de fem Eai srs é 3) 5 Es sê E eu 5 ma o 2” Sib fel EIS Bi RR o t: sê, > Pa = ti E e t Sd ES! ” 57 HARVARD UNIVERSITY feto LIBRARY OF THE Museum of Comparative Zoology HEFYLED COLLEGE GECERVATORY MUS. COMP. Z00L | LIBRARY CRINERIO O EDLIIDO | VROTAVEETEO MEMORIAS ACADEMIA REAL DAS MOENCIAS DE LISBOA CLASSE DE SCIÊNCIAS MATHEMATICAS, PHYSICAS E NATURAES RR Roi ) MEO my t di .., , b Ega À i 1 é É q 1 (e) 1 a ) À ) E as “ + : , ; q i x LA Tá ] ) « o ” | [ 7) À ' a 1 h a ht Pp o A EM k 1 oe f E y É A P CA PR MEMORIAS EB /A ACADEMIA REAL DAS SCIENCIAS DE LISBOA CLASSE E SOLENCIAS MATHENATICAS, PRUSICAS E NATURARS Nisi utile est quod facimus, stulta est gloria NOVA SERIE — TOMO HI, PARTE I ai Ta JU, [NDA LISBOA TYPOGRAPHIA DA ACADEMIA M DCCC LXTII WUS. COMP. Z60L UBRARY PR9 1958] RARVARD UNTERSITY ESTUDOS SOBRE O GARROTILHO OU CRUP MEMORIA APRESENTADA Á ACADEMIA REAL DAS SCIENCIAS DE LISBOA POR ANTONIO MARIA BARBOSA SOCIO EFFECTIVO DA MESMA ACADEMIA, CIRURGIÃO HONORARIO DA CAMARA DE SUA MAGESTADE FIDELISSIMA, LENTE DA ESCÓLA MEDICO-CIRURGICA DE LISBOA, CIRURGIÃO DO HOSPITAL REAL DE S. JOSÉ, - MEMBRO DE VARIAS ASSOCIAÇÕES SCIENTIFICAS NACIONAES E ESTRANGEIRAS, ETC. ETC. nº DR dd y tw 1 º Vo > ' ! . é e z 4 e n r . . . N 4 + a aa + ' & 1 =. J! RE 1 j' ” Rr! 4 | í ” k 4 pao 4 E x dios pad o ECRM e Wa tea ERAS a , es] + " / ! ) J E) IN 1 E My ? j ) o: z ) N E e fá Psi Rr a 4 5 Ad ar - . ) ! EN! ! Ê de TR 4 “1 = k E) ' 4 t ; , 4 q o OO UERR q « A A , ENS do pod. kn : E “ONNERI RACER 0 (o E a AO ANGRA 7 q 4 a Ê A HORA aa invoriamDa E AMA AMADA. Pile ave Da y E Udo af? ! +. pi on caio PS rt Ro poda da alii tuioa A a e: per. ' no po Mia AM udan am nitro oddnauan o i AN 1) A h ç ERAGiE air: e opa CARLENARO TEM 7 AM POR RDA A Eepurvrralgo abre titan » Y eq tis ta rear ado ARO ad ant A! 4] En TA “ ' q DPS NO DEM O era nte Pes uma, pilaito 6] qi bri 64 no p E Es og opala pistas cao JAN E quot epa drag sa + es gintáro 17 s Era gato y PU is F | y 4 ATedO a e a AoA » NS cai RD UR NNE jariemdar 4 x Ada de girio cipa ER Mi O o ante “pesada! p! ] 1 LEU A epa ass! ati s NARRA E rom a es e via a RR RE scg 7 RN spt Mis é RR dia plo abra e A add eua eo y ou ip + bege py qto a, ' é Pro ') U JR, E E ento dá VU + pr A Ed! é! E n x GE SA tm aid ris E PS Spas pd pit JAM emb Pp Na : ANTA A, cobria 4 Ê q 1 Hd | , E Dal k É x mm h 1 v o y t E v) » À j tá ] f gk - » » k CT DA ESTUDOS SOBRE O GARROTILHO OU CRUP O estudo sobre o crup, que apresento á Primeira Classe da Acade- mia Real das Sciencias de Lisboa, de que tenho a honra de ser mem- bro, é um opusculo que precede outro, sobre a tracheiotomia no gar- rotilho, que espero poder terminar brevemente, e ao qual serve, para assim dizer, de introducção. O meu primeiro proposito foi fazer da tracheiotomia e do crup uma só memoria, na qual esta molestia fosse apenas descripta na par- te de mais restrictas relações com a operação. Mas tendo colligido dos collegas e na propria pratica muitos apontamentos sobre aquella doen- ça, que tenho podido observar bastantes vezes; tendo extrahido, a res- peito d'ella e da angina diphtherica, a estatistica mortuaria de Lis- boa nos tres annos de 1857 a 1859 dos competentes bilhetes do Con- selho de Saude; e tendo examinado todas as papeletas das enfermarias da Misericordia, e os mappas de todos os expostos da capital tratados em domicilio, em relação ao mesmo periodo de tempo e á mesma doença, resolvi dividir aquelle trabalho em dois mais pequenos. O pri- meiro, que se refere especialmente ao crup, é o que submetto hoje á approvação da Academia. O segundo, sobre a tracheiotomia no garro- tilho, apresental-o-hei logo depois, porque tenho já para elle mate- riaes muito adiantados. 1+ 4 ESTUDOS SOBRE N'este estudo do crup comprehendo : a definição da doença e a synonimia mais commum; a parte historica; anatomia pathologica; etiologia; symptomas; marcha, duração e terminação; fórmas; com- plicações; diagnostico; accidentes consecutivos; prognostico; natureza e tratamento. Cada um d'estes capitulos, sempre que me parecer con- veniente, será illustrado com observações, dos collegas ou minhas, e com os dados que as estatisticas do paiz e de fóra me poderem prestar. Não tenho a pretenção de haver escripto um trabalho completo sobre o garrotilho, nem podia ser esse o meu fim em uma doença so- bre a qual se têem publicado numerosas e importantes monographias. O meu fim foi sómente fazer um estudo accessori para me ser- vir como de exordio ou introducção a outro sobre a tracheiotomia no crup. O GARROTILHO [nl DEFINIÇÃO E SINONYMIA Definirei o crup: uma doença geral, muitas vezes infecciosa, ca- racterisada localmente pela exsudação de falsas membranas na super- ficie mucosa da larynge, as quaes podem invadir conjunctamente as membranas mucosas da pharynge, fossas nasaes, bocca, tracheia, bron- chios, etc. O crup é, pois, em duas palavras, a diphtheria laryngea. Como se vê, não creio que o garrotilho seja uma inflammação da mucosa da larynge, o que tem feito dar-lhe a denominação de /a- ringyte pseudo-membranosa, porque o estudo mais accurado sobre o modo de invasão, andamento e natureza da molestia me téem dado differente convicção, como mostrarei no seguimento d'este escripto. As principaes synonimias do crup são as seguintes: 4ffectio or- thopnoica (Baillou); Suffocatio stridula ou croup (F. Home); angina suf- focatoria (S. Bard); Cynanche stridula (Wahlbaum); morbus strangu- latorius (Starr e Rosen); morbus truculentus infantum (Van Bergen); angina membranacea sive polyposa (Michaelis); Cynanche ou angina trachealis (Cullen, Johnston, Rush); tracheitis infantum (Albers e Frank); catarrhus suffocatorius (Hillary); angina laryngea exsudato- ria (Hufeland); diphthérite trachéale (Bretonneau), etc. A denominação de croup, adoptada por Francisco Home em 1765, por ser a que vulgarmente se dava á doença em uma provincia da Escocia, foi desde então, e é ainda, a mais geralmente aceita. Em Hespanha, onde se denomina crup, é vulgarmente conhecida por gar- rotillo; na Italia é designada entre o povo por male ix canna; e entre nós por garrotilho ou crup. 6 ESTUDOS SOBRE PARTE HISTORICA Dividirei a historia do crup, que não pode separar-se da da an- gina diphtherica, em quatro épocas ou periodos. A primeira época termina em 1765 com a publicação da monographia sobre o croup, escripta por Fr. Home. A segunda acaba no anno de 1808 em que começa a terceira época, assignalada pelo grande concurso Napoleão. O principio do quarto periodo é emfim marcado pela importante obra de Bretonneau sobre a diphtherite ou inflammação pellicular, publi- cada em 1826. Primeira época. — A doença, que desde Home tem sido conhe- cida com o nome de croup, existiu provavelmente desde os tempos mais remotos; nem ha razão para suppôr, que as causas, que a pro- duziram mais tarde, a não fizessem apparecer sempre. Comtudo é certo, que, nos primeiros tempos, o crup foi confundido com outras especies de angina. O uso estabelecido entre os judeus, segundo refere Double, de jejuar ao quarto dia da semana, com o fim de paeificar a ira do Se- nhor por intenção das creanças atacadas de angina, e a descripção, feita por Elias Levita, de uma doença, que matava instantaneamente, cerrando a abertura da tracheia-arteria, podem citar-se como argu- mentos a favor da antiguidade do crup, e ao mesmo tempo da sua con- fusão com outras molestias da mesma séde- e de symptomas analo- gos. Nos livros classicos mais antigos vê-se a mesma confusão, ainda que em uma ou outra descripção appareçam algumas das feições par- ticulares ao garrotilho. Hippocrates (De morbis, lb. w cap. 1x, lib. m cap. x, edic. de Haller), fallando do pulmo repletus e da angina gravissima, e dizen- do que produz grande dyspnéa e a morte até ao quarto dia, parece ter conhecido alguns casos de crup, que todavia confundia com ou- tras especies de angina sob o nome de cynanche. « Angina gravissima, dizia elle, quidem est et cellerrime interimit, quae neque in faucibus, neque im cervice quicquam conspicuum facit, plurimum vero dolorem ea- hibet, el difficultatem spirandi, que erecta cervice fit, inducit. Haec enim eodem etiam die et secundo, et tertio, eb quarto strangulat.» Mas, logo no primeiro seculo da era christã, Areteo de Capado- cia deu uma descripção, em que melhor se distinguem os caracteres do crup. Este medico, que se suppõe contemporaneo do imperador Domiciano, descreveu efectivamente com o nome de morbus acgy- O GARROTILHO q ptiacus e ulcus syriacum (De morbis acutis, lib. 1 cap. 1x. De tonsilla- rum vulceribus, edic. de Haller) uma doença, que muito se parece com o garrotilho, dizendo ser frequente na infancia, ainda que possa acom- metter a puberdade, e caracterisada por pallidez ou lividez da face, grande difficuldade na expiração, enrouquecimento e sumidura da voz, afilicções e morte, parecendo os doentes estrangulados, quando o mal chegava á tracheia-arteria. Diz mais, que a garganta se cobre de um cer- to humor concreto, branco, livido ou negro, que pode estender-se para alem dos pontos primeiro invadidos, como a bocca, lingua, gengivas, etc.; e aconselha os topicos causticos, com particularidade o pó d'alu- men. D'aqui se collige, que elle conheceu o crup e a angina pseudo- membranosa, e que já n'esse tempo, como depois, e como hoje, a an- gina diphtherica apparecia conjunctamente com o crup. Transcreven- do parte das suas proprias palavras, melhor se verá a idéa que o au- ctor formava da ulcera syriaca: at si in pectus per asperam arteriam id malum invadat, illo ir eodem die strangulat.... Pueri usque ad pu- bertatem maxime hoc morbo Pp Cussis spirandique difficul- tas enascitur, et modus vero mortis quam miserrimus accidit. Pallida his sue livida facies.... cumque decumbunt, surgunt ul sedeant, decu- bitum non ferentes: quod si sedent, quiete carentes, iterum decumbere coguntur; plerumque recti stantes abambulant, nam quiescere ne- queunt; inspiratio magna est, exspiratio vero parva; raucitas adest, vocisque dejectio. Haec signa in pejus ruunt cum subito in terram col- lapsis anima deficit .» Galeno nada adianta sobre o que escreveu Hippocrates e Areteo, mas parece haver achado a falsa membrana caracteristica da doença, porque diz ter visto um doente expulsar com a tosse uma membra- na, que cobria toda a tracheia-arteria e as fauces. Para canhecer a sua procedencia diz elle: ... si fuerit rejectum. . . tussiendo guturis aut asperae arteriae, si excreando faucium. Os auctores dos seculos seguintes, os arabes, e todos os medicos da idade média, nada adiantaram sobre o que Areteo havia escripto no primeiro seculo. Os primeiros copiaram-no mais ou menos tex- tualmente, e os outros fizeram o mesmo a respeito dos seus anteces- sores, de modo que todos se limitaram a descrever a angina sem ne- nhuma distincção de especie. E' só no seculo xvi que se acha indicado o caracter anatomico do crup, sem comtudo se lhe dar a devida importancia, como phe- nomeno ligado á natureza da doença. Foi com effeito em 1576 que Guilherme Baillou ou Ballonius (epidem. et ephemerid. an. 1576,€. 1), 8 ESTUDOS SOBRE na setima nota, que vem no fim da constituição hyemal do anno, re- feriu o caso de uma creança, que succumbiu á dyspnea, que então de- vastava a cidade de Paris, em cuja autopsia um cirurgião achara uma falsa membrana formada na tracheia-arteria. Taes são as suas proprias palavras: «Chirurgus affirmavit se secuisse cadaver pueri. . . inventa est pituita lenta, contumax, quae instar membrana cujusdem arteriae asperac erat obtenta; ul non esset liber exitus eb introitus spiritui ex- terno: sic suffocatio repentina.» Mas, contando o facto, que lhe refe- rira o cirurgião que o observara, Baillou considera o desenvolvimen- to da falsa membrana como um accidente extraordinario, que tinha causado a morte n'aquelle individuo, mas não o toma como ligado á natureza da doença epidemica por elle designada a/fectio orthopnoica. Por isso, e pela descripção imperfeita que faz da epidemia observada, conhecida pelos medicos de París como catarrho violento, pode dizer- se com Royer Collard no seu substancioso artigo sobre o croup ( Di- ctionnaire des sciences medicales), que Baillou viu muitos casos de erup na epidemia de 1576, mas não conheceu o que era o crup. Alguns annos depois da epidemia de París, manifestou-se a mes- ma doença, tambem epidemicamente, em Hespanha, e na Italia, fazen- do grande numero de victimas. A primcira epidemia de garrotilho oc- corrida em Hespanha e de que dá noticia D. Joaquim de Villalba (Epi- demiologia hespanhola, Madrid 1803) teve logar em 1583. A mesma molestia repetiu, tambem epidemicamente, em 1587 e nos annos se- guintes até 1591; reappareceu de novo em 1596, e depois nos annos de 1600 a 1605, generalisando-se então muito, e acommettendo gran- de numero de creanças. Novamente grassou em 1610 estendendo-se de Hespanha a Malta, Napoles e Sicilia, onde: fez victimas por espaço de vinte annos. Em 1613 o garrotilho fez ainda mais estragos em Hespanha do que nos outros annos, e em tão subido grau que foi de- nominado o anno do garrotillo. A mesma doença foi ainda muitas ve- zes observada no principio do seculo passado e nos annos de 1750 a 1762, como o refere D. Antonio Perez de Escobar ( Avisos medicos po- pulares: historia de todos los contagios, Madrid 1776). Aquellas di- versas epidemias dos fins do seculo xvr e principio do seculo xvrm fo- ram observadas, noticiadas e descriptas mais ou menos largamente por diversos medicos hespanhoes que escreveram por esse tempo. Estes medicos são Francisco Perez Cascales, Villareal, Herrera, Nunez de Lerena, Ildefonso de Menezes, Juan de Soto, Francisco de Figueirôa, Lourenço de S. Millan, Thomaz de Aguiar, Alonzo Gomes de la Par- ra, Luiz Mercado, Geronimo Gil de Pina, Pedro Miguel Heredia, etc. O GARROTILHO 9 Não tendo espaço para notar as obras d'estes medicos com a ex- tensão que um trabalho de outra ordem exigiria, limito-me a dizer algumas palavras sobre os pontos mais importantes d'esses escriptos. Francisco Perez Cascales, de Guadalaxara, cathedratico de pri- ma na Universidade de Morviedo, escreveu o Tractatus de morbo illo gui vulgariter garrotillo appellatur, Madrid 1611. Faz menção de uma epidemia de garrotilho que observou em Torrijos, onde curou mais de trezentos doentes com gargarejos de agua de alumen, mis- turada com unguento egypciaco, ou flôr de cobre e xarope de amo- ras. D. Juan de Fillareal, cathedratico da Universidade de Alcalá de Henares, escreveu no mesmo anno a obra De signis, causa, essen- tia, prognostico, et curatione morbi suffocantis, Alcalá 1611. Esta obra foi elogiada por seu mestre, o famoso Christobal Perez Herrera, e della falla o nosso Luiz Soares Barbosa. Descrevendo a doença que primeiro apparecêra na Baetica, e que vulgarmente era conhecida com o nome de garrotillo, diz assim: «Ore aperto et depressa lingua, mo- do conspiciebam apicem omniro album, excuntem ab imo gulae, et impedientem deglutitionem, modo quandam erustam veluti membra- nam, cingentem fauces, guttur, et gulam, non perfecte albam, sed de- clinantem ad lividam: et simul cum hoc adparebat lingua alba a ra- dice ejus usque ad medietatem aut fere totam. Per quod signum si- mul cum difficultate deglutiendi, et grassante tali epidemia, potest morbus hic cognosci antequam adpareat frustrum illud album: auget certitudinem, si in collo et retro aures, tumores conspicias. » Christobal Peres de Herrera, medico hespanhol de muito mere- cimento e de muitos creditos, entre outras obras, escreveu sobre o gar- rotilho a que tem o seguinte titulo: Brevis et compendiosus tractatus de essentia, causis, notis, praesagio, curatione, ct precautione Jaucium et gutturis anginosorum, ulcerum morbi suffocantis garrotillo hispane appellati, Madrid 1613. N'ºeste escripto diz o auctor, que o nome de garrotillo provém do modo como a enfermidade suffoca os doentes, á semelhança da maneira porque o garrote faz a estrangulação. Quan- do escreveu, havia já trinta annos que o garrotilho grassava na Hes- panha. Na sua descripção diz o seguinte: «In his qui hoc morbo la- borant, frusta quacdam alba membranosa, ad lividam tendentia ali- quando inspiciuntur, anatomeque in aliquibus qui interierunt facta, cadem membrana alba, livida aut nigra remanere solet. Materia enim illa cutem irruit, et ibi sua malignitate crustam aliquando efficit, quae fauces, guttur, et gulam cingit, et sic animantis fit suffocatio, MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSET. IH, P. 1. 2 10 ESTUDOS SOBRE quoniam cum poros penetret, partes aliquando excavat, irrigat, et quasi operculum quoddam claudit et suffocat.» Como se vé, Herrera conheceu bem e verificou pela autopsia a falsa membrana, caracteristica do garrotilho ou da angina diphtheri- ca, a qual viu de côr branca, livida e negra. Este caracter do crup, como tive occasião de notar, já em Pa- ris havia sido verificado anatomicamente na tracheia, trinta-e dois an- nos antes, pelo cirurgião a que se refere Guilherme Baillou, sem com- tudo se lhe ligar a importancia que lhe dava o medico hespanhol. Segundo a interessante e larga noticia, que do livro de Herrera ha pouco deu o sr. dr. Bernardino Antonio Gomes na Gazeta medi- ca de Lisboa do 1.º de novembro de 1860, o auctor suppoz a doença de natureza maligna, contagiosa e pestilencial; assevera que pode ter- minar pela morte aos sete dias e muitas vezes antes do quarto; nota a facilidade e rapidez, com que as forças se deprimem, sobrevindo anxiedade, frequencia e pequenez do pulso, o que indicava sempre um prognostico terrivel, assim como as hemorrhagias nasaes e as dejec- ções alvinas repetidas, a côr livida ou negra das crostas. Notou já en- tão Herrera casos de morte subita em individuos, que já tinham ap- parencia de restabelecidos. Factos d'esta ordem, que aliás se obser- vam em todas as doenças infecciosas, não são hoje raros; alguns te- nho eu mesmo observado, e tenho noticia de outros na pratica dos collegas. Herrera, não obstante saber por um medico da Andaluzia, que a doença cedia no principio á sangria da veia leonina, recommendava todavia ser moderado na prescripção das evacuações sanguineas; em- pregava as escarificações nas fauces. Os vesicatorios, posto que usa- dos, tinham já n'essa época certa opposição; os adstringentes ou caus- ticos (alumen, pedra lipes, acido sulphurico diluido em xarope, a agua regia) eram os topicos mais empregados. No uso dos causticos recom- mendava Herrera certa moderação, nem os aconselhava em todos os casos. Como tratamento interno dava a preferencia aos tonicos e aos alexipharmacos ou os reputados especificos das doenças infecciosas. Alonso Nunez de Lerena escreveu, pouco depois, a seguinte obra: De gutturis et faucium ulceribus: anginosis, vulgo garrotillo, Sevilla 1615, na qual descreveu a doença que acommetteu extensamente Se- vilha e outras povoações em 1589, e desde 1600 até 1605, atacan- do tambem a diocese de Plasencia. Segundo o auctor a doença não tinha nenhuma qualidade pestilente. O GARROTILHO 11 Hdefonso Menesius ou Menezes, segundo Haller, citado por Vil- lalba (tom. 2º pag. 21), escriptor hespanhol ou portuguez, publicou tambem em Sevilha, e no mesmo anno de 1615, o seguinte escripto sobre o garrotilho: De gutturis ulceribus anginosis. Juan de Soto, cathedratico da universidade de Granada, publi- cou um livro sobre o garrotilho que foi celebrado com muitas poe- sias, que veem publicadas no principio da obra. Aquelle livro tem o titulo: Libro del conocimiento, curacion Yy preservacion de la enferme- dad de garrotillo, donde se trata lo que ha de hacer cada uno para curar-se y precaver-se de esta enfermedad, segun su complexion, edad y naturaleza, en Granada, 1616. Descreve a exsudação plastica: «una vegiguela ceneciente o costra obscura, o blanca, livida, o negra, o una lhaga sesia, corrosiva, y tan prigojosa, y unida, qui le forçó a un au- ctor moderno (Villareal) afirmar que era un paniculo.» Francisco de Figueirôa, medico de Sevilha, publicou no mesmo anno o Tratado de las calidades y efecto de la aloxa, de una especie de angina, garrotillo, o esquinancia mortal, en Lima 1616. A aloxa, em- pregada por Figueirôa, era uma bebida arabica, composta de 16 partes de agua commum e 1 de mel com certa quantidade de pimenta, cra- vo, gengibre e canella, que se fazia ferver tudo, e dava-se interna-' mente para mitigar a séde. Lorenzo de San Millan, medico de Sevilha, publicou em Zarago- za, tambem em 1616, a seguinte obra: Parecer en que se trata de la esencia, diferencia, causa, senales, pronosticos, curacion metodica, ge- nuina y propia de la enfermedad, que vulgarmente laman garrotejo, ete. Thomas de Aguiar, doutor em medicina na universidade de Al- calá de Henares, em resposta a duas cartas contra Ildefonso Nunes de Llerena, escreveu a Apologia in libro de faucium ulceribus. anginosis, vulgo garrotillo, en Marchena 1621. Alonso Gomez de la Parra y Arévalo escreveu em 1625 a Po- lianthea medicis speciosa et chirurgicis mirifica, dividida em duas par- tes, na primeira das quaes trata: De pestiferis tonsilarum ulceribus de chironis et igni vomis faucium, id est, de morbo sufocativo ex ulcere ; e na segunda de fonticulis et cauteriis tam actualibus, tam potentiali- bus, de spherulis et setonibus disputatio ubi in pestiferis et igni vomis tonsilarum et oris ulceribus invertiginosis eb cpilepticis speciosa ada- ptari possint. Luis Mercado, medico da camara d'elrei Filippe HI, escriptor e pratico mui distincto no seu tempo, escreveu varias obras, e na col- lecção d'ellas tratou especialmente do garrotilho na parte « De con- 2» 12 ESTUDOS SOBRE sultationibus » em 1620 (edição de Francfort). Ahi refere elle um fa- cto mui curioso de contagio e inoculação do garrotilho, digno de men- ção. Uma creança affectada de garrotilho mordeu seu proprio pai, quan- do este, com os dedos, lhe tirava da garganta parte das materias, que a obstruiam. Em seguida á mordedura, poucos dias depois, foi o pai atacado da mesma doença do filho. É provavel que a transmissão da molestia se fizesse n'este caso por inoculação, postoque não seja impos- sivel, que o pai fosse acommettido pela mesma causa geral que deter- minou a doença do filho. A descripção do garrotilho feita por Mercado é das mais com- pletas, e tanto que os escriptores estrangeiros muito se aproveitaram d'ella, como da de Heredia. Geronimo Gil de Pira escreveu em 1636 um Tratado breve de la curacion del garrotillo, dividido en narraciones medicas, muy utiles y provechosas para todos los que exercitam el arte de medecina y ci- rurgia, en Zaragoza. E' um dos melhores tratados sobre o garroti- lho, do qual, segundo Villalba citando Escobar, muito se aproveitaram os escriptores estrangeiros. Pedro Miguel Heredia, cathedratico. muito instruido da universi- dade de Alcalá de Henares, e primeiro medico de Filippe IV, deixou inedita uma obra muito importante, que foi depois publicada em Fran- ça no anno de 1665 por Pedro Barea d'Astorga, medico da familia real de Hespanha, e seu discipulo (Oper. Medic. tom. III, sect. IH, disput. unic. cap. 5.º). Deu ao garrotilho mais especialmente o nome de angina ulcerosa maligna (argina exulcerata maligna), e descre- veu-a com mais exactidão e perfeição do que seus antecessores. Esta- belece uma distincção muito verdadeira e muito importante, e muito esquecida depois, em duas fórmas:—uma inflammatoria e suffocante, acompanhada dos symptomas das inflammações, de inchação e ulceras na garganta, febre e dureza do pulso, e que mata por suflocação; — outra asthenica maligna, caracterisada por symptomas de extineção das forças, na qual os doentes morrem extremamente prostrados e sem phenomenos de asphixia. Heredia já observou n'esse tempo a paralysia do veo do paladar, da pharynge e dos membros, porque falla na difficuldade de degluti- ção, resfolegando o doente os liquidos pelas aberturas nasaes, o que attribuiu a obstaculo mechanico nas fauces; e tambem nota a falta de movimento das extremidades, sem comtudo lhe conhecer a natureza de paralysia diphtherica, como hoje se sabe. A malignidade da moles- tia, que com muita razão admitte, é provada para elle pelas suas qua- O GARROTILHO 3 lidades contagiosas, pela fórma epidemica com que se manifesta, e pela rapidez com que mata, ás vezas em 24 horas, por deliquios, grande depressão de forças e outros signaes de enervação. Nota a crosta bran- ca, cinzenta ou escura que cobre as fauces dos doentes, assentando so- bre fundo ulcerado, as exhalações putrilaginosas da garganta, a intu- mecencia maior ou menor das partes subjacentes, ás vezes quasi nul- la, o engorgitamento dos orgãos do pescoço, a alteração da respiração e da voz, a anxiedade e inquietação, a rapida depressão das forças, o perigo indicado pelas hemorrhagias, o curso insidioso da doença, etc. Já m'aquelles tempos Heredia pensava que os productos morbidos, ac- cumulados na garganta, podiam ser absorvidos, e determinar uma in- fecção secundaria, que juntava a sua malefica influencia á da infecção primitiva. Era principalmente para evitar aquelles perigos, que em- pregava e recommendayva instantemente o tratamento pelas cauterisa- ções feitas logo desde o principio da doença, para executar as quaes chega a lembrar o ferro em brasa. Portanto, descripção perfeita e mui exacta da doença, distincção em duas fórmas, — inflammatoria ou suffocante, e asthenica ou ma- ligna, generalisação e contagio, tratamento activo pelas cauterisa- ções para obstar á infecção secundaria, e ainda outros pontos muito importantes, constituem a sua doutrina no garrotilho, e provam quan- to bem observára, e o bom senso que presidia ás suas considerações sobre a doença. Aqui termino o que tinha a dizer da historia litteraria do gar- rotilho na Hespanha. Fui n'esta parte um pouco mais extenso do que nas outras, em consequencia do interesse, quasi nacional, que devemos ter pelo muito que se fez na Peninsula áquelle respeito. D'entre os medicos que viram a doença na Italia, Marco Aure- lio Severino em 1618 tinha feito uma autopsia, a cujo respeito escre- veu o seguinte: Larynge investigata, contecta erat pituita quadam crustacea, citra ulceris speciem (De pedanchone maligna). Esta obser- vação, que confirmava a do cirurgião de Ballonius, e o que tambem vira e escrevêra Herrera pouco tempo antes (1615), ficou comtudo desapercebida e sem resultado até á epidemia de angina gangrenosa, observada em Cremona no anno de 1747 e 1748 por Ghisi, que, fa- zendo a autopsia de uma creança do pharmaceutico Scotti, morta da molestia epidemica, achou na larynge uma falsa membrana. Este me- dico teve então a idéa de distinguir, pela existencia da pseudo-mem- brana laryngea, as duas fórmas de doença que appareciam juntas na mesma epidemia. A uma, que tinha por caracter anatomico a falsa 14 ESTUDOS SOBRE ; membrana na larynge, e que matava por suffocação, chamou angina strepitosa; á outra, que não terminava por suffocação, deu o nome de angina gangrenosa ordinaria (Lettere médiche, Cremone, 1749). Até então éra a angina gangrenosa da pharynge a unica descri- pta e conhecida; mas depois, Ghisi deu maior importancia ás lesões da larynge a ponto de quasi não dar attenção ás alterações da pharynge, aliás tão realmente existentes como as outras. Pouco mais ou menos pelo mesmo tempo da epidemia de Cremona, outras eram observadas e descriptas em Inglaterra por Fothergill e Starr, sendo a referida pelo primeiro ligada á escarlatina, e primitiva a men- cionada pelo segundo, a qual denominou 7rorbus- strangulatorius. Este medico, na memoria que publicou sobre a epidemia por elle observa- da em 1749, refere dois casos, em que os doentes expelliram com a tosse falsas membranas, tendo a fórma da larynge, tracheia e primei- ras divisões dos bronchios, as quaes representou em uma gravura que juntou á sua obra. Depois de Starr, Hillary tambem em Inglaterra, Arnault em Nova Orleans, Vilch e Van-Berghen na Suecia, Marteau de Granvilliers em França, e ainda outros, escreveram sobre a mes- ma doença, particularisando mais ou menos alguns de seus symptomas e denominando-a angina infantum, morbus truculentus, cynanche mem- branacea, catarrhus suffocativus, suffocatio stridula, orthoprea membra- nacea, etc. Terminarei aqui o primeiro periodo da historia do garrotilho, que começa nos tempos mais remotos, muitos seculos antes da era christã, e termina no meado do seculo XVIII. N'este extensissimo espaço de tempo o crup foi quasi até o fim confundido com as outras anginas; descobriu-se a lesão anatomica da doença sem se lhe dar quasi nunca, á excepção dos medicos hespa- nhoes, a merecida importancia; e manifestou-se nos ultimos tempos de- cidida tendencia para o considerar como uma doença distincta, e para lhe distinguir duas differentes fórmas. Segunda época. — O principio do segundo periodo da historia do garrotilho deve assignalar-se em 1765, quando Francisco Home pu- blicou a sua monographia sobre o croup. A memoria de Home inti- tulada — 4n inquiry into the nature, cause and cure of the croup — impressa em Edimbourg no anno de 1765, foi a obra mais completa que appareceu até então sobre o crup. N'elle se acha a mais perfeita descripção da doença, a determinação positiva da sua natureza pseudo- membranosa, o que era conhecido desde Baillou, e sobre tudo desde Herrera, e a distincção assignalada por Ghisi. Foi elle quem, para de- O GARROTILHO 15 signar scientificamente a doença, empregou pela primeira vez a pala- vra croup, nome vulgar que se dava na Escocia á falsa membrana branca, desenvolvida por baixo da lingua das gallinaceas atacadas de pevide, e pelo qual a doença é hoje universalmente conhecida. N'essa obra, em que são referidas doze observações, nota a sua maior frequencia nas creanças, a influencia das estações frias e dos lo- gares humidos na sua manifestação, descreve-lhe todos os symptomas, indica o tratamento mais racionalmente do que se havia feito antes, insistindo na medicação antiphlogistica, e aconselhando recorrer por fim á tracheiotomia, quando os outros meios tenham sido inuteis. A importante memoria de Home foi por este modo uma verda- deira revelação para a fmaior parte dos medicos do seu tempo, que ha- viam esquecido o que antes alguns já haviam notado ou mais vaga- mente referido. Comtudo faz pena vêr que fossem inteiramente esque- cidos n'aquella obra os medicos hespanhoes, que antes tinham tão bem conhecido a molestia e a sua natureza. Desde então o crup foi melhor visto e observado por todos, e considerado como uma doença distin- cta, sobre a qual foram successivamente apparecendo muitos escriptos, entre os quaes indicarei os de Murray e Michaelis na Allemanha em 1769 e 1778; Rush, Tailor, Mease, Bayley em Inglaterra em 1770, 1773, 1777 e 1781; Mahon em França em 1770, e muitos outros, que seria fastidioso citar. Todos elles são mais ou menos importantes, distinguindo-se sobremaneira a mui erudita dissertação de Michaelis, que dava ao crup a denominação de angina polyposa. Appareceu depois, em 1784, a memoria de Samuel Bard, que descreveu o crup com o nome de angina suffocatoria, na qual se pro- poz provar, que a angina pharyngea isolada, o crup, e a angina pha- ryngea com o crup, quando eram molestias pseudo-membranosas, ti- nham “todas a mesma natureza, differençando-se apenas por occupa- rem orgãos diversos. Eis aqui nos fins do seculo passado a natureza do crup e das af- fecções pseudo-membranosas já avaliada no seu verdadeiro ponto. Foi Bard o primeiro que empregou no tratamento do garrotilho os calo- melanos, a que juntava o opio.. Em 11 de março de 1783 a Sociedade real de medicina de Pa- ris abriu o primeiro concurso sobre o crup, no qual foi premiada a memoria de Vieusseux, medico de Genebra. N'este escripto em que a molestia é completamente tratada, o auctor admitte tres especies de crup : inflammatorio, nervoso e chronico. Pouco depois houve em Portugal, em Leiria, nos annos de 1786 16 ESTUDOS SOBRE a 1787, uma epidemia da mesma doença, em que predominava a an- gina pseudo-membranosa, muito bem descripta pelo nosso compatriota Luiz Soares Barbosa em uma obra especial, impressa em Lisboa no an- no de 1789 ( Aloysii Suaresii Barbosae, Leiriensis medici, de angina ulcerosa, ab anno 1786 ad annum 1787 apud Leiriam epidemice gras- sante commentatio ). N'ºeste opusculo, dedicado a D. Lourenço de Lencastre, bispo de Leiria, de que temos um exemplar na bibliotheca nacional de Lisboa, diz o auctor, que quarenta annos antes, em 1749, se lembrava de ter havido na villa de Ancião, sua patria, e nos logares adjacentes a mes- ma doença, que durava poucos dias, acommettendo as creanças, das quaes muitas morreram, fallecendo entre ellas sua irmã, de seis an- nos, com petechias purpureas e lividas. O vulgo chamava-lhe, acres- centa elle, bolhas na garganta, como ainda hoje, nam crustac albae in faucibus detegebantur. Já antes, em 1626, houvera em Olivença uma epidemia de gar- rotilhos, sobre que ha escriptos dois autos com data de 19 d'outubro de 1626, os quaes estão registrados no livro manuscripto, com o no- me de Provimento de Saude, que existe no cartorio da camara mu- nicipal de Lisboa, e que foi mandado fazer em 1719, no tempo d'el- rei D. João V, para todos os documentos de saude publica então exis- tentes no cartorio da municipalidade. D'aquelles autos, achados pelo sr. dr. Bernardino Antonio Go- mes no referido livro, um tem o seguinte titulo « Informação que por virtude de uma carta dos srs. governadores fez o licenciado Antonio Sirne de Faria, ouvidor desta comarca com o dr. Luiz Antonio, medi- co de s. ex.*, e com o licenciado Estevão Carvalho, cirurgião do dito sr., feita em 19 outubro de 1626.» Ahi se lê que a doença que então grassava em Olivença «erão garrotilhos que deram em muitos meni- nos, e são umas inflammações na garganta com chagas corrosivas e malignas, de que morreram muitos assim pela má qualidade da doen- ca, como pela inobediencia de não aceitarem os remedios, convenientes, e se em algumas pessoas grandes dava, que eram poucas, saravam as mais d'ellas por aceitarem os remedios, mas hoje de presente tem pa- rado depois que choveu, pelo que se entendeu ser a dita doença de muita 'seccura do tempo e quentura delle e má qualidade dos humo- res, e que depois de chover não houve mais a doecer pessoa alguma de novo que elles saibam...» O outro auto tem por titulo « Diligencia que o licenciado Joseph Paulo Guerra, juiz de Sfóra desta villa d'Olivenca, fez com todos os O GARROTILHO 17 phusicos e cirurgiões que curam os enfermos della, feita em 19 d'ou- tubro de 1626.» N'este documento declaram os medicos, Antonio Hen- riques, Antonio Soares, Antonio Nunes, e os cirurgiões, Francisco de Campos e Manuel Diogo, que «na villa grassavam terçãs, quartas, fe- bres contínuas, inflammações de garganta com chagas, a que vulgar- mente chamam garrotilhos, de que morreram este presente anno mui- tos meninos, pela falta de remedios que elles não eram capazes de acei- tar por não terem idade, e d'esta mesma enfermidade não morreram mais pessoas, que fossem de idade de 16 annos para cima, que duas mulheres moças, e que d'estas pessoas algumas morriam dentro de tres dias, e outras ao setimo, e outras ao quadragesimo, e outras aos vinte dias. Declararam mais que a doença não era contagiosa pesti- lente, e que ía cessando n'aquella occasião, que atacava em casas duas, tres e quatro creanças » (vid. Gaz. medica de Lisboa 1.º de novembro de 1860, pag. 325). É portanto certo, que muito antes da epidemia de Leiria, des- cripta por Soares Barbosa, outra houve em Olivença no outomno de 1626; o que nada deve admirar, havendo por esse tempo em Hespa- nha iguaes epidemias de garrotilho, que provavelmente então, e por ventura ainda em outras mais occasiões, que não conhecemos, se ex- tenderam ou irradiaram até o nosso territorio nas localidades confinan- tes ou mais proximas. 1 Manuel Joaquim Henriques de Paiva, na sua traducção da Medi- cina domestica de Buchan, dá noticia de uma epidemia de anginas ma- lignas, que grassou em Portugal ainda antes da epidemia de Leiria ou quasi pelo mesmo tempo, desde 1785, e comparou-a á esquinencia ma- ligna, mal de garganta podre e ulceroso de Buchan; e tratou-a inter- namente com os tonicos, adstringentes, limonada sulphurica, quina, ser- pentaria, fumigações de vinagre, e com vesicatorios no pescoço (Medi- cina domestica de Buchan, traducção de Manuel Joaquim Henriques de Paiva, tom. IJ). Francisco da Fonseca Henriques (Soccorro Delphico, 1710) falla tambem confusamente do garrotilho, e, fundando-se no exemplo de As- clepiades, Galeno, Antonio Musa Brassavola e Sennert, aconselha a tra- cheiotomia no tratamento da angina. Este mesmo conselho já tinha sido dado em 1668 por Thomaz Rodrigues da Veiga, medico portu- guez e professor da Universidade de Coimbra, dizendo na sua Prati- ca medica que escreveu em Lisboa «cum res disperatu est, aperiatur guttur inter duas cartilagines ad respirationem, et sanata angina ul- cus consolidatur. » MEM, DA ACAD.— 1.º CLASSE T. NH. P. L. B) 18 ESTUDOS SOBRE A epidemia de Leiria, observada e descripta por Soares Barbosa, acommetteu principalmente as creanças e poucas pessoas de 20 a 50 annos. Manifestou-se, na maior parte dos doentes, complicada de escar- latina «Tn plerisque, nom in omnibus tamen eruptio scarlatina adpa- ruit.» Via-se debaixo das tres seguintes especies : 1.º Em alguns indi- viduos sem febre e sem escarlatina; sómente ulceras nas fauces com maculas brancas, pouca dôr de garganta, deglutição não muito incom- moda ; em alguns a lingua sordida e vomitos. 2.º A angina e febre aq mesmo tempo, symptomas geraes graves. 3.º Angina, febre e escarla- tina na maior parte dos doentes. Os que tinham esta terceira fórma da doença, que era a maxima parte dos enfermos, eram tambem os mais gravemente atacados. No principio da doença manifestava-se dôr de garganta, em al- guns horripilações repetidas; as fauces inchavam, faziam-se vermelho- escuras ; as amygdalas cobriam-se de manchas brancas « Fauces tumes- centes rubore sub obscuro inficiebantur, eb maculae albae ad tonsillas observabantur. Hae crustae albae ita quibusdam.. . aliis fusci coloris fauces coopertae adparebant humore tenacissimo mucoso. In aliquibus ipse tenacissimus mucus per linguam proserpebat, et eidem adeo tena- citer adherebat, ut pelicula videreter, nec cultro ipso radi posset .... quandoque inspiratio difficilis eb initium stertoris adparebant, vox erat rauca, odor faucium ingrata, spiratio difficilis.» Geralmente ao 3.º, raras vezes ao 2.º ou 4.º dia de doença, apparecia escarlatina. No decur- so da molestia manifestavam-se tumores dolorosos e duros nas paroti- das e regiões submaxillares, umas vezes de um só lado, e geralmente de ambos ; algumas vezes confluentes, outras discretos pelo collo, resolviam quasi sempre. No maior numero de casos ao 7.º dia as crostas bran- cas cahiam e ficavam as partes ligeiramente ulceradas « Septimo ple- rumque die crustam albam a subjecta carne separatam, et ulcuscula detersa habuere. » A duração era pois, geralmente, de 7 dias, algumas vezes menos, em um caso foi de 11 dias. O perigo da morte subsistia quasi sempre até o fim do 1.º septenario. ; À O auctor suppoz a doença contagiosa, e que fôra por este motivo que elle proprio a contrahiu «Contagiosa merito habetur haec angina epidemica. Aliquoties vidimus quinque aut sex sub codem tecto hoc mor- bo corruptos... hac via morbum contraxisse mihi persuasi. » Apesar de ter estado doente, tratou mais de duzentas pessoas que se curaram quasi todas. Como tratamento só prescreveu no principio tres a quatro emis- O GARROTILHO 19 sões sanguineas, porque, diz o auctor, nem a natureza da doença, nem os symptomas pareciam indical-as. Os doentes mais fortes e plethoricos supportaram a subtracção do sangue, mas não alcançaram nenhum alli- vio; e os mais fracos ficaram impossibilitados de resistir á doença. Ven- -do estes resultados logo no principio, Soares Barbosa absteve-se depois “inteiramente das emissões sanguineas, e censura os que não procede- ram do mesmo modo. Usava muito dos emeticos e com vantagem, pre- ferindo geralmente a ipecacuanha ao tartaro. Nunca deu os catharti- cos no principio ; algumas vezes lhe pareceu obter allivio com os vesi- catorios; prescrevia os gargarejos emollientes e detersivos, e usava ainda internamente os tonicos, e sobretudo o decocto de quina. D'aqui se collige, que foi uma verdadeira angina diphtherica be- nigna, que observou em Leiria Luiz Soares Barbosa, geralmente com- plicada de escarlatina, e algumas vezes com o garrotilho ; e que o seu tratamento era já n'aquelle tempo o mais racional e o mais adequado. Se aos vesicatorios, que ás vezes applicava, substituisse os escaroti- cos na pharynge, pouco haveria hoje a acrescentar de mais essencial ao tratamento medico que elle aconselhava. Seguiram-se depois outras notaveis publicações, entre as quaes me basta citar a de Archer, de Philadelphia, em 1798, na qual é pre- conisada a polygala senega; a de Schwilgué, impressa em Paris em 1802, onde vem uma boa analyse da falsa membrana ; a de Caron, de París em 1808, em que o auctor defende ardentemente a importancia e o valor da tracheiotomia, etc. Aqui terminarei a 2.º época da historia do garrotilho, caracte- risada pelas boas descripções da doença, pelo verdadeiro conhecimento da falsa membrana, que constitue o seu caracter anatomico, pela dis- tincção do crup da angina gangrenosa, e emfim pela identidade da na- tureza do garrotilho' e da angina pseudo-membranosa, indicada e de- fendida por Bard. Terceira época — Começa no principio do seculo xix por occasião do grande concurso Napoleão. Em 1807, no mesmo anno em que o exercito francez invadia Portugal, estando Napoleão 1 em Finckenstein e recebendo a noti- cia da morte de seu sobrinho Luiz Carlos Napoleão, primeiro filho de Luiz Buonaparte, rei da Hollanda, e da princeza Hortensia, e ir- mão mais velho do actual imperador dos francezes, que fôra victima em poucos dias de um ataque de crup, dirigiu-se a Corvisart, que es- tava presente, e perguntou-lhe: O que é o crup? Ao que elle respon- deu: é uma doença incuravel. Depois de reflectir alguns momentos o - 3 Pa 20 ESTUDOS SOBRE imperador disse ao seu medico : Sabeis o que vos digo ? A vossa resposta é vergonhosa para vós, vergonhosa para a sciencia, e cruel para a hu- manidade. Fazei abrir um concurso, e contai com um premio de 12:000 frantos para quem achar o remedio para tão horrivel molestia. Tal foi a origem do grande concurso, que foi ordenado no quar- tel-general de Finckenstein com a data de 4 de junho de 1807, e que teve logar no anno seguinte, apresentando-se setenta e nove memorias, cinco das 'quaes foram julgadas superiores: as de Albers de Bremen e Jurine, que alcançaram o premio, que foi dividido entre ambos, e as” de Vieusseux, Caillou e Double, que tiveram menção honrosa. Em 1811 foi publicado o luminoso relatorio deste concurso, re- digido pelo dr. Royer Collard, membro da commissão nomeada para avaliar o merecimento das memorias apresentadas, e professor da fa- culdade de medicina de París. Este mesmo medico, pouco depois, em 1813, escreveu o extenso e excellente artigo croup no 7.º volume do grande Diccionario das sciencias medicas. Comtudo os desejos de Napoleão não foram satisfeitos, porque o remedio do crup ficou por achar, e a natureza da doença tambem não foi muito melhor conhecida do que já era. Todavia muitas outras ques- tões de interesse pratico foram mais bem estudadas, do que o haviam sido até ali, e algumas resolvidas. ; Os resultados deste concurso podem resumir-se nas seguintes proposições : . 1.º O crup tem por caracter anatomico uma falsa membrana for- mada nas vias aereas; e por symptomas funccionaes, tosse, alteração particular da voz, e accessos de suffocação. Para alguns só os symptomas funccionaes podiam caracterisar a doença, porque a energia do tratamento ou a rapidez da morte podia impedir a formação da falsa membrana. Estes são os casos que hoje se classificam na asthma aguda de Miller, spasmo da glotte ou falso crup. 2º O crup distingue-se da ulcera syriaca de Areteu ou angina gangrenosa, que, quando existe, é considerada como uma complicação. Alguns, comtudo, tendo notado epidemias de crup começando pela garganta e extendendo-se d'aqui para a larynge, confundiram os dois estados pathologicos. 3.º Parece ter existido em todos os tempos, ainda que a falsa membrana na larynge só fosse assignalada por Baillou em 1576; mas deve ter sido mais frequente na ultima metade do seculo XVII, a julgar pelo grande numero de trabalhos publicados nesta época. O GARROTILHO ot 4.º Manifesta-se nas mais diversas regiões, ao norte, ao sul, a éste, e a oeste; na Suecia, na Inglaterra, Allemanha, França, Suissa, Hespanha, Italia e America. A humidade do clima ou da estação parece auxiliar o seu des- envolvimento. 5.º E' geralmente attribuido a um principio espalhado no ar. 6.º E” considerado contagioso por uns, e não contagioso por ou- tros, que todavia admittiam o contágio da angina gangrenosa. 7º A falsa membrana é o effeito d'uma inflaâmmação particular. 8.º Uns explicam a suflocação pela acção estrangulatoria da falsa membrana ; outros, admittem que a pseudo-membrana, a tumefacção inflammatoria e um certo estado spasmodico concorrem “todos para aquelle phenomeno. 9.º No tratamento uns dirigem todos os meios therapeuticos con- tra a falsa membrana, que procuram dissolver e separar da mucosa por meio dos calomelanos em alta dose, pelo sulphureto de potassa e pela polygala; ou expulsar e remover pelos emeticos e pela tracheio- tomia. Outros, suppondo a inflamação a causa efficiente da falsa mem- brana, combatem-na com as emissões sanguineas, com os revulsivos ou derivativos (vesicatorios, synapismos, purgantes, etc.), desapprovam a tracheiotomia por inutil e perigosa, e só empregam os calomelanos e emeticos como auxiliares. 10.º O tratamento preservativo consiste unicamente nos cuidados hygienicos, em preservar as creanças do frio e da humidade. D'este resumo se conclue que o concurso foi util por haver col- ligido todos os conhecimentos, que havia dispersos sobre o objecto, e tél-os feito conhecer por toda a profissão; mas as questões propostas sobre a natureza e tratamento da molestia não foram resolvidas. Em seguida ao concursc, desde 1809 até 1826, appareceram successivamente novas e importantes obras entre as ques citarei as de Valentin em 1812, Desruelles em 1821, Blaud em 1825, etc. Aqui termino este terceiro periodo da historia do crup, em que avulta o grande concurso de 1808, e as obras a que elle deu origem. Quarta época. — O quarto e ultimo periodo da historia do crup começa em 1826 com a memoravel publicação de Bretonneau (Des inflammations spéciales du tissu muqueua et en particulier de la diph- therite ou inflammation pelliculaire, conmue sous les noms de croup, dangine maligne, dangine gangrencuse etc. Paris, 1826). A observação de epidemias d'anginas malignas em Tours desde os annos de 1818 a 1821 ministrou ao illustre medico, que acabo de 22 ESTUDOS SOBRE citar, os materiaes para à sua valiosa obra, mais importante, sem du- vida, do que as de todos os medicos reunidos no concurso de 1808. Foi elle o primeiro, que tratou mais a fundo da especificidade do crup, e demonstrou a identidade de natureza d'esta doença e da an- gina pseudo-membranosa, como já em 1784 escrevêra Samuel Bard ; e foi ainda elle quem apresentou os caracteres distinctivos entre o crup e asthma de Millar ou falso crup. Do seu memoravel escripto, fundado em muitos factos de propria observação, na qual estão colligidas quatro memorias, tiram-se os se- guintes corollarios, que são os pontos capitaes em que elle se pode re- sumir : 1.º Não ha angina gangrenosa. O caracter gangrenoso das con- creções da garganta nas anginas malignas é apenas apparente, e só de- pende da decomposição putrida auxiliada pela acção do ar e do calor humido da bocca. 2.º Estas producções anormaes da garganta são falsas membra- nas inteiramente identicas ás do crup. 9.º A falsa membrana da larynge, que constitue a angina cru- pal, é consecutiva ás exsudações da garganta ou á angina pseudo-mem- branosa. Apenas observou uma vez a larynge atacada independente- mente da garganta. 4.º O crup e a angina diphtherica são da mesma natureza. 5.º Estas doencas são uma phlegmasia especifica, consecutiva a uma diathese, para cuja designação propõe'o nome de diphtherite, para a distinguir das outras inflammações. 6.º O tratamento, que deve fazer-se no principio, é a cauterisa- ção, já preconisada por Van-Swieten e muito antes por Areteo ; e por ultimo recurso, quando a falsa membrana, descendo da garganta, não é já accessivel aos topicos, o mercurio e a tracheiotomia. Reprova as emissões sanguineas, os emeticos, os vesicatorios e os outros revulsivos por inconvenientes ou inefficazes. As doutrinas do illustrado medico de Tours foram aceitas com geral enthusiasmo, e pode dizer-se, que ainda hoje, á excepção talvez só de dois pontos, são geralmente recebidas. Nas suecessivas epidemias que posteriormente se têem observado, e em varios casos esporadicos, tem-se visto, que o crup comecava logo pela larynge mais vezes do que suppunha Bretonneau. E a angina gan- grenosa, que, por influencia da sua obra desapparecêra dos quadros nosologicos para ser substituida pela angina diphtherica, tem sido de novo admittida á vista de certos casos isolados e mesmo de certas O GARROTILHO 23 constituições epidemicas, como a que teve logar em 1841 no hospital de creancas de París, em que não era possivel desconhecer o caracter verdadeiramente gangrenoso das producções morbidas, e em que a gangrena não existia só na garganta, mas n'outros pontos, como na superficie dos vesicatorios, vulva, etc. Entre nós tambem, alem de casos isolados que mais de uma vez tem sido observados, houve ha cinco annos, em agosto de 1855, sete casos d'angina gangrenosa bem caracterisada, que foram observados no Estoril pelo nosso amigo e collega, o sr. Francisco Alberto d'Oliveira. Um destes casos tive eu tambem occasião de vêr e de tratar. Todos pertenciam a pessoas da casa do sr. João Antonio Vianna. Afóra estes, todos os outros pontos de doutrina são geralmente admittidos quasi sem controversia. Assim a identidade da doença, ou atacando a larynge e constituindo o crup, ou invadindo a garganta, e determinando a angina diphtherica, é aceita por quasi todos sem a menor reserva. A existencia de uma diathese e da phlegmasia especifica é tam- bem admittida por uma grande parte das pessoas mais competentes na materia. O) tratamento pela cauterisação ainda que recebido exce- pcionalmente com pouca confiança, e até atacado por alguns, merece comtudo a approvação e confiança quasi universal. O mesmo digo da tracheiotomia, que é aceita hoje quasi sem a menor contestação. Não direi o mesmo a respeito dos mercuriaes que actualmente não mere- cem a confiança dos melhores praticos, nem dos alcalinos que depois d'elles foram aconselhados, e que, uns e outros são tidos como mais prejudiciaes do que uteis. Pelo contrario os emeticos são hoje conside- rados poderosos auxiliares do outro tratamento do crup. Como fazendo parte d'este periodo, em que o nome de Breton- neau avulta entre todos, devo citar os srs. Bricheteau (Précis analy- tique du croup etc., París, 1828); Guersant (Art. croup do Dictionai- re de Médicine); Blache ( Du croup ct du pseudo-croup. Arch. gen. de méd. 1828); Trousseau (Journal des conn. médico-chir. 1834); Barthez e Rilliet (Traité clinique et pratique des maladies des enfants, 2.º edi- ção, París 1853); Bouchut (Nouvelle ctude sur le croup, Paris, 1859); Woster (Pacific med. and surg. journal, 1859), e outros. Alem de tudo o que tenho citado, appareceram n'esta mesma. época, a proposito de um ou outro tratamento, que parece mais efficaz, a proposito de novos symptomas notados, das fórmas de novo admitti- das, ou de differentes modos de considerar a natureza da doença, me- morias especiaes ou artigos impressos nos diversos jornaes medicos so- 24 ESTUDOS SOBRE bre tudo da França, onde a doença tem sido melhor estudada do que em qualquer outra parte. N'este sentido téem escripto os srs. Jodin, Bouchut, Wooster, Michel Peter, Loiseau, Barthez, Maingault, e mui- tos outros. Ainda em 1858 e 1859, a proposito d'uma memoria do sr. Bou- chut (Nouvelle meéthode du traitement du croup par la tubage de la glotte) apresentada á academia de medicina de Paris em sessão de 14 de setembro d'aquelle anno, esta respeitavel associação, sobre um lu- minoso relatorio escripto pelo sr. Trousseau discutiu muitos dos pon- tos relativos sobre tudo ao tratamento operatorio do garrotilho. N'esta importante discussão, que começou em 24 de novembro de 1858 e terminou em 18 de janeiro de 1859, occupou-se nove ses- sões, em que tomaram parte os srs. Bonvier, Piorry, Bouillaud, Dela- fond, Barth, e mais especialmente os srs. Trousseau e Malgaigne. As conclusões votadas pela academia foram as seguintes: . 1.º A tubagem no tratamento do crup, como se ha praticado até hoje, não tem parecido nem assaz util, nem assaz isenta de perigo, para merecer a approvação da academia. 2.º A tracheiotomia no estado actual da sciencia é o unico meio a empregar, quando já não ha probabilidade de bom resultado pelos meios medicos. Terminaria aqui o esboço historico do crup, se não quizesse di- zer mais algumas palavras ainda, a respeito de Portugal. Afóra o que escreveu Soares Barbosa sobre'a epidemia d'angina ulcerosa observada em Leiria nos annos de 1778 a 1779, e que já referi, e á excepção do que tambem notei da epidemia de Olivença de 1626, etc., não conheço nenhuma obra portugueza em que o garro- tilho tenha sido estudado ou descripto especialmente. E" n'estes ulti- mos annos que o crup tem merecido mais attenção e estudo em Portu- gal, não certamente por ter deixado de ser observado, sendo-o aliás em toda a peninsula hispanica, como o attestam os escriptos dos medicos hespanhoes que já citei, e como claramente o escreveu tambem o nosso Zacuto Lusitano na sua Praxis medica. Alguns dos casos descriptos pelos nossos antigos medicos com o nome de Synanche, esquinancia maligna e de garrotilho referem-se na- turalmente ao verdadeiro crup, como a ultima denominação parece pro- var, mas em nenhum d'elles se faz rmenção da falsa membrana que ca- racterisa a doença, apesar de não faltarem as longas explicações pro- prias do tempo, nas quaes se expõe como a molestia foi em uns'ca- sos a consequencia do affluxo á garganta do sangue sulphurco, chole- O GARROTILHO 25 rico e inflammavel; em outros, de sangue melancholico e phleugma- tico; e em outros ainda da pituita, humor proveniente da cabeça. Comtudo, apesar dos êrros grosseiros que a época ainda mal desculpa- va, pode perceber-se que os symptomas e o modo de transmissão eram os do crup para alguns d'esses casos pelo menos ; e vê-se tambem, que os remedios, que então mais aproveitavam, eram pouco mais ou me- nos os mesmos que hoje se usam com mais vantagem. Assim Curvo Semedo na sua Polyanthea medicinal indica o contagio, quando dá aos enfermeiros o conselho de usarem as lavagens de agua de rosas e so- limão sobre a pelle; e na sua Atalaia da vida recommenda os vomi- torios como superiores aos outros meios de tratamento. Nas suas 0b- servações medicas doutrinaes de cem casos gravissimos falla do garro- tilho, ainda que vagamente. Ahi refere o facto de uma familia cujos filhos morriam de garrotilho quando chegavam a certa idade, e que foram depois livres pela applicação de onitentos É preciso chegar ao principio d'este seculo para vêr descripta por medicos portuguezes a falsa membrana caracteristica da affecção eru- pal. É o cirurgião Antonio d'Almeida o primeiro em que se vê esta noticia em uma nota escripta a pag. 17 e 18 do tom. 3.º do seu Tra- tado de medicina operatoria (Tratado completo de medicina operatoria, por Antonio d'Almeida, 2.º edição, 1825). Nesta passagem, que se segue á esquinencia maligna e á esqui- nencia tracheal ou garrotilho, de que falla a pag. pás 15, 16 e 17 diz elle o seguinte. « Como esta molestia consiste no estado inflamma- torio da membrana mucosa que forra o larynx, tracheia e bronchios, o muco ganha por effeito do calor uma certa consistencia que o faz parecer ao pus, e d'aqui o parecerem os escarros purulentos, os quaes os doentes lançam com trabalho, tendo-se visto muitas vezes porções membranosas da figura dos canaes onde se formam, tomadas por al- guns como pedacos da membrana mucosa. » Fallando da esquinencia tracheial ou garrotilho, escreve «.. . esta esquinencia, benigna ou maligna, merece todo o cuidado dos praticos, porque é a que mais promptamente póde produzir a suffocação em ra- zão de principiar logo a difficultar a respiração, seguindo-se voz sibi- lante, anxiedade, grande aperto doloroso do laryna, febre, tosse secca e os mais symptomas da esquinencia maligna, xodoas cinzentas nas fauces que lavram e mudam em crustas espessas, que cahindo deixam ulceras, das quaes corre uma materia fetida, que faz o halito insup- portavel. Se estas ulceras ganham uma côr livida ou negra, e o pulso se torna pequeno, frequente, irregular, debilitando-se as funcções ani- MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE T. IH. P.1. 4 26 ESTUDOS SOBRE maes, e vindo o delirio, a somnolencia; se a pelle se cobre de pin- tas, e a inflammação lavra pela membrana interna do larynx até o pulmão, difficultando-se cada vez mais a respiração, o doente morre commummente do terceiro dia por diante com todos os symptomas de uma febre putrida, com os quaes perecem os enfermos se não apres- sâmos os soecorros, e se não prevenimos a suffocação com a broncho- tomia. Esta esquinencia que ataca principalmente as creanças, poucas vezes é contagiosa. Muitas vezes observámos ser uma continuação d'aquella que ataca as fauces. » A proposito do tratamento da esquinencia maligna, diz ainda An- tonio d'Almeida, que os emeticos são muito proveitosos e o uso dos an- tisepticos internamente, ou em gargarejos muito amiudados para se não demorar a materia; que, sendo mui grande a tendencia da moles- tia para a podridão, não se podem fazer evacuações sanguineas, exce- pto havendo grande plethora. De tudo o que sobre a esquinencia maligna e tracheial escreveu o nosso compatriota, lente de operações na antiga Escóla de Cirur- gia de Lisboa, se vê os principaes symptomas da angina diphtheri- ca e do crup; que este se seguia em alguns casos áquella, e que ou- tras vezes começava logo pela larynge; que havia falsas membranas com a fórma dos canaes aereos, as quaes os doentes expulsavam ; que a molestia tinha tendencia para a debilidade constitucional, e por isso reprovava as evacuações sanguineas; que a doença fazia suceum- bir por evidentes signaes do que hoje se chama intoxicação diphthe- rica; e que, para prevenir a morte por suffocação, aconselhava a bron- chotomia, etc. Hoje os conhecimentos que todos geralmente temos sobre o crup são os que se tem em França, o que quer dizer que a doença é per- feitamente conhecida em todos os pontos que se acham esclarecidos na sciencia. A medicina portugueza, principalmente em Lisboa, seguindo em todos os pontos, e passo a passo, a medicina franceza, tem tambem actualmente a respeito do garrotilho as mesmas idéas que ha em Fran- ca, tanto sobre a symptomatologia e anatomia pathologica da moles- tia, como sobre a sua natureza e tratamento. N'estes ultimos annos e sobre tudo desde a epidemia que houve em 1858 e 1859, pela qual foi infelizmente arrebatada Sua Magesta- de a Rainha de Portugal, a Senhora D. Estephania, os estudos sobre o objecto têéem-se multiplicado, como o attestam varios artigos publi- cados na Gazeta Medica de Lisboa, no Escholiaste Medico e no Jornal da Sociedade das Sciencias Medicas de Lisboa. O GARROTILHO 27 Alguns alumnos da Escóla Medico-cirurgica de Lisboa têem es- colhido ultimamente para objecto das suas dissertações inauguraes o garrotilho, ou a tracheiotomia como tratamento do crup. Assim o fize- ram em 1859 os srs. Eduardo Augusto Motta, hoje cirurgião do Ban- co do Hospital de S. José, e Francisco José dos Santos Chaves, que actualmente pratica fora da capital; e em 1860 o sr. Manoel Bento de Sousa. ] No anno lectivo de 1859 a 1860, o meu illustre collega, o sr. dr. Cunha Vianna, lente de pathologia interna na Escóla de Lisboa, depois de fazer magnificas prelecções sobre o crup e a angina diphthe- rica, teve a feliz lembrança de impor aos seus discipulos do 4.º>e 5.º anno a obrigação de lhe apresentarem, antes dos exames finaes, uma dissertação sobre os diversos pontos da pathologia d'aquella doença, o que deu em resultado fazerem aquelles alumnos um estudo serio e profundo sobre uma doença mui grave e bastante frequente na pra- tica em que brevemente iam entrar. Ultimamente a Sociedade das Sciencias Medicas de Lisboa, por proposta do sr. João Baptista Moreira, tem discutido o tratamento da “ diphtheria sobre um relatorio, confeccionado por este mesmo collega e pelo sr. Joaquim Theotonio da Silva, membros da commissão nomeada pela Sociedade para apresentar as bases para essa discussão, o qual foi lido em sessão de 1 de março de 1860. A tracheiotomia, como tratamento do crup, é empregada em Lis- boa desde 1851, sendo então feita pela primeira vez com esta appli- cação pelo sr. Theotonio da Silva, depois por mim desde 1853, e em seguida, menos vezes, por outros collegas. Desde aquelle tempo até hoje têem-se feito em Lisboa, como tratamento do garrotilho, vinte e quatro operações de tracheiotomia, com as quaes se obteve salvar sete doentes, tendo sido praticadas onze pelo sr. Theotonio da Silva com tres casos de cura, e oito por mim conseguindo quatro curas. As ou- tras cinco operações foram executadas pelos srs. Oliveira Soares em 1856 e 1860, Angelo de Sousa em 1859, Figueiredo e Motta, e José “Galdino de Carvalho em 1860. No Porto foi praticada, que me conste, uma só vez pelo distin- cto lente da Escóla Medico-cirurgica, o sr. Antonio Bernardino d'Al- meida, em 1858, e no mesmo anno em Santarem pelo sr. Antonio Mendes Pedroso, conseguindo-se nos dois casos que os doentes sobre- vivessem oito dias. Algumas d'aquellas observações têem sido publicadas nos jornaes medicos de Lisboa com os respectivos symptomas e marcha do gar- m 28 ESTUDOS SOBRE rotilho antes e depois da operação ; e todas serão apresentadas por mim com os precisos desenvolvimentos no trabalho especial, que, sobre a tracheiotomia no crup, completarei brevemente. Seja-me permittido, n'esta parte do meu escripto sobre o crup, dizer. algumas palavras sobre as epidemias de diphtheria que temos tido n'estes ultimos annos, sobre tudo em 1859. Em 1857 houve em Lisboa talvez mais casos de crup e de an- ginas diphthericas do que era costume nos annos anteriores, em que estas doencas se manifestaram sempre, porém esporadicamente. Passando pelos olhos os 10919 bilhetes mortuarios pertencen- tes áquelle anno, em que soffremos a devastadora epidemia da febre amarella, achei 25 em que a morte tinha sido causada pelo garroti- lho ou por angina diphtherica. D'estas 25 mortes foram 9 no primeiro trimestre (2 em janei- ro, 4 em fevereiro e 3 em março); 4 no segundo (3 em abril e 1 em junho); 9 no terceiro (2 em julho, 2 em agosto e 5 em setembro); e 3 no quarto trimestre do anno (1 em outubro e 2 em dezembro). O numero geral de obitos n'aquelle anno foi, como disse, 10919 pertencendo 1286 ao primeiro trimestre, 1115 ao segundo, 1935, ao. terceiro, e 6583 ao quarto trimestre. Das 25 mortes por diphtheria eram 15 em individuos do sexo masculino, e 10 do feminino. A idade não excedia 8 annos em 24, e em 1 era de 25 annos. No mesmo numero acha-se 8 de angina pseudo-membranosa sem crup, e 17 de garrotilho nos quaes se não indica a coexistencia da mesma affecção na garganta. A duração da doença foi designada em 14 casos sómente ; sendo de 1 a 4 diasem 11, e de 5 a 13 dias em 3. Tiveram logar aquelles mesmos 25 obitos em 15 das freguezias de Lisboa; em quasi todas houve um caso de morte, em algumas (Pena Anjos, Santos) deram-se 3, e em outras (Lapa, Soecorro) 2 casos. Na Casa Pia de Lisboa, com uma população de 814 orfãos, não se manifestou nenhum caso de diphtheria no anno de 1857. Nas enfermarias da Misericordia, onde foram tratados de varias doenças 1595 expostos, só appareceu, no mez de setembro d'aquelle anno, um caso de angina diphtherica com escarlatina em uma rapa- riga de 11 annos que se curou, tendo estado 43 dias na enfermaria. Nos expostos tratados em domicilio houve, n'aquelle mesmo an- no de 1857, 5 doentes de diphtheria, sendo 4 de anginas pseudo- membranosas e 1 de garrotilho com bexigas. Foram atacados 2 no O GARROTILHO 29 1.º trimestre, 'sendo o total dos doentes 301; 2 no 2.º em 343 enfer- mos; e | no 3.º trimestre em 523 doentes. Eram 3 do sexo mascu- lino e 2 do feminino. Tinham de idade 8 e 15 dias, 8 e 18 mezes, e 9 annos. Moravam 2 na freguezia da Ajuda, 1 na de Santa Isabel, 1 na de Santos e 1 na da Lapa. Falleceram 2, um de 15 dias e ou- tro de 8 mezes, e curaram-se 3. Nos que succumbiram a duração foi de 1 e 11 dias; e nos que se restabeleceram de 8 dias em dois, e de 28 dias no terceiro. Em 1358 foi muito maior o numero dos fallecimentos de diph- theria, sobre tudo no segundo semestre, e por tanto muito maior tam- bem o numero dos atacados. Segundo o que colligi do exame dos respectivos bilhetes mortua- rios da cidade, em numero de 5390, houve 68 obitos de garrotilho ou angina pseudo-membranosa, isto é mais 43 do que no anno anterior. D'estes 68 casos foram 4 no primeiro trimestre (2 em feverei- ro e 2 em março), 12 no segundo (9 em maio e 3 em junho), 25 so terceiro (3 em julho, 9 em agosto e 13 em setembro), e 27 no quarto trimestre (5 em outubro, 6 em novembro e 16 em dezembro). Deve-se concluir d'aqui que o segundo semestre teve 52 mortes, e o primeiro sómente 16 o que dá uma differença de 36 para mais nos ultimos seis mezes do anno. O numero geral dos obitos no mesmo anno foi 5790; sendo 1440 do primeiro trimestre, 1310 do segundo, 1378 do terceiro, e 1662 do quarto trimestre. N'aquelles 68 obitos contam-se 14 de angina pseudo-membra- nosa ou gangrenosa, e 54 de garrotilho, em que não é indicada a existencia de outra diphtheria, que, não obstante, provavelmente co- existiu em quasi todos. Eram 44 do sexo masculino e 24 do feminino. Tinham até $ annos de idade 63 dos individuos, 3 de 9 a 21 annos ; nos outros 2 a idade não foi indicada. A duração da doença n'esses casos fataes está designada só em 54 dos bilhetes; e n'estes acha-se até 5 dias em 41 doentes, de 6 a 8 dias em 10, e em 3 de 9a 13 dias. Manifestou-se em 22 das freguezias de Lisboa, muitas dando uma victima sómente, e outras de 2 a 7. O numero maximo de mortes, 7, teve logar na freguezia de Santa Isabel; 6 nos Anjos; 5 na Encarna- ção; este mesmo numero na Lapa e S. José; 3 em Santos, Sacramen- to e Santa Catharina; 2 em Santa Justa, Santo Estevão, S. Christo- vão, Pena e S. Julião. ' 30 ESTUDOS SOBRE Na Casa Pia, em uma população de 868 orfãos, n'este anno de 1858 houve 3 doentes de anginas pseudo-membranosas, dois dos quaes tinham sarampo quando se lhes manifestou a diphtheria. Todos 3 eram do sexo masculino e tinham boa constituição. Um contava 4, outro 8 e o terceiro 9 annos de idade. Dois-foram atacados em maio, nos dias 19 e 23,€ o ultimo em 17 de agosto. Todos morreram, 2 aos 5 dias, e outro aos 12 dias de doença. Nas enfermarias da Misericordia não houve caso algum de doenca diphtherica em 1858. Nos expostos de fóra appareceram 4 casos n'aquelle anno, sendo 1 de crup e 3 de anginas pseudo-membranosas. Aconteceu 1 no 2.º trimestre em 294 doentes, e 3 no 3.º trimestre em 377 enfermos. Pertenciam 2 a cada sexo. Tinham de idade 15 dias, 3,4, e 6-> an- nos. Eram 2 da freguezia de Santa Isabel, 1 da de Santos e 1 da Ajuda. Morreram 3 e curou-se 1 de 4 annos. Nos primeiros a doença durou 3, 8 e 11 dias; e no ultimo 2 dias. . No anno de 1859 a epidemia diphtherica em Lisboa foi mais ex, tensa e causou 134 mortes, o que dá mais 66 casos do que no anno antecedente. D'aquelle numero foram 43 no 1.º trimestre (16 em janeiro, 9 em fevereiro, 18 em março), 25 no 2.º (14 em abril, 6 em maio e 5 em junho), 40 no 3.º (12 em julho, 16 em agosto e 12 em se- tembro), e 26 no 4.º trimestre (7 em outubro, 11 em novembro e 8 em dezembro). A mortalidade das outras doenças foi de 6902; sendo 1712 no 1.º trimestre, 1627 no 2.º, 1756 no 3.º, e 1807 mo 4.º N'aquelle numero 134 são 55 de angina diphtherica sem crup, e 79 em que o garrotilho foi a causa da morte. Eram 61 do sexo masculino e 73 do feminino. A idade foi até os 7 annos em 125, em 8 de 8 aos 15 annos e em E era desconhecida. 4 A duração da dvença foi de 1 a 6 dias em 84, de 7 a 8 bias em 16, de 9 a 17 dias em 8, e não era mencionada em 26. Foram invadidas pela epidemia 30 freguezias de Lisboa, havendo em cada uma de 2 a 12 obitos. Assim houve em Santa Isabel 12; nas Mercês 10; em S. José 9; Santa Catharina e Lapa 8; Pena 7; S. Paulo e Soccorro 6; Anjos e Encarnação 5; Santa Engracia, San- tos, S. Nicolau, S. Thiago, S. Mamede e Santo Estevão 4; S. João da Praça, S. Vicente, S. Sebastião e S. Lourenço 3; Santo André, S. Ju- lião, S. Miguel, Chagas, Sacramento e S. Christovão 2. N O GARROTILHO 31 Suppondo que a mortalidade na epidemia de 1859 em Lisboa fosse pouco mais ou menos de 1 : 10, como a que houve no mesmo an- no no Campo Grande e immediações, o numero de doentes de crup e angina pseudo-membranosa teria sido de 1340. Nºeste anno de 1859 não appareceu nenhum doente com diph- theria na Casa Pia. Nas enfermarias da Misericordia houve 5 casos em 1382 expos- tos. Eram todos do sexo feminino ; tinham 7, 9, 12 e 20 annos, e em um a idade não era conhecida; foram atacados: 1 em março, 2 em abril, 1 em julho e 1 em novembro; curaram-se 4 e falleceu 1 cuja “idade não era sabida. A duração da molestia foi de 12 dias no que morreu, e nos que se curaram de 12, 13, 53 e 56 dias. Nos expostos tratados em domicilio houve, no anno de 1859, 12 doenças diphthericas, sendo 3 garrotilhos e 9 anginas; 3 foram des- envolvidas no 1.º trimestre sendo o total dos doentes 316; 1 appare- ceu no 2.º, sendo 316 o numero dos enfermos tratados n'este trimes- tre; 6 no 3.º em 183 doentes; e 2 no 4.º trimestre em 83 enfer- mos. Eram 4 do sexo masculino e 8 do feminino. A idade em 11 doen- tes, nos quaes se conhecia, era em dois de 1 e 7 mezes, em dois de 2 annos, em um de 3 annos, em dois de 4 annos, e em quatro de 5 +, 6, 7 e 8 annos. Residiam 3 na freguezia de Santa Isabel, 2 na de San- tos, 2 na de S. Lourenço, 2 na do Coração de Jesus, 1 na de Santa Engracia, 1 na da Encarnação e 1 na das Mercês. Falleceram 10 e cu- raram-se 2, que não tiveram crup, com a idade de 2 annos cada um. Durou a doença entre 2 e 15 dias nos que morreram, e 14 dias em um dos curados ; no outro restabelecido a idade não vem indicada. A epidemia do Campo Grande e proximidades appareceu tambem em 1859. Segundo as informações e o mappa que me prestou o clini- co da localidade, o sr. Manoel da Silva Franco, os doentes de diphthe- ria por elle tratados em 1859 no Campo Grande e immediações, que foram quasi todos, subiram ao numero 118. Pertenceram 27 ao 1.º trimestre (3 no mez de janeiro, 5 em fe- vereiro e 19 em março), 69 ao 2.º trimestre (46 em abril, 13 em maio e 1() em junho); 8 ao 3.º trimestre (6 em julho, 1 em agosto e 1 em setembro); e 9 ao 4.º trimestre (3 em outubro, 4 em novembro e 2 em dezembro). Eram 48 do sexo masculino e 65 do feminino. Tinham 13 até 1 anno de idade; 90 de 1 a 12 amnos; e 10 de 12 annos para cima. Eram 42 de temperamento lymphatico, 14 de temperamento 32 ESTUDOS SOBRE sanguineo, 10 de temperamento EEE lymphatico, e 47 de tem- peramento duvidoso. Residiam 61 no Campo Grande, 14 em Lisboa proximo das por- tas da cidade, 9 em Tilheiras, 6 em Bemfica, 5 em Palma, 4 na Charneca, 3 no Lumiar, 3 na Luz, 3 na Portella, 3 na estrada de Sacavem, 2 foram vistos em Oeiras. Eram 83 de anginas diphthericas de maior ou menor intensida- de, 26 de anginas diphthericas com symptomas de crup, e 4 de erup com pouca ou nenhuma diphtheria nas amygdalas e uvula. Em 68 as convalescenças correram regularmente sem manifesta- ção de symptomas secundarios; em 4 sobrevieram tumores ao pesco- ço, que suppuraram; em 7 houve paralysias parciaes nos orgãos da vista, no sentimento e no movimento (strabismo e mydriase), no véo do paladar e pharynge, e nos movimentos das pernas. Em 17 ficaram deformidades diversas ou alterações funccionaes em differentes pontos da garganta (hypertrophia das amygdalas, bifurcação e perda de sub- stancia da uvula, difficuldade na deglutição dos liquidos, alteração na voz); em 1 houve uma colite mortal aos 8 dias de convalescença ; em 1 necrose dos ossos da bacia, e finalmente em 15 tendencia notavel para as recahidas. Curaram-se 103 e falleceram 10, ou 1:10,03 O tratamento seguido pelo collega foi, em 38 doentes, cauteri- sações com nitrato de prata auxiliadas com o borax ou alumen, chlo- rato de potassa internamente, frieções ao pescoço com pomada mercu- rial; em 49, alem d'aquelle tratamento, vomitivos, e chlorato de po- tassa topicamente; em 12, alem do que vem dito, vesicatorios e po- mada stibiada; em 14 emissões sanguineas locaes ou geraes. Eis em resumo os pontos capitaes da historia da diphtheria em Lisboa e proximidades nos tres ultimos annos, colligida dos documen- tos mais ou menos officiaes, que pude alcançar. Não terminarei o que me propuz escrever sobre a historia lit- teraria do garrotilho sem citar de entre nós mais tres collegas, que muito se destinguem pelos seus escriptos e pelos seus estudos, ou pela sua pratica especial nas doenças diphthericas ; são: o sr. dr.. Barral, "antigo lente de pathologia interna na Escóla Medico-cirurgica de Lis- boa, meu estimadissimo mestre e amigo, que em seus brilhantes cur- sos muito insistia nos diversos pontos da pathologia do crup; o sr. dr. Bernardino Antonio Gomes tambem meu amigo e presadissimo mestre, a quem se deve um interessantissimo trabalho sobre a histo- ria da diphtheria na Hespanha e em Portugal (vid. Gazeta medica de O GARROTILHO E) Lisboa n.º 21, 1 de novembro de 1860, pag. 321 a 327), ao qual me referi na parte respectiva d'este opusculo; e o sr. dr. Simas, cujo nome está muito honrosamente ligado á tracheiotomia em Portugal pelos seus perseverantes esforços com o intento de a acreditar e de a fazer corresponder ao seu fim. Foi em uma doente sua que vingou em 1851 o primeiro caso de crup por esta operação; e á sua amizade e confiança devo eu as primeiras operações de tracheiotomia que prati- quei, e uma parte das que tenho continuado a fazer depois. 4 ANATOMIA PATHOLOGICA De todas as lesões anatomicas devidas ao garrotilho, a pseudo- membrana crupal é aquella que em rigor se deve chamar a caracte- ristica. Começarei por tanto pela sua descripção, seguindo-se logo a das alterações da mucosa subjacente, e emfim as lesões dos outros or- gãos. 1.º A falsa membrana crupal será apreciada nos seus caracteres physicos, microscopicos e chimicos. Caracteres physicos. — A séde principal da pseudo-membrana é a mucosa da larynge, ou antes a mucosa das vias aereas em maior ou menor extensão. Ella occupa raras vezes sómente a larynge. Segundo o sr. Bou- chut estende-se, na metade dos casos, da larynge ás fauces e ás ra- mificações bronchicas ; e, na outra metade, não passa alem da pha- rynge e da parte superior da tracheia. Alem da pharynge, amygdalas e véo palatino, apparece ás vezes nas fossas nasaes, no esophago, na superficie interna da bocca, na vul- va, na superficie da pelle vesicada, nas feridas recentes, na ferida da tracheiotomia, nas cesuras das sanguesugas, escarificações das vento- sas sarjadas, e em geral nas diversas soluções de continuidade que ac- cidentalmente existem. A côr das falsas membranas é branca, cascosa, branco-amarellada ou acinzentada, algumas vezes escura e saniosa, com aspecto gangre- noso. A fórma é a de membranas de dimensões variaveis, ou como pontos disseminados ou confluentes. Na larynge umas vezes a deposição fórra toda ou quasi toda a cavidade n'uma camada continua, que representa, mais ou menos com- pleta, a fórma do orgão; outras vezes manifesta-se em porções sepa- radas assentes sobre a mucosa laryngea, e, de ordinario, na parte cor- MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. HI, P. 1. 5 34 ESTUDOS SOBRE respondente á face posterior da cartilagem thyroidéa. Na tracheia e bronchios tem mais vezes a fórma de meios cylindros compridos ; ou de tubos mais ou menos longos, o que é menos: frequente. Nas amy- gdalas é muitas vezes, a principio, como pontos brancos que se alargam e se confundem entranhando-se nos seus folliculos mucosos na profun- didade de meio e mesmo de um centimetro. Na pharynge, no véo pa- latino, nas fossas nasaes e na bocca, toma a fórma de membranas maio- res ou menores, que podem augmentar e continuar-se em uma maior ou menor extensão. A consistencia da falsa membrana é muy variavel, mas é de or- dinario assaz rija, assim como a sua elasticidade, o que tenho podido verificar muitas vezes, quando pretendo despegal-a para cauterisar a mucosa subjacente, e quando, depois de expellida ou extrahida, a te- nho submettido a traceções mais ou menos consideraveis.. Na larynge é menos rija do que na tracheia e pharynge, e mais resistente durante a vida do que no cadaver. A sua espessura é igualmente variavel; mas em geral tanto maior, quanto mais tempo tem de formada. Algumas vezes é como la- minas mui delgadas, mas em muitos casos tem a espessura de t a 2 millimetros e mesmo 3, como uma vez tive occasião de observar em um grande pedaço de falsa membrana da tracheia de um dos meus ul- timos operados de tracheiotomia. : A glotte-póde ficar assim mais ou menos obstruida, mas não é forçoso que o seja totalmente para occasionar a morte, porque na ge- neralidade dos casos d'esta terminação a abertura glottica parecia dar ainda sufficiente entrada ao ar, apesar da presença da: producção di- phtherica. A superficie livre da pseudo-membrana é lisa ou granulosa, co- berta bastantes vezes d'uma camada de muco mais ou menos espesso, e, em muitos casos, puriforme. A face profunda, que corresponde á membrana mucosa, a qual se acha sempre n'este caso desnudada do epithelio, está desigual e como que salpicada de pontos sanguineos ou orificios capillares; e quando pertence á tracheia tem algumas vezes estrias longitudinaes. Tenho-a visto muitas vezes toda tinta de sangue, quando tem havido esforço mechanico para a extrahir. A adherencia das producções diphthericas é maior ou menor, se- gundo a sua séde e duração, e conforme o tratamento empregado. Nos ventriculos da larynge e na parte superior da tracheia a adherencia é maior do que no resto das vias respiratorias, donde se O GARROTILHO E) gr podem fácilmente despegar. Nas amygdalas e na garganta são mais adherentes em virtude dos prolongamentos que se insinuam pelos fol- liculos mucosos ; comtudo tenho conseguido sempre, com mais ou me- nos difficuldade, desapegal-as inteiramente, mesmo com o cylindro curto de nitrato de prata ou outro corpo apropriado, para cauterisar depois mais proveitosamente a superficie sangrenta da mucosa. Esta adherencia faz-se por meio de prolongamentos mui finos, que se entranham na mucosa, mas que, em geral, qualquer tracção dilacera mais ou menos facilmente. Ao contrario, n'outras cireumstan- cias, é tão firme o apégo que por vezes, tentando descollar a falsa membrana, arranca-se a mucosa conjunctamente. A adherencia é uni- forme umas vezes, outras vezes acham-se no mesmo individuo todos os gráos de união da pseudo-membrana á mucosa. Em varios casos flu- ctuam livres no muco normal ou puriforme das cavidades correspon- dentes pedaços de falsas membranas despegadas ; ou estão adherentes em uns pontos e descolladas n'outros, A adherencia das falsas membranas é geralmente maior quando o garrotilho vai no meio da sua marcha. Para o fim vai declinando de dia para dia, a ponto de cahirem muito facil e naturalmente. O tratamento energico, que consiste em despegar as pseudo-mem- branas logo que apparecem e cauterisar bem, logo depois, a superfi- cie da mucosa, em que estavam implantadas, diminue-lhes muito a adherencia. Ha substancias, que têem mais especialmente acção sobre ellas, amollecendo-as e despegando-as, o que a therapeutica tem apro- veitado no tratamento da diphtheria. Caracteres microscopicos. — Examinando a pseudo-membrana ao microscopio, vê-se-lhe grande quantidade de substancia amorpha, gra- nulações moleculares, globulos granulosos, de inflammação, que são as cellulas de pus mal formadas, alguns globulos sanguineos, e fibrillas parallelas, e mais ou menos tortuosas de fibrina coagulada (Bouchut). Caracteres chimicos. — A falsa membrana crupal é composta de fibrina coagulada, e alem d'isso de sulphato de cal e carbonato de soda obtidos depois da incineração. E” insoluvel na agua em todas as temperaturas. Tambem é in- soluvel nos acidos sulphurico, nitrico e chlorhydrico, que a endure- cem, enrugam e despegam. E' soluvel no acido acetico, na ammonia, nas soluções alcalinas (Valleix) e na glycerina, convertendo-se em uma substancia que tem a apparencia de muco difluente e diaphano (Bouchut). De todos estes caracteres se tem pretendido tirar proveito nas 5+ 36 ESTUDOS SOBRE applicações therapeuticas, mas sem o fructo, que aliás era de es- perar. As observações microscopicas e chimicas do meu particular amigo e distincto collega, o sr. dr. May Figueira, deram os resultados se- guintes, alguns dos quaes não são conformes com os que acima des- crevi. O que se segue é a nota do proprio professor, a que me refiro, o qual é no objecto auctoridade muito competente. «As falsas membranas, vistas ao microscopio, apresentam grande quantidade de materia amorpha, granulações moleculares, muitos glo- bulos brancos (leukocytos), verdadeiros globulos de pus, alguns glo- bulos sanguineos, fibrillas de materia fibrinosa coagulada, que se tor- nam mais visiveis proximo dos bordos do tecido dilacerado pelas agu- lhas de preparação ; e cellulas epitheliaes pavimentosas, que ás vezes se apresentam unidas em grandes grupos e tão regularmente, que constituem um verdadeiro fragmento do epithelio, que reveste a ca- vidade boccal, e que veiu adherente á falsa membrana. Grande parte dos leukocytos apresentam-se unidos pela materia fibrinosa em tão gran- de quantidade, que dificilmente se podem observar os seus contornos, e parecem antes ser uma porção de membrana mucosa, em que as cellulas epitheliaes fossem substituidas pelos globulos brancos. O acido acetico retrahe um pouco os fragmentos do tecido dila- cerado, sem os dissolver; então os globulos brancos apresentam-se mais transparentes tornando-se muito distinctos os seus nucleos. Os acidos nitrico e chlorhydrico retrahem consideravelmente os fragmentos das falsas membranas, tornando-os mais transparentes, sem que os seus elementos desappareçam na totalidade. O acido sulphurico concentrado, depois de algumas horas de con- tacto, dissolve os fragmentos das falsas membranas, deixando apenas, como residuo, alguns pequenos frocos de tecido carbonisado e um tanto diffluentes, não apresentando ao microscopio elemento algum no esta- do de integridade. A tinctura de iodo, do mesmo modo que os acidos, retrahe com- pletamente os fragmentos da pseudo-membrana, e mesmo os seus ele- mentos, ficando o tecido muito friavel. A ammonia e uma solução concentrada de potassa ou soda caus- tica desaggrega os seus elementos quasi completamente, mas não os dissolve na totalidade ; só depois de algumas horas de contacto en- tre estes alcalis e as falsas membranas é que os seus elementos, cel- lulas, nucleos e filamentos de fibrina, se apresentam ao microscopio muito alterados : alguns pequenos fragmentos da falsa membrana, que O GARROTILHO 31 ainda apparecem no campo do microscopio, têem o aspecto da albu- mina coagulada pelos acidos, isto é, o de arborisação ou fórma den- dritica. E A glycerina só depois do contacto prolongado durante alguns dias é que desaggrega quasi completamente os elementos da falsa membrana, tornando-a um tanto difluente. Nunca pude achar n'esta substancia, continua o sr. dr. May Figueira, as propriedades altamen- te dissolventes, que se lhe tem attribuido. D'aqui se vê, que não deve admirar, que no tratamento do crup aquella substancia” não tenha dado os resultados curativos, que alguem julgou descobrir. A mistura de partes iguaes de glycerina 'e ammonia fórma um composto, que depois do contacto durante algumas horas dissolve com- pletamente os fragmentos das falsas membranas. Parte dos seus ele- mentos altera-se inteiramente na fórma pouco tempo depois d'este contacto, desapparecendo alguns completamente. Só por excepção é que alguns d'esses elementos apparecem no campo do microscopio sem estarem alterados. A' vista d'esta reacção lembra a utilidade, que se póde vir a tirar de novos ensaios therapeuticos com esta mistura, va- riando as suas proporções. A agua bromada a 4 por 100 retrahe muito o tecido da falsa membrana ; porem os seus elementos não perdem totalmente a fórma, nem se dissolvem ; mas depois do contacto prolongado durante algu- mas horas, e mesmo alguns dias, os fragmentos tornam-se muito fria- veis, reduzindo-se facilmente a pó; n'este estado já os seus elementos não se distinguem ao microscopio. Esta solução de bromio póde ser mais fraca, porem as reacções, a que dá logar, só se manifestam de- pois de um contacto mais prolongado. E”, de certo, só num grande grão de diluição, que esta substancia se póde applicar localmente, e n'um maior ainda quando internamente. Notei por ultimo, que as falsas membranas do crup são dos te- cidos que pela maceração resistem mais á destruição produzida pela putrefacção ; assim os seus elementos, ainda mesmo depois de estarem na agua um mez e meio, reconhecem-se bem ao microscopio com to- das as suas fórmas; e até n'aquellas falsas membranas, que soffreram a acção do.nitrato de prata, o seu tecido se póde observar perfeita- mente, e talvez melhor, que antes da maceração.» No Cosmos de 25 de janeiro de 1861 acabo de vêr as conclusões dos estudos sobre as reacções chimicas das falsas membranas feitos pelo sr. Ozanam, que me parece util transcrever. As experiencias do auctor, que tiveram principio em 1849, ver- 38 ; ESTUDOS SOBRE sam sobre a acção, que têem nas falsas membranas os seguintes agen- tes: agua pura, bromio, chloro, chlorureto de bromio, chlorureto de soda, acido sulphurico, acido phosphorico, agua regia, acido chlorhy- drico, acido fluorhydrico, acido citrico, sumo de limão, potassa, soda, ammonia, baryta, agua de cal, chlorureto de potassa, glycerina, per- chlorureto de ferro, bichlorureto de mercurio, chlorato de potassa, etc. Os reactivos, que actuam mais efficazmente sobre as falsas mem- branas, são divididos pelo auctor, segundo a natureza de sua acção, em duas classes: dissolventes, e alterantes. Os principaes dissolven- tes são: as aguas mães de soda, que operam a solução completa das falsas membranas em duas horas; a soda, que as amollece no fim de um quarto de hora; o bicarbonato de soda e a uréa, que as dissol- vem completamente em doze horas; o cyanureto de potassio, que pro- duz “a sua difusão completa em quinze horas; a giycerina, que as amollece depois de vinte e quatro horas, chegando quasi até á difluen- cia; a agua de cal, que passadas doze horas as torna molles e em fragmentos, e que ás vinte e quatro as dissolve completamente; o 4ro- mureto de potassio, que produz a dissolução quasi completa no fim de doze horas; o subcarbonato de potassa, que determina a transparen- cia e o amollecimento passadas doze horas; o phosphato de soda, que as amollece muito em doze horas, eras dissolve em tres dias; o chlo- rato de potassa, que produz a sua dissolução depois de tres ou quatro dias. Os principaes alterantes são: o iodo, que endurece e encortica as falsas membranas em uma hora ; o perchlorurcto de ferro, que as en- durece no fim de doze horas; o bichlorureto de mercurio, que produz tambem o endurecimento rapido, etc. 2º A mucosa subjacente ás falsas membranas acha-se sempre des- nudada do seu epithelio, e muitas vezes vermelha, mais aspera, e com pontos vermelhos ou escuros, correspondentes ao contorno dos orifícios folliculosos, e em relação com os mesmos pontos maculados das fal- sas membranas já notados. Em todo o caso estas lesões, que á primei- ra vista parecem inflammatorias, não são ordinariamente considera- veis. Em alguns casos, mui raros, tem-se achado a mucosa um tanto amollecida e mesmo destruida, ficando descobertas as cartilagens. Casos ha, em que a membrana mucosa se encontra perfeitamen- te sã, á excepção da falta do epithelio, ou apenas rosada como tem sido observado, entre outros, por Albers e pelos srs. Rilliet, Barthez e Blache, e como tem sido confirmado pela minha propria observação. O GARROTILHO 39 3.º Os outros orgãos, em que se encontram frequentemente le- sões anatomicas, pertencem aos apparelhos red pirata digestivo, cir- culatorio, urinario e cutaneo. Do apparelho respiratorio a tracheia, os bronchios e pulmões apre- sentam bastantes vezes as lesões que passo a descrever. A tracheia e bronchios, afóra as falsas membranas e as altera- ções da mucosa, como as da larynge, quando a diphtheria se propaga até elles, contem maior ou menor quantidade de mucosidades, mais ou menos espumosas, por vezes com aspecto purulento, as quaes fre- quentemente saem em jorro, quando se abre a tracheia na operação da tracheiotomia, como repetidas vezes tenho notado. Nos pulmões, quando tem havido pneumonia, que é uma das complicações mais frequentes do crup, observam-se, como lesão ana- tomica propria dos tres gráos da phlegmasia lobar, a congestão, a he- patisação vermelha ou a hepatisação cinzenta em uma extensão maior ou menor; e como lesão caracteristica da pneumonia lobular, que é a fórma mais commum nas creanças, os nucleos de hepatisação verme- lha ou cinzenta disseminados pelos orgãos. Foi em consequencia d'es- ta complicação, que morreu o meu primeiro operado de tracheioto- mia, em 1853, em cuja autopsia achei os ríucleos de hepatisação ver- melha no lobo inferior do pulmão direito, bem desenhados debaixo da pleura por nodoas vermelho-escuras. N'este caso estendiam-se falsas membranas mui finas até quasi ás ultimas ramificações bronchicas, o que nem sempre acontece, porque póde haver a complicação da phle- gmasia pulmonar sem propagação das pseudo-membranas até o pul- mão, e vice versa. No pulmão pódem encontrar-se tambem nucleos apopleticos e ecchy moses de purpura, quando a morte é causada pelo crup infeccio- so; signaes de emphysema interlobular, determinado pelos esforços da tosse que rompem as vesiculas pulmonares, e falsas membranas de- postas na superficie serosa, indicando a existencia de pleuriz parcial. Do apparelho digestivo é na pharynge e suas dependencias, que mais vezes se notam as lesões concomitantes do erup. | Na pharynge ou ha as alterações proprias da angina diphtheri- ca, ou não ha alteração alguma, o que acontece quando a diphtheria se não tem estendido até aquelle orgão, ou, tendo-o feito, as lesões desappareceram em consequencia do tempo decorrido, ou do tratamen- to empregado. N'aquelle caso, ou as pseudo-membranas forram al- guns pontos sómente do véo palatino, das amygdalas e da pharynge propriamente dita, ou cobrem estes orgãos em maior ou menor ex- 40 ESTUDOS SOBRE tensão, formando uma camada não interrompida, e continuada ou não com a falsa membrana laryngea. Na angina diphtherica ha o engorgitamento dos ganglios subma- xillares e principalmente dos cervicaes profundos, onde vão entrar os vasos lymphaticos do véo palatino e da pharynge. O esophago está geralmente normal, mas podem n'elle haver fal- sas membranas prolongadas da pharynge, chegando mesmo até um pouco alem do orifício cardiaco, como duas vezes foi observado pelo sr. Bretonneau-e por outros. No estomago algumas vezes se tem achado pequenas ecchymoses, e até se diz que, na sua superficie mucosa, se tem visto falsas mem- branas. Tem-se encontrado, em alguns casos, os folliculos isolados do intestino delgado muito desenvolvidos. “Em um doente com angina diphtherica e crup, que foi operado no hospital de S. José, na enfermaria de clinica medica da Escóla Me- dico-cirurgica de Lisboa, cuja observação segui, e que falleceu 49 ho- ras depois da operação, acharam-se as seguintes lesões no apparelho digestivo : a mucosa do estomago amollecida e ecchymosada ; na do in- testino delgado algumas Ends e os folliculos intestinaes: intu- mecidos e amarellados, de modo a simularem grãos de milho miudo que fossem espalhados por toda a superficie big (Observação do sr. Manuel Bento de Sousa). Quanto ao apparelho circulatorio, tem-se acido algumas vezes coagulos fibrinosos no coração, o que não tem nada de especial ao crup ou á diphtheria. O sangue nos individuos, que morrem de garrotilho infeccioso, é deliquescente, mais escuro, e assemelha-se ao suco das ameixas passadas ou de alcaçus, segundo a comparação do sr. Millard. Os coagulos que ha formados são molles e assimilham-se ao arrobe de uvas muito cosido. As arterias, em logar de vasias como geralmente se acham nos outros cadaveres, têem tanto sangue como as veias. No apparelho urinario devem notar-se as alterações dos rins, e da sua secreção. Os rins acham-se muitas vezes congestionados, a substancia corti- cal muito mais vermelha do que no estado normal. Por esta hiperemia se tem pretendido explicar a existencia da albumina nas urinas de mui- tos dos doentes de crup e angina diphtherica. Succederia então o mes- mo, que em todas as doenças. em que se difficulta a hematose; e em que se dá a congestão passiva: dos orgãos parenchymatosos em geral, e dos rins especialideites E" o mesmo que succede no segundo periodo da febre amarella, no periodo asphyxico da cholera, e em algumas O GARROTILHO 41 doenças organicas do coração. N'estes casos existe a albuminuria con- gestiva, como lhe chama o sr. Bouchut, a qual se dissipa, quando se restabelece a hematose. - Mas nem sempre a albuminuria, nas molestias diphthericas, é dependente da asphixia e da congestão renal consecutiva ; muitas ve- zes, como n'outras doenças infecciosas, ella está ligada á intoxicação geral determinada pela diphtheria, e depende do estado do sangue. A albuminuria é então acompanhada de outras lesões anatomicas, sendo as principaes a purpura hemorrhagica, a apoplexia pulmonar, a côr annegrada e a difluencia do sangue. N'estes casos viu o sr. Bouchut duas vezes, de mais, abcessos metastasicos no pulmão, e uma outra vez abcessos multiplos no tecido cellular. k Para concluir este esboço das lesões anatomicas do crup, resta- me dizer que a pelle, alem do aspecto proprio á asphyxia, ou á ady- namia, em que succumbem os doentes, póde apresentar as pequenas nodoas caracteristicas da purpura hemorrhagica, o que todavia só tem logar em alguns dos doentes que morrem na fórma infecciosa do gar- rotilho. ETIOLOGIA Nas causas do garrotilho farei especial menção da idade, sexo, temperamento, constituição e condição social dos doentes; das esta- ções, temperatura e climas; das recidivas e doenças anteriores, da in- fluencia epidemica, e por fim do contagio e infecção. Idade. —E' no periodo da vida que vai dos 2 aos 7 annos que apparece mais frequentemente o garrotilho, e que mais vezes o tenho observado. Segundo o sr. Trousseau é mais frequente entre os 3 e os 6 annos. Abaixo de 2 annos, e sobre tudo até á idade de 1 anno, é muito mais raro; assim como dos 7 annos para cima, e sobre tudo na ida- de adulta e na velhice. P E" comtudo certo que creancas de mamma têem sido acommet- tidas de crup, e que adultos e velhos no ultimo quartel da vida têem sido victimas da mesma molestia. A 4.º observação de crup e angina diphtherica notada na obra do sr. Bretonneau, pag. 36, refere-se a uma creança de 15 dias de idade; e a observação 6.º, pag. 39, é de uma mulher que morreu de crup aos 55 annos. As duas primeiras obser- vações de tracheiotomia que pratiquei foram em creanças atacadas de garrotilho com a idade de 9 e 11 mezes. Washington, o glorioso fun- dador da liberdade americana, que morreu de crup, contava 68 an- MEM. DA ACAD.— [, CLASSET. UI, P. 1. 6 42 | ESTUDOS SOBRE nos. O sr. Trousseau na sua Clinique médicale de [ Hotel-Dieu de Pa- ris, a pag. 329 do tomo 1.º, refere o facto de um guarda-mattos de uma aldêa do departamento de Zxdre, o qual, na epidemia de Solo- gne de 1828, foi mortalmente atacado de angina diphtherica e crup na idade de 71 annos; e uma mulher de que falla o sr. Louis (Du croup chez Padulte) tinha 72 annos quando succumbiu á mesma doença. Demonstra-se aquella proposição com as estatisticas do paiz e de fóra. Em uma estatistica do sr. Millard, interno do hospital de crean- cas de París, onde não são admittidos doentes que tenham menos de 2 annos de idade, relativa a enfermos acommettidos de crup desde o 1.º de janeiro de 1857 até o 1.º de julho de 1858, na qual se con- tam 124 individuos, a idade é distribuida pela seguinte fórma : IDADE NUMERO DE CASOS 2 Panos PER ERRA SEE 20 3 » 36 A dd Quo DO RAD Aa 19 51 20 Rb A 6 0 EAR ER 11 Te A CR É DA ER CM RA 8 O AD RE EMEA ARA 2 DR 5 9 » 3 AA SRS ORAIS PRN CPE LHE RS 2 Total/2 a 124 N'esta estatistica foi a idade de 3 annos a mais acommettida ; se- gue-se depois a de 2 e 5 annos na mesma proporção; e em seguida a de 4, 6, 7,8, 9 e 11 annos, como se vê na seguinte tabella em que os numeros são inscriptos de mais para menos : Co O GARROTILHO 4 IDADE NUMERO DE CASOS MATOS a ge ra DO bd A DI to to [emo] -—1 O = Or EN co pda p= co CO to CO qr O periodo da vida que vai dos 2 aos 7 annos deu, pois, 114 ca- sos de crup; e o de 8 a 11 annos apenas 10 casos, isto é, 1: 11,4. Em outra estatistica do sr. Peter, tambem interno do mesmo hospital, relativa a casos de crup por elle observados na epidemia de 1858, vê-se em 148 casos a idade dos doentes distribuida como se segue. IDADE NUMERO DE CASOS O ALHO HABDOS: 2842 0a ctateo stand 26 Ea RT a NUR À 47 7 ABA Du o - 26 Rabo» 23 (O EVA S UDN À E DT 5: ZE E E NA ESA ERA PR RR 13 otali 148 Aqui é a idade de 3 a 4 annos que deu maior numero de doen- tes; vem depois por numeros iguaes a de 2 a 3 annos e a de 4 a 5; em seguida está a de 5 a 6 annos; e por fim, tambem em propor- ções iguaes, a de 6 a 7 cade 7a t0 annos, como melhor se vê na tabella seguinte : [po 44 ESTUDOS SOBRE IDADE ) NUMERO DE CASOS ANOS: los Lula do ep 47 ha or O O periodo da vida, que deu maior numero de victimas, foi, por tanto, igualmente o que corre de 2 a 7 annos, no qual se contam 135 casos de crup, e apenas 13 no que vai de 7 a 10 annos, ou 1:10,37. As estatisticas do nosso paiz dizem a este respeito o seguinte : Vendo os mappas clinicos dos facultativos dos expostos de Lis- boa, a cargo da Santa Casa da Misericordia, relativos aos tres annos de 1857 a 1859, achei apenas 21 casos de crup e angina diphtherica, sendo 5 pertencentes ao anno de 1857, 4 a 1858 e 12 a 1859. N'es- tes 21 casos a idade está pelo modo seguinte : IDADE NUMERO DE CASOS 8 dias 1 1 5 » 2) 1 mez sbt mete to tel cho PU 1 duo 1 83 » : 1 18 » ERES 040,9 ] annoss MAR Rr o e 2 E» o 4 DO emo LiD io pj role o Todo Pata. . 3 5 E » Co RD ASSINE 1 GS Up 2 EPA O os | 6; Dado | TOPA DD LR ES O o Ra AD 1 3.» 1 Dot RR 1 Indeterminada. ..... Í O GARROTILHO 45 N'esta pequena estatistica a idade, que deu mais doentes, foi a de 4 annos, depois em iguaes proporções a de 2 e 3 annos e a de 15 dias. Nas outras idades houve apenas um caso para cada uma. Dividindo os 20 casos de idade conhecida em tres grupos, tem-se o resultado que se vê em seguida : IDADE NUMERO DE CASOS Abaixo de 2 annos......... E De -27arMannos sonar Som: 11 Acimade7 » Total 020 Ainda assim, foi a idade dos 2 aos 7 annos que deu maior nu- mero de doentes. Em 24 doentes de crup, em que se tem praticado a tracheioto- mia em Lisboa, cujas observações tenho todas redigidas para forma- rem parte da minha memoria sobre a tracheiotomia no garrotilho, a idade dos enfermos é a seguinte: IDADE NUMERO DE CASOS JUmMEzEs: 44 > ED is apo Lent 11 A AM VA Soro tir ad ON anos Sa sp RALER, fraih ar noi il ] 4 3 DIE, MMS, do q Sao Mg 1 4 MR es CREATED ph Ses pira, er. 4 RS CORUNHA RR SD DAS EP ME LEA 2 5 Bi OM AS LO. qa hecIap ts ' 3 55» E dé] 6 onda ds NBA 3 67» std Tl » 2 8 » é | 9 » . | 10 pe gras Penas ALI eta l 17 DA | Ps 6 6 EM DRE RU ] otalisã er SUJA; N'esta pequena tabella vê-se que a idade de 4 annos deu 4 doen- 46 ESTUDOS SOBRE tes, as de 5 e 6 annos deram cada uma' 3 casos de garrotilho, se- guindo-se as de 4: e 7 annos que deram, cada uma, 2 doentes, e de- pois as outras idades cada uma com 1 só caso. Dividindo estes 24 casos em tres grupos como fiz precedente- mente, acha-se o seguinte resultado : IDADE NUMERO DE CASOS Abaixo de 2 annos.......... p: De:2" a) Tamos. case AA 18 Acima (de 7 annos. 15 De Gra uti Sm PEC AR ra 17 De” pa agr» 9 De 8a 9 » 3 De 9a 10 DAL MS PRA ET ae 5) Dev KO aii SE 1 De 270205 na A 2 De! 20783 (04 MS A 2 Indeterminada ............ 3 Potato 12251 Nesta estatistica apparece o periodo da vida que vai do nasci- mento até á idade de 1 anno com o numero 45, superior a todos os outros periodos, o que constituiria uma excepção, e faria lembrar a infidelidade da estatistica n'esta parte, o que é explicavel pela diffi- culdade do diagnostico n'aquella idade. Seja*como fôr, dividindo em tres grupos, como precedentemente, aquelles 224 casos em que a idade é conhecida, acha-se o seguinte : IDADE NUMERO DE CASOS Até Manhosa o. Esp RR 82 De 2a 7 annos........... 122 De 7 annos para cima. ..... 20 Total; 84-00 228 Na precedente estatistica, como disse, vão comprehendidos os ca- sos de morte pelo crup e pela angina diphtherica. Separando os casos d'esta ultima molestia, apesar de identica ao garrotilho na sua natureza, em minha opinião, os quaes são em nu- mero de 77, achei 150 casos de crup, em que a idade é assim distri- buida : 48 ESTUDOS SOBRE IDADE NUMERO DE CASOS ARE | anos ra tu E 31 De. 1/a 2 anos Mr 28 De 2a 3 DAR 23 Des Sra AP Ar RA 25 Dee a Bro o ra ak 14 De 5a 6 d» i1 De 6a 7 Divisa pera dE O 4 De Dicas » PENHA tata 7 De 8a 9 » (1 De 9a10 EDER RL CTIS 1 ES TA 1 De 10 a 11 » | De 12 a 20 » 2 De 20 a 30 » Í indeterminada. sois | Motal se 150 Fazendo a mesma divisão em tres periodos obtem-se o resultado seguinte, analogo ao antecedente: e IDADE NUMERO DE CASOS Abaixo de 2 annos......... 59 De'2"avZiannos. Res si ritered Tm . De 7 annos para cima. ..... 13 Motale aa 149 Na epidemia que houve no Campo Grande e suas immediações em 1859, de que me deu as respectivas notas o meu collega, o sr. Manuel da Silva Franco, facultativo da localidade, com o qual vi al- guns d'esses doentes, em 113 casos de garrotilho e angina diphtheri- ca, a idade foi distribuida em tres periodos, na estatistica que tenho á vista, pela fórma seguinte : O GARROTILHO E 49 IDADE | NUMERO DE CASOS Atévl cana dev be am cs Ss 13 De 1a i2amnnos.......... 90 De 12 annos para cima..... 10 Total sir s 113 Devo dizer, que d'este numero total 83 são de angina diphthe- rica só, 26 de angina diphtherica e crup, e 4 de crup com angina li- geira ou sem ella. Sommando as quatro estatisticas precedentes, todas do nosso paiz, em que são sabidas as idades dos doentes ou dos fallecidos de crup e angina diphtherica, acha-se o numero 381, em que as idades subor- dinadas á divisão da estatistica da epidemia do Campo Grande, que não pude obter por outra fórma, dão o seguinte resultado : IDADE NUMERO DE CASOS Ate vanno causo cria ct ido pe 66 De 1 a 12 amnos...... pra po 00 De 12 annos para cima..... 15 Eotal, o... 381 Sommando as estatisticas francezas, que citei, com as nossas, ex- cluindo a do Campo Grande que se não presta á divisão mais adopta- da, acho 540 casos com o resultado geral que se segue: IDADE NUMERO DE CASOS Abaixo de 2 annos......... 91 De 2: 7-annos 4 ssa ais 400 De 7 annos para cima...... +49 Total). ..vants 540 Portanto posso repetir, que a idade, que vai dos 2 aos 7 annos, é aquella em que mais frequentemente se vê o garrotilho. Ainda que esta conclusão não se deduza claramente da estatisca do sr. Silva Fran- co, que elle compoz com outras vistas, e por isso dividiu d'outro mo- do as idades dos doentes, posso comtudo dizer que elle me assegurou, MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE — T. IL. P. I. 50 ESTUDOS SOBRE segundo a sua reminiscencia, que a maior parte dos seus doentes esta- va com effeito n'aquelle periodo da vida que referi. Sexo — Parece certo que os individuos do sexo masculino são um pouco mais frequentemente acommettidos do garrotilho, aindaque a differença seja realmente pequena. , As estatisticas vão demonstrar a presente proposição. Na estatistica feita pelo sr. Bouchut (Vovelle ctude du cr cup) + em 7543 casos de morte de crup, acontecidos em Paris durante os vinte e oito annos que decorreram desde 1826 até 1853 inclusivé, a rela- ção dos sexos é a seguinte : +» SEXOS ; NUMERO DE CASOS Masculino... ........... 3834 Feminino. ...... FE O NATO Indeterminado.......... 113 io talo 7543 A relação do sexo feminino para o masculino é, pois, como 1:1,066. Na estatistica do sr. Millard, já citada, que comprehende 124 ca- sos, pertencem 62 a rapazes, e outros tantos a raparigas : 4 SEXOS NUMERO DE CASOS Masculino. ..... ng ota ev Feminino ............... 211 62 Cotali Na do sr. Peter, que é de 148 individuos, ha, como se vê, uma differença para mais nos rapazes : SEXOS NUMERO DE CASOS Mástulino. . ..,hhit+. to a Dr Feminino. ........ Re tus. 69 Totalgagoss!. 148 A relação das raparigas para os rapazes é, portanto, de 1:1,144. Dos 21 casos de crup e angina diphtherica dos expostos da San- ) O GARROTILHO ; 51 ta Casa da Misericórdia de Lisboa'tratados em domicilio, pertencem 9 ao sexo masculino e 12 ao feminino. Nos 24 casos de crup, em que foi praticada a tracheiotomia, a que já tambem me referi, eram 12 rapazes e 12 raparigas. Juntando estas duas pequenas estatisticas, tenho 45 doentes dis- tribuidos do modo seguinte, em que se vê uma pequena differença para mais nas raparigas : SEXOS NUMERO DE CASOS Masculinos ts sb smp 21 Feminino). . bios er nie 24 Total... Sosa 45 Na estatistica de tres annos que extrahi dos bilhetes mortuarios de Lisboa, os 227 casos de morte de crup e angina diphtherica são distribuidos do modo seguinte : SEXOS NUMERO DE CASOS Masculino. .... et dpefont qe pr 120 . Feminino a o Dia ge OM Total. . 227 A proporção é, pois, de 1:1,12 N'este numero estão comprehendidos 150 casos de morte do crup, e 77 de angina diphtherica sem garrotilho. N'aquelles 150 casos os sexos entram nas relações seguintes : SEXOS NUMERO DE CASOS Masculino. . REA A feno cri 82 Feminino............... . 68 Total... ..... 150 A proporção é ainda pouco mais ou menos a mesma, isto é, de 1:14;20. Na estatistica do Campo Grande, o sexo feminino dá um contin- gente maior: | Tx 52 ESTUDOS SOBRE SEXOS NUMERO DE CASOS Masculino. ............... 48 Feminino ............. cão 6 Total...... . 113 Sommando estas quatro estatisticas do nosso paiz, que registei isoladas, acha-se uma differença, ainda que mui pequena Rua mais no sexo feminino, como se vê em seguida : SEXOS NUMERO DE CASOS Masculino; 24 cera eve ela tedo do 189 Feminino ........... EM MNiDà 195 Total...... . 984 Juntando as nossas estatisticas ás dos srs. Bouchut, Millard e Pe- ter de París, o que dá um total de 8087 casos, vê-se o seguinte : SEXOS NUMERO DE CASOS Masculino. ..... o a li 4 Feminino... .. e RAIAS Total....... 8087 N'esta estatistica geral o sexo masculino tem mais 241 casos do que o feminino, e este está para aquelle como 1:1,061. Portanto, o sexo masculino é um pouco mais acommettido do crup e angina diphtherica do que o feminino, sendo com tudo a dif- ferença pouco sensivel. Temperamento e constituição de pirata á influencia do tem- peramento e constituição dos individuos na manifestação do garroti- lho, tem-se assentado, como banalmente se tem feito para todas as doenças, que são mais predispostas a contrahil-o as creanças de tempe- ramento lymphatico e de constituição fraca, ou alterada pelas priva- ções ou por padecimentos anteriores. Pela sua parte o sr. Rilliet (Traité clinique et pratique des ma- ladies des enfânts, por M. M. E. Barthez e A. F. Rilliet) chegou, n'es- te ponto, ás seguintes conclusões hoje geralmente admittidas : O GARROTILHO 53 1.º As creanças acommettidas de crup são pela maior parte de temperamento lymphatico. 2.º Pertencem a familias em que ha tuberculos, dartas ou o can- cro, ou são de pais consanguineos. 3.º É muito raro ser atacada de crup uma creança forte e em favoraveis condições de herança, salvo em tempo de epidemia mui ge- ral, no qual todavia são mais vezes victimas os individuos que estão n'aquellas primeiras condições. 4.º São ás vezes acommettidas simultaneamente muitas creanças da mesma familia. As opiniões de Guersant (Dictionaire de médecine, art. croup) e do sr. Blache (Du croup et du pseudo-croup. Arch. gén. de méd. t. xvn) estão de acordo com a do sr. Rilliet. Segundo elles, são as creanças pobres, mal alimentadas e fracas as que mais vezes são sujeitas ao gar- rotilho ; e o contingente dado pelos adultos é quasi só dos individuos enfraquecidos ou debilitados por uma outra doença. Apesar do exposto não se supponha que são isentas de crup as creanças robustas. O sr. Hache diz na sua these sobre o crup, que de 8 creanças que elle tratou d'esta doença em 1835, 7 eram fortes, e 1 de notavel robustez; e o sr. Vauthier (Essai sur le croup chez les “enfants) notou nas duas epidemias de garrotilho observadas no hospital de creanças de París em 1846 e 1847, que eram geralmente fortes as creanças atacadas. Pela minha parte, nos casos de crup que tenho observado, não tenho achado differença sensivel com respeito ao temperamento e á constituição das pessoas atacadas. Se d'um lado tenho visto acommetti- dos de crup muitos individuos lymphaticos e fracos, não é tambem me- nor, segundo me parece, o numero das creanças bellas e fortes que a observação me tem mostrado com a mesma molestia. O sr. dr. Simas tem achado a mesma frequencia do crup, senão maior, nas creanças bem constituidas. Nos 24 casos de garrotilho operados em' Lisboa, noto só 6 de constituição fraca e delicada, como mostro na seguinte relação : 54 ESTUDOS SOBRE TEMPERAMENTO E CONSTITUIÇÃO NUMERO DE CASOS Temperamento lymphatico e constituição boa ou regular, creanças sadias. . ...:.0..... 9 6 tua PRM EA CET 16 Temperamento sanguinco ou lymphatico-sanguineo e con- stituição robusta. .......... RL RO a RS E 6 2 Temperamento BE constituição fraca ou dedicada 6 Total....... 24 A minha observação acha-se corroborada com o que se tem ob- servado na Casa Pia e na Santa Casa da Misericordia de Lisboa, cuja população consta de individuos em geral fracos, sensivelmente lympha- ticos e escrophulosos, e onde o crup e as doenças diphthericas são mui- to raras. Nas enfermarias da Misericordia foram tratados, nos tres annos de 1857 a 1859, 4363 expostos, e entraram n'este numero sómente 6 diphtherias, sendo 1 no-anno de 1857, e 5 no de 1859. Na Casa Pia, em uma população média de 814 a 937 orphãos, houve n'aquelles tres annos apenas 3 casos d'angina diphtherica, to- dos em 1858, nos quaes ainda a constituição dos doentes foi classifi- cada como boa. Nos mappas dos expostos da Misericordia de Lisboa, a que tive já occasião de referir-me, muito raras vezes vem indicado o tempera- mento e constituição dos doentes, de modo que não posso fazer por el- les; sobre este ponto, nenhumas considerações. |. Na estatistica geral que tirei dos bilhetes mortuarios de Lisboa tambem não achei dados,.com que a questão podesse ser elucidada. Na estatistica do sr. Franco, do Campo Grande, não vem notada a constituição dos doentes, mas é referido o temperamento pela fórma seguinte : um TEMPERAMENTOS NUMERO DE CASOS Sanguineo-lymphatico.. ..... 10 Sampuingo ds Leah Leila. rnb 14 Lymplatico. 2%. 1 a 42 Mixto ou duvidoso. ........ 47 Total co LIS Em resultado, pois, da observação muito competente do sr. dr. Simas, das considerações e estatisticas que apresentei, e do que tenho O GARROTILHO E) observado, posso dizer que o crup não poupa nenhum temperamento ou constituição. Condição social — A respeito das condições sociaes dos individuos que o garrotilho acommette, tenho a dizer o mesmo que escrevi re- lativamente ao temperamento e constituição. Se a molestia se desenvolve em creanças da classe pobre, que sof- frem as consequencias das privações de toda a ordem, não se mani- “festa menos nas da classe média e superior da sociedade, onde nenhu- ma privação quasi póde ser notada. Estações — E certo que o crup e as doenças diphthericas, em ge- ral, se manifestam em todas as estações ; comtudo tem parecido á ge- neralidade dos auctores que as épocas do anno mais frias eram as mais favoraveis ao seu desenvolvimento. — Osr. Peter (These cit.) achou na epidemia, que houve em 1858 no hospital de creanças de París, que nos cinco mezes mais frios, de janeiro, fevereiro, março, novembro e dezembro, o numero dos casos de crup foi quasi o duplo do dos cinco mezes mais quentes, de ju- nho, julho, agosto, setembro e outubro ; sendo d'aquelles o de dezem- bro, em que a doença foi mais frequente. Não é isto o que tenho observado na minha pratica e na alheia. Nos 21 casos de crup e angina diphtherica dos expostos tratados em domicilio nos tres annos de 1857 a 1859, nos 6 que foram tra- tados nas enfermarias da Santa Casa da Misericordia, no mesmo espa- ca de tempo, e nos 3 da Casa Pia, que prefazem o numero de 30, a doença appareceu nas épocas do anno seguintes : ÉPOCAS DO ANNO NUMERO DE CASOS 1.º trimestre (Inverno) 6 PAR » (Primavera) 8 3.º » (Verão) 13 4.º » (Outomno) 3 otal. eh 30 Nos 24 operados de tracheiotomia a distribuição foi a seguinte : 56 ESTUDOS SOBRE ÉPOCAS DO ANNO NUMERO DE CASOS 1.º trimestre | (Inverno) 3 E » (Primavera) 4 de » (Verão) 7 &.º » (Outomno) 10 Total. ns uA Na estatistica do sr. Silva Franco (epidemia do Campo Grande em 1859) os resultados são os seguintes : ÉPOCAS DO ANNO NUMERO DE CASOS 1.º trimestre (Inverno) ei, 25" » (Primavera) 69 3.º » (Verão) 8 4.º » (Outomno) 9 Motal. ut: 113 O segundo trimestre deu, pois, maior numero de casos, seguin- do-se-lhe o primeiro. O terceiro e o quarto, em proporções quasi iguaes, deram um numero muito pequeno. Na estatistica dos casos de crup feita pelos bilhetes mortuarios de tres annos, mais de uma vez citada, vê-se o seguinte : ÉPOCAS DO ANNO NUMERO DE CASOS 1.º trimestre (Inverno) 38 abs » (Primavera) 30 3.º » (Verão) 43 de? » (Outomno) 39 oral: siso 150 Na mesma estatistica juntando os 150 casos acima referidos, em que houve crup, a 77 de angina diphtherica sem garrotilho, acham-se os resultados que seguem : O GARROTILHO 57 ÉPOCAS DO ANNO NUMERO DE CASOS “ 1.º trimestre (Inverno) 56 as » " (Primavera) 41 So » (Verão) 74 4.º » (Outomno) 56 TPotali01704 21227 Aqui foi o terceiro trimestre que deu o maximo numero de mortes, seguiu-se o primeiro e o quarto em numeros iguaes, e, em ultimo logar, o segundo. Juntando todos os numeros precedentes em uma estatistica ge- ral, obtem-se o seguinte resultado : ÉPOCAS DO ANNO NUMERO DE CASOS 1.º trimestre (Inverno) 92 2 op (Primavera) 122 3.º » (Verão) 102 4º » (Outomno) 78 Eotaliiniis 11.994 O segundo trimestre entra aqui com o numero maximo, - vem depois o terceiro, em seguida o primeiro, e por fim o quarto. D'aquelle numero, 394, consta em 373 os mezes nos quaes a mo- lestia teve logar, como se mostra na tabella seguinte : MEZES NUMERO DE CASOS Mareiro:w» sed papa o TREE RENO 21 Fevereiro ....... BRR STO CAE WEZ Marco 6 Som ER ara dao . 44 HAM OVAL CNP E ERR po DR Pera ARA 66 Maio 2. seo A BEBE 730 Junho . : ias: 292 Julho...... SAS a É . 28 sto Ms NISta SER La. 31 Setembro. ...... PRA MR TO Ouinbro! re voir de q o nisi Novembro ...... UA GITA LA POR A 29 Dezembro... .... PARVEOA TM SEA 14:28 Bl Total sal vis MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE—-T. WI. P. I 8 58 ESTUDOS SOBRE Vê-se d'aqui, que no mez de abril houve o maior numero de ca- sos, 66; seguindo março, com 44; setembro, com 33; agosto, com 31; maio, com 30; novembro, com 29; julho e dezembro, cada um com 28; fevereiro e junho, cada um com 22; janeiro, com 21; e outubro, com 19. Distribuindo os mezes do anno pelas quatro estações pela fórma seguinte, que é a mais racional, vê-se o seguinte resultado com ap- plicação á materia sujeita : ESTAÇÕES NUMERO DE CASOS dezembro. ......... e Inverno fAmeinO 2a 21, 71 js b AMENO dp E Esão março E 5200 A o 44 ) ã Primavera (abril............. 662140 j EA DAL o Edi 304 JUDHOM Eu. Sis. 22 Verão pio RA to a o DES agosto. si nl = oia ja oo E (seta tigor SR aaa ad is | TO Outomno OURO: cfr sk ee 19, 81 Ra ; 29)-— Ro tala ces 3783 Em conclusão, o que posso tirar de todos estes factos é que o crup e as molestias diphthericas, em referencia ao nosso paiz, têem sido muito majs frequentes na primavera, do que nas outras estações, nas quaes a proporção é. quasi a mesma. Temperatura-—Diz-se que a impressão do frio, sobre tudo hu- mido, occasiona muitas vezes o garrotilho, o que não está provado de um modo positivo. Valleix (Guide du médecin praticien) tomando ao acaso 26 observações de crup, apenas em 6 achou que os individuos se haviam exposto áquella causa. Por mim, tenho visto o garrotilho muitas vezes sem que aquella causa podesse ser notada. N'esta, como em muitas outras doenças, cuja verdadeira causa desconhecemos, ha uma grande tendencia para a attribuir a uma tenstiga cias a qual as fa- milias são as primeiras a indicar. O que expuz, relativamente á influencia das estações, póde ser adduzido para esclarecer a da temperatura; e d'ahi se conclue, que não é nos mezes mais frios que a molestia tem sido mais frequente. O GARROTILHO 59 Climas—O garrotilho e as molestias diphthericas, em geral, ap- parecem, póde dizer-se, em todos os climas. Para prova haja vista, en- tre outras, á epidemia de Alkmaar na Hollanda, observada por Pierre Forest no meado do seculo XVI; ás de diversas partes da Hespanha, observadas sobre tudo no principio do seculo XVII, e descriptas por Villareal, Herrera, Mercado, Heredia, Nunez e outros; ás de Na- poles e Cremona, na Italia, a primeira, em 1618, referida por Car- nevale, Nola, Zacuto Lusitano e Marco Aurelio Severino, e a segun- da, em 1749, por Ghisi ; á de Kingston na America do Norte, ma- nifestada 17 annos depois da epidemia de Napoles; ás de Inglaterra assignaladas por Fothergill, Starr e Hillary; á de França, que lavrou em París desde 1743 a 1748, descripta por Maloin e Chomel, e que se tem repetido tantas vezes com notavel perseverança n'estes ultimos annos, não só em París como em muitos dos departamentos, tanto do norte como do sul da França; ás que se têem manifestado em algu- mas partes do Brasil, e especialmente a de S. Francisco da Califor- nia, descripta pelo dr. Wooster no Pacific Med. and Surg. Journal do anno passado; e em fim ás de Portugal, sendo Lisboa, sobre tudo, . acommeitida desde 1858, em que houve 68 victimas, e lavrando com mais intensidade em 1859, em que tiveram logar 134 mortes, tendo sido 25 no anno de 1857, em que a doença não passou quasi da sua “ manifestação esporadica ordinaria. Todavia diz-se, sobre tudo desde o sr. Bretonneau, que nos cli- mas do norte, nos paizes frios e humidos, sujeitos a grandes variações de temperatura e a frios rigorosos, a molestia se desenvolve mais ve- zes e com maior intensidade, parecendo esquecer-se que ella era en- demica no Egypto e na Syria, e que por isso foi descripta por Areteo com os nomes de ulcera egypciaca e ulcera syriaca. E preciso comtu- do não esquecer que o genio epidemico modifica bastantes vezes o que “me parece ser a regra geral, e que tem a seu favor à opinião de um medico, talvez o mais competente no assumpto, o sr. Trousseau. Recidivas— Tem-se como regra geral que o garrotilho acommet- te uma só vez na vida, no que mostra mais uma analogia com as febres eruptivas. É com effeito tão raro vêr o crup no mesmo indi- viduo mais de uma vez, como a escarlatina, por exemplo, o que tem ainda, até certo ponto, rasoavel explicação na grande mortalidade da doenca, que pôucos individuos deixa para novos acommettimentos. Quasi todos os auctores citam comtudo algum caso de recidiva, o que entre nós tem tambem sido observado. Doenças anteriores—Ha doenças no decurso das quaes apparece S« 60 ESTUDOS SOBRE tantas vezes o garrotilho, que não se póde escurecer a relação de uma com as outras. São as febres eruptivas principalmente, e de entre estas é o sa- rampo e ainda mais a escarlatina, que mais vezes têem precedido, acompanhado ou seguido a manifestação do crup, tanto esporadica co- mo epidemicamente. Todos os clinicos têem visto na sua pratica alguns casos d'este genero mesmo esporadicamente. No doente de crup em que o sr. Theotonio da Silva praticou a tracheiotomia pela quarta vez em Lisboa, e que se curou (observação do sr. dr. Simas), tinha havido escarlatina com angina diphtherica a que se seguiu o garrotilho. A's vezes uma epidemia de sarampo ou de escarlatina acompa- nha, precede, ou segue a de angina diphtherica ou de crup. Em mui- tos dos doentes da epidemia de Leiria, descripta por Luiz Soares Bar- bosa em 1789, como já tive occasião de dizer, houve conjunctamente escarlatina. Ainda no anno passado aconteceu no hospital de creanças de París ser precedida a epidemia de crup de outra de escarlatina, que tinha havido em todo o anno antecedente e no principio de 1859, de modo que no começo appareceu escarlatina sem crup, depois casos d'aquella doença complicados de garrotilho, um pouco mais tarde crup seguido de escarlatina, e por fim garrotilho só sem erupção escarlati- nosa. : Na epidemia de crup, que grassou em 1842 no mesmo hospi- tal, segundo Boudet, quasi todos os casos foram seguidos ao sarampo ou á escarlátina. Sessenta casos de garrotilho fataes observados por Ferrand foram consecutivos a uma epidemia de escarlatina. O sr. Vernhes, de Beriers, viu manifestar-se uma epidemia de crup logo depois de haver terminado outra de sarampo que então esis- ta no seu auge, o que lhe deu a idéa de provocar uma erupção cu- tanea, por meio do oleo de croton, com o fim de assim curar a affec- ção crupal. Entre nós tambem muitos casos de diphtheria têem havido con- junctamente com a escarlatina. Esta circumstancia estabelece tambem uma analogia manifesta entre a diphtheria e as febres exanthematicas, principalmente a escar- latina, com a qual a aflecção diphtherica mais vezes se casa, analogia que é ainda reforçada pela albuminuria, phenomeno commum ás duas doenças. O GARROTILHO 61 Epidemia —O crup, sendo uma doença que de ordinario se ma- nifesta esporadicamente, apparece tambem muitas vezes debaixo da fórma epidemica, o que mostra ainda um ponto de relação bem evi- dente com certas doenças geraes, sobre tudo as febres axanthema- ticas. Quando apparece como doença esporadica póde começar pela la- rynge, ou por angina diphtherica que depois, estendendo-se, chega ao orgão vocal. Tenho visto alguns exemplos da primeira fórma, mas mui- tos mais da segunda, que é effectivamente muito mais frequente. Quando o crup se manifesta epidemicamente, o que, como já no- tei, tem sido e é muitas vezes observado, vem em geral unido á an- gina pseudo-membranosa, o que fez dizer ao sr. Bretonncau que o garrotilho era sempre, ou quasi sempre, precedido d'aquella diphthe- ria. O que já disse sobre as repetidas epidemias de angina diphthe- rica e de garrotilho na parte historica d'este opusculo, e o que repeti n'este mesmo capitulo da etiologia, fallando dos climas, dispensa-me de entrar em mais desenvolvimentos para provar a influencia epide- mica na manifestação do crup. Contagio e infeccão-—Não tendo a pretenção de escrever uma monographia sobre o. crup, mas fazendo simplesmente um estudo so- bre uma doença para o tratamento da qual a tracheiotomia é muitas vezes precisa, não darei a este ponto, o mais difficil de resolver na maior parte das doenças, todo o desenvolvimento de que elle é susce- ptivel; mas farei por apresentar com a possivel clareza, e com toda a exactidão, os factos em que assentam as convicções que tenho sobre a materia. Os auctores mais competentes dividem-se uns a favor, outros con- tra o contagio ou transmissibilidade da doença. Entre os primeiros apontarei Jurine, Bricheteau, o sr. Trousseau, e entre nós os srs. drs. Bernardino, Barral, etc.; e nos segundos Guersant, o sr. Bretonneau Miquel, etc. Outros ha, que deixam a questão ainda pendente, espe- rando por novos factos para ulterior resolução. N'este numero contam- se, entre outros, os srs. Rilhet, Barthez e Bouchut. A maior parte com- tudo está de acôrdo em isolar completamente as creanças atacadas de crup, removendo da mesma casa as que ainda estão livres da doen- ca. Pela minha parte sou inteiramente d'esta opinião, e pratico-a sem- pre, não só porque, na duvida do contagio, é de toda a conveniencia proceder, como se este fosse o modo ordinario de communicação da molestia; mas, principalmente, porque, se não é contagioso o crup, é 62 ESTUDOS SOBRE de certo communicavel por infecção ; e, em todo o caso, a separação dos individuos deve logo effectuar-se. O sr. dr. Peter na these inaugural, que já mais de uma vez citei, refere factos de tal importancia relativos á communicação do crup, que não posso deixar de os narrar em resumo, e são os seguintes : 1.º No dia 4 de fevereiro de 1858 passaram das enfermarias de medicina do hospital de creanças de París, para a enfermaria de ci- rurgia, onde fazia serviço o sr. Guersant, quatro doentes com ophthal- mia purulenta, uma das quaes estava convalescente de angina diph- therica. Até então não tinha havido nenhum caso d'esta doença na en- fermaria, para onde entraram aquellas doentes; mas quatro dias de- pois, a 8 de fevereiro, uma creança com ophthalmia purulenta, que estava na cama proxima a uma das que tinha vindo de novo, é ata- cada de angina, e no fim de poucas horas apresenta todos os caracte- res de crup incipiente, que todavia os vomitivos e as cauterisações curaram sem operação. 2.º Quatro dias depois do apparecimento d'este primeiro caso, a 12 de fevereiro, outras quatro creanças da mesma enfermaria são si- multaneamente acommettidas de angina diphtherica, que todavia os vomitorios, as cauterisações e o uso interno do chlorato de potassa fazem desapparecer dentro de quatro a cinco dias. 3.º A 22 de fevereiro, cinco dias depois de curadas estas crean- ças, uma outra apresenta coryza seroso com alguma epistaxis, e no dia seguinte angina diphtherica acompanhada de grande engorgitamen- to ganglionar, e pallidez livida que fazia perfeito contraste com a fres- cura e bella apparencia dos dias anteriores. Ao quinto dia symptomas de crup, asphyxia com suffocação, signaes de manifesta intoxicação, que contraindicavam a tracheiotomia, e morte poucas horas depois. Na autopsia achou-se diphtheria generalisada e falsas membranas na maior parte das ramificações bronchicas. Todas estas seis creanças es- tavam de cama e deitadas do mesmo lado da sala. 4.º A 2 de março, tres dias depois da morte da ultima doente, é acommettida de angina diphtherica, consecutiva a uma erupção es- carlatiniforme mal caracterisada, outra creança de tres annos, que suc- cumbiu no dia seguinte. 5.º N'este mesmo dia, 3 de março, mais dois doentes apparecem com signaes de angina, a principio simples, no dia immediato diph-. therica, e depois seguida de crup, de que se curaram. Em ambos hou- ve conjunctamente erupção cutanea de natureza duvidosa. 6.º No dia 7 de março, uma creança de oito annos apresenta-se O GARROTILHO 63 com escarlatina bem manifesta, acompanhada de angina erythematosa que tomou no dia immediato o caracter diphtherico. Em seguida a resfriamento appareceu anasarca com albuminuria, de modo que a cu- ra só teve logar no fim de seis semanas. 7.º No dia 10 de março, outra creança, que estava do mesmo la- do da enfermaria, é atacada de escarlatina tambem com angina diph- therica, de que se curou. 8.º No dia 11, uma outra creança é atacada de ophthalmia diph- therica, depois de angina pseudo-membranosa, no dia 19 de symptomas de crup com suffocação, por cujo motivo se pratica a tracheiotomia, com a qual se curou em cinco semanas. | 9.º Em quanto esta doente tinha o crup, outros dois doentes apresentam symptomas de angina diphtherica com erupção mal cara- cterisada, de que se curam. É então que a enfermaria é evacuada. 10.º Em fim, no dia 26 de março, depois de evacuada a sala, cahe tambem doente de angina diphtherica, precedida de febre, a re- ligiosa de serviço na enfermaria, que tinha estado constantemente com os doentes acima referidos, e aos quaes prestára todos os cuidados, in- cluindo um, a quem nove dias antes se fizera a tracheiotomia. As cau- terisações localisam e debellam a molestia em quatro dias, e a doente volta de novo ás suas occupações hospitaleiras no fim de oito dias, sendo-lhe comtudo preciso fazer tratamento tonico por dois mezes, em consequencia do estado de fraqueza em que ficou. N'esta serie de factos vê-se uma epidemia de diphtheria desen- volvida em uma enfermaria de cirurgia, onde não tinha havido antes similhante doença, começando quatro dias depois de ter recebido uma creança convalescente de angina diphtherica, e pela doente da cama * proxima. Successivamente, e com intervallos de tres a cinco dias, são acommettidas mais doze creanças de angina diphtherica ou de crup, e por fim é atacada uma religiosa, que tratava os doentes, e sobre tu- do aquella a quem se fez a tracheiotomia. Não póde haver, pois, duvida da transmissão da molestia, fosse por contagio ou por infecção. Citam- se muitos factos analogos, e posso tambem apresentar alguns da minha observação ou da dos collegas de Lisboa, os quaes concorrem a mos- trar a propagação da doença a individuos habitando a mesma casa. O sr. Henri Roger, professor aggregado á faculdade de medici- na e medico do hospital de creanças de París, refere os seguintes fa- ctos em um interessante escripto publicado na Union médicale de 1859 (Note sur Finoculabilite et la contagion de la diphtherite, et sur la du- rec de la période d'incubation). 64 ESTUDOS SOBRE f.º Na familia G. é acommettida de angina diphtherica uma creança de dois mezes, que morreu no fim de seis dias. Cinco dias de- pois a mãi é atacada da mesma molestia e cura-se. Dois dias depois d'este segundo caso adoece de angina simples grave a aia da creança, que se cura. Pelo mesmo tempo mais quatro pessoas da casa têem anginas simples ligeiras, de que se curam. º Na familia V. a dona da casa contrahe uma angina diphthe- rica, da qual se cura; e seis dias depois o filho tem a mesmã doen- ca com o mesmo resultado. 3.º Da familia B. uma creança de um anno apresenta angina e coryza diphthericas, a que succumbe ; quatro dias depois, a mãi tinha uma angina da mesma natureza, de que se restabeleceu. Na familia L. um rapaz de dez annos, depois de uma opera- ção de pbimose, apparece com diphtheria prepucial; e dois dias de- pois com angina diphtherica, de que se curou; dois dias depois do apparecimento da angina no filho, a mãi contrahiu a mesma doença, da qual se curou tambem. 5.º Na familia Mal. duas creancas são atacadas de angina diph- therica com intervallo de seis dias, e morrem ambas no mesmo dia. 6.º Na familia D. duas creanças contrahem o crup no mesmo dia e morrem ; e uma terceira é acommettida quatorze dias depois de ter sido isolada das outras doentes, e succumbe com a mesma doença. 7.º Da familia Mén. dois irmãos são acommettidos de crup no mesmo dia e morrem; e outro irmão, quatro dias depois de isolado, é igualmente atacado de angina pseudo-membranosa e depois de crup, que terminou tambem pela morte. 8.º Na familia P. duas creanças, uma de dez mezes, e outra de tres annos, apresentam angina diphtherica e crup, de que se curam ambas, sendo a segunda pela tracheiotomia. Em uma terceira, isolada ao terceiro dia, apparece o crup nove dias depois de separada dos irmãos, e cura-se. Pelo mesmo tempo a mãi contrahiu angina diphtherica, de que se restabeleceu. 9.º Na familia Mont. uma rapariga de seis annos morreu de an- gina diphtherica ; um irmão, isolado no dia immediato, é atacado qua- torze dias depois do isolamento, e succumbe á mesma doenca ; uma terceira creança, isolada ao mesmo tempo que a segunda, teve a mes- ma molestia dezeseis dias depois da separação, e morre tambem. 10.º Uma menina da familia F. morre de angina e coryza diph- thericas; tres dias depois, é atacada outra de igual doença, a que se segue paralysia da pharynge, e cura-se. . O GARROTILHO 65 11.º Uma creança de dezoito mezes, pertencente á familia Bris. morre em tres dias com angina e coryza diphthericas. A mãi, dois dias depois da: morte do filho, é acommettida de angina da mesma natu- reza, e morre aos vinte dias de doenca. 12.º Uma rapariga da familia X. tem angina pseudo-membra- nosa, que termina pela cura. A irmã, isolada no mesmo dia que a doença começára, cahe com o crup seis dias depois, e morre. 13.º No mesmo dia e na mesma cama em que morreu de crup uma creança no respectivo hospital de París, é collocada outra crean- ca, a qual oito dias depois contrabiu uma angina diphtherica e crup a que succumbiu. 14.º Uma creança é admittida no mesmo hospital com uma oph- thalmia diphtherica, de que se curou; sete dias depois d'esta admis- são outra doente, que se tratava de syphilis, apresenta a mesma mo- lestia e morre. - O sr. Roger apresenta depois o resumo dos factos, que mais ex- tensamente são referidos pelo sr. Peter, e que acima transcrevi. A transmissão é, portanto, aqui evidentemente provada. No mesmo sentido das observações acima citadas depõem os ca- sos de transmissão a medicos que tratavam de pessoas com a mesma doença. Referirei a este respeito os seguintes factos bem conhecidos, por se terem dado em medicos muito notaveis. 1.º O sr. Valleix, de Paris, bem conhecido pela sua apreciavel obra em cinco volumes (Guide du médecin praticien) e medico do hos- pital da Piedade, tratava uma creança com angina diphtherica não muito grave e que se curou. Em quanto a tratava, examinando-lhe a garganta, recebeu na boca uma pouca de saliva expellida pela doente com um esforço de tosse. No dia seguinte o dr. Valleix apresentava uma pequena exsudação pellicular em uma das amygdalas, e depois al- guma febre. Passadas algumas horas, as duas amygdalas e a uvula es- tavam já cobertas de falsas membranas. Pouco tempo depois tinha gran- de corrimento seroso pelo nariz; em seguida inchação muito notavel dos ganglios cervicaes e submasxillares, e do tecido cellular d'estas re- giões, delirio; e em 48 horas, no dia 13 de julho de 1855, morreu sem apresentar signaes que indicassem a propagação da doença á larynge. 2.º Henry Blache, interno muito distincto dos hospitaes de Pa- ris, filho do sr. dr. Blache, medico assás conhecido e respeitado, foi para junto de um doente a pedido de seu tio, o sr. Paul Guersant, que o tinha operado de tracheiotomia motivada pelo crup, e com elle passou tres noutes. Na terceira noute sentiu-se encommodado com li- MEM, DA ACGAD.— 1.º CLASSE T. 1. P. I. 9 66 ESTUDOS SOBRE geira dôr de garganta. Vai então para casa de seu pai, e é visto pelos srs. Trousseau, Roger e Legroux que o acham com muita febre, e com as amygdalas cobertas de falsas membranas. Em poucas horas apparece-lhe enorme inchação do pescoço, corrimento nasal abundan- te e continuado, delirio no fim do primeiro dia, e-72 horas depois morre apesar das medicações empregadas. 3.º O dr. Gillette, medico do hospital de creanças de París, cha- mado ao campo para tratar de diphtheria uma creança, trouxe-a na sua companhia para París, respirando assim durante muitas horas na mesma atmosphera de uma carruagem em que vinham ambos. Desde então começaram os primeiros symptomas da mesma doença, de que morreu em oito dias, a 12 de outubro de 1859. 4.º Um medico de um dos departamentos de França, segundo refere o sr. Trousseau, viu uma creança com angina diphtherica e crup a quem fez logo a tracheiotomia. Tendo entrado sangue na tra- cheia em quantidade que fazia receiar a suffocação, applicou a sua bo- ca á ferida e sugou os contentos da tracheia; e 48 horas depois mor- ria, como o dr. Valleix, de uma angina diphtherica, com delirio e ou- tros symptomas da angina maligna. Entre nós tem-se repetido por muitas vezes casos analogos áquel- les que primeiro referi. Apresentarei em resumo aquelles de que me lembro n'este momento, e de; que tenho nota. 1.º Na quarta observação de tracheiotomia praticada pelo sr. Joa- quim Theotonio (observação do sr. Simas) foram successivamente acom- mettidas de angina diphtherica quatro pessoas da mesma casa: a mãi da doente, que faz o objecto principal da observação ; dois filhos, um que morreu, e outro que se curou pela tracheiotomia; e um hospede adulto. 2.º Ernestina, de quatro annos e nove mezes, filha do sr. Fran- cisco Ernesto da Silva, morador no largo do Terreiro do Trigo, acom- mettida de crup em 3 de dezembro de 1859, falleceu no dia 7. Seu irmão, Edmundo, de dois annos e cinco mezes, foi atacado de angina diphtherica grave no dia 9 de dezembro, seis dias depois do começo da doença na irmã e dois dias depois da sua morte. Foi tratado pelo meu prezado amigo e distincto collega, o sr. dr. May Figueira e por mim, com os vomitorios, duas cauterisações diarias, topicos de alumen, e chlorato de potassa internamente. Aos onze dias de doença, a 20 de dezembro, estava curado. g 3.º Henrique Ferrari, de 4 annos, morador na calçada do Sali- tre, foi acommettido de angina diphtherica e crup, em 19 de mar- O GARROTILHO 67 co de 1860; foi operado pelo sr. Theotonio da Silva na madrugada' do dia 24, e falleceu 2 dias e 11 horas depois. à Este doente tinha mais seis irmãos, dos quaes quatro foram acom- mettidos de anginas, todas com pontos diphthericos. Um d'elles já es- tava com angina diphtherica quando seu irmão Henrique apresentou os primeiros symptomas de diphtheria. Dos outros tres, dois foram . atacados pouco depois d'este, e um só o foi algumas semanas mais tarde. Deixaram de ter a mesma doença os dois irmãos mais velhos, - um de 15 e outro de 18 annos, que pouco se demoravam, em casa, assim como as outras pessoas da familia. º Maria, de quatro annos, moradora na travessa de S. Nicolau, foi acommettida no dia 8 de maio de 1860 de uma angina diphthe- rica, a que se seguiu albuminuria e crup no dia-15, a que a doenti- nha succumbiu no dia 17, aos nove dias de doença. No dia 18, na mãi d'esta criança, de trinta e tres annos, senho- ra robusta e saudavel, que não a abandonava um momento, estando quasi sempre com ella nos braços, manifestou-se amygdalite diptheri- ca pouco grave, de que se curou facilmente. Uma creada da casa, tambem saudavel, de quinze annos, e que raras vezes vinha ao quarto da doente, foi acommettida mais forte- mente da mesma molestia, de que se tratou e curou fóra, em casa de sua familia. Estas doentes foram vistas e tratadas pelo meu esti- mavel amigo e collega, o sr. Augusto Cesar de Azevedo e por mim. 5.º Na rua do Patrocinio n.º 116, 1.º andar, morava uma fami- lia com oito filhos. No dia 25 de julho de 1860 adoeceu com angina “diphtherica um d'elles, Augusto, de nove annos. A" angina seguiu-se garrotilho, albuminuria e intoxicação diphtherica, e a morte no dia 30, isto é, ao quinto dia de doença no hospital de S. Vicente de Pau- lo, para onde entrára no dia 29, e onde foi visto e tratado Cy sr. dr. Bernardino Antonio Gomes e por mim. No dia 3 d'agosto, quatro dias depois da morte do irmão, e cin- co dias depois da sua saída de casa para o hospital, foi atacado da mesma doença Casimiro, de 24 annos de idade, e foi tratar-se ao hos- pital de S. José na enfermaria de Sant'Anna, onde o vi, e d'onde saiu curado em 11 do mesmo mez, isto é, ao oitavo dia de molestia. Em 9 do mesmo mez adoeceu da mesma fórma outra creança da mesma familia, Carolina, de quatro annos, a qual foi tambem para a enfermaria de Sant'Anna do hospital de S. José, onde morreu no dia 16, setimo de doença. a 68 - ESTUDOS SOBRE 6.º No pateo do Thorel, uma menina, D. M. D., de sete annos, tem- peramento lymphatico-nervoso, fraca, é acommettida em 11 d'agosto de 1860 de angina diphtherica extensa e grave, que todavia nunca se acompanhou de albuminuria. Curou-se em onze dias com tratamen- to energico pelas cauterisações duas vezes por dia, topicos de alumen e de tannino, emeticos d'ipecacuanha, e chlorato de potassa internamente. Sua irmã, D. A., de seis annos e melhor constituição, que dormia no mesmo quarto, apesar de removida para outro distante, logo que a ir- mã adoeceu, cahiu no dia 14 do mesmo mez d'agosto com igual doen- ca, se bem que um pouco menos grave, de que se curou em oito dias com o mesmo tratamento que se applicava á irmã. No dia 25 d'agosto, tres dias depois de curadas, a aia da meni- na D. A., que lhe serviu de enfermeira, e estava constantemente com ella, foi atacada de angina diphtherica pouco grave, tambem sem albuminuria, de que se curou em oito dias com o referido trata- mento. Pelo mesmo tempo que estavam doentes aquellas meninas, um creado da casa teve uma angina apparentemente simples, mas grave por ser acompanhada de notavel engorgitamento dos ganglios subma- xillares, e por grande apparato febril de fórma adynamica, de que se curou em nove dias, ficando comtudo muito abatido de forças durante algum tempo. À 7.º Na rua de S. Bento n.º 59, 2.º andar, lado esquerdo, mora uma familia com cinco creanças, duas das quaes, uma de 3 annos ou- tra de 61, foram atacadas de diphtheria com intervallo de um dia. Ambas tiveram anginas diphthericas, e uma conjunctamente os si- gnaes do 2.º periodo do garrotilho, de que se curaram. Ao 3.º dia de molestia, o mais velho d'estes doentes passa muitas horas no quarto do lado direito onde havia quatro creanças, com as quaes esteve du- rante este tempo. Passados dois dias, estas quatro creanças de 37, 5, 61 e 9 annos, foram uma depois da outra successivamente attacadas de angina, com alguns pontos diphthericos em dois casos e apparen- temente simples nos outros dois, os quaes todos se curaram dentro de sete a onze dias. 8.º.0 meu amigo e collega, o sr. Oliveira Soares, referiu-me ul- timamente os seguintes factos da sua observação. No dia 4 de novem- bro de 1860 foi atacada de pnsima uma menina de 3 annos, moradora na rua do Arco do Bandeira n.º 39, 2.º andar. Dois dias depois havia nas amygdalas signaes de diphtheria, que se estendeu ao veo palati- no, pharynge e fossas nasaes. Apesar da intensidade e extensão da O GARROTILHO 69 doença, a menina curou-se com repetidas cauterisações, emeticos e chlo- rato de potassa, tendo tido na convalescença paralysia do veo do paladar. Não foi possivel tomar medidas de isolamento para outras crean- cas da mesma casa. No dia 14 um rapaz de 18 annos, aprendiz de estofador que vi- nha dormir á mesma casa, foi atacado de. angina diphtherica e cu- rou-se. No dia 18, um menino de 23 mezes, irmão da primeira doente, foi igualmente affectado, curando-se em doze dias. - No dia 24 foi atacada uma menina de 4 annos, irmã d'aquelles dois doentes, mas que morava no 3.º andar, e só vinha de visita ao 2.º onde estavam doentes os irmãos. Os primeiros symptomas foram de angina diphtherica, que passou a crup no dia 28, e foi opera- da de tracheiotomia pelo sr. Oliveira Soares no dia 29 pelas 9 ho- ras da manhã. Esta creança, cujo tratamento foi quasi nullo antes da operação pela resistencia que sempre oppoz a toda a therapeutica tan- to topica como interna, falleceu ás duas horas da manhã do dia 30 de novembro, 17 horas depois de operada. N'este mesmo dia 30 adoe- ceu na mesma casa outra menina de 8 mezes, e morreu no dia 2 de dezembro com symptomas de garrotilho. No dia 31 de dezembro, a mãi d'aquellas creancas, de 31 annos, foi tambem atacada de crup, pouco intenso, cujos symptomas se des- vaneceram em tres dias a beneficio de um emetico e do chlorato de potassa. Podia juntar a estes muito maior numero de factos da minha pratica, todos relativos á transmissibilidade da doença de uns a ou- tros individuos da mesma familia e da mesma casa, ou á manifesta- ção da diphtheria em mais do que uma pessoa da mesma habitação ; porêm não tenho presente a respeito d'elles nem a idade precisa dos individuos, nem a época exacta da invasão. De todos elles resulta para mim a convicção profunda de que a diphtheria em geral, e o crup em especial, é communicavel dos individuos doentes aos sãos. Não quero com isto dizer, que a doença seja contagiosa, quer dizer, que se commu- nique ao individuo são por contacto immediato do doente, ou de objectos que lhe pertençam. Nada prova, quanto a mim, que a multiplicidade de casos de crup observados em uma mesma her a em uma mesma casa, em uma mesma familia, seja mais o resultado do contagio me- diato ou immediato, do que o efleito de uma infecção, ou communi- cação pelo ar contaminado. Se a diphtheria é uma molestia epidemi- ca, como ninguem hoje póde contestar, e se se não nega que um in- 70 ESTUDOS SOBRE dividuo, atacado de uma doença epidemica, póde elle só alterar a at- mosphera no meio da qual está e onde respira, e tornar-se o fóco de propagação da mesma doença aos individuos predispostos, submettidos á sua influencia ou á sua esphera de actividade, deve tambem admit- tir-se que, para todos os casos que tenho referido, para esses mesmos occorridos ná enfermaria de cirurgia do hospital de Santa Eugenia, onde a molestia começou depois de ter sido recebida na mesma sala uma doente em convalescença de diphtheria, a transmissão é bem e me- lhor explicavel pela infecção do que pelo contagio, a não querer ad- mittir o contagio mediato por meio do ar, o que para mim é já a infecção. Não quero dizer com estas considerações que o crup ou a diph- theria em geral não seja contagiosa, algumas vezes pelo menos, por- que até inoculavel parece ter sido uma ou outra vez, como se depre- hende dos -seguintes factos, referidos por medicos que devem merecer todo o conceito. 1.º O primeiro facto que póde ser de contagio por inoculação, de que tenho conhecimento, foi referido por Luiz Mercado, medico de Filip- pe III de Hespanha, em 1620. O facto, a que já alludi n'outra parte, passou-se do modo seguinte: o pai de uma creança aflectada de garrotilho foi mordido por ella no momento em que elle com os dedos pretendia desobstruir-lhe a garganta das materias contidas; e pouco tempo de- «pois apresentou todos os symptomas da mesma doença do filho. 2.º No collegio de la Fleche, onde havia uma epidemia de angi- nas malignas, uma creança com frieiras, diz o sr. Guersant, andava des- calça na enfermaria, em cujo pavimento estavam escarros de um com- panheiro que tinha diphtheria, e apresentou pouco tempo depois pla- cas pseudo-membranosas entre os dedos dos pés. 3.º O sr. Trousseau viu, na epidemia de diphtheria de Sologne, placas de falsas membranas nos peitos de uma mulher que amamen- tava o filho, o qual tinha uma angina d' aquella mesma natureza. “4º O sr. Bretonneau referiu o seguinte facto: o sr. Herpin, de Tours, tratava uma creança de diphtherite Pharyngo- laryngea, a qual ti- nha já communicado uma angina diphtherica á sua aia. Cauterisando- lhe à garganta, succedeu, por effeito de tosse, entrar-lhe na venta esquerda uma parte dos esputos expellidos pelo doente. Precisando continuar a cauterisação, o sr. Herpin nem teve tempo de se lavar, nem de se limpar. Passados alguns dias, sentiu entupida a venta que tinha recebido os detritos pseudo-membranosos expellidos da gar- ganta do doente, e logo depois uma angina diphtherica que foi segui- O GARROTILHO 4 da de paralysia, a principio do véo do paladar e depois geral, de que se curou, mas passadas muitas semanas. 5.º O sr. Gendron, de Chateau du Loire, segundo refere tam- bem o sr. Bretonneau, praticando a tracheiotomia, e no momento de abrir a tracheia, recebeu nos labios uma grande quantidade dos pro- ductos da exsudação tracheial, impellidos por um accesso de tosse con- vulsiva. Uma diphtherite pharyngea, acrescenta o sr. Bretonneau, foi a consequencia immediata d'este incidente. 6º e 7.º O sr. Bergeron, medico do hospital de Santa Eugenia, em um escripto importante (Vote sur Vinoculabilité de la diphtherie) lido na sociedade medica dos hospitaes, na sessão de 22 de junho de 1859, refere pela sua parte os seguintes factos : O dr. Loreau, no dia 20 de novembro de 1857, feriu um dedo praticando a tracheiotomia em um caso de crup. Algumas horas de- pois, o dedo picado incha e doe, exagerando-se rapidamente o soffri- mento, e fórma-se um abcesso no logar ferido. A 5 de dezembro, quinze dias depois do aecidente, não estando ainda completamente bom, expondo-se a um frio muito intenso, sentiu pelo fim da tarde calefrios, pela noite dôres de garganta, e na manhã do dia seguinte tinha uma amygdalite diphtherica. Tres a quatro dias depois, a mulher do dr. Loreau é tambem acommettida de angina diphtherica, e por fim já em convalescença ella e seu marido tiveram a paralysia geral, que em um d'elles durou quatro mezes. O sr. Baudray, alumno da escóla de medicina de París, estando constipado com tosse é entupimento do nariz, em seguida a um res- friamento, acontecido em 26 de março de 1859, fez a autopsia a uma creança morta de diphtherite, e picou-se ligeiramente no pollegar da mão esquerda. Apesar de todos os meios empregados para evitar qual- quer absorpção pela ferida (lavagem com uma corrente d'agua, sucção prolongada, pressão energica com grande saída de sangue), logo no fim da tarde, sentiu todos os symptomas de uma lymphangite, que no dia seguinte se prolongava á axilla. No dia 30 de março, tres dias de- pois da autopsia, e cinco depois da constipação, apparece dôr de gar- ganta e engorgitamento dos ganglios submaxillares ; passados tres dias, a angina é já pseudo-membranosa ; dois dias mais tarde, herpes labial seguido de nova producção diphtherica pouco extensa. Cura a 10 de abril, 8.º Entre nós deu-se em julho de 1852 um facto em parte pa- recido com os precedentes, sem comtudo chegarem a manifestar-se falsas membranas, na pessoa do sr. Joaquim Theotonio da Silva, que, 72 ESTUDOS SOBRE por occasião de praticar a tracheiotomia em uma creança com garro- tilho, vendo continuar a asphyxia depois de aberta a tracheia, appli- cou a boca á ferida com o fim de extrahir pela sucção as materias contidas nas vias respiratorias. O meu collega referindo as consequen- cias d'este facto, exprime-se do seguinte modo : « No mesmo dia do fallecimento da doente (que teve logar duas horas depois da operação) tive que recolher-me á cama atacado de forte cephalalgia, quebra- mento de corpo, febre e fastio. N'essa noite começaram a doer-me as amygdalas. O sr. F. A. d'Oliveira, que me tratou, admittindo a pos- sibilidade do contagio da angina maligna, fundando-se para isto n'um grande numero de factos observados pelo sr. Trousseau, Guersant e outros, cauterisou-me as amygdalas, e applicou-me o tartaro emetico como vomitivo, com o que a doença se debellou em oito dias, não ap- parecendo camada alguma diphtherica em nenhum dos pontos inflam- mados. » Provarão estes factos que a diphthería é inoculavel? Não suppo- nho que esta questão possa já resolver-se pela affirmativa, sem um nu- mero mais avultado de observações e experiencias. É com effeito pos- sivel que os factos da mordedura, das picadas anatomicas, e do con- tacto dos productos diphthericos na venta, boca ou outras partes do corpo, sejam simples coincidencias; em primeiro logar, porque os in- dividuos, nos quaes a molestia se manifestou, estavam debaixo da in- fluencia epidemica geral da molestia que então grassava com esta fór- ma, e em alguns houve exposição ao frio como causa occasional ; e em segundo logar, porque muitos incidentes similhantes têem acontecido sem que fossem seguidos dos mesmos resultados. O facto-do sr. Joa- quim Theotonio da Silva, alem de não ser acompanhado de diphthe- ria, perde muito do seu valor com as seguintes palavras do proprio collega : « Deve advertir-se que a angina tonsillar simple E q uma doen- ca a que sou muito attreito, e por tanto supponho que + angina que soffri não foi dependente de inoculação. » Por outro lado é certo que as tentativas directas para obter a inoculação feitas em si proprios pelos srs. Trousseau e Peter, n'este ul- timo por tres vezes, não foram seguidas de nenhum resultado. De tudo o que vem dito, resultado do estudo da materia, prati- camente e nos livros, julgo que o crup e a diphtheria em geral é uma molestia que se transmitte dos individuos doentes aos individuos sãos ; que a transmissão se faz por infecção, isto é, pelo ar contaminado, e que é possivel que a doença seja tambem algumas vezes communica- vel por contágio, e mesmo por inoculação. , O GARROTILHO 73 Como applicação d'estes principios entendo que, dando-se qual- quer caso de garrotilho ou diphtheria em uma familia, devem logo remover-se e dispersar-se as creanças que houver na mesma casa; e que o ar que respira o doente e os sãos deve renovar-se o mais que fôr possivel. SYMPTOMATOLOGIA Os phenomenos morbidos, pelos quaes se manifesta o crup, variam no decurso da doença. A maior parte dos medicos divide-os por isso em tres grupos. Eu divido a doença em quatro periodos, o que me parece mais exacto e mais em harmonia com os factos da minha observação. O primeiro periodo é caracterisado por certo numero de sympto- - mas geraes e locaes, que de ordinario precedem a manifestação da doença na larynge. O segundo periodo começa quando apparecem os primeiros sym- ptomas laryngeos, e acaba quando se manifesta a dyspnéa. O terceiro periodo principia com a dyspnéea, e termina com a ma- nifestação dos primeiros phenomenos asphyxicos. O quarto periodo é caracterisado pela asphyxia confirmada. Primeiro periodo ou inicial —N'este periodo o doente, ás vezes no meio da melhor saude, sente-se mais ou menos subitamente abatido, tem quebramento de corpo, menos desejo de sé entregar ás suas dis- tracções e brincos ordinarios, menos appetite ou mesmo fastio, ce- phalalgia mais ou menos forte, febre ás vezes mui intensa e precedi- da de calefrios algumas vezes de grande intensidade. Sei de dois ca- sos em que os primeiros symptomas do garrotilho foram uma con- vulsão seguida de perda dos sentidos e estado comatoso. Um d'elles teve logar na epidemia do Campo-Grande, e foi observado pelo colle- ga Silva Franco. O outro caso deu-se em um doente a quem tive dé praticar depois a tracheiotomia. Na epidemia de diphtheria do Campo-Grande os symptomas ini- ciaes foram pela maior parte os seguintes : epistaxis repetidas, dores de cabeça e no ventre, febre, vertigens ou tonturas, algumas vezes convul- sões, delirio etc. Estes symptomas tinham muita relação na sua intensi- dade com a dos phenomenos diphthericos. Logo que estes se manifesta- vam, todos os symptomas de invasão abrandavam, e mesmo desappare- ciam, conservando-se a febre poucas vezes no decurso da enfermidade. Estes phenomenos geraes ou prodromicos, mais ou menos simi- lhantes aos que precedem as febres ou as doenças agudas, sobre tudo MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSET. 1. P. 1. LO 74 ESTUDOS SOBRE as febres eruptivas e a febre typhoide, podem durar desde algumas horas até alguns dias. Até uma semana se prolongaram elles em uma “doente da minha pratica; mas geralmente não excedem o terceiro dia. São mais ou menos intensos, segundo os individuos e conforme a in- tensidade dos symptomas consecutivos e a constituição medica reinan- te. Muitas vezes são ligeiros. Algumas vezes parece faltarem, ou pas- sam-se estando as creanças de pé, e continuando nos seus divertimen- tos habituaes, sem que as familias os presintam, o que tem feito di- zer e acreditar a muitos collegas que as primeiras manifestações da doenca são inteiramente locaes, o que é inexacto. Depois d'estes primeiros symptomas, de que muitas vezes tenho sido informado, ou que eu mesmo tenho presenciado, apparecem. os primeiros phenomenos locaes, que se manifestam na pharynge; ou, o que é muito raro, na tracheia e bronchios; ou logo na larynge, segun- do que o crup é successivo (consecutivo) ou primitivo. Se a pharynge é primeiro atacada, o que é a regra geral, desen- volvem-se os symptomas de uma angina pharyngea mais ou menos agu- da caracterisada, alêm dos phenomenos geraes que não differem dos precedentemente enunciados, por vermelhidão maior ou menor, par- cial ou geral das amygdalas, véo palatino, uvula e pharynge, acom- panhada de dôr pouco notavel, ou de certa intensidade, sobre tudo du- rante a deglutição; e de engorgitamento mais ou menos doloroso de- baixo dos angulos da maxilla, não devido então á inchação dos gan- glios, mas, segundo o sr. Bouchut, á tumefação das amygdalas doen- tes, o que eu já tenho verificado, mas sómente no principio, porque mais tarde os ganglios lymphaticos da região são evidentemente i in- chados e sensiveis. Passadas horas, ou geralmente um «ou mais dias, pequenos pon- tos brancos, dépois chapas da mesma côr, branco-amarelladas, ou acin- zentadas. apparecem sobre as amygidalas e podem estender-se aos pila- res, véo do paladar, uvula e pharynge. Frequentemente manifestam- se as falsas membranas nas amygdalas sem parecer terem sido prece- didas dos pontos brancos que notei, nem de signaes de inflanmação local, porque a mucosa não está alterada na sua côr, nem se apresen- ta notavelmente dojorosa. Com as pseudo-membranas as amygdalas apparecem ás vezes como ulceradas e com perdas de substancias e an- fractuosidades, o que é devido á inchação edematosa da circumferen- cia, ficando deprimida a parte que está coberta pela falsa membrana. Estas mesmas pseudo-membranas tomam ás vezes o aspecto de esca- ras gangrenosas, não sendo aliás senão porções dos productos diphthe- O GARROTILHO 75 ricos, ou de sangue, mais ou menos alteradas. A's vezes antes da laryn- ge ser invadida, ha tambem pelas fossas nasaes um (luxo seroso, ama- rellado e fétido, que indica o começo do coryza diphtherico por vezes precedido ou acompanhado de epistaxis. Quando a molestia começa pela tracheia, o que é rarissimo, a di- phtheria laryngea é precedida de tosse, embaraço e fraqueza da respi- ração, e todos os symptomas e signaes da tracheio-bronchite. Quando, antes de se manifestarem os symptomas referidos á larynge, se ouve na tracheia o ruido de valvula, ou com a tosse é expellida alguma por- cão de falsa membrana, cessa à duvida relativamente á natureza da doença existente e da que se desenvolver depois na larynge. Algumas vezes, sem outros phenomenos do lado da pharynge e da tracheia, depois dos symptomas geraes que mencionei, manifesta- se a doença primitivamente na larynge, o que todavia é raro. N'estes termos, tendo havido ou não diphtheria pharyngea ou tracheial, depois de horas, de um ou de muitos dias, a doença apre- senta-se na larynge, e ha então os symptomas do segundo periodo. “Segundo periodo ou dos primeiros symptomas laryngeos. — E ca- racterisado por symptomas referidos á larynge sem accessos de suffo- cação, nem dyspnéa. Este periodo, cuja duração é desde horas a al- guns dias, póde seguir-se logo aos symptomas geraes que indiquei no primeiro periodo, sem que a pharynge ou outras partes sejam interes- sadas ; ou então ser a consequencia da propagação dos phenomenos lo- caes que tiveram origem superior ou inferiormente. No primeiro caso, muito menos frequente do que o segundo, prin- cipalmente nos adultos, o crup é primitivo, e os phenomenos laryn- geos succedem-se logo aos symptomas geraes do periodo inicial. As manifestações locaes da diphtheria na larynge são denuncia- das, alêm de outros signaes, pela tosse, alteração no timbre da voz, e um ruido mais ou menos aspero na larynge devido á passagem do ar atravez da glotte, cujas paredes estão intumecidas ou forradas de fal- sas membranas, e por isso mais estreita. A tosse é um phenomeno quasi constante n'este periodo. Tenho-o visto comtudo faltar para só apparecer no periodo seguinte ou no quar- to, e até observei já dois casos em que o crup percorreu todas as suas phases sem que aquelle symptoma se manifestasse em nenhuma d'el- las. No principio a tosse é mais vezes secca ou aguda, e torna-se de- pois, ou apparece logo de principio, mais ou menos rouca e abafada, tomando um timbre especial que lhe tem dado o nome de tosse crupal. O timbre da voz altera-se. Esta alteração consiste no enrouqueci- 10 + 76 ESTUDOS SOBRE mento maior ou menor, como na laryngite simples. Este symptoma é muitas vezes o primeiro e ás vezes o unico signal da invasão da la- rynge pela diphtheria. Em certo numero de casos, quando os pheno- menos geraes têem passado ou são pouco sensiveis, é sómente a rou- quidão da voz, que parece marcar o começo do crup. Este enrouque- cimento exaggera-se com o progresso da doença, e a voz é então como abafada e caracteristica. Esta voz, que se chama voz crupal, tem lo- gar principalmente nos outros periodos posteriores do garrotilho. Ruido laryngeo. N'este segundo periodo já se observa muitas vezes na respiração um ruido de timbre variavel, rouco, mais ou me- nos aspero ou agudo, que é devido á passagem do ar atravez da glot- te, mais ou menos apertada e alterada. E" mais sensivel durante a ins- piração, mas nota-se em ambos os tempos de cada acto respiratorio. Tambem o tenho observado por vezes igualmente intenso na expira- cão, a qual é então tão prolongada ou quasi tanto como a inspira- cão. Este phenomeno póde faltar, o que acontece principalmente no crup dos adultos mesmo nos outros periodos, ou ser mui pouco nota- vel. Desapparece ás vezes depois da tosse e da expulsão de falsas mem- branas, depois do effeito de um emetico, para reapparecer ne novo com intervallos irregulares. Dôr na larynge. A dôr que os doentes Este á na é ge- ralmente muito pequena, ás vezes apenas perceptivel ou nulla. A expectoração falta quasi sempre n'este periodo, e quando existe é apenas mucosa, e sem nenhum caracter de maior importan- cia. A expectoração caracteristica, com falsas membranas, observa-se principalmente no terceiro periodo. Rod é Com os symptomas laryngeos, que notei, ha tambem em maior ou menor gráo os symptomas geraes que referi no primeiro periodo, mas geralmente mais ou menos modificados, e certos signaes dados pe- las urinas. As urinas, examinadas n'este periodo, são ligeiramente acidas ou neutras, geralmente claras e transparentes, algumas vezes turvas, co- mo leitosas pela grande quantidade de urato de soda amorpho que téem em suspensão, e que o calôr dissolve restituindo ao liquido a sua transparencia. Levadas á ebullição, ou tratadas pelo acido nitrico, dão em dois terços dos doentes um deposito de albumina mais ou me- nos abundante. Quando existe este phenomeno, sem que a asphyxia ou uma escarlatina precedente ou concomitante o explique, o crup é mui- to provavelmente infeccioso. Quando a larynge é invadida em seguimento á angina ou tra- O GARROTILHO 77 “cheio-bronchite diphthericas, quando o crup é successivo ou consecu- tivo, aos symptomas que vêm escriptos, devem juntar-se, em maior ou menor gráo, os que já notei quando fallei da doença na pharyn- ge e nas outras partes do apparelho respiratorio e digestivo. Terceiro periodo, de dyspnca ou de suffocação.— E" caracterisado por dyspnéa intermittente ou contínua sem asphyxia. Começa com o primeiro accesso de suffocação, e, na sua falta, quando a dyspnea se estabelece e cresce gradualmente para se tor- nar contínua. Os symptomas existentes na phase antecedente do crup aggra- vam-se, e apparecem outros novos. Os symptomas geraes, a febre com quebramento do corpo, etc., augmentam em gravidade, e abatem consideravelmente os doentes. A inappetencia, a difficuldade na deglutição são maiores. A tosse apresenta-se algumas vezes sonora e ruidosa, mas geral- mente mais rouca. Tem-se-lhe dado, como disse, a denominação de tosse crupal, por ter um timbre particular. E' preciso comtudo saber que no falso crup e na laryngite aguda póde ter os mesmos caracteres. Quando a tosse é abafada, a tal ponto que recebe o nome de tosse extincta, é então mais propria do garrotilho. Com a tosse ha algumas vezes expectoração geralmente de mu- co espumoso, ou a raras vezes caracteristica pelos de tritos de falsas membranas. A voz, em harmonia com a tosse, está já mais rouca ou mesmo sumida. As creanças quasi que não articulam palavra, fallam apenas com os labios phrases curtas, a cada uma das quaes se segue um pe- queno sibilo na inspiração. Pouco depois a voz póde extinguir-se intei- ramente, ha então a aphonia crupal. Com estes signaes da tosse e da voz juntam-se os symptomas da dyspnéa, que caracterisa este periodo. A dyspnéa manifesta-se ou subitamente por accessos, ou pouco a pouco e gradualmente, até se tornar contínua. Quando começa por accessos, a creança é subitamente aecommet- tida por um ataque de suffocação e anciedade, em consequencia do qual se senta rapidamente na cama e se lança com violencia nos bra- cos das pessoas que a cercam, ou salta para fóra do leito; leva a mão ao pescoço como para arrancar o corpo estranho que a suffoca, e re- vira a cabeça para traz, estendendo o collo; a face congestiona-se, tor- na-se rubra e depois violacea ; os olhos brilhantes parece sairem das orbitas; a boca e ventas abrem-se amplamente como para facilitarem e 18 ESTUDOS SOBRE a entrada de maior quantidade de ar, os labios fazem-se lividos ; o doente agita-se convulsivamente; procura um ponto de apoio para dar ás potencias da inspiração ; cobre-se de suor ;'o ruido laryngeo toma o maior desenvolvimento; o pulso, geralmente pequeno, accelera-se muito podendo chegar a 140, 160 e mesmo 170 pulsações (Hache) : parece que a creança vai morrer suffocada. Mas, passados alguns se- gundos, ás vezes mais, o accesso: passa, e o doente socega, fica pros- trado, deita-se e respira como antes, o que já era quasi sempre com certa difficuldade. Estes accessos repetem-se mais ou menos vezes, mas são geral- mente mais frequentes de noite do que de dia. Nos casos mais ordi- narios ha tres ou quatro. A's vezes faltam completamente, sobre tu- do no crup dos adultos. Quando a dyspnéa se estabelece gradualmente, a respiração faz- se cada vez mais frequente e mais difficil. O primeiro tempo de cada acto respiratorio é acompanhado de uma depressão nas fossas supra- sternal e xyphoidea, e de dilatação das ventas tanto maior quanto mais difficil é a hematose, e acompanha-se do ruido laryngeo já notado no “segundo periodo, porque n'elle póde já apparecer, mas que no terceiro é sensivelmente mais forte, e augmenta progressivamente com a ob- strucção da glotte. Passado um espaço de tempo variavel, a dyspnéa augmenta, os esforços de inspiração são cada vez mais violentos, o ruido laryngeo é cada vez mais intenso, e ouve-se a grande distancia na inspiração e expiração ; a creança agita-se extraordinariamente, ora se senta na ca- ma, ora se volta para um ou outro lado, ora tenta sair fóra do lei- to; a face torna-se vermelha e cobre-se de suor, outras vezes conser- va-se mais ou menos pallida, em todo o caso exprimindo uma viva anciedade e angustia. Este estado é ainda ás vezes rapidamente aggravado por um dos accessos espasmodicos que já descrevi, em que a natureza parece que- rer por um supremo esforço arrojar o obstaculo da respiração; tam- bem estas exacerbações terminam algumas vezes pela expulsão de um tubo membranoso, porções de falsas membranas, ou muco filamentoso e espesso, que melhora muito ou allivia o doente, o que infelizmente só acontece por excepção. N'este periodo a albuminuria, se já existia, continúa, aliás póde começar, ou só apparecer no quarto periodo. A auscultação não dá geralmente nenhum resultado pratico, a não existir complicação inflammatoria do lado do pulmão. De ordinario o O GARROTILHO 79 ruido laryngeo encobre o ruido vesicular totalmente ou em parte, de modo que parece mais fraco, o que alêm disso tem explicação na me- nor quantidade de ar que entra no pulmão, pelo obstaculo que en- contra na larynge. Apesar de tudo, casos ha, em que o ruido vesicu- lar conserva a sua intensidade normal ou mesmo maior. O unico si- gnal dado pela auscultação, e que é caracteristico da existencia de fal- sas membranas abaixo da glotte, é o ruido de valvula, que algumas vezes se sente na tracheia ou bronchios, e que deve fazer admittir a existencia de um corpo estranho membranoso fluctuando n'estes ca- naes. Quarto periodo ou asphyxico—E' caracterisado pela dyspnéa con- tínua com symptomas asphysxicos. A asphyxia, signal pathognomonico d'este periodo, póde ser ma- nifesta ou latente. Na asphyxia manifesta, que é o caso mais commum, os sympto- mas do periodo antecedente aggravam-se muito. A pelle faz-se pallida, como acinzentada ou violacea, os beicos tornam-se rôxos, a tosse .e a voz extinguem-se totalmente, a orthopnéa é quasi contínua, os acces- sos de suffocação repetem-se e succedem-se com intervallos de grande somnolencia e abatimento, pondo cada vez em maior perigo a vida dos doentes. A febre é algumas vezes intensa com bastante sede e calor - de pelle; mais vezes, o pulso sem frequencia notavel, ou apenas fre- quente, é pequeno e fraco, e o calor natural, como se não houvesse nenhuma febre. Nunca vi n'este periodo do garrotilho sede tão inten- sa como em uma menina, filha do sr. Tavora, que operei de tracheio- tomia com feliz resultado; na noite, em que foi operada, pedia inces- santemente agua ou uma esponja molhada n'este liquido para humede- cer a todo o instante a boca e as fauces. Accresce a este quadro symptomatico a diminuição ou extincção da sensibilidade da pelle, a anesthesia crupal. O sr. Bouchut nas suas « Recherches sur un nouveau symptome du croup servant dindication à la tracheotomie» offerecidas, em seu nome, pelo sr. Cloquet á Academia das Sciencias de Paris em sessão de 26 de julho de 1858, apresentou a respeito d'este phenomeno as seguintes proposições : 1.º O periodo asphyxico do crup é acompanhado de anesthesia geral da pelle. 2.º Esta anesthesia augmenta gradualmente á medida que se fa- zem mais espessas ou se estendem as producções fibrinosas da la- rynge. 80 ESTUDOS SOBRE 3.º Só é completa quando o obstaculo á entrada do ar nos pul- mões é consideravel e dura desde algumas horas. 4. É a consequencia da hematose imperfeita ou de asphyxia pro- xima. 5.º Observa-se tanto nos casos de asphyxia latente sem cyanose, como nos de asphyxia a mais manifesta com cyanose e suffocação. 6.º Não existe na diphtherite que se não estende á larynge, ain- da que seja bastante grave para determinar a morte por si só. 7.º A sua existencia é de muito mão prognostico. 8.º E' uma indicação formal da tracheiotomia. 9.º Esta anesthesia cessa quando, aberta a tracheia, se restabele- cem as funcções da hematose. Não foi comtudo o sr. Bouchut o primeiro que notou a insensi- bilidade dos individuos atacados de crup.. Esta especie de anesthesia já era muito bem conhecida desde 1847, quando appareceram os primeiros escriptos scientificos sobre a ethe- risação fundados em experiencias sobre os animaes. Todos sabem que, n'aquelle anno, o sr. Amussat explicava pela asphyxia a acção anesthesica do ether, etc. As experiencias physiologicas sobre a asphyxia feitas pelo sr. Fau- re; assim como a observação do sr. Demarquay nas lesões com obsta- culos mechanicos da larynge, firmavam tambem a opinião do sr. Bou- chut que explica a anesthesia no crup pelo embaraço mechanico á res- piração. Entre nós o sr. Joaquim Theotonio da Silva foi o primeiro a no- tal-a em 1852, dizendo assim no jornal da Sociedade das Sciencias Medi- cas de Lisboa do mez de janeiro, pag. 23 « Não terminarei estas reflexões sem mencionar um facto, que julgo de alguma importancia : ambos os meus doentes (operados de tracheiotomia) soffreram os golpes e manobras operatorias, sem dar mostras de sensibilidade. Interrogados depois da operação, disseram que nenhuma dôr tinham sentido. » Eu mesmo an- tes das investigações do sr. Bouchut tinha notado a insensibilidade d'alguns dos meus operados de tracheiotomia, e o escrevi na minha observação de crup asphyxico curado pela tracheiotomia, publicada na Gazeta Medica de Lisboa de 16 de setembro de 1855. Esta anesthesia, como todos sabem, não é nada especial ao gar- rotilho, porque se vê no catarrho suffocante e n'outras doenças analo- gas, mas um effeito da asphyxia, qualquer que seja a sua causa. Algumas indicações praticas se tiram da anesthesia crupal, se- gundo o sr.: Bouchut. O GARROTILHO 81 No garrotilho com asphyxia manifesta, acompanhada de cyanose da face ou dos labios, em verdade a existencia da anesthesia não fará variar as indicações nem modificar o prognostico. Senão ha contrain- dicação d'outra ordem deve fazer-se em todo o caso à tracheiotomia, e o prognostico nada differe. Mas quando a asphyxia não está patente, isto é, quando a dys- pnéa não é mui forte, quando não ha accessos de suffocação, quando a face se conserva pallida e sem arroxeamento de labios, não obstante a apparencia de um estado geral grave (somnolencia, resolução das for- ças, pouca ou nenhuma febre, pulso geralmente pequeno e molle) ; quando, em uma palavra, a asphyxia é latente, então é a abolição da sensibilidade tegumentar que, fazendo conhecer a existencia da asphy- xia, indica a occasião opportuna, que se deve logo aproveitar, para a operação, com o fim de restabelecer de prompto a hematose. N'estes casos, pois, é só a anesthesia, quando existe, que indica o perigo im- mediato do doente. Se por outro lado, no meio dos symptomas geraes os mais gra- ves de crup ou de outra diphtheria, se conserva toda a sensibilidade cutanea, a tracheiotomia está formalmente contraindicada, porque não é a asphyxia que põe em perigo a vida do doente, mas a intoxicação que se lhe assimilha. É n'estas duas hypotheses diversas que a existencia ou a falta da anesthesia póde ter grande valor. Ora estas indicações d'aquelle symptoma no crup só as tirou o sr. Bouchut. O conhecimento da anesthesia crupal, tendo um certo valor, não merece comtudo toda a importancia que lhe dá o sr. Bouchut. Em al- guns doentes diz-se ter faltado, apesar da asphyxia ter determinado a morte. Segundo observações do sr. Crequy (Gazette des hopitaua) 6 creancas morreram asphyxiadas sem anesthesia, mostrando a autopsia falsas membranas na larynge. A's vezes apparece muito tarde, para que seja prudente esperar a sua manifestação para operar; outras vezes é desacompanhada de outros symptomas graves, e então seria cêdo para fazer a tracheiotomia. Tem-me acontecido por isso operar doentes de gar- rotilho antes de haver total insensibilidade da pelle, e em um caso es- perar por outros symptomas da asphyxia para proceder á operação. Alem d'isso não poderá a anesthesia algumas vezes depender, pelo menos em parte, da propria infecção ou malignidade da doença? Esta supposição parece provavel quando se considera que ha paralysias de sensibilidade e de movimento evidentemente determinadas pela diph- theria independentemente do estado asphyxico. MEM. DA ACAD.— | .º CLASSE—-T. UI. P. 1. (1 82 ; ESTUDOS SOBRE A anesthesia do quarto periodo ou asphyxico do crup começa a manifestar-se na pelle dos membros, e depois vai apparecendo succes- sivamente no resto do corpo, que chega a ser invadido totalmente, tanto no crup como nas outras doenças dos orgãos respiratorios em que ha difficuldade na hematose. Primeiro apparece a anesthesia te- gumentar, segue-se-lhe a anesthesia especial de cada um dos orgãos dos sentidos, e por fim a anesthesia dos sphincters, que explica a saí- da involuntaria das materias fecaes e das urinas. Dura em quanto se conserva o obstaculo á entrada do ar no pulmão, e augmenta ou di- minue com a desobstrucção da larynge ou dos bronchios. Cessa ou di- minue depois da administração de um emetico seguido de vomito, com a expulsão de alguma falsa membrana ou mucosidades, que dei- xem mais desembaraçadas as vias respiratorias; desapparece logo de- pois da tracheiotomia, quando com esta operação se restabelecem as funcções da hematose. Os caracteres das urinas n'este periodo da nei são os seguin- tes: em alguns doentes, quando são excretadas, apparecem neutras ou ligeiramente acidas, turvas, esbranquicadas, leitosas, o que fez suppôr a alguns medicos (Double, Schwilgué e outros) que este estado depen- dia de serem evacuadas pelas urinas as falsas membranas da larynge no estado pulverulento. N'aquelle caso depositam copioso sedimento que é formado por granulações de urato de soda amorpho, e que é so- luvel em leve calor no acido nitrico, clarificando-se o liquido. Nos dois terços dos casos de crup as urinas tratadas pelo calor e pelo acido nitrico dão um precipitado albuminoso. A albuminuria no garrotilho, e nas affecções diphthericas em ge- ral, foi primeiro mencionada, ha quasi vinte annos, pelo sr. Rayer ; mas a observação d'este medico ficou esquecida até ultimamente, quan- do o sr. Lorain a referiu na sua these de concurso. O sr. Sée obser- vou-a de novo em fevereiro de 1857, e, suppondo ser o primeiro n'es- ta observação, annunciou o resultado do seu estudo á Sociedade dos hospitaes, e á Sociedade medica do segundo bairro de París, em maio e junho de 1858; foi depois assignalada pelo dr. Wase no verão de 1858, e melhor estudada pelos srs. Bouchut e Empis n'este mesmo anno. Do estudo especial d'estes dois medicos, resultou uma memoria sobre a albuminuria no crup e nas doenças diphthericas, que foi apre- sentada á Academia das Sciencias de Paris na sessão de 2 de novem- bro de 1858. Desde então comecei a estudar aquelle phenomeno em todos os casos de crup e anginas diphthericas, em que me foi possi- O GARROTILHO 83 vel examinar as urinas, e publiquei o resultado das minhas observa- ções, então ainda pouco numerosas, na Gazeta Medica de Lisboa em 27 de dezembro de 1859, n'um artigo— Da albuminuria no crup, e da sua importancia nas afjecções diphthericas e na operação da tracheio- somia determinada pelo garrotilho—no qual convidava ao mesmo es- tudo os meus collegas. Este artigo vem citado na excellente memoria sobre albuminuria do sr. Sigismund Jaccoud (Des conditions pathoge- niques de Palbuminurie. Paris 1860). De tres causas póde depender, segundo os srs. Bouchut e Empis, a albuminuria no crup e anginas pseudo-membranosas. 1.º Da escarlatina, quando esta febre precede, acompanha ou segue a diphtheria. N'este caso, se a albuminuria apparece nas cir- cumstancias em que ordinariamente se vê n'aquella febre eruptiva, isto é, no tempo da descamação, deve naturalmente attribuir-se á es- carlatina. 2.º Da congestão renal determinada pelo crup asphyxico. N'este caso, como nas doenças organicas do coração acompanhadas de estase sanguinea geral, na eclampsia, tosse convulsa, no principio de algumas doenças inflammatorias, como talvez mesmo na escarlatina, etc., a al- buminuria parece-lhes resultar da congestão renal produzida pela as- phyxia. Para provar que a asphyxia e a congestão nos rins produz a albuminuria basta repetir, que a estrangulação em cães, e as conges- -tões artificialmente feitas nos rins, determinam o apparecimento da albumina na urina, como já desde 1842 e 1843 foi estabelecido pe- las experiencias de M. Robinson, ligando as veias renaes e vendo ap- parecer depois albumina nas urinas (47 inquiry into the nature and pathology of granular disease of the hidney and its mode of action in producing albuminous urine. London 1843. — Rescarches into the con- nection existing between an unnatural degree of compression of the blood contained in the renal vessels and the presence of certain abnormal mat- ters in the urine. London, medical gazette, 1843, p. 154), e como entre nós foi tambem experimentalmente provado pelo nosso sabio col- lega e amigo, o sr. dr. Bernardino Antonio Gomes (memoria sobre a molestia de Bright, 1854); e basta em fim lembrar que, no crup, res- tabelecida a hematose pela tracheiotomia, pára a albuminuria, algu- mas vezes em pouco tempo. 3.º Do estado geral que acompanha a diphtheria, qualquer que seja a sua sede, ou talvez da absorpção puriforme dos productos diph- thericos, por um modo analogo ao que acontece na absorpção purulen- ta, na qual, conforme a indicação de Felix d'Arcet, apparece a albu- 11+ 84 ESTUDOS SOBRE minuria logo que a absorpção do pus começa a effectuar-se, e se mos- tra a infecção. N'aquelle meu escripto, já citado, dizia eu não ter encontrado a albuminuria em doentes diphthericos sem crup. Hoje, habilitado com um numero muito maior de observações proprias e dos collegas a quem pedi cooperação no mesmo estudo, posso dizer, que ha casos de diph- theria sem garrotilho, em que se tem achado albuminuria mais ou menos copiosa, assim como factos de crup sem albumina nas urinas. Como prova apresentarei varias observações, que se referem : 1.º a anginas diphthericas sem crup com albuminuria ; 2.º a anginas diph- thericas sem crup e sem albuminuria ; 3.º a anginas diphthericas com garrotilho e com albuminuria; 4.º a anginas diphthericas com garro- tilho e sem albuminuria; e 5.º a crup sem angina diphtherica e sem albumina nas urinas. Estas observações servirão ainda de exemplificar o modo de invasão, os symptomas, a marcha, as fórmas e outras cir- cumstancias importantes da historia da diphtheria. 1º Observação— Angina diphtherica em uma menina de 8 annos e 9 mezes; albuminuria ao quarto dia, a qual se prolongou por doze dias em quanto houve falsas membranas na pharynge; phenomenos se- cundarios; cura. M. F. €. de 8 annos e 9 mezes, habituada quasi to- dos os annos a inflammações simples da garganta, mas de boa consti- tuição, estando havia mais de um mez na Porcalhota, sentiu certa in- disposição, abatimento, e depois dôr na amygdala direita com engor- gitamento da parte de fóra, em 15 de julho de 1860. No dia 18 de tarde, ligeira dôr de garganta do lado esquerdo.. Pelas duas horas da tarde de 19 frio forte, a que se seguiu, duas horas depois, calor febril intenso e vomitos ; de noite, muita agitação e insomnia; de madrugada, novos vomitos. Na manhã de 20 veiu para Lisboa, rua da Gloria n.º 7, onde foi tratada pelo sr. dr. Bernardino Antonio Gomes e por mim, notou- se-lhe uma falsa membrana na amygdala esquerda, que successivamen- te se estendeu á uvula, amygdala direita, pilares e pharynge, com inchação exterior das amygdalas, e engorgitamento dos ganglios sub- maxilares, febre moderada. As urinas, quotidianamente analysadas com o acido nitrico duas vezes no dia, só denunciaram albumina no dia 23 de manhã (quinto dia de doença) quando-as falsas membranas estavam no maximo desen- volvimento, apesar de duas energicas cauterisações diarias com nitra- to de prata em substancia. No mesmo dia á noite as urinas não dão O GARROTILHO 85 albumina, mas esta apparece de novo no dia seguinte de manhã e continua abundante até o dia 4 d'agosto, em que deixa de se notar, tendo existido doze dias, sendo todavia menor a quantidade nos ulti- mos cinco. Coincidiu a sua diminuição com a declinação das exsuda- ções pseudo-membranosas, e a sua terminação com o desapparecimento dos ultimos vestígios de falsas membranas na pharynge. N'aquella occasião em que o acido nitrico não deu precipitado al- buminoso, tendo-o dado de manhã, não verificámos por meio do tannino se as urinas davam. o deposito gelatiniforme que caracterisa a a/bumi- nose, producto isomerico da albumina ; e portanto ficámos em duvida se a albumina eflectivamente desapparecêra, ou se apenas se transfor- mára em um corpo de caracteres physicos e chimicos diversos, mas da mesma composição elementar. Ainda tinha falsas membranas na pharynge, mas já no fim da doença, começou a ter dôres fortes ao longo das pernas, que muito a incommodavam, sobre tudo de noite. Quasi pelo mesmo tempo quei- xou-se de certa fraqueza na vista, que depois se aggravou a ponto de não poder lêr. Aos quatro ou cinco dias de convalescença sentiu dif- ficuldade na deglutição especialmente das substancias liquidas, que lhe davam repetidas vezes no goto. Os phenomenos primeiro manifestados cessaram doze dias depois. A paralysia do veo palatino e pharynge, que motivavam a difficulda- de na deglutição, estava dissipada aos vinte dias. A amblyopia persis- tiu quarenta dias. O tratamento consistiu nas cauterisações energicas com o nitra- to de prata duas vezes ao dia, depois de despegar as pseudo-membra- nas, e nas applicações de mel rosado e alumen (partes iguaes) nos in- tervallos das cauterisações. Depois a este mesmo topico juntou-se o enxofre sublimado. Internamente tomou a principio dois emeticos e o chlorato de potassa; do quinto dia em diante, depois de manifestada a albuminuria, sulphato de quinina e perchlorureto de ferro. N'esta doente, pois, em que a larynge esteve sempre inteiramen- te intacta, houve albuminuria, que parecia indicar, em quanto existiu, a infecção diphtherica. 2.º Observação— Angina diphtherica em uma rapariga de seis annos; albuminuria; paralysia do vêo palatino; accidentes typhoides cinco dias depois de terem cessado os outros padecimentos ; morte. A observação seguinte pertence a uma doente da clinica medica da Escóla de Lisboa, que vi durante toda a sua molestia, tendo sido 86 ESTUDOS SOBRE tratada pelo meu collega e amigo, professor da respectiva cadeira, o sr. dr. May Figueira, e a observação escripta pelo sr. Manuel Bento de Sousa, então estudante do quinto anno, a quem a doente estava en- carregada. A Amelia Rosalina, de seis annos, temperamento lymphatico-san- guineo, constituição boa, residente em Lisboa, d'onde era natural, en- trou no hospital de S. José em 22 de maio de 1860 atacada de angina diphtherica. Até o dia 25, em que tomei conta da doente, diz o sr. Sousa, nunca apresentou symptomas de que o mal tivesse chegado á laryn- ge. As amygdalas e parte do véo palatino estavam revestidas de fal- sas membranas, havia grande tumefacção dos ganglios lymphaticos sub- maxillares, estado phlogistico intenso, e o estado geral condizia com essa intensa inflammação. Desde o dia 22 até o dia 25 tinham sido empregados contra a doença os vomitivos, as cauterisações com nitrato de prata, o chlorato de potassa internamente, e este ultimo com mel rosado localmente. Dia 25 de maio, 6.º da doença. O estado inflammatorio tem di- minuido na sua intensidade. A face está injectada, a pelle quente e secca, e ha intumescencia dos ganglios submasxillares, porêm menor do que havia sido. A lingua está um pouco saburrosa, e ha difficuldade de deglutição; o pulso, não muito cheio, dá 100 pulsações por minu- to; não ha perturbação dos actos respiratorios. A doente inquieta-se muito com os exames por que tem de passar. As amygdalas, a uvula, e uma parte do véo palatino estão cobertas d'uma camada pseudo- membranosa, lisa e acinzentada, e toda a mucosa proxima muito ver- melha. A urina é albuminosa. Tratamento—Tartaro emetico e ipecacuanha em dóse vomitiva, duas vezes por dia; cauterisação com azotato de prata pela manhã e á tarde; chlorato de potassa em agua distillada (ama oitava para uma libra) uma colher, das de sopa, de hora a hora ; alumen e mel rosado para topico. Dieta—Caldo de gallinha com pouco arroz. Dia 26— A doente está mais quieta; em quanto ao mais o mes- mo. Vomitou. Continúa a albuminuria. O mesmo tratamento e dieta, mas as cauterisações são quatro em vez de duas. Dia 27-— Menor intumescencia dos ganglios submaxillares, menos calor de pelle, e nenhuma injecção da face, pulso fraco e não frequen- te. A doente está abatida. As falsas membranas não téem progredido em extensão, mas a parte invadida está em alguns pontos escura e O GARROTILHO 87 sangrenta. Continúa a albuminuria. O mesmo tratamento; a mesma dieta, e mais quatro oncas de marmellada. Dia 28-—Vomitou muito; o estado geral não peiorou ; as amy- gdalas estão mais limpas de falsas membranas ; o engorgitamento dos ganglios tem diminuido. Continúa a haver albuminuria na urina, cuja densidade é de 1022 pelo urinometro de Prout. O mesmo tratamen- to e dieta. Dia 29— A densidade da urina é de 1014. No mais não ha al- teração. y . Dia 30-— Nenhuma inchação dos ganglios; as falsas membranas vão-se dissipando. A doente está fraca, a sua voz é toda nasal, e ex- pelle pelo nariz parte dos liquidos que lhe são dados a beber. Conti- núa a albuminuria. Tratamento: chlorato de potassa tres vezes por dia; cauterisações duas vezes; mel rosado com alumen para topico. Augmenta-se a alimentação. Dia 31 — Ainda' abatimento de forças; calor normal da pelle ; pulso regular. As falsas membranas occupam dois pontos limitados aos lados da linha mediana. Hoje a urina tratada pelo acido nitrico dá um precipitado abundante, que se fórma no meio d'uma grande effer- vescencia. A urina é muito fétida, e examinada ao microscopio apre- senta certa quantidade de vibrides, muitos crystaes de diversos saes, alguns cylindros (fibrinosos ou epitheliaes?) e muitos leucocytos. En- tre os crystaes predominam os de phosphato de soda e magnesia, e os de urato de soda. O mesmo tratamento e dieta, Dia 1 de junho—A doente está menos abatida. Continúa a voz nasal, bem como a saída ou expulsão dos liquidos pelo nariz. Apenas existe uma porção de pseudo-membranas no véo palatino, á direita da linha mediana, tendo proximamente 5 millimetros de comprimento so- bre 2 de largura. A urina dá um precipitado como o de hontem, e tem 1024 de densidade. Dia 2—O ponto membranoso occupa menos extensão. O aspecto da doente é bom. A urina tratada pelo acido nitrico não apresenta ef- fervescencia, e dá apenas um ligeiro precipitado albuminoso ; a sua densidade é de 1024. Examinada ao microscopio, mostra os mesmos caracteres do dia 81. Tratamento: continúa com o chlorato de potas- sa, e é cauterisada uma vez. Dieta de carne com duas onças de vinho ao jantar. : Dia 3—O estado geral é satisfatorio; o véo palatino está limpo de falsas membranas ; a voz é ainda nasal. A urina contêm mui pou- ca albumina, alguns vibriões, cylindros (fibrinosos ou epitheliaes?) e 88 ESTUDOS SOBRE crystaes de urato de soda. Tratamento : chlorato de potassa. A mes- ma dieta. j Dia 4—O mesmo estado de hontem. A urina sem albumina, é neutra, tem 1020 de densidade, e apresenta ao microscopio grande quantidade de crystaes de phosphato de ammonia e magnesia ; não se observam os cylindros. | Dia 7—Voz ainda nasal; estado geral bom. Pára com reme- dios. Dia 8 -—Parece boa, levanta-se. Dia 12— Algumas dôres no epigastro ; eructações acidas. Recei- ta-se-lhe subnitrato de bismutho. Dia 18—A doente está muito inquieta, com a pelle quente, mas não muito secca, e com o pulso a 120. A lingua está pouco saburro- sa. Queixa-se de dôr em todo o ventre, e fortissima no epigastro. Mis- - tura salina simples, chá de semente de linho ; linimento de sabão com opio e cataplasma de linhaça sobre o ventre. Dieta de caldos. Dia 14-— Está melhor e sem dôr alguma ; tem uma grande aph- tha no labio inferior. A urina é fétida, pouco copiosa, dando com o acido nitrico um precipitado abundante (albuminiforme), o qual se dissolve com grande effervescencia em excesso d'acido. A urina tem de densidade 1026, e tratada pelo calor e acido nitrico não dá albu- mina. O mesmo tratamento de hontem. Dia 15 -— Onze horas da manhã. Estado typhoide pronunciadissi- mo (houve delirio de noite), face cyanosada, respiração estertorosa, pul- so filiforme, membros frios, anciedade extrema, dór em todo o ventre, tympanite. Vomitos e diarrhea de uma materia abundante, amarella- - da e fetida. A urina como hontem. Horas antes fôra prescripto o seguinte tratamento : mistura sa- lina simples, limonada sulphurica para bebida ordinaria, dez sangue- sugas no epigastro, linimento de sabão com opio, e cataplasma de li- nhaça feita em cosimento de folhas de meimendro, verbasco e cabe- cas de dormideiras. A doente fallece ao meio dia. Autopsia— Cyanose das paredes abdominaes, face e pescoço. Olhos encovados. Vestigios da saída de: serosidade sanguinolenta pela boca e nariz. Não muita serosidade no interior do craneo. Congestão sangui- , Dea do cerebro; a substancia branca parece como salpicada de pontos vermelhos. ; Pulmões muito hyperemiados, pleuras muito ecchymosadas. La- rynge com paredes duras, espessas e um tanto deformadas; mucosa O GARROTILHO 89 tracheial muito vermelha, não desapparecendo esta vermelhidão pela lavagem. Coração normal. Ventre muito volumoso, com muitos gazes e pouco liquido; ganglios mesentericos um pouco intumescidos; intes- tino delgado ecchymosado, contendo quatro ascarides lombricoides com 3 decimetros (proximamente) de comprimento, e perto do intestino cego um tricocephalo. No duodeno uma grande eechymose, e algumas tambem no estomago. Intumescencia lívida dos folliculos de Brunner. Figado duro e descorado. Rins bastante congestionados. » 3.º Observação— Angina diphtherica extensa e grave em uma se- nhora de 25 annos, sem albuminuria; cura em nove dias. D. L. B.V. M., de 25 annos, casada, temperamento lymphatico, constituição fraca, na- tural do Maranhão, residente na travessa da Estrella n.º 2, 2.º andar; apesar de fraca, nunca soffreu senão alguns incommodos de estomago. No dia 15 de setembro de 1859, estando constipada havia dois dias, sentiu muito frio, febre, dôr de cabeça, e depois, de garganta, diffi- culdade na deglutição e engorgitamento doloroso no lado esquerdo do pescoço debaixo do angulo da maxilla. Vi-a no dia 16 á noite, e já ti- nha manifesta angina diphtherica, que invadia a amygdala esquerda e parte do véo do paladar, com grande apparato febril. A diphtheria nunca chegou á larynge, mas estendeu-se com bastante intensidade das amygdalas aos pilares, a todo o véo palatino e a grande parte da pha- rynge. As urinas examinadas com o acido nitrico, duas vezes no dia, nunca apresentaram o menor precipitado albuminoso. A acção do ca- lor deu o mesmo resultado negativo. A doente estava curada em 24 de setembro, ao nono dia de doença, por meio das cauterisações muito energicas com o nitrato de prata solido, applicações repetidas de alu- men, e depois de glycerina, nos intervallos das cauterisações, gargare- jos de limonada chlorhydrica, e internamente os emeticos de ipecacua- nha no principio, seguidos do chlorato de potassa, de que chegou a tomar duas e meia onças. 4. Observação— Angina diphtherica extensa em uma menina de 7 annos, sem albuminuria; cura ao decimo dia. D. M. D., moradora no pateo do Thorel, de 7 annos, lymphatica, fraca, vaccinada, nunca teve nenhuma febre eruptiva. Soffreu uma diarrhea depois da idade de 1; anno, quando se desmamou. Esta molestia durou um anno com - pequenos intervallos, melhorando depois com os banhos do mar. Des- «de a idade dos 3 a 4 annos tem passado bem, apesar de magra. No dia 11 d'agosto de 1860 sentiu molleza geral, quebramento de cor- MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE T, IH. P. I. 12 90 ESTUDOS SOBRE po, febre e uma certa impressão na garganta. A 13 vi cobertas de falsas membranas as amygdalas e uvula, alguma febre, sem tosse nem fastio, que veiu depois. As urinas turvas, sem albumina. A diphthe- ria estendeu-se ao paladar e a toda a garganta. No dia 19 estava já apyretica, tinha appetite, as pseudo-membranas achavam-se quasi dis- sipadas ; e no dia 21 estava curada. O tratamento foi topicamente o das cauterisações com o nitrato de prata crystallisado em dissolução (duas oitavas a meia onça por uma onça d'agua distillada) duas vezes ao dia, alumen e mel rosado, tannino em dissolução (duas oitavas por on- ca d'agua); internamente o emetico d'ipecacuanha no primeiro e se- gundo dia, o chlorato de potassa em quanto houve falsas membranas, e por fim o ferro. 5.º Observação— Angina diphtherica em uma menina de 6 annos, sem albuminuria ; cura ao oitavo dia. Uma irmã da doente da obser- vação precedente, de 6 annos, que dormia no mesmo quarto, apesar de removida, logo que os primeiros symptomas de angina pseudo-mem- branosa se manifestaram em sua irmã mais velha, apresentou tambem os symptomas de uma angina da mesma natureza, com falsas mem- branas nas amygdalas, pilares e véo palatino, sem comtudo terem tan- ta extensão. As urinas nunca apresentaram, como n aquella observa- cão, vestigio-algum de albumina. A doença curou-se em oito dias com o mesmo tratamento alli indicado ou pouco differente. 6.º Observação — Angina diphtherica em uma mulher de 57 an- nos, sem albumina nas urinas; cura ao oitavo dia. A aia da menina, que faz objecto da observação precedente, e que foi sua enfermeira constante, quando ella entrou em convalescenca, foi acommettida da mesma molestia, que se annunciou no dia 21 d'agosto de 1860 por uma tontura de cabeca com fraqueza das pernas. No dia 25 repetiu a tontura de cabeça com cephalalgia, abatimento geral, febre a que se seguiu dôr de garganta e inchação exterior debaixo do angulo esquer- do da maxilla. No dia seguinte encontro falsas membranas na amygdala e pilares do lado esquerdo, que se dissiparam completamente em oito dias com o nitrato de prata fundido e em dissolução, com as appli- cações de alumen, e uso interno do chlorato de potassa, seguido das preparações de ferro e quinina para remediar a notavel prostração em que a doente ficou durante vinte a vinte e cinco dias. Não teve em todo o decurso da molestia-albumina nas urinas. x O GARROTILHO 91 7.º Observação— Angina diphtherica seguida de crup em uma menina de 4 annos; albuminuria ao quarto dia de doenca antes dos signaes da diphtheri ia laryngea ; intoxicação; morte ao sexto dia sem symptomas asphyxicos. A observação seguinte é de uma doente, que vi com o meu ami- go e collega, o sr. Augusto Cesar Alves de Azevedo, por quem foi escripta. ; « Maria Luiza Pereira, ly amp 4 annos, constituição fraca, vac- cinada, nunca teve bexigas, nem sarampo, nem escarlatina. Em mar- co d'este anno teve um tumor inflammatorio no interior da garganta, de que se curou com emollientes topicamente, um laxante e dieta. No dia 8 de maio de 1860 teve alguma tosse sem nenhum outro in- commodo, a qual durou até 11 ás oito e meia da noite, em que foi acommettida. de febre violenta; á meia noite sobreveiu intensa cepha- lalgia com grande desassocego, que durou toda a noite, e observou-se intumescencia no collo; no dia 12 a febre e a cephalalg ia diminuiram muito, mas de tarde a febre augmentou com pêso de cabeça; no dia 13 passou melhor da febre e da cabeca, mas de manhã teve uma li- geira cpistaxis, espirrou muito; respiração nasal embaracada, corri- mento de muco pelas ventas, suor, fastio, pouca sêde; appareceram chapas membranosas na garganta. Na noite de 13 para 14 somno le- ve alternado com grande inquietação. “A's 9 horas da manhã do dia 14 vi a doente pela primeira vez, e achei o seguinte: amygdalas e uvula cobertas de falsas membranas de um amarello esbranquiçado, molles, não espessas, com vermelhi- dão nas partes visinhas, e alguma difficuldade na deglutição (sympto- ma que durava desde o dia 12), e dôr, corrimento de muco das fos- sas nasaes, respiração estertorosa,. sem tosse, sêde, anorexia, 132 pul- sações, engorgimento dos ganglios submaxillares, mas não pronuncia- do; calor de pelle, mas não exaggerado; nem o halito nem o muco nasal tem mão cheiro. Prescrevo : tartaro emetico grão e meio, em 4 papeis, para tomar já de 10 em 10 minutos um papel em meia on- ca dagua tepida até vomitar bastante; uma hora depois de vomitar, começou a tomar 12 grãos de chlorato de potassa em julepo gommo- so; caldos de vitella. A” uma hora da tarde, decide-se de accôrdo com o sr. A. M. Barbosa, que foi chamado a conferencia, que se applique o nitrato de prata de modo, que as falsas membranas sejam descolla- das, e cauterisados em acto successivo os tecidos subjacentes, que se continue com o chlorato alternado com as applicações nas fauces de mel rosado (uma onça) junto com o alumen (quatro oitavas), e que fos- 12+ 92 ESTUDOS SOBRE sem substituidos os caldos de vitella pelos de vacca, pela grande ten- dencia, que esta doença tem para a adynamia. O sr. Barbosa applicou immediatamente o nitrato de prata do modo acima dito, e viu-se que as falsas membranas se despegavam facilmente acudindo logo aos la- bios, após a operação, uma parte com a saliva, e vindo outra em de- tritos pegada á pedra. A doente depois do emetico tinha vomitado juntamente com agua e bilis porções de pseudo-membranas. Dez horas ah noite—Tem dormido socegada, menos sêde, as fau- ces detergidas em parte, corrimento nasal de muco, deglutição mais facil, respiração estertorosa, está alegre e entretida nos seus brinque- dos: cauterisação, chlorato e aus Dia 15 ás 7 horas da manhã— Dormiu de it ás seis da ma- nhã ligeira epistaxis, tosse curta, as fauces como hontem, está ale- gre; tratamento o mesmo. Quatro horas da tarde— A's 11 da manhã teve respiração an- ciosa, que foi seguida de dyspnéa, a qual terminou pela expulsão de uma falsa membrana ; as falsas membranas têem-se reproduzido para a amygdala e pilares do lado esquerdo ; obrou duas vezes, fezes duras. As urinas, que têem sido analysadas desde o comeco com o acido nitrico, dão agora uma leve camada d'albumina; 132 pulsações, appe- tite. Tratamento o mesmo. Caldo com sôpas. Nove horas da noite—Fauces detergidas em parte, tem dormi- do, voz um pouco rouca; as urinas têem uma camada mais densa de albumina. Repito a applicação do nitrato, e prescrevo para já 6 grãos de ipecacuanha de 10 a 10 minutos em meia onça d'agua tepida até vomitar, e que continue depois com o tratamento antecedente. Dia 16 ás seis horas da manhãi— O emetico fez muito pouco effei- to, mas assim mesmo vieram parcellas de membranas, ainda que em mui: pequena quantidade; tem tido pouca sêde; continúa a suar; teve uma pequena epistaxis; tem engolido sem difficuldade; dormiu de noi- te; voz mais rouca; a tosse apresenta o mesmo caracter de rouqui- dão; a uvula e a metade inferior de amygdala esquerda forrada outra vez com uma pseudo-membrana amarellenta e molle, mas não feti- da; corrimento hasal o mesmo, assim como o engorgitamento do col- lo; a urina apresenta uma camada mais densa de albumina. Não quer sópas, pede pão de ló, que se lhe concede. O mesmo tratamento. Onze horas da manhã— Consulta com o sr. A. M. Barbosa, pres- creve-se de 10 em 10 minutos meia onça da pocão seguinte; agua distillada, 4 onças; ipecacuanha, 20 grãos; tartaro emetico, 1 grão; xarope de ipecacuanha, uma onça: até vomitar sufficientemente; caute- O GARROTILHO 93 risa-se com o nitrato de prata antes do emetico; determina-se que to- me 4$ grãos de chlorato de potassa por dia em logar de 12, que tem tomado até agora; e que continue com o alumen. Quatro da tarde—Repetiu a epistaxis e em maior copia; ás 3+ da tarde vomitou bastante agua com detritos de membranas e muco; tem espirrado; obrou duas vezes naturalmente; está tranquilla, mas não alegre; reproducção das falsas membranas na parte inferior da amy- gdala esquerda e parte inferior da uvula, e um pouco para a direita, com o mesmo caracter que as outras. À camada albuminosa da urina pareceu-me mais densa e em maior quantidade. Voz e tosse o mes- mo; 132 pulsações. Cauteriso; continua com o chlorato e alumen. Nove e meia da noite— À epistaxis repetiu ás cinco horas. O mais o mesmo. Está a dormir socegada, 132 pulsações. A pedido dos pais não observámos as fauces visto a creança estar dormindo, e ter pas- sado um pouco melhor, segundo nos diziam. No dia-17 ás onze horas da manhã, ao entrar para casa da doente, sabemos que tinha fallecido, e foi-nos contado que tinha passado de noite com alguma dyspnéa, que depois lhe appareceram umas pintas rôxas na face, e que no resto da noite ficára socegada, sobrevindo es- tertor tracheial com todos os symptomas de morte, a qual tivera lo- gar tranquillamente ás 8 da manhã. Soubemos depois, que na vespera da morte, de tarde, o pai cha- mára um homeopatha, a cujo cargo esteve a doente desde esse mo- mento. A mãi, que desde o principio da doença não se tirou um só mo- mento de ao pé da filha, sem embargo dos seus trinta e tres annos, e da sua constituição forte, foi atacada de angina diphtherica ligeira, da qual se curou; não sabemos ao certo que meios empregou, mas temos certeza de que usou de uma medicina simples. Soubemos depois, que tambem fóra atacada violentamente da mes- ma doença a creada da casa, de quinze annos, saudavel, que raras ve- zes vinha ao quarto da doente, e onde pouco se demorava; foi tratar- se para sua casa e curou-se. » 8.º Observação— Angina diphtherica e crup em um rapaz de seis annos de idade; albuminuria; infecção diphtherica; morte sem agonia. * Esta observação de um doente, que eu tambem vi, foi igualmente redigida pelo assistente e meu collega, o sr. A. C. A. de Azevedo. « Alfredo, seis annos, lymphatico, constituição fraca, vaccinado; não teve escarlatina, bexigas, nem sarampo; de tempos a tempos inchava- 94 ESTUDOS SOBRE lhe o pescoço com caroços. Desde o dia 28 de maio proximo até 2 de junho teve tosse solta e humida, pouco frequente, mas andava alegre, brincava, e comia com appetite. No dia 2 de junho de 1860, ás oito horas da noite, foi acommettido subitamente de muita febre e vomi- tos com cephalalgia, dôr de garganta, fastio e sêde. Na noite de 2 para 3 passou o mesmo, mas de manhã a mãi achou-lhe o pescoço todo en- carocado, menos febre, alguma tosse. Dia 4— A dôr de garganta continuou de noite, vomitou de ma- drugada, tem suado pouco, pelo dia adiante melhor da garganta, me- nos febre, voz um pouco rouca. Fui chamado no dia 5 ás cinco horas da tarde, e achei o seguin- te: febre, fastio; lingua saburrosa, amarellenta; ganglios cervicaes, Es dulas submaxillares e parotidas, engorgitados; voz um pouco rouca; nada de epistaxis, nem corrimento nasal; amygdalas e pilares cobertos de uma falsa membrana, amarellenta, radar e adherente. Agua dis- tillada, 4 oncas; emetico, 1 grão; ipecacuanha, 20 grãos; xarope de ipecacuanha, uma onça. Para tomar de 10 em 10 minutos meia onça até vomitar bastante. Tres quartos de hora depois de lançar, caldo de carne simples, e principie a tomar meia onça da poção seguinte de tres em tres horas: julepo gommoso, 4 onças; chlorato de potassa, 4 escropulos. Antes do emetico appliquei nas fauces uma zaragatôa composta de: mel rosado, uma onça; alumen, 4 oitavas; que mandei continuar de seis em seis horas; e prescrevi de tres em tres horas o caldo no in- tervallo do chlorato; em seguida á applicação da zaragatôa vieram fal- sas membranas desfeitas em parcellas, a voz ficou menos rouca. Dez da noite—Tomou quasi todo o vomitorio, mas evacuou mui- to pouco; no liquido vomitado veêm-se detritos de falsas membranas, e alem d'isso, expulsou com tosse tres pelliculas duras, das quaes a maior e a mais dura tem a espessura de um millimetro e é de côr parda; suou e dormiu; voz quasi natural; fauces um pouco detergidas. Cauteriso com nitrato de prata, e em seguida applico a zaragatõa, a que se segue tosse curta, que parece vir da garganta, e expulsa restos de falsas membranas com algum sangue; 116 pulsações; as urinas ana- Iysadas com acido nitrico inostram bastante albumina. Continue com o chlorato de tres em tres horas, no intervallo o mel rosado e alu- men topicamente. Dia 6— Dormiu de noite. Não pude observar as fauces. O collo melhor; voz menos clara. Urinas o mesmo. Repito a applicação do ni- trato de prata, e do mel rosado em seguida; e logo houve expulsão de - O GARROTILHO 95 reliquias membranosas. Queixou-se de dôr e comichão nos ouvidos. A” noite, fauces mais detergidas; dormiu; 108 pulsações. Continua a albumina nas urinas. Repito o nitrato de prata, e o mel rosado em seguida, como pela manhã, com o mesmo resultado. Continue com o mesmo tratamento e dieta. Dia 7—Dormiu de noite. Pede chá. Voz menos clara. Alguma sêéde. Menos albumina nas urinas. Melhor do pescoco. Não tem obra- do; mais esperto; tem emmagrecido sensivelmente; a pseudo-membra- na tem-se reproduzido em parte. Continua a expulsar detritos de fal- sas membranas algumas vezes depois da zaragatõa, e ultimamente uma pequena pellicula, molle e menos espessa; pulso apyretico, fraco. Dia $ ás onze horas da manhã— Não tem obrado ha dias. Dormiu de noite. Voz o mesmo. Corrimento mucoso nasal. Albuminuria o mesmo. A garganta mais coberta de falsas membranas. Tem expelli- do poucos detritos, e pellicula nenhuma. Pede leite. Tratamento: 24 grãos de ipecacuanha em quatro porções para tomar de dez em dez minutos até vomitar bastante. Depois do emetico, continue o chlora- to e o mel rosado com o alumen; toquei as fauces com o nitrato de prata uma hora antes do emetico. Agua com leite para bebida ordina- ria. Clyster de: agua morna 6 onças, azeite uma onça, sal uma colher, das de chá. ' Dia 9 ás dez horas da manhã — Dormiu de noite, obrou fezes du- ras em seguida ao clyster; vomitou muito pouco apesar de tomar to- do o emetico; não vieram pelliculas com o vomito, nem depois. A pri- meira vez que bebeu a agua com leite vomitou o leite em coalhos; muito melhor das fauces; não pude analysar a urina; pede café com leite; toco com o nitrato de prata, e vem detritos. O mesmo trata- mento afóra o emetico. Café com leite. Uma hora da tarde — Appareceram petechias no pescoço. Tres da tarde— Morte sem agonia. » 9.º Observação— Angina e coryza diphthericas, e garrotilho em um menino de quatro annos ; albuminuria; cura ao decimo quinto dia. D. R.sS.€C., de quatro annos, boa constituição, morador na calçada de Arroios, foi acommettido de angina pseudo-membranosa, a qual come- cou depois de uma hemorrhagia nasal, que appareceu pelas oito horas da tarde do dia 8 de julho de 1859. No dia seguinte reappareceu a epistaxis pela mesma hora. No dia 10, febre, inquietação, alguma dôr de garganta; no dia 11, rouquidão; a 12, inchação dos ganglios cervicaes e das glandulas submaxillares; a 13, tosse rouca. Em 15 do mez, tosse 96 ESTUDOS SOBRE secca e aspera, respiração ruidosa, voz mui rouca e abafada, suffoca- ção. Foi n'este dia pelas cinco horas da tarde que vi o doentinho pela primeira vez; e achei a pharynge, amygdalas e véo do paladar, tudo coberto de falsas membranas, e albumina nas urinas. No dia 16, as producções diphthericas manifestaram-se tambem nas fossas nasaes. Com as cauterisações energicas feitas com o nitrato de prata so- lido ou dissolvido em partes iguaes de agua distillada, applicado á pha- Tynge e ás fossas nasaes duas a quatro vezes nas vinte e quatro ho- ras, no principio seguido dos vomitivos de ipecacuanha e tartaro eme- tico, uma a tres vezes por dia, como meio mechanico de expulsar as falsas membranas destruidas pelo caustico, e de desembaraçar a respi- ração; com as pa á garganta do alumen em pó com mel ro- sado na proporção de 1:2, de duas em duas horas, no intervallo das cauterisações; com o uso interno do chlorato de potassa em dissolução de duas a quatro oitavas por libra d'agua, para tomar duas onças de duas em duas horas; e em fim com uma alimentação apropriada con- segui que o doentinho entrasse em perfeita convalescença no dia 23 de julho, tendo a albuminuria cessado tres dias antes, quando já as falsas membranas eram mui limitadas. Este facto foi tambem observado pelos srs. dr. Barral e dr. Si- mas, que viram o doente em conferencia na noite de 16 de julho, con- tinuando o ultimo collega a vél-o ainda por mais alguns dias, e a au- xiliar-me em seu tratamento. 10.º Observação — Angina tonsillar pseudo-membranosa; garroti- lho ao sexto dia da molestia primitiva, em um menino de seis annos; asplipxia; albuminuria, que cessou ao sexto dia depois da operação da tracheiotomia; paralysias secundarias; cura. . Esta importante observação, redigida pelo meu estimavel amigo o Sr. dr. Simas, assistente do enfermo, refere-se a um dos meus ope- rados de tracheiotomia que tive a satisfação de vêr curado, apesar da gravidade do garrotilho e das doenças consecutivas. « F. morador na rua das Janellas-Verdes, de seis annos de idade, constituição delicada, pelle fina, olhos azues, e cabellos bastos e lou- ros. Atreito a constipações que lhe cahiam no peito, nunca teve outro padecimento. Foi sempre de pouco comer. Tem muita vivacidade e in- telligencia, e faz-se querido pela sua muita docilidade e meiguice. No dia 24 de novembro de 1859, andando até ahi de perfeita sau- de, conheceu-se-lhe alguma febre, molleza e fastio. No dia immediato queixou-se da garganta, custando-lhe engulir O GARROTILHO 97 e mover o pescoço. Comtudo a febre não era grande então. O pulso não dava mais de 90 pulsações regulares e brandas. O calor de pelle não era intenso. Respirava bem e sem tosse. À lingua estava um pou- co esbranquiçada e ponteada de rubro. Sêde quasi nenhuma. As amy- gdalas bastante inchadas e vermelhas, e como que estranguladas pelos pilares. Cada uma d'ellas tinha no centro uma falsa membrana do ta- manho de um botão de camisa, um pouco amarellada e já espessa. Por baixo do angulo da maxilla inferior do lado esquerdo achavam-se os gan- glios engorgitados, doridos, e edemaciado o tecido cellular ambiente. No terceiro dia, os symptomas geraes rem augmentaram nem di- minuiram; mas os locaes ganharam em extensão. As falsas membra- nas lavraram a ponto que no espaço de vinte e quatro horas tinham abrangido toda a superficie livre das amygdalas. Os pilares, circumdan- do-as d'um vivo encarnado, pozeram comtudo limites á sua forca ex- pansiva. E não só ganharam em superficie, como tambem augmenta- ram de espessura, circumstancia esta que tornava muito mais volumo- sas as amygdalas que já de si o eram bastante. Do terceiro ao oitavo dia da doença não fez ella differença para peior. Antes pelo contrario a febre diminuiu, a pelle refrescou, e a deglutição tornou-se facil. O edema do tecido cellular dissipou- sespe apenas se sentiam os ganglios. O estado das amygdalas é que sempre se conservou o mesmo. As falsas membranas se cahiam, era para se renovarem, não obstante o tratamento de que mais longe fallarei. Ape- sar de tudo, a creança estava alegre, tinha appetite, e dormia regu- larmente. Parecia pois que a molestia ía acabar. Mas no dia ultimo de novembro o doentinho, que dormíira inquieto toda a noite, acordou rouco, com tosse crupal e febre viva. As falsas membranas das amygdalas, evidentemente diminuidas de volume, ma- nifestavam signaes evidentes de absorpção, principalmente junto aos pilares, dos quaes »se haviam desviado um pouco por effeito da mes- ma absorpção, e a sua superficie era lisa, lustrosa e d'um branco opaco uniforme. Sem embargo, os novos symptomas foram crescendo rapidamen- te e manifestaram-se outros ainda mais assustadores: a tosse e a voz extinguiram-se, a respiração embaraçou-se, e finalmente appareceram accessos de suffocação que obrigaram a praticar a tracheiotomia no dia 2 de dezembro pela manhã. : O meu amigo A. M. Barbosa foi o operador, e o nosso collega Alves e eu ajudantes. A operação fez-se rapidamente, mas apresentou a seguinte par- MEM. DA ACAD— 1.º CLASSET. 1. P. 1. 13 98 ESTUDOS SOBRE ticularidade : não havendo sido possivel evitar o plexo venoso thyroi- deo, o sangue era tanto que duas esponjas não bastavam para enxu- gar a ferida. Não se podia pois dar um passo sem ligar as veias, o que era, não digo impossivel, mas difficillimo no meio d'aquelle mar de sangue. O operador então, sem se desconcertar e com todo o sangue frio, procurando com o dedo index da mão esquerda o amnel da tra- cheia que está logo por baixo da cartilagem cricoidéa, entra n'aquelle orgão com a ponta do bisturi, e, sem descontinuar, fende em um abrir e fechar d'olhos quatro anneis. Em seguida, dilatando com o mesmo dedo a solução de continuidade, por elle introduziu e collocou logo a canula dobrada. A hemorrhagia parou immediatamente, e, assentada a creança, o sangue, que havia penetrado nos bronchios, foi expulsado com violencia por uma tosse que durou alguns minutos. Pouco depois, a respiração operou-se mansa, tranquilla, lenta e sem ruido. Ainda as- sim, o doentinho perdeu muito sangue e ficou muito pallido. Fez-se- lhe o penso ordinario com adhesivo e o lenço de cassa á roda do pes- coco. Uma hora depois dormia a somno solto. D'ahi por diante o pulso socegou, e o calor do corpo diminuiu consideravelmente. A respira- cão só se embaraçava quando a canula se entupia. O appetite desen- volveu-se com forca, e a creança não tardou em recuperar a sua ale- gria habitual. No dia immediato ao da operação foram tiradas as canulas, e a ferida toda cauterisada assim como nos quatro dias seguintes por se haver apoderado d'ella a diphtheria. N'uma palavra, a doença, vinte e quatro horas depois da operação, pareceu entrar francamente no pe- riodo de declinação, por quanto as falsas membranas das tonsillas des- appareciam com rapidez, e a canula dava passagem frequente a fra- gmentos das mesmas embora de pequena dimensão, molles e quasi sem consistencia. “ Não obstante, a canula só pôde ser tirada sete dias depois da operação. Não me tinha lembrado procurar a albumina nas urinas, mas logo que chegou'o meu collega Barbosa, isto é, quando appareceram symptomas de garrotilho, por indicação sua foram analysadas, e en- controu-se-lhe uma grande porção, que a pouco e pouco foi diminuin- do até se extinguir ao sexto dia depois da operação. Esta creança parecia pois salva. Já se levantava, andava com des- embaraço e comia bem. Repentinamente, no dia 11 (nono da operação), sem causa apre- E O GARROTILHO 99 ciavel, apparece febre intensa (130 pulsações), muito calor de pelle, modorra profunda, sêde viva, e lingua sécca e um pouco escura no centro. Estes symptomas, que começaram de noite, diminuiram de ma- nha, para se renovarem na tarde immediata com igual força, princi- piando pelo esfriamento do nariz, pes e mãos. Durante o accesso custava muito a tirar a creanca da modorra ; a lingua seccava-se extraordinariamente, e a respiração estava muito alta e frequente; mas a auscultação não descobriu nunca symptoma algum de catarrho bronchico, ou de pneumonia lobular, que tanto eram de temer. Nos intervallos dos accessos o pulso baixava a 100, a lingua humedecia, dissipava-se a sêde, passava a modorra, e diminuia consideravelmente o calor do corpo. Assim continuou esta creança até o dia 22, em que os accessos se extinguiram, começando desde o dia 15 a diminuir gradualmente de intensidade. O pulso comtudo sempre ficára accelerado. No dia 23 o doentinho já com a ferida cicatrisada quiz levantar- se, mas não se pôde suster nas pernas. á No immediato nem se podia mover na cama, e chorava para que o mudassem de posição. Deitado, movia a cabeca de um para outro lado; mas assentado não a póde conservar em equilibrio. Tambem es- tando deitado, encolhia, estendia, e cruzava as pernas sem grande dif- ficuldade. Era pois evidente uma paralysia incompleta dos musculos do pes- coço, do tronco e dos membros inferiores. Nunca a comida deu no gôto a esta creança, que sempre poude engolir com facilidade. Esta segunda phase da diphtherite prolongou-se até o dia 20 de fevereiro, de que data a sua declinação, podendo já então mecher-se a creança na cama, mover, levantando, a cabeca e suster-se de pé a um canto da casa. A paralysia do pescoco foi a primeira a dissipar-se, e não te- ve mais de quinze dias de duração; depois foi a do tronco, mas não posso dizer com exactidão o tempo que durou; a ultima foi a das pernas. Porêm em todo este tempo, manifestavam-se accessos febris in- tensos e assustadores, e com muita irregularidade, que passavam fe- lizmente no fim de vinte e quatro horas. Uma noite o accesso teve explicação na phlogose dos ganglios do pescoço, que adquiriram rapidamente grande volume, não chegando comtudo á suppuração. 