dos JJocs. e Memorias da h\ Arad. à' Hi»t. 1724, n " xvii, pág. 9 e n.° xix, pág. 6-, Leite de V^isc, Textos Are. eit. 44, n.

* Dr. A. de Vaseoncellos, Um documento precioso^ \n-Jicr, Unic. de Coimbra^ i, 1912, pág. 373.

30 HISTÓRIA LITBBATITRA. POKTnGCêSA

Os namorados qae trobam d*amor todos deviam gram doo fazer, et nom tomar em si neuham prazer porque perderon tam boo senhor Com' el-rey D. Denis de Portugal,

Os trobadores que pois ficÉ.ron eno seu reino e no de Leon, no de Castolla, no de Aragon, nunca pois de sa morte trobnron ^!

Sam de dois géneros as canções qne D. Denís compôs: umas, de caracter profano eram trovas próprias para ne canta,rera á teorba, * outras de caracter religioso formavam o cancioneiro « de louvores da Virgem N.^ /S'.*» ^.

As setenta e sois composições de D. Denís estão escritas em verso endocasBÍlabo, era redondilha maior e menor e sam na maior parte cantatares de amigo e cantigas de amor^ algumas baladas e j>astorelas. Imitando quando queria os provençais, como Me pró- prio diz:

Quer eu cr.i maneira de j^^oníçal fa7:er a f/ora um cantar cVamor

o régio trovador cantou principalmente os sentimentos e tristozas do coração, nào se ^ncontr.mdo na coleoçrio das suas rimas, nem sirven- tês, nem cantos guerreiros, como muifos dos contemporâneos nos deixaram, o que bem se explica pelo seu í^énio ilustrado e piU'itico. Leiam -se as cantip^.is fio amor, a pa>íoreIa e as b^ihvlas tivms- critas na nossa Aufouxiia^ e v^^r-se-liá ao hulo da sim[>li(*idade tia lin- guat^em, a grara dessas composições, (|ue tornaram consagra'lo o nome do rei trovador, do quem Forreira escreveu: honrou as masaSj jfOrJou o leu *.

1 Cave. j)ort/'Q, di Vati^^ava^ oh. rit , n.'"* 708.

'■^ K(l. d(! JI. Lanii'., Das Lxe.derhnch dr^s l\<'hntjs Denis vou Vortugaly 1 vol,, IIhIIo, na c.tsa editora do Max Niorneycr, ISJ-L

•' A exiáténi*ia drste cam^innciro é ate líuia por nma alinnat^ào positiva c eat<Li<'nic'a dt^ Dnarío Nuiios do l^iàn na Crónic i dos Lei'^ da Voriiaj d, parte i, tomo II, pjifif. 77: «(irande trovador, diz òlc rcfonndí» so a D. Denia, e quási o pri'iiL'.iro ijiie na língna })ortn<::;iicsa scrtívoo vorso-*, Hí'<íin)do vimos por um Can- oionoiro stm quo om líonia s<i achou em tcinpo dol R»m í>. Joào nj et -p^'' outro (jue siá lai Torre do Toiídto de, ioavores da. \tr em .Vj *S' - )>

* ('ondo do Sahngos.i, Gcutc d'al(jr>, Li-hoa, IJlõ, no cap. .15 Musas fVKl-h'ei D. Denis.

CAPÍTULO I MCOLA DOS TBOTADORBS 31

17.— D. PEDRO, Conde de Barcelos. Ao lado de D. De-

nÍ8 figuram os dois filhos D. Afonso Sanches e D. Pedro. O 1.® ( 1286- 1529), primogénito entre os nove hastanlnn do pai, autor dp canções amorosas e satíricas (Canc. Vat., 17-27 3i)5-o^W) é de relevo infe- rior ao irmão D. Pedro, Conde de Barcelos, (1289-135J:), a quem foi atribuido como se poesias dele contivesse o chamado Livro das CantigcUy que em testanien:o outorgado em Laliui a ;3U de março de 1350 legou a Afonso xi de Castela, livro que era dele, sim, mas pelo facto da colecionaçâo e da propriedade e nâo porque conti- TCflse poesias dele * . Este cancioneiro devia conter as poesias galaico-

E^rtuguesas recolhidas desde 1H30 a 1350, cm Portugal, AragSío, iao, Galiza e Castela e decerto deveria ser uma colecção riquíssima. Infelizmente perdeu-se, e tudo quanto possa dizor-sf» sobre o valor A»u pop-#.ias que encerrava, sous autores, ópoca e região em que vive- ram, hcííii como sobre as relações dele com os outros cancioneiros, nno pít-i>a de moras conjecturai^, mais ou menos verosímeis. Podemos fazer id«'.i (lo talento poético de D, Pedro pelas onze canções, aliás medío- Cff^-i. quatro de amor e sete de oscárnpo, rocolhidas no Canc. da V^ttr, : 2 10-213 e 1037-1042). A sua glória é outra como pros.iflor. O Livro de LinJiagens ou Nobiliário qup> lhe tem sido atribuido, mas qae dele nilo conserva senão uma parte diminuta, como adeante vere- mos, vincula, apesar de tudo, indelevelmente o seu nome.

18.: Outros Trovadores. A par do rei-e dos príncipes c^n^'\Tn-se muitos nobres, qu'^ formavam a cOrt^ p j)ortrtnciam á sua (•a-<a militar ou onnn fun^.Monários como, no tempo de D. Afonso ii e í^.ncho lí, Va"*co Gil ^ Abril P<*roz (r 1240) íle qucMU ie>t;i \v\^ jocs enanorafz com Bernaldo de Bornaval ( Vat. GG3). Deste tf»m[)o deve Por Pai Soares de Taveiroos e seu irnirio Pt^ro \'ollio, r Marti m Soa- rpí«, de queiíi uma rnbri^^a do (^anc. Hranc. ( 1 Ui) diz (f.íhy do Riba 4<' Li'itha «Mn Portuií^al c trocou mojhor ca toflolos íjuc trof);iron e assi tov julgado aiitr os o-itros trobadorecj ». ilas c com 1). Af. Il( (1247- 1-Tl» que a lírica cheira ao ap'^goo. Entro outros Afonso Lopes Bavrtin, Vaa'*co Gil, Fernam íjarcia Ksu;aravmilia «o que tn^bou b*'i5. Joam de Gtiilhalc, Nuno Fern;inrlcs Torncol, Martim í'oíL-ix, todo? do tempo d*'sse monarca, e Joam Peres d^Avoiín, Joani Sí)arcs Cofllif), irnmoB Poro Marinho e Martim ^Marinho, do tíoiipo do I). DemV, outros ainda que figuram no tempo dos dois monarcas onío Joam Lobeira, e muitos mais, ricosliomons, priva los, o>cu- d^^iros, cavaleiros, etc. *, cultivavam a poesia, concorreu io para

' Xo testamento o comle diz: "wanAo o inon Urro nas rfntf}',n.* a c^ B"! fU Ças//»/íi» e HHO o livro «las minlian c.intipjis, f>n o Iívk» (j/»' cu li/.

* I). Cnrolina Miçh^ícliá, Cnifc. Ajuda, n, 291-r>.St; 11. Lin^^. /; / ? Lf- ^"' <Uê Konifji De /lis ^ XXXV e aegi.

32 HISTÓRIA DA LITERATURA POSTUGUÊSA

avolumar csfio número considerável de trovas quo encliem os Can- cioneiros, que ainda hoje posBuimoe, e que de certo formavam outros muitos que se perderam. A maioria e melhoría destoas ca,nçoe8 sam como, difísemos, de carácter amoroso Cantigas de amor^ muita» de confidencias a amigos Cantfgas de amigo, muita» de tfição sati- rica Cantigas de escárneo e maldizer,

vSe todas as poesias dos trovadores gralaico-portuiruesçs exis- tissem, elíis, juntas ás que possuímos, formariam organizadas edi.^pos- tas o grando Cancioneiro geral galaico português, que se podia tripartir eui 1.° Canc, de Amor; 2.® Livro de Cantares de Amigo ou Livro das Donas j e *ò,^ Canc, de Burlas, O quo temos soma um pouco mais do daas mil canções precisamente 2. 3:^ i) que, tirando as rep(^tidas em número do íUU, perfaz 2.í)l9.

19. -Origem dos Cancioneiros. As e()nrjOí>ii;o'.w trova-

doroscan f«Varn a princípio recolhidas em grandes f ilha-^ d*- pcrganii- nh > e ncornpanliaílas da respectiva noíarào musical, aprovcitatido-se as niairisciilas para lindas e delicadas miniaturas. Com o t(Mnpo essas folhas i'euiiidas íorruaram cadernos ; daí as coh*ç«")f's que moíicrna- ment'^ ;<^ d'\sii>nMra»n por Cancioneiros abrangendo po«'sias de di- fcrenti's autor«^s e várias épocas. Pena é que muitos deles se per- dossciu sahcndo nós da sua exist^Micia, li'>j<^, apenas por uma ou ou^ra infurjiMc.Mo dada de passagem nos autores e por conjecturas mais ou menos f,m l;inieufa.las.

AfuaiiiKMit" os cancioneiros galaico-[)ortuirues»"b (jue po>-uiuios sam: o da Ajtui<(, o da Wtiicana c o de (Joloccl.-Branciii *.

20. Gane. da Ajuda. I^' a>sini denominado por se con- .•^•/rv;;r na ]\\u\. da Ajuda, sendo tamb^Mu conhecido [jor do Odcyio de XoirrcSj pon|ue era na amiua t^ivraria deste (.'uiégio^ que se guardava, e ainda |)or Livro das Cantigas do Conde de Ptarcelos por iterem erron»'amente atribuídas todas as canções nele contidas ao

'froriji i' cituíorc-^, adfníiií' cit., c os al-Muríf-» ; ]>''llerinann, /Jir alfcn J.tttlrr- hn<'''tcr (].•')' l'nri>';íiffii'.ii od^r J n'iir<'''/r. zur (t-9'''>. //*';• portiujicífif.^^hi^lif^n- /'•'^'.»ic

vud iiJU',i / h'(C'J:i'ff, I^KT.iin, IblO, :i o:i'\L'iaíia (]ii»' <'*, (iiz Kau.s-^lfi* ('- "^'''- 0^'''ilj eii. <]f' MiUt.^.ir(l, \'or/ror,\ i. virj frut'» do iiiv-stiiracòc^í df muitos ííikí.í fritas

Mitfrfih'l> r nos ^(//./tcn zur (it\^rJi der í^/)-' in.''<'hf^:/ tuul jiortuif XiitioJKiMUrT^i.tfir^ J><'rlim. l'^') ), i-Mu lo ii ijuo d'ni oeisiào o íiMtjalh . vit. df Iv llc^wiiaiin ; V. Diez (^(■}>o)' lhe. t rsl.r j)nrf''f/ KT.usi-nnd líofpocsic. Hciin, is;>3. A íodr-n on.ses trahjilhoa solu-.-Icva, pnr.''m. a ed. iiionuinont.il <la Snr.* D. Cirolin.i Micliaelis citada. Xo vnl. 11, J8')-'Ji>S d'^áta o!)ra encontra o leitor lun.inosaa conjecturas sobre a origem e inter-dcpend6ncia dos Cancioneiros portiij^neses

CAPÍTULO I ESCOLA D08 TBOVADOBES 33

infanfe D. Pedro, conde de Barcelos. Publicado ^ pela 1.* vez por Carlos Stuart de Rothesaj'-, embaixador inglês em Lisboa, numa ed. de apenas 25 rxes., que pretendia ser rigorosamente diplomática, tomou-se mais conhecido com a ed, que o erudito brasileiro Francisco Adolfo de Vamhagen (1816-1878) dele fez em Madrid em 184:9, I que acrescentou Noaas páginas de notas em 1868. * Edições incompletas e imperf^itiasimas e^tas. com os trabalhos da flnr.* D. Carolina MichaíMis o Canc. obteve a Bua ed. crítica definitiva em 1904.

Possuímos afifora o texto de todas as canções com resumos (em alemão), notas v5 análises métricas (i, 924 págs.), bem como preciosas investigações bibliogr., biogr. e histórico-literarias (ii, 1001 págs.) '. Apesar de truncado, representando talvez um fragmento do Canc, do Amor, i. é, da parte primeira do Cancioneiro geral Galaico- portuguêê, contém 28b canções completas e 27 fragmentos doutras, havenlo 56 repetidas no Canc. da Vatic.

E' indubitavelmente o mais antigo dos nossos cancioneiros, ignorando-8e por completo a sua história, antes de ter sido d«'scoberto no depósito do Colégio de Nobres peio Prof. jubilado de Direito, Dr. Baimimdo Nogueira e de se ter ocupado dele António Ribeiro dos Sanlof», embora deficientemente. Deve remontar aos fins do ►scc. xui, compreendendo as produções de trovadores Afonsinos e pre-Afonsinos ou soja, portanto, dos poetas mais antigos, que conhecemos. Escrito em pergaminho, com a letra inicial de cada canção maiúscula e colo- rida, imo traz, contudo, as notas musicais nos primeiros versos de cada estrofe o qne^ representa, em verdade, uma falta iamentávol.

21. Cancioneiro da Vaticana. Foi o alemão Fernando Wí»lí o primero * que fundado nos dizeres de Duarte Nunes de Liiío s chamou a atenção dos bibliófilos para este Cancioneiro achado no reinado de D. Joíio iii em Roma, na biblioteca Vaticana, para onde fora talrez oferecido por um dos nossos monarcas ao papa, no tempo em que a poesia dos trovadores era tida em alta estima. Bus- «tó, após várias tentativas infrutíferas, deram o resultado que se queria, pois levaram á descoberta do códice 4.803 que nSo continha,

* Fragmento* de um Canc. inédito que. se acha na Livr, da R. Col. doa *Vo6rí». Impr. á citsla de C S. Paris, 1823. A « Advertência» com qae abre a *i t' de Timóteo Lecusaan Verdier, erudito estranjeiro, qae viveu entre nós e maito ponco escreveu ( f 1831) [Cfr. Panorama vi, 406],

* Trovas e Cantares dttm códice do séc. xiv ou antes, wni provável- ^^i, o lArro das Cantiaaw do Conde de Barcelos, Madrid, 1849: id. A^o- ^^ pápnas de votas às Trovas e Cantares, Viena de Anstria, istis.

* A ed. é de Ralle, do editor Max Nierneyer, ambos os vola. de 1904.

* Nos 8twl/ien zur Gesóhichte der spanischen und port^njio!9i?chen Xatto- y^iWnratw, Berlim, 1859, 1 vol.

^ Vide atrás a nota 5/ ao § 16.

3^ HlBrÓRIA DA LITERATUILÁ P0BTUGUÊ6A

somente, como se supunha, as poesias de D. Dem's, mas um precioso pecúlio de cerca de 1.200 canções em que se achava representado, além do monarca, um ciclo dionisico brilhantissimo. O visconde da Carreira, nosso embaixador em Roma, fez extrair do precioso códice uma cópia que em 1847 o brasileiro C. Lopes de Moura deu á es- tampa com o título Cancioneiro d^el-rei D, Dents, pela primeira vez impresso sobre o manuscrito Vaticano^ com algumas notas ilus- trativas e uma prefação histórico-literária. Paris, 1847. (1 vol.

196 pág.).

£ra tam somente uma parte das muitas canções contidas na vastíssima colecção e mais que imperfeitamente apresentada. JBm 1857, dez anos depois desta ed., F. A. Varnhagen descobriu em Ma- drid numa bibliotf*ca particular um exemplar do Canc. da Vaticana, do qual fez cópia, que no intuito de publicar confrontou com o códice de Roma. Circunstâncias diversas fizeram com que em 1872, e também em parte, o dedicado bibliófilo realizasse os seus desejos publicando em Viena de Áustria uma colecção escolhida dos cantares do grande Cancioneiro de Roma á qual pôs o título Cancioneiri* nho de trovas antigas.

ilas o que se tornava indispensável era desde princípio a edi- ção do texto, diplomática, fidelissima, que seguisse o original passo a pasRO, linha a linha. Foi o que pôde realizar o Prof. E. Monaci em 1875* habilitado por trabalhos anteriores* para essa magna empresa.

Pelos estudos do grande romanista ' ficou-se sabendo a histó- ria do códice, nâo original, mas cópia tardia, de mão italiana, dos fins do súc. XV ou princípios do xvi, feita por indústria do filólogo e humanibta italiano A. Colocci (f 1549). Tem 210 fls., faltando-lhe 42, que se conjectura faltassem também no original. Das 1.205 trovas que abrange aparecem 56 no Canc. da Ajuda. O serviço de Monaci foi inestimável pois o códice de papel e escrito com tinta está sujeito a dctoriorar-se. Ele servirá de base a quantos trabalhos filoló- gicos, críticos ou literários se empreenderem, como serviu á ed. que do referido Canc. deu em 1678 o Prof. Dr. Th. Braga *, e á que das canções de D. Denís publicou o Dr. Lang.

' II cauzoniere porloghese delia Bihl. Vaticaaa con una prefazione^ con fac-8ÍmUi con altre illustrazioni^ Halle, 1875.

'^ Canti antichi portughesi. Imola, 1873; e Canii di Udino, 187Õ.

3 Falecido em 1918. Mário Pelaez na Nuova Antologia (julho de 1918) exalta-lhe a memoria comovidamente fazendo ressaltar os seas méritos.

-* Canc, portug, da Vatic. Ed, critica restituida sobre o texto diplomá- tico de Halle, acompanhada de um glossário e de uma introd. sobre os Trovad. e Canc. portug. Lisboa, 1878. [Sobre esta ed. ver Epiphanio Dias Zeitschr. f. romanis. Phil. herausg. v. Grõber, xi, 42-45. Lang no Das Liederb, des Kõnigs Denis também aprecia severamente esta ed. « qae revela a maior arbitrariedade

CAPÍTULO X BSCOUL DOS TBOTADORSB 35

22.— Canc. ColOCCi-BranCUti. Foi ainda em Itália nSo, porém, em Roma, mas em Marca de Âncona, perto de lesi, berço do hamanista Coloeciy que se fez a descoberta dum novo códice, o Canc. CoJoeei-Brancíiéi assim chamado do nome dos seus respectivos pos- suidores. Foi o Prof. Corvisieri quem trabalhando na livraria do Conde Brancatí o descobriu e dele logo deu conhecimento a Molteni, discípulo de )[onaciy que o descreveu sucintamente ^ e se preparava para dá-b & estampa quando inesperadamente faleceu (1880). A pablicaçSo foi feita por Monaci *, mas de 470 canções dentre as 1.675 que o manuscrito continha, pois todas as outras estavam no Canc. da Vatic. e eram portanto conhecidas. Assim se completa- Tam 08 dois importantes códices que, embora independentes, podem bem ter derivado duma mesma fonte primordi li, hoje perdida, mas qae Colocci conheceu. Existirá ainda esse códice? Ser-nos-há ainda um dia revelado ?

23.— Importância dos eancloneirOS. E' enorme o valor <ios Cancioneiros nâo como documentos da língua, mas ainda como docamontos literários e históricos. As idéas e os sentimentos duma época, para nós tam interessante, descobrem -se através das fantasias dos poetas. As tradições, as lendaB, os costumes, o viver e as preocupa- (,1)68 da sociedade têem neles grande parte. Quer dizer, os cancioneiros encerram uma fonte preciosa de inclic^çoes lin«;uisticas, históricas, o sociais, ainda mal adivinhadas, descobrindo-se também oor entre a aridez e monotonia, que enchem muitas das suas páginas, a verda- deira e legitima poesia. E' o que particularmente sucede com as cançks de amigo e outras delicadas e suavíssimas inspirações, pri- meira manifestação genuína do lirismo peninsular, cujo caracter de originalidade não é possível negar, pois nos encontramos a muita dis- tâoda dos sentimentos formalistas da lírica provençal. Quem as lo com um pouco de atenção fica impressionado com a íórma rítmica tam simples empregada para traduzir o sentimento do amor, da admi- r*^5o, da confidência, do respeito, da dOce intimidade familiar para com a donzela, a solteirinha, e com aquele va^o tom de indefinida saadade, que devia ficar, através dos tempos, como nota diferencial de toda a poesia portuguesa. Jeanroy tem razlto em afirmar que o provençalismo se estendeu até o mais extremo dos países ocitánicos, n»B é preciso ajuntar que essa poesia estranha e longínqua encontrou aqui formas peculiares e próprias, uma verdadeira poesia popular,

tanto em relação á lingna, como á medida e sentido »• Cfr. também D. Carolina ^iài^\\B-'Cane. da Aj,^ ii, 44-48.

' n secando Canzon, Fortogh, di Angelo Colocci no Giornale di ^filo- logia romanza, i, 190-191.

* II CattMon. Portogh, CoUod-Br, publicato nelle parti che completano il cwitee Vatic. 4.803 da E. Molteni con un fac-nm. in diotipia. Halle, 1880.

36 HISTÓRIA DJL LITERATURA POHTUOCÊSA

cujos primeirofl documentos ainda portencentes ao séc. xii desapare- ceram, ro8tHndo-no8 agora os qno lemos nos Cancioneiros através dos qtiais podemos remontar mais longe ^.

PROSA

HISTORIA

24. Primeiros ensaios de prosa. Nos most^^iros naci j-

nais *, t'>i>eci?ilm» nte nos do Alcobaça e de Santa Cruz de Coimbra guardavi.m-se monumentos inapreciáveis da língua e da literatura desta priínt^ira idade, como o deixam ver os Indiees dos inventários daquelas casas crnventuais, especinlmeTite de Alcobaça. Alguns desses docf. tê^m Hidí> publicados a Lenda dos Santos Barlaam e Josafat ', a Vida de .SV" Amaro *, a História do Cavaleiro Tungtdo *, a Lenda de ^S.^" Eloy *, todos do Cód. Alcob. 266 e í-s mais numerosos por Fr. l^'ort\mato de S. Boaventura na Colecção de inéd, jTortug. dos stcs. xiv e xV '.

Pela sua antiguidade e importância para o estudo do fabulárío merece mencionar se aqui o Uvro do LCsopo^ desde 1906 eonIi»*<'ido pela publicação do ^fs. respectivo existtínte em Vit^na de Áustria '. Entre cst<'s t* ntativas d»* elaboração o formação da língua nSlo falando nos does. legislativos '-^ e narrativos escritos era latira popular *°, fora do nosso plyno. vcom os crcnico/s do mais alto valor noutros sentidos, como os dos Testamentos de Lorvão, da Mnmadona de Guimaràis, do Livro Preto de CViimbra, Censnal do Porto, Mdei de Braga, a que se refere J. Pedro Ribeiro ^', documentos todos que por uma

1 Mencnflcz y Pelayo, Oh. cit.^ pág. lxxit.

'^ Os does. rn;iis antifçoa em port. e datados pertencem ao mosteiro de Vftirào (FLnt:e-I>oiuo-c-Minho) Leite de Vaac. 'TcÁctos, 13.

■'• l'iibl. i)or Vasconc. e Abreu, I^idboa, 189S, desfavoravelmente apre- ciada por Hinker no estudo abaixo cit.

« Publ. por Otto Klobb, Paris, 1901.

■"• J\(.r. Lks., VIII, 249. Outra reilaeeão deste trecho contida no Mos. Alcob. n.^ iiil na mesma Rtv, Lns. iii, 101.

^' Ili.^tltHfO, XLVII, 118.

" Co//, (h^ Í7U'd. pnrtvfj. dos seca. xit e xv fji'r ou for nu fornj)n.9lns orujinnbnrittn. o" frod. d^ várias lím/naif por morf/n* ciAÍorritiiscs destes lieivns, ordeifida r rr,j,i'-'da ^''hnndp dof Mss. do Moa. d^. Alcob. ^ Co"nibra, 1^2:^ o vol-. l^'^!. pflo I^r. L. de Vaflc, Lisboa, 19í)().

y^ M. IJ DipJomntai^, et Chartae. TurpiisiorKís. Leges rt Ovisne- ivdin<'s.

^'^ P. M. II. T Scriptorts.

BoK dn tip'f. Fortug, de Fernandes TomAs, i, 13.

O

OIPITULO Z BSOOUL 99B TBOVADOBSS ZT

«rolnçSo lenta nos levam até ás primeiras Crónicas assinadas per Fernão Lopes. Vamos citar os que mais de perto se ligam i história. Note- se, de pstgsagero, que ufto têem razSo os aatores que, como D. Nicolau de Santa Maria, sustentaram que o oficio de cronista fôra muito antf»rior a Fernão Lopes, sendo o primeiro crónieta o prior de Santa Cruz, João Camelo, capelão de D. Afonso Henriques e por êle nomt-ado nara aquele carjíjo ^. João Camelo teria escrito o Sumário das Famílias e primeiros conquistadores destes reinos *, continuado pelo BfU sucePBor no mesmo Cargo dd cronista, Pedro Alpnrde oa Alfarde, seguindo- se a este outros priores claustrais de Santa Cras. TaÍK afirm^çòes por falta de base sam hoje unanimemente contesta- das '. O que nestes tempos antigos nos aparece numa ordem de tra- balhos que mu is de perto se bga com a História é o seguinte:

1. Crónica Òreve do Arquivo Nacional, memória anónima dama crntt-na de linhas^ que trata somente dos primeiros reis portu- gueses de 1150 até 1325, e parece ser o mais antigo fragmento da hiatóna em vulgar que possuiraos ( P. M, fí, I, 22 .3).

2. Crónicas breves e memórias avulsas de Santa CruZj tal /es compiladas p^-lís fins do téfi, xv, {Ibid.y 23 32).

3. Os Livros de Linhagens ^ a que abaixo particularmente noa referimos {lòid., J 43-389).

4. Crónica da fundação do mosteiro de S. Vicente de Lisboa ou 8Íui[>l'Sri.erit« Crónica dos ViccTites (Ibid,, pág. 407-414), inte- ressante e curioHa narrativa, * remontando ao séc. xv.

5. (Wmica da Conquista do Algarve descoberta por Fr. Joa- <}uiin d** Santo Agostinho na C* Municipal de Tavira em 1788 [Ibid,^ 415420 e antes nas Mem, de Lit. da Acad. i, 74^98).

Acrescentemos ainda a

6. Vida de S.^ Isabel impressa por Brandão na Mon. Lus.y vi, 405-534; e uma

7. Crónica General ou Estoria de Espanha ^ escrita ou man- dada compor por D. Alonso o Sábio e mandada traduzir por D, De- iiú, continuada no reinado de D. Afonso v até 1455, e começada a

' Chron. da Ord. dos Con, Htg.y 1. n, e. ix; Barbosa Maehado, l''iJJ. Lus. 11, 620.

* Brandão, Mov. husit.^ part. v, 1. Jtvir, e v.

^ Fr. Manoel de Fi^çaeiredo, DÍ9s, liist, « crit. . . para apurar o eatálogo ^ Chron. irtórcs do reino t ultramar, Lisboa, 1789. [16 páp;6.]

* D. Joào III mandoa-a imprimir no mosteiro de ISatita Cruz de Coim- ai em 15.38. Consta de 24 Ha. nnm. Rariasima (Inoc , Oic, 11, 111). Foi wmpr. no Porto em 1873. Seria a obra com o título Hist. Geral que ligara no catáiogo da Livr. de D. Duirte ?

^ Editada na Nueva Bibl. de Autores EspoM,^ por Menéndez Pidal^ Madrid, 19(Mi, 1 vol.

3

38 lUSr^BLà ]>A UTBliârL.tA .*0..rb'OUâ8A

publicar em Coimbra em 1863 pelo dr. António Nunes de Carv^alho ^ Desta Crónica vários códices manuscritos.

25. —Livros de Linhagens. Dentre todas estas crónicas ou narr çSes merecem com justiça aestacar-se os chamados Livros de Linhagens, Estes livros, que desde o século xvn coraeçarnin a ser conh' ei *oa por Nobiliários *, sam registos aristoerálicos das famílias nobres de Portugal e constituem um repositório intereBSHutissímo dos feitos e das lendas que entretinham a imaginação popular, 8(.nd() tam- bém um documento precioso para o estudo da língua nos seus primei- ros desenvolvimentos.

ISupunh a- se antigamente que D. Pedro, Conde de Bircelos, era seu único e exclusivo autor, mas A. Herculano demonstrou que « o livro das linhagens, chamado do conde D. Pedro, é o livro nilo dum homí»m, mas sim de um povo, de uma época; é uma espécie de re- gisto aristocrático, cuja origem se va« perder nas trevas qu»? cercam o berço da monarquia... e talvez que, no estado em que hoje o vCmiios^ seja aquele a quem se atribuo o que nele tenha mais deminuto qui- nhão ». Houve pois primitivamente ura registo aristocrfUico qu^í com o tempo se foi transformando e aumentando, devido isso ao desen- volvimento e multiplicação das gerações, á influencia de indeví- duos e de fan^ílias poderosas que buscariam, com r^zHo ou sem ela, alterar as tradições da p»ópria origem, quando isso servisse a inte- resses materiais ou a emulações nobiliárias. O trabalho do Conde está provado pelos seus próprios dizeres: « eu o Conde D. Pedro... houve de catar por gran trabalho, por muitas terras e escripturas que falavam dos linhagens; e vendo as escripturas con grande es- tudo e en como falavam d'outras, e d'outros grandes feitos, compus este livro...», mas que nem tudo pode ser dele veritíea-se, entre outros fund^mentop, pelas referências a sucessos po&teri(»res á morte dele, por ex., o relativo a D. Pedro I, o justiceiro, quMirlo o Conde faleceu em 1354 e este nasceu em 13Õ2 . E o próprio 1). Pedro con- vidava outros a que acrescentassem o seu trabalho «roíío a aquelles que depois de mim veerem e vontade ouverem de sab^r os linha- gens, qu>í acrescentem. . . aqueles que adiante decenderem dos no- bres fidalgos da Espanha, e os ponham e escrevam nos logares hu convém», o que se explica, afinal, pelo carácter do livro, que não era de mera curioi-idade, mas da maior importância social, como se deixa ver da letra dos Preâmbulos.

1 Leite de Vasc. Textos Are. 44, Bo!. dais Bihl. e Arq., Ili04, 173-177. *^ Na ed. preparada por João Baptista Lavanha e publicada em Roma em l&iO é que apareceu pela primeira vez ê&te uome.

CAPÍTULO I»- ESCOLA DOS TROYAOOBBS 89

PossaimoB boje dos Livros de Linhagens, anteriores ao século ivi, quatro redaçSes que sam :

1.* O mais antig) chamado Livro Velho, publicado no tom o ).® das Proveu da Hisi. Genecdógica, pág. 145.

2.* O fragmento, proximamente da época do antecedente, que se acha impresso depois daquele no mesmo volume das Provas e que o acompaiihi na mesma denominação da Livro Velho,

3.* Um fragmento de nobiliário ainda inédito, que anda desde o aéc. XVI encadernado junto ao manuscrito do Cancioneiro da Ajuda. Parece pertencer ao séc. XIV. Vai desde o tit. 21 incompleto kté o tit. 35 também incompi^^to.

4.* Aquele que foi atribuído ao Conde D. Pedro, chamado por Í88o « Nobiliário do Conde D. Pedro ». Além da ed. da Lavanha \ que sJtercu e buprimiu o texto a seu sabor, e da de Faria e Sousa ^ qae o trad. para espanhol com a maior arbitrariedade, nao tendo portaato um nem outro valor documentário, nem scientífíco, temos a ed. de A. Herculano, que se pôde considerar como a dum texto iné- dito e que é a eopia exacta e completa do apógrafo existente na Torre do Tombo '.

Os códices, acima nomeados, á excepção do 3.^, existiam na Torre e todos se perderam ficando as cópias feitas pelo escrivão ío arquivo Gaspar Alvares de Lousada, que aqui nao exerceu certa- mente o seu mister de falsario ^.

Estes documentos -m sido fonte de trabalhos de grande Talor, eomo do Cajic. da Ajuda da Sr.* D. Carolina Michaélis, dos BTozões da Sala de Cintra de Braamcamp Freire e deram o fundo dilgumas n^irrativas de A. Herculano, como da Dama pJ de cahraj do Ódio velho não cansa de Rebelo da Silva, daH Telas anti(jas de Alberto Pimentel, de O que morreu de amor de Júlio Dantas. Basta isto para tornar benemérita a memória de D. Pedro como autor deua iniciativa a que ficará indelevelmente ligado o seu nome.

^ Nobiliário de D, Pedro, Conde de Bracelos (sic). Ordenado e iltfMr. '^^ wta$ y indieeê por J. Bautista LavaTia, coronisía mnyor dH ref/no de Por- '^o/. Em Roma, lí>40, foi. gr. de xn (iuamer.) -1-4:02 págs. Emboiii o título, csaoievô, seja em castelhano, o livro c em portu^mjg, com excopyào dii-s no- tas i&argiDais. Costama trazer anexas Notas doutros autores.

' Nobiliário de D. Pedro, trad. y ilustr. por M. de Fari i ?; So^isa, Hadrid. 164S, foi. de 725 págs.

P. M. H. I. Scriptores, 230-390. O estudo de Herculano intitula-sc ■Moí. tobre a origem provável dos lii^ros de linJiaf/cjis c data de 1853 Meni. da Aeal âas Se- i, 35-47 ; nos P. M. H, I, Scriptores, liVò e no vol. da ed. mo- rena Compoêiçõeê várias, 245.

* 8dbre os seos erros J. Pedro Ribeiro, Ohsen-. dipl. 83-84:; « IHitert, Crón,^ n, 210: modernamente Viterbo, etc. [Ofr. Inoc. Dic, Ã'M. m, 122J.

40 HI8TÓBIA DA LITSHATUBA POBTUOdàSA

NOVELAS

26. Novelas de Cavalaria. Na efervescêQCÍa à& vida lite- ráríai que esboçámos a largos traços, as novelas brevemente toma- ram o seu logar. O espirito geral do maravilhoso domina essas •omposiç(5es tam curiosas, tam ch^^ias de graciosas lendas que se denominam novelas ou romances de Cavalaria, O assunto delas gira mo tríplice ciclo indicado por Jean Bodel, poeta do século xiii; noi dois versos

« Ne sont que trois materes a nul home entendant, « De Franee, de Bretagnc et de Rome la grant. »

Podemos, pois, distinguir três matérias ou eidos, isto é, três grupos de novelas ligados entre si pelo seu objecto e natureza ciclo francês ou das lendas épicas, das gestas, o bretão ou dos ro- mances corteses, e o antigo ou clássico,

27. Ciclo CaroiíngiO. A matéria de França forma o ciclo tarolingio ou de Carlos Mtgno e seus companheiros de armas e canta as proezas por eles praticadas nas lutas de Espanha e Itália con- tra os SaxSes. Foi a estes poemas, que se deu o nome de Canções de Gestas, ^ que até pouco se supôs filiarem-se nas Cantilenas contem- porâneas dos próprios eventos, que celebravam. Esta poesia, desen- volvida sob 08 Merovíngios, maior brilho teve na época de Carlos Magno. Dessas cantilenas, que se perderam, derivaram as primeiras gestas que circularam na Europa a Chanson de Eoland, a mais notável de todas, a de Gerard de Eoussillon, a de Ogier, a de Haoid de Camhraij a de Aliscans e muitisssimas mais.

Estudos recentes levaram, porém, á convicçSLo de que cada lenda carolingia está intimamente ligada a um mosteiro, a uma peregri- nação* As canç5es de gestas longe de terem alta antiguidade nasce- ram no séc. XII. Não foi a imaginaçSlo popular que as criou. Foram monges ou clérigos que, para atraírem o povo a certas igrejas ou abadiaH, forneceram o núcleo, em volta do qual giram os poemas, aos troveiros e jograis, que iam ás festas ou andavam de castelo em cas- telo c ai as cantavam ao acompanhamento da cítola, espécie de gui- tarra parecida com a viola de arco *.

^ Oa poemas históricos, áíd gtsta, lat., «feitos, acções», mas história eutremeiada, qaando não enfocada, peia lenda.

2 J. Bédier, Ltê Itgtndtê épiqueê. Paris, 1908-13, 4 vols.

CAPITULO X S8C0LÁ DOB TR0TAD0RB8 4t

A arte desta poesia é radimentAr, como simples é a sua verei- ScaçSo, primeiro assonantada, mais tarde rimaria.

Desde a seganda metade do séc. XII e principalmente nos sécs. XIV e XV a grandeza épica é substitaida pela prosa nascendo ent^o as novelas de cavalaria, que foram impressas no séc. XV. Como dÍB8<^mos aeima, a mais afamada das canções de gestas é a Clianson de Roland wbre a derrota dos franceses na g^arganta dos Pirineos em 778. Hoave até quem a comparasse á Ilíada mas, embora monumento de imaginaçSo yigorosa e onde se encontra a alma duma época e dum po7o é, todavia, de arte insuficiente ^.

O caracter dt^ste ciclo é o entusiasmo gaerr^iro e a bravura militar. um episórlio de amor, brevissimo embora chf*io de ternura ~ o da formosa Aude^ que cái morta aos pés de Carlos Mngno ao saber da.morte de Rolando. O heroismo é a pnncipal virtude que se celebra. Rolando, morrendo em Ronces vales, farto de pelejar, exangue e desfalecido, vivo ele no campo de batalha coberto dos cadáveres de mil franceses, derrotados pelos quatrocentos mil sarra- ceooB, é o protótipo da valentia, o tipo inexcedivel do cavaleiro medieval, a encarnação da pátria, da honra e do dever *.

E' também o mais divulgado na velha literatura peninsular, o <}ne n2o admira por se tratar precisamente de Espanha e ter como herói principal o grande Imperador, desde tempcs imemoriais enla- çado com a lenda de S. Tiago de Compost^*la, que tam notável papel devia desempenhar na divulgação da arte, da poesia, da lenda, da fclqu<'-lore, etc. Foram os romeiros que de todos oh pnnto» de França, Itália, povos do Norte, etc, se dirigiam ao celebérrirao pantiiário os ípe «e tomaram os pregoeiros das façanhas d^í Carlos Maj^no e dos 9en» Doze Pares. Entre os devotos jacobitas é que deveria ter nascido s famosa Crónica de Turpín^ que ainda que escrita em latim se tor- Mtt o núcleo de numerosas lendas por toda a part»; divulí2:ada8.

A influência deste ciclo na literatura do nosso país foi grande, en?ontríindo se numerosas alutoís aos seus htíróis e aos feitos l«ndá- no« que praticaram* O verso alexandrino francês aparece era alguns romances populares portuguêaes; a sanfonha, instrumento músico, a que eram acompanhadas as gestas, ainda se encontra entre o povo.

^ Conhecida também pelo nome de Roman de líonceraf e Eoman de Ro- 'ViA tt (jlivitr. E' snónima. O maÍ3 antigo toxto remonta á ncgunda m<»t;ide do •*^oxi. Foi descoberto em Oxford e pela primeira vez pul)licado em l^^.ST. Cfr. -L^íÃin^oTi de, Holand ou de Jioncevaux du xii ® silde puMuift pour la premihrm /•«• «I françaiã d'àpr>^ le Ms. de la Bxbl. de Oxford par F. Michtl, Paris, J^^eaed. de Petit de Julleville, Paris. Lemerrc, 1878, entie as muitas edt, »j<i. Brnnetière, Kt. erUiqws, 1.®

' Vid. Gaston Pari», Esquisse historique de la littcraturc française au ^'i«» àge, Parig, 1907, pág. 71.

42 HISTÓRIA DA LITEBATUSA POUTUGUfiSA

Nomes próprios como Alda derivada de Aude, a amante de Rirland (Roldão), Valdevinos ou Baldovinoa, de Baudouia ou^Baldouin, qae até se tornou nome apelativo como sinóaimo de vadio, vagabundo^ Roldão que teve a mesma sorte homem valentão y destemido j e os de Ferrabrás, Olive'*ros^ Turjnn, Gaiferos, Montesinos^ ach<im-8e em documentos antigos e vulgarizados em cantares populares, alí^uns doa quais amda hoje subsisttjm. E' na Chanson de lioland que fOram ins- pirados os cantares populares relativos á derrota de Rmeesvale^i á perda do almirante Gu trinos, ao desaparecimento de D. Bâltrao, á morte de D. Alda. de que subsistira vestígios, dê-jte último até numa comédia de Gil Vicpnt« *, entrando outros na literatura de cordel^ como o drt Vaidtívinos, em folheto de que é autor o cego B iltasar Dias Tragédia do Marques de Mantua e do Imperador Carloto (sic) Magno, a qual trata como o Marquês de Mantuq, andando perdido em cacada, achou a Valdevinos, ferido de morte ; e da justiça que por sua morte foi feita a D, Carloio, filho do Impera- dor. A história do Marquês de Alantua ditundiu-se tanto na IVnín- sulfi, que ( /ervantt^s escreveu que ela era c< sabida de los niíl is, no ignorada de los mociis, celebra ia y aú'i creida de los viejos y, con todo esto, más vtT Ind^^ra que los milagros Mahoina» *. G-trrett interraloii-4 no Romanceiro '. Um do-^ romanct^s populares m^is co- nhecidos e mais cantados em PortUjLrfil é o doutra personagem do ciclo carolíngio o do Conde Claros de Montnlban e dos seus amores com a Infanta Claritnini, íilha do Imperador.

Enfim, a imaginação popular até criou uma singular perso- nagem — Duran iartí^, a Durindana temerosa de Ariosto e B)iardo, personificação da espada de Rollào, o invencível! *.

A iníluoaciâ do ciclo carolíngio f m Portugal evidencia-ae ainda pela p('pularid-»drt que entre nó^ teve a História de Carlos Magno e dos doze Pares de França, conhecida desde os princípios do sé- culo XVI í^m ndiço s cast -Ih miiiH, e em traduções portuguesas desde 1728, ano em que o médico Jerónimo Moreira de Carvalho (f antes de 174 i) publicou a primeira que apareceu ^.

^ Xa Uaheva. Cfr. a minha ed. daa (fbras d^ Gil Vicente, Coimbra, 1912, vol. II, pn^. 3.'>.

'^ Qmjotc, 1." p., cap. v.

3 II, 120, ed. VML

* Vid. D. Carolina MicliaiMis FMndos sôhrc o romanceiro pcnin^nlar, romances vr/fios cm Portnfjnl^ Madrid, VMK 1 vol.

'• História do Impprddur CarloA Mnauo e dos Doze Pares de França^ trad. de QtsteJJtano em /'ortffrfuês. Litiboa, 1728; ^ptjtuida Parte. Ibid. , 1737. Ambas, ibid., 1700, 1784, 1814, 1804. Terceira parte em (pre se descrevem as gloriosas accòes e rictorias de Bernardo dei Qtrpio liclo P.^' Alexandre Caetano iiomcs, ibid. 1750. lia várias ods. das três Partes.

CAPZTITIiO 1 BSOOLA DOB TSOTADOBBi 43

28* Ciclo Bretão. A mcUéria de Bretanha forma o eido 4I0B poemas que teera por assanto as façanhas épicas de Artus oa Artur, úliimo rei dos Bretões. Este é o herói das guerras contra os anglo-saxoesy e viveu no século vi, segundo a lenda, contada primeiro DQma crónica latina do séc. IX atribuída a Nénnio, depoid na de Gaufrey de Monmouth do eéc. xii. Fora conquistador invencivel| tendo expulsado os saxões de Inglaterra e levado as suas vitórias até Roma. Depois de inumeráveis conquistas, atraiçoado por sua esposa Guenievra e por seu sobrmho Mordred, a este usurpador e traidor uma terrivel batalha, em que o mata e ele fica fendo. As fadas levam-no então numa barca misteriosa para a ilha Av^lon, «pais de eterna mocidades, donde voltará um dia para libertar os Bretões. Como no ciclo anterior um pequeno número de factoe» reais desaparece sob a poesia das lendas, que os transfiguram. Estas lendait, fruto de pura f/intasi^, sam :

a) a da Távola Eedonday assembléa de doze pare?, todt s entre eguÚM, correspondentes aos doze pai es de Carlos Magno, que se assentavam snm distinção em volta duma mesa redonda, i^to c ntra o nao geral da idade-média, que admitia as mesas rectangulares, em que os lugares eram ocupados segundo a hierarquia dos convivas. Fora Artus quem estabelecera esta ordem da Távula Redonda na soa cidade de Cnêrleon. Da sua corte partem vários cavaleiros, como Percrtval, Lancelot du L»ic, Gouvain e outros em procura do Santa Grani, operando em toda a parte prodígios, atravessando flore.ntas em qu*5 a fada Viviana conserva prisioneiro o encantador Merlin, o que origina um grande número de lendas e de romances.

Tais romances tiver»m em Portugal jrrande vogi. D. Denís cit?i no st-ii Cancioneiro a Tristão e Iseu tendo ant»ís alwgadj tlores e Brancajlor a que antes dele, por 1245 havia aladido também o trovador Joam de Quilhada como modelos de constâucia

. . . e o mui namorado Triêtav, sei hen que non amou Iseu quanto eu vos amo, esto certo sei eu ^

Um escrivão da puridade do mesmo monarca Est>^vam da ^Jiarda lembra factos da vida de Merlin e do nrand brado que deu:

. . . convém (Tatender a tal morte da quil morreu Merlin ku dará vozes fazendo ssa fut *

^ Cnnc. Vatic. 115. Ed. Lang, xxxvi. * Canc, Vaiic, 130.

44 mmáaiA da uriBATumA PORTcrouÉsA

Fern&o LopeB escreve « hoje mais nUlo cumpre que se leiam as proeeas de TristSo e de Lançarote», o quo bem indica a vulQ^arizaçSo dessas personagens da Távola Redonda. ' No Livro de Linhagens h4 no tit. 2.^f em que se encontram condensados materiais tirados da HisL Britonum, vários contas bretónicos, como o do Rei Lear.

No tempo de D. João l tradnz-se a História doa cavaleiros da Mesa Redonda e da demanda do Santo Graal, I). Duarte t^m na ma livraria os principais p>»émas deste ciclo, como Merlin e Tristão^ D. Nuno Alvares Pereira imita a virgindade dn Galaaz. cavai di- ros portugueses equipa ram-se aoH heróis do ciclo adoptanda os nomes de Artus, LaTiçarote, Tristão, Per cevai, Lisuarte, etc. Mas é tudo,, ■am nomes, afinal, pois to«.io8 os livros se perderam. Nem um dos que formavam a biblif^téca de D. Duarte chegou até híh.

b) A lenda do Santo Graal. O graal era a taçi mit^teriosa pDr onde Jesus Cristo bebera na última ctia e na qunl J<)bé <i^ Arimutia recolhera o sangue derramado na cruz. Dizia a I^nda que (Ste vaso iôra guardado numa florehta de Nortumberland para cscipar ás pro- fanações dos saxões, esperando o momento era que cavale ro-t eleitos de Deos o^descobrissem, d^^pois de terem ob»'ario í^raudes hútin de armas. O mais fecundo dos poetas que em França explí^raram du- rante o séc. xri a matéria de Bretanha foi Cristiano de Tioyes que deixou o Tristan e Erec, hoje perdido, (Jlítjes e quatro romnncfls arturiano»» Erec et Enide, Chevalier au Líon ou. Yvain, Cheva- lier de la charrete, e Per cevai.

Mas o desenvolvimento completo da lenda e o 8"u sentido místico foram dados mais tarde, no néc. xiv, [)(»r Roberto de lj'»ron na trilogia Joseph de Ariviatia, onde narra a (ui^tMii, c .nsajíraçao e prodigiosas virtudes da Santa Relíquia; Merlin, onde converte em verdadeiro profeta este filho do diabo e o ftz anunriar maravúlhas futuras e Perceval, que apresenta incansável na pmcura e C(>n«|Uisita do graal. Este foi o ponto de partida para ouiraa nirrativan.

Dehta fas** das novelas bretónicas tudo quanio níís n^sta ciíra-se: 1) num Livro de Joseph ab Arimatia, MhS. cópia dinn iice datado de l.;07 a 1313, vÍ8to em Liaboa nn» meados do leéc. xíx e depois desaparecido; 2) numa História de Vtsjxisíano inipr. eru 149t> narrando a cura maravilhosa deate Imperador, ft-ita p- Ia V rónica^ a destruiçSo de Jerusalém, a converbão de Vespasiano e Tito e o- castigo de Pilatos, tida em tam alto conceito i.\\w. \). Jlanoel enviou ao Preste João das índias cem exemplares. * ò) K j)nri'i[»Mlnientei

1 Cr. D, João 7, P. 2.», C. 108.

' n Kfttoria do muy vohre Kwperador de. Roma». K iio fim: Fojf empre" mida a presevle estoria ^m a mui vohre e, seinpre l^nl cvhtde d*' J.i^boa por Va^ Itntino de Moravia... na era de Mil CCCCLXXXXV L Keiínpr. por F. M. Esteves Pereira, Lisboa, 1905.

OArítVLO 1 KBGOUL DOS TROTADOEM 45

na Hiiiória do Santo Graal incompleta, de que se conserva o Mas. na Bibl. de Viena de Aastría e que pode remontar á primeira me- tade do Béc. XIV. ^

Caracteriza-se o ciclo bretão pela doçura e graça das composi- ções. £' mais lífiooy mais sentimental e subjectivo que o ant«3rior; o amor domina nos seus poemas, o tipo rude do herói das gehtaa desaparece para dar logar ao tipo do herói cortes, que faz tudo pela raa dama, correndo por ela todan as aventuras. O cie Lo framrôs é mais violento, êdte mais delicado. Predomina aqui um duplo miãttcísmo, o caviíleirt^i^co e o religioso. O ciclo f rance* deriva do espírito dos p:ernianop, o bretão do dos citas. O maravilhoso discreto e religioso das (Janções de gest** é Ribstituidp por um maravilhoso /eeV/co e má- gico, qu« domina tudo. Foram cantores ambulantes que p^4^. Bret-inha executavam na harpa « Laísi^t isto c, curtos trechos de música acom- panhados de cantos, qun nâo podemos dizer hoje com rigor senara paramente líricos ou narrativos, nem mesmo se eram em bretão, oa em írancês. Os lais referiaui-se a aventuras de amor ou a contos feéricos, cujos heróis pertenciam á tradição clánsic^i; os que 08 executavam juntavam-lhes um comentário oral era que a aventura era cr>ntada *. Kram geralmente em versos de oito f^il iba-^. Do celta lôram traduzidos para francê-i e daí se espalharam para diversos países. Rent^tm vinte, dos quais quinze, pelo uienos, eam devidon a uma mulher, Maria de Fran^, que ha vendo- we esíabele<idt> em iDsrlatfrra aprendeu o bretão, ou pi'lo ni**noa, o insflôd e descreveu e^Us fábulas de av«-nturas e de amor com falias, m>rHvilhas, trans- torma^Ôef, etc., sendo a mais notável a da MadreSIlva, que trata dos amores de Tristílo e Iseu ^.

29. 6iClO GreCO-LatinO. ^ Rome la (jrante)) forma o ciclo greco-ltttino, que verea si bre as personagens e íactos da história an- Uira, revefctidos dos costumes, crenç is, e opinio*s da idade- média. Tróia era um castelo ^ os lilhos de Príamo boons cavaleiros j Helena

1 Apontada aos bil h'op^. desde 1838 por Varnha^(;n no Cancioncirinho, «t., 165 e h^\ e Livros de Oiral., 19. O Mss. tom l'.>9 iU. estando i-iiprs. 77. tíV. História dos Cavaleiros da. Mesa Jíedonda e da Jjctmtuda do Sari la ^jraaí.., zum erslen maie reruj^entlicht vou Karl loii h'cAn'li(irdpt.of.lHcr, 1." ^ftl. (U-2 piíg.) IVrlim, 1KS7. Na Kcn. Lm. vi, ."{^i-oJG foram pul.l. \n-\o I)r. ^. Kh'b Dois episódios tned. da Demanda do Saído Graal: As tr« d maraviiliaii fU florcéta de Corberic (ti. 183 V.-185 v.; e A morte do rei Artiiur (íl. rj*J Í.-196 V.)

* Gaston Paris, Ksqu%S9e hisior. de la Litt. fr^mcaifie au nioyon age, <it, 76. O elo desta poesia na velha lírica p(>rtii<:uê8a foi eatiidado por D. Ca- rolioa Mii'hac'lís em Lais de Bretanha, l'ôrto, 1*. UU.

' Ed. de Karl Warncke na Jiihi Nonnavnica de Suchier, vol. m, com notas de Reinhold Kehler, Halie, Niemeyer, 1885.

46 HISTÓaiA BA LXT£BATUSA PORTCTQ0Ê6A

uma fremosa donay Eneas um ricomem. demais heróis da história clássica Alexandre, César, Heitor, revivem assim completamente trans- figurados.

Nas coplas do menestrel da idade-mériia, escreve Garrett, os donairosos sonhos da mitologia, assim como os severos sonhos da crença, tomavam sempre os hábitos sociais do seu tempo. Júpiter era Dom Júpiter, rei de coroa na cabeça e barbas até á cinta, rodeado de condes e de pagens, servido de nobres donzelas de ehpartilho e toucas altas: San Miguel e o próprio Lúeift^r dois cavaleiros de lança em punho e escudo embraçado, justando em mui leal batalha nessas nuvens, cora Legiões e Potestades por mantenedores do campo; o Olimpo era una cast^^lo feudal e o Céo uma roca- forte. Em suma, sem prin êsas e cavuleiron nào havia poesia para êlt*s, nem a podia haver, porque eô?»a era a vida que eles conheciam, o belo a sublime da vida que concebiam *. Os três romances representativos deste ciclo »'*ni o Roman de Théòcs de 10.230 versog octossilábieos : o Roman de Troie de cerca de 30.000 e o Roman d' Eneas de 10.156, podendo HSr»inar-se somente ao sei^undo dest-s longos poemas o autor Benoir de Sainte- More *. Thdbas considera-se o mais antigo podendo remontar a llòO ou 115.>, mas o mais importante nào pela sua extensilo, como pelo assunto e fama qu^í obteve é o de IVoiaj de que 27 Ms-, i\'ía Bi- bliotecas e Arquivos da Europa. Os compiladoros de Hlstjrías Troia- nas ou Romanas j da 1.* metade do séc. xv, beberam os seus eIl^inos nào em Homero, que ignoravam, mas neste romance quer na sua forma primitiva, quer na nua redacçilo em pro^*a. Entre os nniHnKíes históricos ou pseudo históricos nomeemos o aftiiiado Jiomance de Ale- xandre dtí 20,000 versos dodecassíUbos escrito no t<éc. Xii por Lam> bert le Tort, ou de Tours e Alexandra-, de liernay ou de Pari>*, de quem veio o nume de alexandrinos (12 f^íl.) dado a esta espóoie de versos.

\'ê-8e bem a influência deste ciclo em Portugal nas lendas ligadas á nossa história, por exemplo, na da fiiníiaçAo de Lisboa por Ulisses.

Na poesia popular também deixou vestígios, embora nào tam numerostis como o ciclo carolíngio. O conto Hero e Leandro j o cerco de Tróia, as crueldades de Nero hjram mais ou menos longamente memora<las, havendo tHmbôm alusões a Dido e Enens, Aquiles e Polixena, Páris e Htlena, Orfeo e Euridice ^.

^ A. Garrett, tlomançeiro e Cancioneiro (Jeral, t. 1.°, pág. 1-li, na ed. de Lialxia, ISLJ.

^ I.e roman de Troie.,, jmhlic iVapfi!^ ioui* les Mus. conwi-í* par Le.opold Covstans, Paris, 6 voU. l\h)i 1912. Para a demais bibliogr. Petit d»í Julievílie, fíist, de la langue et de la Litt. fr., i, ITo 'Ihl.

3 D. Carolina Miehaelia, Estudos sobre o Romanceiro, cit., pág. 154.

CAPÍTULO I BSCOLA DOS TROVADORES 47

30. Ciclo dos Amadises. Além destes ciclos elevemos enamerar o dos Amadises, que, originário das gestas bretónicas, foi o que maior vulgarização teve nas literaturas novi-latinas ^. Qaem íoi o criador dest** novo tipo de seres lendáriop, que tam s^rand^ sim- patia adquiria na Europa cultv4 de então ? qual a sua pátria ? Em que língua foi escrito o primeiro Amadis? cm português? em cast^ílhano? cm francês? Difícil e discutidissimo problema até hoje sem solução cabal. Os textos nSo nos autorizam a uma afirmativa categórica, es- creve Uenéndez y Pclayo, mas a tradição portuguesa é antiga e tem em seu abono poderosas razSf^s. Todas estas ef -activam eu te militim em f*vor nâo, como se dizia até liá pouco, do trovador portiiguo-i Vasco de Lobeira, n»tural do Porto, conttímporaneo dei- rei D. Afonso iv, armado cavaleiro por D. João l antes de começar a batrtlhk de Alju- barrota, mas de João Loheira, trovador de quem temos poesias com- posta» entre 12õ8 a 1286.

O facto de se ter perdido o original poituguêrf de que, des- graçadamente, nem uma cópia se conhece, deu origem a tantas dÍ8»*U8fe0dS como as que h òaíq prooósitj «e levantaram ^, snst-^nt^ndo vário;* autores, des 1e Gayi«ní?08 ', que no princípio da sei^^unda metade do sé<íulo XIV, por 1H59, se liam e estavam vul,rariza ^os em Castela os três primeiros livros do Amadis, citados por P^^dro Ferras, um dos mais an»i^08 poetas do Ciuí. de Bi*^ni, pois compor versos morte de Enrique ii, que su^ed u em \iM\) e polo chanceler López de Ayala no Rimado de Palácio em versos anterior, s a 1385 e que portanto a redacçrio primitiva f )i cabt»*lhana, sendo devida a G/ircia Ordón^z de Mont Jvo, io^ualmente autor do 4.^ hvrn, como se decUra desde ai.* ed. conhecida de 1008 *. Seni podermos opor a eatas pretensões um argumento decisivo como seria o do t -xto portu-

^ A série deites romaneen principia nos do noine de A7nadi.9f>9, e con- tinua no.-í de Srrgrts d^. K.^pimdian, íiorisimirte de. Hirrania^ dnlanz^ Flores- tam, o Palmeirim de Oliva e o aPainado eatr(í os da s^tíc o Piilmeirun de Inqhferray de que adeante nos ocnpaino;, etc. A. Ilercnlauo^ Panorami^ t. iv,

l4 7-8.

* Vid. Th. Braga, Oh, clt., píg. 103 c pofr. -. Inn. da Silva, Dicc, fíibl., vir, verb. « VascíO de Lnheira». BarhoHa Machado, IJdd. Ln>fit.. art. «Va.seo Lobeira» diz que o orirjiníd se cons^^rvava na livraria «lo- dnqiuM de Aveiro. O conde da Ericeira em 1726 cita, com referencia ao catáio^x'^ da luWlio- ttoi do Conie de Vimieiro, «um A. do G. em português». Ter-áo-ía perdido irremediavelmente no Terramoto de 1755?.

* Cf. Discurso preliminar no^ Libras de Cabal leria {l>^ri7), in Bibl. Rivadeneyra, voL 40. Recentemente defemicn a mesma opinião o |)r. (lr»(ttVi('il Baist, prof. em Freibnrg, cujai opiniões e sua refutação podem ler- se em I). Ca- rolina Michaêlis, Canc. da Ajuda, n, r)14 e seg.

* Na ed de Roma, 151*> ciiama-ííe ao corrector do-» .'J pi-imciro^ livros antor do ^.** Garcia Ord('>Mez de Monlalvo. Mas nas Ser£:^as dt' F.splandian, fioma, 1525, é Garcia Gutierrez de Montai Ijo. Eis mais um })rol)lema. . .

4B H48TÓBIA DA LlTBftATUBA PORTUGUESA

gaê9, todavia poderoBas conjectnras induzem a crer que a redacçfto primitivH debt^í romance foi obra do referido trovador portnguêR JoSa de Líibt^ira, cabendo-nos por i^ao a glória da prioridade da redacçSo em proBa do primeiro tipo da fan)ilia don Amadisee. Basta para o confirmar:

a) A análise do próprio romance, no qual Be diz que um in- fante 1). Af»)ríSO de Portugal indicou ao autor que modificasse o rí- g.)r com que tratava a heroína iiriolaoja. E«te itíf inte nSo podia ser outro ô*nào o que depoi-* foi r»*i D. Afonso iv, após o falt cimento de 1). l)<"rn's Seu pai, em 1í)25.

b) Esta atnl)u víi » ó tanibom feita em 14Õ4 por Gom^s Ektnea de Z'para na su i C'>'óníca do Conde D. Pedro de Meneses, qu^ t*r- min n»t mente i^8cn-v»* : «... livro (no sinc^ulur, note-ne) do Ama^ dis frifo a pruzer de um Jiomem que se chamava Vasco Lobeira, em tem/h) dei -vai /), Fernando^ sendo todalas cousas do dito livro jin^ (fidas do Autor)) \

c) (J in Mmo 8(3 contirmi pelo testemunho di Hlho do poeta dr. Aníó lio KtMT-ira, em 1 JUS, quan^lo se r;.'ffire a dois sonetos, o primtiio oos quait* principia:

Bom Vasco de Lobeira, de gran sen, 2 Drpran ■' que i'ós /lavedcs lh'm contido O Jeito d'Amtidys, o namonido Sem qnc^Ujr endc por contar hi ren

e q'io < !'*, oínhora en '>'i.»iiv nt'\ at'-.hii a a í^en ])ai, mas onde diz : (( l\>\. s Hdis Hnn tfts ív7s Tn»u j».te na Iuipi;ii4''-Tn que se costumava nest»* II' vno en f- mpo d'4 R y ! ). l)'!ií>» <ju»» h^ a me-^m i em que foi c'M)i'M>-ri a If». '<*>'> rift de y\n)ad>s de (Uvda por Vasco de J^heira^ natural da cidade do J*or*()^ ^'V^ ori<jiiud anda na casa de Aveiro lí» d \.) ( \ir.('. (-'1. I> . hi oris Ir.íLcni -ntos duma cançilo (n.°"* 1' >n -j:',:^) p .ii ; -u •>:». ,ii*.) »'sfrif)ilfi.) 6 ex ictamente o mesmo doutra raii';.oJ iiiM.iia uo Amndis [l, L\" c. li).

J,r>>vnyrtri

fni roffftd

bfii /^ohrr. toda fror

'ift ro'" fa

itfní m^ meta

eu tal coita vosno amor! *

' \À\'. I, (MM. T).'). ]).'.:: 4.^2.

2 Sen, s»*tiíi(lo, y iz'). D) ! it. sensii. Sen A n|i<u'.)|)f> de seno, como don do(l(»i)o, í» son d'' sono K senn\) v a<s:ii,il.ii';V> d*' senso.

I)»' pran -- tV uusunrMitf. (•«■il.imíMití». I )() l.-vt. /;/í2Wé' = clnn on pran,

* \'id«* adraiit»', n;i Aftol.tji i ;i fancàn (M>u)i»l«'t.i eomo a iiitcrpretoa D. CarnliiKi M i.'li.ii'li-^ O l 'is </ 'l''t/>-~j> •rf"ff'i''-'^ «/ oní/Djcln^ úv roscfi» r as orÍ(/t\n9 dou.-'. «/•/"■», Viana do t a?-!»-!'», l'.'•^). ir. \\:\\A se iiào paitis-^t' do precon- ceito <i;i iiDHda suposta falta tle íirigmalidade iiài) explicaria como tardia inter-

OjIPÍTULO I BSCOLÁ DOS TR0TAD0BB8 4A

Ora estes versos sain provavelmente dos fins do séo. xiii ou, IDánmo, dos princípios do XIV, porque nenhuma poesia tem menos aotigoidadei donde se dedus que ao tempo de 1). Dí^nís, a cuja corte pertencia o trovador João Lobeira, existia em portuguê-j um Amfí- di$ em prosa e com trei-hos líricos intercalados, como se costumava £i2er nas novelas bretónicas. Joào Lo beira íi^ura na corte entre 1253 a 1285. Ele devia ser, poiB, senão o autor, p»'lo menos, o refundidor do romance, a que D* Afonso iv impôs a celebrada emenda.

Pouco importa a incerteza que reina acerca da vida do trova- dor portn^ês. Efectivamente Dunrte Nunes de Li^n ', Baib^sa* e A, Herculano snp3em-no contemporâneo de D. João i, e Gomes Eanes de Zurara^ de D. Fernando. F^ria e Sousa, ten^o-o in * içado primeiro como desta época **, e8cr**ve d<'poi8 ser opinião dalguns ser êle do tempo de D. Afonso iv^ embora st^ a<-he o seu nome em tempo de D. João l, mas, acrescenta judiciosamente : a . . . é verdade que podiam ser dois deste nome '». Á identidade do apelido explica a ooniusão entre Vasco e João Lob» ira e ain ia com um tnl Pe<iro Lo- beira, de quem &la Jorge Cardoso no Agíologlo. Como acabamos de Têr as razoes apresentadas ajustam perlei tamente ao trovador João Lobeira ^.

O romance Amadis exerceu uma influência extraordinária so- bre toda a literatura da Europa, s^^ndo traduzido para espanhol, fran- cês, italiano, alemão, holandês, inglê.s e hebreu ^.

Ao fim de um século contavam -se já, pelo menos, doze Ama- dises ^.

polaçSo o aparecimento da cançoneta no Amadis, Cfr. Griíudrias de Grober, ii b, 416-438 441.

» Crónica del-Rey D. João /, 195 (ed. 1G42).

* Bibl. Lus, art. fit.

3 Estudo sobre Novellas de cavai, portug. no Panorama de 1838, págs. 123, 139 e no de 1840, pág. 6, ou nos Opúsculos, ix, 87-114.

* Crónica do conde D. Pedro, t. i, c. 63, pág. 422.

* Europa, m, p. iv, c. viii, pág. 360.

* íd,, ibid., pág. 373 a El primer libro de cavalarias que se escrivió en Europa fuá el Amadis ; e su autor Vasco de Lobeira, que a'gunos dizen fuá en tiempo dei Rey D. Afonso IV si bien este autor se ha lia en tiempo dei Rey D, Juan T qtte es mucho despues. Pêro pudieron ser dos deste nombre»,

' Os does. publicados por Th. Pires nos Estudos HivenseSj VII, Vasco ée Lobeira (2.* ed., 1917) referem-se como vivendo em Klvas a um X^iseo, a um JoSo, a um Pedro e a um José, todos do apelido de «Lobeirji», ina^ sam poste- riores todos á data a qnc é preciso atribnir o 1.^ Amadis.

s Em hebren trad, do livro i de que dois Mss. um no Britsh MoBsnm e ontro na Bibl. do Seminário Judaico de Brcslao. Th. Ikaj^a, Acad, das Sc. de Portuml K' s. il, 2.» p. e iii, Coimbra, 1915-16.

* Eugène Bsret, De l' Amadis de Gaule et de son influence sur les moeurg it la literatura aa XIV et au XVII siécle (1873) ; a curiosa monografia de Var-

50 HIBTÓRIA DA LITRRáTUR^ PORTUOUÊflA

E donde proveio o Amadis ? E' original no todo ou em parte ? Tem fontes conhecidas na literatura geral da idade-média e parti* cularmente na francesa? Questão não m^^nos debatida que a da auto<> ria. Baret julga-o uma refundiçSo de livros bretões, como o provam 08 nomes de logares e os de pessoas ^.

O mesmo demonstra a fabulnçao sendo a imitaçSto patente desde os primeiros capítulos, pondo mesmo de p^rtri as alusões di« rectas a Tristão, Lançarote, S. *^ Graal do liv. 4.®, muito posterior aok três primeiros e obra Montai vo.

Para o Sr. Prof . T. Braga o Amadis passou por quatro fases agiológica, de cantilena anónima ou laid narrativo, de novela ci -lioa de gesta, e de novela em proso, que ó o estado atual, opinião insus- tentável em presença de tí)dos os elementos, quer hi-^tóricos, quer literários ^ E', porém, indubitável q le ainda muitos pontos obscu- ros a resolver sobre a questão do Amadis, cuja ori^rem portuguesa, entretanto, parece poder afirmar-se sem temeridade ^.

O assunto deste ciclo versa sobre os amores de Amadis, cava- leiro bretão, com Oriana, filha de Lisuarte, rei da Gran- Bretanha. ali proHi trios incríveis, combates com gigantes e. monstros, inter- veni^o »8 milagrosas, que constituem o tecido dos episódios, até que a fideli lade é recompensada e Amadis é feliz. Cervantes, ao classificar a obra como « el mejor de todos los lihros que de este género se han compuesto ^) j {D. Quixote i, c. 6). livrou-o do fogo e a posteridade conlirmou a sua sentença: Amadis é a única novela cava leiresca que merece ler- se.

nhagpiii Da Literatura dos livros de Cavalarias, Viena, 1872 ; Th. Braga, Hist. das Novelas portug. de Cavalleria, Porto, 1873. O assunto é largamente estudado no ponto de vista geral das novelas de cavalaria por Menéndez y Pelayo no seu iivro Origenes.

1 (j^anda de la Riega, El Amadis de Gaula, Madrid, lí)09, aproveita este argLiPuínto to|)onimico em favor do galego.

'- líist. da Lit. Portug., I Edade Media, lOoO. Como o autor partisse duma fra;^nl sugetítuo de Victor le Cierc que no Discurso sobre o estado das letras em França durante o séc. XIV (1862), lembrou que talvez do poema francês Amadas et Idoine pudessem colher-se alguns elementos sobre as origens do Amiidis peninsular Ãlciiéndez y Pelayo anota «T, Braga com o espirito aveuta- reiro tjue c( stuma coinprouieter e deíiliizir as suas melhores investigações...» Orig, de la novela ^ ob. cit.

9 Além dos trabalhos cit. podem cônsul tar- se : Gayangos «Discurso preliminar» nos Libros de Cabaleria, 1857, vol. 4.° da Bibl. Rivadeneyra; Amador de los Rios, Lit, Esp., V, 78-97 H. Thomás, Spanish and Portuguesa romances oj chivalry, Cambridge, 1920, pág. 41. E especialmente: Brauenfels, Kritischer Versuch uber den Amadis von Gallien, 1876. E' interessante sob o aspecto bibiiogr. Hugues Vaganay, Les romans de chevalerie italiens áHaspi- ration espagnole, Essai de bibiiogr, Amadis di Gaula, Firenz e, 1915,

i:'

CAPÍTULO 1 ESCOLA DOS :R0VAI>0BB8 51

DOCUMENTOS APÓCRIFOS

31.— As chamadas relíquias da poesia portuguesa.

Induimos debaixo da deBÍ^naçâo de apócrifos as chamadas relíquias da poesia portuguesa, a qae ge assinalou grande antiguidade, mas arbitrariamente. O exame critico delas conduz nos a rejeitnr essa saposta antiguidade e a marcar-lh^s o princípio do século XVU como a data da sua redacção ^ J. Pedro Ribeiro (f 1839) condí^nou em globo a genuinidade destes documentos fundando-se nas st^guintes razoes: 1) íalta de provas da sua antiguidade, sendo uman produzidas por LeitUo no meio duma novela ' em que até põe na boca das suas labui<i8as personagens um soneto de Camões; outros sam ref^^ridos por Brito * cuja é nenhuma; 2) porque as palavras que neles se empregam, todas de diversas idadt-s da nossa língua, formando um todo atfitado^ parecem ser maia obra de um artificio estudado; 3) porque as cartas de Egas Moniz Coelho, e a canção de Gonçalo HerroigJiez, tam vezinhos em tempo a outros documentos vulgares verdadeiros, contudo se distinguem tanto em barbaridade que até nisêo mostram a sua afectação *. S^^ra os seguintes esses documento»: l) CWào de -Gonçalo Hermiguez, o Troga-Mouros ; n) Poema da Cava ou da perda ou destruição da Espanha; iii) e iv) duas Cartas de Egas Moniz Coelho a sua dama (Violante); v) Trovas dos Fi- gueiredos.

I.— Ganção de Gonçalo Hermiguez. o Traga-Mouros.

Consta de três estuncias de cinco versos cada uma aludindo ao rapto que Gonçalo Hermiguez fez de sua mulher Ouroana aos mouros de Alcácer, caso narrado por Fr. Bernardo de Brito, (1569-1617) que noa esta canção, obra dum versejador de fé, «por se ver, diz ele, os mais antigos termos da lingua portuguesa » ^, e que ainda encontrou o sr. Th. Braga para lhe defender a autenticidade e a traduzir sem introduzir palavras novas, e simplesmente submetendo versos ás exigências da rima °.

* D. Carolina Michaélis, Geschichte der jyorttig. Litt,, cit., pág. l'3l. ' Mítcelanea,

^ Manar eh. Lusit, part. i.

* J. Pedro Ribeiro, Dissert, chrón. i, 181.

-' Chr, de Cister, part. i, liv. vr, cap. i, adeante transcrita na /l az ío^o^/a.

* Canc, Pop.^ 107. Pode vêr-se a lição de A. Ribeiro dos San toa no iomai das Amigos das Lettras, pág. 74-75. Garrett servindo-se da tr. alemã do Dr. Bellerman ooDie altên Liederbõcher, ete., pág. 5, fez a versão que se na Rev. Univ. Usbon,, v, 1846, pág. 417, inclaida nas Obras Completas, Lisboa, 1»4, voL XXI, 57.

52 HISTÓRIA DA LITBRATURA POBTUOUASA

n. Poema da Cava, também conhecido por da Perda da

Espanha. Tal como se deixa vêr pelo fragmento que resta, tratava da invasão sarracena e destruição da ERpanha pelos árabes em 714. Faria e Sousa *, seguido por Bouterwt-k e i^ismondi, fazia remontar este poema aos princípios do bócuIo ix- R'líbiro dos Santos fá-lo dos começos do séi-ulo xill *, Th. Br«ga julga-o dos fins do í-éeulo xv. Mas a mais simples análise iilológi(5a dempnHtra que qualquer opinião de a!ta antiguidade é de t<>do o ponto iasub<«isteute, sendo ainda J. Pedro Ribeiro quem tem razão em cousiderar um artificio ê»te poema, que L^^itao de Andrada * dizia ter tirado dum velho códice que nunca, afinal, ninguém logrou ver e examinar.

TTI e IV. Cartas de Egas Moniz Coelho. Atribuem-8«

estas duas cartas a Kgas Moniz (.\)elho, primo daquele Egas Moniz, aio de 1). Afonso Henriques, de quem o nosso épico disse que

a troco da palavra mal cumprida determina de dar a doce vida

uma delas escrita quando o poeta deixou a corte e vae para Coimbra, e a outra ao Itar e saber que havia sido perjura aquela que lhe prometera fidelidade eterna.

Podem vêr-se em Miguel Leitíio de Andrada *, Faria e Sousa ^ e Almeida Garrett '^'y que as puposeram do tempo de D. Afonso Hen- riqueB, dando est*^ último uma linda versão delas, por certo muito mais bela que o original.

V. Trova dos Figueiredos ou Canção do Figueiral.

Refere-se ao tributo das cem donzelas, que os cristãos eram obrigados a pagar aos mouros de Espanha, Fr. Bernardo de Brito foi quem primeiro a publicou ", atribuindo-a a um tal Guesto Ansur, que nunca existia. Miguel Leitão de Andrada diz tê-la ouvido cantar «muito

^ Europa, m, liv. iv, c. 9.

8 AUm. sobre as orig. da poesia portug. no t. -viji, daa Memorias de

Litt. da Acad. O texto vem no Jornal dos Amigos das Lettras, cit., págs. 136-137.

* Miscelânea, Lisboa, 1629. ^ Miscelânea^ diálogo xvi.

* Europa, lu, p. iv, c. xt.

^ Rev. Univ. Lisbon.^ vi, série v. púg. 100 e Obras completas, cit., 5». Veja-se também Ribeiro dos Santos no Jornal dos Amigos das Lettras, cit., «8-99.

'^ Monarch, Lusit. u, 296.

CAPÍTULO I B8MI.A 1K>B TKOTÁDtxaS &S

•entída a fauma ▼elha de maíta idade, natural do Algarve » ^. Ribeiro dos Santos * marca-lhe a época doB fins do século xii ou. princípios do XIII9 opiniSo inteiramente gratuita e que nada tem A*n que se es- tribe. Quando mnito poderia considerar-se do século xv, falando em seu favor o R^ntimento e ò ritmo dum cunho acentuadamente popular. A dúvida £Ôbre a autenticidade desse documento nSo pode, porém, estender-se aos outros denominados apócrifos em que a fraude é logo denanciada pelo estudo comparativo com os de .carácter absoluta- mente incontroverso *.

I Miscelânea, dial. i, págs. 25-26.

t Ob. e loc. cit.

s D. Carolina Miebaêlis, Gesch, der portug. Utter, p4g. 1 62. O dr. JoUo Ribetio dix que desta eançSo « se encontram alasôes até no folk-lore do Brasil ». SOída Clássica, Bio de JaDciro, 1905, xxit, nota.

' í,

ANTOLOGIA

SÉCULOS XU A XV

POESIA

Cantigas de amigo e de amor

I

Ai eu, coitada, como vivo en graa cuidado por meu amigo qoe ei alongado! muito me tarda o meu amigo na Guarda !

Ai eu, coitada, como vivo

en gran dese}o por meu amigo,

que tarda e non veio ! muito me tarda

o meu amigo na Guarda !

£l-ici I>. Stmcho i (?), Canc. B., n.* 348.

II

Como morreu quen nunca ben ouve da ren i que mais amou, e quen viu quanto receou d'ela, e foi morto por en * :

Ay mia senhor, assi moir'eu !

Como morreu quen foi amar quen lhe nunca quis ben fazer, e de quen lhe fez Deus veer de que foi morto con pesar :

Ay mia senhor, assi moir'eu !

Com'ome que ensandeceu, senhor, con gran pesar que viu, e non foi ledo nen dormiu depois, mia senhor, e morreu : Ay mia senhor, assi moir'eu 1

qaalqner coasa, ás vezes rem, aNidha ren* freqàente nos pro- vocais, LOiíf ncnhama, nada.

i Sftt pwa- Thtnde, inde =ein, dele, dela, disso. Por end\ por ende^poi isso.

*

êê AVTOLOOIA P0B8IÁ

Como morreu quen amou tal dona que lhe nunca fez ben, e quen a viu levar a quen a non valia» nen a vai : ^

>y mia senhor, asai mo)r'ea l.

Pai Soares de Taveiroos, Canc. »^ n.^ 35.

III

O meu amigo que me dizia que nunca mais migo viveria, par Deos, donas, aqui é !

Que muito m'el avia jurado que me non visse mais, a Deos grad«, par Deos, donas, aqui é I

O que jurava que me non Tisse, por non seer todo quant'el disse, par Deos, donas, aqui é I

Melhor o fezo ca o non disse ; par Deos, donas' aqui é !

Pai Soares de TdLYtítqos, Canc, Vatic, ii.<> 236.

IV

Disseron-mi ^ nas novas de que m' é mui gran bea chegou meu amigu', e, se el ali ven, a Santa Maria das Leiras irei, velida, * se 1 " ven meu amigo.

Disseron-mi Qas novas de que ei gran sabor chegou meu amigu', e, se el ali fôr, a Santa Maria das Leiras irei, velida, se i ven meu amigo.

Disseron-mi Qas novas de que ei gran prazer, chegou meu amigo, mais eu, polo veer, a Santa Maria das Leiras irei, velida, se i ven meu amigo.

Nunca con taes novas tan leda foi molher, . co«i' eu sOo com estas, e se el i véer, a Santa Maria das Leiras irei, velida, se 1 ven meu amigo.

Afoast Lopes de Baian, Canc, Vatic. tt.^ 342.

I Mi de mthi e ás vezes mh e m' antes de vogal, tornoa-se dtpoit ' Velida, adj.-belo, formoso, alegre. * Adv., aí. Por por-t isso. De tòt.

BÈOVLOê. Zn A XT '.JSJ

ky Deus! que coita * de soffrer

por avcr gran ben a querer

a quen non ousarei dizer ^

da mui gran coita 'n que m^ ten! Non lh'ouso dizer nulha ren da mui gran coita 'n que me tení

Ja sempr' en coita viverei.

Amo qual dona vus direi :

a quen dizer non ousarei

da mui gran coita 'n que me ten : Non lh'ouso dizer nulha ren da mui gran coita 'n que me ten !

Sc lhe d*al quiser' ementar '

sol non lh'én crecerá pesar.

Pêro non ih 'ousa rei falar

da mui gran eoita 'n que me ten: Non Ih 'ouso dizer nulha ren da mui gran coita *n que me ten !

Ains Coipancho, Canc. A,, n.® 66.

VI

Am'en tan muito mia senhor, que sol non me sei consclhar 1 £ ela non se quer nembrar * de min. . . e moiro-me d 'amor !

£ assi morrerei por quen

nen quer meu mal, nen quer meu ben !

£ quando Ih 'eu quero dizer O muito mal que mi-amor faz, sol non lhe pesa, nem lhe praz, nen quer en min mentes * meter.

£ assi morrerei por quen

nen quer meu mal, nem quer meu ben !

Que ventura que me Deos deu, qne me fez amar tal molher, que meu serviço non me quer! Ê moir*, e non me ten por seu !

£ assi morrerei por quen

nen quer meu mal, nen quer meu ben !

* Coíia, snbs. ícm., pena, dôr, queixa; donde coitado^ cheio de coita, de aa^nitiài

' £maUar, cnmentar, fazer menção.

' Sol, idr. de aso fieqàente, só. somente. Sol non, nem sequer.

^ Nembrar, lembrai-se, lecordar-se dalguêm ou daljfuma cousa.

^ Ment€9 idéa, mente. Não qnere p6r o pensamento em mim, recordar-se de mimu

Itt AWOLoaxÁ <-« poasrA

£ veede que cuita Mal,

que eu sempr' ei a servir

molher que mi-o non quer gracir, *

nem mi-o ten por ben, nem por mal ! E assi morrerei por quen nem quer meu mal, nem quer meu ben I

Nuno Fernindes Torneol, Canc, A,, n.^ 71.

VII

Quer' eu a Deos rogar de coraçon, com'ome que é cuitado d 'amor, que el me leixe veer mia senhor mui ced'; e se m'el non quizer' olfr, logo lh'eu querrei outra ren pedir :

que me non leixe mais eno ° mundo viver I

E se m'el á de fazer algum ben, orr-mi-á 'questo que lh*eu rogarei, e mostrar-mi á quanto ben no mundo* ei, E se mi-o el non quizer 'amostrar, logo lh'eu outra ren querrei rogar :

que me non leixe mais eno mundo viver I

E se m'el amostrar' a mia senhor,

que am' eu mais ca o meu coraçon,

vedes, *b que lhe rogarei enton :

que me seu ben, que m' é mui mester ; *

e rogá-lh'ei que, se o non fezer',

que me non leixe mais eno mundo viver !

E roga'-lh'ei, se me ben á fazer, que el me leixe viver en logar u a veja e lhe possa falar, por quanta coita me por ela deu ; se non, vedes que lhe rogarei eu :

que me non leixe mais eno mundo viver.

Nnno Fernandes Torneol, Canc. A., r.^ 75.

VIII

Oi oj' eu cantar d'amor Tornou sanhuda enton,

en un fremoso virgen ^, quando m'est' oíu dizer

•a fremosa pastor, e diss' : Ide-vos, varon f

que ao parecer seu quen vós foi aqui trajer

jamais nunca Ihi par vi, pêra m'irdes destorvar

e poren dixi-lh' assi : do díg* aqueste cantar,

«Senhor, por vosso vou eu ». que fez quen sei ben querer ?

^ Cuita, o mesmo que coita, queixa, mágoa.

* Graeir, do lat. pop. gratire, aj^radecer, ser grato,

* Eno, em no, i, é., em lo donde a atual forma no. De in (il) lum.

* Virgeu, vergel, jardim.

fAoiMS

A xr

M

«Pois que me mandades ir», <liii-Ih' eu, « senhor, ir-m' ei, nuis Ji vos ei-de servir sefflpr', e por voss' andarei ; a voss' amor me forçou i»i qne por vosso vou, cnjo sempr' eu Ja serei»

Dix'ela: «Non vos ten prol * c»e que dizedes, nen mi pcaz de o oír sol ;

ant' ei noj' e pesar en, ca meu coraçon non é, nen será, per bda íe, se non do que quero ben. »

«Nen o meu», dixi-lh' eu já» «senhor, non se partirá de vós, por cujo s'el ten »• «O meu», diss'ela, «será u foi sempi' e u está. e de vós non curo ren. »

D. Denis, apnd H. Lang Das Liederbuch, cit., pá|< 60.

IX

PregDntar-vos quero por Deus, xnhor fremosa, que vos fez mesurada * e de bom prez, > que pecados foron os meus que nunca tevestes por ben de nunca mi fazerdes ben.

Pêro sempre vos soub' amar dei aqnei dia que vos vi, mais que os meus olhos em mi,

e assi o quis Deus guisar * que nunca tevestes por t>en de nunca mi fazerdes ben.

Des que vos vi, sempr' o maior ben que vos podia querer, vos quiji a todo meu poder ; e pêro quis nostro senhor que nunca tevestes por ben de nunca mi fazerdes ben.

Mais. senhor, a vida eom ben se cobraria ben por ben.

D. Denfs, apnd Laag, lò/d., pá|. 44.

L^a pastor se queixava muit' estando noutro dia, e sigo medes ^ falava e drorava e dizia €00 amor que a forçava : par Deus, vi t'en grave dia, ai amor !

Ela s'estava queixando come molher con gran coita, c que a pesar, des quando nicera, non fora doita ; ^

D. Dcnís, apnd Lantf, t&tVf., pág. 28.

por en dezia chorando : tu non es se non mia coita, ai amor !

Coitas Ihi davan amores que non lh*eran se non morte ; e deitou-s' ant' Qas flores e disse com coita forte ; mal ti venha per u fores, ca non és se non mia morte, ai amor !

^ Prolt proreito, Tanta^oii.

* De fiKJtfro, medida, e fignradameâte, circanspecta, cortês, amáTcl.

* Nerecimeato, estima, valor.

* Dispdr, ordenar. Dt guisa, snbs. íem., maneira, sorte. Doutra guisa^ stm

^WM, em pvtaa, etc« E guiêodOy disposto, lesolTÍdo. ^ Medèê, pron. demons., mesmo, próprio. * Experimentado pela dOr.

«

ÀmSMMÊfU -^ POfeSlA

XI

Ua pastor bem talhada cuidava en seu amljsfo, e estava, ben vos digo, per quant' eu vi, mui coitada, e diss' : oi mais non é nada de fiar per namorado, nunca molher namorada, pois que mi-o meu á errado. *

Ua gran peça do dia

jouv'aU, que non falava,

e a vezes acordava

e a vezes esmorecia.

e diss' : « Ai Santa Maria!

que será de min agora ? »

£ o pa pagai dizia:

«Ben, per quanto eu sei, senhora».

Ela tragia na mSo

un papagai mui fremoso,

cantando mui saboroso,

ca entrava. p verSo,

e diss' : « Amigo louçSo

que faria per amores,

pois m'errastes tan cn v8o?»

£ caeu ' antr'Qas flores.

D. Denís, apnd I«ang, ibid,, 51-52.

XII

«Se me queres dar guarida» diss' a pastoc, «di verdade, papagai, por caridade, ca morte m' é esta vida». Diss' el : Senhor comprida ^ de ben, e non vos queixedes, ca o que vos á servida erged' olho e vee-lo-êdes.

Levantou-s' a velida, * alegre levantou-s* alva, ^"^ e vai lavar camisas eno alto. Vai-las lavar alva.

E vai lavar delgadas,, levantou-s' alva ; o vento Ih 'as levava eno alto. Vai-las lavar alva.

Levantou-s' a louçana, levantou-se' alva, e vai lavar delgadas ' eno alto. Vai-las lavar alva.

O vento lh'as desvia,, levantou-s' alva; metcu-se alva em ira eno alto Vai-las lavar alva.

E vai lavar camisas, levantou-s' alva ; o vento Ih 'as desvia eno alto. Vai-las lavar alva.

D. Denfs, apud Lang, ibid., fág. 76.

O vento lh'as levava,, levantou-s' alva; Hieteu-s' alva em sanha,, eno alto. Vai-las lavar alva.

1

3

s

4 5

C

Verbo iotrans., qyási sempre^ cngaBar, ser infiel.

Cair; no perf. caeu, pi. eaestes.

Completa, rica, perfeita. E adrerbialmente compridamenU,

Vide atrás Canção it.

Cedo, de manhã cedo.

Sobst. fcm. camisas.

•áOBliM XII A XT

61

XIII

Non chegou, madr', o meu amigo, e oj' est o prazo saido» Ai madre, moiro d'amor !

Non chegou, tnadr', o meu amado, e oj' est o prazo passado. Ai madre, moiro d 'amor !

E o|' est o prazo saldo, por qoe mentio o desmentido. Ai madre, moiro d 'a mor !

D. Denís, apad Lantf, ibid., 74.

£ oj' est o prazo passado, por que mentio o perjurado. Ai madre, moiro d 'amor !

'Por que mentio o desmentido

pesa-mi, pois per si é falido. ^

Ai madre, moiro d'amor !

Por que mentio o perjurado, pesa-mi, pois mentio a seu grado. Ai madre, moiro d'amor!

XIV

Ai flores, ai flores do verde pinho, se sabedes novas do meu amigo ! Ai Deus, e u é?

Ai flores, ai flores do verde ramo, se sabedes novas do meu amado ! Ai Deus, e u é ?

Se sabedes novas do meu amigo, aquel que mentiu do que pôs comigo! Ai Deus, e u é ?

Se sabedes novas do meu amado, aquel que mentiu do que mi á jurado ! Ai Deus, e u é ?

Vós me perguntades polo voss' amigo ? E eu ben vos digo que é san' e vivo. Ai Deus, e u é ?

Vós me preguntades polo voss' amado? E eu ben vos digo que é viv' e sano. Ai Deus, e u é ?

E eu ben vos digo que é san' e vivo, £ seerá vosc* ant' o prazo saldo. Ai Deus, e u é V

E eu ben vos digo que é viv' e sano, e será vosc' ant' o prazo passado. Ai Deus, e u é ?

D. Dcnís, apvd Lang, ibid,, 75-76.

^ Pui. de falir, faltar, ser infiel, perjaro.

m

àatOUXUA POBBtA

XV

Quer 'eu en maneira de proençal faser agora um cantar d'amor. e querrei muit' i loar mia senhor a que prez nem fremosura non fal, nen bondade ; e mais vos direi en : tanto a fez Deus comprida de bem, que mais que todas las do mundo vai.

Ca mia senfior quizo Deus fazer tal quando a fez, que a fez sabedor de todo bem e de mui gran valor, e com tod' esto é mui comunal ^ ali u deve ; er ' deu-lhi bon sen, ^ e desi non Ihi fez pouco de ben quando non quis que lh'outra foss'iguaI.

Ca em mia senhor nunca Deus pos mal,

mais pos i prez e beldad' e loor

e falar mui ben, e riir mtlhor

que outra molher ; desi é leal

muit', e por esto non sei o\' eu quem

possa compridamente no seu bem

falar, ca nom a, trá-lo seu bem, ai.

D. Denís, apnd Lang., 41.

XVI

Amad' e meu amigo.

Valha Deus ! Vendel-a frol do pinho e guisade d*andar.

Amigu' e meu amado,

Valha Deus ! Vede-la frol do ramo e guisade d'andar.

Vede-la frol do pinho,

Valha Deus ! Selad' o balosinho e guisade d'andar.

Vede-la frol do ramo,

Valha Deus f Selad' o bei cavalo, e guisade d'andar.

Selad' o baioslnho. Valha Deus ! Treide-vos, * ai amigo e guisade d'andar.

Selad' o bel cavalo.

Valha Deus I Treide-vos, ai amado, e guisade d 'and ar.

D. Denís, apud Lang., ibid., 77.

^ Comunal, afável, bondosa.

< Er-ar, oatra vez, ainda, mais, também. É partícula de reforço derivada se- gundo Cornu do re latino. J. J. Nunes, Comp. de Gr. Hiêt , 360.

^ Juízo, descrição. De sensum explicado.

* De tragere (por trahere). Ind. trago, trages; Perf. trouxe t trouve; Impr. treide. Treide-vos ou treides-yinát.

flác«n«M XII xf- '$Q

XVII

Nom me po8s'eu de morte defender poys vejo d'amor que me quer matar por húa dona ; mafs poys m'eu guardar non posso de por dona morrer catarej das donas a melhor^

D. Ptolio, Canc. Vatic,, n.^ 213.

XVUI

Dizia la fieroosinha: Com' estou d'amor ferida

ay deus» vai 1 aj deus, vai !

Com' estou d'amor ferida, lion ven o que ben queria,

aj deus, vai I ay deus, vai !

Dizia la ben talhada: Co'm estou d'amorco3rtada

aj deus, vai I ay deus, vai I

com' cston d 'amor coytada, non ven o que muit' amava

ay deus, vai ! ay deus, vai !

D. Afonso Sanchesr Canc. Vatic, n.^ 368.

XIX

Quando, amiga, meu amigo veer en quanto lh*eu preguntar hu tardou faláde vós nas donçe^as enton ; e no sembrant', amiga, que fezer veeremos ben se ten no coraçon a donzela por que sempre trobou

D. Afonso Sanches, ibid , n.^ 367.

XX

Proençaes soem mui ben trobar e dizen eles que é con amor, mais os que troban no tempo da flor e non en outro, sei eu ben que non an tan gran coita no seu coiaçon qual m*eu por mia senhor vejo levar.

Pêro que troban e saben loar

sas senhores o mais e o melhor

que eles poden, sõo sabedor

aue 08 que troban, quand'a frol sazon '

i, e non ante, se Deos mi perdon,

non an tal coita qual eu ei sen par,

Saion— tempo on ocasião.

u

JUnOLOGlA

rOMIA

os que troban e que s'a]egrar van eno tempo que ten o color a írol consigu'e, tanto que se fôr aquel tempo, logu'en trobar razoii noa an, non víven en gual perdiçon og*eu vivo, que pois m'á'de matar.

D. Denís, apnd Lang, 44.

XXI

Cantigas de escámeo e de maldizer

Tant' é Melion pecador, e tant' é fazedor de mal» e tant' é un om' infernal que eu sõo ben sabeior, quanto mais posso seer, que nunca poderá veer a face do Nostro Senhor.

Tantos son os pecados seus, e tan muit* é de mal talan, que eu sõo certo, de pran, ^ quant' aquesfé, amigos meus,

D. Denís, apud Lang, ibid.t pág.

que, por quanto mal en el à,

que jamais nunca veerá

en nenhun temp' a face de Deos,

E fez sempre mal e cuidou,

e jamais nunca fezo ben ;

e eu sõo certo por én

d'el, que sempre en mal andou,

que nunca ja, i-ois asai é,

pode veer, per bõa fé,

a face do que nus comprou.

101

XXII

Deus, com' ora perdeu Joam Simhom! Três bestas non vi de maior cajon ^ nen perdudas nunca tan sen razon; ca tecndo-as eãas e vivas e ben sangradas com sazon, ^ moireron-lhi todas com olivas.

Des aquel dia en que naci nunca bestas assi perdudas vi, ca as fez anfel sangrar ante si; e ante que saissem d'aquel mes, per com' eu a Joam Simhom oí, com olivas moireron todas três.

Ben as cuidara de morte guardar, Todas três, quando as fez sangrar; mais avia-lh'as u dem' a levar, pois que se par tal cajon perderon. £ Joam Simhom quer-s' ora matar porque Ihi com olivas moirerom.

D. Denís, apnd Lang, ibid., 106-107.

^ Sinceramente, francamente

' Snbst. masc. desgraça, iníortunio.

S A tempo, na ocasião devida.

sâoucoB XIX XT > 65

XXII£

Alvar Roiz, monteyro mayor, sabe bem que-Jhi el-rey desamor, porque lhe dizem que he mal feytoc ; na ssa terra est'é cousa certa, ca diz que se quer hyr, et per hu for levará cabeza descuberta.

El entende que faz elrey pesar se ih'y na terr' aqui mais morar» por en quer hir sa guarida buscar, com gran despeit' en terra deserta et diz que pôde per hu for levar sempr' a cabeza ben descuberta.

D. Pedr», Canc. Vatic. n.* 1037

XXIV

Os namorados que troban d'amor todos devian gran doo fazer, e non tomar en si nenhum prazer, porque perderon tam boo senhor Com'e el-rei D. Denis de Portugal, de que non pode dizer nenhum mal homem, pcro seja porfaçador •.

Os trobadores que pois ficaram e no seu Teino e no de Leon, no de Castela, no de Aragon nunca pois de sa morte trobaron ; e dos lograres vos quer dizer nunca cobraron panos nen a ver, e o seu ben muito desejaron.

Os cavaleiros e cidadãos

que deste rei aviam dinheiros,

outrosi donas e scudeiros

matar- se devian con sas mSos,

porque perderon a tan boo senhor,

de que eu posso en ben dizer sem pavor,

que non ficou dal nos cristãos.

^ (Csla poesia tSm passagens de leitura dificil, como se pode Ter confron- texto de Honaci com o do dr. Th. Braga. TrascieTêmo-la dada a sua importan-

ttária).

r, eicanieccdor.

§6 ▲VtOLOeiA «-* MMWM

E mais vos quero dizer deste rei

e dos que dele aviam ben fazer

deviam-se deste mundo a perder

quando ele morreu, perquanto eu e sei ;

Cl ele foi rei assas mui prestador

e saboroso, e damor trovador,

todo seu ben dizer non podereL

Mais tanto me quero confortar cn seu neto, que o vai semelhar en fazer feitos de mui sábio rei.

De «J^karn, jograr morador em Lcon». Cãnc, Vatíc^ n.* 708.

XXV

Lais de Leonoreta '

Senhor genta, * mi (n), tormenta voss'amor en guisa tal que, tormenta

?ue eu senta )ntra non m'é ben nem mal, mais la vossa m'é mortal.

Leonoreta,

fin roseta. '

bela sobre toda fror

fin roseta

non me meta

en tal coita vosso amor I

Dos que vejo

non desejo

outra senhor se vos non.

E desejo

tan sobejo

mataria um leon,

senhor do meu coraçon !

Leonoreta,

fin roseta

bela sobre toda fror,

fin roseta

no me meta

en tal coita vosso amor !

1 O texto no Canc, Colocci—Branc. vem a págs. 103-104 e no Amadês ed. Riyadeneyra, L. II, fr Xf, 134. A. leitura e interpretação é da Sr.^ D. Carolina MichaS- lis. Confrontc-se com a do Dr. Th. Braga na Hist, da Ut. Portug. Jdãde-Médíã, 284.

' Senhora ^ntil.

^ Bela, delicada on mimosa rosinha. Fin adj. apocopado de fíflQ, c ai» sifl de sine 3= sem, como Th. Braga.

.>

/

«^iii«08 111 X vr $T

■••^

Mha ventura

cn loocora

me meteu de vos amar.

E' loucura

que me dura

que me non pot8'en quitar.

Al fremosa sen par !

Leonoreta, *;

fln roset^ í

bela sobre toda íror,

fin roseta

non me meta

en tal coita vosso amor !

MbLobtin.

PROSA

XXVI

Lenda do rei Leir

Qnacndo foi morto rrey Baldno o voador rrejnou seu filho que ouye nome Leyr. e&te rrey Leyr nom ouve filho, mas ouve três filhas muy fermosas e amavaas muito. £ huum dia ouve sas rrazÁes com ellas e disselhes que lhe disses- ■eai verdade quail delias o amava mais. Disse a mayor que nom auia cousa no mundo que tanti amasse como elle, e disse a outra que o amaua tanto como ssy meeamm, e disse 1 terçeyra, que era a meor, qae o amava tanto como deve d*amar filha a padre. £ elle quislhe máll porem, e por esto nom lhe quis dar parte no irejiio. E easou a filha mayor com o duque de Comoalha, e casou a outra com rrey de E^acócia, > e nom curou da meor. Mas ella por sa vemtuira casousse me- lhor que nenhuma das outras, ca se pagou delia elrrey de França e filhoua por molho'. £ depois seu padre delia em sa velhice filharomlhe seus gemrros a terra e fby malladamte, * e ouue a tomar aa merçee delrrey de Framça e de sa filha a meor a que nom quis dar parte do rreyno. E elles reçeberomno myn bem e de* ronilhe iodas as cousas que lhe forom mester e homrraromno mentre foy vivo e iDorrea em seu poder. £ depois se combateo elrrey de Framça com ambos os cunha- dos de anã molher, b tolheelhos a terra. Morreo elrrey de Framça e nom leixou filho vivo. £ os outros dous a que tolhera a terra ouverom senhos ^ filhos e apo- derarromsae da terra toda, e premderam aa tya, molher que fora delrrey de Framça, e meterompa em hnume carçer e alli fezerom morrer.

De «Os Htios de linhagens », P, M. H,, Scriptores, i, 238.

^ No original Tosiia, o que parece indicar Srro de leitura segundo D. Carolina rUckaÊlis Bev, Luê., tiii, 221.

* Malladainte malandante, infeliz, sem Tentara, por oposição a benandante feliz. Tcntaroso.

' Pion« iodef. um a cada am, a cada qual o seu.

68 AMTOLOaU FBOftà '

XXVII

Lenda da Dama Pé-de-Cabra

. . . Dom Díego Lopez era mui boo monteyro, e estando haum dia em sa armada e ateuidemdo qaamdo vénia p porco, ounyo cantar mayta alta voz humna molher em çyma de haama pena : e êl Joy^pera e vioa seer muy fermoaa e mny bem vietidH, e namorousse logo delia bnv fortemente e preguntoulhe quem era: e ella lhe diase qae era huuma molhnS vlòiuito alto linhagem, e ell lhe disee ^ae pois era molher d^alto linhagem que cagaria com ella se ella quisesse, ca elle era senhor daquel la terra toda: e ella lhe disse que o faria se lhe prometesse que numca st?e santificasse, e elle lho outorgou, e ella foisse logo com elle. Eesta dona era muy fermosa e mny bem feita em todo seu corpo saluando ' qne auia bunm pee forcado como pee de cabra. E viuerom gram tempo e ouuPròm doas fi- lhos, e huum onue nome Enheguez Guerra, e a outra foy molher e onae nome «lona. . .

E quando comiam de suum ' dom Diego Lopez e saa molher aaseemtaaa ell apar de ssy o filho, e ella a^^scointaiia a^^ar de ssy a fílha da outra parte. E huum dia foi elle a seu monte e matou hum porco mny grande e trouxeo pêra sa «asa, e posoo ante sy hu sia ' comemdo com ssa molher e com seus filhos : elan- earom lin;'.ii) os.^o da mesa e veerom a pellejar hum alaão e huuma podemga' «nbrello «mu tal maneyra qne a podemga trauou ao alaao em a garganta e mateuo. £ dom Diego Lopez quamdo este vyo teueo por mi llagre esynousse e disse «tsamta Maria vali, quem vio numca tall oonaa!» E 'sa molher quando o vyo sinar lamçou maâo na fílha e no filho, e dom Diego Lopez -trauo^ do filho e norn lho quis leixar filhar; e ella rrecudio com a fílha por huuma freesta do paaço e fojBse pêra as montauhas em guisa qae a nom virom mais nem a fílha.

De «Os livros de linhagens» P. Aí. H. Scriptores, I, 258-259.

XXVIII f

Uma aventura de D-. Ramiro ou Lenda de Gaia

^Este he o linhagem dos mui nobres e muy honrados ricos-homens, e fi' Ihosdalgo da Maya, em como elles vem direitamente do muito alto e maj no- bre rey D, Ramiro; e este rey D. Ramiro sêve casado com huma rainha, e fege nella rey D. Ordonho; e pois lha fílhou rey ÂbencadSo que era mouro, e foilha fílhar em Salvaterra no logo que chamão Myer; entom era rey Ramiro nas As- túrias ; e quando Abencadão tornou adusea * para Gaya, que era seu castello, « quando veo rey Ramiro não achou a sa molher e pesou-lhe ende muito, e euvi ou por seu filho D. Ordonho e por seus vassallos, e fretou saas naves, e meteuce «m ellas, e veyo aportar a Síinhoane da Furada; e pois que a v.ave entrou pela foz cobrioa de panos verdes, em tal guiza que cuidassem que eram ramos, «ntonce Douro era cuberto de huma parte e da outra darvores ; e esse rey

^ Excepto que.*,

^ Suum, suun^ sun, de,,,, conjuntamente.

* Impf. de seer, estar. Perf. seve. Cfr. J. J. Nunes, Crest. Arc,^ cxzxu.

* Are. Aduztr, trazer, conduzir.

BÚOVÍJOB Zn A XT 69

Kamiro veatiose em panos do veleto, ^ e levou consigo Ba espada, e seu eorne, a (aIqm com sea filho e com os seus vassalos qae quando ouvissem o sen corno qae todos lhe acorressem, e qno todod jovecem pela ribeira per antre as arvo- res, fór^ poQcos que ficassem na nave para man(e!a, e el foice estar a hama fonte qu<? estava perto do eastello; e Abencadao er** fóra do easfcelio, e fora correr â<^a monte contra Alfào ; e hama donxella que sorvia a rainha levantonce pela menhA qao lho fo^^c pela agoa para as mãos ; e aqnella doozella havia iioma <>rti^.i ; e tíiia na fonte sichou iazendo rey litamiro, e nom o conheeeo, e el pe- dio.lhedagna pe.a aravia, ^ e éll-a dQiiLha )>'or hum aotre, ^ e el meteu hum oa- m%f'^o na bjca, o qual oamafeo havT^Jjtf^^^do com sa molher a rainha pela mea- dade; ei deaae a beber, e deitou o^^aúerno acetre, e a donsella foice, e deo agoa á rtiuha, e cahio-lhe o anel na mao, e conheceoo eila logo: a rainha piirguntoa ()Qein achara na fonte; ella respondeu qoo nào era lii ninguém : eila díce que mentia, e que lhe non negace, ca IHm faria por ende bem, e mercê ; e a donzela lhe diãsc entom que achara hum mouro deente e lasarado, e que lhe pedira (i^acoaqun bebcce, e ella que lha Hera; c entonce lhe disse a rainha que lh« fo3âe por el, e se hi o achasse que lho adusese.

A donzela foi per cl, c dicelho ca lhe mandava dizer a rainha que fosse a cila; e entnnces Key Kamiro foise com ella; e el entrando pela portado paço conheceo-o a rainha, e dice-lhe

«Key Ramiro quem te aduse aqui ? » E el lhe respondeu

« o teu amor » . '. . '

e ella lhe dice que vinha a morrer, e elle lhe respondeu, ca pequena ma- ravilha, e ella dicc ú donzella qae o mcte.se na camará, e que lhe nao desse que cornese nem que l>ebece; o a donzela pensou dei sem mandado da rainha; e el jasendo na camará chegou Abencadao e deraolhe qae jantace, e despois de jantar diá^ a rainha

«se tu aqui tivesses rey Ramiro, que lhe farias

O muuro então respondeu «o que el a mi faria: matálo. » Entôo a r|iinha chamou Ortiga que o adusese da camará, e ella assim o fez, «adoseo ante o inouro, e o mouro lhe disse

«es tulrey Ramiro?», o elle respoodeo

«eu sou», e o mouro lhe perguntou

«a que vieste aqui elrey Ramiro lhe disse entom

«vim ver minha molher que me filhaste a torto '*; ca tu havias eomigo tf^as, e nom ine catava de ti : » e o mouro lhe disse

« vieste a morrer ; mas quero perguntar ; se me tiveces em Mier qoe fiiorte me darias ? »

Elrey liamiro era muito faminto e respondeolhe assim

«eu te daria um capáo assado e huma regueifa, e fariate tudo eomer, e ^artchia em cima Qa copa cheia de vinho que bebesses : em cima abrira portas ■do meQ conal, e faria chamar todas as minhas gentes, que viessem ver como °M)ma«, e fariate sobir a um padrão, ^' e fariate tanger o corno, até que te hi *»bwe o fôlego.

Então respondeo Abencadao.

essa morte te quero eu dar. »

^ Sobs. masc, meodifo pedinte.

* Na Uflj^aagem de moaro, empregada pelos mouros.

' O original traz antre, termo desconhecido talvez em logar de acetre, que *Piicce nontra lecensio e significa o vaso de dar agna ás mios.

* Qoe me roubaste injuslameute, com violência. ^ Torre ou ponto elevado.

70 AHTOLOOIA PBOBA

E fez abrir os corraes, e fezeo sobir em hum padrão qoe hi entom estará ; e começou rey Ramiro entom seu corno tanger, e começou chamar sua gente pelo corno que lhe acorressem, agora havia tempo ; e o filho como ouvia, aoorreolhe com seus vassalos, e mcteràose peia porta do castello, e el deceuso do padrom adondc estava, e vejo contra 1 elies, e tirou sa espada da bainha, e des- cabeçando atá o menor mouro que havia em toda Gnya, audarão todos á espada, e nom ficou em essa villa de Gaya pedra sobre pedra, que tudo náo fosse em terra ; e filhou rey Ramiro sa molhar com sas donzellas, e quando haver ahi achou e meteu na nave, e quando forao a foz d' Âncora amarrarão as barcas, e comerão hi e folgarão, e D. Ranjyro déitauee a dormir no rí»gaço da rainha, c a rainha filhouce a chorar, e as lagrimas (Telia caerão a D. Ramiro pelo rostro, % cl espertoucc, e diselhe, porque chorava, e elU dise-lhe

«chifro por o mui bom mouro que mataste».

e então o filho que andava hi na nave ouvio aquella palavra que sa madre dissofa, e disse ao padre

« padre nao levemos comnosco mais o demo. »

Entom rey Ramiro filhou uma que trazia na nave, e ligonlha na gar- ganta, e anchorouha no mar, e dês aquella hora chamarão hi Pozd'Aneora. Kste Ramiro foice a M^yer e fez sa corte, e contoulhe tudo como lhe aoaecera, o entom baptisou Ortiga, e casou com ella, c lonvonlho toda sa corte muito^ c posihe nome D. Ald.ir-, e fege nella hum filho e quando nasceo posihe o padre o nome AlboEar, e disse entom o padre, que liie punha este nome porque seria padre o Senhor de muito boa fidalguia; e morreo rey D. Ramiro. Deus lhe aya sande a alma, reqniescat in pace.

De a Os livros de linhagens», Ihid., 180-18!.

XXIX

Demanda do Santo Graal

0

Véspera de pinticoste foy grande gente asíjunada - era Camaalot, asi que poderá homem hi ueer muy gram gente, mnjtos caualeyros. E muitas donas mnj bem guisadas. El rey, que era ende muj ledo, homrou os mujto e ffezeos hiai hem seruir. E toda rern, que entendeo, por que aquella corte seeria mais uiçosa e mais leda, todo o fez fazer. Aquel dia (jne uos eu digo, direitamente quando qucrriam poer as messas, esto ora ora do noa, aueeo •' que hua donzela ehegoo hi, mui fremosa e muy bem uestida; e entrou no paço a pee CDino mandadeira *. Ella comeoou a catar de hua parte e da outra pello paaoo; e pt^rgnntauamna, que demandaua.

«Eu demando, disse ella, por ã( m Lanearot do lago; lie aqui?»

«Si domzella, disse húu caualleyro. Veede lio; sta aaquella freesta aliando com dom Guakmm » ; ella foe logo para el e salouo.

Elle tauto que a uio, recfbeoa muy bem e abraoona; ca aquella era híia das donzellas, que morauam na jnsoa da ledi(^»a, ^ que a filha Amida dei rei Pelles amaua mais que donzella da sua companha.

^ Na direcção de» . .

Partic. de assomar, junta, reunida.

•' Acontccco, avêir, aviir,

^ Como se levasse mandados ou recados.

^ Na xlha da alegria.

BÁCULOS XII A ZY 71

Como a donzela disse a Lançelot que fosse com ellec

« Ay donzella», disse Lançelot, que nentara nos adnsse aqui, que bem aey qae Bem razom nom acestes qobV

Senhor, verdade he, mais rogo uos, se vos apronguer, que naades oomigo aaqnelia foreafa de Camaalot \ e sabede, que manhãa ora de comer seere- des aqui.

Certas, donzella, dise e1, muito me praz; ca theudo soom de uos fazer aemiço em todalaa cousas que eu poder.

Entam pedio suas armas. E quando el rei uio, que se fazia armar, a tain gram coita foi a el eo a raynha e dise lhe: como leixarnos qucredes aatal festa, ho canaleyros de todo o mundo neem aa corte, o muj mais ajuda por uos ueerem ca por ai dellçs por uos ueerem e delles por auerem uosa conpanha.

Senhor, dise el, nom uou senam a esta fores ta com esta donzella, que me rrogoa; mais trás ora de terça seerei aqui.

Hiêt doa Cavaleiros da Mesa redonda,,., ed. deKarI von Reinhardstoettner.

XXX

Fabulas

O gallo e a pedra preciosa

Comta-se que hQa vez hQu guallo, andamdo em húa caualariça escaruando por ach^r algQa cousa pêra comer, achou hQa mny fremosa pedra preciosa ; e ma- ravilhoQ-ae e disse:

O' gema preciosa e nobilíssima, a qual jazes em aqueste vill luguar; tu nom fazee a mym nhõn proueyto; mais se te a ty achasse outra perssoa que conho^esse o. teu nobre esplamdor, tu serias posta em algiui luguar arte&cioso e nobre. Certo tu nom es compridoyra a mim, nem cu a ty. £u seria inays ledo se aehaase btta pouca de hisca pêra comer, que achar ty.

Per aqnesta hestoria reprehende este auctor os samdeus e homêes de p(meo emtender, os quaes nom curam nem querem curar por a sciençia quamdo podem : e quamdo achan algúa cousa que lhe seria pi^ouey tosa, ha desprcçam e nom curam d'ella, e ao depois se repenidem: assi que pello gualo se entende o sandeu, e pela pedra preciosa se emtende a graça da sapicmçia, a qual nom he conhecida dos samdeos, mas he conhecida dos sabedores.

XXXI o cão e a posta de carne

Gomta-se que húa vez hQu cara furtou hQa posta de carne-, e fugindo con ela paaaaua per húa pomte, e memtres que passaua, íçnardou na augua, e vio a soombra da carne que lemiua na boca, a qual soombra prireoia a clio (jiie era doa3 tainta carne que aquelia que elle leuaua na boca. E veemdo a soombra, dertoD-ae na augua, cuydamdo tomar a outra carne, e abrio a bocii-, e abrindo

72 AMTOLOaiA FBOSA

a boca pêra tomar a soombra qne lhe semelhana carne, cayo-lhe a carne que ienaaa na boca: e assy perdco híja e a ootra.

Em aqaesta hestoria hn doactor rcprehemde ha aqnelles qae leixam as oonsaB cortas pelas jmçertas, e querem leizar as snas consas por cobijça de co- brar aa alheos, assy com fez este cam, que leixou perder a carne que leaaoa na boca, por cobrar a soombra qae lhe parecia mayor.

XXXII O leão velho, o asno, o touro e o porco

Comta-ae que hún leom era tam velho que se nom podia moaer ; e em- •omtroa com hiju asno e com hu^ touro e com híja porco. Veemdo estes qae o leom per velhice nom se podia mouer, diserom amtre sy :

Ora he tempo que filhemos vímguança deste treedor, que matoa nossos parentes e fez a mnytos mal.

E ho asno lhe deu dous couces, e o porco com os demtes e o touro com os cornos. E o leom choraua e bradaua, dizendo :

Tempo fuy qae eu vemçia todas as aliroaiias ! E ora todalas animalias vemçem a mym í E eu perdoey a muytoa, e estes nom perdoam a mym !

Per e^ta guisa o leom íicon choramdo.

Em aquesta hestoria o doctor diz que nas nossas bem auemtorançaa deae- mos fazer mnyto pêra avermos amiguos e nom ymijgos, ca os boos amigues ajudam os homêes nas suas pressas, e os emiigos fazem tod^i polo comtrayro. Ajmda diz qne o homem nom deue fazer a oatrem aquello que nom queria qae fosse facto a elle.

De « O Livro do Esopo » .

XXXIII

Um milagre de Santo Eloy

Em estes dias o piadoso e nobre aey Lotario penssou em seu coraçom como mandase fazer h^a seeda ' ou cadeira real e honrradoira e bem pareçente, a qual fosse toda d'ouro fino e de pedras preciosas da qual se servise e usase honrrosamente é algíías principaaes festas e ajunctamentos de seus povoes por magnificência de deus e honrra e excellençia de seu estado. E fallSdo seu con- çepto e desejo alguas pessoas, se achava nem huQ oficial que se atrevesse a ffazer a dieta obra segando que elnei dosejava. E seeudo pêra esta obra aeqai- rido o meestre ou ourivez moor delrrey, é cuja casa pousava Elligio, se estre- védo o dicto meestre fazer semelhante obra assy sotil e nobre qual se requiris, disse a elrrey : « Senhor, em minha casa he huy mancebo chamado Eiligio, de muy maravilhoso engenho e subtileza e muyto comprido da arte do nosso officio

* Seeda do Ut. pop. êédita, assento ou cadeira.

sáofTLoe xii A XT 73

e mester, o qnat peenso qae fará esta obra eegundo vosso desejo e vontade. » £ logo Eliisio foy chamado, e veo perante elney o qual, vendo saa porssoa e ouvido •lias palavras as qaaaes eril simplizes e humildes cd hua graciosa e prazivel compisíçom foy elle niaj paguado e pi-azente dei. Porem lhe disse: « Eliisio, fuineas tn húa tal obra?». E o virtuoso mancebo aespondeo: a Senhor, eu me eoDÍiio ê déUs que m^ésignara eni isso fazer todo vosso conçepto e desejo. » £ seeodo elrrey mny allegre e prazente da sua resposta, logo lhe mãdou dar grande qoãtidade douro segundo a obra que el quiria e elle pedisse, ho qual Requer eo qoe lhe fosse dado per peso e toque. Finalmente Elligio começou aqiiella obra em nome de deus. â qual acabou em muy breve tempo ; e pesou a cadeira, e esgnardoQ ^ no ouro que sobejava, e consirou * que joya faria a elrrey que elle fosse maia prazéte e penssou é lhe fazer hQa s^lla real. Empero ^ pRreciafhe

Íoe no abondaria aquel ouro que sobejara da cadeira pêra a sella que ellé qairia ázer. Empero a ajuda de deus a começou e acabou cm sua pi^rfeiçò. E Ôez eadeira e seila ambas de ygnal peso d'ouro. Ai-si que cada hjja pesava tanto como ei Recebera pêra a cadeira. Â qual cousa sem duvida quis o senhor deus Muj fazer por tal que se conhecesse o eseu servo segundo a sua virtude.

De A Ltnda de Santo EIop, in Instituto, toI. 47.

XXXIV

Retrato moral e físico de Santo Eloy

E veendo o piadoso e nobre aey tatá virtude ê o sancto barom, prazer lhe dava muy avõdosa * e larguamente de seus theaouros, conhecendo qne elle Prt fiel dispenseiro e muy sages * e caridoi.o esmoller. Oo se vir [i] as o sancto home maytas vezes sahir de sua casa, o qual asay aguardavam aa sua porta, e oatrosy os iuguarea per hn sabiam que ell avia d'ir, como fazem os inininos aos qne íazem algnus jogos ou dam pam por deus a todos : assy o sancto barom, vemdoos assy, se allegrava como sooe ^ a fazer aqnel que se alegra quando acha a cousa qne muyto ama e avia perdida. E dessy dava a cada huú sua esmolla hordenadamente, assy como se sote a dar boi los e fruyta ou outras viandas é os wios hu se negaa o qne he ordenado a todos. Muy tas vezes eram tàtoa que nft 08 podiam abastar os dinheirros que o sancto de deus Klli^io trazia ê seu bolso hi>nleoadamète, e Qm pouca quantidade, o por tal que nem huQ se partise dei w^ esniola e caridade, elle dava todas outras cousas de seu uso atee cinta. E assi virias o sancto de deus hir esbulhado sem saya e sem cinta cingido hufi p^iaço de baraço ou de jQcos. E assy se hiia ao paaço, esguardando como fliiftf ca por itso ho BÍiam escarneciam os que o viam como se sooe a ^r aos que assy voom apparelhados como bragantes e tafuis ^ -, antes eram todos provocados e amoestados por esto aa compaixom dos pobres e louvavam a díM em o sseu servo, conhecêdo a ssua grande virtude. E muytas vezes o aey e •Igoíis outros Senhores gram prazer lhe dava logo suas vestiduras e dinheirroa qos destríbuise os pobres.

1

Olhou com atenção, cnidadosamente.

Consideron.

Todavia.

Abandante.

Sábio, prodenle.

Como costama. Do lat. soUt,

Como libertinos e sem t er^nha.

74 ▲NTOLOOIÀ VROSX

E tanto crecia a ffáma do sancto home que em mnitaci partes assy preto como longe fallavam da sua sanctidade. E porqaanto a cãdea, segando uiz o senhor, se nS pode sc5der qae alomee os qae som era a casa, poré começoa o sancto de deus Elligío resplandecer per miliagres, querendo o senhor deus em elle mostrar a sua virtude. E por se conhe.íer quejando era na alma, pos deus em elle tanta £remosura e composiçom de fora qae qnê o visse, poderia julgar qné era. E esta era sua forma : d* estatura era comprido, a face fremosentada de húa temperada rayveza ou collor, os cabelios fremosos, as maãos hunestae e os dedos compridos, ho vulto angellico e a visti simplez e honesta; ho uso das suas vestiduras acostumadas era sempre tal que era de preço, nS mny des- prazivel, mas de huQ bõo modo têperado e honesto assj que a todos oa que o ▼iiam, era precioso exemplo de honestidade e temperança.

Tanto er» prazente e gracioso que assy 03 grandes como os meaaos e pequenos ho amavam muyto. £ o piadoso sey sobre todos se dileitava e alie- grava el em tal guisa que muitas vezes, ieyxando a companha dos grandes homés e dos prelados e grandes saybhos, apartavase soo clle e fallava do 4 consollaçom da alma.

1

De Á Lenda de Santo Eloy^ ibid.

Quadro sinótico do movimento politico,

80ciat e literário correspondente

á 68Cota do9 poetas palacianos e dos Cronistas

I

Monarcas portuguôses

D, Jo5o I. . 1385-1433

D. Duarte 1433-1438

D. Afonâo V 1438-1481

D. João II 1481-1495

D. Manoel 1495-1521

II

Sincronismo político e social

1400 Origem da casa dos Hedicis em Florença.

1414-1418 Concílio de Constança aberto por João zxiii o encerrado por Mar- tinho T, no qual Jouo Huss e Jerónimo de Pra;;i foram condemnados e entregues ao braço seealar, qae os mandou qaeimar (1414).

1438-1431 Aparecimento, façanhas e suplicio de Joana d'Arc.

1468 -> Tomada de Constantinopla pelos Tarcos.

]45t> Invenção da Imprensa.

1487 Estabelecimento da InqaisiçSo em Castela.

1492 Tomada de Granada peio« reis católicos Fernando e Isabel e expulsS» definitiva dos árabes de Espanha. Descobrimento do Novo-Mando por Cristóvão Colombo.

1513 Princípio do pontificado de Liáo x.

1516 Sabida de Carlos v ao trono de Espanha.

1517 Primeiras pr Cações de Lutero.

1519 Fernão de Magalhães, o imortal navegante realiza a 1.* viajem de eir- camnavegaçao em volta do globo. [Vid. Simões Baião Arch. HisU Portug., II, 321].

III

Sincronismo literário

ESPANHA

iSsoo Tvópss Ds Mbmdoza, Marquês de Santillana (1398-1458)-, das suas obras intereasA-nos conhecer sobretudo a carta intitulada Prohémío, que versa tòore a po^^^ta provençal e é dirigida a D. Pedro, Condestável de Portugal e filho áo io&ate D. Fedro, Duque de Coimbra.

76 AVTOLOOIA FBOftJL

_i - ,

JuAs i>ii Mkha (1411-1456) autor do poema alegórico Labirinto^ qae peU «xaber&ncia da sua imaginação, beleza dos seus versos de arte maior e ardente patriotismo exerceu grande influência, entre outros, sobre o Condestável D. Pe* dro, nas Copias,

JoROB Manbíquc (1440-1478) que escrevpu poesias á maneira provençal merecendo aqui cítar-se as quarenta e três estrofes que intitulou: Copias de Jorge Man/ique por la muerte de su padre, que bastariam a ganhar- ihe a imortalidade.

Garcia Osoónke de Montalvo, que em 14.52 traduziu, adaptando-o, o Ama- éis de Gauía do nosso João de Lobeira. (Vid. n.^ 30).

Como pertencente a esta época, qne corresponde a D. João ii (1419-1454), devemos ainda citar o Cancionero de Baena^ que compreende versos duns ne^- senta poetas do tempo daquele monarca espanhol. A estft grupo pertence o len- dário Macias, Ei enamorado, morto ás màos dum marido ciumento ti:i ocasião em que cantava a sua platónica paixão. Mauias é repetidas vezes lembrado na literatura peninsular.

FRANÇA

ViLLON (1431-1484) poeta satírico, que deixou no Petit Testament e na Grand Testament ura retrato fiel da época cm que viveu.

Fboissakt (1337-1410) funda o género hiatóriuo, tentado p»>r Ville- hardouin (f 1213» e Joinville (f 1317). Nas suas Crôvicns de. França, Int/lntcrra^ Ewcócia^ KapanUa^ Bretanha, Gdsconfifi, FLandrts e outros lof/nref f.i/:, s^bre- tadc, menção das guerras entre a França e a Inglaterra. Froissart muitas vezea 86 compara com o nosso Fernão Lopes.

ITÁLIA

Lourenço de Mbdicis (1448-1492) o M<i'/niii<'o^ ci^lebie ditadfu* do Flo- rença, a qu«"m se deve uma parte importantissima no dí^^pertar da poesia nacio- nal, poeta líriíío muito notável, imitador distinto de Petrarca, autor da S^lre </« Amore, dos Poemeít, e dos Cavti CornavaUschi e Bconi.

Angelo roLiciAN» (1454-1494) preceptor dos li Ih os de Lourenço do Mé- dicis e um dos espíritos mais brilhantes da sua côrt(>, humanista muito citado^ autor do drama OrpiíeUf de Epigravuuf e hpistohia^ escritas em ^'rego, e da Vou- jnraçào dos Pnzzi, em latim. Foi admirador do nosso monarca D. João ii, a quem dirifjiu algumas cartas. [Foram trad. por Kpiphunio da Silva Dias e publi- cadas por Th. Braga, no vol. Poeiaa Palaciano», Pírto, 1871, [jág. 29íí e bcg.J.

INGLATERRA

£ dominada pelo ciclo de Artns, comunicado a Portugal polo casamento de D. Felipa de Lencastre com D. João i.

ALEMANHA

Continuam os Mtisttrsingtrs a cultivar a poesia popular, sendo o maior poeta desta época Bkakt ou Bkandt (1458-1521), autor do poema Barca do» Loucot.

\

CAPÍTULO II

Escola dos Poetas palacianos e dos Cronistas

(1385-1521)

Sumário: B2. Caracteres gerais doste período. 33. Invenção da imprensa; seu inicio em Portugal. 34. Estudo da poesia. 35. Garcia de Kesc ride. 36. Cancioneiro geral. 37. Influência espanhola. 38. Condcstável D. Pedro. 39. D. Duarte. 40 L). Pedio, Duque de Coimbra. 41. Aparecimento da História. 42. FernSo Lope-«. 43. Gomes Kanes de Zor^ra. 44. Rui de Pina. 4.'). Autores d<í biografias.

32.— Caracteres gerais deste período. O emí)enho do

«'onsclidíir ji iiiorMrquid o dn «largar os s< u.-i doiuíniop, hbiioi vndo

a. aU^n^ào dos primeiros monarcart portugnôsrs, mal pod'H |>i'rn«itir

C|ue clf8 .se entrrgahscDi ao cultivo da vi(ia literária. Esta vt^io cmu a

paciíic^ÇMo ír^-ral d*^ país e qiuin a inaugurou ioi o justamente c i^no-

minado Rei trovador,

O impulso dido ád 1- trás por D. D 'ní.s d^riv^ou níio 'M\< sons trabJhog prSHOHÍPy m^s ainda da fun la(,*ào da Univ^ersidade. A d ta de 12yj, ano des^a íjmiaçio, é nuMnorávol na história portiiLiurí a. E' «1 in:eio duma in»tituiçào gloriosa qu-^ tantnH tílhos ilustnís veio a <]ar íí pAtrí». Até àquele t^mpo os estudos, muit) restrito-», liinittvani se ÚA escoljs criadas pelos bispos junto d «s nio^t^^lroí^. S.í1><'-h*í íjhí^ du- T^ni** a idade média foram cstc^s institutos a únici salvaguardai da ciéncid. Em Portugal sucedeu o mesmo que no resto da Europa. A primeira escola que houve em Coimbra ioi instituída lo«j^o n » reinado do Conde D. Heniiqu^, pai do nosso primeiro n^otiarca, pelo primeiro bispo daquela cidade D. Paterno ^. Foram também os prelados, aba- des e reitores de vários mobttiros e igrejas qu« se encarregamm de díifar com rendimento» e bens, que lhes pertenciam, o Estudo Geral, que D. Denis resolvera fundar em Li^boa pelo diplona rr^rio de 1 de março de 1290; guamecendo-o com abundância de doutores

1 Vid. Francisco Freire de Carvalho, Primeiro Ensaio sobre a história Itíerária de Portugal, pág. 35 e seg.

}8 HISTÓRIA DA LITERATURA PORTUOtrâSA

em todas as artes e- vigor izando-o com muitos privilégios *, e logo nele bc começou a ensinar o direito canónico, a medicina, a dialéctica e a gramática '. Este in)pul^o não ae perdeu. O liltimo quartel do Féo. XIV e o aée. xv repreí*entam um período de grande importância politica para Portugal e BÍmultrmeamentts de grande deaen volvi mento intelectual.

B'-)8ta atentar na série dos monarcas dfsto período;— JD.JoJCo I, cnjo reinado marca talvez a época mais brilhante da hiafória de Portugal, tem exceptuar a do próprio D. Mano»-.!, e ele mesmo cultor das letras como adeante veremos. D. Duarte é o mestre de pro^a que se sabe. '

D. Afonso V, qiio tam felizmente ampliou as conquistas dos portugueses e ao tempo de quem remonta o nosso mais antigo código administrativo, civil e penal as Ordenações Afonsinas (14:46) ', foi dos monarcas mais afeiçoados á« letras sendo, como escreve Rui de Pina, mo primeiro Rey destes Reynos que ajuntou bods livi*os e fez livraria em seus paços i». 1). Joào ii foi justamente cognominado o Príncipe Perfeito. D. Mano*-! mandou uma frota em demanda daB terras do Oriente ♦'•m momento tam f^liz, que Vasco da G**ma defecobriu o novo caminho marítimo para a índia (1497-9) *. Que mais era preciso para uma efervescência literária dtspcntar em pu- jantes promeKsas?

O mestre de Aviz subindo ao trono pela força do povo firmou a independência da naçãto e preparou os portugueses para o cometi- mento de empresas épicas e gloriosas. O seu casamento com D. Felipa

* Dr. António de Vasconcelos, Um documento precioso in-Rev. da Univ. de Coimbra, i, 363.

2 Sobre a história da Universidade de Coimbra consulte-se: Franciaco Leitào Fí^rreira Noticias chrán. da Universidade de Coimbra; o Compêndio histórico do estado da Universidade de Coimbra, 1772; Coelho da Ilocha, Ensaio sobre a hisl. do Gov. e da legisl. de Portug. ; Francisco Freire de Car- valho, Primeiro ensaio sobre a história literária de Portugal; Th Braga, HisL da Univ. de Coimbra, i, 128ÍMÕ55; ii, }o56-16íi*J-, iii, 17O0-18UO; iv, 1801-1872; Lisboa, 18í»2-lí)02, 4 vols

3 Fôrain. conclaidas e poblicadas em 1416 om nome de D. Afonso t sendo regente o infante O. Pedro, Cfr. Coelho da Rocha, Ensaios sobre a his- tória do governo e da legislação em Portugal, Coimbra, 1887, pág. 118.

* Foi D João II quem em 1486 confiou a Bartolomeu Dias a empresa ce colher informações do misterioso Preste João. Uma tempestade arrojoa-o para além do Cabo Tormentoso. Vasco da Gama saio de Lisboa a 8 de julho de 1497 do pítio do Restelo, em Belém, comandando as três náos S. Gabriel, S. Rafael e Bérrio, álOm doutra com mantimentos. Transposto o Cabo e depoifl de tocar em Moçambique e Melinde viajou para o Oriente avistando a desejada terra a 17 de maio de 14í<8. Dias depois aportava a Calecut, na oosta do Malabar

Das viagens dos portuguesas ficaram Roteiros, dos quais é autor D. JoSo de Castro, trabidho a que com elogio se refere Barros (Dec. 2.® c. 1 " do L. %.°) e que se tornou conhecido quase 3 sécalos depois —pelo Dr. António Na-

CAPÍTULO U-— B8C0LA. DOS FOBTA8 PAI.ACIAlf08 B DOS CRONISTAS 79

de Lencastre deu ao paÍ3 uma geração de heróis D. Henrique o Navegador, D. Duartrj o Sábio, que lhe sucedeu, D. F<^rnándo o Santo, que a morte surpreendeu no cativeiro de Fez, e D. Pedro, Duqae de Coimbríí, R* gent« do R*'ino. O seu glorioso r*nnado pre- parou a yinda de ♦STitoren como FrírnJlo Lopes, Zurara, Pina, etc.

Desta Ínclita geração D. Duarte foi um letrado insigne, e D. Ht m iqiie pt-lo seu espírito empreenda dor deu alento ás conquistas e descobertas, que tanto engrandece* ram Portugal. A Univí»rsidade encontrou neste último um Z':'loso amigo e protector ^ Elé lhe doou ediíÍ2Ío próprio onde os estudos se foram realizando até o reina-^o de D. M-inoel, bem como dotou com pensão certa a cadeira de prima de Tet h{n».

Pode, pois, dizer-se que 03 quatro monarcas desta é^oca sam beneméritos da pátria e da civilização.

33 Invenção da Imprensa. Seu início em Portugal.

Qaem foi o inventor da imprensa? Esse título caberá àquele que primeiramente se serviu' de caracteres móveis e imaginou operar a tiragem do texto assim composto por meio duma prensa. Poderemos nós dizer quem foi? é impossível, hoje, responder com absoluta se- gurança. A discussslo está circunscrita a João Gutenberg e a Lou- renço Coster, A obra impressa mais antiga parece ser o Speciilum humajiae salvatíonis, anterior a 1450, devida a Coster, ao passo que

nes de Carvalho Roteiro em que se contém a xnagem que fizeram os Port, no ano de 1541 partindo da nobre cidade de Goa até Suez. . . Paris» 1:^33.

O 2.® Rot4^iro é o de Goa a Dio, viagem de 1538 e 1539: Primeiro /?0- teiro da Costa da índia desde Goa a Dio narrando a viagem que fez o Vice- D. Garcia de Noronha, . . por D. Joio de Castro, segando Mss autógrafo pbl. por Diogo Kopke, Porto, 1843; 2." ed. em 1861 por A. Herculano e Barão do Castelo de Paiva.

E ainda 3.** Roteiro de Lisboa a Goa anotado, por J, de Andrade Corvo. Lisboa. 1882. Cfr. Inoc, Dic. Bibl. :ir, 34:5 e x, 213.

Nomeemos nesta ordem de trabalhos: Livro de Marinharia..., de Jo?lo de Lisbot, pabl. por Brito Rebelo em 1903, e Esmeraldo De situ Orbia de Duarte Pacheoo rereira, cm ed. crítica de Hpipháiiio Dias de 1905.

* Num alv. de 21 de abril de 1441 chama-se lhe Governador da Univ.; w Prov. de 27 de fev. de 1479 dá-se lhe o título de Protector, que aparece ^bêm no Livro dos Privilégios. Cfr o estudo do Dr. J. M. Rodrigues, O infante D. Henrique e a Univ. no Instituto, xli, 485 e seç. De D. Honrique (13H41460) citam-se nma Carta a seu pai do como se fez o casamento de •wirinSo D. Duarte escrita eai 1428 íimprcs^ia em Soares da Silva, Memorias, h ^2, pág. 410 e Sousa, Provas, l, 515 e as noticias a que Barbosa Maehado, na BibL, ii, 436, chama a xkma— Conselho sobre a guerra de Africa, e a outra Oonn/ko of, a seu Pai qfiando partia para Tanger. Ksirrcvoo tambf^m um traba- lha etn espanhol com o títuto Secreto de los secretos de Astróloga Cfr. Boi. de ^biiogr. portug. i, 53-55, noticia tirada de Gallardo, ii, 553.' Vide também Gareia -Peres, 630.

a primaeia compete á

■émde 1456. Mabnjew...-^-^.,. ^„^,.,.„»«^„.-..- ade de Harlcm, oadeterU aparecido o '6ífKcu/uni, HBcer o inventor dos caracteres Dióms, conTém nl>erfç a, de ter de!*coberto a prensa e aperfei- i procppfios antenorea, do modo que ae êle nâo I, o veriadeiro inventor. Heja como íSr, certo anos esse poderoso propiiUor da civilizaçilo devido d iniciativa dos judeu». Até entíto a ra- iiorutp, o seu cucito fabulodo. Ah livrarias pos- los príncipes e reis representavam verdadeiroB ). João I, D. Duarte e D. Afnn>o V. ' MuilOii iistosa de escribas e iluininador<'H com preciu- vaia ciosamente escondidos e ^lardados, alg'tins , presos por cadeau ás estantei*, como bem se do L>r, Manganclia de I44íj mimdando que os iseiti a tni huina livraria por cadein». ^l'i'> ^ entrou cui Portugal e et^o rni pn)pafi;ou e des- libeir» dou SanIOB ' faz remontar o 1." preto a ' de Noronha, * fiindando-se^cm Kosíi * b^iixa a qoo 80 seguiria etn 14H7 uma ed. do Pen- d, (Io Sacramental de 14SH, se é exacto o tes- 1 Oarvafiio *, De M^Stí sani as Xoveltas in h- Uaa o muis uotive! incunábulo português é de e a sf^iuir Venpaslano de HÍHi, dõste ano e Abvnham Zacuto. as Constitui cZea do bispado '.vaniittho» e Kpítfolas também do I4'J7, e o irit de Kavtmto d(i lõOO. A Vita Cristi é tradiiçi\o da obra, em latim, dOsao nome, cg- cnla por Lndollb d.i Saxoiria, da Ordem da (';irtitxa o fiii mandada íazer pela diKjiii'za de Coimbra. D. Iz:ibel, 1431-1450 que veio a ser moliíer de D, Atbn.-o V, ao inongB cislerc'i''nae Fr. líei-nardo de Al- cobaça if 1478) e saiu doa prelos cm 1405 ** por diligências da rainha

' Sousa Viterbo, A Lieraiia reiíl e^ijeoiíd mente vo reinado de D. Ma- noel, Li»boa IHOI, pi-. 6.

* Mem. de IaL, tiii, p. 1.'.

» O Vive. ti:ral. Porto, 1871.

* Oi-iy. 'Fip. he!>r., V. iv.

* Km Inou. <la Silva. Dic. U\U 83.

' M«ndeB doB Reiniidios, judeii» em Amtierdam, b!>.

■> Fr. Manoel do Cunáenlo nas Mtvi. liiH. do mint»l, do Propilo, IW conheuea doua eies. em Lisboa, um na Bibl. doa I'adres da Divina ProvidêDuU, outro na dos Padres Fianciscanos áa observância da Província de Portugal. Hi- beiro (ioB Santos apontava oito, 4 doã qnaís na provinda do Bispo de Beja, Lorvão, Arouca e Saula Crui. Fr, Fortunato de S. Boaventura acrescentava

-m^riIo:^:r ""^^^^ ^- -^««o « depois de es.ar in,'.diU du- iInstr«T. *'® inestimável valn,- rli ""é!«ap«ni porfMíru.^Ka

P^amento dos direitos de sSL „.T r.^'"*''''"'*' ^«'"o o da ÍHon,-ào do

<roe a ;L j "*'** «^o» livreiros em ^t^ i^ °". '"*^''"'o ^^^ oram nu- Et "■^"''^"Çao da imprensa em P l""^,"- ^'«de dizer-se, poi^

POESIA

^oneiros medievas t^Trt^.T''^^ " ^"*' í«^''» « «iolo *^o pelo oome de CanciZZ^ g^;T^ ^* "''«"* "^«^*t"- ^

- ^'r llftôfcll'l<8

B[SIÒBI* l>Á LiraaiTOB* 1

eeu Cancioneiro Geral. Resende era 491 Moço da escrev-aninlia ou secreb joao II, cargo i^m que s-^ houve de tal modc afetçSlo do monnrcu, qun dcpoi» também g Manoel. De quanto o ''aliiiiava, t<)igava D. J sempre que ee oíereciii ocasião ou para Aesim ao Moço da Kitcrevaniiiha corape: emquaiito D. João ii escrevia, uma penna Bubtttituir aqueila de que ÍJle m: c.-;tava ser ver ReRttndc tudo quanto si-n iimo asseni estando El-rai a Chcrever n Fernando o Ct Her coisa de muitit impurtAncia e discretam lado ; D. João 11 deu por isso e dÍR»e-Jbe : nSo mo tía^ue de li, iiào to. mandaria .exta; d5 presunyilo, BenSo vontade para melbor sinado » *.

E decerto, a afeição que o monarca OB incitiimenlos com quo ajflaudiu o seu goB OS motivos príncipais que concorreram pars nar numero.sas trovas que iiírmarii o si poeta, Resende distinguiu- se também pela fi dizia, de debiixador e tocava, eompunlia m Referi i](Io-se a <'slas aptid5es várias e

E Gítrcia de Resende, Feito peiío tamboril

i: iiidít q<ie lado xntKitãe, Int dizendo por eode, IJuem me dera um arrab

luporâneo, o poóta D. í

O redondo do Resende ' }k'iii iirenteiide

H d.Í.n.c'Á al:,"<-m

Se uom isto não ac olton

O alto conceito que diile fazia o I!i.. .

peia Chcollm que dOie fez p^ua sccrL-tário da magnifica embaixada

' Sr. Braaeiínip Freire, t-VÍ(rV/i e llislórin, p;'ig, ^f'. ■' ClV. a miiilia ed. dae W.r.n ác Gil Vic.Tnt«, j, -Jia ■' AUisiio k desconmuiil goniiira do po('tíi qne 'Um lenia a tantos apÓJíS dos sijiii onti.TiiiJOruueos, Cfr. ed. Ur. G. Guiniarfica, iv, 375.

a Cunha, em 1514, quando era

íesende a Vida 6 feitos de D, ra como niezquinha col-oySo de Igiimas pá^naa como o mplicio sBÍiiio dotitro {D. Dios;o) *, e o parece fnvcnciiado d>. Jouo ill. Hl na nmioi' pnrte a crónica do

. ..., , .0 servilmente dau mesmas eon-

cep\-Õ«ís, idéan e p<^nsamentos, e ate das próprias palavras acrescen- l&nào, apenaK, aqui e álêni alguns factos pi-óprios *. Deve porém dizer-se, que a crónica está cacrita com «ingelesa a oferece leitura a [^>i.« Tv^ c estranho cerlo gosto e encanto, dandn-nos noticia do nuaos, costumes, trajoa, cerimonia:^, trechos de conversações, notícias de Tç^i^e*i eociais e muitas outras informaçí^cB interessantes, incluindo »t anedotaa, qiie nos revelam em parte o modo de viver da gente ^rtuEuéaa daqueles tempos » ' E' tamhêm inferessuntc u Aíitcelanea e eiriedade de historias ', espécie de crónica rimada doa factos toai^ niitáveía da sua época. De maneira quo não sendo insigne, diz a Sr.' D. Carolina Michaí^lis, em nenhuma especialidade, a critica moilema fez jusliçu aos eervi^oa importantes que prestou á piítria o *! seu espíiito enciclopédico de músico, desenhador, poéla e histo- riador '. Maa o principal merecimento de lícsende resulta de ter sido 1 toíctionador do

36. GanclOnOÍro Geral. Foi fistc cancioneiro publicado H* primeira Tez_ em lólti com o seguinte tiíulo; Cancioveíro Sttrail.., ordenado e emendado por Garcia de Resende. . . <'ome-

' Vid. Salvatore de Ciuliia, Une «mtiws^rfe ]XitI'í'i'Úk à Roínr. ifí Xv™ "■'It. Naplw, 1899.

' A 1.' ed., hoje raríssima, é do VAb. uiaa ed. da 1">P- <^a *-'""; ■Jí Uimbra de l i9S com o título Chr. dos in/erotoa e irmignts feitos d eX-m U. ■"M /í, bastante errada, wpeeialmente oa MifeJ.riiiK<i.

' OpiKulo,, T, 27. ,

j ' D. Fcmando, 3." duque de Brairaiipa, que buIúo ao cafln.*-"^" D. Diogo, dw|ue de Viaen, que foi au^aH^intido pelo V^^Y"'"

'■ Vià. Gareia de Bettnde, Kccerpto* s-^ouidoti rfuma f <^'''^*'*

I ^«'«l™. E'o vol. iiidaZ,íiTanViau«io'i (ÍÕb t;iíHtilh(.a

^ b>. Ilraauamp Freire, Critica e J/,e!.„;u, in''u:. oU ' . ,\o f-*-'

"i- Pw«ipe, qoe é de lf»4. --ITcUv

^''«iofõbre o romanceiro pciii.Ku^ar, pá^f. 2<iO.

ramcntR (182 pAgs.) e parte dn ii (50 piigs.), e António Feliplano de Caatilho, tf areio fie AV^pjcie. eiccrptoa. . ., Rio de Jan., IStlõ, 1 v.

* Viu-i.ui vvzea impresso. Logo em 1514 teve nova ed. Beimpr. em 1882 pela iSoc. de Bibliófilos* teve em 1904 reprod. fac-aimile de milionário Her- MtíogtOD.

CAI*í'tUI.O II ESCOLA DOS POETAS PALACIANOS B O08 CBOriSfAB 85

Principia o debate e nêle tomam parte, usando do eBpanho]^ do portuguei», dez çoétas ^, cujo ídolo troca, por fim, as fantasias dos seus admiradores na maior parte, de resto, casados, peía reali- dade do casamento com um provinciano beirão. Acabado este debate pakciaoo que enclie catorze folhas do Cancioneiro seguem-se poesias amorofas, satíricas, epigramáticas, roçando algumas por uma vivaci- dade de imagens atrevidas e at6 grosseiras, o que explica que a inquisição no seu índice expurgatório de 1624- as trancasse em mui- tos lagares. ^Foi o que sucedeu ás poesias do coudel-mór ^Fernam da Sikeira altamente ofensivas do decoro.

O quo mais chama a. atenção deste Cancioneiro, escreve Me- néndez y Pelayo, nào é a diferença de línguas, que é meramente acidental e nâo afecta o conteúdo poético, é sim a penúria de inspi- ração histórica, o divórcio em que estes trovadores cortesãos parecem viver de toda a grandiosa vida do seu povo, e em que alguns dêlea tomaram parte muito honrosa^ e distinta. Nem as empresas de Africa, nem as portentosas navegações do Oriente têem éco nesta retórica convencional e enfadonha.» Como excepçíto pode apenas apontar- se a descrição da tomada da fortaleza de Azamor pelo duque de Bra- gança em 1513, pouco bela, mas um dos raros trechos hic^tórieos da \ colecção, podendo considerar-se como uma pequena epopeia, com invocaçlto á SS. Virgem em- lugar de ser ás musas. O grande Mestre Castilho diz: «substância poética... pouca se espreme do cor- pulento volume do' Cancioneiro j quási nenhuma fura expressão mais exacta. » Assim é. As excepç(5es sam insignificantes. Aparte Álvaro de Krito e D. JoSLo Jlanoel que escreveram planhs á morte prematura do príncipe D. Afonso, filho de D. Joílo n falecido em 149 ly poucos dias depois do seu casamento, composições ainda assim frias e sem vislumbre de sentimento, o próprio cole- cionador protestou contra a frivolidade dos tomas, cantando a morte de D. Inês de Castro em versos cheios de movimento e de bela elevaçSo e que inspiraram depois as inimitáveis estrofes do nosso «upremo cantoV *. ainda, aqui e álêm, algumas trovas que- com- pensam bem a aridez do grande número,, tais o Fingimento de amo- ^ts f clara revelação de subido engenho e apurado gosto», obra de Diogo BrandSo •, algumas cantigas, e outras composições que damoa na Antologia,

* Se não é uma ficção c as poesias nao pertencem todas e unicamente a doo» poetas Fernam da Silveira « D. Joiio de Meneses, como supõe o Dr. Gonçalves Guimarães. .Cfr. a sua ed. do Canc., v, 427.

* Seriam estas Trovas de D. Ima inspiradas nalgum verso tradicional? Aêsim opensoa Menéndezy Pelayo. Cfr. Antologiu, }\\, çXt. ^ vol. ix, p/ii^s. 28J:-288.

Traeou-lhe o perfil o sr. Braamcamp Freire no Are, Uíst. PorL^ vi^ 2*v'8 e seg.

6

86 HISTÓBIA LITIEATUBA PORTUGUESA

 contextara dâs estrofes que aparecem nQ Cancioneiro é muito variada : nâle amostras muito dignas de adopção,' por seu geito è graça peculiar. Para tal o apontamos, escrevia uma autori- dade competente, aos pouquíssimos engenhos eiccelentes que se téem empenhado em regenerar a nossa lírica, Onriquecendo-a ,com a má- xima variedade de períodos, com a máxima abundância e novi- dade de rimas; mas a metríficaçSo é muito irregular e muito des- cuidada a rima, jogando por exeniplo serras e quiseras, palavra» . e desejavas, etc. *.

Olhado por outro lado o Cano. Geral é inestimável, a ai minúcias interessantes, que em balde s^ buscariam nas chancelaríaa e nas crónicas, de usanças velhas, de trajos, de alfaias caseiras, de relações familiares do rei com a sua cOrte, de amizades e inimizades dos cortesãos entre si, do papel que as senhoras representavam na sociedade alta, das liberdades, hoje inadmissíveis, então moeda cor- rente, do pendor, epigramático e faceto do espirito nacional, da bo- nhomia do viver antigo, das tendências eruditas de alguns versejadores, filhos da Renascença, para o culto dos clássicos romanos, das micros- cópicas maledicências em. que se entretinham os cavaleiros, quando descansavam em Ji<vora ou Almeirim das frágoas de Arzila ou Azamor; e também embuçadas referências genealógicas e históricas que, observadas com critério, dão luz á história geral '.

37. Influência espanhola. O Cancioneiro Geral traduz A imitação da poesia espanhola, que caracteriza esta época. Entre portugueses e castelhanos relações amistosas, que nao impedem o Gobrirem-se de vez em quando d^injúrias. Sem originalidade, por- tanto, as, pouco mais ou menos, mil poesias, que encerra o vaUoso trabalho de Resende, sam de caracter palaciano fruto de artificio por vezes laborioso, inferior, em regra, como documento poético, mas indispensável como subsídio histórico para o estudo do século XV. figuram as composições poéticas dos nobres que frequenta v^m a corte de D. Afonso v, D. João ii e D. Manoel, portanto, do mais notável período da história nacional. tigura a nobre e altiva figura do Condestável, o mais notável dentre todos esses cortesãos do séc. xv, quási todos poetas bilingues e discípulos de Santillana e de Mena. encontramos algumas composiçclles de trovadores castelhanos como João Rodriguez de la Câmara e João de Mena e muitas de portu- gueses em língua castelhana como de D. João de Meneses, inordomo- mór de D. João n e D. Manoel; de Fernão da Silveira, de Álvaro de Brito Pestana, Duarte de Brito, D. João Manoel; do Conde de

^ Castilhos, Liv. Clássica Foriug,, oh, cit., vol. x, pág. 131. ' Do Prefácio ao índice do Canc, de Rcstnde e das Obras de Gil Vicenie^ liisboa, 1900. Anónimo. (Autores Júlio de Castilho e Braamcamp Freire).

CÁPÍTUI.0 U S8COLA DOB POETÀB PALACIANOS B DOS CBOMISTAS 87

Vimioso, de Aatónio Mendes, de Portategre, de Fernão Brandão, Jorge de Resende, Duarte de Resende, Luís Enriques e do próprio Garcia de Resende.

Entre êle e os cancioneiros, que o precederam, e que nSo sam provavelmente âenSo cópias dum original que se perdeu, uma no- tável diferença.

Uma língua irregular servindo ou traduzindo rudes mas enér- gicos pensamentos, certa naturalidade, graça e viveza nas mais anti- gas poesias, e nas. do reinado de D. Denís grande afectaçSo e artíiicio, tais as qualidades das manifestações poéticas características dos trovadores portugueses, que nos deixaram perto de mil canções escriías, segundo Wolf, no período decorrido entre 1245 e 1357. Agora neste temos as trovas de 286 autores quási todos da segunda metade do séc. XV e principios do xvi. Anteriores sam somente «o rei D. Pedro i e o infante D. Pedro, filho de D. João i. A maioria viveu, como acabamos de dizer, nas cortes de D. João ii (1481-1495) e de D. Manoel (1495-1521). nos aparecem os nomes de Af. de Albu- querque, Bernardim Ribeiro, de Miranda, e Gil Vicente, que depois se tomaram assinalados por feitos tam diversos. O Canc, Ge- ral excitou a principio bastante curiosidade, senda levado até índia onde, pelo menos, uma vez, segundo refere João de Barros * se jurou *>bre êlç, como sobre ilns Evangelhos, ao celebrar-se um tratado de paz com o rei do Pegú !

38.— eONDESTÂVEL D. PEDRO (1429-1466). Dentre os poetas do Carictoneiro devemos destaoar o Condestável D. Pedro, nlho do infante D. Pedro, Duque de Coimbra, e rei de Aragão desde 1464 a 1466. Expulso do pais por infertunios políticos viveu em Castela sete anos (1449-1456) durante os quais aprendeu o caste- lhano. Isto explica que quási tudo o que dele possuamos esteja escrito em espanhol e por isso o spu nome seja contado entre os que ilustram a literatura do país vezinho sendo talvez o primeiro português que ocupa lugar na literatura espanhola. E' de D. Pedro a obra que inti- tulou Satyra de felice e infelice vida dedicada a sua irmã D. Isabel casada com D. Afonso V, cheia de copiosas notas marginais que muito abonam a sua erudição, algumas das quais sam de excepcional valor, como aquela que se refere á Rainha Santa de Portugal, a relativa ao enamorado Macias, etc. Espécie de novela alegórica de género senti- mental, foi escrita em português no meiado de 1448 e novamente redigidA em castelhano depois de 1449, antes dos dezoito anos *'*. O

' Dec. tu, 1. ui, c. 4.^ ; transcrevemos adeante esse trecho.

< Canc. de Eet,, i, 67-69.

Pahlioada por Paz e Mélia no vol. XXIX dos Bibliófilos Es^jciuo^xs^ -^^*^-

88 HISTÓRIA DA LITERATURA POUTDGUÊBA

falecimento (1455) de sua irmã D, Isabel inspirou-^lhe outra obra, em prosa e verso, com o titulo: Tragédia de ia insigne Reyha dona Isabel ^, que n^o é uma tragédia, mas antes uma lamentaçáo pessoal^ mistura de Job, Boécio e Bocacio. Mas a obra que a D. Pedro maior renome e que um erro de Garcia de Resende atribuiu não a ele, mas a seu pai, erro em que caíram escritores conternpbrâneos como Inocêncio da Silva e O. Martins, é a conhecida pelo nome de Coplas dei contempto dél mundo^ ou Poema dei menosprezo dei mundo, a melhor obra que no século XV foi escrita em espanhol por um trova- dor português *.

Ao condestável D. Pedro é que o Marquês de Santillana diri- giu entre 1445 e 1458 o seu Proemio, de tam alto valor para o es- tudo das origens da" poesia peninsular.

PROSA

Monarcas escritores: D. João I, D. Duarte a D. Afonso V

Entre os^prosadores desta época cabe o primeiro lugar a- D. João 1 (n. 13G5, gov. 1385-1433) como autor do Livro da Mon- taria, autor senão único, pelos menos, principal, segundo o teste- munho do filho D. Duarte «o mui excelente e virtuoso Eev, meu Senhor e Padre. . . fez um Livro de Horas de Santa Mar*ia e Salmos certos para os finados e outro de Montaria ^ )> e noutro lu- gar « el-rei meu senhor põe alguns avisamentos no seu « Livro da Montaria *.j> O primeiro destes livros também lhe é atribuído por F. Lopes ^. Mas esse e o dos Salmos perderam-^e. O Mbb. do Livro

drid, 1892, e por Menéndez y Pelayo na Antologia doa Poetas li/ricos castdlO' voa, vil, 263.

' Foi publicada no livro Homenaje a Menéndtz y Pelayo en el ano vi- gésimo de 8u profeaoradOf Madrid, 1899, I, 687, pela Sr." D. Carolina Michaêlis de Vasc. O texto ocupa na separata as págs. 53-96. De 1-52 vem uma intrudacâo bibliogr. e hist. qae alguns subsídios importantes para a biografia tanto do Condeatável como de seu Pai e corrigindo várias asserções de O. Martins emiti- das nos Fillioa dt B, João I,

^ Coplas flechas por el muy illastre sefíor Infante Don Pedro de Por- tugal en las quales ay mil versos com sus glosas, contenientes dei menosprecio c contempto de las cosas fermosas dei mundo, demonstrando la sua vana e feble beldad no Canc. Geral n, 229 e quási completas em Menéndez y Pelayo, Antologia, etc, n, 263. Escreve a Snr.* D. Carolina Michaêlis relativamente ás datas atribuídas a ed. príncipe das Cop/aí «1464 ou 1465 nâo merecem dis- cussão. A de 1478 estabelecida. . . por O. Martins provém de uma nota manus- crita lançada á margem do Prólogo. O tipo gótico, o papel grosso e a falta de todas as datas tornam provável a hipótese dele pertencer ao sec. xv ».

y Leal Coimlh., C. 27, pág. í)4.

* Arte de Cavalgar , p. v, c. 11.

5 CV. de D. João li, pág. 41.

CAriTULO n BBCOUk D08 P0BTÁ8 PALACIANOS E D08 CB0XI9TAS 80

da Montaria que fez parte da Livraria -Real perdeu-se, restando a cópia existente na Bibl. Nac. por onde foi feita a ed. de 1918 ^. A obra foi feita «com o acordo de muito bons monteiros» e é pos- terior a 1415 porque D. João intitula-se «Senhor de Ceuta», e an- terior a 1433, ano em que faleceu. No Prólogo encarece j) assunto como o mais alto e proveitoso, superior aos de Falcoaria e de Can- tigas. A matéria ó depois versada com pormenores técnicos curiosis- simos sobre os cães empregados na caça do porco montês, sobre /os cavalos próprios e modo de os cavalgar, trajos dos caçadores, costu- mes, ete. Mais qac este aspecto técnico, nos interessa o gramatical e literário. Neste sentido pode dizer-se que o Livro da Montaria fica a ocupai' um dos primeiros lugares entre as grandes obras do séc. xv, nJo inf-^rior de certo, ao qne, pelo consenso de todos, ocupam as obras de D, JDuarte, (n. 1391, gov: 1433-1438), cujo amor pelas letras o lerou a mandar fazer grande número de traduções que com as muitas obras que adquiriu no estranjeiro por intermédio das feitorias portu- ífuôsas cohstituiam a sua preciosa livraria, infelizmente perdida. * As obras mais notáveis deste monarca que o assinalam álêm de estilista como um cnlto^ de filosoíia moral foram publicadas pela pri- meira vez em 1842 e sam: Tjeal Conselheiro e Livro de Ensinança de hm cavalgar '. A linguagem de D. Duarte é ipuito polida e sofre, por vezes, confronto lisongeiro com a do nosso primeiro cronista, F. Lopes.

Dado ao estudo e á meditação, as suas obras revelam-no como um alto e profundo espírito, a quem a sede da perfeição intima e o desejo de bem governar o seu povo dominavam o espírito até á obaessao, á dot^nça. O Visconde de Santarém na ed. do Leal Cons, feita pelo P. Roquete enumera várias obras existentes na Cartuxa de Évora, domle em 1730 as copiou o Conde da Ericeira sendo publicadas por Caetano de Sousa nas Provas (i. 529 õ48), ficando ainda outras iné- ditas, e hoje, talvez, perdidas.

Na lista dos livros de uso do Monarca o n.** 78 inscreve-se ^Linro das trovas del-rei^ [Sousa, Provas i, 54], o que levou mui-

1 Livro da Montaria ftiio por D. Joõo i, conforme o Mss. 4362 da ^'iU.Nac. (U Lt9hoa pttblicado por F. M. Esteves Pereira, Coimbra, 1918.

* O catálogo nas Provas da Hist. Gen., i, ôié 546 comentado por T. J^ra na Hist da Univ, i, iá09. Doa livros que ajuntoctJ). Duarte apenas sa- wowB da existência da Corte Imperial, hoje publ., e do fragmento do Reg. de rrincipei, obra de ihles de Roma osorito para a educação de Felipe o Belo.

* Leal Conselheiro seguido da arte de hem cavalgar. Dado pela pri' »«r<j ra d luz sobre o m». original da hiblioitca real de Paris, com, votas fi* ^y^at e um glossar 10 das palavras antigas^ por J. I. Roqiiette, l^ari», 1842. I^toihae nesta ed. o c. 55 pelo que em 1854 apareceu nova ed. Foi leimp. em joi3cm Lisboa. Dr»s duas vezes com o Livro da Ensinança de hem Cavalgar, lt*le«íguudo o MêB. de Paris, n.** 7007.] Vid O. Martins, Os filhos de D, Joào I^ **P' ▼!; na nota de pág. lt)2 vêem enumeradas outras obras de D. Duarte,

tOB a considerá-lo como trorador, afirmação gratuita q3o abonada em autoridade alguma. E nSo sam uma poesia e uma trova traduçilío ãn oraçSo latina do Justo Juís-, que dariam tal título a D. Duarte '. Maia infeliz que os precedentes pelo destino que tiveram ae suas obras foi D. Ajonao ^"(1438-141^1), de quem nem o « Tratado da Milícia » nem o da a Conttelarào do Cão» coníirguiram salvarsc. Conhecidas dele apenas duas cartas: uma dirigida ao cronista Zurara, igualmente honrosa para ambos ', e outra, cm espanhol, a sua innil 1>. Joana, a Beltrancja. Cronológica mento êje ocupa o se- gundo lugar entro os Portugueses que escreveram em espanhol.

Podiamos ainda dfar outros membros da dinastia de Avis, mas para nào descer a maiores minuciosidades citejuos somente a fi- . lha maia nova do regente D. Pedro e sna li." fillia D. Filipa de Lencastre [ I4:í7-I4i)7j de quem inipr. por Fr. Francisco Bran- dSo em 1(34^! o «Conselho e voto. . , lôbre^HB terçitria» e guerras de (!'astela». Outro trabalho vagamente cit. por Barbosa, mas qun Dia^ Gomes (Obras, 20õ) diz ter visto v Nove estações ou meditaç~ei da Pahão.

41. O Infante D. Pedro. Duque de Coimbra (1392-14Í9), 2." iilho de D. Jono i, 6 outro principe quô merece menino especial. Tendo-se ilustrado em numerosas vinjens que fizeram entrar o seu nome da lenda e tradição popular ' foi Regente do reino na menoridade de seu fobrinho D. Afonso v, desde 14ií8 até 1448. Daí a pouco deu-se o lamentável desa.stre'de Alfarrobeira em que pereceu (1449). A sua obra capital Da Virtuosa liem feitor ia, em seis iivr.)s, súbre filosofia moral em que procurou Seguir e imitar a Séneca * foi publicada * em 1910. E' dedicada a seu iimãa D. Duarte, Nela foi

^ Th. Braga. Canc. Pop. n." 11.

' Tianscriía adiante, na Antologia.

* A lenda api'Bsini-se com ercito dn InFante fazendo-o percorrer m «í< partidaí do numdo cem dme compaiilit-iroa qoaiido, natiimlnieiitc. êle nem «he- gou H. sair da Kumpa. Coineçnu esti viagi-tn t-ui li-J-l c a 28 de t, 1428 repre"- aava a ?ortu{r,il, litve-se a Uenies dn fiaiitb Esti^vão, que aeii:i ii-n Hêssi-s coin- panbcivng, n oanativa priiiiiiivament>' escriu em espanhol e publícndi depuia doa ini'iaiio3 dn atuulo uti. tradiizidA a Hi'g;uir para portngiH-s, í-nimndo mais tanÍH na rrliaitiada /iíeri/iir/i rfir cordel p i:fiiitaiido di'zpnífl áe i^dieõcs Sobre o Infartti' vid. a Trii/cdm. . . ed. da S,' D. C. M, Viíscont-L-llosuit. em noU anterior; í^ousíi Vitcrlio. O Infitnlt D. Vcdro, o dnn ede p/irtiiim, Lishoa, 1903; (i Boletim d'- In R. H' Geográfica, Af. Madrid, xiv, 3." trimíslri', IM3, . artigo de I). C Fernandes Duro, (jiic ri-pvoíui; o texto, em e^pinhol e porlu- guêí, duma veriiío da* viaien-", e ns Cartiu IStUiryuráphtcn» por FíernaujUs) T(h"m!iaj, Oiimbra, J3í6. plga. m a 4;i. ?..U. do Aião on Lirro ou Hiitória do labute (-m poitiignPa hA nove, polo m'.'no!<, sendo a l.*^ de Xbbk.

' Subre L. Annea Senena veja-se a nojsa Inlrod. á liiit. da !it. portug-, Coimbra, 1911, p/ig. J87.

' Vol. II da Col/e.cção de Manuier. inéii. publicada pela C&maTa Moni-

CArÍTXJl<0 II ESCOLA DOB PONTAS FAliACIAMOS X>OS CBORlSTAB 91

anxiljado pelo seu confessor^ licenciado Fr. João Verba, e estava foncluida antes de 14 de agosto de 1433 em qiie faleceu D. JoSp u Fez parte da Livraria de D. Duarte e D. Aíonsò v e existia na Livraria do Mosteiro da Cartuxa de Évora, havendo atualmente noticia de 4 códices *. Zurara transcreveu verbalmente e qíiási wnftplet^monte alguns capítulos *. E' obra de grande mérito pela elevaçílo de idéas, nobreza e elegância estilo, como o mais sim- ples trecho o manifesta ', e ainda notável pelos problemas que sub- 4Íta *. Temos em poesia breves estancias dirigidas a João de Mena^ o poeta mais celebrado da corto de Castela, as quais saíram no Can- aoneiro Geral de Resende ^. Traduziu também para a nossa língua o tratado de Cícero De. officiis *; o De regimine Principum de Efddio Romano ç o De re militari de Vegecio''. Mencionaremos ainda as Carias escritas em diversos períodos da sua vida algumas impressas *.

42. A GÔrt8 Imperial. Com este título existia na Biblioteca <io Porto um J^Iss. que foi dado á estampa om 1910 ^ . Redigida por iim anónimo é uma obra de polémica filosófica e religiosa contra ára- bes e judeus para mostrar a superioridade da doutrina cristX. Figurou na Livraria de D. Duarte (n.® 39), mas ninguém a aproveitou, nin- guém dela f<íz citação. Será oris^inal? No princípio le-sn «. . .eu pe- cador contiando começo este livro nom como autor e achador das cousas em olle contheudas, mas como «impres ajuntador delias- em huú TcUume». Discute com o Judeu « con sua barva grande e seu

cipal do Porto. Com esto título: O livro da Virtuosa Bemfeitoria do Infante bm Pedro, Porto, 1910, 1 vol.

* O mais precioso, repatado como oriíçinal, em perpjaminho, na Bibl. Nac. de Visen; 2.®, cópia, em perg.^minho, in-fol., letra do aéc. xv na Livr. da Acad. R. do Ilist. de Madrid; 3.**, cópia em livro' do papel letra do séc. xix na Bibl. N. da Âcad. das Sc. de Lisboa e 4.^ cópia de livro de papel de letra do ãéc. XIX da Bibl. Man. do Porto.

* Chr, da tomada de Ceuta^ ed. da Acad. das Sc. de Lisboa, 1915,

* Veja- 80 adeante na A filologia.

* ]}v. Paulo Morea, As teorias politicas medievais no tratado da Virt^ Vi. na Rcr. de Hist. jn, 1-21.

^ Ed. Impr. da Untv. de Coimbra, cit. ii, 225-228 e J. Soarcò da Silva, Mtm. para a história de Portugal^ etj., iv, 463-506.

* A resenha dos títulos dos capitnlos desta obra e a dedicatória ao in- fante, depois rei, D. Duarte, foram publicadas na introd. com qne Pereira de ^mpaio (Bruno) precede a ed.

" K. de l^ina, Chr. dt D. Af. V, c. 125, ptig. 433.

* O . Martins, Os Fxlhos de D. João I, Ap. ; Soares da Silva, Mem. I, 374-379; Sfiisa, Hxst. Gew., v, 64 e 120-1:^9; J. P. Ribeiro, Dis^^crt. i, n." 118, pág. 398-413. Hl inéditas, segundo Aires de Campos, nos Arquivos da Câmara de Coimbra- 73.

* £' o vol. I da ceferida Col, publ. pela Câmara Portuense em 1910, 1 voL

92 HI8TÓRI1. DA LITBBATURA PORTOGUÊSA

naiyz longo vestido em panos pretos» e com um Mouro «velho vi«- tido cn húa aliuba tenada o seu albornoz de preta e huú alfaleme branco na cabrça d .

A dií^cusBíto paira sempre numa alta esfora espiritual erudita o tolerante. A linguagem deste livro emparceira-o, sem menoscabo^ com os melhores de que nos ocupamos.

HISTÓRIA

43.— Aparecimento da história. A história digna deste

nome o elevada a um género independente e próprio aparece entre nós com Fernão Lopes. « Os agiológios imaginados pelo fervor reli- gioso e abraçados- pela crença pop''kr, as narrativas legendárias e as vidas dos Santos, investigadas pela piedade dos monges, os livro» dos forais e eonstituiçfíes dos bispados coligidos e ordenados pelo andamento das necessidades da organização civil, tudo i.sto dii^poo os primeiros passos, e ao mesmo tempo os primeiros elementos da nossa história» ^. O titulo de fundador da liistória cabe, pois, com justa razão a Fernào«Lopes. Ele abre a série dos cronistas oficiais esti- pendiados pelos reis para desempenharem a missíio do escreverem a história nacional. Esta circunstaiicia suscita no nosso espírito certas dúvidas sobro a absoluta sinceridade com que eles poderiam ter escrito. Autores de histórias oficiais e subsi<liadas poderiam ter o- desassombro dos que escrevessem sem essa pressão? A respeito de Fernão Lopes escreve um historiador contemporâneo: devemos sem- pre desconfiar um pouco do velho cronista, porque ele é visivelmente parcial a favor do D. Joào i e dòs que o ajudaram a subir ao trono *. também quem lhe chame o mais antigo s panegiristes oficiais, o decano dos aduladores retribuidos, a que chaiiiaram cronistas e o biógrafo do paço sustentando com melhor ou peior habilidade a fama e o bom r.ome dos reis.

Rui do Pina recebeu várias tenças de D. Manoel. E certo que, nSo obstante isto, nós vemos este cronista nao ocultar na Cr. de JD, João II as suspeitas de envenenamento, que iam atingir precisa- mente D. Manoel, o seu amigo e protector, e vemos tambôm Cíista- nheda no liv. x da Hist, da índia censurar asperamente os fidalgos que se d^^sonraram no segundo cerco de Dio. Mas também vemos que quando e onde apareceram a independência e o "desassombro logo surgiu a influência cortesã ou impedindo que a obra se impri- misse, ou obstando á sua divulgação, ou procurando suprimir ou acrescentar nela o que era consoante os seus interesses como suce-

* Foireira, Curso, cit., 286.

* Pinheiro Chagas, Hisi. dt PorL^ u, § 611, pág. 53.

cxprryjjo I] ESCOLA dos foetab talagunos e dos cronistas 93^"^

deu com Damião de Góes, com Gaspar Corrêa e Castanheda. O que i^to &íg'nifica, pois, é que os cronistas d»vem ser lidos cora certas precauções, pixicurando-se sempre que seja possível contraprovar os sea9 dizeres cora outros testemunhos, ou, o que é o ideal, recorrer aoe próprios documentos originais emanados dos seus autores sem preocupações de passarem á posteridade ^.

44. FERNÃO LOPES (1380?-1450?). Quási nada sabemos da ^da do nosso primeiro historiador. Investigações recentes apenas nos revelaram a modestLa das suas afinidades indicadora, por ven- tara, da sua estirpe. De concreto nada sabemos nem da sua fa- mília, nem dele, nem das condições em que se educou e preparou para a sua missão de Cronista. Vemo-lo por D. João i nomeado ^^arda do Real Arquivo ^, depois Torre dor Tombo, car^o que exerceu durante trinta o sois anos, sendo substituído, quando fraco e velho, por i^íiravii. C^Jiiuivlo D. Diiarte subiu em 1434 ao trono encarregou-o de « fie poer em caroiií/ca as estarias dos reisy que antijgamente em Portugal forom «... os grandes feytos e altos do muy v^.rtuosOy e de yrand^s "oertudes, rei seu senhor e padre)) (D. Jorio i). Em cbedieiícia a esse mandato escreveu : a Chrónica d^El-reí D. rToão I de boa -iixeniória ', que contém álêm das duas partes, obra 8un, a ter- ceira sobre a tomada de' Smta, escrita por Zurara ; a Chrónica do xtnhor vei D. Pedro / o a Chrónica do senhor rei D. Fernando *.

Tinha-se até pouco como anónima a Crónica do Condestável D, j^itiio Alvares Pereira afirmando-se apenas que F. Lopes a utilizaria largamente, em especial na Cr. de D. Joào l chegando a transcreve-la literalmente. Uma análise minuciosa entre es>as duas Crónicas levou A conclusão de que o autor ó indubitavelmente o mesmo Fernão Lopes, que a deve ter composto entre 14;U e 1443 ^.

» * J<Sé Caldas, História dum Fogo-morto . . . Porto, 1P03, pág. xxit ; id. , Btmiffna verba^ Coimbra, 19Ó7 ; Braamcamp Freire, Amarrado ao y^<íwrif^h.o^ Liisboa, J907.

* A história do nosso Arquivo Nacional está feita : J. Pedro Ribeiro, Slent^ autênticas, Lisboa, 1819; Pedro de Azevedo e A. Baião, O Atch. da Torre. <^ Lisboa. 1905. A sua origem parece datar dos primeiros monarcas, esta- belecimento fixo entre 1390 e 1416, e talvez antes, por 1375 com D. Fernando. ^o reinado fie T). Jo9o i estava na Torre do Castelo de Lisboa, chamada do TonJfa por estar o Livro dos Tombos da' Coroa ou próprios da Cor<*>a, antiga- jji^ate f^ecabedo Regni, princip'ando desde aquele monarca a dcs íxnaviío quási constante de Torre da Tombo, J. Silvestre Ribeiro, Primeiros Traços, 157.

3 Lisboa, 16414; 2.* ed. 1897-98; 3." é a reprod. segundo um Mss. da Torre do Tombo, cópia ordenada por D. Manoel, portanto da mnior fidedigni-

^^^ primeira Parte da Cr. de D. João I. Ed. do Arquivo líist. Portag,

1915 I XX -r 388, Ed. primorosa dirigida pelo Sr. Braamcamp Freire.

* Ambas n.i Collecção de Liv. inéd. da Hist. Poftug. iv, 1-20 e 121-525.

* Essa reivindicação é gloria do Sr. Braamcamp Freire no estudo magis- tral que sntepõc á ed. da Crónica de D. João, que nos deu em 19i5. Antes

Todas estas obras se distinguem pela fidelidade, clareza da expres- bSo, vigor c nitidez do8 qnadros,'

« Nas fhrófticas de Fernão Lopes aKo hA história, escreven A. Herculano; hd poesia c drama: hti a idade-raédia com sua fé, sen entusiasmo, seu amor de gloria ' ». Pode dizer-ae que as obras do grandp. historiador ' sam o que a idade-média no» legou do mais perfeito. Nada lhe falta colorido, vida e entusiasmo. Uma geraçSo inteira com as suas ambiçSea e as suas lutas surge nas pdt^naâ das suas crónierts. Se llie fosse possível conhecer a revolução scientífica que depois dSle se operou não teriamos qiio invejar ás oittras nações nerhum dos seus liistoriadores. A descrição do cerco de Lisboa, a da batalha de Aljubarrota, na Cr. de D. JoSo i, o retrato de D. Pedro I, na Cr. di^ste monarca, traçado a cOres inolridáveis como quando por suas mãos aplica justiça ao Bispo do Porto ou a manda executar eôbra os assassinos de Inês de Castro, ainda na Cr. de D. Fernando o, que ôle escreve sobre a intrigante figura de Leonor Teles e setig amores com O rei, etc, sam quadro.=, que o pincel dum grande arfista poderia ter desenhado.

Fenlinanil Denis, que foi um cultor tam justo o tam conhecedor da nosBi literatura, considerava Ferniío I-opes como historiador su- perior ao seu século e aprovava a opinião de Dias Gomes quando este crítieo escrevia que lôra êle o primeiro que mais dignamente escrevera a história na Europa '. Nisto vai o $ea melhor elogio.

45.-GOMES EANNES DE ZURARA (f 1474) nascido no segundo decénio do séc. xv sucedeu a FeruSo Lopes nos cargos de crónista-mór do reino e no de guarda da Toire do Tombo. Ks- creveu : a) Chnínica ãelrèi D. João I * terceira parte, em giie tt contém a tomada de iSeztta. Esta p. 6 a continiiai;^o das duas de F. Lopes. Itidopendentea escreveu b) Crónica. do Conde D. Pedro de Meneses ', em que refere os sucessos das guerras movidas pelos Mouros para recuperar n cidade de Ceuta no Uimpo em que o Conde lí. Pedro de Meneses foi capitílo da mesma cidade, i. é., desde a tomada de Ceuta cm 1415 ate o ano- de 14:17; c) a CV. de D- Duarte de Meneses ", trata dos feitos deste fidalgo desde a conquista

aproxima r;i-sí dessa ctinclnsío o Sr. Fsteves Pereira Acsd. rtas Sc. de I.isbDR, Boi. da segunda Cl . IX, 380, I.* ed. I52(>. Reeditci-a nos S.:bslMos para O es- tudo da Hist. de lAt. onde é o vol. xiv Cr. do Contlest. de Portugal, Coim- bra, l!lll de Xi.V, -1-234 piigs.

' Opúsculos. V, 1881. .

* Urnitmè de l'kut. 'it. du PorttiqnL cli. v, iiii"-. .13, « L.«l.nH, 1M1-. ,

' Na Vot. li' I.ir. inàl. rf-i fíiit. Pirtiig. II, jin cedida ilnm esliido do abndc Cfriêa da S-ira. ,

■■■ N",i iiic^mí Vnl. III, de 1793 Cfr. s.'bro eata? Vrf. o líol. de BMi«gr. Porliiff., CiiMilr.i, 1879, jág. 49.

}.'

CAPÍTULO II BBCOLA DOS POSTAS PALACIANOS S DÇS CBONrSTAS

de Alcácer Ceguer, de que êle foi capitão em 1458 até o ano de 1464, em que morreu para salvar a vida de D. Afonso v na entrada que fez até á Serra de Benacoin. Foi este monarca quem lhe ordenou que deixando todas as outras ocupações do seu cargo escrevesse x)s ^ feitos de D. Duarte. Para bem cumprir esse mandato fez a viagem á Africa, onde esteve um ano desde 1467 a 1468 recebendo ai a Carta a que aludimos '^ d) Vem por úJ.timo a Cr. do descobri- mento e conquista de Guiné *. Nesta revela o seu grande saber. A par dft Biblia e dos escritores eclesiásticos mostra conhecer os autores profanos tantp antigos, como medievais, revelando grande familia- ridade com as ci*ónicas e histórias e até com as novelas de <^ valaria francesas, itaUanas, alemãs^c espanholas '.

Zurara foi acusado por DamiSo de Góes de palavroso e inchado. Mas ninguém lhe contestou a sua fidelidade como historiador. O amor da verdade levou-o a empreender essa viajem a Africa a fim de estudar os logares e as circunstâncias dos iactos, que tinha de referir. Na intumescência retórica tam afastada da lhaneza de dizer do seu antecessor, salva-o a sinceridade com que escreve.

Lendo as diversas obras de Zurara, escreve ura erudito con- temporâneo, álêm das afirmativas terminantes e reiteradas de que procura interpretar a verdade, trçchos que nos denunciam, a par dum espirito recto e esclarecido, superior aos preconceitos do seu tempo, uma alma bondosa e internecida, que se compadece com o sofrimento dos outros. E^ sem dúvida lisongeiro e curva-se reverente e adulador diante da pessoa de D. Afonso v, mas também seria in- gratidão ue não se mostrasse reconhecido aos benefícios que a cornu- cópia rial despejava de contínuo sobre a sua cabeça *.

46. RUI DE PINA (14407-1521?) Foi o sucessor ime- diato, nSo de Zurara, mas de Vasco Fernandes de Lucena que

* Vid. adiante na Antologia.

* Ed. de Paria, de 1841 ! Foi Ferdinand Denís quem descobriu o ori- Çinal desta Cr. na Bibl. de Paris. A ed. foi feita por diligência do visconde da ^Jwreita e nela colaborai am o visconde de Santarém e J. l. Roquette. O Sr. Wgar Preatage verteu-a para inglês para a colecção Hakluyt Society. Nfsta wreao de págs. xiii a lxvií da Introd. ao t. 1,° vem um estudo do Sr. Preptngí^ *>bre a vida e escritos do Crónists. Sobre Zurara, vid.: Ined. da Hi^l. Por- %., cit. ;- 8r. Gama' Barros, Hist. da Adrniniêtracão, ii, nota xiv ; Ernrsto <io Canto, Boletim de Bibl. Port.; Sousa Viterbo, lieo. Portug. Colovial o, Ma- rjtima, n.*> de 20 de out. de 181^8 (n.<> 18 do 2.® ano). Traz altíumas cousas ^^^Mitas, fixa a data da morte do cróuista, etc. Veja-se também d»^st'í último au- *w o artigo A cultura intelefítuai de D. Afoneo V no Arch, Hist.^ ii ilOOt, 254eseg.

3 Rebelo da Silva, Hist, de Port., v, 266.

* Sousa Viterbo, Jiev. Portug, Colonial e Marítima, cit, na nota anteeedente.

96 HISTÓRIA. DA LITKBATU&A PORTUGIUèSA

desempenhou de 1435 a 1497 papel notável como Dr. ccutriusque júris», cujo nome não registamos aparte por dele nSo restar uma página original em história. Todo entregue á vida politica em Por- tugal brilha em 1438 nas Côrt<?B de Torres Novas e em 1481 nas de Évora ; no estranjeiro foi enviado de Portugal aos concilies de Basilêa (1435) e Bolonha e fez parte. das embaixadas enviadas por D. Afonso V a Nicolao v e Inocêncio vm nao pôde ocupar-se dos estudos histó- ricos necessários para pod**r desempenhar as obrigações do iseu cargo, de que desistiu a favor de Rui de Pina, em 1479 ^ Este cionist& também envolvido em cargos diplomáticos, pois coijio secretário acompanhou a Castela D. Joào da Silveira, bar?io de Alvito, em 1482, no mesmo cargo foi a Roma felicitar o Papa Inocêncio Viii e esteve de novo em Castela e Barcelona em várias njissÔes, consagrou-se, por fim, ,aos trabalhos oficiais de historiador. Como tal é, decerto, su- perior a Zurara, mas de merecimento inferior ao antecessor dos dois* Gozou da estima de 1). João ii, que o nomeou cror.ista-mór e guarda da Torre do Tombo, recebendo, tanto deste rei, como de D. Manoel, muitas mercês e honrarias. Viveu ainda alguns anos no tempo de D. tloão Jii e parece ter deixado apontamentos para' uma' crónica de D. Manoel, que Damião de Gocs aproveitou. E' grande o número das crónicas, que lhe sam atribuídas: de D. Sancho i ^, D. Afon«o ii'*, D. Sancho U *, D. Afonso iii ^ D. Denís % D. Afonso IV ', D. Duarte *, D. Afonso v •', e D. João ii '^, mas a substancia dalguma delas deve pertencer a Fernão Lopes, cujos apontamentos ele utilizou nao se podendo cakular^em que medida, visto se terem completar- mente perdido, supondo A. Herculano que o culpado da desaparição- foi o próprio Pina, « pobre corvo do Joào ii que se quis adornar com

^ Herculano, Opúsculos, v 17. As obras de Lucena raras foram impr. e dessas resta o Discurso em latim De Obedientia pronunciado em Roma em 1485 perante o P. hioc. viii, impr. e que se salvou na reimpr. feita no Jornal' de Coimbra, 1813, lu, 309-323.

Os Mss. com trabalhos dêlc que existiram até 1755 na Bibl. Rial e no Palácio do Duque de Aveiro perderam-se na catástrofe do terramoto.

Uma antiga trad. fr. de Quinto Curcio pertence a outro individuo do- mesmo nome, mas nSo a élc Cr. Inoc. xii, 402, Dicc, Bibl.

'^ Ed. por Miguel Lopes Ferreira, Lisboa, of. Ferreiriana, 1727.

3 Ed. do mesmo e na mesma of. 1727.

* Id., Ibid. 1728. » Id., Ibid. 1728. id., Ibid. 1729.

■^ td. de Paulo Craesbeeck, na of. do mesmo, Lisboa, 1653.

* Inserta na Coll. de liv. inéd. da Hist. Portug., i, Lisb*.'a, of. da Acad* rial das Sc, 1790. A Cr. de Duarte foi reimpr. em ed. da Renascença Portug. dirigida por A. Coelho de Magalhães, Porto, 1914, 1 vol.

^ Id., Ibid. ^0 Id-, Ibid.

CAPITCLO II BSOOLA DOS POSTAS PALACIANOS E DOS CBONISTAB

Ò7

p6Qna8*de pavão do Homero de JoSo id. A sua alta sitaaçao na cort^ tornava-o temido, procurando até homens eminentes, como jâLÍbiiflo de Albuquerque, mendigar-lhe elogios a troco, «de anéis de distmantoB e rubi$ e de muitas é preciosas jóias it de maneira quo «nSo se esquecesse dele quando escrevesse das coisas da índia» *. «Aquele cujo nome devera encher o mundo nao teve a cons- oiêiscia de que era o maior capitílo do século e creu que a sua imor- talidade dependia dura cronista obscuro! Triste documento de que os

íos mais portentosos est^m, como os homens ordinários sujeitos ás

is ridículas fraquezas I »

47.-BÍOGRAFIAS. CRÓNICAS RELIGIOSAS E OBRAS

DIVERSAS. Não obstante a sua designação individual, interessa á história geral do pais na ^ época a que respeita a Cr, do Infante Sardo, obra do seu capelão e companheiro de exHio Fr. João Alva- res. £' um verdadeiro modelo de naturalidade e desafectaçào de lin- guagem, de clareza e de simplicidade merecendo contar-se entre os mais formosos escritos da nossa literatura quatuorceptista '.

A Cr. da Ordem dos Frades Menores, hd pouco publicada ', parece ter sido redigida pelos meados do séc. xiv- O Mss. existente traz a data de 1470, mas talvez não seja o primitivo, sendo antes cópia doutro mais antigo. Ignora-se quem seja o autor, ou melhor o tradutor^ visto tratar-se não duma obra original, mas da versão dum texto latino. E' mais uma obra que vem enriquecer notavelmente o pecúlio reduzido desta época.

Pelo pitoresco das notícias e subsidio que fornecem á crítica <do6 costumes da época merecem ainda conhecer-se as quatro Cartas que Lopo de Almeida escreveu em 1451 da Itália a D. Afonso v flSbre a jornada, recepção e festas realizadas por ocasião do casamento de D. Leonor, irmã do rei, coin Frederico iii, imperador da Ale- manha ^.

* O caso tornou-se conhecido por Barros (Asia^ 1. vii, c. i, fl. 98 v: da 1.» ed., 15Õ3) qae o ieu em cartas particulares enviadas pelo grande Aibaquer- ^ao ao Cronista. Vid. Sonsa Viterbo, Aa dadivas de Afonso d' Albuquerque no Areh, Ii\9i., II, 4-7. O Compêndio e sumário das grandezas e cow^as notáveis que entre Douro t Minho, e sua comarca, viHas pelo muito douto Ruy de Pina é opúscalo raro, impresso em 1608, de 16 pág. somente.

' A ed. príncipe é de 3527. Reimprimí-a noa meus subsídios Cr. do l9 fonte Santo,., segundo um Códice Mss, do séc. xv, Coimbra, 1911, xxiv 4-183

5 Cr, da Ordem dos Frades Menores Mss, do séc. xv agora publicados inieiramente pela i." vez,,, por J. J. Nunes, 2'Vols., Coimbra, 1918.

* Podem lêr-se em Sousa, Provas da Ilist, Geneal, i, 633; foram reimpr. oa Bev, de Hist, viii (1919), 293.

ANTOLOGIA

SÉCULO XV

POESIA

Trouas q Garcia de Resende fez a morte de Dõa Ynes de Castro, que eirrei Afonso o quarto, de Portugal, matou em Coimbra, por o príncipe Dom Pedro, seu filho, a .ter como mulher, e, pelo. bem q lhe queria, nam queria casar.

ENDEREÇADAS HAS DAMAS

Senhoras» salgum senhor Vos quiser bem ou servir, Qaem tomar tal servidor, Eu lhe quero descobrir O gslârdatn do amor.

A mynha desaventura Nam contente decabar-me, Por me dar mayor tristura. Me oy pôr em tantaltura Para dalto derribar-me.

Por sua mercê saber O que deve de fazer. Vejo que fez esta dama Que de ssy vos dará fama, 8*estas trovas quereis ler.

I\íla dona Ynes,

Qual será o coraçam Tam cru e sem piadade, Que lhe nam cause paixam HQa tam gram crueldade, E morte tam sem rrezão ?

Que se matar alguém, Antes de ter tanto bem, Em tays chamas nam ardera, Pay, filhos nam conhecera, Nem me chorara ninguém.

Eu era moça menina. Per nome dona Ignês De Crasto ; e de tal doutrina E vertudes, quera dina De meo mal ser ho rrevés.

Triste de mym, ynocente, Que por ter muito fervente Lealdade, fee, amor, Ho, príncipe, meo senhor, Me* mataram cruamente.

Vivia sem me lembrar, Que paixam podia dar. Nem dala ninguém a mym. Foymo princepe olhar. Por seo noj' e mynha fym.

100

AICTOLOaiA

POESIA

Começou-ma desejar. Trabalhou poi me servir ; Fortuna foy ordenar Dous corações conformar A húa vontade vyr.

Meos filhos pus derredor De mym, gram omildade, Muv cortada de temor Lhe disse : «avey, senhor, tt Desta triste piíidade!»

Conheceo-me ! coiihecioo ! Quys-me bem ! e eu a elie ! Perdeo-mc ! também perdi-o ! Nunca tee morte foy frio O bem que, triste, pus nelle.

tt Não possa mais a paixam Que o que deveys fazer ; Jvietey nisso bem a maní Qu'é de fraco coraçam Sem porquê matar molher.

Dey-lhe minha liberdade, Kani senty perda de fama ; Pus nele minha verdade ; Quys fazer sua voatade. Sendo muy fremosa dama.

Quanto mays a mym. q dam Culpa, nam sendo rrezam Por ser mr.y dos ynocentes, Qu'ante vós estam presentes. Os quaes vossos netos sam.

Por m'éstas obras pagar, Nunca jamais qnys casar, Polo vjuai aconselhado Foy elrey. quera forçado, Polo seu de me matar.

« E tem tam pouca ydade, Que se não forem criados De mym, soo com saudade, E sua gram orphindade, Morreram desamparados.

Estava muy acatada, Como princesa servida, Em mcos paços muy honrada : De tudo mui abastada ; De meo senhor muy querida.

Estando muy devaguar. Bem fora de tal cuidar. Em Coyííibra dassesego Poios campos de Mondego Cavaleyros vy somar.

Como as cousas qu'am de ser. Logo dam no coraçam Comecey cntrestecer E comiguo soo dizer : w Estes omcês d 'onde vrãm ? »

E tanto que preguntey. Soube logo queera elrei ; Quando o vy tam apressado, Meo coraçam trespassado Foi, que nunca mays faley.

E quando vy que decia, Sahy á porta da sala, Devinhando o que queria, Com gram choro e cortesya •Lhe fiz hQa triste fala.

Olhe bem quanta crueza Faraa nisto voss'altessa ; E também, senhor, olhay. Pois do princepe sois pay, Nam lhe deis tanta tristeza.

« Lembre-vos o grand*anior, Que me vosso filho tem, > E que sentiraa gram dôr Morrer-lhe tal servidor. Por lhe querer grande bem ;

Que, salgíi erro fizera Fora bem que padecera, E questes filhos ficaram Orfaaos tristes e buscaram Que deles paixam òuvera.

a Mas poys eu nunca errey, E sempre mcrecy, mais Deveys, poderoso rrey, Nam quebrantar vos a ley, Que, se moyro, quebrantays.

i> Usay mais de piadade Que de rrioor nem vontade; Avey doo, senhor, de mim, Nam me deis tara triste ficn,- Pois q nunca fiz maldade. »

■AoijIA XT

lôi

Elrref, vendo como estava, Ouve de mym compaUam £ vjo o que nam olhava, Qu'eu a cie nam errava, Nem fixera traiçam;

E, vendo qusm de verdade Tive amor e lealdade Hcx> princepe, cujn sam Pòú^ mais a piadade Que a determinaçam ;

me ele defendera, QB'a seu filho nSo amasse, Ifa' eu nam obedecera, £otam com rrezám podéra Dar- ma oioorte, qu' ordenasae.

Mas, vendo que nenhfl ora Oes que nacy atégora, NuDca nisso me falou. Quando se disto lembrou pola porta fora,

Cam se^ú rosto lagrimoso, Co propósito mudado. Muyto triste, muy cuidoso, Como rrey muy pia doso, Muy crista ra e esforçado.

HQ daqueles que trazia Comsi^o na companhya, Caraieiro desalmado, Oetras dele, muy yrado, Estas palavras dezià :

«E Senhor, vosa piadade « He dina ic rreprender,

Pois que, sem necessidade, V Madaram vossa vontade

- La^rymas dQa molher.

« £ quereys qu'abarregado, « Com filhos, como casado,

- EAté, senl\or, vosso filho?

De vós mais me maravilho, . Qae <lele quee namorado.

« Sc a lof^uo nam matais, \ « Nam sereis nunca temido, « Nem faram o que mandays, •« Poys tam cedo vos-mudays > IJo conselho qae era ávido.

« OUiay quam Justa qaerda « Tenaet pois por amor dela I « Vosso filho quer estar « Sem casar e nos qaer dar « Muita gueíra com Castela.

« Com soa morte escusareis « Muytas mortes, muytos danos; « Vós, senhor, descansareis, « E a vós e a nós dards « Paz para duientos annos.

«O princepe «casará « Filhos de bençam terá <c Seraa fora de pecado ; .• a Qu' agora seja anojado

« Amanhã lhe esquecerá. »

E ouvyndo seu dizer Elrrey ficou mi^y torvado. Por se em ta es estremes ver, E que avya de fazer Ou h\X ou outro. . . forçado.

Desejava dar-me a vida Por lhe nam ter merecida A morte nem nenha mal ; Sentya pena mortal Por ter feyto tal partida.

E vendo que se lhe dava A ele tod' esta culpa, E que tanto o apertava. Disse aaquelle que bradava: >-« Minha tençam me desculpa:

« Se o vós quereis fazer, « Fazey-o sem mo dizer, <t Queu nisso nam mando nada, «Nem vejo en essa coytada Cl Porque deva de morrer. »

Dous cavaleyros yrosos. Que taes palavras Ih^ouviran Muy crus e nam piadosos, Perversos, d esa morosos. Contra mym rijo se-vyram!

Com as espadas na mam M atravessam o coraçam ; A confissam me tolheram; Este he o gual ardam Qua meos amores me deram.

G. de Resende, Canc. Geral , v, 357.

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AKTOLOOIA POSBIA

11

Fingimento de amores

Eram da sombra da terra As nossas terras cubertas. Quando parecem desertas As abitações sem guerra. Ao tempo qae rrepousam Os corações desça nssa dos, E os malfeytores ousam Cometer mores pecados.

De muy escura neblyna Fra o ar todo cuberto; Devia ser daly perto O iGgoar de Prosérpina. O fogo sem sapagar; O ma II sem comparaçam Podiam bem demonstrar O dominyo de Plutam.

Os nove meses do ano Eram casy passados Quando eram meos cuydados. Crecydos por mais meo dano: E aasy com mall.tâm forte Mays crecendo mynha fee Yy passar além do pett As guardas do nosso norte.

3

Se dormia não sey certo, Se velava muyto menos : Com ineos males n9o pequenos Nem durmo nem sam desperto! Nam mestrevo de torvado Dizelo, nom sey se caie,.. . . Daly me senty levado, E posto nu fundo vale.

vy camarás pintadas Com rricos patyns de fundo. Dos rricos diiqueste mundo Por demasia buscadas. Nem vy ssuaves cantores Com vozes muy acordadas, Mas muy discordes clamores Das almas atormentadas.

8

vy aves muy suycjosas,. Que cantassem docemente; Mas bradavam fortemente Serpentes muy espantosas. Aiy prazer nom senty. Antes descontentamento ; Toda cousa, qualy vy. Era para dar tormento!

ó divina sapiência! De todos tam desejada, E de mym pouco gostada Por nom ter siifficiencia. Fazeme tam sabedor Que possa dizer aquy, Com favor do teu favor As grandes cousas que vy.

o

Por este vai corria Húa tam funda rribeyra, Que estando juncto da beira Escassamente se via ! Tanta tormenta soava Naquele lugar eterno Que se me rrepresentava Quanto dizem do ynfferno t

Daly quisera salvarme. Do que via temeroso, E das armas do medroso Junctamente proveytarme; Mas achar não pude vya Pêra me poder salvar ; Em tam mostrey valentia Para mavs me condenar.

10

E sem fazer a vontadt Nem esperar por saúde, Quys aly fazer vcrtude Da mynha necessidade: E também por ser sem falha Esta verdade, que digo, Cos que fojem na batalha Passam «empre mór perygo»

SÉCULO ZT

103

11

£ como faz quem peleja, Vendo-ae desesperado. Por honrra tomar forçado A morte que deseja; Assy me fuy juntamente Donde o togo mais ardia. Por viver honrradamente. Ou morrer como devia.

16

«Somos passados de íryo Em grandíssima quentura ; A vida nam tem segura Quem bebe diqueste rryo. Que neste fogo penados Sejamos sem esperança, Mata-nos mijf a lembrança Dos prazeres ji passados !

12

Assj de todo mudado Aly junto me cheguej E neste modo faley Assaz bem temorizado. O ]entes atribuladas! Por que rraz9o de vós dê, Dixey M causa porquê Scês assy atormentadas.

17

«Polo qual, se tu quiseres Ser livre de nosso mall. Trabalha quanto poderes Pór fugir caminho tall. Sempre te guie rrazam. Governe como cabeça ; Â vontade ihobedeça. Sem outra contradiçam.

13

LéOgo de todoxessarâm Oaqueles grandes tomultes ; H com muy disformes vultos Para mv todos olharam I E lo^^o salevantou £>antre todas húa delas, H sem culpar as estrelas Desta maneira falou :

.18

« E se quereys saber mays Porque des conta de my, Sam hua dos que decendy Nos abysmos ynfernaés. E fuy com tall ventura Que quanto quys acabey, Mas depoys me condeney Por nom guardar a postura.

!

14

«Este pranto tão durído, I2e tantas tribulações, Sam os justos galardões Dos ssecaçes de Cupido : Que por lhe sermos leaês Tanlas mortes nos persseguem. Que nossas dores mortaés Som muy mays das q se segue.

19

« E por mays certos signaes Dem Rudice íoy marido, Por ela mesma perdido Nestas penas ymmortaes. Eu fuy aquelle couvistes Que na música soube tanto. Que fyz com meu doce canto Nom penar as almas tristes.

15

c Penamos pelas folguãças Que vivendo procuramos ; Que é jrtn possível q ajamos Doas t»emaventuranças. Qoe seria gram destórea, E juizò muy prafundo. Levar prazer no mundo, £ neste ntro tam bem grorea l

20

« Aquessas outras cõpShas Que penam nestas cavernas Antiguas, tlbem modernas, Son de mil terras estranhas. Que jámays se passa dia Quaqui nam sejam trazidos.. Ht muy espaçosa via A que seiri""i nos perdidos.»

SâCTDXiO Xf

105

E por jsso que partays, Em qualquer parte questejTS, Em meu coraçam íycaysi Poys nellc vos converteys.

Rui Gonçalves de Castello-Bianco, Cone. Geral, lu, 138.

IV

Comiguo me desavym: Ve)o mem grande periguol Nam posso vyver comyguo Nem posso íogir de mym I

Antes queste mal tevesse Da outra gente fugya : Aguora fugyrya De- mym, se de mym podésse !

Que cabo espero, ou q fym Deste cuydado, que syguo Pois traguo a mym comiguo Tamanho imiguo de mym I

Francisco de [de Miranda] Cane. GercU, iii, 152«

CojtAào quem me-daraa Novas de mym, hondestou; F^ois dÍ2eys que nam som laa E caa comigo nam vou !

Todeste tempo, senhora. Sempre por vós preguntei ; Mas que farey, que aguora De vós, nem de mym nam ssey ?

Olhe vossa mercê laa Se me tem ; se me*matou ; "Porqueu vos juro que caa Morto, nem vyvo, nam vou!

Francisco de [de Miranda} Cane, Geral, iii. 154.

VI

ForQ meu mal sy dobrase voa fez Deos fremosa tanto, que nam sej santo tàm santo, q«e pecar nam desejasse.

Polo qual sey, que me vejo de todo ponto perder, por nam ser em meu poder partir-me deste desejo.

Mas quem meste malfadasse, e me traga dano tanto, praz-me; poys sey tam santo, que pecar nam desejasse

Condel moi, Cane. GercU, i, 210.

P0j% alinha triste vêtura 110 meu mal ni faz mudança quesn me vir ter esperança, cajde que é de mais tristura.

VII

E poys vejo que em morrer levays groria nem pequena, antes nam quero vyuer, que vyuerdes vos em pcna«

quero triste sepultura; quero fjm sem miis ta poys nunca tjue esper que nam fo«K de tclsti D. Júão de Neoeses, C^anc. Geral, i, 113.

VIII

Folguo muyto de v(

pesa-me quando vos vi

Como pod 'a quisto sser

' que ver-vos he meu di

Isto nam sey que o nem donde tall mall n

sey bem que vos qucrt com quanto dano me I Mas yatee para descrei ter senhora tam grant motrer muyto por vos pesa-me quando vos v TrisUtn TeyieTr», Can*. Geral, ij, 148.

IX

Senhora, parlem tatrlstes meus olhos por vós, meu bê, que nOca tam tristes vistes Outros ncnhQa por ninguém I

parlem tam tristes os

tam fora desperar bem

que nOca Iam tryites ^

outros nenhuns por ni

João Rodciguts dt Castíllo-Braaco, Cana. (

Versos trocados entre q Infante D.

Nom vos será gram louvor Sab

por iL-tdes de mim louvado, grai

que nam sam tam sabedor corí

em trovar, que yos dei grado. em poesias trazer.

Mas meu desejo de giado Ou dt novo as lazer

a mim praz de vos louvar, hu compre com gram meestria

e vós o podeis tomar de comparar meiliaila

tal quejando vos é dado. dos outros deveis aver.

^ Sam importantes como docDmento. vem a alusão is via)>ens do I CDmo it tê, profunda mente haviam impressionado os seus coatemporSneos. S ito do Canc. Otral, ed. da Imor. da Unir., ii 22S.

SÉCULO XY

107

Oamor trovador sentido, como a quem seu mal seiítio, e o ouve bem servido, e os seus segredos vio» £ de todo departio mui formoso, e mui bem, como pode dizer quem vossas copras ier ODvio.

De louvar quem a vós praz aconselhar lealmente, dcsto sabeis vós assaz, e fazei-lo sajesmente. E assentar soo presente creo nam terdes ygoal. de conssoar outro tal, iulgue-o quem o bem sente.

Por todo esto sam contente das vossas obras que vejo, e as nam vistas desejo, faze-me delas presente.

Resposta de D. Joam de Mena

Príncipe todo yaliente en los fechos muy medido, el sol que naace en oriente se tiene por ofendido de vnestro nombre temido, tanto luze en ocidente. Soes de qnien nunca os vido Amado publycamente, tan perfecto esclarecido, que por serdes bien regido, Dios vos fizo éu Regiente.

Vos de reis engendrado,

y de reis engendrador,

hijo díno muy loado

de rey santo, vencedor,

Linaje dempprador,

Cabeça de gran senado

De lealtad v damor

tam gram fruto aves mostrado,

que a vuestro gran onor

Dos creys y huQ sefíor

Son y és muy obrigado.

Nunca fne despues ni'ante quien viesse los atavios, y secretos de levante, sus montes, inssoas y rios, sus calores y sus frios,

Ii6 INTOLOOIA POUIA

como vos senhor líante, Antre moros y Judios esta gram virtud se cante, entre todos três gentios * cantaran los metros mios nttestra períedon delante.

Vos de my no dar loores, *- Mas recebirlos devets, vós gram sefior de seflores que aveis fecto 7 fazeis tanto que grandes astores rouj ocupados tenels. Eu dezlr vuestros dolçores, porque siempre vos llamels príncipe de los mejores porque creçam les lavores desse rreino poitugues.

REPRieA O INFANTE

Como terra frutuosa Joam de Mena respondestes com messe mui abastosa do fruito que rrecebestes. Mas em esto vos errastes louvar mais do merecido, mas por mim he rrecebldo, que louvando me ensinastes.

FIM

Aquelo que devisastes seguirei a meu poder, se quer que po^m dizer, que muito nam sobejastes.

PROSA

XI Prefácio da VITA CHRISTl

Prohemial epistola ao serenissimo príncipe elRey potentissimo e senhor dom Joham o segundo Rei de portugal e dos algarues daquê e daj^m mar em affrica Senhor de gujnee dirigida preposta em a lectura da vida de xpo pef orden9ça e mandado da muy esclarecida de sangue e virtudes e antre as prince- sas da cristandade y ilustríssima senhora Raynha dona Lyanor sua muy virtuosa molhér Inpressa pellos honrrados meestres e empressores felicemente se co- veça..*

8ÉCVLO XJ lOd

Visto como nesses regnos som miiyto mais os vulgaccs que os que a língua latina conhecem : querelo apuestar aa sãiuaçam dos muvtos por em vida eterna receber moor ^uariadam : aos taaes per xpo ja pormetido (sic). mandou |D. Leonor] estflpar e de forma fazer em lingoa materna e português linguagem : como de feiío com divino favor per obra comprio com muyta dispeza de sua fazenda : por serviço de nosso senhor e porvefto comuu : as quatro partes do livro intitulado vita xpi.nom aqueite apócrifo da infância do saluador : mas ho ordenado e composto pello reverêdo padie Ludolfo cartusiano : chamado meditações da vida de Jhesu : no qual se cotem todoi os mjsterios da ffé catho- lica : segudo ii escriptara dos quatro evangelistas e notários cristtculos : com verdadeyras e deuotissimas exposições de diversos doctores r egrégios : dovo-^ tos: c muj- gloriosos... * '

A qual obra tam virtuosa e como ptecçe assi castigada pello uenerauel padre e devoto religioso frey andree observante da religiam de sam francisco de vossa e sua alteza orador devotíssimo : emendada e bem corregida em ho modo de sentencias. E posto que dos antigos vocabios na pscnte obra algus se adiê q aos modern* destes nossos lypos : os quaes de gentijs e doces termos se prezam c cnueterados como grossos emge tam : gosto de suavidade nom offereçerem nem ha queirõ de si como cousa fastidiosa e insípida vomitar dos novos vocábulos a esse dado causa muy grade donde ho dicto padre he mais digno de vénia que de reprehensom. E assi a dieta corrccçom clara e illucida: a petíçam e mSdado da dieta senhora Raynha com muyta dilígecía eu Valétina d Moravia co meu parceiro Ncolao d Saxonia açeptamos de fazer. . .

Acabase a prohemial epístch di rígida pellos imprimedores ao ■sereníssimo príncipe e Rey puté tissimo Senhor dom Joham ho seguindo Rey de portugal

XII

Retrato de Jesus Cristo

Liee-sc nos livros Snuaes que. ham os romaSos que Jesu Cristo que he chamado dos gcfitios Prophetj da verdade foy de statura do corpo gr.indc nom descompassada, mas meaA'e vistosa e honrrosa e reverente. E a cara teve digna de honrra a qual poderiam amar e tem?r os que o vissem. Os seus cabe) los erS de avctlaã madura e chegavH aas orelhas yguaes e chatos e daily ao fundo quanto quer crispos e louros e cobria e avnnavâ sobre os ombros. E no meio da cabeça tiinha hua spartadura segundo costume dos nazareos. A testa cliSa e muy clara e a face seii emverrugadura nem magoa : a qual afremosontava a verme- »h!dom temperada. Do nariz e da bocj nom avia tacha reprehendimemta aigau. A barba era grossa ou farta de cabel'os nom longa, mas na fim forçada. E sem esgua rd amento era simprez e sesudo; os olhos de collores e claros; em sen repreliender muy spSntoso; em amoestar blído e mavioso; alegre pesso. Alguas vezçs chorou mas nflca rijo. fim a feitura do corpo bem fundado e direito. As maSos e brnços muy bem parece tes; em a falia pessado e de autori- dade e l)em a razoado de poucas palia vras e cerras. E porem com razom diz a Psalmtsta : fremoso he em sua feitura sobre todos os filhos dos homês

Vita Chriêtij ProhemiOj foi. ti t., 2." col.

110 ANTOLOOTA rBO»A

XIH

-Jesus Cristo e a Samaritana

Começa-se o livro segado intitullado de vida de Cristo em Hngoagem português, . .

E foy-se outri vez Jesus a Cialliiea. . . a çerca de SícHem cidade de Sa- maria onde stava a tonte que Jacob abrira. . . e veyo huua molher do regno de Samaria... a tirar agua e demftdando-lhc o Senhor augoa por o trabalho e fadiga do caminho. E conhccêdo-o a molher cm as faidrasdo mantom por judeu porque assy como os judeus erã de visos delles em louvor e serviço de Deus cm a circQçisom, assi ti j nhã defferêça nos vestidos. Disse-lhe a molher :

Os Judeos husam conversa os Samaritanos. . . Eu vejo q Prophtta es tu.

E Jesus respõdédo disse :

Que lêpo vijnria em cj o evangelho seria publicado. E entõ os homês adoraria é Jherusalè em aqullfí mote. . mas os verdadeiros adoradores adorara ò padre em spiritu e verdade. '^

Nêguê pêro daquelles lhes disse q demfidas ou q falias ella? porque sa- bia que suj falia non seria sem proveito scgQlo se mostrou pela obra seguint^ porque tanta devoçom conçebeo e ouve ella da pallavra de Cristo que leixou a agua necessária aa vida corporrl por tal que sem detença fosse denuciar a Cristo.

De A segunda parte, . . ibid., foi. I[,

XIV

Do Requerimento da graça

Deus que he geeral começo, c fim, poendo graaos em as cousas que fez, ordcnoti pcra tal guisa o estado dos homõ^.s que em cada huu he achada mingua, e nenhiia condiçom he tanto ysenta (jue em falecimento nom aia sua parte: H por sse rnanteer tal hordenança prougne-lhe de poer natural afeyçom perquesse ífiudassem ai suas criaturas. E liou spyritualmente a nobreza dos príncipes, e a obedeença daquâles que os de servir com doce e forçosa cadea de benffeytu- ria per a qual os senhores dam e outorgam graadas, e graciosas mereces: É os sobdictos offerecem ledos, e volontarios 03 serviços aaquclles aque por natureza vivem sogeyíos, e som obrigados por o bem que rrecebem. Da virtuosa prísom daquesia cadea despojs que eu tive conhocimento, entendendo que he muy necessária em a geeral governança do mundo, e que por cila podemos aa fonte chegar que sobre todos sparge suas augas, e doutrem as nom riecebe: Propuse de screvcr a'gfiis cousas que ao bem fazer sam compridoyras con que eu filhasse n'"nbrança de f;í7er servM;o aaqnelle senhor em cuia obrigraçom todos iazernos. E sentindo o que diz o apostolo paulo em o nono capituilo da cp stolia aos rromaaõs que a bon uoontade nom tem seu primeiro começo em o deseiador, Nem tem o correr comprimento em o que faz : Mais a merçee de deus em cuia sperança todos uiuemoi usa de cada huu a seu prazimento: Conheci que sse nom pode íjjzcr boa obra sem aiudoyro daquclíe senhor cuia uirtude ao ucrda- deiro rcqueredor nunca sse nega : E querendo eu seer em companhia daquelles ue da persunçom dos seus entendimentos desciam sempre uiuer alongados Monho feuzi cn a uirginal mndre quede todallas graças he ministrador rogando-a P

SiCULO XT 111

tm aquesta gtiis;i = Vos senhora s^nta maria, mais gloriosa que outra persoal criatura, e uirtuosa posuydor em sobre auondante comprimento ; Em cuto uéntre de uircuosa pureza fez a deidade graciosa morada : £ ííoy geerado fruyto tempo- ralmente homem, que eternamente he deus geerado nosso remydor Chrispto lezho. perque nós sooes exalçada sobre todas Iherarchias dos santos principados : Per este nosso infyndo merecimcnti senhora vos peço hulmildosamentc que em Sua presença em tall guisa me façaaes seer gracioso, que mertça de servir, e loQuar eile e vôs: Compoendo esta obra ao proueyto daquelies aque sua dou- ctrina hc compiidoyra. E por eu merecer de a vossa petiçom seer a meu proueyto ouuida ofereço com toda humyldade meus fracos rogos em aquesta mancyra-= Padre nosso que sobre lodollos Ceeos sooes exalçado praza-nos án o vosso sancto nome ser iouuado per minha obra, em guisa que eu seia merecedor do celestial regno seendo a uooniade.do vosso prazi *iento comprida em my que om terra: Sguardaae senhor a my vosso fillio que na aruore da verdadeyracruz geerastes com grande door; E ueeJe como iaço no Vdlle da ygnorancia, deseiando de so- bir aa s^rra muito alta do conhecimento verdadeyro: Eporem seia vossa mercee de me outorgnrdes cada dia o p^m de vossa inffynda misericórdia, que sooes vós mesmo, perque eu receba sf forço pêra vos seruir em este aucto, e em qualquer outro: Ordenando boo começo com proucytoso mey ) poendo fim que a ny e aos outros traga melhoramento per guisa que nom soomente perdoemos aos que nos errarem; mas demos benefícios aos m «^stey roso s* seendo u^rdadeyros gradecedo- res de todo bem en qué a vós somos obrigados: E porque senhor em quanto em este mundb uluemos somos f^er temptaçooens tornados de fazermos boas obras; praza- vos de me soportar que em tcmptaçom non seia derribado, e li- vraae-Cic do m ill que a vós he auorreçiuel. Amem.

Infante D. Pedro. Cap, I do Ltv. da Virtuosa Bemfeitoria, 5-j.

XV

Da maneira que fui doente do humor menenconíco e dei guarepi.

Por quanto sey que miiytos foram, som, e ao diante seram tocados deste pecado d^ tristeza, que procede da vómtide dcíconcertada, que ao presente chamam em os mais dos casos doença de humor manencorico, do qual dizem os fisicos que vera de muytas maneiras per fundamentos e sentidos desvairados; raais de três anos continuados fuy dei muvto sentido, e per special merece de Nosâo Sinhor Otos ouve perfeita saúde: com a teençom que primeiro screvi dalguft; desta breve c symprez hltura filharem proveitosa ensynança e avisa- mento, propus de vos screver o começo, perseguim3nio e cura que dcl ouve, por tal que mynha sp:riencla a 0'itros sejj exemplo: ca nom he pequeno con- íorto e reraeiio aos q le som desto tocados s^b^rem co-no os outros sentirom o que elles paiec^m, e ouverrm comprida saudsí, porque hufi dos seus principaes sçmymentos he pensarem que outrem ) 'mais nunca tal sentio que fosse tornado aseu bo.' siado em qui antes era. •^ ^

E porem esta desespir.mça he hííi granlo pirte do seu sent-meuto, da qual p)r o que screvo razoadam^nte se devem tirar, e tambím fi hnr grande conforto, pensindo que 0'itros de grande siad j, e que som theudos em razoadn estima, forom desto sentidos, porque nr>m despreza n tanto ass. medes por receberem tal pensamento com tanto padecimenfo do tristcz.i, qiaido oensarn que taacs pessoas ja tal pas^arom, porque este desprezo que cada hufi de sy ha lie huft grande aazo de sua tristeza, o qunl tirado, e havida qu;ilquer pjrte de hoa spcrança, logo começa de aVer saúde, e se faz muyto dosposio p^ra receber per a graça do Senhor Deos perfeita cura. Quando eit era de xxij annos, ElF^ei

113 ANTOLOGIA PBOSA

meu senhor e padre, comprido de rouytas vtrtudej. cuja alma Deos aja, des- poendosse pera filhar a cidade de Cepta, mandoume que tevesse carrego do conselho, justiça e da fazenda, que eai sua corte se trautava... c desi por grande voonta«íe que avia de se proceder per o dito feito, recebi sem outro reguardo todollos dictos carregos, aos quaaes me pus assy, fora de boa dscli- çom, que na primeira quareesma, que logo veeo fazia tal vyda. Os mais do& dias bem cedo era levantado, e, missas ouvidas, era na rollaçom ataa meo dia ou acerca, c vinha comer. E sobre mesa dava odiencias per boo spaço, e re- traya-mc aa camará, e logo aas duas oras pos meo dia os do conselho e veedo- res da fazenda erom com migo, e aturava com elles ataa ix oras da noite, e desque partiom, com os oflciaacs de minha casa estava ataa xi oras. Monte, caça. muy pouco husava ; e o paaço do dícto senhor vesitava poucas vezes, e aqueibs por veer o que el fazia, e de mym lhe dar conta.

D. Duarte, Leal Consdh.^ c. xix, 114.

XVI

Em nome do Nosso Senhor ]hu ?(po, com sua graça, e de Vir- gem Maria sua muy sancta Madre Mossa Senhora, Come- çasse o livro da ensynança de bem cavalgar toda sella, que fez EIRey Dom Eduarte de Portugal e do Rlgarve, Senhor de Cepta, o qual começou seendo Iffante.

Aos que dizem que esta manha [de bem cavalgar toda sella] sem livro 9e deprende. digo que he verdade; mas entendo que a moor parte de todo& acharam grande vantagem em leerem. bem todo esto que screvo. £ porque nom sej outro que sobreyo geeralmente screvesse, me praz de poer esta sciencya primeiro ^m scripto, e antremetj algtkas cousas que perteecem a nossos costu- mes, ainda que tam a propósito nam venham, por fazer a alguiis proveito, posto que a outros pareça sobejo. C conhecendo que o saber dosi senhore», sogundo razom. em hai soo manha, nom ',sode seer muyto avantajado, por certo he que a virtudo espalhada he mais fraca que se for ajuntada; mas por averem cjnversassoni com muytas pessoas destados e saberes desairados de mais coiisjs que outros, auendo ente^ider natural, razoadamente deuem saber. Porem a uonlade mo rcquere que algQas ouuy, e per mym entendo que screua por se dol as a meu juyzo poderem fi.har boos avysamcntos sem nenhaa perda.

E os que esto quiserem bem aprender, leamno de começo, pouco, passo, e bem apontado, tornando alg&as vezes ao que ja leerom pera o saberem me- lhor; ca se o Icfrem ryjo, e miiyio juntamente, como livro destorias, logo des- prazerá, e se enfíidarom dcl, por o nom poderem também entender nem renem- brar, porque re^ra gecral he, que desta guisa se devem leer todollos livros.

dalgua sciencia ou ensynança. «

D. Duarte, Ibifl., 497,

BÈCULO XT .113

XVII

De como Nuno Alurez foy criado em casa de seu padre ; como em hydade de treze anos per seu. padre foy dado a el-rey dom Femaudo por morador em sua casa.

Sendo dom Nunalurez criado a grã viço em casa de seu padre. E chegado a bdade de treze anos : e auendo elrey dom Fernãdo de Portugal guerra com elieydõ Anrrique de Gtstella. Este rey dom Anrrique de Casteila »e trabalhou de vijr: e de feito veo com seu poderio e cidade de Lixbõa. E a esta s»izom es- taca elrey dom Fer'n8do em Santarém, e com el!e o prioll dom Aluaro Gõnçaluez Pereyra com certos caualleyros da sua ordem e doutros. E outrosy estauam com elte algas dos seus fíihos antre os quaes era Nunalurez, moço de treze annos q ajnda nunca tomara armas. £ porque as gentes delrcy de Castelia passauam per acerca de Santarém pêra Lixbqa honde seu senhcT estaua. O priol por eosayr dom Nunalurez seu filho. Pêro assy fosse moço lhe mandou que cau^I- gasse. E esso mesmo mandou a outro seu. filho que chamauS Diegalurez, que ^oy huQ boõ caualieyro da ôrdetri : que jâbem caualgasse. E mandou com elies outros caualleyros e escudeyros de sua cassa que fossem fora a descobrir terra p^ra verem as gentes delrey de Castelia que passauaçi pêra Lisbo^i que gentes efam: e a maheyra que leuavã. E logo Diegalurez e essomeesmo dom Nunal- urez porque fosse lYioço. Eos outros que com elles mandarom fezeram o que lhes o prioll mandou e se foram fora da villa contra aquella parte per honde dcziam que as gètes delrey de Castelia passauam": e porque ach'aroni ; nem poderá vecr ncnhaa cousa tornaramse pêra a villa: è cheirando asy aa^ villa ajuiito com o castello honde por cntom elrey dom Fernando e a laynha dona Lianor poosaaam: os quaes a essa ora sij9 comendo. Souberom como dom Nunalurez: e Diegalurez seu jrmão: e outros asy vinham de fora e mãdarom nos chamar tondc asy sijã comendo: e dom' Nunalurez e seu jrmSo se deçeram logo das bestas c se foram honde elrey e a raynha éstauam : e ellcs o receberom bem : e ihes fezeram pregunta donde vinham e pollo que foram : e que era o que lia icharom y vljram. E Nuno Alurez Pereyra respondeo que lhe parecia muyta gente mal acaudeilada: e.que pouca gente boõ capitam bem acaudelladaòs poderia desbaratar. E em fallSdo estas pallauras a raynha como molher que era n:urto paçaS e de boõa pataura : fallou contra elrey em sabor dizendo, que ella queria tomar Nt^no Alurez por seu escudeyro : e elrey lhe respondeo que era 1^ feito: c que clle queria Tomar por seu caualieyro Diegalurez seu jrmaão. E d:tas Atas palauras per elrey e per a raynha : logo a raynha disse contra ^'ano .Murez que ella o queria armar de sua maão como seu escudeyro : e q^a que doutras maSos tomasse armas e dom Nuno Alurez assy como era Doço: era muy vergonhosso e missurado. E quado ouuio o que a raynha dezia es- 'íftdeoque lho tinha em grade merece : e que prazeria a Deos que ajnda lho sefíií- rií: c bcijoulhe por ello a mão. E auendo a raynha em võtade de poer em obra oqjedisera. Logo se trabalhou de mandar buscar arnês cõuinhuuel pêra dom Nunalurez: qual lhe compriaí^E poríjue elle era pequeno de hydade de treze jnnos como ja encima f^g pip.^çam ? riam lhe podiam achar arnês tam pequeno. E entora disi^êfam a rrainha de como o Mestre dAuiz, que entom era jrma.lo Wrçy dom Fernando, tinha hutl arnês que ouucra cm seendo assy moço pequeno. t íezcrõihe entender que seria boõ e bem concertado pêra o dom Nunalurez. K ^* ho mandou Jogo pidir ao Mestre: e tanto que o Mestre sobre ello vyo íecado da rraynba : logo lhe enuiou o arnês com boõa võtade : e a rraynha o «u logo a dom Nunalurez segundo lho auia prometido. E assy tornou dom •Nanalarez as primeyras armas que forom do Mestre dAuis : e per manos d.i Ríynha dona Lyanor. E de hy em diante a rraynha o ouue sempre por seu

SÉCULO XV 115

I

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falasem por ele a Lazeraque, que o mandase tirar daquela escuridom, e que o posesem em lugar onde o eles podesem curar, c ajuda-lo, porque com gran pena se leuantaua ja a fazer suas neçesidades.

E forom se entom tam tristes, como quem tijnha posto sua vida em tal risco de a perder. Falaron a el Rej e aa Rainha, e a irmãa dei Rey, que era a major mother de Lazeraquc, de que nom ouverom outra reposta, saluo: •dizeelhe que se esforce a sy o melhor que poder, ca nos nom podemos em isso nentiaua cousa fazer, nem requerer. »

A quantos aleaidcs e homcs honrados vijnham ao alcácer, eles faziom quejxume de tanta crueza, pedindo-lhes mjsericordia para aquele atribulada Senhoi, que tanto au]a mester; e com mujtas lagremas se leuantauom anteles em terra bcijjando-lhes os pees e as mâaos; e de todos nom aujom outra ajuda, senon que hilus diziom : «quem cujdaes que se atreua a falar nijsto ao Senhor

Outros diziom: «Deus sabe que mal nos parece o que lhes fazé. e nos pesadelo mujto, mas nom he em nosa màao de outra cousa fazermos.»

Outros se rjom fazendo deles escarnho, e diziam : «daae nos Çepta, e logouoso Rey auera mais fauorança.» £ en esto chegaarom ao alcaide Laaçem, qoe era o mayor priuado de Lazeraque. e poserom suas prezes ante ele, recon- tando saa neçesidade. E dês quo os oiiujo começou de se asanliar contra eles, dizcndo-lhes : « Cfiaes. peros, sem ley e*sem bem, parece que nos homês ha de darem saúde ao uoso Rey?! hy-nos dhy asinha, ca se Deus qiijser ele o ma- tara, cu dará sãao ! » >

Com esta louca sentença os lançou dante sy rauy desconsolados. E entom ounerom com o aicayde da Çaqujia, que deles tijnha a guarda, que notificase a sen Senhor o perijj^o aa moice, em que o Ifante estaua; o quall nom tanto por socoro do Ifante, como por sua guarda, lho foy dizer. Nom enbargando que outro remédio nom lhe posesem, nem lhe adesem aighQua cousa a ele da regra acostumada; que aaja soomt^nte qu:! o físico esteuese com ele, e alghQus outras cristãos que ouuesem mester. Des a terça feira ataa quarta segujnte estancou a corença de todo.

"^ Cr, do Infante Santo.,., ed., 1911, pág., 99-102.

XIX

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Morte do Conde de Andeiro.

. ..baterom aa porta, e o Porteira como emtrou o Meestre, quis çarrar a porta por nom cmtrar nehuu dos seus, e disse que o pregumtaria aa Rainha, nora por delles aver nehuila sospeita. mas porque a Rainha estava com doo, o npra era costume de nehua emtrar, salvo esses senhores, sem lho primeiro fazer ttbcr. E o Meeslrj rrespomdeo ao Porteiro: Que as tu assi de dizer? E em esto emtrou de guisa, que emtrarõ os seus todos com elle; e ell inoveo passamente comtia homde estava a Rainha; e ella se levamtou, e todoilos outros que eram presemtes.

E depois que o Meestre fez rreveremça aa Rainha e mesura a todos, e íllcsa e'l rreçebimento, disse a Rainha que sse asemtassem, e fallou ao Meestre dizcmdo: E pois, itmaão, que (he) Isto a que tornastes de vosso caminho?

Tornei, Senhora , disse elle, porque me pareçeo que nom hia desembar- gado como compria. Vos me hordenastes que tevesse carrego da comarca dÂmtre Tejo e Odiana, se per vemtuira elRey de Castella quisesse yinir ao rregno e que- brar os trautos damtre vos e elle; e porque aquelía fromtaria he grossa de ieníes e gramdes senhores, assi como do Meestre de Samtiago, e do Meestre dAlcãtara e doutros e boõs fidallgos ; e aquelles que vos assinastes pêra a guar- àanm comigo, me parecem poucos; por emde tornei pêra me dardes mais

116 AxroLoaiA ràosA

xmssallos, pêra vos eu poder servir^ segundo compre a minha homrra e vossa serviço.

A Rainha disse que era mui bem, e mamdou k)go cliamar Joliam Gom- çallvez seu Escprivam da Poridade, que visse o iivro dos vassallos daquella comjrca, e que lhe desse quamtos e quaes o Meestre rrequeresse, e que fosse logo desembargado de todo. Joham Goniçaiivez foi cliaraado a pressa e foisse assemtar com seus escprivães a proveer os livros pêra desembargar o Meestre. hm esto começarom de o comuidar os Comdes cada huâ per ssi; e isso meesmo o.Com^e Joham Fernandez se aficava mais que comesse com eile que os outros. O Meestre nam quis tomar comvite de nchuG, escusa mdosse per suas pallavras, dizemdo que ja tinha prestes de comer que mandara fazer ao seu Vtedor; porem d zem que disse mui escusamente ao Comde de Barçellos que o nom sen tio nehuft: Conde, hiivos daqui, ca eu quero matar o Comde Jokam •Fernandez. E que eU rrespondeo que sse nom viria, mas estaria hi com elle o ajudar. v ' '

Nom sejaaes, áisíit o Meestre,/7ifl5 rrogovos todavia que vos vaodes daqui^ tp me aguardees pêra o Jantar;; ca eu Deos queremdo tamto que isto for feito, logo hirei comer com vosco.

A vemtuira por meihor aazar a morte do Comde Joham Fernandez, come- çou de lhe fazer rreçear a viimda do Meestre; per tal guisa que lhe pos em voomtade, que raamdasse a todollos seus que sse fossem armar e se vcuessem pêra eile; e de quaiiquer geito que foi, partiromssc os seus todos do Paaço assi fidallgos que o aeõpanhavom como os outros, e foromsse armar pêra sse viimrem per eelle; e esta "foi a rrazoe por que til ffcou sso de todos elles, e nenhuú estava hi quamdo morreo.

A Rainha isso meesmo pos fememça nos do Meestre; e veemdoos assi todos armados, lhe prouge em seu coraçom, e disse fallamdo comtra todos: Samtii Maria vali! como os Ingresses ham mui boom costume^ que quamdo som no tempo da paz. nom tragem armas, neni curam damdar arma- dos, mas boas r roupas e luvas nas maãos como domzellas; e quamdo ssom na guerra, emtom costumam as armas e husom delias como todo o mundo sabe.

Senhora, disse o Meestre, he mui gram verdade. Mas isso fazem elles porque ham mui a meude guerras, e poucas vezes vaz, e podemno mui bem jazer; mas a nos he pollo comtrairo, ca avemos mui a meude paz e poucas vezes guerra ; e sse no tempo da paz nom husarmos as armas, quamdo vehesse a guerra nom as poderíamos soportar. E fallamdo em isto e em outras cousas, chegavomsse as horas do comer, e espediosse o Comde de Baiçelios,'^e desi os outros, ca os mais dclles dava a voomtade aquello que sso depois fez.

Ficamdo assi o Comde Joham Fernandez, gastavasse lhe o coraçom, e tornou a dizer ao Meestre: Senhor, vos todavia comerees comigo. Som comerei, disse o Meestre, ca tenho feito de comer. Si comerees, disse elle, e em quamto vos fallaaes, hirei eu mandar fazer prestes.

vaades, disse o Meestre, ca vos ei de fallar huua cousa amte que me vaa, e logo que me quero ir, ca ja he horas de comer

Emtom se espedio da Rainha, c tomou o Comde pclla maão e sahirom ambos da camará a huui gramde casa que era adeante, e os do Meestre todos com elle, e Rui Pereira e Lourenço Martiiz mais acerca. E chegamdose o Meestre com o Comde acerca dhuua freesta, semtirom os seus que o Mestre lhe começava de fallar passo, e esteverom todos quedos. E as pallavras forom amtielles tam poucas e tam baixo ditas, que nenhuu por estomçe emtemdeo quegemdas eram; porem afirinym que forom desta guisa.

Comde. cu me maravilho muito de vos seerdes homem a que eu bem queria, e traha^hardesvos de minhd desomrra e morte»

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Eu, senhor! disse elle, quem vos tall cousa disse, memtivos muigramde ^nemtira.

O Meestre que mais voomtade tiinha de o matar que desta r com elle em rrazoões, tirou )ogo huQ eiiitello comprido, e emvioulhe huQ goUpe aa cabeça; porem nom foi a ferida tamanha que delia morrera, se mais nom ouvera. Os outros que estavom darredor, quamdo virom esto, lamçarom logo as espadas fora pêra lhe dar, e ell movemdo pêra sse colher aa camará da Rainha com aquella ferida, e Rui Pereira que era mais acerca, meteo huQ estoque darmas per olle de que logo cahiu em terra morto.

Os outrps quiseromlhe dar mais feridas, e o Meestre disse que esteves sem quedos, e nehuft foi ousado de lhe mais dar; e mandou logo PeraamdAlvarez e Lourenço Martiiz que fossem çarrar as portas que nom entrasse nehuu, e dis» sessem ao seu Page que fosse a prissa pelia villa braadamdo que matavom o Meestre, e elles fezeromno assi.

E era o MeeNtrc quamdo matou ho Comde, em hidade de viimte e çim- quo anos e amdava em viimte e seis; e foi morto seis dias de dezembro, era ja escprita de quatro çemtos e viimte e huG**

F. Lopes, Cr. de D, João /, ed. do Ârch, Hist,, cit., pág. 17.

XX

- O conde D. Pedro faz talar os campos de Seuta

Como disse aguellé grande Istorial Romano, a^que chamarão Tito Lívio: « Que muitas mais vezes dam as cousas conselho aos homens, do que os homens dam conselho ás cousas.» E porem o trabalho daquella sahida naõ soomente fez honra ao conde, e aaquelles, que o seguirão, mas ainda proveito; porque aprendeo pêra ao diante se avisar melhor dos enganos de seus amigos, espe- xnaimente das cilladas ; e porque sentio, que sua vida sempre seria perigosa em quanto aquelles vailados, e arvoredos aili estevessem, ouve conselho com aquelles Fidalgos, e acháraõ, que era necessário tallarem as arvores, e derribarem os valiados; e estando sobre esta determinação começarom de vir cavallos de Cas- telia porque os Fidalgos mandarão, em tanto que eraõ na Cidade até quatorze; e assy com elles, como com toda a outra gente sahlo o conde da Cidade, e pôs <5u§s ^ruardâs, que sostevessem algum>perigo se sobreviesse d'Aljazira, oud'outra parte, e a gente de pee mandou, qtte cortassem naquellas arvores, em quanto lhes o ái2L durasse, e des q pedreiros, e homens, que sabiam daquelle mester» que derribassem as cerraduras e paredes das Ortas, e Rumares, e assy os valia- dos, de guisa que em breve foi todo achSado, nom sem grande trabalho daquela Jes,' que o fazi^o, C quem nom averla piadade de vêr a destruição de tanta nobreza; porque alli cahião Torres forradas d'oliveis pintados, e crastas ladri- lhadas de niarmores, e ladrilhos vidrados, em que havia diversos lavores; tantas arvores frutíferas', e odorosas, que aquelles mesmos, que as cortavaõ vinha piadade; ora que fariam os Mouros, que estavaõ nos muros, e Torres d'Aljazira, CS ames chorando per suas barbas, gemiaO aquella perda.

Zarar», Chr. do Conde D. Pedro de Meneses, ed. da Acad., ii, c. xvi, 2 6 D.

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8

118 AATOLOOIA PBOBA

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XXI

Rssassinato do Duque de Viseu

E seendo El-Rej cm Alcácer do Sal, sabendo o Duque, e os da conjura- çBxn, que aviq de tornar per mar; detriminaram esperallo na pra^^a, e ali ao sair dos batees ho matarem. Do qual perygo ordenado, EIRey foy per Dom Vasco logo avisado; pello qual mudou por Isso a vynda do mar, e fez o caminho da Landeira per terra, bem acompanhado de boa gente de sua guarda, que por isso, e sem atg& alvoroço, fingindo outro achaque, a mandou perceber; porque des- pois da morte do Duque de Bragança, sempre EIRey trouxe guarda da Camará, e dos Ginetes, de que era Capita Fernam Martyns Mazcarenhas, que nestes fectos, em que a vida, e saúde d*E]Rey e do Regno pendiam, sempre sérvio bem, continoada, e muy lealmente, e de quem EIRey entam mais confiava. Chegou EIRey a Setuvel sesta feira vinte e sete dias d'Àgosto'de mil quatrocen- tos oytenta e quatro; e ao outro dia sábado mandou vyr ho Duque de Viseu de Palmeila onde pousava, c em se çarrando a nocte ho chamou a sua guardarroupa, que era nas casas que for^m de Nuno da Cunha, em que entam EJRey pousava; onde ho Duque entrou da todo desacompanhado, e sem muitas palavras que precedessem, RlRcy ho matou per sy as punheladas. . .

R. de Pina, Chr. de D. Jcão 11^ td, da Acsd., ii, c. xyiii, 59.

xxir

Justiça que el-rei D. ]oâo II mandou fazer na estatua

do marquês de Monte-Mór

EBtSdo elRei em AbrStes, por ser certificado que o marqs de Monte-Mór i^Btado em Castela não deixava de seguir sua vontade cõtra elle, com os do . seu cõseiho, e leterados, ordenou, e qnis era soa aufêeia mandar fazer justiça e justiçar sua estatua nesta maneira. Na praça da dita vílla se fez hQ cadafalso de madeira, grande e alto, todo coberto de panos d<S, e nelle assentos porá corregedo- res, desembargadores e juizes ; ahi em meirinhos, alcaide e officiaes da justiça. E pubricamente foi alli trazida bQa estatua do marqs, natural como viva, que se parecia elle, e vinha armado de todas armas, e è cima delia sua cotadarmas, e na mão doreita húa espada alta, e na e!sqi-ierda 1 úa bandeira quadrada de suas armas; e ali poios juizes lhe fora lidas em alta voz suas culpas, e logo per todo- los juizes e desembargadores sentenceado, que morresse per justiça morte natu- ral, e pubricamente tosse degolado. E acahada de ler a sentença, veo hiJm Hei darmas, v em voz alta dizia: Porquanto vós, cõdestable, por vosso tSo grande oficio creia, obrigado a ter muita lealdade ao vosso rei. e aorvillo e ajudar a defen- der seus leinos, e vós não no fizestes, antes trabalhastes e procuraste por lhe ofiVnder, e lhe fostes desleal, nao mereceis ter tal espada. E logo lhe foi tirada da mao, e tornou Irgo a dizer. Porquanto vós marquês, por vossa grande dignidade vos fui dada bandí-ira quadrada coii'0 a príncipe e pnr esta honra o dignidade qiifí rí'C'(}>t^^\s croi.^ olTif^ado puaidar a honra e o.^tatio d'elKei vosso senhor e servillo e açaí alo como natural e verdadeiro rei e senhor e vós tudo isto fizestes ao enilríiyro tal bardeira nao deveis ter porque a nao mereceis:^ e lh'a tomaram lor^o da mão e pola mesma maneira c ceremonia lhe tiraram a cota d'ariii:iii e arajadiira da cabeea ja todas as nutras ppoas d^armas até ficar desarirado < ni calças e em gibão. E então veo hn pregoeiro e hum algoz e com pregão de justiça em que declarava suas culpas lhe cortaram a cabeça de que

■ÉCULO ZT 119

I

sahin sangue artificial que parecia de homem viv^o. E acabada esta grande cere- monia de justiça que durou muito se doaceram todos do cadafalso e logo foi posto fogo ncHe e estatua e o cadafalso todo asai como estava foi queimado cousa que pAreceo espantosa. E o marqaõa sendo d^isto sabedor foi mui enojado e triste e d^ahi a pouco tempo se finou em Castella onde elle estava.

G. de Resende, Chr. de João 21, cap. zlviu. .

XXIII

Do que el-reí disse a hum homem, que bebia vinho

mais do necessário

ITm homem honrado, qae se não nòmeaj folgava de beber vinho ; e porqae o el-rei não bebia, havia-se por tacha, e todos em geral trabalhava por segair as obras e condição dei- rei. E este homem ás vezes lhe fazia o vinho dano, de aue elrei tinha desprazer. E hum dia o mâdou chamar, e elle, por não cheirar a vinno, eomeo folhas de loureiro, a que muito cheirava^ e el-rci lhe disse:

FoSo, debaixo desse louro, a como vai a canada? Do qae o homem ficou envei^nbado e trabalhou de bC emendar.

G. de Resende, ibid»^ cap. clii.

XXIV

Do que el-réi disse ao Conde de Borba em um conselho

o Cdde de Borba d5 Vasco Coutinho de sua condição falava sempre muito alio, e ás vezes, quando se qoeria frautar, falava muito baixo. E hnm dia, estado elRei em hum conselho, qnando veiu o CÕnde a dizer seu parecer, falava tão baixo, que se não houvia; e elRei lhe disse:

Côde! os vossos baixos são tão baixos,, que vos não ouve ninguém; eos altos Bao tao altos, que se não ouve ninguém comvo^o.

G. de Resende, tbid,, cap. cxcv.

XXV

Morte de D. ]oão II

Mandou saber em que ponto estava a mart'í, e dando-lhe a reposta disse: Daqui duas horas me fínacej: e assi foy. E estado assi muita pena tirando grandes e mortaes saluços, que lhe acudia de ({uaudo cm ({uando disse : Tenho tamanho amargor na boca, que su não pode sofrer. Disac-llic o lii.-jx» do Coini- bfa: Senhor, lembre-uos o vinagre e azedo, (pi., ih-na» a hAnw a Níj.-.ío ^i•llll(ir tESV Christo estando na Cruz, e nao vos &i)i'u^;.i.;'i u Uo^ix. V. vi \lx*\ ilicu'.-í])on- deo : O' Bispo, qnãto vos agradeço iaso. porcpie esse pt.doo tíoo uit* e^ {uceia da palz2.« E estando assim Cfiyo lhe nu muito grande accidciile antes de lho d<iyv a alma* que o trespassou; e cuidaado todos, que era íln;ido, o lli^po d»; Tí»n;,vre lhe fechoa os olhos e a boca; e elle o sentio e tornou a ai, e di.iae: Disp.», ainda naS vem a hora. E falando sempre palauras santas, c eneomeiídiínio a t ..do>, ([vm

lho agiaili-i/o utuito. e vou ílsI llr. <1| :i'i de minha ptrtc. Nho he sem rezSo, cjae oa hnmeii- que tem vnso tuirgiin m>jjiiii de prazer c hoorar, que depoia daqucíes Pr " ou Uapituêns que fazem os iiistna dignos de memoria, aqnellea quo depois de siios diiis 03 escreverão muito louvor merecem : bem aventurado, diais Alei.", que era Aohíles porque tivcru a Homero por seu escritor. Que fora dos feitos de Koma se Tito Livio oa não csurevera? E Qnioto Curcio os feitos de Alexandre? Homero os de Trova 7 Lncano os de César ? E a'»! outros A. A. Muita? consaa eiiti-s fizerfio, aa quaia não sajn tão digaas de mcmoiia quanto sam doces de oa- vir, e leer, pelio bom estilo eom que forSo cseritas. Lese no primr." de Tito Li- vio (eomo vví mcllior sabeis) que se não fora a ora^-ão qne fee hum nobre Ba- rJEo daquele tempo, (juasi todo o poi-o de liotna fora perdido. Muitos são oa que ue dão aos exercícios das armai; e muy poui^o-i ao estudo da atite oratória. Ási que pois vós sois nesta arte asas ensinado, e a natureza vos dou mny grSIo parte delia ; com muita razão eu c P.'" de meua It-jnos e Cápitaens devem daver a merçe que vos seja feita por bem emprcg.ida. Muitos certo vos aão obrigados porque aiifln que os fintoa d.i (iepta acjam hb:ís de re^entea, depois que eu vi a Caronica que vós dellrs escrevestes a muitos fia faoara e mer;e com melhor von- tade, por tier eertn do alguns bofla feitos que laa fiserão por serviço de D.* e dos Reya meus antecrasores, o meu, e a ontroa por serem f."* daquelles qne asi loa bem servirão, do que eu nSo hera antes em tam comprido conhecimento, e creo que não nieuos roerão aos que depois de my vierem, quando virem o que haveis de escrever d<>s feit'>s de Alcaçar. E se alguns merecem gloria por iriim a eaa terra, por servireai a Deoa c a mi, e fazerem de aaas honras, vós assas sois de louvar qne c8 deaijo de escrever a verd.* do que eles fizerão, voa desjwscates a levar o b^balho que elis soportarSo ; vós podereis laa ser bem Hgnaaalhado do Conde ; mas se o dczcjo que landes de me servir, e fazer o qae o voaao serviço pertence,

BÈOVLO XT ' 121

F08 Jaa fizesse yiver contente, certo he que nSo pode Âlcaçar dar bo que Hiz.* tem ; aqoela vida fostes yób boecar por usares de vertnde que aoa outros em lu- gar de peua dao por desterro ; asi que quanto eu isto melhor conheço, tanto vos mais tenho em serviço de ho fazerdes. £ não quero que esteis laa mais f ue q. ^ lezitírdf s que he compricloiro para o que t-endes de escrever, e a vós aprouver. Do que dizeis do Comendador Alvr.® de Faria eu estimo seu serviço como he razam e assi espero de lhe fazer ms^. Q.^ ao que dizeis da mingua de man- tim.to £az-se nisso por minha parte tudo o que se pode fazer, mas duas cousas se requerem para os que estão eta Alcaçar serem bem providos, a hQa estar laa mi- lho em almazem para socorro de quando pello tempo ou por outra necessidade, tSo asinha não vay o pam, e a outra que o Conde, ou qualq.r outro Cap.'^ que- laa estiver, me faça saber aos quartéis do anno a gente que laa estaa, pêra ho- mem concertar a despesa com a recepta. Todo o bem que me dizeis do Conde en éreo que ha nelle, e cecto cuido que he menor pello que eu dello conheço. Tenho-vòs em serviço de quererdes saber novas de minha desposiçSo, e graças a Da. en me acho bom asi do corpo como das outras cousas. Empero home anda no mar deste mundo onde he continuam.^® combatido das ondas delle em especial pois todos andamos naquella taboa depois do primr.® naufrágio, asi que ninguém se pode segurar ate que não chegue aquelle verdadr.^ porto seguro que home não pode ver senão depois da sua vida, ao qual a Deos praza de nos levar q,^<* vir que he tempo, porque elle he marinhr.^ e piloto sem o qual algu home não pode entrar. Do B.^ noso amiguo sabereis que ho vejo ledo e são e de boa desposição, e praza a t>^. de lhe encaminhar as cousas seg.^ elle deseja se forem de seu ser- viço. Da Torre dos pergaminhos eu tirarei aquella lembrança que vir que he meu serviço. O meu vulto pintado eu o não tenho pêra vo-lo aguora laa poder enviar, mas o próprio prazeraa a Ds. que vereis laa em algu têpo, qae vos Isa mais deve prazer. A vossa Irmãa averej em minha encomenda segundo me esereveis.

Escrita a xxjr de Novembro.

(Desta carta faz menção J. de Barros, Dec, /.*1. 2.*^, cap. 2.^, fl. 34 t.; i transcrita de J. Soares da Silva. Col. doa Does, com que se autorisam «# Menunias para a Vida dêlrei D. João, í. iv, 1-4.)

II

ÉPOCA CLÁSSICA

(XYI-XTlll)

1521-1557 1557- I57H 1578-1580

Quadro dtnóticp do movimento politico,

social e literário correspondente á escola italiana

I

Monarcas portugueses

D. Joio III

D. Seb%stiao

I>. Henrique

II

Sincronismo político e social

1531 Eatronioso terramoto em tcdo o reino, que destróe povoaç5Í8 inteiras.

1585 Introdução do ealvinismo em França.

1536 Estíbei^-ce-se em Portugal o sanguisedonto tribunal da Inquisição.

1545— Paulo III abre o Concílio de Trento.

I'i47 Morte de Fraaeiseo i de França e de Henrique viu de Inglaterra.

4 55â Naufrágio de Sepúlveda.

X55S Abdicação de Carlos V.

1564-1061^ Aceitação indistinta dos cânonss do Concilio de Trento, em Portugal.

1571 Batalha naval no golfo de Lepanto ganha por l). João de Áustria ao.. Oto^

manos. 1572 Matança de S. Bartolomeu em que morreram milhares de Huguenotos. 1578 A 4 de Agosto dá-se o terrivel desastre de Mcácer-Qêbir.

III

. Sincronismo literário ESPANHA

ITitgo I^pez de Mendoza, marquês de Santiliana, um dos homens maia notáveis do nea tempo, e Jorge Manrique, autor das celebradas Coplas jk no- meados anter^òrmenle fazem como qae a transição para a if^ade áurea da litera- tura espanhola^ que se abre neste período domina la pela influência de Itália. O caudilho dêãte renascimento é Bosgàn (I49(Mf)42) que naturalizou o soneto, o terceto, a canção, a oitava rima, tomando como modelos, sobretudo, Petrarcha e Sannaszarro, hôbresairam :

GÃacihÁO DE LA Veoa (1503-1536). autor de trinta e oito sonetos, ao gosta

de Petrarcha, cinco canções, duas elegias, uma epístola (m vrso solto e três

éel€fgA9, obra^ pequena (morreu i o) 33 ano^^) em quantidade, mas que não tem

igaJ em valor na literatura castelhana, conformt; o juizo de Fitzmaurice Kellj.

iyiB€i€> HuBTADODB Mbxdonza (15^4-1575), poét», historiador e rom mcista,

autor da //íS0éria da guerra contra os Mouros de Granada, A conhecida no-

re/i ÍMzarillo de Tormes foi-lhe por muito tempo atribuída, mas sem razão,

126 HI8TÒBIA DA L1TB1U.TUHA POBTUanÊSÁ Ji

como o demonetron o hispanóÇIo Morei -Fatio. Kao se pode determinar nem o autor, iietn o aiio, nem o logar da publicação. Ás três ed. mais antigaB conhe- cidas saíram em 1.^54.

Fernando de Hbrsbsa (1534-1097), cognominado o «divino» pela elera- ção dae suas produções, entre as qnais uma elegia a propósito du desastre de Alcácer-Qêbir,

Santa Tebbsa db Jbbus í151íV1*»8'2), a célebre mística, denominada « Vi- dente de Avila». milagre de génio, a maior mulher, talvez, de quantis até hoje manejaram a pena, a única do ^eii moxo que pode ombrear c )m os mais in^^ignes mestres do muudo. (Fitzmaurice- Kelly, oh. cit., 26G].

JuAN de Maaiana (lf)37-1624), o Tito-Livio espanhol, autor da História Geraf de Espanha, que vai até ú m^^rte de Fernando o Católico.

JoRGB DE .MoNTBMÓu OU MoNTFMAiOR 1523*1561) uui dos p' 4ta9 portuguc- ees que maior renome alcançou- na literatura peninsular. A sua Diana divul- gou-se rapidamente, sendo trad. cm in^l(;«, aleinfío^ holandês e francês, onde conta, pelo menos, 12 ed. Ele seria o iniciador do f^/Tjefo par^toril se Sinazarro anteà dele nSo tivesse publicid> a sui ArrAdia. Ma-* ii)trodutor desse í^énero na literatura peninsular cabe lho a glória de ter criado vári »9 discí mk-s FernSo Alvares do Oriento com a bua Lnsilãina transformada, F. Ilod igues Lobo com o Pastor peregrino e Joào Xunes Freire cora o.s Campos Eíi$ios, iilénj dt, outros. Peni é que Montemor escrevesse tnn pouco em porío.^uêd. que apenas se possa c ntir dele na nossa lí"gui um trecho em prosa e algumas qnalras dd , bua Didua [Vi(i. S. Viterbo, no Arch de Hlst , i, Íá49].

Mir.uEL de Cervantes Saavedra (l.'47-lt)l()), o imortal aut* r do D, Qui- xote de la Mavcha, da novela paótoril Galat^ia^ da trag-dia Numânria, do poema alegórico Viaje ai Parnaso (levista dos poetas do seu t<Mnpo) o de varias outras obras. Kntre todas avulta o D. Quixote^ que criou ao sen autíT fama universal.

[Km portuguêi: D. Quixote.., tr. de Ricardo Augusto P. Guimarães, (Visconde de B<malcanfor) efectuaíla de eolaboraçâo com \). Luís Biét««n y Ve- dra, Li>boa. 1877, 2 vols. ; outra tr. do Visconde de Ca^^tillio (continuada pelo Visconde de Azevedo e concluída por Manuel Pinheiro Chagas , 2 vols., com as ilustrações de G. Doré. HA tunbêm uma tr. saíJa na Tip. Uollan liana. 1704, 6 voh., in-S.", nutra de 1853. Em 19()6 saiu uma, em L'sboa, 3 vols. De C'ei van- tes t'*aduzin liocnge Galatea, tr. elabopida ^òl^ro a inter[M*''taeão france-a de Florian, e J'»sé Pedro Francis-^o de P:iu!a C.iinpo-; Kl zeloso e.Alreme7io com o título: O velho e a menina ou o v.afamrnto de^if/aal. . . Liijboa, ISIS, «SO págs.].

I atroi-inad' s p* lo esirHeal Ximknes { j 1Õ17) es estudos de filologia desen- volveni-se o António dk Nkiíhija íl'»44r-l.'>r>'2 , o maior dos humanistas espanhóis, publica os primeiros trabalhos sobre a língua espanhola.

FRANÇA

Em França, onde também se acentua a intluéncia de Itália, merecem citar-fcc:

Kabkllais (149o-li"^5.>), autor dos dois romances satíricos 6rflr^dn/«fl e Pantar/niel.

Maiiot <1407-1o4:4), (juo aperfe'eoou a f«>rma ria poesia ligeira nos epigra- mas e uoB fahliat/x; sobrení^íu nnm ^^<'nero de que é o cria<lor, o Epistolar,

líoNíjAiiD ( i;V24.- ;5!^r)), chefe da Plciada^ a célebre Chcóla poéticii fundada para elevar o nível da língua e da literatura francesa, da qual ."»m 1549 Du Kcllay redieira o propriam"

•N:Ai(«.\'r; (ÍO.S.Í- •> z), liot Vwl mor<Jii3ta, autor ^íKm^^f^i,

CAPÍTVLO UI BSCOLA ITALIAKA OU QUINHENTISTA 127

ITÁLIA

■»

Entre os homens qae ilastráram a Itália neste período oontam-se :

Sasnaezaao (14:i9-1530), cuja Arcádia, pablicada em 15^)4, fundoa a no- vela pastoril qae em Portagal encontroa um exímio ouUir em Bernardim Ri- beiro, passando depois a Espanha com Jorge de Montemor.

Tkissuco (1478-1550), aulor da tragédia Sophonisbe (1515) escrita á imi- tação do teatro clása-co, e do poema ItáUa Libertada,

Ariosto (1474-1533), o maior poeta italiano do sóc. £vi de qae n, além de poesias líricas, hV o Orlando furioêo, poema em oitava rima. [Em portu- guês : José Manoel d' Almeida e Araújo Corrêa de Lacerda, Orlando Furioso, tr, em verêos porlitgueseê , , , Lisboa, 1850 (só saiu o vol. 1.°]; Xavier da Ca- nha, Orlando furioso. .., Lisboa, s. a., com gravs. de G. Dore \ J. M. da Costa e Silva, O dtíirio de Orlando, c. xxii 'm-Ramalhete^ 111 de 20 de março de 1840, pág. 81; o e.9critor brasil. Ljís d>i Silva Alvos de Azambuja tr. em próáa o Orfanflo, i yols., Rio de Janeiro, 1833].

ToRCATo Tasso (154^-1595), qiie escreveu o drama pastoril Aminta, que foi muito ioiltado, e o poema Jerusalém libertada, que o consagrou entre os grandes génios da humanidade. [Em português; Pedro de Azevri<io Tojal, Go- dofredo ou JeriMoUrn libertada, Lisboi, 1()Í3, 1 vol.; André lloiriLíucá de Ma- toe, Oodofredo ou Hierusalem libertada^ poema heróico. . ., Lisl oa, 1^)82, xxxii- t2j9 paga., oatra ed., Coimbn, 18r)0; João Félix Pereira. A Jerusalém libertada, ibid., IH77, 49ô p4pf. ; J. Rimos Cjelho, Jeriisjlem Libertad%y Lisboi, 1864 ; nora ed., ibtd., 1^)05].

Como eruditos merecem citar-se 03 nomes de Machla.vei*li (1459-1527), GciccxAiLDiHi (184*2-1540), dos carleaia Bbubo (1470 1547) e Sadoleto (1477- 1548) do filólogo PoMPONio (14*2.>-1407) e dos dois Scaligbros, o Júlio (1484- 1558) e sea filho Josi (1540-1609). ^

INGLATERRA

A literatura inglesa tem neste período o seu escritor mais notável : WiLLiAM Shakspbahb (1564-ir»16), cujas tragedias principais 8.'.m o Ro- t Julitta, OthellOf llamfet, Macbeth e Bei Lear, Aa melhores comédias : Mercador de Veneza^ Sonho Suma voute de S. João, Muito ruião para nada, Ajê oleies esposas de Wivdsor; dramas hisróricos: JàUo César, António e Cleópatra, Ricardo II, Ricardo III, etc. W. Shakspbajib ó um profundo pensa- dor tendo traduzido todos os cara teres e exprimido oh maiores sentimentos da natureza humana. [Em pirtugués: Castilho, Sonho d'uma noiífe de S. João, Parto, 1874, D. Luís I, Hamlet, Lisboa, 1nS7 (sobre Cita tr. Silva Pinto, Com- ialeê e CrUicas, 2.» ed., Lisboa, 1907), O Mercador de Veneza, ibid, 1B79, Ri- cardo III, ibid, 1880, Olhe/lo, o mouro de Veneza, ibid., esta tr. ó qne trás nome do tradutor; Luís A. ReHello da^Silva, Othelío, ibid., 18^6; Bulhão Pato, Hamlet, ibid., l879; Mercador de. Veneza, ibid., 1881; José António de Freitas, Othello, ibid., \SH^\ Júlio Dantas, Rei Lear, adaptação da irar/. iie Siiotjfpeare, iÀ9hoíi, 1905, 1 vol.; dr. Domingos Ramos, Rei Lear, Porto, 11íC*ô, Handel, Othelo, Romeu e Julieta, todo;? no Porto e de 1911, Mercador de Veneza^ ibid., 1012 e outras].

(Zomo figuras secundárias ao grande trágico nesta época : Joas Ltlt (1554- 1603) "^autor do Kuphues que pòs em moda o estilo afe- etado d'<^ gongorí.staâ de Espanha e Portugal; e os líricos Wtatt (1503-1541) e J'«JIBT HOWABD (1515-1547).

CAPÍTULO III

Escola Italiana ou Quinhentista

(Século xti)

Sumário: 46. O Renascimento; sua difusão. 47. O Renascimento em Portu- gal.— 48. Oa promotores do Renascimento em Portugal. 49. Senhoras por- tuguesas ilustres. 50. Poesia épica. Luis de Camões. 51. Sua bio- grafia. — 52. Camões escritor. 53. Jerónimo Côrte-Real. 54. Luis Pe- reira Brandão. 55. Francisco de Andrade. 56. Poesia lírica. Ber- Tiardim Ribeiro. 57. Cristóvão Falcão. 58. Francisco de Mi- randa.— 59. António Ferreira 60. Pedro de Aridiade Caminha 61. IMogo Bernardes. 62. Fr. Agostinho da Cruz. 63 Poesia dkamátíca. Origem do teatro. 64. Gil Vicente. —65. Escola de Gil Vicente. 66. Afonso Alvares. 67. António Ribeiro Chiado. 68. Baltasar Dias. 69. António Prestes. 70. Simão Machado. 71. Es(!ola clá.«sica. 72. A HISTÓRIA NO SKCULO XVI ; suas características. 73. D. Jerónimo Osório. 74. João de Barros. 75. Diogo do Couto. 76. Damião df Góes. 77. Fernão Lopes de Castanheda. —78. António Galvão. 79. Outros his- toriadores deste século. 80. Samuel Usque.. 81. N^irrativaM de viajena ; Betis autores. 82. FernSo Mendes Pinto. 83. A h«8tória trní^ieo-maríti- ma. 84. Eloquemcia saoeada.' 85. D, Fiei Bartolomeu dos Mártires. 86. Fr. Luís de Granada. 87. Fr. Miguel dos í^antorí. 88. Diof?o de Paiva de Andrade. 89. Dr. Francisco Fernandes Galviío. 90 \1oka- ULâTAs. 91. RoKAKCEg DESTE PERÍODO. 92. Feriião Alvares do Oriente. 93. Obras poktjcab escritas eh latim. 94. Trabalhos FiLOLÓCticos. ^5. Obras de ebudiçâo.

46.— O Renascimento; sua difusão. E' um erro, escreve autor contemporâneo, acreditar que o amor das artes e das le- antigas se extinguiu totalmente no decurso da idade-módia.

Com um pouco de atenção vê-se em todas as épocas esta chama imortal iazer-se luz aqui e álêm, através das ruínas dos séculos. A proAperidade crescente dos povos, a liberdade de que gozavam as grandea cidadeB acabaram, enfim, por criar, ao lado du cultura ecle- nistica, uma cultura secular. * Factos múltiplos preparara o movi- mento característico dessa época memorável chamada Renascimento, Conatanf inópia tomada pelos turcos viu brilhar no alto dos sons mi- aaretes o crescente muçulmano (1453), e isso obrigou os sábios, ali

^ Fr,'X fijraoss, Hiêt. de VEglise, iix; eh. i.

130 HISTÓRIA LITEKATUBA FOHTUOUÊaA

residentes, a refugiar se em Itália oncle abriram os tesouros da stia erudição. Â imprensa^ a nova faculdade, n>i frase de LamAine^ começava de produzir os sms f^cunlos resultados. Dascobríra-se a pólvora, que muiou a política da^i niÇoes, a bússola de marear, que abriu um caminh) através dos mirrjii tenebrosos. Vasco da Gama descobrindo o caminho marítimo par^ a índia e Cristovam Colombo a América revelaram ao veliio mundo mundos novos.

A era moderna foi abi^rta na Itália por Dante, Petrarcha Boccácio, entrando primeiramente. em Florença onde teve a pod \ proteçSío dos Méiicia, ganhando depois Roma, onde depressa: t 'i^3\^ graças ao8 auxílios^ do Papa Liào x, que era daquela fan.í ia. Da Itália o movimento humanista c^muiiicou-se á Alemanha e encon- trou uma falange entusiasta de adeptos, dentre os quais gobresái Erasmo, o sábio maid qu<'rído da Europa inteira nos pnneipios do século Xvi. O movimento geni-ralizou-se depois a todas as naç5es da EuropH.

47. O Renascimento em Portugal. A literatura portu- guesa t'm nesti tó^iulo a sua idade de ouro. Foi .este período de

curta duração, é certo, mas durante êle vivou a plêiada de escrito- . res mais numerosa e mais brilhante que temo^ tido. Portugftl acom- panhava a ftbrc) de progresso, que aquecia toda a Europa culta. Embfíra pr^r pouco tempo gozou duma felicidade material e moral, que 08 mais países invejavam.

Abundava o dinheiro. Por vezes sucedeu na casa da contrata- çao da índia, tím Lisboa, quenrem os mercadores pagar em certo dia e nao o. poderem lazer por nâo haver tempo de contar o di- nheiro. ^ Do Oriente chegavam -nos a cada momento náos carregadas de pedras preciosas e de objectos de valor.

D. ^íaníícl, no reinado de quem estes factos sucederam, não Boubo. ou uTiu quis aproveitar as circunstâncias felizes que o haviam elevado ao trono. >Mas esta riqueza que se perdeu e nos ajudou até a levar á ruína, foi compensada por outra riqueza maior, e essa im- perecível, constituída pelas obras dos que ilustraram o reinado daquele monarca e dos seus Bnces&ore8. Bastaria que contássemos tntre os nossos escritores um épico como Camo js, um dramaturgo como Gil Vicente, ura historiador como Góes para dessa época restar com que nijs lis( rigearmov^í.

48. Os promotores do Renascimento em Portugal.

Fnran iinitiá eausub que troux3ram a Portugal a corrente hu-

' Damiào do (xoes, Crón. de D. Manoel; cfr. Viterbo, E^ivdos BÒbrt

OAPÍTULO III BBCOLA ITALIAKA OU QU^llIlENTISTA I3t

xDftnÍBtft. A Espanha era para nós uma instigação e um exemplo. O Cardeal Francisco Ximenes, o gramático António de Nebrija e ou* tros caoiinha-am na vanguarda do movimento que em breve se co- maoicou ao noRHO p^is.

Com a Itália mantinhamos nós relaçSes literárias desde muito cêjo. D. Afonso V, de qu«m fora mestra Mateus de Pisano, * che- gou a mandar vir de Itália o dominico frei Justo Baldino, hábio e doutor «m amboã os diroitos, para escrever em latim as histórias do reino. * Em Roma o binpo de Évora D. Garcia de Meneses ' cau- sava p**lii i»ua eloquência e erudição latina a admiração dos espíritos maia culto-s como Júlio Pomponio e o cardeal Sadoleto.

Da Itália noá veio também o afamado latinista CATALDO AQUILA SlCULO, poeta e orador, mcbtre de latini de D. Jorge, 1.°. duque de Aveiro, lílho natnr>il de D. João ii, cujas obras foram publicadas em Libboa em 1500. *

No reinado de D. João ii, Portugal assombrava o mundo inteiro com BB Euas descobertas e conqui«-t*í8. Angfelo Policiano escrevj^-lhí», feliz por í^e dirigir a tara cirande R^i. * Demais no curto mas bri- lhante periodo do nosso renasci nento tivemos espíritos superiores que compreenderam t^ssa renovação e concorreram inteligentemt^t'^ para a introduzir ou estabelecer em Portugal, tais foram : Aires Barbosa, Pedro Nune8, Lairenç) de Cárceres, Joríre Coelhií, Diogo Sigeo, Pedro JS4n'-h"8, Pedro Margalho, Clenardo, Víiseu. André de Rt-sende, Jerónimo Cardoso, Francisco de Holanda, Gil Vicent(í, Damião de

1 De Pisano (f 1466) apenas resta De hélio Septensi publicado somente fm 1790 pela Ac:id. R. das Se. de Lisboa no vol. do^ Ivéditoa da Hisi, Por- i»guêa e ttrtd- para portug. por R<»berto Corrêa Pinto, Livro da guerra de Ceu- iaescnlo por MeMre Mateus de Pxzaiio em 1460. ., Coimbra, 1915, 1 vol. Zu- rara (CAr. de D, Pedro de Meneses^ 215 do vol. n destes Inéditos) chama- Ihe^ pxita laureado, íilódofo e orador, mas nada, alem da apontada narração latina, resta dele.

* Baldiíjo morrea em 1463 de peste em Almada sem haver composto eoQea alguma.

^ Freire de Carvalho, Primeiro Ensaio cit ., pág. 59 e níta 87.

* As obras latinas entre as quais avnlta o poêmsi Arcitinga foram reim- prea. em Sonsa, Provas^ vi. A ed. prmceps [1509] é raríssima. A Bibl. da'Univ. íle Coimbra possue um ex. que foi de Ferdinand Denis, a que iv o comprou o insigne bibliófíl.) A, F. Tomás. Algaiis dados sobre a biogr. de Cat^tUlo em Soma, HiêL Gen, iii, 156, liCitão Ferreira Noticias Cron. da Univ. de Coim- bra, 414; S. Viterbo, A cultura intelectual de D. Afonso F, no Arch. Mist.^ n, á60, o A. Carv^ilho, Os incunabulos d% BihL P. do Porto, Porto, I ÍI04, 34.

* Ângeli Poliliani operum tomas prinius : epistolarum lib. XII y etc, ^id. (ed. 152S) uma carta de A. Policiano a D. João ii, na p4g. 5S4; ujna carta deete a A. P. a pág. 290 e ainda uma carta de A. P. a João Teixeira a pig. 291. Puliciano foi dos e3pirito3 mais brilhantes da corte de Lourenço do Mécíi- eii, como dtísemoB no cap. anterior.

132 > BlSTÓXfÁ DA LITBBATOSA PORTOQUÈBA

GoeP, Si de Miranda e outros. ^ NICOLAU CLENARDO ou CLEYNARTS ( 1495-1Ó92), que veio para Portugal na qualidade de mestra do*cardeai loLinte D. Henrique^ foi um jip^iixonado cultor do latim, g^^S^ o árabe, e pode considerar se conao o « grând ^ reoríi^anizador das Im- goas mortas em Portugal». Ensinou o latim em Bp^í;:*, Évora e por ventura também em Coimbra. As suas Cartas, e>crita8 em lattm, i-am altámentj intt;rfct*ftante8 para o eistudo da sociedade portuguesa no século XVI ^ VASEU {f I5G2), insigne latinista, flamengo, natural de Bruges, veio com o ant'3rior para Portugal uni»» r<iiijdiu doze ^nos e dirigio em Braj^a uma escola de latim. ' ÂMDRÉ OE RESENDE * (c. 1500) o erudito anticuário que foi o mensageiro enviado a Sala- manca para trazer consigo Cíenardo, aator da De Anti quitai íbtis Lusitcmiae, ^ da História da antiguidade da cidade de Évora * e da Vida do Infante D. Dxiarte, ^ foi um espirito duma alta cultura,

^ Dos Humanistas portiig. se ocupa o citado Leitão Ferreira Das Noti- cias Cronológicas. De iiiuitos ha trabalhos cr. ticos modernos, como por ex. do mateniátivío Pedro Nuues, do quem foram reeditadas as obras portuguesas na Rv. de Engenharia de 1911-l9lá, como adeante dizeinos.

^ Nic. CUnardi ejjist. lihri diio^ Anltterpiae, 1Õ61. Vid. Sr. Joaquim de Vasconcelos. As Cartas Latinas de Damião de Góes, no Instituto^ xlvui, 58 : L')po3 de Mendonça, Ânnaes das iSc/encIa« e Leiras^ *(1857), 121 e sCi^.; Chau- vin et K »er3ch, Elude siir la vie et Ics travaux de Nicolas Clénard, Bruxellea, 19()0, 1 vol. e sobretudo Dr. Gonçalves Cerejeira, O Uenascimento em PorÍ7i- ga^—Clenardo (com a trad. das suas principnes cartas) Coimbra, 1917-18, 2 vols.

* «... Sai de Braga deixando lanhados os fundamentos doma escola, qne ficou dirigindo o meu companheiro de viajem, Vaseu. . Carta 4." p^g. «õ, ed. injra . E em outro logar «... Viíseu, que foi coinpanheiYo da minha pri- meira viag-m, voltou depoii dalguns meses com toda a família para Braga^ e está dirigirdo a nova escola, com o ordenado anual de cem mil dinheiros ou sejam o03 ducados. Nào se pôde dizer que eu o lenha feito infeliz nas Espa- nlias...» Nic. Clr.i>nrdi epipt., oh. cit., 59. (K a carta 13.*). Vasen publicou cm Salamanca em 1552 uma Chr, de Espanha. Arch, Hist^ Portug., wi\l^ 342, «nota (91).

* Os estudiosos encííntrarào subsidio-? importantes paia a biogr. deste formoso antiquário no Arch. Hist.^ iii (1905) art. de A. F. Barata, André de Resende e vào Jjucío André de Iitisende (pág. 4o ; D. Carolina Micha("lis, Lúcio Andrcas Resc.ndixLs Limianus {ibid., l<il', e ainda Barata, Vitima verba, André de Iícs'indc Lncio ? Resposti e addilamcnfo a um artigo da ar.* />. C ALy Évora, 1905, Jicrista Literária, iii (Porto, 18o9), 340 e seg. o iv, 4ííò. No Arch. liíst. Port,, vil e VIII foram puhlicíidas duas recensõis da Vida de A. de Resende Cíícritas por Francisco Leitiio Ferreira (1735) com eruditas anotaçõis de Rraam- canq) Freire. Veia-se também D. Carolina Michaolis, Notas Vicentinas na Rev. da Unii\ de Coimbra, i (1912), png. 243 e segs.-, Braamcamp Freire, Opitscalos Resendianos no liol. da Acnd. das *S'c. de Lisboa, vil, (1912) UO.

^ 1.» ed., foi., de 1593, reimpr. na Coll. das obras de Auetorçs Clássi- cos^ da imp. da Univ. de Coimbra, i7íiO, 2 voU.

^ 1." ed., 1576; depois reimpr. na Coll. das Antiguidades dt Évora, de Bento José de Sonsa Farinha.

"^ Mandada publicar pela Acad. R. das Sc. de Lisboa, 1789,

OIPÍTULO III KBCOLÁ ITALIAKA OU QUUraOXTIBTA 133

merecendo^ ser esoolhido para íaz^r o elogio da Uriíversí lade em 15Õ1. JERÓNIMO CARDOSO (f 1569), como ca precedentes tambôm in- fligne haoianinta, autor dum Dicionário Latino Lusitánico e de vá- rias obrai», t<^da8 escritas n^ f^nio<ia liagaa do Licio. FRANCISCO DE HOLANDA (1518-15S4) ilurainador, pintor, arqaiteto e escritor, até pouco c >nh«cido das pessoas doutas polo extrato, aliái* iafi^íl^ qae de part*í d;i Kui obra d 'U em traduç^l ) o conde R jczinski no seu livro Les Arts en Portugal (pág4. 5-73) í^ agora, felizmente, posto ao al- cance d*i todos peia edição das í*u is obras *. Francisco de Holanda era filho de António de Holanda, ilumina ior, to primeiro que fea e achou om Portugal o faz^r auiv;) de preto em brinco, muito me- lhor que era outra parte do munlo » íj a quem se atribuo o trabalho do livro de Horas da rainha D. L »nor, mulher do D. Jii^o ii, ma- ravilha d« gosto e de delicada fíxecuçíi) artistica, hoj-^ n* Biblioteca Nacional. Francisco de Hol-inda ri'cebeu de seu pai p talento ar- tistíco. Como escritor, diz o critico que melhor até hoja o t^^m estu- dado «acha a expressão do seu pensamento ás vezes com dificuldade, mas mesmo nos casos em que o diz»ír níto é fçenuinam^ínt-^ p^rtu^uês devemos admirar o exforço e louvar a originalidade da forma, a di- ^;2o expontânea. Fala por imap^ens, como se tilhasse ideias plantica- mente, e apesar de poeta e artista, cônscio do sen valor e vaidoso, por vozes, par.5ce-nos sincero e verídico no que diz de si e doa outros » . '

49. Senhoras portuguesas ilustres. No movimento do

Renascimento português do sócuIj xvi desempenha papel brilhante o grupo de senhoras duma fina distinção int^^lectual, a cuja frmte en- contramos uma Rainha e uma Infanta. A Ratinha é D. LEONOR, mulher de D. Jtão II, a fundadora da 1.* Misericórdia (1498) que houve em Portugal, e que na Madre de Díus que igualmente fundou (1509) dei- xou bem assinalada a sua protecção ás artes da pintura, escultura, oorívesaria, ete. Ela foi que amparou o g^^nio incipiente de Gil Vi- cente, tendo também o seu nome vinculado á impressSLo da Vita Cristi *. A Infanta é D. MARIA, filha do rei D. Manoel e de sua ter-

* Ed. de J. de Vasconcelos qae em 1879 pablicoa : Dcí fabrica , fa- itce á cidade de Lisboa e Da acicncia do desenho ; e em 1896 o tratado Qu . "^ Dialogoê da Pintura antiga. E em 1918 Da Pintura antiga tr it^iio de F, a Holanda., Primeira ed, completa . . comentada p>r J. de Vasconcelos, Porto» 1 vol.

* Vil, Arte Portur/ttèsa, revista ilustrada de Archeologia e Arte moderna^ n.* 1, art. de José Pessanha As « Horas » da rainha D. Leonor,

^ J. de Vasconcelos, Quatro Diálogos^ ed. 1918, pág. 1-t.

* Vid. Braamcamp Freire, Critica e Hièt., i, 97-138 e J. de Vascon- -«elos, Arte RtHgiosa em Portugal, fase. 16.

e

334 HIBTÓBIA DA UTBRATUSA POBTUacÈBA

oeira mulher, D. Leonor, irmã do imperador Carlos V. Faziam parte do grupo, de que ela era como que centro e mentora entre outras^ as duas irmãs castelhanas Luisa Sigêa e Ângela Sigêa, Joana Vaz, a filha do Marquês de Vila- 1 Uai D. Leonor, D. H'4ena da Silva, re- ligiosa de Celap, Paula Vicente, e, embora nâo tôs^e d^^sta roda de cortf^frãs, adquiriu como elas renome e glória imortais Públia Hor- tênsia de Ca&tio ^ O conhecimento das línguas e em especial da latin», o estuno da teolrgia e da filosofia, o amor da poesia consti- tui» m a erudição do século em que essas damas viveram e ê^se é a dooiinií) em quo se imortalizaram. A infantil D. Maria escrevia a Bua n Fii m lí.tim * ; em latim, grego, hebraico, t^iríaco e árabe se dirigin LUISA SIG^A. {f 1560) ao Pontífice Paulo iii e em latim escre- via o 8*u potmeto èSynira '; JOANA VAZ era igualmente conhf-Cídora emérita tia língua latina e mereceu os encómios do célebre Clenardo que a fhwna «(iis-fintainente ilubtrada » *.

PAULA VICENTE, a filha de Gil Vicente ajudou s^u pai na com- posição e T* pM sentaçao das peças teatrais ^ e figura como tangedora no livio das moradias da casa da rainha D. Catarina ^; PU6L1A HOR-

^ Públia Hortênsia de Castro foi moça da câmara da Infanta D. Maria, de qreri) jccíbia GOOO riais anuais, sendo contemplada com igual quantia no testamento. Cír. Arcií. llist.y v, 118, art. de Gomes de Brito -4 a tenças testa- nientanofi cia hífattin J). Maria.

Sí-hif a Infanta D. Maria e a suo CMe veja-se Fr. Miguel Pacheco (f 16G8) Vida de Ia Infanta D. Maria. . ., Lisboa, 1675. D. Carolina Miehaelis de V., A Jvfauía D. Marta de J'ortuyaI {lò'Jl 1577) e. as suas Dnmas, Porto, 11)02; Cíinoíí d».! Sabugosa, O Paço de Cintra, desenhos de. 6'. M, a Rainha, a íSevJiora. D. ArncHa, a2>ontamevt.o8 hist. e arch. rfo. . ., Linj-joa, lí)03, pílsf. 106; JoíU|UÍm de Araújo, A Infanta D, Mai'ia, jiUia de el-rei D, Manoel I de Por- iugaL Génova. JÚCU

•' J( m' ^il\ chtre Kibeiro, Luisa Sigila, breves a}>ont amentos historico-Hte- rários, nu uí('»iííi : pic.ciil^da á Aead. R. ilas ^-e. de Lisb()a, 1880. Nilo obstiute o fccu t)ti!!(), í) iiih lo.saiitíí monfgralia da noticia d.is outras damas ilustres con- lemporâiK-aB de Mgra. encontra também o bitor a bibliografia do assunto, que aqui julí:o esout-ado icpetir. O poi^iníi Sj/ntra v(^m publicado na integra no Aphiduw e tí.mbOni, com a trauuçrio ao lado, no livro O Faço rfe" Cintra do Conde de Siibi'goba, eit., p:íg. 255.

* O lt.blemunho do Clenardo vem numa carta a Joaquim Polites c diz o seguinte: «... etiam apiid puellas me in h ai: fúria [vem falando do seu cnta- Biasmo peias lonipo^içõcs em verso) venditavi, ut uterque Clenardum sexus nihili piitet esse I ortam. . . . Est Ide inter aulicas asseclas virgo eleganter lite- ris culta, arieo mihi nota^ ut vix nomen ternierim, nisi subvenisset Resendius: eam quoque ad exéquias Erasmicas mire venusto carmine cohortatus sum. . . . Est enim virgi/ii nomen Joannae Vasiae cujas abhinc biennium epistolam vidi, cujas rice te puderet. . . » (P<ic. Clenardi epistolarum libri duo, . . Antuer- piae, 15()6, pág. 79). ^ãi i ^■'^''"

^ Ensaio sobre a vida e escritos de Gil Vicente no tomo i das Obras de Gil Vicente da ed. de Hamburgo, 1834.

^ Obras de Luís de Camões, i, ed. de Juromenha.

CAPÍTULO III BSCOLA ITALIANA OU QUINHENTISTA 135

TENCIA DE CASTRO cursou humanidades, filosofia e teologia, defendend© teses era Évora, em 1565, quando apenas contava dezasete anos.

Constituiam estas e outras senhoras o que ás vezes se chama impropriamente Accídemia f em* nina portuguesa.

Do que não resta dúvida é de que essas damas de espírito culto e erudito que abrilhantavam os seroes da casa de D. Maria sam uma prova do explendor que em Portugal teve a eclosão e desenvol- vimento das letras.

A época do nosso Renascimento foi brilhante, embora fugaz. começa depois da Rrforma, que se iniciou com as primeiras pré- gaçSes de Lutero em 15L7. Mâo excede a 1/ metade do reinado de D. JoSo III sendo o de D. Sebastião apenas um reflexo. E' entre 1520 a 1540 que a cultura clássica e o amor á antiguidade, quo de modo muito imperfeito haviam penetrado na Corte de D. João ll e D. Manoel, se expandem impetuosamente. D. Jono iii convencido de que assim cumpria uma mi<t«ão civilizadora atraiu para o pais huma- nistas distintos, quer estranjeiros, quer nacionais educados fora. ^ Mas em 1539 estava estabelí-cida a Inquisição era Portugal, e em 1545 08 Jesuítas dominavam como soberanos. Os sintomas da deca- dêacia moral eram apontados, pelo m^^nos, desde 1534 em várias passag^^ns das célebres Cartas de Nicolau Clenardo *, como nas obras de muitos escritores da época.

Não obstante isso, porem, a gnleria dos nossos escritores é vas- tíssima, como passamos a ver.

POESIA ÉPICA

50. LUÍS DE CAMÕES. Cam3es vale por si uma lite- ratura inteira, escreveu St-hl^g J '. A frase do notável crítico alemSo é períeit«imente exacta. Irmão, pelo génio, de Homero e de Vergilio, Camões simboliza as aspirações, a glória e o valor do pai^, que o viu nascer. A literatura portuguesa gira em volta do seu nome. Mas mais: o Renascimento encontrou nele o poeta, que melhor o soube traduzir e cantar em versos imortais. o nome a um povo. Diz-se a pátria de Camões, como se diz a pátria de Homero. o nome a

' D. Carolina Miehaelis, A Infanta D. Maria, 81.

* «... soube qae meu irmão nà> gost;iva n;i(lii do Portuj^al, o qaa me não contrista, nSo somente porque ele é uma criaiK;-! (\\w teria de lià.r cem uma moeidade inteiramente perdida que aa:siin vivo a mocidade iV^ Ksp.udKi. .;u me- lhor, a maltidão de mancebos que do nosso país para iv\w\ vtiii, hònretaflo em Lisboa, onde tinha de viver e onde uma sociedade de verdaí](;ira libertina- gem, mas também por cansa do nome de que usa, que o meu próprio é, o (|uc me valeria, decerto, algnmas vezea, a aguentar os desvarios fraternos. . . » ( Curta 1/, pág. 5. ed. cit.). Veja-se tamlíêra a carta 2.*, tr. de Lopes de Mendonya, loc^ cit,

^ Hist. da Lit. antiga e moderna, u, 15.

136 HX8TÓBIJL DA LITBBÁTUBÁ PORTUGUESA

ama época. Diz-se o Renascimento produzia CamSes. Isto explica que comecemott por êle o estudo dêate período.

51.— Biografia de Luís de Camões (1524.1580), oriundo

duma família g^iiciana, nascido em Libboa ^, fez os seus primeiros estudos em Coimbra em orcunbtâncias ainda nSo esclarecidas, que alguns biógrafos substituem por conjecturas e hipóteses mais ou me- nos fantasiosas ^ e começou muito cedo a frequentar a c6rte de D. Joào III, onde se inicia a sua vida aventurosa e cortada de desgostos, qae não mais cessaram de o perseguir. Diz-se que fSram os amores com a dama do paço D. Catarina de Ataíde, filha de D. António de Lima, mordomo-mór do Infante D. Duarte e de D. Maria Bocan^gna, que viera de Espanha no séquito da rainha D. Catarins, e que o poeta imortalizou sob o anagrama de Natércia, o pretexto para o afastar da corte, pretexto facilmente justificado pelo seu génio altivo e independente. Em 1547 tondo-se espalhado a notícia do cerco de Mazagão, embarcou para Africa alistado como soldado, e durante dois anos, deu asas ao seu temperamento belicoso, perdendo numa refrega com os árabes o olho direito. Tendo voltado a Lisboa e cum- prido a pena de perto dum ano de prisão no Tronco da cidade por um con flicto por ocasião da procissão de Corpus Christi com um tal Gon- çalo Borges, moço dos arreios de D. João iii, embarcou para a índia. Era em 1553. Esta viajem é decisiva na vida de Camões, cujo cére- bro alimentava a idéa de cantar

« o peito illustre lusitano

<i 1 qaem Neptano e Marte obedeceram ».

1 E' a opinião do Bispo de Visea D. F. Alexandre Lobo, o qual escreve porem: «... que as três rivais Lisboa, Coimbra, Baatarem, eontinaem embora a disputar entre si o berço do grande poeta: a qaarta Alenquer , nSo tem decerto direito nem fundamento algum para entrai na liça». Vid. Memória hist critica acerca de L, de Camões, nas Obras, i. As dúvidas aumentaram depois des does. produzidos por Brito Aranba, no Dic, bibl, xiv, 15 e seg., mas o Dr. Th. Braga, Camões, Época e Vida, Porto, 1907, 166 e seg. demonstra ca- balmente ser Lisboa a terra natal do glorioso Épico. E' lamentável que Manoel Correia [f 1613?], o 1.® Comentador do Poeta [OsLus,. . . Coment, 1613], que com êle privou em amizade estreita nada dissesse sobre a biogr. dele. Sabe-se que Pedro de Mariz [ainda vivia em 1616] quis suprir essa falta na «Vida» anteposta aquela 1." ed. de M. Correia. Mas o autor doa Diálogos de varia His- tória (lf)94) e do interessante livro inexplorado História do &maventufado 5. João de Sahugum (1609) fez esse trabalho sem discernimento. E' preciso vir ató Severim de Faria (Discursos... 1624) e Faria e Sousa {Las... comentados, 1639) e melhor até o Bispo Lobo {Obras, i, 21) para achar elementos valioeoe.

^ O qne se nao tem dito dum susposto tio do Poeta, D. Bento de Camões, abade de 8. ta Cruz, que lhe teria dirigido a educação! Entretanto Pedro de Azevedo demonstra que esse tio nunca existiu. Cf. Boi. dabeg. Cl. da Acad., XI (1918), 24.

CAPÍTULO nX EBOOLÁ ITALIANA OU QFINHENTIBTA 137

É pouco crível a tradição qae diz ter êle lido durante a sua estada na prisão a i/ Década de Barros, que aparecera em março de 1552 e que^ BogestioDado por ê;»se poema em prosa da nossa história da lodia, compusera nada menos qu^ os primeiros st^is cantos dos Lusíadas. Qualquer que fosse a idéa geratriz du poema, é certo qae êlo não po(Ua ser composto dum j^^cto, ininterruptamente. Durante vinte e cinco anos, de 1514 ou 1545 a 1570 trabalhou o Poeta na sua obra prima. « Principiada com Ímpeto juvc^nil, quando tudo pa- recia sorrir ao apaixonado e genial fídalgo-ca valeiro e quan io o sol da pátria estava perto do seu apog^^u, a epop^^ia foi adiantida de vagar, após graves estudos e duras experiêacins e saiu á luz quando a velhice batia á porta e as provas dt^ decadência do pais se haviam multiplicado t. ^ Á viajem á índia tinhdi ainda a vantagt^m de lhe mostrar os lugares, que queria descrever. Que raf^lhor reso- lução poderia pois tomar? Em 1553 chegava a Gôa. t^ndo ent^o mais ocasiões de empunhar a espada do que a pt na. Foi aqui que ele suportou o martiuo dum pesado cruzeiro

cc Janto dam aêoo, duro, estéril monte, a inatil e despido, calvo e informe »

( Canção z )

Em 1558 partiu para Macau a exerc(*r o cargo de Provedor mar de defuntos e ausentes j a quem competia arrecadar as heran- ças, JSnquanto desempenhava ê.-»te cargo co-ripô-», segundo refere a tradição ' na gruta ainda hoje conhecida pj^lo s^u nom^*, a miiior parte dos Lusíadas^ chegando ao canto vii. Chamado a GO a, o na- vio, em que embarcara, naufragou não na costa de Cambodja, na foz do rio Mecon, como se tem dito, mas « ni p irt'^ fr nteira do golfo de Tonquim, a sueste, num dos panJélos que cortam o norte do reino do Anam, ou, mais precisamente num dos b-tixos a que as an-

* D. Carolina Michaelis, Bihl, Fomavica, vo). x, «Oa Lusíadas ».

Numa das snas notávoia Carl<is (hi Lonlres Goiu;alo da G;una, pseu- dónimo dum portagués que viveu sempre no esitringeiro [Jcào P^-i k. 1839- lí)Ô9| combateu a velha tradição procuramio <lemonsii;ir juií Camões ininca es- teve ern Maeaa, qae nem n esmo Macua, ao tfíinpo, aimli exibti.i, nào pasadndo PotSo dum covil de piratas. O mesmo nutor avfintoii a liipót se ('o porta tf^r ido morrer «com a espada na mao, ao lado do síhi rei nos c.iini)na <lo AU-nfor-t^e- bir». Esta uarta tem o título Tradição o e hhtória e foi publit-adji no Portw- gal. D.** 2, de 1Í507 e transcrita no Oriente Portufjitc: (Nova (^ôai n." de abril de 1907. Mas nm escritor tam ponderado como o Hís}).* Lo! o [oh c/7., i, 59) eiara: «... a demora do Poéta em Macau nao pode pòr-de em uúvida sem con-

138 HISTÓKIA DA LlTBaATUaÁ POBTUOUÊBA

tigas cartaB geográficas davam o nome de ilhas ou BaixoM do Pra- eel ou de Parcel», no mar da China, em fins de lõõ8 ou principioa de 1559, ^ e a custo ele se salvou e á cbra, que tam preciosa era. De Goa éhia para Moçambique em 1567 e daí é que partiu para o reino na companhia de Diogo do Couto, que o encontrara (1568) tam 2^^^^ ?wô comick de amigos, (Dec, vii, c. 28), Depois de de- zast-is anos de desterro entrava o Poeta na capital do seu pãi.^, agora devastada pela peste. Moriêra a mulher que iôra a inspiradora dos seus versos, a sua Natércia. Restava-lhe sua mãe, a quem jubilosa- mente, decerto mostraria a obra que era seu orgulho o seu enlevo. Os Lusíadas foram concluídos depôs da sua chegada a Lisboa, a 7 de abril drt 1570, sendo o alvará do pr^,vilégio para a impressão da- tado de 23 de setembro de 1571. Por este tempo foi-lhe roubada uma colecç?to de poefeias, que ele intitulara Parnaso, Os Lusíadas que 8aíram do prélo em princípios de julho de 1572 íôram dedica- dos a D. Sebantiflo, que galardoou o S'mi autor com a parca pensão anual de quinze mil réis. Camões viveu ainda oito anos após o aparecimento ria sua obra e teve por isso ocasião de assistir ás lutas e ás intri^ras mesquinhas, levantadas pelos seus inimigos. Mas alguma cousa o abalou mais que essas lutas que o seu enorme talento des- pertava. O desastre de Alcacer-Qi bir acabava de dar-se, e a domina- ção (le Cíistola batia ás portas de Portugal. Ao seu amigo D. Fran- cisco de Almeida, que em Lamego preparava meios de resistência contra o invasor, Canio"s escrevia : enjin, acabarei a vida e verão todos que fui tam afeiçoado á minha pátria j que não me contentei de morrer nela^ mas com ela. A 10 de junho de 1580 expirava o maior cantor das g.órian pátri* s. ' Onde? Como? Parece que numa pequena casa junto ao largo onde hf je se er^ue a ^ua estátua e em extrema mitéria, sendo enviada da casa Vimioso a mortalha que o

trariar, e com pouco ou iionhuin fundamento, a tradição. . .». Quanto era judi- cioso êdte asserto domonatrou o Jordão do Freitas, Oimões em Macau, LHaX^o^^ 1911. Que Camõps vivtm durant* al>çiini toinpo « di-lo a tradição constante, repeteiii-iio os mais antigos biógrafos casoonoanos e confirma-o um antigo títalo dos bens d*í raiz do colle^^io de Míicau. . });ig. 7.

^ Jordào de Freitas «'Imíidou cabalmente esto problema O naufrágio (h Cnmoes r tios Liinudan^ Li.«]»oa, 1915.

'^ l*o(ieria correspo der a noventa es^Hid is da rnooda atnal e foi-lhc paga pontnalmrnttí Sí-giirido piova Juroinonha, iiias é. bom nào esqne/er que ontros indivíduos de menos m»''iitoa r(»cebia'n mais avultadas somas, sendo por is o para dcí^ejar (]ue ^^e « u.-^asse co:n ele lib^i alidade, mais gcn. rosa do que a que inculca a tença ann;d (h*. qnifize mil reis », eom»» escreve o Bispo Lobo. \0hra9^ cit., 1, íí2J. O alv;ivá da tença deííte^ (juin/e mil reis era por três anos. Em 1575 foi este aiv. c.ntirnia io por uma apostila de 2 de airosto prolí)ng.indo por nihis três anos a tenci, qun ainda toi renovadi a 2 de julho de 157S.

Ou 157'.», enmo su-itenta o Sr. Jordão de Freitas? Vid. Diário de Notí- cias de 10 de junho de r,)13.

GAPÍTni.0 liX XSCOLA ITALIANA OU QUllTHBNTISTA > 139

envolveu, e sendo sepultado na igreja das freiras franciscanas sob a invocação de Santa Ana. Dezaseis anos depois D. Gonçalo Couti- nhoy da Casa Marialva, mandou recolher- lhe os ossos em modesta <2ampa. Depois Martim G:>nçalves da Camará restaurou a sepultura arruinada e sub^ituia o epitáfio por outro em v«>T8 0s latinos do je- suíta Matos Cardoso. O terramoto de 1755 disnersou os os^os, quo Graretf, Castilho, e comissões e&peciais (1854 e 1880) debalde se es- forçaram por achar e autenticar. ^

52. 6dmÕ6$ 6SCrríor. Falemos agora do escritor. Trêa géneros de poesia cultivou Camões o épico, em que foi iriimitável» o lírico, em qu*í podo dizer-se, qu*^ é o primeiro do seu tempo, e o dramático, em que sobreaaíii notavelmente. Vejamos por est* ordem as BURH obras:

a) Os Lusíadas sam a nossa epopeia nacional, uma das quatro ou cinco grandes epopeias do mundo. O ansunto indica-o o poeta dizendo que canta hm armas e os barões assinalados, ou o peito ilus- ire lusitano. A descoberta do caminho para a índia pelos portugueses dea-Ihe motivo «l«5 expor a história nacional, os feitos h^róií^^w doa portugueses. Nao é, poi», casa descoberta o objecto do seu poema; n?U> é Va^co da Gama o seu herói. O que ele na sua fr-nte é um povo glorioso, h róií;<>, audaz e uma série extraordinária do factos ope- rados por ele, tanto por terra como por mar. Daí a idéa da sua obra, a que pGá justis^^imament^ o nome de Lusíadas aproveit-ioio a pala- vra inventada psio antiquário Resende *. Vam^o da Gim* encarna a alma dum povo; a sua navegaç9L0, que o Poeta encontrava d-scrita no Roteiro de Vafco da Gama. na Ásia de B-irros e no Descobri^ mento e Conquista da índia de Castanhí^la, forma o •l^> exiíurso histónco íU) pHC.na, que está dividido era 10 cantos e cida OMUto em estancias de 8 vorsos. Contêm ao todo 1.102 oitavas ou 8.8 IG ende- casBilabos. A narraçSo, sempre interessant?, é cortada d^ ^''scrições e de epifc ódios magi?5trciÍB, entre os quais avultam o do Adamastor

\ Dr. Costa Ferreira, Os ossos de Camões, tentativa de uma investiga- ção antropológica. Lisboa, 1912, 1 folh.

* O Dr. J. M.iria lloilrií^nes nos seus notiiveis estados sobre as Fontes dos Lus. (Instituto^ li. Ibi) supôs qne fora Jorg-^ Coelho, rival e f niií^o de Ke- fenie, qaorn primeiro ♦mprefÇ5ira a palavra Lusíadas em obra itnpre^sa, embora rate a tíves.^o j?< usado no Vincentius Levita et Martyr ii, v. l',)5, fnitrio iiunlito. D. Carolina MichaíMia mostrou qi;e a paisagem de liesonde se acliava r''proda- zída ni Oratio pro rostris^ proninfiada na i^niv. de Lisboa em 1 do oiuiibro de 15.*54, o qu'í matava a (jne^tilo. Ma-» a descobfirta reuente dum eximiplar -lo raríssimo opií-iciro tle Resende Cármen eruditum et el\í^ans... impre.sHo em 1531 reforma M*n,í7aIariTient'; a opin'ao da preelara romanista pois evid<íueia fjne o vocá- bulo Líisíadas }t\ desde iTvU con-ia mando, segundo a tVas í (lo ar. A. Braamcamp oa eoinanicHçiio á Acad. das Sc. de Lisboa de 14: de mar(;o do ano de 1013.

140 HlBTÓmiA DA UTULiTUSÁ P0BTUGUÊ8A

(v, 37-59), o de Inês de Castro (m, 109-135), o do aparecimento do^ Indo e Ganges a D. Manoel (iv, 68-74), o dos doze de Inglaterra (vi, 43-67), o da ilha dos Aviores (ix, 54-79), etc., etc.

Porque muito viu e observou nas suas longas viajens, o nosso épico Fobr^sái na pintura dos cc^tftumes e dos factos, que ímam a sua atençUo. O n>ar encontrou rêlo um pintor inimitável, como b«) pode vêr na detenção da tromba marítima (v, 18-22), e na da tempestade (vi, 70-80). O seu pincel nSo é mf nos fiel ao descrever os lances duma ^«erra; veja-se, por exemplo, o formoeissimo quadro da batalha de Aljubarrota (iv 28-44), o da de Ourique (iii 44-54). Que viveza, e que courido n^ ressumbram d^ pintura dos costumes da índia no canto vil! Que acentos apaixonados ao referir o caso de Sepúlveda nas trê8 fitavas (46-48) do cantt* v!

Que iormoHssimos retratos, ás vezes limitados a pequena» pincfbd^s, os de Viriato (iir, 22 e viii, 6), Sertório, (viu, 6 e í*eg.), D. Fuat* Boupinbo (Viii, 16 e r-fp.), Mem Moniz (viu, 20), E^as Moniz (m, 37 e seg., e viii, 13), Geraldo s<m Pavor (viii, 21)^ Magriçí (VI, 53 e seg.), o de D. Maria Eolicitando de seu pai auxilio para mu mando D. Afoneo de Castela (iii, 102 e seg.), o do Con- destávf] D. Nuno Alvares Perein (iv, 14 e seg., e viii, 28 e seg.), o de I< t-o, no encantador epitódio dos Cafres na An^^ra de Santa Helera (v, 30 e seg.)! E' ebta gtilaria famosa de valentes e de heróia que runHTf sas vezes lhe detêm a pena para romper em hinos pa- triótiei h. E' sempre cem ertfriKcintnto que ele Ê.la do amor dcL^ pátria, nào movido de prémio vil fi, 10), do seu nmko paterno (Ibid.)j á\i pátria amada (iii, 21 e 24), da pátria cara íix, 17), da avinda terra (v, 3), da nossa terra (vi, 42), ria ditosa pátria (vili, 32), eitfin), dsi pequena casa lusitana (vii, 14)1

Algumas censuraH foram i* ilas aos Lusíadas, copío, o é a princ p* ), a ni^tura do maravilhíí-o pagão cim o oo cri^-tianismo,, maB fhpa eníBura deriva do dehccnhecimento do século vm que o Lp < o v)Vfu. Taíso e Milton e et outios artistas do Renatícimento nSc pncíduím diferentemente. Ft-na fup2o, olliadaB as circunstân- cia 8, p< c e * pcntar-se até con o una superioridade.

A í ia deveu Canões o inter» sfe e a vida que ôHo verdadeiro encfníí á leitura da sua obra «)í corridos miis de t^es Bé<*ulo8. O coKí io 0(8 reuses ro Olinipt (i 20-41), o ep'só(lio dap N«reida» e^c<^t{l»fo ( peito ás náos p^^iò oitar cue ot» Pí»rtugut ses ♦^ntrem cm Mnl.íÇr, onde binhm ar.ic^u h»f<os (ii, 18-24), a ffscT"ção do VtiDh y (in.ir-ho do 01in>j)o a mi| licar favor para rs Portuíjjueses Oli í3 41), H defccrivao do p^lá< i(. de Keptuno e a do C(u cílio dos deuMh «ciiÓTeís (vi, 16-34). f deí-ciiçao da IIHh doa Amores (iX 54 6; ) tníim, o barquete da< c por Tétis a Va>-co da Gama em que uii j> niijía canta os louvoreb nos Portugueses (x, 1-73; e tantos

OAFÍTUI.O III ESCOLA XTALUITA OU QUINHENTISTA 141

outros, sam uma fonte inexaurível de graça, de variedade, de brilho e de emsanto ^.

b) Canades distinguiu-se também no género lírico, escrevendo scmetoa, elegias, canções, eglogan, odes, etc. ^. O eeu lirismo é repas- sado de grande naturalidade. O coração humano, em toda a com^ plexa gama de sentimentos, a ternura, o entusiasmo, o desespero, tijda a paixSo, toda a vida, sam áa vezes retratados por Camões nnm simples verso. Fôram-lhe escola a amarga experiência e a

d Tida

amais desgraçada qae jamais se via. »

(Soneto).

'Nesta obra lírica devemos colocar em primeiro logar os sone-^ tos. Conquanto, escreve um crítico eminente, nao cheguem a trinta os que entre todos se avezinham da perf* içâo ' e que ainda nesses ache em que topar o reparo de um juiz pscrupuloso é certo que nenhum dos mais merece inteiro desprezo, mas antes em quase todos, peja nos pensamentos, seja nos afectos, s^ja na expressão e na m^^lodia, i6 encontra motivo de louvor e aparece o grande talento de Camões *.

Que poderemos afirmar ácêrca da interpr( taç^o da lírica, ca-. moneana modernamente estabelecida e que a fília na sua paixão pela Infanta D. Maria? Teremos de abandonar a tradição que diz ter «'io D. Catarina de Atai le, a dama que m«is lhes prendeu o coração, e que êle cnntou sob o anagraraa de Natércia ? Terá esta de passar para um 8eg;»n^o plano, uma das várias darnas cantadas pelo namo^ mJor iTicorrigivel, que foi Camões, para s^. dar o lugar que ela até

í A ed. príncipe dos Lusíadas é de 1672 : Os Lusíadas de Luís de Ca- mões. Com prevvégío riaL Impressos em Lisboa, com luença da Santa Inquisi- ção, & do Ordinário. Em casa de António Gõçalvez impressor 1572, 4.^ 85br# cata ed. devemos notar o scgainte: 1.°) duas iinpr(í.ssòid do inc-íino ano de 1572, aparentemente iguais, mas vc-se que numa o pelicano, i\\\(^ vcrn gravado n-» frontcspício, tom o bico voltado para a direita do leitor, e na outra tom-no roltado para a esquerda. Parece s^r aqiu-la, dn fa.-to, a 1.", rcimpicása, entre otttraá, na ed. do Morgado de Mateus; y. ) Ao eontrário do qae se tem íiílriuiido a ccnteura nesta 1.* ed. foi tolerante c bentH'oIíi, nTio sacri 'u-.inJo em n;nla a in- tegridade do t-xt , como aconteceu na ed. de ]r)8l-, por ex<'niplo.

* A ed. príncipe ásí^i lírica •« ó u'i 15*.»'> Rytfimas de Lvis de Camocnfí di- vididas em cinco partes, . . Ano de MDLXXXXV, A' cusfa de Estevão Lopes, mercador de livros.

3 í^uinzn do género erótico U. 21, 30, Si-, 35 10, 11. Õ3, 70, 78, 81, cSí, 147. 185, l&G: doze de géneros diversoá G, 5'.i, 88, 96. 10!), luS, 173, 228, 237, 5i38, 23'.í, 254.

* D. Fr. Alex. Lobo, A4em.,. acerca de Camões, cit. 118.

142 HISTÓRIA DA LITERATURA PORTUGUESA

hoje ocupava á Infanta D. Maria, a formosissima filha de D. 3I!anoel, a ilustrada e altiva iíp:ura intelectual e moral mais distinta do seu tempo ? E' inquestionável que muitas das circunataocias da vida do JPoéta e da Infanta se harmonizam perfeitamente com as líricas ca- moneanas, que estas parecem ser vistas a nova luz quando se supõem traduzir esse sentimento apaixonado do Poeta, ao qual, é certo, a Infanta nao correspondeu, não o tendo talvez mesmo s*>quer pressen- tido. Mas estas aproximações feitiis por um juizo caut^-loso e erudito, como o pos^á^í o autor d^sta interpretação, podem parecer meras coincidências, opiniões subjectiva?, ainda dependentes de factores ignorados de novas e mais dt^cisivas invPBtiíja^xJf-s *.

c) Para o teatro escreveu Camões três autos Amfitrioes, moldado pela comédia do mesmo nome de Planto ■, vtTsautio um assunto niitniógico Amfitrião, casado com Alcmena parte para a guerra. Júpiter disfarçai- se e consegue passar junto da esposa como seu verdad«*iro marido. M«s este regressa e a ecena complica-Sí^ pe- rante os dois AmfitriÕes, ató que Júpiter declara quem é e explica que o 8í'U intuito foi honrar a descendência dft Arnfitriao fíz^^ndo rom que de Ah-mena nascesse o invencível Hércules. Esta comédia foi ps(írita em redondilha maior parti em castelliano^ partrt em por- Ingno-», diz-sí*, quando ainda frequentava a Universidade fntre 1539-1512 e reprt-sentada pelos estudantes, conforme o cos^tume do t-mpo.

El rei Seleiico sobre um facto muito tratado na antiga hi*<tória de Roma, Anfíoco, filho do rei Seleuco apaixona-se por Estnitónica, sua madrasta. Impossibilitado de confessar a sua ptiixào ado*'Cí3 e definha dia a dia. Mas o lico chamado para o tratar descobre o motivo da doença e leva o rei a ceder-lhe por esposa a bíla Lstra- tó'»ií'n intriga era que se quis ver uma alusílo aos amores de D. Joào III quando ainda príncipe, com stia madra^ta a rainha D. Leonor '.

A tercoira e última Ftlodemo escrita para as f'»sta8 da in- vostidiira no cargo de governador de Gôa de Francisco R irrc^to. Dos aino^-ííd dum Mdaliro portugiiôj? nasoem duas criança-» Filo lemo e Fiorimoni qie, fl.-ando orías do pai e'míH, sim r íoidhid is e criadas por u'n pastor. Com o t«ímoo P^i'odnmo vem a í*ntrar ao serviço de 1>. Lis uLiflo, seu tio, que tem um iilho e uma filhi. NÍM'j:uô{n sus- psíti d) partmt 'SCO. Oi primos nam(>ram-se e acabim por casar cieswiilan lo so cntà-) o mistério desse parentesco.

^ Dr. J. Mirii R')lrij;n'M, Camões e a Infanta D. Maria, Coimbra,

■'' Snln-o. IMiut) vi<l. a nodHii ítitrod. á Hist. da LU. p<^rtu^.<, 3.* ed., 1911, 1.M-

^' Dr. Th. Br.VLM. />o/í7 de Gil Vicente, Porto, 1893, p-íff. 201 e seg.

CAPÍTULO III ESCOLA ITALIANA OU QUINHENTISTA 143

Não deBlustram estas obras o alto conceito qu«) possamos for- mar do maior dos nossos poetas \ Nelas, afastando-s '. bist^nto da inspiraçllo clássica, ligoa-so CatnSes antes á, escola popular de Gil Vicente, de qwem adiante falaremos *.

JERÓNIMO eORTE-REAL (1533-15 nov.- 1588) »

fi^ra com dÍBtinçílo entre os qne. depois de Camões, cultivaram o géoero épico. Da sua vida, atualmente bem conhecida, mer^ê doa do- camentoa descobertos por Sousa Viterbo apura- se que fora muit > novo militar na Xndia e em Afric?», tendo-se encontrado no posto de cnpitílo a p<*l»-jar ena Tanger no dia em que foi morto o famoso fronteiro D. P**4lro drt M-ineses em 18 de m'iio de 1553. Conta Paria o Sousa ((lie ele as of^o^ecera a D. Sebastiíto para o acompanhar á jornada de Africa, mas qiie o monarca o disp^^nsára, como a outros, por a sua aranç^tda. idade lhe nito permitir »ofier 03 rigores inevitáveis da gaeri"»- Tomou, tí^duvi», parte n'\ exp^^diçJto e em Africa li ou cativo com dons «tíbrinhos 8f'U8, filhos de D. Manoel de Portugal. A sua velhiotí d'í veria la pasmado em Vale de Palma, junto de Évora, coiaaaorradiit, tilvez inteiramente*, á composiç^lo das obras poéticas que aoa Ie>gou e Bim:

€íj Seffwido Cerco de Diu, estando D. João de Mascarenhas for cdpitcío da fortaleza, poóma em 21 cantos, em end<n;a8>íUibos 9oltoa ^y muito eloíriado por Francisco de Andrade, Caminha, Antó- liiva 1? errei ra e Diogo Bernardes.

bj jAiLSiriada, ou Vitória de D, Juan de Áustria en el golfo

1 Os autos Filodemo c Amfitriões saírain pola primeira voz rm 1587, pablieailos Janto» aos de Antó-.iio {^rcites: Primeira parte dos Autos c Comedias portusuesus , por António Prestos e por LuÍ5 de (';imòi*á, eto., pu* A-jihó Lo- bato, imprfídíior de livros, 1587, 4.® do 179 pág. Vid. a ed. i^o^whw Comedias de L, de Catnões, Lisboa, 1880.

Th, /iraír-*, os Lusíadas Obras cie Lu ennc^ío»" nirtpo de Viaeii, Memória, y\ cit , ete. Para a bihli' í;r. vd.: Th,

I,*fíd. do Lifsbo.i, 1574: 011 tiM ed. de 17-^ L O Mí. aii^'ui'.it*) «'sM no

5^c xx/ n^-^ Trabalhos Náuticos. \úi!^. 2.", 1S2. Va\\ ^\■.^y\u\\\ú d.i Ft)n.ieci,

itl. Barbosa Machado, 111 (1915), n.'' 2, 77-79.

do c. XX/ l^o-i

Boi. da Soe. de ISibl

144 HI8TÓBTA LITERATURA PORTUaUÊSA

de Lepanto, oferecido a Filipe ii Castella, escrito em espanhol, do que se desculpa com a sua ascendência materna ', em endecassilabos soltos, e 15 cantos, também muito elogiado por Caminha e Ber- nardes.

c) Naufrágio de Sepúlveda^ em 17 centos, verso solto, sobre o mesmo assunto das três estancias dos Ltisiadcts acima menciona- das ', publicado quatro anos depois da sua morte por um dos her- deiros '.

d) Auto doa quatro novíssimos do homem, no qual entra tom- bem uma meditação das penas do Purgatório, poemeto em versos soltos, 23 pág. apenaí», publicado em 1768.

Mditofl dos seus admiradores chegaram a colocá-lo acima de Camõób refe rindo- sft também, com hiperbólicos exaererop, ao seu ta- lento como pintor. E' certo quo êle ilustrou o Segundo Cerco de Diu e a Austriada com desenhos com que pretendia ameniz^ir a leitura e dele s. rào, talvez, dous quadros, um das Almas, e outro da Moci- dade e Velhice^ aquele ainda hoje existente na igreja de Santo Antão de Évora, h êate de que se sabe a existência por uma poesia sua, inédita, u que se refere Rackzineki *.

A todoií êates eloejios dfu a crítica imparcial o respectivo des- conto. Co no poeta Côrte-Real tem nas suas obras alguns epinódio» de muito merecimento e descrições traduzidas cora grande vigor e colorido. «Mas além de ser sequiâi^imo na invenção, é no estdo tam frio e defepido de nervo q'ie raramente deixa de ser languido e aba- tido» ^ Como pintor o seu valor é medíocre ^.

O que SV3 d^duz do que os documentos nos deixam adivinhar é que Côrtt:-R'*al, fidalgo, soldado, poeta e pintor, passou uma existên- cia adu.ada e satisfeita, rodeada da consideração dos seus cont^-mpo- laneot», sem as amarguras que trituravam a alma do imortal épico, que os invejosos colocavam em plano inferior.

^ <«La lenuna li fiM^i.s ca-«tí«llano oáuoori, aiinque mannura lo y arguido de al\,ninoH do mi p.itria: Con los íj mies non ino lia v. ilido decir quo los Mendoças T B.i('.irn\s iÍí; (.'ist-illa, abii<'l()á mios, :i cllo ido dan lii^eucia, eu\a san^^re en na miáino gr.i<i() iii;^ fiicrca y fíl)IÍ!j;a (juaái con yguai razon». Saa mài, D. liritea de Monàot;a era d i ua da rainha D. (Jatarina, (Uijos pais eram D. lííigo López àe M;'iidof'a 13 I). Mari.i Ji.icati. 1* i'd. da Austriada^ de Lishoa, 1Ô78.

« 1.* oÁ. d" Siiiulo Lo|)fM, i:)í»4; o.itr.tíi ml. do 1783 e 1840.

8 A (ícííC içao poriiHínorizada drste Naufrágio pode lèr se em Inácio da Costa (>uÍMt da, Anais da Marinha l^ortiiguésa, pág. 452 e seg. do 1.° vol.

* Les arts en Portugal, 218. •' Dias Gome-, Ob. Poet, 40.

* Cfr. C. Ivackz nski, Dict. hist. et art. du Portugal, 56.

CAPÍTULO III KSOOLÂ ITALIAIIÀ OU QUINHENTISTA 145

54.— LUÍS PEREIRA BRANDÃO (1640?-?), do Porto, é

«atoT do poema Elegiada ^ ttôbre o desastre de Alcácer a que assis- tia^ tendo acompanhado D. Sebastião á África. ficou prisioneiro, ecmaegaindo tarde o resgate á custa do ouro de Felipe ii. Foi aobre essa pavorosa catástrofe de Alcácer que escreveu o seu p>éma, em 18 cantos e oitava rima, acolhida com aplausos por todoo quan- tos deixavam na sombra CamSes. Francisco Dias Gomes, o erudito e cooscioQcioso critico jalgavi i Elegiada como a ccobra mais infeliz qae apareceu em Portugal uo século de qainhmt)s, a quil mais desonra a nação do que a acredita». Sóu autor, continua êJe, fez no estilo «maitas e indiscretas in07aç5is, que o inuniam do^s mus enor- mes vícios de locução» '. Garrett nã> foi tam rigoroso na apreciaça9 da obra de Luís Pereira Brandão. Tem, escreveu, excelentes oitavas^ algumas descrições felizes, grandíssima riqueza d") lingoagem, mas poooo mais ^ A ordem histórica e cromológica que seguiu tornani-no arrastado, não despertando o mínimo interesse.

55.-FRANeiSeO DE ANDRADE (15109-1614), de Lis-

boa, nomeado para substituir António de Castilho no logar vago de Goarda-mór da Torre do Tombo e Cronista-mór do Reino por Fe- lipe n em 1599, é certamente mais historiador que poeta. Como hisloriador escrevòu a Chrónica de D. João IH, mais notável pela linguagem, que pelo critério com que foi redigida ^ sendo acusado de omitir assuntos importantes que tinha o dever de tratar. Como poeta, alem da tradução dum pequeno poemeto lírico Philomena de 8, Boaventura, * deixou-nos o Primeiro cerco de Diu, poema em 20 cantos e oitava rima ^ escrito na linguagem castigada dos auto- res do seu século, bem versificado, mas sem interesse artístico, pondo em relevo a figura heróica de D. João de Castro. Contam-no os crí- ticos entre os melhores poemas heróicos de 2.* ordem.

*' 1.* ed. de Lisboa, 1588, 8.® de iv-286 folhas, reimpr. por Bento José de Sonsa Farinha em 1785.

» Obras Poet, cit. 41.

' Parnaso Lusitano, i, xxvn.

* Lisboa, 1613; 2.", Coimbra, 1796.

^ Reimprími-o segando cópia manascrita. tendo-se perdido o único cxoin- plar impresso conhecido, no Arquivo Bibl. da Bibl. da Univ. de Coimbra, ns. 6-7 de 19D7, de qae se fez separata, Francisco de Andrade ainda fez mais daas trad. qne sam : Chronida do valeroso e invencível capitão Jotge Cas- trioio.»» escrita em latim^ por Marino Brlecio Scutarino. . . Lisboa, lõGT; o Ingtituição de EURei, escrita em latim por Diogo de Teive ou Epodos que con- tem sentença» úteis, . . trad, em verso solto, Lisboa, 1786. Outra ed., 1803. 0 Coimbra, 1589, é.^"; 2.' ed., 1852.

146 HIBTÓKIA DA LITBBATURA PORTUGUESA

/

POESIA LÍRICA

56. -BERNARDIM RIBEIRO (1482-1552), da vila do Tor- rão, no Alentejo, era fiího drt Damião Ribeiro e de Joana Dias Za- galo. Implicado na conspiração contra D. JoSLo ii, Damião Ribeiro fugiu para Castela não conáf^guindo ainda assim evitar a cólera do monarca, por ordem do qual foi assassinado. Bernardim Ribeiro, então de dois anos, juntamente com sua mãi e uma irmã encontrou refúgio cm Sicitni em casa de seus primos Zagalos, que habitavam a Quinta dos Lobos ^, a prot facção dos quais o amparou até se bacharelar em leis (1511) na Universidade, que então estava em Lisboa. Contava a este tempo 32 anos. D. João iii nomeou-o por carta de 23 de set. de 1524 escrivão da câmara. Á paixão por saa prima D. Joana Tavares Z^galo foi funesta para êle e para esta, que 6('> viu forçada por int^^resses de família a casar com um tal Pêro Gato. D. Joana morrou, diz-se que doida, no convento de Santa Clara de Estremoz. Bernardim Ribeiro morreu também doido no Hospital de Todos os Santos, em Li*: boa, em 1552.^ Ena escritor nenhum ttJvez é tam necessário o conhecimento dos dados biográ- ficoêt. ;£leã é que nos ajudam a compreender as suas obras e consti- tuem o melhor comentárii». A Menina e Moça * notável pela simph- cidade, pela candura e pela saudade, a cujo poeta foi e cujos suaves tormentos tam longo padeceu e tam bem pintou » ' tinha ficado inex- plicável ale poucos anos, porque por muito tempo se supôs que a famosa novela descrevia a paixão que o autor ousara ter pela infanta

^ A top(\í;raíia desta Quinta foi estudada cora maito cuidado jior A. Ma- ria de Freitas (Nicolau Florentino). «Fica no concelho de Hintra, cerca de um kilonietro a leate da estrada de Mafra, cjin a qnal está ligada por meio dum ra- mal». Vid. a carta do referido escritor era Th. Braga, Bernardim Ribeiro o Boculismo, Porto, 18í>7, pág. 23, nota.

- Al.* ed. raríssima é de Ferrara, 1554, História de Menina e Moça*.. agora de novo estampada e con suma diligencia emendada e assi alguas eglo- gas suas. . . A mais antiga ed. conhecida é de 1557: Primeira e segunda parte do livro chamado f^As saudades de Bernardim Ribeiro^» com todas as obras. Trasladado do seu próprio o/iginal. Novamente impresso 1557. No fim; «im- primiose e.sías obras. . na muito nobre e sempre leal cidade de Évora em casa de Andi-é do llin^íos». A 3 * é de Colónia, 155ÍÍ. Depois váriaa. Era 1891 apare- ceu uma ed. da Aíenina e Moça, prefaciada e revista por D. José de Pessanha « em líH).') oair.k dirigida por Deltím Ciuimarites. Subre B. Ribeiro, vid. : Costa e Silva, Ensaio cit. i, 102 e seg. : D. Carolina MichaClis, Poesias de de Mi- randa, 767, id., Geschichte, cit., 2'.}li Th. Braga, B, Ribeiro; acima cit.; Menéndez y Pela} o, Origenes de la Novela, Madrid, 1905.

Garrett, Parnaso Lusitano, cit.

CAPÍTUI.O lU BSCOLA ZTALIAI^A OU QUiNHBNTlSTA 147

D. "Beatriz, filha de D. Manoel^ depois casada com Carlos iii, duque de Sabóia ^.

Confiando-se nessa tradição avigorada pela proibição inquisito- Tial da novela posta no Index em 1Ò81 de foi retirada em 1640 dizia-se que o poeta quando a infanta partira para ItAlia a desposar o duque Carlos, se fora até em trajo de mendigo, tendo de voltar á pátria desiludido e pobre *. Este lado romântico da vida de Bernardim Ribeiro desapareceu á luz de investigações modernas. A novela vaga e melancólica foge a uma análise precisa. Nem as p»ersonagon8y nem os legares da scena têem a realidade, que desejá- ramos. Abre pelo monólogo duma donzela, a Menina e Moça (c. l). 8egai<Jo do diálogo com cdrta « dona, senhora do tempo anti^^o (ii). Oontada por esta vem depois a história de Lamentor e de Narbindel ou Bimnarder, novela de cavalaria. A acção passa-se em logar in- 5?<>rto (iv), num vale onde chegam o cavaleiro Lamentor, saa^^sposa Belisa^e uma irmã ^esfa, a donzela Aónia. Ao passar por uma ponte r^imeutor tem de bater-se com um cavaleiro, q&e ali estava em obséquio de sua dama e a quem mata por fim (v), morte que é sen- tidamente chorada pela irmã (vi). Entretanto Belisa morre depois de dar á luz uma menina (vii-viii). E quando sua irmã Aónia lamen- tava esta p"rda chega um cavaleiro, que vinha submeter-se á aven- tura da ponte (ix) e que logo se apaixona por ela (x). Era Narbín- del que renega o seu amor por Cruelcia e muda até o nome para "Bimnarder (xiv). Após uma visão de máo preságio (xv) entra ao ser- viço dum maioral de gado (xvj). a Tangia e cantava » (xvii) do que de ama amostra « Fogem as vacas para a agua » , . . (xviii). Aónia tem apenas 13 ou 14 anos, é a ama que lhe fala do pastor-poéta (xix), de quem presenceia a bravura por ocasião da luta de dous touros (xx). E* ainda a ama quem vem embalando a menina e que recita á maneira de soláo o

Pensando-vos estou filha

Vossa mãe me está lembrando. . .

Apaixonada pelo pastor, não obstante os conselhos prudentes da ama (xxn-XXív), Aónia chega a ir com a sua confidente a visitá-lo á

* Vid. S. Viterbo, O dote de D, Beatriz de Portugal Diiqueza de Sa- boya, Lisboa, 1908.

s A interpretação moito vaga aparece na ed. de liiiõ. Depois Faria e Sooaa na Fuente de Aganipe de 1646 fixa-a e dá-lhe novo^ pormenores na Earopa Portuguesa^ ii, Lisboa (1679), pág. iv, e. 1.®, 54:1). (íarrett idealizou idbre a vida romântica de B. Ribeiro o formoso drama drama Um auto de Gil Vicente, que embelezou eom muitos pontos da saa fantasia, como a entrega do anel á nova daqoêsa de Sabóia durante a representação das Cortes de Júpiter,

l48 HISTÓRIA DA LITERATURA PORTUGUESA

t^bana (xxv). Eatretanto Lamentor trata de a casar com o filho dam cavaleiro vezinho, muito rico Fileno, (xxviii) sem que Biranarder de nada soubesse até ver passar o cortejo, após o que <i se foi e não no viram mais». Como se todas as personagens sam de>ignadas por meio de anagramas Bimnarder é Bernardim Ribeiro; Aònia sua prima Joana Tavares ; Belisa ó a irmã D. Isabel, ambas filhas de EnÍ8 ou seja Inês Zagalo. Fileno é Pêro Gato.

Tal a história a qne B. Ribeiro não deveria, decerto, ter posto o nome de Menina e Moca^ pois não é a história da Menina h que se conta no livro; ela é qne conta histórias alheias. Trinta e um ca- pítulos tem o livro na 1.^ oi. de Ferrara (1551), com mais 12 da 2.* P. Todas as demais ed. trazem uma continuação em 58 cap»., que a maioria dos críticos tem como não escrita por B. Ribeiro, em- bora alguns trechos possam, de facto, ser dele. 1£í^{2í. Segunda parte., > a qital é declaração da primeira vem na ed. de Évora de 1557, que serviu de tipo ás poáteriores. . . A diferença de carácter, ima- ginação e estilo entre ai duas partes é evident *. A primeira é uma novela bubjectiva, uma análise de paixão; a segunda uma no ela inteiramente externa e de aventuras, que não sái do tipo geral das da sua classe. As personagens sam novas em grande parte. Bimnar- der e Aónia paHsam a segundo plano e em metade da obra se fala deles. O herói é A valor (Álvaro) enamorado de Arima (Maria). Tal- vez o continuador aproveitasse alguns fragmentos que deixasse B. Ribeiro para os primeiros doze capítulos, que sam' melhores que os restantes. Na história de Arima e A valor cousas, o cap. xi, por exemplo, que téem toques delicados podendo bem ser de B. Ribeiro \

Como obras poéticas temos de Bernardim Ribeiro, àlêm doutras poesias menores, cinco églogas notáveis pela naturalidade e que cons- tituem também um comentário precioso á sua vida acidentada *. Sam psta obras poúticas que lhe dao direito a que o consider^nos como o fundador da poesia bucólica em Portugal, género em que foi Sí*gui- do por CamoL'8, Falcão, Bernardes e tantos outros que produziram verdadeiras obras do mérito, sem todavia o excederem.

Pelo sentimento e suavidade dos afectos, doçura de estilo, ver- nacuhdade de linguagem, sempre portuguesa, não tendo escrito, como

[Auto de G. Vicente qne dá, afinal, sem grande motivo, o títnlo ao drama de GarrettJ á íjimI, (ii-<far(;ado de moura encantada B. Ribeiro consegue assistir, e e o final d > í>." acto a bordo do galeão S. Catarina. Prestes a ser surpreendido por D. Mano»! o })oóta armja-se ao mar entre as sombras da noute. Cfr. Me- ncndez y PcIj^.vo, Origines de la Novela y Madrid, 1906, pág. 1906, pág. cdxuii.

1 Mcnciiíloz y Pelsiyo, ob. cit.

* Egioíii 1 : Pérsio e Fauno: ii: Jano e Franco; UI: Silvestre e Ama- dor: IV.* Jau o: v: Ribeiro e Agrestes. Para a interpretação destas églogas vid. Bernardim Ribeiro^ de Th. Braga, cit. pág. 70 e seg.

í^ .

GAPÍTCLO tn BSOOLA ITAUANA OIT qTimmnvTiBTA M9

Ferreira^ atna Itaha em espanhol, ' B. Ribeiro constítiie am alto inodêlo a citar. Ensaiando a^ suas extraordinárias facul iades em poe- 8iaâ miúdas * é com ua églo^^ras de beleza incomparável, e òom a prosa igualmente artística é b ^la d is Saudade», é com as três lia* das po.^sia^ Somance de Aoalor,Ao longo de uma ribeira e Pen- sandovos esUnt^ filha^ ' todas impregnada do mesmo mistério, do mesmo sonho, da mesma profunda tristeza, que B. Ribeiro cria o gé- nero baeólico em Poi^tugal ocupando o alto logar iadisputado, que deixamos dito. .

57. emSTOVÂO de SOUSA falcão (151ã?-15&8 ?) foi natural, como o antecedente, s^u contemporâneo e amigo, do Alentejo, de Portalegre, padts nasc3a por 1515, * sen lo sius país Jo3o Va^ de Âlmadu Faleào, capitão da Mina, e D. Beatriz ou lirites Perrira. Nâose conhecem com precisão as datas do seu nas- f-imeoto e morte, mas poie dizer-se, de mod) geral, que a suíí vida coincidiu quasi com o remado da D. João ia (1521-lo57), Este mo- narca consagrou-Ihe muita estima, como o prova o fai^tò de o min- <lar numa espinhosa missão diplomátici a R>m'i, em 1542. A iaipi- radora dos seus versos foi Mari B'aada), om quem contraiu casa- mento clindestino, portanto tendo ela menos de 12 e êle m3nos de 14 anos de id^de. ^ Para não sancionarem uma união que no ponto d-j vista dos interes3es materiais estava loúge de sar vantajosa, os pais encerraram Maria BrjmdSo ou Brando i,c3m> diz ira 03 livrjs de linhagens, no mosteírj cistarciense de Lorvão, até qie por fim a abrigaram a casar om quem entand-iram. S5bre èit3 conflito passio- nil escreveu Cristóvão Falcão a sua afamada égbga Crisfal, n* qual a estas clrcunatânoias t^das aluda vagimente paio que res- peita ao casamentj nas estílncias 2, 3,8Í e 88 e ao mosteiro nas' ^ts. 7 e 51, em especial. Numa Carta qu3 acompanha a égloga dade também á prisão qie êle sofrau diirantV cinco aao3. Alusois igualmente vagas se fazem a outras personagens a uma pastora «^o&na, que á família descobre os amores dos dois (e.^t. 4), aos pas-

* editorea de 18>2 e oiitro? atribainm-Uie sen fariiiminto p^^âia) ♦'ipaiiholaa, cfr. D. Carohtia Mi^haèlis^ EHaios sobre o Ronvinfieiro, 125 e 26 i.

* Vanc. gerai, Kd. da íinpr. da Univ., v. 06-00, ^2t>S-í74.

* O rom-inve d*í Auaíor vem interealad ) na S*.'jiinda ParU e saiu na *^. de Fermra; Ao lotigo de uma ribeira primeiro em fl. aolta foi ti^id) 11:1 ed. de H4Õ; o Pensawio-iiOê . . . cncontra-àe no cao '21 d\ Parte i. Tod )i Ires e a tíar- fôtí. Romanceiro, ed. 1904, 11, 103-118.

* Faieào entrou para moço fídalgo da Casa Kial em l.')27 e se, conform<3 «> eostame, essa matTieula se efectuou nos 12 anos de idade (Duarte Nimes de Leào, Deêcr. do Reino de Põrtngaly 3 )4) a data do nase. do IV.r ta pode fiiar-se «m 1515.

^ Constitttiçõee de Lisboa, 1.* tit. 8.** ^

10

150 aiVTÓBIA LXTUtATUBA POBTCOUtSA

tores NatoDÍo e Guiomar (ests. 32 a 35) e ain<)a a um Rodrigo e Fernando (est. 39), que em balde se procuraram identificar. £ quem era a amada de Crisfal? Imposeirel de o saber. A Maria Érandfto ^os bnhagmtas nSo pode ser a mesma que outras e melho- res fcntes indicftm. ' Seja como fôr, a Crisfal ai e&tá em toda a soa beleza ingénua, suave e misteriosa, perfumada d^ m* sma simplici- dade ni»tiTa das églogas de Bernardim. Quasi t<da ela é ocupada pelo Sonho de Cris&l [ests. 28 a 98], em que os df>is pas^res se confia m n;utuamente os seus sentimentos de paixFto, até qúe Crisfal acorda paia a realidade (est. 99), sem que mais alguma cousa se nos diga do seu destino

»

O qne se fes de Crisfal Nio Jsabe certo ninguém *

Procurou-se recentemente dar a autoria desta égloga ao ma- vioso Poeta das Saudades. ' O criptónimo Crisfal não está a indi- car o nome de CVi>(ióvão) íViZ(câo), mas formou-se de crisfma) Jvlfso), nada tendo^ portanto, cem o nome daquele individuo, que dSo passaria dum simples fidalgo, por sinal, de apoiícados recursos intelectuais, como o deixa vêr uma sua carta repleta de erros orto- gráficos. Todavia nenhum argumento concreto, nenhum testemunho positivo, nenhuma informação directa e objectiva €on6egu)ram firmar a nova hipótese e abalar a tradição antiga, que se funda ein teste- munhos indestrutíveis como os das edições de Ferrara 1554,, e Co- lónia— 1559 que dizem: «Húa mui nomeada e agri»dável Égloga chamada Ciisíal que diz «Entre Sintra a mui prezadas, quê di- zem ser de Cristóvão Falcão porque parece aludir o nome da mesma Eglog^. E hua carta do dito «Os presos contam os anos Mil anos. . » E outros que entrelendo se poderam vêr i> ; e de Diogo do Couto (1542-1576) e de Faria e Souea (1590-1649), para não ci-

' Cfr. Braamcamp Freire, Arch. fíisf. Portug. vi (1909), viu, (1910) e Atlântida i (1916), 518-538; Dr. Th. Braga, Atlântida i, 809-829.

« Vid. Obras de Chr. Falcão, ed. de Th. Braga, Porto, 1871; do meemo Obras de C, F., Porto, 1916 e sobretudo a ed. de Epifânio da Silva Dias, Obras de Chr. lalcào, ed. critica avoíad^, Forto, 1893; Delfim Goimarãe» fez também unia ed. Kob o titulo Trovas de Crisfal, Lisboa, 1908, atribain- do-as segando a sua convicção a Bernardim Kibeiro.

B Esta opinião foi sustentada com raro brilho pelo ilnstre poblieiste Delfim Guimarães no vol. Bernardim Ribeiro (O Poeta Crisfal) subsidia para a história da literatura portuguesa, Lisboa, 1908; Id. Theophilo Braga a lenda do Crisfal, Lisboa, 1909. Perfilhou-a um escritor bra&ileiro de talento Silvio d'Ahneida, A Mascara do Poeta, Lisboa, 1913. Mas a dontrina clássica encontroa um defensor de raras aptidõis que desfez com clarezu as miragens Raul Soares, O Poeta Crisfal, subsídios para o estudo de um problema hisió- rico-Uterário, Campina, 1909.

OAPÍTUIX) XU EBOOUL IVALIAHA OU QTIHHERTIBTA 15 jL

tar outros todo« mais tardios. Sj Bernardim é positivamente o autor da^ Saudcídes, porqae n&o será . Cristóvão Falcão o autor do CrUfalf Porqae na sua carta nSo gramática nem ortografia? Maâ diremos qae Camões não escrt^y^ os Lmiadds porqae igual- mente numa carta sua, certamente autêntica, há, como escrevru o editor dela, < incorreçÓes não somente numerosas, mas até mesmo escaoiialosa»? » ^ Deve, portanto, subsistir a longa tradição indisputada até prova em contrário. '

58.— DE MIRANDA (por 1485-1558), » de Coimbra, fi- lho de Gonçalo Mendes de Sá, fez os seus estudos na Universidade começando a usar o titulo de Doutor (em leis) desde 1516. Vivendo na corte de D. Manoel desde tenros anos, não se deixou absorver pela insânia dos prazeres, geral no tempo daquele monarca. O seu espírito reflexivo e meditabundo, o seu amor ao estudo e á solidão nSo sts casavam com a vida buliçosa da corte do rei venturoso. De* via eer, pois, sem custo senão com praz^t* que em 1521 abandonava o 8F u pais, para viajar, para se instruir, decerto também para fugir ás inquietações da corte dirigindo-se a Itália, c<ija literatura brilhava então com os nomes do Cardeal Brmbo (1470-1547), Ariôsto ^1474-1533), do «bom velho» Sannazzaro (1458-1530). Pode bu- pôr-se o que o ânimo perHpicaz e investigador de de Miranda nio faria num meio t^m diferente daquele que, cheio de tédio, aban- dona vjr. Cinco ou seis anos o poeta esteve por visitando Turim, Roma, Florença, Veneza, Nápoles, p<mdo-Be em contacto com os es- píritos mais eminentes, que então ilustravam a Itália. Âo voltar á pátria em 1526, vinha cheio de jdéas novas, que em Espanha andavam popularisadas por Garcilaso e por Boscan. Miranda não o ignorava e isso^o animou á renovação literária, que imortaliza o seu nome reavivando os antigas metros nacionais, com os vilanceies, (ontigaB, esparsas, glosas^ sátiras, etc, introduzindo a inovação do decassílabo italiano, ensinando a estrutura do soneto ^ e da

* Compara-ee a Carta de Falcão em Delfim GaimarSes, Bernaditn Ri- hârq, 6b. cit., pág. 158 com a de Camões no Boi, das Bibi e Arch Nac. Coim- bn, 1904, pág. 28.

* «Por ora não-eonvertida continuarei a diferençá-los» diz a Sr." D. Ca- rolina Michaèlis nos Estudos sobre o Romanceiro, pág. 21)2, nota (3).

5 O pai era cónego e a mãi uma dama nobre, solteira, de nome Inês de Hclo. Devia o pai entender-se bem com o bispo D. João Galvão, 1.° (onde de Axgfuii], que tinha amores com sua irmã D. Guiomar de Sá. Sendo D. João GalvSo tranafttido para o arcebispado de Braga casaram- na os irmãos com Afonso de Bwros. Logo que o Prelado o soube veiu de Braga a Coimbra para a matai- e disem que desta paixão morrera.

* Sobre a origem desta forma poética veja-se René Doumic Une histoite éuSonnetnsLRev. deDeux-Mondes, 1904, li, 444. Em Portu^^al, Leite de Vasconce- los, O DoatorSto/r* 6 a ZiterateraPorto^aí^^a, Lisboa, líUCpága. 71 e 154, nota.

152 HISTÓBIÁ DA LITBRATUBA POBTCOtTftSA

canção como usara Pctrarcha^ os tercetos' á maneira de Dante^ oa enlaçados em elegias e capitalos á maneira de Bembo, a oitava- rima de Policiano, Boccacio, e Ariosto, e as égiogas de Sannazzaro com os seus versos encadeados, al&rindo assim ama nova era que bavia de atingir em 1572 o ponto culminante com a publicação dos Lusía- das, * Compete-lhe^ pois, bem o título de reformador nao da forma, mas também e sobretudo de novos ideais e mais- vastas ins- pirações. Ao lado do renascimento clássico bí^bido em Vergilio, Ho- rácio, Plauto e Terêncio vinham os modernos, os príncipes da poe- sia— Dante, Petrarcha, Ariosto, etc. A celeuma que levantou a sua empresa, junta aos desgostos qué a vida da corte, em que novamente se achara envolvido, lhe provocaram, fizeram certamente com que de todo se afastasse para o remanso da solidão, declarando então que

Homem d'am parecer, D' um rosto e dOa fé, D'ante8 quebrar que torcer, Outra cousa pode ser, Mas de corte homem nSo é.

As obras de j\Iiranda compreendem cartas, elegias, canções, so- netos, etc, escritos jA em português, em- espanhol e mais nesta do que na nossa língua, sobretudo nos novos metros italianos, preferindo a língua nacional e felizmente para a redondilha, para os metras antigos. *

, Escreveu também duas comédias seduzido pela imitaç^ italiana e em que copiou tudo ficando longe dos tipos que desejava reprodu- zir. ' Estrangeiros é a 1/ que compôs, por 1527, e nela censura^, em alusão transparente, Gil Vicente, por ter escrito em verso e lhe cha- mar Auto. Vilhalpandos é muito posterior, de 1538, quando reti- rado no voluntário exílio. Pela dedicatória ao infante D. Enrique, irmão de D. João ui, depois rei, "então arcebispo de Braga, sabemos que este mandara pedir estas comédias ao- autor, sabendo também pela Vida de Miranda por D. Gonçalo Coutinho que êle as fizera representar perante si e os magnates da sua corte prelaticia, man- dando por fim imprimi-las. Certo é, porém, que ambas de duas fo-

D. Carolina Michaolis, Poesias de Fr. de S. de Miranda^ ed. cit. na nofli seguinte.

« Ed. da Sr,* D. Carolina Michaoli? Poesias,., Ed. feita sobre cinco Miss. inéd. e todas aa impr. Ilalle, 1885; Id. Novos estudos sobre de Mi- randa, Lisboa, lí)ll; Delfim Guimarães, Versos Portugueses, Lisboa, 1909.

Esteves Pereira, As comédias de,,, no Boi. da Seg. Cl. de Acad. das Sc. de Lisboa, ix (1914:) 142.

\r

CAPÍTULO lU BSCOI.A JTALUHà. OU QUIlfHSNTISTA 153

ram inclaidas no índice de 1624. Falhas de enredo, confusas, sem cor, elas interessam somente o erudito pela vernacalidade da írásc. ^

O seu retiro voluntário foi a Quinta da Tapada, [entre Minho e Donro,] e data de lõ36, ano em que se realizou também o seu casamento com D. Briolanja de Azevedo, a fiel e boá companheira que, pelo seu falecimento em 1Õ55, fez com que o poeta começasse a morrer logo também para todas as cousas do seu gosio^. A sua morte deu-se a 15 de março de 1558, na Tapada,- tinha ele 63 anos. Alguns o denominaram o Platão português.

Recentemente duap novidades literárias alargaram o âmbito dos nossos conhecimentos acerca de. Miranda e permitiram uma aná- lise mais profunda e mais intima da sua individualidade. Foi uma delas o aparecimento dum caderno com poesias autografas que nos mostram o autor no acto psicológico da sua elaboraçrio, na sua ma- neira de escrever e de corrigir e emendar o que escrevia. Por uma nota aposta a uma das poesias incluídas nosse caderno ficamos sabendo também que Miranda escreveu uma tragédia, ao gosto clássico, hoje inteiramente desconhecida, e a que dera o título de Cleópatra e que seria importantíssima para dcternjinar o lugar que ne»so género con- viria dar ao seu autor. *

A outra novidade de assunto mirandino foi a publicação do poemeto Vida de Santa Maria Egipciacay escrito em redondilhas, que 86 supõe redigido nos últimos dois anos da vida de ISá de Mi- randa. ^

Entretanto o principal titulo de glória de do ^íiranda con- s »te n?is Cartas cheias duma sã' filosofia e e&critas com admirável simplicidade, o que fez dizer a Garrett que de ^livínidn filosofou C4)m as musas e poetizou com a filosofa.

SÍ.-AWTÓNIO FERREIRA (lõlM-lõG9), de Lisboa, pre- parou-stí com uma forte erudição na Uiiiverciidíide, que, tinha ole nove anos, fora definitivamente transf(íiida para Coimbi-a. Nela cur- sou os estudos e se doutorou em Direito CaiKMiico, dizcvido-se que ^ra lecionando. E', porém, certo que doi.s anos depois se achava <*m Lisboa, sendo possível que volUusse, contuiuíindo a hua convivên- cia com propugnadores do renascimento como de Miranda, Diogo de Teive, lÍLinuel de Sampaio, António de ()ii>tilho e Jorge Bucha-

^ Ed. dos Vilhalpandos, Coimbra, lõGt); d- a Kstraiijciros^ iniil , lõJ9 e aofíbaH nas eds. do Poeta »• \u\\n'. eoin as (ie António IVi niia.

* Cfr. Novos estudos., cit , onde v< ui a estar:«'a do 12 vciáo^s, uniea qnu reata.

^ A Rgipçiaca Santa Maria pela primeira vez piiblieado por Th. Braga- Poito, 1ÍJ1;J. {) Hsaunto foi tratad» tanjb<'':ii p'»r fjt*(>M I ti.i l'-í5l<i. .-1 convcfs lo mi- raculosa de felice Egípcia penitente Santa Maria, sua vida c morte, J.isi>i)a, IbJl.

V

154 HlflTÓBlA DA UTBRATUBA POBTUQUÉSA

nan e aprendendo a conhecer a fundo os ajitores clássicos, em que depois tam superiormente se inspirou. Em 14 de outubro de 1567 foi despachado desembargador da Casa do''Oivel, vindo a falecer na robustez da vida e do talento, em novembro de 1569, quando a peste naquele ano invadiu Lisboa. Amigo de de Miranda é. como êle, um campeão do classicismo. Â sua obra imortal é a Ccutro^ escrita ao gosto clássico entre 1553 e 1567, segundo se crê, e pela primeira vez representada em Coimbra. Tratando um assunto tam profunda- mente nacional e na língua nacional note-se , Ferreira avan- tajasse ao seu predecessor Trissino (1478-1550), que embora usasse a língua literária da Itália escolheu, porém, um assunto da antigui- dade para a sua Sofonisba, A obra do no^^so poeta pela originHlidade, entre nós apenas Mparec^^ra um éco apagado^da tragédia antiga na tradução da Orestiay de Sófocles por Aires Vitória pela escolha do assunto tam sublime e patético como outro não oferecia a história nacional, pelo entrecho e disposição das scanas, pelo movimento e jogo dos coros, que Garrett reputava superiores a todos os ex*mpla- xes da antiguidade, p^^ia lingusgf^m castiça e portuguesa de lei. sem- pre acomodada á grandeza do objopto, ocupa lugar primacial na nossa literatura. Nâo quer isto dizer que a Castro seja impecável. Mas censurá-lo pela apropriação dos Coros da tragédia grega, pelo em- prego dos trechos líricos, pelo afastamento em quási toda a peça da segunda personagem. D. Pedro, cujos diálogos com D- Jnês poderiam fornecer soberbos lances, pela dureza da versificação, pelo emprego de locuções por demaie^ familiares, é esquecer a época e condições em que escrevia Ferreira. O diálogo entre D; Afonso iv e os Conse- lheiros (Acto II, 26) especialmente a invocação (ibid, 34), o Côro das « moças de Coimbra » (m, 38), as falas de Castro (iv, 50 e 54), as imprecações do Infante (v, 65) sam belezas indiscutiveis. * Também a sua influência foi notável. Quita, Nicolau Luís, Manuel de Figuei- redo, João Batista Gomes, entre os nacionais, e entre os estranjeiros Houdard de La Motte (1723) e outros de longe ou de perto não desfitaram a obra de Ferreira. * Mas nenhum procedeu como o autor espanhol Bermudez, que plagiou ou melhor fez uma cópia da obra i^ Ferreira pretendendo evidentemente fazê-la passar como ' original. Frei Jerónimo Bermud» z (1530?- 159©?) era um domínico galiciano, que com o pseudónimo de António Silva publicou dez anos antes que aparecesse em portuguôs, mas oito depois da morte de Ferreira, a Nise Lacrimosa (morte de D. Inês de Castro) seguida pouco depois

' Vide a nossa ed., vol. xviii dos Subsídios ,., <i Coimbra, 1915, onde de- batemos a qnestão do plágio de Bermadez e citamos os esclarecimentos precisos»

2 Dr. T. Heinermann, Ignez de Castro —die dramatischen Behandlun- gen des Sage in den romanischen Literaturen, etc. Leipzig, 1914. ^

CAPXTITLO III BSCOLA ITAXJAXA OU qumBMSTIBTA

156;

da Nise Laureada, (sua coroação como rainha) imitando a Castra tam servilmente na disposiçSLo das scenas^ no entrecho, no estilo, no movimento dos diálogos, na formação dos coros, que a sua obra é um plágio completo da do nosso autor. Alem da Castro temos, « scritaa para o teatro, as dtias comédias Br isto, que êle confessa ter orde- nado em poucos dias, e . Cioso, imitações ou talvez traduções do ita- liano— visto que nomes das personagens, seu» caracteres, costumes alasSès afactt s históricos não pertencem á sociedade portuguesa,— esta superior àquela, mas ambas muito inferiores em mérito á Castro* ^ No género lírico deixou-nos Ferreira grande números de sonetos ins- pirados pnmeiro em amores que teve em Coimbra e que não foram - correspondidos com uma senhora de apelido Serra, e depois em Maria Pimentel, que depois foi sua mulher; de odes e epístolas, que lhe mereceram o cognome de Horácio português; de églogas, onde aa encontram algumas belezas; de sentidas elegias, como a consagrada i morte da mulher, e de várias poesias meudus, todas publicadaa sob o titulo de Poemas Lusitanos. *

António Ferreira escreveu todos os seus versos em língua na» cional da qual escreve, *

Floreça, fale, cante, ouça-se e viva A portuguesa Ungua ejá onde fór Senhora de si, soberba e altiva

exemplo notável no seu tempo, muito para admirar e louv«r e que fez dizer dele ao seu discípulo e amigo Diogo Bernardes :

Qite dando d Pátria tantos versos raros Um nunca lhe deu em língua alheia.

^ Por moito tempo inéditas foram pela 1.^ vez dadas a público por An- tónio Alvarez, Lisboa, 1622.

' Obras completas. Quarta ed, annot, e precedida dum estudo^ sobre a vida e obras do poeta, pelo eónego dr. J. C. Fernandes Pinheiro, Paris, 1865; livraria Clássica, vòl. zc-xi:i; Th. Braga, Hist. dos Quinh, pág^. 180-214.

No Archivo Histórico Português^ l, 1903 fôran pablicadas daas cartas autografas, ama do dr. António Ferreira, e oatra de Diogo Bernardes com vários comentários de Brito R»*belo.

^ As suas obras 'oram" pablicadas vinCe e nove anos depois da sua morte por diligência do filho Migael Leite Ferreira, Lisboa, 1598. Darante este tempo foram copiadas muitas obras do poeta, qae se encontram em cancioneiros con- temporâneos ft posteriores, como o pabMcado em 11^03 por A. F. Barata, onde aparece a Carta díri^^idi a O. Sebastião, qae ali yem anónima, mas qae dosdo 1596 anda iinpf. em todas as ed. das obras de I?*erreira, facto aliás ded conheci do por quem no Prefácio a este cancioneiro a atribae a Camões !

J66 HISTÓRIA DA I.ITBBATUIIA rORTUGUÊSA

60.-- PÊRO DE ANDRADE CAMINHA (1520-1589), do ;

Porto, inimigo de CamSeB, contra quem escreveu vários epigramas, ^

«dac-tne huma fúria grande e sonorosa » ■*

(L^iê,f I, est. 5)

Caminha escreve : x

«Dizes que o bom Poeta á át- ttr faiHa ;

Se non á de ter mais és bom Poeta.

Mas se o Poeta á de ter mais que fúria

Tu non tem mais que/urta de Poeta! » j

1

e de Pamino de Góee^ cuja situação agravou com o depoimento que \ contra êle icz no tribunal de inquieivâo em 20 de abril de 1Ò71, * 1 deve o^mellior do spu nome ao empenlio qno foi toda a preocupação \ da tua vida literária imitar António Ferreira. Num tempo em que . CamíJcs moriia de fome, diz um efcriíor, goz^ava Caminha de todas aB dçlíciaB duma invejável poRÍçíto, Privado do infante D. Duarle (f 1540;, rec( bendo n compensas de 1>. João Jii e I). Sebastião, ricí\ adulado, berKinÍBto, a ftínizade de homens como Ferreira, de 5íi- randa, Kernaide^ e outios cobria-lhe um pouco a mediocridade. suas poe^aF, inéditas durante mais de duz^^ntns anop, f^ram publi- cadas nos fins do ecculo xviii pela Academia Kcal das "Scií^nHas de Lisboa ' e rm melhor e mais vasta colheita recentemente,* que ainda poderá ser, f-enao ampliada, talvez corrigida ou, pelo m^nOí^ aper- feiçoada. * f-e nos depítrara os temas aproveitados pelos outros poetas seus amigos e contemporâneos epigramas, epistolas, elegias, odes, epifáfií s. tglogas, sonetos, cançoí^s, ete. ( Caminha ò um poeta notável pela corrccçrio do metro e pela eievaçP.o dos pensamentos, -mas

Kf^t(» por exíinplo : aludindo ao vorsc :

2 ClV. r^tf (iej fijii.< ulo DO piTc<'í-so, lifjp })nl)Hcado na intrjín^a p-^r Ouilheruio J. ('. lltniiíjiu?. Inéditos (íoisiatws, vil. 'J.", p?'ifr8. 44 45. Um ano ai)tcH, is(o ó. t'in 3 «u» .Inllu» de MuO tinha .-nhiiio as e.-caiias dos Efttáos, onde estava fstíibelecida a iní;nisi(;ào, para domine ar um pobio «Míiigrado d<í Portugal por motivos religi()s<ií* Comuuicaçno íi Aead. daa Sc. de Lt&boa em It de maieo ri«* lí)l:> pelo br. A. Haião.

^^ Poesias, mandadas publicar pela Acad. R. das Sc. de Lisboa, ITÍU, Xl-427.

* Poesias inéditas .. . publicadas pelo dr J fVirbsch, Halle, 1808.

^* O Poeta A. C e um seu Cancioneiro desíonlircido. comunicaorií» íoita á Atí.id. das Si* dn Lial)na i>"lo Sr. Anlí^/iiií) IVtiãn no Boi da 2.'-^ Cl„ x (1017| 481-010. 'l'rat.i-sií d»im Ms-, di Torre do Tombo, d h prinsiipio3 do scc. XVli!, ditoroiitc do- lidia em que ae baseou a ed. da Acatl. e dfs tièá de que se servia ^ Dr. Pnebach.

I

^

CAPItULO XII ESCOLà ITÁLIAKA OU QUJNHiBNTlSTA

157

nunca consogue eniociar-nos. O seu estilo ó frio, a sua inspiração me- dida c artificial. ^

61._— DIOGO BERNARDES (1520-1605) natural de Ponte da Ikrca, * discípulo como o anterior, de tíá de Miranda e Ferreira, fez parte da maloorrada expedição a Alcácer como cantor oficial, que devia ser, das glórias do novo rei Artus. Regressando á pátria de- pois de cinco anos de cativei» o passou a vida na solidão ei^crevendo maitas poesias, algumas repassadas de verdadeiro sentimento. Eis as suas obr.iH :

a) Várias rimas ao Boin-Jesus, de carácter espiíitual e mis- tico. '

ò) ííôres do Lima, * Sam na maior parte gonetos e canti- íTàs, com algumas can^Ôe?, «lógia^, ot**., de ca-ácter profano.

o) O Lima, contando vinííí ciclo^as o trinta o trfs cartas, *• (me íormam as suas obras mais extensas.

Faria c Sousa, e com cio, muitos outros críticos, acusa-o de ter rjnbado a. Camões o poeina Santa rraula^ cinco églo^^is e outras. p«^éí>iat«. Nunca se provou c^ta acu.^-açà.). " O mavioso o flcílicado can- tOr do Lima revela so ato como um <I(^s cultores mais felizosL do gé- nero bucólico. Tcni qua^iros duui descritivo maravilhoso, que nos im- pressiona polo tom de ternura o de tristeza com que estào traçados. ^h sr-us camj)0íí, os swis pastores respiram realmente o ar fampepino. Poucas s^m as composiçoi's om que o rebuscado da fra^^e "' d(> rjuncíu a mácula dos vícios, que principiava a invadir no-^ o de que nem o próprio < 'amues fieou indêne. A i*e*]rra é a pureza da lingua- gem servindo adinirávelment-i a iiarnionia dos vertos. "*

l Vêr riiimn D. Carolina Miehaí-H.-*, Pedro de A. C. (líxtrait. de la Rrv. Hifp.) Pnn<», l\i)l.

* ()ntiv« ílízoin no Vonif* do Lima. A qiT^stao c.stú bem oh-iciflada pdo Sr J. rionifs do Abrcn, Diogo Bernardes ; a sua riattit alidade '. Ponte do lima, 1907. 1 fo^h. «' ijiaiá n centrinente aujciji |)í lo ^r. llí'iiHterio AraiiUs, trti As>os- tuiho da Cruz, LÍ!jÍM)a, 1909, 1 í'n!h. ('(•m-idi, a (Icriionstracrio é rnhvinvfente,

* Varias rimas ao Bcm-Jesus e ã Mrc^em gloriosa sna .\hle e a vários Santos particulares. Com outras mais de honesta e proveitosa !i{ lo. \AA)o i, >imâo Loj»*«í4. i;V.!|.. 4.O. E* a 1 * ed.: outras H)Ol, If.n.S, nilii, 1(íl»l>, 1770.

* (Cirnas várias. Flores do Lima, Ki\iboa, Man-el de Lyra, L')í>6, H/; •alras, HvJ^i. 177U.

^ A l.*^ ed é de Lirsbtxi, poi Siinàn Lopes, lõ.G. 4." de iv-l7o; íuitras,

* llonde de li voa o menoscabo de \Wv: ardcsV Decerto do f.ieto do so en- •"^•ntrarem ♦^m antigos Canvion«Mrí'H pix si.is dcí (^ínnòcs como ^(' f-V^-nn dt« Vn^v- i»âni(^3, Mhh se outras de B^rnard' s i-om n assinatura d»-. Caniò > I O ía.-to do H:«levida?» atribuiçÕ '.s é vulgar e »<'iii propWiio, (Imuiíií ;i jums i';ào »'' plMiíiaiio p-Tfeit.imçnte •;iatnit.i.

"' Leia-:i«í Dará ox. o Son. iM. ]). fi dan Fiorcs do Lima.

* Uebelo da Silva, Hist de Port., v, 275.

158 HISTÓRIA LITVaATURA POBTUOUASA

62.- FR. AGOSTINHO DA CRUZ (1540-1619). E irmão

do precedente pelo sangue e pelo talento poético. Tinha no fiéGuío o nome de Fr. Agostinho Pimenta, «ntrando^ depois na vida monástica com o nome de Fr. Agostinho da Cruz, por que é conhecido. A co- lecção das suas odes, sonetos e églogas foi publicada^cm 1771 ' mae •ó desde 1918 a obra do grande Solitário pode dizor-se conh-cida. * Por toda ela perpassa a sombra duma grande melancolia. Todas as poesias sam de carácter profundamente religioso, revelador do estado de alma de quem as redigiu-pobre monge recolhido na Arrrtbida que quiz apagar a lembrança do tempo que vivera entre os homens^ quei- mando todos os versos dessa época ;

Os versos que cantei importunado Da mocidade cega a quem seguia Queimei. . .

Mas nas suas poesias religiosas um sentimento tam sincero de verdade que impressiona profundamente. E' a alma dum verda- deiro- crente, resignado, compassivo, adorável. Se possuíssemos a parte da sua obra, que ê!e implacávelmente fez desaparecer para sempre, n$Lo pode restar dúvida de que o seu nome se aureolaria da mais radiante fama. Dessa vida passada se divisam sombras dt sombras intangiveis. Canta o. adoce Lima», que o viu nascer, o f Mondego e o Tejo > que o virara crescer e prosperar, especialmente este ultimo, a que parece ligar recordações de ternura e de saudade. Mas o que domina a obra do simpático eremita é a nota do mistério do além, que faz das suas poesias verdadeiros trenos impregnados dt religiosa piedade comunicativa.

POESIA DRAMÁTICA

63. OrlQGm do toatro. A poesia -dramática não tev« forma regular antPs de Gil Viceiíte, que por isso é, com justa razfto, apelidado dè. fundador do nosso teatro. As representações scénicas sempre foram queridas dos povos. Através o longo período da idade- média o elemento dramático conservou- se vivo e persistente. Entrt nós chegou a ter tal desenvolvimento que os bispos nas Constituições diocesanas se viram forçados a proibir as representações nas igrejas, certamente pelo abuso que as tinha manchado. Nas Constiiutçdôs do

^ Várias Poesias, Lisboa, 1771.

' Vol. XXI dos meus Subsídios Obras de Frei Agostinho da Cruz con- forme a ed. de 1771 e os Códices Mss. das Bibliotecas de Coimbra, Porto, Évora. Coimbra, 1918.

'* Veja-se o estudo com que antecede a citada ed.

%

CAPÍTULO ia mnoohA itáliáhá ou ^nunuufTUTA 159

Bispado de Ev^ora (1534) lê-Be: «defendemos a todas as pessoas ecleaiásticas 6 seculareS; de qaalqaer estado e condiçâa qae sejam qae bSo comam nas igrejas^ nem bebkm com mesas item sem mesas, nem se £ftçam nas ditas igrejas ou adros delas jogos alguns, posto qae sejam de vigilia de santos ou de alguma festa; nem representa- ções, ainda que sejam da paixSo de Nosso Senhor Jesus Cristo ou de ■ua resunreiçâo, ou nascença, de dia, nem de noite, sem nossa espe- cial licença, porque de tais actos se seguem muitos inconvenientes... » {CoMi. 10, tit. 15).

Igualmente nas Conat do bispado do Porto aparece a mesma

proibição: «e porque nSo é decente interromper o santo sacrifício da

misáa, e deixar de cantar o que a igreja nela tem indicado se cante

para intrometer , nela eansonetas ou vilancicos, e ainda que sejam

pios e devotos. . proibiúios que se eantem eansonetas e vilancicos^

nem motetes, antífonas e kinos^ que nSo pertençam ao sacrifício que

se oeiebra, nem enquanto se disser alguma missa se consinta cantar

cautigas profanas, nem f estas j nem Aanqas, autos, colóquios, posto

qae sejam sagrados,^ nem clamores, petitorios de esmolas. E outro

mandamos, sob as ditas penas (excomunhSlo maior) que nenhuma

nas ditas igrejas, ermidas ou seus adros, façam comédiofi, re-

fTtsesitaoôeSy entremeses ou alegorias profanas . . . nem se façann

dátnças, baãeSj folias, suetos, ou cousas semelhantes, nem cantigas

desonestas 9 (1. m, tit. 2.^, const. 7, pág. 175, e ibid.^ 1. iv, tit. 9,

oonstít. 6, pág. 427). £dtas e outras censuras nâo faziam mais que

C^novar a letra dos Concílios idade-média e a Lei das Partidas

<i, 1. 34, tit. vi).

Alem deste teatro de carácter religioso, tirando o s^^u asAunto das Boenas da vida da igreja, da dos santos, das lendas cristãs, etc, havia outro de carácter prpjfano, cultivado nos paços reais, onde a Aristocracia se deliciava com as mimicaSy momos e entremeses^ que nunca deixava de haver nas grandes solenidades e festas. Aprovei- tar estes vestígios de tradição inteiramente popular e imprimir-lhes o canho duma poderosa individualidnde, tal foi o trabalho de Gil Vicente.

64,— GIL VIGENTE (1470? 1540?), justamente cognomi- nado o Plauio Português, desde que pela primeira vez mcí^tre André de Resende assim o apelidou, nasceu talvez em Guimaràeí», talvi z na poTÍDcia da Beira,u)x>nde passados os primeiros anos da infância, saiu pura Lisboa começando na Universidade o estudo da jurisprudência, que todavia não chegou a concluir. Tem-se afirmado que [)or 1493 seria jmestre de retórica no duque de Beja, depois rei D. Manuel, circunstancia que lhe daria com a amizade do nionai cu, a entrada no paço, mas o iacto não é nadn verosiniil, embora soja certo que na cOrte d-.sempenhou qualquer ofício, pois disso recebia tenya, como de

^*^

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160 HIBTÓBIA PA LITSRATUBA POBTUaUÊBA

costume. * O talento poético de Gil Vicente revelou-se por ocasilo do primeiro parto da rainha D. Afaria, esposa do rei D. Manoel. No di-i imediato a esse parto, a 7 de junho de 1502, na própria câmara da rainha e deante da corte ai reunida, de seu' marido D. Manoel, de sua cunhada a rainha D. Leonor, de sua BO.ií^ra a infanta D. Beatriz, de Bua outra cunhada a Duquexa de Bragança, etc, Gil Vicente re- citou o Momlogo da Visitação ou do Vaqueiro escrito em espanhol para melhor ser entendido pela rainha, íilha, como se sabe, doa reis católicos Fíirnando e Izibel, e ainda porque a língua castelhana era entuo a proírida pela corte portuguesa. *

O monólogo representado pelo próprio Gil Vicente que, como Shakspoare e Mol.òre, era ao me^ímo tempo autor e actor, agradou tanto, que a rainna D. Leonor qniz que o repetinse para as festas do Natal, com o -que ele se nao contentou coibpondo para a cioL-unhtan- cii Tiovo auto Pastoril castelhano. Estava achado o vdo riquíssimo drstc ^ónio. Durante mais de tr nta anos a lorte de D. Manoel e a Sí;^uir a de 1). Joào iii, him admirar :ís produyóes deste homem ex- traordiíulrio, que ó unia d.s lipiuras salientes- do^ humanismo do st/culo XVI, voniadeiro discípulo de Krasmo pela liberdade com que criti- cava os ;»b'isos das cla^4ses dominantes nobres c clero dominados pi*lo e,:u,"v>i.-nio, eivados de vícios c de paixões gcnsuais, esquecidos uns e outros das virtudes que tinham distinguido os seus ascendentes doutras é])ocas. '

A ( bra de Gil Vicente ó vastíssima e complexa, pois se com- põe (io 4 1 |;í'ras nas quais se encontra o v( rdadeiro retrato da época. >^ob o p<>rjtí) d'' vi^ta da língua em que foram escritas podem distri- buir-.se eiii*:) grn[K")s:

n em PoK rro u r:s : Auto de Mofina Mendes, Pastoril PoriínjvCa, Ftira, Ahini^ Barca do In.j('.r)io, Barca do Purgatório^ IH st '.ria <li' l/((is, JiC.siirrefcàOy <'an>íiica, Kj-hortacào da guerra, Còr(t\s (Ic .l'i jtit(n\ Serra da Kstrclaj Po7)iaf/em de Aijravados, Velho da Ilori'i Al nmcrevcs e (Ir ri i/o da Beira. ^

1') ht) em kstaMõ^l: Msiffu;uOj Pastoril Castelhano^ Ihis

1 o lí. \'. tni '«'iiciitriído c puliliciulí) por Britu lii bilo: Gil l Vc^/i/^, Lis^ boii, 19 2, p'.-. II.

- < ) ii.<)ii«'.ln;ji> t III ;u];ipturno ir í (ici ii;i í1»>. A. Loprs Valeira f^m A CiifTipa- nfia Vicintíiia, IJ.-l.oa. IvH-l <) iru-.inio ilustro poíta '^xahVníim Autos de G V, sei^uidos da iiiin v exa rptos, I Vi rio . 1 9 i <>.

•' n .\\\" ;'».' lioj'* po'l ai iM-ni-sf da rljscnra ])i< £rr. de G. V. ene-ontra-3e na <»l). (Í<' n 1' » [\ It 'lo. rir., na Sr.'^ I). Carolina iMiitiiarlis d(* Vasn., on»* pn*para a 'mí. (" jt .-a (]t> ii aiii. limpo «; t»'m i:nlt ir;. do . Miim prcIiniiriaiCS NotaS Vicefíti-

nas. I (jii Vurnlc uri Hnixdas [\^'i'l)\ \\ A h^ainha Velha e o Monólogo do \\i ,iu .to i'. .'^ IO .11 Romniice ã morre dcl i D. ^%inotl ílMI9j, no •>«• Hiaain- (Miiio 1 iM . . rij7 ' ji V (ií'n no in:iu"iiií'i«"o y. I. \'iií(i e Qbras de Gil Vtcente,^ I'o.to, 191".' a a ;'n.-' p(triii'-:iori/.,ida iii* (['lant.t-- ípu-.-iò }íu(io ItíVaDiar a bio-bibliogr. do i'o('ta.

CAPÍTCTEX). III ESCOLA ITALIANA OU QUUTHBNTtSTA 161

Magoêy Sibila Cassandra, Quatro tempos, Jiarca da Glória^ S, Martinho, Comédia do ViuvOy Z). Duardòs, Amadis de Gaula, Farça das Ciganas.

3) BILINGUKS: AiUo da féy Auto da Festa, Ruhena, Coim* Ira, tloTéSta de Enganos, Não dUimoj^es, Fragoh d^amor, Erkor- taçao da guerra. Templo d' Apolo, Triumpho tt^inmrno^ Romagem d'agravados, Quem tem farelos?, índia, hama, Fadas, Inês Pereira, Juiz da Çeira, Lusitânia e Físicos.

Sob' o ponto de vista da idéa que presidiu á idealização desta VMta obra podem ainda fazer-ae três grupos :

a) obras do carácter hierático, em que aproveitou as tradi- ções e costumes religjiosos. Entram n^ste grupa o Monólogo do Va- queiro ou da Visitação acima reíerido, o Aué^ pastoril castelhano. Reis Magos, Sibila Cassandra, Auto da Fé, Auto dos Qaatro tem- ps, Pastoril Português, Feira, Mofina Mejides, Alma, História de Deus, Resurreiçào, S. Martinho, a trilogia Barca do Inferno, Barca do Purgatório e da Glórid, e o último desta série, que é a Cananêa.

b) O segundo grupo do téntro vicentino compreende as obras <imtQcráticaSy para cuja composição ele naturalmente era levado pelo contacto com a corte em que viveu Anto da Fama, Exhortacão da guerraj Cartes ^de Júpiter, Fragoa d' amor. Templo d^Apoh, Coimbra, Náo d*amores, Lusitânia, Amadis de Gaula, Z>. Duardos.

c) Temos, enfim, o teatro j^òpiãar, em que habilmente Gil Vicente p)s em jogo os costumes e as festas em que o povo era ' principal protagonista, criando verdadeiros tipos de género, como

o Ratinho, o Fidalgo pobre, o Frade devasso, o Judeu explorado^ o Oalante namorado. Neste género foi escrita a farça Quem tem fa- relosf nome que, segundo ele próprio diz, foi posto á sua obra pelo público; Almocreves f índia. Velho da Horta, Viuvo, Fadas, Fisi- wi, Ciganas, Inês Pereira, Juiz da Beira, Romagem de Agrava- dotj hloresta de enganos. Os autos Jubileu de amores representado em Bruxelas no palácio do embaixador português D. Pedro de Mas- <ííU'enhaB ein 21 de dezembro de 1531 para comemorar o nascimento <lo príncipe D. Manoel, filho de João iii, e de D. Catarina, Aderên- <^w do Paço e Vida do Paço perderam-se inteiramente talvez devido i condenaçslo muito especial que por parte da Inquisição sobre eles recaiu, sendo provavelmente o próprio dramaturgo quem os não iiicluiu na Compilação das suas obras que preparou e que seuS filhos Paula e Luís vieram i publicar enx 1562. *

. Todas «Btas obras foram compostas durante 34 anos, devoríde t€r sido conhecidas do público á medida que iam sendo representa-

' Eates factos foram poatos em evidência nas Notas Vicentinas da Sr.^ D. CtnJina Miehaêiis de Vasc. (1912), 205.

162 mSTÓSIA LITBHATUIU POBTDOCâfiA

das, em folhas avulsas. Gil Vicente coligiu as publicadas por esta forma ^as inéditas e dividiu-as nos três grupos apontados : hierático (obras de devoção), aristocrático (tragi* comédias), e popular (comé- dias e íarças), auxiUado nesta faina por sua) filha Paula. O poeta morreu porém em 1Õ40 e em 1562 é que elas apareceram a pú- blico sob os cuidados do íilho Luis Vicente, mas revistas pela Censura eclesiástica.

Não obstante parte importante do teatro Gil Vicente ser, como vimoS; em espanhol, o que perfeitamente se explica pelo público, em que havia rainhas e cortesãos espanhóis, estar inteiramente eivado do gosto castelhano^ todas as obras do nosso Moliére sam eminente- mente nacionais pelo génio que as inspira, pela sua contestura e assuntos. Nuo sofpem peias nem pela linguagem, nem pelo local a que eram destinadas. Mordaz e cáustica, a sua veia cómica retalha, como um escalpelo, as podridões e os vícios dos seus contemporâneos, qual- quer que fô^se a situação em que se achassem. Pontífices, reis, aris- tocratas, clero, bem como o povo, a arraia-meuda, defrontam>se cor- tados a golpes de sátira, desassombradamente. Semelhante liberdade não podia deixar de criar embaraços a quem se mostrava tam pouco tolerante com os vícios, que corroíam as diferentes classes da socie- dade, em especial, a dos nobres e a clerizia. Por isso as intrigas nSo o pouparam e entre outras uma parece tê-lo maguádo profundapaente a de que as suas composições não eram obras originais, mas sim plagiatos. Diziam isto certos homens de bom sabery sublinha êle iro- nicamente. Talvez aludis&em aos autores castelhanos que antes e ao tempo de Gil Vicente compunham autos e farças Juan dei Enzina, Lucas Fernandez e Torres Naharro, o primeiro dos quais já- por 1492 era representado em Castela. Dele se lembra Besende na Mis- celânea onde, reconhecendo- lhe prioridade afirma, porém, que Gil Vicente escreveu «com mais graça e mais doutrina*.* E' precisa- mente o juizo da posteridade que valor muito superior ao funda- dor genial do teatro português '. Para desfazer as calunias, Gil Vi- cente num serão do paço pediu que lhe dessem um toma. Deram- Iho « mais quero asno que me leve, que cavalo que me derrube ». O poeta desquitou-se triunfantemente escrevendo a sua melhor obra, «ma comédia de caracteres, a Inês Pereir^a. Além desta merecem ainda citar- se Eubena, Almocreves^^ floresta de Enganos, Três Bar- caSf ele. ^. Quem queira ver até onde pode altear-se o génio criador

' E&taneia 186 na ed. cit. doa Subsídios.

5 Menendcz y Pelayo, Antologia de Poetas líricos castellanos, vii.

« A l.** ed. traz o titulo: Copilaçam de iodalas obras ^ Gil Vicents, tf qmal se reparte em cinco Hvios. O primeyro he de todas suas cousas de deuoçam^ O segundo as comedias, o terceyro as trágico medias. No quarto as farças. No quinto as obras meadas,, , Ano m.d.lxu. Sam raríssimos os exemp'ares desta

•^Tl

ÇAPfTOLO in BSOOUL ITALLàNA OD QUIHRBHflSTA 163

do Poeta leia o AtUo da Alma, por ex., em que trechos de admi* rárel eablimidade^ como a oração de S.^ AgostínhO; qae opmeça

Alto Deos maravilhoso Que o mundo visitaste . . .

lâo menoB admirável qae o formosíssimo trecho posto na boca do Anjo

Alma humana formada nenhua cousa, feita Mui preciosa,.,

Algamas passagens dos aatos assombram-noa pelo arrojo da conce- pçSo como a scena entre Tqdo o Mundo e Ninguém na Farça dm Lusitânia, que Jembra o conhecido passo do Frei Luís de Sousa de Garrett, e a scena da tentação no AtUo da Alma, que recorda o Fausto de Goethe. Também o Poeta fere a nota do sentimento pa« tríótíco em apaixonados acentos na Exkortaqào da Guerra

Oh famoso Portugal Conhece teu bem profundo Pois até ó polo segundo \ Chega o teu poder real, . .

auto que é, pode dizer* se, todo ele um entusiástico hino consagrado á Pátria.

Mas a notar ainda uma particularidade na obra Vicentina. SemeiadOa pela sua vasta obra dramática há, aqui e além, trechos líricos dum encanto e suavidade extraordinários, demonstrando o multiforme talento do Poeta. A sua lira deixa de ter os acentos da sátira rude, feroz e cruel, para ser cândida, simples, maviosa ^ Obteve (tíí Vicente tal renome com as suas obras que se chegou a dizer ter Erasmo aprendido o português de propósito para o apreciar. Con- quanto nada^haja que abone esta tradição, serve ela para demonstrar a fama de que gozara, entre os seus contemporâneos, o nosso ilustre dramaturgo. Mas pode crêr-se que o grande humanista conhe* c€«se efectivamente o maior artista dramático da Europa do seu tempo, talvez' por intermédio do seu amigo Damião de Góes e de mestre André de Resende. Tal é o que de melhor se pode apurar

•d.; raros ígnalmente os da 2.^ de 1586 e mais raros ainda os das folhas avulsas, em que a priecipio saíram os aatos. Veja-se na ed. cit. do Sr. Braamcamp, da págs. 269 a 302, a tentativa bibliográfica t»,

^ Reuni os versos lirieos na minha ed. das Obras do Poeta, iii, 263. Vide tunbêm Aahrey Bell, LyriêS of Gil Vicente, , . translated bj. . ., Oxford, 1914.

Í6i HtSTÓRIA «DÁ LITBRATUBA TOUTVQVtSÂ.

BÔbre a biografia do grand(; escritor do Renascimento português. Se foi QU não o autor da maravilhosa custódia de Beleni é ponto qud muito se tem discutido, parecendo mais segura a opinião -que atri- buo á mesma personalída le os autos e e:s8a famigerada obra de ourivesaria, que foi feita, com oiro das pifeas- de Quíloa. Pelo menos um ducumento de 1513 menciona Gil Vicente como ourives da rainha D. Leonor e como mestre da balança da Moeda de Lisboa, a que al- gum contemporâneo o dpcorfo pessoa autorizada lançou esta cota marginal Gil Vicente Trovador Mestre da Balança, doe. portanto, senão definitivo, pelo menos eloquente em favor da identidade. *

ESCOLA DE GIJ;. VJCKNTK

65. o impulso dado ao teatro português prfo génio assom- broso de Gil Vicente, não se perdeu. Em Lisbo», Évora, Santarém e Coimbra, onde as comoosiçoes vicentinas foram por vezes ouvidas, o gosto do teatro criou discípulos e imitadores do grande mestre.

Nêáte sóculo, além de CamSes que se aprosima de Gil Vi- cente nos seus três Autos, temos a mencionar como adeptos míds ilustres do teatro popular:

66. AFONSO ALVARES, mulato, creado do bispo de Évora D. Afonso de Portu^çal, acerbamente satirizado por Chiado, autor dos autos Santa Barbara^ Saiito António, S, Tiago Apóstolo e S, Vicente Mártir^ estes dois últimos hoje perdidos. *

67.— ANTÓNIO RIBEJRO CHIADO, memorado no Auto d^El-Rei Soleuco ^ do nosso imortal épico, e na Aulegrafia, * de Jorge Ferreira de Vasconcelos, frade professo no convento de S. Francisco da cidade de Évora, onde tinha o nome de Fr. António do Espírito 8anto, sendo, depois qwe despiu o hábito, conhecido por António o Chiado, alcunha que o público lhe pôs e da qual de- rivou depois o nome para a rua de Lisboa, hoje oficiÇilmente rua Garrett, mas ainda vulgarmente designada o Chiado,

* O Sr. Braamcamp Freire estuda brilhan temente a queatão. Para a leitura das Obras do Poeta podo cônsul tar-se na minha colecção Subsidias para o estudo da História da Literatura Portuguesa, o vol. xi,' 1.** das Obras de Gil Vicente^ Coimbra, 1907 que contêm as obras portuguesas, O S.** vo- lume dtí 1012, contém as obras bilingues; o 3.° vol. as obras espanholas, 1914.

* Para as ed. destes autos como dos autores qtie sepuem pode vôr-se ínnoc, no Divc. Bibl.y e Ricardo Pinto de Mattos, Manual Bibliográphico por- tuguês de livros raros ciáticos e curiosos. . ., Porto, 1878^

^ No Frologo.

* Act. IV, 3(3. 2.".

CAPÍTUU) III JMOOLÂ ITÀIãAMA OU ^nunBHTUTA 165

Diante de D. João m represeiitoa o seu Auto da ncUurcd v«Hção e escreveu mais a Prática de oito figuras^ o Auto deu Sô" ffoieiraã e a Prática de xompadres, ^

68« BALTASAR DIAS é de todos os poetas . dramátioot portugueses o maia conhecido e ainda hoje amado pêlo poro. Era da ilk da Madeira e cego^ escreveu »empre em portagaês e possuía o dom de saber falar e ser compreendido pela alma ingénua da multi- tidão^ como dotado, que era, dum talento incontestável. Tomou-se popalar e muito aplaudido' no reinado de D. Sebastião, pelas soas trovas metrificando tradições medievais, intercalando na sua obra na- merosofl versos de cantilenas jogralcbcas * e pelos seus autos pondo em scena lendas bieráticat^ ; competia com Gil Vicente não na corte, mas entro o povo, cujo filho era e de quem recebia os parcos réis pela venda das suas compoaiçòos, * que eram. divulgadas antes de 1537. Dafe po:»suímos autos sacros como o de Santo Aleixo, Santa ^^(lierina, Nascimento de Cristo^ Salomão, Paixão, e as narrativas de cordel, ainda hoje reproduzidas História da imperatriz Porcina mulher do imperador Lodonio de Roma^ em a qual se trata como o dito Imperador mandou matar a esta senhora: Tragédia do Mar- quis de Mantua e do Imperador Carlos Magno, que Grarrett incluiu no Bea Romanceiro, considerando-a como tradução dura roraan ;^*^ri- pnalmente francês ou provençal dos fins do séc. XIV ou princípio» da XV, e outras de menos nomeada. Homem pobre, sem outra in- dústria para viver senão a venda das suas obras, como êle próprio etcreveu, que no* teria dado o talento deste jogral do povo se tivesse Tivido noutras condições?

69.— ANTÓNIO PRESTES, de Torres Novas, escreveu di- ferentes autos que, como muitos dos dos seus contemporâneos, foram primeiro publicados em folhas volantes ou pliegos sueltos, e de que tu; 1587 um tal Afonso Lopes, moço da capela rial, fez uma colecção 'le 12 com o titulo -^ Primeira parte dos Autos e comédias portu- . fJ^zoA' feitas por António Prestes e por Luiz de Camões e outros

f

' Impr. pftlo Sr. Alberto Pimentel a expensas do Sr. João P^daardo Go- 'í*5 <ie Barrod: Obras do Poeta Chiado, colligidas, annotadas e prefaciadas .^f-. , Liãboa, l vol,, 1899. Sobre esta ed. escreveu Kpiphaiiio Dias um ar- «c-i critico ua Zeitschrift f. rom, Philoíogie, xv (H91), páj^s. íVi i-í)r)8. Vid. **E^.i do mesmo »Sr. A. Pimentel. O Poeta Chiado inovas investigações sôbte ^ sua vida e escritos), Lisboa, lííOl; Sr. Condo de Sabii;ijo.'}a, Avto da natural ifivençam, obra desconhecida com uma explicaç.:lo prévia, Li^bo.i. T'.U7.

b. Caroliua Micliac^lis, Estudos sobre o romanceiro peninsular, \\ íi^M l.áç. 112.

' Dr. Th. Hraga, Escola de Gil Vicente e desenvolvimento do teatro 'Nacional, Porto, 1898.

11

I^ . HlgTdmU. bA LtTBBATUBA POBSruaUÈSA

aatores. . . ^. Nesta colecçSio de Prestes 7 Avé- Maria, Ciosa ^ Procur€uíor, Desembargador j Dotts Irmãos j Mouro encantado , e Cantarifihos ^.

70.— SIMAO machado, que profesBOu a regra de S. Fran- cisQO; em Castela, n^ convento de Barcelona^ ohamando*se na re- ligião Fr. Boaventura Machado, patrício do anterior e talvez o dis- cípulo mais ilustre de Gil Vicente. Ainda vivia em 1632. £ até na dizer de Costa e Silva, ' as suas comedias CêrQO de Diu e Pastora Alfêa sam pela variedade de lances, desenho e desempenho dos ca- racteres, superiores aos autos do próprio Gil Vicente. F^ena é que a maior parte dessas comédias esteja escrita em espanhol, língua que^ bem como o mais, começava a invadir a classe culta e a desterrar do uso o português, mais tarde quási somente falado pelo povo. £' o que êle/ próprio diz querendo desculpar-se do emprego da língua estranjeira :

Se nm estranho á terra vem, ' Dizeis todos em geral. Nunca aqní chegou ninguém, £ do vosso natural Nada vos parece bem.

Vendo qnam mal acceitais As dores dos nataraes, Fiz esta em língua estranjeira, Por vêr se desta maneira Como a elles nos tratais Fiome no Castelhano Fiome em ser novidade, Se nQ5i, & noutra me engano, Vós Portugal, eu o pano Cortay á vossa vontade K

Ás duas comédias de SimSo Machado saíram em 1706 juntas com doiis entremeseSy um dos quais de D. Francisco de Quevedo e mais quatro loas famosas de Lope de Vega. * Os trechos mais for-

» 1 voL, 4.", 379 pág.

' A ed. de 1587 é raríssima. 2." ed. feita por Tito de Noronha^ Porto, 1871. O Auto da Ave-Maria e o dos Cantarinhos têem ed. na Bibl. Univ., Lisboa, 1889, 1 vol. Do Auto do Físico de .T. Ribeiro ed. da Acad. das Sc. de Lisboa dirigida por Esteves Pereira, Lisboa, líil8.

^ Ensaio biogr.-crit sobre os melhores poetas portug,, vi, 106- 16S,

* Páp. 143.

* Comédias Portuguesas feitns pelo excelente poeta Simão Machado,,, Lidboa, 1631, outra ed. 1706. Uma ed. da Diu de 1601 é hoje totahnente des- conhecida.

n* -».

CAPÍTULO III XSOOLÁ ITAL1ÁHÁ OU ^UIRHENTISTA 167

mo608 aam indabitávelmente aqneles etn qne a influência de CamSes 86 &z sentir. Transcrevemo-los na Antologia. por si, esses tre- chos revelam o grande poeta que íoi Simão Machado ^ de quem muito 'se poderia esperar se n^ tivesse professado abandonando a carreira por que mostrara tam decidida vocação e entregando-se a

trabalhos de ordem bem diferente.

>

£3GÓLÁ CLÁSsici^'

71 Chamou-se com grande propriedade á corrente iniciada pelo fiindador do teatro portaguês, toda inspirada nas tradições nacio- naisy escola popular; eili oposição á de de Miranda e António Fer- reira, qae, como vimos, seguiram os modelos eruditos e clássicos. Filia-se nesta escola clássica JORGE FEKREiRA DE VASCONCELOS [? 1 1585?], autor das 3 comédias Eufrosina, Ulysipo * e Aulegrajia, ' acolhidas coin grande «entusiasmo pelos contemporâneos e que na rea- lidade revelam muita aptidão dramática. Na opinião de Dias Go- mes, ^ critico tam insuspeito como perspicaz, Jorg^e Ferreira leva decidida vantagem a de Miranda e Ferreira, tendo scenas inimi- táveis, especialmente na JEufroaina, que constituindo as primícias do aea talento ^ é, como as outras duas, fonte inexaurível de verda-

^ Hi nas duas comédias de SimSo Machado expressões e foruias de dizer qoe muito interessam ao graaiáticoi Na «D/o»; Que num madeiro chantado (p. í, c. l.*) Numa cidade chantado {p. 4, c. 2.*) ; Chantai-vos bem para aqui (p. 5, c. l.*); engullipado (p. 4, c. 1."); Hom'acha (p. 4, c. 1."); marpuz (p. 4. c. !.■); bofas ^, 4, e. 2.»); 6— 2."; 31 - 1.»; 41—2.'; 63 2.*); bem é que lha'queça assi íp. 6. c. l.*); Dinha mãi (p. 6, c. I.*; 14 2/); inho (p. 110, e. 2.»; 111 !.•; Trouge (p. 58, e. 2.»); Md ora (p. 58, c. 2.»); Aramá (IbidJ ; âochopo (p. 59, o. !.•), etc., etc.

Na «Alféa»: emposilgado (p. 109, c. 2.*); seja espldo (p. 110, c. 1.'); samicas (p. 110, c. 1.'); Fato (p. 133, c. 2.'; 170 2.'); resai péíssinho (p. 136, c. !.•); Sejo (p. 158, c. l.a; 164 2/; 165, I.'); 171—1/; Cachopina (p. no. c. 2.*). Etc. , etc.

* 1.* ed. Évora, 155j; outra, Lisboa, 1616, revista e emendada por F. Bodrignes Lofoo e não dele como alguns autores snpoaeram ; 3/, 1786, reimpressa por B^to José de Sousa Farinha ; 4.* publicada por ordem da Acad. das SSc. de Lisboa por Aubrey Bell, Lisboa. 1^10.

* A !.• é desconhecida. 2.* ed. Lisboa. 1618. 3.* Lisboa, 1787, também Rimpr. por Farinha.

* l.»ed. Lisboa, 1619* » Obras, 292.

* Como se conclue do Proémio ao Príncipe D. João (1537-1553), o pri- mogénito de D. João III, casado com a filha de Carlos v, D. Joana, que deixou grávida quando prematuramente faleceu em 1553 com dezasseis auos incomple- tos. Moço da câmara do malogrado Prijscipe a ele dedicou todas as suas obras, tteaos a Eufrosina. oferecendo>as depois de sua morte ao filho póstumo el-rei D. fiebtttiSo.

168 ftlBTÓBUL L1TBBÁTUSÁ POETUCKJASÁ

deiro estilo cómico. Nenhum escritor nosso deixou tam grande quan- tidade de provérbios ou ditados morais, que êle se compraz em pôr na boca das suas personagens quási página a página, e que muitas vezes deixa ao cuidado do leitor o completar Usa também de lo- cuções e dizeres especiais, que se sam agradáveis ao historiador da língua e ao gramático, interessando igualmente o apaixonado dos an- tigos usos e costumes nacionais, tornam em extremo penosa e difí- cil a tarefa do comum dos leitores, que sem preparaçSo especial se abalancem a manuseá-lo. Riqueza vocabular, vernaculidade, varie- dade de alusSes a personagens e a ditos célebres sam motivo bem suficiente para atrair o estudioso dnm dos nossos melhores escritores antigos.

Qualidades igualmente primorosas de linguagem e de estilo com abundância de descrições pitorescas se nos déparanv no Memo- TÍ(d dcLs Proêsas da Segunda Tavola Redonda *, novela de cavalaria, que êle diz ter escrito « fundado mais na alta matéria, que confiado no próprio engenho » . Em Volta do rei Sagramor, cavaleiros andantes obram prodígios de valentia, nem melhores, nem diferentes, dos de todos que figuram nos livros desse género. Uma ou outra vez en- contrara-se intercaladas na prosa algumas poesias de bom cunho tra- dicional, devendo especializar- se o « Romance que as fadas canta- ram» após o célebre torneio, que é o remate do livro

Soberbo e-tá Portugal

Em sua glória enlevado . .

Vê-se de um rei sabedor

Mimoso 6 bem governado ...

Parece que Jorge Ferreira ainda escreveu uma Segunda Parte [Cap. 27, in-Jine] que, entretanto, nunca foi publicada.

OS PROSADORES

72. A história no séc. XVI; suas características. A

forma principal da prosa no século xvi é a história. Uma plêiada numerosa e distinta de escritores empreende a narraçSo das conquis- tas e descobrimentos dos portuguepes, as quais estavam, na reali- dade, pela sua importímeia e pelo seu número^ reclamando cronistas que as transmitissem á posteridade. E' claro que os trabalhos histó- ricos deste período, em geral, niío sam, nem podiam ser, moldados em bases críticas, de cunho scientífico e imparcial. Faltava aos seus autores a educação precisa para isso; a sua época nâo possuía ainda para sernilhanto efeito a disciplina filosófica indispensável. O que to-

Evora, 1567, 2.» ed., Lisboa, 1867.

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CAPÍTULO lU— ■0OOI.A ITÀJãÁMA. OU QUUmmíBTA . 169

m08 sam narraçSes ditadas por am critério simples e ingénuo, sam fiictos contador com a consciência de inteligências que se deixam deslumbrar pelo que contam. Muitos dos seus autores viram o que escreveram ; apaíxonaram-se pelo assunto, n2lo lhes faltava pois a sciência dos factos^ mas a serenidade j>ara os apreciar e o critério para os dissecar. Desta forma algumas vezes escreveram narraçSes enf&ticaSy aduladoras e exageradas. ''

73.— D. JERÓNIMO OSÓRIO ([1506-1580) ó dos historia- dores mais imparciais e m&is desassombrados deste periodo. Homem muito distinto e erudito, formou a sua educação nas universidades de Salamanca, Paris e Bolonha^ vindo a falecer com 74 anos bispo de Silves. ' Escreveu quási todas as suas obras em latim, ' com tanto gosto e perfeição que mereceu por isso o titulo de Cícero português. A sua obra capital é a crónica de D. Manoel: De rebus Emma- nuôlis gestis, ^ traduzida por Francisco Manoel do Nascimento (Fi- linto Eiisio). ^ O facto de ser esta obra escrita em latim, tomou-a e ao seu autor muito conhecidos na Europa. ^ Cita-se com muito louvor a paisagem em que êle censura D. Manoel pelo expediente iniquo^ injueto da expulsão dos judeus. "^ Das suas nove Cartas^ escritas em português, é mais conhecida aquela em que o ilustre prelado tenta diâsuadir D. Sebastião da jornada de África, cousa bem rara em ne- gócio em que, como é sabido, o próprio Camões tanto empenhara o desgraçado monarca.

Nessa iuta contra o projecto do megalómano monarca apenas Be encontraria forte com a opinião do bispo de Mií-anda e Leiria^ D* António Pinheiro (f 1582), que p«la sua superior educação dispôs de grande valimento nas cortes de D. João iil, D. Catarina e do Cardeal D. Enrique. Isso mais abona o procedimento do bispo Otíorio»

74. JOÃO DE BARROS (1496-1570), de Viseu, denomi- nado o Livio português^ sobresái entre os escritores deste século pela belessa do estilo e pelo vigor e propriedade da linguagem, que lhe dam jus a bcr contado como um dos nossos primeiros clássicos.

* J. Silvestre Ribeiro, Esiudo moral e politico sobre os Lusíadas, Lis- boa, 1853, pÂg 7i.

« Vid. Bi-po de Visea, Obras, i, 293-301.

> Vid. hibL Lusít, II. 514 e 516. ^ Lnprestt^i nn 158rt.

5 Da vida e jeitos dei Rey D\ Manoel, 180i.

« F. l)enía. Resume de Vhist, litt da Portugal, Paris, 1826, pág. 225.

J Vid. vol. i, 1. 1, pág. 45 t5 seg na ed de Coimbra, I7í»l. A cnlecç5(>

<**J8 de Osório, era 4 tomos, foi fei^a em Roma, em If 9!, por diligência

oom 8obt^||4) do prelado, também do nome de J. Osório. Das Cartas saía ama

•1 «m Fan p^^ VerUsiiao Alvares da Silva, 1859.

170 HI8TÓB14 DA LITBB ATURA PORTUGUESA

De família nobre começou muito cedo a frequentar a corte de D. Manoel^ cujas graças profusamente mereceu, bem como as de D. João III, que o cumulou de todos os benefícios. Embora nunca fosse capitão de S. Jorge da Mina, como afirmou Sev^erim de Faria, pois na lista das nomeações existente na Torre do Tombo não fig;ara o seu nome, desempenhou os cargos de tesoureiro e feitor da Casa da índia, de que íicou a receber avultada tença quando a cies renuncioa. Da íórma como o tratava D. João iii bem o testifica, àlém doutras provas, o Prólogo da Crónica do Clir imundo dirigido àquele monarca, no qual diz tê-la composto em espaço de oito meses e a per cima das arcas de vossa guardafoupa » . A Crónica do Imperador Clari- mundo declara ser tradução do úngaro, o que é mera ficção, pois se trata de trabalho original de Barros, que nela quis experimenta; os recursos da sua imaginação' de pouco mais vinte anos, escrevendo uma novela de Cavalaria >egundo o gosto do género/Ele próprio diz ainda que revendo a sua obra hesitou em publicá-la. * Mas D. João iil adivinhou- lhe o talento e encairegou-o de escreven a história da In- dia, incumbida a seu tio Lourenço de Cáceres que a morte surpreen- deu antes de realizado o mandato. Do modo como se desempenhoa daquele encargo estam as quatro Décadas da Ásia a atestá-lo. ' A primeira delas, aparecida um ano antes da partida de Camões para a índia (1553) provocou, na opinião de muito* escritores, a conce- pção dos íjusiadas» porisso mereciam elas ser registadas com Amor na memória de todos os portugueses. Mas a Ásia de Barros é, aparte a pureza e louçania da linguagem, um repositório excelente de notícias etnográficas da índia. feitos dos portugueses tiveram, por outro lado, em João de Birros um verdadeiro cantor e apolo- gista. Pode talvez ser acusado por este lado, mas, oomo escreveu Sismondi, «chega-se mais vezes a conhecer a verdade pelos escrito- res parciais da sua pátria, do que por aqueles que nada sentem ; pelo menos os primeiros têem uma cousa verdadeira o sentimento» '.

Entre as outras obras de Barros citam-se como dignas de me- lhor nota:

^ Crónica do Empcrador Ciar imundo, donde Beys de Portugal ãtê- •cendem, tirada da linguagem ungara eni a nossa portuguesa^ dirigida ao esclare- cido príncipe D, JoàOy filho do mui poderoso rey D. Manuel , Coimbra, 1620 (hipotética), Oatrae ed.: .550, 1553, 160:, 1742, 1791, 1843. (Rolandiana).

' Ásia. . . dos fectos que os Portugueses fizeram no descobrimento e con-

4.

as troa 1."* 1628 e todas as quati

de Barros por Manoel Severim de iraria e am índice. A Dec. !.■ saiu 3.* ^^

£in 1752.

a Cit por F. Deaís, ob. cit., pág. 235.

CAPÍTULO III E800LA ITALIANA OU QirmHIUTTlSTA 171

Rhopica pnefma * ou Mercadoria espiritual, colóquio em qae sam interlocutores o Tempo, o Intendimento, a Ventura e a Raz2o; Cartinha para aprender a ler * \ Gramática da língua por- tugue$a '; Diálogo da víoiosa vergonha ^; Diálogo,,, com douB filhos seuSy iôbre preceitos morais em modo de jogo ^.

Os Panegíricos do grande Joam de Barros feitos um á infanta D. Maria e outro a el-rei D. João iii saíram pela primeira vez nas ' Noticias de Portugal de Manoel Severim de Faria, sendo como as outrajB obras do mesmo autor modelos acabados de boa linguagem *• Barros era um enidito e nSto simplesmente um crítico á Tito Livio, escreveu Viterbo. Era um filósofo do seu tempo e não menos livre pen- sador que Damião de Góes. O que admira é como a soltura da sua lin- guagem mais abertamente manifestada na Rópica Pn^/ma não lhe caa- sasse algum dissabor inqui^^itorial. Çontentaram-se com lhe pôr a obra no Index. Vê-se que ele acompanhara o movimento da Reforma "".

75.— DIOGO DO eOUTO (1542 Í6I6), de Lisboa, é o di- gQO continuador de Barros a quem, se n?lo e^uala pelo estilo vence como narrador e apreciador dos factos ". Tendo pai*tido aos dezasete anos para a Indi^ Ih tevo^casião de observar os sucessos que des- /$reveu. Foi amigo pessoal de Camões a quem acompanhou para a inetrôpole em-tí^. Regressando depois á índia, morreu em Gôa com 74 anos. Para o conhecimento integral da obra e do valor de Couto muito

^ Lisboa, 1532; reímpr. em 1869 jantameate com o Diálogo com doxta filhoê êtúè. . . sob o títalo Compilação de váriaa obroê do inêigne Joam d* Bar- ro$.., êtírve de segunda parte à eompilaçào dos monges da Cartucha de Evora^ Porto, 1869, 1 vol.

« Lisboa, 1539.

* Lbtd., 1540« Nês^e vol. se encontra o pequeno DiaMgo em loavor da QOflsa liDgaagem reprod. em 1785 pelos Monges da Cartuxa de Évora, e em 1917 pelo BoL da BiU da Univ. de Coimbra.

* Ibid.. 1540. 5 Ibid., lnH3.

« Kd. de 1655 e 1740. H4 ed. independente de 1791. '^ As 1.** eds. sSn raríssimas. Os monges da Cartaxa de Évora fizeraiu nir-- Compilação de várias obras (Cartinha, Gram. e Dial. da viciosa vergo- nha), Lisboa, 1785. Ma^ cfr. Errata para servir de apendix â Compilação,,. Coimbra, 1830 págs.) E* d«^ Joaquim Inácio de Freitas que descobriu nesta reimp. 173 erros! O Conde de Azevedo deu em 1869 á estampa uma também chamada. Com/F//0pAo. . . (Rôpka f\ Diálogos com dois filhos). A biogr. do his- toriador trm de ser refeita em maitos pontos pois Severim de F^ria, lo>^ cit., incorre em laennas e cm s, e as?im também os que nele se f andaram c >mo P. Chacras rxcm Novos ensaios críticos^ 177-199, etc. Vid. António BaíSo, Documen- tos inéditos sobre J. de Barros, Coimbra, 1917. Ter-so-hiam perdido para sempre Oécada da Africa e o Tratado de Geografia que se sabe com certeza ele ter *H»to? éeg** Comanieaçao do Sr. A. Baião á Acad. das Sc. de Lisboa BoL da xt, 51.

172 HIflfÓBIÁ LirmULTDSA POKTUQUlftSA

deyeiti opncorrer as investigações altimamente feitas no Arquivo da Torre do Tombo, onde os originais das Dec. contendo partes nSo conhecidas^ como sãm as passag^^ns cortadas pela censura ir^quisito- rial ^ e na Bibl. Maoicipal do Porto, onde se descobria um exemplar das Dec. 8.* e 9/, cópia talvez do original ^.

Encarregado de continuar as Décadas de Barros fê-lo com^ miperíor critério e com muita independência. A estas qualidades deve atribuir-se certamente o roubo que lhe fizeram das Décadcts origi- nais 8/ e 9.% das quais temos apenas para as suprir meros epílogos feitos por ele próprio '. Sobre a decadência dos portugueses na índia escreveu: Observações sabre as principais caibas da decadência dós portugueses na Asia^ escritas em forma de diálogo com o ti- tuio de Soldado prático *; e uma biografia curiosa e l>em escrita com o titulo de: Vida d& D, Pardo de Lima Pereira ^. Tem ainda outras obras de somenos valor. Couto é um çsti lista claro e correcto.

A sua vasta obra •;-as nove décadas compreendiam noventa li'' vros é um repositório interessante, em que o autpr trabalhou cora um amor de verdade e de sinceridade verdadeiramante notáveis *.

76. DAMIÃO DE GÓES (1501-1574), de Alenquer, ocupa um logar distintíssimo entre os nossos clássicos e está acima deles pelo seu espirito livre e enciclopédico. Deveu isso talvoz á sua edu- cação. Começando cedo a frequentar a corte de D. Manoel nela rece- beu essa educação, sendo despachado para a feitoria de Flandres e empreendendo cedo o giro das suas viajens, nao para a Africa ou para a índia, como a maioria dos seus conterrâneos, mas para a £u-

1 Sr. João Grave, Para a hist. da Lit, Quinhentista no mesmo BoL, zi, 1041.

Vide Severim de Faria nos Discursos Vários cl.® vol. daa suas Dê- codas, ed. de 173€.

3 Al.* Dec. de Couto saiu com este titulo: ^Década quarta da Asia»^ Dos feitos que os portug. fizeram na conquista e descobrimento das terras e ma- res do Oriente, Lisboa, 1602, Tomon a numeração de 4." por ser continuação feita sobre a 3.*, que Barros deixara ainda impressa em suí^ vida. Passados anos porém veiu a imprimir-se a Décad^ -#.* do mesmo Bar» os, que por morte deste ncára manuscrita e informe. Temos pois doas Décadas quartas^ cuda uma de seu autor. A 5.* e 6.*— 1612; 7.»— 1616; 8.a_ 1673. A última ed. é de Lisboa, 1778-1788, 14 vola. Innoc, Dicc, BibL, ii, 153 e ix, 123.

Lisboa, 1790.

5 Publicada em 1765.

O sucessor de Couto foi António Bocarro, que escrevfu a Década 13'^ da História da índia, ed. diiigida por Lima Feiner e publicada em 1876 com prefácio de Bulhão Pato. entre as Décadas dos do-s auto» es uma lacunn f 12 anos. A rbra de Bocarro abrange somente o período de 5 anos, 1612 a *<fo Vid. Inoc, Dic. i e viu; o dito Prefácio de B. Pato e BoL da Sep^^o d& Acad. das Sc. de Lisboa, iv, 1911, pág. 424, comuuicação do fc>' Azeyedo.

OIPÍTULO III SBCOLA ITAUAVA OU ^UlVaniTlSTA 173

ropa, para os centros mais distintos pelas aíirmaçSes literárias e

•cientificas, onde se demorou vinte e um anos podendo dizer-se que nSo

houve centro afamado pela sua cultura que êle nSo visitasse* *En-

carregado de várias missSes diplomáticas nas principais cortes dB,

£iiropa o desempenho desse cargo oficial ofereceu*lhe o ensejo

se relacionar coro as primeiras individualidades da época. Lutero e

Melanchthon, o cardeal Bembo, o historiador Olau Magno eram seus

amigos. Tratou com Erasmo ^, o demolidor temivel do Elogio dq

loucuray que também foi seu mestre e aínigo dedicado. Álbrect Dii-

rer, o famoso pintor alemão, tirou-Ihe o retrato. Educado nesta forte

escok, com a inteligência da sua têmpera^ estava preparado para ser

mais do que um cronista crédulo e simples. Foi-o na realidade e isso

o perdeu. De volta á pátria, encarregado em 1558 pelo cardeal D^

Enrique, escreveu a Crónica de D. Manoel, *, a que te haviam

escusado Rui de Pina, J. de Qurros e outros. ^

Esse trabsflho l»»vou lhe nove anos e fez com que escrevesse

também a Crónica do Príncipe D. João ' como introdução ao rei* ^

nado de D. Manoel. O desassombro e «altiva coragem com qun foram

redigifias as páginas da crónica do rei venturoso podem calcular-se

pela guerra movida ao seu autor, gn rra que teve o st^u epíl ígo na

prisão de Góes a 4 de abril de 157!. O nobre velho contava ent^

70 anos. À inquisição,- que por duas vezes vira fugir a sua presa ^,

cev<»a-He na pobre vitima durante mais de ano e meio. E' justo dizer

que a família agradou singularmente a situnç^ do historiador, vindo

depor contrn êle uma sobrinha e o genro ! Por fim e depois de vários

rogos, qiiási s m forças e «chíMO (h^ usagro e sarna por toilo o corpo,

' « pradentÍ!<8Ímo e graviaairao E^rismo UetTodam*. . . príncipe de

toda a doiitriífa el(K{úcQcia, . . . por eap'ieo de ciniso inesea com ello em Friííorgo d*^ Briáiyoia pousai...», do Prologo k trad. do Ottào Maior êu da Velhice. Cfr, Notíci*. aur le^ rapports í<'fi7'm«oi'í avec Damien do Gocs^ artigo do Affffuaire, d? l'Univ. e.iih. Louvain, 1.853, pág. '21'à, repnb. por Eugénio do Canto, Li^b^a, 1ÍÍ12, f.lh-

' Chrôntca. , . dividida em quadro partes. Lisboa: A a dnas primeiras! partea sam de 1 6B, as outraa de 1567; á." ed , Lisboa, 1619; 3 *, 1749; 4.*, 1790 Para a composição desta ol»rí aerri i-sc em parte doa Anais de Arzila Crónica inéd. do sto. xvi de Bernardo Kodrignes, Liaboa, 1915 e iy2U, 2 voU., pabl. pela Aoad. daa Se. de Lisboa sob a dire»-çào prodcieuto de David Ltêpft^. 4^

3 Chr, do Príncipe. Dom Joam^ Rei que foi destes regnos se/undo do nome, em qne surpáriamente se tratam aa comias siístãnciais que ndes aco7i- fixaram do dta do aeu nasoimenlo até o em qae el liei dom Afoní^o seu pai faíeceu, Lisboa, 1557. Oatraa ed. : I7á4, 17'.)0. \W.y.

* Iitéditoã Gotaianos, coligidos e anotados por Gilberme J. C. Hen- riques. V''l- 1 Docoinentoa (|8'.in); ii O proceaao na liHiuiaição (!h'.l9), <ioes foi dfMinnciado primeiramente a inqaiaiçito de Kvora pm 1015 e segunda vex 4 de L«ísliria em 1560. bobre estes trabalhos vêr Sr. J. de Vaaconcelos, Archeologo P^rt., iv.

174 HISTÓBIA DA LITBBATUKA ^RTCODÂSA

que me fJta pouco para me julgarem leproso», agravado ainda o ddbil organismo por outras doenças perigosas/foi mau lado em penitên- cia para o mosteiro da Batalha (16 de dezembro de 1572), onde não estaria muito tempo, pois se achava em sua casa e vivendo com os seus quando lhe sobreveiu a morte em circunstâncias ainda nSo de todo elucidadas. Uma versão do m^iado do sc^culo xvil diz: « que sendo velho e efit&nd<í ao fogo, recolhida sua família, caiu nele com um acidente, e ao outro dia o acharam morto e meio queima'^oj). Foi enterrado na igreja de Nossa Senhora da Várzea, em Alenquer *.

Além das duas crónicas mencionadas, de Damião de Góes o Livro de Marco TvJtlio Ciceram^ chamado Catão mayor^ ou da Velhice e em latim a Embaixada, do Prestes João ; a Féj Religião e Costumes dos Etíopes ; Descrição de Lisboa, etc. * A justa lama, porém, de que goza provêm-lhe principalmente da Crónica de D, Manoel, tam fiel e imparcial como bem e^crita, e tam bem escrita que alguns criti'0S o colocaram no mimero dos clássicos l go a seguir a - João de Barros, .ocupando este o primeiro lugar. *

77. -FERNÃO LOPES DE CASTANHEDA (f 1550), de

Santarém, emparceira louvavelmente com -os croni>tiift menciona- dos. Tendo sido seu pai nomeado para» exercer o cargo de ouvidor de Goa acompanhou-o em 1528 e trabalhou «por alcançar saber muito particularmente o que até àquele tempo fizerão os portugueses no descobrimento e conquista da índia, e ÍHto n&o de pei^soas quais- ' quer senão de Capitães e Fidalgos, que o sabido muito bem por serem presentes nos conselhos das caueas e na execução delas e por cartas

* J. de Vasconcelos. Damiào de Góes, Porto 1807; Fd., Músicos Portug. ; íS. Viterbo, Dnmxào de Gota e D, António Pinheiro^ Coimbra, 18^5 {Inêtxíuto, xLii); Id., Estudos sobre D. de G. ilbid., xlvixlvii). Menendes y PeUyo, Jiibt. de los Heter, Espaholes, ii, 12íí-143í Th. Braga, Uist. àa Univ, cit., I. António Baião, Episódios dramáticos da Inquisição Pcr(M//uesn, I, 1919, onde publie.i 4 cartas inéd. O Arch. Hist Portug , i, n.** 11, pg. 379 traz um fauí^imile da assinatara de. Damião de Goe^; Gailiíertne J. C. Henri- ques, A hUdiogr, Goesiana, (separata do ti Boi. da Soe. de Btbl. Barb, Ma- chado», Lisboa, 1911).

2 Veneza, 1534, e liisboa, 1845.

V Heiínp. na CoL doa obras de autor0 clássicos portugueses que e.')cre- Veram em Intim, que no fim do séc, xviii saíram rta Impr. da Univ. de Coim- bra. Sam 16 vols. [cfr. Inoc, Dic. /?iò/,,. ii, 8^). A de Goe« é a 1.' Goa {Damiani): OpuncnUi, quae iv Hispânia iVusfrata conlinenlur, 17í)l, 1 \o\.

* I*ara história bibliográfica e critica desta Crónica importa ter pre- sente o E/eucho das variantes e diferenças notàveAs qtte se eTusontram na /•' p, da Cr. ddret D. Manoel. Po. to, i86tí de que Eugénio do Canto deu em I9l2 a reprodução, e a que em 1913 acrescentou Aditamento á reyrod, do Elenoho dos Variantesj publ. ambos na Impr. da Univ. de Coimbra.

GApfrOLO in BSCOtil 1TALIAN4 OU QUINBBNnSTÁ 175

6 samiriog» . . »• Nestas pesquisàB gastou Castanheda vinte anos o melhor tempo da sua idad^^, declara-o êle próprio. Foi toda a ri- qaeza que trouxe da índia. Taro desprotegido e tam falto de meios «e viu, qne para poder manter-se teve de aceitar em Coimbra o lugar de bedel da Faculdade das Artes, corrector das impressSed da Uni- versidade e guarda do seu cartório e da^sua Livraria. ^ A nua rbra, de correcta e elegante linguagem, tem o titulo História do desço- hrimenio e conquista da índia pelos portugueses, ' .

Ele compreendeu a missão do historiador: «... háde fazer as deligêneias que eu fiz e vêr a terra de que háde tratar como eu vi», A sua imparcialidade criou-lhe inimigos que impediram a pabli- <»ção dos liv. 9 e 10. £' Diogo do Couto quem nitra o caso do Fequerimento de vários fidalgos a D. João iii qiie< julgando-se agravados em suas honras pelo que deles se dizia a respeito do 2,^ oêrco de Dro, onde tinham estado, pediam ao R«i mandasse eliminar o 10.<> liv. !

78.— ANTÓNIO GALVÃO (1446-1557), é umá personalidade extraordinária do século .x^-parecendo a sua vida ticais imsjgináiia <jae rial. Nascido na índia, foi nomeado governador de Maluco, tor- nando-se notável no desempenho -te cargo pela sua rftctidSo e jus- tiça. TaI prestígio alcançou como magistrado que lhe foi oferecido o trono de Ternate * ! .Voltando ao reino debalde solicitou qualquer mercê, que lhe garantisse a subsistência. Durante d^^zasete anos vi- veu de esmolas de amigos tendo por último de recolher ao hospital de Lisboa onde faleceu a 11 de março 1557 ! A publicação pôs- toma da aua obra tem o título :

Tratado dos diversos e desvairados caminhos por onde nos tempos poMsados a pimenta e especiaria veyo da índia ás nossas partes, e assim de todos os descobrimentos antigos e modernos que 900 feitos em a era de lõôO *.

Vt* aos cuidados e diligências do seíi amigo e testamenteiro Sousa Tavares, que devemos a publicação de tam curioso trabalho, notável pela singeleza e brevidade aliados a uma certa elegância de dizer muito peculiar deste autor.

* A obra foi devidida em 10 1., mas o 9.** e o 10.** nnnca foram impres- . O 1.* livro ?afu em 1551. Foi depois reimpr. em 1554 ; o 2.® 1. apareceu

1554; 3.«. 4.*» e o ó.»* 1557 ; 6/' e 7.°— 1554 ; o S.**— 1561. Sam rarís- um(». Do 1.^ 1. ha nova ei. em Lisboa, 1791 e de toda a obra, ibid., 1833, 7 volg,

* Does. respectivos pnbl. no An. da Univ. dt Coimbra^ 1V02, p. 40 e 51. ' Tequena ilha perteneente ao arquipélago das MoIucas.

* Li-boa, 1563, 80 fl*! ; reimpressaa em Lisboa, \TM. Foi trad. para inglâ) oa eoleeçSo Haklajt Socicty, l8t>2, 8."" gs. de xu-242 págs.

176 HI8TÓKIA DA LITBRATUKA FOBTUQUASA

79. Outros Historiadores deste século. Avultado D&mero de escritores iluscra ainda este sécalo, mas deles impossível é dar aqui desenvoldda notícia. Nomeemos: GASPAR CORREIA (1495- 1563?) qut) viveu largos anos na índia, para onde foi aos 17 anos' em 1512 e cujos UBOB, costumes e superstições conheceu muito bem, deixan- do-n«s de tudo iirna d«scriçSo muito pitoresca e interessante nas Lm- dm da índia, que abraçam os sacesdos passados nessa região detide 1497 até lôõO ^^ e que se sam inferieres pela forma ás décadas de Barros e até se quisserem á rude história d^^astanheda^ sfto quanto á Bub^tílncia muito superiores àquelas e ainda á humilde, "mas <*vi- dentemente sincera narrativa de Castanheda c . , . Em rela^ á via- gem do descobrimento como em relaçlto a tautos outros pontos da nossa história da índia, as Lendas levam decidida vantagem ao que escreveram Barros e Castanheda > '. Na disposição das scenas, escre- veu BolhSo Pato, vivesa das cores, pitoresco dos painéis. •• leva vantaic^^m .a todos os no^ses escritores do Oriente '. Em 1561 vivia em Malaca trabalhando nas Landas quando foi assassinado por assa- Uriádrs de D. Estevão Hí4 Gam». .

BRÁS DE ALBUQUERQUE (1500-1580) filho natural do grande AfonFo íift Albuquerque, cuja biogratía traçou nos seus Comentários,, de Afonso de Albuquerque^ * em estilo simples que Jofto de Barros caracterizava como de nua e chã pintura, e onde esta grande fi- gura do noFso império colonial se retrata t^m bem como nas suas próprias Cartas por mais de três séculos inéditas, e que igualmente o acreditam como escritor K

Citemos ainda, omitin^io outros menos importantes: FR. BER- NARDO DA CRUZ (1530?) que, tendo acompanhado como capelão a ex- pedição a Alcacer-Qêbir, escreveu por 1586 a Crónica de Z>. Sebos- tiãoy que í^ó foi publicada em 1837 por A. Herculano e ò Dr. A. O. Paiva '' DUARTE NUNES DE LIÀO (f 1608) que, àlêm das obras gnima- ticais, jidiiinte citadas, escreveu uma Descrição do reino de Porfu-

^ Publicailas depois de mais tres eócnlos pela Ácad. R. d^s Sc. de Lishoa, pob a direcção de Rodrigo José de Lima Felner, em 4 tomos, cada mo devidido cm parte 1.*^ e 2.*, l8f)K-R64.

* A. flerenlano e Ca»ieio de Paiva, Boieiro de viagem de Voêco da Gama, LiHl^(»a, 38f>l, pájr. ix.

^ No puitacio á JJúada Í3^ de. A. Bocarra, ix.

* Lisboa, 1557, outras fd. : lf)76, 1774,

^ Carias de Af. d-e Albuquerque Bcyitidns de doe. que as elucidam p^ddicadas de ordem ,. da Acad. li. das !Sc. de Lisboa, 6 v«ls. 1884-1 9 J6. Sobre o grande vulto Af. de Albuquerque vid. BoL da Seg* CY. da €ad. das aS>. dt J.isboa, iv, (1911), páp. 4íl e seg. ; Aroh, HisL, i, n.** 1*2 (1908), 410, art. de S. Viterbo; António Baião, Af. d' A., LisUa, 1914.

^ Nesía Crónica se baaeia em grande parte a Chr. do Cardeal Hd D. lle.nriqve. e vida de Miguei de Moura, anónima, publicada pela «JSoc. pro- pagadora dos conhecimentos úteis» em 1840.

CAPÍTULO III BSOOLA ITALIAHA. OU QUUfHBHTISTÁ 177

joi ^y e a Primeira parte doê Crónicae doa reis de Portugal refor^ tkada» '•

Ao meflmo aator se deve o t^v coligt<1o por ordem de D. Se- buetiSo as Leiê Eêtravagantes de Portugal *. Merecem citar-se tam- bém DUARTE GALVÃO (1446 1517) autor da Crónica de D. Afoneo Hmriqueí ^ deslustrada pior várias lendas e erros históricos, e MilUEL LEITÀ» DE ANDRADE (1553-1632) de Pedrógão, bispado de Ciâmbra, oio porque escrevesse uma obra rigorosamente iiistórica, e com são critério ao lado de formofiissimas líricas de Camões poâ algumas das relíquias apócrifas mas porque a sua Miscelânea contêm nume- rosos dados interessantes sobre a história e tradigSea, usos e costumes populares, e até. sobre muitos factos de que êla foi t^'8temuQh'i ocular, como os que se reft^rem á batalha de Alcaccr-Qèbir, á qu'il assistiu 6 dfpois da qual ficou prisioneiro, libertando-se ao fim de i«li<um tempo, para ir cair sob an garras de Filipa ii, que o mandou prender por êle seguir o partido do Prior do Crato *.

80. SAMUEL US6UE. judeu português, nascido em Lis- bos, talvez doa princípios do fiéc. XVi, de>xon-nos uma obra qu» me- rece lo^r aparte, a que pôs o fítulo de Consolaçam ds tribulações de Israel (F<*rrara, 153?), que é un>a expobiçâo dialogada das per- s*-gtiiç5e8 sofridas pelos Judeus em todas as edades at6 ao t^impo do autor.

A elegância e pureza com que está escrita e certos dados lústórícM que ministra ooin proficiência, pois que de muitos dol^s foi tectemanha presencial o sèu autor ^^ dào á obra de Usque um locar primacial na nossa literatura* Poucas vezes a linguagem atingiu tam

* Lisboa, 1610; 2.* 17^5. Mencioneinoa corao sabsidios para os tt^dot arqueológicos de Portagal as Varina aníiguidadea de Fortugaf, Liâboa, 1625 [2.^ ed. 1*^41, de Gaspar Estaç*; irmão de Baltazar Estaco, aator do lirro Sonetos, canções éclogas e outras rimas, Coimbra, 1604. Este é clássico de 2.* ordem e nm dos 1.*" imitadores do Gongorismo.

» Lisboa, 1600; e j677, 1774.

* Lisboa, 1669. e Coimbra, 1796.

* Lisboa, 17*26; 1727? Aada quáai sempre encadernada com as dos «ioeo reis secínintes de Rni de Pina.

* Miêcefânea do sitio de Nossa Senhora da Luz do Pedrógão Grande, ^ptirecimefUo da sim santa imagem^ fundação do seu convento^ e da See de Lis- ^, expugnação dela, -perda de tirei Sehastiãon. K que seja nobreza, Henlior, Stnhoria^ Vassalo delHei, Bico ^owicm, Infanção^ Corte, Cortezin, Mizara, lie.- ^'tftucia t Tirar o chapeo, eprodig os, . . Lisboa, 16^29, 1 vol. ; outra ed. lh67. Brito Rebelo poblicoa no Arch, ffist,, i, 12 e seg, urna biogiíiliu n.uito com- pleta do Bim|>átioo e aventareiro prisioneiro de Alcacer-Qebir.

* Vid. na minha Gol. Subsídios para o eatiido da História da TAtera- ^wo portuguesa, os vols, via, xx e x, onde se publicou a obra completa du «•moei Uique, Coimbra, 1906,

V

178 HISTÓRIA DA LTBBÀTUKA P0BTUaUÊ&4

Bentido canho de naturalidade espontânea e deaafectida. Impregnada duma VKga tonaliiade mística inapira-nos simpatia pela Cíiasa qaa defende, comunica-noa a solidariedade da sua dôr. Oa aftu?' queixumes partem dum coraçAo que chora sentidamente as perseguições dos seina irm&os de raça e fazem lembrar por vezes os trenos bíblicos maia senr tidos e mais impregnados de poesia.

VIAJENS

81. Narrativas de viajens; seus autores. E' muita

fecanda a literatura deste período em narraç3es de vinjen^. Oa por- tuguêees. levados a ignotas regiõet*, sulcando mares nunca dantes na- vegadoB, deviam sentir a necessidade transmitir aos vindouroa a notícia dos estranhos êucessos de quo eram autores ou testemunhas. Foi o que originou essa curiosa série de livros de viajens, que ocupa lòe:ar tam proeminente na nossa história literária. CitemoH ANTONtO TENREIRO autor do Itinerário em que se contem como na índia veo por terra a... Portugal ^; FRANCIòCO ALVARES, que escreveu a Ver- dadeira informação das terras do Preste João das índias */ FR. PAN- TALEÃO DE AVEIRO autor do Itinerário da •Terra Santa *; JOÃO DE LUCENA (1549 1600), que nos deixou a História da vida do Padre Francisco Xavier com muitas curiosidades da 'Ásia, obra que mere- ceu ser traduzida em várias línguas e que merecia também ser mais lida do que é por estar escrita em estilo correcto e puro, podendo afoutamente colocar-se o seu autor entre os melhores clássicos da lín- gua ^ (t 1501; GASPAR FRUGTUOSO, autor das Saudades da Terra ou História das ilhas dos Açorei, o mais esclarecido de todos os cro- nistas micaelenses, em parte publicada ^\ FR. JOÀO DOS SANTOS^ autor da Ethiopia Oriental ^; GASPAR BARREIROS, (f 1574) sobrinho de João de Barros, que na sua Corographia descreve os legares por onde pai^sou quando foi enviado por D. Henrique, em 1546, a agra-

' Ed. de 1560, 1565, 1829 e jantamente com as Peregrit^açiks de F. Mendes Pinto— 1725 e l7B2.

> 1540; ed. de 1883 ilustr. com diversos fac-similes da Imp. Nac. de Lisboa.

3 Ed. de 1593. 1596, 1603, 1685, 1721, 1732.

* 1600-, 1788 em4 vols.

^ Saudades da terra. . . de que se conhecia a descriçSo do VaLe da» Furnas [na Viajem de B. J. de Sena Freitas, íí7-105], mas em 1873 Álvaro Rodrigues de Azevedo puhl. a Uist. das ilhas de Porto Santo, Madeira^ Desertas e Selvagens, em 1876, Fr, Maria Supico e J. Pedro Cardoso deram a Hist. Geneal. de S. Miguel e nos três 1.**^ vols. do Ârch, dos Açores apareceram diferentes excerptos, com comentários, correcções, etc. Da obra de Frataoso diversas cópias Mas. Cfr. Inoc, Dic, BibL^ ix, 414. *

« Évora, 1609.

CAPITULO 111 ESCOLA ITALIAKA OU QUINHBNTIBTA 170

dBcer ao Pontífice P;inIo iii a elevação ao cardinalato ^; FERNÃO CAR^ DiM autor da Narrativa apistolar de uma viajem e miêêão jesuitica pela Bahia j llheos^ Porto-Sèguro, Pernambuco, Espirito tíanto *; FR. GASPAR DA CRUZ, que deixou notíciaB preciosas no seu Tratado doA cousas da China e de Ormuz »; DUARTE BARBOSA, (f 1521) oompa- nhriro de Feroando de Magalhães nas suas aventurosas pt$regrinaç5es e cuja obra conhecemos atravez da trad. italiana ootejnda com uma cópia portu2:nê'H, conforme saiu na Col. de Noticias para a Hist^ t Geogr. das Naqdes Ultramarinas ^, etc. A todos sobresae, porém^

82 FERNÃO MENDES PINTO (por 1514.1583). Nata- ral de Montemór-o- Velho, êst^ escritor é pela sua vida aventurosa ama das figuras mais extraordinárias deste século. Filho de pais mo- destíssimos, o seu espirito aventureiro levon-o cedo a deixar Portu* gnl. Viajou durante vinte anos pela Etiópia, Arábia, China, Tartária e pek maior parte do arquipélago oriental. As desgraças que lhe racederam conta- as êle com extrema simplicidade. Treze vezes foi cativo, de2saset<s vendido. Teve ocasiSo de observar as religiões e os costumes de numerosos povos primeiro que qualquer outro viajante ^nrop^^u. Foi do que viu e ouviu que compôs a sua notabilístsima Peregrinação « um dos livros de mais popular e aprazível lição que jamais se escreveram em idioma algum » ^. A riqueza do vocabulá- rio, a^ propriedade das expressSe^, a justa medida do estilo, a singe- leza unida ao vigor, o colorido e a vida que irrompem espontâneos das suas narrações^ fazem de Fernão Mendes Pinto um dos vultos mais simpáticos da nossa literatura e da sua Peregrinação um dos livros mais dignos de ser consultado por todos aquelas que tenham amor pela nossa bela lingua. A acusação de noveleiro ^ e « descarado mentiroso > como o apoda o ípglês Donald Fergusson "^ caiu por terra

^ 1561, impr. em Coimbra, com vários opúsculos, por seu irmão Lopo de Barros.

* Lisboa, IS'!:?, pablicada por deligências de Varnhagen.

' Évora, 1570; reimpr. com a Perigrinação de F. Mendes Pinto em 1829. "

* Cfr. laoe. Die, BihL, ii, 206. A obra foi trad. para inglês pela fioklv^ Sodeíj/, Londres, 1866.

* Livraria Clássica Poriug,^ t. xvi, parte 2.», onde vem a páp:. 6-19 a flotteia da vida e obra de F. M, Pinto escrita por J. Castilho ; Sr. Cristóvão Ayres, F, Mendes Pinto ^-suMdioB para a sua biografia e para ò estudo da sua o^a. Memoria apresentada á Acad. R, doa Sc, dt Lisboa, Lisboa, 19U4; Id., ■^. M, P. to Japão,, Pontoa controversos.,, Lisboa, lí»06 Sr. Jordão A. de ^^tas. Subsídios para a bibliografia portuguesa relativa ao estudo da lingua jfiponesa e para a hiogr, de F, Mendes Pinto, . . Coimbra, 1905.

* Teve- se até o mau gosto de inventar este trocadilho: Fernão, Mentes f MifUo,

' Nas Letters from Portuguese Captives in Canton written in 153^ ^••d Í5B6»

Í80 aUTÒBIA DA LITBRATDSA POKTUOUftSA

Bendo hoje unânimes ob críticos, dentro e íóta de Portagal *, em o oonRÍderarem como autor fidedigno e original. Pode e báde hav^er, escrete um dos seus melhores biógrafos, alguma cousa de exagerado oa menos exacto nis suas narrativa^, miS o facto é que fontes de divf^rsa natureza o estSo hje justificando como informador geral- mente verdadeiro e oris^inal '. Âs suat» Perej^rinaí^Zes foram traduzi- das para alem^lo, inglês, í rances e espanhol e contam hoja numero- sas ediç3«*s no nosso país '. B^m o merec^ím: riqueza e variedade de linguagem, primores de estilo, propriedade nas locuções dam á obra d<«. ^[endes Pinto legar euiin-:;ute entre os melhores escritos da nossa língua *.

83. Não queremos deixar de mencionar no número das nar- ra çfies qu" atraem a atenção do estudioso, as que formam a compi- laçã«i da História trágicomaritima em que se escrevem cronologica- mente 08 naufrágios que tiveram as naus de Portugal^ depois qite se jjôs em ejcer cicio a navegação da Índia ^.

Et^ta colecção de reUço-ís dos naufrágios, que 8(»freram os na- veg «dores portugueses, empreendida por Bernardo Gomes de Brito (1688), ó um modelo de linguagem siínphs, espontílnea e verdadei- ram»*T»t' popular. í>am doze es^sas relaçS^»; 1.* do naufrágio do Galeão grande S. João na Terra do Natal (1552), que deu o assunto do poema de J. Corte- R<^al Naufrágio de Sepúlveda e d«8 f htân- cias de Camões (v. 46-48), pois é do naufrágio de Manoel de ^^ousa

* O último historiador que ae ocupa do Japão, sua de^^coberta, introila- çâo do cristianismo, etc. julga quf» se Mendes Pmto em particalariíiades usou das galas e enfeites durna rica fantasia, manteve a narração, cm geral, <:omo viva e fií4 imagem da vida e costumes dos povos da Ásia Oriental. Cfr. líaos H.ias, Gesr/iichie des Chrietentums %n Japnn^ c. iii. Este cap. foi trad. por Sousa Monteiro e publicado no BoL da Segunda Cfatsc ii (,1^*10) pág. 84.

s ^r. ('nrist. Ayres, ob. cíí., e log. cii.^ pág. HH. Idêntico é o jaizo do

'último biógrafo dH Mendes Pint<>, Brito líobclo, na Xolícia que precede a ed.

(jue dirigiu (;m 1908, pág. xxni. Ant*'» do aparecimento (le8t;\ ed. a de 18"2Í) em

4 vols. era con-iideiada a melhor por seguir exactamtínte a !.■ e conter muitas

adições e correções.

'•* A 1.* é de 1614, a última, que ê a 8.*, saiu em 1908, em 4 vola. sob a direcção de Brito Kebolo.

* Sobre a parte ({ue no trabalho de F. Mendes t(M-ia tido o editor da 1." ed., o cronista F. de Andrade, veja-se o pstudo de Castilho, ciL na pág. ante- rior, e Sr. Christ. Airns, oh. cit.^ pág. r)'2 d. Ambos impugnam a opiniuo do Conde da Ericeira I). Fr. Xivier (le Meneses, soj^nndo o qjal Andrade prepa- rara e dirigira a ed., serrinin-íte dnj* iifuinn i.f ipie Meudet* Pinto deixara. Uiz com inttíira justiça Brito Rí'lt^*io: «■.pu-m conhece a palidez de estilo dAste cronirfta, tanto em prosa, como em verso. rci'onh«u:e prontamente uo fulgor da prona de F. Mendes, a sua grande inteligência e o vigor de um eatii« que prende e domina...». Loy, cit., pág. xxxii.

* Km 2 tomos, o 1.^ de 1735, o 2.« de 173(i.

I

OArfTUI^ III BSOOLA ITAItUVA OV ttaiSHaSTISTA ÍSM.

de Sqiúlveda, que e8Ba narraçSo se ocapa; 2.* da Não 3, B&nto DO Cabo da Bòa-Eaperança (15õ4) ; 3/ da Náo Corèceiçào noa Bai- xos de Pêro do« Banhos (15õõ); 4/ daa Náos Águia e Garça (1509); 5/ da Náo Sarda Maria da Barca (1559); 6/ da Náo S. Paulo na ilha de Sumatra (1561); 7/ da Náo Jorge de Albu- querque Codho (1565); 8/ da Náo Santiago (1585); da Náo S. Tomé (1589); 10.' da Náo Santo Alberto (1589); 11.' da Náo S. Francisco (1596 ; 12.' do Galeão S. Tiago (1604) K

ELOQUÊNCIA

84. Eloquência sagrada. Sam deficientÍBsimOB oa do- cnmentoB para q. estudo da eloquência nêate periodO| reduzida por en- quanto á forma religiosa do púlpito. Alguns oradores sabemos terem exist)do tam somente pelas reíerêacias dos historiadores, como Fer- dSo Lopes que cita o dominicano Fr. Rodrigo ' e os franciscanos Fr. Pedro *, Fr. João Xira * e Fr. Rodrigo de Sintra de quem o velho cronista diz que era « notável e grande pregador mui letrado e teó- logo 9 ^j 08 quais todos \'iveram no tempo de D. João i.

No século XV adquiriram fama de notáveis pregadores o domt- bicano Fr. Vicente de Lisboa, que publicou excelentes instruções para os que se entregavam ao ministério do púlpito ^, e o carmelita Fr. Jo3o Sobrinho, que foi pregador de Afonso v. O que carateríza 08 trabalhos oratórios destes, como de todos os oradores anteriores ao século XVI, é, segundo Cenáculo, a familiaridade no dizer, a sim- plicidade do estilo em harmonia com a poaca instrução do auditório, as referências frequentea_á Sagrada Escritura e aos Santos Padres* Uas a seiência teológica tomou grande impulso com o Concílio de Trento (1545-1563) e disso se resentiu a eloquência do púlpito, como &io podia deixar de eer desde que Portugal tomou parte e muito iK>táyel nessa grande reunião das forças católicas. Como se sabe o Condlio Tridentino compreende três períodos distintos. I A êle assistiram como delegados do nosso país no tempo da

primeira abertura (1545-1547) trôs grandes teólogos dominicanos Fr. Jerónimo da Azambuja ou Oleaster ; Fr. Jorge de Santiago e ir, Gaspar dos R?is, e o bispo do Porto D. Fr. Baltazar Limpo.

^ A alguns exemplares da História Trágico- Marítima anda anexo am

B.** vol. formado de várias Rtlftçòts avulsxa (Cfr. Innoc, Dic, BilK, i, 378).

* CVófitca dt D, João /, p. iii, c. u.

* Ihid,, p, ji, c. ílviu.

* Pnd., p, ju, c. LI e xcr.

^ Ibid,^ p. I, C. CLI.

^ Cenáculo, Mtm, hièt. do ministério do púljjito.

12

16S mflT<SBIA DA UTBBATUmA rOBTUGUAlA

Na segunda abertura (1547-1559) estiyeram como embaixado- res de D. Jofto in Diogo da Silva, Diogo de Grouvêa, JoSo Pais e Diogo Mendes de Vasconcelos, assistindo também o bispo de Silves D. JoBo de Melo e D. EstevSo de Almeida, que tinha a sua diocese em Espanha.

Na terceira e última abertura (1561-1563), entre os muitos portugueses que assistiram diatinguiram-se o arcebispo de Braga, D. Fr, Bartolomeu dos Mártires, o bispo de Coimbra D. Fr. Jo8o Soa- res, o doutor Diogo de Paiva de Andrade, Frei Francisco Foreiro, da ordem dos Pregadores e D. Gaspar do Casal, bispo de Leiria.

Estes e outros teólogos portugueses alcançaram justificada fama

Çelo conhecimento profundo da Sagrada Escritura e dos Padres da gre|a« ^ sen4o alguns apontados como notáveis pregadores, D. Fr. Jofto Soares, por ex., venerado pelos seus contemporâneos como um segundo Demóstenes, diz Fr. Luís de Sousa. ' No último quartel do ' século XVI citam-se alguns escritores, que foram igualmente modelos d ) boa eh^quência como Fr. Pedro Calvo, Fr. António Feio, o padre Luís Alvares, o bispo de Miranda e Leiria D. António Pinheiro ' e outros. Falaremos aqui tam somente dos mais ilustres.

85. -D. FR. BAflTOLOMEU DOS MÁRTIRES (1514-

1590), o célebre arcebispo de Braga, cuja mitra renunciou em troca da pas do convento de Viana, que fundara, àlêm das obras latinas ^ deixou um Catecismo da Doutrina Cristã ^ em estilo correcto e simples. Como orador, segundo o dizer do seu biógrafo» tinha um estilo de pregar cmui diferente do que usava na cÔrte.«. deixou flores de retórica, explicaç<!Ses agudas, e conceitos levantados, que serviam para orelhas delicadas, e entendimentos mimosos para os penetrar, e fazer efeito a doutrina medicinal a modo de bom g^sado e entregou-se todo a termos ch&os e doutrina dará, que servisse para todos . , . » ^

86.- FR. LUÍS DE GRANADA (1504-1588), embom espa^

nhol, pois nasceu na cidade do seu apelido, viveu, ensinou, pregou e morreu em Portugal. Temos dele um Compêndio da doiUrina cristã '^

1 P. António Pereira de Figueiredo, Portugueses nos CondUss Grersds, 1 vol., 1787.

* Vida do Are, i, ii, c. 17.

' As soas obras foram pablicadas em 2 vols., 1784 e 1785 por Bento José de Sonsa Farinha.

^ Vid. Barbosa Machado, Bibl, Lwit,

s Imp. em Braga, 1564. Ontras ed.: 1574, 1594, 1608, 1617, 1628, 1666, 1666, 1674, 1684, 1765, 1785.

Fr. Luís da Sousa, i,. c. xiy (ed. 1857). "v Lisboa, 1559; outras: 1780, 1789.

OApfruLO III asooLÁ ivaluna ou QuiNirnrtisTA ISft

de linguagem simples^ mas apurada. A este Compêndio andam ane- xos 08 seus SemiòeSy pelos qaais foi celebrado como orador de íanm. Veio para Portugal a pedido do cardeal D. Henrique, de quem foi ooofessor e conselheiro e de quem escreTeu uma biografia, .que se oonsenra ainda inédita, como várias cartas ultimamente descobertas. Considerando clássico entre nós, Fr. Luís de Granada é no pais vi- zinho tido como um dos creadores da prosa espanhola ^.

87. -FR. MIGUEL DOS SANTOS (f 1595) é contado no

oAipero doa mais abalizados oradores do seu tempo. Dos sermSes mais notável e o único hoje conhecido é- o pregado nas exéquias de D. SebastiSo celebradas nos Jerónimos, em Belém, a 19 de setem- kro de 1578 •.

88. -DIOGO DE PAIVA DE ANDRADE (1528-1573), um

dos representantea de Portugal no Concilio de Trento, onde feri en*- TÍado por D. SebastiSo, quando apenas contava trinta e três anos, irmSo do cronista Francisco de Andrade, foi também orador notável, como' 86 pode ajuizar pelos 181 sermSes, que dele restam '• O au- ditório diante do qual se fazia ouvir era sempre do mais selecto. Ga leus serinClea sam, no dizer de Cenáculo, juntamente com os de Fr. Joio de Ceita, Fr. Filipe da Luz, Francisco Fernandes GalvSo e Fr. Tomás da Veiga, os mais seguros exemplares onde o orador português pode eatudar o génio da liogua, pu^^eza de diçSo, e mais (]iialidades no que diz respeito ao exercício concinatório. Escreveu oontra Kenmitz e a £*vor dos jesuítas vários trabalhos em latim, que o acreditaram no seu século como abalisado teólogo *.

8f.— FR. FRANCISeO FERNANDES GALVÃO (1564.

1610) distinguiu^se muito cedo no púlpito. Indo a Roma em 1578 o Papa admirou*o tanto que lhe deu um« c^nezia em Coimbra e os CardeaÍB chamavam-lhe o doutor português^ Os seus sermões póstu- mos foram três volumes '^, escritos em linguagem pura e muito fa- miliar.

1 Cfr. Boi. da 2.^ Cl. da Aead. R. doê Sc. de Lisboa, x, (1903), 228.

^ duas e<L, uma de Camilo Casttlo Branco nas Virttutes AnUgoê, e Mtra no aemaDárío de Braga a1>us, Z.^ ano, n.° 9-19.

^ Distriboidos em 8 vol., coatendo o 1.^ (1603) os sermdes do Advento e Festas do Natal; o 2.<^ (1604) de N. Senhora e dos Santos e o S.^" (1615) de Qninsma, fúnebres e outros.

A Cfr. Barbosa, BíU. Imí., t, 684; Panorama^ i, 14.

» Sermões de Quaresma (1611); 2.<> Festas dos Santos (1616); 3/ Fes- tM de JesQs Cristo (1616).

184 HISTÓRIA DA laTBBATURA PORTUOtTÂSA

MORALISTAS

90. VárioB escritoreg cultivam nêdte fiéculo uma literatura filosóíico-moral. íalamca do historiador Barrce. Um outro B^rroa o Dr. João de Barros (n. depois de 1553) publicou o Espelho de casados e é autor da Geografia de entre Douro e Minho e Trás-os- Montes pouco publicada *; Martim Afonso de Miranda deixou no Tempo de agorOy em forma dialogai; conselhos e sentenças morais*; D, Joana da Gama (j^lSSB) professa ou, pelo menos, recolhida dum convento de Évora, CBcreveu os Ditos da Freira. . . nos quais 8$ contem sentenças mui notáveis e avisos necessários 'y D. Franci-^» de Portugal, d^ixou também Sentenças morais e criteriosas ^. Mas há, sobretudo, três escritores que aqui merecem mençSo honrosissima. Todos três sam considerados mestres da língua, que muito opulenta- ram de termos novos e adequados. A pureia, o gôsto^ a soavidiide, aam qualidades que adornam a linguagem de que usaram: HEITOR PINTO (f 1584), oa Covilhã, lente de Escritura na Universidade de Coimbra, autor da Imagem da vida christà ^, obra de grande erudi- ção sagrada e profana escrita em estilo cheio de correcção e altamente instrutivo. Quem quiser ver a verdadeira imagem da eloquência do divino Platão e do eloquentíssimo Cicero, escreve Dias Gomes *, leia os Diálogos oeste autor. Além da mais pura e santa moral crib^, que constituo o fuudo especial dos ditos diálogos, neles admirará, quem os ler, em grau superior todas as graças do estilo, o mais puro e correcto. AMADOR ARRÁEZ (f 1600) de Beja, celebrado bispo de Por- talegre, autor dos Diálogos ' que o imortalizaram como dos primeiros mestres da língua, e em que trabalhou afanosamente no silencio do Colégio do Carmo de Coimbra, a que se recolhera, tendo resigoido bispado em 1596. «... Posso com verdade dizer muito^mais me aver

^ 1.» ed., rarÍ9BÍma 1540', 2.' ed. por Tito de Noronha e António Ca- bral, Porto, 1874. A ed. da Geografia forma o vol. v da Col. deMss. publ. pela Oftmara do Porto, 1919.

2 1.*^ p. 1622, 2.a p. 1624, reimpr. por Farinha era 1785.

Tem janto Trovas^ vilancetcs e sonetos, eantiga» t romanceB agora novamente feitos pelo mesmo autor. 1.» ed. raríssima, Évora, 1555, reimp. por Tito dfe Noronha no Porto, 1872, Vid. também Inoc, Dice., x, 140.

Vid. na minha Col. Subsídios para o estudo da história da Literatura portuguesa, o vol. yn Sentenças de £). Francisco de PortugaL Coimbra, 1905, 1 Tol.

Imagem. , , ordenada por diálogos. [Sam 11 diálogos], eto. Coimbra, l." parte, 1563, 1565, 1567, 1572. 1580, 1591, 1592, 1603. A 2.» parte saiu em 1572, 1575, 1580, 1585, Í591, 1592, 1593, 16S1, 1843.

Obras Poéticas, pág. 29.

' Ed. de Coimbra, 1589. 1604, 1846.

CAPÍTULO 111 BSCOLÁ ITALlABA OU QUMBlCMTlflTl 186

fand^do na diligência, estado e substancia das cousaS; que no artifi- cio ft el«>^ancia das frases pulidas, palavras trocadas e oonsonâncias de cláatiolaa em que nunca achei sabor, nem foram de meu estSImago». Se m algum dos Diálogoê houvéssemos de dar preferência no- meariamoa como primeiro o 4.^ Da Gloria e Triunfo dos Lusita' mt. A obra termma com uma poesia encomiástica a Coimbra In hxidem Coíím&rtcB— ccidade onde gastei a flor da minha adolescêaciai cidade VAronii, que me succedeu em lugar de Pátria.. *; FR. TOME' DE JESUS (f 1582), irmfto do teóloga Diogo de Paiva de Andrade e do cronista Francisco de Andrade, nomeados. Escreveu os Tra- bdhos de Jesuf ^ obra elogiada por nacionais e e&tranjeiros, muitas Tez^s trad. em várias línguas ' e que, na opiniSo do bispo de Viseu^ ma parte do atrevimento e beleza das metaphoras vence indispensa» Tclmente todos os nossos escríptores de «rosa». Se em Fr. Luís de SoQsa, continua o abalisado crítico, o gosto se satisfaz mais, o estudo DÍi) aproveita tanto; e se Vieira não é menos abundante, e é mais rp^lar, na audácia metaphorica fica int^^iramente a perder de vista. E quein, no que toca á prosa portuguesa, sobr^sai a Vieira e a Sousa, mais ninguém lhe resta entre os nossos de que possa ganhar victóriax) K Nomeado por D. Sebastião para acompanhar como capelSo o exército que se destinava a Alcácer foi ferido no dia do combate e ficou cativo sf ndo levado para Mequinés e lançado no fundo d&m calabouço. Tirado dessa prisão pelo embaixador português D. Francisco da Costa, qu'' fô^-a a Marrocos tratar da redenç&o dos cativos, não quis voltar a Portugal por nSo julgar terminada a sua missão evangélica. Faleceu em Marrocos rodeado de veneração. Trabalhos foram escritos no m**io de todas as privações. « Cometi esta obra, diz êle, havendo por mnú^tria e muito segredo papel e tinta e escrevendo as mais das Tez^H sem maia luz que a que entrava pelas gretas d^ porta ou agu- Uieiros e buracos das paredes »•»

ROMANCES DESTE PERÍODO

91. Entre os romances deste século, ao lado da Menina e ^ça, da Crónica do imperador Clarimundo, e do Memorial dos cavaleiros da Segunda Távola redonda, citados; merece mencio-

' Dr. Simões de Castro, Gaia Hist. do Yiajante em Coimbra, 2.* ei,8688. ' ^

* Parte i, Lisbos, maito depois da morte em 1602 ; Parte ii, 1609. As àu» partes na ed. de 1666, num voi. ; 3.» ed. 1733 ; 4.», 1781, 5.% 18«5.

' 8r. E. Preetage, BoL da Seg, CL [da Acad, das Sc, de Lisboa]^ ti^ fcic. !,•, oat. de 1910. pág. 13.

* Obras, I, 292.

(

166 H18TÓBLA. OA UTUULTDBA POSTUGUÉSA

nar-Be em primeiro lagar o Palmeirim de Inglaterra de FRANCISCO DE MOKAIS (-^ 1572) que alguns eBcritoreSi como Gayangos ^^ têem Etribuido ao toledano Luís Hurtado, romance que obteve grande voga, aendo traduzido para francês e italiano, e do. qual CervanteB no D. Quixote dizia, pela boca duma das suas personagens, que me- recia que se fizei^e para êle •otra cajá como la que halló Alejandro en loa despojos de Dário, que la diputó para guardar en eUa ha obras dei poeta Homero » (1.* P., cap* 6.®).

A circunstância que motivou os debates sobre a originalidade do Palmeirim foi o ter aparecido publicado o texto espanhol ' em 1548 ao passo que o português ' apareceu em 1567, quási vinte anos depois. Mas está provado a) que Francif«co de Morais foi quem es- creveu originalmente em português o Palmeirim em 1544 dfdi- cando-o á infanta D. Maria, filha de el-rei D. Manuel e^a rainha D. Leonor e irmS de D. João iii. Além deste argumento deduzido da dedicatória do romance, h) a simpatia nele manifestada em vi- rios lugares por Portugal e seus heróis, c) a exactidSo das referências locais o topográficas, d) a adjectivaçáo apropriada que lhes dedica, e) a concordância dalgumas passagens com o critério que deveria ter Morais conforme se colhe da sua biografia, por ex., o episódio tam conhecido das quatro damas francesas (cap. 137 a 148), que se ajusta

Serfeitamente* a IVIorais e fica inexplicável quando suposessemos o vro da autoria de Huardo, que nâo oferece dúvidas atualmente nem entre nós * nem entre autores estranjeiros '^, ainda mesmo espanhóis *, o cotejo dos textos recaindo sobre «omissões, adições e mudanças», tudo esclarece e resolve a questão em favor do autor português '^.

* Discurso Pt eliminar nos Libros de Cabalíerias (Ed. Rivadeneyra), Ma- drid, 1867.

« Libro dei muy esforçado caballerò Palmeirim de Inglaterra hijo dei-

rei D. Duardos... ITÁS. Libro segundo... en el qual se prosiguen y han

fin los muy dukes amores que tuvo con la Infanta Polinarda,.,^ Toledo, 1548.

* Crónica de Palmeirim de Inglaterra, 1^ e 2.^ p. E?ora, \^1,— -Cró- nica do famoso e muito esforçado cavalero... filho dei rey D. Duardos^ Lisboa, 1592. E mais, Lisboa, 1786, 3 vol^., e ibid., 3 vola., 1852.

* Diz o Dr. José Maria Rodrigues nas Fontes dos Lusíadas do cap. •Camões e Fr. de Morais»^ nota «A questão... está definitivamente resolvida».

^ Conclusão do estudo de Purses: uA careful examtnation. . . leaves no douht.,, that the Palm. of Engl was originaUy written in portug. and.that the autor WãS F. de Aí.» (Pág. 362).

* Cfr. Cejador e Franca na sua Hist. de la lengua y lit. castellana, ii« 188 (Madrid, 1915) nem sequer alude questão ^

■^ tiôbre este ponto vid. M. Odorieo Mendes, Opúsculo àcêrca do Pai' meirim de Inglaterra, etc, Lisboa, 1860; N. D. Benjumea, Discurso sobre el P. de I., Lisboa, 1876; D Harolina Michaêlis, Versuch uber den Palmeirim, Halle, 1883; Inoc, Dicc, BibL, ni, 14, e ix, 349 e F. Pinheiro, Curso, ^tc., pág, 18 e Resumo, pág; 99 e sobretudo WilJiam Edward Purser, Palmeirim of England, some remarks on this Eomance and on the controversy concerning

CAPÍTULO 111 X800LA ITALl AVA OU QUUIHBVTIBTA 18T

O Palmeirim teve dois oontíntiadores: DIOGO FERNANDES, quA escrayeu a 3." e 4.* partes com o titulo: D. Duardoa \ e BALTASAR 80NÇALVES lOBATOi autor da õ/ e 6.' partes com o título D. Clarisel da Brt^ ianha •.

92.- FERNÃO ALVARES DO ORIENTE (1540-1596),

de Qo^y escr^^ven á imitflç^o <da Arcádia de Samiazaro a sua novela {Mstoril Lusitânia transformada^ obra em prosa e verso, aonde figa- nm sob forma alegórica o próprio autor e muitos escritores dos fins do século XVI ^ Mencionemos, enfim, GONÇALO FERNANDES TRANCOSO, que bob o titulo Contos 'e histórias de proveito e exemplo compôs trinta e nove conto», alguns da tradição popular, muitos imitados de Boccácio e outros autores e que sam, no dizer de Faria e Sousa *, o o primeiro livro de novelas que saiu á luz em Espanha. ^

93. Obras poéticas escritas em latim. JA em outro

lagar mencionamos alguns escritores que compuseram todas ou al- gumas das sua<t obras na lingua latina, á semelhança do que na mesma época fizeram os escritores de outras nacionalidades. Cle- Dsrdo, Vaseu, DamiSo de Góes, D. Jeróaimo Osório, André de Re- sende, e as poetisas Sigêas e Joana Vaz pertencem a este número. A afinidade entre a língua portu«ruêsa e a latina explica muito bom a existência desta ordem de trabalhos, como nos egualmento a nsSo da cultura da língua srrêga em Portugal, que teve o seu apo- geu DO reinado de D. JoAo iii ^. Estas obras nSo sam propriamente do domínio da literatura e por isso nos limitamos a registar aquelas

its aathorship, Donblin, 1904, I vol., qae prova a prioridade portuguesa do afa- mado romanize, e de qae se eneontra a súraala dos piúncipais argutneutos no Bolm éoL síeg. CL da Acad, R. das Sc, ii, Lisboa, 1910, 281-299, nam lúoido relatório de Soma i*onteíro.

^ Terceira parte da Cr. do P, de IngL, na qual se tratam as grande» tavalarias de seu filho o Privcipe D. Duardos segundo. ... 1?>87. E no mesmo to). : Quarta parte da Cr. do P. de Ingl. onde se contam os feitos do valorosa Prinápe o secundo D. Duardos seu filho. . . Ibid.

* Quinta e sexta parte. , . Crónica do famoso D. Clarisel da Bretanha, filho do Príncipe D. Duardos,.., Lisboa, 1602.

» Ed. «596. E mais duas— 1607 e 1787.

* Europa Portuguesa, m, p. iv, c. 8.**, n.® 67. Os primeiros contos de Trancoso saíram em 1585 com o títuio Contos Proveitosos, em duas partes; depois da morte do autor, em 1596, é que apareceram em trê^ partt^s e eom o títalo que damos no texto. Outras ed. 16.33, 1646, 1681, 1710. A ed. mais yal- gv, mas ainda a^sim rara, é de 1772.

' Fr. Fort'inato de S. Boaventura, Memoria do começo^ progresso e de «odeticw de liti. grega em Portttgal, etc, in-Mem. da Acad. R. das Sc. de Lisboa^ ▼in, p. 1.* e Dr. A. J. Gronçalves Guimarães, O Grego em Fortugaí, Coimbra,

L_

^

188 RMTdElA DA Lm&áTITlLà POBrUOUftSA

indivídaalidade8| que na Boa maioria viveram no século xvi e escre- Toram o latim com rara elegância. Andam as saaa obras reunidas no CorpuÊ iUusirium poetarum lusitanorum, qui latine scripserwU^ dado i laz pelo Padre António dos Reis e aumentado com a vida dos poétaa pelo Padre Manuel Monteiro ^ Encontram-se nesta obra re- imidaa as produções latinas dos seguintes pnétas :

vol. I : Pedro Sanches, Henrique Caiad0| Manuel da Costa^ Diogo Mendea de Vasconcelos, Miguel de C^ibedo e António de Ca- bedo; todas reimpn excepto as do 1.^;

vol. n: JoSo de Melo de Sousa ; ]& publ. em Lugduni, 1615;

vol. III : Diogo de Paiva de An trade ■, também impr.;

vol. IV: Lopo SerrSo, (já impr. Libboa, 1Õ79) Fr. Francisco de Bareelop, (também impr. Coimbra, 1583} ;

vol. V : Fr. Tomé de Faria, bispo de Targa, e António de Fi- gueira Durfto (também impr.) ;

vol. VI: Fr. Francisco de Santo Agostinho de Macedo;

vol. VII : Continuação desde Fr. Francisco de Macedo, Jorge Coelho e António de Gotrvêa;

vol. VIII : As do Editor P.* António dos Reis '.

Antes daa produções poéticas de caria autor, episrrama^, sone- tos, cartas, etc., primeiramente a sua biografia (Viía), e a se- guir, a tranHoriçSo dos elogios que lhe foram dirigidos por outros co- legaa (testimonia authorumj. Destaquemos dentre essas produções: a intitulada Ckãnleidos FÔbre o cerco de Chaul, muito admirada en- tre 08 eetranjeiros, a de Fr, Tomé de Faria no vol. V que é a tra- duçSo para latim dos Lusíadas, e a que mais parece romance púnico que romano "iy conforme escreveu D. FrAiicisco Manuel de Melo no Hospital das Letras; e no vol. VJ, as de Fr. Francisco de S. Agos- tinho de Macedo, de Coimbra, a principio jesuíta, depois capacho obser- vante, polígrafo afamado que em Vf*neza, em 1667, defendeu por eapaço de oito dias teses que acusam uma erudição verdadeiramente ei^traordinária ^, pelo que mereceu que aquela República mandasse colocar o seu retrato na Bibl. de S. Marcos, autor das tragi-comédias

» Lisboa, 1746-48, 8 vols.

s Filho do cronista Francisco de Andrade e sobrinho do Dr. Diogo de Paiva de Andrade, orador notável, mencionado nn texto como autor do poema ChauUidoBf sobre o cerco de Chaol, sendo gtvemador desia cidade D. Francisoo Mascarenhas e vice-rei da índia D. Lnís de Ataíde (1570-1571). Digníssimo de ser cantado era este cerco, porqae nele se não praticaram menos ^entilesas^ de annas que no de Diu em tempo de D. JoSo Mascarenhas. Com 12 c. é imite- çfio do poeta Estacio. Escreveu ainda o Casamento Fer feito (1.* ed., 1680; 2.*; 1726; 8.* a. a. [1905]), e o Exame de Antiguidade, [1616].

» Cfr. Innoc. da Silva, Die. BxhL, i. 244.

^ Vid. a sua enumeração no cit. t n do Corpuè e J. S. Ribeiro, Ptí- ■tctroa ÍTaçQ9t ttc., cit., pág. 24.

CAPÍTULa 111 MOOLA ITÁLIAMA OU QUINHSNTISTA IS^*

Orpheu e Jacob compostaB para a corte de Luia xiv e nela repre- sentadas. Â8 tésPB tinham o nome «Rugitus Literarii Sancti Marci» e tgem a data de 26 de aet. de 1667. Outra pruva do sou »aber e memória está na d<ffHBa em Roma por trê» diaa de concla^^ões D& (mnt geibilu As concIud5eé de Veneza terminaram por este pasmoso desafio « será Hcito a qtiem qoiser argumentar, eBtabelccer e per- guntar tudo aquilo que bem lhe parecer» \

TRABALHOS FILOLÓGICOS

94. Gramáticos portuguôses. Devemos assinalar nesta época o aparecimento das primeiras gramática»^ portuguêijas. Portu- gal antec«^deu nêite género as outras naçSes civilizada» da Europa, pois qne F«mao de Oliveira, (1507 1581)-, o autor da Fabrica das Náos •, publiccu a tua Gramática da língtAa portuguesa em 1536 ', seguindo- >*e-lh*» três ou quatro anos depois João de BarroB, que pu- blicfto a sua Cartinha para aprender a ler em 1539, e a Bua Gra- medica em 1540.

Do bispo D. Fr. Jofto Soares é tambêiu uma Cartinha sobre regras de gramática, tendo 8parecidb várias outras por êbteb mfsmos tempoe. Duvidou -se até da prioridade que teria Joíío de Barros 6Ôbre D. JifSo Soares questão, por ventura insolúvel, versando f.ôbre f tam mindoB volnmes, tam distantes de nós e que a di.^^cunoaidade que lhes sôbreveiu ainda hoje encrua as esperanças de se acharem ». O que é certo é ter-»e public«tdo a Gramática de Oliveira era 1536 e três anos depiâs a de J. de Barros. Antes de 1540 coloca o erudito Cenáculo outra Cartinha para ensinar a lêr. , ^ *.

Ora os primeiros esforços para constituir uma gramátic^i fran- cesa datam de l^igret que publicou o Tretté de la grammère fran- (ptzB em 1550, à^. Estienne que em 1557 deu á estampa o Traicté de la gr. franqoine e de Rnmus, cuja Grammlrs é no ano de 1562 *. Ao lado dos CrabulhoB que procuravam estabeltct^r as leis gramaticais

^ Ferdinand Denis Resume, 220. Sousa Viterbo traçou -lhe a biogr. no ifrrA. Hist Port.. vin (1910), 199-206 (cí»m retrato). No Boi. da Acãd. das Se. Lisboa th (1913), 48, ^êem algumas notas curiosas qa« se contõem nom itíDeririo encríto por um P.® Agostinho Descalço, que foi a Roma em 1666 para tratar de negóeioe da Ordem. £ncontrando-se com Fr. Agostinho., que vinha de Venea, conta dos prqjétos qne êle concebia.

H. Lopes de Mendonça, O P. F. de Oliveira e a sua obra náutica; ««SI. compreendendo um estudo biog. . . e a 1.^ reprod. typogr. do seu traba- lho inád. 'Livro da Fabrica das Nãos., Li»boa, 1898.

Reimp. DO Porto, 1871. ^ Inquisição, Damxão de Goet t Feriiào d^Oli- ^fôraj^adoê por da ^Serões n.*> 14, agcsto 1106, cit.

Memórias hiêtárieaê^ 11, 65. ^

Nyrop, Gr. hiH, de ia langue française, 1899, pág . 54.

lt# KI0TÓBIA DA LlTSlLàTUEA POBTUGUÉSA

poringaesaB pelo seu confronto com «s rec^rfliB latinas, estudos simi- íãrm diíundem-se. PÊRO DE M4G4LHAES DE G4NDAV0 publica em 1574 as Regras de escrever a ortografia du língua portugwea com um diálogo em defensão da mesma; DUARTE NUNES DE LiAO em 1576 es- xsreve a ortografia da língua portugwsa e em Í606 a Origem da da língua portuguesa ^ ; enfim JERÓNIMO CARDOSO dárnos em 1570 o seu Diccionario latino-lusitanico et lusitanico-latínum^

95. SciOntiStas. Sob esta categoria devemos mencionar alguns escritores, que criaram nome imorredouro peloa- seus trabalhos, como PEDRO NUNES (1492-1644), célebre cosmógrafo e geómetra, in- ventor do nónio e cujas obras o colocam na vanguarda dos i-ábios da sua época ^; GARCIA DA ORTA, médico e botâuico di^tintis8imo que com o muito que entutíou na índia, onde residiu durante trinta anos, escreveu os Colóquios dos siniplices e drogas, ainda hoje estimado e devidamente considerado ', sábio a quem o nosso Épico dedicou a ode que começa

Aquelle único exemplo

De pobreza heróica e ousadia *

p que primeiro que ninguém fez conhecer a cólera morbo numa descripção tam viva como exacta K

' Nrm vol. cora o titulo: Origem je Orihogr, da língua portug, . . Lis- boa, 1784. Outra ed.: 1866. Outras obras Hiêt. da província de iS.ta Cruz, a <fii« vídgarmente chamamos Brasil, Lisboa, 1576 *, Rio de Jan. 1858 e deste mesmo ano, Lisboa, pela Acad. R. dos Se. [E* o n.^ 3 da Col. di s Opuse. reimp, rdor ^voo8 á hi.t, doB navegações, etc.]; Tratado da Terra do Brasil .., ^ lAnhos^ 1826 [No t. IV da Col. de noticias para a hxsL e geogr, das Nações tdtram,]

' Vid. relação das suas obras em Freire de Carvalho, ob. ctí., nota (54), pág. 312. doas sam em português Tratado em defensam da carta de nOi- rear, publ. em 1537 no Tratado da sphera e reirap. na liev, de Engenharia mi- litar, 1911-1912; e Tratado sobre certas dúvidas de navegação, publ. no mesmo livro c na mesma Revista reimp. em 1913. Cfr. também Mem. da Acad. nal da» SC. de Lisboa, A. da Litt., vii, 250-83; e os artigos de Rodolfo Guimarães entre outros na revista de Coimbra, Instituto, 1901, pág. 396; sr. J. Bensaode, L^Aa- 'íronomie nautique au Portugal à l*hpoque des grandes découvertes^ Berne, 1912 e sr. Prof. Luciano P. da Silva na Hev, da Univ. de Coimbra, ii (1913) pág. 127 e 246; Ant. Baião, O matemático P. N, e sua família á luz de does, inéd. Coimbra, 1915, 1 folh. Eto.

* Vid. ed. de Juiomenha, Obras, ii, 275.

* 1." ed., Gf>a, 1563, os Colóquios foram trad. para latim, francês, ita- liano e espanhol. O conde de Fiealho deu em 1891 uma bela ed. (Lisboa, 2 vols.), e um estudo 8«^bre o grande botânico com o título Garcia da Horta e o seu tempo, Lisboa, 1886; A. Tomás Pires, Estudos e notas elvenses, viu Gar- cia da Horta, Elvas, 1905, 1 folh. ; Garcia da Horta (An apreciation) por Cle- ments Markham na Rev. de Hist. 1913.

" Apud Gazeta medica do Porto, setembro de 1901, p. 437.

«ApfrULO 111 S800LÁ ITALIAXA OU QUUmSVTlSTA .llt

Uendonemos ainda ANTÓNIO LUlS, que na Universidade ezplicaya e Gbleno na própria língua grega e que parece ter entre- tísIo a lei da atrtiçào universal enunciada por Newton \

Ao lado ddstes autores outros como Pedro da Fonseoa, Se-* bastilo do Conto, Baltasar Alvares, que se tomaram notáveis no de- minio filosófico, pela exposiçSo das suas próprias teorias, ou pelos oomentárioa das de autores estranhos. Era sobretudo Aristóteles quem rasava nas esodas, foi também esse autor ^ego quem exgotou o melhor dos esforços dos filósofos portugueses '•

Entre todos âstes muito se destinguiu o célebre FRANCISCO SANCHES (1562.1632), médico e filósofo, que ensinou sobretudo no estranjeiro e que defendeu o sceticismo scientífíco na mais conhecida dss soas obras, a que pôs o titulo de De multum nobilif et prima wiweraali êcientia quod nihil scitur, pouco vertida para por- togais*.

^ Freife, ob. cU., pág. 116.

* Â evolnçfio das dootrinas filosóficas em Portugal nSo encontroa ainda Ma hiftoríador. O trabalho do Dr. Lopes Praça História da Filosofia em Partagal nas suas relações com o movimento geral da Filosofia (Coimbra, 1868) é apenas um esboço e, demais, incompleto. No entretanto é o único trabalho da aonjunto, que pode dar-nos idéa do interessante movimento fílosófíoo portngnês ^Bnate o seu eorto, mas glorioso reinado. Apontems aos estudiosos doas mono- S^^Bfiaa de grande valor do Ur, Joaqaim de Carvalho, António de Gouveia e o Aris» ^•tilismo da Renascença, Coimbra, 1916; e Leão Hebreu filósofo, ibid., 1918.

' Dr, Fr. S. filósofo e médico, trad e notas de Basílio de Vasconcelos BA Reo. de Hist., 1913, n.^ 6 e segs. E. Senchet no seu trabalho Essal sur la ffféOiode de Francisco de Sanches, prof de philosophie et de medicine à VUniv. 4e Tottloase, Lavai, 1904, 1 voL, afirma qne Sanches não é portares, nas apanhei, imseido em Tai. O estudo de Senchet traz o retrato de Sancnaa.

ANTOLOGIA

SÉCULO XVI

POESIA

I

Soneto

Busque Amor novas artes, novo engenho Para matar-me, e novas esquivanças ; Que nSo pode tirar-me as esperanças, Pois mal me tirará o que eu não tenho.

Olhai de quQ esperanças me mantenho ! Vede que perigosas seguranças! Pois não temo contrastes nem mudanças. Andando em bravo mar, perdido o lenho.

Mas com quanto não pode haver desgosto Onde esperança falta, me esconde Amor hum mal, que mata e não se vê.

Que dias ha que na alma me tée posto Hum nSo sei que, que nasce não sei onde ; Vem não sei cqmo ; e doe não sei porqu«.

Camões, ObrOi, (ed, Juramenka), ji, son. zt.

II

Outro

Alma minha gentil, que te partiste Tão cedo desta vida descontente. Repousa no Ceo eternamente, £ viva eu na terra sempre triste.

Se no assento Ethereo, onde subiste, Memoria desta vida se consente, Não te esqueças de aquelie amor ardente Que ja nos olhos meus tão puro viste.

IM AMTOU>é\A VOMU

E se vires que pôde merecer-te AlgQa cousa a áòr que me ficou Da mágoa, sem remédio, de perder-te ;

Roga a Deos que teus anROS encurto*. Que tio cedo de me leve a v6r-te, ' Qu&o cedo de meus olhos te levou.

Id., ikid», SOA. XIX.

III

Outrq

Sete annos de pastor Jacob servia Labfio, pai de Rachel, serrana bella. Mas n8« servia ao pai, servia ,a ella, Que a ella por premio pertendia.

Os dias na esperança de um dia Passava, contentando- se com vê-la : Porém o pai, usando de cauteila, Em logar de Rachel lhe deu a Lia.

Vendo o triste pastor que com enganos Assi lhe era negada a sua pastora. Como se a nflo tivera merecida ;

Começou a servir outros sete annos. Dizendo : Mais servira, se nflo fora Para tflo longo amor tflo curta a vida.

UL, ibid,^ soa., XXIX.

IV

Outro

Horas breves de meu contentamento. Nunca me pareceu quando vos tinha. Que vos visse mudadas tflo asinha £m tão compridos annos de tormento.

As altas torres, que fundei no vento. Levou, em fim, o vento que as sostinha; Do mal que me ficou a culpa é minha. Pois sobre cousas vflas fiz fundamento.

Amor com brandas mostras apparece; Tudo. possível faz, tudo assegura; Mas logo no melhor desaparece.

Estranho mal ! Estranha desventura f Por um pequeno bem, que desíallece. Um beui aventurar, que sempre durai

Id.« t5fd., son. oLxxx.

ZTl

ISii

Voltas.

MOTIvb ALHEO

Vós, Senhora, tudo tendes, SenSo que tendes os olhos verdes.

VOLTAS

Dotou em vós natureza O summo da períeiçSo; Que o que em vós é senflo, £' em outras gentileza ; O verde nlo se despreza, Que, agora que vós os tendes, São bellos os olhos verdes.

Id. ibid.y iT, 64.

Ouro e azul é a melhor Cór, por que a gente se perde; Mas a graça doesse verde Tira a graça a toda a côr. Fica agora sendo a flor A côr, que nos olhos tendes. Porque sSo vossos e "verdes.

MOTB

Descalça vai para a fonte Leonor pela verdura ; Vai formosa, e nflo segura.

VOLTAS

Leva na cabeça o pote, O testo nas mSos de prata, Cinta de fina escarlata, Sainho de cha malote > ; Traz a Vasqtitnba ^ de cote *, Mais branca que a neve pura ; Vai formosa, e não segura.

Id. t&td., 97.

Descobre a touca a garganta, Cabellos de ouro entrançado. Fita de côr d'encarnado, Tão linda que o mundo espanta ;: Chove nella graça tanta. Que graça á formosura ; Vai formosa e n9o segura.

VII

Endechas a Barbara •scrava.

Aquella captlva, Qtie me tem captivo. Porque nella vivo. n9o quer que viva. Eu nunca vi rosa Em suaves molhos. Que paia meus olhos Fosse mais formosa.

Ntm no campo flores, Nem no Ceo estrelias, Me parecem Delias, Come os meus amores, Rosto singular. Olhos socegados, Pretos e cansados, . Mas não de matar.

^ Rodrigues Lobo glosou o mesmo mote, qne adeante, no seu logar respectivo, tianscrevcm-os. £ com qne suavidade o fez!

9 Do b. latim Cannehtum de Camelus^ tecido de pêlo de camelo.

9 Vasqiiinha^ vestido antigo de mnlher, também empregado em Gil Vicentt, Cèroê, I, 313.

* Fnsc ádv. quotidianamente, do lat guotidie.

196

ÀMTQJJOÚlk POB8IA

Uma (raçi viva, Que nelles lhe mora, Para ser Senhora De quem é captiva. Pretos os cabellos. Onde o povo vão. Perde opinião, Que os louros sSo bellos.

PretidSo de amor, Tão doce a fic^ura Que a neve lhe jura Que trocara a cor.

lá.ibid,, 118.

1

Sobolos rios que v8o ^ Por Babylonia, me achei. Onde sentado chorei As lembranças de Si9o, E quanto nella passei. Alli o rio corrente De meus o*hos foi manado; E tudo bem comparado, Babylonia ao mal prosente, Sião ao tempo passado.

Leda mansidSo, Que o siso acompanha: Bem parece estranha, Mas barbara n9o.

Presença serena, Que a formenta amansa Nella em fim descansa Toda minha pena. Esta é a captiva. Que me tem captivo ; E pois nella vivo, E' força que viva.

VIII 1 Redondllhas.

Vi aquillo que mais vai. Que então se entende melhor. Quanto mais. perdido for: Vi ao bem succeder mal, E ao mal muito peor, E vi com muito trabalho Comprar arrependimento: Vi nenhum contentamento, E vejo-me a mi, que espalho Tristes palavras ao vento.