13+ 100 ESTUDOS SOBRE Por ultimo esta creança esteve quasi perdida em consequencia de um catarrho bronchico occupando uma grande extensão, com abun- dante secreção de liquidos, falta de respiração, febre, etc.; mas que cedeu ao tratamento revulsivo em grande escala. A albuminuria não reappareceu durante todos estes accidentes. Terminarei esta observação, que abreviei quanto me foi possivel, dizendo : , 1.º Que o tratamento da diphterite tonsillar consistiu simples- mente na applicação alternada, de hora em hora, do alumen e do tan- nino sobre as amygdalas. 2.º Que se administraram alguns vomitorios antes de se prati- car a tracheiotomia. 8.º Que os accessos foram combatidos com o quinino sem gran- de resultado. 4.º Que o ferro e uma boa alimentação formaram a base do tra- tamento da paralysia. 5.º E que nunca deixei de alimentar com leite, mais ou menos, “esta creanca. » [1.º Observação— Angina e coryza pseudo-membranoso ; intoxi- cação diphtherica; albuminuria, em um menino de quatro annos e nove mezes; tracheiotomia ao sexto dia de doenca; morte. A presente observação é de uma das ultimas operações de tracheio- tomia que pratiquei. F. M. B., de quatro annos e nove mezes de idade, tempera- mento lymphatico-nervoso, gosando sempre de saude, excepto ha dois annos na occasião em que teve sarampo, morador na rua de S. Bento, - foi acommettido no dia 16 de junho, pelas duas horas da tarde, de, uma forte dôr de cabeça acompanhada de ardente calor febril, que o obrigou a deitar-se. A estes incommodos seguiu-se promptamente uma forte convulsão manifestada com grande vermelhidão e contorsões da face, reviramento dos olhos e perda dos sentidos por espaço de um quarto de hora pouco mais ou menos. À febre continuou intensa até o dia seguinte, em que se manifestaram signaes de angina guttural a principio simples, mas logo no dia immediato diphtherica, e então ma- nifestada nas amygdalas. Ainda no terceiro dia, já o véo palatino e uvula estavam igual- mente affectados. No quarto dia a diphtheria tinha-se estendido á pha- rynge e ás fossas nasaes, sendo aqui precedida a sua invasão de epis- taxis, e seguindo-se de estado adynamico mui pronunciado. O doenti- O GARROTILHO 101 nho, tratado pelos collegas, os srs. Manuel Carlos Teixeira, Manuel José Teixeira e F. A. Namorado, tinha tido o seguinte tratamento: algu- mas cauterisações com nitrato de prata, applicações de mel rosado e chlorato de potassa, vomitivos de ipecacuanha e tartaro emetico, e por fim o perchlorureto de ferro como topico; e internamente, no ultimo dia, o sulphato de quinina e a limonada sulphurica. Mas apesar de tudo a doença progredia. No dia 21 de junho, sexto de doença, vi o doentinho pela primeira vez em conferencia com o meu amigo, o dr. Simas, e os collegas assis- tentes. Observámos-lhe então o seguinte : Face pallida; beiços arroxea- dos ; tendencia para o somno de que todavia se despertava facilmente ; grande prostração ; respiração curta, anciosa, aspera; não havia ataques de suffocação; alguma tosse rouca ; pulso mui pequeno sem frequencia notavel. Toda a parte da pharynge, que nos foi dado observar,. amy- gdalas, véo do paladar e base da lingua, estavam cobertos de falsas membranas acinzentadas, e tintos de sangue negro e liquido, que cor- ria para os dentes, gengivas e labios, manchando-os e dando-lhes o as- pecto fuliginoso. As ventas em parte entupidas com falsas membranas e crostas de sangue, que impediam a passagem do ar, davam igual- mente saída a um liquido sero-sanguinolento, ichoroso, isgtado de detritos diphthericos. Sêde muito intensa ; alguma soltura de ventre. As urinas, tratadas pelo acido nitrico, eram copiosamente albumino- sas. Algum fervor mucoso nos pulmões. Diagnosticámos unanimemen- Fes diphtheria com manifestações locaes multiplas na parte posterior da boca, fossas nasaes, pharynge e larynge, intoxicação diphtherica, asphyxia incipiente. Acordou-se em continuar o tratamento geral tonico, e o local pelas cauterisações com o perehlorureto de ferro; e ficámos de nova- mente nos reunirmos pelas: sete horas da tarde do mesmo dia. Por esta hora achámos o doente sem dar acórdo de si, em pro- fundo coma, face com a pallidez da morte, labios arroxeados, grande fervor laryngo-pharyngeo, respiração muito curta e difficil, pulso mui pequeno e frequente, com algumas falhas, mãos frias, anesthesia.. Vendo a creança insensivel e muito proxima a uma terminação fatal, e não achando nenhum outro recurso de que podessemos lançar mão, deliberámos unanimemente fazer a tracheiotomia, apesar de ver- mos o estado de manifesta intoxicação já tão adiantada ; porque, sendo parte d'este estado morbido devido á asphyxia, e não sendo sem exem- plo a cura da diphtheria com a intoxicação, seria ainda possivel, se bem que mui pouco provavel, salvar a creança. Pela minha parte dis- 102 ; ESTUDOS SOBRE | se-o então e repito-o agora, de oito operações de tracheiotomia * que ti- nha praticado no crup, em nenhuma como n'esta operei em tão más condições, nem com tão pouca confiança no resultado. Pratiquei com effeito em continente a tracheiotomia auxiliado pelos collegas, dr. Simas, Manuel Carlos Teixeira e F. A. Namo- rado. É A operação correu rapida sem consciencia do doente e sem ferir as veias do plexo thyroideo, que pude desviar para os lados sem dif- ficuldade. Não houve quasi uma gotta de sangue na ferida. Pela abertura da tracheia, logo que foi feita, saíu muito liquido em parte sanguinolento com detritos pseudo-membranosos, e pouco de- pois, com o auxilio da canula dobrada, a creança respirou melhor, o pulso desenvolveu-se algum tanto e regularisou-se, pôde conservar-se assentada, bebeu agua, etce.; mas de prompto reappareceu a prostra- cão, o estado comatoso, a pequenez e falhas do pulso, e o esfriamento dos membros. A respiração estava muito eniairaçada; e a introducção pela ca- nula até á tracheia da lanada de esponja humedecida, não provocava a expulsão das mucosidades dos canaes respiratorios, como aliás tão frequentemente se vê nos operados de tracheiotomia. Parecia que to- das as forças abandonavam o doente, que promptamente se aniquila- ria de todo. Não foi todavia assim, porque, decorrida uma hora ou pouco mais, com o auxilio de caldo quente com algumas colheres de vinho, de synapismos, etc., o pulso desenvolveu-se, a pelle aqueceu, a respiração desembaraçou-se mais, manifestou-se sêéde ; a creança reani- mou-se, bebeu caldo, agua simples e com leite ; assentou-se espontanea- mente na cama, etc. Esta melhora não foi todavia persistente, por- que, algumas horas depois, o estado do doentinho aggravou-se de no- vo, a prostração e aniquilação das forças cresceu de ponto, e a morte teve logar pela uma hora da manhã. 12.º Observação— Angina diphtherica e crup, sem albuminuria, em um menino de dois annos e cinco mezes; cura ao duodecimo dia. E. €. €. S., de dois annos e cinco mezes, temperamento lym- phatico, boa constituição, morador no largo do Terreiro, dois dias de- pois da morte de sua irmã que falleceu de crup, foi acommettido de uma intensa angina pseudo-membranosa, precedida de symptomas ge- ! Hoje, 16 de maio de 1861, em que vejo as provas d'esta folha, tenho praticado mais duas vezes a tracheiotomia como tratamento do garrotilho. O GARROTILHO OB raes e seguida dos phenomenos racionaes que se manifestam no segun- do periodo do garrotilho. A diphtheria foi bem evidente nas amygdalas, pilares, véo pala- tino e pharynge. As urinas tratadas todos os dias pelo acido nitrico, de manhã e á noite, nunca apresentaram albumina. - O doente curou-se em doze dias por meio de fortes cauterisações com a pedra infernal, duas vezes por dia, applicações de alumen, au- xiliados estes meios com os emeticos, e o chlorato de potassa interna- mente. | O meu amigo e collega, o dr. May Figueira tratou 'conjuncta- mente comigo este doente, e verificou tudo o que fica apontado. 13.º Observação— Angina diphtherica e garrotilho em um meni- no de quatro annos, sem albuminuria ; tracheiotomia no periodo asphy- xico; morte. Esta observação, que pertence ao meu collega, o sr. Theotonio da Silva, entra na collecção que deve fazer parte da minha memoria sobre a tracheiotomia. « Henrique Ferrari, de quatro annos, temperamento lymphatico, morador na calçada do Salitre. Sua mãi, diz o sr. Theotonio da Sil- va, é doente do peito, e a creança tinha tido por vezes febres com for- tes cephalalgias; e o seu antigo medico assistente desconfiava que ti- vesse tuberculos nas meninges. . No dia 19 de março de 1860 é acommettido de febre intensa, pelle muito quente e sécca, forte cephalalgia, lingua saburrosa, prisão de ventre, nauseas; não se queixa da garganta, nem os ganglios do - pescoço estão engorgitados, mas observo-a porque um dos seus irmãos tem uma angina tonsillar com placas diphthericas circumscriptas. Ao exame pois da boca posterior apresenta vermelhidão da uvula, amy- gdalas e pilares; nenhuma placa diphtherica ou pultacea. Mando ad- ministrar: calomelanos em dose de 3 grãos: de duas em duas horas, infusão de linhaça, caldo de frango. Dia 20— Menos febre, menos bata n ad evacuou quatro vezes, lingua pouco saburrosa; a uvula e arnygdalas têem pequenos laivos esbranquiçados, semitransparentes : ipecacuanha, chlorato de potassa, mel rosado e alumen para tocar a miudo a pharynge.. Dia 21 As manchas que hontem appareceram estão opacas, brancas, e forram completamente a: uvula e amygdalas, estendendo-se um pouco para as paredes lateraes da pharynge. Dia 22— As falsas membranas, que na vespera foram extrahidas, 104 ESTUDOS SOBRE reproduziram-se, avançaram para as paredes posteriores, e descem para as partes inferiores; a voz começa a ser um pouco rouca, alguma tosse. Tem appetite, e permittimos-lhe o uso de caldo de farinha. Toma no- vamente a ipecacuanha, com que se consegue vomito, expulsão de al- gum fragmento de falsa membrana, e mais clareza de voz. Dia 23-—— Desde hontem á noite a voz e a tosse são alternativa- mente roucas e crupaes. O doente é visitado frequentes vezes durante o dia; os symptomas do crup foram-se pronunciando cada vez mais, apesar do uso dos emeticos, extracção das pseudo-membranas, cauteri- sações, synapismos, vapôr de agua quente, e quantos meios occorrem. De tarde os phenomenos d'asphyxia foram-se manifestando, de sorte que á meia noite o doente entrou no terceiro periodo, e eu tinha perdido toda a esperança de salval-o pelos meios pharmacologicos. Chamaram- se os srs. Ribeiro Vianna, Mendes Arnaut e Sebastião Silva, e reco- nhecida a indicação e opportunidade da operação, procedi a esta, con- tinua o sr. Theotonio da Silva. Eram duas horas da manhã do dia 24, depois de uma syncope prolongada, que se seguiu á operação, o doente tornou a si, tomou caldo, agua, julepo gommoso com chlorato de potassa; mais tarde, | caldo de farinha, sem que os liquidos lhe dessem 'no gôto. A respira- cão deixou logo de ser ruidosa, somno interrompido por alguma tos- se; limpa-se a canula de duas em duas horas, e conserva-se sempre uma gaza por diante da abertura da canula, e o quarto em tempera- tura agradavel. Dia 24 de manhã—O enfermo passou bem a noite, dormiu bas- tante, tem appetite, menos febre, alguma tosse. A auscultação feita agora, assim como a que se fizera antes da operação, não indica lesão alguma pulmonar. Dia 25-—Não houve novidade. A urina foi sempre examinada e nunca apresentou albumina. Dia 26-——Desde a meia noite a respiração tornou-se ruidosa, e houve inquietação; depois os symptomas d'asphyxia lenta foram pro- gressivamente crescendo, a ponto que a creança succumbiu á uma hora da tarde. » 14.º Observação— Garrotilho; mui pouca diphtheria nas amygda- las, em um pequeno de cinco annos, sem albuminuria ; morte ao quarto dia. Esta observação pertence ao meu collega do Campo Pequeno, o sr. Silva Franco, e refere-se ao mez de janeiro de 1860. O GARROTILHO 105 « Um menino de cinco annos, temperamento lymphatico-nervoso, constituição fraca, morador no Campo Grande, foi observado ao segun- do dia de doença, em que apresentava todos os symptomas do crup, e apenas nas amygdalas mui ligeiras placas diphthericas. Morreu com todos os signaes d'asphyxia ao quarto dia de doença e segundo de tra- tamento. As urinas, examinadas algumas horas antes da morte, não deram albumina : estavam mui turvas, e o acido nitrico clarificou-as. » 15." Observação—Crup sem angina diphtherica em um rapaz de sete annos; ausencia de albumina nas urinas; morte ao quinto dia. Esta observação pertence ao mesmo collega, a quem devo a pre- cedente. « Um rapaz de sete annos, de temperamento nervoso, fraco, mo- rador no Campo Pequeno, foi atacado de garrotilho em março de 1860, sem apresentar nenhum vestigio de angina pseudo-membranosa. Ao quinto dia de doença morreu asphyxiado, recusando-se os pais a con- sentirem na tracheiotomia. As urinas, devidamente examinadas uma hora antes da morte, não manifestaram albumina. » Podia juntar a estes ainda muitos mais factos analogos de doen- tes, que tenho visto só ou com os collegas, mas não o faço para não accumular n'este logar observações da mesma especie, e porque mui- tas se acharão n'outra parte d'este mesmo opusculo, onde caberão me- lhor, ou na memoria sobre a tracheiotomia, que seguirá a publicação d'esta. De todas estas observações conclue-se que a albuminuria não tem uma significação bem positiva e determinada na diphtheria ; que póde manifestar-se na angina diphtheria sem crup, ou no garrotilho sem outra manifestação diphtherica, assim como quando o garrotilho e a angina pseudo-membranosa estão reunidos. Apparece, se bem que não constantemente (uma' vez em cada tres casos) nas doenças diphthericas, como em outras doenças infecciosas, taes como a febre amarella, a cho- lera-morbus, a escarlatina, etc. Todas as vezes que observei os doentes no principio da molestia nunca lhes achei albumina nas urinas, mas sómente entre o terceiro e quinto dia. Apparece comtudo muito mais cedo do que na escarla- tina, na qual alem d'isso é acompanhada de hematuria e de hydropisia, o que raro acontece na diphtheria. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE — T. HI. P. 1. lá 106 ESTUDOS SOBRE Quando a morte era a consequencia directa da ini via albuminuria existir sempre até ao fim. "Pelo contrario, quando a doença terminava sarado li iEniES vi sempre diminuir e desapparecer aquelle signal, e na proporção da di- minuição e terminação dos phenomenos diphthericos locaes. Examinadas as urinas na convalescença dos doentes, ou na presença das paralysias ou dos phenomenos secundarios da diphthe- ria, nunca encontrei a albumina, que todavia antes existira abun- dante. Em consequencia d'estes resultados, julgo que o apparecimento da albumina nas urinas de um doente diphtherico concorre: a indicar o periodo infeccioso da diphtheria, quando o phenomeno não é expli- cavel pela presença da escarlatina ou pela asphyxia, quer dizer pela congestão dos rins; e n'aquelle caso é para mim a indicação do tra- tamento tonico geral que instituo logo, ou pouco depois, aos meus doen- tes. Tambem na minha opinião a albuminuria aggrava o prognostico da molestia sem querer dizer que a terminação seja fatal, porque 'te- nho visto curar-se um terço, approximadamente, dos doentes em qua ella se manifesta. Quando deixa de apparecer é um signal negativo que tenho de bom agouro, porque me indica que a infecção cessou, ainda que se conservem alguns dos seus effeitos, e que parou tambem a disposição á producção das falsas membranas. Por este motivo depois da tracheiotomia a cessação da albumina nas urinas indica-me a occasião mais opportuna para tirar as canulas sem perigo da reproducção das falsas membranas na larynge. A albuminuria, considerada em geral, póde provir de duas ori- gens distinctas, ou da congestão dos rins ou de uma alteração na crase do sangue. Na primeira hypothese á congestão renal segue-se a infiltração granulosa das cellulas epitheliaes dos tubuli (tubos urimiferos ou de Bellini), depois a sua saída e a do forro epithelial dos mesmos tubuli com a urina, e em seguida a transsudação do soro do sangue, e por- tanto da albumina d'este liquido para as urinas, atravez das paredes dos tubos uriniferos privados do seu forro organico. Os cylindros cha- e mados fibrinosos, que se observam na urina, não são senão aquelle forro epithelial dos tubos de Bellini arrastados inteiros pelas urinas e com ellas excretados. Para prova de que a congestão dos rins determina a albumi- nuria, basta recordar o que acontece nas congestões renaes mechani- O GARROTILHO - 107 camente determinadas pela laqueação das veias renaes, e nas que se desenvolvem por outras causas, a que se segue o apparecimento da albumina nas urinas. Mas o epithelium renova-se constantemente nos rins como nas ou- tras partes, encontrando-se as cellulas na urina em circumstancias dif- ferentes, sem que o exame chimico revele sempre a existencia da al- bumina n'este liquido. Por outro lado a hyperemia dos rins é um facto vulgar nas febres eruptivas, typhoides, e sobre tudo nas nephri- tes, e todavia a albuminuria nota-se em um numero de casos relati- vamente pequeno, á excepção d'aquelles em que ha hematuria. Portanto a albuminuria em certo numero de casos sómente póde ser explicada pela congestão renal. A alteração na crase do sangue, que produz a albuminuria, póde depender de uma perturbação geral nos actos nutritivos do organismo, ou nos phenomenos de assimilação e desassimilação das materias albu- noides, que o sr. Sigismond Jaccoud (Des conditions pathogeniques de Valbuminurie) denomina dyscrasia albuminosa. Nos casos d'este gene- ro, em que não ha congestão de rins que explique a albuminuria, es- tão as doenças sépticas, a escarlatina, bexigas, febre typhoide, febre amarella, cholera, etc. No garrotilho ou na diphtheria, quando a al- bumina nas urinas não póde só explicar-se por causa que determine a congestão dos rins, como a asphyxia, depende da alteração na crase do sangue ligada á intoxicação ou infecção diphtheritica, á per- turbação nos actos nutritivos do organismo determinado pelo princi- pio morbido que origina a diphtheria, como nas outras doenças infec- ciosas. Tanto na diphtheria como nas outras molestias, quanto mais se protrahe a albuminuria, tanto mais se enfraquece o sangue e diminue a sua albumina, succedendo-se as hydropisias como na molestia de Bright, na escarlatina, etc., o que todavia succede muito menos n'a- quella do que nestas doenças. É para prevenir estas consequencias que, por pouco que se prolongue a albuminuria na diphtheria, prescrevo o tratamento tonico e reconstituinte pelo ferro, pela quina, pela alimen- tação albumino-fibrinosa, etc. , Terminando o que tenho a dizer da albuminuria no crup e na diphtheria em geral, devo acrescentar que ella apparece algumas ain- daque raras vezes por intermittencia. Já a vi de manhã, e não a en- contrei nas urinas da tarde, para continuar nos dias seguintes ; assim como a achei uma só vez de manhã, no quarto dia de uma angina diphtherica, e não a havia observado nos dias anteriores, nem no mes- 14 + 108 ESTUDOS SOBRE , mo dia á noite, nem nos dias seguintes. N'esta observação aconteceu que a albuminuria coincidiu com a maior extensão das producções diph- thericas e com a falta da cauterisação da garganta na vespera á noite, por ter achado a doente bastante melhor na manhã do terceiro dia. O sr. Bouchut a viu cessar dois dias para voltar depois e persistir até á noite. É possivel que n'estes casos a albuminuria se tivesse conver- tido em alhbuminose, composto isomerico com ella. Algumas vezes, pos- toque igualmente raras, é acompanhada de edema dos membros e de anasarca com derramamento nas cavidades serosas, como duas vezes foi observado pelo sr. Bouchut. Nas duas creanças a que n'estes casos se refere o auctor, e nos quaes a terminação foi fatal ao oitavo e undecimo dia de doença, acha- ram-se nos rins as lesões do primeiro gráo da molestia de Bright. Es- tas hydropisias na diphtheria são geralmente a consequencia da maior depauperação do sangue quando a albuminuria tem sido muito abun- dante ou muito prolongada. Resumindo, os quatro periodos que distingui no crup são assim caracterisados : Primeiro periodo ou inicial —Symptomas geraes como os que pre-. cedem as febres graves, sobre tudo as febres eruptivas; e os sympto- mas locaes anteriores á invasão da larynge. Este periodo mais ou menos longo, segundo a pharynge é ou não préviamente atacada, é ás vezes mui pronunciado, outras quasi dps apercebido a ponto de em alguns casos parecer faltar. Segundo periodo ou dos primeiros phenomenos laryngeos — A ppa- recem os primeiros symptomas referidos á larynge, tosse e voz rouca, ruido laryngeo, sem accessos de suffocação nem dyspnéa. Terceiro periodo, de dyspnéa ou de suffocação—Symptomas de suffocação ou intermittente, na fórma de accessos, ou continua. Pare- ce faltar algumas vezes, quando a dyspnéa é latente. Afóra este caso não chega a manifestar-se, aindaque mui raramente, quando os signaes de infecção se apresentam antes e preponderam. Quarto periodo ou asphyxico— Symptomas de asphyxia manifesta ou latente, isto é, asphyxia com grande dyspnéa, cyanose e anesthe- sia; ou asphyxia sem dyspnéa, nem cyanose, mas insensibilidade cuta- nea em maior ou menor gráo. Este periodo falta algumas vezes, como o precedente, quando a intoxicação diphtherica mata os doentes antes da asphyxia se manifestar. N'este caso, a face está pallida, a dyspnéa | é pequena ou nulla, a anesthesia falta, ha grande prostração, albumi- nuria, ás vezes petechias, exsudação de sangue muito escuro e lodoso O GARROTILHO é 109 d'onde se despegam as pseudo-membranas, c os doentes morrem sem a afílicção caracteristica da asphyxia. Em qualquer dos tres ultimos periodos do crup tres circumstan- cias se podem dar : 1.º Ha os symptomas locaes do crup e só os effeitos geraes que d'elles procedem. | 2.º Os symptomas geraes, que indicam a infecção diphtherica do organismo, são os que constituem toda a doença; os effeitos locaes mui ligeiros, não produzem por si sós nenhum effeito geral grave. 3.º Com os symptomas locaes, manifestados pelos phenomenos la- ryngeos e suas consequencias, ha reunidos e casados os symptomas ge- raes de malignidade. Póde por tanto o individuo morrer no segundo, no terceiro ou no quarto periodo do garrotilho por effeito da infeeção, da asphyxia, ou da infecção e da asphyxia ao mesmo tempo. INCUBAÇÃO, MARCHA, DURAÇÃO, TERMINAÇÃO A incubação da diphtheria e do garrotilho, isto é, o periodo que decorre desde a acção da causa morbigena até ás primeiras manifes- tações da doença, varia dentro dos limites da incubação das febres eru- ptivas ce da maior parte das molestias virulentas (2 a 9 dias). Segundo o resultado das observações do sr. Peter, a duração ap- proximada d'este periodo é geralmente de 2 a 8 dias, e por excepção de 12 ou de 15 dias. Em 10 casos achou 8 em que a duração da in- cubação foi de 2 a 8 dias, e 2 nos quaes foi de 10 a 15 dias. O sr. Roger, que tambem fez estudos no mesmo sentido dos do sr. Peter, obteve com pequena differença os mesmos resultados. Em 17 casos notou 12 com a duração d'aquelle periodo entre 2 e 7 dias, e 5 entre 8 e 17 dias. Ajuntando em uma tabella os 27 casos dos srs. Peter e Roger, vê-se o resultado seguinte relativamente á duração da incubação da diphtheria : 1 LO ESTUDOS SOBRE NUMERO DE DIAS NUMERO DE CASOS Qua spbrsasnroteuego esurtatá Ms! gerdea 2 EVA NEEM A RENO Sa RU dy q opuiolo scale natos) Lenta db DO; enbosmuligna seansal. essatajuil L TDi O usialiearas desheraihe 1 14 ; sisraá E ssisd 15 PORTELA RI A 2 17. à Jg CU ea cid Total... 103 = A incubação foi, pois, de 2 a 8 dias em 21 dos casos, e de 8. dias para cima até 17 sómente em 6. Dividindo o numero dos dias pelo dos doentes acha-se para cada um d'estes 3,8 dias como perio- do medio da incubação, ou quasi 4 dias. Conclue-se d'aqui que o periodo de incubação da diphtheria pó- de durar entre 2 e 17 dias; que é mais vezes de 2 a 8 dias; e que a sua duração média é de 4 dias. São tambem estes, approximada- mente, os resultados da minha pratica nos casos em que a devida ave- riguação tem sido possivel. A marcha do garrotilho é essencialmente aguda, porém muito variavel. A doença, como já disse, começa ordinariamente por certo nu- mero de symptomas geraes, mais ou menos agudos, bastantes vezes ligeiros a ponto de parecer não terem existido. Depois d'estes primeiros symptomas apparecem outros, que são diversos, segundo o crup é primitivo ou consecutivo. , ' Quando o garrotilho é primitivo, o seu primeiro periodo é só- mente constituido por aquelles phenomenos geraes que já referi, e os primeiros symptomas locaes notados referem-se logo à larynge. Os principaes d'elles são: a tosse, enrouquecimento, e depois certa aspe- reza na passagem do ar pela glotte, os quaes significam o segundo pe- riodo do crup. Com aquelles phenomenos locaes ha quasi sempre fe- bre mais ou menos intensa, porêm algumas vezes mui pouca, a ponto O GARROTILHO 111 de parecer que falta; alguma prostração, tristeza, diminuição ou per- da total do appetite, etc. Vem depois os ataques de suffocação ou dys- pnéa successivamente maior, que caracterisam o terceiro periodo ; e por fim, no quarto periodo, a asphyxia só, ou a infecção sem asphy- xia, ou uma e outra reunidas em gráos diversos, com que o doente ge- ralmente succumbe. “O crup primitivo parece tambem começar algumas vezes quasi repentinamente por accessos de suffocação e tosse crupal. Quando isto acontece, a marcha do garrotilho é extremamente rapida, e a morte é a sua terminação quasi constante, Quando o crup é consecutivo ou successivo, duas hypotheses se podem dar: a molestia póde comecar pela angina diphtherica, ou pela tracheite e bronchite da mesma natureza, passando depois a larynge a ser acommettida. Se o garrotilho é precedido da angina pseudo-membranosa, o que é muito mais frequente, alem dos phenomenos geraes já referidos, ha ainda, antes de manifestados os symptomas laryngeos do segundo pe- riodo, os phenomenos locaes da angina diphtherica, mais ou menos extensa, com a tumefacção correspondente dos ganglios do pescoço, que lhe é particular, e que falta no crup sem angina pseudo-mem- branosa. E' geralmente do segundo ao setimo dia de doença, ás vezes de- pois de passado o primeiro septenario, que a larynge é invadida. Mais de uma vez tenho visto apparecer a rouquidão e a tosse ao mesmo tempo que os primeiros phenomenos locaes da angina diphthe- rica, de modo a parecer que a molestia começou simultaneamente nas duas partes. Em qualquer dos casos, chegada á larynge, a doença prosegue no segundo periodo e seguintes, quando as medicações empregadas ou a natureza a não fazem parar em sua marcha progressiva. Se o crup é precedido de phenomenos morbidos de natureza ana- loga, respectivos á tracheia ou aos bronchios, que é o caso mais raro, ha antes dos symptomas do segundo periodo do garrotilho os da bron- chite pseudo-membranosa, isto é, signaes de catarrho bronchico, res- piração frequente, fervor sub-crepitante na parte posterior dos dois lados do thorax, ruido yalvular quando ha falsas membranas fluctuan- tes nos canaes respiratorios, febre intensa, etc., seguindo-se depois a invasão da larynge. Qualquer que seja o modo por que o garrotilho comece, ou seja primitivo ou consecutivo, a sua marcha é de ordinario progressiva- ” 112 ESTUDOS SOBRE mente crescente; um certo numero de vezes apresenta comtudo a mar- cha remittente devida á expectoração e expulsão de falsas membranas, em consequencia da qual os symptomas mais graves diminuem para reapparecerem quando uma nova: exsudação pseudo-membranosa vem outra vez embaraçar o exercicio da hematose, o que acontece geral- . mente no fim de 12 horas ou de 1 dia, ou passados 2, 3 ou 4 dias, o que é mui raro. Nunca vi o crup intermittente. O que se tem dito da sua exis- tencia deve pertencer á laryngite estridulosa ou asthma de Millar, que vem por accessos intermittentes, e que se reproduz muitas vezes no mesmo individuo em épocas mais ou menos approximadas, e não ao verdadeiro garrotilho. A duração do crup é geralmente de 7 a 9 dias. Ha comtudo ca- sos de percorrer em 2 dias todos os seus periodos até á asphyxia ou infecção, o que é todavia mui raro. Citam-se mesmo casos fataes com um só dia de duração, e Lobstein referiu um com quatorze horas. E” natural que n'estes factos os primeiros symptomas passassem des- apercebidos. Por outro lado ha exemplos, em que a duração da molestia tem chegado a 25, 30 dias e mais, sobre tudo quando é consecutiva á an- gina diphtherica, e quando a terminação é favoravel. E" sem duvida n'esses casos, que o crup se tem denominado chronico. Eu passo a examinar o que a estatistica diz neste ponto, tanto em relação á angina diphtherica, como ao crup, cuja natureza consi- dero identica, e por tanto tambem proximamente identica a sua du- ração. Em nove doentes tratados de angina diphtherica na Casa-Pia de Lisboa e nas enfermarias da Misericordia nos tres annôs de 1857 a 1859, a duração e o resultado da doença foi o seguinte : O GARROTILHO 113 TERMINAÇÃO NUMERO DE CASOS | DIAS DE DURAÇÃO | m=[-=—"["""> Curados | Mortos A duração minima n'estes poucos casos foi, pois, de 5 dias; a maxima de 56; a média de 23,22. Nos cinco casos de cura a minima foi de 12 dias; a maxima de 56; e a média de 35,4. Nos quatro casos de morte a duração minima foi de 5 dias; a maxima de 12; e a média de 8 dias. ' Nos dezenove casos d'angina diphtherica e garrotilho em expostos da Misericordia tratados em domicilio n'aquella mesma época, os re- sultados, quanto á duração conhecida e terminação, foram os seguintes: TERMINAÇÃO NUMERO DE CASOS DIAS DE DURAÇÃO Curados | Mortos Ie ra DO DO 09 09 o O dO 1 2 3 4 E) 8 11 14 15 28 [= fi) MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE=——T. UI. P. I. 15 114 “ESTUDOS SOBRE ” N'esta pequena estatistica a duração minima foi de 1 dia; a ma- xima de 28 dias; e a média de 7,89. Nos cinco casos de cura a duração minima foi de 8 dias; a ma- xima de 28; e a média de 13,2. à Nos quatorze casos de morte a minima duração foi de 1 dia; a maxima de 15 dias; e a média de 6. Em oito casos de crup! com angina diphtherica, em que prati- quei a tracheiotomia, resultou no ponto em questão o que se segue : TERMINAÇÃO NUMERO DE CASOS | DIAS DE DURAÇÃO |” — > > Curados | Mortos N'este numero a duração minima foi de 6 dias; a maxima de 29; e a média de 15,97. Nos quatro casos de cura a minima duração foi de 20 dias; a maxima de 29; e a média de 23,75. Nos quatro casos de morte a duração minima foi de 6 dias; a maxima de 9; e a média de 7. Nas vinte e quatro ? observações de garrotilhos com anginas pseu- do-membranosas, em que foi praticada a tracheiotomia em Lisboa, nas quaes são incluidas as minhas oito operações, o resultado, no caso su- eito, foi o seguinte: . ! Hoje 29 de maio, em que vejo as provas desta folha, tenho praticado dez opera- ções de tracheiotomia no crup, resultando cinco curas e cinco mortes. Das duas opera- ções que não estão incluidas n'este mappa foi uma seguida de morte, durando a doença 6 dias, e outra de cura com a duração de 23 dias. Estas como as outras observações fa- rão parte da minha memoria sobre a tracheiotomia no garrotilho. ? Actualmente, 29 de maio, consta-me mais tres operações de tracheiotomia em O GARROTILHO 115 TERMINAÇÃO NUMERO DE CASOS | DIAS DE DURAÇÃO | =" > Curados | Mortos | ma ND IDO 2 6 2 2 2 1 1 1 1 1 1 3 1 N'esta estatistica a duração minima foi de 4 dias; a maxima de 29; e a média de 12. Nos sete casos de cura a duração minima foi de 20 dias; a ma- xima de 29; e a média de 23,71. Nos dezesete casos fataes a minima duração foi de 4 dias; a ma- xima de 15; e a média de 7,17. Reunindo as pequenas estatisticas que precedem, obtem-se 52 ca- sos, nos quaes se vê o seguinte resultado, debaixo do ponto de vista da duração da diphtheria, nos casos de cura e nos de morte : Lisboa, com applicação ao crup, sendo duas praticadas por mim, e uma pelo sr. Henri- ques Teixeira. D'estas tres operações duas terminaram pela cura, uma minha, outra do sr. Teixeira, sendo a duração da doença de 23 dias em um caso e de 27 no outro; a ou- tra foi seguida de morte com a duração de 6 dias. 15+ . 116 ESTUDOS SOBRE TERMINAÇÃO NUMERO DE CASOS DIAS DE DURAÇÃO | =—[>—— — Curados | Mortos OOoIS o ço ma je O O = CS CO dO ma [rms nim! 1 2 3 3 1 2 2 3 2 1 2 3 2 2 2 1 1 1 3 1 1 1 1 1 fe pu fã pão fo O eo fo judo | ado fue judo | qr bo — =“ Aqui a duração minima foi de 1 dia; a maxima de 56 dias; e a média de 12,44. Se se elimina d'esta estatistica os tres primeiros casos, nos quaes provavelmente se começou a contar o principio da doença só quando os symptomas foram sensiveis para as pessoas da familia dos doentes, e não quando estes começaram realmente a soffrer, e se subtrahe os tres ultimos numeros em que a duração foi prolongada em consequen- cia de complicações, que detiveram muito os doentes nas enfermarias da Misericordia: vê-se, em quarenta e seis casos, a duração minima de 3 dias; a maxima de 29: e a média de 10,65. Nos dezesete casos de cura a duração minima foi de 8 dias; a maxima de 56; e a média de 24,11. Se se excluir deste calculo os tres ultimos numeros, pela razão que já apontei, acha-se nos quatorze O GARROTILHO 117 casos restantes a duração minima de 8 dias; a maxima de 29; e a média de 18,42. Nos trinta e cinco casos de morte a duração minima foi de 1 dia; a maxima de 15 dias; e a média de 6,77. Subtrahindo ao calculo os pri- meiros tres casos, pelo motivo que referi, acha-se nos trinta e dois ca- sos a duração minima de 3 dias; a maxima de 15; e a média de 7,25. Nas cento e cincoenta mortes pelo garrotilho occorridas em Lis- boa nos tres annos de 1857 a 1859, em que já tenho fallado, a du- ração da doença era indicada sómente em cento e dezeseis casos, pela fórma seguinte : NUMERO DE CASOS DIAS DE DURAÇÃO fuma poa [em] me OR GO ADO aC ma to . “ . . . EN Total.. 116 493 A duração minima foi, pois, n'estes casos fataes de 1 dia ; a ma- xima de 13 dias; e a média de 4,25. deiciorando áquelles cento e dezeseis casos de crup, sessenta de angina diphtherica em que a duração era sabida, acha-se um total de cento e setenta e seis casos, nos quaes a duração é distribuida do se- guinte modo : [18 ESTUDOS SOBRE NUMERO DE CASOS DIAS DE DURAÇÃO 2801 det Si EE 3 00 A QUERIDO, Iiia Sd Raia US ad ia BoA paper ape Naa ato ERRA a (0a a PE ad pa a UR Ein Na RaMo Vas de Va cd CD 11 ba bafo aa fofo tuo a oh Meda feto ta do 13 Dona RR RP Rn Total.. 176 790 A duração minima foi aqui de 1 dia; a maxima de 14 dias; e a media de 4,48. Não incluindo no calculo os trinta e sete numeros nos quaes a duração foi marcada sómente com 1 e 2 dias, por não exprimirem, provavelmente, a verdadeira duração da doença, acha-se nos cento e trinta e nove restantes a duração minima de 3 dias; a maxima de 14; e a média de 5,39. Se tivesse de concluir das estatisticas precedentes, para determi- nar à duração da doença, diria que a média nos casos de cura é de 18 a 19 dias, e nos casos fataes de 5 a 6. A duração da diphtheria e do garrotilho póde ser modificada por diversas circumstancias. É geralmente menor nos individuos fracos, e n'aquelles cujas condições hygienicas são más. A natureza epidemica tem tambem sobre este ponto grande influencia, variavel comtudo em cada epidemia. Na duração do garrotilho convem, segundo os srs. Rillier e Barthez, marcar dois periodos. O primeiro, desde o começo dos symptomas até aos accessos de suffocação ou até á dyspnéa, comprehende os meus pri- meiros dois periodos e dura quatro a oito dias. O segundo, que co- meça com a dispnéa, vae até 4 morte ou á cura, corresponde aos meus dois ultimos periodos, e dura dois a seis dias nos casos fataes, e geral- mente mais nos casos felizes. O GARROTILHO 119 A terminação do crup é, já se vê, mi morte ou pelo restabele- cimento da saude. A terminação pela morte é a mais commum, o que é geralmente contrario na angina diphtherica, salvos os casos em que o genio epi- demico torna mui grave a doença. Aquelle modo de terminar o crup póde ser pela asphyxia ou pela infecção, que melhor se póde chamar secundaria, ou por estes dois estados juntos e concorrendo em com- mum para o resultado fatal. A terminação pela saude póde dar-se de dois modos: ou, para assim dizer, immediatamente, o que é raro, pela expulsão das falsas membranas, que obstruiam ou forravam a larynge e difficultavam a hematose, as quaes, melhorado o estado geral, não se reproduzem mais; ou diminuindo e desapparecendo pouco a pouco e successiva- mente os symptomas geraes graves, e simultaneamente despegando-se e cahindo ou absorvendo-se as producções diphthericas com ou sem o auxilio da medicina, ficando muitas vezes por algum tempo certa rou- quidão e fraqueza ou mesmo extincção da voz. Na convalescença apparecem frequentemente, mas talvez só no crup infectuoso, outros phenomenos morbidos, que são manifestados no systema nervoso, e que dependem da mesma doença, os quaes serão referidos na parte d'este opusculo destinada aos accidentes consecuti- vos ao crup. FÓRMAS Ha no crup duas fórmas essencialmente distinctas pelos sympto- mas, pela marcha e pelo modo de terminação, e que convem nunca confundir. São o crup simples, localisado ou commum; e o crup infectuoso, generalisado ou maligno. Estas duas fórmas são ambas, em minha opi- nião, a expressão da mesma doença. Esta doença, sempre geral, parece determinada por uma especie de intoxicação ou envenenamento, que se manifesta por duas especies de alterações. D'estas alterações são umas locaes : as falsas membranas ; outras geraes: os symptomas da infecção, os quaes umas vezes vem antes, outras ao mesmo tempo, n'alguns casos depois dos phenomenos locaes, e que ainda em outros faltam ou são desconhecidos. Estes phenomenos geraes podem denominar-se symptomas da in- Jecção primitiva, para os distinguir de outros mais graves, os da i7/ec- cão secundaria, os quaes se manifestam depois, e que parece depen- 120 ESTUDOS SOBRE derem da intoxicação da economia determinada pela alteração e absor- pção dos productos diphthericos, constituindo o crup maligno. A origem commum. das duas fórmas de crup, que eu admitto, faz que os symptomas distinctivos não sejam sempre bem determina- dos, e que portanto o seu “diagnostico nem e: seja facil á cabe- ceira dos doentes. Os signaes que me guiam para disninglis as duas fórmas de gar- rotilho são tirados da comparação da extensão das falsas membranas e dos seus caractéres physicos, do estado dos ganglios do pescoço, da pelle e mucosas, das urinas, do estado geral dos doentes, e emfim das daap consecutivas em um € outro caso. º Crup simples. tadas ; larynge, ou apenas coexistem nas amygdalas ou pequena parte do véo do paladar, e sobre tudo não se acompanham de coryza diph- therico ; apresentam côr branca, ou cinzento-amarellada, e quando se tenta despegal-as ou quando se cauterisam, a garganta não sangra, ou apenas verte mui pouco sangue de boa côr rubra. Não ha engorgita- mento dos ganglios do collo, ou, havendo-o, é pequeno e sem incha- cão do tecido cellular ambiente, e em todo o caso sempre em relação com a angina de que immediatamente depende. A pelle e as mucosas conservam a sua côr natural, ou têem sómente a côr determinada pela asphyxia, ou pelos phenomenos locaes; quando desnudadas ou feridas, não se cobrem de falsas membranas, nem tomam o aspecto gangre- noso. O doente conserva o seu estado geral com certa força, o pulso está sufficientemente desenvolvido sem indicar prostração, ou está em harmonia com a asphyxia existente. As urinas não têem albumina quando tratadas pelo acido nitrico ou submettidas á acção do calor ; ou, se existe, é explicavel por escarlatina concomitante ou pela as- phyxia que determine a congestão dos rins. Emfim não sobrevem de- pois as paralysias locaes ou geraes, que são as doenças mais commum- mente consecutivas ao crup maligno e á diphtheria. 2.º Crup infectuoso. — As falsas membranas cobrem em camada mais ou menos continua, espessa e mui adherente, alem da larynge e amygdalas, o véo palatino, a uvula, e estendem-se pelas vias respira- torias e sobretudo para as fossas nasaes; algumas vezes, mui raras, apparecem na mucosa occular e das partes genitaes; têem côr cinzenta, cinzento-escura, apparencia gangrenosa; e, quando se lhes toca para as despegar ou cauterisar, corre da mucosa, sobre que assentam, sangue escuro, liquido, como fuliginoso, comparavel ao sumo de ameixas pas- O GARROTILHO 121 sadas ou de aleaçus, segundo a acertada comparação do sr. Millard na sua these sobre a tracheiotomia. O engorgitamento ganglionar do collo é grande, ás vezes mesmo mui grande, doloroso, e acompanhado de intumecencia do tecido cellular ambiente, e em relação com a inten- sidade da angina diphtherica. A pelle toma a côr achumbada, mani- festam-se-lhe ás vezes petechias ; e se está desnudada da epiderme, ou se tem alguma ferida, cobre-se n'estas partes com a mesma substancia diphtherica, e tanto ella como as mucosas tomam por vezes a appa- “rencia gangrenosa. O estado geral indica adynamia em maior ou me- nor gráo; o pulso está pequeno e fraco, ha resolução de forças sem asphyxia ; ou, quando ha este phenomeno, não está em relação com o estado adynamico patenteado. Algumas vezes ha diarrhea, assim como accessos febris mais ou menos pronunciados e regulares. As urinas são abundantemente albuminosas, sem que o precipitado produzido pelo acido nitrico ou pelo calor seja dependente da asphyxia ou de outra doença concomitante. Em um caso de diphtheria maligna que conheço (observação 20) havia hematuria e ao mesmo tempo signaes de icteri- cia e accessos perniciosos. Ha, finalmente, no crup maligno, de ordina- rio já na convalescença e mais ou menos tarde, paralysia de sentimento ou de movimento, parcial ou mais ou menos generalisada. Aquelles phenomenos geraes, que tanto aggravam a doença, e lhe imprimem o cunho de malignidade, são os symptomas da infecção secundaria em que tem parte a decomposição e absorpção das falsas membranas da diphtheria. Não é preciso que em qualquer das fórmas do crup existam to- dos os symptomas que acabo de enumerar; para se poder dizer que o garrotilho é simples ou inaligno. Raras vezes se juntam todos, a não ser uma ou outra vez, no periodo mais adiantado da doença. Alguns ha, que, mesmo isolados, fazem logo suppôr a fórma da doença. Para o crup infectuoso estes:symptomas são os seguintes: coryza diphtherico; grande extensão, côr escura e aspecto gangrenoso das pseu- do-membranas; albuminuria copiosa e inexplicavel por outra molestia ou pela asphyxia; e emfim paralysia consecutiva. Para o crup commum é a falta destes quatro principaes sym- ptomas que o fará diagnosticar. As consequencias-praticas que se tiram da distincção das duas pre- cedentes fórmas de crup são da maior importancia para a indicação e para o prognostico da tracheiotomia. Sob estes pontos de vista tres grupos de factos tenho observado, e são os seguintes : MEM, DA ACAD-— | É CLASSET. IH, P. 1. L6 12 ESTUDOS SOBRE 1.º— O doente não tem signaes de intoxicação, e toda a doença está para assim dizer-na asphyxia produzida pelo embaraço mechanico á entrada do ar pela larynge. A indicação da operação é inquestiona- vel, e o prognostico o mais favoravel. É n'estes casos que a tracheiotomia traz uma melhora prompta e admiravel: a tosse expelle com força e immediatamente as mucosi- | dades e mesmo as falsas membranas existentes nas vias respiratorias ; a respiração restabelece-se logo, e a cura tem mais geralmente logar mesmo quando se manifestam depois symptomas de crup infectuoso, o que acontece algumas vezes. 2º— O doente apresenta signaes evidentes, e dos mais graves, de intoxicação sem asphyxia ou apenas com alguma dyspnéa. A operação deve considerar-se absolutamente contraindicada, e o prognostico, com a maior probabilidade, fatal. Quando se faz a tracheiotomia n'estas circumstancias, os doentes abatidos pela infecção diphtherica não apresentam reacção possivel de- pois de operados, não podem expellir as mucosidades nem as falsas membranas da tracheia e dos bronchios, e morrem com o progresso da intoxicação e ainda asphyxiados pelo embaraço que faz á respiração o cumulo de liquidos e de producções diphthericas nas vias respirato- rias, que elles não têem força para expulsar. 3º— Os doentes, alem de alguns symptomas de infecção, têem tambem uma certa asphyxia, que dá razão de parte da gravidade da doença. A tracheiotomia está ainda indicada, se bem que o prognostico seja pouco favoravol ao bom exito da operação. Na mui grande maio- ria dos casos a morte é a consequencia das operações praticadas n'es- tas circumstancias. Todavia sou de opinião de operar n'este estado, com tanto que o elemento asphyxico exista concorrentemente, e que a infecção diphtherica não seja muito pronunciada, visto que ha bas- tantes exemplos de cura da diphtheria maligna, assim como os ha, aindaque raros, de garrotilhos n'esta hypothese, quer dizer, com infec- ção e asphyxia, curados com a operação, a qual serve, para assim di- zer, de descomplicar a doença tirando-lhe um dos elementos da maior gravidade. Tenho visto numerosos exemplos d'aquellas tres especies, em que o garrotilho se apresenta na pratica, os quaes me permittem formu- lar d'este modo as minhas opiniões sobre o objecto. Alem d'estas duas fórmas de crup admittem-se outras, mas que não têem a mesma pratica, e que são: o crup idiopathico, epidemico, primitivo, secundario, das creanças, dos adultos, etc. O GARROTILHO 128 Já na'symptomatologia escrevi algumas observações, que exem- plificam o crup simples e o crup infectuoso. Comtudo juntarci mais cinco observações das quaes se referem tres ao garrotilho commum ou asphyxico, e duas á angina diphtherica e ao garrotilho infectuoso. 16.º Observação— Garrotilho em um menino de dois annos de ida- de; asphyxia ; tracheiotomia ao terceiro dia de doença; cura. (Obser- vação pelo sr. Augusto João de Mesquita; operação pelo sr. Joaquim Theotonio da Silva). «O sr. A. Emilio Moura Coutinho, dois annos de idade, tempe- ramento sanguineo-lymphatico, sadio. No dia 14 d'outubro de 1854 começa a mostrar-se doente. A fa- milia julga-o constipado. No dia 15 mais incommodado. Está muito rouco e tosse. Come com appetite e brinca. . No dia 16 tosse rouca durante a noite, e maior calor de pelle. De manhã acha-se em tão mão estado, que assusta sua familia. Man- dam-me chamar á pressa. Não me encontram. Volta das duas horas da tarde soube o recado e fui logo. Encontrei o seguinte: febre, rouqui- dão, dôr na garganta, que se apresenta vermelha, mas sem nenhum ponto esbranquiçado. Respiração muito frequente e laboriosa, acompa- nhada d'um silvo laryngo-tracheial. As expirações mais longas que no estado normal. Aphonia completa. A tosse, que é crupal a não per- mittir duvida, vem com tal suffocação, que o doente, a cada accesso, senta-se de repente na cama apoiando-se firme nos braços, e assim tosse, tosse e tosse, e expectora com tal força que os esputos são ar- remeçados a grande distancia. N'um dos esputos achei um fragmento de pseudo-membrana que recatei para mostrar. Nos intervallos dos ac- cessos o doente jaz prostrado como em somnolencia. Faces um pouco cavas e muito pallidas, semblante abatido, olhos encovados e revirados para cima,.a ponto de esconderem toda a iris na palpebra superior. A áuscultação nada alcança de anormal. Diagnostiquei crup. Mandei vir logo tartaro emetico em agua distillada, e papeis de ipecacuanha em doses vomitivas. Fiz pôr sinapismos nas pernas e bra- cos, e appliquei ventosas séccas aos lados do espinhaço. O doente re- cusa-se a beber, apesar de todas as diligencias que emprego, recebe na bôca, e depois expelle. Faço a titillação da lueta, e provoco d'esta maneira alguns vomitos. São mais de quatro horas da tarde; o doente tem ido, a olhos 16 » 124 ESTUDOS SOBRE vistos, de momento a momento para peior; mais, muito mais oppres- são e abatimento entre os ataques de suffocação, diminuição geral de calor, extremos frios, beiços lividos, o rosto como esfumado pelas som- bras da asphyxia que começava. Sabia por um acaso onde áquella hora estava o sr. Theotonio ; mando “a toda a pressa pedir-lhe, que vieste logo, logo. Chegou ás cinco horas da tarde; examinou o doente, e ratificou o diagnostico feito. Propuz-lhe a operação, concordou ; porêm manifestou desejos de que mais collegas viessem testemunhar a doença e a operação. N'isto o doente foi atacado d'uma suffocação tão forte, que nos resolvemos, temendo pela sua vida, a operar immediatamente. A operação concluiu-se sem accidente; só houve grande difficul- dade em ferir a tracheia pelos apressados movimentos em que estava. A” operação succedeu um desmaio de meia hora; ao desmaio, reac- cão; depois febre intensa, calor grande de pelle, rosetas nas faces e muita séde. As bebidas dão-lhe no gôto, o que muito o afilige. Passa a noite sem dormir, tossindo a miudo, e expectorando gran- de quantidade de muco. Tira-se a canula interna muitas vezes. Fazem- se frequentes instillações de agua morna. No dia 17 o mesmo estado. Dão-se-lhe calomelanos em dóse al- terante, que produzem para a tarde diarrhea, e por isso se suspen- dem. O doente nega-se a beber caldos. Toma alternadamente peque- nas quantidades de leite, e colherinhas de geléa. No dia 18 dormiu alguns bocados. Teve durante a noite tres dejecções alvinas. Tosse menos. Expectoração ainda mucosa. Continuam os liquidos a darem-lhe no gôto. Bebe com appetite caldos de tapioca. Tiram-se as canulas para experimentar se o doente poderia respirar sem ellas. Esteve a ponto de se asphyxiar. Mettem-se de novo ; o doente socega pouco depois. No dia 19 passou bem; dormiu somnos grandes. Está quasi apy- retico. Teve duas dejecções alvinas. Faz-se, o caldo de tapioca com ôvo,. e dão-se-lhe quatro porções no dia, . Tornam-se a tirar as canulas. Accesso violento de tosse; expectora fragmentos de pseudo-membranas envoltas em mucosidade. Acaba-se o accesso; o doente fica socegado a respirar bem pela ferida. Tosse de vez em quando, e n'uma das vezes fluctua entre os labios da ferida um pedaço de pseudo-membrana. A pinça apodera-o muitas vezes, € sempre lhe escorrega, some-se por fim n'umia inspiração. [impa-se a tracheia com a lanada d'esponja. A mesma dieta. , No dia 20 continúa a estar sem as canulas. Tossiu demasiado, O GARROTILHO 125 e quando tosse com mais violencia percebe-se-lhe alguma voz, porêm muito rouca. As bebidas ainda lhe dão no gôto. Apyrexia completa, Desejos de brincar. No dia 25 verifica-se se o doente póde respirar sem difficulda- de pela larynge. Vê-se que sim. Aproximam-se por tiras aglutinati- vas os labios da ferida, que sempre tem mostrado boa granulação, e tendencia para se cicatrisar. No dia 26 lévanta-se. Come com appetite. Da-se-lhe gallinha ao jantar e á cêa. No dia 28 a ferida da tracheia inteiramente fechada, e a exter- na cicatrisando. Alguma tosse. Continúa a estar aphonico. Estado ge- ral excellente. No dia 5 de novembro completamente bom. Diz as palavras que fallava antes da doença, mas com à voz muito sumida e rouca. No dia 13 boa saude. Falla claro. » - [7.º Observação— Angina tonsillar pseudo-membranosa e crup, em uma menina de seis annos e meio; asphyxia; albuminuria; tracheio- tomia ao setimo dia de doença; cura ao decimo setimo dia. (Observação e operação por Antonio Maria Barbosa). Carolina Ferraz, de seis annos e meio, temperamento lymphati- co, constituição delicada, filha do sr. José Roberto Alves Ferraz, mo- rador na rua de S. Lazaro n.º 101, 1.º andar, acordou na manhã de 8 de agosto de 1859 com febre, mão halito, dôr e inchação ganglio- nar no lado esquerdo do pescoço, que lhe impedia os movimentos da ca- beça. N'este dia ficou de cama a caldos, e poz-se-lhe sinapismos nos pés. No dia 9 estando melhor da febre levantou-se, mas a dôr do pes- coco estava quasi no mesmo estado. Fomentações emollientes. No dia 10 estava melhor do pescoço, mas appareceu dôr de gar- ganta, halito mais desagradavel, duas epistaxis abundantes pela venta es- querda, uma ás nove horas da manhã, e outra ás duas horas da tarde. Fica de cama. No dia 11 dôr de garganta mais forte; parece não ter febre ; amygdalas inchadas e cobertas de uma camada branca. Levanta-se de novo. Repetiu a hemorrhagia pelo nariz uma vez de manhã, outra de tarde, sendo a ultima mui pequena. No dia 12 era menor a inchação dos ganglios do pescoço e das amygdalas, mas a dór de garganta mais incommoda. Apparece rouqui- dão e tosse, grande agitação, sem calor notavel da pelle. No dia 13 desappareceu quasi toda a inchação dos ganglios 126 ESTUDOS SOBRE cervicaes e das amygdalas; aphonia; mais tosse mui rouca, por ataques, com suffocação é arroxeamento da face, que obrigavam a creança a sentar-se na cama, e mesmo a pór-se em pé para melhor respirar. Estes ataques começaram pelo meio dia, e continuaram pouco mais ou menos de duas em duas horas até o princípio da noite, mas depois muito mais approximados. Nos intervallos das suffocações, que punham a creança em uma cruel inquietação e soffrimento, havia somnolencia, que era interrompida pela tosse e dyspnéa. N'este dia foi chamado o sr. Diogo Baptista dos Santos Cadet, que reconhecendo a existencia do crup e algumas falsas membranas nas amygdalas sem inchação d'estes orgãos, nem dos ganglios cervi- caes, prescreveu um emetico d'ipecacuanha com que a doente vomi- tou duas vezes, e aconselhou o chlorato de potassa; mas tudo sem re- sultado, porque a doença progrediu espantosamente. No dia 14 ás sete horas da manhã fui chamado da parte do col- lega Cadet, pelo pai da doente, afim de me achar em sua casa pelas oito horas da manhã, prevenido para a tracheiotomia. Por esta hora achei, com o sr. Cadet, a doentinha no estado seguinte: A creança estava deitada na cama, com a cabeça dirigida para traz, face livida, beiços rôxos, olhos mui encovados e cercados de gran- des olheiras, respiração mui difficil, muito aspera e ruidosa nos dois tempos sobre tudo na inspiração, que se ouvia a grande distancia; a cada inspiração viamos dilatarem-se extraordinariamente as azas do na- riz e pronunciarem-se muito as fossas supra-claviculares e supra-ster- nal; aphonia absoluta; som claro pela percussão em todo o peito; a auscultação não parecia indicar lesão pulmonar; pulso pouco frequente, mui pequeno, faltando-lhe algumas pulsações; lingua saburrosa; na pharynge já não havia nenhuma inchação nem vermelhidão, e apenas duas pequenas falsas membranas nos pilares anteriores; insensibilidade da pelle ás vellicações que lhe fizemos; suor frio pelo tronco e mem- bros; urinas da noite citrinas e limpidas com precipitado albuminoso determinado pelo acido nitrico. Vendo a urgencia do caso, e havendo já anesthesia da pelle, ope- rei logo a tracheiotomia coadjuvado pelo collega Cadet. A operação foi rapidamente praticada, porque receci que a pouca vida da crean- ca me não deixasse leval-a ao fim. Houve alguma hemorrhagia veno- sa, que cessou logo que introduzi a canula na tracheia. Poucos minu- tos passados, a respiração estava bem estabelecida e tranquilla; e a doentinha, livre de todos os signaes da asphyxia, assegurou-nos nada ter sentido. O GARROTILHO 127 Meia hora depois da operação dormiu muito socegada sobre o lado direito por espaço de hora e meia. Um enfermeiro, já habituado a cuidar de doentes d'esta ordem, ficou junto da operada para limpar de duas em duas horas a canula interna, e para a desobstruir todas as vezes que a difficuldade de respiração indicasse essa necessidade. A doente ficou tomando de duas em duas horas duas colheres, das de sôpa, da seguinte poção. Chlorato de potassa........ 3 oil. Agua distillada ........... 8 onç. Xarope de gomma arabica... 1 onç. Nos intervallos meia chavena de leite com pouca agua, ou caldo de vacca. A creança passou bem o dia e a noite, ox radodo sd ou em somno- lencia, a maior parte do tempo. No dia 15 a face estava animada e alegre; o pulso a 120, re- gular; calor de pelle natural; respiração silenciosa, pouco frequente, bem perceptivel em todo o peito pela auscultação; urinas claras, com grande deposito mucoso, ainda albuminosas, mas muito pouco; houve duas dejecções alvinas; pela canula saíu uma falsa membrana branca amarellada de tres centimetros de comprimento sobre dois de largura, e um a dois millimetros de espessura. Pelas nove horas da manhã tirei as canulas, que foram limpas, e cauterisei com o lapis de nitrato de prata toda a extensão da feri- da, desde os tegumentos até á tracheia, a qual estava toda lardacea e revestida de materia plastica muito adherente. o No dia 16 houve grande transpiração, sobre tudo durante a nou- te; o pulso a 110; examinando à pharynge vi que haviam desappare- cido espontaneamente, sem tratamento local, as falsas membranas que se tinham notado pouco antes da operação; saíu outra falsa membra- na mais pequena pela canula com certa quantidade de muco viscoso amarellado; toda a ferida, ainda coberta de camada diphtherica, foi novamente cauterisada. Geléa, caldo com arroz. No dia 17, terceiro da operação, a creança, sentada na cama, dis- trahia-se com alguns dos seus brincos habituaes, ria com sentimento de alegria bem manifesta; pulso a 100; urinas limpidas, sem albumi- na, À ferida cauterisada por estar dada coberta na maxima parte por camada diphtherica, da qual extrahi uma porção apprehendendo-a com pinça. Sôpa, frango cosido, caldo de farinha. 128 ESTUDOS SOBRE No dia 18 ha ainda indicação para cauterisar uma pequena parte da ferida; as bebidas dão no gôto, e algumas sáem pelo nariz. Sôpas, e alimentação meio solida. No dia 19 ainda uma pequena cauterisação em parte da me- tade esquerda da ferida; alguma tosse, com a qual expelliu pela bôca dois escarros de muco viscoso, branco amarellado; dormiu bem quasi toda a noite; mais appetite. Vitella cosida. A deglutição dos liquidos, tentada de novo, faz-se sem inconveniente. No dia 20 ainda é precisa uma ligeira cauterisação: Tapioca e ôvo ao almoço; sôpa de massa, vitella assada e geléa ao jantar; só- pas de leite á cêa. Nos intervallos a solução do chlorato de potassa, que não tem sido interrompida, e caldo com geléa ou sem ella. Em 21 do mez, seis dias depois da operação, estando toda a fe- rida limpa de materia diphtherica e com excellente aspecto, sendo muito bom o estado geral da operada, e a urina sem nenhum vesti- gio de albumina, tirei definitivamente a canula, fazendo antes algu- mas experiencias no sentido de conhecer se a respiração seria possi- vel sem difficuldade atravez da .larynge. Puz depois um lenço de cassa com muitas dobras em fórma de gravata á roda do pescoço. Passadas quatro horas, visitando de novo a doente, verifiquei que respirava sem incommodo pela glotte; a voz era muito perceptivel se bem que rou- ca; alguma tosse com expectoração. Approximei os labios da ferida sem incommodo com uma tira adhesiva fendida na parte correspon- dente. No dia 22 tinha passado excellentemente á excepção de alguma tosse. Cauteriso as granulações da ferida que são excessivas e algum tanto pallidas Cha e torradas com manteiga; sópa de vacea e beef, dois pêros assados. Pára o uso do chlorato de potassa, tendo tomado vinte e uma oi- tavas, sem que se manifestasse a salivação, que se tem notado como um dos effeitos physiologicos do medicamento. No dia 23 a ferida em via de cura; levanta-se. No dia 24, em consequencia do estado saburroso da lingua, da diminuição do appetite e da constipação do ventre, toma nove onças de limonada de citrato de magnesia, que cura aquelle estado. No dia 1 de outubro, dezesete dias depois da operação, a ferida estava de todo cicatrisada. A créança tinha apenas alguma tosse e al- guma fraqueza geral, que o ar do campo e o ferro, que lhe recom- mendámos, devia curar em pouco témpo. O GARROTILHO ) 129 18.º Observação— Angina diphtherica e crup em uma menina de quatro annos; biirinerias tracheiotomia no per iodo asph Wico, ao quarto dia da doença; morte por diphtheria tracheio-bronchial e as- phyxia vinte e cinco horas depois da operação. (Observação do sr. L. da Silva Cardeira, operação pelo sr. Joaquim Theotonio dg Silva). «Julia da Conceição Duarte, idade quatro annos, temperamento lymphatico-nervoso, constituição forte; moradora na rua de S. Bento 352, 1.º andar; não foi vaccinada, e nunca teve febre alguma exanthematica. Gozou quasi sempre de boa saude. Antecedentes mor- bidos, os que se notam, são de bem pequeno valor. Aos sete mezes di- zem ter tido um incommodo para que pedíra intervenção da sciencia, e de que se curou com um xarope, e com a applicação de duas san- guesugas nos pés. Mais tarde, ha perto de um anno, uma ligeira bron- chite, de que a curámos pelos meios ordinarios. O começo da doença em questão data do'dia 2 de junho de 1860, depois das quatro horas da tarde. É notavel a exactidão com que se póde- marcar. E todo o dia, e até á hora indicada, a doentinha andou bem, comeu na fórma do costume e com appetite, deu-se aos brincos que a entretinham quotidianamente. Nem uma palavra que accusasse o mais leve incommodo, nem um gesto que traduzisse o menor soffri- mento, nem.a mais ligeira expressão de sentimento de mal-estar. Não se expoz á insolação n'este nem nos dias antecedentes. Não foi visita- da, nem visitou doente algum d'esta ou d'outra molestia. Dão quatro horas, e principia a deixar os entretenimentos que | a divertiam. Queixa-se de dôres de cabeça. O incommodo progride. Expressão de mal-estar, prostração, calor exaggerado. Passa-se assim toda a noite. A indisposição da doente para tomar remedio algum faz com que os pais não chamem ainda facultativo. No dia 3 (domingo) no mesmo estado. Anorexia e seccura. Por um capricho pueril a boa da creança quer acompanhar a mãi á missa. Fazem-lhe a vontade, e vai á igreja por seu pé. Continúa o resto do dia nas mesmas circumstancias da vespera, mas sem nunca se dar á cama., ato No dia 4 (segunda feira) a doente passou muito inquieta. Ca- lor: de pelle exaggerado, e febre no dizer da familia. Um novo capri- cho faz-lhe pedir pão e café. É cumprido o desejo. A repugnância, que tinha a tudo que desconfiava ter pretenções a remedio, faz ainda com que os pais se limitem a dar-lhe os carinhos, de que eram capazes. A molestia é que os não aceitava, e progredia. Cresciam os disvelos da familia, e a doença augmentava. É que o amor de mãi não bastava ! MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE — T. NI. P. I. 17 130 ESTUDOS SOBRE A's tres horas da tarde o caso parece-lhes sério. Não se engana- vam. Decidem-se a chamar-nos. Vêmos a creança. E' no collo da mãi, que nunca deixa. Pulso frequente e cheio, calor de pelle augmentado. As amygdalas, e sobre- tudo a direita, um pouco tumefactas e rubras. Difficuldade na deglu- tição, seccura, lingua esbranquiçada, não tem tido dejecções alvinas. Ganglios submaxillares engorgitados. Não ha tosse. Respiração normal. E' bom notar que até o momento da nossa observação nunca a doente se queixára da garganta. | Prescrevemos: — Xarope d'ipecacuanha em dose vomitiva; gar- garejos emollientes e cataplasma da mesma natureza na parte anterior do pescoço, sinapismos. Recommendámos, para depois, a limonada de citrato de magnesia. No dia 5 (terça feira) ás sete horas da manhã. Não foi possi- vel fazer-lhe tomar remedio algum. Recusou totalmente todas as ap- plicações, e não a forçaram. O estado morbido geral é o mesmo. Não assim localmente. A amygdala direita apresenta um revestimento de um amarello “denegrido. Os ganglios submaxillares do mesmo lado mais engorgitados e dolorosos. | Pensâmos que temos a tratar um caso de angina diphtherica em que os phenomenos geraes precederam os locaes. Tinhamos estes receios desde a vespera. Não nos mentiram; ainda mal. Receitámos o.tartaro emetico; applicação local de mel rosado com o borato de soda, e pedimos conferencia para esse mesmo dia. “ A's cinco horas da tarde. Conferencia com o nosso estimavel col- lega, o sr. Bernardino Augusto da Silva Heitor, A doença não deixa duvida aos mais exigentes. As falsas membranas cobrem já ambas as amygdalas e a uvula. Anxiedade e prostração. O estado febril tem decahido. Concordâmos no diagnostico feito. O collega approva o trata- mento, que lembrámos, de insistir nos emeticos, que pouco effeito têem produzido; começar a dar o chlorato de potassa internamente, e usar dos topicos para modificar as superficies affectadas das falsas mem- branas. | Assim: -— Xarope d'ipecacuanha ás colheres, das de chá, até vo- -mitar. Depois: Chlorato de potassa. ........ 3 oit. Metals. pertula nos a les sto da a ! libra Duas colheres, das de sôpa, de duas em duas horas. O GARROTILHO 131 Cauterisações localmente com o nitrato de prata em dissolução muito concentrada. A's nove horas da tarde. Teve alguns vomitos. As materias vo- mitadas não apresentam vestigio de falsas membranas. Começou a to- mar o chlorato de potassa. Nem o estado geral, nem o local têem me- lhorado. Continúa com o tratamento instaurado. No dia 6 (quarta feira) ás sete horas da manhã. A doença conti- núa na sua marcha rapida. As falsas membranas estendem-se pela parte posterior da bôca. A inquietação da doente é cada vez maior. Repeti- dos ataques de suffocação. Alguma tosse. Respiração curta com inspi- rações difficeis. Aphonia. Prostração. Pulso pequeno e deprimido. Epis- taxis. As urinas tratadas (pela primeira vez) com o acido nitrico dão deposito albuminoso. Continúa ainda com o mesmo tratamento, A's onze horas da manhã, e ás duas da tarde fazemos novas vi- sitas á doentinha. O quadro symptomatico vai crescendo em gravida- de. Desesperâmos do tratamento, e não cremos que a materia medica nos dê remedio para similbante mal, nem que a molestia dê tempo para se lhe sentir effeito. Pedimos nova conferencia para decidir se de- via ou não praticar-se a tracheiotomia, que considerâmos como o uni- co recurso que póde tirar a doente a uma morte certa, breve e affli- ctissima. , A's cinco horas da tarde conferencia com o nosso illustrado e obse- quioso collega, o sr. Joaquim Theotonio da Silva. A creança então não podia conservar-se na cama, que os ataques de suffocação, por serem repetidos e intensos, a punham em contínua inquietação. A face era livida; os olhos como querendo sair das orbi- tas; respiração muito difficil. Cada inspiração fazia dilatar as azas do nariz, e era tão ruidosa, que se ouvia a grande distancia. Aphonia. Pulso pequeno e irregular. Falsas membranas revestindo as amygda- las, a uvula e a parte posterior da pharynge. Temperatura a baixo da normal. Pouca sensibilidade de pelle. Tinhamos assim á vista um caso de crup no periodo asphyxico. Lembra só a tracheiotomia. A auscultação não a rejeita. O periodo é chegado, e não ha a temporisar. Procede-se á operação. Eram seis horas da tarde. Correu perfeita e habilmente nas mãos do sr. Theotonio da Silva, ajudado no empe- nho pelo nosso ilustrado collega militar, o sr. A. Gomes do Valle, e por nós. Logo depois da operação fazia gósto vêr a doentinha. Parecia ou- tra. Era como a vida que tinha entrado n'um cadaver. Respirava si- | 7 * 132 ESTUDOS SOBRE lenciosa e tranquillamente; todos os symptomas d'asphyxia tinham des- apparecido. Quem a observára um pouco antes n'esse combate afanoso contra a morte que a queria arrebatar, admirava agora o meio cirur- gico que tão lisongeiramente tinha mudado a scena, tornando-a tão socegada, dando-lhe tanto alívio, fazendo esperar tanto o pratico que a tratava e os pais que a estremeciam. Nessa noite em que a vimos repetidas vezes, a creança passou tranquilla até á meia noite. Houve uma ligeira reacção febril. A ca- nula tirou-se de duas em duas horas para se limpar convenientemente, mas nunca se encontrou obstruida com falsas membranas. Da meia noite em diante as esperanças começaram a empal- lidecer, o quadro das melhoras a assombrear-se. A respiração, que des- de a operação era facil e natural, começou a tornar-se curta e an- xiosa. O pulso a cahir. A face a contrahir-se. A inquietação a mani- festar-se. : Pela manhã do dia 7 (quinta feira) o estado da doente era ain- da menos lisongeiro; o quadro symptomatico tinha-se exaggerado. Ao meio dia a auscultação mostrava que a doença se estendêra aos bron- chios. Eram as esperanças perdidas. D'ahi em diante a cada hora mais se aggrava o mal. É um ex- pectaculo imponente d'angustia! A respiração torna-se cada vez mais ruidosa e como que impossivel. A pobre da creancinha não tem posi- ção. Falta-lhe o ar, o socego, a vida. Já inquieta, já abatida. Sentan- do-se agora, como que electrisada, em busca do ar que lhe faltava-; dei- xando-se cahir logo prostrada pelos esforços, que tinha em vão tenta- do. Tão depressa virando-se, como revirando-se. Ora cobrindo-se, ora descobrindo-se, já abraçando a mãi, já repellindo-a; morta emfim ás sete horas da tarde, vinte e cinco horas depois da operação. » 19.º Observação— Angina diphtherica e crup em um rapaz de nove annos; albuminuria ; tracheiotomia ao sexto dia da doenca; morte por intoxicação e asphyxia lenta tres dias depois da operação. (Obser- vação e operação por Antonio Maria Barbosa). Leandro €. G. F. de nove annos, temperamento lymphatico, cons- tituição regular, morador na travessa do Monte n.º 16, teve aos tres annos febres intermittentes, durante dois mezes, e aos quatro annos sarampo. benigno. Era propenso desde pequenino a difficuldade de res- piração e a engorgitamento dos ganglios do pescoço, mas ha tres an- nos para cá, que nada sofíria, e era inteiramente saudavel. Na quarta feira, 29 de fevereiro de 1860, á noite queixou-se de O GARROTILHO 133 quebrantamento do corpo, alguma febre, falta de appetite, e depois li- geira dôr de garganta. A's sete horas da manhã de quinta feira, 1 de março, acordou muito incommodado, com calor muito intenso e mais dôr de garganta, inguas aos lados do pescoço, e difficuldade de engolir, pelo que lhe po- zeram sinapismos. N'este mesmo dia de tarde foi visto pelo sr. Manuel Fernandes, que receitou primeiro oito onças de limonada purgante, depois o tar- taro emetico, e para topico uma onça de mel rosado com meia oita- va de acido chlorhydrico. Desde então até o dia 6 de março o-doente teve o seguinte tra- tamento na ordem em que vai exposto: purgantes, emeticos, cozi- mento de quina, algum chlorato de potassa, topicos adstringentes, san- guesugas por duas vezes, vesicatorio nas costas, fricções tonicas. No dia 6 de manhã vi o doente a pedido do meu illustrado col- lega e amigo, o sr. dr. Alvarenga, que acabava de ser instado para se encarregar do seu tratamento. Achámol-o então com todos os si- gnaes externos d'angina diphtherica e crup no periodo de asphyxia e intoxicação mui adiantada; com diphtheria na superficie onde se havia applicado o vesicatorio; o sangue das ultimas seis sanguesu- gas applicadas na noite antecedente, que ainda se não tinha podido vedar, apesar de alguns meios empregados, era difluente e denegrido. O doente tinha, alem de muito grande prostração e somnolencia, a pelle branco-amarellada e insensivel, beiços rôxos, aphonia, respiração mui curta e fortemente aspera, não só na inspiração como na expira- ção, pulso frequente e mui pequeno, diarrhea em consequencia da qual não nos foi possivel ter urinas para analysar. Pelas onze horas e meia da manhã pratiquei a tracheiotomia, sendo ajudantes os srs. dr. Alvarenga, Cypriano Ferreira e Manuel Fernan- des. Pela ferida da tracheia, alem de liquido branco com pequenos fragmentos de falsas membranas, foi expeltdo um grande pedaço de pseudo-membrana bem organisada e resistente, com seis a sete centi- metros de comprimento sobre tres e meio a quatro de largura, e um a dois millimetros de espessura, o qual foi observado por todos os col- legas presentes. A respiração restabeleceu-se logo como por encanto, na fórma do costume. O doente ficou tomando, de duas em duas horas, duas co- lheres grandes de uma poção de chlorato de potassa (duas oitavas para oito onças d'agua), e nos intervallos bom caldo de vacca ou leite. A's oito horas da noite foi possivel analysar as urinas, que tratei pelo aci- 134 ESTUDOS SOBRE do nitrico, e deu muita albumina, como provavelmente já tinha ha- via mais tempo. No dia 7 de manhã ás cinco horas saíu pela canula outra falsa membrana, que foi colhida pelo enfermeiro, a cujo cuidado ficára in- cumbido o doente. A's oito horas e meia o pulso mui frequente e desenvolvido, pelle mui quente, respiração frequente e por vezes anxiosa, muita diarrhea. Junta-se xarope de gomma arabica á poção do chlorato de potassa. “Ao meio dia o pulso mais frequente (144); respiração ruidosa e frequente com a mesma anxiedade, tiram-se as canulas, e a ellas vem pegados pedaços de falsas membranas muito espessas ; a ferida toda coberta d'uma camada diphtherica, que é cauterisada; as canulas re- applicadas. Poção e xarope de gomma, ipecacuanha e kermes, sinapis- mos, chá da India para bebida ordinaria. O estado do doente foi-se aggravando por esta fórma: a respiração embaraçou-se cada vez mais por falsas membranas que não podiam .ser todas expellidas, a prostra- cão e somnolencia cresciam de hora para hora, e o doente succumbiu por asphyxia lenta e intoxicação no dia 9 de março pelas sete horas e meia da manhã. : 20." Observação — Angina diphtherica em uma menina de sete annos; albuminuria; extraordinaria inchação das glandulas maxilla- res e ganglios cervicaes ; petechias sactericia; hematuria ; accessos per- niciosos; e morte por intoxicação ao decimo oitavo dia de doença. (Ob- servação do sr. dr. Barral). » Esta observação, que devo á amisade do meu presadissimo mes- tre, o sr. dr. Barral, não é de garrotilho, mas de angina diphtherica extremamente infectuosa, e rara pelos symptomas apresentados, e por isso a transcrevo aqui como remate ao que eu podesse acrescentar nos symptomas da diphtheria maligna. «M., de idade de sete annos, temperamento lymphatico, consti- -tuição fraca, saude delicada, appareceu na manhã do dia 1 de setem- bro de 1860, sem causa conhecida, com dôres por todo o corpo, al- guns arrepiamentos de frio, pêso e dôr de cabeça, febre para a tarde, e pequena dôr de garganta. No dia seguinte a febre era maior, a dôr de garganta mais in- - tensa, ganglios do pescoço e glandulas submaxillares intumecidas, e igualmente o tecido cellular subcutaneo ; as tonsillas e pilares verme- lhos, como inflammados, e apresentando pontos brancos espessos, que pareciam falsas membranas em começo, Gargarejo de infusão de rosas Y O GARROTILHO 135 e borax, toca-se na garganta, por vezes, com pedra hume, bebidas emollientes, cataplasma de linhaça no pescoço. No terceiro dia maior inchação do pescoço; a affecção diphthe- rica, já bem clara, occupa as amygdalas, pilares e véo palatino; febre; dôr de cabeça. Vomitorio, cauterisação por tres vezes com nitrato de prata, toca-se a miudo com mel rosado e sulphato d'alumina, e toma uma dissolução de chlorato de potassa em todo o decurso do dia e noite. No quarto dia continuam os mesmos symptomas, a deglutição é mais difficil, a afecção diphtherica estendeu-se á pharynge e fossas nasaes, a febre continúa, a dôr de cabeça diminuiu, a inchação do pes- coço é maior.. Tem tido evacuações alvinas; as urinas são claras. O mesmo tratamento, e tenta-se tirar alguns pedaços de membranas com o porta-esponja. À No dia quinto e sexto os symptomas continuam, apesar d'um tra- tamento energico, como nos dias antecedentes; a inchacão externa é grande, desce até o meio do peito e chega quasi aos hombros; a res- piração é difficil e estrondosa; bulhas como de valvula ; depois dos vo- mitorios, e quando se lhe tiram falsas membranas, fica mais livre; as ventas estão completamente obstruidas, muita febre, algum delirio de noite. As urinas téem bastante albumina, evacuações do ventre liqui- “ das e abundantes, mas não excessivas. O mesmo tratamento. No dia setimo ha alguma melhora : tem-se extrahido muitos pe- daços de falsas membranas, a respiração está melhor, menos inchação exterior, grande abatimento, a garganta está como ferida, e a doente sente grande dôr quando se lhe quer fazer engulir qualquer cousa ; recusa-se a tomar alimento, e só quer chá com leite, geléa, e alguma pequena porção de caldo, e tudo isto toma com dôr e difficuldade. O mesmo tratamento; toca-se com o nitrato de prata só uma vez por dia. - No dia oitavo e nono a doente passou muito melhor da garganta, mas muito abatida ; recusa-se a tomar alimento ; a febre é muito pouca, e ha arrefecimento de membros, as urinas ainda têem albumina ; ap- parecem petechias em pequeno numero, mas espalhadas por todo o corpo. Na garganta apparecem tres pontos escuros, que parecem gan- grenosos, e que são provavelmente tambem petechias; não ha mão cheiro, antes melhor do que já houve; toma mais alimento, vinho e sulphato de quinina ; suspende-se o tratamento anterior. No dia decimo os mesmos symptomas, maior prostração. Icteri- cia; utinas com materia corante biliosa, côr amarella da pelle e con- 136 ESTUDOS SOBRE junctivas, fezes descoradas e quasi sem bilis. Volume do figado au- gmentado. Cataplasma emolliente; o mais o mesmo. No dia duodecimo a garganta vai bem, a doente parece mais ani- mada, a ictericia continúa, as urinas são sanguinolentas; tem tomado mais algum alimento, gosta do vinho, tem algum vomito e soluço. No dia decimo terceiro a doente não passou tão bem, mais so- lucos, alguns vomitos, urinas sanguinolentas, lingua escura, dentes fu- liginosos, diarrhea de materias biliosas com sangue. Vinho, quinina, limonada sulphurica. No dia decimo quarto a doente está mais animada, parece me- lhor, move-se na cama com miais facilidade, o volume do figado me- nos sensivel, não ha febre, as urinas são claras, menos diarrhea ; con- tinúa o soluço e algum enjôo; a ictericia desappareceu. Para a tarde frio, abrimentos de bôca, tremor, mais soluço e enjôo, alguns movi- mentos convulsivos da face e membros. Sinapismos, bebidas quentes e excitantes com ether, aquece-se o corpo por todos os meios. O mes- - mo tratamento ; sulphato de quinina em alta dóse. No dia decimo quinto passou menos mal; a quinina é em gran- de parte vomitada, e dada em clisteres é rejeitada ; dão-se fricções com a quinina dissolvida em alcool e com tinctura de quina. O soluço continúa. No dia decimo sexto e decimo oitavo repete-se com mais força o mesmo accesso do dia 14, tendo passado tambem melhor no dia 17; e a doente fallece á uma hora da noite do dia 18 para 19 com um accesso intermittente pernicioso, sem que fosse possivel fazer-lhe to- lerar o sulphato de quinina. Não se fez autopsia. » COMPLICAÇÕES As complicações do crup podem ser da mesma natureza da doença principal, ou de natureza differente. As complicações da primeira ordem são outras especies de diph- theria, outras manifestações locaes da mesma doença, taes são: a an- gina e corysa diphtherico, a diphtheria cutanea, a bronchité pseudo- membranosa, etc., quando manifestadas posteriormente á invasão da larynge. Aindaque o corysa diphtherico e sobretudo a angina da mesma natureza, preceda muitas vezes a manifestação do crup, e seja, para as- sim dizer, n'esses casos o seu ponto de partida; todavia, sempre que É O GARROTILHO 137 existe, constitue uma verdadeira complicação, pelo muito que difficul- ta a hematose e a deglutição tanto dos alimentos como dos remedios, e porque se addiciona á doença principal. Podem considerar-se ainda complicações do mesmo genero certos symptomas geraes e locaes da fórma infectuosa do crup. Na segunda ordem de complicações, colloco, como principaes, a bronchite, pneumonia, tosse convulsa, o emphysema pulmonar, a en- teritef as febres eruptivas, a molestia de Bright, etc. A bronchite acompanha frequentemente o garrotilho, mas quan- do é simples não augmenta sensivelmente a gravidade da molestia principal. De todas as complicações do crup a mais frequente e a mais gra- ve é a inflammação lobar ou lobular do pulmão, que faz succumbir um grande numero de creanças, manifestando-se ás vezes antes de in- dicada a tracheiotomia, ou depois de praticada esta operação, e con- . correndo então para o seu mão resultado. A primeira creança qué ope- rei de crup, e que morreu cincoenta e quatro horas depois, foi victi- ma da pneumonia lobular. Os primeiros signaes d'esta complicação, que é muitas vezes a consequencia da bronchite pseudo-membranosa, são : os ruidos seccos e humidos da bronchite, a que se segue o fervor sub-crepitante do primeiro periodo da pneumonia, e o sôpro tubario com som massiço da hepatisação. A tosse convulsa vem complicar tambem o crup, aindaque raras vezes. O emphysema interlobular do pulmão, que complica o garrotilho, é produzido pelos esforços da inspiração ou da tosse que rompem as vesiculas pulmonares como succede com a tosse convulsa. O sr. Bre- tonneau notou esta complicação em duas observações do seu tratado de diphtherite. Nos operados da tracheiotomia a infiltração do ar chega a invadir o tecido cellular do collo, das espaduas e do peito, que incham na proporção do accumulamento do ar. A enterite é tambem uma complicação frequente do crup, por ser muito commum nas creanças, mas é menos grave do que a pneu- monia. . As febres eruptivas, escarlatina, sarampo e bexigas, apparecem al- gumas vezes como complicações- do crup. Mais do que todas vê-se principalmente a escarlatina regular ou irregular, precedendo, acom- panhando ou seguindo a affecção diphtherica. Ha certas epidemias de diphtheria em que esta ultima complicação é muito commum. Foi o que succedeu na epidemia de Leiria descripta pelo nosso Soares Barbosa. MEM, DA ACAD,— 1.º CLASSE T. UI. P. I. 18 138 ESTUDOS SOBRE A molestia de Bright foi ainda vista pelo sr. Bouchut duas vezes, complicando o garrotilho. N'estes dois casos as creanças succumbiram do oitavo ao undecimo dia com anasarca, albuminuria, rins volumo- sos, em parte descorados, com amollecimento e hypertrophia da sub- stancia cortical, tubos uriniferos privados d'uma grande parte das cel- lulas epitheliaes e infiltrados de grande quantidade de granulações gor- durosas, como no primeiro gráo da molestia de Bright. Entre nós o meu collega e amigo, o dr. May Figueira, na autopsia d'uma doente de angina diphtherica e garrotilho, pertencente á clinica medica da Escóla Medico-Cirurgica, de que é lente, encontrou nos rins lesões analogas ás descriptas pelo sr. Bouchut; e, durante a vida, alem de uma parte dos syinptomas da mesma doença de Bright, observou, no exame imicroscopico das urinas, os denominados cylindros fibrinosos, que se deram como caracteristicos d'aquella molestia, mas que hoje não devem considerar-se senão como o forro epithelial dos tubos uri- niferos, que é expellido com a excreção dos rins. DIAGNOSTICO O diagnostico do crup não é geralmente difficil. O ruido laryn- go-tracheial nos dois tempos da respiração e sobretudo no primeiro, a tosse rouca, a aphonia, os accessos de suflocação'ou a dyspnéa conti- núa, as falsas membranas expellidas da larynge com a expectoração, ou manifestadas em qualquer outra parte, principalmente em alguns pontos da garganta, a albuminuria, e emfim a anesthesia mais ou me- nos completa, tendo todos estes phenomenos uma marcha progressiva- mente crescente, não permittem a confusão com outra doença. Entretanto nem todos os symptomas precedentes se apresentam juntos no mesmo individuo; um ou mais podem faltar, outros não se manifestam com o desenvolvimento característico. Por isso varias ve- zes se têem confundido com o crup outras doenças, e tem-se prati- cado a tracheiotomia em casos que não eram de verdadeiro garro- tilho. Para ficarem bem presentes as molestias com as quaes a confu- são se tem dado, vou enumeral-as com os seus caracteres differen- ciaes. As doenças a que principalmente me refiro são as seguintes: o falso crup, laryngite estridula ou asthma aguda de Millar; a laryn- gite aguda simples; a laryngite submucosa ou edema da glotte; o ca- O GARROTILHO 139 tarrho suflocante ou bronchite capillar; os abcessos retro-pharyngeos e esophageos. 1.º Falso crup—O pseudo-crup assimilha-se ao verdadeiro crup nos accessos de suffocação, no ruido laryngeo, na tosse rouca, e no en- rouquecimento da voz porque se manifesta; mas differe bastante na sua marcha, em alguns dos symptomas, e no modo de terminação. Com effeito o falso crup, ao contrario do garrotilho, começa em geral subitamente no meio da melhor saude e do somno por um ata- que de suffocação ; nos intervallos dos accessos ha quasi completo res- tabelecimento ; a voz é pouco alterada em comparação com a do crup; não ha expectoração de falsas membranas, nem estas exsudações se no- tam nas amygdalas ou outra parte; mais geralmente não ha febre ; os ganglios do pescoço não se engorgitam ; não ha albuminuria, nem o menor vestigio de anesthesia. A terminação pela cura, por meio de um tratamento simples, sobretudo por um emetico e um vesicatorio, constitue ainda a regra geral no falso, e a excepção no verdadeiro crup. 2.º Laryngite aguda simples — Assimilhando-se ao crup pela rou- quidão da tosse e da voz e pela dyspnéa, distingue-se todavia pela ex- pectoração mucosa sem falsas membranas; pela voz que, apesar de rouca, não chega a extinguir-se e a tomar o caracter da voz crupal; pela tosse que é mais sonora, mais humida e menos sibilante do que no garrotilho; pela dôr mais ou menos viva na região laryngea com febre intensa e contínua ; pela falta de exsudações diphthericas na pha- rynge ou n'outros pontos, e do engorgitamento ganglionar do collo, que muitas vezes acompanham a diphtheria laryngea; e pela ausen- cia do ruido laryngo-tracheial, dos accessos de suffocação, e ainda pela falta da albuminuria e da anesthesia. 3.º Laryngite sub-mucosa — O edema da glotte, pelo enrouqueci- mento da tosse e da voz, pelo ruido laryngo-tracheial e pelos sympto- mas asphyxicos, póde á primeira vista ser tomado por garrotilho. Mas não vem no meio de perfeita saude ou depois de um exanthema co- “mo este; ao contrario apparece no decurso da laryngite ulcerosa chro- nica ou na convalescença de qualquer doença aguda ; a dyspnéa é per- manente c sem accessos de suffocação; a inspiração é que é diffi- cil, mas a expiração facil e curta; o dedo levado á garganta reco- nhece a infiltração edematosa nas pregas aryteno-epiglotticas. Alem d'isso o edema da glotte não é acompanhado de febre, ou esta é mui pequena; nem nos esputos, nem nas amygdalas ou outros pontos se vêem falsas membranas ; nem os ganglios do collo se engorgitam ; nem emfim a voz chega, em geral, a extinguir-se como no crup. 18x 140 ESTUDOS SOBRE 4.º O catarrho suffocante pela dyspnéa e asphyxia propria, pela albuminuria e anesthesia que ás vezes o acompanham, tem sido con- fundido com o garrotilho. Mas na bronchite capillar a dyspnéa é con- tínua e intensa, nunca se apresenta por accessos e não é acompanhada do ruido laryngo-tracheial do crup; a voz em logar de extincta é nor- mal; a respiração é mui curta, frequente e difficil, pouco ruidosa ou estertorosa ; nem na expectoração, nem na garganta ou outra parte se apresentam falsas membranas; emfim, a auscultação, que no crup quasi só deixa ouvir o ruido laryngo-tracheial mais ou menos aspero, que encobre quasi totalmente o ruido respiratorio, no catarrho suffocante mostra a existencia de fervores mucosos e subcrepitantes dissemina- dos por toda a extensão dos pulmões. 5.º Os abcessos retro-pharyngeos e esophageos têem sido confun- didos com o crup pela dyspnéa, pela alteração da voz e pelo ruido la- ryngo-tracheial, sobretudo em tempo de epidemia de garrotilhos; mas' o tumor da pharynge, que o tacto ou a vista póde descobrir, a incha- ção e dôr do collo, a dysphagia e a falta dos accessos de suffocação, que muitas vezes ha no crup, e da expectoração de falsas membranas ou do seu appârecimento na garganta, devem bastar para differençar as duas doenças. ACCIDENTES CONSECUTIVOS Algumas vezes ainda no decurso do garrotilho ou da angina diph- therica, mas geralmente mais ou menos tempo depois de terem ces- sado os phenomenos locaes caracteristicos da doença, duas a tres se- manas depois de haverem desapparecido as falsas membranas da gar- ganta, no periodo já de perfeita convalescença ou de cura apparente, manifestam-se accidentes notaveis que dimanam do systema nervoso. Estes accidentes, que têem sido descriptos pelos srs. Orillard, Breton- neau, Trousseau, Faure, Moynier, Gubler, Seé, Colin, e sobretudo pelo dr. Maingault em uma memoria muito notavel, consistem em paraly- sias do movimento e da sensibilidade, ás quaes pela sua frequencia, pela constancia de alguns de seus symptomas, pela marcha e encadea- mento dos phenomenos que as caracterisam, bem cabe o nome de— paralysias diphthericas. São assaz frequentes os accidentes consecutivos á diphtheria. Téem havido epidemias, em que o terço ou a metade dos doentes que esca- param aos priméiros perigos da molestia, apresentaram as perturba- ções da sensibilidade e do movimento que caracterisam os phenome- nos secundarios da diphtheria. O dr. Lemarie, de Pont-Audemer, ci- O GARROTILHO 141 tado pelo sr. Sée na Union medicale, tratou em alguns mezes dezoito doentes de angina diphtherica, dos quaes seis morreram, e nos doze, que se curaram, houve em todos uma paralysia consecutiva. O numéro de casos de paralysias diphthericas, observados n'estes ultimos annos e publicados pela imprensa, excede tres ou quatro ve- zes o das paralysias consecutivas a todas as outras classes de febres e phlegmasias febris, em seguida ás quaes se manifestam accidentes ana- logos. Póde fazer-se uma idéa approximada da frequencia relativa d'es- tes accidentes pelo seguinte quadro que transcrevo da memoria do sr. Maimgault sobre a paralysia diphtherica, e que apresento segundo a ordem da frequencia Paralysia do véo palatino........ et mobi Paralysia generalisada.............. 64 Amaurose .......... tado FEST OO) Paralysia dos o its fes ronde EIN 4 |) Eistrabistmos o ro ERRAR) Paralysia dos musculos do Ene e rh 9 Perturbações da sensibilidade sem enfra- quecimentoimusceular :4 (4). cgi 401118 Anaphrodisianirr: Streets calo dnjaaiO US Paralysial do resto; mhss-h a Lemos ans a bndi6 Paralysiaada bexiga sateor Atire gm da puçÃo Ro tail si ead Começam estes accidentes, tambem denominados tardios, quasi sempre depois de muitos dias de convalescença, quando se julga o doente já curado. Comtudo em muitos individuos a convalescença não é franca, e, quando aquelles accidentes apparecem, estão ainda os doentes em .estado valetudinario. É n'estas circumstancias, que mais vezes tenho observado os phenomenos consecutivos da diphtheria e do crup. Os primeiros accidentes apparecem no véo palatino e pharynge, “manifestando-se a paralysia muitas vezes ainda no decurso da angina, “mas pronunciando-se melhor no fim de oito ou quinze dias. Em se- glindo logar são acommettidos os membros inferiores, e nos adultos é algumas vezes tambem enfraquecida a inervação genital. Ao mesmo tempo, e muitas vezes antes de tomados os membros inferiores, mani- 142 ESTUDOS SOBRE festam-se perturbações na visão e na direcção do olho. Em quarto lo- gar são acommettidos os membros superiores; e por ultimo os mus- culos do tronco e dos orgãos respiratorios. É esta a marcha quasi invariavel dos accidentes consecutivos da diphtheria, quando a sua evolução é completa; e em todo o caso é aquella a successão dos phenomenos até o ponto em que a doença pára na sua marcha para ficar estacionaria ou para recuar. A paralysia do véo do paladar e da pharynge é a que mais ve- zes se observa. É tambem a que tenho observado mais frequentemen-. te; quasi nunca deixei de a notar nos meus operados de tracheioto- mia, em geral do 3.º ao 6.º dia depois da operação, denunciada en- tão, alem de outros signaes, pela difficuldade na deglutição, principal- mente dos liquidos que, dando no góto, saíam pelas fossas nasaes. Apparecendo pouco tempo depois dos accidentes diphthericos, e tendo a sua séde nos orgãos, em que estes accidentes se manifestam, esta paralysia foi por isso conhecida muito mais cêdo do que as outras especies de paralysia. Póde existir só, e precede sempre os outros ac- cidentes consecutivos da diphtheria. Os signaes da paralysia do veéo palatino e da pharynge são os se- guintes : respiração nasal; difficuldade na deglutição sobretudo dos li- quidos, que muitas vezes dão no gôto, saindo pelo nariz; difficuldade e mesmo impossibilidade de exercer a sucção, de soprar e de garga- rejar; véo palatino immovel, descido sobre a base da lingua, sem a sensibilidade geral e especial propria, e sem a sensibilidade da dôr. A paralysia dos membros inferiores segue a do véo do paladar e da pharynge. A paralysia do movimento é precedida ou acompanhada de per- turbações e particularmente de diminuição da sensibilidade : os doen- tes queixam-se de adormecimento e formigueiros nos membros, acom- panhados ou não de dôres articulares, antes de perderem de todo as suas funcções. Quando faltam estes phenomenos subjectivos, interro- gando mais cuidadosamente a sensibilidade, sobretudo pela faradisação da pelle, acha-se quasi constantemente uma anesthesia ou analgesia das mais evidentes, o que mostra a solidariedade que ha entre a fra- queza muscular e a perda da sensibilidade. A analgesia apresenta um limite quasi caracteristico: ella. pára geralmente na altura do joe- lho. Ao entorpecimento e formigueiros segue-se o enfraquecimento das pernas cada vez mais notavel; a deambulação é de dia para dia mais dificil, até que a estação é impossivel e a paraplegia completa. A pa- O GARROTILHO 143 ralysia póde acommetter um só membro, o que é raro, porque quasi sempre são os dois simultaneamente tomados. O que acontece para os membros inferiores succede tambem para os superiores, precedendo a anesthesia a paralysia do movimento, que não sobe, geralmente, acima do cotovelo. Em alguns casos de diph- theria, nos adultos, nota-se tambem anaphrodisia mais ou menos com- pleta. As modificações do-orgão da vista e sobretudo a presbyopía, que é a mais frequente de todas, são geralmente devidas, segundo o sr. See, a alterações na accommodação do olho pelas contracções muscula- res, que estão sob a influencia da anesthesia das partes ambientes, á similhança do que algumas vezes se observa nas mulheres hystericas. Estes phenomenos precedem muitas vezes, ou acompanham, a paralysia dos membros inferiores. A vista enfraquece, e este enfraquecimento póde ir desde a am- blyopia, caracterisada por enfraquecimento da vista com presbyopía ou myopia, e chegar até á cegueira completa, o que nunca observei ; mas geralmente esta paralysia só chega a impedir que o doente leia os ca- racteres mais miudos. A diplopia ou amblyopia é frequente; a heme- ralopía ou nyctalopía ao contrario mui rara. O estrabismo acompanha ou precede a diplopía. A amaurose diphtherica é assaz frequente : foi observada pelo sr. Maingault trinta e nove vezes em noventa casos de paralysia. A sua duração é de alguns dias até seis semanas e dois me- zes. Em todo o caso o ophthalmoscopio não revela alteração que ex- plique a paralysia da vista, nem nas membranas, nem nos humores do olho. Entre outros casos que o comprovam, lembro-me agora de uma filha do sr. João de Lemos, que teve uma pequena paralysia nos membros e amblyopía diphtherica, sem que o exame do olho com aquelle instrumento me denunciasse outra alteração no interior do or- gão, senão alguma congestão da papilla, mais pronunciada em um dos olhos, sendo aliás iguaes os phenomenos subjectivos em ambos. A paralysia dos musculos do tronco apparece mais tarde. A ca- beça pende sobre o peito ou cahe para traz; os musculos do tronco não podem supportar o pêso do corpo; póde haver paralysia mais ou me- nos completa nos musculos da face; a bexiga e o esphincter do recto podem ainda ser paralysados, o que é mui raro, sendo aquelles acei- dentes acompanhados de prisão obstinada do ventre e retenção da uri- na, ou de incontinencia d'este liquido e das materias fecaes. Póde assim generalisar-se a paralysia dos membros ao tronco, in- vadir a maior parte dos musculos do corpo a ponto de tornar impos- 144 ESTUDOS SOBRE siveis quasi todos os movimentos. Observei um facto deste genero em um meu operado de tracheiotomia em que vi a mais extensa paraly- sia diphtherica terminada pela cura (vêr 10.º observação). A propriedade contractil persiste nos musculos apesar da paraly- sia dos movimentos espontaneos. Do mesmo modo que as paralysias hystericas, as da diphtheria podem acompanhar-se de hypersthesia em certas partes do corpo, e em particular de rachialgia e de dóôres articulares mais ou menos in- tensas. Alem d'estas perturbações referidas á sensibilidade e motilidade, ha conjunctamente outros phenomenos funccionaes muito importantes. Algumas vezes, como se vê na observação 1().º, póde haver accessos de febre intermittente ou remittente no principio da paralysia, mas ge- ralmente não ha febre; o pulso fraco, pequeno, póde descer a 50 pul- sações no adulto; palpitações do coração ; ruido de sópro vascular em relação com o estado anemico ; algumas vezes um pouco de edema, ra- ras anasarca. A pelle, pallida c terrosa, tem tendencia para o resfria- mento, sobretudo nos membros inferiores. Alguns doentes têem tosse, e expectoração de mucosidades filamentosas, difficil, naturalmente li- gada a uma especie de paralysia da pharynge e do apparelho secreto- rio dos bronchios. Muitas vezes ha appetite regular e dejecções faceis, outras vezes anorexia e constipação de ventre. No meio de todo este padecimento a intelligencia fica intacta, ou fica apenas lenta c um tanto preguiçosa. A doença póde fazer progressos continuos, e a morte ser a sua consequencia, ou então as forças recuperam-se pouco a pouco, e a cura está completa de ordinario entre mez e meio e oito mezes. Nos casos de cura, que são os mais frequentes, melhoram pri- meiro as partes por ultimo acommettidas, com excepção do véo pala- tino e pharynge. Os casos de morte são felizmente mais raros. O sr. Maingault no- tou esta terminação doze vezes em noventa observações, ou quasi 1: 8. A morte é determinada ou por uma especie de sideração do systema ner- voso, por syncope, pela extensão da paralysia aos musculos do appa- relho respiratorio, pelo obstaculo que a paralysia do véo do paladar traz á sufficiente alimentação, ou emfim pela asphyxia determinada pela introducção de alimentos nas vias respiratorias. As paralysias diphthericas e os accidentes consecutivos á diphthe- ria podem sobrevir a uma angina diphtherica, que não tenha apresen- tado nenhum caracter de gravidade, quando as falsas membranas te- O GARROTILHO [45 nham sido poucas, a molestia de curta duração, e os symptomas ge- raes pouco pronunciados. Uma angina diphtherica, apparentemente benigna, póde pois pro- duzir accidentes consecutivos graves. Nem a albuminuria, nem o tratamento empregado contra a diph- theria parece ter a menor influencia na manifestação das paralysias consecutivas. : Estes factos são da observação dos srs. Blache, Pidoux, Main- gault, Trousseau e Sée, que têem visto phenomenos de paralysia diph- therica em seguida ás anginas mais benignas e mais ligeiras. Tem-se mesmo citado varias observações de paralysias em se- guida a “ânginas herpeticas, a anginas sem diphtheria, o que tem feito suppôr a alguns medicos, como os srs. Gubler, Bouchut e outros, que paralysias como as diphthericas se manifestavam em seguida , a anginas simples, e que aquellas não tinham portanto nada de espe- ciaes. Sem negar os facts citados pelos srs. Gubler, Gros, Empis, Mayer, Bouchut, etc., entendo que se podem explicar pela mesma fórma que nas epidemias de escarlatina, de febre amarella, de cholera, etc., em relação aos casos benignos, em que faltam muitos ou os principaes symptomas da doença, sem que comtudo seja rasoavel deixar de attri- buir esses casos ligeiros á mesma causa geral, que actuou menos pro- funda ou menos extensamente. As paralysias diphthericas podem confundir-se com outras que apparecem, ainda que mui raras vezes, consecutivamente a varias doen- cas agudas, como o typho, a febre typhoide, cholera, dysenteria, fe- bres eruptivas, erysipela, pneumonia, etc. Se a paralysia é limitada ao véo palatino, póde confundir-se com a angina syphilitica. Sendo generalisada, nas mulheres póde tomar-se pela paralysia hysterica, e em qualquer dos sexos, se o individuo é adulto, pela paralysia geral progressiva, e, se é creança, por tubercu- los cerebraes ou idiotismo. Em todos os casos a historia pregressa da doença e a sua mar- cha especial devem pôr o pratico a caminho do verdadeiro diagnosti- co. Convêm aqui repetir, com o sr. Séc, os caracterés proprios á mar- cha da paralysia diphtherica, que são os seguintes : 1.º A paralysia diphtherica segue uma ordem assaz regular na invasão successiva dos diversos orgãos, que é a seguinte: véo palati- no, membros inferiores, orgão da vista, membros superiores, e por fim musculos do tronco e da respiração. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE — T. HI. P. 1, 19 146 ESTUDOS SOBRE 2.º A paralysia diphtherica dos membros, muitas vezes tambem a paralysia do véo palatino e dos esphincters, é quasi constantemente precedida de anesthesia ou analgesia, raras vezes de hypersthesia nas mesmas partes. ; 3.º A analgesia dos membros limita-se aos segmentos inferiores, e diminue progressivamente desde as extremidades dos dedos até ás articulações do cotovello e do joelho, acima das quaes não passa. Terminando este esboço sobre os accidentes consecutivos ou tar- dios do crup e das affecções diphthericas, seja-me permittido apresen- tar o resumo de algumas das observações do paiz que me serviram para a redacção d'este capitulo. 21.º Observação — Angina diphtherica e crup em uma menina de “nove annos ; duração dos symptomas diphthericos por mais de vinte dias. Accidentes consecutivos dos dez para doze dias de convalescença; pa- ralysia do véo palatino e da pharynge; vertigens; paralysia ligeira no membro inferior esquerdo ; amblyopia ; cura em mez e meio. Uma filha do sr. João de Lemos, de nove annos, temperamento Iymphatico-nervoso, constituição fraca, moradora no Campo-Grande, tendo sido sempre saudavel apesar de debil, foi acommetida pelos fins d'abril de 1859, no tempo da epidemia do Campo-Grande, de angina diphtherica muito intensa, em que as falsas membranas se estendiam pela pharynge, amygdalas, véo palatino, uvula, e fossas nasaes, que se reproduziam com summa facilidade, e que obrigavam a repetidas cau- terisações. A larynge foi tambem acommettida, aindaque com menor intensidade, o que foi indicado pela tosse quasi crupal, enrouqueci- mento da voz e repetidas suffocações. Foi depois de vinte dias que as falsas membranas desappareceram. O tratamento, dirigido pelo meu collega, o sr. Manuel da Silva Franco, consistiu nas cauterisações repetidas, extensamente feitas com o nitrato de prata, nos topicos d'alumen, borax e chlorato de potassa, algumas sanguesugas no pescoço e depois fricções mercuriaes na mes- ma região, e internamente em alguns vomitorios e no chlorato de po- tassa. A doentinha entrou emfim na convalescença, mas ficou com muito má côr, voz nasal, e difliculdade na deglutição dos liquidos, que lhe davam no gôto. Contava dez ou doze dias de convalescença, e já saia a dar al- guns pequenos passeios, quando foi acommettida de vertigens, dando- lhe as primeiras na rua e fazendo-a cahir ; pouco depois notou fraque- O GARROTILHO 447 za consideravel na vista, a ponto de não poder distinguir as lettras mesmo do maior typo, e pelo mesmo tempo fraqueza notavel nos mo- vimentos da perna esquerda. Esta doente, alem do sr. Franco, foi vista varias vezes pelo sr. dr. Barral e por mim. Em uma das minhas visitas observei-lhe os olhos com-o ophthalmoscopio conjunctamente com o meu collega e amigo, o dr. May Figueira, e apenas notámos alguma congestão na papilla, so- bretudo do olho esquerdo. A beneficio de um vesicatorio na nuca, algum laxante salino, e sobretudo com o tratamento tonico de ferro e quina, e com o tempo, que não foi inferior a mez e, meio, a doente curou-se e está hoje per- feitamente boa. ; a 22.º Observação — Angina diphtherica e crup em uma menina de cinco annos; duração dos symptomas diphthericos por vinte e dois dias. Accidentes consecutivos aos dez dias de convalescença ; paralysia pala- tina e pharyngea; estrabismo interno; per turbações da vista e da ca- beça ; E em quinze dias. «... de cinco annos, filha do sr. J. A. M,, do Campo-Grande, de ça lymphatico-nervoso, debil, tendo sido antes mais ou me- nos doente, foi atacada, no principio de maio, de angina diphtherica, talvez mais intensa e mais extensa do que na doente da observação precedente, sendo n'esta mais notaveis a tosse crupal e as suffocações, que por vezes parecia a asphyxiavam. Houve de notavel na marcha da doença a extraordinaria tenden- cia á reproducção das pseudo-membranas, Ptyalismo desde o começo da doença até ao fim, que talvez se possa explicar pelo uso interno do chlorato de potassa, e uma dôr constante na região hypogastica. O collega Franco, que a tratou, empregou n'ella os mesmos meios que já mencionei na observação precedente, mas insistiu aqui mais nos vomitivos, e applicou dois vesicatorios. A doença durou vinte e dois dias. Quando já o assistente a ha- via dado em “convalescença, e se tinha despedido, appareceram signaes de paralysia palatina e pharyngea ; depois pronunciado estrabismo in- terno com perturbações de cabeça e-da vista, grande repugnancia para olhar os objectos claros, e dificuldade em andar” a ponto de ca- hir quando tentava caminhar depressa e desamparada. Estes incom- modos não eram permanentes, e, quando vinham, a doente punha a mão diante dos olhos e na testa, e encostava-se aos objectos proximos como quem tem uma vertigem. Este estado exacerbou-se até o quarto 19 + 148 ESTUDOS SOBRE dia, mas foi depois gradualmente diminuindo até quinze dias em que desappareceu em presença de banhos frios com emborcações á cabeça, uso interno do ferro, oleo de figados de bacalhau, e dieta restaurante. 23.º Observação — Angina diphtherica e escarlatina em uma me- nina de dez annos; dôr fortissima no quadril direito, estendendo-se a todo o membro, caria ; cura por anhylose seis mezes depois. Não é certo que os phenomenos consecutivos que se vão lêr na observação seguinte, cujos apontamentos devo ainda ao meu collega Franco, sejam immediatamente dependentes da diphtheria que teve a doente; comtudo creio que alguma partg teve ella no seu desenvolvi- mento, e pór isso a refiro. F...., de dez annos, filha do sr. F. do Campo-Grande, teve no mez de abril de 1859 uma angina diphtherica bastante intensa, mas sem crup, e conjunctamente escarlatina. A beneficio das cauterisações e-do tratamento proprio á escarla- tina, a angina estava extincta, e o exanthema em descamação, quando a doente foi atacada de uma dôr fortissima no quadril direito, que se estendia a todo o membro do mesmo lado. Era tão forte, que fazia gritar a doente constantemente, e tornava o membro inteiramente im- movel. Constou então que a doente tinha cahido, havia tempo, sobre o quadril d'aquelle lado, e que se tinha molhado. Aquella dôr atroz, que por espaço de mezes não deixou de ator- mentar a doente, apesar de todos os meios racionaes empregados pelo sr. Franco, foi depois de algum tempo complicada de uma febre, que tomou o caracter adynamico, a qual era naturalmente symptomatica da suppuração no quadril com signaes de caria do innominado, e tal- vez-tambem da cabeça do femur, que em seguida se manifestaram. A” força de tratamento essencialmente analeptico, de banhos de diffe- rente natureza e de outros meios, conseguiu o sr. Franco que a sua doente entrasse em convalescença. Então o pai da doente fez conti- nuar o tratamento por um homeopatha. Quando se levantou pela pri- meira vez, a doente achou-se muito aleijada, e tanto então como ago- “Ta, em que está aliás em boa saude, anda em muletas. A duração da doença excedeu a seis mezes. 24.º Observação — Angina diphtherica em um rapaz de onze an- nos; grande intensidade c fórma particular dos symptomas de invasão. Accidentes consecutivos «os quinze dias ; paralysia palatina € pharyn- gea; amblyopia e estrabismo convergente; cura em mez e meio. O GARROTILHO 149 F......., de onze annos, temperamento sanguineo, constituição ro- busta, morador no Campo-Grande, tendo tido sempre excellente sau- de, foi acommettido por occasião da epidemia de 1859, nos fins de maio, de uma muito intensa angina diphtherica. A quantidade das fal- sas membranas era tão grande, e a facilidade da sua nova formação era tanta, que o sr. Franco, que tratava o doente, diversas vezes as ex- trahia com a pinça, o que aliviava momentaneamente o doente. Houve n'este doente sobretudo de notavel a fórma e a intensidade dos symptomas de invasão, que consistiram primeiro em uma convul- são, com a qual o doente perdeu os sentidos, e cahiu por espaço de doze horas ou mais em estado comatoso com algum delirio, febre muito in- tensa, e lingua muito secca. Estes symptomas foram desapparecendo á medida que o phenomeno diphtherico se ia estabelecendo. N'este pri- meiro periodo pareceu ao collega assistente que estes symptomas de- pendiam de um estado congestivo ou inflammatorio do cerebro ou me- ninges, e por isso fez depleções sanguineas geraes e locaes, e empre- gou revulsivos energicos externa e internamente. Mas logo que os phe- nomenos diphthericos locaes se lhe manifestaram, dirigiu sobre elles o tratamento apropriado, recorrendo desta vez ao sulphato de cobre para obter o effeito vomitivo, que não tinha podido conseguir nem pelo tartaro emetico, nem pela ipecacuanha. Aos dez dias o doente entrava em convalescença, ficando todavia muito fraco. Durante a convalescença houve dysphagia e voz nasal; e quinze dias depois, quando já se considerava bom, no primeiro dia em que foi ao collegio, conheceu que não podia lêr por não distin- guir as lettras. Chamado de novo o sr. Franco, observou ligeiro estra- bismo interno, dilatação e immobilidade das pupillas, e reconheceu que o doente não differençava as lettras, nem mesmo outros objectos de maior vulto. Com um vesicatorio na nuca intertido por quinze dias, banhos mornos geraes com emborcações e-pannos frios na cabeça, tratamento analeptico e restaurante, curou-se em mez e meio. Referem-se ainda a accidentes consecutivos da diphtheria as ob- servações 1.º, 2.º e 10.º, transcriptas a pag. 84, 85 e 96 d'esta me- moria, sendo sobre todas notavel a ultima pela grande extensão das paralysias. 150 ESTUDOS SOBRE PROGNOSTICO O prognostico do garrotilho é mui grave, porque é uma doença geralmente fatal. Comtudo esta gravidade não é a mesma em todas as circumstan- cias. : Debaixo d'este ponto de vista varia segundo a idade, tempera- mento, constituição, condições sociaes e estado de saude anterior dos doentes ; segundo a fórma, certos symptomas e complicações da doen- ça; e emfim segundo o periodo em que se começou o tratamento, e o effeito dos medicamentos já empregados. - A idade é de todas as condições individuaes uma das que mais influe no prognostico do garrotilho. Póde dizer-se, em geral, que esta molestia é tanto mais grave, quanto mais novo é o doente. Segundo os srs. Rillier e Barthez, salva-se maior numero de creançcas das que têem cinco a sete annos, do que das que têem menos de quatro. N'este periodo é ainda o que vai do nascimento até os dois an- nos, em que a mortalidade é muito superior. As estatisticas seguintes, apesar de pequenas, concorrem a pro- var aquella proposição. Na do sr. Millard, que já citei na parte relativa é etiologia, em 124 casos de crup, operados de tracheiotomia no hospital de creanças de París no anno de 1857 e primeiro semestre de 1858, vê-se o se- guinte resultado. O GARROTILHO 151 IDADE NUMERO DE CASOS MORTOS CURADOS 2 annos 20 20 0 Suba Em 36 31 5 AS um 119 13 6 Esta 20 12 8 6 >» 11 6 5 Y » 8 7 ] Sida d 5 2 3 Dasicá 113 2 | 11 » 7, 2 0) Total. ... 124 95 29 Aqui até os tres annos, em 56 doentes houve 5 curas e 51 fal- lecimentos, o que dá a relação de 1:10,2. Na idade de quatro a seis inclusivê, em 50 casos curaram-se 19 e-falleceram 31, ou 1:1,63. Emfim na idade dos sete aos onze annos, de 18 enfermos curaram-se “5 e morreram 13, ou 1:2,6. A seguinte tabella mostra esta divisão em tres grupos. IDADE NUMERO DE CASOS FALLECIDOS CURADOS Até 3 annos 56 51 5 De 4 a 6 annos 50 31 19 De 7 annos para cima 18 o 13 5 Total) cin 5124 “95 29 Segundo esta estatistica, pois, a idade de mais grave prognosti- co seria a dos dois e tres annos; dos quatro aos seis annos, inclusi- vamente, a doença seria menos mortifera ; e novamente mais grave dos sete aos onze annos, sem. comtudo o ser tanto como até os tres annos. Nas estatisticas do nosso paiz, comprehendendo 20 casos de crup e angina diphtherica pertencentes aos expostos da Misericordia, tratados em domicilio nos tres annos de 1857 a 1859, e os 24 casos de crup em que a tracheiotomia foi praticada em Lisboa, obtem-se 44 casos de diphtheria, nos .quaes a idade influiu na terminação da doença do modo que se vê na tabella seguinte : 152 ESTUDOS SOBRE IDADE NUMERO DE CASOS | FALLECIDOS CURADOS 8 dias Í » 1 ES 2) 2 » [| mez l l » o) Í | » 8.» Í Í » O cio | Í » Bda od | Í » | 8 » Í » Í 2 annos 3 » 3 BD 3 3 » A pi Do 7 o 2 4 > » 2 2 » Ei) 3 2 | 5 z » 2 2 » 6 » 4 Í 3 65» 2 | | nd 3 >» | 8 » 2 2 » (O RIR) 2) | Í l 0 » | 1 » 17 » l 1 » Total... 44 | 30 14 N'esta estatistica acham-se, até á idade de tres annos, 15 casos, dos quaes foram 10 fataes e 5 curados, ou 1:2; dos quatro a seis an- nos 18 casos, de que morreram 12 individuos e se curaram 6, ou 1:2; e de seis e meio annos para cima 11 casos, sendo 8 de morte e 3 de cura, ou 1:2,66. Como se vê, nesta estatistica a maior mortalidade deu-se dos seis e meio annos para cima, e foi a mesma nos outros periodos da vida. Em outras estatisticas citadas no capitulo da etiologia se póde fa- zer idéa, mais ou menos approximada, da mortalidade pelas idades, mas não se póde comparar o numero dos atacados e curados por faltarem estes elementos. Temperqmento e constituição. O temperamento lymphatico e a constituição fraca ou enfraquecida por doenças anteriores, pelas priva- cões, pelas más condições hygienicas em que vivem os doentes, aggra- O GARROTILHO 153 vam proporcionalmente o prognostico do garrotilho, como o fazem em quasi todas as doenças. O contrario acontece com as condições op- postas. As condições sociaes dos enfermos influem nos resultados do crup, como geralmente nas outras doenças. E” com effeito indubitavel, que as creanças, que não soffrerem privações, que pertencerem a familias que vivam no meio da abundancia e das melhores condições hygieni- cas, têem por isso, em igualdade de circumstancias, maior numero de probabilidades de cura do que aquellas que soffrerem as privações da miseria e as suas consequencias. O estado de saude anterior á invasão do crup presta-se ás mes- mas considerações que fiz sobre o temperamento e constituição, e so- bre as condições sociaes dos doentes. Para não as repetir direi sómente que, em geral, o prognostico é mais favoravel quando as condições de saude anteriores forem boas, e mais grave quando molestias preceden- tes tiverem enfraquecido ou deteriorado a constituição dos enfermos. A fórma do garrotilho influe muito mais no prognostico da doença. O crup simples ou localisado é uma molestia muito menos gra- ve do que o infectuoso. N'aquelle caso, quando a marcha da doença é rapida e muito repetidos os accessos de suffocação, o prognostico é certamente mui grave, mas assim mesmo ha o recurso da tracheioto- mia, que é então muito mais vezes seguida de bom resultado. A al- buminuria, se existe n'esta fórma, é geralmente dependente da as- phyxia, diminue na proporção do restabelecimento da hematose e não tem por isso gravidade. Na fórma infectuosa o prognostico é muito mais grave; a mo- lestia é tres ou quatro vezes mais mortifera do que o crup simples : quasi todos os casos são por tanto fataes. Quando a exsudação diph- therica apparece nos labios, orelhas, partes genitaes, na pelle, e so- bretudo nas fossas nasaes, é raro que a morte não seja a sua conse- quencia. Quando a albuminuria é muito copiosa e persistente, a ter- minação é de ordinario mortal, porque é naturalmente effeito da in- feccão e da debilidade geral, a que se segue o edema, e ás vezes a anasarca e a morte. Se pelo contrario a albuminuria diminue pouco a pouco passados alguns dias e depois cessa, é isto para mim um signal quasi certo da cura mais ou menos prompta da doença. O crup idiopathico é menos grave do que o garrotilho epidemi- co. Tambem o primeiro toma mais geralmente a fórma simples, e o segundo a fórma infectuosa. Entre as diversas epidemias tem havido ainda umas muito mais mortiferas do que outras. MEM. DA ACAD.-—|,º CLASSET, IH. P. 1. 20 154 ESTUDOS SOBRE Certos symptomas ha que grupados indicam uma terminação fa- voravel ou fatal. Os symptomas que podem tomar-se por favoraveis são: a dimi- nuição successiva dos accessos de suffocação, a expulsão de falsas mem- branas seguida de melhora no estado geral e local, a tosse mais hu- mida, a diminuição ou desapparecimento do ruido laryngo-tracheial, a - diminuição e sobretudo a desapparição da albumina das urinas. Pelo contrario, quando os symptomas precedentes, em vez de di- minuirem, se exaggeram ; quando depois da tracheiotomia fica um ruido aspero de serra na inspiração, produzido pela passagem do ar atravez da canula; quando se não póde conseguir o effeito vomitivo pelos meios ordinarios; quando accresce grande congestão da face e do collo, suppressão da tosse, aphonia, petechias, disposição a hemor- rhagias, prostração, resfriamento das extremidades, pequenez e irregu- laridade do pulso, o prognostico é então da maior gravidade. As complicações aggravam sempre o prognostico do garrotilho. Sem fallar dos accidentes consecutivos á diphtheria, nem das outras complicações que se ligam ao crup infectuoso, lembro sómente, como as mais frequentes, a pneumonia lobular discreta ou confluente, cara- cterisada por diminuição na resonancia do peito, e pela disseminação de uma notavel quantidade de fervores subcrepitante e mucoso nos dois pulmões; a preumonia lobar principalmente denunciada por som massiço e sópro tubario em um ou, mais raramente, em ambos os la- dos peito; o emphysema interlobular dos pulmões, determinado pelos esforços da tosse em que rebentam as vesiculas pulmonares, e indica- do pela dyspnéa e maior sonoridade do thorax; e emfim a enterite tão frequente nas creancas. Qualquer d'estas complicações, com quanto aggrave muito O pro- gnostico do crup, não o torna por isso necessariamente mortal. Se um tratamento convenientemente energico foi comecado cêdo, ha muito mais probabilidades de cura, do que quando o tratamento é instituido tarde, e sobretudo se tem sido debilitante, pela tendencia que a doença tem á prostração e para se tornar infectuosa, o que suc- cede sempre tanto mais facilmente, quanto mais debilitado está o doen- te, e quanto menor é a sua força de reacção vital. Um dos ultimos doentes que operei de tracheiotomia (observa- ção 17.º da minha memoria sobre a tracheiotomia no crup), ao qual se tinham applicado sanguesugas, e que deu muito trabalho para vedar o sangue, a quem se havia applicado um vesicatorio e ministrado pur- gantes, deveu provavelmente a sua terminação fatal a um similhante O GARROTILHO 155 tratamento, concorrendo tambem a falta de cauterisações com a insis- tencia e na extensão que tenho como essencial e indispensavel para impedir a propagação da diphtheria das fauces á larynge. Se depois de um tratamento bem dirigido, o mal se aggrava pro- gressivamente, o prognostico é muito peior do que na hypothese con- traria, porque não ha o recurso de mudar para uma therapeutica mais racional. Não terminarei esta parte do estudo, que me propuz escrever, sem dizer que é preciso não desesperar nunca da cura do garrotilho, porque ha exemplos de salvar doentes d'esta molestia, sobretudo pela tracheiotomia, estando esta operação indicada, quando tudo fazia sup- pôr uma morte inevitavel. Pela minha parte tenho visto resuscitar, para assim dizer, doen- tes de garrotilho, como se vê em algumas das observações de tra- cheiotomia, e o mesmo acontece a todos os que vêem maior numero de doentes de crup. NATUREZA No principio d'este seculo houve, como disse, o celebre concurso mandado instituir por Napoleão 1, com o fim de conhecer a natureza e o tratamento do crup. Até este tempo a natureza do garrotilho tinha sido considerada diversamente pelos medicos que mais o haviam estudado, mas era, a meu vêr, mais proximo da verdade o juizo que então se fizera do ob- jecto do que foi depois, como o mostram os exemplos seguintes : Para Herrera, que escreveu em 1613, a molestia era de natureza maligna, contagiosa, e pestilencial. O nosso Zacuto Lusitano (Zacuti Lusitani Praxis Medica Admi- randa, Lib. I, pag. 23, De faucium malignis ulceribus. Lugduni, 1657) suppunha tambem que a doença era de natureza contagiosa e pesti- lente, como se deduz das suas proprias palavras, que transcrevo. « In his partibus (fauces) ex humoris virulenti affluxu gignuntur carbun- culosae inflammationes, quae pestis dirae, aut veneni promptissum ins- tar, contagio quodam, pueros et adultos corripiunt, maleficientissimis- que stipata symptomatis citissimum necem inferre solent etc. » Segundo Heredia (1665) o garrotilho era uma angina ulcerosa maligna, tambem contagiosa e epidemica, de que admittia duas fórmas: inflammatoria ou sofjocante, e asthenica ou maligna. Ghisi, que estudou a epidemia de: Cremona em 1747 e 1748, 20+ 156 ESTUDOS SOBRE que verificou anatomicamente a existencia da falsa membrana na la- rynge, a qual primeiro fôra notada em París no anno de 1576, achou n'aquella epidemia e descreveu duas fórmas de garrotilho, uma com a pseudo-membrana na larynge, que denominou angina estrepitosa, a qual matava por suffocação; e outra, a que deu o nome de angina gangrenosa maligna, que matava sem suffocação. Samuel Bard (1784), que deu ao crup a denominação de angina suffocatoria, assentou que a angina pseudo-membranosa, e o crup eram da mesma natureza, e só differiam pela sede diversa de cada uma das doenças. Uma e outra eram, segundo Bard, produzidas por um virus que se transmittia de individuo a individuo. Este virus introduzido na economia produzia um estado geral, a infecção do sangue, de que procediam os symptomas grave%*ou malignos da doença. Só assim Bard podia explicar a facilidade com que a molestia atacava as pessoas que tinham relações proximas com os doentes. Esta doutrina tão clara- mente exposta, e, a meu vêr, tão proxima da verdade, em breve foi. esquecida, e apenas referida sem se lhe dar a merecida importancia. Para o nosso Soares Barbosa (epidemia de Leiria em 1786 e 1787) o garrotilho era tambem de natureza contagiosa, e elle mesmo tinha sido uma das victimas do contagio. Dos escriptos que concorreram ao premio Napoleão (1811) resul- tou a formula pathologica, que exprimia a opinião seientifica da época relativamente ao crup.' Uma parte dos concorrentes (Albers, Vieusseux etc.) suppoz que a doença era sómente inflammatoria, uma simples /aryngo-tracheite, que só differia das outras phlogoses pelo grau phlogistico que lhe dava o caracter pseudo-membranoso. A doença foi considerada por outra parte dos melhores conçor- rentes (Jurine, Double, etc.) como uma ix/lammação particular. A mo- lestia começava com os caracteres do catarrho pulmonar ordinario, mas com alguma cousa de extraórdinario ou singular, que lhe fazia tomar promptamente a fórma adynamica. O caracter espasmodico e as alternativas dos accessos de suffocação, que a falsa membrana laryngea ou tracheial não podia explicar, e a adynamia, que bastantes vezes ter- minava a doença, fizeram pensar que a molestia não era simplesmente inflammatoria; que a dyspnéa, que a acompanhava, não era só meca- nicã; e€ que a doença era muitas vezes promptamente adynamica, sen- do algumas vezes já assim primitivamente. Veiu depois a escóla physiologica, segundo a qual toda a patho- logia era dominada pela theoria da inflammação ; e vendo que o crup O GARROTILHO I q Sa apresentava um certo numero de caracteres da phlogose, collocou-o na classe das inflammações, denominando-o laryngite pseudo-membranosa, designando o nome da especie o caracter principal da doença, que foi attribuido á exaggeração de um dos caracteres da inflamação pura, a exsudação fibrino-albuminosa. A angina pseudo-membranosa e o garrotilho eram, pois, antes de tudo e sobretudo, uma inflammação que era preciso debellar pelos an- tiphlogisticos. O sr. Bretonneau (1826) achou toda a medicina assim dominada pelo imperio da doutrina da moda, o physiologismo broussaisiano. Já Pinel havia dito que a inflammação apresentava caracteres muito assignalados conforme os diversos tecidos que invadia, mas o auctor do tratado da diphtherite fezmmais do que o auctor da xoso- graphia philosophica, demonstrou que alem das differenças que a di- versidade de séde e a intensidade da molestia deviam dar aos caracteres da inflamniação, havia outras procedentes da especificidade da phlogo- se, da qual dependia a duração, a gravidade e o perigo da doença. O sr. Bretonneau, pois, que tinha o crup e a angina diphtherica como doenças da mesma natureza, considerou-o como inflammação, por quanto tinha os caracteres das doenças inflammatorias, mas ixflamma- cão especifica por ser contagiosa, como as doenças chamadas especifi- cas, e por se desenvolver epidemicamente. Ha poucos annos, o dr. Vosgues, de Beriers, fez uma communi- cação á Academia de Medicina de París, por intervenção do sr. Vel- peau, na qual considerava o crup e todas as outras affecções diphthe- ricas como uma fórma das febres eruptivas, como um Proteo d'estas doenças, o que elle suppunha em razão de apparecerem juntas bastan- tes vezes, de se substituirem mutuamente com muita facilidade, e de se vêr cessarem epidemias de sarampo, de escarlatina e de bexigas, quando appareciam as-de crup e de angina diphtherica, e vice versa. Esta doutrina não teve na Academia nem fóra della a acceita- cão que seria para desejar. Menos importancia ainda tem merecido o modo por que o sr. Jo- din considerou a natureza do crup e das doenças diphthericas. O sr. Jodin, na sua memoria impressa em 1859, suppõe que as pseudo-membranas das molestias diphthericas são constituidas por ve- getaes parasitas, cogumelos, que se reproduzem facilmente e são o ger- men do contagio diphtherico, para destruir os quaes aconselha o em- prego local do perchlorureto de ferro. Para mostrar a falta de fundamento da theoria do sr. Jodin, basta 158 ESTUDOS SOBRE dizer que outros micrographos, de muito mais auctoridade, como o sr. Ch. Robin entre outros, não acharam os suppostos vegetaes parasitas, ou só os têem notado accidentalmente, e que o proprio dr. Jodin al- gumas vezes não conseguiu observal-os; e, nos casos em que os pôde perceber, não constituiam as falsas membranas, mas appareciam sobre ellas. Pondo de parte tudo o mais que se tem dito e escripto sobre a natureza do garrotilho, exporei a opinião que tenho formado n'este ponto. Duas opiniões principaes ha hoje mais sustentaveis relativamente á natureza do crup. Uma considera a molestia primitivamente local, podendo depois generalisar-se e tornar-se septica pela sua extensão progressiva, e pela absorpção dos productos pathologicos creados localmente. A outra opinião, que tenho por mais conforme com a melhor e a mais accurada observação, tem o crup por uma molestia primitiva- mente geral, e não consecutivamente generalisada, do mesmo modo que as febres eruptivas e outras affecções. Para mim o garrotilho é, com effeito, uma doença primitivamente geral, uma molestia infectuosa, uma intoxicação sui generis, como as pyrexias -cutaneas, tendo por erupção a falsa membrana, do mesmo modo que as bexigas téem a pustula, a escarlatina tem as manchas escarlates pontoadas, e o sarampo as nodoas vermelhas irregulares na pelle. Muitas e diversas razões concorrem para me firmar n'esta opi- nião; a saber: a incubação do principio morbifico que determina o crup; o modo por que comeca e a sua marcha; alguns de seus sym- ptomas; a analogia com outras doenças geraes, e o seu apparecimento -conjunctamente com algumas d'ellas ; o seu desenvolvimento sob a fór- ma epidemica; e emfim a sua transmissão por contagio ou infecção. É certa a existencia de um dado periodo de tempo, decorrido desde a exposição á causa da diphtheria até ás suas primeiras mani- festações, desde que o principio morbigeno, o virus diphtherico, entra no organismo, até ao apparecimento dos seus primeiros effeitos. Este periodo, denominado de incubação, é, como já o fiz notar a pag. 109 e 110, de dois a sete dias pouco mais ou menos, como nas febres exanthematicas e nas molestias infectuosas; e portanto exis- tindo, como é provado que existe, e durando como n'essas molestias geraes, é um ponto bem notavel de contacto ou de similhança entre todas ellas. O GARROTILHO 159 Quando se examina escrupulosamente o modo por que a doença tem começado, póde saber-se que, quasi sempre dias antes de sermos chamados a tratar os doentes, um certo numero de symptomas geraes precede de mais ou menos tempo as primeiras manifestações locaes, os quaes são em geral: quebrantamento do corpo, dóres de cabeça mais ou menos intensas, pouco appetite ou fastio, febre mais ou me- nos forte precedida ou não de calefrios de maior ou menor intensida- de, algumas vezes uma convulsão e perda dos sentidos, tonturas ou vertigens, epistaxis, etc. Estes symptomas, que caracterisam: o perio- do inicial do crup, variam na sua intensidade e duração, conforme os individuos e as circumstancias. São por isso ás vezes pouco notaveis, a ponto de serem desconhecidos pelas familias, ou por quem não at- tende senão aos phenomenos locaes que ferem mais a attenção, como a dôr de garganta, a difficuldade da deglutição, a tosse, ou a rouqui- dão. Tem-me acontecido bantantes vezes ser chamado para doentes com a diphtheria da pharynge ou da larynge, a respeito dos quaes se dava a doença como tendo-se manifestado logo localmente ; e, todavia, in- terrogando miudamente, tenho conhecido que symptomas geraes em maior ou menor numero, e mais ou menos notaveis, se haviam apre- sentado um, dois, tres quatro e mais dias antes; ou que os sympto- mas geraes tinham comecado ao mesmo tempo que os primeiros phe- nomenos locaes, mas sendo estes tão ligeiros então, que não podiam ser a origem d'aquelles, mas o effeito simultaneo da mesma causa geral. O crup, pois, ou a diphtheria laryngea começa como todas as doenças geraes, como as febres, como as doenças agudas totius substan- tie. Depois dos phenomenos que indicam o principio da doença, ap- . parecem então os phenomenos locaes, a sua erupção caracteristica; e que é para a diphtheria a falsa membrana, como a erupção intestinal é para a febre typhoide, come a pustula é para a variola, como as no- doas vermelhas irregulares da pelle são para o sarampo, ete. As falsas membranas desenvolvem-se com um apparato febril mais ou menos intenso, a febre crupal, durando este periodo um septenario approximadamente. Passado este periodo, ou antes d'elle terminado, a doença declina, os symptomas geraes diminuem, as falsas membra- nas absorvem-se, ou retrahem-se e cahem, e o individuo cura-se, ou morre por um accidente como a asphyxia, ou pelos phenomenos da infecção. 3 160 ESTUDOS SOBRE A marcha do crup é, pois, como a das doenças geraes agudas em que a economia desenvolve um certo numero de symptomas, pelos quaes mostra a sua reacção com o fim de se desembaraçar de um prin- cipio morbifico interno. Ha symptomas no crup que estão em perfeita conformidade com a idéa que faço de ser uma molestia geral. Pretendo fallar do estado febril que acompanha os phenomenos locaes ; do caracter da dyspneéa ; da albuminuria ; das falsas membranas que se manifestam dissemina- das nas diversas membranas mucosas, na pelle excoriada, ou em qual- quer solução de continuidade; dos symptomas de infecção ; e dos acci- dentes consecutivos. O estado febril, que acompanha os phenomenos locaes do crup, e que muitas vezes os precede, constitue a febre crupal. Esta febre, que é manifesta em maior ou menor grau, podia explicar-se como de- pendente do estado local em algumas circumstancias, e sobretudo em uma certa época da doença, mas bastantes vezes, no começo da evolu- ção dos phenomenos locaes e mesmo no decurso da doença, estes são tão pequenos, que não se póde desconhecer que o estado febril é antes a causa do que o effeito d'elles. A difficuldade da respiração, se bem que por vezes continua e em harmonia com o embaraço local que as falsas membranas deter- minam nas vias respiratorias, manifesta-se frequentemente por ataques, ou exacerba-se por accessos subitos, temporarios, intermittentes, que o facto constante, permanente, e invariavel do obstaculo mechanico produzido pela falsa membrana não póde explicar sufficientemente. E' por isso que alguns medicos têem feito entrar o elemento nervoso, o elemento espasmodico na explicação da dyspnéa crupal. A asphyxia, pois, pela falsa membrana é um epiphenomeno muito importante, mas não constitue toda a doença, como pretendia a pri- mitiva escola Bretonneana. A doença é antes um envenenamento geral, que se manifesta e se desenvolve de dentro para fóra, do intimo do organismo para o exterior, sobretudo para a mucosa das vias respira- torias, como a fórma da dyspnéa concorre a mostrar. A albuminuria, que apparece em um terço dos doentes, presta outro argumento para dizer que o garrotilho é uma molestia geral, uma doença em que o sangue está mais ou menos alterado na sua crase. Independentemente da explicação que por ventura possa dar-se da albuminuria no crup asphyxico, pela congestão dos rins, em mui- tos outros casos essa explicação não é possivel. Tem logar no crup o que se vê bastantes vezes em outras molestias inquestionavelmente ge- - O GARROTILHO | 161 raes e infectuosas, nas quaes a albumina sáe pelas urinas em um certo periodo da sua evolução, como na febre amarela, na cholera, escar- latina, variola, etc. O apparecimento das falsas membranas disseminadas nas muco- sas, na superficie da pelle desnudada pelos vesicatoríios, nas cesuras das sanguesugas, na ferida da tracheiotomia, ou em qualquer outra solução de continuidade, emfim, levam á evidencia que o crup é uma molestia determinada por uma causa geral, uma molestia diathe- sica. Os symptomas que acompanham o crup quando elle toma a fór- ma maligna ou infectuosa, taes como os que caracterisam o estado ady- namico, a pallidez livida da pelle, as petechias, as exsudações de san- gue denegrido e diffluente, os bubões cervicaes quando ha conjuncta- mente angina diphtherica, etc., são outra prova de que a doença é ge- ral, e determinada por um principio morbigeno, que actua sobre o sangue alterando-o, como o faz na febre amarella, na escarlatina, na febre typhoide, etc. Depoem no mesmo sentido os phenomenos consecutivos ou secun- darios do crup e das affecções diphthericas, caracterisados por paralysias mais ou menos generalisadas, e manifestando-se em partes aonde a in- fluencia local não podia chegar, como os membros inferiores, os or- gãos da vista, etc. A analogia do crup com certas molestias geraes, e o seu appare- cimento conjunctamente com ellas, é ainda outra prova a favor da these que sustento. O periodo de incubação da doença, o modo por que começa e se desenvolve, a sua marcha e duração, fazem o crup muito analogo ás febres exanthematicas, sobretudo a escarlatina, o sarampo, e as bexi- gas, conjunctamente com as quaes apparece muitas vezes. O que fica escripto no capitulo consignado á etiologia, pag. 59 e 60, dispensa-me de repetir quanto frequente é o crup ou a angina diphtherica antes, ao mesmo tempo, ou depois das febres eruptivas, o que mostra a ana- logia, e para assim dizer a consanguinidade e approximação nosologi- ca d'essas especies morbidas. A manifestação da doença sob a fórma de epidemia parece-me uma prova, que não deixa duvida, de que o crup é uma doença geral, analoga a outras que se comportam do mesmo modo. Que a doença, que serve de thema a este estudo, apparece repe- tidas vezes epidemicamente, é um facto tão commum e tão averigua- do, que não póde permittir contestação. MEM, DA ACAD.=—— |, CLASSET. II. P. 1. 21 162 ESTUDOS SOBRE . Para referir só os exemplos do paiz, basta lembrar a epidemia que houve em Olivença em 1626, a de Leiria em 1786 e 1787, ea que observámos em Lisboa e no Campo-Grande em 1858 e 1859. A transmissão da doença por contagio ou infecção, e talvez a sua inoculabilidade, como notei na parte da etiologia relativa ao contagio e infeccão (pag. 61 a 72), presta-me ainda um poderoso motivo para crêr que o crup é uma molestia geral, e analoga ás febres exanthe- maticas que se transmittem por aquella fórma. De tudo o que acabo de expôr não se deve concluir que eu ne- gue ao crup o elemento inflammatorio. Este elemento tem sem duvi- da uma parte na doença, mas uma parte inteiramente secundaria, co- mo nas bexigas, na escarlatina, no sarampo, na syphilis, e em muitas outras doenças, nas quaes este elemento não é o principal, mas su- bordinado á natureza da causa que o domina, e lhe imprime caracte- res especiaes. Eflectivamente quando ha symptomas de inflammação, não estão em harmonia com a gravidade da doença; e muitas vezes nas autopsias nem vestigios se encontram d'essa inflammmação. Alem de que, as falsas membranas que se desenvolvem na superficie da pelle desnudada pelos vesicatorios, e que não se podem deixar de considerar da mesma natureza que as do crup com o qual coexistem, não se ma- nifestam com signaes de inflammação, mas ao contrario com um es- tado de atonia bem caracterisado. Comtudo uma differença ha bem essencial entre o crup e as fe- bres exanthematicas ás quaes o comparo como doença geral, e vem a ser: o estado local, que no crup merece muito mais importancia de- baixo do ponto de vista do prognostico, e sobretudo do tratamento, do que, por exemplo, a pustula da variola, e a erupção da escarlati- na, o que depende da séde e da fórma da manifestação local do gar- rotilho, que, se não se destroe prudentemente, póde por si só produzir a morte por asphyxia ou pela infecção secundaria. Aqui, como na pus- tula maligna, é de preceito atacar directamente a manifestação local para deter a marcha progressiva da doença e obstar a outras succes- sivas manifestações. Tendo demonstrado que o crup é uma molestia geral, analoga ás pyrexias exanthematicas, resta-me provar que o crup, a angina e as outras affecções diphthericas são a mesma doença, assim como que não ha differenca senão de intensidade entre o crup simples e o crup maligno, como entre a angina membranosa chamada commum e a an- gina membranosa maligna. - Qualquer que seja a séde das falsas membranas, a doenca geral O GARROTILHO 163 é sempre a mesma, « diphtheria. Apresente-se a falsa membrana na garganta, constituindo o que se denomina angina diphtherica ; desen- volva-se na larynge, constituindo o garrotilho ; manifeste-se na mucosa bocal ou nasal, formando a estomatite e o coryza diphtherico, etc., a natureza da doença é sempre a mesma, é em todo o caso a diphthe- ria; € conviria por isso designar aquelles estados por'diphtheria gut- tural, diphtheria laryngea, etc., indicando o nome principal o genero e a natureza da doença, e o nome da especie designando a séde ana- tomica da aflecção. A diversidade de aspecto e mesmo de symptomas e de gravida- de, que as diflerentes manifestações podem apresentar, depende só da diferença da séde das falsas membranas. O que me faz não ter nenhuma duvida a este respeito, é vêr como em uma mesma epidemia, em individuos na mesma habitação, ou da mesmas familia, um doente tem o crup ou a diphtheria laryn- gea, outro a angina diphtherica ou a diphtheria guttural, um terceiro a estomatite pseudo-membranosa, etc.; e como um dado individuo com uma certa especie de diphtheria transmitte a doença a outro com di- versa séde. A este respeito podem vêr-se as observações 7.º (pag. 91 a 93), 12: (pag. 102 e 103), 13.º (pag. 103 e 104). Alem d'isso devo ainda citar o sr. Paul Guersant, que refere um exemplo de diphthe- ria do prepucio em uma creança, quesa transmittiu em, angina pseu- do-membranosa a um irmão e ao pai. Não é, pois, duvidoso para mim que o crup, a bronchite, a an- gina e a estomatite diphtherica, o coryza diphtherico, a diphtheria prepucial, vulvar, anal e cutanea, sejam manifestações locaes diversas, mas todas immediatamente procedentes da mesma causa e com a mes- ma natureza. O crup simples ou commum, e o garrotilho maligno ou infectuoso, são tambem para mim a mesma doença com diflerença de intensidade ou de dóse toxica, assim como a angina pseudo-membranosa commum e a angina pseudo-membranosa maligna são a mesma doença, differen- tes unicamente na intensidade morbida. Não é só na diphtheria que a mesma doença se manifesta mais ou menos maligna, ou benigna, segundo varias cireumstancias. Em muitas outras doenças, já desenvolvidas esporadicamente, já manifesta- das em fórma de epidemia, se observa o mesmo. A escarlatina é umas vezes ligeira e benigna, outras vezes muito grave e maligna; o mes- mo póde succeder ao sarampo; o mesmo se vê nas bexigas, que quan- do discretas .são uma doença pouco grave, e muito grave quando con- 21 x 164 ESTUDOS SOBRE N fluentes. E comtudo ninguem dirá que estas doenças são diferentes nos dois casos. , Nas epidemias acontece o mesmo. Ha com effeito epidemias de escarlatina, de sarampo, de bexigas, benignas ou graves, o que depen- de da natureza dos individuos, e, segundo a phrase escolastica recebi- da, do genio epidemico. Na mesma epidemia, ainda se vêem casos be- nignos a par de casos muito graves manifestados ás vezes em indivi- duos de uma mesma familia, ou em habitantes da mesma casa, Na epidemia de cholera-morbus em 1856 e na de febre amarella em 1857, todos os que tratámos doentes d'aquellas enfermidades, vimos não um, não dez, mas muitos casos em que a doença apresentava-o apparato de muita gravidade em certos doentes, e de notavel benignidade em outros. Ainda aqui, em presença de certos phenomenos caracteristicos e communs, sob a mesma influencia epidemica, não seria logico dizer que havia duas epidemias diversas, mas a mesma atacando com mais força uns do que outros individuos, dependendo isto certamente do gráo de predisposição natural dos doentes, da sua constituição organica, ou da força do principio toxico. O que torna ainda mais provavel a proposição que eu sustento, é a observação que mostra, que a angina pseudo-membranosa simples, chamada commum, transmitte-se sob a fórma maligna para um indi- viduo, e benigna para outro, e vice-versa. Não deixam duvida os se- guintes factos referidos a proposito pelo sr. Guerard, e citados pelo sr. Trousseau. Em uma mesma familia e no espaco de seis semanas, pouco mais ou menos, o sr. Guerard observou o seguinte: uma crean- ca morreu de crup sem esta doença se estender para a pharynge; dois dias depois, outras duas creanças foram atadas de anginas erythema- tosas ligeiras; passados oito dias, o pai, de quarenta e cinco annos, teve uma angina muito violenta com amygdalite diphtherica e inchação dos ganglios cervicaes; uma Tapariga teve uma angina simples ; e em fim um rapaz contrahiu uma angina diphtherica bem caracterisada. Portanto, em seis semanas pouco mais ou menos, em uma mesma fami- lia, houve successivamente-um caso de crup mortal, tres anginas sim- ples, e duas pseudo-membranosas, sendo uma grave e outra benigna. Estes factos e mais que poderia citar, entre outros os das ob- servações 7.º, 13.º, e o que escrevi de pag. 66 a 69, levam-me'a crêr que, assim como em tempo de epidemia, principalmente, a escarlatina póde existir sem a erupção, sinxe scarlatina, havendo só angina, febre, e mais tarde albuminuria ; assim como póde haver sarampo sine mor- billis, manifestado só pela inflammação catarrhal das mucosas conjun- O GARROTILHO 165 ctival, nasal e bronchial; assim tambem creio que póde haver uma diphtheria anomala, manifestada em alguns individuos, em tempo de epidemia, só por angina simples, com febre, e estado geral mais ou menos grave. Assim se podem bem explicar as paralysias diphthericas conse- cutivas a anginas apparentemente simples, mas que naturalmente eram dipltheriticas na sua natureza intima. Portanto, resumindo o que penso sobre a natureza do crup, di- rei que é uma molestia geral, totitus substantiae, especifica, infectuo- . sa; em que as manifestações locaes se desenvolvem especialmente so- bre a mucosa da larynge, tendo por causa um principio morbifico, um virus especial, que é o da diphtheria, qualquer que seja a séde e a extensão das suas manifestações locaes — das falsas membranas ; umas vezes apresentando-se benigna, outras grave, do mesmo modo que as bexigas, a escarlatina, o sarampo, à febre amarella, etc., sem que o fundo, a natureza da doença, seja por isso differente. O que deve tornar mais acceitavel a doutrina que sustento, so- bre a natureza do crup e da diphtheria em geral, é a auctoridade muito competente dos meus mui illustrados collegas, os srs. drs. Bar- ral, Bernardino Antonio Gomes e Simas, que têem, pouco mais ou me- nos, a mesma opinião sobre o objecto; assim como a do sr. Trousseau, que é dos medicos estrangeiros talvez o mais competente no assum- pto. TRATAMENTO O tratamento do crup divide-se naturalmente em duas partes : tratamento medico, e tratamento cirurgico. Não é meu proposito occupar-me n'este logar senão do tratamento medico. O tratamento cirurgico pela tracheiotomia, que tem applica- ção no crup para prevenir a morte por um accidente commum nesta doença, a asphyxia crupal, fará objecto dejo outro opusculo que publi- carei depois. É portanto só do tratamento “medico que vou occupar-me no ul- timo capitulo d'esta memoria. Não é comtudo o meu fim passar para este logar os centenares de meios medicos, a lista immensa de medicamentos e de remedios que se téem aconselhado e usado n'esta doença. Muitos d'elles eram a consequencia das doutrinas medicas do tempo, ou da idéa inexacta ou erronea que cada um formava da natureza da molestia. O que vai principalmente occupar-me n'este capitulo é a descri- 166, ESTUDOS SOBRE pção do methodo que emprego no tratamento do crup. O que tiver de-dizer de alguns meios mais ou menos usados, e que eu não ado- pto, levar-me-ha muito pouco tempo. Antes, porêm, devo dizer quanto importante é o tratamento ener- gico e bem dirigido do garrotilho: e que a doença abandonada aos recursos da natureza, sem ter uma terminação necessariamente fu- nesta, é comtudo frequentemente fatal, a não ser na sua fórma mais benigna. Alem de varios factos nossos que conheço, sendo entre outros aquelle a que se refere a observação 7.º, seja-me permittido referir os seguintes : Conta o sr. Trousseau, que em 1828 na epidemia da antiga So- logne, que elle foi estudar com o dr. Ramon, em uma familia de 17 membros morreram 15 que não tiveram tratamento, e escaparam só- mente 2 que foram submettidos a tratamento energico: uma creada de dezeseis annos a quem o parocho de Tremblerif havia tocado oito ou dez vezes a garganta com espirito de sal (acido hydrochlorico), e o chefe da familia, de vinte e sete annos, que foi tratado pelo proprio sr. Trousseau. Refere este mesmo sabio que em Marcilly en Villette, população de 650 habitantes, morreram de angina pseudo-membranosa 7() pes- soas, ou mais da decima parte; e que só começaram a contar-se ca- sos de cura quando uma mulher d'aquella localidade começou a tra- tar os doentes com uma mistura de vinagre e alumen, tratamento com que no campo se usava curar ulceras da bôca e fauces dos car- neiros e porcos. Tres annos antes da epidemia de Sologne, outra igual, acommet- tendo uma das aldéas perto de Ferté-Gaucher, atacou 60 creanças do sexo masculino e matou-as todas, segundo a noticia do dr. Ferrand na sua these inaugural sobre a angina membranosa. Não é preciso mais para fazer bem sentir eee importa tratar desde logo e energicamente a diphtheria. O tratamento medico do crup consta de meios geraes e meios locaes. Meios geraes. — Comprehendem os sudorificos, emeticos, alteran- tes, tonicos, antiphlogisticos e revulsivos, sobre os quaes farei algu- mas considerações. Sudorificos. Estes meios só devem ter applicação no crup em seu primeiro periodo, antes de manifestados os phenomenos diphtheri- cos locaés, o que raras vezes se póde fazer, por ser em periodo mais " O GARROTILHO 167 adiantado que vemos geralmente os doentes. Faço uso d'elles modera- damente n'aquellas circumstancias servindo-me de ligeiras infusões de tilia, de flôres de borragens, auxiliadas com sinapismos volantes etc., como todos fazemos geralmente na invasão das febres exanthematicas e com o mesmo fim. Emeticos. Os vomitivos são empregados com muita vantagem no tratamento do garrotilho. Mesmo antes de invadida a larynge, quando a doença está ainda limitada á pharynge, tenho por vantajoso empregar os emeticos immediatamente depois de bem cauterisadas as superficies invadidas pelas falsas-membranas. Servem já então de meio mechanico, que auxilia muito e determina a separação e expulsão dos productos diphthericos que téem ficado adherentes á garganta. . Quando a larynge é já invadida, quando ha tosse, rouquidão, rui- do laryngeo, e sobretudo quando ha dyspnéea, os emeticos são tambem de muita e de maior vantagem, porque concorrem bastantes vezes para despegar e expellir d'alli as falsas membranas, desafogando assim a respiração, que depois se faz mais facil e desafrontada. Não poucas ve- zes tenho visto melhora muito notavel no enrouquecimento e na dif- ficuldade da inspiração consecutivamente ao effeito dos vomitivos. Esta melhora não é todavia as mais das vezes senão transitoria; mas em um certo numero dellas a repetição dos mesmos meios, quando cio zem igual efleito, traz novo beneficio e mesmo a cura. Aindaque os emeticos não tenham, como creio, outro effeito se- não o de remover mechanicamente as falsas membranas, e não o de impedir uma nova secreção diphtherica, fazem dois grandes beneficios com essa remoção : evitam a asphyxia, e previnem a infecção secun- daria, quero dizer, a que resulta da absorpção dos productos da de- composição das falsas membranas ; e se aquelle effeito se fôr conseguin- do durante o periodo de duração da diphtheria, que é limitado, che- ga-se assim a obter indirectamente por aquelles meios -a cura da doen- ca. Por este modo se explicam com effeito as curas do garrotilho só- mente pelos vomitorios. São, portanto, meios muito vantajosos no tratamento do SaRPs a assim se podesse obter sempre com elles o effeito vomitivo. O nosso Soares Barbosa, na epidemia de Leiria de 1786 e 1787, já usou com vantagem dos emeticos, preferindo a ipecacuanha ao an- timonio tartarisado. Como vomitivo uso do tartaro emetico e da ipecacuanha isolada- mente ou reunidos. O tartaro emetico é de certo vomitorio muito mais fiel do que a ipecacuanha, mas tem o inconveniente de trazer com 168 ESTUDOS SOBRE aquelle effeito uma prostração muito notavel, que ás vezes dispõe para aquella a que a molestia tem decidida tendencia, ou se somma com a que já existe. Outras vezes produz vomitos muito repetidos e diffi- ceis de suspender, diarrhea choleriforme e outros accidentes geraes que o podem tornar perigoso. E por isso que não uso d'aquelle medica- mento só, senão nas creanças fortes e nos primeiros periodos da doen- ça. Então faço geralmente a seguinte prescripção : Tartaro emetico........ 10 centigr. (2 grãos) Agua distillada...... -. 120 gram. (4 onças) Dissolva. Para tomar uma colher, das de sôpa, de dez em dez mi- nutos até sufficiente efeito vomitivo. » Mais vezes mesmo nos individuos fortes, ou nos de constituição mediana, reuno o tartaro emetico á ipecacuanha na seguinte formula : Tartaro emetico........ 5 centigr. (1 grão) Ipecacuanha em pó..... 1 gram. (20 grãos) Agua distillada........ 120 gram. (4 onças) - . ! = Dissolva e junte. Para tomar do mesmo modo que a poção ante-. cedente. Algumas vezes áquella e a esta junto 15 ou 30 grammas (> ou 1 onça) de xarope de ipecacuanha para reforçar a acção do remedio e facilitar a sua administração ás creanças. Quando os doentes são mui novos, fracos, ou enfraquecidos pela molestia, administro a ipecacuanha só, postoque menos fiel e menos energica no effeito emetico do que o preparado antimonial ; todavia não tem os inconvenientes que notei para este medicamento. Nestes ca- sos prescrevo a ipecacuanha ma dóse de 10 a 40 centigr. (2 a 8 grãos) - em agua morna de dez em dez minutos até conseguir o efleito deseja- do. Quando este não se obtem, procedo á titilação da uvula ou toco a epiglotte com um pincel de fios ou com uma esponja prêsa na ex- tremidade de uma haste de barba de baléa. A ipecacuanha tem ainda sobre o tartaro outras vantagens alem das que notei. O seu efleito é produzir mais esforços do que vomitos abundantes, e por isso serve melhor ao fim mechanico para 0 qual os emeticos são empregados no garrotilho. Alem disso o cipó produz o effeito purgante muito menos vezes do que o tartaro emetico; o que é ainda vantajoso porque não se debilitam por mais este modo os doen- O GARROTILHO 169 tes, a quem convêm muito conservar as forças, que a molestia tem toda a disposição para lhes roubar. 4 Quando a ipecacuanha ou os meios mechanicos não produzem os vomitos que se julga necessarios, ou quando falha o tartaro emetico nas circumstancias que indiquei, deve empregar-se o sulphato de co- bre em dóses fraccionadas, que costuma produzir o desejado effeito sem ter os inconvenientes que assignalci para o sal d'antimonio. A formula de que me tenho servido é a seguinte: Sulphato de cobre. ..... 10 a 20 centigr. (2 a 4 grãos) Agua distillada.. ...... 120 gram. (4 oncas) Dissolva. Para tomar uma colher, das de sôpa, de dez em dez minutos. Algumas vezes nenhum dos meios precedentemente notados, nem outros, como o sulphato de zinco, etc. produzem o effeito vomitivo que se precisa. Os casos em que isto acontece são geralmente de gravissi- mo prognostico, porque indicam ou que o estomago está assaz inerte para se prestar á absorpção necessaria para que o effeito emetico te- nha logar, ou que os musculos, que devem servir n'estas circumstan- cias, não têem já força bastante para se contrahirem e auxiliarem o vomito. Os emeticos são usados uma, duas e mais vezes por dia, sempre que depois das cauterisações é conveniente provocar a expulsão dos detritos diphthericos, ou quando, por embaraço maior ou menor da respiração, se espera remover falsas membranas ou mucosidades mais ou menos espessas que o produzem. Em alguns casos os tenho empre- gado tres e quatro vezes por dia com bom resultado. Nos doentes das observações 1.º, 3.º, 4.º, 5.º, 9.º, 12.º, e ainda em outros, as appli- cações foram assim feitas com resultado favoravel. Pelo que a observação me tem mostrado sobre o uso dos emeti- cos no garrotilho, e pelo que se deduz do que venho de escrever, em- prégo aquelles meios na doença de que me occupo, como agentes me- chanicos que pelos esforços do vomito provocam a expulsão das falsas membranas, e tiram o obstaculo que estes corpos oppoem á respira- cão. A acção contra-estimulante, a acção dynamica dos emeticos e so- bretudo do tartaro estibiado, que póde ser e é de certo favoravel nas doencas essencialmente inflammatorias, não o é, ou só excepcional- mente o póde ser n'esta, em que o elemento inflammatorio é secunda- rio, e em que é tudo a falsa membrana e a sua causa geral. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE — T. II. P. 1. 22 170 ESTUDOS SOBRE Alterantes. No estudo dos alterantes como tratamento do crup referir-me-hei ao chlorato de potassa, alcalinos, mercuriaes, prepara- dos de bromio' e de iodo. O chlorato de potassa tinha sido proposto por Chaussier em 1819, como proveitoso no tratamento do garrotilho, a titulo de reconsti- tuinte e derivativo. Mas este conselho e prática fóram totalmente esque- cidos, até que em 1854 o sr. Blache o empregou de novo em Paris contra a angina pseudo-membranosa e o crup, a instigações do sr. Herpin, de Genova, e depois de repetir as experiencias feitas pelos srs. H. Hunt na gangrena da bôca em 1844, e West n'esta mesma doen- ça e na estomatite pseudo-membranosa em 1847. As experiencias do sr. Blache foram feitas no hospital de crean- cas de Paris, e as suas observações colhidas minuciosamente pelo sr. Isambert então seu interno, que fez d'este estudo o objecto da sua dis- sertação inaugural escripta em 1856 (Etudes chimiques, physiologi- ques et cliniques sur Vemploi thirapeutique du chlorate de potasse spe- cialment dans les affections diphtheriques ). Neste escripto vê-se que o chlorato de potassa tem os seguintes effeitos physiologicos: sobre a respiração ligeiramente irritantes, ma- nifestados nos bronchios e larynge; na circulação, effeitos mullos no estado normal, e sedativos no estado pathologico; na digestão parece excitar as funcções do estomago, sem ter acção sobre os intestinos, se- não favorecendo-lhes a absorpção ; nas secreções actua excitando-as, co- mo se vê pelas das mucosas bocal, pharyngea, nasal e laryngea, cuja vitalidade parece modificar, eliminando-se abundantemente pela sali- va, o que explica a sua acção especial sobre a bôca. Sobretudo em alta dóse augmenta tambem a secreção urinaria. Desde que se publicaram as experiencias e observações do sr. Bla- che, das quaes se concluia pela efficacia do chlorato de potassa na an- gina diphtherica e no crup, este medicamento chegou a ter uma re- putação exaggerada, porque chegou a ser considerado por alguns me- dicos como especifico contra a diphtheria. Logo que chegou a Lisboa pelos jornaes medicos o conhecimento dos factos e dos creditos do re- medio, foi de prompto empregado, principalmente pelas pessoas que pela sua posição especial estavam mais no caso de observar as doen- ças para as quaes era recommendado. Os collegas do exercito, de en- tre os quaes devo-citar especialmente os srs. Valle e Mendes, empre- garam-no em larga escala na estomatite ulcerosa dos soldados com re- sultados mais ou menos favoraveis; e os collegas civis, entre os quaes não póde esquecer o dr. Simas, na estomatite das creancas, e nas af- O GARROTILHO ; 171 fecções diphthericas. N'este numero entrei eu com um contingente no- tavel, que me fez considerar o chlorato de potassa como um remedio valioso no tratamento da angina pseudo-membranosa e no garrotilho, ainda mesmo nos casos graves, mormente quando o medicamento era empregado cêdo e continuado confiadamente durante o primeiro septe- nario. Pareceu-me em numerosos casos que o chlorato de potassa, de- pois de saturada a economia, o que nunca é antes de 24 ou 48 horas de uso continuado do remedio em certa dóse, facilitava a queda das falsas membranas, e concorria a obstar o seu ulterior desenvolvimento. E' certo que nunca deixei de fazer ao mesmo tempo energicas cauterisa- ções e de ministrar os emeticos como meio mechanico, mas pude as- sim conseguir a cura de casos mui graves de angina pseudo-membra- nosa e de crup, e tenho conhecimento de outros analogos da prática a a a dos collegas. Como provas apresento as observações 1.º, 3.º, 4.º, 5.º, 9%, 12º, 17º, 21º e 22º, alem de muitas outras minhas e alheias. Fundado n'estes factos, que são numerosos de mais para se ex- plicarem por simples coincidencias ; e porque não tenho achado incon- venientes no uso temporario do chlorato de potassa, emprego-o sempre no crup assim como na angina diphtherica, até que haja albuminuria que não seja explicavel por congestão dos rins, mas sim o effeito de alteração no sangue, e que o estado geral reclame tratamento tonico. Apesar da confiança que tenho no chlorato, aconselho-o e empre- go-o sempre concorrentemente com os emeticos e com o tratamento topico de que fallarei. Uso o chlorato de potassa em poção composta, para 24 horas, de 2 a 16 gram. (5a 4 oit.) do sal para 180 a 360 gram. (6 a 12 onç.) de agua adoçada com 30 gram. (1 onc.) de xarope de gomma arabica ou outro. Esta poção é administrada na dóse de uma a quatro colhe- res, das de sôpa, de duas em duas, ou de tres em tres horas, confor- me a idade dos doentes e a intensidade da doença. Outros saes alcalinos têem sido muito recommendados no crup. De entre elles o bicarbonato de soda foi, ha annos, de novo empre- gado e muito elogiado pelo sr. Marechal (de Calvi); mas hoje é sabi- do que os elogios feitos eram talvez só o efleito do acaso on de serem mui benignos os casos tratados por aquelle meio; porque é preciso muito tempo, muito mais do que dura ordinariamente a diphtheria, para produzir aquelle efleito antiplastico e alterante, qne o recommen- dava nas doenças pseudo-membranosas. Os mercuriaes, sobretudo os colomelanos internamente, e a po- 2a 172 ESTUDOS SOBRE mada mercurial em fricções, foram muito recommendados e usados como alterantes na Inglaterra, Allemanha, America e França, assim como em Portugal. No principio da minha prática ensaiei algumas ve- zes este tratamento, então muito usado, empregando o proto-chloru- reto de mercurio, segundo o methodo de Law, ou em dóses de 27 a 5 centigr. repetidas duas a cinco vezes nas 24 horas, e prescrevendo “frie- ções de pomada napolitana no collo tres a quatro vezes por dia; mas nunca obtive modificação favoravel na marcha da doença, antes pelo contrario em dois casos notei a passagem Exeiiada para um estado adynamico e fatal. Sabendo o modo por que actuam na economia os preparados mer- curiaes, que modificam a crase do sangue, tornando-o mais liquido, menos plastico, e portanto enfraquecendo muito os doentes já de si fracos ou com grande disposição para a adynamia pela propria doença ; comprehende-se que o tratamento alterante pelos mercuriaes não póde ser proveitoso em uma molestia cuja natureza o contraindica. E' por aquelles resultados, e por estas considerações, que hoje nunca emprégo tratamento mercurial no garrotilho. O bromio é preferido pelo dr. Ch. Ozanam no tratamento da di- phtheria, porque, segundo elle, produz a desaggregação mollecular das falsas membranas no mais subido grau. (Memoires sur Vaction cura- tive et prophylactique du brome contre les affections pseudo-membra- neuses, 1859). Ao bromio prefere ainda o bromureto dê potassio, que á propriedade desaggregativa do bromio junta a fluidificante da po- tassa. Para administrar o bromio prefere o auctor a agua bromada re- centemente preparada, cuja formula é a seguinte : Bromio puro ..... «... 10 centigr. (2 gottas) Agua distillada ....... 100 gram. (3 onças) Agita-se o liquido até se dissolver o bromio completamente, e guarda-se em logar escuro, em frasco de rolha esmerilada, para evitar a formação do acido brombhydrico. A agua bromada assim preparada é transparente, côr de alambre, e tem um cheiro caracteristico. A dóse em que é empregada é de uma a cinco gottas por dia em agua ou ju- lepo gommoso, que se toma ás colheres. A dóse diaria póde elevar-se até vinte e cinco, e trinta gottas. O bromureto de potassio é empregado pelo auctor nas mesmas O GARROTILHO 173 dóses do bromio, mas algumas vezes mais elevadas. A sua formula é a seguinte : Bromureto de potassio...... ESTO TRELO AS 06 ME vs Da AM Pas do Padre aa Agua distillada............ 100 gram. ãa 10 centigr. A addição do bromureto de potassio torna o preparado mais es- tavel, e evita que se acidifique. Não tendo pela minha parte empregado o bromio ou o bromu- reto de potassio, nada posso dizer dos seus effeitos antidiphthericos fundado em experiencia e observação proprias. Tambem me não consta que fossem empregados em Lisboa. A julgar pelos factos de fóra de que tenho conhecimento, que são poucos para poder fazer por elles juizo seguro (27 referidos pelo auctor nas suas duas memorias); e sobretudo a julgar pelo effeito chi- mico que tem o bromio sobre as falsas membranas, nas quantidades como aquellas em que se póde usar sem perigo, como referi no capi- tulo da anatomia pathologica, devo concluir que o bromio não deve por ora merecer confiança no tratamento do garrotilho. O iodo ou antes o iodureto de potassio é um poderoso alterante que não tem esquecido no tratamento da diphtheria. O dr. Wilhelm Zimmerman usou-o reunido a outros medicamentos, segundo diz, com vantagem em uma epidemia de angina diphtherica e crup que acom- metteu Valenciennes em 1857 (Memoire sur les affections diphtheriti- ques, 1860). A formula usada foi a da agua d' Adelaide, que é a seguinte: No 1 N.º 2 N.º 3 Bi-carbonato de soda ...... 15 gram. 10 gram. 5 gram, Sal marinho. ...... Sapos! à bo idem, » TOpidem 5 idem Iodureto de potassio. .... dá 4 idem 3 idem 2 idem Bromureto de potassio..... [idem 75 centigr. 50 centigr. Agua filtrada, . su. s.u o... 1000 idem 1000 gram. 1000 gram. ' Administrava-a pura, ou diluida em agua, tisana, xarope ou caldo etc., segundo o gosto dos doentes, na dóse de 250 grammas e mais por dia em 8 horas, ou 32 grammas por hora. O remedio era usado até apparecerem os respectivos effeitos physiologicos, isto é, o augmento 174 ESTUDOS SOBRE da secreção das mucosas nasal, bocal, guttural e bronchica, e das glan- dulas salivares. Este tratamento foi auxiliado pelo uso interno da agua alcalino- muriática (bi-carbonato de soda saturado 15 grammas, sal marinho 15 grammas, agua 1000 grammas), e pelas applicações da tintura de iodo iodo-bromurada da seguinte formula : Todo pro 5 coma ars. pu furto 12 gram. Alcool rectificado de 95º.. 125 idem Iodureto de potassio.. .... 4 idem Bromureto de potasssio.. . 2 idem Agua distillada. ......... 15 idem Usava esta tintura applicada com pincel de desenho a toda a parte anterior e lateraes do pescoço de hora em hora, de duas em duas ou de tres em tres horas segundo a gravidade da doença. Pela minha parte nada posso dizer da efficacia do tratamento do dr. Zimmerman porque nunca o ensaiei; sómente noto que o auctor apresenta na sua memoria apenas 26 casos de cura da diphtheria por aquelle methodo curativo, numero muito pequeno para firmar os cre- ditos de um remedio sobretudo n'aquella doença, que em algumas epi- demias tem a fórma benigna. Demais, com respeito ao iodureto de potassio, direi que é um medicamento cuja acção é mais lenta do que convem para o tratamento de uma doença de marcha aguda e grave como o crup e angina diphtherica. Tonicos. O tratamento tonico é auxilio muito valioso na thera- peutica do crup. E' elle mesmo o unico a oppôr ao garrotilho infe- ctuoso ou ao estado que se denomina intoxicação diphtherica. Quando apparece a albumina nas urinas, sem que a asphyxia ou a congestão dos rins a explique; quando ella não cede aos revulsivos locaes (ventosas seccas, sinapismos e fricções excitantes nos lombos) e ás mudanças de posição, é para mim a indicação do tratamento toni- co. O estado adynamico incipiente, ainda mesmo sem albuminuria, exi- ge o mesmo tratamento. N'estas circumstancias emprégo o ferro e a quina com a dieta igualmente tonica. Assim o citrato de ferro e quinina, o sulphato de ferro e sulphato de quinina, o lactato, carbonato ou perchlorureto de ferro com o extracto ou xarope de quina ou de genciana, as limona- das mineraes etc., são os medicamentos que mais uso, preferindo a fórma liquida ou pulverulenta á fórma pilular. O GARROTILHO 175 O perchlorureto de ferro liquido é principalmente recommenda- vel quando ha tendencia para hemorrhagia. A formula que tenho usado é a seguinte : Perchlorureto de ferro liquido. ... (a 36º) 4 a 8 gram. (1 a 2 oit.) Agua distillada. .............. 120a 180 idem (4 a 6 onç.) Xarope de gomma arabica ...... 30 idem (1 onc.) Junte para tomar na dóse de uma a tres colheres, das de sôpa, de duas em duas ou de tres em tres horas. Tem-se dado ultimamente o perchlorureto de ferro liquido como tratamento especifico das anginas diphthericas e do crup em dóses muito exaggeradas, que me parece difficeis de supportar, sobretudo pelas creanças ; mas por ora não ha factos sufficientes para fazerem crêr n'aquelle medicamento muito mais do que em outros preparados fer- ruginosos que operam pela sua acção tonica. A alimentação, que se deve permittir sempre no crup, é um grande auxiliar da medicação tonica. O leite, e o caldo de carne com feculas, os óvos, geleas, chocolate, café, vinho generoso, etc., são os alimentos que mais podem aproveitar dados prudentemente. Devo juntar a estes meios outro, que não é menos essencial nem menos proveitoso. Pretendo referir-me ao bom ar, que é sempre pre- ciso dar aos doentes em uma molestia infectuosa como é o crup. Para conseguir isto, é de necessidade ter o doente em um quarto espaçoso e com janella, e renovar bem o ar estabelecendo uma boa ventilação, sem temer os efleitos do ar mesmo frio, porque nada ha mais nociyo do que fazer respirar os enfermos e os sãos em uma atmosphera car- regada de effluvios diphthericos. Procedendo como recommendo, me- lhoram-se muito as condições do doente, e póde evitar-se um foco de infecção e as suas consequencias para todos. Antiphlogisticos. A medicação antiphlogistica, de que tanto se tem abusado em todas as doenças, é no crup não só inutil, mas peri- gosa. Em uma doença só por si capaz de levar os individuos a uma fraqueza e prostração mortal, todo o tratamento debilitante é absolu- tamente contraindicado. Parece por isso impossivel que se não reco- nhecessem ha muito mais tempo os seus maus efleitos, que o nosso Soares Barbosa já mui bem havia notado, referindo-se ás evacuações: sanguineas, e dizendo que nem a natureza nem os symptomas da doen- ça pareciam indical-as, que nas pessoas mais fortes e plethoricas eram 176 ESTUDOS SOBRE inuteis, e nas outras tiravam-lhes as forças para reagirem contra a doença. E' certo, como já disse, que uma certa inflammação, ás vezes mesmo muito intensa apparece nas partes da garganta onde se des- envolvem as falsas membranas, mas não é uma inflammação franca, e em todo o caso é um phenomeno secundario, do mesmo modo que a inflammação que acompanha a pustula maligna, ou o carbunculo, ou a pustula variolica, contra a qual os antiphlogisticos, sobretudo pelas evacuações sanguineas, não fazem senão enfraquecer o organismo e col- local-o nas cireumstancias de se manifestar mais facilmente ou de se approximar o periodo adynamico, infectuoso ou de intoxicação. Por isso, e pelo que a observação me tem mostrado, proscrevo absoluta- mente do tratamento do crup a medicação antiphlogistica, e portanto principalmente as sangrias, as applicações de sanguesugas, as ventosas sarjadas, etc. Revulsivos. O tratamento revulsivo deve igualmente ser rejeitado na therapeutica do garrotilho. Este tratamento feito pelos purgantes tem inconvenientes analo- gos aos da medicação antiphlogistica, e portanto deve riscar-se d'este capitulo, a não haver indicação muito especial que obrigue a empre- gal-os. Mas ainda n'este caso actuam removendo um inconveniente, € não directamente sobre a doença de um modo favoravel. Em todo o caso quando houver um embaraço intestinal de alguns dias, invenci- vel pelos clysteres, e que reclame o uso de purgante, deve escolher- se um laxante suave e de effeito regular, como a limonada de citrato de magnesia, o oleo de ricino, ou o leite de magnesia, em dóses mo- deradas. O tratamento revulsivo pelos vesicatorios tem muito mais incon- venientes, do que o feito pelos purgantes, mesmo drasticos, — não é só inutil e inconveniente, é perigoso. Quem sabe que o enrouquecimento, a aphonia, a tosse e a suf- focação do crup, contra os quaes se tem empregado os vesicatorios no pescoço, na região esternal, na nuca, e entre as espaduas, são o effeito mechanico de falsas membranas desenvolvidas na larynge, reflectindo um momento prevê logo a inutilidade da applicação de um meio que em caso nenhum póde ser indifferente. Seria, como mui bem diz o sr. Trousseau, o mesmo que querer curar pelos mesmos meios a asphy- xia devida a um feijão ou outro corpo estranho que tivesse entrado na larynge ou tracheia de uma creança. Esses casos, que se diz, de crup curados pelos vesicatorios, não eram de certo de verdadeiro gar- O GARROTILHO 177 rotilho, mas naturalmente de asthma de Millar ou falso crup em que aquelles meios são eflectivamente efficazes. Mas não são só inuteis no erup os vesicatorios ; elles podem ain- da ser, e são geralmente, muito perigosos. Em primeiro logar, como meio expoliativo, concorrem para en- fraquecer os doentes, e portanto podem produzir só por este lado os mesmos inconvenientes da medicação antiphlogistica. Em segundo logar, é sabido e verificado que as superficies se co- brem de falsas membranas, as quaes podem engrossar e estender-se muito, e para as destruir é forçoso empregar as cauterisações ener- gicas por muitos dias successivos; e em todo o caso concorrem para apressar a intoxicação ou aggraval-a, ou mesmo para a determinar. Ha varios casos de doentes que tinham resistido ao crup, e que to- davia succumbiram ao desenvolvimento dos phenomenos caracteristi- cos da diphtheria maligna, determinados pela absorpção dos produ- ctos da alteração das falsas membranas na superficie onde se havia ap- plicado vesicatorios; os quaes casos são outros tantos documentos que provam a verdade d'aquellas asserções. Depois, no crup deve ter-se em vista a necessidade da tracheio- tomia, e então bem facilmente se percebem todos os inconvenientes e perigo de fazer a operação no meio de uma superficie coberta de fal- sas membranas, como a região anterior do collo em que se houvesse applicado um vesicatorio. Por todas estas razões entendo ser um grande erro applicar ve- sicatorios no verdadeiro garrotilho, assim como o é abrir qualquer ferida ou desnudar a pelle de doentes com o crup ou em casa onde haja esta doença, porque mesmo para enfermos sem garrotilho o ar contaminado inocúla a doença em qualquer solução de continuidade da pelle. Méeios locaes. — O tratamento topico é essencial para a cura do gar- rotilho e da angina diphtherica, que o precede quasi sempre. Póde-se prescindir do tratamento geral talvez sem grande prejuizo para os doentes; mas de nenhum modo da medicação topica sem quasi a cer- teza de vêr succumbir os enfermos se a molestia é de fórma grave. Este tratamento era já prescripto ha 1800 annos, por Areteo de Capadocia, que aconselhava para a ulcera egypciaca o uso do pó de alumen e da noz de galha em collutorio com mel, ou em insufflação com um canudo de canna. O nosso Zacuto Lusitano (loc. cit.) aconselhava tambem a mes- ma therapeutica pelo unguento egypciaco, composto de verdete e mel, MEM. DA ACAD.— |, CLASSE T. NI. P. 1. 23 178 ESTUDOS SOBRE que ficou sendo usado desde aquelle tempo; e empregava tambem a agua aluminosa. O tratamento local comprehende remedios causticos ou cathere- ticos, e adstringentes. De todos os causticos o mais usado é o nitrato de prata, e tam- bem o acido hydro-chlorico, o sulphato de cobre, o perchlorureto de ferro, e o cauterio actual. Dos adstringentes o alumen e o tannino pre- ferem aos outros. O nitrato de prata tem merecido a preferencia sobre os outros cathereticos no tratamento local da diphtheria, desde que o sr. Bre- tonneau o preconisou, ha mais de 30 annos, por estar sempre á dis- posição dos cirurgiões, e por ser de uma applicação facil de fazer e de limitar. Uso o nitrato de prata holidos e em solução concentrada. Quando as falsas membranas occupam as amygdalas, os pilares e a face anterior do véo palatino, partes accessiveis á vista, onde o la- pis póde chegar sem difficuldade, prefiro o nitrato de prata solido em cylindro curto, bem seguro no porta-caustico ou em tubo de penna de pato, com o qual me esforço por despegar as falsas membranas de sobre as mucosas e cauterisar bem a superficie sangrante a que ad- heriam. Esta cauterisação basta de ordinario duas vezes nas 24 horas ; e nos casos benignos uma só vez no mesmo espaço de tempo. Em al- guns doentes tenho-a feito tres e quatro vezes por dia. Em todo o caso este modo de proceder deve ser continuado energica e confiadamente por tantos dias quantos forem precisos para o dem is desappareci- mento das falsas membranas. Quando estas producções occupam a face posterior dos pilares, do véo do paladar, o fundo da pharynge, a parte posterior das fossas na- saes, a epiglotte ou parte superior da larynge, prefiro sempre a solu- ção concentrada do nitrato de prata (8 a 15 grammas por 30 gram- mas d'agua distillada) que se leva áquellas partes por meio d'uma es- ponja não muito embebida no liquido, solidamente fixa á extremidade curva de uma haste de barba de balêa com a devida consistencia. Es- tas applicações repetem-se uma a tres vezes no dia, sobretudo no prin- cipio da doença e conforme a gravidade do caso. Quando começa a tosse e ha os outrôs signaes da diphtheria la- ryngea, é de toda a conveniencia levar esta cauterisação ao orifício su- perior da glotte, deprimindo bem a raiz da lingua, e levando a es- ponja detraz da epiglotte. O GARROTILHO 179 Para fazer convenientemente as applicações causticas em que aca- bo de fallar, é indispensavel abrir largamente a bôca dos doentes, e pôr-lhes bem patentes as fauces, o que é difficil em muitas creanças, que se oppõem a isso com todas as suas forças e com todos os seus recursos. O modo de vencer esta opposição é assentando-as sobre os joelhos d'uma pessoa que as segure convenientemente, sendo outra en- carregada de lhes fixar a cabeça; então com uma colher forte, tendo o cabo dobrado em angulo recto, ou com um depressor, levado bem posteriormente sobre a base da lingua, deprime-se esta devidamente, ficando assim a garganta bem á vista para as necessarias applica- cões. 5 São as cauterisações com o nitrato de prata pelos modos que aca- bo de descrever, que tenho usado mais no crup e na angina diphthe- rica, e com decidida vantagem. Nota-se comtudo no caustico lunar, sobretudo solido, o inconve- niente de produzir escaras e manchas esbranquiçadas nas superficies que toca, as quaes podem durar 24 e 36 horas, e que têem sido con- fundidas com falsas membranas da diphtheria, mesmo por pessoas muito habituadas a vêr umas e outras; mas esta confusão raras ve- zes se dá, e quando se dê não são notaveis as consequencias, proce- dendo, em caso de duvida, como se fossem verdadeiros productos di- phthericos. Quando, depois de tres ou quatro boas cauterisações, hou- ver duvida, à modo de a resolver é suspendel-as durante 24 ou 36 ho- ras, em que cahem as escaras, empregando entretanto sómente os to- picos adstringentes. O acido chlorhydrico aconselhado por Boerhaave, Van-Swieten e os medicos do seculo passado, tem continuado a ser empregado para o mesmo fim do nitrato de prata, mas, aindaque não tenha o incon- veniente de não estender mui profundamente a sua acção, como o faz o acido nitrico e sulphurico, comtudo, como caustico liquido, póde to- car partes alem d'aquellas que é preciso, o que tem assignalados in- convenientes. Alem d'isso na superficie tocada pelo acido hydrochlorico, mes- mo sem falsas membranas, fórma-se uma exsudação plastica e uma mancha branca, que tem a apparencia pseudo-membranosa, e que nem sempre é facil distinguir da diphtherica, o que tambem succede pela acção topica da ammonia e da cantharidina. Este inconveniente com- tudo, no caso de confusão, só póde consistir, como disse para o nitrato de prata, em fazer tratamento caustico por mais tempo á supposta di- phtheria que já tem terminado. O engano em todo o caso póde durar 23 + 180 ESTUDOS SOBRE 24 ou 36 horas, porque, depois d'este espaco de tempo, as escaras do acido cahem e as nodoas produzidas por ellas desapparecem. A razão principal, porque não uso o acido chlorhydrico como ca- theretico n'estas circumstancias é, porque com a humidade da gar- ganta desenvolvem-se vapores brancos que entram na glotte, e incom- modam muito os doentes. O sulphato de cobre vale, como caustico, quasi o mesmo que o nitrato de prata, e não tem o inconveniente de formar as nodoas bran- cas nos logares sãos, que podem confundir-se com pseudo-membranas. ' Comtudo não o tenho achado tão energico como a pedra infernal. Póde usar-se em dissolução muito concentrada (8 grammas de sul- phato de cobre para 16 grammas d'agua distillada), em que se embebe uma esponja, como disse que usava com a dissolução do caustico lunar. O perchlorureto de ferro liquido como topico tem sido muito pre- conisado, até como especifico da diphtheria. Entre outros o dr. Jodin o julga excellente para destruir os cogumelos, que no seu modo de vêr constituem as falsas membranas. Não se póde negar que é um po- deroso caustico, que modifica favoravelmente as superficies cobertas de falsas membranas, mas sem vantagem, quanto a mim, aos outros caus- ticos. Prefiro-o, applicado com pincel, quando ha exsudação sanguinea no logar d'onde se despegou a falsa membrana, o que sobretudo se dá na diphtheria maligna. Nunca empreguei o cauterio actual, já usado pelo sr. Bonsergent em 1827, nem lhe acho nenhuma vantagem para que valha a pena de o empregar, sendo um meio que horrorisa tanto as pessoas, em quem se tenta applicar, e que é com efleito barbaro, apesar do que, ha poucos annos, disseram de vantajoso a seu respeito os srs. Valen- tin e Danvin. Muitos medicos têem negado as vantagens, aliás incontestaveis, das cauterisações nas doenças diphthericas, e entre elles os srs. Mare- chal de Calvi, Leclerc, e ainda em 1857 o sr. dr. Léon Gigot, de Le- vroux (Etudes cliniques sur le traitement de Pangine couenneuse eb du croup). Este medico convenceu-se na epidemia do districto de Levroux, observada em 1856, que a destruição das falsas membranas pelas cauterisações não era vantajosa, a ponto de tirar a seguinte conclusão a respeito d'aquelle methodo de tratamento: « À cauterisação não só não tem suspendido o desenvolvimento da diphtherite, mas ainda a tem aggravado, tornando mais longa a sua duração média, multiplican- do as producções pseudo-membranosas ou mudando-lhes a natureza. » O GARROTILHO 181 Este pratico tratou as diphtherias por diversos meios, de que apresenta quadros synopticos no fim da sua memoria, onde se vêem as suas vantagens e inconvenientes relativos. Com os causticos tratou 15 doentes, dos quaes se curaram 5 e morreram 10; com o bicarbonato de soda topicamente tratou 83 doen- tes, curando-se 7 e fallecendo apenas 13; pelo chlorato de potassa tratou 32, sendo curados 28 e morrendo 4. Deve notar-se a respeito d'estes grupos de doentes o seguinte : 1.º Que os 15 enfermos tratados pelas cauterisações foram os do principio da epidemia, quando os ataques eram mais intensos e mali- gnos; e que dos 10) doentes que falleceram, 2 por indoceis quasi não tiveram tratamento, e 6 soffreram entre outros tratamentos o das emissões sanguineas pelas sanguesugas. 2.º Que dos 83 tratados pelo bicarbonato de soda em applica- cões locaes, e nos quaes se curaram 70, morrendo (3, muitos tive- ram tratamentos auxiliares, sendo 15 dos curados tratados tambem pelas cauterisações, e outros pelos vomitivos; c dos 13 mortos só 5 tiveram algumas cauterisações. 3.º Que dos 32 tratados pelo chlorato de potassa, em que se cu- raram 28, fallecendo 4; dos 28 curados 6 foram cautérisados, e dos 4 mortos, 1 só o foi. O dr. Léon Gigot passando em revista, no corpo da sua memo- ria, seis especies de tratamento mais usadas na angina diphtherica e crup (emissões sanguineas, causticos, emeticos, bicarbonato de soda, chlorato de potassa, e tracheiotomia) conclue do modo seguinte a res- peito de cada uma. 1.º As emissões sanguineas locaes não têem nenhuma acção sa- lutar sobre a doença. 2.º Os causticos (nitrato de prata solido e em solução, acido chlor- hydrico) não têem obstado ao desenvolvimento e á extensão da angi- na. Muitas vezes mesmo tem-na aggravado, multiplicando as produc- ções diphthericas, mudando-lhes a natureza, isto é, tornando-as mais séccas e mais adherentes á mucosa. Os casos, que pareceu curarem-se pela acção dos causticos, poderiam terminar por cura mais rapida se- guindo-se outro tratamento. 3.º O emetico empregado em alta dóse conjunctamente com a cauterisação, no principio da angina diphtherica, não modifica vanta- josamente a marcha da doença. No crup os vomitivos (tartaro emetico, ipecacuanha, sulphato de cobre) não têem dado nenhum caso de cura. 182 ESTUDOS SOBRE Em muitos casos obteve a expulsão das falsas membranas da la- rynge, provocando o vomito por um corpo extranho como uma es- ponja ou um pincel de fios levado á epiglotte. Este processo parece preferivel aos vomitivos por ser mais rapido e mais certo o seu effeito, e porque se póde obter á vontade, fatigando menos os doentes. 4.º O bicarbonato de soda, applicado sobre a mucosa pharyngea por meio da insufflação, dos gargarejos ou d'um pincel de fios, é um poderoso modificador da constituição diphtherica por sua acção dissol- vente sobre as pseudo-membranas. 5.º O chlorato de potassa não aproveita como topico, mas só- mente quando é absorvido. A sua acção foi tanto mais lenta, quanto mais proximas da epiglotte estavam as producções diphthericas. Não tem nenhuma efficacia contra o crup. As applicações topicas de bicar- bonato de soda, empregadas ao mesmo tempo que o chlorato de po- tassa, têem produzido os mais bellos resultados. Os causticos têem ao contrario estorvado a sua acção. 6.º A tracheiotomia parece ser o unico recurso da arte, quando as falsas membranas são muito adherentes á mucosa da larynge, para serem expulsadas pelos esforços do vomito, e quando o obstaculo que ellas formam á passagem do ar é sufficiente para produzir a asphyxia. Não adopto a maior parte das opiniões do dr. Gigot, comtudo pareceu-me de alguma utilidade transcrever o seu modo de pensar so- bre o objecto nas seis precedentes conclusões. O alumen é muito util em applicação topica nos intervallos das cauterisações. Geralmente dou preferencia ao sulphato d'alumina e potassa junto ao mel rosado em proporções iguaes, ou uma parte do sal para duas do vehiculo, que faço applicar a toda a garganta com pincel de fios ou com a rama de uma penna, de duas em duas horas no intervallo das cauterisações, e não dou importancia a alguma porção que os doen- tes possam engulir. Algumas vezes tenho usado com igual vantagem o tannino com o mel ou em agua distillada (8 a 16 grammas d'acido tannico para 16 grammas de vehiculo). Um certo numero de vezes alterno as applicações do alumen com as do tannino, fazendo sempre de duas em duas horas uma ou outra no intervallo de duas a quatro cauterisações diarias. Nos casos benignos, em que faço uma cauterisação por dia, pres- crevo, nas vinte e quatro horas, quatro a seis d'aquellas applicações sómente. O GARROTILHO [83 O sr. Trousseau aconselha, e eu tambem tenho usado algumas ve- zes, as applicações alternadas do tannino e do alumen em pó, em lo- gar da mistura com o mel ou em dissolução. É o modo de proceder de Aretêo com o alumen e o pó da noz de galha. O processo é facil. Com um canudo de canna, de sabugueiro, ou de cartão contendo 1 a 2 grammas, e mais, de pó da pedra hume, insuffla-se este pó na garganta, repetindo esta applicação quatro, seis e mesmo dez vezes nas 24 horas, sobretudo no principio da doenca. Para que o tratamento seja mais poderoso e mais efficaz, alter- nam-se as insufflações aluminosas com as de tannino na dóse de 40 a 50 centigrammas por cada vez. O dr. Loiseau de Montmartre insiste muito nas vantagens d'este tratamento topico assim feito, unico que elle prescreve, e do qual tem tirado, segundo conta, vantagens extraordinarias. Em uma das suas estatisticas, que tenho presente, em 95 casos só teve 2 fataes, sendo destes 1 sem tratamento e outro com tratamento incompleto. Elle faz seis a oito insufflações de alumen alternadas com outras tantas de tannino, e assim diz curar a diphtheria em tres ou quatro dias. Não é provavel que tenham sido de diphtheria grave todos os casos tratados tão feliz e promptamente pelo sr. Loiseau. Provavel- mente é a angina herpetica e a diphtheria benigna ou commum que figuram na maxima parte d'elles. Estas mesmas applicações se podem hoje fazer aos individuos já adultos com o apparelho pulverisador de Sales-Girons, pelo qual se po- dem levar á pharynge e á larynge tanto o tannino, como o alumen, em agua muito carregada d'estes princípios e reduzida como a pó fino. Alem d'estes meios topicos de mais confiança, tem-se recommen- dado outros de que tenho usado, mas excepcionalmente. Primeiro devo fallar em um que, a julgar pela sua acção sobre as falsas membranas depois de extrahidas, promette ser de muita van- tagem ; quero fallar da mistura de partes iguaes de glycerina e ammo- nia, que as altera logo depois de estar em contacto com ellas, e as dissolve completamente em algumas horas. Póde applicar-se esta mistura, de duas em duas, ou de tres em tres horas, nas falsas membranas da garganta em logar do alumen e do tannico. A giycerina, que foi recommendada pelo sr. Bouchut, e preferi- da pelo sr. Bouillon Lagrange pela sua acção dissolvente, foi usada por mim só em 5 ou 6 casos sem essa vantagem preconisada, o que 184 ESTUDOS SOBRE : eu explico pela fraca acção que em verdade tem sobre as falsas mem- branas, como notei a pag. 37. O chlorato de potassa tem sido usado em gargarejos repetidos (30 grammas e mais para 500 grammas d'agua) e em collutorio (15 grammas para 30 de mel ou mucillagem) do mesmo modo que o alu- men. Por estes dois modos e em insufflação o tenho usado sem uti- lidade bem manifesta, mas é decididamente efficaz nas ulceras que ficam depois da queda das falsas membranas, porque accelera a sua cicalrisação. O bicarbonato de soda em dissolução concentrada tem parecido a alguns praticos muito vantajoso topico pela acção dissolvente dos alca- linos sobre as falsas membranas. O dr. Gigot, como disse, gaba muito este remedio, de que usou na epidemia do districto de Levroux, que tratou em 1856. As pou- cas vezes que tenho usado o bicarbonato de soda topicamente (8 a 16 grammas para 16 de vehiculo) e em insufflação não me auctorisam, por ora, a dar-lhe a preferencia ao tratamento adstringente pelo alu- men e tannico com as cauterisações de nitrato de prata, que prefiro. Não terminarei o tratamento local -do garrotilho sem fallar da cauterisação directa da larynge feita segundo o processo do sr. Loi- scau de Montmartre, e da tubagem da glotte do sr. Bouchut. Cauterisação da larynge. O sr. Girouard, de Chartres, tinha já proposto levar directamente medicamentos cathereticos á larynge com o auxilio d'uma sonda. Mas cabe ao sr. Horace Creen, de New-York, a honra de ter tratado methodicamente a diphtheria da larynge, le- vando a este orgão substancias causticas por meio de uma pequena es- ponja segura á extremidade de uma barba de balêa convenientemente curva. Na Allemanha o dr. Diéffenbach tinha tambem applicado este tratamento em 1839 no hospital da Caridade de Berlin, servindo-se d'um annel para proteger o dedo indicador da mão esquerda, que deve. metter-se na bôca dos doentes para levantar a epiglotte. Mas em 1857 o sr. Loiseau, ignorando os trabalhos anteriores, fez fabricar pelo sr. Charriêre instrumentos para introduzir na laryn- ge e tracheia, e cauterisar estas partes. A memoria apresentada então pelo auctor á Academia de medicina de París tinha o seguinte titulo : Processo simples e facil, por meio do qual se penetra nas vias aereas, para as cauterisar, e extrahir-lhes falsas membranas, dilatar a glot- te e introduzir-lhe todas as substancias liquidas ou pulverulentas que servem ao tratamento do crup, afim de supprir a tracheiotomia, quan- do esta operação não é praticavel. Sobre ella o sr. Trousseau leu um O GARROTILHO 185 relatorio na: sessão de 25 d'agosto de 1857, em que o processo era elogiado ; acrescentando comtudo que nem era novo, nem era em nada preferivel á tracheiotomia, podendo aliás substituir esta operação, quan- do ella não fosse applicavel. O meu bom amigo e collega, dr. Simas, deu d'este processo uma excellente descripção, que póde vêr-se na nossa Gazeta medica de Lis- boa em o n.º 141, do 1.º de novembro de 1858. Os instrumentos que servem no processo do sr. Loiseau, de que a Santa Casa da Misericordia tem modêlos trazidos de París pelo sr. dr. Simas, são: uma dedeira ou annel metallico de 2 a 3 centimetros de largura, para ser mettido no dedo indicador esquerdo de modo que deixe livre a terceira phalange ea ultima articulação ; tres tubos de prata curvos como algalias mui grossas, um aberto no fundo, outro lateralmente, e o terceiro terminado em oliva cayada de anfractuosi- dades, e destinados aos diversos modos de cauterisação, isto é, para a introducção de substancias liquidas, pulverulentas, ou nitrato de prata solido, que se pretendam levar ao interior da larynge ou tra- cheia; e emfim uma esponja fixa na extremidade de uma barba de balêa, que serve para a cauterisação liquida e para limpar as vias res- piratorias. O processo é facil de comprehender e de executar: com o dedo indicador da mão esquerda protegido pela dedeira, e levado profunda- mente á garganta, levanta-se a epiglotte, e com a mão direita leva-se ao interior da glotte e á tracheia upi dos tubos, pelo qual se conduz a substancia caustica até ao interior da larynge. Por este modo de tratar o crup o sr. Loiseau tinha obtido en- tão 12 curas em 26 casos. Não conhecendo por experiencia propria o verdadeiro valor deste tratamento, não posso por ora recommendal-o. A tubagem da glotte foi proposta pelo sr. Bouchut á Academia de medicina de Paris em sessão de 14 de setembro de 1858 na sua memoria sobre um zovo methodo de tratamento do crup pela tubagem da glotte, na qual procurou demonstrar, que era facil praticar a tuba- gem da glotte por meio de uma virola ou canula fixa sobre as cordas vocaes inferiores, não impedindo as funcções da epiglotte; e a possi- bilidade de remediar a asphyxia do crup e das molestias da larynge por este meio, de preferencia á tracheiotomia. Sobre esta memoria o sr. Trousseau leu na Academia em 2 de novembro do mesmo anno um magnifico relatorio, que foi transcripto na Gazeta medica de Lisboa em o n.º 144, de 16 de dezembro de 1858. MEM, DA ACAD.-—1,º CLASSE—T. Il. P. 1. 24 186 ESTUDOS SOBRE A tubagem da glotte, que já havia sido empregada pelo sr. Rey- bard, collocando na larynge e tracheia uma sonda de grosso calibre que saía pela bôca e era fixada externamente, e sobretudo pelo sr. Loi- seau com os seus instrumentos para a cauterisação das vias aereas no crup, não teve a sancção da Academia. Depois de uma longa discus- são concluiu-se, como era rasoavel: que nem era um meio assaz util, nem assaz isento de perigo, para merecer a approvação da Academia, e ainda menos para ser preferido á tracheiotomia. Terminarei este capitulo: dizendo que os accidentes consecutivos do garrotilho devem tratar-se pela medicação tonica, de que fazem a base os preparados de ferro, a quina, os banhos frios, as carnes ver- melhas, o vinho generoso, etc. ; pelos excitantes cutaneos, como os ba- nhos medicamentosos, aromaticos, e salgados; pelos excitantes espe- ciaes do systema nervoso, principalmente a electricidade, a estrychni- na ou a noz vomica, etc. - FIM. O GARROTILHO 187 PAG Introducção. .. . cce cese cone cercar en entr ares era cen carrera neneanão 3 Definição e synonymia ......ceescsstres teses estnene es eneneeuntrcaos 5 Parte historica .... ....cceeseresser eres ese caem aceso res eacea nana 6 Primeira época ........ e... orago ronah agonia ad orador bio ERA DRE o 6 Segunda época .......ccceeceteeasesereneseecrenaeceneenceneas 14 Terceira época. .......ccccertee esse scecentecerenarararinernero 19 Quarta época. ..... cce css rsss s omnes essere seas carona raras 214 Anatomia pathologica. ......cccececetecens ce reeeecanenene cre cnerenes 83 A W Falsa membranas crupalhs .e.0,0.s.taraegos o) ch cjeajto) e polo Lobo corar ai offajio ay o ooo o EO) SB Caracteres physicos . .... cce secs ese sena see vnebos oracao 33 Caracteres! MICEOSCOPICOS, 4. jah. jo boni pare sa sabe RE MIRS CEE ORAIS ENS ado a 38 CErElaies ONA Eee aPonnpepr o Marau Las Sp po abe php ao Ro DE 33 DN dA DEDE RE Cost Covo ooo deslocado ve Bos Odo ea o dado 38 OVO O Ro deep sr E plo 6 0 db do dobulo é c PRC be cut do boo bl cud 39 Apparelho respiratorio.............ciice cc cs its cce ci ciis ces 39 Apparelho digestivo . ........cssiss cs ce snes enesasse si seneo 39 Apparelho-circulatorioj- 4 Ra cao 9a es ij a a Da E kO- Apparelho urinario ...........c.. os SMP ENAP, HEAT RAR APRE 0) E acre RR CORRE DERRE ROSE eo B RA E E So vip AO a do so PUB mu Etiologia. ...... ic cocos serras o sore eee unen aaa ci cecene rrenan A] Td a de e DER art er Aja D 0 1a a “Aa at cp ADIAR DN O SAP DA a e h1 SERA MRI ED A ço A cer A aa a a ator o SA Dia LO ep SA AAA MR o 50 Temperamento e constituição... ......uciscssssossissciss coerentes 52 Condição socialidosidoentes 15 ss aaa too Ag ado PRN 55 Estações: 14-41 -p od cR a R ARE Arad op 9 a SON bo LR MN ORNE o o PV 55 Temperatura ...... ...... Ni Co Joe e Oo Te DIGO E ERR ODDS E DEL CAD o8 CIMASUDS So, chop ioloios RAR ERR av 2] a Sa ae to a) AN o Val a MPS PONTE t+ 59 RE CIdIVASI A 2400 a à aro lo RSA a A a ar nto 90] dio poças HERRERA OR; cho ci cho é 59 Wo encasFaniariores:. apura Mia ao dia a ca ada o o a a APNR à So 59 EPIC NS RT tar so ancora el TRA Sa AR A RED RO say aged 61 COntagiose MÉeCcãO: uva rare tenta atos cr a AME PERI alo at as jatos ajavójoç elos 61 188 ESTUDOS SOBRE ; PAG. Symptomatologia ........icccsictse ce sueses enc encers neces rec nncraas 73 Primeiro periodo ou inicial .........cccincesces cre cns ce cr cessa o 73 Segundo periodo ou dos primeiros symptomas laryngeos. .............. 75 "Rosses aaa DN E E DC a JM Ea BRA Soa a 15 o o 75 Bi DRe(d av OZ Nr peter Vad E A ANEL a Sn RE REU ps a jo 75 uol Era paneDs é She Sb o bas ses s pass meo padendo panos ada ads 76 Do ma as ass da op sb Sc asno ass Basso ba dos o sas o die o TO EAD ENDO: 6 no dana on as sPBB ogia o Podantdss wanfoo avo 76 Terceiro periodo, de dyspnéa ou de suffocação. .........icciiiceccooo A (Oem podoilo naquilo o pass o sa ode n asda) aos doro nd Ea ssa 79 ! Ag ÉS vara É 40) Do ADE UDdA DDS Dos pa ad pads so 79 Am esthesia cru ala RREO a Ra or CS oc bos! cio pote RS 79 ANDiÇEs aa ado a doa ana pass noob asd g do Boba ads os nos 81 NRO Lay da EE GA Sc a RS 82 Incubação, marcha, duração, (TE CIIVLIEICETO É de dd E, ARS INR AD, A A RO Rà 109 Inoubacap Eu Ca RG CRS CN, EPI 6 PAR AA AE 109 MANCHA 2: reis Mo SEM a ate 6 POE do NB Bino o RR o ABRE E PP a PER 110 Diem ss LAS SA dia o CAIS ER Se da SA asa ias Dobras a su BSiSs Gado 112 SGA 04 uma Abdo D SA BAD AGHA ABS a vob bd Duda pato Sosa nadas 1147 PÓRIMAS Esses hs. PIO OLA MARE pe RR DE E OD SU Voa AR SAP 119 Caro Gun nas so ao venda sas sapos Bau boas aos cá no svanbe ce se 120 DEDO ASTON 2 o das ds oa a Bass Cas DSG a gos BBBng a a Sedaar 120 Complicaçdesdo Nao RN IATA Gba Dele nad oba Mapa Det o de DAVE h O REED Rn 136 BRONGHILO: PE E AS re Ra Rea EN pede VER O TRE AU TE NSS P cd DEF a RE 137 Pneumonia lobar eso Diane n At qo dava STR Dalai to DURE Roe Ta Rede 137 Rosse ConvalSas een een e E leo E tas ee RE E se Je RR E 13% Emphysgmanintenlobnlari CR Sra AR RR RAR aa 137 Entenites Srs CRER De ci crio priest te ereta NA ada e POD TERRE co RS 137 WeDTES; CRUpUIVAS A odeia cego a fe neis qe peze o be pe co ae n TO ad POR DR ANA RS RIR 137 Molestiarde Bright). 2 este er fe rio Speedo del er dede evo o CON PERES E Rd 138 Da SnastICOR MEN voe ro e à rodive de saso Teia VE do o e pero vo HO ER eba OT RETAS 5 138 à RS DENIS O DO RR RS RAP RN in PRE aii SS ES DEDE A PO BA pia 139 2.º Laryngite aguda simples. ............. DOOR OT SEIS CU ee 139 do barynsife SUDO 4. ereto fere pe poaeto o e a ORNE Rj PIAS E 139 Mo Catarrho suitocante..Z apae e nste enero pe E RSS dei RI A 140 5.º Abcessos retro-pharyngeos e esophageos. ........iciccscceseetio 140 Accidentes consecutivos, paralysias diphthericas. ......iiiccsesccccssctraeos 140 Bro gnosbico ae Pq Len ppa de fe EE o EE PIER O ENE RR PARA fa A 150 Idades, Made coeso va cena de Vo bE dee TA RE PANTNT RR (7 1235 CET: pes 150 Temperamento e /Consbtuicao DR MRE 4 RA est ie oa 152 CONdICOESISOCIACS Cr per te PRECE LRC R EN Re és pero SEA 153 Estadodeisaude anteçiort. pe RR RR RC se o pais vejo e o 153 INPUT (eme ed vo dota UNO do DR dl at cid a dra O 79 NRP E So |, + te 153 ipi NI EC do bio de DE ata ds Gu trEa 6 0 500 940 084 DEPARAR RIO 2194) é cio DE 154 CDMpICAÇÕES: ion oiro e ie e CS ABRE sta a)= 6 LE ES E 154 rata ento eram Sa as peca dO! solo SU AS RAR PS 154 Na funeZas Ms PD Rs A ERR pa devo qói pe io peca RR A SRD 155 rata ento: (species irreçio PPB Rb RS o SUA SOR TIDRNDRRESRS E 374 2 LAS cio jr É 165 NNE Te OS ISS Sep O is 13 Gee SORRIR OS Seco CRM PS o O 166 SU ORCOS 4 es seta cida Re sp ofedeedeiey-s eso ey ego vos sia err RE SERIES 166 WOMLBLVOS Sea o Psp egos orais empre bones disc sa veioy Ser RETO POA Ste rd 167 PRaBtaro EMBÉiCO!» cry cjepaie ssçiLo apro pentpeeae RAN 167 Epecacnanhama qe ear o eta e oiee TRETA A GRE :.. 168 O GARROTILHO Sulphato de cobre . .......... Alterantes Chlorato de potassa Bi-carbonato de soda... ........ IMERCUEIdeS! JR een io Bromio e bromureto de potassio Todo e iodureto de potassio..... Tonicos... Antiphlogisticos use RES Revulsivosa eira BR Ra Metosiocaesfa sed O Seal bem Penta RR SR poa Nitrato ide prata; tida Acido chlorhydrico Sulphato de cobre aja fo [nfanalintoyato) «uai atoa Al ol oilol a) ao dirigentes Pa Leo RC Nado OR PA AN Alumen (Glycerimane amam on jar paro po do up E Elycerinasr a rs Chlorato de potassa Bi-carbonato de soda. ......... Cauterisação directa da larynge. Tubagem da glotte Ba i há E a fo Me o iai cado A ee b > ps er NO Ba ahi, a a ; uia di ASA PRA à no O a? , pi dr atuo lisa 4 q rito des rr PR ; o a A o, PE A pata sois ggrntartd 1a AB ? VE : alto da a anirdoção 6 ' Ritmo: Pa Br “ rattil PU ra “log 0 dada 4 | PR cm Capitão snes À id A a Ee a ; io rip mo E arado BR Ma AR DR DO ro Wa o REI Re Ns dad DRT A x na crê SR a oem digo tada Ni . 1 RR , ; 18 a, pr iv a Pitta ale e OR ' Da y are E E h Fer Ag dao paca 76d Ui q Es f poa ind ) j ) E À Eiras aid io aguda PAS ico be tpARãs E aa Eder AE Ee — gr da el vs ag: 54 as sa to dama = E E Rennes, y » é unido: he trio Dio vo eb RE o y Eae gados al RU x 7 py EM RD cad E tas 48 Apaga Moeda pm ad o DRE Ê ALA o Al F Perna eyes aa 4º , oe o. h H) T 7 Ê y “o ide . Ntcruaç to lero, Io A Paget a 3 ae Rei ba js ) ! A : E ALIEN ii pn ha A “ o bd Re RMT DR : ) MA E 7 . RPA Eb Aa ) MA 4 NT h HA ' o po e Nite o da v , a ; ' r E f , Sal “ É Ta A E y k BRASA do : Rep N y T o, ji E DAR fiu'4 ( r- ea 2 e/6 ) a x 4 r , aços hó ia Ls so "a x R h LA 1 y DER 4 RA 4 A o F E OPUSCULOS DO MESMO AUCTOR ? Ensaio sobre à cholera epidemica — por F. J. Cunha Vianna e A. M. Bar- bosa, 1 vol. 1854. Instruccões contra a cholera-morbus — pelos mesmos, 1854. Memoria sobre as principaes causas da mortalidade do hospital de S. Jesé e meios de as attenuar — por A. M. Barbosa, 1856. Anatomia e pathologia dos apertos organicos da uretra — idem, 1857. Noticia da febre amarellia no Porto, Belem, e Lisboa em 1856— idem, 1858. À j — sega det, Mom WA - E | ; b MERO DE Pp » E fe PA j ; CR ee REAR a ORA Uri dd PADRE, ts mr io e 120 = e e - A IN + é pis h A à) “AM CIR ú » ARO a PER up 4 Rua x ja f ul a 4 o vai Au ps ) ç Ri ry ' ai Ein AM AU Dn op o a ES E Ny PRA Ê ! E) Date ri E q jr j Vo O ua a), o VD A Re RR e ARA coentro LA 2 dg pês 4 Rd EAD o , Pé, y 1) Dei A OR , PA RUMRO DURAN doa | io Ko É Pe DE TRRA À V Py m ly vp ' EU Ev x ART ” ; AA nv BE O Ata A Mi ) ue nm “vio NAN RA E AR PARRA Mi | “ N 1 SR 4” = A IN Ma is k a a Ê Ts ot | bl fui À Ri É h f o 5 j 4 y I ) Tr ms ” E X + ' + Pp ah ê o p MEMORIA SOBRE ARA CHEN TOMO MO GARROTILHO x APRESENTADA Á ACADEMIA REAL DAS SCIENCIAS DE LISBOA | POR ANTONIO MARIA BARBOSA SOCIO EFFECTIVO DA MESMA ACADEMIA CIRURGIÃO EFFECTIVO DA CAMARA DE SUA MAGESTADE FIDELISSIMA LENTE DA ESCÓLA MEDICO-CIRURGICA DE LISBOA CIRURGIÃO DO HOSPITAL REAL DE S. JOSÉ MEMBRO DO INSTITUTO DE COIMBRA E DE VARIAS OUTRAS ASSOCIAÇÕES SCIENTIFICAS NACIONAES E ESTRANGEIRAS CAVALLEIRO DA ANTIGA E MUITO NOBRE ORDEM DA TORRE E ESPADA, DO VALOR, LEALDADE E MERITO, ETC. nal Era 1 Et Ma a dota " ro arise? e patos foro rAR o A Memoria, que venho submetter ao juizo e approvação da Aca- demia Real das Sciencias, é o complemento dos — Estudos sobre o gar- rotilho— que, ha dois annos, tive a satisfação de ver approvados pela primeira corporação scientifica do meu paiz, a cujo gremio tenho a honra de pertencer. A imprensa medica portugueza e a estrangeira, pelos seus orgãos mais importantes e respeitados, foram tão benevolas com a minha Me- moria sobre o crup, que me constituiram na obrigação de escrever a que agora publico sobre a tracheiotomia applicada ao garrotilho por fórma a corresponder-lhes o melhor que me foi possivel. A materia que contém o presente opusculo é dividida em duas partes principaes. Na primeira comprehendo tudo que respeita á tracheiotomia com applicação ao crup. Na segunda collijo 38 observações em que a tra- cheiotomia tem sido feita até hoje em Lisboa com o fim de curar a as- phyxia crupal. À primeira parte da Memoria é subdividida em seis secções. Na 1.º refiro a historia da tracheiotomia desde Asclepiades de Bythinia a quem se attribue a invenção da tracheiotomia e o conselho de a prati- M car no tratamento da angina suffocante, e desde Antyllus, que é o pri- meiro cirurgião de quem se conhece' processo operatorio, até Breton- neau que obteve em Tours, no anno de 1825, o primeiro caso de cura do garrotilho pela operação, e ao seu celebre discipulo, o sr. Trous- seau, a quem se deve o segundo exemplo de cura de crup pela tracheio- tomia, obtido em Paris no anno de 1830, e sobretudo a vulgarisação e melhores preceitos da operação, principalmente desde 1849. Depois da parte historica da tracheiotomia nos diversos paizes de maior ilustração, ainda nesta secção me oceupo mais detidamente do objecto no nosso paiz, onde se conseguiu salvar o primeiro doente, no mez de outubro de 1852, depois de tres tentativas infructuosas, e onde hoje se contam em um total de 38 operações 12 casos de cura, 6 dos quaes me pertencem, e os outros 6 a tres collegas. Na 2.º secção estudo cuidadosamente as indicações e contraindi- cações da tracheiotomia, sempre em applicação ao garrotilho, tiradas da idade, sexo, temperamento, constituição, e outras circumstancias dos doentes; assim como das complicações da doença, sua marcha, dura- ção, fórma, periodo, tratamento, etc. Na 3.º secção apresento o resultado do meu estudo sobre a ana- tomia da região onde é praticada a tracheiotomia com individuações que muito concorrem para diminuir os perigos da operação e para facilitar o processo cirurgico. Na 4.º secção descrevo os processos pelos quaes a tracheiotomia póde ser praticada, occupando-me mais departidamente do processo que costumo empregar, pelo qual me parece facilitar o modo de pro- ceder na pratica da tracheiotomia, prevenindo os perigos que lhe são inherentes. Na 5.º secção occupo-me de estudar os accidentes immediatos e consecutivos à operação, como são no numero dos primeiros a hemor- rhagia, a morte apparente por asphyxia ou por syncope, a perfuração da parede posterior da tracheia, o ferimento do esophago, as convul- sões e o emphysema immediato; e no dos segundos a diphtheria da fe- rida e de outras partes, a erysipela, a gangrena, a hemorrhagia e o emphysema consecutivo, a dysphagia, ás ulceraçães da tracheia, a bron- cho-pneumonia, a enterite, a intoxicação diphtheritica, etc.; referindo VII a proposito de cada um desses accidentes os respectivos symptomas e signaes, e os meios de os prevenir ou remediar. Na 6.º e ultima secção indico o regimen e o tratamento imme- diato e consecutivo à operação, tanto local como geral, de que muito depende o bom resultado das operações. A segunda parte desta Memoria consta de 38 observações de tra- cheiotomia applicada ao garrotilho, que são todas as que têem sido pra- ticadas em Lisboa pelos meus collegas e por mim, e sobre as quaes são fundamentados muitos factos importantes tratados nas diversas sec- ções que comprehende a primeira parte. Tal é, em pequeno resumo, o objecto da presente Memoria, que tenho a honra de apresentar à apreciação da Academia. Lisboa, 1 de junho de 1863. - A. M. BARBOSA. vá VI, RN A PD ETR Ea ral PT a | a O trigo Ari o YA TR TR cimo br RL O ro ro ANN | pa tus too jd ad Bçges ivo sus Vau? io dao ; ' E rates cn pda AD A td Us oeelotniis TS : e Porco o Mp nte ortgoh be a BRR o do 8 o] Em REAd pao Gr o bs iu CEGA ) AGIA. 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Alguns modernos, sob a denominação generica de bronchotomia, comprehendem todas as operações, em que se abre qualquer parte do canal respiratorio desde a larynge até a tracheia; e admittem como especies a laryngotomia ou a operação na larynge, a tracheiotomia ou -a operação na tracheia, e a /aryngo-tracheiotomia ou a operação em que é interessado um e outro destes orgãos. Para obstar á morte pela asphyxia, determinada pelo garrotilho, emprega-se sómente a tracheiotomia na accepção precisa da palavra. MEM. DA ACAD.— | .º CLASSE.—T. II. P. I. Í 7 to du | pin k a 4; Ro - gu! j ; : ; FER A Pa vi NET atom Sotnas DME O: Pe ain Si ue A doa avo SR O Ds entao ais umleignno pap” iofarigão ar que é Pa RR o qi (Boa a O Wbiy fd umbro Langue e ese 22] ENA sro O vd vie dead ste Banolhivie ota boo Db oBbna dA k Ea ad Pocos ci id gala ab ' PDM Na biliga gs “ E na bi PR magias: RAR RPE RARE og brave dano La fraa vob) ordões is Eb ERRO. 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Home, d' Edimburgo, o primeiro historiador do crup, re- commendou a tracheiotomia com applicação especial a esta doença, e chega até o principio do seculo xrx. A terceira época, a mais impor- tante de todas, é principalmente assignalada pelos escriptos e esforços de dois medicos eminentes: Bretonneau de Tours, e o sr. Trousseau de Paris. Esta ultima época, que principiou em 1825, estende-se até hoje. Brilham n'ella, mais do que todos, os esforços do sabio professor da Escóla de Medicina de París, que tem sido incansavel em vulgari- sar a tracheiotomia, e tornal-a uma operação das mais uteis á iam nidade. - Primeira época. — N'este primeiro periodo, que começa em As- clepiades, não se póde dizer que a tracheiotomia fosse determinada- mente applicada no crup, que não era então designadamente conheci- do; mas é mui provavel que algumas das esquinencias e suflocações, em que era recommendada e aconselhada, fossem de verdadeiro garro- tilho. Asclepiades de Bithynia, que foi exercer a medicina em Roma no tempo de Augusto, 100 ou 90 annos antes de Christo, passa por ter sido o inventor da tracheiotomia, que empregava no tratamento da es- quinencia ou angina suffocante; mas o modo por que o medico grego ls 4 ESTUDOS SOBRE fazia a operação, se a fez, o que para alguns é duvidoso, é absoluta- mente desconhecido. Até ao seu tempo, quando nas esquinencias se manifestavam sym- ptomas de suffocação, pretendia-se remediar o accidente introduzindo um tubo na garganta para conduzir ar ao pulmão. Era o tratamento aconselhado por Hippocrates nas seguintes palavras: «.... fistulaeque in fauces ad maxillas intrudendae, quo spiritus im pulmonem traha- tur » (Hip. de morbis, Jib. m, cap. x. Artis medicae principes, de Hal- ler, Lausannae, t. mn, mpecLxx, pag. 102). Mas esta pratica, geralmente seguida até então (um seculo antes de Christo), foi substituida pela operação aconselhada pelo restaurador da medicina em Roma. * Galeno dá Asclepiades por inventor da incisão. da tracheia para curar a esquinencia suffocativa «Asclepiades ultimum auxiliwm posuil, de quibus summus metus est, ne strangulentur, superiorem gutturis partem incidere» (Galen. Opera. Venetiis, mpexxv. Ascripta introductio seu Medicus, cap. xur, pag. 55 v.); mas não emittiu juizo sobre as van- tagens ou inconvenientes da operação. Coelius Aurelianus, que nasceu provavelmente no anno 223 de- pois de Christo, não fez o mesmo. Grande detractor de tudo que vi- nha de Asclepiades, tratou a operação de fabulosa, e a invenção de te- meraria, por não ter sido aconselhada por nenhum dos predecessores d'este medico. « Est etium fabulosa arteriae ob respirationem divisura, quam laryngotomiam vocant, et quae a nullo sit antiquorum tradita, sed caduca eb temeraria Asclepiadis inventione affirmata» (Coelius Au- relianus, acutorum morborum, lib. m, cap. 1v. Artis medicac princi- pes, de Haller, t. x, pag. 223). Areteo falla tambem da bronchotomia como de uma falsa espe-' culação. A ferida da operação, segundo elle, excita a tosse, aggrava a constricção da garganta, e augmenta o calor da inflammação; e quando os doentes são tão felizes que escapam a estes perigos, acrescenta elle, os labios da ferida não podem consolidar-se por serem cartilaginosos, e por isso inglutinabiles. «At quicunque strangulationem ab angina ve- rentes, quo laxius spiritus duceretur, arteriam secuerunt; nom sane experimento rem comprobasse videntur. Quippe caliditas inflammationis major ex vulnere efficitur, strangulatum adaugel, tussimque commovet. Quin etiam si alioqui periculum id evaserint, vulneris orae in unum coa- lescere nequeunt ; ambae enim cartilagineae, atque inter se inglutina- biles sunt.» (Aretaei. De curatione anginae, cap. vir). Antyllus, o inventor da operação da cataracta, que viveu no se- culo mm da nossa era, é o primeiro cirurgião de quem se conhece o A TRACHEIOTOMIA 5 processo operatorio da tracheiotomia. Os seus escriptos não são conhe- cidos senão por fragmentos citados pelos auctores antigos. Paulo d'Egina, que mais provavelmente viveu no fim do secu- lo vr e primeira metade do vm, e que, portanto, foi muito posterior a Antyllus, descreveu o processo d'este cirurgião, assim como deu conta das indicações e contraindicações que elle admittia na operação. « Tn- cisámos, dizia Antyllus, citado por Paulo d'Egina, uma porção da tra- cheia-arteria dois ou tres anneis mais abaixo do que o princípio do Bron- cHio, porque seria perigoso dividil-o todo. Esta parte é vantajosa por- que não tem carne, e porque os vasos estão situados longe do logar que se corta. Inclinando a cabeça do paciente para traz, de modo a fazer mais apparente O BRONCHIO, fazemos encisão transversal, conduzindo-a entre dois dos seus anneis, para não cortar as cartilagens, mas sim « membrana que as une.» A prova de ser aberta a tracheia estava, se- gundo Antyllus, no sopro da respiração, que saía pela ferida com im- petuosidade, e na extineção da voz. «Nós reprovamos a operação, acres- centava elle, nas suffocações, porque a incisão é inutil quando todos os bronchios e o pulmão estão doentes. Mas nas inflammações das partes situadas na visinhanca da bocca e mento, quando as amygdalas tapam a abertura do BRONCHIO, se à tracheia-arteria não está doente, é rasoa- vel praticar a tracheiotomia para evitar o perigo da asphysia, » (Cirur- gia de Paul dEgine, traducção franceza de René Brian, pag. 165). Autyllus prescrevia portanto a tracheiotomia no crup. Entre os medicos arabes, Rhazes, que nasceu em 860, e Mesne fal- lam da bronchetomia como ultimo recurso na esquinencia que amea- ca suflocar os doentes, mas não dizem uma palavra sobre o modo de praticar a operação. Avicenna (fim do seculo x) era tambem de voto que se devia lan- car mão da tracheiotomia nas violentas esquinencias, quando a medi- cina tinha esgotado todos os recursos, e se julgava proxima a perda do doente; que n'estas circumstancias era possivel salval-o abrindo-lhe a tracheia-arteria. « Cumque synances vehementiores fiunt, et non va- lent medicinae, et creditur quod perditio futura sit, illud per quod spe- ratur evasio est scissio cannae: eb illud est cum scissione ligamentorum, quac sunt inter duos annulos cannae, procter quod recipiat aliquid de cartilagine ita ut per illud anhelet : deinde suatur cum expletum fue- rt regimen apostematis: eb medicetur, et sanabitur. » (Avicennae medi- ir Arabum principis, lb. m, fen ix, pe 11; Basilcae, 1556, pag. dilives 472): Albncasis, cirurgião arabe muito E perineintátlo; transcreveu de 6 ESTUDOS SOBRE Paulo d'Egina o processo operatorio de Avtyllus, e não julga perigosa a operação em vista de uma ferida de garganta que terminou pela cura; mas diz que no seu paiz e no seu tempo ninguem a praticára. «Memoraverunt antiqui de hac incisione in laryngã et ego non novi ali- quem in regione nostra qui cam fecerit.» (De Chirurgid, lib. u, sect. 43). Avenzoar, que morreu em 1161 ou 1162, fez a operação em uma cabra e do resultado favoravel concluiu que a bronchotomia não era mortal. Na idade média não se havia esquecido a bronchotomia, mas não se tinha mais do que uma recordação historica da operação. Guy de Chauliac, que representa esta época, e que escreveu em. 1363, falla vantajosamente da possibilidade da bronchotomia nas esquinencias gra- ves, mas só se refere ao que dissera Avicenna. (La Grande Chirurgie de M. Guy de Chauliac composce en 1363 et restituce par Laurens Jou- bert. Tournon, 1598, pag. 169). E” pois provavel que a operação não fosse mais praticada depois do tempo da cirurgia dos gregos. E' preciso chegar ao meiado do seculo xvi (1546) para achar um novo exemplo de tracheiotomia, pertencendo á Italia essa honra., Foi Antonio Musa Brassavolo, medico do duque de Ferrara, quem a pra- ticou n'aquelle anno em um caso desesperado d'angina grave, conse- guindo curar o doente. E' este o primeiro facto de tracheiotomia se- guida de cura de que ha noticia averiguada nos tempos modernos. O doente era um homem que tinha uma esquinencia que o suflocava. Um cirurgião timido não ousou operar, e o desgraçado doente ia sue- cumbir, quando Brassavolo lhe abriu a tracheia-arteria, e instantanea- mente lhe restituiu a respiração e a vida que estava proximo a per- der. Este facto é referido por Casserius (De laryngotomia, cap. xx) e tambem indicado por Fabricio de Aquapendente (Opera chirurg., cap. XLIV). Jacques Houllier, medico da faculdade de Paris, que morreu em 1562, no seu tratado de Morbis internis, cap. xxn, fallando da esqui- nencia, diz que quando as sangrias, as ventosas, as cataplasmas e os diversos gargarejos, que aconselha, não aproveitam, e o doente está em perigo de morrer suffocado, se recorrerá ao soccorro de Asclepiades, que se deve entender a tracheiotomia. « Quod si his artibus nihil pro- fecimus, utimur auxilio Asclepiadis. » O nosso Amato Lusitano em 1580, a proposito de uma angina curada pela introducção de uma-vela de cêra na garganta, sómente refere a opinião de Avenzoar sobre a incisão da tracheia, assim como A TRACHEIOTOMIA 7 a de Paulo d'Egina fundada na de Antyllus sem indicar o seu parecer. (Curationum medicinalium centuriae. Lugduni, 1580, 1.