Alii lembranças contentes. Na alma se representaram ; E minhas cousas ausentes Se fizeram tão presentes, Como se nunca passaram. Alli, despois de acordado, Co'o rosto banhado em agoa, D'este sonho imaginado, Vi que todo o bem passado, Kão é gosto, mas é mágoa

Bem são rios estas agoas. Com que a lanho este papel i. Bem parece ser cruel Variedade do mágoas, E confusão de Babel. Como homem, que por exemplo Dos trances, em que se achou, Despois qje a guerra deixou. Pelas paredes do templo Suas armas pendurou :

E vi, que todos os damnos Se causavam das mudanças, E as mudanças dos annos ; Onde vi quantos enganos Faz o tempo ás esperanças. Alli vi o maior bem. Quão pouco espaço qu2 dura, O mal quão depressa vem, E quão triste estado tem. Quem se fia da ventura.

Assi, despois qu'assentei, Que tudo o tempo gastava, Da tristeza que tomei, Nos salgueiros pendurei Os órgãos com que cantava. Aquelle instrumento ledo, ^ Deixei da vida passada ; Dizendo: Musica amada, Deixo-vos neste arvoredo A' memoria consagrada.

* Esta poesia é uma paráfrase do Salmo 136. No simbolismo do Poeta Sião designa Lisboa c o céo, Babilónia umas vezes a índia e outras o mundo em ^r&l.

* Sobolos = Are. de super sober ou sobre em que a troca doe cm O se ex- plica por influência da labial, segundo L. de Vasc, Lições de FU., 91.

'

•ácvLo xn

197

II

Fnuta minha, que tanifendo Os montes fazíeis vir Par'oade estáveis, correndo ; £ as sgoas, que iam descendo, Tomavam logo a subir; Jimais vos nâo ouvi rio Os tigres que s*amansavam» E as oveilias, que pastavam. Das bervas se fartarão» Que por vos oiivir deixavam.

»

iy^as deixar n'esta espessura O canto da mocidade. Não cuide a gente futura. Que será obra da idade O q^è é força da venton, Qu' idade, cempo, e espanto. De ver quio ligeiro passe. Nunca em mi puderam tanto. Que poscoque deixo o canto, A causa d'eii6 deixasse.

8

13

Ji nio fareis docemente Em rosas tornar abrolhos. Na ribeira florecentc ; Nem poreis freio á corrente,, £ mais se for dos meus olbos ^âo movereis a espessura, Nem podereis trazer Atraz vós a fonte pura. Pois não pudestes mover Descoacertos da ventura.

Mas em tristezas e nojos. Em gosto, e co itentamento. Por o sol. p )r neve, por vento, Tendré presente a los ofos Por quien muero tan contento. OrgSos, e frauca deixava, - Despejo mâu tão querido. No saigaeiro, qua atli estava, Qje para tropheo ficava ]3e qu^m me tinha vencido.

13

Picareis' offerecída Afama, que sempre véla, Fratita de mi tâo querida ; Porqne mudando -se a vida, Scmadam os ^rostos d'ella, Adu a tenra mocidade Prazeres accommodados ; ^ logo a maior idade Ji sente por pouquidade Aqadles gostos passados.

Mas lembranças da affeiçSo, Que alli ca jtivo me tinha. Me perguntaram então, Qu'era da musica minha. Que eu cantava em Sião : Que foi d'aquelle cantar. Das genteâ t9o celebrado, Porque o de xava de usar, Pois sempre ajuda a passar Qualquer trabalho passado.

10

14

. Um gosto, que hoje s'alcança, Amanhã o não vejo :• Abí nos traz a mudança De esperança em esperança, E <íc desejo em desejo. em vida tio escassa* esperança será forte? rnqaeza de humana sorte, Que quanto da vida passa, ^ recitando a morte.

Canta o caminhante ledo. No caminho trabalhoso, Por entre o espesso arvoredo ; E de noite o temeroso Cantando rcfrêa o medo. Canta o preso docemente, Os duros grilhões tocando; Canta o segador contente ; E o trabalhor cantando, O trabalho menos sente.

U

If8

AMTWJúmiA P0S81A

15

19

Eu qu 'estas cousas senti Valma, de mágoas tSo cheia. Como dirá, respondi, Quem alheio está de si, Doce canto em terra alheia? Como poderá cantar Quem em choro banha o peito? l\)rque, se quem trabalhar, Canta. por menos cansar, Eu s6 descansos engeito.

Terra bemaveotenNla, Se por algum m )vimento D'atma me fores tirada. Minha penna seja dada A perpttuo esquecimento. A pena d 'este desterro, Qu'eu mais desejo esculpida Fm pedra, ou em duro ferro» Essa nunca seja ouvida^ Em castigo de meu erro.

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Que n9o parece razâò. Nem seria cousa idonia, Por abrandar a paixSo Que cantasse em Babylonia As cantigas de Silo. Que quando .i muita graveza De saudade qtiebrante Esta vital fortaleza, Antes morra de tristeza, Que por abrandá-la cante.

E se eu cantar qaiser Em Babjlonia sujeite, Hierusalem, sem te ver, A voz, quando a mover, Se me congele no peito; A minha lingna ^e apega* A's fauces, pois te perdi, S'em quanto viver assi Houver tempo em que te negue. Ou que m'esqueça de ti.

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Que se o fino pensamento S6 na tristeza consiste, N8o tenho medo ao tormento : Que morrer< de puro triste, Que maior contentamento ? Ne» na frauta cantarei O que passo, e passei já, Nem menos o escreverei ; Porque a penna cansará, E eu n2k) descansarei.

Mas ó tu, terra de gloria, S'eu nunca vi tua essência, Como me lembras na ausenda, Nao me lembras na memoria, SenSo na reminiscência? Que a alma é táboa rasa, Que com a escrita doutrina Celeste tanto imagina. Que vôa da própria casa, £ sobe á pátria divina.

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22

Que se vida t9o pequena S'accrescenta cm terra estranha E se amor assi o ordena, RazSo é que canse a penna De escrever pena tamanha. Porém, se para assentar O que sente o coração, A penna me cansar, N8o canse para voar A memoria em Si9o.

N8o é logo a saudade Das terras onde nasceu A carne, mas é do Ceo, D'aqne]la santa Cidade, D'on(1e esfaima descendeu» E aquella humana figura, Que me p6de alterar, ^3o é quem se ha de buscar; £' raio da formosura. Que se deve d'amar.

BÈObLO X%1

IM

33

27

Qoe 08 olhos, e a luz que ateia O fogo que sujeita, Não do Sol, nem da candeia, E' sombra d'aquella ideia, Qtt^em Deos está mais perfeita. E os que me captivaram, Sio poderosos affeitos Qa'o8 corações têem sujeitos; Sc^bistas, que me ensinaram Máos caminhos por direitos.

E s'eu mais der a cerviz ^ A mundanos accidentes, Duros, tyrannos e urgentes, Risque-se quanto Sz Do grão livro <los viventes, E tomando na mfio» A lyra santa, e capaz D'ontra mais alta invençSo, Cale-se esta confusão, Cante-se a visão de paz.

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28

D*estes o mando tyranno M'obriga com desatino A cantar ao som do damno Cantares d 'amor profano. For versos d'amor divino. Mas eu, lustrado co*o $anto Kaio na terra de dôr, Be coofusOes, e d'espanto, Cono bel de cantar o canto, Qae se deve ào Senbor ?

Ouç4.-nie o Pastor e o Rei, Retumbe este accento santo. Mova* se no mundo espanto ; Que do que mal cantei A pallnodia canto. A vós me quero ir. Senhor e grão Capit&o Da alta torre de Sião, A*- qual não posso subir. Se me vós não dais a mão.

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Tanto pôde o benefício Da fpiçã que saúde, Qoe Qfdena que a vida mude : E o qit'ca tomei por vido. Me faz gráo para a virtude ; E faz qn'este natural Amor que tanto se preza, U)a da sombra ao real, Da particular belleza Pua a belleza geral.

t^o grão dia singular, Que na iyra em douto som Hierusalem celebrar, Lembraevos de castigar Os ruins filhos de Edom. Aquelles que tintos vão No pobre sangue innocente. Soberbos co'o poder vão, Arraza-Ios igualmente: Conheçam que humanos são.

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Flqoe logo pendurada A fianta com que tangi, O' Hierusalem sagrada, E tome a Ijrra dourada Para cantar de ti. Nlo captivo e íerrolhado Na Babylonia Infernal, Ma dos vidos desatado, Eci desta a ti levado, Pátria minba natural.

E aquelle poder tão duro Dos affectos com que venTio, QuMncendem alma e engenho; Que m 'entraram o muro Do livre arbítrio que tenho; Estes, que tão furiosos Gritando vêm a escaiar-me, Máos espíritos damnosos. Que querem como forçosos Do alicerce derribar-me ;

5N)0

AHTOLOOIA FOVBU

81

34

Detribae-os, fiquem sós. De forças fracos, imbelles ; Porque nio podemos nós. Nem com elles ir a vós, Nem sem vós tirar-nos d 'elles. Nio basta minha fraqueza Para me dar defensão, Se vós santo Capitão,» >'' J Nesta minha Fortaleza I4So puserdes guarnição

Quem com elles logo der Na pedra do furor santo, £ batendo os de^zer Na Pedra, qae veio t ser Emflm cabeça do canto : Quem logo, quando imagliia Nos vicios da carne má. Os pensamentos declina A'quclla Carne divina. Que na Cruz esteve já.

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E tu, ó carne que encantas, Filha de Babel t9o feia, Toda a miséria cheia. Que mil vezes te Jevantas Contra quem te senhoreia ; Beato pôde ser Quem co'a ajuda celeste ^Contra ti prevalecer, £ te vier a fazer O maJ que tu lhe fizeste:

Quem do vil contentamento d'este mundo visibil, Quanto ao homem for pcmibil. Passar logo entendimento Para o mundo intelligibil ; Alii achará alegria Em tudo perfeita, e cheia De t9o su^ve harmonia, Que nem por pouco recreia. Nem por sobeja enfastia»

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36

Quem com disciplina crua Se fere mais que uma vez ; Cttja alma, de vicios nua, Faz nodas na carne sua, Que a carne n'alma fez. E beato quem toma ri 8eus pensamentos recentes, £ em nascendo os afogar. Por n&o virem a parar £m vicios graves e urgentes :

AUi verá tio profundo Mistérios da summa Altesa^ Que, vencida a natureza, ^ Os mores faustos do mundo Julgue por maior baixeza. O*^ tu, divino aposento. Minha pátria singular. Se com te Imaginar. Tanto sobe o entendimento. Que fará se em ti se achar?

37

Ditoso quem se partir , Para ti, terra excellente T9o justo e tão penitente. Que despois de a ti subir. descanse eternamente!

Camões, Obras, (Ed. Jornmeoha), ir, 1-17.

SÉCULO ZTl 201

IX i

No cruzeiro da costa da Arábia

Junto d' um sêcco, ^mo, estéril monte, Inútil e despido, calvo e informe, Da natureza em tudo aborrecido, Onde nem ave vôa ou fera dorme. Nem corre claro rio ou ferve fonte. Nem verde ramo faz doce ruído. Cujo nome, do vulgo introduzido, E' Feliz, por antiphrasi infelice,

O qual a natureza

Situou junto á pai te, Aonde um braço d*aIto mar reparte ^ A Abassia da Arábica aspereza, Em que fundada, foi Berenice,

Ficando á parte doiíde O sol que nella ferve se lhe esconde ;

O cabo se descobre, com que a costa Africana, que do austro vem eorrendo, Limite faz Aroma ta chamado, Arómata outro tempo, que volvendo A roda, a rude lingua mal composta Dos próprios outro nome lhe téem dado. Aqui, nQ mar que quer. apressurado, Entrar por a garganta deste braço,

Me trouxe um tempo e teve

Minha fera ventura. A qni, nesta remota ^ áspera e dura Parte do mundo, quis que a vida breve Também de si deixasse um breve espaço.

Porque ficasse a vida Por o, mundo em pedaços rapartida.

Aqui me achei gastando uns tristes dias, Tristes, forçados, maus e solitários. De trabalho, de dôr e de ira cheios. Não tendo tSo somente por contrários A vida, o sol ardente, as águas frias. Os ares grossos, férvidos e feios. Mas os meus pensamentos, que s9o meios Para enganar a própria natureza,

"^mbem vi contra mi,

Trazendo-me á memoria Alguma passada e breve gloria, Qn*eu ja no mundo vi quando vivi. Por me dobrar dos males a aspereza.

Por mostrar-me que havia No mundo muitas horas de alegria.

^ Ifaora-K a época e o Ingar onde foi composta esta Canção z, da qaal Jor«> ■ca^, II, 518, diz ser difícil encontrar em qaalqaer Poeta poesia que se lhe oponha. Rcpndttz.sc « texto de 1852 conforme Dr. J. N. Rodri^nes, Canwea t o Lifante,, 2i9^.

AVTOLOOU POBSIA

Aqui 'stive eu, com estes pensamentos» Gastando tempo e vida, os quaes tio alt* Me subiam nas asas, que cala (Oh ! vede se seria leve o salto I) De sonhados e vSos contentamentos Em desesperação de vêr um dia. O imaginar aqui se convertia Em improvisos choros e em suspiros,

Que rompiSo os ares

Aqui, a alma captiva, Chagada toda, estava em carne viva, ^e dores rodeada e de pesares, Desamparada e descoberta aos tiros

Da soberba Fortuna, Soberba, inexorável e importuna I

NSo tinha parte donde se deitasse. Nem esperança alguma onde a cabeça Um pouco reclinasse por descanso 1 Tudo dôr lhe era e causa que padeça Mas que pereça n8o, porque pastasse O que quis o destino nunca manso. Oh que este irado mar, gemendo, amanso ! Estes ventos, da voz importunados.

Parece que se enfrêam ;

Somente o ceu severo. As estrelias, e o fado, sempre fero Com meu perpétuo dano se recrêam, Mostrando-se potentes e indignados*

Contra um corpo terreno, Bicha da terra, vil e tão pequeno.

Se, de tantos trabalhos, tirasse Saber inda, por certo, que algum'hora Lembrava a uns claros olhos, que vi, E se esta triste voz, rompendo fora. As orelhas angélicas tocasse Daquella, em cuja vista vivi, A qual, tornando um pouco sobre si, Revolvendo na mente pressurosa ^

Os tempos passados

De meus doces errores. De meus suaves males e furores, *

Por ella padecidos e buscados, E, posto que tarde, piedosa,

Um pouco lhe pesasse, E, entre si, por dura se julgasse :

Isto que soubesse, me seria Descanso para a vida que me fica t Com isto afagaria o soffrimento 1 Ah Senhora ! Ah Senhora ! E que tâo rica Estais, que cá, tão longe -de alegria Me sustentais com doce fingimento 1 Logo que vos fígura o pensamento,

sáoviA XYf 20S

Foge todo o trabalho e toda a pena« com vossas lembranças, Me acho seguro e forte

Contra o rosto feroz da fera morte I

E logo se me juiitam'eisperanças,

Com que, a fronte tornada mais serena» Torno os tormentos graves

Em saudades brandas e suaves.

Aqui, com ellas fico perguntando Aos ventos amorosos, que respiram Da parte donde estais, por vós, Senhora; A's aves que d'alli voam, se vos viram Que fazicfs, que estáveis praticando. Onde, como, com quem, que dia e que hora ? Alli a vida cansada'se melhora, * Toma espiritos novos, com que vença

A fortuna e trabalho.

por tornar a vêr-vos, por ir a scrvir-vos e querer-vos. iz-me o tempo que a tudo dará talho ; Mas o desejo ardente, que detença

Nunca soffreu, sem tento Me abre as chagas de novo ao soff ri mento.

Assi vivo e se alguém te perguntasse, Cançflo, porque nlo mouro, Podes-lhe responder que porque mouro.

ObrcLs, (£d. Jonunenha), ii, 206.

Morte do D. Leonor ^

(CANTO XVII)

No canto atras passado (se vos lembra)

Vistes o CapitSo ouvir mil gritos.

E o coraç9o presago, a dura morte

Da sua Lianor lhe descubria.

Com trabalho se apressa, por achar-se

Presente ao mal, que teme & certo :

E da penosa dor afadigado,

Quasi arrastando vay os lassos membros.

Hum difficil hanélito lhe seCa

A tK>ca mortal ; & os tristes olhos

Sumidos da fraquesa em vivas fontes

De lagrimas piedosas se convertem.

Chega a donde Lianor ao passo forte

E termo tão timido estava entregue ;

Ye que a turvada vista rodeando,

A elle so demanda, a elle so busca ;

3M AHTOLOeiA P0B81A

E vendo que be chegado, esforça um pouco O animo, & procura despedir-se. Levanta cora trabalho os mortaes olhos. Quer- lhe fatiar, a morte a liogua impide. Firnia-os cada vez mats no triste rosto Daquelle único amigo, que deixa : Trabalha agasalhá-lo, & n&o podendo Com dor mortal na terra se reclina.

. Entregio-se a morrer aquelles olhos Que mil mortes tinh&o dado a muitos Huma mortal angústia lhe rodeia Aquele alegre e angélico semblante; de todo lhe foge a còt de rosa Do rosto tio feimoso ; s* esfria. fica a branca mão sem movimento; O peito ebúrneo fica sem sentido.

Qual da Casta Diana a bella image

Se vio per mão de Phidias esculpida,

Que o soberbo edifício en nobrecendo, *

Sen tio do tempo avaro a fôrçá & a ira :

Entre antiguas ruinas jaz a illustre

Admirável figura despojada ;

£ ainda qtie perdeo estado e glória,

Disisenho lhe ficou valor & estima :

Allí mostra hum perfil medido e justo,

Nos membros porpoição perfeita & rara

Mostra formosos olhos, mjstra graça,

Mostra tudo formoso, mas sem vida.

Tal na deserta Praia fica o corpo

Maiç que mármore ou branca neve, branco

De crespas febras d 'ouro soccorrido,

Que com intento casto alli defendem.

Alça-se um alarido até as estrellas,

Das criadas que em torno d'ella estavão;

Ferem com duros punhos rosto & peitos,

Fazendo um triste som, que rompe as nuves.

Dos gritos & lamento outra vez torna

O concavo rochedo huma voz escura,

E CGuendo por baixo do arvoredo

Miseráveis assentos vai formando:

Quantas vezes o nome amado chamSo

Com palavras do choro interrompidas.

Tanta Eco chorosa lhe responde

Co'a mesma dor, c*o mesmo sentimento.

O varão infelice trespassado

De huma terribil dor sem remédio

Tremendo as fracas pernas, nSo podendo

Soffrer a grave carga & peso triste

Junto do amado corpo se reclina.

Com semblante affligido, os tristes olhos

Com intrinsega pena os tinha promptos

Naquella defunta fermosura.

BKCCLO ZTI âO&

Cuida no duro termo a que seus gostos E a que todos seus bens se reduzi rflo. Cuida em contentamentos passados Que agora muito mais o entrestecião. Aili (para mais dor) se lhe apresenta O vário proceder de seus amores, O principio alterado, & o successo Tão prospero, jucundo & tão elice. Cuida como passou em sombra o tempo Ligeiro & tão amigo, de mudanças E quando imaginava estar mais atto Vio da mudável roda a volta dura. Despois que um grande espaço está pasmado, Oppriniido de dor o peito enfermo, Alevanta-se & vay mudo & choroso Onde a praia se mais oportuna. Apartando co'as mãos a branca área, Abre nelia huma estreita sepultura, Torna-se atras, alçando nos cansados Braços aquele corpo lasso Sc frio, A)udâo as criadas as funestas Derradeiras exéquias com mil gritos. «Ai duro tempo! (dizem) como apartas Para sempre de nós tal fermosura ! »

Na perpetua morada tenebrosa A deixão, levantando alto alrirido ; Com salgado liquor banhan^do a terra Aquelle último vale í todas dizem Não fica so Lianor na casa infausta. Que de um tenro filhinho se acompanha Que a luz vital gozou quatro perfeitos ^ Annos, ficando o quinto interrompidos

Alli co'a morta mãi o filho morto, Ambos com morto amor em terra jazem. Elia lhe nega o branco amado peito, E elle o doce, materno, amado gosto; Ambos na solitária praia ficam Junto das grossas ondas sepultados. Deixando ao mundo tão triste raro exemplo De perversa, cruel, Ímpia fortuna. O mísero Sepúlveda rodea Os olhos com effeito de saudade ; Em lagrimas desfaz o bulcão turvo De que assombrado tinha o triste spirito. Com vozeio triste choro embaraçada Palavras diz de lástima & piadosas. Nos braços toma hum filho que ali tinha ' De tenrra idade & vista miserável ! Por estreita vereda entra no mato Dos bravos leões e tigres povoados; A morte vai buscando : elles doídos De seu mal lh'a darão em breve espaço.

1. Cotte-Rcal, Naufrágio de Sepúlveda, ed. de 1783, pá^. 399 e seg^

SM ANTOLOGIA FQ^^SiA

XI

El-Rel D. Sebastllo em Sintra

Ve bem no cume uma maravilha

Que n9o cuido que n9o fosse igual contada ;

So cem passos da terra moço trilha

Em cima que n9o fosse alcantilada;

Os quaes occupa um templo que se invoca

A senhora da Pena ou da alta Roca.

Aqui viu claras fontes crjst-illinas,

Que em duras pedras tinham nascimento,

Edificadas altas offícinas

D'um consagrado c pudico convento :

Um peregrino alli de peregrinas

Pedras com jamais visto intendi mento

Um ret;ibolo fez, que parecia

De rica e subtil marceneria.

De Pa rio alabastro marchetava O Corynthio porphydo enxerindo O jaspe em luso mármore; que estava Suspenso o rei, pintar-se presumindo. Brutescos e cordões dependurava (Tudo de pedra) que se estará rindo; Quem n9o viu esta obra desusada, De muitos que a viram celebrada.

Nlo so no altar sancto se embebia O moço rei ; que está rapto e enlevado Ouvindo tam suave melodia Que lhe parece estar beatificado. «

Mas como para o mundo emfim pendia, Sai-se do templo a ver o mar inchado, Descobrindo d'alli do Olympio monte Do meio orbe terreno o horisonte.

Tendo sempre presente na memoria O que lhe o seu esforço promettia. Dos seus passados á superna glória, Que n'ene o tempo assim escurecia, A prolongada empresa, c obrigatória A quem a lei de Christo pretendia Estender até o ultimo terreno Contra a fèrça do bárbaro Agareno.

SÉCULO JTI 2Õ7

Mágoa com que ao mar o rosto vira Por jhc nSo renovar tristes lembranças ( E caminhando assim triste suspira (Ef feitos de compridas esperanças) Do monte desce emfim onde subira A ver o que é sugeito de mudanças E fonte de perigos nSo cuidados So para cubiçosos ordenados.

Ve que as nuvens abaixo errando andavam Cubrindo os valles que altas serras fendem; Desce até que per cima lhe ficavam, Que em fria sombra pelo ár se estendem Bosque de férteis plantas se mostravam. De cujos ramos vários fructos pendem; Umas e outras sempre ftorecendo, Como que sempre fosse amanhecendo.

Ouvindo as rotas lymphas que cahindo Por entre lisas pedras murmurando Parece ceito alli que vém sentindo, O que no peito o moço está traçando j Onde Flora de Zephyro fugindo As esquecidas folhas meneando Do bosque bem parece que dizia Porf ue tam cruelmente lhe fugia. '

Sendo néctar e ambrósia alli o rocio Que em matutinas flores lento e grave Cahhido la do ceo, coalhado e frio Da astuta abelha era manjar suave : Debaixo de um castanho alto e sombrio Se assenta o Luso porque mais o aggrave Seu mal ouvindo ao som de claras aguas Passarinhos cantarem ternas mágoas.

Alli pois divertindo o vaga mundo Pensamento, mil cousas considera Por applacar o peito furibundo, Que com nenhum repouso se modera : Alli ve que o que foi senhor do mundo Que mais depois de se- lo, não quisera Que lograr o repouso desejado Em doce companhia congregado.

Mas nada o satisfaz, porque faltando Ao apetite aquilo que deseja, (O peior muitas vezes desejando) Nada o queira emfim, por mais que veja; E assim todo o repouso desprezando

908 ANTOLOGIA TOV»^Á

■ar

Abraça uma interna e van peleja : D'onde turbado e triste se levanta Depois que de confuso se quebranta.

Por entre os iisos troncos corvados O passo move onde escritas crescem. Várias tenções de peites namorados, Que em perpetua memoria permanecem Estão dl tempo ali dos reis passados, Que os cortezãos d'agrora aborrecem A pureza d'amor, porque chorando Não andem as pobres arvores riscando.

Cintra se chama esta deleitosa Parte, onde repouso o moço engeita«

L. P. Brandão, Elegiada, ^

XII

A habitação dos ventos

. . . n'hua profunda cova escura. Os inquietos ventos encerrados, Júpiter pôs, e com bem forte e dura Prisão a todos têe presos, e atados : E para que inda possa trais segura Mente alH seus furores ser domados, Lhe pôs também um grande monte em cima, E hum Rey lhes deu ^ os mande e q os reprima.

Elles com gr9o iruido e estrondo horrendo Sempre em torno da porta estão brn mando, Eolo, a quem o padre alto, e tremendo Deu sobr'eiles o scepiro, deu o mando, Os está d'h(l^ torre alta regendo, Seus Ímpetos, e fúrias temperando, E de tal sorte o temem^^e venerão. Que por elle s'entreião, ou se aiterão.

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Logo do real sceptro a ponta volta Ao cavo monte, que em si os ventos cerra, Empucha-o para hum lado, e a prisão solta, A*quelies com que faz a sua guerra : Sahe a turba feroz, com grãa revolta. Subverter desejando o mar, e a terra, Mas vendo do seu Rei a veneranda Presença, párão, vendo o que elle manda.

SÉCULO svi 909

EUe lhes manda então que ao companheiro Zéfiro dêem favor no que pretende, Zéfiro d'alli parte ligeiro, E ajudado do amor que dentro o acende. Em breve tempo chega onde o primeiro Raio da luz dourado Apollo estende, Contente assaz de vèr-sc4á tão perto Do seu bem, que ser seu ]a, têe por, certo.

Os furiosos ventos, que seguir9o O companheiro sempre que os guiava,- lanto que da prisão soltos se virão MostrSo a sua antiga fúria brava : Os mansos marts tanto que sentirão Aquella fúria, que antes presa estava. De tal sorte se vão embravecendo, Que*até ás nuvens perece ir-se erguendo.

As grossas altas ondas escumosas. Dos furiosos ventos constrangidas, Vão quebrar seu furor nas alterosas Rochas, ou nas praias estendidas : Returobao as montanhas cavernosas, Vèem-se do mar as nuvens combatidas, Qu'a força com que encontra a rocha dura - Lhe faz com que então suba a tanta altura.

O claro ar e sereno s'esçurece, Qu'a grossa e negra nuvem lhe snccede, O resplendor do Sol desapparece, Qu'esia nuvem também mesma lh'o impede: No mar ao meio dia hoje anoitece, Horrisonos trovões de si despede O CeOy e apoz estrondos espantosos Solta de si mil raios luminosos.

Chegão entretanto Euto, Africo e Noto Onde os navios vão, que os levarão, E co'o seu costumado terremoto. Em tudo grão temor então causarão, * Eis com alta voz grita o Piloto, Os marinheiros não se descuidarão, SaltAo de e de com grande pressa. Hum á corda, outro ao remo se arremessa.

M)s por mais que ande esperto e diligente. De se poder salvar desconfia, . Porque cada momento mais presente. Crescendo a tempestade, a morte via, 2^fÍro receioso e descontente Do perigo em que por quem morria, Roga aos ventos, que em ^i q^eirão pôr freio, Nem lhe dêem tanto bem com tal receio.

210

AHTOLOatA rOBSIÁ

Porém elles, que ma! então podião Refrear o que tõe por natureza, Cada momento mais entSo cresciao, \ '

£m Ímpeto, furor, ira e bravesa : Ora por entre as ondas descobriSo Dos mares a areosa profundeza, Ora fazem que o mar tão alto saía Qiie nas nuvens quer fazer a praia.

Nas náos atribuladas isto espalha Grande espanto, temor, desconfiança, ^ Mas a gente que nellas se agasalha Faz, quanto (te viver itae esperança : ^ Com revezada força se trabalha

Na longa bombaie o mar ao mar se lança. Ora se encolhe a escota, ora se sAlta, Cresce a voltas do medo, a grãa rev^ta.

G. de Andrade, Primeiro Cerco de Diu, tà. 1852, cai^to it est. is-xri.

XIII .

Romance

Cap. zzi da «Menina e meça». Chama-llie o anfor «Um cantará seláo, qne era o qoe nas consas tristes se acostumava. . E* posto na bdca da áiri^ido a Aónia.

Pensando-Tos estou, filha ; Tossa mSe m* está lembrando ; cnchen-se-me os olhos d*a2ua, nella vos estou lavando.

Nascestes, filha, antre magua; pêra bem índa vos seja I poi&em vosso nascimento rortuna vos houve inveja.

Morto era o contentamento, nenhuma alegria ouvistes; * vossa m&e era finada, nós outros éramos tristes.

Nada em dor, em dor creada, nSo sei onde isto ha de ir ter; vejo- vos, filha fermosa com-olhos verdes crecer.

NSo era esta graça vossa pêra nacer em desterro. A]al haja a desa ventura que pos mais nisto que o erro!

Tinha aqui sifa sepultura vossa m9e, e magua a nós; nSo éreis vós, filha, não, pêra morrerem por vós;

N9d ouvem fados rezf o, nem se consentem rogar ; de vosso pae hei mór dó, que de si se ha de queixar*

£u vos ouvi a vós só,

primeiro que outrem ningrueoi;

nAo fôreis vós, se eu nio I6im;

n&o sei se fiz mal,- se bem.

Mas não pode ser, senhorit pêra mal nenhum nascerdes com esse riso graeioso que tendes sob olhoa verdes.

Conforto, mas duvidoso, me é este que tomo assi; Deus vos melhor ventnia do que tiveste té'qui.

A Dita, e a Fermosura, dizem patranhas antigas» que pelejaram um dia, sendo d*antes muito amigis.

Muitos hilo que 6 phantatia; eu, que vi tempos eannos, nenhuma cousa duvido como ella é azo de damnos.

bAcULo zvi

21i

^ Mas nenhum mal n9o é crido ;

o bem é esperado e na cten^^a, e na esperança, em ambas ha *hi cuidado, em ambas ha *hi mudança.

Ber&mxdim Kibeiro, ed. Pessanha, 173-125.

XIV

Romance dd Avalõr

Está íAtercalado na Segunda Zuarte, c. zi da Menina e Moça t é precedid«w das k^intes palavras: a de sua ida [da partida de Arima da oôrie] e como Ate* tfr também após ela se foi, não se soube então inteiramente mais qne per lun ConUtr^ nmnet, que daquele tempo ficou ». Reprodoz-se o texto conforme a ed» crítica dô- ítrrara 1554, segundo a lição da Sr.* D. Carolina MichaElis com a disposição épic^ èiTcrsos— Cfr. Estudo» aôbre o Romanceiro, 266.

Pola ribeira de um rio, vai o triste de Avalôr. As aguas levam seu bem I Soo vai e sem companh^ia, qnéquem nio leva descanso, D*eseontra onde ia a barca indo-se abaixando o sol tudo se fazia triste Da barca levantam remos •omeçaram os remeiros •Que frias eram as aguas! Dos outros bancos respondem ; senão quem a vontade pós Tra la barca lhe vão olhos Não durou muito, que o bem Vindo o sol posto, contr'ele, lohou rédeas ao cavalo A noite era calada v e ao compasso dos remos Querer contar suas magoas Quanto mais se ia alongando, dos ouvidos e dos oihos Assim coflfo ia o cavalo e dando ara longo suspiro ^Onde magoas levam alma E ifldo assim, por acerto que estava amarrado á terra Saltou, assim cono ia, dentro A corrente e a maré Não sabem mais que foi d'ele Suspeitou-se que era morto, qne o exnbarcou Ventura

que leva as águas ao mar,

Não sabe se hade tornar!

ele. . leva o seu pesar I

que os seus fora ele deixaij^ '

descansa em caminhar.

se ia o sol abaixar:

escurecia-se o ar ;

quanto havia de ficar.

e ao som do remar

dos bancos este cantar :

quem as haverá de passar.

Quem as haverá de passar

onde a nào pôde tirar f »

quanto o dia lugar I

não pode muito durar,

soltou os olhos ao chorar,

d'á beira do rio andar.

pêra mais o magoar,

era o seu suspirar.

seria áreas contar,

se ia alargando o soar;

a tristeza foi igual.

foi pela agua dentro entrar,

ouvia longe falar.

vão também corpo levar!»

foi c'um barco n'agua dar,

e o seu dono era a folgar.

e foi a amarra cortar.

acertaram-no a ajudar.

nem novas se podem achar,

mas não é pêra afirmar,

pêra [njisso [o] guardar f

Mais sScj as magoas^ d'amor do que se pôde coidari

2H'

▲JVTOLOGIA ^- P0RS1A

/ -

XV»

Egioga li

Interlocutores Jano, e Franco

1

Dizem que havia um pastor Antre Tejo, e Odiana, Que era perdido de amor Por uma moça Joana : Joana patas guardava Pola ribeira do Tejo; Seu pai acerca morava, E o pastor, de Alentejo Era, c Jano se chamava.

Vestido branco trazia;

Um pouco afrontada andava;

Fermosa bem parecia

Aos olhos de quem na olhava.

Jano em vendo-a-foi pasmado;

Mas por vêr que ella fazia,

Escondeose entre um prado.

Joana flores colhia,

Jano colhia cuidado.

Quando as fomes grandes foram. Que Alentejo foi perdido, Da aldeã que chamam Torr9o Foi este pastor fogido: Levava um pouco de gado, Que lhe ficou de outro muito Que lhe morreu de cansado ; Que Alentejo era enxuto D'agua, e mui seco de prado.

3

Toda a terra foi perdida : No campo do Tejo Achava o gado guarida ; Vêr Alentejo era um ; E Jano pêra salvar O gado que lhe ficou. Foi esta terra buscar ; E se um cuidado levou, Outro foi elle achar.

O dia que alli chegou

Com seu gado, e com seu fato, *

Com tudo se agasalhou

Em uma bicada de um mato,

E levando-o a pascer,

O outro dia, á ribeira ;

Joana acertou de hi vêr.

Que se anda\a pola ribeira

Do Tejo a flores colher.

Depois que ella teve as flores

colhidas, e escolhidas

As desvairadas cores

Com rosas entremetidas^

Fez delias uma capella,

E soltou os seus cabellos

Que eram tão longos como ella,

E de cada um a Jano em vellos

Lhe nacia uma querella.

7

E em quanta aquesto fazia Joana, o seu gado andava Por dentro da agoa fria Todo ápos quem o guiava. Um pato grande era guia, E todo junto em carreira. Hora rio acima ia, Hora na mesma mjineira, O rio abaixo decia

8

Joana como assentou A capella, foi com a mSo A' cabeça, e atentou Se estava em boa feiçlo: Não ficando satisfeita Do que da m8o presumia, Partio-se dalli direita Pêra onde o rio fazia D'agoa uma mansa colheita*

I

i

Importante pelos elementos aato-biográficos que encerra.

Cousas do uso pessoal dos pastores, muito usado pelos Quinhentistas.

ZMl

9iS

Chegando á beira do rio As patas logo Tierain Todas uma, t uma. em fio, Que toda a agoa moveram : " De quanto eila folgou Com aquestes gasalhados Tanto eotonces lhe pesou, Ecom pedras, e com brados 0'i)li longe as enxotou.

10

Depois que ellas foram idas E que a agoa assossegou, Joina as abas erguidas Entrar pol'agoa ordenou ; E assentando-se, ent9o M çapatas descalçou £ {londo-as sobre o cb9o Por dentro d'agoa entrou, £ I Jano polo coração.

11

Effl quanto com passos quedos

Joflna pola agoa ia,

Antre uns desejos e medos

Jano, onde estava, ardia ;

Nio sabia se falasse,

Se sahisse, 9c estivesse,

Que o amor mandava que ousasse,

E porque a não perdesse

Fazia que arreceasse.

12

Dizem quenaquesto melo Se esteve Joana olhando, E descobrindo o seu seio, Olhou-se, e disse, um ai dand» : Hq guardo patas, coitada, Niosel onde isto ha d 'ir tèr, Mais era eu pêra guardada, Que concerto foi este ter Fermosa e mal empregada !

13

Hd aquisto Jano ouvindo, ^'io se pôde cm si sofrer. Que d*antre as ervas sahindo Se nio lançasse a correr : ioana, quando sentiu Os estrompidos de Jano, E que se virou, e o viu. Temor do presente damno Lhe deu pés com que fugiu.

14

Mui perto estava o casal Onde vivia o pai delia, Que fez ir mais longe o mal. Que Jano teve de vêl-a : Mas o medo que causou, Joana partir-sc assi. Tanto as mãos lhe embançov. Que a çapata esquerda, alli. Com a pressa lhe ficou*

15

Jano quando viu, e olhoa Que nenhum remédio havia Pêra o legar ae tornou Aonde ella n'agoa se via ; E vendo a çapata estar No areal, é beira d'agoà, Foi correndo a abraçar. Tomando-a, cresceu-lhe a magoa £ começou de chorar.

16 ^

Toda, a çapatar os peitos. Em lagrimas se banharam. Muitos foram os respeitos Que tanto choro causaram. Encostado ao seu cajado, A çapata na outra mflo, Depois de um longo cuidado. De dentro do coraçSo Começou falar, cansado :

17

Jano

Despojo da mais fermosa Cousa, que viram meus olhos. Pêra elles sois uma rosa, E pêra o coraç9o abrolhos : . Çapata, deixada aqui, Pêra mal de outro môr mal. Quem te leixou, leva a mi; Que troca t&o desigual Mas pois assim é, seja assi.

18

Agora hei vinte e um annos, E nunca inda agora Me acorda de sentir damnos. Os deste meu gado em fora ; Hoje, por caso estranho, NSo sei em que hora aqui vim. Cobrei cuidado camanho. Que aos outros todos pôs fim ; Eu mesmo a mim mesmo estranho.

14

914

ÁXTOLOttLA roasi A

19

Antes que este mal viesse, Que me tantos vai mostrando Que aiglins cuidados tivesse hlo me matavam cuidando: Agora por meus peccados, £ segundo em mim vou vendo, N9o podem ser outros fados; Meus cuidados não entendo, Morro-me assim de cuidados.

20

Dentro de meu pensamento Ha tanta contrariedade, Que sento contra o que sento ^ Vontade, e contra vontade ; Estou em tanto desvairo, Que nlo me entendo comigo. Donde esperarei repairo? Que ve)o grande o perigo, £ muito mór o contrairo.

21

Quem me trouxe a esta terra Alheia, onde guardada ÍAt estava camanha guerra, E a esperança levada? Comigo me estou espantado Como em tao pouco me dei, Mas cuidando n'isto estando Os olhos com que outrem olhei De mim me estavam vingando.

22

E por meu mal ser mór indi De mim tenho o agravo, mór, Que da minha magoa infinda Eu fui parte, e causador ; Que se me não levantara D'antre as ervas onde estava. Mais dos meus olhos gosara, E que assim se ordenava Uto ao menos rne ficara.

23

Desastres, cuidava eu Quando eu ontem aqui chegtiti,. Que a vós, e á ventura má. Ambos acabava ; e errei : Triste que me parecia. Que o meu gado remediada Comigo bem me haveria, E estava-me ordenado Est*outro mal que indo havia.

24

O mal, nio vos sabe a vós Quem me vós a mim causos, tristes dos meus olhos sós. Que trouxeram, aonde estou, Olhos a certo lugar. Ribeira, mór das ribeiras Que levam as agoas ao mar, Vós me sereis verdadeiras Testimunhas de pezar.

Bernardim Ribeiro, Obroê^ ed. 1852, 280-287,

Egioga Cristal

AUTOR

Antre Sintra, a mui prezada, e serra de Riba-Te)o, que Arrábida he chamada, perto d*onde o rio Tejo ae mette nagoa sa'gada, ouve um pastor e pastora, que com tanto amor se amarão, como males lhe causarão dVstc bem, que nunca fora, pois foi o que não cuidárSo.

A elia chamavão Maria» e ao pastor Crisfal, % ao qual de dia em dia o bem se tornou em mal, que elle tão mal merecia. Sendp de pouca idade, não se ver tanto sentiio, que o dia, que não se vião» se via na saudade o que ambos se querião.

Igual a êinto, 1.' p. s. do ind« praf.. comd mento de mentir. Texto da ed. de Epifânio.

téêmja xTi

2ia

Algttas horas falav9o

indando o gado pacendo,

t entio apacentavão

os olhos, que, em se vendo,

mais famintos lhe ficavao.

E com quanto era Maria

piqoena, tinha cuidado

de guardar milhor, que o gado,

o qae lhe Crisfal dezia ;

mas em fim foi mal guardado.

Que depois de assi viver nesta vida e neste amor, depois de alcançado ter ntior bem pêra mor dor, em fim se ouve de saber por Joana, outra pastora, qae a Crisfal queria bem. ^ —Mas o bem, que a tal vem, nSo ser bem maior bem fora, por nSo ser mal a ninguém.

Então descontentes d 'isto levárão-na a longes terras, escondêrão-na antre serras onde o sol n9o era visto, e a Crisfal deixarão guerras. Além da dor principal, pêra mor pena lhe dar puserao-no em lugar mao pêra dizer seu mal, ^ mas bõo pêra o chorar \

FALA CRISFAL

24

Companheiras do meu mal, agoas que d'alto correis, onde caís desigual,

?arece que me dizeis: orque nSo choras, Crisfal? Contar-vos quero, amigas, o que esta noute sonhei, com o qual tal dor tomei, que minhas muitas fadigas em mais fadigas dobrei.

A qual logo aquelle dia que soube de seus amores, aos parentes de Maria ^ certos e sabedores de todo quanto sabia. Crisfal nSo era entSo (^ bSs do mundo abastado tanto como do cuidado, qoe por curar da paixSo o2o curava do seu gado.

26

Despois de ontem deixar de vos contar os meus males íui-me baixo deitar no mais baixo d 'estes valles antre pesar e pesar. Onde despois que aos ventos descobri minhas paixões, gastados muitas rezões, mudei os meus pensamentos em minhas contemplações.

E como em a baixeza *> sangue e pensamento «e certa esta certeza Qiidar que o merecimento 6tí em ter riqueza, Éoqacrirlo que teria e do amor nâo curarão, «m qac bem se descontara© nqnczas que faledão por males que sobejarão.

26

Contente de descontente a noute sendo calada, como he certo em quem sente, nao ficou cousa passada que me n9o fosse presente. Vindo- me á memoria dar, Quando andava com o gado ter com Maria sonhado, fez-me o dormir dessejar de mim pouco dessejado.

Sapriacm-ac por nio impoitinm ctacncialmente ao sentido as ests. 8 a 23.

916

iJITOI^OMA PQBSIA

27

31

E crendo que aproveitasse pêra meu contentamento te eu com ella sonhasse, deu-me lugar meu tormento

2ue algum pouco repousasse. ', como cansado estava do que no dia passei, a dormir pouco tardei, «{adormecido sonhava o que vos ora direi.

Sonho

28

Porque vi muitos pastores andar guardando sem gados, vestidos d'alegres cores, bem íóra dos meus cuidados, mas n9o dos seus amores, nlo querendo mais averes, nem qu^endo mais riqueza, por que amor tudo despreza; nas todos os seus prazeres forSo pêra mim tristeza.

32

Sonhava, em meu sonhar, onde dormindo estava alli velando estar, quando da pai te do mar f[rão vento se a levantava « qual com tal sobresalto chegava onde eu jazia, que da terra me erguia em tanto estremo alto, que a vista me fallecia.

Em hum valle descontente

estar Natonio vi,

d 'estes assaz diferente,

que casi o nHo conheci

sendo bem meu conhecente,

aqueste Ite o pastor

que veto aqui buscar-me

nom mais que por consoUr^me,-

e vi-o com tanta dor,

que dor me o lembrar-me.

29

•3

Vendo-me em lugar tal baixei os olhos á terra ; vi craro'dia, n8o ai, e os valies e a serra tudo julguei por igual; mas como aborrecido tanto da vida andasse, que meu mal dessejasse. temor tão pouco temido não creio eu que se achasse.

Chorando lagrimas mil

estava comsigo só,

ao modo pastoril

de bem pêra aver

tinto o Àbito vil.

Em hQa frauta tanhendo

ao de hu*arvore estava;

desque da boca a tirava,

de dentro d 'alma gemendo

em vez de cantar chorava.

30

34

Depois de me ter mostrado este perigo de morte, á terra mais abaixado contra a parte do norte sonhava que era levado. Antre o Tejo e Odiana era o meu caminhar, donde poderei contar se o que notei nom me engana cousas bem pêra notar.

Quisera-o eu consolar, mas em cujo poder ia não me deu a mais lugar que ouvir-lhe que dezia «O* Guiomar, Quiomar, em vós pus minha esperança; e -quanto ella encobre agora em dor se descobre; perigos de confiança ifizerlo do rico pobre >• .

Xfl

Sll

35 Assl, por elle passando «Natonlo tenhas prazQr» lhe diie grflo brado dando, o da vista perder os olhos neJle deixando. Dcos lhe d6 contentamento, pois que nos fez a ventura companheiros na tristura; fm que seu e meu tormento cada vez tem menos cura.

36 D'aqui fomos descorrendo até o Te|o passar, a agoa de quem eu vendo foi dor fobre dor dar indo dor padecendo. Chorando a lembrança d'ella. Virada foi minha face pêra onde ò gado pace da grande serra da Estrella da qual o Zezare nace. ^

37 Posto no seu alto cume deizarom-me aili estar, e meu coraçflo presume qoe foi por me magoar, como tinhSo por costume. D'aIH os pães semeados m a meus olhos deixa rom, que por nSo grados julgarom, mas, posto que forSo grados^ eu sei que nfto me agradarom.

38 o sol se encobria i este tempo e mais ficando a terra sombria, e o gado aos currais )i entio se recolhia. Ouvi cies longe ladrar e 05 chocalhos do gado com hum tOe tflo concertado, que me fizerom lembrar de quanto tinha passado.

39 Por mais minhas queixas v9as vi berrar o gado moucho cuberto de finas lias e assoviar o moucho com o triste cantar das rias. as serranas ao abrigo se ilo, os prados deixando, as mais d'elias sospirando; hOa dezia «Ai, Rodrigo!», outra dezia «Ai Fernando!»

.40 Htla dumes temia outra de si tem receo ; htka ouvi que dezia «QuSo asinha a noule veo!» outra «Já tarda o dia». E por este esperimento foi amor de mim julgado por nom menos occupado do que he o pensamento, que nunca está descansado..

41 Antre estas, só, saudosa vi antre duas ribeiras hHa serrana queixosa cercando htlas cordeiras, sendo cordeira fermosa como alli tem por uso em haa roca fiando; mas, como que ia cuidando, cahia-se-lhe o fuso da mão de quando em quando.

42 Tendo parecer devino, pêra que milhor lhe quadre, cantar cantou d'elie dino ^: «Yo me yua, *a mi madre, a sancta Maria dei pino» ^ O vestido lhe oulhei, e vi que era hum brial de seda e nSo de saial ', a qual eu afigurei a Menga, la dei boscal *.

^ Como se sabe Th. Braga len eonUir cantou de ledino e entendeu por isso ■m canto popnlar, de rooiarias e festas aos Santos. Veja-se Leite de Vasc. Notas FUO' lógieoê, 13; e Júlio Moreira, Eêttêdoê, U, 138.

' Estribilho tal qual em Barbieri, Canc, Miísical dos stcs. xv e xti, Cançâ» 380, Madrid, 1890.

' Opõe o brial, vestido de mnlhci, de seda ou rico estofo ao saial, de tecido grosseiro, próprio das serranas. .

* Menga, equivalente Domingoê; do boscal, i. é., do Boscal f nome prd- prio de logar, para a distinguir de outraa mulheres do mesmo nome? Cfr. Barbieâ '^. etí. Can^ 350 « Es Mtngua la dd voêcar i ».

818

AHTOLOOl A POBSl A

■^•^

43

47

Depois d 'acabar seu canto dezia: «Ninguém me crea por me ver alegre tanto; vlsto-me á vontade alhea, e o meu cantar he pranto; anda a dor dessimulada, nas ella dará seu fruito; a minha alma traz o luito; <le pouco são esposada, nas descontente de muito.

Maria perdi, mesquinha; iogo, em sermos apartadas» do meu mal fui adevinha. Milhor se) fio suas fadas do que foi a fada minha. Deos a de ao eeu Crisfal por amboa contentes ser: e mais n&o lhe quero ver, mas sei peiio meu mal o bem d'outrem escolher. »

44

48

Troquei amor por riqueza porque mo trocar fizerom ; mas bem pago esta crueza, ^ue, em que cem contos me derom, desconta rSo-se em tristeza: - meu esposo abarreço, quando me a lembrança vem do primeiro querer bem ninguém venda amor por preç«, pois elie preço n9o tem.

Quando a eu asai ouvi doer-se da minha pena, com novos olhos a vi, e tntio que era Glena, minha amiga conheci. Esta pastora e dama certa que milhor lhe ia, quando a cantar ouvia dando que em sua cama o velho não dormiria.

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49

Nlo tenho que lhe falar, se n9o s9o cousas passadas; se lhe estas quero contar, v9o ser todas namoradas

Pêra o pouco namorar, ôra elle o meu amor, c vivera eu pobremente! Que grande engano de gente! Que pobreza ha í maior que a vida descontente !

Pena me deu de n9o crer vel-la em tal tristeza posta ; quisera-lhe eu responder, mas trespôs hCla tresposta, pelo qual n9o pode ser. Depois de ver me sem vel-la os meus olhos me chorár9o; quantas cousas lhe lembrarão que antre mi, Maria, e ella em outros tempos pásaárflo!

46

50

Quando com elle me assento mil vezes caio em mingoa, porque, por esquecimento, faiando descobre á língoa o que está no pensamento. Faz-nos isto então ficar, eu muda elle mudado: ama-me como he amado; pêra me d'isco guardar, por bem ei o guardar gado.

Desque aqui com meu cuidado me estive fazendo guerra, sendo o dia passado vi-me levado da terra contra as nuvès alçado. Então, como ave voante, ' de quem me ai li trouxera sonhei que levado era contra onde a tarde ante o sol vi que se posera.

■AOULO ZTl

21«

51

Indo nam com menos dor, «m que com mais sossego, 08 veotoc me forSo por depoiB de passar Mondego aobre as serras de Lor. * Yio ali grandes montanhas de alguns valles abertas, todas de soutos cubertas, aos naturais estranhas mas á saudade certas.

52

Jnnto de h0a fonte era o lugar onde fui posto, onde se-lo n9o quisera, sendo bem lugar de gosto

quem gusto tivera ;

a mim nem o passado nem o que me era pfesente nada me não fez contente, •que nisto o magoado he como o muito doente.

53

Cnberta era a fonte de tSo fresco arvoredo, <|ne o9o sei como o conte, mui quieto e mui quedo, por ser antre monte e monte ; a noite de vento muda, como saudade escolha, e, porque mais prazer colha, chovia agoa meuda por dma da verde folha.

54

Depois que ai li chegava, ou depois que alli cheguei, sonhava que acordava, e do qoe atrás passei de ser sonho me lembrava. O qne então níe era mostrado tendo por verdadeiro ao de hum castanheiro me pus triste assentado ouvindo o tõo de hum ribeiro.

- 55

Meus olhos e eu passámos alli a noute em clamores até que ao tempo chegámos a que nós outros pastores o dilúculo chamamos. * Kaqueste tempo corrompe a ave que cham9o real ' o silencio de seu m-A, que he quando a alva rompe e ó dia faz signal.

56

EntSo porque tudo fale contando as mais paixões que rezSo he que não caie, ouvi gritar huns pavões no mais baixo do valle; trás isto pouco tardando, hum doce cantar ouvia, que na minha alma cahia, o qual eu bem escutando entendi que assi dezia.

57 Cantiga

N8o sei pnra que vos quero, pois me d 'olhos nSo servis, olhos, a quem eu tanto quis !

58 Voltas

Pêra ver me fostes dados ; vós a chorar vos destes, e se eu tenho cuidados, meus olhos, vós m'os Ázestes; desque nelles me piisestes, do descanso me fogis, olhos, a quem eu tanto quis!

* Not2-8e o aitiíício literário, de que outros exs., da divisão da palam Lorvão.

* O romper da manhã.

* E* o ronssinol. Uma filha dom rei de Atenas metamorfoseon-se nessa ave,

dottde o epíteto de rectl.

59

Meus ollios, por multas vias «sais copiigo cruezas ; tomais as minhas tristezas peia vossas alegrias; entrio noites, entrêo dias, olhos, nunca me dormis, •lhos. a quem eu tanto quis !

60

Quando vós prime'iro vistes, que nio me era bõo sabíeis; nas, por gozar que víeis, em meu dano consentistes; o que entSo me encobristes agora m'o descobris, olhos, a quem eu tanto quis !

61

Ando-vos a vós boccando cousas que vos dem prazer, e vós, quanto podeis ver, tristezas me andais tornando ; agora vou-vos cantando, vos a mim chorando me is, olhos, a quem eu' tanto quis!

62

Fim

Quem o que digo cantava, desque o cantado teve, nSo sei o que o causava, mas espaço se deteve, assi como que cuidava ; depois de cuidado ter, a voz de novo a içou e este cantar começou, o qual devia de ser aquillo cm que cuidou.

68

Cantiga

Como dormirão meus olhos 1 Não sei como dormirão, pois que vela o coração.

Voltas

Toda esta noite passada, que eu passei em sentir nunca a pude dormir, de ser muito acordada ; dos meus olhos foi velada; mas como n&o velarão, pois que veia o coração ?

65

As horas d'ella cuidei dormi-las ; forão veladas ; pois tão bem as empreguei, dou-asj)or bem empregadas» Todas as noutas passadas neste pensamento vão, poi3 que vela o coração.

6S

Pássaros, que namorados pareceis no que cantais, não ameis, que, se amais, de vós sereis desamados. Em meus olhos agravados vereis se tenho rezão, pois que vela o coração.

67

Fim

Como a cantiga mostrava» femenil, a meu cuidar, era a voz de quem cantava, que, por mais de bem cantar, eu ouvir me contentava ; porque, de quem ser podia, então sospeira meu deu, que todo o cantar seu era o da minha Maria ou a do dessejo meu. ^

^ Desiipjo, cem 2 ss representa a pronúncia originária conforme a etim., do L pop. diêêidiuni, [Epifânio].

■^ç^r

fláOULO ZTX

9^

68

Com hum temeroso prazer qoe soe ter qaem ddsse)a, dessejava eu de ver s qnera eu ainda veja antes da vida perder. . Neste dessejo, de dma estando-a eu ouvindo, a Deos ser ella pedindo, ví-a vir o vaie adma cm seu cantar proslgulndo.

69

Muito a vi eu mudada, mas com tudo conlieci ser a minha desse) ada a quem, assi vendo, vi, a vista no cliâo pregada, com o seu cantar penoso e passadas esquecidas ao tõo d'elle medidas, vestida vir de arenoso, ' as mãos nas mangas metidas.

70

HOa coisa não lavrada, antes sem nenhum lavor, eem cima, por mais dor, hQa talhinha pedrada ou bum pedrado atanor. * Qaisera-a ir receber veado-a ante mim presente, mas nSo pude de contente, que indo pêra me erguer, de prazer me achei doente.

71

Vendo então que me forçava o prazer fazer demora, olhei o que mais passava e vi que aqcelia hora comigo emparelhava; dando huns mui doces brados saldos do coração, i cantiga vinha então «Bm meus olhos agravados vereis se tenho rezão».

72

Ao que eu responder me lembra: «São agravados? Podem logo os meus dizer que são bemaventurados, pois que vos poderão versr Como ella em me ouvir grão sobresalto sentisse, quis fogir; mas quem lhe dissii que se posesse em fogir, lhe fez com que não fogisse.

73

Nas molheres o temor tanto o poder empede, quanto o medo maior for, e contra donde procede, os olhos cos tu mão pôr. Ella, fazendo assim, vendo-me ficou mudada; depois, em si tornada, se chegou mais pêra mim a ser bem certificada.

74

Depois de me visto ter, e que me conhecia, lagrimas lhe vi correr dos olhos, que não movia de mim, Sem nada dizer. Eu lhe disse : «Meu dessejo» vendo-a tal com assaz dor « dessejo do meu amor, crerei eu ao que vejo ou crerei ao meu temor ? »

75

A isto, bem sem prazer, me tornou então assim com voz de pouco poder : «Crisfal, que ves tu em mim, que não seja pêra crer? Eu lhe respondi : « Perder-vos de vos ver por tanto anno faz-me assim temer meu dano» que vejo meus oihos ver-vos e temo que me engano ».

t

1

De côr da areia. Vasilha de barro.

^2

ÀWrOfAmiA POBSIA

76

«Pois crê certo que esta s8o» deu a isto por reposta» ^ ainda que alegre não « e quem em tal dor he posta, que d'ella n9o crerão ! Bem he de crer o meu choro a que tu causa me deste : não t' espante o que fizeste, que quem me pôs neste foro tu es o que me poseste.

77

»

Por ti vim eu desterrada a estas estranhas terras de onde eu fui criada, e por ti antre estas serras em vida são sepultada, onde a se me perderem a frol dos annos se vão ; ora julga se he rezão das minhas lagrimas serem menos d'aquestas que são ».

78

Depois que isto falou, como quem em si respeita, as mSos ambas ajuntou e postas na face direita dizer assi começou : «Sobre o muito que perdi, nenhGa cousa duvido em ter o saber perdido, pois tão mal me defendi tio que me era defendido».

79

80

E, Crisfal, he-me forçado fazer a vontade sua, porque ih 'o tenho jurado e também porque da tua o certo me tem mostrado ; que me dão certa certeza porque fazem conhecer- me, o que eu ei por grão crueza, ò amor que mostras ter- me ser por minha riqueza ».

81

Ouvir-lhe eu isto me era passar o trago mortal, que nfo ha cousa tã^ fera como he achar-se o mal onde o bem achar-se espera. Vendo que estava posta em o que eu não esperei, com minha dor trabalhei por lhe dar esta resposta que me lembra que lhe dei.

82

«Ó Maria, 6 Maria, brando achara meu maU se, pêra minha alegria, vos vira a vontade tal como me ella ser devia. Mas não he nova usança, quem grande bem esperou não ver o que- desse jou. Muito pode a mudança, pois que vos tanto mudou !

à

Eu lhe perguntei a-hora mui triste de assi a ver : «Quem teve tanto poder, que tenha poJer, senhora, de nada vos defender? Respondeo por antre dentres, como faia quem se peja : « Dir-t'o-ei, em que erro seja : defendem-me meus parentes que te não fale ném veja.

Quem poderia sospéitar

que no amor e na

me avieis de faltar !

Mas pois isto assi he,

tudo he pêra cuidar.

Pois, por mais mal que se guarde,

sempre será meu amor

como a sombra, emquanto eu for :

quanto vai sendo maia tarde, -

tanto vai sendo maior.

1 Dacordo com a etim. rpposita.

sAouL* xri

225

84

88

Quando vos dei a vontade* inda vós éreis menina e eu de pouca idade ; flias cahio minTia mofina sobre a minh^ verdade. . Muito vos qais bem primeiro ^ne de riquezas soubesse ; pois meu amor verdadeiro, de quem sois interesse, ^oem me faz interesseiro.

« 85 '

Mas que fosse assi e mais, que remédio vos d9o, oom quem conselho tomais, á grande obrigação em que a Deos me estais? que nSo são ca^os pequenos pêra que a alma nflo doa ». Kespondeo : « Essa he boa I Dizem que isso he o menos, que Deos que tudo perdoa.

89

Sobre a terra anda o gado, t sobre ella ouro e riqueza ; mas pêra que he dessejado ? qne em fim nSo tira tristeza t aaescenta cuidado. Nlo aei em que se encerra icr esquecida e estranha esta verdade tamanha, ftca o a ver na terra, amor a alma acompanha.

86 .

E dizem que eu moça era ao tempo que isso foi ser; como tempo de crecer tinha, que assi justo me era^ te-lo de me arrepender. Isto e mais se me diz, crê que te falo verdade, que nSo tinha liberdade, pêra fazer o que fiz, por minha pouoa idade.

90

Nooa neste mundo nacemos

t nous sairemos d'ene; *

neste meio que vivemos

o rico he aquelle

Que ser contente sabemos.

E que grandes bêes vos dessem

aquelles que vo-los derflo,

ta sei bem qne nuns nacerSo,

e antes que os tivessem

he certo que n9o tiverão.

Então me mandão que meça amor com quão longe estamos, pêra que mais não me empeça, e, se prazeres passamos, os dessemule e esqueça e que então me buscarão hum mui grande casamento, tflo de meu contentamento quanto meus olhos verão, e que o mais crea que he vento.

87

Pois le isto he assi e o eu também conheço,^ •omo se crerá de mim que soffrer o que padeço pode ser a este fim ? Cuidar que cuidado tinha das vossas riquezas grossas 1 Nas eonsas passadas nossas vereis acr riqueza minha ▼ós, que não riquezas vossas.

91

E eu de mui esquecida

vou-lhe fazer o contrairo !

A ser tal culpa sabida

sei certo que este desvairo

pagarei com minha vida.

E em isto ser assi

assaz de rezão seria,

pois tão mal nsqueste dia

o seu mandado compri

como o que me a mim conipria.

Dístico qne tiadoz exactamente Job i, 21.

S9i

uraoi^aciA voBSí A

92

96

Nf o te veja aqui ninguém ; vai-te, Crisfaf^ d*esta terra ; nSo quero teu querer-bem, porque me nHo mais guerra da que dado me tem ». Em lhe isto eu ouvindo íui pêra lhe responder, mas, depois de o dizer, contra d 'onde tinha vindo se me tornou a volver.

«Amor de minha vontade» ora nom-mais, Crtsfal manso, bem sei tua lealdade : Jesu, que grande descansa he falar com a verdade ! Eu sei bem que nfo me mentas» que o mentir he diferente ; nSo fala d'alma quem mente ; Crisfal, n8o te descontentes, se me queres ver contente.

93

97

Dei hQa voz mui dorida : « Porque me negais conforto» a ima desagradecida ? EntSo cahi como morto ; oxalá perdera a vida I N8o sei eu o que passou em quanto isto passei, mas junto comigo achei quem me este mal causou, depois que em mim tornei.

Quando contigo falei aquella ultima vez, o choro que entfo chorei, que o teu chorar me fez, nunca o eu esquecerei. Foi esta 'k vez derradeira» mas começo da paixSo passando-me eu entSo para o Casal da Figueira do Vai de Pantaleio.

94

98

£ dizendo: «Ó mezquinha ! como pude ser tão crua f » bem abraçado me ,tinha, a minha boca na sua e a sua face na minha. Lagrimas tinha choradas, que com a boca gostei, mas, com quanto certo sei que as lagrimas s9o salgadas, aquellas doces achei.

Minha te he verdadeira: no mal que te fiz o vi, porque em fim á derradeira nSo quero mal contra ti que o meu coração queira. Por me ver livre de dor deixara eu de te querer, se o poderá fazer ; mas poder e mais amor não podem estar num poder »•

95

99

Soltei as minhas então

com muitas palavras tristes,

e tomei por concrusão :

a Alma, porque não partistes?

que bem tinheis de rezSo».

Então ella assi chorosa

de tão choroso me ver,

pêra me socorrer

com hua voz piadosa

começou-me assi dizer :

Neste passo acordei eu ; e o meu contentamento, que eu cuidava que era meu, deu-me depois tal tormento, qual nunca cousa me deu. Não sei eu que a Deos custava, porque não me outorgara que nesta gloria ficara, ou, pois que acordava, que d* isto não me acordara.

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225

109

102

haá oomo nos lugares, cm morte e ehterramento, ot sinos dóbiSo a pares, moneo meu contentamento dobrárSo-se meus pesares. Por qnio grão dita tivera, m por dar fim á tristura ca n'este tempo morrera I . Sabe Deus que eu bem quisera, nio quis minha ventura.

101

Por me isto alembrar» n8o vos pareça estoria, que as cousas de muita gloria, como as de muito pesar, recebe bem a memoria. Por sonho ante vós ponho o que eu velando vi ; por meu mal foi todo assi ; mas seja para vos sonho, pois sonho foi pêra mim ».

103

Nio vos posso mais contar, jgoos minhas, minhas agoas, mt nio me deixa o pesar. ôf» chorai minhas maguas, qoe bem sSo para chorar ; que em que cem olhos tivera, como teve Argos pastor, ds vaca Io guardador. mais olhos mister ouvera pêra chorar minha dor.

Isto que Crisfal dezia, assi como b contava, hda ninfa o escrevia, num alemo que alli estava,

2ue ainda ent&o crecia. >izem que foi seu intento de escrevê-lo em tal lugar pêra por tempo se alçar onde baixo pensamento lhe nfio podesse chegar.

\.

104

Eu o treladei d*alli. donde mais estava escrito que aqui nSb eacrevi, porque mal tSo infinito nSo se lhe pode dar fim. O que se fez de Crisfal nSo sabe certo ninguém : muitos por morto o tem, mas quem vive em tanto mal nunca v6 tamanho bem.

CiistoTio Paleio, Obraa^ ed. Epiphanio, cit. no texto.

926

UnOLOttlÁ POBSLà

xvn

Carta a António Pereira., Senhor de Basto. X quando se partlo pára a Corte

Este António Pereira era o iimio mais Tclho de Nano Alvares Pereira,, filkt de Joio Rodrigues Pereira, de alcunha o Ma/rramaque, senhor de Cabeceiras de Basto. Segne-se a ed. o a Sr.^ D. Carolina l6dialU««

1

Como eu vi correi pardaos ^ Por Cabeceiras de Basto. Crecer em cercas e em gasto. Vi por caminhos tam mãos Tal trilha, tamanho rasto. Nesta ora os olhos ergui A' casa antiga e á torre Dizendo comigo assi : Se nos deus não vai aqui, Perigoso imigo corre !

É entrada poios portos No reino crara peçonha Sem que remédio se ponha. Vms doentes, outros mortos^ Outro polas ruas sonha. Fez nos a ousada avareza Vencer o vento e o mar. Vencer ca]e ^ natureza. Medo hei de novo a riqueza Que nos torne a cativar.

2

Nfo me temo de Castela Donde guerra inda nSo soa, Mas temo-me de Lisboa, Que ó cheiro d 'esta canela O reino nos despovoa, E que algum embique ou caia I O' longe va, mao agouro Falar por aqueila praia Na riqueza de Caml^ia, Narsinga das torres de ouro.

Penedos sobre penedos De que as serras sSo cheai» Vistas se vos fazem feas. Direis dos vinhos azedos O que )a disse Cineas ' A quem, nos convites dado * A provar se lhe aprouvesse, Despois, nos olmos mostrado. Nunca vi (disse) enforcado Quem a forca assi merecesse»

Ouves, Viriato, o estrago Que ca vai dos teus costumes: Os leitos, mesas, os lumes, Tudo cheira : eu olios trago. Vêm outros, trazem perfumes. E aos bons trajos de pastores Em que saístes ás pelejas Vencendo tais vencedores, S&o trocados os louvores, S&o mudadas as invejas I

A's vozeiras montarias Derribar aves que vão Cantando inverno e ver9o. Que ai é se hSo remir dias Do enfadapiento aldeSo? Que trabalhosos concertos Os de vilãos mal criados, Os de viUos mal cubertos. Os de viiSos pouco certos, Muito desarrezoados.

t

8

Antiga Moeda da índia. Ministro de Pirro, rei do Epixob Banquetes.

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22?

Direis» e n9o vo-lo nego ; Porem quereis que vo-lo diga ? Este mnndo é armado em briga, Nio achais nele asossego Nem naquela ermida antiga. M«s porem ha diferenças Antre o de ca e de la : Ca nas mais das desavenças Vos éreis o das sentenças, La embaixo ontrem as dá.

11

Os bons convites antigos, Antes de se tu0o alçar, Erflo pçra conversar Os parentes e os amigos, Qoe n^apera nrrebentar, E de viver juntamente HouverSo convites nome, Soltos ós olhos da gente Que vissem quam santamente Ali se matava a fome.

8

Effl troca tereis manjares, ComposiçOis delicadas» Uas sobre outras grosadas, Por perigos, por pesares Primeiramente compradas. Convites de quem convidai AmostrSo vos suas tendas; Quanta cousa é i perdida l Ceas imigas da vMa, Imigas mâs das fazendas.

De i^o o cheiro, de isto a cer Qoe não tem preço igual. Milagres de Poriugal! Cousas de tanto sabor, Todas a saberem mal. Onde se ha de lançar tanto ? Aquilo é pagar o pato ! Em fim, quando me levanto. Ou bel de morrer d 'espanto. Ou se não me espanto, mato.

IO

Que contas v3o tam erradas I Enfastia o que sobeja I Quem come o que nf o xleseja ? Soilo ser as convid idas Vontades, agora é inveja. Entra comnosco a manhS, E' ]a dia, e pedis velas. A tal cea coitei Quanta inguaria vS A fora a &s escudelas.

12

Aquela ufana rainha, Irma do vil Ptolemeu, Que o rico pendente deu Prodigamente á cozinha ^ De um grande banquete seu, Vendo tudo ir se a perder Todavia convidava. porem não de viver, Mas de assi juntos morrer 0*s tais convites chamava I

13

A vossa fonte tam fria Da Barroca em julho e agost* (Inda me é presente o gosto) Quam bem que nos i sabia Quanto na mesa era posto ! Ali não mordia a graça, Erão iguais os juizes, Não vinha nada da praça. Ali da vossa cachaça. Ali das vossas perdizes 1

M4

Ali das fruitas da terra, (Que cada tempo a sua) Colhida á mão cada Qa! 'Nunca o sabor a vista erra, Cheirosa, formosa, e nua. Oh ceas do paraiso Que nunca o tempo vos vença. Sem fala da nossa ou riso. Nem carregadas do siso, Nem danadas da licença I

1 Alude a Cleópatra q«e ícx diaaalfci em vinagre nma pérola, para dar a be- Wr a Jlarco António.

15 Dei f, o gosto diamando -A outros mdrei sabores, , Liamos pelos amores Do brsvo e furioso Orlando, * E da Aicadia bons pastoi». Se eu Isto estimado agor^ Vira como d'antes era, PoT meu conto avante fora. Mas nfo diz ora com ora ; VIo se como ò fogo a cerai

16 Qoe troca ver la Pasquines Portugueses cento a cento (Quem o ve sem sentimento T) Tratar os livros divinos. Com tal desacatamento! £ o que nilo podem ousar De ler se em glolhos nSo, (Que graças pêra chorar!) Torcem iazendo falar O' iom da sua paixSo. »

17 Esquecidos du conselho. Pudera dizer mandado. Sendo por quem foi vedado No santíssimo evangelho: 0's cais não deis o sagrado. Almas que ós sonhos andais, O multo nSo o troqueis Por nadas, como o trocais; As perlas orientais 0's porcos as não lanceis. »

De atambor que á guerra chama, Leva o velho, leva o ma{xi; Primeiro entra em destroço Que perca de vista Alfama. *

20 Ah vida dos lavradores. Se eles a conhecessem bem As avsnlagens que tém Aqueles santos suores * Que santamente os mmiem. Tratando coa msdie antiga Que de quanto em si recebe

ÍN3o entK engano ou ma llgi) 'or seu costume se obriga A tornar inals do que deve.

Ha uma varjaolc notável Dtsta est. IS, que icprodaiimos pela

cpois do T. •Do bravo efarioso Orlando* acreiccDta: Envoltos tm taatas llSrts Líamos os Assolanos De Bembs, easenho tam raio Nestes diiradeiío» annos, E os pastores italianos Do bom *elho Sanaazaro.

Allusets a Gil Vicente?

Os VT. írifados sam trad. de S. Nal. VII,

D, Joio It. Lêr Reseode. Cron. c. 110.

O céUbit baiirode Lisboa.

Das Georff , ii, 459 Uli fortunato» n

" \

229

21

WtémtoBto aqooks aosiot

AotifOf yãátts prímeiroi

Eão JK> começo intèifot,

Eão Mntaraente grossos.

Sem mal como os seus cordeiros,

JKcgkios da natureza ;

Mio tanto papel escrito

De ipte um nzã e outro reza

cansarem sem certeza *

Ooode jáz somente o fito.

22

Foi sem malfcla e mao erro A boa Idade dourada. Segaia logo a prateada; Nlo tardou nada a de ferro Que tudo troQve á espada. Quanta sombra aqui aparece! Tapai me a boca com as mftos! On atras, que nâo me esquece, lambem por ca adoece. VSo porem ares mais sios.

23

Por isso a gentilidade Com sua filosofia A deus da saúde erguia ' Tempio fora da cidade Onde os seus votos he ouvia. E aquele Vlrbio a quem ' Tomara a vida, fa ás festas Nem ás cidades nfo vem, Sempre por fora o vêm Caçando polas florestas.

24

I que encontre um lobo c9o, Um. nsao que se erga em pé, liso menos má\ n9o é. Que onde eles t9o bastos s8o Qoe antre eles se dorme e sé. ^ Da cousa claramente logo quem a ave, se vela. Chega se á que branda sente ; Por iaso á antiga serpente PinUo rosto de donzela.

y

25

Mossoa maiores se alguém Louvavão, nlo de senhor, Nflo de rico era o louvor, Chamavio lhe homem de bem, E ainda bom lavrKdor. A nossa gente que quis Arremedar nos louvores Que agora parec«m vis,- Aos bonis reis Sancho e Dinis * Chamavflo lhe lavradores.

26

Os valerosos romanos

Antes que o tino perdessem*

Donde cuidais que escolhessem

Cincinatos e os serranos *

Que ante si em campo puaeaipm?

E aquela sua grandeza

Que o tempo n9o quer que monra«'

Vemos que a mais da nobreza

Sobrenomes de riqueza

N9o pôs, se não da lavoura.

27

Inda hoje vemos que em França Vivem nisto mais á antiga ; Na vila o vi 9o se abriga Onde tem nome e herança^ Vive i da sua fadiga. Acende a fragoa o ferreiro O' tempo que o galo canta; l^orde o couro o çapateiro. Brada co moço ronceiro Que saia de baixo da manta.

28

Vive a nobreza por fora Segura, despovoados ^ Corre cos lobos ousados. Por d'arredor donde mora Mantém livre o campo aos gados» Da gente aventureira Que ás escuras traz sem trato Que possa livre quem queira Cantando ir de noite á feira Ou dormindo no mulato. "^

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3

4

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Escnlapio, cujos templos eram nos bos^oes.

Virbiê az li§ bis «^ homem duas vezes.

de $edcf^^é, muito freq&ente em Gil Vicente. Vej. Obras ^ iii, 398.

D. Sancho o Agricola on Povoador e D. Denís, o Lat^r idor.

General romano qoe abandonou o campo pela acção política.

Despovoados = dos. povoados.

Mulo, macho.

15

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AKTd&OaÁ -^ rOBSU

29

Bom tempo quando 8e^ffe A cabeza se encostava. Onde o sono a convidava, Contente de cobertura Que lhe o fern.oso ceo d9val Bebilo da agua côas as mSos Nas fontes inda em velhice, Mllbor que por vasos v8os. Lavava a agua os peitos slos Antes da gargantoice ^.

30

Natureza nos posera

È^mo os olhos nos abriu) lante tudo o que viu Que necessário nos era ; D<>mais todo se sorriu. Como? Qa ave ja vezada A toda delicadeza E' milhor ajuizada? Foje a gaiola dourada. Vai buscar a natureza»

31

Jacob fugindo ao irmSo Que o ma! tinha ameaçado, Que andava assi antre o gad». Passou o rio Jurd9o Na ajuda do bom cajado. Como o sol no mar deceu, Levaria o seu fardel. Da agua no rio bebeu. Sobre pedra adormeceu. Pôs nome ó lugar Betei *.

32

Ua disposição má,

Longa enfermidade e dòr

Que de mal vai em pior,

Onde remédio achata

Se á natureza não fôr?

Leda da minha fadiga

Que em vSo tantas rezões gasta.

Que hizeis? que vos obriga?

Deixais esta madre antiga.

Is vos após a madrasta.

33

Por toda esta grande Espanha Froais que soião chamai ^, Fez em Pereiras mudar N8o do rei mouro a patranha Mas vosso antigo solar. Do qual não ha muitos anos Um que aqui Braga regeti, Pondo aparte os longos panos» X) passo dos castel^ano^ A' espada o defendeu.

34

Ao reino cumpre em todo ela Ter a quem o seu mal doa NSo passar tudo a Lisboa, Que é grande o peso, e com ele Mete o barco na agua a proa. £ mais is «ros muito ao ponta Pêra qualquer apetito. Então eu ouvi um conto : A quem espreita e está proniOy, Não vades mudar o fito.

35

Tereis la conversaçõis. Tereis graças delicadas. Do ar do paço ajudadas; Passarão deiivaçOis Se a todos »9o passadas. TransposerSo os amores, DeixarSo o paço ás cegas. Saem através ma nte dores, Rousinois asoviadores Polas hortas d*Enxobregas.

36

Vereis barcos ir a vela Vms que \ So, outros que vêflà Como que desávem Ctka viração singela ; Tanta força a arte tem; Os marinheiros vadios Que vilmente a vida apreçSo,. Nas enxárcias dos navios Volteáo como bogios Inda que vos ai pareçam.

* Rabelais tiron d* porto^ts o H«me de Garlintna. D. Carolina Micha^lis, Obras de S. de M,, 804.

' Quando fugiu de se« innSd Etaa, Jacab fundou o In^ar de Betei -^ Gen* mil, 17.

* Froais Forjais Forjases. FerérOM, alnsie, talvez, «o vtt do froda Condestircl, D. Gonçalo, arcek de Bra^ no meiído de séc. ziT.

WtCXJUi XTi

231

37

N3o bei por perda esta leve. Que se)&o palavras tudo Mas ó coraçSo acudo. ' Se n2o, dizei quem se atreve A dor esperá-la oiudo. São elas porem muitas, Fe-las ir crescendo a magoa, Lembro vos as vossas fruitas ! Lembro vos as nossas truitas ! Que andâo ja por vossas na agua.

Si de Miranda, ed. da Sr.* D, Carolina Michaélis, 237 a 250.

XVIII

Egioga Basto

PoBÍortê da Egioga:

1

Basto

Como oorre e como atura Quem vai após o seu gosto. Quer. por frio, quer quentura E no suor do seu rosto ! Bvaca ás weze& da ventura, Sem ^vkiA e seiri escon]aio Còa Biedos se desafia. vai afotito e seguro De noite polo escuro. For montes ermos de dia.

BASTO representador Í?'f ^^ 1 contendores.

GIL I

Onde quer cho demo jaz ! ^

Pêra haver d 'embicar nele;

Topei c*um lobo rapaz ',

Dei me cos meus cães trás ele,

Tive da fadiga assaz!

Eis que traspõi, e eis que assoma f

Desfazia me correndo :

Toma aqui, cão, ali toma.

Cego da perfla em soma

Fui me traspondo e perdendo.

Este apetito que digo Qncin o desse a maleita i Qae traz mil artes consigo t Giar-te d*ele, que te espreita Por dar d'avesso contigo RcKto 6 si e rosto ó não, A fòftnna é feita assi ; Mal a conhece o viif o. Cuidas que a tens na mSo*: ■e rindo de ti.

I^to a quem não acontece?

Seja porem na ora !

Que ha de vir e n9o se estrece ^.

Estão se lindo os de fora,

A nos não no-lo parece.

A correr e a dar á choca *.

Este desafia mil ;

Vende aquele, compra e troca;

Outro traz graças na boca.

Faz falar se arrabil * .

Cho^it o. Era arcaico. As formas dos pronomes eram 1.* p. mi, me, m% 2.* p. ti, te, t», chi, chc, eh', vos; 3* p.— x*, xi, xc, s\ si, se. Cfr. NoLi- soa ed. das Cantigas de D. João de Guilhade e Jiev. Lus. ix, 184. S De Rapace^ que rovba. Sobre a etim. J. J. Nunes, Comp. de Gr. Hist, 377.

* JDerirado do castelhano, Terbo imp., esterce estorce=eTÍta. A Jogo da. bola. Sr.* D. Carolina NichaSlis, 776.

* Espécie de rebeca asada pelos pastores.

2S2

A>TOLMRA VOBSU

Cuida que as natnora todas, Nao sei quem che, por fennoso *, Vai se ás festas, vai se ás bodas; Teobo me eu co dadivoso :

8ue unta o carro, andflo as rodas, randes cousas, capa em colo ' Conta, (se elas sáo assi) Que me dSo volta ao miolo; Deve me de ter por tolo, £u a ele outro que si.

Como lontra jaz no rio Um que o seu gado mal passa. Ele piesca, ora co fio Ora cana, ora com naça ; Outra anda sempre em cio, <E nio sei como se chama), Parte e deixa a molher nova Dando voltas pola cama, Ele por neve e por lama Corre cos seus c9es a prova.

Vai assi ja muitos dias Que n9o torna atras ninguém ; Bebemos das bemquerias * Que cada um consigo tem, Damos d'essas rezOes frias. O bom Gil sendo mais moço Muita da terra correra. Vem um, vem outro alvoroço : Co seu fardel ó pescoço A ser pastor se acolhera.

8

Ora ele assi pastor sendo, Se primeiro andara mal. Foi apalpando^ foi vendo Antre nos que era outro igual. Também se foi delambendo! Uma vez lama, outra p«o, Sempre homem anda achacado! Fez inda mais outro voo : Por milhor houve andar soo Que assi mal acompanhado.

Era grande amigo seu Bidio, e vendo a tal mania, Constngo acinte la deu. Tiverio grande porfia, Um rezôis deu, outro deu : N8o ha quem se nAo defenda A pareceres alheos. Antes dez quedas que emenda I Contar vos nei da contenda > Sem meter verbas nos meot : '

10

BÍEITO

Que é isto, Gil, que assi triste Te nos fez este ano abril? NSo sei que demo tu viste» Que tu nfto pareces Gil. Di me e u te nos sumiste ? U-lo aquele grande amigo U-lo dos bofes lavados D*^queles do tempo antigo? Que o siguro e o perigo N8o mos trazia encubados.

11

Assi tSo soo te vieste? Tomaste forte borrflo I Tantos amigos vendeste, Por não sei que nem que n3o. Que nem a mi o disseste. Ora dl me, se te praz. Depois de tanto sol posto. Tal inchaço inda em ti jaz? Arrenega o mal, que traz Sempre consigo mao rosto.

12

Tu olhas me de traves? Parece que a mal o tomas» Mas se tu inda este es, Nâo hei medo que me comas Por mais mudado que estes,. Que inda que certo hajas feito, (ja tamanha mudança, Que te tem como desfeita, D'este nome de Bieíto Sequer has de ter lembrança.

1

s

3

Explicado atrás. Egual a é.

De bemquerer, bemqueria, mas aqai as cabaças de vinho.

Apostilas ou notas.

■iOIflA XVI

283

ia

Moitas fezes esmug^o, Gil amigo, em ti cuidAodo, braiãflra e bom ensino Que departias estando Doas oras c'um menino ; Olha bem, olha o que fais, > Tinhas tantos de bons modos Cos iguais e nSo iguais, Dés que em ti faiem os mais Quando estavas bem com todos.

14

Que se fez do teu cantar ? Ninguém nSo cantava assi. Mas, para que é perguntar Se nao que se fez de ti ? Onde te iremos buscar ? NSo ha ora nm tanto espaço Quando Gi nebra ca sou Com Gregono teu coJaço, . Quem teve rosto M do paço ? Quem tangeu e quem cantou ?

15

Morreu do gado miúdo ? Foi nm andaço gerai ! Nào se pode lograr tudo. Virá ban após o mal. S)fre, que sofre o sesudo, Arremga d >s assanhos, ii 01 devias ter provados ; N9o alo os ma es tamanlios I Se Ido foi o inverno de anhos Outros vir3o melhorados.

16 Gil Seja, amigo meu Bieito, Es:a vinda, em hora boa. Eu digo am^go escolheito Como quem o leito coa Que deça limpo ó seu peito» £. respondendo ó que dizes : Ves me fardel e cajado ^Sovon armando a buizes; ^ sei que ha muitos juizes. Ando tias este meu gado.

17

E espreito andando o que quer. Parece que folga mais Por agora de pacer Por» estes andorríals. * Faça como lhe aprouver. Que por certo homem dirá Nas cousas que nio sflo certas, Eis nos ca e eis oos Ia. A's Vezes no pior se A's vezes também acertas.

18

Do mais que pesa e vai (Ca a nos parece noi muito) Diz Toribio, diz Pascual Palavras vans e sem fruito, E ás vezes ainda sem sal. Quando a bibora no ar morde,- Por mais peçonha que tiagá, N3o temas que inche e que engorde j Não hajas medo que acorde Bradando pola triaga.

19

Ves tu cousa que este queda ? Ora é noite, ora amanhece, Ora corre ua moeda. Ora outra ; tudo envelhece, Tudo tem no cabo a queda. Nas vilas um bailo dançSo Em que todos ó som cmdão, Ums ca, outros la se lanção; Como ó tanger não alcançSo Mais pês nem braços não mandão.

20

Do leite e sangue empolado

O bezerrinho viçoso

Corre e salta polo prado,

Despois lavra pergulçoso.

Tira o seu carro cansado.

Cos dias e co trabaiho

O brincar d'antes lhe esquece,

N9o é o que era almalho, ^

Venda se pêra o talho

Que este boi velho enfraquece l

^ o qoe fazes. FaÍ9 é assim empregado por Gil V. ' Caminhos isoUdos. * Bezerro, novilho.

284

ANTOLOOIA rt»B0IA

21

No começo os erros têm Bom remédio, ao diante Têm o mao; se n9o vas bem,. Pior irás roais avante. Torna atras que te convém. ^ NSlo o tenhas por amigo Que te anda sempre a vontade Dissimulando contigo. Olha aquelle dito antigo: Que enfada muito a verdade.

22

iVlal vai quem sempre empiora ! E que língua a dos pastores ! Um olho ri« outro chora. Este diz que sSo amores, Outro mais que é mal de fora. Um se torce» o outio diz: (E* mao jogo este das línguas) Ou tal fiz ou tal n9o fiz. A cada canto um juiz!* Entre tanto á praça as minguas.

23

O moço que entra em terreiro E não toca o chão de leve, Polo ar voa o pandeiro, ^ E a toda a festa se atreve Ele com seu parceiro. Este tal baile, este cante, Este seus jogos ordene. Corra, va, pase adiante. Este voliee, este espante. Este penas e pene!

24

Mas quem se vêm das pontas, NSo acha o que soía em si, Começa entrar noutras contas : Ouvi mVhor e vi. Suar e passar afnntas. Vai se o tempo, tudo foge, Corre o dia após o dia; Queres que homem não se anoje? Que me não conheci hoje NQa fonte em que bebia.

25

E porque ora te conte De como te aconteceu : Quando me eu ta) vi de fronte. Dos olhos agua correu Mais que corria da fonte^ Passou se me a sede em fim Que me aquela agua mostrara E a tal desacordo vim, Quando tornei em mim. Grande espaço o sol andara.

26

BlElTO

Come de toda a vianda, Não andes nesses entejos, * Vai te por onde o carro anda. Tem te ás voltas com desejos. Passa o mal cedo ou abranda. Ves como os mundos são feitos? Somos muitos, tu es. Poucos sSo os tatisteitos. Um esquerdo, outros direitos. Parece que anda ao revés.

27

Dia de maio choveu : A quantos a agua alcançou, A tantos endoudeceu. Houve um que se salvou ^ Assi então lhe pareceu. Dera vista ás sameadas, ^ Essas que tinha mais perto. Viu armar as trevoadas. Alongou mais as passadas, Foí-se acolhendo ao cuberto.

28

Ao outro dia um lhe dava Paparotes no nariz; Vinha outro que o escornava ; I também era o juiz Que de riso se fíriava ; Bradava ele : homens, olhai: Ião lhe CO dedo ao olho. Disse entSo : e assi che vai? Não creo logo en? meu pai Se me d 'esta agua não molho.

1

3 3

4

Noutra poesia chama-Ihe adufe. Ambos os tennos hoje ainda empregados. Aborrecimento ou aversão. Campos lavrados e semeados, Veja-se atrás explicado Sste pron.

vn

m.

29

Apaixonado qual vinha Adioa num charco que farte. O conselho havido o tinha. Molhou se de toda parte, Tomou a como mezinha. G)mo o virSo la corre r9o. Um que salta, outio qne trota, Quantas graças que i íizérão, '^ Logo todos se entendérSo i Eis hs, vflo ntta chacota.

30

GJL

Tu sabes que eu me abrigara A esta vida de pi^stor : Vinha mui corrido á vara. Cuidei que era cia milhor Como quem SLjião proyara. Determinava de Andir trás estas ovelhas. A conta saiu me má. ^ Más fedas vâo jea e Ia Que bem cho dizem as velhas.

33

Essa vez que saem á rua, Estremece toda a aldea, Eles bebem, homem sua ; Doi lhes pouco a dor alhea ; Querem que nos doa a sua. Inda que o dano é em grosso. Poderá o dissimular, Isto, parceiro, não posso : O entendimento que é nosso* Nfto no-lo querem deixar.

,34

Polo qual CO meu fardel

Fugi das vossas aldeãs ;

Não trago nos beiços mel.

Que não são cresta colmeas,

Nem posso ser ministrei, i

•A suidade não se estrece.

Porem sofra o coração,

(Que este é o que mais me empece)»

Se outro senhor nâo conhece

Salvo justiça e rezão.

31

Um vento apns outro vem : Andara muitos lugares, Viia ja muito, c porem O que n9u eisprimentares, Nâo cuides que o sabes bem ( Quando. Bieito, ]a cuidamos Que algda cousa entendemos, A' cabia cega fuga mos. Achei vos ca fortes amos, Querem que os adoremos. .

32

Para cousas que acontecem. Quando os b.iscas, ora o sono, Ora achaques mil te empeçam. Ao trosquiar achas dono. A's pressas nâo te conhecem. Tudo lhes o demo deu I Quantos suspiros em vão ! Quando te h9o mister, es seu. Quando os has mister, es teu. Que não tens amos então.

35

Então queixo me te logo, Que em casos que ar ontecério, Vi me por eles no fogo. Bradei, e não me valerão Nem os brados nem o rogo. Ali me sai treu quedo ^ A quedo, e fará um dia O que outro não fez, e hei medo De ver môr vinga «lya cedo Do que 'gora queria.

36

BlEITO

Trouxeste me ora á lembrança Aquele amigo fu3o Que, ó tempo d 'essa mudança Tua, foi te assi á mio Como quem os dadvi^ 1 inça. E lembra me ora bem tudo, (Que era eu i no tal ensejo Inda que então me fiz mudo) Falou te como sesudo ; Parece me ora que o vejo.

^ Homem de doces palaTias. Minestrel i. é., menestrel, trovador.

-^RMMU

\

37

Ditse : mttito em çra boa. Mas €u antre este meu gado Dizem, de vespora a m a. Cada ora me acho enganado. Não i tudo como soa, Dir te hei o que me acontece Quando n'este rafe estou. Qualquer outro que aparece Muito milhor rre pi tece, Não i assi quando vou,

38

11

N8o porqae cada um foça Quanto lhe á vpntade vem, (Que essa seria frraçs) Mas entendo o sabtr bem Do que se vende na praçal Porque o tempo fez abalo. £ somos em forte ensejo Inda alevanto outro valo Que nos doentes nSo falo A que mata o seu dese)o.

42

Agora, Gil, o que eu digo:

A la fe, que hei mui bom medo.

Quando debates contigo»

Que te estém ir ostra ndo so dedo

Pedro, Giratdo e R( drigo.

NSo queiras ir muito ao fundo

Inda que ora tanto entendas,

Nfio has de emendar o mundo.

Nesta rezSo me fundo

Por mais que d*elas despendas.

d9

Bem vejo que a verdade era Ir polo fio da gente; Cos outros te respondera^ E o amigo e o parente Que murmurar nlo tivera Porem assi nSo mnto, Nfto finjo, nio lifonjeo. Som farto ou que som faminto. Que mal é o meu distinto Antes seguir que o alheo?

43

Perigosa é a dianteira f Deixa ir diante es mais velhos! Com a paixSo tençceira Nvnca hajas os te ns conselhos. Sempre foi < onselheira. Quem corsigc tr^z rancor E em espreita i-nda do mal, Nunca lhe falece dor, Mas se o bem i^iial n9o for. Seja o coraçSo igual.

40

Gil

Se cos tens r lhos t]9o vejo Nem ouço cos us í u vi dos, Todo o debate é sobejo ; Reges te por teus sentidos. Também poios n eu^ me rejo; Comes tubaras da terra, Eu nio as posso romer : Pará que é sobie isto guerra? Nem um, nem outro n9o erra. Come o que te bem souber.

Vou fugindo ás armadilhas Que via armar e tecer ; Não quero ouvir maravilhas A's vezes mui más de crer. E contSo d'elas em pilhas! Querem que homem ouça e crea ; N3o ja eu ! crea o nosso Jane, ' Crea o baboso d'aidea. Que traz sempre a boca chea Das filhas de dom Beltrane 1 .

44

Olha se a rezão concrude : Es doente, teu pri náo? Digo outro tal da viríude : Pola ventura es tu sAo Porque teu pai tem saiide? NSo, que cumpre outra mezinha. Olhe cada um por si ! O bem nlo é ccmo a tinha,' Não se apega tam azinha, O mal pode ser que si !

Forma pop. equÍTalcnte a Joio.

"yrr

SAOUIA ZTl

237

45

me primeiro outra lenda : Deixárlo te os teus pss^doe Do gado e vinhas de renda Olha qno vão misturados Encargos coa fazenda. Compre a cada um que arrive Por si se desefa a honra ; Nio dizer : boms donos tive ; Que quem como elles nlo vive» Antes lhe sai em deshonra.

46

BlElTO

Pois contigo a rezão vai,

Vejamos quem mais conjunta.

Ollja que todo animal»

Forte ou fraco, aos seus se ajunta

Por distinto natural.

Volo as pombas em bandas.

Altos vfto os grous em haz, ^

Xio querem de nos viandas

Altas andurinhas brandas,

Querem companhia e paz.

47

Tona esemplo no teu fato Qoe o trazes ^nto em rebanho, Nlo rez e rez poio mato; Te o carneiro tamanlit) Se atras fica, é lambia to. "^ Mas inda hão mister mastins, Ioda funda e cagado hão, Qoe a estes lobos ruins Qoe decem dos montesins * Te ajudem sentar a mflo.

48

Eo vi |a sobre isto apostas.

Conta se do alifante

O qoe traz torres ás costas

Qoe ha mister quem o levante

Se di consigo de costas.

Se nlo fosse esta presta nça

Da fala e rezão do homem»

Per forças eie que alcança ?

Mister ha fazer llança

Se nio mãos bichos o comem.

49

Em esta liança tal Que digo, ainda não meto Salvan^e a do meu igual. Dos outros não me antremelo. Digo falando em geral. Como no mundo* apontamos, Tanto que em terra calmos. Dos choros nos ajudamos ; Antão para que prestamos? JSocorro e ajuda pedimos.

50

Fui um dia a vila» Gil, K logo, ó sair da casa. Mais verde que um perrexii ^ Cuidei que matava a brasa ^ De galante e de gentil. Bem plissei cos viandantes Mas desoois ia, quando cheas Vi ruas de outros galantes. Se eu viera ufano de antes, Nio tornei tal ás aldeãs.

^1

Dezia ura vendo ^me assi : Bom vai o do barretinho! Outros dar os o*hos vi. Outros chamar me ratinho. Tanto que me escondi. Finalmente poi acerto Vi alguns nossos de ca, Deixei os chegar mais perto,. Meti me antie eles por certo. Que tarde me acolhem Ia !

52

Um bacarote orgulhoso Diu vista ó gado ovelhum, De quexiquer espantoso ^ Trombejava ele um e um. Andava todo bravoso. Vem o lobo um dia e apanha Pelo pescoço o doudete, Abrandou lhe aquela sanha, Brada ai dos meus; em tamanha Pressa ninguém arremete.

1 t

a

4 >

e

Do lat. (icieit, em bando.

Partic. irre|{. de lambear = lamber = comer.

Lagares rosticus.

Salsa a táNrib^m da côr de salsa, como aqui.

Cuidei qoe excedia a todos.

O qoo se quer, qualquer cousa.

^23a

AHTOLOaiA POBSIA

53

Vlnhlo os porcos da aldeã Mais atras granhir ouvirio; Cada um d eles esbravea» Estes si que lhe acudirão: Perde o Icbo a sua cea. Ele solto, viu que o gado De branca estava olhando De longe, ainda amedrontado. Antes, disse, ser mandado Que a tal perigo tal mando.

54

Gil

Falas me nos animais A que nós brutos chamamos. Que guardSo leis naturais, Nós outros n§o-nas guardamos, A isso obrigados mais. Estes homens com quem tratfio, Piores que liõis bravos. Por força tudo rematfio ; Os 110 s n9o se resgatfio, Nfto se prendem por escravos.

55

Pêra que mandem nem rejão, Nlo v9o ás aguas tengidas Do seu sangue; se pelejâo, Nao aiçam forcas erguidas Onde ás aves manjar sej9o; Não têm repartida a terra Por marcos tam desigusiis Onde por possa nça perra ^ Um tenha de serra a serra. Outro nada ou dous tojais.

56

É cousa pêra espantar

Da irmandade das gralhas

Que vendo a Qa queixar

Decem gritando em batalhas]

Matão se pola salvar.

O que te digo. c assi:

Quem diz o qnc viu. não mente;

Guar te de embicar nqui.

Que verás passar por ti

O amigo e o parente:

57

Que nunca ouvi um rífSo

Mais corrente, mais usado

Que darem todos de mão

Se jaz o carro entornado^

Quantos vêm e quantos vão*

Falo porem em geral

Que a alma, dizendo isto, affronta;

Nfio quero que cuideis ai;

Amigos do meu sinal

Não vão eles nesta conta.

58

Andando assi n9o me empecem Mãos olhos nem más palavras, Nem me empecem se engafecen . Por outros fatos as cabra$; Curo as v}uando adoecem. Porque tudo diga em soma. Não me temo que o cabrito Me esconda o vizinho e coma. Aqui se a paixão me toma, Posso cantar voz em grito.

59

Que me não ouça ninguém, Somente a^ aves (que tais Duas aventagens tem D'esses outros animais. Voar e c;intar também), Ou o som da augua que cai Rompendo poios penedos, Dece ao fundo, e ó alto sai, Parte, e a grande piessa vai: Eles por sempre ali quedos !

60

Ves tu a minha cabana? Se o tempo se muda, a^l A mudo eu. Guiomar nem Ana Não d9o volta por aquf. Cantando se a muliana * Com dos outro^ seus solaos, Que me faç9o merecer Muitas d'est;)s varapaos Com seus olhos vaganaçs ^, Bons de dar, bons de tolher.

1

Poder injusto e vil. Pêra da ptro cio.

Cantijia popular, de baile.

Que vagueam, que nunca estão quietos.

.«• . UfcoULO XTl

239

6L

Ddxa me ver este seo, E o sol em que vai tal lume Que a vista nuaca soffreu, Aqnillo é uso e costume. Que tantos tempos correu ! Que daridade tamanha. Que fogo nele aparece: Quanto raio o acompanha I Dize se que o mar d 'Espanha Ferve quando nele dece.

65

Quando tudo era falante, Pacia O cervo um bom prado, E veu um cavalo andante. Quis comer algum bocado; Pos se lhe o cervo diante. Não que o prado fosse seu, (Que erSo pacigos gerais) Más tinha pontas e deu. Este quero e posso me eu Tanto ha que nos fez

62

Des i cobre se d'estrelas Tudo quanto arriba vemos, Põem se d'elas, nacem d^elas. que d'outra parte as vemos, E a iQa fcrmosa antre elas Que se renova e reveza, Ori um fio, ora crecente, Ora em sua redondeza, Cada mes com que certeza l Semelha a da nossa gente.

66

Vendo tam pouca prestança O cavalo de antes forro, Com desejo de vingança, Ped<u ao homem soccorro; Por terra aos seus pés se lança, Não pode á justa querela Negar-se» caso tam fco), Mas foi necessária a sela ; Põi lha e fàz se forte nela, Toma a rédea, e prova o freo.

63

Do mais dezia Pascual*: Sabeis que é o que nos come? Sio mimos, que nSo sSo ai ; Onde quer se mata a fome, Matio se apetitos mal. Pola calma e pola neve Natureza, a grande madre. Que em fim também no-lo deve, A tudo acudir se atreve Por mais que este ventre ladre.

64

Aqui por estes abrigos

tOis mais debates deixemos) % me hlo ver os meus amigos, O' sol nos estenderemos Falando em tempos antigos. £ despois dos meses mil Qttiçais inda dirá alguém Olhando este meu covil : Por aqui cantava Gil &m qaeixia de ninguém ^.

67

Assi dão volta ó imigo

O qual, como ao homem viu,

Entendeo o seu perigo.

Deixou o campo e fugiu.

Foi buscar outro pacigo.

O cavallo vencedor

Corre o verde, corre o seco.

Fora, foia o contendor!

Ficou lhe porem s^.nhor,

Não foi tanto o outro enxec« *.

68

Tu olhas como o sol anda; Folga ora» amigo, esta tarde, Este se á parte a demanda, Que se co'ella o peito arde, A cea fat^á mais branda. Com dous peixinhos passarás Do rio, nSo d almocreves. Que as viilas fjzem tam caras. Beberás nas fontes claras, Sonharás sonhos mais leves.

1 t

Sem ofensa, on qaeixome. Incómodo OB mal.

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f. ■•> -—

240

ASTOiÉoaiir -^ roíf u

BIBITO

69

Volves me as cousas do invés; Bem ou mal, quês que te crea O que tu quicas não crés. O coiaçSo é na aldeã, La me hSo de levar os pés. ,E tu dize o que quiseres, Torce ca e torce la ; Defende teus pareceres, Mas onde i nfto ha roolheres, Sabe que i vida não ha 1

70

Aquella graciosa idade, O parecer que nos furta Com tanta força a vontade, Com tanta o juízo encurta, NSo é de todo vaidade. Suspiraste I ora eu te intendo; Nós falaremos despois. Por ora a Deus te encommendo.

GIL

Não quero estar detendo.

BIEITO

Vou me (que é tarde) ós meus bois.

BASTO

71

Contf n se isto pola terra Em as juntas dos pastores Eis que logo um outro aferia Sobre quais rezõis milhores São, quem acerta, e quem erra. Porem todo o calendário Lido e contas recolheitas. Fica assi posto em sumario : De Gil : que é um voluntário. Homem Bieito ás direitas.

de Miranda, tòuf., pá^. 156 a 183.

XIX

Soneto

Aquelas esperanças que eu, metido A tormento, lancei fora por vãs, Que fazem ainda aqui com aquelas sãs' Confas, feito em tudo bebido ?

E será Amor tam cego e sem sentido. Será tam bravo, que não veja as chãs £ rezõis craras? não veja estas cãs? Tempo lançado a longe e nSo vivido I

Esta alma tantas vezes enganada Não hav'rá de si dó, não fará conta Co sol, coa despesa, coa jornada ?

Mas .ai! que vi ja alguém que, em quanto conta Que nadando escapou ao mar sem nada Põi se Qa e outra vez á mesma afronta I

de Miranda, xiid,, pág. 69.

sAomo x?i 241

Outro

Nfo sei que em vós mais vejo e n9o sei que Mais ouço e sinto ao rir vosso e falar; N8o sei que ve]o mais no calar Nem, quando vos nfto vejo, a alma que ve?

Que lhe aparece, onde quer que ela este, Que olhe o ceo, que a terra, o vento, o mar? E triste aquele vosso sospirar Em qoanto mais vai, que direi que é?

Certamente nãa sei : nem isto que anda Antre nos, se é ele ar como parece, Se fogo d'oQtra sorte e d'outra lei.

Em que ando? de que vivo? e nunca abranda Por ventura se á vista resprandcce? Ora o que eu sei tam mal, como direi ?

de Miranda, ibid., pág. 75.

XXI

Outro

Este retrato vosso é o sinal Ao longe do quo sois, por desemparo Doestes olhos de ca, porque um tam claro Lume nio pode ver vista mortal.

Quem tirou nunca o sol por natural ? Nem viu se nuvens nSo fazem reparo, Em noite escura ao longe aceso um faro? Agora se nSo ve, ora ve mal.

Para ums tais olhos, que ninguém espera De face a face, gram remédio fora Acertar o pintor ver vos dormindo.

Mas ainda assl n9o sei que ele fizera.

Que a graça em vos não dorme em nenhaa ora.

Falando que fará? que fará rindo?

Si de Miranda, %!tÀá,, pág. 451.

Í42

AHTÔL0Q14 <^ POB81A

XXII

Elegia a António Ferreira em resposta a outra sua

o filbo de Miranda Gonçalo Mendes de morreu em Senta em 15SS combatcnds contra oa Mooros, na mesma ref ra^a em que moiren também ò ami^ particular dt -D. Aaíobío de Noronha.

Esta branda Elegia, esta tam vossa, * Quero dizer de tanto preço e tal ' Que vai fugindo ante ela a hevoa grossa,

Bem vejo x]ue era a empresa principal Esta a que vinha, mas a dor recente Tempo esperava, cura mais geral.

Quando que àquela vea assi corrente Se deve f aquele engenho pronto e raro Que assi sente, assi diz tudo o que sente I

E mais em tal sazSo, tal tempo, avaro De louvores alheos, em gram dano Dos engenhos que se ach9o sem amoaro.

«

Vem um dando á cabeza e cortta ufano Cousas do seu bom tempo, ardendo em chamas Polas que fez : todo ai lhe é claro engano

AndSo se ás razões írlaa polas ramas Um vttancete brando, ou seja um chiste, Letras ás invençõis, motes ás damas,

Ua pregunta escura, esparsa triste I Tudo bem ! quem o nega ? mas porque, Se alguém descobre mais, se lhe resiste ?

E como, esta era a ajuda? esta a mercê? (Deixemos Ja as mercês) este o bom rosto ? De menos custa em fim que esta tal é ?

E logo aqui tam perto, com que gosto Todos Boscão, Lasso, erguerflo bando, ^ Fizerão dia, quasi sol posto !

Ah que n3o tornSo mais I vão se cantande

De vale em vale de ar mais luminoso E por outras ribeiras passeando.

^ Boscan e Garcilaso de la Vei^a qae antes de de Mirasda transportai pan Espanha es metros Italianos.

Kàcuu> xn 243-

Tornemos ao desastre a nós dioroso I Furtando m'ia á dor que inda ameaça Como um paito ao fugir maia perigoso.

N8o ouso inda a falar tanto de praça. Faio comvosco como em puridade, Incerto do que diga e do que faça.

Quando mandei meu filho em tal idade A morrer pola- ít, se assi cumprisse, (Que esta era a verdadeira sua Verdade) :

Tu vas peto caminho agro (lhe disse) Que tu mesmo tomaste á tua conta ! Sem perigos ^uem se acha que subisse?

De tempo que assi foge,\|ue te monta Vinte anos, trmta mais? que roontSo cento? Ergueu a vista a mim alegre e pronta,

Sospirando por ser la num momento, Se ser pudesse I tam de pressa os fados Corriam ! nomes vSos, sem fundamento !

EAt9o o encarreguei d*estes cuidados ; Deus e logo honra, logo o capitão. Quam prestes a cumprir foi tais mandados I

Parece que os levou no cora (9o, N9o soltos por defora nos ouvidos, (Como outros fazem, que perdendo os v9o).

Do corpo aqueles espertos sentidos. Mais inda os da alma tam limpa e tam pura. Ja agora os bons desejos s9o cumpridos.

Viu onde a deixaria em paz segura, De pressa á occasi9o arremeteu, Nio quis mais esperar outra ventura.

No dia do começo a conta encheu. Seguro viu a morte, espanto antigo. Nós sonhamos aqui, tu vas te ao ceu.

Ditoso aquele mestre dom Rodrigo Manrique, a quem em seu tempo louvou O fliho e deu ao corpo em morte' abrigo. ^

%

1 Po^rito Maaríque (1416-t476) foi deplorad por seu filho Jori^e Maariqae- t479 naqseU célebre elegia que começa « Htcuerde ti alma orida*.

24i AHTOUMIA POMIA

\

Era ela conta iguai que quem entrou Antes á vMa, saisse primeiro? _

Eu sou que devera ir ? quem nos trocou ?

Cordeiro, ante o trono aito do cordeiro. Lavado irás no teu sangue sem magua. Oh quem como era pai, fora parceiro f

A Paulo, da fe nossa ardente ihagua, Que pêra o flilio o pai ponha em tesouro, Parece natural um correr d*agua.

Não assi ao contrario, abaixo o Douro Aqui perto ao gram mar se lança escuro Mondego e Tejo dtfs áreas d'ouro.

Quanto mais certo contra o imigo duro Podes que outrem dizer : vim, ifi, venci, > Cerrando e abrindo a mSo posto em seguro.

NSo se vej9o mais lagrimas aqui. Salvo se por nos forem que em tais trevas E tam cega prisão deixaste assi.

Vai te a boa ora ; n9o tens de que devas Temer ; la tudo é paz, tudo assossego I Quem leva um tal seguro qual tu levas !

Ditoso, que-nâo viste de dor cego Por senhor um imigo da ttui lei ! A tanta pressa fora um certo emprego.

Quantas graças, meu Deus, quantas te dei Sabendo da alma que era libre e viva ; Sem ela ao corpo de que temerei ?

Sabia a sua condiç9o altiva (Nesta parte, no mais branda, humana,); Era para morrer, n9o ser cativa.

A sepultura que os olhos engana ' levíssima perda ; assi também E' lodo, é terra, é pó, terra africana.

E' levíssima perda ; assi também |

1 Ao anunciar a sua yitória sObre Farnaces Júlio César pronunciar as palavras, que ficaram memoráveis tent, viái^ uict.

BÚaCUO XTl

245

Que tam estreito mar antre si tem Abila e Calpe, foi tempo um somente, Dous agora, um d aquém, outro d 'alem.

Nos quais duas columnas pos <le fronte Herculeç, que ali entrada ao gram mar deu. Paiece antes quem crea que quem conte.

Os Gregos no que escrevem põem de seu A's vezes rnuUo e ha quem diz que chamadas Ja íorão as cohimnas de Briareu.

Acabemos nas bemaventuradas Almas subidas para sempre á luz Sem trevis, rindo la doa qossos nadas :

Um só, que em sangue aberta tcaz a cruz Branca por armas, deu Oens á cidade. Milagre que em sinais claros reluz.

Rotas as armas, rota a humanidade Por muitas partes, mouros a milhares. Morde se a inveja as mios, ri se a verdade.

0

Para as festas divinas que lugares Tam claros i ganhastes^poias lanças. Correndo ledos á tal gloria a pares. Sem fim, sem sobresaltos, sem mudanças.

de Miranda, ibid., pá^s. 461*465.

XXIII

Gantiga em diálogo

A este cantar das moças ao adttíe :

N'aqaêta serra Quãv ir a morar; Quem me bem quiser. me irá buscar.

N'este8 ]K>voados Tudo 8&0 requestas ; Deixai me os cuidados. Que en vos deixo as festas. D'aquelas florestas Verei longe o mar : Pôr me hei a cuidar.

Responde-Ihe outra companlieíra d'outra opinião :

Sombras e auguas frias. Cantar de aves bem ! Quando as tardes vêm Por ca bradarias. Ves que pressa os dias LevSo sem cansar? Nunca hSo de tomar.

A primeira :

Nlo julgue ninguém Nunca outrem por si! Mais d'um bem que vi A vida não tem. N9o deixa este bem Onde se ele achar Mais que desejar*

Deiía IS VI idades, Qne da mio i boca O ubor se troca ; Trocto se as vontades, Slo essas suldades Armadas no ar: Nlo podem durar. U Minadi, ibid., pi|. 42.

TrBqéd

Eii una idnali tntrtcha: i abre com oi*ctilitBci]<ot decenfiada alefriíd* Inti de Cutro apoitoi í Ama, c com ifÍTmacia do amoi de D. Pedro par eli i dlálole com o lecietirio, li Os aalicas ptisttdrin D. AIi^ksii > itiiti matai D. Inti II) Abic com o xnfao pittif io de Infi e lofo ttto lhe innndR a acntCDça bUl. IV. D' lad «pela pan clemenda ríil. irii debalde. E' o cG» qae nni di notídid* Bort*. V. O tecretaiio fai icienle o PcJDcipe, que rompe tm eiclamacio de dBr e d* rlBfiDfa. Exlratoi da ed., que àz, Gilmbn, 191S.

ACTO II El Rey D, Affonto IV. Pêro Coelho. Diogo Lopes Paehteo. Constíluiros.

Cota. Senhor, pêra que lie mais? moura esta dama Rey. Qae moura todavia V Pach. Senhor moura Por salva-lo do povo. Rey NAo he crueza Matar qnem nlo lera culpa ? Cons Muitos podes Mandar matai sem culpa, mas com causa. Rey. Com que cot, com~que. causa esta matamosT Pach. Nlo basta qne em sua morte se atalham

Os males, one sua vida noa promette? Rey. Ella que culpa tem ? Púch. occaslSo, Rty. Oh que ella nlo a di, o Iflante a toma, ^

Que [ey ha, quea condene, ou que Justiça? Cota. ' O bem commum. Senhor, tem taes larguezas

Com que Justifica obras duvidosas. Rey. Assl que assentaes nisto? Cons Nisto : moura. Pach. Moura. Rey. Kaa tnnocente? Cons. Que nos malat Rey. Nlo averá outro meo7 Pach. Nlo o lemos ^

Rey. Melê-la-ey num Mosteiro- CotíS. Ey-lo queimada R^. Mandí-la-ey deste Reyno. Cons. O amor voa. Este fogo. Senhor nlo morie logo.' Quanto lhe mais resiste, mais s acende. Contra Amot que lugar darás seguro? Rey. Matd-la he cruel meo, e riguroso. Pach. Nlo vês, nlo ouves quantas vezes morrem Muitos, que o nlo merecem 7 Deos o quer Polo bem, que se segue. Rey. Deus o faça, Cuia vontade he ley, e a minha nSo.

ftáccLo XYi. « 247

Púch, Essa licença tem também os Reys,

Que em seu liigar est9o. Rey. Antes nflo tem úcença pêra mais, que quanto ped% A razSo, e justiça : a mais licença He barbara crueza de infiéis.

Pach. Pois que dirás d'aque]les, que a seus próprios FilhoSp e a seu amor nSo perdoaram^ Polo exemplo commum, e bem do povo ?

Rey. Aos que o bem fizeram, hej inveja.

Os outros nem os louvo, nem os sigo.

Cons, Inda que houvesse excessos, todavia Mais males atalharam, dos que deram

Rey. N^ se hade fazer mi\ por quantos bens

Se possaiíi dahi seguir. Cons. Nem bem nenhum, De que se sigam males. Rey. Mal parece Matar htia innocentç. Pach. NSo he mal: Que a causa o justifica. Rey. Antes Deos quer Que se perdoe hum mio, que um bom padeça*

Cons. O bem geral qurr Deos que mais s 'estime, Qne o bem particular. Nas circunstancias Se salvam, ou se perdem as obras todas.

Rey. £ngan3o-se os juizos muitas vezts.

Cons. ^ Os dos Reys bem fundados Deos inspira.

Rey. Ey medo de deixar nome de injusto.

Oms. De fusto o deij^^rás, pois te consethas Cos Juízos dos teus leaes prudentes.

Paeh. Vês, poderoso Rty, vês cos teus olhos A peçonha cruel, que vây lavrando Gerada deste amor cego : vês quanto A soberba, e desprezo destes homês Contra ti, e contra todos, vay crebcendo. S'em tua vida nos tememos tanto. Que faremos depois de tua morte ? Por dar saúde ao corpo, qualquer membro Que apodrece, se corta, e pelo são, Porque o são nSo corrompa. Este teu corpo. De que tu és cabeça, está em perigo Por esta mulher só: corta-lh'a vida. Atalha esta peçonha, tê-lo-ás satvo. Medico» Senhor, és desta Republica. O poder, que tem o Medico num corpo. Tens tu sobre nós todos: usa delle. Se te parece em parte isto crueza, N2o be crueza aquella, mas justiça. Quando de cruel animo não nasce. Tua tençáo nSo pecca, em si se salva. A aspereza desfobra he medicina. Com que s'átalham as mortes, que adiante Muitos he que por força te mereçain. A clemência por certo he gr9 virtude, E digna mais dos Reys, que outras virtudes. Polo perigo grande, que ha na ira, ^

Em quem tfio livremente assi a executa : Mas com esta o rigor é necessário, Por nio vir em desprezo tal virtude. Eile he o que se chamou severidade.

j

348 AHTOLOaià POB8IA

De que tantos exemplos nos deixaram

Os famosos Romaõs em paz, e guerra.

Estas columnas ambas são tam fortes.

Que bemaventurado este teu Reyno, ^

Que nelias por ti está tam fundado.

De tal modo, Senhor, ás de usar d^ellas,

Que htla sempre d 'outra acompanhada^

Exemplos tens mostrado de clemência,

Mostra agora, que he bem, severidade. "Rey, A parte, que me cabe de^te feito.

Eu a ponho em vós toda, como aquelles,

Que sem odlo, e temor sois obr gados

Aquillo conselhar-me, que he justo.

Mais serviço de Deos, e bem do povo.

Vós-outros sois meus olhos, que eu não ye]o.

Vós sois minhas orelhas, que eu nSo ouço.

Minha tençfto me leve, t^lla me salve.

O engano se he vosso, em vós caya. Pach. Sobre nós descarrega esse teu peso. Cons. Eu tomo minha parte, ou tomo todo.

Almas, e honras temos; estas ambas

A ti. Senhor, se devem, a ti as damos.

Estas' sós te conseiham, que bem vês

Quam grande mal he nosso, o que fazemos.

Aventuramos vidas, c fazendas, Que em ódio de teu filho ficam sempre, \

Sob cujos pés ficamos, e em cuia ira. |

Mas percamo-noâ nós, percamos vidas;

Soframos cruéis mortes; nossos filhos j

Fiquem orfaos de nós, e desherdados ;

A fúria de teu filho nos persiga,

Antes que esse tal medo em^nós mais possa.

Que o que a virtude manda, e te devemos. i

Rty. Ivos appareihar, que em vós me salvo.

Senhor, que estás nos Ceos, e vês as almas, i

Que cuidam, que propõem, que determinam ;

Alumia minh'alma, nSo se cegue

No perijTo, em que está : n&o sey que siga. J

Entre medo e conselho fico agora : J

Matar injustamente he grã crueza.

Socorrer a mal publico he piedade.

D' htla parte receo, mas d*outra ouso.

Oh filho meu que queres destruir- mel

Ha desta velhice tam cansada :

Muda essa pertinácia em bom conselho.

Não dês occasiSo para que eu fique

Julgado mal na terra, e condenado

Ant'aquelle grã Juiz, que está nos Ceos.'

O' vida felicíssima, a que vive

O pobre lavrador no seu campo,

Seguro da fortuna, e descansado,

Livre destes desastres, que rejnaml *

^ Reminiscência de Vergílio, Georg, ii, 458-460, qae notámos igualmente de Miranda.

T=^

BKCUtO zvi '240

Ninguém menos é Rey. que quem tem Reyno. Ah que nSo he isto estado, he cativeiro De muitos desejado, mas mal crido. Huma servidão pomposa, hum ifrs trabalho Escondido sob nome de descanso. Aquelle he Rey sóoiente, que assi vive (Inda que seu nome nunca s'(>uça) Que de medo, e desejo, e d^esperança Livre passa seus dias. O' bons dias! Com que eu todos meus aiinos tam cansados Trocara alegremente. Temo os homés, Com outros dissimulo : outros nâo posso Castigar, ou nSo ouso. Hum Rey não ousa. lambem teme seu povo: também «-ofre. Também suspira, e geme» e dissimula. Nâo sou Rey, sou cativu: e tam cativo Como que.m nunca tem vontade livre. Salvo*me n » conselho dos que crco, Que me serão leaes: isto me salve, Senhor, contigo ; ou tu me mostra cedo Remédio mais seguro, com que viva Conforme a c?te alto estado, que me deste. E me livra aTgum tempo antes que moura, De tanta pbrigaçam, pêra que p ssa Conhecer- me melhor, e a ti voar Com mais ligeiras asas do que pôde Hlla alma carregada de tal peso.

ACTO !II

Choro, Castro. Ama.

Tristes novas, cruéis.

Novas mortaes te trago, Dona Inês.

Ah coitada de ti, ah triste, triste !

Que nao mereces tu a cruel morte,

Que assi te vem buscar. Am. Que dízes? fala. Ch. Nlo posso. Choro. Cast. De qu2 choras ? Vejo

Esse rosto, esses olhos essa. .. Cast. Triste

De mim, triste I que mai ? que mal tamanho

He esse, que me trazes ? Ch. He tua morte. Cast. He morto o meu Senhor? o meu Infante? ^ Ch, Ambos morrereis cedo. Cast. O' novas tristes I

Matam-me o meu amor? porque m ) matam? Ch.' Porque te mataram: por ti vive.

Por ti morrerá logo. Am. Deos não queira.

Tal mal, tal desventura. Ch, Vem muy perto.

Nam te tardará muito, poem-te em salvo.

* Não pode nei^ar-se grandeza a este passo. Anunciam-lhe a morte dela JE' <»« morte! /Ias o. ata espírito tem uma tísSo c exclama: K' morto o imiuê^ ^»orf.,.

Fuge coitada, fuge, que As duras ferraduras, que u Correndo a morte triste. G Correndo vem, Senhora, ei EIRey te vem buscar deter Cera ti vingar sua furis. \ Salvar também teus filhos, Parte de teus mãos fados, i Sá, triste, perseguida ! ti.iy Onde estás, que nila vens 1 ElRey. Cast. Porque me tr Cruéis os que moveram a I Por ti vem perguntando. E Vem buscai, pêra com i Serem furiosamente traspa: Cumprlram-se teus sonhos Sonhos crucis 1 porque tau Mc quizestes saytf ó spritt Como nlo creste mais o m Que crias, e sabiasV Ama, Fuge desta ira grande, que Eu fico, fico só, mjs innoc Nlo quero mais agudas, ve Moura eu, mas inuocente. Vlvireis por mim; meu Que cruelmente vem tirar Soccorra me Dcos, e soi Vós moças di; Coimbra. Hi Esta Innocencia minb», soi Meus filhos nSo chorais; e Logray-vos desta mSy, de! Em quanto d tendes viva Cercay-me em roda todas, Defendey-me da morte, qu

ACTI

Pacheco. ElRey. Chi

Por m^goa dessas lagrima: Que esie tempo, que X^ns. Tomes pêra remédio da tu O que elRey era ti Uz. faz Nós o trazemos ca, nSo co De sermos em (i ceus: ma Este Rfyno, que pede . stj Que nunca, ó Deos quiser: Nos fora necc<.surlo. A elF Que crueza nSo íar : se a i Por il ante o grS Dpus ser Vingança justa, si' te nlo Que perdão mereci m^is na Com que elRcy conselham Dona Ines, tua morte I po:

8AOI71.0 ZTl 251

Se ganha boa geral vida a todo Reyno.

Bem vês por tua causa como estava,

Além desse peccado, em que te tinha , O Iffante forçada (que assim o cremos)

Mas pois pêra remédio he necessário ^

A morte sua^ ou lua, he necessário

Que tu sofram a tua com paciência,

Que isso te ficará por ma^ror gtoria

Que aqnella, que esperavas do Mundo.

£ quanto mais injusta te parece,

Tanto m: is Justa gloria terás,

Onde tudo se paga por medida.

Nós, que a teu parecer mal te matamos;' \

NSo viveremos muito : nos tens

Antes de muito tempo ant'esse trono

Do grã Juiz, onde daremos conta

Do mal, que te fazemos. NSo ouviste

das Romis, e Qregas com que esforço

Morreram muitas por gloria suA?

Morre pois. Castro, morre de vontade,

Pois nSo pôde deixar de ser tua morte. . Triste pratica, triste! ciú conselho

Me dás. Quem o ouvira? mas pois mouro»

Ouve-me Key senhor : ouve primeiro

A derradeira voz dest'alma triste.

Co estes teus pés me abiaço, que nfio fujo. .

Aqui me tens segura, Rey, Que me queres I

Que te posso querer, que tu não vejas I

Pergunta-te a ti mesmo o que me fazes.

A causa, que te move a tal rigor.

Dou tua consciência em minha prova.

S'os olhos de teu filho s*enganáram

Com o que viram em mim, que culpa tenho V

Paguei-lhe aquelle amor com outro amor« ^

Fraqueza costumada em todo estado.

Se contra Deos pequei, contra ti nSo.

Nlo soube defender- me, dei- me toda. .

NSo a Imigos teus. n9o a traidores,

A que atguns teus segredos descubrísse

Confiados a mim, mas a teu filho

Príncipe d'este Reyno. que forças

Podia eu ter contra- tamanhas forças.

NSo cuidava, senhor, que foffendia.

Defenderas-me tu, e ol)edecêra,

Inda que o grand'amor nunca se força:

Ignaloiente foy sempre entre nós ambos:

Igualmente trocamos nossas almas.

Esta que te hora fala, he''de teu filho.

Em mim inatas a elle: elle pede

Vida par* estes fihos concebidos

Em tanto amor. N9o vês como parecem

Aquelle filho teu? Senhor meu. matas

Todos, a mim matando : todos morrem.

N&o sinto já, nem choro minha morte,

Inda que injustamente assi me busca,

Inda que estes meus dias assi corta

252 AXTOIdOOlA < POBSIA

Na sua fior indigna de tal golpe:

Mas siQtoí aquella morte t;i8te, e dura '

Pêra ti, e pêra o Reyno, que tam certa

Vejo naquelie amor, que esta me causa.

NSo vivirá teu filho, lhe vida

Senhor, dando-ma a mim : que eu me irey logo

Onde nunca appareça ; mas levando

Estes penhores seus, que ít^o conhecem

Outros mimos, e tetas senSo estas*.

Que cortar-lh'ora queres; hay meus filhos

Choray, pedi justiça aos altos Cecs.

Pedi misericórdia a vosso avô

Contra \ós tam cruel, meus innocentes.

Ficareis sem mim, sem vosso pay.

Que nao poderá ver-vos, sem me ver.

AbraÇ' y-mè, meus Çlhos, abraçay-me.

Despedi-vos dos peitos, que mamastes.

Estes sós foram sempre: vos deixsm.

Ah vos desempara esta mfty vosfa,

Que achará v(sso pay, quando vier V '

Achar-vos-á tam sós, sem vossa m^y :

N8o verá quem buscava : veiá cheas

As cfsas r paredes de meu sangue.

Ah vejo-te moiier, senhor, por mim.

Meu senhor, que eu mouro, vive tu.

Isto te peço, e rogo : vive,, vive.

Empara estes teus filhos, que tant*amas.

£ pague minha morte seus desastres,

Se alguns os esperavam. Rey senhor

Pois podes soccorrer a tantos males,

Soccorrc-me. perdoame. Não posso

Falar mais. N9o me mate.«, nro me mates.

Senhor nSo to mereço. Pey O* mulher forte !•

Venceste-me, abrandaste-me. Eu te deixo.

Vive, em quanto Deos quer Ch. Rey piadoso

Vive ya, pois perdoas: me ura aquele,

Que sua dura' tenção leva a diante.

Dr. A. Fencira, Foemas Ltísxtanos^ ed. 1598.

XXV

Cartas a Joanf) López Leltam, na Indía

Do antigo Portugal, da grfi Lisboa, Por novos mares, novos ceos, e climas Ao novo Portugal, á clara Goa,

Te vay saudar, Joam López. s'inda estimas, S'inda as nove Irm^s honras, minha Musa» Dem lugar duros TrOes ás brandas Rimas.

8ÊCCL0 XVI 253^

Ou teu armado braço este no que usa-, Com Marte contendendo em fortaleza Sem ao Rume aceitar ouro, ou escusa,

On rompendo com fúria, e com braveza As escumosas ondas, vás levando Socorro á quasi entrada Fortaleza.

NSo deixes de ir cos olhos passando Estes versos, verás quanto ás trombetas iVlais animoso som estaram dando.

Antes que com forte animo comettas A feroz multidão.^ e com honroso Despojo, humilde o imigo a ti somettas,

Oa do triste sucesso temeroso

(Como a fortuna quer) com arte, e rogo

Tornes o teu soldado furioso. As Musas ouve sempre, acendem fogo

Nos altos corações, e o mór perigo

Te fazem parecer prazer, e jogo.

Tanto mais forte irás contra o imigo Co spritoaceso em doce som de gloria Quanto das Musas mais fores amigo,

Ao som da alta trombeta, que a memoria De Achilles fero ao mundo renovada, Encheo o grã Macedónio su'alta historia.

Quantas vezes gemia, e suspirava Com generosa inveja do alto canto. Que a nova gloria, e fiiina o levantava !

Aquelle sprito aceso, aquelle sarrto ruror do Rey Profeta, ao som lira Hora era fogo todo, hora era pranto.

Sobre si posto ]a mais que Iiomcm aspira Aos ceos, o altos segredos, q le via, Deos chama, de Deos ca ata, a Deos suspira.

aquelle fogo claro, que assi ardia Antigamente níís spritos raros Torna infiammar a nossa idade fria

os dias nascer vemos mais claros'

O mundo mais fermoso ; e das nove ^

Musas os nomes mais ao mundo charos.

Também algua esse teu peito move, £ todo a honra, e gloria tu levanta, Por mais que em ti o Amor suas frechas prove.

Mas tu com Marte farma, com Amor canta. Inda juntos verás Vénus, e Marte, Juntos ApoUo, e Palias em paz santa. Ata quanto ceu, quanca agoa, João. nos parte ! Os spritos porém de se chamam. de mim tens, amigo, a me.hor parte.

Nfto sio 08 olhos, não os corpos, que amam.

Outta força secreta nos convida ;

Naturalmente btl^ s'amam, hús se desamam. Pôde hoa voz, hQ j fama ao longe ouvida

Juntar duas almas em amor igual.

Fazendo eth doas húa vontade e vida.

:254 ahtoloolil pomia

Esta é a sancta amizade, esta a que vai. Dos corpos, e olhos slo baixos amores, Qoe ao l)em se chegam» apartam se co mal.

Doas em bom amor juntos slo senhores De duas almas : nisto, JoSo. vencemos Mil grandes Reys, e mil Emperadores.

Eiles tem seus Impérios : mas i ós temos

Nossas vontades, boa segurança. *" Reynem temidos lá, nós nos amemos.

A estrada cham da bemaventurança, Que desta vida á eierna vay ^bindo. Que he, se nio deste amor sam confiança ?

Em quanto tu teu braço estás tingindo Nesse bárbaro sangue, e das honrosas Folhas essa tua fronte vás cingindo,

E inda ás armas antigas, e fermosas Nova, e mór fermosura v8o g^mhando Teu forte peito, e mSos victoriosas.

Eu estou tua doce vista desejando Com toda est'alma, com toda a vontade, Ah vive, e vem, Jo8o, de gritando.

Devemos este amor ao nosso Andrade, De nosso amor seguro fu ida mento. Amigo tens em mim. tens sam verdade :

Que servidor nome he de comprimento.

Dr. A. Ferreira,. Poemoa Liuitanos, 1598, pá^ 183.

XXVI

Soneto

Quando eu vejo sair a menham clara Nos olhos dia, as faces neve, e rosas, Afugentando a sombra, qu'as formosas Cores do campo, e ceo d 'antes roubara ;

E quando a branca Delia a noite aclara, E traz nos brancos cornos as lumiosas Estrellas, serenando as tempestuo as Nuvês, qu'o grosso humor nos ceos juntara

Tal he, di^o comigo, a clara estrella.

Que minh'alma me encheo do*, tra luz nova,

E meus olhos abrio ao que não viam.

Assi me leva a vida, e ma renova,

Assi as vâs sombras, que antes m'escondiaii

O claro ceo, fugindo v3o ante ella.

Dt, A. Ferreira, Poemas, cit. pág. 10 v.

sAcuLo rvi 255

XXVII

" Outro

Aquelle claro Sol, que me mostrava * O caminho do ceo mais chaõ, mais certo. £ com seu novo rayo ao longe, e ao pert« Toda a sombra mortal m' afugentava;

Deyxou a prisão triste, em que estava. Ea fiquey cego, e co passo Incerto, Perdido peregrino no desert 3, A que faltou a guia, que o levava.

Assl CO Bprlto triste, o juizo escuro, Suas sanctas pisadas vou buscando. Por viiites, e po: campos, e por montes.

Em toda. parte a vejo, e a figuro. Ella me toma a maO, e vay guiando. E meus olhos a seguem feitos fontes.

Dr. A. Peneira, ihià,^ |)ág. 17.

XXVIII Outfo

Aqaella nunca vista fermosura, Aquella >iva graça, e doce riso, Humilde gravidade, alto aviso. Maia divina, qu'humana real brandura,

Aquella alma innocente, e sabia, e pura, Qa*entre nós fazia hum parayso Ante os olhos a trago, e a deviso No ceo tiiumphar da morte, e sepultura «

Pois por quem choro, triste? por quem chamo Sobre esta pedra dura a meus gemidos, * Que nem' me pôde ouvir, nem me responde?

Meus suspiros nos ceos sejam ouvidos: E em quanto a clara vista se m 'esconde. Seu despojo amarey, amey, e amo.

Dr. A. Fenein, ihiá., pág. 17.

y

266 ÁMTOLOQIA P0B81A

XXIX

Elegia IV

(A Diogo Bernardes em resposta d' outra sua, á mo/ te do doutor António Ferreira)

Um silencio, Bernardes, me rompeste

quasi a não fallar determinado

Na dor, que hora de novo em mim moveste. Igualmente á dor minha ser chorado

Nào podia em meu verso o meu Ferreira,

Nem ser de mim seu spnto bem cantado. Entendia de mim que á verdadeira

Fama do que elle em tudo merecia,

Naõ cht^garía a minha voz inteira. Calava, e a fallur nelle m'escondia.

Por naõ offeiider morto um hom amigo

Que me quíz tanto quando vivia. Fizeste me chorar ora comii^^o

Com nova magoa, nova saudade.

A dor que eu chorava íó comigo. Movestem'Alma a nova picdc^Jc,

A nova pena, e novo sentimento

D'aquel a grande perda d'es<a idade. Aquelia grando peida que dum momento,

Desnois de tanto mal acontecido,

Naõ deixei de triízei no pensamento. Mas eu nsõ chitro ver dVntre nós ido

Este retrato da idade antga,

Do Cto á i.ossa lingoa concedida : Mas faitaime um in^cuho a que o meu siga,

E uma voz que ouça, e esprito de que apprenda;

E os segrtdos das iV\usas m'abra, e diga. E quem o meu mão verso me reprcnda,

E o mcaõ ir.e concerte, e mo levante

Com d' uio aviso, e com segura emenda. Sinto faltar, Ber arded, quem m'cspanie

Com seu bom c;.nto. com seu bom escrito.

Com cuja imiraçlo possa ir avante. Aque:le c aro, aqueile puro esprito

De saõ conseliio cheo, e de prudência,

Sempre será de mim cantado e escrito, Agora em sua triste e longa ausência

Quem acharei que a dor nu* dcsaggrave?

E me mostre o remedi j na. paciência? Fazia-me a tristeza menos grave.

Mais branda a dura pena. a dor mais leve,

Faziam'a alegria mais suave. Se teve (mago* nossa!) a vida breve

Largo nume terá, larga memoria

Que a toda a parte, e tempo a fama leve do tempo terá certa victcria.

Quem s'ouve assi na tnste e mortal vida,

Qu'aspirou s mpre á clara e immortal gloria. Nella da mortal carne desped.da,

Esquecida de tudo, nos amores

Divmos esiará toJa embebida.

K. í

gicuLo zvi 257

A voz levantará a outros louvores

Mais devtdos, ma s puros, e mais santos Arrebatada d 'im mortais fervores.

Mil versoa, e mil ijios, e mil cantos Cantará sempre á eterna Fermosura, Mais dtnos de memoria, mais d*espant08.

Será nelles guiado de mais pura, De mais termosa, de mais rica Musa, Mais ornada de copia, e da brandura.

Amará, e será amado, assi se usa ; Cantará, e será ouvida d*a quem canta, Que quem se ama, d*amar nflo sescusa.

O Sol que sobre o mundo se levanta. Que coro sua luz clara, e tam fermosa Nos v.ence a vista, e o espiito nos espanta:

Em conta n9o terá. que outra gloriosa Luz que luz ó Sol, e ás Almas lume, Lhe terá mais que o Sol Alma lustrosa.

Um tempo eterno, um immortal costume Seguirá sempre, tempo alegre e puro, Primavera que nunca se consume.

naO v irá Inverno triste e escuro, Naõ ventos, naO tormentos, naõ mudanças; Mas tudo quieto em Deus, tudo seguro.

Livrousse das incertas esperanças Que nos desassossegam, e desbaratam ; E das leves e falsas confianças.

NaO vês, Bernardes, como nos maltratam Os movimentos vaõs, e os vaOs reçeos Que as Almas inquietam, as vidas matam?

Quem pode defenderse a mil enleos? Quem se podp valer 'em mil perigos D*outros muitos perigos sempre cheos?

É perigo naõ ter, e ter amigos : Mal se pocle viver nesta estreiteza. Se m'ey de velar d'elles como imigos.

O nosso António está em outra larj^ueza,

Ninguém teme, ninguém d'elle se teme;

Em tudo pureza, e tem pureza. E cá, Bernardes nosso, quem nâo treme?

Quem nSo deve de si mesmo temerse ?

Quem â que contra tempo em vaO naõ reme ? Quem cousa de que possa- valerse ?

Olhos no Ceo, e no divino Norte,

Pôde guiar tod'Alma a não perderse.

NSo chores do nosso António a sorte, A minha sorte chora, e a sorte tua. Pois nolo tem roubado a dura morte.

A nós dura, a nós áspera, a nós crua Que nos levou o nosso amigo brando, £ a doce e branda conversação sua.

Por elle rindo, por mim vou chorando, E por elle contente, e por mim triste Sem elle a vida irei toda passando

258 AXTOLOOiA poasu

que a nossa amizade clara viste, Claro verás que á dor da perda grande D'am claro amig[o. bom, m|il se resiste.

Nunca tal perda, amigo, o Ceo te mande; Dor é que nunca a vida perde um'ora : Remédio pôde aver com que se abrande,

NaÕ que de todo a vença, e deite fora.

P. d' Andrade Caminha, Obraê^ ed. da Academia, pi^. 127.

XXX

Elegia {Sobre o desastre da Jornada de Africa)

.f

«Al triste Lusitânia, triste chora, « Que nunca para ciioro eterno e triste, «Tanta causa tiveste com^^agora.

«Aquelle que com lagnnhi? pediste^ «Quando tam duramente a tenra vida >s « Do Príncipe seo Pay cortada viste.

« Agora nesti sua despedida ' « De lagrimas te quis deixar herdeira, « Ou inda a pior mal offeredda.

< Mas o Ceo o permitta de maneira « Que do teu rico ceptro Soberano « SeH:onserve a potencia sempre inteira.

« Ah jornada infelice! ah cego engano? « Deixar tam rica terra, ir a de*iterros « Por livrar d*um Tyrano outro Tyrano.

« Amb05 imigos nossos, ambos Peiros < Ambos despresadores d:i Cruz Santa, « Ambos tinham hum culto,^ambo9 mil errts.

« Quem põem os olhos nisto n2o s'e8panta, « De permiitir o Ceo castigo tanto «A descuido tamanho, a culpa tanta.

« Dia cheo de dôr, cheo d'espanto. « Em quanto o sol der luz, verdura os prados « Celebrado serás com triste pranto.

« Morrestes. Cavalleiros esforçados, « Daquel a multidão de bruta ge-ite « Vencidos n&o, mas de vencer cansados.

Díof Bernardes, Várias Rimaa, ed. 1594, pá^. 85 y.

XXXL

Outra

(Estando captivo)

Eu, que livre cantei ao som das agoas Do saudoso, brando, e claro Lima, Ora gostos d 'a mor, outr^ora magoas,

Agora ao som do ferro, que lastima O descuberto pe, choro cativo Onde choro n&o vai, ou amor s'estlma.

■AOULO XVI

as9*

Cuida que me deixou a morte vivo Vendo que n9o chegava seu tormento A tormento tamanho, e tam esquivo.

Acabando co'a vida o sentimento Ficarás escondido, oh dia triste, Nas turvas aguas do esquétimento

Oh Sol, como tua luz n9o encobriste Quando do Real sangue Lusitano, As ervas, que secaste, húmidas viste ?

Que Llblco LeSo, aue Tigre Hircano Negara desusada piedade, A lastima tamanhp, a tanto dano?

NSo te valeo. oh Rey, a tenra edade. Não te valeo esforço, nem destreza, N8o te valeo suprema Magestade.

Das armas a provada fortaleza Poderosa não foi pêra guarda r-te Da mão de fogo armada e de crueza

Conjurou contra ti o fero Marte, Vendo que sua fama escurecias, Si vencedor ficavas desta parte.

9ÍQto Benardcs,' t&id.,' pág. 8K

XXXII

Soneto

(A quem ler)

Os Versos, que cantei importunada Da mocidade cega a quem seguia, Queimei (como vergonha me pedia) Chorado, por haver taõ mal catado.

Se nestes ^naO ficar taO desculpado Quanto o mais alto estilo requeria» NaO me podem negar a melhoria Da mudança, q fiz d' hum n'outro estada.

Que vai que sejaO bem, ou mal aceitos ? Pois 08 naO escrevi para louvores Humanos, pelo menos perigosos.

Sena6 para plantar em frios peitos Desejos de colher divinas flores A' força de suspiros saudosos?

AfMtiflho da Cru, Obras, 1.

Do Lyma, do Cavar m NaO Moio I Sfim me sei

A lai de que Torcendo e Os pis que

Nem me de

O povo cu)o ; Vendo teu A Ctlncipe

Louvará mult De mim. m Louva comi

Fr. AJoitlnho da Cu

Pnz em tam

Que o peidi Cansado de Parou em d

Por clle mo Mas nfio ca Inda que o De que eu i

Bem pode j Esta sombii Seguindo k

nunca jh Fazer que d Com pena,

Fr. Aeosliabo da Cr

SÉCDIíO X¥l 261

XXXV

Outro Á duqueza d'Aueiro

Quando na verde planta, ou pedra dura Me mandava escrever minha tristeza, Nunca me pareceo, alta Prínceza, Que podessem meus versos ter ventura

Pêra cuidar que houvesse creatura* A quem taes partes desse a natureza, Que podesse mover minha dureza A não lhes dar no tog« sepultura.

Como fiz de quantos tinha feito Na ribeira do Lima em tenra idade. Por dar algum remédio a meu defeito.

Mas pois Vossa Ezcellenda tem vontade De lhos dar. eu me dou por satisfeito. Que tudo pôde em fim pura amizade.

Fr. Agostinho da Crnz, ibid,, 185.

XXXVI

Auto da Mofina Mendes

Dos Miêtériot da Virgem deveria antes ser como diz Frade ao Prólogo e maito bem lembra o Sr. Braamcamp Freire, Obran, 232. Mofina Mendes é nma pastora, que entra episodicamente no aato. O pátrio pede-ihe contas do sen gado, ela pede-ihe •s dft soa soldada. Damos esta scena conforme a nossa ed., i, 11-14.

Pessival

Achaste a tua burra Andrel ? And. Bofa nSo. Pbs. Não pode ser. ' Busca bem, leiza o fardei ; Que a barra n9o era mel. Que a havião de comer.

André

Salta rifio pêg^as nella. Por caso da matadura ? Pes. Pardeos I essa seri' ella ! * E que p6ga seria aquella. Que lhe tirasse a albardura ?

^ Bofa on bofe, indiferentea ontr, á boa !

^ Pardeos Por D: os ! ezclamaçio freq&tntissima.

17

Pav. Mas ciê q

Mofina Ml

Que, scgu

SÍe Isto na

Que nlo

Ora chi

E aposto-l

Que a nei

Mofina M

Ano. Mofina M

MoF. Que quen

And, Vem tu a

E se has (

Onde d E as vacai

MOF. Mas que c De me pa Que ha ta

Pay. Mofina Onde fica

MoF. A boiada .

Anda n

N'cm sei {|

Nem as

5a micas c

Que anda Saltando

Que CO Que taes

MoF. Dos porcos os mais sSo mortos De magrcira e ma aventura.

Pav. E as minhas trinta vitellas

Das vacas, que te entregéiSo?

MoF, Creio que hi ficSrao delias. Porque os lobos dezimárSo, E deu olho mao por ellas, Qu« mui poucas cscapirlo.

sAcuLo XVI 263

Payo Vaz

Dlze-me, e dos cabritinhos Que recado me dás tu? /

MOF. ErSo tenros e gordinhos, £ a zorra tinha filhinhos, E levou-os hum e hum.

Payo Vaz

Essa zorra, essa malina, Se lhe correras trigosa, ^ Nflo fizera essa chacina ; Porque mais corre a Mofina Vinte vezes qu'a raposa. MoF. Meu amo, tenho dada À conta do vosso gado Muito bem, com bom recado ; Pagae-me minha soldada. Como temos concertado.

Payo Vaz

Os carneiros que fícár9o,

E as cabtas, que se flzerão ? MOF. As ovelhas reganhárSo,

As cabras engafecêrSo,

Os carneiros se afogarão,

E os rafeiros morrerão. Pes. Payo Vaz, se queres gado.

ó demo essa pastora :

Paga-lh'o seu, va-se embora

Ou ma-ora,

E põe o teu em recado.

Payo Vaz

Pois Deus quer que pague e peite Tio daninha pegureira, Em pago desta canseira Toma este pote de azeite. E vae-o vender á feira ; E quiçaçs medrarás tu, O que eu comtigo n9o posso. MOF* Vou-me á feira de Trancoso Logo, nome de Jesu, E farei dinheiro grosso.

lyo que este azeite render Comprarei ovos de pata, Que he a cousa mais barata Qu'eu de posso trazer.

^ Ipressada, ligeiía.

B estes ovos chourK Cada ovo da» hum | E cada pato um tosti Que passari de hum E meio, a vender bai Casarei rica e honr Per estes ovos de pai E o dia que for casad Sahlrel ataviada Com hum brial d'esci E diante o desposado Que me estará namoi Virei de dentro baila Asai desfarte baiiadc Esta caniigs cantandi

Eslu couia) dii t

Agora posso eu dl: E Jurar e apostar, Qi]'es Mofina Mende E s'etla baila na vod; Qu'e!itá ainda por soi E os patos por nasce E o azeite por vende E o noivo por achar, Ea Mofina a bailar; Que menos podia ser

Val-se Mofina A

Mofina

Poi mais que a dita

Pastores, nSo me d<

Que todo o humatii ( Como o meu pote d Ha de dat comsigo

O Pessival meu ve Braz Carrasco, dlze, A burra desse outelil

EatSh rico, como le dUie jí.

^maK^

séouLo zTi ^Y 205

Bra. Per^runta tu a Tibaldinho,

Ou perganta a Barba triste.

Ou pergunta a João Calveiro. TlB. O fato traga eu aqui,

£ a burra eu a meti

Na corte do Rabileiro.

Nós dei temo- nos per hi. Andamos todos cansados,

O gado seguro está :

E nós aqui abrigados

Dormamos senhos bocados.

Que a meia noite vem )a.

GU Vicc&U, Olyroi, Coimbra (1907), pá^s. 1M4.

XXXVII

Auto da Feira

Dos mais afamados aatos Vicentinos e dos mais... castigados pela censura inqni- sitorial. E' Aercurio quem anuncia a Feira, á qual vem Tender o Tempo e o Diabo. Roma ▼em comprar. Damos estas scenas clieias de desassombrada crítica, tòtd., i, 47-55.

Mercúrio

Eu sam Mercúrio, senhor ^

De muitas sabedorias, E das moedas reitor, £ deos das mercadorias : Nestas tenho meu vigor. Todos tractos e contractos. Valias, preços, a/enças. Carestias e baratos. Ministro suas pretenças, Até as compras dos ça patos.

E porquanto nunca vi Na corte de Portugal i Feira em dia de Natal» Ordeno hOa fein aqui Pêra todos em geral. Faço mercador-mor Ao Tempo, que aqui vem ; E assi o hei por bem £ nSo falte comprador, Porque o tempo tudo tem.

Entra o Tempo, e arma hua tenda com muitas cousas, e diz:

TEMPO

Em nome daquelle que rege nas praças D'Anvers e Medina as feiras que ttm, Começa-se a feira chamada das Graças, A' honra da Virgem parida em Belém.

266 m ANT0I/>OIA P0E8IA

Quem quiser feirar, r

Venha trocar, qu'eu nSo hei de vender: Todas virtudes qu' houverem mister. Nesta minha tenda ás podem achar, A troco de cousas que h9o de trazer.

Todos remédios especialmente Contra fortunas ou adversidades Aqui se vendem na tenda presente. Conselhos maduros de sans calidades Aqui se acharão. As mercadorias damos e rezSo, Justiça e'verdade, a paz desejada, Porque a Christandade he toda gastada So em serviço da opinião. Aqui achareis o temor de Deos, Que he ]a perdido em todo> tstados;

Aqui achareis as chaves dos Ceos, Mui bem guarnidas em cordões dourados : £ mais achareis

Somma de contas, todas de contar

Quão poucos e poucas haveis de lograr ^■

As feiras mundanas ; e mais contareis *

As contas sem conto qu'estão per contar. ;

E porque as virtudes, Senhor Deos, que digo. Se forão perdendo de dias em dias, !

Com a vontade que deste ó Messias Memoria o teu anjo que ande comigo. Senhor, porque temo Ser esta feira de mãos compradores. Porque agora os mais sabedores Fazem as compras na feira do Demo, E os mesmos diabos são seus corretores.

Entra hum Seraphim enviado per Deus a petição do Tempo, e diz:

Seraphim

Á feira, á feira, igrejas, mosteiros, Pastores das almas, Papas adormfdos ; Comprae aqui pannos, mudae os vestidos, Buscae as çamarras dos outros primeiros Os antecessores.

Feirae o carão que trazeis dourado ; O' presidentes do crucificado, Lembrae-vos da vida dos sa netos pastores Do tempo passado.

O' Príncipes altos, império facundo, Guardae-vos da ira do Senhor dos Ceos ; Comprae grande somma de temor de Deos Na feira da Virgem, Senhora de mundo. Exemplo de paz.

Pastora dos anjos, luz das estreitas. A' feira da Virgem, donas e donzellas. Porque este mercador sabei que aqui traz As cousas mais bellas.

SiCULO XTI ?67

Entra hum Diabo com hua tendinha diante de si, como bafarínheiro, e diz:

Diabo

X

Eu bem me posso gabar,

E cada vez que quiser,

Que na feira onde eu entrar.

Sempre tenho que vender,

E acho quem me comprar.

E mais vendo muito bem.

Porque sei bem o que entendo ;

E de tudo quanto vendo

N9o pago sisa a ninguém

Por tracto que ande fazendo. Queto-me fazer á vela

Nesta sancta feira nova.

Verei os que vem a ella,

£ mais verei quem m'estrova

De ser eu o maior delia. Tem. Es tu também mercador,

Que a tal feira t'offereces? Dia. Eu n8o sei se me conheces. Tem. ' Paliando com salvanor, ^

Tu diabo me pareces.

Djabo

Paliando com salvos rabos, Inda que me tens por vil, Acharás homens cem mit Honrados, que são diat)os, Que eu n9o tenho nem ceitil. £ bem honrados te digo, E homens de muita renia, Que tem divedo comigo. * Pois nSo me tolhas a venda, Que não hei nada comtigo.

Tempo (ao Seraphim)

Senhor, em toda maneira Acttdi a este ladrão, Que me ha de danar a feira. Dia. Ladrão? Pois haj'eu perdão, Se vos roetter em canceira. Olhae ca, anjo de bem, Eu, como cousa perdida, Nunca me tolhe ninf^uem Que não ganhe minha vida, Como quem vida não tem .

* Savaaor êolvã honor^ com o devido respeito

* Impedimento que resnlta do parentesco, amisade, coaTÍvência« etc

Vendo dessa mannelad E á> veset gttit» torradoí Isto nlo releva nada ; E em todolos metcados Entn a minha quinta ladt Multo bem sabem oa nós Que vende* tu cousas vii Hl ha de homem mis Mais mil vezes que nlo t Como vós mui bem senti

E estes hlo de comprai Disto que trago a vendei Que slo artes de enganai E cousas para esquecei O que devllo lembrar : Que o sages mercador ' Ha de levar ao mercado O que lhe comprSo mdh Porque a ruim comprado Levar-lhe ruim borcado.

E mais as boas pessoas Slo todas p< bres a eito ; E en por este respeito Nunca tracto em cousas t Porque nlo traiem prove Toda a glárla de viver Das gentes he ter dlnheli E quero multo quiser ter Cumpre-lhe de sei prime O mais ruim que puder.

E pois slo desta manei Os contra ctus das morta e Nlo me lanceis vós da fe: Onde eu hei de vender b

aue todos i derradeira, índerás muito perigo. Que tens nas trevas escu Eu vendo perfumi durss. Que, pondo-as no embigi Se salvSo as criaturas.

As vezes vendo virotes E trsgo d'Andaluzía Naipes com que os sacen Arreneguem cada dia, E joguem os pellotes. NSo venderás lu aqui iss Que esla felia he dos ceo Vse vender ao abisso ' Logo, da parte de Deos. Senhor, apello eu d'isso.

■ícuLo zvi 269

S'ea fosse tão mao rapaz Que fizesse força a alguém, Era isso muito bem ; Mas cada hum veja o que faz. Porque eu não forço ninguém. Se me vem comprar qualquer Clérigo, leigo ou frade Falsas manhas de viver. Muito por sua vontade ; Senhof, que Ih'hei de fazer?

E se o que quer bispar Ha mister hypocrisia, E com ella quer caçar ; Tendo eu tanta em porfia, Porque Ih 'a hei de negar? E se hQa doce freira Vem á feria

Por comprar hum inguento Com que voe do convento; Senhor, inda que eu n9o queira L*hei de dar aviamento.

Mercúrio

Alto, Tempo, apparelhar, Porque Roma vem á feira. Dia. Quero-me eu concertar, Porque lhe s^i a maneira De seu vender e comprar.

Entra Rona, cantando

Roma

«Sobre ml armav9o guerra : «Ver quero eu quem a mi leva.

«Três amigos que eu havia, «Sôbre mi armão porfia ; «Ver quero eu quem a mi leva».

Vejamos se nesta feira. Que Mercúrio aqui faz, Acharei a vender paz, Que me livre da canceira Em que a fortuna me traz. Se os meus me desba ratão, O meu foccorro onde está ? Se os Christãos mesmo me matão, A vida quem m'a dará. Que todos me desacatão?

Pois s'eu aqui não achar A paz firme e de verdade Na sancta feira a comprar, Canfa mi dá-me a vontade Que mourisco hei de falia r.

'O AVTOLOOIA POB81A

Dia, Senhora, se vos prouver, «Eu vos darei bom recado.

RoM. Não pareces tu azado Pera trazer a vender O ^ue eu trago no cuidado.

Diabo

Não julgueis vós pola côr, Porque em ai vai o engano ; Ca dizem que sob mao panno Está o bom bebedor : Nem vós digais mal do anno.

Roma

Eu venho á feira direita Comprar paz, verdade e fé. Dia. a verdade pcra que ?

Cousa que não aproveita, E aborrece, pera que he ? Não trazeis bôs fundamentos Pera o que haveis mister ; E a segundo slo os tempos, Assi hão de ser os tentos, Pera saberdes viver.

£ pois agora á verdade Chamão Maria peçonha, E parvoíce á vergonha, E aviso á ruindade ; Peitae a quem vo-la ponha, A ruindade digo eu : E aconselho- vos mui bem. Porque quem bondade tem " Nunca o mundo sen seu, E mil canceiras lhe vem.

Vender-vos-hei nesta feira Mentiras vinte e três mii. Todas de nova maneira, Cada húa tSo subtil. Que não vivais em canceira : Mentiras pera senhores, Mentiras pera senhoras. Mentiras pera os amores, Mentiras que a todas a horas Vos nasção delias favores.

E como formos avindos Nos preços disto que digo, Vender-vos-hei como amigo Muitos enganos infindos. Que aqui trago comigo. RoM. Tudo isso tu irendias, E tudo isso feirei Tanto, que inda venderei, E outras sujas mercancias. Que por meu mal te comprei.

j

bAculo xvx 271

Porque a troco do amor De Deos, te compre! mentira, E a troco do temor Que tinha da sua ira, Me deste o seu desamor : E a troco da fama minha E sanctas prosperidades, Me deste mil torpidades ; E quantas virtudes tinha Te troquei polas maldades.

E pois ]a sei o teu geito. Quero ir ver que vai ca. Dia. As cousas qne vendem

São de bem pouco proveito A quemquer que as comprará.

Vai-Sê Roma ao Tempo e Mercúrio, e di:

Roma

Tio honrados mercadores Não podem leixar de ter Cousas de grandes primores ; E quanfeu houver mister Deveis vós de ter, senhores. Ser. Sinal he de boa feira

Virem a ella donas taes ; £ pois vós sois a primei ra. Queremos ver que feiracs Segundo vossa maneira.

Ca, se vós a paz quereis, Senhora, sereis servida, £ logo a levareis A troco de saneia vida ; Mas n8o sei se o trazeis. Porque, Senhora, eu me fundo Que quem tem guerra com Decs, Não pôde ter paz c'o mundo; Porque tudo vem dos ceos, Daquelle poder profundo.

Re MA

A troco das estações Não fareis algum partido, £ a troco de perdões, Que he thesouro concedido Para quaesquer remissões? Oh I vendei-me a paz dos ceos. Pois tenho o poder na terra. Ser. Senhora, a quem Deus guerra, Grande guerra faz a Deos, Que é certo que Deos nao erra.

Vede VÓ3 que Ih» Vede como o estim; vede bem se o tem Ãttenlae com quem Que lemo que cahi

ROM. Assl que paz nlo A trftco de Jubileus

Mer. Ó Roms. sempre vi Que matas peccado E lelxas viver os t E nlo te cortas d Mas com teu poder Aaaolves a todo o i E nlo te lembras d Nem vCs que te va

RoM, Ó Mercúrio, valei-i Que vejo mãos ap|

Meb. Dá-llie, Tempo, a t O cofre dos meus c E podes-te Ir muilf Hjm espelho hl Que foi da Virgem Co'el]e te tou;»rás, Porque vives mal ( E nSo »lntes como E acharás a maneii Como emendes a i E nilo digas mal d Porque tu serás pe Se nilo mudas a a NSo culpes aos i Que tudo te vem < Polo que (azes ca ( Que, offíndendo a Se resulta o mal K E lambem o digo E a qualquer meu Que nS'j quer guei Tenha sempre paz E nBo temerá perl)

Preposito Frei S Diz o exemplo ' Dá-me tu a mim c E ao demo o a.

Gil Viccait, Obrat, Co^mbii (

sAcuLO xyI 273

XXXVIIC

F&rça dos Almocreves

o fiodamento desta farça he, que hnm fídal^o d^ anito pouca renda nsava muito es- tado, c tinha capellio seu e oníWes seu, e cutrok officiaes, aos quaes nunca pa- gava: e rendo-se o seu capellio esfarrapado e sem nada de seu, eatr. dizendo :

CapellAo

Pois que não posso rezar. Por me ver tSo esquipado, Por aqui por este ar nado Quero hum pouco passear Por espaçar meu cuidado. E grosarei o romance De Yo me estaba en Coimbra, Pois Coimbra assim nos cimbra * Que não ha quem preto alcance.

Grosa

Yo me estaba em Coimbra, Cidade bem assentada ; Pelos campos de Mondego Não vi palha nem cevada. Quando aquillo vi mesquinho. Entendi que era cilada Contra os cavallos da corte E minha mula peilada. Logo tive a mao. sinal Tanta milhan apanhada, E a peso de dinheiro O mula desemparada. Vi vir ao longo do rio HQa batalha ordenada, Nfto de gente, mas mus, ^ Cem muita raiva pisada. A carne está em Bretanha, E as couves em Biscaia.

San capellão d'ham fidalgo Que nSo tem renda nem nada ; Quer ter muitos apparatos, E a casa anda esfaimada ; Toma ratinhos por pagens, Anda a cousa damnada. Quero-lhe pedir lieença, Pague-Ihe minha soldada.

1 De significação desconhecida. ' Do lat. mttluõt mulo ou macho.

Chega o Capellão a

Senhor, ja eera le Fii). Avante, padre, fallai Cap. Digo que em Ires ar

Que sam vosso cape

FiD. He grande verdade :

Cap, Eu fCra do Iffante

E pudeia ser que d*.

Fiu. A' bole, padre, nio

Cap. Si, senhor, qu'eu so

Aindaque ca in'emp

Ora pois veja, sen

Que he o que m'ha

Porque alem do alta

Servia de eompcadoí

FiD, Nso vo-lo hei de ne

Fazel-me hCia petiçSi

De tudo quanto leqt

■Cap. Senhor, nS-j me pro

Qu'is30 nao traz cor

Nem vejo que a que

Porque me fiz pel

Clericus et negodatt

FiD. Assi v«5 dei eu favo

E disso pouco qu'eu

Vos fiz mais que oui

Oia hum clérigo qui

De renda nem d'out

Que dar-llic homem

Que he cada dia hui

Ora a honra que s

E esse comer cora í> E dormir com tanta Que a coroa jaz no i Sem cabeçal, e á hf) E missa sempre de c E por vos cair em g Servia-vos também < comprar sibas na E outros cárregosl Deshonestos pêra ml Isto, senhor, he assl E azemel nesses cart Arre aqui e arre alll E ter carrego dos ga E dos negros da coz E alimpar-vo-los çaj E outras cousas qu'e

' JáiÍ'.íf, qualijuei espécie di

nàcuuo zvi 275

«

Fidalgo

Assi fiei eu de vós Toda a minha esmolaria» E dáveis polo amor de Deos, Sem vos tomar conta hum dia.

Cap. Dos três annos qu*eu allego

Da-la-hei logo sem pendenças: i^andastes dar a hum cego Um reai por endoenças.

FiD. Eu isso nSo vo-lo nego. ,

Capellão

E logo dahi a hum anno. Pêra ajuda de casar Hfla orfan; mandastes dar Meio covado de panno D*AIcobaça por tosar ^ E nos dous annos primeiros Repartistes três pescadas Por todos esses mosteiros, Na pederneira compradas Daquestes mesmos dinheiros.

Ora eu recebi cem reaes Em três annos. contae bem. Tenho aqui meio vintém.

FiD. Padre, boa conta dais. Ponde tudo n'hum item, E fallae ao meu Doutor, Que eUe me fa liará nisso.

Cap. Deixe Vossa Mercê isso Pêra ElRey nosso senhor, E vós fallae-me de siso.

Que como, senhor, me ficastes (Isto dentro em Santarém) De me pagardes mui bem.;.

Fio. Em quantas missas m'achastes? Das vossas digo eu porém.

Cap. Que culpa vos tem Çamora? Por vós estão ellas nos ceos.

FiD. Mas tomae-as para vós,

E guardae-as muifembora, Então pague- vo-las Deos:

Que eu não gasto meus dinheiros Em missas atabalhoadas.

Cap. E vós fazeis foliadas ^

E não pagais ó gaiteiro ? Isso são âlcarriadas ^.

^ Aperfeiçoar.

"* Danças, folgaedos.

' Falsidades piejndiciais.

' ' I

276 AHTOLOOLà POBBU

Se vossas mercês nlo hão Cordel pêra tantos nós Vivei vós áquem de vós, E nSo compreis gavilo, Pois que náo tendes pios K Trazeis s^eis moços de E acrecental-los a capa, Coma rei. e por mercê, Nflo tendo as terras do Papa, Nem os tratos da Gainé, Antes vossa renda encurta Coma panno d' Alcobaça.

FiD. Todo o fidalgo de raça. ^ Emque a renda seja curta, He por íôrça qu'isso faça.

Padre, mui bem vos entendo : Foi sempre a vontade minha Dar-vos a EIRei ou á Rainha.

Cap. Isso me vai parecendo

Bom trigo, se der farinha. Senhor, se m'isso fizer, Grande mercê me fará.

FiD. Eu vos direi que será :

Dizei agora um profaceo, a ver Que voz tendes pêra lá.

Cap. Folgarei eu de o dizer;

Mas quem me responderá?

FiD. Eu,

Capeli.ão

Per omnia secula seculorum. FiD. Amen. Cap. Dominas vobiscum, FíD. Avante. Cap Sursum corda. FiD. Tendes essa voz i9o gorda, Que pareceis alifante Depois de farto d 'a corda.

Capellão

Peor voz tem Simão Vaz, Thesoureiro e capellão E peor o Ada ião, Que canta como alcatraz ^. E outros que por hi estio. Quereis que acabe a cantiga, E vereis onde vou ter. FiD. Padre, eu hei de ter fadiga. Mas d'Eirei haveis de ser. Escusada he mais briga.

Correia para prender os pés das a?es. Certa ave.

aiooiA XVI 2f 7

Capbllão

Sabeis em que tM a contenda ?

Direis: He meu capeliio:

E ElRei saoe a vossa renda,

E rir-se-ha se vem á mSo,

£ remetter-m^ha á Fazenda. P|9. Se vós foiefs ento do. Cap. Que b^m pDsso eif cantar

Onde d9o sempre pescado,

E de dous annos salgado,

O peor que ha no mar?

Vem um Pagem do Pídalge, e DU:

Pagem

Senhor, o ourives s'he alli. * FiD. ' Entre. Quererá dinheiro.

Vcnhaii embora cavallelro:

Cobri a cabeça, cobri.

Tendes grande amig) em mi,

E mais vosso pregoeiro.

Gabei- vos hontem a Elt^.

Quanto se pôde gabarr

E sei que vos ha de occupar,

E eu vos ajudarei

Cada vtz que m'hi achar. Porque ás vezes estas ajudas

SSo melhores que cristeis.

Porque so a fama que haveia,

E outras cousas meudas

O que valem sabeis. OuR. Senhor, eu o servirei

E não quero outro senhor. FiB. Sabeis que tendes melhor ?

(Eu o dixe logo a ElRei,

E faz em vosso louvor :) NSo vrs mais qtie vos paguem.

Que vos d - . vem de pagar.

Nunca vi tal esperar.

Nunca vi tal avantagem.

Nem (el modo de agradar. OuR. Nossa conta he t9o pequena,

E ha tanto que he devida, '

Que morre de promettida,

E peço-a Ja com tanta pena.

Que depenno a minha vida.

Êi esti ali. explicado.

18

Fidalgo

Oit olhae ene fallar

Como vai bem inaitehdol

Folgo dIo vos ler psgado.

Por V(t OQVlt oiBtHiar

Naiteladas de avisado. OuK- Seohoi, beijo-vo-las mio,

Mai o meu queria eu na mio. FiD. Timbem Imo he cortezlo:

Senhor, bel)o-vo-las mios,

O meu queria eu na mio*.

Que bastiiet tilo louçl< si Quanto pesava o saleiro? Oun. Dons marcos bem, ouro e fio. FiD. EsBB hc a prata: e o feitio? OuR. As'az de pouco dinheiro. FiD. Que vai com feitio e ptata? OuR. Justos nove mil reaes.

E nlo posso esperar mais.

Que o vosso espeiai me mata. FiO. Si|amente in'apeitais.

F, faieis-me mentiroso.

Qu'eu gfbei-vos d'outro geito;

E s'eu lornar ao defeito,

Klo íeia proveito vosso. OuB. Assi que o ireu saleiro peito? ^ FjO. Elle he dos mais mãos saleiros.

Que cm mlnba vida comprei. CUR. Ainda o eu tomarei

A Cibo de três janeiros

Que que ha vo-lo eu fiei.

Fidalgo

J'seota n3o he rezão; Eu (iSo quero que vós percais.

GUR. Pois porque me n3o pagais? Que cu mesmo comprei carvSo Com que me ercarvoiçais.

FiD. Noço. vae-me ver o que faz EIRel» Se parecem Damas li : Esie dia nSo se va Em pagarás, nSo pagarei. E ^ós miiiae outro dia ca.

Se nSo achardes a ml, Fallae c'o meu Camareiro, Porque elle lem o dinheiro. Que cada anno vem aqui Da renda do meu esteiro; E delle recebereis O maia ceilo pagamento.

'ao, vai dizndo : O?

lie te.

3/R recado e diz :

OEM

Cedo nio ha de hav»

TodoB dTIKel, todos d

Pio. E tu zombas r Pag. N:

Que lambem alguns eh

H&o de deIxsT a cosiut;

Toma o VapellSo :

CapellAo

Vossi Merre por ventura

Fali<'U a E\Ht\ em mi 7 PiD. Ainda gcito nlo vi. CaP. NIo seja tSú longa a cura

Comi o t( mpo que servi. FlD. Ands hiRei tio oi:cupado

Co'e»le Tuico, eo'esie Papa,

Co'esia França, co'iEta irapa,

Que nto acho vao azddo,

Poique [lido anda soiapa. Eu enito sempre ao veslir;

Porém pi.-;a airccadjr

Ha mUiet glande vagar.

Podeis-me em tanto servir.

Até ítu'eu ve)a logat. Cap. Senhor, queiia eoncnisSo. PlD. ConcrusSo queiels V Bem, btOt,

ConcrusSo ha em a'guem. Cap. Conciusao quer concrusSo,

E nSo ha conciusSo em nada.

Senhor, eu lenho gastjda

Haa capa e hum mamão ;

Pagae-me a minha soldada. Fk). Se vús pLclissejs achai

A alluo de l.esie e Oeste,

Pois nSo tendes vot que preste,

Peiaqui era o mídrat. Cap. E vós pagais-mft co'o ar ?

Mao caminho vejo eu este.

Pagem

Deve-o HIRel de tomar, Que lucia como damnado. El)e he do nosío logai ; De mofo guardava gado, Agota velit a bispar.

Mas não sinlo capcililo Que lhe ch^mte hum par de quedas, E chama-se o Labaredas. FlD. E ca chama-se Cotào,

Mais fidalgo que 03 Azedas. Satisfação me pedia. Que he peor de fazer Que queimar toda Turquia; Porque do satl> fazer Nasceu a melancholla.

■ÉODU> XVI 281

Vem Pêro Vai, álmocfeoe, que traz um pouco de faio do Fidalgo, e vem tan- gendo M chocalhada e cantando :

Pêro Vaz

«A serra he alta, fria e nevosa, «Vi venir serrana gentil, graciosa. »

Arre, mulo namorado, Qne custaste no mercado Sete mil e novecentos

Apre, ruço, acrecentado A moradia de quinhentos. Paga per Nuno Ribeiro.

Arre, -arre, arre embora, Que as tardes s9o d'amigo. Apre. besta do ruim. Uztlz! o atafal vai por fora ^ E a cilha no embigo. Sio diabo ^ pêra os ratos Estes vinhos da Candosa.

«A serra he alta fria e nevosa, «Vi venir serrana, gentil, graciosa. »

Apre ca lera má. ^

Que te vas todo torcendo. Como jogador de bola. Uxtix, uzte xulo ca, ' Que t*eu dou irás gemendo E resoprando sob a co a. Ao corpo de mi Tare]a, Descobris- vos vós na cama. Parece ? Dix, pêra vossa ama : Nlo criarás tu hi vare|a.

«Vi venir serrana, gentil, graciosa, cCheguei-me per'ella com gran cortezia. >

Mando- vos eu suspirar Pola padeira d 'Aveiro, Que haveis de chegar á venda, E entSo alli desalbardar, E albardar o vendeiro. Se nSo tiver que vos venda Vinho a «eis, cabra a três, PSJo de calo, fiihós de manteiga. Moça formosa, lençoes de veludo, Casa juncada, noite longa. Chuva com pedra, telhado novo, A candea morta, gaita á porta. Apre, zambro, empeçarás. Olha tu nSo te ponha eu Ocvlos na rabadiiha, E verás per onde vás, Demo que t'eu dou por seu, E andarás de cilha.

^ CoBsidcram-se como vozes onomatopaicas para incitar os animais a andar.

282 ÁITTOLOOIA POBBIA

«Cheguei-me a ella de gran cortezia, «Disse-lhe: Senhora, quereis compjnhía?»

Pagem

Senhor, o almocreve he aquelle. Que os chocalhos ouço eu : Este he o fato, senhor.

FiD. Ponde todos cobro nelle.

Per. Uxtix, mulo do Judeu I O fato hu s'ha de pôr?

Pag. Venhais embora, Pcro Vaz.

Per. Mantenha Deos vossa mercê.

Pag. Viestes polas Folgosas?

Per. Ahi estiv» eu hoje faz Oito dias por pé, Em casa d'hQis tias vossa.

Pagem

Ora meu pae que fazia ? Per. Cavando andava bacelo.

Bem cansado e bem suado. Pag. E minha m3e? Per. Levava o gado

pêra Vai de Cabelo,

Mal roupada qu*ella la.

Uxtix, que mao lambaz ! *

E vossa mercê que faz ? Pag. Estou loução como que. Per. E á bofe creceis assaz.

Saúde que vos Deos dê.

Pagem

Eu sam pagem de meu senhor, Se Deos quiser pagem da lança.

Per. E hum fidalgo tanto alcança V Isso he d'Imperador. Ora prenda El Rei de França.

Pag. Ainda eu hei de chegar A cavalleiro fidalgo.

Per. Pardeos, JoSo Crespo Penalvo, Que isso seria esperar De mao rafeiro ser galgo.

Mais fermoso está ao villao Mao burel, que mao frisado, E romper matos maninhos ; £ ao fidalgo de nação Ter quatro homens de recado, E Idxar lavrar ratinhos.

Qae comilão, qae faminto!

UÈQUM XVI 28)

Qa'eni Frendes e Alemanha, Em toda França e Veneza, Que vivem por siso e manha. Por não viver em tristeza, NSo he como nesta terra ; Porque o fiiho do lavrador Casa com lavradora, E nunca sabem mais nada ; E o filho lio broslador Casa com a brosladora : ^ Isto per lei ordenada. E os fidalgos da casta Servem o& reis e altos senhores, De tudo sem presumpçSo, TSo chãos, que pouco lhes basta. Para todos lavrão pSo.

Pagem

Quero ir dizer de vós. Ora ide dizer de mi : Que se grave he Deos dos ceos, Mais graves deoses ha aqui.

{90 Fidalgo)

Pag. Senhor, alH vêm o fato,

E está á porta o almocreve : Vede ouem lhe ha de pagar Isso tal que se lhe devei

Fidalgo

Isto he com que m'eu mato Quem te manda procurar ? Attenta tu polo meu, E arrecada-o mu^to bem, £ nSo cures de nincruem. Taq. Elle he d'apar de Viseu» E homem que ve peitem ; Pois a porta lhe abri èu.

Entra dentro o almocreve e d z

Pêro Vaz

Senhor, trouxe a frasearia ^ De vossa mercê aqui. Hi estSo os mus albardados. FiD. Essa he a mais nova arábia D 'almocreve que eu vi : Dott-te vinte mil cruzados.

^ O qne se ocapara em fazer bordados.

^gi AMTOUMtA rOBBU

Per. Mas pague-me vossa mercê

O meu aluguer, mais.

Que me quero logo ir. FiD. O aluguer quantp he? Per. mu e seis centos reaes»

£ Isto por vos servir.

Fidalgo

Fallae c'o meu azemel.

Porque he doutor das bestas

E astrólogo dos mus.

Que assente em hum papel

Per avaliações honestas

O que se monta : ora sus. Porque esta he a ordenança

E estilo de minha casa ;

E se o azemel for fora.

Como cuido que he em França,

Dareis outra volta á massa,

E ir-vos-heis por agora. Vossa paga he nas mSos. Per. a eu quisera nos pés,

O' pesar de minha mSe. FiD. E tens tu pae e irmão? Per . Pagae, senhor, n8o zombeis.

Que sou d^alem do sertSo,

E não posso ca tornar. . ID. Se ca vieres á corte.

Pousarás aqui co*08 meus. Per. Nunca mais hei de fiar

Em fidalgo desta sorte.

Emque o mande San Matheus.

Fidalgo

Faze por teres amigos, E mais tal homem com 'eu, Porque dinheiro he hum vento. Per . Dou eu ja ó demo os amigos Que me a mi levlo o meu.

Vni'8e o almocreve, e vem outro' Fidalgo, e diz

FlUALGO !.•

Oh que grande saber vir, E que gran saber-me a vontade ! JF. 2.® Pois, senhor, que vos parece ? Dese|o de vos servir, E nio quero que venha á cidade Hum quem não parece esquece.

BÉOULO XTI 2t^

F. 1.^ Paguei soma de dinheiro A hum ourives agora» De prata que me lavrou» E paguei a um recoveiro, Que he a dar dinheiros fora A quem não sei como os ganhou.

Fidalgo 2.*

Ganh9o-nos tSo mal ganhados. Que vos roubSo as orelhas. P. t.* Pola hóstia consagrada £ polo Deus consagrado» Que O' lobos nas ovelhas Nfk> dão t9o crua pancada. Poios sanctos avangelhos, £ ptlo omnium sanctorum. Que ate o m;:u capellâo» Por mezinhas de coelhos E ht&a secula seculoram. Lhe dou p >r mi<sa um tostSo.

N9o ha )a homem em Portugal Tio su). ito em pagar, Nem tio fotro pcra mulheres.

F. 2.^ Guardae vós esse bem tal. Que a mi hflo-me de matar Btm me queres mal me queres.

F. !.• Por quantas damas Deos tem Nlo daria ntm migalha. Olhse que descubro isto.

F. 2.* Sam iSo fino i m querer bem, Que de fino tomo a palha, Pola de lesu Christo.

Quem quere s que veja olhinhos. Que se n9o perca por elíes, per huns geitinhos lindos, Que vos mctum em caminhos, E n9o ha caminhos neiles, Sen9o espinhos infindos ?

r. !.• Eu ja n9o hei de penar - Por amores de ninguém ; Mas dama de bom morgado. Aqui vai o remirar, Aqui vai o querer bem, E tudo bem empregado.

Que porqre dance mui bem, Nem bailar com muita graça, Se)a discreta, avisada, Fermosa quanto Deos tem Senhor, boa prol lhe faça, Se seu pae n9o tiver nada. K9o sejais vós tSo Maneias, Que isso passa |a d'amor» E cousas desesperadas.

r- 2.* Porém por vossas vias Vou- \ os esperar, senhor, A rendeiro das jugadas.

^8i AaroiiooiA pomia

Porque galante caseiro

He pêra pôr em historia. F. 1.^ Mas zombae, senhor, zombae.^ F. 2.* Senhor, o homem inteiro

Nflo Ihha de vir á memoria

Co'a dama o de seu pae ;

Nem ha mais de desejar

Nem querer outra alet^ria,

Que so Los tus cabellos nifla,

Nâo ha li mais que esperar,

Onde lie esta cantiguinha.

E, Todo o mal he de quem no tem

E, Se o disserem digão Alma minha,

Quem vos anojou, meu bem :

Hei os tudos de grosar, Ainda que sejão velhos. F. 1.® Vós, senhor, vindes tio bravo,

Que eu hei-vos medo |a.

Poios sanctos evangelhos

Que levais tudo ao cabo.

onde cabo nao ha. F. 2.^ Zombais e dais a entender

Zombando, que m'entendeis.

Pois de vós mui alto estou,

Porque deveis de saber

Que se d 'amor não sabeis,

Nào podeis ir onde eu. vou. Quando fordes namorado,

Vireis a ser mais profundo, ^

Ma s discreto e mais subtil,

Porque o mundo namorado

He lá, senhor, outro mundo.

Que está alem do Brasil.

Oh meu mundo verdadeiro !

Oh minha justa batalha I

Mundo do meu doce engano ! ^. 1." Oh palha do meu palheiro,

Que tenho hum mundo de palha,

Paiha ainda d'ora a hum anno;

F tenho hum mundo de trigo

Pêra vender a essa gente.

Boa cabeça tem Morale.

Nâo quero d'amor, amigo.

Andar gemente e flente

In hac lacrymarum valle.

Fidalgo 2.«

Vou-me ; vós não sois sentido, Sois mui duro do pescoço ; Nâo vale isso nem migalha : Pesa-me de ver perdido Hum homem fidalgo ensonço. Pois tem a vida na palha.

-Gil V.ceate, 06ra« (Coimbra), 1907, pá^. 220337.

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287

XXXIX

Farça da Inês Pereira

a farça feita para responder aos sens detractores. Reproduz-se a pa^^te que realmente jnstifica o ditado qae lhe deram. Ed. de Coimbra, ii, 318 emendada pelo texto anterior á Compilação de 1562 segondo exemplar da fiibl. de Madrid, repiod. na obra do sr. Braamcamp Freire, com fac-simile da portada, 3S8J.

Fin^e-se qne Inês Pereira, filha de htla mnlher de baixa sorte, mnito fantasiosa, citi Urrando em casa, e sna mãi he a oarir missa, e ella diz :

Ines

Renego deste lavrar £ do prioieiro que o usou ; Ao diabo que e eu dou, Que tio mao he de aturar. Ofa Jesu ( qtie enfadamento, £ qae raiva e que tormento. Que cegueira e que canseira ! £q hei de buscar maneira Dalgum outro aviamento.

CoitadSt assi hei de estar Encerrada nesta casa Como panela sem asa, Qae sempre está. num lugar? £ assi hflo de ser 1. grados Doas dias amargurados Qae eu posso durar viva ? £ assi bei d'estar cativa £m poder de desfiados?

Commendo-me eu logo ó demo S'ea mais lavro nem pontada ; Ja tenho a vida cansada De jazer sempre dhum cabo. Todas folgam, e eu n9o, Todas vem e todas vam Onde querem, senio eu. Hai I que peccado he o meu, Ou que dor do coraçio?

Esta vida he mais que morta, Sam eo ooruja ou corujo. Ou um algum caramujo, Qne nlo sae sendo á porta ? £ quando me dão algum dia Licença, como a bugia, Qoe potsa estar á {anella, He }i ma^s que a Madanella, Quando achou a alelufa.

Vem a Mãi, e diz:

MAr

Logo eu adevinhei na missa onde eu estava, Como a minha Ines lavrava A tarefa que lhe eu dei. Acaba esse travesseiro. Hujl naceo-te algum unheiro Ou cuidas que é d<a sancto?

Ines

Praza a Deos que algum quebranto Me tire do captiveiro.

MAi

Toda tu estás aquella ! Chórão-te os filhos por p9o?

Ines

Prouvesse a Deo^; que he rezflo De eu n3o estar tão singela.

MÃI

Olhade o mao pesar I Como queres tu casar Com fama de preguiçosa ?

Ines

Mas eu, mSi, sam aguçosa, £ vos dais- vos de vagar.

MAl

Ora espera assi, vejamos.

Inês

Quem ]a visse esse prazer.

MAi

Car-te que poderí ser.

Que ante páscoa vem os Ramos,

Nlo te apressLs tu, Inês.

Maior he o anno que o mes.

Quando te nSo P'ecata;es

VIrSo marldoi a pares,

C filhos de ties em três.

iNbS

Queío-m'nra ale^anlsr; Folgo mais de falar nisso, Assi Deos me'(i£ o pataiso. Mil vezes que niUt- lavrar: Itto nlo sei que o f<2.

MAl

Aqui vem Llanoi Vaz.

In ES E cila vem-se benzendo.

Leonor

Eu venho

Com grande amor que vos tenht Porque diz o t-x mplo antigo Que amiga e bom amigo Mais aquenta q e o bom lenho,

Inês 'Slá concrnada Pêra casar com algu, m ?

MAi

Atégora cem ninguém Nlo he ella embaraçada.

Em nome do Anjo bento: Em vos trago hum casamento. Filha, nlo sei se vos praz.

I^ES

E quando, Lianot Vaz?

Leonor

Ji ves trago avhmenlo.

■áuuLo xn

28»

Leonor

Lede 8 carta s**!]! dó«

toe ioda eu sam contente delle?

Inês (proscgue na leitora.)

Nem cantar presente mi. Pois Deos sabe a rebentinhã Qtxt me fizestes então Ora, ines, que hajais benção De vosso Pae i a minha, Quí venha isto a concrusão, ^ E rogo-vos como amiga Que samicas vos sereis Que parte me faleis. Aníes que out em vo-lo diga, £ u não fiaes de vir Esteja vossa .S4âi ahi E Úanor Vaz de presente \eremos se sois contente Qae casemos na boa hora. * Oes qae nasci aié agora ' KioTi tal vilão com'este Nun tanto fora de mão.

Lbonor

Queres casar a prazer No tempo d'agora, Inês ? Ames casa, em que te pèz, Qoe n2o he tempo d^escolher. Sempre cu ouvi dizer, Ou seja sapo ou sapinho, Oa nuiido ou maridinho» Tenha o que houver mister, ^ he o certo caminho.

MÃI

Pirdeos, amiga, essa he ella ; Mata o cavalo de cela, £ bd he o asno que me leva.

Leonor

Filha, no ch«o do Concc, Qwem nio puder andar choute. E mais quero e quem madore, Q^c qaem faça com que chore. Chamâ-lo-hei, Inês ?

INB. Si,

Venha e ve|a-me a mi. Quero ver, quando me vir. Se perderá o presumir Logo em chegando aqui. Pêra me fartar de rir.

MAi

Touca-t2 bem, se vier, Pois que pêra casar anda.

Inês

Essa he boa demanda ! Ceremonias ha mister Homem q'ie tal carta manda ? Eu o estou ca pintando : Sabeis, mli, que eu adcvlnho? Deve ser hum vilâozinho. . . Ei-lo se vem penteando: Será com algum ancinho V

Vem Pêro Marquez vestido como fi- lho de lavrador rico com hum gabão azul deitado ao h ombro, com o ca- pelo por diante, e diz :

Pêro

Homem que vai onde eu vou Não se deve de correr ; Ria embora quem qu ser. Que eu em meu siso estou. N9o sei onde mora aqui : Oihae que mesquece a mi ! Eu creo que nesta rua, Esta parreira he sua : Ja conheço que he aqui.

(Chega a casa de Inês Perein.)

Digo que esteis muifembora. Folguei ora de vir Eu vos escrevi de Htta cartinha, senhora : Assi que e de maneira. . .

MÁi Tomai aquella cadeira.

^ Oi versoi marcados entre não fÍÉnram na ed. de 1562, faltando portanto ■* «. dt Hamborfo e cm todas as demais.

290

AarOLOttlA F0B8U

Pêro E que vale aqui hfka destas ?

INES

Oh Jesu I que Jatn das bestas 1 Olhai aquelia canseira.

(Asseiitoii>se com as costas para ellas, e éiz:)

Pero f tt cuido que nSo estou bem.

MAi Como vos chamam, amigo?

Pero

Eu Pero Marquez me digo, Como meu pai que Deos tem. Faleceo, perdoe-lhe Decs, Que fora bem escusado, E ficamos dous hereos, Porém meu he o morgado.

MAi

De morgado he vosso estado ? Isso viria dos ceos.

Pero

Mais gado tenho eu quanto, E o mor de todo o gado, Digo maior algum tanto. E desejo <ti casado, Prouguesse ao Spirito Sancto, Com Ines ; que eu me espanto Quem me fez seu namorado. Parece moça de bem, E eu de bem er também. Ora vós ide vendo. Se lhe vem melhor ninguém, A segundo o que eu entendo.

Cuido que lhe trago aqui Peras da minha pereira : Hão de estar na derradeira. Tende ora, Ines por hi.

Ines E isso hei de ter na mSo?

Pero Deitai as peas no chio.

Ines

As perlas pêra enfiar. Três chocalhos e hum novelo, E as peas no capelos— E as peras onde estSo ?

Pero

Nunca tal me aconteceo : Algum rapaz mss comeo; Qm as meti no capelo, E ficou aqoi o novelo, E o pentem não se perdeo : Pois trazi'-a8 de boamente.

Ines

Fresco vinha o presente Com folhinas borrifadas.

Pero

N8o qu'ellas vinham chentadss Ca no fundo no mais quente. Vossa mSi foi-se? Ora bem, Sós nos leixou ella assi ? Canfeu quero-me ir daqui, Nfio diga algum demo alguém...

Ines

E vós que havíeis de fazer. Nem ninguém que ha de dizer? O galante despejado!

Pero

Se eu fôrà ]a casado, Doutra arte havia de ser. Como homem de bom recado.

Ines parte.)

QuSo desviado este está I Todos andam por caçar Suas damas, sem casar, A este, tomade-o I

Pero Vossa mãi he no muro?

Ines

Minha mil eu vós seguro Que ella venha ca dormir.

I

SAODLO ZTl

Í9l

Pêro

Pois, senhora, quero-me ir Antes que Ycnha o escuro.

iNES

£ aio cureis mais de vir.

Pêro

Virá ca Lianor Vaz, Veremos qae lhe dizeis.

Inês

Homem, não aporfieis,

Qae nio quero^ nem me praz.

!de.casar a Cascais.

Pêro

NSo TOS anojarei mais, lodaque saiba estalar; E prometo nio casar Até que vós nio queirais.

Estas vos sam ellas a vó»; Anda home a gdStar calçado, ^ E qoando cuida que he aviado, Escaraeíncham de vós. Nio sei se flcá a pea : Pardcos I ia eu á aldeã. Senhora, ca fica o fato.

iNES

Olbal le o levou o gato.

Fero

Ioda nSo tendes candea?

Ponho per cajo que alguém Vem como eu vim agora, £ TOS acha a tal hora : Parece-vos que será t>em? Hcii-vos ora com Deos: ^ai a porta sobre vós

Cor>i vossa candeiazinha; E siquais sereis vós minhar Entonces veremos nós. (Vai-sc)

Inês

Pessoa conheço eu, Que levara outro caminho. Casai com hum vilaozinho. Mais covarde que hum judeu 1 Se fora outro homem agora, E me topa ia a tal hora, Estando assi ás escuras, Falara-me mil doçuras, Ainda que m'As não fora.

MAi

Pêro Marquez foi-se ?

iNES

Pêra que era elle aqui ?

MÃi Não te agrada elle a ti ?

' iNES

Vá-se muitieramá ; Que sempre disse e direi; Mãi, eu me nSo casarei Senfio com homem descreto» E assi vo-1 > prometo, Oa antes o leixarei.

Que seja homem mal feito^. Feo, pobre, sem feição. Como tiver descrição. Não lhe quero mais proveito*. E saiba tanger viola, E coma eu p^o e cebola. Siquer húj cantiguinha. Discreto, feito em farinha» Porque isto me degola.

Gil Vicente, Obrai, II, 31S.

292

AaTWiO€IIA POBStÁ

XL

Comédia Alfea Fala Silvio a Célia

Conheço

Que dais mais do que mereço. Pois por preço em q mais ganho; Me dais o que naO tem preço.

A maõ vos dou de ser vosso, E dado que a maõ naO dera, Kaõ ser vosso mal poderá, Porque querendo o que posso, o ser vosso quisera.

Vós ribeiras caudalosas Celebrareis este dia.

Roxos lirios. brancas rosas. Boninas fl )res cheirosas, Celebray minha alegria. Arvoíedos que cubrls Com fresca sombra os paston Porque vos naõ revestis Doutras cores frutos, flores, Pois minha gloria sentis ?

Dai-me minha Cella agora O que peço como esposa.

Simio Machado, Comédias Portuguesas, pig. 108, 2.^ col.

XLl

Comédia Alfea

Silvio

Dizel-me fermosas flores, Que sabeis de Célia bella ? Doei- vos de minhas dores, Que essa f ermos ura, & cores. Me dizem que sabeis delia.

Como não ha fcrmosura Onde Célia está ausente, A que tendes me assegura, Que em vós a tenho presente. Mas escondem a ventura. Ay que atè o engano meu Me persegue, & me faz guerra, , Se Célia quer dizer Ceo, E a terra a n?io mereceo, Como a busco eu ca na terra ? Desse lugar onde estais. Querida Célia vos peço. Qual he mayor me digais, Se a pena que eu ca padeç Se a gloria que la gozais?

E se foy de vos perder, A causa n9o merecer-vos. Vós me façais merecer k-vos la tão cedo a ver, Quam cedo deixey de ver-vos

Id. ibid. pá^s. 118- 119 e 129.

Alfea pois me roubaste A vida cum que vivia. Porque vivo me deixaste. Para morrer cada dia. Ausente de quem levaste ?

Pascoal

A lugar despovoado, Apartado de alegria, Jrey sem levar meu gado. Nem mais outra companhia. Que a de meu cuidado.

Alli em a soidade Moverão minhas querella As cruéis foras, & nelias Verey achando piedade, Quanto es tu mais cruel quellas.

Alli com tristes lamentos Espalharey pelos ventos Palavras que formem crua, Ajudandome com a sua O Ecco nos finaes assentos.

êicuLo XVI 29à

PROSA

XLII

Sobre a pintura em Flandres e em Itália; apologia desta artt

i Diálogo i/n que sam interlocutores : a Marquesa Pescara, Vittoria Coi- lonna^Messer Laitanzio Tolomei Francisco de Hoilanda Fraêe Ambrogio cU Siena Miguel Angelo»)

Dixe M. Angelo:— 'Mas -peça-me v. ex.' cousa que se a eJia possa dar, c lerá sua.

E ella, sorrindo-se: —Muito desejo de saber, pois stamos nesta matéria, qoe cousa é o pintar de Fraudes, e a quem satisfaz, porque me parece mais d€voto que o modo italiano.

~A pintura de Frandes, respondeu devagar o pintor, satisfará, Senhora, geralmente a qualquer devoto, mais que nenhuma de Itália, que lhe nunca fará norar uma lagrima, e a de Fraudes muitas ; isto não polo vigor e bondade daquela pintura, mas pola bondade d'aqueie tal devoto. A molheies parecerá b^m, principalmente ás muito velhas, ou ás multo moças, e assi mesmo a frades ea freiras, e a alguns fidalgos desmusicos da verdadeira harmonia. Pintam em rrandes propriamente pêra enganar a vista exterior, ou cousas que vos alegrem (^a de que não posiaes dizer mal, assi como santos e profetas. O seu pintar é trapis, maçonerlas. verduras d**, cnmpos, sombras d 'arvores, e rios e pentes, a çue cliamaai paisagens, e muitas flguras para ca e muitas para acolá ; e tudo uo, inda que pareça bem a alguns olhos, na verdade é feito sem razão nem arte. sen symetria, nem proporção, sem advertência d'escolher nem despejo, e Sialmente sem nenhuma sustancia nem nervo; e comtudo noutra parte se pinta ;i>r qne em Fraudes. Nem digo tanto mal da framengi pintura porque seja 'i-i3 má, mas porque quer fazer tanta cousa bem (cada uma das quaes bastava vormui grande) que não faz nentiuma bem.

Somente as obras que se fazem em Itália podemos chamar quasl verda- deira pintura, e por isso a boa chamamos italiana, que quando, noutra terra se i»'m fizesse, d'aquella terra ou provin:ia lhe daríamos o nome. E a boa d'esta rl3 lia cousa mais nobre nem devota, porque a devoção, nos discretas, ne- riu-na cousa a faz mais lemorar nem erguer que a deficuldade da perfeição ^je se vai unir e ajuntar a Deos ; porque a boa pintura não é outra cousa senão JC lerlado das perfeições de Oeos e uma lembrança do seu pintar, finalmente ctna musica e uma melodia que somente o inteleito pôde sentir, a grande defi- CQ.dade. E por isto é esta pintura tão rara que a não sabe ninguém fuzer nem aiciaçar.

E mais digo (o que quem o notar, terá em muito) aue de quantos climas &Q terras alumia o sol e a lua, em nenhuma outra se pode bem pintar senão eiB o reino da Itália ; e é cousa quasl impossível fazer-se bem senão aqui, ainda qne bem nas outras provindas houvesse melhores engenhos, se os pôde haver, e isto pelas nzOes que vos diremos.

Tomai um g:ande homem d'outro reino, e dizei-lhe que pinte o que elle qaiser e melhor souber fazer, e faça-o ; e tomai um mau discipolo italiano e mandal-lhe dar um traço, ou que pinte o que vôs quiserdes, e faça-o ; acha- reis, se o bem entendeis, que o traço d'aquelle aprediz, quanto á arte, tem ttiis tostiocia qat o d'aqueloutro mestre, % vale mais o qut tlU queria fazar

15

994

qne tndo o qne aqueloutro fez. Mandai a iiin irrande mestre, que nlo se|a ita- liano, inda que bem fos«e Aberto, h^^mem delicado na au^i maneira, que para me eni^anar a mi ou a Francisco d' Olanda, queira contrafazer e arremedar nma obra que pareçp de Itália, e se n9o p >der ser da mu^to boa, que seja da arre- zoida, ou da 'm4, pintura, que eu vos certifico que logo a tal obra tecooheça nSo ser feitai em Itália, nem ror mio de italiano.

Assim affi^mo que nenhuma naçffn nem Cfente fdeixo estar nm na dom spanboes), pôde perfeitamente fartar nt-m emitsr o tnodn do pintar da Iraiia (que é o prego jinticro), que logo nJlo sela conheddo facilmente por aiheo. p^ír mais que se nisso esforce e trabalhe. F ae por al^um grande mllpgre algum vier a pintar bem. ertio. inda oue o n^o f!zess« por arremedar Itália, te p.deri di- zer que o somente pintou como ttaliane

Aísi que nín se chama pintura de Itália qualquer pintura felt» em Ita^a, mas qualquer que fôr boa e certa, que, porque nella se ^azem ob^as da pin- tura illustre muis mestHo^as e gravemente que em nenhuma outra |ia»te. cha- mamos ^ boa pintura italiana^ a qual. inda que se fezesse em Franf^es ou em Spanha (que mais se aproxima comno^co). s.Jb^^a fdr, p ntnra ser^ de I>a'ia, porque es*a nobeltssima sMencia n9o é de n uhuma terra, que do ceo veio: tw rém do antigo inda ficou em a nossa Itália mais que em outro reino do mundo, e nella cuido eu que acabará.

Assim dizia elle. ^*ndo eu que Mkael, stava callado, por este modo o tornei a provocar :

As^i. mestre MUael Angelo, oue vós affirmaea que somente aos Ita- lianos concedeis entre todo o outro mundo a pintura ?

Nem que mil gre c ser isso assi ? Saber is oue em Itália pfnta-se. bem por muitas rasõ^s, e fora de Itália pinta-se mal por muitas razAes. Prmeira- menre a natureza dos italianos é estudiosíssima em stremo e os de engenho trazem do seu próprio, quando nasci»m. tr^baP^o gosro e amor ánai'lo que sío inclinados, e que lhes pede o seu penio: e «e algum de^ermin» de fazer po- flss8o. e seguir alguma arte ou sriencia liberal, nã^ se ronten^a elle com o que lhe basta para '«er p ir aiue la rico e do numero dos off ciaes mas por ser úni- co e stremadn vcgia e tr. bal^a conrinua n* nte. f s6 traz ante d s o ho« e^te ta- manho interesse de ser monstro de peif 'íçSo íf<llo ond2 sei que «ou rri'ol t nSo arrezoad' naqnell art* ' u «cl- ncia. F isto porone a Iia'ip nío sHms c*te nome de aTero^do. oue tem por baixissimi c^usa nestii oTte « remédio e so- mente d'aq"e les f*<l'a e t^ o c-*o a leva o *a a ^me ci^amr-m ofiuhs. como s'kb'e- pujidores dos outros iodos e cr»mo p nf^tradnr^^ das nnven< e da 'nz do fol.

Depois n^cti^ na p ovincia fvêde se é isto van^pgemi 'ue é mSe e con- servidor? de todas as sri ncias e descep ina< entre tantas r^^liq «ias dos v^s oi ant gos. que em nenhuma outra p^ite se »cham. que de mínimos, a qualquer cou«a qu: a vossa inclinaçSo ou g^^nio emclína, tonaes aite o: olhos poias ruas muita pirte d'!iqiiellas. e costumados sois de p.^quenos a tardes vistas aqueilai cousas que os veihos nunca virara noutrrs reinos.

Depois crescendo, indi que bem fosseis rudos e grosseiros, trazeis H do cos- tume os olhos t9o cheios da noticia e vi^^ta de muitas cousas antigas nomeadas, que n9o podeis deixar de vos chegar a imitar d'eiias ; quanto mus que com isso s^ aluntam, engenhos {como digo) stremad)s e studo e gosto incansável. Tendes mestres que imitnr singulares, e as fws obras, e das cousas modernas chers as ctdades de todas as galantarias e novidades que se cada dia descobrem e acham. E se todas estas cousas nAo bastam, que eu por mui «uficiente st^maria pêra a perfeição de qual luer sciencia, ao menos esta é mui bastante : que nós outros. os Portugueses, inda que alguns naçamos de gentis enpenhos e spritos. como nacem muitos, todavia temos por desprezo e g lantarla fazer pouca conta das artes ; e quasi nos enjuriamos de s^ber mui'o d'ellas. onde sempre as deixamos imperf itas e sem acabar. A vós os italianos (nio digo allemies nem france- ses) a mór honra, a mór nobreza e o ser peia mais, somente pondes tm um

•áffOM Sfl

(bomem] ser terríbd pintor, ou terríbel em qualquer faculdade ; e aquelle dos fidalgos, dos capities, dos discretos', dos praguentos, dos principes, dos cardeaes e dos papas é tido em muito e quasi d'algu'iis exalçado, que alcança fiaia de consu:iiado e raro na sua proflss9o. £ não stímando em Itaiia grandes príncipes, nem tendo nome, somente a um pintor v8o chamar o divino: MUmel Angelo, como em cartas que tos escreveu Aretino, praguejador de todos os senhotes cbristios, achareis.

Ora as pragas e os preços* que em Itália se dSo pola pintura, também me parecem muita parte de em nenhum outro logar se poder pintor, senio den- tro nelia, porque muitas vezes por uma cabeça ou rosto tirado do natural se pigaoi mil cruzados; e o Uras muitas obras se pagam como, senhores, melhor ubeis, mui deferentes do qua pagam po^os outros reinos; posto que o men é dos magniflcos e largos. Ora veja a Excellencla Vossa se são estas deferentes osides e a|nda«.

Parece-me, respondeu a senhora Marquesa, que per cima d 'esses desates tendes vós engenho e saber nSo de tramontano, mas de bom italiano; emfiin« por toda a parte é uma mesma a vittude, e um mesmo bom, a um loesmo méo, inda que nio tenham outras policias das nossas. é

Se i«o (respondi ca) ou/issem na minha pátria, t>era, senhora, st ipantariam a«s1 de me v. ex/ louvar e por essa maneira, como por fazer essa deferença dos homens italianos aos outros, que lhe chamaes tramontanos, ou de tra-los-mojites :

N^n obtusa adeo gestamus rectora ^eeni,

Nec tam aduersus equos, Lysia, sol iungit ab urbe.

Temos, senhora, em Portugal cidrdes boas e antigas, principalmente a &!nha pi»tris Lisb< a : tetros co tumf s bons e bons cortesãos e valentes cavallei- fos e vaiero$os príncipes, as^ i na guerra como na paz e sobretudo temos um 'ei mai poder<m-> e c aro. oue cm g »nde assocrgo no« tempera e rege. e manda pf vln^^as mui af>?)rtarfas de gentes barbaras, que á converteu ; e é temido de todo o oriente e de trda M^urit n a, e favorecedor das boas artes, tanto que por se eatfanar c^m o in*a errgenho, q'ie de moço ?lgum fruto prometiia me man- t^oj ver ttaiia e suas poHcli-s, e mestre Micael Angelo, que aqui vejo estar. i' bera vcHarle que nSo t mos outras poiicfs dos edifícios, nem de pinturas cnifl) r4 tení^c^ mau todavia J* se c* mrçam e vSo p' uco a p uco perdendo a ttoerflui^iade barbara, que os go'^os e m^uritanrs semearfm por as Spanhrs. Tnil)<»in spero que. chegando s Portugal e inio de cá, que eu ajude ou na clc- janda do edificar, ou na n b^cza da p ntura a poierm s comr>ctir comvosco. A qual sHenc'a de todo esá quasi perdtda e srm resplandor nem nome naque>les rino«, e nâo por cu pa d'oa!rem s ião d ) logar e do des^ostumc tanto que ns'mis poucos a stimam nem entendem, senSo é o nos«»o serenis Imo rei por «ostentar tda vl^-tudc e a f a 'orecer ; e assi rr es no o scenissimo infante D Luís, Hu lrm3o Xirn^pQ valeroso e sabto, que teoi n^lla muito geniis advertcn- e descr^çff). como até em tod^s ís outras cousas liberaes. Todos os outros nSg entendem nem se preza^i é^ Pintura.

*-az m bem dixe Aí. Angelo.

Mai Messfr Lactando Tolomei, que havia um pedaço que nSo falia va, d'esta felçflo prosegu o :

Rísa vai's»srem temos mui grande, rós, os italianos, a todas as outras fliÇô^ d'este grS i mundo cti o conhecimento c honor de todas as artes e srien- cía« tMoitres e dignissimas Porém faço-vos saber, M. Francisco d'Hollanda, qui quem nio entender ou st mar a nobelissima pintura, que o faz por seu át- *t\x\ e nlo da arte, qie c mui flda'gi e clara ; e que é bárbaro e sem juízo, e ^ae nlo tem uma aaui honrada parta de ser homem. £ isto por muitos exemplos

998 iBtoLoou ntoiA

dos antigos e novos emperadores e reis muito poderosos : poios dos filósofos e discretDs, que tudo alcançaram, que tanto stimaram e se prezaram do conheci- mento da pintura, e de failar neila com tSo altos louvores e exemplos, e de a usar e pagar tSo liberal e manificamente; e finalmente pela muita lionraque lhe faz a Madre Igreja» com os santos pontifices, cardeaes e grandes príncipes e pre* lados. E pois achareis em todos os passados segres e todas as passadas vaierosai gentes e povos que esta arte sempre trouxeram em tanto que nenhuma consa tinham por mayor admiração, nem milagre. E pois vemos Alexandre o Manho, Demétrio e Tolomeu, reis famosos, com outros muitos princepes, se vangloria- rem prontamente de a saber entender ; e entre os Césares Augustos o divo Cesir, Ottaviano Augusto, M. Afrrippa, ÇlaUdio, e Calígula e Nero, em Isto vertuo- SOS ; assi Vespasiano e Tito, como se mostrou nos retavolos famosos do templo áa Paz, o qual edificou despois que desfez os Judeus e o seu Jerusalém. Qae álrei do grande eroperador Trajano? que de Hélio Hadriano? o qual pola sua própria m9o pintava muito singularmente, segundo screve na sua vida Dion grego, e Spartiano, pois o divino Marco Aurélio Antonino, diz Júlio Capltolino como aprendeu a pintar, sendo seu mestre Oiogenito; e mesmo conta Hélio Lampridio que o emperador Severo Alexandre, o qual foi um fortíssimo princepe, pintou elle mesmo a sua genolosia por mostrar que descendia da linhagem dos Metelos. Do grande Pompeo diz Plutarcho que na cidade de Mitilene debaxou com stjlo a planta e forma do theatro, para o despois mandar fazer em Roma, assi como o fez.

£ inda que pelos seus grandes effeitos e primores a nobre pintura mereça toda veneração sem buscar alegações d'outros senSo próprios d'elia quis todavia mostrar aqui, ante quem o sabe, de que calidades de homens ella foi stimada. E se se achar por ventura, em algum 4empo ou lugar, algum que de elevado e grande n9o queira prezar esta arte, saiba que outros mores se prezaram muito d'ella ; e quem pôde elle ser que se igoale com Alexandre o grego, ou o romano? quem será que exceda a proeza de César? quem de mór sloria que Ponpeo? quem mais princepe que Trajano? Pois estes Alexandres e Césares p9o somente amaram a divina pintura caramente, e a pagaram por grandes preços, mas po'ai suas mesmas mãos a trataram e sentiram. Nem quem será que por braveza e presumpçSo a enfeitar, que até á severa e grave face da pintura nSo fique maito humilde e para muito menos que ella ?

Além d'essas cousas, que s9o grandes, qual cousa ha que mães enno- breca ou faça alguma outra cousa fermosa que a pintura, assi nas armas, como nos templos, como nos paços ou fortalezas, ou qualquer outra parte em que caiba fremosura e ordem V E assim affirmam os grandes engenhos que nenhuma consa pôde o homem achar contra a sua mortalidade, nem contra enveja do tempo, que a pintura. Nem se arredou muito d'e$ta tenção Pithagoras, quando dezia que sós em três cousas se pareciam os homens com Deus immortal: na sdenda a na pintura e na musica.

Aqui dixe mestre Miçael:

Eu seguro, que se no vosso Portugal, M. Francisco, vissem a fremo- sura da pintura que está por algumas casas d 'esta Itália, que n9o poderiam ser tio desmusicos que a nào stimassem em muito è a desejassem de alcançar; mas n9o é multo nSo conhecerem nem prezarem o que nunca viram* o qat lio tem.

F. ét Hollamda, Da Finivra Ántigvm, Fort«, 1918, paga- 1II«1M.

létotiO XVI Wt

XLIII

Minfiii Mtça ou saudades di Birnardim Ribiíro

CAPÍTULO 1

Menina e moça me levaram de casa de meu pae pêra tonges terras.

Qual fosse então a causa d'aquela minha levada, era pequena, ni9 II lOttbe. Agora, nio lhe ponho outra, senSo que então paresce havia de ser « que depois foi.

Vivi alli tanto tempo, quanto foi necessário pêra nSo poder viver em oatn parte.

Muito contente fui eu naquella tena ; mas, coitada de mim ! que em ò^yt espaço se mudou tudo aquello que epi longo tempo se buscou, c pêra bago tempo se buscava.

Gran desaventura foi a que me fez ser traste, ou a que, pola ventura, me fez ser leda. Mas, depois que eu vi tantas cousas trocadas per outras, e o pnzer licito mágua maior, a tanta paixio vim, que mais me pesava do bem que tii^qae do mal que <lnh^.

'"'fioolhi, pêra meu contentamento (se antre tristeza) s e saudades ha i ligum), vir-me viver a «ste monte, onde o legar, e míngua da conversação da gente fosse como pêra meu cuidado compria, porque, grande erro fora, depois de tantos nojos, quajitos eu com estes meus olhos vi, aventarar-me ainda esperar do mundo o descanso que eile nunca deu a ninguém, estando eu iqui s6, tio longe de toda a outra gente^ e de mim ainda mais longe ; d'onde alo vejo senfio serras, de um cabo, que se nHo mudam nunca, e, do outro, iguas áo mar, que nunca estSo quedas; onde cuidava eu que esquecia á desaventura, porque ella, e depois eu« a todo pcder que ambas podemos, n3o kixámos em mira nada em que podesse nova mágua ter logar (antes havia noito tempo que tudo é povoado de tristezas), e com rézão.

Mas paresce que, em desaventuras, ha mudanças pêra outras desaven- \ tins; porque, do bem, nSo na havia pêra outro bem.

E foi assi» que, por caso extranho, fui levada em parte, onde me foram lote os meus olhos apresentadas, em cousas allieas, todas minhas angustias ; t , o meo sentido d'ouvir nflo ficou sem sua parte da dor.

Alli vi, entSo, na piedade que houve d'outrem, camanha a divêra ttr de min, se náo fora tão demasiadamente mais am^ga de minha dor, do que piresce que foi de mim quem me e a causa d'ella; mas, tamanha é a rez8o porque slo triste, que nunca me veio mal nenhum, que eu não andasse em bcsca d'elle.

D'aqal me vem a mim a parecer que esta mudança, em que me eu vi, eotio começava a buscar, guando me esta terra, onde me ella aconteceu, iproove mais que outra nenhuma, pêra vir aqui acabar os poucos dias de vida, qae eu cuidei que me sobjavam; Mas nisto, como em outras cousas muitas, me CQSanei eu.

Agora, doas annos que estou aqui, e náo sei ainda táo somente detreminar pêra quando m'aguarda a derradeira hora. Não pôde vir longe.

Isto me pos em dúvida de começar a escrever as cousas que vi e ouvi» Mas, depois, cuidando commigo, disse eu, que arrecear de não acab.u d'escre- ^ o que vi, nSo era causa pêra o Ici^^ar de fazer; pois não havia d'c'.crever pêra nlumem, senão pêra mim só. Quanto mais, que, em cous^^s n^o acabadas, nlo havia de ser nova: que quando vi eu prazer acabado, nu mal c^ua ti. esse 1 fim? Antes me pareceu que este tempo, que hei ^''e^toT aqui neste ertro icomo < meu ma( aprouve) nSo o podia empiegar c m cousa que m.i:^ de m.iiha \ untada fssse, pois Deus quis que as&l trlnlia vontade seja.

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Se em al^funi tempo se achar. este Hviinh» de pessoas alegres, nis o leam : que, porventura, parescendo-ltie que seus casos ser9o mudáveis, coir.« os aqui contados, o seu prazer lhe será menos prazer. Isto. onde eu estivesse, me doeria ; porque assaz bastava eu nacer pêra minhas máguas, e nlo ainda pêra as d 'outrem.

Os tristes o poderão ler: mas ahi nSo os houve mais, homens, depois que n?s mulheres houve piedade. Mulheres, si ; porque sempre nos homens houvs desairor. Mas pêra ellas n9o no faço eu; que pois o seu mal he tama- nho, que se nio pode confortar com, ojtro nenhum, pen as mais entristecer sem-rezSo seria querer eu que o lessem ellas ^ mas antes lhes peço muito que fujam d'eiie, e de todas las cousas de tristeza ; que. ainda com isto, poucos serio os dias que h3o dj poder szr ledas; porque assi está ordenado peia desa- ventura com que elias nacem.

Fera uma pessoa podia elle ser; mas, d'esta, nlo soube eu miis pirte, depois que as suas desditas, e as minhas, levaram pêra longes lerras extran^as onde bem sei eu, que, vivo ou morto, o possue a teria lem prazer nenhum.

Meu am'go verdadeiro, quem me vos levou tSo longe? Que vós om- t^^go, e eu comvosco, sós, soía aios a passar nossos nojos grandes, (e tiú pequenos pêra os de depois. A vós contava cu tod ). Como vós vos fostts, tudo se tornou tristeza ; nem parece aindj, senio que e>tava espreitando que vos fosseis. f

E por que tudo mais me maguas e, tio somente me nSo fo) deixado, em vossa partida, o conforto de saber pêra que piíte da terra ieis; ca descan- saram os meus olhos em le/arem pêra a visca.

Tudo me foi tirado; no meu mal, remédio nem conforto nenhum houve ahi. Pêra morrer, asinha me podéra isto aproveitar; mas, pêra isso, nlo me aprovtitou.

Ainda comvosco, usou a vosía dcsaventuri algum modo de p'edade (das que nSo acostuma fazer com nenhuma pessoa), cm vos alongar da vista dena terra; cá, pois pêra não &entiides máguas nio havifl rea>edio, para as nio ouvirdes vol-o deu.

Coitada de mim, que estoii falando, e nlo vejo eu ora que leve o vento as minh)s palavras, e que me niD pode ouvir a quem eu fa>o!

Bem sei eu que nSo era pêra isto a que m'eu ora quero pôr; que o escrever alguma cousa pede muito repouso; e, a mim, as m nh^s maguas ort me levam pêra um cabo. ora pêra outro. lraz*m-me assi qu me é forçado tomar ns palavras que me ellas dSo; porque não são tão constran^rid^ a servir o engenho, como a minha dor.

D'estas culpas me acharlo muitas neste livrinho; mas da minha ventura foram ellas. Ainda que, qujm me manda a mim olhar por cu pis, nem por desculpas? O livro ha d* ser do que vai es^ripto neliQ.

Das tristezas, não se pódCvContar nada ordenadamente, porque desorde- nadamente acontescem elias.

Tjmbem,- per outra parte, nio me nada que o nuo lea ninguém; que eu nio no faço sen?io pêra um ou pêra n^nrium; pois d'elle, como dlissc. nio sei parte, tanto ha. Mas, se ainda me está guardado, p?rimescr MB algum tempo outorgado, qus este pequeno penior de meus longos suspiros antt 01 seus oiios

Maiuis o«trss cousas desejo, mas etta me s«ria assas.

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liotTLo xn 29ft

CAP1TUL# II

Em qua a dcnzella vai proseguindo sua historia

... a cabo do penedo, tornava a agua a jontar-se, e ir seu caminho sem estorvo a-gum, oiai antes paresda que corria alli mais depressa qae po a outra parte, b dtcía eu. que seria^ aquello por se apnrtar mais asinha d'aqueile penedo, íi&igo ái »eu curso natural, que. como por fo ça. alH estava.

N9o tardou muito que, estando eu assi cuidando, sobre um verd^ ramo que por cima da hf^m se eitenda, ^e veo pousar um roussinol ; e começou a CMQUr tão doce.nenie, que á^ todi me levou após si o meu sentido d*ouvir.

£ eile cadd vet cre ia mais eoi seus queixumes, que parescia que, como fuiudo. quer a acalmar senão quando tO'na^a como qu: começava então.

Triste 4a a V sinhb, que, estando-se assi queixando, níío sei como se a^la morta sob:e aqueila agua. Ganindo pjr antrc as ratAas, muitas tolhas cahi- nm tambeoi com elía

Pareceu a4UilÍo s'gnal de pesa', naquelle arvoredo, de ca«o tSo desas- tndo. L::vdva-a após si a agua e as folhas apH ella, e guiz^^ra-a eu ir tomar; mas paia corrente que ali fazia, e i>e'o matu> que d'alli para ba-zo acerca do íio iogo estava, p estes run^e se alo.ng-u da viso.

O o^í-fçhu me doeu tanto ent9*) em ver iSo asinha morto quem. d'ante8, íáo pouco havia, que vira estar cantando, que nâo pjde ter :is l^^t^rin as

Certam:nte que por cousa do mund^. depois que perdi »uira cousa, me nla pareceu a mim que assi chorasse de vontade mas. « m parte, este meu cui- dado nio foi em vâo; porque, inda que a d^^aventur» d'a itiel a avesiriiia fosse caasa de minhas lagrimas, ao^sahir d'eilas. fo.am juatas outras muitas lem- b.an(as tii<^ies

Qran le p daço de temoo estive assi embargada dos meus o'hos. an^re os caídsdts que m io tiavia que me tinuam eniA ', e a ndi teiáo. que ve- □ha o tempo que a'guiia pess)a extranha. de de min. com as suas mios •erre estes meus o^hos, que nunca foram tare »s di me mostr»rim máguas de si.

£ e tando asai o*na< d * p^ra onde corria a a^u» ojvi bj ir o arvoredo.

Cuidando que fosse outra ou^a, t >mo i-me med»; mis. olhan lo pêra illl, vi que vinha umi muin r; e p>ndo nelli bem os o' os. vi que era de corpo alto, disp »s»ç?!o b>a, e o rosco de d >n3. senhora lo tcmo)aniig*>. Ve^^tida ioda d: preto, no se j manso and. r. e m ne »s s-guros *U\ cori»o e do rosto e do oohjr. p<ires:ia d^acatament). Vin^a N* sem 1 lança. i^i cuid* sa, que não ipartava os ram s di si, 82nm quando lhe emp diim u c^m nh >. ou ihe fér^an o ros'o. seus p s trazia p''T amre as tresi-as trva^. c pi^rt do veni do xien- did » por cilís 6 antr* u >^ vngir sos pií»sos que ella d «v-», de quando em qaindu col lia um cansad> 'olego, como que lhe un ri^ fjltec«T a m«.

St-ndo acerca de mim. e me viu, «juntando as mflos (a aneira d2 me- do de mu her) um n<iuco mo que vira cois^ rie»»cos u!na ^a ficou ; e eu tam- b:in assi esrava Nfto do m do, que a S'i i boa s -mora logo m'o ifl.) consen- tiu; mas da no.-idade d^aquetlo, que a nda ai i n^o vir . havendo muito que, por meu m.il. tinha con inuado aquele ioear e toda aquela ribeira.

A9% nio c«icve ella mu to qu , p rcsrc nmtict^ndo tombem como es- tfVB, com uma boa sombra C'»m ç u a d zer, viodi cetra n.i n:

« >^a'av»lhi é ver d nzell i em ermo. ^ev^oii que a m nha grande da- isvemura lev* u a iod«> o mundo o meu . »

£ d ahi a grande pe^taço, mi-icurado com lagrimas, disse:

« . . . fiih j- , .

Depois, tilando um lenço, começou a limpar o seu rosto, e chegar-sa pera mde «itava.

Íé# AHTOLOSUL PtOlA

<c Alevantei-zne eu então, fazendo-lhe aquella cortesia, que me ella com a SM, e comsigo mesma, obrigava. E ella :

«O descostume grande, me. disse, (que ha muito* tempo que vivo neste ermo, sem ver pessoa alguma), me faz, senhora, desejar saber quem sois, e que fazeis aqui, ou que viestes a fazer, fecmosa e ».

cu, que um pouco tardava em lhe responder, poia dúvida em que es- tava do que ihe diria, paresce-me que entendendo-me ella :

«A mim podereis dizer tudo, - me tornou, que eu sfio mulher como vôs, e, segundo vossa presença, vos devo ainda ser muito conforme ; porque me paresce (agora que vos olho de mais perto) que deveis ser triste ; que vossos olhos teem vossa fermosura desfeita, e, ao longe, não se enxerga- va ».

« Paresceis vós logo ao longe, respondi eu, o que sois ao perto ; e iiSo vos saberia negar cousa em que de mi vos servísseis, que os vossos tra- jos, e tudo o que vos eu olho, é cheio de tristeza, cousa a que eu sio ha muito tempo conforme : e porque posso mal encobrir o senhorio que eu mesma, ás longas máguas, sobre mi tenho dado, nSo me quero rogar, mas antes vos devia ainda de agradescer quererdes saber de mim o que quereis, para ser, ao menos, nlal escuitado algum 'hora ».

« Pois dizei-m'o, me tornou ella, que ficardes-me devendo ouvir- vos eu, nova maneira é também de me obrigardes ; mas assi me pareceis vós, que de vos ser obrigada folgo muito ainda »..—

Satisfazendo-lhe eu então, disse :

«Pui uma donzella que, neste monte da vanda d'alem d'este ribeiro, pouco ha que vivo, e não posso viver muito, l^outra terra naci ; noutra de muita gente me creei, d'onde vim fugindo pêra esta, despovoada de tudo, se- não de as máguas que eu trouxe commigo. Este valle, per onde correm es- tas aguas claras, que vedes ; os altos arvoredos de espessas sombras sobre o verde \ erva e flores, que por aqui apparescem, e a seu prazer se extendem r ri- beiras d 'esta agua fria ; doces moradas e pousos das sós deleitosas aves, sio tio conforme a meus cuidados, que o mais do tempo que o sol assegura a terra, passo aqui, que, em que me vejais só, acompanhada estou. Muito ha que tenho andado este caminho. Nunca vi sen9o agora a vós. A grande saudade d 'este valle, e de toda esta terra por aqui derredor, me faz ousar vir assi, mulher (fer- mosa, bem vedes que não). £ pois não tenho armas pêra oífender,.pera me defender pêra que me seriam necessárias? A toda parte posso ir, segura de tudo, senão de meu cuidado, que não vou a nenhum cabo, que elie nlo após mim. Agora d'antes, estava eu aqui só, olhando pêra aquclle penedo, (mostrando-lh'o eu então, d*alli) como estava anojando aquella agua, que que- ria ir seu caminho. Ante os meus olhos, sobre aquclle ramo que a cobre, se veo pôr um roussinol, docemento cantando. De quando em quando, pirescia que lhe respondia outro, de muito longe. Estando, elle assi, no melhor do canto cahiu morto sobre aquella agua, que o levava tão asinha, que o n5o pude eu ir tomar. Tamanha mágua me crecêu d'isto, que me accordei d'outras mi- nhas, de que também grandes desastre^ causa foram, e levavam-me onde me eu também não podia ir tomar »

A estas palavras se me arrasaram os olhos d'agua,. e fui com as mios a elles.

« Isto, senhora, fazia quando vós apparecestcs, e o faço as mais das vezes ; porque sempre ou choro, ou estou para chorar ».

Eu, que lhe tinha respondido, detive-me um pouco, cuidando como lhe perguntaria outro tanto d 'ella, míMormente da causa que foi das &uas lagrimas, quando não poude. scníio muito tarde, dizer: «filho».

Elia, cuidando que, pola ventura, eu não queria dizer mais, disse:

«Bem se nisso, senhora, que sois d'úutra parte, e ha pouco qa«

■átULO XYi Ii4

«tais nesta ; pois dos desastres que neste ribeiro acontecem vos espantais. «ma historia, muito falada nesta terra por aqui darredor, muito ha que aconte- ceu. Lunbra-me que era eu menina» e ouvia entflo contar a meu pae, por his- toria. Afora, inda folgo de cuidar nella, pelos grandes acontecimentos e des- aventnras que nella houve. B ainda que nenhum mal alheo possa confortar proj^o de cada um, parte de ajuda me é saber, pêra o soffrimento, que antig» éfazerem-se as cousas sem razão, e contra raz9o. De boa vontade, pois ptreoe inda que a não ouvistes, —vol-a contarei; que, segundo entendo, devem-vot d'apra2er as cousas tristes, como me vós a mim dizeK».

«O sol, lhe respondi eu, --vai alto ; e eu folgaria muito de a ouvir,^ pola ouvir a vós, e, depois, por saber como não busquei embalde esta terra pêra minhas tristezas, pois tanto ha que se costumam nella. Outra cousa, senhora, vos quisera eu agora perguntar; mas fique pêra depois, que pêra tudo haverá tempo, ainda que pois a historia dizeis que é de tristezas, nSo poderá durar tio pouco como o dia ».

«Os dias sáo agora grandes, -*- me tornou ella, e nSo poderá m elles BVflca ser tio pequenos, que vos eu, a todo meu poder, n9o fizesse a vontade oelles. Assi são, senhora, pagada de vós. Mas olbae o que quereis antes».—

«Porque é cousa em que vós folgais ainda agora de cuidar, —lhe res- pondi eu, náo pôde ser pouco pêra desejar d'ouvir. Pique o que eu d*antes quisera pêra depois, ou pêra sempre; que de o eu querer lhe deve vir isto. Nio tomeis de aqui que eu não folgarei de ouvir a historia; porque esto podéra ser, se nflo fora de tristezas, pêra qu*6u vou achando, agora, o tempo curto, tanto folgo co'ellas. Por isso, contae-a, senhora^ contae-a, pois é de tristezas, Qas- tsremos o tempo naqueilo pêra que parece que noPo deram, a vós e amim».—

Eá. Pessanha, 3-31. í

XLIV

u.

Carta

Ào§ vereadores, e senado de Lisboa, querendo a Rainha Dona Caiharinã

ir-se para Castella no anno de 1751

Senhores: He t9o prejudicial ao Serviço de El-Rei Nosso Senhor,>e á ReputaçSo de Sua Real Pessoa, e ao Bem Commum de Seus Súbditos, e Vassal- los, a ida da Rainha Nossa Senhora para fora destes Reinos, que he de crer que cm tudo o que sisudamente, com o devido acatamento, se fizer para a impedir, e conservar, o amor, e quietaçio entre Suas Altezaa, se haverá El-Rei Nosso Seahor por mui bem servido; e pelo pouco que Vossas Mercês nisto tem feito, e fazem, e pelo modo que o guião, entendemos, que ou náo estão cabidos na importância deste Negocio, ou não querem, por alguns respeitos, cumprir com a Obrtgafâo que tem ao Serviço de El-Rei Nosso Senhor, e ao lugar, em que estáo postos; por onde nos pareceo a alguns que nos ajuntámos para tratar desta ma- téria, que vos devíamos lembrar por esta Carta quantas cousas pendem desta sua i(ia, como o porque lha deveis atalhar; se querem Vossas Mercês cumprir com a lealdade, e amor que devem ao seu Rei, e natural Senhor, e eximir-se da culpa, que Sua Alteza, e seus Povos, ao diante com razSo vos poderão dar.

Bem sabem Vossas Mercês, que ha perto de clncoenta annos, que a Rainha Kossa Senhora he natural, e digna Companheira do Senhor Rei D. Jo8o, que com tanta prudência, e paternal amor governár9o, amarão, e estimarão seus Povos, c que de seus Povos com tanta razão forão sempre também providos, e amados, e também, Senhores, vos deve ser presente o grande valor, e discriçáo, com que esta valorosa Princeza Nossa Senhora, na força da paixáo, e immensa áòr, que teria da. perda de tal Marido, lançou mão do governo de seus Reinos,

AÈiOLOÊtlÂ. tnoúÁ,

da tutela, e críaçSo de seu Neto, Rei, e Senhor Nosso, e com quanta sufflcien- da na su3 Meniiice lhe ad.ninistroj seu Estado, e o cuidado que teve de sui creação, coai que nollo deo tal Prínclpâ em Saber, Vtrtulâ, e Valor de Sua Pessoa, que a todos os do seu tempo, pôde fazer injuria ; cumprindo finalmente tudo e^ca valorosa Semora \ossa tão heroicamente, que em na la seseatioa falta do Catholico kei seu marido, salvo ni siuiade, que por sui Real Oemcnoa,

Paternal amor de seus Povos, com tanta razà) deixou a seus Vassalos. sendo Mtes tflo grandes merecimmtos, taj notórios a tolos Oi Principis do >dundo, e a tod..s as Na^ò^s estranias; vendo agKa (j qu^ Oeos nSo permltrai que ul Princesa, sem nenium desmerecim^nto seu se aparte de £t-Kei seu Meto. que £Ua creou com mais amor que de vlai; sahe djs s^uS Reinos, em que tanto a áevem respeitar; e que deixando sua natu eza, e Sçahuno de tantos annos, alongando se dos ossos de seu v\aríd) e Filno^ que tanto am «u vai a Rnin^^ alheio buicar S:pultira, b2m entenderSo os que Uto virem, nl<j póie ser ta^na- fiho abato, senio com muito maior f irça de escandat ), de que resultará no con- ceito dos outros Reis, e P incipes. e Po /os ^xcranhos grande nodja á hoirade ElRei Nofso Senhor, sendo dle, p>r sua^i Reaes ^uiiidjdes» me e :edK de nSo ter nenhuma: e a seus Povos ficará pe ^etua infâmia d«: ingrdJd^o, commettida contri a sua Reai Seihora, deixtndo-a tio desapegadimen.e apartar de si. Tam- bém he de considerar noi Reinos, pra onde Sua '\iteza, se quer ir, o grande escândalo que fiará nos oravOes djs Reis. e Principt^s seis Parentes, que Ci>m tanio amor a háo de receber; e a dha também, que quanto mai4 disto acnarna casa alheia, tanto se ihe accrescentará mais a magoi que levar di sua; e de me- ãos occasides que estas se cjmeçir4o em ou ros iemp)<i, dissençôes entre oa-ros Reis qje tiveiáo trabalhosos fins, de que o maior damno carrega sempre sobre teus Povos.

Sendo estas cousis de tinto oezo. bem nos pnreceo nlo tratar por ora de •utros muitos damnos, que dtsta trtste idi se poderáo seguir; porque nflodeven vir em consideração a respeito destes. s quiies, pód5Ser, que (i4o considerâo algumas pessoas, que agora tão bom juízo tem; e por este respeito não he iil- Râi xSosso Senhor avisado, como deve, do que convém á sua honra, e socego.

Obras inédil<u de D, Hierouimê Oêóri0, td. ISIS, páa. 58.

XLV

Cristóvão Colombo apresenta-se a el-rei de Portugal

«Chegado Colom ante eIRey. pcrô que o recebeo c(J gasalhadD, ficou mui triste quando vlo a gente da terra que com el e vinha nâo ser negra de cibello revolto & do vulto Cv/mo a de (juiné, mas conforme e n asp cto cor, & cabello como lhe diziáo ser a da índia, sobre que elie tanto trabalhava. F. p>rque Colom falava maiores grandezas & cousas da terra do que neila avia, & isto c^m hQt so'tura de palavras, accmando êc reprehjndendo a el-Rey em nSo acceptar sua ofíerta : indignou tanto esta maneira de faiar a al(^Q4 f dalgos, que ajuntando •ste avorrec mento de sui soltura, com a tragoa q .'lao ter a eiRey d^ ptrder aquela empreza, offcr^ceráo se de les que o qu triào matsir, & com l«to se cui- laria ir este homem a Castella. (. â verdadeiramente Ibe parecia que á vinda áell aula de prejudicar a ts:e Heyno, & causar atgu n d-^sassosego a sua alteca, por layão da (Oqu>sta que lhe era concelsda pel )s summis Poniifi^es : da qual conqu sta parecia que este '^ oiom t azia aquella gínce. As quaes offertas elKey nâo a ceptou, ante as reprehcnde) como príncipe catho>ico. p isto que deste leiío de si mesmo teuesse escândalo : & em lugir diss^ fez mercê a Colom & ■landou dar de vestir de graã aos homens que trazia d'aquelle nouo descobri- K k ç/êm Uto ospcdio. £ porque a vinda k descobnmeato deate Ckria*

IÉCULil*XVI Mt

iotíSo Colom (como entSo algtts pronosticarfío) causoa Irgo entre estes dons keys, & depois a seus succe sores nlguas pziixões & cOtcndas, com que de hum reyoo a outro ouue eiubaix.ddS, assentos, & pa.-.tos» tudo sobre o neg tcio da Indta que hc a materii de&ta njssa scripiuia: nfto paieceiâ estranho detia tra- ctar da principio dcste descobri j;e ato & do que dei e ao diante succedeo. Se- |nado todos aífirmão, Chrisiouão Culom era òenoeà de naçio, homem esperto, eloquente, & Dom laiino, &. mui {{loiiosoem seus negócios. £ como naquelle .tempo i.Ai das puôcias de Itaiia que mães nauegava por razSo de suas merca- donas & lommtrcios, era a nsção Genocs : este seguindo o vso de sua paixia k mães sud própria iactm çSo. acidou- navegando per o mar de leuanie tant» tCiOpo, te que veo a estas paites de He^panha, & deu se A nauegaç&o do mar Oceano seguindo a ordem de vida que ante tinha. £ ueudo eile qi^c etRij dom Joflc oídinai ia mente m. ndaua dcscop.ír a costa de Airis:» com intenção de per eUa ir ter á Índia, como era homem latino & curió o em as cou^s da geogia- pbia, & iia per Marco Paulo que falava m ode radd mente dds cousiS oiicutats do reyao Latnayo, & as>i da grande ithd Cypango; veo a f<inicsi*>r que per e^te mar. Oceano occidcntal s^ podia naueg<ir t^nti), te que foi»scm d^r nesta i>ba Cypango. & tm ouiriís terras incógnitas Porque Cv mo em o vè^o do Li- bnte úò rteiiTi^ue se descobrirão a< i dai terceiras, & UnU parte de teira de Aírioi nunca Siibida mm cuiiada dv s HespaiTlioes: assi poderia mães ao po- oente aver outras ilnas âc tecas, po que a na urcza nào bVia de 6i:r tão desor- denada na com, osiyào d ^ * rbe vniue.sal, que quisesse d.ilne mães paite eitmcntu da agoa que da terra desjubcrta. pêra vida & criaçAo dos animaes. Com as quacs imagin- çõjs que l e deu a cun'.inu;)çAo de nauegar, & pratica dus Do.nens deita profíçm> que avia neste reyno mui espertos com OridescoDri- fflentus passados: veo requerer a tlrty J.o^o que lhe desae algds nauios pêra iidescoDiir a ilha Cypáu^o por este mar OLCidentai Mo confiado tanto em o que tmna sabido (ou por m.lhor dizer sonhí^djj d'al^11s iinas occidentaet, como querem dizer al^tlt cscnptores de Cast. iia : qurnto na experiência que tinhd em esies negicios serem mui acreditados es estrangeiros. A&si como An- tónio de Nolle seu natu ai, o qual ttnha oescuDeco a ilha de Santiago de que seus succcssores tinhão pane da capitania : & hum JoSo Baptista hrances de nação, tmna a ilha de Mayo, & los /uira Fra:nengo, outra do Fayal- t per esta Bitneira. ainda que mães nÂo achasse que alg ia iina herma, segundo logo erã« manúaJas pouoar: ella bastava pêra saii>fazer a despesa que com elle fizessem. Esta he mães ceita causa de sua empresa que al^Qjs fiçõcs (q como dissemos) dizem escíiptores de Casielia, & assi f-iycroniaio Cardano Medico Milanês, bá- rio certo, docto, & ingenioso: mas em este ntgocio mal informado. Porque es- creue em o liuro que compôs de sapiência, quw a causa de Colom tomar esta eropressa foi d'al]ueiie dito de ArisiotLles, Q no mar Oceano alem de Africa, aula terra pêra áquai nauegauão os Cartfginenses: & por decreto publico foi «l^fe? o que ninguém navegasse para cila. pjrque com abastança, & mollicias delia senão apartassem das Cousas do exercic o de guerra. EIRey porque via ter e^te Chnsiouâo Coiom homem falador & glorioso cm mosttar suas habili- dades, & mães fantauico & de imagln çõds sua ilha Cyp^go, que certo no ^ dizia : dauaihe pouco cri J. lo. tudo a força de suas inipoitunações, iDandou ?J estivesse com dom Diogo Oriiz B.spo de Çv:pia, & c <m niest»e R jdrigo & mestre loscpe, a qUwm eile cõnutia estas cousas cia cosmog apíiia Sc sius dts^obrimen- tus: & todos ouuerfto por vaidj ie as palauras de Lhristouão Colom, por tudo ter fundado em imagina.;Òes & cusas da il^ia CypS^o de Marco Paulo, & nlo tm o que Hj^iommo Cardano diz. t ts e desenga 10 tspedido elle delRei se foi psra Castella, onde também andou ladrando este requerimento em a corte deiKe]( dom Fernando, sem o qu rer ouuir : que per meio do Arcebispo de Telcdo dom Pêro GõçalULS de ^i^Joça eiRey o ouuio. »

Mb dfl BanM, Década Primtira, 1. ui, c xi.

IÉ4 ÁMOLMIA - - PtOiA

■*p"

XLVI

CAWTUL# IV

Gomo António Corrêa chegou ao Reyno de Pegu : & assi se descrevi

o^sítio e cousas delle & da paz que elle António Corrêa

assentou com o seu Rey, & do mães que fez até chegar a Malaca

António Corrêa quando veyo a fazer seu juramento, chegou-se a elle eapelISo da nao vestido em sui sobrepeliz alua. E porq em a nao nao aula outro livro, que fizesse major pompa, por ser de folha de papel inteira, que hft Cancioneiro de troaas imprimidas, em o qual estavão as obras que os fidal- gos, à pessoas deste Reyno que tinhão vea pêra isso, aquelle tempo tinhSo feito: quiz António Corrêa levar ante este livro, que o breuiario do clérigo, oh algtt.ii liuro de rezar, que na vista do gentio que era presente, parecia poaca cousa, éc que nSo ornamentauamos bem as palavras de nosta crença. Final- mente tomando o capellão o Hufo na mão, & aberto pêra António Corrêa |urar, pondo os olhos na letra, começou a ler alto (segundo o acto requeria) o princi- pio das trouas> que tinha feito Luís da Silveira guarda mor do Príncipe dom Joio, que despois de Rey o fez Conde de Sortelha : o argumento dos quaes he do Écclesiastices de Salom90 que começa : Vaidade das vaidades, & tudo he vaidade. Na qual era por razão destas palavras, tomou tamanho reccyo a Antó- nio Corrêa, com admiração delias : & me saltou no espirito hu tremor» como se posesse as mios nas palauras de toda nossa fé.

J. de Barros, Dec, tíi, 1. m, cap. 4.*' foi. 64 da ed. 162S.

XLVII

P. Henriqne faz passar o cabo Bojador

. . . MSdou armar haa barcha a capitania da ql deu a huQ Oilianes seu criado natural da villa de Lagos, ^ ja o anno passado fora a este descobri* mento : & por lhe os têpos nam terçarem bem, se foi as Canáreas, & em al- guQs saltos que fez tomou certos catiuos com que se tornou pêra o reyno. E porque o Infante se mostrou mal seruldo delle por este feito, ficou tam descon- tente de sy : que nesta segunda viagem detecminou de offerecer a vida a todo- los pirigos, & nam vir ante o Infante sem mais certo recado do que trouxera o afio passado. E a este seu propósito se ajuntou a boa fortuna, ou por milhor dizer a ora em ^ deos tinha limitado- o curso de tãto receo como todos tinham de passar aquelle cabo Bojador : o qual nome lhe elle entam apôs pelas razões que atráe dissemos, tendo até aquelle tempo alguu acerca de nós, segundo a sua situaçam podemos dizer ser aquelle o cabo a que Ptholomeu chama Gana- tiá promontório. E posto que a obra desta passagè não foy grande em sj (quito agora) entam lhe foy contada por huQ grande feito, & ouuéram que era igual a huQ dos trabalhos de Hercules ; porque com esta passagem desfez a vSa opiniam q toda Espanha tinha, & deu animo áqueiles que nam ousáuam seguir este descobríméto. Tornando Gilianes ao reyno com esta noua : foy recebido do Infante com aquelle prazer que se tem das cousas tam desejadas & per tanto tempo, & trabalho requeridas como erzm aquellas. & aga^ardoou sua pessoa à assy os da sua companhia com honrra, & mercê. £ o que mais aninouo In- fante a esta impresa, foi cõtar-lhe Qiliánes como sairá em a terra sem achtr gite. ou pouoaçom algua, & que lhe parecera muy fresca & graciosa : & que

Haoui xn 90S

em sinal de nam ser tam esterele como as gStes diziam, trazia aly a sua meree em huli barril cheo de terra, ht&as beruas que se pareciam cO outras q no rejno tem faOas flores a que chamS rosas de Santa Maria. As quaes aendo tra- zidas ante o Infante d^e as cheira ua, & tato se gloriaua de as ver, como se fora iI^Q fructo & mostra da terra de promissão, dando muitos loauores a dcos : & pedia a nossa senhora cujo nome aquellas heruas tinhS, que encaminhasse as cousas daquelie dcscobriméto pêra louuor & glória de deos e accrecentamSto de sua sancta fee. E nSt somente o Infante cuja era esta impresa, mas ainda eirei dom Duarte séu irmSo que entam reinaua, ficou muy contête deste feito iSto pella honra da Infante por saber as murmurações q andauSo na reyno desta sus impresa : como por o proueito que elle & os seus naturães nisso podiam ter. O aual logo publicamente quis mostrar este contentamento, porque estando em a vilhi de Sintra onde lhe toj dada pelo Infante esta noua : elle fez doaçam de todo o espiritual das ilhas da Madeira, Porto Santo, & Deserta ao mestrado de Chríato, de que elle Infante era gouernador, & disso lhe passou carta a vinte seys de Octubro da era de mií quatro cètos trinta & três annos, pedindo nella to papa que o cõfirmasse. E no mesmo tempo lhe fez mercê a elle Infante, dat ditas jlbas em dias de sua vida : toda jurdiçam de ciuel & crime segundo •m a doaçam se contem.

J. Barro», Déeúda Primeira da Aiiu^ ed. 1552, caf.'iii, fi. 10. 1.' c«l.

XLVIII

li muitas G0U8I8 notaueis qui ha nestas ilhas di Malus»,

& dos fogos que alguas lanção

Estas cinco ilhas, aque propriamente chamamos de Maluco, sSo todas de h&a feiçSo, & grSdeza, porque nenhQa d'ellas passa de seis legoas em cir- coito. SSo redondas. & querem imitar hum chapeo coscuzeiro, cujas abas sSo aqaellas cbans "que todas tem em que nacem os craueiros, & que s3o povoadas de suas cidades & villas. E do meyo de todns se alevantaO huns montes muito altos. SaO todas muito alcantiladas, & redondas, pello que carecem de bons portos pêra ambas as mouções» Noroeste, & Sul, Ternate tem o porto de Ta* langame, hfla legoa da fortaleza, onde os nossos Galecõs inuern9o. Tem outro baa iegoa d'este, chamado o toloco, em que podem as nãos estar com prancha em terra. E quando eIRey mandou, que se fizesse fortaleza naquella ilha, nSo se fez em algum d'estes portos, por ficar longe da cidade onde o Rty viue. Tem ambos estes portos o rosto a Leste. Ha por todas estas ilhas alguns arrecifez que seos moradores abrirão, pêra entrarem suas embarcações. E a ilha de Ter- nate tem hnm defronte da nossa fortaleza, o que tem antre a terra, & elle hum poço onde podem entrar Carauelas de preá mar, d*agoas viuas descarregadas, & no poço estarem surtas a sua vontade. Todos estes arrecifez pclncipalmente este, alo de pedra que se gera do coral, que depois de velho induresse, & com ter muitos ramos se a)untaõ & conuertem em pedra de que se faz muito boa caL Está este arrecife posto por tal ordem que quem vai do nar demandàlo, parece que ve fermosos edificios feitos ali pêra defensão daquelie Porto. Este monte de Ternate, que se aleuanta do meyo da ilha, será de altura' de duas

legoas, he todo cheio de aruoredo, & palmares :

•^. La embaixo arret>enta htka fermosa fonte que corre pêra hna parte, cuja agoa ninguém chegou aprouar, se sabe se he doce se salgada. Este chio que •mbabco aparece ^ue como dissemos he de pedra & terra mouidiça, como hum entulho,) ferue de.contino, com a força do frgo que tem por baixo, k lança para dma muitas vezes hum tSo especo, & fedorento fumo, que parece couaa ^M at ftde palper, li fede a enxofre : k parece que por debaixo he este monte

oco, pot que n'eíte tempo vai sumido aquelle entulho fqne dedma se enxcrEi,] pêra baijco como faz o Uigo nx tremonha da atiFona. & multas vezn acontra, ^uinlo lança aquejie e!;p?ço him-» faz-r t^imanhos terremotos & tínnciéi. que parece aos qu* cst^o em ctmi. que cae todo o monte, & a voltas delfei bnci htta grande quaniidade rfe pi^dr^s Vi-rm ■lha» cotio (oco. que s; e^palhiSo pelM eres. como símís em de b^cas de fiilotjs bamhardas, & espalhandoK pii torta a Ilha com grandps lerrem iio«, caem sobre a nnssa Ioriale«,' & sobre i cidade: t algti^s vezps 9- achou Irem dar nas lluat dos ^"30!, & dos Cafum, dezoito vlnle legoas de Ternate. O fumo que lan;a he de muitas cores. & «tti he' a rezto ptique esta litia he mais itneotU qii; todas, pir cru a doi iniM vaoores, & ciriupçío d.) ar. & das agias, pirque multas vezes caem iquellat

pedr IS nas fontes de quE bebem que n^reTe qu; as corrompe No Woro

ha outra coua em o itro m^^te que taõb 'm lançn fr go. 4 turno. N'estJi llhat todai nBo ha verlo n 'ni Inuerno. & a chuua nio tem (C^ certo, mai he maii ^ral cO o Noroeste que com o S il.. .

Diot» dl CaDta, Déeaia Quiría da À»ia, tá. 1601, i. 7,*, cip. x.

XLIX

De quamo eIReí mandou lã(;ar hos Mouros, & ludeus

fará de seus Regnos, & senhorios

Depola qu"( hos Reis de CasteUa lancarSo hos ludeus [ora de seus repios, ft sedorios. .,. eIRel dom -manuei leiuerdo p r caria» des mesmos Rei» deter- minou de fazer ho mesmo, mas quomi ho negocio to«ae de qualiíaie pêra u delle nilo tomar 'psnluçSo, sem bO cflielho. honue soQrlsio vários pireceies, por^ hns dízllo q no's ho ^api r^<entia esta e ê tò<l»la3 terras da P{;r'ja, pernift'ndn|hes viucé rm sua I' I. & 3 o me^mn 'azi 10 todolos Ptiurioe', 4 M- publicas de lia ia, & H07rl!>. fí^-h mia. & Polr nla, o q se podia cuidar, q nlo fazISo causa, a cuia Imiwçio ê f^rta fi itiemmia. & ouiros fi^no». &p'0'in- dasde ChristSns ot deín.iulo U ê viuer, q cauia Itaueiia peiaos^Sça ê do («rio. 15 nlO repugiasse ri tia taiSo nuesioiilras n frtes t nhSo ne ? OC"asenii'S. Aq jI* dlst> pno» lançuê di terra r)or Isso lhes d mS azo de nas alheas se torna em Chrlsfos, mas anics se se 'ns è plt» ha d s mouris. «» perd a d; todo ha pspe- rança n^nhíi se rfl^ierter. o 1 muitos fie les vii é lo enfe nts mnuidos de nn^sa reMeiS'. & dr> M i-so de'li =e polia sp raro fc^. «em & '■ hau a alndi nisto outros In íl'ipn|,-n es. no q do' s uiços. & trihuii" q .flRei p-rlla. fi- caua Dtirlfdo a s- liífaíer à* rt; -ods ;< q e le. Sc oi >Íp's p'SS"di' de"ps f'ie it mercê. & q nli t'o <ómente l^um 0 cO '^i d.i lerra m^iitf* haueres. & ritiuera». mas ainda o q era ma*s de e 1 m -r. leu.niSo, soti*. & ri lícados >plr tos com q laheriS dar aos mour ' auiíos q lhes nrcfsaríiK f.^^-i rO ra nós. 4 scbre in'(t lhes insInariS" seu» olfi-iis mec^nijns. cm q -rS » muiro» di-stros p incipilm6;e no f-zer das armas, r!" ^ se o'i''erla s guir m'iiio d.lno, ifahalho», í p'td s. »■•! de fBfí. como de be: n tida hi riiistrindid-". °,te fil ho nirecer, 4 opinio dalpQ do cons''ho a q ourri» rrpiigna^a n diíè lo q era verdiiíe o ^ 1 Zi*o, mas q os Re s de Frania 'ngliterr.. Esco; a. I>inii.n^.rei, No<oega, & SuíciJ, com muitas nutras OTiiinciíS vi'i"ha' a eítas, fdo o E-^lido de FHdr-«. A Borg-nha nlo lanc^M.. os liil ■"< ''é re si mu los nn-ioi hauia s*m p;rd o f.iiíi terfi hoaí causís & de rece»-r. & q o mesmo sr diiii» cuidar d:.5 Reis de r"», tella. o q abastaija pp^a aiie C de hçar esra naçlo íijra do ífB^O. CiãlO m»l» í)

nlo pare*ia ((l!í'ho e-is I1 cs'es rcín^s ci'rcadoí d'>s de Casteila, h hos di Ca«tella do» de "fçi. p'.rminê:.> nOie-: Ind.^ui, scnicí liicados dai terra» de taei Tlililios 4 iSo poderosos, ho% qua -s ptid^rlÍT lomar a mal parecernos, lue t' nbanos milhor cõscIlIO eji únxit vluet csia gente unire not, do q dle> tiuerfca

noo&o Xfi 897

em os Iflçaté de si, o qual degosto por ▼«tara tirflo secreto, pen qnido rfncm tépo oportuno «bcitè has asas à tyrannia. & debaixo de cor de catholicos, & cbrífdaiussimos nos fazeté o mal, & d9no ^ podessem, & que sohre tudo, o tOitiho era perder ha saudade, a todolos prqueitos, & tributos t\ se desta géte tirauam, & por o Iniêto em Deos. & na sua Sancta Fê, po.^ eite dobraria cO loas mercês o ^ se nistn perdesse. & q pois esie negocio per sua vO ade viera a 6e por a det« rminaçáo de conselho, t\ ha resoluta conclusam ddle fosse lançati logo do regno aquelies q oSo quisesbé rccebtr ha agoa*do baptismo, & crer ho qcre ha Egrija Catholica Chnsiã Na quai opinilo, & parecer foi el-Rei, sem ter cOta no que se nisso perdia, nem com has satislaçOes. ^ fícaua obrigada fizer, quomo depois por inteiro fef. K logo se assinou t^mpo certo para ha noti- ficaçam deste negocio, hf> qual foi declarado. & publicado, estando el-Rei ainda cm Mu|a. no mes de De2Õ3ro de M. ccccxcv^j em Mli pregaçam ^ se sobre Uso fez, & nam tam somente Si assentou no cOselho q os ludeus se fob&em do regno cO suas molheres. & flihos & t6s, mas tambã hos mouros pelo mesmo modo, peia h ' q lhes ei-Rei limitou logo a todos têpo certo, & nomeou poitos seus de uns rtgnos para suas embarcações.

DamiM de Goa, Chrón, de D* Manoel, ed. 1619; parta i, etp. wii,

L

De como Vasco da Cama i»)m outros capitães foi descobrir a índia

' B como quer que el Rey dom Manuel assi como sucedeo nos reynos a el Rei D. Joflo, assi também lhe sucejeo nos desejos que tinha de descobrir a Indfa: logo so< dous annos de seu reyn do entendeo no seu descobrimento, pêra que lhe aprouti ou muyto as instruções que l^e ficarSo dei Rey dtm João, e seus re^mentos para esia navegaçSo: e mandou fazer dous nauius de madeira que el Rty do n João mamiara cortar. £ hum que era de cento e vinte toneladas OQue nome sam GaoriCi: e ouiro de cento s?m Ròfdel: e comprou pêra ircoestcs nauios tu4 caraueta d.: cinco toneladas a ) um pitoto chamado Birrio de que a caravela lomou ho nome. K estes tns nauios auia de mandar a este descobri- mento e com cap f«nia mór deles cometeo um Pau o da gama caujleyro de sua casa filio que fora >vste./ao na gam^ aicayde mór na viia de >mis no campo douii^ue, em que tinha grande confiança por de ser pêra isso. Do que se ele exumou por iQi doença que inha com que não pod ria sufrer os trabalhos de capitão mór. p din^^o a ei R y que fizesse mercê daqueile ciirgo a hnm seu irm^o msis moç» c^amldJ Xasco da {?ama que no s:ibcria muy b. m seruir. e que eMe iria também na armada por capiíão peia o aionselhar e aiuiljr. Do que el Rey foy contente por saber que era i\sú. e que era Vhsco da (;ama espremen- tado nas rousas do mar em que linha ftyto mnyto seruiço a el Rry dom João: e Que era homem de grandes spiritos: k muyto propilo p:ra d^r fim a este des- cobrimento, e a^^si lho di^sc qt ando lhe deu este cargo enconiendandolhe muyte que stisfizesse ao credito que tinha ne'e, porque s^: assi ho fizesse lhe faria par Isso mu}to grandes mercês, qut* lhe logo comtçou de fazer de I tki comenda, t de dinheiro pêra o apercebimento de sua vií-gt*m. E p.ra ir^m coele despachou tamb-ma Pau'o da gama e a um Niculao coclno ambos criados dei R^y £ ha- mens pêra qualquer grande feyto. h por q lanto nns nauio? da armada nao pó- dio ir mantimtntos que abastassem á gente dela até três annos. co^ipiou el Rey Itti nao a hum <yres correa de Lisboa que era c^e duzentos toneis, pêra que fosse carregada de mantimentos até a agoadi de sam Brás. e ali se despejaria e a queymari^o. Defp)ch.«do Vasco da gama em monte mór ho nouo onde el Rey astioa, pardose com seus capitfiwS pcra Lisboa: onde íeyta sua armada erabsr*

308 imotoau-^pioftA

couse t cfente dela, que íorlo cento e corenta e oyto pessoas: em Restelo, que será hfla legoa de Lisboa, hum sábado ojco dias de Julho do anno de mil ccccxcvi). E ao embarcar sayrSo todos em procissam de nossa senhora de Belém : que he agora um mosteyro da ordem de sam Hieronimo, e yáo em pelote e d- rios acesos nas mios, e os frades rezando : e ya coeles a maior parte da gente de List>oa, e a mais dela choraua com piedade dos que se ylo embarcar crendo que auiSo todos de morrer. Embarcados todos e Vasco da gama com os outros capltles, logo deriío ás velas e se partirão de foz em fora.

F. L. de Castanheda, História do de9cobrimento, t conquista da India^ êà, 1797, i. 1, cap. u, fl. $,

LI

Diseobrimento das Antilhas, e índias pollos Espanhoes feiiaa

...No anno de 539, mandou FernaG Cortez três navios a Frandsco Quilhoa Bcra descobrir a Costa de Culuacaõ p^^ra cima. Partirão de Capuleo tocaiaO Santiago de Boa Esperança, entrarão no Estreito que Cortez descobrira : chega- rão por elle acima atè trinta e dous grãos daltura, que he a fim da agua, poze- raOlhe nome Ancon de Santo André, por ser eni seu dia. Tornarão pêra fora ao longo da Costa da outra banda, dobrarão a ponta de Califórnia, e meteraôse por antre as Ilhas, e a terra : foraõ ao longo delia atè se poerem em trinta e dous grãos, donde arribarão por vento contrairo, havendo hum anno que andavSo: dizem que gastou FernaO Cortez nestas Armadas, e descobrimentos duzentos mil cruzados, e que desta ponta do Engano haverá à outra do Liampo da China mil, ou mil e duzentas legoas de rota abatida, e que que descobrio, e conquistou Fernaõ Cortez, e seus Capitães, he de doze grãos at^ trinta e dous de Leste-oeste, em que haverá setecentas legoas peila terra dentro, que he mais quente que fria, ainda que hn hl serras que dum a neve, e geada quasi todo o anno.

Ha na Nova Espanha muito arvoredo de flores, e frutos, diversos, e proveitosos pêra muitas cousas, e a mais principal delia se chama arvore metei, nzõ he muy grande, nem grossa : prantaOna, podaõna, concertaOna coffio vinha : diz que tem quarenta folhas de feiçaõ de telhas, e servem disso, e quando saO tenras fazem conservas delia, papel, fiaõ nas como linho, fazem delias mantas, alpargatas. esteiras, cintas, xaquemis : tem estas arvores humas espinhas taO duras, e agudas que cozem com ellas como com sovellas, e o tronco bom lume, e cinza pêra decoada : escavaOna ao e a agua que estilla, he como arrobe, se a cozem fica mel, se a purificaõ, açuquere, se lhe deitaO patalim, vinho, se a destemperaO, vinagre, as pancas assadas, e expri- midas sobre chagas, ou feridas, sara, e encoura ; o sumo das espigas, e raízes emburilhadas com sumo de encenso, he bom conth a peçonha^ e mordedura da bibora, assi que he a mais proveitosa arvore que se sabe.

Ha 1& huns passarinhos, que se chamaO Vicincilin, saO pequenos, o bico delgado, e comprido, mantemse do rocio, mel, licor de flores, e rosa, tem as pennas meudas. e de diversas cores, prezaõnas muito pêra lavrar ouro, morre, ou adormece cada ano: no mez Doutubro posto em hum raminho em lugar abrigado resuscita, ou acorda no mez Dabril, depois que ha flores, pello que lhe chamaO o resuscitado. Haxobras que sao como cascavéis quando andafl : ha outras que emprenhaõ pella boca, como dizem da bibora: ha porcos com embigos no espinhaço, que matando-os se lho naõ cortaõ fede logo: ha peixes, qut guinchaO como porcos, e roncaõ, por onde lhe chamaõ roncadores. . .

A. •aWlo, Tratado dêê de*oohrim$nto$ antigoB e modernoi, td. 1711, fig. Sé.

tàims zn

in

A Vida pastoril

Palia Jacob com os Propheías NaHnm ê t^harbê

Sabereis, yrmlos, que en sam aqne!]e antiguHsImo pastor que com pes- coço e raios vellosa', pêra soccder ni hoii(;*o so;j p3C ín^nnoti; e pelos amo- res dhftí fcrmosa pr-stora seie e .^efe :'nro^ f;o^ vi í^"- ? ?.i- 'ís ile mesopotâmia apascentei; dali par.ín^lo com 1 : n :\.:o l f . r, t..-, :^,)^ ; ^ Jc cobfas é ouelhas ce diaersas e nipn^.^i-itias s xiri a U- 'c K\: ■,-!. e^.^.}/' sos cainpos e felice terra de Qucna5 iõs *•? meus p-.ovs : r....,:Si «j d.j' . ; i"^ . i </c ítii.vo*, robustos airões; e com tar.ias e r.in ••iv «as ii';'rj7u w.t.c > ^ ..L-^re inc gosaua ; e hums mais deleita ;•!<• se d4 ^' 'j da '. < ^'Mn- ■? .^ v-»^- "•"•'^ oueliies, em rom- pendo a alua da maa^iía, í^nics q\z no .-m i-í o sc í.'0 eco de sangaiiiea côr se marchase, sabyaai com seu r;ibarilo; c an \o^r?rso passo pisando as ortia- ibadas eruas, e ou'jindo o doce chilrar dos passarinhos pacifica e sosseguda- mente o giríauã contra algum fresco c dcic.toso prado; onde arribados que eram sentandose sobe la verdura daiçum pnr;neno outeiro, pcra melhor com- íetnplarera na minada, via'n a-s o t liut*; j.as rm prado cham as verdes e miúdas cruas suauemcnte nabccríio; (-.v:-;. íl-./í-I) e:n logares ásperos se dependarauam a rroer aigum novo aruores.>iho qic - .:*j:n tenro se leuantaua da terra; outra se empina-ja pcra siícaiiyur iiurr; íj^io J f^^fyacira qual mordendo os tenrros gomos das parielrin^as b';Mns, ainl tnsc.-n ^^ a penca do saluatico cardo; ali os pequenos e tenrros cordei.os de poiícjs li. s antes nascidos arre- mettiam ás cheas tetas das piado-as i '.-..'Ires, .- prcf i:o>a.nenle mamado c6 aqDcile costo e sabor que quasi parecia l^c quererem as longas mamas arfam- q'3ar; muifas outras \A contentes <^o p!^<^^'->. b:bendo nos claros ribeiros se ale- ranam vercmse no fundo como viii.-^'»: e a'^n. cji;ie*'«'S avando-se, arrcme- vim de quando em quando a sui fi/.T.), e ac''aii<Jo-se (icp-jis escarnecidos ãcauam com a cabeça molii^ida corno aun .o'^.

Ora assí viçosamente píis-^rmí^o a fu-'''a rnn'i''1a, qnanio ina o sol, e sua seca cslma embebMo auia nr.<? ^/^<f'l•s fi'ís t^ or. ;:i'in s-^ a •ii\ r-n » c punham en c?mínho coti o rebanh) de sins rw^sas o-ioj; m»^ a i) iN<indr as dv Níito-^^r.s sombras cede a fresca e teaipor^íía vir'ç5o os rr;'t's'^: c l.n no c o de hiini alegre vale hu'n ferm^so e mny basto a^-iTCio os :r\i ia. i.tí.'ii>, e viv'so cos doces ai^-^a^ dhtti fonte qu! ao pce ^l^wn ;!/.-^',*'i j ''..ts'ií a l) .DuImõjs, e con a'esjr{a rebentaua; Junto da qn.'i. (,''•• A:\ ú. .:« m- -- <^ril..na'lamente se 5eata:jam; e abrindo sius veho^^ob s.r. "i -s -.(.'vi "> -^«í j i 'J«) IjíIo J > pescoço lhe pend.am (qual fcit") da nrinca p?^.^ d ) t.'' - ; > '"■ 'JlI.o s.ie o cruol lob3 arreba- toj, qaal da ruiua pe'e do mo/ido be^cr-)) irii p rj a ak-fj-e mesi cada htl de sms viãdas gostosas e naturaes, e j:iMti'T:Í5-is orn o tioI. nue n''ste tempo cstíiia das arvores grossos fios esíiJin lo; e o h':\nro Icue, que ás gordas ouelhas, das mamas sobe las eru's, nií':e'il) ! '^ j:>tija'ia, saborosamente coTiiao, e J4a que crii da fome desncii í'>s, seirJi h rn f^'Sco aar, que com suaue roido o cume d:>5 altos alemos, e d )s vc >s-ís c í;' «". Its f ix- =; an i;'iia mouendo, c dxemôte as mais rí'ras ramidis braidin 'o. '' > n 'i .-n 'o^^^.l<•). e tam mauioso comoa^so, qu2 p.Kí*v'ia dare:n-''%e hiina-» a oi rns pi/ 'í- cfi-imncre ; e nc^te meo pslreiras me'roa?. os n'im )ri 1 « e m i>'.\)s "i-i t«-.s, :n:i los ou ros jjra- ci*^»* passarinhos, que á sonoia se vin^iim w) \\ nu.) di nspcra calma, todo aqueile logãr. írc-^pondcndo-se hums a oUvh con d.)o.«is vo/,r«;, ajndaiido-lhe o murmúrio da viva fõ.ite) en:'nhm d»rm^ni;: e d iJos tanijendo, hús doce- ndtecom suas fraatas, e vilancscos instromcntos; oníros ao som contra as na- mortdas pastoras, amorosamente cantauam: quaes com rústicas manhas, e pees

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latindo; e qaaes os fortes, e ousados carneiros, huns contra outros atiçando, cstauam vendo duramente marrar: e alguns, vencidos do sono, coa cabeça Junto do roido da clara fonte, de viçosos, se dormiam.

Jáa neste tempo o Sol, feita sua obra, na fértil terra d'aqueUe seu parti- ciciar hemlsperlo, se auia escOdldo debaixo das agoas do ponente, e variando o céo de inflamadas nuues, hoas louras da côr do puro ouro de Ophlr, outras san- guíneas, qual a fina escarlata, e preciosos robis; entre-negras algQas como lon- guos rayos; muitas como montanhas de neue, ou branca I9a escarmeada, sobre verdoengas agoas do mar ; e á maneira de longas serras; algttas cinzentas, bor- dadas douro com frescos ares, e quietas sombras deixaua os altos montes) e ver- des campos nUa ddeitosa temperança ; e recolhendo as vagabundas onelhas, qae por entre aquelle aruoredo espalhadas andauam pascendo, e saydos por outra parte do bosque e hua verde, e fermosa varzia, que sem trillhado caminho tée As choupanas, direita, se estendia, e toda aquella alegre companhia, vagarosa- mente com seus cajados guiando, tornaua em suas malhadas a descansar ; e re- nouando nouos jogos de passo em passo hiam tirando côas fundas a algum aloo: e quem mais perto com o duro seixo lhe chegaua, todos os outros com bater de palmas, e alegre grita, o leuauam ás costas hum sinal; e deixando este jogo, ora saltando, ora tlrSdo á barra, e lutando, ao vencedor coroauam com capellas de verde louro, tangendo-lhe com suas gaitas, e rebecas em sinal de vitoria: e assi pouco a pouco, ás choças alegremente se hiam chegando : até que {áa fartos de tanto viço do dia, (quando nos charcos, cubertos de meuda etuinba, as rSas com rouca voz gritando e com htl continuo, e penoso soom os grilos, escondidos nas couas a hna e outra parte do caminho, chirrando, e toda a cam- pina retenindo) contentes arribavam : e depois d 'agasalhado, e recolhido em seus curraes o veloso rebanho, deixando os surrOes e cajados, saparelhavam pêra o desejada c6ea, ao portal de suas ramosas choupanas, fundadas á beira do claro rio yurdSo, onde ordenadamente se sentauam a comer á claridade da lua, que àquela ora, reuerberando nas agoas, hums rayos como de cristal aos olhos formaua, e acabando com grandíssimo deleite,- depois de muytos jogos, sendo gran pedaço da noite pasada ao sereno do céo cuberto destrelas huns fora sobe las emas, e outros dentro nas choças, aqui e aly (como emborrachados) dor- mindo se cabiam.

S. Usqne, Consolaçcm, etc, Dial. i, ed. 1906, pig, iii v. a v v.

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A Inquisição

. . Fizeram vir de Roma um fero Monstro de forma tam estranha e tam espantosa catadura que soo de sua fama toda a Europa treme, seu corpo he de áspero ferro c9 mortífero veneno amasado, com hQa duríssima concha cuberta de bastas escamas de aço fabricada, mil nsas de penas negras e peçonhentas o leuantam da terra, e mil pees danosos e estragadores o move, sua figura daqoelia do temeroso USo toma parte e pTte da terHbel cí»tad»ira das serpes dos desertos de Africa: a grandeza de seus dentes aqueUes dos mais poderosos Elefantes ar- remedam : e o siluo ou voz, com moor presteza que o venenoso Basalisço mata : Dos olhos e boca continuas chamas e labaredas de cõsumidor foguo lhe saem, o pasto de que se ceua he outra com corpos 4ium a nos amasado, precede a Affui^ na ligeireza do seu voar, mas por onde passa faz com a tristonha sombra çer- raçam, por mais claro que o Sol n.iquelle dia se mostre, finalmente seu rrasto no que atraz fica deixa hna tenebra como aquella que foi aos Egípcios dada por hUa das plagas, e depois que onde seu voo encaminhou arriba, a verdara que pisa, ou aruore viçoso sobre que põe os pees, seca estragua e a murcheçe, e sobre

bAodlo XVI Bll

Tsso de rraiz com o destruidor bico o arranca e de tal sorte com sua peçonha todo aqaelle circuito que comprende o deixa assolado que como os desertos e areaes da Síria onde planta nam prend: nem erua nasce o conuerte: Esta tal alimária em todo o pouoado de meus filhos (que em habito de christãdade es- tauam desconhecidos) meteo, e com o foguo dos olhos hum grandíssimo numero ibrasou semeando a terra de infinitos órfãos e viuvas: com a boca e poderosos détes suas riquezas e ouro lhes englutio, e distrlnçou : com os pesados e peço- nhentos pces suas famas e grandezas lhe pizou-e destruyo e com a temerosa e disforme catadura, a outros seus coorados rrostos lhe desfigurou e sumio e seus coraçõe^e almas com seu voo escureçeo, e estes mesmos efeitos vay aynda agora naquella rreglSo continuado nos mõbros que de meu corpo ficaram destroncados na Espanha. •••

S. Uscjue, Conêolaçam^ etc, Dial. lu, e4. }906, págs. xxvi ç x^yi, y.

LIV

Variedade do gentio da índia, especialmente no que toca á religião

... E postoque servira pêra melhor se entender esta parte da historia tractar aqui hum pouco mais largamente da natureza, sortes, calidades & costu- mes do gentio da índia» eu deixindo a outros tudo o mais, farei caso somente do que tem respeito á religiam. Das cousas do céo, & eternis, ha entre elles may pouca» ou nenhdi noticia: nas temporais, & da terra, sam espertos, & tam entendidos, que nam dam vantagem nas sutilezas dos tratos & contratos aos mercadores de Europa ^ Estimam esta vida, & os pontos em que põem a hoara: que. como anda com a vaidide, & inconstância da opiniam dos homés, sam muy differentes dos de -cá ; «iciosos tanto em cabo, & tam desobrigados á fé, & verdade humana, que parece p^rdeo com elles a própria conciencia, ou oofficio de remorder, ou de tocio a autoridade, & força de conuencer, & persua- dir: sendo na mechanica das artes estremados; das sciencias tem somente algQa medicina; 8t da Astrologia, o que basta pêra tirarem os ecciypses do sol, & da loa. tanto dantemam, & aponto como nós. Escreuem com penas de ferro, & seniem lhes de papel (como de mil outras cousas) as folhas das suas pilmeiras, de que fazem grades liuros da? historias dos tempos, & de outras muy tas ma- térias, assi em prosa, como em rima, da qual, & de toda a sorte de poesia sam por estremo curiosos, &tam enleuados, que para o Demónio per seus mini^ros lhes fazer crer as mais fabulosas patranhas contrarias a suas próprias leys, e rezam natural, basta poremlhas; & cantaremihas em verso; que postoque no nu- mero das syllabas seja muy differente do nosso, & do latino (por que em cada iinl ha dauer setenta & duas) nam deixa de ter sua graça, & mnge^tade.

Nestes versos está escrita em húa língua particular chamada Gerodam, a sua Filosofia, & Theologia, que os Brám?ncs estudam & lem em unisrersidades per todo a Indfa. Consta esta doctrina de quatro partes, cada liua das quais se divide primeiramente em seis a que chamam Corpos, & depois em dezoito, com nome de Membros, & finalmente em vinte e oito intituladas Artículos. E tra- íase na prmeira das quatro partes da causa, & principio do universo, da pri- niclra matéria, dos Anjos, das almas, do premio do bem. do ca^^n^i^o do mal. dos elementos, da geraçam, & corrupçain das criati^ras, que cous:i seja peccado, como se deva remir, e quem p<^de delie absolver. Sam o argumento da secunda os Hspiritos, que elles intitulam Regentes dos ceos. &• dos elementos. & a que dam o governo de todas as cousas criadas. A terceira parte toda he moral, de b^>s preceitos, & conselhos, assi pêra a vida politica, como pêra a contemplativa, de que fazem particular profissam. A quarta contem as ceiimo-iias dos pig)des, 05 sacrifícios, as festas, & á volta disso muvtas feiti^^arias, encantamentos, cz grande parte da arte magica*

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Na dlstfnçam das creraçCes, & fjuntlfas, fa^etn venta^em a toda a ontn {enfe do mnndo. He nada em sua conip?raçani quanto nesta parte ouve entre as casa^, & tr bus do povo dlsrael. Poraoe em muytas familias do Vniost^m, nara somente nam podem casar as pessoas dMla com as da outra, mas nem comer á mesma mesa, nem entrar na me«ma casa nem estar, nem passar inn- tamente pela mesma rua. Assi tem repartidoa oa <rfftdos de serviço da Repu- blica, fazendo os de menos sorte os mechan'cos, com tal ordem porem que cada família usa o seu, sem poder jamais entrar no da outra Os nobres oa sam Naires, que sejjuem somente a puerra. ou Brámeres, a quem pertence o falso culto dos pacrodes, & meneo de suas superstições. E^tes fazem apodos os outros grandes ventagens; porque alem do falso sacerdócio, tem o podpr. & autoridade real, que anda na sua família \A de rauvtos anno< ; com cujo favor ella he a mais respeitada, c dilatada na Yndta. & em outros mnytos rcynos orientais. Professam geralmente grande ab'?tínfnwa ; poroue de mais de tnuytos jejQs, que tem, nenhum, postoque seja Rey, pode per nenhum caso beber vinho, nem comer algfta sorte de carne, ou pesrado. nem cous^i emfip, que tevesse vida. Mas ainda entre elles ha muita diversidade. Hfts ^ivem com suasmolhe- res & filhos nas villas. & cidades, tratando a mercancia, como toda a outra gente. Outros, a que chamam logues, & oa Gregos antigamente chamaram Gymnosophistas, vendense por homês castos, nÍQ se obrigando nunca ao ma- trimonio; dos quaes muytos tomam por vida per<»grlnar per todo o Orifntc. rré- gando á gente cega os sonhos de sua superstiçam. oue acreditam. & persuadem com a grHn-"íe .-^srere/a ccn que se tratnm assi no vcsjir, rorio ro comer. AlgOs entrando pelus dcserros. & n^cvi^s fntcrrpdos nrs hv^AS & crvps das feras, pas- sam cora increivcl sofcrimí nto on.-Ti^o sr p'de imrnínar dr dure?», & trôba- Iho.-em fomes, sedes, ^ri^^a. ca^n^as. nrde^a, co^^tinurs víc^i,:'?. fuí^indo, como se \ut teverjím od'o, a tudo o cue ncde srr de gf^sto, & ?Iento í nr^tufeza. Mas feito o noviciado. & curvo dr^tc tcmn v & rllrs agrad'iados A rrdem. que en^re si tem. com norve de Abdufrs. & ov^!^ anal d's«imu'áram com tam fnrte vi^la, ficam ern p cruio áa fa'Fa o^ riiiiíicia, & por gloria da mais falsa reMgirm com publica l'cença prírn <r cvv< Ifíi cm cm v^da a «orte de v^cl^^s por abomináveis que sejym, sem a'g cm so prdcr. nrm rsrnndal^sar. quando os vê. nem apg^a- var quando l^^c tf.ra ; avondo oue até das íeis da rezam, & da vergonha os fz, nam somente isentos mas sc^Iu^ts aQucHc seu dcsetfo. ár surp^rsticiosa aspe- reza. Que quando he rrl'j'r'sa. como o fov. a dos santos hermitflos da Icy da graça, tem por fim a perfeita 'rTT>pçam da pureza d^s Anjos nas almas, è n^s corpos, e nam vay parar naqiuiles mortufos de torpeza com oue o Imipo de longe faz negaça aos infleis cegos, & tanto mais cainais quanto roais sofrem pola carne.

Joio de Lttceaa, Vida do P, FranoUco Xavier^ h o, c. xi, ed. 1600.

Peregrinação

Do qtu passei em minha mocidade neste Reyno, até que me embarquey para a índia

Quando ás vezes ponho d"ante dos olhos os muitos, e grandes trabalhos, i infortúnios, ^ p.ír mi.n pjssín^J. comvad)s no principio da minha primeira Idade, c coaiiiiniD? p^U mujr pirte. e melhor terno") da minha vida. acho que com muita nzaõ me posso queixar da ventura, que parece ^ tomou por particular tençaõ, e em preza sua parseguir-me, e maltratar-me, como se isao lhe houvera de ser matéria de grande nrme, e de grande gloria : porqae vejo que naO conteute de me pôr na minha pátiUi logo no começo da mialu

iiooBo m tif

mocidade^ em tal estado qne nella vivi sempre em misérias, e em pobreza e n3d sem algans sobresaitos, e perigos da vida, me quiz também levar ás partes dalndia, onde, em lufrar do-remedio, que eu hia buscar a ellas, me íoraO cres- cendo com a idide os trabalhos, e os perigos. Mas por outra parte, quando ve}(> que do m*io de todos estes perigos, e trabalhos me quiz Deos tirar sempre em salvo, e -me em seguro, acho que naõ tenho tanta razaõ de me queixar por todoB os males passados, quanta de lhe dar graças por este bem presente; pois me quiz conservar a vida\ para que eu pudesse fazer esta tosca, e rude et- critura, que por herança deixo a meus filhos, (porque para eiles he minha tençaõ escrevella) para que elles ve|a6 nella estes meus trabalhos, e perigos da vida, que passey no discurso de vinte e hum anãos, em que fuy treze vezes cativo, e dezasete vendido nas partes da índia, Ethiopia, Arábia Feliz, China, Tartaria. Macassar, Saroatra, e outras muitas Províncias daquelle Oriental Ar- chipélaga dos confins da Ásia, a que os Escritores Chins, Siamês, Queos, Ele- quios nomeaO nas suas Geografias por Pestana do Mundo, como ao diante es- pero tratar muito pa ticular, e muito dif lusamente ; e daqui por uma parte to^ mem os homens motivo de se naõ desanimarem com os trabalhes da vida, para deixarem de fazer o que devem ; porque naõ ha nenhuns, por grandes que se- jaõ, com que naõ possa a natureza humana, ajudada do favor Divino : e por outra me ajudem a dar graças ao Senhor Omnipotente, por usar comigo de sua iaíinita Misericórdia, a pezar de todos m:us pcxcados; pirque eu entendo, e confesso, que delles me naceraõ todos os maks, que por mim passarão, e delia u fOiças, e o animo para ot poder paspar, e escapar delles com vida.

De algSa pequena informaçflo desta cidade de Pequim, aonde o Rey da China reside de assento

... Esta Cidade que nós chamamos Paquim, a ^ os setfs natural? cha- oaO Pequim, por ser este o seu pjime>ro nome, esta situada em altura de qoarenta e hum gráos da banda do Norte: tem os seus muros de circuito, segundo os Chins nos affirmaraõ. e eu depiis vi num livrinho, que trata das gr^adezas delia, que se chama Aquesendoo, que eu trouxe a este Reyno, trinta legoas, dez de comprido, e cinco de largo ; e outros af firmaõ que tem cincocnta, dõassete de cumprtdo, e oito de largo. C que os que trataõ delia variam nisto tanto, como he diz::rem huns tiinta, outios cinquenta legoas, quero eu declarar a oiusa de»ta duvida conforme ao que vi por meu« olnos Quanto ao como eita agora está povoada de Cd&aría muico nobre terá de circúitj as trinta legoas que dizem, e está cercada toda de duas ordens de muros muito fortes, com iníiaidade* de torres, e baluartes ao nosso modo: mas por fora desta cerca, qoe he a da própria cidade, vay outra de muito maior comprimento, e largura, que os Chins afflrmaõ que antigamente fora toda povoada, o que agora naõ he mas tem somente muitas aldêas, e povoaçõ s divididas 1 ftis das outras, com muita quantidade de quintas ao redor muito nobres, em que entraõ mil e seicentas, qoe tem muita ventagem de todas as outras; as quaes saõ aposentos dos Pro- coradores das mil e seiscentas cidades, e viUas notáveis dos trinta e dous Reynos deita Monarcbia, que quando chamaõ a Cortes, se ajuntaõ nesta cidade cada três annos sobre o governo do proveito comum, como adiante se dará relação. Por fora desta grande cerca, a qual. como digo, corre por fora de t( da a cidade, CitaÔ em distancia de trçs legoas de largo, e sete de comprido vinte e quatro tDíl Jazigos de Mandarins, que saõ bOas capellas pequenas cozidas todas em ouro. as quais tem todas adros fechados em roda com grades de ferro, e de Uta5 feitas ao torno, e as entradas, que tem, saõ huns arcos de muito custo, e rtqoeza. Jumo a estas cafeiliS tem aposentos mu<to grandes com jatdins, e t)osqaes espessos de grande arvoredo, e muitas invençõ(!s de tanques, fontes, e Mcas de agoi. fi •• paiedei das cercas saO forradas por dentro de azulejoi dt

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porcelana muito fina, e por cima pelos espigões com muitos leões com bandei- ras douradas e nos cantos das quadras curucbéos muito altos de diversas pin- turas. Tem mais quinhentos aposentos muito grandes, que se chamaõ Casas do fi ho do Sol, oni2 se recolhem todos os que aleijarão na guerra em serviço delRey ; e a fora e^tes, outros muitos, que por s^r^ra velhos, ou doentes deixa- r<(5 também a guerra, e se aposentarão. ^ a cada um de todos esíei se um tanto por caia meí para 5eu mmti mento, os quais segundo os Chins nos afflrmarsõ ç^q^bvzõ á conta de cem mil: porque em cala hum destes aposentos diziap clles q ha/ia duzentos hom:ns. Vimos mas híli rua de casas térreas muito compida, aonde pousavaõ vinte e quitro mil remeiros, quesSoosdas panouras delRey. Vimos outra rua do mes no modo de miis de híia grande iVgoa de comprimento, aonde pou-ava5 q ntorze m 1 tavernelros, que sã) os da Corte; e outra rui pela mesma maneira, onde havia infiaidade ái raolheres solteiras, privilegiadas do tributo, que pagam as da cidade, por serem tsmbcm da Corte; muitas das quais fugirão aseuj maridos, por andarem nesta desa- ventura, e se elles por isso lhes fiíerem algum mal, tem muito grande pena; porque ellas tem alli seguro do Tutlo da Corte, que he o supremo em todas as cousas, que tócaõ á Casa do Rey. Vivem também nes^a cerca todos os mamatos que lavaõ roupa a toda a cidade, que segundo noi affirmaraõ, passaõ de cem mil, por haver aqui grandes rios, e ribeiras de agoa, coai infinidade de tanques muito fundos, e largos, fechados todos de cercas d^ cantaria muito forte, e de lágeas muito primas e bem lavradas. Tem mais o vaõ desta grande cerca, segundo conta este Aquesendoo, mil c trezentas ca?as nobres, e officinas de mu;to custo de mollieres, e de homens religiosos, .qu2 professaõ as quatro leys principaes do numero das trinta e duis, que ha neste Império da China; das quaes casas dizem que al!:tkis tem das portas a dentro passante Me mil P-issons, a fora dos servidores, que ministraõ de fora o necessário para «nstcn- taçao delias. Vimos miis outra grande quantidade de casas, que tem edifícios mu to grandes,* e nobres com grandes cercas, em que ha Jardins, e bosques espessos, onde se acha toda a maneyra de montaria, e caça quanta se pôde desejar, as qiaes casas nobres srõ como estalagens, aonde concorre de contino muita infinda gcnta assim a comer, como a ver Autos, farças, jógcs, touros, lutas, e banquetes esplendidos . .

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Cotio fomos remettidos á cidade de '^equim

. . .Um dia antes que nós partiosemos, estando embarcados na lanteaa, e presos de três em trcs por umas cadêas muito compridas, que á maneira de corrente vinham fechar n^^s elos que tínhamos nos pás, chrga«'am estes dous procuradores dos pobres, e provendo primeiro que ludo os niais necessitados com mantimento, e vch:iií)5, coif «rmo á necessi.iade qae em cada um viam, nos perguntaram s: haviamos mister alguma cousa para nossa viagem, a que respondamos qne de tuclo tamo<: t?í3 faltos quarro Deus sabia ; mas que se até entSo lhe nSo tirri^mos d to as ínuiías misérias, que padeciamjs," nS$o fô'a senão a fim de lhes nedirmis, que a esmola que nos haviam de fazer fos^e darem nos uma rnrta pnrj os trnigforos d'a'|uella santi irmandade, em que lhe padisserai qne nos qiiisc som fix/orerer, porque éramos, como elies sabiam, tSo desem- parados, que ninguém na terra nos sabi?? o nome; a que elles ambos responde- ram : NMo di^ es isso, que c g-^ande peccsdo. inda que vossa jgnorpncia vos dtsculpa com ['cu'-; porque sabei, que quanto mais abit^d os foídes por serdes pobres n) m.undo, tanto miis altos sereis diante dos seus olhos se cora paciência soffferdes a pena, que a su^^erba carne sempre enjeita, porque assim como o passiro na ^ vòa sem asas, assim também a alma nâo merece sem obras. K quanto á car a, que ped s, vos daremos de multo boa vontade, visto quío necessária vos ha de ser, para que o favor dos bons voj nâo falte no tempo

■AoeLo xn 3IS

iM.

qae o houverdes mister. •— EntSo nos deram um sacco de arroz, e quatro taeli em prata» e uma colcha para nos cubrlrmos; e nos encommendaram muito ao chiíuu, que era o alcaide a quem Íamos entregues, e se despediram de nós com muito boas palavras, e se tornaram a visitar a enfermaria da prisão que atras disse, onde então havia passante de. trezentos enfermos : e como ao outro dia foi manban clara, nos mandaram a carta, que lhe tínhamos pedido, mutrada com três sinetes de lacre verde. . .

Como partimos para a cidade de Pequim e das grandezas

da cidade de Nanquim

Sendo-nos dada esta carta, nos partimos ao outro dia ante-manhan presos da maneira que tenho contado ; e continuando nossa viagem por jornadas incer- tas, por causa da impetuosa corrente, e grande força da agua, que n'aquelle tempo trazia o rio, fomos quasi sol posto surgir a uma aldêa pequena, que se chamava Minhacutem, d'onde era natural o mesmo chlfuu, ou alcaide, que nos levava, e ahi casado com mulher e filhos, na qual esteve três dias aviando al- gumas cousas. E embarcando elle sua mulher, com toda a sua casa, e família, seguimos nossa derrota, em companhia de outras muitas embarcações, que por aqueUe rio iam para diversas partes dos anchadlados e senhorios d'aquelle im- pério. E ainda que íamos presos ao banco da lanteaa, onde remávamos, n&o deixavam os olhos de vér cousas muito grandlosafí^nas cidades, villas, e logares, qoe ao longo doeste grande rio estavam situadas, das quaçs brevemente direi alguma cousa d 'esse pouco que vimos, e começ^u^i logo por esta cidade de Nankim d'onde partimos. Esta está em altura de trinta e nove graus e um terço debaixo do norte, lançada ao longo d 'este rio, por nome Batampina, que na Qossa língua quer dizer, froi do peixe ; o qual rio, segundo então nos disseram, e eu depois vi, sáe da Tartaria, de um lago por nome Fàostir, nove legoas da cidade de Lançame, onde o TaborlSo, rei dos tártaros, reside o mais do tempo. D'este lago, que é de vinte e outo léguas de comprido, e doze de largo, e de giandiasimo fundo, saem os mais poderosos cinco rios, caudaes, que ha em todo o descuberto. . Esta cidade de Nankim está, como disse, situada ao longo d'cste rio da Batampina, em um teso de boa altura, por onde fica a cavalleiro das campinas, que estflo em torno d'ella ; cujo clima é algum tanto frio,, porém muito sadio. Tem outo léguas de cerca por todas as partes, a saber : três léguas de largo, e uma de comprido por cada parte ; a casaria commua é de um só, até doas sobrados, porem as casas dos mandarins s3o todas térreas, e cercadas de moro, e cava, em que ha pontes de boa cantaria, que dão serventia para as por- tas, as quaes todas tem arcos de muito custo, e riqueza ; com muitas diversidadees de invenções nos curuchéos dos telhados, o qual edifido visto todo por junto, representa aos olhos uma grande magestade. As casas dos chies e anchacys, e aytaos, e tutões, e chumbys, que s8o senhores, que governaram provindas, e reinos, tem torres muito altas, de seis e stte sobrados, com curuchéos cozidos em ouro, onde tem seus almazens d'armas, suas recamaras, seus thesouros, e sen movei de seda, e de peças muito ricas, com infinidade de porcellanas muito finas, que entre elles é pedraria; a qual porcellana d'e8ta sorte não sae fora do reino, assim porque entre elles vale muito mais que entre nós, como por ser defeso eom pena de morte vender-se a nenhum^ estrangeiro, salvo aos persas do XaUimaas, a que chamam Sofio, os quaes com licença que tem para isso, com- pram algumas peças por muito grande preço. Affirmaram-nos os chins» que tem esu d(kde ontocentos mil vczlnhos, e vinte e quatro mil casas de mandarins, e sessenta e duas praças muito grandes, e cento e trinta casas de açougues de outenta talhos cada uma, e outo mil ruas ; de que as s'. iscentas, que são as mais nobres, tem todas ao comprido de uma banda, e de outra grades de latão muito grossas feitas ao torno. Affirmaram-nos mais. que tem duas mil e trezentas casas de seus pagodes, de que as mil são mosteiros de gente professa, e são edifícios

âÍ6 AfltOLooiA^— rUeèA

s

muito ricos, com torres de sessenta, e setenta sinos de metal, e de ferro coado muito gf.nJis, q::c e cousn horrenda ouvil'os tanger. Tem mais esta ddade trinta p;is'5:s miif) ^';: ^'lC5, o fortes, em cada uma das quaes ha dous, e ires mi' presos, e a ca \a itni . jcs as pri>òes '^esponde líma cas^ como de ríiseiicordia, q ic previa toda a gcine p3:>:o, co:n s2tiS'p:ocuradu>res oi.i n?ir os em todos os tr'\y\':'^ do '^iv''. e c \'w, c o:•^C^ <■: í'?.e^i ç^::\i ' s c- l ' ^. !•*'!. s esiss raas T)- i/^es \* :n a»'.,.': :i;i< .--i r^* -; c )n sjas p -.lás, o.'' se Tr^^im de n-mte, e as iii:'> e = 'a^ u:n c>"-. i/.s ó .'y>.^^ iiiui.-j l-n, c 'í' em ^l mrito ncas^e de n.Aiij í;r.:.^e m lo. Jt.in u Ia< ;i< 1 : ^ íjovís, e r',é\í>, rViras gcrats, onde con- corre iiiii:i:it"'i.; (Ic ^ciie de d vtrs. í. pyrtes. e ha iieiías grandíssima abundân- cia de mantiiner;t-.iS. quantcs se podem irnagirar, aNsim de friictas, coiUo de éarnes. O pescado d'est* rio é tanto em ta?ua quantidade, princ pai mente de tainhas, e linguados, que parece im/ossivei dizer-se, o qua! sj vcnlc todo vivo, còm juacos meitidos pelos narizes, por onde vem dependurados; c afora este pescado fresco, o secco e sa'gu1o, qie vem do mar, é lambem infinito. Affirma- ramni>s mais os chins, que ti.i ia ú.z mil teares de seda. porque d 'aqui vai para toio o reino. .\ cidcdc cm si é cercada de muro muito forte, e de boa cantíria, onde tem cento e trinta pa:ías, para serveniia da gente, ts quaes todas tem pDntcs por cirna das cavas. A cada poita d*estas estava um porteiro com doas , a'; i :J-iro>, para darem razãD de tudo o que entra, e sae Tem doze fortalezas J rcq-' i'ns, q'i:)si ao nossD mcxlj, com baluartes, e torres muito altas» mas nSo ,' tem ;jUi.haria nenhuma. T.iml^iTI nos afflrmaram, que rendia esta cidade a e!-rei t< d' s (.s diai d>is 'PuI U'''iS (fe prata, que são três mil cruzados, como disse m 1 ns vezes. Dts p:\os^aes não direi nada, porque os não vimos scnSo de fr.a. r^' :n dVlits so;jí»em(.s rn:.is que o que os chms nos disseram, o qual é ti. .0 qie é ni'ii:o pir.i arrecciar crntallo, e pnr isso nSo tractarei por agor; d*i: c*;. f/^íq^e íer^l.o por d :ivant^. contar o que vimos nós da cidade de Pckim; d' s q'i'jis con:cs:o que estou agora arreceando haver de vir a contar ainda es^e pouco que d'e ies via-.os; nSo p.rque isso possa parecer estranho a quem viu as oMirjs grand /.;s d'e>te reino da China, seriao porque temo que os que qij se-arii nitd.r o muito que ha pelis terras, que clks não viram, co pouco que vem p-s terras em g-ie se crca-am queiram pôr duvida, ou por ventura negar de !cJo o crediu) a auneUi^s co js<ís, que se não conformam com o seu entcndi- mtnío, e cem a sua pjuca experiência.

f . Mendes Pinto, Fercyruiaçào, ed, 1604, c. ov, liXXXVii, e I/Txzvin,

LVl

Da sxcetfencia da vista sobre os outros sentidosi Sl do descobrimento da verdade

Indo praticando pelos censeyraes de Coimbra, ao longo do Mondeg* dous amígcs, que sahirao d? Cid^^de, hum delles dado muito ao estudo da hu- manidade, que nrcáw.nia excessivamente de discreto, & grade Philosofo. ák que- ria antes parecelo, que selo (da condição dos que escolhem antes lataO lustroso, que prata sem lustro) outro menos humanista, mas mais humano, encontrarão com huTi Frmitaõ, homem rei gioso, & Letrado, de que tinhaõ conhcciméto doutro tempo, em que todos n'aqu3lla Vniversidade estudarão, & conversarão. E depois de saudad s & passarem entre si algQas amorosas palavras, perguu- teu o Phiiosofo ao Ermicaõ como estava, & que annos tinha de idade, porque lhe pareci 1 mais velho do que clle cuidava q era. Eu, respondeo o Ennitaõ, nuu estou, nem tenho hum anno de ed de, & o mesmo podem com verdade dizer de si todos os homés. Nova opinião, disse o Philosofo, he es^a. Antes, U)UtOu o Ermica^^, na^ he nova, nem opinião, sena6 antiga, & BunilwUl v«(*

fiooM X i 817

dade. Que se fora nova, começara pouco ha» & ella he sentença dos 'sábio i an- tígM, que de si deixara^ gloriosa memoria : à se fora opinião, fora de cousas contingentes, & inctrtas, òc e;»a he ncc<5saiia, & certjsbi.i-a. E eii, disse o Phi- Insofo, lemoa por falsíssima. E o ne t m") «^cm -i-i li.i, q'ie n n-ò ^í.'à ni so, se- naO quem, sDgundo o costume dos Aca«leniicos, c"'?ef em tiKÍ) duvi lar. Ma v..rdadcí, dias.- u ccnr^^M"."' eiró, quo a uo- niio *t j 0 .l\-. ;, n.:ú pi* o nr.ci seiem, nas por n..o entcnfle-rr. s a '! v:.^iu«^*e <^ - Csi lo lín tjii'^ Sdò dirás. D go ibto, porque o Pai*í-- to [•«.• s^ de- !.<:.•:.» í.-d.'. .!.■) m.» cio, pira que quai-io ddile esti- vesse m<!s apattâd.' tjK'-' isííwsííC O fjeos m^is unido, 6c qu.t.uo mris longe estivesse da teria li 00 si :.'ifla mais longe^ tantj mais pcrio estivcss , do Ceo, tem outro estilo tam dif^rtntfí do nusso que havtm.>s de entenòer, qio se naõ entendemos he, porque pasta ede além das balisses de nosso enlendin^ento, mas n«õ porque em suas palavras haja erro nem fatsitlade. NaÒ sei, dissj o Philo* sofo, para que saõ r.^^zô-s para escusar hai sem tazaõ: pois de qiic.er escusar htla nascem muitas. Assi roíno lançando núa ped.a em lui.n gran le poço se faz hum circu o na agi. a. Ac cítiile procede outro m yor, & tste ma) r faz outro mais estendido, apoz o qual vem outro, 8c outros lada vez mayorís quasi em inSniio, assi de hum ciro rasce or.iro, & csie ti az o itro c.-nsigu m .yor, apoz ó qu3l vem outros muitos Ci:.la vez mayores qnasi em infir.itc se lhe .lào atalhaõ lego no principio, f-acil ccu-a seria atam^ir logo no principio a um rio, en- tupindolhe a fL>nte donde nasce, nu laiiv.iníi^líia pji ^;a^'a i>anda . mas depois que nelle entf õ outios, & oiiitos rioeiros, & com a eiurada de muitos rios se fez podeioso. & fundo, na(5 !ia quf m ihe p-jssi rcsi* ir. ]*^ro he c que diz Aris- toteies, que pi jueno t-rro no pr.ncipio, se fyz \[:av ic no fim, 8c que dado hum Inconveniente se sirguem mnitos : & ás vez.s de náo ap-i^^ai t Hi palha, se vem a atear o fogvi em hOa e outra, ate qi-c se vem a qi: Míiiar tcda iifia casa, & de piq-iena faísca se '>iz crrande iriccn*:.'). hii, d'sse o co npariari^-o, naò me deter- mmo lego taô depressa como isso, a c'd.ndr o que i ..O hcm^io de entender ; & sempre tive para mim que as cousas se 'invia^ cie u cjar com .ic.iUiaçaõ, Que, como diz Bias o Phi!osofo, segunr^o re*"orc i .'h;c;o. rjji Qi cc jsa Iic mais con- traria a deiiierar, que a ira, & a pressa. E nai^ V(js \ ircra q i< rcp-fi^endo a di- ligencia nas obras, antes tonho para mim que naõ i cansa ( ue el«a n;iÕ vença. Porque assi como a negligencia he mad as:a das vi.-iutlts, ,'^^i a dihgencia he ffliy de iodas ellas. Eila he htta mna df^. l õ*. & a nigugc cia hum pego sem fur.do cm que todos se afoga õ ; mas a diLigncia ha ái sci pesai?, levan- tando nos pés as esporas da ligeireza, 8c veioci iadj, ha de levar na mão as ré- deas da razão, & do conselho: de maneira, que na dei ber2;aõ ha de hauer tar- dança. & na execução da boa obra pressa. Donde veyo aqucile taO antigo, como fuBoso Provérbio : Apressate de vagar. . .

Heitor Pinto, Imoffem da vida chridtã, ed. 1671, p?rte 1, cap. 1.

LVII

Comparações

Assi como as ervas se criflo com agoa mas sendc el!a muita e demasiada aíogSo, asii os engenhos reverdecem e se avi/entam c m o trabalho, mas sendo eile sobejo os abate e destrne.

Assi como o feio sinal da ferida pMor parece e m:,is disform idade faz no rosto que nas outras partes do corpo, assi o vicio ma s detestável é no Príncipe ^ae é a imagem em que todos põem os olhos, que 110 vassalo pêra que menos nattealt.

dl 8 AtfTOtiOaiA TOWêtA

Assl cofflo a terra amollece com a agoa assi o homem nobre abranda com boas palavras.

Assi como as verdes canas quando crecem de quando em quando vSo fazendo uns nós como descansos, em que parece que a natureza descansa, dIo pêra ficar alli, mas p^ra com maior força tornar a subir, assi os homens disci- plinados no trabalho, v&o ás vezes interpondo descanso a suas moléstias como nós em que descansem, nSo pêra tomar o corporal ócio por fim, mas por meio, para com maior esforço poder soffrer os importunos trabalhos e lançan mio dos honrosos exercícios.

Assi como a faca por quererem com ella cortar ferro, fica bota pêra cor- tar, o pêra que foi feita ; assi o entendimento que quer penetrar o que lhe nlo convém, fica inhabil pêra o que lhe convém.

Assi como as espigas quanto mais gradas e carregadas estSo tanto mais se abaixam e inclinam, e pelo contrario quanto mais leves e vazias estio tanto mais se endireitam, e levantam pêra cima ; assi quanto mais cheios estSo os homens de virtude e bom saber tanto mais se humilham e abatem, e qoaoto mais vazias disto estão tanto mais se levantam e ensoberbecem.

Assi como seccando-se a fonte se secca o ribeiro : assi seccando-se o in- teresse se secca também a amizade nascida n^o da virtude, mas da cobiça.

Quem lava copos de vidro n8o ha de carregar tanto a m9o que 05 que- bre, e quem reprehende ao amigo não ha de assentar tanto a mio que magoe.

Assi como nSo conhecemos a fineza do alambre senSo se o esfregamos: assi não. conhecemos a lealdade do amigo salvo se o experimentamos.

Heitor Pinto, ibid.

LVIII

Que as victorias dos Portugueses, em as partes das índias orientaes, se não hão de atribuir a forças humanas: e porque nas guerras

dos Christãos ha infelizes sucessos

Cousa certa he, que não fez Deos menos mimos, e fauores ao pouo Chris- tSo, que ao Hebreo, en cujo logar o substituio. E ainda q disto testemunho as victorias de Theodoslo, Constantino, Carolo magno, Cario quinto máximo (quá assi o nomeou o Papa Paulo terceiro) padre de eIRey nosso Senhor, estamos os Portugueses tam rico? de exemplos próprios, que bem podemos escusar a re- lação dos alheos. En nossas guerras, nunqua faltarão mostras de Deos as fauore- cer, quomo suas: e porque nas pirtes remotíssimas do Oriente, conuinha mais enxergarse este fauor, ouue por bem de mostrar muitas vezes, quam propicio era a nossas armas, e quanto tomaua á sua conta a honra delias. Sabemos, que en alguas batalhas, das q na Índia aos nossos se derSo, depois de muitos encon- tros, e recontros, se vio receberem os Portugueses os pelouros de ferro, no meo de seus corpos, sen o golpe lhes imprimir mais, que híla piquena nódoa. Eo que he mais de admirar, que voltando dclles quebrauSo os mesmos pelouros grandes escudos, e quanto achauão ante si espedaçau8o. Taes sinaes. e visões do ceo se virão en guerras trauadas cos nosso><, que fezerlo confessar aos bjr- baros, que pelejara Deos por nos contra cHes ; quomo antiguamente confessárlo

tàatiLo xyt âld

os FgipciM, que Deos era da parte dos Hebreos.E esta conflssSo lhes seruia de desculpa do damno, que das armas dos nossos, en mui desigual numero, rece- biSo. Os que isto nSo crem, roubSo sua gloria a Deos, e ignorSo, quantas forças tem a vera religião daquelles, que fundSo, e este9o suas esperanças no cmparo, e presidio de l&os, e por sua honra trat9o armas pias^ e justas. Porque Dauid pos en Deos sua confiança, por isso venceo, com hiia funda, o grande gigante Go!ias, que en suas forças vinha mui confiado ; é Gedeon, com panelas de barro, desbaratou oi Madianitas. Quãto mais cada ha, medindo se por seu spirito, cuida que tem bastante animo, para vencer quaisquer imigos, tanto mais lhe oonuem poer a confiança no Senhor, e encomendarlhe a sua cau5a. Hste foi o norte, que guiou o grande Duarte Pacheco, trlumphador do Çamorim de Calicut, soldado, e CapiíSo felicíssimo, que tantas vezes, pola gloria de Christo, e digni- dade delRey Dom Manoel, offereceo a extremos perigos seu peito, indómito, e incansauel: a cujas victorias nSo se podem comparar as de qualquer outro Capi- ti3, inda que seja o Africano, porque foram miraculosas.

Amador Arraéz, Diálogos, ed. 1589, dial. iii, C. xxi, pig. 109.

LIX

Dureza da gente ludaica

Grandes forfio os trabalhos q o Senhor sofreo os annos que andou pere- (^finando pellas Cidades de Israel, k ludea, que o cansauSo, & affligifto muyto mais que a própria peregrinaçflo. Entres elles hum muyto principal foy a dureza da gdte ludaica, q não não queria receber, mas encontraua toda sua doutrina, h dininas obras: k delia como de fonte nacerflo todos os trabalhos, que a Cariíto nosso Senhor derSo. & sua própria perdição. Antiquíssimo vício he na na^a ludaica a dureza de coração, & de que está a diuina Escriptura cheya. Tanto que sendo entre todas as nações do mundo escolhida pêra pouo de Deus, apartado de todas as gdtes pêra o serulr, & adorar, & espantando Deos o mundo coo marauilhas que por elie fazia, nunca o pode dobrar a seu seruiço, & obe- diência. Feios descendentes de troncos de Patriarchas santos, sempre os trouxe nas palmas das mãos, cheyoi de mimos, & riquíssimas mercês : a elles fez to- das as promessas do Messias, & de todos os bés da terra, & do Ceo : esteue no monte Syna à fala com elles, mandandolhes muytos Prophetas : deulhes em setts pecados espantosos castigos: p^rdoaualhes depois com admlraueis fauo- '«: liurauaos de todos seus inimigos, prouiaos larguissimamente, & por vias desacostumadas em todas suas necessidades : & nenhaa cousa os pode nflca ^ sajeitos, sempcft lhe forão rebeldes, sempre mãos de contentar, sempre fal- ^ nas promessas que fazião de o seruir. A ^4oyses no deserto quiserão ape- (^rejar. A vista de Deos q estava no monte Synai todo inflamado, falando eUe nzerão. hQ bezerro de ouro, & com festa o adorarão. Ora lhe matauão seus preíetas, ora punhão Ídolos pêra tirar o pouo de adorar a Deos no seu Templo, ora aderavão os deoses das outras gentes : em fim que sempre andauão ao reues <li vontade de Deos. E he tanto desta nação de juro, & herdade, dureza de co- >3Çlo, que ainda hoje em' dia a experiência nestas partes de Berbéria (onde ha Rrandes pouoações delles) nos mostra que nlo saõ tio duros que nem con- Q^ncidos pellas diuinas Es':riptura8 em seus erros, & chegados a de todo não uberem contradizer a verdade manifesta, por nenhum caso se querem render, mas antes se prezão de dura seruiz, & tomSo por honra o que Deos contra sua dureza d^z na sagrada Escriptura, como gente q se nao rende facilmente, senão íicowas q forê muyto palpaueis, & vistas a olho. E sendo na vida, & na ma- lícia a pior. mais mal inclinada gente que na natureza, & mundo pode auer, 'ssi se tem hoje por povo mimoso, & escolhido de Deos & pella melhor, & mais

I2A amo&osía rioiA

aceita gente a elle, como se pniera ter o próprio tanto Abrahlo de Quem des- cenlem. E claro se ve nelles o q diz a díuina Escriptura, que saõ veniidospera fazer mal. Porque assi o tem por vida. & oflicio, que tirando-lhes Oeos todos os bês temporaes que coTKcde a fodas as outras erradas naçõ^, lhes ficou a mentira, à engano de q viaessem, delia se mantém : & isto com trazeiem sempre o nome de Deus na bocca , r .

Fr. Tomé de Jesns, Trabaihoi de Jum^ ed. 1602, trab. zix, pá^. 327 T.

LX

Uo qve passou Palmeirim de Inglaterra em companhia da donzella que e leuaua cõsigo

Palmeirim de Inglaterra segulo trás a dõzclla ao mayor passo de seu cauallo, porq a sua pi essa n9o consentia nen^ a repouso. £ posto q muitas vezes qiils saber delia onde o .leuaua, na:a cHíto lhe pode dizer. Assl passarío todo aquelie dia & noite sem repouso nenhft, leuàdo ja as caualgada- ras casadas q não se podiào bulir, ao outro dia pêra mannai quando a alua ronr^ia. passarão pe io pee de hum castello que se velaua A dõzeila se desuion da esíra la, rogando a Palmeirim que a esperasse, k chegando ao castello faliou com um dos valiadores aigais pa^auras que nâo ouvio. & dalli tornando se pira elle ies^uiram seu cam.intio cooi may -r pressa q de antes, & cO cila andirfio tcc horps de meyo dia ^ chegarão a hft vai e grà le & gracioso q estaua aa logo da faldra de haa pequena villa, que era no Ducado át KossiL«õ AIH lhe disse ^ se decesic quanto elia hia ter ao lugar & logo tomaria a elle. Palmeirim a 2[ o aroíiíamento do caminho fez des.Jar alg"» repouso, apeouse do caua.lo, A desenlaçou o elmo para melhor poder desabafar do trabalho. A dõzeila como quem n.lo sofria nenhQ v gir era suas cousas, porque a necessidade delias re jLierui muita pressa, íoy à villa e fez volca lâo prcsten como se o seu palaf em andna em toda sua forçH, & criegando a Pilmeirim vendoo sem elmo, tào moço & gentil homem nam ficou conente, crenJo que p^ra sua afronta achara fraco remédio, d.zéJo mal à sua ura se queixaua mais q de ant-s Palmeirim mouido de piedade, não sabêd^i a razão pj.q se assi mataaa rogou-lhe que sem pejo Ina dissesse.

Que quereis que vos diga senhor cauallcTO, disse a dõzeila. senam que sou a mais mal auenturada molner do mundo, que indo bu car algum cauaileiro famoso para ^Ql necessidade grande, reuolui a corte de França, k dando conta aos melhores delia nenhum quis aceitar o que lhe pedi, que lhe pareceo graue de ac.ibar, & vindo quasi desesperada acertty de chegar ao valle onde Fiorenda estaua, para l^ie pedir que mandasse comigo algum dos seus goardadores em que mai» confiasse, & porque vos vi em companhia de outro cauaileiro que os estaua derribando todos, cuidey que fosseis ass.m como elle, & pedivos q'ie me seguísseis sem vos querer dar conta d j caso, que temi que sabido nSo quisésseis vir comigo. Agora q-je estaua, ao pee da obra vejo vos tam menino òc moço, e de tam poucas forças ao parecer que perdi algQa espe- rança se a em voz trazia.

Senhora, disse Palmeirim, a razão k iustiça queria que tiaessels de vossa parte que no mais eu farey o que pjder & por v«intura será mais do que Ju gais po a iJaJe, por isso peçovos que sem nenhum recco me digais ao que Vira, que no que vos de mim comprir auenturarey a vida-a qualquer perigo.

Ay senhor quebõts paLuras, disse a donzella, se a obra dissesse cora ellas. Sabcy que nesta villa que vedes estam presas três donzellas filhas de hum gram senhor que aula nesta terra, k porque seu pay nam quis casalas com o Du-

de Rosiihom & outros dous seus irmãos, tiueiào maneira como por treiçio ^

rt«oto xn 821

mtintD, e etles a ellas trouxerio a esta fortaleza por força, 8t porff ntlra qtitfte- rto cõceder síu desejo, dorJioMe espnvo te ( jo, q he o dcr'ailciro dia, para que buscassem aí^fl c^vanei-o q pt-i 'or';í ris ^ t?^'c He fc" p-^fc'', & auiase de combater d.sta mane''a. Pr ocr rirfro à fn!r;:''a ci.1 fori:.!v-7J cO Cib*rarim piimo do Duque, tunido c nomeado em i- do tste '^'*:) .o, á, vcnctndoo ase de oMBbater com outros dons caualleiros f&tamête tambê »eus paêntes & mais es- forç íSoft^ a que ch.amSo 0''st^r -^ '*•';■' :r, í^ ^?^ -"ir; h '.^a Ivit,». 'a vencedor, comhnterse com o Duqt^í* & slii<í rí> -jx rfrr-es, n cih^-i u-n n-T -i ••■q trm csneciaí «ralleÍTO q bss^a p^a o msl.-or ^!v^r^l fv:^, .^ p »r ::»ic .ic Me o derra(ie'ro dia do prazo, no onal elias bsm d^scr j^oi-^dcís n-m ih do c-^uj-leiro qiic por -si faça esías batalhas, dry a pxc:^^:^ Mie vi«tes c^ vos-^i vinl?. Aço.s fi.y ter à viUa para lhe fazer síbcr que trnzin ermida vn ciTia''t'!ro qiiíi «e c</.n «'i es com- baicsse sepiindo cstpua- ordonad >. de o;:^ o l-m-)- c e>i^ n iiy aluc^r.-çado & con- tente cremdo que ir4 com seu pr oo^n ^ TiUír.-i. poi.i nuiita con^.:: i.;í que em si ft nos outros caualleucs de su? c?*^.! leru

Por certo, senhor? rioT^/t li i, tiiss-e o nni csfr.rç.íd.-i Paíifcir^Ti de Ingla- terra, arora nam me es:>anío, n^m m*;iOs ty por rriuifo rcceaiem alguns caual- leiros vir a tSo incerta & duuidosa do^^^a^da c «.no ess? he, & pare:e-me moy nal de el Rey consentir que em seu senhorio se faça } Qa tamanha sem razão como essa, alem de ser agrauo fiíto a moliervs. cousa que anire os homés de jfTlde preço se dev^a cOscnrír: & pois o mais do dia he gas*;ído. & pura tStas bstalhís fica pcuco espaço. paT\'^rnjs lego, (!ue cu tspcro cni Dc-s qa maldade dtsse sefa causa í'e sru vennrrentc.

E sem rraís d-zer. ciiiaçoa o c-ino. mcncnario de cou<a tam irai feita. A donzelTa cf punha os o)i*os r-e^e au^rdo o víq rrm t?Tn trm desejo & pruco temor. cobr« u mais algum e*5'orço Ho cre lhe ficara depo s que o vira, & arrbos jvntamcntc entraram po^a vil'a. C* (ktti à lowvli^y^ r;nc t^^aua ler: assentada & forte. Ccusa que aos r?os rnóido m roí^ra^ís se rr-m aua de consfcntir, porq muitzs wczts a ccnficnça ccs ls foiças bc cí-usí- de mu tos erros.

Fr.^de^Worae», Palmeinih dt Ivylatcrra, «d. 1592, p. ji, cap. lxvjij, páí. 73.

Quadro dinético do movimento político^

80cial e literário ccrreepondetite á eecola 8ei8ceiiti8ta ou Gongórica

Monarcas portuguesos

Felipe I .\ 1680-1598

Felipe ir 1598-1621

Felipe IIT 1621-1640

D. Jofo IV . . . . 1640-1656

D. AfoMO VI 1666-1668

D. Pedro II (regente) 1668-1680

I). Pedro II 1683-1706

IL

Sincronismo político e social

1534 Assassiaio do Príncipe de Orange.

1587 ExecaçSo da rainha da Escócia Maria Staart.

1594 Henriqae IV aobe ao trono de França.

1603 Morte de Isabel, rainha de Inglaterra.

21^ Ezpalaão dos Moiroe de Espanha.

1618-1648 DaraçSo da guerra dos Trinta annos, que termina com o tratado de

Veatfália. 1624-1642 Governo de Richeliea. 1630 _ Vitórias de Gustavo- Adolfo. 1692— Morte déate herói. 1S40 SublevacSo da Catalunha. 1643 Principia a reinar Lni9 XIV.

Ill

Sincronismo literário

ESPANHA

E um período brilhantíssimo para a literatura espanhola o principio do i<c. XTU. Citemos entre os poetas:

LopB DB VboaCarpio (1562-1635), fecundíssimo poeta, fundador do teatro em Espanha, para o qnal escreveu centenas de composiçõis que podem classiíi- ear-ae em 1-** comédias de capa e espada ou de enredo; 2.® dramas históricos; 3.0 comédias yatnUiares^ e 4.° Autos. Atribuem-se-lhe 1.800 comédias em trcs L»cta3 {21 mílhôis de versos!) e 400 autos; escreveu 5 dramas cm quinze dias. Tem dons sobre assuntos- portugueses El Diiíjae de Visee e El Prinoipe Ferfeito.

Luís VúLMX na Ouivaeíl (1570-1643), deixou, entre maitas outras comédias, ia intitulada Reinar dupnéa de morir sobre D. Incs de Castro, o a novela satírica JS7 dúMo eoju^o (diabo oôxo), que Lesage imitou no Diáblt hoitwx.

àanmA lu -- ptof a

Timo m Moliva (15ftR-lB48). ptendénimo de Gkbrlel Teles, àlêm deM- uivScíias e aatos esereven El burlado:' de Sevilla^ onde descreveu com grude ei ergia o tipo de D. Jiian, qne depoic se uni versai íson.

Pkbro Caldvron ul BiECA (t 600-1 681) rival de Liope de Vega, aqaem é superior no eatado^das penoni^A quo pôs em aeena nos seis aoaiifMoi ÀMíêê êoeramenkieM,

Luís DE (»ÓNooaA i'l56t-1^7Ve«er«vea"no género lírico e narrativo mnitas €.^ropo8Íç5Í8 ( m estilo, a f|i:e cie chanava Culto e qne é tarobêm conhecido por i''Of!(forico. Uao obstante a aín!íqr»ao, f lisis verdadeiía, de sej esse estilo nm te- ciJo de niatAforas ohpcuras e ridícnias, Oonçora eonsegaíu impo- lo com as aaas cbras JSn!e<l".dfB, Pohf^mo, Py^^m**. y Thinht,

FaA «cisco DK QuiíVEDo (ir)S0-li'45), dotado de grande talento critico e ratírico, aitor de crnipoíu;?»!? em piosa e verso muito estimadas, como / 1 /iiêtéria dei gravdf. iacaho e L)8 Bueho^,

Com ) historiadores : ,

Aktmio d8 Sol'8 (lííIO-lí^S'>) qrie àlêm de obras poéticas, esereven a Hiêtória da conquista no^Mexico, no género de Quinto Gúrcio, muitas veies reimpressa.

Nicola V AvT^iriOf autor la Bib!'oié^ HÍ9panA^ obra de paeionte invM- tigaçSlo bio-bib!iográfíca.

FRA NÇA

Vigorou em França nesta época o chamado Pr^eiomino que foi importado

A literatura co Palácio de PamhouiUet correíponde no go? to e no estilo ao gonfforiar.o da Pi^DÍnaula. O Hotel de fíamhomlUt hem ermo os salô^^de M.il^ de S :nd<^ry criam o pedantismo e a afectação, o que não impede que apa- reçam alguns grandes (escritores, eooso passamos a ver.

MALusuaa (t55~i 1628) conseeme libc(rtar*«ft desta desastrada infln^n^ia, sendo correcto e natural. Boileau rplicoulhe o famoso verso: Enfin, Malherb*, vtnt,,, E' considerado am ref< nnadoí da língua.

La Fontajnk (16JllH9f ) o a^Binsd > fabn^ista inegnalável no génem Tr. f ortiig. : Curvo Semedo, 'irad, lirre da^ r»elJioreB fahidaê de Laf.^ Lisbea, 38. U; Filinto E iaio, Olran, vi ed. de I ondrea, 1813. 2 voh. ; Vi-ents Pein Nola^co da (^unha, O hon em Bin'jular in - O ivrentigador ffortftgfi?.^ ; Antónií) Vicente de Carvalho e Son ja, Du is Desposadas, Lisboa, 1829, 4 vola ]

MoLiàiKi (1622HHI, talerit> geiial. cuj%í obras priniias sim conheci-ias em t^ídoâ 03 pn^os cjvilizalos. [Rn pirta?. : Maa>el de Figueiredo, The^i^ro, vn ; Miiool Som, Ttrtifo Oi o h'pinrita, Lisboa, 1763; id. O peào ^di^- go, ihvi.y 175Í; Jol) Aií^nto Vívící Vieira, Código do amor. Porto, 1856; Castilho, Tartufo, Aoareulo, Mídiío á forçfi^ Sahichonas, Misantropo; C'>elho de Carvalho, K^aola de mídh res, comédia em 6 actoa em uerâo, versào Libérrima, Llsboi, VMl].

BoiLBAU (1631-1711) autor do po^>rna heroi-c<Smico Luírin (Estante do coro), imita lo p ílo nosí > Cru . e S»lva no fl^ssope, e di Arte Poética^ i^èm de Sátiras e C-irfis [En putiiT. : Pílro J033 da Fonseca, Sátira do Homem^ Lisboa, IS)); Antriio LiSo... Girlo, Trai Hvre OH imitai^o da SàUra d-'^ homem, Li^'i)\. 18 í7 ; l l , T»* i f Iní^f», o>i \m\tin ío do LfUrin ou Estante do còn), Lídb>a, HU; AitMÍo \oi\ d* L-n i L-itíi, Aeslantedo coro,,, Lisboa, 1834; D. Fr. Xivierdí Mvi.-ím Ar'e Po^^.Uca, 1S18|.

CoEiNBiLr.B (t)J3-loS0. i^"*- diixoa a^ obrai primas da tras^édia francesa Cti, Hyrv^e, dcjdicidi a li;vi'i li-ju, Cfmi, o / oív«'*;í« [ Em pirmg. í AntiSnio Jo3á de Piala, O Cii, em veuo.. .; Mmuel de Fignoired), O Cid ia Teatro, VIU ; Id., ttnva^ ibid.; Anónimo, O Ctd, ver8;\o em verso (Insoo,, vii, Si9b)].

OAPÍTCTLO IT aSGOLA 8«I0(naiT18TA OU «H^MOÓSICÁ 385

B»ci«4 (1639>1699) oatrd génio da «eena francesa de quem teotos, para ^mentt* nomear as principai.-}, as tragédias Andromaqitet Britannieiu, Mithri" date, Ipktpénie, e sobretudo Esther e Athafie, [Gm pirtu^. : Francisco José Py«ire. AUinlta, Lisboa, 1762; Sebastião Francisco Mendo Trigoso, Fedra^ Liisboa. 18 3; Manoel Joaqui<n da Silva Porto, Fhedra^ Rio de Jaieiro, 1816; A. J. da Silva Leitão, liytma, íiio de Janeiro, 1816; Id., Andrómaca^ tòtd.. 1817],

A eloquência sagrada conta os sens melhores repreâentintes n^^ste séoalo:

BossoBT (1627- l7Ui) imort,i!iza'io pel|is Oraçõis fúnt'hrejt, pelo Diêcourê jmr i''hi8'oire unwersdU e peia lixai, des vanationa des E(/fiaes proiestintes, [Em p'>rtug. : A. S lareâ 13arb)ai, Elevação a Deos eobre os miaUrto» da religião].

BouBDAtocB (16BM70V), Flh;hi".b(163í-1710). [Enn porta, : José Manoel Ribeiro Pereira Comphidio da* onufTns fwntbr a^ Li.Hb»a, 1704; Manoel de Souza^ Vtda de Teodósio o grau de. Lii»baa, 178...], FÈNÍL<)if.Uó5l-1715). [Em portag. : M»noel de Sousa, O fderyfico^ Lisboa, 177») 'J vola, José Manoel tíibeiro Peícira, Aventur<ig de TeJ.emacOy 1780, 2 vols. ; Aveitanis de Telemaeo, tr. de ManoeL de ííou^ i e d^ Fr. Mi^ioel do Xaseimento^ retoc^di e correia por Jn»i dl Fonaezi, Fari-j, 18 >5, l vol ] e Msbilon (1663 17 ti). [Em portag.: Antínio JT>sé Viale, Con/trèmuas ecc^^^staaticaa de.,, trad. e/n portug. e a ex- ^íwaa de S. M. a H xnUa D EHepkanvi, LÍ3b>a. 1859; Fr. J *'3'í do Espirito Santo Monte, Pensamentos sa*i1vn>',f*^. .. Lisboa, 1786] embora inferiores a B^a- «net, sam modelos do género e p^jrfeitos caltores da iingiia.

Entre os filósofos pode^uos nonear principalmente :

DK8CABT<r.8 ( 1596-16>0), cuja ubra capital é q Discurso sobre o método.

Pascal (1623-1662) qac nào >-ò nos seus Pensées, mas ainda nas Leitres Provificiafes deu prova de extraordinário vigor de lingu.igem aliado a uma grande beleza e concisão.

Mallbbranchb ( 1Ô3S 17 5 ) imprime á íiióso&a cartesiana uma feição reli- giosa reflecti II' lo a um tempo Pl.itao e S. Agostinho.

La KocHKPOucAaLD ( '.613-1630). [Em p »rtug. : Gaditano Lop^ís de Moura, Máximas e seateTiçns viordea pdo Dfupie de Hochefoucauld, Paris, 184)] e La BicnrúR^ {161:õ-161i5) sam dois p 'nnadores distmtos, sobr^saínd» no taleato de observação como o revelam as Maximcis do primeiro, e os Caracteres do segundo.

Na história:

Cardeal de Retze (1614-1679), homem político que nas suas interessantes Minérios, se reveli escritor vií^çoroso e correcto.

Saint-Koai. ( lò39-l6JJ), cuja obra principal i". a Conjuração de Venata.

Vbrtop ( 1665-1735) que, se outros títulos nao tivera, merecia aqui menção condigna por se ter ocupado da noisa história nas suas HevoiíUions de Portugal (1659).

Flburt '1640-1723) ó autor duma estimada História eclesiástica. [Em portag.: Jo5o Rosado de Vila-Lobos e Vasconcelos, Os costumes dos israelitas^ Lisboa, 1778].

No gpn-íro epistolar :

Vaoamb de Sèvigné (1626-1636), cujas Cartas dirigidas a sua filha mani- f^^^tazn áníssimas qualidaies de observadora, .e que ficaram como monumento -ie estilo familiar.

ITÁLIA

Bastariam os nomes de Galilbo (1544-1642) e de Torricrllt (160S-16\7) para imortalizar este período. Mas a literatura atravessou urna fase de doca- dência por can<>a de máo gosto que dominou o rjue foi devido í íuPiikVum"! do

Max>no (1569-1625), que pelas suas composi<;õÍ3 se tornou o cht;fe da plêiada conhecida pelo nome do Mariíiistas. Foi o grande corrntor do f^osto

21

326 mSTÓBiA DA UTBBATUSA PO&TUOUÊSA

italiano pelo abnso que cometeu dos e^meeUi e das antíteses. A sua obra prim» Adontê (cerca de 45.000 versos), 1.* ed., Paris, 1623 levantmi renhidas polé- micas. Ttndo vivido eon Fiança e ganhailo as simpatias de Maria de Medíeis esta deu lhe ama peni-So de dons mil escudos. Marini consagrou- lhe um poema Templo Poftfffinco dt Maria de Mediei qne é uma série de matáforas.

TAssoKt (1060-1685) é conhecido sobietudo pelo seu poema heroi-cómic(> La êecrMa rapita (o balde roubado .

(%i7/ftiMi (l::37462á) adquiria imerecida reputação com o drama pastoril PaHw Fido,

SAKpt (1552>16^3) deixou a célebre Hxetôria do Concilio dt Trento 4 qual respondeu

Pallaticími (1607-1667), náo oons^uindo igualá-lo na singeleza e ani- mação du estilo.

INGLATERRA

A Irgla terra sofre da mesma decadência e do mesmo máo gosto das entras aaçõis no que lespeita á extravagância da linguagem e dos asBuntos literários. Ch' moD se a etta eí>i rente Eufutêtno do ronancc de Jomr Lylt (1553*1606) in- titolado Kvplurs, que teve grande voga no seu tempo, e deisanius nome&do do período ant- rior.

Milton (16('8-1674) cujo ParaUo Perdido ele, pobre, esquecido e cego ditou a Mia nm Ikt e aos sens dou filhos. £m doze cantos e verso branco o The Farntiis l ont, bõbre ter um monumento da pctesia inglesa, é uma obra-pnm.^ do espírito brniano. [Em portg. : J«sé Amaro da Silva. Paraíso Perdido,.. Lifibou, 1^70 1! vol.; Iim cisco Bento Mhiia laigini (Foi ViscoLde deS. Lou- renço). O paraíso Ptvd\do,., em verso.,,. Paris, 1823. 2 vola. ; António JostV de Lima Lcitf.o. O 1 maíso Perdido., em vtrso.,,^ Lisboa, 1840, 2 vols., leimpreeso em ]ÍC8,]. Lisboa, JcSo Félix Pereira, trad. em verso solto ende- cassílabo, in A Aoçi.o, 28 nov. ]8(?8 a 21 de 8et. 1869. Do meanto trad. em prosa no mesii o jor» ai, hO set. 1869 a 20 de nov. 1870.

Merecem Mnda apontar-se:

Driden ( 16.-3 1 1701) o maior poeta inglês, depois de Milton, cultor de vários géiuioB littnirios em prosa e verso. |Eni portog. ; António de Araújo de Azevedo, (/de de I ry dm para o dia de Santa Cecilto, s. a. n. 1.].

J(nu BuhYAN ('6*28-16^8) escreveu a Viagem do Peregrino (Pilgrirn9 progress) Uírito estÍDiável.

A 61c6oíia é representada por três nomes notáveis: Bacoh (1561-1626), restaurador do in^tdo e iniciador dum grande movimento filoBÓfíco; Bobbes (16^8-lb'í^)c locKK (1632-1704) [Em porttig. : João de Oliveira de Carvalho, Ensaxo sóhre a verdadeira ongem, eschvçâo e fm do governo cwú, Lisboa, 1884], aquele ííuíot do Levialhan em que se encontram exposto os principies do autor em p^ici logia, moral e política*, êete que tem, àlcm doutras obraf>, o Ensaio sobre o eniendime^do humano em que buguiu a escola sensualista, que- ejcplicava ttdaa idéas como oriundas dos sentidos.

ALEMANHA

A Alemanha ilustrada neste século pelos filósofos Leibh)z (1646-1718) e WoLFP (I()7*J-r(f>l), teve um grande escritor em Opitz, (1597-1639) que foi apéto e drhii.atni^'", deixando aos &eus discípulos regras de metrificação no seu Pequeno (rafado dp poesia ahmà.

HcFFMANN (1618-1679) e Lobenstein (1685-16'^3) agravaram os defeito* que btí revelavam em Opitz tomando como modelos Marini e Gongora.

p

CAPÍTULO IV

«

Escola Seiscentista ou Qongórica

(Séc. xv:i)

Sumário: 96. Decadência literária, seas factores. ^7. Regimentos do S.^ Ofício, eensara e índices exporgatórios. 98. Univ.erBÍ(lade de Ev«ira. 99. Escola Gongórica, carActéres. 100. Academias lit rárias. 101. Academias literárias portnguésas* a; A, doa Generosos; b) A. dos SingU' lares. 102. Representantes do Jirismo no sécu o xvii.-t-10íí. Francisco Rodrigaea Lobo. 104. D. Francisco Manuel de Melo. 105 Outros liriods deste período. 1<«6. Representantes do gén» ro satíiico. 107. D. Tomás de Noronha. 108. António íSerrào d- Castro. 109. Diogo de Sousa ou Camacho. 110. Poesia épitja. seu carácter. 111. Gabriel Pe- rf-ira de Castro. 112. Francisco de de Menea- s. ~ 1 13. Vrbco Mousi- nho.— 114. Antónit- de S usa de Macedo. 115. Brás Garcia de Mascare- nhas. — 116. O teatro no século xvii. 117. Carácter d;i Ili&tória. 118. Fr. Bernardo de Ijiito e seus ccntinoadores. 1 U*. Fr. Luis de Snusa. 120. Faria e Sousa. 121. Jarinto Fr- ire. 122. Historiadores menos impoitantes. 123. Viajens. 124:, Ekquòaciaí sí^us repr» Hentants. 125. António Vieira. 126. Manuel Btrnardea. 127. Trabalhon filológi- cos DO século xvir. 128. O jornalismo. 12*.'. Epistolograôa. Cai tas da Religiosa Portuguesa.

96.— Decadência literária; seus factores. A quadra li- terária do século XSU representa para Portugal ura período' de grande decadência. Ob prenúncios deste abatimento geral, que luio literário, vinham do reinado de D. João iii, aumentaram nos anos da meno- ridade de D. Sebastião, e nos dias do Cardeal rei D. Henrique (1578- 1580) acabaram de caracterizar- se com mais vigor \

D. João III julgou obstar á invasrio da reforma luterana, que l»n'ara como violento incêndio por toda a Europa, solicitando de Roma o estabelecimento da Inquisição. Gastando rios de dinheiro e empenhando nessa empresa a boa vontade e energia dos noe&os me- lhores diplomatas, pôde enfim, vencida a relutância de líonia, obter 4 bula de 23 de maio de 1537 que delÍDÍtivaniente íundava em Por- tugal o terrível instituto.

Com a Inquisição vieram os jesuítas. Ainda antes de coníir- DMida, de Roma em 1540 víuliam para Portugal membros da afa- mada Companhia e por tal forma ho conduziam e iropimliam ao ânimo de D, Jofio ill, que entre 1552 e 1555 o ensino linha cuido

Rebello da Silva, fíist, de Port, nos scc. xvu e xrur, t, v.

328 HISTÓBIA DA UTBBÁTUBA POBTOGUâSA

saas mãos * . André de Gouveia, doutor teólogo pela Univ. de Paris e prot. de humanidades em Bordéus fôra chamado pelo monarca português para vir em companhia de um grupo de homens eminentes em letras lecionar no colétrio que ele d* sejava fandar junto á Univ. Era *im 1547. Veio e trouxe co«nsi{ro João da Costa, Buohanan, Diogo de Teive, Nicolau Gruchy, Guilherme G-iramb^o, Elias Vinct e outros. Passados, porem, poucos anos uma provisão de 10 de Setem- bro daquele ano de 1555 expedida a Diogo de Teive, mandava en- tregar ao Provincial da Companhia nê&te-* reinos, que era Diojrp de Mirflo, o Cohu/fo jlas Artes, para que os P^tdres dirigissem e lessem as Arfe.^ e tiuio o mah que lessem os mestres franceses. por ura alvará anterior 2 lio janeiro de 1552 os professore-^ deste Colégio haviam sito iguala- los em honras e privilégios aos da Universidade. Que se pas>ár9 para ansi^n serem e-bulhados do ensino e, o que é mai-, pfTsoguidos p(^lo terrível tribunal, homens tam insignes e respi-itav» is? Nos fins de 1549 procedia se em Paris por ord^m do Car eal D. Henrique a uma inqíiinç^io sobre o comportamento que em ^ Fran(;a haviam tido os Mostres do Colégio. E como consequência no princípio de agosto de 1550 foi preso em Lisbf a João Costa e no dia 10 do mesmo mes cm Coimbra Diogo de Teive e Buchanan. O que se descobriu sobre a vi^la e moralidades dos professores foi escanda- loso e admira como o Colégio ainda subsi tia em 1555 quando foi mandado passar para a posse dos josuít.s. O resultado fiâberera des- pedidos esses professores, alguns de reputação europeia, como Bu- chanan, Vinet, Fabrico, I^ieolau de Giu<hy, Resende, Teive, Costa e quantos, niz Ceníienlo, em Coimbra e outras partes dirigiam o Colé- gio das Artes e os et-tudos das humanidades. Para cohonestar tal procedimento deram- se a alguns de^^tes professores lugaies que parecia de justiça: a Diogo de Teive um canonieato em Miranda, a Jo2o da Costa a igreja de S. Miguel em Aveiro; ficaram outros ensinando como particulares, outros saíram do reino para retiro dentro dele *. Parece, porém, cm pre.s(^nça dos does. agora conhecidos que D. João líl não podia proceder doutra forma embora os jesuítas se tivessem aproveitado de oeorreneins, que aliás nfío provocaram *.

^ Coelho da lioi'lia, Ensaio sobre a hist. do gov. e legisl. de Portugal, pág. 158.

2 Mem. Hist. do Sup. Prov... da Ordem Terceira^ Lisboa, 1704, ii, 71.

' As fontes indi-pcTKsávf is para o estudo da acção pedagógica doe jesuí- tas neste j»erí< do sani : Quichorat, Hist. du ColègeSaínte Barbe e E. Ganthier, Hist. du C0if\çe de Cniyenne [F. ])«MKsdado, Educadores Portag., 287]: A. J. Teixeira, Does. porá a hisP. d^^s Jes. em Portugal, Coimbra, 3899; F. Rô- diigne», A formaçno inteUrtual dos Jes , l'()ito, vSil \ G. Henriques. Btichanan na Jnquisiçdo no Arch. Hi<;t. pnrtiuf,, iv^ 2il. Rraameaaip F.^CoC.R, das Artes no Boletim da Acad, das Sc., ix (r.'14.).

CAPÍTUIiO lY BSCOLÁ 0B18CB«TlSrA OU aOUGÓAIOÁ 329

97. Regimentos do S.*** Ofício, censura e índices.

A Buia qu '■ fundou em Portugal o S.^"^ Oficio tem a data de 23 de maio de 1536, e o 1.** Regimento por qa** se governou a de 3 de a;ço»to de IÕ52, Bendo depois sucessivamente publicados os de 1570, 1613, 1640 e 1774. Aquele que inicia esta série durou 18 anos e íoi mandaílo organizar pelo Cardeal Infante a seguindo na efcteira da jurisprudência inquisitorial da Idade -Média, menos lib'Tal que o direito portngaê-* coevo, nFto fazendo deste entretanto diteran^a ex- traordinária» '. vinha estabelecido o precito da visitn ás Livra- rias publicas e particulares. Depois dos Regimentos vieram os índi- ces. Qual e quando íoi o livio censurado? Talvez o fosse o livri- nlio Insíno cristão que saiu em Lisboa anónimo em 1539 *. Neste ano tambe n imprimia Joílo de Barros a sua Cariinhi e para íhso foi npc<>shária a iicenga de S.'" v.)fício. Dons anort deí)ois em 1541 o < ardeal Rei proibia q'ie se vend^^sse em Portiití;al o (»púscMlo <ií* Da- mião de Ooes impr^s^so em Pari> Fides^ religío, vtorcsqiie Aeth/jum, Míis é d** I5t7 o l." Indico pxnurtr.itório, ni Ic os livros em poríuicuês aiila ham raro?^ ^, ap 'recendo em núrn(-ro niaií)r no iinodi.ito de 1551, loíif') seguido (l<í outros más p»n'iiit(>s e cííinpletus, de 1564, Ib^iy 15*J7, I6*i4. Mas Tiào f»ra i>to.

Ao ludo da cen.-iu-a ecif^siástlea havii ;i civil o^tHb«;lori a nas Ord-^na;." s d") Reino e apliívidi p"!-) D ^rciiih irico do r.iro. Um âlv. ■!e 4 d-í d 'Z. de 1576 proíhiii a impre^sHo .los livros >^«'ni li-.vnic^a ré:;i'i p-ccdila pala revivia') do Dt:;sí»iiil»aí'>v>, emunra tiv.'ssein aprf>v.iç*»o do S.*^ Ofí'-i) e do Urdiíiino. Mu-* v^strinsa .:i<nl:i ó a •iontrina do alv. de 31 de ai::os^(> de 15*^^. D^po s vcin as Ord. Fe- lipinas, 1. V, ti^. 102) o slU, de 16 de d 'z. do h>23 o o As>(M!r.) de 19 de jan. d^^ 16^4, até qv* na época Pombillna í\sta Icí^i-la^.rio foi con- (•entrada na Rr-âl 3Ip>a (\Ml^<olia por (Jarti de lei de 5 de ;d)iil de 1768 transformada, apóá a morto do P«)mbal, cm Kcal M''.>a da (,'omissao gí*ral Hobre o exame e cen:*ura dos livros extinta etn 17i'4 pnsfeando a Cí»nsura a ser r^^gula la pflo Alv. d 3<> de ju ho de (7U5 e ainda por úlrimo pela Port. de 18 de atcosto de 1^-6. V M"sa do Desem- bargo era!n a pn- senta las as C(msuras do Ordinário e do S.^" Oficio e Bcado conformes as três autorida es o livro a podln corren).

Relativamente aos livros imprcstos íÓra * e que podiam su-

^ Foi o Sr. António Biiiao qu^rn o de«cnbriu na 7* 'rre do Tombo e na integra o pobl. no Afch Hist, Pottug. v, 272- -29^,

' Inoc. Dic. Bibl m, 227 ^ x, 88^ O. Carolina Miehae is, Notas Vic. 1, M

' Sr. António BaiSo, A Censura literária irujuisitorial, Coimbra, 1919, 1 vor.

Correíi da Serra, Af^/n... s^bre o estado das Sr. e Belas- Letras em h>rtugal durante a última metade do scc. passado (o 18 j trad. e publ. no Primeiro Ensaio de Freire da Carvalho, 4014U3.

330 HISTÓRIA DA LlYBRATtJBA POBTUGUftSA

brepticiamente introduzir- se no país o S.^ Ofício tomou medidas para o evitar escrevendo aos Bispos que tinham portos de mar nas suas Dioceses, de modo a que fossem entregues ao seu respectivo comis- Bário.

O original dos Lusíadas teve a censura, embora muito bené- vola de Fr. Bartolomeu Ferreira e assim passou incólume para a ed. de 1572, s w\o essa censura exagerada na ed. de 1534 *. As obras de Gil Viceite pela primeira vez publicadas juntas em 1532 sofreram igualmente censura, disparatada e absurda depois na^ed. de 1586. Pode avaliar-se do rigor com que seriara observadas estas dispôs ÇOÍ8 proibitivas sabendo-se que o bispo de Coimbra D. Afonso de Castolo Branco t «ve de pedir ao Coneelho do S.*** Ofício autoriza- çíío para imprimir as feuavS Constltiãçoes do Bispado ! V^-ja-se se, sob semelhante regimen, a lit^^ratura deveria ou nâo de sofrer nec-ssá- riam ntíí rudes e certeiros g>lpe8 *.

Par.i agravar è^te deplorável estado de coisas, vera a empresa mal concebida e p -ior exociitada de D. Sebastião, que sepultou a flor do exército português nos areais de Alcácer-Qobir ; segue^se depois a regência desgraçadamente imbecil do Cardeal-rei e, a coroar este sudário, o domínio de Castela. O resto do vigor que ainda susten- tava a naçlo exringuiu se. Uma das causas que apontámos seria bastante para dol íro^amsnte se fazer sentir na expansão da vida nacional. K elas eram tais e tantas !

98. Universidade de Evora. Em 1553 o Cardeal D.

Henrique fundava em Evora o chamado Colégio do Espírito- Santo em que se e.st'idiva*a Teologia, a Moral e Humiuidades; ao cabo de muitos esforços coas^guiu ele que ê-<se Colégio fosse elevado á cateí^oria dt^> Uni oers Idade D)r B lU de Paulo IV de 1*8 de setembro de 1558 com a clán-^ula d^ n^^í^a se nao ensinir o Direito Civdl, o Caníjnifo no foro oiitencioso, w^m a M'^licina.

l^m alvará d^ 4 de abril de I5ò2 de D. SebastiJto concedia á nova Universidade os mesra «s prevílégios, direitos, isenções e prero- gativas que tinha a <lè Coi nbra. Foram naturalmente os jesuítas os encarregados da alministr ^ção e ensino da nova escola havendo entre eles figuras d ^ reputação eurooeia í'omo Manuel Alvares, o célebre [ gramático e o teólogo Luw de Molina. E por ai se pode imaginar a dir-^cçlo que imprimiram aos estudos. Até o próprio André de Resen- de, o famoso humanista, tara «esti-nado de Sua Alteza que p t lhe fazer honra o it ouvir algumas ve^zes, autorizando com sua real pre-

' I

1 S. Viterbo, Frei Bartol. Ferreira o primeiro censor dos Las,^ 1891. !

« Vide o Breve estudo sobre a história do censura liteKíria em Portu- |

gal pnsto pelo Sr. Tli. Bra^i, á frente do vol. Obras inéditas de José Agostinho \

4de Macedo y Censuras, ete. Lisboa, 1901. " \

\ I

capítulo IT BlOOLA SBiBCBVTIBTA OU aOKOÓBIOA

331

«ença a escola de tam insi^^ne Mestre » até esse foi pri>ibido de exmi- Dar latim na cidade de Évora ^ I E o cronista da Companhia dis <qae n%o « hav^ia negócio de importâmâa e de confiança pertencente AO sernço de Deus, que [o Cardeal D. Henrique] nâo fiasse e entre- gasse á Companhia! ^^ A Univ. subsistiu até o tempo do Marqaês de Pombal sendo os seus beaal e os do Colégio do E^^p. Santo, »pÓ8 a sua extinção, incorporados na Univ, de Coimbra. Cartórios, p^^peis velhos, tombos e registos foi uma explosão! Uas foram para Coim- bra, outros para Lisboa, fícáram outros em Évora '.

99. —Escola Gongórlca; caracteres. A imitaçSto dos

nioieloa esp.Hnhoes impôs se alem de fazòes de ordem política, que veitt c»m o domínio dos Filioe' [1580- 161:0] por cau^a dos interesses económicos e morais que resultara n dêss n esraio de conquista, pelo prestígio da? grandes figuras literárias que então brilhim em Espa- nha e que sám queridas e estimadas em Portugal a ponlo de nume- rosas obra*s suas saírem do^ prelos portugueses, o que tudo cria o «spi ito de imitação. Em conse |uência disto a Espanha exerceu -obre nói a perniciosa influência do mau gosto literário, de quê ela própria tambÔrn enf rraava. N^o foram os seus e nossos reis os culpados. . K-Jtá hoje provado, que 04 Filipes longe de procurarem propo^tit tda- mente o embratecim^^nto do povo para apagarem quaisquer i.léas de indep^ínlemia e de liberdade, antes se i»sforçaram po' concorrer para o desenvolvimento da cultura geral. No seu tempo o número dos mestres e dos alunos aumentou con'»idprável mente. * S i em Portugal eri a situação literária, o mesmo sucedia em Espanha e nas ou- tras naço-^s da Europa, como afirma Ticknor ^ e os factos o conpro- vam. S*ra os con^ieitos á vrini em Itáha; é o TiJuphwsmu em Ingla- terra, é o pedantismo do Hotel de Ka>i>biuillet em Françi, doençcís j perfeitameit corr spondeutes á da península. A «-voluçà) política <^oncorrpa ap^^nas para que mais se estreitassem os laços que, sob o pmto de vista literário, mantinhamos com Espanhi. Os trovadores

* Crón. da Companhia pelojesaíta Teles, p. ii, 1. v, c. xiv, § 9. Sobre n onivarsid .de de Évora pod^in c^nsaítar-se : Évora Gloriosa^ pip^ 416, n ° 7á3 ; Mem. dei rei' D. Sebastião, Vlaehado, p. 1, 1. 1, e. 9; Bibl. Lasit., verb. O. Henrique, e Colégio de Euora: Pr. d^i Cirvalh>. Primeiro Ensiio, cit., pigs. 122 e 123; e vários Documentos colisflioá pelo Dr. António Jodí IVix-in, lefite df" Mitem itica na Universidade de Coimbra, e impreââos na Lnpro.ija da mesma Uníversidíuie.

« £d., ibid. p. 11, 1. V, c XXXI, pA^. 305 e seg.

» (:;^ab^iel Pereira, Esfudos Eborenses, Univ. de Euora, 1892, 1 folh.

* Vii. aa provas no Curso de Lit Port., do Andrade Ferreira, ii, 21 e seg.

* fíist. da Lit. espanhola, iii, cap. xxix. Vidí também Lncien Paul Thoni«i, Gongora et le Gongorisme consideres dans leurs rapports auec le i\\arinisme. Paris, 1911, 1 vol.

382 BUTduA DA UTBBÁTinLk POBTUflUÂSA

do Cancioneiro de Resende, e Gil Viconte, Camões, de Miranda usaram simultaneamente das duas -língnas. Segu^m-llies o exemplo de Mí^neses, Quevedo, Faria e Sou«a, D. Francisco Manuel de Melo e tartos outros. ^ A' invaeílo na língua suc^^de a invasão no gosto literário, que se abastarda num excetsiro ctdto da palavr?, donde o chamar-se á escola por ele íorm>ida cvJtista, Denomina-se também gonyóricay por ser Luís de Góngora qu^^m exerce o predo- mínio literário. Caracteriza-se o cultismo pt la novidade djis palavras e suas aplica^rx^e, polas inversões forçadas, pela ousadia das Lipéiboíes e proíiisao de figuras, que tornaram a lingua quási ininteligível. *

Os allos quilates do estilo cuUo c am, dz C. C. Bnmco, ' os eqnivoiíoe, os trocadilhos, o marinismo, os concfMi, liipéibole» raie- laiseanas, o estilo ^>om/>ar/o?ír^ nt^onuncias de cláufrulas, honionim^as, jogo de vociíbnlo^, LipotipOvses, eníiiu o ^^ ngorismo que se liivia, com uma doçura iiií-iíliosa, iníihrr-do nus mais f)riinor<)í»oí< engeuLo.^, eem excepçfio do radie António Vitira e ('e Jacinto Frene.

E^ta dole^ria iiitluôncia efcitiKi-i-s ' iMiito !)ein no Postilhão (h Apolo * e Hfbntihio ros ei-ico toinòs na FAic líeyiciHcIda ou (fbrtís poéticas dus 7}}tl/nires ei gf^nlios •j>o't ^vi/iies( s, onde tí^nivii n muitoj» escritoreã ila ('[xx/a, como i)Í!>^o di* >«'! //t cu C.imacho. Fr. Ji-róuiiiío V&hia, D. T<mi,;í^ lie Ní)ro:ina e uutro-i. i) i Ui ler o tífulo d;i> por.-ia*. para í<*' vCv a pi-ile c\'^ bapUi-^-is e d\í j'!iti'i>la<b'S c<nn que »;.n ^Qm\ se entrcti Íimu (h mplrioio* e-pír.to^ *\ * íeiMpo: n A um thsviah t, li e-timas Sfittd 'ne.^», a um npía^asilgo cvlí í'hLj , a (lum-í hôr-^í f)'rtdní-, a « /*. jí}Cfíit>/Ai'fie co)n. uma rasar*, a ás barbos do regimento dj confie de I^eratuy a « uma dama saixj) ada Dj etc. ^

^ Vr-r S. Vit»-»bo, A civilisação portiig e a dvilisaç'lo espanhola^ Porto, LSí'j; id., l'oísiíis' de autorcs portug. em livros de escritores e^punhocSr Coimbra, l«SO .

"^ IViiiM-wtck, Hist. of. Spanish, eti*., clt., i, 53)t e 3"g -, B. Sanvi- senti, Lef. Sf>aí:^rwola, Milano, li U7, pá^n. 8'J. íí.-K K.2 ; CosUe Silva, Fnsaicf biog -crítico, «'i- . .\, 1. ixv. c. V. MeruMul» z Pidal, Antologia de ProsistasCastei, Madrid Í9I 7, "JTH. K ainda para a iilosofia da < .«cola l'an!lian, Psy;h. du f olem- bourg na Rnr dcs De iix- Mondes do 15 ag. 1.S97 (i Sppnmski, Essai sur V origine psych. des métriaphores na l^ev. Phil. xx, 11. Sobre preLdosísai mo : K Brn- netiòre, Kouv. ét crit.. Paris, 188*2, 24 e sígs. ; L. Ziieca^o, Marinismo, Gon- gprismo e Preziosismo, Ravena, i8%. Sobre ] nfiiiamo: Clarem-e Griflin Chiíd John Lyly and Eiiphuism, 18í»4; De Marehi, Linfluenza delia lirica itat sulla lirica ingl nel. séc. XVII {Nuova Ant., 1 jiilho 18í)6).

Os iiatos da Inquisição, Porto, Ir^Si^, pítf. 95.

* Ecos que o clarim da Fama dá: Postilhão de Apolo montado no- Pégaso, girando o Universo para divulgar ao orbe iiterário as peregrinas fi^- , res da poesia portuguesa, etc. etc., publicadí» pí»r Joseph MaiTgAln de O an, voJb., nb\\H,2, Lisb ^a. O nomo do coleccionador é anagrama de D. José An- gelo de Morais. Vej. Innoc, Dic. Bibl., n, 219. ■;

^ Fe,inx, . . ori obras poéticas dos melhores e^tgenhoê portugiiestê, Publi- i cada por Matias Pereira da Siiva^ 5 tomos, 1715-1728. A respeito desta colo-

OlPÍTUIiO lY B800LA 8K1SOB9T10TA OU OONOÓBICA 33^

Nas conferencias das Academias propunham -se assuntos desta ordem : c Uma dama a quem pedhvlo Fábio uma pren/la^ solfou o cabelo e lhe deu com a mão uvta Jigay> ; outro: « jV convalescença de Amarilis^ ; outro: ^A uma dama que expelindo da hôca uma folha de rosa, que nela tinha j se lhe pôs em sna faceit. Os títulos doa livros han : Desmaios de Maio em sombras do Mondego; ^ Cry^- taes da alma, frases .do coração, retórica do sentimento e amante» desalinhas; ' Histíria do predestinado peregrino e de seu. irmão precito, ' Miis «inda: íhixo breoe^ desengano perenney que o Pegaao da Morte abri o no monte da contemplação em nove olhos di agua i»ara refrescar a nhaa das securas do espirito, . . Ou en- tão: Chrysol seraphicOj Taba co^icinatoria^ Sf/mtagina comjmris- tica, eti-. *

Nrio q\\''V i>to dizor que tudo fô-s^e abíolutMmonf^ td-aw nossa ffcola, n-flí' í*.- {-iilvamlo das prndu';ò*^í< litfMárias qne <1 ah^an^^e. Apcsji" de tji.'ras (^x^r.tVfigrmcin.s, <»ni.vHi'r\-s(» corta o?*///.';?í// /^/'/í'. tiíis xproK>o''s. uiiiíi t>'.I ou qn»! iir^rjxsn -racia n;is íVíi-«-s, \\'\ ^n;^^a8 r^z^-A ni" njo.o -lo s nisabfiri.is f^míi iiíum»-, por entro ri''i M-.;,iar- i ni- nhnr as .-í.m{mi--;ii^ .ito f;i>tidin>íi'^. •.(".■nt» \\i\a dn o^j>írito c (N> t«IfM'*o, rí'|p«n'[i;i 4. .s d!' 11 ';5'^iiiai;'.o ({iio sani in' i^.» |)a.ra n})reciar. í'!a-o f que os m^Il.oies í;il- nf«»s da óooo i vi-aLi í-^n a ritmo^fcrii Jf piovrsao Q«^ l^íjNtn (^11 ro.«-pi'-av m.

Xi p'rt*i-«. Fanlx /tC'.'íf7.sr/r/a íí;» "'i cem os pr'í[<'-' >-. oi)ntj'.'V os ateu t; do. > iíoííiri. s que cW toik.- o.> ia']-»ís M7r;;iani.

Kiiijrir chiiiH HiS *^ íaiiar a vuito! Mas sMTipic ouvi <iiz<'r (i'»'>:.i pi.<'si:\ ( tjM* v»'f-ti(l'» d'- in aj.í'111 p vn'v*».i ;

(^11. ho paiiá car» ivi"- >. o.- ao.n cicsíjola^e. ^

cçSo o»(*rrvo. o Ca^". Ih» iro do Olivoiív. : « W. P, <la Silva, Liv!0.\ro v co tIiijcí na roH n ví» .í<* ladina, era o clin*- tí-r ih rbi vur:i'^\i{,\do. , . (U3\ÍMfi«> ijiití elo jd b5o he Llvr-yro f* Hib^Tnin, cnmo n<'is fl z mho^í, (^uct o^tA iniiit" .\'i(ia {X^-Jo, cn^y»,.., ijne hc iiã') tií'nt nua :i obia, p< rqiu; ii;e:i.ligar snnpio lic <i»'/rii'(' ainila C[ae Seja nicrYilí^ r vfi©f)3, c como cl e <»s não í,nh,i (jue tias omiu»!';!.^ do.s cinio- 8W. julir*» i\n*t «♦*rá «'ontra a gravidadcí dar-sc presentemente a f^-yã [)'.'(iintai'.a «. Cff. iV/rOTOfr'*.'» Insror., polUuj.j et Ixtte.r j etí*. líaya, IT-to, ii, o'i7. ' !)«• l)ií;í' Fi rreira de Figiieiro:i.

* De Oraido de Kscohar. ^ Alexandre de Gnsinào

* Vejam se n aia exs. : em Manoel Iná.no da Silva AlvanMiíia, O Deser- tor^ poema heroí-cômico em cinco cantos (Jojmlira. Fa-am í ii roriii-i-»^ in.spi- <Í09 ettcritofl sob a inHcêncía da Diana de Montemor, ou reí|ainta(l'iM inisfifib^nos CxpOtoti-B eeiii 8*'iência nem arte e através dum vocabulário ii-etatiuioo pi ir vezea i&teiramente cú^niático.

* íenix Henck9Cida, v, 54.

334 HISTÓEIA DA LITBBATU1U POBTUGUÊSA

Mas ninguém viu estes defeitos tam bem nem os apontoa com mais desasBO^T.bro do que FR. LUCAS DE SANTA CATARINA (16i>0-1740) na transiçito para o século imediato. Pela sua crítica irreverente e iconoclaíita íaz-nos lembrar Verney. Vitima em certa cota parte dos vícios que condemna, resgata- se pelo vigor da frase, pela segurança crítica. E' ver o seu tíerào politico y onde os Cultos sam apodados de herejes do vocábulo, de obstmados apóstatas das suas línguas maternfíSj de meninos órfãos do Parnaso^ etc, ^

109. Academias literárias. A semelílança da França, da Alemanha, da Itália, etc, cri iram-se em Portugal numerosas soLMcda- d^.s, u f»aa com o propósito de ap3rteiçoar a língua e a liter^tiira, outras visando o o.agrandecimeito das sciência'*. Essas socif^dadeí*, altçaraas das quais tiveram efémera daray,ao e somenos importância, existiram no nosso p;iís, prim iro do q em várias naçS^s da Europa. Com efeito a Academia francesa oriada pelo cardeal Richelieu é se 1*535; a Acadp^mia real das inscrtcles e belas letras de 1663, e a Acade- mia real das Sclèncias de l\i>is de 16)6; de IJOi.) é a Academia real das sciêncías e hala^-le-ris da Prússia; o decreto que nprovou a Sociedade Real de Lonlres à de 1660; a Acaiemia lieal Kspa- nktda é de 1714 e'a Academia Real de S, Petersburgo d^ 1726. * Mis o t>e'go das Academias mo«iornaí e que deu o modelo a todas as da Eunpi foi a Itália, remontando n,i p^iraeir ts conhecidas ao sec. xm. Em tnin »o de Cosme 'de M'^dicÍ3 (14:70) findou-se em Florença a AcaL P/atmicaem que Hg^irara Marsilio Fie-ini, Pico de Mirandola, Miqiiivelo, Policiano e outros. A m?\i* famosa foi a Crusca fnnda'la tambè n e n Florenya em 15^*i o que, apesar do seu scenário extra- vag'int<% produziu o melhor Dicionário da língua italiana (1.^ ed. 1612; 2^ 162:]; .V, 161JI; 4.*, 17;iS) \ Nós desdb o século xvii tive no-i sociodadc^s liter irias e seientíficas, que podem, p'^lo menos h1í;ii nas, por muitos, dos weus trabalhas, figurar ao lado das congé- nere ? do estranjeiro. Tais sam as Academias do século XVIH, de q"e no Kcu lugir falaremos, mas que foram precedidas neste >éculo XVII por outras, que nao merecem total e -aqueci m mito. Estas nào poliam dar todo o fruto que era de e8p'*rar de associações que se propunhana

' Seram politico. . . Lisl)na, 1723. Esta obra foi publicada sob o psen- dónimo d»^ Felíx da Castanheira Turacem Outra-» obras esn Inoe, v, '2*)2. í*<> Bo'. da Seg. CU di Acad. das Sc. de Lisboa, xii, i918, p% 259 foi pn^l. oma ena Farça Festival pelo 8r. Pedro de Azevedo extraída dam Mss. da Torreio Tombo

* Freire de Carvalho. Primeiro Ensaio^ ob. cit., 177.

3 A Crusca tem sido fort 'inente atacada nos últimos tempos por nSo ter ontinmdo, ao mí*no3, a herança qne re^cebera. Com efeito aa primeiras flí. ^^ 5.* e i. do Dicionário apareciera n o n 1813 e p>r ai ou poinjo mais se fiooa. Cfr. Jm Rassegna^ revista de Florenoj, r.'20, p-íga. 124 e sege.

OÁPÍTOLO IV~E9C0L& SJB18C1NTISTÁ 017 GONaÓBICA 335

altos fins scientíficod e pedagógicos. Nem a educação unilateral e ten- denciosa dos jesuítaS; nem o pavor dos tribunais da Inquisição com as soaâ masmorras e os seas autos de fé, nem a carência das liber- dadea politícas eram atmosfera adequada a trabalhos de espírito scien- tíficos ou literários.

101.— Academias Literárias Portuguesas. Dpixando cqui

uma EÍmpIes referência á Academia dos Anónimos ou Ocultos com- posta de muitos meoibros, alguns dos quais passaram depr>is dela eitinta para a Academia real da história Portuguesa e na qual^se havia versistas, como dizia o Cavalheiro de Oliveira, tambom havia poetas *; mencionando a Academia Instantânea estabelecida no Porto jwlo Bispo D. Fernando Corrêa do Lic^-rda; a dos Solitários insti- mida em Santarém em 1664; a dos Ilustrados, Ocultos, InsigneSj Obsequiosos, etc, importa conh-^cer melhor a Academia dos Genero- sos e a dos SingulareSy como a>» que mais importantes fôrvm e dei- xaram, no meio da extravagância de aH>untos e de estilo bastantes coaaas dignas de registo e aproveitamento.

A) A Academia dos Generosos, a mais notávf»! de todas,

foi fundada pelo trinchante-mór de D. João iv, D. António Alvares da Canha (1626 1690), sobrinho do arc/bi-po D. Kodrigo da Cunha, gnarda-mór da Torre do Tombo e pai U. Luís da Cunha, era 1647, durando 20 anos, até 166^. lubtituííU para interpretar os auto- rtí antigos, reformar a eloquência e a pooj^ia, deixou do funcionar naquele ano do 166S para reaparecer em 16S5 durando de- ta 8on;nnda< vez sete anos sob os auspícios de D. Luís Alvares da Cunha. De novo &cex'ingue em 1692 para resurgir em 1696 durando agora vinte «nos até 1716 B- b o patrocínio do 4.° Conde da Ericeira D. Fiancisco Xivier de Meneses, era cuja livraria b^». cehbravam as sos.^òes aos «lonaingos. XLts nênte 3:** período tomara o nome de Academia das Conjeríncias discretas e eruditas p.ira versar questões históricas e scientíficas. Pouco durou a 4.^ época, porque tende começado em 1717 '^w a preãidência do mesmo Conde pass-u em breve a denominar-se Academia Portuguesa, donde, afinal, saíram muitos d* a í^ócios que abrilhantaram a Academia Real da História Portugu(tsa, q le estu- caremos no séc. imediato.

A Academia dos Generosos íoi nmito celebrada no neu tempo. Dela fizeram parte muitos h"mens ilnstres pelos seus conhecimentos ou pela sua posição social, como D. Francisco Manoel de ]\íelo, An- tónio de Melo e Castro, Luís Serrão Pinentel, Conde da Ericeira

' Mémoires hist, poHt. et litt, cit. *, Progressos académicos dos Anã- ^^os ú€ Lisboa, 1 vol , l7l8.

336 HISTÓRIA DA LITVHATURA POSTUQUÉSA

(D. Luís), Conde de Tarouca, Marquês de Alegrete, etc, A Ac«ademia asava desta empresa uma vela acosa e tinha por mote uNanextín- giieturist \

B) Academia dos Singulares. Dando a razão desta deno- minaçrfi diz-hc no prólogo do livro Academia dos Singulares, «com epítetos p.rticularfs se apelidírào todos os AcademicoB do mundo; Conjiados s(3 cluimáriío os de Pavia; Declarados os de Sena; Eleva- dos «8 de Ferr ra; Injlcimudos o^ ^o Padiía; Unidos o^ d^ Veneza.., á imitação deitas A<;adciniíi?4 notneárào os sujeitos dô^te livro ám- gulares, iiiio porque presumào d(i únicos nos tcilentos, mas porque ^ào fc'in;^ular(\'í mx ocupação...».

K>ta academia colebrou a sua primeira Coníerência era 4 «ie cutribro (i'^. 10i)3 e p^r:liin)u íitó 24 'h' íevereiro de ltíô4; recome- çou tlí'})OÍ^ iu\ Jj (J<i outiihro (l'"'-te último ano concluindo em 19 de írvoreiro d»*. i(j'òò. En>l)l<'ma —uma pirâmide na qual df*>de a bise esttvarn iii(!iitu8 o.s iio)mi- d»* líosm^n), Ariátótole.-J, Ver^ílio, O Mio,. IIor'cio, < 'unto a, Claví-ii >S(\ (rVii^ora e Lope, C'»m a si-^i^iiint^ ií'i'a; « ^í>A/r/'/<' ii.fii ijifSHuiit ]i<rr iivjwimriíta morív. Para dar i-léa do ttôr das (; »ih.'r 'lio í^ bist i .-(brir o^ d.).'s «'mos d'í ( ^mf- reucia*^ e Irr os t'"'inas qut» <n^L•lliialn a!;;ui;-. ('o.*? mi 'is ficam ponfados atrá> *, Mitr ^Imi o bào r^c av.ili'on s<j ]H)y i.->o os trabaUioí^ desta A«'H<im}ua. poj'(jue n iit tudo icvolava i^ir'a! <'xtr vaiíAueií. K tiiito assim que os aiit" r s Mo Dicioa/fio <l(i Acn<lpmia erit-M}'!* ram quo podam -aprovt^ifar o> trabalh.)s do>, ISlnijiihires por <i serem estes os <»ug'*ihos mais célt-br s di sua iil ub^ e p la í.bundancia de voz^s e fríx-s fami!ÍMrc.s qu'» s(» cncMintram ui a mesmos escritos; sen<lo difícil que ^e nos (bq)ar»'m tais locnçòi-.s lôva do estilo jocosério, que c o {)LT(b"Hí)ii.aíit laqueias l(K'Ut;o» s m ^.

('a«ía (^)ía' r. abria co u um di-^curso do Pr<\sidente, Ben^ui.'i-sí? a I( itma vKii^iir.as yjoe^ias om l>uvor dele e citavam os Ai^adíMuicos qu-il(jiu V (.'()iiipo.-i(^'rio poética ^^d)'*p o assunto escolhido para o dia. O 1.*^ Pr'>i<b*nr,e íbi Sf b is^iao da Fonseca e Paivi e a R''<]juir verim Joào Air(^^ (l(j Morais, L ;ís Holli o, J-ao da Costa Cáceres, Si nao (-anbiso V' r.tira, André líodrig-ues do ^litos, António ifarques, P«;dro Duarti* r«'rrào, Joào de Almoida Soares, Bartolomeu de Faria, etc.

l [.(*M D. Fr. Manofl de Melo, Obraf* \íéirícas ii, 146-165; *257-284, e in. iítí;')-, Kdfíar Picstme, D tr. Manoel de Melo. esboço biogr,, 1ÍM4 íÍO0-3í6.

'^ Acad dos Sintrnlares de Lisboa dedicados a Apolo. Primeira e se- gunda p'irte, la.sboa, Ihíiô <i8, 2 vols. Ontra ed. 169J-98, À vols. Vid. tanib»*» D. Fr. .Man< el de Melo, Obras métricas, log cit.

^ Vid. J. Si vestre Kii»pin>, Primeiros traços^ etc, cit., 14.'); id , Hist. dos estabelecimentos scientificos, etc, i. 158; Dic. da Acad, no Catálogo dos autores; etc ; Curso de Lit. Portug. de Andrade Ferreira, ii, 131.

CAPixaLO lY K8C0LÁ SKISCB^TIBTA OC OONGkSbICA 337

POETAS LÍRICOS

102.— Representantes do lirismo no século XVII. En- fermada dos defeitos que dt^ixamos as^ia i lados, a poesia lírica conta, ai-^da assim, nê^td períovio um representante da escol i de J^jrnardim Ribeiro e Cristovam Falcão, mavioso cantor, por qu m o hiicolismo toi Kvido á maior altura e que ó, por v ntiira, o primeiro -os es- criton^s portugueses neste género Francisco Rodrigues Lobo. Ura p<:j.í^rafo distinto figura tamlif^rn como poét:i líri o D. Francisco MauoM de il lo. Outros sam de valor *=5r»cund íiio, que nonioaromos a.l.'..nte era um parágrafo, mas aqu3les dous nora s rc.^^•at:un uraa êf/OCí; e enchera um período.

103.-FRANeiSeO RODRIGUES L050 (lõ^0.iG-> de

Leiria, p'*la suavidade das suas cgloga.s mereceu ser cognoraiii.^io o Tí^rilo português.

Tendo-se matriculado na Universídíide em 1594 bach^^relou-se em lis em 21 de maio de 1G02, como conota dos registos de ma- tricula e dos livros dos actos e graus. Pouco mais sabr^nos da sua vida e e^teó meamos elementos recentemente .sara conli» eidos.

Em (.'oirabra lhe madrugou a inspiração corao consta de ro- mances á vida escolástica e de reminiscências espalhadas j)ída Corte na Aldeia . Após a formatura deveria ir viver para Li>boa no meio dw melhores relações sociais e lit rárias. Quando Felipe lli era 1*319 entrou solenemente na capital escreveu ele La jornada por cansa da qual tem sido injustamente acusado de ca-tellianismo. Indo d-í Santarém para Lisboa morreo afogado no Tejo nos últi- mos meses de 1622. O bispo do Grrio-Pará, 1). Joào de S. José Queiroz, atribue-lhe uns amores com certa aia do palácio do Duque de Caminha em Leiria, se não foram mais altos seus jievsa mentos, Escfive êle referindo-se ao desastre no Tejo: «Queira Deus que tivewe naquelas correntes a de lágrimas para chorar quanto tinha cantado nas ribeiras de Lis e Lena nos loucos amores da aya ou d*ma do palácio do duque de Caminha em Leiria, se nao foram mais altos seu-i pensamentos que, emfim se nào foram de ícaro pircceram íe Phaetonte no sitio da sepultura» *. , . M''lhor conliecid;i c a sua t^bra literária, que se iniciou ainda era Coimbra cora Jlomances,

1 Bispo de Gr3o-Pará, Afmdnfls, Porto, 1868. pl'u^ l-H. C>monta C. Câ»te'o Branco: «eia aqui uma novidade bioc^ráfica. . Com i'A{\^ ir -In ri"s pode ■€rquc um agradável estado nas poc.siaa de Lobo colha alír>'ims in^V iv (.'íaB. . ^hid. Cfr. aa curiosas págs. que ao asdunto d^»dieoa Afrauiv) Peixoto na Poeira ^ Estrada, 1918, 114-159.

338 HISTÓBLà LTBBA.TUaÁ POBTCOUÊSA

quá^i todos, iafelizmentc, em espanhol. * Mas era uma iniciativa, como ele próprio o declara: «como mais afeiçoado á nossa língua portuguesa fui o primeiro que n-Ja cantei romances».

Isto deixa-nos num mar de conjecturas, h que ainda as melho- res inveâtig'i(;oes não conseguiram dar corpo d*^ lialidade histórica.

Mas onde se revela um mestre é nas Eglogas, de que que- remos aqui lembrar a 1.*^ «"Uma novilha dourada», a 3.* cCorao estás, Gii, de^c^nsado» e 4!^ «Ontem quando o sol nasceu», e ainda mais e melhor na Primavera, título geral da>* três novelas pastoris^ Primavera (1601), Pastor Peregrino (lt>08) e Desenganado [IQH]. ' O seu fino gosto bucólico levou Guerrett a colocá-lo na primeira fila dos ebcritores do género e o escritor moderno Hugo Rennert a clasbi- iicar a Primavera como «good as the best of spanish ro maneei ». ^

O Condestabre é um poema épico em 8.* rima e 20 c. tendo por herói D. Nuno Alvares Pereira, parecendo minuciosa biogralia com todos OA incidentais da vida do biografado. *

A Corte na aldeia e noutes de inverno trata, em forma dialo- gada de assuntos variados como da linguagem e estilo (ii, lii, IV, v, viii, ix), novelifttica (x, xi), cortesania (Xii, XIII, xiv) instrução (xv, xvi), mate; ias morais e e onómicas (xv, XVi) ®. A harmonia dos versos de Rodrigues Lobo a elegriucia da sua prosa, o colorido e a vivacidade do seu estilo, sam aí» qualidades primaciais que dee- tingu'*m. Exceptuando (>arauf s, d : Miranda e Ferreira, diz Costa e Silva, Koílrigues Lobo é talvez o escritor que mais importantes e valiobos 8(Tviços prestou á língoa e literatura portuguesa. E Camilo Castelo Branco, elogiando-lhe a pureza da frase, escreveu que êle « nas pinturas dos quadros da natureza distribuo colorido admirável, . aformotícado por uns toques de saudade e tristezas do ermo em que nenhum po/ita português se lhe avantaja, nem em Sannazarro, sea mebtre, os mais encantadores», '

^ Primeira e Segunda Parte, Coimbra, 1596; 2.* ed., Lisboa, 165Í. Sam 31 na 1.* p. c l*7 ua 2/ Sam 4 em portug., 1 bilingae e todos os outro* em esp.

^ Primavera, Liv. 2.°, fl. 5.

3 Sam naincrosag as eds. , mas todas mais ou menos raras. As Obras Completas saíram em 1723 em foi. de 754 págs. e depois em 1774 em 4 voIb., mas que ào iiu perfeitas! A Bibl. Univ. em 1888 deu o Pastor Peregrino teta 1S90 a Carte.

* í/íc spanish pastoral romances^ 1912.

•' Llri])oa, itilO; 2.»-l627.

6 Lisboa, 1(519, 1630, 1670, 1722, 1890.

'^ O l)r. Ki cardo Jorpje levantou um monumento á meaiiSría do Poete do Líd com a yua obra Francisco Rodrigues Lobo, estudo biográfico e critico,, Coimbra, 1920.

CAPÍTULO IV B8COLA SBlSOBNnSTÁ OU OONOÓSICA 339k

104.- D. FRANCISeO MANOEL DE MELO. de Lisboa,

(1608- 1(560) é am escritor distintiâsimo, tendo ensaiado a sua pena em vários géneros e merecendo por isso a denominação de « polí- grafo b. Ã maior parte das suas obras foi escrita em espanhol, e com tal perfeição, qae é cmtado como cláss>c.> nessa língua. N^ nossa fs- ereveu o suSciente para nâo desmerecer dos elogios, que naquela lhe iazem. A sua vida é cortada de aventuras, mal se compreendendo como p>de conàagrarse ás letras pela forma por que o atestam as suas numerosas obras. Soldado do exército espanhol, onde chegou a cbter o posto de Mestre de Camp:>, D. Francisco Manoel aliou sem- pre em toda^i as simaçooi da vid:i a fidalguia do sangue á nobreza. e porte d is ac^es. Dastinguiu-se nas lutas de Flandres e da Cata- lunha e em li)37 foi encarregado d? pacificar os motms de Évora levantados por causa Jo imposto de 50():000 cruzados com que foram sobrecarregados os habitantes daquela cidacie.

Quando rebentou a revolução 1640 abandonou imediatamente as fileiras do exército espanhol e recolheu a Portugal, começando a desempenhar um papel preponderante na direcçíio dos negócios pú- blicos ou pelo seu parecer directo ou por conferencia com os que os dirigiam. Nôste tempo foi acusado do assassinato dum tal Francisco Cardoso e por esse motivo encerrado nas pribões da Torre d ^ B lem durante nove annos \ A inocência de D. Manoel tentada por nume- rosas testemunhas contestes, os pedidos feitos pelas maiores persona- gens da época, como por Ana de Áustria, mãe de Luís xii, se é que as instâncias não foram feitas pelo próprio Luís xiv, de nada vale- ram ão valoroso sodado e fidalgo. .

Tudo quanto lhe fizeram foi trocar a prisão pelo desterro para o Bra^il, para onde partiu moral e fisicamente abatido, sem bens, pois que lhe foram confiscados, e onde esteve durante seis anos. A' vista da intransigência de D. João iv em aceder aos rogos de tantos lados endereçados em favor do ilustre escritor, muitos biógrafos re- lerem como motivo plausível da sua desgraça a aventura noturna. que êle teve nos jardins do palácio da condessa de Vila Nova e Fi- gueiró com o próprio monarca, aventura em que, desembainhadas as tí^padas e lutando, D. Francisco levara a melhor. Cumprindo o seu desterro, veiu a falecer em Lisboa aos òi anos, era 1666.

D. Francisco Manoel é um polígrafo de alto valor ; escreveu a prosa e o verso com igual facilidade, cultivou os géneros histórico, didáctico, epistolar, político, moral, etc.

A primeira obra escrita em português e separadamente publi- cada pelo aea autor é a Carta de guia de casados^ obra de íilosoíia

* A aventara galante que originou a prisão de D. Franciseo, pode lôr-ae Bo prefácio á ed. da Carla, . . por Ç. C. Branco citada na nota iniediáta.

340 HISTÓBIA DA UTBRA.TUBA rORTUOUÉSA

moral, notdvel de graça e Bimplicidade. ' Temos mais ; Epanaphoroi de vária história portuguesa, * que consta de 5 partes: 1) Altera- ÇO08 de Évora (1637); 2) Naufrágio da armada poitiig, era França (Ír)27); -S) Descobrimento da Madeira (1420); 4) Conflicto no tV nal de Ingl. entre as armavS espanholas e Holandesas (í6-i9) e 5) lles- taur ç?io do Pernanjbueo (1H54). Cartas familiares *;a Feira de Anev.iiiH * e Apolocjos Díalofjaes contendo os setijuintes diálogos: a) Relor/ios falantes, em que sam interlocutores um relógio da ci- dade (* outro (la aldeia; h) Escritório avarento, « ntre um português fino, um dohrào ca^itelhano, um cruzado novo e um viut«»»n UHTarro; c) Visifa 'las Fontes j entre a I''onte velha do Hcfi'», •: Nova do Ter- reiro do l*uv'^ Apolo c uni Soldado ; d) Hospital das Letras, entre Justo Lipsio, Bocalini, Quev. do e o autor, que o cou-id-rava pre- cisainent ' como o melhor « e ô-^te Hospital. , . qu> mai- estimo que todos D. A. Herculano assim pen^^ava também: «este é certamente por tidíKs os títulos o melhor e mais claro testomunh da vasta lição de D. Fr. Manoel, bem como da clai-eza do seu juizo em matériau literári i> » ^.

]*Oíloinos ajuizar do valor do seu estro p^^ético, que 6 o dum lírico de muito merecimento, pelos sonetos (100), é<íloi2:as í3^ e car- tas (14), q «e, com outros poeuHítí^s, formam as /Segundas três musas do Môlwlino. ^ No j2;énero dramático escreveu o Autf do Fidalgo Aprendiz, "^ divi 'ido em jornadas á moda de Lope de Vej^a, escrito cm redoidilias, e uma remiucscêiuia do teatro popular^ cuja tradi- ção Ai\ p'ir.iêra com os últimos ecos de Gil Vicente. K^ta comédia é pela, sua c iitestura, pela naturalidade do entrecho e do diálogo, pelk

* Carta. . . para que pelo caminho da Prudência se acerte com a casa do Descanso. . . 15iil. namen sas ed., a de C. C. Bra^K^o com prefácio enri- quecido de (iocs. iiv''dit(j3 é de 1878^ depoig )i4 uina de 18íí8 e a última de 191(5 euin uni et-tt.do de E. Preataeçe.

'^ Liyboa, l<i60, 167<5- Inoe. Dic. .fí/í?/. u, 441 demorstra a í^uperioridâde da 1.* ed

'* Primeira Parte.. . das escritas a várias pessoas sobre assuntos di- versos. Recolhidas, e publicadas em cinco centúrias, Roma, IHtíl. A última carta da 5.^ cent. parev^o ter eido mandada arrancar pelo S.^ Ofício. Por ês^e 011 ontfo motivo é raríssimo qne apareça nesta rara ed. 2.» ed. de 1572. A rcfíTÍ-la Criita. a'jni, é subatitnída por outra.

* Ed. de ínoc. da Silva. Ivsboa, 1875 ; 2.*— 1916. » Eisboa, 17-Ji: 2.a— IVOO em 3 vols.

^ Faz m pa^e das Obras Métricas, 1665 a 1.* e a 3.* p. daa Obias Alétrirns s<m em eastelhano.

"^ Ei-b a^ l')7<). S.\ía ])rimeiro na 2.* p. dag Obr. Mí»ír. *Pnbliqneí-o na minh:i Co 'ecç lo Subsídios para o estudo da história da lit portug., Coioi- b-a, 16'.»^, l V'íl. : 'J.^ ed. líMT). Eeeeutemento o Sr. A fraaio Peixoto 6astení'>a que Aínlière ye inspirou i.o Fidalgo Aprendiz ^o iiompòr Bourgeois gentilhomme. Cfr. Atlântida^ ano iv, bl^ò.

CAPÍTULO lY BSOOUL 0B1BOBCTI8TA OU GOVO^BlOA 341

flaêneia do verão, linguagem rioá e apioprÍAda, um doB docamentos mais carioBOS da literatura dramática poitaguêaa. Das obras em es- panhol é a melhor a História de los mavimientos y separaciou de CcAdíma ', notável tanto pela elegância da frase e profundidade do conceito^ como pela 'sua agudeza e descrição. Rebelo da Silva qae muito se aproveitou duma obra manuscrita e* ainda agora inédita de D. Francisco Manoel o Tácito Português que êle deixou incom- pleta, relativa a D. Jo^o iv *, considerava- o como um dos primeiros eruditos do seu tempo,. e talvez o prosador mais substancioso e oon- ciâo da língua' portuguesa ^. Parece- nos que nfio exagero neste juizo*, desde que um erudito espanhol, como Menendez y Pelayo escreveu ser êle «o homem de mais engenho que produziu a Penín- sula no séc. VIII á excepção de Quevedo *. Mal pôde dar uma idéa <lo brilho do seu talento o que adeante reproduzimos na Antologia.

105. Outros líricos dôSte período. Dos demais líricos ihi^ tempo sóraente importa faz^r aqui rápida menção, visto que êlea OU so afundaram totalmente no vício do gongonsmo, ou não conâegairam libirtar-se doutro o de preferirem á sua própria a língaa castelhana, por forma a terem o direito de que os seus nomes figurem numa história d^ Literatura espanhola. Muitos deles foram mesmo em tudo excepto ni origem castelhanos, pela faltado sentimento patriótico, pek língaa que preferiram e p lo gosto com que escreveram. Citemos: SOROR VIOLANTE 03 CEO (1602-1693) natu- ral de Lisboa, mística exaltada, a quem os seus admiradores deno- minaram a décima musa portuguesa e que nas RytJ^mas várias * « no Parnaso lusitano de divinos e humanos versos ', escrevendo em português, e quási sempre em espanhol se revela disci-

^ Lsboa, 1645. Das donjais ed. citaremos a da Bibl^, Clássica, Madrid,

18^3 precedida dum estudi biogr., e depois 1885 e 191*2.

* O catiilogo das suas obms nus e in?. litaa é muito maia vajto qne o àu impr., denot-^-ndo, poríaato, Uiiia aetividaie extraordinária. Veja se Ed. Prcítage, D. Fr. M. d(i Melo, esboço hiogr., Coimbra, 1914, p.-^g. 184.

' Hist. de Portg , u'. 108.

* Si5bre D. Fr. M. do Mello vid. o preFácio de C. C. Braaco na ed. da Oirta de guia, cit. atrás; ê.ste prefávjio foi pub. na íntei^ra n^ Boémia do Es- pírito, Porto, 1886. Numa Nota correctiva C.C. Branei m-jdifiea o seu juizo e bre as reãponsabilidades de D. Joào iv. Vid. também a ed. da Fdra por Ino^i. cit., e o estudo de Hervsulano no Panorama^ de 1810, págtí. IT-^ e 21)1; e ainda a biografia posta á frentvi da ed. cit. na n. 1. O diátinet ) lasiVUo Sr. Edgar Fre.-?- *ise estadou com amorável solicitada tudo o que diz re.speit'j á bio^ra(ia de D. Francisco no vol. acim^ cit.

^ Hist, de las ideaa estéticas en Espana, u, 416.

^ Raan, 1648 Qiási to ias aa composições das Rytmas foram reprodu- zidas na 2.*^ ed. da Fénix Renascida. ■^ Litbo.v 1733, 2 vols.

22

M2 BxardftzA zml utuutuiu pobtuquAba

pula fervoropa de Qóngora; ' outra poetisa, BERNARDA Fj^RREIRA K^ LACERO- (1595-1644), do Porto, igualmente elogiada pelos s^ns con- temporâneos, * autora das Soledadeê de Buçaco ' e da EspaSía U- hertaday ^ duas obras ambas em espanhol, aquela com algumas com- posições portuguesas, o que fez dizer ao seu contemporâneo L^pede Vega elogiando -a que ela se era pelo coração portuguesa peU lingoa erá castelhana; MANOEL DA VEIGA TAGARRO, de Évora, lió^neiado en teolf gia, ffclecido talvez antes de 1640, que escreveu a Laura cie AnfrisOj ^ colecção de poesias amorosas, onde a inspiração é fundida em moldes nem sempre para def^prezar; MANOEL DE* FARIA E SOUSA^ maib historiador que poeta, e por isso adeante nomeado, publicou & íkiente de Aganipe y rimas varias, * cuja raridade ó notável, ape- sar das quatro edições que conta, raridade, em todo o caso, pouc» para lamentar, porque o livro nâo vale os encómios que lhe teceram os seub contemporâneos; FR. BERNARDO DE BRITO, como Faria e Sousa, maior historiador que poeta e também adeante citado, escreveu en verso a obra Sylvia de Lisardo '^ a cujo respeito houve muitai oonteBtf(ç5es, muito saboreada pelos contemporâneos, contando vá- rias edições, chegando Faria e Sousa a tscrtver que êle era superior a. Diogo Bernardes! A verdade, porém, é qup Brito ebtá hoje justamente esquecido ao passo que Bernardes será lido enquanto hiMYkT gosto literário; ANTOMO DA FONSECA SOARES (f 1682), mais eònhecido por Fr. António das Chagas, nome que adoptou quando, depois duma vida aventurosa, na qual se inclue um assassinato que cometera no Brasil, se decidiu a entrar no claustro, deixou no Po6- Hlhão de Apolo ^ e na tenix Renascida * parte das suas poesias^

* O Dome de ViolaDte do Céo lembra o de dois mtros talentos femini- nos iDspiradoB na rr.ev^rofl corrente mística: Maria do Céo (1658-175^) e Maria Madalena Eufemia da Glória (1672). Benni algumas das melhores eompcsiçòes das três no yo\. xvi da minha colecção Subsídios para o estudo da história da Literatura Portuguesa, Escritoras doutros tempos Coimbra, 1914, 1 voL

' O fan 080 Lrpe de Vega dedicon-lhe a eoa égUga Phyllis. Era Data- ra l do Porto. Vi d. Chr. das Carmelitas Descalços, m, pág. 542 e seg. ; i4ftA. fíist Portug., vil', (1910» pg. 248.

^ Lisboa, ]6^^4. £m poitog. apenas ae poesias a fl. 93, 94, 95, 112. 119, 120 e 121. Na obra algnm as poesias em latim e italiano.

* Parte 1.* 1618; 2.* 1673. « 1627 e 1788.

* Madrid, 7 vols.

"^ Lisboa, lf)í)7 ; outras ed. : 1626, 1632, 1668 e 1785. Sôbre a atriboi- eSo deFta obra a Frei Pernardo de Brito, eepeei«lmente S. Boaventora na fíist. Croncl, e crlt. de Alcobaça, 137 e Inoc, Dic. Bibl. i, 375.

8 Em I, 281: Ji, 211.

» Em IV, 35^372 e v, 72-136 (anónimae). Pobre a vida aventnrt»«a deste «scritor poblicon o Sr. Alberto Pimentel Vida mundana dum frade virtuoso^ liisbca, 18í»0. O spíi rrtrato nos Afiais das Bibl, eArq. de Foririffcd, U, 21acum* panhando o art. «A Livraria do Varatojo».

CAPÍTOLO IV— B90OL4 BE180BNT18TA On OONnÓBIOA 343

ihacaladas do defeito ^ons^rlco. Mais para lourar e estimar é como autor das Cartas Espirituais, em que uma vaga aspiração senti- mental de parceria com certa lhaneza de dizer mui to» agradável. Pena é que, como o seu antecessor nesta corr« nte ascéti a Fr. Agostinho da Cruz, tivesse queimado ao entrar no Convento do Varat«'jo, que fundou, as p ^esias em que o seu estro juvenil ensaiara tomas de amor 6 de vida. Oatros poét s de tendências ascéticas sam: FR. JERÓNIMO VAHIA, fervor». 80 gongorísta de quem aparecem tiumerosas composições na tenix Renascida ^; D. FRANCISCO DE PORTUGAL (15-^5) autor dos Dí- vinos 6 humanos versos * e emfim FRANOI&CO RULIM DE MOURA (1572-1640) que revelou bem as tendências místicas nos Novíssimos, em quatro «antos. '

POETAS SATÍRICOS

106.— Representantes do género, A poesia satírici en- controu em dois poetas deste período os precursores legítimos do mestre incontestado deste géneroj que é Nicolau Tolentino, do século imediato, e a seguir de Fau^tino Xavier de Novais. Sam eles D. Tomás de Noronha e António Serrão de Castro, um e out o evocados á noeaa história literária em edições recentes das suas obras. Ao lado dos dois pode mencionar- se Camacho.

107.— D. TOMÁS DE NORONHA (f por 1651) figura com

distinção entre os insulsos colaboradores da Fénix Renascida [V; 218 a 257}. Era natural de Alenquer f* porque cedo se revelou pela sua veia cómica logo o chamaram o Marcial de Alenquer,

Devia ter falecido por 1651 depois duma vida dissipada nos prazeres e a braços com a mifiéria. Da mais fina linhagem portuguesa, os pergaminhos para poUco mais lhe serviram do que para lhe deaa- gorentar a inspiração. As suas composições poéticas, aparte aquelas em que o decoro sossobra, foram publicadas em 1899. ^ Inspiração ' iácil e abundante, linguagem despida dos paroxismos em que tanto divertiram a sua actividade os colaboradores da íenix, fazem de D. Tomáa unr poeta de leiturs amena e apreciável. E' de crer que haja muitas poesias deste escritor inéditas, recolhidas nas numerosas co-

» Em I, 2l6-a76; u, 290-383; ui, 1-219 e iv, 34-150.

« Ltiflboa, 1652. As 52 últimas paga. intituliim-se: Prisoens c solturas áê ama alma, D. FranciBOo é também autor da Arte de galanteria^ Lisboa, 1682, obra oomo a anteoedente qaási toda em espanhol.

» Liflboa, 1623, e ibid., 1853.

* Na minha oolecção Subsidias para o estudo da história da Litera- tura portuguesa com o titalo Poesia inéd. de D. T. de N.^ Coimbra, 1899.

lecçSea feitas no seu t^mpo, aiada hoje existentes nas Bibliotecas Públicas do país ou em poder de particalaree.

108.-ANTÓNiO SERRÃO DE CASTRO (1610-1684),

foi exumado duro quáae total esquecimento pela ed. que em 1383 C. C Branco fez d'Os Éatos da Inquisição, poema de 2.090 vereoB octoeilabos, tam facetos, diz Camilo, que aa delongas lhes nSo ex&a- rem a veia zombeteira. SerrSo de Castro foi denuni-indo ao tribunal inquioitorial por judaizante, compondo os versos d'Oa Ratos certa- mente para iludir as torturas das masmorras, onde O encerraram, mas escondendo-os cu idad ima mente das vistas dos seus perseguidores. No t. IV da Fénix (lõl a 251) estSo mais versos seus, mas eomo escreva com a espada de Dámocles saibre u cab!.>ça, não reísumam a graça dos escritos eia horas de amargura, quandn a iaspiraçSo corria livres voos. tambPm dele muitHB composiçSes em proea e verso nos dois vols. da Academia doa Singulares, atrás mencionados'.

109. DIOGO DE SOUSA ou CAMACHO, de quem se ignoj-a toHa a bíogriífia, sabfndo-sc apenas que era da vila de Pe- reira, purto de Coimbra, e que sft licenciou em direito, e ex-rceu a advoíacia. J,nse com agrado a sua Jornada âs cartes do Parnaso, publicada pfjstumamcnie na Feníx, [v, 1 a 37], alusiva cm grande parto á monomania gongorista e marinista- da ép''Ca e com ref^rÈD- ciaa a peraonageiíH coute niporíinoas, num desassombro de crítica e mordacidade, que lhe em grande parte o interesse cum queseiè. O verso é íacil, em vários metros, podendo admirar-se o cbiate e a agudeza que lhe não sam estranhos.

POETAS ÉPICOS

110.— Poesia épica, seu carácter. É vasta a galaria

dos ópicos dôste perindo, mas vê-se bem através das suas obras, a maior parte de muito votada ao esquecimento, que distância oa nSo separa de Camões!

Na obra do nosío grande Poeta transparece a alnia dum povo traduzida cm formas épicas e grandiosas. Ele criou por si a cpo- péa e ao Olimpo em que êle se entronizou nSo perraittiram os denaes que, irr^-verentee, outros subissem para quinlioar glória igual. nos épicos do sik-ulo xvn erndiçíío vasta, segura e profunda. A tra*

^ Vid, .iatíiiio liaiã", A inquisição. O poeta S. de C, a persegaiçào fem a uma família, com dm^s. iriid. e virias rectificaçBeH i bíogr. feita por C. C. Iliauco, i,os SerOeã. n." ofi, niaio de 1P08.

CAPÍTULO IV B800LA 8BI8CBNTI0T4 OU OOVGkS&ICA 345

diçSo elásBÍca conhecia-se, os recursos da arte poética eram numero- sos e bem aproveitados- Mas, em primeiro lugar, Portugal tinha a sua epopéa. Á{ estaya a sua história, entre o nimbo do mito e o da realidade. Visões do passado cristalizaram em estrofes inimitáveis nos Ltutcutas. Uma grande alma de poeta, encarnando um povo, aproveitara o elemento nacional. Ora, demonstra-o a história, desde qae a epopéa dum povo se formou, essa epopéa será única. Que restava, pois, aos continuadores de Camões? perdor-se num ritua- lismo subtil, cuidar da urdidura dos seus poemas, metrificar mais ou menos sábiam^^nte. No século X7ii muitos dos poemas épicos sam, qaando conseguem sê-lo pira honra de seus autores, crónicas rima- da"), quando n^o sam unicamente vastos repositórios de empoladiis hipérboles, a desafiarem a mais acendrada paciência. Neste caso estão 08 dous poemas de Manoel Tomás (15S5 1665) a que ele pos os títulos de Insulana ^ e O Phenix da Lusit<mía * ; o Virginidos de Maooel Mendes de Birbuda e Vasconcelos ^; o El Afonso,,, de Francisco Botelho d»5 M)rais e Vasconcelos (1670-17 t7) sobre a fun- dação de Portuí^al; a Hesoanha Libertada de D. Bernarda de La- cerda; Gigantomachia de iManonl de Galhegos (15U7-1665) o Macabeu de Miguel da Silveira * (•}• 1639?); a Destruição de Hespanha, Res- tauração Sumária da mesma * de André da Silva Mascarenhas e oatris e outros. E nbora nSLo isentos de defeitos sam doutro valor os eserítores que em s^s^uida enumeramos, mas o sentimento pofmlar e nacional sabia bera fazer a destrinça entre a obra imortal de Camões e a dos seus émulos e continuadores. Durante a dominação castelhana 08 Lusíadas foram reimpressos trinta e seis vezes!

111. -GABRIEL PEREIRA DE CASTRO (1571-1682), de

Braga, doutor em cânones, além das obras jurídicas ®, que lhe dam lu^r honro?<o entro os jurisconsultos, escreveu Ulisséa ou Lisboa edificada % poema em dez cantos e oitava rima, tendo por argumento o &balodO conto da fundação de IJsboa por Ulibses, Garrett chamou-a

^

* Ânvers, 163Õ. A Insulana trata do descobrimento da ilha da Madeira t tem 10 \iv. OQ cantos.

* O Phenix. . . oa oeclamaçõo de. . . D. Joio IV, Raan, 1649. Ambos os poemas de M. Tomás obedecem ao «atilo cfimpanudo e hiperbólico do Gongo- tnmoj mas a Insulana tem trechos aproveitáveis.

' Virginidos ou vida da Virgem Senhora nossa. . . Lisbon, 1667.

Nápoles, 1638 e 1731 em Madrid. Sobre este porta publ. S. Viterbo o opitteolo Poesias avulsas, Coimbra, l0O6.

I^ieboa, 1671.

De Manu Régia, Lisboa, 1622-2r).'2 vols. ; Mononachia sobre as con- cordias que fizerão os reis com os prelados de Portugal nas dúvidas da júris- àiç&o eclesiástica e temporal. . ., Lisb» a, 1788.

■^ Lisboa, 1636; ootra ed., s. i. n. a.; e 1745, 18J6, e duaa om 1821 «ma daTip. Rolandlaoa e outra da lap. Kégia.

346 HISTÓRIA ÒA LITBRATUBA POBTUatriBA

quixôtica e sesqufpedcd \ epitetos que bem qa^dram a um poema Bem vislumbre de originalidade, monótono e sem interesse -de acção, aonde- afloram afogadas em mitologia, apenas de vez em quando, algumas descrições magistrais. também a notar a abundância daa locuç(!les, a harmonia, o número e a sinónimia, qualidades em que prevalece ao próprio Camões, no dizer de C. C. Branco, conseguindo dar ás formas pesadas da oitava rima macieza e flexibilidade, o que Uie deve ser levado em conta nas máculas do cultismo e nos plagiatoB dos episó lios *. O nome deste escritor anda envolvido numa tremenda injustiça que levou á fogueira um tal Solis e que, a ser exacta, como parece, desonra, para sempre o st"U nome '.

112. FRANeiSeO DE DE MENESES, do Porto,

(•}• 1664) é o autor da Malaca conquistada *,''cujo herói é Afonso de Albuquerque sendo a acç^o passada na metrópole indiana, que deu o nome á obra. O protagonista, bem como as personagens secundá- rias, sam bom desímh-idis; o maravilhoso, ao arr^^pio do uso vulgar, é deduzido das creaças cristas; distin^uera-se, pelo de*'oro, as pinturas eróticas; avnlt:im as descriçS-^s de usos e co.stumes dos povos orien- tais. M 13 e-^tas quali lades aparecfim infelizmente afogadas numa grand<e tibieza de estilo, chagando até ao prosaísrao, numa linguagem eivada de epit*»toá, metáforas e trocadilho-», que bem deixam vêr a pernicioí<a influêíicia do tempo. Garrett afirma que a Malaca é «um dos derradciríís títulos de «lória da literatura portuguê-^a» * ntiO obstante ser hlperhWea e caurpaiiuda^ juizo em que nâo é iam ri^ roso como Dia-« Gomos p-ira quem ela nao passava da «mais inferior das nossas epopeias regulares». O grande desgosto que lhe causou a morte da esposa fez com que tomasse o hábito e professasse no mos- teiro de Benfica, da Ordem dos Pregadores, adótando o nome de Franci>co d** Jí^sui:. Oosta e Silva dá-o como falecido em 21 de maio de 1661 e Barbosa ]\lHchado em 27 do mesmo mês de 1664.

113.— VASeO MOUSINHO DE QUEVEDO eCASTELLO

BRANCO, fie cuja biografia pouco ou nada se sabe, deixou-nos o

^ Cfr. o Bosquejo da hist. da poesia e língua portug., que anteceda o Parnaso Lusitano, i, cit.

* C. C. Brinco. Curso, eit., pííg. 31. *

* Vide KibiMio Ouiuianlívs, Sum. de vária his.; Artur Lamas, Arch* Português. X 24:4; A so úí^mca <k>ste easo and^ em Pegas, Tratado hist ejar. do desacato de Odivelas. ol-3S (Ux ed. de J7i0

* Ma Iara cr>n inistadu por o grande A. de Atbuqaerqae. Poema heróicê. Oferecido a Fdippe III de Portugal. Lisl)oa, 16.'H. Outras ed. 1653 e 1779.

•' Bosquejo, cit., ibid.

CAPÍTULO IT BSOOLÁ SBIBOBHTISTA OU €K>aCl4miCA S47

Afonêo Africano ^ cantando os feitos valorosos de D. Afonso t oa tomada Arzila e Tanger, dama urdidura alegórica, que afasta inteiramente o interesse da leitura. Quase todo o poema se passa na luta entre os Sete pecculoa mortais e as virtudes opostas^ sendo aqueles representados pelos filhos do Qovernador de Arzila « 6itas por sete guerreiros cristãos, que os desb&ratam e os subju- gai ! Alguns críticos classificam a Ulissea logo depois dos Lusiadqê mas, diz Rebelo da Silva, se entre os poemas existe um ao qual possa caber a honra de- tam alta classifícaçãi o Afonso Africana telvez sej i o que a mereça, apesar das nódoas que em muitos luga- res o desfeiam.

114.— ANTÓNIO DE SOUSA DE MACEDO (16061682)

antural d » Porto, doutor em direito civil, e secretário d^. estado de D. Afnso VI, foi tentado a rimar o assunto banal escolhido por Ghi- brit*l Pt*reira de Castro a fundaçlla de Lisboa pop Ulisses fábula a que Cam5es aludira nos Lusíadas^ * mas fe-Io, m>iis atiladamente que aquele no s^u poema Ulissipo em treze cantos e oi*ava rima. Das obras em prosa as mais estim^idas s>im: as Flores de EspalSía, RxceUiicifUl de Portugal, * obra escrita em espanhol, e Eva e Avé éu Maria triunfante, ^ em portuguêH puro e muit) corréto. As obras de António de Sousa de llacedo revelam uma erudiçílo pou^^o vul- gnr. * Na Ulissipo excedeu Gabriel P. de Castro, nao no estilo que é meros brilhante, mas na originalidade dos episódios e no gosto mais italiano que espanhol, main á Marini que á Gói^ora, c »mo diz Costa e Silva. Kruditííj>i^no, foi também um político muito )il tend> pres- tailo imp .rtantes serviços ao País. "^

* Afonso Africano: poema heróico da presa de Arzilla e Tanger, Di*- rígido a D Álvaro de Sousa, Capitão da guarda alemã de Sua Magastade, etc. Lisboa, 1611; outras ed. : 178» e 1844.

* Cf.nt vnâ. est. 4.' e 5.*.

' /.ishoa, 1640; entra ed. 1848.

Fhres. . . en que brevemente se trata lo mejor de sus historias y de todas las dei mundo, desde su principio hasta nuestros tiempos^ t se descu- bren muchas cosas nueuas de prouecho, y cunosidad, Lisb )a, 163 ; 2. ed.

^ Eva.. . Teatro da etudiçlo e filosofia cristã. Em que se reptesentão os dotts estados do mundo : caldo em Eva, e leva atado em Ave 1.^ e 2.^ parte* LiáboÁ. 1B76. Outras ed.: 170), 171 1, 17 6, 1720, 1734 e U^\

Outras obras em Matos, Manual, 539 e Inno^j., Dic Vd. t^imbêm Arqaivo Htoresco, 1S*>1-1863, p4gs. 301 3ti8, e F. Deusdaio Educadores Por- tug,, 307-312.

' Vid. Edgar Prestage, O Dr. A, de Sousa de Macedo, Residente de Portugal em Londres, Lisboa, 1916, (com retr^ito) e Duas cartas,. * escritas di Ingl., ibid.

3'I8 HI^TÓBLà DA LimUTURÁ POSTUGUÂSA

115. -BRÁS GARCIA DE MASCARENHAS (lõ96-l

natural da vila de âtô^ junto ás Diargens do Âlva^ na comarca de Arganil. Obrigado a expatriar-se viajou por Espanha, Frarça^ Itália, Flandres e Brasil, Toltarido pusFadc s anos a Portugal. De gé- nio belicoso e cavalheiresco organiziu e dirigiu por ocbisiào da rí*vo- loção de 1640 um batalhão de voluntários conhecido por Companhia dõ8 lides^ e tomou conta da praça de Alfaiates no concelh'»- de Sa- bugal. Preso e encarcerado por D. Sancho Manoel, general-comíín- dante da Beira e por este acusado de traidor á pátria, o de.*^graçado poeta obteve a liberdade conseguindo £izer chegar ás mãos de D. João iV um memorial em verso, feito com as letras arrancadas a um Fios Sanctorum e coladas a uma página em branco do ra*^snio livro. Escreveu, àlêm doutras obras perdidas, o Viriato Trágico publicado quí^rf nta e três anos riepois da sua morte, poénáa era vinte cantos e oitava rima, qne Costa e Silva considera como a nesga pri- meira epop(^a de segunda ordem, notávf 1 ainda pelo pintoresco dal- gumas detcriçoes, eobretudo das de abbuntos militares ^. Brá^ Gar- cia soube ala^tar-6e prudentemente da influência espanhola. A sua obra foi plagiada vergonhosamente por André da Silva Mascare- nlias, no pcêira Destrtiíçào de Espanha (1671), bem longe de pen- sar o plagiário que, passados vinte e oito anos, com a impies^HO do Viriato semelhante vileza ficaria posta a *.

POESIA DRAMÁTICA

116, Teatro no século XVII. O teatro português no «éculo XVii acu^a uma deplorável dei-adêr.cia originada na pRrda do- elemento tradicional, que tinha feito a gloria das composiçòos vicen- tinas e a dos seus imitadores. A influência espanhola exerce-se soberanamente. Os portugueses tomam gosto peias comédias caste-

* Cfr O Passeio, ed. 1945, notas, pág. 9. Eis as palavras deste autor : «... esta Epopeia [ Viriato Trágico], boje absolutamente desconh^icida era di- gna de melhor f*do. M;ís por desgraça foi envolvida na proscrição geral, ful- minada contra os Seiscentistas pt los Árcades, Restaurado -es da poesia e do bom gosto entre nó-»... K comtudo entre oa escritores fio se ^nlo st^iscentos havia muit<^8 poetas de grande talento. . . e nas soas obras apresentam grinde náinero de belezas, que podem bem resgatar os defeitos do tempo. Neste número cooto •Q o Viriato Trágico, qne tenho pela no-sa primeira Epopeia -de segunda or- dem . . «

' Ed. de 1696, em Coimbra, oficina de António Simões, impressor da. Universidade, 2* ed., 1846. TJsboa. Pnra a biog. do poeta o estado do Vis- conde de Sanchfs de Frias O Poeta Garcia, drama histórico, Lh-boa, 101, mas a obra definitiva fundada em dados críticos incontroversos é a do Prof, Dr. Ribeiro de Vasconcelos, c^meçada a publ. na Rev, da Univ, de Coimbra, i aegs»

CAPITUr^ IV B8C0LA 8Bl8CltNT18IA OU OOKOíSrICA 849^

lhanas e deBoaturalizam o teatro. Lope de Vega, Calderon de la Barca, Tyrso de Molina; forneciam as diversas scenas da Europa. Nilo era, pois, de estranhar que entrássemos, nesse número, nós, que tam íntimas relações politicas e- sociais mantinhamos com a noâsa vezinha Espanha.

A Lisboa, onde n?lo havia a corte, concorriam os come- diantes espanhóis atraídos pelos viso-reis do seu pais e representa- vam naturalmente os dramas dos seus compatriotas.

Escreveram imicamento em castelb ino muitos portua:uesea notáveis como flatos Fragoso, António Henriquez Gomez e ]\[anuel Freire de Andrade, ^s coméíiias eram divididas fm jornadas^ e os Pdteos, que assim se denominavam os luj^ares onde se representava, enchiam-se de povo, ávido do espectáculo. O primeiro teatro regu- lar de qn"e noticia foi o Páieo das Comédias, a que se seguiu depois o das Fangas da Larinha e o da Bitesga ou da Moiívaria ^. Assim se perdera toda a tradição nacional. E quando não era o toátro em espanh' 1, era o teatro era latim. Os jesuítas julgaram dever intervir, como procesf-o educativo, nas representações dramá- ticas. Como exercício escolar, passatempo e modo de adquirirem fama para as suas escolas, faziam representar pelos alunos dos seus Colé-jios graves e pesadas tragi comédias, que levavam dois e trôs diâs a representar no meio dum aparato scénico verdadeiramente espantoso. Pode ajuizar- se da obra dramática j^^suítica pelo vol. denominado Tragicae, comicae que actiones à régio artíum eoUegio tocietatis Jesu datae Conimbricae in puhlicum theatrum ^ de Luís da Cruz (f 1604) onde se encontram as cinco tragédias ' Prodigus (1-213), Vita Humana (.17-441); Sedecias (445-1)34); Manass,es (tíâ7->í28) e Josephus (831-1050). Foi talvez em 1550 para celebrara vinda a Coimbra de D. Joào iii, seu protector, que os Padres do Colégio das Artes ensaiaram ai.* ppça recitada pelos estudantes na presença do'rei *. Em outubro de 1570 D. Sebastião rep^^tiu a visita do avo à Lniverrtidade, vindo acompanhado do Cardeal D. Henrique. Repre- sentou-se a Sedecias ou Destruição de Jerusalém por Nabuco, que dumu dois dias acabando coberta de louvores *. Os Colégios de Évora e Lisboa ostentavam iguais exercícios, sendo de todos o mais apa-

' Ami^ry Morato. Mem, sobre o Teatro Porgiiès lida em 24: de Julho de 1817, V, 4Í5 Freire de Oliveira, Elementos para a hist. do Município de Lisboa, 111, 40, n. 1 ; Júlio Castilho, Lisboa Antiga^ u, 136 [da 2.» ed., 1904].

* Ladgani, apud, Horacium Cafdon, 1605, 1 vol.

' E nsio quatio domo diz Barbosa x\f achado, Bibl. Lusit,^ verb. Luís àa Crus.

* Sr. Dr. M. Siraõee de Castro, Notas àcêrca da vinda e estada dtel-rei D. João 3.^ em Coimbra no ano de 1550, Coimbra, 1914, 1 folh.

* J. Pereira BaiSo, Portugal cuidadoso e lastimado^ Lisboa, 1737^ pig. 170 e sega.

<350 mSMTÓtLíA DA UTBIUTUBÁ POBTUauftSA

ratoBO a representação da famosa tragi-comédia Conquista do Oriente jx)r D. Mamml poata no palco de S.*** Antllo em 1619 |jara festejar a entrada de Filipe iii, que assistiu por dois dias consecutivos (21 e 22 de agosto) com as infantas D. Isabel e D. Maria, ouvindo nada menos que 350 personagens, ao meio de coros, máquinas, tranioias e as mais custosas d^^corações. Sabendo que D. Sebastião apre -iava as comédias de Gil Vicente quiseram afastar dos ouvidos do infeliz rei e dos áulicos quo o acompanhavam as liberdades densas come das ridictdas e sem gasto, como as apodavam homens graves e conspicuoe «w letras *.

jesuítas JcSo da Rocha, Domingos Teixeira e Pedro de Vasconcelos, compuseram também trabalhos dramátic4'S, que foram desempenhados na seena pública, E' do primeiro a tra^éiia intitu- lada JDaniel, do secundo a é;iloga intitulada Pastor David repre- sa ntadu em 1618, e do úl^ino a ptçi que el iht tuiou Dares e Kntellus que hubiu á scena em 1629, todas ainda inédit&s. Ti- «en- saboms »'8tHV..m -longe de 8ub-t»tuir «ifl coméliis di- Gil Vtcente, AtonHO Alv«re8, Balt«8ar Dias, António Ribeiro Chia-lo e de outros, lançadas no Index expurgatório de 1624. Debaixo de tais influêa- ciíit^, como pO'1«'riíi dv^.s. nvoh' r-se o t atro n<iCÍonal? ÍV p >r Í!*íío, que, tirand» o Fidalgo Aprendiz de D. Franoi.joo ^Unuel de M»-l<> na Ia de belo neín qu^i tiiobr^ç* a época jiode apontar-se no t áiro do fié- culo presente.

Kntre o j)ovo havia ainda as funç()es devotas em que o divino se tonfundiri com eousats n»und;inrtHi s^invjo muitas vezes n s pn ciesSea mulher<-s j)ouco honestas i-ni figuras de santos e arinaTsdí^-íír-í "nas igpfrjas e eiíprJaH tablados, onde se repre6ent:ivam i-ut' s e forças acompanhados de canti^ras e d»* d iiçis. Chegou a. abusa» -m* tanto que n(>s autos de SM^ Barbara <* SM Catarina se r^^prortiv/i i no t atro a ceriuió ia d»» bati -mo <• n<> auto d;i Paixão Ar Fri»ncií*co V...Z os av^tores e o púuliío ajoeihavaní tm certaB sct^nas! *

HISTORIADORES

117.— Carácter da história nôste período. Nào faltam

os hi t<';iadoreH rie>rt; p^ríod'^, jfíiins dôNs, prini-if» Irne^tt* <»s que viveram noa prinít^iros anos Af^ f-écuL), di<çnori pueensurt-s df» ã> de Barrr« <• Dtnnào d^ Go^^s. XJwíi quíilidí'de ir^TtílíiS OHr«<t' rizH a faltrt dn himfíl.» idí d^^- que é Mib-tituidA pela af»ttHç3io r tórioa t* pelo

^ V'id. o Prefácio áa^iriUdas Trn^icae. . . actionêS,

2 O ant» de F. V. intitula fo: Obra novamente, feita da muito dnlorosa morte e paixio de, N. S. J. C. feita por um devoto Padre, chamado F, V, de Oiiimaràes, Li boa, lôfíQ. Cfr. Inoc, Dic. Bibí , iii, 75.

0APÍT0X.0 IT B8COLA SBISOSHTISTA OU OOHCkSbiOA 351

cuidado excessivo dado á forma, o que os recomenda mais como estilistas^ do que como historiadores, quando os não expunge da lidta dos bons mestres da língua.

Como vimos, alguns dos cronistas do século precedente íOram ^andes investigadores, vi^tjaiites audazes qua. se não pouparam a fadigas para autenticarem o que escrevt^ram. Dia paixão, a vida e o calor que animam as suas narraç3<»8. Os historiadores do sé- calu xvíi sam, príacipalmente, fradas qu ), alheios á luta das socieda- de-8 onde se desenrolam os acontecimentos, burilam friamente; sere- oamente, no silêncio das suas celas, as irases «elegantes, os períodos aonoroB, as rendilhadas expres^d 's que traduzem os factos que outros lhes fornecem. A situação histórica também os não favorecia. A de- sastrada expediç-ão de Alcáctr-Qê^nr lançou-nos numa atonia pn>fun- áa. A glória de muitas bat^lbris» e conquistas como que se eclipsara noa areais de Aíri(*4i. Era preci-o, escrevts Ferdinand Denís, que em- pregassem cores. mais vivas para fazpr comprecn'ler aoh homtns do s^ulo as impreshoes que tinham devido redentir seus antepassados ^.

118. Fr. Bernardo de Brito e seus continuadores.

FR. BERNARDO DE BRITO (1508-1617) chaniadc, ant-^ de professar na mustfliro de Alo«íbaç-i, Biltusar de Brito e Anlrade, ii^tu de poeta, como di-semiiH, f,i historiador, t^^nHo cacrito a Crónica de Cister * e os Elogios dos Reis de Portugal '. Como iTo?íÍ8ta mór do ' reino qu j fá. tMcrevcu a 1.* « a 2.* parte da MoTiarquia Lusitana * depois continuada por ANTOMIO BRANDÃO (3.* e 4* purttO ^ FRANCISCO B:UNDA0 (5.* e G.*) \ RarHAEL D: JESUS ( 1 1693) (7.*) "^ e MANOEL DOS bANTOS (8/) \ Tantos ar.|Uiteetos em vtJta do ^ran lioso monumento consegnirain tam •ónrentft d»*buxar-líirt o8 alic.rcs. E como nSo seria assim se o ini- cia or, como Garibay que começou a história de Espanhji com o

> Résumé de Vhist. litt. du Portugal, cit , pá^^. 804.

* i limeira Parte e única |)nbliea(ia, LÍ8})oa, 160J; ontra 1720, ihid*

3 164 3, 172í>, 1761, 1786, 18'25.

4 1.* p. Âlcob»ça, 15 7 ; 2.* od 1690 e reímpr. na Col. dos principais autores da histor. portug., Lisboa lHO^i, b voU. ; 2^ p., Lisb >a, l<>09', 2." «d., 1690 e reífnpr. na mepina Col., Lidb'»a, 1808 1809, 2 vola.

3/ p. Lisboa, i632, 16í>0p 1806; 4." p. 1632 e l72->.

» 5/ p. Lisboa. 1650. i752; 6." p., 1672 *' 1751.

' Lisboa, 1683. E' tambêin antor do Castrioto Lusitano, Lisboa, 1679, •f>bre a guerra entre o Brasil e a Holanda, de tiouimos valor, eonio tiuio o qne ^eiion.

* Lisboa, 1727. Fr, Manuel doa Santos é mencionado no .st''(!. imediato.

* Croni^ esp. 1525 15í>3 bibliotei-ário de Felipe, n autor de Ixts qiia- ^enta libras dei Compendio historial.,. (l'>28. 2vol3.\ obra sim crítica na p.iite conaagrada ás origens de Espaaba.

352 HISTÓRIA DA UTCBATDBA POBTCGnftSA

dilúvio universal y deu principio á de Portugal com a criação do mundo f ! O trabalho de Fr. Bernardo de Brito termina com a vinda á peningula do Conde D. Henrique, quer dizer, termina, pouco mais ou menoS; onde devera começar. Não há, porém, razSo de lamentar o estorço dispendido por Brito, dada a falta de critério histórico qu^ se revela em toda a sua obra e que o levou a fazer- se éco de quantas lendas a imaginaç^ ou a fantasia haviam sugerido. Nove anos depois da impressUo da 2.* parte da Monarquia Lusitana, mas no mesmo ano em que Brito aparecia nomeado Cronista-roór por Filipe 11 em 1^)16, publicava Diogo de Paiva de Andrade, filho de Francisco de Andrade, CTonista-mór do reino, um livro intitulado Exame de Anti' guidíldes (1616), apontando a falta de verdade histórica da citada Monarquia ^. Embora despeitado, diz -se, por nao hav^r sucedido, como esperava, «o pai, é certo que a crítica posterior d"U razão a Andrade. As cartas de sujViçao e ft-udo de D. Afonso Henriques a Santa Maria do Ciariival e á Snnta vSé com a reí»p>8ta de protecçJlo e reconheci m*-nt'> do título Rial do Papa Inocêncio ii, a carta de S. Bernardo a D. Afonso ILnriques com a profecia comin-ttória de fazer dep^nH^-nte a sorte da Mí^narquia da integridade dasVendas de Alco- baça, nào rf*8Í8tem á ciiti -a dt< João Pedro Ribeiro. Em frente de todas as autoridades perdeu qualquer crédito, como o perdeu Gaspar Alva- res d*' Lrusadíí, que f >i cooperador d^il^uns d »s seus embustes, aca- bando A. Herculano por o colocar fora das autoridades em matéria histórica. A per.-íonalid^d-í de Brito salva- se «ÓTiente com > estilista. A ]infruag<'m é geralmente correcta, sam belas as suas descriçSes e belo é também o vigor com que desenha os caracteres das. suas per- S()nafí«'ne. Mas é tu io, e i«to nSo é ainda sem reservas, porque a lin- guagem dele nao escapa á pecha do cultismo e fica g^^ralmente fria e sem interesse, distanciando-se, por ex., muito da de Frei Luís de Sout^a ^.

D.>« continuadores d' Brito é de justiça destacar o vulto de ANTÓNIO BRANDÃO (1584-1637). A consciênoia e exactidão dos factos que 8 í encontram na 3.* e 4.* p irt^ da Monarquia, obra sua, fize- ram dizftr a fÍArculani ser ele uma das mais nobres {ntêligências que Portugal tem gerado e um ilustre restaurador da história pá- tria, e o homem que mais atingiu o espírito da sciêneia histórica^ excetuando António Caetano do Amaral e João Pedro Ribeiro *. E a Rebelo d^ Silva: ^<0 belo pórtico rasgado pela pena criticado

* A Diogo de Paiva de Andrade respondea o colega da mf^ma ordem Fr. Bernardino da SíIvíí nos dois volumes Defensão da Monarquia Lusitana publicados em 1&20 e 1627, que não ievantarauí a obra ao conceito que êie se propunha, «embora ningaêm sustentasse melhor a causa». Panorama^ i, lí>.

* Bispo de Viseu, Obras, n, 162. 3 Opúsculos, V, 102.

OAPÍTnX^ IT BfOQL4 8B18CB2IT1BTA OU OONCKSbÍOA 353

sábio religioso na parte, infelizmente curta^ qae lhe cabe na Mon. Lu8. ficoa aberto e desamparado, porque nenhum dos que lhe suce- deram foi capaz de lhe seguir o plano severo acompanhando em lan- ços de igual solLdpz a construção durável que êla tinha desenhado e empreendido» '. Diante de tais juízo» nSo parecerá de todo exagerada a aármaçSo de Fr. Fortunato de S. Boaventura quândo cla^bificn o exemplo de BrandSo como a uma ef^p^cie de fenómeno literário». * Conceitos semelhantes na pena de tam judiciosos esmeriladures nossa primitiva história dam a medida do valor de Antóoio Brandão. O pe- ríodo que êle descreveu e que vai desde o Conle D. Henrique até D. Afonso III, põe-noB em presença dum espírito de vasta erudição, fiizendo uso duma sciência histórica e dum método ciitico verdadeira- mente superiores e dignos de elogio.

119.— FR. LUÍS DE SOUSA (1555-1632), de Smtarem, é dm dos mais "dêlíí'adÔ8 estilistas que conta a lín^a portuíruêsa. Antes da sua protist^ão religiosa chamava se Manuel de Sousa Cou- tinho. Mditou na religião de Milta, est-^ve prsioneiro dos Mouros e foi levado cativo para Argd. Btrbasa Micha^lo afirmou, Sr^m fiin la- mento algum, que nêàt*% cativeiro tivera o nosso prim írosr» cítcri»^ >r estreita amizade com Cervantes, em testemunho do que êltí o intro- duzia num episódio da sua novela Trabalhos de Persiles e Segis- nmndo. A lenda, a uma análise criteriosa, desfi^z-se dí^pressa. Reaiquirida a liberdade ao fim de quá^e ura ano voltou ao reino e casou com D, Madalena de Vilhena, viuva de D. João de Portugnl, filho de D. Francisco de Portugal, 1.^ 0-)nd5 d') Vimioso e que ficara nsoito na batalha de Alcácer-Quibir. Vivia na vila de Almada onde era coronel de 700 infantes e quase 100 cavalos quando, para não bospedar os governadores espánhoes * que então eram do reino e fugiam da peste que grassava em 1577 em Lisboa, lançou fogo ao pró- prio palácio. Expatriou- se para fugir á vindicta dos inimigos ^ e, legressando á sua casa de Almada, ai, no remanso do lar, em companhia da esposa e da filha única se entregou aos cuidados literários. O falecimento desta filha levou os p«is a procurarem no claustro um bálsamo aos corações alanceados. De comum acordo

* Obras completas, xxx, 52.

^ MisL Crón. e crítica. . . de Alcobaça, 77.

' C. Castelo Branco Curso, ii, 280 e Inoe., Dic. Bibl., xvi, 72.

* Eram D. Mignel de Castro, arceb. de Lisboa; D. João da Silva, 4.° Conde de Portalegre, mordomo mór; D. Fr. de Manicaninhas, Conde de S. t^ Craz; D. Duarte de Caatel-Branco, l.** Ctmde do Sal)ngal, uieirinho-mor do reino, e Miguel de Monra, Escrivão da puridade.

* Q Partindo para Madrid a informar o rei do procedimento que í^e nsdra pira com êle e do modo por que, perdendo a paciência, se liavia desagravado. €onhec€Ddo-«è a sem-razSo de quem o havia provocado, foi atendido».

354 EJBTÓBIA DA LITBKATUIU POBTUOcASA

vestírani o hábito dominicaiio: Coatinho no convento de Bmifica e D. Madalena no mosteiro do Sftur^m^^nto» Tado quanto se refere ao a pareci mento de P. Jo2Lo de Portugnl é pura lenda, que 86 teve o mérito de inspirar Garrett no primeiro dos seua dramas '. Foi em *1641 que Coutinho inidon a sua vida claustral, adótaodo desde logo o nome de 2^r. Luia de Sousa. no isolamente da cela 6 em obediência é que èU poliu e aperfeiçoou os materiais, que Fr. Luís de Cácf^as reuniu durante mnis de vint«) anos de pacientes in- TCStigHçoes bôbre a história do seu convento e a vida do arcebispo de Br:Hga, p^^rmitindo assim a Fr. Jj^iié de Sousa escrever «assentado, quieto e et^condi^^o no cauto da c^la». Não eram incontroversos os dados qnt*. Cácegas juntara; por sen 1/ido Fr. Luís de Sousa ocupado na Buperíicialiiade do estilo nfto tratou de os depurar no cadinho da veracidade. A obra ressente se por isso do descuido dos dois. A Fr. Luís oabe a glória de ter revestido os informes materiais do seu in- vestigador com as roupagens dum estilo elegante, fecundo e cheio de naturaliH>td '. As suas obras capitais sam:

Vida de D, Fr. Bartolomeu dos Mártires ■. História de S. Domingos ',

Anais dei rei D. João III *.

As duas primeiras revelam o assombroso e finissimo burilador de frase que foi este escritor, qun é um orgulho das notsas letras^ mas nSo assim a última em que o assunto tratado por J. de Barros nas Décadas, por F. de Andrade na Crónica do mesmo rei, e por B^^mardo Rodrigues nos Anais de Arzila ^ ne arrasta por vez^^s numa c série de apontamentos», como disse A. Herculano, se alteiando 6 sendo «digno de si mesmo» quando a matéria acordava dentro dele

' Cfr. especialmente S. Viterbo, Manuel de S. Coutinho.,. Lisboa, Í902.

« Vida de... da ordem dos Pregadores, Arcebispos & Senhor de Braga, primas das Espanhas. Repartida em seis livros com solenidade de sua trasla- dação . . . Por Fr. Luís de Cácegas, etc. Reformada em estylo t ordem e ata- pleada em successos & particularidades de novo achadas por. . . etc. Viana, 1619. Outras ed.: Parig, 1664 (Boi. BibL Port. i, 58) e 1760, 1763, 1785, 1818, 1850. Rolandianas 5 eds., a última de 1857.

^ Primeira Parte da História de S. Domingos..., etc. 1623; Segunda Parte... <, 1662; Terceira Parte..., 1678. E^ta8 três partes, de Fr. Lais de í>0Qsa, com uma 4.' oe Fr. Lucas de Santa Catarina, andam impr. muna ed. de 1767, 4 tontos; outra ed.: 1866, 6 vols.

^ iublicadoa por A. Herculano em 1846, 1 vol.

A vida do beato Henrique Suso . . . nao parece ser de Fr. Luis de Sonsa, mas do dominicano Fr. Pedro de Magalhães, como se pode vêr no Catálogo doa autores, que precede n Dic. da Acad , fág. oxlv e Idoc,

^ Anais de Arzila, Cr. inéd do séc xvi, publ. por ordem da Acad. das Sc. de Lisboa e sob a direcção de David Lopes, 2 vola., 1915-20. Sousa teve em Bou poder um Mss. pertencente á Misericórdia de Lisboa-^ /n//otf. xxu, qn^ aproveitou nos 19 caps. que consagrou a Arzila em tempo de D. João xn.

eAritVho iT MooLX saucBstisTÀ ou ooMOÓBiai 35S

a memória do soldado, fidalgo e caraleiro qoe fura antes de envergap a estamenha de monje.

120.— MANOEL DE FARIA E SOUSA (1590-1649) es-

critor fr candiFHimo, de quem &e conta que escrevia diariamente doze folhas de papel de trinta linhas cada uma; quase tudo em espanhol^ interessando-nos por isso unicamente pelas informaçõ s que sobre cousas e pescoas de Port'jgal deixou.

Essis ohr< 8 sam: os set^s vols. em verso Fuente de Aganipê- y rimas váriaSy não melhores que as dos confrades e talvez p<â)res pelo contumo que tiveram ^; as históricas Epitome de las histórias portugttesas, a mesma que saiu mais tarde refundida 8ob o titulo: Europa, Ásia, e Africa portuguesas ; e os trabalhos de análise Lu- ttadoÃ,.. comjnentcidas '; e Rimas várias de Luís de Camões com- mmtadas '.

Band«ado c^>m Castela viveu na esperança mal recompensada, dcs favores de Felippe ii, que incensou, bem como a Cristovfto de Uoura. Operada a restauração de 1640 deixou-se ficar em Espanha so serviço de D. JoSo iv. Começando como renegado acabou por ser espião^ epítetos justos que infamam a sua memória.

FerHinand Denís escreveu que ele se desdenhou a língua na- cional, p<*rmaneceu português de eoraçfio ^; mas i ciitica imparcial custa bubscrever êdte juizo, embora o veja elogiando a valentia dos porta^neses em Aljubarrota {Europa, ii, p. 3, c. i, pág». 277-282), ou exaltando a nobreza de carácter de D. João i e do Condestável (lbid'j pág. 269) e explicando mesmo a razão da encolha do caste- lhano para a elaboração dos seus livros (no Prólogo da Europa). A lua simpatia pela política dos usurpadores tórna-no Io naturalmente iQspeito. De modo que pela linguagem, pelo estilo culteranista que adótou. pelo meio histórico em que viveu e a que se bubordinou, a fertilioade deste atftor redunda' em qnáse pura perda para nós e nãa pouoo menoscabo para a glória própria dele.

121.— JACINTO FREIRE DE ANDRADE (169M657) ó

dos escritores que figura na Fénix Benascida ^ e se medincre é a teU valor come» poeta, não é muito maior como prosador, segundo se da Vida de -D. João de Castro *, excurso biográfico em que a

' C. C. Branco, Curso 43,

t Madrid, 2 vols. 1639.

» 5 vols., 1.*» 6 2.«, Lisboa, 1685; S.^, 4.^ 5.% ibid., 1689.

* Ob. cit 367.

» T. ui, 274 281

* £d. IH&l. Das muitas ed. é mais (^dtímada a da Acad., de 1835, de ^ue foi encarregado o Cardeal patriarca D. Francisco de 8. Luís, qae lhe ajon- tOQ muitas notas e vários inód.

'356 HI8TÓBIA DA LITBBATURA POBTUGUftBA

rigor IiiBíórico nem sempre é norma, correndo parelhas com a lingua- gem artificiosa, cheia de trocadilhos de mau gosto e falsa no desenho das personagens, a principiar no do protagonl^ta mais bem caracte- rizado por qualquer das carta» qu*) ele próprio etfcrtrveu * do que pela longa e monótona exposição que o i«eu apologista nos legou, t histo- riador enfático e sem íilobofia, mas consciencioso e instruído» na frase de Quental •.

122. Historiadores menos importantes. Citemos ncbte

número, entre outro-, FR. ANTÓ.^IO DA ENCARNAÇÃO (f 166^) a quem devemos as Adiçdes á História de S, Domingos de Fr. Lni-i de Sonaa e a Vida de Fr. Luís de Sousa »; MANOEL SEVERIM DE FAilA (15«3- 1055) que nos Discursos vários politicus * traçou cuidadosampnte as biofirrafi.48 de Camões, de Joào Btrros e de Diogo do Couto, k nas Notícias de Portugal *, forneceu mteressantes informiÇÕes p líticas, e outras reiativi*8 a familinn nobn*B, a moedas que tiveram curso «m Poitugnl, bioírrafias, etc; D. FEfiN^NOO DE MENESES 2P conde da Eri- ceira, ( f 1099), quí* escreveu u História de Tanger ^ e a Vida e acções d'el-rti D. Jono í •; D. LUÍS DE MENESES a^ conde da p:ric ira, (1 Gii2- IG90) autor ria História de Portugal restaurado ^ qu^^ f»rneiíe preciosits inf)rmaço'S. embora x\*m sempre incontiovers«s, FÓbr^ o perio-lo da nossa hi^tória kU U)á) a 16S8; D. RODRIGO DA CUMHA (1577-1643), arcebispo de Braj^a e de L >boa e antes bspí Por- talegre e do Porto, p átrio ra exímio, autor da Hist. EccL da Igreja

* Al^nrnaa imlilio. pelo próprio Andrade Da Vidas entras por S. Luís na ed. cit. da Ai!íid., outras no Instit,^ vol. i. a lu etc no Investigador Fort, em In^L, xvr. Panorama, xu-xv. Vid. Inoc, Dic. liibL, lu. e x, 215. D. João de Castro l)f rnr ini.M-iM'ia enia apoloiria. Quain diferente Ôle foi dos vizo-reis craeUc trafieantcá (|no 1m andar im pela Índia! Vide M. do Sonsa Pinto, D. Joio de Castro. Lisiiíia, l\)\'l. A íwn doà Iraballwa que sobre a índia citamos, de Bar- ros, Coiit), ( orr» .1, r(';2:!í-te-á ' o livro de Francisco Rodri?n''s Silv«ira, Memo- rias lie um soldado da índia compiladas de nm Ms. português do Museu Bri- tânico ])''r A íi S. S. Cof^u L)bo, Li«bja, 4877. Silveira esteve na índia desde 15".') a i.')'.'b, (' tarnbfMí í'rimor e honra da vida soldadesca. Livro excelente antiíiamente composto nas mesmas partes da índia oriental sem nome de autor e ora posto em ordem de sair á luz pelo F, Mestre Fr, António Freire. ., Lis- boa, i<;:io

■' Ou tis, ;vs.

' Ad Adições sam na pAg. 2.' de fl. 95 v. a 106 v. e a Vida abre a mes- ma pá Li. 2.^.

' * Évora. 10 21: L>." (mI Lisboa, 1701. " '

•• J.i«boa, IbíV), 1710 e 1791. Dr. Leite de Vasc, S. de F., notas bio- gráf. lit. no Boi. da Seg. A. da Aead., viii.

^ LiaVioa, 1677.

' LÍ8Í)oa, 1732.

^ i, 1^370 e 1710; ii, 1G98. As duas partes em 4 vols. 1751 e 1759.

0ÂFÍTUI.0 IV BSOOLA SBIBCimiTA OU ocvoómicA 357

de Lisboa ^^ da HUL Ecch de Braga \ e do Catálogo dos Bispa* do Porto ' aqaelas esciitas oom mais correcta exactil^ qae êste^ mas todts três oom aquele primor de lingoagem que íizem iêle ara mestre; JORGE CARDOSO (f Í62â) que deixou o Agiológio lusitano \ 00 período s^^guinte contmaado por D. António Ca^t^ni i) Smsa e em que abundam no meio de prolixidades virias erádit^s iníormaçSea relativas a pessoas e cousas de Portugal*

VIAJENS

123. Viajens. As obras mais importantes a citar neste capítulo rf rem-se á história da Etiópia nos séculos xvi e XV (i e recent mente sam conh-H;idiS griças á publicação Ijs resp ctivos inéditos, ate ngora senSo tot«ln^nt-) ignorados^ pelo me 104 im)^rfâi« tam^^nte conhecidos. As nossas rdlaç5ds com a Etiójii liU^V/tm de D. Manoel »- sobretudo de D. Joâ) iii que enc^rregtu os j^iítis da evan<;eliztçã(i daqueles pavo* e consaguia a criaçl) dm Pitriar- cado. Após várias vicissitudes nos começos do séo. xvii t^nu missão atinjçiu grdn<ie prosperidade, m^rcê do zelo do P. PíId Pim, jua íes c<)m que o rei Saltan Sftgvi, então reinante, e oi t^iiai^^ e a maior partt^ da nação prestass^im obadiência ao PontíÍ3 3 e icútas- sem codio Patriarca a D. Aímso Mendes.

E'* a história deites su33sg)3 religiosos, juitm nt*. coai noções hiâtóricasy gQOgi*áfic>is, etnográficas, arqueoló^ioi*, bít^ioiijas, etc., qa« se nos deparam ao.4 víls. da colecçilo Rerwn Aalhlopica- rum scriptores occidontales inedtti a saec, xvi ad xix puòlic i la em Roma desde 1903. O t. l.<> aX) é senão o pro^rani Í4 0)1. Os vols. II e III (1905-1906), a^^n inlabitivolmente para n<H os maia importantes. Sam obra de PEDRO PAIS (1564-1622) quí, ^. ni>>ra 'íspa- nhol, escreveu em portaofuôé «ísta sua Hist. da Eti>pía, frat 1 de vinte anos de viajens p^Jas regiS^s que descreve. Li apirii3 a mais antiga descrição das celebradas fontes do Nilo (Nilo Az d), que êle visitou em 1618.

MANOEL BARRADAS (o. 1572] é o segundo histirialor-vi^iinta, que dis.sertou sobre o Estado da santa romana na E^tóp^i, qc^ndo w lançou o pregão contra ela, o Reino de Tigre e cidade de Adem (vol.iv). Ainda um terceiro esoritôr MANOEL DE ALMEID\ (1.)S0-LíU(3), QOs íala da Hist. da Etiópia a alta ou Abassiaj cujo rei vidgar-

^ Doi 2 vols., anunciados no fiontespicio do 1.°, vAq sau em lbi:2. « I voi., Braga, 1634 e 1535.

1623 e 1742.

* 4 vols. sendo o 4.® do seu continuador. O piano er;i abrang» r od àozot S Ases do ano, mad chega a Agosto.

23

358 HJBTÓBlA DA UTBHATUBA POBTUOUÊaà

mente é chamado Preste Joào (vols. v, vi, vn), onde se revela sen» BatOy verdadeiro e sóbrio.

Nestes trabaJbos, todos inéditos, se fnndou natural mente Bal- tasar Teles (159Õ-1675) que àlêm da Cr. da Comp. de Jesus^ em que se revela eBcritôr aprimorado nos deixou a Híst. geral da Eiio- jna a alta çu Preste João '.

A' literatura não interessam os outros vols. da CoIecçSo embora sejam de maior importância para a história nacional, pois sam ou em latim, como os vols. vin e uç, obra do patriarca D. Afonsíi Mendes, ou de proveniência diversa e constante» de relaçSes e cartas, como os vcls. x a xiv, que compreendem os últimos does. até 1815 scb a direcção da misnlio francesa. O líltimo vol., o XV (1917) é o iidice analítico de toda a obra. NSLo dúvida de que estamos em presença de documente s do maicr valor, que vêem provar maia uma vez o alto papel civihzador que Portugal desempenhou noutros tempos '.

Escreveram também narrativas de viajens FR. GASPAR DE S. BENARDINO, autor do Itinerário da índia por terra aié á ilha de Chipre; MANOEL GODINHO (f 71)2), natural de Ment hlio, distrito de Portulegre, que escreveu, àlêm da biografia de Fr. Amónio das Cha- gas, o cel» brado místico fundador do seminário díis niÍ883 s do Va- ratojo, a Relação do novo caminho através da Arábia e Síria que fez por terra e mar vindo da índia para Porhujal em 1663; e JEf^OMMO DE MENDONÇA de quem temos a Jornada de Africa*' inte- ressatite como hubddio para o conhecimento do d»sat»tre calaniitOBO de Alcacer-Qêbir, onde o autor esteve e ficou prisioneiro *, Tem o valor duma testemunha presencial e está escrita com grande simpli- cidade.

* Em íinas Partes: 1.*, Lisboa, 1645; 2/ pág., ibid., 1647.

2 Coimbra, 1660.

^ K«t( vcrt JVreíra deu no BoL da Acad. das Sc. de Lisboa, vii (1918) 39-47 aná)ií^e prunu norizada de Rerum Aethic picaram Scriptores. ^ Li&l)oa, 1607; e/^>/£/., 1785.

" K' cnricsa pelas informações que raini&trs nSo sónionte sobre a capi- tal, mas ainda a»"'bre um ou outro ponto do país, a obra de Fr. Nicolau de Oli- veira (por 15H6-16o4), Livro das grandezas de Lisboa [Vid. Arch. Hist. Port,u (líi04), art. do Sr. Brito Releio com o título: a Frei Nii^olau de Oliveira ea Inquisição »]. Tan;bpm não queremos passar em silêncio o nome dum rsnrerado cultor da forma, liomeiíi de estudo e largo saber, Dnaite Hib?i»x) de Macedo (161£ 16^0], cujas Obras (Lihbca, 1743, 2 vols., e 1767 e 1817) o revelam fraco poeta, ina.M rrccti^siiiiO prosadfr. Parece ter entrfívisto a verdadeira lei dos trabalhos bi.^^tóricís quando escreveu: « averiguemcs a v< rdade p lo exame dos monnment('S dos eriifíeios e das mesmfis ruíuiis». O rscrit<>r brat^íleiro Solidónio Leite denunciou o plápio que Macedo fez da obra do Bspo Conde Sebastião (Jetar de Menoes (f 167*^), que até no título se equiparam Suma Política. C£r. Clássicos Esquecidos, Rio, lí»14, págs. 131-146.

CAPÍTULO IV B8C0LA 8E18CK5Ti8TA OU GOMOÓSlCA 359~

ELOQUÊNCIA

124. Eloquência; seus representantes. Sofre a elo- quência nôfite período a sorte dos demais ^énero8 literários. O cuU ÍÍ9mo desnaturaliza- a e, assim como os poetas faziam longos poemas sobre equívocos, sobre pequenos nadaf*, com trocadilhos e arrebiques de linguagem insuportáveis, assim os oradores dissertavam sobre íu- tílidadea, que tornavam abnolutamente improfícuo o ensino do púl- pito. O pregar tornon-se «efeminado, delicioso e à^ galantaria. Esto método proveio de íreqú^^ntarem os homens a lição e a representa- ção das comédiaH de mau gosto. Os eruditos conhecem a locução destas peças do teatro espanhol. . » Os homens habituidos a verem e ouvirem as pessras conferentes naquele jogo da coqpédia e aos assuntos e expressSes pueri)^, do que abundavam as mesmas com- posições teatrais, . . . produziram um costume de se explicarem apai- xonado, mole e delicioso . . . Muitos pregadores ou por condescendên- cia ou por ditame nada m^nos eram que uns maneiristas daquela Éwe do teatro » * .

Dentre os muitos oradores deste tempo, t^iis* como Fr.' Baltasar Pais (f 1638), Francisco de Mendonça (f 1G20), Fr. João de Ceita itl633), Felipe da Lnz (f 1633), Tomás da Veiga (f 1638), Fran- cisco de Amaral (f 1647), António de (f 1678), Cristovam de Al- meida (-f- 1679), Bartolomeu do jQuental (f 169j^)', o fnn ador da Congregação do Oratório em Portugal e Luís Alvares (f 1709, so- bresaíram a eclipsar totalmente o nom^ de todos o orador primacial que foi António Vieira e Manuel Bernardes.

125. ANTÓNIO VIEIRA, de Lisboa, (1608-1687) é o orador previlegiado deste século e um dos melhores clássicos da nosda língua. Nascido em Lisboa a 6 de fevereiro de 1608 recebeu a sua primeira educação no Brasil, para onde fora com seus pais desde a edade dos oito anos, num colégio que os jt^suítas possuiam na Baía. Aos quinze anos entrou no noviciado da Ordem e dois anos depois, em 1625, pronunciava os seus votos solenes de religião. De tal forma se distinguiu nos seus primeiros ensaios, que os superiores o encarregaram de reger a cadeira de retórica e, passado tempo, o curso de dogmática.

Moito cedo se notabilizou como orador. Quando rebentou a revolução em Portugal que, acabando com o domínio castelhano, co- locou no trono D. JoSo iv, o Brasil aderiu ao movimento da metró- pole e, para saudar o novo rei e apresentar-Ihe. preito de obediência enviou o vizo-rei D. Jorge de Mascarenhas expressamente a Portu-

* Cenáculo, Mem. histi do Min, do púlpito, 159.

360 BI0TÓBIA DA UTBRATCBÁ POBTUaDASA

gal seu filho D. Fernando de Mascarenhaa acompanhado de António Vi( ira ^. Tempo antes alguns filhos do Marquês de Montalvão passa- ram-se a Espanha chamando sÔbre si o ódio popular. Dês^e ódio iam sendo vítimas os embaixadores do Brasil ao desembarcarem em Peniche, onde o navio acossado pela tempestadH fôra abordar em 2S de abril de 1641^ tendo saido da B.ia em 27 de íev. do mesmo ano. Salvou-os o Conde de Atouguia,. governador da Praça. Dois dias de- pois Vieira partia para Lisboa, onde o rei não tardou em recebê-lo. E' de 1640 o sermão pelo bom sucesso das armas de Portugal contra as de Holanda, que Éaynal declarava ser o dif^curso maÍ9 extraordi- nário prtinunciado na tribuna sagrada, t). João IV precisava de alguém que reunisse á finura dum diplomata a energia intransigente dum patriota para sustentar a causa portuguesa junto dos gabinetes da Europa '. Vieira foi escolhido para essa delicada missâpO, sendo ao mesmo tempo nomeado pregador da côrte» De então por diante a sua personalidade desempenha um largo papel nos negócios poUticos do país e pode dizer- se que é desde esse tempo que começa a soa laboriosa vida de diplomata, á qual consagrou dez anos, e de missio- nário e «scritôr a que dedicou todas as suas forças até ao último alento. Foi ura apóst</lo incansável da liberdade dos povos do Brasil, á qual por mais duma Vf z pouco faltou para sacrificar a vida, como sucedeu com a lei de 1609 em favor dos indig- nas, que nele encon- trou um fervoroso defensor, e noa colonos e funcionários a mais, enér- gica oposição. Com a morte de D. João IV f^c*ha-se o período de grande influência exercida por Vieira. Lo^o nos primeiros anos do reinado de D. Âíonso vi o grande orador í« i exilado para o Porto e

Smco depois para Coimbra. Poi em seguida acusado á inquisiçSo. ste grande génio supersticiosamente acreditara nas profecias do Bandarra, tôbre a vinda dum príncipe que inauguraria uma época de prosperidade e de ventura para a Igreja e para Portugal, e no Clavis Prophetarum preteadera fundar esses snnhos em razoes dedu- zidas da S, Escritura 1 O tríbunal Jo Santo Ofício de Coiwhra en- cerrou-o pois nas suas prisões e o reteve desde 2 de Outubro de 1665 até 24 de Dezembro de 1667 •. posto, pelos &ct08 que todos conhecem, D. Afonso vi, subiu ao trono D. Pedro il e Vieira readqui- riu o seu prebtígio voltando a pregar na corte na quaresma de 1669. Neste mesmo ano partiu para Roma como promotor da causa da

' Na embaixada vcin também o P.* Simão de Vasconcelos [1598-1671], autor da Crónica da Companhia de Jesus do Estado do Brasil..,, Lisboa, 1663-, 2.aed., 1865

* Pinheiro Chagas, Rist, de Portugal, ti.

3 Sobre o processo inquisitorial de Vieira— A. BaiSo, Episódios drama' ticos da fnq. Fortug., cit., '20b e segs. fundado aôbre o procesbo inéd. qne se gaarda no Arquivo da Torre do Tombo.

OiPITULO lY ESCOLA 8B18CBNTI8TA OU aONa('^BlCA 30l

beatificação do P. Inácio de Azevedo que com trinta e nove compa- nheiros ^avia sido martirizado pelos Calvinista^b de Rochelle, em 15 de Jalho de 1570. Darante os seis anos que viveu na capital do mundo católico^ o iJastre orador obteve, sem dúvida, os seus maiores * triunfos, sendo este o período msis brilhante da sua eleqúência. advogou junto do Papa Clemente x a causa dos Judeus de Portugal^ injuttãf tirânica e barbaramente perseguidos pela inquisição '.

Pregando por várias vezeer na presença da rainha Cristina da Suécia, que então se achiiva em Roma, eota o nomeou seu confessor e pregador. Mas estas grandezas não deslumbravam o espirito de Vieira que em 27 de janeiro de 1681 embarcava para o Brasil. Tinha 71 anos. Entretanto, em Coimbra, ao ter-se notícia de que o tribunal da Inquisição ia novamente abiir-se, numa manifestação entusiasmo, o retrato do velho batalhador era queimado publicamente no pátio da Universidade, isto ao mesmo X^^mpo^ que lhe prestava a iiomenagem do seu rtspeito e admiração a Universidade do México!

Ainda experimentado nos últimos anos pela falHa acusaçJlo de cooperação num assassínio e p^Us intricas dos s^us próprio8 confra- des da Ordem, Vieira veio a suou nbir, depois de lenta agonia, aos 90 anos, no dia 18 de Julho de 1H97.

Considerando agora Vieira como escritor é nos seus numero- sos sermSea e nas suas inttresBantes carta» que se encontra a melhor lição, que se pode procurar em tam grande mestre. As obras de Vieira sam mina inexaurível onde o filão do oiro se não qufbra nem exgota. Abundam as pinturas vivas, as descrições coloridas e movimentadas. A propriedadt^ dos termos, a riqueza e variedade dos epítetos sucedem-se umas ás cutras, c<>m pr<'íunda abundância. Como orador Vieira deixourSH inquinar pelo mau gosto da época: reconhecia ele esses defeitos, mas adoptou-os, donde se não pode propor como modelo incondicional. Aparte esses defeitos Vieira é UQ] grande, um extraordinário orador, apresentando rao(^êlos de verdadeira eh>quência, não merecendo as c»^ nhuras apreí^t^^s de Verney no ^VoiTO Método de Estudar, sendo com mais impHr<*ialiHHdp avaliado p*-l«> P. Islã, o engraçado autor da História de írey Gerúndio de CampazaSf em que censura o írosto dos predadores do sé\ xvii. De- pois de o repreender dos defeitos em que caiu escreve: leiam com reflexão os assuntos capitais que trata dos st^rmSes do Advento e de Quaresma... e digam-me se algum orador, dos anti^s ou modernos, tratou nunca estes pontos com maior viveza, com maior soliiiez, cora maior valentia ou com mais triunfante eficácia.» Como epistolótrrafo u soas Carta» nem sempre tê^m a naturalidade do estilo familiar,

' Vid, Inéditos de Vieira publicados no Arquivo Bibliográfico Bi^ huotéea da Universidade de Coimbra, í.° auo, pág. 77 c seg.

360 BIBTÓBIA DA UTBRATCBÁ POBTUGUASA

gal seu filho D. Fernando de Mascarenhas acompanhado de António Vi( ira ^. Tempo antes alguns fiihos do Marquês de Montalvão passa- ram-se a Espanha chanaando sobre si o ódio popular. Dês^e ódio iam sendo vítimas os embaixadores do Brasil ao desembarcarem em Peniche, onde o navio acossado pela tempestade fôra abordar em 28 de abril de 164 1^ tendo saído da B.ía em 27 de íev. do mesmo ano. Salvou-os o Conde de Atouguia,, governador da Praça. Dois dias de- pois Vieira partia para Lisboa, onde o rei nSo tardou em recebe-lo. E' de 1640 o sermSo pelo bom sucesso das armas de Portugal contra AS de Holanda, que Éaynal declaraya ser o discurso mais extraordi- nário prenunciado na tribuna sagrada. D. João IV precisava de alguém que rf unisse á finura dum diplomata a energia intransigente dum patriota para sustentar a causa portuguesa junto dos gabinetes da Europa *. Vieira foi escolhido para essa delicada missão, sendo ao mesmo tempo nomeado pregador da corte. De então por diante a sua personalidade desempenha um largo papel nos negócios políticos do país e pode dizer- se que é desde esse tempo que começa a soa laboriosa vida de diplomata, á qual consagrou dez anos, e de missio- nário e ^8critôr a que dedicou todas as suas forças até ao último alento. Foi ura apÓ8t</lo incansável da liberdade dos povos do Brasil, á qual por mais duma vf z pouco faltou para sacrificar a vida, como sucedeu com a lei de 1609 em favor dos indig* nas, que nele encon- trou um fervoroso defensori e noa colonos e funcionários a mais, enér- gica oposição. Com a morte de D. Juão iv f»^i*ha-se o período de grande influência exercida por Vieira. Lo^o nos primeiros anos do reinado de D. Áíonso Vi o grande orador t i exilado para o Porto e

S^uco depois para Coimbra. Foi em seguida acusado á inquisição, ste grande génio supersticiosamente acreditara nas profecias de Bandarra, ^ôbre a vinda dum príncipe que inauguraria uma época de prosperidade e de ventura para a I^rreja e para Portu^, e no Clavis Prophetarum preteadera fundar esses sonhos em razíH^s dedu- zidas da S, Escritura 1 O tribunal do Santo Oficio de Coimbra en- cerrou-o pois nas suas prisões e o reteve aesde 2 de Outubro de 1665 até 24 de Dezembro de 1667 •. posto, pelos fj«ctos que todos conhecem, D. Afonso vi, subiu ao trono D. Pedro il e Vieira readqui- riu o seu prehtígio voltando a pregar na corte na quaresma de 1669, Neste mesmo ano partiu para Roma como promotor da causa da

' Na embaixada vein também o P.® Simão de Vasconcelos [1598-1671], aator da Crónica da Companhia de Jesus do Estado do Brasil..,, Lisboa, 1663; 2.aed., 186Õ.

* Pinheiro Chagas, Eist. de Portugal, ti.

3 Sobre o processo inquisitorial de Vieira A. Baião, Episódios drama- ticos da Inq. Portug., cit., 'J05 e segs. fundado sobre o processo inéd. qae se gaarda no Arquivo da Torre do Tombo.

capítulo 1Y S8C0LA BB1SCENTI8TA OU QOMaÓBlCA 30t

beatificação do P. Inácio de Azevedo que com trinta e nove compa- nheiros £avia sido martirizado pelos Calvininta^b de Rochelle, em 15 de Jolho de 1570. Darante os seis anos que viveu na capital do mundo católico, o iJastre orador obteve, sem dúvida, os seus maiores triunfos, sendo este o período m&ia brilhante da sua eleqúência. Ái advogou junto do Papa Clemente x a causa dos Judeus de Portugal, injusiaf tirânica e harbaramente perseguidos pela inquisição '•

Pregando por várias vezes* na presença da rainha Cristina da Suécia, que então se achava em Roma, eBta o nomeou seu confessor e pregador. Mas estas grandezas não deslumbravam o espirito de Vieira que em 27 de janeiro de 1681 embarcava para o Brasil. Tinha 71 anos. Entretanto, em Coimbra, ao ter-se notícia de que o tribunal da Inquisição ia m^vamente abiir-se, numa manifestação entusiasmo, o retrato do velho batalhador era queimado publicamente no pátio da Universidade, isto ao mesmo t<*mpo que lhe prestava a homenagem do seu respeito e admiração a Universidade do México!

Ainda expèrim^-ntado nos últimos anos pela falfta acusação de cooperação num assasèinio e p^Ins intricas dos s^us próprios confra- des da Ordem, Vieira veio a suou nbir, depois de lenta agonia, aos 90 anos, no dia 18 de Julho de 1H97.

Considerando agora Vieira ccmo escritor é nos seus numero- sos sermões e nas suas interessantes carta^i que se enc«>ntra a melhor lição, que se pode procurar em tam grande mestre. As obras de Vieira sam mina inexaurível onde o filào do oiro se não quebra nem exgota. Abundam as pioturas vivas, as descrições coloridas e movimentadas. A propriedadt* dos termos, a riquf^za e variedade dos epítetos sucndem-se umas ás cutras, com pr('íunda abundância. Como orador Vieira deixourSH inquinar pelo mau gosto da época: reconhecia ele esses defeitos, mas adoptou-os, donde se não pode propor como modelo incondicional. Aparte esses defeitos Vieira é um grande, um extraordinário orador, apresentando rao(^êlos de verdadeira elir^quência, não merecendo as c^n^uras agret^tes de Verney no Novo Método de Estudar, sendo cora mais impHr<*ialiHHde avaliado peL» P, Islã, o engraçado autor da História de trey Oerundio de CampcuicUy em que censura o írosto do8 predadores (to j^é*. xvii. De- pois de o repreender dos defeitos em que caiu escrt-ve: leiam com reflexão os assuntos capitais que trata dos st^rmoes do Advento e de Quaresma... e digam-me se algum orador, dos antigos ou modernos, tratou nunca estes pontos com maior viveza, com maior soli<iez, com maior valentia ou com mais triunfante eficácia.» Como ppist<lÓJ:ralo as soas Cartae nem sempre têem a naturalidade do estilo familiar,

* Vid. Inéditos de Vieira publicados no Arquivo Bibliográfico dm Bi- hUotiea da Universidade de Coimbra, i." auo, pág. 77 e seg.

360 HIBTÓBIA DA UTKRATUBÁ POBTOauâSA

gal sen filho D. Fernando de Mascarenhaa acompanhado de António Vidra ^. Tempo antes alguns filhos do Marquês de MontalvSlo passa- ram-se a Espanha chamando sôbre si o ódio popular* Dês^e ódio iam sendo vítimas os embaixadores do Brasil ao desembarcarem em Peniche, onde o navio acossado pela tempestade fôra abordar em 28 de abril de 1641^ tendo saído da B^ía em 27 de íev. do mesmo ano. Salvou-os o Conde de Atouguia,. governador da Praça. Dois dias de- pois Vieira partia para Lisboa, onde o rei não tardou em recebê-lo. E' de 1640 o sermSo pelo bom sucesso das armas de Portugal contra AS de Holanda, que Kaynal declarava ser o dií^curso maÍ9 extraordi- nário pninunciado na tribuna sagrada. D. João IV precisava de alg^uêm que rf unÍ8se á finura dum diplomata a energia intransigente dum patriota para sustentar a causa portuguesa junto dos gabinetes da Europa *• Vieira foi escolhido para essa delicada missão^ sendo ao mesmo tempo nomeado pregador da corte» De então por diante a sua personalidade desempenha um largo papel nos negócios poUticoB do país e pode dizer- se que é desde esse tempo que começa a soa laboriosa vida de diplomata, á qual consagrou dez anos, e de missio- nário e «scritôr a que dedicou todas as suas forças até ao último alento. Foi ura apóstolo incansável da liberdade dos povos do Brasil, á qual por mais duma vfz pouco faltou para sacrificar a vida, como sucedeu com a lei de 1609 em favor dos indíg- nas, que nele encon- trou um fervoroso defensor, e noa colonos e funcionários a mais, enér- gica oposição. Com a morte de D. Ji>ão IV f«*fha-se o período de grande influência exercida por Vieira. Lo^o nos primeiros anos do reinado de D. Afonso vi o grande orador t i exilado para o Porto e

Íouco depois para Coimbra. Eoi em seguida acusado á inquisição. iSte grande génio supersticiosamente acreditara nas profecias de Bandarra, ^ôbre a vinda dum princípe que inauguraria uma época de prosperidade e de ventura para a Itrreja e para Portugal, e no Clavis Frophetarum preteidera fundar esses snnhos em raz3t*s dedu- zidas da S, Escritura 1 O tribunal Jo Santo Ofício de Coimbra en- cerrou-o pois nas suas prisões e o reteve desde 2 de Outubro de 1665 até 24 de Dezembro de 1667 •. Deposto, pelos f»ctos que todos conhecem, D. Afonso vi, subiu ao trono D. Pedro il e Vieira readqui- riu o seu prebtigio voltando a pregar na corte na quaresma de 1669. Neste mesmo ano partiu para Roma como promotor da causa da

' Na embaixada vein também o P.* SimSo de Vasconcelos [1598-1671], autor da Crónica da Companhia de Jesus do Estado do Brasil,.., Lisboa, 1663-, 2.aed., 1«65

* Pinheiro Chagas, Eist. de Portugal, ti.

8 Sôbre o processo inqaisitoriaJ de Vieira— A. Baião, Episódios drama' ticos da Inq. Portiig., eit., 205 e sega. fundado aôbre o processo Inéd. qne se gaarda no Arquivo da Torre do Tombo.

CAPITULO lY S80OLA 8B1SCKMTI8TA OU OOMGi^BlCA

30t

beatificação do P. Inácio de Azevedo que com trinta e nove compa- nheiros Mvia sido martirizado pelos Calvininta^b de Rochelle, em 15 de Julho de 1570. Darante os seis anos que viveu na capital do mundo católico^ o ilustre orador obteve, sem dúvida, os seus maiores triunfos, sendo este o período msis brilhante da sua eloquência. Ai advogou junto do Papa Clemente x a causa dos Judeus de Portugal, injuttãf tirânica e bc^baramente perseguidos pela inquisiçSio ^

Pregando por várias vezes* na presença da rainha Cristina da Suécia, que então se achiiva em Roma, esta o nomeou seu confessor e pregador. Mas estas grandezas não deslumbravam o espírito de Vieira que em 27 de janeiro de 1681 embarcava para o Brasil. Tinha 71 anos. Entretanto, em Coimbra, ao ter-se notícia de que o tribunal da Inquisição ia n4*vamente abiir-se, numa manif^^stação entusiasmo, o retrato do velho batalhador era queimado publicamente DO pátio da Universidade, isto ao mesmo t^mpo que lhe prestava a homenagem do seu rtspeito e admiração a Universidade do México!

Ainda ezpèrim^^ntado nos últimos anos pela íalHa «cusaçà^ de cooperação num assassínio e p^Ins intricas dos s^us próprios coníra- àdi da Ordem, Vieira veio a suou nbir, depois de lenta agonia, aos 90 anos, no dia 18 de Julho de 1H97.

Considerando agora Vieira cemo escritor é nos seus numero- sos sermões e nas suas interessantes cartai que se encontra a melhor lição, que se pode procurar em tam grande mestre. As obras de Vieira sam mina inexaurível onde o Hlílo do oiro se não quebra nem exgota. Abundam as pinturas vivas, as d^^eriçdea coloridas e movimentadas. A propriedadt^ dos termos, a riqueza e variedade dos epítetos sucedem-se umas ás cutras, ci^m profunda abundância. Como orador Vieira deixourSH inquinar pelo mau gosto da época: reconhecia êle esses defeitos, mas adoptou-os, donde se não j»de propor como modelo incondicional. Aparte esses defeitos Vieira é um grande, um extraordinário orador, apresentando modelos de verdadeira ebtquência, não merecendo as c^ nhuras aprestes de Yerney no Novo Método de Eatudar, sendo com mais impa reialidn de avaliado p^l» P, Islã, o engraçado autor da História de irey Gerúndio de CampazaSy em que censura o gosto dos pregadores fio >»é". xvii. De- pois de o repreender dos defeitos em que caiu escrt-ve: leiam com reflexão os assuntos capitais que trata dos st^rm^es do Advento e de Quaresma... e digam-me se algum orador, dos antigos ou modernos, tratou nunca estes pontos com maior viveza, com maior soIi<iez, com maior valentia ou com mais triunfante eficácia.» Como epist<»lótrrato as soas Carteis nem sempre têem a naturalidade do estilo familiar.

* Vid. Inéditos de Vieira publicados no Arquivo Bibliográfico Bi" biiotéea da Universidade de Coimbra, i.° auo, pág. 77 c seg.

360 HIBTÓBIA DA UTBRATUBÁ POBTUODÂSA

gal seu filho D. Fernando de Mascarenhaa acompanhado de António Vi« ira ^. Tempo antes alguns filhos do Marquês de Montalvão passa- ram-se a Espanha chamando eôbre si o ódio popular. Dês^e ódio iam sendo vitimas os embaixadores do Brasil ao desembarcarem em Peniche, onde o navio acossado pela tempestade, fôra abordar em 2S de abril de 1641^ tendo saído da B.ia em 27 de íev. do mesmo ano. Salvcu-os o Conde de Atouguia,. governador da Praça. Dois diasde- pois Vieira partia para Lisboa, onde o rei não tardou em recebê-lo. E' de 1640 o sermão pelo bom sucesso das armas de Portugal contra AS de Holanda, que Kaynal declarava ser o dii^curso mai» extraordi- nário pninuneiado na tribuna sagrada. D. João IV precisava de alguém que reunisse á finura dum diplomata a energia intransigente dum patriota para sustentar a causa portuguesa junto dos gabinetes da Europa \ Vieira foi escolhido para essa delicada missão, sendo ao mesmo tempo nomeado pregador da côrte» De entSo por diante a sua personalidade desempenha um largo papel nos negóicios políticos do pais e pode dizer- se que é desde esse tempo que começa a soa laboriosa vida de diplomata, á qual consagrou dpz anos, e de missio- nário e (scritôr a que dedicou todas as suas forças até ao último alento. Foi um apóstolo incansável da liberdade dos povoa do Brasil; á qual por mais duma z pouco faltou para sacrificar a vida, como sucedeu com a lei de 1609 em favor dos indig- nas, que nele encon- trou um ft^rvoroBO defensor| e noa colonos e funcionários a mBiB, enér- gica oposição. Com a morte de D. João iv f*^cha-se o período de grande influência exercida por Vieira. Lo^o nos primeiros anos do reinado de D. Afonso Vi o grande orador í« i exilado para o Porto e

Smco depois para Coimbra. Poi em seguida acusado á inquisição, ste grande génio supersticiosamente acreditara nas profecias da Bandarra, tôbre a vinda dum príncipe que inauguraria uma época de prosperidade e de ventura para a li^reja e para Portugal, e no Clavis JProphetarum preteadera fundar êssf s snnhos em razoes dedu- zidas da S, Escritura I O tribunal Jo Santo Ofício de Coimbra en- cerrou-o pois nas suas prisSes e o reteve desde 2 de Outubro de 1665 até 24 de Dezembro de 1667 •. posto^ pelos factos que todos oonhecemi D. Afonso Vi, subiu ao trono D. Pedro il e Vieira readqui- riu o seu prebtígio voltando a pregar na corte na quaresma de 1669, Neste mesmo ano partiu para Roma como promotor da causa da

' Na embaixada vein também o P.* Simão de Vasconcelos [1598-1671], autor da Crónica da Companhia de Jesus do Estado do Brasil... ^ Lisboa, 1663 í 2.aed., 186Õ

* Pinheiro Chagas, Eist, de Portugal, ▼!.

^ Sobre o processo inquisitorial de Vieira A. BaiSo, Episódios drama' ticos da Inq. Portug., cit., 'JOfi e sega. fundado sobre o processo inéd. que se gaarda no Arquivo da Torre do Tombo.

capítulo 1Y B80OLA 8B19CKNTI8TA OU O0MG<'^BlCA 30l

be^tifícaçSo do P. Inácio de Azevedo que com trinta e nove compa^ nheiros La via sido martirizado pelos Calvininta^b de Rochelle, em 15 de Julho de 1570. Durante os seis anos que viveu na capital do mando católico, o iJustre orador obteve, sem dúvida, os seus maiores triunfos, sendo este o periodo m&ia brilhante da sua eloquência. Ai advogou junto do Papa Clemente x a causa dos Judeus de Portugal, injusta^ tirânica e harharam&nte perseguidos pela inquisiç^io '.

Pregando por várias vezes* na presença da rainha Cristina da Suécia, que então se achiiva em Roma, esta o nomeou seu confessor e pregador. Mas estas grandezas não deslumbravam o espírito de Vieira que em 27 de janeiro de 1681 embarcava para o Brasil. Tinha 71 anos. Entretanto, em Coimbra, ao ter-se noticia de que o ^bunal da Inquisição ia ni^vamente abiir-se, numa manif^^staçâo entusiasmo, o retrato do velho batalhador era queimado publicamente no pátio da Universidade, isto ao mesmo ^ti^mpo que lhe prestava a homenagem do seu rtspeito e admiração a Universidade do México!

Ainda experimentado nos últimos anos pela faina acusação de cooperação num assassínio e p^lns intrii^as dos s^us próprios confra- des da Ordem, Vieira veio a suou nbir, depois de lenta agonia, aos 90 anos, no dia 18 de Julho de 1H97.

Considerando agora Vieira cc^mo escritor é nos seus numero- sos sermSes e nas suas interessantes carta^i que se encontra a melhor liçSo, que se pode procurar em tam grande mestre. As obras de Vieira sam mina inexaurível onde o filão do oiro se não quebra nem exgota. Abundam as pinturas vivas, as descrições coloridas e movimentadas. A propriedadt^ dos termos, a riqueza e variedade dos epítetos sucedem-se umas ás cutras, c^m pr<>funda abundâocia. Como orador Vieira deixou^sn inquinar pelo mau gosto da época: reconhecia ele esses defeitos, mas adoptou-08, donde se não pode propor como modelo incondicional. Aparte esses defeitos Vieira é um grande, um extraordinário orador, apresentando rao(iêíos de verdadeira eh>qúência, não merecendo as c»^nhuras apre^t^^s de Yemey no Novo Método de Estudar, sendo com mais impareialiHMde avaliado pelf» P. Islã, o engraçado autor da História de irey Oerundio de CampazcUf em que censura o írosto dos pregadores do ^ xvii. De- pois de o repreender dos defeitos em que caiu escrt^ve: leiam com reflexão os assuntos capitais que trata dos sermões do Advento e de Quaresma... e digam«me se algum orador, dos antigos ou modernos, tratou nunca estes pontos com maior viveza, com maior soli^iez, cora maior valentia ou com mais triunfante eficácia.» Como epi8^•ló^rafo as suas Carteis nem sempre tgem a naturalidade do estilo familiar.

' Vid. Inéditos de Vieira publicados no Arquivo Bibliográfico Bi- bíiotéea da Universidade de Coimbra, i." auo, pág. 77 e seg.

aimpleit e corrf^nte. Mas em tudo o que êle escrereu graça, hi HbiindíLndis, Subscrevemos inteiíamente Á opinião dum seu ]).6ír^- nnenhum povo posfuiu jámaia nus obran de um homem tam ri«)e ta"i epcolhidn tesoiro da lingua piópriu, como nóa poaBuimos na» dêrte notável jtauita*. A colecção das obrae de ViHra, comummente havida por completo compreende 26 vol. encerrando pcuco maia ou menos 200 êermões, mai» de 500 carta», grande numero de injorma^tí po- Ulicoê, curioBas notictaB ►ôbrr a inquisição, estudos políticos e /ííe- Tário», etc. Está esta edijiíti Innge de ser eompltta. No BriiUk Mu- seum de Londres, na Btòl. iVac. de Pai-ia, manu^jcritos inéctitoi como o Clavis Prophetarum, que muitt imjWrtaiia conhecer '.

A Arte de furtar, que aparec-u atribiiida a Vieira pela pri- meira vez em ed. que riiz ser de 1652, mas que parece nSo ter eido conhecida em Portugal Benão em 1744 ci-rt«niente nâo aa(u da »ua pHima, de maiii tersa linguagem e maia RC'-ndradii lavor *. Pensaram muitoB que fSsae do jurisconsulto Tomé PnhHÍro da VeifjR (f 1'0Õ6), o autor da Fattigimia *, outros d*- João Pint'> Eibíãro, outros ainda de Duíirte Ribeiro Macedo, ou de Alexandre de GuBmão, mas o caso conatitue ainda hoj*^ um problema bibli< gráfico -*.

f 126.-MAN0EL BERNARDES (1644-1710), natural de

Libboa, oratoriauo, pela haruionia do aeu e^tdo e ptla suavidade da

' Para a bililingralia dfi Vieira conáiUle-se Somrnnrvogfil, 6('6íi£>íft^«í de la Compagnie dt Jisus. nu, vorb. Vieira. Lnein de Aíçv.do, o liisimiiidor de Vieira, rt. n-iios íJist. do Futuro, inéd. C.in.bra, 1918 e Dezanove Car- tas inéd.. ibid., 1ÍÍI5.

' C. V.. Hra.ico. Vurso, cit.. n, 120, e 3Pg. Beia ed.. Rio, 1907, ed. di- rigida pelo Dr 3 iín Riiii'iro.

A Fii$figimii fdrneee intTesíaritea j-iihainirm parn a dneumentaçiin de ll«fis fi eos'iiíiios rl^i \-idi iinrliiL;inVi e (-s:iarih"la d-' {.''hhiIh parte dO Béi', IVJI, tcirpo di'rt FehppM. K' ■■ vol iii da Colecçiio de Mss' inéditos, Port.i, ly]l, \i\i- bli(!uda a <>xp>>UBiks da Câmara Municipal diK|ii<-la i:idade. Veja ee o PrefãiMo de José de i^ampaio iBruno), em que ee denfaxem uinit^s asserções qae a respeita do hnmoriatico autor f^ram inventadas.

* Kra imponaivel trnçar aqai a larga bingrH&t do fainoao jegDÍU. Vsn amplo conheuLmente vfr prinuipalinete: i'.* André de Barros, seu conleinpori- neo posto que o o3o tratasse, Vida do P. Vieira. Lisboa. 17^; Bisp" df Vi- zeo Alei. Lobo, Obros. ii, 173-3.^6; JuSo Fraiici co Lisboa (Timon M««- nhen^e) Obras completas, iv, Maranhão, 18B.'>; E. C^rel, Vlrira, sa vie. etses ocuvres. Paris: a notitiia bi igr qne preceda os TrecHos Selectos, pablicifio comemorativa do binentenárin da ana morte, Lisbna, lí(97 ; Lais Cabial, Vieira, biogr. caractere, éloqiience. Patis, liWO; Id , Vieira Pregador. Portn. 1901, 2 Tols, e J. Luoio de Aíevralo. Os Jesuitas no Gr/lo-Pard, saas missões e a co- lonização, bosquejo histórico, etc , 1 vol., Lisboa, tHOl ; Id. Hist., de A V, com factos e does- novos, i, Ligb"a, J9lK

As obras todas foram reimpr. em Lisboa, ia54-58, em 37 vols. ; SermOes. 15 voU, ; Cartas, i; Ob.inéd.. ò; Várias. 2; Arie de furtar. 1; Hist. do fut- i .; Vida. .. por André de Barros 1.