º vol. pag. 112. Curatio vigesima nona, in qua agitur de angina, quae sola cerea can- dela tractata, disrupta fuit, et cam patiens brevi sanitatem obtinuit. Scholia). Sanctorius Sanctorinus, quarenta annos depois de Brassavolo, em 1586, praticou tambem a tracheiotomia, servindo-se d'um trocarte, que elle mesmo inventára para a paracenthese abdominal, cuja canula deixou na ferida durante tres dias. Na Hespanha, onde o crup foi tão estudado, como tive occasião de o demonstrar na minha Memoria sobre o garrotilho, a tracheioto- mia foi aconselhada e parece que praticada desde o principio do se- culo xvir. Juan Alonso de los Ruizes de Fontecha escreveu em 1611 so- bre o garrotilho a obra que tem o seguinte titulo: Disputationes me- dicae super ea quae Hippocrates, Galenus, Avicenna, necnon et alii Graeci, Arabes, et Latini, de anginarum naturis, specibus, causis et curationibus scripsere diversis in locis; et circa affectionem hisce tempo- ribus vocatam garrotillo. Alcalá de Henares 161 1. Fontecha, cathedra- tico da faculdade de medicina na universidade de Alcalá de Henares, além de outras escreveu aquella obra sobre o garrotilho, que foi uma das mais eruditas que se publicaram sobre esta doença. N'ella reuniu as opiniões dos antigos gregos, arabes e latinos, bem como a dos con- temporaneos entre os quaes cita especialmente o dr. Luiz Mercado, medico de Filippe III. Apoiando-se em todas essas auctoridades diz, que no tratamento do garrotilho póde recorrer-se á laryngotomia, prati- cando uma abertura na parte superior do canal respiratorio, quando haja perigo imminente de asphyxia, porque o canal esteja obstruido em consequencia da molestia. Ahi mesmo refere casos de cura obti- dos pelo mesmo recurso operatorio em uma cidade da diocese de To- ledo. (77. Morejon, Biblioteca escogida de Medicina y Cirurgia, t. 1v. Madrid 1850; e Iglesias, Memoria sobre las analogias y diferencias que existen entre el garrotillo descrito por los antigos medicos espano- les y la angina seudo-membranosa de los autores modernos, por el do- ctor Don Manuel Iglesius, y premiada por la real Academia de Me- dicina de Madrid. Madrid 1862). Fabricio de Aquapendente, mestre do celebre Harveo, que mor- reu de oitenta e dois annos em 1619, foi tambem um dos que melhor fez conhecer a cirurgia dos arabes. Elle falla detidamente da tracheio- tomia, citando com particularidade Rhazes, Avicenna, Avenzoar, Hali- Abbas, e notando a timidez com que estes auctores fallaram d'ella, o hj ESTUDOS SOBRE que influira tambem a principio desfavoravelmente no seu animo. « Bt ego quoque eorum vestigia secutus nunguam administravi.» (Opera chi- rurgica Heronymi Fabritii ab Aquapendente. Francoforti, 1620, cap. xLIv, pag. 157). Apesar de nunca ter praticado a tracheiotomia, Fabricio falla mui judiciosamente a respeito della. Considera-a a mais importante opera- ção da cirurgia, e diz que o cirurgião que, abrindo a tracheia, dá a vida a um doente proximo a morrer suffocado, é perfeitamente seme- lhante ao deos Esculapio. Assenta que a operação não está indicada nas difficuldades de respirar dependentes de vicio do pulmão ou da tracheia-arteria, mas sim quando o mal tem precisamente a sua séde na larynge ou acima, designadamente quando ha inchação excessiva da lingua, das amygdalas e da uvula. Não considera todavia como con- traindicação os signaes de repleção da tracheia-arteria. Exige perfeito conhecimento da anatomia a quem se propozer praticar a operação, sendo certo o bom resultado quando esta condição é satisfeita. « Qui secat, sit anatomes peritus; quia sub hoc medico et artifice omnia tutis- simê et felicissimê peraguntur.» O processo operatorio, que prefere, é o descripto por Paulo d'Egina, para o qual acha fundamentos anato- micos e cirurgicos. E” o primeiro que falla de canula para metter na ferida da tracheia depois da operação, dizendo: que deve ter azas para não cair dentro da tracheia-arteria no acto da inspiração do ar, que deve ser curta, para não tocar a parte interior da tracheia, o que ex- citaria dôr e tosse; e que deve ser recta, e não curva, para não ser agitada pelo ar que a atravessa, o que seria menos commodo. Acres- centa em fim, que, passado o perigo da suffocação, se tire a canula, e que a cura da ferida se obtem com muita facilidade. Julio Casserio, que morreu em 1616 com sessenta annos d'idade, e que fôra discipulo de Fabricio de Aquapendente, foi um dos mais ardentes defensores da bronchotomia. E” para notar, que não cite o nome de seu mestre no assumpto, limitando-se a dizer que magnani- mos e experimentados cirurgiões têem por ella dado vida a doentes proximos a morrer por falta de respiração. Cita o caso de Brassavolo, como já referi, e mais casos felizes. Descreve o modo de operar pela seguinte fórma: « Uma primeira incisão longitudinal, comprehendendo a pelle e o musculo cutaneo sobre uma linha préviamente traçada com tinta; segunda incisão feita entre os musculos bronchicos até á tracheia- arteria; terceira incisão para abrir este canal entre duas cartilagens abaixo da glandula thyroidéa.» Recommenda o uso de canula de pra- ta curva e chata, furada de muitos buracos, e manda (ixal-a com dois: A TRACHEIOTOMIA | 9 cordões atados na nuca. Este instrumento está figurado na estampa que vem junta á Memoria de Louis no 4.º volume das Memorias da Academia Real de Cirurgia de Paris. Nicolau Habicot, que praticou a tracheiotomia em um caso par- ticular de corpo extranho do esophago que comprimia a tracheia e ameaçava suffocação, publicou em Paris no anno de 1620 um pe- queno tratado com o seguinte titulo: « Question chirurgicale, par la quelle il est demontré que le chirurgien doit assurement practiquer Popération de la bronchotomie, fiada dite laryngotomie. Ahi diz que a canula póde ser de ouro, frias chumbo, estanho, etc., de ta- manho tal que possa introduzir-se na capacidade da tracheia-arteria para dar entrada ao ar, um pouco curva e achatada, de comprimento que não toque na parede opposta, para evitar a tosse insupportayel que d'ahr procede, com um orifício bem amplo internamente, e externa- mente guarnecida de um rebordo largo, tanto para impedir que cáia dentro da ferida, como para n'elle prenderem duas fitas que, contor- neando o pescoço, vão atar-se á sua parte posterior ou ao lado. Thomaz Fienus, professor de Louvain, citado por Louis, conside- rava perigosa a operação, e por isso só a propunha na ultima extre- midade. « Est autem hoc remedium periculosum, et ideo non licet co uti, nisi in deploratissimo casu (De laryngotomia sive sectione asperae ar- teriac)»; todavia convém em que deve praticar-se pelo processo que des- creve, o qual não differe do de Casserius. Seulteto (Joannis Sculteti Armamentarium chirurgicum, Venetiis, 1665) discipulo de Malavicini na escóla de Padua, e que praticava a cirurgia em Ulm com muita distincção no principio do seculo xvr, pensava mui favoravelmente a respeito da bronchotomia nas doenças de larynge que trazem suflocação. Marco Aurelio Severino (De medicinae efficacia, part. 1, cap. xL). um dos mais illustrados cirurgiões da Italia no penultimo seculo, que assistira em Napoles a uma extensa epidemia d'anginas gangrenosas, e que, fazendo uma autopsia em 1618, viu a falsa membrana na la- rynge, confirmando assim a observação de Baillou em 1576 e a de Herrera em 1613 (vêr a minha Memoria — Estudos sobre o garroti- lho, pag. 13), foi um extremado propugnador das vantagens “dá tra- cheiotomia n'aquella doença, a favor da qual adduziu quantas razões e auctoridades pôde imaginar e colligir. Entretanto não praticou a ope- ração, segundo o testemunho de Haller e de outros. François Rauchin, professor de medicina em Montpellier, aconse- lha expressamente (Questions sur toute la chirurgie de mr, Quy de Chau- MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. UI. P. 1. 10 — ESTUDOS SOBRE liac) a laryngotomia, quando a esquinencia se não póde curar por ou- tros remedios, e quando os doentes estão em perigo de asphyxia por falta de respiração. René Moreau, antigo decâno da faculdade de medicina de París, em uma carta escripta em 1646 preconisou tambem a tracheiotomia em certos casos de angina gangrenosa. O processo, que aconselha, é parecido com o de Casserius, e a canula, a que dá preferencia, é li- geiramente curva ; rejeita a sutura que cirurgiões anteriores e contem- poraneos faziam tirada a canula, substituindo-a pela posição da cabeça inclinada sobre o peito; aconselha não esperar que a suffocação se adiante até á extremidade para operar; e falla ainda em corrigir o ar exte- rior, logo depois da operação, por calor brando, o que Cesalpino já ti- nha indicado cincoenta annos antes, segundo Marco Aurelio Severino, tambem citado por Louis, que aconselha para o effeito fazer ligeira- mente humida a atmosphera, em que esteja o operado, por meio de vapor d'agua quente, levando assim o ar, que é respirado pela canu- la, as mesmas modificações que tem o que passa normalmente pela bocca e fossas nasaes (De la bronchotomie. Mem. de Académ. Royal de chirurg., tom. 1v, 1784). O nosso Zacuto Lusitano é de voto de recorrer á laryngotomia nos casos extremos pi suffocação pela angina. Na sua Praxis medica, Lug- duni, 1657, lib. 1, pag. 287, faz a seguinte pergunta : Utrim in suf- focante angina ia "yngotomia aliquando exercenda? E, depois de citar a opinião contraria de Areteo, acrescenta: Cúm enim cactera praesidia non prosunt et aeger ad mortis fauces est deductus, ad extrema, et vel periculosa, immo temeraria accedere oportet : Nam quos ratio mon ju- vat, temeritas sanat, monente Celso. Junta em seguida, para confirmar o seu parecer, a opinião de medicos que curaram doentes pela opera- ção, e os nomes de Galeno referindo-se a Asclepiades, de Paulo de Egi- na fundando-se em Antyllus, de Rhazes, Albucasis, etc. Outro compatriota, o dr. Thomaz Rodrigues da Veiga, professor na universidade de Coimbra, na Pratica medica, que escreveu em Lis- boa em 1668, aconselha mui expressamente a tracheiotomia nos casos desesperados d'angina laryngea, como se vê das suas palavas a pag. 157: «Cum res desperata est, aperiatur gultur inter duas cartilagines ad respirationem, ct, sanata angina, ulcus consolidatwur. » João Curvo Semedo é tambem de voto de praticar a tracheioto- mia nas anginas graves. À pag. 276 e 277 da Polyanthea medicinal, impressa em Lisboa em 1697, escreve o seguinte na setima adverten- cia para a boa cura da angina ou garrotilho: «.... se o doente dei- A TRACHEIOTOMIA HH tar o que comer ou beber, pelo nariz, e fallar fanhoso, que n'este caso não ha esperança de vida, salvo abrindo a garganta entre o terceiro e quarto unnel abaixo do cpigloto, fazendo abertura entre as cartilagens para que entre o ar, e ao depois se cure a ferida como as outras »; e faz depois considerações para auctorisar a opinião. O nosso Francisco da Fonseca Henriques (Medicina Lusituna e Soccorro Delphico, 1710) aconselha tambem a mesma operação da tra- cheiotomia no garrotilho a pag. 372, «para que passe o ar por esta abertura e se evite assim o presentaneo risco de suffocação, como acon- selha Galeno. com outros auctores antigos por doutrina de Anthillo e Asclepiades ;o que persuadem tambem muitos modernos, entre os quaes Brassavolo confessa, que com suas mãos fizera esta operação felizmente; e se houver cirurgiam perito, deve fazela, por livrar o doente da mor- te, etc.» ! Verduc na terceira edição do seu Tratado de operações, impresso em París, aconselha a tracheiotomia na verdadeira esquinencia da la- rynge, fazendo uma simples paracentese entre os anneis. « Lorsqu'il ny a nitumeur, ni inflammation QUI parties extericures du cou, com- me il arrive dans la veritable squinancie du laryna, qui est la plus Sfacheuse de toutes, Popération est bien plutõe faite et avec moins de dou- leur et d'appareil, en faisant une simple paracentêse entre les an- neaua » Dionysio no seu Curso de operações (Cours d'opérations de chi- rurgie par M. Dionis, edição de La Faye, París, 1746) limita o em- prego da tracheiotomia á esquinencia, e á especie em que é certo que o embaraço da respiração está na larynge, especie que denomina es- quinencia interna e verdadeira, quando o doente tem forças sufficientes, e quando ha motivo para esperar que fazendo entrar ar nos pulmões se lhe salvará a vida, e que morreria infallivelmente sem a operação. Abre a tracheia transversalmente entre dois anneis com um instru- mento, a que chama mui im:propriamente—bronchotomiste, e vem gra- vado no principio do artigo a que me refiro, ou na sua falta com lan- ceta; depois mette na tracheia um estylete para conduzir a canula de prata, a qual deve ser curta para não tocar a parede posterior da tra- cheia-arteria, e chata para se aecommodar entre dois anneis (bronches), com duas pequenas azas para a fita que a deve prender ao collo. Como curativo mandava pôr sobre a abertura da canula um pedaço de es- ponja molhada em vinho quente e previamente espremida; por cima emplastro fendido, compressa e atadura mediocremente apertada (pag. 472 a 480). o 12 ESTUDOS SOBRE Bernard e Gherli praticaram a tracheiotomia, cada um a sua vez, com feliz resultado em casos d'angina de grave intensidade. Juncker, professor de Hale, no seu Conspectus chirurgiae, entre as causas que exigem a tracheiotomia, põe em primeiro logar a verda- deira esquinencia que embaraça a respiração. No tocante á operação falla do processo de Dionysio, o da simples puncção com lanceta trans- versalmente entre dois anneis tracheiaes; mas dá preferencia á opera- ção feita com o trocate, e fixa em seis linhas o comprimento que deve ter a canula, Garengeot indicou tambem a operação nas doenças da larynge. O processo d'este cirurgião, conhecido desde 1720, e que está des- cripto no tom. 1 do seu Tratado das operações de cirurgia (T raité des in de chirurgie par René Jacques Croissant Garengeot, 2 2.º edit. 1731, t. n, cap. vu, pag. 446), é muito digno de notar-se, e por isso o refiro. Manda fazer uma préga transversal adiante da tracheia entre o terceiro e o quarto annel abaixo da cartilagem thyroidea. Com o bistu- ri recto corta a pelle verticalmente na extensão de tres ou quatro de- dos transversos, correspondendo o angulo superior da incisão á symphyse da barba, e o inferior ao meio da chanfradura do sterno. Depois, se o doente é magro, abre a tracheia com uma lanceta entre o terceiro e o quarto annel cartilaginees, e, logo que percebe estar na cavidade tracheial, corta para os lados com o fim de dilatar a abertura. Em seguida introduz uma pequena canula de prata, armada d'um estylete, que é logo depois tirado, e a canula segura por meio de duas azelhas, em que passam duas fitas que se atam atrás do pescoço. Nas pessoas gordas prefere separar, como é costume, diz Garen- geot, com o bisturi os musculos sterno-hyoideos e sterno-thyroideos, para descobrir a tracheia, procedendo depois pela mesma fórma na aber- tura d'esta e introducção da canula,- cujo comprimento fixou, como Juncker, em seis linhas. Como se lê a pag. 452, já aconselha pôr diante da abertura da canula um panno ralo, mantido por emplastro fendi- do, para que o ar possa entrar e sair com facilidade atravez d'elle, e acrescenta que alguns usavam pôr na canula um pouco de algodão preso a uma linha, e outros uma ligeira prancheta de fios. O dr. George Martin, cirurgião muito distincto da Escocia, em uma carta escripta ao dr. Guilherme Groeme em 1730, marca mais do dobro para o comprimento da canula, e julga muito engenhosa a idéa que se lhe deu de fazer construir duas canulas de diametro des- igual, para metter uma na outra, tirando a interna para a limpar, quando é preciso, sem embaraçar a respiração. A TRACHEIOTOMIA 13 Heister no meiado do seculo passado, e já desde 1739, fazia a tracheiotomia pelo methodo expeditivo, como Sanctorius em 1586, atravessando a pelle, musculos e tracheia com um trocate grosso e curto, que vem representado na tab. xxr, fig. 15 e 16 das suas Tas- tituições cirurgicas, o qual tem uma canula metalica recta com um largo pavilhão em que ha dois orifícios lateraes para os cordões que devem prender a canula (D. Lúurentii Heisteri instituciones chirurgi- cae. Amstelaedami, 1750, t. 1, pag. 676). A verdadeira esquinencia, que embaraça a respiração, era para | Heister a melhor indicação da tracheiotomia. Descreve tres modos de operar, mas decide-se nos casos de angina em favor do trocate, cuja invenção, em 1673, attribue a Deckers, antigo professor de Leyde e seu mestre, tambem citado por Boyer. Recommenda particularmente que se não recorra muito tarde a um meio tão salutar. Van-Swieten nos commentarios ao aphorismo 813 de Boerhaave (Gerardi Van-Swieten med. doct. commentaria in Hermani Boerhaave aphorismos de cognoscendis et curandis morbis. Lugduni, 1745, t. 1, pag. 689), na parte respectiva á angina inflammatoria, descreve e discute o melhor processo de tracheiotomia, e oppõe-se ao methodo expeditivo de Heister, fundando-se em experiencias feitas em cadaveres e ani- maes vivos; ahi citando a auctoridade do cirurgião inglez, o dr. George Martin, lembra tambem a conveniencia da canula dupla, em logar da simples que era usada !, e aconselha pôr estofo de panno por diante da abertura da canula, á roda do pescoço *, para que o ar que entra nas vias respiratorias seja mais quente, e por isso menos nocivo. Bauchot, antigo cirurgião mór do hospital do rei em Poyt-Louis, e socio correspondente da antiga academia real de cirurgia de París, praticou a tracheiotomia, no meiado do seculo xvrm, em esquinencias da larynge que ameaçavam sufocar os doentes. Tinha instrumentos especiaes para fazer a operação: um instrumento, todo de metal, para fixar a tracheia, em fórma de crescente com um cabo curvo; um tra- cheiotomo, que era uma especie de lanceta curta, de cabo fixo, e com a extremidade mais larga, que mettia por puncção atravez da pelle ; e em fim uma canula achatada. Todos estes instrumentos vem repre- sentados a pag. 512 do t. 1v das Memorias da antiga academia de ci- rurgia de Paris. D. Pedro Virgili, cirurgião mór da marinha hespanhola, e dos ! «Si duplea foret tubulus in asperam arteriam dimissus, quorum major alterum minorem exciperet.» 2 * « Si collo circumduceretur lazê rarum linteum. » 14 - ESTUDOS SOBRE reis D. Fernando VI e D. Carlos III de Hespanha, praticou a tracheio- tomia com feliz resultado, a qual vem referida a pag. 581 dot. 1 das Memorias da academia de cirurgia de Paris, 1761, no corpo da memo- ria de Hevin. E' certo, que se não tratava naturalmente de garroti- lho, mas de uma simples angina inflammatoria; todavia refiro o fa- cto mais circumstanciadamente, porque pertence a um cirurgião da Peninsula, quasi compatriota, e porque o processo empregado, em vir- tude de um accidente que sobreveiu, deixou de consistir só na ferida transversal da tracheia, para seguir a direcção vertical, hoje só usa- da, mas que antigamente se temia muito pelos suppostos resultados do ferimento do tecido cartilagineo, em que se não esperava cicatrisa- cão. ] A operação foi praticada no hospital do rei, em Cadix, n'um sol- dado hespanhol do regimento da Cantabria, de vinte e tres annos, que estava em perigo d asphyxia por inflammação da larynge e pharynge. D. Pedro Virgili incisou longitudinalmente os tegumentos, separou os musculos, e abriu a tracheia entre dois anneis Erasmo mas hou- ve hemorrhagia, correndo o sangue para dentro da tracheia, e excitan- do tão violenta tosse convulsiva que se não podia manter a canula na ferida, e que o doente se suffocava. Este accidente fez tomar a Virgili o partido de abrir a tracheia ao comprido até o sexto annel cartilagi- neo, e dar ao doente uma posição tal, que o sangue não corresse para dentro do canal respiratorio, com o que a respiração se fez logo facil- mente. Na ferida, em logar de canula, pôz uma chapa de chumbo cri- vada de orifícios, e á roda do pescoço uma atadura; e assim conse- guiu que o doente se curasse. : Até aqui a tracheiotomia era aconselhada em casos diversos d'au- “gina e de doenças da tracheia, entre os quaes figuraria naturalmente algumas vezes o verdadeiro garrotilho; mas não se póde assegurar que a operação tivesse effectivamente sido praticada contra esta doença. Segunda época. — Este periodo faz-se notavel pela mais completa descripção do crup dada por Home, de Edinburgh, e pela indicação formal da tracheiotomia n'esta doença, estabelecida com toda a clare- za pelo mesmo medico na sua obra 4x inquiry into the mature, cause and cure of the croup. Edinburgh, 1765. Foi F. Home quem deu á doença a denominação de croup, quem melhor a descreveu, e quem finalmente recommendou a tracheiotomia com applicação especial ao garrotilho, supposto que o seu fim fosse só- mente extrahir a falsa membrana pela incisão da tracheia. Não sendo possivel, diz elle, effectuar a solução da membrana morbida, depois de j A TRACHEIOTOMIA 15 x completamente formada e consolidada, por nenhum meio interno ou externo conhecido, e sendo a sua expulsão igualmente impossivel, não ha outro meio de salvar a vida do doente senão a extracção da mem- brana. Esta extracção sendo impossivel atravez da glotte, o auctor propõe nos casos desesperados a bronchotomia, como se vê nas suas pro- prias palavras : «JYe have, then, no method remaining to save the pa- cient's life, but thai of extration. That cannot be done thro' the glot- tis. When the case is desperate, may we not try broncotomy? I can see no weighty objection to that operation, as the membrane can be so ecasi- ly got at, and is very loose. Many a more hazardous operation is daily performed » (pag. 59). A tracheiotomia parece ter sido praticada pela primeira vez no crup em Inglaterra no dia 11 de fevereiro de 1782 por John An- drée, cirurgião muito distincto de Londres, conseguindo curar o doen- te, que era um rapaz de cinco annos, de que fôra assistente o dr. Naukivelli, estando presentes á operação, e servindo de ajudantes, os cirurgiões George Vaux, Adair Hawkins, e além d'estes um medico estrangeiro, que John Andrée disse depois que lhe parecia chamar-se Locatelli. A observação é referida por Borsitri sob as informações de Lo- catelli (Tastic. medic. pratic. Leipsie, 1798), e foi tambem publicada pelo dr. White, de Manchester, em sua these inaugural sobre o cy- nanche tracheale, publicada em 1784, a quem o operador deu os apon- tamentos do caso. As observações de Borsieri e White vem transcriptas em nota a pag. 327 e 329 do Tratado da diphtherite de Bretonneau, assim como a pag. 333 uma carta do mesmo operador Andrée, escripta a Valen- tin em data de 28 de março de 1813, rectificando alguns pontos da historia de Borsieri, e dando mais credito á descripção de White. O processo empregado pelo cirurgião inglez foi diversamente des- cripto por Borsieri e White. Segundo o primeiro, o operador fez uma incisão vertical e mediana, de tres dedos transversos, desde a glan- dula thyroidéa até o sterno. Descoberta a tracheia, cortou transver- salmente a membrana interposta ao segundo e terceiro annel, e depois do mesmo modo a do intervallo do quarto e quinto annel. Em segui- da praticou duas incisões verticaes e parallelas, para excisar o terceiro e quarto anneis cartilagineos, ficando assim uma abertura quadrangu- lar para a entrada do ar, para a expiração e para a saída das concre- ções membranosas. Na descripção dada por White não se falla de ex- cisão quadrangular da tracheia, e diz-se que Andrée mettera na ferida 16 ESTUDOS SOBRE j uma canula de prata ou sonda flexivel para facilitar a respiração. E' esta descripção que Andrée dá por mais' verdadeira ; todavia são para: notar certas circumstancias que por absolutamente impossiveis tira- riam todo o credito ao facto, se se não attendesse a que a descripção foi publicada e talvez escripta muito tarde para terem podido esque- cer algumas das occorrencias. Nesta parte limito-me a transcrever al- gumas palavras da observação escripta e publicada por White, que con- firmam o que acabo de dizer : « Incisione facta, aer magna vi prorue- bat; respiratio protinús facilius absolvebatur ; atque aeger, cujus vox ante vis audiri potuerat, exclamabat se nunc levatum, se nunc sanum esse» (!). Mas a respeito d'esta operação tem havido grandes duvidas, sobre se seria verdadeiro crup a doença que motivou a operação, porque com quanto os symptomas parecessem os do garrotilho, todavia na observa- ção só se diz ter saído uma onda de pus na occasião de abrir a tracheia, e não .se nota a existencia de nenhuma falsa membrana. Entretanto, o dr. Valentin, que negava que Andrée tivesse feito com bom resultado a operação da tracheiotomia no ultimo grau da angina laryngea pseu- do-membranosa, escreveu a Bretonneau, dizendo-lhe que não podia já duvidar do facto depois dos esclarecimentos que verbalmente lhe dera o dr. Locatelli. Nos annos seguintes a tracheiotomia foi defendida e considerada como remedio util, ou combatida e desconsiderada por inutil e peri- gosa. Louis imprimiu successivamente duas memorias sobre a broncho- tomia no t. 1v das Memoires de Pacadémie de chirurgie de Paris, 1784, nas quaes muito se esforcou por acreditar a operação em todas as-suas applicações, servindo-se principalmente dos dados historicos para o con- seguir. Stoll em seus aphorismos (Aphorismi de cognoscendis et curandis febribus, Vindobonae, 1787), na parte respectiva á angina multiplem, indica e descreve a bronchotomia nos casos de angina inflammatoria suffocante, mas sem precisar suficientemente o diagnostico, como se vê das suas palavras a pag. 19: «.. . Siomnibus his nom, sero, vel frus- tra, tentatis, morbus sit maximê recens ct strangulans a causa supe- riori, quam erit locus sectionis, cum symptomatibus pessimis, nec tamen adhuc gangrenosis, statim post acerbam prognosim instituenda erit Bron- chotome .... quae fiet pracparato corpore acgri, in uspera arteria in- Sra laryngis inferiora ad pollicis distantiam discisa cute et integumen- tis; amotis musculis; secto interstitio inter annulos arteriac asperae ; A TRACHEIOTOMIA 17 imposito canaliculo argenteo; dein ablata causa, quae exegerat hanc ope- ram, vulnus percurando; interim clysmata nutrientia applicando, si de- glutitio impossibilis. » Ainda aqui Stoll não especializa a applicação da tracheiotomia no verdadeiro crup; mas outros houve, mesmo antes d'elle, que não es- queceram esta doença, e aconselharam a operação para ella em diffe- rentes circumstancias. Entre estes medicos, Michaelis era de voto que a operação fosse praticada no segundo periodo do garrotilho; Crawfort, quando progri- dem os paroxismos e ameaçam suflocação; Chaussier, quando os outros remedios não têem conseguido sustar os progressos da doença, não se devendo então esperar que o pulmão esteja engorgitado, porque só a operação póde n'aquellas circumstancias impedir a asphyxia. A par d'es- tes podem ainda citar-se os nomes de Schwilgué e Dureuil, que tam- bem preconisaram a tracheiotomia no crup. Pouco mais ou menos pelo mesmo tempo, um compatriota nosso, José Manuel Chaves, medico de Condeixa, sem especificar o garrotilho, mas referindo-se á cura da esquinencia, propõe tambem a bronchoto- mia quando sobrevenha suffocação... . «e havendo perigo de suffoca- cão deve-se chamar cirurgião habil para fazer a bronchotomia» (Febrio- logia, Coimbra, 1790, pag. 227). O concurso-Napoleão, estabelecido em 1807 com o fim de co- nhecer da natureza e tratamento do crup, e que findou em 1808, não produziu o resultado desejado, ápesar de se apresentarem para elle se- tenta e nove memorias. Quasi todos os concorrentes excluiram a tra- cheiotomia do tratamento do crup, fundando-se em que sendo a falsa - membrana efeito d'uma phlegmasia, e a operação não podendo ter in- fluencia sobre esta, era inutil empregar um meio que não combatia directamente a causa da doença, contra a qual só a therapeutica de- via ser dirigida. ; Distinguia-se n'este sentido sobre todos Jurine, de Genebra, um dos dois que receberam o premio-Napoleão. Royer-Collard que fez e apresentou em 1811 o relatorio d'este concurso, como secretario da respectiva commissão da Academia de medicina de París, foi tambem desfavoravel á tracheiotomia. ; Deve comtudo exceptuar-se principalmente Caron, cirurgião de París, e um dos concorrentes ao premio do Imperador, que no seu Traité du croup aigu, impresso em 1808, defendeu com extraordina- rio ardor a importancia da tracheiotomia no garrotilho, operação que elle tinha praticado uma vez n'esta doença, sem ter tido todavia a fe- MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. HI. P. L. 3 Ro ESTUDOS SOBRE ) licidade de salvar o doente. Mas as idéas que Caron sustentou corajo- samente por muitos annos, acharam então a mais completa e obstina- da opposição, a qual tinha o fundamento do mau resultado da primeira e das successivas operações que Caron praticou nos casos de crup. Até aqui, pois, a tracheiotomia não tinha importancia nenhuma na sua applicação ao garrotilho. Terceira época. — Este ultimo periodo da historia da tracheioto- mia é principalmente notavel por dois homens eminentes — Breton- neau, de Tours, e o sr. Trousseau, de París, aos quaes a humanidade deve todos os benefícios que a tracheiotomia tem prestado nos ultimos trinta e oito annos d'este seculo. Esta época brilhante comeca em 21 de junho de 1825, em que Bretonneau conseguiu salvar, em Tours, pela tracheiotomia, uma crean- ca que estava proxima a fallecer suffocada pelo garrotilho. Esta crean- ça, de quatro annos de idade, era Elisabeth de Puységur, filha do con- de de Puységur, um dos seus mais intimos amigos, o qual tinha tido até então o desgosto de perder tres filhos com garrotilho. Esta crean- ca estava curada aos dezenove dias depois da operação e aos vinte e seis dias de doença. (Vid. pag. 300 do Traité de la diphthérite). N'es- ta operação empregou Bretonneau uma canula de prata simples, pro- porcionada ao calibre da tracheia, ligeiramente curva no sentido do comprimento, cortada obliquamente nas duas extremidades, com dois orifícios na extremidade externa, para enfiar as fitas que fixaram o instrumento atando na parte posterior do pescoço. Esta canula vem representada na primeira estampa da mesma obra de Bretonneau. * Por esta mesma occasião vendo Bretonneau a difficuldade de re- introduzir a canula, quando a havia tirado para se limpar, mandou fazer uma canula dupla, que não chegou a tempo de servir n'este caso. Esta era a terceira operação que praticava Bretonneau em casos de crup. A primeira fel-a em 1818 em uma.creancça de seis annos, que falleceu ao segundo dia (obra cit. pag. 95); e a segunda em 1820 em um menino de quatro annos, que morreu doze horas depois da opera- ção (obra cit. pag. 220). No primeiro caso empregou a principio um tubo de penna, depois uma algalia de gomma elastica de n.º 10, e por fim uma mola de prata. No segundo caso serviu-se dum pedaço d'al- galia de gomma elastica. Em 1827, tambem em Tours, aquelle mesmo medico operou a tracheiotomia em um rapaz de sete a oito annos atacado de crup, a quem a familia abandonára por morto. Alguns minutos depois da ope- ração viu-o reanimar-se, extrahiu-lhe numerosas concreções membra- A TRACHEIOTOMIA 19 niformes, fez-lhe injecção de uma solução de nitrato de prata nos bron- chios, e conseguiu cural-o depois de vencidos varios obstaculos. Em outubro de 1831, foi igualmente feliz em um terceiro doen- te de doze annos, que estava como morto, quando foi chamado, o qual deveu tambem a vida á tracheiotomia. O celebre auctor do Tratado da diphtherite reconheceu desde logo que não devia limitar-se sómente a abrir a tracheia, como acon- selhava Caron, mas que era indispensavel fazer respirar o operado pela abertura artificial durante todo o tempo necessario á eliminação das producções pseudo-membranosas, que devia ter logar por essa mesma abertura ; que era importantissimo vigiar que a abertura artificial não fosse obstruida pelos fragmentos membranosos, porque o mais peque- no obstaculo mechanico bastava para fazer reapparecer a suffocação, desenvolvel-a e aggraval-a a ponto de ser fatal. Fundado em experiencias feitas em animaes, e em observações ti- radas da pratica veterinaria, convenceu-se que a tracheia podia sup- portar muito bem a presença d'um corpo estranho, e assim auctori- sado restabeleceu a respiração dos operados por meio da canula de prata conservada na tracheia. Até 1834 Bretonncau tinha salvo cinco creanças em dezesete ope- rações. Depois de Bretonneau veiu ainda com maior importancia o sr. Trousscau, que, com talento e zêlo superior a todo o elogio, tem sido o mais ardente e desvelado defensor da tracheiotomia no garrotilho. E' elle talvez quem tem praticado a operação maior numero de vezes e com mais felizes resultados em França. Foi elle quem praticou a tra- cheiotomia em França, em casos de crup, logo depois de Bretonneau, desde 1826, e quem conseguiu o primeiro exemplo de cura em Pa- ris, depois de sete operações mal succedidas. Esta operação foi prati- cada no anno de 1830 em um filho do celebre magnetisador Marcillé, e foi publicada no primeiro numero do Journal des Connaissances me- dico-chirurgicales do mez de setembro de 1833. Até 15 de janeiro de 1835, em que o sr. Trousseau escreveu, no Dictionnaire de médecine, de trinta volumes, o artigo sobre a tracheio- tomia no crup, em seguida ao de Guersant pai, sobre esta doença, ti- nha já feito trinta e seis operações conseguindo nove curas. Até esta mesma época Scoutteten, de Metz, Senn, de Genebra, e Gerdy, de Pa- ris, tinham tambem alcançado tres casos de cura; e Velpeau, Guersant filho, Sanson senior, Blandin, etc. haviam praticado a operação, mas só tinham conseguido protrahir a vida: dos doentes. Ju 20 ESTUDOS SOBRE Em 1839 houve na Academia de medicina de París uma discus- são motivada pelas observações apresentadas pelo sr. Gendron, a qual foi desfavoravel á tracheiotomia, entretanto ficou-se conhecendo que, em sessenta operações de tracheiotomia no crup havia já dezoito curas contando n'este numero a de John Andrée. Até 1840 Bretonneau em dezoito ou vinte operações contava cin- co ou seis curas, e o sr. Trousseau em pouco mais de sessenta opera- dos contava um pouco acima de vinte curas. Em 1844 conheciam-se já em França quarenta curas em duzen- tas e doze operações. Em 1849, quando o sr. Trousseau entrou para medico do hópi- cal des enfants malades, a tracheiotomia tomou aqui um caminho mais favoravel, que não perdeu ainda. Até áquelle anno tinham-se feito alli quarenta e nove operações, e não se havia conseguido um só caso de cura; mas depois da entrada do sr. Trousseau foram successivamente havendo muitos casos felizes, attribuidos aos aperfeiçoamentos feitos por este sabio ao processo operatorio, e sobretudo aos cuidados conse- cutivos que ensinou a prestar aos doentes. Os medicos que succederam ao sr. Trousseau, e os internos do hospital das creanças de París, têem continuado a seguir o methodo instituído por aquelle professor, e os resultados felizes têem continuado a corresponder-lhe. Na discussão que houve na Academia de medicina de París nos fins do anno de 1858 e principio de 1859, a proposito da memoria do sr. Bouchut (Nouvelle methode de traitement du croup par la tubage de la glotte), apresentada em sessão de 14 de setembro d'aquelle an- no, foi demonstrado. que no espaço de dez annos, em quatrocentas ses- senta e seis operações, praticadas n'aquelle hospital, se tinham alcança- . do cento vinte e sete curas, o que quer dizer que se tinham salvo n'a- quelle espaço de tempo pouco mais d'um quarto dos operados. N'aquella celebre discussão, que teve por base um magnifico re- latorio do sr. Trousscau dado sobre a alludida memoria, na qual se pretendia depreciar a tracheiotomia, occuparam-se nove sessões, a pri- meira das quaes foi em 24 de novembro de 1858, e a ultima em 18 de janeiro de 1859; tomaram parte n'ella os srs. Bouvier, Piorry, Bou- illaud, Delafond, Barth, e mais especialmente os srs. Trousseau e Mal- gaigne; e adoptaram-se as seguintes conclusões: 1.º Que a tubagem da glotte, como a propunha o sr. Bouchut, não parecia assaz, util e isenta de perigo para merecer a approvação da Academia; 2.º Que a tracheio- tomia era na actualidade da sciencia o unico meio a empregar contra 0 garrotilho, quando já não haja probabilidade de bom resultado pelos meios medicos. A TRACHEIOTOMIA am Reunindo todas as operações praticadas no hópital des enfants ma- lades nos dez annos que vão desde 1851, em que a tracheiotomia co- meçou a empregar-se mais, até 1860 inclusivé, o que é extrahido da me- moria dos srs. Fischer e Bricheteau (Traitement du croup, 1862), acho setecentas e quarenta e duas operações, cujos resultados foram cento e noventa e cinco curas, e quinhentas e quarenta mortes. Os sete res- tantes saíram do hospital antes de curados. A média das curas nos dez annos foi, pois, de 1:3,8. No hospital de Sainte-Eugenie, que se abriu em março de 1854, só desde 1858 é que se fizeram mais operações. Reunindo as que foram feitas n'este hospital nos quatro annos que vão do 1.º de janeiro de 1858 a 15 d'agosto de 1861, acham-se trezentas e quarenta e tres ope- rações, as quaes foram seguidas de cura cincoenta e tres vezes, e de morte duzentas e noventa, o que dá a proporção de 1:6,47. Esta es- tatistica é menos favoravêl do que a do outro hospital de creanças, o que se póde explicar pela posição do hospital de Santa Eugenia no meio de bairros populosos, nos quaes o crup é mais maligno; ou porque os cirurgiões d'este hospital, tendo muita confiança no tratamento medi- co do garrotilho, esperam até mui tarde para operar. Seguiram-se ao sr. Trousseau muitos outros collegas, que téem praticado a tracheiotomia com bons resultados, entre os quaes citarei o sr. Paul Guersant, que é dos medicos que têem feito mais tracheio- tomias em París, o sr. Gendron, e o nosso compatriota, que actual- mente exerce a medicina no hópital des enfants trouves, o sr. Casado 'Giraldes, cujo nome tenho muito prazer em citar, além de muitos ou- tros medicos e todos os internos dos hospitaes de creanças de París. N'este ultimo periodo da historia da tracheiotomia, tenho-me quasi só referido ao que se ha passado em França, que é quasi tudo o que se sabe no objecto. Agora direi algumas palavras do que se tem feito n'outros paizes, e terminarei por traçar a historia da operação em Por- tugal, que não é dos que têem concorrido menos para a estabelecer e aproveitar. Fóra de França, ou para melhor dizer, fóra de París e de Tours, a tracheiotomia tem sido geralmente pouco empregada nos casos de garrotilho. Na Russia, apesar de não ser raro o crup, muito poucas vezes tem sido praticada a tracheiotomia para remediar a asphyxia crupal. No espaço de tres annos, de 1856 a 1858, foi praticada com aquella applicação, em estabelecimentos publicos, sómente cinco vezes, curan- do-se dois dos doentes e fallecendo tres. Foram feitas estas cinco ope- 29 ESTUDOS SOBRE rações nos annos de 1856 e 1857, porque no anno de 1858 nem uma só vez foi praticada a tracheiotomia no crup, o que quer dizer que aquelle meio therapeutico, aliás de tamanha importancia, não passou ainda á pratica geral dos collegas da Russia. É o que se vê nos tres relatorios sobre a estatistica iiedica da Russia relativos áquelles an- nos, redigidos pelo dr. Otsolig sobre os relatorios especiaes que são enviados dos diversos hospitaes civis da Russia, em numero de quatro- centos e noventa e quatro, ao ministerio do reino junto do qual aquelle collega exerce a direcção medica. Em Inglaterra a tracheiotomia, que, como se viu, fóra praticada no crup pela primeira vez no anno de 1782 por Andrée com feliz re- sultado, só ha poucos annos começou a ser de novo empregada n'a- quella doença. Mesmo assim é mais vezes usada do que na Russia; to-. davia ainda muito menos do que devêra ser. No Medical Times and Gazette (numeros de 8 de outubro e 5 de novembro de 1859) vem a prova desta proposição. Na estatistica dos ultimos cinco annos, relativa aos principaes hospitaes de Londres e de provincias, vê-se que a tra- cheiotomia fôra praticada oitenta e oito vezes, mas no crup apenas quinze vezes em creanças de treze mezes a dezeseis annos, havendo qua- tro casos de cura, dois na idade de seis annos, um na de cinco, e ou- tro na de quatro annos. N'estes ultimos annos, depois de 1859, os cirurgiões inglezes vão tendo mais alguma confiança na tracheiotomia, e a vão empregando mais vezes para impedir a suffocação nos casos de garrotilho. Entre el- les devo nomear mr. Quain e mr. Berkeley Hill “do hospital for Sick Children, citados por mr. William Genner (Diphtheria : its s ymptoms and treatment; London, 1861), mr. Bain e outros, os quaes têem con- seguido salvar algumas creanças proximas a perecer de garrotilho. Na Allemanha a opinião dos medicos sobre a conveniencia da tra- cheiotomia no erup não está ainda bem assente; mas parece dirigir-se no caminho da boa pratica. Uns não têem n'ella nenhuma confiança, mas outros defendem-na e aconselham-na. E” o que em parte se co- lhe das sessões do Congresso dos sabios, naturalistas e medicos alle- mães, que houve em Vienna, de 16 a 22 de setembro de 1856. Na sessão do dia 18, secção de cirurgia, mr. Roser, de Marbourg, disse que era sua opinião praticar a tracheiotomia no crup como meio de arrancar as creanças a uma morte quasi certa, e citou uma estatistica de treze casos em que fez a operação, conseguindo salvar seis doentes. O professor Baum, de Gottingen, pugnon tambem em favor da tra- cheiotomia, e citou dezeseis operações suas em que houve seis curas. A TRACHEIOTÓMIA 23 Mr. Friedberg, de Berlin, operou um doente que morreu, e attribue o resultado fatal á hesitação que teve em operar. O dr. Simons disse ter salvo quatro creanças de doze que operou; e o dr. Passavant, dois em dezeseis. O dr. Robert, de Coblentz, mostrou-se ao contrario me- nos favoravel á operação; e o dr. Cohen, de Hambourg, não ousou re- commendal-a, e aconselhou em logar della os calomelanos como o me- lhor tratamento interno do crup. Ha dois annos, o dr. Fock, medico do hospital de Magdebourg, publicou tambem uma relação de vinte e quatro operações de tracheio- tomia, todas praticadas no ultimo periodo do crup, com as quaes con- seguiu curar dez doentes. Comtudo parece certo que a maioria dos medicos allemães não dá á tracheiotomia toda a importancia que ella tem nos casos de asphyxia crupal. Na America do norte, julgando pela exposição feita por mr. Glick, de New-York, no Congresso de Vichna em que acima failei, a tracheiotomia é muitas vezes praticada em casos de crup, e com re- sultados muito vantajosos. Só o dr. Roth, d'aquella cidade, tinha pra- ticado cem vezes a operação, e conseguira salvar dois terços dos ope- rados. Na Italia, além do que referi sobre a tracheiotomia nos dois se- culos antecedentes, pouco ha que dizer da actualidade. Segundo infor- mações verbaes do meu presadissimo collega, o sr. dr. Pasquale Gril- lo, medico principal da esquadra italiana, que tive a satisfação de co- nhecer em Lisboa no mez d'outubro de 1862, quando acompanhou Sua Magestade a Senhora Rainha Dona Maria Pia, segundo este respeitavel collega, digo, a tracheiotomia raras vezes tem sido empregada no crup, e n'esses casos sempre mui tarde, de modo a não se haver obtido um só caso de cura. Em Napoles foi o sr. Palaciani quem primeiro a pra- ticou no crup, mas tambem sem resultado. O sr. dr. Pasquale Grillo attribue todos estes resultados desfavoraveis á circumstancia de se pra- ticar muito tarde a operação. Na Belgica. a tracheiotomia é igualmente muito pouco emprega- da no garrotilho. E” o que colligi das informações que teve a condes- cendencia de me dar o meu estimavel amigo e collega, o sr. dr. Van Holsbek, distincto medico de Bruxellas. Em Hespanha, onde o crup foi tão estudado, como tive occasião de o demonstrar na minha memoria sobre o garrotilho, a tracheioto- mia foi aconselhada e praticada desde o principio do seculo xvir, como notei. Mas no seculo actual muito pouco ha que noticiar sobre o ob- jecto. Segundo informações que teve a bondade de me dar o meu pre- 24 ESTUDOS SOBRE sadisstmo collega, o sr. dr. Monláu, redactor del Monitor de la salud, depois de ter consultado os principaes collegas da capital, não se têem feito n'estes ultimos tempos em Madrid mais de cinco ou seis tra- cheiotomias 'em casos de garrotilho, e todas sem resultado favoravel ; em 1859 foi praticada em uma creança com garrotilho pelo dr. D. Vicente Asnero, cathedratico da faculdade de medicina, tambem sem resultado. Segundo as informações do mesmo sabio, os operadores e medicos hespanhoes não têem grande fé no tratamento do garrotilho pela tracheiotomia. Em Portugal, felizmente, mais e melhor posso dizer da tracheio- tomia no garrotilho. “ Já n'outro logar citei o nosso Zacuto Lusitano na sua Praxis me- dica impressa em 1657; o dr. Thomaz Rodrigues da Veiga, professor da universidade de Goimbra; na sua Pratica medica em 1668; João Cur- vo Semedo na Polyanthea “medicinal em 1697; Francisco da me Henriques na sua Medicina Lusitana e Socorro delphico em 1710; José Manuel Chaves na sua Febriologia de 1790, os quaes ai vam à bronchotomia nos casos de angina que determinavam suffoca- ção. O nosso Antonio de Almeida, professor da escóla real de cirur- gia de Lisboa, no seu Tratado completo de medicina operatoria, 2: edic. 1825, aconselha tambem a bronchotomia no garrotilho, para pre- venir a morte por suffocação, e descreve o processo operatorio, que se resume no seguinte: sentado o doente em cadeira ou na borda da ca- ma, com a cabeça direita e encostada ao peito de um ajudante que a segura, o operador, auxiliado por outro ajudante, faz uma préga trans- versal na pelle da parte média e anterior do espaco que ha entre a larynge e o sterno, e pratíca uma incisão de uma pollegada no meio d'esta préga, comprehendendo a pelle e gordura; descobre os muscu- los sterno-thyroideos, e põe patente a tracheia na extensão de mais de meia pollegada. Não podendo fazer a préga, manda pôr tensa a pelle com o pollegar e indicador esquerdos aos lados da tracheia. Abre este canal por meio de uma lanceta de ponta curta e larga, com a qual corta transversalmente a porção ligamentosa que une o segundo ao terceiro, ou este ao quarto annel cartilagineo. Depois introduz na tra- cheia uma canula de prata, de pollegada e meia a duas pollegadas de comprimento, chata, ligeiramente curva, romba, e furada de muitos buracos como a ponta d'uma algalia, com dois anneis no seu bocal, aon- de se atam duas fitas que a prendem ao redor do pescoço. Em fim, cobre o boca! da canula com um bocado de panno transparente, para A TRACHEIOTOMIA 25 impedir a entrada da poeira ou cousas similhantes. (Antonio de Al- meida, Medicina operatoria, t. um, pag. 21). Depois d'esta época, a tracheiotomia foi varias vezes empregada pelos cirurgiões operadores, nos casos de asphyxia que demandavam uma abertura artificial para a entrada do ar. Em 31 de março de 1830 foi, por exemplo, praticada pelo sr. José Lourenço da' Luz, na clinica cirurgica da Escóla de Lisboa, para remediar a asphyxia determinada pela compressão de um aneurysma da innominada, sobrevivendo o doente tres dias. (Jornal da Sociedade das Sciencias Medicas de Lisboa, 1835, t. 1, pag. 35). Outros cirur- giões, entre os quaes o professor João Pedro Barral e L. A. Corrêa, a praticaram tambem em casos analogos. Segundo informações do meu collega no Hospital de S. José, o sr. Antonio José dos Santos, a tracheiotomia foi empregada no garroti- lho pela primeira vez em Lisboa, no anno de 1835, por Martinianno Nunes do Resgate, então cirurgião do Banco d'aquelle estabelecimen- to, em uma creança da sua clinica particular, que falleceu no dia im- mediato ao da operação. Entretanto este facto nem foi consignado em uenhuma publicação, e por isso passou despercebido, nem se póde di- zer com certeza que a operação fosse praticada em caso de verdadeiro crup. No genuino garrotilho não se póde assegurar que fosse feita an- tes de 1851. Em 28 d'agosto, d'aquelle anno, foi effectivamente praticada a tracheiotomia, no tratamento do crup, pela primeira vez em Lisboa, pelo meu amigo e collega, o sr. Joaquim Theotonio da Silva, em um rapaz de dez annos, o qual falleceu ao quarto dia de operado. Uma segunda operação por igual motivo foi praticada pelo mesmo collega na noite de 23 de novembro do mesmo anno, em uma menina de cinco annos, que succumbiu quarenta e uma horas depois da operação. A mesma sorte teve uma terceira doente de dezesete annos, operada pelo mesmo cirurgião no dia 5 de julho de 1852. O primeiro caso de garrotilho curado pela tracheiotomia, foi aquel- le em que o sr. Joaquim Theotonio praticou pela quarta vez esta operação, a qual foi ás onze horas da noite de 17 d'outubro de 1852. A doente, por nome Laura, tinha seis annos de idade, e veiu-lhe o crup consecutivamente á escarlatina que tivera um mez antes. Esta creança era doente do sr. dr. Simas, que escreveu a historia do caso, e a leu na Sociedade das Sciencias Medicas de Lisboa, na data de 27 de novembro de 1852, como se póde vêr a pag. 209 do t. xr da 2.º serie do jornal d'esta sociedade, e na Memoria do sr. Joaquim Theo- MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. UI. P. 1. 4 N 26 ESTUDOS SOBRE tonio, publicada no t. xivy da 2.º serie do mesmo jornal, 1854. (Ob- servação 4.º da presente Memoria). A quinta operação foi ainda feita pelo mesmo collega no dia 15 de fevereiro de 1853, em um menino de quatro. para cinco annos, tam- bem affectado de crup, e que falleceu vinte e seis horas depois. Com estas cinco primeiras observações elaborou o sr. Joaquim Theotonio da Silva uma interessante Memoria com o titulo — Algumas considerações sobre a broncotomia a proposito dum caso de se curado por meio d'esta operação— que está impressa no t. xIv da Bs rie do Jornal da Sociedade das Sciencias Medicas de Lisboa, de 1854. Depois d'aquella época, pouco tempo depois de terminados os meus estudos medicos na Escóla medico-cirurgica de Lisboa, a cujo corpo docente tenho hoje a honra de pertencer, comecei a praticar tambem a tracheiotomia em casos de crup, e fui não só a segunda pes- soa que a praticou em Portugal n'esta doenca, como tambem o segun- do cirurgião que conseguiu salvar doentes d'uma morte infallivel se lhes não praticasse aquella operação. A sexta operação feita em Portugal, pratiquei-a no dia 7 de ju- lho de 1853, em uma menina de nove mezes asphyxiada pelo crup, para operar a qual me convidou o meu estimavel amigo, o dr. Simas, medico da: Misericordia de Lisboa, onde a creança estava. Apesar da idade tão tenra, a doente sobreviveu cincoenta e sete horas á opera- ção, e chegou a dar muitas esperanças de'cura, mas por fim succum- biu á diphtheria tracheio-bronchial e pneumonia lobular. A setima operação foi tambem praticada por mim em uma me- nina de onze mezes no dia 20 de setembro de 1853, a qual falleceu doze horas depois. O sr. Joaquim Theotonio fez depois mais duas Renais conse- guindo salvar um dos doentes. A minha primeira tracheiotomia seguida de cura pratiquei-a no dia 22 de julho de 1855, em urha menina (Maria Carolina Barreira) "de quatro annos, que ainda hoje vive na rua larga de S. Roque, onde a operei. Publiquei esta observação na Gazeta Medica de Lisboa, t. m, 1855, e foi transcripta no Jornal da Sociedade das Sciencias Medicas de Lisboa, t. xvmr, 1855. (Observação 10.º da presente Memoria). Desde então tenho salvo mais cinco creanças suffocadas pelo gar- rotilho. Até hoje (24 de maio de 1863), em o numero total de quinze operações tenho salvo seis creanças. O sm. Joaquim Theotonio da Silva em quatorze operações tem salvo, até á mesma época, quatro creanças. Além destas vinte e nove operações praticadas em Lisboa pelo. sr. A TRACHEIOTÔMIA 7! Theotonio da Silva e por mim, em que ha dez curas, tem-se feito até hoje mais nove, conseguindo duas curas. Ha, portanto, em trinta e oito operações, doze casos felizes. Os collegas que têem praticado aquel- las nove operações, são: o sr. Oliveira Soares em 1856 e 1860, o sr. Angelo de Sousa em 1859, os srs. Motta e Figueiredo em 1860, o sr. José Galdino de Carvalho em 1860, 1861 e 1863, o sr. Hen- riques Teixeira em 1861, e o sr. Teixeira Marques em 1862. Os dois casos de cura das nove operações praticadas por estes collegas, perten- cem: um ao sr. Henriques Teixeira em 12 de janeiro de 1861, e ou- tro ao sr. José Galdino de Carvalho em 17 de fevereiro de 1863. Em Santarem foi praticada uma vez a tracheiotomia, tambem no crup, em 29 de maio de 1858 pelo sr. Antonio Mendes Pedroso, em uma menina de oito annos, sobrevivendo a doente oito dias. No Porto foi tambem praticada uma vez pelo sr. Antonio Bernar- dino d' Almeida, lente da Escóla medico-cirurgica do Porto, em novem- bro do mesmo anno de 1858, n'uma creança de tres para quatro an- nos, a qual succumbiu no fim de sete a oito dias a uma pulmonite. Não me consta que a operação tenha sido praticada, com appli- cação ao garrotilho, em outros pontos de Portugal. Sobre tracheiotomia no crup, ao que já citei devo ajuntar a the- se do sr. Eduardo Augusto Motta, escripta em 1859, publicada no Jornal da Sociedade das Sciencias Medicas em 1860, e as dos srs. Fran- cisco José dos Santos Chaves e Manuel Bento de Sousa, escriptas a pri- meira em 1859, e a segunda em 1860, todas archivadas na Escóla me- dico-cirurgica de Lisboa, aonde foram apresentadas. Por ultimo, para completar a historia litteraria da tracheiotomia em Portugal, cito a minha Memoria — Estudos sobre o garrotilho ou crup — que foi approvada pela Academia das Sciencias de Lisboa, a que tenho a honra de pertencer, e impressa em 1861 na collecção das suas Memorias, a qual tem muitos pontos de relação com o objecto do presente escripto. “A oi plo obmisrgnegao rom dic aja Mont amanto mol je rEa OR Deum cr e co pat À dA rato va vença E onhio / eng ueio! mort ando qi pool job iaeeioado E cestipinasE! ares ao voir Clima odhorme) obronibla O beat dee OM «sbeco sro! ses esa anaar nbusalsga pote cipa ends cueia?o aa Ode a ro cotar sono dra is PR ad seio raid entingud cg) vbearvrados ganas ofios oiee es brota o acaadst se la basic ral cantegmnas emo tivo about bota mediado ato grtesdeçe bien eme neo renepasmetotr src mrelenlpns, BR boo pre guris ty a "oceania reposto vopiti ugise ob sail og perto pro E a hs pum gutoanhecor obio isufimad qo cetau pisstenoo sen of “bp de vis cedepoon tes curvo puidlesonio REV TE Aviacao onto; inrio pa comsibesilitiiposbGE poros visa naneisol Apso! «imag jo astaginncos” Mr Rd nntso mins Es dare en o DINA: y vs oteb en bp rçod cotados feira ler lagar Rar ae meigo A , j Abi p A ty ) d av y! É je ig E A mr 4 E INDICAÇÕES E CONTRAINDICAÇÕES Já vai longe de nós a época em que se argumentava, systemati- camente ou por ignorancia, contra a tracheiotomia applicada ao crup. Hoje sería por tanto trabalho inglorio tentar defendel-a. Quem conhe- ce a immensa mortalidade do crup quando tratado sómente pelos meios medicos !; quem sabe dos numerosissimos casos de garrotilho salvos po- sitivamente pela operação; quem tem por si proprio assistido á scena lugubre e desesperada da asphyxia crupal, e que tem visto as resur- reições obtidas pela tracheiotomia, não póde duvidar um momento da efficacia da operação n'aquella-doença, não como agente directo na cura da diphtheria, mas como meio de obviar a-morte immediata pela as- phyxia, dando assim tempo para a cura espontanea ou artificial da molestia. O:que se deve sómente procurar saber, é quando a opera- ção tem mais ou menos probabilidades de bom resultado, quando é indicada ou contraindicada. E este problema que vou tentar resolver, tomando em conside- ração a idade, o sexo, temperamento, constituição, posição social dos doentes, e seu estado de saude anterior; as doenças anteriores e coexis- 1 No hospital de Sainte-Eugenie, dé París, nunca se recorre á operação da tracheio- tomia no crup, senão quando se-tem esgotado todos os meios que podem dar a cura sem o auxilio operatorio, porque os medicos do estabelecimento confiam muito no tratamento interno do garrotilho. A estatistica d'aquelle hôspital póde, pois, servir bem para demons- trar a grande mortalidade do crup, o valor dó tratamento medico, e as vantagens da tra- cheiotomia ainda praticada nas mais desfavoraveis condições, quer dizer, depois de to- talmente esgotados os recursos therapeuticos e o mais tarde possivel. Desde o mez de maio de 1854 até 15 de abril de 1861 foram ali tratadas de garro- tilho quinhentas e trinta e quatro creanças, das quaes foram operadas trezentas e setenta e quatro, e deixaram de o ser cento e sessenta. Das operadas foram salvas sessenta e sete, que morreriam de certo todas inevitavelmente senão fossem submettidas à operação. Das não operadas curaram-se cincoenta e oito. Este numero, pois, marca a mortalidade do garrotilho com o tratamento medico em um total de quinhentos e trinta e quatro casos, o que dá a relação de 4 curado em 9,2 doentes, ou 10,68:100. 30 ESTUDOS SOBRE “tentes, marcha, duração, fórmas e periodo do crup; tratamento anterior á operação; época do anno em que é feita a tracheiotomia; e em fim a influencia epidemica. Idade. — Qual é o periodo da vida mais favoravel ao bom resul- tado da tracheiotomia no crup? Ha alguma idade que por si só con- traindique a operação? Eis as duas questões que me proponho estudar sobre a influencia da idade dos doentes que se téem de submetter á tracheiotomia. O dr. Cook na sua these escripta em 1843 dizia já, que as crean- cas operadas de tracheiotomia abaixo de dois annos e acima de seis ra- ras vezes se curam. Esta asserção, que foi acceita sem critica, e copia- da sem nenhuma alteração pelos srs. Rilliet e Barthez a pag. 331 do 1.º vol. do seu —Traité olinique ct pratique des maladies des enfants, tanto na 2.º edição de 1854, como na reimpressão de 1861, é geral- mente admittida pelos especialistas como a expressão da verdade. Tenho comtudo para mim que aquella these deve ser hoje mo- dificada, e substituida pela seguinte: 4 idade em que a tracheiotomia é mais vezes seguida de cura, isto é, O periodo da vida mais favoravel ao bom resultado da tracheiotomia, é o que vai dos tres aos sete annos;' mas quasi nenhuma idade por si só deve contraindicar a operação. Os factos seguintes vão confirmar esta opinião. Nas trinta e oito operações de tracheiotomia de que dou noti- cia no fim d'esta Memoria, que são todas as praticadas em Lisboa até hoje, houve doze casos de cura, que se deram nas idades marcadas na se- guinte TABELLA DAS IDADES DOS INDIVIDUOS CURADOS DE GARROTILHO PELA TRACHEIOTOMIA EM LISBOA. IDADE NUMERO DE CASOS PD annossbla. ss PO Est DE e Nim 9 Im . . . . . . . . . . . . 150 O dim [O a e e o Total...... 12 Por tanto, a idade que deu maior numeib de curas foi a dos seis A TRACHEIOTOMIA 31 annos; seguiu-se em igual proporção a dos quatro e a dos sete; e de- pois, no mesmo grau, a de dois, quatro e meio, cinco, e seis e meio annos. y N'aquelle mesmo numero trinta e oito, houve vinte e seis casos fataes, em que as idades estão distribuidas do modo seguinte : TABELLA DAS IDADES DOS INDIVIDUOS MORTOS DEPOIS DA TRACHEIOTOMIA EM LISBOA. IDADE NUMERO DE CASOS DUE TREZE na eras ara cia 2 NDT Sim anta l l1 » ERR DA A RA VER RA SO I 1 RE tanãos Sub cases bad RB) » RE a dE Rap lo de ntas l 4 » GRADO o Roo o Me Dre Dra S do anão 4 420» APIS AO elo) pi E PODA CPAD 5 » EM RAI RE A NR E PIO; 6 » SAE on ASA RE 8 2 8 » E SRTA Cedo RE 3 9 » ER EPE Me pa RS A Da 10 » ER: RR RM SOR Sra no | 11 » ERAM o: tout Pg a AA ahi de 1 SE ER VLRS Lucie ra nl Me UEM ASA | a E RARAS La = PR é Í já Fotals 6 Consequentemente a idade, em que houve maior numero de ca- sos fataes, foi a dos cinco annos, depois a de quatro, logo depois a dos oito annos, em seguida, em proporções iguaes, a dos quatro e meio e seis annos, e em ultimo logar as outras idades, que deram cada uma um caso fatal. Se se compara o numero de casos de cada idade com as duas es- pecies de resultados d'aquellas trinta e oito operações, acha-se melhor confirmada a proposição que estabeleci, como se vê na seguinte : 32 ESTUDOS SOBRE TABELLA DE TODAS AS OPERAÇÕES DE TRACHEIOTOMIA PRATICADAS EM LISBOA, CoM DESIGNAÇÃO DOS RESULTADOS PELA CURA, E PELA MORTE, SEGUNDO O NUMERO DE CASOS DE CADA IDADE. NUMERO DE CASOS IDADES CURADOS MORTOS LARS AR OUMEZES Ses MM saio ce ] Í gdtdo oo RS, 4 ] l ES PQ ANDOSS afeta Ni iv o degesdto é é Í. ROS rec ; AR ros ANDAS DIE MEP TORA 1 (OPA BRL 89] o pen BA RR DE pot ES RA 4 SE PR Ae 4 5 » E eptrinsr sr MA: 2) TR EEE RES) pd A mi! po .6 6.. AIR io o papiro pienado Ê 2 TAM todo E pirita dis, : DA ARM TN» E boa E RA ai E Sms e ds ss A 3 Í. O de pd é | Espaço TO ara o Ê 1 etapas SA DAP aa ds sto AME l kd l IA 5 » DU - Ro | ms RO ETA EA Pci io 1,05 15 Andes: 1 Total 12 26 Dividindo as idades, aqui comprehendidas, em tres grupos, abai- xo de tres annos, de tres aos sete annos, e dos sete para cima, acha- se o resultado seguinte : NUMERO DE CASOS CURADOS MORTOS Abaixo de 3 annos (de 9 mezes a 27 annos) 4 .... 1... 3 De Swat annos jp. ste omnes. o vens cadaid ro pit dp On ciente aililiasnio De 7 annos para cima (8 a 17 annos)..... 8.... de! Total... 38 12º 26 Como se vê, pois, a curabilidade foi muito maior no periodo da vida que tem por limites os tres e sete annos, em que foi de 1:2,36; A TRACHEIOTOMIA Di) até os tres annos foi de 1:4; e dos sete para cima nenhum dos ope- rados se curou. A mortalidade, como tambem se vê na mesma tabella, foi muito maior proporcionalmente dos sete annos ávante, em que morreram to- dos os operados; abaixo dos tres annos foi de 1:1,33; e dos tres aos sete annos, na razão de 1:1,73. Em cento e vinte e quatro operações de tracheiotomia praticadas para o crup no hospital de creanças de París (hópital des enfants malades), desde 1 de janeiro de 1857 até 1 de julho de 1858, nas quaes estão designadas as idades e as respectivas terminações, chega-se pouco mais ou menos ao mesmo resultado, co- mo se vê em seguida : NUMERO DE CASOS IDADES CURADOS MORTOS DOAR 1 Zrannos a QE aqu 2 fa PD) SOR: PA At abale Blois 31 NO Eae 4 » 6 13 DO au tato 5 Mk EE sys Basa tra 12 (tl, ea 6 Du Made Bo prin Diet 6 Steaua it » Sa À es, 7 5. dba OM Da Als A Tede 2 3 RS) DSR Ra TER Ra 1 o Diurastgin 11 po furtar tdo ma ndo Seda; 2 124 29 5 A idade que deu maior numero absoluto de curas foi, pois, a dos cinco annos, em seguida a dos quatro, logo depois a dos tres e dos seis annos, seguidamente a dos oito, e em ultimo logar a dos sete e nove annos, como se vê na seguinte tabella : NUMERO DE CASOS IDADES NUMERO DE CU!:AS DOIDA USD do 5 annos ...... 8 19 pnarid 5 A) Sm iDoE 6 lt. PRN Boda is SARA 5 DOM Re eo /o sis DR a Mu ae 5 5 Co up A 3 3 AUG OL Dad gi trio | 8 e trt» sui ala 1 102 29 MEM. DA ACAD.— [.º CLASSE. — T. HI. P. 1. 5 34 ESTUDOS SOBRE Relativamente ao numero das operações, a idade que deu mais cu- ras foi a de oito annos (1:1,66); em seguimento a dos seis (1:2,20); depois a dos cinco (1:2,50); em seguida a dos nove (1:3), a dos qua- tro (1:3,16), a dos tres (1:7,20), e em fim a dos sete annos (1:8). A mortalidade foi absolutamente maior na idade de tres annos, e depois foi decrescendo na dos dois, quatro, cinco, sete, seis, oito, nove e onze annos, como se vê em seguida : NUMERO DE CASOS IDADE NUMERO DE MORTOS BOT. pu cesta. ai8 canos Ujipstes 31 DOIS a SR pa DAP) 20 LAS RO ANE cd e de e E (ET 13 20 Boss 71 MAE 12 8 item males Mo, eso eh ri 7 ERR, SAR Bo code asd 6 ERRAR ERR SR 8 » 2 3 Obglisoay up aa 2 DO DEVERES db RE DES alo. rosie Ésrco Ma 2 124 95 A mortalidade relativa foi superior na idade de dois e onze an- nos (1:1), depois na de sete annos (1:1,14), tres annos (1:1,16), qua- tro (1:1,46), nove (1:1,5), cinco (1:1,66), seis (1:1,83), e em fim na de oito annos (1:2,5). Juntando estes cento vinte e quatro casos aos trinta e oito da es- tatistica de Lisboa, e dividindo as idades dos cento e sessenta e dois operados nos tres grupos acima referidos, acha-se o seguinte resultado: NUMERO DE CASOS CURADOS MORTOS Abaixo de 3 annos (9 mezes a 27 annos) 24.... 1..23 De 3a 7 annos..... ca ARRR ORAS. RUE 1200..:::036. 08H De 7 annos para cima (8 a 17 annos).... 18... 4..14 162 41 121 A curabilidade absoluta foi muito maior dos tres aos sete annos, depois menor dos sete annos em diante, e ainda mais pequena abaixo dos tres annos. A curabilidade relativa foi tambem maior n'aquelle segundo pe- A TRACHEIOTOMIA do riodo dos tres aos sete annos (1:3,33); depois seguiu-se o terceiro pe- riodo dos sete annos para cima (1:4,5); e por fim o primeiro perio- do, em que a curabilidade foi apenas de 1:24. A estes elementos estatisticos posso juntar outros tirados das the- ses dos srs. Bataille e Millard, de París, que são os seguintes : Em 1850 e 1851 curaram-se pela tracheiotomia no hospital de creanças de París sete dentes de oito operados que tinham todos seis annos ou mais. Em 1852 houve no mesmo hospital (des enfants malades) deze- seis curas pela operação, metade das quaes se deu em creanças que contavam pelo menos seis annos; e em 1856 curaram-se cinco doen- tes de nove operados que estavam n'aquellas mesmas condições de idade. Referindo-me só aos factos da minha propria pratica, devo tam- bem dizer em confirmação da these que sustento, que em quinze ope- rações de tracheiotomia que tenho feito até hoje com applicação ao gar- rotilho !, nas quaes conto seis curas, todas estas se deram em creanças de quatro a sete annos (duas de quatro annos, uma de cinco, uma de seis, uma de seis e meio, e uma de sete annos). O que mais sobresae das estatisticas referidas, é a extraordinaria mortalidade dos operados até a idade de dois annos. Este resultado tem-se explicado de um lado pela maior difficuldade da operação, em consequencia da pequenez do collo e da exiguidade da tracheia, o que a torna mais perigosa pela razão. dos accidentes immediatos que são mais de receiar; e d'outro lado pela indocilidade dos doentes, pela dif- ficuldade de os alimentar, maior tendencia para as febres eruptivas e convulsões, e finalmente pela sua menor resistencia vital, em con- sequencia da qual as complicações, aliás ligeiras, se tornam mui gra- ves, fazendo assim mais incertos e arriscados os resultados da opera- cão. PDA O sr. Delore (De operation du croup et de ses suites chez les três jeunes enfants, Paris, 1863) faz ainda notar, como uma das causas do mau resultado da tracheiotomia nas idades muito recentes, a pouca re- "1 Fiz mais uma vez a tracheiotomia no adulto, mas não em garrotilho ; foi para re- mediar a asphyxia proveniente de uma laryngite submucosa. Foi praticada em 24 de se- tembro de 1855 no dr. J. V. Deslandes, de 29 annos, irmão do meu amigo e collega, o dr. Venancio Augusto Deslandes, para satisfazer aos collegas que desejavam se tentasse neste caso perdido, e proximo da terminação fatal, o ultimo recurso de que a cirurgia po- dia dispór. O doente succumbiu no dia immediato ao da operação, porque a causa da as- phyxia se estendeu para baixo do logar da abertura artificial. 5 + 36 ESTUDOS SOBRE sistencia da tracheia que se achata pouco depois de se tirar a canula, seguindo-se accessos de suffocação que obrigam a reapplicar o instru- mento. Os resultados desfavoraveis que succedem nas idades superiores têem-se explicado pela maior amplitude da glotte e dos canaes respi- ratorios, em consequencia da qual a asphyxia que indica a operação só vem muito tarde, isto é, depois de se estenderem as falsas membra- nas pela tracheia e bronchios, e por conseguinte quando a tracheioto- mia não póde já aproveitar. Outros factos posso juntar ainda aos já enumerados sobre a gran- de mortalidade nos operados abaixo da idade de dois annos. No hos- pital Necker, de Paris, onde se tratam todos os annos muitas creanças affectadas de crup abaixo de dois annos, houve quarenta revezes se- guidos á operação praticada até esta idade sem se obter um só caso de cura. Este resultado fez proscrever a tracheiotomia quasi absoluta- mente n'aquelle periodo da vida. No hospital de creanças de Paris até 1859 não havia tambem exemplo de cura do garrotilho em idade in- ferior a dois annos. Foi só n'aquelle anno que se alcançou o primeiro caso feliz em uma creança de vinte mezes. O sr. Paul Guersant, ope- rador muito conceituado, e que tem por isso praticado muitas vezes a tracheiotomia em París, nunca obteve um unico caso de cura pela ope- ração abaixo dos dois annos. Todos estes factos têem feito proscrever geralmente a tracheio- tomiá antes da idade dos dois annos, tanto nos hospitaes especiaes co- mo na pratica civil. Para attenuar estes receios que têem os praticos estrangeiros, de que participam os nossos conterraneos, e que tenho por exaggerados, devo dizer que até 1849 todas as operações de tracheiotomia pelo crup feitas no hospital das creancas de París, em numero de quarenta e no- ve, terminaram pela morte, sem que a idade entrasse como causa do mau resultado; e que é preciso ter em linha de conta, que o numero de operações praticadas antes de dois annos é muito pequeno compa- rativamente ao das outras idades, porque o garrotilho é justamente mais raro abaixo dos dois annos e acima dos sete (Vid. a minha Me- moria, Estudos sobre o garrotilho, pag. 49). O sr. Trousseau, que é o medico que tem de certo visto mais ca- sos de crup, e operado a tracheiotomia mais de duzentas vezes, não suppõe ter feito mais de dez operações em crcanças affectadas de crup até a idade de dois annos, e comtudo obteve duas curas. Pela minha parte, em toda a minha pratica de treze annos, não tenho visto o gar- A TRACHEIOTOMIA 37 rotilho mais de seis vezes antes de dois annos, e só tenho feito duas operações abaixo d'esta idade. Por outro lado a operação em si não me parece perigosa, mesmo nas mais recentes idades, e tanto assim que M. Scontteten em 25 de janeiro de 1830 a praticou na propria filha, que tinha apenas mez e meio, e a creança curou-se. E verdade que a existencia do verdadeiro crup foi contestada n'este caso, porque não está demonstrado que as falsas membranas, observadas na pharynge e bocca, não fossem produ- zidas pela exsudação molle e caseiforme da angina pultacea, ou consti- tuidas por deposições do oidium albicans dos sapinhos, como a exten- são para a bocca parece indicar. Mas, qualquer que fosse o genero da doença que obrigou á operação, não é menos certa a cura apesar da idade tão tenra da operada. ; Em idades inferiores a dois annos ha varios outros casos de tra- cheiotomia, dos quaes vou referir aquelles de que tenho conhecimento. No Edinburgh Medical Journal, de 1862, pag. 1121, vem refe- rido um caso de garrotilho curado pela operação praticada por M. Bell n'uma creança de idade de sete mezes (Gaz. hebdomad. 31 de outubro de 1862, pag. 702). O sr. Trousseau operou em 11 de maio de 1834 um menino de treze mezes, ainda de mamma, com o crup, o qual se curou. A ca- nula foi tirada aos onze dias. Aos treze dias a creança respirava bem pela larynge e a ferida estava em via de cura. Esta observação foi pu- blicada no Journal des connaissances medico-chirurgicales em o nume- ro de junho de 1834, e vem referida tambem a paginas 429 do pri- meiro volume da Clinique médicale do mesmo auctor. N'esta mesma obra vem citada outra operação tambem no gar- rotilho, praticada pelo mesmo sr. Trousseau, no Hôtel-Dieu, a 24 de abril de 1858 em uma rapariga que não tinha ainda dois annos (me- nos seis dias), a qual se curou apesar de uma convalescença longa e difficil. A canula não se pôde definitivamente tirar senão aos dezesete dias depois da operação; houve diphtheria na ferida, que só cedeu a repetidas cauterisações; depois a creança teve varioloide discreta; mas em fim curou-se. O sr. Barthez, medico do hospital de Santa Eugenia, de Paris, teve em uma das suas enfermarias um caso de cura pela tracheioto- mia, praticada em 16 de novembro de 1861, em uma menina de treze mezes, a qual se curou com grande felicidade. A canula foi tirada ao setimo dia, e quinze dias depois da operação a doentinha estava cura- da (Gaz. hebdom. de 16 de dezembro de 1862, pag. 806). 38 ESTUDOS SOBRE No hospital de creanças de París (des enfants malades), houve em 1859 um primeiro caso de cura do crup pela tracheiotomia em uma creança de vinte mezes. Em 1862 deram-se mais dois casos tambem fe- lizes, na idade de vinte e dois, e vinte e tres mezes. O primeiro foi na enfermaria de São João, d'aquelle hospital, dirigida pelo sr. Bouvier; a operação foi praticada pelo interno de serviço, o sr. Ferraux, em 18 de fevereiro, e o doente curou-se apesar de uma vasta erysipela do tron- co e de outros accidentes consecutivos. O segundo doente, que era, co- mo o primeiro, do sexo masculino, foi operado na mesma enfermaria em 18 de setembro pelo interno, o sr. Borland, e curou-se tambem a despeito de uma escarlatina intercorrente (Gaz. hebd. de 19 de dezem- bro de 1862, pag. 807 e 808). Na mesma idade de vinte e tres mezes salvou o sr. Maslieurat- Lagémard um menino com o crup que operou em 1841, o qual foi referido na Gazette médicale d'esse anno. Não foi menos feliz o sr. dr. Aubrun com um menino de vinte e um mezes, que operou em 1860, resultado que o auctor attribue em parte ao uso internó do perchlorureto de ferro em alta dóse (Ga- zette médicale de Paris, de 8 de dezembro de 1860). ., Eis aqui, pois, nada menos de dez creanças de idade inferior a dois annos salvas pela tracheiotomia ; notando-se que uma d'estas tinha menos de sete mezes (seis semanas), e que nove tinham de sete mezes a dois annos inclusivamente. D'estes nove casos, tres foram em crean- ças dos sete aos treze mezes, e seis dos vinte mezes. para cima. Este numero, apesar de pequeno, tem grande valor, porque se refere a uma época da vida em que o numero de operações praticadas é muito menor do que nas idades de dois a sete annos, em que o gar- rotilho, que a indica, é muito mais frequente. Além d'estes casos de cura, vou referir outros de longa sobrevi- vencia á operação, tambem em idade muito recente, os quaes concor- rem a provar a exaggeração com que se teme operar antes dos dois annos. O facto d'este numero mais notavel que posso citar, é o do sr. Annandale, que se deu em uma creança'de tres mezes apenas, opera- da em 10 de dezembro de 1861, a qual chegou a viver até 26 de ja- neiro de 1862, quer dizer quarenta e sete dias depois da operação. A canula foi tirada no dia 15 de dezembro durante alguns minutos, mas reapplicou-se logo depois, porque appareceu alguma suflocação que in- dicava que a creança não respirava pela larynge. A 4 de janeiro repe- tiu-se o ensaio com o mesmo resultado. No dia 20 aconteceu ainda o mesmo. A doentinha foi-se assim enfraquecendo successivamente, e ê A TRACHEIOTOMIA o O morreu a 26 de janeiro. Na autopsia não se viu falsa membrana na larynge nem na tracheia, nem era natural que ainda existisse; mas a glotte estava quasi fechada, e a epiglotte e mucosa da larynge inflam- madas e intumecidas. Exceptuando o facto de Scoutteten, é este o caso de idade mais recente, em que a tracheiotomia tem sido praticada. Outros casos ainda de longa sobrevivencia á operação são os seguin- tes: um observado em Lille em uma creança de vinte mezes, operada - pelo sr. Dujardin em 1856, a qual morreu de pneumonia vinte e tres dias depois da operação ; outro no hospital Necker em um doente de dezoito mezes operado pelo sr. Collin em dezembro de 1857, e que so- breviveu vinte e cinco dias á tracheiotomia. A estes exemplos junto ainda a minha primeira operação de tra- cheiotomia, praticada em julho de 1853, em uma creança de nove me- zes, a qual sobreviveu até o terceiro dia depois da operação, fallecendo com pneumonia lobular e extensão da diphtheria pela tracheia e bron- chios. Do que vem exposto sobre a influencia da idade dos doentes de garrotilho no resultado da tracheiotomia, e do que resulta do meu estudo especial sobre o objecto, tiro as seguintes conclusões: 1.º A idade mais conveniente ao bom resultado da tracheioto- mia, com applicação ao crup, é a que vai dos tres aos sete annos. 2.º A idade menos favoravel a este resultado é a superior aos oito annos, e sobretudo a inferior a dezoito mezes. 3.º Mesmo em idade mais tenra, como de sete mezes para cima, deverá praticar-se a tracheiotomia quando o doentinho fôr de boa cons- tituição, quando estiver em boas condições hygienicas, quando não hou- ver nenhuma complicação, e quando finalmente o crup não for infe- ctuoso. ur Sexo.—O dr. Cook, que já citei precedentemente, tinha escripto em 1843, que se curavam pela tracheiotomia mais creanças do sexo masculino do que raparigas. Esta these, como a que se referia á in- fluencia da idade, foi adoptada sem contestação pelos srs. Barthez e Rilliet, que a pag. 331 do 1.º vol. do seu Traité des maladies des en- Jants, 2.º edição de 1854 e de 1861, dizem na sexta proposição, das relativas aos signaes prognosticos na tracheiotomia, «curam-se mais ra- pazes do que raparigas.» Pela minha parte tenho por inexacta esta un como espe- ro provar pelas estatisticas. Mas em primeiro logar devo dizer, que a Memoria do dr. Cook, datando de uma época em que era ainda pe- queno o numero das operações de tracheiotomia no crup, não póde ter 40 ESTUDOS SOBRE todo o valor que seria para desejar; e em segundo logar lembrarei que o primeiro caso de garrotilho curado pela tracheiotomia em Fran- ça, que foi de Bretonneau em 1825, assim como o primeiro resulta- do feliz obtido em Lisboa, no anno de 1852, foram ambos em crean- cas do sexo feminino. É certo que nas primeiras trinta operações de tracheiotomia fei- tas no crup pelo sr. Trousseau até 1834, sendo vinte e duas creanças do sexo masculino, e oito do feminino, aconteceu curarem-se oito das primeiras, e morrerem todas as raparigas. A curabilidade nos rapazes foi, pois, de 1:2,75, e nulla nas raparigas. Mas em compensação, na Memoria d'aquelle mesmo professor pu- blicada em 1851 na Union medicale, em dezoito operações alli referi- das nove em rapazes, e nove em raparigas, houve tres curas n'aquel- les, e cinco n'estas. A curabilidade no sexo masculino foi então de 1:3, no feminino de 1:1,8; ea mortalidade no primeiro de 1:1,5 .e no segundo de 1:2,25. Reunindo os numeros destas duas primeiras estatisticas do sr. Trousseau, ha quarenta e oito operações em trinta e um rapazes e de- zesete raparigas, curando-se onze dos primeiros, e cinco das segundas, como se vê no quadro seguinte : ; NUMERO DE CASOS CURADOS MORTOS Rapazes... so dsBlob eia al do coli ad Raparigas. it: orla arara nçan hlr o mato On Dotalo sinatagi 48 Lia nba oii tos ha A curabilidade nos rapazes foi de 1:2,81, e nas raparigas de 1:3,4; e a mortalidade n'aquelles de 1:1,55, e n'estas de 1:1,46. Juntando por tanto as duas estatisticas do mesmo medico, não se acha contra o sexo feminino uma muito notavel diferença, como o fa- zia presuppôr a primeira estatistica considerada isoladamente. Pela minha parte posso dizer, que o resultado que tenho obtido é muito favoravel ao sexo feminino. Nas minhas seis operações segui- das de cura (Obs. 10.º, 14.º, 15.º, 16.º, 22." e 36.º), cinco pertencem a raparigas, € uma só ao sexo masculino; e nas outras nove mal suc- cedidas (Obs. 6.º,-7.º, 17.º, 21.º, 27.º, 29º, 33.º, 37.º e 38.º), quatro pertencem ao sexo masculino, e cinco a raparigas. As outras seis operações de tracheiotomia praticadas em Lisboa por outros collegas, e seguidas de cura, foram quatro em rapazes e A TRACHEIOTOMIA 44 duas em raparigas; e das dezesete em que o resultado foi fatal, per- tenciam nove ao sexo masculino e oito ao feminino. Juntando todas as trinta e oito operações feitas em Lisboa, acha- se o seguinte: | NUMERO DE CASOS CURADOS MORTOS Rapazes! pad .uai rb8s Iyela prá é AD so ed sa nha Raparigas.... 20 ...... À ly om nrriiS Total. dasis DD pó dE e AU a A curabilidade no sexo masculino foi por tanto de 1:3,6, isto é, menor do que nas raparigas em que foi de 1:2,85; e a mortalidade de 1:1,38 no primeiro, e de 1:1,53 no segundo. As estatisticas dos hospitaes de creanças de Paris prestam maior numero de factos, que permittirão avaliar melhor a influencia do sexo na curabilidade ou mortalidade dos operados. No hospital des enfants malades foram práticadas setecentas e trin- ta e cinco tracheiotomias no espaço de dez annos, comprehendidos en- tre 1851 e 1860, cujos resultados foram os seguintes !: NUMERO DE CASOS CURADOS MORTOS Rapazes. ..... BIAS is eb oa Bi ae ss “291 Raparigas... .. 347....... SAS ptr nao 249 Eotal qe js -1- MS aitayfo patio E 101] + otetafs 540 A curabilidade foi, pois, de 1:4 no sexo masculino; e maior, isto é, de 1:3,54 no sexo feminino. A mortalidade foi de 1:1,33 no primeiro, e de 1:1,39 no segundo. No hospital de Saixte-Bugenie, desde o 1.º de janeiro de 1858 até 15 d'agosto de 1861, fizeram-se trezentas e quarenta e tres tra- cheiotomias com o seguinte resultado : NUMERO DE CASOS CURADOS MORTOS Rapazes. . .... 49 0oligo sto Oyo 160 Raparigas. ... 153 ...... UE VA E 130 Total ;useise ERAS states 53 290 Y Memoria dos srs. Fischer e Bricheteau (Traitement du croup, 1862). MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. HI. P. I. 6 ESTUDOS SOBRE me to A curabilidade foi aqui de 1:6,3 no sexo masculino, e no femi- nino de 1:6,65; a mortalidade de 1:1,18 no primeiro, é de 1:1,17 no segundo. Reunindo em uma estatistica geral todos os numeros preceden- tes, incluindo as trinta e oito operações praticadas em Lisboa, contam- se mil cento e sessenta e quatro tracheiotomias, sendo seiscentas e vinte e sete em individuos do sexo masculino, dos quaes se curaram cento quarenta e tres, e falleceram quatrocentos oitenta e quatro; perten- cendo quinhentas trinta e sete ao sexo feminino, de que se curaram cento trinta e tres, e morreram quatrocentos e quatro. É A seguinte tabella abrange estas diversas relações : NUMERO DE CASOS CURADOS MORTOS Sexo masculino JU Rg GATO assa 148) DM nTeTaga Sexo feminino... .... am ias TS SUP eo tont nA Total io MG Aanry a 276 LE NiuBBS A proporção dos curados no sexo masculino foi, pois, de 1:4,38, e a dos mortos de 1:1,29. No sexo feminino a relação foi, nos casos de cura, de 1:4; e nos de morte de 1:1,32. A comparação é por tanto um pouco favoravel ao sexo feminino. Em vista, pois, da reunião e comparação dos diversos grupos de factos que a sciencia possue, não se deve, nem póde, dizer que a tra- cheiotomia tenha mais probabilidades de bom exito no sexo masculino do que no feminino, apesar de se ter escripto e de se ter supposto a priori que as raparigas, geralmente mais fracas do que os rapazes, re- sistem menos ás consequencias da operação, e têem mais longas e dif- ficeis convalescenças. Por tanto, a conclusão que póde mais rasoavelmente tirar-se com respeito á influencia do sexo dos doentes de crup nos resultados da tra- cheiotomia é—que os dois sexos não influem notavelmente, e de modo diverso, nas consequencias da operação. Temperamento e constituição.— A influencia que o temperamento e a constituição dos individuos, atacados de garrotilho, póde ter nas in- dicações e contraindicações da tracheiotomia, não differe sensivelmente da que têem aquellas mesmas circumstancias individuaes em todas as operações de certa gravidade. Posso dizer, por isso, em poucas palavras, que o temperamento sanguineo ou sanguineo-lymphatico, e a constituição forte ou regular A TRACHEIOTOMIA 43 são, em igualdade de circumstancias, elementos favoraveis ao bom exito da tracheiotomia; e que, pelo contrario, o temperamento pronunciada- mente lymphatico, e a constituição fraca ou deteriorada, podem con- traindicar a operação, por não permittirem esperar a necessaria reac- ção dos doentes contra as diversas causas de morte, que acompanham e seguem a tracheiotomia. Varias vezes na minha pratica tenho tido occasiões de deixar de operar creanças com o crup, porque o estado de debilidade geral, e o temperamento eminentemente lymphatico se oppunham, fazendo-me pre- vêr a impossibilidade d'esses individuos resistirem á operação e suas consequencias ; e quando tenho operado n'essas condições desfavoraveis, a terminação fatal tem sido o resultado da tentativa. Cito entre ou- tras, como próva, a observação 33.º d'esta mesma Memoria. Por tanto, sem alongar, por desnecessario, este artigo com exem- plos comprovativos d'esta opinião, concluo, relativamente á influencia do temperamento e constituição dos doentes que téem de se operar de tracheiotomia, que—quanto mais o temperamento se aproximar do sanguineo ou do sanguinco-lymphatico, e quanto mais forte e melhor Sor a constituição dos operados, tanto maiores serão as probabilidades de bom resultado, e vice versa. Posição social dos doentes. — Póde dizer-se, sem receio de errar, que quanto melhores, hygienicamente fallando, forem as condições da vida nos doentes acommettidos de crup e submettidos á tracheioto- mia, tanto mais favoraveis devem esperar-se os resultados da opera- ção. Pelo contrario, quanto menos boas forem as circumstancias hy- gienicas em que viverem os enfermos, tanto mais se deverá receiar da tracheiotomia. Concebe-se bem, que uma creança que vive em uma boa habita- ção, sufficientemente agasalhada, bem alimentada, com a qual a fami- lia tem bem a tempo todos os cuidados, offerece mais probabilidades de cura depois da tracheiotomia, do que outra que vive no meio das privações e dá miseria. Em París, onde ha hospitaes especiaes para creanças, o que, infelizmente para a humanidade, ainda não ha entre nós, aos quaes concorrem muitas creanças n'estas ultimas circumstan- cias, acha-se uma Gifferença muito desfavoravel nos resultados das ope- rações ahi praticadas em comparação com as que se fazem na clinica civil, o que deve em parte explicar-se pela differença da posição so- cial dos doentes e pelas circumstancias que lhe são inherentes. A es- tatistica de Lisboa apresenta a relação tão favoravel de 1:3,16, de certo porque quasi todas as creanças pobres, á excepção das da Misericor- 6 + 44 ESTUDOS SOBRE dia, morrem sem operação, e são geralmente só operadas as da cli- nica civil, nas quaes as circumstancias da familia são quasi sempre boas, e por tanto do mesmo modo boas as condições hygienicas em que se tratam os operados. Estado de saude anterior. — Quando os doentes de crup têem go- sado de boa saude até a ultima doença; quando têem tido regular- mente, e sem accidentes, as doenças proprias da sua idade, taes como são principalmente as febres eruptivas, se têem sido vaccinados, etce., a operação da tracheiotomia, a não haver contraindicação especial, de-' ve fazer-se com mais probabilidade de feliz resultado, sobretudo em época de epidemia de doenças que os operados não tenham ainda tido, do que quando os enfermos estejam em condições oppostas. N'aquellas circumstancias, os doentes têem mais vida para reagirem contra os ef- feitos e os progressos da doença, e não têem quasi a receiar, depois da operação e antes da cura, o apparecimento do sarampo, da escarlatina, das bexigas etc., que venham por si determinar um resultado funesto. As circumstancias oppostas áquellas, com quanto não contraindi- quem positivamente a operação, devem todavia fazer o pratico muito mais reservado no seu voto de operar e no prognostico que tiver de fazer. Doenças anteriores e coexistentes.— A respeito das molestias que o doente de garrotilho tenha tido com muito tempo de precedencia, nada póde ter com ellas a tracheiotomia a que o enfermo possa sub- metter-se, a não ser um precedente acommettimento da mesma espe- cie morbida. Como escrevi na minha Memoria sobre o garrotilho (pag. 59), o crup raras vezes recidiva, todavia tem reapparecido no mesmo indivi- duo, o que aliás succede tambem com as outras doenças eruptivas. Mas o que é mais curioso, por imprevisto, é que um individuo curado de um primeiro ataque de crup pela tracheiotomia, parece ficar em me- lhores condições para ser igualmente feliz em uma segunda operação indicada por segundo acommettimento da mesma doença. Na excel- lente these do sr. Augusto Millard, já citada, vem consignados cinco casos de tracheiotomia pela segunda vez praticada em individuos duas vezes acommettidos de crup, quatro dos quaes se curaram; d'estes cin- co doentes são dois da pratica do sr. Paul Guersant, um dos drs. Gom- bault e Warmont, um do mesmo dr. Millard, e um do dr. Beylard. Dois doentes eram do sexo masculino, e tres do feminino. A sua ida- de na época da primeira operação era de quatro annos, oito, tres e meio, cinco, e cinco annos. O intervallo entre os dois ataques de crup A TRACHEIOTOMIA 45 e as respectivas operações foi de vinte e um mezes, onze mezes, cinco mezes, dois mezes, e dois annos. O doente, que falleceu depois da segunda tracheiotomia, foi ope- rado da primeira vez fóra do hospital pelo dr. Beylard, e dois annos mais tarde no hospital de Sainte-Bugenic: era uma rapariga de cinco annos. “O que notam todos que têem feito duas tracheiotomias no mes- mo individuo, é a facilidade da segunda operação, e a muito mediocre quantidade de sangue que verte da ferida, o que é explicavel pela exis- tencia e qualidade do tecido da cicatriz, que vai da pelle até a tracheia, e pelo qual se leva o bisturi. Por tanto: o facto de um precedente garrotilho, curado pela tra- cheiotomia, parece ser uma circumstancia favoravel ao bom resultado de uma segunda operação que novo ataque de crup possa indicar. As doenças manifestadas pouco tempo antes do apparecimento do crup, ou ainda 'coexistentes, téem muito mais importancia nas indica- ções e contraindicações da tracheiotomia. Entre ellas apontaremos aquel- las cuja influencia é menos contestavel. São as febres eruptivas, saram- po, escarlatina, bexigas; a tosse convulsa; bronchite aguda e sub-agu- da, bronchite ramuscular e pneumonia, bronchite chronica; emphy- sema interlobular do pulmão; phthisica; enterite; convulsões; e outras especies de diphtheria. O crup consecutivo ás febres eruptivas, ou o garrotilho secunda- rio, exclue para muitos medicos a intervenção da tracheiotomia. O sr. Trousseau, a principal auctoridade no assumpto, declara eflectivamente como contraindicação absoluta da tracheiotomia o crup secundario ao sarampo, á escarlatina, ás bexigas, ou á tosse convulsa. A opinião d'este sabio é seguida por quasi todos os praticos. Salvo o respeito a pessoa tão competente no objecto, não professo a mesma opinião quando todas as outras circumstancias do doente forem favoraveis; quando um exame muito minucioso não descobrir nenhu- ma outra complicação, e se ao mesmo tempo o perigo todo parecer li- gado á asphyxia determinada pelo embaraço mechanico na larynge. Diversos factos de fóra e de dentro do paiz auctorisam e firmam esta opinião. N'este momento conheço cinco casos de tracheiotomia se- guidos de cura, apesar de ser feita a operação em garrotilhos segui- dos a sarampo e a escarlatina. Tres d'estes factos foram observados em París e dois em Lisboa. D'aquelles tres doentes um foi operado pelo mesmo sr. Trousseau, que n'esse caso não pôde resistir á tenta- cão de operar contra os seus proprios principios: era um rapaz dé qua- 46 ESTUDOS SOBRE torze annos com o crup consecutivo ao sarampo; outro, de dois e meio annos, foi operado tambem no hópital des enfants malades, cuja obser- vação vem escripta na these do sr. Letixerant : era um caso de crup igualmente consecutivo ao sarampo, no qual a cura foi muito prompta e sem o menor accidente, apesar da idade do operado; o terceiro facto era de garrotilho tambem consecutivo áquella mesma febre eruptiva em uma rapariga de tres e meio annos, operada no mesmo hospital pelo interno de serviço, o sr. Bercioux (Millard). Um dos casos acon- tecidos em Lisboa foi o primeiro facto de cura pela tracheiotomia feita pelo sr. J. Theotonio da Silva em outubro de 1852, o qual se deu em uma menina de seis annos acommettida de garrotilho, depois de escarlatina, e em que as consequencias da operação foram muito fa- voraveis (Obs. 4.º). E preciso todavia não .occultar que n'este caso o crup appareceu um mez depois da escarlatina. A este juntarei um quinto facto, o de uma operação praticada por mim em março de 1863, que se deu em uma menina de cinco annos, na qual o garroti- lho appareceu quando existia erupção de sarampo que se supprimiu então (Obs. 36.%). O sarampo grassava epidemicamente em Lisboa por este tempo. O crup consecutivo ás bexigas é muito mais raro, e tambem muito mais grave. Guersant pai refere tres casos d'esta complicação todos fa- taes, em um dos quaes a tracheiotomia fóra empregada. Não tenho observado em Lisboa, nem me consta que os meus col- legas tenham aqui visto, o crup consecutivo á tosse convulsa, mas J. Frank cita muitos casos d'esta especie, e alguns ha em París opera- dos com bom resultado. Um foi notado, pelo sr. Guersant pai no Di- ctionnaire de médecine, de trinta volumes, t. 1x, artigo croup, tendo si- do observado em um rapaz de dez annos; dois são referidos pelo sr. | Millard, e deram-se em duas raparigas, uma de tres e meio annos e outra de seis annos e meio. Uma e outra tinham a tosse convulsa ha- via tres mezes, e estavam curadas do crup ao decimo nono dia depois da operação. f Em todos estes casos notou-se, que os abalos da tosse convulsi- va foram antes favoraveis do que contrarios ao bom resultado da doença crupal, por auxiliarem a expectoração das falsas membranas, e dirigirem os escarros para a bocca atravez da larynge, desviando-os da ferida por onde têem mais tendencia para sair nos primeiros tem- pos depois da operação. A bronchite aguda e sub-aguda acompanham frequentemente o crup, e precedem-no muitas vezes; mas nem por isso augmentam a A TRACHEIOTOMIA 47 gravidade da doença principal, nem constituem contraindicação espe- cial á tracheiotomia. A bronchite capillar ou ramuscular e a preumonia não estão no mesmo caso, porque são molestias summamente graves nas recentes idades, sobretudo até aos cinco ou seis annos. Quando exista qualquer d'estas complicações, e possa conhecer-se antes de se praticar a opera- ção, deve ser uma contraindicação formal á tracheiotomia, excepto quando a inflammação seja limitada a uma pequena parte do pulmão, o que é raro, e quando ao mesmo tempo todas as outras condições do doente forem inteiramente favoraveis, porque n'este caso alguma espe- rança póde haver de cura com a operação. Mas o que succede muitas vezes é passar inteiramente desconhecida antes da operação a existen- cia d'aquelles estados pathologicos, porque a percussão não dá geral- mente noções positivas na bronchite capillar, nem mesmo muitas ve- zes na pneumonia lobular, que é a que mais acommette as recentes idades ; e porque a auscultação, que offerece resultados precisos n'ou- tras circumstancias, nos casos de garrotilho é annullada pelo ruido la- ryngo-tracheial que encobre os fervores pulmonares, aliás tambem mui enfraquecidos pela menor quantidade d'ar que a glotte mais ou me- nos apertada deixa penetrar para as ramificações bronchicas. Na deficiencia da percussão, e sobretudo da auscultação, o que principalmente deve guiar o pratico no conhecimento da bronchite ra- muscular ou da pneumonia crupal, deve ser a frequencia da respira- ção, que no garrotilho sem complicação pulmonar não vai além de qua- renta e oito inspirações por minuto, em quanto que, quando existem as phlegmasias pulmonares, sóbe geralmente acima de cincoenta. Quan- do por tanto a frequencia da respiração chegar a este ponto, e ainda com mais razão quando o exceder, o exame do peito deve ser feito com o maior cuidado, a fim de se diligenciar perceber pela ausculta- cão e pela percussão algum dos signaes da bronchite ramuscular e da pneumonia lobular ou lobar que contraindicam a tracheiotomia. Quando se não attende a este estado da respiração, faz-se a tra- cheiotomia indevidamente, como bem depressa o vem provar a termi- nação fatal que se lhe segue. , A bronchite.chronica, que preexiste ao garrotilho, tem parecido mais favoravel do que nociva ao bom resultado da tracheiotomia. O dr. Cook já citado, o sr. Paul Guersant, e o sr. Millard estão de acôr- do em consideral-a como uma boa circumstancia para auxiliar o des- colamento e a expectoração das falsas membranas pela repetição da tosse que têem os doentes. mi So ESTUDOS SOBRE O emphysema interlobular do pulmão, que algumas aindaque muito raras vezes apparece complicando o crup, e que é devido aos esforços da inspiração ou da tosse, que fazem romper as vesiculas pulmonares, dando logar á infiltração dg ar no tecido cellular que separa os lobu- los do pulmão, é por si bastante grave pela compressão pulmonar e es- tado asphyxico que determina, e que a tracheiotomia não póde remediar, para no caso de ser percebido a tempo contraindicar esta operação. A phthisica, quando confirmada, deve evidentemente contraindicar, de modo formal, a tracheiotomia no crup que sobrevenha a individuos d'ella acommettidos. Mas quando a phthisica existe só no primeiro grau, ou quando apenas se suspeita a sua existencia, não havendo con- traindicação de outra ordem, mas parecendo ao contrario que a asphy- xia é só determinada pelo obstaculo mechanico á entrada do ar pela glotte, deve fazer-se a operação, porque alguns casos ha n'estas cir- cumstancias em que a tracheiotomia tem livrado os doentes da causa immediata da morte, os quaes têem sobrevivido por tempo mais ou me- nos longo. A enterite ou a diarrhea é varias vezes observada conjunctamente com o garrotilho. Com quanto seja uma complicação menos perigosa do que outras, como a bronchite ramuscular e a pneumonia, por exem- plo, é todavia grave. A's vezes é o resultado da abusiva administra- cão de purgantes, ou do tartaro emetico; noutros casos é um dos symptomas da intoxicação diphtherica. No primeiro caso, ou quando não parece ligada a uma alteração geral do organismo, não contrain- dica absolutamente a operação, com quanto lhe diminua as probabili- dades de bom resultado; mas no segundo deve ser contraindicação for- mal á tracheiotomia. As convulsões raras vezes se vêem complicar o crup. Só uma vez ob- servei esta complicação (Obs. 33." logo depois de ter praticado a tra- cheiotomia em uma rapariga de onze annos, exposta da Santa Casa da Misericordia, summamente fraca e nervosa, e que tinha o signal de um recente vesicatorio, applicado nas costas alguns dias antes de entrar para a enfermaria, sem que durante a operação houvesse a mais pequena hemorrhagia. Na observação 32.º, do sr. Theotonio da Silva, a creança morreu em convulsões oito horas depois de operada. A's vezes costumam apparecer durante a operação ou em quanto se fazem os preparativos para ella. O sr. Millard refere úma observação do sr. Almagro, em que as convulsões se manifestaram logo antes da incisão da pelle, sen- do violentas a ponto de suspenderem momentaneamente os movimen- tos respiratorios, produzirem a contractura dos musculos infra-hyoi- A TRACHEIOTOMIA 49 deos, e darem depois o trismo e convulsões clonicas dos membros, apesar do que o cirurgião proseguiu na operação, e a doente curou-se a despeito ainda d'um pleuriz que sobreveiu ao duodecimo dia. A doente era uma rapariga de sete annos e meio; a canula foi tirada ao quinto dia, e a cura foi estabelecida ao trigesimo segundo dia (These do sr. Millard, pag. 182). Se as convulsões preexistirem no momento destinado para a ope- ração, esta não se deve praticar senão depois de terminadas, quando isto aconteça ; se se manifestarem depois de principiada, deve concluir-se, sem desconhecer nos dois casos que o resultado será muito mais pro-. vavelmente desfavoravel do que se tal complicação não existisse. Outras especies de diphtheria. — Outras manifestações diphtheri- cas podem existir com o garrotilho, e influir mais ou "menos na ter- minação que se seguir á tracheiotomia. A angina diphtherica simples não é contraindicação á tracheioto- mia. Quasi todos os garrotilhos que se curam pela operação são con- secutivos a esta especie de diphtheria. Mas a fórma maligna d'aquella doença, caracterisada pela grande e rapida inchação dos ganglios das re- giões submaxillar e parotidiana, pelo mau cheiro do halito, pela abun- dancia e grande espessura das falsas membranas, conjunctamente com symptomas geraes de grande prostração, pallidez e côr livida da pelle, albuminuria, hemorrhagias, é ao contrario uma contraindicação muito terminante da tracheiotomia, porque n'este caso é companheira, ou o effeito da intoxicação e septismo da economia. O sangue apresenta-se n'estes casos notavelmente alterado na sua côr e consistencia, como no- teia pag. 120 e 121 da Memoria sobre o garrotilho. O coryza diphtherico é geralmente ligado á alteração de todo o organismo, pelo principio morbifico da diphtheria ou á intoxicação diph- therica, quando occupa toda ou a maior parte da superficie de ambas as fossas nasaes, e então contraindica a tracheiotomia do mesmo modo que o crup infectuoso e a angina maligna. Mas quando a diphtheria nasal não é muito extensa, quando é superficial, e não ha contraindica- ções de outra ordem, a operação deve fazer-se, se a asphyxia é evidente- mente a causa que põe em perigo immediato a vida do doente. N'este caso ha sómente menos probabilidade, mas não um obstaculo absoluto ao bom resultado da tracheiotomia. A sciencia possue um certo numero de factos d'este genero nos quaes a tracheiotomia tem aproveitado. A observação 9.º da minha Memoria sobre o garrotilho, a pag. 95, refe- re-se tambem a um caso de garrotilho com angina e coryza diphthe- ricos, que se curaram ao decimo quinto dia, mesmo sem operação. A MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. III. P. 1. 7 50 ESTUDOS SOBRE observação 1 1.º d'aquella mesma Memoria, pag. 100, exemplifica pelo contrario um caso de operação mal suecedida, em cuja terminação fa- tal teve de certo parte o coryza diphtherico que acompanhou o gar- rotilho. A tracheite e bronchite dyphtherica é mais frequente do que tem sido admittido pela maior parte dos especialistas. Varios casos de crup tenho observado, já depois de ter publicado os meus Estudos sobre o gar- rotilho, nos quaes a diphtheria pareceu começar pelos bronchios para depois apparecer na larynge, onde se limitou em uns casos, ou passou á pharynge em outros. Um d'elles, muito notavel, observei-o em uma doente do meu amigo e collega, o dr. May Figueira, filha do nosso com- mum amigo, o sr. João José de Sousa Telles. Antes de se estabelecer o crup houve todos os signaes de uma bronchite, em que os signaes phy- sicos locaes não estavam em harmonia com certa exaggeração do es- “tado geral, e a que se seguiu, antes mesmo de bem estabelecidos os symptomas do garrotilho, a expectoração de um fragmento pseudo- membranoso muito caracteristico. Esta doente, que tinha dois annos de idade, falleceu sem asphyxia ao nono dia da doença com signaes d'in- fecção, incluindo a albuminuria. Começou tambem pela tracheia e bron- chios, ou só pela tracheia, o garrotilho dos doentes da observação 35.º e 36.º desta Memoria. A bronchite diphtherica é muitas vezes o motivo da terminação fatal que succede á tracheiotomia. Algumas vezes assim me aconteceu observar. Em um caso (Obs. 6.º) pude fazer a autopsia e verificar a extensão da diphtheria pela tracheia até os bronchios; em outras, co- mo, por exemplo, na doente da observação 37.º, a extensão da diph- theria pelos bronchios pareceu bem manifesta durante a vida. Afóra os casos de expectoração de falsas membranas tubulares e ramificadas como a tracheia e os bronchios, e do ruido de valvula, unico signal acustico da diphtheria bronchica, que são realmente mui raros, é impossivel conhecer préviamente se com o garrotilho ha a tra- cheite e bronchite pseudo-membranosa. Mas ainda mesmo que por aquelles signaes se esteja convencido da existencia d'esta grave com- plicação, havendo asphyxia sem symptomas de intoxicação, a tracheio- tomia deve fazer-se, se bem que com muito pouca esperanca de feliz resultado. O que me auctoriza a não ter a diphtheria tracheial e brou- chica como contraindicação positiva á tracheiotomia, é o conhecimento proprio de mais de um caso em que pela abertura da tracheia sairam falsas membranas d'este canal e dos bronchios, curando-se os doentes. A diphtheria cutanea manifesta-se principalmente na pelle desnu- A TRACHEIOTOMIA 51 dada da epiderme pelos vesicatorios, mas póde apparecer em todos os “pontos dos tegumentos em que haja qualquer ferida ou excoriação. As falsas membranas, limitadas no principio á parte vesicada ou excoria- da, podem invadir uma área mais ou menos extensa dos tegumentos circumvisinhos, e determinar irremediavelmente a morte dos doentes. Citam-se exemplos de um pequeno vesicatorio applicado sobre a parte anterior do collo, entre as espaduas, ou sobre o esterno, por conselho de medicos desconhecedores da natureza e indole do garrotilho, onde se ha manifestado a diphtheria que depois tem tomado uma extensão quatro, seis, oito, e mais vezes maior sobre os tegumentos proximos, concorrendo assim para o septismo da economia e para a morte mais ou menos prompta. Tenho visto algumas vezes os effeitos desagrada- veis, e mesmo desastrosos, da applicação dos vesicatorios em casos de crup, cobrindo-se a superficie da pelle correspondente de falsas mem- branas espessas, adherentes, acinzentadas, fétidas; estendendo-se um pouco sobre a cireumferencia da parte vesicada, todavia não tenho fe- lizmente visto exemplo da grande extensão das falsas membranas; que algumas vezes tem sido observada em Paris. t Quando a diphtheria cutanea fôr multipla, ou occupar uma gran- de extensão de superficie, deve ser necessariamente contraindicação á tracheiotomia, porque é a prova mais evidente da generalisação da mo- lestia e da intoxicação diphtherica. Mas quando se manifestar em su- perficie pouco extensa, quando occupar só a parte aonde foi applicado um vesicatorio, não deve ser motivo para deixar de operar, salvo no caso de haverem conjunctamente outros signaes desfavoraveis. A diphtheria das partes genitaes e do anus não tem sido obser- vada em Lisboa, conjunctamente com o garrotilho, que eu saiba, mas é uma complicação que algumas vezes tem sido vista fóra d'aqui, espe- cialmente no sexo feminino. Quando seja circumscripta á mucosa d'a- quellas regiões, não é tida como contraindicação á tracheiotomia, mas é-o de certo quando a diphtheria, ainda além da larynge e pharynge, appare- ce multiplicada por outros pontos da superficie mucosa cu tegumentar. A diphtheria do esophago não foi ainda observada em Lisboa, o que póde ser devido ás poucas autopsias feitas em casos de diphtheria. pela repugnancia invencivel das familias para as aberturas cadaveri- cas, e pela falta de hospital ou enfermarias especiaes para creanças, a não ser na Misericordia de Lisboa, onde felizmente as doenças diphthe- ricas téem sido até hoje muito raras. Durante a vida, a dificuldade ex- cepcional na deglutição e os vomitos, em presença de uma angina diph- therica, podem fazer presuppôr a extensão das falsas membranas pelo eso- Ta 52 ESTUDOS SOBRE phago, mas não dão a certeza da sua existencia positiva n'este orgão. Estava n'aquelle caso a doente da observação 29.º d'esta Memoria, na qual suppuz haver-se desenvolvido a esophagite diphtherica, o que to- davia não pude confirmar pela necropsia. A diphtheria generalisada, ou a que se manifesta ao mesmo tem- po em muitas partes do corpo, revela a invasão de toda a economia pelo principio morbigeno septico da diphtheria. Com as manifestações locaes da intoxicação diphtherica, ha simultaneamente os phenomenos geraes de malignidade e adynamia, caracteristicos da alteração do san- gue que a acompanha. A diphtheria generalisada é portanto uma contraindicação formal á tracheiotomia. Marcha e duração da doença.— Tanto a marcha como a duração do garrotilho, até o momento de operar, podem influir nos resultados da tracheiotomia. E Quando o andamento do crup tem sido regular no seu crescente progresso, quando a asphyxia, que especialmente indica a tracheioto- mia, tem augmentado lentamente, quer de um modo continuo, quer depois de remissões, deve-se ter mais esperança no resultado da ope- ração do que em circumstancias contrarias, isto é, quando a doença crescer rapida e irregularmente, o que parece indicar maior violencia da causa morbigena, e portanto mais razão para receiar terminação fu- nesta. : A duração da doença até ao momento de fazer a tracheiotomia, nos meus seis operados que se curaram, foi em um caso de tres dias, em outro de quatro, em dois de sete, e em mais dois de oito dias, o que dá uma média de seis dias. Juntando, debaixo d'este ponto de vista, os meus seis doentes cu- rados pela operação aos outros seis igualmente curados em Lisboa, ob- tem-se o resultado seguinte: NUMERO DE DIAS DE DOENÇA ATÉ À OPERAÇÃO NUMERO DE CASOS 2 bis si entptetl «BEBA VAnti 1 Total...... 90 12 A TRACHEIOTOMIA 53 A duração média da doença antes da operação foi, pois, n'estes doze casos de 7,5 dias. Nos vinte e seis casos fataes operados em Lisboa o resultado foi como se segue : NUMERO DE DIAS DE DOENCA ANTES DA OPERAÇÃO NUMERO DE CASOS Detêsitenna nim boebrisist 1 DOR CIpoD EEE a grade 5 4 : et. é TAGs aa; 7 O UUUSÃS CRR RV ETA TA RPA 2 POR URIA 4 6 ; 3 Bentes ot cria da Lee A ass, ds 1 Det ape ei or Sena srt pa 2 LO nascto a tesrrrsadado ad miga Í LlioBfges utero ro stats E l 13 l Total...... 143 26 A duração média da molestia até ao momento da tracheiotomia n'estes vinte e seis casos fataes foi, pois, de 5,5 dias. Deduzo d'esta comparação, que deve haver mais probabilidade de bom resultado pela tracheiotomia, quanto maior numero de dias tem decorrido desde o principio da diphtheria até ao momento em que a operação se torna necessaria; porque mais proxima está a doença da sua terminação natural. Digo a duração da diphtheria, porque, quan- do mesmo a molestia começar por outro ponto que não a larynge, o prognostico é para mim igualmente favoravel, se, em igualdade de cir- cumstancias, a diphtheria se tem mais approximado da duração mé- “dia da molestia, que é de sete a nove dias, como o escrevi a pag. 112 dos Estudos sobre o garrotilho. Vem a proposito notar que as familias dos doentes muitas vezes não dão ao facultativo exacta informação sobre a duração da doenea, porque desconhecem os primeiros symptomas ou não lhes dão a devi- da importancia, o que portanto deve ser psi para o caso na devi- da consideração. Tambem devo acrescentar que a asphyxia crupal, para remediar a qual se emprega a tracheiotomia, dependendo essencialmente da oc- clusão da glotte pelos productos diphthericos ahi desenvolvidos, póde todavia, em certos casos, ser apressada ou retardada por diversas cau- 54 ESTUDOS SOBRE sas, sem que a doença seja por isso mais ou menos violenta, e sem que as falsas membranas tenham mais ou menos extensão. Portanto, terminando, digo, que a marcha e a duração do gar- rotilho, qualquer que ella seja, não se oppõe por si só ao bom resul- tado da operação; sómente tenho para mim, que, regra geral, quando o andamento do crup tem sido lento e regular, e quando os dias da diphtheria se approximam mais da duração natural da doença, o pro- gnostico é mais favoravel, e menos esperançoso nas circumstancias con- trarias. Fórmas do garrotilho.— A pag. 119 dos Estudos sobre o garro- lho admitti duas fórmas da doença : o crup simples, localisado ou com- mum; e o crup infectuoso, generalisado ou maligno, cujos caracteres descrevi. A respeito da applicação do conhecimento d'estas duas fórmas de doença ás indicações da tracheiotomia, escrevi então a pag. 121 e 122 o seguinte, que ainda hoje adopto: « As consequencias praticas que se tiram da diltinesit das duas precedentes fórmas de crup, são da maior importancia para a indica- ção e para o prognostico da tracheiotomia. Sob estes pontos de vista, tres grupos de factos tenho observado, e são os seguintes: 1.º O doente não tem signaes de intoxicação, e toda a doença está, para assim dizer, na asphyxia produzida pelo embaraço mechanico á entrada do ar pela larynge. A indicação da operação é inquestionavel, eo progostico o mais favoravel. É nestes casos que a tracheiotomia traz uma melhora prompta e admiravel: a tosse expelle com forca e ás vezes immediatamente as mucosidades, e mesmo as falsas membranas existentes nas vias respira- torias; a respiração restabelece-se logo silenciosa, e a cura tem mais geralmente logar, mesmo quando se manifestem depois symptomas de crup infectuoso, o que acontece algumas vezes. 2.º O doente apresenta signaes evidentes, e dos mais graves, de intoxicação sem asphyxia, ou apenas com alguma dyspnéa. A operação deve considerar-se absolutamente contraindicada ; e o prognostico, com a maior probabilidade, fatal. * Quando se faz a tracheiotomia n'estas circumstancias, os doentes abatidos pela infecção diphtherica não apresentam reacção possivel de- pois de operados, não podem expellir as mucosidades nem as falsas mem- branas das vias respiratorias, a respiração fica mais ou menos ruido- sa, e portanto morrem com o progresso da intoxicação, e ainda asphy- A TRACHEIOTOMIA 5 xiados pelo embaraço que faz á respiração o cumulo de muco e de producções diphthericas na tracheia e bronchios, que elles não têem força para expulsar. 3.º Os doentes com alguns symptomas d'infecção têem tambem um certo grau d'asphyxia, que explica em parte a gravidade da doen- ça. A tracheiotomia está ainda indicada, se bem' que o prognostico seja pouco favoravel ao bom exito da operação. Na mui grande maioria dos casos a morte segue-se ás operações praticadas n'estas cireumstancias. Todavia, sou de opinião de operar n'este estado, com tanto que o ele- mento asphyxico exista concorrentemente, e que a infecção diphtheri- tica não seja muito pronunciada, visto que ha um certo numero de exemplos de cura da diphtheria maligna, assim como os ha, ainda que raros, de garrotilhos n'esta hypothese, quer dizer, com infecção e as- phyxia, curados com a operação, a qual serve, para assim dizer, de des- complicar a doença, tirando-lhe um dos elementos da maior gravidade. Tenho visto e conheço numerosos exemplos d'aquellas tres espe- cies em que o garrotilho se apresenta na pratica, os quaes me per- mittem formular d'este modo as minhas opiniões sobre o objecto. » Periodo do crup. — E' no principio do que na minha Memoria sobre o garrotilho, pag. 79, descrevi como quarto periodo ou periodo asphyxico do crup (3.º periodo dos auctores), que entendo chegada a occasião mais opportuna de fazer a tracheiotomia. Operar antes, no terceiro periodo, no periodo de simples dyspnéa, ainda sem signaes de asphyxia, é talvez melhor para a mais favoravel estatistica da tracheiotomia no crup; mas podem incluir-se em o nume- ro dos curados pela operação alguns doentes que se poderiam ter salvo pelo tratamento pharmacologico. Quem tiver numerosa clinica de certo verá um ou outro caso de verdadeiro garrotilho chegado ao periodo de dyspnéa, mesmo muito adiantada, curado sem o recurso operatorio. Está n'este caso, entre outros, o doente da observação 9.º dos Estu- dos sobre o garrotilho, pag. 95, que é notavel por mais do que este motivo. ) Valleix (Guide du medécin praticien, t. u, 4.º edição, 1860, pag. 444) colligiu cincoenta e quátro observações de verdadeiro crup, ca- racterisado pela aphonia, respiração sibilante, e expulsão de falsas mem- branas, nas quaes achou dezesete curas bem averiguadas, ou 1:3,17. Mas é preciso operar logo qué o periodo asphyxico começa. Quan- do a asphyxia se adianta cada vez mais, as probabilidades de cura são progressivamente menores, sendo certo pelas experiencias do sr. Fau- re, que nos ultimos momentos da vida de animaes asphyxiados lenta 56 ESTUDOS SOBRE e methodicamente se formam coagulos sanguineos no coração e gros- sos vasos, que por si sós compromettem a vida, que depois não é pos- sivel restabelecer. Não quero porém dizer, que no decurso ou no fim do quarto pe- riodo do garrotilho, quando a asphyxia está no seu maior grau, quan- do a morte está imminente, se não deva por isso operar. Entendo ao contrario, que quando não ha logar para escolher o momento da ope- ração, deve o cirurgião sempre pratical-a em quanto sente um sopro de vida, se não existe complicação ou phenomenos d'intoxicação assaz graves, a ponto de serem superiores a todo o recurso. Quando, como sabiamente diz o sr. Trousseau (Archiv. gen. de med. 1855), a lesão local, o crup, constitue o perigo principal da doença, deve sempre operar-se, aindaque a asphyxia tenha chegado ao mais subido grau, aindaque o doente tenha apenas minutos dê existencia, porque, mesmo n'estas circumstancias, são hoje muitos os doentes que a opera- ção tem conseguido salvar. Estavam perfeitamente n'este caso os doen- tes das observações 10.º, 14.º e 15.º d'esta Memoria. A opininão do medico mais abalisado e mais competente na ma- teria, o sr. Trousseau, tem sido vária quanto ao periodo do crup em que é mais conveniente operar. No tempo das suas primeiras opera- ções, de 1825 a 1834, fazia como Bretonneau; operava o mais tarde possivel, no fim do periodo asphyxico. Em 1834 no Journal des con- naissances médico-chirurgicales (numero de setembro) o ilustre pra-, tico manifestou uma opinião contraria á que primeiro havia seguido, como se vê nas suas proprias palavras então escriptas: «Tant que la trachéotomie a eté dans mes mains une arme infidêle, jair dit: HM faut la pratiquer le plus tard possible; maintenant que je compte de nom- breux succês je dis: H faut la pratiquer le plus tôt possible.» Depois de proclamar e de fazer correr e aceitar como mais rasoavel o prin- cipio de operar o garrotilho o mais cêdo possivel, o sr. Trousseau mo- dificou novamente a opinião, professada desde 1834, na sua notavel Me- moria Nouvelles recherches sur la période extréme iu croup, impressa em 1851 na Union médicale, na qual refere, em apoio do sen novo mo- do de pensar, o excellente resultado de dézoito casos de garrotilho ope- rados no periodo extremo, em que obteve sete curas ou 1:2,57. Em . outra Memoria, publicada em 1855 nos Archives gén. de médecine, o mesmo sabio refere-se tambem á tracheiotomia praticada no periodo extremo do crup, mas dá muito mais importancia á fórma e natureza da doença na indicação operatoria. D'ahi transcrevo o seguinte perio- do, que tem relação com o assumpto: «Lorsque la lésion locale consti- A TRACHEIOTOMIA ç 57 tue le danger principal de la maladie, à quelque degre que Vasphyxie soil arrivce, Venfant n'eút il plus que quelques minutes à vivre, la tra- chéotomie rewssit, à peu de chose prês, aussi bien que si elle avait cté tentée trois ow quatre heures plus tót.» Para concluir, devo acrescen- tar que em 1861 no 1.º tom. da sua clinique médicale a pag. 427, o mesmo sr. Trousseau diz, que as probabilidades de cura pela operação serão tanto maiores quanto mais cêdo a operação fôr praticada. Sem prolongar demasiadamente esta parte do assumpto de que me occupo, devo repetir, que, quando se póde escolher, é preferivel operar quando já tem começado a asphyxia (principio do quarto pe- riodo), mas antes de estar muito adiantada, pelos inconvenientes que no- tei; porém nos casos em que não é permittida a escolha do periodo, por se achar o doente no fim do ultimo, a operação deve sempre fazer-se quando os symptomas asphyxicos predominarem sobre os outros sym- ptomas geraes. Por esta occasião é preciso não occultar, que, sobre tudo quando não se tem seguido o progresso da doença, e a asphyxia não é mani- festa, é impossivel conhecer com segurança, se os phenomenos obser- vados são só effeito do embaraço mechanico á hematose e suas conse- quencias, ou se alguns, pelo menos, são devidos á infecção diphtheri- ca ou a alguma outra complicação. Se a eo crupal tivesse todo o valor que lhe ata o sr. Bouchut, seria um excellente meio de distinguir a infecção da asphy- xia latente; mas nem sempre a sua existencia póde elucidar o -prati- co, porque tenho visto casos de crup infectuoso sem asphyxia, nos quaes se tem manifestado a insensibilidade cutanea; porque ás vezes ha ver- dadeira asphyxia, a ponto de matar os doentes, sem comtudo haver abo- lição da sensibilidade tegumentar senão prope mortem; e ainda por- que em algumas observações apparece cêdo de mais para se dever ope- rar então, ou muito tarde para ser prudente esperar até lá para fazer a operação (Vid. Estudos sobre o garrotilho, pag. 79). Se, depois de bem estudados todos os symptomas e de pesadas to- das as circumstancias, restar alguma duvida que deixe entrever um raio de esperança na tracheiotomia, esta operação deve ser praticada, por- que não tendo nenhum inconveniente póde entretanto salvar mais uma vida. Tratamento anterior. —O tratamento feito ao crup antes da tra- cheiotomia póde influir muito nos resultados d'esta operação. Quando o tratamento instituído fôr o menos debilitante, de fórma a conservar o mais possivel as forças dos doentes, as probabilidades MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. HI. P. 1. 8 8 ESTUDOS SOBRE N » de cura pela operação serão por este lado animadoras. Mas se pelo contrario a ignorancia ou a rotina dirigir o tratamento de modo a empregar contra os primeiros symptomas do garrotilho meios que a sciencia reprova e condemna, como bem explicitamente o escrevi na Memoria sobre o crup que imprimi em 1860, e se vê na parte res- pectiva ao tratamento, então as probabilidades de cura. pela operação são muito menores ou mesmo nullas. Não será inutil repetir aqui, que as emissões sanguineas, os vesicatorios, os purgantes, os mercuriaes, administrados tanto interna como externamente, a dieta tenue, são contraindicados no crup, e em geral na diphtheria, por concorrerem todos para enfraquecer os doentes, e facilitar a intoxicação diphtherica, que é a mais temivel complicação do garrotilho, por ser a mais morti- fera. Pelo mesmo motivo na escolha dos emeticos que têem de se em- pregar, adopto hoje a ipecacuanha em pó recente em dóses elevadas, e só lanço mão do tartaro emetico, e ainda assim reunido á ipecacua- nha, quando esta só não produz o effeito vomitivo que é conveniente. Epoca do anno em que a operação é praticada. — As trinta e oito operações da tracheiotomia praticadas em Lisboa até hoje, distribuidas pelas quatro estações e mezes do anno, dão o resultado seguinte : e ESTAÇÕES MEZES N.º DE CASOS CURADOS MORTOS | Dezembro 2 2 Inverno aneiro — 8 ES li== 4 neo 5 ) 3 Março 3 Í 2 a dano Abril 3) 8 — 2 3)== 6 Maio 2 l | Junho 2 | 2 Verão Julho p= 9 2n==19 db== 6 | Agosto : | ] Setembro 2 2 Outomno (Outubro 6/==13 Si— 3 al Novembro 5). ) Total qi: 198 12 26 No inverno a relação da curabilidade foi de 1:2; na primavera, de 1:4; no verão, de 1:3; e no outomno, de 1:4,33. A mortalidade foi na primeira estação de 1:2; na segunda, de 1:1,33, na terceira, de 1:1,5; e no outomno, de 1:1,3 A TRACHEIOTOMIA 9 A estatistica de cento e vinte e quatro operações feitas no hospi- tal des enfants malades desde o 1.º de janeiro de 1857 até o 1.º de julho de 1858, que extráio da these do sr. Millard, dá o seguinte re- sultado : ESTAÇÕES MEZES N.º DE CASOS CURADOS MORTOS Epp 16 3 13 Inverno Janeiro 13)=-= 39 3,==10 10)==29 | Fevereiro 10] 4 Marco 20 q 13 Primavera ) Abril 18)== 48 5/==12 13)—36 Maio 10 10 po 11 Í 9 Verão Julho 4p== 21 = 4 4,==17 | Agosto 6 2 i Setembro 5 l 4 Outomno (Outubro 6)== 16 lj= 3 sl= Novembro 5 Í 4 Total. .... 124 H 29 95 A curabilidade foi aqui de 1:3,9 no inverno; de 1:4 na prima- vera; de 1:5,25 no verão; e de 1:5,33 no outomno. A mortalidade foi na primeira estação de 1:1,34; na segunda, de 1:1,33; na tercei- ra, de 1:1,23; e na quarta, de 1:1,28. Outra estatistica do mesmo hospital, que comprehende cento e sessenta e quatro operações, feitas durante o anno de 1859, cujos ele- mentos tiro da these dos srs. Fischer e Bricheteau, dá o resultado seguinte : 60 ESTUDOS SOBRE ESTAÇÕES "MEZES N.º DE CASOS CURADOS . MORTOS Dezembro 12 2 10 Inverno Janeiro 21)== 55 4)== 17;== 45 Fevereiro 22 2 20) Março Bu E 13 Primavera / Abril 13)== 49 24-12 = Si Maio 15 2) 13 | Junho ] Verão Julho — 29 = 7 = 0, Agosto | | (Setembro gl 4 8 Outomno (Outubro T)== 31 5bp==13 29 18 Novembro 12) À à A curabilidade foi, pois, de 1:6,87 no inverno; de 1:4,08 na pri- mavera; de 1:4,14 no verão; e de 1:2,38 no outomno. E a morta- lidade a no inverno, de 1:1,17; na primavera, de 1:1,32; no verão, de 1:1,31; e no outomno, de 1:1,72. Ajuntando as tres estatisticas precedentes, que prefazem trezen- tas e vinte e seis operações, acha-se o seguinte resultado geral, que deve ser o mais aproximado da verdade. ESTAÇÕES MEZES N.º DE CASOS CURADOS MORTOS Dezembro 30 7 23 Inverno Janeiro 352==102 71-22 at 80 Fevereiro A $ 29 Março 16 28 Primavera | Abril A nte ni 79 Maio 3 24 Junho Verão Julho = 59 ju - 45 Agosto Setembro E 5 14 Outomno (Outubro = 60 of= 1 10) 41 Novembro o 5 1 MotaliE E a 6 81 245 A TRACHEIOTOMIA 61 A proporção da curabilidade foi, pois, no inverno de 1:4,63; na ' primavera, de 1:4; no verão, de 1:4,21; e no outomno, de 1:3,15. E a mortalidade teve a relação de 1:1,27 no inverno; de 1:1,32 na pri- mavera; de 1:1,31 no verão; e de 1:1,46 no outomno. A estação que, segundo esta ultima estatistica, deu mais casos de cura, foi, pois. o outomno (1:3,15); seguiu-se-lhe a primavera (1:4); veiu depois o verão (1:4,21); e em ultimo logar o inverno com uma curabilidade menor (1:4,63). Posso, pois, com estes fundamentos concluir, que os mezes do ou- tomno e da primavera são mais favoraveis ao resultado da tracheioto- mia no crup; e que os mezes do verão, e sobre tudo os do inverno, são os que mais se oppoem*á terminação pela cura. Mas devo acrescentar, que para o caso sujeito, aquelle numero de factos é pequeno para se poder tirar uma conclusão que represente a verdade para todos os an- nos. Para isso era preciso ter estatisticas de muitos mais annos com a designação dos mezes em que as operações foram praticadas. Influencia epidemica.— Ha epidemias de garrotilho, como de to- das as doenças que se manifestam e propagam epidemicamente, que são mais graves do que outras, já pela fórma que a molestia reveste, Já pelas complicações que se lhes juntam. A causa d'esta differença de gravidade está na constituição me- dica da época em que essas epidemias se desenvolvem. A tracheiotomia, praticada no crup em tempo de epidemia, resen- te-se tambem, nos seus resultados, do caracter mais ou menos grave que apresenta o genio epidemico, ou a constituição medica da época. k «o jota obgsatday ds! 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A região tracheial, que corresponde á parte anterior e inferior do collo, representa exteriormente um triangulo, com o vertice trun- cado, dirigido para baixo, correspondendo á extremidade superior do esterno; a base voltada para cima, confundindo-se com a região laryn- gea; e os lados constituídos pela proeminencia do bordo interno dos musculos esterno-cleido-mastoideos, que se prolongam para cima, aos lados das regiões infra e supra-hyoideas até ás apophyses mastoideas do osso temporal. A base da região tracheial corresponde ao relevo circular for- mado pela cartilagem cricoidea, facil de reconhecer com os dedos atra- vez dos tegumentos, pela notavel dureza e resistencia do annel que a constitue, e que está situado na parte inferior da região laryngea, abaixo da proeminencia angular da cartilagem thyroidea. Este annel apresenta na parte média um tuberculo, denominado cricoideo, que ser- ve de ponto de relação nos processos da tracheiotomia. Uma linha trans- versal que passe pelo bordo inferior da cartilagem annular, e termine 64 ESTUDOS SOBRE no bordo interno dos esterno-mastoideos, representa pois a base da re-. gião tracheial. No vertice truncado d'esta região, o qual corresponde á furcula do esterno, está a fosseta supra esternal, Jugular, ou antes, innomina- da, que se faz mais profunda no acto da inspiração, e onde se sentem, e se vêem ás vezes, as pulsações da arteria brachio-cephalica. Por dentro dos esterno-cleido-mastoideos, que limitam lateralmente a região tracheial, e parallelamente a elles ha o sulco esterno-mastoi- deo, jugular, ou melhor, carotido, que a contracção e proeminencia d'aquelles musculos faz mais ou menos profundo, e que marca a po- sição e direcção da arteria carotida primitiva que ali se sente pulsar. Esta depressão é muitas vezes occupada pela veia jugular anterior, que então se nota debaixo da pelle por dentro do bordo interno dos mus- culos esterno-clavio-mastoideos. Esta mesma região, dentro dos limites que lhe marquei e des- crevi, é convexa e arredondada transversalmente na sua parte superior ou base, e concava inferiormente, no seu vertice, que corresponde á /os- seta innominada. Os planos sobrepostos, que se encontram n'esta região, são os se- guintes, estudados de fóra para dentro, ou da parte superficial para a profunda. 1.º Pelle fina e muito movel, na face interna da qual ha um pa- niculo cellulo-gorduroso. Pela sua grande mobilidade, é muito facil des- locar-se na tracheiotomia, se se não tem o cuidado de a fixar conve- nientemente. 2.º Fascia superficial, unica na linha mediana, mas desdobrando- se lateralmente para envolver os musculos cutaneos do pescoço. Pela face interna do seu folheto mais profundo se distribuem os ramos su- perficiaes do plexo cervical, e desce quasi verticalmente a veia jugu- lar externa, algumas vezes duplicada, a qual cruza o esterno-cleido- mastoideo, para ir abrir-se na subclavia por fóra da jugular anterior, que corre parallela e contigua ao bordo anterior d'este mesmo mus- culo. N'este mesmo plano tem-se encontrado um ramo venoso do vo- lume de uma penna de perúa, passando transversalmente por diante da tracheia 2 > centimetros abaixo da cartilagem cricoidea, e estabe- lecendo communicação entre as duas jugulares anteriores, por fórma a poder ser ferido na tracheiotomia (Millard). 3.º Folheto superficial, ou primeiro folheto da aponevrose cervical (aponevrose cervical superficial), que se continúa superiormente com a aponevrose da região crico-Lhyroidea e thyro-hyoidea, e inferiormente á A TRACHEIOTOMIA 65 se insere no bordo anterior da furcula do esterno e da clavicula, fazen- do depois continuação á aponevrose peitoral. Lateralmente, desdobran- do-se, envolve os musculos esterno-cleido-mastoideos, cuja bainha fórma, sendo fibroso o folheto anterior d'ella, e mais resistente do que o pos- terior, que é apenas celluloso. Junto ao bordo posterior do esterno- clavio-mastoideo, o primeiro folheto da aponevrose cervical é de novo unico, e estende-se até ao trapesio, tomando no intervallo triangular dos dois musculos a denominação de aponevrose supra-clavicular. 4.º Folheto médio ou segundo folheto da aponevrose cervical (apo- nevrose cervical media), que se prende inferiormente ao bordo poste- rior da furcula e da clavicula, e cobre os musculos esterno-thyroideos e esterno-hyoideos. Lateralmente passa por diante dos vasos princi- paes do collo (carotidas e jugulares), do musculo omo-hyoideo e dos escalenos, cujas bainhas fórma, para ir inserir-se ás apophyses trans- versas das vertebras cervicaes. Entre estes dois primeiros folhetos da aponevrose cervical ha, so- bre tudo na região da fosseta supra-esternal, um ou mais ganglios lym- phaticos, e tecido cellular mais ou menos adiposo. 5.º Camada dos musculos tracheiues, que se póde subdividir em duas: uma mais superficial, constituida pelos dois musculos esterno- hyoideos, e por fóra d'estes por parte dos omo-hyoideos; outra, mais profunda, formada pelos musculos esterno-thyroideos. Os dois primei- ros musculos, os esterno-hyoideos, formam entre si um triangulo muito alongado, com a base para o esterno; e os ultimos, os esterno-thyroi- deos, formam tambem os dois lados de um triangulo alongado, cuja base é superior. Por esta disposição, e por serem mais largos do que os esterno-hyoideos, estão mui proximos um do outro na parte inferior da região tracheial. 6.º Folheto profundo ou terceiro folheto da aponevrose cervical (apo- nevrose cervical profunda), que passa pela face posterior dos musculos tracheiaes, completando-lhes as bainhas que o folheto medio concorre a formar, e separando-os do corpo thyroideo. Prende-se superiormente ao osso hyoide, identificando-se n'esta parte com o folheto medio, e inferiormente á face posterior do esterno abaixo da inserção dos mus- culos esterno-hyoideos e esterno-thyroideos, ao contrario do que escre- vem varios auctores de anatomia topographica. Lateralmente, junto ao bordo externo do musculo esterno-hyoideo, une-se ao folheto medio, e termina como elle nas apophyses transversas cervicaes. Precisamente na linha mediana sobrepoem-se os tres folhetos apo- nevroticos que acabo de descrever, occupando o intervallo dos muscu- MEM. DA ACAD. — [.º CLASSE. — T. II. P. L. 9 66 ESTUDOS SOBRE e los, e formam a linha branca cervical, sobre a qual se opéra na tra- cheiotomia. Algumas vezes, ainda que raras, esta linha falta ou é mui “pouco apparente, de modo que os musculos estão unidos entre si pe- los bordos internos. 7.º Por detraz dos musculos tracheiaes e do terceiro folheto da aponevrose cervical ha, na parte superior da região tracheial, o corpo chyroideo. A” parte média e anterior da tracheia corresponde o isthmo, aos lados estão os /obos d'este corpo. O isthmo thyroideo cobre geralmente o 2.º, 3.º e 4.º anneis da tra- cheia; mas algumas vezes é muito estreito, a ponto de cobrir só o 1.º annel, ou o 1.º e o 2.º, como já vi, e póde mesmo faltar; outras ve- zes é muito desenvolvido, sóbe até á cartilagem cricoidea, e desce muito abaixo, cobrindo assim grande numero de anneis da tracheia, de modo tal que embaraça muito a operação da tracheiotomia, o que é todavia raro. A extensão da ponte que liga os dois lobos do corpo thyroideo é geralmente proporcional ao volume d'estas partes, como tenho veri- ficado; de modo que, quando, antes de operar a tracheiotomia, se pó- de conhecer bem pela palpação os lobos thyroideos, deve inferir-se que o isthmo é bastante desenvolvido no sujeito que se observa, e vice versa. Do bordo superior do isthmo sóbe algumas vezes uma lingueta ou prolongamento pyramidal, que póde chegar até o hyoide, e é co- nhecido pelo nome de pyramide de Laluette. Sobre este mesmo bordo correm a anastomosar-se as arterias thyroideas superiores; e pelo infe- rior vão as thyroideas inferiores, que se anastomosam igualmente na linha mediana. Segue-se d'esta disposição anatomica, que deve evitar- se na operação da tracheiotomia, sempre que seja possivel, a secção do isthmo thyroideo, pelo perigo de cortar aquelles vasos, cuja capacida- de está em harmonia com o volume do corpo thyroideo. Os lobos thyroideos, cujo volume é em geral maior no sexo femi- nino, cobrem lateralmente a tracheia em maior ou menor extensão, assim como a cartilagem cricoidea, e ás vezes tambem os lados da thy- roidea. Quando se hypertrophiam ou augmentam de volume por qual- quer fórma, podem comprimir e deformar o tubo respiratorio, incom- modando mais ou menos a respiração, assim como embaraçar a circu- lação cerebral e a deglutição, pela compressão dos vasos jugulares e do esophago. Abaixo do corpo thyroideo, e igualmente pela parte posterior do terceiro folheto da aponevrose cervical, encontra-se o plexo venoso sub- A TRACHEIOTOMIA 67 thyroideo, tecido cellular, ganglios lymphaticos, as arterias thyroideas inferiores, e algumas vezes a arteria thyroidea media. O plexo sub-thyroideo, tambem denominado thyroideo, é mais ou menos desenvolvido segundo os individuos ; nos adultos é sempre mais amplo e deve por isso evitar-se feril-o. Quando se opéra a tracheioto- mia, está geralmente muito desenvolvido, e tanto mais quanto maior é a difficuldade da respiração. Muitas vezes, apesar de turgidas, as veias estão mais ou menos parallelas no sentido vertical, de modo que é pos- sivel, como tenho feito quasi sempre, separal-as sem as dividir, e cor- tar a tracheia sem effusão sanguinea do plexo sub-thyroideo; n'outros casos, a congestão e turgencia das veias é“mui grande, e não é possi- vel incisar a tracheia sem as dividir, seguindo-se então a entrada de sangue nas vias respiratorias, a asphyxia, e mesmo a morte, se se não obvia ao accidente antes de tudo pela introducção da respectiva canu- la, e depois pela aspiração do sangue caído nas vias aereas. O tecido cellular, em que está o plexo sub-thyroideo, é geralmen- te abundante e muito laxo, e continúa inferiormente com o do me- diastino posterior. E' elle que permitte á tracheia a sua grande mo- bilidade; onde sobem e descem os tumores moveis nascidos no corpo thyroideo, ou no mediastino posterior; e onde tem acontecido metter por erro a canula na operação da tracheiotomia, o que se póde ex- plicar pela pequena abertura praticada na tracheia, por ser muito pro- xima do esterno, e sobre tudo pela pouca pericia do operador, o que todavia se não póde dizer de Dupuytren com quem o facto se deu á vista do sr. Malgaigne. N'este mesmo tecido se acham lateralmente e em baixo alguns ganglios lymphaticos, que se continuam com os ganglios bronchiaes. Es- tes orgãos engorgitando-se, ou augmentando de volume por qualquer fórma, podem incommodar muito as funcções do canal respiratorio, pela mesma fórma que já disse que o podia fazer o corpo thyroideo. As arterias thyroideas inferiores, que nascem das subclavias, so- bem n'este mesmo plano, mas lateralmente, para não poderem ser le- sadas na operação da tracheiotomia. A arteria thyroidea media, assim denominada por Neubauer, quan- do existe, está por detraz do plexo sub-thyroideo immediatamente ap- plicada sobre a tracheia, adiante da qual sóbe a partir da crossa da aorta até o bordo inferior do isthmo. Felizmente é muito rara esta disposição que torna perigosa a operação da tracheiotomia, porque a arteria de Neubauer chega a ter o calibre da radial. Nunca a observei “em dezeseis operações que tenho praticado, nem foi tambem notada nas 9, 68 k ESTUDOS SOBRE outras feitas em Lisboa por varios collegas. Comtudo, vi-a duas vezes, uma em um cadaver que servia ás minhas prelecções de anatomia na Escóla medico-cirurgica, e outra em um em que examinava ultima- mente a anatomia da região tracheial, | Na parte mais baixa d'esta mesma camada, correspondendo á fos- seta supra-esternal ou innominada, e immediatamente por diante da tra- cheia, está a veia sub-clavia esquerda, com direcção obliqua de cima e do lado esquerdo para baixo e para a direita; e seguindo direcção op- posta, de baixo e da esquerda para cima e para a direita, em plano posterior, « arteria innominada ou brachio-cephalica, que nasce da crossa da aorta tres centimetros, pouco mais ou menos, abaixo do bordo su- perior do esterno, e sobe obliquamente para a parte posterior da arti- culação clavio-esternal direita, onde se bifurca. Aquelles dois grossos vasos formam assim um angulo, com o seno superior abracando a parte inferior e anterior da tracheia. O lado esquerdo d'este angulo, além da veia mencionada, é tambem constituido na parte mais profunda, pela origem da arteria carotida primitiva esquerda, que nasce do ba- culo aortico, junto á innominadá, e sobe para a esquerda. O lado di- reito é prolongado para cima pela arteria carotida primitiva corres- pondente, que tem relações muito proximas com .a tracheia na sua parte inferior, a ponto de poder ser facilmente ferida na operação da tracheiotomia. Foi o ferimento d'esta arteria que deu a hemorrhagia, a que succumbin o estudante de Medicina operado por um compa- nheiro, ao qual se refere Desault. O tronco innominado só excepcio- nalmente sobe bastante acima para poder ser lesado n'aquella opera- ção, quando a incisão se prolongar muito para o esterno. Esta dispo- sição observa-se mais na mulher, e depende da menor altura do es- terno, e do achatamento do peito anteriormente. Beclard cita um caso de ferimento da arteria innominada, por occasião da tracheiotomia feita tambem por um estudante de Medicina. 8.º Tracheia, tendo aos lados os nervos recorrentes, o esquerdo dos quaes sobe no sulco que ella fórma d'este lado com o esophago, tendo primeiro abraçado o baculo da aorta; e o direito sobe pela parte posterior e lado direito d'aquelle mesmo orgão, por diante da colu- mna vertebral, não parallelamente como o esquerdo, mas com alguma obliquidade para cima e para dentro, depois de ter contorneado a ar- teria sub-clavia direita. A tracheia estende-se da larynge, ou do con- torno inferior da cartilagem cricoidea até á origem dos dois bronchios em que se divide inferiormente. O limite superior ou laryngeo, pelo qual se une á' cartilagem cricoidea, corresponde á face anterior do cor- A TRACHEIOTOMIA 69 po da sexta vertebra cervical; o inferior ou bronchial á face anterior da quarta vertebra dorsal no mediastino posterior, por onde entra para a cavidade do peito. A direcção da tracheia é rectilinea, com ligeira obliquidade para baixo e para traz. E' por isso muito superficial e accessivel em cima, e muito mais profunda e difficil de descobrir inferiormente, junto do esterno. O seu comprimento médio no homem adulto é de 13 centime- tros, ainda que se tenha visto entre 11 e 15; e na mulher é de 11 centimetros. Nas idades inferiores é proporcionalmente mais pequena. No cadaver de um rapaz de quinze annos, em que ha pouco o medi, achei, por exemplo, 7% centimetros, e no de uma rapariga de onze an- nos 73 millimetros. O comprimentro da tracheia varia ainda muito “com a flexão e extensão da cabeça, assim como com a elevação e abai- xamento da larynge. Quando a cabeça é inclinada para traz, como na posição escolhida para a operação da tracheiotomia, a larynge sóbe, a tracheia segue-a no' movimento ascensional, os seus arcos cartilagino- sos separam-se, e póde chegar a alongar-se mais a quarta parte do seu comprimento ordinario. Descobrindo a larynge e toda a tracheia em cadaveres, e fazendo-lhes a extensão da cabeça, tenho conseguido obter mais 4 a 5 centimetros no comprimento do orgão. No de quinze an- nos, a que ha pouco me referi, e que tinha de comprimento 7: cen- timetros, obtive por este modo 12 centimetros, e no de onze annos 113 millimetros. Quando pelo contrario a cabeca se dobra sobre o peito, e a la- rynge se abaixa, os arcos cartilagineos approximam-se, tocam-se pelos bordos, e a tracheia fica muito mais curta. A differença d'estes dois limites corresponde a um terço ou metade, pouco mais ou menos, do comprimento regular e médio do orgão. No primeiro d'aquelles dois cadaveres achei na maxima retraccão da tracheia 5 centimetros, e no da rapariga de onze annos 49 millimetros. A tracheia não é só movel no sentido vertical, em que segue os movimentos da larynge e da cabeça, tambem o é muito lateralmente. Esta mobilidade, consequencia obrigada e natural das suas funcções, é favorecida pela laxidão do tecido cellular abundante que a envolve, e que, como disse, continúa com o do mediastino. D'ahi resulta a gran- de difficuldade em abrir a tracheia, e introduzir-lhe a canula, sobre tudo para pessoas pouco habituadas á tracheiotomia; o que suggeriu a Bauchot, assim como ao sr. Chassaignac, além de outros, a idéa de um instrumento proprio para fixar aquelle canal. 70 ESTUDOS SOBRE Vista exteriormente, a tracheia tem o aspecto de um cylindro a que se tivesse cortado o terço ou quarto posterior para o substituir por uma membrana plana. Anterior e lateralmente é pois convexa, e apresenta Os relevos circulares correspondentes aos arcos cartilagineos sobrepostos que a constituem, unidos pelos bordos que se correspondem mediante porções ou arcos membranosos interpostos. Posteriormente é plana, em razão da membrana que fórma a sua parede posterior, e que lhe une as extremidades dos arcos transversaes. Os arcos cartilagineos da tracheia são em numero de dezeseis a vinte. A altura de cada um varia ordinariamente no adulto entre 2 e 5 millimetros; e, além d'isso, muitas vezes não é a mesma em toda a sua extensão. O primeiro é sempre mais alto do que os outros, prin- cipalmente no meio, e muitas vezes está soldado e continuo com a car- tilagem cricoidea. Nunca vi tão alto este primeiro annel como na tra- cheia do rapaz de quinze annos que já citei, no qual tinha 10 milli- metros, o que foi verificado pelo meu talentoso collega e bom amigo, o dr. Thomaz de Carvalho, que estava presente. Dois e mais podem unir-se em parte do seu comprimento, assim como um ou mais se po- dem bifurcar em uma ou ambas as extremidades, como já vi. Nos ve- lhos chegam algumas vezes a ossificar-se, e então comprimindo a tra- cheia são susceptiveis de fracturar-se. Aliás pela sua muita elasticida- de póde-se chegar a approximar as duas metades lateraes da tracheia, sem que se rompa a continuidade das suas fibras, readquirindo o ca- nal a sua primitiva capacidade logo que cessa a compressão. A membrana que completa posteriormente a tracheia é fibro-elas- tica, como a que está interposta aos bordos de cada um dos arcos car- tilagineos. N'ella ha fibras musculares transversaes estendidas de uma a outra extremidade dos arcos cartilagineos e fibras-elasticas, e fasci- culos de tecido amarello elastico longitudinaes. As primeiras têem na- turalmente por uso diminuir a capacidade circular do canal, e as se- gundas o de impedir o seu alongamento excessivo. A tracheia é forrada pela membrana mucosa das vias respirato- rias, muito fina, e por tal modo adherente á superficie interna da por- cão cartilaginea e fibrosa do canal, que admira muito que se diga ter acontecido metter a canula da tracheiotomia entre ella e o tecido fi- bro-cartilagineo. O calibre da tracheia é variavel nos dois sexos e nas differentes idades de cada um, mas é sempre determinado pelo calibre da carti- lagem cricoidea. O seu diametro antero-posterior é no homem, approximadamente, A TRACHEIOTOMIA 71 de 20 a 24 millimetros, e na mulher de 10 a 20; e o transversal de 16 a 20 no primeiro e de 8 a 16 na seguúda. Nas differentes idades é tambem diverso, e a elle se proporciona o volume das canulas para a tracheiotomia. Debaixo d'este ponto de vista seis typos de canulas satisfazem plenamente a todas as exigencias clinicas, a saber: para doentes até a idade de dois annos, de dois a cinco, de cinco a oito, de oito a doze annos, e em fim dois para o homem e mulher adultos. Antes da puberdade o diametro antero-posterior da glotte, que mede o da tracheia, tem 10 a 14 millimetros, e o transversal 6 a 10 milli- metros. Estes diametros são portanto metade menores do que no adulto. No cadaver do rapaz de quinze annos de que já fallei, para o dia- metro 'antero-posterior da tracheia, achei 14 millimetros, e 12 para o transversal. No da rapariga de onze annos medi para o primeiro 11, e para o segundo 10 millimetros. Na parte inferior, junto da sua bifurcação nos dois bronchios, a tracheia tem geralmente capacidade um pouco maior. Nos individuos que téem padecido por muito tempo, durante annos, bronchites chro- nicas com repetidas tosses, as vias aéreas em geral e em particular a tracheia são mais dilatadas do que normalmente. 9.º Por detraz da metade esquerda da tracheia, e ao lado corres- pondente d'esta, está o esophago, que desce adiante da columna ver- tebral ou antes dos musculos longo do collo e grande recto anterior na parte comprehendida entre o corpo da sexta vertebra cervical, e a primeira dorsal. O nervo recorrente do vago está, como já disse, no lado direito por detraz da tracheia, isto é, entre esta e a columna ver- tebral, e no lado esquerdo vai na goteira formada pela tracheia e.o esophago. E' por estas relações tão proximas do canal respiratorio e alimen- tar que se dá ás vezes a compressão do primeiro e a suffocação subse- quente por corpos estranhos demorados no segundo, o que tem moti- vado muitas vezes a tracheiotomia. Era quasi só este o motivo porque se fazia esta operação no nosso paiz até 1851. Aos lados da tracheia e esophago, e por detraz dos musculos ester- no-mastoideos, vêem-se os vasos lateraes do collo, a saber : pela parte de fóra e em plano um pouco anterior, a veia jugular interna, e por dentro a arteria carotida primitiva. Entre estes dois vasos e profunda- mente acha-se o nervo vago, e mais para fóra e para traz o grande sympathico do pescoço, que está immediatamente entre os musculos longo do collo e grande recto anterior da cabeça. 4 As arterias carotidas primitivas só inferiormente, detraz do ester- ita ESTUDOS SOBRE no, estão mais proximas do canal respiratorio. A carótida direita, logo depois de se separar do tronco innominado, cruza a tracheia para ir collocar-se ao seu lado direito, mas vai-se afastando d'ella para fóra, á proporção que sobe, de modo que a tres centimetros da furcula do esterno já está escondida por detraz do feixe esternal do musculo ester- no-cleido-mastoideo, e sem relações proximas com a tracheia. Portan- to, sómente operando a tracheiotomia muito proximo do esterno, é que se póde ferir a carotida primitiva direita. A carotida esquerda está, em toda a sua extensão, lateral á tracheia, inferiormente separada por al- guns millimetros de intervallo, e superiormente cada vez mais, do mes- mo modo que a do lado opposto. 10.º Uma camada de tecido cellular laminoso. : 11.º Face anterior da columna vertebral na parte correspondente ao corpo das duas ultimas vertebras cervicaes, e primeira dorsal com os musculos longos do collo e grandes rectos anteriores da cabeça. Duas laminas fibrosas, uma de cada lado, dividem em tres re- partições a região do collo que acabo de estudar: uma mediana para a tracheia e esophago, e duas lateraes para os vasos e nervos princi- paes do pescoço. A repartição mediana, na qual se pratica a tracheiotomia, é di- vidida em tres compartimentos pela disposição da aponevrose cervical: um anterior, outro médio, e um terceiro posterior. O primeiro compartimento tem por limite anterior a pelle, e pos- teriormente o folheto medio da aponevrose do collo. E” occupado pelo paniculo cellulo-gorduroso subcutaneo, fascia superficial, parte anterior dos musculos cutaneos, filetes nervosos do plexo cervical, as duas veias jugulares anteriores, e o primeiro folheto da aponevrose cervical. O segundo é limitado anteriormente pelo folheto médio, e poste- riormente pelo folheto profundo dá mesma aponevrose. Contém na sua capacidade, além de tecido cellular gorduroso, veias e vasos lympha- ticos, os musculos esterno-hyoideos e esterno-thyroideos, aos quaes a dita aponevrose concorre a formar bainhas especiaes. O terceiro é comprehendido entre o folheto profundo da referida aponevrose e a columna vertebral. Contém o plexo subthyroideo, a arteria thyroidea média, quando existe, a tracheia com o corpo thyroi- deo na sua parte superior, o esophago, e uma camada de tecido cel- lular laminoso. N A TRACHEIOTOMIA 73 Terminarei o que desejo dizer sobre a anatomia da região tra- cheial pelas variedades e anomalias das arterias correspondentes, sobre as quaes se deve estar prevenido na operação da tracheiotomia. As anomalias e variedades mais importantes referem-se á arteria innominada ou brachio-cephalica, ás arterias carotidas, á thyroidea mé- dia, ás thyroideas inferiores, e ás sub-clavias. A arteria innominada póde ser mais comprida ou mais curta do que o termo normal, que é de 4 a 5 centimetros; póde faltar ; exis- tir á esquerda, como á direita; e finalmente existir á esquerda faltan- do á direita. Dos observadores que a têem achado mais comprida, Allans Burns (observations on the surgical anatomy of the head and neck) cita um facto em que a arteria chegava até o corpo thyroideo. O sr. Dubrueil representa no atlas do seu livro sobre anomalias das arterias a estam- pa de um individuo em que a innominada tinha 7 centimetros de com- primento, e correspondia no collo a cinco ou seis anneis-da tracheia, por diante e ao lado direito da qual passava e se apoiava. Com simi- lhante anomalia, como se vê, é mui facil ferir a arteria na operação da tracheiotomia, e ter assim uma hemorrhagia mortal. Uma anomalia mui notavel da mesma arteria é a que foi observa- da tres vezes pelo sr. Velpeau, quatro vezes em um só inverno por Col- les (on surgical anatomy), e uma vez por Clément; é a seguinte: a innominada dirigia-se da direita para a esquerda, cruzava a parte an- terior da tracheia na parte inferior da região cervical, curvava-se de- pois da esquerda para a direita por detraz da tracheia, passando entre este orgão e o esophago, para vir de novo collocar-se ao lado direito da tracheia, mas mais profundamente do que no estado normal, e ter então a sua distribuição ordinaria. Esta mesma anomalia, com a dif- ferença da arteria ter a origem no lado esquerdo da crossa, foi tam- bem observada por Jobert, Robert e o mesmo professor Velpeau (Vel- peau— Anatomie chirurgicale, t. 1, pag. 608, 3.º edic.). Comprehende- - se todo o perigo, que com similhantes anomalias se póde correr na operação da tracheiotomia, em que seria facil ferir aquelle grosso tron- co arterial. As carotidas primitivas têem-se visto nascer ambas do baculo aor- tico por um tronco commum; ambas da crossa directa e separadamen- te; a esquerda da arteria inpnominada; e ainda faltarem as carotidas internas e externas tirando origem immediatamente do baculo da aorta. Quando as duas carotidas primitivas provém de um tronco com- mum, este está collocado por diante da tracheia inferiormente, e os MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. NI. P. 1. Lo 74 ESTUDOS SOBRE dois ramos primitivos estão em um plano mais anterior, são mais su- perficiaes, menos divergentes, quasi rectilineos, e abraçam a tracheia cada um do seu lado. Com esta anomalia, pois, a tracheiotomia não deixará de ser uma operação perigosa. No museu de anatomia da Escóla medico-cirurgica de Lisboa ha um exemplo da arteria carotida primitiva esquerda nascendo do tronco innominado (2.º Secção, n.º 53). Além d'este, tenho visto mais um ou dois casos similhantes. A carotida esquerda tirando assim origem da brachio-cephalica abaixo da sua divisão normal dirige-se para o lado esquerdo, cobre e cruza obliquamente a tracheia na sua parte ante- rior, e torna muito perigosa a tracheiotomia, durante a qual póde ser gravemente lesada. A arteria thyroidea media ou de Neubauer que, quando existe, nasce geralmente da crossa da aorta, provém também muitas vezes da arteria innominada, e outras vezes, aindaque mui Taras, de uma das carotidas primitivas ou da mammaria interna. Em todos estes casos sobe pela linha mediana por diante da tracheia, e por detraz do fo- lheto profundo da aponevrose cervical para se distribuir no corpo thy- roideo. Póde por conseguinte ser mui facilmente cortada na operação da tracheiotomia, o que é tanto mais grave, quanto é certo que póde attingir o calibre da arteria radial. A arteria thyroidea inferior muitas vezes nasce da carotida pri- mitiva, menos vezes por um tronco commum com a mammaria in- terna e a intercostal superior, ou da crossa aortica. N'esta ultima va- riedade constitue a arteria thyroidea de Neubauer, e sóbe pela parte anterior da tracheia, podendo conseguintemente ser ferida na tracheio- tomia. O seu volume em todo o caso está, em geral, na razão inversa do da thyroidea inferior quando esta arteria existe ao mesmo tempo, o que é mais raro. A thyroidea inferior esquerda, em logar de nascer da sub-clavia do mesmo lado, tira ás vezes origem da subclavia direita, passando as- sim obliquamente por diante da tracheia para chegar ao lobo thyroi- deo esquerdo, a que se destina. Esta anomalia expõe tambem á he- morrhagia na operação da tracheiotomia. A thyroidea inferior direita póde nascer da innominada, e consequentemente ficar mais proxima da tracheia, e ser assim tambem lesada na mesma operação. Algumas vezes tambem se tem visto as duas thyroideas inferio- res nascerem de um tronco commum, assim como se tem notado a falta de uma ou de ambas," e ainda se tem achado uma supranumera- ria dirigindo-se para o lado direito, mas não sendo a thyroidea mediana. A TRACHEIOTOMIA 75 Já se viu ainda uma anastomose do volume da radial estabele- cer a communicação entre as duas thyroideas inferiores, passando por diante da tracheia por fórma a ter sido cortada uma vez pelo sr. Ri- chet, praticando a tracheiotomia em uma rapariga com garrotilho. A arteria sub-clavia direita póde nascer directamente da crossa da aorta, em consequencia da ectopia ou ausencia da innominada, e caminhar entre a tracheia e o esophago, ou logo por diante da colu- mna vertebral para subir ao lado direito do collo. Póde ainda nascer da aorta thoracica ou de um tronco mediano commum ás duas carotidas primitivas. A sub-clavia esquerda tem-se visto faltar, e ser supprida por um ramo da arteria vertebral. 10 « ii al vp gos porta qn or o cnisndoias 6 datres io eder oba volto ati iionitirobal os midusa mesm lis “oem ape “eteecrertoss ópumi sediriab po coiarrodo. AM sr peer turbo pai quais mkv bro ondr 1 Moi mesada poesmipdtaio 1d eee em iiabiiA TREM 3 K a o ls Aero é Arviade ii Fa PRA vei. 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INSTRUMENTOS Os principaes instrumentos empregados n'esta operação são os seguintes : À 1.º Bisturis.— Dois bisturis são geralmente usados na operação que descrevo: um recto e pontagudo, e outro de botão. O primeiro serve para a incisão das partes molles, puncção da tracheia, e incisão dos dois primeiros anneis d'este canal. O segundo é destinado a dila- tar a abertura da tracheia na extensão sufficiente para a introducção da canula; póde ser recto ou curvo e só cortante na extremidade li- vre, na extensão de 2 centimetros, como o que mandei construir para a minha caixa de tracheiotomia. Por esta fórma, o instrumento cor- tando a tracheia fica inoffensivo para as partes exteriores a este orgão, nas quaes se póde contar a innominada quando suba muito acima, ou quando a incisão se prolongue muito abaixo. Alguns operadores não prescindem de mais um canivete convexo para a incisão da pelle, o que acho desnecessario, e. por isso nem o uso nem aconselho, por ter o inconveniente de augmentar sem preci- são o numero dos instrumentos, e de fazer mais demorada a pratica da operação, o que em certos casos póde ser mui frejudicial. Em ri- gor mesmo, só o canivete recto e pontagudo basta para incisar as par- tes molles e abrir sufficientemente a tracheia. Nos casos em que me 78 ESTUDOS SOBRE tem sido preciso acabar depressa a operação, por motivo de hemorrha- gia grave ou porque a morte esteja. imminente, tenho-me servido só- mente d'aquelle bisturi para resumir o mais possivel a duração do processo operatorio. Ultimamente, mesmo nos casos ordinarios, tenho dispensado o bisturi de botão, servindo-me só do canivete pontagudo. Alguns operadores não fazem o córte da tracheia com o bisturi como é geralmente usado. Entre varios instrumentos inventados para este effeito citarei o tracheiotomo do sr. Marc Sée, prosector da Fa- culdade de Medicina de Paris. Este instrumento foi apresentado á Aca- demia de Medicina em sessão de 20 de abril de 1858, tendo sido fa- bricado pelo sr. Mathieu. E" uma especie de lithotômo occulto, curvo na sua extremidade pontaguda, destinado a effectuar quasi em um só tempo a punção, a incisão e dilatação da tracheia. Póde vêr-se a sua descripção feita pelo auctor na Gazette hebdomadaire de 23 de abril de 1858, pag. 294. O distincto auctor do instrumento foi levado a invental-o, diz elle, pela idéa de evitar os inconvenientes graves que podem provir do intervallo que separa em todos os processos a inci- são tracheial da introducção do dilatador, o que me parece exagera- cão. 2.º Sonda de rego flexivel — para sobre ella serem incisadas as partes molles subcutaneas até a tracheia. 3.º Pinças de dissecção, e de pressão continua-— para auxiliar na divisão dos tecidos molles, e apprehender alguns vasos que porventura seja preciso laquear, torcer ou comprimir. 4.º Ganchos ou erinas rombos — para afastar as partes molles á pro- . porção que se vão dividindo, e patentear assim as partes subjacentes e a tracheia. Estes instrumentos, ultimamente usados e que tenho na minha caixa de tracheiotomia, são ganchos feitos de 7raillechort em la- mina da espessura de 1 millimetro, e do comprimento de 11 centime- tros, curvos em: ambas. as extremidades, mas em sentido contrario, tendo em uma a largura de 1 centimetro, e na outra a de 3 milli- metros. 5.º Dilatador.—Os fins do dilatador são: pôr aberta a ferida da tracheia, em quanto se assenta o doente logo depois de operado, para a expulsão do sangue, mucosidades e falsas membranas; e sobre tudo para facilitar a introducção da canula afastando os bordos da incisão tracheial. Ha varios dilatadores, alguns dos quaes são muito importan- tes para que se the releve descrevel-os. O dilatador do sr. Trousseau adoptado pelo sr. Guersant, é o mais usado, e de que me sirvo. E' o que têem usado os operadores no hópi- » A TRACHEIOTOMIA 79 tal des enfants malades. E' uma especie de pinça de curativo, cujos ramos, curvos para baixo adiante da articulação, terminam em bicos rombos, lanceolados, que se afastam, quando se aproximam os anneis do instrumento, por meio d'uma mola especial. Na maxima separação, isto é, quando os anneis dos ramos estão juntos, os bicos distam entre si 23 centimetros para caber bem a canula no seu intervallo. Com este instrumento, que se introduz fechado, se abre e dilata a ferida da tracheia para se introduzir n'ella a canula dupla. Uma modificação ao dilatador de Trousseau, com a denominação de pinça dilatadora de tres ramos, foi apresentada á Academia de Medicina de Paris em sessão de 11 de março de 1862 pelo sr. Bouvier, a qual fôra fabricada pelo sr, J. Charriêre com as indicações do sr. Laborde, “interno do hospital de creanças de Paris. Consiste no dilatador de Trous- seau com mais um terceiro ramo inferior em fórma de goteira. Quan- do o instrumento está fechado, o ramo inferior applica-se exactamente por sua goteira contra a face inferior dos ramos lateraes aproximados. Quando se abre pela pressão nos anneis, o ramo inferior abaixa-se ao mesmo tempo que os ramos lateraes se afastam, o que produz na tra- cheia, além da dilatação lateral ou transversal, uma dilatação sobre o angulo inferior da ferida, que facilita muito a introducção da canula, á qual o ramo inferior do instrumento serve de conductor. Usando-se d'este instrumento em logar do de Trousseau, evita-se seguramente metter a canula no tecido cellular exterior á tracheia, e diz-se haver tambem a vantagem de poder ser mais pequena a incisão praticada n'este orgão. O novo dilatador do sr. Laborde tem sido já empregado varias vezes no hospital des enfants malades de Paris, e tem-se sempre no- tado que facilita muito a introducção da canula. Tenho-o usado no ca- daver com igual vantagem. Deve, pois, ser preferido pelos operadores menos exercitados. Vem representado na Gazette hebdomadaire de 14 de março de 1862, pag. 171. O dilatador do sr. Garnier, de Mans, merece a preferencia no hospital de Sainte-Bugenie. Este instrumento foi fabricado pelos srs. Ro- bert e Collin, e por elles apresentado á Academia de Medicina de Pa- ris. E' uma pinça construida como as pinças de pressão continua, de ramos cruzados, elasticos, cujas extremidades curvas ficam em conta- » eto só pelo elasterio dos ramos, e se afastam pela mais pequena pres- são dos dedos acima do ponto de cruzamento. O dr. Dufour, antigo interno do hospital des enfants malades tinha já ha annos feito cons- truir ao sr. Charriêre um instrumento similhante. E” de facil empre- 80 ESTUDOS SOBRE go, mas não lhe acho na pratica motivos de preferencia ao do sr. Trous- seau. Com o mesmo fim de dilatar.a ferida tracheial para a introduc- ção da canula, e ao mesmo tempo de fixar a tracheia, inventou o sr. Langenbeck, de Berlin, um instrumento, que tem a denominação de tenaculo fixador e dilatador, o qual foi apresentado á Academia de Me- dicina de Paris na sessão de 19 de outubro de 1358 da parte do fa- bricante, o sr. Mathieu. Tenho este instrumento na minha caixa de tracheiotomia fabricada por este distincto cuteleiro, e já o empreguei. E' um tenaculo duplo ou de dois ramos, articulados por um eixo de parafuso, cada um dos quaes tem a fórma do tenaculo ordinario. Um d'estes ramos tem um cabo recto e de madeira; o outro, mais curto, é todo de aço, e está separado do primeiro por meio d'uma mola, car- ' regando sobre a qual se afastam as extremidades curvas do tenaculo. Quando o instrumento está fechado, estas duas extremidades estão se- paradas uma da outra 15 millimetro, e ainda o podem ser mais me- diante um parafuso collocado 1 centimetro adiante do eixo do instru- mento. Quando se quer abrir carrega-se na mola, e aquellas duas ex- tremidades separam-se suecessivamente mais até 17 millimetros. Usa- se cravando as extremidades pontagudas na parte superior da tracheia já descoberta. Incisa-se depois este canal de cima para baixo entre os ramos do instrumento, que dirigem assim o bisturi. Logo em seguida afastam-se os ramos do tenaculo carregando na mola, e pela abertura- losangica da tracheia, que assim se fórma, introduz-se a canula. O auctor attribue a este instrumento as seguintes vantagens: fi- xar a tracheia antes e depois de aberta, dirigir a incisão, e facilitar a entrada da canula. Como terei occasião de dizer n'outra parte d'esta Memoria, fixar a tracheia, que se dá como uma vantagem, é o maior inconveniente que póde ter o tenaculo de Langenbeck. Vem represen- tado a pag. 740 da Gazette hebdomadaire de 1858, e a pag. 26 do catalogo do sr. Mathieu, impresso em 1862. - Além destes ainda cito o dilatador pouco seguro do sr. Maslieu- rat-Lagemard, que é uma dupla erina dilatadora, ou mola assimilhan- do-se na forma ás ser res.fines de Vidal, destinada a dispensar a canu- la, o qual se póde vêr no Manual de operações do sr. Alph. Guerin (Eléments de Chirurgie opératoire) pag. 423; o do sr: Gendron, des- “exipto em 1835 no Journal des con. medic. abiairaa que é uma canu- “Ja de prata curva, formada de duas metades lateraes ou laminas quasi chatas e parallelas, susceptiveis de se afastarem mais ou menos pelo movimento de um parafuso transversal, contido em um cylindro que A TRACHEIOTOMIA 81 tem na parte anterior e superior da abertura externa, o qual as fixa em angulo recto, e que vem tambem representado a pag. 400 do t. 1, do Traité de médecine operatoire de Sedillot, 2.º edic.; o collar dilata- dor do dr. Garin, de Lyon, descripto em 1844 na Gazette médicale de París, o qual consta de dois ganchos que prendem aos dois bordos da abertura tracheial que assim se mantéem afastados sem corpo estranho mettido no canal. Pela mesma fórma propoz o sr. Bauchet dilatar a abertura da tracheia por meio de dois alfinetes curvos á maneira de gancho, implantado um de cada lado em cada um dos bordos da tra- cheia, e mantido por um cordão que vai atar atraz do pescoço com o do lado opposto. 6.º Canula. — Fabricio d' Aquapendente foi quem descreveu a pri- meira canula para a tracheiotomia, ha perto de trezentos annos, com as circumstancias que referia pag. 8. Juncker marcou-lhe depois o com- primento de 6 linhas. Garengeot adoptou o mesmo comprimento e in- dicou 2 3 linhas para o diametro junto do pavilhão, e 1 linha para o diametro da extremidade interna. Boyer, um seculo mais tarde, deu uma pollegada para o comprimento da canula, 24 linhas para o dia- metro da extremidade externa, e 1 ; linha para o da extremidade op- posta. ' Maunoir, de Genebra, citado por Valentin, foi o primeiro que mar- cou diametro sufficiente para a canula, dizendo que devia ser quasi tanto como o da tracheia, e além disso aconselhou que fosse curva. Bretonneau, depois das primeiras duas operações que praticou, cujo re- sultado foi desfavoravel, e pelas experiencias que fez em cavallos, re- conheceu que, para o melhor exito da operação, a canula devia ser Z curva para ficar parallela á tracheia depois de introduzida, e de um diametro proporcionado á capacidade do canal respiratorio para o en- cher, e deixar introduzir sufficiente quantidade de ar. Esta canula de Bretonneau, ainda simples, e que era pouco mais ou menos como a de Maunoir, fez uma verdadeira revolução na pratica da tracheioto- mia, e foi o motivo de se multiplicarem os casos felizes. Depois o mesmo medico, não sei por que aberração do bom ca- minho que havia seguido, passou a usar a canula recta em logar da curva para ter sómente aberta a ferida da tracheia sem penetrar na sua cavidade; mas ainda aqui, apesar de um passo para traz, adiantou outro, usando a canula dupla em vez de simples. Como já o disse n'ou- tra parte d'esta Memoria (pag. 12), a primeira idéa da canula dupla data de 1730, sendo então suggerida ao cirurgião inglez, o dr. Geor- ge Martin, por um de seus ajudantes, cujo nome não vi referido ( Phi- MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. WI. P. E. 1 82 ESTUDOS SOBRE losophical transactions, ete., Abridged, t. vir, pag. 438). Como tam- bem escrevi a pag. 13, Van-Switen em 1745, nos commentarios aos aphorismos de Boerhaave, fez a mesma recommendação de preferir a canula dupla, citando a auctoridade do mesmo dr. Martin. Bell tam- bem fez sobresair todas as vantagens da canula dupla (Cours de chi- rurgie, traduc. de Bosquillon, 1796, t. u, pag. 229). Bretonneau ap- plicou-a como disse, mas muito mais tarde, á canula recta, chegou mesmo a aconselhar e a usar a canula curva e dupla, mas, não sei porque, durante muito pouco tempo: Tinha este grande melhoramento caído de todo no esquecimento quando só em 1841 os srs. Trousseau e Borgelat o fizeram de novo ap- parecer applicado á canula curva com todas as suas vantagens. O sr. Guersant adoptou-o tambem logo depois, e desde então a canula dupla passou á prática geral. A canula dupla é incontestavelmente a que deve ser usada na tracheiotomia; é indispensavel para conservar desembaraçada a entra- da artificial do ar, que o muco mais ou menos espesso e as falsas mem- branas obstruem muitas vezes, ficando a canula externa para aquelle fim em quanto se tira a interna para se desentupir e limpar. A canula dupla dos srs. Trousseau e Borgelat é de prata, e curva, sendo a curvatura como a de um quarto de circulo que tenha $ cen- timetros de diametro. . A canula externa tem capacidade um pouco maior para lhe ca- ber á vontade a canula interna, e um pavilhão de 3 a 41 centimetros de largura, e 2 a 3 centimetros d'altura, ligeiramente curvo para se adaptar á face anterior do pescoço. Nas extremidades d'este pavilhão ha de cada lado uma abertura ou azelha, tambem metallica, em que se enfiam duas fitas, que, depois de collocado o instrumento na tracheia, o fixam na devida posição, atando-se na parte posterior ou lateral do collo. O pavilhão da canula externa tem ainda na parte superior e me- dia uma chaveta da altura de um centimetro, pouco mais ou menos, que se move muito facilmente em torno de um eixo, e que entra na chanfradura do pavilhão da canula interna para a fixar dentro da ca- nula exterior. A canula interna é modelada pela externa, d'onde deve sair e on- de deve entrar com toda a facilidade, sempre que seja preciso tiral-a para a limpar ou desobstruir e collocal-a de novo. Depois de introdu- zida na canula exterior, que lhe serve de bainha, deve excedel-a meio millimetro na sua extremidade inferior, para obviar melhor á possibi- lidade de se obstruir. O pavilhão é apenas constituido por um rebordo 4 A TRACHEIOTOMIA 33 metallico, que assenta sobre o pavilhão da canula externa, de 2 a 3 millimetros, excepto na parte superior, onde corresponde a uma chan- fradura que tem, na qual se medem 5 a 8 millimetros. Nas partes la- teraes d'este rebordo ha duas azelhas proeminentes, tambem metalli- cas, que servem de péga ao instrumento. Para fixar a canula interna dentro da externa, basta fazer descre- ver á chaveta da ultima um quarto ou um terço de circulo, depois de mettida na chanfradura ou abertura correspondente do pavilhão da ca- nula interna. Em uma e outra canula, a extremidade inferior ou tracheial é cortada perpendicularmente ao eixo do instrumento. A extensão do instrumento é moderada. Sendo muito comprido póde tocar no esporão bronchico ou roçar contra a parede anterior da tracheia, o que o torna intoleravel pela tosse incessante e doloro- sa que provoca. Conhece-se bem de que procede a tosse, n'este caso, porque o incommodo cessa tirando a canula um pouco para fóra, exas- perando-se de novo se novamente se introduz a certa profundidade. A canula muito curta tem, pela sua parte, pouca estabilidade na tracheia, e toca pela extremidade interna na parede posterior do canal respira- torio e irrita-o. O diametro da canula é variavel conforme a idade dos individuos nos quaes se emprega, porque nos diferentes periodos da vida varia a capacidade da tracheia. Em todo o caso, a canula deverá ter o maior diametro possivel, com tanto que entre com facilidade na tracheia e que a não distenda, porque o seu volume excessivo póde produzir a ulccração circular do orgão. A canula muito estreita tem tambem varios inconvenientes: não tem estabilidade na ferida e é por isso me- nos toleravel; a inspiração por ella é muito mais difficil, porque a columna do ar é pequena relativamente á capacidade normal da tra- cheia, e porque se quebra em parte contra a parede do tubo aéreo, por não lhe corresponder o centro da canula. Com razão se devem attribuir os primeiros revezes de Breton- neau ao pequeno calibre das canulas que a principio empregava na tracheiotomia. Segundo o sr. Trousseau, póde em geral suppór-se que a capaci- dade da canula é sufficiente para a boa respiração, quando o ruido de- terminado pela entrada .do ar em uma grande inspiração não é mais forte do que o produzido na larynge no estado normal. Segundo as suas observações podem reduzir-se a seis numeros as dimensões das ca- nulas, calculadas para as diversas idades, e para o homem e a mulher lt+ 84 ESTUDOS SOBRE adultos, como se vê na tabella seguinte, em que está marcado o dia- metro da abertura anterior e posterior da canula, assim como a ex- tensão da grande e pequena curvatura. ABERTURA ABERTURA GRANDE PEQUENA ANTERIOR POSTERIOR CURVATURA CURVATURA . Homem de estatura mediana ..... 07,015 07,012 0”",065 07,050 Mulher de estatura mediana. ..... 0,013 0,011 0 ,060 0,045 Creança de 8a 12 annos......... 0,012 0 ,009 0,055 0,040 pude SraiS Sp hs e meta 0,011 0 ,008 0 ,050 0,036 O DOER OE A PD PAD, RAN O 0 5010 0 ,007 0,045 0,035 » abaixode2» ......... 0 ,009 0 ,005 0,042 0,033 A canula dupla de Trousseau, geralmente usada desde 1841, e que acabo de descrever, apesar de haver prestado notaveis serviços á tra- cheiotomia, apresenta todavia certos inconvenientes ligados principal- mente á fórma da sua curva. Para que a canula interna possa entrar e sair facilmente dentro da canula externa, é com effeito indispensavel que os dois tubos te- nham ambos a curva de um arco de circulo regular; mas com esta fórma, a parte da canula que entra na tracheia, não póde ter paralle- lismo com este canal que é recto. Segue-se d'aqui que a pressão do instrumento sobre a superficie interna do canal respiratorio não póde ser uniforme; que pelo contrario a pressão será maior em certos pon- tos, isto é, na parede posterior da tracheia, na parte correspondente ao vertice da curva ou á parte mais convexa da canula, e na parede an- terior do mesmo orgão na parte correspondente á extremidade infe- rior do instrumento. Esta pressão deve ser e é, effectivamente, exage- rada, nos pontos marcados, pelos movimentos ascendentes e descenden- tes da tracheia, pelos diversos movimentos € inflexões da cabeça e pes- coço, e além d'isso deve estar na razão directa da curva que tiver a canula. O effeito d'esta pressão é a irritação e ulceração da tracheia, de cujas consequencias fallarei na parte d'esta Memoria destinada aos ac- cidentes da tracheiotomia. Para remediar aquelles inconvenientes tem-se proposto desde ha poucos annos algumas importantes modificações nas canulas, sendo as principaes as dos srs. Luer, Robert e Collin, e Charriêre. A modificação da canula fabricada ha quatro annos pelo sr. Luér, foi feita segundo as indicações do sr. Roger. O instrumento é de pra- ta, tem a curvatura das canulas ordinarias de Trousseau e Borgelat, quero dizer, a de um quarto de circulo de 8 centimetros de diame- A TRACHEIOTOMIA 85 tro. Na extremidade externa da canula tem uma lamina movel ou pa- vilhão com a extensão transversal de 45 millimetros sobre 24 de al- tura, ligeiramente curva para assentar na parte anterior do pescoço. N'esta parte do instrumento ha uma abertura mediana circular onde está mettida, e onde se move em todos os sentidos a canula dupla, e duas aberturas lateraes para as fitas que seguram a canula na devida po- sição. Logo por fóra da abertura mediana apresenta ainda dois peque- nos aros tambem de prata. A canula externa como pavilhão tem um pequeno rebordo de 2 a 3 millimetros, nas partes lateraes do qual, cor- respondendo ao seu diametro transversal, tem dois prolongamentos ou raios de 3 millimetros de comprimento sobre 1 de largura, os quaes jogam nos dois aros da chapa metallica exterior que limitam assim os diversos movimentos da canula. A extremidade intérna ou inferior das duas canulas é cortada obliquamente, ou em bico de clarinete, á custa da parte anterior da canula. Em tudo o mais o novo instrumento é como a canula dupla de Trousseau e Borgelat. Esta modificação per- mitte á canula acompanhar os movimentos da tracheia, tanto na ro- tação, como na flexão, extensão e movimentos lateraes da cabeça e pes- coço sem risco de grande attrito nas paredes do canal aereo. Esta modificação da canula é a mais importante que tem sido apresentada para prevenir a irritação e ulcerações na tracheia; e está Já adoptada ha quatro annos no hopital des enfants malades com as- signalada vantagem. Já a tenho empregado, e pude convencerme de que era. bem tolerada, e que póde seguir em certos limites os movimen- tos da tracheia, da cabeça e do pescoço, com quanto não faça desap- parecer inteiramente as pressões resultantes da curva da canula. Tem-se notado a este instrumento o defeito de sair com facili- dade da ferida tracheial, em consequencia do movimento ascencional “que descreve atravez da abertura da chapa. Mas este inconveniente está já prevenido no serviço do sr. Blache, n'aquelle mesmo hospital, em- pregando a canula ordinaria nas primeiras vinte e quatro horas de- pois da operação, e substituindo-a pela de Luér no segundo dia. “A canula fabricada pelos srs. Robert e Collin foi apresentada á Academia de Medicina de París em sessão de 4 de junho de 1861, e vem representada a pag. 371 da Gazette hebdomadaire de 1861. Se- gundo os inventores, estas novas canulas distinguem-se por uma gran- de mobilidade, que lhes permitte seguir os movimentos da tracheia, prevenindo assim as ulcerações d'este canal. Esta disposição depende de duas azelhas triangulares, moveis sobre o pavilhão ou chapa da canula externa, onde articulam de cada lado mediante pequenos an- 86 ESTUDOS SOBRE neis. O ponto de articulação d'estas azelhas está nas duas extremida- des de uma linha que' passe ao nivel da parede inferior ou anterior da canula interna. A estas duas azelhas moveis, e assim dispostas, é que são atadas as fitas que têem de manter as canulas na tracheia, e não a aberturas praticadas no pavilhão como nas outras canulas. Esta dis- posição da canula dos srs. Robert e Collin não permitte, como elles aliás suppoem, grande mobilidade ao instrumento para que acompanhe os movimentos da tracheia; porque não é de certo a resistencia das fi- tas presas em torno do collo que se oppõe a que a canula se mova com o canal aéreo, mas sim a chapa ou lamina do pavilhão, que apoia mais ou menos sobre as partes molles por um ou outro dos seus bordos, quando os movimentos do pescoço ou da tracheia tendem a mudar a posição da canula. (Bouvier, Rapport sur les canules et les dilatateurs pour la cracheotomie. 1862). O fim a que se propunham os srs. Robert e Collin com a sua ca- nula é portanto muito melhor obtido pela canula de pavilhão movel fabricada pelo sr. Luér. A nova canula dupla do sr. Charriêre é só curvilinea na parte su- perior, e recta na porção que entra na tracheia. Esta innovação foi apre- sentada pelo inventor na ultima exposição de Londres e á Academia de Medicina de París, e a respeito d'esta canula e de outras o sr. Bou- vier leu em 23 de setembro do anno passado o relatorio que já citei. Ella vem representada a pag. 11 do folheto ultimamente publicado pelo sr. Charriêre sob o titulo— Quelques rectifications à propos d'un jugement orté sur Vindustrie coutelicre chirurgicale à Vexposition universelle de Londres de 1862, que o auctor se dignou remetterme, assim como a pag. 49 do seu ultimo catalogo geral do mesmo anno. A canula com a curva assim modificada fica parallela ao canal respiratorio na parte n'elle introduzida; assenta por toda a exten- são de suas faces anterior e posterior na superficie interna da tracheia, sem que a sua extremidade inferior a comprima nem adiante, nem atraz; e portanto não causará tão facilmente ulcerações na superficie inter- na d'este canal, como acontecia com as canulas ordinarias. A canula interna, para poder suecessivamente percorrer as duas partes curva e recta da canula externa, é feita de duas porções des- iguaes, uma superior muito maior, e outra inferior de 12 millime- tros, articuladas em dois pontos oppostos, de modo que a parte mais curta possa ter movimentos em dois sentidos contrarios, em consequen- cia dos quaes póde seguir aquellas duas direcções do tubo exterior quan- do- se introduz n'elle. A TRACHEIOTOMIA 87 Segundo o sr. Bouvier, uma canula analoga a esta já antes tinha sido imaginada pelo sr. Morel-Lavallée. A nova canula do sr. Char- riêre faz indubitavelmente muito pequena pressão sobre a superficie interna da tracheia, em quanto este canal estiver immovel ou tiver apenas movimentos ascendentes e descendentes pouco extensos; mas quando estes forem exagerados, e sobre tudo nas inflexões da cabeça e do pescoço, a canula não os podendo acompanhar em consequencia da immobilidade do pavilhão, não poderá deixar de haver pressão e muito exagerada. Pensei por isso que a canula mais perfeita seria a que reu- nisse as duas modificações de Charriêre e de Luer. Debaixo deste ponto de vista mandei fabricar pelo nosso distincto cuteleiro, o sr. Polycar- po, uma canula de pavilhão movel como a do sr. Lugr, com o corpo curvo na parte superior, e recto inferiormente na parte que deve cor- responder á tracheia, como a do sr. Charriêre. Para que a porção articulada e movel da canula interna não possa de nenhum modo cair dentro da tracheia, adoptei a modificação que vi no modêlo que recebi da canula Charriêre, a qual consiste em a canula externa ter na parte inferior e interna dois pequenos cravos, tambem de prata, col- locados em dois pontos oppostos aos quaes vem corresponder duas pe- quenas chanfraduras do bordo inferior da peça movel da canula inter- que assim fica segura dentro da canula externa, quando mesmo inesperadamente se desarticulasse. Na descripção da canula do sr. Char- riêre, que vejo no proprio catalogo deste fabricante, acho indicado para este fim um rebordo igualmente metallico por dentro do bordo infe- rior da canula externa, que não diminue nada a capacidade do tubo interno. Já empreguei a nova modificação que fiz ás canulas do sr. Charriêre e de Luér, e acho-a preferivel. Além destas, que são as principaes e mais importantes, outras modificações de canulas tracheiaes têem sido apresentadas, principal- mente na ultima Exposição internacional de Londres. Estão n'este ca- so, além das de Charriere, as de Morel-Lavallée, e as de Whicker e Blaise feitas sob as indicações do sr. Fuller. Como podendo ter alguma vez applicação vantajosa, aindaque ex- cepcional, á tracheiotomia no garrotilho, citarei as canulas de Trows- “seau, como oculos de punho, cujo comprimento póde variar á. vontade, destinadas a servirem nos individuos magros e gordos, e para os ca- sos de inchação accidental das partes molles exteriores á tracheia; a canula de Richet com valvula, fabricada pelo sr. Charriere !; a canula + Vide pag. 58 do catalogo do sr, Charriêre de 1856, e pag. 48 do catalogo de 1862. 88 ESTUDOS SOBRE tracheial de valvula, fabricada pelo sr. Mathieu !; a canula do sr. Luer, fabricada a pedido dos srs. Trousseau e Demarquay, a qual permitte que os doentes fallem *; e a canula dilatadora do sr. Mathieu * destina- da ao tratamento dos apertos da tracheia. 7.º Pinça de anneis curva e de bicos longos, denominada pinça de Guersant, para a extracção de falsas membranas da tracheia. 8.º Lanadas de esponja, destinadas a limpar a canula do muco e falsas membranas, assim como para desembaraçar a tracheia d'estas mesmas materias, quando se opponham á respiração franca e facil. Estes instrumentos fazem-se com uma haste de barba de baléa,. do comprimento de 24 centimetros, flexivel, ligeiramente curva em uma das extremidades, que é terminada em capitulo, a cujo collo se fixa um pedaço de esponja por meio de um fio de linho. As lanadas podem ser tambem de crina, como usava Bretonneau (Traité de la diphtherite, pag. 324), para substituir as de esponja, quan- do o muco ou as falsas membranas estejam por tal modo adherentes, que se não possam extrahir por estes instrumentos. São construidas com pequenas porções de crina flexivel, seguras com intervallos regu- lares entre dois fios metallicos torcidos em espiral. 9.º Aspirador tracheial de Guersant, ou um tubo de gomma elas- tica com seu conductor, para a aspiração do sangue no caso de pene- tração d'este liquido nas vias aereas. Na sua falta poderá servir uma grossa algalia de gomma elastica. Além dos instrumentos mencionados deve haver um tenaculo; pinças de pressão contínua; uma tesoura; linhas enceradas para a la- queação que por ventura seja preciso fazer; uma rodella de esparadra- po adhesivo com uma abertura mediana, na juncção do terço superior com os dois terços inferiores, da capacidade e fórma exactamente cor- respondente á grossura da canula, para proteger a ferida do collo con- tra o attrito do pavilhão d'este instrumento, e para prevenir a infil- tração do ar no tecido cellular subcutaneo; duas fitas que se enfiem nas aberturas lateraes do pavilhão da canula externa para, depois de atadas na parte posterior ou lateral do pescoço, manterem o instru- ! Vid. pag. 24 do catalogo do sr. Mathieu, 1862. Tanto esta canula como a do sr. ' Richet, pela disposição especial de uma valvula, permittem a entrada do ar no peito pela abertura exterior, e não consentem a saída do ar expirado senão pela larynge. 2 Bulletin de V Academie Imperial de médecine, t. 27, pag. 6. 3 Catalogo do sr. Mathieu de 1862 pag. 25. Esta canula foi fabricada pelo sr. Ma- thieu para satisfazer ao pedido dos srs. Trousseau e Demarquay. E' formada de duas metades que se afastam mais ou menos por meio de um parafuso especial, collocado na sua parte superior e anterior. A TRACHEIOTOMIA 89 mento na devida posição. Estas fitas podem ser de gomma elastica co- mo propõe o sr. Chassaignac, pela vantagem de não embaraçarem a cir- culação. Em fim precisa-se tambem uma gravata de cassa ou gaza, com tres ou quatro dobras para involver o pescoço depois de colloca- da a canula, a fim de impedir a entrada do ar frio e de corpusculos estranhos directamente na tracheia. Alguns, mesmo muitos, d'aquelles instrumentos póde mui bem dispensal-os a habilidade do operador. Rigorosamente, um bisturi re- cto e pontagudo, e a canula, é que se póde dizer indispensaveis. O bis- turi divide as partes molles e a tracheia; os dedos d'um ajudante, gan- chos do cabello ou alfinetes grandes recurvados sobre si, substituem as etinas ou ganchos rombos, e o dedo indicador esquerdo do opera- dor póde servir de dilatador e conductor para a collocação da canula. Em um dos meus operados. que tive a fortuna de salvar (observação 17.9), a hemorrhagia do plexo sub-thyroideo era tanta, e tão instante a necessidade de abrir a tracheia e introduzir a canula para a fazer cessar, que, prescindindo do dilatador, me servi do segundo dedo da mão esquerda para conductor da canula. Só em caso muito excepcio- nal, e quando o operador possa contar bem com a sua destreza, pro- cederá por este modo. Ao mesmo sr. Trousseau, tão habituado na pra- tica da tracheiotomia, succedeu uma vez perder um doente que a ur- gencia do caso obrigou a operar sem dilatador, sendo a causa da mor- te a asphyxia pelo sangue que entrára na tracheia antes de mettida a canula. PROCESSOS OPERATORIOS Começarei por descrever, com a individuação que o objecto de- manda, o processo operatorio a que dou preferencia, que é o do sr. Trousseau com pequenas modificações. Depois tratarei menos detida- mente d'alguns outros modos de executar a operação. PROCESSO DE TROUSSEAU MODIFICADO N'esta operação tres ajudantes são precisos, pelo menos. A um, o primeiro e'o mais importante, collocado do lado opposto ao operador, isto é, do lado esquerdo do doente, compete ajudar a fazer a prega da pelle para a primeira incisão, quando se prefira começar assim a ope- ração, enxugar o sangue com esponjas, afastar os labios da ferida com as erinas ou ganchos rombos, comprimir os vasos que dão hemorrha- gia, auxiliar nas laqueações que por ventura seja indispensavel fazer, MEM. DA ACAD. — [.º CLASSE. — T. II. P. 1. 12 90 ESTUDOS SOBRE e ainda dar os instrumentos ao operador á medida que sejam preci- sos, quando não haja para este effeito outro ajudante disponivel. O se- gundo, situado detraz do doente, segura e fixa-lhe a cabeça sobre uma almofada mettida debaixo das espaduas e parte posterior do pescoço, por meio dos dedos de cada mão postos aos lados do maxillar inferior. O terceiro ajudante mantém o doente pelo tronco na mais perfeita im- mobilidade, segurando-lhe ao mesmo tempo os membros para impedir qualquer movimento inopportuno. Se a operação se faz de noite, é in- dispensavel mais uma pessoa para allumiar convenientemente a região onde se opéra, com uma ou duas velas, ou com rôlos de cêra que le- vam a vantagem de se poderem aproximar muito da ferida. Ninguem deverá imitar, em minha opinião, os srs. Smith e Snow que uma vez chloroformisaram o doente para o operar. A anesthesia, ou pelo menos o embotamento- da sensibilidade, proprio dos doentes de crup no periodo em que a operação deve ser feita, dispensa aquelle meio por inutil n'estas circumstancias, e a asphyxia incipiente, que já tem o enfermo, deve pela sua parte contraindicar-lhe a applicação. O doente, despido, e apenas coberto com um lençol ou cobertor, deve ser collocado horizontalmente em decubito dorsal sobre uma mesa estreita, ou um movel analogo apenas forrado por um lençol dobra- do, ou simplesmente com um cobertor. Esta mesa, quando se opéra de dia, deve estar defronte de uma janella, com o lado dos pés para esta, por fórma que a luz natural allumie bem a parte do collo onde tem de ser feita a operação, e que o operador veja bem todos os pon- tos da ferida que pratica, Assim se consegue evitar o ferimento dos vasos, e proseguir facilmente na execução do processo operatorio. Debaixo das espaduas e da parte posterior do pescoço deve col- locar-se um pequeno travesseiro ou almofada dura e rolica, sobre a qual a cabeça do doente é vigorosamente mantida em um plano infe- rior pelas duas mãos do ajudante collocado por detraz do operando, de modo que fique tensa e proeminente a parte anterior do collo, e com ella a tracheia. O operador, collocado á direita do doente, explora primeiro cui- dadosamente a região laryngo-tracheial para apreciar a profundidade provavel da tracheia, e conhecer da espessura e resistencia dos tecidos que a separam da pelle; para vêr durante a expiração a direcção e o estado de turgencia das veias subcutaneas, as quacs, quando muito des- envolvidas, indicam que as profundas o estão na razão inversa, sendo por tanto n'aquelle caso menos de receiar a hemorrhagia; e em fim para verificar, tateando a linha mediana do collo, a situação precisa da A TRACHEIOTOMIA . 9 cartilagem e tuberculo cricoideo, que deve ser o limite superior da in- cisão cutanea, não confundindo com ella o bordo inferior da thyroi- dea, o que teria o inconveniente de fazer começar a incisão mais abai- xo, e consequentemente mais proxima da arteria innominada. Depois, com a mão esquerda, pega na larynge, que segura e ele- va para fazer tensa a pelle na região tracheial; e com o bisturi recto na mão direita pratíca uma incisão vertical exactamente na linha mé- dia do collo, desde o tuberculo da cartilagem cricoidea até 1 centi- metro da furcula esternal. Tambem se póde fazer esta primeira incisão sem segurar a la- rynge, e fazendo préviamente uma prega transversal na região corres- pondente á tracheia, a qual é incisada DI in na Jinha mediana. Quem não contar fazer esta incisão bem direita, e precisamente na linha mediana, deve descrevel-a antes por meio de um risco de tin- ta, como aconselha o sr. Trousseau, sobre o qual fará correr depois o bisturi. Esta primeira incisão deve ser o mais extensa possivel dentro dos limites indicados, para facilitar as ulteriores manobras da opera- ção, e evitar o emphysema que frequentemente sobréevem quando a ferida externa é pequena; e deve comprehender a pelle e a fascia su- “perficial. Fica assim descoberto o intersticio ou linha branca cervi- cal, que está verticalmente interposto aos musculos esterno-hyoideos e esterno-thyroideos. Bem limpa do sangue a ferida, incisa-se esta li- nha branca com o bisturi recto e pontagudo sobre a sonda de rego, separam-se aquelles musculos com este mesmo instrumento, afastam- se por meio de tenaculos, erinas ou ganchos rombos, um confiado ao ajudante que desvia os do lado esquerdo, e outro' com que o mesmo ajudante ou o operador, servindo-se da mão esquerda, aparta os do lado direito. Algumas vezes não é apparente aquella linha aponevro- tica, ou antes cellulosa, entre os musculos, que se vêem então perfei- tamente unidos pelos bordos internos. Neste caso devem separar-se as fibras musculares na linha mediana. * Depois d'esta segunda incisão, sempre menos extensa do que a primeira, o dedo e a vista descobrem superiormente o isthmo do cor- po thyroideo, mais ou menos alto, e cobrindo um só ou dois dos pri- meiros anneis da tracheia, outras vezes muitos; logo abaixo o plexo venoso sub-thyroideo e a arteria de Neubauer ou thyroidea media, quando existe; inferiormente, na fosseta jugular ou innominada póde ás vezes vêr-se ou tocar-se a veia subclavia esquerda, assim como a ar- 12. 92 ESTUDOS SOBRE teria brachio-cephalica, que é preciso proteger com o dedo de um ajudante, ou com o indicador esquerdo do operador, para não serem feridas, o que, como bem se prevê, teria as mais graves e funestas consequencias. O plexo venoso, que está collocado adiante da tracheia, abaixo do isthmo do corpo thyroideo, é muitas vezes constituido por veias pa- rallelas e verticaes, que se devem separar cautelosamente com a son- da, e afastar da linha mediana com as erinas ou ganchos rombos para se não ferirem; mas nem sempre isto é possivel por haver ramos anas- tomosicos obliquos ou transversaes, que se não póde deixar de dividir para pôr patente a região anterior da tracheia, como tenho visto va- rias vezes. Em todo o caso é de preceito, que tenho por muito impor- tante, proceder mui lenta e cuidadosamente, para evitar, quanto ser pos- sa, qualquer ferimento, vascular, quer por anomalia arterial, quer por outra causa, desviando para os lados ou para baixo as partes que de- vem ser poupadas. Quando algum ramo arterial tenha sido dividido, deve laquear- se immediatamente, e antes de abrir a tracheia, na extremidade car- diaca sómente, se o ramo é delgado, e nas duas extremidades, se é de um certo calibre. E' o que pratiquei na doente da observação 1 0.º, na qual a arteria thyroidea inferior direita subia tão proxima da linha mediana, que, para mais segurança, laqueei este vaso em dois pontos proximos, e cortei-o no meio d'elles. O mesmo deverá fazer-se se a hemorrhagia depende de uma veia muito volumosa. Se a hemorrhagia provém do plexo sub-thyroideo, é em geral pouco importante, porque, restabelecida a respiração pela introducção da canula, a efusão de san- gue cessa promptamente. O preceito de operar muito lentamente dei- xa, pois, de o ser então, porque de ordinario na hemorrhagia venosa só o restabelecimento da respiração é efficaz. A introducção da canula na tracheia, além d'este effeito, que é de certo o principal, tem ainda outro auxiliar, que é o da compressão que o tubo metallico e as respe- ctivas fitas effectuam directa ou indirectamente sobre as veias feridas. Descoberta: a tracheia, deve pôr-se bem patente á vista e ao ta- cto na extensão de 3 ou 4 centimetros a partir do bordo inferior da cartilagem cricoidea. y Parada toda a hemorrhagia, quando é possivel, já pela pressão com os dedos, esponja, erinas rombas, pinças de pressão continua ou pela laqueação, conforme os casos, e bem limpa toda a ferida, .o operador leva a unha do indicador da mão esquerda á parte mais alta da feri- da, logo abaixo do isthmo thyroideo, ou o mais perto possivel da ear- A TRACHEIOTOMIA 93 tilagem cricoidea, a fim de fixar bem a tracheia e impedir que se des- vie lateralmente. Isto mesmo se póde conseguir por uma erina rom- ba, ou pelo dedo do ajudante collocado do lado opposto contra o qual o orgão seja fixado !. Em todo o caso, o bisturi recto e pontagudo em terceira posição deve ser guiado sobre a unha do indicador esquerdo do operador, e cravado perpendicularmente na parte media da parede anterior da tracheia, o mais perto possivel da cartilagem cricoidea. Quanto mais nos afastamos da larynge, mais consideravel é o ple- xo thyroideo, mais profunda está a tracheia, mais risco se corre em ferir algum vaso importante, e em fim mais facilmente se póde por engano metter a canula no tecido cellular exterior á tracheia; em quan- to que operando mais superiormente só póde dar-se o ferimento do isthmo thyroideo, que dá de ordinario menos sangue do que o plexo d'este nome. ' E" por estas razões que prefiro começar a incisão da tracheia o mais proximo da cartilagem cricoidea. Logo depois de cravado o canivete no canal respiratorio, dirige- se o cabo para cima, descrevendo com o instrumento um arco de cir- culo, e faz-se uma incisão de cima para baixo, a qual comprehenda desde logo quatro ou cinco anneis da tracheia, e que não seja inferior a centimetro e meio. ; Quasi todos os operadores, entre elles o sr. Trousseau, praticam ou aconselham fazer esta incisão da tracheia em dois tempos, sendo no primeiro uma muito pequena com o bisturi pontagudo, e no segundo a maior parte da incisão com um canivete de botão; mas eu não ado- pto esta pratica senão quando a primeira incisão não tenha podido ser sufficiente, porque demora mais a operação no momento em que ella deve ser o mais rapida possivel, e dispõe para o emphysema, sem ter vantagens que compensem estes inconvenientes. No momento da incisão inferior da tracheia uso tambem prote- ger a veia subclavia esquerda, e a arteria innominada, com o dedo in- dicador da mão esquerda, que ponho pela face palmar no angulo in- ferior da ferida, tendo a extremidade encostada á tracheia. Esta pra- ! Bauchot havia proposto, para o mesmo fim, um fixador da tracheia em fórma de crescente, que actuava abraçando a parte anterior d'este orgão; e Carmichael, em no- vembro de 1850, apresentou á Sociedade de Medicina de Dublin um instrumento de ef- feito analogo, mas muito complicado. O instrumento de Langenbeck, de que já fallei, é ao mesmo tempo fixador e dilatador da tracheia, e o tenaçulo cricoideo de Chassaignac serve tambem de fixar a tracheia, e de dirigir o bisturi na divisão d'este orgão e na dos tegumentos que se faz conjuntamente. Todos estes instrumentos, e outros analogos, es- tão hoje abandonados, ou empregados sómente pelos seus auctores.. 94 ESTUDOS SOBRE tica dá uma grande segurança ao processo, e obvia aos mais graves perigos da operação, e por isso a aconselho a todos como muito util. Não é tão seguro de certo, nem tão facil de satisfazer o aviso de apro- veitar o momento da inspiração, em que a tracheia sobe, para fazer a ineisão d'este orgão. Tambem não é tão conveniente, para o mesmo fim de evitar o ferimento d'aquelles vasos, cortar a tracheia de bai- xo para cima com o canivete em quarta posição. Só quando a incisão tenha sido comecada muito abaixo da cartilagem cricoidea, de modo a não haver inferiormente espaço sufficiente para toda ella, é que a continuação da incisão tracheial deve ser feita de beixo para cima, para fugir á arteria innominada e á veia subclavia esquerda. A penetração da tracheia, logo depois da puncção, é immediata- mente denunciada por um sibilo caracteristico, devido á saída de mu- co e gazes do interior das vias respiratorias. Aberta a tracheia na extensão precisa para a introducção da ca- nula, o operador tapa momentaneamente a abertura com o dedo indi- cador esquerdo, para evitar a entrada do sangue dentro das vias res- piratorias e a infiltração do ar no tecido cellular do collo, até que troca o bisturi pelo dilatador do sr. Trousseau, e guiando-o sobre a unha d'aquelle mesmo dedo o introduz profundamente no interior da tracheia, fechado e com a concavidade para o esterno. Logo em segui- da abre o dilatador aproximando-lhe os anneis moderadamente; e n'este mesmo tempo o ajudante que segura a cabeca do doente deve levan- tal-a um pouco para facilitar a separação dos bordos da ferida tracheial, e ainda para a saída do muco, sangue, pus ou fragmentos pseudo- membranosos, que obstruam mais ou menos os canaes respiratorios, e que n'esta occasião são expellidos com a tosse. Dilatada assim a ferida da tracheia, o ar entra com facilidade nas vias respiratorias, a respiração faz-se logo melhor, e a hemorrha- gia venosa de ordinario cessa. Se ha falsas membranas visiveis, que não saem espontaneamente, extráem-se com a pinça de Guersant ou com a pinça ordinariá, conforme a sua posição. Logo em seguida introduz- se na tracheia entre os ramos do dilatador a canula dupla, de capaci- dade proporcionada á idade e ao sexo do doente, e com a concavidade para baixo e para diante. A canula, como já disse, deve ir guarnecida de uma rodella de adhesivo para impedir o attrito immediato do pavi- lhão do instrumento sobre a parte ferida, e ainda para se oppôr ao em- physema do tecido cellular subcutaneo do collo, que podia aliás succe- der. Deve tambem penetrar 1 a 2 centimetros pelo menos abaixo do angulo inferior da abertura da tracheia, para que os esforços da tosse A TRACHEIOTOMIA 95 não a desloquem e a façam entrar no tecido cellular da parte anterior da tracheia, como já tem acontecido, morrendo o doente asphyxiado se se lhe não acode a tempo de restabelecer a boa posição da canula. O sr. Trousseau teve occasião de observar varios d'estes casos quando os tecidos ambientes incham muito, e quando depois de terem intu- mecido baixam de volume com certa promptidão. Para obviar a este inconveniente, o professor de clinica medica da Escóla de París pro- pôz o emprego d'uma canula construida pelo mechanismo do monoculo de theatro. Esta canula, que veiu representada a pag. 7 dot. m do Journal des connaissances medico-chirurgicales de setembro de 1834, alonga-se á vontade, puxando para fóra a extremidade exterior que corresponde ao tubo interno do instrumento. Se a canula está devidamente mettida na tracheia, o ar entra e sáe facilmente pela sua cavidade, e por ella se faz a expectoração das mucosidades espumosas e dos fragmentos membranosos, que por ven- tura haja nas vias respiratorias. “Quando a abertura da tracheia é pequena, ou não está sufficien- temente dilatada, tem acontecido, não entre nós, que me conste, met- ter a canula no tecido cellular que está por diante da tracheia em lo- gar de a introduzir n'este canal. N'este caso o erro é muito facil de perceber, porque a respiração não se restabelece, nem se vêem sair pela canula as mucosidades espumosas das vias aéreas, nem a mão, col- locada adiante da abertura externa da canula, sente a saída do ar ex- pirado. Para remediar o caso dilata-se a abertura da tracheia com um bisturi de botão que prolongue-uma das extremidades da incisão, sen- do preferivel a superior. Quando a dilatação não possa deixar de fa- zer-se no angulo inferior da ferida, deve lembrar sempre a precaução que apontei de proteger as partes exteriores á tracheia com o dedo indicador esquerdo. ) Devidamente introduzida a canula, tira-se o dilatador, senta-se o doente, e segura-se a canula externa na sua posicão por meio de duas fitas que prendem nas aberturas ou azelhas lateraes do respectivo pa- vilhão, e que se atam na parte posterior do collo, ou melhor a um dos lados deste, de modo que fiquem devidamente seguras, mas sem em- baraçarem a circulação venosa do pescoço. Se a respiração se não tem restabelecido, se parece ainda baver sangue, muco, ou falsas membranas na tracheia que não fossem ex- pellidos pela tosse atravez da canula, é muito vantajoso metter por esta uma lanada de esponja humedecida em agua morna, e com ella limpar a superficie interna da tracheia na profundidade de alguns e 96 ESTUDOS SOBRE mesmo muitos centimetros, dando-lhe movimentos descendentes e as- cendentes combinados com a rotação, mais ou menos repetidos, mas mui rapidos, de modo a não gastar n'esta parte do processo mais de dois ou tres segundos. Por este meio além de tirar alguns dos conten- tos da tracheia, consegue-se excitar accessos de tosse forte. que são ge- ralmente seguidos de expectoração ou saída das materias que estavam contidas nos canaes respiratorios, as quaes a lanada não pôde trazer, e que impediam a boa respiração. Quando parece haver seccura na tra- cheia, injecta-se préviamente a estas manobras meia colher das de chá d'agua morna, que humedece os contentos e lhes-facilita-a saída. As manobras da lanada podem repetir-se duas ou tres vezes e mais em cada sessão, lavando-a e limpando-a todas as vezes que se tira para a introduzir de novo pelo mesmo espaco de dois ou tres segundos. Se a lanada de esponja não remove o obstaculo á respiração, por ser a falsa membrana muito adherente, poderia substituir-se aquelle instrumento, aindaque muito excepcionalmente, pela lanada de crina ou escovinha de Bretonneau. à Se apesar d'estes meios a respiração fica ruidosa e difficil, deve ter-se quasi como certo prognostico desfavoravel, porque o embaraço “á respiração-se estende abaixo da abertura artificialmente feita para a entrada do ar, e é muito provavelmente impossivel removel-o. Alguns collegas em casos semelhantes de embaraço na respiração têem levado a dedicação a ponto de applicarem os labios á ferida da operação, ou á abertura da canula, para sorver o sangue, o muco e os detritos mem- branosos que obstruiam os canaes da respiração. Sendo contagiosa, co- mo creio que é, a doença, apesar de louvar muito o procedimento, não ouso aconselhal-o nem seguil-o, tanto mais que alguns medicos têem sido victimas d'esta dedicação; e porque em casos d'aquelles uso, com o desejado resultado, da aspiração por meio de um aspirador ou de uma algalia de gomma elastica das mais grossas introduzida na tracheia, conforme a pratica e o conselho de Roux, Guersant e outros. Terminada assim a operação, e restabelecida o melhor possivel a funcção respiratoria, cobre-se a abertura da canula com uma gravata de cassa ou gaza com muitas dobras, que se põe frouxamente á roda do pescoço. E" importantissimo o uso d'esta parte do curativo dos ope- rados, que já era recon;mendado pelos antigos, cujas indicações Garen- geot conheceu perfeitamente, e que tambem se lêem em Van-Swieten (loco citato, pag. 689). + A grande vantagem d'esta pratica, que Bretonneau tambem não adoptou a principio, é impedir a entrada do ar frio nas vias respira- A TRACHEIOTOMIA 97 torias, a que se seguiam muitas bronchites ramusculares e pneumo- nias a que succumbia grande numero de operados antes de o sr. Trous- seau e Guersant a adoptarem e fazerem generalisar. Além d'aguellas consequencias da entrada do ar frio nos orgãos da respiração, acontecia ainda seccar-se o muco e formarem-se na su- perficie da tracheia e na canula crostas duras, que ao despegar-se eram causa de accessos de suflocação muito incommodos e mesmo pe- rigosos. O ar coado atravez do estofo de que é constituida a gravata aquece e humedece-se no vapor aquoso que a expiração lhe traz, co- mo acontece na sua passagem atravez da cavidade da bocca e das fos- sas nasdes na respiração natural, e assim se previnem aquelles maus effeitos. Tal é a descripção de todo o processo operatorio como eu o pra- tico, e que se divide em quatro tempos, que resumo do seguinte modo : 1.º Tempo. — Incisão da pelle e da fascia superficial na linha me- diana do collo, desde o tuberculo anterior da cartilagem cricoidea até um centimetro acima do esterno. 2.º Tempo. —Incisão da linha branca cervical ou dos folhetos da aponevrose cervical, entre os musculos esterno-hyoideos e ésterno-thy- roideos, com bisturi recto e pontagudo dirigido pela sonda de rego; se- paração dos musculos e veias do plexo sub-thyroideo, para cada um dos lados a que correspondem, por meio de erinas ou ganchos rombos. 3.º Tempo. — Puncção na parte mais alta da linha mediana da tra- cheia, e incisão vertical de centimetro e meio para baixo, comprehen- dendo quatro ou cinco anneis cartilaginosos. 4.º Tempo. — Introducção do dilatador de Trousseau na ferida da tracheia, dilatação immediata d'esta ferida, introducção da canula dupla e articulada provida de uma rodella de adhesivo; fixação d'este instru- mento por duas fitas atadas á parte posterior ou a um dos lados do pescoço; collocação da gravata de gaza á roda do collo cobrindo a aber- tura da canula. Varios outros processos têem sido aconselhados e usados para fa- zer a tracheiotomia. Não fallarei de todos, por me parecer que avolu- maria esta Memoria sem a utilidade pratica que desejo dar-lhe. Mas não deixarei de descrever os dos srs. Chassaignac e Maisonneuve, e de fazer a sua apreciação, pela importancia dos auctores, pela facilidade appa- rente dos processos, e pelos graves inconvenientes que póde ter a sua generalisação. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. HI. P. L. 13 98 ESTUDOS SOBRE PROCESSO DE CHASSAIGNAG O auctor emprega no seu processo operatorio cinco instrumentos especiaes: um tenaculo, um escalpello, um dilatador, uma canula, e um aspirador tracheial. O tenaculo, denominado tenaculo cricoide, tem um rego no lado convexo, e usa-se cravando-o na tracheia, logo por baixo da cartilagem cricoidea, atravez das partes molles. O escalpello é pontagudo e, conduzido sobre o rego do tenaculo, serve para cortar simultaneamente a pelle com as partes molles e a tracheia. O dilatador é como uma pinça de anneis, cujos bicos, curvos em angulo recto com os ramos, são articulados entre si nas extremidades. Quando se afastam os anneis dos ramos, o mesmo succede ás extremi- dades terminadas em angulo recto e articuladas, que abrem assim ca- minho para a passagem da canula que se deve introduzir na tracheia. Usa-se mettendo fechada na abertura da tracheia a parte curva do ins- trumento, por fórma que fique applicada contra a parede anterior do canal e acima da incisão. Abrindo-o pela separação dos anneis, os dois pequenos ramos terminaes afastam-se, os labios da ferida tracheial se- param-se, e constitue-se assim um espaço pelo qual é introduzida a canula. A canula é dupla e bastante ampla, tem na convexidade do tubo externo uma abertura oval que fica levantada quando se introduz a ca- nula interna. Tem, segundo o auctor, a vantagem de dispensar as fitas circulares ao pescoço para segurar a canula, porque a valvula impede que o instrumento sáia em quanto está mettido o tnbo interno; e tem tam- bem a conveniencia de, quando se tira a canula interna e se tapa a abertura exterior, servir para conhecer quando o ar passa atravez da larynge e torna dispensavel a canula. O aspirador tracheial é destinado a desobstruir, quando é preciso, as vias aéreas pela aspiração da tracheia. Todos estes instrumentos vem representados a pag. 12,17 e 21 das Leçons sur la tracheotomie, 1855; e de pag. 572 a 577 do t. m, do Traité des opérations chirurgicales, 1862, do mesmo auctor. No modo de operar a tracheiotomia, segundo o sr. Chassaignac, a tracheia e os tegumentos são incisados de uma vez e em um só tem- po. Para este fim, collocado o doente na posição horisontal como no processo ordinario, o operador fixa com a unha do indicador da mão A TRACHEIOTOMIA 99 esquerda a proeminencia formada pelo tuberculo anterior da cartila- gem cricoidea. Então, com a mão direita, crava o tenaculo cricoide perpendicularmente á tracheia, logo abaixo d'aquella cartilagem e pre- cisamente na linha mediana, cio lorde a pelle e telálas subja- centes até a tracheia inclusivamente. Para melhor e mais efficaz pene- tração do tenaculo, póde fazer-se antes uma pequena incisão cutanea no logar onde deve ser introduzido. Logo depois de introduzido o tena- culo na cavidade tracheial, faz descrever ao instrumento um arco de circulo, de modo a ficar o bordo inferior da cartilagem cricoidea na curva do tenaculo, e este em direcção longitudinal. N'este tempo o cabo do tenaculo é confiado á mão esquerda, e levado fortemente para cima. Assim fixada a cartilagem cricoidea, está completo o primeiro tempo da operação. O segundo tempo do processo consiste na incisão dos tegumentos e da tracheia simultaneamente, o que se faz por meio do bisturi agu- do, que se introduz no canal aéreo, guiando-o sobre o rego que apre-' senta o tenaculo na sua convexidade, e dividindo com elle longitudi- nalmente de cima para baixo, e de uma vez, os quatro Ena an- neis cartilagineos da tracheia. No terceiro tempo dilata-se a ferida, substituindo o bisturi pelo dilatador que se dirige fechado sobre o rego do tenaculo até penetrar na cavidade da ineo Chegando alli, o instrumento passa da posi- ção horizontal, em que foi od ei para a longitudinal, por effeito de um movimento de arco de circulo, que lhe dá o operador, como an- tes havia feito com o tenaculo. Assim collocado o dilatador em substi- tuicão ao tenaculo na parte superior da ferida, abre-se para a dilatar, e passa-se para a mão esquerda, ou se confia a um ajudante. No ultimo tempo, com a mão direita, introduz-se a canula pela abertura da ferida por baixo do dilatador. Dão-se como principaes vantagens d'este processo, o executar-se depressa, tornar parallela a ferida da tracheia e a dos tegumentos, e ter pequena extensão a ferida da pelle, seguindo-se-lhe portanto uma cicatriz pouco apparente e quasi sem dlefiica Mas, estas vantagens, al- gumas das quaes são exageradas e menos exactas, não compensam nada os gravissimos inconvenientes que póde ter este processo operatorio, como se vai vêr. Este processo expeditivo de operar a tracherotomia não é novo. Já Sanctorius, como disse a pag. 7, o tinha praticado em 1586, atra- vessantlo de uma só vez os tegumentos e a tracheia com um trocate que vem representado na these de mr. Lenoir (De la bronchotomie, 1841), 13» 100 ESTUDOS SOBRE | e na Medicina operatoria de Sedillot (t. m, 2.º edic., pag. 396). Heis- - ter (D. Laurentii Heisteri institutiones chirurgicae, Amstelodami, 1750, t. 11, pag. 676 e 677) aconselhava o mesmo modo expeditivo de operar, atravessando a pelle, musculos e tracheia com um trocate recto, cuja canula ficava logo na tracheia quando retirava o punção do instrumento que representa na tab. xxr, fig. 15 e 16, e que muito se parece com o. usado por Sanctorius. Depois de Heister, Decker, Bauchot, EbEani Dubourg, Richter, e outros seguiram pouco mais ou menos o mesmo methodo, e in- ventaram bronchotomos especiaes para o praticarem. Mas já Van-Swie- ten em 1745 (Commentarii in Hermani Boerhaavi aphorismos, Lugdu- ni, 1745, t. 11, p. 688) reprovava o processo expeditivo de Heister, porque nas operações que praticára no cadaver e nos animaes vivos o achou mui perigoso e difficil, e dava por isso preferencia ao methodo mais moroso. « Tentavi, escreveu elle, aliguoties in cadavere et in vi- vis animalibus hanc methodum, sed videbatur mihi admodum difficilis et non carere periculo, ne quandoque valida vi adactum instrumentum de- viaret. Unde crederem priorem methodum, licet magis operosam, praefe- rendam esse.» A. Berard, nos primeiros tempos da sua pratica, empregou um processo muito parecido com o de Chassaignac. Elle fixava a tracheia entre o dedo indicador e o medio, cravava o bisturi ao nivel da car- tilagem cricoidéa até ouvir o sibilo particular que indica a saída do ar das vias respiratorias; estendia então a incisão para baixo, até abrir tres ou quatro anneis, introduzia depois rapidamente o dilatador, e lo- go em seguida a canula. Mas tambem A. Berard modificou depois a sua opinião no objecto, porque d'uma vez feriu o esophago, e d'outra perdeu o doente por uma hemorrhagia immediata, de modo que no fim da sua vida seguia o processo ordinario por ser o mais seguro. O sr. Paul Guersant, que empregou tambem por algum tempo o methodo expeditivo, abandonou-o ha muitos annos para evitar os perigos que lhe são inherentes, e passou a operar lentamente. Tambem não tem novidade immobilisar a tracheia antes de a in- cisar. Bauchot, Michaelis, Sanson e outros, já tinham imaginado ins- trumentos para obstar á mobilidade da tracheia durante a operação. Muitos inconvenientes tem com effeito o processo do sr. Chassai- gnac. Em primeiro logar, como o notou o sr. Lenoir em 1841 na sua these (De la bronchotomie), e o dr. Millard em 1858 (De la trachéoto- mie dans le cas de croup), fixar a larynge d'um doente cuja respiração está muito compromettida, que é o mesmo que dizer, embaraçar tem- A TRACHEIOTOMIA 101 porariamente os movimentos ligados á funcção da hematose, deve ser summamente perigoso pelo risco imminente de asphyxia e de morte. A tracheia e com ella a larynge sobe durante a expiração, e des- ce em cada inspiração, levada pelos bronchios, que são obrigados a alar- gar-se para acompanhar os pulmões na sua dilatação. Se se immobili- sar a tracheia, os bronchios não podem prestar-se á expansão pulmo- nar; e portanto, fixando aquelle orgão, junta-se uma nova e mui nota- vel causa de asphyxia á que era já determinada pelo crup. Sendo, pois, os movimentos da tracheia actos necessarios á funcção da respiração, e portanto á manutenção da vida, a sua suspensão mesmo momenta- nea é irracional por antiphysiologica, e consequentemente perigosa, como não podia deixar de ser, e como está provado que o é por nu- merosos factos. Ao sr. Millard (loc. cit.) e a outros no hospital de Santo Anto- nio, de París, e no de creanças da mesma cidade, aconteceu com ef- feito determinar a asphyxia mortal ou quasi mortal na occasião de cravar o tenaculo e fixar a tracheia, de modo que se viram obrigados a tirar promptamente o tenaculo, e, depois de restabelecida a respira- ção, operarem pelo methodo ordinario. Por este motivo, os internos do hospital des enfants malades, que a principio empregaram o pro- cesso de Chassaignac, tiveram de o abandonar. Em segundo logar, cortar ás cegas todas as partes molles da re- gião anterior e media do collo, onde ha ás vezes notaveis anomalias vasculares, onde póde estar a arteria thyroidea media, onde está quasi sempre mui turgido e mui dilatado o plexo subthyroideo, expõe a he- morrhagias perigosas, quando não fataes. Demais, nem sempre é facil punçar a tracheia atravez da pelle com o tenaculo cricoide, sobre tudo em creanças, e mesmo em adultos de pescoco gordo, ainda mesmo que se faça uma pequena abertura no te- gumento. Pela mesma razão não se póde ás vezes apreciar toda a es- pessura das partes molles que separam a tracheia dos tegumentos, e corre-se o risco de ferir a parte posterior da tracheia e o esophago, como aconteceu uma vez a A. Berard. Além d'isso, quando se crava o tenaculo por baixo da cartilagem cricoidea, póde a tracheia ser desviada da sua posição natural, e não ser dividida na linhã mediana, o que aggrava ainda os inconvenien- tes. Demais, como 'mui judiciosamente diz o sr. Trousseau, se houver uma falsa membrana forrando a tracheia, o operador não a poderá vêr bem no meio do sangue, nem tiral-a, atravez de uma ferida profun- da e estreita. 