CApfTULO IV BBOOLA 6R SOBUTISTA Óu aONO'^BiaA 363

diçSo é superior ainda a Vieira e nisto, cremos, fica í^ito o sen maior elogio« Se quisésstímos comparar Vieira a Bossaet, dínamos que Ber- nardes irmana com Féaélon. Distanciáram-se na pré Uca, como na Tida. Vieira foi um lutador; a sua vida prende-se por mais dum laço i história politica de Portug^al; B-rnardes viveu o melhor e m%ior tempo da sua vida 36 anos entregue á meditação e á redaoçSo dos seus livros na pobre cela da congregação do Ontório. Leado-os com atenção, escreve Castilho, sente- se que Vi^^.ira, ainda falando do céo, tinha os olhos nos seus ouvmtes; Bernardes ainda talando das creaturas, estava absorto no Creador. Vieira vivia para ióra, para a ndad<^, p-ira a corte, para ò mundo; Bernardes para a celi, para si, para o seu coração. Vieira estudava g^ias è louç tinhas d^d estilo. Ber- nardes era como estas formosas de seu natural, quv) se não cansam com alindam»*ntos, a quem tudo fica b ^m, que brilham mais com uma ílor apanhada ao acaso, do que outras com pedrarias de grande custo. Todos os livros de Bernardes sam uma mina f-^rauíssima p-ira o es- tadioso. a certeza iniludível de q<ie se encontrará minério abun- dante e precioso. Basta lêr a Nova Bloresta. Nâo sei, escreveu José A^Btinho, que haj^ melhor livro, nem esoritor mais eminentemente portuiçuês. Âli está a lingua portug>iê<ia na sua pureza, na sua har- monia, na sua majestade, na sua opulêacia; e a ninguém de^^emos mbis, quando se trdta da língua porti]g'iêsa. Á cala pagina ã^ a^him frases e palavras não vistas nem sabidas pelos nossos mais Ub iriosos dicionaristas ^. .

A colecção das obras d*5 Bíraardes' compreenie dezanove volumes, entre os quais se contam os Sermões e práticas^ os Exer^ ciciOR espirituais e meditações da via purgativa, oa Últimos fins 4o homem, os. Tratados vários em cujo 2.^ t )rao entra o Pào par- tido em pequenirioSy alguns opiisjulot) e as sudis m^lh)reâ '«bras, aquelas qu«í faz^m dele um mestre in'3ontestado da formosa li igua portu^uôsa^ em que hs b^^lezas do '^srílo se CiSim cura o raais puro aticismo, a Luz e Calor * e a Nova Floresta *. Bernardes durante

fJ^'

' No opúsealo Os Frades, pág. 71.

* Vid. a in licaçai» bibl. completa em Inos., Dic. Bibl. v e no xvi do Sapl. Oa melhores estudos sobre BerrxHrdes «ne mtram-se na Livr. Clássica, do António e J. F. Castilho, Lisboa, 1845, 7 t «mos, e na do Kio de Janeiro, impr. era Paris Excerptos segaidis de uma nolícia sobre sua vida e obras, um juízo -critico, apreciações de belezis e defeitos e estudos da lingua. Rel»olo da Silva, Obras completas t xtiv, *í3 140 ft»z um estudo calcado- aobre o dos Ca-itilhos

* Luz. . ., obra espiritual para os que tratam do exercício das virtudes e caminho de perfeição, etii.., \jUboà, 16 )6. A 4* e última ed 18T1.

* Nova Floresta, ou Sylva de vários apophtegmas e ditos sentenciosos» 'espirituaese moraes, etc., 5 tomos, 170)-L72f$ A últi i»a ed é de 1909-Ii>ll^ Porto, CMia prc-árabulo de Pereira de Sampaio (Bruno), em 5 vols. De conjunto «aítt Cio Lisboa, 1919, 2 vols. Antologia Portug.—Be/nardes, sob a direcção ^e Agostinho de Campos.

« Isrgo período em qne viveu na ( Bou de tnbKlbar até dons anos an vieta e a nzfio. Caetillio dizia qne publicadas naquélfa dois auM melho.^«.

127. Trabalhos filológicos do século XVII. mime-

roíwe ir;<).Blhc'H lioguJiíticoB nêtír pt- li da, todoa porém, df valor eecunilâno. O que predominava no ufo »-ra a Ungua eep«nh"lB; por ela prftpnderfm, pote, diferentee eutc-ivtt explicar as slt«>ia^<I''S que, obpdi-criirln a uma lei fatal, se produziam do portuguê>>. Tais ffíram ÁLVARO FEFtFIFIRA DE VERA que em 16SI (^nblicou a sua Ortogrilia ou modo para escrever certo na língua pcrftifffíêia ' e JOAC FRANCO BAR- RETO c<:Tn 8 t-im Ortografia da língua portvguêsa qne saiu t-m 1(571 '. BENTO PEREIRA {ubliaiu em 16b4 a mu Vromdia, de que e>lr>.ni dife- rente» r(!í^'r>'B c na qual aparecem numerosas frases e adá^ri s pnr- tn^uf-pes (-i>n >>8 Feus correspoudentet- tutinos e em 1645 o TWur» da língua jiortugnêga. Dentre lodo» oh autores, porém, dê^te -i;i'ulo EOb<-í>M.i /M hl DE ROBOREOO, secrelário do arcebispo- He E^ora D. Didf^-n ric Si ut-n, que pode chairsr-Be psra o ppu tempo prstiítico diotir ti''^in o, nio o atestem as pun» nbrae Verdadeira grtimátiea latina (HilíSI; Rnizes da língua latina (162J.) em latim e ni pnr- tDciiês; l\iif(i de língua» (162b); Método gramatical para todas at língua* |16!9\ Eoboredo prepcut'- a importância di. prHináiica, comp! riria, ptruíndo pela cria^So ne língua matern», ao menos no» Corte» e nas Universidades, e pela nn.dènça de mélotío no 'nfÍDO da líi guu ht ii:>, de ttota ueceendade pi<ra o conhecimento Ha Ifnsms materna ; ni^j- j^b reflesSes do gramítico portu^ês, diz um critiov fôram tam at' rtdidas como os vaticínios de Cassaadra '.

128,— Jornalismo. Aparece nPflte sécnlo o prim- iro juniíl portupuGw, t- < ■■•> que nâo podemos deixar de reeÍ8t*r, HaHo o de»- envflvimi-iio xiranrdiíiário qne posteriormente deveria tomar o qae agora no» tiTu^ >^ parece senSo como um pi qa>no e insignifioant 'fib-'^.

Km )(>-■"> publicava Mano"! S.v rim do Paria em Liba» Relaçiio uniiersal do que sucedeu em PorÍMgal e mait provinnas do Ocidente e Oriente, de Março 625 até tcdo o Setembro de S26f

Listíoa, 1IÍ31, qnáse sempre bp encnntr» eDcnderoado com o trai*!]» do mesMio aiitõr Origem da nobreza . . LUboa, 1631; outra ed., i7!'l.

> Hiirrelci tr^dazia a Eneida. Lihlx.a, llí(í4 70, 2 vola. E ainíia 17*^ o 1808. Te' dii i'lo «1 mo secretário da enibaiiHila a França ii andada por P. Juio it escreveu a Relação da viagem qae a França fizeram Francisco de Me^lo.-- * o Dr. António (oelho de Carvalho... a Lais XIII... Lisboa, I6iá. Temaiud* ■Igona opúacuUiH.

^ J. V. G 'inea de Moara, Noticia sucinta dos monumentos da tiniu» latina, eto., Cuiuibra, 1823, pág. 'áíri.

GAFÍTXJIO IT BBCOLA BKISCBHTISTA OU GONGÓBIOA 365.

e em Braga outra até Âgesto de 1627. Várias pubHcaçSefi com título igoal oa equivalente, oomo papeis volantes^ notteías avulsas^ etc, iôram certamente oa precursores d^ Gazeta, em que se relatam oc novas todas que ouve nesta corte e que vieram de várias partes y cujo 1.^ námero apareceu em Novembro de 1641, com seis páarinas em qnarto e mensal. Em Janeiro de 1663 apareceu ò Mercúrio Por- tuguêsj que durou até 1667 e que «Ta redigido pelo secretário de Estado António de Sousa Macedo. O Mercúrio teve grande voga embora o P. Antódio Vieira o apodasse de pouco veríiico (Car- ias, Uf o. 4), de impòlitico (Ibid.y c. 28 e Õ5) e até de mal escrito (Ibid.y I, c. 69). No reinado de D. João v reapareceram as Gazetas de Litíboa redigidas por José Freire de Monterroyo Mascarenhas desde 1715 a 1760. Mas para se avaliar o que eram tais jornaes basta dize^Be que a espantosa catástrofe do tt-rr^moto de Lisboa em 1755 i contada em seis linhas apenas, &f*nm : « Llí^boa, 6 de Novembro de 1755. O dia prípueiro do corrente 6. ará memorável a todos os séculos, pelos terramotos e incêndios que arruinaram uma grande parte desta tidade; mas tem havido a felicid d^^ de se acharem nas minas os cofres da fazenda real >e da maior part^' dos particulares >• E a 13 do mesmo mês outras oito linhas, e nada mais!

com as ideias liberaep, depois de 1820, é que o jornalismo le propaga e engrandece, abusando por vezes da sua imensa força K

129.— Epistológrafos. Cartas da Religiosa Portugudsa.

Temos a registar no género epibt^l» r vários documentos de valor literário. António^ Vieira é, em í*pi^t'J>iírafia, geralmente mestre e exemplar correcto e clássico. D. Francisco Manoel de M lio dmxou esparsas nas suas Cartas Familiares muita daquela compungida tristeza que lhe amargurou a existência, aqui e à-êm indicações literárias, polí- ticas e sociais de valor a aprovt-itnr para quem empreender o estudo da época e do século em que' ele viveu ; FR. ANTÓNIO DAS CHAGAS nos dois tomoa das Cartas Espirituais *, citadas soube arrancar- se ao lodaçal gongorista em que se afundar^ m as suas composiçdps poéticas. Mas nSo sam as Cartas de nenhum destes escritores- políticos, Mterárias, místicas, ou simplesmente d^ assuntos ocasionais as que detgem a atençSo do critico e do investigador. No percurso deste pe-

V.

^ Silva Talio, Brinde aos.,. Assinantes do Diário de Noticias , 1866, iaixu ; A- X. da Silva Pereira, Resenha chronol. de todos os periódicos por- tug. impr. e public, no reino e eêtrang desde o meado do séc. XVII até d morte éê D. ÍmÍSj 18^5 ; Alberto Beat«a, O Jornalismo, esboço hist. da sua origem e éesenvolvimento . . , j Lisboa, 1904; Alredo da Canba, Diário de Noticias^ m saa fundação, e os sêus fundadores. Afguns factos para a hist. do jornatismo fottuguis, Lirboa, 1914.

« 1.» p. 1684, 2.* 1687. Outras ed. : 1736 e 176 i. Vid. outras obras em iBft., Dic. Bibl., 1, e MatoB, Manual, lõ5.

366 HI0TÓBIA DA UTBEATnRA PORTUOUÊaA

riodo da nossa história literária aparecem cinco Cartas, qae imorta- lizaram o nome da autora e em volta dos qaais se tem travado farta e acalorada discussSo* Essas Cartas seriam de. MARIANA ALCOFO- RADO, natural de Beja^ onde nasceu a 22 de abril de '1640 e onde muita moça professara no Convento da Conceição, e teriam sido dirigidas a um Oficial francês por quem ela concebera uma ardente paixSo, o Conde de Chamilly, que era Portugal serviu ás ordens de Shomberg, com o título de Conde de Saint-Légér, quando ê^te veiu auxiliar Portugal nas lutas contra Espanha. Nonca ninguém via o original dessas Cartas, n&o se sabe mesmo se elas fôram primeira- mente escritas em portuguêa, se em francês, e ao passo que uns vêem nelas um monumento de sentimento e de can durai uma obra de arte bela pela intensa ver<1ade que delas ressalta, outros conside- ram-nas escritas por um homem (J. Rouss^^u), portanto, produto dum artificio literário, de origem franc^sa^ como a índole e a eon- testura da frase o revelam (C. Caâtelo Branco). O £Bif*to é que o texto que primeiro deu a conhecer estas Cartas, é francês, em edi- çSo de 1669, de Paris, que o editor apre »entava como tradução do português, de que <ccom muito cuidado e tr<ibalho coaseguira obter cópia correcta». NSo era s^^nâo uma ficção, complt^tada logo a seguir por outra, a da publicação das Respostas, que ta nbê n teriam sido escritas em português, e se traduzi» m como as primeiras. E' aiada desse mesmo ano de 69 o acreseent cimento ás cinco primitivas de mais sete Cartas, constituindo uma Segunda Parte, emb >ra se nSo quisessem fazer passar como do punho da Freira portuguesa. Na convicção de que existira um original português f z se a tentativa de surpreender a alma que screvera as primeiras Cartas, e tanto quanto possível de as localizar na sua época e no seu meio ^ Filinto Elíàio, que, aliás, aceitou como autênticas todas as doze *, o Morgado de Mateus *, Lop s de Mtndpnçi *, D<iming08 Eiues * e Luciano Cordeiro ^ entrega ra^o s*^ a ê^se f? digoso e inútil trabalho efeforçando-se em re88U8i'it>tr ura text), que nunca, seguramente, existiu. Como escreveria Mariana cartas a um francês numa língua que êle seguramente ignorava? Escreveu-as em francês '^? Mas qne e quem nos atesta que ela conb cia essa língua? E se a conhecia e em francês as escreveu que nos importam essas Cartasf

^ A bibliogr. doa Cartas ó mn"to exten-a. Vêr Luciano Cordeiro na sna obra e Josó dos Santos, BibUogr. da Lit. Oássica. . 1917, 137 e sega.

"" Obras Completas, x, 4;)0-494.

3 Ed. de Paris, 18M. !

* Semana^ 1852, n.

^ Ed. de Lisboa, 1872.

« Soror Mariana, Lisboa, 1S8S, •25r>-;n2.

' Sr. Conde de Stbagosa; Gente d'A go, Lisboa, 1915, fl. 265.

ANTOLOGIA

SÉCULO XYil

POESIA

Cantiga

Descalça vai para a fonte, Leanor pelia verdura. vVai fermosa e nâo segura.

A talha lena pedrada, Pticarinho de íeiçio. Saia de cor de limlo, Beatilha so^pieizada, Cantando de madrugada, Pisa as flores na verdura. Vai fermosa e nlo segura.

Leoa na mio a rodilha. Feita da sua toalha, Com hOa sustenta a talha. Ergue com outra a fraldilha. Mostra os pés por marauilha, Que a neue deixSo escura, Vai fermosa e nlo segura.

F. Rodrigues Lobo, Eglogàê, ed.

II

As flores por onde passa, Se o lhe acerta de pôr, Ficão de inueja sem côr, E de vergonha com graça. Qualquer pegada que faça. Faz florescer a verdura, Vai fermosa e não segura.

N8o na ver o sol lhe vai. Por não ter nouo inimigo, Mas ella corre perigo, Se na fonte se ve tal. Descuidada deste mal. Se vae ver na fonte pura, Vai fermosa e nlo segura.

1605, écloga, z, fl. 110.

Cantiga

Antes que o sol se leuante Vai Vilante a ver o gado, Mas nlo ve sol leuantado, Quem ve piimeíro a Vilante.

He tanta a graça que tem. Com hfla touca mal enuolta. Manga de camisa solta, Ftiia pregada ao desdém.

Que se o sol a vir diante, Quando vai mungir o gado. Ficara como enleado, Ante os olhos de Vilante.

368 iJiTOiíoaiA roMíA

Descalça as vezes se atreae^ Se acaso o braço lenanta,

Hir em mangas de camisa, Porque a beatilha encolhe.

Se entre as henias neue plsá. De qualaner pastor qne a oDie,

Nlo se Julga V qual he neue, . Leua a alma na garganta,

Duuida o que está diante, E ainda que o sol se aleoanta

Quando a ve mungir o gado, A dar graça e luz ao prado»

Se he tudo leite amassado, Ja Vilante lha tem dado.

Se tudo as mSos de Vilunte. Que o sol tomou de Vilante;

P. Rodri^oes Lot>o, ibid., íl. 113 ▼.

in

A F. que morreo do ar

Com ar madruga a flor mais engraçada, PavSo de Abril pomposo, e matizado ; Mas para o seu alinho ser prostrado, Basta-lhe o mesmo ar da madrugada.

Nasce ayrosa a vergontea delicada, Pluma do bosque, pavelhSo do prado« Mas de hum zéfiro o sopro arrebatado. Entre as plantas a deixa sepultada.

Assim foy. Fábio, Felis soberana, Delicada vergontea, e flor luzida, Hum ar a corta, se outro ar a abala :

Frágil morreo, se madrugava ufana, Porque em fim toda a popa d 'esta vida Apenas brilha, quando em ar acaba.

Asònimo, Etoa que o clarim da fama dd. . ., i, 269.

IV

A hum desenfano

Será brando o rigor, firme a mudança. Humilde a presumpçSo, varia a firmeza» Fraco o valor, cobarde a fortaleza. Triste o prazer, discreta a ccnfiança.

Terá a ingratidSo firme lembrança. Será rude o saber, sábia a rudeza. Lhana a ficçáo, sofistica a lhaneza. Áspero o amor, benigna a esquivança.

Será merecimento a indignidade, Defeito a perfeiç9o, culpa a defensa. Intrépido o temor, dura a piedade,

Delicto a obrigação, favor a offensa. Verdadeira a traição, falsa a verdade, Antes que vosso amor meu peito vença.

Aaénimo, iiú2., ii, 335.

xvu aG9

SCENA 7.»

(Fm AffwMO Mendez á porta e traz conaigo um EstudantõfO muito cujo e mmto mal vtêtido. Entra maito devagar fanendo cortesias)

PoET. O claro humor de Pyrene

em dipluvlos fragrantes candidlze,

borde, esmalte, retoque, aromatize, Gil. Aio I este homem vem perene I POBT. A graça, a gentileza, a fidalguia,

o grSo valor, o iiter.-irio estudo,

de vossa Senhoria ! . . . Gil. Vedes, Aio?... todavia

bem disse eu que era sesudo f .«. . POET. Ante vossa presença jaz estático

hum culto Professor do estudo critico,

que outros querem cham.ir humor frenético Gil. Aio I ouvis que vem asmático ? I . . .

Chamai logo o meu fisico,

que este me ha-de deixar ético I . . . - Af. Meu senhor ! nunca se espante,

que estes tais palrào assim»! Gil. Mestre !. . . nSo falíeis latim,

que eu nunca fui estudante. PoET. Paliarei, como mandais,

boià português velho e relho. Gil. Crede que he melhor conselho. POET. Venho a ver do que gostais. Gil. Sois Poeta ? POET. E o declaro.

Gil. Fazeis motes? Pobt. E os remendo.

Gil. Remend&o sois? ou entendo

eu mal, ou n9o falais claro. Pobt. A's vezes sou de obia prima,

calçado velho outra vez.

Chega hum Fidalgo cortês. . .

destes nem prosa, nem rima,

que tem seus geitos no Paço. ..

Vem de noite, sem ser visto,

mostra hum hábito-de-ChrÍsto,

pede- me hum mote, e lho faço.

Outro, que engasgado vem '

oom dous versos sem feição,

pede nSo mais de um tacão ! . . .

Paga. . . e lanço-Iho também ! . . .

Quantos namoraõ na rua

que em mi cada qual se fia I . . . Gil. Ah ! por isso eu sempre ouvia :-

«elfes bebem e homem sua».

Cia de hum enguirimanso

chamado, como por momo,

Cabeça àe motes; como

vos vai, senhor Mestre? PoET. Mansol...

S70 ANTOLOGIA POXBIA

QuereMo saber de mim ? Dir-vo-lo-hei . . .

Gil. Dizei ora ! . . .

PoET. Como ora digamos ?

Gil. «Nora,

que anda á roda e nSo tem fím». Como se fazem ?

PoET. Começa

perguntando o que mais ousa . . . Gil. Callai, senhor, que em tal cousa nunca achei pés nem cabeça. Fazeis Sonetos?

PoET. Geitosos.

Gil. Romances ? PoET. Podem-sc lêr.

GlL. Decimas ?

PoET. Quantas, quiser.

Gil. Tercetos ?

PoET. . SSo vagarosos I

Af. Dai vós ó demo o famaco ! . . .

Como elle os homens estreita.! Gil. Pois fazei-los por receita,

ou assim trovas em saco ? *

POET. Os ver os têm seu quilate

e medidas sabidas.

Gil. Oh I se os fazeis por medidas «ercis poeta alfaiate I Mas ora sus!, escutai, bem que nSo tive liç9o, huma trova com feição.

PoET. Podeis dizer.

Gil. Ei ! vai ! . . .

a Vós estais no vosso estrado, « jazendo como um Prelado, ae eu, triste, na chuminé «como um negro bujamé!»

POET. Não a fez tal frei Sicrocio ! . . .

Gil. Poi he toda em consoante!

PoET. Ora vamos adeante!. . .

Gil. Ouvi-lhe agora o negocio :

«Sendo todos de hum terrSo, «minha mana Grimanesa, anão sei eu por que rezão «quereis sempre ser Princesa, «e eu seja madraceirSo. «Todo o mundo por vós chama... « que ha chamar de muitos modos, « a mim apupSo-me todos, . « do Mocambo intés Alfama ! . .

wàmiiM XY11 371

PotT. Ha mais?

Gil. NSo I

PoBT. V Estio bem feitos,

mas falta para dez hum.

QíL. Mestre I nSo falta nenhum. S&o eles todos perfeitos ?

PoET. Todos, mas hum falta !

Gil. ^ Eu sei

que nlo falta. Hjmem, nSo vês, que de cada cousa dez levSo huma para el-Rei ? Pois eu não sou dos de Malta pago como paga o prove» de sorte que, se tem nove nenhum para dez lhe falta.

(Chega Affonso^Mendez á porta e torna logo).

Af. Dou tais mestres ao pecado !

Ora eis chega Dom Beltrflo I Gil . Vem por mim. Traz coche? AP. Náo.

Gil. Em que vem ? Af.' No seu calçado.

GtL. Ora embora I . . . Como he perto

ir-nos-hemos passeando. PoET. Eu também me vou andando. Gil. Ficamos neste concerto :

mandar-vos-hei o morzelo,

vireis todos os dias. PoET. Em dobro as senhorias

. . .e vou-me muito singelo.

(Vai-se o Poeta).

Gil. Dom Beltrão nflo quer subir ? Af. Oiz que antes quer passear ;

Agora o leva a cortar I Gil. Ora sus 1 vou-me vestir.

Aio I dizei-me : he estreita

essa Rua? Ap« Senhor nSo.

Gil. E agora este Dom Beltrão

he homem de mão direita ? Af« Nada aos amigos negai,

que essa regra he cousa crua. Gil. Nflo que hum fidalgo na rua

ha de saber como vai.

(Entrao-se ambos, tocao-se as violas e se acaba a Pri- meira Jornada).

372 AHTOLOOIA POBaiA

VI

f

Apologo da Morta

Soneto 81

VI eu um dia a Morte andar folgando Por um campo de vivos que i nflo viam Os velhos sem saber o que faziam A cada passo ne:la iam topando

Na moddade os moços confiando { Ignorantes da Morte a nSo temiam Todos cegos, nenhuns se lhe desviam Ela a todos co dedo os vai contando

Então quiz disparar e os olhos cerra Tirou e errou Eu vendo seus empregos T^m sem ordem, bradei; Tem-te, homicida 1

Voltou-se e respondeu: tal vai de guerra,

Se vós tv d s andais comigo cegos,

Que esperais que convosco ande advertida?

{Ohroê Mitricoê^ d, pá^. 41).

Vil

Fabulas

I

«Ouvi que o Odlo e'o Amor Jogaram a matar um dia A quem matava melhor Um se armou todo de dor Outro todo de ategrla.

Ja o Ódio o /rco atezado Sempre envolto em fúria brava Fero, medonho, indinado; ^ Ia o Amor mui repousado Salvando a quantos topava.

As gentes que o Odlo viam

De tal gfsto anteparavam ,

E as mais sem parar fugiam

As setas se lhe perdiam

Como do arco lhe voavam.

Mas indo delas fugindo Os tristes homens com medo Eis o Amor que era vindo Vai matando e vai ferindo ' Muito falso e muito quedo.

8£goxx> XVII S7S

Despois ao fazer da conta

Com ser o destro o Ódio e membrudo

N9o fez nada ou tanto monta

E o Amor sem perder ponta

Tinha morto quase tudo.

Donde decerto se sobe Que por mais que o Amor estnde Inda o Ódio é menos grave Somos tais que em nós nSo cabe Excesso, nem de virtude.

Daqui os Persas principais Jamais enquanto pequenos Eram vistos de seus pais £ então Ibes queriam mais Quando lho mostravam menos.

Amor, caridade enfim Ordem pede e discriçSo, Para que tenha l>offl fim. Nem lhe embarga o ser assim A paterna obrigaçSo.

{Obrcu Metricoij ii, p. 77).

II

Vistes FaetSo pintado Quando Piroos e Etio Caíram sob lo Pado Das Irmãs antes chorado Despois alamos em vio?

Dizei- me ora se haveis lido Qual foi esse que o enganou Senão seu próprio sentido? Foi alto, foi atrevivio Ele próprio se abrazou.

<iMd., p. 80).

III

Quando tudo era falante Diz que a raposa caio Num poço de agoa abundante Chegou um lobo arrog^ante Que passa acaso e a vio ;

De hila polé pendurava (Porque o poço era profundo) Htta corda á qual atava Dous baldes; um no alto estava, Noutro a raposa no fundo.

24

374 ahtÓlooia pobsu

{Ibids, p. 94).

Pois a bicha que era arteira Chama o lobo e diz: Senhor, que eu nio fui a primeira. Socorrei vossa parceira, ^

Que eu sei que tendes valor.

Ora assim, sem mais poifia O lobo aue é fanfarião no balde se metia; Ele cai, ela subia Por h&a mtsma invençSo.

Toparam-se ao perpassar E o lobo meio caindo Nem lhe anzava de falar Ela a rir e arrebentar De se ver também subindo.

Em fim ao medo venceu; Fala o lobo e diz: «Comadre Isto vos mttreço eu?» Ela a zombar do sandeu NeAi lhe quis chamar Compadre.

Mss diz-lhe «Dom vagabundo Teus queixumes nfio me empecem» Acaba de ir- te ao fundo Isto sam cousas do mundo Quando hn sobe, os outros decem.

IV

Nunca vistes no terreiro Touro bravo da Chamusca O que passa co tcureiío? Que esse a quem primeiro busca Esse é quem mata primeiro.

Porém se acaso o vilSo Por levar inteira a pele Se deita morto no chão. Que p^s^a o touro por ele, Sem lhe tocar nem mão?

Mas comtudo se depois se ergue Se ergue, por provar ventura, Cos cornos ambos de dois A vida e o fi:to lhe fura, Sem dar por vacas, nem bois.

Pois assim com tal cegueira Se 1 a i< mipo o mundo esquivo Deirubcu-me a ViZ primeira Pasíoii ; bulo e porque vivo Terna a mim doutra maneira

D. Francisco M. de Melo (Ibid,^ p. 103).

sàouu) zyu

375

VIII

Romance

A Democrita do Ceo Ou a Heradita do Polo, Qoe se desfaz toda em tiso Qne se desfaz toda em choro ;

Blosofa no desprezo De perdas hum thesoaro Derrainava sobre a terra, Bem qne as trazia nos olhos.

Quando acordey, doce amigo, Ao som d^ meus próprios roncos: Hn o tal sono cobarde, Ronqodlhe, e fugio o sono.

Vestime, e o rosto lavey, Porque se naõ lavo o rosto, Por meyos de deslavado Se mete a ser vergonhoso.

Almocey hum frangainho. De peras cubertas oito; Seis fsraõ, mas conto mais, Porque me vem mais a conto.

Os consoantes pedirão As duas, que de mais ponho, Que por amigos de doce Querem campar de bom gosto.

Inda que as tiro da boca, O qne me pedem, lhe outorgo, Qae como saõ taõ meus amos. Com elles peras naõ jogo.

Montay^ meu Sousa, no macho, Bem que nelie nada monto, Pois da minha authcridade He inimigo nos ossos.

Por esses trigos me vou. Porém no catupo espaçoso. Bem que me vou por esses tngos, Do caminho naõ me longo.

Na Goieglo descavalgo. Ou desmacho, que he mais próprio, E se dssasnára fora Ma7 mais elegante modo.

Hstalajem á mão direita, Nmn aposento taõ roto. Que por seus velhos remendos Se viaO seus entreforros.

A miséria lhe notey. Mas a soberba mais noto. Porque tendo poucas partes, Acix» naõ tem fumos poucos.

Poeta me pareceo, ^ías naõ Poeta ostentoso. Porque com ter varias rimas. Mostra nada ter composto.

J. Valiia, Á Feniaê BenOêêida,

Hum instrumento de t)oca Temperou nossa ama logo, E eu vendo que ella tempera. Minha garganta disponho.

Mas nisto chegou nossa ama Com um prato muy fermoso. Porque tinha huns olhos verdes, A pedir de boca os olhos.

Eraõ muy tenros, muy doces. Mas sou eu de taõ máo gosto Que com serem taes, os trouxe Bntre meus dentes hum pouco.

Depois dos olhos de cove ' Huma forçurinha como, E comi bem por miúdo, Bem que o digo muy por grosso.

Huma franga vem sem pena No cadafalso goloso, Por ser christS nova hum tanto, Sahio condenada ao fogo.

Mais fino do que hum amante, E mais que hum Cid forçoso Mais puro do que huma Vestal Mais rubicundo, que Apollo.

Era o vinho, que bebi, Taõ delgado, taõ gostoso. Que muitos furos abaixo Lhe fica o Falerno tosco.

Era em fim tal, que melhor. Que a Freira de melhor rosto, Obrigaria aos amantes Ní-õ se apartarem do torno.

Regaleyme como hum Padre, E fartevme como hum tolo, Ceveime como espirigada, E flz-me como hum pelouro.

Comi finalmente hum doce. Mas por ser muy torpe poço O desta Villa, n?ío quis. Que fos?e aguado o meu gosto.

Pus-me logo a caminhar. E depois do Soi posto, Qual engenhosa abtlhinha, N'huma cortiça me ponho

Referirvos eu a cea Fora processo enfadoso, Bem que por estar muy quente, A despachcy n'hum assjpro.

Comer, e callar me Lg:: Ja, Darey pois na boca hnrii i^.ito. Porque de mim se naõ diga Que bom como, e que mai coso.

Jtrnada iv, ed. 1746, 266-2 70.

S76 AHTOIiOOlA ^- POBBIA

IX

Um episódio dos «Virglnldos»

. .deixando os soHifs respirantes. Se leuantaõ em de Crauos & Rosas, Para hir render as purpuras fragrantes A a ^or de lerichó, Flor das fermosas: Logo os Crauos tomando, como amantes^ As Rosas pella mão, gentis esposas, VIo pisando dos Prados os verdores, Quaes Reys, acompanhados das mais flores.

Acháraõ emballando ao sacro Arminho Três Donzelas, que tem gentil presença, E a mais velha, que veste honesto alinho. Era gentil, mes cega de nascença; ,

Para ser mais fermosa, foi caminho. Ter nos olhos das mais a differença, Que as mais, se em olhos ter, tem mais belleza» Eila, em naõ tellos, tem mais gentileza.

A do meio de verde está vestida, Com que mais de íeimosa se quilata, £ sssistindo entre as flores, a pulida Gala, hum campo florido se retrata: A mais nona das galas guarnecida. Com que o Sol vai decendo â lenta prata,

. Trajada ricamente se offerecc, Que de purpura fína se guarnece.

Despois d'htias, & outras conuersarem, Com grauidade, graça, & subtileza, E summissocns alegres tributarem A a Graça, a que o Sol rende a gentileza: A Minina do Ceu por arrularem, Que he Minina dos olhos da belleza, A mais noua das três, que o beiço emballa. Assim canta, & o mais coro em tanto calla:

Minina celestial, Aue diuina, Rosa de lericbó. Pheniz sagrada. Que sendo alua, qual a Alua cristalHna, Qual a Aurora, também sois encarnada: Sc de snbir, qua' Rosa matutina. Do Míiíerno botaõ, estais cançada, Diu mi ao canto rrcu hum pouco agora, E occultai esses Astros, como Aurora.

«feciTLo xni 377

Se Aue, & Mar sois, em nome, & em graça víana. Sem cuidado durmi, Minina bella, Qae está o Mar leite, em quito o tomais d'Âna, Que em quanto vos creaes, nflo ha procella : He Anna Aue Alcyonèa soberana, Que a virtude, ao crear desta Aue, assella, Que em quanto a Aue do Ceo no ninho cria, laz o Mar, dorme o Vento, & o Ceo vigia.

Aqui tendes mil Damas circunstantes, Creadas, para ser vosas criadas, Que em galas, & beUeza estflo brilhantes, E em festiuos apiausos occupadas : Pois, cerrai essas luzes rutilantes. Fechai essas Janellas engraçadas, £ as Mininas gentis, que assistem nellas, ^ As vidraças fechar vos deitem bellas.

Aqui tendes mil guardas peregrinas, (Para em quanto durmirdes vos guardarem) Durml sacro Portento, & as luzes finas Ao losué do sono hum pouco parem : Nesses berços do Sol, essas Mininas, Em quanto vós durmis, & desça nçarem, Falta vos não faraõ, para guardaruos. Porque as Mininas mil vejo cercaruos.

Acabou de cantar a Dama graue, Cuja mágica voz, & doce accento Era encarno das vidas, por suaue. Eztasis d'alma, & suspensão do vento:

Baibnda e Vasconcelos, VirginidoSf ed. 1667, 74-78.

X

Helena despoís da destruição de Troía

Arde a Neptunia Troya rendida

Ao cavalio fatal e gregi espada,

Em cinza, em fumo, em sombra convcrt da,

Que a glória humana é fumo, é sombra, é nada

tratavam os Gregos da partida,

Carregando o despojo a grande armada ;

E entre tão rica e soberana preza

Era a íermosa Helena a mor riqueza.

co*a causa e desculpa do trova no Excidio. que na cinza inda fumava. Soltando a rédea ás naus, o sob^^rano Agamenon as ânchoras levava : Da negra antena despregando o pinno, Que indo prenhe do vento qne soprava, O porto deixa, o alto mar cortando ; Vão-se as prayas e os' montes affastando.

378 ANTOLOaXA POMLL

O destroço fatal de Troya viam Das naus que o Heliesponto atravessavam Os Gregos, quando a vista suspendiam Nas terras que apenas divisavam. So nas partes mais altas pareciam Uns vestígios das torres que ficavam, Adonde a vista o mais que determina E' medir a grandeza co*a ruina.

Amphiteatros, máchinas e muros Pyramides, colossos levantados, Obeliscos que mostram estar seguros Contra a força dos tempos e dos fados, Jazem sem fa Jia em cinza vil, escuros, Das idades por fabula prostrados ; Que o tempo os bronzes e as colunas parte, E os poderes da morte iguala Macte.

De bandeiras e flâmulas ornaram A victoriosa armada que partia ; £ as proas para Tenedo inclinaram. Que um bosque sobre as ondas parecia : Que alli vào despedir- se concertaram, Onde a ánchora pesada o sal feria ; Sobre ella, quando o fere, se dilata O mar azul em circulos de prata.

Ambos de Atreu os filhos valerosos (Antes que um va a Esparta, outro a Missena) ' Queriam denpedir-se, desejosos

Que alli possa alegrar-se a bella Helena : Com eiles sai do campo e os seus fermosos Olhos, de que reparte glória e pena Amor oue assaltear delies aprende, Pelo flórido campo e praya estende.

De ve-la o mesmo ceo se namorava, E o ar no do seu rosto se acendia, O mar, quando ella as conchas lhe furtava, Parece que a bcijar-lhe os pés corr a. Quem as divinas praças que mostrava, Contar quiser mais fácil lhe sertã Contar as flores do lascivo mayo, E do sol os cabellos raio a raio.

Pela testa sem ordem desparzido Solto o cabello voa livremente, Onde s i a aqiitixar-se de opprimido De uma cinta de pedras refulgente. No hombro soa o arre do brunido JVlarfi' ; no lido a í Ijava está pendente: Com menos gryça ao bosque entrar costuma A bcUa drusH que nasceu da escuma.

O. Pereira de Castro, Vlysita, ed. 1036, c. 11

BiauLo zTu 379^

XI

^iaura.procurando no campo de batalha o corpo de BatrSo seu espose

Entre os mortos, da morte o ceo queixosa

O cadáver amado infelizmente

Basca a que foi Batiflo amada esposa ! .

Mas entre a multidão da morta gente

E confusão da noite tenebrosa,

O cuidado amoroso vflo ficara

Se a bella face Cynthia não mostrara»

Com anda que a dôr causa, levantando As chorosas estreilas ás estrellas, Rogos e vãos queixumes misturando, Asã roga, e assi aos ceos manda querellas: « Eternas luzes que passaes brilhando Per celestes caminhos, margens belias ! Males de amor e morte sentistes. . . Mostrae quem morto adoro aos olhos tristes !

Dae^me morto o que vivo me tirastes, E piedosas de mim sereis chamadas] . . . Bastem os males que me causastes. Tanto tempo em meu dano conjuradas 1 Assi no claro assento que occupastes Nunca se|aes de nu irens eclipsadas ! DeUae que chegue a dar-lhe sepultura, E o golpe em mim execute a Parca dura !• . .

E tu que com três rostos resplandeces

No ceo, na terra, e no escuro Averno !

Tu que as plantas animas e enriqueces

O mar profundo com vigor interno;

Os rayos com que as cousas favoreces,

Comunicando teu valor eterno.

Estende, e mostrs-me entre tantos, onde

A escura sombra o morto bem me esconde I . •»

Acaso, qual se rogos a obrigaram, A face Delia descobriu serena ... Primeiro os altos montes se mostraram. Logo a cidade envolta em sangue e pena Entre os que valorosos acabaram, Como daquelle império a sorte ordena, Conhece Glaura o )a perdido esposo, Exemplo de valor pouco ditoso I

No amado peito a setta vai cravada. .• Desmaia o coração á dôr rendido : Cae mais morta emhm-que desmaiada Sobre o que tanto amou, mor to marido. ^Quasi da alma fugaz desemparada, A falta lha deteve do sentido. Tendo suspensa a dôr; edoaccidente -Mortal torna, respira, attenta e sente.

o Oeeano festejando >

Sentiu la no profundo i Onde com Tlietys pan Oceano, e*U abalo de( Da fibricada súbita fio E com tal novidade pe Delu de parte o rtgos E per Tritão os deuses As agoas paia doía foi

Em calma neste tempo E como Tio manso pan O vento em seu deicai Nenhuma tábua conca\ Oceano, que a freta dh De Lusitanos ser recon E por se Ihf s mostrar 1 Co'é3ta voz faz altenta

Õ bellfssimss nymph; fiabltadoies do cil^tal : A esta armada agora a Que em calI^a a tem o E' justo festejemos taet Que tanto teem meu m Por elles soa famoso, e A grandeza celebra do

Cesse |i do Erithren a E seus trophpiis roagnll Nem do Potiii-o mai lo Que tneu dircilo e pree Outras crefcenies, outr Esse Medileiráneo se p Igualar-se commí^o: ei O Mauritano, o Caspio

Nenhum cerúleo reino ! í)e gente em paz c era Nunlium com tal correr Costa cm vicges Iam m Nenhum seus braços ta A cidade tam nobre e | Que, se Uijsscs lhe de £ ja £létia de Ulisses

\

SACULO XTU 38 1

Isto dizendo, os braços vai lançando Com seu compaço igual pela agua fria E à nau real c'os hombros inclinando Escumas levantava e dividia ; Logo vai cadaquai outra aferrando, Poi não ficar detrás sem companhia : O curso era tam destro e diligente, Que iam surdindo todos igualmente.

O navio do príncipe tirava Com graça estranha a linda Galatea, Que por descuido a y€ze% se mostrava Mais alva que o cristal da {xopria vea ; .Os olhos após si todos levava £ coraçOes tcas eiles senhores ; Quantos a culpam de ligeira e leve, Pois tal vista lhes faz assim mais breve I

Vasco Mousinho Q. e Castello Branco, Âffonso Africano, ed. 176S, ii, 33^

I ' ^^"

Ulisses dlspõe-se a fundar Lisboa

Naõ se descuida o sábio peregrino Nos jogQS com q o Rey o íestejava De obedecer ao Ceo, & a seu destino Na fundaçflo que o fado lhe ordenava. Com peito alegre, & sobrante dlno De quem tam alio btm pari;c pava. Junta no largo campo a forte gente, Desta maneira diz, grave, & eioquete :

Illustres companheiros, cuja sorte, Cu!o valor o mesmo fado adi» ira, tile, que pio nos livrou da morte, A cmpreza maior comnosco adspira. Quanto se oppoz a vosso peito lorte Fora trabalho vaõ se o n ferira, Pois ò sofrestes, kmbrarvos quero Para o que intento o mais que cõsidero.

Sabeis como as Sirôas, celebrando

Fxi^quias a seu fim com nossa historia,

HQa nova cidade cierniZíintlo,

Nos prometerão, neUa a maior oloiia;

Occult;*s professias declaríindo,

De polo a polo ficará notoiía

(DezJam) quando a terra que ti norne

D'hQa de nós os largos mares dome.

^2 AHTOLOeiA POBiU

Htta destas innfis Ligia se chama. Lysia, diz outra voz, se vãa não erra ; Por Lusitânia, ou Lysia o mado aclama Esta a que o Ceo nos trouxe feliz terra, Aqui pois nos espera eterna fama. Aqui o fado nossa gloria encerra» E no principio do bem que temos O vaticínio das Sliêas vemos.

N9 vos deve esquecer, que o claro auspicio Daquella águia fermosa q admiramos, Cidade il lustre nos mostrou propicio. Se a famosos sinaes credito damos. A gram Minerva com piedoso officlo. Em cujo nome o templo fabricamos, Me animou a fundar nobre cidade, Que o faio consagrava à eternidade.

Bem lembrados estais, que a penha dura Que procurou naufrágio a nossa vida. Em cidade gloriosa alta ventura Nos descobrio do fado promettida. O mesmo cõpanheiros) me assegura (Fosse verdade, ou visaõ fingida Entre sonhos da força de um desejo) O que no selo vi do claio Tejo.

A. S. de Macedo, Uli/stipo, ed. 1640, c. xiit.

XIV V

Serralvo

Sem cessar a mortífera batalha Se embravecia cada vez mais fera, Que de todos os lados se trabalha ; A gente que da vi^ía d< sespera, Dos peitos, e paveses faz muralha Circular, e a quedo a morte espera. o bárbaro Serralvo se desvia Do perigo, em que as outras nações via.

Era Serralvo moço gigantado,

Pequenos olhos tinha, e rosto feio, Mui calejada mio e gretado, Lar^^o de esp.idoas, e de peitos cheio, Cíibello crespo, e nunca penteado, Bíirb.1 incultí. vestido sem asseio. As niHos vilosas, largas as m inhecas, Grossas as pernas, e as queixadas secas.

MM^--

•àaasM xvit 383

Este, que em muitas guerras pouco obrara. Cobarde entre a bagagem se escondia T2o vilmente, que nem volvia a cara Aonda tSo cara a vida se vendia. Viriato, que umas mangas retirara, E sobre todos tinha grS vigia. Vendo aquelle corpaço alarpadado. Mais severo o reprehende que indignado.

Desculpa-se tremendo, que nSo tinha Arma, e por tanto ali se recolhera. Viriato lhe di2 toma esta minha Arma, e com ella faze o que eu fizera ; Para sempre t'a dou, alto caminha, Que traz ti vuu, e adverte que te espera Grande castigo, ou premio: disse e parte O bisonho discípulo de Marte.

Entra- na escola sem conhecer letra. Mas tao bem a lição do mestre aprende Que do primeiro golpe, que soletra Da testa aos peitos um centurio fende ; Multiplicando os vai, ossos penetra. Que arma nenhuma d'elle se deffende : A mais dobre, c fortíssima armadura Rompe, qual branda cera, a maça dura.

Um dardo, que lhe fora arremeçado O ferio levemente na cabeça. Do que impaciente o bárbaro, indignado. Em meio dos contrários se arremeça, Despedaçand ) os vai a cada lado, Que de matar, e de bramir n9o cessa, Parecendo-lhe poucos, quantos via Para esfriar a cólera, em que ardia.

Dez mil, ou mais romanos acabaram Neste conflicto horrendo, e memorando, E depois que os despojos saquearam, A Tribula se foram retirando; Ali tudo igualme^Qte sortearam, Fntrc grande e pequeno, não levando Viriato dos despoios conquistados, Mais parte que qualquer de seus soldados.

Vantagens aos de mais merecimentos Repartiu» para que outros murmurassem, Que murmuraçõ s, jn^o e juramentos Nao houve guerra na qual n^o se achassem. Murmurando os de máos procedimentos De que Serralvo aos mais avantajassem, Um travesso, que bem o conhecia, E que a seu lado estava, lhe dizia :

Pouco (iKtte* : quem de vós ta Sós cem Romanos pondei no Se me deram tal maca eu me Com ella a derrubar mais de Responde mutto simples : k Também eu os matara, comp Mas eram tio poucos oi o Que de quando em quand

Todoí me pareciam pigmáosfto Cernindo ao laigo. como cSe Pois (uglara de mim como m Do fumo, <: me deixavam

Esta tara. . , e aqui erguendc Cabeceando se foi mui desço De em vez de a mil, maiai a

Bcu Garcia de Mas

O ouro

Se as causas saO pollos e!fe'tos conhuc cia, ou maldade delias, qual o iuy de ríiayoi

meieo aos homens tm mais perignsos iríibal ., . _ .,

z3o podÍjA tudos chumat pcsie do mundo, e posio que oi noiaueis eiemplos das dtsirui^õi;!^ e ruinas que nelle Icz. pudiSo tomar mats tempo do q agora le- nido p^ira iiaidr deilc ; quero começar pmneiro do seu nacimenio, para que mostrem os tens a rr.ícadus princitm-s, us di-sastrados succ^^ssos para que a mi- lícia humana o discvlino. h nâo diisp cz.i' d'> o que diz Plinlo taõ douianenie, q n^o ci^nieniis os lioii es ciim o que a siipLificie da terra produzia para sua re- creaçÍD, e i.iãr n,ÍM>, a !i:r:noMira diis í<iii'iti.s, a diucrsidade dos fiultos, a betlcia ls. u esmalte das boninas, a abandanda LiMiro delia os segredos que a benlgtu

Li.inc:, e nas artérias occultas dos pene- a raiz donde começa va; cspalbando o( ,< o sul com seus poderes aquella ma:e- » Sif 1 uru, e se demostra por dunidosoi i::i ciiipr^-nn^dão se mostra iilste, dando iruri descurada, delgada, sutil. e sequi- ruiH'i:u e ate as agoas que por entre ai '/i.jdo. rspreilando estes sinais a Indni- proiundu caminhando por debaiio doi inj lerra deixando a vista do sol, e dii

e Churo das ílorrs, a verd.,

13 djs htruj

dos legumes, quiscSu di.Mj

ntTjnliar dii

nalurezp nos escond.a.

Nace 0 ouro nas ej;iri

inl.as dos mi

dos; e sobindo como aruorc

: da prolundi

ramos cm desigual mttí^da.

cunucrKndti

ria disposta e propiíiuua, ali

; que c, tf a ;

sina>s na lace da itiij ; que

li:Cod.,4Uei

p'>r indicies da riqueza que

enee ia ; Ir

nliosa ; área e bano leue. sf

■CO. e -.rm pr

veas decern, saem ciuas, c <

íom s,ú)orp-

tria humana, entra fazenilc

> tlnerra an

montes iUMeiíiados era eolui

iiiMS da mesi

«fecoLo xvu 335

I

cstrellas, pondo as vidas ao risco das roinosas machinas que mii vezes os opri* oiem, que tanto a nossa sede fez cruel a benigna terra, que parece menor teme- ridade tirar do fundo do mar perlas, e aijofar, que do seu seyo, o inimigo ouro, que ainda entfio o nSo he mais que nas esperanças. Depois de tirado com tam custosas diligencias, saido como parto de venenosa bibora, rompendo as mater- nas entranhas, com o fogo se aparca, apura, e aperfeiçoa, ficando menos apto para .o seruiço dos homens, na cultiuaçSo dos campos, e aruoredos, e mais apa- relhado para sua destruição, e roina; porque ou se laura para ostentações, e. demasias da vaidade, ou se bate. e cunha em moeda, cujo preço tlranisa os po- deres, e graças da natureza. íirou o ouro a vaiia a todas ellas, e fez em si es- tanque de iodos os comércios do mundo, no qual antes que elle apparecesse, se trocau9o as cousas hQas por outras, com htla composição, e trato mais conforme, e obrigado a necessidade, e cómodos da vida, que aos roubos da cobiça, malda- des da auaresa, e sjbegidoens da vaidade ; e apoderouse tanto de tudo o que na terra aula, que veyo a ser preça até da liberdade dos homens contra o direito natural, em que viuiam. ForSo crescendo seus atreuimentos, e se antes de sair do centro da terra começou a matar homens, sainda úella se leuantou contra o ceo, fazendo guerra de rosto a rosto a todas as virtudes : tirou logo a vara das mãos á justiça, e deitado em sua balança peruerteo o fiel de sua igualdade.

F. Rodrigaes Lgbo, Corte na Aldeia, ed. 1619; dial. sétim», 63.

XVI

A graça da voz, e as propriedades delia.

O espíntoy e víuesa dos olhos para o fallar.

O ar das sobrancelhas.

Gõpostura do pescoço, cabeça, boca.

... o primeiro instrumento da pratica he a voz, e para essa ser engra- çada no fallar ha de ter estas propriedades. Ser clara, branda, chea, e compas- sada, porque a voz escura confunde as palauras. a áspera, e seca, tiralhe a sua- uidade, a muito delgada e feminina faz imprópria a acção do que falia, a muito apressada empeça e reuolue as razões que per si podem ser muito boas ; não tiato nas que a natureza inhabihtou para esta perfeição, como ha a voz do gago, do dsioso, e do rústico grosseiro ; mas na do coitesaõ tomara eu estes atributos, porque ha algQs que íallão com a voz tam metida por dentro, que deixão as palauras para sy, e os ouuintes as escuras, que lhes he necessário, estar esprei- tando o que lhes querem dizer. E outros que pronunciao com tanta aspereza, que espinhão as orelhas dos que escuiSo ; e outros que faliam tão apressada- mente, que parece que leuão esporas na lingua. . .

Depois da voz, os olhos dão muito espirito ás razões, porque como elíes *3o as janelas d'alma, por elíes se coir.mnnica vida ás palauras : e íissim h^o de ser claros, alegres, e mouiucis, porque os muyto instensos, e estendi-ios, cstns- tecem: os muito apertados e franzidos, mouem a despreso; os muito abertos, pssmados, c saldos para fora, fazem temor, e posto que os olhos por risonhos, nunca perdem graça, parece que nas praticas, graues, e de importância, não hlo-de ser muito chucalheiros. . .

Também a acçam do fallar toma muito [das sobrancelhas] oorquc frnnzi- ^ fazem carranca, e mostrão que falia dnm homam com maii-:ínc»,"ia : baixjs, 'cpresentlo tristeza, ou vergonha: muito arqui^afla.s, signfir-^ocsiíTntj: c leu.in- ^<las, alégda ; e não menos conuem a composii^ão da baroa, c^ue íincacía nos

386 iJTTOLOaiA PROSA

peitos mostra desconfiança, ou perfia ; e posta no ar, vangloria : e o pescoço, que nem se ha de ter tam leuantado que faça soberba nas palanras, nem tSo baixo, que pareça que nSo pode com a cabeça , a qual nSo ha de escar tSo firme que patiça que a espectarSo nelle, nem se ha de quebrar para todas as partes como grimpa.

Da mesma maneira a boca ha de ser quieta quando falia, sem estar mor- dendo os beiços, nem torccnd«-se, nem inchando com as palauras, nem tom o riso se ha de mostrar tSo descuidada que as entorne pollos cantos, nem tA apertada, que offenda a boa pronunciaç&o e graça delias no que vay mais á lia- gua portuguesa q a outras muitas. .

F. Rodrigues Lobo, ibid,, dial. oitavo, 72.

XVII

Visita das Fontes

Fonte Velha Os homens princlpaes por hum de dous caminhos se lançaõ a buscar fortuna, ou pela rua das armas, ou pela rua das letras ; a rua das armas he muyto comprida, e tem muytas travessas; a das letras he mais curta, porém muyto mais larga, e mais direyta ; pelas armas, he verdade, que se acha mayor fortuna, mas tarde : pelas letras, ainda que menor mais em breve, e muyto mais certa ; os erros das 2>rmas saõ como os da Cirurgia, os das Utras como os da Medecina; aquelles logo se notaO nos accidStes exteriores; os outros com a terra se cobrem, e se dissimulas ; por onde sucede, que se hum Capitão errou, o castigaõ de cOtado e o perigo no mesmo erro ; mas se errou o Letrado naõ he a letra vista, e sobeiamente mofino será aquelle, ^ com dous annos mais de paciência/ que o outro, lhe naõ atalhe diante, ou sayba. ou na(V sayba; porque seu competente saber, he saber fazer isto.

Apollo A quantos delles conheço eu I

Fonte Velha A esta causa, e como elles no alheio se examinaO, basta que hum homem falle confiado, tenha as barbas rocegantes, como opa de Cor- tes; que dos óculos se naõ dispa mais; que donde o naõ entenderem falle latim; dezenrole Digestos, Textos, glosas, e expoziçoens; com seus números, e parágrafos, mas que nunca taldigaõ; porque ao correr da conversação, se niõ enxerga se vaõ, ou naõ em seus lugares, para o que tal fizer seja tido por Oracuio. /

Soldado Por isso disse o nosso rifaõ : por fora páo, e viola, e por dentro paõ oolorento.

Fonte Nova Grande conceyto íi% eu deste modo de homens, mas confessovos, os naõ conhecia tanto, como depois, que a frequência de meus tra- balhos mos fez familiares.

Fonte Velha Pois agora como entendeis delles?

Fonte Nova Entendo que o naõ entendo.

Apollo He cousa triste viver com todos, e julgar os que vos h8o-dc julgar; sendo certo, como antigo, aquelle costume, ou ditado, que a justiça todos a querem ; cm sua casa ninguém, e menos em si mesmo. Confesso os commodos desta profissão, mas naõ ignoro os incómodos, que quando outros nnõ tivesse, se naõ aquelle máo costume de ler sempre por ruim letra, naõera p.^nsi.u f:iil: per outra p^-irte também considero ser esta huma vida segura, onde a vkia poucas vezes naufraga.

Fonte Velha Se Apollo bem soubera a observação, que tenho feyto em prwa dcsie discurso, que mais se affirmara nelle.

Fonte Nova Communicai-no-lo.

•<ov&9 XVII 387

Fonte Velha Vós sabeis, que trazendo nosso novo Reynado mil novi- dades ao mundo, salpicarão os inconvenientes delias, naõ sem perigo, a toda a sorte de liomens da Republica. Pelo Estado Ecclesiastico Arcebispos, Bispos, Reiigiozd^, e Prelados; pela ordem da nobreza Duques, Marquezes, Condes. Ministros, Fidalgos, e Desembargadores : pelo estado comum tratantes. Merca- dores Oíficiaes e plebeos ; vimos logo, que para todos estes (géneros de gente se estendeo a vara do castigo, ou do ferro, ou cordel, ou da recluzaõ, ou do exilio, mas naõ vimos, que sendo a tormenta taõ levantada, que as ondas apagarSo as Etírellas, molhasse alguma dessas ondas a esfera dos Letrados, sendo que mostra a razaõ, naõ podiaõ ser todos os sospeytosos innocentes, como O' naCi. foraO todos os mais criminados de diversas profissoens.

ApoUo Largo, mas verdadeyro discurso. Assim foy pontualmente. fonte Nova Bem dissestes dos Jurisconsultos, sois bem informada de todo, e datil vem, que de tudo podeis informa rme.

Fonte Velha Naõ fia Coimbra, Salamanca, nem Pariz como os muytos amios, se os cultiva o iuizo.

Fonte Nova Pela conta também conhecereis aquelle Clérigo pompozo, que por acolá atravessa, taõ seguido, ou taõ perseguido?

Fonte Velha -— Naõ vos digo quanto pudera, e tinha para vos contar, por naõ levar tudo ao cabo, que neste mundo huma pessoa de alta discri- ção, desgabava uma prezumida de muyto discreta, com dizer, que Deos a li- vrasse da pratica de fulano, porq era homem prezado de ter resposta para tudo. Fonte Nova Antes he indicio de grande engenho, e lanço de estremado Cortezaõ.

Fonte Velha Eu vos direy ; assim he is^o, como sentis nos termos or- dinários, mas se lançarmos o contra ponto sobie este p>nto, naõ hade ser a conversão dos entendidos, como aquelle Adagio, que dizem da panella. e da pedra. a panella, na pedra, mal pela pctneila I Ocos vos livre de homens rhetoricos, que sempre querem ser a pedra, e fazer de vós a panella ; sempre. vos querem quebrar o verbj na boca, e que a sua valha : eis aqui o que cha- mamos discriçSo impertinente, e se mais apertares indiscrição.

' Âpollo Fallou a propósito esta fontainha corno se íora mulher de arte, ou homem de enche maõ a todos vo lo declaro, o que naõ for comedido, naõ pôde ser entendido : tal vez se realça mais a sabidoria, parecêdo ignorãcia ; se ha disaeto falia com hQ Príncipe, com hum Senhor, e em fim com um mayor, que elte, ou seu igual (e melhor se mais pequerio), he modéstia prudentíssima naõ querer afogar logo as alheias razoens com outras melhores, posto que naõ faltem; porém aqui naõ chega a mera politica sem a prudência própria ; sendo a razaõ, porque os homens mais faci mente se apartaõ, do que gozaõ, que do que concebem : com tudo naõ he deyxar de acertar, mostrar embora, que as cousas se naõ acertaõ.

Fonte Nova De esses seria aquelle grande cortezaõ dos Portuguezes, que disse ao filhp, vindo do Paço: filho vamo-nos de Portugal, porque ElRey sabe, que sey eu mais que elle.

>l/«)//o Devagar o dizeis porque naõ he ufania, mas perigo, querer sempre ter a melhor opinião.

Soldado Folgo de ouvir o colóquio e a velha honrada naõ vay fora de caminho, pelo que logo direy : eu tinha no meu tempo, quando era espadachim, bmna rodella de-cortiça muyto molle, e hum borquel de aço muyto duro ecomo a cortiça fosse muyto brada, e se deixasse penetrar das cõirarias espadas me de- fêdia melhor, ficando sempre salvo ; o que naõ fazia o demónio do barquel, que a cada briga me estalava, deyxandome convidado do resto da mSo dobre.

Fonte Nova Estranhíssima volta foy esta: dos breviários, e folinhas de hum Clérigo viemos ás espadas, e borqueis deste rufiaõ. Bom disse aquelle, que chamou arvores às conversaçoens ; pela copia, e variedade de ramos, e de esga- Uios, que lançaõ a cada palavra.

Ò88 AttTUUMIA

Fonte Velha Emenday os desconcertos fazendo conta, que ainda agora me perguntastes por aquelle escol lar

Fonte Nova Sobre emendar depressa desmanchos vagarozos, havia assas que dizer ; mas he ir dar em outros.

Fonte Velha Aquelle Clérigo, que passou, por quem perguntastes he homem de melhor sangue, que juizo; e como se o despozorio da Mitra foraõ bodas temporaes, pertende peio seu sangue a melhor espoza das Igrejas do Rejnc: aicatruzou o pobre (ante tempo) como se na capacidade dos hombros estivesse a capacidade ! Barbou no berço como se ao modo das forças de Samsaõ consistisse no cabelo a virtude ; ha por isso quem afflrme tem tantos unguentos para cayar as barbas, como algum velho verde para envernizar as cayaduras do tempo. Reza dezentoado. para ser ouvid); esquecemihe os dlicios, e disciplinas por cima dos bofetes na casa dds vizitas; e se SiRey vay a alguma Igreja, es- quecesse elle no altar duas horas: fínalmente tendo a ambição, vaidade, e cobiça de portas a dentro do animo, naõ ha diligencia oculta, que por iliicita engeyte, a troco de se ver colocado entre os Antistetes da nossa terra.

Fonte Nova Oihaj cá, ainda podèra ser peyor: eu creyo, que o mundo naõ está de todo depravado, em quanto vejo durar a hypo^ezia; esse fingi- mento de virtude ainda nos algum sinal de que ella pôde valer aiguma cousa. Ouardenos Deos de homens (e mais deste estado!) soltos e despejados dos de- vidos respeytosl

D. Francisco Manoel de Mello, Apologoê.». ed. 1721, 156 a 164.

XVIII

Preparativos para o descobrimento da Ilha da Madeira

Vendo*se o nosso Rey Dom Jo9o Primeiro, de l>oa memoria, ]a desocu- pado das guerras de Castela, naõ quis, como varão constantíssimo, esperdiçar a serenidade de sua Republica em d repouso, com que licitamente pudera gozalia, despois do largo trabalho de sua recuperação e defensa. Armou nobre exerdto; o qual passando o mar. antes q algum Príncipe de Espanha, conquistou acs Mouros, a iliustre Cidade de Ceytá, e antigo povo de Africa, a quem deu me- morável nome a perda de Espanha, que por suas portas teve principio. Alcan- çou Dom João este triunfo pellos annos de 1415, ajudado n9o dos Vassalios, como fílhos. mas dos filhos, como Vassalios, servindo-lhe de Capitães de suas hostes o Príncipe e os Infantes; entre os quaes se sinalou, em valor, e disci- plina, seu terceiro filho Dom Henrique, Mestre insigne de toda a arte militar, e de nossa milicia de Christo; por ser mais rico, e afeiçoado ventajosamente a emprczas dificultosas; cujos intentos, crecendo em a virtuosa emulação do que via conseguir a elRey seu pay, em si mesmo se estava cada hora ensayando para mayores efeitos.

Havia o Infante estudado, entre as matérias Mathematicas, com mais afeição, a Cosmogrjphia; e como em Africa praticasse acerca delia muytos Judeos, e Mouros, noticiosos das Províncias remotas, e das costas, e mares, que as cercão, instantemente se inflamava seu coração, em o desejo de deso- briias, e ganhalas; nlo para acrecentar os domínios temporaes, mas para dila- tar a Catholira, e «-evereacia do nome de Christo; de cujo divino oráculo, he fama, foi animado à tal empreza.

Resoluto, em fim, a fazer a Deos este serviço, e este beneficio ao mundo tod'); para melhor executar s-.nis propósitos, recolhédose da jornada de Ceyta, se íi:ou no Alcjarve; donde em a Ancra de Sabres húa Jegoa apartada do antigo Promontório, qMc Sacro disse-So os i^Jornarios (e dahi SagrOy a Sagres, a qaem

BÉctLo XTii 389

chamamos hoje Ca^T de S, Vicente) fundou haa vllla em ordem à sua assisten- cii, c m.-yor ccn^do das nav gjco/ns ^ut iitenfa^ra . .. que despois cm mais Poiíugnez, e grjto modo, foi dita : Vií'a do Infante,

Por ebte tempo, e.dtsie este lují-r, r( mtçou D. Henrique novas conquis- !3s, e desco.irirnenios : revolvendo cada dia suas embarcaçcens os mares do Ailaníico, e Occident^J . . .

tntre as D^s^ors, que o Infante D. Henrique ocupava nestes descobri- :ncnto3. foi principal (pello menos, ní\õ se s.ibe de outra mayor) hum nobre Cavall iro de sua ca>a, que disii-rcõ : IO'lo Gcnçalv s Zuco Dnvida-se, se por alcunha ap^li(k), cu fjç nhi :^o a c. -dá^) n) Paç) e diNCip.iaa delRey loaõ o Píirneiro, e pir (ille «iidi^^em g-anie p-íIíti.çiõ ao mfant:. Nao havia ainia n?ijte t^moi os l.vros djs Fil.i; me os. íl-lc pcriTianece escrita a Nobreza civil Cu,.i invé^rõ, ou form-i. síí a hou .n R ynido de D. Afonso Q-jinto. Por esta rízlo. Hcõ por falta de talUdade, que tin Í.;ò Gonçalve? hcíuvesse (poissegQdo a'firmíõ os q le d^le íscrticm, era s b ) c ;id'.miíiíta â de seus cõpanheiros, coaio se tm Iolõ do Bnr s) c s>* nc!'av3 ncl'e menos, o ticulo de Fída'go, da casa do Iiiíanie; a 'ji;é servia iios posi .s de mayor confiança e au oridade: qual o m nJo que lhe encarrt^t u ccm s')rs unu.s, cm que de força havia de con- cor.er a mSo d:lí^ei; c:Jo ;.:.pitjm mór do nur, a p;us diztm que era; e este o mayor litulo, qu.i nossas R:ys d v. õ aos Caoos de s^us exércitos, no mar, ou nocjmoo. He t imbuía de ailvertir, qu^ n:js irm;\s do Inf nte, se incluyâõ as da í^e.i^iai^ de Criri^to; d: cjjis renl^í-s iJom H nri ia2 fornecia seus navios; o que Urnda, cOiHO he. sen d i/i«ia rosuUa en m íy >r h^nra da p:3>oa de loiõ Qon- piv í, e proTiinenci í <io ^^r'nle iie>r, qu^ \o'^^ cm s?us princípios ocupou r.eu: R jno; o q ul se Ih i o r.ro oo'.s:i 1/ :o, e rnercv!im ntos ; havendo sido un dos Capii é., que l'Ríj í) «m íom^ o P 1 i^ira arnuu cavalieiros. o dia do ss aito dv! C^^y í« ; e quo d '■noi^ cin 10 i 'S as •*iíu)^ez-.^s (je \fr ca, acõpin ou a t.R i spu sen^Tf o. (; [i..". e <>'ij a 1 •. (A :i«íi s ri^^ul' (i <;<dí, que se d z dellc : Foi o primeiro C/pitiõ, qne introdiizio em os n ivios o uso da artelharia.

Nsi ti f 'f na gt>\Vt'iir'(ln Ml Ar ii;- a, dis ovico m Gonvi^iv f, pcllo e>ir ito de ii:b';Ifr, a fi:n d'"" pi'5jr-<e á cosr:» de Af i:;-, nos pr!i:ipio< do inno de 142i> havêl) cu o ?nio jir s p vs-d> de MIS, cotio acaso, dpscu- ^ rt) a íl'ia í'o Pofi') v->ní >; vir.dj a n ra h> n )r ra/.ío de i^r id s tormentas da vlígcm, que uiu 1 e.vcS) fi^.-rra, »:m d-man Ui d ) Cabo B^jid tr. Naõ estavflo íiníi as cont nd^s ác P.r'.u»,^it e ' ast'iÍL por o"!»' t^ nT)ij tim acabadas, que tnire o^ subd tos, n\ > . ouv'•s•^e r.lj^ar o: 5' cns de diiordii dond.' p-o:» dia, 'lie Port ig ie/.«M. e Cas:e!rnn »s. e sM Uciv <"5 nr nd r s^"*, qu:i';d.) no mar se acHdV.õ s:m oaíro pr tx.), qu* jn ç^r r-?t: o : rrr s^-^r mis pcderoso.

Faiccer.-í c>n a t ia. a 5 d ^\ ^•;-^ dt l llt). o A scr»^ d Ca^atrava D, Sanro fi TO ultiin d iRt.^ ^. r r.nn 1 ) \r:T^.'^; o q ia M\str* de xára eu 5vU tcst mr.uo 'lum ri o i^ij) \)i í-ui '''na; na''a >\m de ^^arrocos. fos^e il rts^atados muyroí '*a'i/o> C -i i.tn )s ; '^ <M:recs::s fo nu i do** que r.ccbe- rs-í pridici.o io- id;jde {•) I' ) r^^^ d2 d-) M sir* di "ai trav«) o Piloro Io õ de M .r«fCS de q 1^ n ui>/v(no> ' u ) [iirj-d r m^nc'^. e corre-á if[iial por iodo esietfjíad). Síi7 çr^ a a ia: ■'i'- d i>. .\-'i^' a ifi. e n luli lUa, q cõlu- zia a íspari ia. a n< o* dji^í 1 *; r^.^^ .at id >^ '"a rcMiio^. qi d)5jn(l) d «s- cub^ria, ii A^n .d 1 d^ i )- ^ Ci ■yy-.^v s, e ')";'7]i ia d ts m.\''í)-; ma;s \\^ iros, Vvy), sjm Ji'^ai d i^en-Ja, a í'M p>i'' ; -u .'> <> ! ii o .-Tentaud > a m -rrii dos r I d Jos, coui j ii^n c.-rfo da ci', in u'i > d 1 1 f int Do u í icur (| 1 1 la s dcu \< ^ ) libefd.de, res rvando m) narj si a ! > ó d W ^r \^<, que (O o \m^'0-^ mais p a- tica, edíl-íisj^ ♦!Uv''if) ijuis ai^i s ii-rn» Id' t^U" ; t ui uid a 1 ) p íif^ria al- cançar dtí' e aK^fln d !5 noti i^'^. q v '.'is*iva; do quf' n-o')os t>). s: ido ci rti- fi:id'.) [.íõde >\ r-"i'os ti n p.^ u c) f f 1- -a a n<^\--\ n^'.^i.ò q /oru > lirni m astuto, SC o ercceo vount^-ii; mi nte p ra mtví coti 1 ua p i^^i. ( ftr í», à cu^iosidí^de do 1. fjnte D. Hrnrlque pTaú pn lo d --'^p Io^o a l '.-(^ 'lonç.dvcs, p^t^ dv) se- gredo da nova terra, que '. «ptrsva i.iculcarlhc, e crrcb. rando as noticia'*, qut

2S

áella tinha, com a historia do Ingtez Roberto, a hsvla entendido.

Mais rico d'e5ta espeiança, que de outi loaO Gonçalves ao potio de Terça Nabal ; dond viagem e faclt encontro, apresentou ao Infante ^nem deu conta de sua arte c segredos. O que examinado, )a naõ sabia a hora, em que havia e tailto a seu génio acomodada : porque sobre pes fazem ventagem aos mais homt«, na sutile mostra mais expressamente, que no apetite, a entre seus, e nossos afectos.

. D. Fraacisco nauMl de ndlo, Epanaph*

XIX

Carta a hum amigo acompanhando ui

Bem aulados e tanaõ os pequenos, se f

Igual 30 beneficio I Entíõ tor.iõ agradecido, .. , ,

que o naõ fossem. Quis Deus que esta miséria nos escapasse, ou nós a ella : porque senaS prezasse muito a Fortuna, de que, sobrr nos deixar mlserauei;, nos deixaua também infames. Oe outra sorte a grandeza seria contrato; poii dar para receber mercada parece, e naõ generosidade. Mas que conta dera eu de my. se houuesse de pagar a V. M. quanio lhe deuo ? On se para tiie pagar necessltastie de outro metal que a memoria das diuidas ? InuençaO fuy do Amor, ' que ou desprezou, ou naò alcançou outros tezouios, que acunhar animas, t bater vontades, com que satisfazer a todos seus acreedores. U teparei em que, | naO sem mistério, chamamos: Cifra a qualquer figura, que encerra algum >:- | gredo, e Cifra, áquella figura de Arismetica, que não montando nada vsloi j a todas. Digo eu que deue ser este, o geroglifico da gratidaO ; parque sendo em » naO mais de hum humilde afeito, realça todas as obras, a que se ajunta. On '■ ã:nhor, à conta destes nadns, receba V. M. este nada qpe lhe offerefo. Quei- | lesse embora o Hlosoío, de que a amizade faça do nada algul cousa. No cabo . de tanto deucr, começo a <leuic mais, oDngando, a que acceite V. M, culpas poi satisfações. F^m fim sSo obras minhas, que agora acertarão, em buscara V. M. j Mas este caminho dias ha que o sabem os meus errores. V. M. he taO Poru- guês, e taí^ bom Potiugiiés, que naõ engaitari a conuersaçlo destes consoantes; os quaes, ainda que mtus, postos com pouco artificio, e pesadas em bteue conii- deraçílo, (na& scy eu, se st: parecem com aqueili-S a que imitaO) mas se Itm, sequer, hum gram desejo de se lhe parecerem. Rico he o mar das mais sobeibai aguas, e até o nos.so rio7.inlio de Alcântara corre pára elle. Outros seraõ Tejoi, 1 e Douro; este he pequeno regalo, mas leua o que tem á presença de V. M. e | quem dS quanto tem, dizem por que naõ he mais obrigado. Tamhsm as nossas velhas sâo Arlosioí. Nos>o Senlior &c. Toire em 2S de Outubro IWÍ- Id., Otrl'ts K.imUl".!-^!, fd. 1664, Primeira piitt, IS9.

XX

Carta a hum Mi';istrp satisfazendo ai[]uiias Faltas de correspondencii

Qvc corrcspoiídencia se pode esperar de hua alma despadaçada ? En ta* chani:ira .litiiso, se o fussc da violcncia a pessoa, com que ao espirito se per- doasse. Lá clteg.ií as lanv'as da sem ra/ão, fere a dor, mata a melanculia.

'

tâoDLo xm idl

Ainda mal por que os meus desprimores tem taõ grande disculpa I Ando fora de my ha muitos tempos; e agora ando sem my ; porque nSo bastou que me datruissem e^tes que me perseguem, stm que taiTibem me enganassem. Tenho obíeruado vpy o meu negocio acima taõ perdido em fim, como meu. E sup- pos.o que da Altura muico pudera conll^r. a minha fortuna me faz temer n9o □enos.. Grande escudo be por certo aquclle, de quem V. M. me auísa houue por b(m cubiir, e amparar com sua somora minhas desgraças. pelios D. N. iuuia saoido a sineui^r mercê que a Scmiora N fjzia ao meu nome: bem mais deuida h* est?» obra ao seu sâgue, que ao meu merecimento, de todo indigno detai auxilio. S"í esta Princesa quis mostrar seu poder, e bondade em me valer; tíd acertara com outro sogeito, em que tudo mais se luzisse ; porque taõ grande desgraça, de lammho fauor necessita ua. Mais naõ ha em my. Mas também fora Ligraiidão faltar eu com o material para esta pbra. V. M. pode offerecer-me a jeu5 pés dejotissimo, e perpe tua tr. ente ohfipado, e necessitado da honra e mercê que N. comigo exercita: nesta vitima q f-içjõ mais nccessí.ria, que em ncnhufi das passadas. Estou certissimo que tanto neste rogo e ofíerta, como em tudo nia's. que me tocar, ncõ fj ttrá V. M. em me fazer mtrce. conforme tenho visto, e espero ver em quanta viui, e também merecer. A consulta parece naõ tardará Quito em vir á secretaria. Queira Deus seja de tal sorte, que tenha V. M. o pri- meiro contentamento de bom succtsso: e guarde a V. M. muitos anos, como dtiejo. Torre cm 1 de Setembro de 1594.

Id.. ibid, 507. XXI

Us ilguas memorias que ha até o fim do Império de Octaviano Aui^usto...

Com a paz uuiuersal que veo ao mundo, nacendo o Author delia, a tiue- rão todas as Prouincias do Império: e cilas nosso Reyno de Lusytania, can- sados já seus naturaes de ta d continuis guerras, como troiixerão cos Romanos, ca dcffensâo de sua libcidadc; vendo quâio menor inconuen êntc era gozar ktla sogeyçâo liure pêra todo o mais que não fosse Reynar, que susientar liber- dade sogtyta a tantos contrastes, como traz consigo a guerra. Peta demonstra- ção deste repouso (poucas vezes visto dos Romanos) mandou Octauiano cerrar a vitima vez as portas do Templo de lanno, de trcs que (como quer Paulo Oro- 5io) as cerrou durante o tempo de »eu impe^io. ser.do ani-go costume tellas abertas cm qnãto auia noua^ OnquIsLis, ou r*ioui icías ribclLdas, o qual teue Ku principio (conforme aponta .Microhi) ra gu rra d< s S'^inGs, viu-jndo ainda Rómulo: porque estando a pi rta do 'íe .Iv) Ov\ I. vo j-mt^- a outra do iMuro da Cidade, q alj:tli soldados Komiinos (1ovx.il'.; di^tip: r.-ula. n edo dos inimigos, e indo os Sabinos pca entrar p.r ti 'a. s yo óc dtnio do Terrp'o hum Ipe de 3goa tão copioso e qiõ'e, que btist u a iirjv.dif a entrc-ia aos v'o:itra;ios, e segurar a ruyna e dcstruv^ào dos Ruiiiarics, e p»»r icc()..ii'-:cimi mo deste 'jenefi- cio, em quanto auia gucnas c "-tra Roín.í e-ta./io :s m.ns ('^st»-' ti-mnln aber- tas: dando nisto a entcniera ccrfian»;a (ju : lin^ áo em tu ir í?.() bem o^ itjp.iara. E d-íste tempo tio an if^o. ate o de 0.'taria'io, as vi ?i> cjrr; Irs, nynando Numa Pompilio, e acab.uia a premeia lu-^^r.: d: '"í):ll\"^;c, tcU) cvu ui Tito M,n'io, mas. o que os atitig s ai a nu. rio i^. .< r r:i!i..* e « in tjr. o d muso de annos, se vio três vezes, nts c nco-^^ a e í-tis rne rírmi o Im^^cru. de Oct ui?no Augusto a primeira das qudis Ua >rA) la n l; t.ra cini' ci.fu I/-p áo, CIc^d tra, c .Marco António: A sctjun 'a. d ).: ;i'M r dmv j, c .' v.i. ' a, rn"5".)r.'itL.dos os AUmSes e" gentes do Illirico. E dt-n e-i: .'i-. u, tci: -j rr/ii.'! "r<:i -e repouso, oacido mais da presença do seu Cjialur 'juo n.eliv' viuu ja yiu.n.uiado, que do

temor das atnias, & patencia do Império Romano : & wciauunu i;oxou o qnc ine ' reitBua da vida, cO grande Iciicidade, t fora mKyor, ^e lhe nSo taliara nos des- cindentes, porque de qualro mulheres com que foi casado, ouce hOa Rllii chamada íulla, mci:os continente do qiie sua nobreza requeria. & sendo lívtnvi de dous maiidas, chamados Marcello e ^grlppa, a caiou vitima vez com Tibeilo leu enleado, filho de su^ mulher Lluia Dni Ma. k de Tibério Nero, com quem fora casada, & a quem Octaulano a tomou pêra 'e cainr com ella. O dote que deu ao enteado, fcy toi^alo por filho adoptiuo, & hhbilitaJo pêra a succeíslo do Império. Do que reste iãpo succedia em Portugal ha m<>j pouca nctícia, porque como cesiarão as guerras, St. viu.iio todos so*!cito3 aos Legad )s & Pretores Roma- | nos. nlo auia cousas dignas de ponderação, que os Authores deixassem tm : kembrSça . . .

Fr, Buaaida de Brilo, Sfonarchia Lutitana, pirtt il, fl. 1.

XXII

Gonçalo Hermíguez o Traga-Mouru

Tratou Gonçalo Hermígucz com algQs caualdros amigos seus de faicreni ' ' hfla entrada em terr^i de viouros. & correram a villa de Alcacere do Sal, qu^Mi , estar muito adetfo em letra de im gos nSo ttmia ser conieiiila scnio por e>.er- ' cito formado. Qoardousc esta detcimm.ifSo cm sigredo, jut nSo vir à aoiicla dos Mouros, ate a enirada do mes de lunho, em q'ie se foiSo a lisboa poucos ^ poucos por caminhos diveisos, pcra a^^im encubrirem main o caso, & aos áca- noue do próprio mes, tomando aigOai baicps se meteiSo a mcisúe pello rio. is , . outra SC passou ao castelo d-i Almada, louando todos concertado de acotnLterem os Mouras na madrugada d;; S. loSo Bapiiscd, t Qs por mar, outros p<n terra, de modo que se achassem todus ;un:>s m emntesa. Faiio^eceuos avintura porche- j garem vespora di S loito a rjoue, l.ús pe'lo rio, & outros por ti-tra 1 vlsis àt villa onde os Momos d. '.s^i iria ri os tta s.Hnemantc rebfif, andau.w) ocupadi» nu festas & jogos, 4ue co~tiim-i3 I Zi;r cm tal Jia. & na madriigiida do seguinte an- . tei de lOpet a mennam, leudo o campo (a leu parecer) jtguro, & o no desocu- pado de vellas conirartas, nbrindo :is porias da villa se safiíSo ao cairpo Mou- ros Sí .\louras, ouims ineiidos cm b-.tcii se a'a'garlo pclio rii, cantando w'ú romances & lioius ao Mi>uiisco, i la/e do grand-^s aíc-zattas, A as Múuisi no- bres eso;ilha(].ij '.ttis ;iciliis ortas <.oin c.T]'e ias d ; flu-es nss r.liefas, cutras aa longo da prjya com ramos verdes nas mj^is, a.Span' adas dí: .MuuiOs illosirei, hiao goKando d :s mu-.icas dus oarc.s, * da fr s.ura da menham, agoarcindo que esclarecesse malj o dia p-:ta verem i tl.i gentil escaramuça de caualo, que se havia de fazer. St quando si; d.aiiíooor !na:s sc^.iros.ft o contrniamento andiua mais em seu p.^rito savo Q )nç4l'> ticrmitiiicz da cn-boscada, & postos os seu^ em concerto mandou lotar ús trumbeias, 4 uritando por Santiago, dcrSo nos Mouros desarmados & vusiid.s de ícs^a, & es barcos do rio ícmsnd^i com Ioda turla peri os contrários piisciâo tudo em grande confusaO, sim auet Mouro que tluesie acordo peia reparar tSo jupiu it.sgiafa, ii se o gos.o de mMar & catiuii nlo ocupara o cntt;iriim:nlo d.,s nussjs, sem duuida puderilo ganhar a vi;la 4 fiar tcnliorcR duiia...

Acoiíteceo ver ni,nf3'0 llurmgicz enire cuiras Míjoras eatluas tai cufi estraiiliji fermosura r.>de nn mcn ri.; ti w contiísS» & ruido de aro as oiouV-ilie * Coi:.çíu a te cOp^d.-rcr iIíjs la ;nni. s que il?e via san dos olhos, & ci.ino nesK nico êiii .icditise da villa muiu (t nW de C uaiio, ass'in dos que cscspario I"* eiiiúa Cunii> do^ qui; lUs j.íií^ú i^ií, i começiísiem a jugar ai lançidai cH 0>

nicmjo Tfti 393

nossos, o capitSo deu pressa a se recolherem os despojos nas barcas pêra se âlarjfarem de terra, & Vvndo que se n^ío podia recolher tudo sem perigo, dei- xando al^Qs catiuos na prayi, mandou Jeuar ancora, A^ seguir sua derrota, por nio perderem muitas pessoas a troco daS poucas q ficauSa em terra, entre as quais ficou a Moura fermosa que o capitão trazia de olho, & quando os quis por nella vio que l;um Mouro de cauaio a tomaua pcra se recolher com elia, & a por em saluo, peilo que largando ludo o mais, & pondo as pernas ao ginete se lançou trás o Mouro com tanta velocidade como hfl rayo, sem bastarem ao deter muitos que ihe sahiaõ ao encontro, & dado que C3m a lança de arremesso ;lhe pudera fazer dano, deixou de lhe atirar por nSo of fender a Moura que leoaua cõsigo, pello que apertou tanto o cauilo que ouue de chegar ao Mouro, a quem ferio de hQa cruei lançada, & cobrou a Moura com a qual se tornou á escaramuça, & Vendo que os seus andauSo muy embaraçados nella, temeroso de fobreuir maior numero de Mouros & lhe tomarem os passos, fez tocar a retirar, & como gentil ordem se forSo despidindo dos imigos a quem foy por mujrtos annos assaz lamentável aquelle dia, porque nel(e perderUo entre morta & catiua a flor & nobreza de sua v;lla, & assim as deixaremos em seu pranto por seguir- mos o valeroso capitão Gonçalo H^rmiguez que alegre da vitoria em que matara tantos, & muito mais de cobrar a Moura, hia com eUa, sustétada no braço es- querdo cmparandoa com adarga, & com a lança na direita rebatendo algftas arremetidas, que os imigos vimhaõ fazenio na retagoarda, ate que desconfiados de cobrarem o pedido, deixarlo can mar os nossos a seu saluo ate Almada/ que entSo era hfla pouoaçaõ muito piquena, onde estiuerSo aguardando ate che- garem as barcas pello T^\o acima, nas quais se foraõ ate Satarem onde cstaua d Rey Dom Afonso, a quem foy muy alegre a noua de taõ bom succtsso. E vindo a repartir os despojos, escolheo Gonçalo Hermiguez pêra si a Moura que canhara por sua lança sim querer nenhaa outra cjusa, com a qual acabou em breue tempo, que renunciada a ley de M-díorm se conuertesse á de lesu Christo pêra se poder casar com ella, A no baptismo mudou o nome de Fátima em Oriana Hermiguez, como lhe chama a memoria de que vou tirando toda esta historia. Taõ estranho foy o amor que ambos se tiucrSo, que por marauilba se falaua nellc cm Portugal, & o mostraõ bem algQ? versos que lhe fazii de que porey algtti, que tem lugar em qualquer obra, por se ver nelles os mais antigos ter- mos da lingoa Poriugaeza.

Tinherabos^ nom tinherabos, Tal a tal ca monta! - Tinheradesme, nom tinhêraiesme. De la vinherades, de ca filharadas^ Ca andabii tado em soma.

Per mil goiuos trebeíliando, Oy cy, bos lombrepo A f gorem cada folgança Amimei eu: per que do terrenho Nom ahi tal perchego.

Ouroana Óuroana. oy tem por certo Que inha bida do biber Se a^uidrou per ten alindro perqiie em cabo O que eu ei de la cheb ne sem referia^ Mas não ha per que se ver.

Beriiráo áe Brito, Chr, de Ci/tter, tá. 1002, lir. 6.», cap. i, 370.

394 éSToioQU. PS08A

XXIII

Habitantes de Viana; a cidade

Os homfis ou sigfl o as armas, ou as letras, ou se dem à mercancfa & na- vegaçlo em tudo prováo .bem, eu gèi'al açudes de enefenhos, duro^ no trabalho, capazes, slzudjs, amigos do bem cosia, & da conservação delle, moderados na vida, & gasto ordinaao, nus nas occasiõ^s de honra mais q liberaes: esforçados & animosos nos perigos: briosos em todo o tempo, & amigos de se lazer res- peitar & conhecer por taes; nas armas, & nas ciências tem lançado homès di tanto valor, & tantos em numero que se fazem agravo no que tem por honra, que he naO buscarem escrltcres que os façSo no mundo celebrados-

Todos os nobres exeré/iaõa mercancia a vso de Veneza & Génova contra o costume das mais terras de Portugal, que os louvSo & naõ os segu^, invejão a felicidade & bõs sucessos do trato, & nio sabe Imitar a industria. As moKieres naõ vive em ociosidade, mas são daquelle humor ^ a Escritura gnba na q chama forte, aplicadas ao governo de sua casa, & a grangear com trabalho & industria das portas a dentro, como os homè> fora de casa. E onde isto ha naÕ faltaõ as mais virtudes de honestidade, & cõcerto de vida, Assi ha matron^ts de muyto preço, & bom exemplo, & tio inclinadas a encaminhar as filhas a serem molne- res de casa, & governo: que assi como em ottras terras he ordinário na tenra idade mandallas a casa das mestras com a almofada, & agulhas: assi nesta as vemos ir às escollascom pape', & tint^, & aprender a ler, & escrever, & contar. Como a gente he tal a terra he bem governada, barata, limpa, bem provida, cheya de fontes trazidas com arte a lugares differentes pêra comodidade dos vlsinhos, & fabricadas custosam^-nte.

Ha muytos edifícios nobres, se bem saõ de arquitectura ordinária. Nas mais das casas portaes, & janellas de pedraria com suas rexas de ferro, & seus brasões, & divisas sobre as entradas: dentro concerto, & policia em atavios, & trajos, & alfayas: os templos D»mo as casas, não tem excellcncias de arquitectura, mas riqueza de retábulos dourados, & abundância de prata & ornamétos, & bom serviço, espcci Imente a Matriz nue he a>:ompMih:ida de grande numero de clé- rigos, e autorizada com suas dií^nidades de Arcipreste, e cónegos. No edifício tem grandeza: & nos officiís divinos grande solenidade & cõrurso de todos os estados de gente, argumento de devaçío & bom espirito. Ha dous mosteiros (Je freiras de grande observância, que cada hum passa de ceni religiosas, & outro recolhimento de molheres honradas pobícs: mas nSo avia ao tempo que o nosso Arcebispo ali foy mais qum Convento de frades. & esse fora da villa httbfi espaço, & de religiosos entregues mais à vida contemplativa, que aos cuydados & trabalhos da activa. He a Ordem de S. Francisco, a Providencia de S. -António.

O rio dece acompanhido de hOa, & outra margem de quintas frescas, & casaes rendosos, & lava os muros da villa v-^a banda do Sul. Não traz muyta força de agoas, que he causa de sbrir pouco em foz, & ser a barra estreyta, A de pouco fundo: tudo he n mellior, & mais s",pura, & limpa de toda a costa, desdo Minho ao Tejo: & nío a gabamos muyto poiq nesta distada a vedo muytos rios, & algfts pod^roFos de 2gr»?s. ha porto r.ê barra perigo. Para estarê ?e ^uics d s í;rrp )racs os Uívics q cnírao, & aver juntamente como- didade na car^a & di.'sca'?a delivS corre a^ lonoo do rio grade, & estend»do cães de gro-sa cearia, ultjnvmte fundr^do & terraplenado, com suas decidas de escaddS e lingo.tjs para stv ço d ? tcda hera : obra de muito custo, & de grande importância, & nobr-jzí. p^ra villa : & vay cont nuando rio abayxo atè despegar dos muros: & drspois de acomuanhar hum espaço a povoaçio de fora alarga contra o rio, & logo recolhe outra vez para a terra, de maneira que íaz «ndina

•icuLo xm 395

hfla boa praça : & da esquina donde começa a recolher, lança hum molde de forte muro, que corre agoa abayxo hum bom espaço, arqueado como um braço : & assi fica fazêdo hum reducto capaz de grande numero de navios, estancia seguríssima de todos os vetos que aqui fazem dano, porque alem de podorem 6car détro os navios em seco & as proas em terra, ou metidos na vasa, fícSo emparados dos ventos travessias que entr9o por cima da barra, com outro muro q abaixo em distancia competente sae da villa cõtra o rio, & faz frõtaria com a praça que dizemos assim. Guarda a bocca do rio h&a Força feita à moderna com cinco gcSdes baluartes providos de boa artilharia, & guarnição de soldados com- petente. Mas melhor a guardSo os moradores da villa, sempre espertos, & sem- pre prestes a tornarem por sy. A vlila he cabeça de Comarca, & CorreyçSo com majtas villas, & Conselhos sogeitos à jurdiç9o do Corregedor delia: & tem mais dotiis ministros Reaes letrados : hum que he Provedor da Comarca, & outro Juiz de fora que administra iustiça na villa &. termo, Sc preside no governo da Camará. A um tal lugar parece que faltava para inteyra nobreza húa companhia de Pregadores, que como soldados, & juntamôte mercadores do Ceo esforçassem a devaçSo, fizessem guerra aos vícios, & abrissem logea de mercadoria, & trato celestial, onde tanto havia da terra.

Frei Laís de Sousa, Vida de Dam Frei Bertolamev dos Mariyres^ ed. 1619,

llT. I, Cãp. XXYI, 47.

XXIV

Discurso do Arcebispo de Braga D. Fr. Bartolomeu dos Mártires

ao Pontífice

... Mas, Santíssimo Padre (acrescentou o arcebispo), huma obra tio santa e de tanta Iustiça nSo tem inda sua perfeição. Que V. Santidade tirou e nSo consente que os bispos que nssistem a sua mesa estejSo em e descuber- tos, como em tempa atrás se soffria; què mais razão ha para estarem da mesma forma nas |untas e congregações que se tem diante de V. S., como notei nesta flitima, que durou três ou quatro horas, e todos estiveram em quantos bispos íorSo presentes, e com os barretes na mSoV Juntando-se outra desigualdade que pêra o meu entendimento faz o caso mais indigno, a qual foi ver no mesmo tempo os cardeaes bem assentados e suas cabeças cnbertas. Se os bispos em quanto bispos sSo superiores aos cardeaes em quanto somente cardeaes (porque deixamos declarado no concilio que os bispos tem o primeiro lugar da Igreja) em que justiça caberá que os cardeaes, que tic huma dignidade instituída íómcnte por authorídade e conselho humano, scjão aventajados diante de V. S. nas honras do barrete, e assento, aos bispos que forão creados por authorídade divina pelo mesmo Christo, Senhor nosso, e succederiio no lugar dos santos apóstolos? Que razão pode aprovar que onde os cardeaes estSo com tanta honra, fiquem os bispos humilhados, e abatidos, c afrontados? Beatíssimo Padre, os bispos em quanto bispos s3o vossos irmãos, e como taes devem ser tratadas.

Id. Vida do Arcebispo, ed. 1763, pá^. 180.

XXV

Doença e morte de Fr. Bartolcmeu de 8. Dcmingcs

Stndo velho, foyselhe corrompendo a chaj^a da perna, & era íntolcrauel tormento, qut lh« causauaG as dores, & juntamente o asco, & mao cheiro da •wnipçiO. Mas acudialha Senhor com haa paciência tãto n^avor, que o traba-

8Ô6 AMXÔLOGU ri :>iA

lho, qu£ nam parecia pjciíncia, senam alegria, &tríumpho; chrpau-Õ os religiosos a consollalo coii Usiinn^í ; trys respostas lhes dauj, que tornauaõ compungidos, à confusos. Deres sAj, dizia, cio Infcr lo. as qu me cercão; mas eu tornara ter muitos corpjs. & em cada liun muuos m is membros dos ordiná- rios & em cada memfjro outra tal ch-ga. Ha miú:o imy :rosd> esdis que p átço neste: porque tudo fora ginho para rni'n, (!í: nurce áz m^-u Senhor lesu Cnilsio, para lhe sacisf''zer, por m^us gtandwS p2i:cjd s, & a^gUi pnrte d.) muito, qui elle fez po.- mim: eraõ d s.jos ái cor.n;A:>. ^^areciqui foraõ o juidos no Ceo Nam se- pôie crer a tempos avie de males, que vier: õ di nono sobre eile. qu^a longa id ide fazia miis pe^^àdos. Vtyo a fi:ar lo hido de todos os membros, & sem mouimento na:ural em n.nhum m^is, que na »i gja, & olhos. Ias neste estado a lingoa, como a de outio Io >, prcgjau.i louujres de kos, & os olnoj pregados em num Crucifixo dauoõ testemuaho cj.n abundância de lagrimas, que tudo haula por pouco, para que se sentia obrigado a padecer por tam bom Senhor.

Deu o Ceo segundo teste -nunho em honra do San:toao? quinze snosdes- pois de seu bemdito transito. Abriose ac^ua [jara outro defuiuto (estiucra ate entflo respeitada, por quem nclia j.iz a) '.-is que aoparece estranha raarauilha: topaõ os coueiros debaixo da terra com capa preta, à habiios b an?os, taTi saõs, & puroSf como se daquella boia foraõ aili ^an^ados. Passarão adiante: 2c'^£õ o corpo Inteiro, & tam longe de conup;aõ pua rnais osnantar, qu2 Jilcgrauí, re- creava, & consubua hum nalito, que d-jqiu!la teria fria esp raua: terra tam po- derosa, em virtude do Senhor a <]ue:n ^eru ra, que bas:ou a com nunicar ua incorrupçào, & fr;ígaicii, iité a la n dos annnais. de q]v^ trn compo toove^iido. Digrtissimo caso para se ilustrar com mais que cscfiptura o dinarii: se nos nam fizera pusiilanim:s em tod) tempo, recear. nos, que nos lance cores ao ro-to, celebrar cousas, que por ^crem de no^^^os ir-nSo-, fi !jõ em lugar út p oprias. Híia, & outra ficou a ocneicio da tra.liçiõ, cSf inem )'ia dos sucoe>sores: mas sa- bidas com tanta certeza, que na^ lu iicnhQi- na Prouincla mais aueriguada.

Fr. Luís de Sousa, Vila de S. Donunyos, ed. 1662, parte ii, cap. v, 127

XXVI

UltiniLiS m jmentus de D. J,ão de Castro

Achava-se D. Joio de Carro ^r»^tT.'o rn^nos dos amos. que do? trabalhos de tSo conTinu:is gri^crras, cm qi? vei > a ca»» r-'n.1'do ao p.iso do t^o graves cui- dados. Enfermou g"avcaien'e e d>:scob;io a d.ioMçi e^i poucos dias indícios de mortal, o que cile con^ieLCudo p lij nioe tia de r peiidõs a:cide;itos se aliviou do cargo do gv/crno. Ciia^ou o bi r>j >. jo^-o d'AloiM-^'.'rí|-:e, D. Diogo d'AI- meida l-reire, ao Doutor Ffanjisro Tus.an ', rh inci Uer-n^ór do hst:ido, a Sebas- tião Lopes Lobaio, seu ou ndor-jjii.j' .j a l!t...r íto Cu^nçalvcs Caminha, vedor di fazenda, aos quaes entre^^ou o ^i Lido co a a pz d s piincipes v». zinhos assegu- rada sobre tantas vicioíiis. .Miiili-i vi; r. <\ o ;f iverno popular da cidade, ao vigirio-geral da ludia, ao nnr^;lo d 2 S. l';.in i co, a Fr. António do Ccsal, a S. Francisco Xavier, c aos o.íi-iaei da ía:.enda Q'el-rd, a qu.^m fez esta faia:

N5o terei. scn'^nr ■? p^jo de vo^ d = :cr cn?. ao v-zo-rei da índia frhSo nesta doença as vo:n;iioaíd.iJ' s g le :•■:■ a iios ]íOsJMi»;ies o mais pobre sold ido. Vim a servir, n.T) vííti a comi riu ao Or cir:; a vos mesmos quiz empenhar os ossos de meu íiMio. e íinocn' ti os c; !)■ 1 ( ? d:i b:'rt:»;!, porque para ves as*:-- gurar, n-io liiija outras í.!i'\ ri;;'*, \v m 1',-i'Xelirs. Hoje n?io houve nesta casa diiiheiro cjm que se me. c^nipu-ÇòC luiir.a g.i.l.niia; porque nas armad.'.s quefíz

L

•ácuL<^ Tfií 397

pMmeiro comiao os soldados os salários do go/ernador, que os soldos de seu rci: e nSo é de espaniar que esteja pobre um pjy de tantos filhos. Peço-vos qae em quanto durar esta doençi me ordeiêis da fazenda real uma honesta despesa e p;^ssoa por vós determinada, que com modesta taixa me alimente.

E losfo pedindo hum missal fez | iramento sobre os Evangelhos que até a hora presente nSo cr. devedor á fdzenda roa( lium so cruzado, nem havia rece- bido cou<a alg ima de christào, judco mo ro. ou gentio ; nem para a authoridade do cargo, ou da pessoa tinha outras alfaias qu,^ as que de Portugal trouxera; e qae ainda a prata qut no r^ino fizera, havia gastado, nem tivera jamais pos- sibilidade para comprar outra co cha, qu^ a que na cama vi9o; so a seu filho D. Álvaro fizera huma espada £[urrnccida de algumas pedras de pouca estima para passar ao reuio. Qu3 disto lhes pedia que mandassem fazer hum termo, pira que se alguma hora se achasse outra cousa, el-rei, como a perjuro, o casti- gasse. Esta pratici sz escreveo nns livros da cidade, a qual se podéra ler como instrucçio aos que lhe succedérSo; nos qujcs, creo, ficou a memoria mais viva que o exemplo.

Jacintho Freire de Andrade, Vida de D, João de Castro^ ed. 1651.

XXVIÍ

o amor menino

Tudo curíí o tempo, tudo faz esquecer, tudo gasta, tudo digeree, tudo acaba. Atrevc-se o tempo a c lu ias do m^^rniore, quanto mais a coraçoens de cera I SSo as ateiçoens como as vid. s, que nâo lia mais certo sinal de haverem de durar pouco, qua terem durado muit » S.o como as tinhas, que partem do centro para a circunferência, que quíinto mai< continuadas, tanto menos unidas. Por issD os antigos sabiamenie pi iiárSo o amor meni.io ; porque nâo ha amor t5o obusto qu2 chague a s<»r velho. >e todos os instrumentos cora que o armou a naiufcza, o desarma o tcm3>. Afroxa-l ie o .-irco, com que nSo atira ; embo- ta-1 -e as :ei'.as, com que nío fere; abre-lhe os oihos, com que o que nâo via; e f:iZ-ine creícor as asas, com que vòn e fige. A razáo natural de toda tits díiferençi ii^ porqui o icmpo lira a novílale ás coisas, descobre-lhe os defeitos, enfjsua-ihe o i^o lo, e Da«m que s. jlo u adós para nSo serem as rr.csoias. Gjsta-se o fero com o uso quanto lii.iis o amorVÍ O mesmo amar he causa de não amar e o ler amado luuuo, de snijr menos.

A. Vieira, Sermão do Manddo, pregado em Lisboa no Hospital Real em 1643.

xxvnr A guerra

He a guerra aquelle monstro (uie se sjstenta de fazendas, do sangue, das vidii, e quanto mais come e coris me, r.mto morns se faita. hie a guerra aquella tempestade tcrreátre, que leva os c;in p s as casas, as villas. os Cistelios, as cidades, c talvez era hum mom( uto zo^^^c os '-c nos c rn^narchias inteiras. Ht a guerra aquella calamidade composta de todjs as calainjdidcs, em que nJo ha mal algum que, ou se nào padeça, ou se nào tema ; nem bem que scji própria

UtOLOQU— FKOSA

t Kgaro. O pae nlo tem seguro o filho, o rico n pobre nSo tem seguro o seu suor, o nobre nflo tem tico nlo tem seguia a Immunidade, o religioso até Deus nos templos e nos sacrários não está segui

Preceitos da Oratória 8ag

. . .Ha de tomar o pregador uma matéria, ... ... ........... ,^._ .,... ^

conheça, ha de dividi-la para que se dijlinga, ha de provi-la com a cscrlptura, ha-de declará-la com a raiSo, na de co^firm^-la com o cxempto, ha de amplifi- ci-la cpm as causas, com os cfFtiios, com as dtcunsianclas, com as conveniên- cias que s; h3o de seguir, com os inconvenientes que se dev:m evitar; ha de reipondet ás duvidas, ha de satisfazer ás dif[icjldadc% tta de Impugnar e refutar com toda a força da eloquência os argumentos contrários, c depois disto ba de colher, ha de apertar, ha de concluir, ha de persuadir, ha d,: acabar. Isto he ■ermlo, isto he pn^gar c o que nlo he islo, he fjllar de mús alto. Nio nego nem quero dizer que o sermío nSo haja de ter variedade de discursos, masessei hlo de nacer todos da mesma matéria, e continuar e acabar nella. Querei) víi tudo isto com os olhos'/ Ora vÊde. Huma arvore tem raízes, tem troncos, tem íamos, tem folhas, tem varas, tem norcs tmfruno». Assihade set o sermÍo:tia de ler raízes fortes c solidas, por qiic lia de ser fundado no Evangelho; ba deter hum tronco, poique ha de ter hum assump:o e tratar huma mateila. Deste tronco hSo de nacer diversos r.imns, que ^^o diversos discursos, mas nacidos da mesma matéria, c continuados n:lla. t:stcs ramos n9o hlo de ser seccos, icnia cubertos de folhas, porque os disciirsns h.io de scí vestidos e ornados de pala- vras. Ha de ter esta arvore varas, que sao a teptehcns3o dos vicios ; ha de ter flores, que sao as sentenças, e par itmaie de tudo ha de ter fructos, que é o dueto e o fim a que se ha de or^tenar o sermiío. De maneira que ha de haver fructos, ha de havei fl ires, ha de haver varas, ha de haver folhas, ha de havei laiDOS, mas tudo nacldo c fundado em hum tronco, que é huma matéria. Se tudo sSo troncos, niio ho scrtní» he marfuita. Se tudo slo ramos nio he seim.'!o s3o maravalhas. Sc tudo sHo fo.has, nílo he se'rmlo slo varas. Se tudo sao varas, nSo he scrmlo he fcÍTc Se tudo sSo flores, nfio he sermlo lie rama- lhete. Serem tudo fructus, nS? pôde ser; porqie n9o ha fructos sem arvore. Assl que nesta arvotc, a que pi)di:Tnrs cV.auiar arvore da vida, ha de haver o proveitoso do fiueto, o fotmo'.o das flores, o rigoroso das varas, o vestido dai folhas, o estcjidido dos íamos, mas tudo Isto nacido e formado de hum tronco, e esse n^o levantado iio ar, scii^o iundado nas lalzes do Evangelho: Seminais sémen. ?.]s aqui como hSo de ser os scrmilGS, eis aqui como nlo tio. E assim nau he muito que se ii.ío f. ça feudo com elics. . .

,. .Fabula tom duas si^niHc:içocns : quer dizer fingimento, e quer dtier comedia; e tudo são niuiias [.lóKaçjcns di'íte tempo. Sao fingimento, porque sSo subtilezas c p^^nsn mentos aéreos sem luti'l3mento de veidade; são comedia, porque os ouvintes vem n p:i'j;iç3o como i comedia; e hn pregadores que vem ao púlpito como comedianips. linma d; s felicidades que se contava entre as do tempo presente, eia ac;ibpr'.i!;-sc as comedias em Portugal; mas nlo fof aiil. WBo se acabarão, mudáiao-sc: p.xsái.^o-fc do Ihoatro ao púlpito, NSo cuidei! %*» ancateço em chamar comedia a muitas préga(õet qua boje ■« biI*.

8ÍGUL0 ZTIl 39d

Tomara ter aqui as comedias de Plauto, de Terêncio, de Séneca, e verielt se nlo acháveis nellas muitos desenganos da vida e vaidade do mundo, muitos pontos de doutrina moral, muito mais verd ideiros e muito majs sólidos do que ho]e se ouvem nos púlpitos. Grande miséria por certo, que se achem maiores docu- mentos para a vida nos versos de um poeta profano e jj^entio, que nas préga- ç^s de hum orador christao, e muitas vezes, sobre christSo, religioso!

Pouco disse S. Paub cm líies chamar comedia, porque muitos sermos ha, que não sSo comedia, são farça. Sóbenalvez ao púlpito hum pregador dot que professam ser mortos ao mundo, vestido ou amortalhado em hum habito de penitencia (que todos, mais ou menos ásperos, são de penitencia; e todos desde o dia que os professamos, mortalhas) : a vista he de horror, o nome de reveren- cia a matéria de compunção, a dif^^nidade de oráculo, o logar e a expectação de silencio; e quando este se rompeu, que é o que se ouve? òe neste auditório es- tivesse um estranjeiro que nos o conhecesse e visse entrar este homem a failar em nubli:o naquellcs trc^ios* e cm tal logar cuidaria que havia de ouvir huma trombeta do Céu ; que cada pai ,vra sua h^via de ser hum raio para os coraçoens, qie havia de pregar com o z< lo e com o fervor de um Elias, que com a voz, com o gesto, e com as a^çoèns havia de fazer em e em cinza os vicios. Isto havia de cuidar o estranjeiro. K nós, que he o que vemos ? Vemos sahir da boca daqueMc homem assi n?qucllcs trn.os, hu-na voz muito affectada e muito polida, e logo começar com mji:o dc^girro, a quô? A motivar desvelos, a acre- ditar empenhos, a requintar finçzas, a lisr njear precipícios, a brilhar auroras, derreter crystaes, a desmaiar ia«^mins, a fouc.ir primaveras, e outras mil indigni- dades destas. Nào hc isto fart-a a mais liip^ia de riso, se não fora tanto para chorar? Na comedia o rei veste como lei e Llla como rei, o lacaio veste como lacaio e falia como lacaio, o rústico veste como rústico e falia como rústico; mas um pregador, vestir como religioso o. fallar como. .. nãd o quero dizer por reverencia do logar. que o pulDito hc thentro, e o sermão comedia, sequer,' nSo faremos bem a fíeuraV N;lo diiHo as palavras com o vestido e com o oíficio? Assi pregava S. Pau'o, asp.i prosavam anuvies pitriarchas que se vestiram e n-? vestiram destes hatitosV i^^to louvamos e não admiramos o seu pregar? Xào nos pregamos de seus fiUn sV Pois porque o^ vSo imitam? Porque nSo pre- gamos como elles pregavam? Neste mcsn o púlpito pregou S. Francisco Xavier, neste mesmo púlpito prcçou S. í'ra:icisGo de Boria, e eu que tenho o mesmo habiio^ porque não pré^^arei a sua doutrina, que me falta o seu espirito...

A. Vieira, Sermão na Sexajesinia prc;*ado aa real Capela tm 1655.

XXX

DesGíiyiu dj polvo

o polvo com aqur.l'e sni cipc'!o na c^bzra pirice um monge; com aqudles seus raios CL.ten:lJd-'S p.ir.co unia cstreila ; com aquclle nào ler osso, nem espinha, parece a mc^rfa bi.in.iuM, a nicsnM manbijào. E d.:baixo desta apparcncia tilo modesta, oa d.sta i yp. >'riMa ião sonia tostcmunh.lo conteste- mente os dois grandes dou^oris ria I;.uta l.i;ina e ^ra^a que o diio polvo éo maior traidor do mar. Cors^-íe csti ii: ir;V) do pulvo pnm nrinnt ntc em se ves- tir, ou pintar das mosm-^s iô:.:s de t-ulis .inuciíís cò.cs a q;ie csiá pe/.ido. As cores que no camali.\o sào pul^» no i):jÍ^ c s-.o v.\ liem : as li 'uras que em Proteo sào tabula, no polvo ?.:lo verdrdc e aniíiio Sc osH ms li ios U^z .^ vtrcie; se C8*á na areia faz-se brano; se c ti no ido ijz--..; p. nio; cc está em alj^uma pedra, como ma^s ordinariamente ro-t;ii:n (Si.,r. l;-7. s^ ó:\ ló' (\i mesma pedra, £ daqui que succedeV Succ^de qn: oMlro p.ix: innoceniL' da tr içSo vai p:issár.d«

írrovoau rsosi

•IcM cautela d o, e o salteador que estí de cmboí

Sino, laaçalhe braçtn de ripinte. e fa-lo i lo fizera mil*, porque nem f^z tanto, Jud is a ptendérlo; o polvo he o qut abnça e mi<s o qti tei o ilnal, e polvo dos propiloi braços fiz a tol Kaldor, mas cam lanternas dii!n!e: tn^ou i tOQ-a muito ts claras. O polvo escurece nflo-se primeira tral(lo e roubo, qu; laE, he ã luz para peixe aleivoso e vU, qual he a lua maldade, p: he iDcnos traidor.

A. Vieira, Stnivio rít S. Ãntottia prejido r

O Estatuário

Arranca o EslatuJrlo huma pedra dessas Informe, & depois que desbastou o mais gross mio, ft começa a formar hum humcm, primeln

feiçlo poi feiçlo até a mais mliída : ondcs-lliii os cabcllos, aliza-.be a testa, n* gl-lhe os olhfS, aRla-lbe o nariz, íbre-lhc a boca. avutta-lii; as faces, tornet-ibe o petcoço, estende-lhe os biaços. espalma-lliâ as mSos, dlvide-lhe os dedn, lança-lhe os vestidos: aqui deiprrga, aíti arruga, acolá recama: & Eca vm homem perfeito, & talvez hum Santo, que se pôde pAr no attar. A, Vitin,_Strmòei, iii, 419-420.

XXXII

A furtuna

Variamente pintaram anUgns a que eSles diamararr a fortuna. Uns Itie poteram na -mio o mundo, ouiro* u-na coLnuTopis, outros um leme; uns a for- mam de oiro, outros de vidro; c to.los » fíireram c:ga, todos em figura de mulher, todvis com asas nos pús, e o< péi sõbre uma roda. fcm multas coiu) erraram como geritios. em outras ar»ripifam como e^iperimentados e prudentes- Erraram no nome de fortuna, qui; .'i^irfiia tao ou fjdo; erraram nas insignias, erraram na cegueira dos olhos e pndtrs il.H mãos: p-iii:ue O governo do mundo, significado no leme, e a dbtnbuifilo de i ^ilas as coiías. significadas na cornu- copia, pertence somente á proviílcciH divina., a qual nBo cegamente, ou com os~oliios tapados, mas com a perspicácia do sua f^bedoria, e com a balança da sua justiça na mio, é a que reparte a cada um e a todos o que para os Qni dl mesma providencia com aiiiísimo lonseltio ifm ordenado e disposto.

Acertaram porém os mcsmof giíntics na figura, que lhe deram, de mn- Iher, pela Inconstância : nas a^as d.s pis, pda velocidade com que se muda; e sobretudo em l)i'os pAre'n sobrr uma roda ; porque nem no prospero, nem no adverso, e muito menos no prospero, teve jím.iis firmeza. Dos que a fiíersni de oiro, diremos depois: o que reora sómenie me oarece dizer, é, que qnea fingiram de vidro p^la fra 'ilid, do, firij;iram e encatecefam pouco ; porque, ainda que a foimasstm de brnrize, nunca lhe poiliam segurar a laconsuncli

A Viri, iiírf., íi, A.

ááovM xvu 401

XXXIIl

A formosura

A formosura é um bem íragil, e quanto mais se vae chegando aos annos» tjQto mais vae diminuindo e desf zeado em si, e fazendo-se menor. Seja exem- plo d'esta lastimosa ír»g<iidado H.leni, aquciía famosa e formosa grega, filha de Tjndaro, rei de Lacoma, por cujo roubo foi destruída Troja. Durou a guerra dez annos ; e ao passo que ia durando e crescendo a guerra, se ia juntamente com os annos diminuindo a causa d'eUa. tira a causa a formosura de Hclenai flor emflm da terra, e cada anno cortada com o arado do tempo. Estava tia marcha, e a mesma Helena tAo outr;», que, vendo-se ao espelho, pelos olhot, que |i nflo tinham a antiga viveza, ihe corriam as lagrimas ; e, não achando a causa por que duas vezes fora roubada, ao mesmo espelho e a si perguntava por ella.

A, ?ieiri, ibid., n, 319.

XXXIV

Premio das acções honrtd&s

Os reis podem dar títulos, rendas, est ides ; mas animo, valor, fortaleza» constância, desprezo da vid t e as outras virtudes, de que se compOe a verda- deira honra, nío podem. Se Oeus vos fez esfas -mercês, faz^n pouco caso das outras, que nenhuma vale o que custa. Sobre tu lo le .ibrc-se o ca pi «9o e soldado fa- moso, de quantos companheiros p.rdeu, e morreram nas mesmas batalhas, a nlo se queixem. Os que morri rar. fizeram ? ma-or fineza, porgue deram a vida. por quem lh*a nío pode dar. E q itm p'>r me c(i de Deus ficou victo.ioso e vivo, como se queixará de mai pijhai > V Se. nlo bcijas.es a máo real pelas mer- cês que vos nlo fez, b^ijae a mS*^ da vossa csnada, que v.>s fez digno delias. Olhe o rei para vós como p.ia um perpetio acr.dor, e g ortai-vos de que se dUo possa negar de devedor voss o que é ^ei^or de tudo. Se tivestes animo para dar o sangue e arrisor a v da, mostrie. que também vos n9o faita para o scffrlmento, Entio batalhastt:s com os ini i.igo.'^, agora é tempo de vos vencer t vós. Sc o soldado se desi>i.!o folgue de descobriras feridas, e de enver* gonhar com ellas a pátria, por quem as recer>2u.

Se depDis de tantas cavai a ias se a pé. tenha essa p':la mais lllustre carroça de leus triumphjs. £ se emfiti se morrer á fome, deixe-se morrer e vingue-ie.

A. fieira, ibid,^ i, 299.

XXXV

Carti ao CLnde da CasLnhiira

Meu senhor: —He coi>a tSo n- turjl o re?pondjr, que àté os penhascoa duros respondem, e para as vozes tetm cc os. Peio c-^ntaiio hc tio grande vio- lência nâo responder, que a s q* e khn.ô ^o mudos, fez a natureza também surdos, porque se ouvihsem, e rão poduscm rcspí-nder, rebcni riam de dôr. Esta he a obtig^içPíO e a pena em '^i-e v c ria qvv receai ne?ta fiota de vossa Uallencia me lem poi^to, dcvenuo m &6 isp^rur icc^piocamcnte que a resposta

do meu fllenclo fosse tSo muda como eli<^ . •>!== >ju'> « uíii<^u,^a^t. u^ <mi» «xcdlencía que neste ciccsso de favor sj vcnfi^.jssc o pensa me mo dos que di- lem, que para se conhc ctem os amig.ís, haviam os homens de moriei pii- melro, e dahi a algum tempo fscm scr r.cccisaiii icuiia) lesiisc^ar. E porque «u em nSo «sccever lui mud';, como mono, ^^Lia com o cíp^ço de tiiim snno melo, he força que falle ccmo icMi^^ltjdu. O que posso dizer a vo-sa ti- celleiida- he que aluda vivo, crfndo, com muiio fiimc, nàj snà desagradá- vel a voisa excelitmcia esta ccriidSo. Kfo posso comuoo calar que no mestno dU de seis de fcvciclro cm que entrei n^i oitcnl:! e seic annos, foi ilo critico pari a minha pouca saúde este sncno, que apenas por mSo sllieia me petmlite dlctai estai regras, as quics mulii pi Iradas cnt copias. :endo as mesmas, po- dem satisfazer a tantas cibrigaçoLii';. quania^ dci/o á pátria na sua mais 1. lus- tre nobreza. Sendo potcm tao si:i(;i:Iar o n^ j >l^\lda esia indulgência, £inda le- conheço por maior a qu; ds novo pú.-u a todjs, c hc que a pen^ de nSo respon- der is carias se me commuic na graça de as n^) receber daqui por diante, as- sim como tie graça c piedade d.i natureza nSo ouvir quem nio pãde f^llur. E para que o despacho deste íorfidj TTiemoilal nSo pjrtça Rcnero de ingrjtidlo da minha parte scn^o cunlTacio ulli de amlias, e mu:io di^nii de acceit^ção, tlrva-se vossa cxcellcncla de considecar, que se me fa'ta.u.iia u:ao para escrever, me ficam du^s mais livics pata as Icva.nsr ao eco, e encoii. mandar a Deui os metmos a quem n3o escrevo, coni muiio maior cortespi^ndencia do meu agradecimento, porque uma carta cm cada frota, he memoria de ums vei cada anno ; e as da or..çrio de todas as horas, íAo lembranças de muitas vezes cadB dia. iístas i.fÍerefo a v<issa eicc lencia s^m nome de despedida, e posio que em carta circular e co[nm;im, njm por isão esquecido das obrigações ilo particulares que a vossa excellencia devo, e me ficam impressas no coratSo. Deus guarde a vossa excellencia muitos annos, como desejo, com todís as leli- cidades desta vida, e muiio m:iis da que ii3o tem fim. Bahia, dia de Santo Igiiado, 31 de Juiho de 1<3ÍI4.

A. VUita, Caricia, Lisbo», 1735, ii, 461,

Senhor:— O governador D. Pedro de Mello, segundo as Instancia* com que icm pedido licença a vorsa irni; sade para se riToiOcr ao ríino espeta fazcllo na monção d'cste inverno, i\;i o.iur.io pa.io so jio das Amazonas a assentar uma missão nus riíiç^^s uos ílíÍiíij.; .ihis, e outra ni dos tapuyas, que são vizinhas de muitas oiitr;!S, em (jue se c-;prra grnruli; convetsio d= almas, serviço de vossa m;ií.'vStade, e au:;mcni > dj n d.> o "s!:'i!o, que íó por esta via pôde vir a ser o que pt uiictic a \-.:\ ,-u n iL su.;3 brr.s i; mares : da iraporian- Cla da paz doi í;iÍ'ti,'.-í.) is, c qu-nitíirio ci^muicrc o iluílocm as n:i(íl;sd'aquellss parles com os lu-ll.i-i.Ir is, j,i ii,.i -on-a a Vi R'a múg siade, ede romo laitibiu; ficam reduzidos á (.!■ ilte!ii u de \o,s fii.:fi-iad^ itda a ícrra de Tjbiapivs, e franqueado o c<imin'io p<-r t r,-a ate Pc.ii:i,';bu.-o, que sHj mais de 3.X) Icgiias por cosias inles.:;das -.n-- :i^ ri <l: naç^ i IniT.j;;!* e'b:)rbi.as; jgora levo lasi- bem a meu csr;;.! as o d ■-.s d'u-n norav.^i d scobr m.^nlo, de que se esper m ainda maiores coíi^cqueu „s íca c:in^n'(i; l,-:d' dos ros, que muitidto e bon- dade de gente, C pi-la ne ■.^-:'l i !c n^e it. in i\\ ila es as cpitir.ias, da pa te do Maranhiio; e as m;iis d> c--i 'i •, c-'io 'ui,! f.ilr s de i^idios, e por tíso msnoí defendidas, e eipi-sl;!-. ? hy.z .' . :' s ii^in,!,* s, c-ri rj qaacs se rxperimen'a O valor e fidelidade dVita luç"':' p-rqui.; íiijims d'cl es que entre nôs havia,

[atua fizeram aos hollandtzes, quando occupsTim Wti fora d'ella.

or, reprc5en'o a vossa mageslade, para qne qnando o larta antes de eu chegar dcsus missões, seja presente a to qae a vossa magcscade tem servido n'esic estado, em melo de soii govtcno, porque tudo o que se obrou »■ seu zelo, cuidado, disposifío e e]cccuç9o, que é grande, loderã conseguir coisa de considera-lo, e mulio menos as, em tio breve tc:m[)a. A Dum e a vossa magestade osos d'esias missões, lhe mande vossa magestade succe- estade assim o tenha ordenado, pessoa de tal talento e por diante o que elle tem começado, que vossa magu- , deve mandar agf.;decer e premiar fomo serviços tio ira que conheçam todos que vossa magestade estima os s8o verdadeiramente os maiores, e de que mais depende >, fundado £ó no mimdo par Deus para dilatar a fé; e ade ch?ma a D, Pedro de Mello para mais perto da real ;tade, por concorrerem n'este lidaigo as qualidades mils ipo presente, como n'elle tenho conhecido em todo o ntendo, e assim o peço a vossa magestade que na Pedro, pôde vossa magestade. continuar a real prole- gestade (o! servido creat c angmenlar esta conquista de asa magest^idc do seu cunsi^lho e das suas noticias, que

, ^ _. ^,jrtes ultramarinas como cm todas as mais eiperimentari

voua magestade quanto chrisiSo e bem Jiitcn-'ionado é o seu z£lo, e quio acer- tado o seu voto.

Guarde Deus a real pessoa de vossa magestade, como a chrlstandade ft H vasiallos de vossa magestade havemos mister. MaranbSo, 4 dezembro U 1660.

Á. VJtiri. ibid., I, 113.

Carts a D. Rodrigo de Meneses

Senhor: —Algum privilegio se ha de tomar á conta da iiude de lua alteza, de que a vossa senhoria s3o devidos os primeiros parabéns, como tio intetesaado, e mais que todos, no desejo e e3lim,:fSci d'clla. Confesso a vossa Knhoria, que depois de tri:s vezes mono, e três vi:zes resuscitado n'este anno, íoi tanta minha desconfiança da vHa como nof dias d'cste grande cuidado. Bemdita aeja a divina bondade que tSo iiiicií.^mcntt: nos livrou d'el1e, e a voa» senhoria do extremo s;ntimento cm que scompanliei e cunsiderei sempre a vossa lenliotja, como quem tSo lembrado esl.l do alfecto cnm que vossa senlioria amava e adorava a jua alteza, no lempj c ti que eu podia ser testimunha d'elle, que nSo considero bo)c dimiuiiido, senSo mui ctLScido sempre, como o pede iiazlo.

Eu, senhor, como tenho dito a vossa serilioria, trcs vezes chcíjiiel ás portas ,da morte n'e5ta minha d^icnçT, de qiic tiinici a arribar, ióra de toda a esperança, por mercê de IJeus. Sirva>e sua divina M^ijjeslade que se'a para o labtf servir, ainda que pouco posso, mni conv;iIi;ctdi>, c com receios de recair, porque n3o pôde a minha fraqueia ora a inVmpcrança d'este? ares, e com os rigores d'este segundo cari^cre de CuiiniiTa pjw o:;'.le me m^nd:iram, tiio sei por que culpas esta ha sido t^rribcm a ca''s3 do meu du-liiir'11 silencio, e de Dío procurar novai de vossa scnLoiia por cana, como ainda agora o não fizera.

Scnh.if : Vío cslas teg as, noií v-"S'a ?enl'oi.i lh'i conírnte, rcom"5- nhar vossa senhoria na ptrf^rniiíl" "^ ' Sil/.iieris, t t!-'[ ícar o iTiíior goM com que o fliera, se A\i lô.j per ,,.iii 'o iiii:iii as f-cr. \e: ., b ra pó.ie vmmj lenhotU dar-mc credi;o, que é isii; o icrm > r.a.i c:ncdríC di co.n ■] ij o iv^a COUfSo poderá de.laiar o estr ni-> cnm ^ue a,--i, e !■■: ictorlic; .1 i g <lu í pessoa de vossa scitlnih, p .is nín Invet i ■"-i-tfii [ .rçi níin ii'p: ijli-m ihh^^ oobrlrasse a tornar 11 vir o m^in^io depus d? ^tir iw ■■'L-<fng.inai!ki e ;-t> íií- Cido d c|ie. Ma» como em vosí.i *.'r-.t;.)rM s- qn biiri-n tcd s < leis iln in-^ni mundo, razlo era quí se q^ictirií^s-m 1 m >e n iniijs. p>ia dj mas p:J\o vn-!, venerar, e lograr a prisvfa d.; vo *;i n-nU :-\i [li;in s;( q'; p^^.o t.oido Jc vqí s senhoria tiàj I, z a nÁo ag^ia; e -sw ci /i^uni -nt - ti- bura, ;.;n'a tjiie iíiÍJ O mais me perdÊra, para ^iie 3 minli 1 ^laii-^^jí^ij e •<•• naufrágio. Tudo o maií psr-enci a 1 i iv r.o , e cu alma, em que nSo Um p 'dêr o lempo 11-111 igii di v' gesiade, que Otus pui di', ainfta c in i''t dii qiiv pr \ passado, e em mm pjsto quu sela p^ni nl -r liiiium redmento o desí jal-j, por iis soor^i ..s cbrig çri^s d;: dei doi murtos, e as q^.e devo »os vi'>>s, f ;;s ij v s maBCitade, quando, as-im na v^rdii.- do :i:i.ii -y.í^zx pitiaçOei, reconhecer um mcTir l),i;i ' 1, e l.^^^a-' irn- seria, senhor men, se o priniipio d'ts'a ii jíc d id-, ■nr. marquÈs, conu princ pjl in^irumciro dV^liaV -'a propheta mais qua um sj enconirii ro 1 m iMst-ilni cumprir, mas es<c dj lama íeiLili^le. gu- h i,t d^ a^ ultima scnlençí húde (..f «l^urns Inerlo ii;i>rn iif'.' r mar que nSo íaz mcnçlo d èíIíi ;'giin.t o m -t-rn .iiic por que se(i;m di griiiiJ,; uiinuirsiu-ia ;ín'f-ii'i :■.■*

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xvu 405

2inha, e de maior grandeza e conveniência. Entretanto, estimo a peregrinação de vossa senhoria sobre tSo repetidas assistências do Corpo Santo, e me alegra snmmamente que a alma d'eile tenha tão bom gosto. Emfim, senhor, nio é tempo de o tomar a vossa senhoria. Aquelle papel se vae fazendo, quanto o permitte a frieza do tempo, e a fraqueza da saúde, mas nSo o verá o mundo sem qae vossa senhoria o veja e o emende primeiro. Aquelles docnmmtos em que állei na caria passada, não dêem cuidado a vossa senhoria, porque ainda de- pois do entrudo virSo a tempo. A obra ha de ser larga, e o começa a ser; e ainda não é obra. Que o senhor marquês me tenha em sua graça, estim) quanto devo, e posto que em todos os meus sacriflcios tenho p^irticuldr cu.dddo, de os offerècer a Deus pela vida, estado, e felicidade de sua excellencia, d^aqui por diante o farei com o maior affecto e instancia que pede a occasião. Deis guarde a vossa senhoria muitos annos, como desejo e havemos mister. Coimbra, 28 de janeiro de 1664.

A. Vieira, ibid*^ x, 131.

XXXIX

Vaidades femiaís

Tenho reparado em que os latinos a este ornato e adereços da mulher chamarão mindo ; e quer parecer-me que este nome não quadra ao sen signi- ficado, eiuquanto x]uer dizer limpeza, senão emquanto quer tamb-m dizer o mesmo mundo; porque de todo o mundo leva esta náo géneros, e t')do o mundo he necessário concorrer para ornar uma muiher. Por onde, se S. Gregório achou, com verdade, que a creatura humana era todo o mimdo, porquanto com numas creaturas convém no ser, cora outras no crescer, com outras no seiítir. e cora outras no entender, participando também o ornato de humamuluer de cada região do mundo alguma couia, com razão e verdadi se chama e se ornato, mundo. Vejamo-lo mais em parti jular.

Dos reinos do Decão e Bisnagar, e de Goloeondá, na Ind a Oriental, leva esta diamantes; da Bactna, Scychia e íigypto, esmeraldis; d )i reinos de Pegu e da cidade de Calecut, e da ilha de CeiUo, safiras: dj S^ío Pcrsi:o entre Ormuz e o Bassorá, da Samatra, ou Taprobana, da ilhi Borneo. e em íuropa, de Escócia, Silezia, e Bohemia, leva pérolas; do porto de Julfar na Porsia, leva aljôfar (que d*all! se derivou est i nome) ; da eidadi de Syeno no Egypfo supe- rior, e do mar Thyrreno, leva cones, qu*; se se desterrarão dDs rosários e brâ- ce'etes, ainda s^ admittem eíi brinquinhos e veronie is; dos campas de Piza e dos montes Alpes, leva cristaes; do mir da Su:ivia, e di l.ub^ci, leva alambres, que são as fabulosas lagrimas da imâ de Phictonte charadas «ioicm 'cmence cada anno pela sua desgraça ; dos reims de Moaonotapi e Zofila na Cafrarí^J, c da regiíio de S. Paulo na nossa America, leva ouro; d) Serro d > Potosi nas en- quistas d*el-rei Catholleo, leva prata; de Aliem inha, os cimifèjs; de vioscovia, as zebc/inas e martas, e do Palatinado as iniís aperteiço.id.ij; íe ílilvecia, região dos Suizaros, os arminhos do Brasil as safi[iiins pd^^ íhih.mít js, e os eoquíHios para contas; da cidade de Tyro em Fenícia, a purp ti ; ri síti d' Ar- rábida, grâ; de Portugal e Castellí, a côr; de Veneza e Hol' vndt, »> v'^;).'íhoí ; de Provença e de Roma, as poraidas pira fa^.er as m^os nncii> c r.: irosis; de Córdova e Hungria, ao menos as receitas para as agms odíí^ií v;.s ! se '. 'Kymes; das índias de Casíella, a alm^ya, e óleo delia pira as m1')> de ioi"iern, o almíscar; do Maranhão e Seara o âmbar, de Angola, (iiine c C:.i)i>-\'-^rde, a algalia; das nossas Índias, o calanbunco e agnMa, •$ ciMeqniaí ^ ni.n.n 'os de COM, e os torlbios; da Africa, as pennas dos avestruzes, i>ara os o.^t.s áò p u- tnas; da China, os lós, os leques e as chitas; de Graiiidi, iís t- uís; d 2 Fian- do

406

AHVOIAOIA nUMA

dres, as rendat; da cidade Cambrai. as têas flnissimas e candidissimas que têm este nome; de Guimarftes, as linhas; de Leão de França, as primaveras; de Modaba, na Pérsia, t de Itália, astélaa; da mesma Itália, os damascos; de Florença, Génova e Nápoles, os chamelotes; de França, as luvas, os signaes pêra o rosto, e também os leques, huns maiores para o ver8o, outros mais pe- quenos para o lar no tempo de inverno; de Inglaterra, as meias, fitas e relogl- ahos de algibeira; da Arábia, a gomma, que também serve officio neste man- do i da Batalha, os azeviches, para dar figas aos máos olhos.

Que mais? He necessário que concorra também o mar, 080 com as ostras, que se esbulhem das pérolas, senSo também com tartarugas, que desar- mem ' as costas para pentes e coírinhos, e com as balêas, que etnpenhem as barbas para saliir hum justilho, ou prepOem bem desarrugado; sij necessários de varias partes vários materiaes para bocetas, escritorinhos, b&uys, guardarou- pas, para recolher nos camarins e escaparates, este mundo abreviado : slo pe- cessarios vidrinhos, e garrafinhas. e rodomas, e bocetas, curiosa e ricamente forradas, para toda a pharmacopolia de ingredientes liquido? e seccos, simples e confeccionados, que serven* de estender o dia da formosura, quando vêm cahindo maiores as sombras dos altos montes da annosidade, c de dizer oa oara ao desengano, que mente.

Que mais ? São necessárias até as nuvens do céo, para a primeira agua de Maio, que opina rio fazia o carão lustroso: sSo necessários até os mortos, para as cabelleiras, se as nSo quiser o luxo antes tiradas das entranhas dos bichos, fazendo-as de seda. Estava para dizer que são necessários até os demó- nios : porque assim como a mão de Deus ajudou (como o diz o Texto Sagrado) a fetmosura de Judith^ porque se ordenava a intento santo e de sua gloria, assim tenho para mim que, sem a mSo do demónio, não poderá o appetite humano inventar, e dispor, e applicar tanta vaidade e curiosidade.

Manoel Bernardes, JVovo Flírtata, ed. 1706, i, 178 e seg.

XL

Degeneração de Portugal

As espadas largas degenerarão em cotos, e os capacetes se trocárSo em f^rucas ; o pente em vez de se fincar na barba ensanguentada, se finca publi- camente na cabelleira. alvejando corn polvilhos. Cheirão os homens a mulhe- res ; não a Marte, mi^s a Vénus. Quem havia de imitar ao grande Albuquerque, prendendo a barba no cinto, se não ha novas de cintos, nem de barbas? Quem haveria de sair aos leões em Africa, se é mais gostoso estar no camarote em Lisboa, gracejando com as farçantes, e atitando-lhes cem chistes, com dobrões? Ou como se havião adestrar em ambas as selías, andando pelas mas bamboleando nas seges? Amolieceu-nos a infusão dos costumes estrangeiros, que veneramos, devendo aborrecê-los; e nós, que estamos no fim da terra» ficamos no meio do mar de suas depravações.

Manoel Bernardes, ihid,, 11^ 314.

XLI

Celas de freiras levianas

Ver uma ceila de freiras é ver huma casa de estrado de huma noiva. La- minas, oratórios, cuiunas, sanefas, rodapés, tomados a trechos com rosas de maravaliias, bani^uinnas de damasco, franjadas de seda ou de ouro, pias de^

•ÉODLo xvn 407

cristal, guarda-ronpas de HoUanda, eaçoulas, -espelhos» craveiros, mangericões ou naturaes ou contrafeitos, passarinhos, cachorrinhos de manga, que, se adoe* eem de puro mimo, se ch«ima o mais perito na arte de os curar ; jarras, rama- lhetes, perçolanas, brinquinhos de sangria, figuras de alabastro ou de gesso, fnitas escolhidas para coroar as molduras da alcofa ou dos contadores, perfnmes, alambiques, todo o género de arame para a fabrica dos doces, almarios para os recolher, aladas para o ministério da casa, tecto da cella com taes paisagens, relevos e pinturas, que passão para as mãos dos ofíiciaes as bolsas dos parentes e devotos mais ricos.

H. Bernardes, tòid., y, 31.

XLII

Quem quer vai, quom não quer manda

A este ponto faz q apologo, que se conta das cotovias, que tinham seos linhos entre as searas. Dissera o dono do campo a seos criados, que tratassem de metter.a fouce, se vissem estar os pSes sazonados; e ouvindo este recado ama d'ellas, foi pelos ares avisar as outras, que mudassem sitio, porque vinham logo os segadores; poiêm outra mais velha as aquietou do susto, dizendo: Ddxemo-nos estar, que de mandar elle os criados, e fazer se a obra, vai ainda Buito tempo. D'alli a alguns dias, ouviram que o amo se agastava com os criados, porque n9o tinham feito o que lhes incommendára, e quemandava cellar a égua para elle mesmo ir vér o que convinha. Agora sim (disse então aqueila cotovia astuta) agora sim, irm9s, levantemos o vôo, e mudemos a casa, que vem quem lhe doe a fazenda.

M. Bernardes, ibíd,, i, 70.

XLIII

0

Afonso de Albuquerque

o nosso.grande Affonso de Albuquerque tanta fama ganhou de conquis- tador valoroso, que a cidade de Gôa não queria largar seos ossos para se trasla- darem á de Lisboa: como se lhe parecesse, que n'elles, ainda que sêccos, e frios, conservava um certo género de presidio contra as barbaras invasões de seos inimigos, e vinculado um como prazo de vcncé-los. Mas dizem, que, obri- gada por censuras, os deixou levar, e descansam no convento de N. Senhora da Graça. NSo teve na terra premio competente a suas acções heróicas. A causa paiece que se colhe suficientemente de um dicto seo em occasião que acabava de lêr certa carta del-rei dom Manoel.

Fulano, c fulano (disse elle para alguns circumstantes) que eu enviei para o reino presos por graves culpas, tornam cá, um por ca p tão de Cochim, outro por secretario?! Eis-aqui fico eu mal com el-rci por amor dos homens, e mal com os homens por amor d'el-rei. Velho, acolhe-te á igreja ; é tempo de morrer, p^is assim importa á tua honra : e eu sei que não dcixaráb tu de fazer, o que á tua honra importa

IL Bermaides, ibid,t i, 334.

408 jjffTOLoeiA -^ mosA

. XLIV

Lenda dos bailaríns

No anno da salvaç9o hum/ina 1012. ' impenn do Henrique li, succedeu em Saxonia, que um sacerdote por nome Ruperto, presbvtero da igreja de S. Magno Martyr, havendo começado a c«korar a primeira mis>a da noite de Natal, nSo podia proscgutr, por se achar distraído com estrondos de um baile que alli perto se fa?ia. £ era, que um homem plebeo pir nome Otherio, com outros quinze companheiros, e três mulheres, dançando e cantando todos junctos no cemeterio, faziam notável ruido, Mandou-Ihe pois o sacerdote dizer, pelo sachris- tão, que se quises-e aqiretar; porque não era aquel e o modo agradável a Deus de festejar noite tão sancta; e zombando elles do. recado com risadas, e dichotes, como gente de pruco intenílimenio, e menos temor de Deus, osac^rdote* accen- dendo se em zelo da honra divina, e do decoro, que a seo ministro sacerdotal se devia, disse:

Praza a Deus, que um anno inteiro bailem, sem parar!

Caso estupendo, ainda «comente ouvido, quanto mais visto ! A bôcca do sacerdote o disse, e a mSo do omnipotente assim o executou. Amanheceu, e anoiteceu o seguinte dia, e elles a bailar I Introu a rod i de novo anno, e elles sem sahirem da mesma roda da sua dança ! Passou um mes, e outro mes; accu- dia a gtnte attonita com tão raro espectáculo: dançando os achava, e dançando os deirqya ! Pc raun*2vam-lt.es uns uma cousa, e outros outra : a nada respon- diam, nem artndi .:i : o sco d^stiio, a sua tarefa, que continuavam com inces- sante rlii'^' nc?a, era and^r á roda, uns atas dos outros, seguindo aos que os guiavam, e todos instigidos doagui'h5o daquílla praga do sacerdote.

NfiO coiT.iam, nno belvnm n^o mo>tra/am car-ç^sso, não se lhes gastou o calçado, ner' se Uirs rci^n^u o vesfdo, nerr» ciíhíu sobre elles chuva. Da con- tiniií pista, ou cnlcpd^rn sumir; m-se pela terra até mais acima dos joelhos: a si nitsnios parece, que in^c.nx^vam sepnltar-s-^ vi /os, ou anrir caminho, por onde descessem a dançar 20 inferno, (^uís certo mancebo tirar da roda a uma das trcs mulheres, que era sua irrr.r., E pegaido-lhe do braço com violência, este lhe veiu na m-^o, dcsmcmb»'ado do corpo, ccmo se de uma pedra de linho separasse fora agi-iiTia estriga: ou mctteíido a mio na ma^sa :êveda. trouxesse algum pouco no pnn'.:o H cila. como se o brnço ^jsse ai leio, nada (^isse, nem gemeu, e foi prosce'i'ndo a d.inça do s.^.o f.ido, sem da ferida manar sangue I

. í^:-'^! ridente ao rumpr*'r-pí: o -vino. pelo natal de 1013, veiu áquelle logar S. Heri i':r'o. ruicbisno de Coioni?, c o<? absolveu da maldicçâo ; e introduzidos na ;f^r'''a, os reconcHou com ">eus. três mulheres, como sexo mais fraco, e?p.r.'r;'.rn 1' ^^o; porco iambv^m dirprnm alguns dos homens, dos quaes ^e diz, que, d'To*« \-z norto*?. obrou Orus ;">>' ell»^s alf][iins milagres: cpmo significando o ocrd':o de s-. ^r^ p:^*c/dr,<. o^u- p'^* nc*o d-^ t!.o custosa penitencia tmham al- cançado. Os rr,ri> c.ue. s>brr\'\\'.-r:i-r\. s»:mr>ro com o tremor de membros, e es- panto d-^s r!^ 0*^ m'"í'5*r.'iv ni h'm n íotív I r^so que por elles havia passado. E c?da im J'v" s r - nrn-, .^^•a^na do escarmento, erigida para protestação da rcvercicin. ']"e Fe dvc ."..".s my-^^r'-):', aos ministros, e aos ioga res sagrados.

M

. fSp^^^i-rdcT, i'i(J, iz, 15.

XLV

Repentes

Ha !r'::;c.ilics f»-!ixcs nos repe ::js, o aue lhe concilia particular graça aos secs conc./:> ;, ; (;nc ^.Mí^cen n.órcs, n^ío eultivúd.s, mas apparecidas, como por inci'nto. Ji.: .tj lú-s saud-sis .'í^i.ao do Monde r;o estavam uns estudantes em dia

táoiiiA ZTB 409

de sueto; e vendo vfr pelo rio uma cab?ça, a tomaram por assumpto dos seus versos. Depois que os outros disseram, disse um por remate do certame:

Zombou de tácitas cabeças Uma cabaça vasla, Cheia como zombaria I

Dom Tliomás de Noronha, fidalgo de discrição mui celebrada neste reino, vendo falar uma pessoa de sua família com certa mulher suspeitosa, perguntou- o que era. E íoi-lhe respondido, que era uma adeilai a quem se procurava uns coraes. Disse então de repente :

A adélla com quem falais, Boas novas n9o ha d'ella : E o que vós falais com ella, Co 'os coraes- nâo o córaes.

r

Conhecemos aqui em Lisboa um homem que glosava motes (por difficul- tosos, e paradoxos que fossem), sem dettr-se mais, do que em quanto corr^ a mSo pelo bigode, torcendo- o na ponta. Uma vez lhe propôs o marquês de Fron- teira o seguinte mote

A mais formosa que Deus

E elle, levantando os olhos pensativos, e fazendo a acção costumada, sahiu logo com a seguinte glosa :

Com duas donzellas vim Honte .1 de uma romaria ; Uma feia parecia ; Outra era um seraphim. E vendo-as eu assim Sós, sem os amantes seos, Perguntei-lhvs : anjos meus, Quem vus pôs em tal estado? Disse a feia, que o pecccido ! A mais formosa, que Deus !

N. Bernardes, ibid., iv, 47.

XLVI

Grandioso presente

O nosso ínclito rei D. Mnnoel, de feliz recordação, q-iando n. viu domi- nador dos reinos do orierre, do sórre ^j';i' p cr. i'n s dí.er, .juo :ís ;. ..s . j >: òe mediam com o seo imporio. e quo ...|M.' cs ;> v-js 'un ,is s». :;'. . c rii ic.';v..:ii contra a potencia de sniis ariTus, in;iií qj--^ p.i.a sit d'cl;;;'j iiiir.. •(/ i (,uvir os annuncios da palavra evjiig i ch, ci/ião u i^; -'i de s'bM..:. r Li .1 e-i..' íztcM- desa aos pés do summo poiuifi e >J'. ^ x. i í.i ers en bn-x;'''».':^,^ y-. rr^iujres, tributando-lhe junctamente as prim-c.as o.js r qiicíis cio on^ri.e.

O principal d'eiles era Trisi^o d.. Cun i.i, v. í^wíw f' :- n. ladii^ outros doas, a saber, Diogo Pacheco, e Jcão de I\iria^ desem^ar^uãores, e ouuoh. cía-

410 ÃSTOhOaiA PBOtA

coenta cavalleiros. E era em todos tanta a riqueza, e lustre, que até havia cel- las, freios, peítoraes, e estribos de ouro de martelló, com pedraria fina, e péro- las a montes.

Todos os. embaixadores dos príncipes christSos, que se achavam em Ra- ma, e o (governador da mes na cidade, e muitos bispos, e ísmilias dos cardeaes, e outra innumeravel nobresa deram nobres aumentos a esta pompa, e o mesmo papa quiz lograr o vistoso d'esta intr*da. desde o castello da kancto Angelo.

Levavam- lhe um prexnte com um grande, e preciosíssimo cofre, cober- to com pano de ouro, e nelle debuxadas as reaes quinas, posto sobre um ele- fante, o qual, tanto que avistou o summo pontífice, ajoelhou trcs vezes, ensi- nado pelo Nayra, que de cima o governava, e logo mettendo a tromba em um grande vaso de égua que alli estava prevenido, borrifou os cardeaes, e outras pessois, que estavam peias janellas, e o mesmo signal de festa usou com o mais povo, que estava apinhado pelas ruas.

tim outro dia, foi recebida a embaixada, orando elegantemente o Pa- checo em coniístorio; e no fim da oraçSo, o papa exaltou com excessivos lou- vores as prendas de el rei D. M noel, e o catholico zclo, com que naquele novo mundo sol licitava propagar o império de Christo, e glória de sua santa igreja. Os pontos principaes da embaixada eram ires: o primeiro, que sua sanctldade em- preiendesse guerra contra o turco : segundo, que se traccasse mui deveras da refoirna da igreja : terceiro, que a esie fim se proseguisse, e concluísse o sa- grado ecuménico concilio de Tremo.

£m outro dia se abriu o cofre, tornando a ajoelhar o elefante diante de sua sanctidade.

Encerrava um ornamento pontifical inteiro, nlo para a pessoa do pa- oa, mas para todos os seos ministjos ; era todo de chaparia, e fig^iras de ouro, e pedraria preciosa e a trechos unas romSs de rubins escachadas'; e sendo a ma- terial tal, ainda dos primores da arte era vencida ; iam junctamcnte outras ri- quíssimas jóias, e ducaiõe) de 500 escudos de ouro, como para entulho Ava- liaram alguns o prestnce em um milhão, o ^uil veiu a ser dos que saquearam Roma. .

Finalmente Alberto de Carpe, escrevendo ao imperador Maximiliano, como seo embaixador que então era, diz na sua carta este capUalo :

Todo o povo univeisyl úc Roma concorreu por ver esta novidade; e não é maravil a, porque poucas vezes ou nunca succedeu enviarem príncipes ChristSos a Roma, tão magniiico apparato.

M. Bcraardes. ibld , v 93.

O Frade de tresentos anos

Estando um monge em matinas com os outros religiosos do seo mostei- ro, quando chegaram áquiilo do psaimo. onde se diz que : Mil annos á vista de D^us sau como o dia de ontf m que passou, admirou-se grandemente, e come- çou a imag nar como aquiilo podia ser. Acabadas as maiinas, ficou cm oraçãOi como tinha d*. Custume, e pediu affectuosi'm nte a nosso Senhor se servisse de lhe dar inteliigencia d'aqu.;iie verso. Xv^^parcceu-ihe atU no coro um passarlnbô, que, cantando suavissim^imontc, andava diante d'elle dando voltas de un» para a outra pane, c dVsie modo o f^i levando pouco a pouco ate um bosqnt que estava juncco do m^-stciro, e ai i ftz seo assento sobre uma arvore, e ofS- vo de Deus se pu< debaixo d'cllli a ouvir. ')'aili a um breve ia:erval lo (coa- forme o monge julgava) tomou o vòo, e desappareceu com grande máguado servo de Deus, o qual dezia mui sentido :

Bàaauy xm 411

Ó passarinho da minha alma, para onde te foste tio depressa ? Esperou ; como viu que não tornava, recolheu-se para o mosteiro, par&>

<:endo-lhe que aquella mesma madrugada depois de matinas tinhasahidod'elIe. Chegando ao convento, achou tapada a porta, que de antes costumava servir» e at^rta outra de novo em outra parte. Perguntou-lhe o porteiro quem era^ e a quem buscava ? respondeu-lhe :

Eu sou o sachristão, que poucas horas ha sahi de casa, « agora torno, e tudo acho mudado!

Perguntando também pdos nomes do abbade, e do prior, e procurador» elle lh'us nomeou, admirando-se multo de que o n&o deixasse entrar no con- vento, e de que mostrava não se lembrar d'aquelies nomes. Disse-lhe que o levasse ao abbade; e posto em sua presença, nSo se conheceram um a outro» nem o bom monge sabia que dissesse, ou fizesse mais, que estar confuso, e ma- ravilhado de tão grande novidade. O abaade, então allumiado por Oeus, maiv-^ dou vir os annais, e histórias da ordem, onde buscando, e acia ido os nomes» -que o mDnge apontava, se veiu a averiguar com toda a claresa, que eram pas- sados mais de tresenios annos, desde que o monge sahira do mosteiro até que tornara para clfe. Então este concou o que lhe havia suceediio, e os religiosos o acceitaram como a írmlo seo do meímo habito. E elle, considerando na gran- desa dos bens eternos, e louvando a Deus por tão grande ra^ravilaa, pediu os sacramentos e brevemente passou d'esta vida com grande paz em o S^^nhor.

M. Bernardes, ibid», ii, 9.

XLVIII

Freiras loucas

De origem procede a altivez de espirito, e loucura d'í phantasia, e a hypocrisia, com que a tal religiosa todas suas cousas estima, todas as dos ou- tros desdenha ; enc.ie-^e de melindre, iup^rtinencia, e affectaçã^ ni voz. nos passos, n^ riso, no cornar, bebir, e vestir; finge accldentes, edesniios. para merecer compaixões, e ostentar delicadezas; toína sangrias,, nío pua inteirar a saúde, senão para quebrar a côr, ou pjra dar occasiãò aos estrema iinentos de quem a ama, e aos brincos, e regalos de qaem apresentea ; enjoa-lne a pof^reza, e achaques das outras, despreza-se d )s miniitenos biixos, qualquer falta de as- seio lhe revolve o est^maço, ao mismo tempo que traz corrupia a alma, ma- nando bichos de mil defeitos, e p cjidos. Emfim vai-se convertendo em idolo 4e si próprio, propicio a quem coicoirer com adorações, e o inceisar eorm ]ierennes lisonjas, que todas crê, e admitte, par exorbitantes, e ridículas quQ sejam.

M. Bernardes, ibid., ii, 465.

Quadro 8iiiótico do movimento politico^

8odal e literário correspondente á escola f ranceza ou Hrcádica

I

Monarcas portugueses

D. João y ,. . 1706-1750

D. Jneé I 17f.O-1777

D. Maiial ' 1777-1816

D. João VI 1816-3S.26

II

Sincronismo político e social

1715 Tn.taílo de Utrectht; morte do \a\U XIV.

174í) 178íi Governo de Frederico o Urande lia Prússia.

17íV> —(Guerra dos Sete Ancs.

175Í' - Qn*dA da Companhia de Jesus.

I77t S.oi' HO trono Luís XVÍ.

Ii>.; pr «'{irnani-se independentes os Est.ulDrf-Unidos da Amérioa.

17^.', Májuina a vap<r de Watt.

17SÍÍ 1'ri'Tcípio da Revolução fn.neêrfa.

17ÍÍ2 Pr. 'el.tii.-tyào di República eni Franea.

17^1-. Ex '.-ncao d*í Luís XVI e de iM.iria Atitoni(;ta. p4)0fa do rror.

179^^1821— NapMeão.

l^í'7-18 ii In\a õe^ franeônas em Pcrtngal.

1^20--Rfevolu<;õe9 liberais na Europa.

Ill

Sincronismo literário ESfAXHA

Nfst ' país comocnu a vit:;nr;ir no í' . '. I - i ;.'! ;: i^.ílirM.M.. .lo ^K, í . \: <•' -, df^enhan 1 -í^v. ao l<»rmiuai- d-^ a, '\\ m ■.;..<> j'." ••'•, \ i- .•■ ..li'/!:''. •> ../.• ... ...:

IsÁCiO DE Luza:ç {\1'y)í 17M I a ! :. /\/.'r.V'4' . ,i •■. .* \t ..-.j

fr.in-éhea: ,'osk P^rancisco d'Ihla ^i 7' .^-i7". i ■; e n.i / ■/' óua «A \i '. ^., , ic- dicidor fray Gtrundio de Campazus fi .: a "' » ; .- [;. ^..l-ii.- i ,.o;

Ibiaati! ^i7■l^l79i): Kamon ih: la Ckiz ('. - í-'i !.; kllm.': 'i- . ..17): Cjhmtkíos í . 7^í4-18(l9) e Joti:- Li..\n«j.s [\1\\ "^ l;, (j !•• c t-::/r ;■, .\t..-j pflâ.-i U'» ití^nuposioões poéticas; Flouks \ IV. i iTt-i; f (uni i: ^ITv-. -I .)i p- Is aeoá trabalhos históricos.

414 HIBTÓBIA DA LITlRATUSâ POBTUGUftBÂ

\

FRANÇA

A França do século xviii oria pelos seus filósofos o moimento de reacçSa religiosa e política ,qne st^.ÍDfíltroa, como um fermento, em toda- a soeiedadâ ear péa Uma plêiada distinta ÍQÍc''ou esse movimeato: V^ltaiks, Didbwt, d^Alembert, o barão d*HolB'Ch, Covdilic, Helvécio, no campo da filoafia; MoNTBiiQu>Ba e RocssEAu no da politica social^ Mibabbau na elo quê q ria; Lbsags, Pbevost, Becnaboin de SaihtPibbbb e Floriah, no romance; La Haepb, na critic-i literária; Fontinbllb, na TulgarizaçSo ^cientifica, e muitos outros. Aeima de todos se eleva, pirém, Voltaibb (François Marie Aronet) 1694-1778, géaio miíltiplo e ftjcur^io de quem Goethe fez este juizo: «génio, imaginação, pro* fandidade, extençAo, razào, gosto, filosofia, elevação, originalidade,... elegati* cia, alegria, zombaria,... eis Voltaire». O poema «'pico Henriada, as tra édias Bruto, Morte de César. Alzira, Merope, Tancredo, Mahomet, Semlramis e Zaira; is poesias íii'>9ófi as Discurso sobre e homem, lei Natural: a História de Carlos Xíl, Século de Luís XIV, Ensaios sobre os costumes e espirito daí naçõeSy os anus pinaiK^ed cartais, as criticas históricas, politicas e lit^ninãflf demonstram a extra- ordinária adaptação do talento de Voltaire a todos os assnc- tos. Por iaao ele (^omina, facilmente, o seu t^npo e a sua época.

.Em portng. : Manoel Monteiro: Hist de Carlos XII... Lisboa, 1739,3 vols. ; Alhiao de Sonsa Coelho e Almeida, OsScythqs, tr. em verso, Lisboa,? 1781, 117, págs. ; Pedro António Pereira, Zaira, Lisboa, 1783, 39 págs ; oa-i tra ti*, de Maioel F. de S. da Mota e Silva, Lisboa, 1815, I4j pág». ; António Jo3Ó de Pan a, Mafoma. Lisboa, 1785 (Não é de José Anastácio da Canha como se supôs //zoe. , D/í., xii, 215); José Caetano de Figueiredo, Alzira, 17^5, "ií págs. ; Tnmárt de Aquino B. e Fieitas, Henriada^ Porto, 178v>, 264 págs. : ♦*•• (vlosé de Va3Conc(»loa e Sousa), Henrique, IV, poema épico, Litboa, 18')7 *, Joit Félix Pereira, A Henriqueida. Lirtboa, 1878 179 págs. ; José P. de A. Sou«j da Cam:ira, Orestes, Li.sbf a, 179;), 130 páffs ; Id., Mariavne^ ibid.^ I7í*U. 1»^1 págs. ; M., Soj)honisba. ibid., 17ÍV); Id., Bruto. 2.* Id., ibid.^ 1822: Joí^ L. Pinto, Semiremis, Pnrto, 17 '3 ; J..3Ó T. Cabral, Zadig ou o Destino. . ., Lit-! boa, 1807; outr^ tr. do Filinto Klysio in Obras, ix ; José A. de A. VHInso, í Zm de Minas in Trad. Dram., Liiíboa, 1816; José Th. da S. Teixeira: Ff}'- j phile, Pf»rt«>, 18;íi; Tibnrcio A Craveiro, Merope., L ndies, 1 2S ; o-itra tr. ; de M tní.Ml O. Mendos Rio do Janeiro, 1831; António da C. Paiva Romances \ de Voltaire, Poito, 1,S.']H ; Fiiint. Klysio, Virginidos ou a Donzella. (K'atr. ' da f^ticriíe^ in Obras, ix ; Manoel O. Mendes, Tancredo^ Itio de Janeiro, I8i9: Anóniino, Ahíra ínn c. Dic, vi, 298); .anónimo, Memaon ou a .abed^ria^ humana^ 1 folha, s. a. n. d. ; Fernandes Costa, Cândido OU o Optimismo ea ^ Prinieza de Babyfonia na nBibl univ. ant. e mod ». de List^oa. ,

Coí o ae foram numerosas as trad. ^0 fecun lo escritor e nSo estão, decerto, in-lioaiias to'ia^ ; mas o gosto pela literatura francesa nlo se revelou só.nent'' na difusão das obras úe Voltaire. Temos mais, embora algumas sejam de época mui 'o posterior: De Diberot : O P-'^ df /a/wi//a (Innoc. D*C., vn, 298); de ('oHDiLLAc J L. Freire de Carvalh >, Arte de pensar, Coimbra, r94. A 2.* parte por Ro.iri/o F. di Costa e A. le Castro, Obras elementares de phii racional. . . 1 T.ó:riea) Lisboa, 1801. (Foi atribuída a Joaquim Ain» s de Car- - vallio); de \T()N'rs<iri«a, António V. d í C. e Stuisa, Arsace e Ismenia, novella.- Lisboa, IS _>7 ; K ^i ri iro F. Ia Costa, O templo de Gnido^ Paris, 1828 ; de J. J. RoussRAL', J'vlo B.ior -;ta (íastào, O contracto Social. . ,, Lisboa, 1821; Bento L. Viera, Contracto sor/al, Paris, 18JI ; de Ijbsagb, Bocage, Hist. de Gil Braz de Santílhana, VtwU, \X'\^\ [D- líoc-ntre, o vol 1 e u até págs 116, daí por ant«' e <»s vis. 111 e iv ie Luís Caetaon de Campos] ; outra tr de Jólio Ct«»r M..'h;ido, ed. ilnntr. com 1(>0 íjrav e 30 oleocjr., Lii>boa, 1885, 2 volt , foi. ; Carlos J. da Cnnlia, O bacharel de Salamanca ou as aventuras de D, Cheni

CUpItULO MOOLA FEAWGÊHA OU ARCÍDIOA 415

^im de ia Ronda, Lisboa, 1802, 6 yols. ; oatra tr. de Fernandes Gosta, 1888, í vela. in « BibL Univ. ant e mod, » de Pb^v^st, António M. P. Carrilho, Manon Lescaut, outra tr., Porto, 18Í)7, 1 toí. (s. nome do tr.) ; de pLOBLàH, Manoel R. da S. Abrea, Eliezer ou a ternura fraterna^ poema. . ., Braga, 1839 ; de FoaTBHBLui, D Francisca de P. P. da Costa, Conversações sobre a plura- lidade dos mundos, . . Lisboa, 1841 ; oatra tr. de D. Christina H. H. de Car- ralho, 1882, 2 toI. in «iBibl, univ. ant. e mod,»;de Habfb, Filinto, CóriO' lano, in Obras, xt, (só doas actos) de B. Saikt-Piebbb, António P. de Paiva e Pona, Paulo e Virgínia... Porto, 1883-, outra ir. de Alfredo Alves e Bulhão Pato, Lúbja, 1898.

ITÁLIA

A Itália do século xyiii conta os seguintes homens notáveis :

MsTÂSTASio (1^9-1782) que em 1724 publicou a tragédia lírica D/^ abandonada, obtendo o favor de Carloi vi que lhe deu o título de Poeta Cesá- reo »& pensão de 3.000 florins. Compôs 63 tragédias. [Em Portug. : Caetano J. DA S. Souto- Maiob, Operas de. .. Lisboa, 1710; Febnanoo L Alv.m, Semira- ms reconhecida» Lisboa, 1755; Id., Temistocles, ibid. ; Francisco L. Amkno, Acnilles em Sciro, Lisboa, 1755; Id., Alexandre na índia, Zenobia em Armé- nia, A clemência de Tito, Demofoonte em Tnracia e Antifjofto em Thessalonica, todas de Lisboa e 1755; Filinto, Antigono em Thessalonica, 1768;Jo3i db M. FausÃo, a valerosa Judith . , . j Lisbfa, 1773; JosA B da Gama, A liber- dade do sr. Pedro. . . poeta cesáreo, com a tr. fr. de Rousseau, de Genebra, taportug. de Termindo, poeta árcade, Lisboa, 1773; Josá V. Babkbto Fmio, Themistocles, Lisboa, 1818 ; da Opera Achilles em Sciro ha outra tr. por Ma- loei P. da Costa, Lisboa, 1755 ].

GoLDOBi (1707-1793), que mereceu o cognome de Moliére italiano.

AuriBBi (1749-1803), que deixou nas suas 14 tragédias e em moitas obras «m prosa e v^r8o^p^ova3 sobejas do seu talento e gosto literário. [ Km portu^.: JoBm V. B. Fbio, Oresies, Lisboa, 1819 ; Id., O tratado do Príncipe e das le- tras..., Paris, 1832; Id., O tratado da tyrannia, ibid., 18;j2; Ant'».>í.o P. Zaoal», Conspiração dos Pazzis, Porto, 18 8 ].

Na história sobresafu : Vigo fl6^>8-1744) creador da filosofia «la história *>ni a obra, que é o seu título á imortilidade Principi di una nova scienza Intorno alia natura delle Nazione, 1725, 2 vols., que mer(H*3ram a Miehelet a koDra duma tradução.

INGLATERRA

É de esplendor o século xv[ii ; bastará mencionar na poesia Youno (1681-1765) conhecido peias suas Noites ou Pensamentos nocturnos. ÍEm portug.: José M. B. Pbbbiba, Noites selétas, Li.^-boa, 1781; Vickntb C. db Oliveira, Noites. . . a que se ajuntam muitas notas importantes e vários opúsculos de Young^ Lisboa, 1786, 2 voís. ; outra ed , 1804, '2 vols. ; Id , Nova tragé- dia intitulada a m Vingança ^i do dr..., Lisboa, 1788; Id., Busiris no vol. anterior]; Pora, (1688-1744), íjue dosenvolveu o seu génio no poema eóniico Roubo d'uma madeixa. [Em portug : ÀNTÓNfo Teixeira, Ensaio sobre o Ho- mem. ., Lisboa, 1769; Jozb N. db Mas.sublos Finto, Epistola de Heloísa a Mailard. . ., Londres, 1801; Condk dr Anu ar, D. Fernando J. dr roKirG\L, En- saio sobre a crítica.,.. Rio de Janeiro, 181); Id., Ensaios moracs. .. com as notas de José Warton e do ti., ibid, 1811; FkincíSuo J. M. TAuaiNi, Ensaio Sobre o Homem, tr. verso por verso por, . . barão de S^o Loiírcnçn. . . daJo à luz por uma sociedade literária da Gr Ho- Bretanha, Lon'^ir*'s, \Mí), vola. ; Hi5EiquB E. DB Almbioa CouTiNHo, Epístola de Heloísa a Abeilard. . ., l*orto, 1835; JoíB VL. OscBio Cabbal, O inverno ou Dapfine, m-Jornal de Coimbra,

416 HI8TÓBIA UTBBATniU POBTUOUAeA

11, f, 2.*, pg. 211; António Luís Gentil, O roubo do anel de cabetlos... in- Ramalhete, jornal de instr. e recreio, i, 1837, pg. 22 e eeg. ; Pbascisoo J. P. MagalhÃbs, o roubo da Medeixa, in-Minerva BrasiUense^ i, 1843]; Thojípsoi (1700 ■174«) imortalisado pelas Estações, [Em portng. : M^bqcbsa de Alorsi, Estações^ in- Obras, m], poema descritivo. A eloquência parlamentar tem neste século alguns dos seus melhores rf preaontantes: Lobd Chat^m (1708-1778); Edmu» BuBK (1730-17^7); Fox (1748-1806) e William Pitt (i7òí)-1806).

Sam insignes na história David HuifE (1711-1776), também filósofo célebre, Robeetson (17jí'179á) [Em portu^. : João B. da S. Lopes, Mist, de Carlos V, tr. do 1.® vol J e Giudoií (1737-1794), cuja obra História da decadência e queda do império romano ficou clássica.

Na novela merecem registar- se os nomes de Daniel de Fo« (1661-1731), Jonítham Swipp (1667-1745) o conhecido autor das Viagens Gulliver :Ki' chabdson (1689 1761), [Em portug. : D Félix Moreno de M. y Ros, Pamella Andrws ou a virtude recompensada» novella. . . Lisboa, 179 . ., 2 vols,] Got- DSMiTH (1728-1774) [Em portug.: D. MarÍH B G Martins, Hist da Grécia...^ Lisboa, 1865 Anón., Hist. secreta do Gabinete de Napoleão. .., L sboa, 1X11 : Alei. Aragon Hist. de IngL, Lisboa, 1312 44, 4 vols J e Kadclifp (1764-1823).

ALEMANHA

/

O S''culo xviíi é para a Alemanhíi a ép'^ca áurea da sua literatura. Híllsk (1708-1777); Klop«tock (1724-1803). Gkssnisb (1730-1787) [Em portug.: Obras, Port^, 1791, 2 volí3. A morte de Abel poema trad por ura anónimo. Liôboa, 178i, ontra tr. pelo P. Joh('» Amaro da Silva, ibid, 1818.] e \Viellani>(17.-o-1813; [Em portug : Filintn, Oberon in-Obras, u: Marquesa de Alorna, in-Ob^as.m (os l.^** 6 i'antos)] deixar.mi obras qn-^ tornaram imorredouros os seu nonietí. Na história sobrcsníram ÍIerder (1744-1803) y AItller (1752 1809); na crítica lite- rária Li;8si\n (17'J8-17.S1). [Hm portug.: Joa«» F. Pereira. Fabulas, Lisboa. IS;'»"*,], 08 irmàos S..ni.i:(iEr., Au«íiiHto Guilh<írme (17<)7-1845) o. Carlos Guilherme Fred^^ rico (17rJ-1829); na filosofia Wolp (ir,7í)-17r)4), Kant (17241804) e Fica? (17<v2- 814). Míis a AUMiianh.i é principaloníute orgiilhosi do* seus dois grandes poótart GoKTiíE e SciiiLLEií.

(tmetiik (,fo;V) \V'»lf.raníí) (1749- 'í^.')^) rs.Teveu numerosas obras, tendo as iniciado com o dratna Goetz de BciUchingen. íjuaido em 1774 publicou os 5£?- frirncntos dojoven Werther, o s n nome tni uf.u-se conhecido em toda a Alemanha, Atí su:i3 baia ias earn;ó«d, como Rei de Tule, Canto do Conde pris onciw, a seu iài'io rpiro Ilermann e Dorothea, as 8u:\.s tragedias Torquato Tasso^so- hvHudct Iphiifenia cm Taarida, e Conde d'Egmont, que passa pela u.elhor, e tantíiri o)) as admira v^ií*, dào-Uie lugar a »f^r considerado como um dos maiores po«'ta>^ (lo mundo. Km 1 7V»0 apíireciam as orimeiras Bcenas da obra que foi a grande {)rtviciipa(;no d»' toiia a hua vida o Fausto, que saiu completa em lb32. Goetin^ moi rru eri) Wnimar oní LSof), cheio 6e amor e de glória, soltando, na agonia, arjiic^laí^ (••'•fiflT' s palavras <pi'^ tanilxMn urn gónio portuâjuês repttiu: LiU- ainda mais Inzl [Km }>- rt-i;;. : Li.vo Au.nsro de Macbdo Msllo, Hermãmt Dorotfifa \n-l.iz o fin *•■ ir.ra^a, l.-iria, l8r)6, 8.°, 79 pgs. ; outra tr àoài. riuNAMiK. C'"-\K. l'"'^'", '^^ -H:bi. aniv. ant. e mod. ; Aoo8T'>-ho db Obní''í-^»» Fdw^tr .., Li-;'ija, ló.iT. "To i^i/-». im-onnurta): Visconde de Castilho, /^(Jtíí^í?"' Líh'.m..., i>-T-'; .ii'A..'r >! \>v, \ /.«^i;í>x.;hllos, O Fausto de Goethe, Porto, I''5<^-' rn-M'., (U' Ui-tr.., / íjt^ç/V^j de Gc-etfe, íiisljoa, P.íOP, 1 vol.].

l.)-t ii'.\t\. a\'il-i?- '*' m.iifs i*'idi.\:ida.s a ^^a lindissim.i Canção doR^i'^ Tule. i\\\ <Mii pori.. .:."■.■- rni ti-.«ín'/i(]a jíoi- L^tno C«elíio, Eça db QrEiKo.T im* cnn,,>i t,»], (i.'iNvAuv»j< (■K^•-^I^^, Amiípuo nn Qrr.xrAL. Castilho e Joaquim ijb \>í'' com;i.ll(-'B. L itiniaincntn anivia a Cu/fção fui maia trad. pelo sr, Albxandbi FoxrES,

CAPÍTULO y BSOOLÁ FRANCESA OU ABOÍDIOA 417

in- Decide ntej vol. xxx (1907\ pç. 130 e com maia duas de Goethe e einso de

ScHiuAK e oatras in L^ra germânica, Lisboa 19(J7.

ScHiiiX.vm ( Joào Cristóvão Frederico de) (1759-1805). Se Goethe ó o ho-

Bem de ^énio, couqo se diz na Alemanha, Sculllbb é o homem do coração.

Pode adriiirar ae a suaviiade da poesia de S^hiller nas bnladas como as

Pelavras de fé. Palavras de ilusão. Artistas, O Sino, O Ideal e a vida ou o Xreir^o das sombras : nas odes com » A alegria, na elepria Resignação, Deuses da jQTécia, etc. Eu t«>d;i8 estas c<»mp 3içõ^»9 ha nma nobre puieza o nm Hiip»:rior' ciio. Nas tr.^Mins Víúrifl Stuart (1800), Pacelle d^Orhans (l.^Ol), Despo- ' uida de Massines (1803) e sobretudo no Guilherme Tell ( 1804), o grnio de >ohil-

»s éubia a tod;^ a elevição í*pica. A Alemanha chorou a sua inrte (!f»nio uma

ppnU nacional [Em portuj^. : João Feux Perbiba, O visionar' o rnjiian •. . . tr. '4o .iletnão, T^iaooa, I8.i2, 8.°, 225 p^á. E poesias avalias como os-a di'i/.il Die

Glock qae o 9r. ITontiss tr. no Í!vro cit. n.i nota ant. •, em .1. (i mk.** ?»I ntbi 'o,

Era? da lyra teutoaica. . ,, P<Trto, 1848, eucontram-se também alguin-is poesias it ScmuLEB bem csomo de, Gobthk, Lessino, Uiiland...].

. capítulo V Escola Francesa ou Rrcádica

(Séc. xvin)

A POESIA

Sumário: 131. O sécalo xvm, caracteres gerais. 132. Reacção literária. 133. O Terdadeiro método de Verney.—lái. Academias literárias: 1) Academia Real da História Por^agnêsa; i) Arcádia lUissipmense; 3) Academia Real das Sciêacias; 4) Nova Arcádia. 135. Génei-os literários: prÍDcipais re- presentantes. 136. Pedro António Correia Garção. 137. Domingos dos Reis QuiU. 138. António Dinis da Cruz e SiJva.— 139. Mannel Maria Barbosa dn Bocage. 140. José Agostinho de Macedo. 141. Francisco Manoel do Nascimento. 142. Nicolau Tolentino de Almeida. 143. Duas poetisas. 144. O teatro no séculp xv»ii. António José da Silva. 146. Sicolan Luís. 147. Manoel de Figueiredo. 148. A poeêta épica no sé- culo xvijx. 149. José Basílio da Gama. 150. José de Santa Kita Durão. 151. Os Líricos, 152. Thomás António Gonzaga. 153. António Pereira de Sonsa Caldas.

131.— O século XVIII, caracteres gerais. A primeira

metade do século xviii pouca diferença tem do último período do precedente século. A afectação e o mau gosto agraváram-se. Muitos escritores deixaram- se desvairar pelo grande engenho de Vieira co- piando-lhe o mau e despresando o que nele havia de bom. Usavam aquelas excrecências de estilo, escreve Rebello da Silva, corno os sinais, 08 donaires e os riçados altos se trajavam nos atavios cortesãos, de^iigurando a fisionomia e as mais esbeltas proporções. O que nao tinha resaibos de artifício, uma tinta violenta e afogueada, despreza- va-se como inferior á fama do escritor; e por isso naquele século, propenso ás . agudezas e argúcias de teses e ar^Mi mentos nubelosos, intrincados e soãstas, ninguém se eximiu inteiramente ao contágio ^. Por outro lado «o povo arrastava-se no seio da miséria, do embrutecimento e do íanatiamo, segundo escreve Pinheiro (Jhagas, Qma corte frívola, devassa e beata insultava a mi^éria popular com a sua sumptuosidade, a instrucçào pública estava paralisada nas màos

^ Awnaee das 8e. e Lttras, i, 1858, Lisboa. O aspecto histórico-pocial ^ta época é bem desenhado na Htst. dt Portugal nos êéc9, XVII t XVIUt I^sboa, 1860, 5 vols., de Rebelo da Siira.

420 HISTÓRIA DA UTULATUSA P0BTUOUÉ8A

dos jeàuítas, os cristâos-novos, que constituiam a parte mais esclare- cida talvez da naçno, fugiam para o estranjeiro com medo do santo >oíioiOj no reino decadente e pobre havia uma grande sombra, cortada pela chama dos autos de fé».

132. Reacção literária. No meio desta deeíid%oia interna todos voltHvam os olhos para a França, que sobre ela atraía íís reten- ções ilf^ toda a Europa com o seu prestigio politico desde o reinado de Luís XIV o com a fama dos seus escritores, que todo- desejavam conhectíT e imitar. dentro do próprio séc. xvil se notam e^^forços de imitMcno franc("sa, como o demonstra a tradiícçílo da Arte I^oêtica de I)oileau peJo Conde da Kriceira. A traducção nào produzia o iní- nimo (feito na orientarão do gosto literário, como acontec^^u também com o poema dele ^Henriqueida, No conceito de Vernev o Conde era homem erúriito, mas f lho de método e de crítica. A acção de D. João V também foi estúril, embora na sua época se fundas>em várias Academias de História e de Literatura e se publicas.sr^m a?^iin& trabalhos de í;rud:çào íreneMÍógíca p histórica, como a Bihl. Litsit^ de Bíiri)0s;i Machado, o Wtcnhii/árío de Bluteau, e tantos outros. Aias Pòtá o gô.>to da ópnc. ri(K-> pn');)j-ios nomes das Academias e até nos títulos (los livros e. ]>ara cx., o^te nu^smo líicioiulrio de HUitoaxi, que tem inai-i de 50 títulos ua portada drsde áulico aft'^ zoofófjtco, todos (^\dn'ix'uli\s I | )es^a i';'*ili(l;i l(i da época sauí frisa nt^^ exemplo os outriros colcbrjKio^ '«f».-^ ( on\ ^'iito^ por oca^iào da eleu^ao das abades.síis os abadeii.ialus, a qui (ioncorria sempre grauJe nml- tida ) de fidalgos, <* de poucas, (^ em que disputavauí pri?ij;isia3 os con('(^itos alaiiibicaílcs, o.-. trv,cv..(lilhos e os equivoco?í. As freiras ou r(^c U iilas laiiravini afiav!''s do locnf()rio os mofes, que a ciiusina do ií}n)r')vj^aiior<'s ^jlnstiva melhor ou pior C'»nforme o f>oa valor. Li'^l)()a, CoiíobrM. ]*orto, Kvora, ete., conheceram r^>t s intí^res- sarifís 1í.nií'ios, nuí^. aii^la ^Ml>.>vistiram até alem dos meadas do ^(Hrilo XIX, te». «Io +íca'lo inoir,'')ria dí'^ os era poesias de CV.milo Ca.s- t(*''; JWaíi'.') e Giiili. ^rn"- í-.ra>,a. Kraiu protexto afinal para loanifos- M\v}yy fspívi.i.TiJí.sa (10 ];ixo o,u\ trajos, em e(juipa;:^enrt,> em ditos esoi'i'0(irr>, o*^'".^^")!'.'^ ("ji ^'ue o> cr>nvon^os rival -zavam cm fornecer ao.- >t' K eonví !n(l.)s tivli> «'-.uMito a u)ai> fina, ia mj'is curiosíi, a mais invoíiti/a ar^c de [>.'.<^^'' ^i ia hav^a deí^coborto, até n^ss noaies que íii-^rani históricos pa.^tci-- (^t*. Santa Clara (Coimbra), manjar branco de ('(4as, II ah ida d<í S^Muidí^, e toucinho do céo, pingos de tocha, Ijarrif;;'. do freira! etc. Destes outeiros nada ficou digno de rfgistO; sue '1' ndo o mesoio às assembleias ou serdes contemporâneos deles, qwo. (•< >'^*av;im dti «joíío, (íantorias, danças e versos». Meros passa- t(^^moo< (|Uíí yiareciani sí^r a única manifestação séria de vida duma bí.' i"'ia lí^ om víM'd.uKJra deconijjosiç?lo ! Mas se a fisionomia da pTÍrn •■"íi mí.'tuíle do século é como a acabamos de tracejar, a última

CÁPITatX) BSC0L4 FBAHOtSÁ OD ABCADIOA 421

metade apresenta todos os sintomas dama revolução, que viria a <lar o florescente período do renascimento romântico. Muitos escrito- res portugueses haviam fugido á intolerância politica e religiosa do paíá, indo habitar a França, que desde Luís XIV^ repetimos, alcí- nçára era literatura prestígio indiscutível. Ao calor dos ideais de liberdade é que aqueceram os seus espíritos homens como Luís António Verney, Alexandre de Gusmão, o Cavalheiro de Oliveira, António Nunea Ribeiro Sanches, Correia da Sorra, Brotero, Francisco Manoel do Nascimento e outros. Aos esforços destes grandes horaená se deve a rpacçS) em favor da língua, da poesia e da história; sam verdadei- ramente os d Precursores da reforma». Vemey cora o s-^u Método aía^entava a velha rotina literária e linguística; Ribeiro Sanches apontava ao Marquês de Pombal as transformações a realizar no ensiao para o erguer do abatimento em que jazia; todos pelas suas obras prepararam o romantismo. Nêite movimento de reacção importa destacar, pela sua importância, alguns factores. Nomeemos especial- mente o Estabelecimento da Aula de Comércio fundado em Lisboa em 1759 que, melhorado e dosenvolvido, poderia de muito ter- noa dado uma escola superior de comércio ; a instituição do Real Colégio de dobres criado em 17G1 onde se estudavam as línguas clássicas e â!> modernas, a história, a filoscfia, etc, que era para o seu tempo Qm ináfituto de que ínod^^niamente temt)s similar nas Faculdades de Lotras de Coimbra e Li.sLoa, ' e enfim e sobietiido, a ref »rma da Uiiiversidade de Coimbra et^tudada pela Junta de « Providência Lihrária», criada por carta réi^ia de 23 de dezembro do 1880. Ksta Junta composta de nove membros, de que eram inspectores o Cardeal da Cunha e o próprio Marquês de Pombal, e de qio faziam parte, entre outros, o Bispo de Btíja, José Seabr* da Silva e D. Francisco de Lemos, passados oito môsos ai)rosPntava o Compendio histórico "lo estado da Univ. de Coiíahra^ donde talvez a cOren um pouco ^Xií^eradas sobressaia nitidamente a decadônciíi e (esterilidade do í^asmo universitário da época. A ni^^sma Janta elaborou um plano de e::uJos, modeliV p^ra aqu'iíe t-mpo, como coiií^ta dos Estatutos Xovos que criaram as FucuKi.i lo^ de Mafemática e Filoso/iaj com o Obserratório Astronómico, o Museu de História Natural, o Gabi- '^tte de Física, o Laboratório de (Química e o Jardim Ilotâuico, p rones testemunhos a gloríos;imf^nte atestarem a orien*;a;ào pod ii^ó- ;ica o largo e profundo sa'> t de quem os redi^^iu *,

^ Criad-is pelo Deer. i!otn fi.ei ao lei de 19 do alí^i' ^^ V^W. Snoro r, 'íáty 'lo das letras em Portutra'- vi.i, i>i-. A. de. V isron -."lorf, F k^ 'Íc, / 'i' ••ns^ iir'io in.títgural do ano lejUivo de J!j/J'JjJ<> /(.t. si^smo s M>,\ ti', a') -ff '?*.t 'i' t l'iiv\ d *Mn,br(x a líl de ontnbro, Coiini)ri, 1912.

* Para a hiâtóiia d;\ Univ. i^.r-^t»'. pnrí -d > dev»' lòr-srí a ^v- '-'^na, . , de f^. Francisco de Lemos de Faiii\ Teijira vjoutinlio, [íiiblitMli ."''.o ^r. d/. Th.

21

A22 BiexÓBlA OA UTBBATUBA PORTUODÉ8A

13S. O Verdadeiro Método de Verney. A dexsadên-

cia literária e scientifica de Portugal ioi apontada com muita justeza num livro cue apareceu em 1746 eob forma epistolar e astinado por um Frade Ba/rlxidtnho. Tal era o pseudónimo dum individuo de rara ilustração, de vasta e segura cultura e de desassombrado critério tpor ventura o maior sábio foituguês do século XViii» como àoêrca dele escievru Fr. Fortunato de S. Boaventura LUÍS ANTÓNIO VERNEY (17 13- 1792) '. atrás o citamos como um dos cooperadores da re- forma d» 8 letras no séc. xviu : merece o seu nome neste campo ser dentre todo^ singularizado. Verney frz a sua educação em Itália e de vf-io |>or xo serviço da kua causa uma erudição è tenacidade dificilmPT-te superáveis.

Quar do apareceu o Verdadeiro Método de estudar * travou-se renhida po én iea em volta dele e do ^utôr. Vemey nSo era, decerto, um e8<ri'ôr nodelar; a frase saia- lhe incoiTecta, a critica detabrida e por vczen injusta. Mas isso me^^mo constituiu uma das razÒes da salutar sgi^íirai) operada em favor das boas letras. Os {e^uitas ^ram 08 princif-h'ii >ei t^ atingidos pela ^^udeza da crítica de Verney e por todas as fómian procuraram imitih'zHr]he o exforço. Mas ao laáo do imp\hi'áy*'l dt-n h^ògo do velho e bediço rítualifimo literário et<íavam a apoJA-ío hoiiens como Cenáculo e Francisco José Freire. Kem ao própr o Carrors Verney poupou os sfus reparos e á chusma dos poe- tas atiiavíJ da] dos desta ordem : entendem que o compor bem consiste em dizer subtUezoà e inventar cousas que a ninguém ocorressem: €om esta idéa //roduzem partos verdadeiramente monstruosos e qut eles mefmoè, guando os examinam sem calor, desaprovam.

E' Fr'i António das (bagas quem ele escolhe para criticar^ ou melhor, Si.tirizar, como autor do poema Filis y Demofonte^ qoe ntiuca viu a luz pública, mas circulava em cópias manuhcritas por toda á p. rte, e de sonetos, cujo titulo dizia tudo o. Achando na

Braga, 8ob o lítnlo Dom Francisco de Lewos e a Reforma da Univ. de Cw«- bra, etc, Licbía, lh94. Tacnlcm iôbre ést- s e os Estatatos qnepi* e#*derampóde lêr 88 o art. do Dr. A. de Vasconcelos m-Anuário da Unw. de 1901-02 com o título Unir. de LUhoa Coimbra, Súmula tiutórica (1288-lííOO). O nome de D. Francisco de L' n os está estreitamente ligado á reforma do ensino publico em Portugal. Fm 1770 Reitor da Univ., em 1772 Reformador, em 1773 eleito coadjo- tòr e fnturo sucesecr do biupo de Coimbra, D. Miguel da AounciaçSo, vindo a falecer em 18 2. o bispo Lemos exerceu acção pedagógica larga e profsndâ n* esfera superi* r, que sem a sua poderosa iniciativa seria inteiramente efteril. O governo univeiHitário do bispo Lemes suscitou ibe muitos inimigos. Cfr. F. A. Martins de Car\ hllio, Algumas horas na minha jAvraria, Coimbra, 1910, pág. 139.

1 Vid. a t;io;i,r. do btnpniénto pedagngo nts Retratos e elogioa de varvti donas pelo P. J<hó de Figueiredo ^ Ricardo Jorge, J7n«ato« «ctení. ecrUicoi^ Porto, 1886, págs. 67-82.

« Va en(ia, 1746, 2 v( l. ; e ihid, 1747, 2 voU. Innoc. nabitgr. [Dtc, v. 221 e vil, 2íl\ enumera as pubiicaçòos pró e contra esta obra.

CAPÍTULO V B8COLA VBAlIcâSA OU ABCÁDICA 423

belêza de FUis razão p<vra deixá-la í>, ou Aos olhos de Filis com névoas, ou Fineza de não amar Filis» . . e todos os outros de igual jaez. Documenta as suas afirmações com a transcrição e análise daquele soneto em que o Foéta canta o da sua dama^

Instante de Jasmim^ conceito breve j A 'tomo de açucena presumido

Não pé, mentira sois. . .

a que êle faz chistosas considerações. Toma depois á sua conta Ca- mões escolhendo os sonetos Sete anos de pastor Jacob servia, e Alma minha gentil . . c os dous gavadinhos, que se teem grozado ' cem mil vezes », a que declara não achar graça nem el vaçào alg ma.' Depois chega a vez ás Egiogas, «que r»ão se pedem ler com gosto», e aos Lusíadas, que encontra cheios de deíeitos. Porque Camões nâo tinha talento ? Não. Camões « teve n)uito eng nh •, imaginação fecunda e grande, .. teve muitas qualidades de Poeta e para aquele tempo em que nâo havia os conhecimentos que hoje é maiaviiha que escrevesse bem». E vem um rosário de dislates, que outros repe- tiram pela íalta de compreensão do que era a Epoj»»ia dum povo, como Cândido Lusitano, como Soares Birbosa, que sustentavíi qae o título qoe bem quadrava aos Lusíadas éra o de Vasqueida ou Gà- meida! Nenhum deles compreendia, nem s«bia explicar a r^zao daquele formoso título, abraçando em síntese a Raça, o Povo portu- gttê-j, na plenitude da sua História. « Um termo latino, dizia desde- nhosamente Verney, que tanto calça aos Portugueses navegantes^ como aos que ficaram no reino e o pf^ior é que o toma no plural, que nâo tem exemplo na boa antiguidade I »

Toda a Carta VH Ao Verdadeiro Método é uma fotografia do estado do espirito deste curioso séc. xviii.

Melhor senso mostrava Vemey noutro ponto capital das suas críticas, o relativo á instrução a mitústrar nas escolas desde a pri- mária á superior, como sam dignas de registo as suas observações sobre o estudo das mulheres, assuntos que versa na Carta XV L Prova primeiro a capacidade delas e a seguir a necessidade de que estudem^ aprendendo a lêr e escrever com acerto, com « ortografia e pontuação». Gramática muito simples?, quatro operaçõ<*s. A His- tória com base na Geografia, primeiro a da Palestina, depois a de Roma e Grécia, por fim, a de Portu^^al, simples. Podem apreT-dor o espanhol. Um pouco de economia doméstica, saber fazer con;pnis, ter um livro para isso. E trabalhar, tocar alguns instrumc^ntos com mo- deraçSoy saber dançar, sendo de boa educação saber dançar um núnuete, fiizer uma mesura... Quanto ao estudo do latim nâo íari mal entender-se alguma cousa. E que crítica acertadíssima, vi-

424 HIBTÓIXA LimâTDftA POBTUQUÂBA

brant6 de bom senso, a que taz aos sistemas íilosófíeos dominantes nas Escolas !

Tal era o homem, o demolidor dos velhos sistemas literários e scientííicos.

ACADEMIAS

134* Academias' literárias. Para operar a reforma lite- rária fandaram-se no presente século várias Academias, á seme- lhança do que se havia feito no século anterior. Vamos mencionar as mais importantes e p:;los traços, embora em esforço desenhados, Tcr-se-ha o que valeram, estas tentativas de revolução no campo das letras *. S^ todo esse esforço tivesse sido norteiado noutro sentido, que riqueza e abundância em obr^s literárias nós não contariamos! Mas assim, quási tudo sam futilidades, bagatelas, pequenos nadas.

A Academia Real da História portuguesa. Esta socíe-

dale foi institaida por decreto de D. João V do 8 de dezembro de 1720 com o fim de a purificar da menor sombra de falsidade-» a narração dos .sucessos pertencentes a uma e outra História (Eclesiás- tica e Secular), e invehtií^ar aqueles que a negligência tem sepultado nos arquivos.» Usava como solo o escudo das armas reais, por baixo a figura do Tempo preso com cadeias, e em volta o dísiico: a Sigillum Regiae Academiae Historias Lusitanas i^; a empresa era a figura da Verdade com a letra a Restituet omnia*. [Estatu- tos, § 10].

Os académicos principais dentre os cincoenta que contava no fim do 1.^ ano, íôrani D. António Caetano de Sousa; Diogo Barbosa Machado ; Franrisco Leitão Ferreira ; José Soares da Silva ; D. Ba- fa ol JUntcan, t'tc.

Os trabalhos dpsta Academia estam reunidos nos 15 vok. da Co^Gccào dos Documentos e Memórias * publicados entre 1721 e 1736. Para se avaliar dos serviços por ela prestados ás letras pátrias basta

^ Tivemos: Academia dos Anónimos ou dos Ocultos, a doa Aplicados^ a Problemática de Setúbal, a dos Solitários de Santarém, a Problemática de Guimarães, ii dos /Ilustrados, a dos Insii^^nes, a dos Laureados, a dos Obse- quiosos, a doà Unidos, a Latina e Fortuí^nâsa, a Mariana; e no Brasil— a Aiãdemia /?'■ .^^'/^ i djs Fsyjcidos, a dos Felizes, a dos Selectos, a dos Renas- cida» o a Literária. S. uv.i/. \'id. J. Si!vt>tre Ribeiro, Híst, dos estabelecimen- tos scitnli;., e t;: i /n. no-' Primeiros traços, pág. 144-150.

iJ ( o/. í/6'ç ])oc. e \W"n. da Acad. R. da //. portug. 1721 a 1736-, 1'^. voN. \" l i :. .: *íiíO'l Tfics da Silva, Marquês de Alegrete, Hist. da A ( d. R. Partir^, [.^'v.i, 17J7; J. hilveètre Ribeiro, Primeiros traços..- p-'g. I.'i2 e eeg.

A na mesnía ColIecçSo íeita cm 1734 pelo 4." ). Franoisco Xavier de Mtneats onde se encon- eúdo de toda a colecçrio da Academia, a sabíT : ias do que se passou naa cooferSncias ; Contas micos; Panegiricoa; OraçZes ; Elogios ; Decla- Dissertaç^ies ; Catálogos históricos; Extractos )3 manuBoritos e impressos; Documentos extraí- livOB ou noticias dôles; Explicac^ão de medalhas, ; além de diplomaB régios, estatu;©», etc., rela- 'eatre as \remória9 h)l muitas de subido valor

a hist. de EI-téí D, Joào l de J. Soares da ). Seixistiào de Barbosa Macbado, a'^ Meia. de lho de 5[6iidonça de Pina e Proença»; as J/em. ra por D. Jerónimo Contador de Argote* as da

Pereira da Silva Leal, etu. Depois do tantoa Acad. dpcaí i e no reinado de 1). fiaria i foi l. R. das SciêuciaB.

11

ai das Sciôncias de Lisboa. Df^ve a sua

Carlos de Bragança, 'i° Uiique de Lafões linha D, Maria i, quatro anos depois de ter ter-

ntt* auxiliado no seu propósito pelo Abade Cor- 1823) homem de vasta ilustração botnnica, qiio i, onde regeu um curso d-quela sciGiiuia e o ira compreender a reno>'ação sdêutitica que se i, que pelos Ectatuto-- ficava com as três elas- rais, matemáticas e belas-letras. A L" sessSo iaO sob a presidência do Duque e a assistííncía V T.od'TO de Almeida, P." Joaquim de Foioa, ca, etc. Nê"te I.° período a Academia produziu 1 Dicionário, l.° vol. em 1793, obra de Pedro 7 I8l!i), proi. no Colé^íio do Nobres, e dos aeus i Costa de Macedo e líartolomeu Indicio Jorge; imicaa pnra o udeant amento da aijricnUura, itria etn Portugal e euas conquista.-! 5 volí.,

LoDia para onde foi com os ))íiíb aos 6 anis e lii rtJe Toltow aoi 27. Em 1786 expatrioo-se tnm retwU- d- r>.t" nfiuio D.i.eis A'- vida agitada regresson a Portngal falecendo i^ui IH2;l. liiou. íiiV. Bil.l., n. .'iM .'Ul ; Teixeira de Va8conoel'>a, Glórias Portag ; De. Júiio ll.^iiriíiii^i, J Corrêa da Seira. Bra^, 1918 ; Mariuêa du AtíIb e IloUii^a, .1 Wariitiesa de Alorna, l^'Jt3, p. 218; EdoícI. Portug. ilastc, ». v.

426 fliSTÓSiA DA LTTBaATUBA FORTUOUftSÁ

1789-1815; 3.*) Memórias de Lit.^Portug.^9 vols., 1792-1814; 4.) HisL e Mem., 1.» s., 20 vol*., 1797-1839; 5.**) Livros inéd. ds Hf st Portug.f ô vais., 1790-1824; 6.*) Mem. de AgricuUma, 2 vola., 1788-1791; 7.°) Ephemérides náuticas, Ô4 vois. 8.<»); Col dos principais Autores de Hist. Portug,, 8 vol., 1806-1809.

Não é menos notável a série de trabalhos oorrespondentes ao segnndo período da vida da Academia posteriormente á reforma dos seus Estatutos vm 1851 no tempo de í). Maria i, a saber: 1) His* tória e Memórias^ 6 vols., 1643-46; 2) Cl. de se. Matem.j Físicas e Naturais, 13 vol., desde 1854; 3.^) Cl. de se' morais, polit.j e bel cts letras, 18 vols., desde 1854; 4) Portugália^ Monumenta Histó- ri** a, 20 fr«c. publ. ; 5.^) Col, de opúsculos reimpr, relativos á hist, das navegaçdesj 1844 75 [i Roteiro por D. JoSo de Castro anotado por A.* Corvo; ii Estudo sobre as Prov, vltram, por A. Corvo, 4 vol. ; III Os descobrimentos dos Portug. por P. Chap^as, 1 vol. ; IV Bibliog. dos descobrimentos por Con-iglieri Pedroso] ; 6.*) Q^adro Elementar, 19 vols., 1842-76; 7."*) Corpo diplomático, 14 vols., a o que ef^tao ligados os nomes de Rebelo da Silva, Mendes Leal e Jaime Moniz ; 8.^) Monumentos inéd. para a hist. das conquistas dos Portug. j 19 vols. [i Lendas da índia, 4 vol.; li StAsidios para k n^st, da fndia, 3 vol-., iii Década XIII de Bactrro, 2 vols.. iv Livro de Movçoes, 4 vols. ; v Cartai de A. de Albuquerque^ 5 voU.]: ^y Anais das se, e Le^rac, 4 vol., 1857-1858.

A Livraria da Acad. tambê n merece menção. O ftindo primi- tivo loi a livraria do Convento de N. S.' de Jesus de Lisboa e foi instalada num salão construi <o por influência do Bispo Cenáculo con- tando muitos milhares de vols., mais duma centena de incanábalos, o Missal do EstevSo Gonçalves, etc.

A Academia gozou sempre de maior ou menor favor do Es- tado. Em 1910 passou a dpsig-nar-s*^ Acad. das Sc. de Lisboa^ ini- <;iando nova série de cbtudos, que muito a dignificam '.

III

Arcádia Lusitana ou Ulisslponense *• Fotfandada em

1756 por António Dinis da Cruz e Silva e Manoel Nicolau Esteves

' Vide—Criítovilo Aires, Para a história da Acad. das Sc. de -Lwfcw no Dêf. da Seg. Cl., xii (19 '8) págs. 783-897; Fidelino de Figaeiredo, O quet a Acad. da^ Sn. de Li»hoa. Porto, 915, 1 folk.

* Vid. nag Mem. da Acad . it, 2.» p.. 62 e l4l a Mem sobre a Arcá- dia, (1840) de Francisco Minoel Trigoso de Ârag2o Morato, e oa artigos de Ke- belo da Silva sobre a Arcáiia Portuguesa noa \nais das Sc. e Letras, i d^'] páí<a. 75, 147 e i09 ou Obras completas, v Is. 28 a 30 aob o títalo Arcádia Por- tug tesa. ; J. Silvfltrp Kbfiro, Primeiros trecos... cit., pág. 141 eHiet.doi JBstabelecimentos Sciêntificos. . ., vol. i, págs. 266-272.

\

OiPXTULO T - BSOOLA FRAHOftSâ OU ABOioiOâ 427

Negrão para < formar ama escola de b^ns ditames e dd bons exem pios em matéria de eloquência e de po^^sia, que servisse de modelo aos mancebos e estaiiosos e difun liasse por toda a naçlo o ardor de restaurar a antiga beleza «lestas esquecidas Artes» £' o qu) dizem 03 E^^tatutos organizados por Cruz e Sil^a, que agregiu a si o poeta Garção.

Sem ò conhecimento dos molMos antigo? era iraDmív^I, se- gando jalg^vam, enriquecer as a\x\^ C3mp0àições d is ininitas bele- zas poéticas, quo descobre a «'^ada pis^o quem frequ<>.nta a iiç^ dos gregos e latm>s. Sífocles, Vergíli), íljrácio, Térêicio, passaram a ser os ídolos dos s^us estados ^ O nrxx^ Arcádia tom no lam^ das mais célebres províncias da antigi Grécia, que as lenias considera- vam a séie da poesia e da músici; o local onie se reunia, que era ama? vezes na Rml Casa das Niossid ules, e outras n) elifício da Janta do Comércio era desigaado p)r Monte Ménalo ; cala sóâo na <jualidade de Árcade^ era obri^i lo a aloptar o nome e o sobrenome dum dos muitos pistores cel^b^aios pelas musas gi^egis e latinas; a em «rêsa era t meio braço p^g^iado em um podfio * co n sti epí- grafe— (íinutilia truncaty> A HOíieUle tinha uma sessão pifticu- lar por m^s e duas públicas por ano. Os sócios mais notáveis fortm: Corrêa GarçXo {Corydo^i E''f/nianteo) ; Reis Qixifia {A^.cíno Mi- <enh) ; C-uz e Silva {Elphu N imoríease) ; M inoel lo F gi âredo [Lycidas Cyatio); Francisco Joné Freire (Cândido Lmlta'io); Ma- noel Nicolau Bsteves- Negrão {Almeno Sincero).

A Arcádia manteve-se d iraate vinte anos ao fi n dos quais para d saj>artícer, mas resurgir co n o título de Nova A''oa lia, man- teoio-se em to lo o caso a sua i<iflti3ncia mais ou menos até o apa- recimento do Romantismo.

IV

N0V3 Arcádia* Esta sociedade é também conhecida pelo nome de Academia das belas letras de Lisboa e foi instituída em 1790 pelo conde de Pombeiro, José de V^isconcelos e Sousa. D^li fizeram parte muitos poetas distintos :

B.»cag'^ (Elmano Sadino) ; José Aí^stinho de Macedo (Elmira Tagfdeu) ; Curvo Semedo (Belmiro Transtagano) ; Pato Moniz (Olim) e outros como Franga e Amaral, Pimentel MiMnnalo, San- tos Silva, Lima Leitfio, Maxim an ) Torres, Biogre, eti'.. Mas note se <|ue homens insignes como Francisco Manoel do Nasci neiito, Nic daa Tolentino e José Anastasio da Canha nao fisruram ao lalo deles»

' Sam i\B próprias expre33Õ^,5 <i« Girçío no discarso rebitado en I758i, ^•* aao dji fandaçâo da Arcádia ; cfr. C. C. Brainso, Curso, ^j i cit., pi^

428 HISTÓRIA DA UTR&ATCEA POBTUQUÊaA

Sem o auxílio dos poderes públicos, como acontecera á Arcádia Uli wponense, afirmada somente pelo valor dos seus membros, a Nova Arcádia anastou-se num formalismo estéril até se exfinguir mercê em. grande parte das latas dos seus sócios, muito principalmente de Bocage e de Jofcé Agostinho.*

135.— Géneros literários:, principais representantes^

Vedamos agora quais foram os etcritores mais notáv^-is do nosso país durante o séc. xvill. Bastantes main pofieriamos mencionar, raaí* mui- tos sara do domínio da história literária e nào do da história da lite- ratura. AIp:uns dos citados e que até registamos sob rubrica eí^pcial sam da Colónia Brasileira. Dos da metrópole, sani da Arcádia Ulis- sipónense : Ciarção, Quita, e Cruz e Silva; sam da Isova Arcádia, CURVO SEMEDO (1766-18o<S) conhecido por Belmiro Tramtagano, que escreveu Composições poéticas onde sobresácm os apologos e os ditirambos; PATO MCMZ (1681-1772), Oliiio na Arcá'^ia, autor de ' talento que exgotou grande parte da sua veia literf^ria nuna luta sem trégoas contra Joeé Agostinho de Macedo, a quem, para ridicu- larizar consagrou o poema Agostinheida ^ ; PIMENTEL MALDONADO * (1773-1838) notável pelos Apologos; outros ainda que nuo chegam 4 craveira dos apontados, e o principe de todos Bocage, que abaixo- mencií-namos.

Sam dissidentes, isto é, nào fizeram parte de nenhuma acade- mia ou arccádia: JOSÉ' ANASTASIO DA CUNHA (f 1787), lente de geo- metria na Universidade, vítima ilustre da inquirição, e poeta em quem aparecem vislumbres de roma^'tii^nlO *; Filinto e Tolentino, a> quem mais especificadamente nos referimos adiante. Na história e na. epistolografia, que não somente na poesia, tivemos, verdadeiras cele- bridades, como passamos a ver.

POESIA

136. PEDRO ANTÓNIO CORRÊA GARÇÃO (1724-1772>

, de Lisboa, é o lirico mais influente da Arcádia, onde foi designada

1 Rnlchior Manoel Curvo Semedo Torres de Sequeira, de Montemor o Novo. As Cowp. poet. saíram o i e ii vols em LisboH, 1S03 ; o iii, xbid.^ 181T e o iT ibid.^ 1^35. Tem tàmbí^m Trad, das melhores fáhiòla^ de Lafoniaine, Lisboa, 18-20; 2.* ed., t^t-i.. 1843.

* Nnno Alvares Pereira Pato Moniz. A Asiostwheida. poema heroi-nomico em m>'?c cnrfíos saiu em Londres, 18i7 e em Lisboa, 1834. Deve Lèr-se lunoc.

X>ICC., VI, o04r. *

s Joào Vicente Pimentel Mandonado, ApóJogoa, Lisboa. 18*20.

* Para a biogr. do ilustre perseguido vèr Innoe. Díc. , vi, 221-231; Brnno, O Porio evito, obra para servir de remate t conclusão á dos Portuense» ilustres^ \y Porto, 1912, pág. 14õ e segs.

CAPÍTOLO V ESOOLi FRAHCÊ8A OU ABCADICA 429

pelo nome de Corydon Erymantheo, As suas epístolas e odes revê- lam-no como verdadeiro cultor apaixonado e sincero da beleza clás- sica, de que se tinha impregnado sobretudo nas leituras de Horácio, Por motivos que se ignorara mandou o Marquês de Pombal encerrá-lo numa das cadeias da capital na noite de 9 de abril de 1771 ficando desde log^o em segredo e nesse estado pensando oito meses consecuti- vos de torturas fí«icas e morais. Depois de várias instuncias conse- guiu a esposa que ele transitasse pira a chamada sala livre e, após novas súplicas, alcançava ela a ordem de o saltarem què, todavia, chegou quando ehí estava prestOvS a expirar, coráo sucedeu na tarde dosse mesmo dia dez de novembro de 1770.

Houve quem atribuísse a prisão a ter o poeta recitado na Academia dos Ocultos um poemeto intitulado Ao infante D, Pedro não co7isentindo que se levantasse uma estátua^ 'Mn qu" Pombal teria visto uma alusão epigramática por ter mandado colocar o seu medalhão no monumento de U. Jòsó i. < Hitros atribuiram-na a uma aventura amorosa com a filha dum tal Macbean, escosses ao servi í;o de Portugal. A primeira hipótese é desfeita totahnente por esta simples questão de datas: a prisíio deu-se em 1771 e a estátua de D. José foi erigida em 17 7õ. Resta a segunda, porventira ainda sujeita a desapar"c'*T ou, polo m^nos^ a s r modificada.

Garção inscreveu duas comédias que teera mais valor que os seus sonetos e gabadas odes. No Teatro Novo ele reconhece e afirma a necessid ide de criar, de dar novos alentos á scena em Portugal, mas acaba por confessar a impossibilidade de re-iliz^r esse dt'' sidera tu m. Aprijio inculca a s ias íillias Aldonsa e Branca a van- tagem de seduzirem Artur Bigotes

que na frota

Veio pouco do Rio, e vem potente Traz infindo dinheiro, papafj^:iio8, Araras e bugioti, traz mil coisas.

Seria esse velho quem daria o dinheiro para estabelecer um teatro novo. Mas que comédia representar? Teatro clássico ou moderno, estranjeiro ou nacional? Na scena vi, que transcrevemos adeante, sam discutid<^8 os alvitres, apresentando Garção as suas idóas pela boca de Gil Leinel. E êst^ é o da pequena int» res- sante omédia, que é um acto com dez scenas. A Assembleia ou Partida é uma comédia de costumes destinada a satirizar estes exemplares tam numerosos da sociedade, que pretendem ling r o que n5o eam. Braz Carril quer dar em sua casa uma partida, um chã, idéa que a mulher /). Urraca Azeira abraça desvane-ida, pois mostrará mais uma vez a sua prosápia de fidalga. Mas nào dinheiro para isso, E' um amigo vellio Gil Fustote quem custeará

430 mSTÓSlA LITUATURA POBTUOUftSâ

OS gastofií com outros amigos que emprestam as chicaras, as oalhe- res, etc. Â partida estava no auge quando irrooipem na sala os meirinhos com mandado de penhora por uma divida insoMda. Então cada conyilado reclama o que é seu até que o Dr, Macómo ise responsabiliza pela divida e conhecedor da inclinação de sua filha por Jofre, filho de Braz Carril, dispSe o seu casamento. Desta comédia faz parte a Cantata de Dido, que Garrett considerara c como uma das mais sublimes concepções do engenho humanO; das mais perfeitas obras excutades da mão do homem». Como restau- rador da poesia e do bom gosto Garção ocupa entre os seus contem- porâneos lugar distinto. Bem lutou êle por estimular os sócios da Arcádia nesse caminho. Làa-se a Dissertação 3.\ onde êle defende a doutrina de que o principal preceito para formar um bom Poeta era procurar e s guir sómentt) a imitação dos melhores autores da antigui lade. Entre os árcad $, como entre os seus amigos, no remando da Fonte Santa^ a quinta nos subúrbios de Lisboa, junto ao Tf^jo, onde reunia uma Hociedade de escol, (idílio iv, 06. compL, 83) não cessava de ser, o que realmente era, um alto ^^spírito embebido da idéix da maior perfeição literária. Mas o descalabro veiu rápido. A morte do pai no terramato deixou-o na penúria (EpisL a João ' Eoangelista nas Obras compl,, 201) e foi no mi io das maiores

dificuldades que veio a ordem de prisão de Pombal *•

t

137.-pOMINGOS DOS REIS QUITA (1728-1770), o

Alcino Micénio da Arcádia, natural de Lisboa; é o nosso primeiro bucólico segundo Garrett, o legítimo continuador d*í R)drigaes Lobo, segundo o sr. Th. Braga, e ê.st- com mais razão que aquele. Como G-rçào, aprendeu na própria iofelicidade toda a maviosidade dos seus versos. Quita era íiUio dum comerciante. que, falindo, lhe deixou o p^Míido encargo da própria e da subsistência da tnãi e de seus seis irmãos. Na arte de cabeleireiro que aprendeu e seguiu encoa- troii os recursos de que necessitava. Isto explica os vagos tons de sentimentalidade esparsos em toda a sua obra.

Os idílios, odes, sonetos, canç5es, epistolas, etc, o drama pastoril Licore revelam uma leitura proveitosa dos que, como êle, fizeram Boar a frauta pastoril. E* nas églogas e nos idílios que se estriba a sua principal glória. Das tragédias em verso Astarto, Mégara, Hermione e Inês de Castro reputam os críticos como melho- res as duas últimas. A Castro foi imitada por João Baptista Gomes na

^ Obras Poéticas, LÍHboa, 1778 [6 anos, portanto, depois da morte]; 2.» ed.. Rio, 1817, 2 vola. ; 3 », Li-bot, 1825, 2 vols. A todas sobreleva pdos in<'d , riqueza e esmero a 4.* ed Obras Foéticoê e Oratóriaa dirigida por J. A. ce Azevedo e Castro, Roíria, 1888, \ voL Sobre Garção lôr Rebelo da Silvâ, Ob. co/npl. X3ÍV111 ^ Cohta e Silva, Hamalhtte, iii, 333 : laoc. Dic. jSi6/. ti, 386.

GiPÍTULO Y B80OLA FB HCÂS* OU AKOXdíOÁ á31

Nova Celeiro ^j mas está longe da tragédia de Ferreira, da qual nSo tem nem o vigor, nem a coneisSlo do estilo, nervoso e eloq&ente \

138.— ANTÓNIO DINÍS DA CRUZ E SILVA (1731-1799)

na Arcádia Elpino Nonacriense, natural de Lisboa, seguiu a magis- tratura sendo despachado pelo Marquês de Pombal Desembargador da Relação do Rio de Janeiro, depoia que o conheceu como autor do HysBope pela queixa que lhe fez o bispo de £lvas, D. Lourenço de Lencastre.

Este quÍBera obrigar o Deão João Carlos de Lara a ir ofe- recer-lhe o hissope a uma porta lateral da quando particularmente êle ia. Houve recusa do Deão, insistência do Bispo com interven- ção do Cabido, rixas, questiúnculas. Nada mais era preciso para que am talento jovial fizesse aqui o mesmo que em França Boileau ao aproveitar a contenda entre o Bispo- Tesoureiro da Santa-CapfiU e o Chantre sobre o t^^r ou não este direito a mandar pôr dianr,e de si, no Coro, a famosa Estante tam discutida. E assim salvou Deuis o Ku nome, que não pelas Odes Pindárícoi, nem pelas Ajiacreonti- cctí, onde se um ou outro rasgo pjoético, a inspiração se abafa e afoga nas reminiscências clássicas, que as tomam monótonas e aluídas. O Hi8»ope, inspirado no Lutrín, é como a Secchia Rapita de Tassoni, o The rape of the Lock de Pope, uma sátira de costu- mes, escrita com imaginação, embora a frouxidão dos versos torne a leitura uma ou outra vez fatigante.

Garrett classificourO « como o mais perfeito poema horoi-có- mic50 que ainda se com^jôs em língua alííuraa», em atenção, decerto, i regularidade do pUno, á pintura dos quadros, k variedade de epi- aódioB, que sam realmente- dignos de se não esquecerem no confronto com 08 poemas congéneres. Ninguém negará chiste e boa g^aça á descrição do palácio do Génio dai Bagatelas, (c. i), á pintura do Banquete oferecido pel» Bispo ao« cónegos seus partidários (c. lii), *o encontro do Deào com 6 Padre- Mestre na cêrca dos Capuchos, {t\ v), ao vaticínio de Abracadabro (c. Viii) e a outros *.

^ A 2.* ed. das suas Ohras Pêétieas. . . Lisboa 1781, considora-a íunoc. (Díg, u, i96) com vc^d.^de como a maia aca ada e completa. Al.* edioào A de l76tt. A 3.* é Rol audiana como a 2.*, 1831. A Nova Castro de Gnnes teve trad. alemS, Leipsig, 1841.

Traz a biogr. do Poeta compost^i pelo seu colaborador e an igo Mi;iuel Tibério Pedagache Brandio Ivo. A Áfegara foi composta pelos doid, c mforme a notaii, 119, em 1761.

' Está pabl. na nossa Col. doã Stiòaidios, onde ocapa^o n/ xx, Coim- brt, 1917.

' Poesias. . . cm 6 tomos, ed. de 1807-1817. Do Hyssope sam várins as ^; a mais eatimada é á% IST.K ilattr e cob comentários á^ Uamos Coelbo. Pela erXtiea feila ao ensiao sos princípios do sèeuio xix é curioso lér-se oatro

139.-MAN0EL MARIA BJ

(ITòõ-iatlbi fie Setúbal, na Arciiflia conl de Elm-ino Sadina, Hm falsamente avi nome o i.'.oiiliP,i;i;m, foi um esbanjador, m talento. Tcmio embarcado para a Indi

Bemio manlado servir em DamSo, desertou, htginio para Mac&n e dafjiii piir:i Lisboa, onde checou '■m 1790 '. A vida libertina, que diirantií fete anos levou n.i capital, foi coiwida tristemente cora a pub',i(;:i^;ào do poemeto Pavorosa ilusão da eternidade, que o !''Toa LimobiriJ, ondo esteve três moses, daí ao CiVrcere do Santo oticio, onde píTmanPfeu quarro, e daí ao mosteiro de S. Bento da Saade, e por últiitii) ainda A cmLírpf;a(;f[> de S. Felipe Néry. Neste asilo, ilus- trado por i-^jiinfoí supcrií^r-H c^nn Bornirdes, Teodorj de Almeida, e outro-, ciiipn-iinlcn i tradu;'iío do t.° li^ro dai Metamorphotes de Ovídio, de trag^noriLoa de outros, o da õ." Bucn/icaáe Vergílio. Re- adquirida a libe rd adi?, » "^nm níijse ■■mpetiho salutar, ganhando a aub- sL-iírnicia pa^a ti "e (vira uniu aiia irmili, com quem p*s80u a viver'. Dura'itit d lis an>s n>caíe vrtcii o.s Jardins de Defill*!, as Plantas df. Crtíi''!, o CoHsh-ciíy das Flores de La'jroix, a Galhatea de Vh- rian, e uiuitiiíi obr:n, algumas dcks bem poneo dignas do exercício de tani ^rainie talent".

Afilhado par último, matt sem consequências, Á InquisiçíVo, o poeta vrio a f;jlRci>'r cm edade riiie a expfriÊnci* dolorosa da vida tornaria iiia.s fnituoí-a, se fòsto pri>longada *.

IIA n.i vida Ho.-affrí uma circunstância q'ie muito concor- reu 1'ar.i rjii'" i> KPii lirismo to:--íc tim Tcrdadejro e tam sincero. Fúi o amor pu"o e leal qu" consa^ou a Miria Vicência, filha de Anti- nio Miiiç.il Leifi;, de quem fii hóspede, Quandi fora preso no Li- moeiro pida acisiiçiio de revoKicion.irio e ateu nílo foÍ difícil oonven- ctT a niâe de!-sa aeuliora de que tião devia permitir o ca->am nio cnm o !ip:iixonado poóta. A' hora da morte a mãi f^z jurar a a filLa que nuucit teali.-aria c.-.se casamento, VJMe amor c 'ntrariado inspirou a liia d.' ]!oi-aL,'c duma íúrma superior. O poeta também cantou a

poèina h»voi- cómica, o /íimi dn K»í>niid'z pibl, anónÍBo «na 1819 de FnociKe de Me.n Fr.iin>u í \'i^u -\}<2.i). Amli s de di-.is. com algumas sátira» de Tolr" li no, fir.in ]m\i\. om e-jjlt-inliila i"d. do Kio Ai Jaueiío em llilO Mm iatrod. ciitic«« ai 1 1)1.1 ti t <)'> ilustre lllolu^u l>r. Joio Kibeiro.

I Vid« l..ui;<i>l Gr.i^ia;*, Vo^rnve ua índia, Mem. ktit. e erílica, sep. da O Oriente rurí-c/urf. rfv. dn Ccn. 19|7.

= Qu-i feMiiliíiLt L fli V Hal.e ■•' (|nR recebeu 48.0(10 re. paio t. 1." ds» wm J<'.m<ij daa mios do lii. '.Br-ifo editnr !>iu>io T^ideo !

" Fi<;<'iinr>â mn ii'trni<> iié'e tir.ido poucos diu ad[w da norte p«lo pin- t«i' |K)rli7fr. ileuriíjui' J m'' fl;i SiiTa, ti'io com" muito parecido. Cfr. Co3'a e Silvíi. /''n-i-r.io notai 17, AngLiatu de Casiro, Um retrato de Boeage ou Terra 1 vr- tug. 1W6, n." 8.

CAPÍTULO V ESCOLA FRANCESA OD ABCADICA 433

decadência do nosso domínio no Oriente. Este lado por que deve ser apreciado o poeta setubalense é, sem dúvida, bem superior ao que sobreviveu na tradiçlLo o popular, que fez de Bocage um boémio incorrigível, aventureiro e vagabundo. Pelo alto sentimento que tra- duz no8 seus versos, pela onda revolta d** protesto contra a decadên- cia moral e política do seu tempo, tomando ora a fórn»a do ridículo, da sátira, do doesto, ora a da invectiva desassombrada e eloquente, Bocage brilha na galaria dos nossos poetas como Ciitrôla de primeira grandeza.

O talento de Bocage manifestou-se ainda t>o dom da iynproviza- çào^j em que nílo conheceu rival, na sdtiraj que ele brandia vigorosa- mente retalhando a largos vergoos os adversários, que se lhe atraves- savam no caminho, como José Agostinho, contra quem escreveu essa soberbíAa pó^trofô Pena de Talião, e nos sonetos, duma perfeição e dum brilhantismo, que ombreiam cora o melhar de Camões n^^sse gé- nero*. Os discípulos de Bocage criaram a Escola Elmanísta^ que se in- clinava á imitação francesa e era viva, colorida, entusiástica, para con- trapor a Filintistaj que seguia na imitação dos clássicos greco-latinos.

140. JOSÉ AGOSTINHO DE MACEDO (17G1-1831) o

inimigo roaz de Bocage está, ^posar da sua inteligência fecunda e operofcíásima e da sua vasta erudição, posto que superficial, muito abaixo do seu competidor. A relaxação dos seus costumes levou os frides Gracianos, em cuja agremiação entrou, a expulsá-lo solene- mente, £azendo-lhe largar o hábito na presença de toda a comuni- dade '. Duma vaidade ridícula quis suplantar Camões e com êsso

"* Neste dom em que nao conheceu riral se lembram o nome de António Gomes da Silveira Malhão^ morto na ihn- da idale, irmào do Franciisco Manoel Gomes da SilTeira Malhão, que foi })*i do grèndtj i)rí'gador Malhiio. Cfr. Obr. Poéí. de Diae Gomes, nota de l^toklcr, 38.

' Sam várias as èd. das obraa de Bocage. Ynja-se em Innoc. a ennmera- çao. Da antiga ed. em 7 vols., Liáb"a, 1791-1842 alirnns vols. foram várias ve- zes reimpressos. Os vols. 17 a 25 da «Livr. clássica Fortiig^. » Lisboa, 18t5-47 compreendem excertos da obra de Bocage por Castilhoa (António é .Io>é), que no Rio de Janeiro se reimprimiram em 3 vols. Vid, principalmente a ed. anotada por Innoc. e precedida dum estado biopáfico e literário por L. A. Kobelo da ^ilya, 6 vols., Lisboa, ISôS ; e a ed. OOr. po^tican, 8 vols.. Porto, 187.'>-7(i: o ultimo trás a biografia de Bocage pelo av. Tli. Branca. DCv^te inesnio aut^r Booage^ 9ua vida e época litHràna; Êloy do Amaral, bocdtjc, fr^nm^iiton dn fim tstuio auto-bioffráfico^ Figueira da Voz, r.'13. A cidade de S(!tá!;d T^stejoa o pnmeiro centenário do grandíí |)oóta, qae faloLV^u em I^isboa no dm '31 i.\v «Iczem- oro de 1805, no dia correspondente de lí'05. Vêr sobretudo Dt''ír>r> '■l'- Xntinns ^e qainta feira, 21 de dezembro de VM\-\ J!n9fra>:(io do Si'<'"\n^ n ' íli. Via. também Seroes, n." de dez. de 19í>), p;ig. TjíU, JJoco:/ri t a v, 7 (•/.") (acom- panhado de moitas gravuras).

* Foi nomeado pregador rt'gio em 1802, CiMí^or ordinin')» «^'n 1sl'1, S/u-io ^a Acad. de Roma e da de Bcdas-Aríps d(; Lislíon com o n')r:!c (I-' i^y^/rro i'"ji- ^«í*» Deputado por Portalegre «m l'6A-2 e CrouiL^ta ilo ilcluo cm l'ol^).

434 MI8TÓ&IÁ DA LlTfeRATUBA POBTUOUâ&à

propósito retomou o assunto dos Lusíadas e organizou sem paiz&, sem vida, sem poesia^ o Gama ^, que d' pois denominou Oriente * e qae na intuito de t rnar mais perfeito chegou a refundir quatro vezes. Vêem depois, no género didascálico, os poemas Natureza *, Nttoton *, Meii- tacão ^, Viagem extactica ao templo da sabedoria ^^ reveladores da sua facilidad-i em amontoar versos sòb^e versos, e po^oo mais.

Do seu génio atrabiliário e carácter viruleato que lhe criou números inimigos sam prova incontroversa os Burros "^j monstmosi- dade moral e literária contra oh colegas da Aicádia, e os jomms que o seu ódio ferrenho de miguelinta envenenava. A tripa viraday Tripa por uma vez, A besta esfolada, etc. O procedimento que teve com Bocage nos últimos anos da vida do desditoso Elmano, e que Pato Moniz nos revelou, tornam tam odioso o seu carácter, como 6 superficial e seco o seu talento. E' talvez nas obras ligeiras, cartas, sátiras, opúsculos de critiza^ etc, que melhor se evidencia a malea- bilidade do seu talento. Ao muito qu-^ dele se conhecia Agora a juntar as obras póstumas as Cartas e opúsculos * e as Censuras a diversas ohras^ composições líricas, didácticas e dramáticas ^ que, fornecem vasta documentação para apreciar a nova bio- bibliografia de tam fecundo e poderoso escritor ***, a quem se nao se pode com justiça pa^sa^ diploma de prosador em verso, não se comete iniqui- dade assegurando que o seu metro é martelado no ouvido, que a sua linfa é turva quási sempre e que, fora do erótico e do satírico, res- pira cdnbtrangido e invoca uma inspiração rebelde-*^.

» Gama : poema narrativo^ Lisboa, 1811.

* Liaboa, 1814, 2 vols. ; ibid., 1827 e Porto, 175k Ramos Coelho no es- tudo Camô^.8 e Áíaocdo^ análise do Dif^eibrso Preliminar com que ttíe prefaciou o aOnente», (Lisboa, iÇH) deii.oQstrou qae o rancoroso inimigo do grande Épico foi «flêm de injusto, falsário».

" Á Natureza, poema em 6 cantos^ Lieboa, 1846 ; Porto, 1854

* Lisboa, 1813 ; 2.* ed., ibxd , 1815 e Porto, 1854.

" Meditação f poema filosófico em 4 cantoê^ Lisboa, 1813 ; t&u2., 1818 ; Porto, 18r)4:; Peinambaco, 1837.

^ Viagem.., poema em 4 cantos, Lisboa, 1830 ; Pomambaco, 1836 ; Porto, 1854

"' Os Bnrros oii o reinado da sandiee, poema eroico-satirico em 6 c<Mdm^ Paris, 1S27; xhid., 1835, Lisboa, 1837.

^ 1 vul., Lisboa, 1900, publ. pela Âcad. das Sc. aob a direcçSo de T. Braga.

'•' 1 vol., LiriJ)oa, 1001, piibl. idêntica á anterior.

^0 Vid. hXvm (las nb. cit. no texto: Curso, de C. C. Branco, cit.,j)Ãg. 264-Jf).5. Sobre a bicp-ifia : li. Ortiz, La Literatura Portuffitesa en el 9 igU XIá^ Madrid, US6Í) ; Avrfnís das Sc. e Letras^ ii, 1849, artigos de Lones de Mendonça sob o titulo J. Agofttiuhê e a fnia esposa; Carreira de Mello, Macedo^ hiogrdjM e catáloyo de ohms. Porto, 1851; Innoe., Dic. BibL, iv, 183-215. Em 1899 foi pubi. o estudo de Idou. da Silva, Mem. para a vida intima de J. de Macedo^ Lisboa, 1 vol.

^^ Kebelo da Silva, Obras, ed. cit., zxxii, 30.

OÀFliíJh o , ESCOLA TBlNCSflA OU JBCÍDICA 43

141.— FRANÇISeO MANOEL DO NASCIMENTO (1734.

1819) é mais conhecido pelo„nome poético Niceno e melhor pelo da FUinto Elysio, que lhe pôs a primeira Marquesa de Alorna. Tendo escapado milagrosamente da perseguição do Santo Ofício, fugiu para^ Paris (1778), onde viveu a maior parte da sua vida 41 anos e onde morreu quási na miséria, em 25 de fev, de 1819, com 85 anos de idade, não lhe faltando, porém, na terra de «exílio, de pobreza, de amarguras e de saudades» nos dias de doença os socorros mate- riais e na hora estrema os espirituais, mercê da gentileza do embaixa- dor português Marquês de Marialva ^. Apesar de estar em contacto com ama sociedade, centro de cultura universal, as idéas novas não abri- ram brecha no seu amor exagerado a Horácio. Cantado por Lamar- tine em uma ode que ficou célebre, sequestrado da pátria e dos ami- g08j vivendo pobríssimamente rodeado de intortunios, não pôde lar-, gar voos amplos á fantasia e criar- obras originais. Trabalhou muito para viver ; os seus livros téem acentuado cunho didáctico ; talvea^ por isso uma afectação exagerada em tudo o que saiu da sua penna, que é muito, e que constituo um serviço enorme feito ao idioma pátrio. A versificação é pouco suave, mas altamente variada e rica. Das suas obras destacam-ge as traduções do De rehus Em- manueVs gestis de Osório, da Púnica de Si lio Itálico, dos Mártirsà de Chateaubriand, do Oberon de Wielani, das láhvlas de La Foa- taine.- Dent^-e os trabalhos originais, as odes e epístolas sam os me- lhores conceituados. Entre estas uma dirigida cc Ao amigo Brito » sobre poesia e língua portuguesa, que é digna de lêr-se pela provei- tosa hção que encerra.

142. NieOLAU TOLENTINO DE ALMEIDA (1741-

1811), durante catorze ou quinze anos professor de Retórica e de Poética em Lisboa e mais tarde Oficial da Secretaria de estado dos negócios do reino, é, com o anterior, o mais notável dissidente de qualquer tertúlia ou arcádia. O seu génio poético tomou a feição satírica e daí lhe derÍ70u o maior título de glória. Mas como é que um poeta qae se confeesa dependente de toda a gente, em lástimas

I O fnD«ral também foi f«ito a expansas do ■•sso embaixador. Passados 9B anca» em 1842, foram os oasos trasUoadca para Lisl-oa, e em 19 de jalho do 1156 colocados em túmulo especial no cenitéiio do Alto de S. .loão. Vid. o «atado do brasileiro Pereira da Silra Filinto Elysio e a sua épom, Rio de Jaatiro, 1891. Pormeiorts iniditos intere^ sHntes na coiiuinic.v-^o á Aca- demia das Sc. de Lisboa de Soosa Monteiro. Cfr. BoL da Seg CK , i, (1-03), 1&1.168.

* doas ed. geralmente tidas como completas, a de Paris, 1817-1819^ n voU., e a de Lisboa, 1836-1S40. 22 vols.

436 BI8TÓB1A DA LITBEATUBA PORTUOUMA

qae n£to tinham iim ^, podia fazet vibrar nos seus versos a sentida e verdadeira indignação da sátira ? E' por isso que a sua musa nlo tem a coragem da de Juvenal ; é cortesã, respeitosa, engraçada, como disse Garrett, Sabe ter cores variadas e exactas para pintar 05 ridículos do seu tempo ; distribue-as bem, com fluência e vernacu- lidade de frase. Essas qualidades revelam-se sobretudo nas sátiras que sam tidas pelas melhores o Bilhar, Passeio, Fançào, a Guerra, que sam bem portuguesas peia lirguagem castiça, pela elegância e peia cor, qualidades que ôle adquirira na leitura dos clássicos, espe- cialmente dos Quinhentistas, tendo também vasta lição de autores franceses e espanhóis *.

143. Duas POBtisas. Entre os cultores da poesia que brilharam nêôte século e amdn em parte do imediato figurara duas senhora» uão menos in-?Í2rnes q le muitos dos seus cont-^mporuneos a VISCONDESSA DE BALSEMAO ^ cuja obra está quási inteiramente iné- dita, mas que bem merecia a consagração da publicidade, e a MAR- QUESA DE ALORNA *, a decantada Alcippe, cujas Obras Poéticas reve- lam fini.ssimo espirito e de esmerada cultura, .como a podiam ter as mais viris int«-lÍ2í''íncias do R^^na^^ci mento, tanto nas belas-letras, como nas si-iencias. Mais, porém, do que pelos seis volumes das suas poe- sias, o talento da ]\rarqiio.'íi de Alorna tornou-se de.stinto e infloiu largamente no no^so meio pelos seus Salòos que reuniam todas quan- tas pessoas em Lisboa primavam pelo saber e pelo amor ás letras e ás sciencias.

^ Nnnoa se mostrou satisfeito! E entretanto sabe-se que deade qne foi Oficial d(' S»'c'vetaMa iiuiu-a inais deixou de ter sege e qne vendeu os dois mil ex(Mi;jlan's da l.*" «íd. d is .-.ua- (.hraH. uliáa mandadas impriaiir pelo* governo, por

dozr. md cnizíLd<i3 (LSOD^SuOO roís). Inoc. Dic. Hibl., 8. v.

* 0'jni3 comijhtis, . . com nhjuns inéditos t um ensaio biogr. -crítico por J-j*' (hl 7¥rr^.s. I' l nutra lif^ por Xtfjueira da Silva... Lisboa, 1861. E' a ei V ais t-í;inplf'fa e o- tiriia'la. A 1 * biot;!-. do Poeta é de Joiío Augusto do Amaral Fra-ião o naiu em Li.^hoa, l.S[;>, eoni o título Vida do Poeta Nicolau T. de Ál- vitidd, WV p;iL:"d.

Notf-He (jiie 09 dons sonetos famosos Contra os toucados altos e Contra o P.^ Mdcpdo nàn dam d -le O [." ó de António Joaquim de Carvalho e j4de3d? j.S''.'» :intli in-lnid . tio t. 1/ lias biias iM^ras Foet, : o 2.** é de José Basílio d i (jartia,

■' I). Cilariíia Micarlíi de Sousa César de Lencastre [1749-1824)', cuja bic.rr. so. jioie r w.i !'■'■' f.rtirao. Jornal unir., j, 184:'), pág. 127 e seg.

* M;ir<u-:i «ie Al r ♦, ('."il<>s.^a «lo A^Hiimar e Oeynliausen D. I-?o- n"r il.' Ali: rh i >' v/\' ;-. I. ■: .n ♦• L ".vM-tre |17;')(J-18o9]. Vid. Panorama, ISU, p,. .. l'i) 'hic. r. l\i''i ,) ■'• A. Ii"n! dani) ; Teixeira de Vasconcelos, Glorias For- t ' . -.^'^ .«f, Li; }.»a, 1 ^ 'W ]r'^. 1 ,')-l."»'i e u vol. i das Obras; D. Olga Morais Sar- 11». :.i .'a Siiveiri, -l .'• •' ' ' ^ ' .!'.»/-/i.r^ l''UT, 1 vol.; Marquês de Ávila e Ho- ]:» 'í.\, .1 M r'qu:-:i> dt A\^ ', k Id, 1 vol.

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CAPÍTULO. Y ESCOLA FKANGÍfcflA 00 AROÍDIOA 437

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o TEATRO

144. O teatro no séC. XVIIL Não tivemos teatro no sé- culo anterior, pode dizer- se. O Fidalgo Api^endiz é caso esporádico, tam singular ele é. .A decadência continua neste período. O teatro espanhol durou longo tempo entre nós. Em 1709 imprimia-se em Lisboa a Musa jocosa de vários entremeses portugueses e castelha- nos, confessando o colecionador que se resoWera a isso por ser a Musa entretenida de vários entremeseSy publicada por Manoel Coelho Rebelo em 1658, obra rara, e que, por o ser, se lhe fizera segunda edição em 1695. D. João v quis transplantar para Portugal a ópera italiana; isso fez nascer um novo género as Operas Portuguesas representadas nos teatros públicos do Bairro Alto e da Mouraria desde 1733 a 1741. Nâo sam estimáveis estas peças, diz Aragão ^loratOy nem pela invenção, nem pelo enredo, nem pelo estilo e lin- guagem, mas toem muita graça cómica e certa originalidade que ílebalde se procura em todos os nossos dramáticos do sóc. antecedente ^. ITma grande multidão de autores, hoje pouco menos que igno- rados, alimenta as exigências do gosto popular dando-lhe comédias, arcas e tragédias, que não sabemos, na maioria dos casos, se sam originais, se traduzidas ou adaptadas. Impressas em folhas soltas, roáo papel, sem nenhum cuidado de revisão, sem intento algum li- terário, destinavam-se á circunstancia de momento. Chamou-se-lhes (vmédias de cordel porque se expunham á venda nos mercados e praças presas ou suspensas era cordoes, ao que alude Tolentino no Bilhar :

Todos os versos leo da « Estatua equestre » E todos os famosos entremeses, Qae no Arsenal ao vago caminhante Se vendem a cavalo num barbante.

Seria interessante reunir essas peças teatrais, que figuram ás centenas, impressas e manuscritas, nas Bibliotecas públicas e nas mãos de particulares, porque estão sujeitas a perder-so e com elas am documento típico da época, no que respeita a linguagem, ás mo- das, ás preocupações e gostos da sociedade. Na maior parte sam inónúnas ou trazem nomes supostos. Contra elas declamavam os tnoralistasr, como Bernardes, que do seu cenóbio lamentava a assis- tência a esses' espectáculos perturbadoros dos bons seiííimeutos, « porque o que ordinariamente vemos nelas sam as.s untos aniatorios

* Aragão Morato, Mem, sobre 9 teatro porfMfjv/'9^ cit. pág. 71.

28

438 sunduA utb&atoba ntruanteà

representados por mulheres moças de ruim viver; bailes indecentes, trafos descompostos (e ás vezes transpostos saindo a fêmea com. ves- tidos de varão), afectos lascivos metidos em verso, para se pregarem mais na memória, tonilhoa e sarabandas mui picadas, que parece as inventou o diabo galanteios tecidos com tal arte sobre o trama da história ou fabula, que a alma gosta do mesmo veneno, que esti bebendo V».

A Areá4iaj tentou a restauração do teatro, mas nRo o conse- guiU|' pois foi arrancá-lo á inâuôncia castelhana para o lançar sob outra influência estranjeira a francesa e a italiana. Obras de Vol- taire, Racine> Molière, e de Metastasio, Goldoni, Slaflfei, acomodadas com melhores intençSes do que feliz efeito ao chamado gosto portu- guês inundaram simultaneamente o nosso teatro. Entre esta sujeição ao jugo estranjeiro e a influência decisiiva do gosto clássico, que- rendo muitos sujeitar toda a literatura ás leis traçadas por Aristó- teles na sua Arte Poética, que Francisco José Freire desde 1748 traduzira, se vai arrastando o teatro até esperar a hora em que o pulso de Garrett o arranncará ao seu torpor. Pondo de parte indi- vidues de nome qa;isi ignorado, como ANTÓNIO XAVIER FERREIRA DE AZEVEDO (1784-1814) autor da farça Manoel Mendes; JOSÉ' CAETANO DE FIGUEIREDO (f 1815) da Brites 'papagaia; MANOEL RODRIGUES DA MAIA (f 1604) do Dr. Sovina; ALEXANDRE ANTÓNIO DE LIMA (1609- 1760) dos Novos encantos do amor, etc, os melhores representan- tes do teatro português do séc. xviii sara, àlêra de Garção e Quita, citados, os que em seguida apontamos.