102 ESTUDOS SOBRE Não terminarei a lista dos inconvenientes que desabonam o pro- cesso do ilustrado cirurgião do hospital Lariboissiere, sem dizer que expõe mais ao emphysema do tecido cellular do collo do que o pro- cesso ordinario, pela infiltração do ar pelo rego do tenaculo; como foi notado pelo dr. Triquet, no momento de punçar a tracheia, e de- pois da incisão d'este orgão, em consequencia da estreiteza da ferida da pelle, da difficuldade da introducção da canula, e principalmente da falta de parallelismo que póde haver depois da operação entre a fe- rida da tracheia e a das partes molles. Emfim, o processo do sr. Chassaignac expõe mais do que o me- thodo ordinario.ao córte do corpo thyroideo, que é melhor evitar. PROCESSO DE MAISONNEUVE Por uma parte dos motivos que me levaram a descrever o pro- cesso precedente, darei tambem noticia do do sr. Maisonneuve, que foi communicado á Academia das Sciencias de París, na sessão de 4 de novembro de 1861. O auctor, para executar o seu processo, serve-se do tracheiotono simples, do tracheiotomo de cabo fixo, ou do tracheiotomo dilatador. - O primeiro é uma simples agulha curva, cortante na ponta e no bordo concavo, e munida de um regulador, que limita a profundida- de a que póde ser levado o instrumento. Um porta-agulha serve de fixar esta especie de tracheiotomo para se poder operar com elle. O segundo consiste na mesma agulha pontaguda e cortante, se- gura perpendicularmente a um cabo fixo, como a agulha de Deschamps. O terceiro tem de mais que o precedente um mechanismo mui simples, que mantém dilatada a tracheia logo que a incisão d'este ca- nal é terminada. Podem vêr-se as respectivas estampas na Gazette hebdomadaire de 18 d'outubro de 1861, pag. 674, e nos ultimos catalagos dos srs. Charriêre e Mathieu. O sr. Maisonneuve opéra ao mesmo tempo na tracheia e nos te- gumentos, n'esta parte como o sr. Chassaignac, mas não fixa prévia- mente o orgão como este pratico. O logar mais conveniente para a operação é, segundo aquelle ci- rurgião, o espaço crico-thyroideo, ao qual o auctor attribue as seguin- tes vantagens: 1.º Ser um dos pontos mais superficiaes do tubo la- ryngo-bronchial, e por isso mais facil de reconhecer, tanto nas crean- ças como no adulto; 2.º Apresentar uma superficie plana e ligeira- A TRACHEIOTOMIA 103 mente depressivel, onde no momento da puncção o instrumento não corre o risco de resvalar lateralmente; 3.º Ser exclusivamente com- posto de partes molles, pouco espessas, e consequentemente faceis de perfurar; 4.º Emfim, corresponder posteriormente á parte mais larga do tubo laryngo-tracheial, a unica em que as dimensões são fixas pela presença de um annel completo, e onde o esophago é protegido por uma especie de broquel cartilagineo, constituido pela parte mais alta da cartilagem cricoidea. Para executar o processo, collocado o doente em decubito dorsal com a cabeça moderadamente revirada para traz, o operador com o dedo indicador da mão esquerda procura o espaço comprehendido en- tre as cartilagens thyroidea e cricoidea, e com o tracheiotomo na mão direita applica-lhe a ponta ao meio do intervallo crico-thyroideo, e crava-o brandamente em direcção perpendicular até o ponto em que o regulâdor impede que o instrumento entre mais profundamente. E” denunciado o complemento deste primeiro tempo do proces- so, em que o tracheiotomo entra no tubo respiratorio, pela sensação muito evidente de uma resistencia vencida. Em um segundo tempo dirige a ponta da agulha para o esterno, e a introduz brandamente na tracheia, até a agulha estar toda escon- dida nas carnes. Durante toda esta manobra, o regulador deve estar sempre em contacto com a pelle. Chegada á devida profundidade, faz sair a agulha de dentro para fóra atravez da tracheia e tegumentos, e incisa de baixo para cima todas as partes molles comprehendidas. Esta incisão é limitada na parte correspondente á cartilagem cricoidea, por- que a base da agulha do tracheiotomo não é cortante. Para que a incisão seja perfeita, desviam-se os tegumentos da parte anterior do collo para cima no momento em que o tracheiotomo faz a puncção detraz para diante; e, ao contrario, puxam-se de cima para “baixo no momento da incisão, para a facilitar. Por este modo a feri- da dos tegumentos desce mais abaixo do que a da tracheia, e o san- gue tem por isso, segundo o auctor, menos tendencia a entrar nas vias respiratorias. Feita a incisão, em um terceiro tempo introduz ó dilatador com a mão esquerda, tira o tracheiotomo e substitue-o pela canula, que mette com a mão direita. Acho n'este modo de operar, aliás engenhoso, todos os inconve- nientes do processo expeditivo do sr. Chassaignac, com excepção dos que prendem com a fixação da tracheia, e por isso não o considero co- imo devendo adoptar-se na pratica geral. saem ceslfolir” votre da malinagesin oscilando spa isabia o pm almas sotolgnos borpena o cera ci biutitasas qaonignfisa go toripo ul ob sigla ii e OR O o rot «Rabiovera cimo tido dei mago esadbay o dEJuagrs ereq ao apra cistina dt “om em onieiafoiro O mos abiastuy E) en Pasgaliago à es o á “osbiosquli-oairs oleo: soleuoisi, pi nerada e e bessçço o Ri 91 e sup nr3 olnoq o“bJb noleroi beer ofgaonib, 9 osuocrisbenmd à adecneabordang Caine tiro ojos ani soma aliaar simornguo big! oaiginiag o rea be potusenatgetos o ci bracos uiipua ana ek aiMino) ani êsri ud ahh ue matei otneihaisdiois sm seit sa apstipecado 96] onbioone eisisniasr se çab oraabivs otra tassocruda fublirgo sbre mirra, 6 erginilr empuas sbaugaamo, suonko abas veses blogo so sol portos meios mivci o arado se “etapa olbalugnno! amipirms sao) dbos tando vesnanp est sobelaidutulosa abirad do obg inabhaapçi maos ioatetaoo ns Se o Spong renistlsmet ob sure picasa; cata oem ul na 626: soda dom dor colors en a dsoy “via evo oviad 9h oq snobigsineso ones ida no ai anca ça ibibog cr qse Ds dd 3 cof ron O RAR ob gelada sina eonaninaigo mose ani tabf sulsamo ioiadonatro., ML ques con ] erica umão cabidmsmurao aisisitaos ou e ana «pd pe se nho epbisol dem à “Gr buster gls do asp nda u EAR, en TAN vita b: sisesbant asma |U apud 7 a ço ip a vabtalaboo subo raias Eca Sentia a cedo Bila O2ef nor pr RN nd 16 hã ruer- ams pr ACCIDENTES A tracheiotomia muitas vezes não é acompanhada, nem seguida de nenhuma difficuldade, nem de nenhuma circumstancia desfavora- vel. Mas n'outros casos complicam-n'a diversos accidentes, que podem apparecer durante a operação ou pouco depois de terminada, ou no fim de um certo numero de dias. Os accidentes que podem sobrevir á tracheiotomia distinguem- se por isso em immediatos e consecutivos. ACCIDENTES IMMEDIATOS Os accidentes principaes, que podem sobrevir durante a operação ou immediatamente depois, são: a hemorrhagia; a entrada do sangue nos canaes respiratorios; a morte apparente por asphyxia ou por syn- cope; o ferimento da parede posterior da tracheia; a perfuração do esophago; as convulsões; e o emphysema. A hemorrhagia póde proceder das veias ou arterias do collo exte- riores á tracheia e feridas durante a operação, ou dos capillares da mu- cosa tracheial. A hemorrhagia venosa é a mais frequente e a unica que tenho observado. Tem geralmente por causa o ferimento das veias do plexo subthyroideo que algumas vezes se anastomosam por fórma que é im- possivel evital-as. Muito excepcionalmente póde depender da ferida de alguma veia volumosa do collo, como as jugulares, subclavia esquer- da, ou innominada. Sedillot (ob. cit. t. 1, pag. 397) refere a proposi- MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. WI. PL 14 106 ESTUDOS SOBRE to um caso em que viu morrer o doente por ter sido ferida uma veia volumosa do pescoço, sendo tambem ferida a tracheia nas duas pare- des oppostas. Quando a hemorrhagia provém do plexo sub-thyroideo, é ás ve- zes muito consideravel, sobre tudo se está muito turgido como acon- tece por effeito de algum tempo de asphyxia. Para a fazer cessar, algu- mas vezes basta a compressão feita com os dedos, com esponja, com eri- nas rombas, ou com pinças de pressão continua. Quando estes meios são inefficazes é preciso fazer cessar de prompto o corrimento de sangue, para prevenir os graves inconvenientes que podem succeder ás perdas san- guineas nas doenças diphthericas. O meio mais seguro n'este caso é abrir a tracheia sem perda de tempo, e introduzir logo a canula, cujas fitas se apertam devidamente á roda do collo até que a hemorrhagia cesse. O restabelecimento da respiração, e a compressão exercida pela canula e pelas fitas faz estancar o sangue de um modo maravilhoso. En- tre outras é notavel, debaixo d'este ponto de vista, a observação 17.º, em que houve uma extraordinaria hemorrhagia proveniente do plexo sub-thyroideo, a qual, apesar da compressão com esponjas e com os de- dos, cobria toda a ferida desde a tracheia até aos. tegumentos. N'es- tas circumstancias abri logo a tracheia, e sem esperar o dilatador in- troduzi em continente a canula guiada sobre o dedo indicador da mão esquerda, fiz sentar o doente, apertei as fitas atraz do pescoço; e, em menos tempo do que é preciso para o dizer, a hemorrhagia tinha .ces- sado como por encanto, salvando-se o doente apesar de diversos acci- dentes consecutivos que sobrevieram. Se, depois de restabelecida assim a respiração, a hemorrhagia con- tinúa, o que nunca vi, devé proseguir-se com a compressão por meio de fios, ou antes com pequenas porções de isca de sola ou esponja fina, sós ou imbebidos em uma dissolução fraca de perchlorureto de ferro, postos na ferida em torno da canula e por detraz da rodella de adhe- sivo. Se a hemorrhagia provém de uma veia volumosa do pescoço, e a compressão é inefficaz, sendo a ferida pouco extensa, deve-se appre- hender as suas margens com tenaculo ou pinça, e laquear o vaso late- ralmente diminuindo-lhe apenas a capacidade, mas sem lhe interrom- per a circulação. Se não póde applicar-se este meio por ser extensa a ferida, far-se-ha a laqueação de todo o vaso acima e abaixo. Este ul- timo procedimento, o da laqueação completa do vaso, se deve tam- bem ter quando a veia que der a hemorrhagia fôr de um calibre me- diano que não comporte a laqueação lateral. A TRACHEIOTOMIA “107 A hemorrhagia arterial póde proceder da arteria thyroidea me- * dia, da carotida, innominada, ou de outras arterias quando estejam fóra da sua posição normal; assim como do ferimento do isthmo thy- roideo. Desault cita a observação de um estudante a quem um collega, com o fim de o salvar de uma asphyxia por submersão, feriu a arte- ria carotida primitiva praticando a tracheiotomia. Beclard refere tam- bem um facto de ferimento da arteria innominada na occasião da tra- cheiotomia, feita igualmente por um estudante de Medicina. Na hemorrhagia arterial deve-se laquear promptamente o vaso d'onde procede, antes de abrir a tracheia. Na que provém do isthmo, salvo casos excepcionaes, em que a laqueação é tambem precisa, o fino jacto arterial que dá cede á pressão da canula e das fitas á roda do collo, como duas vezes aconteceu com o sr. Millard na observação 8.º e 32.º da sua Memoria, referidas a pag. 139 e 2083. A hemorrhagia capillar da mucosa da tracheia foi observada uma vez pelo sr. Chassaignac. Appareceu logo depois de aberta a tracheia e immediatamente em seguida á extracção de um tubo pseudo-mem- branoso muito longo e espesso. Reconhecida a origem da hemorrha- gia, o distincto cirurgião do hospital de Lariboissiêre fel-a cessar com a applicação de um pedaço de gêlo do tamanho do punho sobre a parte superior do esterno (Lecons sur la trachcotomie, pag. 88 e 89). 4 entrada do sangue nos canaes respiratorios é a consequencia da hemorrhagia. Deve, pois, sempre que fôr possivel, evitar-se a he- morrhagia por mais este motivo, ou impedir que o sangue penetre nas vias aéreas. Previne-se muitas vezes a hemorrhagia operando com bastante luz, de modo que toda a região onde se opéra esteja bem illuminada, fazendo nas partes molles uma incisão sufficientemente extensa, e se- parando bem os bordos da ferida com ganchos ou erinas rombos para pôr bem patente as partes que técm de se dividir successivamente, e emfim operando com a maior lentidão para evitar todo o ferimento vascular. Não se podendo Glam á hemorrhagia, seria mui conveniente es- tancar o sangue pelos meios aconselhados antes de abrir a tracheia, porque assim se evitaria a penetração do sangue nos canaes respirato- rios. Mas quando isto se não póde conseguir, o que ha a fazer é abrir de prompto a tracheia introduzindo-lhe a canula, para evitar a conti- nuação da hemorrhagia e suas terriveis consequencias. Quando o sangue cáe na cavidade da tracheia e dos ratio a 14x 108 ESTUDOS SOBRE natureza promove a sua saída atravez da canula por meio da tosse. Quando este phenomeno não se manifeste espontaneamente, deve pro- vocar-se excitando a superficie mucosa da tracheia por meio da lanada de esponja que se faz passar atravez da canula. Se ainda assim se não consegue o fim desejado, sem perder um momento deverá proceder-se á aspiração do sangue por meio do aspirador de Guersant, ou de um tubo de gomma elastica com o respectivo conductor, ou, na sua falta, com uma algalia de gomma elastica das mais grossas. Alguns colle- gas assaz dedicados, imitando Roux e o sr. Ricord, e a despeito do contagio, têem applicado os proprios labios á ferida da tracheia e fei- to assim a sucção ou aspiração do sangue, muco e productos diphthe- ricos que obstruiam as vias aéreas. À morte apparente póde proceder da asphyxia, como mais vezes succede, ou da syncope. Nó primeiro caso os meios mais efficazes de restabelecer a respiração são: a aspiração do sangue, se é a penetração d'este liquido nas vias respiratorias que determina a asphyxia, a in- sufflação pulmonar com a bôca ou mediante uma canula de gomma elastica, as pressões cadenciadas e alternas sobre o thorax e abdomen, as fricções excitantes, a flagellação mais ou menos generalisada pelo cor- po, as aspersões d'agua fria sobre a face, a excitação das mucosas na- sal e pharyngea com a rama de penna molhada em vinagre e intro- duzida nas ventas e pharynge, etc. No segundo caso, quasi sempre ef- feito de hemorrhagia, devem empregar-se, sem perda de tempo, as fric- ções excitantes, os sinapismos volantes, a flagellação, as ventosas sec- cas sobre a. região cardiaca e base do peito, os manuluvios e pedilu- vios quentes, as excitações electricas, as aspersões d'agua fria ou-de agua e vinagre, as inspirações de ether, de vinagre aromatico ou de ammonia, à posição horizontal, etc.; e como ds as pressões al- ternativas sobre a caixa thoracica e sobre o ventre, a insufíflação pul- monar, etc. A syncope que sobrevém ás vezes á tracheiotomia dura geral- mente muito pouco tempo, mas póde prolongar-se por mais de dez mi- nutos. Não se deve por isso desesperar cêdo de tirar os doentes d'este perigosissimo estado, porque algumas vezes, não só nos casos de syn- cope como nos de asphyxia, tem succedido restituir a vida aos doen- tes depois de prolongados esforços que a principio pareciam inuteis. O ferimento da parede posterior da tracheia nunca foi observa- do em Lisboa, que me conste; mas tem acontecido n'outras partes, ainda que rarissimas vezes, nas mãos de operadores, aliás habeis, os quaes tem ferido a tracheia na parede posterior, introduzindo depois A TRACHEIOTOMIA 109 a canula atravez das duas feridas da parede anterior e posterior. Esta infelicidade tem-se dado em creanças muito novas, concorrendo para ella o pequeno volume da tracheia. Quando haja este accidente, póde perceber-se, porque a canula mettida na ferida da parede posterior da tracheia não faz terminar, mas antes aggrava, o estado asphyxico do doente. Deve então tirar-se a canula e fran DE -a por fórma que fique na cavidade tracheial, e não, passe para a sua parte posterior. O ferimento do esophago é ainda mais raro do que o da parede posterior da tracheia, o que tem motivo na posição profunda do orgão e á esquerda da tracheia, bem como na molleza e flaccidez do seu te- cido que lhe permitte desviar-se e escapar ao bisturi. Aconteceu uma vez a A. Berard, pretendendo fazer a tracheiotomia pelo methodo ex- peditivo, que depois abandonou por este facto, e por haver perdido tam- bem um doente com hemorrhagia immediata. As convulsões rarissimas vezes apparecem durante a tracheioto- mia, ou immediatamente depois. Este accidente quando é ligado ao crup parece mais provavelmente devido á congestão cerebral por ef- feito da difficuldade de respiração. Já n'outro nor d'este escripto (pag. 48) me referi ao facto do sr. Almagro, observação 21.º da Memoria do sr. Millard. N'este caso, logo ao começar a incisão da pelle, appa- receu rangimento dos dentes e movimentos convulsivos dos musculos da face; proseguindo-se na operação notou-se rigidez tetanica nos mus- culos infra-hyoideos que poz grande obstaculo á introdueção da canula na tracheia, seguindo-se depois rigidez como cadaverica em todos os musculos com perda de sentidos, e todas as apparencias de morte. Com a respiração artificial durante quatro minutos conseguiu-se reanimar o doente, que tinha sete annos e meio; mas pouco depois reappareceram as convulsões em quasi todo o corpo, consistindo em riso sardonico, trismo, e movimentos clonicos dos membros. Estes phenomenos cede- ram promptamente a uma poção com ether, e o doente curou-se em 32 dias, apesar de um pleuriz esquerdo com grande derramamento, que sobreveiu ao 12.º dia da operação. O facto de convulsões que observei logo depois da tracheiotomia (observação 33.º) foi pelo contrario de terminação fatal, assim como outro da pratica do sr. Theotonio da Silva (observação 32.7). O emphysema resulta da falta de parallelismo entre a ferida dos tegumentos e à da tracheia, ou da pequena abertura deste orgão que dê difficuldade na introducção do dilatador e da canula. N'estes casos ' a infiltração do ar vem immediatamente ou pouco depois da operação, á5 vezes mesmo antes de se conseguir a introducção da canula, o que 10 ESTUDOS SOBRE a difficulta muito mais. N'outros casos o emphysema apparece uma ou mais horas depois da operação, e então depende provavelmente da ca- nula ter saído da tracheia collocando-se por diante d'ella e obstruindo mais ou menos a sua abertura. O emphysema limita-se quasi sempre ao tecido cellular das visic nhanças da ferida e do collo: é então um accidente sem gravidade, que dura apenas 2 ou 3 dias; ás vezes estende-se á face e é muito desagra- davel porque desfigura extraordinariamente os doentes, mas ainda as- sim não se lhe póde chamar um accidente grave; n'outros casos pro- paga-se ao peito, e concorre a incommodar mais ou menos a respira- ção; por vezes ainda a infiltração do ar generalisa-se mais ou menos, e torna-se um accidente gravissimo em consequencia da dyspnea, da inchação, e da profundidade em que fica a ferida da tracheia a ponto de serem insufficientes as canulas ordinarias. Quando se faz a tracheiotomia é preciso, pois, ter presente a pos- sibilidade da infiltração do ar. no tecido cellular do collo, para a pre- venir, evitando as condições mechanicas com as quaes ella apparece. Depois de manifestado o emphysema é necessario fazer cessar de prompto a causa que lhe deu origem, estabelecendo franco e perfeito parallelismo entre a ferida das partes molles e a da tracheia, intro- zindo n'este orgão uma canula com bastante comprimento para che- gar dentro do canal, ete. E” para estes casos que foi inventada a ca- nula em occulo de punho de Trousseau. Algumas vezes, quando a in- chação emphysematosa for mui grande a ponto de trazer accidentes, deverá dar-se saída ao ar infiltrado por meio de escarificações nas par- tes mais distendidas, seguidas de pressões methodicas que a auxiliem. ACCIDENTES CONSECUTIVOS Os principaes accidentes que apparecem consecutivamente á tra- cheiotomia são: a diphtheria, erysipcla e gangrena da ferida; a incha- ção dos ganglios submaxillares; a saída da canula para fóra da tra- cheia; o emphysema; a suppuração do mediastino; a hemorrhagia se- cundaria; accumulação de muco nas vias respiratorias; a difficuldade na deglutição e saída das materias alimentares pela ferida; as ulcera- ções da tracheia; a bronchite e pneumonia; a enterite choleriforme; e a intoxicação diphtherica. A diphtheria, erysipela e gangrena apparecem por vezes na feri- da da tracheiotomia. A diphtheria é constante no crup infectuoso, e frequente mesmo r A TRACHEIOTOMIA tt no garrotilho simples. No primeiro caso as pseudo-membranas que se desenvolvem na superficie traumatica são acinzentadas, escuras, espes- “sas e fetidas, e tenho-as visto já bem manifestas quando tiro as canu- las e observo a ferida 18 ou 24 horas depois da operação. Mui raras vezes esta diphtheria se estende ás visinhanças da ferida debaixo da fór- ma serpiginosa e grave como foi descripta pelo dr. Axenfeld. No segun- do caso são branco-amarelladas ou branco-acinzentadas, menos espes- sas do que as outras, sem cheiro desagradavel, e apparecem no fim de 24 ou 48 horas, umas vezes com a fórma de membrana contínua e uniformemente adherente á superficie da ferida, outras vezes como porções de muco espesso e concreto adherindo em certos pontos e dei- xando outros como insulas de botões cellulosos mais ou menos pallidos ou regularmente córados. Previne-se ou destroe-se a diphtheria da ferida por meio das cau- terisações, como terei occasião de dizer no capitulo relativo ao trata- mento dos operados. A erysipela simples ou phlegmonosa e a gangrena, que se ma- nifestam na ferida e suas visinhanças, são accidentes geralmente liga- dos á intoxicação diphtherica, e coexistem com a diphtheria da feri- da, ou dependem da constituição medica reinante. O melhor tratamento preventivo d'estes estados morbidos é o das cauterisações da ferida, e alimentação tonica apropriada ás circumstan- cias. Depois de manifestados, convem-lhes o tratamento geral tonico pela quina, pelo sulfato de quinina, pelo perchlorureto de ferro, e pela alimentação; e o tratamento local proprio d'aquelles estados quando apparecem independentes da tracheiotomia. A inchação dos ganglios submaxillares quando ápparece depois da tracheiotomia não depende directamente da operação, mas da diphthe- ria guttural, Nos doentes a que se referem as observações 16.º e 29.º, vi este engorgitamento summamente exagerado. Quando a inchação ganglionar é pequena é um accidente pouco grave, dissipa-se sem tratamento ou apenas com algumas uncções de pomada iodurada e de belladona. Quando é grande está ligada á into- xicação diphtheritica, e é por isso um signal prognostico mui grave. Neste caso póde a tumefacção estender-se para as proximidades da feri- da, e afastar mais ou menos a abertura da tracheia da da pelle, obri- gando a trocar a canula ordinaria por outra mais comprida ou a to- mar outro expediente. O tratamento local resolutivo tem aqui muito pouco valor. O tratamento geral da diphtheria é o unico indicado, ain- da que raras vezes com esperança de bom resultado. x 112 ESTUDOS SOBRE A saída da canula de dentro da tracheia tem acontecido algumas ve- zes. Na doente da observação 37.º succedeu pouco tempo depois da ope- ração sair a canula da ferida da tracheia por estarem largas as fitas que a seguravam, seguindo-se todos os phenomenos da Pig mas feliz- mente eu estava ainda em casa da doente, e pude reintroduzir a canula e restabelecer a vida que ia extinguir-se n'aquelle momento. Com o sr. Trousseau aconteceu este accidente tres vezes em toda a sua longa pratica, tendo o desgosto de fallecerem os doentes por se não ter remediado a tempo o incidente. As consequências da saída da canula do interior da tracheia são: a asphyxia mais ou menos prompta por não entrar o ar francamente nas vias respiratorias, desde que a canula se desloca e sáe para a parte anterior; e o emphysema no tecido cellular da região proxima pela falta de parallelismo entre a abertura tracheial e a das partes molles. Previne-se este accidente empregando canulas bastante compridas, para penetrarem | a 2 centimetros abaixo da extremidade inferior da ferida da tracheia, e com a grossura apenas inferior á capacidade deste canal; e em fim fazendo que as fitas que as prendem as ajustem bem na devida posição e não lhes permittam muito grande mobilidade. A grande mobilidade das canulas de Roger ou de Luér póde dar aquelle accidente, e por isso se tem proposto empregal-as só ao segundo dia da operação, em que os inconvenientes da saída da canula são menos para receiar, No caso de succeder que a canula sáia da tracheia, não ha outra cousa a fazer se não reintroduzil-a immediatamente. Por mais esta ra- zão um ajudante intelligente deve velar constantemente o operado. O emphysema subcutanco e subpleural que vem consecutivamente á tracheiotomia é um accidente muito raro, porque a inflammação das partes feridas na operação dá certa consistencia, densidade e espessa- mento aos tecidos que se oppõe á infiltração do ar. Quando existe é devido á saída ou deslocação da canula, que tira á passagem do ar o caminho directo do exterior para as vias respiratorias ou vice-versa. Não me demorarei em dizer como este accidente se evita ou cu- ra, nem os phenomenos a que dá logar em vista do que acabo de re- ferir da saída da canula do interior da tracheia, e do que escrevi delle como accidente immediato a pag. 109. A suppuração do mediastino ainda não foi observada entre nós, mas algumas vezes, ainda que mui raras, o tem sido fóra de Portu-. gal. Quando este accidente se manifesta, geralmente succede que todo o organismo revela uma alteração mais ou menos profunda, caracte- A TRACHEIOTOMIA 118 ristica da infecção diphtherica. Algumas vezes comtudo póde existir sem ser acompanhado d'esse estado geral. Em todo o caso devem empregar-se os meios de obstar á demora do pus, por curativos repetidos, e por meio de mechas de fios com a fórma de siphão, os quaes pela acção da capillaridade conduzam o pus para o exterior. Se o pus se juntasse em algum ponto inferior, ou aos lados do esterno, junto das cartilagens costaes, ou aos lados do appen- dice xiphoideo, não se devia hesitar em abrir o abcesso n'esses pontos para a saída do pus pela parte mais declive, seguindo depois o trata- mento com injecções detersivas e iodadas, principalmente. Ao tratamento local deve juntar-se o tratamento tonico geral que o estado do doente e a fórma da doença exigirem n'essas circumstan- cias. A hemorrhagia secundaria que sobrevem á tracheiotomia é mui- tas vezes um dos signaes do crup infectuoso. Outras vezes póde ser o effeito da ulceração de algum vaso, como acontece nas ulcerações da tra- cheia produzidas pela canula, etc. No primeiro caso é sobre tudo con- veniente o tratamento tonico geral, dietetico e medicamentoso, incluin- do o feito pela limonada de perchlorureto de ferro, etc. No segundo caso deve-se antes de tudo tirar a canula, se foi ella que promoveu a ulceração, ou substituil-a por outra que não tenha os mesmos incon- venientes. Está nestas cireumstancias a canula que fiz fabricar, em que reuni as modificações das duas melhores canulas conhecidas, a de Luér e a de Charriêre. Depois, tanto em um como em outro caso, deve applicar-se o tratamento hemostatico apropriado á sede da he- morrhagia e ás outras circumstancias concomitantes, podendo con- vir, quando a hemorrhagia é exterior ao canal da tracheia, a com-, pressão com a isca de sola, a esponja fina ou os fios de linho, seccos ou molhados em uma dissolução de perchlorureto de ferro, de creo- sote, etc. A accumulação de muco no canal respiratorio é varias vezes ob- servada. Depois da tracheiotomia a mucosa das vias respiratorias se- grega ás vezes uma extraordinaria quantidade de muco e de muco- pus, que dá ao ouvido um fervor mucoso generalisado, que tem por causa a accumulação nos tubos bronchicos de liquido mucoso que o ar atravessa na inspiração e expiração. N'estes casos a materia da secre- ção póde sair pela canula francamente para fóra, e então tenho este signal como favoravel ao prognostico da operação. Observei dois casos muito notaveis d'este genero, que foram os das observações 15." e 36.º, em que a secreção muco-puriforme foi muito abundante, salvando-se MEM. DA ACAD. — [.º CLASSE. — T. II. P. 1. 15 É 114 ESTUDOS SOBRE os doentes porque as materias saíam muito facilmente pela canula. Em outros casos a materia, segregada em grande copia, não é expellida, e accumula-se nos bronchios porque estes perderam toda a sua contra- ctilidade, bastantes vezes por effeito da infecção diphtherica. Sobrevem então quasi sempre uma asphyxia mortal. Em quanto se não usava pôr a gravata de cassa por diante da ca- nula á roda do pescoço, este accidente era muito mais commum, o que faz suppôr que elle tivesse muitas vezes por causa a acção immediata do ar frio sobre a mucosa tracheial e bronchica. Quando a secreção do muco é copiosa e sáe para fóra com fa- cilidade, nada ha que fazer se não ter maior cuidado para conservar sempre desobstruidas as canulas. Quando pelo contrario a materia se- gregada não possa sair, deve provocar-se a sua evacuação excitando a tosse por meio de um corpo estranho, como a lanada de esponja met- tida humida pela canula até á parte mais baixa da tracheia, com o que sé consegue ás vezes vêr expulsar os liquidos accumulados. Boinet deu- se bem em dois casos d'este genero, introduzindo na tracheia uma son- da elastica ôca para a entrada de ar, o que excitou a saída do muco agglomerado que embaraçava a respiração. A collocação do doente dei- tado, de modo que seja facil a saída dos liquidos da tracheia pelo pro- prio pêso, póde ser um meio auxiliar conveniente em algumas eir- cumstancias. Como tratamento interno uso com vantagem, para facilitar a ex- pectoração, o kermes mineral unido aos xaropes expectorantes, como o de hyssopo e ainda melhor o de pólygala, etc. Parecendo ligar-se este accidente, pelo menos um certo, numero de vezes, á influencia do ar frio, é escusado dizer, que por mais este motivo se deve evitar a sua acção sobre os operados de tracheioto- mia. A difficuldade na deglutição e a saída dos alimentos pela aber- tura da tracheia ou pelo nariz, é um phenomeno frequente depois da tracheiotomia applicada ao crup. De ordinario ao 3.º ou 4.º dia, de- pois da operação, é que este accidente se manifesta, dando no goto as bebidas ou alimentos liquidos que os doentes tomam, com accessos de tosse mais ou menos violentos e ás vezes convulsivos, que os incom- modam extraordinariamente. Além d'isso póde produzir irritações gra- ves das vias aéreas, sobre que actuam aquelles liquidos e alimentos, e assusta por tal fórma as creanças, que resistem por todos os modos a beber para evitarem novos accessos. Este accidente assignalado desde muito tempo pelo sr. Trousseau A TRACHEIOTOMIA 115 e especialmente estudado pelo sr. Archambault, tem tambem sido ob- servado por mim em alguns dos meus operados entre o 4.º e 8.º dia depois da operação. Deixei de o observar em tres operados que se cura- ram (Obs. 15.º, 22º e 36.º), apesar de um d'elles (o da obs. 15.º) ter phenomenos secundarios de paralysia muito extensos. Conheço um caso em que as bebidas deram no goto no mesmo dia, poucas horas depois da operação, ao 4.º dia de doença (Obs. 8.º); e outro em que o acci- dente appareceu no 2.º dia depois da operação, 11.º de doença (Obs. AB e A media dos dias depois da operação em que o accidente se tem manifestado em Lisboa, é de 4,2 dias, sendo a minima de 1 dia (Obs. 8.), e a maxima de $ dias (Obs. 10.9. Tenho-o visto persistir entre 4 e 11 dias, e conheço um caso em que chegou a durar 21 dias (Obs. 28.º). A sua duração media nos ope- rados em Lisboa, é de 9,85 dias, sendo a minima de 4 dias (Obs. 10.º) e a maxima de 21 dias (Obs. 28.º). Tem-se dado diversas explicações á dysphagia que succede á tra- cheiotomia. O sr. Archambault pretendeu explicar o phenomeno pela perda do habito de fazer mover harmonicamente os musculos que actuam na passagem do bolo alimentar para o esophago, e dos que operam a occlusão da larynge, determinada pela respiração artificial por meio da canula. E accrescenta que se póde remediar o inconveniente tapando a canula com o dedo, na occasião em que o operado tomar algum ali- mento, porque então é obrigado a fazer actuar a larynge, com o que a harmonia normal se restabelece. Não parece rasoavel a explicação do sr. Archambault, nem o preceito que recommenda é sempre efficaz. Não é de certo da respiração artificial pela canula que depende a dys- phagia, porque n'esse caso o phenomeno deveria apparecer sempre em todas as operações de tracheiotomia, feitas ou não para o garrotilho, mas pelo contrario -não se manifesta em todas as que se fazem para o crup, e falta sempre nas que são indicadas por outra doença. O con- selho dado pelo auctor para que os liquidos não dêem no goto tenho-o seguido, mas raras vezes me tem dado o resultado annunciado, o que era para esperar, porque algumas vezes, como é sabido, a dysphagia persiste mesmo depois dé tirada a canula e de fechada a ferida, ape- sar de bem restabelecida já a respiração laryngea. | O sr. Chassaignac, pela sua parte, explica a dysphagia ulterior dos operados da tracheiotomia pelo ferimento simultaneo da parede pos- terior da tracheia e do esophago, em consequencia do que os liquidos 15 116 ESTUDOS SOBRE engolidos passam do canal alimentar para o respiratorio, atravez da ferida da parede posterior da tracheia (loc. cit. pag. 39 e 90). Mas esta explicação cáe evidentemente em presença da raridade d'aquelle feri- mento e da frequencia do accidente. é O sr. Trousseau attribue a dysphagia á paralysia dos musculos laryngeos e deglutidores dependente da diphtheria laryngo-pharyngea. Vou de acordo n'esta parte com este pratico, por me parecer a sua opinião a mais razoavel. O phenomeno é, pois, um accidente consecu- tivo á angina diphtherica e nada tem com a operação, e por isso ap- parece tambem nos individuos que têem padecido aquella doença, mas que não têem sido operados, e não se vê n'aquelles a quem a trácheio- tomia é praticada por doenças não diphthericas. Para obstar aos inconvenientes da dysphagia crupal tenho segui- do, com bom resultado, o preceito do sr. Trousseau, que consiste em prohibir aos doentes a ingestão de liquidos, consentindo só o uso de alimentos solidos que se possam comer com garfo, taes como: sôpas de pão, aletria feita em leite, ovos cozidos, pedaços de carne cozida, e ou- tros alimentos d'este genero, que geralmente são bem recebidos e não dão no goto. Quando os doentes têem muita séde, concedo-lhes algu- ma agua fria, bebida aos goles, logo antes da comida solida ou muito tempo depois, para que não haja por essa occasião nenhum alimento no estomago que possa ser deposto no caso de sobrevir o vomito. As ulcerações da tracheia complicam varias vezes a operação que faz objecto d'este escripto. Este accidente foi perfeitamente estudado pelo sr. Henri Roger em uma Memoria apresentada á Academia de Medicina de París em 5 de abril de 1859, a qual tem por titulo — Des ulcérations de la trachee-artére produites par le sejour de la ca- nule aprês la tracheotomie, e está publicada nos Archives góncrales de Médecine, t. xL1v, pag. 5 e 75. 1859. O sr. Roger admitte tres fórmas ou graus de ulcerações tracheiaes: a simples erosão da mucosa da tracheia, a-ulceração propriamente dita d'esta mesma membrana, e a perfuração completa da tracheia. A sua frequencia era grande pelo menos até ha pouco tempo, em quanto se não usavam as-canulas que menos vezes devem produzir aquelle acei- dente. O sr. Roger reuniu no seu escripto 21 observações de ulceras tracheiaes, sendo 13 colhidas em menos de tres mezes em um total de 63 creanças operadas no 1.º trimestre de 1859 no hospital des cn- fants malades, o que dá a relação de 1:4,84. Formam-se ás vezes muito rapidamente, em 40, 38, 36 horas, incluindo-se a ulceração com perfuração; mas quasi sempre apparecem 1 A TRACHEIOTOMIA t17 maior ou menor numero de dias depois da operação, quando se é obri- gado a conservar a canula por mais tempo. A séde mais frequente da ulceração é a parede anterior do ca- nal ao nivel-do bordo inferior da porção vertical da canula, sendo pro- “duzida pelo attrito que faz este bordo contra a parede anterior da tracheia nos movimentos de respiração, deglutição e outros da cabeça e do pescoço. Muito menos vezes se observa na parede posterior da tra- cheia, quer inferiormente, ao nivel da parte correspondente da extre- midade inferior da canula, quer superiormente correspondendo á parte mais convexa do instrumento. Mais vezes a ulceração existe só na pa- rede anterior; duas vezes em vinte e uma estava só na parede poste- rior, e quatro vezes no mesmo numero de casos existia simultanea- mente nas duas paredes da tracheia. Quasi sempre ha uma só ulceração, mas póde haver mais sobre tudo em certas fórmas de epidemia. A fórma da ulcera é ordinariamente oval, e justamente limitada aos pontos do attrito. Em alguns doentes tem-se observado com maior extensão, chegando a oceupar toda a cireumferencia da tracheia. A fórma mais commum é a da ulceração propriamante dita, que foi encontrada pelo sr. Roger quinze vezes nas 21 observações; vem depois a ulceração com perfuração que viu quatro vezes; e por fim a erosão que observou apenas duas vezes n'quelle mesmo numero de casos. As outras alterações anatomicas observadas conjunctamente são por ordem de frequencia: a ulceração ou a diphtherite da ferida do col- lo, a broncho-pneumonia, a tracheite e bronchite, a suppuração do te- cido cellular ambiente, e as tlcerações espontaneas multiplas na super- ficie interior do canal aéreo. Os principaes symptomas que podem fazer suppôr a existencia das ulcerações tracheiaes são, segundo o sr. Roger, os seguintes: mau es- tado da ferida exterior Enbtetináio pela Re aço de falsas-mem- branas, ulcerações e gangrena; coloração denegrida da canula, sobre tu- do na parte inferior mais proxima da ulceração; mau cheiro do halito e das materias que sáem pela canula; dôr na parte anterior do collo com dysphagia; e em fim algumas vezes expectoração sanguinolenta, ou hemorrhagia. ; No British Medical Journal de 6 de abril de 1861, os srs. Rus- sel e Bolton do hospital geral de Birmingham referem um facto muito extraordinario de hemorrhagia mortal consecutiva á ulceração da tra- cheia, determinada pela-canula. A doenca por cujo motivo se fez a tra- 118 ESTUDOS SOBRE cheiotomia não foi o crup, mas uma laryngite syphilitica. O doente mor- reu vinte minutos depois do comeco da hemorrhagia, a qual appare- ceu ao 6.º dia da operação. Na autopsia achou-se a tracheia e bron- chios cheios de sangue, sem que houvesse vestigio de apoplexia pul- monar; e uma ulcera do comprimento de 3 centimetros sobre 7 a 8 millimetros de largura, situada na parede posterior da tracheia na parte correspondente ao bordo posterior da canula. Das causas da ulceração tracheial, a principal é a acção vulne- rante da canula, a pressão e attrito que ella fez em certos pontos da superficie interna da tracheia, como foi demonstrado por experien- cias feitas em animaes pelos srs. Trousseau e Bouley. Como causas ac- cessorias nota-se o estado congestivo e phlegmasico da mucosa das vias respiratorias, o estado geral dos operados ligado á intoxicação diph- therica, a natureza da epidemia reinante, e em fim a idade muito re- cente dos doentes que, menos doceis, fazem mais repetidos e mais ex- tensos movimentos, os quaes produzem exagerada pressão e attrito so- bre a mucosa tracheial. O prognostico é de certa gravidade, porque se algumas se cica- trizam, outras ha que aggravam a posição dos operados em consequen- cia da febre que provocam, da suppuração que excitam e dos aeciden- tes que desenvolvem na ferida da operação. O tratamento preservativo das ulcerações tracheiaes deve consistir em obstar á pressão da canula sobre a mucosa da tracheia. Para este effeito foi aconselhada a canula ordinaria cortada nã extremidade infe- rior obliquamente, ou em bico de clarinete, á custa da sua parede ante- rior; a canula de pavilhão movel de Lugr; a de Robert e Collin; e a nova canula de Chatriere. De todas estas canulas, de que já fallei a pag. 84 e seguintes, é a de Luér que melhor satisfaz o seu fim, mas é ain- da preferivel a modificação que adoptei e de que dei conta a pag. 87. Deve juntar-se á escolha da canula, o demoral-a na tracheia o menos tempo que seja possivel, e tiral-a todos os dias ainda que por pouco tempo até o fazer definitivamente. O tratamento curativo das ulceras da tracheia deve ser, além da remoção da sua causa immediata, quando isso seja possivel, o trata- mento tonico interno que fôr dictado pelo estado geral dos doentes. A bronchite e pneumonia são dos accidentes mais communs de- pois da tracheiotomia, e tambem dos mais graves. Deve-se por isso a tempo tomar conhecimento preciso d'elles por meio da auscultação e percussão muito accuradamente feitas, sobre tudo se ha opressão, fre- quencia de respiração e persistencia de febre, para os combater o mais r A TRACHEIOTOMIA 119 cedo possivel pelos meios mais adequados á doença e ao estado parti- cular dos doentes. A bronchite simples não se deve considerar como accidente de gravidade, nem se presta a indicações especiáes. A bronchite genera- lisada não está no mesmo caso, porque póde determinar algumas ve- zes a morte dos operados. Deve por isso combater-se cedo pelos meios ordinarios, sobre tudo pelo kermes, pós antimoniaes de James, etc. A pneumonia é muito mais grave, o mais frequente e o mais mortifero de todos os accidentes que se vêem sobrevir aos operados de tracheiotomia em París. Entre nós este accidente é menos frequente, o que deve attribuir-se á temperatura do nosso clima e da época do anno em que o crup é aqui mais frequente, assim como tambem a se- rem quasi todos os operados da clinica particular, e não dos hospitaes onde ha mais motivos para se adquirir a referida complicação. Em um dos meus operados pude confirmar pela autopsia a existencia da pneu- monia lobular, que concorreu para a terminação fatal (Obs. 6.º). Quando se manifesta deve tratar-se, logo que se dê por ella, pe- los pós de James, kermes, dedaleira, com bebidas e xaropes peitoraes e expectorantes. Se a complicação pulmonar apparecer poucos dias depois da ope- ração, não se devem de nenhum modo empregar vesicatorios; mas quan- - do muitos dias tiverem decorrido, quando sobre tudo as manifestações diphthericas e a albuminuria tiverem cessado, póde lançar-se mão d'a- quelle meio tão poderoso em taes casos, demorando todavia poucas ho- ras a sua applicação, e tratando-o logo com ceroto de espermaceti, po- mada alvissima, ou manteiga fresca, para que seque promptamente, e não seja origem da diphtheria cutanea. A enterite choleriforme é um accidente felizmente raro depois da tracheiotomia, porque é quasi sempre invencivel. Anda quasi sempre ligado á intoxicação diphtherica, e é uma das suas manifestações; ou depende do abuso de purgantes ou do tartaro emetico. A doente da observação 38.º foi victima, pelo menos em parte, da diarrhea abun- dantissima que se desenvolveu principalmente depois da operação, por haver usado nas doze horas que a precederam repetidas dóses de tar- taro emetico, que não tiveram o effeito vomitivo para que as empre- garam. Quando similhante complicação apparece, o tratamento que pre- firo é o feito pelo subnitrato de bismutho com xarope de gomma ara- bica e de ratanhia, e algumas gottas de laudano liquido de Sydenham ; ou os pós de cré com mercurio (Aydrargyrum cum creta das Pharma- 120 ESTUDOS SOBRE copeas inglezas), ou os calomelanos em dóses fraccionadas de a a | cen- tigramma. A intoxicação diphtheritica é desgraçadamente o mais grave acci- dente que apparece depois da tracheiotomia. Entre nós tem sido a causa mais frequente da morte dos operados. Em quasi todos os da minha clinica que não tive a fortuna de salvar, a manifestação pseudo-mem- branosa local desceu para os canaes respiratorios, e ao mesmo tempo appareciam os symptomas geraes de malignidade a que me referi tanto na Memoria sobre o garrotilho (pag. 120), como na actual, que pu- nham termo mais ou menos prompto á vida dos doentes. Previne-se até certo ponto este terrivel accidente não fazendo an- tes da operação nenhum tratamento debilitante, nem pelas sanguesu- gas, nem pelos purgantes, nem pelos mercuriaes, nem pelos vesicato- rios; não abusando do tartaro emetico; e alimentando os doentes do melhor modo possivel. O tratamento, que póde ser de utilidade depois de manifestada a infecção, é o que já mais de uma vez referi, e que insisto em repe- tir, a saber: o tratamento tonico pela quina, sulfato de quintas per- chlorureto de ferro, vinho, boa alimentação, etc. A TRACHEIOTOMIA 121 TRATAMENTO DOS OPERADOS Ed O tratamento, que precisam os operados da tracheiotomia indica- da pelo crup, divide-se naturalmente em immediato e consecutivo. “ TRATAMENTO IMMEDIATO Conclue-se a operação, como disse, collocando na tracheia a ca- nula dupla. O pavilhão d'este instrumento deve ir guarnecido de uma rodella elliptica de esparadrapo adhesivo, ou de gomma elastica, para proteger a ferida das partes molles. A canula será mantida ou segura na sua posição pelas fitas, ou por tiras de cautchuc, prezas ás azelhas. do mesmo pavilhão, e apertadas á roda do pescoço por modo que nem a canula sáia fóra da tracheia pelos movimentos da cabeça e do collo, ou pelos esforços da tosse, nem comprimam os vasos cervicaes por fór- ma a oppôr-se á sua livre circulação. Por diante da canula e á roda do pescoço pôr-se-ha ainda, como já indiquei, uma gravata de cassa ou gaza constituida de tres ou quatro dobras, com o fim, que tambem já notei, não só de impedir que entrem nos canaes respiratorios corpus- culos que estejam na atmosphera, como, e principalmente, para que o ar que vai servir á respiração não seja frio, mas aquecido na sua passa- gem atravez d'aquelle estofo, e humedecido pelo vapor aquoso que a expiração alli depõe. Feito isto, deve limpar-se o doente de todo o sangue com espon- jas embebidas em agua morna e enxugar-se com ioalha: vestir-se-lhe camiza limpa de algódão! previamente aquecida na estação fria, e so- bre ella um roupão mais ou menos espesso. Em seguida deve dar-se- lhe a beber uma chavena de caldo de carne, ou de leite quente com MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. HI. P. 1. 16 122 ESTUDOS SOBRE assucar, e deital-o na sua cama que deve estar tambem aquecida se a operação for feita no inverno ou em tempo frio, sem roupa demasiada a ponto de provocar transpiração, e em quarto espaçoso, com janella, bem exposto, e na temperatura de 16º a 18º c., quando tudo isto for possivel. Em certas circumstancias é conveniente que a atmosphera do quarto seja um pouco humedecida por meio de agua ebulliente expos- ta á vaporisação em bacias ou outros vasos amplamente abertos. Se a, creança ou a pessoa operada tiver tendencia para frio, e um certo aba- timento, ao caldo deve ajuntar-se uma colher de vinho do Porto, da Madeira ou outro na falta d'estes, ou dar-se-lhe sómente agua quente com vinho e assucar. Se isto não basta para lhe restituir o calor, ou se se vê alguma tendencia para syncope, deverá empregar-se o tra- | tamento mais conveniente n'esta hypothese, como as fricções estimu- lantes feitas ao peito e a todo o corpo, por meio de flanella quente ou das mãos, com agua-ardente simples ou camphorada, agua de Colonia, vinho do Porto, vinagre aromatico ou simples, segundo o que for mais facil ter no momento; os sinapismos volantes nos membros inferio- res etc. Em quanto o calor e a vida não estiverem completamente restabe- lecidos, deve-se evitar por todos os modos que o doente se entregue ao somno, para o que elle tem a maior tendencia em quanto dura a dis- posição para a asphyxia, e o desfallecimento dependente ou de trata- mento debilitante, porventura feito, ou da propria operação, ou da di- phtheria; mas quando a respiração, a circulação e o calor se tenham devidamente regularisado e restabelecido, o semno é então reparador, e muito convém que o doente o consiga, e desfructe todos os seus be- neficios. São exemplos bem concludentes n'este ponto os doentes das observações 10.º, 15.º, 16.º, 28.º, e 36.º, além de outras. TRATAMENTO CONSECUTIVO O tratamento que convém aos operados consecutivamente á ope- ração, comprehende os meios locaes e os meios geraes que vou indi- car. TRATAMENTO LOCAL No tratamento topico dos operados ha a referir a limpeza da ca- nula, as instillações na tracheia, a cauterisação da ferida, a época em que se deve tirar a canula, e o curativo ulterior. , A TRACHEIOTOMIA 123 A limpeza da canula deve fazer-se constantemente com interval- los de duas ou tres horas; e além d'isso todas as vezes que for ob- struida por muco, muco-pus, ou porções de falsas membranas, o que é sempre denunciado pelo embaraço na respiração que se torna ruidosa, em vez de silenciosa que era, e como é sempre que se faz facil e des- embaraçadamente pela canula. Para este fim, um enfermeiro intelligente deve vigiar constantemente .o operado, tendo o tuidado de tirar a ca- nula interna n'aquellas circumstancias para a limpar por meio da la- nada de esponja e agua morna, e repol-a logo depois.! As instillações de agua na tracheia são ás vezes convenientes no tratamento consecutivo da tracheiotomia. Tenho-as empregado em duas cireumstancias: ou quando desejo provocar accessos de tosse que ex- pulsem muco, falsas-membranas ou sangue contido nas vias aéreas, e que ponham estorvo á respiração, o que ás vezes succede ao terminar a operação; ou para amollecer, despegar e facilitar a saída de muco ou de falsas-membranas que tornam aspera e difficil a respiração, o que se observa muitas vezes no decurso do tratamento consecutivo. No primeiro caso, uso instillar pela abertura da canula algumas got- tas de àgua quasi sempre fria, mas em certos casos morna; e auxilio o seu efleito, quando é preciso, introduzindo e fazendo descer rapida- mente pela tracheia a lanada de esponja, que retiro logo. Assim consi- go muitas vezes desenvolver accessos de tosse que têem por fim ex- pulsar o sangue, muco e falsas-membranas, dos canaes respiratorios, e. restabelecer consequentemente a respiração. No segundo caso, quando ha só muco para diluir e despegar, uso instillar duas ou tres gottas de agua morna de quarto em quarto de hora, ou com maior espaco, até que as mucosidades sejam expellidas pela expectoração, e que a respiração esteja livre. Quando são falsas-membranas para amollecer e despegar, adopto o conselho do sr. Trousseau, e emprego meia colher, das de cha, de agua morna e depois metto a esponja como no primei- ro caso para conseguir a extracção e saída d'aquellas substancias, re- petindo a manobra quatro e cinco vezes nas vinte e quatro horas. E” um bom auxiliar nas duas variedades da segunda especie, fazer” bas- tante humida a atmosphera do quarto pela vaporisação de agua quen- te, pelo modo que disse precedentemente. Até 1839 o sr. Trousscau fazia varias vezes instillações de uma dissolução de nitrato de prata, enchendo do liquido caustico o tubo de uma penna de escrever que despejava na tracheia, aproveitando o mo- mento da inspiração, instillando logo depois agua morna, e introdu- zindo a lanada de esponja. Mas desde aquella época abandonou simi- 16 + 124 ESTUDOS SOBRE lhante pratica, sobre tudo depois que viu Gerdy e A. Berard curarem doentes de crup pela trachciotomia, sem lhes fazerem nenhuma ou- tra especie de tratamento. Recentemente o sr. Barthez recommendou as instillações de uma dissolução de chlorato de soda, repetidas de quarto em quarto de ho- ra, com o fim de promoverem a diffluencia das falsas-membranas; mas não se acredita geralmente que algumas gottas de dissolução d'aquelle sal langadas na tracheia, e que a tosse rejeita promptamente, possam ter o effeito dissolvente que lhe suppunha o illustre medico do hospi- tal de Sainte-Bugenie, e que só póde ter uma demora de contacto muito prolongada. No principio do periodo moderno da historia da operação usava- se tambem muito vasculhar a tracheia para a limpar, destacando as mucosidades e falsas-membranas. Bretonneau foi o auctor d'este metho- do, cujos instrumentos eram a lanada de esponja e a de clina em que já fallei, Usava um ou outro destes instrumentos segundo a consis- tencia e adhesão das materias que se deviam extrair, introduzindo-o na abertura da tracheia, fazendo-lhe percorrer uma extensão maior ou me- nor do canal aéreo, e tentando extrair a falsa-membrana ou o muco existente. Depois punha a canula, ou cauterisava préviamente a tracheia por meio da lanada de esponja molhada em uma solução caustica. Este procedimento era repetido muitas vezes no dia. O medico de Tours usava este processo de limpeza da tracheia no tempo em que empre- gava na tracheiotomia a canula simples. O sr. Trousseau seguiu e aconselhou nos primeiros tempos da sua pratica o mesmo systema do mestre com alguma modificação. Em pri- meiro logar fazia a cauterisação da superficie mucosa da tracheia logo depois da operação; e praticava-a de dois modos: ou tocava toda a su- perficie da tracheia que podia com a lanada embebida de uma dissolu- ção concentrada de nitrato de prata em agua distillada (1:4), pelo me- nos por tres vezes no primeiro dia ec duas vezes nos dias seguintes; ou instillava na tracheia, como já disse,'uma dissolução caustica menos forte (1:20) por meio de um tubo de penna de pato, correndo depois varias vezes a superficie mucosa com a lanada de esponja, até que as vias aéreas estivessem desobstruidas e limpas. Este processo era repe- tido duas e tres vezes por dia durante os tres primeiros dias. O pri- meiro processo de cauterisação era o unico de que fazia uso Breton- neau. O segundo aconselhava-o o sr. Trousseau nos casos graves em que as falsas-membranas desciam para a tracheia. Mas hoje, tanto o mesmo sr. Trousscau como os outros praticos, A TRACHEIOTOMIA 125 têem limitado ou abandonado estes diversos meios. A cauterisação da su- perficie da tracheia está universalmente condemnada, porque sem ella se curam muitos doentes, e porque as experiencias nos animaes demon- straram, que, quando os liquidos causticos caíam nos bronchios, podiam coagular o muco n'elles contido, e obstruil-os, assim como póde deter- minar graves lesões no parenchyma pulmonar. Quando se faça sómente a limpeza da tracheia vasculhando-a com a lánada de esponja, que é a menos nociva, póde ainda haver alguma vez o inconveniente de empur- rar, para a parte inferior da tracheia, falsas-membranas collocadas supe- riormente, seguindo-se por tanto a asphyxia. Empregando o instrumento de crina, que é uma verdadeira escova aspera, é facil ferir a mucosa da tracheia e dar logar a hemorrhagias e à propagação da diphtheria. Cauterisação da ferida. Na superficie da ferida que resulta da ope- ração da tracheiotomia motivada pelo crup, como em todas as solu- ções de continuidade das pessoas que padecem a diphtheria, nas super- ficies onde foram applicados vesicatorios, nas feridas de sanguesugas, etc., ha uma extraordinaria tendencia para se manifestarem prompta- mente producções plasticas que augmentam muito a gravidade da doen- ca, já porque podem estender-se e propagar-se pela tracheia, e produ- zir a asphyxia, já porque podem concorrer para a infecção diphtheri- ca secundaria que está, quasi sempre ao contrario da infecção primi- tiva, na razão directa da quantidade e extensão dos productos pseu- do-membranosos que se alteram e são absorvidos. Esta cauterisação tem ainda outra vantagem, a de impedir ou combater a propagação morbida ao tecido cellular ambiente, e o des- envolvimento de inflamações phlegmonosas de mau caracter, que téem por terminação a gangrena local, e uma febre de má natureza que ra- ras vezes se póde vencer. E por isso muito conveniente prevenir a for- mação d'esses productos, ou destruil-os logo que apparecem, por meio das cauterisações. Tenho seguido sempre esta pratica com excellente resultado nos seis operados que hei conseguido salvar pela operação, e a este modo de proceder attribuo eu uma boa parte da cura, e a felicidade da mi- nha estatistica, em que a curabilidade é de 1:2,66. Na cauterisação a que alludo procedo do seguinte modo. Se o crup é simples, tiro às canulas no dia immediato ao da operação, ordi- nariamente quando se completam vinte e quatro horas; limpo a ferida e suas proximidades com esponja fina humedecida em agua morna, e enxugo-a devidamente com a lanada de esponja ou com fios na extre- midade de uma pinca. Passo depois á cauterisação, que pratíco com o 126 ESTUDOS SOBRE nitrato de prata 'solido em toda a extensa superficie que a ferida tem então, desde os tegumentos até á tracheia, ainda mesmo que tenha bom aspecto e que ainda não haja nem pontos diphthericos, nem fal- sas-membranas. Immediatamente depois enxugo tambem por aquelle mesmo modo toda a superficie cauterisada, para que o caustico que se dissolve no liquido segregado pela ferida, não corra para dentro da tra- cheia e lhe irrite e cauterise a mucosa. Introduzo depois o dilatador, e com o seu auxilio reapplico as canulas perfeitamente limpas. Esta operação é repetida do mesmo modo todas as vinte e qua- tro horas até o 4.º ou 5.º dia depois da operação, ou até que o bom as- pecto da ferida indique que se deve suspender. - Se o garrotilho, em consequencia do qual se fez a operação, tem signaes de infectuoso ou maligno, começo mais cedo a cauterisação da ferida, isto é, entre doze e dezoito horas depois da tracheiotomia, e repito-a todos os dias como no primeiro caso. O sr. Trousscau faz actualmente a primeira cauterisação logo de- pois da operação. No hospital de creanças de París nunca a praticam antes de passadas vinte e quatro horas; e deixam de a fazer quando as creanças não são bastante doceis, e quando tenha sobrevindo febre, no qual caso esperam que este phenomeno tenha melhorado. Parece-me exagerado um e outro modo de proceder. A cauteri- sação de toda a susperficie traumatica, tão viva e sangrenta, logo depois da operação, deve ser summamente dolorosa e além d'isso difficil, por- que, para ser bem feita, obriga a tirar as canulas para se reapplica- rem de novo antes de estabelecidas as adherencias que a inflanmma- ção fórma depois, e não tem a menor vantagem, mas antes inconve- nientes, quando o crup não é maligno. Esperar pelo menos vinte qua- tro horas e mais para a fazer, e mesmo não a praticar senão quando a creança é docil, e quando não tem febre, ou esta tem diminuido muito, é expôr-se muitas vezes aos perigos que procedem de deixar crear e estenderem-se falsas-membranas, cuja presença, desenvolvi- mento e propagação deve inspirar os mais serios cuidados. Por estas considerações procedo como disse, sem que me desvie d'essa regra nem a indocilidade do doente, nem a manifestação da fe- bre. Creio e confio bastante no meio para deixar de o fazer com to- das as condições da melhor efficacia. A época em que se deve tirar a canula não é determinada. É muito conveniente tiral-a o mais cedo possivel, para evitar os accidentes que já referi a pag. 118, mas raras vezes se póde dispensar antes do 5.º ou 6.º dia; assim como é raro que se precise conserval-a além do 9.º A TRACHEIOTOMIA 127 ou 10.º. Citam-se todavia casos em que foi preciso demoral-a quinze, vinte, trinta, e quarenta e quatro dias como aconteceu com um doente do sr. Trousseau. Este mesmo medico cita outro facto em que a ca- nula se conservou durante cinco annos, só depois dos quaes se pôde dispensar, ficando comtudo uma fistula que o individuo conservava ain- da por occasião de se publicar o 1.º volume da Clinique médicale do respeitavel professor da Faculdade de Medicina de París, em 1861. O que impede que os doentes respirem pela larynge n'estas cir- cumstancias póde ser: falsas-membranas ainda existentes na glotte, mu- co mais ou menos espesso, alguma inchação da mucosa laryngea, assim como uma certa falta de habito nos musculos correspondentes em se contraírem harmonicamente para as necessidades da respiração. Nos meus seis operados que se curaram pude tirar definitiva- mente a canula em dois ao 6.º dia, em um ao 7.º, e em tres ao 9.º dia. Nas doze operações seguidas de cura em Lisboa, comprehendendo as minhas seis, o resultado n'este ponto foi o seguinte: NUMERO DE DIAS NUMERO DE CASOS SP sn entráio dad | pus oe RN e I OU a Ce nie gi 1 Total...... 84 b 12 O minimo da conservação da canula foi, pois, como se vê, de tres dias, o maximo de doze, e a media de sete dias, que se póde reputar como” indicando o termo mais proximo da verdade. Todos conhecem a grande conveniencia de saber, a occasião mais opportuna para tirar a canula sem perigo de reapparecer a suffocação; mas nenhum signal havia sido dado para o caso pelas pessoas mais com- petentes no assumpto. , No caso sujeito o sr. Trousseau procede do modo seguinte. No fim da primeira semana tira as canulas, tendo cuidado de não assus- tar nem fazer chorar as creanças, porque, costumadas a respirar pelo tubo artificial, quando se vêem privadas d'elle, agitam-se e choram 126 ESTUDOS SOBRE por tal fórina que a respiração se lhes accelera muito, ainda que den- tro em pouco se consegue socegal-as. Então fecha a ferida com tiras de esparadrapo inglez, que conserva se o ruido da respiração e da tos- se, e se a natureza da voz ou do grito, indicam que a abertura da glot- te está sufficientemente dilatada para admittir a quantidade de ar pre- ciso para toda a respiração. Se pelo contrario o ar passa, mas não é bastante, se a creança respira mas com difficuldade, não põe as tiras adhesivas, e limita-se a cobrir a ferida com um panno esburacado, com-uma camada de ceroto, e espera até ao dia seguinte para a fe- char. Se nenhum ar passa pela larynge, então reapplica a canula, e espera dois ou tres dias para fazer nova tentativa. Pela minha parte nunca experimentei dispensar a canula antes de desapparecerem as producções membranosas, tanto da ferida da ope- ração como das superficies mucosas invadidas pela diphtheria; e ainda hoje o mesmo signal me serve para os casos de crup que não é acom- panhado de albuminuria. Mas n'estes ultimos annos, desde 1859, nos estudos que fiz da albuminuria nas affecções diphthericas, cujos resul- tados publiquei na Gazeta Medica de Lisboa em data de 27 de dezem- bro d'aquelle anno; e nos que se seguiram e que referi na minha Me- moria sobre o garrotilho (pag. 82 a 108), tenho que a cessação da al- bumina das urinas, quando haja existido sem ser explicavel por es- carlatina concomitante ou pela asphyxia, isto é, pela congestão renal, é o indício de haver terminado a infecção diphtherica, e de ter cessa- do a disposição para novas formações pseudo-membranosas, Este signal negativo, pois, o desapparecimento da albumina das urinas n'aquellas circumstancias, indica-me a occasião mais opportuna para dispensar a canula sem perigo de reproduçção das falsas-membra- nas na larynge, nos casos de crup com albuminuria que não dependa de escarlatina ou de asphyxia. Nos outros casos o criterium que me ser- ve para começar as tentativas de ablação da canula é, como disse, o desapparecimento do elemento diphtherico. Em todo o caso é quasi sempre ao 5.º ou 6.º dia, rarissimas vezes antes, que é permittido tirar a canula. Tirada a caúula, fecho com os de- dos a ferida unindo-lhe os labios, e obrigo o doente a fallar-ou a so- prar uma vela accesa. Se o ar passa atravez da glotte, ainda assim não fecho definitivamente a ferida; mas limito-me a collocar adiante d'ella um panno esburacado, com ceroto, ou uma leve prancheta de fios tam- bem untada, e ponho por cima a gravata de cassa frôxamente man- tida á roda do pescoço. Passadas quatro horas, vejo o doente para co- nhecer o modo por que se faz a respiração, pois ainda é tempo de A TRACHEIOTOMIA 129 reapplicar a canula se fosse preciso. Se por esta occasião a respiração se faz perfeitamente pela larynge, uno então a ferida com tiras adhesi- vas, aliás espero o dia seguinte para o fazer. Dou-me bem com este modo de proceder, no caso sujeito, por- que deixo o espaço de muitas horas para que a economia habitue de novo os orgãos respiratorios ao antigo modo de introducção do ar no pulmão; assim se vai a larynge desembaraçando pausadamente de al- gum muco ou de porções diphthericas que ainda a possam obstruir, e os musculos vão tomando paulatinamente os antigos habitos que tem- porariamente haviam perdido. Quando pareça pela demora no restabelecimento da respiração la- ryngea que a glotte está obliterada por falsas-membranas que não cáiam espontaneamente, deve-se proceder á respectiva desobstrucção, introdu- zindo uma lanada-de esponja na parte superior da tracheia, até se con- seguir a remoção indicada. O curativo da ferida faz-se muito simplesmente. Tirada definiti- vamente a canula, aproximam-se os labios da ferida por meio de tiras adhesivas ou de esparadrapo inglez, da largura de 1 centimetro e do comprimento de 12 centimetros, deixando ficar entre ellas um inter- vallo de 2 ou 3 millimetros. Por diante das tiras appõe-se uma prancheta de fios e um ligei- ro chumaço, e mantem-se o apposito com uma leve tira de panno ou com um lenço á roda do pescoço. No primeiro dia é geralmente pre- ciso renovar este curativo tres ou quatro vezes, por motivo do muco que sáe ainda pela ferida em maior ou menor quantidade; mas nos dias seguintes basta quasi sempre um ou dois curativos diarios. Uma ou outra vez é conveniente auxiliar o trabalho da cicatrização, tocan- do com o nitrato de prata as granulações ou botões carnosos, que mos- tram signaes de pouca vitalidade. Para o fim bastam os fios com ce- roto de espermaceti, os fios seccos ou o cotão de linho. É muito para notar a facilidade com que a parte profunda da ferida da tracheiotomia se oblitera depois de tirada a canula. No fim de quatro ou cinco dias, e ás vezes no fim de dois a ferida da tracheia está A fechada. A parte mais exterior da ferida cicatriza tambem muito prom- ptamente. Nos meus seis operados que se curaram, a ferida exterior estava unida, em um caso, aos quinze dias depois da operação e aos seis da ablação da canula; em outro aos dezeseis dias depois de ope- rado, e ao decimo de tirada a canula; em dois aos dezesete dias da operação e aos oito e onze depois de dispensada a canula; em outro MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. HI. P. I. 17 130 ESTUDOS SOBRE aos dezoito dias depois de operado e aos nove de ablação da canula; no ultimo aos vinte e um da operação, e aos quatorze dias depois de tirada a canula. É Nas doze operações de tracheiotomia de que os doentes de crup se curaram em Lisboa, nas quaes incluo as minhas, o resultado n'este ponto foi o seguinte : NUMERO N.º DE DIAS QUE A FERIDA N.º DE DIAS QUE A FERIDA DE LEVOU A CICATRISAR DE- LEVOU A CICATRISAR DE- Casos POIS DA ABLAÇÃO DA CA- POIS DA OPERAÇÃO. NULA. | ben fair ginde rede FOPRUA LU TE ae 15 a alud isento si 19 Le pa dd caco SARA APRE E N PR PRE ar 17 APR do cite tesarad OO E free 18 RSRS DE O dp 15 o RAMAIS PNR JE TU PRN [MP Nda 16 E PESO MO SPO DD : 17 PESA RE A pe 921 a E 18 Pe AP pm 20 a eras Dl Total... 1 to [a re to 226 Com relação á época em que a canula foi tirada, a cicatrização completa da ferida exterior estava, pois, estabelecida entre seis e vin- te um dias, sendo a media de 11,83 dias. E relativamente á época da operação, a cicatriz completou-se entre quinze e vinte e sete dias, sendo a media de 18,83 dias. Em casos excepcionaes acontece que o doente respira pela laryn- ge, mas a despeito dos meios empregados para obter a cicatrização da ferida, esta não fecha e conserva-se fistulosa. Uma. similhante occor- rencia significa geralmente que ha algum trabalho phlegmasico do ap- parelho respiratorio, como a pneumonia ou pleuriz, sem a resolução do qual se não vê a fistula aérea desapparecer pela cicatrização da fe- rida tracheial. Ha exemplos d'estes, acontecidos com os srs. Blache e: Trousseau, nos quaes a ferida se conservou aberta por similhante cau- sa durante quarenta e cincoenta dias. A, TRACHEIOTOMIA 131 TRATAMENTO GERAL No tratamento geral dos operados comprehendo o que é feito pela alimentação e pelos meios therapeuticos. A alimentação dos operados pelo crup é objecto muito importante pela influencia capital que póde ter nos resultados da operação. Nunca os prejuisos da medicina de Broussais forão tão evidente- mente nocivos como nas doenças das creanças e sobretudo na diphthe- ria. A abstinencia ou a dieta tenne, como todo o tratamento debili- tante, é n'esta doença sobre modo funesta, por augmentar muito a fra- queza dos doentes já debilitados pela acção propria da molestia, por lhes tirar as forças precisas para a reacção salutar, por favorecer a in- fecção diphtheritica facilitando a absorpção dos productos diphtheri- cos, por se oppôr á promptidão da convalescenca e da cura definitiva, e em fim por facilitar à manifestação dos accidentes nervosos que po- dem vir consecutivamente ás doenças diphthericas. Por estes motivos, e pelo que escrevi nos Estudos sobre o crup, no tocante ao effeito do tratamento antiphlogistico e á natureza do garrotilho, aos operados da tracheiotomia pelo crup deve dar-se uma alimentação tão substancial quanto possivel, e obrigal-os mesmo, se tan- to fôr preciso, a tomarem os alimentos que se lhes aconselhar. A alimentação que costumo mais habitualmente prescrever é a seguinte. Nas primeiras 24 ou 48 horas alimentação liquida, que con- siste em bom leite, que é o melhor alimento que se póde dar aos ope- rados pela facilidade com que é digerido, e por ser sufficientemente alimentício quando é tomado em certa quantidade. Costumo fazer be- ber duas a quatro onças de 2 em 2 ou de 3 em 3 horas conforme a idade das creanças. Quando os doentes se prestam, alterno o uso do leite com o de bom caldo de carne de vacca, nas mesmas dóses e com os mesmos intervallos. Ao 2.º ou 3.º dia, senão ha contraindicação especial, prescrevo Já os caldos de farinhas, de feculas, de aletria, feitos em leite ou em caldo, o creme de leite e a geléa de mão de vacca se os doentes a ap- petecem. E Ao 3.º ou 4.º dia faço juntar ovo aos caldos de leite, e aconselho tambem as sópas de pão em leite, ou em caldo de carne, chocolate de salepo com leite, etc. Ao 4.º ou 5.º dia, se tudo caminha bem, conforme a idade dos operados, permitto ovos quentes, um pouco de gallinha ou antes de : 17. 132 ESTUDOS SOBRE “carne cozida, beef de vitella ou de vacca, etc. Depois vou augmentan- do a quantidade e modificando a qualidade da alimentação, em har- monia com os habitos anteriores dos doentes, sua idade, appetite e ou- tras circumstancias da occasião. - Se o crup é infectuoso ou tem tendencia para se tornar maligno deve accrescentar-se o uso do vinho do Porto ás colheres, das de chá, em caldo ou em agua com assucar; o uso de café com um ou mais grãos de sulfato de quinina por dóse, ete. Por meio da boa alimentação modificada e variada segundo as circumstancias, consegue-se muitas vezes evitar as absorpções dos pro- ductos diphthericos, e diminuir as probabilidades de infecção, assim como tornar mais prompta a cura, menos longa e menos perigosa a convalescença. | O tratamento medicamentoso que uso nos meus doentes, divido-o em externo e interno. Como tratamento externo aconselho sobre as falsas-membranas da pharynge ou da bocca, quando existem, a continuação dos collutorios com alumen ou tannino, com quanto aconteça muitas vezes que as falsas-membranas d'essas regiões, uma vez chegadas ao termo da sua duração ordinaria, se despegam espontaneamente e desapparecem. Ha- vendo diphtheria cutanea são indicadas as cauterizações como nitrato de prata, e os curativos com o pó de alumen ou de tannino, ou com pomada de ratanhia ou d'aquelle acido bem vigorada. O tratamento interno que prescrevo limita-se ao chlorato de po- tassa, 4 a 8 grammas em dissolução, distribuidas pelas 24 horas, em quanto ha manifestações diphthericas, ou em quanto não existe albu- mina nas urinas que se não explique por congestão renal. Nestas cir- cumstancias a albuminuria é em minha opinião o effeito da infecção diphtherica comecada e traduz a alteração do sangue. N'este caso abro logo mão do chlorato de potassa para o substituir pelo tratamento de- terminadamente tonico feito pela quina ou pelo sulfato de quinina, pelo perchlorureto de ferro em limonada ou em xarope, etc. Quando ha difficuldade de respiração por falta de expectoracão, dá ás vezes bom resultado o kermes (5 a 10 centigrammas) em looch branco ou xarope de violetas, etc. Havendo dyspnéa com fervores mu- cosos muito abundantes é preferivel o xarope de ipecacuanha em pe- quenas dóses. No caso em que as hypotheses precedentes se dêem em operados muito debilitados, é bom addiccionar ao tratamento indicado o xaro- pe ou extracto de quina, etc. . A TRACHEIOTOMIA 138 Quando sobrevem complicações combatem-se pelo modo que in- diquei a proposito de cada uma. k Se restam phenomenos nervosos secundarios, como muitas vezes succede depois da diphtheria, se os individuos ficam fracos e anemi- cos, como não é raro acontecer, além da therapeutica geral apropria- da áquelles estados, é muito vantajoso insistir no tratamento tonico pela boa alimentação, pelos preparados ferruginosos, tonicos amargos, ar do campo, banhos salgados, etc. Dou aqui por terminado o tratamento dos operados. Seguem-se como complemento d'esta Memoria as trinta e oito observações, que me serviram de base para esta obra. 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Joaquim Theotonio da Silva). «No dia 27 d'agosto de 1851 fui chamado para tratar R.. de 10 annos d'idade, temperamento lymphatico, e que tinha sido sempre sau- davel. Sofíria havia oito dias dôr na garganta e tosse. N'este dia pela manhã queixou-se de calefrios, estava abatido, tinha febre, calor de pelle pouco augmentado, alguma agitação ; fastio, tumefacção dos gan- glios submaxillares ; mucosa da pharynge, amygdalas e uvula verme- lha e inchada, mas não tendo camadas diphthericas ; respiração acce- lerada e curta, dyspnéa, voz rouca, accessos de tosse produzindo ligei- ra suffocação, e com um timbre e caracteres taes, que por si só bas- tavam para estabelecer o diagnostico. Tratamento: um escropulo de ipecacuanha em quatro dóses com intervallo de meia hora; um vesi- catorio entre espaduas ; caldos de gallinha. tí horas da noite. Desde as 10 horas sentiu-se muito anciado, a agitação augmentou, o calor da pelle diminuiu, o pulso tornou-se mais pequeno e frequente. Orthopnéa, suffocação, aphonia, inspirações cur- tas e sibilantes, voz e tosse decedidamente crupaes. Apenas vomitou duas vezes com a ipecacuanha. Sinapismos, meio grão de emetico de quarto em quarto de hora, 28. — 5 horas da manhã. Todos os symptomas da vespera exa- 136 ESTUDOS SOBRE cerbados, posto que vomitasse e experimentasse logo depois algum alli- vio, chegando a conciliar o somno, de que ecra despertado por um ac- cesso de tosse secca; então o doente sentava-se na cama, apoiando-se sobre as mãos, lançando a cabeça para traz, e levando a mão á gar- ganta como para tirar o corpo que o suffocava; a aphonia era com- pleta, o pulso muito concentrado, e a pelle fria. 8 horas. Conferencia com os srs. Francisco Alberto d'Oliveira e Frederico Augusto da Silva; concordou-se em que se procedesse imme- diatamente á operação da tracheiotomia. Collocado convenientemente o enfermo, com o peito e cabeca mais elevados que o resto do corpo, fiz uma incisão no pescoço na linha me- dia e desde a parte inferior da larynge até o bordo superior do ester- no, dividindo a aponevrose cervical superficial e descobrindo os mus- culos esterno-hyoideos; separei sem dividir algumas veias do plexo thy- roideo, os musculos esterno-thyroideos, e depois de verificar que não existia a arteria thyroidea de Neubauer, ou alguma outra anomalia, colloquei o dedo indicador esquerdo sobre a tracheia, cortando um dos seus anneis (o 3.º) com um canivete de ponta, que foi logo substitui- do por outro de botão, com que dividi longitudinalmente mais tres anneis (4.º 5.º e 6.º) poupando o corpo thyroideo. Durante a expira- ção que succedeu a uma inspiração profunda saíram pela ferida mu- cosidades juntas a algum sangue que tinha caído para a tracheia. Ser- vi-me do dilatador de Trousscau para introduzir a canula dobrada de Borgellat, que fixci por meio de duas fitas atadas ao pescoço do pa-: ciente. Consideravel allivio depois da introducção da canula; somno in- terrompido por alguma tosse e sede. Capilé para bebida ordinaria, cal- dos de gallinha. Meio dia. O mesmo estado; pulso mais largo; pela auscultação percebi a entrada do ar até ás ultimas ramificações bronchicas. 8 horas. Tendo passado bem, esteve comtudo a ponto de asphy- xiar-se, porque o enfermeiro tirou as duas canulas para as limpar e teve difficuldade em introduzil-as. Meia noite. Não teve novidade. 9 29. — 5 horas da manhã. Passou a noite soflrivelmente, dormiu, teve sede, alguma tosse e febre. Dois grãos de calomelanos de duas em duas horas, fricções no pescoço com pomada mercurial. . t1 horas. Foram substituidas as canulas por outras mais estrei- tas feitas pelo sr. Antonio Polycarpo. A TRACHEIOTOMIA 137 30. — 6 horas da manhã. Nenhuma alteração notavel tinha ha- vido no dia e noite antecedentes, o doente tinha estado alegre; toda- via pela madrugada começou a achar-se mais abatido, tinha alguma dyspnéea, pulso mais pequeno; a percussão dava um som claro em todo o peito; pela auscultação, porém, não se percebia o murmurio vesicu- lar tão bem como na vespera, e ouvia-se um fervor mucoso e sibilante. Introduzi-lhe uma canula mais larga, furada na parte posterior e supe- rior, depois de limpa a tracheia com a lanada de esponja de Bretonneau. Repete os calomelanos, renova-se o vesicatorio que estava quasi secco, não se formando camada diphtherica na derme ; bebidas do centes, geléa, caldos, etc. Meio dia. Mais socegado. Tinha expellido grande quantidade de mucosidades pela canula; menos dyspnéa. 7 horas. Expulsão de duas falsas membranas, que appareceram na abertura superior e posterior das canulas, estando uma d'ellas in- troduzida na abertura inferior da larynge. 31.— 6 horas da manhã. Passou menos mal a noite; appetite. Agua de Vichy, calomelanos, geléa. Meio dia. Sede, febre, pulso pequeno, mais oppressão e dyspnéa, inspirações difficeis acompanhadas de silvos, exigindo a cooperação de todos os musculos que as possam auxiliar ; respiração accelerada, tosse vindo por accessos e dando logar á expulsão de muco grosso e espu- moso, vindo alguns retalhos de falsas membranas; face exprimindo grande anciedade e cheia de vergões azulados. Limpa-se a tracheia a miudo. 9 horas da noite. O mesmo estado. 1 de setembro. — 6 horas. Não póde estar senão sentado firman- do-se nos braços, cabeça inclinada para a parte posterior, abatimento, grande anciedade, vergões azulados em todo o corpo, mormente na face e extremos; a passagem do ar na tracheia faz ouvir a grande distancia um estertor, que diminue um pouco quando se limpa este tubo. Faculdades intellectuaes sempre em bom estado. 11 e meia horas. Morte. Não pôde fazer-se a autopsia. » OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e garrotilho em uma menina de 5 annos; tra- cheiotomia ao decimo dia de doença, no periodo asphyxico; morte 41 MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. III. P. I. 18 138 ESTUDOS SOBRE horas depois da operação. (Observação e operação pelo sr. Joaquim Theo- tonio da Silva). «Na tarde do dia 22 de novembro de 1851 fui chamado para ver a filha do sr. €. J. B., que se achava doente na Charneca. Eram 7 horas da tarde quando ali cheguei, e encontrei o meu collega e ami- go, o sr. Augusto Cesar Gomes de Carvalho, que me informou de que a menina estava doente havia nove dias, e de que a sua doença come- cára por tosse, dôr e rubor na pharynge, alguma dyspnéea, fastio, se- de, dôr epigastrica, e constipação de ventre; que tudo isto sobreviera a uma suppressão de transpiração. Para debellar estes incommodos ti- nha o meu collega empregado uma pequena sangria geral (4 onças), sanguesugas no pescoço, laxantes, demulcentes, e dieta tenue. Tendo porém augmentado a dyspnéa, enrouquecido a voz, e não sabendo o “sr. Carvalho o estado da pharynge, porque a doente recusava mostral-a, pediu a presença d'algum outro collega. Passando a examinar a doente, que era robusta e tinha 5 annos d'idade, pude com difficuldade inspeccionar a pharynge, que achei co- berta d'uma camada diphtherica ; a lingua alvacenta, larga e humida ; tosse crupal, voz rouca, respiração frequente e ruidosa. Pela ausculta- ção percebia-se algum fervor mucoso; o ar entrava até as ultimas ra- mificações bronchicas ; som claro em todo o peito. Pulso frequente e cheio, calor de pelle augmentado, face rosada. Tratamento: tartaro emetico em dóse vomitiva; depois cauteri- zação da pharynge com uma dissolução de nitrato de prata; sinapis- mos. Concordámos em que se estes meios não aproveitassem, se em- pregariam os calomelanos, a pomada mercurial, os vesicatorios, e por ultimo a tracheiotomia. O pae da doente manifestou desejos de que sua filha fosse trans- portada para Lisboa, aonde mais facilmente se poderiam empregar to- dos aquelles meios ; com authorisação nossa foi pois conduzida no dia seguinte (23) para Lisboa, aonde chegou ás dez horas da manhã, e im- mediatamente foi vista por mim e pelo sr. Francisco Alberto d'Oli- veira. ; A menina tinha vomitado com o emetico, tinha sido cauterizada, vindo com as materias vomitadas alguns fragmentos de pseudo-mem- branas; a camada diphtherica que revestia as amygdalas e pharynge era menos espessa, a voz mais clara. Os outros symptomas no mesmo estado. Tratamento : seis grãos d'ipecacuanha de quarto em quarto de A TRACHEIOTOMIA 139 hora até vomitar ; cauterização com uma dissolução concentrada d'azo- tato de prata (uma oitava por onça d'agua distillada), um vesicatorio entre espaduas. 1 hora da tarde. O mesmo estado. Sómente vomitou uma vez com 24 grãos d'ipecacuanha. Ficou tomando de duas em duas horas um grão de calomelanos, e decocto de althéa para bebida ordinaria. Não quiz tomar caldos nem geléa - 8 horas da noite. Orthopnéa, timbre de tosse mais agudo, pulso mais frequente e deprimido. Tratamento : titillação da uvula para pro- vocar o vomitq, nova cauterização, continuaram os calomelanos. 11 horas da noite. A doente tem estado muito agitada ; desde as nove horas e meia a dyspnéa augmentou ; ameaçada frequentes ve- zes de suffocação, tenta levantar-se da cama, inspirações ruidosas e acceleradas, côr livida na face, strabismo, aphonia, pulso miseravel, indiflerença para tudo que a cerca. A asphyxia está imminente. N'este momento chegou o sr. F. A. de Oliveira. Concordámos que a tracheio- tomia se devia praticar sem demora, é logo fiz uma incisão nos tegu- mentos do pescoço, que chegou até a aponevrose. Quando ia verificar a direcção das veias e arterias d'aquella região, a doente revirou os olhos para a «parte superior, contrahiu os musculos da face, perdeu o pulso, e deixou de respirar. . .. Cravei então a ponta do escalpello na tracheia, logo abaixo da cartillagem cricoidea, e abri largamente aquelle canal, cortando-lhe quatro ou cinco anneis ; afastei os labios da ferida, mas nenhum movimento respiratorio ; introdúzi a canula de prata, a mesma impassibilidade ! Apesar de quasi me persuadir que d'ali por diante seriam inuteis quaesquer tentativas para chamar a doente á vida que, bem parecia, acabava de perder, appliquei os meus labios sobre a abertura da canula, suguei por tres vezes todas as mucosidades que a trachéa continha, insufílei depois nos pulmões produzindo assim uma respiração artificial. Quando tinha insufflado sete ou oito vezes, a doente começou a respirar a principio lentamente; o pulso reappareceu, mas tardo e pequeno; a face conseryou-se pallida por alguns minutos, po- rém no fim d'um quarto de hora a respiração já se fazia sem ruido algum, a circulação estava mais accelerada, o calor da pelle era nor- mal, os olhos estavam animados, e a doente aa a presença da sua enfermeira predilecta. Dormiu quasi toda a noite, acordando apenas tres ou quatro ve- zes para pedir agua, ourinar e defecar ; alguma tosse. Foi necessario uma vez tirar a canula para a limpar. 24. — Foi chamado o mesmo enfermeiro que assistiu ao doente 18 « 140 ESTUDOS SOBRE da 1.º observação para limpar a canula na nossa ausencia. Continuação dos calomelanos, fricções de pomada mercurial; cura-se com basilicão o vesicatorio que não tinha camada alguma diphtherica. Não póde in- speccionar-se a bocca posterior. Meio dia. Alguma tosse, febre, sede; recusa todo o alimento. Caldos em clyster, e tudo o mais o mesmo. 3 horas da tarde. Começa a respiração a ser ruidosa, a doente a estar mais agitada, o pulso a deprimir-se. Tirada a canula, vê-se a parte posterior da tracheia revestida d'uma camada branca ; limpa-se . esta com a lanada d'esponja de Bretonneau, applicando com este mes- mo instrumento alguns calomelanos. Meia noite. A creança estava quasi asphyxiada, tirou-se imme- diatamente a canula, e limpou-se a tracheia, o que provocou tosse e a expulsão de dois cylindros de muco concreto similhante a grade, tendo cada um d'elles o diametro de duas linhas, e o comprimento de qua- tro a cinco. Copjunctamente com elles saiu um pequeno tubo de pseu- do-membrana muito tenue que tinha uma linha de diametro e outra de comprimento. Durante todo o resto da noite a doente teve alternativas ; ora es- tava tranquilla, conciliava o somno, e respirava sem grande ruido ; ora agitada e acommettida de tosse, orthopnea, etc. De ordinario ficava mais socegada depois de extrahidas da tracheia as mucosidades mais ou menos concretas que ali existiam, préviamente humedecidas por meio d'instillações feitas segundo recommenda o sr. Trousseau, ou por meio do vapor d'agua quente ultimamente aconselhado pelo sr. Elsaener. 25. — Na manhã d'este dia o quadro symptomatico assumiu pro- gressivamente a sua maior gravidade e exacerbação ; a respiração foi-se tornando cada vez mais difficil e ruidosa; a orthopnéa constante e acompanhada de contorsões de tronco e membros ; a pelle fria ; o rosto, mãos € pés lividos; o pulso filiforme e frequentissimo. Finalmente ás 4 horas da tarde a morte pôz termo a tão afílictivos padecimentos. » 3.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e garrotilho em uma doente de 17 annos; tra- cheiotomia ao 5.º dia, no periodo asphyxico; morte 2 horas depois. (Ob- servação e operação pelo sr. Joaquim Theotonio da Silva). « No dia 3 de julho de 1862 fui chamado pelas 9 horas da noite para vêr F. conjunctamente com o sr. F. A. Barboza. A TRACHEIOTOMIA , 141 Tinha a doente 17 annos de idade, temperamento lymphatico, e achava-se havia 3 dias aflectada d'uma angina, que não cedêra aos meios energicamente postos em pratica pelo meu collega;, taes como vomiti- vos, sanguesugas no pescoço, vesicatorio, demulcentes topica e inter- namente, dieta tenue, etc. Quando a observei era o estado da enferma o seguinte: verme- lhidão intensa no paladar e pharynge, inchação das amygdalas ; degilu- tição muito dolorosa e dificil; pulso pequeno e muito frequente ; pelle quente e sécca; a uvula, parte do véo palatino, e as amygdalas cober- tas de uma camada cinzenta, pouco espessa, muito adherente, e exha- lando cheiro gangrenoso, ganglios cervicaes e submaxillares inchados e dolorosos ; sede e fastio. Tratamento: tartaro emetico em dóse vo- mitiva, depois tocar a miudo as partes aflectadas com mel rosado e alumen ; calomelanos em dóse alterante; gargarejos demulcentes ; dieta; ealdos e gallinha. 4.-— 9 horas da manhã. A doente está muito áterrada, e pede que a peça da morte; passou a noite muito inquieta; pouco dor- miu; vomitou mas não expelliu falsas membranas algumas; estas estão menos adherentes que na vespera, mais espessas, e a mucosa proxima mais arroxada; ainda o mesmo cheiro gangrenoso ; com tima pinça po- demos separar a pseudo-membrana em que a uvula estava como en- castoada, depois as das amygdalas e paladar. Posta assim a mucosa a descoberto, podemos observar que ella não tinha perda alguma de sub- stancia, mas a superficie ficava um pouco desigual e dava logar a um corrimento pouco abundante de liquido sanioso côr de borra de vinho. Com uma esponja presa a uma barba de balêa e embebida n'uma dis- solução concentrada d'azotato de prata (oitava por onça) cauterisámos vigorosamente o paladar, as amygdalas e as paredes da pharynge, aon- de já começavam a apparecer algumas chapas diphthericas. Continuam os calomelanos, o mais o mesmo. 4. — 9 horas da noite. A subtracção das pseudo- membranas cau- sou um grande allivio á doente, permittindo-lhe mais facilidade na pro- nuncia das palavras; passou a manhã mais socegada ; porém de tarde, com a nova formação das camadas diphthericas, voltaram os antigos incommodos. Estas camadas, “posto que mais delgadas que as da pri- meira formação, estendem-se comtudo a toda a pharynge e ameaçam a larynge, pois a doente já tem tosse e rouquidão. Arrancam-se com bas- tante difficuldade as falsas membranas da uvula, amygdalas e de toda a pharynge, sendo depois todas estas partes cauterisadas com o nitrato de prata em substancia; ordena-se a ipecacuanha em dóse vomitiva, 92 ESTUDOS SOBRE applicações repetidas de mel rosado e alumen, gargarejos adstringen- tes, e a mesma dieta. 5.— 6 horas da manhã. Todos os symptomas do crup. Aphonia, tosse rouca, dyspnéa, ataques de suflocação, pelle cyanosada, frio d'ex- tremos, pulso filiforme e muito frequente, etc.; etc. Nova cauterização da pharynge, sinapismos nas extremidades; o mais o mesmo. Propõe-se á familia da enferma a operação da tracheiotomia, não escurecendo a pouca probabilidade do aproveitamento. A familia não annue. E' convidado o sr. dr. Bernardino Antonio Gomes para uma conferencia. S. s.º concorda com as nossas idéas, tanto a respeito de diagnostico, de prognostico, como de tratamento, julgando necessaria a operação indicada. A familia porém não tolerou que a operação se fizesse senão quando todas as esperanças de salvação estavam perdidas, e, talvez já muito tarde, abri a tracheia, e pude dar saida a grande quantidade de muco e sangue, que durante a operação tinha caído naquelle tubo. Vendo que a asphyxia continuava depois de aberta e dilatada a tracheia, imitei o procedimento de Roux, e, sem me lem- brar das propriedades contagiosas da diphtherite, aspirei as materias contidas nos canaes da respiração, applicando a minha bocca á ferida. Todos estes exforços foram baldados; a enferma é verdade que saiu do estado afflictivo em que estava antes de operada, mas 2 horas de- pois (11 da manhã) morreu sem agonia. Na tracheiotomia nada houve de notavel senão hemorrhagia venosa mais consideravel que nas crean- cas; apesar d'isso não liguei as veias; depois da aspiração das mate- rias, e de se ter restabelecido a respiração, o sangue deixou de correr. Como complemento d'esta observação, e esclarecimento a respeito do caracter contagioso da angina diphtherica, cumpre-me acrescentar o seguinte. No mesmo dia do fallecimento da doente tive que recolher- me á cama atacado de forte cephalalgia, quebramento de corpo, febre e fastio. Nessa nojte começaram a doer as amygdalas. O sr. F. A. de Oliveira, que me tratou, admittindo a possibilidade do contagio da an- gina diphtherica, fundando-se para isto num grande numero de fa- ctos observados pelo sr. Trousseau, Guersant e outros, cauterizou-me as amygdalas, e applicou-me o tartaro emetico como vomitivo, com o que a doenca se debellou em 8 dias, não apparecendo camada alguma diphtherica em nenhum dos pontos inflaramados. Devo ainda advertir, que a angina tonsillar simples é uma doen- ca a que sou muito attreito; e por tanto supponho que a angina que soflri não foi dependente de inoculação. » A TRACHEIOTOMIA 143 4.º OBSERVAÇÃO Diphtheria laryngo-tracheial, depois de escarlatina e de angina diphtherica, em uma menina de 6 annos; tracheiotomia no periodo as- phyxico; a canula dispensada ao terceiro dia; cura 18 dias depois da operação. (Observação e operação pelo sr. Joaquim Theotonio da Silva). « Laura, 6 annos, temperamento lymphatico, constituição fraca, sadia. - No 1.º d'outubro de 1852 foi acommettida de escarlatina com angina diphtherica, doença que então soffria sua mãi e um hospede adulto, e a que succumbiu seu irmão de 9 annos de idade, sendo n'este ultimo a doença acompanhada de symptomas typhoideos. A 18 do mesmo mez achava-se a doente restabelecida, postoque tivesse soffrido accessos durante a descamação, dôres ao longo da espi- nha e nas articulações, e algum edema na face que se dissipou em 3 dias. Passou bem de saude até 12 de novembro seguinte; n'este dia po- rém amanheceu pallida, impertinente e com fastio, não accusava comtu- do incommodo algum, conservando-se n'este estado nos dias 13 e 14. 15. — Aphonia, nenhuma tosse, tinha dormido bem de noite, e passou o dia alegre mas com algum fastio. - | 16.— Passou a noite inquieta, não appareceu tosse, dyspnéa ou febre; de manhã ainda estava aphonica e expellia das fossas nasaes gran- de quantidade de mucosidade. Ficou de cama no uso de cozimento de althéa e dieta de gallinha. 17.—2 horas da manhã. Alguma dyspnéa, as amygdalas volu- mosas e com manchas amarellas. É provocado o vomito com adminis- tração de quinze grãos de ipecacuanha; depois do vomito ficou soce- gada, dormiu até a madrugada em que teve novo accesso de suffoca- cão, sobrevindo-lhe ainda outro ás 11 horas. Meio dia. É vista pelo sr. dr. Simas, que descreve o estado da doente n'esse dia nos seguintes termos: « À creança quando eu entrei «andava de pé; parecia esperta, aindaque o seu olhar era triste e a «côr pallida. Apparentemente respirava bem. Nenhum calor de pelle, «e o pulso apenas accelerado; lingua limpa; amygdalas volumosas, mas «não muito; a côr era a mesma da mucosa ambiente. « Uma falsa membrana, um tanto amarellada á superficie da ton- « silla direita, do tamanho de uma ervilha e de fórma redonda. 144 ESTUDOS SOBRE « Não pude vêr se tinha algum prolongamento para o lado da «pharynge. A amygdala esquerda nada tinha n'este genero. «O ar penetrando na larynge, ou a respiração, é acompanhado «de um ruido caracteristico comparado exactamente ao de serrar a « pedra, mais exagerado no segundo do que no primeiro tempo. Vê- «se claramente de perto que a creança respira com difficuldade, os « musculos respiradores já se contráem visivelmente, e as fossas su- « pra-claviculares começam a deprimir-se sensivelmente no acto inspi- « rador. « Com uma esponja do tamanho e fórma de uma azeitona preta, « prêsa a uma barba de balêa dobrada em angulo recto, levei uma forte «dissolução de nitrato de prata até á extremidade superior da laryn- «ge, aonde me pareceu ter tocado, por quanto a esta operação se se- « guiu immediatamente um accesso de tosse convulsiva, que nada ex- « pelliu. « À respiração prendeu-se-lhe então, e houve uns ataques de suf- « focação bastante assustadores, que duraram apenas segundos. « À creança durante a operação contraiu os musculos como quem «chorava, mas não deitou nem uma lagrima. « Durante a suffocação, a face como que lhe inchava, e fazia-se «Tôxa, os olhos pareciam querer-lhe sair das orbitas, e com os braços « elevados procurava no vestido da mãe, que não largava um momen- «to, um ponto d'apoio para melhor poder respirar. O esforço era im- « menso e a afflicção intensissima. « Passado o ataque, continuava respirando como d'antes, mal, mas «apparentemente bem e de bocca fechada. Sem embargo ouvia-se-lhe «o ruido, de que fallei, principalmente no segundo tempo da respi- « ração. « Quando a creança procurava fallar, parecia um sôpro filiforme, « delgadissimo, que ella articulava. PRESCRIPÇÃO EM o [Efe MR A CAN RS O 0 EE LIGO, de ja polo ERR AME RRE AR o co AUD , AA, do pa ADE RA Rania Godi é 1d OSS « A's colheres de sôpa de cinco a cinco minutos até vomitos abun- dantes. « Mel rosado... ...... |. À ' ãa duas oitavas «Alumni A TRACHEIOTOMIA 145 « De meia em meia hora com o que podesse levar a extremida- «de de uma colher de chá. «3 horas. A creança vomitava muito, mas não expellia nenhum « corpo extranho; o mesmo estado da respiração que d'antes. Não teve « nenhum ataque de suffocação. « Ainda respira com a bocca fechada, porém as azas do nariz di- « latavam-se visivelmente. « Nenhuma tendencia para dormir. Principia-se a ministrar-lhe a « mistura aluminosa. «8 horas. A creança teve repetidos e,violentos accessos de suffo- « cação; estava em somnolencia. «O ruido da respiração, com o caracter acima apontado, ouvia-se “«a grande distancia em ambos os tempos. « Pulso accelerado; pelle fresca. Decubito lateral esquerdo, passan- «do com frequencia para o direito. Face pallida; bocca aberta; dilata- « ção violenta das azas do nariz. « Auscultada, murmurio vesicular sem estertor de qualidade al- «guma. « Na origem da tracheia um estertor sonoro e grave, que parecia « produzido por uma valvula. « Percussão sonora por toda a parte. O meu bom amigo e colle- «ga, o dr. Bocage, que teve a bondade de me acompanhar, observou « nesta occasião o que levo dito. « Este estado de somnolencia durava havia meia hora. A asphy- «xia de intermittente tinha-se tornado continua. « Decido em consequencia a operação, que é acceita pelos pais. « Convida-se o sr. Theotonio para este fim, que entendeu comigo «que a indicação de operar tinha chegado. » 11 horas da noite. Ouvida a historia da doença feita em poucas pa- lavras pelo sr. dr. Simas, e examinada rapidamente a doente, procedo sem demora á operação, que na realidade estava perfeitamente indicada. Serviam-me de ajudantes os srs. dr. Simas e Bocage, estando pre- sente o enfermeiro do hospital de São José, que tinha assistido ás mi- nhas operações de tracheiotomia. A operação foi feita pelo processo ordinario, não se apresentando coisa alguma de notavel, não houve hemorrhagia, porque as veias do plexo superficial, postoque muito dilatadas, corriam parallelamente á tracheia, e poderam afastar-se, não sendo necessario cortal-as. A ca- nula que introduzi era simples, porque a não tinha dobrada com o ca- libre que o diametro da tracheia exigia. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. HI. P. 1. TIO 146 ESTUDOS SOBRE A doente depois de operada ficou alegre, prestando attenção ás pessoas que, a cercavam, respirando sem ruido, apresentando porém al- guma tosse, e expellindo grande quantidade de mucosidades; a auscul- tação deixava perceber a entrada do ar em todo o peito, pulso a 110, calor de pelle augmentado. As' 2 horas adormeceu, acordando pouco mais ou menos de meia em meia hora. Está socegada, póde jazer de todos os lados. Toma por duas vezes dois grãos de calomelanos; não quer porém caldos nem geléa. 18.-——8 horas da manhã. Passou o dia sem novidade, tomou duas vezes os calomelanos e geléa, teve algumas dejecções liquidas. Extráem-se da tracheia dois pedaços de falsa membrana em parte ainda adherentes; nos bordos da ferida dos tegumentos tambem appa- recem camadas diphthericas; a ferida foi cauterizada com azotato de prata; limpa-se a canula a miudo. 19. —8 horas da manhã. Dormiu soffrivelmente de noite; tem alguma tosse, a respiração ruidosa, inquietação, pulso frequente, pelle quente, sêéde, nenhum appetite, diarrhea. 4 horas da tarde. Respiração mais ruidosa, alguma dyspnéa; o muco secca facilmente na canula, de modo que é necessario extraíl-a repetidas vezes. 11 horas da noite. Desde as 8 horas da noite a respiração tem- se tornado mais difficil, a agitação augmenta; a extracção da canula, a introducção do dilatador e da lanada, a instillação de algumas got- tas d'agua morna, a extracção de uma porção de falsa membrana, a cauterização da ferida, tudo foi ensaiado, mas pouco allivio causou á doente. Sobrevieram depois ataques de suffocação, que obrigaram a creança a fixar-se nos cotovellos e pés, ou a lançar-se ao pescoço das: pessoas que a cercavam; caíndo depois prostrada sobre a cama, para de novo se levantar precipitadamente quando outro ataque a acom- mettia; o pulso ia-se tornando cada vez mais pequeno, e o calor aban- donando pouco a pouco os extremos, chegando'a estar fria até á parte media dos braços; a face tornou-se livida; os olhos como que saltavam fóra das orbitas, e a morte parecia approximar-se. Tudo se tentou para remediar estado tão afflictivo. Tendo obtido uma canula dobrada de. maior calibre que a de que a doente usava, pretendi introduzil-a, mas | a ferida era pequena e tive que a dilatar; sobreveiu uma hemorrha- gia, que se suspendeu com a cauterização; a canula porém, sem re- mediar a dyspnéa, comprimia o esophago, e temendo alguma gangre- na da tracheia introduzi a antiga, vendo primeiro se a doente respira- A TRACHEIOTOMIA 147 va melhor só com o dilatador de Trousseau; fiz repetidas instillações d'agua morna; appliquei-lhe as inhalações d'agua quente, cobri-lhe a pelle de sinapismos; fazendo estas applicações quando a agitação era menor. 20.-—6 horas. A enferma caiu em lethargo, depois o pulso foi- se desenvolvendo, o calor de pelle augmentando, e deixava-se ouvir a distancia um fervor tracheial similhante ao estertor dos moribundos, Passado pouco tempo a doente expelliu n'um accesso de tosse um pedaço de muco concreto, muito duro, do comprimento de tres polle- gadas e meia, e da largura d'um quarto de pollegada; todos os signaes de asphyxia desappareceram, e a respiração ficou completamente des- embaraçada. 10 horas. A doente está alegre, pede de comer, e toma com pra- zer leite e geléa; as substancias liquidas sáem em parte atravez da fe- rida, misturadas com muco- pus, e provocando tosse. 8 horas da noite. A respiração já se faz pela larynge, tira-se a canula para ensaio, tencionando introduzir-lh'a se houvesse difficulda- de na entrada do ar; a doente porém dormiu socegada o resto da noite. 21.— A ferida apresenta ainda falsas membranas apesar das re- petidas cauterizações. Os liquidos ainda passam atravez da larynge; appetite; alguma tosse para expellir o muco-pus da tracheia e bron- chios. 22.— O mesmo estado. Cauteriza-se a ferida. 23.— Algumas estrias sanguineas nos escarros; a auscultação ape- nas deixa perceber som mucoso em ambos os pulmões. Concedem- -Se- lhe alimentos solidos (carne), porque os liquidos sáem todos pela fe- rida, a qual está perfeitamente limpa de falsas membranas, e com boa granulação. Levanta-se. 24, — Ainda alguns escarros de sangue; pouca tosse. Approximam- se os bordos da ferida, e intercepta-se a passagem do ar pela abertura da tracheia. 25.-— Menos tosse; escarros mucosos. 28. —O mesmo estado. 30.—0s liquidos já não penetram na larynge, a ferida da tra- cheia está completamente obliterada, não saindo já a expectoração e o ar, como nos dias antecedentes. 5 de dezembro. — A ferida externa completamente cicatrizada, e a doente perfeitamente restabelecida, tendo cessado a aphonia desde o dia 30) de novembro, conservando-se a voz rouca. so 9 148 ESTUDOS SOBRE 20.—A enferma é acommettida de grippe, que lhe produz tos- se, dôres no lado do peito e nas articulações, e accessos quotidianos: este estado desappareceu em poucos dias a beneficio do tratamento su- dorifico. N'esta observação ha sobre tudo a notar as seguintes circumstan- cias. 1.º É digno de notar-se que este caso de cura se désse n'um gar- rotilho que suecedeu á escarlatina, pois, segundo a opinião de todos os auctores que se têem occupado do estudo das doenças diplithericas, o crup é quasi sempre mortal quando é acompanhado de escarlatina. 2.º A escarlatina d'esta doente affectou uma fórma pouco frequente na pratica, postoque descripta pelos actores, quero fallar da fórma inter- mittente. O dr. Bernardino Antonio Gomes, pai, no seu Basaio der- mosographico descreve-a com o nome de escarlatina quotidiana, d'esta sorte: « Escarlatina reversiva quotidianamente em paroxismos de febre intermittente.» 3.º Não deve esquecer a particularidade que apresentou esta enfermidade (a diphtherite), de atacar successivamente quasi todos os membros da familia, não poupando os adultos: seria contagio, ou in- fecção? 4.º É para notar que as escarlatinas de que foi acommettida a fa- milia a que pertencia esta creança, fossem todas anginosas, e tivessem todas mais ou menos um certo caracter de malignidade, a ponto de succumbir um dos atacados com estado comatoso, petechias e todo o cortejo de symptomas typhoideos. 5.º N'esta doente occorreram alguns dos accidentes de que acima fallâmos; esteve a ponto de ser asphyxia- da pelas concreções mucosas da tracheia; os liquidos deram-lhe no goto, em quanto a ferida da tracheia permittiu a communicação do ar ex- terior com o interior da pharynge, etc. 6.º Esta observação, além de servir para provar a efficacia da bronchotomia para curar o crup, de- monstra a pouca gravidade da operação. Com effeito, no fim do ter- ceiro dia pôde dispensar-se a canula; no fim do sexto já a doente se levantava, estando perfeitamente curada no decimo-nono. 7.º Por ulti- mo, entendo eu que o aproveitamento da operação não póde deixar de attribuir-se em grande parte ao acerto com que foram dirigidos os pri- meiros cuidados prestados á doente, e á opportunidade da occasião em que se operou; pois nem se tinham feito emissões sanguineas, locaes ou geraes, nem applicado vesicatorios, nem se tinha esperado o fim do terceiro periodo para propôr a tracheiotomia, seguindo-se n'isto o pre- ceito do sr. Trousseau. j As honras, pois, do brilhante resultado obtido por meio d'esta operação cabem em grande parte ao sr. dr. Simas. » - A TRACHEIOTÔMIA 149 5.º OBSERVAÇÃO Garrotilho em uma creanca de 4 para 5 annos, do sexo masculi- no; tracheiotomia ao 3.º dia de doenca, no periodo asphywxico; morte ás 26 hgras de operada. (Observação e operação pelo sr. Joaquim Theo- tonio da Silva). « No dia 15 de fevereiro de 1853 fui convidado pelo sr. Joaquim José Rodrigues da Camara para observar um doente que, havia 3 dias, estava afectado de crup, e a quem s. s.* tinha feito todo o tratamento pharmacologico que a sciencia aconselha. Era uma creança de 4 para 5 annos de idade, temperamento lym- phatico, e a quem sobreviera crup laryngeo depois de ter apresentado por alguns dias symptomas de bronchite. Na occasião da minha visita (meio dia) tinha já comecado o terceiro periodo da enfermidade; já os ataques da suflocação eram amiudados, havia aphonia e silvo laryngo- tracheial entre os accessos da tosse, pulso muito frequente, extremos frios, pallidez de face, etc. Pela auscultação pôde perceber-se a entra- da do ar em ambos os pulmões, mas ouvia-se som mucoso e bulha de valvula.- A inspecção da pharynge não deixou perceber camada diph- therica n'esta região. A minha observação não fez mais do que confirmar a opinião que o sr. Camara tinha emittido, isto é, que o doente tinha o crup, e que era provavel que as falsas membranas já se estendessem aos bronchios. Expuzemos com toda a franqueza á familia do doente que a operação era o meio, não provavel, mas unico de o salvar. A familia exigiu de nós que se esgotassem todos os recursos, e nós convencidos do pouco risco e possibilidade de aproveitamento da tracheiotomia, praticámos esta operação seguindo o preceito de Hippocrates. — Melius est anceps remedium, quam nullum. A operação fez-se com facilidade, não houve hemorrhagia nota- vel; a respiração porém não se restabeleceu senão passada meia hora; não pôde introduzir-se a canula inmediatamente, porque apresentan- do-se uma pseudo-membrana na abertura da tracheia quando o doente tossia, houve difficuldade em extraíl-a, o que se conseguiu, pegando- lhe com uma pinça, em que se foi enrolando para não se quebrar; a porção extraída era um cylindro do comprimento da tracheia, divi- dido na parte que devia corresponder á raiz dos bronchios, sendo ain- da bifurcada a porção que correspondia ao lado direito. Logo depois 150 ESTUDOS SOBRE da extracção d'este corpo o enfermo começou a respirar bem, o pulso tornou-se mais cheio, veiu calor á pelle, e todas as funcções de rela- ção, excepto a voz, se faziam sofirivelmente. Introduziu-se a canula curva dobrada, deram-se-lhe calomelanos, e demulcentes internamen- te; caldo e geléa por alimento. 16.—0 doente dormiu alguma cousa durante a noite, effectuan- do-se a respiração bem, em quanto se não formavam concreções mu- cosas na tracheia, sendo necessario empregar instillações de agua mor- na quando as inhalações de vapor d'agua eram insufficientes para as despegar. A's 7 horas da manhã a respiração começou a embaraçar-se ca- da vez mais; as inhalações d'agua morna, a limpeza da tracheia e das canulas com as lanadas, etc., tudo foi tentado, mas em yão, porque a asphyxia que se manifestava, era dependente das falsas membranas se estenderem até ás pequenas divisões bronchicas, pois a auscultação já não deixava perceber a entrada do ar até ás ultimas ramificações, sendo claro o som dado pela percussão. Depois o pulso foi-se tornan- do cada vez mais pequeno e frequente; o calor foi abandonando as ex- tremidades; a face, as mãos e os pés foram apresentando uma côr li- vida; por ultimo, desappareceu o pulso das radiaes, e ás duas horas da tarde o doente falleceu, » 6.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e crup em uma menina de 9 mezes; tracheio- tomia ao 4.º dia de doenca, no periodo asphyxico; diphtheria tracheio- bronchial, e pneumonia lobulur; morte 57 horas depois da operação. (Observação e operação por Antonio Maria Barbosa). 1 F. de 9 mezes, lymphatica, de boa constituição, exposta da Santa Casa da Misericordia de Lisboa, foi trazida ao 4.º dia de doença pela respectiva ama para a enfermaria da Misericordia, em S. Roque, que dirige o meu distincto collega e amigo, o sr. dr. Simas, na manhã do dia-7 de julho de 1853. Na sua visita da manhã o dr. Simas vendo a doentinha diagnosticou angina diphtherica e crup, e instituiu-lhe o tratamento pelos emeticos e cauterizações. Entretanto a doença progrediu rapidamente, e, julgando na sua segunda visita que a tracheiotomia estava indicada, convidou-me para a praticar. t A TRACHEIOTOMIA 151 Em consequencia, pelas 5 horas da tarde d'aquelle mesmo dia, reuni-me na Misericordia com o sr. dr. Simas, e com o meu amigo e collega, o sr. Arantes. d N'esta occasião a doentinha apresentava-se no estado seguinte : voz extincta; ruido laryngeo mui aspero tanto na inspiração em que era mais extenso, como na expiração; respiração abdominal; alguma congestão e arroxeamento da face; pulso muito frequente e apenas perceptivel; extremidades frias; insensibilidade da pelle. Não havia en- tão tosse. O pulmão pareceu estar em bom estado. O fundo da gargan- ta com falsas membranas em que se notavam os vestígios da cauteri- zação pelo nitrato de prata que se lhe tinha feito algumas horas an- tes; ganglios submaxillares engorgitados. Com intervallos irregulares manifestaram-se alguns ataques de suffocação, em que a face se arro- xeava muito mais, e nos quaes parecia que a doente ia succumbir as- phyxiada. Nestas circumstancias pratiquei logo a tracheiotomia pelo me- thodo ordinario, estando presentes e auxiliando-me os collegas, dr. Si- mas e Arantes. A creança não deu a menor demonstração de sentimento durante a operação. Introduzida a canula dobrada na tracheia, a respiração foi- se restabelecendo progressivamente; a creança recuperou a vida que ia fugir-lhe, e, passado um quarto de hora ou pouco mais, estava senta- da no berço, logo depois bebeu leite, e tomou a mamma com avidez, parecendo que nada a molestava. Até o dia seguinte tudo caminhou bem e dava muita esperança de cura, apesar da idade mui pouco favoravel para este resultado. Mas desgraçadamente não aconteceu assim, porque 2 dias depois a asphyxia reappareceu com signaes de pneumonia lobular direita, e de invasão da tracheia pela diphtheria; e no dia 11 do mez pelas duas horas da manhã, 57 horas depois da operação, a creança suc- cumbiu. A autopsia, feita no dia seguinte pela manhã, mostrou a pharyn- ge e larynge, incluindo a face inferior da epiglotte, cobertas de falsas membranas branco-acinzentadas, mais ou menos finas, mas resistentes e elasticas que se estendiam pelá tracheia e bronchios até ás suas di- visões e subdivisões; e no lobo inferior do pulmão direito as indura- ções ou nucleos proprios da inflammação lobular, É sobre tudo notavel esta observação, porque tendo sido feita a tracheiotomia na idade de 9 mezes apenas, e já no periodo asphyxi- co do crup, a creança sobreviveu ainda 57 horas, e parecia dever cu- 152 ESTUDOS SOBRE rar-se, senão sobreviesse a complicação da pneumonia lobular, e par- ticularmente a propagação da diphtheria pela tracheia até os bron- chios. Esta creançca depois de operada foi tambem vista pelos srs. dr. Beirão, dr. Pereira Mendes, dr. Cunha Vianna, e -Theodoro Teixeira. OBSERVAÇÃO Angina di iplihientoa e crup em uma menina de 11 mezes; tra- chbioLbrd no 5.º dia de molestia, no periodo asphyxico; morte 12 horas depois da operação. (Operação e observação por Antonio Maria Bar- bosa). F. de 11 mezes, lymphatica, de boa constituição, padecia ha 4 para 5 dias incommodos de garganta que a ama attribuia a constipa- cão e á saida dos dentes. Via ás 5 horas da tarde de 20 de setembro de 1853 com os meus illustrados collegas e amigos, o dr. Cunha Vianna e Arantes, na rua do Paço do Bem-formoso, em casa da ama que a creava. Então já a creança estava com os signaes de manifesta asphyxia. A respiração era difficilima e mui ruidosa na inspiração; a face estava congestio- nada e azul-arroxeada; a voz extincta; o pulso pequenissimo, quasi im- perceptivel; os membros começavam a esfriar, e um suor quasi frio cobria o peito; ganglios submaxillares engorgitados ; falsas membra- nas branco-acinzentadas nas amygdalas e pilares do véo do paladar. Vendo a imminencia da morte, e quasi sem nenhuma esperança de salvação, depois de uma cauterização da garganta e de um emetico ministrado sem fructo, pratiquei a tracheiotomia pelo processo ordi- nario, logo que me chegou a caixa com os instrumentos para a ope- ração. Fiz a operação ás 6 horas da tarde sem que a creança désse ne- nhum signal de soffrimento. Não houve hemorrhagia. Aberta a tra- cheia, saiu grande quantidade de liquido branco-turvo, com alguns de- tritos fibrino-albuminosos. Posta convenientemente a canula dobrada, e passada uma gravata de cassa em torno do collo, consegui que a doentinha se sentasse no berço e ainda bebesse por diversas vezes algumas colheres d'agua e leite. O amigo dr. Cunha Vianna e eu velámos toda a noite junto da creança prestando-lhe todos os cuidados ; entretanto tivemos o des- , A TRACHEIOTOMIA 153 gosto de ver que depois das 2 horas da manhã do dia 8 a respiração se foi embaraçando de novo, e a asphyxia, que nunca chegou a dissi- par-se de todo, tomou cada vez majs incremento até fazer succumbir a doentinha pelas 6 horas da manhã. Não foi possivel fazer-lhe a autopsia. OBSERVAÇÃO Garrotilho em um menino de 2 annos de idade ; asphyxia ; tra- cheiotomia ao 3.º dia de doença; canula tirada ao 4.º dia da operação ; cicatrização da ferida aos 20 “dias; cura. (Observação pelo sr. Augusto João de Mesquita ; operação pelo sr. Joaquim Theotonio da Silva). « O*sr. A. Emilio Moura Coutinho ; 2 annos de idade ; tempera- mento sanguineo-lymphatico ; sadio. 14 de outubro de 1854. — Começa a mostrar-se doente. A fa- milia julga-o constipado. 15. — Mais incommodado. Está muito rouco e tosse. Come com appetite e brinca. 16. — Tosse rouca durante a noite, e maior calor de pelle. De manhã acha-se em tão mão estado que assusta a sua familia. Mandam- me chamar á pressa. Não me encontram. Por volta das 2 horas da tarde, soube o recado, e fui logo. Encontrei o seguinte: febre, rouquidão, dôr na garganta, que se apresenta vermelha, mas sem nenhum ponto esbranquicado. Respiração muito frequente e laboriosa, acompanhada de um silvo laryngo-tracheial. As expirações mais longas que no esta- do normal. Aphonia completa. A tosse, que é crupal a não permittir duvida, vem com suffocação tal e tanta, que o doente, a cada accesso, senta-se de repente na cama apoiando-se firme nos braços, e assim tosse, tosse, tosse, e expectora com tal força, que os esputos são ar- remessados a grande distancia. N'um dos esputos achei um fragmento de pseudo-membrana, que recatei para mostrar. Em intervallos dos ac- cessos o doente jaz prostrado como em somnolencia. Faces um pouco cavas e muito pallidas; semblante abatido ; olhos encovados e revira- dos para cima,'a ponto de esconderem toda a iris na palpebra supe- rior. A auscultação nada alcança de anormal. Diagnostiquei : : crup. Mandei vir logo tartaro emetico em agua distillada, e papeis de ipecacuanha em indo vomitivas. Fiz pôr sinapismos em pernas e bra- MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. HI. P. 1. 20 154 ESTUDOS SOBRE ços, e appliquei ventosas seccas aos lados do espinhaço. O doente recu- sa-se a beber; apesar de todas as diligencias que emprego, recebe na bocca e depois expelle. Faço a titillação da luêta, e provoco d'esta ma- neira alguns vomitos. São mais de 4 horas da Dando o doente tem ido, a olhos visto, de momento a momento para peior ; mais, muito mais oppressão e aba- timento entre os ataques da suffocação ; diminuição geral de calor ; ex- tremos frios; beiços lividos; o rosto assim como esfumado pelas som- bras da asphyxia que começava. , Sabia por um acaso onde áquella hora estava o sr. Theotonio ; mando a toda a pressa pedir-lhe que viesse logo logo. Chegou ás 5 ho- ras da tarde, examinou o doente, e ratificou o diagnostico feito. Pro- puz-lhe a operação, concordou ; porém manifestou o desejo de que mais collegas viessem testemunhar a doença e a operação. Visto o doente, foi atacado d'uma suffocação tão forte, que nos re- solvemos, temendo pela sua vida, a operar immediatamente. A operação concluiu-se sem accidente ; só houve grande difficul- dade em ferir a tracheia, pelos apressados movimentos em que estava. A” operação succedeu um desmaio de meia hora ;” ao desmaio, reac- ção ; depois febre intensa, calor grande de pelle, rosetas nas faces, e muita sede. As bebidas dão-lhe no goto, o que muito o afflige. Passa a noite sem dormir, tossindo a miudo, e expectorando gran- de quantidade de muco. Tira-se a canula interna muitas vezes. Fazem- se frequentes instillações d'agua tepida. 17. — No mesmo estado. Dão-se-lhc calomelanos em dóse alte- rante, que produzem para a tarde diarrhéa, e por isso se suspendem. O doente nega-se a beber caldos. Toma alternadamente pequenas quan- tidades de leite, e colherinhas de geléa. 18. — Dormiu alguns bocados. Teve durante a noite tres dejec- ções alvinas. Tosse menos. Expectoração ainda mucosa. Continuam os liquidos a darem-lhe no goto. Bebe com appetite caldos de tapioca. Tiram-se as canulas para experimentar se o doente poderia respirar sem ecllas. Esteve a pontó de se asphyxiar. Mettem-se de novo ; o doente socega pouco depois. 19. — Passou bem. Dormiu somnos grandes. Está quasi apyre-. tico. Teve duas dejecções alvinas. Faz-se o caldo de tapioca com ôvo, e dão-se-lhe quatro porções no dia. Torna-se a tirar as canulas. Accesso violento de tosse; expectora fragmentos de pseudo-membranas envoltas em mucosidade. Acaba-se o accesso ; o doente fica socegado a respirar bem pela ferida. Tosse de A TRACHEIOTOMIA 155 vez em quando; e n'uma das vezes fluctua, entre os labios da ferida, um pedaço de pseudo-membrana. A pinça apodera-o muitas vezes, e sempre lhe escorrega ; some-se por fim n'uma inspiração. Limpa-se a tracheia com a lanada d'esponja. A mesma dieta. 20. — Continúa a estar sem as cannlas. Tossiu demasiado, e quan- do tosse com mais violencia, percebe-se-lhe alguma voz, porém muito rouca. As bebidas ainda lhe dão no goto. Apyrexia completa. Desejos de brincar. - 25. — Verifica-se se o doente póde respirar sem difficuldade pela larynge. Vê-se que sim. Approximam-se por tiras agglutinativas: os la- bios da ferida, que sempre tem mostrado boa granulação e tendencia para se cicatrizar. 26. — Levanta-se. Come com appetite. Dá-se-lhe gallinha ao jan- tar e á ceia. 28. — A ferida da tracheia inteiramente fechada, e a externa ci- catrizando. Alguma tosse. Continúa a estar aphonico. Estado geral ex- cellente. Novembro 5. — Completamente bom. Diz as palavras, que antes da doença fallava, mas com voz muito sumida e rouca. 13. — Boa saude. Falla claro. » 9.º OBSERVAÇÃO Garrotilho em uma creança de 8 annos, do sexo masculino; tra- cheiotomia ao 4.º dia de doença, no periodo asphyxico ; diphtheria bron- chial ; asphyxia lenta; morte 28 horas depois da operação. (Observa- ção e operação pelo sr. Joaquim Theotonio da Silva). «F. de 8 annos, temperamento lymphatico, sadio, morador na rua Augusta. Foi por mim observado em conferencia pela primeira vez no dia 13 de novembro de 1854. Era o quarto dia de doenca e começava o terceiro periodo do crup. Assistiram á conferencia os collegas, os srs. Moreira, Oliveira, Brito, c Augusto Mesquita assistente. Decide-se a operação, que pratico immediatamente (ao meio dia) pelo methodo or- dinario. Nada de notavel. Saída de falsas membranas que se estendiam até a parte inferior da tracheia. Pequena hemorrhagia venosa pelo an- gulo inferior da ferida, 4 horas depois da operação, que cede á cau- terização com o nitrato de prata. 20» 156 ESTUDOS SOBRE O tratamento empregado foi o seguinte: Calomelanos interna- mente; pomada mercurial exteriormente. Dieta de caldos. No dia 14 signaes de crup bronchico, asphyxia lenta, e morte pelas 4 horas da tarde. » 10.º OBSERVAÇÃO Angina diphiherica e crup em uma menina de 4 annos; asphy- «ia ; tracheiotomia ao 4.º dia de doença; diphtheria na ferida desde o 3º até o 8º dia; canula tirada ao 9.º dia; cicatrização da ferida e cura ao 17.º dia depois da operação. (Operação e observação por Antonio Maria Barbosa). Maria Camilla Barreira, de 4 annos, temperamento lymphatico, boa constituição, filha do sr. Antonio José Barreira, moradora na rua larga de S. Roque n.º 81, foi vaccinada e sempre saudavel. Seus paes, que não têem parentesco por consanguinidade, são tambem saudaveis, ainda que a mãi seja de compleição fraca e delicada. Uma irmã da doente morreu de 5 annos, diz-se, com tuberculos mesentericos e meningeos ; os outros irmãos que tem, tambem pequenos, gosam de boa saude. Em 22 de julho de 1855 começou a apresentar-se doentinha, o que se attribuia a constipação. Os seus incommodos consistiam então no seguinte: alguma tosse, ligeira rouquidão e dôr de garganta, sede, fastio, algumas dores pelo ventre, febre, o que a obrigou a ficar de cama. Já quatro dias antes estava mais abatida e com pouca vontade de comer. No dia 24 de manhã levantou-se por se achar melhor, saíu a um pequeno passeio, e jantou á meza, mas ainda com pouco appetite. Pelas 3 horas da tarde d'este dia manifestou-se tosse aguda, metallica, a que se seguiu febre, certa inquietação e difficuldade de respirar, o que obri- gou a recolhel-a á cama. A tosse, da mesma natureza, foi mais frequente para o resto da tarde e começou a mostrar-se na fórma de aecessos pe- las 8 horas. Até ás 10 horas” da noite teve tres d'estes ataques de tosse, que a obrigavam a sentar-se logo na cama, parecendo suffocar-se, so- bre tudo no terceiro accesso. Por esta hora foi chamado o sr. Fernan-. des Branco, que chegou pelas 11 horas da noite. Este collega observou então o seguinte: turgencia de face; op- pressão de peito; respiração difíicil, aspera e ruidosa ; tosse metallica, crupal, apresentando-se ás vezes na fórma de accessos suffocantes ; fe- A TRACHEIOTOMIA 157 bre intensa ; falsas membranas forrando a amygdala direita, parte pro- xima da pharynge e lado direito da uvula; deglutição difficil e dolo- rosa ; algum engorgitamento doloroso dos ganglios submaxillares, mais notavel do lado direito. O collega diagnosticou garrotilho, e prescreveu logo o seguinte tratamento: tartaro emetico, 2 grãos, em 2 onças d'agua distillada, para tomar uma colher, das de sôpa, de quarto em quarto de hora, até vomitar sufficientemente ; fricções no collo, de duas em duas ho- ras, com partes iguaes de pomada mercurial e de belladona. Depois dos efeitos do emetico prescreveu o uso interno dos calomelanos na dóse de um terço de grão de duas em duas horas, e pincelar a gar- ganta, de tres em tres horas, com uma mistura composta de 1 onca de mel rosado e 2 oitavas d'alumen. No dia 25 pelas 9 horas da manhã o collega visitou a doentinha e achou-a peior ; a difficuldade de respirar e a oppressão eram maio- res; a respiração aspera e como serratica;a tosse mais frequente, já rouca e como abafada ; as falsas membranas revestiam já as duas amy- gdalas, o véo palatino, e engastavam a uvula; com as materias vomi- tadas appareceram dois ediices de falsa membrana. O sr. Branco fez continuar o uso interno dos calomelanos de duas em duas horas, as fricções mercuriaes no pescoço, o mel aluminado na garganta, de tres em tres horas, e prescreveu mais a applicação de 4 sanguesugas no dorso dos pés, e de um vesicatorio na parte superior da região ester- nal. Pelas 3 horas da tarde do mesmo dia, todos os signaes estando mais aggravados, assentou-se fazer uma conferencia á doentinha para que foi escolhido o sr. dr. Simas. Este distincto pratico reconheceu tambem immediatamente o crup verdadeiro, fez logo a cauterização da gar- ganta com a dissolução de 1 oitava de nitrato de prata em 1 onça de agua distillada, que o sr. Branco já tinha receitado ; aconselhou a re- petição do emetico, logo depois da cauterização ; e propoz a operação da tracheiotomia, se a molestia se aggravasse apesar d'estes meios, com aquella instancia que dá a verdadeira crença e confiança no valor the- rapeutico de um remedio, com o qual já tinha conseguido salvar uma doentinha da sua clinica particular. Para este fim escreveu-me para nos reunirmos pelas 8 horas da noite em casa da doente, indo preve- nido com os instrumentos proprios para a tracheiotomia. A nossa reunião não poude effectuar-se antes das 9 horas: O es- tado da creança era então o seguinte: pallidez de face; olhos cerra- dos ; pelle pouco quente; respiração anciosa, aspera e secca, serratica, [58 ESTUDOS SOBRE nos dois tempos ; voz extincta ; já não havia tosse, nem accessos de suf- focação ; pulso mui frequente e pequeno ; véo palatino e amygdalas co- bertos de falsas membranas. Sendo claro que a doente tinha o verdadeiro crup ou garroti- lho, parecendo que as falsas membranas que forravam a mucosa da la- rynge, não se estendiam aos bronchios; não havendo conjunctamente doença incuravel, nem mesmo outra que contraindicasse a operação ; tendo a molestia resistido ao tratamento energico e conveniente que se havia administrado ; e estando, emfim, já em principio de asphyxia, con- cordei com iaRo na necessidade da tracheiotomia, como unico meio de salvação, e por isso só esperámos pelo 'sr. Branco, que devia che- gar pelas 11 horas da noite. A esta hora o estado asphyxico era mais pronunciado ; a fáce es- tava livida e vultuosa ; os beiços arroxeados ; olhos fechados ; pelle fria nos membros ; suor frio pelo corpo ; respiração apressada, anciosa, mui aspera em ambos os tempos; pulso mui frequente, pequeno e já com intermittencias ; cessação dos movimentos voluntarios ; insensibilidade absoluta aos estimulos externos. Apressci-me então em praticar a tracheiotomia, estando presen- tes os srs. dr. Simas, Fernandes Branco, Machado, e uma pessoa da” familia, que nos serviram de ajudantes. Durante a operação houve de notavel apparecer a arteria thyroidea inferior direita mui proxima da linha mediana de modo a julgar prudente laqueal-a em dois pontos e cortal-a no meio. | Terminada a operação sem nenhum outro accidente, a respiração estava suspensa e não se restabelecia ; suppuzemos que a creança não conseguiria reviver. Fizeram-se por isso excitações á tracheia com a la- nada de esponja humedecida em agua fria, que se levou pela canula até á parte inferior da sua superficie interna. Por este modo se excitaram expirações violentas e repetidas, que expelliram alguns fragmentos de falsas membranas, muco espesso e algum sangue. A respiração come- çou logo depois a fazer-se regularmente, e a creança que nada havia sentido, como que acordando de profundo somno, abriu os olhos que tinham estado cerrados até então, e, como que admirada do que se passava em torno de si, pretendeu sentar-se, e fez alguns movimentos voluntarios ; os beiços trocaram a cor arroxeada pela de rosa ; a lividez do rosto, o esfriamento dos membros, a irregularidade e frequencia do pul- so cessaram ; bebeu agua e leite com certa avidez. Logo depois uniram-se os bordos da ferida, acima e abaixo da canula, com esparadrapo adhe- sivo, posto por detraz do pavilhão d'este instrumento, e cobriu-se-lhe A TRACHEIOTOMIA 159 º a abertura com uma tira de cassa, posta frouxamente á roda do pes- coco e atada na parte posterior. A doentinha foi então levada para a sua cama. Pouco depois ap- pareceu o pai, que a beija; e ella, com um engraçado sorriso de in- nocente, correu-lhe a mãosinha pela face. A vida, pois, que estava a apagar-se n'esta bella creança, como que reappareceu por encanto depois da operação. Não era passada meia hora quando adormeceu, respirando natu- ralmente e em perfeito socego. Decorrida hora e meia, acordou com tosse e suflocação, cessando estes incomimodos com a saída, pela canula, de um coagulo sanguineo e materia puriforme espessa. A respiração ficou pausada, o pulso a 90, e a creança dormiu mais uma hora. Acordou novamente pelas 3 horas da manhã do dia 26, suffocada por falsas membranas e muco viscoso, que obstruiam parte da canula interna, que logo se tirou e limpou, remediando-se o accidente. Este mesmo processo de limpeza da canula interna se assentou fazer todas as tres horas, além das occasiões, como aquella, em que era acciden- talmente determinada ; assim como uma ou outra vez se levava a es- ponja humedecida até o interior da tracheia, quando ecra indicada tosse para obter a expulsão de falsas membranas ou de muco. Depois d'aquelle accidente a doentinha ficou socegada, mas sem dormir ; quando queria agua ou caldo, batia com a mão no berço, e pelo movimento dos beiçcos percebia-se distinctamente o que pedia ; a intelligencia conservava-se tão clara que obedecia discretamente a tudo ; pretendeu sentar-se; pulso a 80; transpiração geral. A's 4 horas e meia extrairam-se pedaços de falsas membranas, largos, que pareciam forrar a tracheia, e adormeceu depois. Pelas 5 horas e meia acordou de novo, e pedin agua por diffe- rentes vezes; urinou em grande quantidade; o calor da pelle pouco excedia o natural; pulso a 70; movia bem os braços e pernas, alter- nando movimentos de agitação com intervallos de 15 a 20 minutos de completo socego. A's 6 horas a respiração mais alta e apressada ; augmento de ca- lor; pulso a 90; a cabeça caía pesada sobre o travesseiro; olhos um tanto amortecidos. Sinapismos volantes de meia força, prescriptos pelo nosso collega Machado que então via a doente. Pelas 11 horas reunimo-nos todos que tinhamos assistido á ope- ração. O estado da doentinha era o mesmo da observação precedente, acrescendo que a respiração estava mais embaraçada. Tirou-se então a canula dobrada para se limpar, ao que sobreveiu logo um grande 160 ESTUDOS SOBRE : . ataque de suffocação pela approximação dos bordos da ferida da tracheia, mas este accidente foi promptamente remediado, dilatando a ferida com o dilatador de Trousseau, e fazendo logo depois a introducção da ca- nula dobrada, pela qual se passou á tracheia a esponja molhada em agua. Logo em seguida houve tosse forte, que expulsou uma pseudo- membrana e algum muco, depois do que passou bem o resto do dia. Ficou tomando o bicarbonato de soda na proporção de duas oitavas para duas libras de agua, aos copos pequenos, de duas em duas horas. De noite dormiu muitos pedaços, acordando para pedir agua e ador- mecendo logo depois. Assim passou sem novidade até ás 7 horas e meia da tarde do dia 27, em que a respiração se tornou curta, frequente, afflictiva, ha- vendo demais alguns movimentos convulsivos. Estes incommodos ces- saram tirando-se e limpando-se a canula interna, e excitando alguma tosse que fez expulsar muco viscoso; adormeceu ás 8 horas, e dormiu seguidamente até ás 10; ás 11 bebeu com appetite duas onças de lei- te, e conservou-se acordada até á 1 hora da manhã do dia 28 em que adormeceu; ás 2 horas sentiu-se-lhe mais calor, que conservou até ás 4; pediu agua diversas vezes, e, afóra estas occasiões, dormiu socega- da até ás 6 horas em que tomou seis colheres, das de chá, de caldo de farinha. No dia 28 pelas 2 horas da tarde tirou-se a canula dobrada, e achou-se toda a ferida coberta de uma falsa membrana; as margens da ferida da tracheia, que estava na profundidade de uma pollegada pelo menos, já adherentes aos tecidos proximos, conservavam-se sepa- das e não produziram suffocação como no primeiro dia em que se tirou a canula dobrada; introduziu-se a lanada até á tracheia, com que sobre- veiu tosse e a expulsão de algum muco espesso e viscoso; cauterizou- se com o lapis de nitrato de prata toda a superficie da ferida, e met- teu-se de novo a canula. Pelas 7 horas da tarde, por haver prisão de ventre e alguma sen- sibilidade no abdomen, administraram-se quatro grãos de calomelanos que produziram efleito purgante na manhã do dia seguinte. Pára o uso do bicarbonato de soda. No dia 29, apyretica, passou a noite socegada, dormiu soffri- velmente. Cauterização da ferida, algum leite, caldo de farinha duas vezes. , No dia 30, bem; nova cauterização da. ferida, quatro onças de chá e uma torrada, que não quiz toda por lhe fazer doer a garganta; instando muito para levantar-se, permittiu-se-lhe estar sentada um pou- A TRACHEIOTOMIA [61 co fóra da cama, mas sentindo-se mal voltou para o leito, onde esteve assentada, brincando com diversos objectos apropriados á sua idade. No dia 31 notou-se algum calor de pelle, ventre um pouco ele- vado, meteorisado e dorido. Clyster de calda de abobora; quatro grãos de calomelanos de quatro em quatro horas, até se obter efeito pur- gante; a ferida foi ainda cauterizada nas partes em que havia restos de falsa membrana; ensaiou-se tapar a abertura da ferida, mas não pô- de ainda fallar, nem respirar pela bocca. No dia 2 d'agosto acordou pelas 6 horas da manhã com muita tosse, expulsando muitas mucosidades espumosas pela bocca e nariz; quando tomava caldo, agua ou outro liquido, tinha tosse, e depois saía- lhe parte d'elle pelo interior da canula; tirada esta, e tapando a feri- da, respirou um pouco pelo nariz, mas não se pôde prescindir ainda da canula. Ligeira cauterização da ferida; havendo mais appetite, deu-se- lhe algumas colherinhas de geléa de marmello; apenas se permittiu agua ou outro liquido ás colheres das de chá. No dia 3 pelas 2 horas da tarde tirou-se a canula dobrada, e ta- pando-se a ferida, que estava então toda de optimo aspecto, com um len- co de cassa posto como gravata, percebeu-se que a respiração se fazia bem pela bocca e nariz; a voz rouca e fraca. A's 8 horas da tarde uniu-se a ferida por duas tiras adhesivas. Tomou geléa de mão de vac- ca em logar da de marmello. No dia 4 fallava mais claro, sobre tudo quando o ar era expel- lido com mais força atravez da glotte. Cauterização da ferida para ser bem regular a cicatriz; vitella assada duas vezes, geléa de marmello. No dia 5 levantou-se pelas 9 horas da manhã e-esteve de pé até á 1 hora sem incommodo; a ferida continuava em via de cicatrização. No dia 6 tomou tres colheres d'agua sem lhe dar no goto nem sobrevir tosse; cauterizou-se a ferida. No dia 7 pediu para se levantar pelas 6 horas da manhã, por se achar bem; almoçou chá e uma torrada sem sobrevir tosse. Pela | hora resfriamento repentino e quasi geral, começando pelas mãos e pés; os membros inferiores, até ás nadegas inclusive, estão frios de neve; os su- periores do mesmo modo; o nariz e as orelhas, côr de cêra, assim como a testa, estão igualmente (rios; a face rosada e em suor abundante. Para contraste, a creança dormia tranquillamente, respirando com admiravel socego; o pulso amplo, sem dureza, batia 80 pulsações re- gulares. Despertando-se, acordou e pediu geléa. Prescreveram-se fric- ções de vinho do Porto quente ás mãos e pés, e envolveram-se de al- godão em rama. MEM, DA ACAD. — [.º CLASSE. — T. NI. P. I. 21 162 ESTUDOS SOBRE Pelas 5 horas desappareceram as rosetas da cara; as mãos e pés adquiriram mais calor, mas os joelhos conservavam-se frios. A's 6 ho- ras adormeceu; calor nas faces e resto da cabeça, mas os joelhos sem- pre frios, e o pulso sem frequencia, Repetiram-se as fricções, applica- ram-se sinapismos e botijas quentes aos pés, e prescreveu-se dois clys- teres com uma colher, das de sôpa, de vinho do Porto em quatro on- cas d'agua quente, sendo um ás 10) horas da manhã, e outro ás 4 ho- ras da tarde. . Tudo tinha passado pela 1 hora da noite. No dia 8 achava-se bem; pedindo comer, tomou vitella assada e geléa; a ferida quasi fechada, foi tocada ainda com o nitrato de pra- ta. Pelas 3 horas da tarde adormeceu, e começou pouco depois a tran- spirar; ao mesmo tempo esfriaram as mãos e pés, e córaram as faces. Tomou uma colher de vinho do Porto em agua morna, e applicaram- se-lhe botijas quentes aos pés. A's 4 horas já as faces tinham descórado, e o frio desappareci- do; ás 5 horas estava já bem; ás 5 horas e meia pediu beef, que co- meu com boa vontade, e tomou uma colher de vinho com agua. Pe- las 7 horas e meia adormeceu e começou a transpirar: as faces córa- ram, os pés e mãos um pouco frios. Fricções de essencia de mostar- da, dois clysteres, cada um com tres grãos de sulfato de quinina em meia onça d'agua. A' 1 hora tudo tinha passado. No dia 9 passou bem; comeu 4eef, e tomou chá e torrada. No dia 10 levantou-se. - No dia 12 estava curada. A ferida do pescoço era representada por uma cicatriz pequena e linear. A voz ainda rouca; mas aos 20 dias depois da operação estava já perfeitamente natural. Eis aqui, pois, a historia e marcha do garrotilho na primeira creança que operei conseguindo a cura, sendo aliás a minha terceira operação. Cabe grande parte da honra d'este resultado, tão feliz, ao sr. Fernandes Branco, que tratou medicamente a doença com todo o cui- dado e energia, proprios da sua dedicação e habilidade, e que se fez auxiliar do sr. dr. Simas, pratico mui consummado em doenças de creanças; e a este distincto medico, pela instancia com que propoz a tracheiotomia, sem a qual a doente de certo se não salvava, e pelos sa- bios conselhos que prestou no tratamento consecutivo a esta operação. x A TRACHEIOTOMIA 163 11.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e garrotilho em uma menina de 5 annos; tra- cheiotomia ao 5.º dia de doença, no periodo asphyxico, morte 6 horas depois da operação. (Observação e operação pelo sr. Antonio Maria de Oliveira Soares). «No dia 12 de setembro de 1856, diz o sr. Oliveira Soares, o nosso collega e amigo o sr. Avelar pediu-me para vêr a sua filha Ma- ria Ernestina, que se achava, havia 2 dias, com febre e dôr de gar- ganta, e em que elle pela manhã, examinando a pharynge, tinha per- cebido alguns pontos de falsas membranas. Vendo eu a doente, que era uma menina de 5 annos de idade, de temperamento lymphatico, confirmei a existencia de falsas membra- nas, de um branco sujo, nas duas amygdalas e uvula; rouquidão; tosse secca e com timbre particular; tumefacção nos ganglios sub-maxilla- res; febre; fastio; mas não havia difficuldade de respirar. A doente foi successivamente peiorando nos dias seguintes; as fal- sas membranas pH depois de arrancadas e estenderam-se á pharynge e larynge. A voz primeiramente rouca foi-se extinguindo gradualmente; a tosse tornou-se estridente; muita agitação; orthopnéa; inspirações curtas e acompanhadas d'um sibilo Nisso Aracheial secco. O tratamento consistiu em cauterizações com o azotato de prata; applicações de pó de alumen por meio de um pincel; no emprego de vomitorios, e mais tarde no do chlorato de potassa. Apesar d'esta therapeutica, no dia 15 ás 6 horas da tarde a doen- ça tinha-se aggravado bastante, e a morte parecia proxima. Então a dyspnéa era extrema; os esterno-mastoideos contraíam-se convulsiva- mente; o pulso pequeno; os beiços azulados; as extremidades frias, com pouca sensibilidade. | Em virtude d'este estado, concordámos eu e os srs. Camara, dr. Marques e Rirmo dos Santos, que se praticasse immediatamente a ope- ração da tracheiotomia. Fiz a operação sem accidente; introduzi uma canula dobrada, que se fixou por meio de fitas. A creança alliviou immediatamente á operação. Mas logo depois caiu em uma grande prostração, as forças anniquilaram-se, e a doente falleceu á meia noite, 6 horas depois de se ter feito a tracheiotomia. » 21» 164 ESTUDOS SOBRE 12.º OBSERVAÇÃO Garrotilho em um menino de 6 annos de idade; asph yxia; tracheio- tomia ao 9.º dia de doença; a cunula dispensada ao 5.º dia da opera- ção; a ferida cicatrizada aos 15 dias; cura. (Observação e operação pelo sr. Joaquim Theotonio da Silva). « José Antonio d'Oliveira Gomes; 6 annos; temperamento sangui- neo-bilioso; habitualmente sadio, tendo tido apenas por tres vezes fe- bres ephemeras, acompanhadas de symptomas nervosos, que se dissi- pavam em 3 a 4 dias. O doente reside actualmente na rua do Arco do Limoeiro n.º 3, 1.º andar, mas contraiu a doença em um collegio á Boa Vista, onde*não me consta que houvesse. affecções diphthericas. No dia 18 de dezem- bro de 1858 foi acommettido de laryngo-bronchite, que foi tratada pelos meios ordinarios, tomando um laxante no dia 22. A 23 á tar- de veiu do collegio para casa a pé, expondo-se por consequencia ao frio e á humidade. No dia 25 estava rouco, triste, e com alguma febre; ficou de cama; tomou sudorificos, um pediluvio sinapisado, e dieta de gallinha. No dia 26 ás 8 horas da manhã foi chamado o sr. Cadet, e jul- gando a creança affectada de crup, applicon-lhe um vomitorio d'ipeca- cuanha, e veiu pedir-me que o fosse observar. Eis o estado em que encontrei o enfermo quando ás 10 horas o examinei. Decubito lateral direito, estando a cabeça e parte superior do tronco elevado por almofadas; pallidez de face; pulso pequeno e fre- quente; calor normal; respiração frequente e ruidosa, extincção da voz, tosse crupal, dilatação das azas do nariz em cada inspiração, som claro em todo o peito, percebendo-se a entrada do ar até as ultimas ramifi- cações bronchicas, estertor mucoso, nada de som valvular; lingua sa- burrosa, sede, pharynge e amygdalas um pouco rubras, mas sem fal- sas membranas. . Não tendo ainda vomitado, augmenta-se a dóse da ipecacuanha, com o que se obtem o vomito; depois dá-se-lhe de hora em hora qua- tro colheres da pao poção: Chlorato de potassa.......... meia onça Agua distillada... ........... uma libra PA SSUICaMo E e EO, A E Rua (oo o DES ESTUDOS SOBRE 165 A's 2 horas conferencia com o sr. José Galdino. Além dos si- gnaes acima referidos notou-se o seguinte: orthopnéa; a respiração não póde effectuar-se sem o concurso de todos os musculos que se pren- dem ás costellas; por isso durante a inspiração o doente apoia-se in- stinctivamente sobre os membros superiores e inclina a cabeça para a parte posterior; durante a respiração o ventré deprime-se; os extre- mos estão frios; a pelle, sobre tudo a da face, está cheia de vergões arroxados; ataques de suffocação; insensibilidade de pelle. Concordámos todos tres em que estava indicada a operação da tra- cheiotomia, que pratiquei immediatamente, seguindo o processo acon- selhado pelo sr. Trousseau. Nada occorreu de notavel até á incisão dos anneis da tracheia; vendo, porém, que o doente não respirava apesar de termos dividido tres ou quatro anneis da tracheia, dilatado a aber- tura com a pinça de Trousseau, e introduzido a canula, prolongámos a ferida até á cartilagem cricoidea; então dividimos um ramo trans- versal do plexo venoso subthyroideo, que até esse momento tinhamos poupado, e correu algum sangne para a tracheia; como porém o en- fermo ainda não respirasse; e o pulso já não batesse, julgando que não teriamos tempo para ligar as veias, apesar de nos lembrarmos da morte de Valleix, imitámos o corajoso exemplo de Roux e sugámos a grande quantidade de mucosidades e sangue que obstruia a tracheia e bron- chios, praticámos a respiração artificial, insufflando por cinco vezes ar nos pulmões, e tivemos o prazer de vêr voltar á vida aquelle que era quasi cadaver. A creança ficou em estado de syncope por espaço de 2) minutos, tendo cessado a hemorrhagia logo que a respiracão se. res- tabeleceu. Sobreveiu alguma tosse, que promoveu a saída de alguma mucosidade espessa; o doente bebeu por algumas vezes agua e depois caldo; ficou socegado e com a respiração frequente, mas não ruidosa, nem laboriosa. Continúa o uso do chlorato de potassa. A” noite, 8 horas. — Face rosada, calor de pelle, pulso muito fre- quente e cheio, alguma tosse, tem dormido e está alegre. Chlorato de potassa, caldos, extraeção da canula interna de hora a hora, feita por um enfermeiro do hospital de S. José. No dia 27, 10) horas da manhã. — Menos febre, ainda tosse, appe- tite. Chlorato de potassa, caldo de-farinha. 8 horas da noite.—O mesmo estado. No dia 28. — Apyretico, menos tosse, os escarros vem estriados de sangue. Não ha pontada, nem signaes estethoscopicos de pneumo- mia ou bronchite capillar. Tira-se a canula: o doente ainda não res- pira facilmente pela larynge; passadas algumas horas o sr. Cadet tor-, 166 ESTUDOS SOBRE nou a introduzir a canula, porque se formára sobre os bordos da fe- rida uma camada pseudo-membranosa que difficultava a entrada do ar.. Suspende-se o uso do chlorato de potassa. 8 horas da noite. — Depois da reapplicação da canula o doente dorme, e fica no estado o mais satisfactorio possivel. No dia 29, 10 horas da manhã. — Muito appetite, nada mais de notavel. Juntamente com os escarros vem porções de uma substancia muito espessa, similhante ás falsas membranas crupaes. A respiração faz-se em parte pela bocca. Os liquidos dão-lhe no goto. No dia 30, 10 horas, — Extracção da canula. 8 horas da neite.—O doente tem-se conservado em bom estado, respira pela bocca, e percebe-se a voz, postoque surda, quando falla. No dia 31.— As extremidades divididas dos anneis da tracheia, em virtude da sua elasticidade, têem-se approximado, de fórma que a ferida, eliptica exteriormente, está no fundo quasi linear. No dia 1 de janeiro de 1859. — Approximam-se os labios da fe- rida com emplastro adhesivo, não obstante o que, o enfermo respira bem. No dia 5.— Durante estes 4 dias a ferida tende a unir-se em vir- tude da granulação abundante que appareceu. E” porém necessario cau- terizal-a, porque, além de excessiva, tem um aspecto lardaceo, sem comtudo se lhe observar o caracter diphtherico. No dia 6.— Está completamente interrompida a communicação do ar exterior com a tracheia; cauterização, fios. Sôpa e beef. No dia 8.— À ferida está quasi cicatrizada. A voz é mais clara. Todas as outras funcções no estado normal. Levanta-se. » 13.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e garrotilho em um menino de 3 annos; tra- cheiotomia ao 4.º dia de doença, no periodo asphiyxico; morte 4 horas depois em presença de um accesso de suffocacão. (Observação e opera- ção pelo sr. Antonio Angelo de Sousa). «No dia 7 d'abril de 1859, diz o sr. Angelo de Sousa, fui cha- mado ao Arco da Torre de Belem para vêr o menino, Nuno Antonio de Bulhão Pato, de idade de 3 annos e 3 mezes, de boa constituição, que, segundo as informações de seus pais, se queixava, havia dois dias, de difficuldade na deglutição, cephalalgia e febre intensa. A TRACHEIOTOMIA 167 Examinado o doente, achei-lhe alguma inchação dos ganglios sub- maxillares, calor de pelle secco, lingua algum tanto saburrosa, amy- gdalas tumefactas e cobertas de uma camada esbranquiçada, o que me fez diagnosticar angina diphtherica. Cauterizei desde logo as amygda- las, e prescrevi tartaro emetico em dóse vomitiva. Passados os efeitos vomitivos, aconselhei o uso de perchlorureto de ferro liquido do se- guinte modo : Perchlorureto de ferro liquido. ... duas oitavas Ana as spo pao: cera atá qe os ci eye giima libra Para tomar uma colher, das de sôpa, de meia em meia hora, e no intervallo uma colher de leite. No mesmo dia á noite via-se na bocca posterior, destacando-se de cada lado das amygdalas, falsas membranas, e nas proximidades ainda vestigios do nitrato de prata. Os mais symptomas conservavam-se os mesmos, a não ser alguma diminuição no calor da pelle, e a lingua algum tanto escura pelo uso do perchlorureto de ferro e pelas caute- rizações. Por esta occasião repeti a applicação do nitrato de prata so- bre as amygdalas e insisti no mesmo tratamento. No dia 8 de manhã a febre tinha abatido um pouco, mas as fal- sas membranas reproduziram-se e prolongavam um filete diphtherico para o lado da uvula. De novo se cauterizou e se applicou o emetico. Pelo decurso do dia as falsas membranas vão ganhando a bocca posterior, e as amygdalas estão bem tumefactas. As cauterizações re- petem-se extensamente em todos os pontos onde se apresentam super- ficies diphthericas. A” noite o doentinho é visto em conferencia com o nosso respei- tavel professor o sr. Magalhães Coutinho, e combina-se na applicação do chlorato de potassa alternado com o perchlorureto de ferro. A fór- mula foi a seguinte: Chlorato de potassa............. tres oitavas Agua distillada ................ uma libra Uma colher, das de sôpa, de hora a hora, e nos intervallos bom caldo com vinho do Porto, ou leite. No dia 9 ás 6 horas da manhã. — As falsas membranas continuam a reproduzir-se com incrivel rapidez; o doente exhala da bocca um cheiro diphtherico muito pronunciado; grande prostração geral; pulso 168 ESTUDOS SOBRE pequeno; algum ruido aspero no acto da inspiração; alguma tosse; pou- co calor de pelle, accessos de sufiocação. Mandou-se repetir a applica- cão do tartaro emetico combinado com a ipecacuanha, e depois conti- nuar com o chlorato de potassa. Apesar d'isso, este estado tornou-se cada vez mais grave até á uma hora da tarde, em que a asphyxia se tornou bem visivel. Chegando eu n'esta occasião, e vendo que já não era possivel esperar pelo sr. Magalhães Coutinho, que tinha ajustado voltar para operar na occasião opportuna, pratiquei a tracheiotomia no periodo asphyxico. O perigo era tão iminente que nem pude esperar por collegas que estavam mais proximos para me ajudarem; mas a insensibilidade do «doentinho era tal, que pessoas inteiramente estra- nhas á medicina me poderam coadjuvar sem que durante a operação se fizesse da parte do enfermo o mais pequeno movimento. Aberta a tracheia, e introduzida a canula dobrada, saíu pela ferida uma porção de liquido espumoso e ensanguentado, que obstruiu a canula; mas com a lanada consegui desobstruil-a, e que o ar fosse impressionar as vias respiratorias. Ao mesmo tempo faziam-se applicações sinapisadas nas extremidades, e fricções com flanella n'outros pontos, e pôde fazer-se engolir ao doente uma colher de caldo com vinho do Porto. Dez mi- nutos depois de aberta a tracheia, a circulação começou a restabele- cer-se, a côr livida a substituir-se por uma côr ligeiramente rosada ; as suflocações desvaneceram-se; o estado asphyxico desappareceu; e a creança, como que acordando d'um somno profundo, abre os olhos, olha em redor de si, e pronuncia bem claramente os nomes de pai e mãi com grande admiração de todos. Um quarto de hora depois de novo se obstruiu a canula, mas a applicação da lanada põe termo á suffoca- ção, a ponto de a creança se conservar n'um estado satisfactorio du- rante uma hora. Vendo que este estado continuava, e tendo de vêr ou- tros doentes de gravidade, retirei-me, aconselhando que continuassem o uso do chlorato de potassa, e que se prevenisse o sr. dr. Sousa Go- mes que d'alli ficava bem proximo, e que tinha assistido a toda esta scena depois de terminada a operação, para o caso de qualquer acci- dente. Eram 6 horas da tarde quando voltei para tornar a vêr o meu doentinho, mas já não existia. Tinha succumbido, 4 horas depois de operado a um violento ataque de suflocação, a que acudiu com toda a rapidez o sr. dr. Sousa Gomes, que todavia não chegou a tempo de o poder remediar. Não se fez a autopsia. » E' summamente notavel esta observação, na parte que diz que a creanca pronunciára bem claramente os nomes de pai e mãi, depois de operada e de ter metida a canula na tracheia. Não podendo duvidar A TRACHEIOTOMIA 169 do facto, por ser referido por um collega mui intelligente e probo, quero explical-o pelo pequeno volume da canula em relação á capaci- dade da tracheia, de modo a poder subir e passar pela glotte uma grande columna de ar durante a expiração. 14º OBSERVAÇÃO Angina pseudo-membranosa e garrotilho em uma menina de 7 an- nos de idade; asphyxia; albuminuria; tracheiotomia ao 7.º dia de doen- ca; diphtheria na ferida no dia seguinte ao da operação; tirada a ca- nula ao 9.º dia; cicatrização da ferida e cura aos 15 dias da operação. (Observação e operação por Antonio Maria Barbosa) No dia 30 de julho de 1859 fui convidado para ir á rua direita de Pedroiços n.º 16, á casa do ex.”º sr. Luiz Meyrelles do Canto Me- rens Tavora, pelas 9 horas da noite, com o dr. Simas, a fim de vêr uma menina aflectada de garrotilho, de quem era assistente o sr. dr. Faustino de Sousa Gomes, e á qual seria preciso praticar a tracheioto- mia como ultimo recurso. A doentinha que fomos vêr, a sr.* D. Maria de Tavora, era na- tural da ilha Terceira, tinha 7 annos de idade, temperamento lympha- phatico-nervoso, e boa constituição. Foi vaccinada na idade de um mez; tinha tido varicella havia 2 annos, e sarampo por duas vezes aos 4 e aos 6 annos. Afóra estas doenças apenas teve nos dois verões anteriores adenites cervicaes, que haviam cedido promptamente á applicação de algumas sanguesugas e cataplasmas emollientes, segundo nos referi- ram. Ultimamente, no dia 24 de julho, foi acommettida, sem causa apreciavel, de dôres de garganta e ouvido esquerdo, engorgitamento doloroso dos ganglios da região jugular deste mesmo lado, alguma vermelhidão e tumescencia das amygdalas, e muita febre. Foi assim que a viu o sr. Sousa Gomes, que prescreveu topicos emollientes e si- napismos nas extremidades inferiores. No dia 25 de manhã a febre estava ainda intensa, o pulso cheio e duro; o engorgitamento doloroso dos ganglios em ambos os lados do pescoço, se bem que maior no lado esquerdo; a lingua muito sabur- rosa; vermelhidão ligeira em toda a pharynge; amygdalas pouco in- chadas cobertas por uma camada pultacea branco-amarellada da ex- tensão de 1 centimetro quadrado, pouco mais ou menos; alguma dif- MEM. DA ACAD,— 1.º CLASSE.—T, HI. P. 1. 22 170 ESTUDOS SOBRE ficuldade na deglutição; inappetencia. O assistente prescreveu logo um grão de tartaro emetico em uma libra d'agua distillada, para ser to- mado em quatro dóses, com o que conseguiu que a doentinha vomi- tasse muito. No mesmo dia de tarde o estado local não apresentava quasi dif- ferença, mas o estado geral parecia melhor, porque a febre havia di- minuido. No dia 26 de manhã a febre tinha decaído ainda mais, porém as camadas brancas de sobre as amygdalas tinham tomado mais al- guma extensão, e parecia terem a fórma membranosa bem caracte- rizada. O tratamento posto em pratica foi logo a cauterização das super- ficies brancas das amygdalas com o nitrato de prata solido, e a limo- nada de citrato de magnesia. Na tarde d'este mesmo dia foi repetida a cauterização, porque as falsas membranas destruidas de manhã se tinham já reproduzido. Na manhã do dia 27 a ganglionite tinha augmentado, a deglu- tição dos liquidos era mui difficil, e obrigava a doentinha a compri- mir com as mãos os ouvidos, para minorar a dôr que da pharynge se communicava a estes orgãos n'aquelle acto; as: falsas membranas mais extensas. Cauterização, seis sanguesugas e cataplasma emolliente no pescoço. Em 28 de manhã nova cauterização indicada como as primeiras, gargaréjos emollientes, limonada de citrato de magnesia. De tarde a creança estava mais agitada, a deglutição mais dolo- rosa; as falsas membranas estendiam-se á face posterior da uvula. Cau- terização. No dia 29, pelas 5 horas e meia da manhã, o sr. dr. Gomes achou a doentinha no estado seguinte: face decomposta, livida, na- riz afilado, olhos encovados, grande difficuldade de respirar, respira- ção aspera e acompanhada d'uma especie de guincho particular, tosse e voz rouca; pulso pequeno, pouco frequente; quasi nenhum calor de pelle; certa agitação que levava a doentinha a mui variadas posições; falsas membranas cobrindo as amygdalas, uvula e toda a pharynge. Toda a garganta coberta das pseudo-membranas foi logo energicamente cauterizada com esponja molhada. em uma dissolução de nitrato de prata na proporção de duas oitavas por onça d'agua distillada, e se- guiu-se logo a administração de tartaro emetico. Em vista da rapida extensão da molestia e da sua gravidade cres- cente, foi convidado o sr. Simas para vêr a doentinha em conferencia A TRACHEIOTOMIA 17 Este pratico, cuja reputação na especialidade é tão justamente aprecia- da, reconhecendo, como o sr. dr. Sousa Gomes, que havia angina- diphtherica já propagada á larynge e constituindo o crup, mas sem lesão dos orgãos thoracicos, foi de opinião que se insistisse no trata- mento local pelas cauterizações, repetidas de tres em tres horas, com a dissolução de nitrato de prata em partes iguaes; que se ministrasse como vomitivo a ipecacuanha e o tartaro emetico; e que eu fosse pre- venido para praticar a tracheiotomia, que naturalmente seria precisa. Até á noite de 30 de julho foram feitas sete cauterizações, e mi- nistrou-se o emetico por mais de uma vez, sem se conseguir melhora duradoura e bem apreciavel nos symptomas geraes; entretanto o esta- do local modificou-se muito, porque as falsas membranas estavam des- truidas, excepto em uma pequena parte da uvula. Assim se tinham passado as cousas até ás 9 horas da noite, quan- do cheguei com o dr. Simas a casa do sr. Tavora, onde nos espera- va o dr. Gomes. Por esta oecasião a doentinha apresentava os sym- ptomas seguintes: respiração mui aspera, serratica, sobre tudo na ex- piração; tosse mui rara e rouca; voz extincta; algum fervor muco- so bronchial; som claro pela percussão em todo o thorax nos pontos correspondentes ao pulmão; prostração; alguma somnolencia; pallidez de face; pouco calor de pelle; pulso pequeno, pouco frequente; sec- cura de bocca muito intensa, desejo incessante de a humedecer, o que a doente fazia quasi constantemente com uma esponja molhada em agua; ganglios cervicaes um tanto inchados e dolorosos, mas muito menos do que já haviam estado antes das cauterisações mais repeti- das; ligeira tumefacção das amygdalas; pharynge um pouco rubra, li- geiramente ensanguentada, limpa de falsas membranas á excepção de uma pequena parte do lado esquerdo da uvula; urinas com grande quantidade de albumina denunciada pelo acido nitrico. Com interval- los irregulares vinham accessos de suflocação de mediocre intensidade, que obrigavam a creança a variar repetidas vezes a posição. Sensibili- dade da pelle pouco menor do que no estado normal. Em vista de todo este quadro, e do efleito dos remedios, assen- tou-se, em commum, que a operação era indispensavel, e que só se devia esperar o momento opportuno para a praticar. Fiquei por isso com o dr. Gomes em casa da doente, esperando a indicação para operar. Pela 1 hora da manhã do dia 31 a asphyxia tomou maior inten- sidade por occasião de um forte ataque de suflocação, que tentámos dissipar com o emetico de ipecacuanha e tartaro. 22 « 1792 ESTUDOS SOBRE Nada conseguimos com este meio, a cujo uso a doentinha oppu- nha todas as suas forças: o estado asphyxico cresceu successivamente, e com elle a somnolencia e a insensibilidade da pelle; a face fez-se li- vida; os membros esfriaram e cobriram-se de suor glacial; o pulso tornou-se mui pequeno, irregular, intermittente; a respiração ancio- sa, intercortada, mui ruidosa nos dois tempos; a creança não dava ac- cordo de si. Eram 4 horas da manhã quando os symptomas chegaram a este grão. Foi n'esta occasião, em que todos os meios estavam esgotados, em que a asphyxia era já manifestada pela anesthesia, e em que a morte não podia deixar de ser a consequencia proxima, se se não abrisse de prompto um caminho artificial ao accesso do ar no pulmão, que pro- cedi á tracheiotomia com o auxilio do sr. dr. Sousa Gomes e de algu- mas pessoas da familia estranhas á profissão. Incisada a pelle na linha mediana da região tracheial, desde a cartilagem cricoidea até o esterno, a fascia superficial e folhetos da apo- nevrose cervical, separados os musculos esterno-thyroideos e as veias turgidas do plexo sub-thyroideo, sem apparencia de conhecimento da parte da doente, dividi immediatamente quatro ou cinco anneis da tra- cheia abaixo da cartilagem cricoidea. Abertas as vias respiratorias, com o ruido proprio, saíu pela ferida uma certa porção de liquido puri- forme com muitos frocos brancos, cuja saída promovi ainda com a in- troducção na tracheia da lanada molhada em agua morna, depois de collocada a canula dobrada de Borgelat e Trousseau. Assim excitada a tosse, e desembaraçadas as vias respiratorias abaixo da larynge, a creança começou a respirar regularmente e a re- animar-se, recuperando a consciencia e a sensibilidade, readquirindo calor, desenvolvendo-se e regularisando-se o pulso, e desvanecendo-se a lividez da face, a ponto de, um quarto de hora depois de operada, estar deitada em decubito dorsal com a cabeça baixa, mui socegada, e no estado o mais satisfactorio. Pelas 6 horas da manhã, em que chegou o dr. Simas, a respira- ção estava bastante embaraçada e anciosa, havia somnolencia e algu- ma febre; mas este estado cessou logo que se tirou a canula interna que estava em parte obstruida por uma falsa membrana e sangue co-. agulado, e pela saída de muco e de algumas porções pseudo-membra- nosas, provocada pela instillação de gotas de agua morna na tracheia. Até o dia seguinte as cousas continuaram bem, tirando-se a ca- nula interna de tres em tres horas para se limpar, e além d'isso to- das as vezes que havia indicação para o fazer. A, creança esteve soce- A TRACHEIOTOMIA 173 gada, dormiu; a febre não era exagerada. Começou logo a alimentar- se com agua e leite, e caldos de vacca. No dia 1 de agosto vi a doentinha conjunctamente com o dr. Si- mas e o collega assistente. Tinha saído pela canula muito muco e detri- tos diphthericos; a pharynge estava de novo coberta toda por falsas mem- branas, que se haviam formado em 30 horas; albuminuria; tiraram- se as duas canulas para serem limpas, e para se vêr a superficie da fe- rida, que, como era de esperar, estava toda coberta de uma camada diphtherica. Cauterizei bem, tanto a pharynge como a ferida, com o nitrato de prata solido, e colloquei de novo as canulas. Nenhum trata- . mento interno, porque a doente se recusava absolutamente a tomar ou- tra coisa que não fosse caldo de vacca e agua com leite. Nos tres dias seguintes continuaram as mesmas cauterizações dia- rias, tanto na pharynge como na ferida da operação, por haver sem- pre falsas membranas que destruir. Ao 4.º dia as bebidas que a doente toma dão-lhe no goto, e sáem em parte pela canula, por isso dá-se-lhe sópas. Ao 5.º dia depois da operação, em 4 d'agosto, a ferida estava inteiramente limpa, e deixei por isso de a cauterizar. Na pharynge comtudo algumas pseudo-membranas havia ainda para destruir sobre as amygdalas, as quaes se deixou de cauterizar por- que a doentinha se oppunha energicamente. Mas não havendo já fe- bre, nem engorgitamento dos ganglios cervicaes, tendo diminuido mui- to a albumina das urinas, e apparecendo o appetite mui pronunciado, Julgou-se a doença vencida, e começou a alimentar-se mais a doente com sôpas de vacca e de leite, e alguma carne. No dia 8 de agosto, nono da operação, tendo desapparecido intei- ramente as falsas membranas da pharynge e a albuminuria, depois dos convenientes ensaios com o fim de verificar se a creança já respirava sufficientemente pela larynge, tiraram-se as canulas, deixando ainda por 4 horas separados os labios da ferida, que depois foram approxima- dos. A voz, que logo depois se restabeleceu, era um pouco rouca. No dia 11 de agosto a ferida estava quasi toda unida, e a 14 do mez, isto é, 15 dias depois da operação, tinha de todo cicatrizado. Só então deixaram as bebidas de dar no goto. Dois dias mais tarde a creança, que na madrugada de 31 de julho vi moribunda, partia para Cintra, bella, cheia de vida, e sem nenhum dos accidentes nervosos ou outros que bastantes vezes se seguem ao garrotilho. 174 ESTUDOS SOBRE 15. OBSERVAÇÃO Angina tonsillar pseudo-membranosa e crup em uma menina de 6 annos e meio; asphyxia ; albuminuria; tracheiotomia ao 7.º dia de doen- cu; diphtheria na ferida desde o dia immediato ao da operação, dispen- sada a canula ao 6.º dia; cura e cicatrização completa da Jerida ao 17.º dia. (Observação e operação por Antonio Maria Barbosa) Carolina Ferraz, de 6 annos e meio, temperamento lymphatico, constituição delicada, filha do sr. José Roberto Alves Ferraz, moradora na rua de S. Lazaro n.º 101, 1.º andar, acordou, na manhã de 8 de agosto de 1859, com febre, mau halito, dôr e inchação ganglionar no lado esquerdo do pescoço que lhe impedia os movimentos da cabeça. N'ºeste dia ficou de cama, a caldos, e poz-se-lhe sinapismos nos pés. No dia 9, estando melhor da febre, levantou-se, mas a dôr do pescoço estava quasi no mesmo estado. Fomentações emollientes. A 10 estava melhor do pescoco, mas appareceu dôr de gargan- ta, halito mais desagradavel, duas epistaxis abundantes pela venta es- querda, uma ás 9 horas da manhã e outra ás 2 da tarde. Fica de cama. No dia 11 mais forte a dór de garganta, mas parece não ter fe- bre; amygdalas inchadas e cobertas de uma camada branca. Levanta- se de novo. Repetiu a hemorrhagia pelo nariz, uma vez de manhã, ou- tra de tarde, sendo a ultima mui pequena. No dia 12 era menor a inchação dos ganglios do pescoço e das amygdalas, a dôr de garganta mais incomoda. Apparece rouquidão e tosse, grande agitação, sem calor notavel da pelle. No dia 13 desappareceu quasi toda a inchação dos ganglios cer- vicaes e das amygdalas; aphonia; mais tosse, mui rouca por ataques com suffocação e arroxeamento da face, que obrigavam a creança a sen- tar-se na cama, e mesmo a pór-se de pé para melhor respirar. Estes ataques começaram pelo meio dia, e continuaram, pouco mais ou mé- nos, de duas em duas horas até o principio da noite, mas depois muito mais approximados. Nos intervallos das suflocações, que punham a crean- ça em uma cruel inquietação e padecimento, havia somnolencia, de que a doente saia despertada pela tosse e orthopnéa: q O collega, o sr. Diogo Baptista dos Santos Cadet, foi chamado n'este dia, e reconhecendo a existencia do crup e algumas falsas mem- branas nas amygdalas sem inchação d'estes orgãos, nem dos ganglios A TRACHEIOTOMIA 175 cervicaes, prescreveu um emetico de ipecacuanha com que a doente vomitou duas vezes, e aconselhou o chlorato de potassa; mas tudo sem resultado, porque a doença progrediu espantosamente. No dia t4 fui chamado ás 7 horas da manhã, da parte do colle- ga assistente, pelo pai da doente, a fim de me achar em sua casa pe- las 8 horas da manhã, prevenido para a tracheiotomia. Por esta hora achei com o sr. Cadet a doentinha no estado seguinte: A creança estava deitada na cama, com a cabeca dirigida para traz, face livida, beiços rôxos, olhos mui encovados e cercados de gran- des olheiras; respiração mui difficil, muito aspera e ruidosa nos dois tempos, sobre tudo na inspiração, que se ouvia a grande distancia: a cada inspiração viamos dilatarem-se extraordinariamente as azas do nariz e pronunciarem-se muito as fossas supra-claviculares e supra-esternal; aphonia absoluta; som claro pela percussão em todo o peito; a auscul- tação, não indicava lesão pulmonar; pulso pouco frequente, mui pe- queno, faltando-lhe algumas pulsações; lingua saburrosa; na pharyn- ge nenhuma inchação nem vermelhidão, apenas duas pequenas falsas membranas nos pilares anteriores; insensibilidade da pelle ás vellica- ções que lhe fizemos; suor frio pelo corpo e membros; urinas da noite citrinas e limpidas com albumina indicada pelo acido nitrico. Vendo a urgencia do caso, e havendo já anesthesia da pelle, ope- rei logo a tracheiotomia coadjuvado pelo collega Cadet. A operação foi rapidamente praticada, porque receiei que a pouca vida da crean- ca me não deixasse leval-a ao fim. Houve alguma hemorrhagia veno- sa, que cessou logo que introduzi a canula na tracheia. Poucos mi- nutos passados, a respiração estava bem restabelecida e tranquilla; e a doentinha, livre de todos os signaes da asphyxia, assegurou-nos nada ter sentido. j < Meia hora depois da operação dormia mui socegada sobre o la- do direito, e assim esteve por espaço de hora e meia. Um enfermeiro, já habitnado a cuidar de doentes desta ordem, ficou junto da opera- “da para limpar de duas em duas horas a canula interna, e para a des- obstruir todas as vezes que a difficuldade de respiração indicasse essa necessidade. A doente ficou tomando, de duas em duas horas, duas colheres, das de sópa, da seguinte poção : Chlorato de potassa......... tres oitavas Agua distillada............ oito onças Xarope de gomma arabica. ... uma onça 176 ESTUDOS SOBRE Nos intervallos meia chavena de leite com alguma agua, ou cal- do de vacca. A creauça passou bem o dia e a noite, dormindo ou em somno- lencia a maior parte do tempo. No dia 15 a face estava animada e alegre, o pulso a 120, regu- lar; calor de pelle natural; respiração silenciosa, pouco frequente, bem perceptivel em todo o peito pela auscultação; urinas claras, com gran- de deposito mucoso, ainda um pouco albuminosas; houve duas dejec- ções alvinas; pela canula saiu uma falsa membrana branco-amarellada de tres centimetros de comprimento sobre um e meio de largura. Pelas 9 horas da manhã tirei as canulas, que foram limpas, e cauterizei com o lapis de nitrato de prata toda a extensão da ferida, desde os tegumentos até á tracheia, a qual estava toda lardacea e re- vestida de materia plastica mui adherente. No dia 16, examinando a pharynge, viu-se que haviam desappare- cido espontaneamente, sem tratamento local, as falsas membranas que se tinham notado pouco antes da operação; saiu outra falsa membrana mais pequena pela canula com certa quantidade de muco viscoso e amarellado; toda a ferida, ainda coberta de camada diphtherica, foi novamente cauterizada; houve grande transpiração, sobre tudo durante a noite; pulso a 110. Geléa, caldo de vacca com arroz. Em (7, terceiro da operação, a creança sentada na cama distraia- se com alguns dos seus brincos habituaes, ria com sentimento de ale- gria bem manifesta; pulso a 100. A ferida foi cauterizada por estar ainda coberta na maxima parte por camada diphtherica, da qual ex- traí uma porção apprehendendo-a com a pinça. Sôpa, frango cozido, cal- do de farinha. ' No dia 18 ha ainda indicação para cauterizar uma pequena parte da ferida; urinas limpidas, sem albumina; as bebidas dão no goto, e al- gumas sáem pelo nariz. Sôpas, e gallinha. A 19 ainda uma pequena cauterização em parte da metade es- querda da ferida; alguma tosse, com a qual expelliu pela bocca dois escarros de muco viscoso branco-amarellado; dormiu bem quasi toda a noite; mais appetite. Vitella cozida. A deglutição dos liquidos, ten- tada de novo, fez-se sem inconveniente. No dia 20 ainda é preciso uma ligeira cauterização. Tapioca e ovo ao almoço; sôópa de massa; vitella assada e geléa ao jantar; sópas de leite á cêa. Nos intervallos a solução do chlorato de potassa que não tem sido interrompida e caldo com geléa ou sem ella. Em 21 do mez, 6 dias depois da operação, estando toda a feri- A TRACHEIOTOMIA L7i da limpa de materia diphtherica e com excellente aspecto, e sendo muito bom o estado geral da operada, ec a ourina sem nenhum vestigio de albumina, tirei definitivamente a canula, fazendo antes d'isso al- gumas experiencias no sentido de conhecer se a respiração seria possi- vel sem difficuldade atravez da larynge. Puz depois um lenço de cassa com muitas dobras em fórma de gravata á roda do pescoço. Passadas 4 horas, visitando de novo a doente, verifiquei que respirava sem in- commodo pela glotte; a voz era muito perceptivel ainda que rouca; alguma tosse com expectoração. Approximei os labios da ferida com tiras adhesivas. A 22 tinha passado excellentemente, á excepção de alguma tos- se. A granulação excessiva e algum tanto pallida da ferida foi caute- rizada. Chá e torradas com manteiga, sópa de vacca e beef, dois peros assados. Pára o uso do chlorato de potassa, tendo tomado vinte e uma oi- tavas, sem que se manifestasse a salivação, a qual se tem notado como um dos effeitos physiologicos do medicamento. No dia 23 levanta-se. A ferida em via de cura. As bebidas não dão já no goto. No dia 24, em consequencia do estado saburroso da lingua, da di- minuição do appetite, e da constipação do ventre, toma nove onças de limonada de citrato de magnesia, que remove aquelles inconvenientes. No dia 1 de outubro, 17 dias depois da operação, a ferida esta- va de todo cicatrizada. A creança tinha apenas alguma tosse e certa fraqueza geral que o ar do campo e o ferro, que lhe foi recommen- dado, desvaneceu em pouco tempo. 16.º OBSERVAÇÃO | Angina tonsillar pseudo-membranosa; garrotilho ao 6.º dia da mo- lestia primitiva, em um menino de 6 annos; asphyxia ; albuminuria que “cessou ao 6.º dia da operação; tracheiotomia ao 8.º dia de doença; di- phtheria na ferida desde o 2º até o 6.º dia; canula tirada ao 7º; pa- ralysias consecutivas; ferida cicatrizada aos 21 dias; cura. (Observa- cão pelo sr. dr. Simas, e operação por Antonio Maria Barbosa) « F, morador na rua das Janellas Verdes, diz o sr. dr. Simas, tem 6 annos de idade. A sua constituição é delicada, a pelle fina, os olhos azues, e os cabellos bastos e louros. MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. IH. P. I. 23 178 : ESTUDOS SOBRE Attreito simplesmente a constipações que lhe caíam no peito, nunca teve outro padecimento. Foi sempre de pouco comer. Tem muita vivacidade e intelligencia, e faz-se querido pela sua muita docilidade e meiguice. j No dia 24 de SRA de 1859, andando até ahi de perfeita sau- de, conheceu-se-lhe alguma febre, molleza e fastio. No immediato queixa-se da garganta, custando-lhe a engulir e a mover o pescoço. Comtudo a febre não é grande então. O pulso não vai além de 90 pulsações regulares e brandas. O calor da pelle tão pouco é in- tenso. Respira bem e sem tosse. A lingua é que está um pouco esbran- quiçada e pontuada de rubro. Séde quasi nenhuma. As amygdalas estão bastante inchadas e vermelhas, e como que estranguladas pelos pilares. Cada uma d'ellas tem, porém, no centro uma falsa membrana, do tamanho de um botão de camisa, um pouco amarellada e já espessa. E por baixo do angulo da masxilla inferior, do lado esquerdo, mostram-se os ganglios engorgitados, doridos, e edemaciado o tecido cellular de em torno. No. 3.º dia, os symptomas geraes não augmentaram nem dimi- nuiram; mas os locaes ganharam em extensão. As falsas membranas lavraram a ponto que no espaço de 20 a 24 horas tinham abrangido toda a superficie livre das amygdalas. Os pilares circundando-as de um vivo encarnado puzeram com- “tudo limites á sua força expansiva. E não só ganharam em superficie, como augmentaram de espes- sura, circumstancia esta que tornava muito mais volumosas as am y- gdalas que já de si o eram bastante. Do 3.º ao 8.º dia da doença, não fez ella diferença para peior. Antes pelo contrario, a febre diminuiu, a pelle refrescou, e a de- glutição tornou-se facil. O edema do tecido cellular dissipou-se, e os ganglios sentiam-se apenas. O estado das amygdalas é que sempre se conservou o mesmo. As falsas membranas se caíam, era para se renovarem, não ob- stante o tratamento de que mais longe fallarei. Demais a mais a creança estava alegre, tinha appetite, e dormia regularmente. A TRACHEIOTOMIA 179 Parecia, pois, que a molestia ia acabar. Mas no dia ultimo de no- vembro o doentinho, que dormiu inquieto toda a noite, accorda rou- co, com tosse crupal, e febre viva. As falsas membranas das amygdalas, evidentemente diminuidas de volume, manifestavam signaes evidentes de absorpção, principal- mente junto aos pilares, dos quaes se haviam desviado um pouco por effeito da mesma absorpção; e a sua superficie era lisa, lustrosa, e de um branco opaco uniforme. Sem embargo, os novos symptomas foram crescendo rapidamen- te; manifestaram-se outros ainda mais assustadores; a tosse e a voz extinguiram-se; a respiração embaraçou-se; e finalmente appareceram accessos de suffocação que obrigaram a praticar a tracheiotomia no dia 2 de dezembro pela manhã. O meu amigo, Antonio Maria Barbosa, foi o operador; e o nosso collega Alves e eu ajudantes. A operação fez-se rapidamente, mas apresentou a seguinte parti- cularidade. Não havendo sido possivel evitar o plexo venoso thyroideo, o sangue era tanto que duas esponjas não bastavam para enxugar a ferida. y Não se podia, pois, dar um passo sem ligar as veias, o que era, não digo impossivel, mas difficilimo no meio d'aquelle mar de sangue. O operador então sem se desconcertar e com todo o sangue frio, procurando com o dedo index da mão esquerda o annel da tracheia, que está logo por baixo da cartilagem cricoidea, entra n'aquelle orgão com a ponta do bisturi, e, sem descontinuar, fende em um abrir e fe- char d'olhos quatro anneis. Em seguida, dilatando com o mesmo dedo a solução de continuidade, por ella introduziu e collocou logo a ca- nula dobrada. Logo a hemorrhagia parou, e assentada a creança, o sangue que havia penetrado nos bronchios foi expulsado com violencia por uma tosse que durou alguns minutos. Pouco depois, a respiração operou-se mansa e tranquilla, lenta e sem ruido. Ainda assim, o doentinho perdeu muito sangue, e ficou muito pallido. Fez-se-lhe o penso ordinario com adhesivo e o lenço de cassa á roda do pescoço. Uma hora depois dormia a somno solto. D'ahi por diante, o pulso socegou, e o calor do corpo diminuiu consideravelmente. 23 « 180 ESTUDOS SOBRE A respiração só se embaraçava quando a canula se entupia. O appetite desenvolveu-se com força, e a creança não tardou em recuperar a sua alegria habitual. No dia immediato ao da operação foram tiradas as canulas, e a ferida toda cauterizada, assim como nos quatro dias seguintes por se haver apoderado d'ella a diphtheria. À N'uma palavra, a doença 24 horas depois da operação pareceu entrar francamente no periodo de declinação, por quanto as falsas mem- branas desappareciam com rapidez, e a canula dava passagem frequente a fragmentos das mesmas, embora de pequena dimensão, molles, e quasi sem consistencia. Não obstante, a canula só pôde ser tirada 7 dias depois da ope- ração. Não me tinha lembrado procurar a albumina nas ourinas, mas logo que chegou o meu collega Barbosa, isto é, quando appareceram sym- ptomas de garrotilho, por indicação sua foram analysadas, e encontrou- se-lhes uma grande porção, que a pouco e pouco foi diminuindo até se extinguir ao 6.º dia depois da operação. Esta creança parecia, pois, salva. Já se levantava, andava com des- embaraço, e comia bem. Repentinamente no dia 11 (9.º da operação) sem causa aprecia- vel apparece uma febre intensa (130 pulsações) com muito calor de pelle, modorra profunda, sêde viva, e lingua secca escurecendo um pouco no centro; mas taes symptomas, que começaram de noite, dimi- nuiram de manhã, para se renovarem na tarde immediata com igual força, principiando pelo esfriamento do nariz, pés e mãos. Durante o accesso custava muito a tirar a 'creança da modorra ; a lingua seccava-se extraordinariamente, e a respiração estava muito alta e frequente; mas a auscultação não descobriu nunca symptoma al- gum de catarrho bronchico ou de pneumonia lobular, que tanto era de temer. Nos intervallos dos accessos o pulso baixava a 100, a lingua hu- medecia, dissipava-se a séde, passava a modorra, e diminuia considera- velmente o calor do corpo. E assim continuou esta creança até o dia 22, em que os acces- sos se extinguiram, começando desde o dia 15 a diminuir gradual- mente de intensidade. O pulso comtudo sempre ficou accelerado. No dia 23 o doentinho, já com a ferida cicatrizada, quiz levan- tar-se, mas não se pôde suster nas pernas. A TRACHEIOTOMIA 181 No immediato não se pôde mover na cama, e chora porque o mu- dem de posição. Deitado, move a cabeça de um para outro lado; mas assentado não a póde conservar em equilibrio. fon Tambem estando deitado, encolhia, estendia, e cruzava as pernas sem grande difficudade. Era, pois, evidente uma paralysia incompleta dos musculos do pescoço, do tronco, e dos membros inferiores. Jámais a comida deu no goto a esta creança, que sempre pôde engulir com facilidade. Esta segunda phase da diphtherite prolongou-se até o dia 20 de fevereiro, de que data -a sua declinação, podendo já então mexer-se a creança na cama, mover levantando a cabeça, e suster-se de pé a um canto da casa. A paralysia do pescoço foi a primeira a dissipar-se, e não te- ve mais de 15 dias de duração; a segunda foi a do tronco, mas não posso dizer com exactidão o tempo que durou; a ultima foi a das pernas. Em todo este tempo porém, e com muita irregularidade, mani- festaram-se accessos febris intensos e assustadores, que passavam feliz- mente no fim de 24 horas. Em uma noite tiveram explicação na phlogose de ganglios do pescoço que, adquirindo rapidamente grande volume, não chegaram comtudo á suppuração. Por ultimo, esta infeliz creanca esteve quasi perdida em conse- quencia de um catarrho bronchico oecupando uma grande extensão, com abundante secreção de liquidos, falta dé respiração, febre, etc., mas que cedeu ao tratamento revulsivo em larga escala. Terminarei esta observação, que encurtei quanto me foi possivel, dizendo: 1.º Que o tratamento da diphtherite tonsillar consistiu simples- mente na applicação alternada, de hora em hora, do alumen e do tan- nino sobre as amygdalas. 2.º Que administrei alguns vomitorios antes de se praticar a tra- cheiotomia. 3.º Que os accessos foram combatidos pelo quinino sem grande resultado. 4.º Que o ferro e uma boa alimentação formaram a base do tra- tamento da paralysia. " 5.º E que nunca deixei de alimentar com leite, mais ou menos, esta creança. » 182 ESTUDOS SOBRE 17.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e crup em um rapaz de 9 annos; albumi- nuria ; tracheiotomia ao 6.º dia de doença, no periodo asphyxico; morte por intoxicação e asphyxia lenta tres dias depois da operação. (Obser- vação e operação por Antonio Maria Barbosa) Leandro C. G. F., de 11 annos de idade, temperamento lympha- tico, constituição regular, morador na travessa do Monte n.º 16, teve durante 2 mezes febres intermittentes na idade de 3 annos, e aos 4 annos sarampo benigno. Era propenso desde pequenino a difficuldades de respiração, e a engorgitamento dos ganglios do pescoço; mas ha- via 3 annos que nada padecia, e era saudavel. Na 4.º feira, 29 de fevereiro de, 1860, á noite queixou-se de que- brantamento de corpo, alguma febre, falta de appetite, dôr de gargan- ta, inguas aos lados do pescoço, difficuldade de engulir. A's 2 horas da manhã da 5.º feira, 1 de março, acordou muito incommodado, com calor muito intenso e mais dôr de garganta, para o que lhe fizeram applicação de sinapismos. , N'este mesmo dia de tarde foi visto pelo sr. Manuel Fernandes, que receitou primeiro 8 onças de limonada purgante, depois o tarta-. ro emetico; e como topico 1 onça de mel rosado com meia oitava de acido chlorhydrico. Desde então até o dia 6 de março o doente teve o seguinte 'ttra- tamento na ordem em que vai exposto: purgantes, emeticos, cosimento de quina, algum chlorato de potassa, topicos adstringentes, sanguesu-. gas por duas vezes, vesicatorio nas costas, fricções tonicas. “ No dia 6 de manhã vi o doente, a pedido do meu illustrado col- lega, o sr. dr. Alvarenga, que acabava de ser instado para se encar- regar do seu tratamento. Achei-o então com todos os signaes de angi- na diphthericà e de crup no periodo de asphyxia e intoxicação mui adiantada. Havia diphtheria na superficie onde se tinha applicado o vesi- catorio; o sangue das ultimas seis sanguesugas applicadas na noite ante- cedente, que ainda se não tinha podido vedar, apesar de alguns meios empregados, era diffluente e anegrado ; e além disso tinha mui gran- de prostração e somnolencia, a pelle branco-amarellada e insensivel, beiços roxos, aphagia, respiração mui curta e fortemente aspera não só na inspiração como na expiração, pulso frequente e mui pequeno, diar- rhéa em consequencia da qual não foi possivel ter urinas para analysar. A TRACHEIOTOMIA isa Pelas 11 horas e meia da manhã pratiquei a tracheiotomia, ten- do por ajudantes os srs. dr. Alvarenga, Cypriano Ferreira e Manuel Fernandes. Pela ferida da tracheia, além de liquido branco com pe- quenos fragmentos de falsas membranas, foi expellido um grande pe- daço de pseudo- “membrana bem organisado e resistente com 6 a 7 cen- timetros de comprimento sobre 3 e meio a 4 de largura e 1 a 2 mil- limetros de espessura, o qual foi observado por todos os collegas pre- sentes. A respiração restabeleceu-se logo como por encanto, na fórma do costume. O doente ficou tomando, de duas em duas horas, 2 colheres grandes de uma poção de chlorato de potassa (2 oitavas para 8 on- cas de agua), e nos intervallos bom caldo de vacca ou leite. A's 8 ho- ras da noite bavia já urinas que tratei pelo acido nitrico, e achei mui albuminosas, como provavelmente já estavam havia mais tempo. No dia 7 de manhã, pelas 5 horas, saiu pela canula outra falsa membrana, que me foi apresentada pelo enfermeiro, que logo depois da operação ficou cuidando no doente. A's 8 horas e meia o pulso mui frequente e desenvolvido, pelle mui quente, respiração frequente e por vezes anciosa, muita diarrhéa. Junta-se xarope de gomma ara- bica á poção de chlorato de potassa. Ao meio dia o pulso mais ve- loz (144); respiração ruidosa e frequente, com a mesma anciedade; tiram-se as canulas, e a ellas vem pegados pedaços de falsas membra- vas muito espessas; a ferida, toda coberta de uma camada diphtheri- ca, é cauterizada e as canulas reapplicadas. Poção com xarope de gom- ma ; ipecacuanha e kermes, sinapismos, chá da India para bebida or- dinaria. O estado do doente foi-se aggravando por esta fórma, a res- piração embaraçou-se cada vez mais por falsas membranas que não podiam ser todas expellidas, a prostração e somnolencia cresciam de hora para hora, e o doente succumbiu por asphyxia lenta e intoxica- cão diphtheritica no dia 9 de março pelas 7 horas e meia da manhã. Não se póde desconhecer que o tratamento pelos purgantes repe- tidos, pelas sanguesugas por duas vezes, e pelo vesicatorio, teve grande parte na manifestação da intoxicação diphtherica que determinan a morte do infeliz doente. 18.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e crup em um menino de 4 annos; albumi- nuria ; tracheiotomia no 5.º dia de doença, no periodo asphyxico ; morte a Lo A ESTUDOS SOBRE por asphyxia lentu, 2 dias e 11 horas depois da operação. (Observa- ção e operação pelo sr. Joaquim Theotonio da Silva) « Henrique Ferrari, de 4 annos, temperamento lymphatico, mo- rador na calçada do Salitre. Sua mãi era doente do peito, tinha tido por vezes febre com forte cephalalgia, e o seu antigo medico assistente desconfiava que tivesse tuberculos nas meninges. ] No dia 19 de março de 1860 é acommettido de febre intensa, pelle muito quente e secca, forte cephalalgia, lingua saburrosa, prisão de ventre, nauseas; não se queixa da garganta, nem os ganglios do pescoço estão engorgitados, mas observo-lh'a, porque um de seus ir- mãos tem uma angina tonsillar com placas diphthericas circumseri- ptas. Ao exame, pois, da bocca posterior apresenta vermelhidão da uvula, amygdalas e pilares; nenhuma placa diphtherica ou pultacea. Mando administrar-lhe calomelanos na dóse de 3 grãos de duas em duas horas ; infusão de linhaça ; caldo de frangão. Dia 20. — Menos febre, menos cephalalgia, evacuou quatro ve- zes, lingua menos saburrosa ; a uvula e amygdalas têem uns pequenos laivos esbranquiçados, semi-transparentes. Ipecacuanha ; chlorato de potassa, 2 oitavas por libra d'agua, para tomar uma colher de hora a hora; 1 onça de mel rosado com 4 oitavas d'alumen para tocar a miu- do a pharynge. Dia 21. — As manchas, que hontem appareceram, estão opacas, brancas, e forram completamente a uvula e amygdalas, estendendo-se um pouco para as paredes lateraes da pharynge. O doente é visto pelo sr. Francisco Alberto de Oliveira, que manda insistir no mesmo tra- tamento, e confirma a nossa suspeita sobre a possibilidade de a doenca se converter em crup. Dia 22. — As falsas membranas que na vespera foram extraídas, reproduziram-se, avançam para a parede posterior, e descem para as partes inferiores; a voz começa a tornar-se um pouco rouca, alguma tosse. Tem appetite, e permittimos-lhe o uso de caldo de farinha. Toma novamente a ipecacuanha, com que se consegué vomito, expulsão de algum fragmento de falsa membrana e mais clareza de voz. Dia 23. — Desde hontem á noite a voz e a tosse são alternada- mente roucas e crupaes. O doente vomitou frequentes vezes durante o dia; os synptomas de crup foram-se pronunciando cada vez mais, apesar do uso dos emeticos, extracção das pseudo-membranas, cauterizações, sinapismos, vapor de agua quente, e quantos meios occorreram. De tarde os phenomenos de 4 A TRACHEIOTOMIA 185 asphyxia foram-se manifestando, de sorte que á meia noite o doente entrou no terceiro periodo do crup, e eu tinha perdido todas as esperan- ças de salval-o pelos meios pharmacologicos. Chamaram-se os srs. Ribeiro Vianna, Mendes Arnaut e Sebastião Silva, e, reconhecida a indicação e opportunidade da operação, procedi a ella seguindo o processo que já n'outra parte descrevi. Eram 2 horas da manhã do dia 24. Depois de uma syncope prolongada que se seguiu á operação, o doente voltou a si, tomou caldo, agua, julepo gommoso com chlorato de potassa, mais tarde caldo de farinha, sem que os liquidos lhe dessem no goto. A res- piração deixou desde logo de ser ruidosa; o somno interrompido por alguma tosse: limpa-se a canula de duas em duas horas, e conserva-se sempre uma gaza em frente da abertura da canula, e o quarto em tem- peratura agradavel. : Dia 24 de manhã. — O enfermo passou bem a noite, dormiu bas- tante, tem appetite, menos febre, alguma tosse. A auscultação feita agora, assim como a que se fizera antes da operação, não indica lesão alguma pulmonar. Dia 25. — Não houve novidade. A urina foi sempre examinada, e nunca apresentou albumina. Dia 26. — Desde a meia noite a respiração tornou-se ruidosa, e houve inquietação ; depois os symptomas d'asphyxia lenta foram pro- gressivamente crescendo à ponto que a creanca succumbiu á uma hora da tarde. Este doente tinha mais seis irmãos, quatro do sexo masculino, e dois do feminino; estas duas e os dois irmãos mais novos soflreram anginas gutturaes e tonsillares, todas com a complicação de pequenos pontos diphthericos, a qual foi mais pronunciada em um do sexo mas- culino que tinha 5 annos de idade; uma das meninas só foi acommet- tida algumas semanas depois. Escaparam de ser atacados os dois irmãos mais velhos (de 15 e 18 annos) que pouco se demorayam em casa, e todos os outros membros da familia, Parece, pois, que aqui a causa infectante acommetteu os indi- viduos de menor idade, poupando os maiores, posto que alguns (a mãi principalmente) estivessem constantemente junto ao leito do doenti- nho. Ha de particular n'esta observação a falta de albumina, que não se manifestou mesmo no periodo d'asphyxia. Tambem não houve sym- ptomas de intoxicação. Outra particularidade notavel foi apresentar-se a febre, cephalal- gia, nauseas, etc. antes do apparecimento das pseudo-membranas : ao MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. IH. P. 1. 24 186 ESTUDOS SOBRE passo que outro doentinho já tinha placas diphthericas e não apresen- tava grande reacção febril. A febre precedeu aqui a formação das falsas membranas; como na escarlatina e sarampo precede a erupção exanthematica ; é mais um ponto de contacto entre estas duas especies morbidas ; e mais um ar- gumento a favor da opinião que considera a diphtheria como uma doen- ça primitivamente geral. » 19.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e érup em uma menina de 4 annos ; albumi- nuria ; tracheiotomia no periodo asphyxico, ao 4.º dia, de doença; morte por diphtheria tracheio-bronchial e asphyxia 25 horas depois da opera- cão. (Observação do sr. L. da Silva Cardeira ; operação pelo sr. Joa- quim Theotonio da Silva) « Julia da Conceição Duarte, idade de quatro annos, temperamento lymphatico-nervoso, constituição forte. Moradora na rua de S. Bento, 352, 1.º andar. Não foi vaccinada, nem nunca teve febre alguma exan- thematica. Gosou quasi sempre de boa saude. Antecedentes morbidos, os que se notam, são de bem pequeno valor. Aos 7 mezes dizem ter tido um incommodo para que se pedira intervenção da sciencia, e de que se cu- rou com um xarope e com a applicaçõo de 2 sanguesugas nos pés. Mais tarde, ha perto de um anno, uma ligeira bronchite de que a cu- rámos pelos meios ordinarios. O começo da doença em questão data do dia 2 de junho de 1860, depois das 4 horas da tarde. E” notavel a exactidão com que se póde marcar. E todo o dia, e até a hora indicada, a doentinha andou bem, comeu na fórma do costume e com appetite, deu-se aos brincos que a entretinham quotidianamente. Nem uma palavra que accusasse o mais leve incommodo, nem um gesto que traduzisse o menor soffrimento, nem a mais ligeira expressão de sentimento de mal estar. Não se ex- poz á insulação n'este, nem nos dias antecedentes. Não foi visitada, nem visitou doente algum d'esta ou d'outra molestia. Dão 4 horas e principia a deixar os entretenimentos que a di- vertiam. Queixa-se de dôres de cabeça. O incommodo progride. Expres- são de mal estar, prostração, calor exagerado. A. TRACHEIOTOMIA 187 Passa-se assim toda a noite. A indisposição da doente para tomar remedio algum faz com que os pais não chamem ainda facultativo. No dia 3 (domingo) no mesmo estado. Anorexia e seccura. Por um capricho pueril, a boa da creança quer acompanhar a mãi á missa. Fazem-lhe a vontade e vai á egreja por seu pé. Continúa o resto do dia nas mesmas circumstancias da vespera mas sem nunca se dar á cama. Dia 4 (segunda feira). — A doente passou a noite muito inquie- ta. Calor de pelle exagerado, e febre, no dizer da familia. Um novo ca- pricho faz pedir-lhe pão e café. E" cumprido o desejo. A repugnancia que tinha a tudo que desconfiava ter pretenções a remedio, fez ainda com que os pais se limitem a dar-lhe os carinhos de que eram capa- zes. A molestia é que os não acceitava, e progredia. Cresciam os dis- velos da familia, e a doença augmentava. E' que o amor de mãi não bastava ! a A's 3 horas da tarde, o caso parece-lhes serio. Não se engana- vam. Decidem-se a chamar-nos. Vemos a creança. E” no collo da mãi, que nunca deixa. Pulso fre- quente e cheio, calor de pelle augmentado. As amygdalas, e sobretudo a direita, um pouco tumefactas e rubras. Difficuldade na deglutição, seceura, lingua esbranquiçada, não tem tido dejecções alyinas. Ganglios submaszillares engorgitados. Não ha tosse; respiração normal, E" bom notar que até o momento da nossa observação nunca a doente se quei- xára da garganta. Prescrevemos : xarope de ipecacuanha em dóse vomitiva ; garga- rejos emollientes e cataplasma da mesma natureza na parte anterior do pescoço. Sinapismos. Recommendámos para depois a limonada de ci- trato de magnesia. Dia 5 (terça feira) ás 7 horas da manhã. — Não foi possivel fa- zer-lhe tomar remedio algum. Recusou totalmente todas as applicações e não a forçaram. O estado morbido geral é o mesmo. Não assim lo- calmente.. A amygdala direita apresenta um revestimento de amarello denegrido. Os ganglios submaxillares do mesmo lado mais; engorgi- tados e dolorosos. Pensámos logo ter de tratar um caso angina diphtherica em que os phenomenos geraes precederam os locaes. Tinhamos estes receios desde a vespera. Não nos mentiram, ainda mal. Receitámos o tartaro emetico ; applicação local do me! rosado com o borato de soda, e pedimos conferencia para esse mesmo dia. A's 5 horas da tarde. — Conferencia com o nosso estimavel col- 24» 188 ESTUDOS SOBRE lega, o sr. Bernardino Augusto da Silva Heitor. A doença não deixa duvida aos mais exigentes. As falsas membranas cobrem já ambas as amygdalas e a uvula. Anciedade e prostração. O estado febril tem de- caído. Concordâmos no diagnostico feito. O collega approva o tratamento que lembrámos de insistir nos emeticos, que pouco effeito têem pro- duzido, começar a dar o chlorato de potassa internamente, e usar dos topicos para modificar as superfícies aflectadas das falsas membranas. Assim : xarope de ipecacuanha ás colheres, das de chá, até vomi- tar. Depois: Chlorato de potassa ........ tres oitavas Aguas .spósico eo adia. 6 enineial libra Duas colheres de sôópa de duas em duas horas. Cauterizações localmente com o nitrato de prata em dissolução muito concentrada, A's 9 horas da tarde. Teve alguns vomitos. As materias vomita- das não apresentam vestigio de falsas membranas. Começou a tomar o chlorato de potassa. Nem o estado geral nem o local têem melhorado. Continúa com o tratamento instaurado. Dia 6 (quarta feira) ás 7 horas da manhã. — A doença continúa na sua marcha rapida. As falsas membranas estendem-se pela parte posterior da bocca. A inquietação da doente é cada vez maior. Repe- tidos ataques de suffocação. Alguma tosse. Respiração curta com in- spirações difficeis. Aphonia. Prbstração: Pulso pequeno e deprimido. Epis- taxis. As urinas tratadas (pela primeira vez) com o acido nitrico dão deposito albuminoso. Continúa ainda com o mesmo tratamento. A's 11 horas da manhã e ás 2 da tarde fizemos novas visitas á doentinha. O quadro symptomatico vai crescendo em gravidade. Des- esperamos do tratamento, e não cremos que a materia medica nos dê remedio para similhante mal, nem a molestia o tempo para se lhe sentir o efleito. Pedimos nova conferencia para decidir se devia ou não praticar-se a tracheiotomia, que considerâmos como o unico recur- so que póde livrar a doente de morte certa, breve e afflictissima. A's 5 horas da tarde conferencia com o nosso illustrado e obse- quioso collega, o sr. Joaquim Theotonio da Silva. A creança então não podia conservar-se na cama, que os ataques de suffocação por serem repetidos e intensos a punham em continua inquietação. A face era livida; os olhos como querendo sair das orbi- tas. Respiração muito difficil. Cada inspiração fazia dilatar as azas do A TRACHEIOTOMIA 189 nariz, e era tão ruidosa que se ouvia a grande distancia. Aphonia. Pulso pequeno e irregular. Falsas membranas, revestindo as amygdalas, a uvula e a parte posterior da pharynge. Temperatura abaixo da normal. Pouca sensibilidade de pelle. Tinhamos assim á vista um caso de crup no periodo asphyxico. Lembra só a tracheiotomia. A auscultação não a regeita. O periodo é chegado, e não ha temporisar. . Procede-se á operação. Eram 6 horas da tarde. Correu perfeita e habilmente nas mãos do sr. Theotonio da Silva, ajudado no empenho pelo nosso illustrado collega militar, o sr. A. Gomes do Valle, e por nós. Logo depois da operação fazia gosto vêr a doentinha. Parecia ou- tra. Era como a vida que tinha entrado n'um cadaver. Respirava si- lenciosa e tranquillamente ; todos os symptomas d'asphyxia tinham des- apparecido. Quem a observára um pouco antes n'esse combate afanoso contra a morte que a queria arrebatar, admirava agora o meio cirur- gico que tão lisongeiramente tinha mudado a scena, tornando a doente tão socegada, dando-lhe tanto allívio, fazendo esperar tanto o pratico que à tratava e os pais que a estremeciam. N'essa noite, em que a vimos repetidas vezes, a creança passou tranquilla até a meia noite. Houve uma ligeira reacção febril. A ca- nula tirou-se de duas em duas horas para se limpar convenientemente, mas nunca se encontrou obstruida com falsas membranas. Da meia noite em diante as esperanças começaram a empallide- cer. O quadro das melhoras a assombrear-se. A respiração, que desde a operação era facil e natural, começou a tornar-se curta e anciosa ; o pulso a cair; a face a contrair-se; a inquietação a manifestar-se. Pela manhã do dia 7 (quinta feira) o estado da doente era ainda menos lisongeiro; o quadro symptomatico tinha-se exagerado. Ao meio dia a auscultação mostrava que a doença se estendia aos bronchios. Eram as esperanças perdidas. D'ahi em diante, a cada hora mais se agerava o mal. E' um es- pectaculo imponente de angustia! A respiração torna-se cada vez mais ruidosa e como que impossivel. A pobre da creancinha não tem- posi- ção. Falta-lhe o ar, o socego, a vida. Já inquieta, já abatida. Sentan- do-se agora, como que electrisada, em busca do ar que lhe faltava ; deixando-se cair logo prostrada pelos esforços que em vão tentára. Tão depressa virando-se, como revirando-se. Ora cobrindo-se, ora descobrin- do-se; já abraçando a mãi, já repellindo-a; morta emfim ás 7 horas da tarde, 25 horas depois da operação. 190 ESTUDOS SOBRE 20.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e crup em um menino de 5 annos; albuminu- ria; tracheiotomia no periodo asphyxico, aos 13 dias de doenca; morte por intoxicação diphtherica 49 horas depois da operação. (Observação do sr. Manuel Bento de Sousa, operação pelos srs. Figueiredo e Motta) « Manuel Joaquim Alves, de 5 annos, vaccinado, temperamento lymphatico, constituição media, natural e residente em Lisboa, entrou no Hospital de S. José com seis dias d'uma doença que foi capitulada diphtherite pharyngea (tornando-se depois laryngea por extensão), e que foi tratada como ta] desde o dia da entrada, 15 de junho, até o dia 18, em que tomei conta do doente. O tratamento empregado con- sistíra no uso interno do chlorato de potassa, vomitivos, cauterizações com nitrato de prata, e mel rosado e borax topicamente e a miudo 18 de junho de 1860. — O doente está quieto, apyretico, apho- nico, com calor normal de pelle, tendo alguma tosse mas com largos intervallos. Apresenta alguma tumefacção dos lymphaticos submasxil- lares; a pharynge está em grande parte revestida por falsas membra- nas que não têem uma côr uniforme, sendo em partes brancas, em outras acinzentadas. Reconhece-se pela auscultação e pela aphonia que as falsas membranas se estendem á larynge. Nada de notavel pelo lado das vias digestivas. A urina, não muito abundante, tem (pelo urino- metro de Prout) 1014 de densidade, e dá com o acido nitrico um precipitado branco, floconoso, e soluvel no excesso de acido. A mesma urina fervida, só, dá pelo resfriamento um precipitado branco, albu- minoso. Fervida com acido nitrico, em excesso, dá o mesmo precipita- do em pequena quantidade. Fervida com pouco acido dá-o em maior quantidade. Examinada ao microscopio apresenta alguns cylindros (fi- brinosos ou epitheliaes ?). Tratamento : ipecacuanha e tartaro emetico em dóses vomitivas; perchlorureto de ferro para topico, cauterizações com nitrato de prata duas vezes. Dieta : caldos de gallinha ; leite de vacca, geléa e marmellada. Dia 19. — Vomitou muito. A voz reappareceu, mas não de todo clara e facil. O estado geral é o mesmo. As falsas membranas estão mais escuras. Urina com 1020 de densidade, precipitando como hon- tem. O mesmo tratamento e dieta. Dia 20. — Vomitou. O mesmo estado geral. Outra vez aphonia A TRACHEIOTOMIA 191 completa. As falsas membranas estendem-se muito pelo véo palatino, e a uvula está em parte destruida por ellas. Albumina nas urinas. O mesmo tratamento e dieta. Dia 21. — Estado adynamico, tosse repetida e crupal, vomitos, albuminuria. Dia 22. — A's 11 horas da manhã ha aphonia completa, sibilo laryngeo, tosse crupal, prostração de forças, extremos frios, ernpção de papulas vermelhas na parte anterior e superior do tronco, pupillas dilatadas. Continúa a albuminuria. A's 11 e meia accessos asphyxicos que obrigam a doente a pôr-se em”pé sobre a cama. A' 1 hora da tarde o sr. Figueiredo, cirurgião do Banco, ausxi- liado pelo seu collega Motta, pratica a tracheiotomia, o doente lança muitas mucosidades pela ferida da tracheia, depois cobra socego. Fica tomando leite só. A's 7 horas da tarde prescreve-se chlorato de potassa (1 oitava para meia" libra d'agua) 4 colheres. A mesma dieta. Dia 23. — O doente está quieto, apyretico; não tem obrado. A canula 'é limpa a miudo das muitas mucosidades, e algumas pseudo- membranas que n'ella se depositam. Continúa a albuminuria. O mesmo tratamento e um clyster. A mesma dieta e mais quatro colheres de vinho nos caldos. Dia 24. — O mesmo estado de hontem, reapparecendo o adyna- mico de que o doente já tinha melhorado. Os dentes estão fuliginosos, ea ferida está revestida por falsas membranas, que são cauterizadas com nitrato de prata. Tratamento: sulfato de quinina 6 grãos em nfis perchlorure- to de ferro 6 gotas em uma colher d'agua distillada, que se repete ; - cauterização na ferida. A's 2 horas e meia da tarde este estado tem-se aggravado, e o doente fallece. Autopsia. Côr arroxeada em todo o tronco. Nada de extraordina- rio na ferida. Ambos os pulmões congestionados em pontos muito li- mitados da sua parte inferior. Toda a mucosa respiratoria muito ver- melha, apresentando uma pequenissima concreção membranosa perto da divisão dos bronchios. A mucosa do estomago está amollecida e ecchymosada. A mucosa do intestino delgado apresenta tambem al- gumas ecchymoses. Os folliculos intestinaes estão tumefactos e ama- rellados de modo que simulam grãos de milho miudo que fossem es- palhados por toda a superficie intestinal. Os rins congestionados. » 192 ESTUDOS SOBRE 21.º OBSERVAÇÃO Angina e coryza diphthericos ; crup; intoxicação diphtherica ; al- buminuria; em um menino de 4 annos e 9 mezes; tracheiotomia ao 6.º dia de doença; morte 6 horas depois. (Observação e operação por An- tonio Maria Barbosa) F. M. B., de 4 annos e 9 mezes de idade, de temperamento lym- phatico-nervoso, gosando sempre de saude, excepto havia dois annos em quanto teve sarampo, morador na rua de S. Bento, foi acommettido no dia 16 de junho de 1860, pelas 2 horas da tarde, de uma forte dôr de cabeça, acompanhada de ardente calor febril que o obrigou a dei- tar-se. A este incommodo seguiu-se bem depressa uma forte convulsão acompanhada de grande vermelhidão e contorsões da face, reviramento dos olhos, e perda dos sentidos por espaço de um quarto de hora, pou- co mais ou menos. À febre continuou intensa até ao dia seguinte em que se manifestaram signaes de angina guttural, a principio simples, mas logo diphtherica. no dia immediato, e então manifestada nas amy- ao Ainda no 3.º dia já o véo palatino e uvula estavam igualmente aflectados. No 4.º dia a diphtheria tinha-se já propagado á pharynge e ás fossas nasaes, sendo aqui precedida a sua invasão de epistaxis, e acompanhando-se posteriormente de estado adynamico mui pronunciado. O doentinho que era tratado. pelos collegas, os srs. Manuel Car- los Teixeira, Manuel José Teixeira e Francisco Antonio Namorado, ti- nha recebido o seguinte tratamento : algumas cauterizações com nitrato de prata, applicações de mel e chlorato de potassa, vomitivos de ipe- cacuanha e tartaro emetico, perchlorureto de ferro como topico e in- ternamente, e no ultimo dia sulfato de quinina e limonada sulfurica. Mas apesar de tudo a doença progredia. No dia 21 de junho, 6.º da doença, vimos o doentinho pela pri- meira vez em conferencia com o sr. dr. Simas e os collegas assisten- tes. Observámos-lhe então o seguinte: pallidez de face, beiços arroxea- dos; tendencia para o somno de que todavia se fazia saír facilmente ; grande prostração ; respiração curta, anciosa, aspera, não havendo com- tudo ataques de suffocação ; tosse rouca; pulso mui pequeno, sem fre- quencia notavel. Toda a pharynge que nos foi dado observar, amygda- las, véo do paladar, e base da lingua cobertos de falsas membranas acinzentadas e tintas de sangue negro e liquido, que corria para os A TRACHEIOTOMIA 193 dentes, gengivas e labios, manchando-os e dando-lhes o aspecto fuligi- “noso. As narinas, em parte obstruidas por falsas membranas e crôóstas de sangue que impediam a passagem do ar, davam igualmente saída a um liquido sero-sanguinolento, ichoroso, misturado a detritos di- phthericos. Sêde muito intensa ; alguma soltura de ventre. As urinas, que pedi ao collega Namorado para tratar pelo acido nitrico, eram abundantemente albuminosas. Algum fervor mucoso nos pulmões. Diagnosticámos unanimemente diphtheria com manifestações lo- caes multiplas na parte posterior da bocca, fossas nasaes, pharynge e larynge; intoxicação diphtherica ; asphyxia incipiente. Acordou-se em continuar o tratamento geral tonico, e o local pelas cauterizações com o perchlorureto de ferro; e ficámos de nova- mente nos reunir pelas 7 horas da tarde do mesmo dia. Por esta hora achámos o doente sem dar acôrdo de si, em um estado de profundo coma ; face com a pallidez da morte, labios arro- xeados ; grande fervor laryngo-pharyngeo, respiração muito curta e dif- ficil ; Bolso mui pequeno e frequente, com algumas falhas; mãos frias, unhas roxas; anesthesia. Vendo a ereança insensivel e muito proxima a uma terminação fatal, e não achando nenhum outro recurso de que podessemos lançar mão, deliberámos em commum fazer a tracheiotomia, apesar de ver- mos o estado de manifesta intoxicação já tão adiantada ; porque sendo parte d'este estado morbido devido á asphyxia, e não sendo sem exem- plo a cura da diphtheria com intoxicação, seria ainda possivel, se bem que mui pouco provavel, salvar a creança. Pela minha parte, disse-o então, e repito agora, de dezeseis opera- ções de tracheiotomia que tenho praticado no crup, em nenhuma como nesta operei em tão más condições, nem com tão pouca confiança no resultado. Pratiquei com effeito em continente a tracheiotomia auxiliado pe- los collegas, os srs. dr. Simas, Manuel Carlos Teixeira e Francisco Antonio Namorado. À operação correu rapida, sem consciencia do doente, e sem ferir as veias do plexo thyroideo, que pude separar para os lados sem dif- ficuldade. Pela ferida da tracheia, logo que foi feita, saiu muito liquido em parte sanguinolento com detritos pseudo-membranosos, e pouco depois, a beneficio da canula dupla, a creança respirou melhor, o pulso des- envolveu-se um tanto e regularisou-se; pôde conservar-se assenta- da, bebeu agua, recuperou a sensibilidade, etc,; mas bem depressa MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. II. P. 1. 25 194 ESTUDOS SOBRE reappareceu a prostração, o estado comatoso anterior, a pequenez e fa- lhas do pulso, e o esfriamento dos membros. A respiração estava muito embaracada, e a introducção, pela canula até á tracheia, da lanada de esponja humedecida, não excitava a expulsão das mucosidades dos ca- naes respiratorios, como aliás tão frequentemente se vê nos operados de tracheiotomia. Parecia que todas as forças abandonavam o doente, e que em breve se aniquilaria totalmente. Não foi todavia inteiramente as- sim ; porque, decorrida uma hora, pouco mais ou menos, a beneficio de caldo quente com alguma colher de vinho, de sinapismos, etc., o pulso desenvolveu-se de novo, a pelle aqueceu, a respiração desembaraçou-se mais, manifestou-se sêéde; a creança reanimou-se, bebeu caldo, agua simples ou com leite, assentou-se espontaneamente na cama, etc. Esta melhora não foi todavia persistente: algumas horas depois, o estado do doentinho aggravou-se de novo, a prostração e-a aniquilação das forças cresceu de ponto, e a morte succedeu pela 1 hora da manhã. 22.º OBSERVAÇÃO Garrotilho em uma menina de & annos; tracheiotomia no periodo asphyxico, ao 10.º dia de doenca; canula tirada definitivamente ao 6.º dia; ferida cicatrizada e cura aos 16 dias da operação. (Observação e operação por A. M. Barbosa) Felicidade, de 4 annos, exposta, de temperamento lymphatico, vaccinada, entrou para a enfermaria da Santa Casa da Misericordia de Lisboa em 13 de maio de 1860, em que foi vista pelo sr. dr. Simas. Trazia então nas costas, quasi cicatrizado e sem falsas membranas, o signal de um vesicatorio que lhe havia sido applicado recentemente. ' Nada se sabia da historia progressa da doença senão que estava doente havia oito dias. Tinha a respiração dificil, ruidosa, a ponto de enco- brir a bulha natural da respiração. Aquelle ruido era aspero, parecia ter a sua causa na tracheia, e ouvia-se a distancia. Tosse humida ; voz pouco clara. As amygdalas estavam um tanto inchadas, vermelhas, sem falsas membranas. Não havia engorgitamento nos ganglios sub- maxillares. Pouca febre sem fastio. Foi prescripto um vomitorio de ipecacuanha. No dia 14, depois do effeito emetico, respira melhor, mas conser- va o mesmo ruido, e a tosse mais rouca. No dia 15 a creança estava muito peior, tinha orthopnéa, ruido mais aspero na inspiração e expiração, faces córadas, pulso muito fre- A TRACHEIOTOMIA 195 quente. Em um ataque de tosse que teve com suffocação, expectorou um fragmento de falsa membrana, que foi observado pelo dr. Simas, dr. Marcellino Craveiro e por mim, que estavamos todos presentes á uma hora da tarde. Não havia albuminuria. Ficámos de nos reunir de . novo todos tres ás 6 horas da tarde para se fazer a tracheiotomia se a asphyxia se adiantasse. Assim o fizemos, estando então tambem pre- sente o sr. João José de Sousa e Silva, vogal do Conselho de Saude. Por essa occasião, a asphyxia estava no maior auge, é por isso delibe- rámos fazer inimediatamente a operação, que pratiquei logo pelo processo já descripto, tendo por ajudantes aquelles collegas. Logo depois de intro- duzida a canula na tracheia, a respiração fazia-se mui tranquillamente. No dia 16, tinha dormido ; havia menos febre ; appetite ; pela ca- nula saia grande quantidade de materia muco-puriforme, em que ap- pareciam pequenos fragmentos pseudo-membranosos. Na fórma do cos- tume tirei as canulas, e, apesar de não haver diphtheria na ferida, cau- terizei-a e reappliquei-as. As urinas que no momento da operação não foram analysadas, porque as não havia, hoje não apresentam albumina sob a acção do acido nitrico. Toma agua e leite de duas em duas horas. No dia 17, continúa bem ; dormiu socegada ; a expectoração me- nos abundante; menos febre; mais appetite. Toma sôpas de leite; e Ni o mesmo tratamento local. o dia 21 não havia febre. Tiraste a canula, e vê-se que a crean- ca a respirar sem ella ; quatro horas depois approximam-se os bor- dos da ferida. A voz iara rouca; alguma tosse humida com expe- ctoração de mucosidades. Dieta de leite e carne. - No dia 27, a ferida quasi fechada ; a voz rouca ; tosse humida, ain- da com expectoração mucosa. No dia 31 de maio, ferida cicatrizada ; tosse quasi nulla ; voz na- tural; bom appetite. 23.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e crup em um menino de 5 annos e 3 mezes; tracheiotomia aos 9 dias de doença e ao 5.