145. ANTÓNIO JOSÉ DA SILVA (1705-1739) é o

representante legitimo desse teatro nacional e popular inaugurado por Gil 'Vicente, que as comédias espanholas haviam desterrado da scôna e do gosto popular. Embora nascido no Brasil, (8 de maio de 1705), António José, conhecido pela designaç3[o de Judeu, por ter nascido duma família de cristao-novos o pai, o advogado JoSo Mendes da Silva e a mae Lourença Coutinlio íôram remetidos para Lisboa, esta acusada de cristã-nova ó verdadeiramente um escritor nacional, que nas suas obras soube casti«:ar os ridículos da socie- dade, em que viveu desde os oito anos até os trinta e quatro, em que expirou como vítima da inquisição, sendo degolado no auto-de-íá realizado a 18 de outubro de 1739. A Vida de Esopo era um bote jogado ás teses escolásticas; o Lahirintho de Creia visava a mitologia considerada como indispensável na fabulaçao poética; as Guerra$ do Alecrim tb da Mangerona retratavam dois grupos de peraLvilhoi inúteis; o Amjildtriào tinha scenas alusivas ao terrível tribunal| qaa

Vóaioê tratadoê^ u, 585.

OArfTBLO B8C0LA VBÁHOÉfll OU àacImcÁ 4S9

o não poupou. O público apreciava as « Operas » do Judeu como via pela concorrência ao teatro do Bairro alto e pelas gargalhadas com que lhe sublinhava os dizeres.

As comédias de António José sara: Vida de D. Quixote de la 3f ancha; Esopaida; Encantos de Medea; Amphitrião; Lahirin- iho de Creta; Guerras do Alecrim e da Mangerona; Variedades de Protheo; Precipício de Phaetone \

146. NICOLAU LUÍS ^r^ mestre-escola e foi ensaiador teatro do Bairro Alto quando começou a traduzir comédias do espa- nhol, do francês e do italiano. Foi o criador de muitas das denomi- nadas <Lde cordel 1^, e que alimentaram durante anos os teatros de Lisboa. Muitas tomaram-se popularissimas aparecendo sem nome do autor e sem a mím'ma pretensão literária. A única que traz o seu nome é Maridos peraltas. Por testemunhos autênticos coptempotâ- neos sabe- se serem dele a tragédia Z>. Í7i^« de Castro, o Belisário e Conde Alarcos. Todas as outras sam duvidosas *.

' 147.— MANOEL DE FIGUEIREDO (1725-1801), o Lycidas

Cynthio, pretendeu ser ' o reformador do teatro nacional, mas êle próprio confessava ^ inanidade dos seus esforços. Traduziu de Eurípedes a Andromaca e a Ifigênia, de Comeille o Cid e o Cinna, de Addison o Catão ^ etc, e compôs algumas comédias que Garrett julgava aproveitáveis com «um diálogo mais vivo, e um estilo mais animado». Nesse número devem contar-se O dramático aficionado^ o Acrèdorj a Escola da Mocidade^ a Apologia das Damas^ o Fátuo- sinho, que reímem curiosos quadros de costumes, em que muito temos á estudar e que os novos engenhos dados a este género de letras poderiam aproveitar sem desaire para a nossa scêna e com agrado do público, pois ali encontrariam a observação e censura fol- gasS de muitos dos ridiculos que ainda sam dos nossos tempos e que seram sempre como que uma feição moral permanente do homem em fociedade '.

A falta de qualidades essenciais a quem escreve para o teatro.

* Consnlte-ae a Fttsiração Luso-Brasileira de 1856, i, 190; Varnhagen, Florilégio da Poesia brasil. ; Pereira da 8ilva, Varões ilustrejt do Brasil, Aa oito comMiaa de António José apareceram em dois voU.^— Teatro cómico portit" guês^ 1774. Na minha colecção í:ifd)siilio9 para o estudo da história da Litera^ tura Portuguesa, vol^. v-vi, publiquei a Vida de D. Qiiixote, Coimbra, 1905 e as Guerras do Alecrim, ibid,^ 1905, etc, com introdnoao bio-bibliográfica no 1.® desses vols. No Porto, ed. da «Renascença Portng. » foi pubi. Amphitrião, 1916, 1 vol.

' Cfr. o Dic. Bibl. de Innoc, ri, 272 e seg., onde vem a lista, eerta muito incompleta de 221 comédias de cordel.

* J. M. Andrade Forreira, l,it., Mus, e Bdas Artes, u, 178.

440 KISTÓBU DA LlTiSBATDSA FOUTUGUâflA

a ruim metrificação, o Oâtílo didáíicO; a frieza oa acçao, a pouca graça, tado isso tornou o toalro de Figueiredo vejho alcJa para 05 seuB oontemporâneos, que riem lhe com(>reef)deiíim os Í£it.i:lto3 loiívi- veifl, nem o fiavoreceram e estimaram, de;*xaadu-o perecer no quase completo desprêso da sua obra \

COLÓNIA BRASILEIRA

V

os ÉPICOS

148. A poesia épica no século XVIll. Doa numerosos poetas épicos do presente século, liparte José AgostinHo de Macedo que estudamos, os reslanfes perl^jncetn á colóa'a bras.Iieli^a. Per- tencem ainda á metrópole os sc^.iiuíes de que bastará ía^e.' meação: D. FRANCISCO XAVIER DE MENESES (ltí7;M73n\ 4.<> Conde da ErJce>a, na opinião de i\ C. Branco « o esj^.íri(o mais esíeiiJmenie aíadigado e o mais simbólico das academias Xe sua eleí<;rio » * tiaduícr da -4/- te poética ' de Boileau, e que escreveu a llenrlqaeída^ cujo herói é Henrique de Burgonba, movendo se a ac<;ào em volta da expulbSo dos Mouros, poema sem iaspiracrio e sem eij!,usiilsmo *, THEOOORO DE ALMEIDA (1722-1^04) * que, alem da novela l^dlz indej}endeníe do mu7ido 6 da fortuna (1799, ?* voís.), da Ktcreação filosófica (10 vols., 1751-99) e das fartas Ftsico-Mafemátlcas (1784-99, 3 voIs.), eB(»*eveu em seis cautos e oitava rima o poema Lisboa destruída; PEDRO DE AZEVEDO TOJAL, autor do Carlos Reduzido e Ôo poema he-

^ Vid. a ed. completa: Teatro J«..., Lisboa, 14 tomos, 1804-15. Fei am irmão do autor quem ihc pui I içou as Obras, bdm como as que sairam com o títilo Obras Posthumas, Lisbca, 180i, 1 vol. No vol. 14 e último numerosas e interesaantiísimas referências a pessoas e factoi do séc. xfiii feitas por esse irmão, muito dignas de lêrse.

' Curso, 11, 138. Cfr. atraz, pág. 456.

^ Lisboa, 1818, e antes na t,^ pág. do Álmanach deu Muèas, C. C. Branco (Curso, u, I08 113) nirra 'di peripéciai interessantes que se deram en- tre Boileau c o 4.*^ Coudt da P^rieeira a propósito desta trad., e que sambai poutto konrosas para a incnKnia do es^ritcr francês.

* Liiboa, 1741.

^ Homem de faito saber. Viven em Fraaea durante dez anos ensinando física e matemática. A sna <J)ia capitil é evidc:i temente a Recreação filosójica ou diálogo sobre a jiíosojia natural, i>n.ra instru*}ào de pessoãs eurioêos quenàô frequentaram as aulas, Lisbta, 10 toIs. O Lisboa destruidu tem valor liistócico lítlas minúcias com que se refere ao terremoto Qe 1755, tomo também acooteei a dons poemas que tratara da edilleavrio de Lisboa Lisboa reaiaurada, por Ti- cente Carlos cie Oliveira, Lisljoa, 17b4, e Lisboa reedificada, porMignel Ma- nucif Kamalho, Lisboa, 1780. Tb. de Almeida escreveu taiubêm serina i

ciPiTTJLO 7 •— 'bícôIa rnkVctsJL. ou arcXdica 44l

I

rói-cómico Foguetarío \ MEDINA DE VASCONCELLOS, que deixou o Zar- queida e o Georgelda ; e COSTA E SILVA (f ISõá), cuja obra o Passeie tem algamas belezas descritivas *, ete. Da colÓDia brasileira femos :

149.- JOSÉ BASÍLIO DA GAMA (17401795) que nas-

cea a 22 de ] "'ho na vila de S. José do rio das Mortes, em Minas, hoje cidade de Tl^^cdaníes (M^Tas Gerais), e foi educado no Rio de Janeiro nas e^co^ai que os jesuítas sustentavam com lustre naquela capital. CoDcírlclo o curso de preparatóvíos quis seguir os estudos su- periores em lV'':ii'3;al fa Universidade de Coimbra, mas pouco se den?orou ncjía ç*cíade, p^rLiclo para Boroa e daí para Lisboa, e por úl'ÍTro pa^a o R»o. l*ereb'':^o neita cidade com desconfian»;? . perse- gaic-o e p-^e^o como paríú^iiío do3 jesuítas, obteve a liberdade com as boas g^açai qne cap'on ao Marquês de Pombal por 03asi2U) do casamento da fiH^a 3^6, D. M.i^'ia Amália, e3crevendo um epitalá- m'o, que é uma be'a p-í^rlnr^ao. Pomb. l deu-lhe o lugar de oficial da 6e:-'etaT'*a dos Ne^^ócVn L-N.-aijenos ; na mediania desta situação escreveu o Uraf^hf -. Gaiua morea a 31 de Julho de 1795 em Lis- boa, 3eado sepn!t,do na ma -z cl a Box Tlora. em. Belém. O Ura- S'.'Ci/ é um poenna óp^jo, íe^do por Jícvi o ch«ífe indio Cacambo e por ac^Sfo a ]'<í, eviíe os po íi?^ae^cs e os índios do Paraguay. O poema é es'i»*:to em ve^ro ^^'lecasiilabo solto e tem episódios notá- veis, como o da mo ^e ca l«er.?Ina ]^iiKl»)yíi; o sonho do herói, o dis- curso do Cacambo ^ Gomes Freire, eíc. O Uraguay é, no dizer de 6a»rett, a melhor coroa du poesia b^asUei^a *.

150.— JOSÉ DE SANTA RITA DURÃO (1722-1781) natu-

ral, como- o antecedente, de Minas Cerais, tomou o hábito angusti- niano e doutorou-se na Faculdade do Teologia da Universidade de

Tários opáseulos. O Feliz Indrpend-entc é uma imifcanão do Tflémaco, como o é também o Tomance Aventuras de Diophancs ou más imas da virtwie c formosura ww que JDiophaiK3^ Clj/menea e Hemirna, príncipes de Tiíe^as vencer<ivi os maia ^pertado9 lances da deegrara, por Do^o^hea Encrvacía Tavareda de Almira (1777) anagrama de Theresa Margarida da Silva e IJoitu).

1 Carlos reduzido^ LifjU' terra iín.9('rada. .., Lisboa, 1716. Tojal como deixamos apoutado no lo?C'ii* eom^x!. 'finfo, ó n!n dos trad. do 'lasso. Ktícreye» também "m poema herói-cóir.ico paia ridicul.Tiz.ir o inventor dos balões Lou- renço de GosidS* fofpí^fff^io, qno eu reeiiilei na minha Cí.-le^ção Subsídios pflra o eêiudo da Mst. da J/it. PcH. E' o t' 1. iv, Coimbra, 1904.

* As Poesias abrangom 3 voia. T«iin mais Isabel ou a heroina de Ara- gào ; Emília e Leontda ou os amanic^ ívp -os : O K.'^pp<'lro oit a Baronesa de Gttya; a trad. do poema de Dclile, A [muffinaçào^ e a de Apobmio Kúdio, Os Argonautas, Mas acima de todos vsie^ [)..C"iias e.stii a pna obra em prosa de in- vegtigaeSo e analiso crítica JCnsaio òiofjráico-crltiro sobre os melhores poetas pwiugueses, Lisboa, 1850-.09, 10 voh.

» Ed. !.■, Lisboa, 1760. K 1811, 18-J2 c 1815. Vêr a ed., feita em 1900 em Pelotas com anotações de J. Artur MoBt<;nogro.

bi>t6iiá da LiTHÁnru I

Coimbra (17&6), onde recitou a oraçSo latba de sapiâncía na aber- tara das aulas em 1778. Perpetuon-lhe o DOme o Caramurú (1781), impr. doze aaoB depois do Uraguay.

A acção do poema, diz o próprio autor, é o descobrimento da Bala, feito quase no meio do séc. XTi por Diogo Âl7areB Correia, nobre viannês, compreendendo em vários episódio^ da histâría do Brasil, ritos, tradíçSea, milícias dos seua indígenas, como também a natural e política das colónias. Diogo. Alvares , . , naufragou nos baixos de Boipeba, vozinhos da Baía. Salvaram-se com êle seis dos seus com- panheiros, e f^ram devorados pelos gentios antropófagos, e êle espe- rado por vir enfermo para, melbor nutrido, aervir-lhes de mais gostoso pasto. Encalhada a náo, deixaraíq-no tirar dela pólvora, balas, armas, fl entras espécies de que ignoravam o uso. Com uma espingarda matou êle, caçando, certa ave; do que, espantados os bárbaros, o aclamaram Bilho do Trovão e Caramurú, iato é, DragSo do mar. Dâste momento por diante Diogo Alvares toma-se lun semi-deus. Casa com Paraguaçú que conduísiu a França, onde foi baptizada, sendo madrinha Catarina de I^Iedicis, regressando depois á Baia, onde é recebido com o antigo respeito.

Sobresáem ng^te poéoia as descrições dos costumes dos selva- gens do Brasil, o epiaóito de ^loêma, o da estátua da ilha do Pico, etc. Cultor desvelado doa clássicos conseguiu DurSo ser mais corr«icto que Basílio da Gama, que o excedia em delicadeza a gosto. O Cara- mwú foi impresso em Lisboa sob as vistas do àutSr em 1781 *. Parece que DurSo compôs muitas peças liritas, que inatilizoa ou se perderam *.

08 Lfsicoí

151. Os líricos. O lirismo chegoa a grande altura nas composições dalguns doa poótas da nossa colónia do Brasil, muitos dos quais faziam parte da Arcádia Ultramarina e constitoíram a afamada Escola-mintira como CLÁUDIO MANOEL DA COSTA (1729-1789),

1 2.» eii., Li^bdB, 1S36; 3.», Baii, 1837; 4.«, Lisboa, 1845. Reprod. eora o Uragiiay nos Épicos Brasileiros, de VarnhBgem.

A vidíi (ie Udrào tbi muito e9cl<irc<^ída no valioso trabalho de Artur Viegas, [pspudóiiiiiio do iliistri; Jcsuita. V. Autiines Vieira] O Poeta S. R. Da- rão, revelações histór. da sua vi-la e do seu séc, Bruielas, 1914, 1 vol., onde, entre outros doi^s., se ]iode lèramit aiitnbi(i^'r. donolável Braãileira. (Paga. 1-68}.

» Kn meu artigo Alguma cousa de novo sobre S. R. D. dei a biogr. a(!.i<K'iiii(va do famo:<o poúta uiirioiía e publiquei na Int^ra nn poemeto em latina inaiMrr.iuieo. Vfiv Rei'. de Língua Portuguesa (do Rio de Jan), i, {19:i0), ii'J-a-'.

*

lU^XTLO t B800LA f&AXoÃsA Otf AXCÍDiOA

C0J08 sonetos sam petrdrquis^as e na contextura tgem o sainete úrci' dieo da escola de Garçjo ^ ; IQ^IAC^O JOSÉ DE ALVARENGA PEIXOTO » (1744- 1793) e MANOEL IGMACIO DA SILVA ALVARENGA (1749-1814) o Alcindo Palmireno da Arcádia Ultramarina, líricos apreciáveis mas de craveira inferior a Gonzaga, de quem, todavia^ tentaram aproximar-se. Gon- nga e Sousa Caldas merecem registo especial.

152.-T0MÂS ANTÓNIO GONZAGA (1744-1807?), a

Direeu da Arcádia, nasceu no Porto, de pai brasileiro e mãe portu- gaêsa-portaense, a 11 de agosto de 1744. Formado em Direito na Universidade de Coimbra (1763) seguiu a carreira da magistratura, passando á Baia no cargo de desembargador. Ai, quando estava para casar com aquela que depois cantou sob o nome de Marília ^ aaiteou-o uma ordem de prisão motivada por o acusarem de fazer parte capital da chamada conjuração dos Confidentes, suposta rebe- lião republicana de Minas. Com a confiscação de bens, íoi-lhe imposta a pena de degredo perpétuo para um dos presídios de Angola, depois comutada em dez anos de degredo para Moçambi- que, com pena de morte se voltasse á América. E no meio das agruras do exílio, entre os tormentos- da loucura morreu o mavioso Poeta por 1807.

Imortalizou-o a Marília obra repassada de sentimento e notá- vel pela doçura e/lsuavidade da expressão. Mas não dúvida de qae os amores desgraçados de Gonzaga tgem grande parte na exa- gerada popularidade da sua obra ^.

' C. Castelo Branco, ob. cit, n, 249. As suas poesias líricas encontram-se Rtmidas in Obras de ... Árcade Ultramarino, chamado Glauceste Saturnlo.»,^ Coimbra, 1768, 1 vol., raro, com tudo o que é deste poeta. Tem ed. na casa Gamier. O poema G'aura saía na Bibl. Univ , Lisboa.

* Obras Poéticas , Rio de Jannro, IS^^, ei. de J. Norberto de S. Silva. ? E' o aator do poém^ heroi-cómieo Desertor, Coi.nbra, 1774. Ed. da»

líricas na mesyia casa Gamier dirigida tambe n por Norberto da Silva.

* Mfiria Joaquina Dorotlit^n de Seixas era a Minha, que o poeta esque- wa, anos depois, casando em ITXò em Af'iea corr. a opulenta senhora Juliana de Soosa Mascarenhas. No depoimento á autnrida.le eclpsiáatica declarou çoe nunca dera palavra de casamento a pessoa alguma! (l^ernandes Pinheiro, 06. tíí., II, 331). Mas se Marília também eaáon !

* Biogr. em Bruno, Fortuí^ueses ilustres, Porto, lf07, pág. 207; 01, Bilae., Critica e fantasia, Lisboa, IMii, p4g. 9.

Sam numerosas as ed. Apro^íiável é a de Pari3, 18(V2, 2 vols. Marília dt Direeu, Liras de Tomás António GonzaQa, precedidas duma notícia biblio- páflca e do juízo critico dos autores estran] tiros e nacionais e das liras escri* ^ tm resposta ás suas e acompanhadas de documi ntos históriccs, \mv J. Korbprtode Sonsa S., Paris, 1862, 2 vols. llá uma ed. de lh<StS, du Lisboa. Mas a *o<líí sobreleva a revista e prefaciada p r Jotíó Wríti.-imn, Ji^o Cxm Jaiioiro, 11)10. ^'a^.^ ttdijao! Qi^iuaga trdduzia o Pastor fido do UvUi<ui.

444 bistÓria da i<iTaRÁT0EA po&ruauásÁ

t53.-ANTÓNIO PEREIRA DE SOUZA CALDAS (1762-

1814) é o poeta português que melhor desferiu voos em aasantos religiosos. As suas Poesias Sacras, que abrem com a belisáma óde Sôhre a existência de Deus dam testemunho da vitalidade do seu estro. A óde Sobre a virtude da religião crista, a cantata chamada CreaqãOj a óde Sobre a necessidade da revelação, e muitas outras dam-lhe jus ao título de primeiro poeta sacro. Das composições pro- fanas sobreleva em gosto e arrojo a cantata Pigmalião ^.

PROSA

Sumário : 154. História, seus representantes. 155. Sebastião da Rocba Pitta 156. Fr. Manoel dos Santos. 157. D. António Caetano de Soasa. 158. DiogQ Barbosa Machado. 159. Francisco Leitão Ferreira.— 160. Joié Soares da Silva 161. Fr. Manoel do Cenáculo Vilas Boas. 162. António Ribeiro dos Smtos. 163. D. Autóoio Caetano do Amaral. 164:. João Pedro Ribeiro. 165. D. Francisco Alexandre Lobo. 166. D. Fr. Francisco de S. Luís. 167. Fr. Fortunato de S, Boaventura. 168. Manoel António Coelho da Rocha. 169. Eloquência. 170. Epistolografia. 171. António da Costa. 172. António Xuncs Ribeiro Sanches. 173. Fi-anciseo Xavier de Oliveira. 174:. Alexandre de Gusmão 175. Tra- balhos filológicos do st'^cnlo xviíi. 176. Francisco José Freire. 177. António Pereira de Figueiredo. 178. Fr. Joaquim de Santa Rosa de Viterbo. 179. Francisco Dias Gomes. 180. Jerónimo Soares Barbosa. 181. Obras diversas.

154. História; seus representantes. Nfto chegaria um

volume pa.ra íalar dignamente de todos quantos neste século se empenharam em colher pelos arquivos do reino noticias que interes- sassem á nossa história quer eclesiástica^ quer civil. Podemos divi- di-los em dois grupos: oa p3rtftncentes á Academia Real de História e os da Acadeinia Real das Sciências. Os seus trabalhos sam, como ó natural, desiguais^ mas todos se esforçam por serem exactos e conscienciosos, Deve-se-lhes, em geral, muita investigação sábia e pacientemente feita. Bastaria citar um Caetano de Sousa, am I^arbosa Jlachadp, um Joíío Pedro Ribeiro, respectivamente os cria- dores dos estudos geneológicos, das investigações bibliológicas e das pesqliisas diplomáticas e crítico-cronológicas da história nacional. Oxalá o nosto géculo podesse apresontar assim uma plêiada tam numerosa e tam distinta dc^ trabalhadores nos árduos campos da história nacional, onde ainda tanto que arrotear e surribar!

^ Obras pociicas: \ P salmos de David vertidos em ritmo portu- guês... 11 Poesias sacrai e profanas. , . 2 vols . 1830- iil. Oatra ed., 0»iín- biM, 1^'»') [Heiíi (o. psalir.. s]. Cil^is julj^a\ a as suas composioòes imperfeitfls e pensou em qiicini.i hin, j):'«'P''.-ito do (jikí araigos O demoveram a muito custo. Viíi. L. I). Vilela di S:iva, Observações criticas,., a Balbit Lisboa, 1828, pág. 20.

ÒÁPXTULO V - H«<JOLA PlUNOÃSA OU ABCÍdIÒA 445

Academia Real da História 155.- SEBASTIÃO DA ROCHA PITTA (1660-1738),

em estilo eivado dos defeitos gongóricos, túmido e hiperbólico, dei- xou a Historia da América Portuguesa desde o ano de l&y). . . até o de 1724y útil pelas informaçõeo que BÔbre o assunto compendiou *, mas sem cunho histórico propriamente dito, parecendo antes um ro- mance histórico.

156. MANOEL DOS SANTOS (1672-1718), um dos

continuadores da Monarchia Lmitana de Brandão (Parte Viii, rela- tiva a D. Fernando e 1). Jo3lo i), escreveu mais : Alcobaça ilustra- áa, e sobre a vida e feitos de D. Sebastião a História Sehastiaca *, 1.* da série das obras que traçam a história do infortunado monarca e da sua época, a saber : as Mem, de D, Sebastião de Diogo Bar- bosa Machado; o Portur/al cuidadoso e lastimado de José Pereira Baião; as Crónicas de D. Manuel de Meneses fmas veja-se Inoc. Dic. Bibl.j V, 97) e de Fr, Bernardo da (.Vuz^e a Jornada de Africa de J. de Mendonça.

157.-D. ANTÓNIO CAETANO DE SOUSA (1674-1759), (un dos fundadores da Academia Real da História Portuguesa, es- creveu :

--^ História Genealógica da Casa líeál 13 (tomos) ' á qual juntou, como documentos^ as :

Provas da História Genealógica (6 tomos) * dando ainda um outro volume com o título índice (leral ^.

Esta obra, fruto de largas invebtigayojs e denunciadora de aturado esforço, foi oferecida a D. João v. Nito é um mero cati-

* Lisboa, 1730, 2.*, ihid,. 18 SO, anotada por J, J. Gocs, outra na Baia, 1878.

* LáBboa, 1735.

^ Uisi. Genea!, da Casa lUal port. desde a sua origem até o presente fom 08 familias iltisirès que proced^ja dos ]{eÍ9 e dos Sereníssimos Duques dp, JiTdgança^ jtMtificada com iiistrniuentos e escritores de invio/ável ; hishosL, n3b.48, 13 tomos em 4 "

* Provas da Hist. Geneal. da Casa Real port., tirada dos instrumen- toj áo Arch. da Torre do Tombo, da Sereníssima Casa de Bragança, de diver- SOS Catedraes, ÃÍBSteiros e outros particulares deste reino ; lAtihoíij ^173Í>-4S 6 tomos cm 4.**

^ índice geral dos appellidês, nomes próprios e causas notáveis que se ^omprehendem nos treze tomos da Hist. Genral. e dos doe. compreendidos 10$ seis vol. de Provas com que se acha atictorisada a mesma Hist. ; Lisbga, n49, 1 vol. em 4«.

logo de famdiaH; mas uma hiattSria qne se com interesse ecom proveito. As Provag mereceram a J. Pedro Ribeiro graves ceneuras, qae nnlas n tantos erros e tSo grosseiros que apenas se pode su- por que êle chagasse a lòr alguns mcnumentoB que aií produziu, tendo-se servido de pessoas intRiramente ineptas para Ilie tirar c^ pias > ', e Herculano também aHrma que raro será o doe. lançado dos seis vols. das iVouos, que não venha cheio de erros grosseiros de có- pia •. Mas o ilustre Tcatino se nSo pôde de viiu contraprovar a rigo- rosa exactidito dos {"ocs. que aproveitou por ninguôfn foi acusado de menos solicito ou de menos probo. D. António Caetano de Sousa acrescentou um 4.° tomo ao Agiologio Lusitano de Jorge Cardoso e escreveu Memórias dalguns biapaios ultramarinos '.

,158.-D10G0 BARBOSA MACHADO {1682-1772), Uus- tro abade da igrtja de «.into AdriSo de tí;ver, no bispado do Porto, líeuniu á custa de imprcbo tríiba:iio durante maia de oitenta anos uma rica biblioteca, que de opú-ículos raros corcprnentea á história de Portug'd e Branil formava 85 vols., íilòm d-^ muitas outras precio- sidades bdilio^niHcas. Tendo-as Ifgado d. R. Bibl. da Ajuda *, foram parar ao lí.o de Jaripiro quando em Uns de 1807 O Príncipe Re- gente, depois rei D. Joào vi, para íugiu, vindo a constiuir com outras o fundo da B.Mictófa N^t^íonal do liio, que assim pôde abrir ao públiuo fartaraenln enriquecida em TíílO *.

Biblioteca Lusilaua *, Debalde ae procurará nos grandes

t Vid, as Observações DÍp!omáUcas.

» Composições várias, Lislioa, s. a,, 266, nota {2).

' Afonso <le IJoTifl.is, D. António Caetano de Sousa, a sua vida, a SM obra e a sua família, I.UIina, IM", 1 vol,

* o I ) «eiilíor 1), Joífi qiio <:niu i:d'a Livrai ia, àlêtn de outras acqulaiço» ia eonippníauclo a enorme ii.-nU <k antica Bibl. líi';;ia frz ao Abade n grsça acuiLoSo i!oioiima t-n.-a \it:ili.-ia <ii; lin i,V"l'i ra. e eobi evivêoda a algumM pe'- loas obri£r.i.>à.> ■]■• itfínv Ab.i.i-i.. ( \'ii.k'iilo, Mem. Hist., ii, 46.

« (I .-a'(/.lr.L'(i rins i-l., do linLisa í'i puld. not A/iãis da Bibl. Nac. io Rh de Janeiro io7õ-77, Um^.:. i, oiido vi-iu :i l>"'lí. o rtt-ato de Barboaa. Sego r- do iníe8liu'!ii'0i'ij ri'^fot"a [líira c '|ili! o- livr.is friram mandadoa para o BrJíil en Irca aui^i-sMv.ia n i li. si aí, i|oaod-. \\ i>t..iva 11. Jo5o »i. SÕbre aa riqnejM da lí'bl. em Ím|ir,, Cmorama. vi. , JJ:», c liii ilmcntc Boi. da Soc. de Bibliófi- las Bari. mci.uilo, \-'-\.. -'■■ (1'.M::i, ooiUia lUvida >\n Brasil inielecliul é paga ao [lau.iio*.- ■; =:ii.ir> l!i li i;r.if.i !"■! i (>^ na •\o Or. Itatnia Galvão.

' liíb'io'c:a iiisiUina. fiisl:'>ri'n. (ii:ica e eronolóf-ica na qaal se com- preende a notiaa iloí aiitiv; s poriuiniíses e das cbras qae tpmpuseram desdi o Umpodapioimri^iiião dn hi da Oiui-a. até o tempo presente. Ot. i. Aagutíi m:n:''^t.v\- •>•: if J^^ri . v N...-Í., Snhr.r, l^i-boa, 1741-W. 4 tom<iBín-/oWo. BenU Jo^;- d.! S..',Ha F:iriiilia'i.'.iiniiu i.W tniballn) no Sumário da Bibt. Lusit-, LU- boa, 4 voIb.

Ciirhui.0 V wBeoLk nuvc^Ak ot^ AMcImnà,

447

Tolames da Biblioteca a nota cHtica estremanclo as beleasas e os de- feitos das obras, qne entram na sua galaria ; mas ali, que baste, um vastisBÍmo reportório do informações, com iinprobo trabalho colhidas, e que de muito tgem servido aos continuadores de estudos idênticos. E* de menor importância o vol. Memórias para a hist. de Portugal que compreendem o governo d'elrei D. iSebastlão desde 1554 a

mi \ t

Diogoí Barbosa teve dous irmãos: I6NACI0 BARBOSA MACHADO autor doe fastos políticos e militares da antiga e nova Lusitânia e D. JOSÉ' BARBOSA MACHADO que deixou o Catálogo cronofógicOy histórico e ge- nsalógico e critico das rainhas e sens jiUws (1<27) *, mas nenhum tonseguiu sequer igualar a gloria do irmào Dio^o.

159.— FRANGISeO LEITÃO FERREIRA (1G<;7-1735) es-

ereveu aa Noticias cronológicas da U uivar si d< ide de Coivihra *, que abrangem o período das t^an^f^i^(JIK•ii^tí da ÍTnivcT&idade ató á data - de 1537, e constituem subsídio indispensável para quem quiser estu- dar a história do desenvolvirneuto iitrário do nosso país. A morte do autor fez com que ficaase iujompl.ta a obra que ó também um correctivo aos erros de Fr. António <1íi Purifioaçri) (1(301-11)58) na sua Crónica da antiguissima rrocincia de Poiíugal *. As Noticias ia vi4a de André de Resende Kam um ti^ab.JIio revelador da mais etcmpolosa investigação hislórií^a ^,

160. -JOSÉ SOARES DA SILVA (1072-1739). As suas

Memórias para a história de Portugal (juc compreendem o governo íd-rei D. João /, do anno de liJdJ até o de 1433 j cstam escritas

^ Lisboa, 4 toIs.

* Ll8boaY.2 vol». Outros trab.ilbos om >íp.ttr^^, Manual, cit. e. Innoc,^ Die, A obra de Fred. Francisco dii ia Fír.nièn', Meu órias das Rainhas de Portugal, (1859, 1 vol ), o a d^í Fr. di F.)I!.m»v';i F,fn»'vi(I«M, Rainhas de Por tu- Zdl, (1878, 2 vols.) fizeram ffl[uccer inít-i Mni<jnt a oi/ia dr j). Joííó Macibòdo.

* Noticias cronológicas.,. Prín:> íui p:rír que co>^prcende os annos que discorrem desde o de I2òo até princ p i>s dj l~> .7. Lisboa, 1729. K xisto manuscrita a 2.* parte de qiu liá um i ^ 'j^j.i n. Ai [ úvo d.i lJiiivi'i.^iii..ti<» de Coimbra.

No vol. IV da CoUecç^o dos l^or. e ^^/^! d,i Ac'\d. í-s!;! TfidjH.v.do o Catálogp cronológico critico di)S /;:>;■'> </.- c.V/. i^ru <i u.-- :m» i.jI r. A i-ii sito do trabalho sôbru a Univ^r-. i. •' )i " . i*.. -^ . ■. ^'.. Coimbra de Francisco Crin-.-i-i (Uí 1 < <■ i \ .^ ;• '.■■ F Jo6é Maria Rodrigues, A CrJv. de /.>/.•. (a>'. ^i-.- ., C dilema, Coimbra, 1802, pá-r. l7) <* to .;i.' .i n \Ui., i .. ..i i: 1871-72 6 1773-74 a IhSí-fciJ .i^'--' '- < .-•

* Em doas partea: 1.^, M i. .., i . A; :;,' , A' 'A !•' ' Cfr. a ed. que coli uiIi.ai . .: ..*.t.. o <A..

lútoriador Sr. Braamcamp i iLl.t'.

f i IS J-: l 'nrj. de

A.- 1 ^ (■• v'ii (Dr.

'• '/ .'-'' A' ;:,. a obra

A '..'*.': ' ua Univ.,

) -3

IL \,^i

\ "'JIG u b.luio

44â SllT^KIA DA LTTK1UT0KA PORTUQUlÀftA

num estilo túrgido e afectado, qne muito prejudica a beleza bÍFt<'»rica desse período, um dos mais cavaihei^^esí^as de Portuga' \ e que :rm tanta grandeza épica licou exarado por í^ernUo Lopes.

II

Academia Real das Sciôncías

4

16t.-FR.MANOELDOeENÂeULpVILLAS-BOAS(iT44-

1814), doutor e lente da Fa-iuldade de Teo«og»a da I 'iivers'd«.de de Coimbra, bispo de Beia e depois arcebispo de Evo^a. foi um e3p"*'o ilustradíssimo, a quem as Jelras portiigu»' as devem sc^ir^.ia ipc»Vv láveis. O critério supe^-iormente aeeríado c^jd que di^aníe vitife e cinco anos governou a diocese de IJeia revelou -se nnma m:'^i*(^?o de actos qual deles maÍ3 merecedor de ap^Siiso. No -eu p^''j>"«o p:ço criou um curso de buroanídades e de feo^c^Ia, in3tHir*íi noí'.'e'èi?C't'9 *©clesiásfí'*,as, abriu escolas para o s^tto f^m^cíno; !•/ mon nra ILrz^ de antiguidades, reuniu uma co^ec»;!^? no^áv»! de pintaras e, à'*!.» oferecer tambim muitos volumes á líla^ B.IjI. Publica da Cj* e, dii- xou milhares de livros impressos, de-.ettas de mamiseiil.'!, mi'*. o? d*; subido valor, e três mil moedas ou medalhas nrlo duo' caías, com- preendendo moedas grogas e romauas e entras raras e de ap*ef;a *. Escrevendo, aconselhando, dirigíndo; o dono p-£'a^lo Ijíni o seu nome ás reformas, que tanta gloria deram ao Ma^-qn.Gs de Fcir- bal, que o chamava ^pOço sem fniido e fc n Jôaojf, Das àuaj nume- rosas obras destacam-se, como princinai", as Mcrúórla^ /etV'.'V^í do Mmíatério do pdfj)i'o ' e os Cnldados Uferctws de Prelaco de Bela *, dois livros de vasto saber em li-.tvírla ec^esiá !iia. de í»- nissimos preceitos da vida sacerdoía!, de regras oraiôrias para ÍCHift a eloquência *. Fr. Fortunato de S. Boaveiitmá consíderaví-t «o maior homem do seu sée. j>'^

* Ed. de Lisboa, l7;^0.1732, 3 vols. Em 1734 pubPcou o mesmo aaíor o vol. Colleram de Documentos com que se authimzam //c Aírmoria3. . .

» Cfr. Boi. das BibL e AnH, Nac, 19' . v-j. If/ ' Mem. por am religioso da Ordem Tercirji de S. Frannsco: Lisbco, 1776.

* Cuidados.,, em graça do seu bispado, Líaboa, 1791.

5 C. C. Branco, ob. cit., pág. 210. Fr. Vicente íSaigcado, Orl^m e prc- gresso das lingoas oriintai': na CG..^^rrç:a:(ío da Terceira Ordem de Portugal, Lisboa, 1790: id., Comp. hist. da Congrcgnr/Jo da Tcneira O rd ^m de Portu- gal, Lisboa, Í7r > e o fio^io fiist. por rrii;<^so reeit-ado na sessão da Aead. R. dad Sc. de Lisboa do 2i de j anho ae l.Sl4 no t.^T das Mem. da mesma Acad. 1815, foi O Conimbricense ãe í>(jS pablicoí: Memórias intimas Qnác o Prelado rejistava o que lhe parr^-ia diirno de nola como educador do Príncipe do Brasil, D. José, primogónito de P. Maria i e prematuramente falecido.

* Hist. cronoL e crit de Alcobaça, 82, nota, 2.

capítulo T SSOOLA FBABCftsA 00 ABOÍOIOÁ 449

162.-ANTÓNIO RIBEIRO DOS SANTOS (1745- 1:^18), lente

íe cano%e3. l».b'!ocec i'0 da UdÍTersWacle, e depois da Bibí. Pi- blica de L'>-l>oa, jjOí'.'v^<> 'ú-^-e^ cevcm t:?-lhe ii abai lies de subido ^aio"; be^Jo p:ÍDc'p^.a3. 3 e>^ 'wt^r^h àem coaíras, as Merr^órioê ú . <'a da y in u,a '( J% u ^ ^^'jJ> ' p))\ "'feses decide os pri' Vi/nOB '4 np^s Ja vc',\a -7 </ c. " ujj f:? Jo ..?. XV ^^ e sobre as O, ' iéU:,- új. :,pog:u''j.> 'a )): '. ':a .0 ò'>^o XVI K Di o autor Lc\ í8 * &'j. a*)S p.MAa Cd .^uô vOil .simas ijves^ga^Ces e aceodrado t - ^/o l'i> .c ...lí'^ i uí.iO cOá ^.u>l!os t^c.eveu umbêm sob o ronje axc/dleo de > /.f / <í, 'cr 0 iic>a?e:0c*,3 poesias ao sabor clás- 8Í';o '. M:;s c i:c5 t-ic\,v*iyCíè3 xíJj.ÔíIjis, miis que nos voos da fanta- sia, que a soa gloila ta esi. .ba.

t63.-ANTGNIO CAETANO DO AMARAL :n47-I819)

121 niu suò ,Vios de mai^o a'*, ce j.u ^i a h's i''ia c'vh e ecoGÓmica do n'ssD p^'3 :3a8 u r.cn> Mt.vX. . -. «,.»]o l i *^i]'o tcvela a importân- ta dei. 3; .M.*ji3 ma!c.!.»j do luis a d. 3 LrãCj, uTo dtjbravítdas por nechum parien.e 'nvéiJ^j^ad );. Si.oi:

Meji. i.* Lii\ído da / ,ò\ a7u':i atè o ttmpo cn qvs foi ftd.Zida a pi ov hw ia jonurfa *;

Mem. 2,* A'- t Jci ( 'iu'l Js-t Lu^iJ^arôa no U fhpo em que esteve i^ujeita aos romanos •';

Mem. 3.* L. ado (''o>l da Lvb>taaia dchde a entrada dos pooos i'o Nuj.e íl' d d'j8 Ali bcs %•

Meo?. 4* i.^\^Jo do Urrciio que hoje ociíj^a Portugal^ desde a hunsâo do 3 Árabes ol' li f\,'ndac1o ca I-ionarquia Portuguesa'^ ;

Mem. b*"^ frincha cpoca da ^íonarqxJa Portuguesa, desde o coTide Ds Heiii'*q^ri a.>\ o fim, do reinado del-rei D. íemando *.

A' grande figtxra de apóstolo que íoi D. Fr. Caetano Brandão nonsagrou dous vo'3.. de Afemórias e desenterrou do esquecimento a Vida de S. Martinho Bracarense, que ilustrou e completou com a ^

* Joaquim José Ferreira Gordo (1758-1838) junton para a história dos jadeQB Mi Portagal algumas achegas na Memória que lhe consagrou e anda publicada no vol. vm da História e Memórias da Academia (1823).

* As primeiras publicadas uo.^ vois. iii e iv das Mem. da Lit. e as outras doas no vol. vm das mesmas Memórias. Cfr. Innoc, Dic. Bibl., ti, 203-210.

'' Poesias, yols. i, n, iii, Lisboa, 1812-1817. Ribeiro dos Santos também ^. a Poética de Aristóteles (Lisboa, 1770, an()niina) c a Liiica de Horácio (Lisboa. 1807, 2 voIs.)

* iPublicada nas Mem. da Lit. Port. da Acad. /?. das Sc, i, 16-30.

* íbid., II, 313â53. /

* Ibid,, VI, 127-437. ^ /^/a.; vil, 60-236.

^ iòid,,. VI, p. II das referidas yiíf/n.ycm fólio, e eoutiuáadt no tomo vii.'*

450 BIITÓBU DA LITIlATtTlA FOBTUOuAsA

Colecção de Cílnones, obras todas que representam valioso auxílio aos eequadrinhadores da hi-.tória eiílesiástiea portuguesa.

164. -JOÃO PEDRO RIBEIRO (1759-1839), do Porto, aba- lizado lente da cadeira de cliol^niática da Universidade, foi um dos investigadores da história de Portu2:al mais pacientes, mais eruditos e roais conscienciosos que temos tido, sobressaindo aos seus contem- porâneos na crítica dos documentos e na interpretação e estudo das fontes.

Elucidou muitos pontos obscuros, corrigiu bastantes, que anda- vam adulterados em cronistas de menos escrúpulos, /refez em bases novas a cronologia de factos importantes. Dos seus livros merecem mençSo principal as:

Oh8ervav^)es' históricas e críticas para servirem de Memo- rias ao sistema da Diplomática porturjiíssa^,

. Dissertações cronolóqicas e criticai sobre a História e Jurisprudência eclesiástica e civil de Portugal *.

J. Pedro Ribeiro le,:rou á l^iblioteca da Universidade de Coimbra os seus livros e tod^s os seus manuscritos, entre OB quais alguns liá de subi-lo m írivim-^nto, como o intitulado Estractos para servirem a ordenar-se o Glossário latino-etimol. e arch, por' tugues '.

165. -D. FRANGISeO ALEXANDRE LOBO (1763-1844),

de Beja. lente da Fi.eullude Tool-^gia da Universidade e bispo de Viseu, 6 considerado como um escritor clássico, dotado de grande erudição literária, como se ve dos seus trabalhos, modelos de lingua- gem pura e muito correcta. Os que se consideraram mais completos e perfeitos foram reunidos em vols. que se publicaram postuma- mente \ Salientemos dentro eles as Memórias BÔbre Camões (vol. 1.°), Fr. Luís de Sousa e Aatóii.i Vieira (voL 2°), que sam mode- los no góticro e ;U quais tt^rá nneessilríimente de recorrer quem queiri escrever sobre aqueles mestres da língua. E' também notá- vel pela sobneLlide do e^tíio o seu Resumo da História do Antigo

» Pabl. p-la A'"^1. l^^il 'lia S12. ; Lisboa, 1798.

2 Ihii., 5 tonod, l^H)-L^;,'->.

3 Co:iu'r!)u a ser pihl. n) BdL Bibl da Univ. de Coimbra^ 1915, p:ig. 2m.

^ Obras de D. Frind^^co A^^xmire Lobo, Bispo de Viseu. Impressas d ciJ^.ta do Srmini^io '^a rrv IJíoc^se. Li^h «a, 184S-53Í 3 voU. Onde pararão an. obiag iaóiitu fi» liiip) L /)>, ,ju ; ^o u'nivd\vam no Seminário de Visea at4 li;i poufos an )3 ? Sibro 03 ^Ijs. d) Í5i>[)í Lobo lôr o o artigo de Fortonato de Almeida no Boi. da Seg. CL da Acad., xu, 218.

OATÍTULO T B8C0LA nUHCâf A 017 ABCÍ2>I0A 451

Tettamento. Foi em 1828 nomea'1o Reformador Geral dos Estados, logar em que prestou ao ensiao relevantes serviços ^.

166.— D. FR. FRANGISeO DE S. LUÍS (1766-1845), mais

eonheeido pela de8Ígn>iç?io de Cardeal Saraiva^ doutorou- se em Teologia, foi reitor da UniversidHde e biápo de Coimbra, ministro de Estado ò Cardeal- Patriarca de Lisboa. Aa memórias sobre histó- ria antiga e moderna, navegação e conquistas dos portugueses bem como sobre factos da história eclesiá^^tica nacional, os seus estudos de linguística, etc, publicados nas Obras completas * atestam o alto merecimento deste ilustre prelado e o seu amõir infatigável ao tra- balho ^

167.-D. FR. FORTUNATO DE S. BOAVENTURA (1778-

1844), outro prelado ilustre, doutor em Teologia e arcebispo de Évora, a quem as letras portuguôsas mereceram belos estudos histó- ricos e literários. Citam-se, entre outroí», os ref»^rentí*s aos cronistas Fr. Bernardo de Brito, Fr. António Brandão, Fr. Francisco Bran- dSo e um sobre os estudos das línguas grega e hebraica em Portu- gal*.

168.-MAN0EL ANTÓNIO eOELHO DA ROCHA (1803-

1850), insigne professor da Faculdade de Diieito da Universidade, a quem se devera os. vííIíosos trabalhos Ensaio sôhvõ a história do governo e da legislaçãa de Portugal e as InstituiçZes de Direito pá- trio, Ghiiado por lúcido critério C )ellio da Roclia ccnsoguiu elaborar uma obra de conjunto que muito h^nra a sua memória, e que é, até agora, na latitude que lhe deu, a única que posôuimos ^,

' Vid. P. E. de Faria e Melo, Memória sobre a vida de D. Fr. A. Lobo, liiboa, 1844.

Obras completas do Cardeal Saraiva, precedidas de uma introdução pelo Marquês de Rezende, publicadas por António Correia Caldeira j Ligboa, 1872-1876.

* Cfr. Marquês de Rezende, Memória histórica. .., Lisboa, 1864.

* Âlgtms dos aeus livres, cou o uh Memórias para a vida da bjai.t Ma- Jdda (Coimbra, 1814), e o Sumário da viJa de D. terriando (Modena, ItíoS), iam bastante raros.

* Para a história do direito eivil sim taml)''tn snb-íflios d(^ valor nio- mórias de JOSÉ ANASTACIO DE FIGUEr-^EDO (iTiyMH]")) i.ui)liiM'l-iá no. (io-s 1/- v li. Oto Mem, de Lit. 'da Acad.» b»'iii como a Mia Syncpse Cronn'ó's. Sim t.m.l.r-m nwito interessantes os trabalhos de 0. ANró.M DA V WWÃ) FRti-iE Dl (j^^-^VALH j {)nMli- ttdoB no Investigador Port. em Iní^L, vm-ix, n."" .IJ;;*), como aiufUí om que JMliia oe motivos que teve D. João n pari rr^*itar oa projt^n m do Cri.-tovdO Colombo; aquele em quo estada o d m Hnd >v -iWo (na :i.* ál''rit^ t. 1.^, n. 1.* ^Mem. da Acad. /?. das Sc.) o outro ajbro Fr. ijjrnaido d»i Ijcuo /na Kd. da Moa, Las^, pabl. pela Acadsxaia).

452 mSTÓBlA DA LITEBATUBA FOBTCGCáSA

~^ ri-r»imj iii . i . j .' ' : r ' t * < «i ^-■^"■«•w»»^^

ELOQUÊNCIA '

169. -FR. ALEXANDRE DO ESPIRITO SANTO PA- LMARES (1748-1611) é o orador mais notável deste século. Os seus discursos (36) andam reunidos em dois vols., que foram publi- cados depoÍ£( da sua morte com o título: Sermões P, Mésire ír^.t, copiados de manuscriptos originaes ^ A colecç&o nSo é completa pois lhe falta o sermão pregado na presença da Rainha D. ]\Iaria i e da eôrte^ em que Fr. Alexandre desassombradamente in- vectivou os vicios das altas classes que o escutavam. Esse discurso valeu-Ihe, diz-se, a deportação para fora da capital.

- Os sermSes acusam* no seu autor muita leitura dos de Vieira.

Citam-se ainda como oradores apreciáveis: RAPHAEL 6LUTEAU que como filólogo tem outros e novos títulos á lembrança do seu no- me «; FR. JOAQUIM DE SANTA CLARA BRANDÃO, de quem se aponta, so- bretudo, o oraçSo fúnebre nas exéquias do Marques de Pombal; FR. PATRÍCIO DA SILVA (175G-lS5i)), bispo de Castelo Branco, depois arce- bispo de Évora e por úUimo patriarca de Lisboa, cujas orações e pastorais lhe deram grande nomeada ; enfim ANTÓNIO JOSÉ DA BOCHA (1767-1831), lente de Teologia da Universidade e muito admirado pelos seus contem ponlneos ptia sua eloquência particular e inconfím- divel de quem publicados apenas dois sermões, hm pregado nas exéquias do bispo-conde i ). Francisco de Lemos, (Coimbra, 1S22), e outro em acçPto de graças pela restauração da monarquia indepen- dente, recitado na capela da Universidade^ em 2G de fevereiro do 1824.

Pelos seus trabalhos apostólicos, virtudes exemplaríssimas e profunda erudição nSlo calaremos o nome de D. FR. CAETANO BRANDÃO If 1805), bispo do -Pará e depois Arcebispo de Braga, cujo centená- rio esta cidade celebrou em de dezembro de 1905 e de quem publicados, postumamente, dois vols. de Pastorais e outras obras,., (Lisboa, 1824).

170. Eplstolografia. No género epistolar podem apontarse

nêote século alguns traballhos, mais valiosos como documentos auxi-

1 Ed. de Lisbo.i, 1.*, l^r)."); e de Coimbra o 2.«, 1856.

* JCoino orador lieixou : Primícias Evangélicas, ou sermoens e panegy- ricos, Lisboa, 1G76. l\iit«í J." ibid., 1GS5; parte 3.». Paris, 1698. Oatra ed. da p. 1.*, Lisboa, ll()l. Scrfn<'-es panegy ricos e doiitrinaes que a diversas fes- tividades e assumptos préqon o P. D, Raphael Bluteau^ part. 1.* e 3.*, Lii- boa, 17o2-«jo, 2 vois.

CAPÍTULO BBOOX.A FBABOASA OU AXGÍDIOA 45$

liares da história e subsidios para o oonhecimento do século, do que propriamente oomo peças literá'rias. Tais sam as cartas de António da Costa, Ribeiro Sanches, Alexandre de Gipmão e do Cavalheiro de OUveira*

171.- ANTÓNIO DA COSTA (1714-1780), do Porto, deai. gnado vulgarmente por Abade Cosia deixou nas Cartas, pubÚcadaB um século depois da sua morte ^, escritas de Roma e Viena de Aos- tria, muitas e interessantes referências para avaliarmos da nossa si- tuação política, moral e religiosa no século xviii.

Em Viena de Áustria foi protegido do Duque de LaíSes, D. JoSo de Bragança, o que não impediu que vivesse em completa inde- pendência de idéas e de carácter. Foi também músico notável e como tal citado pelos especialistas '•

172. -ANTÓNIO NUNES RIBEIRO SANCHES (1699-1783)

bomem mbigne que viveu quase to ia a sua vida no estranjeiro, ji na ISÚBsia, onde foi por largos anos, médico de Catarina n e Director de Hospital do Colégio dos Nobres Militares, em Paris, em Lf^yde, onde estudou três anos, e trabalhando sempre activamente. Além de outras obras temos de Ribeiro Sanches as Cartas sabre a edttcação- da mocidade, pela jJrimeira vez publicadas em Colónia em 1760 '. Â criação do Colégio de Nobres levada a efeito pelo Marquês da Pombal em 1761 foi aconselhada por carta dele, de Paris, de 19 de dezembro de 1759. ^ As Cartas discutem as bases dum^^ educaçSo integral, desde a primária á superior. A secularizaçao do ensino, a utilidade geral do Estado como fim da instruc;çâo, a idéa duna con- tracto entre os povos e o soberano como fundamento da organização politica, a afirmação de que as instituições devem adaptar- se ao grau de desenvolvimento dum povo pareceriam no seu tempo excessivamen- te revolucionárias e ele é, entretanto, seu expositor e apologista. Quan- do propõe para a nobreza a organização da Escola Militar é na idéa

' Cartas curiosas anot. e precedidas de um ensaio biog. por J. de Vas- concelos, Porto, 1879, 1 voJ. Vid. sòbre es^ad C;irtas, Th. Brnpra, Questões de Literatura^ pág. 295 e seg., a ti^M ant-3 pabl. no liol. de BíbL Fort. i, 98 e 1^5.

' Vieira, Dic. de Músicos Portug.. i, 316

' Reproduzidas em 1 ^S J na Rev. da Soe. de Instrucç^o do Porto.

* Cfr. para a bio-^ de Saruih -a a-> Obras de Filinto FJy>io. vol. ix, onde w encontra a tr.id feita pelo poeta do e-studo qn í o sibii Vi ; j i' Xzi-' c^M-evea a respeito dele. O Sr. Prof Hitjardo Jorge pnblioui no opri,.'n'o Cirnas de Ri- beiro Sanches (Lisb a, 1907) dnas (!arta3 in<Sd. diri^nd^s pc^b» fim) o i'^di(;o ao 1 * Teodoro de Almeida a(;o!n[) meando e-<8i y)iibliv*,a^!."o dfí a n ^ ,m í critico- oiográfico. O historiador da mi^di^ini portuajiiA-a, Sr. Prof x' li \ lo Lemo.-i tttadoa com toda a proFundidade a vida de Saaívies —no vo! R'/-, {•-o Sanches. A sua vida e a sua obra, Po- to, 1911. Cfr. tambnn <lo mí^^rr; > ". »f \'oiicia dalguns Mss, de R. S, existentes na Bibl. Nac. d^ \Udrí:: V^^t-. >, 11)1. >

29

■iiiAu* m uiBkAimA roBiDODiai

de criar utna grande Escota de amor da Pátria. 1 1 escreveu éle, nilo coodeta em perder a vida senhir das terras, que as faz íerteÍH, que multip as aldi-iiis, coBtribuindo com o seu e cum as Buai êBtee BubHitOB e ob que hSo de 7Ír desta <miJto. dendo Ci irprar um vebtido de pano de Inglaterrf Cl vilhS. E tea aam os patriotas. . , ,

l73,--FRANeiSeOXAVlERDE OLIVEIRA. deUeboa,(i™-

1783) mui» coiiherifio por Cavalheiro de Oliveira, àlêm das Mem- rias históricas, politicas e literárias iBcntas em francês e publica- da» eui íluia cm Í74'd ('ij voIb.) e docttaR obraa, eacrereu immeroíu cartas que s<iiram' pela primeira vez pm ] 741 ; em 1855 fôrara reedi- tailhB em fêit volw. com o título Cartus familiares, kistóricat, polí- ticas 6 criticas. Sam intevesfianli-BÍuKih algumas deB^ae cartas pt-laí aluí(I'H aos euMumcB do tempo. Nem sempre a diç^o é cnrr.cta, oem o «Biiln spurart'>; mas que vivera em tudas squelus pii^i ifl Que bom liiimnr niun expatriado o p-ra-giiido, a qu-m a Inquir-içflo, forntando lhe o \>n ceaso em 17Õ6, eh pai a queimar em estátua no aufo fip de 20 de setembro de I76I ! '

Fiuaram dele muitos JIsb., cuja perda é muito ['ftra B-^ntir. Gurrett n< lii-ii dum exemplur da Bibl. de Barbosa cem folhas intt-n-alarfB onde, lomo nas íls. marginais êle ia lançando anota^Ses, emeiidí.s, (OmenlárioB, etc. Coflus, romances, trovas antipas e até proí^ctas como ait do Bandarra liHvia-aB com profusão. Garrett apro- veitou imenso c pianHo umas cinco' nta peças. Outro Mes. notarei era o por êle intitulada Oltveiriana, que ae compunha de 27 vols. um dos quais, todo aulógrafo, fazia parte da livraria de Inicfincio.

Algumsb Cartas como aB que ven-am o tema « eloqàSiteía (l, 267), a Projitíiícííi de latim {l, 456, adeante transcrita na ^nto- logia) a justificação da leitura da^ Novelas e Comédias (ll, 198), « educarão feminina (li, 484) e tsnlas maia revelam a variedade

' O prni'es80 guarda-ae na Bibl. de Évnra, Cód. ciin. O qoe lhe ÍM origem foi o Discoiirs patitique au sujet des calamítés presentes arrivées tn Foitugal. .. taiiibôm trad. em portuguéa, onde, diziam os acasadoree, éle ao»- tenti va qite a cansa do tciramoto do I." de nov. de 1755 fura.dar-se culto às im^acna, negava 09 sufrAgios preetidoa às aluías dos mortos, etc. jVeÍa-SE a ló- uulii do i)rotea3< ih. /IreA. //ÍSÍ. Port-, i. n " 11, 381.38-i, e completo oamM- ma ie\ia:i, u, n."' 8 e 9, a81-3:í01. D.i £)/jcurso /ffltótóo M ed facstmilede Joa'|uiu, ilr Aiaiijo, Porto, ISf^i, 8.", V4-v (i:'!»;. Deste pantleto erAuí eouheeidM três ejcii jilavra c u re[irod. Ibi de a*i, fii-aTui.i .isíim da meama maucira, qnass, rara. Com o nuagiama de Felyx Vieyra Comino de Arcos, Oliveira publicou em LoiídriH Rejle.\oens... sabre a tentativa teoógua do P- António -vreiía, opúaualo de } 5 paga. rarÍHsitno. Vid. F. A. Martina de Carvalho, Algumas Ina- tas na minha Livraria, pág. 74. Para a biogr. Cartas, iii, l-im, de Kivara.

CAPÍTULO y SSOOUL FBAHOASA abgídiga 455*

sua eradiçSo e a segurança dos seus fuizos críticos. E todos os oonhecimentoB dos maiores segredos da liigua, que na sua pena tiniia a flexibilidade dos melhores escritores do nosso tempo.

174. ALEXANDRE DE GUSMÃO (16951753) de Santos, província de Paulo, secretário particular de D. JoSo V, individua- lidade superior pela lucidez politica, carácter- probo e íntegro, dei- xou nas suas Cartas menos do que modelos de linguagem, belos dccumentos de crítica e análise aos costumes da ép ca como pode vêr-se nas que diririgiu a D. Luís da Cunha (CoL de inéd.j 41 e 64), a Barbosa Machado (ibid., 61) etc. Para quem antepõe estudos sociológicos e preluxidades linguísticas, diz Camilo, o secretário de D. JoSo V excede António Vieira e D. Francisco Manoel de Melo *. Por morte dê/ste monarca (1750) extinguia-se o cargo de escrivão da paridade, que êle exercia, o que o obrigou a voltar á vida particular, vivendo amda oito anos amargurados p^los desastre;} familiares sobretudo, pois perdeu sua mulher e dois filhop, tendo-lhe também ardido o palácio em que vivia. Foi-lhe ultimamente atribuída a paternidade da Arte de furtar,

175. Trabalhos filológicos do século XVIII. O estudo

da lÍQgua adquire notáv^l df8envolvinient) le.-te períi^do. O Marquês de PombaL a cuja previdente atenção nada escapava^ a 30 de setembro die 1770 fez publicar um decreto em que aíirmava «que a correcção das línguas n^cion^is é dos objectos mais atendíveis para a cultura dos povos civilizados, sendo pelo contrário a barbari- dade das línguas a que manifesta a ignorância drs nações ». Bastaria lembrar para honra deste século e período literário a empresa a que Be abalançm a Academia R^al das Sciencias relativamente á elabo- ração do grande c Dicionário da língua », a que nos referimos.

^ Curso, 11, 162 De Alexandre de Gusmão várias Cartas publicadas no Investigador P. em Inglaterra, Colecção de vários escritos inéditos e literá' rios. Porto, 1841, e Complemento de inéditos, ibid., 184i. Inoc. Dic. BibL, ii 33, VIU, 31- Irmão dêi»* foi o celebrado P.® Bartolomeu Lourt^nço de Gusmão, o inventor dos balões (1865) o Voador ou hassarola, como o ridicularizaram os poetastros do tempo, como Toinás Pinto Br.nniào, antor do Pinto Renascido (1732) e Feiro de Azevedo Tojal, do Foguetário [Kdit. iv^ meus Subsídios, Coimbra, 1904], Qaando em 8 de agosto de liil2 pasd^Mi o 200.° ariivcr.-áno do invento de Gasmão o facto foi comemorado por ui.a lá}jide (|ue se colocou em Lisboa BO Castelo de S. Jorge e pelo projecto duma e:it;itaa a erguer cio Sanfcoa, DO Brasil, onde Gusmão nascera. Estes facto.-* oriííinar.im hrill-autfd Cartas do Prof. Ricardo Jorge, que fcram publicadas no Diário de "NotlciuS, de Lijbua, durante o citado mês de agosto de 1912. Cfr. Anais da BibK Xuc. do RiO de Jan, 1, 190, onde se publicaram poesias satíricari curi< aas e iniportantcá na diflcoaeSo do problema a que se referem.

179.-FRANeiSeO DIAS G0MES(l745-1796,éamMme- rilidor da puresa flcorrncçS') da Ungia m orjlioo e oonanmiido filólogo.

A Ánalyie è comhinaç^e» pkÍto$ophÍca* sSbre a elocução « m- íy2* áe de Miranda, terrtira, Btrnardee, Caminha c CamUti ^ é trabalho de proãoienta análÍBa e lai^o estado. Mas onda a erudi^ filológica de IMbh Oomei h revela com exubsrasoia é nas t Notat * ái suai Obras Poéticas ', que juBtíficam o titulo qae alguns lhe téomdado do melhor oiíríco de século ZTiii.

180— JERÓNIMO SOARES BARBOSA (1737-1816)4 « Tepresentaate do movioieiíta filocólico sensualiata aplicado =om db- cernimpnto á gramitíca portaKUflaa. A tua Gramática fihiáfita marcou>Ibe am legar nntáv»-l nu história da lingaa *.

Fft ainda ANTÓNIO JOSÉ' DOS REIS LOBATO (f 1804?), ANTÓNIO DAS NEVES PEREIRA (f 181ÍÍ) e outros * que deixaram estudos ?ra- matitaÍB apropeitaveie como espiei Imiwti deste último O Exame crítico tõbre qual eeja O ueo prudente doe palavra» d* que «e »r- viram oi nosio» boné escriptorai do» sieidot XV e VVI '.

OBRAS DIVERSAS

181. JurlSprilddnciS. Pelo tbbIo saber de qtie deram provas nos tmbalhos que deixaram, pela inSaância qae exercrram no seu tempo e fama qae alcançaram mT^em ser lembrados os nomr-s dos f uri consultor PASCOAL JOSÉ DE MELLO FREIRE DOS REIS (1738 1798), lente, na Univ^rsidad'", e fundador da história do nosso din-ito civil; MANOEL FERNANDES THOMAZ (1771-1722), figura proe- minente do modc^rno PortuguI, modelo de abnegação patriótica, qna

' ri.-7ol. daa Mem. de Utt. da Aead., pg. 26- 305. Uma análise i noeitia baci^líca dos poMus portugiiPse-- foi feita por outro Bcadáoílco Joaqaini da Foina (]TS:-i- 18 '1). o jadiaioao^ieÍAaiadoida-i.* ed. átt Lusitana Traniformada de F. Alves do Ondule.

* Oèras Poéticas... mandadas publicar pela Acad. R. das Scienciasa èene/lclo da viuva e órfãos do «uctor. Liaboa,, 1793, xivii-4a6 pg. As ntii

fpa. confÈBin a bicgr. do poíW íStnckler. Aa notas tiroam éale livro, díi Innoo. Dic. Bibt.. II. 37yj. DTTi verdadeiro breviário doa homena de gfiato.

* Vid. rnanc. Díc B/W-

* A Arte da Giai 1.' veiiMii 1771; de N.:v ballioa de maior valnr.

' Vid ■■ omisealo do Dr. J. t.eite de Vasoonoeloi, Philologia Porta-

OAPÍTVLO T B800I.A VRAVCÉBA OU ▲«oXdiOÂ 45§

morrea pobríssimo ^ e que aqui merece figurar como autor do Ré* periorto Geral ou índice... das Leis extravagantes de Portugal; MANOEL DE ALMEIDA E SOgSA (1745 1817) quase designado somente pelo nome de Lobão-, da aldeia da B^^íra Alta onde exerceu h advo- cacia, jurisconsulto íamosissimo, autor de numeros>s trabalhos do qae aqui citaremos n^n sobre a Emjiteuee o outro sobre qb Mor^ gados >; MANOEL BORGES CARNEIRO (f 1833) patriota eximio p ra sempre memorado tanto pelo seu amor i liberdade^ cuja vitima ín^ como pelo saber vasto e profundo do direito^ de que s&m provas, entre outroS; os vols., BÔbre o Direito Civil de Portugal (4 vols.) o ^8 Extractos das leis. . . ; e enfim JOSÉ FERREIRA BJR6ES (f 1838) o autor do Código Comercial Português^ e um dos implantadores do regímen liberal em Portugal.

182. Filósofos 6 ScientiStàS. Anstóleles foi sempre o fí^ó- loío mais coment do e explicado em Portugal. Toda a erudiçSlo doa nossos pensadores se escota em subtis esforços de o anali^tar, de o decompor, de o modernizar. Esse trabalho colossal, mas estéril, en- cerra-i<e em centenas de volumes, quase todos inéditos, uns irr^nnediável- mente perdidos; outros guardados nos arquivos e bibliotecas do pais, i espera da. .. consunçSo natural dos tempos. Mas pelos fins do sé- culo XVIII aparece uma plêiada de homens que intransigentemente combate essas idéas, prosurando dar nova orientaçílo ao enoino filo- Bófico. Sao— VER?<EY e THEODORO DE ALMEIDA, qun mmeamos; JA- COB DE CASTRO SARMENTO, de Bragança (1691-1762) defmaor e apo- logista de Bacon, cujas obras pcnHou em traduzir nSo che^^ando^ parpc^, a realizar o seu intento, médico famoso, a qu«*ra Be atâhue grande acçHo na orientação do ensino em Port'ip^»l; JOÃO DE CASTRO, autor da filosofia aristotélica restituta e ilustrada, livro ^m que se empenhou por «adornar a antifr^ Filosofia de Anstót^^les com novos raciocínios e experiências»; ANTÓNIO SOARES BARBOSA (1731-1901), knte de Filosofia na Univercidade, de quem ap nas aqui menciona- reno'* o s^u Tratado elementar de Filosofia Moral^ era tres vols.; e SILVESTRE PINHEIRO FERREIRA (1769 1846), pôlíj^r fo emérito, autor de numerosos trabalhos de dir**ito político e intemHcion*^^, alffu^s deles escritos em francês e inelêi». As suas Prelecções phÚsophiras sam um dos seu trabalhos maia iúcid' b, mais meto ticod e m tis b«m or- ganizados. Perseguido por Napoleão, destingue-se na primeira metade

' Vid. P. A. Marting de Carvalho, Algumas horas na minha Li- vraria, ji, cit., pág. 167-172; Ferrei ra-Deasdado, Educadores Port, cit* IWO, 354.

* Biogr. no Panorama, vii, 382.

■tndaiÀ OA LRBSAtn

do eéc. xiz como umas das figuras mi kctaal. <

Figura primacial é também F 1828), o sirigo de Filinto Eliaio, con taibiinfil da lnquiPÍç3o, o qne cnníPgii na tiara Lusitana clBBsifieru e desc MOURA PORTUGAL é outro ^^énio a qut^r de melhoramento . , . escritos noa prii

bra 18SÍI) deram n'imBÍada universal, .«-w .„.,■..,..„ *.- „.^-. ...,■.., siBgiilarizou-íie p' la profundidade de sabre talento inventivo nas scicn- eias expirimentuin.

183. Políticos- NSo é descabido citar aqui os nome» da- quelas pcraonalidade que ou dentro do paín ou em misB^es difícrix no «BtriiDJeiro, quf-r pHo ppu porte irreprnensivel, seri-dade d^ ena con- duta, ea^ucidade, prudência e penetru^^o no trato dos neE'5i'ioB, quer pela ciia cultura, acubpram honrar e engriíndpcer o noma de Ponu^sl. Além de Alfxendrp df QusinSo, que tentbramos, temos ainda D. lUlS DA CUNHA (f 1709), do connelho dos mor.ircas D. Pedro ]i e D. Jo5o V, e acu >^rnbaixador d»*' cõrtps.de Viens, Hai» e Paria, de quem pesauimoa impresso Testamento politico diriçido a D. Jofé, quando «ioda Príncipe do Briíeil, e R'[um8s Cttrfoí, o que tudo apareceu no Investigador partugutB em Inglaterra.

JOÍÉ DA CUNHA BROCHADO [Ití51-17iiy) e.-creUrío da embaixída em Pariu com o Marquês de Cawaes, D. Lnli Alvares de Castro, e depoih Ervjado em Londres e Madrid, autor de numerosos egcrito» na maior parte inéciiloa, noa quaia rp ret^ela observador pêra pie z a cafoso anotador dos íactoa que podiam convir &a Buae delicadaa fmiQSie. ' ,

MARQUÊS DE POMBAL, SebaatiKo Joaé de Carvalho e Melo, (1609- 1782), Ministro, Enviado ás Cortes de Londres e Viena de Áustria, Primeiro Ministro e Secretário de Estado de el-rei D. Joaé, colabo- rador, a-nrin aiitõr, da Dedurção ehronohiçica e ana>ytica, coopT»- dor do Compendio histórico da Universidade de Coimbra e o pulso de ferro que inspirou, sustentou a. executou os Novoi Eitatulo» dt

~j- ' Vid. Teixeira de VsBconcelioa, Glorias Portuguesas, pg. 1-60: Fef- reira Deoadado, Educadoras Portuguesas, cit.. pg 411. A enun eruçSo das um» obras atin^i.^ wn Innur., Dic. vii, a59-273, nada inence qne 393 niimeic*! Vid* também Mem. e Cartas biogr. noa Anais da Bibl. Nac. do Rio de Jan., n, 1887, 217.

' O Bcii Elogio anda na Collecção dos Dotam, e Mem. da Acad. das Sciências de Lisboa vnl. itii. [mpresBu eia aeparudo não de Brochado s''nio o Auto da Vida de Adão..., 1727, e ai m^srnn se aasitia con) o cripiómio Felii JoBep. da Scledade. Vid. o vol. zii da minha colet-íãu SnsaiDios riBn o Mir» ' A PoKToaraai : Memórias de José da Canha Brtxliado^

CAPÍTULO y XBOOLA. FRASCAfiÁ OU ABOÍDIAA 461

Universidade, figura colossal em volta da qaal o fanatismo dans e o radicalismo doutros ainda não deixou exercer a serena e clarividente luz da crítica hiotórica ^ As suas Cartas sam indispensáveis para o eonhedmento da sua vida e época '.

I

I

1 Iddoc. Dic. BibL, vii, 209-216 fornece subeidios bibliográficos .para o estado do grande menistro de D. Jngé. .Apenas aqai ini içaremos entre os mais reeentcs trabalhos dignos de nota : Latino Coelho, O Marquês de Pombal, gr, id, pop. ilustTsf Lisboa, 1905, 1 vol.; D. Mi^i^uol Sotto- Mayor O Marquês de Pombal, exame e história crítica da sua administração. Porto, 1905, l vol. ; Ze{]Ai6rioo Brandfio, O Marquês de Pombal (Documentos inéditos), Lisboa, 1905, 1 voi. , J. Lúcio de Azevedo, O Marquês de Pombal e a sua Época. Lisboa, 1909, 1 vol. ; Jordão de Freitas, O Marquês de Pombal e o Santo Ofi- cio da Inquisição, Lisboa, 1917.

* Publ. por D. JosS de Noronha, Lisboa 1916. Colecção de valor. En- tre u 50 cartas ali pi^l. 39 inéd. escritas, após a qaeda, do desterro de Pombal.

ANTOLOGIA

SÉCULO XVIII

POESIA

I

GantBta

no roxo Oriente branqueando At prenhes velas da troiana frota Entre as vagas azues do mar dourado Sèbre as asas dos ventos se escondião.

A misérrima Dido Pelot paços reaes vaga ullulando. Cos turvos olhos inoa em vão procura

O fugitivo Eneas- ermas ruas, desertas praças A recente Carthago lhe apresenta: Com medonho fragor na praia nua Fremem de noite as solitárias ondas ;

E nas douradas grimpas

Das cupolas subeibas Pilo nocturnas agoui eiras aves.

Do marmóreo sepulcro

'Attonita imagina Que mil vezes ouvio as frias cinzas Do defunto Sichêo com t>eis vozes, Suspirando chamar : Elisa I Elisa !

D' Orço aos tremendos iNumens

Sacrifícios prepara,

Mas vio esmorecida Em torno dos thuricremos altares Negra escuma ferver n«s ricas taças :

o derramado vinho Em pélagos de sangue converter-se.

Frenética delira;

Pa ilido o rosto lindo, A madeixa subtil desentrançada, ia com tremulo entra sem tino

No ditoso aposenio,

Onde do infido amante

Ouvio enternecida Magoados suspiros, brandas queixas. Alli as cruéis Parcas lhe mostre r9o As iliacas roupas, que pendentes Do thalamo dourado dtscobriam O lustroso pavez, a teucra espada.

464 ahtoiiOOla

Com a convulsa mio súbito arranca

A lamina fulgente da bainha,

E sobre o duro ferro penetrante

Arroja o tenro cristalino peito :

E em borbotões de espuma murmurando

O quente sangue da ferida salta:

De roxas espadanas rociadas

Tremem da sala as dóricas columnas.

Trez vezes tenta esguer-se, Trea vezes desmaiada sôore o leito O corpo revolvendo, ao ceo levanta

Os macerados olhos. Depois attenta na lustrosa malha

Do prófugo Dardanio, Estas ultimas vozes repetia, E os lastimosos lúgubres accentos Pelas áureas abobadas voando Longo tempo depois gemer se ouvirSo:

« Doces despojos

Tam bem logrados

Dos olhos meus.

Em quanto os fados,

Emquanto Deus

O consentíão;

Da triste Dido

A aima acccirae,

D'estes cuidados

Me libertae. »

ft Dido infelice Assas viveu; D'aita Carthago O muro ergueu : Agora nua, de Charonte, A sombra sua Na barca feia. De Flegetonte, A negra veia Sulcando vai.

Corrêa Gaiçio, Aaaemblea ou Partida, Séc. zvi, 3S1,

II

A Assembiéa ou Partida

SCENA I

Braz Carril e Gil Fustote

Braz. Entendes, Gil Fustote, o que te digo? G/7. Entendo, entendo: dizes que partida

Hoje em casa teiás ou assembiéa;

Amigo Braz Carril, estas galhofas»

fiooLo mil 4d5

Jantares e merendas s9o o fructo

Da reloucada teima de fldalga

Com que tua muihet sagaz te enloixa»

Ou te embrulha na rede em que pernetas :

Compaixão, grahde compaizSo me deves.

Partidas f Assembléa ! que mania I

Braz. E chamas tu mania, Gil Fustote, O viver como vive a gente séria Hoje em Lisboa ? grandes e pequenos Todos querem gozar dás sIs delicias, Do suave prazer da companhia.

OU0 Sem esses bons prazeres e delicias

Nossos avós. e nossos pães viveram Fartos, alegres, ricos e contentes.

Braz. Ora que traziam retorcidos Os grizalhos bigodes; estirada A esquálida guedela ; no pescoço Crespas golilhas ; gorra na cabeça ; As calças retalhadas e pantufos ; N80 tragas tu casaca e cabelieira, Nem ates com fivelas os sapatos. Mudam-se os tempos, mudam-se os costumes. Nio vês no frio inverno ao tronco annoso Cair-lhe as murchas c9s, e quando torna A fresca primavera verdejarem Cobertos de mil folhas, novos ramos? Assim as modas s9o. assim os usos : E devemo-nos todos sujeitar- nos A t9o perpetuas leis da natureza. I OU. Amigo, amigo, e^^tás perdido. . . doudo. ..

Braz. Com os olhos abertos.

Oa. Nâo fo invejo.

Nem quero governar a casa alheia : FIca-te em paz com tuas assembléas, Podes sem mim fazer a sinagoga.

BtÊZ. Caro Fustote, espera que não posso. . .

Oti. Eu não canto, nem sou arreburrinho:

Pouco gosto de chá, menos de jogo : Falta não farei: adeus, amigo.

Bntz. Espera, espera, podes divertir- te Ouvindo duas árias, temos doce, £ doce delicado, se quiseres,

OU. Não caio nesse anzol.

Braz. Meu Gil Fustote.

Espera, escuta . . . QiL Dize, que mais queres ?

Braz. Eu queria pedlr-te algum dinheiro

Porque estou sem real: olha cm que dia! Gã. Pois a perpetua lei da natureza,

Que murcha as folhas, c que traz partidas,

Não também dinheiro para o gasto?

Braz. Amigo Gil Fustote, eu pouco peço ;

Dá-me, sequer, seis mil e quatrocentos; Acode-me; e conforme o nosso ajuste, Sete e duzentos lançarás na conta.

I

466

AVMLt^IA POniA

Ga.

Braz. Gil. Braz. Gil.

Seis mil e quatrocentos I Quem m'os dera ! Não me pagam tSo bem os teus foreiros : E a divida vae de foz em fora. Oito mil réis porás.

Isso é perder-te. Qual pcrder-me!

Amigo, eu nio podia ; Mas ve|o o grande aperto. . . Toma . . . escuta Eu cbamo a Deus dos Céus por testemunlui Sem juro te levar, sem interesse De t9o forçosa vcxaçlo remfr-te; E que o pouco que mandas que accrescente A' nossa ccnta, é dado, e nffo por força» Sim de livre vontade. Adeus, amigo. Que vou vestir-me, e logo torno.

(Vae-sc)

SCENA 11

Braz somente

Tenho Para sequilhos, chá, café e cartas, Falta para luzes. Que remédio I Recorro ao coscorrinho da senhora. Que é fonte limpa. D. Uríaca... Urraca.

(Cantamdt) SCENA III

Braz e Urraca

Urraca* Assim se chama, Braz, uma fidalga?

Braz. Perdoa, filha, que hoje nflo me lembro Nem de excellencias, nem de senhorias ; Mandando á via estou a nau ronceira* ^ Com vento escasso, e com estofas aguas.

Urraca. O rato sempre foge para a palha ; E preto velho não aprende íingoa.

Braz. Que vens a dizer nisso ? que me esqueço De etiquetas, mesuras, ceremonias, £ mais ritos e leis da fidalguia, ' Com que queres, Urraca, ser tractada? Ou entendes que meus progenitores Descendem de outro Ad9o, e que nio foram Por seus honrados feitos estimados. Bons vassallos fieis e servidores?

Urraca, Tem beiíi que ver Carris com Azevias, Por linha masculina descendentes De Príncipes, de Reis, Imperadorei» E que até nos colchetes de costados Tem mitras e roquetes I

Braz. Basta, basta l

sioouo xy u

467

(Fazendo-lhe muitas cortezias)

Urraca.

Breu.

Urraca.

Braz.

Urraca.

Braz.

Urraca.

Senhora, exceilentissima senhora»

D. Urraca Azevia ! mas menina, Vamos ao caso : falta para a noite

Dois arráteis de velas. . . Eu nSo posso. . Queres» sei, pregar-me esse calíote* NSo é callote, que pagar prometto. Quando tiverem dentes as gailinhas ; Mas para que conheças que nSo falto Quando é preciso, mandarei buscá-los. Onde mesas nlo ha, nSo ha cadeiras, Colheres, castiçaes, pratos, bandejas. Querer dar assembléas, e partidas, £' nadar sem bexigas.

Mas com lábia Tudo se vence, tudo se consegue ; Porque a gente ordinária agazalhada Com uma tal lhaneza, facilmente Deixa cardar a 18. Anda o dinheiro Pelas mãos de viliOes contra vontade:

E, como galgo em trela, cubiçoso De entrar nas algibeiras de fidalgos. Para brilhar com pompa e luzimento Em ricas mesas, em custosas galas. Ah 1 vossa senhoria, ou excellencia,

E' per<]ida entre nós : que s3 doutrina. Que políticas máximas de estado, Caindo n9o lhe estflo por entre os dedos. Que florente não fora o vasto império Dos fulas Amazonas, se o rrgêra T9o gentil coração, alma t9o 'nobre ! me Julga capaz de mandar gente Tio çáfara e boçal? Negros, Tapuias? Agradeço-te, Braz, o bom conceito. Que tu fazes de mim : bem me conheces. Se fosse outra qualquer dessas que campam Por lettradas, que gostam de ouvir versos.

Sue os repetem» que os fazem (se lh'os fazem) essas...

SCENA IV

Um Gallego com uma teiga, e os mesmos

GoUego. Aqui. senhor, manda meu amo

Senhor Jacob Bilhostre, o que se pede ; Vem oito castiçaes : diz que tesoura E' traste que nSo tem, menos de prata: Que virá a seus pés, como lhe ordena ; Que sempre estimará poder servi-lo.

Braz. Vae-te, dize ao Senhor Jacob Bilhostre, Qne tudo recebi : que fica entregue.

(Ya«-se Gallego)

468 AMTOÍÁMIÂ P0B9IA

SCENA V

Braz b Urraca

Braz. Vejamos que taes s3o. Oh lá! soberbos!

Que secia, minha Urraca! Estás contente? Urraca. Nunca vi castiçaes? Tu imaginas

Que em berço de cortiça embalaram?

Que nasci num curral? Braz. Nlo digo tanto;

Mas olha, sflo magníficos e novos. Urraca, Na verdade sSo bons, mal empregados

Em casa« onde bastava uma candda;

E talvez que nem essa ella teria,

Quando cebo vendia aos Romulares

Na fétida baiuca. . . Mas o tempo. . .

Coriêa Garção, ibid,, Sc« i a v, 339-350.

Teatro Novo

SCENA VI

Aprígio Faies, Aldonsa e Branca (filhas de Aprí(io), Arthar Bi^es (Ni* ndro), Jofre Gavmo (Músico e Mestre de Aldonsa), Inigo (Actor), Gil Leinel (Poeta), Braz (Licenciado), Mousienr Arnaldo (Architecto).

Aprigio. Sentemo-nos, Senhores:

Que grave tribunal! Que magestosol Mal sabe o mundo agora, que pendente Deste conclave está o seu destino. Oh ! quanto, amada pátria, quanto deves A teu bom cidad9o Aprigio Fafes, Suando, e tressuando por salvar-te Do pélago profundo da ignorância. Onde pobre jazias, atolada Entre péssimos Dramas corriqueiros I Deste cano real hoje te saco, Qual saca o Candeeiro um prego torto D'entre os chichelos velhos da enxurrada.

Gil. Senhor Aprigio Fafes, isto é tarde,

E eu tenho que fazer: vamos ao poncto.

Aprigio, Sim, Senhor, sim, Senhor: o caso é este: E bem o sabeis vós ha quanto tempo Que eu desejo fundar um bom Theatro: Agora que a Fortuna me depara Feliz occasiSo de executai- o Com o favor aili de meu Compadre, E' preciso ajunctar a sarabanda, Repartir os papeis, escolher obra. As vistas idear, e celebrarmos Com solem ne escriptura este contracto.

•Éoobo zviii 468

Senhor Aprigio Faies, o Theatro

Depende, mais que tudo, do Poeta:

Que fazem bastidores, e instrumentos

Sem dramas regulares ? Uma boa»

E peifríita tragedia, inda despida

Da magnifica pompa do apparato.

Tem mais graça, e mais força, q'um mán Dian^

No ( heatro de Rheggio, ou de Veneza»

Com suberbas tramóias recitado. Jcfrem Amigo Gil Leinel, ninguém ce nega

O constante poder da poesia :

Mas quem ha de soffrer Catão, ou Dido

Do grande Mecastasio, repetido (282)

Entre velhas cortinas, sem orchestra ? Aprigio. Nada, nada. Senhores; desse modo

Aqui nos amanhece: todos juictos

NSo podemos fallar: irá votando

Por turno cada qual, quando ihe toque.

Continua, meu Gil; dize o que entendes. <jií. Errado vae, quem julga que o Theatro

ISó para drvertir o povo rude. Dos antgos Poetas foi achado, f Com mais alto designio, Athenas, Roma.

E outras Cidades mil. o receberam : Pôde nelle ensinar-se á mocidade Guardar as sa netas leis. a devida A* cara Pátria, ao Prindpe. aos amigos: Pode nelle ensinar-se quanto é feio O pallido sttmblanie da Cubica ; Da Avareza infeliz ; da triste Inveja : Mas para recolher tSo grande fructo E' necessário, Aprigio, que o Poeta Em sisuda dicçSo, em phrase nobre. Com sonoroso verso torneado Exponha ao povo fabulas sublimes. Tragedias, ou Comedias regulares. Daqui venho a tirar, que no Tneatro N9o devemos soffrer Drama imperfeito» Cuja graça consiste na doçura D*effe minada musica moderna. Na remendada phraze de mil vozes Barbara», ou guindadas, ou ras eiras. Long^e, longe de nós esta mania : Restauremos o português. Theatro, Desaggravando a caNta língua nossa Dos aleWes que sem rasSo lhe assacam. Aprigio, Viva o Doutor Leinel, Doutor das gentes:

Quem me dera q'o bom Goldoni ouvisse (283) Como ronca um Poeta de Lisboa! Agora falia Braz Licenciado. Braz. Eu que posso dizer? Que me parece

Muito mal tudo quanto aqui se disse. Que proveito tiramos em metter-nos No principio em camisa de onze varas ? Tragedia é cou«a que ninçjuem atura: Quem ao Theatro vem, vem divertir-se»

30

470 AHTOLOOIA FOBBU

Quer rir, e nSo chorar; vae o tempo De lagrimas comprar ás Carpideiras : Uèo faltam boas Operas, Comedias Em Francez, Italiano, em outras línguas. Que pôde traduzir qualquer pessoa. Com enredo mais cómico; que o povo, se agrada de lances sobre lances; Quem isto nfto fizer, jáinais espere Que o povo diga bravo, e palmadas. £' o voto que dou.

Aprigio. Optimamente.

Arnaldo, agora vota.

Arnaldo. Meus Senhores,

Venho ajustar o preço do Ttieatro ; Com Dramas nSo me metto: os bastidores E' o que me toca. Poiém digo, Que regular Tragedia nas Italias Muito ha que se nio usa ; que a mudança De vistas sobre vistas; as tramóias, Mares, incêndios, drsgos, e batalhas, Sáo cousas de que o povo se namora. eu fiz em Theatro trovoadas. Com raios e relâmpagos tão próprios. Que as damas desmaiavam : era um gosto Ver a gente fugir dos camarotes Espantada, biadar misericórdia.

Aldonsa. Negro gosto ! Quem pôde dWertir-se Co'a pavorosa scena de um flagello?

Branca. Bom Arcnitecto ! Magico patcce.

Aprigio. Calae-vos filhas. Vote agora Inigo.

Inigo, Muito dizer podia, pois que tenno Experiência bastante de Theatros ; Actor de profissão; isto me basta: £ também. Senhor Gil, o louio Apollo, De commigo tractar nio se envergonha : Mas por não demorar a conferencia. Em branco assignarei ; estou por tudo.

Arthur. O cSo é Mouro.

Aprigio. Inigo, desabafa ;

Dize quanto souberes : falia, falia : E's a columna do Theatro novo.

Inigo. Pois devo fallar, digo, Senhores,

Que o Theatro sem dança pouco vale ; Muito menos sem musica. Podia Quem a gloria quizesse de primeiro. Pôr no Tneatro as Operas cantadas Na língua portuguesa : eu aqui trago Uma por mim composta neste gosto* E' a perda de Tróia : vê-se Eneas Sair co'o Pae ás costas : vae Ascanio Com os caros Penates abraçado : Arde a cidade: caem as altas tcrres: Embarca a gente Phrygia : muitos annos Por inhospito mar andam vagando, Até que surgem no distante La cio. Onde Eneas a Turno tira a vida,

BiODLO XTIU

471

Aprigio. Inigo.

Branca, Aprigio.

Jofre.

Aprigio. Branca.

Aprigio. Arthar.

E casa com Lavinia. (284)

Bravo! Bravo I Tem vários duos, árias, cavatinas : Eu cuido que desbanco a Metastasio. Alvora sigo- me eu.

Espera. Branca. Perdda, amigo Jofre, que a memoria Principia a faltar-me : preterido Por engano ficaste : e bi m podias Pedir a tua vez. Perdoa, e falia. Em tal nfto reparei : eu sou sincero Digo o que entendo; e cuido q'o Theatro Sem musica, e sem dança, nada vale: Ha cousa mais Jormosa que a ligeira Calada pantomima, cujos gestos, Sem auxilio das vozes, representam Recônditas paixões, mudes suspiros, Que entendem o coração, ouvem os olhos? Que melhor espectáculo, que os ieves Orandes saltos mottaes? que vêr nos ares Bater c'08 calcanhares oito vezes, ^Torcer o corpo, e revirar os braços ! Mas nunca votarei em que façamos Opera em Portuguez, toda cantada : Para tanto nSo e a lingua nossa : Algum&s árias, duos, recitados Se podem tolerar; o mais em prosa: Para o Theatro nós npo temos versos. Falias como um Catão. Que dizes Branca? Eu sou de parecer, que se façam As p^rtuguezas Operas impressas; Encantos de Medéa; Precipícios Le Phaetonte; Alecrim e Mangerona: (285) Em outras nunca achei galantaria. Esse voto era digno de mais annos. A ti, amigo Arthur, que te parece ? Que podem parecer-me taes loucuras? Estou tonto de ouvir estes Senhores I Parece-me -que estou entre Paulistas. Que, arrotando Congonha, me aturdiam, (286) Co'à fabulosa illustre descendência De seus claros Avós, que de foram Em Jaleco, e ceroulas Mas pergunto: As oomedias de Calderon, Mureto. Candâmo e Salazar, isso não presta? (287) Tem bichos, meus Senhores? Tanta gente? Imperadofres, Reis, Infantes, Duqius, Os Condes, e os Marquezes, q'as ouviam Com gosto e com prazer, eram uns asnos ? estes, meus Senhores, tem juÍ7.o! Que Colombos e Gamas denodados, Para achar novos climas, novos ni^^es f Pois digo- vos, que se a minhit Aldonsa Fdr de contrario voto o meu dinheiro Servirá para as barbaras ideias, De que prenhes trazeis essas cabeças.

Mil

Adamastor

Adamastor nucl I de teus furores Quantas vezes me lembro horioiisad O' monstro I quantas vezes tens ttag Do lobeibo Oriente os domadores I

Parece-me, que entregue a vis trai Estou vendo Sepúlveda afamado Co'a spoia c'o* filhinhos abraçado. Qual Ma "rte com Vénus e os Amoi

Pa tece- me que vejo o triste esposa Perdida tenta prole e a belía dami A's garras dos leOes correi furioso.

Bem te vlnffaste em nós do afoito Pelos nossns dessstrts es Famoso:

Maldllo Adamastorl maldttft famal

Bocafe, ibib.

IX

Epi

igramas

0 PAE ENFERMO E O DOUTOR

cc

Um velho caiu na cama;

HoiT

Tinha um filho esculapino.

Tendo

Que para adivinbaçO:a

P.;dia.

Campava de ttr bom Uno

Um ve

O puiso psieriio apalpa,

>Na<

E receitai dfpuís vai:

Velho .

Dlz-lhe 0 veliio, suspirando:

Não ha

Repara n^f. ^ ou teu pai, ■>

Meso

A MOI.Í-ISTIA E A HECEITA

Pata curar febres podres

M(

Um doctoi foi chamai.

Estem

Que, feitas as ciremonias,

Surge 1

Começou a icceiíar.

E diz ú

A cada pennada sua

Ao teu

O enfermo iiram-ava um ai !

.NSo se assuste, (diz (i^ileno)

Que inda ri'csta se não vai »

■Ah senhor! (torna 0 uoilado.

Umi

Como Oiicm sfu f:ido «-.pieiia;

Decert

Da moléstia não me assusto.

Ante ui

Assusio-mc da receita.

Todo ai

«NOLO XflU

481

«Pan punir este indigno, Este vil, tomira um raio. » Aoode o outro: «Ha um meio Muito mais íadl ; cural-o. »

o RÉCIPE

Pos^e medico eminente Em voz alta a receitar.

«Recipe, (diz)... de repente Grita da cama o doente : —«Basta, que mais é matar.»

o ADEUS DO DOUTOR

Um medico receitou : Sublto o recipe veio. Do qual no bucho do enfermo Logo embutio copo e meio,

« Adeus até á manhan » (Diz o fofo professor) Responde o doente: « Adeus Para sempre, meu doctor. »

o LETRADO

Inda novel demandista Um letrado consultou, Qut, depois de cem perguntas, Tal resposta lhe tornou : IC— «tm Cuiacios, em Menochios, Em Pegas e Ordena ç&o. Em Reinicolas e Estranhos Tem carradas de razão.»

«Sim, sim, per toda essa estante Tem razio, razão de mais.

«Ah senhor ! (o homem replica) Tê-la-hei nos tribunaes?>

TÍTULO PARA UNS AFORISMOS

Certo Averroes quis no prelo

Ver seus aphorismos junctos.

Pos-lhes o editor singelo :

Arte de fazer defunctos.

*

A CURA

Lavrou chiba nte receita Um doctor com todo o esmero. Era para certa moça. Que ficou san como um pêro Tam cedo I é milagre (assenta A mfle, que de goste chora )

« Minha m9e não é milagre : Deitei o remédio fora. »

ALIANÇA DE DUAS ALTAS POTENCIAS

Arrumado ás duas portas Pingue boticário estava, E brandamente acenou A um doctor, que passava.

Mal que chega o bom Galeno, Diz o outro em ar jucundo : « Unamo-nos, meu doctor, E demos cabo do mundo. »

Id. Obroê, ui, ondç voem compendiadas os Kpigr,^ de i a ca, pá£. 215 a 256.

O homtm no estado insoclal

Estado insocial, embora acclame

Teus falsos bens, quimérica igualdade,

O sábio hypocondriaco eloquente

Que a sciencia combate, e a vida emprega

Das artes todas no profundo estudo,

Que os homens aborrece, e os homens busca.

Que adora a solidão, martyr da glória,

E TimSo so quer ser, sendo Aristippo.

Se elle comigo pela marge' immensa

Do Amazonas medonho os homens vira

Humanos na figura, em tracto feras,

Nus sem cultura, bárbaros sem pátria,

Entio chamara á liberdade sua

Mais penosa que o cárcere e que os ferros,

E; so menos cruel que o jugo injusto,

Que esses, que elle illustrou, cobardes soffrem,

4d2 ÁjnmMUA roasiA

Pelos vastos sertões sem lares gyrSo, Qual onça ínsociAl, so pasto buscam, •Nos lacerados membros palpitantes De seus mesmos Jgoaes (e, de assustada Doce mãe natureza os oíbos tapa) A crua fome, e a gula ávida cevam. N'elles é morta a luz do intendi mento ; Contra a injúria do ar lhe ensina apenas, Qual frada ás feras machinal instincto, A mal vestir enregelados membros De hirsutas pelles de animaes que matSo Gente errante, infeliz* nflo sente apego A' terra em que nasceu ; repousa e dorme ; Onde a seps olhos lhe fenece o dia, Lança-se em terra, a languida cabeça ^ A um tronco, quasi um tronco, encosta e dorme. Se o sol surgindo as pálpebras lhe toca. Frouxo, indolente o bárbaro desperta. Ora um tigre veloz o despedaça, Ora co'a hervada frecha vara um tigre ; Co'a mosqueda pelle os membros cobre, Se o frio agudo os membros lhe retalha. Sente o calor ? indifferente a deixa ; N9o se ouve um pranto, Ugrimas nSo correm, (Feudo que á morte a natureza paga) Se no bocejo extremo a vida foge. O cadáver esquálido na terra Jaz, ou no ventre da tçedonha Hyena ; Nenhuma pia mSo seus olhos fecha. Nenhuma boca os últimos suspiros Lhe toma* e lhe conserva : assim nos bosqties Viveu per muitos séculos o homem ; Assim vive o Tapuia errante agora Pelos sertões da America opulenta : Glle o primeiro annel d'inda não finda, Para o perfeito, progressão dos Entes ; Tem limites no bruto o instincto, e nunca Dos homens a razão pára n'um ponto 1

J. A. de Macedo, Meditação, ed. 1818, C. |, pig. 24.

XI

A creaçSo .

Quam longe estou úb terra ! Eis se esvaece Engolphada no tfr... Enthusiasmo, Pára detem-te aqui. . . admira um pouco Ceo que outro ceo circunda, e todos cheios De immensa luz, revérbero brilhante. Que outros soes fulgentisslmos derramlo. Inda me alongo mais ; rápido vOo Mais que a fuga do rápido cometa. Me levo pelos ceos onde não chega. Nem fugindo per séculos, um raio

EBOULO XVUl

48a

Do fulgurante sol. Do espaço eu tooo'

A extremidade incógnita aos humanos,

Onde a luz desfallece, onde se perde

De orgulhosos philosophos o estudo.

A congerle dos ceos, dos soes, do todo,

Um ponto se me antolha e brilha apenas ;

Qual aeronauta ve d'alêm das nuvens

Assomar no horizonte a aigentea lua

Toda in volta no eclipse, em veo sombrio.

O que espaço não é, nem é matéria

Além do immenso circulo dos mundos,

E' throno, onde se assenta eterna causa.

Eis o Deus que a Moysés inspira, ensina,

Auctor da natureza, auctor de tudo ;

Aos degraus de seu thtono a íe se eleva,

Vai da razflo seguida humilde e muda ;

Pbilosophia é so dócil escrava

Da luz que revelada iilustra os homens.

Sobre um throno immottal preside, existe

O que existe per si : seu nome soa ;

Ergue-se Newton, curva-se a seu nome.

Sem Deus em quem repouse o homem se perde.

A creaçSo mysterio impenetrável

Ficará para sempre á mente humana.

SSo confusas hypotheses, problemas

Tudo o que Roma disse, e ouvira Athenas.

Sobre as ruínas das sciencias todas

Alça a voz um propneta, e explica tudo :

(Oráculo immortal minh'alma abastas I )

«Creou Deus no principio os ceos e a terra.»

Mortaes, eis a verdade : o miis . . . delirio. I

l J. A. ét Macedo, ibidem.

XII '

Ode

Irritado da dôr, de vêr zombada

Por insultos pichótes, A Ungoa de Camões sonora e pura.

Que nos deu tanto nome ; A phrase nobre e tersa com que a Castro

Derramava seu pranto ; Chorando o fado dos alados cysnes,

Que do Parnaso as sendas Nos calca rik) com t&o gentil despejo,

E com tanta opulência De eloquente riqueza nos fizérão

Herdeiros sumptuosos, Fui sentar- me cuidoso, magoado

Nas ribeiras do Tejo : E, a mSo na face, descabida a frente,

' Lançava ao longe a vibta Pelas aguas do rio caudaloso.

Outrora tam cantadas,

484 ÁaroLoeiA vomia

Tam famosas na Europa, e no Oriente»

Quem nos viu n' ou trás eras Tágides nobres, celebres nos hymnos»

Levantar triumphantes Nas claras ondas o sobt:rbo rosto,

Entre as do Alpeu, do Mindo, Na Itália e Greda tam gabadas nymphas ?

Hoje, de deslembradas, N&o atreveis erguer-vos, pôr os olhos

Nos cantores de Elysia ... N'isto. . . sinto um rumor. . . turl)8o-8e as ondas;

Borbúltão, formSo cercos. Que v9o, uns após ouiros. estendendo-se ;

£ entre miúda espuma, Que alveja peias lisas verdes tranças,

Diviso o lindo coro Das giaciosis nymphas, escoltadas

L)e triíòes escamosos G>m a forcdila cauda o mar varrendo.

No meio um sol)erano AndSo de branca barba ondeada e longa,

Que branda lhe desda Pela ceruleca toga s uri -brilhante.

De Nerea em Ncrea Os veide-mares olhes perpassando,

Cuiva rt:ai aceno A' mais bei ia das nymphas, que responda

A meus vivos queixumes. Callou-se o vento, e as ondas alizárSo-se,

Como em luzente espelho Tritões espadaúdos retratárSo,

E o Ttjo e suas nymphas, EntSo tm mim fitando a clara dea

O angélico semblante : <Filinto, com razSo, mui Justas queixas

Apaixonado espalhas Pelas nossas ribeiras saudosas,

Depois que a morte crua Segou, com fouce avara, aquelles grandes

P!sp'riios exceilentes Camões subi mo, altiloquo Ferreira,

t (|UHntos a era augusta Criou com leite são, clara doutrina,

QuL a pátria acreditárflo E nume tuto ar, benigo Phebo,

De arcendiir não cessriva Divino ío^o nos 'ngenhos Lusos

Mosi and()-'hís r'roado De illustTs ramas o desejo de honra

Cianna^^a por bons v^tsos. Este ar-tr pndo ainda c'o» furores

Da bf 11 irosa turba Que ir^mc-tal acuccin o Vate ousado,

Qmn lo lançííva o brado Que por e^sc Universo se estendia.

Mostrando os márcs da Asla

lÉopLO xTin 49S

Trilhados das aiòatas proas Lnsis,

E os feitos memorandos Que inda rcho íazem nos auritos montes.

Despe rtâo Lisoff ridos Ardentes peitos de renome eterno >.. A treparem com anda Pela scabrosa encosta do alto Pindo» » E n'eiie cortar louros. Inda ha pouco Garção, cipino, Alfeno

Per Apoilo animados, E nos nossos reg ços instruídos.

As lyras receberão Dos ^cantores mais altos do Parnaso,

E sÔ9re HS doutas cordas Ja renovarão as canções Dirceas ;

E as musas, que corridas Da rançosa académica cohortCf

Ftigifão enojadas ; Que, de mil semi-vates aprosados,

Escuros e espinhosos, Desdenharão influir os anagramas,

Acrósticos e enigmas, Ou gothlcos, freiraticos conceitos ;

Ja canoras do Pindo Vinháo descendo a bafejar os hymnos

Dos viços alumnos. Nos gregos prados, nas latinas veigas

Medrados coa cultura Do apuiado saber, ferrenho estudo.. ••

Eis gue de negros corvos Um bando iníquo em torno de^les grasna

Invetoso, molesto, Moteja a língua de áspera, e de antiga ;

De sentido enleiado ; Acha bronco o Camões, charro o Ferreira ;

Camões ! a nossa gloria I Por quem somos so lidds e estudadas

Nas terras mais remotas ! Erguem no povo rudo alto rufdo

Contra os novos Orpheus. E assim como as Bistónides raivosas

O canto lhe afogarão Quando no Hebro a dulcisona cabeça

Arrojarão dementts : Taes contra os m^us alumnos, essas gralhas

Os gritos dcsentoão : Delias te queixa, neilas ceva as iras ;

Que as fl^xas do ridículo Horácio e Juveiial te afião promptas :

Que nâo temos as nymphas Mais armas que as do verso acicalado

Que rasga o arnago d'alma. Não somos Jove atirador-de-raios.

Nem Phebo arci-tenente, Que contra esses, que a pura veia turva»

Da Pegasea Aganippe,

31

486 AHTOIíOOU P0B81A

E ás estradas do Pindo o passo impedem

Aos mimosos das musas, Disparemos bomlMitdadas. Mas ta podes,

Novo Boiieau severo. Cortar per Scuderls, Cotins, Ea Serres»

Descoser seus escriptos ; Ou novo Lobo, de engiaçado pico,

Pô-los tam desprezíveis. Que nem os olhos levantar se atrevSo

Para que os sons melifluos Andosos bebem na agua de Parnaso

Alta esperança Lusa. i

Francisco Manoel do Nascimento, Obras , ed. 1817, Í, S40.

XÍII "^

Galicismo

Abra-se a antiga veneranda fonte Dos genuínos clássico-, e soltero-se As correntes da antiga linguagem, Rpmpam-!»e as minas gregas e latinas ;

gão cesso de o dizer, porque é urgente) vemcs a facúndia que abasteça Nossa prosa eloquente e culto verso. Sacudamos das falias, dos escriptos Toda a p^ rase estrangeira, e frandulagem Dessa tinba, que comlchona afeia O gesto airoso do idioma luso. ' ->

Quero d^r que em francês hajam formosas Expressões curtas, phràzes elegantes ; Mas Índoles diferentes tem as línguas ; Nem ioda a phraze a toda a língua ajusta. Ponde um bello nariz alvo de neve, ^ N'uma formosa cara trigueirinha; (Trigueiras há, que ás louras se avantajam) O nariz alvo no moreno rosto, \

Tanto nSo é belleza, que é defeito.

Se por força de fado, ou por penúria Forçados somos a espremer dos livros Franceses o aIitr>ento das sciencias ; Se como na palestra err poeirada Vamos luctar contra a ignorância bruta No gymnasio francês, tomemos o uso Dos antigos athletas, que ao sahirem Do pugilato on férvida carreira, A pceira dcs fatos sacudiam, E ban^'ando-se em liquidas correntes Do Illiaso (que, alli perto, com sereno Passeio, alegra a margens estudiosas) Os corpos asseiavam diligentes.

sácuLo XVIU

487

Assim vi sempre o litterato Erilo, ~ Depois de revolver francês volume, Desempoar-ae da estrangeira phraze Co espanador de Banos ou Vieira.

F. Manoel do Nascimento, ibid,

XIV

A Função

SÁTIRA

Musa, basta de rimar;. Ja fazes esforços v9os. Vai a Lyra pendurar ; Nio sabem trémulas mfios Com as cordas acertar ;

a velhice pesada Te encheu de rugas a testa ; Ja co'a dura m9o gelada Te pos a marca funesta Na madeixa branqueada ;

Ten Estro, falto de meios, Ja furta mais do que imita ; Vas dando airosos passeios, E todo o Povo te grita : •Larga os v^tidos alheios » ;

Toa vaidade faz ; Cinges cascos enrugados, Cheios de caruncho e pó, Com velhos lucros furtados Do sepulchro de Boileau :

Leste por teu mal um dia Este livro endiabrado ; Tal se pos a phantasta, Qne o corpo velho e cansado Ioda te pede folia :

Depois que vistosa Quinta Te deu brilhante funçflo. Tu de discórdias faminta. Vens com damnad^ tenção Pôr-me ao papel e tinta ;

Bem me lembra o sitio aiáeno ; Quanto vi tenho presente ; Mas a ti é qne eu condemno, Que na acçflo mais innocente Vas sempre deitar veneno :

Com felpudos chapelinhos, Que estofada pluma ornava. Per aprazíveis caminhos, Formoso Esquadrão montava Ajaezados burrinhos :

Marcha a Tropa ; Amor a guia ; Tu que a mesma estrada trilhas, Mostra-me em todo esse dia Cousas, que não fossem filhas Da innocencia, e da alegria?

Dizes que pobres Donzellas Vão os olhos enganando Com postiças t ancas bellas, E chilas de contrabando, Que ainda são das Adellas,

E que em quanto em taes desmanchos A Irmã, com titulos falsos. Faz a glória d'estes ranchos ; Corre o Irmão, co'os pés descalços. Vendendo em Lisboa ganchos :

Dizes que um, o qual eu calo. Assentando que as Senhoras Querem todas namorá-lo, Cravando a furto as esporas, Mettia em obra o cavallo :

Que outro, falto de expressão. Traficar de longe quis; E'com o lenço na mão. Pagava o pobre nariz Os crimes do coração :

Mas quanto atéqui exprimes, Por mais que as cores lhes mudes. Por mais que a teu geito o rimes Creio que não sâo virtudes. Porém também não são crimes 1

AKTOtovu rt

No largo pateo apeadoí, Que alva cal em tAino pinta, Dizes que de braçoi dados Fomos passear na Quinta, Uns dos outros separados:

Piisa

Perdi<

Gcltoi

Onde estão, Portugal VeUw,

Onde estio os tens costomat

N. Tolutino, Obra* Complttiu, tá, 1861, pít. :

Senhora também um dia

Euo tn

Entrarei co'a frente erguida;

Mas a ten

Nlo serçl na vosaa mesa

Traz escoí

Dependente toda a vida.

Maior, qu

Nem lempie abatido pejo

Com un

Dir* nesta cara feia,

0 atralçoi

Qusnto doe a um p^ito altivo

Vem a m(

Matar fome tm casa alheia.

Porque m

Airoso, gordo perii

Curse t

E meu soberbo presente;

A mtnha <

Traz Inda ss pennas molhadas

56bre a m

Co pranto da minha gente;

Seja esta i

No santo dia esperavam.

De oiíir,

Quebrando antigo jejum.

Trocae em

Cravar ineuperlos dentes

E seta um

M'este primeiro penim ;

A phenU

A russa magra Josefa.

Na ondi

Ergueu queUume sentido ;

~ Coa a bei

Custou-lhe mais esia ausenda.

Seus filos,

Que a do detuncco marido.

De carne :

0 louro, alvar galleguinho

Conscnl

Chegou aos orhos seu irapo;

Ao prodlg

Tinha visias sobre a carne,

E que der

E muitas mais sobre o papo.

A rrOr pa;

Seu almoço requerendo,

Na dext

Em luzindo a madrugada.

O seu puf

Na esquerda, grossa fdtia

Em tenrai

D'amb3s as piíiies barrada :

Para si o :

Quando Ibe mandei irazer-vos

Quanto

O bom companheiro seu.

Meu voto

Pcdlndo-me coxos meses,

Porque ha

Me disse «que o trouxesse eu."

Multo me

N. Tolenlino, ihid., pií, 188.

•iouL» xvm 489'

XVI

Soneto

CAVALO À MARGEM \

Vai, mísero cavallo lazarento. Pastar longas campinas Uv^mente ; Nio pereas tempo, em quanto t'o consente De magros cSes faminto a)nnctamento ;

Esta sella, teu unlco ornamento, Para signal de minha dor vehemente, De torto prego ficará pendente. Despojo inútil do inconstante vento :

Morre em paz ; que em havendo algum dinheiro Hei de mandar, em honra de teu nome, Abrir em negra pedra este letreiro :

Aqui piedoso entulho os ossos come

Do mais fiei, mais rápido sendeiro.

Que fora eterno a não morrer de fome,

N. TolentinOy ibid,

XVII

L Indoya

Nflo faltava

Para se dar principio á estranha festa Mais queLiridoya. Ha muito lhe preparam Todas de brancas pennas revestidas. Festões de flores as gentis donzells^s. Cansados de esperar, ao seu retiro V9o muitos impacientes a buscá-la. Estes da crespa Tanajura aprendem Que entrara no jardim triste e chorosa. Sem consentir que alguém a acompanhasse. Um frio susto corre pelas veias ^ De Caitutú, que deixa os seus no campo ; £ a irmi per entre as sombras do arvoredo Busca co*a vista, e treme de encontrá-la. Entram emflm na mais remota e interna Parte de antigo bosque, escuro e negro. Onde ao de uma lapa cavernosa Cobre uma rouca fonte, que murmura. Curva latada de jasmins e rosas. Este logar delicioso e triste. Cansada de viver, tinha escolhido Para morrer a misera Lindoya.

489 AVfOUMILá «OMIA

La reclinada como q»e dormia Na branda relva e nas mimosas flores; Tinha a face na mão, e a mSo no tronco De um fúnebre cypreste, que espalhava Melancólica sombra. Mais de perto, Descobrem que se enrola no seu corpo Verde serpente, e lhe passeia e cinge Pescoço e braços ; e lhe lambe o seio. Fogem de a ver assim sobresaltados, E param cheios de temor 90 longe; £ nem se atrevem de chamá-la e temem Que desperte assustada e irrite o monstro, E fu)a e apresse no fugir a morte, Porém o destro Caitutú, que treme Do perigo da irmS,'sem mais demora Dobrou as pontas do arco, e quis três vezes Soltar o tiro, e vacillcu três vezes Entre a ira e o temor. Emflm sacode O arco, e faz voar a aguda setta, Que toca o peito de Ltndoya, e fere A serpente na testa ; e a boca e os dentes Deixou cravados no vizinho tronco. Açouta o campo co'a ligeira cauda O irado monstro, e em tortuosos giros Se enrosca no cypreste e verte envolto Em negro sangue o lívido veneno.

Leva nos braços a infeliz Llndoya O desgraçado irmSo, que ao despertá-la G)nhece com que dor I —no frio rosto Os signacs do veneno, e ferido Pelo dente subtil e brando peito. Os olhos, em que amor reinava um dia, Cheios de morte, e muda aquèlla língua. Que ao surdo vento e aos echos tantis vezes Contou a larga historia de seus males. Nos olhos Caitutú não soffre o pranto, E rompe em profundíssimos suspiros, Lendo na testa da ftonteira gruta De sua m9o trémula gravado O alheio crime e a voluntária morte. . . Inda conserva o pallido semblante Um n9o sei quê de magoado e triste Que os corações mais duros enternece : Tanto era bella no seu rosto a morte ! J. Basílio da Gama, Uraguay, ed. 1845, c. lii, pá^. 51.

XVIII

Moôma

E' fama então que a multidJo formosa Das damas que Diogo pertendiam, Vendo avançar-se a nau na. via undosa, £ que a esperança de o alcançar perdiam ;

téoaiá) xfin 491

Entre as ondas com ância fnrlota Nadando, o esposo pelo mar seguiam, E nem tanta agua. que fluctua vaga, O ardor que o peito tem banhado, sp>S**

Copiosa multIdSo da nau francesa

Corre a ver o espectáculo assombrada,

E Ignorando a occasi9o da estranha empreza

Pasma. da turba feminil que nada :

Uma que ás mais precede em gentileza

NSo vinha menos beila do que irada ;

Era Moèma que de inveja geme

£ ]a vizinha a nau, se apega ao leme*

«Bárbaro (a beiia diz) tigre e nlo homem!... Porém o tigre, por crucl que brame, Acha forças, amor, que emfim o domem, So a tinio domou por mais que eu te ame* Fúrias, raios, coriscos que o ar conitomem Como nSo confiimis aquelle infame? Mas pagar tanto amor como tédio e asco. . . Ah que o coiisco.es tu. . . raio. . . penhasco!

Bem puderas cruel ter sido esquivo Quando eu a fe rendia ao teu en^^ano, NSo me offendêras a escutar-me altivo, Que é favor, dado a tempo, um desengano: Porém dtixando o coração captivo Com fazer-te a meus rogos sempre humano Fugiste-me traidor, e d 'esta sorte Paga meu fino amor tam crua morte?

Tam dura ingratidllo menos sentira

E esse fado cruel doce me fora.

Se a meu despeito triumphar nSo vira

Fssa indigna, es^a infame, essa traidora :

Por serva, por escrava te seguira

Se não temôra de chamar senhora

A vil Paragupçú que, stm que o creia.

Sobre ser-me inferior, é nectcia e feia.

Emfim tens corcçlo de ver-me affiicta

Pluctuar moribunda entre estas ondas.

Nem o passado amor teu peito incita

A um ai som 'Hte com que aos meus respondas

Bárbaro, se esta fe teu peito irrita

< Disse venflo-o fu^^ir) ah, nSo te escondas.

Dispara &ôbre mi<ii teu cruel ratol. . »

E indo a dizer o mais, cai num desmaio.

Perde o lume dos olhos, pasma e treme, Pallida a côr, o aspecto moribundo. Com mais ja sem vi^or soltando o leme, -Entre as salsas escumas desce ao fundo.

492 AHTOIíOèlA POBBIA

Mts ni onda do mtr que indo freme Tornando a appareccr, desde o profundo : « Ah Diogo crael ! » disse com mágoa, £ sem mais vistas aersorvea-se n'agua.

Choraram da Bahia as nympbas bel las. Que nadando a Moêma acompanhavam, E vendo qve sem dor, naveg2'm. d'eilas, A' biranca praia com furor tornavam : Nem pode o claro heroe sem fena vel-as Com tantas provas que de amor lhe davam : Nem mais lhe lembra o nome de Mcêma Sem que ou amante a chere, ou grato gema.

J. de SanU RiU Dum», Caramurú, ed. 1787.

' XiX

Lira XXVIII

Alexandre, Marilia. qual o rio,

Que engrossando no inverno tudo arrasa,.

Na frente das cohortes

Cerca, vence, abraza

As cidades m.ais fortes. Foi na gloiia das armas o primeiro ; Morreu na flor dts annos, e tinhi

Vencido o mundo inteiro.

Mas rste bom sodado, cujo nome NSo ha poder algum, que n9o abata.

Foi, Marilia, somente.

Um ditoso pirata,

Um salte ador valente. Se n3o tem uma fama baixa e escura» Foi por «e pôr ao lado da injustiça

A insolente ventura.

O grande César, cujo nome vôa, A' sua mesma pátria a quebranta ;

Na mio a espad» toma,

Opprime-lhe a garganta,

senhores a Roma. Consegue ser heroe por um deíicto : Se aca^o não ven esse, enrSo seria

Um vil traidor proscripto.

O ser heróe, Ma ri Ma, n9o consiste

£m queimar os império» : move a guerra».

Hspilha o sangue humano,

R despovoa a terra

Também o mau tyranno. Consiste o ser he^óe em viver justo : £ tanto pode ser heróe o pobre.

Como o maior Augusto.

ftáooLo ZTiii 493

Eu é qae tou heróe, MariUa bella, Sej^lndo da virtude a honrosa estrada :

Gdnhei, ganhei um throno,

Ah I Não manchei a espada,

NSo o roubei ao dono. Ergni-o no teu peito e nos teus braços : E valem muito mais que o mundo inteiro

Uns tio ditosos laços.

Aos bárbaros, injustos vencedores Atormentam remorsos e cuidados ;

Nem descansam seguros

Nos palácios cercados

De tropa, e de altos muros. E a quantos nos n9o mostra a sabia historia A quem mudou o fado em negro opprobrio

A mal ganhada gloria !

Eu vivo, minha bella, sim eu vivo [ Nos braços do descanso, e mais do gosto :

Quando estou acordado Contemplo no teu rosto De graças adornado : Se durmo, logo sonho, e aiii te vejo, I Ah 1 Nem desperto, nem dormindo» sobe

I A mais o meu desejo.

[ Th. A. Gonzaga, Marília, ed. 1840, pág. 73.

^

i XX

Pygmaliio

Ja da lúcida aurora scintil'ava O trémulo fulgor, e a noite fria Nas mas remotas praias do Ocidente, Entre abysmos gelados se escondia.

Amor impaciente Dos filhos de Morpheu se acompanhava, £ de Pygmaliâo a altiva m^ nte. Com lisongelros sonhos, afagava,

Ora de Qalatea,

A estátua airosa e beila, Obra de seu cinzel, obra divina, Se lhe avi/ava na amorosa .dea,

Ora cuidava vê-la

Pouco a pouco animar- se E a marmórea dureza tr^^nsf- rmar-se Em suave vital brandura dina

D*aquella que em Cythera, Sobre os Amores, e o prazer domina.

Sooresaltado freme ;

E entre illusões espera Galatea apertar nos ternos braços :

I

494 AnouMHA roMiA

Mas súbito desperta Procura-a, nSo a ve ; snsplra e geme. Entio eom rosto triste e carregado,

O corpo ergue cansado,

E mal firmando os passos

Girando a vista Incerta Pela vasta offlcina, o busto encara

Da magestosa Juno,

Que junto collocara Ao do implacabil fero deus Neptono : Lança mão do cinzel '; ergue o martello ;

Repoli-los intenta

E o extremo ideai tocar do bello; Mas o cinzel da mão se lhe extravia ;

Frôxo o martello assenta, E na vivaz ardente phantasia Se Galatea com prazer revia.

Acceso, arrebatado De insólito furor, quebra, esmigalha

O mármore inculpado'

Dos bustos, que polia ; Anemeça por terra e á toa espalha O martello, e o cinzel com que trabalha ;

Volve os olhos, repara

De Galatea amada ^^^•^Na formosura rara ; E ferido do amor curva tremendo Os joelhos, e ]a não lhe cabendo

Dentro d 'alma encantada O transporte que o agita, ardido brada : c O* tu que os deuses do Olimpo

Feres de inveja, e de espanto. Porque nunca pede tanto Todo o seu alto poder ; E' possibil que reúnas Tanta graça, tal belleza E te negue a natu eza

Respirar, sentir, viver ? Fis do génio o prodígio soberano : Nem poderá jamais o sprito humano, Depois de rematar esta obra- prima.

Conter ça sobeja

Que poderosa seja

Para novos inventos, sem que o opprima

Tam grande esforço d'arte, E esmorecido desfalleça e caia Amor, ó deus ! sem quem tudo desmaia ;

Amor que me guiaste O sublime cinzel n'esta árdua empreza,

Ah ! d^^sce, vem ; reparte

Da minha vida parte Com aquel a que tu avantajaste

A' deusa da belleza : Supre assim o langor da natureza :

I

Mftouui xvin

495

Infloe doce alento Na minha Qalatea tam formosa : Inflae-lhe razJfo e sentimento. O' Amor l 6 deidade grandiosa ( Anima-a do calor em que abrasado Men coraçflo a teu poder se rende. Rouba a Jove esse facho sublimado

Do qual a vida pende :

Sacode, vibra a chamma Que 08 mortaes aviventa, anima, inflamma. O* Amor I ó deus grande ! per quem vive

Quanto nos vastos mares Se volve, e quanto talha os leves ares;

Per quem tudo revive, E cu)a mto potente desencerra A vitai força que fecunda a terra ! Escuta a voz que o teu soccorro implora,

E a minha Qalatea

Possa eu ver s^m demora Sentir o fogo que em meu peito ondeia. Deuses, se isto impedis, de novo digo

Que inveja negra e íea

Em vossos corações achou abrigo.

Mas que vejo ! ó justos céus I

Treme o maimore e respita,

£ parece se retira

Ao toque de minha mão I

Rubro sangue as veias gira.

seu braço me rodea,

£ da linda Qalatea

Ja palpita o coração ! Nos olhos lhe circula, eu n9o me engano, O teu fogo, ó Amor ! hoje cessaste

De ser um deus tyrano : Hoje sobre os mais deuses te elevaste. Que te direi Amor ? . . . Olha . . . repara,

Nas faces delicadas

As graças animadas Ateiando desejos, e compara Tuas acções com esta que fizeste : Ve bem com' a ti mesmo te excedeste :

Prazeres fervorosos,

Suspiros incendidos,

Transportes an *ios s,

Mil ais interrompidos, Affagos e deleites, como em bando.

Pela voluptuosa

Cintura mais L{ue airosa, Qual a era se enroUrn, misturando

As engraçadiiS frentes ;

E de mimos ardentes,

De delicias minha a ma repassando. O' Qalatea I ó minha doce vida ! Tu me faltavas so para endeusar-me, £ de immortaes prazeres inundar-me.

496 AHTOLoeiA -^ rovuÂ

Agora brame irada

A natureza contra mim erpitda !

Não a receio, e nada

me pôde astnstar. porque te vejo

Responder a meu férvido desejo ; Dar vida a novos seres. Cretr o sentimento De mil novos prazeres:

Eis, ó deuses I sem dúvidas a ambrósia, O divinal sustento,

A suave celeste melodia, Que embebe de alegria,

£ torna glorioso o firmamento 1 » G)m este pensamento

Transportado ontempla a Qalatea (Que, ou mo /a a medo os passos, Ou revolva o semblante, Emtôrno ao seu amante. Ou ia recurve os braços A cada movimento, A cada novo instante. Sente uma nova idea

Sente um novo prazer que a senhorea).

Então outro prodígio amor obrando,

A linguagem dos sons val-ihe inspirando, E de reoente usando Doeste dote sublime

A feliz Galatca assim se exprime: « Este mármore que toco, ns ta flor tam graciosa, Nem esta árvore frcndosa, Nada d'isto n^da é eu: Mas. ó to/ que ante mim veja, Que todo o meu pt- ito aballas. Que i9o doce d - amor falias, Ah t tu sim, também es eu, Vera a mim, querido objecto, Aperta-me nos t us braços: Convcnce-me cm ternos laços. Que eu e tu somos so eu. »

A. P. Sonsa Caldas, PttjmaHào, O^Oê, 1820.

PROSA

XXI

Vieira julgado por P. Francisco Alexandre Lobs

Composto raro de imperfp'çõ^s e de prendas insignes, serviu Antoni# Vieira muito á religião, e não serv u menos á pátria; mas poderia servir a aia- bas ainda melhor. A pátria, ^e o louvou em seu tempo com demasia, taml>ein o ttatou cm alguns casos com desmerec das esquivanças. O seu zelo politico kA recompensado com injustos desterros; os cárceres da Inquisição de Coimbra

•áomo zviii 497

íòrain pena sobejamente severa das suas singularidades; as suas prendas e ser- viços poderam ser mais at.endidos e mais bem satisfeitos por el-rei D. Pedro u. A posteridade, mais cega ainda por cdio. doestou as suas egrégias qualidades, vilipendiou os seus talentos, calumniou as suas intenções, escureceu as suas obras, imputou-lhe aleivosamente culpas, perturbou* por ultimo, e affrontou com ffiror bárbaro as suas cinzas. Para que vejam os homens (quero dizê-lo, como Vieira o disse em substancia por varias vezes), para que vejam os homens, que o unlco motivo certo, mas por si superabundante, para se encamin larem to bem, e o porem em prática, está nas ap provações deliciosas da própria cons- ciência, e nas esperanças da justiça invariável d'Aquelle, que na estimaçflo do merecimento nSo pôde ter erro, nem pôde em o remunerar padecer defeito.

A. Lobo, Discurso, . . acerca do P. A. Vieira, ed. 1899, pág. 133,

XXII

O Amazonas

. . Como corre pomposo e soberbo, revolvendo em suas empoladas on- das madeiros pesadíssimos, e ameaçando estrago a tudo que se lhe põe diante! Rico do cabedal immenso das aguas que tem recebido d 'outros muitos rios, sempre insaciável, não se demora jamais, mas continua cada vez a adquirir novos augmentos até espraiar emfim no Oceano, e, confundido com elle, nâo ter mais nome nem gloria differente da sua Que differente^ e agradáveis pai- néis descobre a vista pelas margens d'este grande rio ! . . /Eis-ahi logo á pri- meira vista essas duas alamedis sempre frescas e viçosas, que acompanham o grande rio constantemente em toda a sua extensão. Ah I de que variedade admi- rável se nlo revestem ! Aqui o arvoredo frondoso e cerrado, convidando o en- calmado navegante a respirar á sua sombra ; abrindo-se um pouco, e dando iogar aos olhos para se dilatarem pelas espaçosas campinas que terminam o horizonte: para uma pirte, cedros elevadíssimos d'uma grossura espantosa, o tronco meio desarreigado pela força da corrente, e ameaçando ruina com a sua qaéda imminente ; para outra, differentes arbustos copados e floridos enleiam a vista pela diversid<ide das suas cores. Repara para a multidão de aves que parecem toldar o céu, matizam os campos com o engraçado da sua pintura, finalmente sobre verdes ramos, abrindo as azas aos raios do sol, explicam por mil gjrgeios a alegria que sentem nestes logares amenos. Não vês como brUiam ao longe as alvas areias de que está semeada aquella praia V Bis-ahi voand) em torno d'ella nuvens de pássaros, e fazendo ver, por seus redobra- dos gritos, que têm o mais a iiavel domi:ílio. Cardumes de peixes de diffe- rente grandeza apparecem também, volteando sob as aguas que banham aquella situação encantadora. Mais adiante olha como surgem do leito do grande rio barreiras empinadas e sublimes, que, pelas diversas cores da matéria de que se compõem, servem de balisa ao atrevido navegante. VUs n^o te enche de assom- bro essa perenne e intrincada cadeia de mont.ímas altíssimas, correndo no longo da margem septentrional ? Olha como parece querem desafiar as nuvens, e vão esconder nellas a sua mais alta superfície! Pois as caudalosas corrent- s que cor- tam estas mesmas serras como se despenham com furioso ímpeto por rima de alcantiladas rochas até virem confundir-se com as aguas do grande rio ! para •titro lado os plácidos ribeiros, que correm murmurando por entre cspe*<sos e frondrosos bosques, fazendo bulir mansamente a branca areia. Ahi tens uma nova ilha, que a natureza vae formando no meio do rio, para servir de recurso aos vasos atacados da furiosa tormenta. Que lindo quadro! tenras vcr^^onteas sobreaaem á superfície da agua ; dirias que d'clia tiram toda a sua subitancia:

outiii pTOfuiidaiiiente andgadM na terra, abrindo os ramoa, « enfcItiiido-K de ÍIAru cngraçadliilmas. Todo aquelle fresco terreno como esti aleitilid» d'iiiiia relva verde e mimosa, qne encanta o espirito 1 1 D. Fi. Cactino Bnudia

Elogio funobre da 0. Francisco da Lemos

(PERORAÇÃO)

Elle foi tio grande na. morte, como na vida. Havendo atéll governado oi outros, goveina-ae entio a il pcoprlo. Impávido c tranqnlllo a mala pavo- rosa das scenas, a vida, que foge. o tumulo, que se abre, a eternidade, qae »p- parece. Mune-sc dos sacramentos, medita ai cousas eternas, afervora do aea es- pirito, une-se á Cruz do Senh^T, e che o tanto de paz, como de annoi tmetltos. deixa o mando, cáe no seio da Divindade. Ji nlo existe : apagou-se a luz dos teus dias ; mas nunca se ha de apagar nem a mjgoa do nosso peito, nem o es- plendor do seu nome. Oitenca e sete annos tieroicamente vividos dlo-lbe |nsU celebridade. Foi a honra do Saceidoclo, o lustre du Império, columna de am- bos. Foi entre nós o Abrahao das Sciencias. o venerando Pai das Letras. Em quanto elJas achaiem no mundo estima, em qoanio se virem ergufdu as pare- des do nosso Aiheneu, a sua memoiia leri bençflos. cada pedra daqueile edifí- cio seri um padrSo i sua fama. Cada AcademiiM uma estatua ao seu nome. Em- bota se calem todos os outros seus irofeos, a Academia bradaii sempre. O grande AfFonso d'Albuquerque quasl morbundo esoevia ao seu monarcba : St- nhor, quanto ás cousas da índia, nada digo; a índia falloJá por si e por mim. Em eguai Forma pode dizer do meto d'aquelle fcretio o Pai das Letras: Esse Universidade fatiará por si e por mim. E se o grande Rei D. Manoel dizia ler seguia a Índia com os ossos do mesmo Albuquerque, timbem nós podemos di- zer, que longo tempo a sombra e restos veneráveis desse Vario exímio Uo de ser o amparo e o incentivo das Letras.

Dr. A. loii da Rocha, Oração funebre dai exequioê dt D. FratteUea dt Le- mos, pá^. 13, ed. cit-, no leilo.

XXIV

Carta ao Snr. Manuel Gomes Costa

[Vitaaa d'Aiiiliia, 29 de Inlhd de 1780.)

Estimo muito, e estimarei sempre as suas cartas, pelas duas cousas que n'ei1as resplandecem, a que o mundo chama tolice, isto é, a naturalidade eiio* ceildade com que V. M. falia, requisitos de que gosto sobie modo na commu- nlcaç-3o; e especial mcnie agora, porque ainda os nlo achei por cá, senão oi gente verdadeiriuncjiic tola, e simplória. Admirou-me muito o desejar V. M. tanto Iti livros franceses e ingleses; e communicar pessoas que o podessen instruir e dissolver as suas duvidas com sinceridade, porque eu tiniu por cuu qiiú V. M. seria como os outros reinicias brazlleiros que nlo estudaram antes de irom para a America; que, quando tornam, cuidam somente em come"' q\rc trnuxeram, ou, quando multo, em conservarem um pouco de negodo. Quanto a parccei-lhe a V. M. que eu lhe podia ler bom aos leas lnteata)>

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engana-se de remtte; porque eu nunca fiz pecúlio na memoria do que li, oui e vi ; creio que por me mostrar a experiência que isso não me servia de nacj mais, que de conhecer uma pequeníssima parte das fraquezas do nosso natural assim V. M. por este motivo não tenha pena de eu lhe estar longe ; antes t asse^rure que» se falássemos muitos meses e annos, todo o fructo que V. N poderia tirar de me ouvir, pelo que respeita a livros, era o persuadir-se de qi em lugar de lhe aproveitar o tê-los, prejudicaria fora de modo, se o fizesi como o commum da gente, que, sem nem vir-lhe ao pensauiento o julgar d'e les por si mesma, julga quasi sempre das cousas por elles somente, e qua naoca nem das cousas, nem d'elles, peb modo que deveria fazê-lo, isto é, vi lendo-se unicamente da sua pura experiência, e ditames da razão. V. M. n! tuá nenhuma duvida em que o juízo, entre os outros dons que recebemos c natureza, é, sem nenhuma comparaçflo, ò mais estimável de todos ; mas eu nt cuido, como os que lêem muito que os livros no-lo augmentam ; porque n parece que a sua actividade natural não pôde crescer, nem ainda diminut senão por própria indisposição de si mesmo, nascida de doença, ida«1e, paixõe etc., e que, se os livros nos tiram d'eile'aJguns erros dos infinitos de que no- vae enchendo desde a meninice, o que vemos e ouvimos no mundo, lhe impii gem muitos mais. Não digo nada d'iftto para o desconselhar a V. M. d(i l absolutamente, mas para vir a con:luir que leia quanto quiser, com a adve tencia, porém, de não se descuidar nunca de julgar com toda a liberdade di cousas que lê, e do juizo dos autores que as escrevem ; e se V. M. me diss qne não se acha capaz de ju-gar com aceno da ruindade do juizo de auton famosos, responder-lhe-hei qye cambem não se de^ve achar capaz de julgar co acerto da sua bondade ; e por conseguinte, nâo lê-los de nenhum modo. L ei torno a dizer, quantos livros quiser, portugueses, castelhanos, franceses e ingl ses, traduzidos, mas leia-os pondo de parte inteiramente o que tem ouvic d'elles, e o grande coneeito que os autores, ainda dos livros mais ordisiaiio mostram nas suas palavras fazt^r do seu talento, especialmente os francese qoe neste ponto são insoffilveis; e até fazem insoffriveis os seus leitores pe tnaldita presumpção e vangloria de saber, e pelo desprezo com que faliam ( ignorância, isto é, da falta de lição dos livros franceses. Ainda outra vez, V. A lãa todos os livros que puder, mas como a gente olha para a fazenda de gran( valor, quando a quer comprar^ que a volta i em do aveço e do direito e repara be nella de alto^ baixo por todas as partes, para lhe d tscubrir os defeitos e avaria e espero que a comparação não lhe pareça demasiadamente encarecida ; porqi bem conhecerá que a perda juizo e boas inclinações, que nos pôde vir c leitura cega de um livro, é de maior consideração que todas as perdas qi tivermos em quantas compras fizemos na nossa vida; e que falíamos ( livros, lhe direi logo que o tal Francisco Xavier de Ólisreira não se acha e Vienna, nem eu acho nenhum rasto de elle ter estado aqui nunca ; e por is V. M. que esta gente não o tem em nenhuma conta, nem boa nem m Eu porém da minha parte, pelas informações que tive d 'elle em Paris, lhe pos dizer, (em duvida, se entende) que faço mau conceito do seu juizo, porque n disseram, louvando o muito, que elle escrevera um bello livro francês, em qi corta muito os portugueses e as suas cousas, e me offereceram para eu o v^^t ; que eu agradeci, mas não acceitei ; porque ha muitos annos que me d( ooia grande fastieira de livros franceses, especialmente dos que cortam d outras nações; não porque cortam também da nossa, mas porque quasi e tudo a cortam sem pinta de juizo. Ora V. M. considere se eu me acharia co animo para lêr um livro em que um português corta a sua nação á francesa ; somente porque os franceses a cortam, a parecer d'elle, com grande juizt agora sim, V. M., que leu as suas cartas, é que me poderá dizer com certeza conceito que faz do seu juizo, e natural. O mesmo que tenho dito a V. M. respdto de livros lhe digo também a respeito de vêr mundo ; nem eu lhe pos instruir o jnizo, ou destruir-lh^o, contando-lhe o que vi, e vejo por ; nem

500 ABTOLOaiA— PBCMA

M. se poderia instruir a si mesmo, se desse uma e muitas voltas por estas tems em que tenho estado ; porque nSo veria senSo a nossa mesma christi, ai mesmas leis com pouca differença, e os mesmos costumes, entre elles o mais louco de todos, chamando matrimonio (chamo-lhe louco, da parte dos homens, pelo posto com que abraçam, e fazem gloria da vil escravidSo em que põem as mulheres); as mesmas fiaquezas- de juízo, e desordens do coraçio; eemfim os mesmos vidos e virtudes, & £' verdade que oi movimentos do nosso espirito da cabeça, e do peito, que reluzem nos nossos costumes palavras, acçOes, etc, assim como nSo 39o os mesmos em numero, equlidade, em toJos os homens, nfb no são também no mesmo grau em todas as terras. Ora que se tira d'aqai?? Por ventura que- se V. M. andasse pela Europa oito ou dez annos. tomando bem sentido no modo de pensar e obrar, das suas nações, se recolheria com maior conhecimento do mundo que o com que se acharia n'aqueile tempo em Portugal, se estivesse estado sempre parado? Eu entendo que nSo certa- mente; antes quanto a minha pessoa, creio com toda a segurança que, se eu nunca sahisse doesse reino, conheceria mais do mundo de que conheço hoje «m todas as minhas giravoltas; porque os vícios e a virtude do nosso Juízo e do nosso coração, silo e ca, da mesma qualidade; e iá, ambas as coasas em maior grau conhecidamente; que náo saiba o que eu digo quem se preza de ter girado.

António da Costa, Cartas, ed. cit. no texto, xr, pág. 69-77.

XXV

Carta sobre a educação da mocidade

lllustrissimo Senhor. Quando V. lilustrissima foi servido communi- car-me o Alvará sobre a reforma dos Fstudos, que S. Mag -stade Fidelíssima foi servido decretar no mes ác Julho passado, e juntamente as instruçoens para os professores da Grammatica Latina, logo determinei manifestar a V. illastris- sima, o grande alvoroço que me causou a real disposiç<õ sobre a educação da Mocidade Portugueza ; mas embaraçado com algtla dependência que entaõ me inquietava, e com a saúde mui quebrantada íío mesmo tempo, n^õ pude satis- fazer logo o meu desejo ; naõ applaudindo o util d'esta lei, mas taõbem, renovando os mais ardentes votos pela vida e conservaçato de S. Magcstade que Decs guarde, que com o seu paternal amor cUida laõ efficazmente no augmento, como taõbem na gloria dos seus amantes e fieis Súbditos.

hsta lei, lllustrissimo Senhor, incitou o meu animo^ ainda que pelos achaques abatido, a revolver no pensamento o que tinha ajuntado da minha leitura sobre a Educação civil c paiitica da Mocidade, destinada a servir á sua pátria tanto no tempo da paz como no da guerra. Ninguém conhece milhor a importância desta matéria, que V. Illustrisaíma, e nesta considera çaÕ he que determino pateniear-lhe naô hQa succinta historia da Educação civil e poli- tica que tiveram os Ciiristaos Caiholicos Rominos até os nossos tempos, mas taõ :)em hQa noticia das Universidades, com a utilidade ou inconvenientes, que deíSas resultarão ao tstado civil e Politico, e á Religiíõ Espero que será do agrido de V. lilustrissima que me ocupe nesta indagação por algum tempo, c que admirará, depois de ser st^rvido »ê-h, a admi avel providencia de S- M. Fidelíssima, expressada neste Alvará que venho de lêr novamenic. Veri V^ lilustrissima que naõ temos inveja aos imperadores Theodoslo, António Pio, ou a Carlos Majrno; porque ainda qu^ todas as monarchias, c Republicas de- cretaram leis paia regerse a feducaçaõ da mocidade, naõ 11 ategora que Sobe- rano algum destruísse os abusos da errada, e que em seu logar decretasse t

BdouLO xwia 5Õ1

mais reommendavel. Mostrarei pelo discurso deste papel, que toda a Sduca- Ç2Õ, que teve a Mo-idade Portuguesa, desde qup no Reyno se fundarão ãscv>fas e Universidades, foi meramente £cctesia!»tica, ou conforme Oi dlctimes do^ £c!- desiasdcos ; e que todo o scu fim f Jl, ou para conservar o estado hcelesiastieo» Ott pura augmr^ntaio.

Somente S, Magestade Fidelíssima foi o primeiro entre os ^eus Augus- tos ^reaecttssores, que tomou a si í\q ieUo Jus da Magescade de ordenar que os seus Subiitos aprendam de tal moJo. qu^ o ensina pjbiico p'>sr»a utiltiCar os seuh diiHtadcs Oomintos. este grande Rey conheceu que como a ai ma go- verna os movimenios de todo o corpo p^tra conserva-lo ; assim e<ie co uo alma e Intcrliigencia superior do seu Estado, era obrigado promover a ua co.istrva* ç9o, e o seu augmento por aquelles mcyo» que coneebeo mais aJequados Aquelle benegnissi^no Alvará nos d^ a conhecer que a Bducaçaõ da Mo^id.ide, cono drve sfr, hc o mais effecttvo e o mais necessário. Porque S. Magest á^. que DeoHgu^i^dj com alta providenca, cjnsidera que lhe saõ necess nos Caj)itaens para a defensa; ConsJheyros doutos e experimentados; como taõ «em Jat2.t, Justçss, c Administradores d'is lendas Reais ; e mais que tu'Ío na situa; 5 em quf t-stá hoje a tiuropa, Embayxadores, e Ministros publivOs,, que conserytím a harmonia de que nece-sitaõ os s us 'stados esta Educação n õ seria :!ompleta SC ficasse somente dedicada á Mocidade Nobre ; sua Magestade tendo orde- nado as Escolas publicas, nas CabcrÇdS das Comarcas quer quc nelia^ s- msiiuaG aqneileá que h õ de ser »^ercadores Directores d .s Fabricas, Arc^itectos de Mar e Terra, e que se introduziíõ as Aries e Sctencias.

A' vis^a do referido permuca-oie V. Illustrissima que s tisfaça aquelle ardente dtsejo, que conservei mpre, t inda taõ distante e por t. ntos annos longe de Portugal, de servi-lo do modo que posso, ou que penso lhe sei virá de il^^ua uiiíid d 2 Nem a amoiçaf) de s;ii' d) meu esudo, neii a cobiça d fize ii mais conimod), me obr*ga a occup^r aqu lie pouco tempo, qui me d 'yxíõ os acha- ques, em ajunctar neste papi'1 ludo «quillo que tem connexaõ ton o Alvará que V Iliustrissím 1 foi servido uitimamen:e com unicar-mj. He somi nte aquplle ardente zelo é somente aquelle a nor da pátria, que V Illustr sslma acmdeo de novo em mim pelo seu ciaro e penetrante enícndimentíi t õ judl- cioíwmenie cultivado, peia sua clemenria, pe a sua pi':d;^de, e por ]in*'i a. dor de promover tudo pira maior felicid dj d. nossa pátria que snis^ y õ ^ le te- nho neste instante ! que louvo estas viríudcs, taõ raras nos nossos di s, sem a minima adu-açaõ, e sem o mini no interesse servi-lo. Aquelle^ Port 5g i e> que viveu peia piedade de V. llhstris>ima, e todos, naõ confirm.nírt o pi)uco qae d'go, mas augmentariaõ de tal modo o que agora callo, qnp r>. ncfiamos ilcasst: offendida aquella modéstia e aquelia inimitável affabilidad(^, Cvtm que V. Illuslrissima sabe render os nosso» coraçoens.

A, N. Ribeiro Sanchei^ Cxrtas, xn /íer, da socitdade de inatnirção do Porto, Tol. II, pág. 283.

XXVI

Carta ao Principe Rodolpho Cantacuzeno de Valaquia, Duque dt» Bessaraba &c. sobre a pronuncia da Língua Latina

G>Dcedo que V. A. nSo entenda o qne cu á\^o em LatíTi. f -^r jmp o nSo sei falia r, porem nego que a pronuncia que lhe dou por ser Po t k^vU-^^ seja mais barbara que a que V. A- lhe d.i sendo Valão. T..ndo p:lo m :u P is o devido amor, c pelo de V. A. o devidi rnspeito, posso entendvT que se Va- Isqaiase pronuncia o Latim de outra forma, que isso nSo serve de prov •» que

32

•5QS AiTOLoeiA— -raotA

ae prenuncia melhor em Portugal, e mtlhor do que em outros muitos Países^ em que ha muitas ditíerenças que se nSo conformfio ao uso, nem á pioDundt de V. A.

He verdade qne digo Imaginatío, Longitudo,' Gigas éec pionuniindo gi, t nSo gui, e observando as Ule do uso nacional da Língua Português que diz Imaginação, Longitude, Gigante, e não Ouigante, Lenguitud^ nem ima- guinação iomo pronunciam os Htspanhoes ainda stm escrevei tm o u nas ditas palavrcs, cu nas suas semelhantes, e que eu introduzo nas três ieftnd«spaia &Z' r a dif <'erei>ça do gui ao gi. Também he vèidade que digo uniusqui ur- pitque, fulgentiaque &c. oumo 9t no e de ^uf se achasse htm assemc^, aa mt«a o tempu que quasl todas as ma^s N^çcens pronunciflo como se o acento se ac>'a»-5e em ouiras letras das d^çoens^ dizendo-as na fóima seguinte uniúsque, serpitqne^ fugentiáque Ssc Tenho a minha pronunca por erfo, e nfto saoehdo^ dízti ^ . A. a raz^o porque uso delia, parrce-me que trouxe esse mao cosume de Portugal, onde creio que se prafca. e onde ci^mecei a aprender o pouco mao I at m que sei. Finalmente estas, e seneihanus pronuncias fazemomqQC V A. me nío emenda, supondo qut the falo Português quando lhe íi*Uo U- tim. Cuai do Y. A. se explica nesta Língua, também cu podia ter a liberdade de ile cizcr qiA: nSo ertierdo Va^ati. pcrtm sabendo i um pouco ds« Lirgua Qs tlhana, e tendo costumado os ouv dos á pronuncia do gui, em logar úu^i seguio a V. A. oup o entendo, pcrcm s>tguro>l^e ao mesmo tempo que outios muit. s o nSo entenderflo» e que homens muito grandes lhe diiiam que primiffi' ciava muito mal o Latim se o nào pfonunciasse cimo elles Alem ditso otstrve V. A b( m algumas pronuncias tíe todrs as mais N^çoens que nfio he a Portu- guesa, nem a Valaca ; e achará diversidades que o obrigarSo a confcsfar qiie tocas se sepárSo, ou que todas errflo no uso da Latina, se he que o priviiefi» de acertar nessa matéria não foi somente concedido á Venerável Ling^a de V^ A. em que nenhum homem discreto até o presente falou huma paUvia

Lembro a V. A. oueSiloppio, Mdalgo de Franconia, que tomava o ti- tulo de Ccnde de Claravalle, mu;to amado de pessoas poderosas, ene mniea- daOo a Luiz -xiii de França, por bum Breve ntificio, preter.deo mos r:^ ni- qmlle Rciro que o Latim se devia prenunciar na fóima seguinte In Lath» decuus pronunkiationis & ^loquenthiee est Kikero, em lugar de In Latio uaa pronunciationis & eloquenhcB est Cicero,

Ge I arde Vossio na sua Grammatica Latina pág. 2 falando da prononda das letrbs. diz que he agora muito oiíierertte do que foi em outro ttmpo q^ os R manos faziam dtstincçgo do / breve ao / longo, que n9o pronunciAV^o o^ ^ C nas pa avras t//f/Y Júrfs difíerentemcnte do que o pronuncravflo nas psli- vra^ dica & dicam, que ffzi^-m »oar o T na palavra artium da mesn a forma oa» na pa-iivra arti, e que o V Romano t'n» a o meí>mo som que o W dobrado dos Flf«n enjí' s, e dos Alemaíns Desta forma p?oni'nciando V. A. em La-tim Cíi* nam Ciceroncm aiidivissemus Romani, ut pronunciaremus vocês véStras d decet, nei luim Rr maro o eniei lií* serido ceno que elles diriao pe a r»g'a de V(í^Mo. Outiram làkeronem audiouissemous. Romani, out pronunkianmctS woches irestras out deket ^'

Ct,nir.rei Lgca huma historia a V. A. Houve na minha terra homDo-^ que que íalaiido Latim c( mo qualquer, se scpunha homem douto cm iodas tf matiiias. Fazeiídr-se em sua caí-a 1 uma jiinía de Mcdcos, Parc&s vis:vcíf da vifía, e do I..- dm, para vt t&n m na cu a de l um seu filho que estava eníei* mo. fez o Duúue a expôs çSo, e dcu a inf(;rração da enfermidade. tomandoO' 1( gíir do McGiL*u fiíisistcntL a qutm piitin ia a acção. Depois de empregar n^ ! discurso todos os ttnnos stmrjl antes a sintomas, accessos, principies» anDi> tos. e decjinaçoí ns, í>tm í^e («ciufcr de ívríopes, efimeras, c Ubrifuges pe^ ; ^vniou mui viiidc so ao diio Aicd^ro l-ss^-udIc se tinha e He satisfeito i «* ' ob.jgaçrio? RcspciíÒLu o Akd'cc S.m Stnlcr, V. Ex. para Duque sabe /ftm^ de Medicina, porem para Medico he certo que não sabe V* Ex: o que diz. i*

'V--

oàrtnjho ti Afooa aoiaarriCA 5ê3^

Km dovida que o medico tinha razfto, porque nenhum dos outros Doutores da ]nata tinha entendido o Duque. Eu nSo sou tHo atrevido que aplique o caso, ^reiB quem he que diz a V. A* que se fosse talar o seu Latim aos Romanos, Povos que tiverlo mui pouco respeito aos de Valaquia, e aos de Bessaraba que nio liaveria algum tSo ousado que dissesse a V. \, Meu Prnicipe, para vós Valaeo falais bastante Latim, mas para Romano nem pronunciar o sabeis.

Digo a V. A. sinceramente o que me parece verdade. Cada um hoje ao Latim a pronuncia que he natural á su^ Ungoa. Isso deu occasiSo a Joseph SciliEcr, paca dizer por galantaria a hum Fidalgo de Escócia que lhe falava em Litfro oom a pronuncia do seu Pais, Meu Senhor, perdoai-me se vos não res- pondo, porque não sei falar Escocês Observe V. A. os Bávaros, e achará que dizem claramente Poter & ponem, pro Panem & Pater. Os ingleses dizem kerds pro canis^ examine-os V, A. e verá facilmente que qualquer delles para dizer, canis intravit meam cameram lhe dirá, kenis intrevit meem kermerem. Aqui ha ffloitos polacos, a quem V. A. ouvirá dizer quanjam pro quamquam, e agfa ptoaquâ.

Sei que he loucura escrever de huma forma, e pronunciar de outra. Pa- plriano, Autor muito antigo pc is que se acha citado antes de Prisciano, notou isso mesmo. Alitersiríbere. aliter pronunaare vecordis est, poreoi parece-me ainda maior loucura querermos que as pionuncias de todos os idiomas se unão na do IjBtino. Continue V. A. com o seu Gue a brilhante Gemmans da sua pro- oimeia Bessaraba, e permita que eu fique com o meu ge, Gelaius no deffeito da minha pronuncia Poituguesa. Deos me livre de dizer que he a melhor das que se ao Latim, porem Deds me livre também de sacrificar á autoridade dos •atros a dos primeiros Priores da ml<iha terra, em cousas em que todos' ti verSo igual razSo. No que «se n9o póàe dar outra que a de sicut volaerunt Priores cada hum está obrigado a seguir, e a defender os da sua Nação, e es^a lei fez-se tanto para todos que até chega a este.

F. Xaner le OlÍTeira, Cariaa^ yoI. i, pág, 455.

XXVII

Carta a Uiogo Barbosa Machado

Sinto que Vmce. tomasse incommodo de buscar-me, e que o naò achar- me cm casa me roubasse o gosto da sua estimável conversação, da qual procu- raiei aproveitar-me sem moléstia sua.

Muito tenho que agradecer à Vmece. occorrer-lhe o meu nome ao fir- mar hhm catalogo dos Portugueses eruditos; sendo tanto maior o agradecimen- to, quanto menos razaõ havia para que eu devesse lembrar-Ihe ; e suppostoque naO desconheça, ou deixe de apreçar a honra que Vmce. me faz, he justo taõ- bem, que me naO induza o amor próprio abuzar delia. A'guns amigos me fazem a mercê de espalhar no publico hum conceico vantajozo dos meos estudos ; po- rem como estes, em quanto se nèõ daõ a conhecer peias ( bras, dependem de mui pia para se acreditarem ; naõ devo attribuir o estaheleciTierito djquella fama senaô á benevolência dos que me favo-ecem ; pois até o p'?í-en'ci naõ te- nho mostrado composição por onde pjd^sse adquiri la ; c fnz^nio Cín^Ms com o meu talento, tenho por mui provável que a perderia de todr» se s-^Jm-^sc á luz com algum volume. Supposta esta verdide, que sou obr g:.-! a - v':,''^^; r, ain- da que me cause confusão : discorro que taõbem Vmc^i. se tem d-.-ixid'^ enca- nar com aquella naõ merecida opinião e qu;i seria extrr/an ? 'í\.\\''\ e boa cxitíca de Vmce. contar na Bibliothcja Lusitana entre on .-\iit::;(^s -avlivi-luo que o naõ he: assim naõ tenho que responder ao i:i:e:r.'^i.'j:'o p:\icip;il das

504 mSTÓBlA DA UTBBATDXi. rOETUOUft&ft.

obras que compaz. Julguei supérfluo dar satisfação aos mais quesitos, que oos- tem a carta de Vmce. No seu livro terei que envejar aos varoens, que pdoí seos trabalhos se fizeiam merecedores dos eíogios de taO discieto, e intelligeotc Juiz ; e sempre conservarei buma viva lembrança do mg: u que a bondade de Vmce. me queria dar nelle, e qoe será hnm novo motivo para dezejar repeti- das occazioens em que possa servir a Vmce. e mosttar o meu reconhed- fliento. Deos Guarde a V mce. muitos annos.

Alexindre de Gusmão, Cartas^ in Investigcidor Portugue»^ vo]«T,pá|.S66'

XXVÍII

Carta a Fr. Gaspar da EncarnaçSo

Rmo. Senhor. Eu ji tive a honra de dizer a V. Rma. o que me pare- cia justo a respeito da en* preza, que V. Rma. intentava ; e se nflo me achasse molesto iiia pessoa' mente dizer-lhe que naõ se persuadisse do que lhe dizem, e aconíeibrõ inadvertidamente esses doutores, «por qi^e n?õ pezaO a importanda, e gravidade da matéria.

Senhor, a collecç9o das ordenaçoens do Reino, que deve formar o corpo do Direito da NaçaO Portuguesa naõ he obra, que possa fazer com tanta sem cerimcria, e faci. idade, como elles incautamente im?gina5.

Se V. Rma. tem empenho em querer emprehende-Ia, o que será mtdlD bastante, sirva- se fazer convocar os Oezembargadores Joaõ Alvi s da Costa, Ignacio da Costa Quintella, Doutores José Pereira Barreto, Joze Gomes da Cruz, e JoSo Thomaz de Negreiros, ou Francisco Xavier Teixeira de Mendon- ça, com os quaes fará algumas conferencias antes de principiar-se a cbra, en- carrcgando-lhes, que forme cada hum a sua idea sobre a organização do corpo das nossas Leis ; e eu formarei também as minhas, as quats todas juntas vis- tas, e examinadas pelos diros juristas na ptezença de V. Rmri., e ouvida a ra- zão de cada hum deiles a respeiío do stu piano, e Lne'hodo, cem que pretende arruma-las, se poderá V. Rma. rezolver ao que for ma^s aceitado, que será sem- pre o em que convierem os mais votos destts homens. Isto he o que me parece, e não espere V. Rma. que eu me exponha a acotrpanhai o bf m homem Jeró- nimo da Silva, se elle cahir na fatuidade de prrscguir np que tinha ententado; porque eu o conheço a elle, e sei que ignora a'míi teria, que sem forças, nem conhecimento pertende tratar.

Também naõ piomettem coiza de ponderaçpõ os anxilios do? Dezembar gsdor(s JV'aroel d'A]meida, e Fr. Seba>tíaÕ, nem dos D(zcirbarga dores Veiga c Brito. He o que posso dizer a V. Rma., ficando sempre á sua obedienda como o mais affectívo Criado.

Id. ibid.^ Tol. VI, pág. 516.

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III

ÉPOCA ROMÂNTICA

(xix)

<)uadro Sinóttco do movimetito potitico,

social e titerário correspondente á escola Romântica

Monarcas portugueses

3). Pedro IV l«2í>-182S

D. Maria I( )82H.i85g

D. l'pdro V 1853 18^1

D. Laís I . 18 '1-1889

D. Carlos . 1«89-1908

D. Manoel II 1908 IH 10

II

Sincronismo político e social

1820 Pevolaçdes na Europa meridional.

1827 ~ B italha de Navariao.

18^ I ndependêoeia da Bélgica.

1854 Guerra da Criméa.

18^1 > K voInç^Ses italianas.

1870 Gnerras da França com a Alemrinha.

18^7-ISOI Governo da rainha Vitória da Inj^laterra.

IU)3 - Vl-rre LeSo Xíll no dia 2 ) le lulbo dê-ítejaao, aeado a 4 de asfogio eYeit#

8*- o snoessor o pontífice Pio X. l^h - Ri^ndiçâo de Port- Artur a 2 d janeiro. A 5 de setembro paz de Pnrtsmnth

entre a Uiís^ia e o Japão. 1908 A l de fevereiro é aadassinado em Lidboa o monarca D OaHo^ e o

Príncipe Real D. Jjuís Felipd. A 3 foi aclamado rei o então Infante D

Manoel. 1910 5 do ontubro. Estabalecioaent) em Porcugil do regime republicaao.

Ill

Sincronismo literário

ESPANHA

E om exame mnito sintético e uecesaariamento muito imoerf>ito o qae- IttS8amo« a fazer relativamente á hidt )ri>i (U hto atur^ dm iiforeiít ;d n leõ ís, ^jua ttaia ou menos eatão ou tèam estai»» em con^a^to coi» a noasi.

A corrente romântica acabou na Ear(»pa por avasaaiar toJoe 03 espiritea •Qperittrea. Em Espanha sobrepairam nesta evolução :

V

m I

i

^ft mSlÓBLà I»A UTBBATUBA F0BTD6UE8A

V

Makobl J> Quiwtaha (1 772-1 8^7), célebre pelas snas poesias patrióticas^ sobretudo tx^las Odea á hapanha Itvrt (1808) cm que aoimava os seus eotnpatríotas^ á luta contra os Fiancêses; FaAHGisco Mártinbz ob la Rosa (1789-1862), politico, orador e eseritc r sísmado, a quem be deve, eiitire outras obras, o drama Covju- \ mçào Vtveta, o esfodo sobre a revolução frarcêsa KeiÁrito do êécuLo^ utaitas po<>8)as líricas, sátirss, etc, ; J<. si d'£8pbogbda (1810-1842). romancista e poeta distinrtc, couio o GPmonstrrm naqcê e ginfo o hsiudantt de iSnlamanca e iSafi- \ €ho ae iSalaoha e nêtte o Z>tò òo- Afundo /^Habtzenbuscu (1806-1880) conquisVitt f a c«)* bridad< pelo t»eu dn-n-a Loê Avavtfa tíc T^ervtl; Jvsií Zobbila (18 7-1894) j tornado ( éh bre desde a puliicf ção dos ( anton dei Irolador em 1840> adquirindo | desde eiitiln a glória, que depois pei durou engrandecica, com vários dramas i como D. Juafi Tenório ^ Dtáf*o *m Valodohd, is í.otê Vuo-hetê, ttc. ; K^bob | DB Campoauob (1817 ií'01) nas Lolorcs^ Drama Umverênl e nos Pequefíoa /^oc- fnaa ui* ^trr■u-&e um grande e gh ricsf po<'ta, rnins vezes filósoto, outras buinoritta, a m: if lidiíi a glória da literatura poética etpanboia contrDprrânea; >umkbdk f ÁBCB é o ilustre potta, célebre, sobretudo, oepois da publicação dos GrttoM dei \ tomffate.

Dstingnir^m-se ainda né^te século pa hietóriá o Cokdb de Terbno (1786-

3843), >u1or da Uifitõna do hfovoTi.ndo^ yutrraa e revoluçòts de Kfpavha;

JoB' Amadíb PE los Bios (1818-1878). que rscnvf^u os Estudos pofUteoã e htt'

raru'^ Aob'f' oi» Jtmeiíê df- t fronha e a fíiêléna crtnca da literatura ejtpQnho' a;

Mo D BIO L- Fi EMTE (lí 06- loi'6). a qLtm te deve a Historia gercU de Espanha^

28 vol.

A íilfsofia orgnlha-ee com os ncmes de Balmes ( 810-1848) e Ckfiri» GoNsÁiKz. A cloqúóneia prninhUlar perdeu em Emílio Castbllar (1832 lb^9) o seu ni»ii» g rriíio rtpn sentante.

Nt» !oi)an<'e entre muitos oitics, b5o eobretudo conhecidos Axtôxio de Tbitbra {\h2\ 1^80) e Fbknam C/bali.rro, pseudónimo de Ckcilia RoíiLDEhABEB (17l=í ]877. I KHNÁKDBz B (tonzílkz ^]8*^0-l^^S) e Enrique PabezEscuích ^1827) peidtD) o b( n la <'i,t< (ni run < lot^aB cb'M8 de inaginflçao.

lertencim á f8*'o)a nifderna } kdro Aniómu. de Alíbcon (1832-'8P1^ ea- critor fic ròoe elevai. te, í.ut( r di viíij<i s. cort í» e n mances tomo tJ sovfhrefo^ de Ires pivos^ Kl tscavdolo^ etc. ; Jon Valbha (18:í 7-1905), cuja cbra pH ti» é I epitf J nu vez o Jobk' Ecukoauat ilí'33-lí»Jt)|, um d< s níimes mais dibcatidos da urfitjiia jiter tura \ezii lia, punde critico < draii aturgo, mem de 3iiêni*ia, €le. í ? tic í 8 ' Bcritnes etíj a hoc^ ii evX*u onte falecid- s oevemos non ear Fei- VAKDi-z 1 LKu (f H 08) ptio trab* Ibo qi e díix' u e tem h rgo interesse para a eea hi-toria, J <i tnquista de los Azf frs trn Jôí>S; Canotas dbl Cast llo, qne noa Jls odiC'fi (III uvhiiflo de Flíjie IV f* rDcccu j rei-ios» s subfioios para abisfóriada dou in.i(r< (^p;.l hoia cu í oitn^al s s^cu'oh xvi e xvii; Joaqu»m Costa grande pí^rt-í coi c p: rlíiii crt; r, ctc A n d' a n l»reli va a figura eminente, kti-ombr« de eiu«.icro H d«^ sí^.ler de M. Menenpkz y í'e ato if '91 2) autor da Í/W. ae lo9 HeU n ( oanf o niuitoS f utras /^lu.iii tntc hír t{ibilÍ83ÍnrK)S Josb Mar'a dr Pb- EEi>A 1 b:'A ' Cf m < 8 í f uh li\ Tf-s Escevfs n fntíii'(fi(is^ bueif svelto 1 eflOê arriffC^ Bek.io 1 KKKz Gaidoz (f lí'2(»» c< 11 b G/íTm, li fia I erjecta, Aifíerfdrif ra e com várich f lõiih» H Ircti.dí o cn **ií < //fr/ro, que tôm viva agitação levantou em E^puiiba, e D. Emília Paudo Hazab (1802;.

FRANÇA

E^<e país é representado na bintóiia da literatura* do século xix por nma serie r rii en ba e difcti; ta (^c p.i tons. n. quf rcfu'gcm couro as-tn.s oe prin^eira grardízji rnii es c< nu» ot dv Madame de íSt^el (17't-18l7), a quem cab«'a honr do iii pi; ntar < m Vr nya o roíi ai-tit:' d m o seu livro Da Alemanha e autora ào utulycl rou.aiice tomnia, [Em pcttug. : D.' Francisco de Paula PossoLoda

a

OriTULU VI JPsJ»A UOMAKf^rSA 50^.

\

Costa, Corinna ou a Itália, Lisboa, 1835, 4 vqIs. : José António MotSo, Agar jto decerto, drnwa sacro em uma scena.,. Porto, 1846, 8 ** de 30 pág ] ; Cha- TEÁLBUiAND ( 768- 1848), autoT dos romances Atala^ htné. Natchez^ Arev taras do vitimo Abevcerrdgem ; do poéoia épico em p>08a Os Mártyres, do Gf^*io do Crvtiamsmo, das Memórtas d* Alem da eampa, [Em portog : Henrique Ernesto de Alraeila Coatinho, O enterro de Atala^ xn- Algumas poesias^ Porto, 18^6; Man<-el Cypriano da Costa. Atala ou os amores, de dois seJ-vng^iiS no deserto* Brevissiitio resumo (em quadras lyricas ... Lisíioa, 1827; Felippe F df S.. e Castro, AtrJa ou os amantes do deserlOy Lisboa, 18. . ; Th. Braga, Obras pri- mas . Ataln, líenaiOt Areviuras do derradeiro Ahmcerragt com um estwio do ir.». C imbra, 1í^7; GTuiíherme Braga, AtoJa^ Perto, I8"i8, 4-** gr. 1 vi. com grav. ; outra td , Po to, 1 84; José A. C de Melo, A enturas do uf.ttvio Aierf- cerroge. Angra do Eeroismo, 844 ; Marqnesa d'Alorna, De Bonaparte e ios Boitrboiiã . ., Londres, 1814; Bento Lnis Via ia, Henato, epií^sod o do Gento do CriStt wtrno. . ., Paris, 1818, 1 vol.; Manuel Nunes da Fonseca, Os Martirts ou a rel»giao christà em tnumpho^ Lisboa, 1816, 6 vols. ; D. Bin.'venuto A (>. de Caupoe, Os Mártires ou o trxmnpho di Ref giào christà^ Lisboa, 1816- 17, 6 voís ; oulra tr. por Filioto, Ohr i^, vii e viii; Caetano Lopes de Mii.jra, )s' Notcf'eíi. historia americana. Pnriâ, 18 H, 4 v«^ls ; Alriào Forj^iz de S.irnijaio, Pensamentos, memorias e sentimentos f*ucio de minhas leituras e Roma e seus arrabaldes.,., Pam, 183-4; editu lo por Joaé J N Arsejas (Ofr In i c, Dicc XI •! plg ii6 . Deus o quer. Li - boa, lis4 ) ; C C Branco, O G^nio do Cris^ tionismo. .. trad rev. por A. S"ro«nenho; 'uitra tr. d* Castilho e Men iea Le, l, Lií*boa, 1*<54. U vol.; José A. N. Vieira Mem. d\4.lém da Campa], ete. : H«- RAXOB ! 178í' 1857) o celebre aut r dj » càneõeí» populare , (luo i le elevou muitas ve*fs a t' da a altura da poesia lirica; Lah^kt nk (iTíiQ 181*9), orador parla i.en- tar rot>-v<'l, Irstoriador, romancista f pcéia. oe qu^'m se citam como melhores as Meditações e as Harmonias' poéticas e religiosas [Vau portug. : Marquesa d*Alor».h. Ode a Filinto Elysio, in Obras. »v; Jo.sé M d'A. Ferreira, Hist da revol francesa de 1848 Lidb' a, 181:9 M), 4 vols ; P>aní'is.io D de A. e Araújo, Bist dos (lerondinos, Lisboa, 1^5i: li.. O pwisado. o presente e o funiro da Rf publica 1'orto 18 t»; id., A poUtica raconrã, Coiínlira, 18;V.); José A. ias, Btogr. de Jo^o Guttemberg, Li-b>H, NSbo. 4". de lO pá^s ; Mdncel U. de S. Abreu, O Iramem, meaitaÇfJo^ \i\-Opefano senanári de Braga, 1^^71-72), u."^ 8-11; ' in^' in» Chatr-^s, Regina, episodio 'tas <i Confidencias^, 1873. 1 vo!.; id , O pedreiro de Sa.nt-Point, narrativa popultr. 1 vol ; i l , Genoveva. Porto,. 1851, ávoi.; Mana A. V. de Cnrva h Raphael, Lisb-ia, 1889; outra tr de D En.íniíi Sinith. 18ííO, 2 voKs da « Hibl u iv ant e mcd »; Aifnd'i (lam- pos. For d' Alisa, Porto, 18Si, 1 vol.; Mana Jo-ó da Si'v . Cinui •, /oc/^/^^/r, tr prona: Bulh «o Pato. GrazieUa, 1888, n v « fiibl univ ant e mod »J; Alkií-do DJi ' la^y 1 17' 9-1868. a t^r do iiii anco hist/rii'«. Cinq ,\^iirs. do diaina Chartte- ton, e d . colei«çao de liricaa Poemas an i^os e modernos. [Kai pnrtug Jo tj 'iia M d >ilva, Chatterton^ dram > em tre» actos, Sa"ur. 'ii, 1857|; Dei wu; s (1793 8Í3l autor d?iK tríjéd ias Vésperas S <'i ianas. Pátria, Marino FaUrro, das e^nufuiias Escoa dos Velhos, Com diantes e Hcí hiIi-Muas el''ui s p ^t i >ti- cas intitula-las Messenienses : V cr» u Ilroo ílS 2 188.'^) qne expò^ a iif>\a (iiro- cçào dfB enoirití s no prefáeio d' draiiin Cromwe , e qiie ele iTiUiai ttMnci.te ex»rnp.ifie"u nos dran.as Hernâni, Le roi s'amiise, Lucreca /^orí^ia, Ruy f>las e fíufgra es, nos Tiiminees NossaSen ora de ''aris, Miseravei^i, tionwn^ do mar. Homem que ri. Noventa e três. e na» v-<>i evo»;- por i, Md Vo^es inter iofé-s. Folhas a' outono. Contemplações Orictaes e l.enda dos seca' us, pK.-ln-ò-a tttas qu h d -rarn iu.s a ser (.•••n i i* ralo cuno um dos pritii^ir»- [jnéran rpn* a Pr -nça e o mu ido mu admira lo [lOm p >rra^. : »Ii:^iiol A. -li .^i va, '^í2" d' !S- fandi^, Li-»b r-i, Hl., 3 vois ; Fri'iiin;.> J P. «Uii ia»,! n Ht^niani. dri n i, Ri*» áf*. Jttic!r«), t8l:S: Josi M. l? S L » ) > Os ^iiiror ws trUo^ia, k\' ir>. 1863; PranjísvSO P. da 3. -Vieira, Os operários do m.ir, Li^bja, i8jò ; H , Os

6 10 HISTÓRIA DA LlTBBATXmA PORTUOUftaA

miseráveis, 10 vala., ibid. ; id.i Otí^o/n^m ^a^ ri. 2 rola., ibid. ; Ednardo de Faria. Ruy Braz, drama hiet. imitado em prosa, Lisboa, 1840. Id., Nossa Se- nhora de Paris, Lisboa, 1841 ; João Pinheiro Chagas, Nossa Senhora de Paris, Porto, 1887, 1 Tol. eom grav. ; Âií njmo. Historia de um cnme, Lí^hoa. 1901, 8 Tols.; Nossa Senhora de Paris, Lisbon, 1853. s. d. de tr.); J<So Husa, Clau* éio Gueux, Porto, 1^89 *, António R. de S. e Silva, Miseráveis, tr rev. por Gohldino de Csmpos, Porto, (s ».) in-foL, com grav.» 5 toIb ; Alexai^dre A. Barreira. Hug-Jargal, Porto, 1885, 1 vol. ; Angnsi) Machado, Meus PUhos, Fortu, 1884 l vol. ; Maximiano de Lemos. Noventa e três. Porto, 1^8tí. 2 T«>l8. ; BulhSo Pato, Huy Blas, Liebna, 1881; Hist de um crime, 2 vols., e^ n grav. ta. n de tr.) ; Napofeão o Piçueno, 1 vol. com grav. (s. n. de tr.) ; Fernanda Leal. Entre os trad do verso de Hago merece especial nençS^ este autor. Vid. Livro da^Fé, Nova Goa. l* ()6 pág 65-113' utras tr. in 'icadns en Br i<> Aia- nha. Factos e homens do meu temiot, u. 285. 'Ihiophili Gaitt aa (IHli -1872), [Em port : D. Maria Ha S. d' Almeida, Fortunio, Lisboa. 1889 in-» Bib' univ. ant. e mod »|, Tuiodorb na BAaviLLa Char .ks na B^DDaLA*RB, Lkuomtb ds LiSLB, (18:20-1894) A na Mussht, 1810 i857i, t- Jòs« Maria db Hrrkdi^. t.\e- ram ama acçlo determinante no movimento poético contemporâneo Vaac ikb, ST»]^HAaa Mallarme renovaram mod< inai lent^ o estilo, o ritmo e a bt^l»SH plás- tica do verso franct^a Com Sullt Prcdrohmb (f 1907) a li eratura francesa per- deu o 8PU melhor poétn e «ntempoiftneo.

ComFRBDsRii VIi TR L [f '/.» 4) perdeu-se mais qae nm poeta regional oa francês nm verdadeirc génio universal.

Um poeta qne aeordoa a alma da França foi Padl DaaoniADB (-{- I*.4l4) autor dns Chants du soldai.

Alcançaram no romance e no drama fa*na immoriedoura: Soa Ba (1791- 1861) [Em portug. : Joaq<iim M. Baptista, G^rnlda ou a vna l'ê rhé., r^perm cómica, pilavra» de...^ Lisboa, 1S;'0, gr., 144 pág ], os dois Aiiex^MOBa Dumas, pae (1803-1870) [Em portug : (citarem -h sóment os mais sensac OMaes) O Comie de Monte ('hrufto^ Lisboa l847, 6 vols (E^a 1 * tr em p rwig Innfc, Dxco., xi i. 35) Ha- rutra-» tr. de Joaé M. de S. Ribeiro e d E luarde de Faria; Mi:ruel A. da Silva, O captáo fanlo^ Lisboa, 1841, •J vnla : Id., Ar.té. bid., 1847, 2 vols. ; 'd , S?/lvandire, .bii . 1848, 2 vols. ; Id , fídu-^rdo lil^ ibd., Ib50, 2 v(íl8 ; J sí'í M de S. Ril)»ííro, HiH dos Stuirtn, Li-»1> a lh4l, 3 vols.; Id . A CoiidfêM i de !S'ihahnrif^ ou a inst ttmçao d'\ Ord^m dt /v^a. Lis- boa, 1818. 2 vols ; Joh6 M. d" S Lobo. Ke'm, ou a dfêortietn e o t/f^nio^ Áv \t<\ isr>'3; Frincisi'o L. ('. <le M rani ., '^^emorian d'uma favorifa. Li h<ia, 18<)0-l8»ii; Joàn \j li. Tr pieir s. A s gémeas Machicow, 18» <. 4 v- Js ; Id., 05 Mochicanos de -aris, l8f>,*MU. iJ vols \ . A fur a do in- ferno^ 8f6, 1 vol.: 1(1., Deos dispõe, 18«>>. "i voi : Augusto J. H. G nzaga. Os tns Mosqu tetros, Lisboa, l?*5f), 4 vols.; Augusto C de L.u-t-;da, O eh le de cacf-emini, ramela Lisboa, '86 ; J ào B. Fornira O sr de Dumbiki, (omeda, ibid , 1715; Eduardo de Faria, Memorias d* um medico, Lisboa, 18*H 4íí, O voU ; Francscc A de A. P. e Souna, As dunS Dianas^ Lisboa, 1847-48, 9 vols ; P Chagas A San f-eUce, 1864, 3 vols : Id., O filho de Murai, 1872-73. 4 voU ; li.. O Capuõo Pau o, l878, l vol ; Míino»». \. de S. M Piuheiro, Hst d'um mono cnntcda p >r el e ifiesmo, LislM-a, I8H7; Id., 05 doas estudantes^ ibid., 1857 in-Um palácio sem nome. . . de P Cli«»ralier, tr, do mesmo; Fr.niíi co F. da S Vi» ira, Romance d* uma Senhora, Li^b^a, 2 vols ) e filho (18.4 ISÍT)), [Em portug.: P Chagas, A dama aa^ camélias 1 vol (3. a ); outri tr. is n. do tr ) A dama das camélias. com prr^acio de JuHo Janin: ArTonio \1 V ('arrilho, .1 vid'i aos vinte annos ; Id., Diana de Lys], Iwr.isK Slr ílhOl- S í') [E'n portug; : Jo.ié P Keis. Mysterios de Par:s, porto, l'~4.< 8 vols.; Li , Os Sfte peaados mortaes; Francisco C. d** M. e M(> lo Marhilde. . ., Lisitoa. 1^44-46, 8 vo s ; José F. de C. B. e Noroih*. O Judeu errante, Liyboa, 1845, 10 vois.; Eduardo de Faria, Mysterio do povo.

oApfruto VI jIpooa mouAwnoA 51 1

1850, 7 voIb. ; Franeisoo Â. de « P. e Soasa, O aventureiro oa e ia Azui^ LisboH, 1844, 8 Tola. ; Id , O Judeu errante, 1860, 5 vols ; Jofto B. Trigaeiroa, Arthur, 1850. 2 vols ; \A.,Áfamilia de Jouffroy, 1854, 6 |).; Id. João Cavalleiro, 1854. 2 vols ; Id., Os segredos do travesseiro, 1, 4 voU \ id , Os fl'hos familias, 1866, 3 Is.J, e os iniciadores da escola lista Balzao (1799-1850) [Era portag : Th. Braga, Obras pnmas ... , Porto, [Í9; Baihâo Pater: Vendetta, Porto/ 1874: Tio Goriot 2 vols ; Os eomedian" Stm o saberem, (s a de tr ); Pedro dos Reis, O lyrio do valle, 181)0, 8 Is.: Assis de Carvalho, A casa de Nucingen, 1891, A moiher de trinta anoSy de Laia Cardoso, Lisboa, 1909 1 vol. ; e outros na bibl univ ant e mod ], ^(BBBT (1812-1880) [Em portag.: Francisco F. da Si Iva Vieira. Salambó^ Vsb^a, 186ri, 2 vols. ; Jo&o Barreira, Madame Bovarv, scenas da provinda^ 1 ti.: Id . Saf-ambó, 1 vol ; Id.. A tentação de Santo Antão ^ 1 voí. ; V Edu- 00 sentimental 1 vol.] e Zola (f -902) ievuu o realismo ás últimas c nse- i<*ncia8. De g<''nero inteiramente diferente é Julo V^ernb fl8i8-1905), o cria- fT dos romances geograíioos e de sciências natarais Dezenas de obras fírma- an neste género a saa reputação verdadeiramente universal.

Na oratória do palpito, á, sobretudo, notável La :obdai as (1802-1861) Sm portng : IlermenegiMo A Pinto Conferencias de Nossa Senhora de Paris^ lio de Janeiro. 2 vols ] e MoHSâBRÉ [Mm portug, : As suas Conterências em Íotre-Dame qae deram brado fof- m trad. p lo dr. Silva Ramos, decano da FaF- oilade de Teologia dti Universidade], e na parlamentar Bbkjah.n Comst.ht lí67-1830) e Gambbta (1832-1883).

De^tinguem 80 na história: Guzbt (1787-1874), [Em portug. : Marianno I. Cabral, Da democracia em França, Lisboa, 18í^V; Marquês de Sousa Ilols- tein, Htêt da cviftêação na tlaropa^ 2 vols ; Maximiano tie Lemos, Hiêi. de h^ttítrra contada cuí» meu» vetos... ^ tlltiêír., 4 vols ] Thikbrt (l 788-) 856), lliCHBLBT (17í»í$-1874) [Em portug^: JosA M d' A. Ferreira, O padr^, a mulher e a fimtlia, Lisboa, 1861, 1 vol ; Rrís Damasco, Joanna d*Arc^ l}^90. ! vol. ia íiM. univ, ani, e mod], Thiebs (!797»877) [Em portug : Migu 1 J. M. T<rrr-a, Hist da remohkçào frirtcêsa, Lisboa, 184.-), 6 vols. ; íd., IhH. do coO' *^-ídê c dó. império, tbid., 1845 e segs. ; outra tr. de Francisco Duarte «le \. e Aida^u] e RsNâN com as suas obras das Origens do Chnaiian smo fi\m portug. : Funei^ieo F. á* S. Vieira, i ida de J^ms. L-sboa, 864 . Id , Os ApisWos, ibid , 1866. Ha outras trad. d. 1." obraj. O sábio Maapero ^f 11'16) ai',anc;ou toionJdde em assn ito de Esôptologia.

Entre os filósofos deste aécuio sobreaaem Augusto roMra (I7í)õ-18' 7) e Fm LE L'TTttÉ (18 »1-1884). Na filosofia ta«ribein Iíena.^ e Taink atitaaram podero- ftjiejte na dirt^cçSo dis idéas cout» mp irâneas.

Nestes ál'im >s anos a Fraiçi tin perdido grande - ero de escritores wtiveis como FkakçoíS CorPBS, (f 1908) V^icr «a bn Sardou, Ludov c IIalbvt, El* LB Gbbelart . , . (Sobre o movimento potiíO rn»ileriio, i'áp ciahnriti» sirubo- ií*H po<ie consultar se An^bí Rakrb. Le symbolime, essai hisiorique sur le RourcfTtóní symboliste en France de 1885 a 1900 suivi d' une bibUogr ; laris, '''12, 1 vol ) Km Bbuvbtjeke e E Faoohí- (f 19 H; a Literatura francesa p rdeu Maetu dois mais autoiizados criticos: cm Jules Lbiíaitrb(1914) em poeta, con- ota e homem de teatro ile grande valor.

ITÁLIA

Os mais ilnstres cultores da Itália literária do sfcnlo xix sao :

0*BiiO BoTT\ (1776-1^37 , notável p las obra.s histnricad 'iist da Itália

isde 1789 até 1814 e a Hist da Itália continuada desde o fim da hibtória de

Ouichartfin até 1789.

Cbsab Cabtu (1807-1895), escritor eatólic^o e lib ral cirja Hist Universal

* toraou conhecido em todo o mando [Bm portug. : Laid Francisco Kiddo, O bom

mtmÊt

5Í2 B BTÓBIA TA UTBBATUBA POBTUOUÔ8A

menino, contos moraes.,*, Lisboa, IS^íO; José Caldas, Margarida Pintai fí:u Vianna, I8b9; Mano 1 B. B aneo, Hist Universal (parte da tr. feita por Rt- be'lo Trindade), Lisboa, 1875-76 ; António Kiim^s, Hist, univ. rejormada. accrescentada e amp'iada na parte relativa a Portugal e HrasiL . .^^isboa, 2) vols.; Júlio de Castilho, Os izUimrs trinta annos, Lisboa, 18tt0, 1 vol.]. Cultivam :i fílosoBa e a teologia;

Ros\£!Ni (17i)7-1885), G kbrkti (180'"-1852) e Ventoha (1792-1^^61).

Alex NDRE Manzoni (1 78'J:-i873), nm dos arautos do romantismo com os seus fíimnos Sagrados, a céltbie ^áe Cinco de Maio fobre a morte de NajK>- leào e coTisideiMcia uma das maia bo'as da nossa época, as trag-dias Conde de Camagnol e Adelchi e a sua novella tam espalhada I promissi sposi (Os Dea- posí^dosi.

Uq'> FoieoLO (1776-1827)^ poeta, dramaturgo e romancista, cuja obra ca- pital sain os Sepulchros.

S Lvio PKLLicir 1 1789-1854) a quem a trag'dia Francisca de Rimini, os Cant cos e '^ o sias inedit s em ver-^o e as obras em pros-i Deveres dos homtns e as -^'1/1 as prisões conferiram títul- s df» d**Btioto e clássico esttri nr [Em por- tuj:. : Fr.uiciáo C. de M e Mello, Tratados dos devens do homem dirigido a um Joven, Lisboa, 1843; Id. As minhas prisões, C limbra, 184^].

G A(> MO Leopardi (1798 I8b7) .talv(*z ô primeiro poeta lírico da Itália mod» r ia aiitôr das n<'tH.bilit>8Íina3 comp' s (-Ò»'» Cazoni, Versi da canç o O amor e a morte e da obra viu pro^a Opúsculos m ra s IVitei-cem A Itáíia eonten.po- râ-.KíH Jus.-: ('Aiinocci (1^.S(>-I905; cnjas Odes barbaras t^ con a^rnr in i^ n\») o priíntMro p lóta d-» stMi paÍ8 ; Ivimundo db Vm os 1 "»4o) cujas obras Constanti O- po^a, Marrocos, Scbre o Oceuno f"ia tiad p<"r Pinheiro Chagas; Axto^iu l o- OAz^KEo (líStii, brilliíintrt lep oscotaiit»* do ideali mo poesia e r o r^niaiice ; Ei»MUND DK Aàiiois (184"»), CO ti.-la e pro-^a<inr fulgurante e G*'Bribl oWnjinNzio (1^H'{) cuja ccfbfdado se j^mpagou rapi lamente e)n todos os paí-e** gr»çi3 Bobrctudu uos soua dr unis fV^d .H^b e e.s vi fa e contemporânea do romance Jí:am Dl KNii, Le roman italien conte mporain Paris, 1907).

INGL\TEIiRA

Eis os uoiues dos co.ift-os do romantismo no pretente período em In- glaterra:

, . WouoswoRTH (1770 ^nOí, jtutór sonetos e baladas, nas quais, b»Mn coMio o í^rt itdio o na E.xcursdo traduz tin f'nuir»s s mp es os s^ntim nt e nj;iis elcs';.d 8 c o chefe da es •«> a do Lakistas assim ch>»mada p«>r ocj j o«'Ma.-* cama- lem r |>'t'da^ vzís og bii^ s do Wertiimri l.md e. do CninberlMnd.

Ihomáh MoMRtí ( 17*9- lòi)^), aiií-u- das Mehdias irandesas e do romam-e LaUa RoocfiU, oade ^n int rcilados quatro d fS &eus mais couh cid w peque- nos pí-e ..}.».

Byhóv fl7S8-182i), o mai* af mado pr><'ta injxiÔs depois de >hak speare. Dpíxou o poíMna f-ereçrmaçfW de C' id Harold « s cf nti^ era verso Cerco de Connt^o f^r-sioneiro de < hi/on, Rarisina e Mas ppa : oa drarnas Man- redo' Marino Faliero e Dois Foscaris. e o ay-oiiil)ro8 p^ema D. Jo'1o B ron é nina da;* I L-^-ira-í niaid notá\ fia e mais cu ioaas da Inglaterra literária d- s lenipfp nro- deru H ['an p iiui; \ Fernando L M d' Mbuipienjue, O presO de ( hilon Lis- boa, l>;{o T Im cío •Xnt.-ui Oaveiro. Lara. Ilio de Janeiro, ^88*. ; FI»ni ijiie E de ^ ('< u ifiho, O cerco de C 'rintho. Porto, 1^3 ; VI inoel R diS Abreu, O ''o snri'i (s'» o O. I) ir» Op r^rio iseininario de Braga), 18- 1-72. n ** 1 '■ ; Alh( rt.i l .'l *'3, Peregrinaç-lo de C^^id Harold, S^li 1 vol. ; A •gu.''tí> C. Xa- vier, "anffcJo; Id ,0 Giaour, C< imbra, \6Sò, 1 vol. ; João Vieira, Os amores de D. JuaUy l vol J

CaPÍTUIíO VI ETOCa BOMAKTICA 51 3

Skellbt (1792-1822), poeta mais revolncionário ainda qne Byron, cajá ma não «:gaa)oa porém. ^4 T££iKT8oH (18v)9-l892). é especialmente couhdciâo pelas elegias qne dei-

a com o ti ta lo In memoriam.

S^wjBBUUNB (l*^9-íy^'y) era considerado o maior poeta contam porâa^ío de 2ft]glaterra. Â doa injpiraçlo revelou se brilhantemente na poesia é^i^^a, lírica e nática.

A novela histórica encontra o seu fundad(»r em Wa tbb Scott (1771- 1833>, de Kdimburgo, qae lanç»d bS ba-ied d sae «lovo erAnero liter.irio no Wa- rUy, Antiquário, Puritanes da Esc>'>cia, RobRoy, Noiva de Lammeimodr, Jvan/ioe e em mnitos ontros ro.uaticeii que lhe erearain uina repatafào universal. ^10 miââo A. Herculano inspirou se paia os rotnan^^fs hiat<)rtcus U' ste cA'ebre au- tor |E .1 portog : Caet.no L^pps de Moura Os puritanos na Escócia. Paris, l^S?, 4 vol-. \ , A prisão d'Edinburgo, ibid, iS3S ; Id ., O tatisman ou Ri- cardo na Palestina, 'bid , 1837 Id. ^ O misantropo ou o anti o dos / edras Negras, í ari», \^'ò'i \ Id Quintino Darward ou o Escocês da cõfte de Luís XI, Paris, 184...; outra tr. Ant<>nio J. Kitmalh» e 8 nsa. Lií*bi»a, JiSh->, \ vf Is. ; ' ontr-4 de Jnlin Ccear (1. de M-^gaUiáes, 3 vold. : Caetano L. Moma Wuverley ou ha sessenta annos. Pai is, 18'U, 4 vois ; Outra tr. de André ,í. Kmiu lho e S> QBa, Li-boa, iH .. 4 v^U ; A. J lliunlho e Sousa, Os de^posídos. . , Lis- boa, 1837 3 vois. ; Id. Ivanhoé ou a cruzada bntamca, Lislí^a l^oS, 4 voIs.; l\. Keni'worth, \b\d , 1842, 4 vcis ; Ia.. Anna de Gelrste n ou a donzeJUi do nev e*ro, ibid , 1.'43 41. 4 v< Is. -.Joné M. de Sa le 'R Imiro, Mcste ro, Lisboa, 18 2. 3 vois ; Id Abbade..., ib d., 1844 3 vois •, Vllmiel A -ia Silva, (Ima lenda de Montrose, LiVbon, 1813 3 v(»ls •, Id.. Guv Mannenne ou o astrólogo ^ ibid., i842 5 vois ; Id . WoJdstock ou o cavaleiro, ib d., 6 v< Í8.j.

Charles Dickbns í1812-'870 , ailqmriu uma giande repntuoà com o seu prí-neiro romance Vlub Fickwck Ui kens dirttiugue-ae pela finura de obs rv^a- eiio e p«Ia exquis'ta sensi »ilid.ide que s* revela-n na Vtda e ave turas de Ni- co au Níckfeby, Barnab^ Kudge. Contos do Natal, et*. Tein-s con pimio a Ditrkena o nots > Juli Denis [ m pnrtug : A C xxx Scenas da vida iit^'eza e uma Loa do Natal em prosa .,; Pe>tro doa Kui.s O ho ^ em e o cspcciro m- Bibl un V ant e moi. (outros eontos na mes 'a Cotecieíu)), J J. I ( ix ir;i Bo- t.lho. Lentos do Natal, s. a. (19<'6), 1 vnl., Lisboa].

Ontros escritíTCs notáveis p deriainos ainda mencionar, como Lytíon (1785-1872;-, Thacheray (1811-18(j3); Th.'MÁs Lar yle (1795-1881) a qnem -e de- vem vários trabalhos de história sobre a Rtvolução francesa, (183/ 1, Frederico II da Prussta (1860-64-), etc; Mvsc/m-AY (180(M8r)9) hutôr Oa tíistória de /n^'a- terra desde a subida ao throno de Jacqiies II: Stu^rf Mn.i. (1806-1-62 que deixoa obras de filosofia como o Systma de Log ca e dr Scienàa socíaf^ de politica como os Principios de Economia politica, (joverno rcpresenUitivo, «'te; Ubbbbbt Spejtitbk (l820-190f)) é o maior p-ieólo^ío da Ing aterra eonteinpdrnnea; ÂJUiZAbDRB Bain (1818) fcz, como ele, da biologia a base da psicologia. Um e OQtro infiniram immeuso na mentalidade do nosso tempo.

O melhor romancista do periodo contemporâneo é, pode dizer-?e, Georgh EioT {l8<9-lí^80). Os seus romances Scenes of C' eriçai Life, Middlemarch, Daniel Deronda, e outros, manifestam um espírito snl)t!l e pMutrante

EtusstH (1817-1899) é o grande M^ístro da Arto. Liv^ma como The sevcm Lamps, of architeciure, The stones of Venice, lhe Crown of wild olive, otc, sam outros tantos exemplares de profunda críiica e belíssimo gOBto.

Esta resenha ficaria ipcoirpletisísima so uTio ine"('ion\::.íein"? •^•= f c^as primaciais da literatura anglo- americana, om Em^rsov (180T 1882' pn»HT d'^ i «ado e psicólogo penetrante como o demonstrou nos Ensaios sobre os hofrcns rcpre- sentatívos.

honarKLUOW (1807-1882) que se destingnin pela colete Jío lí?'iea Vo7^s da noate e pelo poema Evangelina. Viajou muito e da sua estada em Espanha

" ■»■!'

514 BMTdsiA UmàTOSA POBTUeuâSA

resnltoa o tradasir as Cop^4i$ de Jorge Manrique com nm estado sobre a poesia espanhola [Em porta^ : Mi>nel Street de Arriaga, Evangelina, Lisboa, 1879].

Edoab Pob (1801*-1S49) notável pelos sea4 oontos fantásticos (HáTaríoi Contos, 1889 1 v 1. in-Bibl. univ. ant mod ).

Pbowh (17íM809),Irting (1783-1859) e sobretado FaviMosa GooFSB(17d9- 1851) síio Hdiniraveis prosadores, nendo universalmente eonhe<'id^ «s leos romances [Em portng : C;etann Lopes de Mnara, O Derradeiro Mechicano.,,^ Paris. 1838, 4 VoU ; Id.. O Piloto, ibid. 4 vols].

Fecha brilhantemente esta dérip Brbohss-Htows (1812-1891) de qaem s^ citaremos uma das soas pérolas A casa do Tio Tom»

ALEMANHA

A literatura aleirS eonta no séc. zix grandes poetas e grandes prosais- res. Goethe implantara com a sast incontestável autoridade a harmonia, a m^- dida^ o ritmo, caract^ristic^s da literatura grega. Mas um STupo^e escritores sorria qne despiesdn e combaten t sne h(*:enÍ3iiio, voltando-se de prererênri i pira a fd td» \^édia, para os romances de cavalaria Logo os bantizaram de Roman- ticos qiiar do mais fMrof^riamente oa dever>am chamar Germânicos' Certo é que a novtt escola deprCs^á se imp*«nb*i com todas as suas vantagens ma» também, depn-ssa, com todos seus bnsos e e^ t*'avag&Doias. Citemos os corife* s prinei- paifl : os irmãos Schlbosl (Auinisto-Fre lerico) (l767l**45i) < Frederico) (1772- 1&29) poeta-» e erutitos foram os primeiros th órícos da esooia Sesuiram-at Nov-LiB (1772-18 1) TiRCK (i773-1^5^) que foi com oslrmSos Schiegpr BBidoa fundidores do Athénoeum o rrgílo da nova e8<»ola, Chamisso (1781-1838), «•ujs conto Peter Schlemihi, além de baladas e canções, t »mou eélebre, P[.atb« (\1^^ 18<^7) independente de estiolas; Kobb br (1T91-IÔ13) m' rto aos 22 anos. oMsji imnrt-tlÍEado pel*>s seus cantos gn^rreiros; Arndt (1769-1860) ci^aalmente imor- talizado pf^los seus cânticos patrióticng^ e enfím R okbbt (178^^-18^6)

Um grupo dissidente do iomaiitisn>o é o que f«'rma a Escola suabia onn Uhlakd it7871H62) e^cri or cheio de serenidade, doce e simpático e K.KByBB (178^1862), poeta e fíl6:iofo, á frente. Hbbbl ( 7^0-1826) pertence ta ubêm a este grupo.

A' Escola austríaca pertencem Zbdlidtz (1790-1862) Lbbau ( 1802 1850) t Gbun (18()61876i, três poetas que cantdm a natureza e a pátria, em formas ora simi^Ks. ora brilhantes.

JovEN Alemíinha. Revoltandc-se ontra a escola clássica e contra a roinântii*.a, surgiu um outro gnipo de e.scritores capitanead(« por Ebomi Hi'n (17 '.' l^r)H) qu<' se propôs reaizar ub programa político social e lit rário. Poeta liiiiio. cri'ico, natírico, e humanisti, H<*''ne é uma das íigons mais »)Otá- veÍ8 djv Alemanha literária conte m porân t^ i. O Livro dos Cantos, os NovoS Poemas, o Romancero, no gónero lírijo. Atta-TroU e A Allemanha no satirieo, Ahnunsor e RaUl jj no dramático assim comj em prosa, a sua melhor obra Re Síbilder colo»-avíini-no na van^íuarda dos escritores n»ais eminentes. [Ka port. : uma ou outra p )Osia dispersa, o Joaquim de .\raujo, O mtermezzo lyncojf

Prosa. Nào nii* mPM>s ilu-tres qu-' os poétíis aqueles Cdcritor-s que uo sec. XIX iMiltiviir.im a filo-ofia, a hi.^»Ó!Ía, o te;» tro, o romance. . . Nomeando Fidír (l7b-'-lSi i', hiHF.LLiNo (] 775-1 gr» V), IIecel (1770-1831) Schopbsbacsb (]7'^^]'^''h o nltiinaiiifmte Nirtzscur ( 1844-I9CK)), qne produziu com as saas qI) -i C)'iicm da trai: 'dia, Assim falou Zarathustra, e tt.uitas oatra^^, ama inlK •■lUMa consi irr 't*l na ciircoí/ão iIob ei^piíi tos da sua pátria temos indicado Q^ ;i i'ciiiars (*H(M'itor»'s íiiMi s(i (iíatiií^^niram por trabalhos filosóficos.

Nu Céltica b.V) \Vo p fl75t*- .8-lj, os iraiS' s Ghijím (.Íoc b e Guilherme, G'j"'i'i' r\ " Mli.i })ol]t ( i7«s;- lí^or^ o H( u irmão Alexandre 1769-1859) naturalista e viínaiit*? exiuiiíí ; na //ís/cWj Niebuiib (1776-1831), GEBvisns (1^^^^^^)»

«APÍTULO VI aPOCA BOMAHTICA 51Sk

LiopoLD Ravkb (1795*]866), Stbel (1817-1895) CusTiua (1814-189^) e Mommsbh (1817 19u3)'jnei^ao profundos investigadores; no romance Rcn-ritu, (1768 1823), HoFFMAH (1776 1822) cujos fantásticos coutas toda a gente culta conhece, âpsb* BiCH (1812-18^2), KvLLBR (1819-1890) e Hí^bb: 1830) encontraram um pub ico en^ toBÍasta: no Teatro o nome que naturalineute primeiro ocorre é o de WAONBa (1813-1883) poPtH e másico destiotisMmo, o criador trenial do «drama musical», do Navíf' phantastna, Tanhãuser, Lohengrin, Mestres Cantores, Parsifal, eUi.

Ve^íOi depois 08 contemporâneos -- Sudermann (Rerm^n) nasc do em 1857 que àêm de romaiices escreveu Die Ehre (A donra) bem conhecida em todos os gtaides teatros europeus. Heimat. Qluck in W,nkel, Morituri o outras sam egoalm*'ute peças dramáticas de nome. Hauptmaiíji mais noVo que o seu compe- ti or, pois nasceu em 1862 é, como ele un cu tor do género naturalista, em- bora nfto «bsoiotov Antes da atusora é un> estado sobre o alcoolismo que impres- sionuQ piofundameote Os tecelõts rfpousH sob e um fáHlp bietóri<-o e prodnsia cgualmente emoção A Festa paz. Almas soUtariasl Florian Geiger, etCi tratam tiinbêm a quentão social, onde positivamente Hanptmann alca^jçou oa mais assinalados triunfos.

Nào deixaremos de mencionar aqui o nome dum lusófilo notabilíssimo, qoe mu t concorreu para o conhe«*iment<j da literatura do nosso País entre o es- tr. ngeiro Wilhe'm Stonk, (1820-1Í»05), a qaom o Sr. Leite de Vascousflloa devidamente c<>iiiemorou no vol. O Doutor Storck e a Lit, Port,, estudo hisL^ bibliogr,, LiDboa, 1910.

Literatura Russa

Esta ' resenha das literaturas estranjciras que precede cada período nck coesa própria fícar-nos-ia incompleta se nós > ao déssemos aqui uma noticia, emlora sumaríssima» daquelas individualidades que. fora dos povos até aqui es- tudados, adquiriram uma fama merecida e UMÍversal. S^im particularmente russos e eiscaiidinavos que importa estudai no u periudo conte.mporântio e actual, visto qne modernamente se pode dizer que entraram no convívio intelectual e artís- tico dos velhos povos europeus. Isolaios por coudiçõed geográficas politicas, lingoísticaSf uma sede de >Iesconhecido, de imprevisto e de novidade levou oa espíritos ocidentaes a retemperar-se em fontes novas de inspiração Um-t aluvião de tradnçõee apareceram em todos os países c'>m o intuito de darem a conhecer 08 h<*meii8 buperiores que ilustram a literatura do século xix e o corrente. Lem- bremos da HuBfiia:

ioDCHKiNB (1799-1837) representante do romantismo do seu país poeta e prosador vigon^so. Conhec dor do íspanhol, d<' italiano e do inglí^s, foram aa obras de Byron as que mais influi ran n . seu espírito. Os seus Prisioneiros do Cáucaso dt-ran-lhe jus ao título de j^rande poéca. A sua Historia de Pedro o grande e o ^eu romance histórico a FiL' a do Ca/? Wo são as bu^s meiliorea obrds. Foi Hiorto em 1837 num duelo por Oaiiièd. oficiil de origem francesa. *

Go«ofi n809-18^2) professor na Univ. de Saint-Pclersburgo, aut^.r da ÍTsíí. fies Árabes e (^a Hist. d i Idade \Uclia e íbia nuvelaa Arabescos c Narrações de Mirgorod e do grande romance Ai mas mortas. •Ninguém mclfior do qiui ele, escn^ve L(>nis Léger, soube ontir o espl"iidor das noutea del^krin''a, a rriaL,'es- ta^ie don grandes rios, o enctuto nielaucóli "o da estope. As su is novelas nfio vei- dadé"ros pfqoenos poemas e a sua prosa cadenciada tem a harmonia e o numero dos mais belos versos».

ToraOEMBFr (1818-1883) um dos tbcritorca q'ie mais se crstínguo pelo cuidado, perfeição e aelicadeza da fiSnua. Od Paes e FJhos^ Terras vírt^cns sauí grandes romances de telas 8ocia"3 Algumas das suas novulaa iLoptcárionam ^clu Tida e realismo das personagens e do movimento scónico.

6' 6 HIBTÓBIA lU LITSBÁTXTBA PORTUOUftBA

DosToiETTSKK ( l ■^22- 1881), escritor popnlarissimo na Bússi v Filiado nama sociedade sí^crcta, foi condenado á morte, mas a pena foi-lhe comuta* Ia em cxi- Jio p ra i\ Sibéria A este facto d'* mas uma das mais impressionante^ obras Lembrança da casa dos mortos Outro romance de celebridade mandijil é oC>i- me e Castigo. Na Carteira dum escriptor deixoa muitos dados auto-biográBcos. ; Ti'l9toi. o c(»nd'- Lfào Ni«*.oihievitch nasceu em 28 de a^xr ato de 1828

em lassn ia Folinna, no governo de Tnla. E' do t >rio8 os seus comparrio^as o que ii.aior glória literáriíi conqnistou As suas tvíoriaa rcliginsas, pfv.ítieas. so- ciaes que uao literáriís e estíHieas toe n sido e con*^inuarao sendo miuda- ire te ana'isvla3, djscutidas e crític-jdíis. Ateu e nihi ista na ^ua prime ia mrdv lidade. aparec^^-nos depois mistíco e s nhador de uma nova fónna eiitriosa Para qu<í citar os seus livros aq'ii ne.4ta resenha estéril ed ficientssima? Para que leu brar o s 'u famoso romioce Guerra e Paz onde a vidn russa ét»m h»* amente descrita? Ou o Uesurre çào Ond» de euha o ideal de uma vida sócia! divo .sa da que temos V Ou o Anna Karetiina pungeute drama de um adu téiio? Ou o sca drama x* a ista Podar das trevus? etc et ?

S KXK Ew.cz. íl8ÍD-19«6j nào podoria -i^r esquecido. Polaio, ca tiv^aíin- gaa nacio. a c » > entranli.L-lo umor e com nilo me 03 entranhado am'^r cant* nns sens romaiceíí a p.Hriii esmagada c oprlm-da. De todos os seus r^.ma^^ces foi o Quo vadis o (|ne mai co h»'c*i ;os tornou o seu nome. O seu Cctilo v chfíio de cla- re/.a, de e- quôncia e de imaginação E todavia sabe Deus parque tradnv5»*3nós adivinh iinos a m;igia d<* f s^e esti o !

Max mo G rki. (f 191 S) é o sublime interprete das tragedias dos humil- des e o pr'>p. iganHista dris «déas maici avançadas.

Sobre o período actual cfx-. Sí.rgb Pbr?íky, Les maitres du roman russe contemporain, Par.s; lbl2, i vol.

Literatura Escandinava

Po" irilí'!''-' '^^X'^ ni'^ soja o período inicial da literatura escandinava com n sun Rrrií' ' en] ts i* no mitos, que no soe xi tomaram a fórm » e-críta sob o nriiiic dr F.dilas f (jn»' ^'.\':\ o e citiC-ito prini -rdia' dos Niebelungen^icd, a que é pi»'t'i.i'» r M*( , Ff-, nr « •.«-taV d\s » n^ctiH das tradiçí^es poetic is e re i^iosas oa Ale- ii.anlia, na«i,í mais ••(ini po'i'VMOs faz';r do qne assinalar pouco mais que a perso- nU:ihii" (-xíracrilinaiia de n)sen.

Xo fci''í*. XVI i; o notnf» d»' Andkiise:? 1 80ã-l 87 '^) avuUa JjI gloriosamente. Nas Aventiir,:s da minha vida d(íixou expostos os tóp'C03 da sua caireira aci- flfiiT.ni.i. S.,i;i prin ipa nu-ntri os seus i ontos, ricos fant^iBia, e htmx dramati- z;4vlo- tjno o t iiiaam eonlicfâlo o (\sti,imd > entro nós, ocidentaes.

Tkw vm ( 1.S7J-181G) ('• um puíHa d»^ ta ento. Frithjof é cm poema épico que pinta a '"iiir -vpltnente os contame^ dos países s«'tentrionaes.

Kl M.nr.iíG. (1804- 877), K lmann (1811-1860) distinguiram-gé na poesia e no r' max.-e. A maior p: oria porêin da lit^^ratura escandinava estA em Idses (l828-r.K)^>) d-am itnrcro viííor')so, dotado de um poder de evocaçiio maravilhoso, venti ando com t:rande esj) r.t-» de' sobri<'dade e de clarpza os mais empoignntes prob'ema3 re i^iosna e soeiaes. fazendo-nos sonhar algumas vezes, obri;;a" do-ncs a pensar poinpro. Todos ou qna-i t(»da3 as snas obras estào traduzidas pira fran- cOtí, sendo rHi.resrníadas vm todos os grandes palcos do mundo. C<2/2flríí 5flff- viif.e fcer Gint, Rrvrnnnts, Hedda Gaber.,, contam-se entre as mais belas crCacões <^ran»atií»as don n^^sos tempos.

Ontro noruf^_urs notáve , ainda vivo, B orníion Bjorxstikrnt? nascido em j83-2. Hu TJiiWía la bcitaist y o Roi Sverre a TrUogie de Sigurd, 08 Noa-^ vcaus miriés^ furam dramas representados com extraoi dínarias ovações no tea- tro de Criítiania, de qne ele era Director.

iCJOÍTULO Tl MOOLA BOHASTIOA

51?

JoHis LiB, que nasceu em 1833, é outro escritor contemporâneo desliii- tissimo. O Visionário, novela romântica, oonqniatou-lhe de princi|^io granda^ reputação. Foi em Paris que escreveu os melhores romances Condamné Â vie e SM Filies du Commandant Em 1891 publicou um estudo sobre BalsM)» justamente apreciado Honoré de Bcúzac, Vhomme et i'artiste. CttaremoB ainda Gboboi Bkamdèe, nascido em 1842 em Copenhagne, critico de arte e escritor de grande erudiçSo. A sua obra mais importante é a intitulada Priaà^ peux courants dans la littérature, du XIX^ siècle,

ROMÉNIA

Exaltou o nome da s;ia Pátria, imortalisando-a uma escritora insigne, c[ae foi também uma notável figura de maiher, a Rainha Isabel, mais conhecida pelo pseudónimo que adoptou de Cármen Sylva (1813 1916). Os romances e «ontos irai-eam-lhe lugnr de destaque na atual idade. Quase todos os seus livroa foram trad. para francês, o que tornou o seu nome conhecido de tod >s. A soa sensibilidade de mulher e de artista revela-se bem a que fizer a leitura doa Pensamentos Les Pensées dune Reine.

BRASIL

Deveríamos consagrar neste lugar um g á literatura dos nossos irmSoa dalém mar, áqaela que nos deve com a lingua, a religião, o direito^ a arte, a poesia, a literatnn e todas as manifestações espirituais que toroam os bra^iltu- co-participes da. moderna cultura ocidental, como escreve Si aio Romão.

Mas ecPtendemos melhor remeter o leitor a quem o assanto interesse para o Compêndio de História da Literatura Brasileira daquele aatôr e de Jo^Ur Ribeiro. (Rio, IfOí-, 2.* ed ) e para a Hist. da Lit. Brasileira de José Verisdi- mo, Rio. 19I6^« Lucidez, concisão, juisos e apreciações críticas bastantes a •oiíear quem segue a leitura, iaformaçdes bio-bibliográficas comedidas dão a estes livros um lugar de distinção insubstituível.

A concisão que guardei pira as outras literaturas tem explicação fíLeii. ^aeaqai não colheria, n^m para mim, nem p%ra o leitor.

Comemoro apenas como uma grande perda nacional o desaparecimento ^ daas grandes figuras de críticos e de educadores Silvio Romero e José Veríssimo.

38

CAPÍTULO yi

Escola Romântica

(1826)

Sumário: 181. Romantismo: sn^m características 185. O Romantismo na Énrop^. 186. O Romantismo em FortagU. 187. Garrett. 188. Uereolano. 189. Gabtilho.

184.— Romantismo: suas caracterfscas. Nos prindplo»

do sée. XIX iniciou-se na Alemar.ha um movimento literário, que em kreve Be eomuníjou a toda a Eun^pa, e que é conhtcido, á falta d^ melhor palavra, dizia Oarrett, pelo nome dn Romantismo ^. Este movimento procurou desterrar os moldeti rotineiros e estéreis, que áesde o féc. xyi dominavam soberanamente em t< dos os ramos da» •bras litf^rárièit», e, «-m v^^z desses niolde^ clássicos cansados, impor lovos ideais, fazendo consistir «a er semeia da art>j e da poesia na naravilboÊo e no fantástico, nas lembranças da idads-módia e até Oriente e nas tradições p> 'pulares d.

Elstadan^iç a obra do Romantismo vê-se que as suas earaterit- CM aam efectiyamént < :

1.*^^ A reacção contra a Escola Clássica, c Lancemos o mar- telo ás teorias, ás pnétican, ao^ sistema?, trovejava Victor Hugo célebre prefácio do Cromwelj esse prefácio que det-de- 1827, ano em ^ue apareceu, se consuierou o grande manifesto da Escola Român- tica. Abaixo o velho estuque que mascara a fichada da Arte! N&o ^ regras nem modelos à ê n das leis gtrais da natureza, que planam iobre toda a arte, e àlôm das leis especiais que, para cada composi- {So, derivam das condições próprias a cada assunto ».

^ Garrett dizia bem : nem etimológicairteate, nem de facto êese român- tico termo romantismo caracter izHva a nova corrente literária. Jioma/itiamo de- rivoi de romântico, como este derivou de romait^e e êst^^, como muitos outros, ^ Roma (Cfr. G. Viana ÁpoHilaa aos Dicioiíános^ ii, 376>. Romance^ romã» *t<^« TomantxGa^ diziarse na idadt^-uédia da língua usual em contrapoeição á lingoa das escolas, da igreja, dos doutos. Liuguas e literaturas romanticau deve- >UiB ser, pois, na origem, as que se coutituiram independentes do latim. Mas o ^^^■0 foi uturuad* para denominar a nova Escola e não senão que aceitar «farta*

520 BISTÓRLà DA UTBRATimA PORTironâSA

2.° Condenado o qae fazia o obj<>cto da arte, era preciso ofe- recer aiguma oousa que o substitoisBe. Esse substituto foi a art**, ft poefiia, a lenda da idade- média e das tradições pátrias. Escrevia Gúr- rett^^o que é preciso estudar é as nossas primitivas fontes poéticas, OB romances tm t^tbo e as legendas em prosa, as fábulas e crenças velhas, as coetumciras e as superstições antigas, lê-las no máo latim «mosárabé meio suevo cu meio godo dos documentos obsoletos, no máo português dos forais, das leis antigas, e no csstelhano do mesmo t^mpo. O tom e o espirito verdadeiro português esse é ítrçoso estudá-lo nt grande livro nacional, que é o povo e as suas tradições, e as suas virtudes e oe seus vidos, e as suas crenças e os seus Ôrros. Por tudo isso é que a poesia nacional ba-ne reguçcitar verdadeira e legitima 'i. ittte regresso ás fontes nacionais é a segunda característica da Escola.

3.® Três séculos de classicismo haviam secado a veia popu- lar. Desaparecera a expontaneidade* Na Itália, na Alemanha, em Inglaterra ' como em Portug-1, a influência da literatura francesa fizera! -se sentir deí^póticamente e era por toda a parte a mesma imi- tação estéril, servil e monótona. O Romantismo proclamou o indivi- dualismo na arte, a liberdade contra o regime absoluto. Que cada um estude o que tem na piópria casa, antes ir vêr o que na casa alheia. «Que o poeta se guarde, escrevia Hugo, de copiar quem

?uer que seja nem Shakespeare, nem Molière, nem SchiUer, nem lorneille». É em Portugévl Garrett: vamos a ser nós mesmos, vamos M vêr por nós, a copiar de nossa natureza, ejdeixemos em paz

Oregoêf romàos e toda a (nUra ^gmie. . .

E que ha-de f > zer para isto? Substituir Goethe a HoráciO| Schiller a Petrarcha, Shaket^peare a Hacine, Byron a Vergilio, Wal- ter-Scott a Dellile ? NSlo st;i que se ganhe nisso senSo dizer mais aensaborías com menos regra *•>

Tal a terceira característica, que nlo pôde dizer se, todavia, absoluta, como se prova com os próprios fundadores do Romantísmo em Portugal. Escreveria Almeida Garrett, diz com muita razão Lo- pes de Mendonça, o seu precioso Camõsi como o escreveu, se nS« tivesse lido o Corsário e o Child-Harold de Byron? Teria Alexan-

1 Na Introdução ao vol. 1.* do Romanetir^, ed. 1904, pág. 6.

< Na Inglaterra e Alemanha a aujeifSo ao classicismo é passageira e de- vida á influencia predominante do grande sécalo clássico francês. Tomando cou8':!Íência de si o espírito patriótico de ingleses e alemSes sacode o joçfo fran- cês, torna-se independe/ite, « indivídaalista». «O romantismo inglês nS<' come- çou pelo medievalianio, C-ste foi nm sentimento derivado». Cfr. Carlos de Mes- quita, O liothfitihfimo inglês, Coimbra, 1911, Introd. '

«* Ibid., pág. ().

CAPÍTULO VI SSOOuA BUMÁUTICa 521

dre Herculano concebido o seu Monge de Cister com aquela ma^es* tofla 6 imponente fábrica de Waltt-r S(M)tt não noB houvesse dado o modelo do romance histórico ^?» Pregando, pois, o individualismo ^ a revolta era contra a tut la despótica até e^ntâo exercida pela Escola Clássica.

185. O Romantismo na Europa. Quem primeiro levan- tou o grito da revolta í^i a Alemanha, pelo que muitos autores di- sem que melhor se chamaria á Escola n. Germanismo i^ . Esse grito Boltoa-o uma plêiada de jovens poetas e críticos dos quais uns segui* iam tendências filosóficas. e estéticas «omo Schle^el, Novalis, Tieck^ Schelling, e outras tendências nacionais e históricas como os irmãos Grimm e Uhland. Mas o movimento impôs- se com Groêthe e Schiller, tendo encontrado cooperadores em críticos da força de Leasing e Wieland e tendo um representante superior no lirismo irónico da Henri-Heine.

De Alemanha a corrente romântica comunicou-se rapidamente a Inglaterra onde t^ve como arautos lord Byron e Walter Scott, co primeiro com a sua poesia apaixonada, profundamente pessoal, amarga e duma ironia desesperada; o se<^urido rcssuscitaado a idade média escondida sob o dos f-éculoa». Vera depoi.s a Itália e a seguir a \ própria França, que entrou no movimento ci m M."^° de Stael e Cha- teaubriand, aqueU dando a conhecer a Al<^manha e a nova geraçílo no iivro que intitulou De VAllema^ne (1802), e^te traduzindo e co- mentando os melhores p<»éta8 ingleses, como Milton e o seu Paraíso Perdido. Victor Hugo, Lamartine, Viguy, Dumas, Balzac, G orge Sand, iMusset, e muitos outros deram briílio extraordinário á nova Escola, qxie a Espanha acolheu com alvoroço por intermédio do Duque de Rivas e de Espronceda.

186. O Romantismo em Portugal. A reacção literária

efectuada em Portugal nos princípios do séc. xix t-mou, como na resto da Europa^ o nome de Romantismo, A corrente clássica, des- virtuada pelas imitações espanhola e francesa, acabara entre nós por avassalar todos os géneros literários. O respeito pelas regras da arte poética f8ra levado até o absurdo. O mecanismo substituirá a inspi- ração; o preciosismo desteriára o natural. A onda da erudição afogara OB domínios da poesia, a Quase se podia dizer destniida toda a na- cionalidade, apagados os últimos vestiários originais da nossa poesia, quando no fim do primeiro quartel dê-* te século (xix) a influência ia renascença alemã e inglesa se começou a fazer sentir», escreveu Garrett Os sectários das novas formas apareceram, pois, como in-

' Mémáiiaê de LU. Contemporânea, 1855, pág 4.

522 BlBTdRlA »A L1TB1ATUBA PORTUauiSA

flabmissos e inimigos declarados dos dogmas da vielha igreja clássica. E' a Garrett que se deve a glória da inovaçS^; dele partia, como êle próprio o acentuou, a primeira aclamação da nossa independên- cia literária. Desde 1825 Í6 que fora publicada a Dona Branca e o Camões, onde estfio as primpira^ tentativas da revolta. Em 1828 com a Adozinda e o Bemal- Francês firmou-se o efttanda'"te da res- tauraçílo. Falando do seu Camdes dizia o autor: c Conheço ^que está fora das regras e gmy se pelos principws clássicos o quizerem jiúr j^or, nào encontrarão seiíào irregularidades e defeitos. Porém «fo- claro desde que neto olhei a regras ^ nem princípios, qtte nao co»- tultei a Horácio nem Aristóteles, mas fui insensivelmente após o coração e os sentimentos da natureza, que não pelos calcxdos da arte e opera çf^es combinadas do pspirito^, E' a êst« rasp^a* o crité- rio, ipialmente seguido p 'r Herculnno e ainda^ embora m^is tarde Íir Castilho, que devemos a introdnçílo da Escola Romântica em brtugal.

Qiiando Garrftt ap^rKíe na sc^n- literária degrladi^m-se ainda os discípu o- d*- íi c í2^e d-; Fi into. A'íib>B oe jncontestáv^-I tsílento, 08 d is ^nmdes Mc^tres^ que faz m -r* transiçíto do Arcadistno para a nova Eseoln, aqu le com a if.elo.lit e oxponttn idnde dos i^eos verso^- êtíttt com as tr.»(lu(,!<5 s de d^is í*ut6nticos românticos Cha- teaubâand e Wielml , preci^^varn de ner substitui ^os nOs temas das MIAS obras, nas irlé .s, na in-^prçâ , no voe bulário e no «stílo- Com Boc^g intrclnziía se o ab 'S» da tranr*po iv3>") as n p-fiç5ea hiperbólicas, o tumid * vf-rso inchado ao veato d-» f^tlsas im^gnas. Os aomi^ad. rea do í^ra~ de El mano t x ig rár-im o erro e fiz ?raro da es- cola uma b goma plítnpica, em que martelavam no ouvido versoi hidrópií*Oft, ri«lí(íiilo8 e gnnííori^^taR,

E FiliTit ? Grandes servi-^os prestou á -gna q le punficou e enriqueceu cimstituiíid».-ae seu p.*U'^ino d nodHíio, ma:* fê-lo c»»m sa- crifício di nat'iriil;^^a'irt e da si-^^pli cidade. O período que la inou •m triinbpo8Í<;ues contr feitas; h h»ciiyAo psmmlhad» á custa de ro-* cábulos ol)M.]<-t'-8 « a «on-^truçío corcovando a i-.iéa debaixo do peso de txppss()"8 am-n» iradat*, leviraudo o estilo a torniquet-, dia Ro^ belo da Siiva, roubaram p-la Heipasi-i á sua Encola grande parte doi frutos, que a d^-viam popula»- zar, ppiram o s^n tal» nto áf^% am^^BAi grhças quH a imagiuaçFlo t eunda, e da < riginalidade que sempro ioge á rede de ap.nbar vocábulos com q^e armam á oorrecçfto oi copistas *.

Existia ainda José Asfontinho pretendendo dar leia á EpopdS| triunfar pela sátira, introm»-t-^r-he no t»'fctro, popularízar-se pelo jo^* Bal, insitiuar-se pelas cart^iS e pelos juizos de oensara literária, xnai

^ Obras CsmpUtOê, ed. cit. xviu

^ MQ eetro nlo tem grandeza nem fl^bilidaie, a sua sátira é groa- Mra e até obscena, a sua enidiç^ estéril. £' em 1826. E é nâesè voo que apareee em Paris am poema em sete cantos ^, celebrando a conquista do Algarve e assinado com dua^ iniciais F. E. O ponma era D. Branca e o autor Garrett, acabando a sapo$(iç2lò de muitoa qae tradaziam aqaelaa duas letras como as iniciais de Filiiito Elísio. Desde os primeiros versos se precente que alguma a)asa de novo qaere estabelecer se em lagar de alguma cousa que **q quero nbstituir e pôr de parte. A culta Grécia amável^ a bela Vénua^ Jipiter, BácO; Apolo ... de todos o poeta diz :

Gentil r^igião, teu culto abjuro Tuas aras profanas renunci > E para novo altar meus hinos canto

Disse adeus ás ficções de pUíE^anismo E cristão vate cristãos versos faço.

Pela primeira vez se aproveitavam num poema era lin^uagf^m ilaída, expontânea e colorida, episódios à*i tradição e da len^ta. Na Orónica de D, Afonso III, de Duarte Nunes de L ao Gacr«tt lera a relação da conquista do Algarve e ai a história da intenta I). Branca^ filha áaqaele monarca, que foi senhora do mosteiro de Lorvão. Com «ta infaata teve amores um cavaleiro Abon-Afan, rei de Silví^s, cajo reino Garrett estende por todo o Algarve. E a sua tantasia aproveita, em volta dâste ponto, episódios curiosos como o das bru- xarias do Fr. Gil de Santarém (C. vili-ix), o comba^^e dos cavjilei)08 de Santiago em Tavira (vi), a última peleja ás portas rle Silves (x) s até a narrativa da distribuiçílo da posta de toucinho aos fraieS| por horas mortas designado por Tremenda (i-ii).

E' quri Garrett está neste poema int iramente convicto la nova crença literária? Nâo. Mostra-se ainda indiferente, irresoluta (C. m, fisiTK. xii). Mas está Cam'(^e8 e essa iniecisno no intuito^ issa tal oa qaaí imperfeição e mesmo trivialidade nos contos dosi- parece. O romantismo estava definitivamente assegurado em PortugiL

Castilho qae foi a principio um clássico aciíbou por se conver» tn* ás noras idéas. Em 1844 escrevi -i o primoroso estilist i c . . . bana iei ea qne a Poesia portuguesa, como a do restante di Euroo^, e a iK>e8a mesma linguagem, se and m, annos, revolvendo para uca iaturo que ainda se não enxerga bem distinto; e que tudo que nós iiiUEemoe neste género, mormente os que ainda, como eu, retiveram (ttio grado seo) alguma coisa, e muito, de certos hábitos tradicio-

1 Quando Gkrrett refundia o Poema acrescentou-o e modifiooo-o ewm Miado sntiU) oom os 10 ctntos, qae pos^ae.

^^ y HltTÓniA UTBKVTtJSÁ FOBTOOITÍSA

" " III I II I I

Dan e viciosos em literatura, tSem e temos de ficar esquecidos diante da brilhante escola que por ventura vem raiando; isrra da pro- fniêsãOj f m que temos fé, para onde caminhamos, guiados, ora por nuvem, ora^ por coluna de luz, mas onde a nós outros nos nSo será dado penetrar». * Castilho era arrastado para o claseicismo pela sna educação e pela sua própria indole. * Mas a sugestão do exemplo chaamou-o para a orbita do romantismo, c Nascido, creado, apramen- tido na escola clássica, escreve devendo a ela o primeiro favor c^ie achfi no público, fanatizado pelos belos génios da antiguidade, rí\o. cheguei sendo tarde a íazí*r juptica a este livre e creador movi- mento da nossa era. Rendi me, fascinado pelos seus préstimos, ar- rastado pelo caudaloso do exemplo, inspirado pelos dictames da pró- pria razão».

Vejamos, agora, como esses grandes escritores Garrttt, Her- culano ^ Castilho concorreram paia a obra do rejuvenescimento li- terário, que proclamaram.

187.— João Baptista da Silva Leitão de ALMEIDA GAB-

PETT (Viscoi.ae de Almeioa Gairptt), (1799-1854) * nt.tural do Torto, línrçíu os seus esturcs ra lilia da Madeira sob a direcçSo i^H seu tio o bispo de Angra D. Fr*i Alexandre da Sagrada Família. C^s sf Uh pr meiros trí^biilhos lit<^rários retsentem-se da influência dí'8ta pTintira íduca^ao, que foi bobreturlo humanista, como se ros drt«nias ilêrope e Catão *. As lutiis políticas entre ab^outistas e hbírjíis obrighri-m-no, como íervorcso apóstolo destas ú t mas, a emigrar. O couvivio com o fstrai jeiro, onde viveu três anos (1823- 1826), pTimetramtnte em Tngh terra e depois em França, operou rma re^<^]llçao completa no seu espirito. Abandonando os assuntos clásfrieoh vdtou a sua atterçSo para sucessos e carectéres exclusiva- E erte díkíí n^is, dêles soube o seu bTilhante talento arrancar os me- Ihons fnírtchos para as suas obr*<s Um Auto de Gil VicenU (1838), relativo á época de D. Manoel e ao fundador do teatro na- cional; 1). Ulipa de Vilhena (i840) sobre a revoIuçSo de 1640;

* Do Prólogo das Excavaçòeê I oéiicaê, vol. I, ed. 1904, S Cfr. Excavaçòeê po^tcas ed. 1904 pág. 88,

* í -fr. Amor e Melancolia, ed 1903.

* Sobre a vida poiitica e literária de Garrett poBaaimos o estodo larga- mente documentado de Fr. G. de Anaorin» GnrrtUy memórias hiográjicaè^Z ▼oK, Lifboa. 1^81-1888: vid. tan bèin Homero Ortiz La I.tícra<«ro -Pof^»- g7iê8a tn e.l siglo XIX, Madrid, 18()9 ; Lopes de Mendonça, Memoriai de LU. Contefriporâfien, Lisboa. 1855 ; Th. Braga, modemoê idioê na LtteraíurA Foriuguêsa, I.^toI., pág. 25 e seg.

* No vol. Os prtn.etros versos de Garrett (Porto, 1902) eatfto dep&j. 11^ a 122 aa odes auacreontic<u^ qae o poeta escrevao bm seus primeiros anos.

CAPÍTULO VI— XSOCKA BOUAATICA 525*

O Âlfageme de Smntarem (1841) sobre D. Nilnal varas Pereira; a Sobrinha do Marquês (1848) alusiva á época do notável ministro d& D. Jiisé e, enfim, a primeira entre todas o drama frei Luís de Sousa (1844) que^ pela pungente simplicidade em que se cUsenroln, ver- dade e beleza das situHçSes, e aticismo da lingus^gem, é um padrSo imorredouro na história do nosso teatro. Não ficaram aqui as obras de Garrett inspirado em factos da vida nacional.' A biografia tam dramática do nosso primeiro épico deu- lhe o assunto do seu formo*» flissiroo poema, em versos brancos, C^am^ds (1825); uma lenda do tempo de D. Afíonso lii o conquistador do Algarve, inspirou- lhe D. Branca (1829), e o desejo d(* dizer alguma cou«a nobre a pintura hsitana levou-o a escrevesr o Retrato de Vénus (^1821). £«te5 « stu- dos. foram coroados com o Romanceiro, colecção de poe-^i; s populares, verdndeiro tr-souro que encontrou em Garrett o mais cuidadoso de* fensor e guarda *.

As poesias líricas existem reunidas na Lyrica de João Mir %imo, nas flores sem fructo e nas folhas caidas, a primeira desr tas obras escrita até os vinte anos, a segunda compreendendo as poesias escritas desde aqu-la edade até os quarenta e três anos, e a última onde se encontram as su s derradeiras compo8Íç5»H.

DíiH obras em prosa t<^nio8 como prmcipais as Viagena da minha terray miscelânea de história e novelística; o Arco de ISant* Anna^ novela histórica do tempo d»^ D. Pedro l; Portugal na lala^iça da Europa; Tratado da Educação^ etc. '. Garr» tt foi taniLêin um orauor eolqú^ite e vigoroso, sendo algumas das suas orações p-vrlamentares verdadeiros modelos do género.

(?omo o poeta é cheio de viveza e de colorido. Com u*Tia acen- taa'la predilecção por tudo o que era inglês dai sem dúvida lhe provinham a graça e o espirito, que vivificam as suas obras. Garrett tem ainda o mérito e a glófia de ter começado a reacção român- tica '. Os seus restos mortais iôram solenemente transportadoa

' Com certas restrições, é claro, pois Garrett teve a infeliz, id^^a de xetocar e aperfeiçoar o que lhe chegava da tradição oral. Mas isso, se empana, d£o invalida o grande serviço por êle prestado!

A ed. completa das Obras de J. B. de A. Garrett, compreende 24 tomos. Lisboa, (1854-1877) oa 28 na ed. última de 1904-1905 Lisboa.

* Garett deizoa alguns inéditos, ao qne parece de somenos valor. No Arqwvo Histórico Português (vol. i, n.° 5. Maio d(í 1903) foi publicada uma carta a Hereaiano a acasar a recepção da Harpa do Crente. A carta é natural- mente de 1838 e não obstante ter então Garrett publicado obras como Camões e D. Branca dizia nela: «Se ea tivesse SMÚde havia de refundir quási tudo que pobliqaei e de qae pela maior parte nao gosto hoje». O Sr. Júlio Brandão Bo opáseolo Garrett e as Cartas de amor, Poito, 1913, reveloa a existôncia de 22 «atas qne Garrett escreveu á inspiradora das Folhas Cahidas.

326 HIBT^BIA DA ÚVRATITBA FORTUCIllttA

I

para a igrpja de Santa Maria de Belém (Jerónimos) no dia 3 de maio de 1903 justa glorificaçSo em honra do patriota, do eflcrit4>r, do p<éta, do dramaturgo e do estadista que foi o Visconde de Almeida Garrett.

188. - ALEXANDRE ,HEReULANO de Carvalho e

Araújo (1*^ 10- 1877) *, de Lirt)OH, é, diz Komero Ortiz, o pléta m;iis M o&ófico, o novelista maits eru tito, o historiador muis coor BCiêíicioso, o pensador m .is profundo que teve a naçSo portup^nêsa no pr**s«nte século *. S Idado, c^mo Garrett, do exercit» lib ral, como êhi «'Xilaio da pattii, nJlo foi como o s«u cooperador n\ obra do romantismo, nm espírito vivo luzido pflas gloriai do mundo e qu'* por eUp se deixa^^se arrastar. E^ucsado primeiram^^nt»^ no Colé- gio t:o Espirito Si nto, dirigida pelos padr»*s de S, Filioí^ Néri, enccíitrou logo a aâmar lhe o tal nti in^ipi-nte a, M-^rquêw de Al HM, ihistrr? sf^nhcra dotada de raras premias de educ^»ç^í e alto e6|írito iUirttriído, «que fazia volt-nr a at^nç^ da m<cid«d«, ei*creve ê'» jró/Mo, para a arte da Al»*mMnh'i, a qual veiu dar » ova s^-iva á artf 111' ridii nal qn« vegetava na imit^çSo servil das chamadas l^tra» hícm.-^, < «ind estas f htn dadas no transunto ii^fiel da lit r^t^rafran- con i j- c[K ca de Lní- XI •. A emigr«ç?lo afervorou- o na>- suas crerças poii ic .s i littírárias. A Harpa do Crente (1838) e a Voz do propheta

* Vi d. A. Serpa Pimentel, Alexandre Hercufaio e q seu tempOt Lishf a, IS- I : TU. Bríip:«i, História do Romantismo em Ponugaf, Liàííoa. 188U; i 1 , .'15 mcdetnas idéus na Lit. Pott., •, pHfç e sp^r Bolhão Pato, Sob os ciprestes, vida Inttma de homens ilastres, Lisboa, 1877; íd , KUmó' nos, ffíenti"; de infwr a e Homt-ns d- fetras, LisK a. 18ií4, vnl !.<>; Alberto Pjiii" n!."'. V-me anos de V''ki lit^tána, pái;. "Jl ond** estnda Ho-ciilaiio sí-bo artp<\io j-.<»li ioo; lint') Araiiln, f-nttos e homens do meu tfmpo, ii, 7 110. R. Orii/. ob , rit . pi^. 298; D. António Sancli«»8 M ^çne , Alexandre Herca'<inO de arva^ho, M dri i, 18í^>, reproduzido no Instituto, vol xi. ii (I8í'6) p^. 41,') (' sf^r. ; Silva Cordoiro, A crise em seus aspectos morais, C^iiiubra, 1896, páp: 18 o HOií. ; Novo Alm. de Lembranças de 1879 bioçr. por \. X Hodriguc» CurdíMro; Mem, da Acad. R. das S:tenc de Lisboa, vi. o, u ílHOí) elogio por M. PitslKíiro Orai^as; Agostinho Forte*», A Herculano Breve esboço da sn& vida e obras Li -boa, 1910: Gomes de Brito, /.<* centenário de A H. 28 de março de 1810 a 2S de março de 1910. Páginas {ntim< s, ibid.. 1910; BhIwmt Osório, f aneglrico, ibid., 1910; Teixeira de Queir z. Centenar o do nasci- mento de A. H., ibid.» 1910. Estes últimos sani «a melhores trHbaJhiíS qUt aparecram por ocas S o do centenário do naseirento do jfrancíe hintonador. Veja-hc ainda Boi da Seg. CL de Acêd das Sc de Lisboa, i i (1910, n*d« bo -enairem, e J Ajçostinho, A Herculano, Porto 19 jO; G-^mes de Brito, Hercula o, estudos r.rit co-bibliogr, nt> Dic Bibl. d»* [noc., xxi (1914); Ag. ForicM, Escorço da vida e obras de H., 1911; Costa Ferreira, H. sob o ponte vista antro poL, Lisboa. 1911, 1 folh.

^ Ob ciL pá«. á97.