º dia do garrotilho; morte por asphyxia lenta e infecção 48 horas depois de operado. (Observa- ção do sr. Bernardino Augusto da Silva Heitor. Operação pelo sr. Joa- quim Theotonio da Silva) « Guilherme Antonio, filho de Rafael Fontes, de idade de 5 an- nos e 3 mezes; de temperamento lymphatico, e fraca constituição. Foi 254 196 ESTUDOS SOBRE vaccinado nos primeiros mezes da vida, e amamentado por sua mãi, de quem herdou a disposição escrofulosa. Morava no cimo da rua da Rosa das Partilhas, ao Bairro-Alto. Esta creança não era sadia: tratei-a aos 4 annos de uma escar- latina seguida de anasarca e de albuminuria, e posto desapparecessem todos os symptomas d'esta complicação, ficou sempre magrinha e en- afesada. Teve ainda um corrimento purulento por um dos ouvidos, que cedeu depois de muitos banhos do mar e preparados ferruginosos. No dia 19 de outubro de 1860 fui chamado novamente para esta creança, a qual se queixára no dia 17 de dóres na cabeca e no pescoço, que, comtudo, não a impediram de sair no dia seguinte. Em o dia 19 acordára com a voz tomada e com alguma tosse, que augmen- tára todo o dia tornando-se cada vez mais aspera, até que a mãi se re- solveu a chamarme. Eram 9 horas da noite quando vi o doentinho assentado no collo da mãi, tossindo de um modo que logo me impres- sionou. Queixava-se da garganta, mórmente no acto da deglutição, e doía-lhe a cabeça quando tossia; tinha pouca febre, respirava bem, ainda coméra de manhã umas ata sem repugnancia. Notei-lhe a guma turgencia e sensibilidade á pressão no pescoço, porém não pude bem ver-lhe a garganta. Prescrevi-lhe um cosimento peitoral para be- bida, sinapismos nos extremos inferiores, e cataplasma emolliente no pes- coço. No dia 20 de manhã observei-lhe então a garganta, e vi ambas as amygdalas inflammadas, e revestidas de placas diphthericas bem dis- tinctas. Passára toda a noite muito inquieto, ora na cama, ora no collo; engulia com dificuldade, e engasgava-se quando bebia qualquer liqui- do; inspiração ruidosa, tosse crupal; maior tumefacção e sensibilidade no pescoço ; muita sêde. Era sem duvida o crup ou a diphtherite laryngea, que succedeu á angina tonsillar diphtherica. Mandei-lhe tomar a miudo algumas colheres de xarope de ipeca- cuanha ; cauterizei-lhe a garganta com uma esponja embebida numa dissolução concentrada de azotato de prata (2 oit. por onça), e suspen- deu-se o uso do peitoral. No dia 20 á noite parecia um pouco melhor, e expellia não sem trabalho algumas mucosidades. A tosse continuava com o mesmo ca- racter, e a voz cada vez menos sonora. Tornei a cauterizar a garganta do mesmo modo, e substitui o xarope por uma mistura de meia oi- tava de ipecacuanha em pó n'uma onça de xarope commum. Dia 21 de manhã. Passára muito mal, e pouco dormira em toda a A TRACHEIOTOMIA 197 a noite. Continuava a tosse expellindo sempre mucosidades ; constante inquietação, e repugnancia invencivel para à ipecacuanha. Cauterizei de novo a garganta, e n'esse acto expulsou entre as gotta ads um pedaço de falsa membrana bem caracteristica. PRESCRIPÇÃO Aeuandishillada- aa cia moravaro (o “L QUCAS Dariaroeneticos a. ra alo ao Sadat sfoo) RÃO Para tomar uma colher de sôpa de meia em meia hora. - Dia 21 á noite. — Notavel prostração, diminuição sensivel da fe- bre. Vomitou por vezes apparecendo novas porções de falsas membra- nas. Teve algumas dejecções alvinas, e transpiração cutanea na occasião da visita. Fiz suspender o emetico, applicar sinapismos nos pés, e em vez da solução de nitrato de prata usei topicamente de uma mistura de 2 onças de mel rosado com meia onça de alumen. Como a creança rejeitava os caldos, mandei-lhe dar leite por alimento. Retira-se-lhe a cataplasma do pescoço, e fomenta-se este com oleo d'amendoas doces camphorado. Dia 22 de manhã. — Tinha-se estabelecido durante a noite uma lenta reacção, que era completa na hora da visita. A creança rejeitava tudo quanto não fosse agua fria, e só á força se lhe podia ver a gar- ganta. Molhei a esponja na solução de nitrato de prata, e levei-a até á epiglotte, provocando-lhe tosse e vomitos. Dia 22 á noite. — Maior inquietação ; completa aphonia e tosse constante. Nova cauterização como de manhã; e recommendei que lhe fizessem, quanto possivel, as applicações do mel e alumen á garganta. Dia 23. — Tanto de manhã como á noite o mesmo estado sem alteração consideravel. Não obrava havia dois dias. Clyster ordinario, e insistencia no mesmo tratamento. Dia 24 de manhã. — Abatimento de forças, e declinação da fe- bre. O mesmo estado local sem alteração nos symptomas pelo lado da respiração. Dia 24 á noite. — Começam a manifestar-se tendencias para suf- focação. Sinapismos volantes; algumas colheres de mistura de ipecacua- nha. Dia 25 de manhã. — Durante a noite houve alternativas de gran- de anciedade, e accessos de suflocação seguidos d'um estado hyposthe- nico, em que o doentinho esfriava, extenuava-se, cobria-se de suores, 198 ESTUDOS SOBRE e parecia proximo a espirar. Pareceu-me indicada a operação da tra- cheiotomia, e disse-o ao pai. Destinou-se uma conferencia para as 5 horas da tarde. Dia 25 á tarde. — Consultei o sr. Joaquim Theotonio da Silva, o qual concordou comigo na urgencia da operação que estava perfei- tamente indicada. Compareceram pouco depois os nossos collegas D. Elias Garcia e Anacleto da Costa. Era noite: a creança custava a sub- jugar-se, o que muito difficultou a operação, que se consummou sem accidente algum, começando o doentinho a respirar facilmente pela ca- nula. Dia 25 á meia noite. — O doente dormiu socegadamente ; tossin de vez em quando sem acordar, expellindo mucosidades pela canula, e readquiríra pouco calor nas extremidades. Mandei-o envolver em bae- tas, e que apenas lhe dessem agua e leite. Dia 26 ao meio dia. — Respiracão facil, mas apressada ; calor de pelle; seccuras ; pulso frequente ; deglutição difficil, expellindo pelo na- riz parte dos liquidos que toma. Tem tomado leite e caldo de galli- nha. Prescripção : 1 grão de calomelanos com assucar de duas em duas horas. Dia 26 ás 11 da noite. — Dyspnéa ; agitação denotando ancieda- de; menos tosse; respiração sonora, ruidosa e desigual ; pulso .frequen- tissimo. Tem saído poucas mucosidades pela canula desde que diminuiu a tosse. Dia 27 ás 9 da manhã. — Consideravel abatimento de forças; pulso pequeno e frequente; as extremidades quasi frias; as feições desani- madas ; o olhar indilferente ; a respiração difficil, tendo tido antes d'este estado, pelas 4 horas da manhã, um accesso de suffocação, repetido ain- da duas ou tres vezes. Houvera difficuldade em tirar e metter a ca- nula para se limpar por causa da viscosidade do muco, que estava como cristallisado nas paredes da mesma. Tinha obrado tres vezes de noite. Tirei-lhe as duas canulas, que estavam sujas de muco concreto ; fiz-lhe instillações de agua morna na tracheia, e levei-lhe ao fundo uma lanada d'esponja humida ; seguindo-se a esta operação um ataque de tosse, expulsão de mucosidades e, por ultimo, de um verdadeiro cylin- dro membranoso, do comprimento de 3 a 4 centimetros, bastante es- pesso, o qual forrava parte da tracheia. Limpei as canulas, reappli- quei-as; mandei pôr sinapismos nos extremos, e fazer fricções com tintura de quina na parte posterior do tronco, e nas extremidades su- periores e inferiores. Pelo dia adiante foi perdendo o calor e o pulso, e sem novo ac-. A TRACHEIOTOMIA 199 cesso de suffocação falleceu ás 6 horas da tarde, 48 horas depois da operação, 11 dias depois dos primeiros symptomas da molestia. Não tive occasião de observar as urinas, de modo que podesse verificar a existencia ou a ausencia de albumina. » 24.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e crup em uma menina de 8 annos ; tracheio- tomia ao 8.º dia da doença primitiva, e ao 2.º do crup; morte por as- phyxia progressiva ao 2.º dia de operada. (Operação pelo sr. José Gal- dino Carvalho da Silva) Esta observação foi copiada da respectiva papeleta da doente onde fôra escripta pelo sr. dr. Simas. « Luiza, de 8 annos de idade, temperamento lymphatico, exposta do collegio de D. Estephania, na Santa Casa da Misericordia de Lisboa, entrou para a respectiva enfermaria no dia 27 d'outubro de 1860, com angina diphtherica que comecára no dia 26. Foi ali immediatamente cauterizada e vomitada com ipecacuanha. A dieta lactea. Bebida de chlorato de potassa. De noite manifestaram-se-lhe symptomas de crup, rouquidão de voz e alguma suffocação. No dia 28 ao meio dia as suffocações eram intermittentes ; voz e tosse bastante roucas, mas ainda não extinctas ; cauterizam-se de novo as falsas membranas das amygdalas. A's 6 horas da tarde extincta a voz e a tosse; respiração muito aspera ; pulso muito accelerado ; somnolencia quasi continua e profunda. A's 9 horas da noite foi operada pelo sr. José Galdino Carvalho auxiliado pelo medico e cirurgião da Casa. A respiração restabeleceu-se, mas jámais deixando de ser metalli- ca, o que é sempre um signal de mau agoiro, até que, manifestando-se de novo a asphyxia, a doente succumbiu ás 8 horas da manhã do dia 30. As urinas não foram observadas. » 25." OBSERVAÇÃO I Angina diphtherica e crup em uma menina de 4 annos e 2 me- zes; tracheiotomia ao 6.º dia de doença ; coryza diphtherico ; morte por asphyxia lenta e infecção diphtherica 17 horas depois de operada. (Ob- servação e operação pelo sr. Antonio Maria d'Oliveira Soares) 200 ESTUDOS SOBRE « Palmira d'Abreu e Barros, 4 annos e 2 mezes, temperamento lymphatico, moradora na rua do Arco do Bandeira. Não tinha tido molestias anteriores. No dia 24 de novembro de 1860 apresentou-se pela primeira vez esta menina com dôr na garganta e voz rouca. Foi-me impossivel exa- minar-lhe a bocca posterior e a pharynge. Não, deixou fazer tratamento local; e a muito custo tomou alguns grãos de ipecacuanha em pó, que lhe produziu alguns vomitos. Desde aquelle dia até o dia 28 os symptomas de crup foram sue- cessivamente apparecendo e aggravando-se. Rouquidão, tosse estriden- te, bulha caracteristica que produzia o ar passando atravez da glotte, . engorgitamento dos ganglios do pescoço. N'este dia á noite tiraram- se-lhe com muita difficuldade alguns pedaços de falsas membranas que forravam a pharynge, e cauterizou-se mal aquella parte com uma dis- solução concentrada de nitrato de prata. No dia 29 dyspnéa continua; a face muito pallida; o pulso pe- queno ; tosse e voz quasi extinctas. Faço a tracheiotomia ás 9 da ma- nhã na companhia dos collegas Joaquim Theotonio da Silva e Fran- cisco Alberto d'Oliveira. A operação correu sem accidente, e depois d'ella a doentinha ficou socegada. Na tarde do mesmo dia tornaram a manifestar-se accessos de suffocação. As falsas membranas appareceram nas fossas nasaes; grande resolução de forças. Continúa a não querer tomar remedio algum. Os symptomas foram augmentando de gravi- dade até ás 2 horas da manhã do dia 30, em que falleceu. As urinas não foram observadas. Este facto deu-se em uma casa onde tinha havido, e havia, mais casos de crup. » 26.º OBSERVAÇÃO Bronchite e crup em um rapaz de 6 annos de idade; tracheioto- mia no periodo asphyxico, ao 21.º dia da doença primitiva; canula ti- “rada ao 12.º dia; ferida cicatrizada e cura ao 19. dia de operado. (Observação e operação pelo sr. José Bernardino Henriques Teixeira) «No dia 12 de fevereiro de 1861, ás 11 horas e um quarto da manhã, entrou para a enfermaria de Sant Anna, cama n.º 15, José, da idade de 6 annos, que pelas informações da mãi, que o apresentava, se soube que havia tres semanas estava doente com tosse e catarrho. A TRACHEIOTOMIA 201 Informado pelo nosso collega que o admittiu, soubemos que apre- sentava tosse funda, alguma anciedade e difficuldade de respirar. Pa- recendo uma bronchite aguda intensa, receitou: ipecacuanha em pó fino 6 grãos, para tomar logo, e igual dóse ás 4 horas da tarde. A's7 e meia horas da tarde foi encontrado pelo nosso amigo e collega, o sr. dr. Simas, na sua visita, com tosse rouquenha sibilante, impossibilidade quasi completa de respirar, face livida, olhos salien- tes, lagrimosos, brilhantes e avermelhados, cyanose ligeira, que se ia tornando mais intensa no pescoço e resto do corpo, asphyxia immi- nente. Não tinha vomitado com a ipecacuanha. Em vista d'este quadro aterrador, e de uma morte proxima, fô- mos avisado pelo sr. dr. Simas para ir vêr o doente, para o qual elle achava urgente a operação da tracheiotomia. Concordei com a urgen- cia da operação, a qual foi immediatamente praticada por mim, tendo sido coadjuvado pelo sr. dr. Simas. Pratiquei uma incisão na pelle desde o osso hyoide até um cen- timetro proximo da fossa supra-esternal; incisão consecutiva da apo- nevrose subcutanea, e quando esta se fez, em razão da escassez da luz “artificial de duas vellas, foram incisados alguns ramos do plexo veno- so, o que deu uma grande quantidade de sangue, que alagou a ferida, e tornoú impossivel continuar uma dissecção methodica. N'estas cir- cumstancias, vista a urgencia de franquear a entrada do ar nos pul- mões, cravei o bisturi perpendicularmente na linha mediana da tra- cheia até atravessar a espessura da sua parede anterior, cortando ao mesmo tempo para a parte inferior alguns millimetros, introduzi por esta abertura um canivete de botão, com o qual dilatei a abertura na extensão conveniente para a introducção da canula competente; ten- do-se conseguido enfraquecer a hemorrhagia do plexo venoso por meio da compressão para um dos lados das partes molles com uma erina do- brada de pontas rombas, habilmente sustentada pelo sr. dr. Simas. No acto da abertura da tracheia caiu algum sangue no seu interior, o que promoveu tosse, mas foi expellido para o exterior acompanhado de porções de falsas membranas. Fiz a introducção da canula, e por esta occasião o doente absorvendo uma grande quantidade de ar, abriu os olhos já mortaes, e expelliu com grande tosse nova quantidade de fra- gmentos de membranas diphthericas acompanhadas de grande quanti- dade de muco purulento, que obstruiu a canula por tres vezes conse- cutivas, «tendo de ser todas as vezes desobstruida pela lanada e agua fria. O doente caiu em prostração logo depois, porém respirando fra- ca e lentamente. Ficou deitado sobre o lado esquerdo, com a cabeça MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. II. P. 1. 26 202 ESTUDOS SOBRE elevada um pouco. Tratamento : leite com agua morna de quando em quando ás colheres; ordem para a ajudante desobstruir a canula com a lanada. Dia 13. — O doente está esperto; respira bem; tem expulsado grande quantidade de muco pela canula, e pequena quantidade de fal- sas membranas; tem havido alguma transsudação sanguinea da ferida exterior, porém pequena; alguma febre; nota-se um tumor do vo- lume d'um ovo de gallinha no lado esquerdo do pescoço por bai- xo e por detraz da orelha que é devido a derramamento de sangue subcutaneo (trombus); ao mesmo tempo alguma tumefacção no pes- coço do mesmo lado. Tratamento: sinapismos nos gemellos ; agua e leite; extracção da canula, e limpeza d'esta; xarope commum Í onça, chlorato de potassa 1 oitava, para tomar uma colher de chá de qua- tro em quatro horas. Dia 14. — O doente continúa no mesmo estado ; expulsão de gran- de quantidade de pus; porém menos febre. Tratamento o mesmo. Dia 15. — Melhor em geral; appetite; nota-se uma ulceração lardacea em torno da abertura exterior da ferida. Tratamento : o mes- mo; cauterização ; dieta, arroz de gallinha. Dia 16. — O mesmo estado; o mesmo tratamento, e vinho do Porto 2 onças. Dia 18. — Tirou-se a canula ás 10) horas da manhã para ver como o doente passava sem ella, porém foi necessario tornar-se a collocar por não ter ainda franca passagem o ar atravez da larynge. “Dia 19. — Continuam as melhoras ; ayticula alguns sons fracos ; grande appetite. Tratamento o mesmo; arroz, frangão assado e vinho do Porto. Dia 22. — O mesmo. Becf de vitella, arroz, pão e vinho. Dia 24. — Idem ; extracção completa da canula. Dia 25. — Não houve nada de extraordinario. Dia 3 de março. — Continúa perfeitamente; a ferida da tracheia está quasi fechada ; percebem-se bem as palavras. Tratamento o mes- mo, e pomada de hydriodato de potassa no trombus. Meia libra de leite. Dia 6. — Está bom; a ferida cerrada ; voz clara. O doente está gordo. Pára o tratamento. Dia 9. — Saíu curado. » A TRACHEIOTOMIA 203 27.º OBSERVAÇÃO Garrotilho em um menino de 5 annos; tracheiotomia ao 3.º dia da doenca ; morte por asphyxia lenta 48 horas depois da operação. (Ob- servação pelo sr. Antonio Joaquim de Sousa Freitas, operação ,por A. M. Barbosa) « Um filho do sr. Fernando Bello, morador na rua da Esperança n.º 160, de 2 annos de idade, lymphatico, constituição regular, foi ata- cado no dia 23 d'abril de 1861 de uma irritação gastro-intestinal com febre e cephalalgia forte. Este incommodo estava completamente desva- necido no dia 26, permittiu-se-lhe por tanto saír da cama ; e elle, como creança, achando descuidada a familia, correu para o quintal, e ali se demorou por algum tempo : a atmosphera estava bastante fresca e muito humida, e foi isto causa bastante para se recolher para casa rouco e com tosse. Passou essa noite mal, com grande agitação e inquietação. Foi visto no domingo 27, e logo vomitado com ipecacuanha ; e em se- guida posto no uso de uma dissolução de chlorato de potassa, sinapis- mos volantes, pediluvios sinapisados, etc. No dia 28 os symptomas do crup tinham-se desenvolvido com toda a sua força ; tentei a cauterização, mas reconheci ser infructuosa, porque as falsas membranas eram inaccessiveis pela bocca. No dia 29 de manhã os symptomas do crup continuavam com a mesma intensidade, senão maior. Insisti nas mesmas applicações, e fiz- lhe dar tambem um pouco d'oleo de ricino. Pedi para as 6 horas da tar- de uma conferencia, com 6 fim de fazer-se então a tracheiotomia se se achasse indicada n'aquelle momento. Com effeito ás 6 horas da tarde con- correu comigo o meu collega e particular amigo, o sr. Barbosa ; exami-. námos o doente, e achámos que a doenca tinha progredido immensamen- te: a respiração estava quasi totalmente embaraçada ; a suffocação era extrema, tinha os labios lividos, a pelle fria; não articulava palavra, nem conhecia pessoa alguma; a anesthesia era completa ; à asphyxia tocava o seu ultimo grau. Não havia tempo a perder ; recorremos á operação, que foi immediatamente praticada pelo sr. Barbosa com aquella rapi- dez e com aquella pericia que todos lhe reconhecem. O doentinho, logo que pôde respirar pela ferida, e que por consequencia a hematose se foi restabelecendo, recuperou a sensibilidade e tornou a si, reconheceu as pessoas que o cercavam, e sorriu-se; a respiração porém ficou ain- da um pouco embaraçada por alguns minutos, apesar de haver saído 26 « 204 ESTUDOS SOBRE pela ferida uma grande falsa membrana e muito muco: percebia-se que algumas mucosidades, pelo menos, existiam para baixo da aber- tura anormal que se havia feito; foram porém saindo pela ferida al- gumas, que o doentinho foi expectorando. Durante a noite do dia da. operação socegou, dormiu por alguns intervallos, teve duas evacua- ções alvinas, e urinou; concedeu-se-lhe e tomou algumas porções de leite com agua, e pequenas porções de caldo de gallinha. As primei- ras 24 horas depois da operação passaram-se soffrivelmente : a crean- ca ia respirando, e estava satisfeita; a ferida era limpa amiudadas ve- zes por um enfermeiro intelligente, e costumado a velar doentes d'esta natureza. Chegámos a conceber alguma esperança de que se salvasse o doente. Passadas as 24 horas, porém, e principalmente ás 10 da noite do dia 30 d'abril, começou a estar muito inquieto, e a respi- ração a difficultar-se mais; percebe-se algum fervor e sibilo para a parte inferior da ferida; parece isto indicar que ha nova formação de falsas membranas,, que se vão agglomerando por esta parte do apparelho respiratorio. No dia | de maio de manhã todos os sympto- mas se téem aggravado ; a suflocação é extrema ; tira-se a canula, ten- tam-se algumas instillações, mas é tudo inutil; a doença propaga-se extensa e profundamente ; a asphyxia começa, e o doentinho suecumbe 48 horas depois da operação. » 28." OBSERVAÇÃO Angina, coryza diphtherico e crup em um menino de 4 annos e meio; albuminuria; tracheiotomia no periodo asphyxico, ao 3.º dia do garrotilho e ao 8.º da molestia primitiva; tirada a canula ao 6.º dia; ferida cicatrizada e cura aos 27 dias depois da operação. (Observação do sr. Alexandre José da Silva Campos; operação pelo sr. Joaquim Theotonio da Silva) « No dia 21 d'outubro de [861 fomos convidado ás 10 horas da manhã para ir a casa do ill.”º sr. Bramão, vma de S. Pedro d'Alcan- tara, afim de ver Arthur, filho de João dos Reis, fallecido de tisica pulmonar; 4 annos e meio, lymphatico, vaccinado, com cicatrizes no pescoço resultantes de adenites suppuradas. Teve sarampo. - Contou-se-nos que o doente tem tido por vezes inflammações de garganta. Que haverá 6 dias lhe appareceram os ganglios do pescoço enfartados e dolorosos ; febre; cephalalgia; dôr na garganta ; difficul- A TRACHEIOTOMIA 205 dade na deglutição, no qual estado se conservára por 3 dias, decli- nando tudo com o tratamento, que consistiu em sinapismos, pediluvios quentes, cataplasmas de linhaça no pescoço, etc.; ficando o doente no dia 19 quasi curado. Que no dia seguinte acordára com tosse e cory- za; e que no dia 21 apparecêra rouco, queixando-se tambem da gar- ganta, pelo que lhe foi receitado mel rosado e alumen para tocar as fauces, e internamente um ligeiro purgante; mas que apesar de tudo para a noite peiorára, Achámol-o no dia -seguinte : Sentado na cama; febre a 120; calor exagerado ; tosse rouca, de timbre particular, mas não frequente ; respiração aspera, um tanto aper- tada e ruídosa, mormente na inspiração ; voz enfraquecida ; dilatação ampla do peito; espirros; narinas obstruidas, obrigando o doente a respirar com a bocca entreaberta ; lingua humida, alvacenta e ligeira- mente conspurcada no centro. O exame da bocca posterior deixou ver restos de phlogose da mucosa ; placas branco-amarelladas e delgadas na parte inferior do pilar anterior esquerdo, estendendo-se para a epi- glote, denotando serem falsas membranas delgadas. A auscultação deu o murmurio respiratorio normal, e a percussão som claro em todos os pontos correspondentes aos pulmões “Hora e meia permanecemos junto do doente, não só Ns pelos medicamentos que receitámos, mas fazendo-lhe a applicação d'el- les; por isso tivemos tempo de conhecer, que os symptomas laryngeos eram permanentes, o que fortificou a opinião que haviamos formado, de que a doença era o crup ou garrotilho. Tratamento : nitrato de prata 2 oitavas, agua distillada 1 onça; para cauterizar as falsas membranas até á epiglote,'por meio d'um pin- cel de fios; e em seguida ipecacuanha em dóses de 6 grãos de 10) em 10 minutos, até provocar o vomito, para ser repetida d'ahi a 4 ou 6 horas, segundo o doente estivesse mais ou menos angustiado da res- piração. Sinapismos. Caldos. Dia 22 (9 horas da manhã). O collega Pontes, que era o assis- tente, apresentou-nos a historia da doença, como se acha descripta no logar competente, e teve a bondade de nos convidar para com elle di- rigir o tratamento, o que aceitámos. O doente tinha passado mal o resto da noite, pouco dormiu, e sempre afílicto ; teve evacuações e vomitos depois da applicação do se- gundo vomitorio. Apresenta dyspnea; tosse crupal, sumida e rara, ou antes ape- nas um esforço como para desembaraçar-se de um objecto que como 206 ESTUDOS SOBRE o afoga; voz quasi extincta ; ruido laryngeo, sibilante e caracteristico, ouvido a distancia, mormente no primeiro tempo da respiração ; febre “a 116; olhos brilhantes, ás vezes amortecidos, olheiras; posições va- riadas, ora sentando-se, ora passeando de uma para outra cama que es- tava perto; lingua humida, os pilares do véo palatino apresentam pon- tos circumscriptos branco-amarellados que são evidentemente falsas membranas. — Tratamento: continuam as canterizações e os vomitorios com in- tervallos rasoaveis ; e de duas em duas horas é tocada toda a bocca pos- terior com a mistura seguinte: mel rosado 1 onça, alumen 3 oitavas. Para uso interno uma colher, das de sôpa, cada duas horas, de chlo- rato de potassa 2 oitavas, agua 6 onças. Caldos de carne. Vendo nós que o caso era dos mais graves, pois ameaçava pela dyspnéa comprometter a vida do doente, e julgando em tal conjunctura que os meios pharmacologicos eram impotentes, combinámos em con- vidar um dos collegas mais habituados a praticar a tracheiotomia, pois não havia contra-indicações. N'estas idéas abundou o nosso collega o sr. Avellar, que se achava presente, e incumbiu-se de escrever ao sr. Joa- quim Theotonio da Silva. Meio dia. O estado do doente tinha peiorado ; comecavam a ma- nifestar-se symptomas asphyxicos, como ligeira lividez de pelle; pés frios; peso de cabeca, revirando-se para trás em cada inspiração ; olhos salientes ; sensibilidade da pelle diminuida, a ponto de ser indifferente ás vellicações. Nada de tosse. A urina tratada pelo acido nitrico deu grande cópia de albumina. Pouco depois o sr. Theotonio da Silva observou o doente, ouviu a nossa exposição, e declarou concordar no diagnostico feito, e na ne- cessidade de praticar de prompto a tracheiotomia, não só por não ha- ver contra-indicações do lado do pulmão, mas porque a doença estava entrada no periodo asphyxico, e nada se esperava dos meios oco cologicos. Immediatamente foi a creança collocada de costas com uma al- mofada debaixo das espaduas e pescoço, ficando a cabeça revirada para tras, afim de tornar saliente a tracheia. O sr. Theotonio praticou a tracheiotomia pelo methodo do sr. Trousseau, com tanta perícia como felicidade, servindo nós ambos de ajudantes. Um ramo do plexo veno- so foi dividido, o qual deu uma hemorrhagia que demorou um pouco mais o processo operatorio ; mas o distincto operador não se incommo- dando com isso, segurou a tracheia com o indicador e pollex da mão esquerda e dividiu-lhe 4 ou 5 anneis. Immediatamente saíu- com o A TRACHEIOTOMIA : 207 ruido proprio grande quantidade de muco espumoso tinto no sangue da ferida; em seguida foi introduzida à pinça dilatadora do sr. Trous- seau, e fez assentar a creança ; seguiram-se grandes inspirações, dando em resultado desembaraçar-se a tracheia de mucosidades mais ou me- nos espessas. Depois foi introduzida a canula dupla que atou ao lado esquerdo, cobriu depois o apparelho com uma porção de gaza sem gom- ma, e fez deitar a creanca do lado direito. O resultado immediato da operação foi parar a hemorrhagia e o ruido laryngeo; estabelecer-se a respiração só pela canula; desappare- cerem todos os symptomas assustadores; apparecer uma syncope, con- tra a qual não foi mister fazer tratamento; e uma hora depois dormir o doente mui socegado! Tratamento: pára todo o tratamento, excepto o chlorato de po- tassa, que continúa alternado com o “caldo de carne e geléa ou leite de vacca. A's 4 e ás 9 da tarde: o doente esteve tranquillo; houve eva- cuações e vomitos, talvez em resultado da syncope. Pulso a 116; tosse “frequentemente pela canula, e expelle muco e fragmentos pseudo-mem- branosos. Urina sem albumina. Extraímos a canula interna para a lim- par, ficando d'ahi em diante este serviço a cargo de um enfermeiro intelligente. Dia 23 (9 horas da manhã): tossiu muito durante a noite. Apre- senta respiração ruidosa; calor; pulso a 120; face rosada. A ferida tem bom aspecto; grande copia de albumina nas urinas. A's 3 horas da tarde: q % Theotonio da Silva levantou o appa- relho, introduziu algumas gotas Te agua tepida na tracheia, e por duas ou tres vezes a lanada de esponja, e em seguida extraiu com a pinça uma falsa membrana mui espessa de 7 a 8 centimetros de comprido, e 15 millimetros de largo. O apparelho foi reapplicado e a respiração tornou-se menos ruidosa. A's 6 da tarde e á meia noite havia maior calor de pelle; seccuras; pulso a 140. A auscultação deixou ouvir o murmurio respiratorio em ambostos pulmões. A percussão deu som claro. Tratamento: capilé para bebida ordinaria; em quanto ao mais o mesmo. Dia 24 (9 horas da manha): a noite foi tranquilla. A febre trau- matica que se havia manifestado no dia antecedente, acha-se diminui- da; pulso a 108. A lingua apresenta na face inferior placas circula- res pseudo-membranosas, mui adherentes, do tamanho de lentilhas, bem como o lado direito e interno da face, as quaes foram cauteri- 208 ESTUDOS SOBRE zadas com o nitrato de prata solido. A urina contém pouca albu- mina. | Dia 25: menos tosse; a respiração mal se percebe pela canula. Urina ligeiramente albuminosa. A ferida apresenta-se granulada. Con- tinuam as cauterizações como no dia antecedente. Caldo de farinha duas vezes ao dia. Dia 26: pulso a 97. Pede continuamente agua, e por vezes mais alimento. Urina ligeiramente albuminosa. Algumas falsas membranas têem-se destacado. Extrairam-se as canulas por alguns minutos, e fez- se a experiencia de approximar os labios da ferida da tracheia, e por ella se reconheceu que a respiração ainda não podia fazer-se livremente pela bocca. Augmenta-se progressivamente a alimentação. Dia 27: mais tosse de noite; expectoração pela canula de muco ligeiramente sanguento, o que attribuimos á manobra do dia antece- dente. Pulso a 105; nauseas provocadas pelo chlorato; calor normal; não ha já falsas membranas na bocca. A auscultação e percussão dão signaes negativos da existencia de lesões pulmonares. Tratdnicnitos tiram-se de todo as canulas; cura-se a ferida com linimento de espermaceti, mas não se lhe approximam os labios. To- ma o chlorato apenas de seis em seis horas. Dia 28: a noite foi optima. A tosse produz um som laryngeo; a expectoração teve logar pela ferida e pela bocca; a voz é mais in- telligivel; a ingestão dos liquidos produz tosse; a ferida da tracheia está reduzida a metade. Apyrexia. A urina contém apenas alguma al- bumina. | e “8 Tratamento: suspende-se o RA chlorato. Augmenta-se a ali- mentatão. Dia 31: as melhoras progridem. Os liquidos dão no gôto, e pro- duzem tosse. Approximam-se os labios da ferida com tiras de adhesivo. Dia 4 de novembro: a voz tey mais energia, mas ainda ha rou- quidão, Dia 9: voz cada vez mais clara. A ferida, que já não dá passa- gem ao ar, apresenta excesso de granulação, que é rebatida pelo ni- trato de prata. Levanta-se. Dia 17: ferida completamente cicatrizada. Ha ainda tosse com expectoração mucosa e rouquidão, e as bebidas ainda ás vezes dão no gôto. Tem boa vontade de comer. Démos o doente por curado, mas ainda por algum tempô o sub- | “mettemos a certos preceitos hygienicos, mandando- o vestir de flanel- la, etc. » A TRACHEIOTOMIA 209 29.º OBSERVAÇÃO Diphtheria rhino-guttural e laryngea em uma menina de 4 an- nos; albuminuria; tracheiotomia no periodo asphyxico do crup, ao 2.º dia de doença; morte por infecção diphtherica ao 5:º dia da operação. (Observação pelo sr. dr. Baldy, operação por Antonio Maria Barbosa) « Maria Emilia do Carmo Carreira, natural de Lisboa, moradora na Praça das Flores, idade 4 annos, temperamento lymphatico, boa compleição, sem nenhuma idiosyncerasia. Não foi vaccinada; nem pa- deceu de febres exanthematicas, ou de outras molestias peculiares á infancia. Descende, de pae que succumbiu á tuberculose pulmonar; e todavia tem gosado de boa saude, e foi sempre nédia, alegre e de ap- petite regular. Esta doenca invadiu quasi sem pródromos; apenas algum affluxo nasal e enrouquecimento a precederam; foram porém estes incommo- dos tão ligeiros, que não motivaram o cuidado da familia. Ainda na vespera se entregou, sem differença, aos seus habituaes brinquedos, e comeu com vontade. Pelas 9 horas da noite de 18 de novembro de 1861 serviram-lhe a ceia, que saboreou sem embaraço apparente na deglutição, instando por mais alimento, que lhe recusaram. Foi dei- tar-se, e logo adormeceu com socego. Despertou no periodo do primeiro somno (11 horas da noite) an- ciada, e logo pelo vomito depoz os alimentos inodoros e indigestos. Se- renou um pouco aquella inquietação, “porém o somno interrompeu-se. Começou a familia de notar que a voz era roufenha, e que a res- piração se impedia 'com ataques de tosse ruidosa e repetida, a não lhe permittir, ainda por momentos, uma posição commoda, em que po- desse respirar. Pela madrugada a attribulação cresceu com o anhelito da res- piração, e foi tanta a angustia que exprimia aquelle rosto, que a fa- milia por vezes julgou que ella ia morrer n'uma d'essas agonias. Des- pontou o dia, porém, com quanto a doente depois d'aquella crúel lu- cta parecesse mais vencida do que alliviada, porque o paroxismo pou- co a pouco se foi remittindo, nem por isso a familia alcançou mais esperança: por entender, que a somnolencia que se tinha vindo intro- metter na doença, era insidiosa, como a nuvem que encobre o raio. Pela 1 hora da tarde de 19 de novembro visitei pela primeira MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. NI. P. L. 27 210 ESTUDOS SOBRE vez esta doente. Então todas as potencias do mal conspiravam para destruir aquella existencia ainda ha pouco tão viçosa. E como a vi eu, n'um relance d'olhos, que nem para mais dava o tempo? Moribunda; a face livida; os olhos com as palpebras quasi pendentes, entumecidas e'sem animação; os labios arroxeados não se abriam para produzir um som, apenas acompanhavam o esforço de to- das as potencias musculares para exhalar um fraco respiro; debatia-se toda n'uma convulsão, mas era uma convulsão interior que lhe fazia estremecer o corpo quasi frio e inanimado; a insensibilidade subia-lhe das carnes até os sentidos; não despertava aos estimulos; não se doia das vellicações; a modorra era assustadora. Conhecia-se que era viva pelo anhelito; as inspirações curtas, mui curtas, convulsas; as expirações ruidosas, e com esse timbre indefini- vel, signal que não mente a uma orelha habituada; a voz extincta; a tosse nulla. O que dizia a auscultação? Quasi nada; que a bulha ve- sicular está muito esmorecida; não apparecem todavia fervores sono- ros nem humidos, nem percebi ruido de valvula na larynge. O pulso sumido, tardo e irregular revela uma profunda adyna- mia, que era então a expressão mais caracteristica da molestia. A pelle fresca; as mãos e pés frios mostram que o calor animal se vai es- vaindo. » A lingua estava humida e pouco suja; para as fauces, porém, uma densa codea alvacenta e membraniforme forrava as ámygdalas, a uvula e o veo palatino a tolher-lhe a deglutição. A defecação e as urinas suspensas, o que nos impedia de verificar a reacção d'estas, e se por- ventura n'ellas já a albumina se encorporava. Eis, a largos traços, esboçado o quadro d'esta subitanea e gra- vissima doença; n'elle apparecem com relevo os principaes symptomas e os signaes caracteristicos, que são o apanagio da diphtheria laryngea. Era essa a doença: bem caracterisada pela lesão anatomica (plas- ma-diphtherico descendo das fossas nasaes até á larynge), demonstrada pelos symptomas pathognomonicos (dyspnéa progressiva, asphyxia e anesthesia) e pelos signaes privativos (rouquidão, tosse ruidosa e apho- nia). Que esta doença tocava o seu ultimo estadio, dil-o a asphyxia, comprova-o a anesthesia, revela-o a cyanose. E o que podia occasionar este encadeamento de phenomenos morbidos? Era de facil intuição, com tal perspectiva, a quasi occlusão da larynge motivada pela presenca da crusta diphtherica e ageravada pelo espasmo, D'ahi o estorvo do san- gue se oxydar na sua vasta corrente; d'ahi a sua estagnação; e, como fecho d'esta anarchia funccional, a insensibilidade cutanea pelo compro- A TRACHEIOTOMIA 211 mettimento do poder organico vital de animalidade. Assim pensámos, e a consequencia foi esta: se a doença era a diphtheria laryngea no seu periodo asphyxico, todos os recursos da therapeutica para salvar a doente, a não ser a tracheiotomia, eram impotentes. Ainda empregámos a titillação; quizemos administrar 0 emetico; ordenámos um pediluvio alcalino: tudo foi em vão; não engulia, não se resentia dos estimulos. O tempo era precioso e fugia rapido, por isso propozemos á familia, como ultimo recurso, a operação. Pelas 3 horas da tarde reunimo-nos com o nosso collega, o sr. Antonio Maria Barbosa, que, observando aquelle quadro Earl da diphtheria laryngea no periodo asphyxico, e admirando a rapidez com que a doença se havia precipitado, concordou absolutamente com- nosco. A operação praticou-se logo; foi aproveitar os instantes d'aquella existencia. Correu firme como a vontade do operante; veloz como po- dia ser o pensamento de salvar aquella creaturinha; era realizar n'um momento um futuro de esperanças, e concebemol-as.... porque foi para admirar como, golpeada a tracheia, gotejando apenas algum sangue, e introduzida a canula, o ar se precipitou nos pulmões accendendo queda vida quasi extincta. Sentámos a doente logo depois; e tendo-se varrido a superficie da tracheia com a lanada de esponja, a tosse sacudiu com impeto al- gumas viscosidades ensanguentadas e pelliculas, que embaraçavam a res- piração de se fazer. Pensou-se a ferida, e protegeu-se com a golilha de cassa; e assim disposta foi para a cama, aonde a collocámos convenien- temente, mandando-a aquecer por todos os meios, porque o corpó es- tava mui frio. A respiração pouco tempo depois fazia-se serena; o rosto ia-se compondo com animação; os olhos já viam a luz a distinguir as pes- soas; o ouvido prestava-se ás caricias da familia. E em menos de uma hora tinha-se operado esta transfiguração à modo de parecer resusci- tada. Foi collocado cerca da doente um enfermeiro avesado a estês pen- sos, e lhe ordenámos que de duas em duas horas limpasse a canula, e cuidasse no resto do tratamento prescripto, que apenas foi o dietetico de leite e caldo de gallinha. A's 7 horas da tarde são examinadas as urinas, e dão um guide precipitado albuminoso. Saíu pela canula um pedaço de falsa membrana de 4 centimetros sobre 2 2, além de outros fragmentos menores. Dia 20 ás 10 horas da manhã. A doente dormiu durante a noi- 27 + 212 ESTUDOS SOBRE te, por vezes, sendo um dos somnos de 3 horas suecessivas. Tem be- bido leite com agua; recusou absolutamente tomar caldo. A segunda canula foi tirada a tempo, e por ella tem saido pelliculas e alguns fragmentos membraniformes, que se guardaram. Urinou com demora, e as urinas grossas e com cheiro ammonical, precipitam muita albu- mina; vistas ao microscopio, notam-se muitos cylindros fibrinosos e bai- nhas epitheliaes do rim; não teve dejecções alvinas. A face agora está animada; senta-se na cama com promptidão; a respiração continúa a fazer-se bem; o corpo todo está quente; e o toque da pelle é macio e natural. O pulso frequente e mais cheio não perdeu o seu rhythmo, bate 120 pulsações. A inspecção das fauces mostra as producções mem- braniformes, ainda muito adherentes ás amygdalas e uvula, o que muito lhe embaraça a deglutição; as narinas tambem se forraram de pseu- do-membranas. O mesmo tratamento. A's 3 horas da tarde: as urinas pouco albuminosas. A ferida é cauterizada e pensada pelo nosso collega, e são extraídos alguns fra- gmentos de falsas membranas que se haviam desprendido; a superfi- cie das fauces e narinas foi tambem cauterizada com o lapis de ni- trato de prata; para topico da garganta usa de uma mistura de par- tes iguaes de mel e alumen. Prescreve-se-lhe para uso interno o sul- fato de quinina em café; e para combater a constipação do ventre um clyster emolliente e laxativo; no demais, o mesmo tratamento. Dia 21 ás 10 horas da manhã. Passou a noite em maior agita- ção; os somnos foram curtos e interrompidos por ataques de tosse, com que expulsou alguns pedaços de falsas membranas. Apenas bebeu al- gum leite, que engole com muita difíiculdade. Não se pôde conseguir que tomasse o sulfato de quinina. Não teve dejecções alvinas. As uri- nas são mais limpidas, e depoem menos albumina. Todavia desagrada- me a physionomia da doente; a face está vultuosa pelo engorgitamento das glandulas submaxillares, e empastamento dos ganglios cervicaes e tecido cellular sub-cutaneo; esta inchação desce pelo collo até o peito. Respira regularmente e sem ruido. Expelliu pela canula um fragmento extenso de pseudo-membrana, como fimbrado. As fauces estão menos rubras; e o induto diphtherico das amygdalas é menos consistente e de côr cinzenta. Nenhuma séde; a lingua está saburrosa. O pulso, me- nos concentrado e frequente, bate 100 pulsações; o calor da pelle ten- de a baixar, e as extremidades estão frescas. Ordenámos que se lhe ad- ministre o sulfato de quinina em clyster, e que se lhe façam fricções com tintura de quina composta á columna vertebral, côxas e ante- braços; e que para alimento se lhe dé leite e gelea. A TRACHEIOTOMIA 213 A's 3 horas da tarde, a doente tem peiorado; a respiração é as- pera e curta; o pulso mais pequeno, bate 120 pulsações. Está inquie- ta, e em vão procura uma posição commoda, em que possa repousar da afílicção que a persegue. Expulsa pela canula alguns detritos diph- thericos amollecidos. A superficie da ferida, apesar de cauterizada, ves- tiu-se de pseudo-membrana, e resuda algum ichor. O mesmo penso com as cauterizações. Prescreve-se o uso do vinho do Porto nos cal- dos, e um clyster purgativo. Dia 22 ás 10) horas da manhã. Passou a noite muito mal; deba- teu-se n'uma constante agitação; só pela manhã descançou alguns mo- mentos. Não deglutiu nem os caldos, nem os remedios, porque lhe dão no goto, e sáem pelas narinas; apenas e com muito custo recebeu al- gum leite. Não teve dejecções alvinas; as urinas são raras, turvas e mais abundantes em albumina. A respiração é laboriosa; a ausculta- ção mostra impermeaveis as bases de ambos os pulmões, e deixa aper- ceber nos apices, com mais clareza no do pulmão direito, o fervor mu- coso; o tempo da inspiração é mais rapido. A pelle fresca e um pou- co halituosa; o pulso, deprimido e precipitado, bate 130 pulsações. Nenhuma séêde. As pseudo-membranas da garganta entraram em dis- solução; as amygdalas estão muito oppiladas, e resudam humor mais purulento do que plastico; pelas narinas jorra um liquido viscoso, de cheiro desagradavel que concorre a avexar o mau halito que da bocca se evapora. Ordenámos que se lhe entretenha o calor por todos os meios, e que se insista no mesmo plano de tratamento tonico. A's 5 horas da tarde. A molestia resvalou para a adynamia, e ain- da mais se exaspera e aggrava este critico estado com o apparecimento de hemorrhagias nasaes (epistaxis) de dificil suspensão; pois só rolhan- do as narinas com tampões de fios, impregnados em solução de perchio- rureto de ferro, se podem sustar; o sangue negro e diffluente mostra que entrou em decomposição. A angustia da misera doente cresce por demais. O mesmo penso cirurgico; e para uso interno, o perchlorureto de ferro em agua de canella; fricções ao corpo com tintura de quina e camphora; e para sustento caldo de carne, e vinho do Porto. Dia 23 ás 10 horas da manhã. Violento paroxismo durante a noi- te; remissão pela manhã. Expelliu pela canula alguns pedaços de fal- "sas membranas em putrefacção: N'este momento, a adynamia é pro- funda e mascarada por uma modorra lethargica. A respiração faz-se com grande empenho dos musculos thoracico-abdominaes, é ruidosa, e as expirações curtas e frequentes. O corpo todo denuncia grande re- solução de forças, e conserva-se morno a poder do calorico artificial. 214 ESTUDOS SOBRE Tem urinado pouco, e as urinas precipitam muita albumina. O pulso está filiforme e quasi imperceptivel. As faculdades intellectuaes, que até aqui se tem conservado perfeitas, acompanham agora a decadencia do poder organico vital. Continúa no mesmo tratamento no que é pos- sivel, pois que a deglutição está annullada. A's 5 horas da tarde. Face decomposta; adynamia profunda; res- piração anhelante e muito fraca; pulso sumido. Era uma vida que ia à extinguir-se n'um corpo aniquilado por uma cruel doença, con- tra a qual não tinham valido todos os esforços da medicina, e todas as caricias da desvelada familia. Falleceu pela madrugada do dia 24 em agonia lenta. » Seguem-se a esta excellente observação no original do meu il- lustre collega, o sr. dr. Baldy, importantes considerações que tenho pena de não poder publicar n'este logar, em consequencia da sua gran-' de extensão e do volume que já tem esta Memoria. 30.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e garrotilho em um rapaz de 8 annos; tra- cheiotomia no periodo asphyxico, aos 11 dias de doença; morte 2 dias depois de operado. (Operação pelo sr. José Galdino de Carvalho) A historia d'esta observação vai redigida mui imperfeitamente, porque o sr. J. Galdino de Carvalho, a quem a pedi, não tinha apon- tamentos d'ella, e por isso não a pôde escrever. O que vou dizer foi obsequiosamente obtido do pai do doente pelo meu estimavel collega, o sr. Francisco Alberto de Oliveira, que tambem viu a creança e assis- Liu á operação. Luiz J. G. F. de 8 annos de idade, temperamento lymphatico, constituição fraca, morador na rua Nova do Almada, começou a estar rouco em 9 de Novembro de 1861. Dois dias depois, o pai mettendo- lhe os dedos na bocca para lhe observar a garganta achou-a esbranqui- cada. Em consequencia fez chamar o sr. J. Galdino de Carvalho que - começou e seguiu o respectivo tratamento pelos emeticos, chlorato de potassa, cauterizações etc. Ao [1.º dia de doença tinha todos os signaes de crup no periodo asphyxico, o que obrigou o assistente a proceder á tracheiotomia pelas 3 horas da tarde de 20 de novembro, auxiliado pelos collegas, os srs. Joaquim Theotonio da Silva e Francisco Alberto de Oliveira. A TRACHEIOTOMIA 215 Passadas 30 horas, manifestaram-se falsas-membranas nos labios, amygdalas e margens da ferida; e pareceu tambem que as mesmas produceções morbidas se estendiam pelos bronchios, seguindo-se a morte dois dias depois da operação. 31.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica ; crups coryza; albuminuria em um menina de 6 annos; tracheiotomia no periodo asphiyxico, ao 4.º dia de doença ; morte por infecção diphtherica e asphysxia progressiva ao 3.º dia da operação. (Observação do sr. Alexandre José da Silva Campos, opera- cão pelo sr. Teixeira Marques) « D. Leonor L. d'A. 6 annos, muito intelligente, pelle clara e ca- bello loiro; vaccinada. Residente na calçada de S. João Nepomuceno. Por vezes foi por nós tratada de anginas simples, ficando em resulta- do d'ellas as amygdalas hypertrophiadas. Haverá seis annos falleceu- lhe um irmão de crup. ' Contou-se-nos que no ultimo dia do anno passado (1861) se ha- via deitado com saude e muito alegre, mas que acordára ás 4 horas da manhã com febre, dôr na garganta estendendo-se-lhe para o ou- vido esquerdo, abatimento, fastio, etc. Assim continuou, fazendo-se-lhe medicação caseira até o dia seguinte, em que fômos convidado para a tratar. Apresenta pulso frequente, calor augmentado, ganglios cervicaes engorgitados, rouquidão, voz alterada, difficuldade em engulir, pouca tosse, amygdalas um pouco rubras, augmentadas de volume e com pon- tos brancos aqui e ali, lingua coberta de induto mucoso. Tratamento : vomitorio dé ipecacuanha e tartaro emetico para ser repetido doze horas depois ; alumen com mel rosado para tocar na gar- ganta de duas em duas horas; cataplasma de sementes de linho no pescoço ; sinapismos nos extremos inferiores. Cama ; abafo; dieta de caldos. . t Dia 3 de janeiro de 1862 (9 horas da manha). — Vigilia durante a noite, e vomitos provocados pelo emetico. Maior difficuldade na de- glutição ; falsas membranas branco-amarelladas cobrindo as amygdalas, as qnaes foram tocadas com o nitrato de prata solido ; chlorato de po- tassa, uma porção cada duas horas. Continuam os vomitorios e o mel rosado, como acima. 216 ESTUDOS SOBRE A's 6 horas da tarde: pulso a 128; falsas membranas nas faces lateraes da cavidade da bocca, e nova camada nas amygdalas; coryza ligeiro. A materia dos vomitos apresenta fragmentos membranosos, ás vezes tintos em sangue. Continuam as cauterizações, etc. Dia 4 (9 horas da manhã). — Pulso a 140, com algumas falhas ; voz quasi extincta ; nada de tosse; anciedade ; ea ruido Jaryn- geo mais intenso na inspiração ; dilatação das azas do nariz ; olhos amor- tecidos; impossibilidade de jazer no decubito, a não ser por momen- tos; revira-se para traz em cada inspiração ; contracções convulsivas ; começo de cyanose ; nova camada de falsas membranas nas amygdalas, parecendo assentes em um fundo arroxeade aqui e ali, as quaes se es- tendem para a glotte sem se lhes poder descobrir o limite; coryza mais intenso. O acido nitrico lançado gota a gota na urina produz um pre- cipitado branco em flocos, denotando ter albumina. A auscultação deu o murmurio respiratório em ambos os pulmões, e a percussão som claro. Tratamento: o mesmo do dia antecedente. Vendo nós que o caso se ia tornando cada vez mais grave, e por isso approximar-se o momento de applicar os meios extremos da arte, propozemos uma conferencia para as 11 horas da manhã do mesmo dia; o que com effeito teve logar com o nosso collega o sr. José Gre- gorio Teixeira Marques. Declarámos-lhe que a doença se havia manifestado pelas falsas membranas nas amygdalas, e que se haviam estendido ultimamente para a larynge, constituindo o verdadeiro crup; que não havia lesões pulmonares; que julgavamos ser chegada a hora de praticar a tra- cheiotomia, pois a doença estava no terceiro periodo ou asphyxico ; mas que no caso presente pouca esperança nos dava a operação, por- que as falsas mambranas tinham extrema tendencia a reproduzir-se, sendo a sua queda seguida de hemorrhagia, posto que ligeira. Pelo progresso tão veloz da doença, pois havia doze horas que ainda não “existia na larynge, e por outras considerações mais admittiamos a exis- tencia de uma infecção geral diphtherica. O estimavel collega concordou no diagnostico ; não julgou o es- tado geral tão compromettido como suspeitavamos ; e opinou pela ope- ração como unico meio de poder salvar a doente de uma morte certa. Combinámos pois em operar no momento propicio. A's 11 horas e meia da manhã, progredindo a asphyxia a ponto de ameaçar extinguir a vida á pobre creança, talvez por meia hora, foi ella collocada em posição conveniente, e o sr. Teixeira Marques, com “ A TRACHEIOTOMIA 21% a habilidade que todos lhe reconhecem, praticou a tracheiotomia pelo methodo do sr. Trousseau em dez minutos pouco mais ou menos, ser- vindo nós de ajudante. Extraíu da tracheia pequenos fragmentos como membranosos, em cuja manobra a creança esteve quasi de todo asphy- xlada, empregando por isso os maiores esforços para receber o ar. Sentámos então a creança ; foi introduzida na ferida a canula du- pla, e immediatamente por ella começou a tossir e a respirar livre- mente, o pulso a regularisar-se, e a sensibilidade cutanea a reappare- cer. Não houve syncope. Hora e meia depois dormia socegada ! A hemorrhagia foi apenas capillar, mas muito mais duradoira do que costuma ser, pois continuou a córar a ferida por algumas ho- ras depois de restabelecida a entrada do ar nos pulmões. Tratamento : chlorato de potassa, meia onça para uma libra de agua, para tomar uma colher (das de sôpa) todas as duas horas; cal- dos de carne e leite de vacca, alternados com o remedio. A's 6 horas da tarde: pulso a 130; seccuras ; face animada ; uri- na mais diaphana, e tratada pelo acido nitrico dá grande cópia de al- bumina. Limpa-se a canula interna de meia em meia hora: este cui- dado ficou a cargo de um enfermeiro. Dia 5 (10 horas da manhã). — Passou a noite soffrivelmente ; teve evacuações. Apresenta o pulso a 140; corrimento mucoso e abun- dante pela venta direita; lingua humida ; tosse pela canula ; pescoço e face inchado ; as amygdalas e lados da bocca apresentam falsas mem- branas espessas, que novamente são cauterizadas. A ferida tem bom aspe- cto. Extraíram-se as canulas por alguns instantes em razão de se sentir a respiração sibilante, e introduzimos na tracheia a lanada de esponja hu- medecida em agua tepida. A urina, analysada pelo sr. Teixeira Marques, apresentou laminas de epithelio, albumina e saes de ammoniaco. 7 horas da tarde. Pulso a 132; face mui córada; expectoração quasi nulla. Tratamento : leite de vacca varias vezes ao dia, e caldos de carne com arroz, Dia 6 (S horas da manhã). — Socegou e dormiu por vezes du- rante a noite. Pulso a 140; olhos mui brilhantes; dyspnéa ; respira- cão accelerada e curta; seccuras; tosse fraca e secca; expulsa conti- nuamente pela bocca muco espumoso ; inchação do pescoço até a parte superior do thorax. Extraimos por momentos as canulas, e podemos ver que a parte posterior da tracheia estava rosada e sem falsas mem- branas ; instillámos algumas gotas de agua tepida, o que produziu al- guma tosse. Continúa no mesmo tratamento. MEM, DA ACAD. — [.º CLASSE. — T. IH. P. 1. 28 218 ESTUDOS SOBRE A's 5 horas da tarde. Anciedade; dilatação das azas do nariz; dyspnea, que obriga a creança a estar sentada e a mudar continua- mente de posição; abaixamento da temperatura, mormente nas mãos e pés; lividez da face; respiração aspera ; tosse rara e mui fraca ; ex- pectoração nulla ; pulso brando e mui frequente ; afílicções referidas ao epigastrio, aonde frequentemente leva as mãos ; urina mui albumino- sa. Tornámos a extrair as canulas, que estão quasi seccas; instillámos na tracheia algumas gotas d'agua, e introduzimos a lanada de esponja, com o que não remediámos a dyspnéa. Tratamento: continúa o chlorato, e nos intervallos caldos de car- ne com uma colher de vinho do Porto ; sinapismos nos extremos infe- riores. A's 8 e meia horas da tarde. Progride a cyanose; respiração si- bilante pela canula; reviramento da cabeça para traz em cada inspi- ração, sem que o peito se dilate; olhos salientes; resfriamento pro- gressivo; nada de tosse; algumas petechias pelo tronco e extremos inferiores; contracções clonicas dos membros ; asphyxia pronunciada ; morte á hora e mcia da manhã do dia 7. Esta doença pareceu-nos muito grave desde o segundo para o ter- ceiro dia de sua manifestação local: a extrema rapidez com que as falsas membranas se reproduziam em despeito das cauterizações e dos emeticos ; a tendencia para a hemorrhagia quando ellas se destacavam de certos pontos das amygdalas, deixando-as um tanto arroxeadas ; a ve- locidade com que as falsas membranas invadiram a larynge; a grande tumefacção do collo e da região sub-maxillar, a frequencia do pulso, etc. inclinou o nosso espirito para admittir a existencia de uma affec- ção geral virulenta do organismo, emfim uma intoxicação diphtherica ; quer a doenca fosse primitivamente local, como o julga o sr. Breton- neau; ou quer ella fosse geral desde o seu” principio, sendo a falsa membrana a expressão symptomatica, como é de opinião o sr. Laboul- bene. Apesar do exposto, a tracheiotomia ficou indicada logo que a doen- ça chegou ao periodo asphyxico; pois em tal conjunctura não havia que appellar para outro meio mais rasoavel, para pelo menos prolon- gar a vida. A operação produziu os seus effeitos maravilhosos de quasi uma verdadeira resurreição, mas não pôde dar mais do que 62 horas de vida á pobre creança, porque a saturação diphtherica do organismo, continuando a desenrolar o seu terrivel quadro symptomatico, fez pe- recer a doente por uma nova asphyxia, não porque houvesse obstaculo A TRACHEIOTOMIA 219 mecanico á entrada do ar vivificante nos pulmões, mas pela paralysia dos musculos respiradores, a qual se foi tornando cada vez mais pro- gressiva, á proporção que avançava a intoxicação que a havia produ- zido. A albumina nas urinas manifestou-se sempre em grande quanti- dade em todas as analyses, até na ultima urina colhida poucas horas antes do passamento. A anesthesia asphyxica estava estabelecida n'esta doente no acto de ser operada, a ponto que foi insensivel ás vellicações, bem como o foi quasi de todo aos golpes do bisturi. » 32.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e crup em um rapaz de 2 annos e meio; tra- cheiotomia no periodo asphyxico, ao 4.º dia de doença; morte em con- vulsões 8 horas depois da operação. (Observação e operação pelo sr. Joaquim Theotonio da Silva) « Luiz de Oliveira, de 2 annos e meio de idade, temperamento lymphatico, constituição fraca, morador na rua de Arroyos, teve ha pouco tempo uma inflammação catarrhosa do peito que exigiu a appli- cação de um vesicatorio nas costas. Um irmão morreu ha 6 mezes de convulsões. Em 29 de outubro de 1862 adoeceu com febre e outros sym- ptomas, que foram tomados por constipação. No dia 30 foi chamado o collega Silva Franco, do Campo Peque- no, que achou os signaes de angina diphtherica, contra a qual prescre- veu um vomitorio, Cobddáto de potassa internamente, e para applica- ções locaes o alumen com mel rosado. No dia 31 foi applicado um vesicatorio. No 1.º de novembro ás 7 horas da noite, em que vi o doente pela primeira vez, tinha todos os signaes do garrotilho no periodo asphy- xico. Faço então a tracheiotomia servindo-me de ajudantes os srs. dr. Vicente Ferreira e Franco. À operação correu sem nenhum accidente immediato. Mas constou-me que o doente morrera em convulsões ás 3 horas da manhã de 2 de novembro. » 220 ESTUDOS SOBRE 33.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e crup em uma rapariga de 11 annos, muito deteriorada ; tracheiotomia no periodo asphyxico, ao 4.º dia de doenca ; convulsões immediatas á operacão; morte por asphyxia lenta e intoxi- cação 14 horas depois de operada por A. M. Barbosa. Ignacia, de 11 annos, temperamento lymphatico, constituição muito deteriorada, exposta da Santa Casa da Misericordia de Lisboa, moradora no beco da Lage n.º 15, freguezia de Santo- André, foi trazida para a enfermaria da Misericordia ás 9 horas da noite de 2 de fevereiro de 1863. A pessoa que a trouxe disse que estava doente havia tres dias com suflocações, tosse e rouquidão. Trazia contudo nas costas o signal de um vesicatorio já sêcco. Quando entrou para a enfermaria, ás 9 horas da noite, tinha o aspecto de moribunda, pallidez terrosa de face, labios arroxeados, olhar mortiço, tosse mui rouca, voz extincta, respiração orthopneica com rui- do laryngeo que se ouvia a distancia ; falsas membranas na garganta ; pulso frequente, ainda que com certo volume e resistencia. Pés e mãos frios e arroxeados. Ausencia absoluta de secreção nasal e de engorgi- tamento dos ganglios-submaxillares. A" meia noite é chamado A. M. Barbosa para fazer a tracheioto- mia.. ; A operação foi praticada com effeito pela 1 hora da manhã de 3 de fevereiro sendo o operador auxiliado pelos srs. Urs. Simas e Pitta, e reconhecendo todos a quasi nenhuma probabilidade de bom exito em vista do pessimo estado da doente. A operação correu bem, e sem hemorrhagia porque se não abriu nenhuma veia do plexo subthyroideo, nem vaso algum importante. As . affliccções cessaram com a introducção da canula na tracheia, e o calor restabeleceu-se, mas a respiração ficou aspera e ruidosa como se se fizesse atravez de um tubo metallico. Logo depois de operada teve con- vulsões choreiformes nos braços e pernas, que duraram mais de um quarto de hora. Não se pôde saber se era antes sujeita a esta fórma de padecimento nervoso. Não quiz beber o caldo e o leite que se lhe of- ferecia. Uma hora depois da operação adormeceu, mas accordava com pequenos intervallos para cair de novo em somnolencia, até que falle-. ceu ás 3 horas da tarde do mesmo dia 3 de fevereiro de 1868, 14 horas depois da operação. A TRACHEIOTOMIA 221, 34.º OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e garrotilho em uma menina de T annos; tra- cheiotomia no periodo asphyxico, ao 7.º dia da doença primitiva e ao 8.º de crup; tirada a canula ao 8.º dia; ferida cicatrizada e cura ao 28.º dia da operação pelo sr. José Galdino Carvalho da Silva. Vi a doente que faz objecto d'esta observação por duas vezes, uma em conferencia com os assistentes, e outra vez mais tarde, quan- do estava já convalescente. O que vai constituir a presente observa- ção são unicamente os pontos principaes da doença de que me recor- do, ou de que pude ter conhecimento. Pedi a observação escripta ao sr. José Galdino para a publicar aqui, mas não a pude conseguir. Sophia Rodrigues, de 7 annos, temperamento lymphatico-san- uineo e boa constituição, moradora no largo de S. Carlos, adoeceu no dra 10 de fevereiro de 1863. A doenca começou por um grande accesso de frio a que se seguiu febre. Depois appareceram os signaes caracteristicos da angina diphtherica. No dia 14 começou a manifestar-se o crup pelos symptomas pro- prios da doença. No dia 17 fui convidado para uma conferencia ás 9 horas da ma- nhã com os collegas assistentes, os srs. dr. João Luiz Brignoli e José Galdino Carvalho. A doente tinha então angina diphtherica e crup denunciado pela dyspnéa, ruido laryngeo, rouquidão de voz e de tosse, febre modera- da, etc., sem albuminuria, nem signal algum de infecção. Votei pela operação quando a asphyxia se pronunciasse, e instei com o pai da doentinha para que consentisse n'ella, porque o caso parecia dos mais -favoraveis ao bom resultado; e disse, que tendo de entrar n'aquelle mes- mo dia de serviço no Paço não me era possivel assistir a ella, mas que o sr. José Galdino podia auxiliar-se, além do sr. dr. Brignoli, que era tambem assistente, do sr. Joaquim Theotonio da Silva e do dr. Simas que cultivavam muito distinctamente a especialidade. A doente conti- nuou no:uso do chlorato de potassa, cauterizações, etc. Foram ainda propostos varios meios therapeuticos para o caso de se manifestarem certos symptomas. A's 11 horas e tres quartos da noite a asphyxia estava no seu au- ge, e a operação foi praticada pelo sr. José Galdino, coadjuvado, além 222 ESTUDOS SOBRE do outro assistente, o sr. dr. Brignoli, pelos srs. Manuel Carlos Tei- xeira e Joaquim Theotonio da Silva. A operação correu regularmente, havendo comtudo hemorrha- gia com entrada de sangue nas vias respiratorias, cujos effeitos foram remediados pela sucção, e para que se empregou o perchlorureto de ferro. Restabelecida a respiração, a doente foi progressivamente a me- lhor. Appareceu albumina nas urinas ao 2.º ou 3.º dia depois da ope- ração, que durou poucos dias. No dia 25 foi tirada definitivamente a canula; e a ferida estava cicatrizada e a doente curada no dia 12 de março, 23 dias depois da operação. 35." OBSERVAÇÃO Garrotilho depois de sarampo em uma menina de 6 annos: tra- cheiotomia no periodo asphyxico, ao 8.º dia do crup; diphtheria tracheial, bronchica e pharyngea; albuminuria nos dois ultimos dias; morte ao 5.º dia da operação, por asphyxia lenta e infecção diphtherica. (Observação e operação pelo sr. Joaquim Theotonio da Silva) Ê | « Maria Emilia Ferreira Borges, de 6 annos, temperamento lym- phatico-sanguineo, sadia. Já teve sarampo ha 2 annos. No dia 16 de fevereiro de 1863 queixou-se da garganta. No dia 17.— Febre, fastio, lingua alvacenta, alguma vermelhidão no paladar, uvula e pilares. Emetico; caldos. No dia 18. — Nada de febre, tosse, appetite. Infusão d'althea; lei- te; sópas. No dia 19.— Sarampo, tosse, alguma febre, fastio. Infusão de bor- ragens. No dia 20.— A erupcão do sarampo muito desenvolvida; muita tosse. Ipecacuanha; xarope de acetato de morphina. No dia 21.— Lingua saburrosa, rouquidão de yoz; do mais o mes- mo. Calomelanos 6 grãos. No dia 22. — Dyspnéa que começou ás 2 horas da noité e tem augmentado progressivamente, assim como a tosse. Pallidez, pouco ca- lor, pulso pequeno, fervores mucosos denunciados pela auscultação, tosse crupal, voz quasi extincta e percebendo-se só quando a doente quer gritar. Pela inspecção da pharynge não se vêem falsas membranas. A erupção totalmente extincta e a pelle descorada. Emetico; depois chlo- A TRACHEIOTOMIA 223 rato de potassa internamente; sinapismos volantes por todo o corpo; fricções com agua de Colonia; esponjas quentes na garganta. Conferencia com os srs. Fraweisco Alberto de Oliveira e José Gal- dino de Carvalho. Assenta-se ser indicada a tracheiotomia, se os phe- nomenos asphyxicos se pronunciarem, ainda que fossem devidos ao falso crup, ao edema da glotte, ou ao verdadeiro garrotilho primitivo como era mais provavel. ' No dia 23 nova conferencia ás 7 horas da manhã, e uma hora depois pratico a operação, porque a asphyxia punha em risco immedia- to a vida da creança. Chlorato de potassa internamente; leite, caldo de farinha. Um enfermeiro vigia a doente. No dia 24, 25 e até ás 4 horas da tarde do dia 26 passou sem novidade. A esta hora tira-se a canula para ensaio. A doente expelle grande quantidade de mucosidades; a parede posterior da tracheia está coberta de uma camada branca que parece muco; a pharynge exami- nada então, como nos outros dias, não apresentava signaes de diphthe- ria; as urinas nunca manifestaram albumina. A doente dorme tran- quillamente algumas horas, no fim das quaes acorda com muita diffi- culdade de respirar. Como os anneis da tracheia tinham pela sua elasticidade dimi- nuido as dimensões da ferida, tornando-a quasi linear, de circular que era,-e houvesse mucosidades demasiadas na tracheia que não saíam pela ferida, nem podiam ser expellidas pela larynge que estava um pouco obstruida, julguei que, limpando a tracheia com a lanada e re- applicando a canula, as coisas tornariam ao antigo estado. Assim acon- teceu nas primeiras horas que se seguiram a este tratamento. Mas ás 3 horas da madrugada do dia 27 fui chamado a toda a pressa porque a doente estava a asphyxiar-se. Quando cheguei ouvi o ruido que fazia o ar saindo atravez da canula, e logo me fez desconfiar que havia diph- theria bronchica. Com cífeito não me enganei, por quanto extraíndo a canula e limpando a tracheia, a creança expelliu alguns fragmentos de falsas membranas, ficando um pouco mais socegada, postoque sem- pre com respiração ruidosa. Queixava-se de dôr na garganta, e inspec- cionando-a de novo achei um ponto-branco na amygdala direita; o na- riz com a mucosa avermelhada e sangrando com facilidade não só no lado da mucosa, mas tambem na pelle da aza esquerda, onde havia uma pequena arranhadura. No decurso do dia 27 a diphtheria estendeu-se da amygdala a ambos os pilares e á uvula, exhalando cheiro gangrenoso; o nariz e. labios sangram com facilidade; a dyspnéa augmenta progressivamente. 224 ESTUDOS SOBRE Urinas com albumina. Cozimento de quina e camphora; vinho do Por- to; geléa e caldos. No dia 28 ás 25 horas da manhã, morte. » 36.º OBSERVAÇÃO Garrotilho e sarampo em uma menina de 5 annos; tracheiotomia no periodo asphyxico do crup, ao 8.º dia dos primeiros symptomas desta doença; albuminuria; diphtheria na ferida ao 2.º dia da operação; ca- nula tirada definitivamente ao 9.º dia; cura ao 18.º dia. (Observação e operação por A. M. Barbosa) Luiza do Carmo Pereira da Motta, de 5 annos e 3 mezes, tem- peramento lymphatico, constituição regular, sadia, filha do sr. Manuel da Motta Pessoa de Amorim, director do collegio Europeu, morador no largo do Conde Barão n.º 50. No dia 18 de março de 1863 mor- reu-lhe de garrotilho um irmão de 2 annos e meio, estando doente só 3 dias. Esta menina estava constipada e com tosse havia um mez. No dia em que falleceu seu irmão, 18 de março, appareceu rouca. No dia 19 manifestaram-se-lhe na cara, pescoço e tronco pintas vermelhas, como havia tido seu irmão, que forão consideradas pelo as- sistente, o sr. Anselmo José da Costa, como a erupção de sarampo, que então havia epidemicamente em Lisboa. Este diagnostico foi rati- ficado pelo sr. conselheiro dr. Bernardino Antonio Gomes, que foi cha- mado em conferencia n'esse mesmo dia. No dia 20 de manhã a rouquidão era maior, a tosse secca; «dõe na garganta, febre. O assistente prescreveu- -lhé um purgante e duas sanguesugas no pescoço. A's 11 horas da noite sou chamado em con? ferencia com os srs. dr. Simas, dr. Gaspar Gomes e Anselmo José da Costa, e observámos o seguinte: ruido laryngeo aspero, mais percepti- vel na inspiração, voz quasi extincta, tosse secca e metallica, dyspnéa continua; pulso frequente e pequeno; calor de pelle pouco intenso mas geral; pelle descorada e sem as manchas de sarampo que ainda exis- tiam durante o dia; sensibilidade cutanea sem alteração; vertia algum sangue das cesuras das sanguesugas que se haviam applicado no pes- coço; pharynge apenas mais vermelha, mas sem nenhum ponto diph- therico; não havia engorgitamento dos ganglios submaxillares. As uri- nas, tratadas pelo acido nitrico e pelo calor, não dão albumina nem A TRACHEIOTOMIA 225 outro precipitado. A lingua um pouco saburrosa. A auscultação e per- cussão não denunciam notavel alteração nos pulmões ou bronchios. Dia- gnosticámos crup, para o qual estava indicada a tracheiotomia quan- do os phenomenos asphyxicos se pronunciassem mais. No entretanto prescreveu-se internamente o chlorato de potassa; e como dieta, leite, caldos de vacca- e geléa. A doente ficou tendo por medico assistente o sr. dr. Gaspar Gomes. No dia 21 de manhã todos os symptomas estavam mais aggra- vados; ainda corria algum sangue pelas cesuras das sanguesugas, ape- sar dos meios empregados para o suster; houve uma pequena epista- xis; voz mais extincta; tosse abafada; grande tendencia para somno ; urinas ainda sem albumina. A's 4 horas da tarde juntamo-nos todos. Havia todos os signaes da asphyxia crupal muito adiantada; todavia a sensibilidade cutanea estava apenas modificada. Não era prudente esperar mais tempo para operar, e por isso pratiquei logo a operação pelo processo que descre- vi. A operação correu sem nenhum accidente, e sem ser ferida ne- nhuma veia do plexo subthyroideo. Ao abrir a tracheia foi expellido, e veiu caír na minha mão direita, um pedaço de falsa membrana tra- cheial que tinha 5 centimetros sobre 2. A respiração, depois de intro- duzida a canula, fica silenciosa; a creança recupera a vida, bebe cal- do, fica socegada, e adormece uma hora depois. As urinas examina- das então estavam muito turvas, jumentosas, mas sem albumina. Prescreve-se internamente a continuação do chlorato de potassa ; caldos de vacca, leite. Vem para junto da doente um enfermeiro. No dia 22 a respiração tranquilla e silenciosa, pulso a 136, mais calor de pelle; a urina apresenta um ligeiro precipitado albuminoso; grande repugnancia para os caldos. Ao tirar as canulas para limpar e cauterizar a ferida sáe outro fragmento pseudo-membranoso pouco me- nor que o de hontem. Substituo a canula ordinaria pela canula movel de Luér. Continua o chlorato; caldo com geléa; leite. No dia 23.—Tem dormido bons somnos; pela canula tem saído grande quantidade de muco, que obriga a tiral-a muito a miudo para a desobstruir e limpar; tosse repetida desde o meio dia. Ao tirar as canulas sáe outro fragmento de pseudo-membrana; a ferida, com di- phtheria manifesta, é cauterizada. Substituo a canula de Lugr pela no- va canula de Charriére, que é mais incommoda para a doente. Urinas claras, com grande precipitado de albumina. Suspende-se o uso do chlo- rato de potassa, e prescrevo um grão de sulfato de quinina de 4 em 4 horas. Caldos, sôpa de pão, EEE. MEM. DA ACAD.— |.” CLASSE.—T. HI. P. 1. 29 226 ESTUDOS SOBRE No dia 24. —A doente está alegre, sem febre; dormiu a noite muito socegada, pouca tosse; continúa a saír pela canula muito muco puriforme; urinas claras, com pouca albumina; pequena diphtheria na ferida que é ainda cauterizada. Aproveito a occasião para ensaiar a ca- nula, que fiz fabricar ao sr. Polycarpo, em que reuni as duas modifi- cações das canulas de Luér e Charriere, e é tolerada perfeitamente, in- commodando menos do que as outras tres anteriormente usadas. Cal- do, sôpas, gallinha, leite. Sulfato de quinina. No dia 25 de manhã tudo o mesmo. —Sáe pela ferida um peda- co de falsa membrana de 3 centimetros quadrados. A's 8 horas da tar- de, febre, mais tosse, dôr no ventre que cedeu ao effeito de um cly- ster. Pára o sulfato de quinina. Caldos só, durante a noite. No dia 26. —A doente está bem; urinas com pouca albumina, só manifestada com excesso de acido; ferida quasi limpa. Sôpas, fran- go, chá e leite. No dia 27.—Tudo está bem. As urinas, tratadas pelo acido ni- trico, em excesso, apenas dão uma ligeira nuvem albuminosa. Sôpa, beef de vitella, pão. Tiro as canulas ás 4 horas da tarde, e vejo que a doente respira bem pela larynge; fios na ferida. A's 6 horas a doente adormeceu e dormiu até ás 8. A esta hora acordou muito afílicta com falta de respiração. O enfermeiro tira o penso da ferida, sáem mui- tas mucosidades; a doente fica melhor e adormece de novo para acor-” dar com a mesma afílicção e dyspnea passados 10 minutos. Cheguei então e introduzi de novo as canulas. O resto da noite foi desde logo excellente. No dia 28.—A urina apresentava a mesma nuvem albuminosa que a do dia anterior. Quiz tirar de novo a canula, mas o pai da doen- te pediu-me para a conservar 1 ou 2 dias mais, se isso não a preju- dicasse. Levanta-se a doente. . Tendo que sair de Lisboa no dia 29 só tirei a canula definitivamen- te no dia 30. As urinas estavam então perfeitamente normaes. A voz apenas perceptivel. Uni depois a ferida com tiras adhesivas, e termi- nei o curativo com fios e uma tira de panno á roda do pescoço; o que foi repetido quatro vezes em consequencia da grande quantidade de mucosidades que saíam pela ferida. A's 7 horas da noite começou a fallar um pouco claro. A dieta foi augmentando progressivamente na proporção do appetite, que crescia de dia para dia. A ferida foi alguma vez tocada com o nitrato de prata e curada com fios seccos e cotão de linho. No dia 5 de abril a creança foi jantar á mesa com seus, pais; a A TRACHEIOTOMIA 227 voz era já lara; e no dia 6 tinha a ferida totalmente cicatrizada, e considera-se curada. 37.º OBSERVAÇÃO Garrotilho depois de angina diphtherica em uma menina de 15 an- nos e meio; albuminuria; tracheiotomia ao 8.º dia da doenca primitiva o 4 , Da E 4 . dê e ao 3.º de crup, no periodo asphyxico; morte po asphysia progres- siva e infecção diphtherica 19 horas depois da operação. (Observação e operação por A. M. Barbosa) ' No dia 17 de abril de 1863, pelas 7 horas da tarde, fui convi- dado para assistir a uma conferencia a uma filha do sr. João Pedro da Costa Coimbra, moradora na rua da Penha de França. A doente, a sr.* D. Amelia Coimbra, de 15 annos e meio, tem- peramento sanguineo-lymphatico e boa constituição, tinha adoecido ha- via 7 dias. Era seu medico assistente, o sr. dr. Miranda, e fazia com elle parte da junta o sr. dr. Cesario, lente da Escóla de Medicina de Coimbra, e então deputado ás côrtes. Os symptomas observados por esta occasião eram os seguintes : dyspnéa com ataques de suflocação; ruido laryngeo muito notavel no primeiro tempo da respiração e ainda perceptivel no segundo; voz e tosse muito rouca e abafada; som claro no peito denunciado pela per- cussão; respiração vesicular muito pouco perceptivel porque era enco- berta pela bulha da larynge; pulso a 128, pouco desenvolvido; calor de pelle pouco acima do estado normal; lingua saburrosa e um pouco ari- da; pharynge vermelho-arroxeada, já sem falsas membranas que toda- via tinham existido até á vespera; urinas muito albuminosas. Em vista da historia da doenca exposta pelo assistente, e da ob- servação feita, podémos convencer-nos de que a doente havia tido uma angina diphtherica, cujos productos pseudo-membranosos tinham já des- apparecido, e que actualmente havia o garrotilho com 2 dias de exis- tencia. , Assentou-se começar a administrar internamente o chlorato de potassa em dissolução (3 oitavas por libra de agua), dando nos inter- vallos bons caldos de-vacca; usar da ipecacuanha em pó como vomi- tivo quando reapparecessem os ataques de suflocação; e fazer a tra- cheiotomia quando a asphyxia se manifestasse com sufficiente intensi- dade. No dia seguinte (18 de abril) vi de novo a doente ás 9 horas da 29 « 228 ESTUDOS SOBRE manhã. Os symptomas observados na vespera tinham-se aggravado to- dos; a asphyxia tinha começado e augmentava lenta, mas progressiva- mente com os ataques de suffocação que se repetiam; havia sobretudo uma grande oppressão de peito e afflicções que parecia denunciar que a exsudação pseudo-membranosa se estendia para a parte inferior dos canaes respiratorios; o som do peito era ainda claro, mas a ausculta- ção era annullada pelo ruido laryngo-tracheial então mais exagerado; a albuminuria era mais abundante; a sensibilidade tegumentar um tanto embotada. Portanto nada era permittido esperar já dos meios pharmacologicos. O recurso operatorio era o unico que podia dar uma tal ou qual esperança. Na ultima extremidade pratiquei com effeito a tracheiotomia pe- las 11 horas da manhã, tendo por ajudantes o meu illustrado collega, o sr. Joaquim Theotonio da Silva, e duas pessoas da familia da doen- te. O medico assistente, o sr. Miranda, não voltou a vêr a sua doente depois da occasião da conferencia por ter infelizmente adoecido, e o sr. dr. Cesario tinha-a visto de manhã, mas saíu julgando-a completa e irrevogavelmente perdida. A operação correu sem accidente. Aberta a tracheia, saíram al- guns fragmentos de falsas membranas; e introduzida a canula foi res- tabelecida a respiração, ficando comtudo uma certa aspereza que con- firmava as suspeitas da propagação da diphtheria pela tracheia e bron- chios. Um quarto de hora depois, ou pouco mais, estava limpando os instrumentos que tinham servido á operação, quando percebi que a doente cessava de respirar, que os olhos amorteciam, que a face des- maiava, que o pulso estava quasi imperceptivel. Reconhecendo no mo- mento que a canula, que era a de Borgelat e Trousseau, tinha saído para fóra da tracheia, dando logar á asphyxia rapida, tirei-a logo da ferida, meti 'o dilatador de Trousseau e reintroduzi a canula no canal respiratorio, apertando mais as fitas, o que fez restabelecer a respira- ção e cessar o accidente. Pouco tempo depois veiu um enfermeiro para junto da doente com o fim de vigiar a respiração, limpar a canula, administrar a dissolução do chlorato de potassa de duas em duas ho- ras, e caldos de vacca com geléa nos intervallos. “ Ajustei com o meu collega, o sr. Theotonio da Silva, vermos a enferma alternadamente de 3 em 3 horas. Na minha visita das 3 horas da tarde a respiração continuava a fazer-se soffrivelmente mas com certa aspereza, o pulso estava frequen- te (120) e desenvolvido, pelle quente, face córada. Quando a tornei a vêr, pelas 9 horas da noite, a respiração estava mais aspera; a doente A TRACHEIOTOMIA 2929 referia de novo oppressão e ardor na região esternal; respiração aspe- ra, e alguns fervores humidos nos dois lados do peito; o pescoço nas visinhanças da ferida inchado, vermelho-arroxcado e doloroso á pres- são; a canula interna estava secca, não saia por ella nem muco, nem falsas membranas; a urina mais abundantemente albuminosa; pulso frequente, mais pequeno; pelle menos quente. Instillei gottas de agua morna na tracheia e introduzi por ella a lanada de esponja humede- cida com o fim de provocar tosse e expectoração que desembaraçasse a respiração, com o que pude conseguir-lhe um certo allivio. | Pela meia noite, quando o meu collega observou de novo a doen- te, os symptomas notados tinham-se aggravado muito; e pelos mesmos meios empregados não pôde conseguir melhora. A oppressão de peito e a suffocação progrediram, e a enferma falleceu ás 4 horas da manhã do dia immediato, 19 horas depois da operação. 38. OBSERVAÇÃO Angina diphtherica e garrotilho em uma menina de 5 annos e 3 mezes; tracheiotomia ao 5.º dia da doença primitiva e ao 2.º do crup, no periodo asphyxico; diarrhea choleriforme; morte 15 horas depois da operação. (Observação e operação por A. M. Barbosa) No dia 22 de maio de 1863, ás 8 horas da manhã, fui convi- dado a uma conferencia na travessa de Santa Quiteria n.º 66, em casa do sr. Antonio Soares, para sua filha, Georgina Cazimira Soares, de 5 annos e 3 mezes, vaccinada, de temperamento lymphatico-sanguineo e boa constituição, de quem era assistente o sr. Anselmo José da Costa. Segundo as informações havidas então, a menina Georgina, sem que tivesse saído de casa nos dias antecedentes, começou a ter febre, na noite de 2.º feira, 18 de maio. No dia seguinte de manhã appareceu dôr de garganta, e de tar- de notaram-se algumas fálsas membranas nas amygdalas. Em a noite de 5.º para 6.º feira, 21 para 22, sobreveiu tosse e rouquidão. Pude ainda saber as seguintes particularidades que é muito im- portante notar. Na 6.º feira antecedente, 15 de maio, veiu da traves- sa da Victoria n.º 3, para aquella mesma casa na travessa de Santa Quiteria, uma parente da enferma, Thereza Amelia, de 10 annos, ir- mã de outra creança que alli ficára acommettida de garrotilho, a que succumbiu 4 dias depois, na 2.º feira, 18 do mez. A hospeda, Thereza 230 j ESTUDOS SOBRE Amelia, em a noite da 6.º feira para sabbado, 15 para 16 de maio, teve muita febre, dôres de cabeça e alguma dôr de garganta, o que tudo desappareceu no dia seguinte em que esteve, como em todo o dia anterior em contacto muito immediato com a actual doente, sua prima Georgina. Na occasião da conferencia, 8 horas e meia da manhã do dia 22 de maio, a doente apresentava todos os symptomas e signaes de angi- na diphtherica muito intensa, e de crup no 2.º periodo. As urinas não tinham albumina. Assentou-se em instituir o seguinte tratamento: cauterizações na pharynge com o nitrato de prata e depois alumen e anel rozado (par- tes iguaes); para uso interno, dissolução de chlorato de potassa (duas oitavas para uma libra de agua), duas colheres, das de sôpa, de duas em duas horas, e caldo de vacca nos intervallos. Como medicina de occasião assentou-se tambem empregar os emeticos, mas de preferen- “cia a ipecacuanha só ou junta ao tartaro, para logo depois de se cau- terizar, ou quando houvesse ataques de suffocação. Apesar do tratamento, como aliás se previu, a doença progrediu successivamente em todo aquelle dia 22, e durante a noite que se lhe seguiu; por fórma que ás 4 horas da manhã do dia 23 fui de novo chamado para praticar a tracheiotomia. Por esta occasião o garrotilho estava no periodo asphyxico. Os principaes symptomas eram os seguin- tes: ruido laryngeo mui aspero e estridente nos dois tempos da respi- : ração, encobrindo totalmente a bulha vesicular dos pulmões; respira- cão muito curta, e laboriosa; aphonia; somnolencia de que a doente saia com certa facilidade; face pallida; olheiras lividas; beiços e unhas arroxeados; pulso mui frequente e pequeno; pouco calor de pelle, so- bretudo nas mãos que estavam quasi frias, A ipecacuanha não produ- ziu o effeito vomitivo que se queria, nas dóses e pela fórma em que foi administrada. Tinha-se, por isso, recorrido ao tartaro emetico que tam- bem não fez o efleito desejado, mas pelo contrario dejeccões serosas abundantes que comecaram no principio da noite. Não havia urinas isoladas das excreções alvinas, e por isso nãô forão analysadas. Não havia, pois, tempo a perder. O assistente e eu só esperámos por mais um collega para nos ajudar. O sr. Heitor chegou para este fim pouco antes das 5 horas da manhã. Pratiquei então a tracheiotomia que correu sem nenhum ac- cidente. Depois d'ella a respiracão restabeleceu-se, e a vida voltou com toda a sua actividade, de modo que ás 6 horas da manhã, quan- do deixei a doente entregue ao facultativo assistente e a um enfermei- A TRACHEIOTOMIA 231 ro competentemente habituado na especialidade, a creança estava em um estado muito satisfactorio, e ficou no uso de caldos de vacca en- grossados com arroz, e da poção do chlorato de potassa com xarope de gomma arabica. Mas a diarrhea serosa continuou frequente e abundantisssma; e a doente, sobretudo do meio dia em diante, foi-se enfraquecendo pro- gressivamente de hora para hora, ao mesmo tempo foi tendo afflicções e anciedade, e falleceu pelas 8 horas da tarde, 15 horas depois da ope- ração. * x E N 1 , h ) E, Rego MAMBO ARE A o ” 1 , degunrates gota 8 eba byid chaos does ooo bte hand coitada epi E DE ES MAL VOTES RR PRO RRA RNA A SRR AT LESOTO LIRA TO CEA CIT ERRAR LUTERO MR ATI eputoo . EORNP e; : y AULAS O BREDA) eo um ONCE Su do a OT Et A vob cepa RAE cede “BLA So N j , t 1 o M , 1 E Ce içtr ce Cher ao e PO O DURO RO LELLE HO cpsatroae COMPETBLO A anti Es Ou Uria ua ad ae eg VOTO MUS psi Lorne gt coli vulva mt agógo he Obina Lo depara do Quurea tg Dr pr Grt rec enreto NHb O) ea dti pe RE é ç di al A ti E Et DUfO Ea pI 11) BETON, Kisd a yitl GEO tara LEE tp pdo Fi Ph -— Ê » À V Ee A! - , , > a “ Ny N t hog a, É “ : - q ' | ' 4 Lá y | ) [ ” á . a . A A * E ) k Ê 7 . . , d 4 2 ' , q Ná doe l ' N 1 “ f , To, INDICE RIRDEGAICCAO E << 4 0/6 ojo ata efahbja ata fra vo a rae eai aoro 5) o DATAS SE io oiori » Wefinicaode SynoninAa - co e aja o (oa iodo jeto ie valo po vo oo Disso Jal Ele pelo Snoab ooo c Ponte histonicas (ess jo peitara ja ro o TS EVITE. Sigo et SSH A a RD cio Tio ter Pninerranépoca 7 balaio fetos drebetos aber chefe Reto RS o fetais ENE ros eva oia é BENI Se pum daNépo Cali. fee fefada ooo o dado o faba of o of noafoo poeta o o CX ING Ten ato Tarada GMC none ooo E Porem aDE dae pd BIO ESA SR E: ceroresa to t06 Parte historica relativa a Portugal... ............ sa srs star ssonapro Memperamento econsiituicãos. e aceso gnia aja a oito ARE ESA E cet ta a aid Posição social dos doentes... ... afaga) ajavejo ago ao Sie a RE apa do oe : Estadoideisaude anterior). )sag- ia e capo noto oia or PRI SbeGê E Moro er irer te Doenças anteriores e coexistentes ................... BROS AVE Monet Tae des fa Acommettimento anterior de garrotilho ..........cccccciccc. Crmpiconsecutiyo om secundario EA rt aa So egatano é crojora ole Bronchite agudajersubaguda! a2h5 Sa pispo gas panda oo paises sreaio » capillar e pneumonia ...... “E tê arder 0 É PEC RARO De » CHTODICAL agopaiato açata eae os era pego ERES Dr arroio Emphysema interlobular do pulmão............. cicciccso. Bhthisicas.t. 040 2. o sto As de. abas das Psicose ão BID la no enolti, A TO PAE CReRRA P RA a E ConmihÕAS c comes nosbasoy decor bos albo os ode sco dou codes cce Ouirastespecrestderdiphiheriar MA aro ea Rato er PRI M Marcha leidoracão dardoen cat. pero asse fenato rea ges ce parece o E SR Pe Dr FER ao aa PONTES CO CEO o é o Ga o Ce SE E O DEE EI SIE E en ento REED RES BertododoXeru pa RS = steve Rato oa to ob ab go PSA Sor cds dar IietanoDEnio MO cao rebr soma or ORAS CENA Cro a Epoca do anno em que a operação é praticada. ........ccciiciiiiiio Enilrencraepidemicis o e peqes nato entar PORRA af ane la DE, eia RB A ao 6 e fo o ea fo imelania da me brado Sto cet Eu DOS Erro Dio ERRAR RAE TRUE 'Amomaliasie variedades arteriaes..... . casco cem iriale a o a aladalaio las a e e talo MEM. DA ACAD.— [º. CLASSE. — T. UI. P. 1. 30 Operação............... Nà Ste POA E É a aaa A AD a E Ud ER DR AR CA Instrumentos! so ajss- cotas ropacdpo dono o fahofieao Eta aged ao bi JE NO Va o jo falo e (oa POR A POVO vo RA PrOCESSOSTODPETALOTLOS si auca ero for papa fio o sd RUA o A AS DD av a UNA 89 Processo de Trousseau modificado. ...........cccccccccocc. 89 » de Chassaignac ............ SUS Ta VS foi ON Pap a Pe do a o 98 Day MMdeuMaTsonne ves Ci JEI 98 a Gitano ato Lota vo To) o tao pa RR dama 102 ACCIdENLeS ja sia e price oneta ca fo ELSE en TEN E pero pr cl Pe E a IENGN RATE! Ea) RO 6 O E a 105 Accidentes imediatos ss ni.) 1sf o nateveio a ger ape arado nto falta ca 5 olavo CAVE RSA 105 Hemorrhagia se rep Se ER ro nrdego ce Side bMarája fe vaio do anel A e 105 Entrada do sangue nos canaes respiratórios ............ccc..... 107 Monterapparenter seua vo Lado yo sete ge Robo ve no Fo Ee Voa aa a NO REA ETO 108 Ferimento da parede posterior da tracheia...........ccccccco.. 108 » do esophago (Ms MEI ENE o lot rage fo jo ofensa o E 109 COLO UA ALE E OS Ol: RARE SR E LARS ER A VR MS EPE OS 109 EmphyséMia! er tro Upon o aa o Dt de Me a NR DV 109 Accidentes consecutivos. já sia ay= oo eRse Voodoo Too go Pet A Do Boro apo POP ad RR 110 Diphtheria naiferida da operacçãos ias o erp le seo a 110 Erysipela simples ou phlegmonosa e gangrena .................. 111 Inchação dos ganglios submaxillares..........iciciciciiiiiio. 111 Saída da canula de dentro da tracheia ..........cccccccciccco. 112 Emphysema subcutaneo e subpleural.............c.c.c.c..... 112 Supputaçãoido'mediastino).- 45/0000) 5/a sejais 2a] o aja avo) ola falo elo] o RR 112 Flemorchagiajsecundariar . é sc jssie cia oie o alo o a ooo (o pao SR Re 113 Accumulação de muco no canal respiratorio ............cc...... 113 ; Dysphagia e saída dos alimentos pela abertura da tracehia ou pelo DATIZ Suse o arado opor sreis! sereno o de e Tosa aj a presa te EE A TG 114 Ulcerações dajtrachetar:s oyo renaercotan ana of oie o pote ja Da A MEDE Pe RTV O 116 Bronchite e pneumonia ............... pars tiros pobratatehos gal ca 118 Enterite,chaleriforme)... .,= o ia = assi E o ope o AMA a DOE AE AT 119 Intoxicação diphtherica sis safa geteso a tataia atotolofofa vo ato! mind! ih NRO 120 Tratamento iidosioperados; - seransiare hero (ar epatardatal etapa alo ora e ata a ojo tata enero o ENAP 121 Tratamento imediatos, ..: .- sr stancrio esteiara apar oro poe Pha toa (O SEER VE 121 » CONSECULIVO or 245 papi a cf e fa Ve R DAS ORE AH A EEN RE 122 Pncitamento local Par catete se IDE AY ARE 122 Limpeza! dajcanula. 5 tt o So EAD ce 123 Insfillaço es; RSI PRE ENE Dep ato RAR oRE foreign eo 123 Cauterização da feridas ts SiS pa apesar aj aço nica 125 Época em que se deve tirar a canula. ................. - 126 Curativo; da ferida. ENADE RR came gogo Roo plo paga 129 Mratamento geral RARE = tea io toe E 131 Alimentação! EN AE RARE DE esa ERRA O 131 Tratamento medicamentoso ........cicicsicicreseereo 132 Observações! NT oo fofo fato poa o po pala beato aro (o PARE RR e 135 ESCRIPTOS DO MESMO AUCTOR Ensaio sobre a cholera epidemica—por F. J. Cunha Vianna e À. M. Bar- bosa, 1 vol. 1854. Insiírucções contra a cholera-morbus — pelos mesmos, 1854. Memoria sobre as principaes causas da mortalidade do hospital de %. José e meios de as attenuar —por A. M. Barbosa, 1856. Anatomia e patnologia dos apertos organices da wuretra— idem, 1857. Noticia da febre amarella no Porto, Belem, e Liísbca, em E856 - — idem, 1858. Estudos sebre o garrotilho ou crup — Memoria apresentada à Academia Real das Sciencias de Lisboa — idem, 1861. INDICE DA | PARTE, TOMO III DA NOVA SERIE, CLASSE DE SGIENCIAS MATHEMATICAS, PHYSICAS E NATURAES Estudos sobre o garrotilho ou crup — por Antonio Maria Barbosa. Memoria sobre a tracheiotomia no garrotilho — pelo mesmo. El nam ” ” N bo f ei] N k Á h 1 a — “ a 4 E ” E A] p fa “ ae 4 + k f y “ v OTA o hou br , . 1 ) 4 q : tie UE HR GH TINA RU |] ka b) E “ ESARITENT MR EDIA TEM ERNEST E MS PERA: * + | a x | À . 4 y 1 «seodantl evil oingand 104 = pura e blegoretira dr arihos «ornteae olag se odivorime of nimontoradanat » oudge ql + . ” 4 há ; À . ” hd “ 7 N 4 há E + 4 f “ E) , Dre, k + É Pd no 1 . - r j - . " x + , ) ' ha n - + [q r 5 4 EN Prado e pa À ! UR a n Po do a oa MAG AD Pei or RA >»: A PA Tia . Hd A) Lo . A O) 7 H PE ale o RAN di Me Ne | Ss 4— /, É Zi 817 ES AS MEMORIAS DA ACADEMIA REAL DAS SUIÊNCIAS DE LISBOA CLASSE DE SOÍENCIAS MATHENATICAS, PHYSICAS E NATURARS Nisi utile est quod facimus, stulta est gloria NOVA SERIE — TOMO Il, PARTE II dei ia EL é za LEVE a) Prá) 1 / E] TIC RE E ES] M E f. “y RlrviBlo é TE. o EA LISBOA TYPOGRAPHIA DA ACADEMIA M DCCC LXV LOHALI PrHI La INDICE DA II PARTE, TOMO III DA NOVA SERIE, CLASSE DE SCIENCIAS MATHEMATICAS, PHYSICAS, HISTORICO-NATURAES E MEDICAS Estudo synthetico sobre as secções conicas, por Francisco da Ponte Horta. Additamento á precedente Memoria, idem. Nota sobre a possibilidade de assentar uma conica dada sobre um cone egualmente dado, idem. Estudo industrial e chimico dos trigos portuguezes, por João Ignacio Ferreira Lapa. Noticia dos arvicolas de Portugal, por José Vicente Barbosa du Bocage. Noticia ácerca da descoberta nas costas de Portugal dum zoo- phyto da familia Azalochaetides, Brandt, idem, Diagnose de algumas especies da familia squalidae, idem. Descripção de tres especies novas de crustaceos da Africa occi- dental, por Felix de Brito Capello. Catalogue des poissons d'eau douce de Portugal conservés au Mu- séum d'histoire naturelle de Lisbonne, par M. Franz Steindachner, de Vienne. Ibidem (suite), idem. Nota sobre a uretrotomia interna, por Antonio Maria Barbosa. Investigações sobre a acção da fava do Calabar, idem. Estudos sobre a diabete, por Abel Jordão. rt é ” E kda br ooaiortmk 104 es0000 esdarae o siitos ostadiuço diriam : , qg2a00 hsgudroT aly sopoflr if ty endmateg esb Supals X 4 nora sera Mana po tetnsdad ob abhem entao orisatePi “CRIAM MRE MINE AL FE OM ITA HH tu ” ENUTATRAOSO HELLO TA E AOIPARIHTAI CA IVLILIE, HO, ARA visi Daly cotioo gamas 4 » - ng 4 hs » - ; esorstmo uógiar gol ostra 4 Psrneobor dba ! j p ; contei : “a etimrasW or Hj A Heronro ab pal re cob eram LA dé EE guto 5 1200 est eprodosesh sb gonsoh , nisfonpaA bi sono cesso Beltane DO OT snlantio 6 bs arraste a ita is song eb pogastanão ab torosspo tugas ss rogb np tera (Teo ONE gb mit ro: o rd o e abr orpe) eos teciA oinolmh s6c comrosdo iitosortoso autor PT) A pa ' evebi cutdalso ob pra eb ans o sidor ando seites np er snbtuol Jock au pentaitoih q gridos volurias m ns ESTUDO SYNTHETICO SOBRE AS SECÇÕES CONICAS PELO SOCIO EFFECTIVO FRANCISCO DA PONTE HORTA As theorias da geometria superior de mr. Chasles, prestam-se tão naturalmente á deducção das propriedades das secções conicas, que não podemos resistir ao desejo de fazer um pequeno estudo sobre es- tas curvas, procurando ligar as proposições incidentemente deduzidas por mr. Chasles, no referido tratado de geometria, com outras dedu- zidas pelas mesmas theorias, a fim de estabelecer a continuidade e in- tima ligação que as diversas proposições relativas a este assumpto de- vem oferecer entre si. - Foi um grande passo na sciencia geometrica o que mr. Chasles avançou com a sua brilhante e riquissima producção —a geometria superior. Os methodos de transformação geometrica por homographia, ho- mologia, figuras reciprocas, correlativas, e outros, de que eminentes geometras poderam tirar valiosos subsidios, serão abandonados em um grande numero de casos; porque mr. Chasles inventando um novo al- gorithmo, ou funcção geometrica—a razão anharmonica—creou com elle uma nova sciencia, que permitte reduzir a uma marcha uniforme e directa uma grande parte das investigações geometricas. Em geral, os methodos directos, isemptos das laboriosas cireum- voluções dos indirectos, teem a preciosa vantagem, com serem mais naturaes, de satisfazer muito mais o espirito, accrescendo, como muito bem observa mr. Chasles, que permittem descobrir as analogias, ou pontos do contacto que muitas vezes existem entre questões de ori- gem diversa ; qualidade que não possuem os methodos indirectos. Nós deixaremos ao proprio mr. Chasles o fazer a critica dos me- thodos indirectos, ou de transformação; tomando a liberdade de trans- crever do seu tratado de geometria as judiciosas considerações que se seguem. MEM. DA ACAD. — [.º CLASSE. — T. IH. P. 1. | 2 ESTUDO SYNTHETICO «Par les méthodes de transformátion, on fait un théorême dé- terminé avec un autre théorême déja connu. On peut former ainsi une collection plus on moins ample de propositions. Mais ces propositions sont en quelque sorte isolées; elles manquent de liens entre elles; on ne saurait les déduire les unes des autres, lors même qu'on voit qu'el- les se rapportent à' une même théorie; on ne connait que leurs liai- sons avec celles d'ou on les a déduites, l'une de Vautre respectivement par voie de transformation, mais non par voie de composition ou de synthese. Nous avons cherché, au contraire, à former un ensemble de pro- positions constituant par leur enchainement naturel, des théories, et un corps de doctrine susceptible d'applications fécondes dans toutes les parties de la géometrie. Il nous a donc fallu démonstrer directement chacune de ces pro- positions, les unes au moyen des autres, par les propres ressources qui peuvent offrir les théories auxquelles elles se rapportent.' C'était une condition à laquelle il fallait s'astreindre pour constituer ces théo- ries, et cette marche parait d'autant plus nécessaire, qu'en général il ne suffit pas de savoir q'une proposition est vraie, pour qu'on puisse en faire un usage utile en mathématiques ; il faut encore connaitre toutes ses dépendances avec les diverses propositions qui se rattachent au même sujet. Quand cet enchainement est mis à nu, tout devient facile, et il est même rare qui ['on ne puisse pas démontrer une même proposition de bien des maniêres, car on y arrive par toutes celles qui la touchent de quelque côté. C'est lã un criterium qui permet d'ap- précier jusqui à quel point on a pénétré dans le sujet que Ion traite, et combien il peut encore laisser a désirer.» Compenetrados d'estas considerações, fizemos a applicação das mo- dernas theorias ao estudo das curvas, que representam o logar geome- trico das intersecções dos raios homologos de dois feixes homographi- cos: deduzindo a fórma, as principaes propriedades, e as equações d'es- tas curvas. Demonstrámos a sua identidade com as secções conicas. Deduzimos a theoria dos polos e polares: apresentando como applica- cação d'esta theoria a solução do problema, talvez novo, que consiste em tirar uma secante a uma circumferencia por um ponto exterior, de modo que a parte exterior, que vai da parte convexa até ao ponto, esteja para a interior n'uma relação dada. Na applicação extremamente fecunda da mesma theoria á deducção das propriedades do hexagono, pentagono, e quadrilatero inscripto a uma conica, designámos todos os grupos de seis rectas tomadas entre os lados e diagonaes do hexa- SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 3 gono inscripto, dotadas da propriedade de concorrerem duas a duas em tres pontos situados em linha recta. O mesmo fizemos relativa- mente ao pentagono e quadrilatero inscripto; mostrando que não só se intersectam no mesmo ponto as diagonaes dos quadrilateros inscripto e circumscripto, taes que, os vertices do 1.º sejam os pontos de con- tacto dos lados do 2.º, como é sabido, mas tambem que se intersectam no mesmo ponto as diagonaes dos dois quadrilateros que se formam com dois lados oppostos do 1.º, e dois lados oppostos do 2.º — No es- tudo sobre duas conicas provamos que, se os tres vertices d'um trian- gulo girarem respectivamente em torno de pontos situados sobre os mesmos lados, um d'estes vertices descrever uma conica passando por dois d'esses pontos, e o outro descrever outra conica passando pelo 3.º ponto e um dos 1.%, tambem o 3.º vertice descreverá uma conica. D'este theorema, que nos parece novo, deduzimos processos para traçar conicas, quando as cinco condições dadas constam simultaneamente de pontos conhecidos da curva, e suas tangentes. Obtivemos egualmente pelas novas theorias, a demonstração de todos os principios em que se funda o problema de Poncellet, que consiste em tirar uma tangente commum a duas conicas; recorrendo ao novo theorema que, se esti- verem em involução os dois Eunpos sextinarios q, à!; D, b';.c, c': a, b; a',b';c, d tambem o grupo a, b'; à, b; d, c' estará em involução, etc. PRIMEIRA PARTE ESTUDO SOBRE UMA CONICA t É sabido que as secções do cone recto de base circular feitas por um plano offerecem tres generos de curvas, ellipses, hyperboles, e parabolas (Vincent. Cour. Géom. Elim. pag. 515, e 516); as quaes são chamadas secções conicas, ou simplesmente conicas. Qualquer d'estas curvas, originadas pela intersecção do cone com um plano, é projecção conica no seu plano de uma das cireumferen- cias produzidas no mesmo cone pela intersecção d'este com um plano perpendicular ao eixo. 2 Ora, a circumferencia gosa da propriedade de que, se tomar- mos dois de seus pontos para centros de feixes, cujos raios concorram cada um do 1.º, com cada um do 2.º, em pontos da mesma circum- ferencia, estes dois feixes são homographicos; por quanto os angulos Lx 4 ESTUDO SYNTHETICO do primeiro são eguaes aos angulos do segundo, cada um a cada um; logo : 3 Dois feixes cujos centros são dois pontos d'uma conica, e cu- Jos raios concorrem dois a dois em pontos da mesma conica são ho- mographicos: por quanto, estes feixes não são mais do que as proje- ções de outros, formados de um modo semelhante na circumferencia da secção recta do cone que contém a conica; e como é sabido, estes ultimos, homographicos entre si, são respectivamente homographicos com os primeiros (Geom. Super. de M. Chasles $ 547). 4 Estudando as propriedades das curvas que representam o lo- gar geometrico das intersecções dos raios homologos de dois feixes ho- mographicos, estudamos as propriedades das secções conicas; por quanto nenhuma d'aquellas curvas deixa de ser alguma das secções conicas, como mostraremos. 5 Theor. O logar geometrico das intersecções dos raios homolo- gos de dois feixes homographicos passa pelos centros dos ditos feixes. Com efeito, a recta que unir os dois centros O, O' (fig. 1) con- siderada como raio de qualquer dos feixes, por exemplo do centro O, tem por homologo um certo raio que parte de O'; logo encontra em O' o seu homologo. Obs. Para simplificação da linguagem, chamaremos conicas ás cur- vas que resultam das intersecções dos raios homologos de dois feixes homographicos. 6 Theor. Uma conica não póde ser cortada por uma recta em mais de dois pontos. Sejam 0,0,M,M, M"... (fig. 1) diversos pontos da conica, em que O, O! representam os centros dos feixes homographicos OMM'M"...; 1 O'MM M"...: estes feixes cortados por uma recta qualquer NY, offere- cem duas divisões homographicas sobre esta recta, — a,b,c..., a'b,c'..: ora os pontos da conica existentes n'esta recta são pontos duplos das duas divisões; mas como é sabido, não ha senão dois pontos duplos reaes, ou imaginarios em duas divisões homographicas sobre a mes- ma recta; por tanto não ha senão duas intersecções entre uma recta e uma conica. 7 Corol. Logo, se houver continuidade entre dois pontos d'uma conica, o ramo que os ligar será convexo. 1 A notação O designa que o ponto O é o centro do feixe, cujos raios são OM, OM! etc. SOBRE AS SECÇÕES CONICAS. 5 8 Theor. As conicas gosam da propriedade de que, se em torno de dois quaesquer de seus pontos girarem dois raios, intersectando-se em pontos da mesma conica, estes dois raios geram dois feixes homo- graphicos. Sejam O, O' (fig. 1) os centros dos dois feixes homographicos a que “é devida á geração da conica; digo que aos centros O, O' se podem substituir os centros M. M', quaesquer que sejam estes dois pontos da mesma conica. Com efeito sejam NY, N' outros dois pontos da conica; tire-se a recta NY, e os raios OM, OM, O'M, O'M'. Os quatro pontos NY, a, b, N' teem suas razões anharmomicas iguaes ás dos quatro pontos Y, à!, b', N': logo são pois homographicos os dois feixes MNOO!N, e MNOO'N': mas N, N' são quaesquer dois pontos da conica; logo os centros O, O' po- dem ser substituidos pelos centros MZ, M'. Pela mesma razão os cen- tros M, M' podem ser substituidos pelos centros O, N; O, N; ete. 9 Corol. Cinco pontos determinam uma conica, Com efeito, tomando quaesquer dois, O, O' para centros dos fei- xes geradores, e dirigindo d'estes dois pontos raios para os outros tres ON, OM, OM; ON, OM, OM, (fig. 1); o ponto em que qualquer outro raio ON' encontra a conica é completamente determinado, por quanto este ponto existe na intersecção do raio ON' com aquelle que se deve tirar de O para que o feixe O/NMM'N' seja homographico com ONUM'N. 10 Corol. Duas conicas não podem ter mais de quatro pontos communs sem se confundirem. 11 Probl. Por cinco pontos dados couduzir uma conica. Sejam 4, B,C, D, E (fig. 2) os cinco pontos dados; tomem-se dois d'estes pontos 4, E para centros dos feixes geradores; e tirem-se os raios 4B, 4C, AD; EB, EC, e ED; e determinem-se as intersecções de dois grupos de raios homologos 4B, CB; 4C, EC, tomados inversa- mente, e tire-se a recta «+ pelas ditas intersecções. Repita-se o mes- 6 ESTUDO SYNTHETICO mo processo com qualquer dos outros dois grupos 4C, EC; 4D, ED; ou 4B, EB; e AD, ED; o que determinará nova recta €6': estas duas rectas cortar-se-hão n'um certo ponto O. Posto isto, querendo deter- minar um sexto ponto da conica na direcção 4X, tire-se uma recta do ponto O para o ponto y em que a recta 4X corta um qualquer dos raios do feixe E, por ex. ED; e prolongue-se até encontrar o raio AD (homologo de ED) em Y; finalmente tire-se a recta YE, a qual cortará 4X no ponto pedido. Em logar d'este processo, póde empregar-se qualquer dos outros descriptos por mr. Chasles para achar o 4.º raio d'um feixe, homolo- go ao 4.º raio de outro, homographico com o primeiro. 12 Theor. Quando dois pontos O, O' d'uma conica são tomados para centros dos feixes geradores, o raio homologo da corda OO, re- putada do feixe O, ou O' é a tangente á conica no ponto O, ou O. Considere-se uma parte finita da curva no seguimento de O, por ex. O'N' (fig. 1), e tirem-se os dois raios homologos ON', O'N:: é claro que quando o ponto N' caminhar para O', o raio ON cami- nhará para a direcção limite OO', em quanto que o raio homologo O'N' caminhará para a direcção da tangente em O. 13 Probl. Dados cinco pontos d'uma conica, construir as suas tangentes em dois d'estes cincos pontos. Sejam 4,8,C€,D,E (fig. 2) os cinco pontos dados. Tomem-se para centros dos feixes geradores os dois pontos 4, E em que se perten- dem as tangentes; e determine-se o ponto O como no problema (11). N'este ponto O intersectam-se os dois raios cada um dos quaes é no seu feixe o homologo da recta que une os dois centros; logo as re- ctas tiradas de O para 4, e E serão as duas tangentes pedidas. 14 Probl. Dados cinco pontos d'uma conica, e uma recta de- terminar as intersecções d'esta com a conica. Tomem-se dois dos cinco pontos para centros dos feixes gerado- res, e tirem-se d'estes dois pontos raios para os outros tres; as inter- secções d'estes raios com a recta dada formarão tres systemas de pon- tos homologos de duas divisões homographicas sobre a mesma recta: a questão reduz-se pois, a achar os pontos duplos de duas divisões ho- mographicas sobre a mesma recta, conhecendo tres systemas de pon- tos homologos (Gcom. Super. pag. 184.) 15 Theor. Se em uma conica (fig. 3), tirarmos uma corda ef, e por dois pontos D, E da mesma conica forem tirados raios DM, EM para o mesmo ponto, dos quaes o primeiro passe pelo meio O da dita corda; e pelo extremo Z da corda DL, parallela a cf, for tirada a se- SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 7 cante EL, digo que o ponto 7º que esta determina na corda ef veri- ficará a relação de; = 01.00". Com effeito, considerando os pontos D, E como centros dos fei- xes geradores, e estes cortados pela corda cf, haverá n'esta corda duas divisões homographicas de que O será o ponto central, O' o seu ho- mologo na segunda divisão, e 7 o ponto da mesma segunda que cor- responde ao infinito da primeira. Para outra posição do ponto M, por ex. M', terá logar a relação notavel em!.fn==eM. mm; ou fm.em=[Pmm..... (1) que mr. Chasles deduz da formula am.b'm + ymn'+ d==0; a qual exprime a homographia de duas divisões sobre a mesma recta. As relações (1) fazem vêr que os quocientes em. fm fm'.em 7 ? 7 é mm m'm são constantes, qualquer que seja a posição do ponto M. Deduz-se ainda das mesmas relações, mudando » em O, em' em O' np TR o isto é, que a divisão e,0'f.l! é harmonica. Tambem se deduz facilmente a seguinte relação 16 Theor. Em dois feixes homographicos não ha mais do que dois systemas de raios homologos parallelos. ê ESTUDO SYNTHETICO Sejam O, O! (fig. 4), os respectivos centros; OT e O'T os dois raios, dos quaes cada um é no seu feixe o homologo da recta OO! re- putada raio do outro, Oa, O'w'; Ob, Ob os dois systemas de raios pa- rallelos. A recta qg' que unir as intersecções dos raios Oa, O'b'; Ob, O'a passa por 7 (13): mas a figura OgO'q é um parallelogrammo, logo a diagonal gg passa pelo meio / de OO'. Conclue-se pois, que o unico systema de raios parallelos, compativel com o systema Já existente Oa, O'w', se obtem tirando a recta 7W, de T para o meio de OO! a fim de determinar o ponto q' por onde deve passar o raio O'b' do se- gundo systema, [7 Corol. Estes dois systemas reduzem-se a um só quando a re- cta TF fôr parallela ao raio Oa. 18 Theor. As conicas dividem-se em tres generos de curvas. 1.º Curvas fechadas dum ramo finito. 2.º Curvas fechadas dum ramo infinito. 3.º Curvas abertas de dois ramos infinitos. Com effeito, ou não ha systema algum de raios homologos paral- lelos nos dois feixes geradores, ou ha um systema, ou ha dois. 1.º Caso — Os dois raios geradores Om, e O'm girando em torno de seus centros respectivos O, O' vão descrevendo a curva continua- mente, produzindo uma successão de pontos á distancia finita dos dois centros O, O'. Esta curva passa pelos pontos O, O' (5); é convexa, € fechada, por não poder ser cortada por uma recta em mais de dois pontos (6). Este genero é o das ellipses. 2.º Caso — A curva compõe-se d'um só ramo infinito podendo reputar-se fechada, e por conseguinte comprehendida de certo modo no primeiro genero. Com effeito os raios parallelos Oa, O'a' (fig. 5), podem reputar-se concorrendo no infinito; e nada obsta a suppôr ahi um ponto da cur- va. Imagine-se agora que o raio O'a' se desloca, girando em torno do centro O', até tomar uma posição qualquer O'm, comprehendida dentro do angulo a'0't'; apenas esta direcção deflfirir de O'w, já o prolonga- mento do raio O'm encontra o raio Oa por baixo de OO': a recta / 7 pas- sará á direita de F, meio de OO"; e logo, será O0f>> O'p; por conse- guinte os dois raios homologos Oz, O'm concorrerão por cima de oo de modo que este ponto 7» vindo do infinito, começará e acabará por se approximar do ponto O', á medida que Om girar para a direcção O't'. O mesmo se conclue para o lado opposto, quando o raio Oa girar para Ot. Tambem é facil reconhecer que os raios dirigidos d'um dos SOBRE AS SECÇÕES CONICAS. 9 pontos O, O' dentro do triangulo OO'T, encontram a curva dentro d'este mesmo triangulo. Podem resumir-se estas considerações do seguinte modo: se uma recta conduzida por O', na direcção O'a', girar continuamente da es- querda para a direita, não cessará de encontrar a curva em dois pon- tos, um dos quaes é o dito ponto O': ao principio está o 2.º ponto no infinito; mas logo este ponto movel se irá approximando do ponto O', o qual attingirá quando a recta movel houver tomado a posi- ção Ot. Continuando no mesmo sentido o giro da recta movel, o ponto movel passará a desviar-se de O', fazendo o seu curso dentro do trian- gulo OO'T, até cair em O, o que acontecerá no momento em que a recta girante attingir a direcção O'O. Em seguida, o ponto movel passará a aflastar-se de O, mantendo-se sempre dentro do angulo a Of, alcançando uma distancia infinita, quando a recta movel attingir a po- sição inicial O'a'. A curva é pois infinita, e nenhuma razão obsta a suppol-a fe- chada. Este genero é o das parabolas. 3.º Caso — Curvas de dois ramos infinitos, convexos entre si. Na discussão d'este caso é preciso distinguir duas hypotheses — a de existir o ponto 7 entre os raios parallelos Oa, O'a' do 1.º grupo, e entre os raios Ob, O'b' do 2.º, (fig. 6); e —a de existir fóra d'ambos os grupos (fig. 8). E' facil reconhecer que a hypothese de achar-se o ponto 7” entre os raios d'um dos grupos, e não entre os raios do ou- tro é inadmissivel. 1.º Hypothese— Sejam Oa, O'a'; Ob, O'b' (fig. 6) os dois gru- pos de raios parallelos; e 7 o ponto de concurso das tangentes em O, O. Supponha-se que o raio O'a' gira para a direita, conservando-se no an- gulo a'O't!: tão depressa este raio se separe da direcção O'a', tomando nova direcção O'c, já o seu prolongamento O'fcortará o raio Ob entre ge q; e portanto a recta /7 cortará OO! á direita de seu ponto me- dio F; e logo os raios homologos Op, O'c concorrerão em »m por ci- ma de OO'; e como não cesse de verificar-se por cima de 00" o en- contro dos dois raios homologos em quanto um d'elles, Oc, permanecer dentro do angulo «'0't, haverá um ramo continuo, que partindo do infinito sobre a recta O'a', se approximará mais e mais da recta O'””, que attingirá quando o raio O'c se tiver confundido com esta mesma recta. Conclue-se do mesmo modo, que, um ramo vindo do infinito, MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. IH, P. II. 2 10 ESTUDO SYNTHETICO sobre o raio Ob (d'esta curva convexa que estudamos (6)), se approxi- mará mais e mais de Of, até attingir esta recta no ponto O, o que acontecerá quando o raio movel, que girar de Ob para Ot, se houver confundido com esta mesma recta. Supponha-se agora que o raio O'c continua o seu giro para baixo de O't!, mantendo-se dentro do angulo 4/0! 4; ver-se-ha que em qual- quer posição O'c, elle cortará o seu homologo dentro do triangulo 0O'T, de modo que a curva continuará de O' até O; attingindo este ulti- mo ponto, quando o raio O'c chegar á posição O'4' (5), (12). O mesmo se deduz relativamente ao raio que se fizer girar á roda do O, de Ot para 04; e se conclue: haver um ramo infinito contido no angulo 474! das duas tangentes, o qual caminhando no triangulo TOO, tocará em O, e O' as rectas Ot e O!t, irradiando d'estes pontos para o infinito, que procura alcançar por dois lados, correndo dentro dos angulos 40%, e a'O'r, não cessando de approximar-se mais e mais dos lados Ob, e O'a', que só attinge no infinito. Finalmente, considere-se o giro d'um raio movel indo de Ob para Oa (fig. 7): tão depressa este raio movel se distinga de Ob, já o seu prolongamento cortará o raio O'u! dentro do angulo a Ob, : a recta /T cortará OO! em [, á direita de F; e por tanto as rectas Of, e O'p', comprehendidas entre as duas parallelas Oa, O'a', concorrerão por baixo de OO. Este raio movel não cessará pois de encontrar a curva por baixo de OO'; a qual, por assim dizer, conduzirá por dentro do angulo d ga, desde o infinito, em que a encontra na direcção Ob,, até a abandonar outra vez no infinito ao tomar a direcção Oa,, quando o seu homo- logo se confundir com O'a/. A curva é pois o conjuncto de dois ra- mos infinitos convexos entre si. 2.º Hypothese. — Supponha-se que o raio O'a' (fig. 8), gira para O'4', tomando uma posição qualquer O'c, dentro do angulo a'0'4'; m'esta posição o seu prolongamento encontrará o raio Ob, entre O e q; a recta Tf passará ao lado de K (n'esta fig. á esquerda), e logo os dois raios homologos O'a', e Oa, ou Ola) e Oa, transportados ás posições O'c, e Op concorrerão por baixo de OO! entre as duas parallelas Oa,, e O'a/: mas quando o raio O'e cobrir O'4', o seu homologo cobrirá OT; logo a curva tocará em O esta recta OT. Assim, n'este movi- mento do raio O'c, de O'a! para O'4', e em que o raio Oa, gira de Oa, para OT, produz-se um ramo de curva, que vindo do infinito por entre as parallelas Oa,, e O'a,, se approximará mais e mais da recta OT, a qual attingirá no ponto O. Se considerarmos o raio O'b/ girando para O'4', vêr-se-ha de SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 1 modo similhante que um ramo de curva vindo d'um ponto infinita- mente distante sobre a recta O'b, á esquerda de O', descerá por en- tre as parallelas Ob, e O'b', procurando o ponto O, onde fará a sua juncção com o ramo já descripto entre as parallelas Oq, e O'a,. N'este movimento de O'b/ o raio Ob girará em torno de O desde Ob até Ot. Reflectindo porem na symetria da figura, concluir-se-ha que um novo ramo, tangente em O' a recta TV, correrá exteriormente ao an- gulo 4Tt,, parte entre as parallelas Oq, e O'a', e parte entre as pa- rallelas Ob, e O'b/; perdendo-se no infinito tanto d'um lado como do outro; o que corresponde ao giro do raio Oa, para Ob, acompanhado do giro de O'a! para O't', ou de O'a/ para O'b/. Estas considerações fazem ver que qualquer dos raios parallelos encontra a curva no infinito tanto d'um lado como do outro. Se ao centro O' (fig. 7) substituirmos qualquer outro, por exem- plo 0”, O",..., os raios parallelos relativos ao centro O, e novo cen- tro O”, ou O" terão as mesmas direcções que os primeiros; por quanto, se reputarmos respectivamente homologos nos dois centros O, e O” os raios OO', Ot, Ob; O"O', O"O, O'b, a curva gerada será ainda a mesma; e como o raio Oa encontra a curva no infinito, se- gue-se que o seu homologo em O” lhe será parallelo. Por tanto, se o raio O'a' se deslocar parallelamente a si mesmo, passando ás posições O"a!, O"'a!”, etc. elle não cessará de encontrar a curva no infinito tanto d'um como do outro lado; mas o centro O! caminhará tambem para o infinito, visto que a curva é convexa. Estes dois pontos = co, em que o raio ou secante O'a' corta os dois ramos da curva, devem considerar-se formando um só ponto, como se a curva ahi tivesse sido cortada, e houvesse depois soflrido um des- locamento conveniente. Quando o ponto O estiver tambem no infinito, a recta O'a' dei- xará de considerar-se como secante, e será reputada tangente á curva no infinito. N'este momento acha-se esta recta entre os dois ramos da curva, passando a uma distancia Jinita de qualquer ponto tomado na parte accessivel da mesma curva. E por estas duas qualidades que ella ha recebido o nome de assimptota. Se o movimento da recta O'a” continuar ainda no mesmo senti- do, o ponto movel O” deixará o ramo JM, passando ao ramo 1/', com- prehendido no angulo a/qb,, e este novo ponto do ramo )/', vindo do infinito, approximar-se-ha mais e mais do ponto q, para depois se afastar e perder-se ainda no infinito com a dita recta movel. DO 12 ESTUDO SYNTHETICO É esta collocação dos dois centros O, e O' em ramos diferentes que caracterisa a fig. 8, e a distingue da fig. 7. Todas estas considerações se repetem quando se faz discorrer o raio O'b, da direita para a esquerda parallelamente a si mesmo. Em resumo: O terceiro genero consta de curvas tompostas de dois ramos infinitos, convexos entre si, e cuja disposição geral se póde caracterisar como se segue. Quando uma tangente tirada em um ponto d'uma d'estas curvas, girar constantemente no mesmo sentido em torno de seu ponto de contacto, ella não cessará de encontrar a curva em novo ponto. Este novo ponto coincidirá ao principio com aquelle ; mas afastando-se delle cada vez mais, abandonará no infinito o pri- meiro ramo, passando logo ao segundo, que tambem encontrará no in- finito, mas do lado opposto: em seguida a nova intersecção se appro- ximará do centro de rotação, sem que attinja este ponto, para depois se afastar delle até ao infinito ; e abandonando então o segundo ramo, voltará ao primeiro, o qual percorrerá desde o infinito até ao centro de rotação, attingindo este ponto quando a dita recta movel comple- tar um giro de 180º. 19 Coroll. Nas conicas do 1.º e 2.º genero não podem inscre- ver-se pentagonos concavos: logo a conica que passar pelos vertices de um pentagono concavo é do 3.º genero. 20 Ha casos em que se reconhece à priori o modo pelo qual os à vertices do pentagono concavo se distribuem pelos dois ramos da conica circumscripta. Assim na figura 9, em que os 5 pontos dados 0, 0', 4, B, C formam um pentagono concavo, os tres pontos 4, B,C estão em um ramo, e os dois O, O' no outro. Por quanto, tomando os pontos O, O' para centros dos feixes geradores, e considerando es- tes cortados pela recta BC, os dois pontos B, € serão os pontos du- plos das duas divisões interceptadas por esta recta; mas a ordem dos pontos homologos a, a', situados fóra do segmento BC, é contraria á dos pontos homologos existentes no mesmo segmento !; logo todo o raio Ob, tirado dentro do angulo BOC, será cortado pelo seu homo- logo dentro do angulo BuC; e a conica irá de Ba C por baixo da ! É facil reconhecer que, quando um ponto pertencente a uma de duas divi- sões homographicas sobre a mesma recta existir com o seu homologo no segmento ef, que separa os respectivos pontos duplos, o mesmo acontecerá a todo o ponto situado no mesmo segmento; e logo todo o ponto situado fóra do segmento ef, terá egualmente fóra o seu homologo. Nºeste caso os pontos homologos que existirem fóra de ef, achar-se- hão ambos do mesmo lado d'este segmento. Finalmente a collocação relativa de quaes- SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 13 rectaBC, — Concluir-se-ha de um modo similhante haver continui- dade na conica entre os pontos 4, e B. 21 Theor. Quando os tres lados d'um triangulo girarem respe- ctivamente em torno de pontos distinctos, tomados sobre os mesmos lados, não em linha recta, e dois de seus vertices percorrerem rectas quer pontos homologos dentro do segmento ef será sempre a mesma, e contraria à dos pontos homologos situados fóra do referido segmento. em.fm! em'.fm gos m, m! dentro do segmento ef; À será positivo, e logo nenhum ponto póde existir no segmento ef, que não tenha ahi o seu homologo, porque do contrario, À seria ao mesmo tempo negativd e positivo. Reconhece-se facilmente que, se for Com effeito, recorrendo à relação =); e suppondo os dois pontos homolo- em em em SÉ É será fm fm. fm Sm e logo em.fm! em.fm .., .< dad Roo si a es É em em! gue-se que a ordem dos pontos homologos no espaço ef, é a mesma para todos. em, > fm, em > fm. fm) logo fm, im). Tambem é mas fe CF, e CED> CG: porém junto ao ponto 4, na parte inferior ao diametro 4B, a conica vai por fóra da cireumferencia ; logo entre 4, e G haverá um ponto 7 onde as duas curvas se interse- ctarão. O prolongamento da recta CI produzirá uma nova intersec- ção 7", á distancia do centro conmum CI'==CI. Estes dois pontos 1, 7º determinam um systema só de diametros orthogonaes, visto que as cordas 41, BI são respectivamente parallelas a BI', 4T', como se conclue da egualdade dos triangulos 4CI, e BCI". Os diametros 4B, II' são os unicos communs ás duas curvas (10). Tambem se prova a existencia dos eixos nas conicas do 3.º genero, descrevendo uma circumferencia concentrica sobre um dos diametros da conica. Com effeito, a conica offerece a convexidade para o centro, em quanto que a circumferencia lhe oflerece a concavidade; por tanto, ou a conica é tangente á circumferencia nos extremos do diametro commum, e então este diametro, e uma das tangentes communs em seus extremos constituem as direcções de duas cordas supplementares perpendiculares entre si; ou as duas curvas se cortam nos extremos do dito diametro. Considerando um só dos ramos da conica, e sup- pondo que o semidiametro que lhe é commum com a circumferencia gira sobre o centro, pelo lado em que o dito ramo entra na circum- ferencia, ver-se-ha que antes d'este semidiametro se confundir com a primeira assimptota que se lhe depara, elle tem de encontrar a conica fóra da cireumferencia; e por tanto, entre estas duas posições do re- ferido semidiametro ha uma intersecção Y da conica com a circumfe- rencia, á qual correspondem duas cordas supplementares perpendicu- lares entre si. 41 Schol. 1.º Um dos eixos das conicas do 2.º genero existe no infinito (32). Schol. 2.º Determina-se o eixo accessivel destas conicas traçando um diametro, tirando duas cordas perpendiculares a este diametro, e finalmente determinando o diametro conjugado com estas cordas. SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 21 Schol. 3.º Os eixos d'uma conica dividem esta em duas partes eguaes e symetricas, de modo que dobrando o seu plano por um dos RE eixos, rebatendo uma metade sobre a outra, uma das duas par- tes da curva ajustará inteiramente com a outra. 42 Theor. O minimo diametro das conicas do 3.º genero é o eixo real d'estas conicas. Conclue-se esta proposição por serem os dois ramos d'estas cur- vas convexos entre si, €e ao mesmo tempo serem perpendiculares ao eixo real as duas tangentes á curva tiradas nos extremos do dito eixo. 43 “Theor. As conicas do 2.º genero são similhantes entre si. Sejam MP, M'P' (fig. 20) duas conicas do 2.º genero, Ou, O'a! os raios parallelos da primeira relativamente aos centros O, O'; AB o eixo da segunda, e O, o ponto em que a tangente a esta fórma com o respectivo eixo o angulo O [4 ==a,Ot: tirem-se as rectas 0,0,, O/C, parallelas a 4B, tendo entre si uma distancia igual á que se- para as duas parallelas Ou, O'a': finalmente tirem-se as tangentes em O,e O/: ter-se-ha logo, deslocando convenientemente a curva P'J/', afim de applicar o ponto O, sobre O, a recta O'C' sobre Oa,, e a recta CC, sobre a/a' ; o ponto 7” cairá sobre 7; o ponto O/ sobre O”: mas n'esta posição re- lativa das duas conicas, ellas teem uma tangente commum em O, e os mesmos raios parallelos ; logo são inversamente similhantes (23). 44 O angulo formado por duas tangentes a uma conica tiradas pelo mesmo ponto exterior, chama-se angulo circumscripto. A corda que une os pontos de contacto dos lados do angulo cir- cumscripto, chama-se corda de contacto. 45 Theor. Todas as secantes d'uma conica tiradas pelo mesmo ponto exterior são divididas harmonicamente pelo dito ponto exterior, por aquelle em que são cortadas pela corda de contacto relativa ao dito ponto exterior, e pelas suas intersecções com a conica. Sejam a (fig. 21) o ponto exterior, OO! a corda de contacto, e af uma secante qualquer conduzida por a. Tomando os extremos da corda OO! para centros dos feixes geradores, as intersecções d'estes feixes com a secante af offerecerão duas divisões homographicas em involução : por quanto, concorrendo as duas tangentes tiradas em O, e O' no mes- mo ponto « da secante af, o ponto a' reputado na 1.º ou 2.º divisão 22 ESTUDO SYNTHETICO terá por homologo o ponto a. Ora os pontos e, / são os pontos duplos das duas divisões: logo estes pontos dividem harmonicamente o se- gmento qa”. 46 Corol. O ponto onde uma corda d'uma conica corta o seu diametro conjugado, e aquelle onde concorrem as tangentes tiradas nos extremos da dita corda, dividem harmonicamente o dito diametro (28). 47 Schol. Nas conicas do 2.º genero o extremo d'um diametro conjugado com uma corda dada, divide ao meio a distancia entre o meio da dita corda e o vertice do angulo circumscripto, visto que os diametros são todos infinitos. 48 Theor. Os raios dirigidos dos extremos d'um diametro de uma conica para o mesmo ponto d'esta, dividem harmonicamente to- das as cordas conjugadas com o dito diametro. Sejam 4, B (fig. 22), extremos d'um diametro, os centros dos feixes geradores, e supponham-se estes cortados pela corda «f, conju- gada com o dito diametro. O ponto O, meio de ef, quer se considere na 1.º divisão, quer na 2.º, terá sempre o mesmo homologo — o infi- nito —; logo as duas divisões estão em involução, e por tanto os pon- tos duplos e, / dividem harmonicamente o segmento aq”. D'outro modo. Para os pontos homologos a, a' tem-se a relação ae de. RE Vad e para os pontos homologos O, O, Oe - Oe == À ar» Of su mas o ponto O! está no infinito, logo À Pe Mo or tanto (o bm op 1: e por pato por outro lado 0e =— Of; logo y=— 1; e finalmente ae. ale la apo SOBRE AS SECÇÕES CONICAS. 23 49 Corol. Se sobre um dos eixos d'uma conica do 1.º genero, com o diametro, descrevermos uma circumferencia, digo que as tan- gentes tiradas a uma e outra curva nos pontos em que ambas são cor- tadas pela mesma perpendicular ao dito eixo, concorrem no mesmo ponto d'este eixo. Com efleito, ambas as curvas são conicas, e por hypothese a cor- da de contacto das tangentes d'uma e outra é a mesma perpendicular ao eixo, a qual corta o dito eixo, quer relativamente a uma, quer re- lativamente á outra conica, no conjugado harmonico do vertice do respectivo angulo circumscripto, em relação ao mesmo eixo. 50 Corol. Se circumscrevermos uma circumferencia a uma co- nica do 3.º genero, tendo por diametro o eixo real da dita conica, e á circumferencia for circumseripto um angulo tendo o vertice no dito eixo, e outro angulo for circumscripto á conica tendo o verlice na intersecção do eixo com a corda de contacto da circumferencia, a corda de contacto d'este angulo tambem passará pelo vertice d'aquelle. E' evidente, porque ambos os vertices dividem harmonicamente o diametro da circumferencia ou eixo da conica. 51 Thcor. Se de um ponto exterior a uma conica se tirarem varias secantes para a dita conica, as rectas que unirem dois a dois os pontos em que duas d'estas secantes cortarem a conica, concorrerão duas a duas na corda de contacto relativa ao dito ponto exterior. Nas duas divisões harmonicas D, 4',C',B',e D,4'",C",B' (45), (fig. 23), coincidem dois pontos homologos em D; logo as rectas 4/4", B'B", e CC" concorrerão no mesmo ponto «. O ponto O da intersec- ção das duas cordas 4'B', A'B” existe na corda de contacto MM"; por- que a recta tirada por «,e O passa por (', e C". Reciprocamente: Se tirarmos duas cordas que se cortem 4'B”, e B'4"; e seguidamente as secantes 4'B', AB", A'A'!, e B'B”; e pelo ponto «, onde estas ultimas se intersectarem, for tirada a secante «O; digo que esta recta «O comprehenderá a corda de contacto MN re- lativa ao ponto D. As cordas 4'B', e 4'B” serão divididas harmonicamente pelo ponto 7), e recta «O, parallela ás cordas conjugadas com o diametro que passar pelo ponto 7. 52 Theor. Se em uma conica for inscripto um triangulo qual- quer, digo que dois de seus lados dividirão harmonicamente o dia- metro conjugado com o 3.º Com elfeito, sejam MNP (fig. 24) o triangulo dado, e 4B o diametro conjugado com o lado MAN; tire-se a corda PQ parallela a 24 ESTUDO SYNTHETICO MN; e seguidamente a corda NQ : as duas rectas MP, e NQ concor- rerão no mesmo ponto /) do diametro 4B (24); as diagonaes do tra- pesio PMQN tambem concorrerão no mesmo ponto O do dito dia- metro; logo os pontos D, 4, O, B estarão em proporção harmo- nica (45), (51). 53 Theor. Se em uma conica for inscripto um triangulo MNP (fig. 24), e pelo ponto D em que um de seus lados, por exemplo MP, cortar o diametro conjugado com o lado MA, for tirada uma recta DX parallela ao dito lado MN, digo que o 3.º lado NP, ficará dividido harmonicamente pelos pontos U, e O em que for cortado pela dicta recta e diametro. E' evidente, visto serem homographicas as divisões U, P, O, N, e D, E, O, F; e esta ultima ser harmonica. 94 Corol. Todas as cordas d'uma conica tiradas pelo mesmo ponto d'um de seus diametros, serão divididas harmonicamente pelo dito ponto, e por aquelles em que forem cortadas pela parallela ás cor- das conjugadas com o dito diametro, conduzida pelo conjugado harmo- nico do referido ponto em relação ao mesmo diametro. Considerando v. g. as duas cordas PN, e P'N' (fig. 24), e tiran- do a corda N'M' conjugada com o diametro 4B, a recta M'P! pas- sará pelo ponto 7), conjugado harmonico de O em relação ao diame- tro 4B; e recair-se-ha na proposição antecedente. 55 Theor. Se por um ponto qualquer O interior a uma coni- ca (fig. 24), forem tiradas differentes cordas PNY, P'N', P'N”, ete., as rectas que unirem dois a dois os diflerentes pontos em que estas cortarem a conica, concorrerão em pontos situados em linha recta, a qual será parallela ás cordas conjugadas com o diametro que passar pelo dito ponto. Este ponto e aquella recta dividirão harmonicamente o referido diametro. Com efeito, tirando pelo ponto O o diametro 4B, e pelo ponto D, conjugado harmonico de O em relação ão mesmo diametro, a re- cta DX parallela ás suas cordas conjugadas, os pontos U, U”, etc. em que esta recta cortar as cordas PN, P'N, etc. serão conjugados har- monicos de O em relação ás mesmas cordas; logo em relação a duas d'estas cordas, v. g. PN, P'N', as rectas UU, PP', NN!' concorre- rão no mesmo ponto, visto serem homographicas as divisões U, P, O, N, e U', P', O, N', coincidindo dois pontos homologos no mesmo pon- to O. Tambem é facil reconhecer que as rectas N'P, e NP' concorre- rão sobre a recta UU. Por quanto, se tirarmos a recta JO, obter-se- SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 25 ha o feixe harmonico INOPU, cortado pela recta N'P, em que o ponto 7! será o conjugado harmonico de S em relação á corda N'P; porém, como é sabido, tambem é conjugado d'este ponto .$ em rela- ção á mesma corda V'P, aquelle onde concorrem as rectas NP,eNP'. As proposições (51), e (55) podem comprehender-se no seguinte enunciado. 56 Se por um ponto interior ou exterior a uma conica, forem tiradas varias secantes á dita conica, as rectas que unirem dois a dois os quatro pontos de intersecção de quaesquer duas com a mesma co- nica, concorrerão em uma recta determinada. Esta recta chama-se polar. Aquelle ponto commum de todas as secantes chama-se po(o. As noções de polo e polar são associadas; cada uma d'ellas sup- põe a outra. Vê-se pois, que o polo e sua polar em relação a uma conica, go- sam da propriedade de que, toda a recta tirada do polo até á polar, será dividida harmonicamente pelos dois pontos em que for cortada pela conica. 57 Theor. A polar relativa a um ponto interior ou exterior d'uma conica, é o logar geometrico dos vertices dos angulos cireumscri- ptos á mesma conica, cujas cordas de contacto passam pelo dito ponto. Se tirarmos duas secantes pelo referido ponto, as rectas que uni- rem dois a dois os pontos em que as mesmas secantes cortarem a co- nica, concorrerão na polar respectiva: mas quando uma d'aquellas se- cantes girar para a outra em torno do polo, approximando-se della mais e mais, as outras rectas, egualmente moveis, não cessarão de con- correr na mesma polar: tal se verificará pois no limite, quando as duas secantes se confundirem, e aquellas rectas se tornarem tangentes á conica nos extremos da secante fixa. 58 Schol. A recta que unir os polos d'outras duas em relação a uma conica, será a polar da intersecção d'essas duas. Com effeito, tirando rectas dos ditos polos para aquella inter- secção, cada uma d'estas duas rectas ficará dividida harmonicamente pelos dois pontos em que respectivamente cortarem a conica. 59 Schol. As polares de todos os pontos d'uma recta passam todas pelo polo da dita recta. 60 Probl. Dado o polo; ou polar d'uma conica, achar a polar, ou polo respectivo. Resolve-se este problema de diversos modos, tendo presentes as proposições (56), (57), (58), e (59). MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. WI. P. IL. = 26 ESTUDO SYNTHETICO 61 Probl. Tirar duas tangentes a uma conica em dois de seus pontos. Sejam, M, N (fig. 25) os pontos dados. Tirem-se a corda MN, a sua parallela M'N', o diametro conjugado 4B, a corda M'C, e final- mente a secante NV'P. O ponto 7 onde se encontram os prolongamen- tos d'esta secante e d'aquelle diametro, será o ponto de concurso das tangentes pedidas (52), e (57). 62 Probl. Por um ponto exterior a uma circumferencia tirar uma secante que vá até á parte concava da mesma circumferencia, de modo que seus dois segmentos tenham entre si uma razão dada. Seja D (fig. 26) o ponto exterior á circumferencia dada. Tire-se a secante DB, passando pelo centro; e divida-se o diametro 4B na relação dada = : levante-se a perpendicular QS ao diametro 4B; e tirem-se as cordas S4, e SB, assim cômo a polar PP! do ponto D:- tome-se S4'== CP; e tire-se 4'B' parallela a 4B. Finalmente toman- do a grandeza SB' no compasso, e fazendo centro em C, descreva-se uma circumferencia, a qual cortará a cireumferencia dada em dois pontos x, e x”; digo que as rectas Dx, e Dx! resolverão o problema. Com effeito, a corda Cx passa pelo ponto i em que a secante Da! corta a circumferencia (52); e ter-se-ha Di q ; Dig mas Manto so Ca Co OD nO as a E = E RR logo Di m Do nº 1 63 Theor. Se pelo polo d'uma conica em relação a uma recta, tirarmos raios para os differentes pontos d'esta, formar-se-ha um feixe homographico com o que se formar no mesmo polo com as polares relativas áquelles pontos. Sejam (fig. 27), O o polo da conica M em relação á recta GH, e 44, BB', CC, etc. as polares da mesma conica em relação aos pon- tos «, 6, y, etc.: tirem-se as rectas Ox, 06, Oy, etc.; e bem assim as rectas O'x, 06, O'y, ete., passando estas pelo centro O! da conica. SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 27 As rectas 44", e O'x teem as direcções de dois diametros conju- gados (28), (57), logo são homographicos os feixes OAB... e O'0&... (39); mas o feixe 06... é homographico com o feixe 0: ..., logo são ho- mographicos os feixes ru AB E (Ora 64 Theor. O producto das distancias de qualquer ponto d'uma conica a dois lados oppostos d'um quadrilatero inscripto, é para o pro- ducto das distancias do mesmo ponto aos outros dois lados n'uma ra- zão constante. Sejam 040'B (fig. 28) o quadrilatero inscripto á conica, e 7» um ponto qualquer da mesma conica: d'este ponto abaixem-se rectas respectivamente perpendiculares aos quatro lados do quadrilatero. Re- putando os pontos O, e O' centros dos feixes geradores, n'estes serão respectivamente homologos os raios fixos 04, O'4; OB, O'B, assim como os raios moveis Om, e O'm; e ter-se-ha ma coma! 1 ma . mb! == ou — , mb mk! ma! .m6 Se a conica fôr uma circumferencia, e sobre o raio O'm tomar- mos a grandeza O'm == Om; ter-se-ha ma! mb! ma mi! a!! A ooo (ais ml! qg!! mé!” Sm 1 As razões anharmonicas d'um feixe de quatro rectas, poder sempre exprimir- se pela razão das distancias de qualquer ponto d'um de seus raios a dois dos outros raios, dividida pela razão das distancias de qualquer ponto do quarto raio aos mesmos dois. Sejam m, e n (fig. 29) dois pontos tomados arbitrariamente em dois raios do feixe O; destes pontos abaixem-se sobre os outros raios as perpendiculares mx, mê, nx,, nó,; ter-se-ha mb mê ma ma nb n6, ? ma na, ? lógo ma na ma na, mb nb me: n6, ps x 28 ESTUDO SYNTHETICO porém os angulos m04, e mO'4, mOB, e mO'B são respectivamente eguaes ou supplementares; logo ma =ma!; mb==m8": por tanto )== 1; e finalmente ma ma! Se o OU ma « mE! == mg ma! ; m mê o que prova que na circumferencia, o producto das distancias de qual- quer de seus pontos a dois lados oppostos d'um quadrilatero inscripto, é egual ao producto das distancias do mesmo ponto aos outros dois lados do mesmo quadrilatero. : 65 Theor. Os seis pontos em que uma transversal corta uma conica e os quatro lados d'um quadrilatero inscripto, estão em invo- lução. | Representem O, e O' (fig. 30) os centros dos feixes geradores Supponha-se outro feixe homographico com o primeiro, e que o ponto m seja a intersecção de dois raios homologos d'ambos os feixes; ter-se-ha tambem ma! na” ma! na! mb" mb! ml nb! logo ma na, ma! nal! m6"n6” mé!” n6 ou é ma ma na, no! mê mé! (a “nlgu) Se m designar sempre a intersecção de dois raios homologos de dois feixes homo- graphicos de qualquer numero de raios, ter-se-ha, quaesquer que sejam os raios fixos ou de comparação, 04, OB; O'4!, O'B' ma mo! == E -=5 m6 mé! o que prova que a razão entre as distancias da intersecção de dois raios homologos de dois feixes homographicos a dois raios quaesquer d'um dos feixes, dividida pela razão das distancias do mesmo ponto aos dois raios respectivamente homologos do outro, é constante. SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 29 da conica; e considerem-se estes feixes cortados pela recta LM. Nas duas divisões homographicas existentes sobre esta recta, e de que são pontos duplos e e f, serão respectivamente homologos os pontos a, a”; b, 6; e logo estarão em involução os seis pontos conjugados dois a dois a, b'; a!, b; e, f Designando por « o ponto central da involucão, ter-se-ha aa eb == aa! . ab == ae . af: logo as tres circumferencias descriptas sobre os tres diametros ab, ab, ef cortam-se mutuamente nos mesmos dois pontos. 66 Theor. Em uma conica do 1.º, ou 3.º genero a razão entre o quadrado d'uma semicorda, e o producto dos dois segmentos do seu diametro conjugado é constante. Sejam MN, M'N' (fig. 31) duas cordas conjugadas com o diame- tro 4B. Tirem-se as cordas 4M', e BM': os pontos u, e H dividirão harmonicamente a corda MN (48), e ter-se-ha PRE Pis PEbx certo (a) Pu: PM':: AP: AP, ii, Pu PM: des AP) mas tambem é PH: PM':: BP: BP':; logo BP , Dia Ma (c) e finalmente, comparando (a), (4), e (c), 2 ==> P; 'M' PA. PB E PE PA. PB" ou 2 PM PM PA.PB PA.PB''': (d) 30 ESTUDO SYNTHETICO PM == ESSO VOLS PA.P'B 67 Representando por p a quantidade constante se-ha PM=p.P4. PB. O valor de p póde determinar-se por meio de qualquer semicor- da, e dos respectivos segmentos do seu diametro conjugado. Nas conicas do 1.º genero, designando por 4 a semicorda que passa pelo centro, e por a o semidiametro conjugado ; ter-se-ha PA.PB=— e. : e finalmente PH AP PRM a2 Nas conicas do 2.º genero, o extremo B do diametro 4B está no infinito, circumstancia que muda a equação (d) na seguinte MARA pn prai Pic AP ART Ap OS Nas conicas do 2.º genero, a razão entre o quadrado da semi- corda e o segmento correspondente do seu diametro conjugado, é cons- tante. Designando esta razão por p; ter-se-ha Esta equação mostra ser p a terceira proporcional a 4P, e MP. A grandeza linear de p determina-se facilmente, descrevendo d'um ponto qualquer ? do diametro 4X como centro (fig. 32), e com um raio egual á semicorda conjugada PM o arco de circulo MS; e ti- rando pelo ponto $ a recta .SQ parallela a 4M. Com effeito; é AP: PM:: PM: PQ, donde PM= PQ. AP; logo p= PQ. Nas conicas do 3.º genero a constante p tem signal contrario ao que tem nas do 1.º N'estas o ponto P acha-se entre os extremos 4, SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 31 e B do diametro, em quanto que n'aquellas existe além de ambos os extremos. Logo, designando ainda por a o semidiametro 4B destas coni- 2 b cas, e fazendo p ==: ter-se-ha a? —— 2 2 PM = AP.BP.... (3) As quantidades a, e » nas conicas do 1.º genero representam os semidiametros conjugados, dos um quaes é parallelo á semicorda PM. Nas conicas do 3.º genero, attribue-se por analogia a mesma significação á grandeza », posto que n'estas curvas o diametro parallelo á corda PM, contida no mesmo ramo, as não encontre. 68 Thcor. Nas conicas do 3.º genero a tangente em um dos extremos de qualquer diametro, contada desde o ponto de contacto até aquelles em que encontra as assimptotas, é egual ao semidiametro d. Seja OM (fig. 33) uma secante conduzida por qualquer ponto 17 da curva e pelo centro d'esta. Tirem-se o diametro 4B, a tangente AT em seu extremo 4, a corda MN conjugada com o dito diame- tro, bem como a assimptota OD; e designe c o comprimento 4Z: ter-se-ha PM: PO:: AL: ÃO d'onde Pu LE Po: a2 mas é tambem = Ss) PO AP.BPta'; - logo PM—(AP.BP+e)S: [1 e visto ser Pu= O AP.BP; ter-se-ha AP.BP.bB=(AP.BP-+a')e: d'onde a2 c2 b2—c? CEM PA is DE 32 ESTUDO SYNTHETICO Ora n'estas conicas o producto 4P. BP é sempre positivo; logo é b o maior valor que póde ter c. N'este limite, 4P.BP-—= o; logo 4P== 0, BP-— o; e por tanto 4L == 4G, isto é b == AG. 69 Probl. Dada uma conica do 3.º genero traçar as suas as- simptotas. Tirem-se duas cordas parallelas VM, N'M' (fig. 33), e seguida- mente o respectivo diametro conjugado: determine-se o meio d'este, ou centro O da conica; descreva-se uma circumferencia com o dia- metro BP ; levante-se a perpendicular 4Q a este diametro ; marque-se a grandeza 4Q' == PQ; e na tangente á conica tirada pelo ponto 4, marquem-se as grandezas 47, e 4T' eguaes entre si ea PM; tirem-se as rectas Q'T, e Q'T': finalmente pelo centro da conica tirem-se as rectas OD, e OD! respectivamente parallelas a Q'7, e Q'T”, as quaes serão as assimptotas procuradas. Com efeito, AQ'— AP. BP; mas AQ': AO :: AT: ÀG, ou AQ':a:: PM: AG, logo — q.PM, dBi AP.BP' e finalmente AG =D. 70 As conicas e as secções conicas são curvas identicas. Sobre o maior dos dois eixos das conicas do 1.º genero, ou sobre o eixo real das conicas do 3.º como diametro (fig. 34), descreva-se uma circumferencia de circulo; e seja MP uma semicorda conjugada com o diametro ou eixo 4B: tire-se a tangente em M; e nos pontos D, e E onde esta encontra a circumferencia, tirem-se as respectivas perpen- diculares DF, e EF'; e finalmente dos pontos F, e F' tirem-se as re- ctas FM, e F'M. à Os pontos 7, D, M, e E estarão em proporção harmonica (49), (50), (56); logo TD MD SOBRE AS SECÇÕES CONICAS. [e Co Os triangulos MDF, e MEF! são semelhantes, visto ser e por conseguinte E DMF —= EMF! == HMD : a DFM = MF'E == MHD Ora, a perpendicular baixada do centro € da circumferencia so- bre a corda DE, passa pelo meio d'esta corda, e é parallela ás rectas Dk, e EF; logo CF==CF. Designando a distancia CF por c, deduzir-se-ha do triangulo FMH' MEA ME =2 MC+2 CE=2 MP+2 PO+2€ MPR — ME =ShésiGPis oh patroa duran o Nas conicas do 1.º genero tem-se ME+MF'==2a; logo ' 2 ME'— ME?" El. (4) e por tanto Mpicesaa eae. ME a —* =, a d'onde —— a ME — 20. E MFE'-=a* + 2c. à. GP , Sommando. estas equações, obtem-se 202. is MF + MF 20º +22 -CÊ Ur MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — To. III. P. IL. 34 ESTUDO SYNTHETICO e comparando esta com a 1.º das equações (e), obter-se-ha —» c2. CP a2 =—MP+PÉre, q + d'onde a2— c2 mas 4º — Po AP.PB D) ? (a? — PC) e hA 2 a logo a2— c2 ——s E AP.PB--MP ; e visto que Mp — É AP.PB (equac. 1), Pp: a ter-se-ha finalmente Conclue-se pois que, os dois pontos F e F' do eixo 4B, são fixos; e logo as conicas do 1.º genero gosam de propriedade de que, a somma das distancias de cada ponto a dois pontos fixos do eixo maior é constante, e egual ao mesmo eixo maior. As conicas do 1.º genero são pois ellipses., Os dois pontos F, e F' são os focos. As rectas MF, e MF" são os raios vectores. Nas conicas do 3.º genero, tem-se q MF — MF == 2a, que combinada com a segunda das equações (e), conduz á equação ME! + Mp — ECT, logo Mire ca eMeB pe paes Cr, a 4) quadrando estas equações, e sommando-as depois, obter-se-ha 2 i 26º. CP dei =" US Re c2. Mk +ME'—24+5 a e comparando esta com a 1.º das equações (e) deduzir-se-ha 2 PP2 sy —— Pig Ca — MP. PC Ee, a: SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 35 d'onde OR <2eBiO ly ESTE Pensar = (à—PC)=MP ; a mas PA.PB- PÉ a, logo 2 E PA PRES PM: na (E a2 e finalmente cats db, As conicas do 3.º genero são pois hyperboles. Como as conicas do 2.º genero podem reputar-se do 1.º, suppon- do o eixo maior infinito, a circumferencia circumscripta a qualquer d'ellas, tendo por diametro o respectivo eixo, será uma linha recta 4Y (fig. 32 bis) tangente á dita conica no extremo accessivel do eixo. Por con- seguinte a perpendicular DK a qualquer tangente d'estas conicas, ti- rada no ponto 7) onde a dita tangente encontra a recta 4Y, passará sempre pelo mesmo ponto F. Ora TA AP (47), logo TD == DM. Tirando pois a recta MJ, parallela a 4P, e unindo o ponto Z, onde esta parallela encontra o prolongamento de DF, com o ponto 7, obter-se-hão os triangulos rectangulos eguaes DM, e TDF, d'onde HD — DF, e por conseguinte MH == MF. Emfim, como o ponto K seja fixo, o ponto /) percorra a recta 4Y, e seja DF — DH, segue-se que tambem o ponto H percorrerá a re- cta fixa B/7, a que se chama directriz. As curvas do 2.º genero são pois parabolas. 71 As conicas gozam da propriedade de que, as tangentes em qualquer de seus pontos, dividem em dois eguaes o angulo formado pe- los raios vectores do dito ponto, ou por um d'estes raios e o prolon- gamento do outro. Nas conicas do 2.º genero um dos focos existe no infinito, e por conseguinte o raio vector correspondente é parallelo ao eixo. 72 Obs. A propriedade geral das tangentes (71), verificada nos tres generos das conicas, deriva d'um certo modo de geração que sendo commum a estas curvas, convém ainda a uma infinidade de outras. As conicas são curvas cujos pontos distam egualmente d'um ponto fixo, e 5 36 ESTUDO SYNTHETICO duma linha egualmente fixa. O ponto fixo é um de seus focos; a li- nha fixa é a circumferencia descripta do outro foco com um raio egual ao eixo maior. Na parabola o ponto fixo é o foco accessivel; e a linha fixa (circumferencia descripta do outro foco com um raio egual ao eixo maior) é a directriz. E facil reconhecer, com effeito, que as tangentes das curvas as- sim descriptas, ou sugeitas a este modo commum de geração, dividem ao meio o angulo formado no ponto de contacto pelas distancias d'este ponto á linha directriz, e ao ponto fixo * 13 Quando em uma conica se inscrever um hexagono, e de dois vertices d'este se tirarem rectas para os outros quatro, formar-se-hão dois feixes homographicos: é porém sabido, que, em dois feixes homogra- phicos as rectas conduzidas pelas intersecções de dois raios com os seus homologos, tomados inversamente, concorrem no mesmo ponto, quaes- quer que sejam os ditos raios: poder-se-ha pois, variando a escolha dos vertices tomados para centros dos dois feixes, deduzir diversas pro- priedades relativas ás intersecções dos lados e diagonaes do hexagono inscripto. Assim, tomando para centros dos feixes os dois vertices B, E (fig. 36), serão homographicos os feixes BACDF, e EACDF; mas este é homographico com EFDCA ; logo são homographicos os feixes BACDF EFDCA ! Seja AX (fig. 35) uma curva cujos pontos distam egualmente do foco F, e da curva arbitraria A'X'. Tirem-se a secante MN, os raios vectores MF, NF, e as distancias MM, e NN! ou normaes à curva A!X!. Marque-se N'p==MM', Fy==FM; e tirem-se as rectas Mp, e Mg: ter-se-ha FM=MM'; FN=NN'; d'onde FN— FU=NN' — MM', ou Ny= Np- Se fizermos convergir o ponto N para M, os dois angulos MpN, e MqN convergi- rão para rectos; por quanto as duas linhas MM', e NN' caminham para o parallelismo, e como a corda M'N' n'esse limite se torne perpendicular a MM", o mesmo succederá a Mp relativamente a NN'. No triangulo MFq, o angulo F convergirá para zero, logo a somma dos dois angulos eguaes FMg, e FqM convergirá para 180º, e por conseguinte cada um dºelles para 90º. No dito limite à corda MN tornar-se-ha tangente à curva; mas então os dois trian- gulos rectangulos MNp, e MN serão eguaes, visto ser commum a hypothenusa MN, e eguaes os lados Np, e Ng: e logo no dito limite, serão eguaes os angulos MNg, e MNp. SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 37 Ora os centros que ha a considerar, para deduzir todas as com- binações possiveis, são: B, E; B, F; e B,C; separados por dois ver- tices, por um vertice, ou contiguos. Haverá pois os tres seguintes grupos, e suas respectivas combi- nações : BACDF BACDE ACDEF EFDCA FEDCA BFEDC he BC, BA BC, BA AD, AC ra: | pe DS PAR | 2 2 O E 2 E a BD, RA (BD, BA AE, AC intao ERG EG chi iRE gURO trip Bi Da BF , BA4 (BE , BA $/ joe ER VE bp Ti 1 SD AN ER BD, BC BD, BC AE, AD E ds ED DECS TE OP ED RO "ivioj BEN, “BD: E BF , BC os BC (AF, AD ae É BORA ED BAR a BE a ER , BD (BE, BD AF, AE RN EC EA RC EA (BD, BC As combinações 3.º c 4.º do 1.º grupo, determinam as rectas CD, e AF, a cujo concurso G vão ter as rectas que passam pelas in- tersecções das rectas designadas nas outras combinações do mesmo grupo. As combinacões 3.º, e 4.º do 2.º grupo determinam as rectas 4E, e CD. As combinações 3.º e 4.º do 3.º grupo determinam as rectas CF, e DE. Umas e outras representam nos respectivos grupos o mes- mo papel que CD, e A4F representam no is; Posto isto, numerando, e notando os diversos lados e diagonaes de hexagono inscripto, como se vê na fig. 36, e entendendo-se pela nota- cão [4, b; c, d; e, f| que estão em linha recta as tres intersecções — da recta a com a recta b, da recta c, com d, e da recta c com /: de- duzir-se-hão as seguintes combinações, que importam outras tantas pro- priedades do hexagono inscripto : 38 ESTUDO SYNTHETICO dota lpAà +9 BB 36 REA ad ÃO, ( (Goo murado) ] (1),(3 ]: ER alia (2: Be. [4,800249,0)); (AMA DEL. TAL: (1, : (A PAIS Ee MAÇA SLI E TR DS qa ça Ea (1,2) ]: BS JS 0),5 0; NOME So ICS (SNL; A IE TUA), s (MB): ADE TA(4): 2,3 5 BM A 1.º d'estas proposições diz-nos que, os lados oppostos do hexagono inscripto a uma conica, concorrem em pontos situados em linha recta. As mais proposições teem enunciados complicados, que é inutil produzir. Ellas podem comprehender-se todas na 1.º, considerando no- vos hexagonos formados por seis linhas contiguas, tomadas d'entre os lados e diagonaes do primittivo hexagono. Esta proposição, que subsiste, pois, qualquer que seja a posição relativa dos seis vertices 4, B, C, D, E, e F do hexagono 'inscripto, e que se applica como caso particular ao systema de duas linhas re- ctas 4H, e BD (fig. 37) tracadas em um plano, é uma das mais fecundas que existem sobre as secções conicas. Ella foi enunciada a 1.º vez por Pascal em seu ensaio sobre as conicas. Segundo Leibnitz, esta propriedade não é senão a do hexagrammum mysticum sobre a qual compoz Pascal um tratado completo das secções conicas, que não ha chegado até nós. Foi depois reproduzida sob differentes fórmas por um grande numero de geometras, principalmente por Mac-Laurin, R. Simson, Carnot, Poncellet, e ultimamente por mr. Chasles. Brianchon estabeleceu sobre o principio de Pascal toda a theoria dos polos e po- lares das secções conicas, e das superficies de segunda ordem. 74 Probl. Dados cinco pontos d'uma conica construir um 6.º ponto da mesma conica. Sejam 4, B, €, D e E (fig. 38) os cinco pontos dados, e suppo- nha-se que se pretende um novo ponto sobre a recta CX. Tracem-se E rectas contiguas 4B, BE, ED,e DC; determinem-se as intersecções + 4; 2, 5,ou os pontos a, b; ache-se o ponto c, intersecção da re- R E) com o lado 3; e analise trace-se a recta 4c, cuja intersec- ção com Cr determinará o ponto M pedido. — É evidente em virtude da proposição Em O Da 6]. 15 Theor. NE tres diagonaes que unem os vertices oppostos de um hexagono cireumscripto a uma conica, concorrem no mesmo ponto. SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 39 / Com effeito, o ponto p (fig. 39) é o polo de BE; |! é o polo de CF; logo a mine : das diagonaes BE, e CF é o polo de pp' (58). AD é a polar de p''; mas os tres pontos q, |, p estão em linha re- cta (73), e além d'isso a polar de qualquer ponto da recta pp passa por à (59); logo 4D passa por i. 76 Probl. Dado um pentagono circumscripto a uma conica, ti- rar novas tangentes á mesma conica, ou descrever a conica elemento por elemento. Seja 4BCDG (fig. 40) o pentagono circumscripto, e supponha-se que se pretende a tangente que corta em K o lado DG: tirem-se as diagonaes 4D, e BE, as quaes determinarão a intersecção i das diago- naes do hexagono circumscripto (73); logo a recta Ci, prolongada, deter- minará o vertice W do dito hexagono, ou novo ponto da Finaepis pedida. 77 Theor. Se numerarmos seguidamente Ins dg eds nos ver- tices d'um pentagono circumscripto a uma conica, digo du concorre- rão no mesmo ponto as diagonaes 13, 25, e a corda que unir o ver- tice 4 ao ponto de contacto do lado 12. Considere-se o hexagono circumscripto 4B 2345 (fig.41);n'este as diagonaes 43, B4, 25, deverão intersectar-seno mesmo ponto, qual- quer que seja a grandeza dos lados do dito hexagono (75); supponha-se pois que o lado 4B rola sobre a conica até se confundir com a tan- gente 12, o ponto B caminhará para O, ao mesmo tempo que 4 ca- minhar para |; sendo O, e | respectivamente as posições limites dos ditos pontos B,e 4:0 lado 2B diminuirá até se tornar 20; o lado AB tornar-se-ha Ol; e finalmente o lado 54 mudar-se-ha em 51: emfim o novo hexagono será 102345,e por conseguinte concorre- rão no mesmo ponto as diagonaes 13, 04, 25. 78 Obs. Quando for dado o pentagono que deve circumscrever uma conica, poder-se-ha determinar tantas tangentes á dita conica quan- tas se quizer (76): e se pretendermos tambem os pontos de conta- cto das novas tangentes, o que completa os dados precisos para obter o traçado da referida conica, recorreremos á proposição (77) que nos indica o seguinte processo. Supponha-se que o pentagono primittivo é CA4543 (fig. 41), e que se pretende o ponto de contacto da nova tan- gente 2B: determinaremos o ponto 1, prolongando 5.4, e 2B; traça- remos 13, e 25, as quaes determinarão o ponto i; e tirando emfim a recta 4i, esta determinará o ponto pedido O. 40 ESTUDO SYNTHETICO 79 Relativamente ao pentagono, quadrilatero, e triangulo ins- criptos, tambem ha grupos de intersecções ternarias em linha recta, que é importante conhecer. Deduzem-se estes grupos mui facilmente, considerando o hexagono inscripto; e reduzindo um, dois, ou tres de seus lados a zero, fazendo-os girar em torno d'um de seus extremos respectivamente até que tomem a direcção tangencial. O primittivo hexagono é assim reduzido a pentagono, quadrila- tero, ou triangulo inscripto, sem que cesse de lhe serem applicaveis as propriedades geraes do mesmo hexagono. Com quanto a grandeza d'alguns lados do referido hexagono se tenha reduzido a zero, a direcção d'esses lados não subsiste menos ; ella é a das tangentes á conica nos vertices sobre que giraram os mes- mos lados. Deduz-se assim dos grupos (73), comparando as figuras 36 e 42, empregando a notação da ultima, e mudando successivamente as lettras dos vertices, escrevendo no vertice duplo ora 4B, ora BC, etc. em lo- gar de 4H A aro Dios auto] [08 vie Diruê pelo) 184 [1),1)); (1,((15 (1),6] th Logan ga, [8 (du 6 (4) 5, 447,8 Concursos rectilineos | [2,(1 ; O(S vibi,d] do pentagono Piso; (1,(1); 6,((1] is 5 D,(1); 6,1))] Ed 5 51); (1.(1] [6,4 PN 1),1))] UUAS o qa ; 1),(1)] 80 Obs. Destas diversas proposições de concurso derivam ou- tras de parallelismo. Se, v. gr., duas das tres rectas PQ, MN, e DC (fig. 42) forem parallelas entre si, tambem a terceira lhes será pa- rallela. Reduzindo dois lados contiguos ou descontiguos do hexagono ins- SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 41 cripto a uma conica obteem-se os quadrilateros inscriptos (fig. 43, 44), acompanhados das tangentes que assignam as direcções limites dos Ja- dos reduzidos. A respeito d'estes quadrilateros dão-se os seguintes casos de con- curso | (Ls 25 5 dado o Quadrilateros com as tangentes de 5 ty E = dois vertices contiguos (fig. 43) [3, 6; 2,1); 4,(1 ] (4) TE 2,4; (1,1); 1,5] a NES Eos AOS DN ps 8º Quadrilateros com as tangentes de , [1,4 ! 2,5) 2 3,6 ] EB) s dois vertices discontiguos (fig. 44) | [1,5 - 2,64; (1,1 )] | St Corol. 1.º As diagonaes de dois quadrilateros, um circums- cripto, e outro inscripto a uma conica, taes que os vertices d'este se- jam os pontos de contacto dos lados d'aquelle intersectam-se no mesmo ponto. Considerando as duas tangentes contiguas 4a, e Ad (fig. 45), resulta das proposições (4), o acharem-se em linha recta 4, ,, e p”: mas considerando as tangentes contiguas Cb, e Cc resulta das mesmas proposições que tambem estão em linha recta os tres pontos p, p”, e C: conclue-se pois, que os quatro pontos 4, C, p, e |” estão em linha re- eta. Prova-se d'um modo semelhante que os quatro pontos B, D, 6, e o tambem estão em linha recta ; logo etc. Esta proposição tambem se póde demonstrar do seguinte modo : Considerando o quadrilatero 1 3 4 6 (fig. 45 bis) como um verda- deiro hexagono, em que cada um dos dois lados 13, 46 representa dois de seus lados contiguos, tendo respectivamente por vertices communs os dois pontos 2 2, 5, conclue-se que concorrem no mesmo ponto as diagonaes 14, 25,e 36. Mas se reputarmos duplos os lados 34,e 16, tendo por vertices communs respectivamente os pontos 2, e 5, abneláiit se-ha que tambem se intersectam no mesmo o ponto as diagonaes EA, 36, e 25 9,; d'onde finalmente, as diagonaes 14 sas 36, e 25 5, inter- sectam- se em um só ponto. 82 Corol. 2º Os pontos de concurso dos lados oppostos de dois quadrilateros, um EnsCuIptO; e outro circumscripto a uma conica, taes MEM, DA ACAD. — [,º CLASSE. — T. III. P. II. 6 42 ESTUDO SYNTHETICO que os vertices d'aquelle sejam os pontos de contacto dos lados d'este, estão em linha recta. Os pontos Q',(', e |” (fig. 45) estão em linha recta (80, 1.º pro- posição (B)), mas pela mesma razão tambem estão em linha recta os pontos (), 5”, e p”; logo estão em linha recta os pontos Q, Q',,',ep!”. D'outro modo : O ponto p da intersecção das duas diagonaes bd e ac é polo da recta QQ'; o mesmo ponto p é polo da recta 6!" (56); logo os pon- tos p', p”, Q, e Q' estão em linha recta. 83 Corol. 3.º As diagonaes dos quadrilateros formados por dois lados oppostos do quadrilatero circumscripto, e dois lados oppostos do quadrilatero inscripto a uma conica, taes que os vertices deste sejam os pontos de contacto dos lados d'aquelle, cortam-se mutuamente na intersecção commum das diagonaes d'estes ultimos. Com efleito, em virtude da 2.º proposição (B), a recta JG passa pela intersecção das diagonaes ac, db; logo as diagonaes do quadri- latero Gdlb passam por p. 84 Thcor. Em dois triangulos, um inscripto e outro circums- cripto a uma conica, taes que os vertices d'aquelle sejam os pontos de contacto dos lados d'este, os lados respectivamente oppostos d'um e outro intersectam-se sobre a mesma recta. Os dois triangulos 4BC, abc (fig. 46) constituem um hexagono em que os lados do triangulo circumscripto representam as direcções limites de tres lados reduzidos. Cada um dos vertices do triangulo ins- cripto é vertice duplo do referido hexagono. Numerando pois os seus lados como se acha executado n'esta figura, reconhecer-se-ha, que, bas- tará applicar a este hexagono a proposição [1,4; 2,5; 3,6] para de- duzir a proposição actual. D'outro modo: 4a é a polar de |! (51), (57), Cc é a polar de ; logo a recta po é a polar de é (58); mas no angulo 4BC, cortado pe- las transversaes 45”, e c!!,é a recta Bia polar de 5”, em quanto que na conica é Bb a polar de p!'; logo os tres pontos B, à, e b estão em linha recta. E visto que Bb é a polar de e! e da é a polar de p', segue-se que pp" é a polar de i; por tanto os tres pontos p, p', e p'! estão em linha recta. Conclue-se ao mesmo tempo que, as rectas que unirem os ver- tices oppostos de dois triangulos, um inscripto e outro circumscri- pto a uma conica, taes que os vertices do primeiro sejam os pontos de contacto dos lados do segundo, se intersectam no mesmo ponto. [eo] SOBRE AS SECÇÕES CONICAS SEGUNDA PARTE ESTUDO SOBRE DUAS CONICAS 85 Já vimos que duas conicas não podem ter mais de quatro pontos communs sem se confundirem. É tambem facil reconhecer que o numero de pontos communs a duas conicas distinctas é sempre par, dois, ou quatro. Esta assercção é evidente quando uma das conicas fôr fechada, isto é, do 1.º ou 2.º genero. E não é difficil verificar a sua exactidão quando ambas as conicas forem do 3.º genero, considerando as assimptotas d'uma e outra, nos diversos casos de sua direcção re- lativa. 86 Tambem admittiremos ser dois ou quatro o numero das tangentes communs a duas conicas. 87 Probl. Dadas duas das intersecções de duas conicas, e tres grupos binarios de pontos d'uma e outra, em linha recta com uma das ditas intersecções, determinar as outras duas intersecções. Sejam O, e O' (fig. 47) as duas intersecções dadas, 7», 7; nm, n'; e m!, n!' os tres grupos binarios de pontos d'uma e outra conica em linha recta com a intersecção O. Tirem-se as rectas Om, O'm, e O'n, e cortem-se estas pela transversal 4B: n'esta transversal serão homographicas as duas divisões a..., e a'..., bem como as duas a..., a -..; logo tambem serão homographicas as divisões a'... e a... Mas os pontos duplos d'estas duas divisões, os quaes correspondem ás no- vas intersecções das duas conicas são determinados, pois que se conhe- cem tres systemas de pontos homologos d'ambas as divisões. 88 Theor. Se os tres lados d'um triangulo girarem em torno de pontos situados sobre os mesmos lados respectivamente, um dos ver- tices descrever uma conica passando por dois d'esses pontos, e o outro descrever outra conica passando pelo 3.º ponto e um dos 1.º, tam- bem o 3.º vertice descreverá uma conica, a qual passará por dois dos ditos pontos, e por todas as intersecções d'aquellas conicas, exceptuando a que fizer de centro de rotação. 6 + 44 ESTUDO SYNTHETICO Sejam O'40, e O"OB (fig. 48) as conicas que os vertices 4, e B do triangulo 4MB descrevem respectivamente quando os seus lados AB, AM, e MB giram em torno dos pontos O, O', e O” respectivamen- te. Ver-se-ha que o vertice M descreverá a conica O'TO", por quanto: o feixe O'4... é homographico com 04...;0 feixe OA... é homographi- co em O'B...; logo os dois feixes O'M..., e O"M... são homographi- cos; e por tanto o ponto M descreverá uma conica, a qual passará por O, 10! e É pois muito facil o traçar a conica M obrigada a passar pelos pontos 7, O',e O”, quando as duas conicas 4, e B forem dadas. Que- rendo v. gr. um ponto da nova conica sobre a recta 0'B', tiraremos do ponto B' onde esta recta encontra uma das conicas dadas, a recta B'O, a qual determinará o ponto 4' na outra conica, e tirando depois a recta O'4', esta cortará OB! no ponto pedido. 89 Seo ponto O' caminhar para 7,a conica MI tenderá a ser tangente á conica O'4 no ponto 1; verificando-se o ser-lhe tangente eflectivamente quando o ponto O! se confundir com o ponto Z. Logo: Se pretendermos traçar uma conica que seja tangente á conica 4 em qualquer ponto Z, e ao mesmo tempo passe pelo ponto exterior O”, traçaremos uma circumferencia que passe por 7 e O”, e descrevere- mos a conica M por pontos, reputando o ponto O' em Z. Este pro- blema é indeterminado, porque se podem traçar infinitas circumferen- cias ou conicas, passando pelos pontos 7, e O”. 90 O numero das condições distinctas que determinam uma co- nica é cinco. Já vimos como as conicas se descrevem quando se conhecem cinco pontos, ou cinco tangentes. Entre as cinco condições dadas podem entrar simultaneamente pontos e tangentes da conica, mas é preciso que o seu numero seja pre- cisamente cinco. Deve porém advertir-se que, quando se der por condição o ser a conica tangente a uma recta dada em certo ponto, vão ahi inclui- das duas condições; porque não só se dá um dos pontos da conica senão que tambem se dá uma tangente. Quasi todos os problemas que se podem propor sobre o traçado das conicas, sendo as condições dadas comprehendidas nos generos acima mencionados : passar por pontos dados, ou ter taes tangentes, se resol- vem pelos principios já expostos. Como exemplo apresentaremos os se- guintes problemas. SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 45 91. Probl. 4.º Traçar uma conica tangente a outra e a uma recta em pontos dados, e que passe por outro ponto tambem dado. Ha n'este enunciado cinco condições. O ser a conica pedida tan- gente a outra n'um ponto dado, equivale a ser essa conica tangente a uma recta em ponto dado; sendo esta recta a tangente á conica dada no dito ponto. Sejam (fig. 49) M a conica dada, O' o ponto em que a pedida lhe deve ser tangente, O” o ponto em que esta deve tocar a recta GJ, e finalmente 2? o ponto dado. Tirem-se a recta O'0”, que se prolongará até encontrar em Ka conica M, a corda arbitraria EO partindo do ponto K, e produzida até G;as rectas DO! e DO"; e finalmente a corda LO, prolongada até encontrar a recta DO”. Pelos pontos O, O', O", P, e G conduza-se a respectiva conica, seguindo-se um dos processos (11), e (74), e em- pregando a conica auxiliar O'O"P, tragar-se-ha a conica O'0"D, tan- gente em O! á conica M, e passando pelo ponto O” (88). 92 Se além do ponto dado a conica pedida devesse tocar duas conicas em pontos dados, seria preciso, para reduzir este problema ao antecedente, tirar a tangente d'uma das conicas no respectivo ponto de contacto. 93 Se em logar das duas conicas se dessem duas tangentes com os respectivos pontos de contacto, tambem levariamos a solução d'este problema ao (91), substituindo a conica M por uma circumferencia arbitraria tangente em O! á recta dada. 94 Probl. 2.º Traçar uma conica que passe por quatro pontos dados, e seja tangente a uma recta egualmente dada. Sejam 4, €,C',e B (fig. 50) os quatro pontos dados, e LT a tan- gente. Tomem-se os dois pontos C e € para centros dos feixes gera- dores, e dirijam-se os raios CÁ, C'A4, CB, e C'B; estes raios prolon- gados marcarão sobre a recta L7 dois systemas de pontos homologos de duas divisões homographicas q, a”; b, d'; os quaes bastarão para determinar o ponto central. N'este ponto central juntam-se os pontos duplos das duas divisões; visto que a dita recta é tangente á conica ; e recae-se assim no problema dos cinco pontos (11), (74). 95 Probl. 3.º Traçar uma conica que passe por dois pontos da- dos, e seja tangente a duas rectas dadas, sendo dado o ponto de con- tacto d'uma d'ellas. Sejam 4B,e CD (fig. 51) as duas tangentes, p o ponto de con- tacto duma d'ellas, », e 7% os dois pontos dados. Tomem-se os pontos mw, e p para centros dos feixes geradores, e 46 ESTUDO SYNTHETICO reputem-se estes feixes cortados pela recta 4B: produzir-se-hão os dois systemas de pontos homologos «, a!; b, b'; com os quaes se determi- nará o ponto central, ou ponto de contacto da tangente 4B. Acabe-se a solução d'este problema como em (93). 96 Probl. 4.º Traçar uma conica que passe por tres pontos da- dos, e seja tangente a uma recta dada em um ponto tambem dado. Sejam 72, 2, e p (fig. 52) os pontos dados, 4B a tangente dada, e q o ponto de contacto da referida tangente. Forme-se o quadrilatero 7»72pg, numerem-se os seus lados como: na (fig. 43), e applique-se ao dito quadrilatero a 1.º proposição (4) [1,4; 2,5; 3,6]. As rectas 3,6 determinarão o ponto C; e as rectas 2, e 5 o ponto B. Logo, tirando a recta BC, e produzindo a recta 1, obter-se-ha o ponto X por onde deverá passar a tangente á conica que se conduzir pelo ponto 72. O resto póde executar-se como em (93). 97 Probl. 5.º Inscrever uma conica em um triangulo, sendo dados os pontos de contacto de dois lados do dito triangulo. Sejam 4BC (fig. 53) o triangulo dado, a e c os pontos de con- tacto dos dois lados BC, e 4C. Tirem-se as rectas 4a e Cc, as quaes determinarão o ponto à, e seguidamente a recta Bi, que se produzirá até encontrar o lado 4C. Será b o ponto de contacto do lado 4C. Acabe-se a solução como em (93). 98 Considerem-se duas conicas de especie qualquer, e dispostas de qualquer modo, não comprehendidas uma na outra, e sejam Pp, e R'r' (fig. 54) um grupo de duas tangentes communs. Tirem-se as cordas de contacto PR, e pr', as quaes concorrerão em um certo ponto o» Pelo ponto M de concurso das ditas tangentes tire-se uma secante qualquer MT, a qual determinará os quatro pontos 7,c,(,e 7"; final- mente tirem-se tangentes ás duas conicas n'estes pontos. Quando se estuda as relações de posição das differentes rectas que compoem esta figura, e suas variantes fig. 55 e 56, deduzem-se va- rias proposições muito notaveis, que vamos apresentar, é a cujo con- juncto nós chamaremos o problema de Poncelet. 99 Theor. O ponto 6 de concurso das tangentes á conica P nos pontos 7, e é, o ponto 6 de concurso das tangentes á conica p nos pontos 4', e 7”, e o ponto M, estão em linha recta. Com effeito, o ponto 6 existe na recta PR, por ser esta a polar do ponto M em relação á conica P: o ponto 6 existe na recta py”, por ser tambem esta a polar do ponto M em relação á conica p. À divisão 6, R', L, P é harmonica, por ser Tt a polar de 6: é tam- SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 47 bem harmonica, por motivo semelhante, a divisão 6, 7”, 1/, p; mas as rectas Pp, LI”, e R'r' concorrem em M, logo tambem & concorrerá em JM. Corol. Por tanto, se a secante MT girar á roda de M, os pontos 6, e € percorrerão respectivamente as rectas PR', e pr"; logo, se as tangentes 67, e 64 d'uma das conicas concorrerem em , tambem as duas é T', e Et! concorrerão em q. Schol. 1.º Se pelo ponto p for tirada a tangente [a a uma das conicas, a recta «aM determinará os tres pontos 4, a”, &' onde tambem as tangentes tiradas ás respectivas conicas concorrerão em q. Schol. 2.º A recta AM é pois uma polar commum ás duas coni- cas em relação ao ponto p. 100 Se as duas conicas tiverem mais duas tangentes communs, o que suppõe a penetração, ou a nenhuma comunicação entre ambas fig. (55), (54), as quatro tangentes communs formarão um quadrila- tero HI H'IH circumscripto a ambas; e serão inscriptos em uma e outra os quadrilateros P'PRR'P', e p'prr'p', cujos vertices respecti- vos são os pontos de contacto dos lados do primeiro. 101 Theor. As diagonaes PR',e RP' do quadrilatero inscripto á conica P, as diagonaes p'r» e pr” do quadrilatero inscripto á conica p, e as diagonaes HH' e II! do quadrilatero circumscripto a ambas as conicas concorrem todas no ponto p. Com efTeito, concorrem no mesmo ponto as diagonaes PR', RP, HH, e II, dos quadrilateros inscripto, e circumscripto á conica P (87). Tambem, pela mesma razão, concorrem em ponto determinado, as diagonaes py”, p'r, HIT, e IT dos quadrilateros inscripto e circums- cripto á conica p; logo todas estas rectas concorrem na intersecção de HH' e IT; isto é, em um só ponto: e pois que este é determinado pela intersecção de duas quaesquer d'estas rectas, segue-se que todas concorrem no ponto p, onde se encontram as rectas PR! e pr. 102 Theor. Os pontos |! e p”, onde se intersectam os lados op- postos dos quadrilateros PP'RR'P, e pp'rr'p inscriptos respectivamente nas conicas P e p, e os pontos M e M' onde se intersectam os lados oppostos do quadrilatero JH T HI, circumscripto a ambas as conicas, estão em linha recta. Démonstra-se como precedentemente recorrendo á proposição 82. Deve porém notar-se, que, os dois pontos onde concorrem os lados op- postos do quadrilatero inscripto á conica P, são os mesmos onde con- correm os lados oppostos do inseripto a conica p; por existirem uns e outros na recta /MM', como acaba de demonstrar-se, e além d isso 48 ESTUDO SYNTHETICO existirem todos tambem nas diagonaes /7H", e 17 do quadrilatero cir- cumseripto IH HI. Schol. 1.º Os tres pontos p, p', e p! gosam da propriedade de que, cada um é em relação a qualquer das conicas o polo da recta que passa pelos outros dois. Schol 2.º Os dois pontos ,!, e 5” dividem ao mesmo tempo har- monicamente os dois segmentos ab, e «'b' (51). Logo, quando as co- nicas se cortarem só por dois pontos, um destes segmentos entrará em parte no outro, e os dois pontos ,/, e p! serão imaginarios, 103 Theor. Os pontos M, e M' dividem harmonicamente o se- | gmento pp”. Com effeito, o ponto p é o polo da recta MM" em relação ao an- , gulo 7 MH; logo a divisão p, HW, p”, H é harmonica, e por tanto é harmonico o feixe Hp H. mas este cortado pela recta MM offerece a divisão harmonica 0, M, pi, M. Os pontos p, 1, , 1 tambem estão em proporção harmonica, como é evidente. Schol. Os seis pontos a, b; a, b'; e M, M' formam uma involu- ção de que p', e 5 são os pontos duplos; e por conseguinte ter-se-ha em relação ao ponto O, meio de p';' Oa. Ob Oq .Ob == 0OM.0OM. 104 Theor. Não ha senão tres pontos, cada um dos quaes seja o polo da recta que contém os outros dois em relação a duas conicas. Com effeito, se além dos tres pontos p, p» e e houvesse outro grnpo dotado da mesma propriedade, por ex. p), o!» € p/', à tangente de (fig. 54) commum a ambas as conicas cortaria geralmente as rectas 2/9)» € p,9/! em novos pontos 7, e Z/,; mas então pelos pontos 7, e 77; H' e T passariam novas tangentes communs ás duas conicas, distinctas de 1H, e HI; o que é absurdo (86): Ro as intersecções H, e 1 sub- sistem ainda com o novo grupo p,, e o O mesmo se concluiria a respeito dos pontos 7, e Z7. Se pois o quadrilatero circumscripto Z77 HT deve manter-se em ambos os gru- pos, não poderão estes ser distinctos, isto é, os pontos p, p/, € pf con- fundir-se-hão respectivamente com os pontos p, !, p'!. 105 Havendo penetração como na fig. 55, além dos quadrila- teros já considerados, ha ainda o quadrilatero cfgh inscripto a ambas as conicas. Os lados oppostos d'este quadrilatero e suas diagonaes, cons- SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 49 Lituindo seis cordas communs a ambas as conicas, concorrem em pon- tos cada um dos quaes tem a propriedade de ser o polo da recta que contém os outros dois (56); isto é, concorrem nos mesmos pontos os o, e g'!. As cordas oppostas eg, e /h; cf, e gh; ch, e fg dizem-se conju- gadas. 106 Schol. Cada grupo de duas cordas conjugadas divide har- monicamente o angulo formado em uma de suas intersecções p, q”, ou 4”, pelas rectas dirigidas ás outras intersecções. 107 Theor. Se pelo ponto M da intersecção das duas tangen- tes unicas, communs a duas conicas quaesquer, ou de duas tangentes oppostas, quando houver quatro tangentes communs, fôr tirada uma transversal MT ás duas conicas, e de suas intersecções 7, é, T',é' forem tiradas as respectivas tangentes ás ditas conicas, digo que os pontos 7, e: onde concorrerem os dois grupos de tangentes situadas do mesmo lado d'ambas as conicas, a saber: 67, e Er; Et, e &T' estarão em linha recta com o ponto q, Tambem estarão em linha recta com o ponto ; os pontos «, e x, onde concorrem as tangentes oppostas €%, e 64"; ET, e 6 T. Com effeito: 1.º os dois feixes ETLtM, e Et L'T'M são harmonicos, e por conseguinte homographicos; e visto que dois raios homologos coincindem em EM, segue-se que os mais concorrerão dois a dois em pontos situados em linha recta, os quaes são y, y, e p. 2.º Das duas expressões equivalentes De Mt DD — — LT MT MTM Lit Mi se segue que ao feixe 64 L'T'M se póde substituir o feixe TLM, que será por tanto homographico com o feixe 67'LtM; d'onde se con- clue que os pontos «, «, e p estão em linha recta. 108 Theor. As duas rectas (y, e px, onde concorrem duas a duas as quatro tangentes 67, 6t, 4, ET", cada uma d'uma conica com cada uma da outra, são fixas, ou independentes da posição da recta MT. Com effeito, se mudar infinitamente pouco a posição da secante MT, e por conseguinte de M€, os tres lados do triangulo 6 « é girarão MEM, DA ACAD.— 1.º CLASSE. —T. HI. P. II. TU 50 ESTUDO SYNTHETICO respectivamente em torno dos tres pontos situados em linha recta £, é, e M; além d'isso os vertices €, e & percorrerão as rectas 60, € Sa respectivamente ; logo tambem o vertice » percorrerá uma recta fixa, a qual passará pela intersecção ; de gp, e €p. E pois que cada elemento de caminho descripto por « é dirigido de x para p, segue-se que a li- nha «p é fixa. Applicando eguaes considerações a qualquer dos triangulos &4”, ou 6/6' concluir-se-ha o ser tambem fixa a recta y/. 109 Theor. As polares do ponto M em relação ás duas coni- cas formam um feixe harmonico com as rectas px, € (7. Com effeito, no quadrilatero 2%, os pontos &'cêc' estão em pro- porção harmonica ; e por tanto o feixe 76'46y é harmonico. 110 Theor. Os dois grupos sextinarios 4, 7; 41, TP; G,M:c,e; T,T;G, M estão em involucão. Demonstra-se o primeiro, considerando o quadrilatero 6:/6', cor- tado pela transversal 47. Demonstra-se o segundo, considerando o quadrilatero 6y6'6 cortado pela mesma transversal MT. E' effectiva- mente n'aquelles pontos, conjugados dois a dois, onde a dita trans- versal corta os lados oppostos e diagonaes d'ambos os quadrilateros. Dando á transversal M7 a posição Ma, deduzir-se-ha o estarem em involução os dois grupos Es Data EMO TS a,a:;b,b: Mu. 111 Theor. As duas conicas são duas figuras hormologicas. O ponto M é o centro de homologia. As rectas x, e -y são dois eixos de homologia. As duas divisões 6, L, P, p, e 6, L', p, » são homographicas ; logo são homographicos os feixes T6LPp, e T'6L'pp; e como coinci- dam n'estes os dois raios homologos TL, e T'L'; segue-se que os ou- tros raios homologos concorrerão em pontos situados em linha recta. Ora, os raios T6, T'é'; To, ”, concorrem na recta 5x; logo tambem: as rectas 7P, e T'p concorrem em az. Se houvessemos considerado os dois feixes Z6Z Pp, e CE L'po tam- bem teriamos provado o concorrerem £P, e !'p na mesma recta px. Se a recta MY tomar a posição MT,, as rectas TP, e T/p ain- da concorrerão em pz; e logo as rectas TT, e T'T/ concorrerão egualmente em qa. E visto que toda a corda TT, concorre com a sua homologa 7'T!, comprehendida pelas mesmas transversaes tira- SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 51 das de M, no mesmo ponto de px; segue-se que as duas conicas são homologicas para o eixo 5x, e centro JM. Conclue-se a homologia das duas conicas em relação ao eixo ,y e centro M, tomando para centro dos feixes comparados na demons- tração anterior, não os pontos oppostos 7 e 7', out e é, mas os pon- tos situados do mesmo lado das conicas Te vd, oute 7. 112 Considerando uma. transversal conduzida pelo ponto M' (fig. 56), em que se intersecta o 2.º grupo de tangentes commuons, deduziremos as seguintes proposições d'um modo semelhante ao dos $$ antecedentes : 1.º Os vertices 6, e 6 estão em linha recta com o ponto M. 2.º Os pontos «, ou «' do concurso das tangentes em 7 e 7", ou t e & percorrem uma recta fixa passando pelo ponto p. 3.º Os pontos de concurso y, ou y das tangentes em Te 4, ou te 7” tambem percorrem uma recta fixa passando pelo ponto q. Estas duas rectas fixas pu,, e pu, são as diagonaes do paralle- logrammo 66'y6. 4.º Os dois grupos sextinarios Pb Os RAR | Pl RU cen DR estão em involução; como se reconhece considerando os dois quadri- lateros 2676'«, e 6/6'/6, cortados pela transversal M'T. Se a transversal M'T tomar a posição M'a, obter-se-hão as in- voluções às 0 OND! AM us O, DM sual, vos Vita ao 5.º Finalmente, as duas conicas são homologicas em relação aos eixos ptt,, e pu, e centro M. 113 Theor. Os dois eixos de homologia relativos ao centro M”, são identicos aos eixos de homologia relativos ao centro MZ. Esta asserção funda-se no principio geral que se segue: Se estiverem em involução os dois grupos de pontos ie r. Pe CA UMES TAUM ANE ab; a,b';c, d DE ESTUDO SYNTHETICO tambem o grupo a, BS altbod, é, estará em involução. Com effeito, tem-se entre os segmentos do [.º grupo a seguinte relação d'involução ab .bc.ca-=—ab'.be'.ca; d'onde be ablibe, ca - ab cla! * e entre os segmentos do 2.º grupo aa'.bc.db--—bb' .ad.ca; d'onde be boaid, ca ad.db' e finalmente bd.be! - ald.ac ba.bb! da.ab! o que prova que o 3.º grupo está em involução. Logo estando em involução os dois grupos de pontos ab; 0,6; M, M', (99) a, & pa Mb; Mp ur (106) segue-se que estão em involução os pontos ad; bb; u, M': mas tambem estão em involução os pontos a, a;b,b;u,, M' (108); logo as rectas pu,, e pu confundem-se. Demonstra-se do mesmo modo que as rectas qu”, e pu) tambem se confundem. 114 Coroll. Os dois eixos de homologia relativos aos centros M SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 53 ou M situados na recta 6”, são as cordas communs ás duas conicas que concorrem no ponto q. Esta proposição é evidente: ella deriva da propria definição das figuras homologicas; mas póde verificar-se mui facilmente, como se segue : Seja 4, (fig. 57) uma corda commum ás duas conicas C, e C. Tire-se a transversal MI: no ponto 1 reunir-se-hão os tres pontos que na fig. 54 são designados por é, !', e «. O mesmo acontecerá em V'; logo a recta pf corresponde á recta px, da fig. 54. Quando as conicas se intersectam unicamente em dois pontos, um dos eixos de homologia deixa de cortar as conicas, e por isso Poncelet lhe chama então corda commum ideal. Se as conicas não teem ponto algum commum, ambas as cordas communs são ideaes. Mas se teem quatro pontos communs ha então seis cordas com- muns todas reaes, concorrendo duas a duas nos tres pontos p, [/, e q”. 115 Schol. As rectas pa, e py são os logares geometricos dos vertices dos angulos circumscriptos ás duas conicas, cujas cordas de contacto passam por M, ou M. 116 Theor. O logar geometrico das intersecções das polares de duas conicas relativamente a cada ponto d'uma recta dada, é tambem uma conica, a qual passa pelos pontos ;, 0', e 5, e pelos polos d'uma e outra conica relativamente á dita recta. A esta conica chamaremos polar-conica. Sejam O, O' (fig. 58) os polos das conicas dadas relativamente á recta LH; Om', e O'm' as polares d'uma e outra relativamente ao ponto ». Se o ponto 7» percorrer a recta Z/f, os dois raios Oy, e O'm' girarão em torno dos pontos O, e O', gerando dois feixes homo- graphicos. Com effeito, o feixe Om... é homographico com Op... (63); o feixe O»... é tambem homographico com O'm; mas os feixes Om..., e O'm... são homographicos; logo são homographicos O... e O'n'... Segue-se pois, que, o logar geometrico descripto pelo ponto 77 é uma conica que passa pelos pontos O, e O, Esta mesma conica passa pelos pontos ,, ;, e p'; por quanto, as polares d'ambas as conicas relativamente aos pontos em que a recta LH cortar qualquer das rectas que unir dois dos tres pontos p, 6, ', passam pelo outro (58), (59). 117º Theor. Os dois pontos 72, e 7º são reciprocos; isto é, as duas polares das conicas dadas relativamente ao ponto »! passam por 2x. 54 ESTUDO SYNTHETICO Com efleito, se Om for a polar de » na conica C, a polar de qualquer ponto de Om! relativamente á mesma conica passará por 7 (59): do mesmo modo, se O'm' for a polar de m» na conica C', a polar de qualquer ponto de O'm! passará por »; logo as duas polares de 7?! em uma e outra contca, intersectam-se no ponto 72. 118 Theor. Quando a directriz Z77 passa por p, a polar-conica degenera em duas rectas, uma das quaes passa por p, e a outra é a recta pp”. O ponto p da recta Z77 (fig. 59) tem a mesma polar em ambas as conicas, a qual é pp”; logo, nos dois feixes de polares d'uma e outra, cujas intersecções dos respectivos raios homologos determinam a polar-conica, ha dois raios homologos coincidentes ; e por conseguinte todos os mais raios homologos concorrem em pontos situados em li- nha recta. Uma d'estas rectas passa por p. A outra é a recta p'p”, por- que é indeterminada a intersecção das polares relativas ao ponto p. Estas duas rectas passando por p, a que é dada, e a que contém os seus pontos reciprocos podem chamar-se reciprocas. 119 Considerem-se as duas Teciproças pH, e pH' (fig. 59), sejam O e O! os polos das conicas C, e (0! relativamente á recta pH; fsef' os polos das mesmas conicas relativamente á recta p47. Se o ponto »: mudar de posição, a recta O'm gerará um feixe homogra- phico c com o que gerar a recta O'm; mas o feixe Om... é homographico com O'm...,0 qual tambem é homographico com Sm; logo as intersec- ções dos raios homologos dos dois feixes Om... e fim. descrevem uma conica tangente em 0/, e f' ás rectas O'p, e /p. Demonstra-se d'um modo semelhante que as intersecções dos raios homologos dos dois feixes Om'..., e fm... geram uma conica tangente em O, e fás rectas Os, e fo: O feixe O'm'... é homographico com /'m..., mas este é homogra- phico com /jmx...; logo as intersecções dos raios homologos dos dois feixes O'm'..., e fm... geram uma conica, tangente em O', ef dsites ctas O'p, e fr. O feixe Oy... é homographico com O'n..., mas este é homogra- phico com /'m...; logo as intersecções dos raios homologos dos dois feixes Om'..., e //m geram uma conica, tangente ás rectas Os, e Pe O feixe O'm'... é homographico com /'m..., mas este é homogra- SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 55 phico com Om...; logo as intersecções dos raios homologos dos dois feixes O'm!..., € Om... geram uma conica, tangente em O', e O ás re- ctas O/,, e Op. Finalmente: Os feixes /7»..., e O'm'... são homographicos, mas este é homographico com /m'...; logo as intersecções dos raios homo- logos dos dois feixes /'»..., e fm! geram uma conica. 120 Theor. As polares de duas conicas C, e C' (fig. 58) relati- vas ao ponto /)/, onde se intersectam duas tangentes oppostas com- muns a ambas as conicas, cortam respectivamente as duas polares d'ambas as conicas relativas a qualquer ponto 7», em pontos que estão em linha recta com o dito ponto 7. Com effeito, tirando a recta JM», esta cortará as duas polares de M nos pontos à, e à: Ora, as polares de à, e / em relação a C, e € formam uma só recta que passa pelo ponto M (98); as suas intersec- ções q, € q' com as rectas p?, e cp são os polos da recta 17» em uma e outra conica (58); logo as polares de 7» em uma e outra conica, passam respectivamente por q, e q' (59). 121 Theor. As rectas dirigidas do ponto p, onde se encontram duas cordas oppostas communs a duas conicas, para os diversos pon- tos d'uma recta dada, formam um feixe homographico em involução com as rectas dirigidas do mesmo ponto p para os pontos respectiva- mente reciprocos d'aquelles. Sejam LH (fig. 58) a recta dada, e 7 o ponto reciproco do pon- to mw: tirem-se as rectas qt, e pm!; e supponha-se que o ponto 7» per- corre a recta L77: o ponto 7 descreverá a polar-conica, a qual pas- sará pelo ponto p, e pelos polos O, e O' das conicas €, e C' relativa- mente á recta L/Z (112); logo os dois feixes 07!..., e Ow... são homo- 8 e graphicos : mas este é homographico com O... (63), o qual tambem é homographico com g71...; logo os dois feixes pm..., € gm! são homo- graphicos. O raio qm! do 2.º feixe é o homologo do raio gm do 1.º; consi- derado porém no 1.º feixe o dito raio pr, ou p»,, elle tem ainda o mesmo homologo pm ; porque existindo o ponto 72, na recta qm, re- ciproca de pm (114), o ponto reciproco de »m, existirá na recta pm; e logo o raio homologo de qm! é gm, como asseveramos. 122 Theor. Os raios duplos dos dois feixes em involução pyz..., 56 ESTUDO SYNTHETICO e gnt... são os eixos de homologia relativos aos centros M ou M', ou as cordas communs reaes ou ideaes das duas conicas que concorrem em qo Seja u (fig. 58) o ponto onde uma das cordas comuns que con- correm em p intersecta a recta LZ7: digo que o raio homologo de au é o mesmo u. Com elleito, as tangentes tiradas de u a uma e outra conica, determinam quatro pontos e contacto, dois a dois em linha recta com JM, visto ser pu um eixo de homologia, e M o respectivo centro: a recta que unir os dois pontos de contacto d'uma das coni- cas encontrará a recta que unir os pontos de contacto da outra na mesma recta pu, pois que os dois primeiros pontos são homologos aos dois segundos cada um a cada um. E visto pois que o ponto reciproco de u existe em cu; segue-se que n'esta recta pu coincidem dois raios homologos das duas divisões. 123 Corol. As cordas communs a duas conicas que concorrem em ,, dividem harmonicamente os angulos formados por todos os sys- temas de duas reciprocas. N'estes systemas comprehende-se o angulo Pep (109), 124 Probl. Dados dois systemas de reciprocas de duas conicas relativamente ao ponto p, determinar as cordas communs que concor- rem no dito ponto q. Resolve-se este problema por qualquer dos processos descriptos na Gcom. Sup. de mr. Chasles, para achar dois raios que dividam ao mesmo tempo harmonicamente dois angulos, tendo um gertice com- mum. Ou tambem, cortando as rectas dadas por uma transversal, e determinando os dois pontos que dividem ao mesmo tempo harmoni- camente os dois segmentos, que as ditas rectas determinam n'aquella transversal, 125 Probl. Dadas duas conicas determinar as suas tangentes comimuns. 1.º Se as conicas se cortarem por dois pontos (fig. 60) tiraremos a corda commum 4B; e de dois pontos d'esta, « e «o, tiraremos tan- gentes a ambas as conicas, «7, at, «T', «t'; e conduzindo emfim as rectas 7t, e T't', estas determinarão o ponto M onde concorrem as tangentes communs. Por tanto as tangentes que se tirarem do ponto M a uma das conicas, serão as tangentes pedidas. 2.º Se as conicas se cortarem em quatro pontos, tiram-se as suas seis cordas communs, e empregando o processo anterior relativamente a uma das cordas “e, ou p'g (fig. 55), determinam-se os pontos 7 e ', que estão em linha recta com pg. Sc o empregarmos relativamente SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 57 a uma das cordas communs que concorrem em p, determinam-se os pontos M, e M'. Emfim, empregando o referido processo com uma das cordas que concorrem em ! obteem-se os pontos ZH, e H', em li- nha recta com pp”. Estes pontos assim determinados são aquelles onde concorrem as tangentes communs ás duas conicas. 3.º Se as conicas, sem se comprehender uma na outra, não teem ponto algum commum, o processo que vamos expor para determinar as suas tangentes, e que foi primeiro deduzido por Poncelet, é com- plicado, e por isso puramente theorico. Tire-se uma recta no plano das conicas, e determine-se a sua po- lar-reciproca. Proceda-se do mesmo modo com 2.º recta: estas duas polares-reciprocas intersectar-se-hão nos pontos p» po pl (116), e no ponto reciproco da intersecção das duas rectas. Quando se teem duas d'estas intersecções podem determinar-se as outras duas pelo proces- so (87). Excluindo pois o ponto reciproco das intersecções das duas dire- ctrizes, e querendo determinar as cordas communs que concorrem em um dos tres pontos p, p”, ou p”, tire-se uma recta por esse ponto, e determine-se a sua reciproca: preceda-se semelhantemente com outra recta, conduzida pelo mesmo ponto; e applicando a estes dois syste- mas de reciprocas o processo (124), acharemos as cordas communs que concorrem no dito ponto. D'este modo o problema está reduzido ao caso antecedente, e se acabará como ficou indicado. 126” Quando cada uma das duas conicas tem um eixo perpen- dicular á linha dos centros, o processo das tangentes simplifica-se, visto que o ponto p está no infinito, e as respectivas reciprocas são perpendiculares á dita linha dos centros, a qual é a mesma recta q'p”. Tirando pois duas perpendiculares á referida linha dos centros, obteremos as respectivas reciprocas; e com estes dois systemas de re- ciprocas deduziremos as cordas communs (124). Finalmente determi- naremos os pontos MM, M', como no 1.º caso de (125). MEM. DA ACAD. — [.º CLASSE. — T. IL, P. U. 8 NOTA O problema do $ 62 convem tambem ao caso em que o ponto D é interior ao circulo dado. N'este caso a polar do ponto D é exterior ao circulo; e a recta CP é a tangente ao mesmo circulo tirada pelo ponto €, conjugado harmonico de D. PAG. J 8 13 LIN. 2 m f. o» 13 ou em em em Dem em . fm! em! fm! oM | 0 com 0 MM O valor de p semicorda, dos um quaes H'e T' passariam (99) (106) (108) (144) o ponto m, na recta pm (fig. 60) ERRATAS EMENDAS EB Og em em! em! “em em . fm! E 7 q ea em. fm OM 00, como MM! mo O valor de p relativo a um dado systema de cordas parallelas semicorda do mesmo systema dos quaes um RP! e! p!! MR' H, passariam (103) (10) (142) (147) o ponto m, na recta gm”. (fig. 57) Ui, Dinobté os nos RPA ) N soph dobol ofetiho RR ; ( SE E o (ER pn pola É e ci leito e, gi vir rr NO), AT aa trai y. ea ba ls qa UE uid Se Carva Leth. V asques = Carvalho Ela Luh Vasques Carvalho 9" ) Lith. Vasques t wrvalho gr Path Wrgres * | | | | ] | l ] | l ] ] | + [4 [ra ” E DES SS spa 2 A Rr a f e Carvo o g” Lith Vasques o E ts | a) m Curva tho gr LHh Vasques A ur. Ee e x get ga Carealho a ADDITAMENTO À MEMORIA ESTUDO SYNTHETICO SOBRE AS SECÇÕES CONICAS POR FRANCISCO DA PONTE HORTA Depois de havermos publicado a Memoria intitulada Estudo syn- thetico sobre as secções conicas, notámos que se podia inserir na mes- ma, entre os $$ 37 e 38 da pag. 19, a seguinte proposição, consti- tuindo um verdadeiro logar ou porisma, que, posto se comprehenda na proposição 21 da dita Memoria, nos parece merecer especial men- cão. Logar. Se por dois pontos dados O, O', passarem duas rectas cor-= tadas por um systema de outras paralelas entre si, e pelos dois pontos d'intersecção de cada uma destas com as primeiras, Jorem dirigidos raios para os dois “pontos O, O'; digo que a intersecção dos dois raios de cadu um destes grupos está ado sobre uma recta DADA de posi- “cão; ou sobre uma conica DaDa de fórma e posição. Este logar virtualmente dado é linha recta, quando as transver- saes parallelas teem a direcção Ds recta que une os pontos O e O. É uma conica do 1.º ou 2.º genero, quando as rectas dirigidas por O e O' são concorrentes, e aquella do grupo das transversaes pa- rallelas que é conduzida pelo ponto de concurso d'essas duas concor- rentes, existe dentro do angulo que ellas formam entre si, ou seu ver- ticalmente opposto. E uma conica do 3.º genero esse logar, quando as duas rectas que passam por O e O' são parallelas; ou não o sendo, a recta do grupo das transversaes parallelas conduzida pela intersecção das duas concorrentes, existe dentro do angulo que é supplementar d'aquelle que as mesmas concorrentes formam entre si. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. NI, P. U. Í 2 ADDITAMENTO A” MEMORIA O primeiro caso póde derivar-se do porisma de Euclides, enun- ciado em linguagem moderna por M. Chasles, como se segue : “Se os tres lados d'um triangulo girarem em torno de pontos em linha recta tomados spbre os mesmos lados respectivamente, e dois dos vertices percorrerem rectas dadas, tambem o 3.º vertice percor- rerá uma recta dada de posição. Ha só aqui a observar que, na applicação ao caso proposto, um dos centros de rotação está no infinito sobre a recta OO. Poder-se-ha porém, recorrendo á propriedade dos feixes homogra- phicos, dar uma demonstração directa d'esta proposição, como se segue: As rectas gh, g'h', ete. (fig. 1 e 2) constituem o grupo das trans- versaes parallelas. O$ e O'S$ são as duas rectas que passam por O e O”. As divisões 9, 9, O, g'.., e À, |, O, hs, são semelhantes, e por | conseguinte homographicas; os dois feixes 0h/h'0'h"... e O'gg'0g"..., são pois homographicos ; mas ha na recta OO! dois raios homologos coincidentes ; logo os pontos 72, 2, o... estão em linha recta. Os dois casos restantes comprehendem-se na proposicão (21). a: S » | a | À | jo. y $ f 1 d / | | 8, | À | | | / | | / | [ | 1 h | | 4 i | h ] | À ok nm 0 ETR , v/ o a! | pós (0) O fc inss À 3 ESTUDO SYNTHETICO SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 3 Na fig. 3 o triangulo movel é hgm; o lado hm gira em torno de O; o lado gm em torno de O'; e emfim o lado gh gira em torno d'um ponto 7 situado no infinito sobre o mesmo lado gá. Os pontos O, O' são os centros dos feixes geradores da conica. As rectas gh, 1 hluaas concorrem no ponto 7, onde se intersectam as tangentes á conica tiradas nos pontos O e O' (13): logo estas tangen- tes são parallelas entre si; e por tanto a recta OO! é um diametro da conica (37). Se a recta gh for perpendicular a OO, será OO' um eixo da co- nica; logo se o angulo OSO! for recto, a conica virtualmente dada será uma circumferencia; o que é evidente, visto haver dois feixes de 3 raios respectivamente homologos, cada um de um a cada um do ou- tro nos dois centros O e O, quer para a circumferencia, como para a conica dada ; e vem a ser (fig. 4) OUSO! e O'OSU. 4 ADDITAMENTO A' MEMORIA Couclue-se, pois, que os angulos OmoO!, OnO', etc. são todos re- ctos: o que aliás era sabido, pela propriedade de se intersectarem no mesmo ponto as perpendiculares baixadas dos vertices de qualquer triangulo Og0! sobre os lados respectivamente oppostos. D'este raciocinio póde concluir-se tambem que, se duas conicas tiverem entre si dois pontos de contacto, ellas não podem ter mais ponto algum commum, a menos que se não confundam inteiramente. O logar que acabamos de considerar é sempre uma conica do 1.º genero, porque os raios dirigidos de O e O' para os extremos da re- cta gh, em todas as posições d'esta recta, são sempre crusados ; isto é, nunca parallelos. — Logo não ha raios parallelos nos dois feixes geradores da conica ; excepto : : +. ESTUDO SYNTHETICO SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 5 Quando um dos dois pontos O e O, por exemplo O, estiver no infinito; então a conica gerada, tornando-se infinita, passa do 1.º ao 2.º genero, como se vê na (fig. 5). N'esta, a recta $0o é um diametro, e gh tem a direcção da tan- gente em O. No 3.º caso o triangulo movel é mgh (fig. 6 e 7). Os tres cen- tros O, O'e T, dos quaes o ultimo existe no infinito, não estão em linha recta, segundo a hypothese: o logar dado é pois uma conica. Esta conica é visivelmente do 3.º genero quando os dois raios Oa, O'a' são parallelos (fig. 6); porque com estes, ha ainda outro systema de “raios homologos parallelos Ob, O'b; o qual se obtem conduzindo pelo meio de OO! a recta SS” parallela a gh; vindo a ser os ditos raios as duas rectas parallelas OS, O'$”. 6 ADDITAMENTO A' MEMORIA e d A . Quando os raios Oa, O'a' são concorrentes, como na (fig. 7), a conica é ainda do 3.º genero, por haverem duas posições para a recta * gh em que os raios Ok e O'g são parallelos entre si. Estas duas po- sições acham-se de lados oppostos ao vertice 15. Para determinar estas duas posições, que supporemos represen-. tadas pelas duas rectas XY, XY (fig. 8), e por conseguinte que é OX parallela a O'Y, recorreremos á comparação dos triangulos semelhan- tes SOX e SO'X, SOH e SYX; suppondo haver-se tirado O/Z paral- lelamente a gh. Deduz-se d'uns e d'outros triangulos SX : SO :: SO": SY SENDO e SK SN d'onde SH: 80':: SO: SF ESTUDO SYNTHETICO SOBRE AS SECÇÕES CONICAS 7 A construccão executada na (fig. 8) para determinar a linha SY, em que se tomou S/7'== SH, é ensinada na geometria elementar: não insistiremos pois na sua explicação, limitando-nos a observar que to- mámos Z7=S0, e SY=-ZU|!. É inutil observar que nas conicas (fig. 6 e 7) a recta OO! é um de seus diametros; que a recta gh assigna a direcção de suas tangentes nos dois extremos O e O'; e finalmente que a construcção executada na fig. 8 constitue um novo processo para determinar as asymptotas das conicas do 3.º genero, quando se dá um ponto $, um de seus dia- metros reaes OO", e a direcção gh das tangentes nos extremos do mes- mo diametro. Deve tambem notar-se que em todas estas differentes conicas (fg. 3, 4, 5, 6 e 7) se podem empregar angulos auxiliares para fa- cilitar o seu traçado. Assim nas fig. 6 e 7, depois de havermos de- terminado o ponto $”, empregámos o angulo OS"'O' para obter o ponto 7», mediante a parallela g'/”. Nas fig. 3 e 4, em que a recta SH é um semidiametro, empre- gámos semelhantemente os dois angulos OSO' e OS'O". O logar importante que vimos de considerar dá o meio de resol- ver os seguintes problemas : 1.º Dados um diametro, a inclinação sobre elle d'uma das asym- ptotas d'uma conica do 3.º genero, assim como a direcção da tan- gente em um dos extremos do mesmo diametro, construir a dita co- nica. 2.º Dados dois diametros d'uma conica, OO' e 8%, e a direcção gh da tangente em um dos extremos do dito diametro, construir a co- nica. A curva obtida é do 3.º ou 1.º genero, conforme as parallelas do systema gh ás ditas tangentes, são intersectadas pelos lados do angulo OSO" e seu verticalmente opposto; ou pelos lados do angulo supple- mentar d'este. Se os dois diametros dados são conjugados, a direcção da tan- gente em um dos extremos dos ditos diametros é dada (26). Se 00! e 88" (fig. 6) forem dois diametros conjugados, as rectas OS, O'S' serão parallelas ás asymptotas; porque traçando as ditas asym- ! Esta construcção resolve o seguinte problema de geometria elementar: Dados dois pontos O e O! sobre os lados d'um angulo, achar a posição que deve tomar uma transversal de direcção dada, para que sejam parallelas as rectas dirigidas dos ditos pontos O e O! para aquelles em que a dita transversal córta os referidos lados. po ADDIT. A' MEM. ESTUDO SYNTHETICO ETC. ptotas, bem como a tangente Oi no ponto O; e prolongada esta até encontrar em i a asymptota; ter-se-ha Oi== FS! == FS (68). 3.º Dado um diametro real d'uma conica do 1.º ou 3.º genero, e dois pontos $ e m da dita conica; ou só um ponto 7», e a direcção Ou d'uma das asymptotas, nas conicas do 3.º genero, determinar a direcção das tangentes nos extremos do mesmo diametro. Para obter essa direcção, basta dirigir os dois systemas de raios OS, O'S; Om, O'm (fig. 3 e 7); ou as rectas Oa, O'a'; Om, O'm (fig. 6): com efleito, na recta gh, determinada pela intersecção dos dois ulti- mos raios sobre os primeiros, está a direcção pedida. 4.º Dado um diametro d'uma conica do 1.º ou 3.º genero e mais dois pontos da mesma conica, determinar o conjugado do dito dia- metro. A solução aqui deduzida póde tambem derivar-se do probl. 13, e corol. 26. 5.º Dado um diametro d'uma conica do 2.º genero, a direcção da tangente no extremo accessivel do mesmo diametro, e mais um ponto da conica, construir esta. 6.º Dados tres pontos d'uma conica do 2.º genero e a direcção geral de seus diametros, construir esta, ou a tangente em qualquer dos pontos dados, 7.º Dados quatro pontos d'uma conica do 2.º genero, dispostos dois a-dois em duas parallelas, construir a curva, ou a tangente em qualquer dos pontos dados. & NTE PRA», SOBRE À POSSIBILIDADE DE ASSENTAR UMA CONICA DADA SOBRE UM CONE EGUALMENTE DADO PELO SOCIO EFFECTIVO 4 FRANCISCO DA PONTE HORTA Probl. Dado um cone recto de base circular, achar a secção plana d'este cone que é egual a uma conica dada. A solução geometrica que apresentamos d'este problema é tão simples, tão elementar, que nos pareceu merecer algum interesse, posto seja mui conhecida a sua solução analytica. 1 Provaremos primeiramente que são semelhantes as curvas produzidas na superficie d'um cone por suas intersecções com planos parallelos. Definem-se figuras planas semelhantes, aquellas que podem ser dispostas no mesmo plano em relação a um ponto, centro de seme- hança, de modo que toda a recta conduzida d'este centro para qual- quer ponto d'uma das figuras encontra: um ponto da outra, sempre do mesmo lado, ou sempre do opposto relativamente ao dito centro, sendo constante a razão entre as distancias dos ditos pontos ao mesmo centro, MEM. DA ACAD.— ).º CLASSE.—T. Il. P. H. l 2 NOTA SOBRE Sejam pois 4BE, e 4'B'E' (fig. 1) duas sec- ções parallelas do cone $. Tirem-se as geratrizes S4, SB, SC, etc.; e bem assim os raios vectores 4B, AC, AD, etc.; AB, A C', A'D', etc. Estes raios vecto- res serão respeita Ron paralelos ; e logo : Dt ESA Se ASA e e SD USB e ICS O! reto; RA Rir RABRA BE: ACRA Ce: ADA D': te mas d'este mesmo parallelismo se A concluc o serem BA4AC=-B'A'C, BID BAD, etc.; por tanto, levando o plano 4BE. parallela- mente a si mesmo para 4'B' E, de modo que a recta 4E tome a direcção 4'K', e o ponto 4 ajuste com 4'; as rectas 4B, 4C, AD, etc., cairão todas respectivamen- RR AS SRA - te sobre 4'B', A'C', A'D', ete., dE ou todas sobre os prolongamen- tos d'estas rectas; e logo as duas secções dadas são semelhantes ; / sendo 4' o respectivo centro de SE ao razão de semelhanca. SA A'B E Passemos agora á solução do problema proposto. semelhança; e 2 Seja a conica dada uma ser Supponha-se que a ellipse 40B (fig. 2) perpendieulaa ao plano diametral DSH, tendo o respectivo centro em O sobre o diametro DE da base do cone, seja semelhante á ellipse dada; e por conseguinte que OB om” a b sendo «, e b os semieixos da ellipse dada. Tire-se SX parallela a 42. O feixe SXDOE será harmonico, por | AS SECÇÕES DO CONE RECTO DE BASE CIRCULAR ser 40 — OB; logo os pontos X, D, O, e E estarão em proporção harmonica : pelo que | XD OD XE 0E' “Dos triangulos semelhantes EOB e EXS deduz-se OB: SX:: BO: EX: d'onde EO E 2 E 1 EX.OM OM vp: = E LOU EO e A EO.SX OB SE. EO 2 OP “ 4 NOTA SOBRE mas OM = OD .0E; logo o EX,OD XD.XE JM. RR E a xs e finalmente XM b RA (1) : : cu CO ER Determine-se sobre o eixo SH um ponto QQ tal que seja PR | a do centro C com o raio C(QQ descreva-se uma circumferencia; e do vertice $, sempre exterior a esta circumferencia, tire-se á mesma a tangente $SY: ter-se-ha a! SX— SCA CX; MXS CX— CM; logo E —o ) -2 =) b2 a SX= SC + CM+4 MX = SD + Er SA: d'onde co a? Re bz ===+2 5X ( — )—sD : ou sx. a? o RAS « (a) Por outro lado ) — = SC—CF==8T; Jogo e A OSSO GE ou Rd aço (b) “ed e combinando as equações (a) é (b) obter-se-ha finalmente sx— SC-SD (9 sY ; AS'SECÇÕES DO CONE RECTO DE BASE CIRCULAR 5 O problema está pois resolvido, por quanto, depois de ter deter- minado o ponto Q pela relação dos eixos da ellipse dada, e haver-se tirado a tangente SY ao circulo CQ, o que é sempre possivel, facil- mente se determinará a grandeza SX; sendo um dos modos, o tomar sobre a tangente SY uma grandeza SH — SE, ou SD, para depois ti- rar pelo ponto HZ a recta /G, parallela a YC. Com effeito, tem-se SG: SC:: SH: SY; d'onde , SD . SG SG — E Por tanto, descrevendo do centro $ com o raio SG o arco de cir- culo GX, obter-se-ha o ponto X, e por conseguinte a recta SX, paral- lela ao eixo maior da ellipse pedida. A questão reduz-se pois a tirar entre as geratrizes Sí e SE uma parallela a SX, que seja egual ao eixo 24; o que se consegue facil- mente, tomando sobre SX a contar de $, uma grandeza SZ==2a ; para tirar de seu extremo Z a recta ZU parallela a SB; vindo emfim a ser UN, parallela a SX, o eixo maior da ellipse pedida. 3 Seja a curva dada uma hyperbole. Se o centro O da recta 4B (fig. 2), isto é o centro da conica, caminhar para D, tambem o ponto X se approximará de D, visto que os pontos O e X dividem harmonicamente o diametro DE. O eixo menor da ellipse 4B, diminuirá cada vez mais, anullando-se de todo quando o ponto O cair sobre D. N'este limite a ellipse degenera em uma simples linha recta. Se o deslocamento da recta 4B continuar ainda no mesmo sentido, o ponto medio O, ou centro da conica, pas- sará para fóra do espaco HD (fig. 3), em quanto que o ponto X en- trará n'esse espaço; não cessando o segmento ED de ser dividido har- monicamente nos pontos O e X. Começam então as hyperboles, como é sabido, mas n'estas, o eixo perpendicular ou 2.º eixo não encontra as respectivas curvas; assigna-se-lhes porém ainda uma grandeza, at- tribuindo-lhe a mesma propriedade metrica que tem o cixo menor nas ellipses; qual é na figura 2, a de ser meia proporcional entre as dunas 6 ALON LEMA SRORABOBRDO 04 esÓ ae ca distancias do centro O da curva aos psd E Re DE da ni do cone. to sb 20 Joia RU “Logo, na hyperbole 4B (fi E 3 o eixo: perpendicular éa “tan- gente OM á base do cone. Foi + al b FIL vê ' o! nf ST ' q. “1 tras ] . , (1 ' 4 5: í bel ut | UTI Ns Di , o ts x se Sitio | é |] o r 1103 o 1 tr | IR t 1 ca É ey [4 mm re |] . silta . AS SECÇÕES DO CONE RECTO DE BASE CIRCULAR 7 Não deixaremos, porém, de demonstrar esta asserção, suppondo sabido que o eixo perpendicular n'estas curvas é egual á perpendicu- lar ao primeiro eixo, tirada por um dos extremos d'este até encontrar qualquer das asymptotas. O angulo que se obtem no cone pela sua intersecção com o pla- no SX, parallelo ao plano da conica 4B, é egual ao angulo das asym- ptotas; por quanto, considerando estes dois planos fixos $SX e OB, e um plano movel girando em torno de SO, partindo da posição 4OSX, e ca- minhando para a geratriz SM; ver-se-ha que as intersecções d'este plano movel n'aquelles planos fixos ahi descrevem angulos respectivamente eguaes. Na posição inicial 40$X, o referido plano movel cortará o cone segundo as geratrizes SD e SK; em seguida irá cortando o cone em duas novas geratrizes, uma das quaes se comprehenderá entre as rectas parallelas, que o mesmo plano vae intersectando nos planos SX e 04; por conseguinte, as suas intersecções successivas com o plano da co- nica 4B, encontrarão sempre esta conica; não cessando de verificar-se este encontro, senão quando o dito plano movel passar pela geratriz SM situada no plano SX: logo o angulo das asymptotas é, como asse- veramos, egual ao angulo traçado no cone pelo plano SX parallelo ao plano da conica 4B. A grandeza d'este angulo das asymptotas é XSN; logo, se to- marmos SR== OB, e em R levantarmos a SR a perpendicular RI, esta será egual ao semieixo perpendicular da byperbole 4B. Posto isto, dos triangulos semelhantes XSY e RST deduz-se Rs XN so RS: XS: d'onde XM . RS E DIEO mas tambem dos triangulos semelhantes XSZ e OXR se deduz RS: AS =: OE: XE d'onde RS 0E XS A XO e portanto 2 AM .0D DX.0B XE EX o poréim logo e finalmente NOTA SOBRE “RI 0D.0E<-0M: RI = OM. 5 Estabelecido este ponto, notaremos que, a direcção limite para onde converge o diametro 4B ao passo que o ponto O se desvia de D, é SC; por quanto em SC cae a recta SX, quando o ponto O estiver no infinito, visto que O e X dividem harmonicamente o diametro ED. Se pois a hyperbole 4MB for semelhante á pedida, designando os eixos d'esta por a e b, ter-se-ha e finalmente a CM as ANA RR O) A relação xs eresce constantemente até attingir o seu limite TS. & 0E.0D.0X OD EX, a? . 0X.XS 0E sx OD XD OE, 2 XE: a? sx xs XM b a (3) logo não poderão tracar-se hyperboles em um cone dado, quando a ra- AS SECÇÕES DO CONE RECTO DE BASE CIRCULAR 9 5 Edo 7) Ê E GE: : zão — de seus dois eixos for menor do que a razão E entre O raio a da base e a altura do dito cone. “6 Seo plano da hyperbole for parallelo ao eixo SC, como acon- tece com a hyperbole 4'B”, será a recta 4'B' o respectivo eixo trans- verso, em quanto que a perpendicular SO", baixada do vertice do cone sobre o plano da secção, será o semieixo perpendicular. 7 Querendo determinar a secção plana, que produz na superfi- cie do cone uma hyperbole semelhate á hyperbole dada, e cujo centro exista na base do cone, determinaremos um ponto (2 sobre o eixo SC tal que se tenha E GS sa EO Todo Ora, da desegualdade ns , (1) for SC==a, será b< CH e por conseguinte CQ << CH. A não verificação d'esta desegualdade importa a impossibilidade do traçado da conica. Posto isto, levando a grandeza CQ para CY, ter-se-ha ou bx SC.* Determinação da cellulose. —Tivemos occasião de verificar que a digestão na agua acidulada com o acido sulphurico por meio do vapor, não dissolve só o amido, mas tambem uma parte da cellulose. Esta observação já feita por Poggiale levou-nos a não dosar a cellulose na farinha, de que successivamente se haviam extrahido as substancias precedentes; mas n'outra farinha egual e intacta. Foi este tambem o processo dos srs. Peligot e visconde de Villa Maior. Tomavamos um peso de farinha bem secca e a punhamos em digestão por espaço de vinte e quatro horas, com acido sulphurico de 6 equi- valentes de agua (isto é, 100 de acido a 66º com 91,8 de agua). No fim d'este tempo o mixto de côr violacea era aquecido a 70º; se tur- vava com o calor addicionavamos-lhe acido acetico para redissolver o coagulo da materia proteica. Filtravamos, e lavavamos o filtro primei- ramente com uma solução quente de potassa, depois com o alcool, e por fim com ether. A cellulose era então secca e pesada. Reconhece- mos em todos os trigos duas especies de cellulose : uma branca e ma- cia, que fórma o trama ou esqueleto do bago, nas malhas da qual se acha o amido, a dextrina e a maior parte das materias proteicas; ou- tra rija, colorida de amarello escuro, incrustada de materias terrosas constitue a episperma ou pellicula exterior do grão. Veremos mais adiante em que proporção se acham estas duas celluloses nos dois grupos de trigos mais importantes. 6.º Determinação das cinzas. —Um peso de farinha bruta e secca era primeiramente queimado n'uma capsula de porcelana. O carvão poroso resultante era pulverisado á pressão e incinerado em cadinho de platina. Nos trigos em que separámos as materias protei- cas entre si e a dextrina do amido, dosámos tambem as cinzas na cel- lulose que nos restava a final na ultima operação. 14 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 5.º Dosagem do azote. Seguimos o processo volumetrico de Peligot, processo bem conhecido, e que por isso não descreveremos em todos os seus pormenores. Fizemos sempre uso dos tubos de ferro com preferencia aos de vidro envolvidos em fita de cobre. A execu- ção da operação é muito mais expedita e tem egual exactidão, como verificámos por vezes. Bobierre serve-se d'estes mesmos tubos nas suas dosagens promptas do azote das terras e dos estrumes. A nossa expe- riencia provou-nos, que havendo o cuidado de limpar bem os tubos a cada operação, a cifra de azote obtida por meio d'elles não diflere de 1 millesimo da fornecida pelos tubos de vidro. O apparelho de que nos servimos é exactamente o de que se serve Bobierre, e que se póde ver no seu tratado do xegro animal. O ammoniaco formado pela combustão de 1 gramma de farinha hem secca era absorvido em 1 decilitro de agua distillada, á qual ha- viamos misturado 10 centimetros cubicos de acido sulphurico quila- tado, formado de 61,250 de acido monohydratado, com a quantida- de de agua necessaria para perfazer | litro. Como se sabe, cada 11) centimetros cubicos d'este quilate de acido saturam 0,212 de ammo- niaco e corresponde a 0,175 de azote. Para licor de prova preferimos ao sacharato de cal uma solução de potassa pura. Para a quilatar enchiamos até ao zero uma galheta de vidro com a solução. Despejavamol-a depois gota a gota em 10 cen- timetros cubicos de acido normal, até que o papel azul que tinha sido avermelhado pelo acido virasse ao azul. Liamos o volume despejado, e uma simples proporção nos dizia a equivalencia da mais pequena divisão da galheta á fracção de cen- timetro cubico do acido. Nas dosagens de azote feitas em diferentes dias quilatimos sempre de novo o licor de prova. O calculo da deducção do azote é simplicissimo. Saturado pela solução de potassa o acido que absorvêra o ammoniaco, e conhecido o volume de acido neutralisado pelo ammoniaco, deduziamos o azote pela seguinte proporcão : 10 centimetros de acido : 03,175 de azote :: V, volume de acido neutralisado pelo ammoniaco, : P, peso de azote correspondente. Conhecido este peso P do azote, est'outra proporção nos dava o peso da materia proteica em 1 gramma de farinha secca. 1,6 de azote : 10 grammas de materia proteica :: P: M, materia proteica correspondente. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 15 PLANO E ORDEM DAS OPERAÇÕES NO ESTUDO DAS TERRAS Podem as terras ser analysadas immediatamente ou elementar- mente. A analyse immediata, propriamente agricola, desdobra as ter- ras, nas partes que em diverso grau de attenuação as constituem im- mediatamente. A analyse elementar, verdadeiramente chimica, dosa-lhes os ele- mentos chimicos que as formam, importando-se pouco com o estado de attenuação ou de actividade em que se acham. Para o fim e necessidades da agricultura, todos os chimicos e agronomos concordam em que a primeira analyse, sobre ser muito mais simples e natural, é a mais necessaria, e não poucas vezes lança a luz sufficiente ácerca da natureza da terra, se é acompanhada do reconhecimento das suas qualidades physicas. Sob o ponto de vista geologico, é a analyse elementar indispen- savel e unica bastante. Mas em relação á agricultura, a mais perfeita analyse elementar não dispensará jámais a analyse agricola e o estudo physico da terra. Por todas estas razões, e tambem porque não cabia no tempo analysar elementarmente tão grande numero de terras, restringimos o nosso estudo ao exame das qualidades physicas e ás determinações immediatas, dosando em separado alguns elementos ou compostos de- finidos, que nos pareceram de maior influencia na cultura cereal. Eis-aqui o nosso plano : ESTUDO PHYSICO DAS TERRAS Bem quizemos indicar n'esta parte qual a natureza geologica, se- não da rocha subjacente a. cada terra, pelo menos das da circumscri- pção ou localidade d'onde cada terra tinha sido colhida. Não temos por ora um mappa geologico do nosso paiz suflicientemente completo e detalhado que nos habilitasse a pôr por obra este desejo. O mappa geral geologico do sr. Carlos Ribeiro, inédito ainda, e a carta especial ao Algarve do sr. Bonct, trabalhos sobremaneira uteis, não satifaziam á nossa exigencia. São grandes reconhecimentos, são as feições salien- tes da nossa geologia geral, tal como a estampam os districtos e os concelhos, e nós precisavamos dos traços miudos que particularisam a geologia local da parochia, da bacia, do valle, de todo o acecidente no- 16 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO tavel. Só assim se poderia fazer uma idéa exacta da relação e modo de derivação do solo agricola do seu leito geologico. Limitámo-nos portanto a estudar a terra em si mesma depois de misturar o solo com o sub-solo para formar a terra media, e consi- derar: 1.º, a sua côr; 2.º, o seu estado de divisão; 3.º a sua densi- dade; 4.º, o seu grau de imbibição; 5.º, o seu grau de deseccação ; 6.º, o seu grau de adhesão aos materiaes mais communs dos instru- mentos aratorios, sobro e ferro; 7.º, o seu grau hygroscopico. N'este estudo seguimos o mais possivel os methodos aconselhados por Schubler. 1.º Descripção da apparencia da terra. — Nas apre- ciações que fizemos sobre a côr e o estado de divisão da terra, entra- ram apenas as nossas impressões, depois de repetidas comparações de umas terras com outras. 2.º Densidade. Foi reconhecida e determinada pelo pro- cesso do frasco tapado. 3.º Grau de imbibição para a agua. -—Tomavamos um peso de terra secca, que lançavamos n'um filtro tarado no estado humido; faziamos-lhe passar a agua, tiravamos o filtro quando a agua tinha cessado de escorrer, e o assentavamos por alguns instantes aberto sobre o papel passento, a fim de lhe retirar a agua adherente e a só ficar a agua imbebida. Pesavamos a terra molhada descontando o peso do filtro. Como sabiamos, pelas experiencias de Schubler, a agua absorvida por 100 de humus, era facil com estes dados calcular a quantidade de agua absorvida por cada terra em relação ao humus, que é das terras elementares a que absorve mais agua. 4.º Grau de deseccação. —Ficava-nos da operação prece- dente um peso de terra completamente saturado de agua, e era facil determinar com que grau de promptidão a perderia em circumstancias dadas da operação. Expunhamos a terra molhada que estava no filtro á temperatura de 20º. As mais das vezes era esta a temperatura do nosso laboratorio. E no fim de quatro horas tornavamos a pesar a terra, a differença do peso dava-nos a agua perdida; e como sabiamos a perda do peso que em identicas circumstancias experimenta 100 de areia, a terra elementar que mais depressa sécca, determinavamos em relação DOS TRIGOS PORTUGUEZES 17 a esta o grau de deseccação da terra. Para ser exacta esta determina- ção, diminuiamos da agua perdida, a agua perdida pelo filtro humido, cujo coefficiente tinhamos anteriormente determinado. 5.º Grau de adhesão das terras ao sobro e ao ferro. — A terra que restava da operação precedente apresentava or- dinariamente um estado medio de humidade ou de media saturação. Era precisamente o estado em que as terras são fabricadas, estado em que a sua adhesão importa ser conhecida, para se poder avaliar a re- sistencia que opporão ao trabalho. Faziamos assim esta determinação: Ao gancho inferior de um prato da balança, suspendiamos, sem que puxasse, um disco de ferro ou de sobro, cuja área era de 25 centimetros quadrados. Faziamos adherir este disco á terra humida com uma pressão egual para todas as terras, e estando a balança equilibrada. Iamos depois collocando pe- sos no outro prato, até o disco desadherir. Com este peso, e sabendo quanto em identico caso supporta a argilla, primeiro que desagarre de discos eguaes, obtinhamos o grau de adhesão da terra em relação ao da argilla, suppondo este de 100. * Grau hygroscopico das terras. — Expunhamos dentro de um recinto saturado de humidade 5 grammas de terra secca estendida sobre um disco de vidro, de maneira a apresentar uma su- perficie de 3:600 millimetros quadrados. Deixavamos n'este estado a terra por espaço de seis horas. No fim deste tempo pesámos a terra. O excesso de peso representava o vapor que tinha absorvido, e pelo caleulo deduziamos o seu grau hygroscopico em relação ao do humus, collocado nas mesmas circumstancias, que é das terras elementares a mais hygroscopica. ESTUDO CHIMICO DAS TERRAS 1.º Determinação da agua hygroscopica. —Secca- vamos a banho de areia na temperatura de 115º, 100 grammas de terra, até á pesagem constante. A differença de peso marcava-nos a quantidade de agua hygroscopica. º.' Divisão das terras em lotes para as opera- ções subsequentes. — Outros 100 grammas da mesma terra eram divididos em 5 lotes. MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE. —T. HI. P. 1. 