3 Panorama, viu, (1S44), pág. 404.

Oàrixou> "n bsooia uoim* vtí«a 527

(1836) sam ob protf^stos da sua razSo itidiernada contra a víolaçSo da8 liberdades politicas e de consciência. Fundou á semelhança do jornal ingiêa Penny Magazine e com o intuito de n derramar a .ins- truçfto íasendo descer a literatura e a sciência ao nívd das intflli- gèncias comuns» o Panorama (1839) ^ que lhe devi ensejo a publi- car as soas int«'r''Ssant«^R novelas histórica», que reunidas formaram 08 dois vols. das Lendas e Narrativas (185)), dos quais o i»rira*iro com pretende: O alcaide de Santarém; Arrkaa por fÔro de Espa- nha; O Castelo de Faria ; Abóbada; e sigundo : A dama de cab a; O bispo negro ; A morte do lidador; O párocho de aldeia; De Jersey a Granville. Neste ^'énero d^• romance hintónc" H* n^u- lano publicou, discutindo ad mesmo tem<>o uma.tés<^ filoFÓfic», o iliõ- nasticon em 2 vols. compreend^endo Eurico o presbiterOy nlat vo á inv 8\* árabe na PeníuduU, que foi publicado em 1844, e o Monge de Cister publicado em 184S e r fí^rt-nte á época de D. Joílr i. Tudo nênses volumes é ettudado com o maior rigor oesde perso- nagens aos acontecimentos, constituindo um» « intuição quás*» profé- tica do passa* o, áa vezes inruiçâo mnin dificulto«»a que a do í «taro *,

A figura capit»! do I.® romance é Eurico^ descendHnt** He «n- tisfOR nobres e educndo em ToI^íIo, q»i' se apaixona pí>r IL-rmen- ga/rday ilha do Duque Favila e irmã de P»layo. Ttnd«.-lh«* «i lo re- codada a mSo da donzela, vítima do orprul ho.pt terno, Eurio faz-se lacf rdote o toma-se pastor espiritual da br»' paróquia ide Carteia, na Béti a.  sua vida passasse entre a reef»rdaçlo do amor lon^inquo, hoj»* impossível, e o amor da Pátria invadida e subjuga ia. Ao p«so d^s suas meditiç5es vem arrancá-lo, u.m dia, a n c ssidaie de com- bater o inimi^. Substituindo as vestes 8ac»*rdutaÍ8 pelas armas do cav lei» o tem a ventura He salvar a HermcDgarda da» mílcs do eDi»r Ab<íeliziz. Mas quando »li d»»8Cobre no seu salvador a Eurico nêí»t'í presbit^íro enlouq lece. EU bii^c^ a mortí^ luntári:i na luta •xeUm«^ndo : c possa o sangue do mártir romir o crime do presbi- tero! 1

Nâste romance-poema episódios sublimes como o da bata- lha de Chryssus (cap. xi), o do Mosteiro da Virgrem Dolorosa (cap. Xli), o das elegias do Presbítero (iv a vil). E em todo Ôle, da pri- meira á última linha, a mesma igu^tldade e brilho de estih», o mes- ao colondo e perí^^içâo da lingua^iem.

No Monde Cister a acçâ) desenrola se n^ tempo de D. J 5o i, ^ cavaleiro Vasco da 8ilva ao voltar da bo talha de Aljubarrota en-

I * Compreende cinco séries ; i, vol. 1-5 (lft.S7-41) ; ii, vol. S-8 (184 .'-46);

u, vol. 9 (1846 59), e vol. 10-13 (1853 5^) ; it, vol. 14-16 ílbf)7 58 ; v. voU

^'\H ( 1866-68 1. Heroolano obrigara-se com os editoras a escrever em todos os

a,^* doM a duas páginas e meia, pelo qae recebia 40^00 rs. mensais, Enoo.

MU., ZTU, ia6.

Bm4*IA DA LITaKATtfKA KtWTVautMÍ

coDtra a ena prometida Leonor cacada com Lopo Mendes por ser mais rico e nobre que êle ; sua irmã Beatriz seduzida e depois atun- donxda por D. Fernando Alfon^o a seu pui Vuco Eanea morto de vergonha e de dôr. Desde então Vasco st} alberga o sentimento àa, riu- gança e é a frio, serenamente, que assassina Lopo M<'ndes, e ve^tiDCla O hábito de Monge de Cioter continua perseguindo D. Fernando Afonso.

No desenho das fixurss, como na dos vários tuceasoB H-nsa- lano pôa o mais rigoroso cuidado. Citaremos como ex. a retrato mO' ral de D. JoSo I e Joíto daa R-gras (vol. I, cap. XV e Xxiv); O do abade de Alcobaça D. JuSo de 0rn4fB, tipo de perverso, ao Jsdoda Tr. Lourenço Lampreia (v<i|. I, cips. VU, VIll), a discrição da pro- cissão de Corpua Christi (ii, eap. xvii), a da Festa da Maia (i, cap. IV), o do sa-nu da Côrt" (il, cap. xxv).

Como ae vê, tanto no Eurico corao no Monge a âgura central doB romxnces é um aao-rdot--' e ó na ojiosição do dever nligioso o principio do c libato, com as imposiçSes do coração no L", « no 2." n luta i-ntie a vocaçSyarrfbHtadn, a profis>'So monástica íeita no delírio da dôr irrem-diávcl e as paixõ a do homem e da aociedade, en> qu'' é preciwo viver, que se ■■Btribt tudo o enredo até o deaeo- laie. Quí^lfUT qun seja o n'>s?o juízo sobre o pfnaamfnto filosólioo, qn-^ (tingiu Ilurtulano, o facto é tT êli> escrito uma obra, qui- pile contar-se como uma [jroduçSo admiráv I do engei.ho humiiQO. Míi vej^mioa outios trabalhos Ho autor. Proíu^das e d ■-. m orad as investi gv çõe* nos principais cartórios do p^l-' haliiíiti.rara-no a escrevur o maií TÍg'ir08ij dos s UB entudos a História de Portugal ', abraçando D m^i" d.fiuil perfodi>, o dwa orgena, em que, todavia, algum* fousi encontrou íeito no paciente e uonseifncioso estudo de Antómo Bruiidâo e ni'S tiabalh'iB de Schaf.-r wóbre a história do nosso pai» (1HÍÍ6J. A eel^ama qu.. a História de Portugal levantou, pelo facio dii oniiB-3o do mil»t;r(! de Ooriqn", originou os npúscnloB de com- bate— Eu e o Clero, Consideraç^-es pacíficas, Svlemnia verba, »* tritb- lbi> IIP mais largo tôlfg" História da origem a do eitabelMÍ- mento da Inquisição em Portugal (1854-59, 3 vol.). Como só-iod» Aoíjnemia ri^l daf nciéncias Oe L sboa dirigiu a publicação Port» galice Monumenta Histórica *, e quando atada a pátria muito h»'*

' 4 vols.. 1, 1K46. at,'D Afon8Í»i;ii, lH47, atÉ D. Sancho ii; iii. 180, até D Afonso in; IV. 18:i3. f«a elueH*-no de certos pont.>3 vèr o cspleriíij trabiilho de l>s»id I^pfs, Os árabes nas obras ãe A. H., notas marginaaít Unsaa e histót ia porta guésa, Lisbi>a, lilll. .

^ , U-poie da morte d.. A. Htrcidíino piseou a dirRi^çAo desta pnbliW» nara O Bfu le-taiiienteiro e aoiÍRO, o pale^lgrafo João Basto que tantos Berrip" Pe«t..u.->03 .■r.,dit.,s p-rtu^-m^^es na J-orre Oo Ti..nbn, onde era en.pre^adoW- Denor A sua in. r^; í IhVO) foi uma perda maito aeneiv.-l. bobre a indo e ^ s dw-B. doa P. M. H. vid. Boi. da 2.- Ci A

CAPÍTULO VI BSOOLA BOUÂHTICA 529

a esperar dele, rléRalentado, ambiòionando a obscuridade e nada maie, abandonou o convívio sociedade « daa letras, e enclaustroa-se na quinta de Vale de Lobofl, em Santarém, onde faleceu a 13 de Setembro de 1877. Com dle perdeu a península ibérica o seu primei ro^ o seu grande, o seu único historiador, de qnf^m pôde dixer-se, sem lisonja, que reunia a elegân^âa de X^nofonte á energia de Salúatio^ e a concis&o de Taci e á irapar- ciabilidade de PoTibio *. Se o principal titulo de glória de Hercu- lano é a histÓFÍn, nSt) devemos esquecer que é também um éta emi- nente*, como o provou com os pequenos p^iémas que intitul u Deus, Semana Santa, Arrábida^ Cruz mutilada, Victoria e Piedade e muitos rutros.

Os seus artigos mais imp. rtantes publicados no Panorama ou cm íolbeto fÔram recolhidos «c^rtaflamente nos Opúsculos, de que publicados dez vols., e de que, para se fazer uma idéa, respigamos alguns do9 assuntos neles tr^^tido"*. Assim temns:

I—A Voz do Profeta {i'l IS); os Egressos (135-154); as íreiras de Lorvão (193-206).

II Monumentos pátrios (3-54); Mousinho da Silveira (171-223).

III ít* e o Clero (1-34); Solemnla verba (62-184); Clas^ ses servas na Península (237 332).

IV— Oa vinculos (3-104); Emigração (107-292).

V Historiadores (3-24); Feudídismo (193-300).

Yl Bens da Coría e forais (183-301).

VII— Foraía (277-286).

YJII— Instrttção pública (105-163).*

IX . Origem do teatro moderno,

X Reacção ultramontana em Portugal, a Concordata. Juntemos ainda um vol., de Composições várias e um 1.* rol.

tle Carta».

Herculano foi um exemplar perfeito de honestidade, tinha a frigidez de caracter de tempera antiga» e conquistou o respeito e «impatia de todos os homens de bem do seu tempo, a principiar no monarca D. Pedro V * que com a sua amizade honrava o grande escritor do seu reinado como no mesmo tempo Frederico, rei da Prússia, honrava o grande escritor Humboldt» *. A sua obra histó-

^ Ortiz, ob. cit., pág. 334.

* D. Pedro V (1837-1861) era bem digno da amizade do grande hiato. TÍador, qae nao podia ser main profanda, d> m mais sincera. Di.senhei o peral do BauidoBo monarca no vol. Cartas inéditas de D, Ptdro V, Coimbra, 1903

"* As palavras entre aspas aam do douto Prof. de Direito da ' Iniv. de Coimbra, Vicente Ferrer de Neto Paiva (18(X)-l88í)), que aos 80 anos veio da sua aldeiazinha natal Freixo, contigua a Lousa, lèr o »'logio do seu velho ami^o «na íessSo solene que lhe consagrou o In-tituto. Vid. O Instituto, vol. de 1878-

530 auTdsu »a uthutuba mbxiwiiéia

j

rica, embora nSo seja impecável, ficará sempre* como um modâo de^ •orrecçao e de gravidade.

189. -ANTÓNIO FELICIANO DE CASTILHO (1800-1875)

naturi>l ue Lisboa, íoi um cooperador operoso Ho romantismo ao lad» de Herculano e de Garrett. Nenhum deles ihe levou a palma na graça, na harmonia, na pureza, e no gosto com que escreveu o nos* so idioma. Cego, em virtude da eoímnidade do sarampo, desde a idade dos seie anos, a vivacidade das snas faculdades estética» supriu a vista que a doença lhe roubou. Com seu irmSo Augasto, mais noTo quatro anos, e que foi para êle amigo e companheiro des- velado, assup como a luz dos seus olhos, estudou o «urso de haoui- Bidades, concluido o qual, em 1817 se matriculou na Universidade, ma Fai'uldade de Cânones.

A Bua tendência romântica, manifdstou-se logo nas nove Cor- ta$ d^ Echo e Narciso, cujo asnunto em tirado da mit»! ^gia grega e qn« apareceram em lb21, na Primavera que é de 1822, no Amor e Melancolia de 1828, e acentuou- He pod^-rosamente em A Noite d^ Castello 1836) e no» Ciúmes do bardo (1838K

Quando a Sociedade propagadora dos conhecimentos úteis ini- cir.u em Lisboa a publicação dos Quadros históricos de Portugal Ca^tilho encarregou se da parte literária, mas a breve trecho tam mtil como interessante publicação interrompia-se, ao mesmo tempo que o mavioso poeta partia para a Madeira a acompanhar sen irmSe Augusto, que lhe era dedicadíssimo, mas que se achava condenado pela terrível doença a que sucumbiu em breve. Castilho voltou oon coraç^ alanceado, m^s brevemente se retemperou na luta ^em tréguas das letras. Herculano fundara em 1837 o Panorama, Casti- lho fez pelo seu lado aparecer a Revista Universal Lisbonense, que durou quatro anos. £m 1845, de colaboração com seu iroião José, publicava a Livraria clássica portuguesa destinada a dar conheci- mento por largos extractos, dos melhores escritores portugueses^ mas logo dois anos depois o vamos encoatrar na ilha de S. Miguel lan- çando os fundamentos da Sociedade dos amigos das letras e artes dando ao prélo o seu livro A felicidade pela agricultura* Vêem a seguir, entre outros tr baihos, o Tratado de mePrificaçâOj o Estude histórico-poético de Camões e o método primeiramente conhecido pelo nome de Leitura repentina e depois por Método de Castilho, que êie mesmo dedicadamente ensinava, como apóstolo fervoroeo da inbtrucção popular que sempre íoi, e que lhe marca um lugar indis- putado entre os pedago^btas mais distintos do nosso país. Para defender publicou os folhetos Ou eu ou eles (1853), Tosjtda dum eamêlo (1853) e Ajuste de contas (1854). No Brasil, para onde par- tiu em 1854, escreveu Castilho a sua célebre Epistola á imperalrvs* Nã« obstante serem todos os trabalhos, que deixamos enumeiídti^

▼1 mmêjét MuianoA 53|

Bafidentes para firmar nma repataçfio nSo comtiitaem eles ainda a maior título de glória de Castilho. Efectivamente Castilho é sobretuda antf^B de tudo um mestre da forma, uma purista, um cláií^sico da liogaagam e como tal se revelou principalmente nas traduções qua empreendeu dalgumas obras primas das literaturas estranjeiras, como as Metamorfoses (1841) e os Amores (I8õ8) de Ovídio, a Lírica de Anacnonte (1866) e as Georgicas de Vergilio (1867).

De Molière apareceram quase sucessivamente as belissimaa. tradações do Médico á forqa. Tartufo, Avarento, Doente de scisma, Sabickonas e Misantropo; de Shakspeare, o Sonho duma noite de S^ João; de Goethe enfim, o Fausto. £eta última deu origem a uma polémica violenta ^

Tal o esboço, a largos traços, da vida deste mestre da língua, que se extinguiu pelas duas horas e meia da tarde do dia 18 da janho de 187õ, depois duma dedicação completa ao trab;«lho, cuja cantor foi, dedicação- tanto mais para admirar quanto a fafalidada quf' o af^inalou desde a infância lhe serviria por ventura de de&culpa depois da morte *.

ROMÂNTICOS E ULTRA-ROMANTICOS

Sumário : 190. Sequazes da Escolsà. Caracteres. F. Xavinr de Novais e J. P. de M'>iai9 Sarmento. 191. João de Lemos. O * Trovador». 192. Os Poetas do «TroTador». —193 A. A. Soare» de Passos h^. J da 8. Mei des Leal. 195 Fr. Gomes de Amorim 196. A. P. da Cunha a Castr». 197. Thomás Ribeiro. 198. Bulhão Pato.

190. Sequazes da Escola. Caracteres. A E.coia ro- mântica estava definitivamente implantada pela poderosa influência dos seus iniciadores. Mais ou menos fieis ás formai^ romant cas apa* receram numerosos di cípulps entusiastas^ seguindo o caminlio por ^es traçado. O abuso e exagero das normas adoptadas devia produ- zir mais ta^de uma reacção salutar e criar a escola dos Dissidentes ie Coimbra, que fez enveredar por novo trilho a literatura portu-

^ Gromes Monteiro, Os Críticos do Fausto do Sr. Visconde de Casti' lho; P. Adolfo Coalho, Sciência e Probidade, a propósito das pasquinadas <te Sr. J. Gomes Monteiro Se Companhia^ P(»rto 1875; J. A. Graça Barreto, Liçãa sum literato, Â propósito do tausto. Resposta ao Sr. J Gomes Montei/ o; J. ie VaacsoncftloB, O consumado germanista (vmlgo o Sr. J. Gomes Monteiro) e s Mercado das letras portuguesas.

* Mait'i8 obras de Castilho haviam-se tornado raras no mercado Feliz- mente possuímos hoje as soas Obras completas revistas, annotadas e pref(u ia^ ^ por um dos seus filhos. Lisboa, 1903 1910, 80 vols. Etípalbadoa por êss* nooamento, o mais glorioso que podia ser levantado ao imoredouro eacritor, •Dcoutra, quem quiser pesquisar -lhe a fecunda actividade, materiais de sobejo a to de nais para agua.

'SÍ2 HIBTÓIZA DA UraBATUEA PORTUautSA

gaêsa. Como românticos mais notáveis podemos citar JoSo de Lemos e os }'0éUt8 do Trovador, e yários outros que abaixo designamos. 'Claro é que a escola rom^intica tem íeiç5es diferentes em todos os «eus sequazeS; alguns dos quais acentuaram mesmo a sua individua- lidade. Mas a influência dos processos e método da escola é neles, mesmo quando re>igem, nitidamente acentuada. E' satírica e mordas em FAUSTNO XAVIER OE NOVAES (1820 1869) qua escreveu um volume áe Poesias (Porto, 1^55) ao gosto de T«*Ientino a quem excedeu «na largueza dos quadros, na variedade do feitio e do assunto, na expon- taneidade da in^piraçJJlo, na ausência de artifícios arcadianos, e at^ e muito no reflexo da sua pessoa, como altivo e de brion, a contras- tar com a nojenta pedincharia do profes&or de retórií-a» ^ ; simples e p pular em IGNACIO PIZARRO DE MORAES SARMENTO (1807-187U) que ilus- trou o seu nome com o Romanceiro ou coleção de romances da HisU Portug. (Porto, 1841 e 184Õ) e os dramas Lopo de Figueiredo ou a cárie de D. Jêào II (Porto, 1839), Diogo Tinoco (Pí)rto, 1^39), Proscripto (ibid., 1839), e a Filha do sapateiro (farça). Mas a escola romântica adquire cambiantes várias desde os poetas do Tro- vador e Soares de Passos até Tomás Ribeiro e Simões Dias.

191.— JOÃO DE LEMOS. O tTrovador» JOÃO DE LEMOS SEIXAS CASTELLO BRANCO (1819-1890) foi conhecido

desde o tempo de Coimbra, onde se formou' em direito, pela publi- oaç&o do jornal poético O Trovador, interessantissimo repositórít das produções poéticas dum ^upo de moços estudajites '. Álêm dele, alma e director d^ssa publicaçSo,' faziam parte do Trovador Luís da Costa Pereira, A. X. Rodrigues Cordeiro, José Freire de Serpa, Augusto Lima e Couto Monteiro, os autores da sextina

Sobre as asas da poesia Aqai nos troaxe a aixiisade Cant m(is nas Ijras d^oiro Esperanças da mocidade, E aos bardos da Primavera Mandamos uma saudade.

' Novais morreu no Brasil com 49 anos de idade aos 16 de agosto de 1869, O Visconde de Sanches de Frias na obra inédita em verso que do Poete publicou (Ignez d' Horta, comédia semi-ti*{iííi<.»a em 5 actos I isboa. 1ÍK)7) traça com iariíii abundância df informações o porfil di desditoso escritor, bem digno de molhor 9(»rte se pode vTt o retrato do [*oéta, também reproduzido no Occidente. vol. xxx (U-O/'. p^ix 1.')^.

' O Trovador, coecção de poesias contemporâneas por uma sociedade de académiccs, ('oi'i.l)rii, Impr. do Trovàn, 1848. S<^>bre o grupo galhardauiente capitaiif^ado por J< ào de L-miks ler-so hani cora muito proveito a? págiuiiâ qae lhe consagrou íjopi'3 de Mendonça nas Memórias^ cit.

-«JViTfTLO TI >' Sf OOLA lOMAITIOA SS^

L ^

•em qae coube a cada' poeta sea verso e qae foi deixada em 1844

pelos autoras na Lapa dos Esteios ou dos Poetas depois de

lerem festejado o S. Ji^o na Quinta dos Varcuidas, que lhe

'fica em frente. Essa Qainta estava consagrada desde 1822 em

qae os irmãos Castilhos (António, Adriano^ Angasto e José) com

outros poétaSy haviam celebrado em brilhante convivência pri-

meirç a festa da Primavera^ depois a de MaiOj que o }.^ Viaoonde de

Castilho depois imortalizaria no poemazi ibo A Primavera^ e onde em

1862 voltana era saàdosa rom 4gem ^. Na plêiada de moços do 7Vo-

^sador saudava Castilho uma nova geração destinada a receber- lhe a

herança, a Além do mérito p^^soal dos seus redactores, escrevia êle,

iklèm do mui elevado concei*:o que a todos merece a Uaivernidade

^ de Coimbra, existe uma idéa grandiosa que há<de comunicar ao

Trovador a imortalidade. sons maviosos com que a sua lira louva

! & reGgiSo de nossos maiores, as canções em que a honra e o valor

I português brilham cercados pela glória sam o pensamento da nova

geração. O Trovador irá até á posteridade coroado com os loiroa

qae o adornam, porque tra^ no peito como dema^^a cruz, e traja as

cores nacionais » ^.

I

O grupo pagava esta saudaç^ do famoso autor da Primavera elegendo o seu Hestre e guia. cAo desembarcarmos, diz Joào de I Lemos na 'ies^riçFlo do passeio a que nos teferímc^ acima, luziu na I alma de todos um sentimento, e, de cabeças descob^^rtas, voou doa ^ lábios de todos um nome: o sentimento era a admiração, o nome era I C(uHlho3 ».'

Dentre este grupo sobressaía notavelmente JoUo de Lemos, : que se afirmou grand" jornalista em d-fêsa dos seus ideais políticos. I No í*eu Cancioneiro (18Ò8-1867) três vols. com os títulos: i,

j Hôres e Amores; li, Religião e Pátria e ni, Impressões e Recordai- ç5w, no vol. Canções da iarde^ muita produção dtj verdadeira beleza. Algumas das suas poesias, por exemplo, a Lua de Londres^ adquiriram popularidade m»*recida. Arrojo, inspiraçSa, exporjtnneidade e colorido tais sam as qualidades que brilhantemente aiirmoii nos melhores das suas produções. João de Lemos escreveu mais : O tio Damião, poemeto lírico; O monge pintor, poema em 4 cantos, peqaeno vol. iri-8.", que foi o seu canto de cisne. Em prosa deixou oa Serdes de Aldeia^ 1 vol., e muitos artigos jornalísticos depois cole- âonadoB com os títulos Os Frades^ 1 vol. ; Ele e Ma, 1 vol. ; e a

* Â8 festas da inangara^^o do monameato a CamSes iniciaram- se eom «m passeio á Lapa dos Poetas em 5 de maio de !8Sl. Acaao a 8:eraç:lo de h 'Mí <ionhec(>rá ainda aqaele nome? Cfr. Dr. Teixeira Biatos, A vida do estudante <tn Coimbra, Coi«.bra, 1920, pág. 42.

' Rev. Univ. Lisbonense de 20 de janeiro de 18i8.

Trovador j pág. 198.

34

534 BinÓBU AA UrBEATUBA fOBTUCVÉSA

Inquisição de 1860, 1 vol. ^. £m Coimbra escreveu o drama em 4 actos Maria Pais Ribeira representado em 1845 no Teatro Aca- démico e Um susto feliz, cou édia. que anda na interessante colecção do Teatro Moderno.

192. Os poetas do "Trovador". Do grupo do Trova- dor, ANTÓNIO XAVItR líODhIGUES CORDEIRO (1819-1900) deixou Esparsas, SerZes de História, numerosos artigos no Novo Almanach de Levibranças Luso- Brasileiro e vários trabalhos inéditos; algumas das suas poesias como a Doida de Albano, Tasso, Outono, toma- ram-se populares p^^lo encanto e, toada rítmica; JOSÉ' FREIRE DE SERPA PIMENTEL (1808) foi autor de vários dramas como Z>. Sisnando, O A^viansor Aben-AJan, D. Sancho II, várias poesias, soláos, etc; AUfiHSTO JOSÉ' GONÇALVES LIMA (1823-1867) núniu os seus veríK» no vol Mu múrios; ANTÓNIO MARIA PO COUTO MONTEIRO (1821-1896) dei- xou numerosas compoHçÒe.s no Trovador citado. Quando estudante em Coimbra compo- a Cahulogia * encerrando inimitáveis paródias .do Camdes de Garrett. Nas poesias de J< âo de Deus andava incluída uma Melopeia da Dorotheia, que lhe pertencia. Esta forma homo- ristica 8umiu-8e no espírito do antigo trovador, para dar lugar ás fórmulas e locubraçoes iurídicas, poi?- Couto Monteiro foi um magis- trado muito distinto; LUlS ClPRElA CALDEIRA (1827-1859) falecido aos 32 anos^ quando tinha aberto deante de si uma carreira de glórias. Lir co como todos 08 seus colegas do Trovador desfere mais tarde as asas para outros e mais largos horizontes fazendo trad ç5e8 da sublime poesia hebraica, a que pos o nome de Flores da Bíblia. Basta ler Jerusalém e o Mar Morio para se ver que estamos em presença dum t(mpera mento verdadeiramente artístico, a que faltou a vida para o contagrar entre os primeiros Poetas do género •.

193.-ANTÓNIO AUGUSTO SOARES DE PASSOS(1826.

1860) é, um poeta ultra-roraantico, melancólico, dum Urismo vago e doentio. Muito conhecido pela balada O noivado do SepulcrOj o ilustre escritor portuense firmou com o seu nome uma série de poe-

i Vid. o eea esboço biográfico por A. X. Rodrigaes Cordeiro no Novo Alm. de Lembranças para o ano de I89L

* Ao lado da Cabulogia convém citar como elenrentog para o estudo di

vida acadrmira de Cf iinl ra doutros ten^pos o tn.balho de Guilherme Oiitazri»

O Estudante de Coimbra, jui^s. 97-210 de As literárias distraçõfs, Liebcs,

Ifcíil, o II ( j1í( r a Vida c I eitos de Francisco Aí. G. da Silveira Malhão escrita

por èle mesmo, J.i.^hoa, lòJl. -i voIb., eu» que sob a sua forma despreocnpad» ^

líá realiitcuti' ii.uito chiste.

riiiliciío Clingas dcdica-lhe lupar condigno ncB Ensaios CritícoSf \^' Pinio <'b' ijo (J^íiro Kiuico) nan Figuras do Passado 0 retrato e bicgr. da Poeta e transcreve os dois bcli&òimo^ trechos citados.

OAPÍTDLO TI BflGOLA BOUAHTiOA ^ 535

^

aias repassadas de sentimento, dentre as quais avultam Amor e Eternidade^ Yida, DesaUnto^ a Ode a Camões e mais que todas O ^irmamenioj que por si faria a reputação dum homem de letras \ e que foi considerada superior á famosa ode de Edmond Eostand ao sol no Chantecler^ superior pela sua pujança e majestade yerdadeiramente grandiosas '.

194. JOSÉ DA SILVA MENDES LEAL (1818.1896)

de Lisboa, dramaturgo, jornalista, poóta. orador académico e parlaT roentar^ crítico, romancista, tendo àlêm disso uma vida agitada no seio da política portuguesa e em cargos e missòes diplomáticas. Aos 25 anos tidha espírito, com aplauso d » publico, os Dois Renegados, Homem da mascara negra, O pagem de Aljubarrota, D. Ausenda, e D. Maria de Lencastre, Vi-:ram d-pois numerosos dramas e co- mélias, dentre os quais obtiveram maior aplauso a Herança do Çhan- celler, os Homens de mármore, O sonvio d* oiro, Egas Moniz e Pri-^ ineiros amores de Bocage, os liltimocí que escreveu. Mendes Leal cultivou todos 08 géneros de po<*8Íi, mas foi inegualável no género hennco, onde se contam como verdadeiras pérolas no arrojo e subli- midade a Indiana consagrada a Va^eo da Gama, Glória e Martyrio no aniversário da morte de D. Pedro iv. Ave Caesar á morte de Carlos Alberto, Arde o sólio e o túmulo na niort^ di laínha D. Ala- ria II, Napoleão no Kremlin em que descreve o herói francês em toda a Hua glória, nesí-a fnexpu.íínável cidadela de Moscow, e eníim o Pavilhão Negro sobre a afronta que nos fez a França na questão Choflrles et Georges^ uma das invectivas mais veementes e mais vi- gorosas que téem saído da penna de poetas ^.

195. -FRANeiSeO GOMES DE AMORIM, o devotado ami-

go e companheiro de Garrett, foi um poeta de merecimento e um dramaturgo digno de que se lhe registe o nome. Alem dos dous vols.

* Poesias por,. ., l vol. Porto, iSõO. A última ed. rev. e aumtntada com inéd. e precedida dum escorço bidgr. por Th. Braga, é de lí'Oy, Inerte, 1 ▼f>l. Um contemporâneo do poeta acu8ou-o de plagiário e precisamente das com- poaiçdes que maior celebridade lhe deram. Foi o Sr. Lourenço de Almeida e Medeiros, qúc a si atribne a patiiruid.i i(^ d > Noivado do Scpu^chro e do /^/r- ffiamento, mas o Sr. Dr. Th. l);"ir{a <i m t^strcu p»-re'i)|)t. rijiincntí» a i np^Tti- nènda da acu^açAo. Vid, Rev. lit., sàvntificx e artística do Sécnlo i\(' V-^0\, 2 * <le 19 de <^ezembro.

* A. Pimentel, Boi. da Ac. das Sc de Ush c, m '^'l'.), ^o^.

^ Vid. Mem. polit., lit.. e biidiooy c l ^.,l.i.. ],..r !;•■! Ar."'M <' qne saíram como Brinde do Oiário de Noticias de /<sy7 ; o Ai/n nac:: de I.etnhran- fOS Luso-Brasileiro de 1886\ hiogr por A X. Koíri-íncs Clonlidn^ ; artigo de Kebello da Silva na Rm. Peninsular, 11; Or^iz; oh. cit., pii^ t'!'-) e s-g. ; Lo- de Mendonça, Mem. de Lit, Conttmp , cit , j-. ir^í', cte.

#

636 H10TÓEIA UnUATUSA rOWTXSQVÈãA

áe verbos Cantos Matutinos (1858) e Ephemeros (1866), é muito •onhedda a formosa poesia intitulada Hôr de Mármore. Entre os dra- mas tiveram imensa populandade Ghigi, Abnegação^ Cedro nerme- lho. Herdeiros de Viuoa, e mais que todos o Ódio de raça ; dos ro- mances e narrativas sam dignos de lembrança /Selvagens, Remorso mvo. Duas fiandeiras. Muita parra e pouca uva, etc.

Amorim publicou também uma ed. anotada dos Lusíadas em que se nota a sua falta dn educação filológica, e as Memórias de Ga- rrett, cheias de importantes pormenores sobre a vida do seu melhor amigo.

196.-ANTÓNIO PEREIRA DA CUNHA E CASTRO,

de Viana do Castelo, um dos mais ilustres partidários da causa de D. Migue), tendo por isso colaborado, em diversas épocas, no jornal a Nação e publicado em 1869 o opúsv:ulo de propaganda Z>. Miguú ll, que obteve no seu tempo larga vulgarização. Escreveu vários dramas, sendo os mais notáveis As duas filhas, Brazia Parda e Herança do Barbadào e um vol. de versos a que pôs o título de Selecta (1879). A musa de Pereira da Cunha é patriótica e reli- (íosa. No amor da pátria e na íé cristã se inspiram as suas melhores oomposíçõe», as quais lhe dão incontestável direito a que o seu no- me seja rec Tdado com justiça. Jdi impossível esquecer que algumas das poesias da Selecta^ por exemplo, o Voto d*Elreí, podem colocar- ae ao lado do melhor que em língua portuguesa se tem escrito.

197-TOMÂS ANTÓNIO RIBEIRO FERREIRA (1831-

1901) de Parada de Gronta (Beira Alta) é dos mais festejados e Aplaudidos escritores dos últimos tempos; poeta e prosador dos mais elegantes; orador inspirado,. historiador e jurisconsulto distinto, dedi- cou grande parte da sua vida ao jornalismo e á carnira diplomática e politica, mas foi como poeta que a sua individualidade mais se acentuou no nosbo meio contemporâneo. As suas magnificas po»*BÍas A Judia, festa e Caridade, o poema Delfina do Mal, as liricas conglobadas nos Som que passam, nas Vésperas, e nas Dissonân- cias, apaixonaram a alma popular a tal ponto, que dificilmente se encontraria no país lugar onde alguns desses maviosos cantos n8o íRssem conhecidos « ató de cór recitados. Duma viajem que em 1870 fez 4 Índia como Secretário Geral derivaram os seus vols. de proaa Do Ttjo ao Manãovy, Entre Palmeiras, bem como o poemeto /«• diana *.

No domínio (la invefttií]^a(;an histórico- política deixou: História da IcjU^iic/to liherdl, 2 volà. ; D. Miguel e a sua realeza.

^ Entre Primores, qae se anandou, nanea chegoa a publicar-se.

«ApfruLe VI WÊO&hA soiuiitica \537

Propositadamente deixamos para o fim desta imperfeita rese- nha o primeiro e o mais amorável dos seas trabalhos D. Jat/mêy o poema em que vibra, em cada uma das estrofes, o amor acendrad# á pátria, o entusiasmo pela nossa história e pela nossa vida autó- noma \

Tomás Ribeiro encanta pela melopêa dos seus versos, pela candura e simplicidade da sua linguagem. Conhecia todos os segre- dos do ritmo e da euritmia e sabia tr>iduzir a suprema perfeição da idéa numa lioguagem melodiosa e pura.

O seu último canto foi o Mensageiro de lez^ onde a inspira- çSo, enfraquecida e quebrada, se alteia por vezes, como águia, ás alturas que, em melhores, tempos, ífiram sua natural atmotiíéra.

198.-BULHÀ0 PATO (Raimundo de..) (1829-^912), n.

era Bilban de p>>is portugueses, é o último representante da escola tí- pica do Romantism », cujo^ fundadores conhecf'u e tratou. O seu nome ficará eternamente vinculado na história da poesia lirica, en que deixou um padrS^o iraorredouro a Paquiia, (1866) e as Can(;ZeB da tckrde, as t lares agrestres, Sánras^ cattqZes e idílios ^ etc. A sua pro-a era viva, nervosa, colorida, como o atesta sobretudo o vol. Sob os ciprestes, Cbamaram-Ihe o último abencerrag''m duma gera- çío de poetas que passou, e cora r^zão *. Conviveu intimamente com a camada dos nossos primeiros romanti os Garrett e Herculano, foi dos corífeos da segunda, cc^-panheiro gloriopo de M^^n^les Leal, de Kebelo da Silva, de Lopes de Mendonça, Latino Coelho e tantos mais.

A REACÇÃO CONTRA O ROMANTISMO

Sumário: 199. Como surgia esta reaeçSo. Elogio- mútuo. 200. Novas tendéDcias poéticas. 201 J. SSint((e8 Dias —202 Joáo de Dean —203. Antero do gaental. 204. Cesário Verde - 205. António Nobre. 206. 6. de Azevedo. 207 G Crespo 208. Alex. da Conceição. 209. Conde de Mensarai. 210 Outros Poetas.

199. Gomo surgiu esta reacção. Eloglo-mútuo. A

morte de Gkurett troaxe as mais funestas consequências para o ro- mantÍBiDo. Desaparecia com êle o Mentr»' que todos estimavam e «nja tbra mais profundamente impresbionára o pais. Herculano vivia

' Esta nota patriótica vibra também nos Terso» doutro romântico Lmís Aagttsto Palmeirim (1825) autor da Vivandeira, Guerrilheiro, Veterano^ etc., possiu inspiradas no alto sentimento da grandeza da Pátria.

* Oceidente, d.*' de 80 de agosto de 1912 biogr. e letrato. Á Acad, das- St. Lisboa pe a voz de JúJio Dantas preBtoa-Íhe a nevida homenagetn em ses- iloaoléne de dei. de I9ld Bulhão Pat^ dirigiu enquanto pôde com afanoso eni- ^*do a poblieação das Cartas de Áf. de Albuquerque até o 4. ^^ toI.

(38 mSTÓBlÁ DA LITBSATDBA POBVUaVÉSÁ

ainda, mas morto inteiramente para a luta pelo isolamento a qae êlo próprio se submetera na sua Quinta de Vale de Lobos, em Santa- rém. Restava, pois, Castilho, sendo á sua sombra que se iam acolher muitos dos que enKIeiravam pdo caminho .das letras e que se jolga- ' vara felizes desde qu*- os acolhia, benévolo, o juízo do Mestre. Desta sujeição incondicional á teocracia literária de Castilho nasceu a £9- cola do Elogio-mútuOy acusada de elemento pernicioso e deletério que consagrava as mediocridades, ao passo que se mostrava intole* rante e cru<-l para com aqueles que aspiravam a novas formas tanto na arte, C( mo na politica, tanto no romance, como na filosofia. Em 1865 apareceu o Poema da Mocidade de Pinheiro Chi«gas e incluida nele (pág. 183-423), scb o título Crítica literária^ uma carta ao editor António M tria Penira lirm da por Castilho. Antero dirigiu-lhe imedidtam finte a Carta Bom senso e Bom gosto que conteç&va Acibo de ler um escrito de V. Ex.* cndt-, a propósito de faltas de bom senso e de bom gosto se fala cm áspera censura da chamada escola lit^^rária de Coimbra.. . » e em que, a seguir, Castilho era acusado de i.Ita de boa- e ^e davam os motivos dos seus ataques que eram, no dizor QuentU, n5o a uma opin âo literária m»*no9 provaia, a urna cone pçào poética mais atrevida, a um estilo ou a uma idéa. « Mas a gu^^rra &z-se á indep ndência irreverente de es- crit(»re8 que enten''em fazer por si o seu caminho, sem p-^direm li- cei ça aos Mestres.. . A guerra faz-se ao escândalo inaudito duma literatura dt^ saturada que cuidou poder correr muiido sem o selo eo visto da ehanc< laria dos gião-mestns oficiais. •• > ^ '

Daqui se originou a p* lémica designada por Questão Coimbrã ou do Bom senso e Bom-gosto que durou mais de seis meses e durante a qual se publicA^ram algumas dezenas de folhetos assinalofl por Pinheiro Chagas, Júlk) de Castilho, Theófilo Braga, R^m^tlhs Ortiga-, Canúlo Cast« L Branco, Urbnno Lour< iro« António Feliciano Gatilho, Eiuardo Vidal, Jo^é Fdiciano de Castilho, Brito Ara- nha, Teixeira de Vasconcelos, Luciano Cordeiros e outros. A violên- cia dns paix5es chagou ao ponto de provocar um dutlo entre Antero e Ramalho Orti^SLo, que na Literatura de hoje ms^goára a Escola de Coimbra, du-Io realizado nos subúrbios do Porto e breve termi- nado após um ligeiro ftirimento de Eumalho, mas que oausou a maii viva emoçSo.*.

Castilho tinha razão quando dizia não adivinhar bem o qas

* O folh. Bom senso e Bom gosto aaín em 186Õ em Coimbra, a M inclaind* no voi. Cartas de Antero, Coimbra, 1915, 40-&7. 8ôbre'a qaeitfo Antero pabl. main A dignidade das letras e as Ut. oficiais, Lisboa, 1865.

^ Vide :i enameração destes folha, em Inoe., Etíc, BibL tui, 404-4()8; Th. Braga As mod. idéas, 11, 179; Fraa Paxeoo, A Esc. de C. 0 a dissíúntOB áú Romantismo, Lisboa» 19x7, p4g. 346.

ciFfrcKo TI mooLÂ moHumoA SS&

^tieria a geração que SLSÚm se afirmava rebelde a preceitos àe Ea^ cola, audaz, violenta e agressiva. Toios êssss no^os repeliam o passado e eitavatn os arautos do pensamento que fóra revolviam a fílosffia, a art?, a estética, a política, a história. Era Mich *l*9t é Qninet e Renan, os grandes agitadoras de i léas^ e Hegd) e Vi so e Prudhon, Hugo, Balzacy H^ine^ todos os que se impinbaai p^a lite* Tatura, pela conierência, pelo livro ^.

Castilho alvejava na sua critica sobretudo Th. Br^^a, qu"^ em 1864 publicara a Visão dos tempos e as Tempestades sonoras^ 6 Antero de Quental que em 1865 aparecia com as Odes Modernoã. A respeito deles dizia: «pelas alturas em que voam coní<i48(> humilde e envergonhado que muito pouco enxergo, nem atino por onáe vROi nem assento o que será deles afinal» *. Ca8tilh<» sereno e confiado f nos seus ideais não compreendia ê::te8 reb^^ldeâ e icono^U^tas qud lhe falavam de Goethe e de Hegd. . . Ihí cit^vafn n)m ^s birbaroa e Bciências desconhecidas a Qlotica, a Filolog^ia, etc. '

Anos depois em 1871 um grupi que repretientava òsu es »frita de inovação e de revolta eram Adolfo Coelho, Aotér», Bça de Queiroz, Batalha Reis e Silomão S^r-i^i propôs-se f?iz*,r uma sé- rie de Conferências no Casino Lisbonense, Ainda se realiz ra /) t^aa- tro, mas antes da quinta o Marquês de Ax ila, iíntáo ch^-d io i J »«^ê"ao, manHou encerrar o Casino com o fuadamf^nt» de que n-is (^nif- êu* cias «se atacava a reli^ifto do Est'ido e certos princípios qu 3 leia resralam e mandam respeitar». O gruoo s^Hiiindado por m ns íIr 49 adeptos formulou no dia imediato 26 ie Junho de 1871 —um ca- loroso protesto cem nome da liberdade de pensamento, d^ lib^^^dido de palavra, da liberdade de reuniito, biS'^» de todo o dir»iit> pu- blico» *. E Antero eserevia ao Marquês de Ávila uma C-^rta reivin- dicando para si e companheiros o dirt^ito máximo de expor as suaa idéas e classificando a sua acçSo de cmá e tok» ^.

200.— Novas tendÔnCias poéticas. Mas a temp sUde des- fess-se e alguma cousa ficou. Das figuras qu» nêase movimtmto entra- iam eleva- se sobranceiramente p-^la acção decisiva sobre a gera^^Io contemporânea Antero de Qaental poeta que qualquer naç^o inve- jaria, e Eça de Queiroz, e pouco depois Ramalho Ortigão, João de

^ Eça de Queirós, Notas Contemp,, 349; Antero, Carta autobiogr. Ae Dt. W. StoTck.

' Na 2.* ed. do poema de P. Chagas, Lisboa, 1901, pág. 179.

* Na eit Carta Autobiogr.

* Os does. desta ^neitão apareceram no Diário do Gov* de 14 ag. 1871« '^ 5.^ e último é o pareeer do Procurador da Coroa, que então era Martinf For»

^, homtm de grande saber e grande honradez. » No vol. das Cartas, cit. , 57-69.

540 idmiA IDA tírmuTomk nmrwnfàÊA

Deus e tantoB outros; A «scdk de Coimbra tere o mérito da dar o^ rebate e acordar toda a geraçSo que ae lhe Beguia. Desta rerolta contra o velho Castilho, o cárcade póstumo» como entSo se dizia, linelhor eonlra o século e a escola que êle simbolizava, derivou toda a renovação contemporânea: o mutualismo na poesia de Ceeirio Verde, vo rolrance de Eça de Queiroz, na hif^tória de Oliveira Martins.

A poesia liberta-se de íórmulas, é independente, insubmissa, >«ÍDdividual». Popular como Sin5es Dias, ps^triótica com Tomás Ri- beiír, filosófica com Antero de Quenu), simples e amoráveloom JoSo <>o D^uí", rt- vestindo cm cada qual sqa friçSo própria no que está o seu v»]or : aspira a ser cada vêz mais perfeita.

Esse cuidado da íórma fez enveredar a poesia para o Pamor 9ianiêmo que havia de, por sua vês, vir a produzir, como sucede» em França, o Simbolismo.

Ao Indo da impecabilidade da fórmá, que. em França tivera o seu prirreiro cultor em Le^onte de Lisle (1820-1894) íeria-se a nota péêsmtsta com A. de Vigny (1797-lh63) e com Musset (I810-18Õ7)* Essas torrentes encontra» ram éco em Portugal como passamos a vêr.

201. -JOSÉ SIMÕES DIAS (1844-1899) da aldeia Benfeita, no concí-dío de ArganiJ, eomtç^ou muito cedo a manifestar o seu ta- lento joético, tendo iund^do en Coinbra com Emídio Navarro e Lopes Irava p jornal Academia^ com Te<'filo Braga a Criiálidíte eolaborhDCo oam João Peiha no jornal deste a folha, e em outra» revinti-s e publicações académiras. Concluída a formatura em 1868 oonsagrou-se ào ensino secundário aro E»vap, Viseu e Lisbra tendo escrito cou esse destino algurs trabalbos didásticrs. Os seus versos sairam coleccionados com o titulo PeninstUareSf abr««ngendo quatro part' fc;: Elegias, Canções j Odes e Poemas \ Simões Dias caracterizou- se a si pTÓpiio com inteira verdade fecrevenoo que quis fugir ás peias do e<'iivc iieionalismo romântico e retemperar se nas aguas lustrais da inspin.çl)(> popular, a única verdadeiramente bumana e hincera, e que a^ t-uas obrtis poéticas s^m na íua maicr parte versos amorcsoa e elepíí cof», de caracter subjectivo, con>o aliás os faziam os m^nes- treih do tempo e bâo-de de fazê los sempre os poetas meridionais,, «nqiianto durar o bom s( 1 da Pt nínsula, que tam gen rosamr nte os ilumina e aquece '. De fecto, a sua musa foi genuiDamente jpopolar,. símiles e espontânea, an^^ando alguns dos seus versos na tr«diçS^, como se fossem nascidos da me^ma alma do povo. A 3 de março de

* 5.' ed., com um estudo crítico-biográfíco p«lo Visconde de Sanches de Vrias, Lisboa. 1899, 1 vol. Este mesmo escritor dedicoo ao poeta a maior parta. 4o livro Memórias litterdrias» apreciações e criticas , Lisboa, 1907. '

' Na advertência da 4.^ ed.

OAfIvOIA vi BSOOLA BOKAVTIGA 541

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1893, com 55 anos SimSes Dias exalava, pobremente, entre um pe- queno circnlo de amigos, o último suspiro.

202.— JOÃO DE DEUS ' (18301896) é um lírieo inimitá^ vel e o mais expontâneo e genial burílador da poesia portuguesa. Nnnca ninguém teve a arte de dizer cousas mais belas em frades, tam simples. Esta beleza e esta simplicidade casavam- se numa har- monia tam intima, que tudo que saia da sua penna trazia o cunho. do génio. E' percorrer ss páginas do Campo de Flores e vêr que tesouro se n8o encerra nessa colecção completa das suas poesi^isl João de Deus nasceu em S. Bartolomeu de MeE>sines a 8 de março de 183<). Terminou o curso de direito na Universidade de Coimbra em 18d9, mas em 1862 abandonou a cidade *, deixando um nome glorioso aureolado pelas compoBiçSes que logo revelaram o poeta lirico eimples e espontâneo que havia de ser toda a sua vida. Sam dêtwe tempo a elegia Rachel, a Noite de Amores, o Adeus e o, poemeto A Vida^ que principia com o extraordinário soneto :

Foi-se-me pouoo a pouco amortecendo  los que nesta vida me gaiava

Das suas poesias foram muitas publicadas em periódicos, hoje reoorditdos apenas por terem o grande nome de Jo^ de Deus nal- guns dos seus números; outras apareceram avulsas, várias andavam por mSos de amigos num descuido completo do grande joalh<'iro, que lapidava tam belas e raras preciosidades. Deve-ee a Teófilo Braga a ed. dos versos e das prosas de João de Deus, aquela com o título Campo flores > (1896), esta com o de Prosas * (1898). Mas a alma que conheceu tam belos cânticos imaginou também o mais limple» e intuitivo método de leitura de que uma nação se pote •rgulhar. 'A CartilJia Maternal, declarada nas côrtea de 1898 método

1 Echo SC. e lit, n.*" 2 e 3 de 1902, art. de Th. Braga; Reis Dâmaso^, João de Deus e a sua ob^a, Lisboa, 189S.

' Da vida académica do poeta díd^ôid esorevea págiaas mais sentidaa ^08 o Dr. Pinto Osório (Pedro Enrico) nas Figuras do Passado, 51 e segs.

* Campo de Flores, poesias líricas completas coordenadas sob as vis-^ tas do auetor, \ Poesias liricas ; u Sátiras e Gpigr. ; m Versões e Imitações^ Teatro, por T. Braga^ 4.* ed. Lisboa, s. a. 19 15).

* Prosas, narrativas singela», cartas, prólogos, criticas, cartas sobre método de leitura, cartas intimas, através da imprensa, traduções, coordena* áaa por T. Braga. Lisboa, 1898.

542 manÓÊBUL da unBATinu romxomíÈãA

»

de leitura nacional, continha esse mavioBO hino do amor que as 'tríançiiB na sua melopêa infanttl cantam:

Andava am dia £m peqQ»'DÍno KoB arredores . De Nazaieth Era conJpanhia De SSo Joeó O bom Jesas O Dead-Menino.

A mocidade das escolas íest«']ou-o numa grande apoteósB a 8 de março de 1895, que muito comov- u a alma do grand^ e ilustre poéta ^. Mnos dum anno depois, a 11 de janeiro de 1896, fal^àa èle em Lisboa, deixando as letras pátrias em luto /pela sua p^-rda ir- repara v^el.

Donde vem a grandeza de João de Deus? Da sua naturali^ dade: nada de esotérico, nem de artificial,* nem de patológico em ne- nhuma das suas composições. !

Alma simples, ingénua e bondosa, deu-nos somente reflexos dela: vernos simpl 'S, duma limpidez de cristal^ íazendo-se amar pela Bua meHma candura, e espontaneidade.

Chameu-selhe o poéta do amor; o asserto é justo, que o fogo que aqueceu e inspirou a alma de Oam^í^s, Bernardim B.beiro, Cns- tóvam Falcão e oiitroB é o mesmo que aquece e ilumina os versas do autor do Campo de í/ore« « Campo de estrelas^ jardim sideral, lí- rio de luz inoce)'te, a que mil milhões de anos n&o roubarão uma pétala;^, escreveu Guerra Junqueiro,

203.- ANTERO TARQUINIO Dl QUENTAL (1842-1892)

é outro poderoHO ^éniu da nousa literatura, mas de feição diversa da do João de Deus. Logo em Coimbra começou por exercer na sua geração uma espécie de magiàtratuia moral. Indep^^ndente, insab- roisso, melhor vincou o seu nome quando em 1862 tendo visitado Coimbra o Príncipe Rial de Itália, que depois foi Rei Humberto, êle na saudação que fez, disse-lhe: a Os estudantes da Univ. de Coim- bra saúdam^ em nome da fraternidade de dois povos irmãos, o neto de Carlos Álbr*rto; a mocidade liberal portu^êsa saúda, em nome da liberdade do mundo catóhco, o filho de Victor Manol. Não é at representante da casa de Sabóia, que vimos prestar homena^m, é ao filho do primeiro soldado da independência italiana -•• » Antén

Vid. O Festival de João de Deus. 8-^-1895 . . com um escorço W#- igráfico por T, Braga» Lisboa, 1906, 1 vol.

aàrtnju} ti wboola bohahtioa 543

foi um dos fand&dores da Sociedade do Eaio e as poesias escritas

l nesta sua quadra acaáémica se destiuguem, como todas as post^

riores, pela profundidade di^s idéas aliada a uma grande perí^içSo

de forma ^.^ E' preciso conhecer-se a psicologia mórbida de Antero^

' as suas preocupações filosóficas, os seus estados de alma atormen-

, tados ds dúvidas, de desesperos e de apatia, que o^ conduziram á

noite fatal de 11 de setembro de 1891, para bem compreender as \ soas poesias, onde o pensamento ííIobóíoo mais abstracto souba, pelo r dum do talento, encontrar uma forma sublime e inspirada. ! Ântéro publicou diferentes opÚRcnlos como a Defeza da Carta

evangélica de SS, Pio IX conéra a chamada opinião liberal (18j64), que era um protesto violento contra as folhas ^ue atacavam o Syla- ^ Im em nome da lib-r4ade, pretí^ndendo ao mf smo tempo permane- : cer fi^is católicas ; a Carta ao Marquês de Ávila e Bolama sobre a

fartaria que mandou fechar 'as Conferências do Casino Lisbonense (1871) *, violenta sátira qu f'Z baqu^nr o mmistério AviU-B«lama.

I A 8«^guir publicou as Causas de decadência dos povos peninsulares nos séculos XV 11 e XVII [ e as Considerações sobre a filosofia da história Literária Portuguesa, que êle própria dizia s r o melh-ir trsbaltio em prosa, « proSa nâo de convonç^o, arremedando o estilo dos líéculos XVI e XVII; mas duma prosa que tem o tipo na língua viva e falada boje, analítica nos movimentos da frase, e na lin-

1 gaagem ainda e sempre portutruêsa. »

Antero entrou na Questão coimbrã com os dois opúspulns Bom senso e Bom gosto e Dignidade das letras e literaturas oficiais, oomo dissemos atrás.

Mas as suas obras principais sam Raios de extinta luz ^, Ode» modernas * e os Sonetos *.

Espírito eminentemente filosófico se tivesse nascido, escreveu BulhSd Pato, duzentos ou trezentos anoa atrás seria wn cenobita, talvês' retirado nas agruras Ha montanha, elevando os seus hymnos a Deus, em extásis místicos ! {Memórias, i, 297). O que aprtsssou a

1 Tem págs. dom inédito encantador a respeito de Antero o livro do I^. Pinto Osório (Pedro Earico) Figuras do Passado^ cit., 77 e aegs.

s c As eonferéncias demoeráticas que evidentemente excitaram as iras fáblicas e officiais foram as daas do ar. Antero do Quental, encreve A. Coelho, a minha sobre o ensino, .e a anaociada do sr. Salomão Saraga sobre os Histo^ ríadorea eritíeos de Jesn». ..•A Portaria de 26 de junho proibindo a s Cou" leréntías demoeráticas, carta pública ao Marquês d' Ávila e Bolama, por F^ Jéolfo Coelho, Lisboa, 1871, 1 folh , p)^g. 10.

* Poesias inéd. (1859-1863) com outras pela 1.^ vez coligidas, publ. e jneedidaa dum escorso biogr. por Th. Bra^a, Lisboa, 1892.

* Odes.., contendo várias composições inéd. Porto, 3.' ed., 18í)8.

* Sonetos compUios publ. por Oliv. Martins, 2.* ed aumentada com Mm Apêndice contendo trad. em alemão, ff., itaL e esp.^ Porto, 1890.

544 MunrÓRiA da UTBiÂTomA woKnwaÈéA

hora trágica do' saicidío foi; mnito mais que a8 dores flsioas; a dôr moral; o desconforto que dos homens e dos factos se infiltrou na 8aa alma de crente. Tinha a dum romântico, o entusiasmo pelos ideais que haviam sentido os poetas e os políticos de J.830. Tenho passado a vida, escrevia, êle próprio, a prof^^ssar teoricamente uma im parcialidade estóica e a desmenti-la constantemente nos meus sen- timentos. E assim era. Foi porque muito soube sen^tV que âle muito sofreu. Antero como escritor é simplesmente admirável. Pensamento e fórms; elevsçfto, grandeza^ sublimidade de idéas sam vasadas numa linguagem de que êle conhecia os segredos; e que é duma con- cisão e beleza verdadeiramente esculturais ^.

204. CESÁRIO VERDE (1855.1886) malogrado poeta, sincero, verdadeiro e original; perfeitíssimo na Pua arde de apanhar em fl grante a realidade, de descrever do natural^ sem resaiboa doentios nem formas contorcidas; os pequenos quadros da sociedade, que pas^^avam pelo priâma do seu espírito d^licadispimo de artista.

Evocar o shu nome, escreveu Silva Pinto, é um tributo a algumas sinceridades que nos domínios da nosna poesia vêem nele o inspirar] f^r e o guia na intfn*pretaçAo poética da >iatureEa universal e da Dôr humana » *. A^^ compobiç5e8 poéticas, que nos deix«>u a sna forte in-piraçâo, distinguem-se por um grande espíiito de verdade 6 de n^tu^ali lade e f(5ram coleccionadas e publicadas por Silva Pinto no Livro de Cesário Verde (1873-1883, 1 vol., 1901). Essas cem páginas do Livro vakm muitos volumes e representam uma obra genial.

205.- ANTÓNIO NOBRE (1867 1900). Dentre os poetas da geração nova, algun» dos quais tam brilhantemente se têtsm afir-

* Sobre Antero vid. os eariosissiinos estados reunidos na pnbIieaç2o Antero do Quental —In memoriam. Porto, 1896; e a ed. doe Sonetos por Oliveira Martins, 18í^0; Bolhão Pato, Memônas, scenas da infância e hnmera letras, cit., vol. 1.*, páe. 2%. KA Revista, mensàrio de sdêndase letras, do Porto (2.<> ano, 1904) foram publicadas moitas cartas soas ÍDtere0«aO' tes como does. literários e bibliográficos. Essas & maitas oatras fSrampobie. no vol. Cartas, Coimbra, 191 5 precedido dam largo estado (vi i-Lxvii) de JoSo de Faria e iMaia. E' também indispensável lér Ârchivo dos Açores, v<>l. z<i> pág. 160 e segs. , e a Carta Autobiográfica inserta entre ontros logares, a p^- 2H7-2h6 do vol. de Leit« de Vasconcelos, O Poutor Storck^ ji eit ewsCcn tas íí !.• com que abre o vol. A. Sérgio, Notas sôbre os sonetos e as tendén- àas gerais da filosofia de A do O Lisboa, 1909 ; F. de Figaei^ed^ A. à$ O-, a sua psychologia, a sua filosofia, a sua arte, Lisboa, 1909; A. Arrovo. A viigem dp A. do Q. á América do Norte cm Á Agttia, n.~ 66-57 (1916). Pcdw Enrico, Figuras do Passado, 77-Í20 malta nota inéd. sobretudo da época coimbrã,

« Noites de Vigilia, n.* 2, pág. 53.

capítulo ti MOO&l. BOMAMnOA 545

mado, destaca pela Bua poderosa e esquisita originalidade oatro •malogrado poeta que a tuberculose roubou, aos 33 anos, no dia i8 de março de 1900, quando ainda êle próprio, numa fãmentida espe* rançai se preparava para nos dar mais ampla e* robusta obra. A morte, porém, nAo o poupou, inielizmente para nói^, mas dSLo para a •na mf^mória, quo tem a perpetuá-la esse volume de preciosos versos denominado Só. Â vida de António Nobre passon-se uma -boémia despreocupada, íóra do lar a que êle aspirava voltar mais do que para morrer para trabalhar, para viver a sua vida de -espirito, no meio da paz, com os amigos e oom os vernOM. Tendo principiado por se matricular em Coimbra na Faculdade de Direito, breve aban- donou este curso para seguir em Paris o de sciências politicas que completou em 189Õ.

A comoçSo produzida pelo seu livro foi enorme. O impôs-se^ deflde que foi publicado, p la sua alta inspiração, doçura e maviosi- daHe rítmica e um. não shí quê de bondade, que era um reflexo da alma do poeta. E nada mais deixou de completo e acabado. Póstu- mamf-nte foi publicado o volume Despedidas (1 vol., 1902), de que &z parte o pnema Desejado, iní lizmente in< ompleio. Anunciou-^se também outro volume com o título Primeiros versos, ^.

206.- GUILHERME DE AZEVEDO (1846 f 6 de abril

1882) deixou três voU. de poesias a conquistar-Ihe a adminçSo e

'■ «atima de todos òs cultores das belas letras ApariçoeSy^ Radiações

. da noite e si.bretudo. Alma Nova, Espirito Bcmtilante fund u com

, fiâfael Bordalo Pmheiro o António Maria (1873) e foi o cronista do

! Ocidents (1878), carg^^s que abandonou para ir para Paris como

» correspondente da Qazeta de Noticias do Rio de Janeiro. Escreveu

} para o teatro, onde não foi feliz, Rosalino e a Viagem á roda da

I Parvónia em, que entrou a colaboração de Guerra Junqueiro e que

^ IsDçou a publico com o pseudónimo de « Comendador Gil Vaz » .

I £ata última peça era uma espécie de revista e bubiu á scena no tea-

! tro do Ginásio de Lisboa na noite de 17 de janeiro de 1879. Caiu

' tam ruidosamente que o Governador, Civil a pretexto de perturbação

\ de ordem pública proibiu no dia imediato a representação !

207.— GONÇALVES CRESPO (1846 f U Junho 1883), de família portuguesa, nascido no Brasil, poeta de requintada senui- bilidade e. do mais delicado espirito, enriqueceu a literatura portu-

^ Vide o seu r.etrato. o antót^rafo e mnit^s H«»cs. in A Afinia^ i (1911) n.® 10, Porto; Visconde de Vila->íonra, António Nobre. Porto, llílf); A. Forjaz de SAmpsiu, Os Hárbaros. i. António Nobre, Lifh. a, 1919 e em rrpliea a este •Uno Céear de Frisa, A afronta a A, N., Lisboa, 1920.

546 HISTÓftLA DA laTVRATURA rOVtUQTJÈBA

guêf>a com dois padrões de incontestável mérito: Miniaturcts (1870) e os Notumos (1882) ^. D«^ colaboração com sua esposa, a distinta escrit* YH D. M>ifia Amália Vaz de Carvjilho escreveu os Contos para nossos filhos, G. Crespo formou-se em Direito na Univ. de C«imbra e foi redactor do Jomcd do Comércio, p«*rtencendo á geraçSo de JnSo Penhsy Simlo Dias, Guerra Junqueiro e tantos m^is, que em Coim- bra deram a nota graça e do espirito.

208. ALEXANDRE DA GONCEIÇAO (1842-1889), poeta,

crítico e polemista ' insigne, que terçou armas com Camilo Castelo Branco por causa do romance Euzéhio Mctcário. Primeiramente romântico coTro o provam os mais belos versos do vol. Alvoradas (1865), evolutiu para o realismo e nessa fase atacou Camilo que êle acusou de querer lançar o ridículo sobre a escola realista *. Na pleiítda dos poetas do seu tempo... tinha mer cidamente lugar de honrai pela largueza dos traços, pelo colnrido das tintas, p- la feiçlo muitas vezes irónica e discretamente naturalista com que floreava o pincel sobre teks que ainda hoje sam formosas '.

209. eONDE DE MONSARAZ. António de Macedo

Papança) (1852-1913) poeta lírico xionsagrado pí^la opinião pública desde que era ISSO^ por ocasião das festas comemorativas do tricen- tenário de Camõtís recitou na Sala dos Capelos da Univ. de Coimbra as formosas estrofes do seu poemeto Catarina Ataíde, Era um delicado artista, que punha grande cuidado e empre- gava uma arte req «intada em burilar os seus verbos, sompre harmoniosos e inspirados. No vol. OJrcw (Lisboa, 1895) andam reunidos o poemeto aludido e mais O Grande Marqitês e A lenda do jesuitismo^ que antes formavam o vol. Tdas Histéricas e haviam sido escritas por ocasião do centenário do Marquês de Pombal Pm 18.82. O vol. último que publicou tem o título de Musa Alemfejana (Lisboa, 1908) e é todo sugerido pela regiSo a que ele ee or^ulliíiva de pertencer. Alguns quadros como As Mondadeiras, que rt produzimos na ilntoZo<;ia,- sonetos, como a Calina, us Bois^ etc. podiam sair da pena dum verdadeiro artista *.

* Obras completas precedidas dama advertência por J. de Soosa Moo- teiro e Prefácios (Jo '{'lixeira de Queiroz e D Maria Amália Vaz de Carvalho, 1 vol., Li ^ boa, 1897-, vi d. também Cândido de Figueiredo, Fí^nw //terJrwJ. Lisboa, 1906, pá^ t)b,

' Combates e Criticas, 2.^ ed., 1907 ; Alberto Pimentel, VinU anos de vida literária, cit. , 175.

^ Câhíhdo de Figueiredo, Hguras literárias^ Lisboa, 1907, pág. 162.

* Retrato e art. crítico de A. Sardinha em Terra Nossa, n.* 2 (191C*

f I

Capítulo vi-^bsoola wouÀxmoA i 547'

210* Outros poetai. Ao lado dos que citamos avaltam 08 nomes dalguns Poetas/ a quem a morte prematura não deixo^ que a memória se vinculasse a larga e profunda demonstração, do peu talento como era jasto esperar. Estão neste caso GUI- LHERME BRAGA 71845-1874) imortalizado pelo eeu vol. de deli- ciosas líricas Heras e violetas, cuja 3/ edição (1917) revela que a Bua lira tem alguma cousa de superior que se impôe^ o que bem se conhece pelo trecho que na Antologia o leitor adeante encontra e em que poderosamente se condensa a idéa da tortura e da desilusão, wraterintica dos seus versos. ANTÓNIO FOGAÇA (| 18^88) falecido no seu 3.° ano jurídico e que publicou um ano antes He morrer os Ver» 90$ da Mocidade, reeditado enx 1903. EDUARDO COIMBRA (1867-1884) autor dos Dispersos, livro de líricas de fina composição e de ií\8pira- çâo sentida e apaixonada. HAMILTON DE ARAÚJO (1^568-1888) cujas CaTiçoes dum Bohémiò evocam em nimbo de profunda saudade o seu nome de inspirado poeta. ALFREDO SERRANO .(f 1904) que/ álêm do Tol. Horas de prosa, publicou o vol. de poesias Manhã dourada^ ambos os quais a crítica acolheu benevolamente. E' mais vasta a obra de EDUARDO AUGUSTO VID^L, de quem temos Folhas soltas. Canto do eétio. Crepúsculos e No Ocidente, em prosa Contos da sesta, e Enire a murta. Na Quéstcio Coimbra deix* u o opúsculo Guelfos e Gibelinos, que é dos mais Dotáveis ; e para o teatro o Saboyano, Ao luar e O que fazem as royas, e a de AUGUSTO LUSO DA SILVA (lOOiJ) ^ aatôr do vol. Odes, da Colecção de poesias, mas nem um nem outro, iguala qualquer dos que antes dél^s citamos.

O nome de. FERNANDO LEAL (1846-1910) em quem a índia, donde era naturat (Margào) perdeu um dos seus filhos mais iluftres não pode ficar esquecido. traduções que ele fez da língua francesa para a nossa que por si bastam para fund&mentar a sua reputação. Notável de espontaneidade e de colorido é também o seu Livro da Fé, (Nova Goa, 1906).

AgPOESIA NOS SEUS ÚLTIMOS REPRESENTANTES

^ 211. A poesia nacional no período qu^^ podemos chamar con- temporâneo quebrou o elo quo a prendia ao pasí^ado, ou ío^^se pela con- tinuidade da tradição, ou pela sobrevivòneia dinii ou outro grande nome de escola, 'lodo, o po« ta procura prescrutar-í?e a si pró|)rio e de si próprio, das suas emoções e Hí-ntiniciUos, tirar o fundo de beleza, que deve animar as suas prodnçocá. Alguns lembram ainda o apego ao clasacismo, traduzem tendências de educação, que luio [)odiam

^ Retrato e notas biogr. no Occid., 11)02, pág. 112.

* 548 . RitTÓBlA DA LlTBftATOHA POSTUCHTASA

desaparecer dam jacto, outros sam individualistas, fugindo a toda a iitaitação e se escolhem velhos temas de eterna beleza esfbrçam-se pOT vazá-los na mais pura, na mais requintada e perfeita das formas. Aos primeiros pertence JOSÉ «AMOS COELHO (1832-1914) que deixou nos cinco vol. Prelúdios poéticos^ estreia de 1857, Novas poesias^ Lampejos^ Camhiante^^ e Refleocos amostras da facilidade do seu es- tro, que é aquecido pela nota dum patriotismo sincero. Conhecedor das línguas modernas soube traduzir no mais puro vernáculo alga- mas gemas de poetas estranjeiros, sendo de notar-se, como mais no- tável, a JerusaUm Libertada de Tasso, vertida em 8.' rima ',

MANOEL DUARTE DE ALMEIDA (1844-1914) é dos nossos poetas mais ilustres. As suas Estâncias ao Infante D. Henrique manifestam uma ardente patriótica^ E se a sua musa respira elevação deaate do grande vulto histórico que canta, não é mt-nos sentida dewnte de pequeninos temas, como na Elegia panteista a uma mosca morta ou na Terra Azuly colecção de poesias em vários géneros. Rigoroso na técnica do verso, conhecia- lhe bem os segredos, e por isso tinha au- toridade entre os seus contemporâneos, coíifíaudo IJbe, por ex-, João de Deus, a revisão das suas composições '.

JÚLIO DE CASTILHO (1840 1919) é o herdeiro dum nome glorioso nas letras pátrias, que ele também honrou distintamente. Purista in- tra isi gente a sua obra literária é uma obra moral, saída do cérebro e d% con3ciência. A Lisboa Antiga consagra-o como historiador e ar- queólogo, ao lado da Ribeira de Lf-sboa do mesmo teor.

Ás suas Memórias d^ Castilho, como a ed. das Obras Com- pletas de beu Pai, deu- nus o ambiente literário, político e social em que se formaram ele e a sua geração e serão sempre um elemento indispensável a todo o que quiser estudar essa época. O í^eu vol. de de versos Manuelinas e os factos Portugueses documentam a soa capacidade e o seu bom gosto. Este volume, o último que escreveu, é em verso branco e escrito no casticismo peculiar aos Ca^^tilhos. A traça do livro não deixa de ser original, pois Júlio de Castilho quis glosar dia a dia acontecimentos da história pátria como lhe impres- sionavam o espírito, mas, como era natural, o estro sente-se preso da realidade episódica e perde bastante em elevação e exponta- neidade.

JOÃO PENHA (1839-1919) é o contemporâneo de Gonçalves

' Ramos Coelho deixou nma b^hi ed. do Hyssope^ Lisboa, 1879, e pa- blicoa nrn vol. de larga investigação historiei, Memórias do infante D. Duar- te, monografia valio:?a (lt*8t« desgraçado trmào de D João iv. Natural d'^ Lisboa foi durante largos anos ('on>í'Mvador do Arquivo Nacional.

> De Vila Real de Trárt-o«<- Montas Aa Estâncias tòram conhecidas des- de a recitação delas feita pelo autor em sessão solene na 8oc. de laòtr. do Porto 'cm honra do Navegador. Cfr. Inoc. Dic. Bibl., xti, 173.

OAFfrULO TI WM09Là. BOMAVTIOA 519

Círespo, Simões Dias, Gomes de Amorítiiy Frederico LaranjO| Oãn- dido de Figueiredo, Alberto Pimentel, Gaerra Jaaqaeiro « doutroi^ •que formavam em Coimbra am grapo de cavaleiros do Ideal, q'ia^d(> êie de 1868 a 1873 tomou a direcçSo do jornal literário A FolhA. Ji no meio académico era o correecissimo sonetidta, que sempre ae conservou. O voL Rimas saiu em 1892 dividido em 4 partes Vinho Bel, Violão nocturno j Onofre e Lira de Pangloss e abranj^e as composições dessa época. Em 1905 fez sair em Coimbra Novaes Ri- mas e não viu terminada a ptiblicaç^ em 1919 Ultimas Rirnoã. Sabe-se das torturas físicas e morais que atingiram os últimos anoB da vida do mais alegre boémio que tem transitado por Coimbra» Que melancolia a dos seus últimos versos, últimos também no valor. Nos primeiros volumes cita los é onde deve procurar-se o estalão â» seu merecimento literário.

Infeliz como JoSo Penha foi outro talento poético, que desapa- receu quase despercebidamente no recoliiiminto dum ho^picio. Re- ferimo-nos a JOXQUIM DE AB^UJ^ (1858-1917) que àlên de ser distinto poeta foi biblióiilo e bibliógrafo notável, deixando trabalhos qu^^ como A Infanfa D. Mirià muito h)nram o sei e^ipírito de investigador consciencioso. Fica a sua obra dispersa por grande número de jor- nais e de revibtas literárias, ou por pequenos folhetos, publicados li fora era tiragens pequemssimasi, sendo de lamentar que não haja quem a reúna, pois nela muito que aprender e aproveitar. Intitu- la-se o seu livro de poesíis LiVa Intimai c ompreeaiendo duas par- tes— Canções de Abril e Filigranas ^ era que composições doíica- dissimas, que raerecerara a Antero de Quental una apreciação muito liaongeira '.

MTQm FE'JÓ (1862-1917) falecido longe da pdtria, era Estocol- mo, onde era ministro, a quem alguém chamou o último lírico nacio- nal. Vivendo distante do seu país é a piisagem da saa terra natal. Ponte de Lima, que lhe inspira a imaginação, fazendo dele um espírito de escol, notável de sobnedaie el »g>inte, de coloriílo e graci- lidade. Por ocasião do ceatenário de Cimoes «Bcríweu o Sacerdos Magnus em que o verso epo-lírico ó dii^iio do príncipe dos nosso» Poetas. Vieram depois Líricas e Bucolfcas^ A' janela do Ocidente, Cancioneiro Chinês, Ilha do9 Amores e Transfiguraç^^es, todos impregnadDS dum verdadeiro fulgor de inspiração e do beleza.

JJAO lúcio (f 1918) talento roubado ás letras na flor dos anos e que na vida académica se revelou dotado de grande orii^inalidadíi.

* A Infanta é eonatituida nor nma sArie de notas histór. - artísticaíi, que reetifieara e complet v\i o '[ii ; à^òr -a di ilast -«i Filhi d-í i). VI mo «l h i piibl., saiu em Génova em r'0'.), em tol. iliHtr. A i^)r vúi.*!*) Oim^íI soh o titulo Á Poesia na actualidade ^pareceu no Jornal do Comercio d í 7 juUio 1881 e era aep.. Porto, 1882.

35

550 miTÓBlA DA UTIBATUBA POBTUeufiSA

Os seus livros Descendo e O meu Algarve ficaram como docamento» dama arte profundamente pessoal, que Na asa do sonho mm se «vigora e particalariza. Nesta resenha rápida não devemos esquecer o nome duma Poetisa, que teve a sua época de fama e de brilho e firmou poesias de autêntico vi»lor AMÉLIA JANNY, (f 1914) que aparf*ceu no mundo literário pela mão de Castilho no &mo80 Teatro Académico de Coimbra em maio de 1862 e que depois^ a apresentou encnmiásticamente na Conversação Preambular do poema D. Jcdm de Tomás Kibeiro. Â sua musa é tranquila, doce e perfumada, como o íoi todo o seu viver, consagrado ao amor de Coimbra, á amizade do pequeno grupo de admiradores que com ela conviviam, ao circulo de grandes e fecundos ideais que lhe povoavam o coração a ami- aade entre os indivíduos, a paz entre os cidadSos, o progresso e a liberdade. Viveu eternamente joven, querida e estimada e quando ela desapareceu alguma cousa de íoi com ela desta paz dourada que nos rossos tempos perturbados nos parece um sonho. A obrado D. Amélia Janny ficou dispersa por grande" número de ren^Us literárias. Era ura preito merecido qiie Coimbra lhas reuni^Fc. As

Íioesias Progresso de 1867 e A Giierra de 1870 impr. ápaite em olh. fiam hoje raras ^.

FERNANDES COSTA (1848-1920) militar que para a arma de arti- lharia, a que pertenceu, escreveu trabalhos de valor, jornalista de grande saber que como tal se afirn ou f m numeroBOS jornaip, quere- mos dar- lhe aqui lugar como poeta lírico que o foi e muito (iÍ6*iiito tendo firmado quer traduções, quer oripoais do maior valor. Lem- bremos daquellas Alguma cousa de Bartiina, a que deu o relevo do original e destes os numerosos sonetos espalhados pelo Almmxaà Bertrand e que saiam da sua pena com perfeição parnasiana -.

POESIA DRAMÁTICA

Embora nSo escrevessem todas as suas obras em verso e embora também cultivassem outros géneros podemos aqui memiorar aqueles dos tíoí-sos autores que nos últimos tempos se tornara insignes na fornia dramática. Os piir.cipais sam:

212.— FRANCISCO PALHA (1826-1890) poeta de fá^l^

humorística e satírica como se revelou nsL. lábia, tragédia htrá^ cómica em três actos e mais tarde se acentuou no Andador das almas

^ Podro Enrico [psendónino do falecido magistrado Dr. Pinto CVtio» êle próprio itera to de raro brilho] Figuras do Passado Lisboa, 1915, 205-235, publicou lhe o rt trato e várias poetisa algumas inéd.

* Joeé Fernandes da Costa Júnior é mencionado no Dic. BibL d€ Idí** oi, 319.

oàrirvLo n bsooi^a bomâstioa 551

1 O n.** de 29 de dez. 1007 de a Soberania do Povo^ jornal de Águeda^ traí o retrato do Poeta e ó-lhe inteiramente consMgrado.

' Enameração bibi. em Ocid.^ onde êle es^revea dnrante doze anos a Orómca Ocidental, n.° de lU jan. 1908.

EiBcritor fecando no género drainático foi José Jgnacio de Araújo '1827- 1907) autor de A princesa de Arrentela, trag. l)nriet^«a; no mesmo g«">dto O J^rnv- Çtpc Eêcarlate. A maior jiarte da sna obra fíeoii mi inédita ou dispersa peloB joraaifl e reTÍatas. Era esBencial mente um poeta popular.

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i 1

e em ^ morte do Catimbâo, Palha foi durante 24 anos empresário do teatro da Trindade e comiseário do governo junto do Normal e nestes cargos prestou ótimos serviços á arte dramática e seus culto- res, já pela nacionalização de muitas novidades estranjeiras, pela 6aa influência e acção dentro do nosso próprio meio nacional.

213.— FERNANDO CALDEIRA (1841-1894) é um delicado

dramaturgo de forma requintadaraente artística. A sua primeira comédia O sapatinho de setim valeu-lhe, desde que foi conhecida, verdadeira consagração. Apareceram depois a Mantilha de renda e as Nadadoras, ambas em verso, em dois actos, finis&imas de con- textura e de perfumada gr;<ça. O mesmo filigranista se revela no seu vol. de versos. Madrugada \

214.— JOAeUlM ALVES CRESPO (f 1907) foi um escritor distinto, apaixonado cultor da forma, que o vol. de versos Escola bataria para consagrar. Enriqueceu a literatura dramática com a comédia Jogo de Cartas, com a trad. do drama de André Theuriet João Maria e a comédia de F. Copée Le jpassant. Ilá também dele |

o elogio do Prof. ILnoel Bento de Sousa. J

i 215.— D. JOÃO DA CAMARÁ (1852-1908). O nome deste ^

escritor ficará perdurávelmente ligado á sua obra dramática nota- bili8sima.

Os dramas históricos Afonso VI, Alcácer Q^hh, os dramas de

psicologia social O pântano, A toutmegra real, llosa JjKjeitada,

Amor de perdição, as comédias Os velhas, A triste viuvinha. Meia

noute demonstram o seu grande talento previlrgiado, eesencialnunite

I artístico. Numerosas outras p^'ças teatrais, ori^nnais e traduzidas,

f; algumas também etcritas de colaboração eom outros autores, dam ^

f. medida do que valia ê>te primoroso escritor, urn dos que melhor

f Boube honrar a nossa literatura teatral *. Era uma alma credite e

> cheia de bondade.

\ 216.— SOUSA MONTEIRO (José Maria) [lS4t>-lP09]

natural da cidade da Praia, da ilha de Santiago, arquipclago de Cabo Verde, intransigente purista e admirador dos clássicos, poeta, jorna-

552 miTÓUA DA LmnATUBA pobtuottAba

lista e dramaturgo. Um dos seus últimoB trabalhos para o teatro foi o Auio dos Esquecidos escrito para as festas do Centenário da índia.

Para o teatro adaptou o Falstaf, e traduziu o Pato bravo de Ibsen. Como sócio da Academia das Sciências tomou parte em nume- rosos trabalhos dessa corporação, elaborando relatórios, pareceres/ etCy e pronunciando discursos, dos quais se tomou célebre o recitado na sessáo solene comemorativa do Centenário de Cervantes em 1905,

O romance histórico Os amores de Júlia é uma reconstitai^ da vida romana no tempo de Tibério, onde a cultura documental se <»sa harmónicament-'. cpm as exigências da arte e da imaginaçSo '

Postumamente saiu o drama lírico em verso D. Pedro com prefácio de António Cândido.

217.-MIX1MILIANO EUGÉNIO DE AZEVEDO (1850-

1911) foi distinto autor dramát co, sendo numerosos os seus traba- lhos, quer originais, quer traduções, sobresainio «íooio dos de maior valor o drama Lies de Castro representando pela primeira vez em 1894. Escreveu também um livro de contos Em campanha e no quartel de narrativas militares.

218. RANGEL DE UMA (Francisco) (1839.1909) jor-

nalista, ruja obr» ficou, como a de tantos outros dispersa e esque- cida em breví*, e dramaturgo, género em que deixou algumas pro- duções como a Pedra de escaiidaJo, Condessa de freixial., VisSo redentora j etc., repres< níâdos nos melhores palcos portugueses com agrado e até com entusiasmo.

Era apaixonado por asstintos de arte, sendo o fundador da So- ciedade 2)romotora de Belas-Artes de Portugal e das revistas Artet e Letras e depois da Artej em que deixou numerosos artigos.

219.— ANTÓNIO DE SOUSA BASTOS (1844 1911) «i-

tôr dit coinérliíis, dramas, mágicas, revistas do ano, qu^r originais, quer traduzidas, que af^piravam a ser não obras de gosto literário, maíí trabalhos de ocasifio. Soupa Bastos foi empresário teatral, co- nhecendo, portanto, perfoitamente a vida dos palcos, a que consagrou a Carteira do Artista, o Dicionário do Teatro e numerosos artigof no Diário de Noticias.

220. ^las, {aparto D. João da Cfimara, todos estes nomes sam eclipsados pelo de MARCELINO MESQUITA (1856 1919), homem de teatro no mais rigoroso bentido da palavra, que deixou uma obra cheia de audácia e de originalidade, percorrendo todos os tons, desde o cómico

^ Din„^r. e retrato no Occidente^ n.® de 20 de outubro de 1909.

2 Lisboa, UU3.

capítulo VI BSOOLA BOMÀirriCÁ 553^

ao trágico, conseguindo dominar e impôr-se ás plateias pelo conhe- cimento por assim dizer expontâneo, imprevisto e fulgurante dos recursos scénicos e representativos, que tinha como ninguém. Basta dizer que quem escreveu êíse acto comovedor da Dôr supremeL foi quem nos deu a deliciosa aguarela, encantadora obra prima de graça c de pintoresco, que te chama Peraltas e Sécias, Aindn estudante escreveu o drama em verso Leonor Teles, em que desenha as figu- ras de^sa d itora intrigante e do fraco e apaixonado D. Fernando l. Em 188Õ a Pérola regeitada pela empreí*a do teatro D. Ma» ia deu pretexto a uma violenta polémica na in)p^en^a que t(3ve o mérito, pelo menos, de tornar conh»'cido em todo o pais o nome do autor. A obra dram Itica de Mesquita é muito vasta constituindo quase um triunfo cada peçi q'ie foi apresentada ao público desde a primeira até á última Phrinea, aproveitando com habilidade e delicadeza o tema da vtda des^a cort 8a grega, tam fanioí-a, como celebrada, em ura act^^, acolhida com «plau-ío no p^lco rio te; tro Nacional. O Velho Tema, Almas doentes, Pedro o Cinely Envelhecer , Sempre noiva e tontas mHÍft demnuHtram a flt;KÍli]idad<^ do seu talento dramático e a maleabilidade do 8eu e54íílo, que hc aconuidava niriraviih- sãmente a todas as fecena>'. OertameTite a preá qm» niellior gr;.VH a ."ua memó- ria no bronze da história é a tragédi<. histórica, O Refjente, inspirada numa nobre e patriótica t.*neào. O pTorap)nista é o infante D. Pe- dro, o sábio filh' de D. Joào i, gloriosa fi^'"ura de>Ha imortal ínclita Geração. Ao seu lado eleva-F.e, épico conn» êle, D. Álvaro Vaz de Almada, C^nde de Abranehes, hen-ico e cavalheirí^seo, e a inteliz rainha D. Isabel torturada entre o hcu an or de íiilia e o sui amor de esposa, D.' Afonso, Conde de Barc-los, e 1.** Ihique de Bra- gança, etc.

^íarce ino Mesquitn, alem do eoLíborar cm váiios jornais escre- veu o romance Quatro reis impostores Hobre os aví^ntureiros, que se quiseram faz» r pa^í^ar como o verdadeiro D. Sel)astirio, o livro de oontOíí Ka azenha e o vol. de poesias As Meridionais, Mas repeti- mos— a soa glória estriba-se sobretudo no atro, que encheu com o aeu talento essencialmente impressivo, fulgurante e teatralizador *,

* Marcelino Mesquita era do Cartaxo, onde tinha as suas propriedades, » cujo grangeio nos últimos anos se entngava. Era formado em Medicina.

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554 ^"^ BISTÓBLâ DA LITUUTURA POBTUQUftSA

\ . PROSA

Sumário : 221. A História e soiênctas aaxiliarea. Caosas do deaenvolvímeaU.

222. Canha Ri vara. 223. Visconde de Santarém. 224. Rebello daSUvi. 225. Latino Coelho. 2J6. Pinheiro Chajjjas. 227. Oliveira Martins.

228. Júdice Bick^r 2 i9. Soriano. 230. Martins de Carvalho.— 231. Luciano Cordeiro. 232. Lino de Assunção. 233. Chaby. 234. Viterbo.

2i35. Loureiro.

221. História e Sciôncias auxiliares. A literatura his- tórica no séc. Xix foi honrada por homeas de iasigtií* Valor. O movi- mento iniciado no séc. xvii por Fr. António Brandão e no imediato continuado por Caetano do Amaral, Santa Rosa Viterbo, Ribeiro dos Santos, João Pedro Riboiro, veio ter a sua corpa em Herculano, mestre e modelo que oa hi-storiado^es do futuro muito ganharão em ler e me<iitar. Investi e^ayo^^s seguras, apreciações rigorosas e bem deduzidas, estilo grave^ majesto.so e severo sam qualidades que o exoraain e forn-^cnn boa liçào ;íos estudiosos. As sciências auxilia- res da hisf/tría como a arqu oloi^ia, a história literária, etc, tiveram tambôm cultores no premente século ontiriuanlo um movimento, que vai juntando infansivelm^nte e sem d-ísânimo muitos materiais colhid 's nos arquivos e bibliotecas do País, e que agora tem vivos, felizmente, muitos e apaixonados representantes.

222.- eUNHA RIVARA (Joaquim Heíiodoro da) (1809-

1879) o notável bibliot cáiio da Biblioteca de Évora, que êle orga- nizou e dirigiu * proficientem nte, organizando igualmente o rico Arquivo Mnnicipal *, no m*^io dura trabalho indefeso, pacientíssimo, de loníí^os anos, (1838-1853), o in^i^rne secretário do Governo Geral da Índia PortuguT^sa, que com tanto denodo e brilho defendeu o glo- rioso padroado da Inclia, hoje perdido ', foi um erudito investigador, um pesquizador de factos e sucessos a que deu sempre relevo pela sua BÍnceridade e p«'lo amor da verd vdf>, como se nos documentos pubiicíidos no Arquivo Fortugues Oriental (1853-1866) e no Cro- nista de lissuary (1806 18(39). Bons 20 anos de paciência inesgotá- vel nos arquivos da índia lembraram-no a da Bandeira quando ministro da marinha em 1858 para continuador das Décadas de Barros e Cuuto, tarefa de que nào chegou a desempenhar se.

Em 1877 regre stiou á pátria, fixando residência em Erora,

1 Catálogo dos Mss. i, 1850 (Innoc, iv, 83y, continuado por Joaaoim António de Sousa Tellea do Matua (Id., x i. 13).

* 5 vols. dos Mss. exiatetitea no Arquivo da Câmara Manicipal de 1 Évora.

3 EeJacçào dêáaea trab^Ih s em Inoc, xii. 60.

CAPÍTULO VI BSOOLA BOKAHTIOA 555

^ode t&lecea quando se ocupava de dons interessantes assuntos -^ Bocage na índia e Camdes na índia, que nunca chegaram a impri- i mir-se. Saber, coneciência, sinceridade, trabalhOi tais os característi- cos de Rivara \

223.-0 VISCONDE DE SANTARÉM « (1791.1856) foi

mn investigador notável como o provou com diferentes trabalhos^ ^tre 08 quais avultam: o Q^iadro elementar das relações político» e diplomáiicas de Portugal eom as diversas potencias do mundo ^ . * (voIh. 1 a 8 e 14 e lõ), a Memória sobre a prioridade dos desço* irimenfos portuguesps na cos^a de Africa Occidental. . . (l voL) 6 muito:^ outros^ algans em francês, todos reveladores da sua vasta eradi(^5o *^ do seu constante e aturado -estudo. Nos dous vols. Opús^ ctdos e Esparsos (Lisboa, 19 tO) reeditaram- se vários tribal lOs seus €8p*.lhaflos por Boletins e Revistas scientíficas, hoje de difícil con- sulta. Conquanto sejam pequena parcella, diz o erudito prefaciador desces voli^.y do muito que produziu aquele assombroso espírito de investigador e crítico... c n^titu^m um pidrSo glorioHO osla p»~odi- \ giosHS f-iculdades do afanoso lab')r, da crit^TÍosa intelio;ê,rn>t, da J inxgotá«el erudição, do «ab» r p ofunlo, do atilado disctrnirapnto e ! do hl to patriotismo daqu^*le que as eacreveu e lhes díu public dada A Correspondência abrange 8 vols. e é uma fonte riquis-una d* in- form.'Çoes de toda a ordem de inHspensável consulta pa-a o histo- ria^lor dd época. (Lisboa, 1918-19). O «^ábio de novo n. s aparece noa Tola. retíeiítemente publicnd»'» Estwlos de Cartografia anfiga (I, 1919-11, 1920) com largo Prefácio de Aires de Sá.

224. -LUÍS AUGUSTO REBELO DA SILVA (1«21-

1871), u;n dos discípulos miis notáveis do romantismo. Os prim iroa trabJlios dignos de menção, que escreveu foi o RáxkS%o por Homu

^ Innoc, Dicc, IV. mas sobretndo xii, ondo vt-im biblioari"'fia ''xténsa. Seria iajastiça iiào deuar aqUi Lnf*nf^»A() de José António Ismad Gracias (f i9l9) qne contiiíaou cuiu brilho na [Mia o nome de Rivara. A soa ol>ra pitriótfca fieon patent* **m moitas pah ivíacõfvs, do. qne aiçora citaremos O Oriente Por- tuguêSf revibta de preciosa docmnent.içào sobre o aosso domínio nltramarÍDO.

* Manoel Francisco de Barjoa e Sousa de Mesquita Leitão e CarvalhoBa Cfr. Innoc, ÍJicc. Bibl,, v, lof» e xvi, 217; P. Chagas, Dicc. Pop , xi. 150; Boletim da Soe. de Geogr de Lisboa, '21 '^ série, 357 e se^ç., e Td . 23.* série, 1 e -t^g., onde- C3mei;arai.i a at;r D.thlif.alaa muitas cartas suas, quf? abrangem o período de maior act vidade s 'ifnítiti* i do seu autor. Ei. aparte : ^Ij^umas Cartas inéditas do V. de S. com uniu introd. e notas por Vicente Á'nifida d' Eça, Lisboa. lííO\ 1 vol.*, A. Baia», V^^isconde de Santarém como ^uar'a Morda Torre do Touibo, Coimbra, lUtí*.», 1 f-lha; Jordão de Freitas, Onde nasceu o 2.* Visconde de Santarém? Lisboa, 1913; Ferreira da Fonseca, Visconde de San--

Mrem^ apontamentos para a sua biografia, Lisboa, FJOT.

* iSr. Jordão de Froitaa, nj rróloço, ao 1.^ doa vols.» p. vi::.

556 HIBTÓBIA DA UTBBATCmA POBTUGCftSA

%to, rcmance hútórico do reinado de D. Sancho 2.® *, e o Ódio vé- UèO nao carsa, ínnditdo numa tradiçSo do século xiri. Seguem-se # dilicio^o conto, que descreve um epifódio do reinado de D. José i, Ultima corrida de touros em /Salvaterra, e a Mocidade de D. João V, que é de 1852. No ano imedi&to saiu Lagrimas e Tesou- ros rctrrtTte fo ninado de D. Maria i, em que as qualidadeb histó- ricas KbrdíTani as nc velísficas, e o seu trabalho capit»! con o histo- riador — a Hihtôria de Portugal nos séculos XVII e XVIII, 5 vok., eecril' t entre 18(0 a 1871. A sua lirguagem era correctissima e ae quíílicadrp do estilo brilbantií-simí s cono se jóde vêr, àlõm dos livres ctadís, rof- Fastos da Igreja, rnd< dfscr(v^ o piimeiíc século do cr S'ifinibmo. Kos Varões ^tuytres dos três éjtocas constitucionais a coi c íir e a elepfmcia ca8ín'-Fe nunía ycrfnt;» liarncna (cni os dares hi^tón(0s dch hcut biografados. Gcntinuou o Quadio Elementar do VistC/nde de Stntarem *.

225,- JC5É M/RIA UTINO CCEIHO (l^lò-lSPl),

foi 1 ni I (Ijiicí f^oufiiií^iio, etcritoj grande tii d ^«'^c, ( xinoo pro- fessa r, h stof^rf^or piinioroFO e dásfico dun>a rnaíulií^i.dc iirpe- eável. A^ brillirntfs qiislidades d^ sua JjT.gi ag» m ríveljin* s- nos minn TOKiS íTibalíos a que vincu-ou o sru nomf. Ent^o ("'cf felecta- rímff-: A hihtórfa politica e militar de Portugal dfcde osfivs do século XVUI oté 1814^ ; e os esiudoF (onsidtiafoa ccm< i(dêlos:

Luís de Lumôts, 1 vol., 1880 e Vosco da Gavxa, 2 ▼ol., IS. ^4.

Litro Cíílho trídu7Íu do pngo a b'lí^fi^la Craçao da Co- rda, d< P^mó^tench * e ro alenào o Gladiador de Ra^izia. O mo aócií» da Acar f mía Rtal d>8 Sc cncias d* Li? boa conpos c publicou di^e!f■(^ í.^-fndít- biogiííficos srbre o Cardei 1 Saraiva,' Bodrigo da FcnH(^ca SIíígalbàeB e tutros portugueses ilustres *, andando dispersa

' Sr-io na Rev, Universal, rie 1842 43.

* C'M.sultar p:i}.i a sua bitgr. : Andrade Keneirp, Lit.» Música, etc, j* cit., j)Hg. 43 e ^ops ; Teixeira de VíÀfCf ncelos. Cartas de Paris. v»!. 2 ", pág. ií>8; A. X. K< drign» a Cordeiro, Almanach de Lembranças para J874 ; Balhso 1 ato, Sob os cypret^tes : Serões, n ** de abril de 1Í07. sobre a parte iconográ- fi'.ía; o 1." vol. das Obras completas iiK^ere <• oxcurbo bi<gr do brilhante escri- trr. Foi uiii grande servçio e8^a edi^^ao dirigida btainente pelo grande ?dn irador de Rebelo da Silva, que havia dirigido as igu^lnieute ediç(k» eompletae de Castilbo (e cem que amor!) e de Garrett.

3 vols. 1874.

* A Oração . . . versão do original grego precedida dum estudo sobre « eiinlisação da Grécia, 1 -"^TQ, 1 vf 1

'• Vid. Inoe.. Dic. BibL, v, 37 e xm, 97. Elogio académico p<^ r Souea Monteiro, ra Hist. e Alem. da Acad. das Sc. de Lisboa, viii. pág. i, ISOO). pég. 1-21; J. Antniíiode Freitas, Atlântida, i (1916), 1043; Livro de HcTit nageit a Latino Coelho em i9 de agosto ae 1916 (25.® aniv. da soa mcrte).

CAPÍTULO n B8C0LA BOSIARTICA 557'

por jornais e revistas grande parte sua actividade literárin,,que agora começa porérn a coligir-se est^nHo ji publicados rs vols. ter- não de Magalhães (1917), Gai-reit e Castilho (191 7), lipos Nacio- nais (19 19 e Cervantes (1919). Ai se pode admirar o artista insigne que era Latino.

226.- MANOEL PINHEIRO CHAGAS (1842-1895), es-

critor de nítáv»-is e fecundas «pti^oes liteiárian, de xnu bi grafias, romances, folht tins, dramas, pi esias, história, etc. PdIíiÍí o notabilis- BÍmo, orí»dor indigne, jornalista, a í^ua prodigiopa actividrid^- parecia nSo ter limitcí^. puíís obríis roais f st maHas s^m em v^rso o Poema da mocidade ^ (1864); no gén»-ro dran»fitico: A Judia^ A morfjadi- nha de Vai- flor ^ O drama do povo, a fífjca de MercuUs'; no yénero hifctónt o ;* História de Portugal ^, HiMria a^e^re de Portugal '. Portug7ifs€§ ilustres: no nman^e A flor stca^ O juramento da Du- queza. As duas Jiores </e sangue, A mantilha de Beatriz^ Tristezas á beira mar, efe. Pmh» i'0 Chn^as cr/labon u em inunierív- ii^ j«»rnais, dirigiu o Dicionário Popular em «6 lume.H * <- 1»'Z numerosan tra- duções. A Morgadinha de Vai flor ^t*|^r(•^e^ta' a ^m 18l)9 i'0 ni*ío d-^ vibrí^ntet* ^iplc.u.-ot? conciig'Ou-o como um doi^fjDaHor da- platí ias. Entre í»8 flnr-s o'nm Cíuitiro na Avenida da Lib'rdar*e, rm Li4)oa, foi tr' g no (m ]1H)S um bisto dêt^te Cf-cntor, (|ue foi um ])rotótipo de hon* stiílaHe, tr;ib lho e bonHude. Mas outra h muTtaíí- in a er- guer-Ihe ** é a pnb!ícíiçao iíjt« grui das snas obra», qm* rno ^empre uma lição para tod(í.s os qne amara a linguv p >rtu^> esí4 qne, p ucos, como ele, tscrevt-iam cem tanto brilho, talento e ma!* t^bilid. de.

227. -JOAQUIM PEDRO DE OLIVEIRA MARTINS

(184:5- l^i94), publicifta ilntvtie, n tunl dr Li^b• a, oídn n is ími aos 30 de abril d^ 1845 e prematurara» nt fah ci lo na maior pujança do talento em 1894. Com»ç<>u aos 14 an^s a carreira conienit', iodo •08 24 aduinitítrir as miriMS de Santa Eufê ! ia em E-pnnhi e con- Bervf-ndo-se ai até 1874. Nênte ano veio para Portugal, ond perma- neceu biè á morte, que foi uma verdadeira p rd» nacional, tanto bavia ainda a esperar das suas fecundas qualidades intelectuais. '

A pág. 182 e spí:^. insere a c irta de Castilho Crítica Literára di- rigida ao edit.<r da obra A. M. Pereira, e que deu orit;eia íi Questão de Coimbra^ corno dií-scmoa

Teve na l.*ed, 8 tomos e saiu na 2,^ eom 12. Saía pouco uma o * ed. 3 3.' ed., 18ÍU.

Vid- sobre a bio-bibliografia cie Pinheiro Chaga3 Icoij., Dic. Bibl., !▼!, 288; Ocidente, vol. aviii, n." de lO-Abnl 18^5

O aen eU'gio hist. na A*ad. I\. das S<v <\r T.isboii t' i foito pdo sr. lí. Lopes de Mendonça do dia 8 de maio de P/Ut. Vid. ainJa ar. Ikito Aranha,

Factos e homens do meu tempo, m, 109 e seg.

Oliveira Martins inicioa ft sua carreira literiria aos 19 um com a pablicaçSo do romance bistóríco Pkebus Moniz, qac. nbtere êxito mfdiocre para quem, como Sls, se havia de revelar uin dw mais lúcidos escritores na kisbíria, na literatura e em diverroa tn- balbos da ordpm económica e fílosófico-reli^osa. D'ntre os t^abalhtx Jii^tóricoB mencionaremos a História da CivUiaação Ibérica, a Hit- tória de Portugnl, o Portugal eontemporâjieo e os bpus últiinos tra- balhos A vida de Nun'Ãlvare8, os íiikos de D. João I, e n Prín- vip» Perfeito, que dxixou incompleto. Todas estas obnts sn prendem, como os títulos indicam, & história do pais, mas Oliveira Minins es- creveu trabalbort de hintória gT^\, sendo primacial aqu--[t; qn-j Sle Die^mo designava como o «cort-çSo das suas obras e qiv é real- mpnte dos mas belos e mais profundos a Hittória da Rffúhliea Romana, deixando mais raças humanas e a cioil aa^ào j-rimlti- va, O Helleniemo e a civilitat^ão ckriítã, Quadro da» ín«''''níçijM primitivat, etc. .S-.m de i:íLrai'ter econótniiío : O Regimen d-ts riqvt- xa» (2.* ed., 1H94, 1 vnl,), o opúsculo Reorganitação do fí-meo Commercral, Politica e Económica Nacional (l v> 1.) e a iM-mória aprs.ntHda í Academia Real das Soêucias de Lisbou, A circtJaçào fiduciíirla, et",.

Oliveira Martins tinli» um poder de anilise e dft ilfscnçSo verdbd<-irBmente as tom b roei s. A sua linguagem é encaniaH. r*, ad- quirindo o estilo das íuas obraf, princip-Imenfí as hi-tóni'i-s e u quase purament'' litt-rárias, como a Inglaterra de ftoje (2.* ed., 1894, I vol.) ebcrita sr b a forma epiftolar, e as Cartas Penintula- ree (1895, 1 vol.) todos oa tons e todas as intensidades. Jl, b widm- deraito ngoroSiim>'nce sob o aapt^cto SGÍ'-ntífico é indubitável (|iieiiêlfl o artií>ta sobrel^-va o Ínv<íHtig»<Íor, e o estilicta exceile e c\\- pn a f^ zer enqiípcr o írio díssccaHor e analista dos factos bisfó'iCi-8 ■.

Mf*nendtz y PpIijo chumou-lh í com todi) o diri-itio ■•■iiiirar- tieta histórico qae a P nínsula produziu em nossos dias '. Quire di- Eer êla i Tm é um frio construtor das personag^aa do puasi in e das épocHa em qu" elas vivaram. A sua poderosa imagin ç5' Iwsead» nSo em trabalhos originais, como o fez H-srculano, como t- l' k boje Gama Barros, mas nas narrativas dos cronistas, discrt:ta, p t vezeí,

> D Cíirf.Hna MicliiiMis. Uma Obra inéd. do Condestdvel. tit., 31. Achamos iI.>iii,iíííi.I<. s.^vBru o iiiizn de K Prtawge na ^ev. da HIsl.. vcl. d* mu, páií. .H.2, c. A Hisl. de Portugal de Oliveira Martina; é Miohetét em reduz idaii. Mu.

' Vid. Anti'Tr. do Quanta! 0/iWfi>a Martins, o critico liltrdrío. o eco- nomista, o historiador, o pub!icisía, o político, Lianoa, l8'-'4, 1 toih ; Srrõti, ■a" -JT. wl-Tiiíiríi li' líhií, :irt. do sr, J. L d'AviÍa acomp^nhad > de 7 iloíir»' rflpa, 1 viiiiii'Lii í. 1 íniLii^i-.iúi, ]i.',^'. l'V< : Leite de Vasooneelos, O doator SCorl.\ plg. 218.

mais livremente do qae lho permitiria a realidade. Lança afirma- çBes, estabelece juízos, dita sentenças, que criam o desalento, geram O pessimismo, fazem perder a té. A esta acç3!o destruidora e negatt- rista, qu9 se deataca sobri^tudo da FlUt. de Portugal a do Portugal Contemporâneo, qae opor o entusiasmo do eacritor pela Ínclita geraçíi> e pelo Santo Condestabre (ifiSPiihados a grandes traços épi- cos noa Filhos ãe João T e ds Nun' Alvares. Qup êle tinha no p»ís, qu« também pensava era organisar e n5o em doflmir, mobtríi-o o seu livro Politica e Económica Nacional e o seu Pro- jedo de lei do fomento rural. A «tiiude de eapiríto de O. Martins, era idêntica A de RamaDio Oitigil nas Farpas, á de Eça nns seus romances, Á Antero nu una lil sufia. Era um mal do tempo, âB que procuraiam libertar-sn na medida do piiBsivel.

228.-JÚLIO FIRMINO JUDIGE BIKER {f 1S99), l«bo-

rioM) esiTÍtor que tendo si-lo rincarreg.ido do continuar a VoUecqão' de lrataílos,_ convenç~es, eta, do visconde de líorei?» Castro, dei- xou o Hiiiilemetito á colecção de tratado», conv&nqTies, contracto* e actOK pdlilicos celebrados entre a coroa de Portugal e as mais po- tênelas desdn 1640 ' l a XXil do Suplemento ou IX « XXx da Colle- eçàoj," Cuí/ecçÕo de tratados e concertos de pazes que o Estado da Índia Portuquãsa je,z comos reis e i-eiihores com quam te<e relaçííet nas partes dn Ásia e Africa Orieniml desde o principio da con- quista até ao fim do século VXlfl, 14 v.,1.), tr.Lb.lh.i» êsr.M <!« pe- nosas e i;uric>i*is->imaii inv^stiíaçííi a. Deixou mHÍi: Docwnentns iné- ditos para subsídio á história eclesiástica de Portugal, .afir»' do- cumi;iitoi relativos aos reinados do D, JuSo V, lí. .Iimé l. 1>. JoSo Ti ■> rfgêm-ÍH de' D. Pedro, e a Collecção dos negócios de Huma no reinado de D. José I, ele.

229.-SIMÍO JOSÉ DA LUZ SORIANO (1802-18!)!) dei-

SOU váins obrBB históncii", pid-nitti iiitarse como mi'!h T a que in- titnl»ii História do cerco do Porto (2 vol.). No vol. Reoelnçijes da ninha vida e memórias de alguns factos e homens meus contempo- râneos {l vol., 18i)(lj nnlíiiias int-rfsíiantes qu« se prcuilt^m mais ou meuos com a história g^ral do paÍH, como as notas sobre Coim- bra e a U 'iveraídade (pAí. 6S a 397), a d(scri(,'ao gooffrática doa Açores (470 a 308), eto. Publicou mais a História da guerra civil (19 Vil., e a Vida do Marqms de da Bandeira. Sin.nn foi um benemérito, deixando um ra-to luminoso Ha sun m-milna, ■'ntr<í ou- tros factos, no legado I2:0005UOO réis á Hiat^ri órdia d^ Coim- bra para sub-ídios de três alunos polires nas aulas drsta cidude.

230.— JOAQUIM MARTINS DE CARVALHO (1^L'.í-ivj«j

benemérito filbo de Coimbra, enjoa intcièíses iulumi-rataLUt-ntu advo-

560 ' B18T<^iA DA LITBRATUSA POBTUBUASA

gou durante, toda a sua operosa vida íomalietica principiada com o Observador (1847) e continuada no Conimbricense (1854) até á sua mort', sucedida a 18 de outubro de 1898. Nas páginas do eeu jor- nal ficou dirper^a uma numerosa aluvião de noticias de &lto interesse para a hi^tó^ia geral e particular do nosso pais. O mesmo interesse se li^a atíH s us volumes Apontamentos para a história conUmpo- rânea e Os assassinos da Beira ^.

231.— LUCIANO CORDEIRO (1844-1900) jornalista, crítico e autor d<* nimieroB^rs triib»n>0H sobre viajene, questões económicas, coloriiaíh, hi!-tóriCí*H, etc, Fund.idv.r da Srciedade de Ge< grafia, ao engr; )i :< Mm» nto íí proí-p*'ri<ia 'e. da qual consagrou todos seus al< nto^, |M I . íiUH raSiTída iriujatna, ptla sua actuidade incansável, pela ht n<-stt 'ade do sen viv^rr, p<)^t08 desintereaisadamí nte ao neíviço da c; nsH I úl) i •«, impu^s" coii»o um modelo de sacriíicio e de cora- jopa ah •• <^ (;n( , » rn qu»* uiuito a liaivar e imitar.

j) . ír- Hei M1M8 nume' "Hi.s obraft p en"i n-r^mos como princi- pjíi'--: Lvro de ( riiiea^ Arte e IJteratura Pqrfvgue,i^a de hoje^ J8h'8- lS^!f^; >Sf'iJíindo livro de Crífica,' Viat/ens: Espanha e trança; VidiJfUis : J^ rimai, BdVferUj Áustria- Itália , Soror Alariana, d freira jHfrttujnêsa, etc.

]au\ix\ p (]. nniio noritu a 24 de dezembro de 1900 com 55 anus tlt* j<i. (['•. -.

232. LINO DA ASSUMPÇÃO (f 1?02) escritor infa- tigáy^ I, cuj. í.cti\i ^do íicou ; bhinaladii em bastante* vols. de inres- tigarro jn íó íca. Falecido a 1 do nov. de 1902, deixou: Frades é íreir(fs (' K/Tiiqiict •^ nioiiíísncíis), As Freiras de Lorvão, an J/o'ya* de i^em/dH, Aa últimas frnii-as. Histórias de f raies, apreciáveis como cl m- ritos (1^ vida conventual em Portugal e que ele põJe eo- nhec» r n uiio bem como Director, oue íoi, <ias Bibliotecas •* Arquivos do leino, oi li^^ado por Íj-ho a folhear todos os documentos dos con- ventos, á m (liíia qu.í êst s ía-n hcnc^o extintos. Tom mi^: Narra- tivas do Jírasil (1870-1880) ; 3//7 e seiscentas legoas pefo Atlantic^); O Catholi cismo (Da costa ao sertão); Fim de secvlo (historias meu tempo) ; As J estas doutr^a, Matheus de Magalhães ; Em HespOr nha (Avie e paysagem) ; Mlscela^iea; Diccionario dos termos architetura; Historia dos jesuitas e Martyres {paraphrase durM

' \ id. F. A. Martins de Carvalho, Algumas horas na minha Livraria* Coimbra, 1910, p;ig. Má.

^ V "ja-se a sua bicgr. muito documentada no Novo Almanach de Leffi- brancas para 1Í)U4.

Unda ehrittS), que é o seu último livro. Para o teatro escreve» ; Eva, drama em 4 actos: O* Lazaroi, drama em 5 actos; A Pátria na oficina, comédia em 1 acto ; a Gramática, id. em I act<> ; Mal' dita campanha, id., id., Dormir aeordado, id., id., Monaenhor, que é o seii último drama. Escrevia aioda do Dia e na Gazeta de Noti- ctot, do Rio de Janeiro.

233. CLÁUDIO BERNARDO PEREIRA DE CHABY

(1818 1905) iiotáv<;i escritor militar, cuja viila de anste-idadi; e de trabnilio foi um exemplo e um alto ensinamento. Dentre os seua trebilhos lit-rárioB e scícotíficoB des'a'<Aremo8 : Excerptos his- tóricos e colecção de documentos relativos d ffue-ra de-ith minada da Península (186.-íi, Apontamentos para a história da legião portuguesa ao serviço de Napoleão I (l^^ij-^ ; Aponla- menios biográficos de sua majestade imperial o senhor D. Pe- dro IV (lãC-l); Magnas e flores (poesias, 1855); Deus, poe- meto (185tí); Do Porto a Lisboa, versão do espanhol anotada pelo tradutor (1856).

F 234. SOUZA VITERBO (Francisco Marques de)

(1846-1910) é nm dos mais lioiifstos, mais inua' silvei- e maia valio- 108 Imballudures do moderna literatura histórica poitiifr"^"»!-

As numerosas monograriai por, ê^e publicadas vtír8:»nHo oa maia variados assuntos téem toHas o cunho Ha conscir-ncia e da pro- hida^e. Inid.ndo a au* carreir.i lij Tilriii pelo livro de vr-os O anjo do pudor (1869) breve se orientou pira os trabal''0^ h BUÍricus, o Último dos quais foi D. Lenor de Portugal, Imperatriz da Alema- nha (19 lU).

As dezenas e dezenas dosais trabalhos eram sempre a 'ompa- nliados parte documentai parecendo impoasivid que um homem, ás mais no último período da vida digo, podesse ter remido tam vasta documentação para dela tirar as devidas eoacInnSus.' IJexemoB •rquivadoB aqui os nomes dalfíumas daí suas princi iiis obras Dicionário krst. a documental 'tos Arqn''t.etos, Eii'j«iih-:iivs e Coru- f/nioret portugueies. . .; Notícia aòlii-e pintores portug-iesen oi* qaé txerceram a eua arfe em Portugal; Ivahalhos n'iit''coa iÍda Portw- ?ueMj noa sécs. XVI e XVIÍ; A armaria em Portif/al ; cstiidoa «abre de Miracula, Camin/ia, D'i,n-ão ih Oi>c>, 'tr. Ui.i do Sojua, Duarte Galvão; numerosas Tuouiúiias bdhva Aries e Artistii» *m Portugal, etc., etc.

A lista das suas obras pode vcr-se quilse com[]l'ta ua E-íciclo- pidia PortugnSsa, vol. SI. Por ocusiãi) lía wiiii luurii^ toiins ns juniaia e revistas publicaram artifí'i3 eiicotiii^l^ticus da vida e nbras do prés. 'nnoso cidadão, devendo citar-ae entre todos o Díãrio de Xoticatf

da qiic @le ffira constante e devotado colaborador. Parte deasa obn jomaliítíca foi pÓBtumanteate reunida no vol. Cemartígo$dejonid'.

235— ADOLFO FERREIRA LOUREIRO (1836 1911) engenhtiiro dintintÍBaimo da que sam prova os trabalhos técnicM que deixou e aqui nSo é lugar de nomeiar, pelos seuB estudos e investi- gaçSes históricas é uma 6gura importante da vida literária contem- porânea. Alêm do livro de poesias Espinho» * Amoro» (18S9) escre- veu para o centenário da índia os dois volumes No Oriente » De Nápoles á China.

Ãilolio Loureiro foi dos bibliófilos mais apaixonados que temm tido, deixandj uma livraria riquÍNsima de assuntos militares, e em determinaidoB pontos inegualável, como em tudo que se referia i Guerra Peninsular, etc,

SCIÊNCIAS AUXILIARES DA HISTÓRIA

Snmárlo: SM. A anueolcgia, ele 2;;7. Pinho Leal, —233. Felipp SimSei.

:i3íi. Villicna B*iboBa. 240. J. A. Vieira —241. BbUcío da Veigs.

342. Martins Sarineuto. a4a. Aragiio,— 244. Zeferino Brandio.— 216. Consigiieri IVdroso. 24S. Gabriel i-ereira. 247. OntruB aatores...

236. Arqueologia. Humismática, Heráldica, «te. Du- rante o h<''C. SIX luram niuito!; oa i seriton-s, que dedic^tram pacientes e auirarliin invcíti<; v"''» a iVtos inlprfMsantes estudos, que em tam alto apreço hhui tidua boje em iodos os países.

237. -AUGUSTO SOARES DE AZEVEDO BARBOSA DE PINHO LEAL (isi;j-18,s4), é o aut.r do Portugal AnUgo t M'i'/eri,o, v,^>lo r-jio-itiirio di; iiifòrniaç-õ b topogrática» e históricas àfôrua das povom^ucs e uionumeutos do nosKo pMs. Trabalhou nessa obra quarenta anos, levamlo-a até pilgs. 412 do vol. IO sendo daqni por dvantií coiitínuíida até o vol. 12 por Pedro Augusto Ferreira (f }'J\',i) t-oiii o inc-Miio zelo e ik-siiitiTc^íiada abn^^gaçíío. Copiosos f5- rina oa dados rewiiiidos qi^r fia tiivIJvào oral, quer da leitura de velhos litros e códices espalhados pelas bibliotecas públicas e parti- culares do n-ino. NTisse monumento erguido Á custa de tantos sacri-

' O eli'KÍo hietÓrií-o de í>on9a Viterbo foi lido na Ass. dos Arqatólogei Po/tiifl. pplo lír. Alfii-iín da Cunha em eesaao «oleae de 31 de des. ar Wl, *

nnvaNir-nlP pi'l<> mt-siiio distinto pm-ta e eserilor na sesaão Bolene do AleoM .

Cuineriíial do IVrtn em i"' de dcíriíiliro de 11*13 j

Vid. lanil)L-in o Instimlo, vol. de 191 1 ; Odd a." de 20 de íaooiro " ]

191!, (^ o diacnrsii do Dr. IVdro de Az<<ve<to na seeaio da Academia de ttdefDf. I

de lail. 1)0 Uol. de Seg. O., i», (1911), pig. 244.261. ^

ficioe nem tudo, eem duvida, está a coberto da crítica, mas nem por ' isBo êle fica menoB como um padr%o a conferir aos eeaa autdres título dl verdadeiros benemérita '.

238. DR. AUGUSTO FILIPE SIMÕES (1835-1884> profeexor da Faculdade de Medicina na Univ., deixou importantes trabalh -1 (fibre seiência» médica», 8en^o o maia iraportantn 0 vol. Edueaqào Física *■ A Introduc^Ho d arqueologia da péntfUTila ibé- rica *; .1 ReUquuts da Arqui.têturaromaiia-'iyíantlna em Portugal *, a Ex/ionição retrospectiva ãa arte ornamental portitg. e eepanh. em Lisboa ', «am aegunimpnte os sfius estuJos muie wimpletoe e per- ieitos iT Cdtnpo da arqueologia e dua belas-letraa '.

239- IGNACIO DE VILHENA BARBOSA ( lSll-1890)

foi o lu 'lador 1^ principal n:d.ttor do Universo Pitoresco, revista em- que 1 ii'i.it'! 8i'js anos aparei^êram tmbalhos ecutt bObre arqueologia pátria,, levcladorea dn sua lar^a erientação, que dep.ja ao siirmoa brilh-nlt-mi-nte na colaboraçã'! era dif^reiítcs rcviwtaa cuino o Pano- rama (Hrgiin.la sérit^). Arquivo Pitoresco, Artes e Lettras, Oci- dente, t'-., e Kobretudo noa trêi vol. ^s cidades e vilas da monar- quia po'-tuguèsa que têem brazào d'armds.

240. -JOSÉ AUGUSTO VIEIRA (18d6.1890-,, de Valença do M Tilio, niiínico pcbi ei-coia du Fort", vitimado ao» 34 anos por ama ti-i.M g.lopant-; escritor qiift s>-ril stnipre (ij;,'nami;rite lembrado pelo d l .-LosT kvro Minho Pitoresco, fotij};raiiíi da ridente provín- cia dfi ott'!, onde numa maf^ia A>: estilo encantíidora se deíífnrolam a paiBHíífm, os i;ioniinu;íitoa, aa tradições, a l<*ndH, numa pítlavra, a vida natunza e a da histiirJa apanliada em fljgrijnt« p^-io intuli- geote f perspicaz observador que èle era. Ao lailo do Minho Pito- resco figuram do mesmo autor o livro de conto* Fofotipias do Mi- nho e o romance A Divorciada ',

241.— SEBASTIÃO FILIPE MARTINS ESTAGIO DA VEIGA, de Tavira (tí maio Ibl'H— j 7 dcaumbro ItíDl) depois

' Leia-se o que escreven o Dr. Pedro Ferreira no vol, 13 a aegnir i, pig. 230^.

' 1." ed., Coimbra; 1873 ; i* e 3.% ibid., !S7i e 1878.

Lisboa, 1878.

* Md., 1870.

' Ibid.. 1882.

' Cfr. para a «ua biogr. A. F. Barala eG. Feteira. Esíéma de perpe- tuai na campa do dr. A. Simões, Li-bnn, líí84,

' Jálio de Leinoa, /. A. Vieim náo cultivou a prosa, Irnbtdhou Iam- *tn o «ern. «« teus iníd. Coimbra 1017, 1 Iblh.

564 mrdBiA da lxtbbatoba 90wtn9c鐣

alguns ensaios em poesia e drama especializou- se nos trabalhos arqueolÓ2;icos alcançaalo grande celebridade. Aqui m^^ncionaremos 00 mo int ^r desando mais os trabalhos literários sóm «nte o seu Romanceiro do Algarve (Liib^a, 1870), devidilo em duas partes: romanc^e e lendas christcLs^ e acompanhado de eraditas expli- caySes ^.

242.— F.MARTINS SARMENTO (1833-1899) arqueólogo <leBtintiHHÍrnOy cujos tr^tb^ltios o colocam na primeira plana dos sábios da especialilaltí. Na»! exòavaçõ^s da Citâaia de Briteiros (1874) e nas de S^broso (1877) feitas com um método e rigor verdadeira- mente sci^ntidcns empreifou grande parte da sua actividade fecunda. A Socied^ide Mirtins Sarmento criada em GuiniarSeSj sua tãrra natal (1882j, deixou to ia ^ sua Biblioteca e todos os seus manoar critos *.

243.— AUGUSTO CARLOS TEIXEIRA DE ARAGÃO

(1823-19 JJ) nimismtti ilisio, autôr d* Descrição históricadas •moedas romanas existe ites no museu numismático de.., D. Luís I 8.** 640 p4íçi., Lisboa, 1870). A sua ob^-a capital Des- cripção geral e histórica das moedas cunhadas em nome dos reis» reí^entes e governa iores de Po''tugal, em trèi gr^nirí» vols. publi- ca tos «m 1874, 1S77 e 1S80 e clássica n) asnunto. Sim de aomeaos valor a raoaograíii D. Vasco da Gama e a vila da Vidigueira, (8.®, 46 p{4gí., Li«b)a, 187 L) ^ Díahruras, santidades e prophecias (8.^ 150 págs., Lisboa, i894) \

244.— ZEFERINO BRANDÃO (18421910) ligou o sea

nome a alíi^uns «soritos que ra rr< c^m citarsi.

Apirt^í o seu vol. de v-^r-os Páginas intimas deixou €car oi Monumentos e lendas de Santarém^ sen dúviia o « u trabalho (jpi m »i .r ioK'^>, e ain Ia o Bitizado de D. Atonso VI, Pêro di Covilhã, (iscit) por ooasiuo 1, Centenário da índia e constituinia uni < ()dio romanti.t) lij béc. XV, e a obra -ie investigação historie* Bélgicãj bõbrvi as relaço is dcs.s; p^ua com PortagnL

245.-~ZOFIMO CONSIQLIERI PEDROSO (t 1910), o

ilustra; ilirector «i prof^^^s )r do aat go Curso Sup jrior L-^tra^, 8 pr.'i?i.líí'iíeí da Sofinlidí dt G^oijjraíiA de Li-^bm, a que impnniía grande desenvolvi -n nito^ conf-írêncista teráb e erudito, é autor de

* Rev. Lusit., JI, ú'>H-^í)b ondo vem uma notícia laccinta escriupor Gabriel Pcnirt

- PortuQalíi^ I 4-1, bio^r., bibliopjr. e retrato. ^ Portugália, I, Sóijuotíoia com retrato.

OAPÍTULO VI B80OLA B0IUMT10A 5^

Tárias obras como As grandes épocas da História^ Tradições po* pulares portuguesas^ Contribuições para um Cancioneiro ,e ro^ manceiro popular português; e outro3 estados de mitologia e foi- que lóre. Trabalhador iníatigáv«rly caracter grave e independente, Consiglieri Pedroso que era muito conhecido, entre outras qualidades de cultura geral, pela perfeição com que escrevia e falava virias línguas, iica na nossa história literária como exemplo e guia digno de ser imitado.

246. GABRIEL VICTOR ©O MONTE PEREIRA (1847«

1911), profundo conhecedor de tudo quanto se relacionava com a história e a arqueologia do país, como quem se acostumara a lidar nas bibliotecas e arquivos com os documentos autênticos e originais, que sam a verdadeira base de toda a elaboração histórica. '

Onde estivesse um ponto obscuro, delicado, ás vezes indecifrá- vel, i.cu Jia Gabriel Pereira com a sua lucidez e deixava o problema aclarado numa monografia curta, ráoida, sem aparato, como ele, mo- deeta e simples. Os seus Estudos Eborenses sam uma prova do que aêrinam>s. Fôrann incialculáveis os serviços que prestou á BibL Na- cional, de que foi nomeado Inspjctor-mór *.

247. Outros cultores da arqueologia e estudos afins.

Pc nào poieriTios dar maior 'es *íi\^oIvimento nSo queremos con- tu:lo deixMr de citar aqui os nomes le muitos indefesos trab ilhadores a quem a história deve úteis e importantissimos subsídio^'. Citemos: Borges de Figiieiredo (j" 1800) o í\i idador e director da Revista Arqueológica; Joaquim i\[aria Pereira Botto (1861-1907) o fun- dador do Museu Arqueológico Lapidar Infante D, Henrique, de Faro, a que inteiramerit^ se cons grou descrevendo-Ihe 03 principiis exemplares no seu vol. Glossário, . .; Albano Bellino (j* 11)07) que d:í)xou três vols. sobre Inscripções e letreiros de Braga e um* outro de Archeolo^ia cristã. M litas sam as achegas reunidas pelo pesquizador de autií;iiallias Ant<)nii) Francisco Barata (1S313-1910) autor de numerosos -Htudos do bibliografia, história, arqir^ol^gia, àlêm de poesias e românicos, eonstituindo tudo uma longa lista^ quo b^m a medida da sua energia de trabalho e da sua luta contra h «dversi- dade e pobresa. Um duelo nas sombras^ O último Cartucho, A Monja de Cister, etc, sam romana s históricos. A memória sobre a fundação da Sé, o Catálogo do Museu Arqueo/ó^lco, Évora antiga, fornecem elementos apreciáreis para o confi'X'Í!'vnit > da ci-

' Vid Brit^ Aranhi, Gabriel Pereira, notas bio^r. (8'^pir. tl> BoL da 2> Cl. da Acad. das Sc. de Liab ta) 1913. Qaáse tolo èòtfí n/' é y>id irral) a O. Pereira. Pedro do Azevel) foz-llie o elo^^io hiatóric?) com ineir-i \o.diIe. Rev. de HisL. 1912, págs. 213-224.

56^ BÍBTÓBIA BA xáTnUTUBÂ FOBTUGUtSA

dade onde Barata .viveu por largos anos e prestou bons serviços^ eomo Director que por muito tempo foi da sua Bibl. Pública.

Aos estudos de folque-lore, lendas^ usos e costumes popula- res consagraram-se MANOEL DIAS NUNES (f 1907) o fundador da Tradição (5 vols. e parte do 6.^) e ANTÓNIO THOMÂS PIRES (f 1912). SANCHES DE BAENA (Visconde de) [1832 1909] primou nos trabalhos genealógicos, sendo o Arquivo Heráldico a sua obra capital; VIEIRA NATIVIDADE (f 1918) defensor inteligente de Alcobaça e suas tradiçSes que estudou desde a prebistória nas Grutas de Alcobaça (1901) até á etnografia nas Rocas da minha terra (1908). O seu último trataího Inês de Castro e Pedro o Cruel pôde ter e tem vários deslises, mas é um subsidio notável para o estudo iconográfico dos túmulos daquelas importantes figuras da nossa história.

HISTÓRIA LITERÁRIA

Sumário: 248. Os historiógrafos da Litei*atnra. 249. Inocêncio da Silva. 250. A. P. Lopes de Mendonça. 251. Juromenha. 25i2. Ânt<5nio J. Viale. 2o3. Santos Valente. 254. Vasconcelos Abreu. 2u5. J. Silves- tre Ribeiro. 256. J. Gomes Monteiro. 257. Silva Pinto. 258. Dife- rentes géneros. 259. Uutros autores. 2(50. Autores contemporâneos.

248,— Os Historiógrafos da Literatura. Aos progressos da

história e dos géneros afins, mencionados, hgam-se intimamente os de história literária, de crítica, filologia e em corto modo até os ro- mances históricos e outros trabalhos de exposição geral e bastante di- fusa para se poderem concretizar em fórmulas sintéticas e concisas. Mencionaremos neste lugar aqueles dos nossos autores, que deixaram maior sulco da sua passagem.

249.— INOCÊNCIO FRANCISCO DA SILVA (1810-

1876), o infatigável e pacientíssimo bibliógrafo português, que escre- veu o Diccionário híbliográphico^ brilhantemente continuado por Brito Aranha, e as Memórias para a vida intima de José Agos- tinho de Macedo (1 voL, 1901) publicadas, com ampliações e corre- cções, pelo diligente cuidado de Theóphilo Braga. Aquele trabalho de Inocêncio é hoje um auxiliar absolutamente indispensável na pro- víncia de estudos a que é consagrado, e isto basta para fazer o sen elogio. Inocêncio deixou concluídos nove tomos, sendo dous deles de Suplemento *.

* Inocêncio inseriu no Dic. a sua própria biogr. ///, 220-225. «mpletar Annais de Bibl. Nac. do Rio de Jan. i (1876), 161-178.

0 PEDRO LOPES DE MENDONÇA

BulhSo Pato eacreveu que tinba na fronte o iventura ', autor da monografia Damião de e de apreciações literárias aúbre Bocage, ia nas Memórias da Literatura Contempo- ;ea trabalhos teve o mérito de ciísmar a aten- nista de D. Manoel e, nSo obstante o assunto e por mnis duma vez tratado e discutido, a Mendonça niio é para ser posta de parte.

DE DE JUROMENHA, .ToJío António de ;e,-da, (1807-1887), autor da Cintra pinta- 'SK anónima em 183S, O seu principal traba- ca ed. dEs Obras de Luís de Camões eai 6

1 cond,e de Rackzimskí no livro Les Arts en aire histórico-artistique da Portugal, for- lat;íiç3es que corrigiram e ampliaram o* estu- to8 por Cirilo Volckmar Machado e João da

O JOSÉ VIALE (1806) um dos prcíeasorea a grega e latina que temoa tido. A sua Alis- aria é prova cabal da sua educação ciábMca. cas, enriquecitiao com uma cf.rta ni)t;ível do Viale fora mestre, sam um modelo <k( tradu- ulos mostram o erudito sempre pondwado, que foi esta nobre iigura do Portugal iiitcle-

10 LOPES DOS SANTOS VALcNTE

mista, filólogo e critico. Ao mosmo tmipo que Çflo fadigosa do Dicionário Contemporâneo !, que Caldas Aulete dtixáva .ipsnas cm es- Mço, ia vertendo para l.itim e grego belisi^imaa comi>i,í)i^òcs portu- guesafl. Oa seus verãos latinos saíram no vol. Carmina. Quiiiido es- tudante na Utriveraidade, publicou o poema Ermelinda, e em ItílJl, também em Coimbra, foi publicado o vol. Primícias, encciíando poesias liricas latinas e portuguesas. Santos Valente redigiu a Re-

1 Sob os Ciprestes, &7.

' Vid. Brito AraDlia, Factos e homens do meu tempo, mcmõriíis de Bmjoinatista, i, Lisboa, 1907, pdg. 23 e Bcg.; Leite de Vastuniielos, O doutor StonJt. DáiT. 246.

Ill, 21S-2Í0 : A. A. da Fonstc.i i^húo. Par-

568 mSTÓBlA DA LITBHATUIU POBTUeoASA

vista popular de conhecimentos úteis e dirigiu a ediçSo dos Lusía- das nianiiscrítos.

254. -GUILHERME AUGUSTO DE VASCONCELOS

ABREU (1842-1906), de Coimbra, foi, àlêm dam sábio orientalista, professor eméhto de língua e literatura sânscrita, sobre que deixou trabalhas ioiportantissimos, um cultor da língua portuguêda, notável pela sobriedade, vigor e propriedade com que a escreveu, aliando grandes predicados de imaginação e de gosto literário a uma formosa erudit^uo. Citaremos aqui apenas os Fragmentos de uma tentativa de estudo scoliastico da Epopeia portuguesa e os Passos dos Lusíadas esboçados á luz da mythologia e do orientalismo, dedi-

cadotí á obra imortal de Camões, e Os contos, apólogos e fál^ulas da

índia, influência indirecta no Auto da Mofina Mendes de Gil Vi- cente, curioso t-síudo aôbre o funda^lor do nosso teatro. Vasconcelos Abreu faleceu em Lisboa no dia 1 de fevereiro de 1906 consagran- do-Ilie a maiori ' dos jornais, com bastante superficialidade, palavras

de elc^io e de louvor.

255. JOSÉ SILVESTRE RIBEIRO (1807-1891), indivi-

dualidade política e literária de grandes méritos e serviços feitos ao pais. ?]n^r ' oíí seus trabalhos literários destaca-se como o de maior importriiir i a sua História dos estabelecimentos scieniíficos, lite- rários e artísticos de Portugal, nos successivos reinados da mo- narcliia^ da precio-^as informações laboriosamente colhidas e agrupa- das 1103 16 voliiin' L^ de que consta a obra. A esta a acrescentar: Resoluçõc< do Conselho de Estado (18 vols.), O que sido feito e o que a fazer em matéria de beneficência ; Estudo"^ sobre os LuzíadaSy etc. J( Silvestre Ribeiro foi o fundador em Lisboa da bynéíica, humanitária e civilizadora Sociedade Protectora dos Animais '. \

256. JOSÉ GOMES MONTEIRO (1807-1879), do Porto, tondo encontrado Tuiraa excursão pela Alemanha, na Biblioteca da UniverFÍdad<- de G(V ntí^cn, a 1.* edição dos autos de Gil Vicente, deu, com o auxíIí > Jt; Barreto Feio, a conhecida ediç2o das Obras do famoso coinelió^rafo em dous volumes. Para defender Castilho acusado de tor adultí rado o lausto de Goethe, de que Monteiro fora o editor, es rf-von Os críticos do lausto, modelo de erudição e ae- renid.:;de cvíti":]. X i cMebre edição dos Lusíadas empreendida pela

* Tem cstítua lui vila da P/aia na Vitória, em comemoraçSo dos scrri- <;"08 ali prrstad "s. i'ara a sua biogr. vér Occíd.^ vol. xir, págs. 66, 76, 87 e 110 e Tol. XXX, \\\^. 'IM-, Iviuardo A. da Roclia Dias, O Conselheiro J. S, R' exemplo de inteira dedicação á Pátria. . . factos da hist, nac, Lisboa, 1888.

oílPÍtuu) VI Mooijk BOiuamoA. 569

casa Biely do. Porto^ uma introdução da sua peniia que é igual- mente modelo de saber e estudo. Gomes Monteiro deixou muitas obras inéJitas que é para sentir venham com o tempo a perdar-se. Ele concorreu imensamente para o triunfo das idéas românticas em Portugal com a sua edição de Gil Vicente '• «

257. -SILVA PINTO (Manoel José da) (1848-1911)

jornalista, critico de temperamento insubmisso e independente, dotado de singular vigor de estilo, de espírito cáustico e mordaz, que lhe criaram fama nais numerosas polémicas que sustentou, dutra lingua- gem vernácula, pura, camiliana, inconfundivel. Desde 1870 por diante publicou numerosos e vários trabalhos, como Do realismo na arte. Combates e criticas, Novos combates e críticas, Ter- ceiro livro de combates e críticas, Filosofia de João Braz, A queimar cartuchos. De Palanque, Noites de vigília. Em ferias. Frente a frente, , Para o fim. Na procela, etc., etc. Apezar da fecundidade de trabalho. Silva Pinto, que disposera na sua mocidade de largos meios, veio a falecer quase na penúria, ch^^íçando ainda alguns jornais a abrir uma subscrição poucos dias antes da sua morte!

258. Autores contemporâneos. Á história literária con- temporânea crestaram os mais v< liosos serviços, entre outros, JOSÉ' DE SAMPAIO (1857-1&15) mais conhecido no mundo das 1'tras polo p^endó- nimo de Bruno, cuja erudição é pena nao ter hido servida por uma lin- gaagom mais lirapida e correcta. Gerarão Nova, O Encoberto, Forfuen- •w ilttsíres^ atí stam de sobejo a sua extraordirjina ciiltnra. Implicado na revolução republicana de 31 de jan. de í>^[)) tt ví» de eniiícrar,. e, em Paris, on 'e se acolheu, escreveu Notas de €j'íh'o em que dentro duma acrisolada política um grande .' mor de verdade e de justiça na apreciação de factos e de homens do nosso tempo. A crí- tica religiosa demolidora e irreverente do seu 1.** livro Análise da crítica cristã (1874) toma a apan^cer, mas s-^gura de si, reve- lando um grande pensador e um vasto saber em A id4a de Deu» que com o Brasil Mental forma sem. duvida o se'i nw^lhor título de gloria. Mas sciêneia, a aníilise abstracta de tant.v^ idé;is superiores afogam ^r .'i-sim dizer a limpidez das idóns. Tireco que Bruno propositadamf nte encobria o pensar sob o véo espesso 'a forma, recorrendo a inversões, a trocadilhos, a t nro^ a Ctuco^ ou invulga- res. Tradutor da Hiêtória de Portugal de Sjho^^ffer, dir ctor da Co- Ucçào de Inéditos da Câmara do Porto, a que ii;js logar^s próprios tivemos oca^iSti de nos referir, jornalista, em todos os s- us t^aballios W a nota original que os torna úteis a quem souber ler, vi^^to que

Albprto Pimentel, Vinte anno^ de vida literária^ cit., pág. 35.

570 HI8TÓB1A LITIBATtmA POHTOODteà

Bruno pertence á categoria dos escritores que obrigam a pensar para ser compreendido.

259. -ANTÓNIO AIRES DE GOUVEIA (1818-1916) é

uma das figuras mais interessantes das letras contemporâneas. Tendo obrigado a falar muito de si e de muito diversas maneiras quando nos primeiros tempos da vida académica publicou A reforma das ca* delas evi Portugal (1860) e Resenha das principais cadeias da Eu- ropa (1860) estava por assim dizer esquecido quando scb o modesto nome de Um curioso obscuro publicou no Porto em 1911 o toI. Apontamentos sobre os Lusiadas^ Ensaio de critica ás criticas. Co- nliecimento perfeito do grande poema, mestria no manejo dos tex- tos sugestionados ou sugestionadores da grande obra^ através dos poe- mas clássicos ou gregos e latinos, ou modernos sam quilates do livro que aos primeiros capítulos se impunham á atenção. O que se dfíscortinava logo também era o prurido do uso de certas formas um pouco de& usadas, duma feitura do período com seus ressaibos do des- terrado gongorismo. Quere dizer Aires de Gouveia cougervara através das vicií^situdes da longa existência um pouco daquela sua maneira dc^ estilo cora que entrara na arena das letras, entre o sor- riso benévolo do muitos e a gargalhada causticante de alguns. ^las o saber real n?ío pode negar-se-lhe. Os Lusíadas âcam assim relacio- nados com o Passado e.o Presente como obra imorredoura que é,

260. Do^ mais novos e mais recentemente desaparecidos temos MONIZ BARRETO que na crítica literária deixou alguns ^-studos rápi- dos, mas de alt^o valor, notáveis pela elevação e profundidade do pensamento, traíluzidos num estilo vigoroso, cheio de per3cnalia«ide, duma belfza coiuisa. Aparte a monografia consagrada a Oliveira Aíarf!;!S, qii ? cb* quis que fosse, e realmente é, um estudo de psico- logia, tod:t> os outros estudos, como que capítulos de preparação pru-a livros de amplos objectos, ficaram espalha^J os por diversos jo^ nais. Ke-^ses e^tii^-os uma orientação sciêntífica do crítica rara em Portug.il \ CARLOS DE MESQUITA (f 1916) de quem vivem na me- mória (íos que o conheceram o vigor e originalidade do pensamento. Os outros poderão avaliá-lo escassamente pelos trechos poéticos que firmou, muito poucos, na Ave Azul *, no esboço crítico de Manoel Gaio ^ e no líomantismo inglês * vol. em que revela o profundo oo-

1 A Revista de História, Lisboa, 1918, pág. 215-276 reprodazío ntre desses trabalhos.

'^ Revista publ. em Viseu em 1899 pelo poeta Carlos de Lemos e aa E?no9a. Mcrifjnita publ. a poesia de pág. 56.

^ Separata do Inaiitiito, folh. de 22 págs., Coimbra, 1900.

^ Separata da mesma Revista, vol. de 263 págs., ibid., 1911.

CAPÍTULO Tl ^^BSOOLA BOUAanOA 571

Ahecímento da literatura inglesa, de que era Prof. na Faculdade de Xietras da Univ. de Coimbra. Ficaram do moço escritor vários iné- ditos, que um dia publicados estenderão mais largamente, como ê justo, a memória do seu nome.

TRABALHOS FILOLÓGICOS

261. A Filologia é uma sciência moderna criada em França, em Inglaterra e principalmente na Alemanha, onde as bases do estudo das línguas românicas foram lançadas por Frederico Diez, prof. em Bona, cuja 1.* ed. da Gram, das Línguas Românicas é de 1836- 44. Passados bastantes anos, um erudito português que, desde que apareceu, conquistou o lugar duma autoridade, tornou esse trabalho conhecido no nosso país, chamando para êle a atenção, esclarecendo-o e completando-o. Era ADOLFO COELHO [1847-1919] doutor pela Univ. de Heidelberg, e que depois veiu a ser Prof. do Antigo Curso Sup, de Letras, publicista,, pedagogo, de vasta, sólida e larga erudiçSo. Em 1868 apareceu o seu primeiro trabalho A Línguxi Portuguesa, onde traçava um programa, que não chegou a realizar, publicando a seguir em 1870 a Teoria da Conjugação em latim e português, primeira tentativa, como êle diz, de aplicação metódica dos princípios <ía Gramática comparada indo-germânica a uma língua romíinica. Deve-se a este grande erudito a vulgarização no ensino dos princí- pios scien"íficos da linguística, que foram a sua melhor preocupação^ •embora tivesse publicado diversos outros estudos como Os Negror da A^frica, os Ciganos de Portugal, os Cantos 'populares portuguõ~ êeSy etc. A monograiia A línrjua portuguesa publicada em 1881, o seu Dicionário Etívwlóqico de 1890 prestaram os mais a-sinaladoB serviços. Se as condições de trabalho lho tivessem permitido a sua obra 8(3rii muito mais metódica e útil ^ Ao lado de A. Coelho outros eruditos versaram os estudos da língua nacional honrando os esforços que no estranjeiro romanistas abalisados como o snisso Júlio Cornu * animavam com os seus próprios trabrilhos e incita- mentos, como Júlio Moreira (1854-1911) autor dos Estudos da Língua Portuguesa, prova da sua competência e bom senso ';

* Francij9(co Adolfo Coelho era natural de Coimbra e eurs^^n com diatín- ^5o a Univerflidade. A liatA dos seus trabalhos, desconexos, mas sempre repletos da melhor erudição, tendo-lhe granjeado aatoridade em todos os meios universi- tários estranjeiros, ó bastante grande.

' Falecido em 11)19 em Loeben, na Estiria, a quem cabe a glória da iniciativa da primeira Gram. Jrlist. da nossa língua.

^ Estudos.., I Subsídios para a Sint, hist. e popular, 1907; 11-^ "Continuação e outros estudos. E' póatamo e inscreve a biogr. par J. Leite da VasconceloB.

872 mWtáÊKLL da. UTB&VTUBA PORTUODteà

AU6UST0 EPiFÀNIO DA SILVA DIAS, (184M916) renovador dos métodos gramaticais do portugaês e do enBÍn«> do latim nas escolas, autorídad» eonsomada em assuntos de lexicc logia e evolução da língua, de que 4eixoa prova na Stntaxô histórica portuguesa e em edições critícas- do Crisfal e dos Lusíadas e noutroR trabalhos < ; GONÇALVES VIANA (1840-1914) famoso poliglota e eminente foneticista, o maior defen- sor da puresa da língua pelos vols. Ortografias Nacionais e Pro- núncia Normal, pelas Palestras filológicas e Apostilas aos Dicio- nários PortugiteseSj^ repositórios de imenso saber, que o conheci- mento das mais numerosas e variadas línguas vivas e mortas, desde o grego e o latim ao russo e líneas orientais e africanas, tornava essencialmente fecundo e original. O seu Vocabulário ortográfico ortoéptco será o vade-mecum iudispenffável e insubstituível a quem quiser eecrever cuidados£tm> nte o português •. O DR. GONÇALTES GUIMARÃES [1850-1919] honrou igualmente as sciências e as letras. Se notáveis sam os seus trabalhos de Geologia, não o sam menos 08 de filologia e história da líii{2:ua n.icional, como o atestam os cur- sos que professou na Faculdule de Leíríis da Univ. de Coimbra. Ao lado (l^s eds. da colecção Jóias Lterárias da Impr. da Univ., que nobrrnjente dirigiu, deixou estudos da maior originalidade, muitos dos quais a morte não pcrruitiu que se publicaseem '.

262.— Diferentes géneros literários. HENRIQUE

0'NEiLL (Visconde de Santa ]\ión<a) (•(• ISSO) drscendfute duma família ncbro de Irlanda.; por n nit s aTios chefe da segunda leparti- çSo da dii'C(,no central (estíitísncí.) da síccrotaria de justiça e pre- ceptor do monarca D. Carlos e de i-eu irmào D. Afonso, espírito dotadí dun-a grande ilubtraí^rio e dum espírito muito brilhunte. O lahuhh to (2.* ed., 18tí8) composto om parte de fábulas 0'ÍLrinais^ em parte de traduções ou imitações do fábulas antigas e modtrnas,

* A Sintaxe,., saín póstiitua, portanto, sem ter a última lima da mão do antci, L.iboii, 1917, 1 vol. A ed. (\y,% Lus. provocon da iparte do insigne Co'. oiuM"^t:i I)r. JoáA Maria Kodngi-i a Algumas observações a uma ed. COment dcs Lua., Coimbra, I91f, que f. zem iembrí»r, pela justteza da apr.'cia- ção, o Ouand:quidem bónus. ..

* Anict-to dos Reis Gonçalves Viana era de Lisboa e aí, onde era fon- cionório, viveu e trabalhou com» taii te mente. A lista dos seus trabalhos foi publ. no Eol. d Seg. Cl. da Acad., x, V^ 72- 1010. Vide Leite de Vasc. Go/ip/7to«y Viana, epo'' '■amentos para a sua biogr., Lisboa, 1917, 1 folh., Rodolfo Dal- gado, õ. V. ea Lexicologia Port, de origem asiátieo-africana Lisboa, 1917, 1 voL

^ Algarvio, de Tavira, deixo.i uo ensino das cátedras de Filosofia fr Lfetrns nouie i morredouro. Destaqu^^íinos na sua oV»ra. Elem, de Gr latina, ISOO" « 1907); Primeiro Curso de latim (1004); Breviário da pronuncia normal do iatim cl. (l^Ctó); Das Jóias saíram Cr- do Príncipe D. João, de Gois, (1 vol.). Canc. Geral (5 vols.) e Lusíadas (1 vol). Tem artigos valiosos na Rev, da Univ^ ids Coimbra»

•APÍTU&O YI BtOOLÀ BOMAaVlflA 573l

cdSo é ama série de contos paeris e frívolos, l , mas um todo har- móm'co e útil . . . com a maior cópia de idéas sãs e práticas, destina- das a concorrer para a educação da mocidade e a servir de momento ás outras edades mais avançadas». Os grandes modelos de 0'NeilI DO Sf u Fabxãário fôram La Fontaine e Lessing *. ABÍLIO AUGUSTO DA FONSECA PINTO (1830-1893) revisor literário da Imprensa da Univer- sidade, sócio efe tivo do Instituto de Coimbra a cujo jornal O Ins- iituto prestou relevantes serviços, encontrando-se disseminados por ôl© muitos artigos seus de bastante valor. O estilo de Fonseca Pinto era dama grande pureza^ muito escolhido e clássico, como se convencerá quem percorrer a ílôr de mármore^ Carta Familiar, as Cartas telectas e as cunonas notas bio-bibliotrráficas publicadas (págs. 203 a 3y4) no vol. Parnaso Mariano. Por ocasiíto do tricentenário de Camões eforeveu àcêrra do episódio à*^. Ines de Castro, sobre a pmto literário j nas suas variadas manifestações^ algumas pá^^inas qiií- conbtitueni um íornioHÍ68Ímo trtcho dií iit-ratura hodierna. D* AlilOMO DA COSTA DE SOUSA MACEDO (1824) foi entre uós o indeíeaso pro- pi^gadcr Cíx instrução popular, sendo ministro de instruçílo pu- blica quando ê-sp ninittério foi decr. tado era 22 de jiiiihí^ de 1870. Durante os Fe. senta e nove dias que durou ês^e ministério, D. An- tónio da CostH pronjulgou o decreto «'a libt-rcUiile Ho ensino Buoe- rior, o da refornia da instrução pri»i ánnj o das bibliotecas popula- f re.», o das e^col^h normais, o d;i reoígaiiizaylio do teatro normal, etc. Deixou livros mnito apreciadts pc^Ia corr^ e<;a > e eJígancia da li gna- , gerri como os Três mundos ^ História da instríLcção popular em I Portugal, O christianismo e o Progresso, etc. TEIXEIRA BASTOS, l tra^uilhadr.r iliiotre e honrsío faleci io vu\ L'JM)a a 2-4 de irjiio do \ 1901, com quarenta e ein «j anos, qiian.lo p^rt-rito irmit > hav a ^nida t a capturar da sii'^ infati^íávil attiviíL d". Eiitr*- riitras o[)rus Te x"ira BahtoB escíi^^v» u Sciêncía e Pliilosophia (1 vrl.i; Comie e o positivis- mo (1 vo!.); Princípios de phíLosophia positiva (I V'l.); Theophila r Braga e a sua Obra (i v.ds.); A Crise, e^íll lo econóiuico (1 vol.). l En verso escrevv-u os Rumores vulcânicos o d-ixou o int^r". h *Tite ', vol, sobre literatu^-a cont'iní;)0"riiea u. loiloir-^, Escudos críticos sobre l os poetas do Brasil. VISCONDE DE BE;MLCANFw^{ (f lS89j mai^ oo, h> cido pelo título, do que p.^lo seu no ne Ki ^rdo Aug isto P' r ira 3 Guimarães, pnnsador eleginte e co, . ctís i "O de quMu menciou 'x> \ mos como notavas pelo biilho e cn].»r .io das «Ictcriyu 's os vols. Ini- pressões de viagem: Cadiz, Gibraltar, Pari^ e Londres (Porto, 1869, 1 vol.); De Lisboa áo Cairo, scenas de viagens; Leituras deverão, etc. Traduziu o D, Quixote de Cervantes (2 vols., Li^-

^ Tem taiubêfn nm vol. do versos In memoriam qne saiu âcm nomo «autor. Vid. Câid-do de Figueiredo, Figuras literárias, pá^^. uOl.

>574 mmámu. ba cdrauTOBA foaHwiaà

hoh). VISCONDE DE SEABRA (António Luís de Seabra) (1798-1895) M ao mesmo tempo que um grande jurísóonsulio, e nisto «stá o sea principal titulo de glória, pois a êle, e em grande parte, se deve a redacção do Código Civil e os trabalhos que o implantaram e fize- ram vinsfar em Portugal, um culto escritor de esmerada forma. Sol* dado das idéas liberais, emigrado em 1828, ao serviço delas pôs a sua penna e a sua palavra. No parlamento combateu ao lado d^ José Estevão, Garrett, Passos Manuel, etc.; na Academia colaborou com A. Herculano, com quem travou polémica a propósito do Casamento Civilf com Cafttilho, Meni(^í Leal e outros; e no silêncio e tranquili- dade do sou gabinete de estudo, entreteve-se em traduzir para castiça e apurada linguagem os nx^lodiosos versos de Ovídio *. DR. JJ-O"! AUGUSTO SIIíOES DE CARVALHO (181^2-1902) espirito ilustradíssimo, homem de sciência, cultor das belas-artes, professor exímio, orador sóbrio e culto, tais as qualidades qn-^ assinalam á imortalidade e^ta nobre e! simpáticíi Hp^ura do maí?Í8tórii) univereitário do séoulo- xix. A8 puís Lições de Pliilosophia Chimica que sam o seu primeiro livro apa- recido em 185Õ revelam ao lado do sábio o mesmo apaixon ido lit> rato que redigiu para c .nio'norar o centenário da Universidade a Memória híst. da Facullade de Phiíosophia «. CONDE DE FICALHO (1837-l9o;5) ^, de Lií*bo:i. foi durante muitos anos professor de b> tânica na E^ciola Politóonic i da capital, tendo sucedido a Andradí Corvo na rtícjôncia drssa cud'» '^:i, que muito enobreceu pelo sua sólida e profunda erudição. Os S' us comentários a Garcia da Orta nos Co- loquios dos Simples e Dro^ras da índia (Lisboa, 1891, 2 vo!?.), se nao sam irapoc:lvois b o ponto de vista filolÓJ^ico, dSo iiéa do seu vasto sab^r e da sua cul^v e variada inbtruç.^o. O mesmo atcfta a sua monoí^r itía Flora dos Lusíadas (Lisboa, 1 vol.) publicada ror ocasião do trioonten.lno d * \j\i^ de Cam3ei, bem como o trabilhs histórico Viãj^^ns de P^"'o da Covilhan (Li^jboa, 1 vol.V Na Tm* dição, joni;il qu) s. * ^»r);r 'i ^m Serpa, deixou os seus últimos escritoâ com Csto tífilj: Sc"pa sob o domínio dos Sarracenos 9\^ Influências mosaral?cs na Uiguagem dos pastores alentejanos. A| Sociedade de Geog. afi* d* Lisboa dedicou ao ilustre extinto, alta; figura por ií^ual ari'>t'C 'ática na fidalguia e nas letras, uma ses&5o solene em qiio foi ene irn-j^ado dp panegírico o Condo de Arnoso, grande amigo do finado ^ MANOEL BENTO DE SOUSA (f 1899) médico a

^ Vid. o Elogio histórico do Visconde de Seabra na Assodaçàoàí» Advoe^ados de Lisboa aos í de dezembro de 1895 pelo sócio Joaé Diaa Ferreirt» Imprensa Nacional, IH.^Ó, 8.^ pr. áo 47 paga.

« Occid., I90i, pá-. 138. retrato e biogr.

^ Fraiic.iáco Manuel de Melo.

* Elogio. . ., Lisboa, 1903; Ednardo Bornay, Elogio hist, lido m 5^ <sao da Acad,R. daa Sc. de Lisboa^ em 25 março 1906; Ocidente, à^ ^^ ^

OAPÍTCLO YI MOOLA BOIUSTIGA 575

-O orador eminente, ma^ simaltâneamente espirito muito culto e in- <;iiuado ás belas-artoa. Deixou várias poesias inéditas ^ e dous vols. em prosa, um de crítica de costumes A Parvónia, recordações de viagemy publicado com o pseudónimo de MARCOS PINTO, e outro de crí- tica ao ensino da história em Portugal Doutor Minerva, cheios de fino humorismo e escritos em uma linguagem castiça e amena. ainda de Manoel Bento o seu Discuno em homenagem ao Dr. A. Maria Barbosa *. iGNACin FRANCISCO SILVEIRA DA MOTA prosador doa mais distintos e da maior vernaculidade, como se prova pelas for- mosas páginas das Horas de Repouso, Quadros da história portur guêsa e Viagens na Oaliza, Era natural de Lisboa onde nascera a 26 de agosto de 1835 e oa<ie também faleceu a 15 de abril de 1907. A sua linguagem era sóbria, clara e elegante, o seu estilo despretencioso e corre jtissi mo. N )8 poucos livros que deixou 8ilv-*ira da Mota firmou a sua reputaçrio literária mais ou meliior quj muitos que deixaram numerosos volumeti '.

263. Outros Autores. Nao deixaremos em completo «es- quecimento 08 nomes de Ç/\NAtS DE FIGUEIREDO (f 1857) cujos Estu- dos ÈiogrdficoSy apesar das diirress-o -s políticas e relif^iosaa por ve- ees b^m alheias ao fim que nt^ propunha, prestam b'ms auxilios ; FRANCISCO FREIRE DE CARVALHO (1799-1854) autor do Primeiro Ensaio sobre a hist, lit. em Portugal onde, no meio do ien li^^, muito que aproveitar; JOSÉ' MARIA Dt ANDRADE FERREIRA (lS2o. lo í5) que re- tomcu o a«»8unto de Freire de Carvalho com outro íiiscjrnimento no Curso de Lit, Portllg., (\\v' Camilo continuou, e es(^r íveu vá- rias criticas literárias no vol. Literatura y Música e Belas Artes; AKTOKIO DA SILVA TÚLIO (1817-18<S4) eruditi litviratoque na Revista Uni'-

versai, Arquivo Pitoresco, Semana (com o criptónimo cir^ Viscon- de de i^) e Epóca (Barão de Alfením) usou sempre àuma lin- guagem pura e escolhida coiistituinio todos os s mib escritos espa- lhados por aquelas revistas outras taatas lições d 3 estilo e boa crí- tica; JÚLIO MOREIRA (1854-1911) HhUogo de opiniões sem[jre madura- mente pensadas, de que sam bjm te3t'ímunho os dou^ vjI.^. Estudos da língua portug.Çl.^ 1907; 2.^ pÓ3tumo, com preíd.io do Dr.

maio de 1903; Boi. da Segunda CL da Acad. R. das Sc. de Lisboa, i\, 1910, paga. 56 59.

1 Veja a Rev. Lit., scientif, e artist, do Século, n.° de 9 de Março de 1903, artigo de Balhao Pato.

' O aen Elogio histórico foi recitado na seanfio doléne cclcbraia pela Associação doê Médicos Portaguêsea, na noite de 23 de nov. de 189ii pelo poeta médico Alves Crespo.

' Vid. Cândido de Fii^neiredo, Figuras literárias, l.iaboa, l'JO'3, p4g3. ^9-102. Biogr. e retrato no Ocidente, de -jd áv. iibril de r.'07 ; elo;;; > por Sousa Monteiro BêL da Seg, CUisse da Acad. Real das Sc. de Lisboa, u, (1910), 325.

576 HI8TÓIIÁ DA UmULTUmA POBTUCRJÍ8A

Leite de VasconeeloR, 1913), que j^ citamos, e ainda Anibtl Fernandes Tomás (1840-1912), um dos mais distintos bibliófilos e bibliógrafos qi^e temos tido. PoBi^uia uma riquíssima livraria de espécies raras e valiosas, vendida em 1' ilão após a sua morte ( Ás suas Cartas bibliográficas: (l.!& série 1876, 2/ 1877) revelaram a sua mestria nos assuntos que ^ versara. Que pena que tam grande competência nSo fosse posta ao serviço do p^í-", na cooperação do DíC. Bibliográfico oa na publica- ção dum tr balho como o de Brunet óu Gallardot Modesto, simples e bom Anibal F<^rnandes Tomás se deixou pequena bagagem lite- rária, viverá na memória de todos os que a êle recorriam a pedir um eseb reciraento, uma nota, um docum^^ntOi e que nunca saíam de junto dôle sem serem largamente beneficiados ^.

264. As pesquisas bibliográficas se consagraram, dois fun* cionár:(»8 ilustres da Biblioteca Nacional, que trabalharam ao lado de Júlio de Castilho e de Gabriel Pereira. Foram Xavier di Cunha, [i 840 1920] autor de muitos estudos de bibliografia, infe- lizmente Hispersos era raros folhetos. O seu último trabalho é nraa lar^H Carta -Prefacio anteposta ao livro de Latino Coelho Garrett e Castilho (1917) em que revela as qualidades que o distinguem cr)mo es TÍtor a vernaculidade e o estilo simples, mas el«*ganle. O outro tuinhêm conservador da Bibl. Nacional foi José António Moniz (1(S49 1917), que nessn Estí^beU^cimento prestou os mais re- h nt 8 b-rvig s nnma dan raais «ielicidas e importantes s^cçíles que lhe íor')n cotirialaB a dos Cimelios ou preciosidades bibliosjráfi- CMS ^. A Im/irensa em Espanha no «ec. XV (1913) é ura fdh. na góneTO dos tav^ publicou irubrio, mas ch(io de utilidade. Moniz tam- bém [>TvsToii á Mte dramática irmitos s^-rviçi^s, sendo aotor e ensaia- d' r por muitos ; nos e escrevent^o ças ao gosto popular conforme as n Cí'.^'^i 'a íes de ocasião. A sua biografia, como pode lêr se ex- ttDsíim uto no Dicionário P* rtugal é um grande exemplo de tena- cidade de trabalho e de virilidade de caracter.

265. Notável nito p^^lo qus produziu, mas pelos serviços prefi- tado? á hi. túrla litjrári i co^ío ditor de raridades de alto valor do- cuaiciitd io íui Eugénio do Canto (185G-1915) irmão de José do Canto qae no vol. Camoneana (1895) deixou vasti^^ notícias de crítica impar- ei.) sobre o n^ sso E; i*o, e de Ernesto do Canto, o fundador do Arqui- vo dos Açores (12 vol>.), onde se «ncontra tudo quanto se refere á bisturi 1 do Arqiii|)élago açoriano d^?fc*de os seus monumentos aos seus

1 A lista «Ins ?ua« pvorlnçScs, innit') raras, pois eram sempre de tiragem doininntíi. fsíá cnid.ulnHamente regititada no Occid.^ n.*** de c 30 de tbril de 1912. 1 , •-' Vide Anais àas LHbL, 1917, iii, 20.

0APÍTUL9 Tl B800LÀ BOMAHTIOA 577

homens maU insignes, sendo incalculável a soma dos documentos qae aproveitou e tomou conhecidos. Eugénio do Canto seguindo esteira dos irmãos no seu amor aos livros, impÕ3'Se a tarefa de fazer reimprimir todas as raridades bibliográficas respeitantes ao nosso do- mínio ultramarino, contribuindo para esse fim as Bibliotecas nacionais e estranjeiras por meio de cópias fidelíssimas ou de reproduções fotográfiaas. Como' til os serviços que prestou á historiograiia sam do maior alcance. ^

266. Autores contemporâneos. Longa * a lista dos

autores que em nossos dias firmaram trabalhos, que nâo serão esque- cidos, como António Serpa Pimentel, * poeta e homem politico autor do interessantíssimo estudo A. Herculano e o seu tempo; José Frede- TÍco Laranjo (1846-1909) incansável trabalhador, que deixou na cá- tedra de Direito, no parlamento e no jornalismo, provas do seu fe- cundo talento.

E' longa a lista dos seus livros, que pôde vêr-se no «Dicc. Portugal». Picaram no «Instituto» arquivados vários artigos seus notáveis pelos seus primores literários. Manoel Fernandes Sanfanna (1864-1910) sacerdote católico de vasta e segura ilustr.içã^ como se deduz dos vols. : Materialismo em face da Scléncia, jornalista e orador notável, morto em plena pujança d^ talento. Outro sao-^rlote, de vasta e segara erudição, mas dotado de cultura literária mais aprimorada, foi Senna Freitas (1840-19 Li) cujos livros No presbitério e no templo, Por agua e terra, para nao citar senão oát^s, licarao como modelos da mais tersa, da mais perfeita, da mais ii (ima e bela linguagem. Polemista foi-o também e como o soube ser ! ^

Sam críticos de arte

RIBEIRO ARTUR (Bartolomeu Sezinando) (I8õl-I9i0)

autoridade de provada competência como o demonstram os três vols.

Artes e Artistas compo âneos, indispensáveis a quem, de fiituro, quiser elaborar a história da evoluçFlo da arte e dos artistas dos nos- sos dias, muitos dos quais o autor conheceu e tratou.

* O Boi, BibJ da Acad. das Sc. de Lisboa, 1." a., v. n, de mareo de 1917 den o catálogo pormenorizado de tod;is í^.^a?íò puh\. ov'j;:vúz\:l) por Álvaro Neves e antes até á época respetítiva o sr. Braí^meamp Freire no Arch, Hist. PorL V, 1907, 241.

' O seu elogio na Hist. e Mem da Acad. R. das Sc. de Lisboa, xi, pAí::. 11(1909).

^ Algamas págs. vivas como sabe e3'*rp\e-]as o Visconrí. r\o. Vi'ri Monra, em A vida rriental portuguesa. Coimbra, l'J09, p;íg. 99, e Vida litt. politica. Porto, 1911, pág. 67.

BatimiA DA LITMU1

ZACHARIAS DE EÇA (Francisco ■.■ de Araúio ds

Gosta>>>) (1840-1908) critico de arte doa maJR conhecedores qne temos tido, cuja obra neste sentido ãcou disperaa por jornais e re- vistas. Apaixonado pelo desporto da caç» eacroven o vol. de interes- santea narraiiras Caçadas Portuguesas, onde incluiu Paisagens e figuras de campo, & au» melhor obra pelo cuidado da forma, que é irrepreensivel, O seu último vol. é A Lisboa moderna (1907), onde recopilou muitaa das suaa criticas de contestara bastante original '.

JORNALISMO

) aãe. XII. Ãlgtina caltorea -270. £m;gdio Navano.

267. O jornalismo no séC. X!X. O jomal tomou no sé- culo XIS uni debciivoivimeoto assombroso. Politica, sciência, arte, questõcH souiais, tudo êle invailiu, toi'Qando-Be um dos veículos mais poderosos do progresso muiidii.!, A êle se deve a popularização da literatura perlas suas condições de modicidade de preço e de atuali- dade. Se n^m sempre liti^ráriamentê e tomo força moral é impecá- vel, se inteligónciua que su lho f.oa^aííram dariam mais e melhor com trabalho meitos rilpído, menos febril, nsto se póde/sontestar a Bua aL\'H0 profmnU c estuiisà no inoviíi-ento de difus^ío 'das idéas li- terárias. ]^cp<ã^ da implanti«;.ii)..jdu rfgimen liberal em Portugal a imprecisa jornalística abiiin,.loii-BC por grandes progressos'. Por passou- a frrandc- maioria dos uoosos escritores desde Herculano, Castilho e Giirrott até Mendes Leti!, Pinheiro Clisgas e tantos outros, ons aproveifíinilo-o como an:i!i poiiiica, outros como instrumento lite- rárío, alguns como meio de vida, outros simplesmente como mero passatempo. Mas a distinguir, dentre a magna caterva que pelo ioniulisiiiij passou, aqueles que a éle se consagraram tornando-se ver- dadeiros profissionais atingindo o seu trabalho foros de reputação merecidissiiiia,

Tiês ou quutro noir.cs registaremos. ANTOHIO RODRIGUES 6AHPAHI (1806-ltíiri2) é um dos fundadores do jornalismo moderno em Porta- gal. Na Revolução de Setembro, ao lado do tribuno José EstavSo e doutios, depois no Espectro, eotregou-se a uma laboriosa vid» pugmindo sempre d('noda<iameiite pelas idéas de liberdade e de pro- gresso ■. Tciseira de Vasonncelos (1816-1878) é outro jornalista insigne,

1 Rin^r. e retrato no Occid., 1909, n." de 20 de janeiro. ^ Jíriio Arauha, Factos e homens do meu tempo, Lisboa, 1907. Trai» retrato e largoa elameutos biogr., alguns iuéditoa e intijDOB. Os habitantes di

CAPÍTULO YI MOOXJk BOMAanOA 579l

iandador da Gazeta de Portugal e do Jornal da Noite. As saaa obraa literárias Lição ao Mestre, Ermida de Castro/nino, ^Prata de arroz doce, que sam romances da alto valor, o vol. de Viagens na terra alheia^ os Contemporâneos (em francês), biografias e opúacufos vários mostram a pujança e a grande maleabilidade do sen talento ^ Carlos Lobo de Ávila (^ 1895), parlamentar vivo e bri- Iliãote, e fino argamentador, cujas qualidades literárias começou a revekr ainda quando estudante na Revista de Coimbra e melhor íA carteira d' um viajante. Aasinalou-sí- como jornalista na direcção íe O Tempo. Urbano do Castro (1850-1902) deixou uma obra vastís- nma difundida pelas páginas do Jornal da Noite, onde ganhou as ' was esporas de oiro e pelo Diário da Manhã, Correio da Noite e Tarde. Mas em quem o jornal'srao do Portugal conte Yiporâneo encontrou os seus melhores paladinos foi em António Enet?, Emídio Navarro e Mariano de Carvalho.

268. ANTÓNIO ENES (1848-1901), de Lisboa, t.^m tam- bém d(3 encarar-se como dramaturgo, iluito moço ainda obteve um êiito triunfal com as psças dramáticas Saltimbanco e sobretudo cem 08 Lazaristas, peça de combate e de propaganda liberal, que fez voar o seu nome em sobreaaltos de entusiasmo por todo o Por- tara! e Brasil, Vieram depois Os Engeítados, o Luxo, o Divórcio, lExtrangeira (tradução). Tendo entrado na política envolveu-se na ▼Wa jornalística, tomando-se, pela corr^^cçao dos seus artigos, sobre- fedo no último jornal que dirigiu o Dia um dos nossos primeiros jornalistas contemporâneos. Era também um polemista vigoroso e incisivo. Deve-se-lhe uma versão anotada e ampliada da História Universal de César Cantu. Na revista literária que apareceu em Li^boa com o título Serões foram publicudas interessantíssimas notas de viajem De Lisboa a Moçambique.

269. -MARIANO DE CARVALHO (1836-1905) professor

íâ Escola Politécnica de Lisboa, poiítio e ánanceiro de grandes recursos intelectuais. Foi no Diário Popular que durante quarenta ftnoa Mariano de Carvalho ditou as suas opiniões económicas e fínan-

Esposende, donde o grande jornalista era natural, levantaram-lhe em 1906 ama eaitaa no melhor largo da vila. Vid. Occidente^ n.** de 10 de-^. 1007. Vid. tam- bém Alberto Pimentel, Vinte anos de vida literária, cit., pág. 61.

* Elogio hist. por Teixeira de Qneiroz in Hist, e Mem. da A. R. das Se, de Lisboã, nova série, 2.' ed. xi, parte 2* (1909). A obra jornalística foi em parte reonida nos 2 vtls. Cartas de Paris, Porto, 1908, de que se tiraram 60 pA' ! Interessante para a vida intima do grande jornalista o opúsculo de J. Corrêa Pacheco. O archivo de Ex-libris porlug, e A. A. Teix, de Vasc, Carta filde Araújo, Porto, 1910.

580 nsTÓEUL D4 umuTUHÁ rowruwoÈêÁ

ceifaS; que abrangiam um largo plano depois metodicamente exposto no livro Questões d' hoje (1893), que saiu com um prefácio do jor- nalista Mariano Pina. Nas horas vagas, momentaneamente alheiado das pugnas quer da imprensa, quer do parlamento, traduziu alçamas obras de Júlio Veme. O seu estilo, apesar de irregular, era brilhante e repleto de humorismo e de fina graça.

270. Com Mariano competia, sobrepujando- o literariamente Emídio Navarro (1864-1905) estadista e píolítico, que deixou um pro- fundo vinco da sua personalidade, sobretudo no Novidades, que fundou em 1885 e redigiu até á sua morte. A saa prosa sonora e vigorosa, era formidável na polémica, ficando célebres alguns das seus artigos sobre personali iadee políticas ou acontecimentos de ocasião. Nos Quatro dias na Serra da Estrela (1884) páginas de descritivo, que sam modelares *.

271.— Jornalistas Contemporâneos— Pelo seu saber,. con-

Bciência da sua profissão e valor literário sam merecedores de re- gisto nos últimos tampos os nomes de Brito Rebelo (1830-1920) qae tem o seu nome ligido, entre vários jornais, ao '^ Ocidente ^^ ^^ ^'i® foi redator-fun iador em 1878. Os seus artigos tiuliam ura cunho histórico da maior probidade e reunidos se lhes poderia aquilatir o valor. O seu vol. Gil Vicente (1912) fica entre os últinnos traba- lhos consagrados ao fundador do teatro português como modelo de probidade em investigações históricas •. Outro jornalista insigoe e si- multaneamente esmerilhador de antigualhas históricas foi Brito Annfii (1833 1914), que nae^ceu no jornalismo e nele morreu íícindo ai a maior parte da sua glória. Foi continuador de Inocêncio dando a esse monumento biblio;^^rcií]co os melhoras cuidados do seu espírito [vols. 10, 3.° do Supl.f ídé o 21] desde que em 1878 íoi encarregado aé^sa pesadíssima t<aréfa \ RODRIGO AUGUSTO CERQUEIRA VELOSO (1839-1913) ganhou o amor ao jornalismo, pode dizer-se, desde os bancos da Universidade, pois * m Coimbra quando estudante fundou diversos jor- nais, embora de eurta daraçrio, o Phosphoro, Tira Teimas e Atila, Di- pendeu a maior actividade na direcção da Aurora do Cavodo, de liarcclos^ seman;irio *quáse exclusivamente consagrado a questões

1 Vid. Vfnfe e cinco anos nos bastidores da poUtica Emídio Navarro tas aNozfiaadcs» por K. de Noronha, Lisboa, 1913.

^ Jacinto de Brito Rebelo n. em Ponta Delgada e eegaiu a carreira mi- litar morrendo no poato de General. Vid. Inoe. da Silva Dic. Bi^. x, 10o.

•^ I'"dif) AV«'ní-«'^'a;i do Brito Aranha, de Lisboa, trabalhou incansável- me:i*o afr ,1 pidvertH idadi; do 80 atoa eom qne faleceu. O Diário de MoUnoiàt que toi HiirriTite lariros anos rodactor efectivo, publicou-lhe por ocasião ào fakcimento 9 de s< t. 1911: larga e justíssima biografia.

capítitlo Tl aaoobÁ wouàMtiaA S81

l)ibliográficaB. Reimprimia livros raros e coligia composiçSes inéditas oa pouco conhecidafi, que ou se perderiam de todo, ou de raros fica- riam conhecidas, como fez com o poeta brasileiro Francisco Bastos falecido em 1895, (Versos, Barcelos^ 1898), com Antero, João de Deaa, etc.

PEDRO p^ALCANTAl^A VIDOEIRA (1833-1917) também

«6 assinalou no jornalismo ao lado de Pinheiro Chagas, Júlio César Machado e outros escritores da éooca. Traduzio obras de Jú'io Vemo e entre outros t-abalhos literários deixou os romances A fidalga do Jutical, Ambições de Cortesã^ etc.

ELOQUÊNCIA

S|imário:272. A eloquência sagrada :<sea caracter. 273. Malhão. 274. Mota Veiga e Rodrigtiea de Azevedo. 275. Alves Matens. 276. Alves Mendes. 277. Franeiseo Patrício.

272. A eloquência sagrada. Separemos nesta exposi^ as daas formas tam diferentes por natureza, fias e recursos qu) res- pectivamente as inspiram e de que cada qual lançi mão: a eloqilên- cia sagrada « a profana na sua forma mais literária e brilhante, a forma parlamentar. «O orador sagrado do século XIX nlo deve apresentar-se no carapò armado de escudo e morriSLo pira bater adversários, que zombam desta armadura antiga, mas vai^r-se para defender a religião das armas^ que os inimigos dela empregaram para a arruin:(r». Assim pensava e escrevia Malli.^o, o m^is notável orador do século que findou; essas mesmas idéas tratou ê'e da efe- ctivar na prática, bam como os oradores Mota Veiga e Rodrigues de Azevedo, qu^ mencionamos a ssguir. Mais modernosi, Alvís Ma- teus, Al^es M ndes e Patrício sam também doutro feitio literário que muito os diatancía daqualâs, sobretudo Alves Mend?s que, posto que brilhante, está longe de poder servir de modelo no género da 'Oratória sacra.

273.-FRANeiSeO RAFAEL DA SILVEIRA MALHÃO

(1794-1869) notável orador sagrado e insigne poeta, natural de

Óbidos, aquém os seus contemporâneos exalçaram (.-h imando-lhe,

como D, António da Costa, o Lacordaire português. Confa-se que

outro grande orador, José Estevão, ouvindo-o uma vez pregar,

irrompera, em plena igreja, em bravos e palmas, arrebatado pela

palavra dominadora de Malhào. Dos seus numerosos sermòr?s des-

taca-se o que recitou nas exéquias do Conde de Barbaeena (Fran-

37

ciaco Furtado de Castro do Rio Mendonça e Faro) na igreja cie S. Vicente de Fora, em Lisboa, no dia 2J de agieto de 1854. Malhão caltivou ; I o.a sacra com muita felicidade, encODtr&ndo-st! no eecrimo que ae encerra (não todaa), a que pÕ3 o título de Lyra Ckristu, muitas notáveis pela sua incontestável beleza '.

274. -MANUEL EDUARDO DA MOTA VEIGA (Ki-

1879), doutor e lente da Faculdade de Teolo;:çia, foi um orador fluente e vigoroso. Ab suas Conjerínclag religiosas ' sam conceituo- sas e ornadas de irtíne elpgaute o erudita. Klota Veiga eãcrcvcu, àlêm doutras obrae, um Esboço da tíKuldade de Teologia ', que encerra piedoso materiais para a li)st<'>ria da Universidade, em ije- ral, e muito pariicularmenie pura jt d.i douti^^iira corporaçilo, de. que foi pr-.ilaro ornamento; FRANCISCO ANT.ONII) RODHIGUES OE AZEVÍDO (1S11-]ÍÍ'J7), outro doutor e lente da Facuidadi de T(>o!oi;ia, prolM- sor insigne, e tnSo menos insigne orador. A ora^^Ho ÍÚMcbre rmlada na» exéijiiiiis de filinto A7^sío merece p^rtici |ur reí-rr-neia pois q'ie nela, s('<;undo as e^iprensões de ?>I:iIhAo < o elogio do rei dos lirieos foi ícilo pelorei dos oradores portugii' ^es i> *.

275. JOAQUIM ALVES MATEUS (1835-1003) na-

tur«l de Santíi Coml)a Dão, bacliart lou- se em ttologia na Universi- dade de Cuimbri', onde fui e^tuflante distinto, e notabilizou -se ni tribui a h««ritda deix;uiii<> publicados numerosos discursos, que sam uma sfiiUia^So incciílc.ilável do stu grande Valor literário. A lingua- gem c.élis é vernácula e muito . castiça, podendo «pontar-ae 'coma verdadeiriH mcdúlos do pénpin. ríit&renioM tam fomente a Orarão Cofiijrahdatôria no consórcio de tíS. MM. El Jiei D. Luis e D. Ma- ria Via, ptiguda na do Pi ito em 18(52; as oraçòea fúnebres de D. P^dro IV, D. IVdio v, da B^nH^ira e D. Luis, ete. A última vez que subiu ao púlpito íoí em Braga por ocasião do Cod- gribso CtilúlÍLO rculiziído netta cidade em ISU^, e ainda entSoasut

1 Vid. a jnitkia iic(.ToU'>gieft por J, M. deAndrade Ferreira, Literatura. Música e BelasLetras. 1." vol., 1871, pág H9.

* Vonjerí-ncias natadas na de Coimbra em. os domingos de Çbb- resma, Litljoa, 1874, 1 vol.

* Esboço histórico-littrário da faculdade de teologia e da Universiá^ de Coimbra em comemoração do centenário da reforma... 1772. Comi"*! JBTi, I vol.

* <.>s aerm5o3 do Donl^^r Hodrí^-uea fiiram rennidos nama ed. de 1897: Tributo de suiidode ijiie á Memória do seu dedicado amigo Dr. Franàsa) António Rcdrituts de Aztvedo. do conselho de sua MagestaiU...,papi Visconde de Taveira.

\'i(i. o Elogio histórico pelo Dr. L. M. da Silva Eamoa m-Ánairio da Universidade de Coimbra para o bdc de 1897, pág. iiiv e seg.

-■Boou BomariOA

te, a soa ergumentaçSo brilhante e erudil a 8ua presença levantada e augusta, iôrai

que começava de miná-lo, o p mto mi

ftolieate e m&iB (tistioto daqui^la cclebraçSo ri-ligiosa.

Alves Mateus morreu no dia 20 de sg<>bto de 1003, na bi terra natxl, vitimado por uma brosquitc, deisan<]o proftind ia naud dea a todos que ouviram a sua palavra eloquente.

\ 276.-FRANeíSGO JOSÉ PATRÍCIO (18501011). Dês

orador sam n(TtáveÍ9 as orayilija por êle pronunciaiUs noa Jeriiair»' quando ali dt^ram entrada os rettis mortais de Garrett, e n^a tx qnias da D. Lui* i, na dia vitimai do incõoSio do ííifiuisi;, do aft canista Silva Porto, ptc. Os saua primeiros enauioe litunlrios p-leoi noii-03 êle no vol. 1ela$ Românticas. Fgi tumbím cti! .boriídor < diferentes jornais do Porto, terra da sua nsturaliilade, esTicciíluK-.i do Comercio do Porto,

277.-ANTÓNIO ALVES MENDES DA SILVA R!BE

RO, nasceu em Penacova e morreu em 4 de julin de r..Kl Foi bacharel formado em teoloj^ia, cónego da SO do Porto e pi-ote sor DO Seminário desta cidade. A sua fíiraa como orddur sagrai £rmou-Be principalmente desde qu<i em Lisboa pronunciou a or':d fúnebre de A. Herculano por ocasi.ío da traãIadni;íto dos rsslcs mo tais do Ínclito historiador para os Jeróoimos. Préfíou depois er.i iílC- ticas solenidades, comemorando o passamento de vultos iIt^ifl;fles fOi' Fontes Pereira de Maio e Barros nomes. Uma das suas ori-v"-^ '■• notáveis foi pronunciada no mosteiro da Batalíia, quando ali sa t-.y. trasladação dos ossos dos príncipes da Avia,

Além do discursos Alves M^mdes publicou um livro de vi geoB Itália que originou azeda polémica tendo sido acusado pt.-l< «eus detratores de plagiário de E, Oastelar, citando-RA em PHpi*ci 08 Recuerãos da Itália deste grande orador espanhol. Pai'a se deíei der escreveu Os mevs plágios, e em discussíto com M<ír. Almei» SUvano sabre questOes de filosofia tomista escreveu Um quadrup dante á desfilada e Tkomista ou toliatai, panfletos que no gene: sam verdadeiramente notáveis pelo vigor do sarcasmo e da lirt^^a gem.

Como orador sagrado Alves Mendes nílo o foi no r]goio-.o sii tido do termo. Foi antes um burilador de frases e um joalln^iro ( linguagem.

594 mutimu. ba umutoba iMwwrtiá

A ELOQUÊNCIA PARLAMENTAR

Sumtfrío: 278. A eloqaêneia politica e parlamentar. Vários oradoroB. 269. J. fisterSo. 270. Vieira de Castro.

278.— A eloqiiôncla parlamentar. Com a conquista das

idéas liberais e a im plantação do regime representativo abre-se uma época gloriosa para a eloquência parlamentar portuguesa. A convi- cção ardente^ que impeliu para o campo de batalha os defensores da liberdade^ ievouos igualmente á tribuna onde puseram a sua pala- vra na defesa dos mesmos ideais : tais fôram MANOEL FERNANDES TOMAS (1771-1822) antonomasticamente designado por o c patriarca da li- berdade» a quem foi erguida uma estátua pelos habitantes da Fi- gueira da Foz, seus patrícios; MANOEL BORGES CARNEIRO (1774-1833) qne no período anterior mencionamos como jurisconsulto; AGOSTINHO JOSÉ FREIRE (1780-1836),. como os anteriores, patriota eximio; FRANCISCO MANOEL TRIGOSO DE ARAGÃO MORATO ^ e mais tarde, numa íase de com- bate e antagonismo dos partidos políticos, RODRIGO DA FONSECA MAGA- LHÃES (1789-1858) político hábil, e muito astuto, a quem os contem- porâneos demasiadamente severos e por ventura até in]ustos chama- ram a «Raposa Politica»; GARRETT, » MANOEL DA SILVA PASSOS (1801- 1862), outro grande liberal, como os mencionados, verdadeiro de- mocrata a quem devemos um grande passo na reforma do ensino, todos honraram de modo notável a tribuna do parlamento. Mas a to- dos sobresaíu José Estevão.

279.— JOSÉ ESTEVAO COELHO DE MAGALHÃES

(1809-1862), de Aveiro, o príncipe incontestado da el* qiiência par- lamentar portuguesa. Nem antes nem depois dele a liberdade teve mais enérgico e devotado apóstolo. A sua palavra tinha o poder de dominar todos os auditórios. Arrojo nas imagens, grandeza nas oon- cepçc^es, uma forma ampla e vasta, postas ao serviço da mais com- pleta vocaçSo oratória, fizeram de José EstevSo um tribuno insigne, cujo nome será sempre recordado com admiração' *. Os seus discnr-

^ AragSo 'Morato (1777-1838) é autor de dnaa memórias muito estima- das — Sobre o teatro português; e Sobre o estabelecimento da Arcádia de Lisboa-

a Bulhão Pato, Memórias, vo!. 2.^ Lisboa, 1894, pág. 11-22; Latino Coelho, Elogio hist, 1859-, J. M. Andrade Ferreira, Rev. Contemp. de Porta' gai e Brazil, t 3.°.

O discnrso mais notável de Garrett é o do Porto Pirea, profSeridõ ni Câmara dcs Deput;\dos na sessão de 1840, tliscutindo a resposta ao discono da coroa. Cfr. Obras Completas, cit., tom. 21, pág. 67.

^ Vid. Discursos Parlamentares com um Apêndice contenda vários v- tigoB jomalfsticoa, a defesa do Portugal Velho, etc. Ed. do Centenário (1609- 1809) Porto, 1909, 1 vol.

oártruLo vx sboola bomaot.oa 585

80B príncipaiê eam sobre a questSo €harles et George ^y proDunciado a U de dezembro de 1857 ; sobre as Irmãs da caridade de 9 e 10 de janbo de 1861 ; sobre a suspensão garantias de 12 de agosto de 1840; e a resposta ao discurso da coroa (Porto Pireu) de 6 6 13 de fevereiro de 1840 em qae tomou parte Almeida Garrett.

280. JOSÉ CARDOSO VIEÍRA DE CASTRO (1838- 1872) foi am orador de palavra quente, apaixonada e vibrante. Co- nhecido desde os bancos da Universidade pelo seu temperamento irrequieto notavelmente desde o dia em que, em plena Sala dos Ca- pelos, violentamente^ apostrofou a decisão dum júri, Vieira de Castro, conseguida a sua formatura, entrou no parlamento como deputado e ali a sua eloquência alcançou enormes triunfos. Em 1866 partiu para o Brasil^ m »s jogou amargamente a ambiçllo que para o arrastou. O s u C'^f»amento com uma senhora brai^il^ira deu origem ao seu enorme infortúnio. Em 1870 Vieira de Castro foi condenado a 10 anos de d^gr-^do, vindo a falecer dois anos depois *»m 7 de outubro de 1872. D ixou entre outras obras: Uma pagina da Universidade^ Porto, 18o8; C C. Branco^ Noticia da sua vida e obras, Lisboa, 1861; Discursos parlamentares, 1865-1866, Li>boa, 1896.

Como docurac nt'^ biográfií'0 e literário tem muito valor a cor- respondência que Vieira Castro trocou com C. Castelo Branco publicada tob o título de Correspondência entre Camilo . . . e Vieira de Castro (2 vcls.).

O trá ico desenlace da vida do tam proraot»'d«^r espírito, abru- ptamente acont eido aos 32 anos, chama ainda sobre ele a piedade da história, não obstante o tempo volvido.

Vi •i»a de Castro exerceu graMfU', embora efémera, influencia nos escritores seus contam porân^^os. A obra íGbre Camilo foi a -olhida com alvor, ço e constituiu a fonte principal do gongorismo mo'lerno, que foi depois a feiçito mais ciraeterí^tiea da chamada Escola de Coimbra *. Tinha a envergalura dum grande orador e sê-lo hía cer-

i Pinheiro Chagas, Dicc, Popular, vol. xni, p«c:. 389.

A Charles et George era una barea fiaucèsa apresada cotno negreira nas agaas de Moçambique. O gpvôrno de Napoloiío ni mandou a rorftitair dentro de 48 horas ou, dada a recusa, que o ministro se reculliesse á esquadra surta no Tejo e que as hostilidades prin(íi|)iassem Xào foi preeiso tanto. No dia 25 de oatnbro de 1858 a Charles et George era entre;;ue ao t-apitao Tmvillo e cora ela ama indeomização do 120 cont s! K era ministro da marinha da lia^ leira ! O discarso BÔbre a Charles et George vem no Diário da Câmara dos Deputa' dos, líí58-6d. pág. 348.

Em 1909 eelebrou-se o cent«náiio natalício do grande tribuno, cumprindo destacar doe trabalhos então publicados o do Sr. Jaime de Mai^alhães LÃma, José Estevão, CJoimbra^ l vol, estulo seieno, BÍn>;(íro e emá^ieucioso. Vide também J, A. de Freitas Oliveira, /. E., esboço histórico, Lisboa, 18ò4.

58G BiflTÓRiA DA %jTnLATUBA roHruauABÁ

tamente se tivesse tempo de moderar o arrebatamento da saa pala- vri. Dos seus discaraos os mais célebres fôram aquele em qne de- feri leu a? leia de desamortízaçSLo e um outro sobre liberdade de imprensa.

ROMANCE

Sumários 281. O romance no s^c. xiz: saa grande extensão. Vários' autores. 2S2 Júlio Denís. —283. Camilo. —284. Eça de Qaeiroa. 285. O conto. 2S6. Paganino.— 287. J. César Machado. —288. Barros Lobo.— 289. Alberto Braga— 290. Trindade Coelho.— 291. Conde de Arnoso.— 292. Fialho de Almeida.

281. O Romance. Sua grande extensão. Vários au- tores. YL%i2k forma literária ocupa na literatura do séc. Xix um lugar proeminente^} umas vezes aproveitando a história para base de narração e criando assim com W. Scott o género que se di- vulgou por toda a Europa, conservando-se outras vezea exclusiva- mente dentro dos âmbitos do idealismo, tomando ás vezes a forma do romance propriamente dito, outros a forma mais rápida, ligeira, mas nSo menos artística do conto^ êle atingiu entre nós, como nas literaturas es tranj eiras grande extensJlo e desenvolvimento. Algumas das mais belas páginas da moderna literatura sam devidas a Júlio Denís, Camilo, Eça, Fialho, etc. Mas pouco mais podemos aqui fazer do que apresentar uma nota rápida, sumária e simplicís- sima de muitos dos nossos escritores que primaram neste género li- terário.

Assim RODRIGUES BASTOS (1777-1862), o autor da Virgem da Polónia e dos Dois artistas; ARNALDO GAMA, romancista histórico, (18-8-1869), cujas obras mais estimadas sam o Sargento-mór de Villar, Um motim ha cem anos, O segredo do Ahbade e a Ultima Dona de S. Nicolau; ANTÓNIO DE OLIVEIRA DA SILVA 6AY0 (1830-1 870)que, alem do drama D, Frei Caetano Brandão (Coimbra, 1869) nos deu a reconstituição da agitada época liberal do nosso país de 20 a 34 no romance tam popularizado Mário, (Lisboa, 1868) ; * OLIVEIRA MARRECA (1815-1889) figura de alto relevo social, autor do que me- lhor chamaríamos ensaios de romance histórico, Manoel de Sousa Sepúlveda (in- Panorama de 1843) e O Conde Soberano de CasUla (Ibid., 1844 e 18Õ3); JOÃO DE ANDRADE CORVO (1824-1890), escritor de vasta erudição patenteada em numerosos trabalhos de história,

* Algans traços í átimo j da vida deste simpático escritor em BulhSo iPato, Sob os cvpresteSj cit., pig. 269.

ae<rau smurra»

. etc. *, Mas àíêm ds eruâito foi também artista I belas faculdades de imaginaçilo como o demons- ) romance Um ano na côrU, Lisboa, 1850 51, 4 i O Aliciador (ia-Arefiivo Univ., 1, 1859), O )l. 1 e ii) e várias poesias avulsameote impressas Guilharmino de Barros (1835-1900), àlèm de poeta,

correcto, do que deisoii assinalado teatemunho isant.o, romance-crÓDica que lhe rendeu oa encâ-

criticos da época e o vol. de versos Cantoi do obteve o-prémio D. LuIh; Garvasio Lobatg (1850- comcdiógrato destinto. A sua primeira peçi, Z>«- , foi representada no Qinásío em 1873. Desde lais de seguir o que uêle era voca^So e tendência 08 dentro ai ana^ muitas peças os Groteacoí, 3f^

Stia Exaflência, O comi»»ari<y ds policia,

e de colabjrflçSo com D. Jo3o da Câmara— O ide ; Cócâ, Reineta e Vacada, O testamento da de copas. A facilidade doa diálogos, a graça e o , como faíscas, da todo^ eles, o apropósíto alegre Ma a3 obras de Oerva-^io essencialmente popnla- iccs originais sam A comédia de Lisboa, A prí-

Lisboa em camisa. Os invisíveis de Lisboa, © ica, Doixou numerosas traduções teatrais e cola- lUia em diferentes )ornaÍ8 do pais. Júlio Louran^a do Porto, oníe nasceu a 24- de maio di 1843 e mo mí-s de 1907. Escritor vernáculo e primoroBO 17, sceiías da vida contemporânea, Pjrto, 1879; idem, ly^O; O senhor Deputado, id., 1882; O vel. id., 1884 e Estética naturalista, estados , itl., ll?85. Colaborou àlfím disso em diferentes :as Bcndo sempre tudo o que escrevia do aprímo- r de muita leitura e Bab<:r,

}UIM GUILHERME GOMES COELHO, mais

dónimo de Júlio Dmií. Nasceu no 1'orto a 14 de e morreu a 19 de setembro de 1871. Era mé- Porto e aindi quando estudante publicou alga- uenos romances que depois formaram o volume cia. O romance que de repente o consagrou na as Pupilas do Snr. Reitor, primeiro vindo á luz

ni, e 1. HS f :m.

itou o Roteiro de Lisboa a Sôn por D. Joio de Castro.

588 mfTÓiiiA HA unoLVTtmA roBTOGoteA

em folhetins no Jornal do Porto -e depois em volnme em 186T segoindo-se nuroeroBas^ediçSeSy e que mereceu a Herculano a ckssi- ficaçSo de primeiro romance português do século xix. Vieram depois a Morgadinha dos CanaviaeSj os Fidalgos da Casa Mourisca e Uma família inglesa, que nlo fizeram senão confirmar o alto ▼alor deste fiaissimo psicólogo e interessantissimo escritor. Morreu aos 32 anos vitima da tuberculose^ pura debelar a qual fôra sem resultado até á Madeira^ numa edade em que a glória lhe começava a nimbar a fronte. E' o criador do romance na tur;n lista em Por- tugal. As scenas dos seus livros acusam um observador per.<picaz; delicado e exacto da alma portuguesa. Em Grijó; Ovar, Famalicão e Fâuzires, on >e tinha alguns parentes e amigos e onde vi^ea em procura de alívios para a sua saúde abalada, foi observando os tipos com que enriqueceu a galaria notabilíssima dos bcus romances o Mestre Bento Pertunhas, o Herbanário Vicente, o Dr. João Se- mana, o Snr. Reitor, aquelas boas e doces f guias de Madalena, de C/istina, etc. Sem esforço, 6 enredo desenvolve- Fe prendendo a atenção do leitor, que nSo se carsa de admirar es qnadtos e as per- BOmgens que os enchem e que dso mais se lhe apagam da mfníória nuDia len-brança suavlí^pima e deliciosa *. 'Rcceiítem- nte publicou-se o vol. In edil os e Esparsos * importítntísfimo para o estudo psicoló- gico e crítico do autor.

283. CAMILO GASTELO-BRANCO (1826 t 1 de junho

1890), [joé^a,, dran.aturgo, romancista, critico, é um dos mais fecun- dos e 0} erosos escritores que conta a história da ri' s-a liter.aura. Natural de Li.- boa, orí3o de pais dt sde verdes anos seguiu os seus estudos cdin muita irregularidi.cle no Porto e <m Coimbra. A sua activid: de literária é verdadeiramente febricitante detíde os primei- ros píi.:.-('^ no domínio das letras. As tuas obras eíevam se a 262 COE I < 1 rvdo poesia, romance, conto, drama, opúsculos de crítica, traci.-^r s, bi( grafias, etc. '. E nào fosse a doenya que o torturava nos últiuiris anos, o desconsolo produzido por muitas dores morais, a cegueiía qne o atacou irremediavelmente, e por fim a morte que a si prófíiio Fe deu no dia primeiro de junho de 1890, e certamente a heranya l g?da ao país seria inelhormente acrescida como de quem

* Vid. a biografia do distinto romaDcista escrita por Alberto Pi- mentiíl n; a Fidalgos da Casa Mourisca, 3* ed., 1877. Cfr. também o artigo da A. X. líocirifrucs Cordeiro no Almanath de Lembranças para 1876, o Masen. Ilustrado, n (1879), n.^ 1, t> muitas cartas suas inéditas até então e poblicadis Bo Portugal Artístico, Porto, 1905.

í i.isboa, 1910, 1 vol. A obra traz largo estado biográfioo-cri tico pelí> falecido escritor Sfusa Viterbo.

^ M. Ilenriqne Marques, Esboço duma Camiliana,

t

oàphuao Yi asooiJL BonÁinoÁ 5^

poBsaía a pena mais bem dotada, mais rica e mais fecunda que por rentura pôde apontar a nossa galaria literária. Como Herculano, Grarrett, Kebelo da Silra, Arnaldo Gama, Silva Gaio, explorou Ca- milo o domínio da história aliado ao da fantasia escrevendo dezenas de novelas e romances históricos, em que o interesse pela narrativa. 66 desenrola através de páginas duma lídima linguagem bem portu- guesa e bem clássica, sempre rica e variada, maleável ao sabor da artista genial que a emprega, umas vezes provocando a gargalhada, outraa o patético, mas sempre dúctil, apropriada e bela. Os seus tipos o brasileiro, os lhos fidalgos do norie, os abades do Minho, o boticário, o escrevente, o namorador apaixonado e romântico, o hraaíleirOy o poHtici e quantos outros! vivem nas páginas dos seus livros imorredi uramente.

Há, cr-mo^ era natura), na sua vasta obra desigualdades, in- coerências, fraques <8. M^s quem as não ten- !

Desie a Agulha em palheiro, O olho de vidro, o Retrato de Rícardhia, ao Eusébio Macário, Brasileira de Prazim, sem dúvida, o espaço percorrido é enorme, mas em to ios se pode admirar o ostilo amplo e a maneira viva e CDlorida que pr»'iii!e e encanta. Ci'einos das sur-s «'bras tam somente: "^

TiíAruo: Ahenqoatlas Jdrjrimas, Agosfinlio de Ceuta^ ConJem- nado, Justfçaj O moríjaío de Fafe em Linhoa, Morgado de hafe amoroso, Marquês de Torres Novas, Purgatório e P<iraízo, et*.

RomaNCks: Am'^r r/e ^;ercZ/ç(/o, Amor dt>, sdlvaçao. Os In-ilhan- fes do BrazUeiro, Sereia, A Iruxa do 'Diunte Cardona, A O rja, Mistérios de Lií^hoa, Livro Negro, Net<c d'j Arcediago, Ktnéhio Macário, Volcoes de Lama, <^t'.

Poesia : Ao anoitecer da vida, Duas ípocas da vida, Lispi- rações. Um livro y A as t?evas.

TraducjuES: A'aôres do diabo, d-' Carotí^^, a Lanny, i\^ Fey- dean, o Génio do Cristianismo, de ('h t iiuhriarul, o InjernOj de Calet, Romance dam rapaz jobre, do Oeíac F uillrt, o Dicionário de Educação e Ensino, de Campagne, Illatória de Gahrel Mala- grida, de Mony^ A imortalidade, a morte e a vida, de Pucheshc, etc.

Repetimos: é inípo.ssivel citar a cbru cie Camilo, tam vasta, tam complexa se oferece a quem tenta íixá-la. Q le brilhiiíte^ P^*,^!" nas ainda nos Críticos do Cancioneiro Alegre^ nos k^eroes de S. Mi- guel de Seíde, na Boémia do Espírito! A 'Imuinosa trajectórin per- corrida por este belo esj.írito pode sc^^uir ho loi^n minúcias aqui des- cabidas, por ex^^mplo, no Romance do Romancista do seu diBCÍpuIo e amigo sr. Alberto Piment^d, nas Idéas Modernas na lit, portuguesa do sr. Th, Braga (l, pág. 240-285) e em outros livros da esp cia- lidade.

Aqui queremos salientar dentre os romances o Aynôr da Perdição, história paesional dum tio do romancista Simão Botelho,

ftSO mBV&ÊJÁ DA^ LZnUJLTOBA FOBTOOUASA

romance que parece ser, dentre todos, aquele que o carinho público de muito consagrou, áo lado dessa obra impregnada de senti- mento e de beleza ponhamos a sua obra de ironia e de riso, leve^ cáustico, dos Serões de S, Miguel de Seide, Cancioneiro Alegre e Críticos do Cancioneiro^ da Senhora Ratazzi^ da Cavalaria da Sebenta, et<3., e teremos os dois tipos caractidsticos da complicada psicologia de Camilo, que é português e bem português na raça, no espírito, no coração, sentimental, impulsivo, generoso e nobre \

284. J. M. EÇA DE QUEIROZ (1846-1900) natural da Povoa de Varzim, cônsul de Portugal em Cuba, em Bristol e por último em Paris, onde faleceu. No dia 9 de novv3mbro de 1903, inau- gurou-se no Largo do Quintela, em Lisboa^ a sua estátua e na saa terra natal no dia 14 de outubro de 1906 colocaram os seus admira- dores uma lápide na casa onde nasceu.

Na história do romance nacional o seu nome, independente- mente do juizo que venha a lixar-se a respeito da sua obra, ficará para sempre perdurável pelo caminho novo que rasgou no campo do naturalismo e pela influência decisiva que a sua maneira criou e exerceu. Temos rl^le O Mistério da Estrada de Cintra^ escrito de colaboração com Ramalho Ortigão, primeiramente public ido em fo- lhetins no Diário de Noticias e mais tarde em vohime: O crime do Padre Amaro y O Primo Basílio, episódio doméstico; O Manda- rim, A Relíquia, scenas da vida romântica ^ Os Maias, episódios da vida romântica, A Ilâstre Casa de Ramires, A Correspon- dência de Fradique Mendes, A Cidade e as Serras^ Contos, Prosas barbaras com uma introdiicção de Jaime Batalha Reis, Cartas d' Inglaterra, Ecos de Paris, Notas contemporâneas e Ultimas páginas (rass. inéditos).

Em todos os seus trabalhos nSo é o entrecho que prende e seduz o líitor, mas principalmente a magia do estilo, vivo, novo, de riquíssima policromia. Devemos colocar á parte o Mistério da Es- trada de Cintra, que os seus autores publicaram com o propó- sito de aproveitar todas as velhas molas do deilS-ex-machina dos ro- mances sensacionais. Eça foi acusado de plagiário no Crime do Padre Amaro que derivaria de La faute de Vabbé Moaret, de Emilio Zola, mas basta registar que o Crime é de 1871, íoi lido a

1 Veja-se Silva Pinto, C. C. Branco, notas e documentos: desãf^avos* Lisboa, 3. a. (1910). 1 vol; J. J. Tavares Proença, Auto-biografia de (Camilo, Coimbra, 1906, 1 vol.; A. Pimentel, Memórias do tempo rfí Camilo, Porto, 1913, 1 vol. ; Paulo Osório, Camilo, a sua vida, o seu génio^ a sua obra. Porto, 1908, 1 vol.; Visconde de Vila Morna, Camilo inédito; Sérgio de Gaatro, C. Ç- B. tipos e episódios da sua galeria, Lisboa, 1914. 3,vo a.; A. Cabral, Camilo de perfil: e Camilo desconhecido, 19 i8; Prado Coelho, Camilo, 19i9.

CAPÍTULO TÍ^-BSOOLA BOMAVTICA 591

um grupo de amigos em 1872 e foi de^de fevereiro de 1875 publi- cada na Revista Ocidental, Ora Za faute.., foi escrito e publi- cado em 1875.

obra de Eça foram postumamente coligidos alguns traba- lhos dispersos *, mas a melhoria doía, qualquer que seja o lugar de- finitivo a dar ao Crime do Padre Amaro, ao Pimo Basílio, aos MaiaSf foi publicada e amorosamente revista por ele e é essa que firma a inconfundível personalidade do seu autor. No entretanto o livro postumamente publicado A Cidade e as Serras tem tantod eucantos de estilo, tanta riqueza e varied-^de de d?8criç5*8, diálogos tam bem tracejados e com tal arte, tam simples e tam na- turais, um sabor tam exquisito e tam fino que, pareee-nos, nâo se hesitirá em lhe dar a primasia sobre todos os demais livros de tim finisBimo talento.

Fialho afirmou um dia que Eça n^o era um escritor nacioaal, mas antes um escritor europeu, cosmopolita, o que ó ura paradoxo, ou ník) tem dignificação. Outros téem sustentado que a ob^a de Eça é essencialmente imoral e sceptica. ^las sí^m querer desculpar o exa- gero de certos pormenores e o aproveitamento de situações moral- mjent* inieíensaveis e que nfio sa^b^imos em que importava (n á sua arte, á sua estes»?, o ficto é qu3 o notável romancista nHo ])óde ser considerado, em princípio, como um sistemático demolilor de forças morais. O m^is criticado dos seus livros, o Primo Basílio é a for- mal condenação do adultério. No Crime do Padre Amiro a figura abnegada e simpática do Padre Ferrão é a prova do que o autor quere e sabe distingui-lo dos raáus e falsos sacer iot<'fl, ess< s mere- cedores das suas ironias e das su-is censura?. qU'*ni ítHrnie que no pensamento de Eça o Mondar im não é senão o psta io huraoris- tico do Remorso, como a Relíquia o estado humorístico da llipocri- BÍa. Em conclusão « sustentar-so-hia sem grande dilioulrlafle, contra o equívoco de muita gente, que a obra de Eça de (^ii ii*oz teria exercido afinal, e poderá exercer ainda, uma acçSo soci-il de efeito benéfico, embora na maior parte das suas pác^inas mais como agente de saneamento do que como estímulo de ediJicamo,i^

' Sobre Eça deve lêr-se um arf ^o de Caiei na Rev. critica de História y Literatura espaflolas, portuguesas e hispano-americanas, 1901, reproduzido ^0 Diário de Noticias, n.*'* de 24 e 25 de maio do mosmo ano, iintAvol sobretudo pelo aspecto bibliográfico; o ostudo tam intimo e tam belo de Hatalha Reis na ÍQtrodDçSo ao vol. Frosas bárbaras, cit., e ás páijiiias quentes de Si.va Bastng no prefácio ao DiC. de Milagres rebatendo nm paradoxo tam tVerjueute, de resto, na penna ioconfundívelmente )>rilhante de Fialho de Almeida; J. Agostinho, Queiroz (Eça de), Porto. 1900, 1 vol.; A. Cabral, E. de Q sua vida e a sua cbra^ cartas e documentos inéditos, Lisboa, 1900; Alberto dT)liveira, H. de Q., páginas de memórias^ 191*J; Manoel (raio, E. deQ. (Carta .Coimbra, 191^.

Manoel Gaio, Eça de Queiroz (Carta), cit., p;'ig. \b.

592 mSTÓSlA DA LITHEATXTBA rORTUGCilA

CONTO

285. Não distinção essencial entre o romance e o conto. A exteiibSlo é um ekmento todo exterior e superficial. Em todo o conto b^^i naturalmt^nte ama base^ um fundo, que alargado a outra proporções, entremeiado com outras intrigas, daria um romance; como êdte, apertado em moldes mais concisos teria de classificar-se no piimtiro género. No conto brilham, porém, tblvêz com mais des- taque, hs qualidades qne p^^rsonnlizam um autor— fantaaia, arte, estilo pióprio e inconfundível. C<>mo nas formas poéticas o sonetOy nas formas em prosa o conto de tine rapidamente o que é e o qae vale um escritor. Nao admira pvOr itiso que esse géaero tenha tam* bem os seus cultOrci esp ci-ti^i, emb)r<i a maior parta não limitaase exela-ivamí^ute a buí aclividade a essa forma literária, como pas- samos a ver.

286. -RODRIGO PAGANINO (1835-1863) além de colabo-

rar oui, aiversos joraAiá e reviiUs. 1 1 -rárias, deixou um livro de ^ contot-, que tivijriira lon^a aceitaça> do público Os contos do tio Joaqninij c justamiintj a m«rejiaiu p^la simplicidade e naturali- dade aliadas á btíltzA do estilo *.

237. A liníjur g»,ra é (^uasi sii^nprrt humoriática em JÚLIO CÉSAR IVIKH\j3 (lcs;ij-lsiHj) auíôr ile Apontamentos dum folhetinista 1878; A vida em Lisboa (1858); Contos ao luar (1861); Recor- dações de Paris e Londres (18ii2); Em Espanha (1765); Do Chiado a Veneza (18i3T); Â lareira (1872); A vida alegre (1880). Traduziu eui ed. nicnumenttl a História de Gil Braz de Santí- lhana, de Ltíbiigo, 0^ seus livros ligeiros, recreativos, simples e bona Síim dotumeatos inteieòsantos para o conhecimento das letras e para o da vida das diferentes classes no período de 1819 a 1880'

288.- BARROS LOBO (Eduardo de) (1857-1863) mai»

conhecido pelo pseudónimo de Beldemónio^ auiôr de pequenos con- tOP, artigos de jornalismo e de crítica, t^m que se revelou sempre estilista primoroso e d tsassombrado. A mtisa loira ^ Viagens no Chiado, Contos imorais sam uma amostra, aliás incompleta, do seu brilho como artibta, que se manifestou ainda em algumas trada*

* Cfr. J. J. de Sou-ia Teles, Anuário portag., sc,j Utt. e artistico, 127- 131. Pai^^anino era de Lisboa, m('dieo e faleceu em Carnide em 22 deaet de 18ò3. Vid. B. Pato, Sob os cyprestes, cit., pág. 195.,

OlFÍTULO Tl B800LA BOMASTmA 593

çSea primorosas de Zola e Balzac. Os seus artigos de polémica eoBcitaram-lhe muitos inimigos.

289. ALBERTO BRAGA (1851-1911) um dos mais finos contistas dos nossos dias, como se desde o primeiro vol. Contos da minha lavra (1879) até aos Contos de aldeia y Novos contos. Contos escolhidos, todos, pôde dizer-se, primorosos. Para o teatro, onde não foi feliz, escreveu A estrada de Damasco ^ a Itmã e O Estatuário, Deixou também uma longa colaboraçSto em vários ]omaÍ8. Minado pela tuberculosa, Alberto Braga finou-se no Porto, (Foz), sua terra natal, no meio dum esquecimento bem injusto e bem crufcl.

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290.— TRINDABS COELHO (José Francisco.) [1861-

1908] é o fino burilador áo formosO livro que pelo seu título nos revela o conceito em que o tinh'^ quem o idealizara e lhe dera aquela perfeição de estilo, aquela finura 'le ssntimento, aquela graça, ajjuela gentileza, àquela arte, tudo en' 'ilto numa Bimplicidade de ^ima casta e bca e pura, que di a esse livro um lugar primacial na hist<>ria da novela portuguesa Os meus ^ morei, E como é que o autor desse livro, que traduz em todas as eurs páírinna tanta saúde morul, pôde ser arrastado á tremenda crise que teve o seu desfecho doloi-oso em 19 de agosto de 1908?

Trindade Coelho deixou páginas expl-^ndidas em várias re- vistas e jornais. Magistrado lúcido e íntegro publicou obras da es- pecialidade; como educador do povo a esse larguiseimo ideal consa- grou dinheiro, forças e actividade incansável,

A sua autO'bíO grafia e as Cartas editr das por seu filho, o ilustre poeta Henrique Trindade Coelho, sam a fonte principal para o estudo dçsta complexa individualidade.

291. -CONDE DE ARNOSO, (Bernardo Pinheiro Cor- reia de Melo) (1856-1911) prosador que criou'um lugar de des- taque no nosso meio literário desde a publicação do seu primeiro livro Azulejos. O volume de viagens Jornadas pelo mundo acentuou as qoalidades de elegância, de vivacidade, de gosto, que predominam, de resto, em todos os trabalhos, como nos contos^ artigos de jornal, o aiada nas peças teatrais A primeira nuvem e no Suave milas^rej pequenos episódios de fina el^^gância literária. Todos sabera o abalo moral que lhe acarretou a morte trágica do rei D. Carlos de quem ftra grande amigo. O Conde de Arnoso ficou desde esse aconteci- mento .morto para a vida, senão apenas para erguer no Parlamento

« OdéL, n,® de 30 de agosto, 1911.

594 BISTÓRU DA LITBKAT0BA FOBTUOI7É8A

a sua V02S vingadora e jasticeira contra quem tinha causado a morte do seu grande amigo, atitude de grandeza moral que se itnpOs ao nosso respeito, e de que íicou o éco, embora longínquo, nos dois vo- lumeainhofi Justiça.

292. -FIALHO DE ALMEIDA (1857-1912) é incontesta-

velraente um do^í escritores mais originais, mais vivos e que melhor e mais vigorosamente soube conhecer, amar e imprimir um ciuiho de ini'»iviJu£jl idade á nossa língua.* Os combates dos seus primeiros anoB contra os azíires da vida a que ele alude no /l* Esquina ' (1903) ajudam a compreender como nele surgiu e com o tempo se avigorou <íbta maneira, talvez cruel, talvez mordaz e cáustica em excesso, couio ele apreciava as cousas e os hom<^ns do seu e nosso tempo. Vinrlo do seu pequeno recai^to de Vila de Frades fez-S€y pela vonlaHe, poli enerpa e p^ila dfcisSo, qualidades que, por singiilar contrastt*, se íôram ap8íi;ando e diluindo até o tornarem, nos últimoi anos, uma criatura siagularraente indiferente a tudo. Está poderoso mcHtre da lí'tgiia, que vibrou como Ininguêm o látego da crítica, como o revr-lum os GaíoSj * as Pasquinadas (1890), a Vida irónica (1192) e o Barbear, penteiar, póstumo, acabou como uma creança ou um velho abúlico, na paz da sua aldeia, entre os cuidados da sua mo |(\-tíi lavoura^e os seus livros,* postos por fim os olhos na contem pU.çrio da morte, com verdadeira retignaçâo criotâ,

O observador e psicólogo, a quem não escapavam as mais insi- gnifieant^vs minúcias, revclam-se iietjsas obras de análise, de colorido e de sentimento, algumas das quais constituem verdadeiras obnw primas e que ec chamam A cidade do vicio (1882), o Pais das uvas il81):J), Lisboa galante (1899), Contos (1881).

As \)A' zas que ôotes livros encerram dificilmente se poderiam destacar. (Jonhecedor profundo da língua, arcaico pelo coatato doB mestres quo nielhor a escreveram, moderníssimo pela originalidade que tanto se afastava dos seus contemporâneos, através de todas as páginas que escreveu foi sempre um artista superior, amoroso do colorido, dos tons fortes e quentes que definem num traço, num es- corço, numa atitude, uma completa figura, viva, sentimental, apúxo- nada. Que orquestração de ricos sons no Sempre amigos^ no Fíl- nambulo de mármore, na Ruiva do seu primeiro livro de contos I Havia noáse admirável artista vigor e doçura, raiva e perdão, o dardo envenenado e vertiginoso e o seu gesto brando e de piedade.

I íli^nra a sna antn-biografía a Eu». Entus oitras cousas diz: «tenho eficrito. . . e<'r<j,i de l.oOO pá^iinas por ano. . . nem Í6gro anferir da pena o var tento neeedúrio ganlundo menos que uin earpioteiro ou nm pedreiro».

« 1.* sriie, 54 n.""* agosto de 89 a janho de 93 ; 2A3 n.*» ; último, de 25 de janeiro 9-i, recentemente reeditados.

CAPÍTULO VI B8C0LA BOXJlBTICA 595

Pintando como Rémbrant, cinzelando como Beaerenuto Cellini, nao é por isso de admirar que a sua obra tenh* produzido tam forte impressão nos ©scritores novos, alguns dos quais tal mal decerto ò compreenderam. Mas é que os seus quadros fixam-se na retina, e de U nSo é fácil expulsá-los. E como tantas vezeg sucede, como sucedeu com Eça de Queiroz, sara as estravagancias destes grandes artistas, a êJes facilmente desculpáveis, as que se imitam e repetem e propa- gaii com maior facilidade. No jaizo de (jruerra Junqueiro, Fialho ó a mais rica naturezi artística que Portugal tem duas dúzias de anos, rutilando em génio por inst mtes . . . natureza de sensibilidade vibratil, agudíssima, quási mórbida. Depois português idolatrando o seu Alentejo, adorando a sua pátria, instintivamente, organicamente, como a raiz adora a terra. Acrescentaremos somente que deseja- ríamos vêr expungida da obra do grande impressionista certas pági- nas, que sam indubitavelmente uma míincha de máo gobto, que a desfeia. Para que o uso de grosseiros plebeísmos em pena a que de- vemos quadros tam delicados como os que se nos deparam no Pais das uvas e mesmo nos Gatos? Escreveu algures um inteligente crí- tico aproximando os criadores da nossa prosa contempoiânaa se ' Eça^ frre com o seu florete sorrindo. Ramalho com a sua espada rindo, i Camilo com o seu caceta nodoso gargalhando, Fialho fere com as ; suas pedradas sssobiando ^.

293.-FRANeiSeO TEIXEIRA DE QUEIROZ [1849.1919]

de Arcos de Val-de-V*ez, que usou durante* muito tempo do pseudónimo I de Bento Moreno impoi-se á atenção pela elegância e correcção com que manejou a língua que, cheia de viveza, de colorido e de sentimento ele nunca quis abastardar em sacrificio á popularidade, que nào cortejou. Des- de A Comedia do campo (i Contos ; ii Novelas), os Noivos; Salus- tio Nogueira; O ilustre Galrào ; A Morte de D, Agostinho ; Cari- dade em Lisboa; Cartas de Amor, até o seu último romance A Grande Quimera deixou documentos de inteligência e de cultura primorosas, propondo-se a explanar scenas sociais ou morais debaixo da orientaçâbo experimental em que o seu espírito, como médico que era, primeiro se tinha formado. Para o teatro escreveu O grande homem acolhido no palco em 1881 com simpatia. Dominado pela idéa de maior perfeíçSo raro foi o romance que nSo refundio, bem convencido decerto de que nSo é o número, mas a qualidade dos trabalhos que salva o escritor do esquecimento. Teixeira de Queiroz é dos que nSo esquecerá nunca pela vernaculidade e pelo brilho

' Pátria, Porto, 1896, t^ Annotações r> , 206. Flexa Ribeiro, /^/a//io de Almeida, visão estética da sua obra, Lialjoa, 1912; Occid, n.® de 20 de março de 1907; Novo Alm. de Lemb. Luso Brás. para 1912 : Visconde de Vila Moura, f, de A., Porto, 1917; Raul Brandio, Memórias, 1." (1919), 61.

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596 BZITÓBIA DA LiraBATUBA rOBTU«UfttA

com que escreveu algumas páginas dos seus formosos Hyros. A per- feição da sua arte coatiece-se melhor que nos romances, nos CorUoi (3/ ed.) onde alguns como A vingança do morto, O tio Agrela, etc nHo podem esquecer a quem uma vez os leo.

294.— ABEL BOTELHO (1854-191 7). escritor, }orn!iU8ta,co- mediógraío, deixou muitas obras audaciosaà nos seus processos realistas e que foram largamente discou tidas. Da sua vasta obra literária, que em 1885 ele iniciou com a Lira insubmti^sa, eitaremo^ as comédias Jucunda, Imaculável e Ge.manOf e dos romances o Barão de Lavos, o Livro de Alda, Amanhã, os La,zaro8, Sem remédio, ía^al dile- ma e Prótpero fortuna. Quer no teatro, quer no romanc**, Abel Botelho quis discutir temas ou originais ou eecdbrofos, que lhe cria- ram adeptos e adversários, uns sempre prontos a exaltar o seu ta- lento, que era incontestável, outros a denigri-lo e rebaixá-lo. A re- presentação do Imaculável em D. Maria terminou quase por um motim e Germano n»*m s* quer foi aceito pela empresa e originou conflitos pessoais. O Barão de Lavos foi indubitavelmente o ro- mance que liie conquiâtou maior renome. O caso pat^> lógico nele es- tudado, como sucedeu em Os Lazaras^ julgou se ser cópia do natu- ral,— o que provocou a maledicente curiosidade do maior número. Nào podem negar^se a Abel Botelho finas qualidades de observador. Tem páo^inas de grande tacto psicológico/ perfeitas de análise e de estudo. Mas os processos realistas que adoptou, demasiadamente exagerados, cansaram o leitor, que acabou por abandonar o autoi^de tantos quadros de podridBlo social. As suas obras ficam assim re6€^ vadas aos homens de estudo como documentos duma época ou como sintomas duma sociedade que ele soube e quis era a sua idiosin- crasia apresentar com verdade, outros dirSo, com cru^^zi dema- siada. Entre os seus volumes nâo deixaremos de citar Mulheres da Beira, interessantes contos refijionais e o seu último livro Amor crioulo (Vida argentina, de 1919) ^

295.— RAMALHO ORTIGÃO (1836-1915) é dos mais vivos, mais originais, mais rivOs e mais prestimosos escritores que conta a lite- ratura contemporânea. A suceder aos fundadores do romantismo, duma geração a que pertenceram Latino Coelho, Camilo, Chagas, Rebelo da Silva, Tomás Ribeiro, Antero e tantos mais, ele ocupa o seu lugar cheio de altivez e de independência, como alguém que deixou uma obra, que nào poderá esquecer jamais quando se fale em quilates de

' Abel Acácio de Almeida Botelho era de Taboaço ns Beira Alta e faleceu era Buenos Aireá, na Argentina, ot-^^ era ministro plenipotenciário detíde 1910, não teudo mais voltado ao pais. ij..i oficiai do Eataib» maior muito distinto.

oApfmio VI ^'bsoola wmkAànoà S97

boa prosa portagaôsa. Tendo principiado pelo jornaliamo o seu nottie impos-se i caríosidade pública dei^de 0 aparecimento de O Mistério da Estrada de Cintra no Diário de Noticias em colaboragto estreita com Eça de Qaeiroz^ que residia ao tempo em Leiria, ao passo que Ramalho vivia em Lisboa. A forma como esse romance foi iniciado^ o artificio de que autor e editor se serviram para atrair a atdnçSlo do públicO; absorvida pelas notícias da guerra estava-se em 1870 e então importavam os telegramas sôbre a guerra franeo-prussiana acordaram a indiferença geral e até a própria policia julgou estar em presença dum delicio sua alçada I Era uma prova de que os autores alcançavam o seu desideratum. escrevendo uma obra que, como diria mais tarde o seu primeiro sagestionador^ «se n^<> valia como obra literária, valia como obra imaginativa:», ficando assinalada pelos episódios da sua original com- posição e por esse estilo novo, sacudido, nervoso e policrómico que depois apareceria nas Farpas^ saídas egualmente da mutua colabo- ração amigável. O L°' n.* das Farpas surgiu em maio de 187 L Dessa tribuna saiu, sempre com eloq&ência e brilho, a voz do maior crítico que tem contado Portugal analisando a mais completa ordem de questões da atualidade, desde as de higiene individual ás de pedagogia geral, dos problemas políticos e económicos aos da mais elevada transcendência religiosa e social. Durante l?.rgo espaço o espírito, o chamado « bom-humor » perfuravam como estilete agudo a vida social portuguesa, nao num intuito subversivo, destruidor e anárquico, mas como quem tem um ideal de justiça, de bondade e de beleza e quere a todo o custo impô-lo e vê-lo respeita lo. Nêsáes volumes pela primeira vez aparecia a pro^a variada, múl- tipla, riquíssima, bem portuguesa e bem sS^ incutindo força, ins- pirando beleza, distribuindo graça. Havia Camilo, mas era mais amargo, hav;ia Eça mas era mais sentimental, triste e recolhido. Ramalho tinha a franqueza da dicção cheia.de claridades e de sol. O dom de pintar, de discrever uma paisagem, um objecto, um episódio, ninguêii o possuiu como êle. E' vêr a Holanda; todo esse vol. ó uma maravilha d-» descritivo, a começar nê^se capi- tulo inicial Primeiros Aspectos, desde o qual logo principiamos a conhecer e a amar e->8e siní^alir país «labirinto aquático, teia de aranha enorme em que os fios sam agua », vol. que é certamente a 8ua obra de mais uniforme e concisa beleza. Amigo da luz e da cor soube pintir as coiisis em que o seu espírito de espírito de artista e o seu cora'^ao de português mais se deliciavam as nossas aldeias, ôs nossos rios e montiinhis, as nossas arvores, e n^^sse sce- nario distribuiu a galaria dos seus tipos, o aldeão, o Cimponês, a ra- pariga do povo, cuja beleza se eoraprouve era exaltar, mostrando-no- loe nas nossas festas populares, nas procissões e romarias, nos bailes « nas feiras. A destruição malévola ou inconsciente dos nossos mo -

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588 BIBVÓBIA HA LITMIÍlTUBÁ POBTUOUftSA

nairentoB artísticos ou arqueológicos fez^lhe levantar esse grito depro- testo que representa um dos seus últimos vols. A Arte em Portu- gal, Kste amor a tudo que é nacional e representa a fôrça oa a graça é uma das características da sua vida de escritor. A outra é o espirito de verdade, de justiça e de independência. Estas quahdft- des que o impunham moralmente fizeram amar ainda mais as que irradiavam do seu talento de grande prosador. Tanto em Portug^i como no Brasil Ramalho Ortigão exerceu uma influência inten^ira^ aaktar e imediata. Mais equiJibrsdo que Eça de Queirós e qne .Fi« ho de Almeida, nele o imprcssionii^mo da vis So nSo altera a serenidade emotiva. £' sóbrio, ponderado, diz o que quere esòo que quero. páginas suas que ^am águas-fortes de intensidade. E i^HO ou &ça a descriçSo do Museu de South K^nsington no JohK Buli (c. vii) ou a da lapidaçSo dos diamantes na Holanda (P. 176), a d]i ca.sa holandesa (ibid,j 98), por ex., ou a da festa do Natal oas íar^^as, (v, 171). E' a sua natureza de artista que se revela na mnin prouena minúcia. E essa natureza de artista é servida pela mais pi.); iito linguagem possivel. E' para cada cousa; para cada trfcho^ parii cadu tipo, para cada emoção, o vocábulo adequado, preciso e completo.

O poder degcritivo encontra-se ainda no livro de viajens Em Par^e, contendo estudos e obeervaçSes da expoE>içSo univereal de Ihí 7, Dí.h Histórias cor de rosa^ centos de deliciosa leitura e ontroe. ls<í) Luiii livro, porém, retrata melhor o escritor, o cidadSo, o homem de bem, do que as í arcas com todos os seus exageros, irregularida- des e mrrmo injustiças, a que as circunstâncias do momento por veiUiTíi o puderam arrastar quando tinha em mira um ideal maia alto c riobre.

l)pf|neles e destas se resgatou na última fase da sua vida em qiu iniiHís quiseram achar uma contradição com o período negatí- virita da piimcira fase dela e outros viram um eslbrço, o derra- dtio, ]tara a aproximação do ideal de justiça e de bondade, porqQd coi> batera toda a sua vida de escritor '•

* O Dr, Ed nardo Bumay CBcreveu algnmas Cartas aôbre^esta delicada qneetHO. ^^bie o cielinto escritor é aicda cedo para ajuizar serenamente. Sam dignas de notar-Bc as impressões criticaa seguintes, de Ricardo Jorge, Ratnãih Ortigflo, Linhoa, lí^lT); Hemeterio Arantes, Ramalho Ortigão, ibid., 19l5; Prftdo Coellio, Ramalho Ortigão, conjer., ibid., 1916. três artíjfos no/)w de 8 nov. I91f> notáveis, do Conde de Sabogosá, António Cândido c LoíideMir galhaiB. Prado Coelho estudou Ramalho con o edocador noa fiisd/osOítieOf' 1919, 36^66.

ANTOLOGIA

SÉCULO XIX

POESIA

I

As minhas asas

Ea tínlu umas asas brancas, Aas que um anjo me deu, Qne, em me en cansando da terra, &tla-a8, voava ao ceu. ^Eiam brancas, brancas, brancas. Como as do anjo que m'as deu. Ea Innooente como ellas, Por isso voava ao ceu«

Veio a cubica da terra.

Vinha para me tentar;

Por seus montes de thesouros

Minhas asas nSo quis dar.

—Veio a ambiçflo, co'as grandezas,

Vfaiham para m'as cortar,

Dairam-mç poder e glória ;

Por nenhum preço as quis dar.

Porque as minhas asas braíncas, Asas que um anjo me deu, Em me en cansando da terra, Batia^Uf voava ao ceu.

Mtt «ma noite sem lua

Qne eu contemplava as estrêllas.

E )a suspenso da terra

Ia voar para ellas,

Deixei doscahir os olhos

Do ceu alto c dns estrêllas, •«

Vi, entre a nc voa da terra.

Outra luz mais bella que eilai»

E as minhas asas brancas. Asas que um anjo me deu. Para a terr;. die pesavam, Ja não se er^' liam ao ceu.

Cegóu-me essa luz funesta De enfeitiçíicins amores... Fatal amor, n ígra hora Foi aquella hora de dores I Tudo perdi nessa hora Que provei nos seus amores O doce fel do deleite, O acre prazt > das dores.

E as minhas asas brancas. Asas que um anjo me den« Penna a pendia me cahiram.»* Nunca mais voei ao ceu.

Almeida Ganett, Floreõ sem fruto, ed. de 1858, pá^ 184-186.

II

Ignoto Deo

Creio em ti. Deus: a viva De minha alma a ti se eleva. E's : o que és nSo sei. Deriva Meu ser do teu : luz. . . e treva,

600 iJiToiíOou roBtiÁ

Em que-- indistinctasl se envolve

Este espirito agitado,

De ti vem, a ti devolve.

O Nada, a que foi roubado

Pelo sopro creador

Tudo o mais, o ha de tragar.

vive de eterno ardor

O que está sempre a aspirar

Ao infinito d'onde veio.

Belleza és tu, luz és tn.

Verdade és tu só. N9o creio

Sen^o em ti ; o olho tíú

Do homem nSo na terra

Bfais que a duvida, a incerteza,

A forma que engana e erra.

Essência I a real belleza,

O puro amor o prazer

Que náo fatiga e n9o gasta. .

por ti os pôde ver

O que inspirado se affasta.

Ignoto Deus, das ronceiras.

Vulgares turbas : despidos

Das cousas vans e grosseiras

Sua alma, raz9o, sentidos,

A ti se d9o, em ti vida,

E por ti vida tem. Eu, consagrado

A teu altar, me prostro, e combatida

Existência aqui ponho, aqui votado

Fica este livro confissio siticera

Da- alma que a ti voou e em ti espera.

A. Garrett, Folhas caidas, 1859, pág. 123.

III

Deus

Nas horas do silencio, á meia-noite,

Eu louvarei o Eterno ! Ouçam-me a terra, e os mares rugidores,

E os abysmos do inferno. Pela amplidão dos ecos meus cantos sôemi

E a lua resplandente Pare em seu gyro, ao resoar nest*liarpa

O hymno do Omnipotente.

Antes de tempo haver, quando o infinito

Media a eternidade, E do vácuo as solidões enchia

De Deus a immensidade, Elle existia, em sua essência envolto,

E fura d elle o nada: No seio do Creador a vida do homem

Estava ainda guardada:

•áouLo zix €01

Ainda entlo do mando os fundamentos

r Na mente se escondiam De Jehovah, e os astros íul^rantes Nos cens nSo se volviam.

Bis o tempo, o Universo, o Movimento

Das mios solta o Senhor : Surge o sol, banha a terra, e desabrooha

N'esta primeira flor : Sobre o invisível eixo range o globo :

O vento bosque ondeia : Retumba ao longe o mar : da vida a força

A natureza anceia !

»

Quem, dignamente, oh Deus, ha-de louvar-te,

Ou cantar teu poder ? Quem dirá do Teu braço as maravilhas,'

Fonte de todo o ser. No dia da creaçSo; quando os thesouros.

De neve amontoaste ; ^

Quando da terra nos mais fundos valles

As aguas encerraste ? ! E eu onde estava, quando o Eterno os mundos

Com dextra poderosa. Fez, por lei immutavel, se librassem

Na mole ponderosa? Onde existia então? No typo immenso

Das gerações futuras ; Na mente do meu Deus. Louvor a Elle

Na terra e nas alturas !

Oh, quanto é grande o Rei das tempestades.

Do raio e do trovão ! QuSo grande o Deus, que manda, em secco estio.

Da tarde a viração ! Por sua Providencia nunca, embalde.

Zumbiu mínimo insecto ; Nem volveu o elephante, em campo estéril, O olhos inquieto.

N8o deu Elle á avesinha o grão da espiga,

Que ao ceifador esquece; Do norte ao urso o sol da primavera.

Que o reanima e aquece ? Nfio deu elle á gazella amplos desertos.

Ao cervo a amena selva,

Ao flamingo os paúes, ao tigre o antro.

No prado ao touro a reiva ? Nlo mandou Elle ao mundo, em lucto e trevas,

Consolação e luz ? Acaso em vSo algum desventurado

Curvou-se aos pés da cruz ? A quem não ouve Deus ? Somente ao ímpio

No dia da afflição. Quando pesa sobre elle, por seus crimes, . Do crime a punição.

603 urroLoau ^- FOBfeu

Homem, ente immortal, que és tu perante

A face do Senhor r És a junca do bré)o, harpa quebrada

Nas mSos do trovador I Olha o velho pinheiro, campeando

Entre as neves alpinas : Quem irá derribar o rei dos bosques

Do throno das coliinas ? Ninguém I Mas ai do abeto, se o sen dia

Extremo Deus mandou 1 correu o aquillão ; fundas raizes

Aos ares lhe assoprou. Suberbo, sem temor, sahiu na margem

Do caudaloso Nilo» O corpo monstruoso ao sol voltando.

Medonho crocodilo. De seus dentes em roda o susto habita ;

Vê-se a morte assentada Dentí enf sua garganta, se descerra

A bocca afogiieada : Qual 'luro arncz de intrépido guerreiro

É seu dorso escamoso ; Como os últimos ais de um moribundo

S>'U grito lamentoso : Fumo z fogo respira quando irado ;

P )rém, se Deus mandou, Qual do norte impellida a nuvem passa,

Assim e]le passou I

Teu n'ime ousei cantar! Perdoa oh. Nume;

Pv rdoa ao teu cantor I Dign> -^ de ti não são meus frouxos hymnos,

b iS si o hymnos de amor. Embor i vis hypocritas te pintem Qual bárbaro lyrano: Mento 1, por dominar com férreo sceptro

( ' vu'go rego e insano. Quciii os crê é um implo! Recear-te

i maldizcr-te, oh Deus; E' o ' rono dos déspotas da terra

Ir coliocar nos céos. Eu, po" mim, passarei entre os abrolhos

í' »s males da existência Traiid iilo, e sem temor, á sombra posto

l; 1 tua Providencia.

Alexandre IL rculano, Potêias^ Lir. i, A Harpa do Crtintô, pif* 5M0.

IV

A Cruz mutilada

Amo-tp oh ! cruz, no vértice firmada Ue esplondidas igrejas:

Amo-te quando á noite, sobre a campa. Junto ao cypreste alvejas;

BÈauLú XIX 60S

Amo-te sobre o altar, onde, entre Incensos,

As preces te rodeiam : Amo-te quarydo em préstito festivo

As multidões te hasteiam ; Amo-te ergruida no cruzeiro antigo,

No adro do presbyterio, Ou quando o morto, impressa noathaude,

Guias ao cemitério ; Amo-te, oh I cruz/até, quando no valle

Negretas triste e só, Nunda do crime, a que deveu a terra

Do assassinado o :

Porém, quando mais te amo. Oh I cruz do meu Senhor, £' se te encontro á tarde,

Antes do Sol se pôr,

Na clareira da serra, Que o arvoredo assombra, Quando á luz que fenece -

Se estira a tua sombra,

E o dia últimos raios Com o luar mistura, E o seu hymno da tarde O pinheiral murmura.

Eu te encontr<!l, n'um alcantil agreste. Meia quebrada, oh! cruz! Sosinha estavas Ao pôr do Sol, e ao elevar- se a Lua Detrás do cíilvo corro. A soledade Nâo te pôd\: v^ler con-::? a mão impia. Que te fcn'T sem f^ó As linhas puras Oe teu perfil. ..íjliad s. t- r.uosas. Oh í mutiUKla cruz, rail.-m de um crime Sicrilego brutnl e i:o imnio inútil I A tua sombra es:;.mpa-se no solo. Como a sombf? de íint'go monumento. Que o tenp^í quasí d^Trcou, truncada. No pedestal ruu^^poso. tm que te ergueram Nossos avós lu me nss( ntei. Ao longe. Do presbylLrJo rnstico mrí.idava O sino os simples «ons p<*'as quebradas Da cordilheira annunciíiiulo o instante Da Ave- Maria ; (\a or iç;!.) singela. Mas solemne, mas sania, em que a voz do homem Se mistura nos c^ntico^ «'uidosos. Que a natureza » nvia ro Teu np extremo Raio de Sol, p.issando fayjtivo Na tangente de te orbe. ao qual trouxeste Liberdade e prod:í-es>o. ^ aue te pa^a Com a injuria c o de^n^ z > e que te inveja Até, na soH ini^», o cs juec mento ! Jl. Hercnlano, A llnrpa do Crente^ pág, 121.

iOi

âmroiumtA «* rouiA

Ganticó da noite

Snnln-te o Sol esplendido Nas Tagas imnoroBas 1 fim trevas o crepusculo Foi desfolhando as rofas I Pala ampla terra alargasse Calada soIidSo ! Parece o mundo um tumulo Sob estrellado manto ( Alabastrina lâmpada, sobe a lua 1 Emúnto Gemidos de aves lúgubres Soando a espaços vSo I

Hora dos melancólicos undosos devaneios r Hora, que aos gostos Íntimos Abres os castos seios I Infunde em nos^^os ânimos Inspirações da I De noite, se um revérbero De Deus nos alumia, Distillam-se de lagrimas A prece, e a prcphccia I Alma enlevada tm êxtase Terrena não é I

Antes que o somno tácito Olhos nos cerre, e os sonhos Nos tomem no seu vórtice, rindo, e medonhos. Hora dos Céus, conversa-me No extincto e no porvir.