3 [8 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 1.º LOTE DE 10 GRAMIMAS 3.º Determinação da materia organica total. Este peso de terra era calcinado em uma capsula de porcelana. A dif- ferença de peso, depois de deduzido o peso respectivo da agua hygros- copica, dava-nos a quantidade da materia organica. 2.º LOTE DE 60 GRAMMAS 4.º Beterminação dos detritos organicos e inor- gamices. —Lavavamos este peso de terra natural sobre um sedaço grosseiro, no qual nos ficavam os restos organicos, assim como os mi- neraes indecompostos. Este residuo depois de secco era pesado, calei- nado e tornado a pesar. Este segundo peso dizia-nos a quantidade dos restos inorganicos, e sua differença ao primeiro, a quantidade dos re- siduos organicos. 5.* Determinação da areia. — A lama passada pelo pe- neiro da operação antecedente, era novamente passada por outro pe- neiro finissimo, aonde ficava a arcia, depois de bem lavada até a agua escorrer limpa. Esta era bem secca e pesada. 6.º Determinação da argilla. —A agua turva que es- corria do segundo peneiro era filtrada por filtro de papel tarado em secco, e cujas cinzas tinham sido tambem taradas. O filtro com a ar- gilla era secco, pesado e depois calcinado ao rubro. Pesava-se o resi- duo, e este peso, menos as cinzas do filtro abatido do primeiro, esta- belecia-nos a quantidade da materia organica e da agua retidas na ar- gilla. Subtrahindo então do peso da argilla secca, o peso do filtro e o peso da materia organica e da agua, tinhamos o peso da argilla só- mente. Mas a argilla foi dosada sempre por differença, como abaixo di- remos. º.* Determinação do humus insoluvel. —Demos o nome de humus á materia organica da terra que se acha em suffi- ciente grau de attenuação, para se considerar alimento activo das plan-' tas. Este alimento póde achar-se ou no estado soluvel, e é então ali- DOS TRIGOS PORTUGUEZES 19 mento de actualidade; ou no estado insoluvel, e é então alimento em preparação que tem já a attenuação physica, faltando-lhe apenas a fór- ma chimica que o ha de solubilisar. Este ultimo humus não se achan- do nos detritos, porque estes conservam ainda a fórma do ser que os produziu; não se achando tambem na areia, porque esta foi lavada de toda a parcella organica; e não se achando finalmente no liquido da ultima filtração, porque esta arrasta as partes soluveis da terra, se- gue-se que só póde achar-se na argila. Humus insoluvel dosámol-o por differença, como mais adiante di- remos. 3.º LOTE DE 10 GRAMMAS 8.“ Determinação do calcareo (carbonato de cal). — Este peso de terra era tratado a quente pelo acido chlorhy- drico. Filtravamos, precipitavamos pela ammonia todo o ferro; alu- mina e materia organica; filtravamos novamente, e d'este segundo li- cor filtrado precipitavamos a cal pelo oxalato neutro de ammonia. Filtravamos o liquido por filtro tarado em secco, seccavamos o preci- pitado na estufa de ar e o pesavamos. Este peso depois de deduzido o peso do filtro, dava-nos o peso do oxalato de cal, do qual deduziamos o carbonato de cal equivalente, sabendo que um de oxalato de cal secco, corresponde a 0,968 de carbonato calcareo. Foram poucas as terras em que achámos calcareo em quantidade sensivel. Mas n'essas taes, a areia e os detritos eram lavados em acido chlorhydrico, antes de os pesarmos, a fim de podermos aceitar a per- centagem do calcareo fornecida por esta operação. 9.º Determinação dos saes soluveis e do humus soluvel. —Reunida"toda a agua de lavagem da terra, era exacta- mente medida, e conforme a sua densidade tomavamos uma parte maior ou menor que concentravamos a calor brando até á seccura. O residuo secco era pesado em capsula tarada, e depois calcinado até á alvura. Tornava-se a pesar para ter os saes soluveis, e por differença do peso ao primeiro, obtinhamos a quantidade de humus soluvel. 10.º BDeducção do humus insoluvel. —Sabida a quan- tidade total da materia organica, era facil por differença da somma dos detritos organicos e do humus soluvel áquella quantidade, conhe- cer o peso do humus incorporado na argilla. 8 * 20 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 11.º Deduccção da argilla. —Em todos os casos aceitá- mos o algarismo da argilla deduzida por diferença. A determinação directa que fizemos em varios casos serviu-nos apenas para confron- tar o nosso processo. Faziamos deducção da argilla reduzindo a uma unidade commum os resultados obtidos nas dosagens da agua hygroscopica, dos detritos organicos € inorganicos, da areia, do calcareo, do humus soluvel e in- soluvel, e dos saes soluveis, sommando as partes que na proporção competiam a estes corpos, e vendo quanto faltava a esta somma para perfazer a unidade. DETERMINAÇÃO DOS ELEMENTOS DAS TERRAS MAIS IMPORTANTES A” CULTURA CEREAL 4.º LOTE DE 10 GRAMMAS ' 1.º Dosagem do ferro. — Adoptámos para esta dosagem o processo volumetrico de Marguerite, servindo-nos de uma solução de permanganato de potassa. Para quilatar esta solução, dissolviamos pri- meiramente um gramma de fio de ferro puro em 25 centimetros cu- bicos de acido chlorhydrico fumante; ajuntavamos, logo que o ferro estava dissolvido, o necessario de agua distillada até completar um litro. Preparada a solução de proto-chlorureto de ferro, vertiamos so- bre ella gota a gota a solução de cameleão, contida n'uma provetta de Mohr, até a descoloração cessar e apparecer a côr rosada persis- tente na solução ferrica. Tomavamos nota do volume despejado de permanganato, e uma proporção nos dava a quantidade de ferro me- tallico correspondente á menor divisão da provetta. Quilatada a solu- cão de camaleão, dosavamos o ferro das terras do seguinte modo : Um peso de terra era tratado pelo acido chlorhydrico fumante á temperatura de 50º a 60º por espaço de 15 minutos. Addicionavamos outra tanta agua distillada e filtravamos por filtro lavado em acido cholrhydrico. Vertiamos da provetta de Mohr o licor-quilate de cameleão, até apparecer'a côr rosada persistente por 10) minutos. Como sabiamos a que fracção de ferro correspondia cada pequena divisão da provetta, uma simples multiplicação d'esta fracção pelo numero de divisões des- pejadas, dava-nos a quantidade de ferro que a terra continha no es- tado de protoxydo. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 21 Para determinar a quantidade de ferro no estado de peroxydo tratavamos do. mesmo modo um gramma de terra. Unicamente depois de aquecida com o acido lhe ajuntamos 6 grammas de zinco, puro de ferro, para reduzir todo o ferro ao minimo de chloruração. O licor de amarello fazia-se esverdeado e depois incolor. Era diluido em qua- tro a cinco vezes o seu volume de agua distillada, filtrado e submet- tido, como já expozemos, á reacção do camaleão. O algarismo achado nesta operação, representando todo o ferro existente na terra, dedu- ziamos a quantidade de ferro no estado de peroxydo, subtrahindo d'a- quelle algarismo o que já tinhamos achado de ferro protoxydado pela. primeira operação. 5.º LOTE DE 10 GRAMMAS 2.º Dosagem do acido phosphorico.—O processo que aqui seguimos é mixto do processo de Malagutti e do de Bobierre. Faziamos ferver este peso de terra em acido azotico destempera- do por espaço de 15 minutos. Addicionavamos mais agua distillada e filtravamos. Esta solução era evaporada á seccura, e o residuo tratado pelo alcool rectificado, acidulado com algumas gotas de acido nitrico. Preparada assim a solução dos phosphatos da terra, dosavamos o acido phosphorico, empregando o licor-quilate de chumbo, como o pratíca Bobierre. Preparada a solução dos phosphatos, vertiamos-lhe de uma ga- lheta-graduada o licor normal de acetato de chtimbo, cujo quilate ha- viamos de antemão determinado. Formava-se o phosphato de chumbo, que se precipitava rapidamente. De cada vez que addicionavamos o licor plumbico, agitavamos o mixto, e depois de assente o precipita- do, embebiamos a ponta de uma tira de papel passento na superficie - da solução e a chegavamos a uma gota de solução de iodureto de po- tassio, depositada sobre um disco de vidro. Se apparecia a côr ama- rello-esverdeada do iodureto de chumbo, isto nos dizia que havia já excesso de acetato plumbico, e que todo o acido phosphorico havia sido precipitado. Addicionavamos então ao mixto os dois terços do seu volume de alcool; e se a nodoa amarella se fazia do mesmo modo ain- da, reputavamos a operação terminada. Preparavamos este licor normal plumbico dissolvendo 628,14 de acetato de chumbo cristallysado, com o necessario de agua distillada até perfazer um litro. ' Cada 50 centimetros cubicos d'este licor decompõe 1 gramma de 22 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO phosphato tribasico de cal, sendo portanto equivalente a 0,461 de aci- do phosphorico, e cada centimetro cubico egual a 05,0092 do mes- mo acido. 3.º Bosagem do azote. —Seguimos ainda o processo de Peligot empregando 3 grammas de terra das 10) em que se tinha do- sado a agua hygroscopica. Em algumas terras foram tambem desados os alcalis e os nitra- tos pelo processo de Ville. Fizemos tambem reconhecimentos sobre os sulphatos e chloruretos. Não descrevemos estas operações, nem inclui- mos os seus resultados na tabella geral, porque não se estenderam a todas as terras. | ] to [or DOS TRIGOS PORTUGUEZES PARTE HI RESULTADOS DA ANALYSE CHINICA Todos os nossos trigos são soltos do casulo. Podem classificar-se em dois grandes grupos commerciaes; a sa- ber: Molares e Rijos, comprehendendo tres especies botanicas que são: 1.º Especie: Triticum sativum, que tem por caracteres geraes: palha ôca, grão macio e mediano. 2.º Especie: Triticum turgidum. Palha ôca em parte, grão semi- tenro, grande e grosso. 3.º Especie: Triticum durum. Palha cheia, grão alongado, duro e vitreo. As duas primeiras especies pertencem ao grupo dos molares, a terceira ao grupo dos rijos. Estas tres especies desdobram-se em cinco variedades; a saber: 1.º Variedade: Z7ybernum, muticum ou sem barbas; cujos cara- etéres botanicos são: Espiga geralmente longa, pyramidal, mais larga na face que no perfil; espiguctas chatas e flabelliformes ; g/umas li- geiramente chanfradas abaixo da ponta, que é curta; caréna saliente e visivel na sua metade superior ; casulo maior que o bago, distincto e aberto no cume; bago alongado e oval. 2.º Variedade: Estivum ou barbatum. Caractéres: Espiga mais larga na face que no perfil, geralmente tombada no sentido da face e nunca no das espiguctas; barbas divergentes no plano das espiguetas e persistentes. 3.º Variedade: Turgidum simplex. Espiga quadrada ou achatada no sentido do perfil; espiguctas curtas, mais grossas que altas e en- tumescidas ; g/umas barrigudas ; carénra saliente, curvada na base; ca- sulos barrigudos, curtos, collados ao bago; barbas compridas, paralle- 24 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO las ao eixo da espiga ; bago grosso arqueado ; palha dura, cheia e cur- vada na parte superior. 4.º Variedade: Turgidum compositum. Eixo ramificado; espiga composta ; hago tenro; palha cheia, ondulada ao pé da espiga. 5.º Variedade: Durwm. Espiga quasi pyramidal ou achatada no perfil; cspiguctas estreitas e alongadas; g/umas duras, muito pouco barrigudas, terminadas por um dente agudo; caréra muito saliente em todo o comprimento das glumas, curvada uniforme e ligeiramente; barbas muito compridas, persistentes, muito fortes e divergentes; ba- go comprido, triangular, quasi sempre vitreo. A 1.º e 2.º variedades pertencem á primeira especie (Triticum sativuna ). A 3.º e 4.º variedades á segunda especie (Triticum turgidum ). A 5.º variedade á terceira especie ( Triticum durwum ). A 1.º variedade comprehende dois typos vulgares estudados : mo- cho ou rapado, e gallego rapado. A 2.º variedade comprehende seis typos: ribeiro; portuguez ; egypeio; barbella; trigo da terra; gallego. A 3.º variedade comprehende tambem seis typos vulgares: ca- noco ; alexandre; sicilio; pombinho ; rubião ; cascalvo. A 4.º variedade comprehende um só typo: o caxudo. A 5.º variedade tem 14 typos: durazio mollar; durazio rijo; candial; amarello barba branca ; anafil; mongia ; amarello barba pre- ta; javardo; aza de corvo; vermelejoilo; mourisco; vermelho fino ; amarello Santa Martha ; lobeiro. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 25 (Fig. n. 1) TRIGOS MOLARES I MOCHO OU RAPADO (Fig. 1.º) 1.º Cassiração botanica CHUNO po spvasdonuovoo dan padovo dao ada Molar. DEpeBE gooa nado poa ddadoc osso nodos DBad ao Triticum sativum. Venenos aaa Ads à DSO RA Hybernum muticum ou sem barbas imo ql sao osso savno do do dba apado ndo Mocho ou rapado. 2.º Corvactéres botanicos Espiga compacta, metade mais larga na face que no perfil; espiguetas de tres ou qua- tro flores, apertadas e pegadas ao eixo, quasi a angulo recto; pontas das glumas e do casulo curtas e como que roidas; palha muito grossa, acanellada em cima. Toda a planta glauca (secção 9.º de Vilmorin). MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE. —T. NI. P. II. 4 26 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 3.º Localidade Vonde veva Districto do Funchal. Concelho de Machico. Parochia de Machico. K.º Estudo industrial é cimo 4.º Exame do grão: Aspecto phySiCo ASen RE mediano, amarello, liso e roliço Peso em kilogrammas por hectoliiro .......... 83,50 Densidade ...,2.'. sssqate taça sacia opel ao pc PA E RR 1,99 ?.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada. .......... branca, entrefina, macia e pegadiça a farinha panificavel . 72,35 | farinha espoada ... 25,00 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha espoada) 3 xs revela one rod Saga ae AR 32,60 Quantidade em 100 de grã 3.º Exame dos glutens : Aspecto iphiysiGo ris dr rf so fofo Es See esbranquiçado, firme e muito elastico RETO ide iris pn fi em fresco... 36,30 quantidade em secco ... 12,34 poadar:. Mp | agua que absorveu ..... 23,96 Quanto medrou na cosedura................. 6 vezes o volume em fresco 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas .........ccco oo. esponjoso, branco, fofo e leve Rendimento em peso por 100 da farinha espoada 129,7 Agua que absorveu. ............ e PR 48,4% Agua retida depois da cosedura.............. 29,17 5.º Analyse immediata do grão: Agua hySroscopica 1. e SBN nad o 8,10 Materias; gordas... .. (yfrtga AUS NRE Dn 1,94 Materias protejgass puta. ted o 12,03 Materias amylaceas. oba ste lotnaMh mem ooo 73,614 Celhulosess. sis core es E Bro ss A 2.52 Cinzas lets oo nro OST QI A 1,80 5.º Estudo ciymico-agreola da terra que 0 qrodagiy 8.º Qualidades physicas da terra Côr daiterta eos nie e AE O vermelha escura DOS TRIGOS PORTUGUEZES Naturezara rico ade ep Ep PERES ren Rye ro argillo-siliciosa Pstadoldei divisão 240.2 persa o O RT em torrões esboroadiços Densidehtio So pl a RR ER 2 (A 3,30 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 17,97 Grau de dessecação em relação à areia ........ 57,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 20 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 25 relação à argilla. . . tadhesão ao sobro....... 26 *.º Analyse immediata ou agricola em 190: Eis indecompostos ... 4,20 * Parte organica ...... pa o 0,32 humus..j. | insoluvel.... 5,08 agua hygroscopica ..... 8,40 pedras eareia......... 23,40 . Parte mineral....... area ar. MDA 57,92 | calcareon e te vestigios saes soluveis .......... 1,28 Ir é ai a PER e RS SADO SERIE 0,233 nec | protoxydado........... 1,28 A Hperoxydado MP. ..iP 9,92 PACIUONDROSphOrico Sc sra PR RE 0,066 28 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO (Fig. n. 2) H GALLEGO RAPADO (Fig. 2.º) 1.º Classifração botanico CANO RS RA SARRO BÃO GE Ego É 6 Molar Especie JM. rocdo prefiro Po todo pe o Ra PR Triticum sativum Variedade”. Mr Me cr o Ur dad Do RR Hybernum muticum ou sem barbas Ev po vulgar) sd aaa Gallego rapado 2.º Caractéres botamicos da secção 26.º du Vilmorim q que pertence Eixo da espiga grosso e apparente; espiguetas alongadas, afiladas, muito rijas ; bago vermelho comprido ; palha rija, curvada, semi-cheia. 3.º Quractíres botamicos espertos do typo Os mesmos da secção e mais : espiga arruiviscada. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 29 h.º Localidade Yonde nova Districto de Portalegre. Concelho do Crato. Parochia de Nossa Senhora dos Martyres. 5.º Estudo industrial e clinico 1.º Exame do grão: Apiaaro ay e Be | É bico o A mediano, avermelhado, liso e roliço Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 75,75 Densidade: sem eres eo aa RR = sro page 1,23 2.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... branca, entrefina, muito macia e pega- ( farinha panificavel. 71,24 (diça | farinha espoada. ... 29,00 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha Quantidade em 100 de grão CEEE cantansenas Rap ao bol Sponpo soda 29,60 3.º Exame dos glutens : AS pecionphySICO) it Do ERRAR RES esbranquiçado, firme e muito elastico : uantidade em fresco ... 25,10 Por 400 de farinha es-| LU" aa a quantidade em secco. ... 8,03 poad ap rito agua que absorveu ..... 17,07 Quanto medrou na cosedura.......cccccccc. 5 vezes o volume em fresco 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas................... esponjoso, trigueiro, fofo e leve Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 122,5 ouatquetabsorveu Sp 54,5 Agua retida depois da cosedura.............. 22,5 >.º Analyse immediata do grão: Nate pin pasa ns e ds ve ddo spa oc cone 11,82 Nataniast cordas... lite sjo/rteintsano ater PA RRRER Tia 1,00 Maientasaproteicasi rn sr lRR e oo 7,65 Mateniastamylaceasi nd Dr Ro ota 73,11 CollulosoRAr Ta etc ani SUE de ud Sc poda 3,48 (DINERS o cao clas e REAR AA ES DR 2,28 30 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 6.º Estudo ciumico-agreola da terra que 0 produzia 1.º Qualidades physicas da terra : Coóridalterras ELA IRà o ro Tora cinzenta escura Natureza agrigolar tj. epajo tropa to RR argillo-siliciosa Estado de divisão - =). MPR SP solta e fina Densidades.,- e reger pg a ro CPR PR 2,30 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 16,84 Grau de deseccação em relação à areia ........ 59,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 18 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ........ 27 relação à argila... | adhesão ao sobro....... 28 ?.º Analyse immediata ou agricola em 100: (po indecompostos. ... 1,20 Parte organica ...... soluvel ..... 0,48 (humus So a insoluvel.... 41,70 agua hygroscopica...... 1,60 pedras NEN Go E oe 34,40 Parte mineral....... ec ENE E So Te 60,20 Balcareo MIC cc ss prooo vestigios saes solúveis). ..... finitos 0,42 AZOLE; + (o o E, NO DEI BANG MS hogrnsrnageças 0,273 a protoxydado .......... 0,34 Ad a peroxydado, 0 1,70 NcidofphosphoricoriR 0,101 DOS TRIGOS PORTUGUEZES HI RIBEIRO 32 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO (Fig. 3.º) 1.º Classificação botanioa LEPATIATO) (47 BR E NPR E DE a Molar DDD 009 sda sAnovanpa cds sGod bo dao 0abs Triticum sativum Variedade ..... Ba DP SP SR pd A Estivum ou barbatum tdo VALA co cnaa dsova bon as sbooasonad eo Ribeiro 2.º Caractires botanicos da secção 30.2 de Valmor a que pertence Espiga meio fechada ; espiguetas de tres flores alargadas na base; barbas muito diver- gentes, finas; palha fina curvada, muito ôca e flexivel. 3.º Caractives botamicos esprericos do typo Os mesmos da secção e mais : espiga mediana, grão miudo alaranjado. H.º Localidade donde veias Districto de Santarem. Concelho da Barquinha. Parochia de Nossa Senhora da Atalaya D.º Estudo industrial é clvymico 4.º Exame do grão: Aspecto pySiGo/ jaja of dado e opa GAR RR Miudo, amarello, liso e ovoide Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 84,50 Densidade: payeto elatosos atoa vice todo NR 1,32 ?.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... alvissima, finisssma, muito macia e (farinha panificavel . 76,65 (pegadiça [farinha espoada. ... 41,0 : Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha Quantidade em 100 de grão CI bossaaga spo dans posso a00 ppa Dea 31,10 3.º Exame dos glutens: INSOIMO DNA o osonabasa passado nas bpoaNo esbranquiçado, firme e muito elastico Por 100 de farinha pn pano em fresco... Pa aa quantidade em secco. ... 11,40 E a que absorveu ..... 23,50 Quanto medrou na cosedura................. 5,9 vezes o volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES 33 4.º Exame” do pão : Quantidades organolepticas. ................. esponjoso, alvissimo, fôfo e muito leve Rendimento por 100 em peso de farinha espoada 128,3 IAgualque absorveu. = -1./.70.01== hore Ra 51,5 Agua retida depois da cosedura .............. 28,3 5.º Analyse immediata do grão: AgUaMhyoToscopica.. ... -1. alo como ais oe pr e 8,33 Materias GOLdas es. seas sra pr RES Sa 1,53 Materiasiproteicas: (17.15. ecra o a 11,02 EMaterias amylaceas: sor liso rtp 72,30 Coalition ms io od 3,22 EPT A SR DR O o RSI O 3,60 6.º Estudo chimico-agrivola da terra que 0 produzia 4.º Qualidades physicas da terra: Cod antena; asia screens retal EN amarella escura Natureza agricola...) nscio asm eres o Se RR argillo-siliciosa Estado derdivisãos 2. o em grumos tenaces Densidade 2 sol oio desaba ja to e 2,20 Grau de imbibição em relação ao humus....... 21,84 Grau de deseccação em relação à areia ........ 45,50 * Grau hygroscopico em relação ao humus....... 19 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 23 relação à argilla. .. [adhesão ao sobro....... 28 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: | restos indecompostos.... 1,90 Parte organica ...... RL (soluvel ..... 0,10 | ““linsoluvel.... 4,00 agua hygroscopica...... 3,00 pedras BEMSPlace o o cone 40,08 Parte mineral....... argilla e areia. ........ 50,62 | calcareo! ij aa vestigios saes soluveis .......... 0,30 PAZ LONA BRR e 70 qu 6 a 08 e Da o PD a 0,520 Eai | protoxydado .......... 0,22 de pe | peroxydado «. «js sure 1,00 Meidojphosphonico RR RR 0,080 v gr MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. II. P. IL. “ ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 34 (pu dg) PORTUGUEZ DOS TRIGOS PORTUGUEZES 35 (Fig. 4.º) 1.º Classificação botamica UERR RR ERRAR O A É PR A Molar. Dsfitta CAE ERR Pr PR SERA SAE MA RE Triticum sativum. Vaniedades ssa ans arjero ee crepe Der Estivum ou barbatum. Digo pe Ro e de de preco Portuguez. 2.º Cavactires botanicos da 30.º secção de Vilmorim a que pertence Os da 30.º secção, precedentemente descriptos no typo ribeiro. 3.º Caractires botamicos especificos do typo Os mesmos do trigo ribeiro, sendo a espiga mais fechada. h.º Localidade Aonde vera Districto de Funchal. Concelho de Porto Santo. Parochia de Nossa Senhora da Piedade. 5.º Tetudo industrial q chunico 1.º Exame do grão: PASDECLO PhySICO/. 2,=1-15121=12,0 0/0155] cus) Sora Lp miudo, amarellado, liso e ovoide Peso em kilogrammas por hectolitro ....... E. 82,00 Densidade, =. essere eres ars enrae e ART 1,34 2.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........ --. amarellada, fina, macia e pegadiça idade em 100 de rão ! farinha panificavel . 61,50 e SO | farinha espoada.... 20,00 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha ESA asse te rg sásla PORRA rs Re 36,75 3.º Exame dos glutens : AS DeGLONEINYSICO pgs = 22) 244108 2,0 aro ape AD RR amarellado, firme e pouco elastico : uantidade em fresco... 34 Por 100 de farinha es- | 1 ú aee E Esto quantidade em secco...: 1,35 poadar: soersacra css agua que absorveu ..... 22,65 Quanto medrou na cosedura..........ccccc. 5,5 vezes o volume em fresco 5» 36 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas. ........cccicico. massudo, trigueiro e pouco leve Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 127,0 A alquelabsonveuE Ap Rei epaofe ne 69,6 Agua retida depois da cosedura .............. 27,0 5.º Analyse imnmediata do grão: Agua hygroscopica;... . NOME ERE crise pele rneie 9,80 Materias cordasA [ee pote cabe RR 15 Materias profeicasa Ea o E RR E 10,98 Materias amylaceasi sessao TESE) Gellulose ... co os cs co pttbo SAE CER 2,7% CiMZAS ss sds nieneta fole raia Sra e BR NRP 1,98 6.º Estudo cmico agricola da terra que 0 produziy 4.º Qualidades physicas da terra: Cór dajterra, solve o ie PO RR RE cinzento escura Naturezalagricola:-. 2). bo ER argillo-calcarea Estado deldivisão 2 = eo solta e fina Densidade = semente cu te SR EO O E TER 2,08 Grau de imbibição em relação ao humus....... 16,80 Grau de deseccação em relação à areia ........ 55,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 15 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 24 relação à argilla. . . [adhesão ao sobro. ...... 25 2.º Analyse immediata ou agricola em 100 : pio indecompostos.... 3,60 Parte organica ...... ig (soluvel ..... 0,48 “linsoluvel ... 0,92 «agua hygroscopica...... 8,00 pedras careia......... 28,40 Parte mineral....... DE) Hed ERR 14 Co AE h4 77 caleareoMN BE Ses 13,03 saes soluveis.......... 0,80 AZOLO siso (o No pio Roo fab o 2 DEPARO at e 0,200 Rio | protoxydado .......... 0,840 RPE CASEIRA 2 Coe |peroxydado........... 1,16 DOS TRIGOS PORTUGUEZES - === mas e =. -. O SES =. sida 3 o) = EGYPCIO 58 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO (Fig. 5.º) 1.º Classificação botanica CEO A RR ro e RSA AD io HR 6 RL, O a Molar. ESPECIE: uva ir eleja pelo cao leeEA E ta EE E Triticum sativum. Variedade spas eteap ACE Estivum ou barbatum. Dypo vulgar: rs piso cio isa e e seg RNA CAE a Epypcio. 2.º Caractéres botamicos da 30.º secção de Vilmorim q que pertence Os da 30.º secção, já deseriptos. 3.º Caractéres votamos especificos do tiypo Os mesmos da secção, e mais: bago mais arredondado e avermelhado. - H.º Localidade Aonde vera Districto da Horta. Concelho das Lages. Parochia da Piedade. 5.º Estudo industrial q cinco 1.º Exame do grão: Aspecto plySiCOR je i Rr e miudo, alaranjado, liso e roliço Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 74,00 Densidade soares sato O E ER 1,20 2.º Exame das farinhas : Aspecto physico da farinha espoada. .......... alvissima, entrefina, macia e pegadiça : sz, | farinha panificavel . 69,40 Quantidade em 100 de O) inha esposas .. 29.00 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha CORO ERR 615 O a a tada oo vidio 33,25 3.º Exame dos glutens: AN spectoNphySico Ei Ene RP paes Re esbranquiçado, firme e elastico quantidade em fresco... 24,50 quantidade em secco.... 7,80 agua que absorveu ..... 16,70 Quanto medrou na cosedura................. 4,75 vezes o volume em fresco Por 100 de farinha es- | poadar- pt | DOS TRIGOS PORTUGUEZES 39 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas. .........cc.cc.... pouco esponjoso, trigueiro, pouco fófo Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 124,0 (e pouco leve Ao (UE QUEM algo sopocercooboD aba bbb pDO 48,4% Agua retida depois da cosedura............... 24,0 5.º Analyse immediata do grão: here lientsto o OPA DARDO dbnaça ob o Pdenbn as 12,67 IMaienias; GOrdas:- -.jove sis josefoio! o nto ereta o 1,00 Iaterias profeicas 1... atsrge ste pop fn Rg Res ed 6,56 Materias /amylaceas ="... cspro creia Ap aereas 73,69 ellulosert a sao sair EN ERR 3,98 Ciro o Bo NE RS o 2,10 6.º Estudo-chunico agruola da terra que 0 produzia 1.º Qualidades physicas da terra: Corda terras care oia repre PAR negra Natureza asricola: . «... 1610/00 oleo Ad siliciosa Estado do divisão .... oscar RR solta e fina Densidade veio srs sraioro o ope) re 3,20 Grau de imbibição em relação ao humus....... 24,00 Grau de deseccação em relação à areia ........ 60,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 7 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 19 relação à argilla. .. [adhesão ao sobro....... 20 *.º Analyse immediata ou agricola em 100: restos indecompostos.... 4,59 Parte organica ...... pasa pa foto 0,41 “* (insoluvel. ... 1,00 agua hygroscopica...... 4,00 pedras e areia ......... 66,40 Parte mineral....... Ellb sono sv ss esoe 22.99 Calcareo dy oo tera! vestigios saes soluveis.......... 0,61 3.º Analyse elementar mais importante em 100: Lo não DP O OR 0,309 Pa o | protoxydado .......... 2,20 E e liperoxydado! o si tears 2,20 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO BARBELLA DOS TRIGOS PORTUGUEZES 4 (Fig. 6.º) 1.º Cassiação botanica ERUpo-- ss. assa sismo om 0 a a Le [RES cr er raia Molar. Dede EANES Soda dao emas BRs IPSGaE Triticum sativum. Namedade- = se spa a ep Re SR orago Estivum ou barbatum. Iypo ulgar:. tarja oo fo Rs pa eataparetane -- Barbella, 2.º Garactives botanicos da secção -30.º-de Vibmorir q que pertence Os da 30.º secção, precedentemente descriptos. - 3.º Caractires botanicos especificos do taypo Os mesmos da secção, e mais : espigueta em leque, bago grande e muito solto. h.º Locahdadeo Aonde-vryy Districto de Bragança. Es aa Concelho de Moncorvo. Parochia da Felgar. 5.º Estudo industrial é cliunico 1.º Exame do grão: Aspecto physica) ss) (aja safa o joao to DR grande, alaranjado, liso e ovoide Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 74,50 Densidade +... 2.000.008. 00000 AR 1,28 2.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... branca, fina, macia e pegadiça : wrz, | farinha panificavel . 78,60 cosa nado OD a | farinha espoada. ... 37,00 Peso em kilogrammas por hectolitro de farinha espoada. . .. cu nes oo o PbBitagy R 36,50 3.º Exame dos glutens: ASPECIOAP SIGA = se eis pa ». esbranquiçado, firme e elastico Por The fagua es quantidade em fresco ... 25,90 poada quantidade em secco.... 8,64 a va agua que absorveu ..... 17,26 Quanto medrou na cosedura................. 3,5 vezes o volume em fresco MEM. DA ACAD. —— 1.º CLASSE —T. HI. P. II. 6 42 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 4.º Exame do pão: (e pouco leve Qualidades organolepticas............ cc... pouco esponjoso, branco, pouco fófo Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 129,5 Aga tque GBsoEVEN.. oras dor Ci ereta 60,0 Agua retida depois da cosedura .............. 29,5 5.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopica ..... a ofefietsth aceso cerassrnroia 7,65 Materias gordas. a sos iosoieieieis o api 1,06 Materias PROfeicas, o main IS PDDE E Bra à 8,74% Materiastams;laceasf ir aa apa o RR 75,75 Celulose so sie saio rasta sara SR 3,10 Cinzas sarro aisree ara a ara ra a AR 3,10 6.º Estudo climico agricola da terra que 0 produzia 4.º Qualidades physicas da terra: Côr da terra... .....s 000 pis A SR cinzenta canella Natureza agricola... «oo cito aro oro a argillosa Estado de divisão. «q. 4: «04.000 dia semi-solta e fina Densidade... quero e euro oii faire eme NE A 2,10 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 10,52 Grau de deseccação em relação à areia ..... 1... 50,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 18 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro....... 22 relação à argilla. .. | adhesão ao sobro....... 26 *?.º Analyse immediata ou agricola em 100: restos indecompostos. ... 1,60 Parte organica ...... aa soluvel ..... 0,08 ' “* (insoluvel. ... 2,36 agua hygroscopica...... 2,80 pedra eltáreia . . eglueu 32,00 Parte mineral....... argilla ..c so HDL 5 60,64 | calcaredki 06... «cmo vestigios saes soluveis .......... 0,52 AOLB, o) ga ais crosta eva ce ds RR 0,300 | protoxydado.......... 0,60 PERO io ea | peroxydado ........... 2,60 43 DOS TRIGOS PORTUGUEZES =——— Ei === TE = E: ESSE Ses EPE A = ST, + E ts ZA ei VII TRIGO DA TERRA 44 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO (Fig. 7.º) 1.º Classvfração botamica Giripostto. Maraca cio, Mad SS ones edhas Molar. [Dj o o TR RA Rei SR E PR À Triticum sativum. Variedade vi. spas atear aee Dao oia ipa Estivum ou barbatum. Typo vulgar... cestas sebo Misco dolo Peigo da terra, 2.º Caractives da seção 30.º do Vilmar q que pertence Os da 30.º secção precedentemente descriptos. 3.º Caractires botamicos especificos do typo Os mesmos do typo barbella, e mais: bago pardento. h.º Lovarigão Aonde mea Districto de Evora. Concelho de Borba. Parochia de Santa Barbara. 5.º Estudo Industrial q chimico 4.º Exame do grão: Aspecto physico = 4... Ml A mediano, deslavado e rugoso Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 78,00 Densidade... area versao eee EA ae SMA, SO ?*.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... branca-rosada, finissima, muito ma- = | farinha panificavel . 73,93 (cia e pegadiça dnpudade en | farinha espoada ... 24,00 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha espoada .. «sos os ER o ro a 32,50 3.º Exame dos glutens: AspectoWpiySicoR: cio 7o no pero RR NR RA avermelhado, firme e muito elastico Por OO do faso co quantidade em fresco... 30,80 “ “quantidade em secco ... 10,92 poada . suas sait agua que absorveu ..... 19,88 Quanto medrou na cosedura................. 5,2 vezes o volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES 45 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas .........ccc cc... esponjoso, trigueiro, fófo e leve Rendimento em peso por 100 da farinha espoada 129,0 Agua que absorveu. ...«- doses sans 48,4% Agua retida depois da cosedura.............. 29,0 5.º Analyse immediata do grão: Apuahysroseapiea .... «bless imo oo miami 10,50 Materiasggondas. . o arado ja cafe beta Loto Loboxo no cessa 1,60 Materias proteicas. ... SMA cido 10,45 Materias amylaceas 4! ADA So a SD, 71, Cellulnse. . sigo o see if A JE at AR SA 3,40 Dino Sp dA pe a O ES a AR 2,64 6.º Estudo cimico-agricola da terra que 0 produzia 4.º Qualidades physicas da terra: Côr da terra .... 00. 6 dos ss atijolada Natureza agricola ..... 4 MA do PAM argillosa Estadovde divisãos...... 45h 4... AL A em grumos tenaces Densidades. Cousas... cu MR Soo DA 2,00 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 24,73 Grau de dessecação em relação à areia ........ 31,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 17 Grau de adhesão em ( adhesão ao ferro ....... 34 relação à argilta. . . [adhesão ao sobro....... 35 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: É restos indecompostos ... 3,33 Parte organica ...... ao (soluvel ..... 1,06: “* linsoluvel.... 1,67 agua hygroscopica ..... 3,00: pedras eareia......... 36,66 Parte mineral....... argila; MA SAN dE a - 52,59 | calcareo!. .44 as dao da vestígios saes soluveis .......... 1,75 Azoter.phegie. =. cos cao oo Setas AS 0,130 Bediiilde Bacinha sa: protoxydado........... 0,510 nc “O peroxydado). ... SERA... 1,89 TRIGO GALLEGO (Fig. n. 8) EST. INDUST. E CHIM. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 47 VII TRIGO GALLEGO (Fig. 8.3) 1.º Classificação botanica (ENTDO sabes po adnop eo dendor d qa code osa o dnh Molar. Especie: ereto ora sro area seria AME fole fera o 0 ota Triticum sativum. Maniedade! je eia joi go ita o ASMA tono pap Estivum ou barbatum. Ev pos WU gar. ais ja ego do ao jo eae AREA AR fo eso pagan DOR O Gallego. 2.º Caractives botamicos da secção 30.2 de Vora q, que peetenco Os da 30.º secção, precedentemente descriptos. ção, p p 3.º Caractires botanicos espetos do typo Os mesmos da secção, e mais: espiguetas muito desunidas, espiga grande, barbas muito divergentes. k.º Localidade Monde nova Districto de Vianna. Concelho de Coura. Parochia de Ferreira. 5.º Estudo vadustrial v chumico: £.º Exame do grão: Aspecto phySiCO sais ais o/a mo) e fole N poa grande, fusco e rugoso Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 84,00 Densidade... casos e cn sinais A RS DD RR RNE = ATA A 1,35 2.º Exame das farinhas: . ; Aspecto physico da farinha espoada. .......... alvissima, finissima, muito macia e : - (farinha panificavel. 74,41 (pegadiça Pmamfidado em 109 de prão | farinha espoada. ... 36,00 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha. . espoada..... ooo sissate veto paroro MD Re 30,70: 3.º Exame dos glutens: Aspecto physico....... 2... AM esbranquiçado, firme e elastico Por 100:de farinha es: quantidade em fresco... 33,00 psd quantidade em seeco...... 11,76 P “*" Vagua que absorveu...... 21,24 Quanto medrou na cosedura............ci. h,5 vezes o volume em fresco 48 - ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas...........iiol.... esponjoso, alvissimo, fófo e leve Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 129,0 Noualiquelabsorveu sb ei ps 51,5 Agua retida depois da cosedura .............. 29,0 5.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopica... 1. tina css ro o vovo EAD, DA) Materias gordas... ... 0. e e coleapapõps 193 Materias proteicas ...j.1 je Je) ofe ER estepe 11,25 Materias amylaceas ... .... roads Pad, NOR, digas; 71,2 Celulose . sans uvass sro sorpo le o a tele oe 3,32 Cinzas é soa srs teiaeio ici e NR RE EEE: LET) 6.º Estudo chimico-agrivola da terra que 0 produzia 1.º Qualidades physicas da terra: Córida terra, . sic aposto io RR RR TA DRE E parda-escura Natureza agricola... . aja favo soa PA =. + Siliciosa Estado de divisão... ........... pu o AR - solta e fina Densidade... cuatro rerio é So E mem 3,30 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 33,68 Grau de deseccação em relação à areia ....... » 68,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 5 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 10 relação à argilla.... pa ao sobro....... 12 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: restos indecompostos. ....... 2,16 Parte organica ...... met soluvel ..... 1,05 ““ |insoluvel.... 4,23 agua hygroscopica...... 2,50 feiras elareia -. Each: 68,66 Parte mineral....... argilla (OA Era 20,70 | calcareo. 1.1. MERE IES: vestigios saes soluveis . ...u sus 0,70 Avote gskznta.a aval ohenupnasades. Acpstesre io 0,320 protoxydado .......... 0,520 PRB ás seo into | peroxydado..........0. 2,08 Acido phosphorico. ..........cisicccsaeos 0,030 No DOS TRIGOS PORTUGUEZES 50 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO IX CANOCO (Fig. 9.3) 1.º Classificação botamiea Grupo. ss atas aaa re E Rio oca Molar. Especie e gro o alo asa DR SR EE Triticum turgidum. Wariedaden. são. js aa soja ro ci EUR RR 0 Simplex. ypo Mulgar= e. as so e jeboo o SRD O crio Canoco. 2.º Caractéres botamicos da secção de Valmor q que pertence p Os da 35.º secção, a saber: espiga branca mais larga no perfil, apertada ; gtumas agarra- das ao casulo, glaucas ; casulo amarellado, glabro; palha cheia, recurvada ; grão po- lido. 3.º Caractéres botanicos espretíicos do typo Os mesmos da secção. h.º Locadado Aonde mera Districto da Guarda. Concelho de Foscôõa. Parochia de Foscôa. 5.º Estudo industrial é chico 8.º Exame do grão: Aspecto phySiCols ira obter ER RE grande, branco, bagudo e liso Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 70,00 Densidade «xs «sie s os lérssa to suo AR EE 1,26 2.º Exame das farinhas : Aspecto physico da farinha espoada........... alvissima, aspera, grossa e pouco pe- f = (farinha panificavel , 72,59 (gadiça Cp ii nous Lote do farinha espoada. ... 27,00 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha espoada:./. js ajerola elege io oia vo de RR 90,75 3.º Exame dos glutens: Aspecto physico. . ... . ss.leja ju aca jaio jaiodil o jane A Pole esbranquiçado, firme e pouco elastico uantidade em fresco... 26,20 arinha es) AR d Por doa de A quantidade em secco.... 8,92 agua que absorveu ..... 17,28 Quanto medrou na cosedura......cccccsiiio. 3 vezes o volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES 4.º Exame do pão: 51 (leve Qualidades organolepticas. .................. pouco esponjoso, branco, pouco tôfo e Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 117,8 Artarque absorveu. ss 0 s/a =/=)2 ob o opafe fd o 8 Broto 51,5 Agua retida depois da cosedura .............. 17,8 5.º Analyse immediata do grão: Aalhyeroscopica.. «sas ccns toca ba 9,98 Mate riasigordaS ss se se soa casas adro ela ce bao 1,492 Materias proteicas.......... sos toa ep 9,50 Materias amylaceas. Due sado e 74,79 Celulose: x. rs rsss rea ole ep RR RR A 2,29 (Dito sã a TE a e e OU e SM 2,02 6.º Estudo-chimico agricola da terra que 0 produziu 4.º Qualidades physicas da terra: Cor da terra... socos 5 VER A cinzenta azulada Natureza agricola... ato (o o o E argillo-siliciosa Estadoideidivisão =... 0... AR solta e fina Densidade =. 500 Lattss e nor MPRPR RE UA 2.50 Grau de imbibição em relação ao humus....... 24,24 Grau de deseccação em relação à areia ........ 53,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 4 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 2h relação à argilla. .. [adhesão ao sobro....... 25 2.º Analyse immediata ou agricola em 100 : restos indecompostos.... 1,40 Parte organica...... f soluvel ..... 0,34 jumus ..). insoluvel.... 1,26 agua hygroscopica...... 2,00 pedras e areia ......... 42,60 Parte mineral....... EMI So oB no jopaoo 52,34 calcareo [a vestigios saes soluveis.......... 0,06 3.º Analyse elementar mais importante em 100: DNA VEDA AR O En a RREO RPC) 2 7 0,485 f protoxydado .......... 0,740 a ia | peroxydado........... 1,36 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 52 ( O cu 819) TUANVXATY ODIUL DOS TRIGOS PORTUGUEZES »5 X TRIGO ALEXANDRE (Fig. 10.º) 1.º Classificação botanica TND aoee eb eoaban ao Eua do cevCAdao de ac ab Molar. WE pecien RE Triticum turgidum. Nefedade erre Simplex. DO CA pop RPE o poea ra uodpadverao Alexandre. 2.º Catactéres votamos da 38.º secção de Vimorin q que pertence Os da 38.º secção, a saber: espiga grossa, quadrada, branca; glumas e casulo villosos : barbas divergentes; grão grosso, polido. 3.º Caractéres botanicos especificos do tiypo Os mesmos da secção. h.º Localidade Aonde very Districto de Funchal. Concelho de Santa Cruz. Parochia de Santa Cruz. 5.º Estudo industrial é chimico 1.º Exame do grão: IN Specto: PhYSICO).). is arananosaçávaçã ora po pao grande, branco, liso e bagudo Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 78,50 Densidade-.. . ecsrerais eee rara 070) O AR RR 1,33 2.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... branca, entrefina, aspera e pouco pe- ( farinha panificavel . 90,00 (gadica ERR de O de ondo [arinha espoada.... 45,00 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha CSjUCEà E RS E e ba a of ogia 42,10 3.º Exame dos glutens: Aspecto physico.... .)- .je/»i oia 0/u/e MAN RAR aaa a esbranquicado, firme e pouco elastico : uantidade em fresco... 36,90 Por 100 de farinha es- (q 3 a quantidade em secco.... 12,20 agua que absorveu ..... 24,10 Quanto medrou na cosedura.........ccicioo. 4,5 vezes o volume em fresco poada sas stsmyaorçess | 24 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 4.º Exame do pão: Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 130,0 Agua que absorveu .........ccccccsesanctos D7,5 Agua retida depois da cosedura .............. 30,0 >.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopicam his ain sono. 12,03 Materias gordas. . =... 10 o SRS (o/a) o ato) roda 1,50 Materias proteicas .. MBM corel 114,59 Materias amylaceas 69,60 Cellulose . suntent eus Mia sta a RA 3,18 (CINZAS: isto since fere a casei ep RR 2,40 6.º Estudo chmmico-agriuola da terra que 0 produz 1.º Qualidades physicas da terra: (Gôr da terra... cc see o etoro cs e vermelha café Naturezasagricolals = ira oito ocre e TR argillosa Estado de divisão. ..:... 0. esa JMR dr em grumos tenaces Densidade: «sessao pace gere voçes ERR 2,04 Grau de imbibição em relação ao humus....... 18,00 Grau de deseccação em relação à areia ........ 25,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 35 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... E) relação à argilla. .. [adhesão ao sobro. ...... 36 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: press indecompostos.... 1,20 Parte organica ...... h soluvel ..... 0,74 | UMUS -- [insoluvel ... 10,38 ; agua hygroscopica...... “4,20 pedras eareia......... 19,20 Parte mineral....... argila. SEE E 62,69 calcareo MEN RE vestígios saes soluveis.......... 1,62 3.º Analyse elementar mais imporiante em 100: DV Ao RR RESETE TÃO io 6 6/3 56 6% Bj 0,437 Í ( protoxydado .......... 0,660 DOBRO cestas | peroxydado........... 1,20 E) DOS TRIGOS PORTUGUEZES (LE cu 81) QUIDS 6 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO XI SCICILIO (Fig. 44.º) 1.º Classificação botaniea CRUDO:: sos spacja re areia Serato aah Tae AR RR Molar. DS RR RR notas qd oo Triticum turgidum. Variedade: ... 00% sm e seo custe to E cafe CNT Simplex. MVIDO VULGAR. re joio to jocouo ato E DR Seicilio. 2.º Caractives botunicos da 40.º secção de Vimoria a que pertence Os da 40.º secção, a saber: espiga grossa, quadrada, mais larga na face das espiguetas; barbas muitas vezes caducas; palha grossa, tombada. 3.º Caractéres botanicos espeerficos do typo Os mesmos da secção, e mais: espiguetas serradas, barbas curtas. H.º Localidade Aonde nevu Districto de Leiria. Concelho de Porto de Moz. Parochia de S. Pedro. D.º Ystudo industrial q chiymico 1.º Exame do grão: Aspecto physico.;... e jocgete jeto jo ER RR mediano, deslavado e rugoso Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 73,50 Densidade «a seres sto EMO o e RE 1,26 *.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada. .......... branca, grossa, aspera e pouco pega- | farinha panificavel . 64,09 (diça | farinha espoada.... 17,00 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha Quantidade em 100 de grão C3p0adA pego foyono cisfe aporcneforshe topo RR RRE RE E 44,00 3.º Exame dos glutens: Aspecto physicon = amarellado, firme e elastico PoRADO de farinha Gs: (uai o em fresco... 26,70 a pa em secco.... 8,80 Da Road agua que absorveu ..... 17,90 Quanto medrou na cosedura................. 4,5 vezes o volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES a 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas................... pouco esponjoso, trigueiro, e pouco Rendimento por 100 em peso de farinha espoada 129,0 (leve Aun querabsorveu. =. scr sre ro o qo 60,0 Agua retida depois da cosedura .............. 29,0 5.º Analyse immediata do grão: Noah ySTOSCopiCa.=/.748s7e o (ereto torovofero sor ef RR 10,02 temas gordas ... ... 0. ves cr ale t cido o 1,15 Materias proteicas”.. «scr cereiore oro to to lero todo AA 8,74 Materias amylaceas. ....wcs css neces nan 75,50 MBeulose:... seres eat é cota lsioto ME A 2,84 ÚIRZAS- eo e SEA LO do E e ADA 1,75 6.º Estudo chymco-agrieola da terra que 0 produzia 1.º Qualidades physicas da terra: (onidanterra. ss. gusos oseinetrer CR dE ERR cinzenta canella Natureza agricola... pio ice o RE argilosa Estado deldivisão.. .. 0 ojojora o rato o SEE em grumos tenaces Densidade! ss. seo sereno o a o fo o PIE BZ Grau de imbibição em relação ao humus....... 19,00 Grau de deseccação em relação à areia ........ 24,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 24 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 3) relação à argilla. .. [adhesão ao sobro....... 47 2.º Analyse immediata ou agricola em 109: restos indecompostos.. .. 0,60 Parte organica ...... PA soluvel ..... 1,60 | ““ linsoluvel.... 2,60 agua hygroscopica...... 2,20 pedras e areia. ........ 17,00 Parte mineral....... argila. E re 75,80 calcareo!: =... masa vestígios saes soluveis.......... 0,20 3.º Analyse clementar mais importante em 100: NA a da e AR o cy cro 0,363 ; | protoxydado .......... 0,600 a OE | peroxydado........... 1,20 Acidoiphosphorico- =. 0,020 MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. II. P. II. EST. INDUST. E CHIM. DOS TRIGOS PORTUGUEZES XI POMBINHO (Fig. 12.º) 1.º Classificação botanica Grupo ssa .s ERR RI o ARE O So Molar. Especie, ........ da a ja (0 ja EO RNA tcp Triticum turgidum. Vaniedade; ts nem a sms inca a Arara Simplex. ypo vulgar... assess Sapato loiro oro ita Pombinho: 2.º Coractéves botanicos da secção 40.º de Vimori a que pertence Os da k0.º secção, precedentemente descriptos. 3.º Caractires botanicos especvíicos do taypo Os da secção, e mais: espiguetas desunidas, acamadas contra o rachis, h.º Localidade donde ney Districto de Faro. Concelho de Lagos. Parochia de Barradas de Budens. 5.º Estudo iadustrial q clinico 1.º Exame do grão: 59 Aspecto; physico. . .../.. anseia sn apoio ada oo grande, amarellado, liso e ovoide Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 87,75 Densidade... seis store e rulaio o eco ER 1,30 2.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... trigueira, grossa, aspera e pouco pe- : ; - (farinha panificavel. 63,00 Puaniidade om 100 de grão farinha espoada. ... 17,00 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha ESpoada o seio eajeio «15 0/0 MS SR 11,70 3.º Exame dos glutens: Ê Aspecto pliysico!. |... . e. aiajo/=/0 1. e IA E amarellado, firme e elastico POr AQUido a ce quantidade em fresco ... 34,97 ia quantidade em secco.... 11,60 PESE agua que absorveu ..... 23,37 Quanto medrou na cosedura............cc.. 5 vezes o volume em fresco S« (gadiça 60 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas........ NEGRA Dadas pouco esponjoso, trigueiro e pouco le- Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 136,0 (ve Agua que absorveu..... PRRNNERRS EESC O O PAR 51,5 Agua retida depois da cosedura .............. 36,9 5.º Analyse Immediata do grão: Agua hygroscopica ...... DR é cr UR 10,30 Materias gordas. ............ SION too bao 20 1,96 Materias proteicas ...... BRR e Mac lo o A PR 11,25 Materias amylaceas ........ PRBNSOR cp Rce o 71,41 Celulose. . sumplega Eles ate ARAL ROS CinzaS:, serao ea Melao vo PRA Etr do 12,00 6.º Estudo chvmco-agricola da terra que o produzia 4.º Qualidades physicas da terra: Cor da terra........... o O arg o o sas vo neo» pele et Natureza agricola. RR « argillosa Estado de divisão... «. cjuloio o RPA em grumos tenaces Densidadess8 es es ne sete A E DP AR 2,50 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 23,00 Grau de deseccação em relação à areia ........ 29,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 18 Grau de adhesão em | adhesão ao ferro....... 42 relação à argila. .. [adhesão ao sobro....... 4h 2.º Analyse Immediate ou agricola em 100: | restos indecompostos. ... 0,60 Parte organica ...... animo soluvel ..... vestigios | ““Uinsoluvel.... 2,20 agua hygroscopica...... 5,20 pedras e areia ......... 19,20 Parte mineral........ argila . Sae NR 62,03 | calcareo ee 10,37 saes soluyeisMBE o. 0,40 8.º amalyse clementar mais Importante em 209: Mole sita io ease SS CAES de PARE 0,315 Frio | protoxydado ........ «. 0,400 DANE a | peroxydado.......... 28 DOS TRIGOS PORTUGUEZES (gr cu 314) OVITAY ONIIL 62 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO XII RUBIÃO (Fig. 13.º) 1.º Classificação botanica EU) o 000209 599999050 009 20553) sdas Molar. Especie LEE POBRE Ro Triticum turgidum. Variedades. opor o jo foda jeta(o pon SR Ro SR o Simplex. ig DESSA ou on oras go de av ae 9554 Rubião. 2.º Coractires botanicos da secção 42.º de Valmoria q que pertence Os da secção 42.º, a saber: espiga quadrada, mais larga na face, pyramidal; glumas e casulos villosos ; barbas às vezes caducas; grão polido. 3.º Caractíres botanicos especificos do tiypo Os da secção, e mais: espiga de côr arruivada. 4.º Localidade à onde veias Districto da Guarda. Concelho de Castello-Rodrigo. Parochia de Verniosa. 5.º Estudo vadustrial e chynico 4.º Exame do grão: Aspecto physico... ..... ec o= nm anne meio grande, esbranquiçado, liso e bagudo Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 75,50 Densidade .. casaco carrera apo leio PIERRE ER 1,30 ?.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... branca, fina, macia e pegadiça E « (farinha panificavel . 69,30 Dana tado mio o farinha espoada. ... 30,00 Peso em kilogrammas por hectolitro de farinha espoada- .jóisaro a o/em o jojsis tape jo ade RIR 38,00 3.º Exame dos glutens: Aspecto MphySiCO: . o jojofajais ja o o jo)o fato E o RR esbranquiçado, firme e pouco elastico Pardo dédaninlia es quantidade em fresco ... 27,30 a quantidade em secco.... 9,29 NANA agua que absorveu ..... 18,01 Quanto medrou na cosedura..........cccccãs h,5 vezes o volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES 63 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas .................. pouco esponjoso, trigueiro e pouco le- Rendimento em peso por 100 da farinha espoada 127,5 (ve Agua que absorveu. ....... bs cielote saber reto io h6,6 Agua retida depois da cosedura.............. 27,5 5.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopica .........ccccccccicsroo 11,00 Materias gordas. .......ccecccesussresassso 1,35 Materias proteicas...........ccicisc isto. 9,50 Materias amylaceas..............ccicc cc... 73,08 Celilose...: «mo smespeio so spo ersjanofoto) é) Lo cd PS 3,20 DIZAS a je cisto aroeira esa e cr Apae rea MRE AR 1,87 6.º Estudo climico-agriola da terra que 0 produzia 1.º Qualidades physicas da terra: Covo Do Ga Lo Sa av Dono amb eosesDs cinzenta azulada Natureza agricola ...........cccecsseccs sos argillo-siliciosa Estado de divisão... .......ccscinccoo cocos solta e fina Densidade... age o se ereto o PER 2,00 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 24,00 Grau de dessecação em relação à areia ........ 54,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 10 Grau de adhesão em ( adhesão ao ferro ....... 23 relação à argilla.. .ladhesão ao sobro....... 25 2.º Analyse immcdiata ou agricola em 100: restos indecompostos ... 1,00 Parte organica ...... | soluvel ..... 0,04 humus ..). | RR Bb 30 FAO agua hygroscopica ..... 1,60 pedras e areia........ o 45,80 Parte mineral....... argila... cb sr TA 49,40 calcareo) pp vestigios saes soluveis .......... 0,20 ARDOR aieraga dera era irávo data isa ace f o AA 0,208 Er ER protoxydado........... 0,480 a peroxydado ........... 1,52 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 64 FL eu da ) OATVISVO ODIIL DOS TRIGOS PORTUGUEZES 65 XIV CASCALVO (Fig. 14.º) 1.º Classucação botanica Cpo Sapo Ega ponasbat do 0 bo nbas amargos Molar. EiMadO asosub so doc npoe co doca pb dgasr Triticum turgidum. Vedteo Bo ERR co on po dor ane Simplex. Teto upa en dao Ba o 065 ob» Header Cascalvo. 2.º Cavactires da secção 42.º de Vilmorim q que pertence Os da 42.º secção precedentemente descriptos. 3.º CGuractives botanicos espeerficos do typo Os mesmos da secção, e mais : espiga esbranquiçada no casulo. h.º Localidade Aonde very Districto de Leiria. Concelho de Alcobaça. Parochia de Alfeizirão. D.º Estudo imdustrial é chiunico 4.º Exame do grão: Aspecto phySicO ja ejagodoy jo fole ja alo Oda Pa grande, esbranquiçado, liso e bagudo Peso em kilogrammas por hertoliti SE efe RR 79,75 Densidade... «sas caso crase mtoo) RR 1,30 2.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... amarellada, grossa, aspera e pouco EE ec DO de qr farinha panificavel . 69,64 (pegadiça farinha espoada ... 20,00 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha espoada) «srs javora spa jssopaia io ore LR 37,45 3.º Exame dos glutens: ASPecto phiySicO) 5.1. eca(o ao jo to TR esbranquiçado, firme e pouco elastico Poco Gina es quantidade em fresco... 29,00 dE quantidade em seeco ... 11,10 a Sa agua que absorveu ..... 17,90 Quanto medrou na cósediia EAR so cooif oMRR 4,75 vezes o volume em fresco MEM. DA ACAD, — 1.º CLASSE — 7. Il. P. II. 5) 66 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 4.º Examc do pão: Qualidades organolepticas......... PRA O a esponjoso, branco, e pouco leve Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 130,0 Aguai quelabsonweu o PE 57,5 Agua retida depois da cosedura.............. 30,0 5.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopica..............cco cos ico 14,53 Materias gordas... . as ao on PMES Oo cho 1,73 Materias) profeicas:..... efe No OR 10,93 Materias amylaceas ..........ccccecs comer 69,67 Gelulose . ..0 +: APENTRE SD O DE 3,18 CINZAS sessao sinto ira va A AD 2,96 6.º Estudo chumeco-agriola da terra que 0 produzia 1.º Qualidades physicas da terra: Cor da terra)... ais o piel o o RE amarella torrada Natureza agricola... ... ...... o ato O argillosa Estado de divisão, 5... .j- er soja m RR em grumos tenaces Densidade... «0 css siga ore o 2,27 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 17,00 Grau de deseccação em relação à arcia ........ 23,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 20 Grau de adhesão em | adhesão ao ferro ...... .h5 relação à argilla.. . |adhesão ao sobro....... h8 *.º Analyse immediata ou agricola em 100: | estos indecompostos. ... 0,40 Parte organiea ...... soluvel ..... vestigios | humus RE insoluvel.... 6,60 agua hygroscopica...... 3,00 pedras careia......... 13,00 Parte mineral....... argila, CER 76,23 calcareo.. .. cido vestígios saes soluveis .......... 0,77 Motenis 43 AE do MME): abit ago 8 0,145 Fóio | protoxydado .......... 0,600 ERRA An | peroxydado ........... 1,20 67 DOS TRIGOS PORTUGUEZES (gi cu “S) OCAXVD ODNIL 68 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO XV CAXUD O (Fig. 15.º) 1.º Classifração botanica (TUDO. soa srs teia as sie je sois o qora RR Star Molar. Bispecies” SANTO ud ara o eve E Triticum turgidum. Variedade "2 ss vais arrendar AE Compositum. Eypo vulgar... cao siso ear ar RR fofo (ER Caxudo. 2.º Caractives botanicos da 45.º secção de Yumorim a que pertence Os da 45.º secção, que são os mesmos da 4.º variedade (compositum) já. descriptos. 3.º Caractéres botamicos especificos do tiypo Os mesmos da seeção. h.º Localade Aonde neva Districto da Guarda. Concelho de Foscôa. Parochia de Foscôa. 5.º Estudo industrial x chimico 1.º Exame do grão: (Aspecto physico 1... 1. Jojo ARE RR grande, deslavado e rugoso Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 76,25 Densidade. nono nor RE RR 1,32 ?.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada....... «-.» trigueira, grossa, aspera e pouco pe- : = | farinha panificavel . 66,13 (gadiça Quantidade em 100 de grão farinhaies piada Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha espoada...... cias 0/0 nie o E E h2,65 3.º Exame dos glutens: Aspecto physico.....«. 2.0.4.0 6/0007: cinzento escuro, firme e pouco elastico PRADO de farinha ce quantidade em fresco... 30,90 quantidade em secco. ... 10,30 poadarEno no , agua que absorveu ..... 20,60 Quanto medrou na cosedura................. 4,5 vezes o volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES 69 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas. .................. não foi panificado Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 125,0 Agua que absorveu...........cccc crus ones — Agua retida depois da cosedura .............. — 5.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopica............ccccesecrecs 10,39 Materias gordas... ..... saio sjolniaio o jeto food e ra e A Materias proteicas). .. sas se o) o ojoio apagada ato 10,87 Materias amylaceas .............ccc css css. 72,99 Celulose. asse a ore o sa o a aja 2,20) ÚMNZAS És merdas eres apoto ofoja ia é Sm ERR 1,84 6.º Estudo-chimico agricola da terra que 0 prodziy 4.º Qualidades physicas da terra: Coridajterra.. ..s. 2 ss. 20 cc code TREE cinzenta clara Natureza agricola . 2... 0 cone ooo e siliciosa » Estado de divisão .............. | solta e grosseira Densidade: saio ave a era 2/06) Lelo o re 2,63 Grau de imbibição em relação ao humus.. .8... 21,05 Grau de deseccação em relação à areia ........ 58,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 9 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 20 relação à argilla... a ao sobro. ...... 23 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: restos indecompostos.... 1,20 Parte organica...... soluvel ..... 0,24 humus..),. insoluvel.... 2,76 agua hygroscopica...... 1,80 pedras e areia ......... 30,80 Parte mineral....... argila... 0/.;. det 00. 43,08 calcareo.,. . japan: vestígios saes soluvels.......... 0,12 AZOLBIA a a itaaia oro paris cr eba gao ja mca do RA 0,200 | protoxydado .......... 0,400 Do ae | peroxydado ........... 1,60 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO (94 cu 319) YYTON- OIsvund DOS TRIGOS PORTUGUEZES rh TRIGOS RIJOS XVI DURASIO-MOLAR (Fig. 16.º) 1.º Qassificação botavica (CrupOos copnda OB go o dba pooao cor dobnnoo nor Durasio. Especie. ........ GR ODRo dd o pl SR do o calor Triticum durum. Verde pot RR o rtp bao “.. Durum. OG BORAUI SAR: . io. eres oro r0 o o e Durasio-molar. 2.º Caractires botanicos da 46.2 seção de Vilmorim a que pertence Os da 46.º secção, a saber: espiga alongada, amarella ou vermelha; palha tombada. Tanto este como o typo seguinte (durasio rijo) são villosos. 3.º Caractives botavicos especificos do typo Os da secção, e mais: espiquetas desunidas, casulos bojudos, grão semiduro. n.º Localmdado Aonde via Districto de Lishoa. Concelho de Cascaes. Parochia de S. Domingos de Rana. 5.º Estudo industrial q chimico 4.º Exame do grão: Aspecto physico..... RR DRI NTE PAIO E «..... grande, pardento, liso, alongado e se- Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 82,50 (mivitreo Densidade. seen mese sta BERSLBRRSE 5 so go 1,35 2.º Exame das farinhas: Aspecto physico da, farinha espoada....... “... trigueira, entrefina, aspera e pouco (farinha panificavel. 59,80 (pegadiça Quantidade em 100 de grão | farinha espoada.... 12 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha ESpaadanioi ss elis PRP e RA ra ele Non) 3.º Exame dos glutens: SPECO) PIWSIGOR!. =). oco sarro eps PPM po RR pardo, amarelado, firme e pouco clas- Phi 100 de farinha es. | quantidade em fresco... 36,60 (tico poada .. ) quantidade em secco.... 12,20 agua que absorveu ..... 24,140 Quanto medrou na cosedura...........c.... 4,5 vezes o volume em fresco 72 EST. INDUST. E CHIM. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas................... esponjoso, atrigueirado e pouco leve Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 126,0 Agua que absorvem. ss o aja oco joe jo ata 57,5 Agua retida depois da cosedura .............. 26,0 5.º Analyse immediata do grão: Agua hySTOSCOpiCa- ct: fejoroo Re 14,00 Materias gordas; . . « popoeragdio ajojrafe (RE ep eo 1,50 Materias proteicas ................. Dt ADA 12,06 Materias amylaceas ............cccccse seo 69,70 Celulose = so o areia posar te Core RE 2.54 Cinzas +... SIMSÉ IS AD A IE E DS 3,20 6.º Estudo chimico-agricola da terra que 0 produzia 4.º Qualidades physicas da terra: Cór da terra... ass cujo tee = je O cinzenta clara Natureza agricola... io septo bo argillo-calcarea Estado de divisão... ... =. MPS semi-solta e fina Densidade: ; 2.206 era Ss ator ER E ERR E 2,00 Grau de imbibição em relação ao humus....... 25,00 Grau de deseccação em relação à areia ........ 31,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 12 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 23 relação á argilla. .. | adhesão ao sobro....... 25 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: pts indecompostos.... 0,40 Parte organica ...... has e > RA 0,14 | ““|insoluvel ... 2,90 agua hygroscopica...... 4,00 pedras eareia......... 18,80 Parte mineral....... argila. sea teres 53,83 calcareo/ RR 19,37 saes soluveis.......... 0,56 AOL err e ate Ma EUR os 0,388 protoxydado .......... 0,320 PER e eco peroxydado........... 1,48 (L7 cu 314) OLIM-OISVUNA T. HE. PI, 1.º crassE. MEM. DA ACAD. Tá ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO XVI DURASIO-RIJO (Fig. 17.º) 1.º Cassfcação botamica Grupo” ass fssnelgen sa aeee tri RA Durasio. Especie: tea cieialedo inojara ai ala ato poe A RR: Triticum durum. Variedades sds store opa RR RR Durum. By poryulgaR:s. ajssioto sjeieisjeto o foto E ES Durasio-rijo. 2.º Cavactives botanicos da 46.º secção de Yimorin q que pertence Os da 46.º secção, precedentemente descriptos. 3.º Caractires botanicos especificos do typo Os da secção e mais: espiguetas acamadas em trança ; casulo chato ; grão duro. h.º Localidade Vonte vera Districto de Lisboa. Concelho da Lourinhã. Parochia da Annunciação. 5.º Estudo industrial q clico 8.º Exame do grão: f Aspecto physico)-.... ./.i0s js (oo a grande, pardento, liso, alongado e vi- Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 85,50 (treo Densidade... ..c. 0000. «oc RS 1,833 2.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... trigueira, entrefina, aspera e pouco pe- (farinha panificavel . 69,40 (gadiça Quantidade em 100 de grão | urina 18 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha espoada! sais sjelare e opa) RR 38,60 3.º Exame dos glutens: Aspecto PhYSiCOL .: aj). sia 0 See pardo amarellado, firme e pouco elas- Ê Pr : PógiODide fics | quamaidada em fresco... 34,90 (tico o quantidade em secco.... 11,30 E DE E lagua que absorveu ..... 23,60 Quanto medrou na cosedura................. 4,5 vezes 0 volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES E) 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas ........c.cc.o.. pouco esponjoso, trigueiro e pesado Rendimento em peso por 100 da farinha espoada 133,3 Agua que absorveu... ......cAstems cen... 59,0 Agua retida depois da cosedura.............. 33,3 5.º Analyse immediata do grão: Agua hyeroscopica ....... cido GRhaR ENTRA 11,00 Materias gordas... se o(a vicio JE RRR TRA. 1,75 Materias proteicas....-.. cos ARS 10,64 Materias amylaceas. ........ fa 74,19 Mellulose saias: o series é virei 1,32 Cinzas sb sessmase a o o avo É sto PR 1,10 6.º Estudo chymico-agricola da terra que 0 produz 8.º Qualidades physicas da terra: Cox dapterra 4 teja ritos too torcido ERR PE cinzenta clara Natureza agricola. 1... 7 no DE RR RR argillosa Estado de divisão... =. cj coro RE em torrões duros Densidade... ses sissre ssa lo fot fera do ER E 2,04 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 40,00 Grau de dessecação em relação à areia ........ 24,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 21 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 50 relação à argilla. .. ladhesão ao sobro....... 53) 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: restos indecompostos ... 0,80 Parte organica ...... pa pRR-de e TR vestigios “" |imsoluvel.... 4,30 agua hygroscopica ..... 1,40 pedras eareia......... 5,20 Parte mineral....... cargilla............... 73,70. calcareo AM rr: 11,04 saes soluveis .......... 0,56 Agzote mbsBras cores elo laio !o o co So ER 0,182 protoxydado........... 0,600 RC Hs peroxydado ........... 1,80 cido; phosphorico;. “1h 171. 1a 0,035 10 « EA A == = EST. INDUST. E CHIM. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 77 XVII CANDIAL (Fig. 18.º) 1.º Gassicação botanica Cro anBo ada Dado don nado dans.» bo boa omni Durasio. Dieu EDER RR 6 o 35 4 do da Triticum durum. Vaniedade-. ..masesssss e eroe) 2010, MIS opostas Durum. Eyporyulgar: . cs. sis que coto joio avo/ o o PAR LDO efe a Candial. 2.º Covactires botamicos da secção 48.º de Vilmoria a que pertence Os da 48.º secção, a saber: espiga chata no perfil; barba muito comprida. Ha n'esta secção & subsecções : a 1.º caracterisada pelos trigos de barba branca; a 2.º pelos de barba preta; a 3.º pelos de barbas ruivas; e a 4.º pelos de casulo muito adhe- rente ao grão. — O typo em questão entra na 1.º subsecção (barbas brancas). ç 3.º Caractires botanicos especificos do typo Os da secção e 1.º subsecção supra, e mais: espiga e barba grande e branca; bago branco. h.º Localiade Aonde ney Districto de Evora. Concelho de Borba. Parochia de S. Thiago Rio de Moinhos. 5.º Estudo industrial e chinico 1.º Exame do grão: Aspecto) physico. ja soja fo 00] o) o) efe o RS grande, amarello, liso, alongado e vi- Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 87,00 (treo Densidade)... ....... as 0000! o 1,34 2.º Exame das farinhas : Aspecto physico da farinha espoada........... branca, grossa, aspera e pouco pega- . - (farinha panificavel . 60,93 (dica Ea ade ermv1DO do grão farinha espoada. ... 14 Peso em kilogrammas por hectolitro de farinha CSpoada. sro does ni oia atado 107000 AEE 38,00 3.º Exame dos glutens: Aspecto physICO.'. . 00 cisto 16 01070 SPAM E pardo, amarellado, firme e elastico Por donde ninhos quantidade em fresco ... 35,90 dada quantidade em secco.... 11,65 aa re agua que absorveu ..... 23,65 Quanto medrou na cosedura..........c.c.... 3.5 vezes o volume em fresco 78 EST. INDUST. E CHIM. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas. .................. massudo, branco e pesado Rendimento por 100 em peso de farinha espoada 135,0 Agua que absorveu ..........cccccsssecnsss 60,60 Agua retida depois da cosedura .............. 35,0 5.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopica...........cciicc cisco 14,19 Materias gordas .......... Aeee RR 1,92 Materias profeicas!. 1...) pe pe 11,35 Materias amylaceasH 1 a 71,80 Celulose . saseitsras qajó pars opta foi a OA RR O 2,04, Cinzas: De a erepnsrsatd crrórnado 15; = Po pA dE RR 1,70 6.º Tstudo chimico-agricola da terra que 0 produza 4.º Qualidades physicas &a terra: Côr da termas.» qosisrd eia raferato cre fode EL ER E cinzenta canella Natureza agricola... api ato no o pp argillo-silicisa Estado de divisão........... soa. em grumos estorroadiços Densidade... cce 2d. 0 ce e e fe PER 2,50 Grau de imbibição em relação ao humus....... 35,26 Grau de deseccação em relação à areia ........ 50,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 17 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 17 relação à argilla. .. [adhesão ao sobro....... 19 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: | restos indecompostos.... 4,20 Parte organica ...... j soluvel ..... 0,19 humus ..). insoluvel.... 3,80 agua hygroscopica...... 2,00 pedras e areia... ...... 35,20 Parte mineral....... argila. . .520 Meto ape Do 97,90 caleareo). pa vestigios saes soluvels .......... 0,31 Azote also anseio cosas orere period 0,533 | protoxydado .......... 0,320 PRRRÓOs ds ralo a peroxydado........... 2,28 (GL “U 31) VONVUS-VINVE OTTIUVAYV ONII 80 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO XIX AMARELLO BARBA-BRANCA (Fig. 19.º) 1.º Cassvfcação botanica GLUDO. aaiaco ardçapataço ispape ser sto (o CDE ore Durasio. Especie: . o si sis ser iarirr a ARE RE Triticum durum. Variedade Mat. SS soo CRER E Durum. Typo vulgar, seco .!. 0 0100001 RR Amarello barba-branca. 2.º Caractires botanicos da secção 48.º de Vilmoria q que pertence Os da 48.º secção e 1.º subseccão, precedentemente descriptos. 3 3 b) 3.º Caractives votanicos especiíos do typo Os da secção e subsecção supraindicados e mais: espigas amarelladas ; barbas onduladas na base. h.º Localidade Aonde ney Districto de Evora. k Concelho de Montemór. Parochia de Nossa Senhora da Villa. 5.º Estudo vadustrial é chiunico 1.º Exame do grão: Aspecto: physico) 4». .). =p) polo RR grande, amarellado, liso, alongado e Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 86,00 (vitreo Densidade:.: 2) i20. 00.0 RR 1,36 ?.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... amarellada, grossa, aspera e não pe- (farinha panificavel. 68,30 (gadiça |arinha espoada.... 16 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha Quantidade em 100 de grão espoada ., . sis essi o disso io e 38,60 3.º Exame dos glutens: Aspecto physico”!........... 0 cinzento, firme e elastico : “( quantidade em fresco ... 35,70 E farintiates quantidade em secco.... 11,98 eg né Per agua que absorveu ..... 23,72 Quanto medrou na cosedura................. 4,5 vezes o volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas,.................. massudo, trigueiro e pesado Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 133,3 ANTA, UIS AME DaIanodo dopo copa ao ve doapon a: 54,50 Agua retida depois da cosedura .............. 33,3 5.º Analyse immediata do grão: Ae anhyoroscopica..../....e eve japa loio go Rida MR oo 8,65 Materias gordas... . .isjaj- ajojó/o jato fo fel Seo co 1,92 Mierias proteicas ...... oro fd ia tee ae ore 12,25 Materias amylaceas:.. . .. = 00. AS fpoefto doe ol 72,50 Celulose... cota os sapo apisoioço seo DEE RI 2,58 (nzaso atoa qdo arara lepaio Em a RR RP 2,10 6.º Estudo chimico-agricola da terra que 0 produza £.º Qualidades physicas da terra: Coradanterra..- ss. 1 ae 1610 crase AR cinzenta escura Natureza agricola, . cj «joe caio fole ORE siliciosa Estado de divisão... -. qe dc oo A Sa solta e grosseira Densidade: asusseara a sara a srresero a SR 2,27 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 22,00 Grau de deseccação em relação à areia ........ 58,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 8 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro....... 20 relação à argila. . . [adhesão ao sobro....... 21 ?.º Analyse immediata ou agricola em 100 : | restos indecompostos. ... 1,00 Parte organica ...... RR soluvel ..... 0,12 I “* (insoluvel. ... 0,38 agua hygroscopica...... 2,00 pedras e areia. ........ 55,00 Parte mineral....... argila, .& ofeRa ae paços 40,90 calcareol Aa RR vestigios saes soluveis .......... 0,60 PANE oe e doado o Rap ado opa casoc ck 0,253 Fei protoxydado .......... 0,320 tb Es is oia peroxydado........... 1,00 Neido'phosphorico--1.1-1. -....0. joio jo 0,050 MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. HI. P. II. 11 81 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO gu dia) TIAVNYV ODIVL DOS TRIGOS PORTUGUEZES 33 XX ANAFIL (Fig. 20.º) 1.º Classificação botamica ET Secas ERRAR bon ado +S obras dc Durasio. Din RR RA AL or Agr ADO doe Triticum durum. Nantedade: 2... carris raro esco E popa Durum. ip auipo asa BRR ERR E Ao coco orar o canos Anafil 2.º Caractéres da secção 48.º de Vilmorim q que pertence Os da 48.º secção e 2.º subsecção da mesma (barbas pretas). 3.º Caractires botamicos especiíicos do typo Os da secção e subsecção supra, barbas pretas só na base. h.º Localidade Move veis Districto de Evora. Concelho de Villa Viçosa. Parochia de Nossa Senhora da Conceição. 5.º Estudo industrial q cluvuico 1.º Exame do grão: Aspecto) PhySICO. -. 0/27. 000 0/10 E RE grande, amarellado, liso, trifaceado e Peso em kilogrammas por hectoliiro .......... 80,50 (vitreo Densidade... sun soco = SERA E JRR 1,37 2.º Exame” das farinhas: . Aspecto physico da farinha espoada........... branca rosada, entrefina, aspera e Quantidade em 100 de grão farinha panificavel . 70,83 (pouco pegadiça farinha espoada ... 20 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha ESpOada; ss sia sia arara caso 0 0/0 0+ PAR 39,00 3.º Exame dos glutens: Aspecio/PhYSICO .+.1.)010:0/0 (670/0010 ER a a cinzento rosado, firme e elastico Por dOnadEnina cs quantidade em fresco... 40,40 arde quantidade em secco ... 13,60 ER O ada agua que absorveu ..... 26,80 Quanto medrou na cosedura.............c. 5 vezes o volume em fresco 11» 84 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas................... pouco esponjoso, branco rosado e pou- Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 130,8 (co leve Agua que absorveu .............cccseee eo. 66,60 Agua retida depois da cosedura .............. 30,8 5.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopica............ccciccrs ooo. 12,00 Materias gordas... .,.l-j-io ro fo Ros 1,98 Materias proteicas:.. 1... citei teatro 13,18 Materias amylaceas. . 1d o SR RR 67,90 Celulose .: .. is LUCIA O E 3,04 CINZAS às ss ea ss sra ia io ER 1,90 6.º Estudo chimico-agruola da terra que 0 produzia 4.º Qualidades physicas da terra: Córida terra... «jato e jorenerairio reto lo E ER atijolada Natureza agricola... .....)s 0.0. fr ER argillo-siliciosa Estado dejdivisão.. ..0 so DER semi-solta Densidade. seis eu co ororo o ore o E RE RPA 2,20 Grau de imbibição em relação ao humus....... 23,68 Grau de deseccação em relação à areia ........ 44,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 11 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 24 relação á argilla. .. |adhesão ao sobro. ...... 26 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: restos indecompostos.... 1,93 Parte organica ...... soluvel ..... 0,01 humus..). m insoluvel ... 6,67 agua hygroscopica...... 2,00 peda eareia......... 33,90 Parte mineral....... argila . -. AM 54,89 | calcareo. ... . LR vestigios saes soluveis.......... 1,60 PAM) (ENRIA MIRA SR POR E A MADE SS Bo a 0,550 protoxydado .......... 0,700 Per ooo peroxydado........... 2,90 DOS TRIGOS PORTUGUEZES TRIGO MONGIA (Fig. n. 21) 86 ) ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO XXI MONGIA (Fig. 24.º) 1.º Chassufiração botamica CD opooado aos aos cosa tmDo vo 450 DAME Durasio. DEEM ob pnea bobo o sor 5205000 0be bp Triticum durum. ET E RR o pop Dos baasah Durum. yposyulgar:;- (a4e40 1072/0100 pers ERR RE Mongia 2.º Caractives botanicos da 48.º seção de Vilmoria a que pertence Os da 48.º secção e 2.º subsecção precedentemente descriptos. 3.º Caracteres botanicos esprerícos do taypo Os da secção e subsecção supra : barbas todas pretas. 4.º Lotaldade Aonde nova Districto de Evora. Concelho de Reguengos. Parochia de Reguengos. 5.º Estudo industrial é chynico 4.º Exame do grão: Aspecto) physico) ..../.).e/0 op A RR grande, amarellado, liso, trifaceado e Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 85,20 (vitreo Densidade .......0- 0 copas sro RR 1,30 ?.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... avermelhada, grossa, aspera e não pe- - (farinha panificavel . 60,74 (gadiça Quantidade em 100 de grão jp my, espoada.... 13 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha espoada.. ss cus pote ay RR RR h0,85 3.º Exame dos glutens: Aspecto physico. ...... 0006 cure dose ispe pa pardento, granuloso e pouco elastico é “( quantidade em fresco... 44,70 Ford DO de daria quantidade em secco. ... 14,63 agua que absorveu ..... 30,07 Quanto medrou na cosedura................. 2.5 vezes o volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES 87 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas................... massudo, muito trigueiro e pesado Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 130,0 Agua que absorveu. ...........c.ccuce ecos» 60,6 Agua retida depois da cosedura .............. 30,0 5.º Analyse Immediata do grão: Agua hygroscopica...........ccccsiccciies 11,49 Maierias cordas... o. rop RR 2,33 Marias proteicas .......! cpf as E sro 14,31 Materias amylaceas ....................o..s 67,25 Cellulose-s.. 20 00 + = cre SR SS 1,58 (Dive RAR E o ASR à pó O 3,04 6.º Estudo chimico-agricola da terra que 0 prodaziay 4.º Qualidades physicas da terra: Corda terras. ...02 0100 >= RR cinzenta escura Natureza agricola. ....../. «o jo1o oaetado fo aaa siliciosa istado de divisão . ........ JRpte o a era solta e grosseira Densidade. teses ais eco os o ARO DA to 2.38 Grau de imbibição em relação ao humus....... 20,00 Grau de deseccação em relação à areia ........ 70,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 8 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro....... 8 relação à argilla. .. [adhesão ao sobro....... 10 2.º Analyse immediata cu agricola em 100: restos indecompostos.... 1,00 Parte organica ...... PARE soluvel ..... 0,08 ““(insoluvel.... 2,18 agua hygroscopica...... 2,50 pedras e areia ......... 66,00 Parte mineral....... argila” RESaM era 28,05 calcareo. DE vestígios saes soluvels.......... 0,19 3.º Analyse elementar mais Importante em 100: ADORO As apja rs tare cera sera eo ato va 1a fase a SER EE 0,272 | protoxydado .......... 0,260 Dniiao ao cas caça | peroxydado........... 1,44 EST. INDUST. E CHIM. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 89 XXI AMARELLO BARBA-PRETA (Fig. 22.º) 1.º Classificação botamica (Cine Sa a RR E o Er O cid AMO É Sb Durasio. DSpeb GAR RR RR GORE. Pr sr Re Triticum durum. WManiedade. ass sus crendo do e RS SIT E Durum. VRO VULoar (e are crio eco a a Amarello barba-preta. 2.º Garvactires votanicos da 48.º secção de Yimorm a que portenco Os da 48.º secção e 2.º subsecção da mesma (barbas pretas) precedentemente descriptos. 3.º Cavactires botamicos especificos do typo Os da secção e subseccão supra e mais: espiga mmor, barba toda preta. h.º Locuidade Vonde vera Districto de Faro. Concelho de Faro. Parochia da Sé. 5.º Estudo madustrial é chynico 1.º Exame do grão: PRA MS RR E o Sos dosboctr grande, amarello, liso, alongado e vi- Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 81,25 (treo Densidade ..........000000 MPB RE 1,31 2.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... amarellada, grossa, aspera e não pe- DR iadado om AO0 de grão (farinha panificavel . 64,24 (gadiça | farinha espoada.... 16 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha espoada. ... as. 0.00. 0000 RR 40,10 3.º Exame dos glutens: Aspecto physico;....... . (oo o AA RR A cinzento amarellado, granuloso e pou- Por AO dae | quantidadis em fresco... 34,30 (co elastico quantidade em secco.... 44,55 poada,- pra ER ) . E ' agua que absorveu ..... 22,75 Quanto medrou na cosedura................. 3,9 vezes o volume em fresco MEM, DA ACAD.— [.º CLASSE, — T, HI. P. II. 12 90 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas................... massudo, trigueiro, e pesado Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 131,6 Agua que absorveu ............cccossse mo. 60,00 Agua retida depois da cosedura............... 31,6 5.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopica..........ciciccces socos 13,02 Materias, gordas. ..... rose cova o) ERR RS edgar 1,80 Materias, proteicasif MAE MR 10,93 Materias amylaceas .. .. .isjoie ejeje jo elo ate o load 67,99 Cellulose.. & mM 124; 40.0 4 aurrearÃe Fe Arad SAR 3,20 CINZAS... so, ao soci ser ore dedo vo jarteg RE RR NPR 3,06 6.º Estudo chymico-agricola da terra que 0 produz 4.º Qualidades physicas da terra: Côr da terra... io soro eso RR RE cinzento-canella Natureza agricola, . is... oc jerntoro ED E SE argillo-calcarea Estado de divisão..................0.: ER torrões duros Densidade: . so siso eso a o uia o Ro RR 2.08 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 13,16 Grau de deseccação em relação à areia ........ 29,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 12 Grau de adhesão em | adhesão ao ferro ....... 28 relação à argila... !adhesão ao sobro....... 29 *.º Analyse immediata ou agricola em 100: restos indecompostos. ... 0,60 Parte organica ...... ab soluvel ..... 0,55 “* (insoluvel.... 1,45 agua hygroscopica...... h,40 pedras eareia......... 6,00 Parte mineral....... argila... db. o oloaa 76,40 calcareo. ERR 9,65 saes soluveis .......... 0,95 Amotes expo rspearáso ares boy so veto ope MR 0,254 FaMs | protoxydado .......... 0,360 A | peroxydado........... 1,7h DOS TRIGOS PORTUGUEZES e - E ana 92 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO XXHI JAVARDO (Fig. 23.º) 1.º Classificação botamica GRUpO! sos is ersraneate e apevede rar ERA RR Lee E Durasio. Especiere ne esod o ur cr too 1 6 Triticum durum. Variedade LS). sean pote era MR RR Durum. Typormulgar 204 nen o RR RRRE O Javardo. 2.º Caractires botanicos da 48.º secção de Vilmorim a que pertence + Os da 48.º secção e 2.º subseeção precedentemente descriptos. 3.º Caractéres botamicos especificos do typo Os da secção e subsecção supra e mais: barba toda preta e casulos raiados de preto. h.º Localidade Monde vera Districto de Faro. Concelho da Albufeira. Parochia de Albufeira. 5.º Estudo industrial e cliimico 1.º Exame do grão: Aspecto physico;.... .,... co oia RA RE grande, alambreado, liso, roliço e se- Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 75,00 (mi-vitreo Densidade... .c cc oct oo do IR RR 1,32 *.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... amarellada, aspera, entrefina e pouco Quantidade em 100 de grão ( farinha panificavel. 62,00 (pegadiça | farinha espoada.... 15 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha espoada ....... e. 00d 4 E 39,25 3.º Exame dos glutens: Aspecto physico. ........- o 4 oa TO cinzento amarellado, granuloso e pou- Por 100 de farinha és a em fresco... 36,80 . (co elastico quantidade em secco. ... 12,16 poada/s sc sets j agua que absorveu ..... 24,64 Quanto medrou na cosedura................. 3 vezes o volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES 93 £.º Exame do pão: Qualidades organolepticas.................. massudo, trigueiro e pesado Rendimento por 100 em peso de farinha espoada 126,6 Anual que absorvem. ... ss. ar area UE 60,6 Agua retida depois da cosedura .............. 26.6 +>.º Analyse immediata do grio: Agua hygroscopica.............. ARS SMMSS CSA 10,30 Materias gordas. . 1.0.2 pdoe O 1,90 Materias proteicas .................. É AR 11,56 Materias amylaceas ....... ARRRRO So 5-0 71,86 Gellulose.. 240127 2.4, nro RR 2,38 MIZAS Sto ese cera sra dis ese arari cr SAR 2,00 6.º Estudo chmmco-agricola da Levra que o produzia 4.º Qualidades physicas da terra: Coridaiterra”.. so. je je oro oia (é jo, RR cinzenta clara Natureza agricola. . ... . == cui E PECA Rar argillo-calearea Esitadolde divisao... ....-. LEME Do ir em grumos tenaces Densidadess. 0. seno sao, E DRE RS 2,38 Grau de imbibição em relação ao humus....... 18,00 Grau de deseecação em relação à areia ........ 24,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 29 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 59 relação à argila... tadhesão ao sobro. ...... 63 2.º Analyse immediata ou agricoia em 109: jaete indecompostos.... 0,20 Parte organica ...... na soluvel ..... 0,96 | ““linsoluvel.... 2,64 agua hygroscopica...... 3,80 pedras e areia. ........ 8,00 Parte mineral....... argila, . EPMD 77,36 calcareo . - RR 6,50 saes soluveis .......... 1,14 AZOe so o eis soa to novo ol ofot ipa o RS 0,208. | protoxydado .......... 0,360 ETTA ga pi | peroxydado........... 1,04 (ge US) QAMOD AQ YZY. ODIIL EST. INDUST. E CHIM. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 95 XXIV AZA DE CORVO (Fig. 24.º) 1.º Classificação botanica CUUIONAÇE RE PRE RR ERR o Spcié ro de cs be Durasio. PRPORC (isto tejo rs a safa o a ore a SD Triticum durum. Manedade...... o. coca APG elai DRE Durum. PO VuÍgar. s 08 ses 6u.é MM a ai RA Aza de corvo. 2.º Caractires botanicos da secção 48.2 de Valmoria a que pertence Os da 48.º secção e 2.º subsecção da mesma (barbas pretas) precedentemente descriptos. 3.º Caractives votamos especificos do tiypo Os da secção e subsecção supra, e mais: espiga muito larga no perfil; casulos avermelha- dos ; barba toda preta. h.º Localidade onde ves Districto de Faro. Concelho de Faro. Parochia de S. Pedro. 5.º Estudo industrial é chyuico 1.º Exame do grão: Aspecto physico-=...º.isjaço e, Ae grande, fuseo, rugoso e alongado Peso em kilogrammas por heetolitro .......... 79,25 Densidade ss. sq esse acc E 1,31 ?.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... amarellada, grossa, muito aspera e : = iam ificavel.. ) ão pegadica Dntidade em 100dé eso! farinha panificavel . 64,50 (não pegadica | farinha espoada. ... 14 Peso em kilogrammas por hectolitro de farinha espaada. sai. - o seo onto 01 RR 42,75 3.º Exame dos glutens: Aspecto plmsico. .. ..c. . e. vue RS cinzento amarellado, granuloso e pou- Por AOC a cs quantidade em fresco... 36,90 (co elastico poda quantidade em secco.... 12,04 agua que absorveu ..... 24,86 Quanto medrou na cosedura................. 3,5 vezes 0 volume em fresco 96 EST. INDUST. E CHIM. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas ........icccccs.. massudo, atrigueirado e pesado Rendimento em peso por 100 da farinha espoada 130,0 Agualiquelabsonveu «Miojo sto sto ao 57,75 Agua retida depois-da cosedura.............. 30,0 5.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopica .......u o aja af Ju 10,82 Materias gordas... ... «guias ass o ma 1,90 Materias profeicas,. .J. de ejer= oo a E 11,15 Materias amylaceaS; rj 15 se /patdo o o Rj 71,59 Celulose see siesersaiser sara oe ETR 2,04 Cinzas 2 iepuna tu ba À SA RE 2,50 6.º Estudo chimico-agricola da terra que o produzia 1.º Qualidades physicas da terra: Cor daterra ... se esieo to orsio o Sb vermelha Natureza agricola...) cp JR argillo-siliciosa Estado de divisão: . 1d o RR solta e grosseira Densidade. ro ea srtr nar e PE a ooo RPA RR 1,92 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 12,00 Grau de dessecação em relação à areia ........ 47,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 12 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 21 relação á argilla. . . ladhesão ao sobro....... 2h 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: predios indecompostos ... 0,90 Parte organica ...... Rosas e Shen a 0,24' | “ |insoluvel.... 4,86 agua hygroscopica ..... 3,00 pedras e areia. ........ 36,00 Parte mineral....... argila. .sJefo o 54,98 calcareo . RR 0,46 saes soluveis .......... 0,16 Azote) «srsliagan tar erbia! lero a tc letas ERR 0,333 protoxydado........... 1,06 Ra peroxydado ........... 1,39 Acido phosphorico..........ccccccssse cosas 0,051 E OS TT?D])J::: | HS" == === T— E E a (ge "u"Sta) QTUOLATANVMA ODII 98 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO XXV VERMELEJOILO (Fig. 25.º) 1.º Classificação botanioa GLUpO: saias stars gera o anja ro era oro E SA Durasio. Especiê.. . zo css sas mo dog DA INR Triticum durum. Variedade ....2..0000000 02h Durum. Typo vulgar... .. sas 0uieo o RR SS Vermelejoilo. 2.º Caractéxes botanicos da seção 48.2 dy Vilmorim q que pertence Os da 48.º secção e 3.º subsecção da mesma (barbas ruivas). 3.º Caractêres botamicos espreríios do typo Os da secção e subsecção supra e mais: espiga e barba muito grande, cór arruivada. h.º Localidade Aonde vera Districto de Portalegre. Concelho de Elvas. Parochia de Aventosa. 5.º Estudo industrial e chimico 1.º Exame do grão: Aspecto physico. . . a... cite sjo jo doi a ERR RE grande, avermelhado, liso, alongado Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 80,00 (e vitreo Densidade... .... cce sro cito pa RR 1,28 *.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... avermelhada, grossa, aspera e não pe- (farinha panificavel . 55,60 (gadiça Quantidade em 400 de grão | farinha espoada.... M Peso em kilogrammas por heetolitro da farinha espoada ..... cocos ces 0/0 RR 40,70 3.º Exame dos glutens: Aspecto physico. .........../0 0 ERR avermelhado, granuloso e pouco elas- PURIDO de Eninbo ido quantidade em fresco... 30,00 (tico Res quantidade em secco.... 9,76 EESC PR Lada agua que absorveu ..... 24,24 Quanto medrou na cosedura................. 4,5 vezes o volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES 99 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas. .................. massudo, avermelhado e pesado Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 130,0 THarqUue aDSOLVeUl 2.4. ste atoto) 5 efe Pao PAR 54,5 Agua retida depois da cosedura.............. 30,0 5.º Analyse immediata do grão: Ea yo TOsCOpiCas). ot. crera lo toe a pado rodo 10,00 teriasigordas .,.1.72,5/. 7% cla eco /ato eee Ro 0 o 1,18 Maferiasiprofeicas . . 1. 01.150 RR RR Rd 9,24 Materias amylaçeas .... cito o iece nt RS RR dt 74,1 Welluloser ses so ses dé cab sao aee coleftaro 2,90 DZAS E pero o eia /ero oi Soro e eos esolo ad IS 2,00 6.º Estudo chimico-agricola da terra que 0 produzia 4.º Qualidades physicas da terra: Cor danterra. ss sessao oro to PRE roxa Naturezajasricola, .. .j. . ar njo/ore SRI RR RN argillo-calcarea Estadoide divisão =. =... roi RRRE E RS em torrões duros Densidade ss. so se ab seara ra ae DRA RP 1,92 Grau de imbibição em relação ao humus....... 31,00 Grau de deseccação em relação à areia ........ 39,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 30 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 19 relação à argila... (adhesão ao sobro....... 24 2?.º Analyse immediata ou agricola em 100 : restos indecompostos.... 1,10 Parte organica ...... soluvel ..... 0,26 (humus sete Er insoluvel.... 3,44 agua hygroscopica...... 3,20 pedras e areia ......... 14,40 Parte mineral....... argilla;. ppp 74,22 calcareo.. 44 ERR ERA. 0,58 saes soluveis.......... 0,80 VS ao do o oba AR RARE Bi Se 2 o o Gr 0,231 ( protoxydado .......... 0,280 Cinligsb sos oaas: Uperoxydado SC Eo.... 1,82 Ácido phosphorica a RR Rs mt 0,060 100 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO TRIGO MOURISCO (Fig. n. 26) DOS TRIGOS PORTUGUEZES 101 XXVI MOURISCO (Fig. 26.º) 1.º Classificação botanica (OUNO enebne ado Poni Sup ooripopocoLHonDuvs Durasio. Dead Soo poe DDEpo on bla Das sopa bc cobpede Triticum durum. Namiedade; 1... persas 52 areais MA Durum. IE ypo gulgano ==. cejsra re sero ae o PRA AM a Mourisco. 2.º Caractéres da secção 48.2 de Valmor q que pertence Os da 48.º secção e 3.º subsecção da mesma (barbas ruivas). 3.º Caractires botanicos especificos do typo Os mesmos da secção e subsecção supra, e mais : espiga menor, barba annegrada. h.º Localidade Yonde nes Districto de Portalegre. Concelho de Campo-maior. Parochia de S. João Baptista. 5.º Estudo vudustrial é chynico 4.º Exame do grão: IA Specto physico). 5... ateioiero é o AR ER mediano, fusco, liso, alongado e semi- Peso em kilogrammas por hectoliiro .......... 86,62 (vitreo Densidade . tocas o 0 area é 0 1,38 2.º Examejdas farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... amarellada, entrefina, macia e pega- ; - (farinha panificavel . 65,97 (diça Quantidade em 100 de grão MES rio RE Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha ESPOAdA -;. essta ra efe sia áre/sj0 10 7 SR 39,75 3.º Exame dos glutens: Aspecio)pliysico. . . .. iso ooo RS A cinzento amarellado, firme e elastico Por 100:de farinha cs: quantidade em fresco... 43,85 poada quantidade em secco ... 14,66 SS Srta agua que absorveu ..... 29,19 Quanto medrou na cosedura.............c.o. k,5 vezes o volume em fresco 102 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas.............. 00... esponjoso, branco, fófo e leve Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 133,3 Agua que absorveu...........ccccrcameneo 50,00 Agua retida depois da cosedura .............. 39,9 5.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopica .........cccccccsesese 9,92 Materias gordas . .... se «jo std dh 2,38 Materias proteicas ........cs coisas uso 14,31 Materias amylaceas .............cssscrccs 70,93 Gellulose. ... so SME MERO O nato 1,10 Cinzas. ssa me ses usar cpa DE RE 1,96 6.º Estudo chunico-agricola da terra que 0 produziu 4.º Qualidades physicas da terra : Cór da terra... je ca sm passjo mara oo to SA RR RR cinzenta escura Natureza agricola... . eee ee o o PoE RR siliciosa Estado de divisão... 2a cpa agr isiete fo PR solta e grosseira Densidade, terei os arara atereoa e fociae R 2,50 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 19,00 Grau de deseccação em relação à areia ........ 59,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 7 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro. ...... 22 relação à argila... [adhesão ao sobro....... 23 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: restos indecompostos..... 0,80 Parte organica ...... pe soluvel ..... 0,14 “ (insoluvel.... 2,66 agua hygroscopica...... 2,4) pedras e areia ......... 58,20 Parte mineral....... argila... . 0 ppa 39,62 calcareo; .... os RR vestigios saes soluveis .......... 0,18 3.º Analyse elementar mais importante em 100: a ADOOS, DUDA EA DD too 0,291 protoxydado .......... 0,240 oo bas daáa o peroxydado........... 1,96 103 DOS TRIGOS PORTUGUEZES 104 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO XXVII VERMELHO FINO (Fig. 27.º) 1.º Classificação botanica Grupo +. use ds, AC Durasio. Especie. ........cccsscuse ses esusamase mens Triticum durum. Variedade) ==. o aero aja fole e obeo o R RE R Durum. Typo vulgar. sc. ./eistejo esmola elo = OR Vermelho fino. 2.º Caractéves botamicos da 48.º seção de Vibmoria a que qrrtence Os da 48.º secção e 3.º subsecção da mesma (barbas ruivas). 3.º Cavactíxes Lotanicos especificos do typo Os mesmos da secção e subsecção supra, e mais: espiga avermelhada. H.º Localiade Aonde mevy Districto de Evora. Concelho de Reguengos. Parochia de S. Marcos do Campo. 5.º Estudo industrial é clinico 4.º Exame do grão: Aspecto physico..............cccrcrscrrses grande, vermelho, liso, trifaceado e Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 79,00 (vitreo Densidade... cos perco eins (ef 1,28 2.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada. .......... avermelhada, grossa, aspera e não pe- ! - (farinha panificavel . 50,60 (gadiça unido ao Luto ei farinha espoada. ... 14 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha espoada;.. . joe miss alo jatodo PARRA 42,60 3.º Exame dos glutens: Aspecto physico js. .jol-e o ore/e ave o o o o avermelhado, granuloso e pouco elas- DOADO de faria es quantidade em fresco... 26,60 (tico da quantidade em secco.... 8,93 ES AS agua que absorveu ..... 17,67 Quanto medrou na cosedura..............c.. 4,5 vezes o volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas................... massudo, avermelhado e pesado Rendimento em peso por 100 de farinha espoada 126,0 Agua que absorveu .............ccccs ooo... 53,00 Agua retida depois da cosedura .............. 26,0 5.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopica.............ccccssssceos 9,5% Materias) GORDAS .Jiteis (o aja) aio jo sto ol o ode nie 1,02 Matexias proteicas ... ..j. rele e talo to ARS ja 8,87 Materias amylaceas............s cousa cera 75,15 Glellulose! =... as cursores o scale sie a te RR 2,62 CinzaSp gasto jaeaio o q lso erao sto re A 2,80 6.º Estudo cnvmico agricola du terra que 0 produziw 4.º Qualidades physicas da terra: Coridantenrad.s.. 0 oo osso to RE vermelho-canella Naturezalasticola.. ......iojoio o opor Ee argillosa Estado de divisão................... cc... em torrões duros Densidades MM reis io re voto ro aro RS PRE 2,12 Grau de imbibição em relação ao humus....... 32,00 Grau de deseccação em relação à areia ........ 31,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 20 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 42 relação á argila. .. | adhesão ao sobro....... h3 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: restos indecompostos.... 0,80 Parte organica ...... pe soluvel ..... 0,24 ““ |insoluvel ... 1,46 agua hygroscopica...... 3,00 pedras eareia......... 23,60 Parte mineral....... argila. s.cço po SR 70,16 calcareo sc RE vestígios saes soluveis.......... 0,74 AzOLerS ar pare ereraie a é avos ovaioo ae ef io jo fole o jo PR RR 0,242 protoxydado .......... 0,560 o ad peroxydado........... 2,04 Ácido phosphoricoi = 0,020 MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. IM. P. II. 14 (ge cu 911) VHLYVN VINYS OTIMUVAV ONIIL EST. INDUST. E CHIM. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 107 XXVIII AMARELLO SANTA MARTHA (Fig. 28.º) 1.º Classificação botamiea Cpo cegandae dao duo soou aa 00 dn ab oinoo Durasio. Dispomos cosacanravo pegado sena o Bassannan Triticum durum. eva too E DAR 4 o 0 A Durum. Tina aaa Do das ao o o ada bad abas Amarello Santa Martha. 2.º Caractéres botanicos da 48.º seção de Vilmoria q que pertence Os da 48.º secção e 3.º subsecção da mesma (barbas ruivas). 3.º Caractires botamicos especiíicos do typo Os mesmos da secção e subseeção supra e mais : espiga avermelhada, bago vitreo, côr de canella. h.º Localidade Aonde ves Districto de Portalegre. Concelho de Elvas. Parochia de S. Vicente. 5.º Estudo industrial q chunico 4.º Exame do grão: Nspecto) physico.. .-/. 1. site o o - dp Sete muito grande, amarello, trifaceado, Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 80,50 (liso e transparente Densidade... srerarssseiernraço o ec 1,34 2.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada........... branca amarellada, entrefina, aspera fari 1fi nn) - gadiçe tantidade em/10O de grão arinha panificavel . 55,96 (e pouco pegadiça farinha espoada.... 15 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha esEibssoa papers od cobanDo é MAbarocos ado 59,95 3.º Exame dos glutens: Aspectorpiiysico;: 21... of.) jo) Rega ape pae ee cinzento, firme e muito elastico s uanti m fresco... 80 Por 100 de farinha es- sia dido e S5, quantidade em secco.... 11,93 agua que absorveu ..... 23,87 Quanto medrou na cosedura.................. k,5 vezes o volume em fresco 14 « 108 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas .................. esponjoso, branco, amarellado e pouco Rendimento em peso por 100 da farinha espoada 130,0 (leve Agualquelabsorveul ij dr ci 60,0 Agua retida depois da cosedura.............. 30,0 5.º Analyse immediata do grão: Agua hygroscopica ............c.cccssso. 12,72 Materias gordas... jade o ope te REAR epa 2,07 Materias proteicasshl. 11,56 Materias amylaceas?. 1-1... ce RE RA 70,15 Cellulose ups tório da pa 0,86 CMAS oe ómaris sieero ore sera se revo pastora FRED Ee 2,64 6.º Estudo chyamico-agricola da terra que 0 produz 4.º Qualidades physicas da terra: Cor da terra, si. sjecio feio eim e E RT negra Natureza agricola... E VA DRR argillosa Estado de divisão... ..............cccccwss em torrões duros Densidade : suas se eroorto roi o eso do E RE 2,07 Grau de imbibição em relação ao humus ...... 31,57 Grau de dessecação em relação à areia ........ 33,00 Grau hygroscopico em relação ao humus ...... 22 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 48 relação á argila. . . tadhesão ao sobro....... 49 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: restos indecompostos ... 1,20 Parte organica ...... h pm BA 0,10 umus..). insoluvel.... 5,10 agua hygroscopica ..... 5,60 pedras e areia. ........ 18,40 Parte mineral....... argilla:... 7. ep 69,36 calcareo . ...-- pico vestígios saes soluveis .......... 0,24 AoteM tato ISVE Ria a ane, bos tu a 0,290 protoxydado........... 0,280 E cr peroxydado ........... 1,92 109 DOS TRIGOS PORTUGUEZES L1O ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO XXIX LOBEIRO (Fig. 29.º) 1.º Classifração botanica DEDOS RR OA So do Eu bias nana Durasio. Especie... . soc o priest CARR toe Triticum durum. Variedade: » is oio)npo mioto po o RR AR Durum. Typo vulgar... cem mp RR E RS Lobeiro. 2.º Caractives botanicos da 48.º seção de Vimoria q que portenco Os da 48.º secção e 4.º subsecção da mesma (casulo adherente ao bago). 3.º Caractires botamicos especificos do tyo Os da secção e subsecção supra. h.º Localidade Aonde neu Districto de Faro. Concelho de Albufeira. Parochia de Albufeira. 5.º Estudo industrial q chynico 1.º Exame do grão: Aspecto !pliysico oi: 7- dpi dado o popoto jo po A muito grande, amarello, alongado e Peso em kilogrammas por hectolitro .......... 82,50 (vitreo Densidade... cream o cce 62 o RR EE 1,38 2.º Exame das farinhas: Aspecto physico da farinha espoada. .......... amarellada, entrefina, aspera e não (farinha panificavel. 58,60 (pegadiça Quantidade em 100 de grão [farinha ds pa 10 Peso em kilogrammas por hectolitro da farinha ESpoada é ..els je o fejo rogo teto oo e NE OR 41,75 3.º Exame dos glutens : Aspecto PhYySICO)!. .jojajs e o) ojoje o jo oro to pe PoE eo pardento, firme e elastico Por 100 de famintos | quantidade em Tresco... 40,40 ER * quantidade em secco. ... 13,36 as RR ne lagua que absorveu ..... 27,04 Quanto medrou na cosedura. .........cccccos 4 vezes o volume em fresco DOS TRIGOS PORTUGUEZES tt 4.º Exame do pão: Qualidades organolepticas................... pouco esponjoso, trigueiro e pouco leve Rendimento por 100 em peso de farinha espoada 128,3 iHTO (UE NS Asc on desde asse voga sa dA 66,0 Agua retida depois da cosedura .............. 28,5 5.º Analyse immediata do grão: any ETOSCODICa. -I-foysjeato ciefetolofeso!siojo otetoto efeio 11,30 atenas gondasfr 2 aa pe a et 2,29 RECTTAS PrOtelCaS/1.j. o pejo nie petogopolage ojos tape ge folofo 13,12 Re niassamiylaçeas cio sono oo er ade ate 69,45 Mellulose scr m js tie ide Apis 1,64 CITA SS Asas ater ER GM e UÇDO 2.20 6.º Estudo chimico-agricola da terra que 0 produzia 4.º Qualidades physicas da terra: CORdanerra: poe rerstssra perto rara ae il arg vermelho-café Naturezagasricola.. .sj- «joe cjopsseio toco SER argillosa Eisfadodderdiyisãos=.. see error te miolo teto em torrões duros Densidadess carr a sie reiaofs é ins SERA SS 2,00 Grau de imbibição em relação ao humus....... 15,79 Grau de deseccação em relação à areia ........ 22,00 Grau hygroscopico em relação ao humus....... 28 Grau de adhesão em (adhesão ao ferro ....... 52 relação à argila... (adhesão ao sobro....... E) 2.º Analyse immediata ou agricola em 100: restos indecompostos.... 0,20 Parte organica ...... E soluvel ..... 0,78 umus ..1. É insoluvel.... 7,02 agua hygroscopica...... 6,00 pedras elarejardo 8,20 Parte mineral....... arotlla 2, Seoiatetescicio e cororo 77,28 calcareo/ 1. :-PR reto ja vestigios saes soluveis .......... 0,52 VAN Ds dO à 6 SER RS e SERRA PR 0,160 = | protoxydado .......... 0,560 Férro sd | peroxydado........... 1,04 EI ec RR SM OPS a i ab od mimada “a ' (o Pe eg canta é “hu =: Rr PAR Th n Coe nto Ga Tod aliar Br tados VU ELE Pd rare gens oo o US A bs Lo vol sb sbisiiracaad ore fede Ro O CR b 6,MA a: PR PRRCR PESE CN ie ar dr “MR OR ri Eta Era Sida: dedo nao data mo esco USADO , d+ AMA bn PRA re e ER MR dy ENTE e do DEVO CORRER E RR TRA e ar TR TO Ea KSA SA ATT 1 tds Dyeias DEE 1 : q du aacute eshebitom. 4 Altos 6o Lag Re stato faria sto» ARRUDA Cd é, chorona ra RARE tá plo , uq asteri Oda SA sentia dia E DANE nagar vce e TA WA ) . + trio nafretor fa; RR O W DOR jp. PLA NA eo b AROS Um ad viu O GRANA qr ad | LA mo vo MAB à OUgbÃor tos apurada x EA PP f ape ha as uiustar io coiquos E Eres MAE OM QU | A a ape é, vinha que Ditmopthas |. liga COPE, god dis no PA Waveloa h Ra bg qu ato cotar) AVDA a BE OTTO dd ds A w y , A b , : Ba id ANSA O duedd da ani ro 5 apmleag | - AR pm AS e ma 20 vá) prtoplo pa ) Vl ces va inrentrto tur çdnsed “AB f tu Ro] UNR 1 NERO antro é e o E Ui vãos cr Oda E ke ft , | “sa EA t to qua al RARE! o y ts o 4 :* 5 " “ No PARTE TH PRIMEIRAS CONSIDERAÇÕES DEDUZIDAS DOS ESTUDOS FEITOS SOBRE OS TRIGOS E TERRAS DO REINO O exame minucioso que fizemos em cada typo de trigo e na terra aonde foi creado, o grande numero d'estes typos, forneceu-nos uma serie de dados que se podem comparar de muitas maneiras, e tirar de cada comparação uma consequencia. Póde-se estabelecer a comparação entre typo e typo vulgar, e achar as razões mais ou menos fundadas das suas similhanças ou dif- ferenças. Podem-se comparar entre si, não os algarismos dos typos vulga- res, mas os algarismos medios das categorias botanicas, para saber até que ponto diversifica a indole ou modo de ser de cada grupo definido, ou se deixa modificar pela natureza da terra e do clima. Podem-se finalmente confrontar as médias dos grupos maiores, dos grupos commerciaes, para deduzir ao lado de principios puramente scientificos, outros principios de applicação immediata para a agricul- tura e industria do trigo. São considerações baseadas na confrontação das médias referidas em cada assumpto estudado, aos trigos molares e rijos que por agora apresentamos, reservando para um trabalho ul- terior o explanar toda a doutrina que outras confrontações dos nossos numeros nos poderem suggerir. A ordem em que expenderemos estas considerações será a mesma do plano de estudo que concebemos e seguimos. MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE. —T. 1X. P. II 15 114 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO CAPITULO I ESTUDO PHYSICO E INDUSTRIAL DOS TRIGOS Grupos commerciaes dos trigos portuguezes. — Proporção dos trigos molares e dos rijos. Sua distribuicão nº reino e sua productividade A primeira coisa que chama a attenção, quando se consulta os resultados das nossas analyses, é que os nomes vulgares dos nossos trigos não correspondem sempre a grupos botanicos differentes. Sendo vinte e nove os typos vulgares que se acharam entre quinhentas e duas amostras provenientes de quasi todas partes do paiz, apenas re- duzidos aos quadros da classificação fromentaria de Vilmorin pelo nosso distincto collega e amigo o sr. Corvo, constituem dez sub-variedades ou secções. Estas mesmas sómente se incluem em tres especies distinctas, a do triticum sativum, triticum turgidum e triticum durum; faltando-nos portanto exemplares das especies polonicum, amyleum, monococcum e spelta. Não somos pois ricos em especies de trigos, mas incontestavel- meénte possuimos as tres que se reputam as melhores pela sua produ- ctividade, robustez e qualidades alimentares. Posto que o numero dos typos vulgares, e mesmo dos typos bo- tanicos dos trigos molares, pouco diffira dos typos dos trigos rijos, comtudo se compararmos a área da distribuição de uns e de outros, achar-se-ha que os trigos molares acham-se repartidos por uma maior parte do reino. Os rijos apenas occuparão um terço da área cerealifera no cen- tro, e quatro quintos ao sul do reino, ficando os molares dominando sós ou em grande desproporção com trigos rijos nos seis districtos do norte e nas ilhas. Mas esta distribuição está longe de corresponder á população ou á densidade da cultura de cada um d'estes grupos. Até parece que a DOS TRIGOS PORTUGUEZES 115 área da distribuição e a densidade da cultura cereal se acham em ra- zão inversa. Com effeito, se compararmos a população cereal, a distribuição dos typos vulgares e as regiões cereaes do nosso paiz, notar-se-ha que a população dos trigos rijos é cinco vezes maior que a dos molares. A região dos trigos rijos abrange os districtos seguintes, produ- zindo : Alqueires Rontalegies (nc e bideraracas. fo fot 2.072:647 E gora dq BSS atodo pas bien paia PAHODETÃO Baja pias e rio iate | ga A E 3.940:746 Faro q sas AME ASUS Sa 680:279 Metade do districto de Lisboa..... 1.390:000 10.447:4921 A região dos trigos molares comprehende os districtos seguintes, produzindo : Alqueires ELA DE pr CLEO Co L EAD ARE RE ME TERRENA 99:174 Valar Reale, sm tas sta tis o lego botas 85:955 raganea.quuga sos ist Es bsd B. fenátush 559:639 Diap fob Ee ves galo, dar std sata SE 25:558 Pontos. trirsicos Sed BM RL ata 171:234 Mizem aÃ: O sptpiisiadal. ale PESA (dra th 155:896 (Guardas. o craetro heepaç, seia is og dy e 594:302 Ageu? EM) o. 1 ctibos tim. Bla Saaiaa 127:970 Cornbrala fes puma go. Sets temo s ee 241:208 Castello Branco.............. mo 347:576 2.408:507 Estas quantidades de producção de trigos são as médias relativas a um periodo de seis annos, desde 1852 a 1857, e devemol-as á obse- quiosidade do nosso amigo o exc. sr. Rodrigo de Moraes Soares, chefe da repartição de agricultura. Demonstra-se por ellas que apesar de os trigos rijos occuparem menor superficie que os trigos molares, a sua cultura mais densa, e muito provavelmente tambem maior a sua productividade, dão em resultado serem elles o trigo dominante do reino. 15+ 116 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO A provincia do Alemtejo, que é onde o trigo rijo se accumulou preferencialmente, podia bem substituir-se, senão na qualidade, pelo menos na quantidade a todo o paiz. É ella o grande celleiro de Por- tugal; e é-o por aptidão e privilegio natural; porque já o nosso Ca- mões engrandecia esta provincia por causa da sua riqueza em trigos, dizendo : E vós tambem ó terras transtaganas, Afamadas c'os dons da flava Ceres. A desmedida protecção concedida desde muito tempo aos trigos rijos, pois se mandou pelos reaes avisos de 1819 e 1820 que o trigo rijo estrangeiro pagasse 200 réis em alqueire, prohibindo-se por fim a sua entrada; protecção ao mesmo tempo desegual para os trigos mo- lares, pois que estes pagavam, vindos de fóra, apenas 80 réis em al- queire, revela que ao mesmo tempo que se tratava de favorecer a venda da qualidade de trigo mais abundante, se admittia todavia algum da qualidade em que se sentia falta para o consumo na capital. A cultura experimental que se fez no Instituto Agricola deu em resultado que o rendimento da producção dos trigos rijos é superior ao dos molares. A média absoluta da producção dos primeiros foi de 6,4 semen- tes, e de 5,2 a dos segundos. Póde ser que esta differença provenha em parte das circumstancias e contratempos que sobrevieram a esta cultura. As chuvas e fortes ventanias da primavera de 1860 fizeram acamar quasi todos os trigos, que só a muito custo se levantaram. Muitos d'elles chôcharam e crearam a alfórra, e todos foram, apesar das maiores cautelas, infestados pelos pardaes. Mas toda a cultura cereal está sujeita a estes riscos, e com elles se deve contar mesmo n'uma cultura experimental, para as deducções serem applicaveis á pratica commum. Só lhes attribuimos alguma parte na diflerença acima exposta, porque temos razões para crer que a influencia d'estes contratempos se exerceu com maior intensidade ou preferencia nos trigos molares. A cultura experimental foi tremez para todos os trigos. Notou-se que as médias de producção dos molares de cada dis- tricto eram tanto maiores, quanto este districto se avisinhava mais em clima ao de Lisboa. Dos resultados da cultura experimental viu-se que, em quanto os trigos molares, todos gallegos, barbellas e da terra, dos districtos de Vianna do Castello, de Braga, de Bragança e da Guarda, dotados de um clima mais frio que o de Lisboa, dão as médias de 4, 4,8, DOS TRIGOS PORTUGUEZES 117 3,9, 4,8, os de Aveiro, Santarem e Leiria, de climas mais analogos ao de Lisboa, dão as médias de 5, 6, 9. Ao passo que os molares das ilhas, de clima mais quente e humido, deram as médias de 4,2 e 3,8. Esta observação reforça o principio já assentado, de que os tri- gos molares aprazem-se nas localidades mais frias que quentes, mais humidas que seccas. Quanto aos trigos rijos, notou-se que foram os districtos mais quentes e seccos os que deram médias menores; e os de districtos mais frios e humidos os que produziram médias maiores. Assim, em quanto um trigo rijo de Aveiro produziu 12 semen- tes, os de Faro produziram 7,2 e os das ilhas 6. Esta observação confirma outro principio estabelecido, que os trigos rijos preferem os climas mais quentes que frios, mais seccos que humidos. Consultando a distribuição dos nossos trigos, vê-se que, á parte algumas pequenas excepções, o trigo molar procurou a região do nor- te, e d'esta a parte mais baixa do centro, isto é, as bacias e as var- zeas, aonde um sólo mais anateirado e fundavel lhe permittiu achar, em despeito da maior evaporação, o grau de humidade conveniente. O trigo rijo puro acha-se no sul do reino e nas partes mais ele- vadas e seccas do centro. O trigo bagudo ou turgido, transição do grupo molar para o duro, e que nós incluimos n'este ultimo por se approximar d'elle mais que do primeiro, foi procurar as regiões quentes mas humidas. É notavel que uma distribuição analoga se encontra nos trigos do paiz visinho. Nas Asturias e provincias Vascongadas domina o trigo molar ; nas Castellas, em Murcia e na Andaluzia o trigo duro; o trigo tur- gido acha-se especialmente nas ilhas Baleares. As condições do sólo e do clima são de certo as causas primor- diaes d'esta distribuição dos trigos. Averiguar porém estas condições e explicar como cada uma d'ellas coopera para este resultado, é o que não podemos de um modo cabal satisfazer, porque nos faltam os da- dos meteorologicos e ainda os geologicos especiaes de cada região do paiz. Nas considerações relativas ao estudo das terras, esforçar-nos-he- mos.para pôr bem em relevo a concordancia do modo de ser das terras das grandes regiões em que se apartaram os dois grupos molar c rijo, com estes mesmos. 118 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO Quanto ás condições do clima, sabemos apenas, além das diffe- renças ás vezes bem sensiveis de temperatura, de evaporação e de hu- midade que caracterisam as regiões do norte, centro e sul, mas so- bre tudo norte e sul do nosso paiz, que a região dos trigos molares corresponde á zona das chuvas de inverno. A linha limite d'estas zo- nas, suppondo, como ha razões para crer, que passe por Castello Branco e por Coimbra, viria a corresponder muito proximamente á linha di- visoria das regiões dos dois grupos de trigos. D'esta sorte os trigos molares teriam preferido o norte do reino, porque sendo quasi todos de inverno, acham logo depois da semeada humidade necessaria para a germinação, que o inverno lhes continúa pela chuva propria e sobre tudo pela menor evaporação. Os trigos rijos quasi todos cultivados de tremez teriam na re- gião do sul chuvas mais approximadas da sua semeada, ao lado de uma temperatura e evaporação mais fortes na época de formarem o grão. Outra observação colhida da cultura experimental foi, que todos os trigos molares de inverno sairam semi-durasios nos caractéres do bago e da palha; e os duros legitimos quasi não mudaram de rijeza. Concorda este resultado com a experiencia vulgar, segundo a qual se sabe que o trigo molar de inverno cultivado de tremez se faz cor- rical, isto é, semi-durasio, dando então menor producção. Que, pelo contrario, o trigo rijo de inverno cultivado na primavera não amol- lece, mas diminue ainda na producção. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 119 Peso do grão por hectolitro, sua densidade, aspecto physico, vantagens da compra a peso à compra por medida Peso do hectolitro Densidade em kilogrammas Aspecto physico Grupos de trigos Trigos molares. . Grão ovado, curto, opaco e farinaceo. Trigos rijos .... Grão ponteagudo, alongado, vitreo, não farinaceo. | Todos os trigos. . São os trigos rijos mais pesados e mais densos que os trigos mo- lares; mas esta proporcionalidade do peso á densidade não apparece sempre, quando se comparam os vinte e nove typos estudados um a um por causa da fórma do bago, e da quantidade differente da humi- dade em cada trigo. Geralmente o grão ovoide e pequeno accommoda-se melhor na medida, deixando ficar menores vasios. Os bagos alongados e magros encruzam-se uns com os outros, e deixam por esta razão subsistir na medida um maior espaço que não é occupado por trigo. Só por esta razão, dois trigos, um molar e ovado, outro rijo e alongado, podem apresentar diversos pesos na mesma medida, apesar de terem egual densidade. A fórma ovada e a miudeza do grão favo- rece portanto o comprador de trigos, porque no mesmo volume obtem maior peso. Os trigos molares que teem geralmente esta fórma deve- riam beneficiar mais que os duros o comprador, se ainda outra influen- cia, a da humidade, não contrariasse quanto á medição do trigo o ef- feito da configuração do bago. Sendo a agua especificamente mais leve que o trigo, concebe-se bem que uma porção de trigo humedecido deve augmentar mais em volume do que em peso; portanto, um trigo humido é menos denso que este mesmo trigo em estado secco. Mas a humidade penetrando e imbebendo mais facilmente o trigo molle do que penetra o rijo, seguir-se-ha que nas mesmas circumstan- 120 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO cias a humidade desfalcará na medida mais o trigo molle que o duro. O comprador que era favorecido pela fórma do trigo molar, achar- se-ha mais lesado n'elle, do que seria na compra do trigo duro, de toda a differença do grau hygroscopico do grão molar ao rijo. A experiencia seguinte, que fizemos para comparar os augmen- tos de peso e de volume que adquirem os trigos molares e rijos quan- do se humedecem, comprova o que acabâmos de dizer. TRIGO RIJO Medida de 01,200 Grammas Peso em secco d'esta medida. ......... 160 Peso em humido d'esta medida. ....... 170 Ganho. de peso sra es Epica Seta 10 Ou 6 por 100. Litros Volume em secco.........ccccico. 0,200 Volume em humido................ 0,245 Augmento de volume............... 0,045 Ou 22 por 100. Grammas Peso do acrescimo do volume... ...... 30 TRIGO MOLAR Medida de 01,200 Grammas Peso emeseccoM, MEI Mir Se iiRaas 160 Peso em humido............. us 175 Aranho e peso. cc pn fao ERRAR DE o o à 15 Ou 9 por 100. Litros Volume em secco ...... sm .......... 0,200 Volume em humido................ 0,255 Augmento de volume............... 0,055 Ou 27 por 100. Grammas Peso do acrescimo de volume......... 44 DOS TRIGOS PORTUGUEZES 121 Vê-se d'estes resultados que o comprador perde, comprando o trigo humido, qualquer que elle seja; mas que perde mais 5 por 100 comprando trigo molar. No humedecimento d'estes trigos tivemos todo o cuidado em os deixar enxambrar de maneira a que nem o tacto, nem a vista, nem o olfato denunciassem a operação a que se haviam sujeitado. Os resultados d'estas experiencias, mostrando que, em razão do grau de humidade, o peso do trigo não póde ser sempre proporcional á densidade, mostram tambem quanto deve ser grande a variação na medição dos trigos; e quanto conviria, para diminuir esta variação occa- sionada pelo estado do tempo e pela cobiça maliciosa de muitos contra- tadores, substituir a venda ao volume pela venda ao peso, no qual nem as cireumstancias meteorologicas, nem a fraude teem tanta influencia. Com efeito, segundo as nossas experiencias, em quanto 160 de trigo rijo adquire pela humidade mais 10, 160 de trigo molar adquire mais 15; vindo por conseguinte o comprador a perder n'aquelle trigo 6 e neste 9, por 100, se eflectuasse a compra por peso; se comprar a volume ou por medida perderá nas mesmas circumstancias, no trigo rijo 30, que é o peso do volume acrescido, e no trigo molar 44; isto é, no rijo 18 por 100 e no molar 27; ou em ambos os casos 3 vezes mais. Não havendo relação constante entre o peso e a densidade dos trigos, quando os individuos comparados são differentes, por causa de não ser egual em todos a fórma, dimensões do bago e a quantidade da agua hygroscopica; existe comtudo esta relação nos trigos do mes- mo typo de uma maneira muito clara, sobretudo quando as condições de clima, do solo e da cultura não modificaram nem a fórma, nem a grandeza dos bagos. Os trigos ribeiros, por exemplo, cultivados na vasta bacia do Ri- batejo de inverno, são tanto mais densos quanto mais pesados. Mas se compararmos um trigo ribeiro da Gollegã, por exemplo, com um ribeiro tremez do Alemtejo, a relação do peso á densidade Já não é egual. E que os ribeiros tremezes saem com um grão mais agucado, maior, e atirando para durasios; teem maior densidade que os genui- namente molares. Mas deixando na medida maiores vasios por encher, em consequencia da modificação de fórma nos seus bagos, o mesmo volume rende menos em peso. Apesar das circumstancias que alteram a relação do peso e da densidade quando os trigos não são identicos, como esta relação existe quando os individuos são do mesmo typo e localidade, ou nas médias MEM. DA ACAD. — [.º CLASSE. — T. UI. P. IL. 16 122 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO dos pesos e das densidades, embora os trigos sejam de diversas proce- dencia e cathegoria botanica, podemos assentar como principio geral, que o peso apparente dos trigos é sensivelmente proporcional á den- sidade do bago. Ora, como demonstraremos mais adiante, a densidade do bago acompanhando ou a glutinosidade ou a riqueza em fécula fina, circum- stancias de que dependem a quantidade e a boa qualidade do pão, se- gue-se que até certo ponto o peso do trigo poderá ser um indicio seguro da obra em pão que produzirá. De entre os trigos lobeiros, por exem- plo, o que for mais pesado é incontestavelmente o que conterá maior dóse de gluten; por consequencia o que renderá maior peso de pão. De entre os trigos ribeiros que são molares, quando temporões, o que for mais pesado, tendo necessariamente mais gluten e fécula mais fina, fará mais e melhor pão. HI Desdobramento dos trigos nas farinhas commerciaes, panificavel e espoada, suas qualidades e quantidades Chamamos farinha em rama á farinha tal qual sae do moinho antes de ser peneirada. Farinha paxificavel é a farinha que por peneiração perdeu o fa- rello e a semea, e com a qual se fabrica o pão ordinario. Farinha espoada é a parte da farinha precedente tirada pelo pe- neiro mais fino, propria para pão fino de luxo. Quantidade Farinha espoada Grupos de farinha commerciaes ip Quantidade dos trigos MET ASS em 100 e Ro kilogrammas 8 de grão Peso por hectolitros Qualidades Molares.... 27 Alva, fina, leve, pega- | 358,77 diça aos dedos, ma- cia. . Trigueira, grossa, pe- | 40:,07 sada, pouco pegadi- ça, aspera. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 123 As quantidades das farinhas panificavel e espoada dos trigos mo- láres que obtivemos estão em concordancia com as que a pratica vul- gar nos forneceu ; concordam ainda com as quantidades que achámos em alguns auctores que tratam d'esta materia, os quaes se referem naturalmente aos trigos molares por serem estes os trigos dominantes nos seus paizes. Knapp, por exemplo, achou que 100 de trigo produzem : Farinha fina. ...... 55 |s : nl ficavel Rolãos uns be pra. val 18 UI E Semanas sido anais 9 Farello........... 18 100 Boussingault apresenta o seguinte desdobramento do trigo pelos dois systemas, inglez e francez, de moagem e peneiração : Systema inglez Systema francez Farinha para pão alvo... 58 | 79 | 66 | 714 Dita para pão de rala ... 14 8 Parello; e semea «1... .!.2..05 26 23 Perdas - sita tns yada pR 3 100 100 Segundo Pommier 100 de trigo dão : Fanimhaypanificavel. ques gs tige gil paiyo 12 Farellosecsemed. ssapare air o tera ante oro 25,4 [o ESTAD CR PORRA IPC CARTE RA 2,6 100,0 Mas as quantidades das farinhas dos trigos duros sairam-nos in- feriores ás que sabemos, por informação, se obteem nas padarias. A razão d'esta discordancia dependeu de nos termos servido do mesmo moinho e dos mesmos peneiros no fabrico e dosagem das fari- nhas em todos os trigos, o que não podia deixar de ser, para os re- sultados dos dois grupos de trigos poderem ser comparaveis. Na pra- tica vulgar o trigo rijo é moido com maior forca, e peneirado por pe- 16» - 124 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO neiro mais largo; d'onde resulta o deixar menos farello e produzir mais farinhas que os molares. Quanto ás qualidades das farinhas, póde-se julgar em que grau de inferioridade ficarão as dos rijos a respeito das dos molares, penei- rando-se as d'aquelles mais em grosso, á vista da grande differença que apparece entre umas e outras, mesmo sendo feitas no mesmo moi- nho e peneiro. E' por isso que as farinhas dos trigos duros são geralmente re- jeitadas para o fabrico do pão de luxo, e só empregadas na panifica- ção do pão vulgar, e ainda assim lotadas com alguma farinha de mo- lar; sendo porém preferidas na fabricação das massas, para as quaes a sua maior glutinosidade as torna mais prestadias, e o seu baixo preço mais economicas que as dos molares. A opposição que apresentam em suas qualidades as farinhas dos trigos rijos e dos trigos molares é tão saliente, que o mesmo trigo mo- lar cultivado de tremez, ou creado em terras seccadaveis, não tem no mercado o mesmo preço que o cultivado de inverno ou em terras hu- midas. Os ribeiros do Ribatejo valem no terreiro-publico mais que os tremezes do Alemtejo. Os trigos rijos do Alemtejo, a saber: candial, Santa Martha, ama- rellos, etc., valem 60 réis menos em alqueire que os ribeiros do dis- tricto de Santarem. Os trigos gallegos de que se faz o excellente pão de Bragança e do Porto são muito superiores aos gallegos cultivados no Alemtejo. Os trigos chamados durasios que se cultivam nas immediações de Lisboa, e que obram o bem conhecido pão saloio, sustentam um preço intermedio aos ribeiros de Santarem e aos ribeiros do Alemtejo. Vê-se por estes exemplos que, em quanto á qualidade das fari- nhas, os trigos teem um valor que parece decrescer conforme o trigo se afasta mais da condição de molar. Entretauto a differença do valor d'estes trigos não é proporcio- nal á diflerença da qualidade das farinhas e do pão. E a razão prin- cipal está em que as farinhas dos trigos rijos são especificamente mais rendosas em pão. A maior parte da população que usa do pão de trigo, não po- dendo chegar ao pão fino de luxo, determina o fabricante a procurar os trigos baratos e rendosos, isto é, os rijos, que satisfazem melhor a dupla condição de serem vendidos tambem baratos ao consumidor, e darem lucro ao fabricante. Esta razão explica ainda como o trigo molar, apesar de ser muito DOS TRIGOS PORTUGUEZES 125 mais raro no nosso paiz que o rijo, não tem a elevação de preço que seria para esperar, ou que imporia a sua mesma raridade. Passa geralmente entre o vulgo como facto averiguado, que a qua- lidade das farinhas, no que respeita á alvura sobretudo, depende das mós que as trabalharam. Diz-se que as mós macias de pedra calcárea, por isso mesmo que são brancas, communicam á farinha a sua brancura. Pelo contrario, que as mós urgeiras de granito, mais rijas e es- curas, deixam a farinha tambem atrigueirada. Sem attribuirmos á qualidade das mós a influencia que lhes sup- põe o vulgo, não podemos deixar de confessar que em grande numero de casos esta coincidencia existe. Mas parece-nos que a razão está no trigo e não na mó. Geralmente escolhem-se para a moagem dos trigos duros as mós mais duras tambem, que são de ordinario as mais escuras. Isto por- que, carecendo o trigo rijo de maior força de moagem, a mó se não gaste tão depressa. - Aeresce que nos terrenos soltos, areosos e fracos, o trigo mesmo molar, se o clima for humido. propende para durasio. Ora estes ter- renos, sendo geralmente derivados de rochas graniticas e de grezes, e cortando-se as mós das pedreiras mais proximas ao povoado, vem mui- tas vezes a mó do moinho a saír da mesma rocha de que resultou o terreno em que o trigo se creou; isto é, uma mó dura e escura para moer trigo duro e escuro. Não admira que na sua imperfeita observação o vulgo tenha de um facto coincidente feito uma causa, e attribuido á mó o que está no trigo. ) As farinhas dos trigos rijos são mais pesadas que as dos mola- res; O que não é para estranhar, attendendo a que aquellas farinhas conteem mais gluten que estas. E' tambem a esta maior quantidade de gluten que se póde attri- buir o serem as farinhas dos trigos rijos muito mais hygroscopicas e susceptiveis de se alterarem pela acção da humidade do ar, como ti- vemos occasião de observar. Adiante veremos que a agua que se embebe n'uma farinha per- tence ?/ d'ella ao gluten. Este é portanto mais ávido de humidade do que é o amido. Segue-se d'aqui, que na venda das farinhas a peso acontece a va- riação opposta por effeito da humidade do tempo, da que succede aos respectivos trigos em grão. 126 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO Vimos que os molares humedecem mais que os rijos com a hu- midade do ar. Nas farinhas é o inverso que succede. Qual será a ra- zão d'esta discordancia ? Não a podemos achar senão na natureza differente das pelliculas ou epispermes de uns, e de outros trigos, e na compacidade do miolo. A episperme do bago molar é grossa e esponjosa, o miolo é tenro e poroso. A episperme do bago rijo é fina, mas rija e mais incrustada de silica; o miolo é muito denso e apertado. Duas farinhas, molar e rija, expostas ao ar humido, a ultima to- ma quasi o dobro da agua que toma a primeira, ganha uma côr mais trigueira, fermenta e exhala em poucos dias um cheiro ammoniacal, em quanto a farinha branca se póde ainda reputar em bom estado. IV Exame especial dos glutens Grupos commerciaes Qualidades do gluten Peso de gluten fresco em 100 de farinha Peso do gluten secco em 100 de farinha Agua absorvida pelo Grau aleurometrico Trigos molares... b ! 20, Cinzento claro, muito viscoso, firme e brando. Cinzento amarel- lado, desman- chadico. Todos os trigos. . Vê-se que os trigos rijos conteem mais gluten que os molares. O peso e a densidade d'estes dois grupos estão pois em relação com a glutinosidade do grão. O poder de absorpção para a agua é egual sensivelmente em to- dos os glutens. O gluten absorve geralmente dois terços do seu peso de agua. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 127 O volume que toma o gluten dos molares é um pouco maior do que adquire o gluten dos trigos rijos. O gluten dos trigos molares é mais viscoso, mais homogenco, mais firme e mais elastico que o dos trigos rijos. O gluten é um complexo de quatro substancias: fibrina, gluti- na, caseina e gordura. A gordura parece ser o laço connectivo que liga estas tres substancias proteicas. Porque, se se extrahir pelo ether a gordura a uma farinha, diz Peligot, esta lavada na agua não depo- sita mais o gluten. Mulder nega este facto; e para nos tirarmos de duvidas repetimos a experiencia. O gluten obtem-se com efleito 'da mesma maneira, mas em menor quantidade, um pouco desmanchadiço e mais esbranquiçado, o que prova que o oleo do trigo é, para assim dizer, tanto ou quanto empastador das substancias que constituem o gluten. Tambem a gordura do trigo existe essencialmente toda incor- porada no gluten. Porque dosando este principio na farinha e depois no gluten extrahido da mesma, obtem-se d'este quasi a mesma quan- tidade que se achou na farinha. Mais adiante veremos que a quantidade da gordura RE a quantidade do gluten. As proporções das substancias que compõem o gluten variam pouco nos trigos rijos e nos molares. Bibra achou em trigos espeltas, que se approximam do nosso lo- beiro, em 100 de gluten secco : Medias de tres analyses : Bibrina. -. 2. 0.0 EE a ce DL Glutinas ST E SI o a Sr OSSO Caseina?W=. rro m o Sd pc aca 6,85 Corduras Pr RA Sp RA p=, 5,67 100,00 Em farinhas de primeira qualidade, tal como as dão os trigos molares, achou o mesmo chimico, em 100 de gluten secco : Medias de quatro analyses : TEMOS Sl q Ca E CU Die o TE) (Elo E go DN A É cer 16522 CasSelna. oo siena as PUEDEN É co IS APR HA 1,24 ODE E DE APS dr Sp PE 100,00 128 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO Segundo estes resultados viriam os trigos rijos a ter um gluten mais fibrinoso. Outros chimicos não admittem que o trigo contenha caseina. Mulder não reconhece no gluten do trigo senão duas substancias. Uma elastica e não glutinosa, que communica ao gluten a sua elasticidade, é a fibrina que elle chama elastina. Outra não elastica, mas viscosa, que dá ao gluten a sua firmeza e homogeneidade, é a glutina. Aceitando esta composição do gluten, quizemos ver em que pro- porções se encontravam a elastina e a glutina nos trigos rijos e mo- lares. Eis como procedemos : preparámos glutens de trigos rijos e de molares pelo processo já descripto de Beccaria. Eram pesados em fresco e tratados pelo alcool fervente, depois pela agua, para extrahir toda a glutina. O residuo que ficava no fil- tro era a fibrina ou elastina de Mulder. Esta era secca e pesada. A decoada alcoolica era evaporada, o residuo secco dava-nos a glutina. Para referir estes resultados ao gluten secco, seccavamos um peso dado de gluten fresco e reduziamos os resultados. Nós obtivemos em 100 de gluten secco pertencente a trigo rijo : Médias de duas analyses : Fibrina ou elastina... ........ccc.... 90 Glutina see e cm MARAR + io go co VS RD 10 Em 100 de gluten secco de trigo molar : Médias de duas analyses : Eibrina. Do... BEM RS RM Ro SR APV SIO Co oo ER SRA tiro o UR 18 100 Estes numeros são um pouco differentes dos que apresenta Mul- der, o qual dá em 100 de gluten secco : Fibrina ou elastina... .... coro e a 96 Glutina........... - DOS TRIGOS PORTUGUEZES n 129 Z Os nossos resultados relativamente á composição dos glutens dos trigos rijos e molares explicam a diferença de propriedades que se notam entre os glutens d'estes dois grupos. E' na maior proporção de fibrina e na menor quantidade de glu- tina, que se deve achar a razão por que os glutens dos trigos rijos são menos homogencos, menos firmes e mais granulosos ou desmancha- diços. Na mesma differença das proporções da elastina e da glutina se póde estabelecer a causa do maior crescimento dos glutens dos trigos molares, cozidos no aleurometro de Boland. E' evidente que o gluten mais viscoso e ligado d'estes trigos of- ferecerá á vaporização da agua maior resistencia, a qual necessaria- mente se ha de traduzir por um augmento de volume mais conside- ravel. E' preciso advertir que, sendo a elastina o principio unico que possue o dote da elasticidade, comtudo a elasticidade do gluten não está só dependente d'ella, mas da harmonica associação da fibrina com a glutina e com a gordura. Já vimos que extrahindo-se a gordura, o gluten obtem-se, mas com menos ligação, com menos elasticidade. Quando uma farinha aqueceu e começa a fermentar, o gluten perde do mesmo modo a sua elasticidade, torna-se grumeloso e des- manchadiço, não medra nem cresce se for cosido. Se a um gluten d'es- tes alterado se separar a fibrina e a glutina, achar-se-ha esta ultima notavelmente diminuida e a fibrina augmentada. Acontece n'estes casos por accidente o mesmo que por efleito das circumstancias naturaes se manifesta nos glutens dos trigos molares e dos rijos. Portanto se o gluten é elastico por causa da fibrina, a fibrina não proporciona esta propriedade ao gluten, senão quando ella mesma pela sua união com a glutina e a gordura desenvolveu esta propriedade. Sabe-se que um grande numero de corpos só são elasticos quando teem uma porção d'agua interposta; a mesma fibrina do trigo não se exceptua desta lei; pois que separada da glutina e lavada pelo ether, não demonstra elasticidade alguma, e só a adquire, ou tornando a li- gar-se com a glutina e com a gordura, de que foi privada, ou pelo menos absorvendo agua. A agua faz n'este caso a funcção de empas- tador ou de adhesivo entre as particulas da fibrina, funcção natural- mente preenchida pela glutina e pela gordura. No commercio julga-se até certo ponto da forca de um trigo, MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE. —T. UI. P. IL. 17 130 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO isto é, da ligação e corpo da massa que produzirá, pela extensão e viscosidade do gluten. A operação para chegar a este reconhecimento é um pouco gros- seira, mas é facil e expedita. Tomam-se alguns bagos de trigo na bôca e mastigam-se, tendo o cuidado de não engolir senão a saliva e con- servar na boca a pasta dos bagos esmagados. A saliva opéra uma ver- dadeira lavagem do amido e deixa no fim de algumas voltas de queixo o gluten com parcellas de cellulose. Este é então estirado entre os de- dos, e pela sua firmeza, estensibilidade e homogeneidade se aprecia o trabalho na amassadura, e por este o grau de crescimento do pão. Tal é o gluten, tal será a massa e tal sairá o pão. v Estudo comparativo da panificação dos trigos rijos e moclares Grupos s i ão commerciaes Qualidade do pã: em 100 de farinha espoada Agua retida o pão Agua absorvida pela o E] [= Õ e) 2 e E o EE, E A o [er 27,8 | Branco, fofo, enxuto e leve. a As) a [erp] [o 4> h9 Trigos molares.. Médias. 4 Trigos rijos..... Trigueiro, massudo, humido e pesado. Todos os trigos. . O trigo mais rijo é o que rende maior peso de pão, pelo facto de beber mais agua na maceira e de a reter no pão; por isso este fica humido e pesado. A côr trigueira do pão de trigo depende da côr da farinha. O ficar chato e massudo é a consequencia necessaria da quali- dade grumelosa do gluten e da pouca finura da fécula dos trigos rIjos. Na verdade um gluten pobre em glutina, já de si pouco ligado, DOS TRIGOS PORTUGUEZES 131 ligará e empastará imperfeitamente a fécula que for aspera e grossei- ra, como é geralmente a dos trigos rijos. Á vista do quadro que apresentámos, pergunta-se naturalmente, quaes as razões por que se fabrica pão de trigo rijo, sendo como é in- ferior ao pão de trigo molar ? A primeira razão é porque se produz mais trigo rijo que molar, como já mostrámos. E produz-se mais trigo rijo que molar, porque o clima do nosso paiz é a esta qualidade de trigo que se accommoda melhor. Os trigos molares não prosperam, nem são productivos senão nos terrenos que, ou por grande fundo e adubo das terras, ou por uma humidade natural d'estas, ou pela abundancia das chuvas, se ap- proximam das condições da região dos cereaes. Póde ver-se na distri- buição dos nossos typos de trigos, que os molares grupam-se distin- ctamente ou em terrenos anateirados e fundos, ou em localidades de um clima frio e humido relativamente ao clima de Lisboa. Fóra d'es- tas condições apparece sempre o trigo rijo, guardando no grau da ri- jeza uma proporção correlativa com o grau de seccura do ar e da terra. Ora a maior parte da superficie de Portugal é constituida por terrenos muito quebrados e muito lavados pelas chuvas; se ajuntar- mos a estas circumstancias a grande temperatura, a forte evaporação e o fraquissimo adubo que levam as terras, conhecer-se-ha que a maio- ria dos nossos terrenos não é a mais accommodada para a producção do trigo molar e do bom trigo. Ha geralmente um erro em pensar que uma vez que o trigo rijo se dá bem em Portugal, Portugal é um paiz excellente, productor de trigos. Coopera a arraigar este erro a apparencia seductora do trigo rijo, que é, na verdade, em palha, na espiga e no grão mais bello e avantajado que o molar. Mas nos trigos é a obra em pão que decide; e quasi sempre o pão de melhor qualidade occulta-se debaixo de um exterior não pom- poso. Que mais humilde ha que a espiga do trigo ribeiro ao pé da altaneira e barbuda espiga do vermelho ou de qualquer outro rijo? E que differença tão grande na qualidade do pão fabricado com estes dois trigos ? A verdadeira questão a pôr relativamente á nossa aptidão fru- mentaria, é se temos condições para produzir os trigos mais aprecia- dos para pão de luxo em abundancia e por baixo preço. Assim posta a questão não póde deixar de se resolver negativamente. Mas o trigo rijo tem tão boa saída no mercado nacional e es- Lia 132 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO trangeiro, como o trigo molar, e ás vezes é até mais procurado e tão bem pago como este. É porque n'um grande numero de paizes, incluindo o nosso, são maiores as necessidades do consumo que a producção. É porque ha maior numero de consumidores para o pão barato, posto que inferior, do que para o pão fino e caro. É porque o trigo rijo acode ao peso, e permitte, lotado com o molar, vender-se o pão fino mais em conta do que seria possivel fabricando-se apenas de molar, applicando-se a parte d'este, que o rijo substitue, para melhorar a qualidade do pão barato, cuja inferioridade, se fosse fabricado apenas de rijo extreme, desgos- taria o consumidor. Finalmente ha uma razão puramente industrial que estabelece ao trigo rijo um merecimento verdadeiro: é que cer- tos trigos molares, aquelles que teem naturalmente, ou pelas condições da cultura, pouco gluten, e que por isso não levantariam sufficiente- mente, nem renderiam maior peso, carecem para uma e outra coisa da mistura com farinhas glutinosas. Se compararmos a quantidade de agua bebida pelas massas com a da agua absorvida pelos seus glutens, acharemos que a agua absor- vida não se reparte proporcionalmente entre os diversos principios im- mediatos da farinha. No quadro seguinte : espoada substancias tomada pelo gluten tomada pelo amido e outras sub- stancias & d E E E) o [= o So - Gluten secco Amido e outras Agua absorvida pela massa Agua Agua vê-se que sendo os glutens pouco mais /, da quantidade da farinha, recebem mais de !/, da agua total que a farinha absorve ao amassar. Ainda assim o trigo molar guarda no seu amido alguma maior porção de agua que o rijo; o que se deve attribuir á finura do mes- mo amido, o qual tendo maior numero de superficies a serem molha- das, recolherá por isso maior dóse de agua. Póde-se por tanto assentar que o poder de imbibição de uma fa- rinha segue a razão composta da finura do amido e da quantidade do gluten. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 133 É por isso que entre os trigos molares ha alguns que bebem muito mais nas maceiras que os rijos, e que levando a primazia a es- tes na qualidade do pão que obram, não lhes cedem em rendimento do peso d'estes: taes são geralmente os do grupo sativo; trigos estes que juntam a uma sufficiente proporção de gluten, uma extrema fi- nura nos seus amidos. Trigos que, embora dotados de amido fino, fo- rem pobres de gluten, tomam pouca agua ao amassar, largam-na fa- cilmente na cosedura e dão por isso fraco rendimento em pão: tal é, por exemplo, o canôco. Trigos embora rijos, que não forem dos mais glutinosos e forem de amido grosseiro, não produzem maior peso de pão. Taes são: o vermelho e o vermelejoilo. Mas os trigos rijos, cujo amido não for grosso em excesso, e ti- verem tempero de gluten avultado rendem muito pão. D'este genero são: o mourisco, o anafil e os dois durasios. O gluten dos trigos rijos ergue maior volume no aleurometro do que medra o pão d'estes mesmos trigos. Não se póde explicar este desaccordo senão pela qualidade do amido. Com effeito, a massa de amido grosso sae necessariamente me- nos ligada que a do amido fino, suppondo constante a quantidade do gluten em uma e outra. Consequentemente, debaixo da acção expan- siva do vapor da agua e do acido carbonico no acto da cosedura, a massa grossa deve abrir ou rachar mais depressa do que acontecerá á massa fina. E logo que os vapores interiores da massa tenham saí- da facil, cessam de a levantar ou tufar. O que parece fundamentar esta explicação, é que os trigos moles lotados com uma porção de trigo rijo não deixam, quando esta lota- cão se faz em certas proporções, geralmente de dois para um, de ad- quirir o mesmo medrio de grandeza. É que então a addição do amido fino conserva á massa a ligação conveniente para levantar, sem abrir, até ao volume do pão fófo e medrado. Das considerações que levâmos expendidas resulta, que se o peso do pão deriva principalmente da quan- tidade do gluten, por ser este elemento da farinha o que chupa e re- tem mais agua; o volume ou medrio do pão, provém sobre tudo da abundancia e finura do amido. Ora, como o amido anda geralmente na razão inversa do gluten; como o amido grosseiro acompanha quasi sempre as maiores dóses de glutens, segue-se que o peso e volume do pão são de certo limite para cima incompativeis no mesmo trigo; e só conciliaveis estas duas con- dições por meio de misturas bem entendidas. 134 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO A qualidade do pão já pelo aspecto do bago se póde vaticinar. Bago bojudo, curto, farinaceo e molle rende muita e boa farinha; faz o pão medrado, leve e fófo. Bago alongado, corneo, trifaceado faz o pão como elle é; pão chato e pesado. Esta correlação do bago do trigo com o pão observa-se mesmo na farinha, no gluten e na propria terra productora do trigo; a ponto de se poder dizer que tal é a terra, tal é o grão, tal a farinha, o glu- ten e por fim o pão. Eis-aqui em poucas palavras uma approximação synthetica a que chegámos depois de longas e repetidas confrontações. Terras fortes, fundaveis, humidas e substanciaes criam geralmente trigo molle ou duro amollecido, grosso, ovoide; se o clima é humido e quente o bojo sae-lhe entumecido, parecendo trigo do grupo bojudo. Tal trigo é rendoso em farinha, e esta fina e branca; dando glu- ten muito lêvedo ou crescido, e um pão volumoso e leve. Terras e climas de condições oppostas, terras magras, delgadas, fracas, seccas, exhaustas de adubo emmagrecem o grão, como que o lenhificam. Este grão é pesado, como são pesadas semelhantes terras, muito glutinoso, mas pouco farinhudo ; a farinha é pesada e grossa: como o grão de taes terras; dá um gluten que pouco medra, e um pão mas- sudo, chato e pesado. Se a terra e o clima transfundem o seu caracter nos productos da vegetação, nunca esta verdade achou demonstração tão plena, tão irrefragavel como a que se depara nos trigos de diversas provenien- cias. Posto que as qualidades do pão dependam da qualidade dos tri- gos, é certo todavia que o processo da panificação tem n'ellas uma in- fluencia notavel. Sabe-se que a massa bem sovada ergue mais o pão, afófa e es- boraca, a ponto de se dizer vulgarmente, quando se corta o pão e se lhe acha dentro uma larga escavação, que ali se ficou a alma do pa- deiro. Nós tivemos muitas occasiões de verificar nos glutens esta influen- cia que o trabalho exerce nas massas. Preparando os glutens por ma- laxação, sob uma quéda de agua, reconhecemos que elles se imbebiam de agua tanto mais quanto mais os trabalhavamos; e que eram jus- tamente os glutens mais trabalhados os que tufavam, ccteris paribus, mais no aleurometro. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 135 É de persuadir que outro tanto succedendo nas massas, as causas sejam as mesmas, e que a massa assim como o gluten não cresça maior volume quando recebe forte manipulação, senão porque esta lhe faz incorporar maior porção de agua. O sovamento das massas, admittindo mais agua, torna além d'isso estas mais ligadas e macias; o que é outra condição para o pão crescer. Notámos na preparação dos glutens que a sua elasticidade e li- gação augmenta com a manipulação a que os sujeitavamos. Sendo ne- cessario no ultimo tempo da preparação manipulal-os muito pouco, para evitar que se ligassem de mais e obstassem assim á saída das ultimas porções de amido. Póde-se por tanto crer que as massas medram em peso e em vo- lume com o trabalho que se lhes dá. A porção de massa que sc fabrica, a qualidade e a temperatura da agua são outras circumstancias que cooperam para a melhor ou peior qualidade do pão. Em pequenas porções as massas recebem mais voltas, ha empas- pastamento perfeito. | Quanto mais puras são as aguas mais facil é a imbibição. A agua quente imbebe-se melhor na massa que a fria; faz a massa mais branda e ligada; mas o pão retem muita agua. O pão fa- bricado nos suburbios de Lisboa e aqui vendido com o nome de pão saloio é fabricado em pequenos lotes, amassado ás vezes em alguida- res, por consequencia muito trabalhado, o que explica a sua grande macieza e esponjosidade. Usam muitos da agua quente e lh'a deitam em tal proporção, que o pão depois de tendido assemelha-se a verda- deiros bolos, semelhantes aos que se cosem na Beira Alta. O pão er- gue no forno em consequencia da forte vaporisação da agua que le- vou; mas fica sempre mais largo que alto, muito humido e pesado. Em resultado d'este fabrico especial, e sendo o trigo durasio de que se faz geralmente o pão saloio suficientemente glutinoso, fica-se sabendo a razão por que os padeiros saloios podem vender o seu pão por um preço mais baixo que os padeiros da cidade. Elles teem a arte de fazer beber ao pão maior conta de agua da que elle precisaria, em razão da sua composição. E o que o pão bebe de mais é o lucro da vendagem. Fazendo seccar pesos eguaes de pão alvo da cidade e de pão sa- loio, acha-se que este contém um terço de agua mais que o pão da cidade. Como resumo das considerações relativas á panificação, podemos 136 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO admittir no trigo em geral tres valores ou merecimentos distinctos, com relação á qualidade do pão que produz. O valor alimentoso ou physiologico, o qual, segundo a opinião ad- mittida pelos chimicos e pelos physiologistas, com que nos não con- formamos inteiramente, se mede pela quantidade das materias protei- cas que contém. O valor industrial, que consiste essencialmente na proporção do rendimento em pão; pois que o que mais interessa ao fabricante, uma vez segura a sua freguezia, é fazer o maior peso de pão com um dado volume de grão ou de farinha. O valor venal, estabelecido pelo consumidor e baseado apenas nas qualidades organolepticas do pão; a saber: leveza, esponjosidade, me- drio, alvura e bom gosto. São poucos os typos dos nossos trigos em que estes tres valores se acham naturalmente combinados em proporção satisfatoria. Geralmente os trigos rijos apresentam o valor physiologico e in- dustrial em «alta escala; mas a apparencia do pão, o valor venal não o teem no mesmo grau. Os trigos molares, á parte alguns do grupo sativo, teem a ap- parencia que agrada ao consumidor, mas não o rendimento industrial dos primeiros. D'aqui a necessidade das lotações, como já ponderámos, pelas quaes o defeito ou falta de umas farinhas se tempéra e preenche com o defeito ou excesso opposto de outras. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 137 CAPITULO II ESTUDO CHIMICO DOS TRIGOS Grupos commerciaes dos trigos hygroscopica Materias gordas Substancias proteicas Amido e dextrina Cellulose 10,14 | 73,45 3,05 2,45 11,75 | 71,07 2,13 2,29 Todos os trigos ..| 10,605 10,93 | 72,260 | 2,590 | 2,370 Eis-aqui o quadro da composição chimica média dos grupos mo- lar, rijo e de ambos em 100 de farinha em rama. As sommas das médias em cada grupo não perfazem justamente 100 partes por causa das fracções que foi forçoso desprezar nas operações de cada média. Humidade dos trigos A quantidade da agua hygroscopica saiu-nos um pouco maior nos trigos rijos que nos molares, contra o que está admittido. E nós explicamos este resultado pelo tempo que uns e outros trigos tinham passado depois de colhidos. ; Recentemente colhidos, os trigos molares conteem mais humi- dade que os rijos, como tivemos occasião de verificar; mas quando uns e outros teem enxugado por mais de anno, como succedeu com os trigos que estudámos, o poder de retenção para a agua, sendo me- nor nos trigos molares, succede perderem estes maior porção de peso que os duros, vindo por tanto estes a ficar relativamente mais humi- dos que os molares. MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. HI. P. IX. 18 138 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO Assim como os molares largam promptamente parte da sua hu- midade, conservados em logar secco, tambem facilmente a absorvem expostos ao ar humido, ou sendo molhados. De sorte que uns e ou- tros trigos podem alternativamente ser mais ou menos humidos con- forme as circumstancias que precederam á analyse. Dosando a humidade em trigos rijos e molares recentemente co- lhidos, nunca achámos os algarismos marcados a este respeito nos trigos do centro da Europa. Esta circumstancia, filha do nosso clima mais quente e secco, favorece a conservação do trigo, e já não admira que na Hespanha e mesmo em parte do nosso paiz se conserve o trigo em silos, ou tulhas subterraneas, exemplo legado pelos arabes; coisa total- mente impossivel nos paizes humidos. Nos trigos do norte acham-se 18 e 20 por 100 de humidade. Nos trigos que estudámos o maior algarismo que obtivemos n'um bar- bella foi de 13 por 100. Por esta razão, e sendo geralmente o peso médio dos nossos tri- gos elevado, fica patente que o comprador deve ser favorecido mais com os nossos trigos do que com os trigos dos paizes mais humidos que o nosso, ou compre a peso, ou compre a medida; porque em todo o caso leva uma precentagem de quebra menor. H Materias gordas A materia gorda do trigo concorre muito para o aroma e bom gosto do pão. Anda em proporção com o gluten; de sorte que os trigos rijos são os que apresentam maior dóse de gordura, e por isso quando bem fabricados, o pão apesar do seu ruim aspecto é grato ao paladar. Em algumas analyses de trigos, em que se teem comparado os trigos dos paizes meridionaes com os do norte, tem-se achado nos tri- gos rijos dos primeiros uma gordura dupla da dos molares. Nós não encontrámos tal desproporção; o que attribuimos a ser feita a nossa comparação entre trigos molares e rijos ambos creados num paiz quente e secco. Entretanto outras analyses mais recentes, e por isso mesmo mais acreditaveis, oflerecem menor desproporção entre as gorduras dos dois DOS TRIGOS PORTUGUEZES 139 grupos de trigos; e a relação que estabelecem é muito proxima da que resulta das nossas analyses. Na analyse que Peligot fez de quatorze qualidades de trigos acha- mos a média da gordura dos tres primeiros trigos da sua tabella, tri- gos molares, egual a 1,1 por 100; e a dos tres ultimos, que são rijos legitimos, egual a 1,6. A maxima gordura encontra-se n'um tangarock e é de 1,9; e a minima de 1,0 em um trigo branco de Flandres. Ali achamos 1,8 de gordura n'um trigo de Hespanha ; cifra egual á mé- dia dos nossos trigos rijos. Em umas analyses do Boussingault tirámos a média de 1,2; e é tambem esta a que dá Polson em duas analyses. Millon dá a média de vinte e duas analyses egual a 1,80; somma um pouco elevada, mas que se explica por um ana numero destas analyses ter recaído em trigos rijos. HI niaterias proteicas Não ha nada mais variavel nos trigos do que a quantidade da materia azotada. O clima, as estações, a riqueza do sólo, exercem uma influencia incalculavel sobre a quantidade e a qualidade d'estas ma- terias. Passaremos em revista os resultados das analyses chimicas mais acreditadas, em relação a este principio dos trigos, e confrontaremos estes resultados com os nossos. As analyses de Reiset, feitas em vinte qualidades de trigos, dão uma média geral de 12,90, uma minima de 10,68, apresentada pelo trigo poulard e petagniclle noir, trigos correspondentes aos do nosso grupo turgido, cuja média é de 10,34; e uma maxima de 16,31 ofie- recida por um trigo polaco. Nas analyses de Peligot vê-se o poulard roux, correspondente tal- vez ao nosso rubião, conter 10,60 de materias proteicas. Mas já ou- tro poulard lhe deu 18,10. Nas analyses d'este mesmo chimico, um trigo hespanhol dosou- lhe 10,70, algarismo pouco inferior á média geral dos nossos 29 ty- pos, que é de 10,93. Um tangarock, correspondente ao nosso axafil, deu-lhe 13,60, « o nosso 13,80. ÍSx 140 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO Um couzelle, correspondente ao nosso ribeiro, deu-lhe 9,83, e o nosso deu-nos 9,90. Um trigo polaco dosou 21,15; um egypcio 20,60. Não achámos trigo algum que nas circumstancias normaes da nossa cultura attinja similhante dóse de substancia proteica. Nas vinte e duas analyses de Millon encontra-se a média de 11,00 muito proxima á média geral dos nossos trigos, que é 10,93. Foram ainda os trigos de Odessa, de Oran, de Metidja os que deram mais azote a este auctor. Nas vinte e quatro analyses de Boussingault a média geral é de 18,34, realmente muito elevada em relação ao resultado das analyses de outros chimicos; o que o auctor attribue á riqueza da estrumação do sólo em que cultivou os seus trigos. Os trigos duros foram ainda aqui os que dosaram mais azote. Em vinte analyses de trigos differentes obteve Mayer a média de 16,60. A qual póde ter a mesma explicação que Boussingault dá da sua. Dois trigos de inverno cultivados em Hohenheim, em 1850 e 1851, deram a Fehling e Faist um d'elles 13,24, outros 12,59. Bibra obteve média do azote em treze qualidades de trigo de in- verno 2,21. Média de doze qualidades de trigo tremez 1,96. Média de vinte qualidades de trigo mutico 2,23. Média de quatro qualidades de trigo turgido 2,12. Média de nove qualidades de trigo de Hespanha 2,30. Esta média concorda com a do nosso mourisco, candial e lobei- To, trigos rijos que são os mais vulgares em Sevilha e Catalunha, par- tes d'onde Bibra obteve estes trigos. O trigo mais azotado que achou este chimico dosou 3,86; o me- nos azotado deu-lhe 1,40, era um trigo do Egypto, que está muito longe de chegar ao azote de um trigo tambem do Egypto analysado por Peligot. Em tres analyses Fux achou a média de 17,16 de materias azo- tadas. Oudemans n'uma analyse teve 11,50. O sr. visconde de Villa Maior, em dois trigos, obteve: em um 10,92 de materia proteica, n'outro 11,092. O primeiro cultivado n'um talhão ricamente adubado com es- trume inodoro (excremento humano desinfectado com cal e carvão, e contendo 3,5 de azote por 100) forneceu-lhe 21,70 de materia pro- teica. O segunde semeado n'outro talhão tambem fortemente adubado com estrume de cavallariça, contendo 0,55 por 100 de azote, deu-lhe DOS TRIGOS PORTUGUEZES 141 18,91 da mesma substancia. (Annaes das Sc. e Let. da Acad., tom. 1.º, junho de 1857.) Polson em duas qualidades de trigos encontrou n'um d'elles 7,00, n'outro 10,9 de materias proteicas. A vista d'esta diversidade de resultados nada de seguro e fixo se póde estabelecer quanto á dóse de materias proteicas dos trigos. E a razão está na influencia grande que a riqueza do sólo sobre um mes- mo trigo, a ponto de fazer variar a sua riqueza em azote de simples ao quadruplo. Quando os ensaios do sr. visconde de Villa Maior houvessem de deixar alguma duvida sobre a extensão da variação que soffre o azote no mesmo trigo, segundo é cultivado com adubo mais ou menos azo- tado, os resultados de Hermbstaedt que aqui reproduzimos da Econo- mia rural de Boussingault dissipal-a-iam inteiramente. Aquelle agro- nomo achou em 100 partes de trigo cultivado com diversos adubos, mais ou menos azotados, as seguintes quantidades de gluten, principio que não representa a totalidade do azote, mas que anda em propor- cão com elle, Glutens urina humana. ...... 35,l sangue de boi....... 34,2 excremento humano. . 33,1 excremento de cabra. . 32,9 excremento de ovelha. 22,9 excremento de cavallo. 13,7 excremento de pombal 12,2 excremento de vacca.. 12,0 Trigo cultivado em terra não estrumada ..... 9,2 Trigos estrumados com Boussingault achou n'um trigo cultivado em terreno de horta bem adubado de materias azotadas 21,94, e no mesmo trigo culti- vado no campo 14,31. Mas o que em todas as analyses é constante ou não varia tão largamente, é a superioridade em azote que os trigos rijos teem sobre os molares. Esta superioridade está em relação com o seu maior peso, maior densidade e maior quantidade de gluten. E geral a opinião, que os trigos dos paizes meridionaes, a maior parte rijos, são mais azotados do que os do norte. Esta opinião não é comtudo apoiada pelas analyses até hoje conhecidas; porque se ha al- gumas que teem mostrado mais azote nos trigos meridionaes, ha ou- 142 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO tras que teem mostrado o contrario, e até no trigo do mesmo nome, como deixámos já claramente expendido. O que parece ter fundamentado melhor que a dosagem do azote, a opinião a que alludimos, é o facto constante de que os trigos rijos meridionaes são mais glutinosos que os do centro da Europa. Como o gluten é a substancia proteica mais abundante nos trigos, tem-se con- cluido da cifra do gluten para a cifra total do azote. Mas se o gluten segue a cifra do azote, não lhe é comtudo dire- ctamente proporcional, senão quando o trigo é do mesmo typo e cul- tivado em identicas circumstancias, Fóra d'estes casos a relação dos azotes de dois trigos não é con- stante com a relação dos seus respectivos glutens. E a razão procede da maior ou menor quantidade das substan- cias proteicas soluveis que o trigo contém, e que não entram na com- posição do gluten. Geralmente os trigos molares são mais albuminosos que os rijos, Mas uns e outros creados em paizes relativamente quentes e sec- cos, conteem menor cifra de albumina que os trigos molares e rijos dos paizes de maior latitude. Nos trigos em que separámos as materias proteicas soluveis das insoluveis achámos as seguintes médias em 100 de farinha bruta : Trigo molar 1,60 média geral. ......... 1,25 Trigo rijo.. 0,90 P Ora a média geral das substancias proteicas soluveis nos qua- torze trigos analysados por Peligot é de 1,76, sendo a dos moles 2,2 e a dos rijos 1,6. N'estas analyses de Peligot acha-se uma demonstração plena de que a relação dos glutens não é sempre a relação dos azotes. Com effeito, se compararmos o trigo n. 1, trigo molar branco de Flandres, com o trigo n. 11, trigo rijo de Hespanha, vemos que um e outro teem a mesma quantidade de azote, pois que ambos de- ram de materias proteicas totaes 10,70. Mas o trigo de Flandres tem de gluten 8,30 e de albumina 2,40. Em quanto que o trigo hespa- nhol tem de gluten 8,90 e de albumina 1,8. Nas analyses de Millon ha quantidades de albumina maiores ainda que nas de Peligot; o que tudo leva a admittir que um trigo póde relativamente a outro ser mais glutinoso, sem todavia ser mais azo- tado. Nós dosámos os glutens, não nas farinhas brutas, em que dosá- DOS TRIGOS PORTUGUEZES 143 mos o azote, mas nas farinhas espoadas, porque o nosso fim n'esta dosagem era descobrir a funcção dos glutens na panificação. Portanto não podemos comparar as suas quantidades com os azotes. Mas a julgar do peso e da densidade do grão, que andam n'uma relação muito proxima com a porção do gluten, parece-nos que os nos- sos trigos são mais glutigosos que alguns do centro da Europa, sem comtudo serem sempre os mais azotados. Na verdade não ha razões para suppor que o nosso trigo deva ser muito azotado. Sabe-se que as nossas terras são geralmente pouco estrumadas e as nossas analyses o comprovam. Sabe-se que pelo sys- tema seguido quasi em toda a parte, trigo e milho, ou trigo e pou- sio, as terras cedem proporcionalmente mais do que recebem. Sabe-se que em consequencia da elevada temperatura do nosso clima, as ter- ras perdem por evaporação uma grande parte dos seus principios nu- tritivos; e que outra parte não menor é arrastada pelas aguas chove- diças para os paritanos, para os rios e para os mares, em consequen- cia da forte accidentação do nosso territorio. Como podem terras tão depauperadas depor no trigo mais do que ellas conteem? A atmosphera fornece um supplemento de azote, que sob a fór- ma de nitratos entra nas terras trazido pelas chuvas, pelas neves, pe- los nevoeiros e outros meteoros. Contra o que pensa Berthelot, que entende não poder o azote penetrar no interior dos vegetaes e servir á composição das materias proteicas, senão o que lhes é apresentado em estado de ammonia, temos experiencias muito concludentes que provam quanto os nitratos auxiliam e augmentam a riqueza em azote aos trigos. Entre outras podemos citar as que Voelcher fez ainda ha pouco na Inglaterra, comparando a acção que na cultura dos trigos teem diversos adubos commerciaes; as quaes se podem ver na Revista Agricola de Inglaterra, de Trehonnais, 8.º caderneta. É admittido além d'isso que nos paizes quentes o azote atmos- pherico se nitrifica em maior escala que nos paizes frios; ou seja pela passagem do fluido electrico na atmosphera, ou pela acção catalyptica das terras, ou pela affinidade predisponente das bases alcalinas. Mas apesar de todas estas razões, as nossas terras de Lrigos não nos deram á analyse senão quantidades muito fracas de azote. As dosagens e reconhecimentos que fizemos dos nitratos não fo- ram mais animadoras. Não será o nosso paiz sufficientemente quente para que a nitri- ficação do azote atmospherico se opere em grande escala? 144 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO Ou serão estes nitratos arrastados pelas chuvas, como são as ma- terias organicas ? Ou será tal a mingoa do estrume, melhor diremos do azote pro- veniente do adubo artificial, que o azote do adubo natural seja quasi o unico que provê ás necessidades das nossas trigadas? Questões são estas a que não podemos satisfazer cabalmente. Mas entrevê-se que n'ellas póde existir a causa, porque sendo as regiões quentes geralmente ricas em nitratos, e sendo os nitratos prestadores do azote ás plantas, ao trigo sobre tudo, o nosso trigo não folga a este respeito em proporção do que se podia esperar. Mas ha razões de outra ordem que indicam ainda outra causa da mediania do azote nos nossos trigos. São as que derivam da correla- ção e solidariedade que ha entre o phosphoro e o azote para a com- posição das materias proteicas dos vegetaes. Está reconhecido que as partes dos vegetaes em que se accumula o azote, se accumula tambem o acido phosphorico. Pelos trabalhos de Corrwinder e de Izidore Pierre sabe-se que estes dois elementos não só affluem ou escaceiam parallelamente nos orgãos das plantas; mas nos periodos successivos da vegetação, emigram dos orgãos velhos para os novos n'uma certa parceria. Em relação aos trigos, Mayer reconheceu uma certa proporciona- lidade do acido phosphorico com o azote no grão; e estabeleceu que a cada 1,00 de acido phosphorico corresponde termo médio 2,04 de azote. Nós dosámos o acido phosphorico nas cinzas de todos os trigos analysados, mas não tendo confiança nos resultados de algumas d'ellas, não as apresentámos na tabella geral, por não ser estudo completo. Entretanto, tirando a média ás analyses que reputamos aceitaveis, e comparando-a com a média do azote d'estas mesmas analyses, acha- mos : EM 100 DE FARINHA BRUTA Acido phosphorico Azote Trigos mos. ala .iclor 0,98 des putdçSo Trigos molares. ... 0,87 trio APPO odost. pics. q bias 0798 Bypass 1,800 Ora a relação de 0,985 a 1,800 é approximadamente a relação que achou Mayer 1:2 do acido phosphorico para o azote no bago do trigo. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 145 Mas o que nós não achámos nos nossos trigos são as quantidades absolutas do acido phosphorico que este auctor encontrou nos que ana- lysára. Em dezenove analyses por elle feitas, a maxima de acido phos- phorico é de 1,185 n'um trigo tremez de Schleissheim ; e a minima é de 0,200. Nas nossas analyses o maior algarismo de acido phospho- rico foi, de 1,00 fornecida pelo trigo ribeiro, e a menor de 0,350 dada pelo barbella. É notavel como observou Mayer que ao trigo mais azo- tado não corresponde sempre a maior dóse de phosphoro. Esta corre- lação não apparece senão nas quantidades médias do azote e do phos- phoro de umas poucas de analyses. Comparando as quantidades absolutas do acido phosphorico dos nossos trigos, ás mesmas quantidades dos trigos que Mayer e outros chimicos teem analysado, não póde deixar de se reconhecer que elles são pouco phosphorados; assim como já reconhecemos que elles eram medianamente azotados. A média geral do acido phosphorico admit- tida no grão de trigo é de 1,00; e nós não achámos este algarismo, senão como maximo, e n'um só typo de trigo. Esta mediania do phosphoro coincide com a escassez d'este mes- mo elemento nas nossas terras, como veremos mais adiante, e é uma causa talvez de os nossos trigos não adquirirem aquella dóse de azote que em circumstancias excepcionaes um torrão mais pingue, ou um clima mais favoravel lhes podem prestar. Porque em virtude da soli- dariedade que parece haver entre o phosphoro e o azote para a com- posição das substancias proteicas, não basta que um terreno seja rico em azote para que o trigo ou qualquer outra planta se azotise, é ne- cessario o concurso dos phosphatos. Assim como, inversamente, não basta que as terras tenham bastante phosphoro, para que as culturas se carreguem de substancias proteicas, se o azote não concorrer com aquelle elemento na devida proporção. Temos para nós que as tres substancias proteicas que existem nos trigos, albumina, glutina e fibrina, são estados gradativos de con- densação mollecular de uma mesma substancia. A influencia do clima e do solo alteram no mesmo typo'de trigo a relação d'estas tres substancias, sem comtudo chegarem ao ponto de as egualarem em quantidade. Sabe-se que um trigo rijo cultivado de inverno, ou em terra quente e humida, ou em terra muito pingue e substancial amollece, tornando-se mais albuminoso e menos glutinoso do que era; e que em circumstancias oppostas os trigos molares adquirem os caractéres dos trigos rijos, fazendo-se menos albuminosos e mais glutinosos. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. IH. P. LL. 19 146 ESTUDO INDUSTRIAL E GHIMICO Parece que a abundancia dos suecos na terra, na planta e no ar, entretem uma certa fluidez ou rarefação nas substancias proteicas, des- favoravel á formação da fibrina, que é o estado ultimo de concreção ou condensação d'aquellas substancias; e que a pobreza de succos ou a falta de humidade puxa a albumina e a glutina ao estado de fibrina. Estudando um trigo qualquer nas diversas epocas da sua vege- tação, observa-se que, em quanto o bago está em (feite, todas as sub- stancias proteicas se acham no primeiro estado de condensação, isto é, no estado albuminoso. É impossivel n'esta epoca separar o gluten do trigo. Mais tarde, quando o grão principia a endurecer, o gluten já se póde separar; mas n'esta epoca é tão branco e fluido que a operação da sua separação tem grandes difficuldades. O gluten obtido é quasi todo constituido de glutina. Finalmente, quande o grão chegou ao seu perfeito estado de ma- turação e de seccura, a albumina e a glutina teem-se reduzido á pro- porção com a fibrina, em que costumam apparecer nos trigos perfei- tamente desenvolvidos. Todos estes factos auctorisam a crer que a fibrina sae da glutina e esta da albumina, e que n'esta tranformação participa notavelmente o clima e o sólo, segundo proporcionam á planta maior ou menor abundancia de suecos. A composição elementar das tres substancias proteicas dos tri- gos offerece tal analogia, que já mesmo & priori se poderia admittir a possibilidade da sua transformação. Eis-aqui a sua composição, se- gundo Cahours e Dumas para a albumina e glutina, e segundo Mul- der para a fibrina. Albumina Glutina Fibrina Carbonco ste. acDosla a EN OE JUDO Al Hydrogenio vo Tl. agrid Tau ária 6,9 Aizotel. ee A LS SOS 2 TUSD sus US, 4 Oxygenio .... 9 23,5 oxygenio Enxofires st FE di 1,2 enxofre Phosphoro.... — — 0,3 phosphoro 100,0 100,0 100,0 DOS TRIGOS PORTUGUEZES 147 EM Materias amylaceas c cellulosicas dos trigos Reputa-se geralmente que o amido e a dextrina seguem a pro- porção directa da cellulose, e a inversa com as materias proteicas e gordas. E o que nós temos achado nos resultados médios dos dois gru- pos commerciaes de trigos. A qualidade e a quantidade dos amidos parecem andar de com- panhia, e isto em ambos os grupos. Geralmente, quanto mais grossa é a fécula, menos abundante é, quer o trigo seja duro quer seja molar. Se compararmos a relação dos amidos, com a relação das fari- nhas panificaveis dos trigos rijos e molares : Farinha panificavel Amido e dextrina Trigos rijos..... 62,10 Roi 71,07 Trigos molares .. 71,62 ais 72,74 achamos que não são eguaes. O que depende, como já anteriormente ponderámos, de nos havermos servido do mesmo moinho e peneiro para todos os trigos. E a confirmação d'esta explicação fornece-a a comparação da re- lação da farinha ao amido em cada grupo. Vê-se que a quantidade da farinha é, relativamente ao amido, muito menor nos trigos rijos que nos molares. É porque o moinho não desprendeu, e o peneiro não se- parou, todo o amido que o trigo rijo contém que resulta aquella des- egualdade. De que depende esta maior resistencia que offerece o amido dos trigos rijos a desageregar-se de si mesmo e a separar-se da episperma? Já sabemos que os trigos rijos são mais glutinosos e que o seu gluten é muito fibrinoso. E a estas circumstancias, e tambem á quan- tidade menor de humidade do grão, que aquella resistencia á pulve- risação -se deverá attribuir. D'aqui resulta, que o farello do trigo rijo ha de ficar, no moi- nho apropriado ao trigo molar, com grande porção de amido. Mas esta 19 » 148 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO consequencia parece ser desmentida pela apparencia dos farellos de uns e outros trigos. Na verdade, o farello de um trigo rijo não mostra parte branca alguma, em quanto que o farello do trigo molar, por maior que haja sido a fricção do moinho, resta sempre com muito amido agarrado. Se porém um e outro farello forem repassados por moinho de maior força, será o farello do trigo rijo o que ainda produzirá mais alguma farinha. De resto esta apparencia dos farellos é a mesma dos respectivos bagos. Quem nãe soubesse que o trigo rijo depois de moido apresenta uma farinha comparavel á dos trigos molles, duvidaria d'esse facto, comparando a sua quebradura vitrea e a côr da casca, com a quebradura branca e farinacea do bago molar. Comparemos agora as quantidades médias das substancias amy- laceas, determinadas pelas nossas analyses, com as quantidades que das mesmas substancias nos offerecem as analyses de outros chimicos. Nas vinte e quatro analyses de Boussingault tirámos para o ami- do, dextrina e agua a cifra média de 81,6 ou de 71,6, suppondo uma média de humidade de 10,0. Nas duas analyses de Fehling e Faist obtemos a média do amido e da gordura egual a 82, quantidade excessiva que só se poderá en- contrar em trigos muito amylaceos. Oudemans dosou em um trigo secco 61,5, e n'outro molar 73,8. Fuss dá-nos uma média de 57,2, que é o extremo opposto da média de Fehling. Nas doze analyses de Peligot achámos a média geral de 69,4, para os trigos molares de 72,4 e para os rijos de 68,4. A divergencia de resultados a respeito das substancias amylaceas, não é tão grande como a que observámos a respeito das substancias proteicas. Separámos o amido da gomma e da dextrina em alguns trigos, e tivemos occasião de verificar que estes dois ultimos principios, isto é, que a materia amylacea soluvel, abunda mais nos trigos molares que nos Trijos. Relativamente á cellulose, ha em todos os trigos duas qualida- des d'ellas bem distinctas. Uma que constitue a casca ou episperma do bago, de côr escura ou amarellada, deixando pela calcinação grande quantidade de cinza, e dissolvendo-se com difficuldade no licor cupro- ammoniacal de Schweitzer. E uma cellustase. Outra que fórma o es- queleto ou parenchyma do bago, nas malhas da qual se acha o amido e as materias proteicas, de côr branca, dissolvendo-se facilmente no DOS TRIGOS PORTUGUEZES 149 licor acima dito, c deixando fraco residuo salino pela calcinação : é a cellulose propriamente dita. A somma total das duas celluloses é maior nos trigos molares; mas a cellulose epispermica predomina nos trigos rijos. Sc considerarmos as materias amylaceas e cellulosicas como de- rivando de um typo fundamental por condensação ou incrustação suc- cessivas, consideração que temos direito de fazer attendendo á grande analogia de composição que ha entre ellas, acharemos que ellas se po- dem representar em tres estados distinctos, e taes que outros tres es- tados homologos lhes correspondem nas substancias proteicas. É para notar que esta correspondencia, estado a estado, das materias amyla- ceas e das materias proteicas, não existe sómente nos caractéres e no modo de ser, senão muito particularmente nas circumstancias externas que preparam ou decidem cada um dos ditos estados. Nós dispomos no seguinte quadro a correspondencia dos estados das materias proteicas e amylaceas dos trigos rijos e molares, com as influencias que os favorecem e com as qualidades do grão. ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 150 OBJTA “0INP “00098 “oproo “Bio “01SeW uLopT O92ULIR] “OP =-LUUMTY “ofjow “ojos “ossors oxIá op sopeprrend JOJeo “ora -J0] OP €ZIIQ -0d 9 vinaoos wap] OI “Ojos op viurIsqns o apeprunt euro o o1S SIE sajrout soda, SOU eplo| -09 9S0Jn]| por) opruy eTUUIOS 9 eUmxoE seoIsojnI[oo à stodr|Áuir setIaJeW SOU SIA saJrjOUL SOS sou EULIQUA eus eurungy seotajoid SELIOJEI oBótsuapuos ep snvIL, DOS TRIGOS PORTUGUEZES 151 Vê-se d'este quadro, que as mesmas circumstancias que conden- sam as materias proteicas e as puxam ao estado de fibrina, são as que condensam e puxam as materias amylaceas ao estado de cellulose co- lorida. A insolubilidade e a lenhificação de umas e de outras substan- cias marcha, guardadas certas proporções, par a par, e em virtude das mesmas causas. Vi Estudo das terras em que foram produzidos os trigos Assim como temos comparado entre si as médias dos resultados que obtivemos no estudo dos dois grandes grupos de trigos molares e rijos, não será distituida de interesse a comparação das médias das ter- ras que produziram uns e outros. Não é esta certamente senão uma face do plano com que se póde chegar a uma averiguação rigorosa da in- fluencia dos sólos sobre o trigo em geral, ou sobre cada typo em especial. Seria mister depois d'este estudo estudar ainda as terras, ou um certo numero de terras de cada districto geologico bem definido, e com- parar a média da sua composição, a média das suas qualidades physicas, com a média da composição dos trigos no mesmo districto produzidos, sem esquecer egual estudo comparativo dos elementos climatericos. Seria mister ainda comparar a composição do mesmo trigo creado em sólos diversos, mas de clima identico; e por ultimo comparar a composição de todos os typos de trigos, nascidos em sólo e clima eguaes. É este immenso e trabalhoso estudo que deve resolver a segunda questão: conhecidos os typos vulgares dos nossos trigos, saber em que circumstancias de clima, de sólo e de cultura attinge cada um o seu maximo valor. À Entretanto, se reflectirmos que a distribuição das culturas tem a sua razão principal nas condições do clima e do sólo, especialmente nos paizes de uma agricultura mais natural que artificial; se nos lem- brarmos que os trigos molares e rijos occupam no nosso paiz regiões perfeitamente destacadas, em quanto ao clima e em quanto á natureza geologica, poderemos esperar do estudo já feito das terras que produ- ziram uns e outros, senão a luz brilhante que esclareça todas as ques- tões oflerecidas ácerca das multiplices relações dos sólos com a vege- tação e producção dos trigos, pelo menos os dados elementares, os pri- meiros traços da concordancia entre cada grupo de trigos, e a região que espontaneamente preferiu, CHIMICO ai 4 09% oIgos or p o snumiy op o 00T opuas “oordooso1s Ay ne1s vIaIr T ESTUDO INDUSTRIAL 1 | eIrãar ep o 007 opuas “orsomp" op nes 00TOpuos “'ogôeodasap op nexo 152 LV ng LS'eo ** RIJOs-TULOS “* VIJOS-IUTOS "ee*-- og snunT op o 00T opuas “ogórqrqurr op nvis apepIsuad OBSIATP 9p oprystr " "RSONOI[IS-O[ [LIV |" -Rav|o-TUIoS SO SOPO) op stato “"esoLonIs-O[[Lay |" "+=" exero jofia odnas op serra, * "BSOToI|IS-OT|ISAY | -=+= umas |teeececeeocoo q EZOIIEN -ouL 0dnIS Op seua |, soS14 sop SOCVSXTYNV SODIIL SO NYHIZAONA UNO SVUNAL SVO SVICAN SVOISAHA sadyaITyad DOS TRIGOS PORTUGUEZES 153 Vimos precedentemente que as condições climatericas das regiões affectas aos dois grupos de trigos, eram ajustadas ao fito de propor- cionar humidade aos molares e seceura aos trigos rijos. Sendo a producção vegetal o resultado da acção conjuncta do cli- ma e do sólo, pareceria que este devesse afinar-se em tudo pelas qua- lidades d'aquelle com quem anda casado. Seria um erro, comtudo, se assim suppozessemos. O accordo de qualidades em tal caso, longe de temperar e harmonisar as influencias, desconcertal-as-hia, determinando excessos Prejudiciaes á vegetação. Nem sempre com o clima humido se abraça a terra humida de condição ; nem sempre a seccura do ar acha egual qualidade no sólo que a reforce. Quasi sempre é o contrario que se observa; e quando apparecem excessos de uma ou outra natureza, não é porque a natu- reza opposta não exista ahi, mas porque a sua intensidade não foi pro- porcionada á intensidade da que devia adocar. A confrontação dos algarismos que traduzem as qualidades phy- sicas das terras dos trigos molares e das terras dos trigos rijos, di- zem-nos pelo menos que o sólo e o clima não são congeneres, mas diametralmente antagonistas em muitos casos. Se este antagonismo é providencial não o questionamos. Que o deve ser, não soffre duvida pelo principio da harmonia dos contrastes que regula todas as coisas naturaes. Que é justamente este medido antagonismo que o agricultor trata sempre de restabelecer quando naturalmente o não tem, tambem não se póde contestar. Que finalmente é a esta opposição do sólo com o clima, que devemos a facilidade da cultura cereal por toda a ex- tensão do paiz, não obstante ser excessivo e destemperado o seu cli- ma, a curto tempo e a curto espaço, é tambem uma verdade que a observação dos factos não fará senão aclarar cada vez mais. Entretanto limitamo-nos a fazer sentir a opposição ou harmonia de influencia do clima e do sólo na região de cada grupo de trigos. Consideraremos as duas influencias de maximo effeito na vegeta- ção, isto é, a temperatura e a humidade. Em relação á temperatura, o clima e o solo parecem dar-se as mãos nas duas grandes regiões dos trigos molares e rijos. Com efleito, as terras da região septentrional do nosso paiz go- sam de um poder de aquecimento, e de um poder conservador para o calor, um pouco inferiores aos das terras do sul. Não tendo apparelhos apropriados para determinar experimental- mente estas qualidades nos sólos de uma e de outra região, satisfize- mo-nos com determinal-as pelo calculo. MEM. DA ACAD. — |. CLASSE, — T. NI. P. 1. 20 154 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO Schubler havia achado os numeros que representam aquelles dois poderes em cada uma das terras elementares: areia, argilla, calcareo e humus. Reflectimos que o poder absorvente e o poder conservador para o calor de qualquer terra composta, devia ser egual á somma dos po- deres absorvente e conservador das suas terras elementares; e que a quantidade de calor absorvido e retido por cada terra elementar de- via ser proporcional á quantidade que da mesma terra elementar en- tra no tempero da terra Composta. Então, conhecendo em cada terra composta as quantidades das suas elementares, foi-nos facil achar por uma serie de proporções a fracção do poder absorvente e conservador, com os quaes cada terra elementar entrava para a composição das ditas qualidades na terra composta. Achadas estas fracções, a sua somma deu-nos o poder absorvente e conservador do calor de cada uma das terras médias pertencentes ás duas grandes regiões dos trigos molares e rijos. D'esta sorte achámos que as terras da região septentrional aonde se accumularam os trigos molares teem, termo medio : Poder de aquecimento. . ............. 43,64 Poder conservador de calor... ......... 72,90 As terras da região dos trigos rijos teem, termo médio : Poder de aquecimento. .............00 4455 Poder conservador do calor... ......... 73,61 Assim a região dos trigos molares mais fria pela latitude e pela altitude do que é a dos trigos rijos, é-o ainda mais, porque o seu sólo nem aquece com facilidade, nem retem por tanto tempo o calor como faz a região do sul. Esta harmonia do clima e do sólo nas terras do norte que ag- grava o frio da região, dá em resultado prolongar-se n'ella o cyclo vegetativo dos cereaes; a ponto de ser impossivel em grande numero de sitios a cultura tremez, e em outros de altitude mais elevada ser impossivel a cultura do trigo; podendo apenas dar-se as cevadas e os centeios que se contentam com menor caloração. Quando se reflecte que o calor é a primeira causa da producção dos trigos rijos. Quando se observa que os molares vão muito mais DOS TRIGOS PORTUGUEZES 155 além em latitude e altitude que os trigos rijos. Quando se repara que nos logares em que, embora temperaturas elevadas, os trigos podem sair molares se a terra for frescal, pingue e fundavel, circumstancia, esta ultima, que se não dá na maioria das terras de trigo da nossa região do norte. Quando finalmente se attentar que as terras delga- das, arenosas, fraqueiras, propendem a endurecer o bago, sendo desta qualidade a maioria das terras da nossa região do norte, acha-se a ex- plicação da coincidencia do sólo com o ana! a qual parecendo dever oppor-se á creação do trigo, e oppondo-se realmente em certos loga- res, é todavia uma discreta combinação para permittir a producção pao trigo molar em terras que de natureza propendem a enrijar o bago. Ainda n'este caso ha antagonismo entre o sólo e o clima; pois que é o frio do sólo ssmmado com o do ar, que rebate a tendencia do mes- mo sólo a fazer trigo rijo, derivada da sua natureza chimica. O an- tagonismo acha-se aqui na propria harmonia. Se agora indagarmos a relação das qualidades dos sólos com o clima em respeito á humidade, achamos uma opposição manifesta en- tre ambos nas duas regiões de trigos. Na região dos molares a terra média tem menor poder de im- bibição para agua, maior facilidade em enxugar, menor grau hygros- copico. E estas qualidades estão em concordancia com a sua menor adhesão ao ferro e ao sobro, o que já podia indicar que devem ser terras menos argillosas, o que effectivamente vemos que assim é, com- parada a composição chimica inmediata das mesmas terras médias. Este conjuncto de qualidades legitimadas pela composição chi- mica, demonstra que as terras da região dos trigos molares tendem mais para seccadaveis que para lenteiras. O que, se de um lado prova o antagonismo do sólo com o clima em relação á humidade, não prova menos a conveniencia da harmonica apparencia do mesmo sólo com o clima em relação á temperatura. Por ultimo, sabendo-se que o trigo não deita as raizes além de um decimetro de profundidade, e que a camada superficial do sólo é onde menos demora a humidade por causa da Savidatas que a chama para baixo, e por causa da evaparação, que a arrebata para a atmosphera, concebe-se que em terras delgadas e soltas, valia para o facto de man- ter a terra em um certo grau de humidade, quasi tanto o augmento da mesma humidade, como a diminuição da evaporação devida á falta de calor no ar e no solo. ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO 156 Ga%0'0 ootIoqdsoqd oproy L66'0 | 9L9Y 6650 | 09STY G66'0 | G6LT opáxoJad opíxojo1d ap optyso ou OJIP SI9ANTOS Saes 6% | 6098 voIrojto eiuóre JeloUIva eLIJeI LV TE | STO'E | SEO | LET SOJLIJAP O VIAIE c6'0 | e80 Sm | €6T T2AnJosur j24Anjos e snumyr sojsodumoo9pur soyiyap TOTULÍIO ELOJEM | vordoosoiSAy endy ter "=" ** SOB SO SOPOI AM cessa vacas ofta odnas oq Jejou odnus oq odni3 vpro op sela VUMAL AQ 00T WA SOUNA A SAUVION SODIML SO WYHIZACOUA AND SVUNAL SVA VICAN VOINIHO OYDISOANOO DOS TRIGOS PORTUGUEZES [57 O quadro presente da composição chimica média das terras que produziram os trigos analysados, comprova e explica não só as quali- dades physicas médias das mesmas terras, mas alguns dos resultados singulares da analyse dos trigos. Achámos com effeito maior quantidade de agua nas terras dota- das de maior grau hygroscopico. A differença não é proporcional; porque as terras, assim como já vimos succedera com os trigos, passaram um anno encaixotadas an- tes de se proceder á sua analyse. Em consequencia d'esta longa secca- gem, as terras perderam mais de dois terços da sua agua. E perde- ram-a na razão da sua natureza mais ou menos areiosa; pois se vê que as mais argillosas são em média as que retiveram maior dóse d'ella. O grau hygroscopico acha-se em relação com a quantidade do humus e da argilla, que são as terras elementares mais ávidas do va- por atmospherico. A densidade é proporcionada á quantidade da areia, que é de to- das as substancias terrosas a mais compacta e pesada. A quantidade da agua absorvida é directa com a da argilla, e inversa com a da areia. Ao contrario, a facilidade de seccar ou enxu- gar, segue a quantidade da areia, e é inversa com a da argilla. O grau de adhesão ao ferro e ao sobro é maior justamente nas terras que tem maior somma de argilla. O poder conservador do calor não segue a quantidade da areia, porque a terra média que offerece esta quantidade maior não contém humus, que é de todas as terras elementares a menos dotada d'este poder, n'uma quantidade proporcionalmente menor. O poder de aquecimento pela mesma razão não é proporcional á quantidade do humus e da argilla, mas sómente proporcional á da ar- gilla; porque a quantidade diminuida no humus é mais que compen- sada pela que augmentou na argilla, sendo a argilla, como é, a terra elementar immediata ao humus em poder de aquecimento. Por ultimo ponderaremos, que o calcareo de que estão quasi des- herdadas as terras do norte, apparece mais quantioso e generalisado nas terras do sul. É uma poderosa razão de ser esta Aistrnição do calcareo da distribuição dos trigos; e realmente, quando se reflecte na acção do calcareo sobre a preparação do alimento vegetal, acaba-se por adquirir a convicção de que elle devia necessariamente abundar na região mais quente que os trigos duros escolheram. Diz-se que o calor é, tanto para os animaes como para os vege- taes, um equivalente de alimentação. Mas não se diz a verdade inteira. 158 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO O calor é um excitante, apressa os actos vegetativos, faz todas as co- lheitas temporãs. Mas se esta precocidade não for acompanhada de far- tura de alimento, a producção sim chegará breve ao termo de seu desenvolvimento, porém amesquinhada de fórma e de robustez. Precipitada a serie dos actos vitaes da planta, cumpre que se preci- pite egualmente a serie das transformações dos detritos organicos e inor- ganicos que hão de fornecer a materia soluvel para a formação vegetal. E o calcareo que em grande parte afina a elaboração nas entra- nhas da terra, pelo tom da elaboração verificada nas entranhas do ve- getal. A materia organica é consumida pela acção do calcareo e con- vertida em ammoniaco, parte do qual se converte depois em acido ni- trico, ambos principios assimilaveis pelas plantas. Uma prova d'esta acção do calcareo, é que nas terras do sul, onde elle mais apparece, é onde tambem se acha menor quantidade de de- tritos organicos e maior quantidade de humus. Quer dizer, que de- baixo da acção, n'este ponto congenere, do calcareo e da maior tem- peratura, a materia organica da terra experimenta uma decomposição mais rapida. Quando se considera na importancia do calcareo para a solubilisação da materia organica, admira realmente como póde haver terras quasi destituidas d'elle. E nós temos bastantes que se acham n'este caso, quasi todas na região dos trigos molares. Suscitam-se naturalmente estas questões. Podem os trigos de qualidade molar crearem-se sem cal? N'este caso, por que se acha cal nas suas cinzas? N'este caso, ainda que outro elemento preenche o papel da cal na transformação da materia organica das terras, pois que a tempe- ratura, seu auxiliar, longe de acrescer na região pobre de cal, antes se acha diminuida ? Nós acreditamos na indispensabilidade da cal, tanto para a cul- tura cereal como para qualquer outra cultura; porque a cal não é apenas um instrumento de preparação, um dissolvente da materia or- ganica das terras, senão tambem material da composição vegetal. Mas a cal, de qualquer fórma combinada, não deriva só das ro- chas que originaram o sólo agricola. Sabe-se hoje, depois das curiosas experiencias do sr. Isodoro Pierre, que as aguas das chuvas, ainda ha pouco reputadas em pureza logo abaixo da agua distillada, encerram uma parte terrosa, não só sensivel mas até copiosa, bastante em mui- tos casos para fornecer a parte mineral a uma ou mais culturas. A cal, differentemente combinada, é transportada ás terras na proporção de 26 kilogrammas por hectare em cada anno. DOS TRIGOS PORTUGUEZES 159 Ora, admittindo que 1 hectare produza 20 hectolitros de bago de trigo com o peso médio de 1:600 kilogrammas, e de outros 1:600 kilogrammas de palha; dando por cada kilogramma de bago e palha 5 grammas de cal, acham-se necessarias para esta producção apenas 16 kilogrammas de cal, Póde-se portanto suppor que n'um terreno absolutamente priva- do d'este material, se elle for beneficiado pelas chuvas, encontra n'es- tas annualmente a quantidade de cal mais que necessaria para uma producção de trigo de bom quilate. Mas as nossas terras são pobrissimas, e não destituidas inteira- mente de calcareo. Nós achámos, em muitas, pequenissimas proporções, as quaes não dosámos e a que demos o nome de vestigios, porque a sua quantidade ia muito além da segunda casa decimal, limite que taxámos ás nossas analyses, por nos pareccr sufficientemente approxi- mado n'um ensaio puramente agricola. Estes vestigios de cal foram po- rém em algumas das terras dosados pelo sr. visconde de Villa Maior no laboratorio da Escóla Polytechnica, que achou a quantidade de 08,0002 em 100 grammas de terra. Por pequenissima que seja esta fracção de cal, um pequeno cal- culo vae mostrar-nos que ella é muito mais que sufficiente para as exigencias das terras. Vimos acima que o trigo de 1 hectare de terra póde consumir 16 kilogrammas de cal. Se admittirmos que na área de 1 decimetro quadrado não cabem folgadamente mais de dez pés de trigo não atou- cado, e que as raizes do trigo não bebem alimento além de 1 deci- metro de profundeza, teremos que em 1 hectare: de terra apenas 1.000:000 decimetros cubicos contribuem para a alimentação da tri- gada que o guarnece. Este volume de terra pesa 4.740:000 kilogrammas, sendo a den- sidade média das nossas terras 2,87; e como se achou em 100 gram- mas 05,0002 ou em 1 kilogramma 08,002, segue-se que aquelle peso de terra que fornece ás despezas do trigo, contém 4:740 kilogrammas de cal, isto é, duzentas noventa e seis vezes a ração annual d'este corpo. Por este calculo, para o trigo, vê-se que as taes terras desher- dadas de cal parecem antes ter sido bem contempladas. E na realidade o são, se considerarmos a cal apenas como elemento de constituição vegetal. Mas a cal, como já dissemos, exerce nos terrenos uma acção de digestor sobre as materias organicas, e parece mesmo que das inorga- nicas, que ella concorre a solubilisar. Ora desta funeção da cal é que 160 ESTUDO INDUSTRIAL E CHIMICO incontestavelmente se acha privada a maioria das nossas terras, nota- velmente as em que carregaram os trigos molares. Resta saber então como é que em taes terrenos se decompõe e apparelha a materia organica para entrar na composição vegetal. Que principio poderá supprir a falta da cal n'esta obra da re- ducção e de simplificação da materia do estrume, senão o oxygenio? É recente e ainda obscuramente estabelecida a theoria da respi- ração da terra; mas é fóra de duvida que esta immensa mole, asse- melhada ao corpo humano debaixo de tantos pontos de vista; que este gigante, de que nós, os viventes, não seriamos senão uns parasitas in- significantes, que teem ossos e carne, liquidos circulantes e correntes imponderaveis, excreções, absorpção, movimento e digestão, possue tambem a sua respiração, e uma respiração que, aferida pela luz chi- mica, muito se aparenta com a respiração animal. A terra fixa o oxygenio atmospherico como o pratica o sangue animal. Este oxygenio exerce na terra que o fisa, como no sangue que o absorveu, uma combustão. O vehiculo d'esta absorpção é o ferro em ambos os casos. Em ambos os casos o ferro peroxydado e rutilante embrenha-se na massa do corpo, no animal pela acção do coração e das arterias, na terra por essas outras arterias abertas, ou pelas causas naturaes, ou pela força das machinas aratorias. Como o sangue venoso trazido a contacto com o ar de escuro se aclara e purpuréa, tambem a terra vermelho-escura trazida á super- ficie se faz mais rubra. Como o sangue arterial, chegando a contacto com os tecidos do corpo, se despoja de parte do seu gaz vital que combusta a porção d'eiles envelhecida ; assim o peroxydo de ferro mettido ao dentro da terra, se desoxyda, queimando, reduzindo a compostos mais simples a materia organica da terra. A analogia não póde ser mais completa, nem mais auctorisada pelos factos. Entre outros citamos o que é nosso, o que se colhe do nosso tra- balho, e é que o ferro não só é mais abundante na região dos trigos molares, na qual o calcareo escaceia; mas, coisa notavel, é tambem ahi que a proporção do peroxydo em relação á quantidade do ferro é maior. Como a materia organica, reduzida pelo oxygenio ou curtida pela cal, se acha mais disposta n'aquelle caso a formar o trigo molar, n'este a formar o trigo rijo, é segredo que mal podemos penetrar. Não nos parece que o meio reductor do estrume tenha maior DOS TRIGOS PORTUGUEZES 161 influencia para estabelecer a qualidade molar ou rija do trigo, se ou- tras circumstancias de que já fallámos não intervierem n'este pheno- meno. Entretanto poder-se-hia admittir que a maneira por que se reduz o estrume a materias utilisaveis não é indifferente a este facto. Talvez que a reducção pelo oxygenio prepare maior dóse de aci- do carbonico, o qual, dando ao trigo mais luxo e desenvolvimento her- baceo, faça ao mesmo tempo predominar as substancias carbonadas ; substancias que effectivamente dominam em relação ás proteicas, mais nos trigos molares que nes rijos. E estas substancias são: a gordura, a fécula, a cellulose e a dextrina. A reducção do estrume pela acção da cal, preparando menos acido carbonico e mais ammoniaco, decidiria o predominio relativo das ma- terias proteicas nos trigos rijos. E FIM MEM, DA ACAD. — [.º CLASSE. — T. HI. P. ll. 21 e Pay pa A My Pim; SM E o y do «Ret goto ir va OU oba dg Rquicgio A mu EA PN Ada pe o cm MONEA IA La Mv DS RR US VR O! eiiógo q hds aih A a RR Abeac qui a) mi iá DEAR ii o ir ph nen tea la ento PA E EA e à a O Criado RO ay OS Hoaoo pereira tao a, ei quis Er aa RO em A ço A am dane it peço RO q a ma O a a UR, o pd verbas ed e al A Ar ti! "a A A ab O a E , pio a Rush | Aa) e hah indo Ma É | ! VA Do pi o RS ? o A oia e ua UR + na 7) AS RR) À À ; ! EVA A RR RV À a A dd NRO RREO O PO AR DR) ste a o a A o AAA Apoca TAM O RD e a saio dt A eu PR po ARO o Ar NA um ' RE: NA ns ta PESA ML DAÇà af dc) ; prt h pe ia do: j 1 ER ret O O bo india, mel E bd À d Mt) . r f “o E) bs DE E a uh TERRA TA À i Had or Pe A AP AA HA RR mos a A AAA p sn ma via | dar br CAE DANA é frtAsos É seia AME PPA EO uh O AM va viro nar; E m RAUL in PA E dei ted ad | Aa ia Ap dr io, ; Tr a tags Rd am gta : PAi Ta +, di TR EMA Ha Sie ! = PV lido pp pet rr sra po pfênaota: shoot, lados boo que af duto Nida E e pr A bpm do na factor ad era io dir ve e Dodi botao E Gera, Niro ya ) de atri tu. doglatça, PA, rim a ns apo Ns pena ana, pira à da hds va ns panbia esd rio gli Me Mintimáigro ao bginrasa Mbiibitas didi vunges emu Erg qu mos si H, MM Ana, ha na dello ço ag ty 4 dd e dl di A duliaganiga + nm ge derda EATros DM AT a e Mod rd pe ni » PRE ame: bags, Elo Ao nos dd peu atuado Enjaito Les, y po poa nl nho on NO rio Pas rigtee vu: jo AA, oe fu liuida to PO tiibsm djs to ta dem mos datas m aaa h o hi tl . Virá pur) mM o and era , ea RA: A | igor dg e ibisigtnde o Pato Mada M E e api A deh bed Pa psd oa À) N IA nos | ns E ij my ; e | Me By E LIA H Mn h J 7 Ás! | o, | ; dl] | 4 ANT A A : go PA l ') ç Ni AREA A NUR RA HM Ip l ] U y À o ) nt | ! À Ny | | CRM, ir 1 [ o | pn U DRE es | | | É NaN | | || ) ) b A NOTICIA ÁCERCA DOS ARVICOLAS DE PORTUGAL PELO SOCIO EFFECTIVO JOSÉ VICENTE BARBOSA DU BOCAGE Os pequenos mammiferos da Europa, e mui particularmente as especies pertencentes ao genero Arvicola, teem sido objecto da mais se- ria, ou para melhor dizer, da mais minuciosa attenção de varios zo0- logistas contemporaneos. Os estudos de micromammalogia de Selys- Longchamps, e os escriptos de Jennyns, Schinz, Blasius e Gerbe ácerca dos representantes do genero Arvicola na Inglaterra, Suissa, Alema- nha, Belgica, França e Hespanha, teem augmentado consideravelmente a lista das especies européas. Sem querer aqui discutir detidamente o resultado definitivo, e a importancia real dos trabalhos de tão distinctos zoologistas, mesmo porque nos faltam muitos elementos indispensaveis, parece-nos com- tudo que do exame attento de quanto ha hoje escripto sobre o assum- pto, se deprehende claramente a necessidade de novos e acurados es- tudos. Muitas especies estão carecendo de uma boa caracteristica. Para as estabelecer, recorreram a pequenas differencas, a caractéres extre- mamente variaveis e fugazes, em quanto que em outros generos dif- ferenças mais pronunciadas mal auctorisam a admissão de boas varie- dades ou raças. O diverso habitat é muita vez o argumento mais forte que se póde invocar para separar especies, que apenas differirão entre si por ligeiras variantes nas côres do pello e nas proporções relativas de algumas partes do corpo. E d'aqui resulta que, em faltando a in- dicação precisa da localidade d'onde procede, se torna quasi impossi- vel reconhecer a especie; nem se póde ter por segura a determina- MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.— T. HI. P. II. 1 » NOTICIA DOS ARVICOLAS cão especifica, em quanto se lhe não alcança a confirmação do zoolo- gista que creou a especie, o qual assume por esta fórma as funcções e a infallibilidade de contraste zoologico. Esta situação não nos parece boa nem conveniente. Não vemos n'ella um verdadeiro progresso scientifico; e é justamente por isso que fazemos votos porque se comparem attentamente as especies eu- ropéas inscriptas no genero Arvicola, e se lavre o catalogo definitivo das que ali deverem ser admittidas. Por em quanto acceitaremos o que está, e trataremos de com- parar os typos que encontramos no nosso paiz com os que achamos admittidos na sciencia. Na nossa lista dos mammiferos de Portugal, que a Revista Zoo- logica de Paris publicou o anno passado !, incluimos tres especies de arvicolas. Uma, pertencente por seus habitos aquaticos ao subgenero Hemiotomys de Selys, pareceu-nos então identica ao 4rv. amphibius (Linn.); as outras duas, ambas terrestres (subgenero Microtus, Selys), approximavam-se tanto de duas especies extremamente visinhas, os arvicolas incertus, Gerbe, e Savii, Selys, que não hesitámos em as mencionar sob estes nomes. Depois da publicação d'aquelle nosso primeiro ensaio, podemos obter maior numero de exemplares dos nossos arvicolas, graças, sobre tudo, ao concurso benevolo e efficaz que nos tem prestado o nosso amigo o sr. Rosa de Carvalho, de Coimbra, a quem devemos muitos dos representantes da fauna de Portugal que fazem parte das collec- ções do Museu de Lisboa; e habilitados d'esta sorte com melhores ele- mentos para emprehender um novo estudo, reconhecemos a necessi- dade de introduzir algumas correcções na parte que se refere ao ge- nero Árvicola, e de justificar as nossas novas determinações com a in- dicação resumida dos caractéres que nos levaram a admittil-as. Eis por tanto as especies do genero Árvicola de cuja existencia em Portugal já possuímos documentos authenticos. 1 Revue et Magasin de Zoologie. 1863, pag. 329. DE PORTUGAL 3 ft. ARVICOLA MUSIGNANI. Selys. Arv. destructor. Selys. (Micromamm.) — Arv. terrestris. Bp. (Icon. faun. ital) — 4rv. amphibius. (Lin.) B. du Bocage, Liste des mam. et rept. de Portugal. Rev. Zool. 1863, pag. 329. Todos os exemplares que possuimos d'esta especie tem-nos sido enviados de Coimbra, onde parece muito commum, pelo sr. Rosa de Carvalho. Deixando-nos guiar, num primeiro exame, tão sómente pe- los caractéres exteriores, julgámol-o identico ao 4rv. amphibius ; de- pois, tendo á nossa disposição um maior numero de exemplares dos dois sexos, e tendo estudado tambem o esqueleto, viemos a reconhe- cer que com mais razão o deviamos ter na conta de representante de outra especie assaz proxima do amplibius, e que parece substituil-o na Italia e na França meridional, o 4rv. Musignani. Dando em seguida o resumo dos caractéres exteriores e osteolo- gicos dos nossos exemplares, julgamos desnecessario entrar em mais explicações. Caractéres externos. — Pello ruivo ferruginoso, mesclado de ne- gro, na cabeça e dorso; ruivo mais ,claro, lavado d'amarello nos hy- pocondrios ; cinzento escuro, mais ou menos tinto de ruivo, no ven- tre, peito e mento. O focinho é da côr da cabeça, mas os labios são esbranquicados. As orelhas proeminentes, e orladas de pellos eguaes aos do dorso. Olhos medianos (o globo do olho tem de diametro 0º,005). Pés pardos, vestidos de pellos cinzentos e pardo-escuros entremeados, e com uma orla de pellos negros na base das unhas, que são brancas. Vibrissas negras, as mais compridas com as extremidades brancas. Cauda comprida, egual a ?/, do comprimento do tronco e cabeça, re- unidos; bicolor, fusca por cima e amarellada inferiormente, com mais de 13) anneis escamosos. Dimensões : Comprimientontotals isto te to. UU0P;300 » doFeorpo- sa sr A O0ITS0 » dadcaudansbnrernan do ORE » darcabeça . 87 Levi Sina, “0,042 » dasrorelrast PERa Raro a OusO dr » dolperanteriond, Sl se 0u 30% » do pé posterior. ....... 0,038 Anneis escamosos da cauda...... 133 a 135. wi. NOTICIA DOS ARVICOLAS Caractéres osteologicos. — Treze pares de costellas e vinte e dois pares de vertebras caudaes. Cabeça ossea comprida e estreita, tendo de diametro occipito-nasal 0",040 e 0,018 de diametro bitemporal, com o espaço inter-orbitario estreito e as cristas supraciliares proxi- mas, mas sem se tocarem. Os ossos nasaes encurvam-se bastante, e alargam-se na sua porção anterior. A maxilla inferior tem os ramos bastante approximados. O primeiro dente molar inferior mostra 5 arestas ou prismas do lado interno, o primeiro dos quaes é o menos desenvolvido, e 4 prismas externamente, sendo o primeiro tambem assaz obtuso. 2. ARVICOLA (MICROTUS) INCERTUS. Selys. Arv. incertus e Árv. Savii. B. du Bocage. Liste des mam. et rept. de Portugal. Rev. et Mag. Zool. 1863, pag. 329. Esta especie descripta a primeira vez por Selys, porém mais mi- nuciosamente caracterisada por Gerbe (Rev. et Mag. Zool. 1854, pag. 359) tem mui estreito parentesco com outras a que se pretende tam- bem dar curso legal na sciencia; taes são os arvicolas Savii. Selys, pyrenaicus. Selys, e ibericus. Gerbe. E não é sómente difficil distin- guir d'estes o arv. incertus, mas egual difficuldade se encontra para extremar bem qualquer das outras especies. Bastará adduzir para pro- va do que dizemos, que o proprio zoologista que crcou tres d'estas es- pecies, Selys-Longchamps, se mostrou depois mais inclinado a consi- deral-as raças locaes de uma só especie. (Rev. et Mag. Zool. 1847, pag. 811) Com effeito, em todas ellas ha quatro mammas tão sómente ; to- das tem as orelhas pequenas, quasi totalmente nuas, e escondidas nos pelos ; os olhos pequenos ; a cauda muito curta; as vibrissas medio- cres; as côres do pello mui semelhantes. São por conseguinte as dif- ferenças tiradas de caractéres exteriores, com que as e aic des- criminar, de todo o ponto insignificantes; reduzem-se a cambiantes das mesmas côres, a ligeirissimas discordancias para mais ou para me- nos, na proporcionalidad relativa de algumas partes do corpo, a dif- ferenças minimas que escapam quasi a toda a apreciação. Foi por conseguinte necessario recorrer ao estudo do esqueleto, e procurar em caractéres osteologicos o melhor fundamento para as distineções especificas; porém não se chegou tambem por este cami- DE PORTUGAL B) nho a um resultado que se possa dizer absolutamente satisfactorio. Assentam-se, é verdade, diflerencas na fórma geral da cabeca ossea ; diz-se que a região crancana apresenta diversa convexidade nas diffe- rentes especies; insiste-se na comparação da curva, ora mais ora me- nos pronunciada, que define o contorno superior da cabeça ; compa- ra-se a distancia tomada entre o angulo superior do occipital e a mar- gem inferior da caixa do tympano, com a que representa o maximo diametro da cavidade orbitaria, e diz-se que ora são equivalentes as duas dimensões, ora é a primeira inferior alguns millimetros á se- gunda. E n'isto se resumem as principaes diflerenças osteologicas. O exame dos dentes não dá a solução do problema. Nas quatro especies, o ultimo dente molar superior apresenta tres prismas de am- bos os lados, e o primeiro molar inferior 5 prismas internos e 4 ex- ternos. Esses dentes pois, que costumam apresentar variantes de estru- ctura em outras especies, são n'estas completamente uniformes ; ape- nas se poderá notar, a favor do arv. incertus, uma ligeira differença na estructura do ultimo dente molar superior, a qual consiste em ter o prisma medio externo menos desenvolvido que os prismas lateraes, chegando mesmo em alguns individuos a obliterar-se. Decidir portanto a qual d'estas quatro especies, tão similhantes, tão pouco distinctas entre si, pertencem quaesquer exemplares que se apresentem com os caractéres que a todas são communs, não deve ser problema de pouca difficuldade ; e é esta eflectivamente a situação em que nos achamos. Os exemplares recebidos de Coimbra teem quatro mammas, a cauda muito curta, os olhos muito pequenos, as orelhas nuas e escon- didas no pello. Nos adultos a côr da cabeça e dorso é parda, tinta li- geiramente de ruivo; d'um ruivo mais claro nos hypocondrios, e nas regiões inferiores d'um cinzento esbranquiçado, quasi branco em al- guns individuos. Em exemplares mais novos variam algum tanto as córes; são mais escuras nas regiões superiores, domina menos n'ellas e nas lateraes o ruivo, e o ventre e peito são mais cinzentos. Em to- dos o focinho é escuro, d'uma côr parda bastante carregada ; a cauda bicolor, escura superiormente, amarellada por baixo. Dimensões. — Os nossos maiores exemplares apresentam as se- guintes: 6 NOTICIA DOS ARVICOLAS Comprimentostotalss! sbuga o E Da » daticauda BERRO ODE » daricabeca re Su TOS TO DG » do pé posterior. ...... ADS » dasmonelhas E ROO OT Diametro do globo do olho ......... 0,002 Quanto aos caractéres osteologicos, a fórma geral do craneo não desdiz da descripção e figura que Gerbe publicou d'esta parte do cor- po do arv. incertus, com a differença, porém, de que em nenhum dos nossos exemplares, a distancia tomada entre o angulo superior do oc- cipital e a margem inferior da caixa do tympano é inferior ao dia- metro maximo da orbita; pelo contrario é-lhe egual. O ultimo dente molar superior tem, em muitos dos nossos exemplares, o prisma me- dio externo menos desenvolvido do que os lateraes, e até em alguns, quasi rudimentar : em muitos exemplares porém tal caracter não se observa. Apesar das ligeiras differenças que ficam apontadas, a presença do arv. incertus, Selys, em Coimbra parece-nos pois sufficientemente attestada por um grande numero de exemplares. Deverá affirmar-se o mesmo do arv. Savii do mesmo auctor, e referir-se a este todos os exemplares em cujo dente molar superior não encontramos o caracter em que mais parece insistir Gerbe na di- agnose d'aquella especie, o prisma medio externo rudimentar ? Tinha- mo-nos a principio inclinado a este alvitre, porém hoje não hesitamos em adoptar uma solução contraria. Se a cabeça ossea apresentasse n'estes individuos alguma diffe- rença apreciavel na conformação geral; se por exemplo a região cra- neana fosse ou nos parecesse n'elles menos convexa, mais deprimida, poderiamos talvez hesitar : porém nós achamos uma tal uniformidade nos caractéres, quer externos quer osteologicos, de todos os individuos, tenham ou não o prisma medio do ultimo dente molar posterior me- nos desenvolvido, que a considerar uns identicos ao arv. incertus, não podemos deixar de os considerar todos. Do Alemtejo e de Cintra possuimos tambem arvicolas em que vemos egualmente representantes do arv. ircertus. Os primeiros teem na verdade as orelhas e os olhos um pouco maiores que os exempla- res de Coimbra; porém nos demais caractéres exteriores, e nos cara- ctéres osteologicos, nenhuma outra diflerença apresentam ; e até n'el- les notamos bem rudimentar o prisma medio do ultimo dente molar DE PORTUGAL 7 superior. Quem quizesse dar muita importancia ás dimensões das ore- lhas. poderia talvez consideral-as identicas ao arv. pyrenaicus; mas não se deixariam de lado, procedendo-se assim, caractéres de mais alguma importancia ? O exemplar unico que possuimos de Cintra é de individuo ain- da não bem adulto, e concorda muito bem nos caractéres com os de Coimbra em eguaes condições. 3. ARVICOLA ROZIANUS. Nob. Nov. spec. Se nos decidimos a acrescentar uma especie mais á lista dos ar- vicolas da Europa, que de algumas eliminações nos parece estar ne- cessitada, é porque não conseguimos referir a nenhuma das que já en- contramos descriptas aquella de que vamos dar uma succinta des- “ cripção. Diagnose. — Arv. supra ferrugineus nigro-irroratus, subtus al- bescens, hypocondriis abdomineque flavescentibus; pedibus fusco-ca- nis; auriculis magais, prominulis, pilosis, antitrago magno semicir- culari instructis; oculis regularibus; mystacibus exilibus, nigro-albis, capite brevioribus; cauda bicolore, penicillo apicale albo, tertiam par- tem corporis superante. Habitat apud Conimbricam. — Possuimos um só individuo desta especie, que devemos ao nosso amigo e infatigavel correspondente o sr. Rosa de Carvalho. E” exem- plar sufficientemente adulto, como se deprehende bem da ossificação completa dos ossos do craneo, e do estado em que se apresentam os dentes; foi encontrado nas immediações de Coimbra, no sitio da Ge- ria, em dezembro do anno passado. A estatura d'este arvicola anda pouco mais ou menos pela do 27- certus, mas a cabeça é muito mais volumosa, e dá logo na vista a sua desproporção com o corpo. Na cabeça e dorso reina a côr ruiva ou antes ferruginosa mes- clada de negro. Os pellos que vestem estas regiões são finos, macios e fartos, mas differem entre si no tamanho e côr: são cinzentos na base e ruivos na extremidade os pellos mais curtos e mais abundan- tes, e pelo contrario negros e mais compridos os que se acham disse- minados, em menor quantidade, por entre os primeiros. Da associação d'estes pellos de diversa côr e grandeza resulta o tom dominante que procurámos definir pelos termos — ferrugineus nigro-irroratus. o) NOTICIA DOS ARVICOLAS Os hypocondrios são ruivos, mas d'um ruivo mais deslavado. O ventre e peito esbranquicçados, tintos levemente de ruivo amarellado. A ponta do focinho, os labios e o mento, brancos. As extremidades, assás robustas, são cobertas de pellos pardos e esbranquicados, que lhes dão uma côr uniforme parda-clara. As unhas são brancas. A cauda, maior que o terço do corpo, é bicolor; parda-escura na face dorsal, branca amarellada inferiormente, e com o ápice branco. Dos pellos das vibrissas, ou bigodes, uns, os mais curtos, são in- teiramente brancos, e os mais compridos pretos na base e brancos na extremidade. As orelhas, de fórma oblonga e bem desenvolvidas, sobresaem aos pellos, e são cobertas em toda a metade superior da face externa de pellos ruivos e negros, abundantes e compridos. Na base da ore- lha, cobrindo completamente o buraco auditivo, nota-se uma eminen- cia membranosa de fórma semicircular, analoga' ao antitrago da ore- lha humana, muito mais desenvolvida n'este do que nos outros arvi- colas em que a temos observado. Os olhos são bem desenvolvidos e proporcionados ao tamanho da cabeça. Não podémos verificar qual seja o numero das mammas. Dimensões : Comprimento total. . 4.0.0 Misto oo HOP ADA » dancandas a POMBO » daticabeça Quis vivos H0M0DS » do pé posterior... ...... 0,020 Altura da torelhati MR OND OS Diametro do olho ............. sa AD ADS Caracteres osteologicos. Só temos a mencionar os que nos forneceu o exame da cabeça ossea, unica parte do esqueleto que podémos examinar. Comparada á do nosso arv. incertus de egual estatura, a cabeça do arv. Rozianus distingue-se facilmente por um notavel comprimento. N'esta o diametro occipito-nasal é de 26 millimetros, ao passo que é apenas de 23 millim. n'um arvicola incertus de egual estatura, ou tal- vez mesmo um pouco maior. Em ambos o diametro bitemporal não vae além de 12 millimetros. | Esta differença notavel no diametro antero-posterior não se re- DE PORTUGAL 9 parte proporcionalmente por todas as regiões da cabeça, mas, para as- sim dizer, concentra-se na região craneana. No arv. incertus os dia- metros antero-posterior e transversal d'esta região, são, um e outro, de 12 millimetros; no arv. Rozianus o primeiro é de 14, e o segundo de 12 millimetros, havendo por conseguinte um excesso de 2 milli- metros d'aquelle sobre este. Outra circumstancia, que merece apontar-se, é a bem pronuncia- da convexidade da região craneana, d'onde resulta que, ao examinar-se a cabeça de perfil, as arcadas zygomaticas apparecem mais proximas do plano inferior que do plano superior da cabeça. (Veja-se a fig. 2 da nossa est.) Os ossos nasaes encurvam-se e dilatam-se bem na sua porção an- terior. O buraco occipital é grande, e, em vez de cordiforme, representa antes um hexagono. Dentes. — Os incisivos superiores apresentam uma ligeira cur- vatura ; dirigem-se quasi verticalmente ao encontro dos inferiores. Os dentes molares são destituidos de raizes. O ultimo molar da maxilla superior tem, externa e internamente, quatro arestas ou prismas e quatro sulcos. O primeiro molar inferior apresenta, como o arv. incertus, seis prismas e cinco sulcos no lado interno, e cinco prismas e quatro sulcos no lado externo. (Veja-se as fig. 3 e 4 da nossa est.) Diagnose differencial. A grandeza das orelhas, a abundancia, qualidade e côr dos pel- los, as dimensões proporcionaes da cauda, o conjuncto de todos os ca- ractéres exteriores que constituem a /acies d'este animal, fizeram-nos crer, mal o examinámos, que elle seria identico ao arvicola g/arcolus ou Naggeri, ou, quando distincta destas, que não deixaria de perten- cer ao subgenero Myodes, caracterisado pela existencia de raizes nos dentes molares. Verificâmos porém, depois, que os molares do nosso exemplar são inteiramente distituidos de raizes, e com quanto este caracter sómente se pronuncie bem nos individuos adultos das especies já citadas, não nos parece que a ausencia d'elle se possa explicar no arv. Rozianus por effeito da edade, como já dissemos. Julgamos pois dever concluir, que a especie que descrevemos não é um Myodes, mas sim um typo intermediario a este subgenero e ao subgenero Microtus, ao qual refere Selys-Longchamps todos os arvico- las terrestres, com exclusão unicamente dos arv. glarcolus e Naggerii. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE — T. III. P. II. 2 10 NOTICIA DOS ARVICOLAS D'estes ultimos distinguem-no outros caractéres, além dos já re- feridos, como se poderá verificar comparando-se a nossa descripção com a descripção ou com exemplares d'estas especies. Para evitar repeti- - ções fastidiosas, contentar-nos-hemos com insistir nas diflerencas que apresentam em sua estructura o ultimo dente molar superior e o pri- meiro inferior, por isso que os temos na conta de mais importantes. Nos arv. glareolus e Naggerii, especies extremamente visinhas e assás difficeis de discriminar, o ultimo molar superior tem 4 prismas in- ternos e 3 externos, e o primeiro molar inferior 4 prismas externa- mente e 5 internamente: no aro. Rozianus o ultimo molar superior tem 4 prismas bem pronunciados de ambos os lados, e o primeiro mo- lar inferior apresenta 5 prismas externos e 6 internos, exactamente co- mo no arv. incertus. Resta portanto examinar, se, além da grandeza das orelhas, ou- tros bons caractéres o distinguem de todas as especies já conhecidas de arvicolas com quem a uniformidade de estatura ou a semelhança das cores poderia levar a confundil-o. Temos portanto a comparal-o de um lado com os arvicolas Savii, incertus, pyrenaicus e ibericus, de ou- tro lado com os arvicolas subterraneus, neglectus, Selysii e arvalis. Não é possivel confundil-o com nenhum dos do primeiro grupo. Todos estes teem no ultimo dente molar superior sómente tres pris- mas internos e externos, em quanto que no arv. Rozianus encontra- mos 4 prismas de ambos os lados. Por nos parecer sufficiente esta differença, não insistiremos na comparação dos caractéres exteriores, de que já démos conta, nem repetiremos o que já fica dita ácerca da fórma notavel e peculiar do craneo da nossa especie. (Veja-se pag. 8) Se tivessemos podido reconhecer o numero das mammas do nosso exemplar, teriamos simplificado muito a confrontação em que temos de proseguir; por quanto, no caso de lhe havermos achado 8 mam- mas, só nos restaria comparal-o aos ar». arvalis e neglectus; e a ter 4, ficariam estes excluidos, e a comparação teria de fazer-se com os art. subterraneus e Selysii. Não nos faltam porém outros caractéres a que recorrer para o distinguir de todas essas especies; taes são: o grande volume da ca- beça, a notavel grandeza das orelhas, o tamanho do globo do olho, as dimensões da cauda. O arv. Selysii é, á vista da descripção publicada por Gerbe, o que mais parece approximar-se-lhe. Fôra comtudo impossivel confun- dil-os. A especie de Gerbe é maior do que a nossa, e todavia a cabeça é proporcionalmente muito mais pequena, as orelhas e os olhos menos DE PORTUGAL 11 desenvolvidos, e nas côres não ha perfeita identidade. A confrontação dos caractéres osteologicos das duas especies ainda deixa mais bem fir- mada a sua dent: o diametro occipito-nasal da cabeca, o volu- me da região craneana propriamente dita, a estructura do primeiro molar inferior e do ultimo molar superior, diferem inteiramente. Na Revue Zoologique * encontramos recentemente publicada a descripção de um arvicola novo, a que M. Fatio poz o nome de aprv. bicolor, o qual foi encontrado nos Alpes Suissos a uma altitude de 1800 metros. Como esta especie nos parece bem caracterisada, não deixaremos já agora de examinar se tambem se distingue da nossa por caracteres de facil apreciação. O arv. bicolor, Fatio, pertence ao subgenero Myodes ; tem, como os Arv. Naggeri e glarcolus, os molares radiculados. Eis um primeiro caracter distinctivo. Além d'isso os caractéres exteriores auxiliam só por si esta dis- criminação. O arvicola bicolor é muito maior que o Rozianus ; a cau- da do primeiro é proporcionalmente muito mais comprida, mas a sua cabeça, pelo contrario, não é proporcionalmente tão volumosa ; na côr differem sensivelmente, porque o arv. bicolor é pardo-escuro no dorso, em quanto que no arv. Rozianus domina a côr ruiva ferruginosa com pontuações negras. Finalmente o arv. bicolor tem o ultimo dente molar superior com quatro prismas de ambos os lados, exactamente como o nosso arvico- la, porém o primeiro molar superior em vez de ter, como este, 5 pris- mas externos e 6 internos, apenas apresenta 4 externos e 5 internos, á semelhança do que se observa nas outras especies do subgenero Myodes. Parece-nos portanto que não haverá motivo para negar ao arv. Rozianus os fóros de boa especie; e ousamos esperar que admittida nos catalogos da zoologia, poderá perpetuar o testimunho de reconhe- cimento que quizemos prestar, dedicando-lha, ao nosso amigo o sr. José Maria Rosa de Carvalho, a cujo zelo infatigavel e sincero amor pela sciencia devemos uma boa parte dos documentos sobre que vamos lan- cando as bases da Fauna de Portugal. ! Revue et Magasin de Zoologie. 1862, pag. 257. dO tm ns ESTAMPA Arvicola Rozianus. Craneo do arvicola Rozianus. Ultimo dente molar do lado esquerdo da maxilla superior do arv. Rozianus. Primeiro dente molar inferior do lado esquerdo do arv. Ro- zianus. Ultimo dente molar superior do arv. incertus. Gerbe. NOTICIA ACERCA DA DESCOBERTA NAS COSTAS DE PORTUGAL D'UM ZOOPHYTO DA FAMILIA HYALOCHAETIDES. BRANDT (HYALONEMA LUSITANICA. NOB.) PELO SOCIO EFFECTIVO José Vicente Barbosa du Bocage Os zoophytos que M. Gray intitulou primeiro Z7yalonema Siebol- die MH. mirabilis, melhor estudados ultimamente por M. Brandt, que d'elles formou a familia Z7yalochactides, pareciam até hoje exclusivos dos mares do Japão. E” por isso que a descoberta nas costas do nosso paiz d'um individuo que pertence evidentemente a esta familia, nos parece acontecimento digno de ser referido a quantos se interessam pelos progressos da zoologia. O exemplar que nos forneceu assumpto para esta breve noticia, foi-nos enviado em junho do anno passado de Setubal pelo nosso ami- go o sr. Gamitto, guarda-mór da alfandega d'aquella cidade. Colhe- ram-o a grande distancia da costa, e a notavel profundidade, uns pes- cadores, dos que se empregam na pesca dos Squalos ; e tiveram o bom senso de o não deitarem novamente ao mar, como muita vez prati- cam com outras preciosidades zoologicas, que por não lhes serem pa- gas nos mercados de peixe, elles teem por inuteis. Parece ser especie mui rara, porque d'entre os pescadores que o trouxeram, sómente um pareceu conhecel-o e lembrar-se de que, ha annos, havia colhido ou- tro, proximamente nas mesmas paragens. Recebemol-o poucos dias depois de haver sido apanhado, e n'essa occasião cheirava fortemente a peixe, e trazia todos os indicios de ha- MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE —T. 1. P. II. l 2 NOTICIA D'UM ZOOPHYTO ver sido tirado recentemente do mar. Quando porém mesmo se nos não deparassem estas provas a favor da authenticidade da sua captura na costa de Setubal, a respeitabilidade de caracter do sr. Gamitto ser- nos-hia garantia, mais que sufficiente, da exactidão das informações que nos transmittiu. Se deixámos passar alguns mezes antes de fazer publica esta des- coberta, não foi porque desconhecessemos o valor scientifico d'ella. Não nos foi difficil reconhecer que havia entre o specimen de Portu- gal e os zoophytos do Japão, descriptos por M. Gray, uma notavel affi- nidade, mas tambem lhe notavamos differenças ; e como nos constava que M. Brandt se occupára mais modernamente do estudo d'estes ani- maes, entendemos que deviamos primeiro que tudo consultar os es- criptos d'este illustre zoologista (Symbolae ad Polypos Hyalochaetides Spectantes), para com mais segurança nos podermos pronunciar ácerca da sua identidade especifica. Não havia em Portugal, onde tão escas- sas são ainda hoje as obras scientificas, o trabalho de M. Brandt; ti- vemos de o encommendar para París, de esperar que nos chegasse, de aproveitar para o nosso estudo alguns momentos que nos deixaram li- vres as nossas muitas occupações; e por isso sómente agora é que po- démos vir dar conta da nossa descoberta. Como todos os hyalochaetides, o nosso exemplar consta d'um eixo composto de compridos fios hyalinos com toda a apparencia de fila- mentos vitreos, e de um corium polypigerum que reveste em parte esse eixo. Mede de comprimento total 63 centimetros: é portanto superior aos maiores exemplares do Japão observados por M. Brandt. O corium polypigerum estende-se desde uma das extremidades, que reveste completamente, até proximamente */ do comprimento to- tal do eixo. O espaço que elle occupa pois é de 16 centimetros: o seu maior diametro não excede 12 millimetros. Desde a extremidade até ao ponto onde se mostram a descoberto os filamentos vitreos não se nota a menor solução de continuidade, zem se encontram vestígios de esponjas ou de outras producções parasyticas que se lhe adherissem. Os polypos, de fórma eliptica, não estão collocados irregular- mente sobre o corium polypigerum, nem guardam entre si distancias mais ou menos consideraveis, como succede em todos os exemplares estudados por MM. Gray e Brandt; pelo contrario, estão bem agelo- 1! Os maiores exemplares observados por M. Brandt tinham 22 pollegadas e 3 linhas ou proximamente 56 centimetros. (Veja-se Brandt, Ob. cit., pag. 3) DA FAMILIA HYALOCHAETIDES 3 merados e juxtapostos, e formam series regulares tanto no sentido lon- gitudinal como em direcção espiral. (Est. fig. A e B) Os polypos mais proximos do ápice são mais pequenos, e sio mesmo rudimentares os que se acham implantados sobre o ápice: todos os outros diflerem pouco entre si, quanto a dimensões; o seu maior diametro é de 6 millimetros, o menor de 4. Elevam-se pouco acima do corium polypi- gerum, onde se implantam ; não teem mais de 2 a 3 millimetros de altura. Corium polypigerum e polypos apresentam uma côr parda escura e um aspecto finamente granuloso. A partir do orificio central ou bo- ca, ha, na parte livre de cada polypo, um certo numero de sulcos ir- radiantes pouco profundos ; não lhe notámos porém os gommos salien- tes que M. Brandt descreveu e fez representar nas figuras que pu- blicou. Para poder estudar devidamente os polypos, fizemol-os immergir durante 48 horas em uma solução d'acido acetico, e conseguimos en- tão examinar bem ao microscopio os seus tentaculos, que se acham re- trahidos para dentro da cavidade do corpo. Esperavamos encontrar uma simples corôa de 20 tentaculos, por ser este o numero apontado por M. Brandt; e foi por isso grande a nossa surpreza quando, além d'uma primeira serie de 20 tentaculos dispostos circularmente, vimos distinctamente uma segunda corôa de igual numero de tentaculos, im- mediatamente por dentro dos primeiros, situados nos intervallos d'es- tes e perfeitamente desenvolvidos. Além disso, por dentro d'esta se- gunda corôa de tentaculos, no espaço que fica entre ella e o orifício da boca notámos quantidade de elevações conicas, como pequeninas pa- pillas, que nos pareceram tambem dispostas em duas series concentri- cas, e que tomámos por tentaculos rudimentares. A fig. € da nossa Est. reproduz com exactidão o que observámos. Os tentaculos são triangulares, comprimidos nas duas faces, por onde se correspondem, com os bordos lisos e o ápice rhombo e arre- dondado. Os da primeira serie pareceram-nos mais largos, e com o bordo externo mais arredondado e convexo. Como já dissemos, o corium polypigerum reveste o eixo parcial- mente, e occupa apenas os VA da extensão total. Devemos porém acres- centar que no extremo do corium polypigerum, opposto ao ápice, que- remos dizer, no ponto onde os filamentos vitreos começam de mos- trar-se a descoberto, se notam os vestigios de uma perda ou dilace- ração de substancia. Na fig. E da nossa Est. vem marcado pelas li- nhas » e c o espaço que primittivamente devia achar-se revestido. Ora 1 + 4 NOTICIA D'UM ZOOPHYTO essa perda de substancia ou dilaceração parece ter tido logar na occa- sião em que o zoophyto foi trazido do fundo do mar. Mas seria de- vido ao pouco cuidado e delicadeza com que os pescadores tomaram nas mãos o animal, ou teria logar em consequencia delle se achar adherente por aquelles pontos, mediata ou immediatamente, a qual- quer corpo submarino de que fosse mister separal-o violentamente? Faltam-nos dados para emittir sobre este objecto uma opinião fundamentada. Os filamentos hyalinos que constituem o cixo variam bastante em tamanho e espessura. Os mais compridos teem mais de 67 centime- tros, por isso que se enroscam em spiral, e os mais grossos apresen- tam quasi um millimetro de diametro. Constam todos de muitas camadas concentricas, transparentes como laminas de vidro, e perfeitamente amorphas. Muitos d'elles teem a superficie lisa; outros porém, principalmente mais para a extremi- dade, parecem fibras articuladas, e devem esta apparencia a um re- vestimento, tambem transparente, mas composto de anneis, mettidos uns dentro dos outros. Cada um destes anneis fica em parte incluido no que lhe é immediato a contar da base para a ponta do filamento ; a sua margem inferior é portanto a que fica livre, e essa é irregular. M. Brandt nota muito bem este revestimento das fibras hyalinas, mas representa-o mal, porque na sua figura a sobreposição dos anneis tem logar da base para a extremidade. É possivel que isto seja devido a não ter advertido na inversão devida ao microscopio. Os filamentos são compostos quasi exclusivamente de silica: é a mesma composição indicada por MM. Gray e Brandt. Eis-ahi como o nosso collega e amigo o sr. Aguiar, professor de chimica na Escóla Polytechnica, nos relata o resultado da analyse que, a nosso pedido, acaba de fazer : « Os filamentos do hyalorema que analysei são formados de silica «com vestígios de materia organica azotada e vestigios de ferro. « 67 milligrammas de materia secca na estufa a 100º produzi- «ram 63 milligr. de acido silicioso. « Aquecidos tostam-se superficialmenre tomando uma côr pardo- «clara, estalam dividindo-se em pequenos fragmentos, que chegam « muita vez a saltar fóra do tubo onde se faz o ensaio, e deixam per- «ceber o cheiro caracteristico da materia organica azotada. « Os acidos azotico e chlorhydrico não teem acção sensivel sobre «elles. » Não entraremos por agora na apreciação de varias questões a que DA FAMILIA ZYALOCHAETIDES 5 deu logar a singular organisação dos hyalochaetides. O nosso exem- plar, o mais perfeito talvez de quantos se conhecem, ajudará a escla- recer desde já alguns pontos duvidosos, e mui principalmente um em que apparecem divididos zoologistas muito notaveis; e vem a ser, se se devem tomar por parasytas, como o querem MM. Gray e Brandt, as esponjas que nalguns exemplares apparecem, juntamente com o co- rium polypigerum, cobrindo porções mais ou menos extensas do eixo, ou attribuir a essas esponjas, ausentes do nosso exemplar, a formação dos filamentos vitreos, como pretende M. Valenciennes. Por agora vamos occupar-nos tão sómente das affinidades zoolo- gicas do nosso exemplar, assumpto que interessa mais particularmente á zoologia descriptiva. E' evidente que elle pertence á familia /7yalochactides : não pre- cisamos insistir mais n'este ponto. Será porém um //yalonema ou um Hyalochacta ; e, pertencendo a algum destes generos, será elle iden- tico ou distincto das especies já conhecidas do Japão? Diremos primeiro que não nos parece feliz a creação dos dois ge- neros Hyalonema e Hyalochaeta : partilhamos n'este ponto a opinião de M. Gray, que não acha para ella fundamento plausivel. Tambem nos parece que M. Brandt não andou bem em admittir além do Myalonema Sicboldii, primeiramente descripto por M. Gray, um 7. affine; porque não vemos bem em que esta especie se distinga d'aquella. Já não di- remos outro tanto da especie que M. Brandt chama Myalochaeta Pois- steti; porque, com quanto lhe faltem caractéres suflicientemente dif- ferenciaes para constituir um bom genero, entendemos que tem, no modo de agrupamento, e na muito maior altura dos polypos, caracté- res especificos bem distinctos dos que apresenta a especie de M. Gray ; e acceitamol-a por isso como uma boa especie sob o nome de hyalo- nema Poissicti. Brandt. Admittidos pois estes dois typos do Japão, resta saber se é iden- tico a algum d'elles o exemplar de Portugal; e não o sendo, se é uma nova especie do mesmo genero /7yalonema, ou o representante d'um genero diverso. Se podessemos acreditar que sómente no nosso specimen se dá a circumstancia, que já commemorámos, de terem os polypos não 20, mas 4() tentaculos bem desenvolvidos, teriamos de certo de propôr para elle a adopção de um novo genero. Suppomos porém que esta divergencia entre as nossas observações e as de M. Brandt, não é real, mas o resultado de erro d'este ultimo observador; e suppomol-o as- Z sim, porque os exemplares que elle teve á sua disposição, vindos de õ NOTICIA D'UM ZOOPHYTO maiores distancias e conservados seccos muito mais tempo, se acha- vam em peiores condições que o nosso; e além disso, porque nos pa- rece que M. Brandt, contentando-se com amollecer os polypos em agua fria, não conseguiria dar-lhes a flexibilidade precisa para os estudar convenientemente. : O zoophyto de Portugal pertence por tanto, no nosso entender, ao genero Hyalonema, em cuja caracteristica se devem mencionar não 20, mas 40 tentaculos desenvolvidos. Quanto a elle se poder referir a alguma das especies do Japão, pronunciamo-nos negativamente, porque lhe encontramos caractéres es- pecificos bastantemente distinctos, e são: 1.º a fórma e as dimensões dos polypos; 2.º a sua aggregação ou juxtaposição; 3.º o seu arranjo regular em series longitudinaes e espiraes. Se estas razões forem admittidas por zoologistas de maior com- petencia no assumpto, propômos que á especie de Portugal se dê o nome de Hyalonema lusitanica, cuja caracteristica differencial se po- derá apresentar nos seguintes termos : o HYALONEMA LUSITANICA. Nob. * H. polypario elongato, fibris setaceis, hyalinis, spiraliter tortis, corio polypigero ab apice usque ad */ longitudinis totae involuto ; po- lypis dilatatis, elypticis, valde aggregatis, juxta-positis, parum eleva- tis, tentaculis 40, triangularibus, per duas series digestis. ESTAMPA Fig. A Hyalonema lusitanica. Nob. (metade do tamanho natural). Fig. B Uma porção do corium polypigerum, augmentado duas vezes. Fig. € Um polypo aberto, para deixar vêr os tentaculos que estão retrahidos para dentro da cavidade do polypo. Fig. D Porção d'um filamento byalino fracturado, para mostrar as diversas camadas concentricas de que é formado. Fig. E Porção terminal d'um filamento hyalino, para mostrar a dis- posição do seu involucro. DA FAMILIA HYA4LOCHAETIDES q NOTA ADDICIONAL Z Depois de submettido o presente escripto á approvação da Aca- demia, foi-nos offerecido pelo sr. Gamitto um segundo exemplar do nosso hyalonema, que uns pescadores de Setubal extrahiram em maio d'este anno de uma grande profundidade por meio do apparelho usa- do por elles na pesca das lixas, a que dão o nome de espinhel. Diz-nos o sr. Gamitto que elle foi colhido a 20 leguas de distancia da costa, e entre 600 e 700 braças de profundidade. Este segundo exemplar é mais pequeno do que o primeiro, iden- tico a elle nos fios vitreos de que é composto, mas diverso, diversis- simo, quanto á substancia que o reveste, na porção correspondente á que é coberta n'aquelle pelo coriwm polypigerum. Salta aos olhos, mal se observa, o aspecto differente e a diversa natureza d'este revestimento organisado. E” elle pardo-escuro quasi negro na maior parte da sua extensão, e apenas em dois pontos limi- tados d'um pardo-amarellado. A sua superficie é perfeitamente lisa e lustrosa, sem vestigios de polypos, e sem aquelle aspecto finamente granuloso que tanto sobresahe no outro exemplar. A sua textura é tambem diversissima : consta de camadas finissimas, concentricas, co- mo folhas tenuissimas de papel, que se patenteiam, mesmo á vista desarmada, nos pontos em que não está adherente ao eixo; e exami- nado ao microscogio apresenta, em vez das grandes cellulas com nu- cleos e granulações escuras e das spiculas de fórmas variadas e curio- sissimas, que caracterisam o tecido dos polypos e o corium polypigerum do nosso primeiro specimen, uma textura mui simples, que se reduz a numerosissimas granulações distribuidas por uma substancia funda- mental amorpha, desacompanhadas de cellulas e d'outros quaesquer corpusculos de fórma definida. Não encontrámos tambem nella ca- naes nem aberturas organisadas e naturaes. A analyse chimica mostra que é uma substancia fortemente azo- 8 NOT. DUM ZOOPH. DA FAM. MYALOCHAETIDES tada, a qual se queima quasi inteiramente deixando um pequeno re- siduo composto na maxima parte de ferro e de uma pequena porção de silica. Suppozeramos a principio que seria uma esponja, por assim te- rem sido consideradas as substancias incrustantes que apparecem, jun- tamente com porções mais ou menos extensas de corium polypigerum, em varios exemplares do Japão. Em vista porém do que fica exposto, não ousamos por ora emittir opinião decisiva, com quanto nos pareça sem duvida uma substancia animal. Reservamos para outra occasião apresentar com mais minuciosi- dade os resultados do exame microscopico de ambos os exemplares, resultados que diflerem notavelmente em varios pontos dos.que acha- mos consignados por M. Brandt na sua obra citada; e por essa occa- sião, demorar-nos-hemos a considerar os corollarios que poderão ti- rar-se de nossas observações ácerca de um ponto ainda hoje mui con- trovertido, e vem a ser: — a determinação de quaes sejam os verda- deiros habitantes e creadores dos filamentos hyalinos, se os polypos e a camada que lhes serve de base d'implantação, se a esponja ou espon- jas que costumam apparecer, na generalidade dos casos, juntamente com elles. Lisboa, 18 junho de 1864. HP A q 0 DE DE ALGUMAS ESPECIES INEDITAS DA FAMILIA SQUALIDA E QUE FREQUENTAM OS NOSSOS MARES POR Fosé Vicente Barbosa du Bocage e Felix de Brito Capello Em quanto não conseguimos apresentar á Academia um traba- lho mais extenso sobre um grupo notavel de peixes da familia dos squulidae, que é representado nos nossos mares por bastantes especies, algumas d'ellas novas, desejamos fixar perante ella a data d'esse nosso trabalho, apresentando-lhe concisamente a diagnose de especies que temos por ineditas, e de generos novos que julgámos indispensavel es- tabelecer. Fam. — SQUALIDAE. Bp. Tribu— SPINACINI. Bp. Gen. — Centrophorus. Mull. et Henl. A este genero de que até hoje se conheciam apenas duas espécies authenticas, C. granulosus e C. squamosus (ambas pertencentes á nossa fauna e representadas nas collecções do nosso museu), julgamo-nos au- ctorisados para acrescentar tres especies mais, que suppomos ineditas. f. €. lusitanicus. Nob. Nome vulgar: Lixa de lei. €. granuloso valde affinis, sed diversus : violaceo-nigricans, ros- tro breviore, pinnis pectoralibus ab apice rostri propioribus, pinna dor- MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. HI. P. 1. Í 2 DIAGNOSES DE ALGUMAS ESPECIES INEDITAS sali anteriore latiore ac magis producta, spinnis pinnarum dorsalium brevioribus et gracilioribus. Os nossos pescadores distinguem-o do C. granulosus, ao qual dão o nome de barroso, apesar da sua grande semelhança com esta especie. 2. €. crepidalbus. Nob. . Nome vulgar : Sapata branca. C. cinerascens, corpore subtriangulari, fusiformi; rostro valde producto, depressissimo, spatulato, capite postice brevi; pinnis dorsa- libus magnis, latis, fortiter lobatis, spinnis longis, validissimis ins- tructis; squammis magnis, rudibus, erectis. An Acanthidium calceus. Lowe? Proc. Zool. Soc. Lond. 1839, pag. 91. A” vista sómente da descripção que d'esta especie da Madeira publicou o nosso sabio amigo Lowe, não é possivel affirmar que sejam identicas. Purpurco-fuscum chama elle ao seu 4. calceus, em quanto que o nosso C. crepidalbus é realmente cinzento ; e n'esta differença de côr começa a nossa hesitação, que mais augmenta quando considera- mos que o mesmo A. diz ser a sua especie muito semelhante no as- pecto ao Scymmnus micecnsis. Risso, com a qual nunca nos lembraria- mos de comparar a nossa. M. Gray no catalogo dos peixes do museu britannico (Chondro- pterigii, 1851, pag. 74) inelue o dc. calceus. Lowe, na synonimia do C. granulosus, mas junta-lhe um ponto d'interrogação. Deste facto não podemos tirar outro corollario senão que este auctor não conhe- cia bem a especie madeirense. Por occasião da sua visita annual a Lisboa, M. Lowe pôde exa- minar um exemplar do nosso C. crepiralbus, e a estampa que já d'elle tinhamos; e pareceu-nos inclinado a reconhecer-lhe a identidade com a outra especie que citámos. Igual opinião manifestou depois outro zoologista inglez, M. Johnson, que tambem conhece bem uma grande parte das producções naturaes da Madeira. Prevalece portanto hoje em nosso espirito a idéa d'essa identidade; mas como não podémos ainda obter exemplar algum da sapata da Madeira, com que comparassemos a especie de Portugal, não ousamos tambem afirmar deliberadamente que sejam identicas. Assim se explica o ponto de interrogação que acompanha a citação do Ac. calceus. DA FAMILIA SQUALIDAE 3 3. €. crepidater. Nob. Nome vulgar: Sapata preta. €. rufo-fuscus, corpore rotundato, capite brevi, rostro depresso; pinnis pectoralibus brevibus, truncatis, spinnis mediocribus munitis; squammis horisontalibus, juxta-positis, fere imbricatis. Nov. Gen. Centroseymnus. Nob. Char. gen. — Dentes maxillae superioris dentibus Scymnorum si- miles; dentes maxillae inferioris Centrophorum dentibus non discrepan- tes. Pinnae dorsales angustae, breves, spinnis fere inconspicuis ins- tructae. Pelos dentes estabelece a transicção entre os generos Centropho- rus e Scymnus; pelas espinhas das barbatanas dorsaes pertence pro- priamente ao grupo dos Spixacini. €. cerlolepis. Nob. Nome vulgar: Pailona. €. castanco-bruneus, corpore subtriangulari, capite brevissimo; rostro breve, parum depresso, marginibus cingulatis; squammis ma- gnis pedunculatis, horisontalibus, antice fortiter excavatis. Pela fórma das escamas se distingue bem esta especie de todas as outras a que mais se possa assimelhar ; nenhuma tem as escamas como ella. Nov. Gen. Seymnodon. Nob. Char. gener. — Dentes maxillae superioris ut in Scymno : ma- xillãe inferioris dens medianus impar, post quem dentes plurimi erecti, et versus angulum oris magis ac magis decumbentes. Pinnae dorsales angustae, breves, spinnis minutis. Se não fossem os espinhos, assaz diminutos, das barbatanas dor- saes, mal se distinguiria do gen. Scymnus. Scymnodon rigens. Nob. Nome vulgar: Arreganhada. Se. rufo-fuscus, corpore subcylindrico elongato ; capite a trunco distincta, sub-prismatica; ore amplo, hiante, rictu fere horisontali ; pinnis pectoralibus angustis, rotundatis ; squammis ut in Centr. squa- noso. i | t ) IO tá ERR RrTa a nro, 4 > A eU Si alo “totabigono A 8 pese ave Pepalu Senti a x sun ;ospsngab brio, venid ebiapasy untabu tos: ssoques Geri Pei caiticiastiso aid igaarbaçe alanigo «aiteonirtr audiaarek anelitonotoge E G/; er patibogadot 4) vei Figo: eta nd: thaligom rócÊ atoat Sa mi o da ” do spoanaiiç marra ni es gisia taste qo sq stoatedis nabo apidimatpro amb bio crio eres us sv ENA “a! aih no audi ráaad st Ab Visa e a tecrr gba gol lago bes eo pa Be des asseio pro rh pousa rgrs van meonitl, Eta ntt ósre, eddie sr ga, Eno k Fdtsihi ar TI Pala ed aa ash) V) ROTMIgE ga 4 eteio Une 6 sontade las ce colyf E Ap Mat Lo aagetób contou ab cetalerigano pola p assunção 3 eistioasabagéro coli oqira) sem - EPA TR UR : e MEN UI rr ia EPE 6, ADS) tá » eslejolotma Ber ass eiavà Tiso ur negra ida | oertagh eroenieair sndo ytinas ev asda road Padre o su atores; aitido guia rudimi gra Losesayahomiteradgr dem lh ça ai DR eras sir) sois adianta eltelunim halê ghaiagem dao tolo surge paro gp aftengs veto urso als “ANS So tunde pen dbiigie o amd! eútizat nao “Maes vu pos . , as no “> vii Eru id MUS Guina VEN ao) o eo fiat asi agri Pasteur pus abruláio». gola EPA ALI À Ro OA AIDS itenteatay aa Pra b uno np: tao via valdir is abisiral esuenol 1 rei es basis ergua qu sia iate ereto amptid: Gus À da pet apr aa «e PErtId Ro 1 esteeçredrraid aeb a ttneriiipoxpaaa eotiniges do: (isgasol véi ai | gado PAS RANA ada cit Er dá e, E ç Ela N v rá eatds pie" thais a eb bg Cao RR nabáiia Pot over a UE E iatitraato pn: Er FA see ce paras cr Haras Loca opa pi rarnad + sáfiuriis aqamy dart! So acl vias Ame SUE MNE PAi ani rumo pa tata o 18 Hai; As egcile sos K é - t e y RR SP RT, aa = got Gates cotegadola PRA nad pra santo todo BC DESCRIPÇÃO DE TRES ESPÉCIES NOVAS DE CRUSTACEOS I'AFRICA OCCIDENTAL E OBSERVAÇÕES ÁCERCA DO PENOEUS BOCAGEI. JOHNSON. ESPECIE NOVA DOS MARES DE PORTUGAL POR Felix de Brito Capello NATURALISTA ADJUNTO AO MUSEU NACIONAL DE LISBOA CRUSTACEOS NOVOS D'AFRICA OCCIDENTAL Comi a publicação de tres especies de crustaceos que nos parecem inéditas, temos em vista não sómente fazel-as entrar nos catalogos da zoologia, mas tambem, e mui principalmente, concorrer quanto nos- sas forças nos permittirem para tornar mais conhecidos os productos zoologicos das nossas colonias, e prestar o nosso testemunho de agra- decimento ás pessoas que, oflerecendo-os ao nosso museu, vieram acres- centar as riquezas d'este estabelecimento scientifico nacional, e habili- tar um compatriota seu a revelar aos homens de sciencia a existencia, em territorio portuguez, de aifimaes ignorados por elles, tarefa de que desde muitos annos usavam incumbir-se exclusivamente os estran- geiros. Das especies que publicamos, e que só nos atrevemos a dar por novas depois de attento exame, uma —o Panulirus regius, Nob. foi oflerecida ao museu por seu desveladissimo protector ElRei o senhor D. Luiz; outra — a Telphusa Bayoniana, Nob. devemol-a ao sr. F. A. Pinheiro Bayão; e finalmente a terceira —a Sesarma angolensis, Nob. foi enviada pelo sr. José de Anchieta. MEM. DA ACAD.— | .º CLASSE.—"T. WI. P. II. Í to DESCRIPÇÃO DE TRES ESPECIES DE CRUSTACEOS Fam. — CATOMÉTOPOS. Trib. — TELPHUSINOS. Gen. — TELPHUSA. Telphusa Bayoniana, Nob. (Est. fig. 3.º) O sr. Milne-Edwards, na sua obra intitulada Zlistoire Naturelle des crustacés, inclue no genero Telphusa seis especies, a saber: 7. flu- viatilis, T. nilotica, T. indica, T. perlata, T. Leschnaudii, e T. Be- rardii. Da primeira possue o museu de Lisboa dois exemplares ; da se- gunda e terceira temos á vista os desenhos (Archives du Museum, t. vm, pl. xm, fig. 2; Iconographie du régne animal, pl. mr, fig. 3); finalmente de todas ellas encontramos as descripções na obra acima citada. A especie de que vamos tratar approxima-se sómente de tres das que nomeámos, a saber — 7. nilotica — T. indica —e T. perlata, por um caracter privativo d'estas tres especies, que é uma crista post- frontal contínua entre os dentes post-orbitarios, crista que separa a fronte da região gastrica tornando aquella quasi vertical. Distingue-se porém a nossa especie da primeira das tres indica- das, pela integridade do dente orbitario externo, e pela ausencia de es- pinhos atraz do dente post-orbitario. Na T. indica ainda existem atraz d'este dente vestigios d'outros dentes, e o dente orbitario externo apresenta a denticulação que se nota na 7. nilotica. (Vid. ob. cit.) - Na ultima emfim existe nos bordos lateraes da carapaça uma se- rie de pequenos dentes como aljofares (perlces), em quanto a nossa especie tem o dente post-orbitario seguido de uma crista absoluta- mente lisa e disposta em arco de circulo. Tendo accusado os caractéres que distinguem a nossa das espe- cies conhecidas, vamos dar. para maior clareza uma descripção mais minuciosa dos seus caractéres. Carapaca ! alguma coisa convexa nos sentidos antero-posterior e ! O termo francez carapace serviu primeiro sómente para designar o escudo supe- rior das tartarugas ou reptis da ordem dos chelonios: depois foi tambem applicado a designar, nos crustaceos da ordem dos Decapodos, a parte do corpo que é formada pela reunião dos anneis que correspondem á cabeça e ao thorax; a qual é por isso denomi- nada tambem cephalo-thorax. Linneo, na sua obra Systema naturae, dá a esta parte dos crustaceos o nome de DA AFRICA OCCIDENTAL ) lateral. Fronte bastante inclinada, com o bordo livre sensivelmente ondulado, mostrando uma cavidade no meio, e um lobulo arredondado de cada lado. Detraz do dente orbitario externo existe, de cada lado do bordo anterior da carapaça, um dente muito agudo, e apoz elle, dirigindo-se para traz, uma crista elevada, cortante e sem vestigio al- gum de dentes ou tuberculos. Esta crista, depois de ter descripto um arco de circulo encurvando-se para dentro, e entrando pela super- ficie superior da carapaça, termina proximamente na altura da região cardiaca. Ao ponto medio de cada uma d'estas curvas corresponde a maior largura da carapaça ; por isso que coincide com estas curvas a juncção da superficie superior com as faces lateraes, a qual fica bem assigualada n'esta especie por um angulo diedro assaz agudo. A partir do bordo anterior, e entre os dentes post-orbitarios, no- ta-se um degrau ou resalto que, dando uma forte inclinação á região frontal, a separa completamente da parte superior da carapaça: este degrau é continuo entre aquelles dentes, salvo uma pequena incisão a meio, a qual limita os lobulos da região gastrica. Carapaça, patas, e regiões pterigostomias completamente lisas ; um espinho agudo no angulo antero-interno do carpo; mãos achata- das sem caneluras nem tuberculos; nas patas seguintes só o tarso é espinhoso. O quarto par é o maior. Braços robustos e deseguaes ; na femea relativamente mais pequenos, e eguaes em dimensões. A côr do exemplar mais fresco, entre onze individuos que o mu- seu possue, € o unico que conserva a epiderme, é um mixto de ver- de-escuro, verde-claro e pardo-avermelhado, formando manchas sem ordem nem regularidade. Domina a côr verde, mas apparecem por transparencia alguns refiexos avermelhados, devidos á côr propria do tegumento do crustaceo, o que se vê claramente nos individuos que não tem epiderme. thorax; porém este termo não exprime rigorosamente a parte do crustaceo que se quer designar. Cuvier no Reino animal, emprega os termos test e carapace nos decapodos bra- chyuros; e os termos test e thorax, no resto dos decapodos e nas outras ordens de crus- taceos. M. Milne Edwards, na sua Historia natural dos crustaceos, emprega tambem o termo carapace em toda a ordem dos decapodos, e poucas vezes o applica ás outras or- dens, usando então de varios termos correspondentes à porção do crustaceo que quer designar. Os auctores inglezes adoptaram o termo francez sem modificação alguma, e escre- vem carapace. M. Dana, auctor americano, não sómente adoptou esta palavra, mas até derivou della a palavra carapax, de que se serve nas diagnoses latinas. A sombra d'estas auctoridades não hesitamos tambem em trazer para a nossa lin- gua a palavra carapaça. Ie 4 DESCRIPÇÃO DE TRES ESPECIES DE CRUSTACEOS O maior exemplar mede 0,066 de largura e 0",048 de com- primento (dimensões da carapaça). A sua maior extensão medida nas patas do quarto par, é 0”,197. A relação do comprimento para a lar- gura é C-— 4 L- Habita o interior d'Africa no districto Duque de Bragança, nas nossas possessões da Africa occidental. Vive nos rios e ribeiras. Propomos para esta especie o nome de Telphusa Bayoniuna, em attenção aos serviços prestados ao museu pelo alferes Bayão, serviços que se não tem limitado á remessa dos exemplares da especie que des- crevemos, mas comprehendem o generoso donativo de muitos e mui curiosos representantes da fauna da Africa occidental. Fam. — CATOMÉTOPOS. Trib. — GRAPSOIDINOS. Gen. — SESARMA. Sesarma angolensis, Nob. (Est. fig. 2.º) Especie mui diversa de todas as de que temos conhecimento !. Caracteristica : — Carapaça bastante convexa no sentido longitu- dinal, e lateralmente na parte posterior. Fronte larga, encurvando-se em angulo recto, e apresentando uma aresta viva que vae de um ao outro angulo interno das orbitas. Por detraz de um agudo dente or- bitario externo, os bordos lateraes da carapaça não apresentam denti- culação alguma, mas sómente uma crista que se estende até meia re- gião das guelras, constituindo a aresta do angulo diedro que resulta da juncção da superficie anterior com as porções lateraes da carapaça ; d'ahi para a parte posterior curva-se para baixo até o intervallo da 3.º e 4.º pata. A região gastrica é dividida em quatro lobulos por tres depressões pouco profundas. As regiões medias são bastante distinctas, e as das guelras apresentam algumas cristas obliquas que partem da crista lateral e terminam pouco mais ou menos a Ya do diametro trans- versal da carapaça. Epistome granulosa; bordo anterior da fronte terminado n'um cordão granuloso, o qual de um e outro lado acompanha o bordo su- praciliar das orbitas. (Vid. fig. 2a) Patas do primeiro par grossas e grandes; carpo com estriação granulosa; mão cordiforme, achatada, com granulações muito mais 1 Veja-se Milne Edwards, Histoire des crustacés, 11, p. 71 a 76; Dana, United Sta- tes, Expl. exped. xt, p. 353 à 356. DA AFRICA OCCIDENTAL 5 pronunciadas na face interna do que na externa; dedos curvos e agu- dos, com tuberculos denticulados; pinças cavadas em fórma de colhér, todas semelhantes, com o 3.º artigo chato, largo, granuloso, e com pinceis de pellos dentro da cavidade. Patas dos pares seguintes com um dente agudo no extremo do bordo superior. Quarto e quinto ar- tigos com espinhos e pellos; estes são de duas especies tanto no bordo superior como no inferior, pellos curtos e bastos á maneira de escova, e pellos alongados mais raros. A côr d'esta especie é castanho-escura, com alguns tons avermelhados nas partes salientes. Habita os mares de Angola. Secção — DECAPODOS MACRUROS. Sub-secção — Macruros couracados. Trib. — LAGOSTINOS. Gen. — panuLikus, Gray !. Panulirus regius, Nob. Especie proxima do Panilurus spinosus (Edw. Hist. des crust. 1, 298), do qual se diflerença comtudo pelos seguintes caractéres: Abdomen picado de poros pelliferos, e com uma faxa transversal de pellos no meio de cada segmento; esta faxa é interrompida na li- nha mediana em todos os anneis, com excepção unicamente do pri- meiro, no qual é continua. No P. spinosus, como no P. guttatus (que temos á vista), o abdomen é liso, e apresenta a meio de cada annel um sulco pellifero que não é interrompido na linha média nos tres primeiros segmentos. A côr do mais fresco dos nossos exemplares, é ainda hoje em partes, mas foi, quando fresco, azul-escuro pela face superior do cor- po; e manchado irregularmente de azul e amarello-alaranjado na base das antennas, epistome, regiões pterigostomias, superfícies latero-infe- riores, e porções anteriores á faxa pellifera nos segmentos abdominaes. Uma fita transversal amarello-alaranjada corta a meio, dividin- do-a em duas, a faxa azul de prussia que oceupa a parte posterior de cada segmento abdominal; e curva-se para baixo seguindo as margens posteriores dos cornos lateraes. Uma malha arredondada da mesma cor se vê d'um e outro lado na parte anterior de cada segmento. (Vid. fg. 1a) 1! Palinurus, M. Edw., sub-gen. dos lagostinos longicornes. 6 DESCRIPÇÃO DE TRES ESPECIES DE CRUSTACEOS Patas de eôr azul-escura com duas faxas longitudinaes amarello- alaranjadas na face superior, e manchadas irregularmente da mesma côr na face inferior. O outro individuo, pertencente á collecção antiga do museu, tem a cór azul bastante desbotada e convertida em verde-escuro, porém conserva ainda vestigios bem claros do desenho e distribuição que aca- bamos de indicar. - OP. spinosus do sr. Milne Edwards tem «a côr verde apenas manchada de amarello no thorax e nas patas, porém n:iudamente sal- picado (finement piqueté) de branco-amarellado no abdomen. A côr azul de prussia é facil de se modificar com o tempo tor- nando-se verde (o que se dá no exemplar antigo e em parte no exem- plar mais fresco, conservando este, comtudo, a côr azul de prussia nas partes menos expostas á luz); o que porém não é provavel, é que in- dividuos da mesma especie apresentem córes tão differentes. A diffe- renças de sexo (os dois exemplares que o museu possue são ambos fe- meas) não se podem attribuir modificações tão pronunciadas, não só nas côres, mas na fórma e esculptura das diversas partes. A differen- cas de edade tambem não é provavel que sejam devidas estas modifi- cações, por isso que os exemplares que temos á vista teem dimensões diferentes, e comtudo (salva a differença d'intensidade das côres) são perfeitamente similhantes. O sr. M. Edwards não indica a patria do P. spinosus, mas está hoje averiguado que pertence ás ilhas do Mar pacifico *. O nosso exem- plar mais moderno foi colligido na bahia de S. Vicente de Cabo-ver- de. O outro exemplar fazia parte das antigas collecções do museu da Ajuda, e mui provavelmente foi trazido d'aquellas ilhas por Feijó, na- turalista que as visitou no seculo passado. A diversidade de caracté- res que fica apontada, a differença de patria, e a circumstancia de pertencer a nossa especie a uma fauna especial, qual é a das ilhas de Cabo-verde, pareceram-nos razões sufficientes para a considerar distin- cta do P. spinosus do sr. Milne Edwards. Apontaremos agora o que n'ella nos parece mais digno de ser notado. Carapaça coberta de grandes espinhos regularmente dispostos em linhas proximamente longitudinaes : entre estes espinhos existem ou- tros mais pequenos, muito juntos, dispostos irregularmente, e com a base rodeada de pellos compridos: nos intervallos d'estes espinhos a ! Dana, United States, Expl. exped. xr, p. 519. DA AFRICA OCCIDENTAL 1 superficie da carapaça é totalmente vestida de pellos curtos e asperos. Os pellos curtos e os espinhos pequenos são mais raros na porção que fica por diante do sulco transversal. A superficie do annel antennular tem quatro grandes espinhos conicos, dispostos em quadro, e por entre elles alguns espinhos rudi- mentares. Bordo anterior da carapaça armado de dois espinhos rostraes gran- des e achatados lateralmente (vid. fig. 1), e-de dois dentes espiniformes de cada lado, um collocado no angulo lateral, e o outro a egual dis- tancia d'este e do espinho rostral correspondente. Pela parte posterior dos espinhos rostraes na região gastrica, exis- tem quatro espinhos dispostos em curva com à convexidade voltada para a parte anterior: estes espinhos são maiores que todos os outros, exceptiando os que acabamos de descrever. Artigos basilares das antennas externas muito espinhosos pela parte superior. Epistome com tres grandes dentes triangulares na margem anterior. Antennas externas muito grandes (2,25 do comprimento do cor- po). Artigo basilar das antennas internas alcançando apenas o penul- timo artigo peduncular das antennas externas: o maior dos ultimos segmentos d'aquellas antennas muito comprido, chegando quasi a meio do comprimento da antenna externa. O comprimento total das anten- nas internas é proximamente egual ao comprimento do corpo. Regiões pterigostomias e latero-inferiores lisas: sulco transversal profundo. Patas lisas superiormente, e bastante granulosas pela parte inferior: o terceiro par é o mais comprido; o quinto tem (como em quasi todas as femeas do genero Panulirus) no penultimo artigo um tuberculo espiniforme, a que corresponde um tuberculo analogo que existe na base e na parte inferior do sexto artigo. Abdomen com todos os segmentos munidos de uma faxa de pel- los asperos c curtos, contínua no primeiro segmento, e interrompida nos seguintes, com interrupções cada vez maiores, a ponto de se tor- nar quasi nulla nos dois ultimos. Esta faxa de pellos, que se acha perfeitamente conservada no exemplar mais fresco, occupa uma ligeira depressão, que se vê per- feitamente no exemplar mais antigo aonde faltam os pellos que a co- briam, e não chega aos bordos lateraes do segmento correspondente. Póde muito bem servir este caractér para distinguir a especie de Cabo-verde das outras especies de Panulirus. N'estas existe realmente um sulco transversal ou fenda profunda, que em algumas (2. penicil- o) DESCRIPÇÃO DE TRES ESPECIES DE CRUSTACEOS latus e P. guttatus) chega a simular um numero duplo de anneis, e além d'isso esta fenda. é apenas franjada de pellos no bordo. Os cornos lateraes dos segmentos são lisos na parte anterior, e com um lobulo denticulado na parte posterior. Habita os mares das ilhas de Cabo-verde. Na ilha de S. Vicente d'este archipelago foi encontrado, como já dissemos, por ElRei o Sr. D. Luiz o exemplar que nos serviu de typo; e é com o fim de com- memorar este facto que propomos para esta especie o nome de regius. H OBSERVAÇÕES ÁCERCA DO PENOEUS BOCAGEI. JOHNS. ESPECIE NOVA DOS MARES DE PORTUGAL O sr. James Yate Johnson, distincto ichthyologista e carcinolo- gista inglez, descreveu nos Proceedings da sociedade zoologica de Lon- dres, junho de 1863, um crustaceo muito commum nos nossos ma- res, confundido vulgarmente com outras especies debaixo do nome de — camarão. O auctor teve conhecimento d'este crustaceo por occasião de uma visita que fez ao musen de Lisboa, onde lhe foram apresentados al- guns individuos d'esta especie, que já então reputavamos inédita, e tencionavamos descrever. Confrontando agora a descripção do sr. Johnson com um grande numero de exemplares, julgámos necessario fazer alguns additamentos e observações, não só para apresentar a caracteristica da femea, que falta alli e differe bastante da do macho, mas tambem para rectificar algumas inexactidões que se dão n'aquella descripção; inexactidões in- evitaveis quando de uma especie, cm que ha não só differenças de ca- ractéres de sexo a sexo, mas até variantes nos individuos do mesmo sexo, se examina apenas um pequeno numero de exemplares. Logo no principio, tratando do rostro, diz o sr. Johnson : « Este rostro passa muito além dos olhos, porém não chega á ex- tremidade do pedunculo das antennas superiores.» E mais adiante: «O seu bordo inferior (do rostro) é simples, porém o bordo su- perior contém oito pequenos dentes, o primeiro dos quaes está sobre DA AFRICA OCCIDENTAL 9 a sua base, e o ultimo a muito pequena distancia da sua extremidade anterior.» Quanto á primeira parte desta citação, veremos mais adiante, tratando da femea, as diflerenças que apresentam os dois sexos relati- vamente a este caracter. Quanto á segunda ha realmente inexactidões. Em primeiro logar o numero dos dentes do rostro, contado em muitos exemplares, é o seguinte: 2a maior parte dos exemplares — se- te; ainda bastantes vezes — oito; algumas — seis; e raras vezes —nove. O numero de dentes do rostro do P. Bocagei é pois — 7 ou 8. Em segundo logar a posição do ultimo dente, e por tanto a por- cão livre da ponta do rostro, estão dependentes do numero dos den- tes, por isso que o primeiro se acha sempre na sua base. No maior numero dos casos aquella porção livre mede pelo menos um quarto do comprimento do rostro. Quando trata das antennas superiores (internas) diz o sr. John- son : « Cada uma d'ellas tem dois filamentos, dos quaes um tem proxi- mamente duas vezcs o comprimento do outro, e o mais comprido tem quasi o comprimento da carapaça, excluindo o rostro.» O resultado do attento exame feito sobre muitos exemplares dá- nos o seguinte : No macho os filamentos terminaes das antennas internas (supe- riores do auctor) são differentes na fórma, entre si e em relação aos da femea: tratando porém agora sómente do macho, diremos que um d'estes filamentos (o superior) mede mais de dois terços, e não poucas vezes chega a ter o comprimento do outro: além d'isto, constando am- bos de uma porção grossa e outra delgada, um d'elles (o mais curto ou superior) tem a porção grossa mais curta do que a porção delga- da, no outro dá-se exactamente o. contrario. (Vid. est. fig. IV) Na femea o rostro é sempre mais largo e mais elegantemente lançado ; e as antennas internas (superiores de Johnson) são mais cur- tas, não só no seu pedunculo, como nos filamentos terminaes. Estes são sempre deseguaes, e na maior parte dos casos um d'elles mede metade do comprimento do outro: o mais curto tem, como no ma- cho, a porção grossa menor que a porção delgada; porém o mais com- prido não tem porção grossa na base, e adelgaça regularmente até á ponta. De maneira que, sendo exacto o que diz o sr. Johnson, na re- lação que accusa entre o rostro e o pedunculo das antennas internas do macho, não acontece o mesmo em quanto á femea; porque n'esta o rostro passa muito além do ultimo artigo d'aquelle pedunculo ; não MEM. DA ACAD. — [.º CLASSE. — T. II. P. IL. 10 DESCRIPÇÃO DE TRES ESPECIES DE CRUSTACEOS porque o rostro seja proporcionalmente maior que o do macho (dize- mos proporcionalmente, porque a femea é sempre muito mais corpu- lenta do que o macho), mas pelo facto já citado do menor comprimen- to dos artigos pedunculares das antennas internas. Em quanto á relação entre o comprimento do filamento maior e a carapaça, devemos dizer que no macho este filamento excede o com- primento d'esta; e que na femea é que se dá o caso apontado pelo sr. Johnson. Tratando das antennas externas (inferiores do auctor) diz que «os seus palpos são grandes, prolongando-se muito proximamente até o rostro. » Tanto no macho como na femea, o comprimento do rostro não é invariavel nos differentes individuos (e é esta a razão do engano do auctor), porém na maior parte dos casos os palpos passam além do extremo do rostro. Estas são as differenças que achámos na caracteristica da nossa especie confrontada com a descripção do sr. Johnson ; differenças de- vidas, como já dissemos, ás variantes no numero e disposição de cer- tas partes, tanto de individuo a individuo, como de sexo a sexo. Terminaremos apresentando os caractéres distinctivos entre o ?. Bocagei e o P. caramote. O P. Bocagei é delgado em relação ao seu comprimento, e apre- senta uma fórma elegante. A crista é singela, isto é, sem sulcos me- dio nem lateraes; começa um pouco adiante do bordo posterior e se- gue até o rostro, sendo interrompida pelo dente mediano da carapaça. O rostro começa de nivel com a base das antennas externas, tem sete a oito dentes, no bordo superior, começando na base e terminan- do, em media, a um quarto da ponta; o bordo inferior não tem dentes. O P. caramote é curto e refeito; a crista da carapaça é dupli- cada por um sulco profundo, e existe de cada lado outro sulco mais largo, que se prolonga até á base do rostro, adelgaçando ahi, e se- guindo cada um do seu lado até proximo da ponta. O rostro não tem um começo tão definido como na nossa especie, por isso que, se o seu bordo inferior tem a mesma origem, não se dá o mesmo em relação ao bordo superior, que começa pouco mais ou menos a meio da cara- paça, pois é ahi que se acha o primeiro dos dentes que o guarnecem (dez a doze). O bordo inferior tem um dente collocado um pouco adiante do ultimo dente do bordo superior. O P. Bocagei tem, além dos dentes accusados na carapaça do P. caramote, mais um dente proximo ao angulo lateral anterior. O que porém o distingue logo á primeira vista do P. caramote, é o grande DA AFRICA OCCIDENTAL 1 desenvolvimento das antennas internas ou superiores, especialmente os filamentos terminaes, que são n'aquella especie mais compridos que a carapaça, em quanto que no P. caramote constam apenas de uma la- mina curta terminada por um filamento mais curto ainda. Os filâmen- tos terminaes das antennas externas ou inferiores são tambem muito mais compridos (excedem o comprimento do corpo incluindo o rostro). O P. caramote tem fortes espinhos recurvados nos primeiros ar- tigos dos tres primeiros pares de patas; o nosso Penoeus tem identi- cos espinhos sómente no primeiro par. Finalmente o P. Bocagei tem um só dente espiniforme de cada lado, proximo ao dente que termina o segmento caudal do abdomen; o P. caramote tem de cada lado d'aquelle dente terminal tres espi- nhos engastados em alvéolos proprios. ESTAMPA Fig. | — Annel antennular, artigos basilares das antennas externas, e porção anterior da carapaça do Panulirus regius. la — Terceiro annel do abdomen, mostrando a faxa pellifera e a pintura do mesmo. 1b-— O mesmo amnel visto de perfil. Fig. IL — Carapaça, e 1.º e 5.º patas direitas da Sesarma angolensis. é (tam. nat.). 2a — Carapaça da mesma, vista pela parte inferior (augmen- tada). 2b — Pata-maxilla externa da mesma. 2 ec — Mão vista de frente. Fig. II — Carapaça, primeiro par de patas, e quinta pata esquerda da Telphusa Bayoniana (tam. nat.). Fig. IV — Penoeus Bocagei (tam. nat.) b. 4a — Carapaça da femea, mostrando a differença entre as suas antennas internas e as do macho. e DESCRIÇÃO INTRA: tico Pra ve im anias carr odiar ago damas macias tanatls door eta ponpnpoo go brieopeeêro arentr siieção cs Lenda poi ia Sup cemeerigrerat cual sob onubas cabo messages vom eras stories (A cómo otro dra envelecea bot 0) clyenii bege mic vo resigrel are crop sb ro en agt Into gua ooo teias ira coins tros ecra namoro “a stecdeninia tom sagrados obteniirisrad drjuos ato B tens esmaga dobra pr vob sapriam o sedento ga o bra mação embasar aço Mad tais sra ASA polo ado arsgra dagor o jets bb esti pomiseniço eovt cobro AD ve seg Other ve aneis temendo viço AR pigs abr cançãs diana vd ido Oi coraçao drrgstão or x sra ba ul comepobel e sabe! ab so: adro ce ganso cor irtreot seprostmsbs une ainsi la gas soyrbarvirtresto abit bla pe elias cod lpus abs seas es Soeiro morimona seolaiwr é; qu pobetargna . f 1h v ny í " é rede ; f te rha DAMA tos had vo ve da eterna eita ceu cedrraligo de demesisern o reatar di » rn odio do o ngm o pao! tor a odores nenbiloy iz ot oe sabriieaçarr pas eat: cha boreçer ti ce Trena ct ; peetesedo vols moema pon do dry cstarsgpitr doerira costeiros Dice vob deem abro paterna tod vg dudos opina nl onça ) Ê ecra serena), Bloves e Dental cera copo) pniasirção o Peep dba to Dirirdo imp gar uso ED utel): us ds 5º dog vam ) gba ou) ; e: open abr pedra! vo sia matei mudas do, O : contro 4h utado GBsssam O ho nbr gos nao ereta pao eder sis asiprenina e od ? oe Air vce O a safe dem esp edge O ads ergad o prog Ae mA mo 2 pagas aus bonsai paternal bobo ce Do Lo dao e VE a rh z “een ert sado aro dear ni dseos tan D%; é ERRATAS A pag. &, lin. 5, onde se lê anterior lêa-se superior A pag. 5 houve transposição da 3.º com a 4.º linha: deve lêr-se, começando no meio da 2.º linha, ...... pinças cavadas em fórma de colhér com pinceis de pellos dentro da cavidade. Patas dos pares seguintes todas semelhantes, com o terceiro artigo chato, lar- go, granuloso e com um dente agudo no extremo do bordo superior. AU CATALOGUE PRÉLIMINAIRE DES POISSONS DEAU DOUCE DE PORTUGAL CONSERVÉS AU MUSÉUM D'HISTOIRE NATURELLE DE LISBONKE PAR M. F. H. STEINDACHNER, DE VIENNE. Gen. — Cyprinus. Lin. 1. Cyprinus carpio. Lin. La carpe, si abondante dans les eaux douces de VAllemagne et dans Vest de T Europe, est extrêmement rare dans la peninsule ibéri- que, et trés probablement elle y a été introduite de "Europe centrale, comme le Carassius vulgaris. Nilss., que jai rencontré á Toledo. Jusqu'á present je n'ai pu trouver cette espéce en Portugal et en Espagne que dans le Tage, et dans des étangs artificiels prés de Madrid. Gen. — Barhus. Cuv. 2. Barbus Bocagei. n. sp. Steind. B. corpore elongato, subcylindrico; altitudine c. 53— 55 in cjus longitudine ; capite 5 in longitudine total corporais ; linea rostro-nu- chali convexa; rostro obtuwso 2— 25 in longitudine capitis; labiis valde carnosis ; rictu oris parvo, horisontali, infero; radio osseo pinnae dorsalis modice denticulato ; trunco in actate valde juvenili dense ma- culato, in adultis immaculato, interdum vittis latis | — 3 parum ap- parentibus, longitudinalibus ornato. 8—9 D. 3— 4/8. A. 3/8. Squ. gs. 5-6 MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE.—T. III. P. II. l 2 CATALOGUE PRELIMINAIRE C'est une des espeéces les plus communes sur les marchés de Ma- drid, Toledo, Zamora, Lisbonne (Tejo). Porto (Douro), Coimbra (Mon- dego). Elle ressemble, surtout dans le jeune-áge, au barbeau canin de VItalie; mais nous trouvons chez notre espece les barbillons, par- ticulitrement les anterieurs, bien plus longs, les écailles plus grandes,: et le quatriême rayon de la nageoire dorsale dentelé en arriêre. Le musée de Lisbonne possede des individus de Coimbra (Mondego), de Cintra (riviêre de Collares) et de Lisbonne (Tejo). Je me suis permis de donner á ce poisson le nom du savant di- recteur du musée de Lisbonne, comme un temoignage de ma recon- naissance pour son empressement á me faire connaitre les poissons d'eau douce de sa patrie, 9. Barbus Comizo. n. sp. Steind. B. corpore elongato, modice compresso ; capite valde depresso, eso- ciforme, 4 — 42 in longitudine totali; altitudine capitis 2 in ejus lon- gitudine ; linea rostro-frontali recta vel concava, valde declive ; occipite plano; riciu oris valde fisso, obliquo, terminali; labiis parum carnosis ; radio osseo pinnae dorsalis forti, valde denticulato; dente pharyngeali ultimo, supremo seriei primae, minimo. 84-94 D. 4/89. A. 3/6—7. V. 2/8. P. 2/17. Squ. 48—50 PE Hab. Le fleuve Tejo. Sur les marchés de Toledo et Madrid le nom vulgaire de ce pois- son est Comizo ou Comba. En Portugal on Vappele harbo, como á tous ses congéneres. Gen. — Eeuciseus. Rondel. Sieb. 4. Leuciscus (Leucos) aula. Cuv. Val. Cette espece est abondante dans les fleuves Minho et Mondego, et dans un grand nombre de petites riviêres du Portugal. Son nom vul- gaire est guiváca. Gen. — Squalius. Bp. 5. Squalius cavedanus. Bp. Le musée de Lisbonne posséde plusieurs individus. tous des jeu- do one hm mito a o pe | | E [PAM old E o y , (OR Subindo hate 1 Ea: PR NR RS ae A TA que or RA A: fat! tis sa be) a” ota Pons dr dci ds dn Forti Ena Ain Ad é Cen á Vir CARO Josrimena e hr sw frengy di hi am do 41 eo na AM &á pedi RATIO nes tom 1) ” Do ido EA À ; A ) n F . Í ) fa a a ga Diga guri 6 piga Irina ol ] er bom abs abeiyBrts Tua peço 4 hai RE, void at do ' A 3 E servo oque The” praste À EM Ain dit ETA a seinpre “ig F : p EUA todas as putos que Wuizeo o revi TUTOR wi vim harpa od! E E e Eos ab Megas qroirauguraho rar, re RE aa io trago a due, ) » Ea idntos * Aa ep di ; A nr open Et LVeR à ) nr “op qto »k Broto dest mma fr cêetuita Ng) Nº teto tido , áto q tu pegue, vc vo po pri tara pisado RT que tuo Ea bju ç ita ro) É A; à El Enf y tapes Kia tura | RA rop pal mA A ape: NE dA io is e torneio a RM Ni | Mu ii ju Dê, vu pill na. pinta it int PRE fr! mbipo, tn deito * ; ] 4 A ne pura oy nice BR ti rita do peito, AN MAL, rh ab fudido. > ; TES at | ) e dr A ao “inifanbener po pratti pá y ETCO) ee og dh “Avó MesThd: . / Ko EN Ni Ae Rg: pts) 4 Sirnste r RA quatso HE de Listutas | x o E REA ay praticar qi foda os adro Tite. pe e k Je dh ode parta uar aqui D temo uuho tu ap EEÇão AA dk À po sau ' A entida que o the a potos ars À dades DR ee ad a | “d ais. Í E 1 , Eve ho qm Her do o a o RA RV d a Ê k , 1,4 ARO A sa eia, Pd ; 1 | 4 A f E Ta E PRA DA 2 7 DR Dol renda gt rvP f ma Pra o | E) , RI, a E RR PMs va dh Á (ist MM vita; Era deaé a gsm, Ag RUE? do ug go pah: qu ps UM Lig) RA ri a veto , s 4 ia vi egos ct & e 4 Mr mar o OA À RANA | o rede Hi, qu im 4 Vas, ' ; e ra É É cido Ria TEA, NCTC A) « Fi Ay! o“ st lavra dé WBge! CALIE [ A vs gi * td, frio j fx ” es Eompurers NL e + Regue NA sin + EM + ida aj seo. “gato vogal ala Ma 3 ho PE a tiro k a tro, iva dem aa ; PRE NOTA Á PRECEDENTE MEMORIA 5 Alosa vulguris. Cuv. Val., Trulta fario. L. e Anguilla vulgaris. Flem,, especies bem conhecidas e cosmopolitas. Quiz o dr. Steindachner fazer-me a honra de me dedicar uma das especies que descobrira em Hespanha, e viera consecutivamente encontrar em Portugal, em testemunho de agradecimento, diz elle, por eu haver franqueado ao seu exame os exemplares existentes no mu- seu de Lisboa. Mui cordealmente Ih'o agradeco; porém seja-me permittido ob- servar, que o sabio zoologista me parece haver exagerado o valor do tenue serviço que lhe prestei. O muscu de Lisboa está sempre franco a todas as pessoas que quizerem aproveitar-se dos materiaes scientifi- cos que ali tenho conseguido reunir, sem distincção de individuos nem de nacionalidades: e assim succederá sempre em quanto eu tiver a honra de me achar á frente d'este estabelecimento nascente. Nisto não faço mais do que seguir o exemplo de respeitaveis zoologistas que nos paizes mais cultos da Europa teem a seu cargo importantes collecções “zoologicas, reunidas a expensas do estado ou de corporações, não para mera ostentação de vaidades nacionaes, ou para tropheo de tacanhas rivalidades, mas para favorecer o progresso da sciencia e a cultura in-- tellectual da humanidade. Ao dr. Steindachner não tratei pois excepcionalmente no acolhi- mento franco que lhe fiz; porém se o director do museu de Lisboa não foi além do que usa praticar com todos os naturalistas, o homem folga muito de lhe poder consignar aqui o testemunho do apreco em que tem o seu vasto saber, e da estima que lhe consagra pelas suas. apreciaveis qualidades pessoacs. J. V. BARBOSA DU BOCAGE. ie W: l mm y á , hi , i E ” ] ( “ ê Atua VAU À ATOM À TELES pts! pipe Abu arde do storm plage 1881) HIiMtvo 1 eat nda api iv eaiba Doce al eae ce Mperá to) vopudostiniste ADO sin) aliemok dife nos n9iT 9 SUR. 1 nt! , HS roipagponã 13h Ti o RT Ho eso ENTE anta e Seen attEo! a pa NE QU da Err vor aa tá ' º IA F 63 CM É ts att at 189 1 4 . El - Mota real m ntétestods nvidia O -Miris es , PONTE E Ma fi ' TH 1 h FE. BAIA SA DD ONA UMA GUETIDA à Errar ESTE dão ETA Vo Mame ATOR] 25 cats | $ Ê E ] E So urna die MUDO ouipssatios odost ta “Osho “Aquino esta Misko O 9babiisaoty oi erga oe od ada tes db singibi qedva gui as [anta goloas aprhtiiqeua db dqinaza o sia Ss ob eb cn tida da Tço ddr pio! gana nb satias Sia ] ca rbui (vis TOC[50O db Ho Olalãp Ob auait KIKO 6 ELDIAUSA 403780 + PR | ; ÇA q E per Ho Star esbabriss als qu NRO i nas Al OBM O 47%0A STO] Games SLIM oba ia Devices over! ato, frota Iv Hran) Et e viadinho nb (AR E! , te do mol» E o fre ' E Tr shh41 nrrtça) a y ad ha tis vá Dor as Irit GAld Greer Mr ht HR, DO RE RR RIR b Cio Mp Guulleo po O vumice Qlag? UG O tudo 2 ; donoceny votrali Lotjo Ata E pon o v ' e E ; r s - 1 * 4 + a “DES POISSONS D'EAU DOUCE DE PORTUGAL 3 nes, de cette espêce provenant du Mondego, du Minho, du Tejo et d'une riviêre du Crato. Son nom vulgaire en portugais est bordálo ou roballinho. Gen. — Chondrostoma. Agass. 6. Chondrostoma polylepis. n. sp. Steind. Ch. Corpore elongato, compresso; longitudine capitis 5 £ in lon- fo) . . fo) . . 7 giuudine totali corporis; altitudine corporis longitudinem capitis aequante vel paulum superante ; rostro modice prominente. n11—12 D. 4/8 MAS AS o Ato 49 ss Po AIG: o SquiisTE 51—6 Les individus du musée de Lisbonne proviennent du Crato. En Portugal, aussi bien qu'en Espagne, les espéces du genre Chondrosto- ma sont connues sous le nom vulgaire de bógas. Gen. — Alosa. Cuvy. 7. Alosa vulgaris. Cuv. Val. Hab. Les embouchures des fleuves; nous avons vu des individus pechés dans le Tejo et dans le Minho. Gen. — E'ruítta. Nills. Lieb. 8. Trutta fario. Lin. Salar Ausonii. Cuv. Val. Hab. Fleuve Zêzere, et riviêre de Marvão (Castello de Vide). Gen. — Anguilla. Thunb. 9. Anguilla vulgaris. Flem. Hab. Trés commune dans toutes les caux douces d'Espagne et du Portugal. Nom vulgaire portugais, exguia ou ciroz. NOTA QUE ACOMPANHOU A APRESENTAÇÃO DA PRECEDENTE MEMORIA EM SESSÃO DA 1.º CLASSE DE 17 DE NOVEMBRO DE 1864 Tenho a honra de apresentar á Academia, em nome de seu au- ctor, o dr. Franz Steindachner, naturalista-adjunto do museu de Vien- na, uma interessante noticia, intitulada — Catalogue preliminaire des poissons d'eau douce de Portugal conservês au muscum dhistoire natu- relle de Lisbonne —, onde se acham consignados os resultados das suas investigações ácerca dos nossos peixes d'agua doce, que lhe foi dado até hoje examinar. N'esse trabalho faz menção o dr. Steindachner de nove especies, tres das quaes são novas. Não é comtudo de suppor que seja este o algarismo exacto das nossas especies ichthyologicas d'agua doce, an- tes é muito de esperar que novas investigações lhe addicionarão al- gumas outras. Por em quanto, o distincto ichthyologista allemão ape- nas pôde examinar os peixes d'agua doce que, ha pouco tempo, come- cámos a colligir, exemplares recebidos de poucas localidades, d'aquel- las que temos podido visitar ou em que já temos correspondentes. Figuram no catalogo do dr. Steindachner oito generos, que teem geralmente representantes nas aguas doces dos diversos paizes da Eu- ropa. As especies são: Cyprinus carpio. L., muito commum em França e na Europa continental, mas que parece rara na Peninsula, como nota o A.; Barbus Bocagei, Steind. e B. comizo. Steind., especies novas, pe- culiares a Hespanha e Portugal, mas vulgares nos rios e ribeiras dos dois paizes ; Lewucos aula. Cuv. Val., conhecido vulgarmente pelo nome de ruivaca, cujo habitat é tambem assaz extenso pela Europa; Squa- lius cavedanus. Bp., o roballinho ou bordúálo dos nossos pescadores, es- pecie já conhecida, commum na Italia; Chondrostoma polylepis. Steind., especie inédita, e como os dois barbos propria da Peninsula; finalmente CATALOGUE PRÉLIMINAIRE DES POISSOAS DEAL DOUCE DE PORTUGAL CONSERVÉS AU MUSÉUM D'HISTOIRE NATURELLE DE LISBONNE PAR M. FRANZ STEINDACHNER, DE VIENNE. (SUITE) SCOMBEROIDEI. Gen. — Gasterosteus. L. 10. Gasterosteus brachycentrus. Cuv. Val. Ce poisson habite les riviêres de | Europe meridionale, et surtout celles de VItalie septentrionale. Sa longueur atteint jusqu'a 7 ou 8 cen- timeétres. Par ses moeurs, ainsi que par sa grandeur etc., il ne différe pas du Gasterosteus aculeatus. L., qui se trouve dans les riviêres de VEurope centrale et septentrionale, le territoire du Danube exce- pté |. Cette espece est representée au Muséum de Lisbonne par de pe- tits individus, tachetés, lesquels ont été trouvés prés de Coimbra dans un petit bras du Mondego, qu'on appele Yalla da Geria. C'est M. le Dr. Paulino d'Oliveira, professeur à [Université de Coimbra, qui les a tout recémment envoyés au Museum, ! La découverte de la singuliére aptitude qu'ont les épinoches mãles à construire des nids pour les femelles est due a John Hall. Cette découverte a été publiée par Bradley en 1739. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. III. P. HI. Í CATALOGUE PRÉLIMINAIRE to CLUPEOIDEI. Gen. — Alosa. Cuv. 11. Alosa finta. Cuv. Cette espece, que javais déja rencontré sur les marches de Lis- bonne dans les dêrniers jours de novembre, et au mois d'octobre à Tuy (riviêre Minho), se distingue surtout de / Alosa vulgaris. Cuv. par le nombre et les proportions des lames courtes des ares branchiausx, bien moins nombreuses et plus grosses chez la premiére que chez la seconde espéce. L'une et V"autre remontent au printemps les riviêres pour y frayer; mais 7 Alosa finta n'y vient que quatre semaines plus tard que / Alosa vulgaris. Outre les poissons d'eau douce précédemment ennumereés, jai en- core remarqué parmi les collections du Muséum de Lisbonne un cy- prinoide trés intéressant, avec des barbillons et des dents pharyngien- nes comme les barbeaux, mais présentant la levre inféricure recou- verte de la lame corneo-cartilagineuse qui caraterise si bien le genre Chondrostoma. J'y voie un cas d'hybridisme trés prononcé et incontestable. Dans les lignes suivantes on trouvera la description détaillée de ce métis du Barbus Bocagei. m. et du Chondrostoma polylepis. m. L'individu unique qui a servi à ma description a été reçu de Castello de Vide (Alemtejo). Par sa conformation extérieure il rappele beaucoup le Barbus Bo- cagei, mais sa tête est un peu plus courte. La longueur de la tête est comprise cing fois et demi dans la longueur totale, sa hauteur huit fois et un tiers, et sa largeur dix fois et deux tiers. La hauteur ma- ximum du tronc est un peu moins d'un cinquiême de la longueur du corps, la caudale comprise. La nuque est convexe ; le crane et le chan- frein sont lisses, le profil de la tête, faiblement convexe, descend vers le bout du museau, lequel est saillant en avant de la bouche. Les yeux de moyenne grandeur, sont éloignés du bout du muscau un peu plus de deux fois leur diameêtre, qui est compris à peu prés cinq fois dans la longueur de la tête et deux fois et un quart dans [espace qui les sépare. Le museau conique mésure deux cinquiêmes de la longueur de la tête. L'ouverture de la bouche est tout-a-fait transversale et lineaire; a NA MO a PA ; ) + Tt TARA h v Ro Canin ho ELA trt di bl Doo MAE PURA RN da anpolousto. Spoiosh, pai : ANE AE in gos title EU NA sa pi pasto, plosiguatn É ipi too rp Mas atutulia tipliiá do RIO E do hongetidina; cu Janio Mori dj Pair coptas éra io . YA4 ” Rr. | LATA NA h a! E] eo oC PIN A eia USADA We devo rp a Ny» ni Ione coa feias dos ep pi pia fe, A N 5 qsrado a Ure Ma saceliatieçue setas 1 ti mega ti. ho Rb Rd («Ri pib va its Lento demvesgitads eta mento tu pe o ig re a gd core has th DRE emo os Proa gaba, Lado et Estas pipas ps dd q rg a e q suis Eddie Pinte pop e heaa que quadro sesunints: quiri Cad quan É Eutim s Do qc dr . » Outra Jog ab aii N: df é td Sean de primer anéis É cm) relatar porem fanl ar ad tan alheio na del Mimiaros dee En Dipo Em, Leia pude A ata E a ess rr tis Ligas nf wos data: pé ay 4: pur CO nas Vs dr Pad o, E Pod o rt PR nt EXPE msm quentio edo Da Mig cecrrireçoo is Ls d bn Poda popa O GO NID PONR A DOSE LR ce j E ed ' | o. ig 1 my ET al Bitigreça da a] Ri rd SPO O E ii oo rp rE Mi ME PRE BIA ini 0) Et A (lide Quseao, ATA RR Bo teath E trigo H pq PASSA dis 0) te RE OD A RD O o a DAVA Lab Est Pranto a 1a ce ré nas qrhg 2. Tonto Getty PRE 4? | o RE ra Rat so dA ER, : RAR O MR Jar edi Dolo Redes Lives E TELHA tLdo FPS COD O pH Td uu COM PS [Ra SA Do Fator d] es sd chi bd praia Ep rig a EO 4 AT U ramo sê DA CE IS, prai des TR Ti they a ca vita 4” , dee MM qa adere Mr a aa meia Eri feio Sape een j PRO ter, E dura Bray Sipondira, 1 É AEARON qr EIA (Ha ta! por o a eso a e 9 Deh Te IN E agonpd, d duty Fespado ho pf separe Lot paçendmtd teto) e irei a cl apo y - | Le EA gt A q ; É CR ANTT dE O “b | PERU 4 Hirata! trás viria DESCRIPTION D'UNE ESPÉCE NOUVELHE DU GENRE MEMICHRONIS PAR M. FRANZ STEINDACHNER, DE VIENNE. Hemichromis angolensis, Steind. H. corpore oblongo, compresso ; altitudine 3 > in ejus longitudi- ne; latitudine 25 in ejus altitudine ; capite paulo plusquam 3 in lon- gitudine totali corporis; altitudine capitis a in ejus longitudine; ocu- lis diametro 6, latitudine frontis 5 in longitudine capitis; maxillis antice aequalibus ; rictu oris valde fisso, obliquo, sursum spectante ; longitudine ossis intermaxillaris protractilis 2 submaxillaris 25 im longitudine capitis; maxillis seriebus dentium 2; dentibus externis conicis, curvatis; internis parvis, velutinis, numerosis; lingua parva, remota; osse ante-oculari fere triangulari, aeque alto quam longo; ge- nis squamis 6-7 seriatis; operculo seriebus squamarum 5, obliquis; ad marginem superiorem operculis 1 serie horisontali squamarum mi- norum; ossibus maxillaribus, osseo ante-oculari et rostro nudis; mar- gine libero praeoperculi et parte inferiore ossis sub-maxillaris foveis mucosis ; linea rostro-occipitali modice curvata, ante oculos concava ; pinna dorsali spinnis 15, et radiis divisis ff, spinnis postrorsum al- titadine accrescentibus ; parte radiosa pinnae dorsalis et analis angu- latis, angulis prolongatis, remotis, basin pinnae caudalis Aa dn deus, spina ultima pinnae dorsalis 1 5 in altitudine radii divisi, ceteris altioris; radio tertio diviso pinnae pectoralis ceteris aa giore 5 -, radio primo diviso pinnae ventralis paulo elongato 6 in lon- gitudine totali corporis; linea laterali interrupta, squamis 21 in parte anteriore, superiore, et 10-[[ in parte posteriore; pinna caudali in demidia parte basali squamis parvis obtecta ; colore partis superioris corporis brunneo, partis inferioris, vittis longitudinalibus fuscis orna- ti, aurantiaco; parte radiosa pinnae dorsalis, analis, et pinna caudali 6 DESCRIPTION D'UNE ESPECE DU GENRE HEMICROMIS maculis rotundis vel annulis fusco-violaceis; macula magna, nigricante in parte superiore operculi. DA RAE 5 RAS O NE (6 a Longitudo speciminis unici in Museo Olissiponense — 20 centim. Hab. Angola. DES POISSONS D'EAU DOUCE DE PORTUGAL 3 Vos maxillaire est presque entigrement caché sous le premier sous-or- bitaire; les deux intermaxillaires sont petits. Sur les deux machoires se trouve un bourrelet charnu, assez épais, et recouvert par une lame corneo-cartilagineuse, lisse, de couleur-jaunátre et à bord anterieur tranchant. Les quatre barbillons sont de la même longueur, laquelle est comprise quatre fois et un tiers dans la longueur de la tête. Le quatriême rayon épineux de la nageoire dorsale est trés fai- blement dentelé en arriêre dans le deuxiême quart de sa longueur. 9 D. 6/05 A. hi Visa e lait so. 5 Longueur totale du corps...... 235 mm. » “ide ta téte . -. bm 42 » Hauwieur (du icorps;.-.. cs. . co 45h » » deqlantete eis meras cpabo 27 » Larseur dela” tete. apjimi sida parar uia » Longueur du museau.......... 17 » Diametre de Voeil. . js. cuia 8 » Longueur de la pectorale..... Sebpi SS, Too » de landorsaler 4 er mira) Hauteur de la dorsale ......... 32% » Longueurde"Vanale. .......... 14 » Eauteur"dePanale: "4. do AO TeS » APPENDICE LISTE DES POISSONS DE LA GUADIANA TROUVES PAR L'AUTEUR Á MERTOLA 1. Barbus Bocagei. Steind. 2. B. comizo. Steind. Hab. r. Guadiana et Oeiras. 3. Chondrostoma polylepis. Steind. Hab. r. Guadiana et Oeiras. 4. Anguilla fluviatilis. Thunb. 5. Mugil cephalus. Cuv. Chez les individus adultes la longueur totale comprend cinq fois, et souvent cinq fois et demi, la hauteur du corps, et quatre fois et demi jusqu'a quatre fois et deux tiers la longueur de la tête; mais chez de jeunes individus de 16 1 centimétres de longueur, la hauteur du corps est á peine comprise quatre fois et quatre cinquiêmes dans la longueur totale, en y comprenant la caudale. 6. Mugil capito. Cuv. NOTA SOBRE A URETROTOMIA INTERNA A PROPOSITO DE DOIS CASOS DE APERTOS ORGANICOS DA URETRA CURADOS POR ESTA OPERAÇÃO PELO SOCIO EFFECTIVO ANTONIO MARIA BARBOSA Tendo praticado ultimamente a uretrotomia interna em um caso de aperto fibroso da uretra, e sendo esta a primeira vez que simi- lhante operação foi feita entre nós por cirurgião portuguez, entendo dever chamar sobre ella a attenção dos praticos do meu paiz, por me parecer uma operação importante e mui util quando executada pelo processo que segui, e fazer assim um serviço á humanidade em uma doença tão frequente, tão incommoda e por vezes tão perigosa, como aquella em que a referida operação é indicada. Em Lisboa, e posso dizer em Portugal, os apertos uretraes eram e são ainda exclusivamente tratados pela dilatação. O methodo da cau- terisação de Ducamp e de Lallemand, e o das escarificações de Amus- sat, Leroy d'Etiolles e de outros, que alguma vez haviam sido em- pregados em Lisboa, estavam julgados pela sua inefficacia e inconve- niencia, por se lhes seguir ordinariamente, senão sempre, a formação de tecido inodular que augmentava, em logar de diminuir, a coarcta- cão, para serem novamente tentados. Ao methodo da uretrotomia pro- priamente dita, quer externa como a pratica Syme, quer interna, como a que venho de eflectuar, nunca se havia recorrido, pelo menos em Lis- boa. Pela minha parte tambem não tinha procedido de modo diffe- MEM. DA ACAD.— |." CLASSE —T. UI. P. IL l 2 NOTA SOBRE rente d'aquelle, porque nunca havia encontrado em toda a minha prati- ca, tanto do hospital como civil, um caso de apertos de uretra, sem ou com fistulas ourinarias, em que mais tarde ou mais cedo não podesse chegar a metter uma sonda delgada, e em que não alcançasse depois uma dilatação regular e sufficiente da uretra, ainda que com mais ou menos difficuldade. Para as primeiras tentativas empregava velinhas elasticas delga- das, conicas ou com a extremidade olivar, ou as algalias de prata finas, quando com aquellas, pela sua pouca resistencia, não podia chegar á bexiga; e, logo que a dilatação do aperto permittia, continuava o tra- tamento dilatante com as sondas de estanho. O instrumento dilatador era conservado na uretra por espaço de 15 a 30 minutos em cada ses- são, e reintroduzido todos os dias quando não havia accidentes, como especialmente a inflammação, c a febre uretral, durante os quaes so- brestava na introducção das sondas. Chegada a dilatação ao seu maximum, instruia os doentes no modo de introduzirem a si mesmos ou a sonda de estanho de n. 38 ou 40, raras vezes 42, ou uma velinha de gom ma elastica da mesma grossura; e recommendava-lhes a repetição do catheterismo com intervallos progressivamente maiores, mas nunca su- periores a trinta dias. Quando em 1856 fiz concurso para o professorado na Escóla Me- dico-cirurgica de Lisboa, na minha dissertação, que versava sobre o seguinte ponto: —Tratamento dos apertos organicos da uretra, e qual o preferivel — defendi tambem o tratamento pela dilatação progressi- va, como se vê da 1.º das proposições com que terminava aquelle opus- culo, que é a seguinte: «O tratamento dos apertos organicos da ure- tra pela dilatação progressiva é o mais conveniente no estado actual da sciencia, como methodo geral, soccorrendo-se o pratico aos diversos meios de que dispõe este methodo em harmonia com a extensão, du- ração, e natureza particular da doença ». Entretanto, por este methodo, pela dilatação, os apertos uretraes, quando organicos e clasticos, não se curavam radicalmente, e reappa- reciam quasi sempre se os doentes se descuidavam em repetir a intro- ducção das sondas como lhes era prescripta. Muitas vezes tinha, pois, a tratar de novo pela dilatação os mesmos doentes com apertos da ure- tra em egual ou em peior estado que da vez anterior. Isto, que me succedia, acontecia egualmente aos meus collegas, e comtudo não se variava de methodo operatorio. Diversas razões concorriam para este statu quo. Em primeiro lo- gar, porque se conseguia geralmente dilatar os apertos, ainda que por DR O RR RE E 1 Sd brio , AR i my [5 À do RR Í ' F ne K ) Vu a no ER ; À f a Pr A ” linda dia LE plamitçr este perto hos rearg tolo eo, Art tio Sã nr ug mir id "ellos A extrdecidade “ , A are gde Deo Moi pda cenas ret atliva cur E é ires Raros 4 ator tilhada elo apinlo me pog my on E ar tes ed og: o 4 pe NÃo ddr puro de val Rea Sites ain No A PE ao iai Tua + tola partidos a dao 'B srt tes dom bia hocdggo É tnrier "as ingtaias Lots MR A Senti truis eh: ini Sto dabmta Pri na print ornos é no eres £ Rã ato 6 pricd 0) k * e ty grs rt di AGIR Fuatotina gihd E Wi! As A na. api, Pagdos vcerwr A pidaanto E elo : a Muegriiror 4 pm er) degidantent + pisado 18 Ago utinade» por: ares go tora Lignapds Eron ni apo é Ai pote E y PAR ho prontos Ian Lensraçõo té nv as david É aprnação pede po to qr meo. Peitos ses aro Presntontacoo Eliana, mesa dae | prapeis pettica, arcollicndo o pasa e tada does contiapes ” gut cOmsreray Elis, a h remada o vida Juciera aponte Pa an Dao; 8 'guço ati, tociré, Fesulciento mm qruivos via tertimaigos, Hd supietos e diime Lntotdeaçãe po manto j + cóm Cor ibistonto estes ah dertisa patos tirem - ro dan Pes pa afuiprogiro PARRA ” “a É EO Eu te F + E : Eu At Mi UM J : [P Poti! tita | de ir paes ato qt em Ê | go dio vigia: oonitboroy Crema, pa SR poe be Eds pita e dos dó a ar ju A cia EA da CRS SRA eba Tunncero ds Sá, E 90 sema se ven E Ee vet no tierra AM Bino Apa od dee o Ao pa ro debtinrar ts pi urguarhesd! à hi k hi peirtero ad oia qo o teto cs GA lie Sds at dita a Host aE iseno o intio- ] ig: qse grdeade fas E dilatado, rr pra, sujo” oniené/ad abade - ti ed o nec Rá! F a ] PRA JE 4 t% y (| hi N ', n b UR AT RR f E] ANO AS SE ERR SAVE LA | MANOR RM Rea , PIA by AM]. ' E: ' f ER PA MANTA pa] TAM Fe TP ; Fo! bi o ny) NA a NCRA Dm rá e E bro at Vias EAR Migas a RS a am E : q TO, AQ a os A RAT etpon pila 6a, EA JA A MA MM Pág Mt ie Hr “ED pode 45 ! LO o y , 1 Rede ed CR 4 1 r “ | a j É a PI : , E ME A EE RE o DA A DO Rad OS RA MA PR Os RSA Reta: AA DAL Rã DES AS sta ba A CR fio adia JEM ds END Nai, ya hasta nba Fà AS Rà o DS cole qro Dad ado Le DDS q o RS SD PROLE boAtigata Mo AAA PotigabMa go : ' À Ce BENS AE AA , RP Sã a vha chita popa dd air RNA PA Aa djs FAR a dA tia qd elo PS a A PEA RE RS Em qui RE od po 7 ga a ves Eos RS DS IR IA roubados petit ia Er | Hino da iodo 4 LEA ey Rm voa Cena a fd ER GR ) A SS RS vd h O HE Q I; M ) 1,48, dá NX da F EM , Ma f Ciara bi li E Do La JA , po ad epib) epi Vevg di i de IARA UR E RUE ) tie id h PDA j LCA EL PR TUE ] y iu ph Wi Me RO RA O A Ca Ses RR , " Raro , ' K dr , À 7 1] ' A URETROTOMIA INTERNA 5 tem uma aresta que concorre a manter esta parte do uretrotomo no rego do catheter impedindo-a de sair d'elle. A extremidade opposta ou externa do uretrotomo tem um pequeno cabo metallico com um botão, cuja circunferencia é serrilhada, pelo qual se pega no instru- mento e se faz mover em todo o comprimento do rego do catheter conductor. Ha uretrotomos em que a fórma da lamina é mais verdadeira- mente lanceolar, e cortante dos dois lados para fazer as incisões late- raes, construidos tão engenhosamente como os primeiros e com as mes- mas variedades de largura. E com esta terceira parte do apparelho instrumental de Maison- neuve que se cortam os apertos, fazendo-a correr rapidamente pela goteira do catheter depois de devidamente collocada e segura. Reflectindo por tanto no modo porque actuam os novos instru- mentos, que eu já possuia havia tempo, e tendo assistido á operação pra- ticada com elles por mr. Declat no sr. Francisco Chamiço, resolvi ava- “Jial-os na propria pratica, escolhendo para o caso um doente com aper- tos fibrosos muito consideraveis, e fazendo não só uma incisão supe- rior como fez mr. Declat, o que me parece insufficiente em muitos casos, mas tres incisões, uma superior e duas lateraes; e não manten- do na uretra uma velinha em contacto com as feridas, como tambem fez o mesmo sr. Declat, contra o conselho do proprio Maisonneuve e a pratica esclarecida de Sedillot. A operação a que alludo foi praticada no amphitheatro das cli- nicas da Escóla Medico-cirurgica no dia 10 de outubro corrente, pe- rante varios collegas cathedraticos e do hospital, e dos alumnos do 4.º e 5.º anno medico. O doente, José Maria Ribeiro da Silva, de 40 annos de edade, entrára pela segunda vez na enfermaria de Santo Antonio, que dirijo no hospital de S. José, para se tratar de um aperto organico da ure- tra consecutivo a antigas blennorrhagias. Da primeira vez consegui me- lhoral-o no espaço de um mez, ou pouco mais, por meio da dilatação progressiva, a ponto de o proprio doente fazer por si mesmo a intro- ducção de uma grossa sonda de estanho de n. 38. Mas o doente fóra do hospital não pôde continuar a introduzir o instrumento dilatador, como lhe havia recommendado. Consequentemente, passados poucos me- zes, foi obrigado a recolher-se de novo á mesma enfermaria em 20 de setembro proximo passado. Por esta occasião o doente ourinava com muita difficuldade, com 6 NOTA SOBRE intervallos de uma hora ou pouco mais, sendo a micção acompanhada de tenesmo vesical muito incommodo. De noite ourinava cinco ou seis vezes, e entre dia e noite vinte vezes e mais, raramente menos. Umas vezes a ourina saía gotta a gotta caindo perpendicularmente ; outras em jacto muito delgado sempre bifurcado ou retorcido. Pela uretra havia um pequeno corrimento mucopuriforme. A ourina era além d'isso se- dimentosa. Procedendo ao catheterismo com uma sonda de estanho de n. 26, não consegui passar o aperto que estava na parte posterior da porção membranosa, a 14 centimetros do meato ourinario. Uma velinha elas- tica da grossura de 3 millimetros, cuja introducção foi tentada por duas vezes em dias differentes, não pôde tambem penetrar o aperto. Resolvi então operal-o pela uretrotomia interna com os engenho- sos instrumentos e segundo o moderno processo de Maisonneuve, como vira fazer a mr. Declat algumas semanas antes, mas praticando tres incisões em logar de uma só como fizera aquelle habil collega. Antes de proceder á operação, deitado o doente em decubito dor- sal com os joelhos levantados, comecei por tentar a introducção de uma velinha elastica de 2 5 millimetros, a qual não foi possivel fazer passar até á bexiga. Reconhecida assim a profundidade do aperto e o grau de constricção que determinava, procedi então á introduccão da velinha conductora que media 1 5 millimetro na maior grossura, a qual passou o aperto com certa facilidade. Em seguida articulei parafusando á extremidade externa da ve- linha a ponta do catheter canelada em espiral, o qual tinha 25 milli- metros de grossura, e conduzi-o até o aperto; mas o volume relativa- mente grande d'este instrumento não permittiu que passasse devida- mente todo o aperto. Em consequencia tirei-o e substitui-o por outro mais delgado, de 2 millimetros, que consegui passar facilmente para além do aperto. Immediatamente depois levei pelo rego da curva do catheter con- ductor o uretrotomo simples, de 7 millimetros na maxima largura, o qual, passando o aperto, o incisou na sua parte superior. Logo depois tirei este uretrotomo e metti em seu logar o uretrotomo duplo tam- bem de 7 millimetros na maior largura, e fiz pelo mesmo modo duas incisões Jateraes. Tirei então este ultimo instrumento, e seguidamente o catheter com a velinha articulada na sua extremidade vesical. Depois de cada incisão, e quando se tiraram os instrumentos, sai- ram pela uretra algumas gottas de sangue. A URETROTÔMIA INTERNA 3 um processo longo, impertinente, e que não curava radicalmente, mas que era em regra livre de perigos. Em segundo logar, porque nos diversos processos de uretrotomia interna mais recommendados e per- tencentes aos primeiros operadores na especialidade, era preciso dila- tar préviamente os apertos para se poderem praticar as incisões respecti- vas com os volumosos uretrotomos que operavam detraz para diante, como acontecia, por exemplo, com os instrumentos de Guillon e de Reybard; e quando se chegava a conseguir aquella dilatação, que tinha custado ás vezes muitas semanas de trabalho e de paciencia da parte do medico e do doente, não se achava que valesse a pena proceder en- tão ás incisões da uretra, nem sempre isentas de perigos e algumas vezes mesmo fataes, já por hemorrhagia, já pela phlebite, como mais de uma vez succedera, por exemplo, a doentes operados pelo processo de Reybard, aliás premiado em 1852 pela Academia de Medicina de Paris com o premio do marquez de Argenteuil, de 12:000 francos. Em ter- ceiro logar, porque alguns, senão todos os doentes de Lisboa, operados em Paris por mr. Guillon, são obrigados a continuar a introduzir son- das, como os que eram tratados simplesmente pela dilatação, a fim de conservarem a uretra com o calibre conveniente; e quando o não teem feito, a reproducção da doença ha sido a consequencia. Pelas razões principaes que ficam apontadas, não admirava portanto que os operadores portuguezes preferissem o methodo da dilatação no tratamento das coarctações organicas da urelra, tanto mais que em Paris, onde a uretrotomia tem tido mais defensores, e onde está mais em voga, ha especialistas muito distinctos, como Ségalas e Philips, en- tre outros, e cirurgiões do valimento de Nelaton, Michon, etc. que não empregam nem recommendam senão a dilatação, como methodo geral, no tratamento dos apertos organicos da uretra. Mas actualmente as circumstancias são diversas com os novos in- strumentos de Maisonneuve. Com efeito, com estes engenhosos instru- mentos não é necessario proceder á dilatação prévia dos apertos para fazer a sua secção, e portanto não se perde tempo n'esse trabalho pre- paratorio, ás vezes bem longo e difficil; a incisão é feita de diante para “traz, sem risco de ferir outros pontos da uretra que não sejam aquel- les onde o canal está apertado, e por tanto sem os perigos a que ex- punham alguns dos anteriores processos do mesmo methodo. Uma breve descripção d'estes instrumentos facilitará o conheci- mento do modo porque operam. São tres os instrumentes de que se compõe o apparelho de Mai- 1 4 NOTA SOBRE sonneuve. Uma velinha de gomma elastica mui fina e flexivel para poder passar os apertos ainda os mais exagerados, e acommodar-se fa- cilmente na cavidade vesical. Esta velinha é filiforme na ponta ou ex- tremidade interna, e no resto da sua extensão não excede dois milli- tros de espessura. Ha velinhas conductoras de 1, [7 e 2 millimetros de grossura para servirem nos apertos de todos os calibres. Na sua ex- tremidade externa está articulado e bem fixo um pequeno cylindro me- tallico do comprimento de um centimetro, pouco mais grosso que a velinha a que está articulado, ôco e com a superficie interna canelada em espiral. Na primeira operação de uretrotomia feita por Sedillot, pelo processo de Maisonneuve, succedeu desprender-se a velinha do cylindro metallico e cair na bexiga, o que levou este distincto opera- dor a segurar melhor as duas peças do instrumento por meio de uma pequena cavilha ou cravo metallico que as atravessa ao mesmo tem- po. Tendo por acertado este meio de precaução, vou mandar empre- gal-o nos meus instrumentos, que, fabricados em Paris por mrs. Ro- bert e Collin, não: o apresentam ainda. Esta velinha é cognominada conductora, porque depois de levada até á bexiga serve de conduzir o catheter de rego até além dos apertos. O segundo instrumento é um catheter de aço, com rego ou go- teira na concavidade, delgado, mas de grossura variavel de 2 a 3 mil- limetros para os diversos casos, tendo a extremidade interna ou ponta em parafuso para ser articulada no pequeno cylindro da extremidade externa da velinha conductora, depois d'esta ter passado o aperto e haver penetrado na bexiga. Na extremidade externa tem, correspon- dendo á convexidade, dois anneis que servem de pega ao instrumento. Esta parte do apparelho deve chamar-se catheter conductor, porque, depois de se fazer chegar a sua extremidade interna ao collo da bexi- ga, tendo ultra-passado os apertos, é destinado a guiar o uretrotomo. Ha destes instrumentos com o rego na convexidade, para o caso de se querer fazer a incisão inferior, que é de certo a menos conveniente. O terceiro instrumento, ou o uretrotomo é constituido por uma haste de aço delgada, de fórma proporcionada ao rego do catheter pelo qual deve correr com facilidade, e de uma pequena lança que está contínua na sua extremidade interna. Esta lança é uma lamina d'aço ponteaguda, de fórma triangular, do comprimento de 17 a 22 milli- metros e de 7 a 9 millimetros na sua maior largura, com um bordo cortante na extensão de 10 a 13 millimetros, desde a ponta até á base onde é obtusa, e mais larga para não offender as partes sãs da ure- tra, as quaes dilata. No bordo opposto ao do gume e junto da ponta À URETROTOMIA INTERNA 7 Para provar peremptoriamente que a uretra estava devidamente dilatada, imtroduzi logo depois da operação uma volumosa sonda de gomma elastica de 7 millimetros de espessura c de extremidade oli- var, que todos viram passar até á bexiga com summa facilidade, e que tirei innmediatamente. O operado, mui satisfeito porque a operação fôra muito menos dolorosa do que suppunha, foi pelo seu proprio pé do amphitheatro para a sua cama na enfermaria de Santo Antonio. Nas primeiras vinte e quatro horas os intervallos da micção fo- ram de uma a duas horas; o jacto da onrina, grosso, regular e impel- lido a distancia, era acompanhado de sentimento de ardor nos sitios correspondentes á operação; a ourina ensanguentada no principio ia sendo gradualmente menos córada. No principio da noite o doente sentiu al- guns calefrios, a que se seguiu febre, que quasi se extinguiu na ma- drugada quando appareceu ligeira transpiração. Na manhã do dia seguinte ao da operação (11 de outubro) a ourina começou a estar clara e sem nenhum signal de sangue; o doente já não sentia o minimo ardor no acto da micção; a uretra não apresen- tava o menor engorgitamento, nem sensibilidade á pressão, nem o mais pequeno indicio de infiltração sanguinea ou ourinosa ; o pulso estava comtudo ainda um pouco ligeiro. Nos dias seguintes o operado continuou a passar bem; a frequen- cia do pulso cessou e o accesso febril não reappareceu; o jacto da ourina continuava grosso e projectado a distancia com facilidade e sem tenes- mo, nem o menor incomodo, como no estado normal; os intervallos de cada micção foram-se espassando progressivamente a duas, tres € quatro horas, ourinando durante a noite apenas duas ou tres vezes; a ourina citrina, transparente, sem nenhuma deposição mucosa ou salina ; o corrimento muco-puriforme, que existia antes da operação, foi tam- bem diminuindo e desappareceu. O operado levantou-se ao 5.º dia, quando suppuz que as feridas estariam cicatrizadas; e aos doze dias, em 21 do mez, achando-se bom, pediu-me para sair do hospital. N'este dia querendo verificar o cali- bre da uretra, fiz-lhe a introducção da uma vela de gomma elastica de 7 millimetros de grossura, com extremidade olivar, em presença dos meus collegas, os srs. dr. Carlos May Figueira, João Mendes Arnaut, Joaquim Theotonio da Silva e Oliveira Soares, e de varios estudantes, que tambem tinham assistido á operação; e essa vela, apesar de bem volumosa, passou muito facilmente pela uretra até á bexiga, o que provou que o canal conservava a dilatação que havia adquirido pela MEM. DA ACAD. — 1º. CLASSE. — T. 1, P. 1. y 8 NOTA SOBRE operação praticada doze dias antes, apesar de não ter conservado son- da na uretra, como fez mr. Declat e como varios aconselham, e de nem mesmo a haver introduzido momentaneamente todos os dias como outros recommendam. A unica introducção de vela que fiz no meu operado foi instantanea logo depois das incisões, e só com o fim de ve- rificar o effeito immediato da operação. Não podendo demorar o operado por mais tempo na enfermaria, concedi-lhe alta no dia 24 de outubro, isto é, quinze dias depois da operação; mas recommendei-lhe muito, que viesse procurar-me se sen- tisse o mais pequeno incommodo de vias ourinarias. O modo, pois, porque as coisas se passaram n'esta operação, in- dica que as feridas cicatrizaram, como as soluções de continuidade sub- cutaneas ou não expostas, sem inflammação suppurativa, e por tanto sem tecido inodular, cobrindo-se a superficie traumatica de lympha plastica, organisada depois em membrana mucosa de nova formação, liza, fina e sem retractilidade. Se tivesse empregado as sondas, estes corpos em contacto com as feridas recentes, além de terem por certo demorado a cicatrização, pro- vocariam inflammação suppurativa, e por tanto a cicatriz seria effe- ctuada mediante tecido inodular naturalmente retractil, e que mais tarde ou mais cedo deveria reproduzir a doença. Por dois motivos se tem instantemente aconselhado e praticado a introducção de uma algalia grossa, de gomma elastica, logo depois da uretrotomia interna: — para manter afastados os bordos da incisão ou incisões, e conservar assim dilatada a uretra até completa cicatri- zação, —e para impedir que a ourina, passando por sobre a ferida, a irrite, ou se infiltre nos tecidos recentemente: incisados. Mas a estructura da uretra, constituida por fibras contracteis cir- culares immediatamente por baixo da membrana mucosa, isto é, per- pendiculares ao eixo do canal, deve dispensar aquelle meio destinado a obstar a nova união dos bordos da ferida, com tanto que todo o te- cido do aperto seja dividido; porque, incisada a uretra longitudinal- mente e cortadas assim as suas fibras annulares, estas, e por tanto aquelles bordos que ellas constituem, teem toda a tendencia pela pro- pria retracção para se separarem, e não a devem ter para se reuni- rem. Este facto é provado pelas experiencias feitas em animaes por mr. Reybard, e conhecido por quantos temos praticado a talha ure- tral sem se lhe seguirem apertos de uretra. A URETROTOMIA INTERNA 9 O que reproduz a coarctação uretral depois da uretrotomia: in- terna devidamente feita, não deve ser por tanto a approximação dos bordos da ferida immediatamente á operação por falta de um corpo estranho que a ella se opponha. Além da estructura da uretra, do re- sultado das experiencias em animaes, e do que acontece depois da ta- lha perineal, tenho contra essa opinião o facto que motivou esta nota, no qual os bordos das incisões da uretra sem o uso de sondas cicatri- zaram isoladamente, de modo a conservar este canal o calibre que 12 dias antes lhe havia dado pela uretrotomia. A reproducção dos apertos depois das incisões intra-uretraes, deve pelo contrario ser antes o cffeito do uso das sondas, que provocando a suppuração determinam o desenvolvimento do tecido fibroso cicatricial, ou inodular, que é tão retractil como o tecido proprio dos apertos orga- nicos, sobre tudo quando por qualquer causa é irritado ou inflammado. Por outro lado a algalia de gomma elastica, metida na uretra e mergulhada na bexiga, além de poder ailacerar mais ou menos, de ir- ritar e inflammar a nova solução de continuidade, e de provocar ac- cessos febris, a infecção purulenta ou a phlebite, mantendo afastadas as paredes uretraes, em logar de impedir, facilita o contacto da ourina com a ferida, não intermittentemente como quando o operado exer- cer a micção sem intermedio da algalia, mas a todo o instante pela facilidade com que se faz a insinuação da ourina gotta a gotta por en- tre as paredes da uretra e a superficie exterior da algalia, como se vé sempre que uma sonda é conservada na uretra e bexiga. Ainda mais. A solução de continuidade regular e sem dilacera- ções, como é a ferida incisa e longitudinal da uretra, não feita na sua parte inferior, onde é muito mais vascular, e em que o tecido caver- noso da porção esponjosa é muito mais abundante, mas na superior e lateraes, sem profundidade que a faça chegar ao tecido cellular exte- rior como se praticava pelo celebre processo de Reybard, permitte a pas- sagem da ourina sem notavel irritação nem perigos de infiltração, por- que se oppõe a estes accidentes, primeiro o sangue que coagula logo em lamina sobre a ferida, e pouco depois uma camada de lympha plas- tica, que cobre como uma especie de verniz protector a superficie toda da solução de continuidade, e que se converte mais tarde em. mem- brana mucosa de nova formação, fina, flexivel e não retractil. No doente a que me tenho referido, as coisas passaram-se por fórma a justificar o procedimento adoptado, e a apoiar as considerações que precedem. E quando mesmo o processo operatorio não desse a cura radical dos apertos organicos da uretra, o que ainda não asse- Dr 10 NOTA SOBRE guro, deveria preferir-se á dilatação, em muitos casos, pela facilidade, promptidão e simplicidade com que leva o canal ao seu calibre phy- siologico. Este primeiro ensaio é pois sumimamente animador, e deve dis- por os collegas a acomponhar-me no caminho que encetei, pelo qual me parece se adianta um passo no progresso da therapeutica dos aper- tos organicos da uretra em o nosso paiz. Brevemente espero praticar o mesmo processo operatorio em al- guns doentes com apertos fibrosos da uretra refractarios á dilatação. D'este numero deve ser provavelmente o sr. Chamiço, a quem se fez uma só incisão superior, e que, com quanto melhor, não está ainda res- tabelecido como convém. Quando, pois, tiver colhido um certo numero de factos, terei o cuidado de dar uma noticia d'elles mais completa do que faço hoje, em que o meu fim é indicar o primeiro facto de uretrotomia interna praticado em Lisboa, á excepção do de mr. Declat, e de chamar sobre ella a attenção dos collegas, em vista das innegaveis vantagens que me parece descobrir-lhe. Concluindo, devo dizer que, referindo este facto clinico, não penso comtudo que o methodo da dilatação deva ser inteiramente substituido pelo da uretrotomia interna. Entendo ao contrario que a maior parte dos apertos uretraes deve ser tratada pela dilatação progressiva, re- servando as incisões internas para os casos da doença refractarios áquelle methodo, ou para aquelles em que a dilatação é difficil e morosa na sua applicação e nos seus resultados. Lisboa 29 de outubro de 1964. E] Peço para juntar ao facto de uretrotomia interna, que referi em a nota lida na sessão passada, outro não menos valioso do que aquelle, porque me parece confirmar em todo o ponto as asserções que tive en- tão a honra de emittir. Pratiquei esta segunda operação no dia 11 do corrente perante varios collegas, entre os quaes tive a honra e a satisfação de ver o nosso distincto presidente da classe, o sr. dr. Bernardino Antonio Go- mes, e em presença dos estudantes dos ultimos annos do curso medi- co-cirurgico. O doente que operei, Henrique dos Santos, de 26 annos e boa constituição, entrou para a minha enfermaria no dia 2 do corrente, com um grande aperto uretral que o fazia padecer havia 5 mezes. A URETROTOMIA INTERNA lt Como doenças precedentes, que influiram directamente na molestia actual, havia tido duas blennorrhagias, a primeira ha dois annos e meio, e a ultima ha pouco mais de seis mezes, em seguida á qual, a uretra, já antes apertada, se estreitára muito mais. Desde então ouri- nava effectivamente com muita difficuldade, gotta a gotta, por inter- vallos de 3 a 5 minutos, raras vezes de 15. A saída da ourina era ainda acompanhada durante o dia de tenesmos repetidos. De noite a excreção, fazia-se incessantemente apezar do somno, executando-se por tanto sem consciencia. Pela uretra não havia nenhuma purgação; mas depois das explorações a que tive de proceder, appareceu uma certa humidade muco-puriforme no meato ourinario. As ourinas que se po- deram aproveitar para serem observadas eram claras, mas tinham al- gum sedimento muco-salino. Explorada a uretra com uma velinha de gomma elastica de 2 millimetros de espessura, pude reconhecer muito evidentemente a val- vula navicular ou de Guerin, a qual deixava de ser encontrada quando, tirando o instrumento explorador, o reintroduzia dirigindo-lhe a extre- midade contra a parede inferior da uretra. A sonda seguia então para tráz e ia encontrar um aperto uretral a 104 millimetros do meato ou- rinario, quer dizer, na parte posterior da porção esponjosa da uretra. Com a extremidade da velinha um pouco mais delgada consegui pe- netrar o aperto, mas não ultrapassal-o. O instrumento explorador ficava tenazmente apertado pelo tecido elastico que constituia o aperto de modo a ser difficil retiral-o. Convidei alguns collegas a fazer a mesma exploração, e o resul- tado foi o mesmo. Repetindo o meu primeiro ensaio por mais tres ve- zes, só da ultima, que teve logar na vespera da operação, pude con- seguir que a velinha passasse o primeiro aperto, mas encontrou ou- tro que não pôde passar, 2 centimetros mais atraz. Pude todavia levar com facilidade atravez do aperto até á bexiga a mais fina das velinhas conductoras de Maisonneuve, quasi capillar na extremidade vesical, de 1 a 1 + millimetro no resto do comprimento; e com ella pude tambem passar o catheter conductor mais delgado. Parecendo-me este um excellente exemplar para a uretrotomia interna, cujo valor e importancia trato de verificar, fiz com effeito a respectiva operação no dia 11 do corrente mez de novembro. . Para ser bem reconhecido por todos o grau de aperto a que a uretra havia chegado, não quiz eu mesmo proceder á exploração que precedeu o acto operatorio, e pedi ao meu collega na Escóla, o sr. Ri- beiro Vianna, lente de medicina operatoria, que assistia tambem, para 12 NOTA SOBRE a fazer; e elle, depois de ter encontrado igualmente a valvula de Gue- rim, não conseguiu passar o aperto com uma velinha de 2 millime- tros, que ficou como antes preza na parte apertada da uretra. Procedi então á uretrotomia com os instrumentos mais delgados de Maisonneuve, pelo modo que já tive occasião de descrever, termi- nando por fazer, como na minha primeira operação, tres incisões, su- perior e lateralmente. Finda a operação, que foi seguida de mais algum sangue do que a primeira, introduzi e tirei logo uma grossa vela de gomma elas- tica com extremidade olivar, de 7 millimetros de espessura, a qual, em presença de todos que assistiram á operação, foi levada até á be- xiga com summa facilidade. Como no meu primeiro operado não conservei pois, nem intro- duzi mais nenhuma sonda na uretra pelas razões n'outro logar addu- zidas; e repito aqui que tenho esta pratica por sobre modo impor- tante. Os effeitos immediatos d'esta segunda operação não differiram muito dos que foram observados depois da primeira. A ourina vein muito sanguinolenta logo depois da operação, e assim continuou toda a tarde e durante a noite, sendo o jacto bastante grosso e expedito, com intervallos de 1 a 3 horas, e acompanhado de ardor, mais sensi- vel de noite, sómente referido á região dos apertos, que correspondem à parte central do escroto. As 3 horas da tarde o doente sentiu al- gum frio, e depois muito calor e sede que terminou por suor cerca di meia noite. Na occasião da minha visita do dia 12, vinte e quatro horas de- pois da operação, o estado do operado era o mais satisfactorio : jacto da ourina sufficientemente grosso ; ourinas ligeiramente córadas, mas sem apparencias de sangue, com ligeira deposição catarrhosa, e estavam as- sim desde pela manhã; nenhum engorgitamento ou outro signal de inflamação no trajecto da uretra que se podia observar; nem o me- nor indicio de infiltração ourinosa ou sanguinea ; pulso a 76; calor de pelle natural; appetite. Havia sómente alguma sensibilidade não es- pontanea, mas provocada pela pressão, na parte da uretra correspon- pondente á região mediana do escroto; uma certa humidade no meato ourinario constituida por serosidade côr de rosa; alguma sede. No dia 13 pelas 6 + horas da manhã, tendo até ahi continuado a passar bem, houve uma forte erecção, em seguida á qual saíu al- gum sangue pela uretra, e as ourinas foram sanguinolentas até ás 3 ho- ras da tarde; mas nenhum d'estes accidentes, nem a excitação vene- A URETROTOMIA INTERNA [3 rea, nem a hemorrhagia, reappareccram em presença do uso das pilu- las de camphora e opio com limonada sulfurica que prescrevi. Depois d'este accidente tudo tem continuado bem ; e hoje, 6.º dia da operação, o operado tem estado de pé; o jacto da ourina é natural- mente volumoso, effectua-se sem o menor incommodo e com inter- vallos de 3 a 5 horas; a ourina clara e citrina apenas tem uma pe- quena deposição catarrhosa ; pela uretra não ha o menor corrimento; a pressão ao longo d'este canal não desperta já nenhuma sensação do- lorosa ; o operado, emfim, sente-se muito bem, e em breves dias sairá do hospital. Como prometti fazer a respeito do primeiro operado, que até hoje está no melhor estado, segundo as ultimas informações, não esquece- rei recommendar a este segundo que me communique qualquer oc- correncia que por ventura haja de ter em relação ao estado da sua uretra. Este novo facto deve pois contribuir para estabelecer a convenien- cia da uretrotomia interna, pelo processo que segui, nos casos de aper- tos muito consideraveis da uretra. Este additamento à nota precedente foi lido na sessão da 1.º classe da Academia de 17 de novembro. Desde este dia, sexto da operação, o operado tem continuado a passar excellentemente como foi testemu- nhado por varios collegas, ourinando com intervallos de-4 e 6 horas, ourina perfeitamente limpida e normal. No dia 22 do mez, duodecimo da operação, sondei a uretra para verificar o estado do seu calibre com a mesma vela que lhe havia in- troduzido logo depois da operação, e essa vela foi levada até á bexiga com muita facilidade. Instando o doente para sair do hospital por se achar perfeita- mente bom, concedi-lhe alta em 25 de novembro. Es ATA MMOTORTIAD 4 rustigy eb. ogucob, sqnisena am connapanaga nn esiganromado o rot po vit a luggannta onposainulino obeaormib umas oiqo bind el ' 0,0 ; baugiinoss as obg obs dh 4 ig a cg RD bbb e obstago engetuma OS A 9 obos rosa saca do enda Mesmidacito neta sd ve OS cermage ensino ano sopagnod é 06º cobencu nado mongeo gd -oêm priori el ses mevereetço obpiogab -obr cBasande BemqulaDa. his etragesho om. Isunonadaoitcagaa! e: dinipe. uiho, estIad MMS So gde cSiua Seg) nge antes sobeggorasg MA asatia dae abpra RR +. 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Ha muito que a medicina sentia não poder oppor-se á mydriase ou dilatação pupillar com a mesma facilidade e simplici- dade, com que a atresia das pupillas sem adherencias se corrige pelos agentes mydriasicos desde muito conhecidos. Felizmente esta grande lacuna foi preenchida em 1862 pelo dr. Fraser, de Edimburgo, o qual descobriu na fava do Calabar propriedades oppostas ás que a belladona exerce sobre os olhos. As propriedades toxicas da fava do Calabar ingerida no estomago eram conhecidas na Europa, de muito mais tempo do que os seus ef- feitos physiologicos sobre a pupilla e apparelho accommodador da vi- são. Ha 20 annos que alguns missionarios da egreja presbyteriana da Escocia, estacionados na costa occidental da Africa, deram uma des- cripção da fava do Calabar, que tem ali o nome de fava de prova, e a planta que a produz o de escré no dialecto dos naturaes do velho Calabar; e apontaram os efleitos que haviam observado nos indigenas em quem tinha sido empregada, mandando ao mesmo tempo amostras della para Inglaterra. O governo do Calabar é oligarchico, geralmente moderado, mas por vezes despotico e cruel. Os chefes das differentes povoações for- mam entre si um conselho supremo, cujo presidente toma o titulo de rei. Abaixo d'elles seguem-se em hierarchia os padres ou medicos que presidem ás festas, procissões, invocações etc. Tudo que acontece de inexplicavel, agradavel ou triste, é ali attribuido á intervenção de um feiticeiro mysterioso, para descobrir o qual se recorre ás proprieda- MEM. DA ACAD. — |.º CLASSE. — T. NI. P. IL. Í 2 INVESTIGAÇÕES SOBRE A ACÇÃO des denunciantes das sementes da eséré. Quando alguem é indigitado como criminoso, a accusação é levada a um dos chefes da localidade que junta em conselho os governadores visinhos, perante o qual o ac- cusador expõe os motivos de queixa contra o accusado. Segue-se per- guntar a este o que allega em sua defeza. À esta pergunta responde geralmente o accusado pedindo a fava de prova, que é logo concedida. Quando elle se não submette espontaneamente á prova indicada, é con- demnado a fazêl-o. A ceremonia da prova, que é presenciada por uma grande multidão de curiosos, e para a qual se escolhe a maior praça da povoação, consiste em o accusado tomar uma beberagem leitosa ou especie de emulsão feita com a fava pisada e diluida em agua. Geral- mente a pasta da fava do Calabar desfeita em agua é dividida em duas partes, uma que é ingerida e outra que é administrada em clys- ter. A dóse da substancia, graduada pelo padre encarregado da exe- cução do processo, é geralmente de 25 a 30 favas, mas póde variar de 12 a 100. Depois da ingestão da fava de prova, uma de duas coisas acontece: ou o accusado vomita e escapa, o que quer dizer que está innocente, ou morre, o que significa culpabilidade. A morte manifes- ta-se ás vezes no fim de meia ou uma hora, precedida dos symptomas de paralysia gradual dos musculos voluntarios, e quasi sem manifesta - ções de padecimento ou angustia. Quando o accusado escapa, os juizes proclamam-no innocente, e o accusador é obrigado a submetter-se á mesma prova. A fava do Calabar não é só usada nas provas judiciarias; é-o tam-, bem nos duellos. N'este caso o provocador parte com os dentes uma fava em duas metades, das quaes come uma e offerece a outra ao seu adversario, que a ingere tambem immediatamente. N'estas circumstan- cias acontece frequentemente a morte, porque meia fava é sufficiente para este effeito, não succedendo mais vezes o mesmo quando se to- mam grandes dóses, porque o organismo se encarrega de as expulsar pelo vomito e pelas dejecções alvinas. Os indigenas não acreditam que as sementes da escré tenham propriedades especiaes ; consideram-nas ao contrario como substancia inerte, a que todavia os deuses communicam a propriedade de indi- car quem é o culpado em um crime grave qualquer, determinando a morte da pessoa que o perpetrou. Só os chefes podem prescrever o seu emprego. Na Europa rarissimos tinham sido até ha pouco os casos de en- venenamento pela fava do Calabar. Um dos casos deu-se na dr. Christison, que intencionalmente a DA FAVA DO CALABAR 3 tomou para estudar os respectivos effeitos, na dóse de 6 grãos inglezes em um dia, e 12 grãos no dia seguinte de manhã. Os effeitos da pri- meira dóse foram apenas um certo grau de enfraquecimento; mas os da segunda foram de verdadeiro envenenamento, isto é, frequencia de pulso, fraqueza e irregularidade nos movimentos cardiacos, vertigens 'e desmaios sem angustia, e suspensão dos movimentos voluntarios, mas sem perda dos sentidos. Dois outros factos aconteceram a duas criadas, em Glascow, as quaes por curiosidade comeram um pequeno fragmento de fava do volume de uma hervilha e do peso de 5 grãos inglezes (30 centigr.) pouco mais ou menos. Segundo o dr. Maclaren que as observou, al- guns minutos depois da imprudencia tiveram indisposição geral e de- pois vertigens com extrema fraqueza que se prolongou por dois dias. Um quarto caso occorreu tambem accidentalmente em Sam Pe- tersburgo no anno passado em uma creança que achando no porto uma fava do Calabar, que caira de uma caixa que tinha desembarcado, a comeu, manifestando-se-lhe symptomas de envenenamento que cede- ram aos vomitorios empregados pelo dr. Linden no hospital de Santa Maria Magdalena onde o doente fora recolhido. Mas ultimamente, no dia 11 de agosto de 1864, houve em Li- verpool factos muito mais extraordinarios. Nada menos de 60) crean- cas foram ali envenenadas com favas do Calabar, encontradas em um terreno proximo do porto e de um bairro habitado por uma popula- cão miseravel e faminta, e trazidas em um navio da companhia com- mercial da Africa occidental, o Commodore, chegado do Calabar, que, segundo uma versão, as trouxera como parte da carga em caixas mal acondicionadas de que haviam caido na occasião da descarga, e se- gundo outra versão vindo misturadas com o lastro e lançadas á praia por occasião da limpeza do porão. Fosse como fosse, é certo que as creanças das proximidades comeram as favas do Calabar, apesar da dureza do episperma e do sabor amargo da amendoa, dando logar em Liverpool a um dos mais afflictivos e compungentes espectaculos. O numero medio de favas que comeu cada creança foi de 2 a 4, mas variou de 1 a 12, sendo para notar que escapou a que ingeriu esta enorme quantidade, e que a unica que falleceu foi a que apenas co- méra uma fava, na qual se não pôde conseguir o vomito. Os sympto- mas manifestaram-se meia hora a hora e meia depois da ingestão do veneno, sendo os principaes, em todos os casos, muito grande pros- tração, pulso pequeno e fraco, resfriamento geral da pelle com suor frio, vomitos em uns, em outros repetidas dejecções alvinas; em al- l- 4 INVESTIGAÇÕES SOBRE A ACÇÃO guns casos dôr aguda no ventre; em dois terços dos doentes sómente, contracção das pupillas, a qual, em um doente que foi submettido á acção da electricidade, cessava sob a influencia da corrente electrica para voltar quando a electrisação era interrompida. 46 dos doentes foram recolhidos no hospital do sul, e os 14 restantes no dispensato-. rio. A sua edade variava entre 2 e 10 annos, tendo a maior parte menos de 7. Curaram-se todos os que vomitaram e aquelles a quem se administrou o sulfato de zinco, mesmo tendo já tido vomitos pro- vocados pelo veneno. O tratamento consistiu no emetico de sulfato de zinco, como vem dito, na emulsão de mostarda ou no uso do carbo- nato d'ammoniaco. Um só dos doentes falleceu, aquelle que não vo- mitou nem pela influencia toxica, nem pelo uso dos vomitivos, e a quem nem mesmo pela sonda estomacal se pôde conseguir a expulsão do veneno. Este doente, que tinha 6 annos, entrára no hospital com symptomas dos mais graves e com o pulso mui fraco. Quando o me- dico assistente, o dr. Cameron, diligenciava conseguir que bebesse, ainda com o fim de obter o vomito, o enfermo foi acommettido de uma especie de calefrio, nada similhante a uma convulsão, e morreu como se tivesse tido uma syncope, sem nenhum signal de angustia, mas ao contrario com a expressão de tranquillidade. As pupillas só estavam meio contrahidas. Na autopsia achou-se o ventriculo esquerdo do coração dilatado e contendo quasi tanto sangue como o direito; o estomago e intestinos, sem injecção inflammatoria nas paredes, conti- nham uma consideravel quantidade de materia semifluida com appa- rencia de emulsão de amendoas. A mãe de uma das creanças teve tambem alguns symptomas de envenenamento, porque, vendo o filho doente e querendo saber o que era a substancia a que a molestia era attribuida, comeu metade de uma amendoa. Ella sentiu pela tarde dores intestinaes, mas passou bem a noite, e só no dia seguinte se manifestaram os symptomas or- dinarios do envenenamento, que uma medicação estimulante fez des- apparecer em horas. O dr. Daniell, medico da marinha ingleza, foi o primeiro que cha- mou a attenção dos medicos para as propriedades da fava do Calabar, no anno de 1846, em uma Memoria que leu na Sociedade Ethnologica de Londres em 28 de janeiro d'aquelle anno (Ox the natives of Old Calabar west coust of Africa). Ahi deu conhecimento do uso que no Calabar se fazia d'ella com o fim Judiciario que referimos, e indicou que era produzida por uma leguminosa aquatica cujo nome não disse. Mais tarde, em 1854, o padre Waddell, missionario no velho ' DA FAVA DO CALABAR 5 Calabar, referiu com mais precisão os effeitos determinados pelo seu uso, disse que os indigenas chamavam escré á planta que a produzia, e levou a Edimburgo n'aquelle anno algumas sementes que offereceu ao dr. Christison. Com estas sementes oflerecidas por aquelle missio- nario e com outras que obteve de diversa origem, o professor inglez estudou as suas propriedades toxicologicas no coelho e em si proprio, com os effeitos já referidos, e communicou o resultado das suas inves- tigações á Sociedade Real de Edimburgo em uma Memoria (On the properties of the ordeal bean of Old Calabar) publicada em 1855 no Monthley journal of medical science. Em 1858 o dr. Sharpey estudou tambem a sua acção sobre a rã. “Foi Balfour que em 1860 (Transactions of the Royal Society of Edinburgh) deu a descripção correcta da planta que fornece a fava do Calabar com os seus caractéres botanicos, tendo antes feito germi- nar algumas sementes no jardim botanico de Edimburgo, e compa- rando a planta ahi desenvolvida com os especimens recebidos do Ca- Jabar por intervenção do missionario Baillie. Segundo elle, a legumi- nosa que dá a fava do Calabar, a que poz o nome de Physostigma venenosum, é uma trepadeira vivaz, que cresce nos logares pantanosos e margens dos rios, podendo chegar a 50 pés d'altura, da tribu das euphascolas, sub-ordem das papilionaceas. Mas até então ninguem havia notado as singulares propriedades que a fava do Calabar exerce sobre os olhos e particularmente sobre a pupilla. É ao dr. Thomas R. Fraser a quem cabe a honra de haver descoberto aquellas propriedades, pelas quaes a fava do Calabar mais se recommenda. Foi em 1862 que elle notou que o extracto da fava do Calabar applicado sobre os olhos determinava a contracção pupillar, e que tinha uma acção immediata sobre o apparelho accommodador “da visão. Esta importante descoberta foi publicada em sua these inau- gural sobre os caractéres e usos therapeuticos da fava do Calabar (Ox the characters, actions and therapeutic uses of the ordeal bean Calabar Physostigma venenosum), sustentada em 31 de julho de 1862 e pre- miada pela Sociedade Real de Edimburgo. Esta these foi publicada em os num. de julho e agosto de 1863 do Edinburgh medical journal. A descoberta do dr. Fraser foi logo confirmada por observações de um distincto ophthalmologista, o dr. Argyll Robertson, tambem de Edimburgo, feitas em si proprio, commmunicadas em 4 de fevereiro do anno passado á Sociedade Medico-Cirurgica de Edimburgo, e pu- blicadas no mez seguinte no Edinburgh medical journal (On the Ca- labar bean as a new agent in ophthalmic medicine). 6 INVESTIGAÇÕES SOBRE A ACÇÃO Egual confirmação tiveram estas observações em Inglaterra, Al- lemanha, Hollanda e França por Soelberg Wells, Bowman, G. Har- ley, Nunnely, Graefe, Donders, e C. Giraldes. Pela nossa parte quizemos tambem verificar entre nós a acção do extracto da fava do Calabar sobre o apparelho accommodador da visão e particularmente sobre a iris, assim como tirar o valioso par- tido que d'esta acção se póde alcançar nos, casos pathologicos de my- driase, de hernia da iris e outros. Mas tivemos que demorar as nossas observações por não podermos obter o extracto da fava do Calabar se- não mui tarde. Ê Havia em Lisboa as sementes do physostigma venenosum, e ti- nhamol-as na pharmacia da Escóla Medico-Cirurgica desde o mez de maio d'este anno, em que chegára a Lisboa á pharmacia Barral e Ir- mão, a quem tinha sido pedida para a Escóla pelo nosso amigo e col- lega, o professor dr. May Figueira. As favas do Calabar recebidas em Lisboa vieram da casa de Benjamim Barral de Paris. Mas o extracto não o podémos ter á nossa disposição senão no principio de julho, em que chegou á mesma pharmacia Barral, vindo de Londres da casa de Savory and Moore. Os caractéres physicos da fava do Calabar, verificados nas que ti- vemos á nossa disposição na pharmacia Barral e nas que temos na Escóla Medico-Cirurgica, são os seguintes: Fórma oval ou antes seme- lhante á do rim, com duas faces convexas, um bordo recto e outro convexo em que ha um longo hilo como um sulco ou raphe em toda a extensão d'este bordo; côr de castanha escura ou de choco- late carregado, com numerosas asperezas em toda a sua superficie, que lhe dão o aspecto desegual da peau de chagrin; o episperma ou tegumento proprio, que dá á semente a côr escura que vem notada, duro, adherente á amendoa, mas susceptivel de se separar d'ella sem grande difficuldade ; a amendoa branca, friavel, constituida por dois volumosos cotyledones que se separam facilmente um do outro. E n'el- les que abunda a parte activa da fava do Calabar. A medição das se- mentes que tivemos á nossa disposição deu os seguintes resultados : comprimento maximo 32º”, minimo 25". largura maxima 20", minima 17”; espessura maxima 17”? minima 12º”. peso maximo 58,50, minimo 3,33. Cada vagem ou legume contém 2 ou 3 d'estas sementes. Segundo Baker Edwards, em 100 partes de sementes ha 30 de episperma e 70 de amendoa. Segundo Harley contém proximamente 2,7 por 100 de extracto alcoolico activo, mas aquelle professor pelo DA FAVA DO CALABAR 7 alcool rectificado quente tem obtido 5 e 6 por 100 de extracto al- coolico, que depois da evaporação se separa em duas camadas liquidas perfeitamente soluveis no ether. O extracto alcoolico secco fórma com a agua uma emulsão es- branquicada que toma a côr rosada quando exposta á acção do ar e da luz. Conforme o mesmo professor Baker Edwards, em uma Memoria lida ultimamente na Sociedade Pharmaceutica de Bath, 32 centigram- mas d'extracto da fava do Calabar em 3,35 d'agua distillada, repre- sentam 7º,87 da amendoa; uma gotta d'esta mistura equivale a 14 centigrammas d'amendoa, e applicada sobre a iris produz uma con- tracção que dura 5 minutos. Não podendo alcançar a calabarina, empregámos nas observações que fizemos o extracto da fava do Calabar tendo por vehiculo a gela- tina, constituindo o que os inglezes chamam calabarised gelatine em pequenos discos de 4”"” de diametro, preparados pelos srs. Savory and Moore, de Londres, conforme as indicações do dr. Ernest Hart, de que deu noticia a Lancet de 16 de janeiro e 16 d'abril d'este anno. Por esta mesma fórma preparam aquelles 'pharmaceuticos a atropiscd gelatine para os usos ophthalmologicos. Este modo de empregar nos olhos o extracto da fava do Cala- bar parece-nos preferivel, porque se administra assim uma quantidade determinada do medicamento; porque a gelatina, em que vae impre- gnada a parte activa, amollece e dissolve-se lenta e gradualmente no liquido lacrimal que humedece o globo do olho sem o irritar e vae nas melhores condições para a absorpção. Não acontece o mesmo com os quadrados de papel preparados por Squire e Bell, nem com os que, mais fortes do que estes, preparavam tambem Savory and Moore e usa- dos em Inglaterra antes de conhecidos os discos de gelatina; nem com os preparados em França por Le Perdriel que são graduados e divididos em centimetros quadrados subdivididos em decimos, e tendo cada cen- timetro quadrado de papel 2 milligrammas de extracto. Uns e outros, como não são constituídos por materia soluvel, interpostos ao globo do olho e ás palpebras, actuam como corpo estranho de um modo ás vezes insupportavel. O dr. Robertson, que já citámos, emprega nos usos ophthalmolo- gicos o extracto ! da fava do Calabar em dissolução na agua distillada, em tres graus de concentração. Da solução n. 1 cada gotta corres- 1 O dr. Robertson prepara o extracto da fava do Calabar fazendo macerar as favas descascadas em alcool rectificado, e evaporando o liquido obtido até à consistencia de xarope. 8 - INVESTIGAÇÕES SOBRE A ACÇÃO ponde a !/, de centigramma do pó da fava; da de n. 2 cada gotta representa 10 centigrammas de amendoa; e da do n. 3 cada gotta equivale a 20 centigrammas de pó. A dissolução do extracto da fava do Calabar em glycerina (1 de extracto para 5 de glycerina), como usou o nosso compatriota Giral- des, parece-nos de tão vantajosa applicação como a gelatina calabarisa- da, e era d'ella que pretendiamos servir-nos se não tivesse chegado esta preparação de Savory and Moore. O principio activo, ou o alcaloide da fava do Calabar, que o Me- dical Times & Gazette de 12 de março do corrente anno nos dá como descoberto pelos dois chimicos allemães, Jobst e Hesse, de Stuttgart, ainda o não podemos alcançar e por isso não o empregámos de pre- ferencia. Segundo elles, o alcaloide é exclusivamente contido nos co- tyledones e foi obtido dissolvendo no ether o residuo deixado pela evaporação de uma solução alcoolica da fava. A solução etherea va- porisada deixa depositar aquelle principio activo, para o qual elles propoem o nome de physostigmina, que outros acham melhor substi- tuir pelo de calabarina !. Segundo aquelle mesmo jornal, onde lemos esta noticia, 2 gottas de uma solução aquosa do alcaloide em 10 mi- nutos determinam a contracção da pupilla até á vigesima parte do seu diametro, pouco mais ou menos, permanecendo este estado durante uma hora, e recuperando os seus anteriores diametros no fim de 4 a 6 horas. Como diziamos, empregámos nas nossas observações os discos de gelatina calabarisada, sendo efficazmente auxiliado n'estas applicações e observações pelo nosso amigo e distincto collega o dr. May Figueira. Estas observações, em numero de 23, foram começadas no dia 11 de julho do corrente anno de 1864. Com ellas pretendemos verificar o effeito do extracto da fava do Calabar em olhos normaes, em olhos submettidos prévia ou simulta- neamente á acção mydriasica da atropina, em casos de mydriase pa- thologica, e finalmente em casos de hernia da iris. 1 À calabarina tem no principio a fórma oleosa, mas depois apresenta-se em massas de côr amarello-torrado, amorphas; é pouco soluvel na agua fria, mais soluvel no alcool, ether e alcalis. A solução aquosa tem sabor de queimo. O biiodureto de potassio a pre- cipita em vermelho-escuro ; e ella pela sua parte precipita o sesquioxido de ferro das suas dissoluções. Fórma com os acidos saes de côr vermelha ou azul-escuro, os quaes precipitam em branco pelo tannino, em amarello-pallido com o chlorureto de platina, em azulado com o chlorureto d'ouro, e em branco-avermelhado com o bichlorureto de mercurio (Reveil). DA FAVA DO CALABAR 9 O extracto da fava do Calabar foi applicado em 7 individuos com os olhos normaes. Estes individuos eram todos do sexo masculino e da enfermaria de Santo Antonio. Os resultados foram os que vão des- criptos nas observações seguintes : 1.º Observação. — Doente da cama n. 56, de 44 annos, tempe- ramento lymphatico-sanguineo, constituição regular. — Primeira ap- plicação no dia 16 de julho ás 9 e meia horas da manhã. As pupillas normaes, ambas com o diametro de 3!/, millimetros. Applicámos em cada olho um disco da gelatina calabarisada, levado na polpa do dedo minimo de uma das mãos, sobre a parte inferior do globo do olho, tendo antes mandado ao doente que olhasse para cima, e cuja palpe- bra inferior separámos e deprimimos com o indicador da mão opposta. Depois da applicação pedimos ao doente para ter fechadas as palpe- bras: 20' depois verificou-se o começo de contracção das duas pupil- las. Aos 35! a pupilla direita tinha 2 millim., e a esquerda um pouco menos ; a vista turva. 1 hora depois, isto é, ás 10 e meia horas da manhã, a contracção pupillar conservava-se no mesmo grau, e assim ficou estacionaria até ao meio dia. As 2 e meia horas da tarde, quer dizer, 5 horas depois da applicação, os olhos estavam normaes, as pu- pillas com os diametros que tinham anteriormente, e a vista com a clareza ordinaria, devendo notar-se que a contracção da pupilla direita foi sempre menor que a da esquerda. No dia 17 as pupillas conser- vavam-se no estado normal. 2.º Observação. — Doente da cama n. 35, de 38 annos, tempe- ramento sanguineo, constituição regular. — Primeira applicação em 16 de julho ás 9 e meia horas da manhã. Pupillas normaes com o diametro de 2!/ millim. Uma lamina de gelatina calabarisada em cada olho. Aos 20' da applicação começa a notar-se ligeira contracção pupillar. Aos 25' pupillas a 2 millim. Aos 35' a 1!/, millim. e a vi- são ligeiramente turva. Aos 60” as pupillas tem 1 millim. de diame- tro. Este efleito durou assim 2 horas proximamente, isto é, até ao meio dia e um quarto, em que começou a dilatação das pupillas, até ás 2 horas da tarde em que haviam voltado aos diametros normaes, e com elles 'o restabelecimento perfeito da vista. No dia seguinte de manhã as pupillas conservavam os diametros normaes. No dia 18 ás 9 h. 40' da manhã, estando as pupillas a 2//, mil- lim., applicámos dois discos da mesma substancia no olho direito só- mente. Às 9 h. e 58' minutos, isto é, aos 18' havia principio de con- MEM. DA ACAD.— |. CLASSE. — T. NI. P. II. 2 10 INVESTIGAÇÕES SOBRE A ACÇÃO tracção na pupilla correspondente. Aos 30" estava a 1!) millim. e a vista ligeiramente turva. Aos 50" a 1 millim. Aos 80”, isto é, ás 11 h. a pupilla tinha apenas o diametro de 0”"”,8; a vista muito menos clara. Ao meio dia e um quarto, quer dizer 2 h. e 35! depois da ap- plicação, a pupilla começou a dilatar-se, de modo que ás 3 e meia h. da tarde tinha o diametro de 2*/ millim., e a vista restituida ao grau normal. O olho esquerdo conservou-se sempre extranho á alteração dos diametros da pupilla direita. 3.º Observação. — Doente da cama n. 6, de 36 annos, tempera- mento lymphatico-sanguinco, constituição regular. — Primeira appli- cação em 16 de julho ás 9 e meia h. da manhã. Pupillas normaes com 2!/, millim. de diametro. Um disco em cada olho. Aos 20” principia a diminuir o diametro das pupillas que marcam 2 millim. 30" depois da applicação. Aos 35! as pupillas estão al / millim., e o enfraque- cimento da vista começa a ser notavel. Ás 10 e meia HE isto é, 1 h. depois da applicação do extracto, a contracção estaciona em 1!/, mil- lim. Pela meia hora da tarde, 3 h. depois do começo da observação, principiam as pupillas a dilatar-se, e teem recuperado o diametro nor- mal á 1 e meia h. da tarde, quer dizer, 4 h. depois da applicação do agente myosico. No dia 18 ás 9 h. 40” da manhã, estando as pupillas a 2 */ mil- lim., applicam-se dois discos da calabarised gelatine no olho direito e um no esquerdo. Ás 10 h., 20! depois, principio de contracção nas pupilas. Ás 10 h. e 10”, isto é aos 30”, visão confusa, ambas as pu- pillas a 1º, millim.; ás 10 e meia h., isto é aos 50', a 1 millim.; e ás 11 h., quer dizer aos 80” da applicação, pupilla direita a 0"",8, conservando a esquerda o diametro de 1 millim. Ás 11 h. e 20' a con- tracção começou a diminuir; e ás 12 h, e 10' a pupilla direita tinha menos de 2 millim., e a esquerda um pouco mais d'este diametro. As 2 h. a pupilla esquerda e ás 3 h. a direita ficavam a 2, millim. 4º Observação. — Doente da cama n. 15, de 35 annos, tempe- ramento lymphatico, constituição fraca. — Primeira applicação no dia 2 de agosto ás 10) b. da manhã. Pupillas normaes a 4 millim. Um disco da gelatina só no olho esquerdo. Aos 20' começo de contrac- ção pupila Aos 25" pupilla a 3 millim., vista turva; aos 30/ at!/, millim., e assim se conservou até á 1 h., em que começou a dimi- nuir de modo a ficar com o diametro de 3 millim. pelas 3 h. da tarde. No dia immediato ás 10 horas da manhã o olho direito conser- . DA FAVA DO CALABAR 11 vava a pupilla normal com 4 millim,, e a do esquerdo estava ainda a 3 millim. No outro dia, 4 d'agosto, as duas pupillas tinham egual diametro, 4 millim. 5.º Observação. — Doente da cama n. 18, de 42 annos, tempe- ramento sanguineo, constituição forte. — Primeira applicação em 2 de agosto ás 10 h. da manhã. Pupillas normaes com 3 millim. Um disco de gelatina calabarisada no olho esquerdo. Aos 18” principio de con- tracção pupillar, e ligeiro enfraquecimento da vista. Aos 30” pupilla a 1 millim.; aos 40' a 07,5, e assim fica até á 1h. da tarde em que começa a dilatar-se e a vista a esclarecer-se. Ás 3 h. da tarde tinha [o diametro de 2 millim., e ainda o mesmo diametro ás 10 h. da ma- nhã do dia seguinte, 3 d'agosto, conservando-se a direita, que não ex- perimentára nenhuma alteração, com o diametro de 3 millim. No dia 4 d'agosto ás 10 h. da manhã a pupilla esquerda estava, como a di- reita, a 3 millim. 6.º Observação. — Doente da cama n. 20, de 29 annos, tempe- ramento sanguineo, constituição forte. — Primeira applicação em 3 d'agosto ás 10 e meia h. da manhã. Pupillas normaes a 4 millim. Dois discos da gelatina calabarisada no olho esquerdo. Aos 15" prin- cipio de contracção na pupilla que marca o diametro de 1'/, millim. aos 20, e visão confusa; aos 30! a pupilla a 0"",5, e assim fica até á 1 h.e'!/, em que a contracção começa a diminuir. Ás 3 h. da tarde está a 2!) millim. No dia seguinte de manhã ainda a pupilla esquerda tem 3 a 3!/, millim. em quanto a direita apresenta 4 millim. como antes tinham ambas; a visão normal nos dois olhos, no dizer do doente. 7.º Observação. — Doente da cama n. 28, de 25 annos, tempe- ramento lympbatico-sanguineo, constituição regular. — Primeira ap- plicação em 5 d'agosto ás 10 h. da manhã. Pupillas normaes com 3 !/, millim. Um disco da gelatina calabarisada no olho direito. Apenas aos 30" se divisa principio de contracção na pupilla, e o doente percebe menos clara a vista do olho correspondente. Aos 45' a pupilla tem 2 millim. Aos 60' 1/, millim., e assim ficou até ás 2 h. da tarde em que começou a dilatar-se. Ás 3 e meia as duas pupillas estavam pro- ximamente eguaes e a visão dos dois olhos egualmente distincta. D'esta primeira serie de observações, em que o extracto da fava do Calabar foi empregado em olhos normaes, conclue-se o seguinte : 2x 12 INVESTIGAÇÕES SOBRE A ACÇÃO 1.º Que o effeito myosico do extracto da fava do Calabar começou a manifestar-se entre 15! e 30” depois da sua applicação no globo ocular. 2.º Que o maximo da contracção pupillar foi obtido entre 30' e 80, 3.º Que a contracção da pupilla foi levada de 4"”, 3"",5, 3º”, e:2º",5 'no estado» normalyia MES, ACER Be DPS; 4.º Que a myose se conservou estacionaria no maximo grau en- tre 20" e 3 horas. 9.º Que a contracção pupillar começou a diminuir entre | hora e 50”, e 5 horas depois da applicação local do extracto da fava do Ca- labar. 6.º Que o effeito myosico foi conservado em maior ou menor grau entre 4 horas e mais de 24. 1.º Que a acção do extracto da fava do Calabar se limitou ao olho no qual se fez a sua applicação directa. 8.º Que a promptidio no apparecimento dos effeitos myosicos, assim como o seu grau e duração, estiveram geralmente na razão di- recta da quantidade do medicamento applicado. Em outra serie de 9 observações a acção da fava do Calabar foi es- tudada tambem em olhos com pupillas normaes, mas conjunctamente com a da atropina usada antes, ao mesmo tempo ou pouco depois do em- prego d'aquelle medicamento. São estas observações que vamos referir. 8.º Observação. — Doente n. 36 da enfermaria de Santo Anto- nio, de 50 annos, temperamento sanguineo e constituição regular. — Primeira applicação em 1 1 de julho ás 10 horas da manhã. Pupil- las normaes com 3 millimetros. 2 gottas de solução mydriasica (sul- fato d'atropina 10 centigr., agua distillada 30 gram.) em cada um dos olhos. 25' depois dilatação completa de ambas as pupillas; visão muito confusa. No dia 12 ás 11 h. da manhã as pupillas ainda muito dila- tadas (8 millim.) e a vista ainda turva. Um disco de gelatina calaba- risada em cada olho. 30” depois ainda nenhuma diferença; aos 35! começa a perceber-se ligeira contracção, que é bem manifesta aos 45', mas um pouco desegual nas 2 pupillas, a esquerda das quaes tem o diametro de 5 millim. e a direita de 4. Aos 60”, não tendo progre- dido a contracção, applica-se mais um disco em cada olho; 15! depois a pupilla esquerda a 3'/, millim. e a direita a 2. A visão restabele- ce-se na proporção da diminuição dos diametros da pupilla. Uma hora DA FAVA DO CALABAR 13 depois a dilatação recomeça. No dia 13 ás 10 h. da manhã a dilatação havia progredido; a pupilla direita estava a 4 millim. e a esquerda a 5 mpillim.; o estado turvo da visão reappareceu ainda que menos exagerado. Uma lamina da gelatina em cada olho; passados 15' as pu- pillas começam a diminuir, e aos 35 a direita tem 2 millim. e a es- querda 3. Ás 10 horas e 40, não tendo progredido a myose, appli- ca-se mais um disco calabarisado no olho esquerdo em que a contrac- ção é menor, e 5! depois vê-se a pupilla d'este lado começar de novo a contrahir-se; e aos 20”, isto é, ás 11 horas e 5', apresenta 2 millim. como a do lado direito. A visão distincta restabelecida ao estado nor- mal, com grande aprazimento do doente que receiava ficar com a vista enfraquecida. No dia 14 á mesma hora da manhã a pupilla direita a 2*/, millim, e a esquerda a 3. 9.º Observação. — Doente n. 27 da enfermaria de Santo Anto- nio, de 45 annos, temperamento sanguineo-lymphatico, constituição regular. Olhos normaes. Pupillas de 3 millim. — Primeira applicação em 11 de julho ás 10 horas da manhã. 2 gottas da solução mydriasica no olho esquerdo sómente. Aos 15' é evidente a dilatação pupillar no olho onde foi feita a applicação ; aos 30” mydriase completa e grande enfraquecimento da vista. No dia 12 á mesma hora a dilatação pupil- lar no olho esquerdo está ainda a 6 millim., conservando-se a 3 mil- lim. no olho direito. Ás 11 horas da manhã applica- se um disco cala- barisado em cada olho. 20' depois começa a contracção na pupilla di- reita, que fica a 1 millim. aos 30". Na pupilla esquerda quasi ne- nhuma alteração: só no fim de 1 hora apresenta o diametro de 3 millim. No dia 13 ás 10 h. da manhã a pupilla direita está ainda a 2 millim, e a esquerda readquiriu 4””. Ás 10 h. e */, um disco calabarisado em cada olho; 30' depois as pupillas começam a aper- tar-se sendo-o mais sensivelmente a direita que não havia sido sub- mettida á acção da atropina, e na qual o diametro chega a 1 millim., sendo de 2!/, na esquerda. A vista do olho direito nublada. 45' de- pois o diametro da pupilla direita desceu a 0"",5, e a esquerda a 2 millim. Ás 5 h. da tarde ambas as pupillas começaram a dilatar-se. No dia 14 ás 10!/, h. da manhã a pupilla direita marcava 2 mil- lim., e a esquerda 4"” como no dia antecedente. Dois discos de gelutina calabarisada no olho esquerdo leváram a pupilla a 1, millim. no fim de 20'. Esta contracção persistiu até á meia hora da tarde, em que começou de novo a dilatar-se até ás 5 h. No dia 15 de manhã as duas pupillas a 3 millim. Ás 11 h. uma 14 INVESTIGAÇÕES SOBRE A ACÇÃO nova escama calabarisada no olho direito, que no fim de 15” começa a determinar a contracção pupillar, a qual aos 20" está a 2 millim. e aos 30' a 1!/, millim., isto é, exactamente a metade do diametro que tinha a pupilla do olho esquerdo. Este estado subsiste até á 1 bh. da tarde em que a dilatação recomeça. No dia seguinte, tô de julho, as duas pupillas normaes, isto é, a 3 millim. 10.º Observação. — Doente n. 68 da enfermaria de Santo Anto- nio, de 50 annos, boa constituição. Olhos normaes; pupillas a 3 millim. — Primeira applicação no dia 1 2 de julho. Ao meio dia um disco de atro- pised gelatine (de */,09 de grão) no olho esquerdo. 20' depois nenhuma alteração visivel: outro disco da mesma substancia. Aos 25' depois d'esta segunda applicação ligeira dilatação que proseguiu até á tarde. No dia 13 ás 10'/, h. da manhã persiste uma pequena dilatação (4 millim.). Um disco de calabarised gelatine, que contrahe a pupilla no fim de meia hora em que apresenta 3 millim, e 1 h. depois 2, persistindo assim por mais 15'. Depois começa de novo a dilatar-se, e ás 4 h. da tarde está com 3 millim. Este estado vê-se ainda no dia seguinte, 14 de julho, em que as duas pupillas estão eguaes. 11.º Observação. —Doente n. 1 da enfermaria de Santo Antonio, de 25 annos, boa constituição. Olhos normaes; pupillas a 3"/, millim. — Primeira applicação em 12 de julho ao meio dia. Um disco de atro- pina d'aquella mesma força no olho esquerdo. Aos 20" nenhum re- sultado: outro disco, que dilata a pupilla a 4!/, millim. depois de mais 35! No dia 13 as duas pupillas teem egual dilatação (3 */, millim.). As 10!/, h. um disco de gelatina calabarisada n'aquelle mesmo olho. Passados 20” contracção sensivel; ás 11 h. a pupilla tem o diametro de 1 millim., a vista ligeiramente turva. Ás 11!/, h. pupilla a */, mil- lim e a vista mais turva. No dia 14 ás 10!/, h. da manhã o estado normal restabelecido. * Observação. — Doente n. 41 da enfermaria de S. Miguel, de rim annos, constituição regular. Pupillas normaes a 3!/, millim, — Primeira applicação no dia 16 de julho. Ás 9 “/, h. da manhã dois discos de atropina um em cada olho. 10” depois, antes de haver di- latação pupillar sensivel, applica-se uma escama calabarisada no olho direito. 20' depois d'esta applicação começa a perceber-se ligeira con- % DA FAVA DO CALABAR 15 tracção da pupilla correspondente. A do lado opposto tem o grau de dilatação que tinha antes da applicação mydriasica, e 1 hora depois desta ainda não apresenta alteração sensivel. A pupilla direita, ao con- trario, tem apenas 1 millim. de diametro aos 50" da applicação da fava do Calabar consecutivamente á da atropina. As 107/, h. tem ainda 1 millim. e a esquerda 3!/. As 11!'/, h. a pupilla direita vae-se dila- tando e apresenta já 2"/, millim. No dia 18 os dois olhos teem as pupillas normaes. 13.º Observação. — Doente n. 32 da enfermaria de Santo An- tonio, de 33 annos, constituição regular. Olhos normaes; pupillas a 2º/, millim. — Primeira applicação no dia 18 de julho ás 10 h. e 40º da manhã. Um disco de atropina de "/»,o de grão, e outro da fava do Calabar no olho direito. As 11 h., 20' depois, ambos os olhos no mes- mo estado. A's 11!/, h., isto é aos 50' da applicação, a pupilla direita a 1!/, millim. e a esquerda sem alteração. A contracção persistia no mesmo grau 1 h. depois, isto é, pela meia hora da tarde; mas á 1'/, h. as duas pupillas tinham o mesmo diametro de 2'/, millim. 14.º Observação. — Doente n. 1 da enfermaria de S. Miguel. Olhos normaes; pupillas a 4 millim. — Primeira applicação em 18 de julho ás 9 h. da manhã. Uma escâma da fava do Calabar e outra de atropina (! [20000 de grão) no olho esquerdo. 18' depois começo de contrac- ção pupillar; aos 30” pupilla reduzida a metade do seu diametro (2 millim.) O olho direito sem alteração. Aos 35' a pupilla esquerda a 1'/, millim e persiste assim até ás 10 h. em que começa a dilatar-se por fórma a estarem eguaes as dúas pupillas pelas 11"/, h., isto é, 2"/,h. depois do principio da experiencia. 15.º Observação. — Doente n. 48 da enfermaria de Santo An- tonio, de 23 annos, constituição regular. Olhos normaes; pupillas a 3 millim. — Primeira observação ás 10 h. da manhã de 6 d'agosto. Um disco de gelatina calabarisada em cada olho. 20" depois ligeira contracção ; mais um disco no olho esquerdo. A's 10º/, h. a pupilla direita a 2 millim. e a esquerda a 1!/,. 2 gottas de solução mydriasica (2 grãos ou 10 centigrammas de sulfato de atropina por onça ou 30 grammas d'agua distillada) no olho esquerdo. 20' depois d'esta ul- tima applicação a pupilla esquerda começa a dilatar-se, e 10" mais tarde, isto é, ás 11'/, h., está já a 3 millim. em quanto a direita se conserva a 1 millim. A dilatação progride até ás 2 h. da tarde em 16 INVESTIGAÇÕES SOBRE A ACÇÃO que a iris é apenas representada por um circulo de 1!/, a 2 millim., e assim fica estacionaria por todo o dia seguinte, fazendo um nota- vel contraste com a pupilla direita, que a partir das 4 h. da tarde d'aquelle mesmo dia fica com o diametro normal de 3 millim. Es- cusado é dizer a confusão que a vista apresenta quando o doente se servia ao mesmo tempo dos dois olhos, não só quando a pupilla es- querda dilatada e a direita contrahida, como quando esta estava com o diametro normal e aquella com a mydriase; estando a visão distin- cta a distancias diversas para cada um dos olhos, isto é, mais pro- xima para o olho direito e muito mais distante para o esquerdo. No dia 8 é que a dilatação da pupilla d'este olho começou a decrescer um pouco, mas era ainda bem sensivel no dia 9. Só no dia 10 é que as duas pupillas estavam eguaes. 16.º Observação. — Doente n. 29 da enfermaria de Santo An- tonio, de 19 annos, temperamento lymphatico, constituição regular. Olhos normaes; pupillas a 3 millim. — Primeira applicação em 6 de agosto ás 10 h. da manhã. Uma escama calabarisada em cada olho. Decorridos 20' começa a contracção das pupillas: mais uma escama no olho direito. A's 10 /, h. o olho direito a 1!/, millim. e o esquerdo a 2. A's 11h. pupilla direita a 1 millim., a esquerda a 1!/,; 2 gottas de solução de atropina no olho direito. A's 11 h. e 20” a pupilla di- reita começa a dilatar-se, e a esquerda está a 1 millim. A's 11!/, h. pu- pilla direita a 4 millim. A's 2 h. mydriase completa no olho direito ; a pupilla esquerda a 2 millim. No dia 7 o olho direito no mesmo estado de dilatação; o esquerdo a 2 millim. No dia 8 a mydriase diminue um pouco; pupilla esquerda a 3 millim. Só no dia 10 de manhã é que a pupilla do olho direito recupe- rou o diametro normal. D'esta segunda serie de observações deduz-se naturalmente o se- guinte : 1.º Que a contracção pupillar determinada pela fava do Calabar depois da applicação da atropina é geralmente mais morosa em ma- nifestar-se. 2.º Que n'estas circumstancias a contracção persiste menos tem- po do que quando a applicação da fava do Calabar não é precedida da applicação da atropina. DA FAVA DO CALABAR li 3.º Que a mesma contracção pupillar cessa promptamente sub- sistindo a dilatação quando o agente mydriasico empregado é suffi- cientemente concentrado. 4.º Que as duas acções da atropina e da fava do Calabar são manifestamente oppostas, e se neutralisam. 5.º Que o efleito mydriasico da atropina é muito mais persistente e muito mais energico que o effeito myosico da fava do Calabar. 6.º Que a contracção produzida pela fava do Calabar é mais prompta em manifestar-se do que a dilatação devida ao emprego da atropina. A outra serie de observações, em numero de 3, refere-se ao em- prego da fava do Calabar só, ou com a atropina, em olhos em que a pupilla estava mais ou menos paralysada. 17.º Observação. — Doente n. 17 da enfermaria de S. Miguel. Amaurose e paralysia das iris; pupilla esquerda de 4*/, millim., a direita de 4. Este doente com difficuldade podia distinguir os de- dos á visão distincta. — Primeira applicação em 13 de julho ás 9 '/, h. da manhã. Duas escamas de atropina, de '/,oo de grão, uma em cada olho. 20” depois principio de dilatação, maior no olho esquer- do, que aos 30' chegou quasi a duplicado diametro, e aos 45” ain- da a um pouco mais. Este grau de dilatação conservou-se assim por mais meia hora, isto é, até ás 10 h. e */, em que se applicou uma la- mina de gelatina calabarisada sómente no olho esquerdo, que era o mais dilatado. 15' depois não se percebe nenhuma differença. Aos 25' não havendo ainda nenhuma modificação, applica-se no mesmo olho outra escama calabarisada. 20' depois, isto é, ás 11!/, h., sensivel contracção a ponto de ser já menor a pupilla d'este lado que a do lado direito : a pupilla esquerda tem então 3 millim. e a direita 4. A's ll h. e“, quer dizer, 15' mais tarde, a pupilla direita conservando-se a 4 mil- lim., a esquerda está a 2'/, millim. No dia 14 ás 9'/, h. da manhã a pupilla direita está a 4 !/, mil- lim. e a esquerda ainda a 3. No dia 15 os olhos estão como antes da experiencia, isto é, o di- reito com a pupilla de 4 millim., e o esquerdo com a pupilla de 4 '/. millim. [8.º Observação. — Doente da enfermaria de Santa Margarida, com amaurose cerebral e mydriase havia 4 mezes. MEM. DA ACAD. — Í.º CLASSE. — T. ML, P. II. 3 18 INVESTIGAÇÕES SOBRE A ACÇÃO Esta infeliz, Anna Rosa, de 20 annos, temperamento sanguineo, constituição forte, natural da aldêa da Escusa, districto de Marvão, trabalhára no campo, durante 3 semanas, exposta ao sol da primavera, não estando aliás acostumada a trabalho semelhante e n'essas circum- stancias. Começou a doença por dor intensa na cabeça e lados do pes- coço, a que se seguiu fraqueza notavel nas pernas e braços, principal- mente do lado esquerdo, que chegou a estar dormente e sem movi- mento. 15 dias depois d'estes primeiros symptomas experimentou en- fraquecimento rapido da vista por volta do meio dia; á noite apenas distinguia os vultos e no fim do dia seguinte já não via nada. A doente havia estado no hospital de Castello de Vide, onde lhe applicaram san- guesugas, ventosas sarjadas, sangria, vesicatorios, purgantes, aflusões frias na cabeça, sem nenhum resultado. Quando a observámos em 27 de julho a cegueira era completa, não distinguia a luz das trevas, pupillas absolutamente immoveis e dilatadas (6 millim.) O ophthal- moscopio não denunciou nenhuma alteração no interior dos olhos. A amaurose é por isso cerebral, devida provavelmente a hemorrhagia circumscripta a algum ponto da passagem nos nervos opticos, sobre tudo no kyasma. Primeira applicação da fava do Calabar no dia 27 de julho ás 10!/, h. da manhã. Duas laminas de gelatina calabarisada no olho direito. 20' depois principio de contracção da pupilla, muito notavel aos 35", e que aos 60! chega ao diametro de um grão de mostarda preta. No dia seguinte ás 10 h. da manhã ainda a pupilla tinha um millim. menos que a esquerda, sendo aliás antes dilatadas por egual. No dia 31 a pupilla direita está a 5 !/, millim. e a esquerda a 6. Uma nova escama no olho direito. No fim de 25' começo de contrac- ção pupillar que aos 40' chega a 2 millim. 3 h. mais tarde recomeça a dilatação. No dia seguinte os diametros pupillares estão proxima- mente eguaes. 19.º Observação. — O individuo que faz objecto da presente ob- servação foi o primeiro em quem ensaiámos a applicação do extracto da fava do Calabar em 11 de julho d'este anno (1864). Era um doente da minha enfermaria (Santo Antonio) que tinha mydriase symptoma- tica no olho esquerdo. Esta observação é curiosa debaixo de varios pontos de vista, e por isso nos permittimos dal-a menos resumidamente do que as precedentes. Paralysia do motor commum do olho esquerdo: prolapso da pal- pebra superior, estrabismo externo, abolição dos movimentos alternati- DA FAVA DO CALABAR Í9 vos de rotação em torno do eixo antero-posterior, mydriuse, visão muito confusa e turva no olho esquerdo, sobre tudo para os objectos proxi- mos; gomma na parte anterior e média da abobada orbitaria direita; dores osteocopas na cabeca e membros inferiores. Cura depois de 85 dias de tratamento pelo xarope de Gibert, banhos geraes mornos, pomada mercurial e extracto da fava do Calabar. Antonio Maria Pé curto, filho de João Antonio Pé curto, de 27 annos, casado, natural de Moura, districto de Beja, onde residia, de temperamento sanguineo e constituição regular, almocreve, entrou para a nossa enfermaria em 17 de junho de 1864. Ha tres para quatro an- nos havia tido chancros venereos e bubões que suppuraram. Não sabe informar se teve um só ou mais chancros, nem a sua consistencia. Tres ou quatro mezes depois teve ulceras na garganta. Ha anno e meio appareceram-lhe dores no braço direito, e na cabeça ha seis mezes, para que fez tratamento dirigido por facultativo, no qual sabe ter en- trado o iodureto de potassio que tomou por muito tempo. Desde o dia 1 de junho, 17 dias antes de entrar para o hospital, que datam os padecimentos que apresenta actualmente, e que são os seguintes: Prolapso da palpebra superior do olho esquerdo ou blepha- roptose, que cobre todo o globo ocular. Levantada a palpebra, grande dilatação pupillar ou mydriase sem nenhuma mobilidade da iris que está reduzida a um circulo de 2 a 3 millimetros de largura; pupila dirigida constantemente para fóra, constituindo o primeiro grau do estrabismo externo, e impossibilidade de ser levada para cima, para baixo e para dentro, assim como dos movimentos alternativos de ro- tação em torno do eixo antero-posterior do globo ocular. A visão pouco distincta n'este olho, sobre tudo para os objectos mais proxi- mos, pela paralysia do apparelho accommodador. Quando o doente in- clinava a cabeça para a direita havia diplopia, sendo uma das imagens recta e a outra obliqua. O doente tinha ainda dôres na cabeça, mais intensas de noite com o calor da cama; engorgitamento indolente de alguns dos ganglios das partes lateraes do pescoço, proximos da raiz do cabello; e um tumor indolente, duro, elastico, do tamanho d'uma ervilha grande, na parte anterior e média da abobada orbitaria direi- ta, que levantava a base da palpebra correspondente. O prolapso palpebral ou a blepharoplegia era evidentemente o effeito da paralysia do musculo levantador da palpebra superior. O es- trabismo externo e a impossibilidade dos movimentos de elevação, ad- ducção, abaixamento e rotação alternativa do olho, eram certamente o resultado da paralysia dos musculos recto superior, recto interno, 2 3 20 INVESTIGAÇÕES SOBRE A ACÇÃO recto inferior e pequeno obliquo, ficando em integridade o recto ex- terno ou abductor do olho, assim como o grande obliquo ou superior que pela sua parte impedia que a acção do recto externo fosse mais pronunciada e exagerasse o estrabismo, aliás conservado em pequeno grau. A diplopia com as duas imagens, uma recta correspondendo ao olho são, e outra obliqua correspondente ao olho doente, é compa- nheira, como é sabido, da paralysia do obliquo inferior. A dilatação permanente da pupilla, era devida á paralysia da raiz motriz do gan- glio ophthalmico e dos nervos ciliares que d'elle procedem, sob cuja dependencia estão os movimentos da iris. Os precedentes morbidos, e phenomenos manifestados, estavam indicando que a doença era a paralysia do terceiro par dos nervos ce- rebraes, o nervo motor commum, cuja causa organica estava prova- velmente em uma gomma syphilitica na parte da duramater da pa- rede externa do seio cavernoso, ou antes da fenda esphenoidal que o nervo atravessa para entrar na orbita. O doente foi logo no dia da entrada, 17 de junho, submettido ao tratamento mercurial iodurado pelo xarope de Gibert, e ás fricções excitantes de tintura de noz vomica na fronte e tempora do lado es- querdo. Até ao dia 24 de julho não houve de novo senão o apparecimento de dores nos joelhos e braços, em consequencia das quaes o enfermo começou a usar banhos geraes mornos. No dia 11 de julho, 24 dias de tratamento, em que obtivemos o extracto da fava do Calabar em gelatina, de Savory and Moore, come- cámos a usar esta substancia no olho mydriasico. A iris d'este olho estava, como no primeiro dia, paralysada e com uma dilatação de 8 millimetros; a visão turva e confusa. No olho direito a iris estava normal, contractil, e a pupilla com o diametro de 3 a 3//, millim. A's 10 h. da manhã applicámos n'aquelle olho duas laminas de gelatina calabarisada, e ao mesmo tempo instillámos no olho são ou direito duas gottas de uma dissolução de sulfato de atropina de 10 centigrammas por 30 grammas d'agua distillada. 20' depois começava a contrahir-se a pupilla esquerda e a direita estava muito dilatada. Aos 25' a contracção pupillar era muito sensivel, aos 35" o orificio da pupilla estava a 2 millim. e aos 45! estava reduzida a 1 millim. Por esta occasião a pupilla direita tinha uma dilatação egual, senão maior, á que tinha a esquerda antes da experiencia. A" proporção que a pupilla esquerda foi diminuindo de diametro, o doente foi vendo cada vez mais distinctamente, o contrario do que nota em relação ao olho DA FAVA DO CALABAR 21 direito dilatado pela atropina. Estes phenomenos subjectivos são, no primeiro caso, o effeito da acção da fava do Calabar, que antes mesmo de contrahir a pupilla contrahe o musculo ciliar, o qual actua então sobre o crystallino, modificando a curva d'esta lente; e no segundo caso da atropina, que ao contrario paralysa aquelle mesmo apparelho accommodador da visão. A's 3 h. da tarde, 5 h. depois da applicação calabarisada, a pu- pilla esquerda começou a dilatar-se. No dia seguinte á mesma hora, isto é 24 h. depois, achámos o olho esquerdo, em que foi applicado o extracto da fava do Calabar, com o diametro de 3 a 4 millim., e a vista regular. O olho direito, que levou a atropina, estava pelo contrario no mesmo grau de dilatação do dia antecedente e com a vista egualmente confusa. Applica-se a este olho uma escama calabarisada; 1 hora depois, não havendo ainda differença sensivel na pupilla, outra escama ; passada meia hora sem resultado, um terceiro disco; e só 1 hora mais tarde apparece sensi- vel contracção que se conserva até ás 5 h. da tarde, em que o doente, depois de dormir duas horas, acorda tendo já a pupilla no mesmo grau da dilatação anterior. No dia 13 ás 10 h. da manhã a pupilla, que se fóra dilatando de novo desde a vespera, tem a dilatação que se lhe observava antes da applicação da gelatina calabarisada. A direita ainda dilatada. A vista enfraquecida e confusa quasi por egual nos dois olhos. A's 10!/, h. uma escama calabarisada em cada olho; meia hora depois leve con- tracção nas duas pupillas, mais pronunciada na esquerda. Aos 40" pu- pilla direita a 3*/, millim., esquerda a 2; aos 60" a primeira a 27/, millim. e a segunda a 1. É para notar que a palpebra superior es- querda, que estava completamente paralysada, começou a ter alguma acção e a contrabir-se depois da primeira applicação da fava do Cala- bar, tornando-se este cfleito mais sensivel depois de cada nova appli- cação. Duas horas depois, o olho esquerdo conserva a pupilla com o diametro de 1 millim.; mas a direita começa a dilatar-se por fórma a estar já a 5 millim. pelas 5 h. da tarde. Por esta occasião a pupilla esquerda começa a estar menos contrahida. No dia 14 pelas 10'/, h. da manhã a pupilla direita estava a 5 millim. e a esquerda a 3. Applicam-se duas escamas do extracto da fava do Calabar no olho direito sómente. Momentos depois grande ar- dor no olho, que cessou em dois ou tres minutos. Um quarto de hora depois começa leve contracção na pupilla, que aos 30” está a 4 mil- lim., e aos 45'a 3 as Meia hora mais tarde, o olho esquerdo, a que 22 INVESTIGAÇÕES SOBRE A ACÇÃO se não fez nenhuma applicação, como o direito, estão com o mesmo diametro nas pupillas, isto é a 3 millim. Mais 30” depois a pupilla do olho direito estava um pouco mais contrahida, isto é a 2 millim. No dia 15 a pupilla esquerda tem 3*/, millim. e a direita 4. Até ao dia 19 continuámos pela mesma fórma as applicações do extracto da fava do Calabar, com resultados sensivelmente semelhan- tes; e repetimol-as ainda no dia 3 d'agosto, estando a pupilla esquerda com 3*/, millim. e a direita com 4 antes da applicação; e ficando de- pois do dia 4 as duas pupillas com os diametros de 3 millim. appro- ximadamente. Desde então não se fez mais nenhuma -applicação cala- barisada. O doente continuou a usar o tratamento interno anti-syphili- tico pelo xarope de Gibert, e a applicar a pomada mercurial no tumor da raiz da palpebra, com o que as melhoras foram sempre progre- dindo. Em 10 de setembro de 1864, isto é, 84 dias depois de haver entrado para o hospital, saiu curado, com a pupilla esquerda regular- mente contrahida e contractil, movendo bem o olho em todos os sen- tidos, sem dores, com o tumor desvanecido e tendo excellente appe- tite. Das tres observações precedentes, e sobre tudo das circumstan- cias occorridas no ultimo facto com o uso da fava do Calabar, infe- re-se o seguinte: 1.º Que o extracto da fava do Calabar actuou contrahindo a pu- pilla dilatada pela paralysia, pelo menos tão facilmente como quando é applicado nos olhos normaes. 2.º Que a duração do effeito myosico não foi menor do que quando não ha mydriase por aquella causa. 3.º Que o medicamento actuou simultaneamente sobre o appa- relho accommodador do olho esquerdo do ultimo doente, restituindo a clareza e a distincção da vista na proporção em que a pupilla se contrahia. 4.º Que a acção da fava do Calabar no doente da observação 19.º, pareceu estender-se por absorpção até ao nervo paralysado, favorecendo a cura da blepharoptose e da paralysia dos musculos recto superior, interno, inferior e pequeno obliquo. 5.º Que a cura da molestia do mesmo enfermo, e a sua persis- tencia, se deve muito no caso sujeito ao tratamento especifico mercu- rial e iodado convenientemente prolongado como foi. DA FAVA DO CALABAR 23 As 2 observações que se seguem referem-se ao uso do extracto da fava do Calabar na hernia traumatica da iris. 20.º Observação. —F., de 70 annos, lymphatica, constituição regular, solteira, moradora em Arroios, operada de cataractas por ke- ratotomia inferior em outubro de 1864, appareceu-lhe hernia da iris do olho esquerdo ao oitavo dia da operação, que foi quasi completa- mente reduzida a benefício da applicação de quatro discos de gelatina calabarisada, empregados em dias suecessivos, sendo dois no primeiro dia, com os quaes conseguimos a reducção de dois terços, e outros dois no dia seguinte que fizeram recolher mais uma pequena porção, não se conseguindo a reducção completa por motivo de adherencias. 21.º Observação. — F., de 46 annos, temperamento sanguineo- lymphatico e boa constituição, casada, moradora ás Janellas Verdes, foi por nós operada de cataractas por keratotomia inferior em outubro d'este anno. Ao quarto dia da operação não se tinha unido ainda o retalho da cornea esquerda, e via-se a iris fazendo hernia através dos labios da ferida na sua parte inferior e externa. A applicação de dois discos de gelatina calabarisada fez contrahir e recolher a iris, por fór- ma a ter desapparecido a hernia no dia seguinte em que o olho foi de novo observado. D'estas duas observações se conclue a vantagem com que o ex- tracto da fava do Calabar, pela propriedade que tem de contrahir a pupilla, é empregado na hernia da iris em que não ha adherencias, ou quando estas são pouco fortes para cederem ao estiramento da iris. Não foi nosso fim estudar a acção da fava do Calabar senão na parte relativa á sua influencia sobre os olhos; todavia, tendo sido em- pregada internamente em dois casos de epilepsia pelo nosso collega o sr. Eduardo Augusto Motta, vamos apontar em seguida as duas res- pectivas observações, que devemos á condescendencia do distincto de- monstrador de medicina da Escóla Medico-Cirurgica de Lisboa. 22.º Observação. — Luiza Maria, de 25 annos, solteira, creada de servir, de temperamento sanguineo, constituição forte, estatura alta, entrou para a enfermaria de clinica medica da Escóla em 16 de julho de 1864 e saiu com apparencia de melhora no dia 12 d'agosto. 24 INVESTIGAÇÕES SOBRE A ACÇÃO Padecia ataques epilepticos havia 5 annos, tendo-os de 8 em 8 dias, mais raras vezes de 15 em 15 dias, e só em uma occasião com inter- vallo de um mez; alguma vez chegou a ter 5 por dia. Tinha aura estomacal. Fez tratamento fóra do hospital, que consistiu em prepa- rados de ferro, e uma vez na applicação de dois vesicatorios. Começou a fazer uso da fava do Calabar em pó no dia 19 de ju- lho, tomando por dia duas pilulas, tendo cada uma um quarto de grão do pó. A dóse foi-se augmentando gradualmente até tomar doze grãos diarios por espaço de tres dias. Em presença do tratamento a doente nutrio mais, sentia-se bem, e no dia 12 d'agosto pediu alta visto não ter o mal havia perto de um mez. Durante a sua estada no hospital só teve um ataque forte no dia immediato ao da entrada. Não pare- ceu que as pupillas fossem influenciadas pelo uso interno da fava do Calabar, apesar de chegar a 70 '/, grãos a quantidade total de pó to- mado pela doente. 23.º Observação. — José Luiz da Silva, de 18 annos, solteiro, servente de pedreiro, de temperamento lymphatico-sanguineo, consti- tuição fraca, entrou para a enfermaria de S. Roque em 15 de julho de 1864 e transferido em 26 do mesmo mez para a clinica da Es- cóla, d'onde saiu no mesmo estado no dia 29 d'agosto. Padecia havia tres mezes ataques epilepticos, um por dia, repeli- dos de dois em dois ou de tres em tres dias, precedidos de aura esto- macal, e constando dos tres estadios bem caracterisados (grande mal). No hospital, até ao dia 26 de julho, fez uso de purgantes, clyste- res, antispasmodicos, sinapismos etc. No dia 26 começou a fazer uso da fava do Calabar em pó debaixo da fórma pilular. Começou por tomar dois grãos por dia em duas pilulas. Augmentou-se successivamente a dóse até chegar a tomar dezeseis grãos por dia, que por fim era tole- rado pelo estomago com difficuldade, vindo a tomar ao todo 194 grãos. Nos primeiros tempos da administração do remedio os accessos distanciaram-se mais, chegando a haver esperança de algum resultado satisfactorio; mas depois voltaram como d'antes. Este, como a pri- meira doente, engordou; além d'isso de melancolico que era tornou-se alegre e esperto, achando-se, como elle proprio dizia, mais leve depois que tomava o remedio. O seu estado geral melhorou pois muito sem que se podesse attribuir a condições hygienicas differentes. Nos dia- metros da pupilla não notou o sr. Motta diminuição alguma, apesar de observar o doente um quarto de hora, meia e uma hora depois da ingestão das pilulas e nos dias seguintes. DA FAVA DO CALABAR 25 Nºestas duas observações, em que o pó da fava do Calabar foi “administrado internamente, vê-se que a dóse do medicamento foi ele- vada sem inconveniente de meio grão a dezeseis grãos por dia, che- gando uma doente a tomar 70 '/, grãos em 24 dias, e um doente 194 grãos no espaço de 34 dias; que as funcções de nutrição pareceram, ao contrario, beneficamente influenciadas; que a pupilla nao teve al- teração sensivel; e emfim que a epilepsia, contra a qual esta substan- cia se empregou, não foi mui notavelmente modificada. Não tem sido só contra a epilepsia que se ha aconselhado e usado a fava do Calabar. Tem-no sido ainda em outras affecções espasmodi- cas do systema nervoso, em que convem calmar os espasmos muscu- lares sem affectar a intelligencia, taes como, entre outras, a choréa e o tetano, com o fundamento de que a fava do Calabar actua sobre os nervos motores paralysando-os, sem exercer influencia sobre o ap- parelho nervoso central, nem sobre a irritabilidade muscular, como é demonstrado pela experimentação physiologica. Os resultados já obti- dos na choréa pelo dr. Harley, que vieram publicados no Medical Ti- mes and Gazette de 16 de janeiro d'este anno e no Journal de Vana- tomie et de physiologie, de Brown-Sequard et Robin, do mez de marco d'este mesmo anno, são sobre tudo animadores para continuar novas tentativas. Não tendo sido o nosso fim, como já dissemos, senão verificar pela propria experiencia os effeitos locaes da fava do Calabar, que os jornaes estrangeiros tem ultimamente annunciado, damos aqui por ter- minda esta nota em que descrevemos as nossas observações. Lisboa, 15 de dezembro de 1864. à. M. BARBOSA. ne MEM. DA ACAD. — |," CLASSE. — T. UI. P. II. y nt py 4 E] 7: o 1 tr E AMT + [ [+ £| Hi Dis TE Th) ] - fo | taty A BRA 401 P k Mo! y IR peca ati noob Biro Dr Ra Opera omnia, t. 11, p, 445, Lugduni, 1649. A DIABETE 49 tur ; mas deve confessar-se que, embora negada por P. Frank !, appa- recem alguns casos de anorexia, como observaram Sagar 2, Alibert *, Lima Leitão *, Girard *, Trousseau *, Bonnefous, Aran ”,e nós mesmo ultimamente. Segundo o sr. Fauconneau-Dufresne * não é raro observal-a em Vichy; Hecker viu-a alternar com a bolimia. Paulo de Moraes Leite Velho ?, William Wats ”º e Picard ! acharam o appetite natural em tres casos, sem augmento nem diminuição ; e Schoenlein pretende que elle está na razão inversa da sêde, o que nos parece insustentavel em presença das experiencias que n'um doente fizemos, e deram o seguinte resultado : 8 Dias Comida Liquido tomado Rs ROO erammass 20 DO terammas ELEDA DCE DUO 1:086 DO SED O QUSA 11:605 » SEL LD 1:060 Do EMUNA O ro ade O ISO » ds a 1:179 E dO LER Ra 10:361 » BRA, SUMA o 96 » SEDES Alado PAO Et ADS » GR E 1:040 o in 8:440 » TIA 1:102 DA AO A DC SD 10:597% » Ontipao sed l:116 » ane ei ANSA » O Es 1:309 » EEN. eo 112: 2:37 » NOME i:499 » Nro Pre 12:436 » Ile os 2 Bis DO!S » ps a DE AO » EQ A o ne 1:537 DAM AA Ape 10:481, » Sia lo vera en aio A IO) » ERR EIPRO Ret SA) » | ED 1:584 DIAL I= es Sara 9:433 » se sé go pe LEE » ato as 9:064 » DE asoro ereto IS o] PA RE Ra RA E E 12:032 » Como quer que seja, é facto que o augmento de appetite é fre- 1 Epitome de cur. hom. morb., 1797, lib. v, pars. 1, pag. 43. * System. morborum. pag. 347, Vienna, 1776. 3 Nosol. natur., Paris, t. 1. 1817, pag. 190. * Esculapio n. 16, pag. 65. Lisboa, 1849. ? Union médicale, pag. 375, 1855. Clinique méd., t. 11, pag. 576. 7 Abeille médicale, 1860, pag. 235. 8 Guide du diabétique, Paris, 1859. º Jornal de Coimbra, 1816, t. vt, pag. 46. 10 The Lancet, junho, 1848. 1 De la présence de I'urée dans le sang, Strasbourg, 1856, pag. 55. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. HI. P. IL. q 50 ESTUDOS SOBRE quente no nosso paiz; no Brasil porém, segundo o sr. dr. Aquino da Fonseca, a bolimia não é commum. Tem-se dito que os diabeticos preferem os feculentos e o assu- car a toda e qualquer substancia; e o sr. Bouchardat (que sem fun- damento se apresenta como descobridor d'este phenomeno, muito tempo antes delle já descripto por Dusscaux *) tem observado casos em que esse gosto pelos feculentos chega a ponto do doente comer batatas e amido cru. Não podemos de modo algum admittir, apesar das observações dos srs. Bouchardat e Requin, que este gosto caracteristico pelas sub- stancias amylaceas exista nos diabeticos ; nos casos que temos observado, a não ser em um, temol-o sempre visto faltar, havendo mesmo n'outro o aborrecimento do assucar, circumstancia que o sr. Bourdel de Mont- pellier tambem notou. Estes factos, a segunda observação de Rollo, e as dos srs. Phara- mond 2, Monneret * e Auflan * vem confirmar o nosso sentimento. Parece-nos que a razão por que os doentes desejam o pão e o pedem a cada momento, é antes o resultado, quasi sempre, de um habito do que da depravação especial do gosto. Os individuos acostumados a comer pão desde a infancia, devem necessariamente soffrer com a privação d'este alimento, e sentir desejo de o tomar, porque em geral soffre-se com a mudança de alimentação a que se está habituado. Além d'isto, o systema seguido para demonstrar a pretendida pre- ferencia pelos feculentos é errado, porque se começa por submetter a uma dieta, completamente animal, o doente que em virtude do prin- cipio acima estabelecido, deseja e pede pão com instancia; concluir então sem mais reflexão, que o doente tem um gosto especial pelo pão, é observar mal, pois se qualquer de nós fosse sujeito por algum tempo a uma similhante dieta, faria o mesmo que esses diabeticos, e nem por isso se diria que tinhamos preferencia por aquella substancia. Procedendo-se d'um modo difterente do geralmente seguido, isto é, pondo á discrição do doente o pão e a carne, veremos então que elle quasi sempre toma de uma e outra substancia alternativamente, sem por modo algum deixar a carne, o que não aconteceria se hou- vesse a pretendida preferencia. 1 Diss. sur le diabete, pag. 16. Paris, 1835, n. 249. 2 Loco citato, pag. 116. 3 Arch. gen. de méd., 1839, t. vI, pag. 300. t+ Du diabête sucré. Strasbourg, 1859, pag. 35. A DIABETE 51 Estas ideas, que expozemos em 1857 !, e que posteriormente (1861) o sr. Fauconneau-Dufresne adoptou completamente, acabam de ser con- firmadas em dois doentes que ultimamente observámos; um d'elles mui- tas vezes nos pediu para lhe trocarmos uma porção de pão, que de pro- posito lhe davamos em grande quantidade, por outra porção de carne; outro preferia a tudo o presunto. Que haja casos de preversão do gosto não o duvidamos ; Prunelle affirma-o, e Frank viu-a num doente que appetecia carne crua; outros tem até visto o gosto pelos feculentos; mas que a preversão seja só e sempre (como quer Bouchardat) no sen- tido das substancias amylaceas, é uma verdadeira illusão d'este auctor, identica á que o levou a affirmar que os individuos atacados de oxalu- ria tem um gosto decidido pelas azedas! Da parte do sr. Bouchardat ha na realidade uma tendencia decidida pelas exagerações.— É neces- sario por ultimo acrescentarmos que conhecemos individuos gostando muito de feculentos e assucar, sem por isso serem diabeticos. Do que levamos dito se póde conhecer, que nenhuma importancia ligamos á explicação do sr. Mialhe ? sobre o gosto pelos feculentos, suppondo que os diabeticos saturados de humores assucarados, não po- dem conhecer o sabor do assucar senão tomando-o em dóses conside- raveis; uma tal conjectura nada explicaria, quando realmente existisse aquelle gosto pelos feculentos. G 13º 4 séde N'esta doença a sêde é geralmente excessiva, sendo um dos sym- ptomas que primeiro chama a attenção dos praticos, como já reconhe- ceram os antigos; Areteo, por exemplo, na sua bella descripção da diabete (sitis intoleranda, potus copiosus) e o nosso Zacuto * (siti in- compescibili vexantur). A quantidade de liquidos tomados é muito variavel, como se vê do seguinte quadro, aonde a par dos observadores indicâmos as maio- res quantidades que cada um d'elles tem visto beber : ! Loco citato, pag. 22. * Chimie appliquée a la physiologie, pag. 86, 1856. 3? Opera omnia, t. 11, pag. 445. 52 ESTUDOS SOBRE Tacutodtal e etded Sal Slade “... 45:000 grammas Mirza: Reza-ben-Mokim 2........ 33:000 » Landrazim casa enlatado go vo E 25:000 » Abel Jordão... .............. 24:000 » Elaase sia serias spot ca Es no Is 20:000 » Du fones pib Seia MELO SAO cab 16:000 » Hildanus; ess age o e ota 15:000 » PÁTIO peso lb pe esTO Ne. a praga pe SE DO » Dolbeau *..... ARE DP TR RI E ED 15:000 » JamesyjG ray subir aii So 13:650 » MB iuda Graça bo dede RR Do 10:000 » Abelilordão ez ts sdegesbita re adess 10:000 » Monteiro de Portalegre ........ 9:000 » Contoni VR: setuoesdrs sato 7:000 » AbplEVordio Ca RR 4:250 » Estas quantidades variam no mesmo doente em differentes dias; no doente que nos deu em maximo 4:250 grammas, achámos em mi- nimo (vespera da morte) 1:000 gr., e no que deu em maximo 10:000, o minimo foi de 6:000, havendo entre os dois termos as variações se- guintes : Eesedial sr des store 9000 prammas dO RR PARA 6 ola 8:500 » E EEN JA BR TR 9:000 » EA sao DS a ad au GOO » ES MA Ra e Ras MEN A 9:500 » 65 upa e des RE 6:000 » RAM Te O agem bro Ec Eat ro RES AU) » Fo NDA STA Ce ER 2 DA 8:000 » ! Fere nonaginta libras. Prax. med., lib. 11, obs. 91. 2 De la polyurie, Paris, 1860, pag. 35. 3 Thése pour le doctorat. Paris, 1860. 4 Loco citato. 5 Arch. gen. de méd., 1861, f. 69. º Obsery. med. chir. cent., 5 obs. 63. 7 Abeille médicale, 1860, pag. 235. $ Fischer, Arch. gen. de méd., Septembre, 1862. º Monthly journ. of medic. science, 1852. 10 Tratado da diabete, pag. 68. 1! Considérat. sur un cas de diabête, pag. 24. 12 Du diabête sucré, Thése, Paris, 1854. A DIABETE 58 OL re. si 110:000) grammas BON mA ones ota 3 0000 » a Spiral 9:000 » AURA Va) Rea rS LIA ey tea 8:000 » Sao ara pra arts nao TOO » EAD ER op pç cs STO OO » Sega or Mep ateste ais GD » LG go o ppa ROSS » Do exposto se vê até que ponto podem elevar-se os liquidos in- geridos ; e ainda assim, é sem contarmos os que são introduzidos com os alimentos, porque então ainda é superior a sua quantidade, como vi- mos n'um doente ! em que o total dos liquidos ingeridos foi de 12:436 grammas, maximo, e de 8:480, minimo, quantidade quasi igual á ob- servada por Dupuytren e Thenard (12:894 ou */, da massa total das comidas e bebidas.) Entre aquelle maximo e minimo houve n'esse doente as quanti- dades intermediarias que passamos a indicar : [dias =. o rara RIR gramas; SPO e A E RE Ro aa 10:605 » De O SPA VQLDIO DIO DD OO 11:162 » apa ua ORE An oo NO O » DS Ae SS SR sra errar o secas 9:809 » (EMOS, o OS 8:440 » PO OCR BRAS do bestas o [SS ao 10:597 » ico eo o bao Qlo Color 10:266 » 9.º io Gb DD BlQe Cro EB] » TE Men AE a ares po qu 12:436 » Migas dão sementes oro, PS DÃO » MOS ds ais 6 ui e are EAN » TS PR o ras ars LEO) » A A iso E e DEDO MEI » E aa D A er a ris rei ADEGA » DOSE MM agr gi es 12:032 » Em regra geral a séde, é sempre mais forte á tarde e á noite, como exactamente notou Reil ?, e tambem em certos casos especiaes 1 Considérat. sur un cas de diabéte, pag. 23. 2 Ueber die Erkennt. und Cur. der Fiber, Bd. rm. 54 ESTUDOS SOBRE no momento da menstruação ou depois de commocções moraes, como viu o sr. Fauconncau-Dufresne, e já tive occasião de verificar, Rubeus !, Sylvaticus ? e William Watts º, viram porém n'alguns casos ficar a sêde normal; o que não admira se as observações foram feitas em in- dividuos em via de cura ou nas proximidades da morte, porque em ambas as hypotheses ou diminue ou torna-se natural. Mundinus falla tambem de uma rapariga diabetica que aborre- cia os liquidos como uma hydrophoba ; esta observação, attribuida por alguns a Trnka, e por outros a Morgagni, não tem sido verificada por auctor algum moderno, que nós saibamos. E facto que alguns casos existem em que a sêde tem ficado quasi no seu natural ainda mesmo nos periodos mais elevados da doença. Sobre a causa da sêde na diabete tem havido diversas opiniões. Prout e Elliotson a filiam na acção exagerada dos rins; William Watts, pelo contrario, julga-a symptomatica de uma lesão da innervação ; e o sr. Jangot pensa que a diminuição da agua do sangue e o augmento da densidade d'este pelo assucar são a causa do phenomeno. Bouchardat emfim, e com elle o sr. Schutzenberger *, crê que os liquidos ingeridos estão em relação com a quantidade de fécula intro- duzida no organismo: assim, diz elle, para 500 grammas, de fécula bebem-se 3:500 de agua, isto é, uma quantidade quasi egual á neces- saria para converter no laboratorio o mesmo peso de fécula em gly- cose, vindo a fécula a estar para com a sêde como 1: 7. Os resultados que obtivemos n'um doente dão um desmentido a este modo de ver *. Durante 16 dias a fécula tomada e os liquidos bebidos estiveram na relação que passamos a indicar : Dias Fécula Bebida Proporção ERRA d09,0S Eeimmas. cc | ODDS 1520 Do DD » Ra O OR DE E E SAS So va o e ADA » aaa RB agree tiro LSD) RA PA 341,26 » par Sto JO RO NUA dE Dr TD) AR aa 0) » Epa ata AUTO RE RR 0 OE E SOR SA » RR ROO OU) ARE RaR E RU lero TES Mad 319,89 » ra SEO OE RR DS ds ron o ADAM » ERR SA BAR O 0 A e 1 Noct. exerc. in hist. med., exerct. x11r, pag. 174. 2 Consult. et resp. med., cent. rr, cons. 41. 3 The Lancet, junho, 1848. 4 Gazette méd. de Strasbourg, 1855. 3 Considérations sur un cas de diabete, pag. 14. A DIABETE 55 Dias Fécula Bebida Proporção 9... +. 0402,6% grammas. . ...: V0000S- A ak MO o, 495,82 O DA Pera Os 000 a 1:20 RAS, 507,78 DR pero MS 9000. 1:17 |1:248 BU 2 DN e: SE 000 PR Leis IR) DOI Os 502,01 » SUNS SE TOMO 2 ua nte 1:13 RA ct. 503,65 DR URL sa tis TODA rn o = oie) MES a 5/0250] » SAR ALTA So DRESS LDU) Fa AA VE A LD 496,64 DAMA fenda lo totais VAO OMR 15119 O resultado não será mais favoravel se considerarmos só como bebida a tisana, e não contarmos, como acabamos de fazer, 1:000 gram- mas de limonada nitrica que o doente tomava, diariamente, como re- medio ; n'esta hypothese os algarismos seriam : Dias Fécula Tisana Proporção 1.... 309,08 grammas.... 8:000 grammas.... 1:25 do BAD) » ao o USO) » Baco NEM Sb 4 mol le! » A S:000 » antiDA voo DEMO » nove US) » RED O Rua E 0 » 83900 » Sta O) (area LESTE » 2 52000 » ste Bit Toa do DUO » nao TÃO) » o EVA] Gr 926,01 » soa TAN) » Era DA] 9. 4025611 » E IEOOO » 1 290 10.... 495,82 BETE 9:000/114 15 ERIEdIS ils ator OT ATio) » RR Ss OO » E litio NA ale EA A » a bos e TD) » sv baile! Meda eo ERA] » OS ONO » Ieilãl Te4t ms 503,65 » SR Os DO » IS! Nos 502501 » 3 a oo DDS) » Leto Ha e 496,64 » D aledo tg) » oil Se em logar de compararmos a quantidade da tisana e da limo- nada nitrica, ou a da tisana só por si com a da fécula, fizermos en- trar no calculo todos os liquidos tomados, isto é, vinho, caldo da sôpa, tisana, limonada, etc., o resultado não será mais favoravel ás idéas do sr. Bouchardat. 56 ESTUDOS SOBRE Dias Fécula Liquidos tomados Proporção 1.... 309,08 grammas. ... 11:071 grammas.... 1:37 DMR 300,28 » 0:60 » o SS? be ap Ai » So Ibis) » so go Is3y4! 4... 941,26 » .... 10:36] » Sa0a Ia) Bh iE () » 95:00 9:808 » a895a 0 Doo io » SEA O » JE29 Ms do Nos) » Bm o AMD TA » ES 817 1526,08 » ova NV » 5 sGgil 9. HORE6A » so sa UBBB » & DiEdO OBS o Lda » a gr Sh BEE » E ils TESS, » da nã Melo » 5 1228] 2 SD » so vo DRA » Ss HSM abs so DDD » sta na DE ADO » > baila NS 05400 » do ga 1 Og ia)a) » - J:is Ss 50270 v ER IE UIGA » . J:is 16.... 496,64 » vo 05 NZD » 5 HeDA Resumindo pois teremos que todas as proporções achadas entre a fecula e as bebidas foram LES [:28........ |9 RE AP A à LDA NR a Rs: pero pib 1 vez On RE É LE SA er e RE RD PRM IRENE IDR DS POR O DES e rmdeo lo LRC o ERR, PR OP) TE 29 io co EP RD SA ES 1E:28>> PAM LR DRE Die 15265 2 De DS LE20. 3» RR : 1724 4» AA cr Do exposto vê-se que o maximo da proporção, entre a fécula e a tisana (que era dada como bebida ordinaria) foi de 1:25 e o mini- mo de 1:11; que entre a fécula e a tisana com a limonada o maximo foi de 1:29 e o minimo de 1:12; que entre a fécula e todos os liqui- dos tomados o maximo foi de 1:37 e o minimo de 1:18; e emfim que o maximo entre todas as proporções achadas foi de 1:37 e o minimo de 1l:tl. A DIABETE 57 As nossas observações não são por tanto favoraveis ás idéas de Bouchardat, mas vão de accordo com as experiencias que este mesmo auctor fez sobre cães; porque, dando fécula e diastase a alguns d'estes animaes, não viu manifestar-se a sêde. De resto a observação clinica mostra que os diabeticos submettidos a uma dieta animal rigorosa tam- bem teem séêde. Mas qual será a verdadeira causa da sêde excessiva na diabe- te? Como vimos, a explicação do sr. Bouchardat não satisfaz; a de Prout e Elliotson não passa d'uma stmples hypothese ; a de Watts, com quanto nos pareça verdadeira, julgamol-a com tudo insufficiente por- que o phencmeno é de si complexo; a de Jangot tem tambem um fundo de verdade, e acaba de ser reforçada pelas experiencias do sr. Mandl sobre o poder osmotico do assucar, porém, pela mesma razão que de- mos a respeito daquella, parece-nos insufficiente. As de Watts e de Jangot reunidas, talvez se deva recorrer para ter a explicação do phe- nomeno ; não queremos com isto resolver o problema; ás investiga- ções futuras é que pertence achar o x d'esta equação. $ 14.º Bocca A bocca exhala ordinariamente um cheiro particular e nausea- bundo, notado principalmente pelo sr. Durand-Fardel, e comparado por Latham ao de feno *, o que nos parece inexacto, porque a sensação que temos tido é a d'um cheiro a iode. As gengivas são pallidas e molles; algumas vezes porém appa- recem vermelhas, fungosas, dolorosas, e sangrando facilmente, como temos visto, e igualmente notam Oppolzer * e Hill-Hassal ?. N'alguns casos ulceram-se nos bordos dentarios, lançando pus á menor pressão, como diz Bardsley * e o temos verificado em dois doentes. Os dentes algumas vezes, sobre tudo quando a molestia tem feito progressos, não estão bem presos ás gengivas, acham-se abalados e caem facilmente: já vimos um doente perder sete em dois annos de doença, e Home refere a perda de dezeseis n'um espaço de tempo mui curto, mas que não determina. Estas lesões dependem, quanto a nós, de uma inflammação, que, partindo do bordo das gengivas se propaga 1 Facts and opinions. 2 La clinique européenne, 1859. 3 The Lancet, 1859. * The Cyclopedie, London, art. diabet. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE, — T. HI, P. II, 8 58 ESTUDOS SOBRE até aos alvéolos: não cremos que a explicação esteja principalmente nos contentos da saliva, mas antes na tendencia inflammatoria que existe n'esta doença, segundo vimos, fallando da pelle. As odontalgias, que se manifestam muitas vezes, são resultado da caria dentaria, procedente da acção dissolvente do acido lactico da bocca, e muco boccal sobre a parte calcarea como quer Falck. A expli- cação do sr. Larez, que suppõe a decomposição do assucar no esto- mago em gazes, e a acção d'estes sobre os dentes, parece-nos falsa. As experiencias d'este medico, relativamente ao contacto prolongado de uma solução de assucar sobre os dentes, e á perda consequente da parte calcarea d'estes, apesar de não serem confirmadas pelo dr. Fici- mus, de Dresde, parecem-nos verdadeiras; e a razão da differença dos resultados obtidos por estas dois auctores não é a natureza da agua, como pensa o sr. Favrot, mas o ter havido nas experiencias do sr. La- rez a transformação do assucar em acido lactico, de cuja acção sobre a parte calcarea, e não dos gazes, elle deveria ter deduzido a caria ; de facto as experiencias do sr. Mantegazza de Pavia ! mostram que o assucar destroe os dentes, pela sua transformação em acido lactico. A lingua no principio da doença conserva-se humida e natural, torna-se depois um pouco mais secca, como temos observado com Op- polzer, e manifesta um revestimento esbranquicado no centro, conser- vando os bordos rubros. Alguns auctores, entre elles Fournet ? e Bou- chardat, dizem porém tel-o visto, um pouco escuro *: e Wolff e Krimer affirmam até tel-o encontrado côr de ébano. Tenho visto em alguns ca- sos que a lingua se torna por extremo aspera, assemilhando-se á lingua de gato, e tendo ás vezes verdadeiras rachas. A fórma com que a lingua se apresenta é constantemente espalmada. As aphtas tambem ás vezes apparecem n'este orgão e nas pare- des da bocca ; P. Frank notou já este symptoma * (pustulas ad linguam et labia), e vimol-o mui pronunciado n'um doente que tratámos em Paris >. O sr. Hub. Boens diz ter observado tambem a manifestação de sapinhos º*. Temos notado que a mucosa boccal é quasi sempre aspera, prin- cipalmente na aboboda palatina, parecendo ter sido sujeita á acção do 1 Presse méd. belge., 1863, pag. 17. 2 Arch. gen. de méd., 1835, t. xxxvir, pag. 257. * Hufeland's Journ. 1810, sect. x, pag. 118. * Epit. de cur. hom. morb. 1797, lib. 1, pars. 1, pag. 44. * Considérations sur un cas de diabete, pag. 25. º Presse méd. belge, 1860, n. 19. A DIABETE 59 tannino, e além d'isto que o seu epithelio se destaca facilmente por pontos, formando verdadeiras manchas esbranquiçadas que fazem lem- brar um pouco as aphtas. A boeca está quasi sempre sêcca, como já escrevia Areteo (os hu- more privatur) e repetia Avicenna (cxsicatur os et labia), sendo erro de Zipp * affirmar a existencia de salivação no principio da doença. A saliva torna-se, como advertiram Areteo e o nosso Zacuto*, al- bam et spumantem, e muito viscosa, como diz Graça * e o temos no- tado. É alcalina, como mostram as nossas experiencias e as dos srs. Andral e Bernard ; as observações de Naumann, Gemmaro Festeggia- no *, Dumas e Bouchardat, que a viram acida (em resultado da sup- pressão de transpiração, segundo elles), são erroneas, porque não at- tenderam a que a acidez é devida ao muco, e ao acido Jactico o que se póde facilmente verificar lavando previamente a bocca e obtendo a saliva pela raiz de pyrethro. Segundo Lehmann * e Falck º ella contém acido laetico, mas a nosso vêr é só depois da fermentação do assucar na bocca. Um principio que achámos n'um diabetico foi o sulphocyanureto de potassio, mas a sua presença, a ser verdadeira a theoria de Longet, nada offercce de extraordinario, porque este sal, descoberto por Trevi- ranus ” na saliva, n'ella se acha normalmente, segundo aquelle phy- siologista, que tem por falsa a opinião de Eberle *e Bernard, que elle é anormal. Não tendo dosado o sulphocyanureto, não podemos por isso comparal-o com as quantidades que teem sido encontradas normalmen- te; a saber: Jacubowitsch ?.. ..... cc... 0,006 por 100 Mira BA. aero deganO, DO BO pri Lehmann !! ........ 0,0046 a 0,0089 - » ! Hufeland's Journal, 1827, vir, pag. 13. 2 Opera omnia, t. 11, pag. 445. 3 Tratado de diabetes, pag. 29. 4 Observatore medico, fevereiro, 1851. º Lehrb. der physiol. Chem. Bd. 1, s. 98. é Deutsch. Clin., n. 3. 7 Biologie, t. 1v, 1814, pag. 330. 8 Physiologie der Verdauung, Wurzbourg, 1834, pag. 36. * De saliva dissertatio, Dorpat, 1845. to The Lancet, 1842. H Lehrbuch der physiol. Chemie, 1850, 60 ESTUDOS SOBRE Mas a saliva dos diabeticos conterá assucar ? Vauquelin e Segalas !, os srs. Vernois * e Bernard * não o acha- ram, e este ultimo julga isso impossivel, por não ter nunca nas suas experiencias physiologicas passado pela saliva o assucar injectado nas veias. Em contrario porém a estes factos e opinião, estão a observação de Rollo, que achou na saliva um sabor doce, e as experiencias de Mac- Gregor *, Martin Solon, Contour *, Grisolle *, Lehmann”, Guitard * e as nossas * que demonstram a existencia do assucar. Além d'isso, em opposição á proposição geral de Bernard, de que em caso algum o encontramos na saliva, estão as do sr. Righini !º, que por meio do fer- mento o reconheceu na dos individuos que tomavam iodureto de ferro aloetico. Para melhor se julgar da importancia das nossas experiencias, des- crevel-as-hemos com todos os pormenores. Fizemos por tres vezes se- guidas lavar a bocca ao doente (duas horas depois de almoço), e demos- lhe a mastigar uma pouca de raiz de pyrethro ; passado algum tempo obtivemos 1() centimetros cubicos de saliva, tratamol-a pelo carvão animal, tendo-lhe juntado préviamente 30 centimetros cubicos de agua distillada, e filtrámos. Depois ensaiámos pelo rcactivo do sr. Bernard o liquido filtrado, e vimos que não havia uma perfeita reducção, mas que uma ligeira tinta amarella esverdeada apparecia claramente. Cal- culando que o reactivo tinha sido junto em excesso, e que o liquido estaria mui diluido, ensaiámos uma nova porção, depois de concen- trada pelo calor, com uma pequena quantidade de reactivo, e vimos então appárecer a reacção caracteristica da existencia do assucar. Não contentes com esta prova tratámos de alcançar mais saliva, para poder com maior rigor seguir a observação. Recebidos então [2 centimetros cubicos pela raiz de pyrethro (tendo precedido á lavagem da bocca), juntámos-lhe 18 centimetros cubicos de agua distillada, e tratando o todo por 2 grammas de acetato de chumbo solido, fizemos ferver; filtrámos depois o liquido, juntámos- ! Journ. de chim. méd. et pharm., 1825, n. 1. 2 Archiv. gen. de méd., 1853, t. xxx1, pag. 674. * Phys. experim., t. 11, pag. 99. * The London med. gazet, 1836, n. 33. 3 Du diabete sucré, Paris, 1844. é Traité de pathologie, t. 11, pag. 908. ? Loco citato. à é De la glucosurie, 1855, pag. 83. º Considérations sur un cas de diabête, pag. 30; e Jornal da socied. das scienc. med., 1860, n. 5. 19 La science, 28 juin., 1856. A DIABETE 61 lhe 4 grammas de sulphato de soda, e levámos de novo á ebullição ; separando então o precipitado formado, ensaiámos o liquido obtido (e já concentrado pelo calor) pelo reactivo de Bernard, e vimos operar-se uma perfeita reducção. Em todo o caso o phenomeno não é constante; ha diabeticos que teem assucar na saliva, outros que o não teem, e o mesmo individuo nem sempre o apresenta. Terá n'isto a comida alguma influencia ? Não o crêmos, porque, analysando a saliva duas horas depois de almoço em dois individuos, um apresentou assucar, e o outro não. Qual será pois a causa? No estado actual da sciencia julgamos o phenomeno inexplicavel. $ 15º Pharinge N'alguns doentes tem-se notado, posto que não geralmente, uma sensação de estrargulação. O primeiro que notou este symptoma foi P. Frank !, e depois d'elle Dezeimeris * e o sr. Aran *- este ultimo achou n'um caso que esta sensação se propagava até o braço esquerdo. A secura da mucosa póde muitas vezes produzir por si esta sen- sacão, sem que o systema nervoso tome parte alguma no phenomeno, outras vezes porem é necessario recorrer a elle; n'este caso está a sen- sação de aperto que se manifesta no momento de beber, e que obriga o doente a parar. Não vimos ainda notado este symptoma, mas temol-o frequentemente observado. Uma ligeira inflammação se manifesta muitas vezes n'este orgão ; assim o temos visto, e Bennewitz *, Renauldin *, Lorey * e Combes ". Segundo Zipp * tambem as anginas são frequentes no principio da mo- lestia. Bang º, além de rubor, notou o aspecto aphtoso das fauces, e Boys de Loury ” a paralysia do veo do paladar impedindo a degluti- cão. 1 Epitome de cur. hom. morb. 1797. Lib. v, pars. 1, pag. 44. 2 Mém. de la soc. méd. d'émulation, anno Ix, pag. 235. 3 Abeille médicale, 1860, pag. 235. * Edinb. med. and. surg., journ., july, 1828. é Dict. de méd. en 60 vol., art. diab. $ Revue méd. franc. et étrang., octobre 1837. 7 Gaz. méd. de Paris, 1840, n. 31. 8 Loco citato. º Acta regiae societatis Hauniensis, Hauniae 1783, t. 1, pag. 11. 10 Gazet. Hebd., 1861, pag. 465. 62 ESTUDOS SOBRE S$ 16. Digestão No principio da diabete a dyspepsia é frequente, sobre tudo quan- do os individuos abusam de feculentos; com os progressos da doenca notam-se peso e tensão no epigastrio, sensações de calor e frio no ab- domen, arrotos acidos, uma verdadeira cardialgia, seguida ou precedida de vomitos, como vimos n'um caso, e já antes o tinham notado Mac Gregor, Prout e Fournet !. Estes vomitos, principalmente os que se manifestam no fim da digestão, levam muitas vezes, segundo Prout, o doente á sepultura, quando se tornam frequentes, e se manifestam nºum periodo avançado da molestia. O vomito, não tendo logar logo depois da comida, é em geral esbranquicado, assemilhando-se ao cosimento de arroz ; tem um cheiro enjoativo, e contém assucar. Mac Gregor julga que só fazendo-se uso da comida vegetal é que os vomitos conteem este principio; Bernard ? affirma pelo contrario, que elle se encontra ainda mesmo depois de alimentação animal. É mais exacta a opinião do sr. Bernard, pois até já temos achado assucar nos vomitos em jejum, o que não é de admirar, visto ser a mucosa gastrica na diabete um dos emunctorios d'este principio. No hypochondrio direito nota-se ás vezes uma sensação de pêso (Hillairet *) e até uma verdadeira dôr (Pharamond, Hub. Boens * e Kunkler *. Esta observação é verdadeira, mas não absoluta; em alguns casos temos, além d'esta sensação, notado a hyperstesia da pelle n'este ponto. Percutindo esta região verifica-se muitas vezes tambem que o figado se acha hypertrophiado, como temos observado; e de factos identicos fallam os srs. Bouillaud *, Hillairet 7, Auffan * e um jornal italiano ?, o que não obsta todavia a que n'alguns casos, entre outros no citado pelo sr. Oppolzer ”, o figado se conserve natural. 1 Archiv. gen. de méd., t. xxxvir, 1835, pag. 257. 2 Compt. rend., et mém. de la soc. de biolog., pag. 4, 1819. 3 Union médicale, 1856, pag. 628. é Presse. méd. belge, 1860, n. 18. 5 Union médicale, 1861, pag. 138. ê Clinique médicale, Bruxelles, 1838, pag. 558. 7 Loco citato. 8 De la glucosurie; Strasbourg, 1859, pag. 36. O figado elevava-se até ao bico do peito. º Annali univers. di medic., junho, 1827. t0 La Clinique européenne, 1859. A DIABETE 63 No fim das digestões não é muito raro ver-se uma elevação de ventre acompanhada de ligeiras colicas, de que nos refere um exem- plo-o sr. Girard '. $ 17º Defecação De ordinario os doentes soffrem de uma prisão de ventre mui forte, que os obriga a usarem de purgantes repetidas vezes; mas quando o mal progride a diarrhéa alterna muitas vezes com ella, e n'alguns casos declara-se com tal força, que os doentes succumbem, como ob- servou Sprengel *, e ultimamente se verificou n'um caso semilhante na clinica da faculdade de medicina de Lisboa. Segundo Gray * a dysen- teria vem frequentemente complicar esta doença. Qual será a causa da constipação do ventre? Segundo o sr. Mia- lhe deve explicar-se pela falta de alcalinidade dos liquidos da econo- mia: a bilis, diz elle *, tornando-se thais espessa, não tem a fluidez ne- cessaria para sair dos canaes biliares, entrar nos intestinos e mistu- rar-se com as fezes, que ficam então descoradas, resultando desta in- terrupção do curso da bilis a constipação do ventre. Não é esta, quanto a nós, a explicação, e parece-nos que deve de- duzir-se da diminuição dos succos intestinaes, em virtude da grande perda de liquidos pelos orgãos urinarios, da diminuição da contracti- lidade dos musculos dos intestinos, e emfim da menor quantidade de bilis existente no figado. Se a bilis, como quer Mialhe, se tornasse mais espessa nos canaes biliares, o que a observação desmente (R. Wil- lis), a ictericia deveria ser frequente, o que não succede. A bilis acha-se sim diminuida, como temos visto com Heidmann * e Bouchardat, c a razão é talvez porque sendo n'esta doença uma parte do assucar pro- duzida á custa dos elementos da bilis, deve por isso diminuir a quan- tidade d'esta. As fezes, segundo Rollo º, não teem mau cheiro, n'alguns casos porém apresentam-o horrivel de corrupção, como viram Hodgkin e Marchal de Calvi ”; tem geralmente uma côr mais clara do que a na- 1 Union médicale, pag. 575, 1855. * Handb. der Pathol., Leipzig, 1810, t. 111, S 160. 3 Glasgow med. journ., outubro, 1856. í Chimie appliquée a la physiologie. Paris, 1856, pag. 86. º Handb. der Pathol., Leipzig, 1810, t. 111, $ 160. $ Glasgow med. journ., outubro 1856. ? Union médicale, 1861, pag. 215. 64 ESTUDOS SOBRE tural, mas ás vezes são d'um verde escuro e conteem assucar, segundo as nossas observações * e as de Mac Gregor ?. As materias gordas tam- bem tem sido encontradas augmentadas por alguns observadores, como por exemplo Simon º. Temos notado igualmente que no principio da doenca as fezes exha- lam um cheiro a ammonia mui pronunciado. Haverá perda d'uréa pe- los intestinos? é um ponto ainda para estudar. , A quantidade diaria de materias fecaes excretadas é maior do que no estado physiologico, pois sendo a d'estas, termo medio, de 160 grammas, Thenard e Dupuytrin viram-na elevada n'um diabetico a 228, e Porter * refere outro, cujo maximo era de 2:256. Este au- gmento da quantidade das materias fecaes excretadas pelos diabeticos explica-se facilmente; porque sendo frequente n'esta molestia a cons- tipação de ventre, é consequencia a aecumulação d'aquellas materias, que já devem ser superiores ao estado normal, visto tomar o doente grande quantidade de alimentos que não póde digerir completamente. A defecação quasi sempre no principio da diabete é acompanhada de perdas de sangue pelo recto ; as quaes são, umas vezes, resultado de hemorrhoides, tão frequentes n'esta doença, outras são essenciaes. Estas hemorrhagias e as hemorrhoides não provarão a affecção do figado ? S$ 18º Respiração Os movimentos respiratorios, que normalmente são, termo medio, segundo o sr. Marcé *, de 19 por minuto, não apresentam um typo constante n'esta doença; em quanto o sr. Donné * achou, em tres ca- sos, que variavam entre 22 e 20, nós achámos n'um outro 18 como maximo, 15 como minimo, e 16 5 termo medio ?. Sendo os numeros intermediarios obtidos : 1 Considérations sur un cas de diabête, pag. 26. ? Journ. de chim. méd., 1840, t. vr, pag. 16. 3 Beitrage zur Chemie und Mikroskopie, 1844, t. 1, pag. 418. 1 London med. and. phys. journ., junho, 1829. 3 Archiv. gén. de méd., 1855, t. xxxvr, pag. 74. é Archiv. gén. de méd., 1835, t. xxxix, pag. 129. 7 Considérations sur un cas de diabete, pag. 26. A DIABETE 65 Dias Numero de Dias Numero de respirações respirações RSS LA en ER TE 17 Nidisaa Sugira studio O ESPERE RI Se E a veto ora pu Se ser rs TO 16 cds ari h6 AV. PNR abiliO | Tits gate pos stand 16 Da E: fa o 15 DSestada prpsug af: 18 Orr ed xs te RahE Qui BiganÃo s IR) et andreia 17% DO Jigtadd sda 18 ER E RASTA PULO) DU ISENERA PRp 17 nes 6 es hs E ES CRE ÃO PODRES NERO ERRO 17 Oie: td: EA NQIO DR SA AE 7 ares Pes es LO o RR 16 DZ eso piso 7 2 A ORE EINE TR 15 MONTE pa! fe BIO PARIS, EMI EEE 15 Em relação aos productos da respiração, tambem não se póde af- firmar coisa alguma no estado actual; porque se de um lado vemos o sr. Jangot, de Lyão *, verificar o augmento do acido carbonico expi- rado, que sendo 6 por 100 no estado normal, é nos diabeticos de 7 por 100, e a diminuição do vapor de agua, que sendo no estado phy- siologico de 0,40 a 0,25, nos diabeticos é de 0,15, e o sr. Bodiker, de Bonn ?, estabelecer que os individuos atacados d'esta doença con- somem alguns decimos de pollegada cubica de oxigenio a mais que o individuo são; vemos por outro lado os srs. Mac-Gregor *, Hervier * e Saint-Lager * declararem nunca terem achado differença alguma no acido carbonico expirado. Mas seriam rigorosas estas experiencias? Em quanto ás do sr. Jangot devemos ter certa desconfiança ; todos sa- bem quão difíiceis são as observações d'este genero, e que para ob- ter resultados satisfactorios é necessario empregar apparelhos mui deli- cados, que elle não tinha á sua disposição; das outras nada podemos dizer, visto serem os observadores pouco explicitos na sua descripção. Nesta doença manifesta-se ás vezes uma tosse sêcca e por quin- tos, de natureza nervosa ; porém mais frequentemente é symptoma de bronchite, congestão pulmonar, pneumonia, pleuresia, phtisica, e em ge- ! De la théorie du diabête sucré. Paris, 1851. 2 Nasses Archiv. fur physiol. Heilk, 1851. 3 British. Associat, 1840. Trans. of Lhe sections, pag, 87. * Gaz. méd. de Lyon, t. 1, pag. 49. * Gaz. méd. de Lyon, t. 1, pag. 49. MEM. DA ACAD.—— 1". CLASSE. ——T. NI. P. II. 9 66 ESTUDOS SOBRE ral de todas as affecções do orgão pulmonar. E' em algumas d'estas circumstancias que se apresenta uma grande secreção bronchica ; uma vez por exemplo, Dupuytren e Thenard viram expectorar 60 grammas por dia. Os escarros, segundo Rollo ! e Koechling *, teera um sabor doce, e segundo as observações dos srs. Bernard, Francis, Fricke, Guitard E e as nossas *, conteem assucar. Os srs. Wurtz * e Vernois º não o acha- ram porém em alguns doentes que observaram. As bronchites teem sido notadas por differentes auctores, entre outros, Hub. Boens *. Da pneumonia ha muito que fallava Ettmuller : saepe pneumonia extinguuntur ; e ainda ultimamente o dr. Fricke, de Baltimore *, publicou um caso, que se tornou muito notavel pela rapi- dez da sua marcha. A phtisica porém é a lesão mais frequente, pois é muito raro ver um diabetico que não apresente symptomas de tuberculisação, em pe- quena ou em grande escala. Uma grande parte dos individuos affecta- dos d'esta doença morrem plitisicos, e aos antigos não tinha escapado esta circumstancia, porque Arnaldus de Villanova º já dizia «facile transire potest in hecticam.» E de facto no ultimo periodo, e quando a consti- tuição se acha mui enfraquecida, que ella se manifesta. Os modernos teem estudado tambem a questão n'este sentido ; uns exageram talvez a coincidencia d'estas duas affecções, e é por isso que Nicolas e Gueudeville, Barsdley e Copeland adoptaram a expressão phtisurie sucrée para designar a diabete; outros, sem serem tão posi- tivos, reconhecem comtudo a frequencia dos tuberculos e a analogia das duas doenças, sendo d'este- numero Rollo *º, os srs. Andral, Bona- my “, Legrand ? e Griesinger que a achou na proporção de 43 a 44 por 100. Uma outra lesão pulmonar sobre que mais modernamente se tem insistido, e com razão, por causa da sua zovidade e das particularida- 1 ! Traité du diabete, pag. 18. * Horns, Nasse's und Wagner's Arch. jan. e fev. 1834. * Dela glucosurie, Toulouse 1856, pag. 83. 1 Considérations sur un cas de diabete. pag. 27. * Mém. de la soc. de biologie, 1850, pag. 4. 8 Archiv. gén. de méd., 1854, t. xxx1, pag. 674. ? Presse méd. belge, 1860, n. 19. 8 American med., journ. julho 1862. 9 Praxis medicinalis, 1586, pag. 74. to Loco citato, pag. 83. !! Bull. gén. de thérap. 1840. t2 Abeille médicale, 1855, pag. 325. A DIABETE 67 des com que se manifesta, é a gangrena pulmonar. O primeiro que parece tel-a observado, mas sem lhe conhecer uma relação de causa- lidade, é o sr. Monneret em 1839 !, affirmando ter observado n'um diabetico a expectoração de escarros escuros como de gangrena do pulmão. Depois os srs. Hodgkin, Scott?, Griesinger, Charchot * e Fritz * tem tido occasião de verificar esta observação, e de notarem todos, a não ser o sr. Fritz, que o mau cheiro da expectoração, caracteristico da gangrena pulmonar ordinaria, não se observa n'esta gangrena es- pecial dos diabeticos. Mas qual será a causa da frequencia de todas estas lesões pulmo- nares? De dois modos se póde talvez explicar o phenomeno, ou pela exa- geração das funcções do orgão encarregado da combustão de uma maior quantidade de assucar, como quer o sr. Bernard, ou então pelo prin- cipio estabelecido por Magendie, isto é, logo que o sangue perde as suas condições de fluidez e viscosidade normal pela introducção de uma materia estranha, circula menos facilmente nos capillares, e tem grande tendencia a parar e a congestionar os orgãos, principalmente os pulmões. S 19º Circulação As veias acham-se de ordinario muito desenvolvidas, principal- mente nos ultimos periodos. O pulso, segundo alguns auctores, é lento e varia entre 30 e 40 pulsações por minuto; mas não se póde esta- belecer isto como regra geral, porque deve variar com o periodo da doenca e muitas outras circumstancias accessorias; assim, se de um lado o vemos na observação do sr. Barbier * pequeno e fraco, e variar en- tre 61 e 74 pulsações por minuto n'uma observação nossa *, vemos tambem P. Frank affirmar que elle se apresenta forte e cheio, e o sr. Donné ? verificar em tres casos a variação do numero das pulsações entre 78 e 84 por minuto. No nosso caso a marcha, que o pulso se- guiu, foi: * Arch. gén. de méd., t. vI, p. 303. 2 Dublin hosp. gazet., 1858, t. v, pag. 71. 3 Gazet. hebd., 1861, p. 545. * Gazette des hopitaux, 1862, 2 de setembro. * Du diabete sucré, Montpellier, 1856. º Loco citato, pag. 27, 7? Archiv. gén. de méd., 1835, t. xxxix, pag. 129. 68 ESTUDOS SOBRE Dias Pulsações Dias Pulsações lia peter GG LARA. PGE 66 Do SA RARE R Ge EMABO SEE PAO NR AGO E pero SENA 68 Node ur ca6S PE REA JE DO OVAR 70 EMITE, ota q 67 DE RE Misto 69 [EL fio Eder a AOS) O Pap 64 O Ev sgado pano 70 TE Re Rs E 60 DD. ternas tera ger Ti SME ee a 62 0 DRT TG IA E T4& Grim ate, 64 ODOR RO Coy Es 7 Os usineiros 64 PAS o alrRe E PIA E 69 Lap: 66 24. 69 lira a less 65 PA 1a PST o 70 13 65 DO MENA lo O 70 O que ha de constante e verdadeiro em todas as observações é que nos ultimos periodos da doença, o pulso torna-se mais frequente á noite, para mais tarde se conservar assim continuamente e não lar- gar o doente até á hora suprema. As observações de Driessen ! e Brocklesby ?, em ambas as quaes se notaram palpitações do coração, e na d'este ultimo intermittencias do pulso, tem sido confirmadas pelas nossas. $ 20.º Calorificação A temperatura do corpo acha-se diminuida nos individuos affe- ctados da diabete, como mostram as experiencias feitas n'este sentido ; n'um caso achámos que a temperatura variou debaixo das axillas en- tre 35º e 36º centigrados *, e na seguinte ordem : Dias Graus Dias Graus Dasssens eso end O Disto ercbniêr ate 35,0 o 36 EP e pa a 35,0 O RR o e 36 o o RR DE 36 UNO caio RR 35,9 E e arts 36 EMEA cus oa DD DOS pio ads 35,5 1 Diss. de diabete mellito, Gronningae, 1818. 2 Medical observ, and inquiries by a soc. of phys. in London, vol. 11, 1797. 3 Loco citato, pag. 28. iii qt É A DIABETE 69 Dias Graus Dias Graus TUA. ae trsé BI IPO) UI ss 059 D 12 35,0 20. 35 18 36 O TARS sual mad, SD) Midge as cho issá tado 36 Didi quero rip, 36 Sra me ME Eta asas 35,5 28 36 ME eee bato raia 35,9 24, 36 17 36 SE 36,5 LE ES 36 PAO PR 36,5 O sr. Donné ! viu-a variar entre 36º e 25; o sr. dr. João da Camara Leme ? entre 35º, 75 e 36º,e o sr. dr. Lomnitz º viu-a tam- bem abaixo da normal 1º,07 Réaumur. Na bocca achámos egualmente que ella era menor do que a nor- mal, pois o thermometro marcava entre 35 e 36º, e na ordem se- guinte : Dias Graus Dias Graus ARE grs doer: 35 14. 36 Di AND 35,9 a pts Sea 35,9 RO ARM e 35,9 MOSER sussa 35 ES APR DE a 35 7 36 5) 35,9 18 36 Oppo avr RE 35,9 DOspstorsab ape sroto 36 TASTE RO e E 36. DOG. fitipretsçe (a 35,5 8 35 Dto at ent bobagem 35,5 Dra ars o taitar 35 DB ns apare goste 35,5 10 35 DS DST: 35 De Ros E 35 DRA vp SE 35 12 36 Ds, o esti ts 36 ES nte dor. + 35 DO gts srs aralçat 36 O dr. Lomnitz determinou tambem n'um caso uma differença a menos de 0º,39. à As experiencias physiologicas feitas pelo sr. Bernard “* em tres coelhos, diabetisados pela lesão do quarto ventriculo, confirmam as ex- ! Loco citato, pag. 129, 9 * Memoria inédita apresentada á Academia de medicina de Paris, sobre a tempera- tura do homem e dos animaes. * Henles, und Pheuffers Zeitschr, 3.º Reihe. Bd. 11, 1.º Heft 1857. * Leçons sur les liquides organiques, t. 11, pag. 451. 70 ESTUDOS SOBRE periencias pathologicas; em todos elles verificou que a temperatura tinha baixado no recto, n'um de 0º,323, noutro de 0º,310 e no ultimo de 0º,717. Estas variações de temperatura, segundo o dr. Lomnitz, não correspondem ás variações do pulso. As nossas observações sobre a temperatura de urina deram-nos em resultado : Dias Graus Dias Graus ANO cs ELE Re Rm LAO end ce ndo O rr a RD RS CR Der SERA USO CROSS) [US RR om AE IE RS AR) gi DUTO aa IIS o PENIS 5) URSS a EE RA Re RT) NS ade do ARS GU. TON MI US NORsiaa a, AU BU DIS RS ND ca Dei. DS E DOU UNIDAS SUA DO Dus O MD DES DA E DIDI o, ÁS SO ORE a DB e VA VA DS) DAE A: ERA O Por RR pi) OA Re DA, AE UEVA A art rgo t as e ED LM ari dr data DOU, bn BUhE Em vista do que levamos dito, não podemos deixar de admittir que a temperatura se acha realmente diminuida, e que as opiniões de Areteo «calorem e ventre in vesicam tendere sentiunt», e do nosso Za- cuto ! «universi corporis aestus et ardor insignis qui diabete correptos graviter infestare solet» são falsas, a não se referirem a sensações sub- jectivas, que em verdade são frequentes na diabete, ou então a casos em que a tuberculisação se achava er grau avançado. Póde-se tambem explicar esta proposição de Zacuto, suppondo que elle tinha observado as alternativas de calor e frio que tem logar nos diabeticos, e que passam rapidamente. Na realidade é mui frequente encontrar n'esses doentes, verdadeiros affrontamentos, ou antes conges- tões locaes que passam rapidamente; e até parece que n'esta molestia o nervo sympathico se acha de tal modo affectado que se paralysa momentaneamente e com facilidade, para depois retomar nova forca, dando assim logar á dilatação dos vasos sanguineos e depois á sua re- traccão. 1 Opera omnia, t. 11, pag. 445. A DIABETE 11 É] $ 21.º Orgãos urinarios e genitacs Como os orgãos urinarios e genitaes estão intimamente ligados, não querendo fazer repetições, descrevel-os-hemos promiscuamente, re- servando-nos tratar das suas funcções seguidamente. Estes orgãos são n'alguns casos a sede de um erythema, como viu o sr. Gubler; mas o prurigo é mais frequente. Os srs. Hervez de Chegoin e Lambron foram os primeiros que em 1857 chamaram a attenção sobre esta complicação, que se manifesta no prepucio do ho- mem, va vulva e entrada da uretra da mulher. Já vimos n'esse mesmo anno este phenomeno n'um homem, e o sr. Fanconneau-Dufresne ! re- ferindo-se a esta nossa observação, cita tambem alguns casos; sabe- mos que o sr. Alves Branco observou ultimamente um exemplo d'es- tes; na mulher vimol-o pela primeira vez em 1860; o prurigo apre- sentava-se com muita força, e repetidas vezes no dia; a doente era forçada a coçar-se com tal afinco que appareciam depois escoriações, e formava-se uma crusta branca similhante ao coalho do leite, indi- cio de que o accesso passava ; n'este anno vimos outra doente com esté symptoma, e consta-nos que o sr. dr. Gaspar Gomes; conjunctamente com o sr. Malheiros, facultativo em Bellas, observaram já outro exem- plo. O sr. Hervez de Chegoin * diz ter notado este symptoma em to- das as diabeticas, e o sr. Landouzy * na maior parte; o primeiro d'es- tes observadores parece-nos ter exagerado o facto. Este prurigo passa quando a doença principal diminue, e volta com as suas exacerbações. Mas dependerão os erythemas do assucar que sáe com a urina e cáe sobre estas partes, ou serão manifestações de um estado geral, como os que descrevemos fallando da pelle? A cir- cumstancia do erythema se manifestar, apesar de largas uncções das partes genitaes com glycerina, no momento da micção, e de repetidas lavagens consecutivas, mostra 'a veracidade da primeira hypothese ; a raridade d'estas afecções na diabete favorece-a tambem. O prepucio apresenta-se muitas vezes inchado, doloroso e com escoriações, como vimos depois de Rollo *, Valleix, Barsdley * e Bar- bier. O escroto acha-se pendente e cheio de rugas, como notaram ! Abeille médicale, 25 de oct. de 1858. * Comptes rendus de la soc. de méd. pratique, sept. 1861. 3 Gazette des hopitaux, 1862, 8 mai. ' Du diabête sucré, pag, 3. * The Cyclopedia, art. diabetes. 72 ESTUDOS SOBRE Durr, Reil, e nós mesmo. Os testiculos apresentam-se ás vezes atro- phiados, como advertiu Neumann A $ 22.º Funccão urinaria Em geral a micção é facil; n'alguns casos, mas raros; nota-se po- rém a dysuria, como viram P. Frank e Barbier ?, e até mesmo a stran- guria e a ischuria, como adverte o primeiro d'estes observadores. De resto, já Areteo e Cullen tinham observado a suppressão da urina. Nos ultimos periodos da doença manifesta-se ás vezes a inconti- nencia ; exemplos d'estes teem sido apresentados por Goeritz, Fother- gill *, Berndt *, Ambroise Dupan e Monneret * e por nós. A vontade de urinar é ás vezes, mas raras, tão forte e rapida, que os doentes quasi não teem tempo de tomar o vaso. Areteo já ti- nha observado este phenomeno : « Mictum quae ratio suppressit aut quae verecundia dolore potentior;» Nicolai * tambem cita factos destes, Jul- gamos porém que o phenomeno é raro, e não tão frequente como ao primeiro aspecto se póde suppór. ] Os doentes urinam a miudo no dia; Guitard ” viu um tomar o vaso dezoito vezes, e este caso não é inda dos mais extraordinarios. É á noite, e sobre tudo de madrugada, que esta necessidade é mais pronunciada : assim o teem ado P. Frank, R. Witt”, Dolaeus º, Hildanus *º, Oesterdyck "!, Schuchmann *, Schmid 9, Lebenwardt *, Monneret “ e Chevalier *º, o qual chegou a vêr, n'uma noite, urinar vinte vezes. O resultado d'este excesso na micção é manifestarem-se ! Spec. Path. und Ther., 1832, Bd. 11, S. 784. 2 Du diabete sucré, Montpellier, 1856. - , 3 Medical, obs., t. III. * Encycl. Worterb., Bd. 9. 5 Arch. gén. de méd., 1839, t. v1, pag. 300. é Progr. de diab., pag. 8 7 De la glucosurie. pag. 178. 8 Beobacht. uber die Nerven hyp. und hyst. Zufalle, cap. 1v, S 8. º Encycl. med., lib. 1, c. xr, S 10, 10 Obs. med. chir. cent. v, obs. 53. !t Samml. auserles. Abhandl. zum Gebrauch praktisch Aerzt. Bd.1,st., 2, pag. 179. 2 Misc. nat. cur. dec. n1, an. 1.º, obs. 101. 13 Misc. nat. cur. dec. II, an. 2.º, “obs. 122 1 Misc. nat, cur. dec. 11, an. 10.º, obs, 155. 15 Arch. gén. de méd., 1839, t. vi, pag. 300. 16 Journ. de chim. méd., 1829, t. v, pag. 7. A DIABETE 73 sensações de calor e frio nos hypochondros, e principalmente as dores de rins, que se estendem ao collo da bexiga, e até ao longo do canal da uretra, o que temos visto, assim como o sr. Alquié, de Montpel- lier. $ 23.º Aspecto da urina A urina é, em geral, de um amarello-palha claro. Mead, compa- rando-a á côr: do mel, e Willis á que apresenta a dos hydropicos « vel hydrope laboratium» não foram muito felizes. Aquella côr porém nem sempre se manifesta, porque o sr. Cahen filho * viu-a n'um caso ser sempre de um amarello carregado, e nós já acháfmos mais exemplos d'estes. Além d'isso nem sempre é constante, porque varia nas dif- ferentes horas do dia, sendo pela manhã de um amarello carrega- do, tornando-se mais tarde clara, e apresentando-se á noite menos có- rada. As doenças intercorrentes tambem influem n'estas variações, e não é raro vêr a mais leve indisposição seguida de um augmento de côr na urina. Quando esta se acha descórada não é pelo desapparecimento do principio córante, como alguem julgou, mas sim pela sua diminuição ; pois n'um caso em que a urina estava extremamente branca, o sr. Che- vreul? pôde ainda achar este principio. O melhor meio para designar a variedade das suas côres n'esta doença em especial, e em todas em geral, são as taboas de Vogel. A transparencia da urina é muitas vezes perturbada pela pre- sença de muco, sangue, flocos albuminosos, acido urico, etc. N'alguns casos tem a apparencia chylosa, o que é talvez devido a alguma quan- tidade de liquido prostatico, ou de gordura que passam. De resto este phenomeno já não tinha escapado aBoerhaave: urinam prac se Sferentem speciem chyli; nem a Haller *: «2» qua chylus cum urina exit. 1 Archiv. gén. de méd., fevereiro, 1846. 2 Annal. de chim., 1815, t. xcv, pag. 319. 3 Elém. phys., t. vir, pag. 351. MEM. DA ACAD.— 1.º CLASSE. —T. III, P, IL, 10 = Es ESTUDOS SOBRE $ 24.º Cheiro O estudo d'esta qualidade não data de ha muito, porque os an-. tigos consideravam como aviltante para o medico cheirar a urina, para o que basta citar a Fernel! «C'est une chose vilaine et tout'a fait sále et indecente à la dignité du médecin de s'arréter à Haire Purine»; e apesar de Savonarola dizer *: «urina cujus odor ad dulcedinem trahit do- minium sanguinis significa... ub est odor lactis vel sanguinis», nem por isso se destroe o que avançamos, provando simplesmente que ha- via medicos, os quaes, apesar dos preconceitos, se abalançavam a chei- ral-a. Segundo Mead e Kapp * a urina na diabete tem um cheiro a mel; segundo Rollo, Sprengel * e Corneliani * a violetas; segundo Reyd Clanny * a feno, e, segundo os auctores do Compendium, umas vezes a osmasoma, a leite e a soro de leite, outras a carne de vitella, viole- tas, etc. Sem negarmos completamente esta variedade de cheiros, cre- mos que naturalmente é devida, já ás substancias empregadas no trata- mento, já a circumstancias muito especiaes, porque em todos os casos que temos observado achámos a urina ou com um cheiro enjoativo, ou inodora, como tambem notam John ?, Nicolas e Gueudeville. Como quer que seja, é facto que a urina perde aquelle cheiro pi- cante que de ordinario tem. Será isto, como quer Heller, o resultado da diminuição do principio córante, a urophacina, que dá ao mesmo tempo o cheiro normal? Parece-nos que esta opinião está d'accordo com as experiencias modernas. A urina diabetica não conserva porém aquelle cheiro proprio por muito tempo; exposta ao ar, e passadas vinte e quatro horas, segundo a maioria dos observadores, apresenta outro azedo e alcoolico, sobre tudo quando se ferve; mas n'alguns casos o ammonical é manifesto, como Já uma vez notámos *. Hodgkin * crê que o cheiro a almiscar é o mais ! La pathologie de Fernel traduite en français par A. D. M., París, 1646, pag. 183. 