Onde oi que amei? 8umiram*se. Onde o que eu fui ? d^ixou-me.. Ddlei, vans memoiias; De mim, resta um nome. No abysmo do pretérito Desfez-se choro e rir.

Desfez-se I e quantas lagrimas. Brotaram de alegrias f Desfez-se ! e quantos júbilos Nasceram de agonias i Teu curso, ó Providencia, Quem o sondou jamais ? Que horas d*esi'hora tacita Me irSo desa brocha nd<^? ' Quantos nSo fez cadáveres .Num leito o somno braodo I Vir-me-hSo co'a aurora próxima..» As saudações ? os ais ?

Se o penso, tremo, aterro-me. . Porém, se ao Pae Supremo Remonto o meu espirito. Exulto : já*nSo tremo, A alma ihe dou ; reclino-me No somno sem pavor. Cl^ama me ? ascendo á pátria ; Poupa-me ? aspiro a ella. Scrvir-te ou ver-te, e amarmo-nosf Que sorte, ó Dt us, tão bella I Vem 1 cerra as minhas pálpebras. Virgem do casto amor !

António Feliciano de Castilho, Eslrêoê poéiiéOB-rmihcau, ed. de 1907, pig. 75i.

VI

A Lua de Londres

I

É noite ; o astro saudoso Rompe a custo um plúmbeo céu, Tolda-lhe o rosto formoso Alvacento, húmido véu, Traz perdida a côr de prata. Nas agoas n3o se retrata, NSo beija no campo a flor, NSo traz cortejo de estrellas, N8o falia d 'amor ás bellas, Não íalla aos homens d'amor.]

Meiga lua I os tens segredos Onde os deixaste ficar ? Deixaste-os nos arvoredos Das praias d 'além do mar? Foi na terra 'ua amada. Nessa terra tio banhada Por teu límpido clarão ? Foi na terra dos verdores, Na pátria dos meus amores». Pátria do meu coraçSo 1

•âouio xiz

eos

Oh I que íol : deiuste o brilho Notlmontes de Portuga^ LA onde nasce o tttmUho, Onde ha fontes de crista ; LA onde veoe|a a rosa» Onde a leve mariposa Sc espaneja á Inz do sol ; onde Dens concedera Que em noites de primavera. Se escntaiK o rouxinol.

Das ddades a princeza Tens aqni, mas Dens e^^ Nfto quis dar-lhe essa lindesa Do teu e meu Portugal ; Aqui a industria e as artes, Além de todas as partes A natureza sem véu ; Aqui oiro e pedrarias. Ruas mil, mil arcarias, Além ... a terra e o céu.

Tn vens, ó lua, tu deixas Talvez ha pouco o pais Onde do bosque as madeixas tem um flóreo matiz. Amaste do ar a doçura. Do azul céu a formosura Das Bgçtis o suspirar, O>mo has de agora entre gelos Dardejar teus raios bellos Fumo e névoa aqui amar ?

Vastas serras de tijolo. Estatuas, praças sem fim Retalham, cobrem o solo Mas n9o me encantam a mim ; Na minha pátria uma aldêa Por noites de lua cheia Ê tão bella, e tao feliz ! . . . Amo as casinhas da serra Co a lua da minha terra Nas terras do meu pais.

Quem viu as margensdo Ljma, Do Mondego os salgueiraes, Qvem andou por Tejo a cima Por dma dos seus cristaes. Qnem foi ao meu pátrio Doiro Sobre fina arêa d'oiro Halos de prata esparzir, N8o pôde amar outra tena Nem sob o céu d 'Inglaterra Doces sorrisos sorrir.

Eu e tu, casta deidade, Padecemos egual dôr, Temos a mesma saudade. Sentimos o mesmo amor ; Em Portugal o teu rosto De riso e luz é composto, Aqui triste e sem clar9o. Eu sinto- me contente, E aqui lembrança pungente Faz- me negio o coração.

Eia, pois, ó astro amigo, Voltemos aos puros céus, Leva-me, ó lua, comtigo Preso n'um raio dos teus, Voltemos ambos, voltemos Que nem eu, nem tu podemos Aqui ser quaes Deus nos fez, Terás brilho, eu terei vida, Eu livre e tu despida Das nuvens do céu inglês.

J. de Lemos, O Trovador, 1848, pá^. 362-365.

VII

O sino da minha terra

Tange, tange, augusto bronze Ten som alegre e festivo, Despertando echos do peito, Faz-me ficar pensativo I

Era assim que tu cantavas Quando nasceu minha mSe. Quando a viste ser esposa. E após ter filhos também.

UUD

iJITOLOOU roísiA

Choraste»a quando ao sepolchro. Longe idéa tSo funesta I Eia assim que te alegravas Todos 08 dias de festa.

Era'a8iim que tu folgaste Quando fui, débil menino, Mergulhar .nas santas aguas O meu corpo pequenino.

Era assim que ao Ceo di£Ías. Acompanhando a oraçSo. Mais um roubo a Satanaz, Para Deos, mais um Christão

Tange, tange, augusto bronze, Teu som alegre e festivo A cada nova pancada, Me torna mais pensativo.

Quantas vezes me chamaste Em meio de meus folguedos, A louvar c'o povo todo Da Igreja lindos segredos I

Ora á missa convidando, Ora ao solemne sermão, Ora a invejar os anjinhos Que levava a Procissão.

Eu era doido no templo Cos sons do orgam sagrado, Canto, insenso, ramalhetes, E c'o tl^nco illuminado.

Minha" prfr s mal snbidns Eram tocl..s d'innocencia, Inda os lábios recusavam As preces da penitencia.

Oh I como tu me recordas N'essa voz enternecida, Doce viver d 'essas horas Da aurora doce da vida I

Tange, tange,' augusto bronze. Teu som, casado commigo, A cada nova pancada Me torna mais teu amigo.

As vezes nas horas quentes Quando eu brincava e sorria, Vinhas tu brrdar-me reza Que é chegado o meio dia !

Ás vezes n'hora da testa Acordava ao ten clamor. Era um christio que pedia A vizita do Senhor.

Ás vezes junto da noite Tristinho amando um retiro, Tu me afagaste enlaçando Teu suspiro ao meu suspiro.

. Ás vezes também vieste Dizer- me com voz de ferro, Caminha p'ra aqui agora Do teu amigo o enterro I

Eu chorava . . . eras forçado» Era a mão do atroz sineiro, N9o eras tu, que buscava Ser da morte o pregueiro.

Tange, tange, augusu) bronze. Teu som casado com migo, A cada nova pancada Me torna mais teu amigo.

Com que esp'ranças vi saudar-te Lavrador, que a lida insana Deixava, para c*os filhos Ir demandar a cabana !

Com que ledlce t*e$p'ravam Ternos qmantes d'a'.dela I Tu lhes dizias a hora Em que inda é morta a candeia.

Em que a voz tem mais doçura. Tem o peito mais desejos, S9o os risos mais mimosos, Sflo mais suaves os beijos.

Nada disso eu conhecia, Mas .ua voz feiticeira, Nio me era nunca indiffrente. Nunca me foi estranjelra.

Hei vivido de ti longe, Desde a infância nSo te ouvi De novo agora te escuto. De novo a infanda senti.

Vou partir. . . talvez p'ra sempre Levem-me os echos da serra Estes sons, que heide amar sempre, O sino da minha terral

8Í0UL0 ZIZ 607

^Splnda aqui ^er morrer. Tange, tange, angusto bronze

Ikmb iio*inea funeral. Teu som, casado commlgo,

B «e for em terra alheia, Inda na morte me agrada,

Rmpdtt o alheio signal. Inda aili sou teu amigo.

I. de Lemos, ibid.^ pág. 24-25.

VIU

O Firmamento

Gloria a Deus 1 eis aberto o livro immen80«^

O livro do infinito, Onde em mil letras de fulgor intenso

Seu nome adoro escripto. Eis de seu tabernáculo corrida Uma ponta do véu misterioso : Desprende as asas remontando á vida, Alma que anceias pelo eterno gôso !

. Estrellas que brllhaas nessas moradas, Quaes sâo vossos destinos ? Vós sois, vós sois as lâmpadas sagradas

De seus umbraes divinos. Pnllulando do seio omnipotente, E sumidas por fim na eternidade, '<

Sois as faíscas do seu carro ardente Ao rolar atravez da imensidade.

E cada qual de vós um astro encerra,

Um sol que apenas vejo, Monarcha d*outros mundos como a terra

Que formam seu cortejo. Ninguém pode contar-vo-;: quem pod :ra Esses mundos contar a que daes vida. Escuros para nós qual nossa esphera Vos é nas trevas da ampIid5o sumida ?

Mas vós brilhaes, no fundo accesas

Do throno soberano: Quem vos ha de seguir nns profundezas

Desse infinito oc>^ano? E quem ha de contar-vos nessas Dlajras - Que os céus ostentam do brilhante aWura, L& onde sua mão sus.em r s vagas Dos soes que um dia romperíío na altura ?

E tudo outr'ora na mudez Jazia, r Nos véus do frio nada : Reinava a noite escura ; a luz do dia

Era em Deus concentrada. Elle fallou? e as sombras n'im moniento Se dissiparam na f>mpi*'lão distante I Elle fallou { e o vasto firm > mento Seu véu de mundos desfraldou ovante I

606 AaTOLooiA FoaflU

E tudo despertou, e tudo gira

Immerso em seus fulgores ; E cada mundo é sonorosa Ijra

Cantando os seus louvores. Cantae, ó mundos, que seu braço impelle, Harpas da creaçSo, faxos do dia, Cantae louvor universal A'quelle, Que vos sustenta, e nos espaços gtila !

Terra, globo que gera nas entranhas

Meu ser, o ser humano, Que és tu ^om teus vulcões, tuas montanhas»

E com teu vasto oceano ? Tu és um grão d'areia f rrebatado Por esse immenso tuibilhSo dos mundos Em volta de seu throno levantado Do universo nos seios mais profundos.

E tu, homem, que és tu, ente mesquinho

Que subeibo te elevas, Buscando sem cessar abrir caminho

Por tuas densas trevas? Que és tu/com teus impérios e colossos? Um átomo subtil, um frôxo alento: Tu vives um instante, e de teus ossos restam cinzas, que sacode o Vento.

Mas, ah ! tu pensas, e o girar das orbes

A' raz9o encadeias ; Tu pensas, e inspirado em Deus te absorves

Na chamnia das ideias: Alegr^i-te, immortal, que esse alto lume N9o morre em trevas dum jazigo escasso,! Gloria a Deus, que num átomo resume ^ O pensamento que transcende o espaço,!

Caminha, ó rei da terra ! se inda és pobre.

Conquista áureo destino, E de scculo em século mais nobre

Eleva a Deus teu hymno ! E tu, ó terra, nos floridos mantos Abriga os filhos que em teu seio geras, E teu canto d'amor reúne ao« cantos Que a Deus se elevam de milhões d'espheras!

Dizem que sem forças, moribunda, Tu vergas decadente ; "*

Oh ! n9o, de tanto Sol que te circumda Teu sol inda é fulgente.

Tu és jovcn ainda: a cad^i passo

Tu assistes dum mundo ás agonias,

E rolas entrando nesse espaço

Coberta de perfumes e harmonias.

BÈomjo xxx 609

Mas ai I tu findarás I alem scintilla

Hoje um astro brilhante ; Amanha ei-lo treme, ei-lo vadlia,

E fenece arquejante ; Que foi ? quem o apagou ? foi seu alento Que extinguiu essa luz fatigada ? Foram séculos mil, foi uin momento Que a eternidade fez volver ao nada.

Um dis, quem o sabe ? um dia, ao peso

Dos annos e ruinas, Tu cahirás nesse vulcão accêso

Que teu Sol denominas ; £ teus irmSos também, esses planetas Que a mesma vida^ a mesma luz inflamma, Attrahidoà emfim, quaes borboletas, CahirSo como tu na mesma chamma.

Entfio, ó Sol, ênt&o nesse áureo throno

Que farás tu ainda, ' Monarcha solitário, e em abandono,

Com tua gloria finda ? Tu findarás também, e fria morte Alcançará teu carro chammejante : Elle te segue, e prophetiza a sorte Nessas manchas que toldam seu semblante.

Que sSo ellas ? talvez os restos frios

D'alguqi antigo mundo, Que Inda referve em borbotões sombrios

. No teu seio profundo. Talvez, envolta pouco a pouco a frente Nfls cinzas sepulchraes de cada filho, Debaixo delles todos de repente Apagarás teu vacillante brilho.

E as sombras pousarão no vasto império

Que teu faxo alumia ; Mas que vale de menos um psalterio

Uos orbes na harmonia ? Outro Sol como tu, outras espheras VirRo no espaço descantar seu hymno, Renovando aos sities onde imperas Do Sol dos soes o resplendor divino.

Gloria a seu nome ! um dia meditando

Outro Céu mais perfeito, O Céu d*agora a seu altivo mando

Talvez caia desfeito. EntSo, mundos, estrellas, soes brilhantes, Qtial bando d'aguias na amplidão disperso, Chocando-se em destroços fumegantes, Desabarão no fundo do universo.

610 iJITOLOOlA FOISU

é

4

EntSo a vida, refluindo ao selo

Do foco soberano, Parará concentrando-se no meio

Desse infinito oceano : Ê, acabado por fim quanto fulfifura, Apenas resta iSo na immensidade O silencio aguardando a voz futura. O throno de Jehovah, e a eternidade 1

de Passos, Poesiae, ed. 1858, pág. 145.

IX

Ave. Cassarl

(A MORTE DE CARLOS ALBERTO, REI DO PIBMONTB)

I

E!-lo, o teu defensor, ó liberdade; Ei-Io no extremo leito ! A' humanidade

O tributo pagou ! Da ncbre espada á lamina abraçado. Viveu soldado-rei, e, rei-soldado,

Sobre a espada expirou !

Rasgou-Iha ovante as margens do destino» Foi-lhe rota bordSo de peregrino

Essa espada leal ! Hoje é cruz I Oo aço puro a cruz resta. Sentinclla da campa, ao mundo attesta

Que o heroe era mortal !

Os (Edidos de um drama incerto e vario Talhar a m-te na purpura o sudário

Deixaram- te ermo e ! Salve, ó rei ! Rei no sólio e no abandono : Mais rei no exílio, do que os reis no throno :

Rei até sobre o pój

II Salvé, ó martyr, coroado Dos espinhos da paixSo; N'uma nova cruz pregado D'uma nova redempçflo ! O teu Gólgotha foi este. Aqui te cobre um cyprefte Muita gloria e multa dór ; Aqui teu marco plantaste; Vencido, aqui triumphaste De ti mesmo vencedor !

O cálix trasbordava : ' = '^ Bebeste o. Foi Deus que o qtdsl Deu a vida á Itália escrava, £ a sua alma ao seu pais*

gáouLo XIX 611

NSo dobra a fronte suprema : Impondo o no diadema Dos estranhos foge á lei, E, holocausto derradeiro. Expia a dôr do guerreiro . Na sepultura do rei !

Fd longa aquella agonia ! Foi curta aquella afQicç9o I Desceu rápida n'um dia ^ D^ cabeça ao coraçSo. Cntre as balas despedidas, I Entre as phalanges caldas, Ficou, tranquillo e de pé. Como o cedro da montanha. Que, da tormenta na sanha, A selvas prostradas !

Pela Itália, Hespanha e França Depois, calado, galgou ; E por momentos descansa Onde o mundo lhe faltou ! Chega, observa, sclsma e pára, O soldado de Novara Quer ter por leito final, Quer por leito das batalhas Este berço de muralhas Que fez livre Portugal.

Onde a nossa liberdade Martyr, heróica nasceu, Pela sua a majestade Heróica e mart^^r morreu. Das glorias tuas, ó Douro, Accrescentaste o thesouro. O que é ligando ao que foi, Cingiu teu braço robusto D 'um heroe ao resto augusto A memoria d'outro heroe I

Ambos firmes combateram Para a pátria libertar ; Ambos do throno desceram Para a vida á pátria dar ; Ambos reis, ambos soldados, Ambos fieis a seus fados, JVlostraram que no porvir Podem ambos muitas ytzcSj No triumpho ou nos revezes, Eguaes da historia surgir.

Ferve o sangue, troveja a batalha ! Tine o ferfo, rebomba o canhão ! Povorosa sibila a metralha, Yarre as fHas, díspersa-as no chSo,

612 AHTOLOou-— roasu

galopam, se Imbebem, se enlaçam Uns nos outros rivaes esquadrões ; Corpo a corpo ferventes se abraçam Em sangrentos, cruéis turbilhões.

No lampejo do gladio vermelho Fulge o raio que a morte vibrou ! . . . Sem sen filho a gemer deixa um velho, Sem esposo uma esposa deixou !

D'e8sa immensa procella de guerra. Doesse ardente e confuso stridor, Que ficou? Uma c'rôa por terra, Uma beila captiva, um senhor !

Pobre Itália, t9o bella e tHo triste No teu vasto, florido jardim 1 Fói-te ingrata a fortuna, caíste ; . Mas a queda d*um povo tem fim !

Infelizes ! Da turba guerreira Fica um resto, que, prompto a morter, ^obre a face c'o a rota bandeira, Para ao menos a affronta não ver !

Mudos prantos os rostos consomem Dos valentes de Goito.. . Que adeus i... Era a sombra d'um rei e d*um homem, Que passava em silencio entre os seusj

E passava. Expirar não lograra \ Sob o golpe que em vSo procurou ;

Mas a vida que o ceo lhe deixara Entre os braços da pátria a deixou.

IV

Salve, Salve, ó magestade Moribunda a succumbir ! Como o espinho da saudade Te havia fundo pungir ! Como o homem sofíreria Do monarcha na agonia ! Longe do que era tâo seu^ Da esposa e filhos briosos, E dos campos seus formosos, £ do seu formoso eco !

«Pátria, adeus ! Itália minha, «Oh ! terra que tanto amei I «Se nSo te fiz ser rainha «Não quis mais também ser rei I a Adeus, margens do Tessino, «Sentença do meu destino 1 a Adeus, povo que escolhi; «Sê tu justo, e livre e forte, c Possa dar-te a minha morte «O que era vida não venci I

«AoiJu> jax

613

i^i'%

Awlm diria; e, lançando Os olhos em de-redor. £ vendo aíflicto e chorando Outro povo aquella dôr. Resoluto accrescentara : «O Soldado de Novara «Morre contente afinal, «Morre ao ecco das batalhas cN'este berço de muralhas «Que fez livre Portugal

José da Silva Mendes Leal Júnior, Canticoa, ed. 1858, pá£s. 327-132.

X

O marinheiro

Para adormecer n*um rio, Junto aos pés duma cidade, Não foi feito o meu navio Que zomba da tempestade. ' Leva as ancoras! desferra ! Larga, larga, deixa a terra ; Iça longo e sem parar ! . Fora sobres e cutelos í Uma talha aos enderbelos ! Ancora toda a beijar !

Larga essas velas de pióa ! Gavia grande, todo o pano ! Meu navio é uma c'rôa Sobre a fronte do Oceano. Eu sou rei, aqui domino ! A estrella do meu destino no mar brilha feliz. Quando sopra o vento forte, Seguindo sempre meu norte, Que me importa o meu paiz ?

Onde nasci ?. . . não o digo, Porque nâo o sei ao certo ; Quando busquei um amigo Achei o mundo dv^serto. . , tive contentamento. Quando ouvi a voz do vento Nas gavias a sibilar ; Quando, sem medo ao perigo. Tive as nuvens por abrigo, Achei consolo em chorar. . .

E chorei ouvindo as pragas Dos meus rudes companheiros •, Mas tomei amor ás vagas Na fúria dos aguaceiros. Se á rouca voz da tormenta.

Vinha a onda turbulenta Quebrar dentro do convez, Eu pasmando a contemplava ; A vista me fascinava O abysmo que tinha aos pés.

Cada vez que o mar bramia» Solto o ca bel lo na fronte. Os meus braços estendia Para a curva do horisonte. Sempre de na coberta, Sobre a abobada deserta Adivinhava o tufão ; D'olhos no tope dos mastros. Aprendi a ler nos astros A vinda do furacão.

Assim fui homem, primeiro Que de homem tivera a idade! A escola do marinheiro, E' a voz da tempestade- Oh ! do leme, encontra! arriba! Folga a bujarrona, e giba Olha as bolinas de ré!- Caça a draiwa e o traquete ! Ala velacho, e joanete. de longo! bate o pé.

Temos vento L^.s-Nord-Este, vai o cabo dobrado. Faz piôa de sudoeste; Aguenta o leme ! cuidado. Passa talha na retranca. Olha a escota I volta franca! Arria mais. . . de vagar. . . Volta ! volti ! -Site e meia : O vento não esjaccia ; Corre assim, que é bom and^^.

'é9

614

AHTOliOOlA rOMLÀ

Meu paiz é nestes maies. Meus campos estes banzejros. Este navio meus lares, Minha fomilia os pampeiros ! Diz-me a voz do cataclismo, Qne dormirei neste abysmô Aos cecos do temporal; Envolvido nestas vellas, Como o anjo das procellas, On como o génio do mal !

Com fnria o mar se alevanta E ás nuvens cuspindo a vaga, Pda tremenda garganta, O laes das vergas alaga ? O espaço todo se abala.

Se o trovSo rugindo estala E o raio lança dos cens : Mas o navio nf o treme. Que a minba mio vai no leme» E sohre eila a mio de Deus.

Corre, meu fino velleiro. Até que no ceu se apague A estrella do marinheiro. Depois que a onda te esmague; Que venha, atravez do espaço. Do senhor o occulto braço Tuas pranchas deslocar : Tu és da terra inimigo. Por isso virás comigo Dormir no fundo do mar»

Fianclsco Gomes d' Amorim, Cantos matuiinoê^ ed. 1858, págs. 46-51.

XI

O voto d'Elrei

Ô milagre dariêtimo e evidemU t

Camões.

EiQ que pensas? que tens? que fixa ideia. Em quanto um mundo anneX2S, te sopêa ?

Onde, inquieto assim, vaes ? Sêris quem és, e ver que mais te agrade, Que o aspecto do fausto, o dos sarçaes, E o silencio de um ermo, que a cidade I

Deixas tudo o que, em torno, te sorri, Tudo o que do esplendor, que espalhas, vive, E sobes, do píncaro o declive, E lá, triste e esquecido até de ti. Ficas horas I ... O que ha que tal motive ?

Dize, porque antepOes, Aos coxins de brocado, a rocha brava. Em que do raio o gume, em chammas, giava O Nome, que ahi no âmbito, os trovões

Proclamam com voz cava ?

Pcrque á c'rôa^ que, em brilho, egual nSo tem, £ que, ennrstrada em louros, domina

Do Estreito áquem e alem, Picfcics os aljoíres da neblina. Que a fronte, em febre, rociar-te vem ?

fliODLO VX. 615

Qae fozes onde, só, bem vês que habita. Entre as vrzes e o ar, Seu ninho, a águia , e a cella, o cenobita? £m que é que, inteira» essa attenç9o se fita ? O que bnscaSf ó rei, a olhar. . . a olhar ?. . .

E é . . . nSo onde a vaga,^ em flor, espuma Nos eternbs vae-vens, Mas onde da agua o anil se esvae na bruma. Que tu postos, ó rei, teus olhos tens !

Que te falta V o que esperas De climas* que talvez s9o chimeras?

Quem te ha-de vir de ? Que planos concebeste? em que é que scismas?

Através de que prismas, Teu espirito o futuro ahi vendo está?

Oh ! e agora que o sol d'aureas scentelhas fra^nja ao ar o véo, e em seus clarões Banha o penhasco e os valles, te ajoelhas No chio húmido, e as mSos, orando, põesl

^ E que fef vor 1 que mystlca doçura I

1 Ver K.m ti se afigura,

i Em eztasi, Tjrcpheta, no Synail

Que de o^âo c essa, ^

Em que a alma, integra, aos lábios se arremessa, \ £ toda n'um pedido se contráe ?

O' Virgem do Restêllo, Dizia humilde o rei, Se eu chego a merecé-Io, Ouvi o meu appêllo, E os olhos nos volvei, A mim, e á minha grei.

«D'aIto mysterio um sêllo Toda esta ci^ presa tem. Toda I e poder rompê-lo, O' Virgem do Restêllo, vós, e mais ninguém.

« Parece-me ainda vfi-lo I Sáe, dobra o cabedelo. Ao largo mar se fez ; E passa o dia, o mes, Dous annos. . . e, a escondê-lo. Sempre esta névoa . . . vês, O' virgem do Restêllo ?

«Ha tanto tempo |n ! Onde é ouc elie estará, O* Vargem do Restêllo ? Quem poderá deté lo? O que o detém por ! A guerra? os soes? o gelo? Ai I quando é que virá !

616 AaroboeiA roHiA

m^

«E, ó Virgem do Restêllo, dentro podeis !ê-lo. . Se o plano herança é De nm rei, de reis modelo, Moveu-se a commettè^lo, Nfo a ambiçflo, a fé.

* este ardente zelo De cultos dar á cruz. . . Vós bem deveis sabê-lo, O' Virgem do Restêllo. Ao feito 'audaz me induz.

NSo heis-de proteg6-lo? N9o me direis que sim,

O' Virgem do Restêllo? Pedir-voro, hoje, vim; Viria, se fazê-lo Preciso fosse assim. De rastos e em cabello.

Que q* éreis? que vos convém,

Que exprima o meu desvelo? Com claustro um templo?... Bem. Se a frota agora ahi vem. . D'aqui promelto erguê-lo, Do orago de Bethlem, Qual vossa ermida o tem, O' Virgem do Restêllo.,

ra da Cunha, Selecta, ed. 18 79, pág. 84-93.

XII

Saudades do céu

ó mãe, quem semeou tantas estrellas N'esse abysmo que estás a contemplar? Quem deu ás ondas, que me inspiram medOj As pérolas que tens no teu coUar?

Seria aquelle Deus riijos decretos Nos roubar jm mfu pne e meus irmãos, E para ouem. de joelhos sobre o leito, Ergo ao tiiíJiar-me ns pequeninas mãos?—

•Foi esse. foi! tu como elle é grande. Que tanros astros espalhou nos céus! QuetanTíJ? io<ns escondeu nos mares! tu como elle é grande, aquelle Deosl,

ulflin/). xtx 617

O' ^ie, que linda noite! Em noites d'esta8 En «into os anjos sobre mioi passar: Quem me dera também as asas puras Que os voos lhe sustentam pelo ar!

Estremeceu a mie. Depois, convulsa, Ao palpitante seio o filho uniu ; ' Rebentaram-lhe ;sis lagrimas dos olhos, E o n^enlno a sdsmar nem mesmo as viu.

N'esie noite, ao deitar-se, o bello infante Ergueu de novo as pequeninas 'mios, Mas quando o sol lhe penetrou no quarto Tinha partido em busca dos irmãos !

QmOhiumt Bra^a, Heroê t Violetas, p. i, pág 225.

XIII

Ás mães

O' santas que emballaes o berço das creanças,

E assim lh'o revestis de flóreas esperanças !

Que andaes sempre a cuidar das almas por abrir,

E a verter-lhes no seio o gérmen do porvir!

Sois vós que« pela mão, da gloria á vida inquieta,

Levaes um vosso filho, um pailido propheta,

Que é Newton ou Petrarcha, Angelo ou Raphael,

Com o pincel e a penna, o compasso e o cinzel.

Fazendo ennobrecer quem llie seguir o exemplo. .^

Sois vós que o conduzis aos pórticos do templo

Onde o porvir coroa os génios immortaes,

E, mal chegadas lá, de todo o abandonaes«

Sem aguardar sequer nas sombras d 'uma arcada

A grande acclamaçâo que lhe festeja a entrada I

E modestas que sois! voltaes a vosso lar

E vos contí nt^es em vê-lo atravessar

Croada de lauréis a fronte scismadora

Um arcotriumpnal que o ceica d'utna aurora...

Mas nós, cabeças vãs, cscríivos pelo amor,

Andamos a dizer: "Beatriz I Leonor!.

E o nome vosso, ó màes, n^o lembra um instante l

Quem sabe o nome vosi.o, ó mães de Tasso e Dante?

Ó santas, perdoae ! tendes o Senhor A cobrir- vos de luz, de bençios e d 'a mor, Fazendo abrir ao sol as vossas esperanças.

Ó santas, eraballae o berço das creanças! Gf Braga, Heras e Violetas^ p. i, pág. 249.

G18 ' ANTCLOOU P0B9IA

XIV

Velha Farça

Rufa ao longe um tambor. Dir-se-ia ser o atranoo D' um mundo que desaba ; ahi vae tudo em tropel ! Vio vèr pasHar na rua um velho saltimbanco £ uma fera que dança atada a um cordel.

O' funambulos vis, comediantes rotos. O vosso riso alvar agrada á muItldSo 1 E quando vós passaes o archanjo dos esgostos Atira-vos a flõr que mais encontra á trAo l

vae tudo a correr : sflo as grotescas dansas D*un8 velhos animaes que foram cruéis E agora v9o sof frendo os risos .das creanças E os apupos da turba a troco de dez reis.

Conta um velho histrião» descabellado e pallido, Da fera sanguinária o instincto vil e mau, E vae chicoteando um urso meio invalido Que lambe as m9os ao povo e faz jogo de páo.

Depois inclina a face e obriga a que Ih'a beije A fera legendaria olhada com pavor : E um-i dcosa gentil, vestida de bareje, Annuncia o piodigio a rufo dt tambor !

E as mães erguem ao collo uns filhos enfezados Que nunca tinham visto a luz dos europeis : E accresce á multidão a turba dos soldados, Ao ilota ds cidade o escravo dos qui.rieis. '

E o funambulo grita ; impõe qual evangelho A' turba extasiada a grande narraçSo. E sobre um c9o enfermo um onrangotango velho Passeia nobremente os gestos de tru&o.

Correi de toda a parte, aligetrae o passo, Deixac a gr;mdc lida e vinde á rua vêr As prendas d'iima fera, as gallas d'um palhaço, E um archanjo que sua e pede de beber!

A tua imagem tens ó povo legendário No cómico festim que mal podes pagar. Pois tu aii.dc' és no mundo o velho dromedário Que a varj do histrião nas praças faz dansar.

Gailherme de Azevedo, A Alma Novã^ pá]!. 17.

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I

XV

O teu lenço

O lenço que tu me deste Trago*o sempre no meu seio, Com medo que desconfiem D'ondee8te lenço me velo.

As- letras que bordaste Sflo feitas do teu cabello ; Por mais que o veja e reveja, Nunca me farto de vê-lo.

De noite^ dorme comigo, De dia tr^^go-o no seio. Com medo que os outros saibam D'onde este lenço me veio.

Alvo, da côr da açucena, Tem um ramo em cada canto ; Os ramos diz^m saudade. Por isso lhe quero tanto.

O lenço que tu me deste Tem dois corações no meio ; tu no mundo é que sabes D'onde este lenço me veio.

Todo elle é de cambraia, O lenço que me offertaste ; Parece que inda estou vendo A agullia com que o bordaste.

Para o ver até me fecho No meu quarto com receio. Não venha alguém perguntar- D'onde este lenço me veio*

A scismar neste bordado Nlo sei até no que penso ; Os olhos trago-os gastos De tanto olhar para o lenço.

Com receio de perdê-lo Quardo-o sempre no meu seio. De modo que ninguém sailM D'onde este lenço me veio.

Nas letras entrelaçadas Vem o meu nome e o teu ; Bemdito seja o teu nome Que se enlaçou com o meu !

Por isso o trago escondido, Bem guardado no meu Selo, Com medo que me perguntem D 'onde este lenço me veio.

Quanto mais me ponho a vê-lo» Mais este amor se renova ; No dia do meu enterro Quero levá-lo p*ra cova.

Vem pô-lo sobre o meu peito. Que eu hei de te- lo no Feio ; Mas nunca digas ao munio O 'onde este lenço me veio.

José Simões Dias, Peninmlares, ed. 1899, pá|<. 195197.

XVI

Alguém

Para alguém sou o lyrio entre os abrollios, E tenho as fcims idoaes do Cbristo ; Para algu^^m so-j a v!da e a luz dos olhos, E se na terra existe, é porque existo.

Fsse alguém, q'ie prefere ao namorado Cantar das aves min^u'' rude voz, NSo és tu, anjo meu ido-atrado ! Nem, meus amigos, é nenhum de vós !

€20* AMTOU>«U rowtA

Quando alta noite me reclino e deito Melancholico, triste e fatigado, Esse alguém abre aa asas no meu leito, E o m&u som no deslisa perfumado.

Chovam bençSos de Deus sobre a que chora Por mim além dos mares! esse alguém t' de meus dias a esplendente aurora. £*s tu, doce velhinha, oh minha Mie I

Gonçalves Crespo, Obraê comyletoê^ pá£. 105.

/ XVII

Mater-Dolorosa

Quando se fez aO largo a nave escura, Na praia essa mulher fícou chorando, No doloroso aspecto figurando ' A lacrimosa estatua da amargura.

Dos céos a curva era tranquilía e pura. Dos gementes alcyones o bando VMa-sc ao 'onge, em circulo, voando Dos mares sobre a cérula planura.

Nas ondas se atufara o sol radioso, F a lun .«•ucccdera, astro mavioso, Do aivôr banhando os alcantis das fragas. . .

E aquella pobre mSe, não dando conta Que o sol niorrêra, e que o luar desponta, A vi''ta embtbc na amplidão das vagas.

Gonçalves CrespQ, Ihid,

XVIIl A Judia

C(»rria brinda a noite; o Tejo era sereno; a riba, silenciosa ; a viríição subtil; a lup, mi p!ono azul erguia o rosto ameno; no ctu, inteira paz; na terra, pleno abril.

T. ;<'o iinv r longínquo; airoso barco ao largo l K. '; >i. í'i reo listão do Tejo ao manto azul; c <■*.• ;t ija.i:reza ao celestial hthargo; ti<./uini nítidos sons as virações do sul.

Ó rK.'1'rs de Lisboa! ó noites de poesia!

Ill rs c' ti.,s d'iiToma! cspIcnd'do luar!

\;is ' s jitroujs «m flor! suovissiira harmonia!

tiúiibpii«.ntc, piofundo, infindo, o ctu e o mar*.

mIcuLo XIS 621

Se a triste da judia ousasse ter desejo de pátria sobre a terra» aqui prendera o seu: nm bosque sobre a praia, um barco sobre o Te{p, e eleito da minh'alma um coração meu !. .

Corria branda a noite; immersa em fanda magoa fui assentár-me triste e no meu jardim ; ouvi nm canto ameno ! e urr barco ao lume á^agatí vogava brandamente. A voz dizia assim :

«Dormes? e eu velo, seductora imagem,

Srata miragem que no ermo vi; orme Impossível que encontrei na vida! dorme, querida , que eu descanto aqui!

Dorme! eu descanto a acalentar-te os sonhos» virgens, risonhos, qpe te vem dos céus : dorme; e nSo vejas o martyrio, as iliaguas, ^ que eu digo ás aguas e não conto a Deus !

Anjo sem pátria, branca fada errante, perto ou distante que de mim tu vás, ha de seguir- te uma nudade infinda, hebreia linda, que doimindo estás.

Onde nasceste? onde brincnste, ó bella,

rosa singela que nP.o tens jardim ?

Em Jafâ? em Malta ? em Naiorcth? f)o Egypto?...

mundo infinito, e tu s^m berço? ! oh ! sim,

folha que o vento da fortuna impelle, victima imbe'le que um tu''áo roubou! flor que n'um vaso se alimenci, cresce, ri, desparcce e nunca m.is voltou !

Filha d'um povo perseguido e nobre, que ao mundo encobre o seu martyr.o, e crê: sempre Ashevcro a perconer a espheía ! desgraça austera! inabalável fé!

porque ha de o lume de teus ollios bcllos, mostrar-mc aniulcs d'infinito ardor V porque esta chammi a con:sumir-me o seio?... Deus de permeio nos maldiz o ; mor!. ..

Peito! meu peito, porque anccias tanto? pranto! meu pranto, basra já, n^o mais! é sina, é sinal ^cm:^da^. voUt^mos; nSo n'a acordemos.. . para «.^iiê, :r. 'is .-^^s?

Dorme, que cu v^Io, siductora imspcm, grata mus^(;n\ que no ermo vi ; dorme Impo>sivei que encontrei na vidai dorme, querida, que eu não vo tu a^ui!»

622 AITOLOOIA FOMIA

Sumlu-se a barca, e eu chorava debruçada sobre o Tejo ; a aragem trouxe-me um beijo que nos meus lábios toinei . . ergui-me cheia d'affecto; vi scintillar inda a esteira da barquinha feiticeira, e disse ás auras : « Correi !

trazei-m*o I quero contar-lhe . o fundo tormento enorme *. da judia que não dorme a penar d 'ignoto amor I voael trazei- me o seu nome, o seu retrato, o seu canto, uma baga do seu pranto. . . que venha I o meu trovador I . . .

Al, nSo 1 que ha na minha historia

que lhe sua vise a tristeza?

Nasci na triste Veneza,

onde perdi minha m^e ;

acalentaram-me lagiim^s

que derramava a saudade,

na desgraçada cidade

que não tem pátria também.

Cresci", meu pae uma noite disse-me : « E' tempo agora ; ergue-tc ao romper da aurora, vamos partir amanha ; vamo$ vêr as terras santas, sepulchros de teus monarchas; a pátria dos patriarchas. desde o Egypto ao Chanaan.

Fui, corri o mappa inmenso das montanhas da Jiid<.:a; ai, patrra da raça hcbrtia ! ai» desditosa Sião ! que extensos montes sem relva I que paragens sem conforto, . onde se estende o Mar- Morto e onde serpeia o Jordão! . . .

Aqui, de Hemor os vertigios;

de Ziphe, aiém o desrto; longe, o Si nay encoberto: d'Horeb o morro, infla além; d'csie lado, o Mar-Vermelho; d'aqiiclle. . . nada! un^ destroços: rui nas, campas sem ossos, e, £0 fuiiL-o, Jerusalém.

•áouLo zix 628

Meu pae chorava, e eu chorava, vendo morta e sem prestigio, terra de tanto prodígio, maldita agora de Deus. Tudo silencioso, estéril, tudo vastos camiterios onde ruinas d 'impérios ficaram por mausoléus!

« Meu pae disse eu tenho sede. »

«Vê filha, a aridez do m jnte: Deus dava ao ermo a fonte em que bebia Ismael >

«Pae, cansei; mostra-me a pátria, quero dormir sem receio. .

«Filha, ericosta-te ao meu seio que não tem pátria Israel. »

Em todo o mundo cstranjcira, toda a vida p. regrina ! Vede se ha mais triste sina : ser rica e n9o ter um lari Sempre a lenda do Asheverol sempre o decreto divino! sempre a expulsar-me o destino, como AbraSo á pobre Agar!

Que pôde valer á hcbreia sentir n'alma chaoiir-a infinda, como a linda Ksther «^or linda e amada como Raclinul? Se o coração da Judia se entre-abre do í.mor aos lumes, nSo lhe tempo aos perfumes o seu destino crud.

Ai! trovador nazareno, n8o ''oltes, tenho receio... Dizes que é Deus de permeio? nSo, blasphcmpstts; Deus, n5o Pôs o mundo essô impossível entre o desejo e a vcntuia; o amor cli?ma-lhe loucura, e o preconcfito ra^ã).

Deus é Deus, e um existe ; cego é o mundo, e váriij a crença ; mas esta cúpula ímmcnsa é tecto de t(jdos nós : este ambiente que respiro, da lua e do so! os briloos, hSo de ser de nossos fill os, foram de nossos avós.

624 ▲■TOLOOIA EOMlA

Mas se a èrença nos separa e o mundo exige o supplicio, dê-se o amor em sacrifício^ deixaiido-se o pranto á dôr ; eu, cerro o peito é ventura ; tu, esmaga o teu desejo ; nSo mais virei |anto ao Te}o. . . nio voltes mais, trovador !

Thomáf Ribeiro, Sonê que pasêam, ecL 1898, pá£. 173-18L

XIX

A vida

Foi-se-me pcuco a pouco amortecendo A luz que nesta vida me guiava. Olhos fltos na qual até contava Ir os degráos do tu.nuio descendo.

Em seella annuveando, em a nio vendo, se me a iuz de tudo annuveava ; Despontava ella apenas, despontava Logo em minha alma a luz que ia perdendo.

Alma gemca da minha, e ingénua e pura G)mo os anjos do ceo (se o uâo sonharam. . .) Quis mostrar-me que o bem bem pouco durai

Não sei se me voou, se m*a levaram ; Nem saiba eu nunca a minha dc^sventura Contar aos que inda em vida não choraram...

Ah I quando no seu collo leclinado, Collo mais puro e cândido que arminho, Como abelha na flor do rosmaninho Osculava seu Iibio pe fum?do ;

Quando á lui dos seus olhos (que era vél-os^ E enfeitiçar-se a almn em graça tanta !; Lia na sin bocca a Biuiia santa Escripta cm letra côr dos seus cabellos;

Quando a sm m?íosiiiha pondo um dedo Em seus lí:r Ob do ro?a puuco aberta. Como timiH.-i ponib-i st mpre alerta, Me impunha ora silencio, ora segredo;

Quando. C(v u) p alvéola, delicada E linda c. mu a flui que liaja mais linda^ Passíiva coir.o o cy^ne, ou tomo ainda AnrLb do slI «aiar nuvem doirada ;

BÍ0I7I.0 zix 625

Quando em bálsamo de alma piedosa Ungia as mSos da supplice Indigência, . G)m a nuvem nas mios da ProWdenda Uma lagrima estllla em flor sequiosa ;

Qnando a cruz do collar do sen pescoço Estendendo-me os braços, como estende O symbolo de amor que as almas prende. Me dizia. . . o que ás mais dizer nao ouço ;

Quando, se negra nuvem me espalha Por sobre o coraçSò algum desgosto, Condiegando-me ao seu cândido rosto No perfume de um riso a dissipava :

Quando o oiro da trança aos ventos dando È a neve de seu collo e seu vestido. Pomba que do seu par se ia perdido. de longe lhe ouvia o peito arfando;

Quando o anel da bocca luzidia, Vermelha como a rosa cheia de agua. Em beijos á saudade abrindo a magua, Mil rosas pela face me esparzia ;

Tinha o céo da minha alma as sete cores, Valia-me este mundo um pâraiso, Distillava-me a alma um doce riso, Debaixo de meus pés brotavam flores !

Deus era inda meu pae ; e em quanto pude Li o seu nome em tudo quanto existe. No campo em flor, na praia árida e triste, No céo, no mar, na terra e. . . na virtude I

Virtude ! Que é mais que um nome Essa voz que em ar se esvae, Se um riso que ao lábio assome Numa lagrima nos cae !

Que és, virtude, se de luto Nos vestes o coração ? E's a blasphemia de Bruto: Nao és mais que um nome vão

Abre a flor á luz, que a enleva, Seu cálix cheio de amor, E o sol nasce, passa c leva Comsigo perfume e flor!

Que é d'esses cabellos de oiro Do mais subido quilate, D'esses lábios escarlate, Meu thesoirol

62Í AiTOLoou rouiA

Que é d'esse faallto que ainda O coraç9o me perfuma ! Que é doesse collo de espuma, Pomba linda !

Que é d 'uma flor da grinalda Dos teus doirados ca bei los! Doestes olhos, quero vê-los. Esmeralda ;

Que é d 'essa franja comprida D'aquel!e chaile mais leve Do qu : a nuvem côr de neve. Margarida !

Que é d'essa alma que me deste, D'um sorriso, um que fosse, Da tua bocca tSo doce, Flor celeste 1

Tua cabeça que é d'ella, A tua cabeça de oiro, Minha pomba! meu thesoirol Minha eitrelia !

De dia a estrella de alva empallir* ce ; E a luz do dia eterno te ha ferido i Em teu languido olhar adormecido Nunca me ura dia em vida manheoetiel

Foste a concha da praia ! A flor pan oe Mais ditosa que tu ! Quem te ha pTitidOf Meu caiix de cristal on 2 bei bebi^ o Os néctares do céo. . . e um céo i ouveMe I

Ponte pura das lagrimr que horc , Quem t9o mrnina e moça destr. tí\ 'lado Te ha peias nuvens os cabellos de iro!

Scme-te, vela de baixel q ebrado 1

Some-te, vôa, apaga-te, meteoro!

E*^ mais neste mundo um desgraçado.

E as desgraças podia prevê-las Quem n terra sustenta no ar, Quem sustenta no ar as estrellas, Quem levanta ás estrellas o mar.

Deus podia prever a desgraça

Deus podia prever e nSo quis I

E n9o quis, n9o. . . se a nuvem qne pim

Também pôde chamar-se infelitl

SÉOULO XIX Í2f

A vida é o dia de hoje, A vida é^i que mal soa, A vida é sombra que foge, A vida é nuvem que voa ; A vida é sonho tão leve Que se desfaz como a neve. E como o fumo se csvae ; A vida dura um momento. Mais leve que o pensamento, A vida leva-a o vento, A vida é foi ha que cae I A vida é flor na corrente, A vida é sopro suave, A vida é estrella cadente, Vòa mais leve que a ave : Nuvem que o vento nos ares, Onda que o vento nos mares, Uma após outra lançou, A vida penna cabida ' Da asa de ave ferida De valle em valie impellida A vida o vento a levou 1

Cbmo em sonhos o anjo que me afaga Leva na trança os lirios que lhe puz,

E a luz quando se apaga

Leva aos olhos a luz 1

Levou sim, como a folha que desprende De ama flor delicada o vento sul,

E a estrella que se estende

Nessa abobada azul ;

Como os ávidos olhos de um amante Levam consigo a luz de um terno olhar,

E o vento do levante -

Leva a onda do mar !

Como o tenro filhinho quando expira Leva o beijo dos lábios maternaes,

E á alma que suspira

O vento leva os ais 1

Ou como leva ao collo a mSe seu filho» E as asas leva a pomba que voou,

E o sol leva o seu brilho. . .

O vento m'a levou !

E Deiís, tu és piedoso. Senhor! és Deus e pae! E ao filho desditoso NSo ouves pois um ai! Estrellas destes aos ares,

€S8 AlTOLOeiA PoasiA

Dás pérolas aos mares, Ao campo dás a flor, Frescura dás ás fontes, O lirlo dás ao montes, E roubas-m'a, Senhor !

Ah ! quando nnma vista o mundo abranjo. Estendo os braços e, palpando o mundo, O céo, a terra e o mar vejo a meus pés. Buscando em v&o a imagem do meu anjo. Soletro á froixa luz de um moribundo Em tudo : Talvez I . . .

Talvez I é hoje a Biblia, o livro aberto Que eu ponho ante mim nas rochas quando Voa pelo mundo ver se a posso ver ; E onde, como a palmeira do deserto. Apenas vejo aos pés inquieta ondeando A sombra do meu sêr !

Meu sêr. . . voou na asa da águia negra Que, levando-a» nSo levou comsigo

D'esta alma aquelle amor ! E quando a luz do sol o mundo alegra, Chrisallida nocturna a sós commigo

Abraço a minha dor !

Dor inútil ! Se a ílor que ao céo. envia Seus bálsamos se esfolha, e tu no espaço Achas depois seus átomos subtis, Inda has-de ouvir a voz que ouviste um dia..« Como a sua Leonor inda ouve o Tasso. . . Dante, a sua Beatriz I

Nunca ! responde a folha que o outono. Da haste que a sustinha a mão abrindo,

Ao vento cqnfiou ;

Nunca ! responde a campa onde do somno E quem talvez sonhava um sonho lindo,

Um dia despertou !

Nunca I responde o ai que o lablo vibra ;

Nunca ! responde a rosa que na face

Um dia emmurcheceu : E a onda que um momento se equilibra Emquanto diz ás mais : Deixae que eu passe

E passou e. . . morreu I

João de Deus, Campo de Flores^ ed. de 1896, pág. 205»214«

^

«

M^OUIA TXX 629 ^

XX

Rachel

Despe o luto da tua soledade

E vem junto de mim, Urio esquecido

Do orvalho do Ao I Tens nos meu^ olhos pranto de piedade* E se és, mulher ! irmft dos que hiosofírido.

Mulher ! sou irmSo teu.

Consolos nSo te dou, que nSo existe Quem de lagrimas suas nunca enxuto

Possa as do outro enxugar : N8o pôde allivios dar quem vivetrlste^ Mas é-me doce a mim chorar se escuto

Alguém também chorar.

Botfio de rosa murcho á luz da aurora ! Que peccado equilibra o teu martyrío

Na balança de Deus? ^e é como justo e bom que elle se adorip Quem te ha mudado a ti, ó rosa, em Hrío,

£ em li rio os lábios teus ?

NSo enche clle de bálsamos o callx Da flor a mais humilde, a esses espaços

NSo enche ejle de luz? NSo veiu o Filho seu, lirio dos valles ! por amor de nós pregar os braços

N*os braços de uma cruz:

Mulher, mulher ! quando cu num cemitério Levanto o dos túmulos sósínho :

Eis, digo, eis o que eu sou ! Mas, quando penso bem n*csse mysterio Da virtude infeliz : Vae teu caminho;

Do's mundos Deos creou I . . .

Deus n3o rMspara a setta envenenada A' pombinha, que aos ares despedira,

Com miio traidora e vil ; Imagem su:i, Deus nSo volve ao nada. Não anniquilla a flor que ao chão cahira

d'csse eterno abril I

Has-de, cysne, expirando alcançar teu canto; Hás-de quando a lua da montanha

Te acene o extremo adeus, Voar. Cândida, ao céo, e ébria de encanto No oceano de amor que as almas banha,

Unir teu canto aos seus.

40

^9D AlTOLOeiA POMU

I

Seus d'ellas, mSe e irmS. . . cinzas cobertas D 'um lanço de terra. . . Oh desventura 1

Oh destino cruel 1 Ve)o*as ainda ir com as mãos incertas Qniando-se uma á outra á sepultura,- E a mfle : « Rachel ! Rachel I »

Desde então, á Janella do ocddente

Te h&o de ver como a bússola em seu norte

Fita pensando. . . em que? Oh ! nfio n'os voes também, pomba innocentejl E' grande a eternidade e é certa a morte:

Espera, vive e crê 1

J. Deus, i^td, pá^s. 215-217.

XXI

A Víctorla Colonna

Ha nSo sei quê divino, força é ciê-lo N'esses teus ol! os de um:i luz tão pura Que ao vê-los, tive logo por segura A eterna paz que é meu consta me anhelo.

Filha de Deus, nossa alma aspira a vMo; Desprezando caduca formosura Ella em seu ^iio eterno procura A forma, o typo univeisal do belio.

NSo pôde amar, não deve, uma alma casta

Fugaz belieza, giaça transitoiia.

Coisa que o ttnipo Icva^ o tempo gasta*

Nem também alma digna de tnemoria Pôde amar o prazer que o buto arrasta, Em vez do puro amor sombra da gloria*

I. DcBS, Ubiáy pág. 623.

XXII Á Virgem Santisslnrta

Num sonho tcdo feito de incerteza, De nocturna e indizível anciedade, E* que eu vi teu olhar de piedade E (mais que piedade) de tristeza...

NSo era o vulgar brilho da bcUeza, Nem o ardor bí.nal da mocidade, ' . Era outra luz, era outra suavidade Que até nem sei se as ha na natureza. ••

■iCbXO XIX 631

Um mystico soffrer. . . uma ventura - Feita do perdão, da ternura E da paz da nossa liora derradeira . .

Ó visio, visSo triste e piedosa ! Fita-me assim calada, assim chorosa. .. E deixa-me sonhar a vida inteira !

Anteio do Questal, 90Ktios completOB, tá, de 1890, pág. 88.

XXIII

Na mâo de Deus

Na mão de Deus, na sua m9o direita, Descansou a tiiui n.eu coração. Do palácio enaiitat^^ da I Ilusão Dlsd a passo e \yooSu a escada estreita.

Como as flores m*. rtaes, com que se enfeita A ignorância infantil, despojo vao, Depuz do Ideai c da Paixão A forma transito u imperfeita.

Como criança, cn lubrega fornada, Que a mãe leu .. í io agasalhada E atravessa, soniiido v<igcimente,

SelvaSf mares, areias do deserto... Dorme o teu som no coração liberto. Dorme na mSo de Deus eternamente !

A. do Quental, ibid., pág. 121.

XXIV

Anima mea

Estava a Morte ali, em pé, deante. Sim, deante de mim, como serpente Que dormisse na estrada e de repente Se erguesse sob os pés do caminhante.

Era de ver a fúnebre bacchante I Que torvo olhar ! que gesto de dementei E cu disse-lhe: Oue buscas, impudente, Loba faminia, peio mundo errante?»

Não temas, respondeu (e uma ironia Sinistramente oxtriinha, atroz e calma, Lhe torceu cruelmente a bocca fria).

( ^,2 iurroLOOiA pomia

Ea nSo bnsoo o teu corpo. . . Era um tropliéo Glorioso de mais. . . Basco a tua alma. » Respondi4he: «A minha alma monenl»

A . de Qnentil, ilnd,, pá£. 82.

XXV

Aparição

Pelas espadas que tu tens no peito« Pelos teus olhos roxos de chorar» Pelo manto que trazes de astros feito, Por esse modo tio lindo de andar ;

Por essa graça e esse suave geito, Pelo sorriso (que é de sol e luar) Por te ouvir assim sobre o meu leito, Por essa voz, baixinho: «Ha-de sarar. . »

Por tantas bençSos que eu sinto n*alma. Quando chegando vens, assim tSo calma, Pela cinta que trazes, côr dos céus :

Adivinhei teu nome, AppariçSo! Pois consultando manso o coraçSo Senti dizer em mim « A m&e de peus

^ '.lónio Nobre, Despedidoê^ 1902, pá^. 8.

XXVI

Ao cair das folhas

A minha irmã Maria ia OUrto,

Podessem suas mSos cobrir meu rosto« Fechar-me os olhos e compôr-me o leito. Quando, sequlnho, as m9os em cruz no peito» Eu me fôr viajar para o Sol-posto.

De modo que me faça bom encosto O travesseiro comporá com gelto. E eu ta m feliz ! Por nSo estar af feito, Hei-de sorrir, Senhor, quasi com gosto.

Até com gosto, sim f Que faz quem vive Orpham de mimos, viuvo de esperanças» Solteiro de venturas que nSo tive?

Assim irei dormir com as crianças, Quasi como elias, quasi sem peccados. . . E acabarão emfim os meus cuidados.

/ ir lio Nobre, Ibid.

BiOULO ZIX C'''l

XXVII A Vida

Olha em redor, poiza os teus olhos ! O que ves ?

O mar a uivar ! A espuma verde das marés I

Escarros I A traiçSo, o ódio, a agonia, a inveja I

Toda uma cathedral de lutas, uma igreja

A arder entre clarões de cóleras ! O orgulho

Insnpportavel tal o meu, e o sol de Julho !

Jesus i Jesus! quantos doentinhos sem botica I

Quantos lares sem lume e quanta gente rica !

Quantos reis em palácio e quanta alma sem ferias f

Quantas torturas! Quantas Londres de miseiias!

Quanta injustiça ! quanta dor! quantas desgraçasl

Quantos suores sem proveito ! quantas taças

A trasbordar veneno em espumantes boccas ! ' v

Quantos martyrios, ai I quantas cabeças loucas,

N'este macomio do Planeta I E as orfandades !

E 08 vapores no mar, doidos ás tempestades I

E os defuntos, meu Deus ! que o vento traz á praia (

E aqnella que nSo sae por ter uzada a sala !

£ os que sossobram entre a vaidade e o dever!

E os que têm, amanha, uma lettra a vencer !

Olha essa procissão que passa : um torturado

De Infinito I Um rapaz que ama sem ser amado^

E para ser feliz fez todos os esforços . . .

Olha as insomnias d 'uma noite de remorsos,

Como dez annos de prizio maior-cellularl

Olha esse tysico a tossir, á beira-mar. . .

Olha o bebé, que teve Torre de coral

De lindas iUuzOes, mas que uma águia, afinal,

Devorou, pois, ao vê-la ao longe, avermelhada,

Cuidou, ingénua ! que era carne ensanguentada !

Quantos s9o, hoje? Horror I A lembrança das datas. .

Olha essas rugas que têm certos diplomatas !

Olha esse olhar que têm os homens da politica !

Olha um artista a ler, soluçando, uma critica...

Olha esse que nSo tem talento e o julga ter

E aquelle outro que o tem. . . mas n9o sabe escrever I

Olha, acolá, a Estupidez ! Olha a Vaidade I

Olha os Afflictos ! A mentira na Verdade !

Olha um filho a espancar o pae que tem cem annos!

Olha um moço a chojar seus cruéis desenganos!

Olha o nome de Deus, cuspido num jornal ! *

Olha aquelle que habita uma Torre de sal,

Muros e andaimes feitos, nao de ondas coalhadas.

Mas de outras que chorou, de lagrimas salgadas!

Olha um velhinho a carregar com a farinha

E o filho no arraial, jogando a vermelhinha !

Olha a sair a bana a galera Gentil

E a Anna a chorar p'lo João que parte p*ro Brazil f

Olha, acolá, no cães uma outra como chora :

E' o marido, um ladrão, que vae «(p'Ia barra fora I

Olha esta noiva amortalhada, num caixão...

634 ÀMTQL%QIA rOMlÂ

Jesus I Jesus I Jesus ! o que ahi vae de afílicçlo ! O* meu amor ! é para ver tantos abrolhos, O' ílor sem elles ! que tu tens tAo lindos olhos ! Ah ! foi para isto que te deu leite a tua ama, Foi para ver, coitada ! essa bola de lama Que pelo espaço vae, leve como a andorinha, A Terra ?

O' meu amor !. . . antes fosse cegulnha

A. Nobre, SÓy ed. de 1892, pá£. Í1M13.

XXVIII

Ave Marias

Nas nossas ruas, ao apoiteoer. Ha tal soturnidade, ha tal melancholla, Que as sombras, o bulicio, o Tejo, a maresia Despertam- me um desejo absurdo de soffrer.

O ceu parece baixo e de neblina, O gaz extravasado enjõa-me, perturba ; E •$ edifícios, Com as chaminés, e a turba Toldam-se d'uma côr monótona e londrina.

Batem os carros d'aluguer, ao fundo, Levando á via férrea os que se v9o. Felizes ! Occorrem-me em revista exposições, países : Madrid, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo I

Semelha m-se a gaiolas, com viveiros, As edificações, somente emmadeiradas : Como morcegos, ao cair das badaladas, Saltam de viga em viga os mestres carpinteiros.

Voltam os calafates, aos magotes. De jaquetSo ao hombro, enfarruscados, seccos ; Embrenho-me, a scismar, por boqueirões, por beccoi^ Ou erro pelos cães a que se atracam botes.

E evoco, então, as chronicas navaes : Mouros, baixeis, heroes, tudo resuscitado ! Lucta Camões além salvando um livro a nado ! Singram soberbas naus que eu nÍo verei jimais!

E o flm da tarde inspira-me; e Incommoda I De um couraçado inglês vogam os escaleres ; E em terra num tinir de louças e talheres Flammejam, ao jantar, alguns hotéis da moda.

Num trem de praça arengam dois dentistas ; Um trôpego arlequim braceja numas andas ; Os cherubíns do lar fluctuam nas vaiandas; A's portas, em cabello, enfadam-se os logistas !

BÈGXJhO ZIX

Vasam-se os arsenaes e as offidnas ; Reluz, viscoso, o rio, apressam-se as obreiras ; E nam cardume negro, hercúleas, galhofeiras» Conendo com firmeza, assomam as varinas.

Vem sacudindo as ancas opulentas ! Seus troncos varonis recordam-me pilastras ; £ akrnmas, á cabeça, embalam nas canastras Os fihos que depois naufragam nas tormentas.

Descalças ! Nas descargas de carvSo, Desde manha á noite, a bordo das fragatas ; B*^apinham-se num bairro aonde miam gatas, E o peixe podre gera os focos de infecçfto !

Veide, O Livro de Cesário Verde, 1901, páa. 60.

XXIX De tarde

N'aqueUe «pic-nic» de burguezas, Houve uma coisa simplesmente bella, E que. sem ter historia nem grandezas, - Em todo o caso dava uma aguareila.

Foi quando tu, descendo do burrico, Foste colher, sem imposturas tolas, A am granzoal azul de gr3o de bico Um ramalhete rubro de papoulas.

Pouco depois, em cima d*uns penhascos Nósacan.párnos, inda o sol se via; E houve tallir«das de melão, damascos, E p2o de molhado em malvasia. '

Mas, todo purpuro, a sahir da renda Dos teus dois seios como duas rolas. Era o supremo cncr.nto da merenda O ramalhete rubro das papoulas I

C Tcidc, ibid. páj{. 69.

XXX A mãe e o filho morto

A pobre da mSe cuidava Que o fi.hinho inda vivia, E nos braços o apertava 1 O coraf/So quo batia Era o d'o.ll;», e não d(. filho 'íue do som no da morte Havia instantes dormia.

CW AnOLOOlA POUIA

Olhei, e fiquei absorto Na d6r d*aquel)a mulher

£e tínha, sem o saber, I braços o ^llio morto I

Rcsava, e do fundo d^alma ! Em quanto a infeliz resava O pobre infante esfriava I

Quando gelado o sentira, O grito que ella soltou, Men Deusl que dôr expressou I

Pensei entfio : A mulher, Para alcançar o perd&o De quantos crimes tiver, Na fervorosa oraçlo Basta que possa dizer : «Tive um filhinho, Senhor, E o filho do meu amor Nos braços o vi morrer I

BmlkSo Fali, Cantoê e Salyroê, 1873. pág. 29.

XXXI

No serão (fragmento)

▲o VISCONDE DB BBNÁX.GANFOB

Sio OS teus olhoSi menina dois gominhos de maça. . Quem me dera a mim trincal-sa- em jejum, pela manliZ.

E o serfto começou. Tudo é festejo. . .

Rompe a banza de Paulo alegre harpejo».

E agora, ó da flada, haja quem toque diz Theresita. Diz e o seu galante áqueila voz, que o intima, ergue o chapéo, encara o céo, prepara a voz, mais a rima, desce o bordfio, sobe a prima, e canta.

A viola está bem alta, mas por aUa nada perde, a voz a mim nSo me falta ; vou cantar a canna verde.

•áciTLO xiz 637

■*•♦

Ó Cannlnha, ó verde caniia, ó filha do cannavial,

eu namoro ama tricana I

mas em bem» que nem-]a em mal.

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)

m

NSo tem o aol ondas de oiro ' ao descair no sol posto como as do cabello loiro, que lhe inunda todo o rosto.

Os olhos duas estrellas e da côr da noite o olhar, mal desunidos sobre ellas dois arcos ne^^ros a par.

A fronte da côr da lua, as faces côr da manhS... Madurece côr da sua a pelle de uma maçã.

A boquita, conjecturo que Ih'a fizeram as fadas das metades orvalhadas de um morango bem maduro.

Por isso, quando ^ucccde resplrar-lhe a gente a fala, morre-se a gente de sede e, o que appetece, é trincara.

Tão pequena, tSo pequena, que a gente ás vezes nem sabe, quando suspira de pena,

se um ai ! por ella lhe cabe !

Nao vem no rio pedrinhas a rebolar nas corientes

tão lustrosas, tfio branquinhas, como o esmalte dos seus dentes.

Nem ha no raiar do dia, quando a cstrella empallldece, não ha d^aquella alegria, que ao seu sorrir amanhece !

O pescoço côr de neve nas vistas pela alteza. Rosas de tal gentileza querem hattil, que as eleve.

De descabidos, coitados ! os hombros pena veros, talvez de tBo carregados com o pezo dos cabellos.

638 ÂSTOLOG1A FOBSIÂ

D' uma vez enamorado o amor pousou- lhe no seio, e, áquelle doce embalado, adormeceu-lhe no meio.

Tem umas mSos tSo pequenas, que n3o se me dava um dia de lhes dar um beijo apenas,

a ver se o beijo cabia.

Os pésinhos tomam banho em duas gotas d'orvalho I vejam, d'aquelle tamanho, quando a levam, que trabalho I

Quando canta na ribeira de saias arregaçadas, ficam as aguas paradas a adorar a lavadeira.

E d'alli até aos mares tudo 89o conversas ternas sobre miragens de olhares, Sobre esculpturas de pernas.

Mas retrato seu perfeito n9o tem ella um, srn9o aqui dentro do meu peito gravado no coraç9o.

Fernando Caldeira, Moeidadeê^ 1882, pág. 84.

XXXÍl

Missa das almas

Altas horas. Ao vicio a febre, sem desça nço. Povoa de visões a treva abafadiça. Ent9o na muito velha egreja, muito manso, Um sino velho* relho acorda e toca á missa.

Em tempos bons tangeu repiques ás centenas. Baptismos festejando e deslumbrados noivos: Rachado agora, o som que vibra alcança apenas O termo a que attinglr um bálsamo de goivos.

Rangem portas. Fieis velhinhas pelas ruas Vão tossindo e gemendo, arfando, ennoveladas; Sombras, com vivo amor pcla« alminhas suas, São nuacias sem falhar das frescas madrugadas.

UACULQ XI t (^30

Na ermida a noite escura acolhe-se affectiva; Sós, duas velas põem, de lume ao ceu direito. Na Senhora do altar três pontos de luz viva, Nos olhos e na espada a atravessar-lhe o peito.

Um padr^e um sachristSo, dos dois qual mais velhinho Dobrados como anzoes, de frontes como neve, D*alva e sobrepelliz d'alvinitente linho, Um vago alvor no escuro abriram muito leve.

Velhas, da noite irm9s, na sombra, velha amiga, Quanta vis8o lhes surge, ai, quanto sonho idéami O padre resa 6 intróito e o sacristão mastiga Um latim acabando cm juventutem meam,

E logo, por milagre, em cada peito arrulha Uma saudade azul que estende as azas, corre, Que da aurora ideal nos altos céos mergulha, Sabendo que vive o que na terra morre.

Pelos olhos sem brilho e alguns talvez sem vista, Todos postos cm alvo, o antigo amor perpassa, De tempos mortos lume, estrellas em revista, Puríssima visão cheia de luz e graça.

A missa continua, a cada olhar devoto

Rasga a treva buscando um mundo em que se interna.

Buscando n'esse mundo outro que foi, remoto,

E uns olhos em que vive a chaidade eterna.

Tem cânticos de arrolo o ciciar da prece, ' As alminhas têm sede. a missa é de defunctos; EntSo sob a vetusta abobada parece Ouvir-se o revoar de muitos pombos juntos.

Ao levantar a Deus, correm pelo ar livores; Ao som da caiiipainha, a luz ajuda a festa; Já, como n'um bafejo, os pálidos vapores Esfumam, ao de leve, um traço a cada aresta.

Um tenuissimo véo de seda lumino<:a Tehdeu-se pela cal do tecto e das columnas; Nas velas muda a chamma a côr em côf de rosa; Albergam toda a sombra as concavas tribunas.

Á missa vai no fim. O pndre deita a bençam. Radiante surge o dia embalsam: do e loiro. As velhas a benz3r-se, olhando os muros, pensam Que uma frota do cqo navega em rios d 'oiro.

E cuidam que é, decerto, a aurora que as encanta Eas aquece e as perfuma, o resplendor somente Da» almas, que as reveste, alAm. na terra santa, D'onde ao mundo as evoca uma oração fervente.

640 .àVTOLOOlA POMIA

B tonham inda mais que, um dia muito perto, Hlo Ir também buscando, ao despontar da aurora, N*nm barco de topasio o porto em céos aberto. Puxando a cada remo uma alma que se adora.

Dia daro. Fechou-se a porta. As velhas descem. O sol no azul palpita esplendido e risonho. E cilas vio, sem dar das coisas que florescem, As lidas entretendo a prolongar o sonho.

Dt Mo da Caman, A Cidade, 1908, pá<. 67.

XXXIII As Mondadelras

Por entre os trigos as mondadelras Enchem as várzeas de cantorias, Herva damnlnha, que bem que cheiras Nasces e afrontas as sementeiras E é por isso que n9o te crias.

As mondadelras andam nas mondas. De rego em rego, sentpre a cantar, Troncos curvados, sncas redondas, Braços roliços e o peito ás ondas Que não se quebram como as do mar.

Nas terras baixas ou nas vertentes, Alegres ranchos de raparigas, O' mocidade, tu nunca mentes!— Como as cigarras andam contentes, Mas trabainando como as formigas.

Ranchos alegres, mondando as cearas. Que rico assumpto para os pintores! , Lembram vistosoii bandos de araras; Saias, roupinhas de chitas claras, Chapóus redondos lenços de cores.

Desde o sol fora que andam n'aqnella Faina constante pelos trigaes ; O' mondadeiras, tende cautella. Que o parasita que se debella. Se escapa cresce cada vez mais 1

É necessário que o trigo venha De palha grossa, de espiga cheia, Ef quando caia na da azenha, Não seja o caso que ás vezes tenha Joio ou mistura de grSos de aveia.

642 inoLoeiA raotA

Ó sombra da ilusSo, que foi ventan. Fumo que o vento dissipou no ar. De que resta o salmo d 'amargura : Chorar, chorar I

Amélia Janmy.

Diu mFSgurtiê do Pcusado» Dr. Pinto Osório, 227.

PROSA

XXXV

Fr. Luís de Sousa

Manubl de Sousa, sentado num tamborete ao da mesa,- o rosto inclinei: sobre o peito, os braços cahidos e em completa prostração d'espirito t u corpo ; num tamborete do outro lado Jorge meio encostado para a tus^ com as mãos postas, e os olhos pregados no irmão,

MANUEL

Oh minha filha, minha fiihaf (silencio longo) Desgraçada filha, q.c ficas orphan!... orphan de pae e de mãe... (Pausa).,, e de tamilia e uc nome, que tudo perdeste hoje. . . (Levanta-se com violenta afflicção) A dcs^n^j- çada nunca os teve ! Oh Jorge, que esta lemorança é que me mata, que :zt desespera ! (Apertando a mão do irmão que se levantou após d'eUe £ o #s« consolando .do gesto) E' o castigo terrível do meu erro. . . se foi erro.. . cncc sei que nào foi. E babe-o Deus, Jorge, e castigou-me assim, meu irmio!

[JORGE

Paciência, paciência: os seus Juízos s8o imperscrutáveis (Acalma ejes untar o innão : tornam a ficar ambos como estavam).

MANUEL

Mas eu em que mereci ser feito o homem mais infeliz da terra, posto it alvo á irrisão e ao discursar do vulgo?. .. Manuel de Sotisa Coutinho, o tJ:.: de Lopo de Sousa Coutinho, o filho de nosso pae, Jorge.

%

JORGE

Tu chamas-te o homem^ mais infeliz da terra... te esqoeoeste qi< ainda está vivo aquelle. ..

, «

;MANUEL,[cahindo em ii;

£ verdade. (Pausa; e depois, como quem se desdiz) Mas nio é, n^t tanto: padeceu mais, padeceu mais longamentey e t>ebeu até ás fezes o c; -^ das amarguras huminas. . . (Levantando a voz) Mas foi eu, en otie lh*o prc: - rei, eu que lh'o dei a beber, pelas mãos... innocentes miotl d*ciia Infc .

1

sicuLO xiz 64^

que arrastei na minha queda, que lancei n'ésse abysmo de vergonha, a quem cobri as faces as faces puras, e que não tinham corado d'outro pe)o senSo do da virtude e do recato. . . cobri-lh'as de um veo dMnfamIa aue nem a morte ha de levantar, porque lhe fica perpétuo e para sempre, lançada sobre o tumulo a cobrir-lhe a memaria de sombras... de manchas que se nSo lavam t Fui eu o auctor de tudo isto, o auctor da minha desgraça e da sua deshonra d'elles... Sei-o, conheço-o ; e nSo sou mais infeliz que nenhum ?

JORGE

a palavra que disseste : «deshonra : lembra-te d'ella e de M, e con- ddera, se podes pleitear misérias com esse homem a quem Oeus não quis accu- dlr com a morte antes de conhecer ess'outra agonia maior. EUe não tem...

MANUEL

Elle não tem uma filha como eu, desgraçado... (Pausa) uma filha bella, pura, adorada, sobre cuja cabeça oh, porque nSo é na minha! vai cahlr toda essa deshonra, toda a ignominia, todo o opprobrio que a injustiça do mnndo, não sei porquê, me não quer lançar no rosto a mim, para pôr tudo tu testa branca e pura de um anjo que não tem outra culpa senão a da origem que eu lhe dei.

JORGE

Não ó assim, neu irmão, não te ceges com a dor, não te faças mais infe- liz do qtie és. não és pouco, meu pobre Manuel, meu querido irmão! e Deus ha de levar em conta essas amarguras. que te não pôde apartar o cálix dos beiçps, o que tu padeces, ha de ser descontado nella, ha de resgatar a culpa...

MANUEL

Resgate ! sim, para o ceu : n*esse confio^eu, mas o mundo'?. .

JORGE

Deixa o mundo e as suas vaidades.

MANUEL

Estão deixadas todas. Mas este coração é de carne.

JORGE

Deus, Detis será o pae de tua filha.

MANUEL

Olha, Jorge: queresrqne te diga o que eu sei decerto, e que devia ser consolação... mas não é, que eu sou r.omem, não sou anjo, meu irmão devia ier consolação, e é desespero, é a curoa d'espinhos de toda esta paixão que estou passando... é que a minhd fi.ha... .V.aria... a íi'ha do meu amor a filha 00 meu peccado, se Deus quer que seja peccado não vive, não resiste, nío sobrevive a esta affronu. fÍJe^ata a soluçar^ cai com os cotovelos fixos na nesa e as mãos aperta-las no resto; fica nesta posição pot lonf^o tempo. Oa» ^^•W de quando em quando um so uço comprimido, frei Jorge está em d#- ^Aa d'eUe, amparando-o com seu corpo, e os olhos posioê no ceaj

€44 idnQUMiA nMA

JORGB, chanundo timidamente. Manuel I

MANUEL

Que me queres innio?

JORGE» animando-0.

£lla nlo está tSo mal : estive hoje. . '

MANUEL

E$tive8te?* . . oh! conta-me, conta-me; eu n8o tenho*. nSo tive animo de a ir ver.

JORGE

Haverá duas horas que entrei na sua camará, e estive ao do Idto. Dormia, e mais socegada da respiração. O accesso de febre, que a tomou quando chegamos a Lisboa e que viu a mfle n'aquelle estado, parecia declinar... quebrar-se mais alguma coisa. Dorothea, e Telmo... pobre velho coitado!... estavam ao d'elia, cada um de seu lado... disseram*me que nio tinha tor- nado a. . . a.

I . .

MANUEL

A lançar sangue?... Se ella deitou-o do coraçSoI... nlo tem mais. N'aquelle corpo tão franzino, tão delgado, que m?is sangus ha de haver? Quando hontem a arranquei de ao da mãe e a levava nos braços, nfto m'o lançou todo ás golphadas aqui no peito? (Mostra um lenço branco todo man- chado de sangue.) Não o tenho aqui. . . o sangue. . . o sangue da minha vicâ- ma ?. . . que é o sangue das minhas veias. . . que é sangue da minha alma é o sangue da minha querida filha-, (bei/a o lenço muitas vezes) Oh meu Deus ! meu Deus, eu queria pedir-te que a levasses já... e nSo tenho animo. Eo de- via acceitar por mercê de tuas misericórdias que chamasses aquelle an]o para junto dos teus, antes que o mundo, este mundo infame e sem commisseraçSo, lhe cuspisse na cara com a desgraça do seu nascimento. Devia, devia... e nSo posso, nSo quero, não sei, n3o tenho animo, não tenho coraçSo, Peço-te vida meu I)eu8 (Ajoelha e põe as mãos) peço-te vida, vida, vida... para ella, vida para minha filha !... saúde, vida para a minha querida filha!... e morra eu de vergonha, se é preciso ; cubra-me o escarneo do mundo, deshonre-me o op- probio dos homens, tape-me a sepultura uma loisa de ignominia, um epitapl:Jo que fique a bradar' por essas eras dtshonra e infâmia sobre mim!..«. Oh meu Deus, meu Deus ! (Cahe de bruç.s no chão. . . Passado algum tempo, Frd Jorge se chega para elle^ Itvanta-o qiiasi em peso^\e]o toma a assentar).

JORGE

Manuel, meu bom Manuel. Deus sabe melhoro que nos*convém a todos: Põ2 nas suas mãos esse pobre coração, p(5c-n'o resignado e contricto» meu irmio, c Elle fará o que em sua misericórdia sabe que é melhor.

MANUEL, com vehemencia e medo.

Então dcscnganas-me. . . desenganas-me ?... é isso que queres dixer? Falia, homem: nâo ha que esperar d'alli, nSo é assim? dize: morre, morref..* {Desanimado) Também fico sem filha !

■AoDM m HS

JOROB

NSo di$se tal. Por caridade cotntigo, meu irmSo, nSo imagines tal. disse-te a verdade: Maria pireceu-me mencs oppriin>da; dormia...

MANUEL, varianda

Se Deus quiíera qae nSo acordasse!

JORGE

Valha-me Deos !

MANUEL

Para mim aqui está esta mortalha : (tocando no habito) morri hoje. . . vou amortalhar-me logo ; e adeus nido o que era mundo para mim I Mas a mi- nha filha nSo era do mundo. . . não era Jorge ; tu bem sibes que nio era : foi um anio que veio do ceu para me acompanhar na peregrinaçSo da terra, e que me apontava sempre, a cada passo da vida para a eterna pousada d'onde viera e onde me conduzia. . . Separou-nos o archanjo das desgraças, o ministro das iras do Senhor que derramou sobre mim o vaso cheio das lagriqias, e a taça rasa das amarguras ardentes de sua choiera. . . (Cahindo de tom) Vou com esta mjrtalha para a sepultura. . . e, viva ou morta, deixo a minha filha no meio dos homens que a não conheceram, que a não hSo de conhecer nunca, porque eila não era d'este mundo nem para eUe... (Pausa) •— Torna lá, Jorge, vai vê-la outra vez, vai e vem- me díz^r ; que eu ainda não posso. . . mas hei de ir, oh ! hei de ir vê-la e beijá-la antes de descer á cova. . . Tu não queres, não po- des querer. ..

JORGE

*

Havemos de ir. . . quando estiveres mais socegado. . havemos de ir am- bos : descama, has de vê-la. Mas isto inda é cedo.

MANUEL

Qae haras são ?

JORGE

Quatro, quatro e meia. (Vae á porta da esquerda e volta) São cinco ho- ras, peio alvor da manhan que nos vidros da igreja. D'aqui a pouco ire- mos ; mas socega.

MANUEL

Ea outra... a outra desgraçada, meu irmão?

JORGE

Está— imagina por ti está como nSo podia deixar de estar: mas a confiança em Deus pôde muito : vai-se conformando. O Senhor fará o resto. Eu tenho n'este esca pulai io (Tocando no habito em cima da mesa) para ti e para dia. Foi uma resolução digna de vós, foi uma inspiração divina que os alumiou a ambos. Deixa estar; ainda pôde haver dias felizes para quem soube Gonsagrar a Deus as suas desgraças.

MANUEL

E isso está tudo prompto ? Eu não soffro n'estes hábitos, não at«r«, com estes vestidos de vivo, a luz d*esse dia que vem a nascer.

41

646 inOLOGXA— PBOIA

JORGB

, E9tá todo concluído. O arcfbfspo most^rn-fe bom e p^doso prelado n'e8ta occasiSo; e é um san^o homem, e. O arcebispo ejcpediu todas as licen- ças e mais papeis necessários. Coitado 2 O pobre velho veloa quasi toda a noite com o seu vigário para que não faltasse nada desde o romper do dia. Mandou-se ao provincial, e pela sua parte e pela nossa tudo está corrente. Prei João de Portugal, que é o prior de BemRca, e ti^mbem vigarfo do Sacramento, sabes, chegou haverá duas horas, noite fechada ainda, e está; é quem te ha de lançar o habito, a ti e a Dona... a minha irmsn. Depois ireis, segundo vosso desejo, um para Beinfica, outro para o Sacramento. .

MANUEL

Tu és um bom irmSo, Jorge: (Aperta lhe a mão) Deus t'o ha de pagar. (Pausa) Eu nSo me atrevo . . tenho repugnância. . . mas é forçoso peiguntar-te por alguém mais. Onde está elles . . e o que fará !. . .

JORGE

Bem sei, nSo digas mais : o romeiro. Está na minha oella, e de nlo ha de sair que foi ajustado entre nós senão quando... quando eu lh'o disser. Descansa : não verá ninguém, nem será visto de nenhum d'aquelles que o nSo devem ver. Demais, o segredo do seu nome verdadeiro está entrie mim e ti além do arcebispo, a quem foi indispensável communi:á-lo para evitsr todas as formalidades e delongas que aliás havia de haver n'uma separação d'e6ta ordem. Ainda ha outra pessoa com quem lhe prometti nSo pade deixar de prometter, porque sem isso n9n queria eLe entrar em accordo algnm com quem lhe prometti que havia de fallar hoje e antes de mais nada.

MANUEL

Quem ? será possível ? Pois esse homem quer ter a crueldade de rasgar, fevra a fevra, os pedaços d'aquelle coraçSo partido? N8o tem intranhas esse homem : sempre assim foi, duro, desapiedado como a sua espada. C D. Magdalena que eJe quer vérV

JORGE

NSo, homem ; é o seu aio velho, é Telmo Paes. Como lh'o havia de ea recusar?

MANUEL

De nenhum modo \ fizeste bem ; eu é que sou in|usto. Mas o que en padeço é tanto e tal ! . . . Vamos : eu ainda me nSo intendo bem claro com esta desgraça: dize-me, falla-me a verdade: minha mulher .. minha mulher I com que bocca pronuncio eu ainda estas palavras! D. Magdalena o que sabe ?

^ JORGE

O que lhe disse o romeiro n'aquella fatal sala dos retratos... o que te contei Sabe que D. Joào está vivo, mas nfio sabe aonde : suppõe-no ni Palestina talvez; é onde o deve suppor pelas palavras que ouviu.

gáouso za .647

MANUE^

Entio nflo conhece, como eu, toda a extensão, toda a indubitável ver- dade da nossa des^jraça. Ainda bem I talvez possa duvidar, consolarse com algnma esperança incerteza.

JORGE

Hontem de tarde não : mas esta noite começava a raiar-Ibe no espirito alguma falsa luz d*essa van esperança. Deus lh'a deixe se é para bem sen.

MANUEL

Porque nSo ha de deixar ? Não é desgraçada bastante ? E Maria, a pobre Maria ! . . . Essa confio no Senhor que não saiba, ao menos por ora . . .

« *

JORGE

N9o sat>c. E ningaem Ih 'o disse, nem dirá. Não sabe senSo o que viu : a niSe quasi nas agonias da morte. Mas o motivo, se ella o adivinhai. Tenho medo que o faç^ ...

JVIANUEL

Tambeu eu.

JORGE

Deus será coranosco e com ella ! Mas não : Telmo nSo ihe -diz nada por certo; eu lhe asseverei e acreditou-me que a mãe estava melhor, que tu ias logo vê-la.. . E assim espero que, até por meio dia, a possamos conservar em completa ignorância de tudo. Depois ir-se-lhe-ha dizendo, pouco a pouco, até onde for inevitável. B Deus. . . Deus acudirá.

MANUEL

Minha pobre filha, minha querida' filha !

A. Garrett, Frei Luís de Sotisa, acto 3.^, scena ii.

XXXVI

Discurso do Porto Pireu

(peroração)

Os indivíduos morrem ; depois da morte vem a justiça e começa a Immor- talidade das famas honradas, tu nào sou materiaiibta religioso nem politico, espero salvar a minha alma em Jesu Christo, e o meu i redito na lembrança dos Portugueses: nessa esperança certa de icsurreição adormeço tranquillo ao som dos huivos infernaes com que presumiam fazer-me desesperar nesta hora que cuidaram da morte.

Mas nSo é assim das crenças e opiniões politicas; essas nSo morrem, essas precisam desaggravadas cm vida dos que as professam, e por isso as vim hoje defender, e aos seus irmãos em doutrina, dos traiçoeiros ataques de seus inimigos. Por mim, ladrem todas as trcs garfjantas do cao infernal, que nem me importa açaimá-lo de força, nem uma sopa lhe heide deitar para lhe caiiar um latido.

€IB AVKXLOOU-^nMU

■^

Como cidadio nanca renunciei am direito, nem qae me custatse a fazenda, a vida. a pátria : tenho-o provado nos cárceres no exilio, na miscria... Como súbdito nunca faltei a uma obrigaçflo : e nio menos duramente asseiei a minha lea« dade. . .

Como português, nem um pensamento leve. momentâneo, chegou a cml»r-me ainda no cérebro, de que nSo possa vangloriar-me A face do mundo... ' '^

Como funccionario publico, quis mlnba boa estrella que ainda nlo esti- vesse em logar a que podessem chegar nem as suspeitas da inveja. . .

Fraco homem de letras sou, nfio presumo d*ellas ; mas nunca prostitui a minha prosa numa mentira, os meus versos numa lisonja... Fallem esaes opús- culos que a Naçio portuguesa ainda tem a indulgência de ler.

Fraco soldado fui, o último, o derradeiro d'essa phalange em qae tantos morreram para nos immortalizar a todos. Mas nem fiquei nos baiíes de Paris ou nos pasmatoríos de Londres, em quanta os meus compatriotas vinham inoerrar-se nos débeis muros do Porto ; nem a minha mão. apezar de imbelie e doente, recusou pegar na espingarda de soldado, para ficar nas reservas de França e de Inglaterra, manejando a penna censória que tudo achava mau quanto se fazia pelos que expunham a sua vida por elles. Cubrl-me do vestido grosseirb, nutri- me do p9o {(rosseiro do soldado razo, nunca tive outra paga ou outra etapa, fiz como os outros sem ser valentflo; e a debil pegada que o meu obscuro imprimiu nas praicS do Minderlo, hade ficar gravada na historia, como a dos bravos cujos heróicos feitos rodeam de uma aureola de glória os fracos serviços de seus honiados companheiros que, para o commum empenho, n8o deram pouco no que deram porque era quanto tinham.

N8o fomos nós os únicos que estivemos no porto Pyreu. La estavam sem dávida os que vendo estar esses bojudos galIeOcs carregados de urnas e de votos, de actas e de escrutinios, calculando mal a aura popular que lhes infu- nava as velas, imaginaram que toda aquella carga era sua. correram á alfandega, fizeram os gastos do despacho, e ao conheceram a pequena parte que tinham n: sociedade quando viram chegar os donos a tomar posse da maior porçlo da carga.

No porto Pyreu estavam os que suppunham. que nenhum poder cr* possível sen^o o sei ne^ta terra ; e que a Nação se h via de levantar em massa virtuosa^ cada vez que o Ch fe do Estado ousasse quebrar o gue, em sua modéstia, como privilegio exclusivo se arrogavam, chamando fosse quem fosse aos conselhos da Coroa, sem ordem ou, pelo menos, sem consentimento de suas alt^s potencias.

■TTNo porto Pyreu estavam, mis com c perigosa doudice, os que nlo duvidaram transtornar a ordem pú'>líca. fazer correr o sangue pelas ruas para que não entrasse no ministeio um homem fortemente stispeilo de Ordeiro a quem declaram inimigo do Povo e assassino da liberdade e que d'ahi a pouco chimaram initmgns de Povo e assassinos da liberdade aos que tiveram a menor dúvida sobre a cinvenicncta d'es'e mesmo ministero.

No porto Pyreu estacam os que, sem virtudes... ou com ellas, de toda a parte importavam ca^umnias e injúrias que vendiam a retaho, mercadejando da rep tarão dos homens de bem; e quf^, na momentânea crença que suas fal- sidades encontravam no vulgo, imaginavam ter estabelecido perpétua qnc para sempre os fizesse odio>o3 ao Povo, e so para ai ficasse a boa opiniio e credito de honrados exclusivos.

No Porto Pyreu estavam os que sem serviços. .. ou com elles imagina- ram podôr offuscar os de todos os que nSo fossem de sua parcialidade, e con- dem nar a perpétuo ostracismo quantos fizessem sombra a suas pretensOei vaidosas.

iÉoin.0 1X1 § 64f

No porto Pyreu estavam es 'que imaginanm que este honrado PovjO poiingaes se tinha esquecido de que pela Legitimidade lhe viera a Liberdade, qne na fidelidade dos seus Reis tinMa a melhor garantia d'ella, e a única de sua independência; que na religífio de Jesu-Crisco— a so ciença que prokssa a egualdadade do homem tinha o mais seguro amparo e fortalexa de seus diiVltos. Qae assentaram que bastava dizer insultos ao Thrdno para que o Throno ficasse impopular; que bastava mofar da religião, para que o Povo abjuraste a religiflo de seus pães!... O Povo zombou d^clles! I O Pov9 mn n-ot de sua loucura, desinganando-os, amando a religilo. respeitando o Tnrono e querendo a iic>erdade com ambos. O povo foi o seu medico, quei- xem se d'elle se p<'dem, mas as receitas ahi estfio e as visitas do medico, ao mesuM nlo as pagaram. '

A. Garreit, Obroê^ t. ixi, pig, 112-121.

XXXVII

O Mosteiro

Grossos e altos cannelios de ròb'c separam do re^to do templo tmi extenso rec-nto sem sepulchros, immcdiato ao a tar principal: ergue-se no topo cruz agigantada: por um e ontro l?d ) dirjuelie espaço além das grades negrejara duas fi eiras de monjas: mui:as CHtâo de )o Ipos e dtbrjç^djs sobre o primeiro degiau do altar; cm pé, entre as duas fil i as. uma delias, cujos cílios desvair»- áoi reluzem á claridade das to:h s e cujo a pecto severo intunde uma espécie de terror, teu na m\o um punhal, cujo ferro s; m brilho parece lincto em san- gue. Juncto da monj-^ um vuUo de muher vestida de branco sobreiáe no meio ádt virgens cubertas de iucto: unidu ás >;rades que defendem a entrada daquelle recinto, um velho, cujas melenas e longa baibi lhe alvejam soore os bombros e peito, está de joelh js com os braços estondidos através da balaustrada : agi- ta-o uma' convulsão horrível de pjvor, que lh'cmbarga na gargsnta os sons articuliidos e lhe consente murmurar um ruído con'uso. semelhante ao respiro anciosOp do agonisante Um dos dous '^óros de freiras começa a entoar de novo os psalmos: a monja do punhal estende a mio ordenando silencio. Vai falar. Suintila, a ponto de arremessar-se para aqueile lado, pára e escuta as suas palavras. SSo lentas e lugui^itcs, C( mo as de espectro que se alevantasse d'al- gnma das campas derramadas ao longo da ciypta. Dirigc-se ao vulto branco qae está ao seu lado :

«Ainda uma vez. nobre dama, attendci as supplicas do velho buccllario

5tte tenta salvar-no^. Para vós ha c^p^iançi na terra: a nossa mora no céu. luando ot infiéis soiberem que aindi existe na íiespa.iha quem pissa quebrar com ouro o vosso capiiveiro ou vii^cir om forro a voisa affronta. rcspeitario a pureca de nobre virgem. A nós, que não te-nos ningu m no mundo, rcsta- va-nos unicamente o tremendo arbítrio que o Senhor nos inspirou. O martyrie nlo tardará a cingir-nos a fronte dumi aureola de gloria : os anjos de Dtus nos esperam».

A minha ultima resolução, venerável ChMmhllde. 6 atnbar juncto de v6s e de nossas irmans. O mou animj sai á, com) o dVlli^^, illcso da ultima prova que Christo nos peoe na vidi Como ellas, ddrcl sem hesí ar [estcmunho da cruz. O velho bucerano de m:u pie m''nte á própria rofisLÍencia uuando afirma que os infiéis resp-itarSo a pu ezj d : urna donz 'Hti gola : a inf.-mij tem sido escripta por elles na frente das famílias mais Ulusins d.i llctpLnba: o •tt a prostituição é o que árabes oíferecem á innoceocia. £u cscoibo o

050 IHTOlOâlA V0B81A

ctttello : a morte vale mais que a desbcnra Porventura, para a evitar me gnion o Senhor ao mosteiro da Virgem Dolorosa. »

«Seja feita a vontade do Altíssimo »— respondeu a abbadeasa alevan- tando ao céo as mfios, entre as quaes apertava o punhal.

Depois de um momento de silencio, Chrimhiide disse, voltando-se pêra o lado esquerda: Hermentruda, approximae-vos!»

Uma ddS monjas saiu d*entre as outras e veio ajoelhar aos pés da abba- dessa: as suas companheiras ajoelluram também voltadas para o altar; eo bymno que .Suintila ouvira ao descer para a crypta murmurou de novo naqaellas curvas abobadas.

Como no horizonte o sol tremulo e sereno ^ reclina ao fim da tarde no seio tenebroso dos mares, assim o canto melancholico e melodioso das vir- gens foi pouco a pouco enfraquecendo até expirar no cicio de orações submissas. Apenas cessou de todo, um gemido de agonia agudo e rápido soou juncto da abbadessa. Aos olhos de Suintila afigurou-se que o punhal de Chrimhiide des- cera duas vezes sobre a monja que estava a seus pés. Um brado de cólera e horror, saindo involuntariamente da boca do godo, restrugiu pelo templo. Crera o renegado que Hermentruda havia s do assassinada. Pareceu-lhe entSo claro o sentido, das palavras mysteriosas que ouvira. As monjas fugiam ao eaptiveiro do harém pelo ádito do sepulchro. Eiie assistia a uma scena horrenda de suid- i dio, e o braço mais robusto de Chrimhiide apenas era o instrumento cego mo- I vido por todas essas vontades, conformes para morrer.

«Mulher ou demónio, detem-te -^ bradou Suintila, correndo com oi | cheiks e o centenário para o recinto fechado e procurando abrir os fortes .can- ; cellos que lh'embargavam os passos. J

Embebidas no seu drama cruel, nem as monjas nem Chrimhiide volvem i sequer os olhos para os quatro guerreiros, cujas arm?s relusem ao fulgor das tochas. Hermentruda não está morta. Ergueu- se. Tem a cabeça descuberta, os louros cabellos esparzidos, o collo nú. Bem como o aspecto do formoso archanjo de luz no dia em que, rebelde, a espada de fogo lhe estampou na fronte a con- demnaçáo eterna, o sefo e o rosto da monja, suavemente pallidos, estio sulcados por betas escuras, que serpeiam por aquelle gesto, eomo as víboras estiradas ao sol sobre um busto grego tombado entre as ruínas de antigo templo pag9o. E' que, semelhantes ao nordeste frio e agudo, que, passando pela bonina viçosa» lhe desbarata os encantos^^ os fios do punhal de Chrimhiide correram por vio- lentos e rápidos, e num momento ánniquilaram a formosura da virgem.

As grades fechadas interiormente balouçam aos empuxões de Suintila: mas não cedem. «Okba diz o godo a um dos cheiks correi! Chamae oi mais robustos zenetas e os negros de Takrur armados dessas achas a cujo pri- meiro golpe nunca resistiu elmo de bronze. Prestes! Chamae-os aqui. Abdulazia deve ter chegado. Que venha ! Mulher infernai lhe vae destruindo peça a peça os despojos mais ricos, os que eiie destinava para si e para o khalifa. Que ve- nha salv. -los ! Que venha ! Prestes, cheik de Hoara ! »

E, emquanto o cheik galgn a extensa escadaria, os três tentam muitas vezes fazer estour^tr os grossos fcirolhos, que resistem ás suas deligcncias. Arquejando, Suintila abandona a tentativa inútil. Ameaça Chrimhiide: as inju- rias acompanham as ameaças; seguem-nas as supplicas, as promessas, e logOf de novo, as pragas e as affrontas. Baldado é tudo. Chrimhiide lançou ao rene- gado um olhar de compaixão e conservou-se em silencio.

Mss os cânticos cessaram de todo; as monjas saem successivamente de ambos os lados e vem ajoelhar aos pés da abbzdessa ; vem despir as galas dl | formosura e comprar á cusia delias a pureza da virgindade e a palma do martjr- rio. Cada vez mais rápido ranj^^e o punhal nos rollos puríssimos das virgens do mosteiro. O gemado que cxpra comprimido pela constância, se prende coa o que a dòr c a fraqueza mulheril arrancam do seio das victimas ao descer do

BÉotriiO jot 661

primeiro golpe, e a Aleira das que se V&o debruçar sobre os degraus do altar cresce d'inscante a instante aa passo que rareiam as outras duas.

A terrível saceidoiiia parou. Fstá o seu braço cansado de tio largo sacri* fido? Nãol Braço e animo sào robustos, porque os fortalece o espirito do Se- nhor, h' que o momento supremo da morte se approxima. A mourisma jorra subitamente pelo portai estreito, como o rio caudal na caverna que lhe estendia deoaizo do leito e cuja i> bobada fendeu tremor de terra. Os gueneiros negros das tnbus de Takrur« á voz de Abdulaziz que x>s precede» prectpítam-se contra 0% sólidos canceiíos do legar vedado : vinte mjchados ferem a um tempo nas grades, que gemem sob a fuiia dos golpes e mal resistem ás pancadas violentas dos negros possantes, a( s quaes redobra os brios a piesença do amir, cuja co- Itra resfolega eoi maldições e bia«phemias.

Entfè as monja* e os árabes bem curta distancia medeia : e todavia, no mais pequeno recinto, onde soam gtmldos de dores atrozes, onde ri uma esperança, a da monc, ha paz intiíra, ha o céu; aqui, na vasta crypta» onde a ebr idade de fácil iriumpho. a riqueza dos despojos, o futuro de uma larga exis- tência de gloria e deleites sorriem na mente dos infiéis, está o furor insensato, está o inferno. O evangelho c o koran estSo frente a frente no resultado das suas doutrinas. £' sublime a victoria do livro do Nazareno!

Os golpes de machado rcdob am : os troncos affeiçoados do roble come- çam a estourar nas suas juncturas. A uliima freira fora curvar-se juncto aos degraus do altar: a donzeila vtstida de branco vai ajoelhar aos pés de Chrini* hilde, eidamando:

« Para mim também o martyrio ! Salvae-me do opprobio! A tua constância, fíiha, na dura prova de agonia por que tens passado te purificou. uma das monjas da Virgem Dolorosa e vae com tuas irmana re- ceber a coroa de lÃartyr »

O ferro, porém que descia sobre o colio d^i donzeila foi cair com a mSo de Chrimhilde aos pês da cruz gigante do altar. Um tevês do alfange de Abdo» lazizlh'a cerceara: as solidas grades estavam d.'Spedaçadas.

A abbadessa vaciílou e, ao cair, pôde murmurar; «Jesus, recebe a minha alma!»

Foram as suas palavras extremas: um segundo golpe lhe atalhou na gar- ganta o derradeiro suspiro.

As freiras ergueram- se e encàminharam-se para o logar em que jazia o cadáver destroncado da abbadessa. Ajoelharam Juncto deila com a face voltada para a turba dos infiéis. Os seus rostos inchados, e manando sangue, eram dis- formes e horríveis.

«Ao menos tu, serás minha ! exclamou o amir, lançando a mio ao braço dadonztUa vestida de branco, a quem o terror desia scena rapidíssima tornara immrvel, como uma dessas estatuas que patecem orar sobre s sepulchros nas cathedraes da idademédta. Fi hos vslentes do Sudan, conduzi-a á minha tenda. As outras, que as asas do anjo Azraei se entendam sobre os seus cadáveres.»

D'ahi a poucas horas a crypta estava em silencio. As monjas da Virgem Dflorosa jaziam degoladas em voita da venerável Chrimhilde, e as suas almas puras abrigava m-se no seio immenso de Deus.

Â. Herculano, Eurico o Prethytero^ cap. zii, pág. 149-156.

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âfffOLOAu— notA

XXXVIII Umipoeta cego

\

Encetara eu apenas a carreira do estudo, t2o menino, que a onvírem-me ler, e verem- me formar caraoteres, era (nunca a minha vaidade o esqueceu) «m thema de admirações e de felizes prognósticos para os parentes e amigos da família.

De repente uma doença nflo paga com martyrisar-me, nlo contente de balançar-me por um fio largos meses entre a vida e a morte, me atira vivo para am seputchro I Eu respirava ; mas os bellos t. lhos, idolatras das flores e de Amá- lia, e vangloria de minha mSi, nfto sabiam se havfa ainda no ceo o sol de Oeusl B' fmpossivei recordar-me desse praao, prazo de nâo sei quantas eternidades, sem que ainda agora o coração se me confranja.

Imaginai um homem á hora em que se fosse embarcar num bergantim doirado, por um mar de prata, com vir£ções balsâmicas dos vergtis da terri, cuidando velejar hoiisonte em fora para um mundo de delicias. . . e lançado de improviso no mais fundo subterrâneo de uina torre! Esse homem tio desa- fortunado, e desafortunado tio sem culpa, que nem ainda era homem, ful-o eu; t tant* mais sem ventura, quanto ninguém entfio, nem eu por conseguinte me julgava possível a resurreiçfto, e a soltura. Convalesci. Tinha as forças e a ed&dc para folgar, linha o disejo e a precislo do movimento, da convivência, da fra- ternisaçlo, geral, da conquista, enfim, do que pelos olhos de opera de continuo nos inexauiiveis domínios da natureza e da sociedade; nSo podia permanecer immovel; mas o meu cárcere, sem lanterna, me seguia por toda a parte. A ave da poesia, que me pipilava dentro, debatia-se contra as grades quando ouvia de fora estrondear a vida festiva), e pelo ecco deshumano das suas vozes se lhe revelava o sem numero de bellas coisas, que até os insectos e vermes senho* reavam pela vista.

A. P. dt Castilho, Amor t meíCMcolia, pág. 204.

XXXIX

Goimbfa á morte de Afonso Henriques

. . .Funda magoa apertava com mSo robusta os corações dos christflos de Coimbra, e de todos os que começavam a povoar de novo esta terra portuguesa, assolada por guerras d*anniquiiaç9o, mas remida do domínio dos Mosselemaoos com sangue de muitos m lliares de martyres soldados Vestidos com sobrv vestes de burel pardo, viam-se os cavalleiros subiiem para a alcáçova, ou descerem dt em silencio pelas ruas escuras e tortuosas da cidade, e os sobrei uizcs e offi- ciaes paladinos com vestiduras d'almafega rncaminharem-se para a càrU^ oi tribunal supremo, onde se distribuía a justtça. Similhante á paz de um cemi- tério, a paz que reinava em Coimbra era lobrega e pesad?.

No canipanario do cenóbio de Sancta Cruz um sino batia de quando em quando uma pancada soturna, e em c-ma nos paços do alcácer os prantos das carpideiras, discordes e agudos, reboavam pelas salas, e iam expirar pelas oo^ redouras e arcarias, misturando-se e confundindo-se com o gemido do veoto.

D. Aífonso Henriques íôra depositar perante o throno de Deus uma larga vida consumida em grande parte nas batalhas pelejadas em nome do christia- nismo c da pátria. A voz de bronze do mosteiro e;a o gemido da igreja; o murmúrio profundo e sentic!o. que transverberava pelas yentanas e frestas da aicaçora, resvmia rapresen-ava o pranto d«lMOto, que soava por t»dM m iOr

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galos dl boa terra la^Uana, ao verem seas filhos que o braço d'aquelle homem de ferro, cuja passagem ni terri fora una incâssante peleja, e a cujo nomCi. maldicto d'irifie s, escavam ligidas as glorias portuguesas de meio século, la^ gara a espada para nunca mais a em^iunhar qudndo por entre os eccos dos ana» files mouriscos retumbasse o gnto de Aliah. —o grito do accommetter.

As portas do templo monástico estavam cerradas havia- lambem três dias: os mong^ pialmeavojn as oraçõjs do* Ana io« ao redor de ama tumba vazia, e na Cdpella frotiieira una campi, ahi pjsta de íresco, cubria o cadáver agigintadj do funiador di m^narchii, que de tintos sentiorlos herdados a seu filno, reservara apenas pira si nove paimos de terra e una lousi, que lhe ser- vissem de derradeira mirada, e dv>s avu; dos thesouios, a cumulados por elle« gaardára para seu moiiunento uma espada embjtada. e um escudo assignado de goipes das lanças e a fanges d s araues.

Tal era o a^pocto grave e mclanc^iolico de Coimbra durante os dois dias- primeiros depois, que sc finara o vened^r d'Ourique: til era o seu aspecto pelo alvor da manhS de nove de Dezembro do anno de 118&.

A. F. Castilho, Qucuiroê Uiêtoricos^ í. 53.

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XL

Decadência dos povos Peninsulares no princípio do século XVil

A producçSo decresce, a ag^ricultura ricua, estap na-se o commercio, de- perecem uma pur uma as industrias nacionaes ; a rtqucsa, uma riquesa fausiosa e estéril, concemrase em algins pontos exccpcionaes, em quanto a miséria se alarga pelo resto do país: a populdÇSo, decimada pela guerra, peia emigraçlo, pela miséria, diminue d'uma maneira assustadora. Nunca povo algum absorveu tantos thesouros, ficando aj m.smj tempo tâo pobre! No meio dessa pobreza e d'essa atonia, o espirito nacional desanimado e sem estímulos, devia cair na* taralmente n'um estado de torpor e de indiíferença. £' o que nos mostra clara* mente esse salto mortal dado pela inteiligencia dos povos peninsulares passando da Renascença para os séculos 17." e 1^.®. A uma geração de philosophos, de lábios e artistas criadores, succide a tribu vu gar dos eruditos sem critica, dos leademicos, dos imitadores. Salmos d'uma sociedade de homens vivos, moven^ do-se ao ar livre, entramos n'um recinto acanhado e quasi sepulcral, com uma atmosphera turva pelo dos livros velhos, e habitado por esp^tros de dou- tores. A poesia, depois da exaltação estéril, faisa, e artifiJalmente provocada do Gongoiismo, depois da affectaçao dos conceit:>s (que ainda mais revelava a nalUdade do pensamento), cae na imitação servil e ininteiiigente da poesia la- tina, n'aqaella escola clássica, pesada e fradesca, qu.; é a antithese de toda a inspircção e de tcdo o sentimento. Um poema compõ2-se doutoralmente, como uma dissertação theologica. Traduz r é o ideal : inventar, considera-se um perigo t mna inferioridade : uma obra poética é tanto mais perfeita quanto maior nu- mero de versos contiver traduzidos de Horjcio, de Ovídio. Florescem a trage- dia, a ode pinderlca e o poema heroí-c )mico, isto é, a affect8ç9o e a degrada- (io da poesia. Quan:o á verdade humana, ao sentimento popular e nacional, ninguém se preocupava com isso. \ invenção e originaiiiadL*, nessa época dc- p'orav«l, concentra-se toda na discripção cynlcamcn-e palh feira das misérias, das intrigas, dos expedientes di vida ordiniria. Os Romances picarescos, hes- panhoes, c as Comedias popilares portugue as, sSo os irrefutavtis acios de ac- tQsaçSo, que, contra si mesmi. ros ddxoii e^sa sociedade, cuja profunda desmo- ralisaçfto tocava os limites da in^^cnuidade e da inoccn^ia no vicio. Fora d'esta nalidsds pungente, a Utteratura oíficial e palaciana, expraiava-ss pelas regiSai

954 áVTOLOOU ^ PBOBA

Insípidas do discurso scademico, da oraçSo fúnebre, do pane^rico encommen- dado géneros ariiflclaes, pueris, e mais que tudo soporificos Com um Ul es- tado dos espíritos, o que se podia esperar da Arte ? Basta erguer os olhos para essas lúgubres moles de pedra, que se chamam o Psçuílai e Mafra, para ver- mos que a mesma ausência de sent mento e invençSo, que produzio o gosto pesado e insípido do Classicismo, ergu -u também as massas compactas, e fria- mente correctas na sua falta de expressivo, da architectura jesuitica. Que triste contiaste entre essas montanhas de mármore, com que se julgou attingir o grande, simplesmente por que se fez o monstruoso, e a constru çio delicada, aérea, proporcional e, por assim dizer, espiritual dos Jeronymos, da Batalha, da cathedral át Burgos I O espi ito sombrio e depravado sociedade re- flectio-o a Arte, com uma fídelidaie desesperadora, que será sempre perante a historia uma incorruptível tesctmunha de accusação contra aquella época de verdadeira morte moral. Essa morte moral nSo invadira o sentimento, a ImaginaçSo, o gosto : invadira também, invadira sobre tud ) a intelligenda. Nos últimos dois séculos não produzio a Peninsula uoi único homem superior,

3ae se possa pôr ao lado dos grandes criadores da sciencia moderna : nio saia a Peninsula uma das grandes descobertas intellectuaes. que são a m«ior obra e a maor honra do espirito moderna Durante 20J annos de facunda ela- boraçSo, reforma a Europa culta as sciencias antigas cria seis ou sete sden- cias novas, a anatomia, a p^tsiologia. a chimica. a mechanica celeste, o cal- culo dlfferenclal, a aitica histórica, a geologia : apparecem os Newton, os Descartes, os Bacon, os Leibníz, os Harvey os Bufon. os Ducange. os Lavol- ser, 08 Viço —onde está entre os nomes d'estes e dos outros verdadeiros he- roes da epopea do pensamento, um nome espanhol ou português? que nome hespanhol ou poítugues se liga á descoberta d' uma grande lei sctentihca, dam sjstema, d'um facto capital? A Europa culta engrandeceu-se« nobiliton-se, sa- biu sobre tudo pela sciencia : foi sobre tudo pela falta de sciencia que nós des- cemos, que nos degradamos, que nos anullámos. Â alma moderna morrera den- tro em nój completamente.

do Ooental, Cauaoê da decadência dos Povob PevinêtUare».:^ Porto, 1171, pá^s. 13- 17.

XLI

Universidade de Coimbra

A Unlversid?de de Coimbra, que antigamente era quasi que o nosso nnico estabelecimento scientifico, conserva ain(ia hoje o primeiro logar entre os outros que a revolução liberal creou e engrandeceu Entre is seus antigos ílam- nos ou professores contou ella sempre homens illustrts, ta es como Luís de Ca- mões, Gabriel Pereira de Castro, de Miranda, António Ferreira ; depois os dois RIpinos, Durão, Mello Kreire, Brotero José Ansstasío, S Luis, "acra-Fa- milia, Garrett, Castilhos, Coclno da Rocha, e outros muiios Os partidos polÍ- ticos deveram-lhe e devem-lhe aiuda hoje a'guns dos seus prlncipacs caudilhos e ornamentos ; J. \. d'Aí?u ar e F A Lobo, António Ribeiro Sataiva. Bruschf, Gomes d'Abreu, José Fstevão e os dois Passos honram este a caçar das leiras. A litteratura contemporânea recebeu daqui muitos dw seus melhores florõJÍ Joflo de Lemos, Soares de Passos. Jíflo de Deus, lo3o Penha, e outros que continuam as tradições ^loriosn:» da nos>^a historia litterai ia, receberam das auras do Mondego as inspirações ilas su s musas.

Bem conhecido e o qic de Coimbra e de sua Universidade escreveu o distinto humanista e infeliz patrioia Frei Heitor Pinto. Oiz eile na sua obra doi

rtourx) XIX

655

Diálogos: «E assim como quem edifica em terra alheia, por mais qoe faça, sempre fica devendo o foro ao senhoiio de cuja mSo tem a teria, assim por mais que os moradores de Lisboa, Évora, Santarém e d'outras cidades e viilas nobres d'este reino edifiquem, sempre ficam devendo o foro a esta tflo antiga como excellente cidar*e de Coimbra . . £ assim como do centro da esphera sa- bem as linhas para a circumferencia, assim d*aqu1 sairam as armas com que se conquistou o reino, e d 'aqui sahem as virtudes e as letras, assim divinas como humanas, com que elle é ornado e ennobrecido. £ finalmente é esta cidade como alma d^ste reino, coroada e sempre leal, e uma formosa imagem em que todas devem pôr os olhos. >

Tinha razSo o douto monge jeronjmo, elle que foi também uma das Jóias mais preciosas da Universidade de Coimbra. G o que elle escreveu no século XVI ainda hoje se verifica em grande parte.

O antigo estabelecimento de D. Dinis, disse alguém ha bem poucos annos, é como a cidade da sua sede nunca envelhece. Remoça constante numa juventude perpetua ; impregna-se d'aquella florescente mocidade de seus filhos, que sãp os filtios de todo o Poitug;)!. que para aqui faz convergir de todos os pontos o mimo das suas povoações Ror isso esta terra é como es- pelho de todas as outras, ccntto de muitas attençôes, alvo de innumeras espe* ranças, onde os pães concentram futuros auspiciosos, e as mães as suas longas saudades.

A. A, da Fonseca Pinto, Panorama photograiihico de Pertugal^ pátf. lOSt

XLII

Retrato de Tibério

Mo seio do mar de Nápoles, e defronte das costas da Campania, erguia-se Capréa, piiz9o por fora e asylo de delicias por dentro. Na coroa do seu alcan- tilado rochedo descobríamse os tectos e eirados das doze casas de recreio cons- truídas por Tibério em memoria dos doze deuses superiores do Olympo. Bellos ediflcios thermaes, aqueductós e arcarias ligavam os valles com a montanha.

N*este recanto aprazível, resguardados pelo mar dos tumultos do conti- nente, e cobertos dos rigores das estações pela grande muralha do monte Solaro, basearam silencio e tranquilidade alguns dos senhores do mundo: Au- usto ha- bitou-o quatro annos. O filho de Livia escolneu-u para a cidadella das suas crueldades. Nero n9o se esquecia de o visitar frequentes vezes.

A sensua;idade romana era habil em acomcnodar as formosuras da natu- reza aos seut deleites. Nero cavou os seus banhos na famosa gruta, que os viajantes admiram em Capréa, fazendo entrar as aguas salgadas por conductos subterrâneos.

No tempo de Tibério escarpadas rochas fechavam o acesso da ilha por toda a parte ; e no umco sitio, aonde se desembarcava, scntinellas vigilantes tomavam o passo, n9o deixando que ninguém se aproximasse da residência do prinpipe, sem licença.'

Aquelle velho disforme, com o rosto meio comido de ulceras, melo re- mendado de emplasTos, calvo, cur/.-do. Mc olhes ferinos, e hálito fétido; repu- gnsnte, taciturno, e altivo pqueilc; homem gasto e cansado de devassidões monstruosas e oceultas, que está recost 'do á m< sa, e questiona, sórdido de em- briaguez, no meio dos grammati<^os ^obre a ror d .s cabellos de Phebo, ou acerca da idade dos cavaLos de Achillcs rqu41a figura sin'stra, que a hedion- dez e òs vícios assignaiam pela sua e.xpressâo sinistra é Tibério 1

AtnoUMiÂ^MoêÁ

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1

Ao sen lado acha-se Thra^yio, poderoso no animo do imperador pelo medo que lhe inrunde em nome dos astros.

Oesprezador das leis divinas e humanas, e alardeando impiedade e e»- carneu em pontos de crença religiosa, o enteado de Augusto, como todas as al- mas fracas, unia a supersUçlo ao atheismo. Quando o trovão estalava e os raios fuzilavam cobria a cabeça de louros para afugentar a tempestade; e desafiando o poder de Deus, cedia como uma crcança a>s signaes imaginários das estrellas, ptrmUtindJ tudo ao astucioso g ego, que fingia ler nos céus no livro sublima» que a Sabedoria eterna cerrou aos riom^nsl

Os deleites asqué o>os, e as toroezs mais abjectas acabaram de lhe e^ gotar as forças, e a decrepidez apresa >u-se antes da iJadc Quanto a devassidio requintada, e a obscentdaie p^di m inventar, tinha-o e 1e reaiisado n s seus haréns secietos Para se form-r idea da deprav^^çâo a que Roma tinha chegado é preciso lutar com o pe:o, e seguir em aigumas paginas de Tácito e d^ Sueto» fiio as descripções espantosas, que ultrajam o pudor, e parebeiiam traçadas pela calumnia se o testemunho de tantas viptimas e de tantos depoimenios as nlo confirmasse!

Igual em todas as cousas. Tibério até se exced u a si nos vicios sensoacs ! Levantando-se dos prazeres do banquete, cambaleand-, e perdido de vinno; ou saindo das infâmias monstruosas do<> serralhos, o passatempo de K^cs^rera assis- tir aos supplicios e á agonia dos que o seu capricho, a sua cubica, ou as saspel* tas haviam sentenciada. Os ma s bárbaros tratos pre:ediam ali a m^rte, que debalde imploravam as dores e supplicas dn$ condemnados

Espo) mdu-sd no lodo das dcsvas^idõv^s, e no sangue derramado pelos algozes. Tibério cessou de matar quinio a vila Ih fugiu. í)e vint: conselheiros, eh/imados no começo do r^ inado, dous ou três escaparam ap nas á sua feroci- dade, bile próprio conhecia o horror que inspirava exclamando: -«-«Detea- tem-me ; mas obedeçam 1 »

Uís Augusto Rebello da Silra, FoêtOê d% Egreja, t i, 18S4, pi|. 253-255.

XLIIl

Vasco da Gama

Quem era Vasco da Gama? De que tronco procedia? Onde nascera? Qae feitos lhe tinham assellado o merecimento, quandj el-rei J. Manuel o escolhca por seu primeiro lescobridor? li* qu:)si in díffero.nte a prosápia e geneaio^i^ para os que nascem n^o pari comprazerem ociosos no passado, senão para rasgarem por si m^sm^s o caminho até á mais remota posteridade. Ha homens que derivam dos seus antep4SS;idos todo o mérito. Slo comD vermes, que vivcoí ae ossadas sepulchraes. ^^stes são os qu^ valem pelo sans^ae dos avós, san- gue |á sem hematlna e sem glóbulos verm^ h)s, sangue obscuro, inerte, incapaz de grandes feitos, san^^ne d^^ m^ndicroi iilustres ou de chatins agaloados. Oatrof homens ha, que á simi hançi do Mito para os antigos, não se acerta dizer d'onde procedem, e prin:ipiand3 em berço escuro e nevoento, a pouco trecho assom- bram com o seu nome e dominam com a sui IrreMstivel superioridade ama inteira civilização, assim corro o rio caudaloso do Egypto, inundando os cam- pos com a* sua corrente impetuosa, derrama o seu nateiro fcçundissifflo ta legilo, por onde corre distante das nascentes ignoradas. Estes homens «ao carecem de herdar no sangue o esforço, o g<.nio. a majestade. ^U^ •!• nasmo tampo o tronco e o lobento, a cstirpa a

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da. Nasceram psra dar notn* ás ocIo^as dferaçO^s, de qne tio progenlto- rps. Uns para valerem, é mester oue digam r «Fu descendo de um heroe». Os ontros com o nob^e or^rijibo dos qtie a si mesmos se coroaram. \íê!^ que digam : « Oa luz. que díffundi n^ m^n^a epocha. no mundo, em toda a huma* nidade; ainda uns clarões Irãio dourar a fronte obscura da familia qíie en fun- dar». Uns sffo os que encontraram no berço a purpura, cosida dos. retalhos, que ainda restam do manto dos avós Os outros sffo os que a souberam talhar eom o engenho ou com a esp;fda do estofo humilde e sem valor. Uns slo ot reit fainéanlSt os magnates de cérebro v^sio e de escudo divisado de henldicai pinturas. Os outps s8o os Qamas. os Bonapartes, os Newtons, os L4ip1aeefl, os Hugos, os Shakspeares, cu)a gloria é tSo grande e pessoal, que ao mundo atMorto e deslumbrado na contemplação de tSo intensa luz, nSo é dado o dii- tlnguir em suas stirpes quem antes ou depois d*elle8 existiu.

Foi Vasco da Oama de estatura mean. por^m de vigorosa corporatura* A' forte compleição respondia cabalmente a impávida fortaleza do seu animo, a constância inabalável nas emprezas. o desprezo dos perigos mais instantes, ò vigor infl^^xfvel no governo, a severa iustiça. em que foi exemplar. Em verdade» no seu trato com os inimigos, é força de ser duro e Inexorável, raiava muitas vezes em cruel- Mas se hoje pomos de um lado na balança algumas de tnat mais inclementes represálias contra mouros e gentios e seestamosa ponto de o condemnar sem remissSo em nome da humanidade, ponhamos na outra concha as clrcumstancias extraordinárias, em que passaram os seus feitos no Oriente, e venhamos a concluir que a necessidade, as idéas e os costu- mes do seu tempo em certa man^^ira o escusaram das cruezas e sevícias, que exerceu. Como navegador foi talvez d prim«»iro, nlo fomente do seu século, senSo de todas as evades e npç0"s desde o primeiro oue ás onias se aventurou. Com elle pod^m unicamente entrar em parallf lo ChristovSo Tolombo, c princi- palmente Fernio de Magí^IhSír'*, Dr navegnnte foi sem duvida a sua gloria principal. Como soldado e cao^^So pp-azinm-lhe mais as pelejas do Oceano do aue em terra os mais galh rdos feito» de j»rmas. Nunca o vemos como um Almeida, um Albuquerque, ou um Pacheco, desembarcar de suas naus e reptar longe d*ell88 o inimigo. O mar era a srena predilecta dos seus bí^ios, a terra, como que um passageiro dive»^sorío, onde apenss reoqusar das iraritimas refre- gas, ou tratar com os reis orientaes, mais como negoriador do que soldado. Quando urgia castigar uma trdic^o ou uma affrnnta nffo saia na praia.com os seus bellicosos companheiras, ant^s recoihi^^o em seus navioa, d'ali senhoreava ornar e a terra com as b^^mbnrdss, ora arrasando as povoaçOes, ora afundindo no Oceano as fu«tas e os parcos do ÍTi*migo.

Acima de todos os homens em'npntes, oue I^var^m os baixeis e as armas portuguesas at»*^ os mais remoto» confins do no«so gl^^bo, levanta-se Vasco da Gama, á similhsnca do mais alteroso cimo do Himalaya. oue vi absixo de si 88 mais erguidas cumiadas. que sfm e^e seriam issombr^^sas serranias rolossaes. Toda t acçSo de Portugal ns historia da civilísac^o r*tá personificada no se« grande soldado navegador, o esnixito da pátria no Camões, também guerreiro e navegante, que ao nome do argonauta enlaçou no seu poema todas as glorias de Portugal.

LatiM Coelho, Galeria de VarÕfM TViiêtrts de Portugal^ Vcuto da Gamm, 2." parte, té, de ]882, pá^. 10-19 e 369-371.

8S8' ASTOUMIU -2- notA

XLIV

Origens de Portugal

(PRIMEIRO SERAo)

O qne era Portngal. Os carthaginesea. Os romanos. Viriato.— Sertório.

Meus amigos, começou o Jo9o da Ag^ualva, é de saber que esta terra em qae nós vivemos nem senipre foi Portugal, e se alguém se lembrasse de fallar, aqui ha consa de uns três ou quatro mil annos ou mesmo, de mil annos, em Portugal e em portugueses, havia de ver como todos ficavam embas- bacados srm perceber patavina. Isto para os amigos era tudo Hespanha, desde os cocurutos dos Pyrinéus, que são uns montes que separam a Hespanha da França, até essas aguas do mar que cercam por todos os lados a nossa terra, mais a dos hespanhoes, e até por estar este pedaçSo de terra cercado de agua Dor toda a parte, menos pela banda dos Pyrinéus. é que se chama a isto penín- sula, que quer dizer uma cousa que é quasi uma ilha, mas que o nflo vem s ser de todo.

Estavam os carthagineses senhores da Hespanha, e, como tinham posto fora os phenicios, queriam também pôr fora os grvgos, quando estes se lembra- ram de pedir o soccorro dos romano;, que andavam ba muito tempo de rixi velha com os carthagineses, e que eram dos povos mais pimpões d'aqueUe tempo.

Vieram então os romanos ? perguntou o Francisco .artilheiro que estava seguindo com interesse a narrativa.

Não tiveram tempo de vir, porque um tal Annibal. rapasote dos seus vinte e cinco annos, e que dizem até que era fii.io de uma lusitana, suocedendo no commando dos carthagineses a seu pae Amilcar, não esperou que elies viessem, correu a Sagunto, uma das t es colónias gregas, 'tomou-a e queimou-a, e depois sae da Hô^spanha, atravessa os montes Pyrenéus e mais os montes Alpes, que parecia que tinha mesmo o diabo no corpo, bate os romanos aqui, derrota-os acolá, escangalha os mais alem, e ás duas por três, se continua assim de vento em popa. era uma vez Roma. Porém, os romanos, que eram tamisem levadinhos da breca, nunca desanimaram, e, apesar de estarem de corda na gargaranta, tiveram artes de mandar para um exército, de forma que, emquanto Annibal saia por uma p>orta, entravam os romanos por outra. O atrevimento ia-lhes saindo caro, isso é verdade, mas a fortuna viroui e o que é certo ó que d'aqui a pouco tempo nào havia nem um carthagínez tia peninsuia, e estavam os romanos senhores de tudo isto.

Então os povos de estavam a olhar ao signal ? perguntou Bartho- lomeu.

Ora ahi é que bate o pon o. Effectl vãmente, os povos das Hespa- nhas acharam assim exquisito que os cartaginezes e os romanos andassem a dispor d'elles, sem ao menos lhes perguntar a sua opinião, de forma que, quando os romanos, julgando-se senhores da Hespanha, começaram a espreguiça r-sc, os differentes povos da península disseram-lhcs d*esta maneira: "Ora esperem lá, senhores romanos, que nós somos duros para colchões I

Ah ! boa rapaziada ! observou, esfregando as mfios» o Frandsco Artilheiro.

—Começou a pancadaria, e o povo que andou sempre na frente foram os nossos lusitanos, principalmente os serranos do Hermínio (que era assim que se chamava d'an:es a serra da Estiella). Não eram os romanos capazes de

sAcuxiO XIX 659

metter dente para este lado, até que uma vez um dos seus cfeneraes, eira* mado Sérgio Q Iba, apanhou os lusitanos á traição, efez nelles uma mortan- dade de qus poucos escaptram.

\h I grande patife ! exclamou o Manuel da Idanha.

Isso era, mas aiem de patife era tolo, porque isto de excitar multo maus resultados. Os lusitanos, que escaparam, ficaram como uma. bicha. Ora um d'elles era um pa^^tor chamado Viriato, homem decidido e espertd que disse para os seus patrícios : Fi^ç.im vocês o que eu mandar, e deixem ps ro- manos commigo. Assim foi. |uritar<)m-se á roda de Viriato, e, quando a ppare- ceu um exercito romano commandado pelo ro^sul Vetilio, o nosso homem, que era das bandas de Vizeu, esconde n'uma emboscada uma parte da sua gente, e com o resto põe-se a fazer fosquinha^i aos romancs, parecendo a modo medroso. O cônsul percebe que ellc es á com 'eu su^to, e diz de si para si : c Vaes apanhar uma surra mestra.» Corre sobre clle, Viriato faz trez meia volta, e pernas para que te quero, elle ahi vae. O cônsul Vetiiío desata a correr atraz de Viriato e vae-se mesmo metter na boca do lobo. Era uma vez um exercita romano. Depois de Vetiiio vem outro e outro, c eile sempre zás, pásada de crear bicho. Em Roma havia terr^^r. diziam que o luzitano lhes dava mais que fazer que o próprio Annibal. Em Hespanha n9o era um enthusiasmo por ahi alem. Se Viriato nem se contentava em estar nas montanhas, entrava pelos povoados, romanos, levantava contribuições, revrlucionava os povos, era um vivo demónio, e cada novo exercito, que por apparecia, nSo lhes dlGfo nada, sumla-se n'am abiir o fechar de olhos, até que emfim o cônsul SciplSo apanha dois patifes que Viriato mandara para tratar de um negocio e tantas endro- minas lhes metteu na cabeça e tantas promessas lhes fez que e)les quando vol- taram para onde estava o seu chtfe apbnharam-n'o a dormir e mataram-n'o.

Oh! que grandes malvados ! exclamou Bartholomeu.

E assim acabou esse homtm que foi o que se pôde chamar um homemzarrão: O' senhores, eu sou um pateta, que nSo percebo nada doestas cousas, mas, quando me ponho a penfar n'efte Viriato quando me lembro que era apenas um pobre pastor de cabras, um selvagem que nio entendia nada de guerras, nem de manobras, nem de legiões para aqui, nem de centuriões para ahi, e que, apezar d 'isso, em defesa da sua terra, fez andar os romanos em papos de aranha, e atarantou aquella poderosa Roma que mettia medo a todos, quando me lembro que elle era filho d'esta boa terra, que hoje se chama Portugal, ah ! c'o a breca, sinto assim uns arrepios pela espinha, e parece que é até uma vergonha para o paíz não se lhe ter levantado uma es- tatua de um tamanho por áhi alem no alto da Serra da Estrella, que aquillo é^ que se podia chamar a sentinclla da nossa independência.

E o bom do João da Agualva, no Ímpeto do seu enthusiasmo, cerrava 08 punhos ; faiscavam-lhe os olhos e dava mostras de querer elle mesmo ir põrnos fraguedos da serra da Estrella a estatua do seu heroe.

Tem razào, tem, observou o Bartholomeu, que o tal Viriato foi nm homem de truz, isso foi.

A morte de Viriato, como podem imaginar, continuou o JoSo da Agualva, deixou firar os lusitanos um pouco atrapalhados. Mas continuaram a defender-se, e os romanos viram uma bruxa com elles. Pode-se dizer que Roma foi senhora da Lusitânia quiindo não ficaram nas nossas montanhas senão sk%> mulheres e as creanças Mas as creanças íizeram-se homens, e os homens esta- vam mortos por jogar as cristas com os romanos. Não tardou a apparecer-lhes uma boa occasiao.

Vamos a ver isso? exclamou o Bartholomeu, com um orgulho pa- triótico. . . S K

E' de saber que em Roma havia umas guerras civis; tal qual como nós tivemos por muito tempo em Portugal, assim umas cousas á moda di Maria da fonte ou da guerra dos dois irmãos. Um fulano Sylla e um sicrano

060 inoMMnÁ -«-raotA

Marto andanm á oincadaría un com o outro« até qtie vencea titti d'enesqae foi Sylla. Era homem de cabeliinho na bsnta este Sylla, e apenas se via no poleiro, começou a chacinar nos que eram do partfdd contrario de forma qne parecia que nSo queria deixar vivo nem um só. Os amigos de Mário trata- ram de se escapulir, e um d*elles, iiimem desembaraçado, chamado Sertório tafou-se el para He«panha, pira os lados do Oriente. Ahl num instante revolu- éionou tudo. arranjou um exército, mas os generaes de Sylla. espatifa ram-lh'o. e o amigo Sertório tingou-se para a Africa. Souberam os lusitanos do caso, e disseram comsigo: «Este maganSo é que nos faz conta». Metem-se uns poucos n«m barco, vao alli a Marrocos, por onde o Sertório andava aos paus, ofen^ cem-lbe o vir comandál-os. Sertório saltou l^go para dentro do barco e d'ahi a pouco estavam os lusitanos em campo com Sertório á frente.

Este, porem, nlo era, como VirUto, um pastor de cabras, era homen civilizado, sabendo tudo o que se sabia no seu tempo, e que tratou de arraniar et tias nossas terras uma espécie de Roma. Pareceu-lhe que Évora servia pan o caso, estabeleceu-se alU, e, como o tinham acompanhado muitos romanoi, conseguiu perfeitamente o seu fim.

Que o Sertório era uma grande eabeça, isso é que nJlo tem duvida ! Nlo pos o sal na molel rinha dos seus patrícios oue se quiseram metter com elle, mas costumou os lusitanos a ser gente civilisada, e a imitar os romanos em tudo, de forma que Viriato resuscitasse, nlo os conhecia. E a final de con- tas, vejam como as cousas sSo ! Este Sertório deu lambada nos romanos por um sarilho! pois ninguém fez miis serviços a Roma do que elle! Introdusla aqui as artes, os u<tos e os costumes de Roma ! de fórma'qtie, deools. os nossos começaram a ter m^nos repugnância aos estrani^eiros, a confundir-se com elles. Isto de fallar a ihesma língua, (de ter os mesm'>s hábitos, sempre é uma grande cousa ! Sertório foi aMa^sinado, assassinado também por um traidor, um pa- trício d*e11e, um tal Perp^nna I Pois senhores, quando morreu, isto por era tSo romano como a própria Roma I de forma que nunca mais houve revol- tas, e os lusltrnos como o resto dos habitantes de Hespanha, á excepçiodos vasconsos que sempre forr m mettido comslgo, e nunca se deram com os vizi- nhos, os lusitanos ficaram fazendo oarte do gr'^nde império que vinha do Mar Negro ao Oceano Atlântico, e da boca do Rhf no até á foz do Guadalquivir e ainda mais para baixo, do outro lado do estreito.

E com Isto os n?lo enfado mais meus amigos, a Margarida acabou a sua estriga, a luz do c^indic^ro está assim » modos ás upas oomoquemse quer ir embora, e entso domingo á noite continuaremos com esta convém, visto que vocês parece que v9o gostando,

Ora se gostamos, sr. Jo^o da Agualva ! bradaram todos em coro. Venha depressa o dominpo para ouvirmos o resto.

E despedindo-se de Margarida, e de JoSo, retlraram-se para assuascifai

Piaheiro Chagas, História aJitgtt de Portuga!, ed. de 1SS5, pif. M4.

XLV

A batalha de Valverde

... A hoste portuguesa arremeteu logo contra os Inimigos da vanguarda, fustigada ao mesmo tempo pelos que a seguiam na marcha. Entflo o combate ganhou o seu momento culminante. As sett;)s, os dardos, as pedras, as lançai, formavam sobre o monte coroado pelos combat n^^cs como que uma couraça de escamas sdntilantes em perpetua b^H-íç^o, e de sob ella rel)oava pelos ares o trovSo medonho das juras e imprecações de guerra, com o tenir das aiaai» o

siOQLO ziz 961

estalar dos golpes, o gemer dos feridos, o soluçar dos agonlsantes : tudo revol« vido nama ondá^ que descia sobre a campinha, alastrando-a de horror.

Uma setta, sibilando, veiu cravar-se num a Nun'alvaref. Ferido» assim mesmo correu á retaguarda d 'onde vinham gritos de perdição ; as fileiras vergavam sob o ataque sempre renovado, batendo-as como catapulta contra muralhas de pedra. Reforçou os ânimos, avivou a coragem, partiu: da van- guarda ohamavam-no... Mas desapparecera... a hoste portuguesa ASo avançava : fíxara-se no cbSo como petrificada, obedecendo ao impulso contrario dos inimigos» que de ambos os lados a assaltavam. G)meçava a surgir o terror vago da derrota. Nuns empallidepiara as faces, noutros redobrava a iuria ; mas quando chamavam por Nun 'alvares, e nSo o viam, gelava- se- lhes o sangue, 8entlndo>se (^fios. Para onde foraV Morrera? Fugira V Não; nio podia ser... Um milagre talvez : Deus têl*o-hia arrebatado ao ceu. livrando-o á morte e á deshonra que viam imminences no crescer cada vez tnais temível dos inimigos contra os muros hesitantes do quadrado português... Sumira-se! Busoavam-no por toda a parte, numa angustia summa, com o medo cruel de perderem um pae. No recinto do quadrado, dentro da hoste, não estava. Sairam para fora, lateralmente, á procurá*io na charneca, por entre os dentes empinados da rocha que aflorava. Entretanto o combate feria- se cada vez mais rijo. Ruy Gonçalves, de súbito, deparou com elle.

Ao lado estava a mulae o pagem que a tinha á mSo, segurando a lança e o braçal do cOndestavel. Nun'alvares, de joelhos, entre dois penedos, cem as mnos postas e os olhos no ceu resava. Pendi2:-lhe ao peito o relicário do rei de Castella. tomando em Aljubarrota, e que D. João i ihe dera. Perienceta a Bur- gos, à*oode o castelhano o trouxera como taiisman. Continha um espinho da coroa do Red^tnptor, uns ossos de marcyres, e um dos trinta dinneiros de ouro por que Judas vendera o seu Mestre. Era uma foía preciosa de prata cinzelada a buril, suspensa por cadeias, para se deitar ao p^iscoço : era o taiisman de Nun'alvares que entrará com elié na batalha. Agora, na angustia de a ver ar- riscada, trans porta va-se em êxtase para Deus, orando. O seu rosto, banhado por uma illuminaçio intima, com os olhos cavados no ceu e os lábios entie- abertos, dizia: Ruy Gonçalves, parado a contemplá-lo, n'aquelle instante o con- destavel fallava com Deus, transportado em alma ao ceu. O ^«'xtase, e este si- lencio do escudeiro, contrastavam com o fragor medonho da batalha que se feria ao. lado... Erguido nas asas da poesia. Nun'alvares transformara as phan- tasias cavalheirescas da sua educação num realismo piedoso e prático, d onde provinha, ao mesmo tempo, a sua arte de guerreiro e a sua allucinação de saoto... Deus assegura-lhe nesse instante que venceria a batalha» remaund* por um verdadeiro milagre a sua doida aventura ; cUe em paga promettia á Virgem levantar-lhe em Lisboa um tempio magnifico. O realismo mystico trans- portava, assim» para a piedade transcendente, as normas da vida mundiina, transfigurada. Entre o ceu e a terra, negociavam se ajustes.

Passado o primeiro espanto, Ruy Gonçalves, affiicto e accordado pelo travSo constante da batalha, arrancou num grito :

Estamos perdidos !

Nan'alvares, fitandoo distrahídamente, com uma vóz pousada, tor- lou-Ihe :

Ruj Gonçalves, amigo. . . ainda n3o é tempo. Aguardae um pouc«, e acabarei de orar.

Mas, nisto, outros tinham descoberto o condcsíavel, e, açodado, «ffe- faiite, Gonçalves Annes que vinha adeante, gricava, atropellando as palavras brutalmente :

Kada da rezas . . que morremos t«des I

Elle, voltando a face e eminodecenfllo-o com a fascinação de olhar, tornou :

Ainda não é tempo amigo ...

692 ijrroMttu -* p»u

•^rm

Cafa no êxtase. Fm volta, o^ sea^ cnhm num dssespcio mudo, mistondo de etpanto. Que homem singular, mas sfdurtorl

De repente, Nui'alvares, como que accordando. erguen-se O aocessode bypnose passara. Er^ueuse fírmouse nos pés, dist^ndru os braços fixoa a vista, armou o (uvido: a batalha rugta med >nha ! Pm frente, na crista do monte, recortando-se no a7at d) ceu. destaca^a-se maís/alta a bandeira do mestre de Santinpo Pondo a mSn esquerda no hombro do seu alferes Diogo Gil, apontando com a direita» di^sc-lHe :

Vês as banieir^s que estio no cômoro d 'aqaelle monte?. «. a mali ilte deve ser a do mestre San.iago. vês?

Senhor veio.

Pois andae rom essa minha e vamos Junto d'cllar.. Amigos avante! Cada um seja para quatro !

Largaram, guiados pela bandeara saerada do condestavel, partida por quatro camp^^s em que se confundiam aereamente. batulos pelo vento, as imi- grns da alma mystíca, os brarOcs do sangae filal^o, perfumes de santidade, reptos de heroismo, concatenados pelos braços vermelhos da cruz floreteada dos Pt reiras, fundindo assim, phantasmagoricamente. o c-^u e a terra. invo. vendo todo n'uma atmosphera de milagre e ailacinaçio. Uma rafada de passava pelos cérebros rude, dandò aos nervos, de cada braço rig-za cataléptica e força mais que humana. A ondulação ma,jnetica passara do condestavel para o grupo dos que o cercavam, e, correndo todo^ loucamente, a en cor porá r-se na hoste, passava ao corpo inteiro do exerc to que arremeteu conf fúria, levando perante si, de roldAo, toda a gente inimiga, num arranco de violência hysterica. A ba- talha estava gan ia,* o campo ficava livre, o miUgreconsummara-se.

Oliveira Martins, A vida dt Nun'alvareê, 1893, pig, 3C6-309.

. ' XLVI

*•. * j >

O solitário de Val-de-Lobos

A '^va do cemitério de \zoli onde baixiu o cadáver de Herculano no ▼erio de 77 é, no seu isolamento, o symbolo da iisen^ibiâiade cot: que Por- tugl o sepultou Os camnonezes arancav«m «las oliveiras de Val-de-Lobos tristes ramos dessas pardis arvores melancólicas, em memoria do que vivera entre ellcs: selam também ests palavras, csbojadas pouco depois da morte de HcrcuUno e agora de novo rscriptas: sejam ta^ibem como um ramo de saudades deposto por mSo fle^mente amiga sobre a pedra do sepulchro.

Os camponezes celebraram, poética, rural mtnt*», um saimento que dei- xava indífferentps os grànies boTipns de Lisboa; e as<im dcvia ser. porque o morto a em vida um pçiitc p ra os pod rosos. e um pie, um protector, um amigo, para esses hirai d s cm cuii sociedade v v'a. Como um Voltaire no seu retiro, Herculano era una espécie do purono dos camponezes, defondendo-os contra os casos arblfr^ros de umi jnstiçi, de uma poHiica, muitas vexes cruel. O mesTio que ]\ rechmyra uma esmola pira as oobr s freiras de Lorvio era o que salvava Jo degredo um cindemnado da Azoii, vic ima de um erro judiciá- rio, sem poder evitar que a cad ia o mitas^e com as do:nças alii gan «as. Her- eu'ano. procurador do infclz, vin^a a Lisboa, p:dia, batia de porta em porta, subia ás Casas dos conselheiros e com que ironia contava a so te a que se vfi reduzido! para alcançar o perd^ ^ da victima injustamente Cv.ndemnada cm todas as instancias. Sob um^i do^crença convicta n^s homens, elle, afinal, tinbi c«xâ^ UM kgcauid^dc fcminioa^ e sob o aspecto rude de am« quasí

sácòii» xu 608

affectada dnreza, uma verdadeira meiguice, uma caridade doce, uma candari diapbana.

O seu génio produzia o seu pensamento. Era una intelligencia, Incida enkystada em fórmulas duras, e um coraçSo bondoso e meigo, encoberto pela educaçio, sob um exterior rigido e appjrentemente hostil. Quem o ouvia, d3pois de o ter lido, irritava-se muitas vezes ; quem o tratava nSo podia deixar de o amir. Ingénuo como uma creança, mais de uma vez foi visto dando o braço, nas suas palestras peri patéticas do Chiado, a algum janota a quem expu- nha a theoria de Savigny sobre os municípios da Edade-media : o janota ouvia, orgulhoso, mostrando-se, ~ porque ent9o era moda, com) alguém disse, «trazer o Herculano ao peito». Se o advertiam, elle, sem se oífender, ao contrario, respondia como uma fala arrastada e séria : oh, diabo!

Era a candura própria dos bons; mas o singular no génio de Herculano estava na força de uma convioç9o que, em vez de religiosa, era civica, e que, portanto, em lugar de se affirmar condemnando abstractamente o mundo como- nm mystico, afflri^ava-se condemnando individualmente os homens, pelos seas nomes, como um Juvenal ou utn Suetoni9. Ninguém lhe falasse no Saldanha, no Rodrigo ! E esta direcção que o seu estoiciímo tomara levado pela vida de Portugal, fazia, com que, para muita gente, Herculano passisse por um ser duro, asoero, intractavel, con^tYuido aoenis com orgulhos e ódios.

Mas. se no fando do seu coraçlo hivia notas doces de meiguices e uma candidez ingénua, nao foi sem duvida este o traç) dominante do seu caracter, ^o lado da humanidade tinha Herculano a dureza e a força lusitana ; e por cima da esoontaneidale, abafando muitas vâzes o coração, dando sempre una forma intelH^ivel á força, viera a educação racionalista dar uma unidade, mais ou menos consistente aos seus, pensamentos e aos seus sentimentos. Assim, a palavra que O' retrata é o Caracter, porque n*elle a vida moral e Inteliectual eram uma e untca : o contrario do sceptico, nlo raro santo, o próprio do estóico, nlo raro obtuso.

Se na mocidade, pois, ao vêr termln^ída a iniciíçío dolorosa, que as suas poesias nos cintam. Herculano, amia imoellido por illusõas generosas, ainda incerto do destino fatal do seu e-nlo, entrou na batalha da vidi cimo soldado, esperando chejsfar a vêr realisad^s as normas esboçadas em «eu esoiri^o, esse enthusiasmo caiu depressa: e no flrdir com que esceveti a Voz do Propheta, para condemnar a democracia, an i-lib^ral em seu concjiito. se csooçada fugitivamente a condem nição futura dos parti lis todos sob a fórma artificial de uoiestylo prophetico. á Lamm^n^ts. O mn^nto át se convencer das razões de uaia tal sentença coegou em IS,")!, ouaiio i\<s}^ corrido di vergonha e tédio perante uma corrupção que se Ine fiçuava í»x!:oiíi'^nil e única. Pnisou á con- diçlo de caturra para os homens p'ir'coí, de or?u^hoso pira os simples, e de protesto symbolico contra a d^«"i*T*in n^rti^in^q. e contra o abjtimento universal da Europa, utiiitíiria e irnen'i!is'a oin os q-n, de fora do nrundo, como criticos, observam e c'is>f'nn n< p'i^n^T!Mioí. Tornon-se o remorso vivo de uma naçío degenrali. ÍL' n'cs[o ni^nino que as cousas levam o génio de Hercuhno a def^ni-^-ie m s'n rtnrpzi : c é por iss-) q'ií3 ao cxttn^ul- rem-se-lhe as iilusões politics, p-'n.* p'a a tonar-se um typ-) característico da nossa vida contem ooranen. Poie di^er-se que, ao '^rs-rer pua o mando, na?ce para a historia. O lu^ar que lhe c-»mo*te, n\ ^^'^rii d)s nossos homens tBodernos, é este. Emoo'a Id ant;s o s^u nome tiv^í^-* .ttí'' 'o hoí pr-^^rammas e polemicas, a sua ind^vidníid.He nl"» «?e destncjva ainia seiíilo pelo valor addldonal da reputação litteraria conquistada.

0. Martin», Portugal Conte/niyoranco, ti, de 1895, ton* 2.*, páf. 302-301.

664 ANTOLOOU PB08A

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XLVII

Excerptos do sermão pregado nas exéquias do conde de Barbacena

« Deus é grande (eminentissimo e reverendíssimo senhor) I Deus é grande»!. PoÍ assim que um grande orador francês principiou a orsçSo fúnebre de um grande monarcha d'aquelle pais. Dâpois de D6u$ é grande a virtude : é assim que eu, o mais humilde pregador da nossa terra, começo e elogio, também fúnebre, e d'uma distincta gloria d'ella.

Grandezas ha que, n9o obstante fazerem o timbre de uma família, orgulho de um povo, e até a admiração do mundo nlo passam muitas vezes, por ialta de solido fundamento, de estatuas de uma belleza apparente» firmadas, como a do rei de Babylonia, sobre os pés de barro.

, Que importa que por algum tempo deslumbrem os olhos, fascinem oi espíritos, e recebam a indevida homenagem do respeito V teem na base a ra- zão de sua ruina.

Se por ventura se conservam de pé, em quanto dura a illusao que as le- vantou, baqueam, logo que a analyse do bom senso pó4e vir examiná-las de perto, e descobrir a fraqueza dos seus alicerce?.

Eis' aqui a historia dos homens de todos os séculos, que usurpam um logar que nSo lhes pârtence na jerarchia do sangue, do poder ou do talento. Eis aqui o destino de todas as grandezas que devem a existeticia, nSo ao mé- rito e á virtude, mas ás lisonjas do génio prostituído^ ás inspirações da poesia degradada, aos enredos da intriga, a tudo quanto pôde ser posto em acção pelo pelor dos dois homens que ha em cada homem.

ha um meio de edificar solidamente para o tempo e para a eterai- dade: é edificar ^obre a virtude. cila é grande depois de Deus, e as obras em que ella mette a mão sno ooras immortaes. A morte passa por filias desar- mada, o tempo inclina-lhe, reverente, a frente encanecida ptlo gelo dos secuios, e a posteridade recebe-as como única herança que lhe pertence, porque »ó acceita o que escapa á linha do tempo e á foice da morte.

Quando a adversidade entrou em casa do conde e^ fortuna saiu. a vir- tude não se retirou. Comp.i.nheira fiel nos dias da gloria, n3o o desamparou nos dias do infortúnio. Depois de fazer que não se deslembrasse com os risos da prosperidade, fez que não siiccumbissc com os revezes da desgraça. A]udou-oa ser feliz com sabedoria, ajudou-o a ser desgraçado com valor.

Este campo, confesso-o, para o 1 ilustre finado está matizado de flores, mas para o orador está coberto de espinhos. Apresenta flores de alto preço, m^s difficeis de colher, e de um aroma que pôde ser jusiamente apreciado por um sentido delicado. E deverei eu deixá-las moirer na obscuridade, onde foiam tio diligentemente cultivad?js? Não: ird com cautella por causa dos espinhos, mas hei de colhê-las, e ate espero íjzô-las amar. peço duas coisas: bom uso do espirito e do corsção.

Cada um do vós s-ibe o que são convicções (não tractemos agora de apre- ciar o valor d'e'la^; as b )as lOtA.im-se; as ruins lamentam-se; insulto nâo se faz a nenliuma. Mas, se antv's quereis, dcbçamos da esphera intellectuai para a moral, da rcgiào do e«.jH>ito pira a do coração. Cada um de vós sabe o que éo amor de uma idó.% de um principio, de um systema, de uma causa; e, sabendo isto, sabe e^u. lau-nte o ljuo s.'.íU ;?mar uma, Jogar as armas, expor a vida por ella c perdé-la! Jui.ri;,e anula -íb 'y.T.pathias do amora firmeza de um chzracter nobre de um cimracter port'ii.Miez. Agora, corao*faIo a. pessoas ét esplritt subié*

àKorro \iT 66S

c coraçSo delicado, peço a todos que decidam (fazendo bom uso de um e outro); fue deverá fazer um homem que perde uma causa que ama? Julgo que decidi- [.rti3 comigo, que lhe restam ttes recursos: ou morrer, ou abandonar a causa, PU retirar-se das scenas do raundvi. iv.orrer succumbindo, não pertence ás almas cner^cas: morrer attentando contra a vida, nSo pertence ás christas : abando- nar a causa, pede um tríplice sacrifício que o mundo todo condemna: o das convicções, o das sympathias, o da firmeza de character. Que restava ao conde, {ttflo podendo morrer, nem abandonar a causa V Retirar-se d.is scenas do mundo. H' o que fez ; resistindo, ainda nos uliimos annos da sua vida. ao convite que lhe fizeram para acceitar o car^o de ministro e de conselheiro doestado.

Retirado, pois, das scenas do mundo e reduzido a uma vida de obscuri- dade, aquelle que luzita num thcatro e>p!endido, que assistira aos conselhos dos reis, e que exercera os mais honrosos carjs^os da republica; devia, porque era bomem, sentir as luctas que occasionam simtlhantcs sinistros; mas -era nestas luctas, neste fogo lento, ncste-crysol, que a Providencia tinha resolvido acabar de purificar a sua virtude. A adversidade, que abate os espíritos fracos e eleva os fortes, nSo abateu o seu, elevou-o. O conde adorava os decretos de Deus, ▼ivia resignado, purifica va-?e, ia sa:udindo o da sua passagem pelo mundo, occapava-se do infinito e do eterno, dava ao céo um espectáculo digno d'eUe. Tal foi o caminho recto por onde u.timamente o conduziu o Senhor, o caminho recto da iealgnaç9o.

Francisco Raphael da Silveira Malhão, Sermão, cit.

XLvni l/m trecho do discurso sobre a "Charles et George,,

« «

Os heroes sao excepções monstruosas da nossa natureza; podemos van-

glor/ar-nos de vermos os seres da n- ssa espécie exctder as condições ordinárias

*^í nossa existência mas essa valjoí^a s:i:jsf.-:i;^o custa sempre cara. Os heroes

^0 uns fillios pródigos da nntiirczi e da soci-^dade, que dispõem, em proveito

^n suas paixões, do oiro, do «^ngue e da honra do mundo; que sacrificam aos

^ÇM Cí-pric^os quanto ha nVlle d-: niais santo, de mais nobre e de mais sympa-

%C0, (Apoiados) e a Provioenc ia, que casti^ja bcmpre, ainda que por diversos

íliodos, os que se esquecem da huniild.idc do hcrço commum, ou lhes esconde

^ lousa da sepultura piira que os dt J; ml-r m, uu lha deixa apontada a indigna-

V?o publica para que os aiK riscam. {Ví.zls:— .Muílo bi m.)

As ondas tocadas da t. n.pcitr-Jj \ õ;cm lurjcsí-mnre no penhasco que as assoberba. N*esta lide íiircjpLilarí^-sc. an,<- ,tcL^l-^t; s( bem utnas sobre as outras, repetem assim os ati^qt^es, ndubr. m (.s aio iiic^síis, a-é que pai^rm á altura Onde a resistência ss levou, c rie lá. f:;;;^'.^as e discti^s cm espuma. c.Uni no tnar de onde sairam, no mar de oik!c cra.n, no n:ar que lhes de(a a fo:ça, no mar cm que se tornam. {Vozcí: ~-■:<'^ \\\j uei.n. O.i hero !s sao escas c. tarataá passageiras, estes cachâos e.num.-sos. k) m:.r é a hum ird.i .o,; cmio cila larao, vasto, Immenso, como elia qu^rcnd') seiíiine s,.ltj' fúr ^ dis su.^?, barr^.iias, fu^^ir ás leis que o domesiicmi, e vil.a ido ^•:ll..e a.v-ar d.i :.ui infiuict v'«o, aos principlos da harmonia natural a 'jue r ''-<'•' ^n: es;: m:j. i. Í, e pára 'con- servar os quaes f->i errado, h k-reri '\. :> \- w:,. s' . :e, ;.;- r. ^^, d- .- p^nn.scos em Queas ondas não br tem que o .-m an ...v f c', t;.v' : l :.'. . ./■:,;, » :-. ..: j,( s- sas vistas pela luta que so ue ell 's s^ ['•'v-.ra." í-^i-.ir s n,,. ifr.^^r.i.:,r lo'^í.)A7\-í;,\o Mm belezas que satisfaçam a n >:..' cu « ' /' •. ne; : i ;. u. m o ii..>> . p, ^^ni >. Sr. pr«sident«, esse incsnio i oní--.:! k\-.c íoi r. jit do o ísaiv.: iur d.. hnr.Çii

6C6 . AMTOtOQLà PftOSA

O dotnador da anarchia, este grande capItSo que venceu tantos povos, mas qae nio pdde vencer as idéas, esse guerreiro estadista, a quem attribuem a gloria de ter segurado a regeneração europea de 1793, esta mesma entidade histórica pa- rece-me que se poderia ter dispensado e suprimido, e que a sorte da £uropa seria a mesma que hoje é, ou ainda meihor, sem as suas batalhas, as suas victo* lias e as suas leis. O génio dos acontecimentos e da civilização é mais poderoso qne o génio dos liomens. (Apoiados).

i:u tenho asco á guilhotina e nio tenho consideração peia espada» qiundo eila serve a violentar os povos, porque a guilhotina é sempre a ignominia das revoluções, e a espada muitas vezes o opprobrio dos governos. Mas se nós ti- rássemos da historia o grande vulto do verdadeiro Napoleão, pelos mlLiares de vidas que se perderam nos campos da batalha, teríamos a contar mais alguns milhares de cabeças decepadas nos cadafalsos poliiicos, e o curso dos aconteci- mentos' teria sido o mesmo, afora a differeoça moral d 'estes martyrios. porque os destinos do mundo saltam por cima das baionetas e dos potros, e seguem a sua vereda sem haver nada que os detenha nem os desvie. (Apoiados). Por estas razões pjra mim, quancj menos heroes melhor, e se digo isto dos heroes que verdadeiramente o são, que será dos heroes que apenas pretendem arremedal-os?

N'um jantar dado em Paris em prol da liberdade dos negros, mr. La- martine pronunciou um discurso inspirado peios princípios mais humanitários e pelas ideas mais elevadas, c julgando necessário doutrinar o patriotismo francês que relujtava em ceder ao dirciio de visita, disse apoiando-se na auctorídade de Mlrabeau pouco mais ou menos estas palavras : «Consistirá a dignidade da bati' deira francesa em tornar invioláveis os navios empregados no trafico da escra- vatura, verdudiiros túmulos fluctuanies, ou em dt fender o santo principio da Uberdade c humanidade conquiciada em nome de Deus t em proveito de todoê os homens?

E émr. Lamartine, ess2 pos a que carpiu todas as misérias da humani- dade, qne exiltou todas as suas g ori .s, que excitou todos os seus melhores ex- tinctos, que levantou a corag.m djs povos, que acalmou as suas demasias, qne ^ suspendeu cooi a sua palavra tjd,s as patxÕ;^s revolucionarias da França: esse homem cuja composição moral e intellectual, é no meu presentimento como o simulacro da futura politica e dos futuros governos na Europa ; esse homem qne depois de tanios servivos e de tantas lides, pede que o deixem ter sepultura honrada na terra em que teve o h^\ç^ ! .)nde escamos nós? Onde está a França que nós co.ihccijmos ? Choremos todos por ella» porque o nosso pranto é pela dvilízaçSo (Vozes :— ^\\x\xo bem).

A França não sabe honrar os seus melhores cidadSos e manda, e presta os seus canhões para o serviço da escravatura ! Comparemos a França no Zaire e em Moçambique, com a França a quem mr. Lamartine pede em vão que lhes resgatem da m9o dos seus credores os bens paternos, onde está presa a soa alma de poeta e filho (Apoiados). í'agar as dívidas de mr. Lamartine e honrar a firma das suas virtudes, é de todas as homenagens que sio devidas ao seu ca- racter, talento e serviços, render-lhcs apenas a mais grosseira. Oh I não permitia Deus que seja castigado o povo que ouve sem emoção as queixas de tio nobre infortúnio e se mostra tão tardio e difficil em lhe dar allivio e consolo (Apoia- dos, Vozes : Muito bem, muito bem),

José Estevão, Diário da Câmara dos Deputados, SeBsã3 legisUtiva de 1158- 1159, v«l. !.•, jpig, 334.

ZLIX

O %r. Mínístrd

Tiburdo esfreara-se nos trib-^naes rtn causaaf crimes. A Imprcnw )onui- líftlca pubticoi> trechos dos s* us discursoi tonenciaes de eloquência commo* vtMicc ; m<is elie afto se sentia bem ; < periavam-se-ine os horizontes que sonhara. Nãu qu« lia salvar deiinquintis que a bt a pr( pi ia ccnsc.encla sccusava. Queria Salvar a naçAo. Ancirva as gio ias Comidas do pail. mento. Amí>lia, que lhe conhecia a itprgnancia em ir a Relação combinar a dJ.sa am es crimÍnosoS| pwdlii multo ao \ij que em.)enhass^ as suas reiavOes p.ra que Tiburcio fosse i Oim ^ra. O bispo, as auc or dddes, c a fama do orador apUnaram as difflculda- dts. O dr. TiDuiciofoi eltiio por SinfSes ac ^o que foi por Sinfâes, devia ser por Sinfâes - um t\ obre de dcputad' s talentosos que vem aempie á iiu politict por aquei e ventre laxo c fecundo de Sín ScS.

« Uebutou espKndidamrnte > disseram os jornaes do governo. A oppvsi* ÇSo ach(u-o mttaphysico. nenulohO con.o um p ntano de mairuj^ada. Dcfendí.a a eleição crmnta do circulo 70^ como quem dt fendia um réo do parriAdio, com as mesmas phrascs plangente» dos tilounais do ctime A opposiVHO accusava admlnistriidor do conct lho como se elle fosse o Mattos Lobu ou u Luis Negro. O mi smo'con&umo de rhet^ ri;a. c eia ne vitrioio, de parte a p.iite. No fim da le- gislatura o dr. Tibufiio confe^s* va que. ne^te diluvio de porcaria, as bistis eram tantas e aiarca tâo pequena que a final nâo se salvava ninguém, por causa das bestás.

Eu queria ser ministro tiès meses dlzlj clle um dia a Amália» Eslt pais grangrenalo binda podia saivdt-se com uma grande amputaçS>.

Ella começou a imaginar que o seu marido podia ^al/^r o país «ou ttma grande amputaçi > e o lio cónego p rgunt^va ao sobrinho, sorr donte:

>M.s que diabo tem o paíi ?! \ingucm por foia me cheira a g ngrena« Reinam es rneunaiismos e oscaU>rrhos; mas quanto a p dndào. náo sei dt nenhema, fora d^ s holpitacs. hu, se fo»se ^ ti, meu Tibuiclo, nào ^mpuuva nada, sendo ministro.

O dout <r insistia em voltar a^^ parlamento queria dizer as derradeiras t solemnés palavras cuspidas a face do cynismo publico, encdrvoarcom o estigma da infâmia a entupida tndiffererça geral, inclmai-se sobre o loito de Portugal agonisante e psa mearihe threnOi de destruição como Jeremias sobre o reina de Israel E o contgo :

Parpcc-m\ que voltas aos se^mO s de casa das Botelhas. Fsscs sermSas do parlamento, se ninguim es enccmm^nda. sjmp.e ha uma n<<ç9o que os pa- gue;— a poDre nação garg cnadd, mas a sim mtsmo a pagar ao!« medipos c m rara pontualidade! Ti mrcm, nadj de amputaçdwS, que te nSo vA ficar a doeata nas mãos por causa da hi morrh^ ga.

NSo ' biante, o con go i ab olhava pira a rIetç'o do sobrinho por um circulo d Porio. Amiliri p dia lho c >m instancia nào para abrir ao marido a veeda dos '^on^^e tios di co ôa, m s parque tinha cus iimâs casadas em Lis- boa, e qut^ria muito estar peno d'e<lHS Padre loâo Pv^ngciista diiva se rom os influentes notáveis, grandes firmas com merct; es poteni. do- du suffiaglo que tinham os arsc'^a(s ú.\ sua populaiidadc nas ro fif-rns. Acois». In^v^rr-lne que orientasse o doutor dos mananciais d^s irmandades fontes limpas d^ votes aue oapresentassi ao Sou:a B«s o. da Frlnladi ao -oliad».! a, ao visconde, do Alpendurada, ao Carneiro Giraldes, ao Custtdií Pinh iro, ao Forquato, á aris- tocracia de Cedof ita ao Fi^^utire^io, ao Dourado, e outros memurcs da Oíd^m Terceira de S. Francisco uns finoiics que a ubiiiU tuda.

663 ANTOLOdU PAosi

J.Í.

o doutor nlo transigia com oi maus hábitos da mendicidade. Se ellc queria jarretar excrescencl&s canceradis no orj^anismo nacional, o mais pédre áw membros era a corrupçlo do suffragío por meio de dinheiro aos pobres ou át abjecções aos ricos. De mais a mais, o insinuar-se nas irmandades parecia- Ilie carolice estúpida ou hypocrisia canalha. Apesar da esposa, elie teimava em nSo ir prorurar os irmãos da Ordem Terceira, ao passo que o tio cónego mexia •s peusinhos. desculpando o doutor com as suas muitas ocupações juridicas. A Ordem Terceira de S. Francisco estava conquistada, desde que o cónego fi- zera inscrever como Jrmio o doutor Tiburcio Pimenta.

Fallava-se muito em reforma ministerial. O ministro da fazenda em con- sequência de se aggravar o golpe d^ um cailo, recoIiera-se á caraa; o ma- rinha tinha-se constipado a bordo de uma fragata, onde íôra ver a Dolacha<se tinha o feitio que eile indicara n'um lindo des nho em que a poesia se dava ás ■loa com a geometria linear. Esta/am c'ieios de gloria, mettidos na cama, um com emplastros emolientes, outro a mastigar pastilhas de Naphé, um repuxo de espirros.

Se agora estivesse em Lisboa, Tiburcio, talvez entrasses para o mi- nistério— dizia-)he Amália-

Nflo sejas cre^nça. Homens da minha inflexivel independência po- dem ser ministros, se o povo e as armis os impõe ao Poder Moderador. A mi- nha colnmna vertebral *n9o se cirva nem ao povo, nem aos argentarios, nem á ctmarilha. Nunca passarei de bacharel Tiburcjo Pimenta, natural dj Ganda- rella. e advogado nos auditórios do Porto.

E irmSo da Ordem Terceira de S. Francisco -*iccres:entou o cónego. te mettif e de \k sahlrás deputado nas primeiras eleições. Eu conheço o Porto melhor qae tu. Isto aqui é Braga com mais alguns mi heiros d^almas.

Um dia, ás sete da manhã puxaram fortemente á campainha do doutor Tiburcio. Desceu a creada á cancella, e viu un homem de boa compostura se- raphica perguntando se podia failar ao snr. doutor. Era um sujeito calvo, it óculos verdes, sobre um nariz muito verrug)so, com umi venta obsttnida.

Que ainda estava recolhido.

Que vinha trazer-lhe um officio a dar parte a sua senhoria qae Mra no- meado m'n'stro E entregou-lhe o officio.

Faça favor de dar da minha parte os parabéns ao snr. ministro; diga* lhe que é o Lavanha, o irm^o Campainha.

O irmSo de quem?

O Campainha, o Lavanha : o snr. doutor bem me conhece, que eu tam- b^^m sou escre"ente no escriptorio do Bandeira; e tenho vindo com pa- peis ao snr. doutor. Não se esqueça de dar os. meus parabéns ao snr. ministra. Adeusinho m»nina.

A creada subiu multo açodada, offegante, a chamar a ama :

O' senhora, ó senhora, um officio a dar parte que o snr. doutor está ■inistro !

E Amália, muito alvorotada, correu com o officio ao quarto, e abriu a janella, exclamando :

T'burcio, Tiburcio, parabéns! estís ministro! Aqui está o officio!-

E deslacrava o sobrescripto sem o iêr para dar o officio ao marido que 6€ sentara estrouvinhado na cama, a esfregar os olhos. O doutor leu :

///.*"• Snr. Dr. Tiburcio Pimenta A Mesa da Venfroveí 0rdim Ter- ceira de S- Francisco, d 'esta invicta e heróica cidade, do Porto, tem a satisfa- ção de participar lhe qw hontem, ítn reunião geral, foi V. 5* unanimemente eieito Ministro da mesma Venerável Ordem Terceira de S- Francisi0,

Til^Hrcio ma:huc«H o papel, ati.ouo ao tapetei e disse:

nàatho z}X 6èd

Ní« valia a pena accordar-me para isto, Amália I

£ ella, con ns olhos cspantad^iminte espasmódicos na cari esquisita naiM», disse com um grande desalento:.

Ministro da oídem terceira de S. Francisco! Ora bolas!

O cónego, que »inha ouvido fallar em ministro, entrou n'csta conjun- ctura, e perguatou o que era. Amália explicou co.n muito desdém a nomeaçã© de ministro da ordem teiceíra ; e o tio com gravidade, e um pouco de mi- guelismo :

Pois éu antes queria ser ministro da Ordem Terceira de S. Francisco das Chagas, que minisiro da primeira ordem da Senhora D. Maiia da 6r!oria.

Camillo Caslello Braaco, Narcóticos, i, págs. 243-249.

A morte da lobi

Uma noite de novembro cahia neve, e os aspeotos do céo profundamente fri« tinham umas estrcUas iremulãs. lucilantes, e um luar áfgido que dava ás ctncavidades nevadas a claridade nitida d' uns lagos de prata fundida. U padre vestia polainas de saragoça ass';rtoad.is, tamancos ferrados e suspensos nas for- tes presilhas das polainas, jaqueta de pelies e uma carapuça alemtejana escar- late, que lhe abafava as orelhas. Debaixo da lapel.a da vestia resguardava a escorva da clavina, e caminhava curvado com as màos nas algibeiras e os olhes vigilantes nas gargantas dos serros. Uivos longínquos do lobo cuviam-se e pu- ahara-lhe vibrações na espinha, e um terror g-ande n'aquclla Immensa corda At serras, onde elle. áquella hora, se considorava o único ente exposto a ser comido pelas feras esíomeadas. Pulava-lhc o coração. Ao tiepar a um outeiro, entaliscado de rochedos que parenam resvalar de encontro a elle, ouviu o uivo alll perto, para da espinha do serro. Tirou a clavina do so/aco, e livido, com a sensação estranha do ficado dzspegjdo, metteu o dedo tremente. autOr matico no gatilho. Fez um acto de contri:ç.^:>; pr)vava quanto as re'igiões sflo ' importantes, urgentes, nas crises, nos con flicto > ^órios do homem com o lobo. tisperou. A fera assomara ni lomba do outeiro, recortando-sc esbatida no hori- sonte branco com uma negrura im^iovel, sinistra: parecia um bronze, um emblema de sepulchro. Eila quedou-se por largo espaço n*um aspecto de admi- ração, de surpreza. Depois, descahiu sobre as patas trazeiras. com ares contem- plativos, de uma pacatez fl:ugma:ica. Mediam trinta pissos entre a fera e ô frade. Estava ao alcance da ba!n o lobo; nias o frade, caçador astuto, manhoso, receava perder um dos tiros. Pôs-ihe a pontaria com um gesto de espalhafato; áava gritos como quem aç.ila cães : " BCkh I pi''>7 1 ! cjr:n I Ahi v.ii lobo ! Echos respondiam; e a fera. men)? versada na piy ica dos S';ns reflexos, olhava crespa, espavorida para o l:'do em nnc rcncr uriam os braJos. Prgueu-se, desceu mui de p^.sso, com uns va^^ires ironio?, coni a cauda do rojo c o dorço erriçado, a ladeira da colina. O pa.lro via-.i ncgr jjr na linli.i íLxuosa do declive. Pensou retroceder; m^s o K garejv) de Fi liria ctiva m ns perto oiic a sua aldêa, e para aquelle Ia':io lytiam c^^rs d'!'m faro q.r: adivinha o loDo antes de lhe ouvir o uivo, e o farisca^i pela inquiLí-ç^o das ifr/xs w. s ru r.ies. Ticpou afoito ao teso do outeiro: gjnhpra anini); o i):ra uns tm^TOíi de ;!;íuardcntc d"umi cabaçi atada com o polvorinho no C(.'rr( ào. Scni;u--;p r «p.;/ d : ai:"rontnr o rebelde, se elle o n3o respeitHSSc cotio rei da crcnçào sef;nn io "fíir:nr.ti^a^ de iheologos que nunca viram lo>o Do topo olhou pira b.ixo: n?í') o nvistou. Carcav.j-se nm algar ommaranhado de bravio esp.sso f nde se cmbríir.ára. Estucando o pass#, gankou uma «ha ladeaiu de extensas leiras de feno alvejantes como um

^ro AVTOLMll «-^ MOIl

estendal d^ Icnrô^s; c. qumdo olhava para trás receoso, viu a alimarfa, a ^^o- des passos, com a cab ça aiu atra«rcsiar a 1 ira da csquetda, pjrtondo querer c«rtar-lhe o passo na extrema do caminho qje entestava com a aidêi. O padrs agachou se, costu se com o valio de urzes e gestas que furmiivam o taoumo das terras cuUiviid >s, e muito derr ado. arg icjuidu com o dcd > no g^til to. e a fecharia rent« da barba, camiihou parais 1j con o tobj lue o fart|iva de foci- nho anheiante e as orelias fi as; e a^sim que a f:ra passou de perfí) e n frente do taplgo, o rei di creaçlo. qu^ o era pjlo Jirtito do oacam^rte de<ip dtu-iie primeira bala com a dstra pontaria de qucm havi.i \A m tbd > agui. s o>ni zaga oies. O lob i, varad > p ia espáioa aié 40 cor<içào djcaUiu sobre um àoi quadris, escabujou em roncos fr«mc-iitrs, e>p.rgindu fl^coi de nevc, ergueu>se ainda inteiíf^ado n'uma grande ago.ita, e morreu.

C. C. Braaco, ii;ai#t6t0 Jídêurio, ed. de 1687, pii. 35-37.

LI

Suave m.lagre

Entre Fnganim e Ce 'arca, n*um casebre desfifarradn, s*im'do na prega de um cerro, vivia a esse tetnpo uma v u/a mjis desgraçada mulher que toddS as mulheres de Israel. O seu fiin : uhic*), ludo «ilci) <do. pjis^ra do migro pe^to a que ella o creára, pa a os farrapos d^ eiiterga apvjdrccida. ondj jazera, sete annos passado^, mirra ido e g.'men'lo. Faib. m a ella a úo nça a enge- lhara, dentro dus trapoi nunoi mudados, mais escura e torcida que uma cepi arrancada.

E sobre ambos, espessamente a míscria cresc- u, om o bo^or sobre cacos perdidos n'um ermo. Ate na lampadi de barro vermelno seccára havia mu.to o ai;:ite. Dentro da arca pintada nào resta/a grão de côJ.a No estio, sem pasto, a cabra morrera. Ocpois no quinteiro seccárj a figueira. Tào longe do povoado, nunca esmola de pio ou mel en rava o porial. h her^^as apam^dtS nas fen- das das rochis, cosidas st^m sal. nutriam aqm lias cri atuas de Deus na Terra Escolhida, onde até ás aves m ncficas sobrava o Fustrn o !

Um dia. um mendigo mirou no cas b e rep.irtiu do seu farnel coma mSe amargurada, e um momento sentado na pedra da lareira, coçando as feri- das das pernas, contou de sa grande esper «nçi dos tristes, cs:»e Kabbi qne appirecera na Galilóa, e de um pio no mehmo cesto fazia sete, e amava toJss as creancinhas, e enxugava tod. s os prantos, e pro-rettit aos nobres um grindc e luminoso reino, de abundância maior que a Côrie de S-lomâo A mulher escutava com olhos famintos, tsse doce Rabbi, esperança dos trlitts, onde se encontrava?

O mendigo suspirou. Ah! esse drc? Ribbi! quantos o desejavam, qoc se desesperançavam i A sia fama anJãva pir sobre toda a Judéa cimoosol, que até por qual ^uer velho muro se es ende e se gosa ; mas, pjra enxergara eliridade do seu resto, aquelies ditosos que o stu d sejo e clhia Ot)ed, tio rico, míudárj os sous sei vos por toda a Qaiiléa, par«i qu« procurassem Jesus, o chamasícm c im promessas a t-nganim; Se.)tim>. rã) sobcianj, dtsta- oára os sus soldados aic á costi do mar, p«ra que buscassem Jtsus. o c^nduz*s- sem por seu mando a Cesárea. Kirando esmolando por tantas citradns, elle topara os servos de Obed, depois os legionários do S p^mo. E todi s voltavam, como derrotados com as sandálias as. sem ter descoberto em que mattaoti cidade, em que local ou pilavio, se r&condia Jesus.

A tarde caía. O mend go apanhou o s u bo dSo, desceu pelo duro trillio. entre a urze e a rocha. A mM reformou o seu canto, a mSi roais vergada mil* abandonada. £ cniio, o filninho, num murUiU.io maiS debii que o lOÇar d'ttOii

•éCULO ZIT 671

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asa, pediu á mSi que lhe trouxesse es^e Rabb^ que amava as creancihhas ainda as mais pobres, sarava os maies ainda os mais antijros. A mãi aper^u a oabeça esguedelhada :

Ob filho ! e como queres que te deixe, e me metta aos caminhos» i procura do Rabbi da Galiléa V Obtd é rico é tem servos, e debalde buscaram Jesus, p T areaes e colinas desde Chora^in até ao pais de v*oab. Septimo é force e tem soldados e debdide correram por Jesus, desde o Hebron até ao marí Como queres que te deixe? Jt.sus ai di p^r muito longe, e a nossa dôr mora comnosoo dentio d'est4s parede*-, e denco d'ellas nos prende £ mesmo que o enooiítrasse, como convenceria eu o Rabbi tâo deneiado, por quem ricos e for« tes suspiram, a que descesse a;ravez das cidades até este ermo, para sarar um entrevadihlio, tSo pobre, sobre enxerga tão tota V

A ereança, com d'ias lo igas lagrimas na face magrinha, murmurou:

Oh mai ! Je'«i;s ama iodos os pequeninos. £ eu ainda tão pequenc^ e- com nm mal tfio petado, e qui tanto q jeria ^arar !

Oh meu fi h ), como te possj d u ar ? Longas s9d as estradas da Ga* liléa, e curta a piedade dos homens. Táo rota, tSo trôpega, tflo triste, até os •Sei Ia|irariam entrai a porta dos casaes. Ninguém atttndeila o meu recado, e me apontaria a morada do ducc Raobt Oli fíiho ! talvez J.sus morresse. . Nem mesmo os ricos e os fortes o enojntrain. O céu o trouxe, o céu o levou. £ com elle para sempre morreu a esperança dos tris'.ts

D'entre os negros trapos, erguendo as suas pobres mãozinhas que tre- miam, a creança murmurou :

Mfii, cu queria vêf Jesus...

£ logo, abrindo de vagar a porta e sorrindo, Jesus disse á creança :

Aqui estou.

Eça de Queirox, Sttave milagre,

LII

A chegada a Tormes

... o carregador lembrou que perto, no casal da Giesta, ainda perten- cente a Tormes, o caseiro, seu tompadie, tinha uma boa tgua e um Jumento... E o- prestante honem enfiou n'uma carreira para a Gie^ta emquantoo meu Príncipe e cu cabíamos pira cima d' um banco, arquejantes e succumbidos, como náufragos. O v;isto Pimentinha, com as mios nas algibeiras, não cessava de nos contemplar, de mu murar : « b' de arrelia ». O rio defronte descia, preguiçoso e ctmo adorm*-nLado sob a calma pesada de maio. abraçando, sem um sussurro, uma larga ilhota de pedra que rcbiilhava. Para além a serra crescia em corcovas doces, com uma fuada prega onde se pninhava, bem junta c esquecida do mundo, uma v llasinhq clara. O espaço imcnenso repousava n"nm Immenso silencio. N'a^uil!as s. lidõe- di monte e penedia os pardaes, re voando no telhado, pareciam avts considiraveis. £ a massa rotunda e rubicunda do Pimentinha dominava, atrlhava a ri^i^o.

Está tudo arranjado, meu senhor! Vem ahi os bichos !... o que nSo calhou foi um selimsin^o p.ira a juTitnta !

Era o carregador digno ho.n m. que voltava da Giesta, sacudindo na mSo. duas esporas desirmanadas e ferrug-ntas. H nào tardaram a apparecer no cónego, para nos levarem a Tormes. uma cgua ruça, um jumento com albarda, nm rapaz e um podengo. Apertam s a mão suada e amiga do Pimentinha. Pu cedi a cgua ao senhor de Tormes. E começamos, a trepar o caminho, que nao St alisara nem i% desbravara desde os tempos em que o trilhavam, com rudes

6^2 iKrCLOWl— PROaA

sapaties ferrados, cortando de rio a monte, os Jacinthos do século xvi -Logo depois de atravessarmos uma tremula ponie de pan, sobre um riacho quebrada por pedregulhos, o meu Príncipe, com o olho de dono subitamente aguçado, notou a robustez e a fjnura das oliveiras. . . E em breve os nossos males es- queceram ante a incomparável b:lieza d'aqucllfl serra bemdita.

Com que brilho a inspração copiosa a composera o divino artista que hz ns serras, e que tanto as cuidou, e táo ricamente as dotou, n'este seu Por- tugal bem amado! A grandeza egualava a graça. Para os valles, poderosamente cavados, desciam bandos de aivondos, ião copados e redondos, d' um verde tio moço que ersm como um musgo macio onde appetecia cahir e rolar. Dos pendores, stbíanceiros ao carreiro frai^cso, largas ramarias estendiam o seu toldo amável, a que o esvoaçar kve dos p.^ssans sacudia a fragancia. Atravez dos muros seculares, que sustem as terras liados pelas hcas, rompiam grossas raizes colliantes a que mais heta se enroscava. Em todo o torrão, de cada fenda, brotavam flores silvestrats. Brancas rochas, pelas encostas, alas ravam a solida mudez do seu ventre polido pelo vento e peio sol ; outras, vestidas de lichen c ét silvados floridos, avançavam como proas de galeras enfeitadas ; e, dentre as que se apinhavam nos cimos, algum Ciísebre que para galgMra, todo ama- chucado e torto, estreitava pelos postigos negros, sob as desgrenhadas farripas de verdura, que o vento lhe sem ,ara nas tcliias. Por toda a pirte a agua susur- rante, agua fe:undante... Espertos regatinhos fugiam, rindo com os seichos, d'en(re ai patas da égua e do bnrto; g ossos ribeiros açudados saltavam cora fragor de pedra em pedra ; fios diriitos e luzidos como cordas de prata vibra- vam e faiscavam das alturas aos barrancos ; e muita fonte, posta á beira de ve- redas, Jorrava por uma bica, beneficamente, á espera dos homens e dos gados... Todo um cabeçD por vezes era uma ceara, onde um vas:o carvalho ancestral, solitário, dominava como seu senMor e seu g larda. Em sucalcos verdejavam laranjaes resccndentes. Caminhos de la^es soltas circundavam fartos prados com carneiros e vaccas reiouçando : ou m^is estreitos, entalados em muros, penetravain sobre ramadas de parra esp^ss^j, n'uma penumbra de iepou*^o e frescura. Trepávamos entSo bl^uma ruasinha de aldeia dtz ou doze casebres, sumidos entre figueiras, onde se esgsçava, fugindo do lar pela telha vã, o fumo bratico e cheiroso das pinhas. Njs cerros rcmjtos, por cima da negrura pensa- tiva dos pinheiraes,- branquejavam e midas. O ar fino e puro entrava na alina, c n*alma espalhava alegria e força. Um esparso tilintar de chocalhos de guizos morria ptlas quebradas. . .

Jacintho adiante, na sua égua ru;a, murmurava:

Que belleza!

E eu atrás, no burro r^e Sancho, murmurava :

Que belleza 1

Frescos ramos roçavam os nossos hombros com familiarldado e carinho. Por trás das sebes, carrc^jd-ís d'a-noias, as m-ícieiras estendidas offcreciam « suas maçSs verdes, porque as nà-) tinham ncuiufuS. Todos os vidros d tima casa velha, com a sua cru/, no to,jT, tlíu ^^ir^n^ hospitaleiramente quando nós passa- mos. Muito tempo um me K) nos sjf^uiu, de azinheiro a olmo, assobiando os nossos louvores. Cl). «^ííIo, uivSi - melro ! H.hm-^s de macieira, obrigado ! Aqui vimos, aqui vimas! t s^tu;:- c.-iti i^) fijai^iuos, serra tão acolhedora, serra de fartura e de paz, serra hj-ndua entrv^ a- s rr-s !

Assim, vii^í^iosnmcii e c rn.'jraviini:dcs, chegamos áquella avenida de falas, que sempre me encan ára pela sua íiJaiga gravidade. Atirando uma ver- gastada ao burro c á epua, o nosso r;p'x, crin o seu podengo sobre os calca- nhares, gritou: « Aq-ii é (jue eMcir.os, inei^s amosi » E ao f ando das faias, com eífcíto, apparecia o poruo da duiiUa de Tcrmes, com o seu brazSo de ar- mas, de secular granito qae o r'' us 'o re-.ocava c mais envelhecia. Dentro os •àts ladravam co.n furor. E quando .laciuho, na sua suada égua, c eu atrás, burro de Sanciío, tran^postnios © limiar solarengo, desaeu para nós, do alto

S]&GDXiO XiZ 073

do alpendre, pela escadaria de pedra (fasta, um homem nédio, rapado eomo um padre, sem coHete, sem jaleca, acalmando os cSe^ que se encarniçavam contra o meu Príncipe. Era o Melchior, o caseiro... Apenas me reconheceu, toda a bocca se lhe escancarou n'um riso hospitaleiro a que faltavam dentes. Mas apenas eu lhe revelei. n'aqucl]e cavalheiro de bigodes louros que descia da égua esfregando os quadris, o Senhor de Tormes— o bom Melchior recuou, colhide de espanto e terror como diante d' uma avantesma.

Ora essa !. . . Santíssimo nome de Deus! Pois entflo...

E, entre o rosnar dcs cães, n'um bracejar desolado, balbuciou uma his- toria que por seu turno apavorava JacintliOj como se o negro mur« de casarfie pendese para desabar.

£. de Queiroz, Â Cidade e as Serras, pág. 191-214.

LIII

Um telefone em Tormes!

E agora, entre roseiras que rebentam, e vinhas que se vindimam, cinco annos passaram sobre Tormes e a Serra. O meu príncipe não é o ultimo Jacintho, Jacintho ponto fin^l porque n'aquel'e solar que decahira, correm agora, com soberba vida, uina gorda c vermelha Theresinha, minha afilhada, e um Jacinthinho, senhor muito da minha amisade. E, pae de frimilia, principiara a fazer-se monotomo. peia peifiiçSio da belleza moral, aquelle homem tSo pittoresco pela inqúiet.çao phiiosophica, e pi los variados tormentos da phap- tasia insaciada. Quando elle aj^ora. iom sabedor das cousas da lavoura, percor- ria comigo a quinta, em solidas palestras agricplas, prudentes e sem chimeras eu quasi lamintava cbse outro Jaciniho que colhia uma^theoria em cada ramo d'arvorc, e riscando o j-r rrm a bencala, planeava quoijeiras de cristal e porceliana p»ra fébr-cf-r Giicjini;cs que custjírism duzentos mil reis cada um!

Também a paternidí ce Ibe desrcriá-a a iesponsabi'idcde. Jacintho pos- suía agora um caderno '^o contas, aindc pequeno, rabisci^do a lápis, com falhas, c papeluchos soltos entre rnfjií^os, ni;s onde fs suas despesas, as suas rendas se almhavam, como dnys hostes disciplinadas. Visiiára as suas propriedades de Montemor, da Beira; e Oínicírtava, rrobilava as veibas casas d'cssas proprie- dadts para que os seus fi hos' mais tirde, crescidos, encontrassem «ninhos fei- tos». Mas onde eu reconí-eci ene definitivamente um perfeito e ditoso equilíbrio se estabelecera m ijlmn de meu Piincip-^, foi quando elle, sabido d'aque]le primeiro c ardente f M.'U'sm > da Simpíic*dade entrcabrio a porta de Tormes á Civilisaç?o. Dons mcNOS a tcs de nns:er a Theresinha, uma tarde, entrou pela avenida de plí^tmos nnia clii.mio e loiítTa fila de c^^rros, requisitados por toda a freguesia, e aí-uíuKidíJS d", cpixot' s. hrnm os famosos caixotes, por tanto tempo en^^alhados cm A!ba d*- To m-^^, e qi^o ric^av^^m para despejar a Cidade sobre a Serra. Eu penjei: Mpu! o meu p brc Jacintho teve uma recahidal Mas os confortos mais co-nnlM-.Hli*?, cu.; confnha a'iu. lia caixoiaria temerosa, foram, com surprezn rrinln, rtts ' ai'í s n.';' os SffiíS ir'nen"fos, p?ra o da inutili- dade: e o veliío soinr í n '..i^ as a'^-'u'i crrp nli,'uns tapetes sobre os seus soa- llios, cortinas peiris ]:\v l' 's d '--.ib' í7' ^as. o fnnd.-s poUronas, fundos sofps, para que os repousos, p' r cn (-'L». -n^p ^'í', ^)>s(m miiis icr ti^s c suaves. Attnbui esta moderaçfio a múil"' T>rin'a Ji : rnpii». -n e .ir::iv.i Torm s na tua nudez n:de. Ella jurou que a \>im o or^';;-;, o un .ínint o. ;Vr..>, (l<.TO''nM..s stmanas, tremi. Âppareceu, vindo do í.isb n, nir. ccrit a-íucbtre, com ope''ir'os, e mais caixotes, para installar um tci» phone!

Um telopMone, em T' r-res, J?rint''o?

O meu Principí" eTpl.cou, com humil«?.dc:

674 AitoLMu raotA

"—>■

Para casa de men so^rro ! . . . Bem vês.

Era rasoavel e carinhoso O teleph^e porém,. subtilmente, madamente, estendeu outro longo fio, para Valverde. E Jacmtho, alargando os braços, quasi suppliirante:

r Para casa do medico. Comprehendes. . .

\ Era prudente. M^s, certa manh), em QuIScs, accordei aos berros da tia Viceneja! Um homem chegara, misterioso, com outros homens, trazendo arame, para installar na nossa casa o novo invento. Soceguei a t*a Vicendâ. jurando que essa machina nem fazia barulho, n^m trazia doenças, nem attrahia as tro- voadas. Mas corri a Tormes. Jacinto sorrio, encolhendo os hombros:

Que queres? Em GuiSes está o boticário está o carniceiro... E, de- pois« estás tul

Era fraternal. Todavia pensei: Estamos perdidos I Dentro ^'um mes temos a pobre Joanna a apertar o vestido por melo d'uma machina! Pois nio! o Progresso, que, á intimação de Jacintho. subira a Tormes a estabelecer aquella sua maravilha, pensando t^^lvez que conquistÃra mais um reino para desf-^ar, desceu, sllenclosamenie, desilludirlo, e nlo avistamos mais sobre a serra a sua hirta sombra côr de ferro e de fuligem Ent/So comorehendi que, verda- deiramente, na alma de Jacintho se estabelecera o equilíbrio da vida, e com elle a Gran- Ventura, de que tanto tempo elle fora o orincípe sem Principado. E uma tarde, no pomar, encontrando o nosso velho Qrillo. agora reconciliado com a serra, desde que a serra lhe dera meninos para trazer ás cavalleiras, observei ao digno preto, que lia o seu Figaro^ armado immensos óculos redondos: y

Pois, Grillo, agora realmente Inpi podemas dizer que o Snr. D. Jadn- tho está firme.

O Grillo arredou os óculos para a testa, e levantando para o ar os dneo dedos em curva como pétalas d'uma tulipa:

S ex.* brotou I

Profunlo sempre o digno preto! Sim! Aquelle rescquldo galho de Cidade, plantado ni serra, pepfílra. chupara o húmus do torrSo herdado, creára seiva, afundara raizes, engrossara de tronco, atirara ramos,. rebentara em flores, forte, sereno, diioso, benéfico, nobre, dando fractos, derramando sombra. E abrigados pela grande arvore, e por ella jnutridos, cem casaes em redor a bem- diziam.

E. de Queiroz. A Cidade e cu Serras^ pi]{. 351-355.

LIV

Ceifeiros

. . .Em linhj á borda do trigo, d'síanctanlo seis metros uns dos outros, começiram eu silan:lo a terríve' falai di cafar. Tfaxeai as pernas apolainadas de trapos aiados estes por cordn qu* 1'iís entrecruzam, desde o sapato até ás coxas, por d(*/esi aos ab'olhoj do reU)lh3 ; truem n>s braços e m\os piàgu velhas, de que fizera n miióaes contra as "scoriíçõss da oalla ardente; c a cara mal se lhes sob as abis do c^^iaoclr^o de feltro ou de palmeira, eo mover dos seus rhins trahe o derreament^ de miseráveis envUecidos pelas mocdelras da fome e do trabalho. Con a mâo direita lançim a fíice ao rez da terra; com a esquerda agarram nos Ciules e v?lo deixmio atraz de si o trigo, em pequenos molhos paralelio?. Aqui, alcu. iiia os mih no/oi cantam, mas nas resoiraçõ&s oppressas, cantiga e palcsti^a entreortaoi-se-lhes da prígas. quando o suor, tres- passando a saragoçí das caiçis e o omn» crú das camisas coneça de se Ihci pegar á carne silgaio e eh m a s:aid )-ries as sanas cotio fogo. As prlmeifii horas ao almoço, são suavâi, pjrqae os ò^ gráos do sol pouco fazem ncnii

ficou XIX 675

iwwf>*»i>»«i. I ■■»! tmmimmmmrum

Indofes de salamandra, affeitas a torrar. Apenas alguma sede, um ou outro asso- pra aos mo«cardos que os pers'{7ci> m, e o hadcllas ao sol para fndagarsé a meia hora de dcscanço do aloioço, estará. lo~ge Fsse plácido interregno, poren^, por pouco alcança, que a fornaina solar rtfí a de brazidos, graduando o martyrk) na prop<>r(9o di mais atroz perversidade. A oriente o sol vemcamlnliando, sahindo da fum rada do horizonte passando di côr de sangue, a bronze liquido; e os seus raio<, i medida que se aprumam, trazem na escandencia, náuseas de ve- neno e a anj^ustia liorroro^a do metal derretido sobre a carne: rareia o ar, a araijem matinal cessa de todo, os cães arqueiam, de língua cahida, as cavalga- duras cessam de riiiiar; e calando-se os pássaros, e os voos mais lentos, os ares mais tmvos, a sombra ma<s epliemera a nora do tormento diabólico da sede, nio sêd? do palidar, tendo por centro de refrigério a górja secca mais sede do sangue espessado nas artérias, rx:ehuadora iêde dos tecidos, colossal, geral, que nada estanca, e sob cujo e^tert r o cérebro zumbe nos allucinantes delírios da insolação! Julgareis que a temperatura, marcada ao sol por 44 mortaes riscos do thermometro, tocado este acume, regresse lentamenre ás virações mais fri- gidas da tarde.

M^s qual regressar! s9o nove bóras ap''nas da manhS, e dahi ás três, o ther- mometro não fará s?n9o subir. Começa então o pavoroso espectáculo da natureza e do homem, torturados a fogo para expiar o crime dilrns ter dado fructo, e do outro Insistir em viver d''.lie. O almoço dos ceifeiros é par^o e sem vontade: pSo secco, azeitonas, algum queijo de cabra ou laranjasita mirrada, e agua! agua! agua! bebida pela b^cca dos cintaros, a plena ({ór|a, ou de bruços nas p3ças cheias de li nos, onde batr^irheos estagiam, tôr de lama, d'oihos extáti- cos no sol como fakirs Impaludismo, desynteria, typho. o que elles bebem? Dcixal-o; a sede não refl-cte: cada gotta diquella podrídáo vaie mil vidas; e sSo goladas e goladas^ a cada instante o cântaro despH >-se, e o rapaz sae a Diergulhal-o no charro próximo, que (s rSes turvaram banhindo-se-Ihe dentro, e donde bandos de pas«aredo fogem, r galados Meia h>ra de r pouso após o almoço. MdS repouso adondc? os arvoredos sâo raros, a terra escalda, e na rara sombra os insectos chacinam, furiosos. Ao mesmo tempo começa a fazer-se um in:)uietante silencio na ctiarneca, um silencio oppriaiido, um silencio irres* piravel. , ,

Tessaram os vôis, as cigarras começam, e o grasnar dos corvos, nos valles de milho, faz pelo matt^ como um echo de disputa rouca entre uma cana- lha malcreada. para o longe, emqu nto nos primeiros planos as folhas das arvores perto, ganham umi niildcz metálica d»í contornos, vê-se a atmosphera p^tr completo encinz^irad'1, a luz do sol sem brilho, como qw^ vista atravez vid^^os de fu-^o ; e horrível coisa ! em certos sítios a paizagem, atravez camadas d'ar aqufícid=»s descgual-nente, como qu^* se refrange n'uma successSo de lami- nas horizontaes^ fppirecendo á visra n'uma perpetua e irradiante oscilação ^. Como é o tempo das roças, dos lumaréos d'e9teva, ao longe, pelos montes, erguem-se coSimnas de fumo pardo, muito altos, completamente immoveis, redondas e direitas avultando no deserto como troncos, e eseabelleiradas cima. n*alífumi zona d ar onli inda corra viração. P^ra fora dos bordos de vaso das montanhas, nio ouve nada; o socego e s solidSo dominam tudo. Dentro d > vaso, na seara se^ra mar de pnêas sem marés, crepitante lençof de messes loiras, oppressos, congesti on dos, sorvendo o ar rarefeito com medonhos cs'orços de clavl^^nlas a hau to«; agonie s. e verdadeiros rios de suor no torso latejante, os condcunalos ciifeiros lançam a fo»c^ e a palha estala, os molhos vão cal ido nos regos, em fítas regalares e paralUlas, que o manageiro acama t

^ A este pheaomeno ortico, chama-se do AlemtejOf €armeUiJ9, €aramêltijê, ra eramtliUo, Os dícci.uaarios cãc (razeizi a pilavra«

676 ▲.«T0L001A paosA

]unta, formando molhos maiores^ atando-os com a meima palha nnm gesto violento de tjrsflo, e atirando-os para outro, que nos enfeixa afinai em roleiroi de doze a dezaseis, d'esp!gas para o ar como cornucopias d'abundancia. EUes nflo faliam, toda a energia animal consumida no tumulto d 'abrir e fechar o thorax ao oxigénio atmospberico; assopram! e alguma palavra a dizer, da bocca se lhes secca, apenas solto num gemido, o monosjliabo primeiro.

Dez, onze horas... o thermometro subiu a 48 e a 50, e o zangarreio das cigarras, prenuncio do terrível meio-dia, a principio disperso, agora multi- piica-se num unisono de milhões e milhões de gritos roucos. Aquelies ruidosía- zem um marulgo agudo peb campo, pjreccndo, nào vózd'insecto, mas umasup- plica geral, da terra devorada, ao sol feroz. Elles vêm de todos os pontos do horizonte, e pelo caminho sommam-se aos que topam, incham no ar, trepidam, centuplicam de fúria e resonancia, v3o, vêm, ondulam, general sim-se, ensur- decedores, constantes, allucinantes, ora nem choro, ora em zumbaia. ora em chacota ; e de cada vêz que o suão abre a guela para extinguir a vida e enco- xarrar as folhas das arvores,' mais teimoso, incenso, aquelie marulho maldito des- agrega a sua pulsação de loucura isochrona com o delírio do cérebro, a febre do pulso, e o arfar desesperado do peito, k cata d 'ar. Desde esse instante a vida normal, physiologica, do ceifeiro, é im possível, e entra-se numa flagelaçio, donde a poder de teimas a resistência vital produz, no meio do trabalho, aliu- ctnações de sentidos e delíquios Sob a direita e intolerável flamma do sol, per- deu-se a sombra, mas o calor n^o é. dos:>l, senão concentrar, suffocante, em braza viva, radia de tudo, cc^a, deslumbra exhala-se de tudo, como se dentro de cada coisa houvesse um íó:o. directo, incandescente. Tocar um ferro, noa pedra, uma raiz, um caule, é dar um grito de horror peia queimadura horrível de contracto. A liiz é tanta, tão reenviada de tudo, que os oliios chamus- cados perdem a noçào das formas e do piano; de sorte que a paisagem tor- na-se obscura, e os objectos deixam de ex-stir peia vista real. uniformisando-se as quatro cores da paisagem, em uma única, a côr do vácuo, que é fuiva, ardente, desiunbrante, irradiante, feita de picadas, d'cstaUdos, d'asphyxias, de biasphemias! Tudo crepita, arvores, terra, fenos, rochas, animaes; faísca tudo, e a natureza toma um tom de martyrio, perante o qual, attonito o próprio ho- mem esquece ss suas dófvis. Meio-dia, a hora da sesta emfim I O roanageiro faz o signa 1: Louvado seja Nosso Senhor Jesti, Christol quando iá, automáticos, os desgraçados deíxim a foice, em trjpos^^al.iopos, ^ procura d'um canto onde ca- hir. Sjnibra;, aonc^eV O sol decora o ar; o thermometro ao sol fáz 50 gnts completos, temperatura das primeiras vinte léguas d'areia do Sabara ; nos bor- dos do hjrizonto o eco parece csiupido, baço de pó, dum azul trepidante no zenlth ; e por ma s que se contemple o quadro ditbolico, feito de sol, de bana- lidade, de malevolencia e de j^randeza, impossível encarar sem pavor essa des- mesurabiiidade de linhas, esse vasio espaço, essa nudez da terra côr de cinza, extenuad.i num estupor sem o líro egual. Mas o que elles querem é abandonaj- se, caair piáii, seja onde fu . Ali^u.is tiram a roupa encharcada e fétida do suor, e entre as estevas immindi)s, nús, tombam de bruços deslumbrados, incapasef dum esforço, ÍLicidos, Cíun a iruíuictação sinistra da hora, um peso de cérebro que parece a caoeça rj-bTit-jn lo (jo craneo, inchada de calor, e revolvendo sca appetite os a'torges, com o nala^^ar crc )rtiçado, opSo sabendo a terra, a agni a ca. do, a b3c:i a lod-v c wva.. anciã de dormir, atroz, complicada do terror áe ficar ali na p(ii:ieira Ictli ;r{T[\a.

Dormir! lorínra nova, a m^iis maldita e a peior que os estortéga. Fechaai os olhos, amidornam, mas os se it dos ixisp^rados da luz continua, piaffaoi na al;ncin. ';1o como c.iv<í!i "^ de oi -nn.s bebidos d'aguardente. Ao ouvido, o zum- bir das vcreicirjs e ati.^-^i. dí-1 s n ilíuzlo do faiazar de muita gente, vIím sen conta se er^:i>^m p.iia a^irLir fr.cricias guerreias- As jaesmas detorAait Dtfacte, onde o simp.es tnv» do feno aquecido se Ikes exággera na pltQÍtgrfl

8i«uio xiz §77

por modos de Ih'a illudir eo*as asphyxias dom incêndio ; e calcolá-se o aolxe- salto, sabendo como os fogos sejam, naquella regilo sem agna, o alnlante dia- grSo devastador! Mas allucinação torturante é a da vista. Picon-lhes no cerebr» uma claridade que se reíracta atravez do somno, e faz das pálpebras, stores es» carlates ; de sorte que, mesmo dormindo, os ceifeiros nSo cessam de sonkar in- tensos soes, de vér no campo dos olhos fechados, moscas de fogo, phophenas» revérberos e instantâneas auroras boreaes... Ao cabo d 'algumas horas deste estado congestivo, 'o dese)o das trevas tonis um caracter d'ancia adusta, e é neste momento que a impaciência faz pruridos na pelle, e prepara aos moscar- dos occasiSo de exhaustinarem melh«r o paciente. As cegueiras periódicas sSo também, nestas occasiões de trabalho, freqnentadissimas, e derivam da affloett- da de sangue á base do cérebro, da acçflo persistente do levante, e da fadiga emfim dos nervos visuaes. Começam por vislumbres, vendo-se tudo subitamente amarello de foga, ou azul, que se accentua com uma zoeira d'ouTÍdo8, qae no fim de cinco minutos é abolida a discriminação das formas, e flqi apenas tima noção de névoa, onde se movem sombras indistlnctas. . .

FialiiS d'Almeida, A' Esquina, pát 71 a 79.

LV

Viana do Casteit

AS MULHERES B OS TRAJOS

O mercado semanal em Viana celebra-se ás sextas-feiras, num largo lanço de estrada macadamisada, i beira da agua, ao do jardim. A feira é constituída por mulheres de todas as freguesias drcumvlzinhas, d'aqaem e d'além rio. Chegam de manhã, enfileiram-se ao lado umas das outras, em três ou quatro ordens de extensas alas paralelas, ^usam no chio os cestos com as respectivas mercadorias, e vendem de á multidão que preenche os espaços intermediários de fila para fila, os ovos, a manteiga, o pano de linho, a sirgui- lha» as riscaSj as rendas, todos os variados e curiosíssimos productos das indus- trias caseiras dos arredores. N9o um<a barraca, nem um toldo, nem um guarda-sol pberto. O sol cae de chapa em cada figura, e a luz, intensíssima, verberada do límpido céo, refrangida pelo espelho do rio, inunda numa clari« dade triunfal, verdadeiramente gloriosa, esse vasto quadro deslumbrante.

As vestimentas das vendedoras, conservando aqui, excepdonalmente^ toda a pureza do costume tradidonal, s2o as mais pitorescas, as mais gradosas. a^ mais variadas de côr e de linha, as mais felizmente achadas para fazer real- çar a graça das formas, a ondulação dos movimentos, o mimo da expressS» fenílnil.

As saias curtas, descobrindo a base piramidal da perna nua, sSo de pano carmezim ou de sirguilha, de uma infinita variedade de combinações de IS ardida em estopa, em linho e em algodão : brancas ás listras pretas, castanhas ou aznes ; cinzentas ás riscas vermelhas, azues, castanhas ou brancas, numa enorme diversidade de tons. Camisas de grosso linho alvíssimo, mangas largas, bordadas em apanhados bisantinos no alto do braço, bordadas em entremeios abertos no mesmo linho sobre os hombros, bordadas ainda a linha de cores, á russa, nos canhões chatos, muito justos ao pulso. Grandes colarinhos redondos, de renda. O colete muito curto, redondo na cinta, levemente eapartilkaáo, vermelho, dnzento ou preto, sempre guarnecido de uma larga barra de veludo preto lavrada no estilo de Utrecht, ordinariamente pespontado numa espiguilha de ouro ou de prata. Os eós das saias s9o invariavelmente de linho branco, eom meio palmo de largura, em pregas miadissimas, presas aos debruns encarna-

43

dos, pretM cn axtiei. Os avcnti U «stfeitinbct e eortM, «ncabeçados eu fnnéoi de Ufilio hotánúo a cdres, slo de sir^niiha com soberbos bordados em ponto de tapelt^ Ros mais fkos tons de escarlate e de azttl pena. Brincoa ]ai£OB de ffi- fptLnz de oqro. Colares de contas de ouro liso. Algibeiras pendentes da ctatim, a «m lado, em ampla châtelaine de pane, com apUcaçOes polkromas gnamoci- «hn de lefrte}OQlas. Os lenços da cabeça, em toucado de diversas formas, {i em fgntnát laço como na Alsada, fazendo diadema sobre os eabelos apartados ao meio, achatados no alto da cabeça, á semelhança do que asam as mulheres dctt Apeninos, envolvendo o rolo da trança sobre a nuca e caindo em dan pontas entre as espáduas, sio ordinariamente vermelhos, de um magnifico ve^ nelho ardente, de purpura, cdr da ílòr dos cactos. . .

Prézo-me de ter visto mulheres e de ter reparado nelas em alguas dos aMos onde mais famosas se tornaram as legendas da formosura. Vi-as celebra- is pela arte nas melhores telas de Leonardo de Vinci, de Rafael e do Tidaao, de Velasques e de Murillo, de Van Dyck e de Rubena, de RemtHandt.deMetsa e de Ary Scheffer, de Gieuse, de Watteau e de Latour, de Reyilolds e de Tho- maz Lawrence. Vi-as nos próprios logares onde Tivem ainda os contenâneos dos grandes tipos consagrados pela arte : em HydePark e em St. James Paik, nos Champs Elysées e no Luzembourg ; nas Delicias e no Prado : nas Galerias St. Hubert e no Bosque da Haya, no Square Brougham em Cannes e no Tasseio dos Ingleses em Nice, no Trinkhalle de Bade, no Cursaal de Wiesbade e no Palmengarten de Francfort ; na terra de Espronceda, na terra de Bjron, na terra de Musset, rui terra de Goethe, em todas as velhas cidades flamengas, e nessa nevoenta e misteriosa Frisa, onde as raparigas de um mimo sagrado e impoluto como o das flores do gelo, se diz descenderem das antigas sereias do mar do Norte.

Pois bem ! eu acho-me hoje na obrigaçSo de declarar que nunca, em parte alguma, vi mulheres mais bonitas do que algumas das que encontrei a vender na feira de Viana.

Impressionado por este fenómeno, procurei explica-lo, e cheguei a esta oonclnsfio : A mulher do caihpo*de y''ana é a mais bonita de Portugal simples- mente pela razio de que é, entre as mulheres portuguesas, a mais bem edo- cttda.

Farpas^ ed. 1887, i, SO.

Ramalho Ortigão. LVI

A lapidação dos diamantea

A IspidaçSo consta de três operaçGes distinctas.

A primeira operaçio consiste cm cortar a pedra pelo fio, o que qner di* zer no sentido da sua cristalização, desbastando-a e tirando-Ihe as rugoaidades mais salientes. A parte dificillma deste primeiro trabalho é a de determinar precisamente, matematicamente, o ponto exacto da base.e do vértice da pedra, os quais constituem os dois poios do eixo em torno do qual ae distribuem as facetas.

A segunda operaçio é a lapidagem propriamente dita, e consiste em indicar as facetas a dar á pedra a sua forma geral. Neste estado o diamante tem ainda a aparência amarelada e baça de um pequeno cristal de goma arábica.

A terceira operaçio é o polimento, que se realiaa empunhando o diadema n"uma pega solidissima, nlo deixando sobresair senio a faceta qne tem de ser polida, e aproximando-a em seguida de um pequeno disco de lerio, embebido em de diamante e azeite, posto em movimento giratório hofisantal por máqvèna de vapor, e dando 2:500 voltes por mlmito i banca -de

sAouLO XIX 67^

O aspecto destfs oficinas tem o que quer que seja de misterioso, caba- iistico, que infunde em quem as visita a sensaçSo de entrar num mundo inteira- mente aparte daquêie em que vivemos, habitado por uma raça de homens orientada mu! diversamente da nossa, nSo somente com outra iingua e com OQtra religiio primitiva deles, mas ainda com caracteres anatomico8,'com cara- cteres fisiológicos, com temperamentos, com atavismos absolutamente diversos daqueles que concorrem na nossa idiosincrasia. E' a vida olhada atravez de um vidro escuro e de aumento, com uma intensidade que ela atinge nas conden- sações da arte, e que lembra o mundo formidável de Shakespeare, o de Balzac ou o de Carlos Dikens.

Para o fim de terem a máxima quantidade de luz para um trabalho de minudência microscópica, os ateliers dos lapldarios acham-se todos enfileira- dos em estreitos corredores alumiados por largas janelas rasgadas desde o tecto á altura das bancas que lhes ficam fronteiras.

Essas grossas bancadas de carvalho, os sólidos mochos altos, aparafusa- dos ao pavimento para o fim de permitirem o máximo desenvolvimento de força muscular empregada sobre a ferramenta, os utensílios de trabalho, as fottes pinças, as torquezes, as luvas com dedos de ferro, as lamparinas, as caixas de madeira em que cae o tenulssimo dos diamantes cortados, as bfgornas de aço, as mós de ferro da policio, as correias transmissoras em giro por cima de cada bancja, as cortinas brancas caídas ao longo das vidraças, as m9os. as camisas, as caras, os cabelos dos operários em transpiração, tudo n'estas extensas gale- rias se acha uniformente SQjo. gordoroso, encdoado de óleo preto.

O diamante brnto é tomado com uma pequena tenaa da caixa de depo- sito em que se acha com muitas outros, e seguro pelo artífice n'uma bolinha de massa dúctil como cera, a qual em seguida endurece como ferro ou abranda no grau que se deseje ao fogo de um massarico, e serve de engaste provisório á pedra. Presa esta bolinha numa torquez mecânica, apertada á chave, com gar- ras solidissimas, o lapidário toma, fortemente empunhada noutra torquez egual- mente sólida, uma lasca de diamante cartada em forma de cinzel, e, apoian- do-se á bigorna cravada ao meio da mesa, por meio de um supremo esforço muscular que o faz vibrar dos pés á cabeça no seu alto banco especado ao sobrado, começa a morder pedra com pedra, gume com gume, diamante jóia com diamante escopro. . .

Para que um brilhante se considere lapidado em regra é preciso que, colocado sobre qualquer dos seus dois vértices, ele se equilibre no próprio peso, sem descair para nenhum dos lados. Para este fim é indispensável que cada uma das facetas tenha uma dimensão exacta, perfeitamente geométrica. Ora o lapidado, ao passar a pedra no polidor corrosivo, nSo senão uma faceta de cada vez, e é a olho que determina exactamente, sen discrepância alguma, a forma e a dimensão justíssima de cada uma das sessenta e seis super- flcies, matematicamente regulares entre si, que tem de apresentar a figura que ele á encarregado de delinear. . .

Depois de facetado, com as suas sessenta e seis superfícies, n&s oficinas de Amsterdam, o estéril carbonc fica sendo a jóia rutilante, m&e fecunda e ser- vidora fiei dos corrosivos pecados temperamento e da fantasia.

Ide, magnéticas estrelas! Ide polvilhar de luz, em doudejantes reflexos rosados, verdes e azues, o firmamento da elegância! Ide respland'!cer nos leli-^ carios sagrados, nos tabernáculos divinos, nas tiaras dos pontífices, nos diade- mas das rainhas, nos sceptros dos reis e nas chinelas das cortcz^s ! Sereis sucessivamente adoradas, apetecidas, profanadas; eo que uma vez julgar pos- suir-vos, será eternamente o vosso escravo, acorrentado para todo stmpre a nm velho altar, a um carcomido trono, a um desgastado brazSo ou a um invete- rada vido...

Ramalho Ortigão, A Uolanda^ 2.* ed., 179-183.

índice das matérias

INTJRODUÇAO. Sumário: História da litoratara; sea âmbito: situação geo- gráfíca^ raça e tradição e meio. Sentido em qae aqai se emprega. An^ iologia porta^êsa. DítísSo da história da literatura portuguesa. Cri* iério desta divisSo. Esquema geral .... - pág. 1 a 10

Quadro da História da Litbbatuba Portuguesa. . . . pág. 11

l ÉPOCA MEDIEVAL

«

Quadro SINÓtico ão movimento politico^ social e literário corres- pondente á Escola Provençal, pág. 15

CAPITULO L Escola dos Trovadores ou Provençal (1200-

138Ò). Sumário: Idade proto-histórica da língua portuguesa. Origem da literatura portuguesa. Situação politica da Provença. DiíusSo da poesia provençal. Causas gerais. Causas da diíusSo em Portugal. Caracter da poesia provençal. Arte poética pro- vençal. Trovadores, segreis e jograes. Antiguidade dos trova- dores ém Portugal, D. Denís. D. Pedro. D. Afonso Sanches. Outros trovadores e suas obras. Origem dos Cancioneiros. Can- cioneiro da Ajuda. Cancioneiro da Vaticana. Cancioneiro Colocci- Brancuti. Importância dos cancioneiros. Primeiros ensaios his- tóricos. Livro de Linhagens. Novelas_de ^Cavalaria. Ciclo Carolingio. Ciclo Bretão. Crdo' Greco-Latino. Ciclo dos Ama- dises. Fábulas e lendas. Documentos apócrifos,, pág. 19 a 53 Antologia. Séculos xii a XV pág. 55 a 74

Quadro SINÓtjcO do movimento politico, social e literário corres^ pendente á escola Espanhola. . . . pág. 75

CAPITULO n. EscoIaEspanhola(1383-1521). Sumário: Ca- racteres gerais deste período. Invenção da imprensa; seu início em Portugal. Estado da poesia. Garcia de Resende. Cancio- neiro geral. Influência espanhola. Condestável D. Pedro. D. Duarte. D. Pedro, Duque de Coimbra. Aparecimento da histó- ria. Fernão Lopes. Gomes Eanes de Zurara. Rui de Pina. Autores de biografias ^. . . pág. 77 a 97

Antologia. Século xv pág. 99 a 121

■682 HISTÓBU DJL LlTBRAtUVA. FOBTUOUÊfÁ

II. ÉPOCA CLÁSSICA

I

'Quadro sivÓtico do fnovímânto foUHco, t^cial e Ui^árto cêrru- pondente â escola Italiana . ^ pig. 125

CAPITULO m. Escola Italiana ou Quinhentista (século xvi).

Sumábio: o BenaBcimento ; sua diioflão. O Renascimento em Portugal. Os promotores do Renascimento em Portugal. Senho- ras portuguesas ilustres. Poesia épiCà. Luís de CamSes. Soa biografia. CamSes escritor. Jerónimo Côrte-Rial. Luis Pereira Brandão. FranciBoo 4e Andrade. Poesia líbica. Bernardim Ribeiro. Cristóvão Falcão. Francisco de Miranda. António Ferreira. Pedro de Andrade Caminha. Diogo Bernardes. Fr. Agostinho da Cruz. Poesia dbahítica. Origem do teatro. Oil Vicente. Escola de Gil Vicente. Afonso Alvares. António Ri- beiro Chiado. Baltasar Dias. Antinio Prestes. Simão Machado. Escola clássica. A história ko século xvi; suas .características. D. Jerónimo Oáorio. João de Barros. Diogo do Couto. DamiSo de Góes. Fernão Lopes de Castanheda. António Galvão. Oa- troB hitttorir^dores deste século. S*muel Usque. Narrativas de viajens ; seus autores. Fernão Mendes Pinto. A história trágico- marítima. Eloquêncu sagrada. D. Frei Bartolomeu dos Már- tires. Fr. Luís de Granada. Fr. Miguel dos Santos. Diogo de Paiva de Andrade. Dr. Francisco Fernandes Galvão. Moii- LisTAS. Romances deste período. Fernão Alvares do Oriente. Obras poéticas escritas em latim. Trabalhos filológicos.

Obras dk erudição pág. 129 a 191

Antologia. Século XVI . . . pág. 193 a 321

QuADUO SINÓTICO do movimento politico, social e literário corres- pondente á escola Seiscentista ou Gongórica pág. 323

CAPITULO IV. Escola Seiscentista ou Gongdríca (século m)

Sumário : Decadência literária, seus factores. Censura e índices expurgatórios. Universidade de Évora. Escola Gongórica, cara- cteres. Academias literárias. Academias literárias portuguesas: a) A. dos Generosos; b) A. dos Singidares. Representantes lirismo no século xvu. Francisco Rodrigues Lobo. D. Francisco Manoel de Melo. Outros líricos dôste período. Representantes do género satírico. D. Tomás de Noronha. António SerrBo de Castro. Diogo de Sousa ou Camacho. Poesia épica, s«u caracter. Gabriel Pereira de Castro. Francisco de de Meneses. Vasco Mousinho. António de Sousa de Macedo. Brás Garda de Mas- carenhas. O teatro no século xvil. Caracter da História, Fr. Bernardo de Brito e seus continuadores. Fr. Luís de Sonsa. Fa- iaria e Sousa. Jacinto Freire. Historiadores menos importaaioi'

vmc» DA» MáaomuA iMI

Via] ena. EIocfíiidaei&: seus represeataotes» Âniximo. Vieira. Manoel

Bernardes. Trabalhos filológicos no sécalo x?ii* O joraalismo.

Spistolografia. Cartas da Beligíosa Portogaêaa. . pig. 321 a âM

Antologia. Sécalo xní pig. 366 a 411

<2uADR0 amÓTiCO dfO míovimento polUicOy social e {i^arono oarra»- |X>7k26n^6 á escola Fraricêsa ou Árcádica, ••...,... p&g. 413

<:íAP1TUL0 V. Escola Francesa ou Árcádica (século xviii).— Sumário^ O sécalo xvuiy caracteres gerak. Reacção literária. O verdadeiro método de Verney. Academias literárias: 1) Acade- mia Red da História Portagaêaa; 2) Arcádia Uiikssípoueoae; 3) Academia Real das Sciencias; 4) Nova Ar^:}ádia• G-éaeros Uterá- rios: principais representantes. Pedro António Correia GarçSo. Domingos dos Reis Quita. António Dinis da Cra2S e Silva» Manoel Maria Barbosa du Bo )age. José Agostinho de Macedo. Francisco Manoel do Nascimento. Nicolaa Tolentino de Al- meida. Duas p 'Otisas. O teafro ao sécalo xvil. António José da Silva. Nicolau Luís. Manoel de Figueiredo. A poesia épica no século xvni. ' José Basílio da Gama. José de Santa Rita Duríio. Os Líricos. Tiiomás António Gonzaga. António Pereira de Sousa Cdidas pág. 419 a 444

PROSA

SUJIÁRIO: História, seus representantes. Sebastião da Rocha Pitta. Fr. Manoel dos Santos. D. António Caetano de Sousa. Diogo Barbosa Machado. Francisco Leitão Ferraira. José Soares da Silva. Fr. Manoel do C naoulo Villas Boa^^. Antóoio Ribeiro dos Saatos. D. António Caetano do Amaral. João Pedro Ribeiro. D. Francisco Alexandre Lobo. D. Fr. Francisco de S. Luís, Fr. Fortunato de S. Boaventura. Manoel António Coelho da Rocha. Eloquência. Epistolografia. António da Costa. António Nunes Ribeiro Sanches. Francisco Xavi .t de Oliveira. Alexandre de Gusmão. Trabalhos filológicos do século xvm. Francisco Joaé Freirvi. António Pereira de Figueiredo. Fr. Joaquim de Santa Rosa de Viterbo. Francisco Dias Gomes. Jeronymo Soares Bar- . bosa. Obras diversas. pág. 444-461

Antologia. Século xviii. pág. 463-504

IH— ÉPOCA ROMÂNTICA

Quadro sisótíCO do movimento politico^ social e literário corres- pondente á escola Romântica ....,., , pág 507

€APITULO VL Escdia Romântica (1825).— Sumário: O Ro- mantismo: suas caracterifttiea-^. O Romantismo na Europa. O Ro- mantismo em Portugal. Garrett. Herculano. Castilho, pág. 519

€84 HlSTÓmU >■ UTBRATUBÁ POBnCOAflA

EOMANTICOS E ULTRA-BOMANTICOS

Sumário : Seqaazes da Escola. Caracteres. F. Xavier de Novaes t J. P. de Moraes Sarmento. João de Lemos. O €2rovadorÈ. Os Poetas do c Trovador > Â. A. Soares Passos. J. da S. Mendes Leal. Fr. Gomes de Amorim. A. P. da Cunha e Castro. Th»* más Ribeiro. BulhSo Pato , pág. 531

A REACÇÃO CONTRA O ROMANTISMO

Sumário: Como surgiu esta reacção. Elogio-Mútuo. Novas teir- dências poéticas. J. Simões Dias. JoSode Deus. Antero do Quental. Cesário Verde. António Nobre. G. de Azevedo. G. Crespo. Alex. da Conceiç&o. Conde de Monsaraz. Outros poetas. Poesia Dramá- tica: Fr. Palha. Fernando Caldeira. J. Alves Crespo. D. JoSoda Camará. Sousa Monteiro. Miximiliano de Azevedo. Rangel de Lima. António de Sousa Bastos , pág. 537-554

PROSA

Sumários A História e sciencias auxiliares. Causas do desenvolvi- mento. Cunha Rivara. VÍEcr nde de Santarém, Rebelo de Silva. Latino Coelho. Pinheiro Chí^gas. Oliveira Martins. Júdice Bicker. Soriano. Martins de Carvalho. Luciano Cordeiro. Lino de AssunçSo. Chabi. Viterbo. Loureiro pág. 554-562

SClÊNCIAS AUXILIARES DA HISTÓRIA

Sumário: A arqueologia, etc. Pinho Leal. Felipe SimSes. Vilhena Barbosa. J. A, Vieira. Estado da Veigt. Martins Sarmento. Ara- gão. Zeferino Brandão. Consiglieri Pedroso. Gabriel Pereira. Outros autores pág. 562 a 066-

HISTÓRIA LITERÁRIA

Sumário: Os historiógrafos da Literatura. Innocêncio da Silva. H. P. Lopes de Mendonça. Juromenha. António J. Viale. Santos Valente. Vasconcelos Abrou. J. Silvestre Ribeiro. J. Gomes Monteiro. Silva Pinto. Diferentes géneros. Outros autores con- temporâneos pág. 566 a 578

JORNALISMO

Sumário: Desenvolvimento do jornalismo no sée. XIZ. Alguns cultores. A. £nne8. Mariano de Carvalho. Emídio Navarro pág. Õ78 a 581

INDIOB DAS 1UTBBIA0 685

ELOQUÊNCIA

Sumário: A eloquência sagrada: seu caracter. Malhão. Mota Veiga e Bodrigues de Azevedo. Alves Mathens. Alves Mendes. Fran- eisco Patrício pág. 581 a 583.

A ELOQUENCLA PARLAMENTAR

Sumário : A eloquência politica e parlamentar. Vários oradores. J. EstevKo. Vieira de Castro pág. 584 a 586

ROMANCE

Sumário: O romance no séc. xix: sua grande extensSo. Vários autores. Júlio Denis. Camillo. Eça de Queiroz. O conto, Paga- aino. J. César Machado. Barros Lobo. Alkerto Braga. Trindade Coelho. Conde de Arnoso. Fialho de Almeida pág. 586 a 598

Antologia. Século xix pág. 599 a 679

*'»'«

Antologia de Prosa e Poesia Portuguesa

DESDE O SÉCULO XII ATÉ A ATUA LIDA DE

SÉCULOS XII A XV

POESIA Pág,

D. Sancho I

P. Soárez de Taveiroos

López de Baian

Airas Corpancho [ m .- j j ^r ^ <

N. Fernandes Torneol > Cantigas de amigo e de amor . 55-b4

D. Denís D. Pedro D. Afonso Sanches

D. DenfSy Cantigas de escárnco e de maldizer 64

D. Pedro G5

Lais de Leonoreta 66

PROSA

De ** Os Livros de Linhagens ^ :

Lenda do rei Leir 67

Lenda da Dama de Pé-de-Cabra. . 68

Uma aventura de D. Ramiro ou Lenda de Gaia 68

Demanda do Santo Oraa} 73

«86

PAG.

Anónimo» Fabalas O galo e a pedra precioBa 71

^O cio a posta de carne . 71

O leSo velho, o asno, etc . 72

Anónimo, Um milagre de Saato Eloj 73

Retrato moral e fisico dec Saato^ Eloy 73

SÉCULO XV

POESIA

Garcia de Resende, Trovas á morte de D. Inês de Castro. 99

Diogo Brandão, Fingimento de amores 102

Rui Gonçalves, Cantiga . . / 104

SA de Miranda, Cantiga 105

Cantiga. 106

Coadel mór , 105

Versos trocados entro o Inianle D. Pedro e Jaan de Mona . 106

D/João de Meneses* Cantiga 106

Tristão Teixeira, Cantiga . . . . 106

João R. de Castello-Bratico', Cantiga 106

Jorge d'Aguíar, Trovas contra as mulheres 108

PROSA

Da a Vita Cristi ^:

Prefácio 108

R^ trato de Jesus Cristo 108

Jesus Cristo e a Samaritana 109

Infante D. Pedro, Do requerimento da graça 110

D* Duarte, Da maneira que foi doente do humor menenco-

nico e dei gnareci. 111

Prologo do Livro de bem cavalgar toda sella ». . , . 112

Da «Crónica do Condestabre»., Primeiros anos de Nuno

Alvares , . 113

Da « Crónica do Infante Santo. », Últimos sofrimentos. . 114

Fernão Lopes, Morte do Conde de Andeiro 115

Zurara, O «onde D. Pedro faz falar os campos de Seuta. . 117

R. de Pina, assassinato do Duque de Vizeu 118

Garcia de Rezende, Justiça que el-rei D. João ii mandou

fazer na estátua do marquêd de Monte-mór. . « . . 118

" Do que el-rei disse a ha home, que bebia vinho mais

do necessário •...•«••.. 119

Do que el-rei disse ao Conde de Borba em ura eo»-

selho 119

Morte de D. Joio ii 119

Afonso V (D.) Carta a Zurara 120

/

u»iaa BA iwMLMU €S7

SÉCULO XVI

POESIA

Camões, Sonetos : Í93

Toltas 195

Endechas a Barbara escrava . . . , . 195

Redondilhas 194

No cruzeiro da costa da Arábia 201

J. Côrte-Real, Morte de D, Leonor , 203

L. P. Brandão, El Rei D. Sebastião om Sintra 206

F. de Andrade, A habitação dos ventos 208

B. Ribeiro, Rooiance 210

Romance de Avalor 211

Egioga . . 1 212

Cristov2o Falcão, Egioga Crisfal . . , 214

de Miranda, Carta a António Pereira^ Senhor de Basto 226

Egioga Basto 231

Sonetos 240 241

Elegia 242

Cantiga em diálogo 245

Dr. A. Ferreira, Tragédia Castro 246

Carta a Joam López 252

Sonetos 254 255

Andrade Caminha, Elegia 256

Diogo Bernardes, Elegias 258

Fr. Agostinho da Cruz, Sonetos 259 261

Oil Vicente, Mofina Mendes 261

Feira ; 265

Almocreves 273

Inês Pereira . 287

Simão Machado, Alíoa 292

PROSA

F. de Holanda, Sobre a pintura em Flandres ....... 293

Bernardim Bibeiro, Menina e Moça . , 297

Jeronymo Osório, Carta , 301

João de Barros, Cristóvão Colombo apresenta -se a el-roi

de Portugal 302

Juramento feito sobre o Cancioneiro Geral 304

D. Henrique íaa passar o cabo Bojador ...,.,., 304

Diogo do Conto, Oe moitas cousas notáveis que ha nas ilhas

de Moluoo . 305

6S8 HUràuA BA UTIBATDmA POSTUChUBfA

PAG.

Damião de Góes, De como D. Manoel mandou lançar os

Mouros e os Judeus fora de seus reinos 30(

F. L. Castanheda, De eomo Vasco da Gama foi descobrir

a índia 307

A. Galvão, Descobrimento das Antilhas e índias pelos Es-

panhoes .•..•••..•. 308

S. Usque, A Tida pastorÚ , 309

A Inquisição ...•.•,.••....... 310

João de Lucena, Variedade do gentio da índia. ••.... 311

F. Mendes Pinto, Peregrinação , 312

Heitor Pinto, Da excelência da vista sobre os outros sen- tidos ,' 316

Comparações ' 317

Amador Arráez, Que as vitórias dos Portugueses. . . se n&o

a hão de atribuir a forças humanas 318

Tomé de Jesus, Dureza da gente judaica . •.,...... 310

Fr. de Moraes, Do que passou Palmeirim de Inglaterra . . 329

SÉCULO XVII

POESIA

F. Rodrigues Lobo, Cantigas 367

Anónimo, A que morreu do ar ; 368

Anónimo, A um desengano 1 363

F. M. de Melo, Uma scena do « Fidalgo Aprendiz i . . . 369

Soneto 372

Fabulas 372

J. Vahia, Romance 375

Barbuda e Vasconcellos, Virginidos 376

G. P. de Castro, Helena depois da destruição de Tróia . 377 de Meneses, Glaura procurando no campo de batalha o

corpo Batrâo 379

Vasco Mousinho, O Oceano festejando a armada portuguesa 380

A. S* de Macedo, Ulysses dispõe-se a fundar Lisboa . . 381

Brás Garcia, Episodio de Serralvo 382

PROSA

F. Rodrigues Lobo, O ouro 384

A graça da voe . . . 385

F. Manoel de Melo, Visita das Pontes 386

Preparativos, para a descoberta da ilha da Madeira . . 388

r- Cartas 390 391

!

ISDICB DA AITOIOCIÁ 689

PAC.

F. Bernardo de Brito» De alg&as memoriaB que ha até ao

fim do Império de Augusto . . : 391

Qonçalo Hermigues o Traga-Mouros 392

Fr. Llifs de Sousa^ Habitantes de Tiama .... ^ ... . 394

Discurso do Arcebispo , 39S

Doença e morte de S. Domingos . . . . 395

J. Freire d*Andrade, Últimos momentos de D. JoSo de

. Castro \ 396

A Vieira, O amor menino 597

A guerra. . , . 397

Preceitos da oratória sagrada 398

A. Vieira, O Polvo 399

O Estatuário 400

A Fortuna. 400

A Formosura 401

Premio das acçSes honradas 401

Carta ao Conde da Castanheira 401

Carta a Elrei 402

Carta a D. Bodrigo de Meneses 403

Outra carta ao mesmo 404

Manoel Bernardes, Vaidades feminis 405

Degeneração de Portugal . 460

Celas de feiras levianas 406

Quem quer vai , 407

Afonso de Albuquerque 407

Lenda dos bailarins 408

Repentes 408

Grandioso presente 409

O frade de 300 anos 410

Freiras loucas 411

SÉCULO XVIII

POESIA

C. Garção, Camtata 468

Assembléa 464

Teatro Novo 468

R. Quito, Idílio 474

Cmz c Silva, Hjssope 475

Bocage, Sonetos 478 480

Epigramas 480

J* Agostinlio de Macedo, O homem no estado insocial . . 481

T A creaçSo ,, 482

9Qê mnòmuL mt titausimâ MamouâiA

PÂa

F. Manoel do Nascimento, Ode 48a

GaUciflinos iSt-

N. Tolentino, A funçío 487

Carta oferecendo um peni 488

Soneto 489

J. Basílio da Gama» Lindoja. 489

Santa Rita DurSo, Moema 490

Gonzaga, Lira 492

Sousa Caldas, PjgmaliSo , 49?

PROSA

A. Lobo, Vieira julgado por D. Franci^o Lobo 496

D. Fr. Caetano Brandão, O Amazonas 497

A. J. da Rocfia, Elogio fúnebre de D. Francisco de Lemos 498

A. da Costa, parta ao sr. Manoel GFomes da Costa 498

Ribeiro Sanches, Cai*ta sobre a edaeaçSo da mocidade. . . 500 Cavalleiro de Oliveira, Carta. . . sobre a pronanda da

lingua latina #..,•**.,.,.. r * '501

Alex. de Gusmão, Carta a Barbosa Machado ,..,... 503 Carta a Fr. G. da EncamaçSo ..,...,.,... 534

SÉCULO XIX

POESIA

A. Garrett, As minhas asas .....•• 599

Ignoto Deo 599

A. Herculano, Deus. 600

A cruz mutilada 602

A. F. de Castilho, Cântico da noute 604

João de Lemos, A lua de Londres 604

O sino da minha terra 605

Soares de Passos, O Firmamento 607

Mendes Leal, Ave, Caebar 610

Gomes de Amorim, O marinheiro 613

Pereira da Cunha, O voto de elrei 614

Guilherme Bragia, Saudades do ceo 616

A's mães. . 617

Guilherme de Azevedo, Velha farça 618

Simões Dias, O teu lenço * 619

Gonçalves Crespo, Alguém 619

Mater Dolorosa .►..•..... 620

Ttiomás Ribeiro, A jadia m

\

[

iiDicn ASTOtotfu 691

PAo.

João de Deus, A rida : . . 624

Rachel 629

A Victoria Colonna 630t

Anthero do Quental, A' Virgem Santissima 630

Na mao de Deos 631

Anima mea 631

António Nobre, Aparição 632

Ao cair das folhas 632

A vida 633

Casario Verde, Ave Marias 634

De tarde . 635

Bulhão Pato, A mSe e o filho morto 635

Fernando Caldeira, No serão 636

D, João da Camará, Missa das almas 638

Conde de Monsaraz, As mondadeiras 640

Dr, Pinto Osório, Três cantos 641

PROSA

A Garrett, Fr. Luis do Sousa 642

Discurso do Porto Pireu 647

A. Herculano, O Mosteiro 649

A. F. de CastílIlO, Um poeta cego 652

A. F. de Castilho, Coimbra á morte de Afonso Henriques . 652

Anthero do Quental, Decac^cncia dos povos peninsulares . 653

A. A. da Fonseca Pinto, Universidade de Coimbra .... 654

A. Rebello da Silva, Eetrato de Tibério 655

Latino Coelho, Vasco da Gama 656

Pinheiro Chagas, Origens de Portugal 658

Oliveira Martins, A batalha de Valverde 6G0

O solitário de Val-de- Lobos 662

Silveira Malhão, Excerptos do 6ermSo pregado nas exéquias

do Conde de Barbacena 664

José Estevão, Um trecho do discurso eobre a «Charles et

Georgei 665

C. Castello-Branco, O sr. ministro 667

A morte do lobo 669

Eça de Queiroz, Suave milagre 670

A chegada a Tormes 671

Um telefono em Tormes! 673

Fialho de Almeida, Ceifeiros . . . . 674

Ramalho Ortigão, Viana do Castelo 677

A lapidaç&o dos diamantes 678

\

1

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ERRATAS

[ReBBalram-se apenas algumas das numerosas erratas^ que foi impossível evitar nas condiçSea escepoionais em que esto livro foi impresso].

pAgs.

LINHAS

21

9

28

9

30

16

131

22

132

36

145

15

156

3a 10

159

41

162

8

171

21

185

14

331

6

332

18

338

4e 5

341

13

426

21

429

41

432

19

457

1

519

6

519

16

521

2

523

7

EMENDAS

Minnesang

Antiguidado

Cantares

Cáceres

famoso

Cronológica

Estas linhas pertencem á nota 1/

do duque

Teatro de Qil Vicente

1570

prosa

bens

Fénix

Eiitas linhas devem seguir na pág. anterior,

ao fundo, as que se transcrevem do Bispo

do Grao-Pará.

XVII

Bocarro Aze via Oalatea Pereira Caraterifiticas

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pressente

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