2 Pratica canonica, 1562, pag. 704. 2 Syst. Darstellung des durch. neuerne Chem. in der Heilk. etc. 1805, pag. 177. 4 Handb. der Pathol. t. nr, $ 158, pag. 95. ? Giorn. di patol. e di Terap. Veneza, maio e jun. de 1840. º The Lancet, agosto 4 de 1838. ? Chem, Unters. miner. veget. und an im subs. Berlin, 1810. 8 Considérations sur un cas de diabête, pag. 32. * Union médicale, 1861. A DIABETE 7 frequente no momento da decomposição. O sr. Pailon ! affirma, e quanto a nós erradamente, que a urina exposta ao ar, ainda mesmo durante muito tempo, fica inodora. S 25.º Gosto da urina A urina diabetica tem um sabor doce, ou a mel, como advertiu pela primeira vez Thomas Willis (1667): quasi melle aut saccharo im- buta *. P. Frank * a comparou ao « suco alni betulae verno tempore pro- Puente e trunco perfurato.» Este gosto adocicado falta comtudo em muitos casos, provavel- mente como pensa Becquerel, por causa de alguma combinação da uréa com o assucar: é n'estas circumstancias que se nota o sabor salgado, observado por Thenard e Dupuyiren, e o enjoativo, descripto por Mar- tin Solon. O que n'isto ha de curioso é que no mesmo individuo, em differentes épocas, apresenta a urina o sabor doce, salgado ou enjoati- vo alternativamente, como temos visto e egualmente Martin Solon. Frequentemente se observa que a urina, independentemente d'estas differentes sensações, produz sobre a lingua a mesma impressão que uma solução de gomma. Que um facto tão importante, como este do gosto assucarado, tenha escapado aos antigos não se póde explicar se- não por certos preconceitos, de que achamos uma prova em Henricus Martinus Dantiscanus *: «ut urinam degustet, quemadmodum fecit Ascle- piades; nam id a medici dignitate alienissimum» em Francisco Calmette * «quia... et medicorum dignitas huic explorationi minus favent» e o que é mais para admirar, em Lima Leitão, que escrevia em 1849 estas. palavras: «Quem queria Zacuto que provasse as urinas do doente? Lou- variamos no Zacuto o zelo d'elle as provar, mas não o imitariamos, por- que a nossa saude em primeiro logar que a dos outros *». A verdade é ter sido Willis o primeiro a notar este facto, que tempos depois foi ve- rificado peios differentes auctores, entre os quaes figuram Dolaeus em ! Gaz. méd. Lyon, 1862, pag. 287. 2 Pharm. rationalis sive diatrib. etc. Hagae Comit. 1667, part. 1, sect. 1v, pag. 1664, e na edição de Oxford de 1674, pag. 207. * Epitom. de cur: hom. morb., liv. v, part. 1, pag. 45. 1 Anatomia urinae galeno spagyrica. Francfort, 1658. * Riverius reformatus, t. 1. Genevae, 1735, pag. 455. 5 O Esculapio, 1849, pag. 80. 10» 76 ESTUDOS SOBRE 1697 !, João Curvo Semmedo em 1704 2, Valentini em 1721 *, Nen- ter em 1735 *, Cour. Zumbac Koesfebr em 1741 *, José Rodrigues d'Abreu em 1745 * e Monravá em 1747. S 26.º Quantidade No estado physiologico, segundo Vogel, um adulto bem nutrido, e bebendo largamente, excreta nas vinte e quatro horas entre 1:400 e 1:600 grammas, e bebendo pouco entre 1:200 e 1:400 grammas. Estas quantidades podem variar porém entre 1:100 e 3:000 gram- mas. Calculando a quantidade da urina com o pêso do corpo, a rela- ção physiologica é de 1 centimetro cubico de urina por hora para cada kilogramma de pêso. Na diabete esta quantidade augmenta considerav elmente, ea ponto de ser em geral o principal e mais frequente symptoma; e é por isso que Areteo, Alexandre de Tralles, Prospero Alpinus e outros o nota- ram desde a mais alta antiguidade. A quantidade de urinas, excretadas pelos diabeticos, é, termo me- dio, segundo Bouchardat, de 5:000 a 8:000 grammas, e de 5:000 a 6:000, segundo Contour; o maximo e o minimo são mui variaveis, como se póde vêr do seguinte mappa: Fonsecarinagsets dali: «. 100:000 grammas Bapeniesvi (um. estadia ãos a cos BE OD to Michelotft.tne rprctaçca mesa muicA, 67:500 » Zacuto |. na io o peRere Rr RA 50,00 /m4 | qq Devay “ Se cet a TElpSAA a 0 ae » Mirza Reras e a O no AA) » ! Encyclopedia medicinae, etc. Antuerpia, 1697, pag. 422. 2 Polyanthea medicinal, 1704. Lisboa, pag. 521. 3 Praxis medicinae. Francfort, 1721. * Fundamenta medicinae. Venitiis, 1735, pag. 217. * De pulsibus et urinis fasciculus indicatorius. Lugduni Batavorum, 1741. pag. 22. £ Historologia medica, t. 11, liv. Iv, pag. 578. Lisboa, 1745. 7 Novissima medicina, t. 111, pag. 832. Lisboa, 1747. * De natura artisque miraculis. º Journ. de méd., t. LvI, pag. 153. 10 Epist. ad amicum. H Praxis méd. lib. n, obs. 71. 2 Revue méd. chir. 83 De la polyurie, pag. 35. A DIABETE Farra NRO. Sosa sa ass 35:000 grammas Dupan, e Boens 2... . 0. 0000010) 3020000 om en Can er E RS RC ARE 26:000 » Abel Tordo ABR o DEU VO » Savonarola MIMBR. .cscrmpositana Petrus Pawius*,.. . css ss oo f AbelNTordio RR ssa dedo 22:000 » MELVASAMG Mo ne esa Sra ro ralo Um practico de Bolonha *.... Dodonaeus Sa 42! pb sia os 21:500 » Searamuúccius Fu, od Sida ada Abel Jordão nr É Agostinaechio de Spinazzola *. 20:000 Ê AMIB Ent MUST ia Barton pr 19:5492 » BOStociaa e us sn cai orar are elo ra SID 00 » Birdsley Psi, sis apa sioa 1a EB800O» cúta AlbelBJordiori RR o e Cardans o. sofarçe is us a UG: 010 0) » Bocha Rd alt o SMERR Re Mp e Aran) ss REM sda oa 15:000 » Nicolas et Gueudeville...... 13:695 » Dúpuyitren SEL Mar 13:645 » Dupré) ro us MMS Rats to or 13:000 » Reno ld in 2000 » Abelk Jordão FEB o ara 12000 » 1 Duncan, Med. annals. 2 Presse méd. belge, 1860, n. 19. 3 Practic. tet. vI, cap. xIx, pag. 240. * Obs. anat. 2.º * Comm. Acad. Bononiensis, t. 1, pag. 145. 8 Obs. med., cap. xLIr, pag. 74. ? Act. nat. cur. dec. 1, anno 10.º 8 11. filiatre sebezio, junho 1834. º Nosol. nat , t. 1, pag. 190. 10 In Morgagni de sed. et caus. morb. Epist. 41. H Dict. de chimic. de Klaproth. Set. 1v, pag. 484. 22 The cyclopedia art diab. Londres, 1822. 33 De rerum var. lib. vir, cap. xLvr, pag. 564. Basilea. !4 Abeille méd., 1860, pag. 235. 1 Dict. méd. (vol. 60) art. diabéte, pag. 133. 18 ESTUDOS SOBRE Bortendas: GOGLBA cet ico M1:500 tapas Antonio Mendes Pedroso *....) |. AbelTordioM Bs. TUR) ROO j Dolacas QUUdO ira: - 9:000 » Albellordaos E Aire 4:000 » PiCaBA o css vo SME ADD, ipa a 3:200 » Barbier 2 BAGMR prq 3:000 » Cremos que algumas d'estas cifras pertencem talvez á polyuria, sobre tudo as mais elevadas, por quanto no tempo em que foram mar- cadas, o estudo analytico das urinas não se achava adiantado. A obser- vação de Fonseca é para nós mui suspeita, visto não a termos acha- do mencionada em nenhuma de suas obras. Apesar d'estas considera- ções julgámos que o sr. Racle º se aflastou da verdade, affirmando que a quantidade mais elevada e verdadeiramente authentica é de 14:000 grammas jo; Além destas quantidades enormes de urina, ha factos em que ella não passou da normal; Watt * cita uma observação d'este genero, e em que a urina tinha a consistencia de xarope; Prout, Copland, P. Frank, Bouchardat, Griesingerº, e o sr. Girard *º viram exemplos simi- lhantes. Semimola viu-a mesmo abaixo da normal. Devemos aqui notar que esta quantidade de urina varia com o clima, periodo da doença, intensidade e regimen. O sr. dr. Aquino da Fonseca nos diz de Pernambuco, que ella não augmenta muito no Bra- zil, apesar da ausencia dos suores. Nas proximidades da morte, ou quan- do a molestia diminue, a urina baixa em quantidade; e n'um mesmo doente varia todos os dias; assim n'um diabetico vimos em trinta e e nove dias que foi !!: ! London, med. and phys.; journal; junho 1829. ? Gazeta Medica de Lisboa, 3.º anno, pag. 150. 3 Epist. pag. 230. * De la présence de Vurée dans le sang. Strasbourg. 1859, pag. 52. > Du diabete sucré. Montpellier, 1856. é De la glycosurie. París, 1863, pag. 38. 7 Cases of diabetes melitus consomption, 1808, pag. 174. 8 Archiv. von Wunderlich. Stuttgard. 1859. 9 Union médicale 1855, pag. 376. 10 Considérations sur un cas de diabete, mappa de observações. A DIABETE Dias Urina UERR PRATOS, 10:000 grammas OR fuga bas cus fo e TÃO e é 8:000 » E ao bd ba 6:000 » ANITA NR. APULC O. 2. 8:000 » Dee Meo MAR E: E es SAE (OO » 6 7:000 » TRA ME 5 o ADEREM Po é 8:000 » Dado Mo, ao TN RE 8:000 » Dra Morto oyo EAR Reto 10:000 » PO MS so ANS: qe 9:000 » il 7:500 » ND ME TE 8;000 » 13 6:000 » 14 7:000 ) Das grato ER DO 6:000 » 16 8:000 » 7 6:000 » | co RE E US Mad 7:000 » o 7:000 » DO ts SMDS EMO, Eis 6:500 » DAP MS a vaia EDEMA RR To gere 9:000 » DD DM one RPEDANEL ED 7:000 » PANE bo CAMA E A E 7:500 » Dr o am Cro to IPA 8:000 » DA sa SR) AA A 7:500 » 26. ADE o oe ss 8:000 » PT RR ERA A JA Les 6:000 » Dee, aa oO o do RU MPE RÇE rata 6:500 » 29 6:000 » EB OE, Mr o ADA EN 6:000 » Sb on cura MA das 7:000 » 32 6:000 » 33 8:500 » 34 7:900 » Sm ate NOMRI 6:000 » DOS o doe cr IR 7:000 » So e TERA De, UE PLA 8:000 » 38 9:000 » 80 ESTUDOS SOBRE N'um doente de clinica da faculdade de Lisboa, cuja historia foi colhida pelo sr. Ordaz Mascarenhas em 1864, as quantidades foram : Dias Quantidade de urina Rea 549 + AS 25:000 grammas DN age istiai eae PNERAE De pera 18:000 » BS arta o ae! to MANDRERAR te ei 17:000 » é UPS PESAR (A OT epoto ts 18:000 » BL A ro ERR a fe povo 19:000 » Dis Ma ig oa MALTESE Ec 18:000 » O AS DA 9 4 e 23:000 » o AU, espe a (1 É (E oa 21:000 » 9 17:000 » DUQUE acne PE RERERO fogo Pena 12:000 » 11 20:000 » à ARE SEEN 114 e DRA 14:000 » Dae Soo PR pegas 14:000 » [eU E RA O EEN 13:000 » 15 15:000 » IDE ao ue REIE Esse 16:000 » Jr iso Cu RO CS SS 18:000 » MIBNE ea. DRESS raiar 15:000 » DO ro o nERER e pio o o = A DEDO » e Pa 2 22:000 » 91 do osso ndo a dia o do 20:000 » 22 mo Gs AnovoS do Do 17:000 » done e PRE 16:000 ap so rolo o fe! LAMA arara 20:000 » A PEDRA PRERESI 467 RA 19:000 » DD) ojos or A PAN ao 23:000 » O ee efe: ca to AMO RARE AE co e 22:500 » DIS tom ade nqo ERRAR a a 18:500 » 29 18:500 » E | be lbmrdior | 4 EUA ge 19:000 » Dil coto pra irão PARAR bi iodo DR » DOS de Pete E 19:500 » Bojo oe 20 jo! oO RE 20:000 » EL Ape atos dora SRT RS ea do 20:500 » DOM tecno SA Ss 21:000 » PD gg ba DE A E ht A 21:500 » A DIABETE 81 Dias Quantidade de urina Bien ii, s=94 pera rio 402000 gramas SO caes E iedo a nl OO » SOME a ctnbapiinodo 2a 20:000 » ÃO colide sé R .. 24:000 » TN ro o Rn qe : 23:000 » ÃO dom ad ENA 21:000 » Ea o dp fá . 24:500 » DA abrimos cmo forte ud 11:500 » o E TR 1 Mr 1:500 » 46.. SORO SR 6:000 » 47 ateh 13:000 » ANE ego een RSRS o so Best) » NE TS a Re 5:500 »)accidentes febris E EAR AV gr À 4:500 » lia spo ro eus Rb O Sr 5:000 » Dom sp po SED PRO a a 4:500 » DO eus deus $ 2:500 ») Ha alguma relação entre a quantidade de urina e a da bebida? Esta questão tem sido resolvida diversamente. A opinião mais antiga é que a quantidade do liquido tomado é inferior á da urina: Celso ! dizia « 4t quum super potionum modum mingitur »; Areteo * falla n'este sentido; Goeritz?, Cummenus*, Riedlinus”, Hertodius * e Scmid ” seguem a mesma opinião. Fothergill pensa que as urinas estão para a bebida como 4:3, Oesterdyk * como 5:1, Michelot como 9:1, Pouchelt como 21:9, Cardanus * como 5:1, Curvo Semmedo *º como 6:1, Frank como 3 ou 2:1, e Berndt como 7:4. Estas idéas combati- das desde certa época tiveram modernamente tres defensores : Contour, apoiando-se em experiencias proprias e nas observações de Cullen, R. 1 De re medica, lib. Iv, cap. 1, sect, 7. 2 Diutur. morb. cap. 1r, lib. Ir. 3 Anúal. wrat. tentam. 29, 1724, jul. cl. 1v, art. 12. 4 Mis. nat. cur. dec. 1, anno 2.º 3 Lin. med., anno 4.º, maio 12. $ Mis. nat. cur. dec. 1, anno 2.º 7 Ibidem, dec. 11, anno 2.º 8 Verhandelingen. nitgegeeven door de Hollandsche maatschappyc der weclen schappen te Harlem x1r, 1770. * De rerum var. lib. vir, cap. xLvI. 10 Atalaya da vida contra as hostilidades da morte. Lisboa, 1720, pag. 203. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. II. P. Il. I1 82 ESTUDOS SOBRE Willis, Rollo ! e Renauldin *; o sr. Ormerod * que viu um doente to- mar em vinte e oito dias 4:250 onças de liquido e urinar 5:130; e o sr. Burresi de Sienne *. A opinião contraria tem sido sustentada por Kru- ger Hausen, que suppõe ser a relação de 11:13; por Bardsley * que pensa ser de 9:10; por Neumann *, Bouchardat e Bell” que affirmam ser a cifra das urinas inferior ou egual á das bebidas, mas nunca su- perior. As nossas experiencias parecem confirmar esta mesma opinião; n'um caso achámos a bebida para a urina como 1,24:1, en'outro 2,45:1 em maximo, e 1,10:1 em minimo, sendo as relações intermediarias DiaglA Fo MMA e a ieiafo Wa ORE a MA MARE do BI! Sn o” o MR om a nd de PR e o A q 12/22 E IR A DA A 2,45:1 LO! fes o aà E 1,21:1 Ta gg TE de de RS 1,32:1 O VS coa eso O AD A fe 1,28:1 OLL A cem na E dp Hd ed db de E 1,30:1 e ad dg LO NEDARA o BARES ONU pA 1,80:1 É LE tessli Cah pc 1,48:1 e Td A A 1,34:1 15 san! 16 ae ted MA Raras, Va pa Os, GAROA SESI Na RAÇA Pet desta 1,16:1 BASE EAD CIDADES FIO IAM A E 1,00:1 Ds Ta ci DI 1,06:1| Neste periodo não entraram 929, 1 06d E linha de conta os liqui- « 98. 1.20:1 Aa e com as comi- ! Traité du diabête'sucré, pag. 7. 2 Dict. cit. de 60 vol., art. diab. * Med. and surg. Journ., janeiro, 1847. * Ann. de la soc. de méd. Anvers, 1861, pag. 258. 3 Med. reports, 1807. $ Von diab. méd. conv. Blatt, 1830. ? Diet. des études méd. prat. art. diabête. DS A O A op A a o a E o a A DIABETE 83 Dia 24. 11,22] E Soupjagro be siaso eis 1,00:1 26.. 1,08:1 am F 1,00:1 ” Estas experiencias estão de accordo com as de Nasse de Bonn !, que achou n'um caso 1,5:1 em maximo, 1,08:1 em minimo, n'ou- tro 1,3:1 maximo, 1,08:1 minimo; e com as de Th. van Dusch * que verificou em tres diabeticos ser a bebida superior ás urinas; e não dif- ferem tambem muito das de Schutzenberger *, Barbier *, e Auffan * que acharam esta relação como 1:1. A razão porque muitos auctores pensam ser a somma das uri- nas superior á das bebidas ingeridas, parece-nos ser a dada por Nasse, isto é, que os doentes occultam a quantidade de liquido que bebem. Em Franca tivemos occasião de verificar este facto; um doente a quem se permittia só uma certa dóse d'agua apresentava sempre as urinas su- periores a esta; interrogado elle e a irmã de caridade de servico, sobre este phenomeno, e apresentando nós algumas duvidas a respeito da totalidade do liquido bebido pelo doente, foi-nos sempre respondido, tanto por elle, como por ella, que a quantidade tomada era só a per- mittida; insistindo com elle, e promettendo-lhe pôr á sua disposição a agua que quizesse, confessou-nos então que bebia ás escondidas, e d'ahi por diante comprida a nossa promessa, as urinas foram sempre infe- riores á bebida. Se não fosse empregado este meio continuariamos a ser enganados, resultado inevitavel da falta de cuidado habitual d'este genero de enfermeiras. Já se vê, pois, a consideração que ligamos ás diflerentes theorias imaginadas para explicar o excesso de urina rela- tivamente ás bebidas. Estas theorias são: 1.º A de Areteo * seguida por Home, que suppõe uma liquefa- ção dos solidos : carnes et membra in urina liquari. 2.º A de Haller ”, Reil, Klapp e Dungerfeld, seguida por Chomel *, “que suppoem uma absorpção, pela pelle ou pulmão, da agua contida no ar atmospherico. 1 Arch. fur phys. Heilk, 1851. 2 Zeitschrift fur ration. Med. von Henle's und Vierordts, 1853, Bd. 1. ? Gazet. méd. de Strasbourg, 1855. 1 Du diabête sucré, 1856. Montpellier. Du diabete sucré. Strasbourg, 1859, pag. 5. 8 Lib. 11, cap. 11. * Elem. Phys., t. vir, pag. 392. * Abeille médicale, 1844, pag. 222, Aiii 84 ESTUDOS SOBRE 3.º A de Rutherford !, que admitte a formação de uma grande quantidade de agua no pulmão, á custa do oxygenio do ar, e de um excesso de hydrogenio existente no sangue. Mas qual será a razão da polyuria na diabete? Será, como quer Barlow *, devida ao poder diuretico do assucar? Julgamos o phenomeno assaz complexo para ser explicado tão simplesmente; ás investigações futuras pertence resolvel-o. S 27.º Temperatura Acha-se diminuida como a do corpo. Este facto apontado por Re- nauldin * e negado por Bardsley, foi verificado por nós n'um doente *. Marcando a urina normal 38º,3 a 39º,56 e em média 39º,12, segun- do Brown-Séquard, no nosso doente marcou entre 34º e 35º,5, sendo os numeros intermediarios: Dias Graus Temperatura do ar Pa a po 35º. 15º eric dd ed é E É e SR 16º E Pendy D e Ads Pd Ar ALL 16º,5 eee Bit E SO POUCO. 16º,5 5 es rn, era 145 6 ER Je A 14º 7 SA DR ORAS E 14º Sen ES tai O qi oO 13º,5 E cade SO SEVERA RITA, 14º,5 10 FB TARA am 15, 11 DELE 15º 12 STE O DA 158 13 SUP IdA SIR 4, 14º,5 14 So ANJ, 15º 15 DUB. era oO 15º TOSA ES as RA 34º,5 15º ! These inaug. A. Marcet. pag. 179. 2 British and foreign. medical review, oct. 1841. 3 Dict. des scienc. méd. art. Diabete. * Considérations sur un cas de diabete, pag. 28. A DIABETE S 28.º Densidade Na urina normal, segundo Becquerel, a densidade varia de 1:024,790 a 1:014,934, e a média é 1:017,010; n'esta doenca porém soffre uma grande variação, que é, segundo Bouchardat e Becquerel de... ..... Guitard 48 2 pao cd go ogsio de PE GE RE SEG do E A Contour e Martin Solon ... Bell...... R. Willis. .. :.1:020 a 1:074 1:000 a 1:044 1:028 a 1:040 1:025 a 1:052 2. 1:027 a 1:049 :1:025 a 1:060 1:020 a 1:055 D'esta taboa resulta que a urina diabetica póde variar de 1:000 à 1:074 ou antes de 1:000 a 1:111, porque Gripekoven achou n'um caso este numero. Ser a densidade menor que a normal não é muito frequente; alguns casos comtudo teem sido observados por Guitard, Fonberg (1:008)*, Diet], e por nós (1:010,500). Varía todos os dias n'um mesmo doente, e em um caso vimos ser : 1! Encyclographie des sciences médicales, avril 1840, pag. 97. DitaR a) (6) (6) 0) 16 ce. ss. . 20 cs 00. Dis O Ou QuE Densidade . 1:013,440 no... .. 1:019,320 1:013,440 1:014,700 - 1:014,700 1:014,700 - 1:014,800 DD a dO UI O 1:016,800 . 1:016,800 cv. o. a. 1:016,600 e EO NS TOO: ec... 1:014,700 - 1:014,280 1:014,120 - 1:015,800 1:016,800 2 Ann. der Chem. und. Pharm. 1849, Bd. LXHI. 86 ESTUDOS SOBRE Dias Densidade TE ars Rr e AO 18.0. tapes play: 1:014,700 ORLA TEM do cafeyri 1:016,800 20. 50 «Chnigãs «ds gem 1504,4,200 DM e rs E NR GA da 1:013,440 Varia tambem á mesma hora todos os dias; ás seis horas da ma- nhã durante dezeseis dias, foi em um doente nosso: Dias Densidade | DEE sas SS JR RS 1:010,500 dão MR RE DD 1:012,600 Soa paciadeth pasa é 1:014,700 E CATETER RETA E TA DR] MA SR 1:021,000 5.8 ago sena sbolbieds0L8;900 Bsedo abit moss .olrdz0d 4,200 Void MIO Virais me 1:014,700 DB.» 9tesob armadas als 1:012,600 CAE E de qa RR SR 1:012,600 UBMBRMNAE 22 sato de io 1:014,700 DIR ESO Etoss siada o, glião 1:016,800 MOI Bs ea nire ti ara 1:012,600 DES BABE sum a reme +s 13012,600 REG SE Sumare oi 1:014,700 LESS O - prtede sr o 1:01 4700 MOLA LO Ecce rena ot 1:018,900 As nove horas e meia da manhã variou assim : Dias Densidade MEG DEt rr de sure 1:013,020 PAR OR LE PAR 1:021,000 E MO PR RR LD DE EA ERA LES CAR SR 1:014,280 DRA TOS Serrat 1:013,440 OBA! M os o das er deO 11604680 Mede o o pp es e «IR DIDO COPA PRA E cu PR 1:014,700 à Leve 1 E 1:016,800 A DIABETE Dias ] Densidade UA SAS TR 1:016,800 TUR es mebo rage toro 1:012,600 ZA 8 SR LAO E RT RR 1:014,600 LBA MI sogro vrsmo 1:018,900 PAR Soto ger NTE 1:014,700 DAS TE MBA ao no/to do too Fofo 1:015,120 DG ESSA ara go no tod EO 6,800 Dias Densidade Niro Ep pa Rr TS QUZIGÕO DO Sr eS DEE DR e à 1:014,700 SD. ads cuido io 1:013,020 AOL ocre 05! USO ADO BLA. ssateçcio cio PDEO NA,980 CAs sois sure a A 1:016,800 UERR 8 dee RD PO 1:014,700 Obi o qo vi ANTES É ds a 1:016,800 GA do MEP sd 1:021,000 DOME su ts a has R 1:018,900 RAM o go soneto co 70 ars ARO NGS 00 UOL E se 1:014,700 | E ed RE RS RD TE RT 1:016,800 DS Ud DRE E 1:014,280 A SD DEDE E ER 1:016,800 GM A Er. 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EA [1:014,700 8 horas.. “4 1:012,600 6 horas.. ara 1:014,700 , 3 9 e meia “11:013,020 1 hora.. ESET 1:013,020 8 da EE RA: Os DO 6 horas.. a et 1:021,000 ] 4 9 e meia “11:014,280 1 hora .. E taTdE 1:014,280 8 horas. “1 1:012,600 6 horas.. da 1:018:900 ; 5 9 e meia 1:013,440 1 hora.. d 1:014,280 8 oa o 1:013,020 1 La clinique curopéenne, 1859. [o 2) = [=p ta a co tt a, MEM. DA ACAD. — 1.º E A DIABETE 6 horas.) ee y :014,700 9 e meia) 1:016,600 1 hora.. à ves SUR st 016,800 8 horas.. “(1:014,700 6 horas.. | 4 ue 4 1:014,700 9 e meia) 1:012,600 Í para (da bode si 1:014,700 8 horas.. 1:014,700 6 horas.. aaa 1:012,600 9 e meia 1:014,700 1 hora.. aipRtaça 11:016,800 8 horas..) E 012,600 6 horas.. | hã 1:012,600 9e meia | AMRS A 016,800 1 hora. “da Fem (1:021,000 8 horas.. [1:018,900 6 horas..) 1, al aa 1:014,700 9 e meia) 1:016,800 1 hora.. dá uide 1:018,900 8 horas.. “11:014,700 6 horas.. 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Lda PR [1:014,700 Da 15 9 e meia) (1 015,120 E 1 hora. q ali 1:016,800 8 horas. .| O" PC: 1:012,180 1:018,900 1:016,800 1:014,700 1:014,280 da manhã. | t hora .. da tarde... 8 horas..|º4 á Resumindo, pois, e tomando a média dos dezeseis dias para cada hora em que foi feita a observação, achámos: Cl horasída manhas 1:014,831 9 e meia; dafnpoiac. nl ttisoo croia 1:015,311 [ Iorasidal tardes 1:015,697 S"horas da, iabrai 9h... . 4 JEM BIAS ou collocando-os pela ordem da sua maior densidade: 1:015,697............ 1'hora da tarde EO NNE Sgt soco and 9 e meia da manhã LOU Ne E gas pecar 6 da manhã 1:013,938. 0000 20.0.... 8 da tarde S 29.º Exame microscopico A urina no momento da emissão nada apresenta de rotavel; pas- sado porém algum tempo, observam-se os globulos de fermento des- criptos por Quevenne !, que são analogos aos que Cagniard-Latour notou no fermento da cerveja, e cuja configuração se acha estampada no tra- tado de urinas de Golding Bird, e na botanica medica de Moquin Tandon. A sua fórma é ovoide, e teem = ou 55 de millimetro em diametro ; alguns assemelham-se aos globulos sanguincos, e acham-se ora isolados, ora ligados em pequenas massas de fórma curva; fervidos com a po- tassa caustica, diminuem de volume, mas não se dissolvem; apresen- tam-se então mais pallidos, e formando uma massa confusa. O carbonato * Journ, PExpérience, 1838, t. 1, pag. 405. A DIABETE 91 de soda quasi que não tem acção sobre elles; a ammonia tem-na mais fraca que a potassa; resistem aos acidos, tornando-se porém mais pal- lidos, e não se solvem no ether. Estes globulos são numerosos quando se deixa a urina dois ou tres dias exposta ao ar; forma-se então uma nuvem branca como leite, onde elles estão, a qual se deposita no fundo do vaso, e actua á maneira de fermento, como notou Prout '. Este sedimento é unctuoso ao tacto; depois de lavado apresenta-se de- baixo da fórma d'um magma branco sujo, com cheiro azedo, sabor en- joativo, mais denso do que a agua e com reacção acida. A analyse dá oleo amarello aromatico, materia extractiva com o cheiro d'osmazo- mo soluvel na agua e alcool, acido lactico, acido phosphorico, phos- phatos e carbonatos de cal, e uma pouca de gordura, segundo Vigla a O mycellium das urinas diabeticas não é o torula cerevisiae, se- gundo Bence Jones, Hassall e Darrach ?, mas sim um vegetal de um genero e especie diferente; e este ultimo auctor acrescenta que o pe- nicillium glaucum não pertence essencialmente ás urinas diabeticas. O sr. Marchesseaux * achou tambem uma vez o acarus domesticus; mas parece-nos que este facto nada tem de particular com a doença de que nos occupamos, e foi devido sem duvida a alguma cireumstancia ex- traordinaria. $ 30.º Da reacção A urina, que de manhã, no estado normal e no momento da emis- são, é acida, depois neutra ou alcalina, e no resto do dia acida, se- gundo o sr. Delavaud º, não segue a mesma lei na diabete. N'um doente a vimos alcalina durante dezesete dias, e depois acida durante nove: e já noutros temos verificado esta circumstancia. O sr. Auflan n'um caso achou-a acida pela manhã *; mas John * e Lehmann * viram-na alcalina. Este ultimo pensa que, passado algum tempo depois da emis- são, torna-se acida pela formação d'acido laetico; porém nos casos que temos observado, umas vezes a urina conservou-se alcalina ou passou de acida a alcalina, e outras tornou-se acida. 1 Inquir. on the nat. and treat. on diab., pag. 61. 2 V'Expérience, t. 1, pag. 187. 3 The american Journ. of the med. scienc. 1860, pag. 421. 1 Resumé des trav. de la soc. Havraise. Havre 1846. * Compt. rend. de la soc. de Biologie 1851, pag. 118. é De la glycosurie. Strasbourg. 1859, pag. 37. 7 Chem. Untersuch. veg. anim. min. Korp. Berlin 1810. 8 De urina diabetica. Leipzig 1835. 92 ESTUDOS SOBRE $ 31.º Analyse da urina diabetica Eis o quadro de algumas analyses completas da urina diabetica para melhor se comprehender o que dissermos sobre cada um dos componentes: 1.º a de Bouchardat. Meta. O. Gui. pertuastus. nina lose rats 8357,33 Assucar PESA. OMiteto GhNSE Josie. 134,42 Tirea oiro MS PAO mota ANE ao 2,87 Albumina). a. cio egaitadaile esmigir. a 1,40 Mu co, Mane o entes eh, as Al rr! 0,24 Acidorlacitedtso. qual Mitos a orantragera Materias extractivas soluveis no alcool 6,38 ) Lactato de ammoniaco. E Materias extractivas eos na ata 5,27 Satsie eee do cb: sra! 8,69 2.º A de Mueller !. Em 1:600 grammas Assucartçte Merss quer nloston gs Elia! 778,05 Ure. Ses der 3 coitado. HO pts 0,075 Acido! bipparigo meras 5 sugar ais .*. signaes Bixiracto ;traquir no gm eme saaros 22,20 Materiasimúcosas! users pas ao 0,25 Gommall's do viro RR Elo 5,40 Albumina . Rb) PU OA ADS Pa POPA 0,35 Sulphato de pbtissal dh TS Da 0,25 Chlorureto de sodio. ............. 0,65 Chlorureto de potassio............ 0,175 ' Chlorureto d'ammonia,........... 0,40 Phosphato de lealsti a dio dou dos. 0,30 ; » de soda. RISORAL NENE o dra 0,412 » de ymaghesiasad caEl jsco! bah 0,008 1 Arch. des Pharm. eine Zeitsch. der Apothek. Vereins in Nord Deutsch. 2. H. Bd. 18-s. 55-1840. DR (q E O, ci A DIABETE 93 Oxydo de ferro. ......... signaes Sica! dexa sad pari 0,05 CAFE OPRN a eta Po apar a 1484,00 3.” e 4.º as de Simon E 4 A UA Dea NE à Eres RS a 957,00 960,00 Materias solidas. . ........ 43,00 40,00 Eirdas eps gia É RE signaes a Acido urico............. Signaes signaes PASS Car. Ft Merda mi a PD ORO 0) 25,00 Materias extracti- vasdelsaesisol= AR a: 2,10 6,50 VOLSS, PESE! a das Phosphaitos. cs aaje ela 0,52 0,80 Abu day agem mgs issues mas signaes | signaes 5.º, 6º e 7.º as de Percy 5. (De This sta So tags oie colada 894,50 918,30 898,90 Materias solidas .... 105,50 81,70 101,10 Urca! rato E 1251614, 80,32 2,89 Acido urico ....... 0,16 0,26 indeterminado IASSUCA E efe de ipod AO iiahS 79,10 Materias extractivas/ , 4 j DO FIZ 19,52 e saes soluveis. .. Phosphatos........ 1,30 0,09 $ 32º Da agua A quantidade d'agua, que physiologicamente é nas vinte e qua- tro horas, segundo Becquerel, de 1:282º,634 em média, 1:500 gr. em maximo e 800 gr. em minimo, é na diabete, diz Lheritier !, de 19957,562 em média; o que nos parece diminuto, pois n'um caso en- contrámos 13:248 gr. Em geral deve ser sempre superior ao numero indicado, porque variando a quantidade d'agua nas analyses de urinas 1 Chimie physiologique, pag. 428. 94 ESTUDOS SOBRE diabeticas entre 800 a 960 gr. e mais por 1:000 de urina, e sendo a somma d'estas de 3:000 gr. diarias pelo menos, teremos na hypothese mais desfavoravel 2:400 gr. $ 33º Das materias solidas As materias solidas que physiologicamente variam de 32,786 a 48º,024 acham-se diminuídas na diabete, segundo Lheritier, Nico- las e Gueudeville; porém, conforme as analyses de Simon e Percy, ou estão na quantidade normal ou são exageradas. S 34 Da urca A uréa varia physiologicamente entre 28 e 30 gr., segundo as experiencias de Scherer (1852), Bischoff (1853), Rummel (1854), Fran- que (1854) e Smith (1860). Na diabete tem a avaliação da sua quantidade suscitado duvidas; sustentando uns que ella se acha abaixo da normal, outros que lhe é egual e outros superior. Nicolas e Gueudeville!, Henry, Lheritier ?, Du- puytren e Theénard, Vauquelin e Segalas são da primeira opinião; W. Prout *, John Bostock *, Barruel*, Kane, Rose *, Picard " e Becquerel seguem a segunda; Mac Gregor*, Millon, Auflanº. Haughton (1861) e Thicrfelder (que a achou em alguns casos na dóse de 90 e 94 gr. diarias) sustentam a ultima. Alguns auctores, mas em numero mui li- mitado, pensam que a uréa chega até a desapparecer; entre estes con- tam-se Chevalier !º e Chevreul ”, Todas estas differenças explicam-se facilmente pela natureza do processo empregado; assim a uréa não póde com rigor dosar-se pelo t Recherches sur le diabête sucré, pag. 98. 2 Loco citato, pag. 555. * Med. chir. transact. Lond. 1818, t. vir, pag. 526. 4 Mem. of the med. soc. of London 1806, t. vI, pag. 237. º Journ. de chim. méd. 1829, t. v, pag. 14. é Neues. allgem. Journ. der Chem. 1806, t. vt, pag. 91. 7 De la présence de Yurée dans le sang. 1856. 8 Journ. de chim. méd. 1829, t. v, pag. 14. * Du diabete sucré. Strasbourg 1859, pag. 7. 10 Journ. de chim. méd. 1829, t. v, pag 77. 4 Blainville, Cours de physiol. gen. t. 111, pag. 190. PN e ND A DIABETE E pêso, porque em presenca do assucar crystallisa com difficuldade, acres- cendo a isto ter Henry ! notado que ella se decompõe com muita fa- cilidade n'esta doença. Além d'isso as differenças das dietas a que os doentes estavam sujeitos, e o momento em que a analyse foi feita, são razões mais que sufficientes para explicar esta diversidade de opiniões. De facto, Sydney Ringer viu que o maximo da excreção da uréa appa- recia de uma a tres horas depois da comida. Segundo Reich *, Fonberg *, John *, Morin * e Schmidt, a uréa está na razão inversa do assucar, porque (diz este ultimo) é feita á custa dos elementos da glycose. Como quer que seja, o facto é que esta substancia varía em ra- zão da alimentação, regimen e maior actividade das funcções. Auffan * viu que a mudança da dieta animal para a vegetal, e d'esta para aquella produziu a seguinte differença : Dias Uréa Regimen Nao Di ilorde pão, batatas ad libitum, sopa, pouca carne 2a 978,90 — 1 kilo de pão, batatas, mais carne RA 64,69 — > kilo de pão, idem 4.º 63,24 — 375 gr. de pão, idem os 69,88 — 250 gr. de pão idem 6º 62.04 — 250 gr. de pão, idem RS 90,40 —. nada de pão, idem 8 41,99 — 125 gr. de pão, menos carne O sr. Sydney Ringer determinou até que, durante a abstinencia ou o regimen azotado, está a uréa para o assucar como 1:2,2, e que mudando para a dieta feculenta o segundo termo da proporção aug- menta consideravelmente. O sr. Bence Jones ” quer tirar um elemento para o diagnostico da quantidade da uréa existente na urina, e suppõe, não sei com que fundamento, que o augmento d'esta substancia na urina diabetica de- ! Mekel. Deutsch. Arch. t. 11, pag. 658. 2 Arch. der Pharm., 1847, Bd. 10. s. 29. 3 Ann. der Chem. and Pharm. 1847. Bd. 68, s. 360, * Chem, Untersuch. veg. anim. und min. Korpen Berlin 1810, pag. 105. 5 Journ. de pharm. 1843. $ Loco citato, pag. 36. * London med. chir. transact. vol. xxvr. 96 ESTUDOS SOBRE signa um exito feliz. Em opposição a esta idéa estão as experiencias de Thierfelder e Uhle!, Mosler ?, Heynsius *, Rosenstein *, Bocker º, Gar- rodº, Leubuscher”, Sydney Ringer* e Haughton º, as quaes mostram, que nos ultimos periodos da doença, a uréa augmenta consideravelmente, o que é um terrivel signal. Estas observações explicam, além d'isso, a variedade de opiniões dos auctores sobre a quantidade d'esta substan- cia na diabete, vindo assim a ficar estabelecido que não se exagera nos primeiros periodos, mas sim no ultimo *. Devemos aqui notar que a proporção de uréa não se póde avaliar, como alguem suppoz, pela den- sidade, porque não ha entre ellas relação alguma, como viu Millon !': Densidade Uréa LD E MO OO E rannas DEDE 8,25 » Soo ab pop ae 21,50 » LED BB 9,91 » 102 e MAR 8,7 grammas LEAD 7 ME 10,6 » 1:034. : 0,5 » E |Siaa 2. ad Cds OO LO Em ED O e Eneas E 3,92.» EL TA O aos aa AU a ca 13,86 » Ee hs DE Tiaras us teatoy SOL ILIAA SA o E 0,25" » 1 Wunderlich's. Archiv. 1858. 2 Arch. fur physiol. Heilkund. 111. 3 Hollandische Arch. 1. 4 Virchow's Arch. xII € XIII. 5 Deutsche Klinik 1853. º British med. Journ. 1857. ? Med. chir. Transact. 1860, vol. xLIIr, pag. 323. 8 Virchow's Arch. xvrrr. 9 Dublin quart. Journ. of med. sc. 1861 10 Parkes, The composition of the urine. London 1860. 1 Études chim. org. Lille 1849, 1. 3. 12 Journ. de pharm. et chim. 1843, t. 11. Ea, - ar A DIABETE 97 $ 35.º Acido urico A quantidade d'este acido, segundo Becquerel, é de 07,4 a 0,6 nas vinte e quatro horas e, para Lheritier, de 0,3 a 0,7. Na diabete, segundo R. Willis, Thénard, Barruel *, Henry ?, Lu- roth * e Elliotson *, elle falta completamente. Nicolas et Gueude- ville * porém, encontraram-no na urina, mas em quantidade menor que a normal: e depois d'isso muitos outros teem verificado a sua pre- sença, entre elles, J. F. John º, W. Prout ! e Lheritier. De resto, a circumstancia do apparecimento de calculos e crystaes de acido urico na urina d'alguns diabeticos, devia já fazer prever a existencia d'este acido. Factos d'esta ordem foram notados na antiguidade por Bernar- dus Cordonus * (arenulac rubeae et solidae apparent), e mais moder- namente por Bell º, Rollo !*º, Rayer !, Mialhe ?, Chevreul, Bouchar- dat, Plaindoux, Kuchenmeister * e por nós. Das observações mais recentes parece poder concluir-se que a sua influencia na doença não é mui grande, por quanto o sr. Picard “ achou o acido urico n'um caso na dose de 0,67, eo sr. Auffan É viu-o variar n'um mesmo doente entre 0,47— 0,48-—0,29-—0,40—0,60— 0,56 — 0,85; não nos parece pois que o sr. Bence Jones º seja muito exa- cto, quando suppõe o apparecimento d'este acido como um signal de bom agoiro. ! Journ. de Chim. méd., t. v, pag. 12. 2 Journ. de Pharm., t. xxvir, pag. 617. 3 Répert. Anat. et Phys., t. 111, 1.º parte, (1828). 4 The Lancet, 1833. n. 71. * Loco citato, pag. 97. $ Chem. Unters. miner. veg. und anim Subs. Berlin, 1810, p. 94. 7 Méd. Chir. transact. London, 1818, t. vir, pag. 526. ê Lilium medicinae, Lugduni 1574, pag. 588, º Dict. des scien. médicales. art. diabête. 10 Loco citato, pag. 11 e 18. It ['experience, 1838, t. 1, pag. 640. 12 Arch. gén. de méd., t. vir. 13 Gunsburg's Zeitschrift, Bd. iv, S. 438. 1 De la présence de I'urée dans le sang. Strasbourg, 1856. 5 Du diabete sucré. Strasbourg, 1859, pag. 36. tê London med. chir. transact., t. XXXVI. MEM. DA ACAD.— | .º CLASSE. —T. 1. P. IL. 13 98 ESTUDOS SOBRE $ 36.º Acido hyppurico Este acido que segundo Liebig, Weismann, e Hallwachs existe na urina normal, acha-se augmentado na urina diabetica, como mos- tram as experiencias de Neubauer, Mueller, Wurtzer !, Lehmann? e Valentin º, $ 37º Acido benzoico Segundo Schindler * o acido benzoico apparece na urina diabetica; porém Nicolas, Gueudeville e Henry * negam a sua existencia; e quanto a nós com razão, por quanto é muito facil pelo processo d'analyse empre- gado transformar-se o acido hyppurico em benzoico; sendo por isso muito mais logico admittir que o producto achado por Schindler era o acido hyppurico decomposto, como provam as experiencias de Du- mas, Dessaignes * e Van Tieghem ” $ 38º Xanthina Scherer *, Strahl e Lieherkuhn * admittem a existencia deste principio na urina physiologica ; na diabete pensamos que não soffre mudança alguma, por quanto as experiencias de Jackson ”º assim o pa- recem provar. $ 39º Oxalato de cal Nos casos em que a doença é pouco forte não é raro, segundo o sr. Bence Jones !!, encontrar este sal: admittindo-se porém a opinião À Berzélius. Traité de chimie, t. vi, pag. 368. * Journ, fur pratick. Chem., 1835, Bd. vi, S. 113. * Grundriss der Phys., pag. 308. 4 Rust's Magaz, Bd. 37, Hft. 2. à Journ. de Pharm., 1841, t. xxvir, pag. 617. * Annal. de chimie, 3.º serie, t. xvir, 1846, pag. 50. 7 Thêses présentées à la faculté des sciences, n. 246. Paris, 1864. º Annal. der Chem. und Pharm. 1858, novembro, t. evir, pag. 314. º Harnsaure im Blut. Berlin, 1848, pag. 112. 10 Arch. der Pharm. 1837, Bd. xx. !1 London med. chir. Transact., t. XExvI. A-DIABETE 99 de Walsh !, nenhuma importancia teria esta observação de Jones por quanto elle considera a presença do oxalato de cal na urina como physiologica. $ 40º Ammoniaco 2 Caventou ? achou-o n'um caso, livre no momento da emissão. S 41º Phosphatos Estes saes, que representam uma certa quantidade d'acido phos- phorico, a qual normalmente oscilla entre 1,6 (Neubauer) e 5,2 (Win- ter), acham-se augmentados em alguns casos de diabete, segundo as experiencias de Picard e as nossas; porém Nicolas e Gueudeville jul- gam-nos diminuidos. S 42º Chlorureto de sodio Physiologicamente a sua quantidade varia, segundo Vogel, de 10% a 13 e segundo Kerner * entre 15,0 e 19,2. Picard em alguns casos de diabete não o encontrou. O sr. Auflan pensa pelo contrario que o chlorureto de sodio augmenta com a molestia, pois o viu n'um caso variar para mais ou para menos, conforme os symptomas se aggrava- vam ou melhoravam ; por exemplo : Dias Chlorureto de sodio Diogo e qui eco tato. opavro RREO RAIO PEN RE A ço Pai e 4 DA DT) E RED SRS Ea LT é AO den VE R ER e SRD MEM De 18 ,40 (o std Cd een ria, 43 raiado 18,00 MN 9 é ee sa oa A analyse do sr. Bettamio d'Almeida na urina de um doente, ! Monthly Journ. of med. scienc., 1849, t. 1x, pag. 454. * Journ. complem., 1824, t. x1x, pag. 226. * Arch. fur. Wissensch. Heilk., 1858, t. 11, pag. 616. 13» 100 ESTUDOS SOBRE contendo 47 por 1000 de assucar, confirma o que diz o sr. Auffan, porque encontrou 23,2 de chlorureto de sodio. S 43.º Gordura Tem sido encontrada por Venables* e Gemmaro Festeggiano ?. Golding-Bird até chegou a extrahir o acido butyrico da urina d'um diabetico. SG 44.º Inosite Foi notada pela primeira vez por Hohl *,o qual chegou a extra- hir 20% n'um dia, verificando ao mesmo tempo que ella se manifes- tava quando o assucar e a uréa desappareciam. Este facto leva a crêr que C? H? O” (glycose) se transforma em 6 (Cº Hº 0?) (inosite). SG 45.º Materia extractiva Segundo Hunefeld “ ha na urina diabetica uma materia extracti- va particular e especial a esta doença, mas que ninguem isolou depois d'isso. SG 46.º Prussiato de ferro Esta substancia foi achada n'um caso por Cantu *. A sua obser- vação é unica, segundo cremos. G 47.º Creatina e creatinina * Estes dois productos azotados, o primeiro dos quaes foi descoberto em mui pequena quantidade por Heinz e Liebig na urina normal, e o segundo por este ultimo, acham-se exagerados na diabete. As obser- 1 London med. Gaz., abril, 1839, pag. 36. 2 Observatore medico. Fevereiro, 1841. 2 Arch. fur phy. Heilk. Nova serie, t. 11, pag. 418. g Berzélius t. Ir, edition belge, pag. 694. 2 Journ. de Pharm., 1833, t. x1x, pag. 192. A DIABETE 101 vações de Leo Maly ! mostram que a sua quantidade augmenta no ultimo periodo da doença, quando a uréa tambem se eleva. SG 48.º Acetona Segundo Bowman tem algumas vezes sido descoberta em urinas diabeticas *, $ 49.º Cholesterina N'um caso teve occasião de notar a sua presença o dr. Salisbury *, e fazendo a analyse quantitativa a achou na dóse de 103%“*,68 no to- tal da urina segregada nas 24 horas por um diabetico. SG 50.º Albumina Tem sido indicada na urina diabetica por Cotugno *, Cruikshank, Darwin *, Sorg *, Klaproth ”, Naumann e Rayer *, em alguns casos ; Hauner encontrou-a até na urina d'uma creança diabetica, e o sr. Pi- card º chegou a determinar a sua quantidade, que foi n'um doente de 48,86. O sr. Bird !º achou muitas vezes no ultimo periodo da doença uma materia proteica muito similhante á albumina, mas que era pre- cipitada pelo acido nitrico só depois da urina ter sido aquecida. Se- gundo Becquerel e Rodier, a presença da albumina na urina coincide sempre com a diminuição da quantidade d'esta. Mas qual será o valor semeiologico da albumina? Para Dupuy- tren, Thénard !! e Naumann a sua existencia na urina é d'um bom agoiro, e indica a reapparição das materias animaes que, na sua opi- g Wiener Med. Wochenschr, 1862. *? À pratical Handbook of medical. Chemistry, 1862, pag. 46, nota. * The american Journ. of the med. scienc., 1863, abril, pag. 281. 4 De ischiade nervosa comment. Vienna, 1770. * Zoonomie, London, 1801. $ Neues allgem. Journ. der Chem., 1806, Bd. 6, S. 9. ? Dict. de chimie, 1811. 8 Maladies des reins, t. 11, pag 224. * De la présence de Vurée dans le sang. Strasbourg. 10 The lancet, 1858, 20 março, 1856, pag. 55. ! Ann. de chim., t. 1x, 1806. 102 ESTUDOS SOBRE nião, desapparecem na diabete intensa, e estão na rasão inversa do as- sucar. Os srs. Prout, Rayer ! e H. Bell * consideram, pelo contrario, o apparecimento da albuminuria como um symptoma terrivel. O ultimo d'estes auctores, posto tenha a glyco-albuminuria como menos grave que a albuminuria, julga-a comtudo mais grave que a glycosuria. As experiencias do sr. Cl. Bernard levam-nos a adoptar a opi- nião dos srs. Rayer e Prout. Este sabio physiologista mostrou que quando se torna diabetico um animal, ferindo-lhe a medulla oblonga- da, se o golpe foi feito muito acima, manifestam-se desarranjos muito graves, a que póde seguir-se a morte do animal, e vê-se então a al- bumina apparecer nas urinas ao mesmo tempo que o assucar, em quanto que picando mais baixo apparece só o assucar, e os phenomenos mor- bidos passam rapidamente. Este ponto, quanto a nós, poderia ter uma certa importancia no tempo de Dupuytren, porque a physiologia pathologica d'esta doença estava pouco adiantada; hoje porém, que todos conhecem o valor se- meiologico da albuminuria persistente, a importancia da discussão so- bre o alcance da sua presença na diabete é nulla. 1 $ 51º Assucar Como vimos, fallando do gosto da urina, foi Thomás Willis o primeiro que suspeitou a existencia d'assucar na urina diabetica: quasi melle aut saccharo imbuta *. Algum tempo depois Pool e Math. Dob- son * admittiram a opinião d'este illustre auctor, mas foi Cawley * em 1778 o primeiro que demonstrou por meio da fermentação a sua exis- tencia real. Depois de Cawley, Marabelli *em 1782, P. Frank em 1791, Nicolas et Gueudeville em 1803, Thomé Rodrigues Sobral em 1805, Manuel Pereira da Graça em 1806, e outros " verificaram a presen- 1 Compt. rend. et mém. de la societé de Biologie 1851, pag. 44. 2 An essay on diabetes. London, 1842, 3 Pharm. rationalis sive diatrib de operat. in human. corpore. Hagae Comit. 1667, part. 1, sect. Iv, pag. 164. 4 Medical observ. by a Societ. of phys. London, 1775, t. v, pag. 298. 3 The London med. Journ. 1778, t. 1x, pag. 286. é Memoria sulli principi esulle differenze d'ell orina in due spezzie di diabete con- frontata colla natural. Pavia, 1782 pag. 32. 7 Taes são Cadet, Neves allg. Journ. der Chem., 1805, t. 1, pag. 952. Dupuytren et Thénard, Ann. Chim., 1806, t. LIx, pag. 44. Rose, Neues allg. Journ. der Chem. 1806, t. vi, pag. 21. Bostock, Mem. of the medico-surg. society of London 1806, t. vi, pag. 297. A DIABETE 103 ça d'este principio na urina diabetica. Desde então a existencia do as- sucar nas urinas foi considerada como o caracter pathognomico da diabete; e só por excepção vemos dizer a Dezeimeris * que a existen- cia d'este principio na urina é uma circumstancia accidental, que mui- tas vezes falta. Mas qual é a natureza d'este assucar ? Cullen julgava-o similhante ao assucar ordinario, e Nicolas sup- punha ser uma especie particular d'elle. Em 1826 o sr. Chevalier * considerava-o ainda identico ao assucar de canna, quando anteriormente (1815) o sr. Chevreul ? já tinha mos- trado a sua identidade com o assucar d'uva, observação que mais tarde confirmaram Prout, Erdmann, Peligot e Soubeiran +. Em 1823 tam- bem Caloud * tinha notado a combinação em que sc acha o assucar com o chlorureto de sodio da urina, á maneira do que tem logar com o assucar d'uvas : Chlorureto de sodio. . ...... 83 ASSUGAR polo trafos «SP RfIS e cR 917 1:000 Apesar das observações d'estes chimicos, alguns dados fornecidos pelo polarimetro pareciam comtudo contradizer esta opinião : com ef- feito, o assucar d'uvas, antes da sua crystallisação, desvia para a es- querda o plano da polarisação, em quanto o assucar diabetico antes e depois da crystallisação, desvia sempre o plano da polarisação para o mes- mo lado, e com o mesmo grau de intensidade que o assucar de fé- cula. O sr. Biot * porém destruiu esta objecção, demonstrando que o assucar de uvas, tendo sido crystallisado e depois dissolvido em agua, polarisa para a direita, como o assucar de fécula. D'este modo a iden- tidade entre o assucar de fécula, de uvas, e diabetico ficou perfeita- mente estabelecida. A questão estava n'este ponto, quando o sr. Cl. Bernard apre- ! Mem. de la societé d'émulation, t. 1x. pag. 211. 2 Arch. gén. de méd., 1826, t. x, pag. 320. 2 Bull. de Soc. philomatique, 1815, pag. 148. * Journ. de Pharm. et de Chim., 1842, pag. 2. * Journ. de Pharm., 1825, t. 11, pag. 563. º Gazette, médicale de París 1843. 104 ESTUDOS SOBRE sentou um caracter novo e differencial entre o assucar de uvas e o diabetico ou do figado. Estas duas especies de assucar, postoque fer- mentem egualmente com o fermento de cerveja, differem comtudo em que o assucar diabetico decompõe-se nos vasos sete ou oito vezes mais facilmente que o assucar de uvas; isto é, para que o assucar diabetico ou de uvas appareçam nas urinas, é necessario introduzir nos vasos sanguineos sete partes de assucar diabetico, em quanto para o segundo é necessario introduzir sómente uma parte: a razão do phenomeno é. a maior destructibilidade do primeiro. As experiencias de Limpert e Falk ? vieram confirmar completamente a observação de Bernard. A experiencia tem mostrado, além d'isso, que o assucar diabe- tico é perfeitamente identico em composição ao assucar do figado des- coberto pelo sr. Bernard. Prout mostrou que a sua composição é de 34 a 4() de carbone para 54 ou 60 de hydrogenio e oxygenio. Ber- thelot e Luca provaram até que a composição de ambos é identica á da glycose ?. Sendo os assucares divididos geralmente em assucar da primeira especie (que comprehende os que, resistindo á acção dos alcalinos, se convertem debaixo da influencia dos acidos em assucar de segunda es- pecie), e assucar de segunda especie (que comprehende aquelle, sobre os quaes os acidos diluidos não teem acção, mas são destruidos pelos alcalinos), é necessario dizer que o assucar diabetico é um assucar de segunda especie, e que os caractéres da especie são aquelles de que nos aproveitamos para o diagnostico da diabete. Existem por ventura na urina dos individuos affectados desta doença duas especies d'assucar, um sapido e outro insipido, como pen- saram Dupuytren e Thénard? Os srs. Guibourt, Bouchardat e Becque- rel demonstram perfeitamente que o pretendido assucar insipido, não é senão uma mistura do assucar diabetico com lactato d'uréa, lactato de soda, chlorureto de sodio, e materias extractivas, substancias que : desapparecem pelas lavagens successivas de ether sulphurico alcoolisa- do, e deixam a glycose no seu estado de pureza. Em vista d'estas experiencias, e do facto da urina diabetica per- der e adquirir muitas vezes o sabor adocicado, a asserção de Dupuy- tren e Thénard cae completamente, sendo para notar que Goodman * ainda a admitta na actualidade. Mas o principio saccharino existirá nor- 1 Virchow's Arch. fur pathol. Anat. 1856, t. Ix,pag. 56. 2 Annal. de chim., et de phys. 1860, vol. Lvu, pag. 448. 3 New Orleans med. and sur. Journ. 1860. A DIABETE 105 malmente na urina? Apparece em outros estados pathologicos além da diabete? Ou será especial só a esta doença? Fourcroy, em 1801, parece ter suspeitado ! a existencia d'este prin- cipio na urina das amas, visto dizer «il est possible qu'on trouve à leur urine un caractéré sucré. Antes d'elle já Rollo tinha notado a sua presença na urina das mulheres pejadas, que soffrem algum incom- modo do estomago ?. Mais tarde os srs. René em Montpellier, e Blot com Reveil e Berthelot em París, acharam-no (1856) egualmente nas urinas das amas, puerperas, e em algumas pejadas na dóse de 1 a 12 gr. por 1000. O sr. Leconte sustentou que é verdade a reducção dos reactivos pelas urinas das mulheres sobre parto, etc., mas que é de- vida a um excesso d'acido urico (que tem esta propriedade), e não ao assucar *. Bernard *, sem se pronunciar abertamente, nota que a reduc- ção do licôr cuprico é lenta n'estas urinas, e que pela fermentação não mostram assucar ; Becquerel porém confirmou plenamente as ex- periencias de Blot, por quanto verificou a existencia pelo polarime- tro *. Wiederhole, Beidel, Bruecke, Kirsten e Lecog * confirmaram egualmente estas experiencias; este ultimo em sete casos viu variar a quantidade de glycose entre 2 e 6 gr., servindo-se para isso da potas- sa, do licôr de Fheling e do subnitrato de bismuth, e notou que nas mulheres pejadas ella augmenta principalmente nos ultimos mezes. Kirsten ” concluiu das suas observações, que nas amas a sua quanti- dade tambem augmenta quando desmamam as crianças. Parece-nos, em vista d'isto, que é real a existencia da glycose n'es- tes casos, e que as observações do sr. Leconte não tem valor, por quanto o acido urico não reduz o subnitrato de bismuth, nem se torna es- curo pela potassa; além d'isso este auctor empregou dous maus pro- cessos para provar que a reducção era devida sómente ao acido urico; no primeiro (aquelle em que o proprio auctor confia pouco) junta a ammo- nia, que segundo os trabalhos de Duroy, impede a precipitação do oxi- do de cobre, ainda mesmo havendo assucar; no segundo serve-se do acido acetico e do alcool, processo mau, porque Bruecke * viu uma uri- na claramente diabetica não mostrar assucar tratada por este modo. ! Systême des conn. chimig. 1801, t. 1x, pag. 178. 2 Traité du diabête sucré an. v1, pag. 63. 3 Abeille médicale, 1857, pag. 186. 1 Lecons sur les liquid. de Porg. t. 11 pag. 135. > Abeille méd. 1857, pag. 244. ê Gazet. hebd., 1863, pag. 36. ? Monatschrif. fur Geburtsk. 1857, junho. 8 Sitzungsberichte der mathem. Clas. der k. Akad. der Wissens. 1858. MEM. DA AGAD.=— |." CLASSE. — T. Il. P. ll, 14 106 ESTUDOS SOBRE No estado physiologico, segundo alguns experimentadores, a glyco- se é constante ; assim o pensam Lehmann, Behier ?, Bruecke *, Biot *, Meissner's*, Vanderdonckt *, Burggraeve”, Lowe, Tuchen*, B. Jones º e Lecoq "º; este ultimo de seis experiencias feitas em individuos de dif- ferentes idades concluiu: [1.º que a quantidade d'este principio póde variar entre 50 centigrammas e 2 grammas por 1000 em maximo; 2.º que augmenta depois das comidas; 3.º que augmenta com a ida- de. Esta ultima conclusão parece-nos falsa, por quanto o sr. Lecoq apre- senta uma unica observação, e está em opposição com as experiencias do sr. Déchambre !!, que notou a existencia do assucar em doze velhos. Ora, se o sr. Déchambre apontou este principio só n'estes casos (tendo examinado tantos), é porque o não achou em outros, e admittindo mes- mo como elemento normal o assucar, deve tirar-se por conelusão que n'esses outros não se achava augmentado, o que destroe as idéas do sr. Lecoq. De resto, o sr. Déchambre julga o facto pouco commum, e ex- plica-o, com Gibb e Reynoso, pela difficuldade ou lentidão da respira- ção nos individuos de idade madura, opinião que, em vista das obser- vações do sr. Lecoq e das experiencias do sr. Bernard sobre o córte do pneumogastrico, não póde ser admittida, por quanto nem este au- ctor viu o apparecimento do assucar na urina seguir-se a esse córte, nem aquelle outro em seguida ás doenças que affectam a funeção res- piratoria. Mas, seja como fór, é facto que na urina dos velhos se en- contra ás vezes assucar. Em certas circumstancias especiaes, ainda mesmo no estado phy- siologico, o assucar tem sido observado na urina; Harley !? notou-o em si depois de ter comido espargos, e em outros individuos que ti- nham usado de queijo e bebidas alcoolicas; Garrod * em um individuo depois de ter tomado comidas indigestas; o sr. Bernard depois d'um accesso de colera; e J. Becker depois d'alimentação assucarada. * Chimie physiologique. París 1855, pag. 237. 2 Union méd. 1857, pag. 259. 3 Zeitschr. der k. k. Gesellsch. der Aerz. zu Wien 1858, 29 setembro. i Gazet. méd. 1841, janeiro. º? Jahresber. fur ration. Med. vi, 3.º serie. º Arch. belges de méd. milit. 1862. * Bull. de "Acad. roy. de méd. de Belgique 1862. 8 Virchow's Archiv. xxv, 1862. ? Rec. de mém. de méd. chir. et pharm. mil. 1862 janeiro. 10 Gaz. hebd. 1863, pag. 36. H Arch. gen. de méd. 1852, t. xxxix, pag. 338. 12 Quarterly Journ. of pract. med. and surg. julho 1857. %3 British med. Journ. 18 avril 1857. E E A DIABETE 107 No estado physiologico póde tambem achar-se assucar, prove- niente não do sangue, mas só da decomposição dos principios da uri- na; o sr. Eduard Schunk pensa existir n'esta um principio analogo ao indican (extraido da isatis tinctoria), que tem a propriedade de se transformar debaixo da influencia dos acidos em indigo e assucar. Que devemos pensar d'estas ideas? Esperar que as observações futuras as confirmem ou rejeitem, e registal-as com todo o cuidado até então. Segundo o sr. Alvaro Reynoso *, nos individuos sujeitos á anesthesia pelo chloroformio ou ether, as urinas, momentos depois, contém assu- car por causa das perturbações da respiração, ou antes pela conges- tão cephalica, como bem quer o sr. Lecoq; não é constante porém o phenomeno, porque Frerichs, Staedler, e Schiff * não o acharam em alguns casos. Nos individuos, respirando por um certo tempo n'uma atmosphera em que o acido carbonico esteja um pouco acima da nor- mal, manifesta-se o assucar na urina, segundo Hesse *, o qual diz ter visto este facto em dois individuos trabalhando nas minas de carvão de pedra. Em diferentes estados pathologicos tem sido notada a glycose nas urinas sem haver por isso diabete. Exporemos quaes os observado- res que a tem descuberto e em que doencas: o sr. Burdel * na febre intermittente, quando analysava a urina do principio do accesso, prin- cipalmente nas perniciosas, chegou mesmo a dosar ás vezes até 15 por 1000; antes d'elle já o sr. Guitard a tinha achado nos individuos ata- cados de terçãs *; Richard Goolden * nos individuos soflrendo nevral- gias faciaes e sciaticas; Thompson verificou isto n'um caso de nevralgia facial, e o sr. Alvaro Reynoso ! nos que soflrem de asthma, hysteria, epilepsia, pleuriz, phtisica pulmonar, e gastrite chronica, experiencias que Herzfelder * confirmou completamente. Em nós mesmo quando aflectados n'uma nevralgia intercostal tivemos occasião de verificar esta circumstancia *. Nos epilepticos depois do ataque, no delirimum tremens, na ma- 1 Archiv. gen. de méd., 1851, t. xxvrr, pag. 265. * Untersuch. uber. Zuckerbild. in der Leber. Wurtzbourg 1859. 3 Medical Times and Gaz. 1862, pag. 234. * Gazette hebdom., 1859, pag 780. ? De la glucosurie, pag. 77. Toulouse 1856. * Abeille méd. 1855, pag. 70. 7 Arch. gén. de méd., 1852, t. xxvirr, pag. 104; e 1853, t. xxx1, pag. 349. * Tageblat der 32 Versaml. deutsch. Naturforsch. und Aerzt in Wien 1856. * Considérat. sur un cas de diabéte, París, pag. 75. 14» 108 ESTUDOS SOBRE nia, na hysteria e na paralysia geral achou-a o sr. Michea !; Goolden nas crianças no momento da dentição, na chorea, epilepsia e paraly- sias; Becquerel? na paralysia geral; Grisolle? n'uma hemiplegia; Gui- tard na epilepsia, gangrena pulmonar, bronchorrhéa, amaurose, e na hy- drochephalia chronica; Dietl* n'uma febre typhoide, e n'uma pneumo- nia; Prout * nos velhos gottosos e dyspepticos; Adolphe Bobiere * em um caso de emphyseuma pulmonar; Becquerel” na myelite aguda, me- ningo-encephalite-cerebellosa, congestão chronica do figado, cancro do “utero, e anemia profunda; Garrod * nas perturbações graves dos orgãos digestivos, rheumatismo e gotta chronica. O sr. Gibb. * pensa egual- mente tel-a achado em quasi todos os individuos atacados de tosse convulsa; mas em 1359 tivemos occasião de examinar as urinas de dez crianças atacadas d'esta doenca, e não podemos obter os mesmos resultados que este observador. O sr. Lecoq em cinco casos de nevro- ses tambem não achou a glycose em quantidade fóra da normal. Em individuos que recebem pancadas na cabeça ou figado apparecem ás vezes passageiramente grandes quantidades de assucar; Fischer, Ber- nard, Jacquemet, Kleée " e outros citam observações d'este genero. O sr. Putegnat !! e Dannecy ” tiveram occasião de o descobrir na de indi- viduos affectados de cancro em periodo avançado (8 a 12 por 1000). Em fim em individuos sujeitos á acção de certos medicamentos tambem se tem notado, em alguns casos, o assucar; Chevalier º viu-o na urina de um syphilitico que usava do tratamento mercurial, e Rey- noso na dos que tomam chlorureto, sulfureto e iodureto de mercurio, opio, sulfato de quinina e carbonato de ferro; Pavy ““ depois do uso do acido phosphorico. O que se deve concluir de todos estes factos sobre a presenca nor- mal do assucar na urina, e em certos casos pathologicos? Julgamos ! Abeille médicale, 1853, pag. 47. 2 Moniteur des hopitaux 1857, n. 107 a 112. 3 Union médicale, 1853, n. 31. 1 Gazette hebd., 1856, pag. 894. º London med. Gazet. 1831, junho, pag. 185. 8 Abeille méd. 1852, pag. 36. 7 Abeille méd. 1857, pag. 244. 8 Brilish med. Journ. 18 abril 1857. º The Lancet, 1858, 30 janeiro. 10 (Gazette méd. de Strasbourg, 1863, novembro. ! Journ. des Scien. méd. de Bordeaux, 1859, pag. 649. 12 Bull. gén. de thérap. 1862, pag. 221. 33 Journ. de chim. méd. t. 1, pag. 179. lá Procedings of the royal society, vol. xr, 1861, pag. 336. A DIABETE 109 que o assucar deve apparecer nas urinas physiologicas, mas em quan- tidade infinitamente pequena, exceptuando porém, os casos marcados pelo sr. Blot, em que este principio é bem sensivel, o que não admira vistas as condições especiaes em que se acham as mulheres. Não acreditamos que as quantidades marcadas pelo sr. Lecoq como physiologicas sejam verdadeiras; temos muitas vezes ensaiado urinas normaes sem quasi apparecer o mais pequeno signal de reducção; para nós o assucar normal escapa, em regra, aos reactivos quando não pro- longamos a ebullição, e não esperamos o resfriamento, ou se os re- duz logo, é mui pouco. As experiencias do sr. Bence Jones * vem con- firmar a nossa opinião por quanto em mil duzentas e oitenta gram- mas d'urina só achou dez centigrammas. Em quanto aos estados pa- thologicos crêmos que as perturbações de digestão, algumas affecções atacando certas e determinadas partes do systema nervoso, e por ventura outras condições que ainda ignoramos, podem favorecer ou determinar a presença do assucar na urina, porém em quantidade pequena, ou passageiramente no caso contrario. Qual é a porção de assucar contida ordinariamente na urina dia- betica? Ella é, como se póde suppor, muito variavel. No começo da descuberta da glycose na urina, marcava-se a quantidade de extracto assucarado por se ignorar o meio de a dosar. P. Frank * em 24 li- bras d'urina achou 26 onças de materia assucarada; Cruickshank de 1-. kilog. de urina extrahiu 100 grammas de extracto, e Nicolas de 4 on- ças de extracto d'urina obteve 4 onças e 2 oitavas d'alcool a 32.º Depois que os processos chimicos permittiram dosar com facili- dade o assucar, uma immensidade de auctores tem apresentado a nota das quantidades que teem achado, e sobre as quaes formámos o se- guinte quadro: Osusrs. Mialhe. ... Sh. .n ro sit entpor 1:000 Vauquelin e Ségalas?.. 142,85 » Guitardies «sas tear ra viidO » PicardRa o .... 135,58 » Bonchandatita "gar. s PRET » ! Quar. Journ. chem. soc. abril 1861. 2 De cur. hom. morb., lib. v, pag. 39. 3 Journ. de Phys. de Magendie, 1824, t, 1v, pag. 355. Í De la glucosurie, pag. 180. * De la présence de 'urée dans le sang, pag. 55. Strasbourg, 1856. $ Mem. de "Acad. de méd. de Paris, t. xv. 110 ESTUDOS SOBRE Os srs. Bonchardat ......... 134,42 gr. por 1:000 Coulier .......... RE 246) » Dupuy *...... de piauirDs » Bouchardat......... 109,98 » Bourdel de Montpellier 108 » Bouchardat ......... 106 » Do ue ceara 104,65 » DIBIT QUO sy Er E neto . 104,05 » » 104 » Abel Jordão... ...... 101 55 » Bouchardat ......... 100,4 » Peligor "or oi tattoo » Mialhe As! ob esbanlao 95 » Favrotéitavy obras) “. 90,24 » Burresi de Sienne*... 82,98 » Dr. Percy aah. MN opobaMo! sigo TER 0 » Burresi de Sienne.... 72,9 - » Schutzenberger *..... 71 » Abel Jordão Ve dito 70 » Andral Sup ndo bei » Abel Jordão. 4.6.0. 60,42 » Burresi de Sienne .... 60 » Lebmann'2 o di sento OB » Burresi de Sienne..... 50 » JA ui Era PNR era 49 » Mueller. ......... . 48,156 » Fonberg "cio. o. 0001 46 » (Contour PMN ES » Elec NDA A e a 43 » Atas SAE too vo é 43 » 1 Union médicale, 1861, pag. 507. 2 Ann. de Chim. et Phys., t. Lxvir, 1837, pag. 136. 3 Abeille médicale, 1853, pag. 49. 4 Union médicale, 1861, pag. 427. 5 Annal. de la soc. de méd. d'Anvers, 1861, pag. 258. 6 Gazette méd. de Strasbourg, 1855. 7 Considérat. sur un cas de diabete. París 1857, pag. 43. 8 Abeille médicale 1853, pag. 215. 9 Schmidts Jahrbuch Bd. 1x, s. 33. lo De la glucosurie. Strasbourg. !! Ann. der Chem. and Pharm. 1847. B. LxxxIx, pag. 360. 12 Compt. rend. de Vacad. des £c. de París, 1844, t. x1x, pag. 111. 3 Arch. des Pharm. 1847. Bd. 101, s. 20. A DIABETE Os srs. Simonbásmos gola aiogab. 39,80 gr. por 1:000 PA rea ola e nl) ar tea 38 Bouchardat ......... 53 Dulk 03. 32,03 Dupré de Montpellier. 29 111 É necessario notar que estas quantidades de assucar variam muito Assucar na urina 14 horas depois de comer: o E o çã 53,14 Da A ie 54,23 ER E MO ra 50,14 ARE ADOOS cmi ade 44,17 ROMA A a 42,25 Es Sou 40,38 AREA ra o 29,33 Ss 36,10 DELAS do 40,60 e 39,27 IL. 36,22 dê. . 32,59 RA SAR ISiÇh: 7 mao 40,38 Bá. 51,25 15.. 52,13 E NS 53,71 ! Abeille médicale, 1860, pag. 235. 2 Huf. Journ. 1827. Bd. vir, s. 55. 3 London med. Journ. t. Ix. t* Arch. fúr pathol. Anat., 1851. Bd. 1v, pag. 109. conforme o grau de força da molestia, o periodo, as impressões moraes e ainda alguma complicação que se manifesta no curso da doença. Na proximidade da morte o assucar desapparece quasi sempre. N'um caso visto pelo sr. Richardson a posição da cabeça para a banda de traz, fazia, logo que era tomada, augmentar a quantidade. O momento das digestões tambem tem uma influencia decidida, porque o assucar aug- menta sempre, qualquer que seja a natureza da alimentação. As ob- servações de Cawley *, de Traube, Rayer e Shirref? mostram que na diabete incipiente a urina da noite não contém muitas vezes assucar. As nossas experiencias provam egualmente a influencia da digestão. 112 ESTUDOS SOBRE issucar na urina 4 horas depois da comida : Dia ERR APRE RR 2477 58,99 QN . cmeniirón core beffa 6 60,14 e 54,13 Ea a O osiagec gaga rege E 50,91 Do cobalto! Bite nt 54,183 Brcidnp so rtralanr gt 56,41 tese: th SUL MERaADà 40,05 8 GIMISAÇUEI NAME 44,20 9: 49,00 10,0: 51,95 Labuluioab sipasolhatas 44,00 Os gnt. & mise sap 42,91 LAS apagado duas 48,90 Mestra. cio Som a; é 60,00 lb: e si macalrnga. Re 61,09 E RE tiro 2 64,00 Mio la geito 6 np RES 59,02 ZA TRI PR NS to 63,32 RE Saio oe 56,25 4 EMPIRE SD 6) 51,32 DRDS RS RS RR 59,27 (OD RAS O SRS e 58,66 ESSE DS Md 9515 40,61 Es cajalh bjo ócio LE 45,50 ERR DSO RSRS 1 3o 49,63 Dome E E 52,20 E aa Se Pa 44,29 a RE RE 43,05 DE A to) frias oi iris 48,99 he tea De CO oRD O 60,14 EOdia diaie este SiS E 62,15 IDR dO O 64,35 A DIABETE 113 Assucar na urina 2: horas depois da comida : Ba Mucirentos, oiosbs 45. 46; Braob 9. Oise a551504b7 3 -. 93,85 HE miss ad 0 ubitros 47,35 E art . 51,32 Bout sa 9.6 do: 56,41 7 : 36,00 ofeta d aPD. BMLPRA. dit 40,60 9 41,13 DOS IAPTTS as ars 43,15 PIA SA 58 raios abas 42,20 12 : De EU TS podres: patos ESA 14. stat. DOG lis tar 57,01 POr rs 25 mento. ais 58,25 Resumindo estes quadros e tomando a media de cada um d'elles temos : Horas depois da Quantidade d'assucar comida na urina | Ee SAM de NR TES ER RUE di Ser NARRA Srs DAS! Ee DR q Camiseteria dO 49 ,002 Classificando pela ordem da sua maior riqueza em assucar te- mos : 1.º — urina obtida 3: horas depois da comida 53,421 por 9 » 4 » » » » 592 a) le o =—— » » 25 » » » » 49 002 o » 14 » » » » 43 49 3 Estas nossas experiencias são conformes com as de Sydney Rin- ger *, que viu ser o maximo da eliminação de tres a seis horas. As observações de escarlatina, manifestando-se no decurso da dia- 1 Med. Cir. Transactions 1860, vol. xurrr, pag. 323. MEM. DA ACAD.-——(.“ CLASSE. —— T. HI. 'P. Il 15 114 ESTUDOS SOBRE bete (Garrod '), de sarampo ?, de diarrhea (Baglivi * e outro 9, de bexi- gas (Jadioux º, d'anthrax (Goolden , de furunculos (Frank), de pneu- monia (Rayer e Fricke), de affecção intestinal aguda (Bernard), onde se acha notada a diminuição e mesmo o desapparecimento do assucar, mostram a influencia das complicações sobre a quantidade d'este prin- cipio, circumstancia já apontada por Latham, em 1811. Mas a quantidade do assucar urinario estará em relação directa com a fécula ingerida como pensa o sr. Bouchardat? Esta idea é já bem antiga, porque Rollo ” faz d'ella menção, e o nosso compatriota Manuel Pereira da Graça * dizia a este respeito em 1806: não é menos falso que a materia assucarada contida na urina dos diabeticos provenha com preferencia dos vegetaes; porque no leite dos animaes que os não comem, se acha egualmente materia assu- carada O sr. Bouchardat, fazendo reviver estas idéas, seguidas tambem pelo sr. Schutzenberger *, não fez avançar a seiencia, bem pelo contra- rio, para estabelecer esta theoria interpretou mal os factos, não levou em linha de conta nos seus calculos o assucar que sae pelos outros emunctorios, e emfim creou palavras vasias de sentido para defender os seus erros, como por exemplo habito de saccharificar, etc. De resto estas idéas estão em completa opposição com os factos que temos ob- servado, porque n'um caso vimos: Dias Fécula Assucar urinario RR ÃO LEDS e e NINE NO DARE Do paldo io LA DE qo p= More VR Ss 1,44 Se l A SA RAR A a O e desta) DR Aero car iai 1520 Osso irc. o efe ceitayeo ue ABL (Obe JE NG a da EA ERE Tahices ab elonsiy edited S8.. LERRIS 1502 Gis e E TRA so E o dt! ! British med. Journ. 18 abril 1857 2 Acta erud. Lipsiae 1727, pag. 403. * Prax. med., pag. 717. * Acta nat. cur., dec ur, an. 9, obs. 288. * Union méd., 1847. pag. 141. º Medical Times, 1851, t. 1x, pag. 598 ! Du diabêéte sucré, pag. 23. º Tratado de diabete. Lisboa, pag. 81. ? Gazette médicale de Strasbourg, 1855. A DIABETE 15 Dias Fécula Assucar urinario OR 0) ME DA A, Vl OITO BENS. O RO, 62, o DIS e asse Tl. Ma ss o A BOROA, PRDLSA Etta d IDA o ME o E 1768 MR | 13.. ; 15266 gu st + SL fodas: DA MA, Lu Eno Í 157 am gr. HO 2 pal tros aah. 1 E estão tambem em contradicção com os factos observados por diferentes clinicos. O sr. Dupré, de Montpellier, viu um doente, a quem se tinham dado 300 grammas de batatas extraordinariamente, não augmentar o assucar urinario. O sr. Andral * verificou n'outro, que seguia a dieta animal e tinha 49 grammas de assucar por litro, que esta quantidade baixou a 15 grammas, depois de uma dieta de ovos, pão e legumes. Este pra- tico falla de um caso, em que apesar d'uma privação completa de fe- culentos, havia 12 grammas de assucar na urina; e um facto simi- lhante foi observado pelo sr. Baudrimont *?. O sr. Quissac viu tambem no serviço de Delpech um doente que, nutrindo-se quasi exclusivamente de toucinho, apresentava uma forte porção de assucar nas urinas. Sharley * conseguiu fazer desapparecer o assucar das urinas em dois doentes, por meio dos feculentos. Esta nossa opinião, apoiada em experiencias proprias e alheias, é egualmente seguida pelo sr. Boens *, Cappezuoli de Florença, Budge de Bonn, e pelo sr. Fauconneau-Dufresne º. Como poderá explicar o sr. Bouchardat na sua theoria, o facto observado por Martin Solon, do assucar diminuir de - depois da ad- ministração de leite que contém assucar? E este facto não é unico, porque Manuel Pereira da Graça e Lucas Tozzi * observaram outros similhantes. Como poderá elle considerar o facto do assucar urinario dimi- nuir 2'alguns casos depois da administração do assucar? E o facto 1! Abeille médicale, 1855, pag. 215. 2 Abeille médicale, 1855, pog. 235. 3 Transactions of the king and Queen's college in Ireland. 4 Press. méd. belge, 1860, n. 19. * Guide du diabétique 1861. º Opera omnia, t, 1, pag. 23. 116 ESTUDOS SOBRE existe sem duvida alguma, porque Christophorus da Vega !, os srs. Chevalier * Piorry, Antonio da Luz Pitta (da Madeira), Alvarez *, Ri- godin *, Herry Ussher *, Budd º, e nós o temos verificado em diffe- rentes épocas, e em individuos diversos. Parece-nos em vista d'isto que a idéa do sr. Bouchardat é in- sustentavel. É necessario comtudo notar que em geral o assucar urinario au- gmenta com o uso dos feculentos; nós não negámos nunca este facto, como pretende o sr. Marchal de Calvi, o que dissemos em tempo, e hoje ainda repetimos, é que a proposição do sr. Bouchardat «/a pro- portion de glycose contenue dans les urines est dans un rapport cons- tant avec la proportion des aliments feculents ou sucres» é falsa, Poder-se-ha avaliar e conhecer a quantidade de assucar pela den- sidade, ou antes haverá uma relação entre a quantidade de assucar e os graus de densidade? De modo algum. Diz-se que Henry de Manchester ” pretendia que existisse esta relação; porém o que elle dizia era, que entre a quantidade de extra- cto solido e os graus de densidade havia uma relação, e n'este sentido formou uma taboa em que a razão é de 19%,2 por cada grau. Quantidade de materia solida Densidade contida em 93 grammas de urina, avaliada em grãos 1020... 0:00 «gusaolnds Ay grãos 10 erga erros nie 21410456 405 DO Denis aco). q ogtis 420,8 » 1023... 0, amey0t44O, O, ga 102%. 4pfrracoueil dp Aula LOBSsiab. egnasas. olá TBihê ? 1026: gssoágo, 1004 Oy P TO2MmaT. seara. 60 516,8» MOS legs = OT; OD 1029 0h. atual 9. 4010 DoR aff ! Opera omnia, 1376, pag. 504. 2 Journ. de Chim. méd., 1828, t. v, pag. 1. * Gazette des hopitaux, 1860, pag. 532. 4 Bull. de la Soc. de Poitiers, n. 28. * Medical Times, 17 janeiro 1863. º Brilish med. Journ. 14 nov. 1857. 7 Pransact. of the med. surg. Soc. of London, vol. x1t, pag. 119. A DIABETE 117 Quantidade de materia solida Densidade contida em 93 grammas de urina, avaliada em grãos LOS O geito 2. 01.. 974,4 grãos MOS e srta E e era SD |) TODD a A oia opor O O OD NOS 632,0 » BOSE o o OPS MODO ps E Ep 670,4 » OB O RR GS ECN OS AR SA OSS SU» OBIS per ori TES DO DOG ss MAE ares otioos 741,2 » O AO apagar o pilar in 766,4 » 1040 ae iii pr tear SO 456, d PA A O SER 843,2 » LO dO apesar SS boba MO AS io PA IDO EO Mando A evo DOS A Além d'isso as experiencias de Bence Jones, Guitard !, Morin, Barbier *, e as nossas * mostram não haver relação alguma ; assim Bence Jones viu em suas observações, que uma onça de urina com as densidades abaixo marcadas tinha quantidades d'assucar não proporcio- naes: Densidades Assucar NO erga DS verei, 2 patas MOD esa MO e DE] » DRA re é em en E) » LO ya ses re brisos os 256 » POL O Re A 4,5 » O Sra cs aa 14,5 » NOZO Mine o): 6) » HOBOR sd s 3,6 » ROS os Ta) » AM) EPE 14,5 » ! De la glycosurie. Strasbourg, 1856, pag. 179. 2 De la glycosurie. Montpellicr, 1856. 3 Considérations sur un cas de diabtte. Paris, 1857, pag. 37. 118 ESTUDOS SOBRE Guitard achou egualmente : Densidades Assucar 1038............ 80"grammas TO QOSM nas ie, Tõ » LOOSE is 2 80 » 000 Rr Sa: 70 » VOTE AE Ts » TO do RD E O » 1038: OM DEE B0 » LOBO 75 » 1028: MAN ds » 000 eba 60 » O sr. Morin tambem encontrou : Casos Densidade Assucar VOZ5 PSL 2a b7 grammas TUMOR BR ia 00 » REa 26 : NOMAQRE rs caro noso 37 » 2º NOS o a ot 13,5 » VS. do Ego s neio+ SÍRRAES AD o SUDO DOS: ABRE rr Dn th) » SAMIR pelos doe ro de re 47 « 1027. 45 » E nós tambem n'um caso não achámos relação alguma : Densidade Assucar por 1000 VOOS 00 sina nao ae IOGA TOUS, 02058. eo pero to rp Ro 0 12:600,5, nu e tm. 1 DOBDO: RMT ADA Ba Dia AR 58,39 103540) eus RREO ro oro) DIOS Õ O POA 00 RR si 54,23 ED O PR RR TQUAZTOO! hr rodetios no sc, A DIABETE Densidade Assucar por 1000 BR 600 nas, - 60,14 VEMOS HS DA) je A 29,96 ERIBETOG- os . 90,14 DUELO DOS. eo OO ga 53,85 PONSEODO: e. 2d dO 56,95 HONO;500. po MBM AS QUIS O o or 53,59 102H000,0 5:05. 2 O 44,17 DOM o re da 47,35 TR RD RR RR 51,32 1012,600... 50,91 LORETO e SS buDAgAS POE D00 e an 49,925 TDUB440.s nero E DONSTSP POA DIO 2 e cmo 55,27 1013,020... 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E puto te e tado fo Po AR 43,05 O MBDEG OD. xo torrado eo e feria AMA 42,91 O A O RR RR 36,97 DO NDIGO OD EE o A 40,38 + TOMBZIO 0 qu crio 6 RAE LOMOSSDO. = 2. non o ro o ABI OO TONbiCOD sc cara am 48,90 OTBRDRO. o love ADA 45,81 FONT O, O!. cs ca do 51,25 NOAMAT OO 2, co a ABS A MDIBRIBO 2. Do cm rr Ah 60,14 OMR AOL. 0.0. + AVEGOIDO MOBT DO SL o, 56,94 VOIBSTODL DO. erro, ALONE TON DO/ E, de geo ve MNBRLO DOBBLSDO: Oss creo AA 62,15 VORA BO: . cost: 1 85 da 61,09 TO L5;800.. .. 0... EMASSÃOO vO SEO Ó sia, Sis achada 58,71 OMS DO. oa ce So ADS TDS MOTRBTDO! o... MISS Relativamente á quantidade diaria do assucar urinario nada se póde fixar, por quanto deve variar com a quantidade de urina excre- tada, e com o quantum de assucar por 1000. Tal é a razão porque não fallâmos mais extensamente sobre este ponto, limitando-nos uni- A DIABETE 121 camente, a titulo de mera curiosidade, a apontar as quantidades obser- vadas em um caso : Dias Assucar por dia e 2 68/06ugrammas EMA, AA RUA 471,68 » EPE AS Ne Sal 94 » 4 MSG a Sto 5 202/9469 1 Gina aa 370,72 » FEM ASR DO 291,92 » o YO SO oia 9 450,09 » 10 433,08 » LO utah BUS GO ps 12 317,36 » 13 298,15 » DA MEM Do bo 398,58 » 15 348,54 » 16 483,36 » 17 272,04 » 18 302 54 ora MOI a 497,61 » BLA NAN ER RESID 427,05 » DITA sd o a e par À 439,20 » DOME OUR VANR BE A E 336,64 » 23 319,32 » $ 52º Funcção genital Geralmente a erecção é nulla nos individuos affectados desta doença, sendo quasi sempre o symptoma que mais fere a attenção dos doentes, e que mais os preoccupa; P. Frank !, Durr. Cleghorn, Thomas, Reil, Neumann *, Elliotson ?, Giovanni Ferrini “ 5 , Barbier º, ! Trad. franç., pag. 396. 2 Spec. Path. und Ther. 1832. Bd. rr, s. 784. * Brit. Ann. of med. agosto 1837. 4 Abeille méd., 1857, pag. 349. º Du diabête sucré. Montpellier, 1856. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. HI. P. II. 16 122 ESTUDOS SOBRE nós e outros muitos o teem observado. Elliotson pensa que a sua fre- quencia está para o total dos doentes como 9:10. Sem duvidar da opinião de Giovanni Ferrini que dá uma certa importancia, na manifestação d'este symptoma, á affecção do espirito, crêmos que mais alguma coisa ha de especial n'este phenomeno, e que talvez possa concorrer para acreditarmos na influencia da medulla so- bre a producção da doença. Recorrer á fraqueza geral do doente para explicar a impotencia parece-nos inadmissivel, porque como bem nota Hodgkin !, os phtysicos e outros doentes affectados de grande fraqueza teem potencia. Parece- nos que é mais racional fazel-a depender d'uma depressão nervosa que é mais do que evidente n'esta doença. Em alguns casos, mas raros, fazendo excepção á regra geral, as faculdades viris conservam-se normaes, ou se exageram. Nunca obser- vámos exemplos d'estes em periodo adiantado, mas quer-nos parecer que só no principio é que esta exageração póde ter logar, como de fa- cto já vimos em dous individuos. Steinthal ? (em um atacado de dia- bete havia sete annos), os srs. Marchal de Calvi, Guitard, e Griesin- ger teem visto individuos em que a potencia se conservou normal. O sr. Marchal de Calvi cita um doente o qual no momento da copula sentia uma dor atroz, que partindo do occipital se estendia a todo o craneo e era acompanhada de grande calor na testa. Temos tambem observado no primeiro periodo, quando o doente póde ainda praticar o coito, que a manifestação dos prazeres venereos não é demorada n'essa occasião. A ejaculação é de tal modo rapida que o acto da copula só dura alguns instantes. “Examinando-se com attenção as observações em que este sym- ptoma da diminuição das faculdades viris vem consignado, conclue-se facilmente que de ordinario se manifesta n'um periodo mais ou me- nos adiantado da molestia; e apesar de ser um dos signaes que mais cedo chama a attenção do doente, como já notaram Martin Solon * e Bouchut *, comtudo havia muito que a doença avançava lentamente. Em quanto á secreção spermatica, pensa Elliotson que ella pára ; porém as observações do sr. Marchal de Calvi sobre um individuo que tinha ejaculações hemorrhagicas, as de Griesienger, a de Fritz *, e as ! Union médicale, 1861, pag. 295. ? Deutsch Klinik, 1858, n. 7. * Gazette des hopitaux, 1849. 4 Gazette des hopitaux, 1858. º Gazelte des hopitaux, 2 de setembro de 1862. A DIABETE 123 do sr. Guitard ! sobre um outro em que havia polluções nocturnas, mostram a falsidade da opinião de Elliotson. No semen de dois diabeticos, os srs. Griesinger e Guitard viram pelo microscopio os spermatozoarios vivos. Pela analyse chimica descobriu o sr. Guitard ? assucar no semen. O sr. Rochoux julga ter visto um caso em que havia um corri- mento de humor prostatico ; citamol-o de proposito pela sua raridade, por nunca o termos achado indicado nos differentes trabalhos sobre a diabete que temos consultado. Nas mulheres diabeticas a amenhorrea é frequente; n'um jor- nal italiano de 1827 * cita-se um exemplo, e os srs. Boens *e Wills- hire é fallam d'outros. Já vimos dois casos bem pronunciados, e do exame d'elles concluímos que não é logo no principio da doença que a amenhorrea se manifesta; de ordinario os mezes vão diminuindo pouco a pouco em quantidade, e vão-se tornando irregulares até que, chegando a doença a um certo periodo, se suspendem. Se apparecem melhoras não é raro vel-os reapparecer, posto que sempre com irregu- laridade. A esterilidade tambem é commum n'esta doença, porém tem-se visto frequentemente conceberem as mulheres diabeticas. Deve-se pois affirmar que só quando a doença está em um grau avançado é que se observa tal phenomeno. É digno tambem de notar-se que as mulhe- res diabeticas, ainda mesmo n'um periodo pouco adiantado, são pouco sensiveis aos prazeres venereos. 1 De la glycosurie, pag. 179. 2 De la glycosurie, pag. 18. 3 Annal. univ. di med. Junho 1827. 1 Presse méd. belg, 1860, n. 19. 3 The Lancet, 1860, pag. 404. 16 4 SEGUNDO ESTUDO CAPITULO | MARCHA, DURAÇÃO, TERMINAÇÃO, RECAIDAS E FREQUENCIA $ 1.º Marcha A diabete desenvolve-se, em geral d'um modo lento; mas n'al- guns casos corre os periodos da sua marcha com rapidez. Quando a causa que motivou o apparecimento da doença foi trau- matica, uma queda ou uma pancada na nuca, por exemplo, a diabete manifesta-se nestas condições rapidamente. A sua marcha ulterior póde n'este caso ser mais ou menos lenta, conforme a força da causa que actuou ou a constituição e disposição do individuo affectado. Quando alguns symptomas ou complicações de certa ordem se declaram, como gangrenas, apoplexias, etc., a doença póde tambem se- guir um curso veloz. Umas vezes é a diabete precedida de polyuria, outras de ataques de gotta; Bostock! viu um caso da primeira hypothese; o sr. Billard, nós e muitos outros teem visto exemplos da segunda; e o sr. Galtier- Boissiêre chega até a affirmar que, na maioria dos gottosos, vem com o tempo a desenvolver-se a glycosuria; tratando da relação d'estas duas doenças, melhor estudaremos este ponto; em fim, a diabete póde ma- nifestar-se sem precedencia de outra molestia. ! Med. chir. Transact. 1812. vol. 11, pag. 107. 126 ESTUDOS SOBRE É mui difficil, e até quasi impossivel, marcar os symptomas por onde começa a doença, e é por isso que esta parte do estudo da diabete ainda se acha muito incerta. Não ha comtudo razão para nos admirar- mos d'isso, porque na sua marcha lenta se encontram motivos mais que sufficientes para o explicar. A pouca gravidade dos symptomas, e o seu desenvolvimento vagaroso fazem muitas vezes que ella passe des- percebida, e só venha a ser diagnosticada achando-se já n'um periodo mais ou menos adiantado. Tratando, porém, de recorrer aos factos em que foi conhecida quasi a principio, e comparando-os com os casos em que se manifesta em seguida a lezões traumaticas, parece-nos dever concluir-se que a sêde, os desarranjos digestivos (dyspepsia, flatulencia, ligeira constipa- ção de ventre alternando com raras e leves diarrheas) e a polyuria são as primeiras manifestações morbidas; todos os outros symptomas, ap- parecendo umas vezes cêdo, outras tarde, devem considerar-se em ge-. ral como secundarios. O facto de não serem sempre a sêéde e a polyuria os primeiros phenomenos zotados, póde ser julgado em opposição com este nosso modo de vêr; entendemos porém, que a razão, n'este caso, é porque augmentando a sêde e a quantidade d'urina mui lenta e progressiva- mente, os doentes ordinariamente não dão por este augmento, e só fi- xam a sua attenção sobre um ou outro symptoma, que mais tarde al- tera o seu bem estar. Com estas considerações não queremos estabelecer que estes sym- ptomas sejam sempre a vahguarda da doença, desejamos unicamente fazer sentir não só a probabilidade da nossa idéa, mas tambem pro- vocar algumas duvidas da parte de novos investigadores, E possam ajudar a resolver o problema. Como quer que seja, é facto que alguns observadores teem citado como phenomenos annunciadores da Abe além dos desarranjos nas digestões (arrotos nidorosos, pêso no estomago, e prisão de ventre) as cephalalgias *, ataques de hysterico (Fr. Hoffmann) ?, a hypochondria (Wedel) *, a ictericia e as dôres articulares (Kruger Hausen). Póde perguntar-se, e com razão, se estes symptomas, alguns so- bre tudo, não são já manifestações de um periodo mais ou menos adian- tado. Na marcha ulterior da doença costumam marcar-se, em geral, ! Hufeland's Journ. 1827, Bd. vir, s. 13. 2 Cons. et resp. med. Cent. 2, cas. 75. - 3 Diss. de diabete 1717. Jena. A DIABETE 12% tres periodos, os quaes não são bem distinctos e caracteristicos, porque muitos symptomas que de ordinario pertencem a um periodo, ou fal- tam completamente ou se manifestam n'um outro mais ou menos adian- tado. Assim a seccura da pelle e a magreza, que de ordinario appa- recem no segundo periodo, não se tornam apreciaveis senão no tercei- ro, e algumas vezes até faltam. Os periodos podem, apesar d'isto, dividir-se e caracterisar-se por esta fórma: [.º Periodo—Séde, ás vezes forte, sobre tudo depois das comi- das; ligeira prisão de ventre; dyspepsia em pequeno grau, principal- mente depois das refeições em que teem entrado em grau elevado os ' feculentos; diarrheas seguindo repentinamente, mas de longe em longe, a ingestão das comidas; algum espessamento de saliva; ataques he- morrhoidaes seguidos muitas vezes de hemorrhagias; sensação de pêso sobre o figado; desenvolvimento de furunculos; augmento na secreção urinaria; sensação de fraqueza geral; augmento de gordura; grandes suores; leves .epistaxis; exageração das faculdades genitaes. 2.º Periodo — Exageração dos symptomas que caracterisam o pri- meiro periodo, excepto das hemorrhagias rectaes e nasaes; lesões das gengives, dôres e caria dos dentes, perturbação na vista, insomnias, magreza, diminuição nas faculdades genitaes, sensações subjectivas de calôr e frio, seccura de pelle, alguns phenomenos nervosos. 3.º Periodo— Exageração dos symptomas do segundo, vomitos, diarrheas alternando frequentemente com a constipação de ventre, des- arranjos intellectuaes mais ou menos pronunciados, as infiltrações se- rosas, e a phtysica. Entendemos dever insistir, principalmente sobre as hemorrhagias rectaes e sobre o augmento de gordura que em geral se notam no pri- meiro periodo da doença, pois esta circumstancia não se acha indicada nos livros; é verdade que alguns auctores teem attribuido por vezes a doença a suppressões de hemorrhoides, e que o sr. Marchal de Calvi, Landouzy e outros teem indicado a constituição forte gras como causa da diabete, mas uns e outros, parece-me, viram superficialmente os fa- ctos; quando se manifestaram as rectorrhagias já a doença existia, e quando se notou a constituição forte gras tambem a glycosuria minava o individuo, sendo por isso aquella resultado e não causa. Melhor se poderá ajuizar de um ou outro symptoma e do seu valor no diagnostico, tendo-se presente o que dissemos a respeito de cada um em particular. Quando a doença tem um termo feliz, as melhoras manifestam- 128 ESTUDOS SOBRE se lenta ou rapidamente, conforme o tratamento empregado e o perio- do em que ella se acha; sendo para notar que os symptomas que mais difficilmente desapparecem são os que se apresentam do lado das gen- gives, e a polyuria. A marcha da diabete é muitas vezes interrompida por differen- tes causas, as quaes fazendo com que ella desappareca durante um certo tempo, nem por isso a fazem terminar: póde-se mesmo dizer que ha nestes casos verdadeiras remissões. Differentes observadores tem visto a doença desapparecer depois de alguns epiphenomenos, sobre tudo quando estes são acompanhados de febre. Na presença de vomitos no- tou este facto Stosch; de hydropesias Graves, Raimann ! e Adams ?; de diarrhea P. Frank e Baglivi *; de cataracta os auctores do Compendium e Bourdel; de pneumonias Rayer; de bronchite forte Trousseau; de in- flammação intestinal Cl. Bernard; de sarampo e bexigas Padioux *; d'escarlatina Garrod *; d'anthraz na nuca Goolden *; de furunculos P. Frank. As estações, na opinião de alguns auctores, parecem tambem mo- dificar a marcha da diabete. P. Frank, os srs. Barral (Lisboa), Marchal de Calvi, Oppolzer (Vienna) e Bouchardat pensam que o verão traz sem- pre melhoras aos diabeticos. Não acreditamos porém, apesar dos nomes respeitaveis que abonam esta opinião, que seja geral ou pelo menos fre- quente esta cireumstancia, por quanto em quasi todos os doentes que temos visto, excepto um, os seus padecimentos parecem exasperar- se com o calor, e modificar-se sensivelmente com o frio. A priori já se poderia suppôr que o ar do inverno, pela sua baixa temperatura (não sendo excessiva), e pela sua maior riqueza em oxigenio, é mais vanta- joso: o calor do verão é essencialmente debilitante, e se alguns o tem julgado benefico, é por estarem por ventura debaixo da impressão de que a diabete depende da suppressão da transpiração, e que é muito mais frequente nos paizes frios e humidos do que nos quentes; o que ainda hoje está por demonstrar. A diabete apresenta-se debaixo de differentes typos. O alternante é caracterisado pelo desapparecimento da doença, e sua substituição por uma outra, que mais tarde cede o seu logar á dia- ! Handb. der spec. Pathol. und Therap. Bd. 2. pag. 464. ? The med. Works of P. Aeg. vol. 1, pag 432. é Praxis med. pag. 717 e Act. nat. cur. dec. 111, an. 9, obs. 288. * Union méd. 1847, pag. 141. º British. med. Journ. 1857, 18 abril. º Med. Times 1854, t. 1x, pag. 598. A DIABETE 129 bete e assim successivamente. Com a polyuria a teem visto alternar Watts e Trousseau, com a gota Rayer, Bernard, Marchal de Calvi, Gal- tier Boissiére, Guerard e outros. Quando se considera a relação inti- ma entre a gotta e as doenças do figado, comprehende-se com faci- lidade que a diathese gottosa, manifestando-se ou localisando-se n'este orgão, dê logar ao desenvolvimento da diabete, e que fixando-se nos extremos ou em outras partes se apresente então com os symptomas caracteristicos da gotta regular. De resto ha entre estas duas doenças uma ligação intima; a cons- tituição e o temperamento, como notam os srs. Musset, Landouzy e Marchal de Calvi, a manifestação da gotta na linha ascendente e des- cendente dos diabeticos, a alternancia entre a diabete e a diathese cal- culosa, a existencia mui frequente do acido urico nas urinas de mui- tos diabeticos, a influencia determinante das causas moraes n'estas duas doenças, e emfim a similhança dos resultados do uso dos alcalinos, são provas mais que evidentes. O typo periodico é aquelle que apresenta a doença quando ataca um individuo, para depois o deixar perfeitamente são e voltar mais tar- de, passado um tempo mais ou menos longo. Casos d'estes teem sido observados pelos srs. Bence Jones*, Warnecke, Girard e Garrod *. O typo intermittente é caracterisado pela existencia da doença durante um certo tempo, sua cessação findo este, e pela sua volta, passado um determinado periodo. Differe este typo do periodico, em que n'aquelle a doença manifesta-se de periodos em periodos certos, em quanto n'este não ha regularidade: um é caracterisado pela cer- teza do apparecimento da doença em certa época, outro pela incerteza da occasião em que o individuo será de novo affectado da molestia. Ca- simirus Medicus * e Bartholinus *, segundo alguns, observaram exem- plos d'estes; julgamos porém, que os casos não eram realmente de dia- bete, e se o eram, os phenomenos observados pertenciam antes á classe de exacerbações do que á de intermittencias. Como quer que seja, é facto que Moritz Traube * e o sr. Rayer teem visto exemplos d'este typo, em que o assucar apparecia nas urinas sómente depois das comidas, parecendo ser devido á excitação produ- 5 1 Lond. med. surg. transact. vol. xxxvI, pag. 401. 2 British. med. Journ. 1857, abril 18. 3 Traité des malad. period. París, 1790, pag. 168. * Mis. nat. cur. dec. 1, an. 2.º obs. 162. 3 Virchow's Arch. fur Heilk. Reinhardt. 1851, vol. 1v. MEM. DA ACAD. — [.º CLASSE. — T. HI. P. II. 17 130 ESTUDOS SOBRE zida por ellas no systema digestivo (principalmente no figado), ou tal- vez aos principios contidos nos alimentos. Em vista d'este facto o sr. Traube estabeleceu que este typo da doença precede sempre o contínuo, e que é, para assim dizer, o seu primeiro periodo. Sem negarmos completamente a asserção de Traube, parece-nos que ainda não estamos sufficientemente habilitados para se poder marcar uma lei tão geral. O typo continuo é aquelle que deserevemos a principio, e que ca- racterisa a diabete propriamente dita. N'este ha dilferentes fórmas a notar, com as quaes a doença póde apresentar-se, /órma nervosa, com- sumptiva, abdominal e thoracica. A nervosa é caracterisada especialmente pela exasperação ou ex- cessiva irritabilidade do genio do individuo, as comichões em certas e indeterminadas partes do corpo, e as sensações de pêso ou adormeci- mento em alguns dos membros, e outros phenomenos nervosos. Esta fórma quando existe apresenta-se sempre mais ou menos clara em to- dos os periodos da doença. A comsumptiva manifesta-se pela tendencia ao emmagrecimento, e pela perda da vitalidade da pelle e seus annexos; o marasmo vem cedo, a phtysica pulmonar raras vezes é evidente, e na maioria dos ca- sos a phtysica é antes geral do que especial a um certo orgão. Ha en- tão o que Copland e outros chamaram phthisuria, ou o que Areteo de- signava pela frase fusão das carnes, e nós denominamos marasmo. Esta fórma tão difficil de debellar como a antecedente, é comtudo mais peri- gosa do que ella. A abdominal distingue-se particularmente pela bulimia que, con- servando as forças ao doente, faz com que elle apresente um aspecto de saude. N'esta fórma, uma das mais faceis de cura, o que ha de mais notavel é a coincidencia dos symptomas diabeticos com esta falsa apparencia de saude. A thoracica caracterisa-se pela facilidade e rapidez com que os symptomas da phtysica pulmonar se manifestam logo no principio da doença. Parece n'este caso que a parte fraca sobre que recae toda a força da molestia é o pulmão. Esta fórma, com quanto tenha pontos de contacto com a comsumptiva, d'ella differe com tudo em aquelloutra não ser sempre acompanhada de tuberculos pulmonares, em quanto esta é essencialmente caracterisada por elles. Estas differentes fórmas ás vezes apparecem simples, outras asso- ciam-se mais ou menos. A DIABETE 131 4 2.º Duracão Geralmente é longa a duração, como a priori se podia deduzir da marcha lenta da doença; Dodonaeus, Fernel, e Moegling * viram-na durar toda a vida. Bassereau, citado por Contour, aponta um caso que se prolongou por trinta annos. O sr. Marchal de Calvi * viu-a durar quinze, Garrod * seis, oito e mesmo doze, Richardson * doze, Graves, Valentin * e Steinthal * sete, Trousseau * e nós seis annos. Eis um resumo dos casos de que tenho tomado nota, relativa- mente á duração. Muitos outros, sem duvida, se poderiam citar; mas além de serem desnecessarios para provar a marcha lenta da doença, seriam por extremo fastidiosos. Relativamente á duração da diabete, como em geral em todas as doenças, deve-se levar em linha de conta a constituição, o trata- mento seguido, os cuidados hygiénicos observados, a força ou grau da doença, a sua fórma, as complicações, e até o estado pecuniario dos doentes. Esta ultima circumstancia com quanto pareça á primeira vista de pouca importancia, é comtudo interessante; a dieta que teem de se- guir, e o tratamento que devem fazer, são de sua natureza caros e so- bre tudo por extremo longos, o que depende da marcha da doença. Póde por isso dizer-se que a diabete é um dos melhores exemplos para provar a veracidade do aphorismo— molestia chronica, tratamento chro- nico. A origem ou causa productora é um dos elementos que deve en- trar nos calculos sobre a duração, porque em geral a diabete resul- tante da acção d'uma causa traumatica, termina felizmente em pouco tempo, em quanto que, se depende de uma causa interna ou mesmo desconhecida, a sua marcha é quasi sempre chronica. Tem-se citado casos em que a doença tem tido pouca duração, mas, quanto a nós, a maioria d'elles tem sido mal interpretados. As ob- servações, em que se apresentam diabeticos curados rapidamente depois 1 Ephem. cur. nat. dec. 1, an. 2.º obs. 175. 2 Abeille méd. 1853, pag. 205. 3 British med. Journ. 18 abril 1857. * Medical Times and Gaz. 1862, pag. 234. * Union méd. 1861, pag. 298. é Deutsche Klinik, 1858, n. 7. 7 Clinique méd. t. 11, pag. 583. 132 ESTUDOS SOBRE de tal ou tal tratamento são quasi sempre falsas, pois tomam as me- lhoras ou a suspensão temporaria da doença por uma verdadeira cura. Não é raro dizerem-se curados diabeticos só pelo facto de terem me- lhor parecer e menos seccuras! Nos casos fataes, em que se aponta a pequena duração da doença, tem egualmente havido uma má direcção de ideas. Em geral, quando se observava um doente diabetico, contava-se unicamente como tempo de doença aquelle em que se tinham começado a desenvolver sympto- mas pronunciadissimos d'ella; methodo este mui fallivel, pois se deixa de contar um espaço de tempo mui longo, isto é, aquelle que me- deia entre a época em que se diagnosticou a doença e a do seu desen- volvimento. N'ºeste caso está a observação de Frank, em que a diabete se diz ter percorrido todos os seus periodos em sessenta e sete dias; a de Dobson na qual se consigna o facto de um doente ter morrido em trinta e cinco dias; e a de Oesterdyk ! em que se aponta a morte suc- cedida no fim de alguns dias. O facto é que a doença tem sempre uma marcha lenta, e que os exemplos de marcha rapida devem ser explicados pela presença de al- guma complicação grave. É assim que as gangrenas, os anthrazes, as pneumonias e as phtysicas de marcha mais ou menos rapidas, etc., são quasi sempre as causas que encurtam o andamento da doença e pro- duzem a morte. Na sciencia conhecem-se innumeros casos em que al- guma d'estas manifestações tem figurado como causa de terminação da diabete. S 3.º Terminação A doença termina algumas vezes pela cura, mas não frequente- mente; outras vezes desapparece e é substituida por outra mui ana- loga como, por exemplo, a polyuria. Um caso d'estes é citado pelo sr. Mirza Reza ben Mokim ?, outro pelo sr. Leudet * e ultimamente vimos mais outro n'estas condições. A phtysica é um dos modos de terminação mui commum d'esta doença. Tem sido mencionada e observada por Zacuto *; Arnaldus de 1 Vernandelingen nitgegeenvendoor de Hollandsche maatschappye der Weetens- chappen te Harlem, 1770, t. x11, pag. 5. ? De la polyurie. París, 1860, pag. 37. 3 Moniteur des sciences, 1859. 4 Opera omnia, t. II, pag. 445. A DIABETE 133 Villanova * José Rodrigues d'Abreu?, Rollo *, Barsdley, Copland, Nico- las et Gueudeville, Andral, Legrand *, Gray *, Trousseau, por nós e muitos outros. O sr. Criésingor estabelece, que a phtysica está para os casos totaes de diabete como 44: 100. É quando a diabete tem feito progressos que ella se manifesta, e ataca com mais ou menos forca, tornando-se sobre tudo notavel o desenvolver-se até em individuos, na familia dos quaes não existia motivo algum para suspeitar a sua ma- nifestação. Casos ha, mas não mui frequentes, em que a phtysica ap- parece cedo, mas é só n'quelles em que a fórma é a thoracica. A pneumonia tambem algumas vezes termina o quadro da doen- ca; Ettmuller fez menção especial d'este modo de terminação, e depois d'elle alguns outros o teem egualmente indicado. D'este numero são, os srs. Bouchardat, Lecadre, Constantin James, e Fricke de Baltimore º que tiveram occasião de verificar a marcha rapida d'esta complicação. As pleuresias purulentas teem egualmente sido causa de morte, como viram os srs. Gallard e Fritz. A gangrena pulmonar tem sido apontada por Hodgkin, Scott ”, Griesinger, Charcot *, Rayer e Fritz *. ) A paralysia dos orgãos thoracicos foi abservada uma vez pelo sr. Lecadre. A terminação por apoplexia é uma das mais frequentes; Nau- mann, Champouillon, Marchal de Calvi, o sr. Trousseau, nós, e mui- tos outros, teem tido occasião de a observar. As apoplexias serosas e as que sobreveem a indigestões (Prout) são as que se notam mais ve- zes. A paralysia geral progressiva foi observada pelos srs. Lecadre e Delpech. As hydropesias, que Areteo e Arnaldo de Villanova já tinham descripto na antiguidade, constituem egualmente um dos variados mo- dos de terminação da diabete, sendo umas vezes symptomaticas de mo- lestia de Bright, como viu Gray, outras não. ! Praxis medicinalis, 1586, pag. 74. * Historologia medica, t. 1, pag. 874. 3 Traité du diabête, pag. 83. t Abeille médicale, 1855, pag. 325. * Glasgow med. journ., outubro, 1856. é American. med. journ. 1852, julho. ? Dublin hosp. Gazet. 1858, t. v. pag. 71. 8 Gazet. hebd. 1861, pag. 545. * Gazet. des hopitaux, 1862, 2 setembro. 134 ESTUDOS SOBRE As congestões pulmonares, segundo Gendrin e mais alguns aucto- res, poem termo, por vezes, á doença. As gangrenas que, como vimos, não são raras, matam em algu- mas cirecumstancias os individuos diabeticos; tornam-se especialmente notaveis pela sua frequencia os anthrazes, sobre tudo quando se ma- nifestam na nuca. As diarrheas, que de ordinario se tornam quasi contínuas no ul- timo periodo da doença, extinguindo as forças aos individuos affecta- dos da diabete, poem termo tambem ao curso da molestia. O hydrocephalo agudo, segundo Lebert !, não é um modo raro de terminação; e d'ataques eclampticos viu o sr. Jousset um exemplo. Finalmente, é tambem commum vêr os doentes extinguirem-se, permitta-se o termo, pelo progresso da molestia, aggravando-se todos os symptomas sem verdadeiramente se achar uma causa ou lesão pal- pavel que explique a morte; já vimos um exemplo d'estes, no qual, nem os symptomas, nem a autopsia poderam explicar o genero de morte. É egualmente digno de nota o facto das doenças inflammatorias serem em geral mui perigosas na diabete, e de arrebatarem mui fa- cilmente os doentes: Garrod * viu morrer em poucos dias um diabe- tico atacado de grippe, apesar da epidemia que então reinava ser mui benigna. Além d'isto os diabeticos supportam mal qualquer lesão trauma- tica, e com facilidade são victimas d'ella: Garrod viu morrer um in- dividuo diabetico com uma erysipela gangrenosa no pé, em consequen- cia da ferida resultante do aperto d'uma bota; e tambem notou, n'um caso, o córte d'uma phalange ser seguida de morte. S 4.º Recaídas As recaídas são frequentes, e á proporção que se repetem, o pro- gnostico torna-se pouco favoravel. Com razão disse Frank: «non satisfidas semper esse diabetis sanati, nisi morbus per annum et ultra non redeverit, historias.» Nada ha mais commum na realidade, do que vêr os diabeticos go- sarem uma saude perfeita depois de algum tempo de tratamento, e des- 1 Traité d'anat. pathol. París. 1860, pag. 35, 358, 974, 680. 2 British. med. journ. 18 abril, 1857. A DIABETE 135 apparecer até o assucar das urinas, mas passados alguns mezes voltar a doença com a mesma força. A falta de cuidado na qualidade das comidas, as imprudencias na maneira de viver, e ás vezes finalmente, a natureza da propria doença, são geralmente as causas das recaídas. S 5.º Frequencia Alguns auctores (entre elles Manuel Pereira da Graça) teem jul- gado esta doença mais frequente hoje do que nas épocas passadas, e fundam-se no testemunho dos medicos da antiguidade para confirma- rem, com mais ou menos apparencia de certeza, esta opinião. É ver- dade que Galeno ! diz ter visto unicamente dois casos de diabete; que Areteo * affirma egualmente ser mui rara; e que Haen * refere ter ouvido Boerhaave dizer: «quod per omnem vitam illum modo vidisset » e escarnecer «quod junior medicus anglus de diabete vel morbo in dies obvio scriberet ». E verdade tambem que Zacuto a viu só cinco vezes, Tulpius * e Francisco da Fonseca Henriques * tres, Juncker e Trincavel- lius * duas, Asselin, Blancard * e Lomnius * uma, e finalmente que Campanella º* diz: «rarissimus est, nec cxperimentum feci ». Mas o que provam por ventura estas declarações? Que o diagnos- tico n'aquellas épocas era insufficiente, e que hoje, graças aos pro- gressos da sciencia, podemos conhecer muitos casos de diabete, que aliás teriam passado despercebidos. Querer ir mais além seria um con- trasenso; presentindo esta verdade, já Van der Haar dizia nos tempos antigos, que a diabete seria tida como mais frequente se os medicos fixassem melhor a sua attenção sobre as urinas. Mais tarde Copland, Graves e Henry Marsh aproveitando os processos analyticos necessa- rios para a determinação do assucar, e reconhecendo que a existencia da diabete é compativel, a principio, com pequenos incommodos de ! De locis aff. L. vr, cap. rr1, e Lib. de dif. sympt. 66. 2 De morb. diut. caus. L. 1. cap. 11. 3 Prael. in H. Boerhaave, etc. Viennae, 1780, t. 111, pag. 279 e 281. + Obs. med. L. 11, cap. XLVI. * Med. Lusit. Porto, 1750, L. 11, cap. ci, pag. 541. é De rat. cur. corp. affect. L. x, cap. xI. 7 Anat. reform. cap. xxv. 8 Obs. med. Libri tres. Amstelodami, 1745, pag. 215. º Med. juxta prop. princip. Lugduni, 1635, pag. 498. 136 ESTUDOS SOBRE saude confirmaram esta idéa. É um facto fóra de duvida que á pro- porção que o diagnostico se torna mais preciso, o numero de exem- plares de qualquer doença augmenta; o que notámos sobre esta, tem- se verificado em muitas outras melhor estudadas n'estes ultimos an- nos, como, por exemplo, as do coração, a de Bright, a de Graves e outras. À frequencia da diabete em Portugal não póde ser determina- da, nem mesmo aproximadamente, pela falta de estatisticas e outros do- cumentos; pelos poucos que podémos colher vê-se que a doença, sem ser rara, não é por extremo frequente. Devemos acrescentar comtudo, que não se deve, nem se póde dar todo o valor a estes dados, pois resentem-se da falta dos estudos especiaes só feitos ultimamente. Eis os dados de que dispomos actualmente : Lisboa : 1835 — 1.º Semestre — Hospital da Marinha — 2:266 doentes, ne- nhum diabetico. » — Março, abril, maio — Hospital de S. José — 2:585 doentes, nenhum diabetico. » — 2.º Semestre — Hospital de S. José — 5:911 doentes, ne- nhum diabetico. 1836 — Hospital de S. José 1.º Trimestre 2:555 doentes Dai » 2:912 » nenhum diabetico Bos » BULAS) » » — Janeiro — Hospital militar do castello de S. Jorge — 284 doentes, nenhum diabetico. 1838 — 1.º Semestre — Hospital da marinha — 1:190 doentes, ne- nhum diabetico. » — Casa-pia — 1:107 doentes, nenhum diabetico. 1839 — 1.º Trimestre — Hospital de S. José — 2 diabeticos sobre 2:018 ! doentes. ! Jorn. da Soc. das Sc. Med., 1839, t. 1x, pag. 322. A DIABETE 137 1840 — Hospital da marinha — 2:4 17 doentes, nenhum diabetico. 1841 — Hospital da marinha — 2:531 doentes, nenhum diabetico. 1842 — Hospital da marinha — 2:065 doentes, nenhum diabetico. 1843 — Hospital de S. José — 11:441 doentes, nenhum diabetico. 1844 — Hospital de S. José — 12:078 ! doentes, 1 diabetico. 1845 — 1.º Semestre — Hospital de S. José — 5:097 doentes, ne- nhum diabetico. 1853 — Hospital de S. José — 10:000 doentes, 1 diabetico. 1855 — Em toda a cidade — 6:119 mortos *, 4 diabeticos. 1856 — Hospital de S. José —? doentes, 1 diabetico. 1857 — 1.º Semestre — 1:116 mortos nas casas particulares, 1 dia- betico. 1857 — Hospital de S. José —? doentes, 1 diabetico. 1862 — Em toda a cidade * — 5:700 mortos, 2 diabeticos. 1862 — Hospital de S. José Doentes Diabeticos Julho saga potes DO tão broa oia to O Agosto! 19 CreZIs ias dh otimo Setembro....... Za 4 nula. À Et nO Outubro........ 24822201] MA ES ARE Novembro ...... DIDO Bl. tia 0 Dezembro, sin 2z12: 38700. Guerra. ie 2 ! Jorn. da Soc. das Sc. Med., 1845, t. xx1, pag. 48. 2 Relat. da epid. da cholera morb. pelo Cons. de Saude de Lisboa, 1858, pag. 447. 3 Relat. geral do serviço da repart. de saude. Lisboa, 1864. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T, HI. P. II. [Ro 138 ESTUDOS SOBRE 1863 — Hospital de S. José ; Doentes Diabeticos Janeiro ss teandet el 55. eobeernens ceieO INEO doc vo Stoa sb eba ne () Março. eostcod SMS. ese asilo B) Abrilia rs Tas row 01510 btt elis ro 0 Maiotsest poor d ADO Mista fes cedo 0 Junho: o ae RIO A MR) Em todo o paiz 1837 — Março a dezembro — Hospitaes regimentaes — 3:066 doentes, nenhum diabetico. ! 1838 — 1.º Semestre — Hospitaes regimentaes — 4:485 doentes, ne- nhum diabetico. Nas provincias do norte, na Beira, por exemplo, não seria mui frequente segundo informações particulares que temos: os srs. drs. Paes de Figueiredo e Antonio Gonçalves nunca viram exemplo algum; na mesma provincia o sr. dr. Antonio Augusto da Costa Simões, du- rante quatorze annos de uma extensa pratica em Cinco Villas e Bair- radu, tambem não achou caso algum. O sr. Tenreiro, de Oliveira de Canhedo, viu em quinze annos de clinica sómente dois diabeticos. Em Coxdeixa o sr. dr. Quaresma viu um só, e o sr. dr. José Ferreira de Macedo Pinto nos informa que no hospital de Coimbra, no espaço de seis annos, appareceram tres doentes diabeticos, e que na sua clinica civil no mesmo praso de tempo víra um unico. No Douro, segundo nos diz o sr. Macedo Pinto, é bem pouco commum. No Hayal, de julho de 1842 a junho de 1843, no hospital da Mi- sericordia entraram 677 doentes, dos quaes nenhum com diabete. Em Poxta-Delgada, no mez de janeiro de 1843 entraram no hospital da Misericordia 339 doentes, nenhum dos quaes com diabete. No Funcha! não parece ser frequente a doença, mas tambem não é rara, e mal informado foi o dr. Mittermaier * quando escreveu: Jon diabetes mellitus Wunrde mir kein Fall bekannt; o que se prova pela estatistica do hospital d'aquella cidade, e pelo facto do dr. Luz Pitta ter observado na sua pratica, no anno de 1856, dois casos. ! Madeira und seine Bedeut. als Heilungs., 1835, pag. 13. A DIABETE 139 Hospital do Funchal. Annos N.º de doentes N.º de diabeticos SPT, AA o Petri aro Ro pus dl 1838 UTAD DU Ta l 1839 UR O MO ces aba art! Í tigeHÓs Din sa tada Sa | 303 Gema So aa Dr ) USA sent E a dd OMI, 2080 qt. 0 USA QRO ra gala COS na O) 1843.. 600-580718,20.0 aba nei 0 1844.. 7 UE Nà À 1a () US UM do 613 () 1846 SB UMa pontas O) ÀS o a zo o a 0 MESES RA A q 9 eta sort, A O) 1849.. MTE qa PA tra aa Í SO o sea PU a API RD () ES SAO. DE! ER da e 0) HS25 PAO AL A q 0 PS DS, aorta ? 2 CAPITULO II ETIOLOGIA , Differentes são as causas que se tem julgado produzir a doença, umas vezes predispondo, outras determinando-a. S 1º Herança Esta causa tem sido alternativamente admittida e rejeitada, mas hoje, apesar das asserções de Nasse ! e Contour, a sciencia possue bas- tantes factos para a admittir. - Frank observou dois casos, Prout quatro, Storer e Thomas um; Rollo, Clarke, e Blumenbach ? citam outros. Não fallamos do caso ! Arch. fur med. Erfahr. março e abril, 1818, pag. 330. 2 Med. bibliot. Bd. 2, pag. 126. 18» 140 ESTUDOS SOBRE de Isenflamm, tão notado em todos os tratados de diabete, porque não prova a herança; o que elle diz é ter observado com diabete oito filhos de um homem são !. Mas sem recorrer a este caso, mais que duvidoso, nem aos outros apresentados no fim do seculo passado e principio d'este, nem ainda ao observado pelo clinico Rondelet ?, te- mos muitos outros notados modernamente, que provam a hereditarie- dade da doença. O sr. Vernois viu um exemplo d'estes; o sr. dr. Bar- ral (de Lisboa) dois; o sr. Tenreiro (de Oliveira de Canhedo) um; o sr. Fauconneau-Dufresne * viu a diabete manifestar-se em dois pri- mos, filhos de irmão e irmã, e que contavam um diabetico entre os seus ascendentes. O sr. Azevedo Guimarães diz ter visto tambem /a- milias diabeticas na Bahia *; o sr. Marchal de Calvi viu dois casos de pae e filho diabeticos, Wagner * um e o sr. Alquié outro; o sr. Niepce viu tambem dois irmãos diabeticos, mas nada diz sobre os anteceden- tes do pae; em fim o sr. Mialhe obseryvou-a em tres irmãos; em dois irmãos de uma outra familia; n'um irmão, n'uma irmã e n'um primo direito; e em pae e filha. O dr. Thierry Mieg viu egualmente quatro casos em crianças de uma familia, cujo avô era tuberculoso. A doença parece não se trans- mittir sempre directamente; paes phtysicos teem filhos diabeticos, e reciprocamente. Griesinger teve cinco casos comprehendidos na pri- meira hypothese, e outro em que havia parentes epilepticos. Já observá- mos pae epileptico e filho egualmente, até certa época, e depois diabe- tico. Já vimos um caso em que havia um exemplo de loucura na linha ascendente e dois na collateral; n'outro havia pae louco, filha diabeti- ca, e filho monomaniaco. Haverá tambem relação entre estes dois sof- frimentos? Estes factos assim o fazem suppôr, e as observações do sr. Marchal de Calvi (pae diabetico, filho com accidentes nervosos, tremura de mãos); a do sr. Niepce (pae diabetico, filho nervoso); e em fim duas outras do sr. Marchal de Calvi (pae diabetico, filha nervosa ; pae dia- betico, filha maniaca), parecem confirmal-o. Entre a polyuria e a diabete tambem ha uma similhante rela- ção; Trousseau na sua clinica medica cita um exemplo; outro tanto acontece com a albuminuria; Hodgkin viu uma familia em que havia ! Versuch einiger prakt. Anmerkungen uber die Eingeweide zur Erlanter. vers- chied. verbogener Krankh. und Zufalle entworfen Erlang. 1784, pag. 135. ? Methodus curandorum omnium morborum, 1575, Lugduni, pag. 525. 3 Guide du diabétique, pag. 34, 1861. 4 These de doutorado, Rio de Janeiro, 1858, pag. 2. * Arch. fur pathol. Anat. t. x1r, 1857, pag. 401. E e SUS da Ss a A DIABETE 141 diabetico e albuminurico, e o sr. Marchal de Calvi, pace diabetico, e filha albuminurica. Com a diathese urica tambem existe uma intima ligação; o sr. Mialhe diz ter visto muitas vezes na mesma familia um irmão diabe- tico e outro soffrer d'areias; o sr. Billard * viu pae diabetico e filho gottoso, e nós já vimos pae gottoso e filho diabetico. As relações que existem entre estas duas doenças, são tão evidentes que desnecessario é citar mais factos comprovativos. Pela nossa parte, não acreditamos com Garrod ?, que ella não é frequentemente hereditaria; temos visto quatro casos, um de pae e filho, outro de mãe e dous filhos, outro de dois primos (o que se- riam os ascendentes?), outro de dois irmãos (o que seriam os ascenden- tes?) e outro em fim de mãe, filho, duas filhas e neta, em que a iden- tidade de habitos, de modo de vida, de alimentação, etc. faltavam com- pletamente, e faziam admittir a hereditariedade. Já observámos um diabetico, cuja mãe morreu de apoplexia, um dos tios phtysico, um irmão tuberculoso, e outro irmão é alienado. SG 2º Sexo : A maioria dos auctores julga a doença mais frequente nos ho- mens do que nas mulheres. Todos os casos que P. Frank, viu de diabete foram em homens. Esta observação porém não póde de modo algum provar que as mu- Jheres sejam isemptas d'esta doença, mas só a sua maior frequencia no sexo masculino, por quanto muitos auctores a teem visto nas mu- lheres. Os srs. Pitta (da Madeira), Elliotson *, Schoenlein, Garrod, Nau- mann, Berndt, Autenrieth, Bardsley, Oppolzer, Fauconneau-Dufresne, Abeille, e nós mesmo temos visto bastantes casos em mulheres, mas temos concluido que é mais frequente nos homens. Alguns medicos teem até estabelecido a relação comparativa da frequencia entre um e outro sexo, e d'este numero são: Berndt, 5 homens: 4 mulheres. Autenrieth, 5 homens: 4 mulheres. É Gazette des hopitaux, 4 maio, 1852. 2 British medical journ. 48 abril, 1837. * La Lancette francaise, 1838, n. 53. 142 ESTUDOS SOBRE Bardsley, 7 homens: 3 mulheres. Oppolzer, 4 homens: 1 mulher. Com os srs. Fauconneau-Dufresne, e Abeille *, e sem querermos determinar esta relação, limitamo-nos a consignar simplesmente o nu- mero de casos que temos observado: O sr. Fauconneau-Dufresne tem visto 106 homens, e 42 mu- lheres. O sr. Mialhe, 24 homens e 3 mulheres. Griesinger, 172 homens e 53 mulheres. Abel Jordão, 14 homens e 5 mulheres. No hospital de S. José no periodo de um anno, 1862 (julho) a 1863 (junho), appareceram 5 homens diabeticos e 2 mulheres. Mas esta maior frequencia no sexo masculino será legitimada por alguma condição organica, cu será devida pura e simplesmente ás dif- ferenças do genero de vida? Inclinamo-nos á segunda hypothese; pa- rece-nos mais simples e facil para explicar o phenomeno, e assim o julga tambem Garrod *. Em vista do exposto, não será absurdo admittir a maior frequen- cia da diabete nos homens, e ao mesmo tempo estabelecer com R. Wil- lis, que o sexo em si não tem influencia alguma na producção da mo- lestia. S$ 3.º Idade O sr. Contour e a maior parte dos auctores pensam, que a dia- bete se observa mais commumente entre trinta e quarenta annos. O sr. Venables crê ser a sua maior frequencia na infancia, po- rém as observações dos srs. Guersant, Prout, e Fauconneau-Dufresne, mostram a falsidade de similhante opinião. Não menos errónea parece ser a de Monravá *, Bence Jones, e Heberden, que a suppoem mais frequente na velhice. O sr. Antonio da Luz Pitta (da Madeira), quanto a mim, appro- ximou-se da verdade, ou antes foi mais exacto, marcando o periodo, em que a diabete é mais comum, entre vinte e cinco e sessenta an- nos. As observações do sr. Fauconneau-Dufresne parecem confirmar ! Traité des maladies à urines albumineuses, etc., 1863, pag. 670. 2? British. med. Journ., 18 abril, 1857, 3 Novissima medicina, t. 111. pag. 823. Lisboa, 1747. A DIABETE 143 esta idéa, por quanto sobre 67 casos que reuniu, 55 acham-se com- prehendidos n'este periodo. Melhor se poderá julgar da importancia dos factos colhidos por este auctor, apresentando-os aqui em fórma de quadro: Idade N.º de casos De lan) annos: PS ADA TO ao OS a ir na 6 20: amado lb ÃO agito ao ço AR SOGRO pa e a 50 a 60 » RA DEE NO 70 a 80 » DENSAS JH A SA SOL po sa EE e a] 67 No hospital de S. José de Lisboa, desde julho de 1862 a junho de 1863, appareceram 7 casos de diabete, todos comprehendidos no periodo de 26 a 50 amnos. As observações d'esta doença nas primeiras idades não são mui frequentes; por isso, além das de Morton * sobre uma creança, de Guer- sant sobre duas, do dr. Laborde sobre outras duas, e de R. Willis so- bre outra, citaremos por menor os casos de um a vinte annos de que temos conhecimento, visto o sr. Fauconneau-Dufresne ter colhido nos auctores sómente 10 casos comprehendidos n'este periodo da vida : Nomes dos ob- Annos Numero servadores de idade de casos Elatnnenêr. Sera at ERRO SUR eg | Mine Cores or cs cp RAP RARO CO O GRERAOS oa io era MD Oppolzenda sea ep RARAS acao pao » Prout asso po 5 » Miaillhe se a 5 » Um medico... .... 5 » ! Phthisiologie, L. 1, cap. vir. * Carper's Wochenschrift, 1850. * Clinique européenne, 1857. 4 On Stomach, and renal diseases, pag. 36. * Racle: De la glycosurie, pag. 64. 4 144 ESTUDOS SOBRE Nomes dos ob- Annos Numero servadores de idade de casos Mialhesbipau slando quobns: adegi du css 1 Nallensas ts ps signos O) mea cera) Bouchardat ........ 6 esa bs uia » Hunerwolfius !...... COD TUA A PAREDE » Heine ss. Paso va eis Hran, A ES Sesps o » Isenflamm'º........ Sn Hp (DO rs o Mialhesr.f. = iscas Dia RS cas, Í Heine ssa dai ao Dão. Fa ancAtdesasos » Johnson EO PRA Pe pigs » Rollo fede ea gs 1 DB rg » Oppolzer: sas cuales 1Bispisegata delirante » Crozantdt nois: 12 ES LARA UES » Mialhe............ 12al5. DEAR ST TES) Broutyls-s ts, algo o 1242208 nto ERRA TREO 5%, ELorn es es gelo. put çd 13 sETo ante 1 Abel Jordão ....... DS Less ip tpda » Bonyierh sagas anima 140... » LebenwaldiS eds! 16 - RR PTE » Txelat L. sonhada: UG seat: alelos » Bouchardat........ Ulisses » Reil PUDE O RIO ER E 18 DEMO O DIDI bica VE) Petrus Pawius*..... LSupas iso adrenal Gracfe; iso senso dare VS aos mato Aria saia » Um medico*.... mi Bira rabo surdas 4 ? Act. nat. cur., dec. 1, an. 2.º 2 Journ. fur Kinderkrank, 1849. 3 Versuch einig. prakt. Anmerkung uber die Eingeweide zur Erlanter. verschied. verbogener. Krank. und Zúfalle entworfen. Erlang., 1784, pag. 135. 4 Med. Surg. Review. Lond. oct. 1838. 5 Gaz. hebd., 1859, n. 51. 6 Act. nat. cur., dec. 11, an. 9. 7 Arch. gen. méd., 1861, pag. 67. 8 Obs. anat. 2. 9 Racle ; De la glycosurie, pag. 64. A DIABETE 145 Reduzem-se pois a 59 os casos, de que temos conhecimento, obser- vados neste periodo. Comprehende-se a possibilidade de Weit ! não ter nunca visto um exemplar n'estas circumstancias, por quanto foi ne- cessario para formar esta lista de 59 percorrer todos os periodos da historia d'esta doença, e dirigir-nos aos jornaes de todos os paizes. Nos velhos, posto não seja frequente, comtudo não é rara. P. Frank, Berndt, e Monravá parece que viram alguns exemplos; Francisco da Fonseca Henriques ? falla egualmente de uma velha diabetica, mas sem lhe indicar a idade: dos casos em que esta se achava apontada formá- mos um quadro, em que melhor sc póde vêr e estudar este ponto: Nomes Annos Numero dos observadores de idade de casos Antonio Mendes Pedroso?.... 60 ........ | Bonnefous*..... tala RU E 1012400: attsnà DiO Bouchardato: = 49 ss o 60. . =" rather » Demeams e PE. GO sc RS » PeBbrette o 61S sds sado 00 ce Ro Pemnarquay 85 ago: 60. .nEisss E | Nelaton Mo ris ra Ro EDR A 60)g 4. ct Iriseto Barras ess SA mais des 607 =... s2oas Bence Jones..... a nais: der60 sr * sy. med: 5 Wrousseaun 45. vimais de 607... BA AbelhJordãos BM rs eo (O UR ue gds tels 2 Constantin Jantes e... eres er O, = o MESA TOIA Bouchardatr =” BM2 acacenas 0S, de AE » Marchal de: Calyit:,:)>..,... 2.ejae OSTES 45 up Dapay Ms Po ER » emenda Ee Ra ease A a fuichetos Res. Ro es es BM o Se (EM A Bonchardatbe-d se ro E OO A tor gc ED 1 On diseases of infancy, etc. 1854. 2 Medicina Lusitana. Porto, 1750, L. 11, cap. 101, pag. 541. 3 Gazeta Medica de Lisboa, pag. 150, 3.º anno. 1 Revue méd., agosto 1842. 5 Transact. of the med. surg. Soc. Edinburg. 1824. $ Union méd., 21 marco de 1863. 7 Clinique méd., t. 11, pag. 584. 8 Union méd., 3 junho de 1861. 9 Union méd., 29 de novembro de 1856. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. IIL. P. H. 19 aj 6 ESTUDOS SOBRE ; Nomes Annos Numero dos observadores de idade de casos ardem, eram. Cm. iv unG Onda asas! Ri Bramarst oo ementas Lagar sea er eso. » Dionis de Carrieres?........67 ........ » Garrod:jttávo amo mero muro Super Eeenols Valentin Gato fem, ste minar ta6S MIRO used Delpechiados se 812% Sp 2 0690 sn vira do Vernois as (9 Aa bes Ds Too ass cera bio Aquino da Fonseca....... ECO np o cd » Broca... ach Eta Sa rs SS » Pupuy sMEBR nho, o. O a » Broca ee CRM maisideS/04bm 8 seu » Bence Jones". Mi. mais dev Po Renauldio 2, MA e tes TU Ee east Valores er SED co a AD A asus ATQUIEs o SD logo le pego e Te le » Abel Jordão “2 soe ea VAO RA RO Marchalide:Calyid.. as e VS Sa OVAL Beuders 2. 03,0 ati. ro DDS MA >» Elervez ide: Chegoinals sen. «106 o ta Apuietr!, 42 E TI A peneudd!E Heuret A Rea css çase DO o aa E sath Oppolzer : 5. 100» rede no vaia DUM, UA Lasrds Bouchardat SE 80º, +: trtrsarioõo Burresi de Sienne"......... 80102. als Jet » Alguem qro te VR ROO qja PS RREO 56 1 Journ. des conn. méd. chir., 1841, pag. 234. 2? Moniteur des hopitaux, 5 maio 1857. * British. med. Journ. 18 abril 1857. 4 Union méd. 1861, pag. 298. ? Arch. gén. de méd. 1853, pag. 673. é Union méd. 12 agosto 1862. ? Dict. méd. de 60 v. art. diabéte, pag. 131. Arch. gén. de méd. 1857, t. xxx1x, pag. 503. º Clinique européenne, 1859. 1º Ann. de la Soc. méd. d'Anvers, 1861. A DIABETE 14% Sommam pois 56 as observações colhidas entre os diabeticos de sessenta a oitenta annos. Do que levamos dito, e da nossa experiencia, concluimos, que a diabete é mais frequente entre trinta e sessenta annos, não sendo rara nas idades extremas. S 4.º Temperamento Segundo a opinião de Cawley e R. Willis, seria o lymphatico ner- voso aquelle que mais predispõe para esta doença; as nossas observa- ções estão plenamente de acordo com esta opinião. Com quanto se citem casos, em que o temperamento sanguineo (Picard) ou outro (musculoso, Nicolas e Gueudeville) era o predomi- nante, nem por isso deixa de ser real a idéa que sustentamos, como se poderá vêr do seguinte quadro feito pelo sr. Fauconneau-Dufresne sobre 36 casos. Temperamento lymphatico...... 9 casos » Dervosolet o . fSsUTST » » sanguineo....... 6 » » nervo-sanguineo.. 4 » » lympho-nervoso .. 4 » » biboso 45 sale am » bilio-sanguineo ... 1» » bilio-nervoso..... 1» 36 Não se achando de ordinario os temperamentos bem definidos e caracterisados, devem em rigor sommar-se os casos, em que os tem- peramentos lymphatico, nervoso, e lympho-nervoso se acham especifi- cados. Procedendo-se d'este modo teremos realmente 21 casos de tem- peramento lympho-nervoso sobre 36. Se a este quadro acrescentarmos ainda outra observação apresen- tada pelo sr. Boens !, teremos 22 casos sobre 37. Devemos comtudo acrescentar, que no anno de 1862— 1863 no hospital de S. José em 7 doentes 4 tinham o temperamento sangui- neo e à o mixto. 1 Presse médicale belge, 1860, n. 19. 19 +» 148 ESTUDOS SOBRE S 5.º Constituição Em geral, no periodo em que os doentes são observados, não é facil marcar qual a constituição do doente; raciocinando porém pelas informações colhidas, conclue-se que na maioria dos casos predomina a constituição forte. O sr. Fauconneau-Dufresne sobre 48 casos achou: Constituição forte... .......... 36 casos » Trata tenso elegia. e) aid » mole; “14: evita sei) De pd 48 E) Póde mesmo dizer-se que a diabete quando ataca os individuos não mui novos, prefere sempre os que tem uma constituição forte. Ni- colas e Gueudeville, os srs. Landouzy ! e Marchal de Calvi acreditam egualmente na preferencia d'esta constituição. Os srs. Demarquay *? Mousset *, Frank, Demours, Vogt, Broca e Constantin James apontam egualmente alguns factos em que se confirma esta opinião. Julgamos comtudo, que a constituição gras, admittida pelo sr. Marchal de Calvi, é posterior ao desenvolvimento da doença. Um in- dividuo póde ter uma constituição mais ou menos fraca e ser atacado de diabete, mas logo que esta começa, a constituição parece tornar-se mais forte, porque além do bello aspecto de saude que se manifesta, o doente começa a engordar. Este facto, que parece estar em opposição com a experiencia, é verdadeiro, e póde ser facilmente verificado inter- rogando os doentes minuciosamente. O facto de animaes engordarem muito depois de nutridos com bastantes substancias feculentas e assu- caradas confirma a nossa idéa. S$ 6.º Climas A influencia dos climas n'esta doença não está ainda demonstra- da, nem tão cedo o poderá ser, por falta dos elementos necessarios para 1 Clinique, maio 1862. * Union méd., 21 março 1863. 3 Recueil de la Soc. de Livourne, 26 outubro 1861. A DIABETE 149 resolver a questão. As estatisticas rigorosas não existem, e é mesmo dificil descriminar a parte que pertence ao clima, ás bebidas, e ás co- midas: é pois um problema a estudar ainda. Não faremos por isso se não reunir os factos, de que temos conhecimento, deixando ao tem- po preparar a sua interpretação. Nos paizes frios dizem ser mui frequente, na Inglaterra e Hol- landa, por exemplo. Robert Willis falla até de 33 casos: observados n'uma mesma épocha em Cambridge; o dr. Lefévre porém affirma não ter achado menção de um unico caso de diabete nos hospitaes da Russia; o dr. James Willis, inspector militar dos hospitaes russos, não viu um unico exemplo em mais de dois milhões de soldados; e P. Frank !, emfim, durante vinte annos de pratica em Allemanha, só viu 3 casos, em quanto na Italia em oito annos viu sete. Pharamond diz que ella é mais frequente nos climas quentes, e: affirma ser mui commum em S. Domingos, Bengala, e Ceylão. Rabbi Moysés, depois de a ter visto vinte vezes em dez annos no Egypto, affirmou que a doença multoties generatur in regionibus calidis. No Brasil, segundo o sr. Aquino da Fonseca, a doença seria. commum; e na India, sem ser mui frequente, tambem não é rara, por quanto Mo- rehead ?, sómente em Kirikal, viu 6 casos no espaco de um anno q 856). Em contradicção com estes, que julgam os paizes Pontes mais favoraveis para o desenvolvimento da diabete, estão W. Hunter *, que diz nunca a ter visto em Bengala, e Christie que a julga rara em Cey- lão*. O sr. Mialhe, não sabemos com que fundamento, classifica entre as causas da doença a mudança do clima quente para frio. Se nos fosse possivel deduzir uma consequencia dos factos que temos observado, diriamos que os paizes quentes me parecem mais fa- voraveis para o desenvolvimento da doença. Esta nossa idéa, é antes um simples presentimento do que uma opinião bem determinada, vista a falta de estatisticas rigorosas. O facto da maior predominancia, nos paizes quentes, do systema nervoso, a grande actividade do figado, e a circumstancia da menor combustão das substancias hydrocarbonadas, são os motivos que nos levam a adoptal-a. Uma prova da impossibilidade de conhecer bem a influencia do clima, é haver em um mesmo paiz certos pontos em que a doença ! De curat. hom. mob. Epit. 1794, L. v, pag. 477. * Clinical resear. on diseas. in India. London, 1856. 3 The Edimb. med. and Surg. Journ. janeiro 1846. 4 The Edimb. med. and Surg. Journ. julho 1817. 150 ESTUDOS SOBRE parece ser mais commum, o que é devido sobre tudo ao genero de vida e alimentação ; assim Elliotson julga-a mais frequente em Edimbur- go do que em Londres; Nicolas, Gueudeville, e Contour mais na Nor- mandia do que no resto da França. Sobre Portugal não podemos dizer nada de positivo por nos fal- tarem os documentos valiosos. Para complemento d'este paragrapho acrescentaremos algumas no- ticias estatisticas, incompletas é verdade, mas que outros poderão mais tarde desenvolver. França— Em 1854, em todas as cidades contendo mais de 10:000 habitantes morreram 63 homens, e 28 mulheres de diabete; total 91 casos |. New-York 1851 ........ 6 diabeticos, mortos » bas nuns Broca É » » Inglaterra 1839 ........ 214 » » Londres? 1184240.) 00n07 4120 » » : » 84. Mr EVTAIS » » » negao 6 nara 23 » » » US 4 BR Ena 44 » » » SA Ge 94 » » » US 407 q a a 33 > » » 1848 VA Dis! fobia; o! fo 45 » » » Peanuts: 40 » » » DST. Pupa 45 » » » TSbIaR E nr. 41 » » » SoM Ba, 48 » » » USB LE ana 54 » » » (ISA hora 62 » » » TIS PE ps 38 » » » 18568 FA. dE 050 » » 1846 — Rio de Janeiro? sobre 5:867 mortos, 1 com diabete. Lisboa 1835 — 1.º Semestre — Hospital da marinha — 2:266 doentes, dia- betico nenhum. ! Annal. d'Hygiene publique, etc. abril 1858, pag. 321. ? Annal. d'Hygiene publique, 1857, t. vir, pag. 471. * Annaes de méd. Brasiliense, 1847, t. 111. A DIABETE 151 1835 — Março, abril e maio — Hospital de S. José — 2:585 doentes, diabetico nenhum. » — 2.º Semestre — Hospital de S. José — 5:911 doentes, diabe- tico nenhum. 1836 — 1.º Trimestre — Hospital de S. José — 2:555 doentes, diabe- tico nenhum. » — 2º Trimestre — Hospital de S. José — 2:912 doentes, dia- betico nenhum. » — 3º Trimestre — Hospital de S. José — 3:725 doentes, dia- betico nenhum. » — Janeiro — Hospital militar do castello de S. Jorge — 284 doen- tes, diabetico nenhum. 1838 — 1.º Semestre — Hospital militar de marinha — 1:190 doen- tes, diabetico nenhum. » — Anno — Casa-pia — 1:[07 doentes, diabetico nenhum, 1839 — 1.º Trimestre — Hospital de S. José — 2:018 doentes, dia- beticos dois. 1840 — Hospital da marinha — 2:417 doentes, diabetico nenhum. 1841 — Hospital da marinha — 2:531 doentes, diabetico nenhum. 1842 — Hospital da marinha — 2:065 doentes, diabetico nenhum. 1843 — Hospital de S. José — 11:411' doentes, diabetico nenhum. 1844 — Hospital de S. José — 12:078 doentes, diabetico um. 1845 — 1.º Semestre — Hospital de S. José — 5:097 doentes, diabe- tico nenhum. 1853 — Hospital S. de José — 10:000 doentes, diabetico um. 152 ESTUDOS SOBRE 1855 — Em toda a cidade — 6:119 mortos, diabeticos quatro, 1856 — Hospital de S. José —? doentes, diabetico um. 1857 — Hospital de S. José —? doentes, diabetico um. » 1.º Semestre — Casas particulares — 1:116 mortos, diabetico um. 1862 — Em toda a cidade — 5:700 mortos, diabeticos dois. » — Hospital de S. José Doentes Diabeticos Julho; Ms ted is a abas 2:298. Sorerurbisap ) NS OSHON e Sd Sd a SS RS Mo Sha iss ft codo do 1 Setembro tus ab np A Date 0 Databro res tested DDD ia spas S od 1 Novembro: = du a O DOOR 0 Dezembros. so estiticg do DEN sra Mel SS 2 1863 — Hospital de S. José Doentes Diabeticos Janeiro Aereas sa NR SS o 0 Hevereiro! Sab se ele deb 17098. catete 0 Marcos Ms aan Ms 198907. aeb 3 Abril SA tea e RAT DONO ereto stars 0 Marogth. cette: DA acl pal! o qota dA 0 Junho Bebel [a é GT a e 0 Em todo o paiz: 1837 — Hospitaes regimentaes — marco a dezembro — 3:66 doen- tes, diabetico nenhum. 1838 — 1.º Semestre — Hospitaes regimentaes — 4:485 doentes, dia- betico nenhum. 1860 — Julho a junho 1861 — Hospitaes militares — 12:472 doen- tes, diabetico nenhum |. 1 J. A. Marques, Estatistica da mortalidade do exercito portuguez, pag. 265. [eU A DIABETE [5 Funchal (Ilha da Madeira) - 1837 — Hospital — — ? doentes, diabetico um. 1838 — Hospital — 1:034 doentes, diabetico um. 1839 — Hospital — 1:040 doentes, diabetico um. 1840 — Hospital — 1:038 doentes, diabetico nenhum. 1841 — Hospital — 977 doentes, diabetico nenhum. 1842 — Hospital — 698 doentes, diabetico nenhum. 1843 — Hospital — 600 doentes, diabetico nenhum. 1844 — Hospital — 791 doentes, diabetico nenhum. 1845 — Hospital — 613 doentes, diabetico nenhum. 1846 — Hospital — 830 doentes, diabetico nenhum. 1847 — Hospital — 912 doentes, diabetico nenhum. 1848 — Hospital — 794 doentes, diabetico nenhum. 1849 — Hospital — 557 doentes, diabetico nenhum. 1850 — Hospital — ? doentes, diabetico nenhum. 1851 — Hospital — ? doentes, diabetico nenhum. 1852 — Hospital — ? doentes, diabetico nenhum. 1853 — Hospital — ? doentes, diabeticos dois. Ilha do Fayal 1842 — Julho a junho 1843 — Hospital da Misericordia — 677 doen- tes, diabetico nenhum. Ilha de S. Miguel (Ponta-delgada). 1843 — Janeiro — Hospital da Misericordia — 339 doentes, diabetico nenhum. MEM. DA ACAD. — |. CLASSE. —T. HI, P. U. 2() 154 ESTUDOS SOBRE S 7.º Estacões Segundo as observações de alguns medicos, é o inverno a estação, em que mais se desenvolve a diabete; e o sr. Pita (da Madeira) nos affirma ter verificado esta circumstancia na sua pratica; similhante opinião parece ser confirmada não só pelas observações de Frank, Fritz e Marchal de Calvi, nas quaes os doentes teem peiorado no inverno, como tambem pelo facto do clima frio e humido ser julgado propicio para a sua manifestação. Concebendo que a estação fria e humida possa dar logar ao desenvolvimento d'esta doença, não podemos comtudo ad- mittillo senão com certa reserva, porque de ordinario quando somos chamados junto de um diabetico, a doença tem já um certo tempo de existencia, e o doente em geral ignora quando ella teve começo; e ainda quando mesmo o marcasse, para nós a sua opinião não tem valor, por- que quando dá pela molestia, ha muito já que se acha affectado. $ 8.º Profissões Elliotson ! diz ser mais frequente nos carpinteiros e padeiros ; Wolff nos caçadores; Mialhe porém, pensa que se encontra em todas as profissões. Esta opinião vai de accordo com as nossas observações, e é confirmada pela estatistica do hospital de S. José anno 1862-1363; Occupações ed afora DA 2 o pd Domesticar ce DRA Rap pI Industrial” ses PRC 1 Tibenadis gears todas mts Sesapi Ss bo oa 06 RP É | E noracse DME E ea co ML DO Sobre a idéa do sr. Mialhe, que julga a passagem da vida activa para a sedentaria como uma causa predisponente, nada podemos dizer. O sr. dr. Pita (da Madeira), julga a vida sedentaria, não sabemos com 1 La Lancette française, 1838, n. 53. A DIABETE 155 que fundamento, a mais propria para o desenvolvimento da doença, em quanto que Sydenham, Senac e Curvo Semmedo ! accusam o ni- mio exercicio a pé ou a cavallo. Cardanus cita as profissões em que é necessario empregar muita forca. $ 9.º Alimentação A falta de uma boa alimentação, e a sua natureza toda feculenta e em grande parte assucarada, tem sido geralmente considerada como uma das causas da diabete. D'esta opinião são Dupuytren, Théenard, Pharamond, Contour, Bouchardat, Alquié, Piorry, Rayer, Cleghorn, Bufalini ? e Girard ?. O facto citado por Magendie * de um homem, depois de uma alimentação exclusiva de batatas durante quinze dias soffrer uma especie de diabete; a circumstancia de morrerem em oito dias os porcos da India nutridos com fécula, assucar e agua distil- lada (Lassaigne e Yvart); de os habitantes dos Alpes maritimos de- pois da alimentação quasi exclusiva de figos, por falta de ceraes, fica- rem valetudinarios e fracos (Fodéra); e de serem atacados de febre e furunculos as crianças que fazem uso exclusivo, durante o dia, de as- sucar, confirma a idéa. Christie attribue a doença mais á má qualidade das comidas, o que parece ir d'accordo com o facto observado por Garrod, da gly- cose se manifestar depois do uso de comidas indigestas. Silvius * diz ter visto esta doença resultando de um abuso de cebolas, Paullini de espargos e rabanetes (Harley notou uma vez a presença passa- geira do assucar depois de usar de espargos), Amatus Lusitanus de pimenta º, e Schmidt de diversos condimentos ”. Sem negarmos estas causas, não podemos deixar de dizer, que quanto a nós, a opinião do sr. dr. Barral (de Lisboa), que busca a causa antes nos desarranjos digestivos, do que na natureza dos alimentos, se não é verdadeira é pelo menos mais generica, e vae d'accordo com o facto de se manifes- tar por vezes uma glycosuria passageira nos dyspepticos, como tem ob- ! Polyanthéa medicinal, pag. 454. 2 Union médicale, 1854, pag. 391. 2 Ibid., 1855, pag. 375. é * Dict. de méd. et chirurg. pratiques. art. Gravelle. * Morb. int. curat., pag. 219. 8 Curat, med., cent. 11, cur. 94. 7 Misc. nat, cur., dec. 11, ann. 2.º, obs. cxxrr. 20 + 156 ESTUDOS SOBRE servado os srs. Garrod!, Lecog e Christison?. Não duvidamos comtu- do, que as comidas excitantes, ou os condimentos, possam para isso con- correr; as experiencias dos srs. Harley, Bernard, e Leconte, uns com o ether, e ammoniaco diluído, e outro com o azotato de uranium, mos- tram, que estas substancias irritantes introduzidas no canal digestivo augmentam a secreção do assucar. $10.º Bebidas Tem-se geralmente attribuido uma grande influencia sobre o des- envolvimento da doença á natureza das bebidas; sem a podermos ne- gar completamente, parece-nos que tem sido exagerada. O vinho é de entre as bebidas a que mais ataques tem soffrido. Zacuto accusa * o viri generosi potus immodicus; Amatus Lusitanus “o vinum acidulum; Lanzoni o abuso do vinho em geral; Willis o do Rheno; Lister o das Canarias, e todos os que são falsificados com arsenicum et sulfur accen- sum et infinita alia lenocinia damnosa *. A aguardente e licôres em excesso tem sido notada como causa de diabete pelos srs. Joaquim dos Remedios Monteiro (de Rezende), Autenrieth, dr. Barral (de Lisboa) e Garrod *; observação esta que vae d'acordo com o facto notado por Sandras, Bouchardat, Harley ", e Guntzler * de o assucar apparecer nas urinas depois do abuso dos al- coolicos. Entre as bebidas fermentadas teem sido apontadas, principalmente a cidra, por Nicolas e Gueudeville, a cerveja por Chopart, e Phara- mond, mas, segundo Nasse *, sómente a que esteja estragada. Este ul- timo facto parece estar de acordo com o que o sr. Jessen de Dorpat notou nos cavallos, isto é, depois da administração de aveia avariada desenvolver-se uma diabete passageira. 1 British. med. Journ., 18 de abril de 1857. * Monthly Journ., jan. 1851. * Opera omnia, t. 11, pag. 445. 4 Curat. med., cent. 11, cur. 94. ? Tract. de quibusdam morb. chron. Exercit. 2.º º British. med. Journ., 18 de abril de 1857. 7 Quartely Journ. of pract. med. and surg. julho 1857. 8 Canstatt's 1856. “ Arch. fur med. Erfahrung., março de 1818, pag. 338. A DIABETE [57 O abuso do chá tambem tem sido açcusado por Herm. N. Grimm *, e uma observação similhante vem nas Acta erwditorwm Lipsine *. Cul- len e Bosquillon citam as bebidas abundantes, Boerhaave * e Contour as bebidas abundantes e quentes, Lister * os liquidos carregados de acido carbonico, Mialhe e Pharamond as limonadas. Sit Affecções moraes Teem sido aceusadas, e quanto a nós com razão, de produzirem a doença ; assim o teem notado Trincavellius, Trumphius *, Curvo Sem- medo º* e Pinel. Garrod * falla de um homem que ficou diabetico de- pois de um duello, em que a pistola do seu adversario tinha falhado por duas vezes. Latham e Oppolzer tambem viram a diabete depois de um susto. Bouchut e Hodgkin depois de trabalhos intellectuaes fa- tigantes. Noble * em seguida a uma excitação excessiva do cerebro, Landouzy *, Marchal de Calvi e Vulpian !º em consequencia de impres- são moral viva. S 12.º Prazeres venereos O abuso dos prazeres venereos tem sido julgado uma das causas de diabete por Zacuto Lusitano “, Leonilunensis *, Nicolas e Gueudeville. Alibert ! accusa principalmente o onanismo. Julgamos que a excitação mui repetida da medulla deve sem duvida concorrer para o desenvol- vimento da doença; as experiencias modernas demonstrando a parte importante que este orgão toma na producção do assucar, abonam esta idea. ! Comp. med. chim., pag. 225. * Fevereiro de 1682, pag. 39. ? Prael. acad. in propr. inst. rei med., t. v, ad. $ 824. 1 Exercit. med., pag. 75. * Commer. Nor., 1740, t. x, n. 2, pag. 92. é Polyanthéa medicinal, pag. 454. ? British med. Journ., 18 de abril de 1857. * British med. Journ. 1863. º Gazette des hopitaux, 1862, 13 maio. 0 Gaz. hebd. 1862. ti Opera omnia, t. 11, pag. 445. Ars medendi. Francofurti, 1597, pag. 1065. Nosol.nat., t. 1, pag. 191. es 158 ESTUDOS SOBRE $ 13.º Abuso de remedios Alguns medicos teem apontado differentes substancias emprega- das na therapeutica como produzindo a diabete, quando empregadas em excesso. Tulpius * falla dos diureticos, Riedlin ? dos emmenagogos, Lister dos preparados antimoniaes, Hartmann e Sandras * dos purgan- tes, Monravá “ das aguas mineraes, Cardan * do nitrato de potassa (96 grammas de uma só vez) e outros em fim dos mercuriaes, sangrias, copaiba e cantharidas. Apontando estas opiniões não nos julgamos habilitados a emittir a nossa, visto não termos os elementos indispensaveis para a basear. S 14.º Doencas anteriores Segundo alguns auctores, ha doencas que dispoem ou produzem a diabete e outras mesmo que desapparecendo são seguidas della. As que tem sido apontadas são as doenças da medulla, nevralgias rebeldes, asthma, irritações nervosas (Whytt), hysteria e hypochondria, isto re- lativamente ás que atacam o systema nervoso. Entre as que teem a sua sede nos rins, as irritações e inflammações, os abcessos, os calecu- los (Ruisch e Tenon º e as ulceras. Nos intestinos, a sua irritação (Cro- zant), vermes intestinaes, e a dysenteria. Nas uterinas, a suppressão de leucorrhea, e a amenhorrea. Entre as doencas geraes o rheumatismo (Leh- mann), a gotta, principalmente a sua metastase (Sydenham), as scrophu- las (Cawley), a albuminuria (Schoenlein um caso). Em fim a supressão de exanthemas, a sarna, por exemplo, (Desault) !; de catarro antigo Rollo e Pearson); de salivação (Reil.) Os abcessos frios (Ruysch, Che- selden e Latham), as suppurações abundantes, a hydropesia, as hemor- rhagias, as febres intermittentes, a phtysica pulmonar e as doencas do figado (Ontyd) *, foram egualmente indicadas. ! Obs. med. Liv. xr. cap. XLVI. 2 Lin. med. ann 4.º, pag. 948, novembro. 3 Bull. de therap. t. vir, pag. 129. 1 Novissima med., t. 111, pag. 832. > Abeille méd, 1849, pag. 35. º Mém. de "Acad. des sc. 1761. 7 Traité des mal. des voies urin. pag. 11. * Unters. uber die Ursachen des Todes, pag. 712. A DIABETE o 159 Entre estas doenças muitas sem duvida não tem importancia al- guma na etiologia, mas acham-se notadas em virtude da má interpre- tação dos auctores, pois sem duvida se tem tomado por causa o que não é muitas vezes senão um symptoma. As doenças do systema ner- voso, as febres intermittentes (vistas as observações de Bourdel), as ir- ritações intestinaes e a gotta são sem duvida alguma verdadeiras cau- sas de diabete, as outras que apontámos para nós teem pouco valor. Ha ainda um inconmodo, as constipações, que representam um grande papel na etiologia; Wolff! viu a diabete desenvolver-se em ca- cadores em seguida a suppressões de transpiração; Haase n'uma sen- tinella esquecida no seu posto toda uma noite; Hodgkin em individuos tomando bebidas frias estando a suar, Sundelin * e Garrod* em indivi- duos que se immergiam na agua no momento do suor; Darwin, Mon- diere * e Hufland depois da suppressão do suor dos pes. Tratamos expressamente este ponto em separado, vista a grande importancia que se lhe liga, e que a experiencia parece confirmar ; ou- tro tanto faremos relativamente á prenhez, porque as experiencias do sr. Blot lhe deram um valor que até então não tinha. Antes das ex- periencias d'este illustre medico, Bennewitz *, Bouchardat e J. C. W. Lever º tinham apresentado alguns casos de diabete seguindo a pre- nhez, porém tinham passado despercebidos ; póde-se pois dizer que a elles em parte pertence a honra da descoberta. S$ 15.º Contagio Reil e Thomann admittiram este meio de adquirir a doença, mas no estado actual da sciencia esta idéa não merece a menor considera- ção. No mesmo caso está a de Kampf ”, que a julga epidemica. $ 16º Pancadas As pancadas na nuca ou outra parte do craneo, seguidas ou não de fractura, são umas das causas mais evidentes da diabete. Larrey é, ! Horn's Arch. 1818, Helf. 12, pag. 194. 2 Ibdem, 1830, Helf. 5, pag. 13. 3 British. med. Journ. 1857, 18 abril. * Expérience, t. 1, pag. 487. > Ozann's Clinical reports 1828. 6 Guy's hospital reports 1847. 7 Encherid. med., pag. 145. * Bauchet — Des lesions traumatiques de Vencéphale. Paris 1860. 160 ESTUDOS SOBRE Malaval!, Poteau ?, Rayer *, Szokalski *, Guitard, Goolden * (4 casos), Bernard º, Tode”, Erichsen *, Cless?, Griesinger !º (20 casos em 225), Plagge *!, Fano, Fischer 2, Garrod É, Klée !! (2 casos) e nós egual- mente * temos visto exemplos d'estes. O sr. Fischer, colligindo os casos de que tinha conhecimento, quiz vêr se podia tirar alguma conclusão, sobre qual seria a região mais propria para produzir a diabete, sendo exposta: a uma força ex- terior. Em resultado obteve os seguintes dados estatísticos : Pancadas na testa... .......... 6 casos » no vertex ou parietaes... 5 » » no loceiput: usfepa te RADIO, » em região não determinada 5 .» Potal bens NBS no Lhe 21 casos Casos de pancadas na columna vertebral seguidos de diabete tem egualmente sido observados. O dr. Reiken !º, de Brusxellas, cita um, e See” falla d'outro em que tinha havido mesmo fractura de vertebra. Não tem sido n'estas regiões exclusivamente que se teem visto as pancadas produzirem a diabete; de algumas outras fallam tambem os diversos auctores. Hodges * e Griesinger ” viram-a seguir uma quéda sobre os pés ! Quesney — Obsérvations sur le trépan. Obs, 12. * Oeuvres posthumes, 1783, t. II, pag. 123. * Union méd. 1850, 16 abril. 1 Ann. méd. de la Flandre oceid. 1852-53, pag. 436. º Med. Times, 1854, dezembro. * Physiol. exp., t. 1, 1855. ? Union méd. 1854, dezembro 23. * Dublin. Hosp. Gazet. 1858, janeiro 15. * Eyr. et med. Tidskriot, 9, H. 2. 10 Arch. fur phys. Heilk, 1859. 1 Union méd. 1860, março 22. 2 Ibidem 1860, fevereiro 16. 3 British. med. Journ. 1857. abril 18. 1 Gazet. méd. de Strasbourg. 1863, novembro. '» Considérations sur un cas de diabéte, 1859, pag. 70, tb Abeille méd. 1846, pag. 69. 1 Arch. gén. de méd. 1862, pag. 436. '8 Lond. med. Gaz. 1843, julho. 9 Arch, fur. path. Anat. und phys. 1859. A DIABETE 161 e face. Bouvier, Marsh !, Canuti * e Stosch ?, depois de pancadas nos rins; Vallon * e Trousseau * em seguida a um choque forte sobre o ven- tre; em fim Rosenstein * depois d'uma queda sobre o peito. Além d'estes factos, outro tem sido observado, que tem bastante relação com os apontados, e tal é, seguir-se a diabete, n'alguns casos, aos esforços musculares excessivos; Frank”, Reid Clanny * e Cardanus citam alguns exemplos d'este genero. A causa d'este phenomeno parece dever buscar-se no systema ner- voso; pois uma perda ou antes uma sedação na força do centro de inervação póde facilmente produzir a exageração da glycogenia. CAPITULO [HI ANATOMIA PATHOLOGICA Diversas são as alterações observadas nos individuos mortos de diabete. Conforme as idéas que teem vogado sobre a natureza da doença, assim tal ou tal orgão, que se suppunha ser a séde da lesão, tem sido melhor observado, pondo-se de parte todos os outros, considerados me- nos importantes. O grande numero de complicações, que de ordinario vem juntar- se á doença principal, faz que muitas alterações sejam attribuidas á diabete, quando realmente só pertencem a molestias mais ou menos directamente ligadas com ella. Taes são, em resumo, as causas que poderosamente teem concor- rido para o estudo da anatomia pathologica d'esta doença estar ainda tão atrazado. Em vista do que levamos dito, e tendo por fito preparar ele- mentos, que talvez possam vir a ser mais tarde de grande valia para ? Dublin, Journ. t. xvir, 1854. 2? Gaz. méd. París 1851, pag. 555. 3 Path. and Ther. des diab. mellitus. Berlin, 1828. 4 Zeitschrif. der K. K. Gesellsch. der Aerzt, in Wien, 1845, Ix, pag. 186. * Clin. med. t. 11, pag. 601. 6 Virchow's Arch. 1859, t. xr, pag. 462. T Act. instit. clin. Wilna 1812. 8 The Lancet. 1837, pag. 655. MEM. DA ACAD. — [.º CLASSE. — T, WI. P. II. 21 162 ESTUDOS SOBRE o estudo da natureza da diabete, exporemos tudo quanto temos obser- vado e Jido sobre as differentes lesões encontradas pela autopsia ; de- vendo todavia notar, que Julgamos, como Babington e Hodgkin, não haver lesão especial e constante que caracterise a diabete, parecendo sómente mais frequentes as do figado e medulla. LESÕES DOS LIQUIDOS 4 1º Sangue E) fo) As analyses de que temos conhecimento são : 1.º As de Simon !: 1.º Caso AREAUEAÇS do st ad A, 2 ERR NA 194,663 Residuo solido ....... SEN RA DU BS OT Ribas 0728 ia Mie NR EP Gordos oe. adprundo aobunaodla 2,010 Ana ra EAR A uso MG ao AT Globulina. ........ PAi pi de sent GIBIS) Elematima/s e. 2% Glenn i pa e ad 5,425 Materias extractivas e sacs........... 11,570 2 Caso Area ds O pd Rara, rios apra. dg Residuoselidas. é. e sobr dé sd para Lu Or) ibn a e a cp a 2,970 Cordnraisaçrbos SU Mpstt go. es Ssturd 0n3;040 Abin ads d due iu gua tans pl 4864000 (lol ulin ars en o a Eta AA 98,500 Ele vratiaçr.. sint 4 tido segrab, ade 5,100 Materias extractivas e saes.......... 14,900 2º A de Mueller feita em 12 onças de sangue”: Au apoR Ds A Ss 8 onças | oitava 33 grãos Elematosimas o a AP o ori dl » Abono RR pai Ape 34:35 37 » ! Arch. der Pharm. t. xvir, pag. 33, e t. xxr, pag. 269. 2? Arch. der Pharm. cinc Zeitsch. der Apolheket. Vereins in Nord-Deutschland, 2 H. Bd. 18,s. 55, 1840. A DIABETE ÁSSUCA Pisa di Ls ada ad 0 onças Í oitava > Gordura crystallisavel....... 0 » RR 33 Chlorureto de sodio, ,...... ONE» Di 24,5 Materia extractiva.......... 0 » 0» 22,5 Phosphato de ferro... ......U » 0» POD) Gordura fluida... .......... DN» 0» 19 Carbonato de potassa........ Dia 0» 17 Chlorureto de potassio ...... O» Ono! 13 Carbonato de soda.......... 0» 0» 11 Phosphato de magnesia.. .... (Op (0) 05 10 Carbonato de magnesia...... 0 » 0 » 9 Sulfato de potassa.. ........ 0 » Qu» 9 Carbonato de cal... ........ 0» 0 » 6,7 Phosphato de soda... ........ 0» 0 » 0,5 3.º As de Bouchardat ! (a primeira das quaes foi feita sobre o sangue d'um diabetico já extenuado) : 1.º Caso PA GRUTA pole Ceperine ca capa to Re a opera 808,76 Saes, materia extractiva e corpos gordos 8,92 Globulos esa castanha estala dt ae 118,23 PADRAO Mascate O a ER Ta 1,95 Albumina do 44 edi bis Fai croltanl cg besos 62,54 1000,00 2.º Caso Asia poor s qo) assi, o lmndã. é bosta NE OS ie 791,00 Saes, materia extractiva e corpos gordos 11,31 GlobulosAEs ooo sonar eso Mae e a SRS at PAO LATO EE ETR TS 2,83 AB maias ho area Lie ss ao o a DRE Tai 67,12 999,48 Perdag: ago bE mea AL ASAE li 0,52 1000,00 ! Sup. à " Annuaire de Lhérap. 1846, pag. 186. 164 ESTUDOS SOBRE 4.º A de Rees ! sobre o soro do sangue d'um diabetico : PE ME PDR PRN A IDE | 908,50 AMB na. digas vi uara de DR ap 80.35 Materias gordas. ..... a e De EE 0,95 USSICAA da dig do dO gr o Eram 1,80 Extractivo animal, uréa ......... FIRE 2,20 Albuminato de soda... ........ RR 0,80 Chlorureto alcalino... ...... ORAR ce 4,40 Phosphato e sulfato alcalino... ........ signaes Perdad) sos Mb bc A RRRRERIRERTO + ce 1,00 1000,00 Estudando cada uma das substancias que compõem o sangue, me- lhor se poderá ajuizar das modificações que a doença lhe imprime: (a) Assucar Depois de descoberta a existencia do assucar na urina dos diabe- ticos, começou a dirigir-se a attenção para o sangue, e foi então que P. Frank, Cullen, Rollo, Richter, Michaelis, Zipp * e Dobson * lhe acharam um sabor adocicado. As experiencias de Nicolas e Gueudeville *, Wollaston *, Vauque- lin e Segalas *, Berzélius, Henry e Soubeiran ”, Hughes, Home e Kane * pareceram porém contrarias á idéa da existencia do assucar no sangue, porque, pela analyse, não puderam estes observadores descobril-o. Mas Ambrisioni º, Maitland ºº, Rees !!, Mac Gregor 2, Peligot º, Si- 1 Guy's hospital reports, outubro 1838, t. ur. pag. 398. 2? Hufeland's, Journ. 1827, s. 7. * Med. obs. by a Soc. of Phys. in London, 1775, vol. v, pag. 298. 4 Recherch. et exp. sur le diab. sucré, pag. 71. º Ann. de Chim. nov. 1819, pag. 2927. º Journ, de phys. de Magendie, 1822, t. 11, pag. 335. ? Journ. de pharm., 1826, t. xr, pag 320. London med. Gazet. t. x, pag. 61. * An. univ. di med. di Omodei 1835, t. LxxIv, pag. 160. 1º Lond. med. Gazet. 1836, t. xvrr, pag. 900. 1 Guy's hosp. reports 1838, t. 111, pag. 398. 2º Journ. de ch. méd. 1840, L. v1, pag. 17. !3 An. de phys. et chim. 1837, t. Lxvn, pag. 136. A DIABETE 165 mon !, e mais modernamente Fonberg, Drummond *, Bouchardat e muitos outros, teem demonstrado a sua existencia. Em 1847 Garrod achou esta substancia (em pequena quantidade) no sangue de diabeti- cos, estando mesmo em jejum ou seguindo o regimen animal. A razão da differença d'estes resultados nas experiencias dos di- versos observadores é, provavelmente, porque a analyse foi feita muito tempo depois de extrahido o sangue. A má escolha dos processos, reu- nida, como bem notaram Stosch e Bouchardat, á circumstancia de se servirem do sangue tirado aos doentes em jejum, póde tambem expli- car o facto; e com efeito viu Parkes que na qaioria dos casos não se acha assucar, quando os doentes estão privados de assucar ou fécula durante oito ou doze horas. O processo seguido por Ambrisioni foi o seguinte: Tomou uma libra de sangue, juntou-lhe agua, ferveu e filtrou ; depois tratou o liquido pelo acetato de chumbo, que produziu um precipitado branco sujo. Para isolar o excesso de chumbo serviu-se do acido sulphydrico; o residuo formou então uma especie de massa escura ; diluida esta em agua, filtrou, juntou-lhe mais agua e clara d'óvo; ferveu e filtrou de novo; o liquido obtido era incolor; submettendo este á evaporação len- ta, obteve uma especie de xarope, no qual se formaram crystaes de as- sucar de nove grãos de pêso. O processo seguido pelo dr. Rees diflere bastante d'este, e con- siste em evaporar até á seccuta, a banho-maria, doze onças de sangue; pôr depois o residuo durante algumas horas em contacto com agua a ferver, filtrar, e em seguida evaporar até á seccura; tratar o residuo pelo alcool a 0,825º, filtrar de novo, decantar e evaporar até á sec- cura. A massa sêcca, obtida n'estas operações, é lavada pelo ether re- ctificado para a desembaraçar da uréa e materias gordas; depois é dis- solvida no alcool, que pela evaporação deixa ficar sómente crystaes de chlorureto de sodium e assucar ; separam-se depois uns dos outros dei- xando-os cair em alcool; os de chlorureto de sodium vão ao fundo, e os do assucar sobrenadam, sendo por isso facil tiral-os por meio de uma espatula. O processo seguido hoje, consiste em desfibrinar o sangue, logo ao sair da veia, pelo methodo de Figuier. Pesa-se uma certa quantidade de sangue assim preparado, e mistura-se com tres vezes o seu volume de ! Animal chemistry, vol. 1, pag. 327. 2? Montly Journ. of med. 1852, t. x1v, pag. 281. 166 ESTUDOS SOBRE alcool a 90 graus; passa-se o sangue coagulado atravez de um panno e expreme-se; lava-se depois o residuo com alcool, filtra-se o liquido, que é quasi incolor, e evapora-se a banho-maria quasi até á seccura, depois de o ter ligeiramente acidulado com acido acetico; o residuo da evaporação é dissolvido em agua distillada, e em fim a solução, de- pois de filtrada, trata-se pelo liquido cupro-potassico (Fheling ou ou- tro). Querendo maior rigor póde-se tambem sujeitar a solução prepa- rada á fermentação. As quantidades de assucar que teem sido determinadas, são : 28,00 em 1:000 de sangue. ..... Drummond 1,90 » » » RT o Rees 1,25 » » » po) sa vo Picard 4 pega) » » » » 2.0... Mueller 1,00 » » » pop nais «dBeligos 04900» » » » 2.40 Ambrisioni 0,33.» » » porilo ab cosadHonherg (b) Urca Gregory, Bostock, Christison e Rainy ? verificaram em alguns ca- sos a existencia d'este principio em grande quantidade, e o sr. Picard o achou n'um doente na dóse de 07,181 por 1000. Ultimamente Heyn- sius *, Rosenstein *, Bocker *, Haugston *, Thierfelder, Uble” e alguns outros teem verificado que a uréa augmenta excessivamente nos ul- timos periodos da doenca. (e) Chlorureto de sodio Esta substancia tem sido encontrada já em dóse mais elevada que a normal, já mais inferior, como melhor se póde vêr pelo seguinte qua- dro: 1 De la présence de I'urée, etc. Strasbourg 1856, pag. 55. 2? Lond. med. Gazet. 1838. 3 Hollandische, Arch. 1. 4 Virchow's, Arch. 12 e 13. * Deutsche Klinik 1853. * Dublin quart. journ. of med. sc. 1861. 7 Arch. phys. Heilk. 1858. j A DIABETE [6% NotiaralSs pre uas 2,5 a 4,5 por 1:000 Na diabete ; Neeson dad EO) » » Mueller .........3 190 » » Pregrd. qa upa de duo, 279 » » (d) Phosphatos Hunefold diz que elles se acham sempre diminuidos, porém, se- gundo Rayer !, alguns teem encontrado o phosphato de cal em ex- cesso. (e) Gordura Dobson, Rollo, Mac-Gregor, Marcet, Thompson, Elliotson *, Bird º e Mialhe teem-na visto augmentada. Melhor se poderá julgar, das dif- ferentes proporções achadas, pela tabella seguinte : Normal média. .... 18,60 por 1:000 Na diabete : Mueller. ......... 6,71 »o» Simon lo) (a ta neNtol laio! jo RN) 64 » » Becquerel e Redier * 2,67 no Simon. MMS a 2 01 » » Rees! MEIRA ass 0 595 » » (1) Creatina e creatinina Das observações do sr. Levellaly * parece dever concluir-se, que ha nesta doença o augmento d'estes dois principios, mórmente nos ultimos periodos. 1 Traité des malad. des rins, t. 7, pag 243. 2 The Lancet, 1833, n. 71. * London med. Gaz. 1836, t. xvrrr, pag. 133. 1 Recherches sur la composit. du sang, pag. 110, * Wiener. med. Wochenschrift. 1862. 168 ESTUDOS SOBRE (8) Mibrina Drummond, Nicolas, Gueudeville, Henry, Soubeiran, Guibourt e o sr. Andral teem verificado a sua diminuição; n'algumas analyses, po- rém, os srs. Bouchardat e Simon acharam a sua quantidade normal ou quasi normal. O primeiro d'estes observadores notou, comtudo, que ella diminue realmente quando a doença chega aos ultimos periodos. (h) Albumina Simon achou-a em dois casos augmentada (114,570 e 86,000); outro tanto aconteceu a Rees (80,35) e a Mueller (119,40); Drum- mond porém encontrou n'um diabetico a quantidade normal, e o sr. Bouchardat parece que a viu duas vezes diminuida (62,54 e 67,12); o que melhor se deprehende do seguinte quadro : Quantidades por 1:000 Observadores 70,00.......... Normal O OLndi ms putas Bouchardat (T/c DS a Idem SOS idrs A! Austhos Rees 86,00 Simon 1146 one la cosittirdidem IPO RR rs Mueller - (1) Agua As quantidades determinadas pelos differentes observadores teem sido : Quantidades por 1:000 de sangue Nomes MDA nara ap 0 006 INCERTO 908,5... ........ Rees 908,0........... Rech SZ90. na Lecanu 816,0."- ams 805,0, 0 ce - Henry e Soubeiran .« Bouchardat A DIABETE 169 Quantidades por 1:000 de sangue Nomes RO OS e STO 791,0........... Bouchardat MS DOU O. o. O Simon 681,3 . Mueller D'onde resulta que em geral a agua augmenta, tornando-se por isso notavel a observação de Mueller, que affirma têl-a encontrado em quantidade abaixo da normal. N'um caso, tambem Drummond a viu na dóse physiologica. (3) Principios fixos As proporções determinadas teem sido por 1:000 : 2 ME E as SE BRD Rech DIR (| RS TIRO 90/0h0. psprs ad Votem 92000 E VP Bouchardat 184,0........... Henry e Soubeiran ESQ NOR err Lecanu (k) Globulos Drummond viu-os na proporção ordinaria, mas os srs. Andral Bouchardat e Rayer acharam-os diminuídos em numero, volumosos e descorados. Lheritier tambem verificou a sua diminuição (a 86), como se po- derá melhor comprehender comparando com a média normal (1 34,25.) (1) Soro Nicolas, Gueudeville e outros teem-no encontrado mais abun- dante; e Prout tambem lhe achou a densidade um pouco augmentada a 1029,5, sendo a normal 1028 !. 1 Lehrb. der phys. Chem. 1853, t. 11, pag. 131. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. II. P. HI. 2) 170 ESTUDOS SOBRE (m) Reacção Os srs. Andral e Bouchardat verificaram o caracter alcalino do san- gue contra a opinião d'aquelles que o suppunham acido; este ultimo observador até determinou pelo acido chlorhydrico o grau d'alcalini- dade do sangue. (n) Côr Dobson, Rollo, Mac-Gregor, Thompson, Elliotson, Duncan, Mialhe e Marcet, teem-no visto com o aspecto leitoso, em resultado de uma superabundancia de materias gordas. Marshall notou-lhe uma côr, parte leitosa e parte castanho es- curo na veia subclavia, o que elle attribuiu á imperfeita mistura de sangue com o chylo; Michaelis * observou um phenomeno similhante no sangue contido no coração; Watt, em fim, diz tel-o encontrado côr de theriaga. Pela nossa parte nada. temos visto, relativamente a este ponto, que mereça especial menção. Além d'estas propriedades que acabámos de notar no sangue, acrescentaremos ainda que Scudamore o viu, n'um caso, apresentar a crusta pleuritica, e que Rollo lhe descobriu a qualidade de se conservar por mais tempo do que o sangue dos individuos sãos, ou tendo succum- bido a outra qualquer doença. S 2.º Liquido cephalo-rachidiano Storch? e o sr. Auffan tiveram occasião de verificar o augmento da quantidade d'este liquido. Parece tambem resultar d'algumas ex- periencias que o assucar, que n'elle existe no estado normal, aug- menta sensivelmente havendo a diabete. $ 3.º Serosidades As que se encontram no peritoneo, pleuras e pericardio, conteem 1 Hufeland's Journ. Bd. 145. 3, S 66. * Hufeland's Journ. 1827, s. 7. A DIABETE I71 assucar, segundo as experiencias dos srs. Cl. Bernard e Cappezuoli |. Estas serosidades muitas vezes acham-se augmentadas, principalmente as da pleura e peritoneo, por causa das pleurites, e ascites tuberculo- sas que por vezes se manisfestam. O sr. Gallard n'um caso em que se manifestou uma pleuresia intercorrente, achou dois litros d'um liquido purulento, com flocos albuminosos, e Fritz tambem encontrou no pe- ritoneo um liquido acinzentado e purulento. Rudolph, segundo Frank, n'um diabetico hydropico, achou assu- car no liquido do peritoneo. S 4.º Bile Segundo o sr. Bouchardat apresenta-se limpida, de uma côr ama- rello-encarnada e marcando 1,020 de densidade. Dupuytren e Thénard acharam a côr natural, e as nossas observações confirmam a proposi- cão d'estes dois auctores; Gallard porém encontrou-a amarello-claro. Relativamente á quantidade, uns, como Bardsley, dizem ser maior (Fritz n'um caso a viu augmentada), outros com Heidmann*?, Duncan, Dupuytren e Thenard affirmam ser menor; as nossas observações con- firmam as d'estes ultimos. Em quanto á consistencia, R. Willis pensa que é mais liquida que a normal, outros pelo contrario mais espessa. Nicolas e Gueudeville affirmam vagamente tel-a encontrado al- terada, sem determinar qual seria a modificação; e R. Willis sustenta além d'isto que a sua reacção é acida. O assucar tem sido descoberto n'este liquido por Cappezuoli e outros; mas será isto um phenomeno cadaverico? As experiencias so- bre a passagem d'este principio atravez da vesicula felea assim o fa- zem suppór. $ 5.º Lympha Segundo as analyses de alguns observadores abunda em assucar. ! Journ. des conn. méd. 1845, nov. * Mechel Deutsch. Arch. 1801, t. 11, pag. 642. Li? ESTUDOS SOBRE S 6.º Succos gastrico e intestinal Robert Willis diz tel-os achado mui acidos; Nicolas e Gueude- ville affirmam simplesmente estarem alterados. Nos succos intestinaes achou o sr. Bernard * muito assucar; não o pôde porém determinar no succo gastrico. LESÕES DOS SOLIDOS FIO 7.º Cerebro e cerebello Depois que o sr. C. Bernard mostrou a importancia do systema nervoso na producção da diabete, foi então que se começou a dirigir a attenção para o cerebro c cerebello. Antes d'isso pouca ou nenhu- ma menção se fazia d'estes orgãos nas diflerentes descripções das aber- turas cadavericas, visto o systema nervoso representar então um pa- pel mui secundario na etiologia da doença. Apesar desta circums- tancia, ha comtudo alguma coisa a aproveitar em certas observações anteriores a 1850; com esses elementos, com o que a sciencia mo- derna nos tem ensinado, e com o que temos observado, poderemos me- lhor é mais seguramente descrever a anatomia pathologica d'estes orgãos. Bardsley ?, Fritz e Gallard dizem ter encontrado o cerebro de consistencia normal; Venables e Guitard viram-no endurecido, mas Auffan só o lobo esquerdo; Hauner * achou-o todo amollecido, e o sr. Broca só no lado direito com atrophia. Pela nossa parte não lhe temos encontrado particularidade alguma. A congestão da massa cerebral esquerda tem sido notada por Auf- fan, e em toda ella, já duas vezes, a substancia cerebral nos pontos cortados nos apresentou um mosqueado mui sensivel. Entre a ca- mada optica e os tuberculos quadrigemeos achou Steinthal focos apo- pleticos, e Trousseau encontrou no corpo striado, na camada optica e nalguns pontos da substancia cinzenta, proximo da cireumferencia do hemispherio esquerdo, pequenas massas como infiltradas de sangue e notavelmente amollecidas. qo [19] 1 Lecons sur les liquid. org. t. 11, pag. 2 The cyclopedia. 3 Casper's Vochenschrift, 1850. A DIABETE 173 Na protuberancia annullar foi observada a congestão por Auf- fan e Fritz, o amollecimento por Frerichs, e o amollecimento parcial por Lima Leitão ! no espaço de meio centimetro quadrado em super- ficie e um em profundidade. Frerichs aponta egualmente o amolleci- mento dos tuberculos quadrigemeos. No cerebro descobriu assucar ursa vez o sr. Wagner. O cerebello analysado pelo sr. Vernois* mostrou a presença de assucar, e a sua con- sistencia era maior n'um caso observado pelo sr. Guitard. O sr. Richardson * aponta uma observação em que o cerebello se achava comprimido por um tumor osseo da fossa occipital. A base do quarto ventrículo tem sido encontrada normal pelos srs. Auffan, Wagner, Trousseau e Fischer * n'alguns casos; Levrat achou sobre ella um tumor colloide; Frerichs, Broca, Leudet *, Fauconneau- Dufresne * e Becquerel” teem visto o seu amollecimento, apresentando manchas amarelladas, e com caractéres que bem definiram os srs. Luys e Martineau. O sr. Luys * descreve as lesões encontradas por elle, do seguinte modo: Parede anterior do quarto ventriculo, d'um modo geral, córada de amarello-escuro e além d'isso fortemente vascularisada ; no estado normal é ordinariamente branca, e apenas se distinguem algumas strias sanguineas. A sua consistencia estava mui claramente diminuida. Des- tacava-se além d'isso á menor fricção, com o aspecto gelatiniforme. Esta côr amarello-escura era muito mais carregada em quatro pon- tos, symetricamente collocados ao lado da linha mediana e em alturas differentes; a accumulação d'esta substancia acinzentada formava n'es- ses pontos verdadeiras manchas escuras. As duas manchas superiores com bordos diffusos e mais carrega- das em côr no centro, estavam situadas a um centimetro, pouco mais ou menos, abaixo dos pedunculos superiores do cerebello, ao lado da li- nha mediana. As duas inferiores, situadas pouco mais ou menos um centimetro acima das pyramides posteriores, correspondiam aos pontos em que os ! Esculapio 1849, pag. 65. 2 Arch. gén. de méd., 1853, t. 111, pag. 676. * Med. Times and Gaz., 1862, t. 1, pag. 234. ! Gaz. des hopitaux, 1862, septembro 2. * Moniteur des sc., 1859, $ Monit. des hop., 1857, n. 107 e 112. * Union méd., 1849, junho. º Bull. de la Soc. anat., 1860. 174 ESTUDOS SOBRE pedunculos inferiores entram no cerebello, e distavam egualmente um centimetro da linha mediana. A mancha inferior esquerda era a menos carregada em côr; a di- reita era onde esta mais se pronunciava e onde se notava a maior vas- cularisação. Pelo exame microscopico verificou-se que além da turges- cencia dos capillares de menor calibre, havia uma degeneração particular de todas as cellulas nervosas, nos sitios onde existem as manchas aci- ma descriptas. Todas estas cellulas, em via de evolução retrograda, es- tavam cheias de granulações amarelladas, eram franjadas nos bordos, e a maior parte estavam meio destruidas, deixando-se apenas reconhecer por alguns pequenos fragmentos que restavam. É inutil acrescentar que as connexões das cellulas entre si estavam completamente destrui- das. Apesar de se macerar a peça no acido chromico, nem assim era possivel reconhecer a existencia das anastomoses do prolongamento das cellulas, que tão numerosos são n'este ponto. O sr. Luys !, n'outro caso da clinica do sr. Trousseau, achou o seguinte : ' Pavimento do quarto ventriculo mais vascular que o normal, de- senhando-se grossos troncos vasculares á superficie: manchas aloiradas e diffusas abaixo dos processos superiores do cerebelo; notando-se egualmente algumas manchas d'este genero abaixo do ponto de inser- cão do nervo acustico. Fazendo córtes n'esta região viu a substancia cinzenta muito vas- cular e com um aspecto rosado. Examinando as manchas ao microscopio, reconheceu serem com- postas de globulos de gordura, em que tinham degenerado as cellulas nervosas. Estas cellulas, em logar de apresentarem os contornos cla- ros, com os seus prolongamentos estreitos, e nucleo bem circumscri- pto, estavam todas convertidas em massas granuladas informes, cons- tituidas exclusivamente por granulações amarelladas mais ou menos ligadas entre si. Podia-se pois dizer, n'este caso, que os elementos his- tologicos, depois de chegarem ás ultimas phases d'evolução retrograda, tinham perfeitamente deixado de existir como individualidades anato- micas. O sr. Martineau * descreve pela seguinte maneira as lesões que encontrou no quarto ventriculo, + * Clinique méd. de Trousseau, t. II, pag. 578 * Gazet. des hopitaux, 11 janeiro 1862. A DIABETE 175 Base do quarto ventriculo, sobre tudo ao nivel de calamus scri- ptorius, d'uma côr acinzentada mui manifesta, Existia uma injecção bastante pronunciada d'esta substancia, que a fazia assimilhar á substancia cinzenta ; e além d'isso os vasos super- ficiaes eram mais volumosos e apparentes. O sr. Martineau, conjunctamente com o sr. Luys, observou além d'isso um caso no serviço do sr. Herard, em que se notaram lesões - similhantes, com a diferença, porém, de se apresentarem em grau mais elevado, pois havia a ulceração propriamente dita da substancia cerebral. Pela nossa parte temos achado o seguinte em dois casos: 1.º — Quarto ventriculo e aqueducto de Sylvius de capacidade maior que a habitual. Pavimento mais espesso, dando ao tacto uma certa aspereza, côr amarellada em toda a superficie. Encontraram-se duas verdadeiras manchas no lado esquerdo da base, devidas a ser a côr amarella mais carregada n'este ponto. Arborisação vascular mui evi- dente, tendo alguns vasos mesmo um calibre bastante forte. Fazendo córtes na espessura da parede, viu-se que a substancia cinzenta tinha uma côr rosada mui pronunciada, devida sem duvida ao desenvolvi- mento vascular. 2º-— O quarto ventrículo tinha uma capacidade um pouco maior que a habitual; a base não apresentava côr fóra do natural, nem sen- sação alguma anormal pelo tacto. Havia uma arborisação vascular muito desenvolvida á snperficie, n'alguns pontos chegando a apresentar um millimetro de diametro. Pelos córtes successivos reconheceu-se o as- pecto rosado da substancia cinzenta. O sr. Fritz achou tambem, na base do quarto ventriculo e espes- sura dos pedunculos cerebellosos superiores, as veias mais volumosas que o habitual; na parte subjacente do bolbo e protuberancia notava- se a mesma lesão. Nos ventriculos encontra-se ás vezes alguma serosidade, como te- mos visto com Fritz. SG 8.º Medulla O sr. Auffan ! viu-a normal n'um caso; porém os srs. Vogel e Scharlau ? acharam-na amollecida, e Venables pelo contrario endureci- da. A hyperemia tem sido cgualmente notada por Vogel e Scharlau. ! Du diabete sucré. Strasbourg, pag. 38. 2 Die Zuckerharhruhr. Berlin, 1346. 176 ESTUDOS SOBRE S$ 9.º Involucros e annexos do cerebro e medula Os involucros cerebraes parecem ás vezes não soflrerem lesão al- guma, e Bardsley aponta casos em apoio d'esta supposição. Outras vezes porém, em presença dos factos, não se tem podi- do duvidar da sua participação na manifestação da doença; Stosch |! encontrou adherencias entre a dura mater e o cerebro; Garrod, n'um caso, em que tinha havido durante a vida um corrimento purulento pelo ouvido, achou uma grande quantidade de pus sobre as membra- nas do cerebro; Auflan a injecção da pia mater e plexos choroideos ; e os do quarto ventriculo foram encontrados por Fritz mais volumo- sos e consistentes que o natural. Nós já temos visto a injecção d'estes ultimos, e a deposição de exsudações gelatinosas nas meninges. N'um caso, em que havia injecção dos plexos, achámos haver in- seridos n'elles dois kystos, um em cada ventriculo, tendo dois centi- metros de largo e um de grossura, mui vasculares na sua superfi- cie externa, avermelhados, e contendo no interior alguma serosidade. Examinados ao microscopio manifestaram a existencia de cellulas ce- rebraes, tubos nervosos, granulações moleculares, globulos gordurosos e granulações calcareas. Nos involucros da medulla teem-se notado ex- sudações gelatinosas (Scharlau e Vogel), e a injecção de todas as veias (Durr). S$/10º Nervos Tem sido observadas duas diferentes lesões nos nervos, a sua hy- pertrophia, e a compressão. Da primeira cita um exemplo Muller (3 a 4 vezes o volume normal); os srs. Rayer e Duncan ? fallam de outros casos em que ella era parcial, limitando-se no de Rayer ao plexo re- nal, e no de Duncan ao sympatico. Relativamente á compressão, os srs. Duben, Huss * e Nyman * citam quatro casos em que o pneumo- gastrico estava estrangulado por concreções calcareas. ! Hufeland's Journ. 1827, pag. 7. 2 Edinb. clinical reports. 3 Hygea medicinsk och pharm. monaesskrift 1856. ? 4 Dublin Hosp. Gazet. 1857, n. 14. t A DIABETE 177 $ 11º Pulmões, pleuras e gangiios bronchicos Se é um facto que ás vezes não são a sede de lesão alguma, como vimos com Lima Leitão !, Bardsley e Pavy, tambem não se póde ne- gar a existencia mui frequente de tuberculos em differentes periodos de evolução; Bardsley, Copland, Cloquet, Bonamy ?, Rayer, Auffan, nós e muitos outros tem citado exemplos d'estes. Kuchenmeister e Wagner viram-os cretificados. Ao redor dos tuberculos, e n'uma certa extensão, o sr. Charcot viu o tecido do pulmão reduzido a uma polpa malle de côr escura e sem cheiro especial. Griesinger descreve uma autopsia em que se no- taram lesões mui similhantes: a parte anterior do lobo superior do pulmão esquerdo estava completamente privada de ar, e cheia d'uma serosidade pouco espessa, d'uma côr cinzenta-escura ; havia além disso numerosas cavidades, do tamanho d'um feijão, cheias d'um liquido verde escuro contendo detritos de tecido pulmonar. Ao redor d'estas ca- vidades não existiam signaes alguns de reacção inflammatoria, nem de hepatisação. No lobo inferior a pleura apresentava algumas placas de aspecto gangrenoso, cercadas d'uma injecção mui manifesta : no inte- rior d'este lobo existia uma cavidade gangrenosa, do tamanho de um ovo, bem limitada, na qual se encontrava um liquido côr de choco- late; ao redor d'esta cavidade o parenchyma estava molle, de côr rubra- clara, e sem granulações hepaticas; estas partes gangrenadas não exhala- vam mau cheiro, e o liquido que as banhava tinha uma reacção acida. Dupuytren e Thénard viram n'um caso a existencia de kystos, e o sr. Vogt de Berne observou, na parte central d'um dos pulmões, a de uma cavidade forrada por uma membrana, e contendo pus mistu- rado com uma massa de consistencia caseosa, não se podendo decidir se era uma massa tuberculosa se um abcesso; Wagner achou uma vez no pulmão um oedema, e por meio da analyse chimica descobriu- lhe assucar; as hepatisações em differentes pontos do tecido pulmo- nar são apontadas por Pavy e outros, como resultando das complica- ções pneumonicas; e nas pleuras não é raro verem-se adherencias ou derrames. Os ganglios bronchicos são ás vezes tambem a séde de tuberculos, do que o sr. Monneret aponta um exemplo. 1 Esculapio, 1849, pag. 65. 2 Bull. gén. de thérap. 1840. MEM. DA ACAD, — 1.º CLASSE, — T. WI. P. IL. Du) 178 ESTUDOS SOBRE $ 12º Coração e vasos O sr. Auffan encontrou uma vez o coração mui infiltrado de gor- dura, e Vogt diminuído de volume; e Luroth viu o aneurisma da arteria pulmonar. N'um caso o sr. Pavy encontrou-lhe assucar no te- cido. O sr. Demarquay, n'um caso de gangrena do pé, achou pequenas placas calcareas nas tibiaes e na pediosa um pequeno coalho molle e adherente ás paredes, mostrando ser recente; mas o sr. Broca em ou- tro caso similhante encontrou a femoral e poplitea perfeitamente per- meaveis e sãs. | S 13.º Estomago e intestinos O estomago tem sido encontrado dilatado (o que não é para ad- mirar) em quatro autopsias por Berndt *, por Dupuytren e Thénard (5 a 6 litros de capacidade), por Auffan e por nós; n'um caso porém, já o vimos, assim como Baillie e Wagner, de volume normal. O sr. Auffan, e Duncan reconheceram egualmente a hypertrophia dos ele- mentos musculares, em quanto nós vimos o seu adelgaçamento. A injecção do estomago tem sido notada por Berndt, Lima Lei- tão, e por nós. f Nos intestinos não é rara a dilatação (Auffan e nós), a injecção vascular (Lima Leitão, e nós) e a hypertrophia das suas paredes (Auf- fan). A mucosa estomacal ás vezes apparece inflammada e amollecida (Berndt), outras descórada (Porter), e tambem mas raramente coberta d'um inducto negro (Marshaall e Stosch). O sr. Fritz verificou uma vez existir junto do cardia e pyloro uma injecção ponteada ou striada, d'envolta com pequenas echymoses quasi microscopicas, situadas na espessura da mucosa e dispostas em fórma de duas ou tres placas irregulares. Algumas placas de congestão hemorrhagica, analogas ás do es- tomago existiam no duodeno, na parte superior do jejuno, no cego e na parte contigua do ileon. A mucosa da parte superior do intestino delgado apresentava uma lesão mui notavel: era uma verdadeira hy- pertrophia, mui notavel sobre tudo nas valvulas conniventes, que ti- nham o dobro do volume normal. 1 The american journ. of the med. science. 1845. A DIABETE Ni Um espessamento ainda mais consideravel se notava na mucosa do recto. Se Figado Nem sempre se tem descoberto lesões n'este orgão, pois Cullen em vinte autopsias o achou sempre normal; e Frank, Dupuytren, Thenard, Duncan e Frerichs citam cásos similhantes. O augmento de volume, na totalidade do orgão ou em parte, é commum, sem comtudo ser mui frequente, pois Griesinger, em ses- senta e quatro casos, só em tres achou uma hypertrophia consideravel, e mediocre em dez; e o sr. Crozant em quarenta e um diabeticos, tam- bem só encontrou dezoito com hypertrophia. Tem além d'isto apon- tado esta lesão Berndt ! (uma vez em quatro), Bardsley, Frerichs (tres vezes), Lecorché ? e nós. Alguns teem ido mais longe citando as di- mensões e até o pêso, entre estes estão os srs.: Auffan—0",30 de longo—0",22 de largo. Frerichs— 12: polg. de longo—5; polg. de largo— 2; d'alto. Gallard— 0",18 de longo. Trousseau— 0",34 de longo. Hiller ? e Trousseau encontram-no tambem com duas vezes 0 vo- lume normal. No lobo direito viu Gallard ser a altura de 0",20, e a espessura de 0",08; e no esquerdo ser aquella de 0º,06; Trousseau no lobo di- reito achou 0",19 d'altura e no esquerdo 0",20 de longo. Relativamente ao pêso, tomando-se como normal o de 1200 a 1575, podem citar-se as observações dos srs.: Bernard... .......... 2500 grammas Bernard “usos t00 102250 » Auta dorso er mir 1880 » Pangaio SMA 4 doridi o dia » Pánpi o SiunPu sro, IE » Pieamd q, siso ori: 1600 » Paio E, SS 1532 » t The Amer. Journ. of de med. science, 1845. 2 Arch. gén. de méd. 1861. pag. 75. 3 Med. Zeit. heraus. von den Preuss. Vereins, 1843, pag. 43. 4 Leç. sur les liquid. de I'org., t. 11, pag. 86. > These, Strasbourg, 1859, pag. 38. 8 These, Strasbourg, 1857, pag. 56. ty cs ” 180 ESTUDOS SOBRE A hypertrophia parcial do lobulo direito, estando o esquerdo atro- phiado, é indicada pelo sr. Fritz !. Da atrophia tem sido apontados alguns exemplos pelos srs. Be- noit ?, Vogt? e Rayer! (360 gr. de pêso). A congestão é indicada como uma das lesões mais constantes pelo sr. Andral (cinco casos), Monneret*, Prout *, Auffan, Rayer” e por nós. No aspecto d'este orgão tem-se encontrado uma grande varieda- de; Chopart refere n'um caso a existencia de uma côr acinzentada ; Lé- corché, Pavy e Wilks a escura; Gallard a vinosa escura analoga á do ba- co; Auflan e Vogt a descoloração ; e Fritz só limitada ao lobulo direi- to. Além d'isso o sr. Auffan notou que o orgão começava a soffrer a degeneração gordurosa; Fritz observou o mesmo phenomeno, mas limi- tado sómente ao lobulo direito, principalmente junto do ligamento sus- pensorio, assimilhando-se em alguns pontos á cirrhose, facto de que Vogt descreveu um exemplo (mas espalhada esta degeneração a toda a glan- dula), e de que tambem Frerichs observou quatro. Chopart e o sr. Auf- fan, tractando da consistencia, dizem tel-o achado, um molle, outro fria- vel. Fazendo córtes mais ou menos profundos, o sr. Andral chegou a concluir que a distincção das duas côres que se nota normalmente no figado não se encontra n'esta doença. As nossas observações em dois casos confirmam esta idéa, porém o sr. Monneret aponta um facto em que esta distincção era manifesta, sobresaindo principalmente a côr amarella. (Haveria a degeneração gordurosa? Assim o julgamos). De todos estes factos póde-se deduzir com o dr. Wilks que o figado na diabete apresenta-se com caractéres especiaes, differençando-o dos estados em que se apresenta nos outros doentes. Estes caractéres são — maior consistencia, apparencia homogenea ou uniforme, e côr es- cura. Baumes e Cauley dizem vagamente terem visto algumas altera- cões. Juncker e o sr. Andral citam dois factos em que havia oblitera- ção dos ramos da veia das portas. Gallard e Fritz viram a vesicula fel- lea mui destendida pela bile. Pelo microscopio descobriram Sockvis * e Frerichs que as cel- ! Gaz. des hopitaux, 1862. 2 Thése de Montpellier, 1856. 3 Abeille méd. 1855, pag. 216. é Arch. gén. de méd. 1861, pag. 72. º Arch. gén. de méd. 1839, t. 111, pag. 300. é British. méd. Review, t. xr. 7 Arch. gén. de méd. 1861, pag. 72. * Bydrag. tot. de Kennis der zuikervomingin de lever, 1856. A DIABETE 181 lulas hepaticas estavam intimamente unidas, pallidas, redondas e mui pequenas (de oo à "43 de pollegada): todas continham um nucleo volumoso e brilhante, mas os granulos acinzentados eram em peque- no numero e acompanhados de um ou outro amarellado ; e todas eram acompanhadas de numerosos nucleos redondos com nucleolos, e appa- reciam cellulas ainda novas, cujas paredes estavam exactamente uni- das ao nucleo. N'outro caso encontraram os mesmos caractéres com a differença de haverem, ao pé das cellulas novas e nucleos, cellulas an- tigas normaes, umas e outras augmentadas de volume; n'outro final- mente cellulas, volumosas em parte, com nucleos multiplos, e além d'isso cellulas e nucleos recentes. O sr. Pavy * descobriu pelo microscopio as seguintes lesões: 1.º caso —Cellulas pallidas, nucleos distinctos, um grande numero de nu- cleos brilhantes de grandeza regular, e pequenos globulos de gordu- ra. 2.º caso — Cellulas hepaticas mui distinctas, com granulos gordu- rosos no seu interior, e alguns globulos gordurosos de diflerentes ta- manhos entre as cellulas. 3.º caso — Cellulas irregulares, mui peque- nas e quasi imperceptiveis, não tendo nucleos no seu interior, mas só- mente uma materia granular e pequenos globulos de gordura; grande numero de globulos de gordura de differentes tamanhos entre as cel- lulas. 4.º caso — Cellulas transparentes, contendo algumas particulas de gordura, nucleos brilhantes livres. 5.º caso — Cellulas de fórma irregular, com raras e pequenas particulas de gordura no interior, ha- vendo alguns globulos de gordura entre as cellulas. A autopsia feita ultimamente pelo sr. Trousseau é bastante im- portante para que transcrevamos por inteiro a parte relativa ao figa- do. Este orgão estava granuloso em toda a sua superficie; a sua côr era d'um amarello-sujo uniforme, sua densidade consideravel; resistia á pressão é não permittia a dilaceração pelo dedo; era duro ao cór- te, e a superficie da secção, em logar de lisa, era granulosa ; havia, pois, uma cirrhose evidente, mas uma cirrhose hypertrophica. A al- teração tinha a sua séde mais na parte fundamental ou secretante do que na parte fibrosa do orgão. A capsula fibrosa e as trabeculas que segmentam o figado tinham augmentado na realidade em espessura, mas os acinos, visiveis á superficie em que sobresaiam, tornando-a granu- losa, tinham augmentado de volume. Assim, havia hypertrophia do figado por excesso de funccão; o que era evidente ao microscopio, por meio do qual podiam vêr-se as ! Researches on the nature and treatement of diabetes 1862, pag. 118. 182 ESTUDOS SOBRE cellulas hepaticas, em vez de destruidas ou atrophiadas, apresentarem- se augmentadas em numero e em volume. Sobre as quantidades d'assucar contido no figado, os resultados são mui differentes. Os srs. Vernois *, Bernard, Pavy e nós não o temos achado em alguns casos; num viu o sr. Vernois só ligeiros traços; n'outros a quantidade tem variado muito, sendo abundante nas analy- ses de Wagner, e Pavy: Assucar no figado normalmente... .... 17 a 25 grammas Na diabete — O sr. Picard .......... 10,000 » O sr. Auffan.......... 10,719 » Abel Jordão ........ .. 38,400 » O sr. Bernard... ...... 57,500 » O sr. Pavy............ 0,62 por 100 Relativamente á substancia glycogenica, diremos que Pavy em duas analyses não a encontrou; em quanto porém á gordura pôde elle extrair pelo meio do ether n'um caso 5,2 por cento, e noutro 10,5 por cento. A razão de todas estas differenças provém do genero de morte do individuo observado; se morreu repentinamente o assucar é abun- dante, como no caso que vimos; se a morte foi lenta ou devida a al- guma doenca febril, então desapparece da urina e até do figado. Es- tas lesões do figado a que os modernos teem dado tanta importan- cia, já tinham sido em parte notadas ou previstas pelos antigos; as- sim Mead dizia ?: Secanti mihi semper inter eorum hepar occurrebar steatomatosus tumor; e anteriormente Actuarius *: guamvis hoc vitium renibus cum gecinore commune sit. Posteriormente Zacuto Lusitano ns Pedro Heredia *, Francisco Henriques de Villa Corta *, Rudius ”, Syl- vaticus *, Curvo Semmedo, Marc e Baumes admittiram a lesão d'este orgão como constante na doença. 1 Arch. gén. de méd., 1853, pag. 672. 2 Opera omnia. Parisiis, 1757, t. 1, pag. 31. * Methodus med. Parisiis, 1526, t. 1, pag. 31. 4 Opera, t. 11, pag. 443. * Opera, medic. Lugduni, 1665, t. Iv. pag. 129. ê Opera, Lugduni, 1680, t. 111, pag. 559. 7 Pract. Lib. rr, cap. xxxIx. 8 Controyv. 31. A DIABETE 183 $ 15º Baco Hiller, assim como Vogt e Fritz, observaram uma vez a sua hyper- trophia, e Bernard viu-o pesar 145 grammas. Vogt aponta tambem o amollecimento da sua parte interna e Fritz a friabilidade de todo elle. Duncan achou-o pequeno uma vez. Os srs. Bernard e Vernois pela ana- lyse não lhe poderam descobrir assucar, mas de outro lado o sr. Pavy encontrou-o em grande quantidade n'um caso, faltando n'outro. Pela nossa parte nada temos visto de notavel a tal respeito, e outro tanto affirmam Dupuytren, Thénard e o sr. Auffan. S$ 16.º Pancreas Foi encontrado normal por Dupuytren, Thénard, Fritz e por nós; teem-no visto porém diminuido de volume os srs. Bouchardat * (uma vez), Bernard (duas), Benoit?, Lécorché, Rayer * e Frerichs (cinco ve- zes). Este ultimo observador notou egualmente a degeneração gorduro- sa; e Cauley * e Chopart a existencia de calculos. N'um caso não pôde o sr. Pavy descobrir-lhe assucar. S 17º Ganglos mesentericos e vasos lymphaticos Bardsley aponta vagamente a sua alteração. Home *, Mascagni, Juncker, Monro, James Johnson º, Dezeimeris ! (tres vezes) e Cloquet (tres vezes) notam especificadamente a sua hypertrophia. Juncker viu-os en- durecidos, e Duncan * pelo contrario molles; na observação d'este ulti- mo continham uma materia caseosa, em quanto que na de Baillie era cretacea. Relativamente á sua côr, affirma Home tel-a visto pallida. No mesenterio viu Berndt uma injecção mui pronunciada. Os vasos lymphaticos na observação de Dupuytren e Thenard es- tavam por extremo desenvolvidos. 1 Gaz. méd. de Paris, 1847, pag. 3. 2 Thése de Montpellier, 1856. $ Arch. gen. de méd., 1861, pag. 72. 4 Journ. de méd., t. LXXIX. * Mém. de la Soc. méd. d'Emul. an. 2.º, pag. 169. é Med. surg. Review. London, octob. 1838. 7 Mém. de la Soc. méd. d'Emul. an. 9.º, pag. 224. 8 Transact. of the med. surg. Soc. Edinhurg, 1823. 184 ESTUDOS SOBRE S$ 18º Cavidade da pelve O sr. Fritz * encontrou as seguintes lesões n'esta região; der- rame de sero-pus no peritoneo; alguma injecção da serosa na fossa iliaca direita e bordo interno da esquerda ; falsas membranas eviden- temente recentes, formando em certos pontos algumas adherencias in- testinaes; todas as tunicas do recto mui hypertrophiadas, e a externa como gelatinosa. No tecido cellular subperitoneal da pequena bacia existia um phleimão diffuso, que, passando alguns centimetros acima da symphyse e ramos horisontaes do pubis, tinha invadido egualmente as duas fossas iliacas e uma parte do tecido cellular situado adiante do psoas direito. No Jado direito, atraz do recto e na fossa iliaca do mesmo lado, o tecido cellular estava infiltrado d'uma materia esverdeada meio fi- brinosa meio purulenta ; estava espessado, duro, lJardaceo em alguns pontos, friavel e reduzindo-se facilmente em grumos n'outros. À apo- nevrose d'involucro do musculo iliaco estava destruida, n'uma pequena extensão, por esta infiltração, que tinha atacado até as fibras mais su- perficiaes do bordo interno d'este musculo. Na metade esquerda da pequena bacia, na fossa iliaca do mesmo lado e atraz da bexiga, a infiltração tinha dado uma espessura quadru- pla da normal ao tecido cellular, o qual tinha um aspecto gelatinoso; a sua côr era amarellada, e parecia formada em parte de serosidade e em parte por uma materia fibrino-gelatinosa, quasi toda transparente, mas em alguns pontos opaca. No interior do musculo psoas direito observou o dr. Vogt de Berne a existencia de um abcesso do tamanho de um ovo de pata. S 19º Rins N'alguns diabeticos teem os rins sido encontrados normaes por Clark, Reil, Berndt?, Hecker, Rollo, Demours *, Chopart, Gue *, Trous- scau e Vogt *. Ê 1 Gaz. des hbopitaux, 1862. 2 The American, Journ. of the med. sc., 1845. * Journ. univ. des sc. méd., t. x1v, 1819, pag. 121. 4 Gaz. méd. de Paris, 1838, n. 28. ? Zeilsch. fur rat. med., 1844. A DIABETE 185 As lesões achadas, relativamente ao chciro, consistem apenas em ser um pouco acido como notou Home !. Coloração —Teem-os visto naturaes Bouchardat; côr de chocolate Marschall; acinzentados Lieutaud; pallidos Trousseau e Auffan; ama- rellados (o direito e a ponta do esquerdo) Picard; vermelhos escuros Monro, Gallard, Luroth, nós e muitos outros. Consistencia— Quasi todos os observadores os descrevem molles, como Dupuytren, Thénard, Mascagni, Hertzog, Monro, Rutherford, Marschall, Cauley, Hecker, Petrus Pawius ?, Trousseau e Auffan ; de consistencia augmentada sómente cita um exemplo Segalas; Bouchar- dat viu-os uma vez normaes. Volume — Descrevem-nos augmentados, Dupuytren, Thénard, * Bardsley, Duncan, Rutherford, Brodie, Marschall, Forbes, Home *, Se- galas *, Ducasse filho *, e Frerichs. Casos em que um só estava hy- pertrophiado, ficando o outro normal ou atrophiando-se, são apontados por Frank, Muller, Hoffmann *, Rayer *, e o sr. Picard. Um exemplo de atrophia dos dois rins é indicado por Kuchenmeister. Alguns auctores teem especificado o tamanho e até o pêso : Beer. sb. «o 1 pé de longo.. .. 7 polg. de largo RT 5 ca LCA Sp ED cit iraro! Dei Copia Media D Rizo 12 comedia ars VC. E Diymid Picard.... Tem»... 3ecm.» » 12c.m.deespessura (allard;. areril can dani. atira DG TD O bt » Barthezs sob Ip CaID: Le Dino o retaro Co MDS, D ooo » Rim esquerdo Rim direito Béso — Bernardi (ato tayarioreu 200, ERAM, (e Sho o 235 gram. DO io o ao NOS sd SED) DR CREU aan rea DS (OM » — Barthez..... O AVE) DAE pb SARA IS ERREI ob » — Rayer. . 210 » ACER de dpi» » — Pavy....... Spa O OND o : 344 j os dois rins. ! Clin. exp. hist. and diss. London, 1781. 2 Obs. anat. 2. 3 Nouv. Journ. de méd., 1806. “ Clin. exp. hist. and diss. London, 1781. é Journ. de phys. de Magendie, t. 1v. pag. 362. é Ops. de sc. méd., 1822, abril, pag. 80. 7? Cons. med. cent. 2 cas. 85. 8 Arch. gén. de méd., 1861, pag. 72. MEM. DA ACAD. — 1.º CLASSE. — T. HI, P. II. 24 186 ESTUDOS SOBRE Relativamente 'aos vasos sanguineos, teem sido vistos injectados por Lima Leitão, Ducasse filho, Monro, Bonamy, Luroth ! e Freérichs, e anemicos por Vogt; Baillie ?, Reil e Rutherford acharam as veias tão desenvolvidas, que formavam uma especie de tecido reticular á sua superficie, e no caso apresentado por este ultimo observador, a veia emulgente direita tinha em diametro 2 de polegada. Pelo córte teem sido descobertas hydatides por Beer e Bonamy * ; kistos por Kuchenmeister; calculos por Baillou; Ruysch observou placas cartilagineas na substancia cortical; Caventou !, Ruysch e Hauner * fo- cos purulentos. Tem-se notado egualmente estarem mui dilatados os ca- niculos da substancia cortical (Frerichs), e esprimidos deitarem uma substancia branca (Benoit.) Os corpusculos de Malpighi ás vezes acham- se norimaes, segundo Hodgkin. Ao redor de cada tubo urinifero já Monro encontrou manchas amarelladas, denotando a degeneração gordurosa que Beale * e Auffan viram estender-se a todo o orgão. Rutherford viu tambem estes tubos mui distinctos e a pelve de cada um mui di- latada, e Brodie as cryptas mui desenvolvidas; Auffan notou a hy- pertrophia e pallidez das pyramides; Stosch a dilatação dos bassinetes, que no caso de Vogt estavam todavia normaes; a mucosa d'estes era catarrhosa n'uma autopsia feita por Wagner, e natural na de Fritz. Por ultimo Bardsley descreve granulações e o sr. Johnson ” modifica- ções, e ás vezes destruição, das cellulas epitheliaes. O assucar tem sido reconhecido n'este orgão pelo sr. Vernois e Pavy, o qual nota ser mui variavel esta circumstancia, pois se ás ve- zes se encontra a glycose em dóse forte, outras nem se quer se acham signaes d ella. $ 20º Capsulas suprarenaes Brodie achou-as mui duras em um caso; mas Vogt e Trousseau já as viram normaes. 1 Rép. de anat. et de phys., 1828, t. a. 2 Traité de anat. pathol. pag. 271. 3 Bull. gén. de therap., 1840. 4 Journ. compl., t. x1x, 182%, pag, 226. 5 Casper's Vochenschr., 1850. é British. and for. Review, t. xi. ? Med. Times and Gazet., 1859. A DIABETE 187 $ 21.º Uretheres Rollo, Vogt e muitos outros descrevem-nos normaes, outros po- rém augmentados em volume, n'este numero contam-se Reil, Hecker, Bardsley, Rutherford. Alguns especificam mesmo esta grandeza ; como são : Beer.............. 1 poleg. de grossura 1 Duncan: ts » » » Clark la oh/s| nes ao (uai) aiio Í E » » » S 22.º Bexiga Brodie, Berndt 'e Wagner teem-na visto normal; Rutherford, Dun- can e Berndt notam a sua dilatação em alguns casos; pela nossa parte já a vimos tres vezes com o volume normal; Dupuytren, Thénard, Otto, Bardsley, Baillou? e Durr já a teem encontrado mui pequena. A hyper- trophia das suas paredes é apontada por Home, Bardsley, Rutherford e Rollo. Vogt n'uma autopsia encontrou a mucosa vesical corroida em muitos pontos proximo do collo; nos intervallos das erosões havia por- ções de mucosa sã, e o todo representava perfeitamente as lesões que se encontram na dysenteria e colite mucosa. Fritz n'um caso descreve a injecção ao nivel do collo e na parte posterior, e alguns espessamen- tos circumscriptos da mucosa, ao nivel dos quaes as camadas superfi- ciaes estavam fortemente oedemaciadas. $ 23.º Uretra Rollo encontrou-a, n'um caso, com um diametro quatro vezes maior que o normal. SG 24.º Prostata Vogt, de Berne, achou uma vez um abcesso encostado a esta glan- dula, e Fritz viu-a mais pequena do que a natural. ! The Amer. Journ. of med. Sc., 1845. 2 Epid. L. 2. 24 « 188 ESTUDOS SOBRE S 25.º Pesiculas seminaes Thomaz achou-as contraidas, Frerichs normaes, mas contendo um liquido acinzentado com muitos spermatosoarios, e um calculo trans- parente côr de rubi, do tamanho de uma ervilha. S 26.º Testiculos Fritz viu-os normaes, mas Naumann aponta a sua atrophia n'um caso; não nos consta porém que outros tenham verificado esta cir- cumstancia. $ 27.º Ossos e gordura Duncan encontrou n'um diabetico o tecido adiposo com o aspecto gelatiniforme, e Pott * por outro lado o amollecimento dos ossos. 28.º Cheiro dos cadaveres Michaelis affirma terem um cheiro a almiscar, porém nunca ob- servámos este facto, e nem sabemos que alguem mais o aponte. $ 29.º Considerações sobre as lesões descriptas De todas as lesões que acabámos de notar, as que parecem estar ligadas á doença propriamente dita, são as lesões do figado e do systema nervoso ; todas as mais pertencem ás complicações, ou são puramente accidentaes, ou são em fim consequencia de alguns symptomas da dia- bete. No primeiro caso estão os tuberculos, os abcessos, e a gangrena, etc.; no segundo os aneurismas, lesões dos ossos, etc.; no terceiro, as lesões do estomago, intestinos, rins e bexiga. Uma das lesões mais importantes, notada pelos srs. Andral, Wilks e outros observadores, é a congestão do figado de tal modo pronunciada, que o orgão, em logar de apresentar o aspecto de duas substancias, uma 1! Philos. Transact., 1753, n. 459. A DIABETE 189 amarella e outra vermelha, como normalmente, só deixa vêr uma côr vermelha-escura em toda a extensão. Estes caracteres, diz o sr. Andral, de uma hyperemia intensa teem o que quer que seja de especial e dão-lhe um aspecto differente das hyperemias ordinarias. Nos diabeticos o figado torna-se pois notavel pela grande quantidade de sangue que o engorgita, e o facto de não serem seguidas de glucosuria todas as congestões hepaticas acharia tal- vez a sua razão de ser na diversidade dos elementos afTectados na con- gestão ordinaria e na diabetica. Com quanto esta lesão não seja constante, nem por isso se deve deixar de ligar-lhe uma certa importancia. Esta circumstancia prova unicamente que, se nem sempre o figado se acha lesado na diabete, ha comtudo certas fórmas da doença, em que elle representa um não pe- queno papel. De certo as hypertrophias geraes e parciaes, as degenerações gor- durosas, e transformações morbidas de seus elementos microscopicos, em muitos casos, levam-nos a estabelecer a maior frequencia das lesões d'este orgão, e a dar-lhes uma importancia elevada. As lesões do systema nervoso, posto não sejam constantes, teem comtudo um valor muito differente d'aquelle que se dá ás dos outros orgãos, pela importancia que lhes teem attribuido, não só a anatomia e a physiologia normal, como tambem a pathologia. As observações sobre a origem do sympathico; as experiencias dos srs. Claude Bernard, Becker !, Harley ?, e Schiff*, sobre a influen- cia do ferimento da base do quarto ventriculo no apparecimento do assucar na urina; as de Krause e Graefe * sobre a compressão da me- dulla; as de Moos * sobre a galvanisação d'este orgão; os casos de dia- bete manifestados em seguida a pancadas no craneo, observados por Plagge, Itizgsohn *, Goolden ”, Fano, nós e muitos outros; as lesões nervosas seguidas muitas vezes do apparecimento de glycosuria, e nota- das por Siebert *, Becquerel º, Scharlau !º, Levrat, Ulrich, Michéea ”, 1 Zeitsch. fur wissensch. Zool., t. v. 2 The Lancet 1860, pag. 386. 3 Golt. gel. Aerz. oct. 1856. 4 Canst. Jahresb. 1855, t. 1, pag. 177. * Schmidt's Jahrbuscher, t. xcix, pag. 274. ê Union méd., t. xr, n. n. 52. ” Medical Times, 1854, dezembro. * Diagnostik der Krankh. des unterleibs, pag. 135. º Moniteur des hopitaux, 1857, pag. 107 a 112. 1 Die Zuckerharn, etc. Berlin 1846. 1 Abeille méd., 1853, pag. 47. 190 ESTUDOS SOBRE Reynoso ! e outros; e em fim os casos de diabete em seguida a im- pressões moraes, são razões mais do que sufficientes: para se acreditar na importancia das lesões do systema nervoso na diabete, e se poder di- zer com Bouchut?: Ze róle du systeéme nerveua dans la production du diabete est une chose capitale, immense, contre laquelle on disputerait en vain. Devemos finalmente ponderar que se, ás vezes, não se encontra lesão alguma, é porque a anatomia do systema nervoso não está ainda bastantemente adiantada, para nos poder fazer conhecer todas as con- dições anormaes em que elle se acha em qualquer doença, o que deve necessariamente deixar um vasio, ou antes, a incerteza no espirito de muitos observadores em certos casos de diabete. As alterações renaes não teem, nem podem ter, hoje a importan- cia que em épocas passadas se lhes ligou; a hypertrophia e as outras lesões explicam-se facilmente pela exageração da funcção do orgão como já notára Frank. De facto esta alteração encontra-se nos polyuricos, falta nos diabeticos não polyuricos, e póde produzir-se facilmente nos ani- maes extirpando-lhe um dos rins, vendo-se então o que resta augmen- tar de volume. À acção irritante do assucar sobre o tecido do orgão tam- bem não deve ser indifferente, pois o sr. Bernard viu n'um cão, de- pois de lhe ter injectado assucar nas veias, inflammarem-se os rins e formarem-se abcessos. Eis as lesões encontradas n'esta doença e descriptas de modo a poder marcar-se a importancia relativa de cada uma d'ellas. A apre- ciação deve talvez resentir-se das idéas que hoje vogam sobre a natu- reza da doença, mas na exposição dos factos fomos o mais exactos que podémos. Se talvez peccámos por minuciosos foi na persuasão de que, se a consignação de pequenas circumstancias é muitas vezes inutil na época em que se escreve, póde porventura ser de vantagem immensa nos tempos futuros. ! Arch. gén. de méd. 1852, t. xxvirr, pag. 204, e t. xxxr, 1853, pag. 349. 2 Gazet. des hopitaux, junho 1853. A DIABETE 191 CAPITULO IV PATHOLOGIA COMPARADA Tem a pathologia comparada feito adiantar bastante o estudo da doença de que nos occupamos, e desejando nós dar todo o desenvolvi- mento a esse estudo, citaremos os factos de que temos conhecimento e faremos sobre elles as necessarias considerações. Nos animaes póde-se fazer apparecer a diabete, mas temporaria, ferindo a base do quarto ventriculo, como fez o sr. Bernard, ou dando uma pancada forte sobre a região occipital. Estes factos teem sido ob- servados por differentes experimentadores, os quaes teem concluido que, em geral, a glycosuria dura de um a dois dias nos coelhos e de seis a sete nos cães. O sr. Pavy tambem fez algumas experiencias neste sentido, as quaes merecem' ser consignadas, por serem geralmente pouco conhe- cidas. Consistiram tres em cortar a parte descendente da medulla oblon- gada, em decapitar o animal, e em fim em cortar a medulla até ao centro ; sete foram praticadas sobre o sympathico (com a idéa de ser elle quem transmitte a influencia do systema cerebro-spinal ao figado), dividindo os ramos que acompanham a arteria vertebral, os ramos as- cendentes do ganglio thoracico superior; extraindo o ganglio carotido d'um lado e depois os dois; e o ganglio cervical superior; todas es- tas operações, praticando-se a respiração artificial, foram seguidas do apparecimento do assucar na urina. Irritando o cerebro, separando este da medulla oblongada pelo córte das coxas do mesmo cerebro, cor- tando a espinal medulla na região cervical com os dois pneumogastri- cos, ou estes separadamente, e em fim separando o sympathico no tho- rax não appareceu o assucar. D'estas experiencias concluiu elle: 1.º que o figado recebe da medulla a força que preside nos actos chimi- cos da nutrição. 2.º que a transmissão não se faz pelos pneumogastri- cos. 3.º que se deve admittir ser atravez do sympathico que a me- dulla actua sobre o figado. 4.º que o sympathico por si só concorre um pouco para estas acções chimicas. O sr. Harley observou que a injecção de alcool e ether na veia 192 ESTUDOS SOBRE porta dos animaes produz uma glycosuria, e o sr. Pavy ! notou egual phenomeno introduzindo o acido phosphorico nos intestinos delgados. A alimentação com aveia alterada pela humidade, é egualmente seguida nos cavallos de phenomenos diabeticos temporarios, segundo o sr. Jessen de Dorpat. Estas observações teem vindo confirmar ou esclarecer alguns pon- tos duvidosos n'esta molestia. É facto que as experiencias instituidas na medulla oblongada esclareceram muito a natureza da doença, e fizeram que uma nova theoria surgisse sobre as outras em parte já duvidosas. Se esta theoria (a do sr. Bernard) não é hoje acceitavel no todo, nem por isso deixa de ter um fundo de verdade, e de dar uma forte ala- vanca ao estudo do prognostico e ao tratamento da molestia. O sr. Jessen indicando os resultados do uso da aveia avariada, veiu confirmar, até certo ponto, o que a etiologia já tinha em parte previsto relativamente á influencia da natureza e qualidade de alimentação. Os factos apontados como de diabete espontanea nos animaes, não são mui numerosos. Os mais antigos de que temos conhecimento são os citados por Pharamond *. O 1.º refere-se a um cavallo sustentado exclusivamente com mas- saroca de milho, que passado um certo tempo comecou a emmagrecer, a ter grande sêde, grande appetite, e augmento de secreção urinaria. A urina, n'um dia, elevou-se a 115 libras, era espumosa e des- envolvia um cheiro a melasso. A sêde era de tal modo imperiosa que de uma vez o animal be- beu 30 libras d'agua. O pulso achava-se frequente (156 a 164 por mi- nuto) e dicroto. O cavallo depois de um certo tempo de tratamento curou-se segundo o mesmo auctor. O 2.º e 3.º referem-se a observações feitas sobre cães; apesar da molestia se ter caracterisado pela sêde, fome, magreza e augmento de diurese, não nos julgamos bastante auctorisados a admittir a existen- cia da diabete, porque a analyse da urina não foi feita, nem se indica n'ella o sabor ou o cheiro de assucar. Pharamond acrescenta além d'isso que muitos outros factos, simi- lhantes ao primeiro, foram notados nas cidades do Cabo e de Fort- Dauphin. Em 1850 o sr. Leblanc * communicou á Academia de Medicina 1 Proceedings of Lhe royal society of London vol. xr, n. 45, 1861. 2 Descript. des caus. et des effets de la malad. etc, Paris, 1829, pag. 143. 3 Bull. de "Acad. de Méd. Paris, 1850. A DIABETE 193 de Paris um caso de diabete n'uma cadella de seis a sete annos, tendo sido sempre nutrida de carne. Ultimamente o sr. Beranger-Féraud ! viu um macaco, nutrido exclusivamente com substancias animaes de- pois da sua chegada a França, a fim de lhe dar mais força para re- sistir ao frio, morrer diabetico no fim de nove mezes. Os symptomas notados foram : magreza rapida, sêde imperiosa, augmento de secre- ção urinaria, existencia de assucar n'esta excreção, amaurose, e phe- nomenos convulsivos. As observações de Pharamond pouco ou nada adiantam o estudo da diabete no homem. As de Leblanc e do sr. Beranger-Féraud são importantes, pois mostram que a dieta animal não póde curar a doença, e ás vezes nem mesmo prevenil-a; além d'isso a do segundo obser- vador confirma o facto de serem os symptomas oculares, observados nos diabeticos, intimamente ligados com a molestia e não complicações accidentaes; o mesmo se póde dizer relativamente aos phenomenos con- vulsivos indicados, os quaes teem sido egualmente notados no homem. Por ultimo serve esta observação para confirmar a theoria, que julga ser o systema nervoso aquelle que mais frequentemente se acha affe- ctado. Temos concluido este nosso trabalho e esperamos continual-o pro- ximamente, com a parte relativa ao diagnostico e prognostico. ! Gazet. méd. de París, 1864, pag. 324. MEM. DA ACAD.—— 1.º CLASSE. ——T. III. P. II. 25 PARA SUAR VER LAIO A Palas! aoeita dia A Sh has a 1 “itadid A dam cue ei E bus ario (a via, 1 dA Douro a abro ip je é 4 ME: dh ER | ps p pu aubnes abbumi | y nem Ê a a MES TO TE a ab Tai “agrado 8 a ig qu BR | ga E AMENA 4 e NO side ) y cabelo pero N HA + ' f | : Ea | im ara E ainda va min juan é lado cena Uta “og uai Fr | a gb. gu ontolda da Ez ah io v a e aa da al inato Ol Ani to aqintoo polias E NAO! ui amido ça oo ti arde RR pa a o | p RA A bo ale lt il no 8 ipa | Wing CAM! f , lol pira dd a ad en my toa conlrom gil aviao rd a 4 Mr pari va Hr RR! o Ni nv q io à Ea ER, ke o a OR Ra PRA E Nai) poa 4 Wins o SAN : dg bo Eua: pe é no di 4 ndo a UPA pg VEPM sd qm Por ú gui o gi om à poa A RS RR Po y AM no NUA k 4 NA Da UR am ARE Ed, My; DO Ag E pe aa eq ad tm nt Min? PU pr e AO RE eg AA ANO A » Wyerh AP nm | ob À sis it, j Ei a upa EA x ni Me nry entire É ERA o es oo nte) E, “ea mo BRA (TA dom, PA no mm hero MR E pol [o a; p oia ty Ye ' p lat E Tai 7 Ê ey tia nv ad A read TR No nd one PM Craig Muda k = ca apa 4 peido 7. A Ts , E el sia Re TEA ) fas ape s ai RR "a ei y RUM E : Ar Rd y A Ri + 1 E A é 4 hM WE: ei f Ni, E sê a * h ' r Hds É Mn á ud sa Ri Pr E A Er th NA É pes Pra rs Bi A A a im a a estadia qd uam | Dio ar EA, ; Ji AA a nto w N ! | . ) " nó pena ” ra h 8) NOTA À PAGINA 25— FURUNCULOS Quando escrevemos a parte relativa aos furunculos e anthrazes, estavamos persuadidos, pelo que tinhamos visto nos auctores e observa- do na practica, que os caractéres com que se apresentavam estas duas affecções eram particulares e especiaes só á diabete. Hoje, tendo melhor estudado a questão, parece-nos dever acrescentar algumas particulari- dades, tanto mais importantes quanto é certo não terem sido apresen- tadas antes de nós. Nos individuos que soflrem de amollecimento cerebral de fórma chronica, o apparecimento dos furunculos é frequente. Apparecem em todas as regiões, mas principalmente na nuca. As erupções fazem-se com intervallos e ordinariamente apparece um até dois de cada vez. Em regra geral são menos dolorosos que os furun- culos que se desenvolvem em individuos não soffrendo d'este padeci- mento; suppuram com facilidade, mas o pus acha-se misturado coni uma grande quantidade de sangue escuro que lhe dá uma côr quasi castanha, e o torna mui liquido. As paredes e bordos dos furunculos tomam uma côr arroxada-escura, mostrando haver principio de uma verdadeira gangrena exterior. De ordinario são difficeis de fechar, le- vando ás vezes vinte e mais dias. Quando cicatrizam deixam apoz de si por largo espaço de tempo uma mancha escura, com o aspecto de ecchimose. Este facto, que julgamos ter sido os primeiros a notar no amol- lecimento cerebral, não virá tirar muito valor aos furunculos para o diagnostico da diabete? sem duvida; mas quanto a nós tem uma gran- de importancia, porque, provando que esta affeccão se filia a uma lesão do systema nervoso, é mais um argumento a favor d'aquelles que sup- põe a diabete uma doença de origem nervosa. Reservamo-nos continuar no estudo d'este novo symptoma do amol- lecimento cerebral e espinal, esperando ser ajudados pelos nossos colle- gas, aos quaes nos apressamos a fazer, com toda a reserva, esta com- municação, visto ser um novo phenomeno na interpretação do qual é possivel termo-nos enganado. ATA 4 AS RV ds ALBA 4 “aditon a ribnontid oe meitalaa drég dh E dig CR IA a ooo 4 astuto dna tire csvenecteni up ato metades doces rea eus po sates diets 28 pondo CMTaRAIRO RO HI RE ra Ru Sfo set ofist Hot made o CA post) ERP URIPLRTLEREFARA (PLS agbpettia ienbuirea anciapla CEDAR Ee ADD OBA À of uma Obi niiseal dh drIdo + altar gs tou reli DIGO J ) kê tire bs, Qod ar astogi, , RES R eu Pic eestoabtorri dA ternos cg sovbi bar get , deda pur M aotesi papeis BOB a bigen! rt Giuro 8 cima É El sau Er : a boi evo figo 22 delta (rioriRa ih NES us Sespterin aMrarudrataiio + soltas tn erros nero! PR NTA TIE Vert o epi posertolólr andeiet ka Fonda Ta nt ser Rhoy sh ao vino atas fr obmienitlos va sou bieihar me ctto aloe east O sigo OA i a Tendo aba tao get! suo amoo AMpant=aad coro drprempaUo cARA + Pena po VOC as fr ed si go q E” atpgiine ay abolido a A salganitiy sob sobçod Ss aburecr ado Obi dito ge O VV poco sb ode toia uerend abat ane Prior br a imesriod mb ndo sb ginaihito ha ariano é patrocina tida bras 2 9h Hj 8 pa GIESTEISHIO Dre) PER era cd thin? passe RD obra + al asnes o qnos ruinas eleita mano ninar fe orgão rel a Ri, Hi IO CE TEME b ports , (rim E porra eatçs JOPaBE Ba , ] is , CDA a O Sd RA ROD GEL SP ve dovito nes orais cad o tHIPNS RR ADE AO O OTRA Bio petit au ma Sotodob aly variantes usas! no EGO ne-bhrrnle mira sup qm NE SLI prem «ferve Pegar BT EU in Ss petigLa Ccretd nc tre dis MRE SD DADA pero tógo abel Bi ro e corar Sir d esddy mei ginde! “ME «Feita Ge Gia cet no ts Er boa LD EO OS PS Who pemmoto ads Erro ve Daiane Bortie pet feet a rraçhd isaj it nd Lu dudert Gl OA ASSARO aónctinas epa (rustapo PÓ Li gl Gata Neo ol ar emita HH! Aid, n ha (irah Oo fer eris MDA puta AESA k q INDICE TONI o poino neu Bor Nano e Ber DRCopnbo cedo cdr Eloi é Lt cbu Emp bs db PROLOGOMENOS: .jo e crer) ARNS ee eo e dee po pd eia a pone enero SUR ERA RPM SPAM a DR ofaiio asto a DEMO beso o do DECLDocoLarDEDOdopapoloon nono vo Baden nob aloe agiu DIVISÃO). cuorsrA fo aee EP ERR MD RSRS exoa ca sbre re REDES, DINAR 6) o NaPER alfa avo a SUNONTIMIA Sd = od MARE NRP ARE SO E cbr oa pps a SR ERP SENA o o RNP RS O MAGNA Ono dao nd dra COnDDOO O SOLDADO DPoRPPoDdALCoLDOpEAdpopT no ade BIBLIOGRAPEIA o 2774 dA A Sd qa pda cr vç a A e DL DOR SR rir PRIMEIRO ESTUDO — SYMPTOMATOLOGIA ......ccccccccccc cce CM Ao 5 de ES RR RR RR O O A E EC Md BA ETR S S SEO. pls if O RE o e E CE vo UE CC co de E PR sp O Dino o peRer POR ONDE EC ae DE DESIRE RE Led LD o Ut (So (RO (osjo ndo o open e Re PERO RO PRE Do Alo de IE OR S S S S RARE po ES GR RS RS ER SEDES 14 ERA LLTO Dá EAD So 51 o SUA Jima oo po ne aaa ode Bo sBano Duboc a Puno bbo ce bo bola Go AROS Pharinea (ao csei feguiap tendas (ade eged 10d Aedo PAD a So jo SRA GL Nigestão Hr cralte anta feno ola ego ago PIRES tio ata E DA Defocação Soa) scagenaiapado grafo saia ia pede RAIVA 7 de SO E AS ROSpIFaÇãOr A po dio tes feras alo tto o musa) ao o) SRS ta Roo ao SAO Gienlaçãos. sos mio a alega o = gafes aloja) o TAI a aa S 20. Calorificação! us. so. ane aisao ecoa ao onças $ 2.º Orgãos urinarios e genitaes. .........cicictsssseseseeeeoo S 22.º Funcção urinaria............oco ce sereneceesecereraeeos 5,23.º Aspecto da urina... o. cesar s es cmo ssa letais do ado rea S CO (ai) cre ua ponto ob aob ao aro po PE RBD nR eric o vao Eee Bope o 198 INDICE PAG. SEADE GOSTO Citi Rd pac ra Ra o AP Pa ade Mania RG 75 Sv20 Quantidades aee o UR ce DR 76 Siad Po nipera Meat estela: RA UR SR o od nat 84 Suas Densidader e pe PRE PAR o ore NBR RNE UEM RR o ci ra 85 S 200 NBba me microscopia E E onda e Ot 90 Sus00 Reacção ic). RR RR LAO O O no 9M Eai RGE Dojo E SRD Roda e DT O RN 2, O 92 SPO 2 AO UI) Rego de O RR A E SR Le 93 S da AMatemas soldas 4d areia rece eae A RR ARA R 94 SR PG UI aii La DRA DR SELO E]TPALA E 94 SiS Cid MUTICOn Lo DO cuando RR RE 97 3/90: Ando NYNDURICO soe raca are rd ERR NTE LD ABM 98 Sed va Nedo BentDiCO! cure pira e a Ee boo EMA ed E BONO 98 S par RARE o). cio pe E E ET RS a 98 S 990 )0xalato;de cal: doc o BRO do dt a DD 98 S040 0 Amaniaço =. nu ano SPO a cce E a a a A 99 S/41º Phnsphatos; Ste se o nte oa a al RE Ada nd o PAM 99 Susa er Qhlorureto (dessodio RR RR an 99 S.48.º Gordura. .2s2 002 crer MBEOV A MOEMA ata dus 100 18 440 nositer ro Does se uns dd ou da 7 Ee MORNO SR RS 100 Siedo Malena jexitanhiva saca. caso no e no do a ssa 8 SR 100 S 46º, Prussiato de ferro co css eram o no oo se DR 100 Subi-o Creatina e creatina! , ou ssse tas E asia ARO MM RS co 100 ST PES EO | ACEROLA E ppt e Dao piso lo pi é cd AD 104 S 49º Oholesterina; 1. l cerne see E ra mpé é ii UR DS 101 Sm 00207 Albumina”. 58 css furto e Porno Ms ars E E ERR CAR 101 S :91.27Assucar tosa taegalre, Apt i dh. pos Pee and e E BD Sa 102 Sao 2:00 Fumeção genital, 2% MU. soa dr je do RR DANE A 121 SEGUNDO ESTUDO Capitulo E — Marcha, duração, terminação, recaídas e frequencia ......... 125 So dio Mameha a, OS sera eg a Bia aa a Lion o re A SR 125 Sou Rae DUMAÇÃO Dora ao ap sa DE E MD dn ADO E A 131 Su5e PeRMIDAÇãO So aee aqni o E o rata a SA A DR DIS 132 Souto URegaidas a cat Sed a ota ben E e ORAR OT RR 134 S 10º E requentia, sc sfosioo o seis mae su eia AAA É SE 135 Capitulo 1 — Biologia. 20.12. s srta te epaio nara a OR MT 139 Sin die MMerangaL sé s4s/= sia /oianete ore bi a A PR 8 AR 139 Sed PERO qua aa ea area ss ora dia ade sia oi lat A AO A 141 S/c dee Bdade sas Ss E ado arena eita E RT 142 S. 4.» Temperamento)....... ei Eta MAPA E root RAR 147 Su 5:20 Constituiçãos sas o ro PA QUEE o pr pe NR RE BS 148 Su 16:9 Climas 0 2 Soda sos. coro do rd MARE Ab CR ARE TO 148 Sp odor Estações! o as nd opa into o o ATO RNA SE 154 INDICE 199 PAG. Si 8.0 Profissões. =, ssstas spa pore novata eyolapede SB SRD MEIA RI Do 154 So DO Nieto, aeb poo voo o poas vs 2 d2= nada agetiso Gore bed ane 155 S AQ Bobidas dor 0a auras per) fo AS PSI 156 SUDO Affecções Moraes): 0) ci poleper od epapmvep ca Rotepebodo tele ASAS OR 157 S 42.º Prazeres yenereos. ......)...0.,0 =) sssrepanaper polo bra 6 Rc A Ra DA 157 SAS Nboso dejremedios;. ds epejetorepejolaraier a asctoi os ate RADIO raio atas 158 S/44.º Doenças anteriores |...) .jeis feio ia tosco poda e ob de ereto fel ee RA A o ole dego e = 158 S LB Contasio (tese os erejeperado iodo ERES RU TIOV SR UR 159 SEG Pancadasdo 2a 4270, caes ape jd leia PAÍS O APT 159 Capitulo III — Anatomia pathologica ...........iciicisic ii liciciioo 161 LescesidosiliquidosfS SR RR Re 162 S.A Sangue 4a cs pqlisoa dh subia dar E Ro OR) AS o 162 (a) Assucar”,-,.2..:5.10s70p1= AOS AMC UI SER ge o NI Req 164 (0) Dir: RR REDE proc nana E) E OL ELSE Banghe a ão rs 166 (Cc) NOhlonuretoFdpisonio ERR Lodo pen 166 (OD Bbosphatos FE E E 167 o nCondura E 167 (E Oreatmafeleresimina 167 (63) Min ear ppa a cuto do a DEE DOE DEDO DOS tre 168 (CE) A lininii tia E Dadas o dana bas or cade es is io DE 168 (CU agi Cida CNA E ERR é 0 H70 PRB ENA A 168 (DP BRimeipios fixosd: ae E DRI voadora 169 (1) Col Es co eo ste sodd ae cado dE Do SABE a ppa a de 169 (1) SorO apapue ve vom sp anca suas com ivo sd BEeso papos de 169 (im) EResrção RE 170 (73) Desa Pro NICE E Cara E ER VER PRER OERE so AR 170 S$ 2.º Liquido cephalo-rachidiano...............cicis esc cccotso 170 S- 3.º Serosidades. ...... cs esses ese ces ma oras es ss tes neto nada 170 GORRO MEe o a a aposto asa o e oi opatra Sa a apeoto to epopade aa ça ao 171 Se Geo Ema ooo doa a apa tio o aja acao 15 crarnpao nf caga IA S 6.º) Sueco) gasírico; uu cio = siosigesa oo) o feio a var0 nojo aaa E sa Pr 172 estes dos Sltsas sas cuenrb sto o CoanLadpa pop Eco ed dn sanar 172 8 4 Cerebro eicerehello; ... aos do o na le aro nojo 172 SEM dna aros 175 $ 9.º Involueros e annexos do cerebro e medulla ................. 176 S 10.º Nervos ..... ED A to a UR RE NE 176 S 14.º Pulmões, pleuras e ganglios bronchicos .............cc..... 177 S 1200 Coração eivasos cj Men nl je elabore tolos sima aja a a rosa ao 178 S 13.º Estomago e intestinos. .........2.cisiccscss rsss ess cestos 178 SUAR Ineanlo co o snHor os Bad aas o see dp dan ao o peles e enero 179 BRL Baços ia eos ojos ato MARS fade ta e alo feto a Direi 2 nie) ota va a ao 183 RAOL mic ooa SER. = aaa o rap apena a e ajeitar ata apra a oi é 183 S 17.º Ganglios mesentericos e vasos lymphaticos ........ccicccicoo 183 200 INDICE PAG. SoAS-e Cayidade da jpelse) CE SER RPE e td e o ERAM e o 184 S 019.0 ABimsioo corpo (oe de e PS TE Re de df e fd MR AMRS RAR e 2 sega 184 $ E Gapsulas suprarenaes: gude te to foto de to godo fogo to AP MEADER o ooo 186 SO Wireinaras sagas ss apa ova voa dado o bas sob ss Boda ada anda 187 S a OMBEXIDA,. e teno foro ro deep pe leRc nose te perde de tor Po ALA RD RB É 65 feia 187 Sado Dita Ma aA o o ns so ss Sa ao) 32492 0:9 00455 47 o JB IDO 187 5, 24.0 Drostata, «joe aj pje noi oi ie e 1 Pope DME VARIA 32 00/2006 187 S 25.º Vesiculas/semindesc. «ssa «medem pote foto too ARA E AN e to = 188 S 26.0 Mesticulos CEE na corar arenoso o ER BNNC E TAN do 188 S 27º Ossos eigordura clero r RIO AN ARDE LS O DS 188 S 28.º (Cheiro dos cadaxeres cas. je pese de pose todo feet DORME MO 188 $ 29.º Considerações sobre as lesões deseriptas ............cc.csoos 188 Capitulo IV — Pathologia comparada ............cllsisisisstsesceo 194 Nota a pag. 25 — Furunculos..........ccccscsunnnnemab sebrae sssnenars 195 Indica .57 feet pote e poa ape A Te NV RA AAA CNE A RELER OO Pops 197 NUA pie iai a de St a ed mi ela tato “ TER Cem na : = Elo . TER eee ee SE E Roses , ae É Ep me - E ME Co memos PAUS UBE UM A a Sac NARRA o » vi E pe asça s AN A ne E EN ya ata , o hi MD a MAS : ) uy Rits Ng TUR giato a x : Ven: Nk o bias n% 2 dam 3 A o! Ea CRE : e aa ua Mg: a RAR dEgeve EM ANANDA) WU x a DU eq E i CR » N Nr 7 : 1 ON fa w: - À ge va Rss e vã no - bo ! Ea ç ; Nesvimarato E y DR