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NOITE I.

SUsPENDE , Atropos fera . ai ! . ai ! não cortes Vida tão precioza . . . Mas . . . que vejo ? Defgraçados de nós ! . . a Parca bruta Os anneis da tizoura unio fem pejo.

2

Ai ! . ai ! . eftremeceo . . o ultimo arranco O leito fez tremer;.. a morte dura, Bafejou-lhe o fembiante ... ah nos olhos Apagou mortal fopro a luz mais pura !

A Com-»

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NoiT ES JOSE FINAS

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Completou- fe por fim o facrificio A viílima efpirou... a final pena Executada eíiá . . . rompeo-fe o laço . . . Voou do corpo ao Ceo a alma ferena.

4 Triíle coração meu . . em pranto , em queixas

Derrama o teu pezar...os teus gemidos

Prendáo os rios . . . e os ligeiros ventos j

Os penedos lamentem condoídos.

Troncos, que abrandar-vos confeguírao Mil vezes dos amantes os queixumes , Chorai o maior damno , que podiao Talhar da Parca os encruzados gumes.

6

Chorai montes , e valles : chorai prados . .

Faunos dos noíTos bofques , e Napeias . . .

Chore todo o vivente , que refpira

Do Minho , e Guadiana entre as areias.

Defventura cruel , feroz defgraça , Porque oíFufcas de Lizia a feliz forte? Porque do Erébo na caverna efeura Aífrouxaíle o grilhão á crua morte?

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N o I T

I.

A defcarnada mão a Parca fera Sobre o peito lhe eítende . . . Ah Luíitanos! Com ella do calor lhe extingue o reílo . . . Lamentai . . . lamentai da morte os damnos.

Dia o mais infeliz de quantos dias A' cofta Occidental o Sol tem dado : que trouxefte tão--fatal fucceíFo, Foge 5 foge de nós arrebatado.

IO

Entre aíFumada névoa appareceíle Sobre o noíTo Horizonte macilento ; Da tua commifsão horrorizado Nas grutas s' efcondeo gemendo o vento. II

Encubrindo co' as mãos o rofto efquivo, Defce de Thetis ao Cerúleo feio ; que cheios nos deixas de amargura. Vai teu leito bufcar de magoas cheio.

12-

Vai-te , e por noíTos ais quaíi obrigada

Venha a Noite m,ais fedo aos noíTos montes:

Negra filha do Cahos . . . mai do defcanío.

Vem de Lizia enlutar os horizontes.

A ii Tu-

TríTY''iiB^ii''nrÉTHr'wmriTgi

-nrtii

No ITES JOSE FINAS

Tudo forra da cor , de que tingidos Temos os corações amargurados ... Vem de negro veílir os noíTos valles, Outeiros, praias, mar , bofqucs , e prados,

14

Tágides lindas . . defgrenhai as tranças . .

Dos ternos feios deílerrai amores ... Nelles agazàlhai de hoje em diante triítes anfias , pungentes dores.

15- Nadando ao cimo das ferventes aguas ,

Ouvi a minha rouca voz confuza... Chorai mais , que no plácido Eiymano- Entre as Irmans chorou triíle Faetuza. 16 E vós , ó Luzos , que a pezar dos ventos ^

Que íólta, e prende Adamaítor ufano, Sem de Juno temer impunes dolos. Nem as vinganças d'Eolo deshumano.

17 Mais deílemidos , que de lyro os povos

Em curvas pranchas por incerto rumo

Foftes de Calecut ferrar a areia.

Que primeiro fondou pezado prumo.

Vós,

^V^:^

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^!^JJ^ ^ ^^''%..''^y^':7>9^^^Jt,UB0fS^Lr^^ ' '"TP^

N O I T E I. y

i8 Vós, que altivos pizando as meias Luas^

Rompendo armadas , barbaras falanges . . »

Levaftes os grilhões , em que ficarão

Prezos os pés do embravecido Ganges.

.19 Luíitanos ! . . . ouvi . . . ouvi tremendo . . .

Ah Mercúrio! dos Deofes menfageiro,

Tu que animas da fama as cem trombetas,

Conta o fatal fucceíTo derradeiro.

20 Luíitanos , . . ai í . . ai ! . . o alento falta ... Lufitanos , . . o pranto me fufíoca . . . Luíitanos , . foltar a voz nao poíTo . . . Luíitanos , . . a dor fecca-me a bocca.

21 Lufitanos ; . . mas o amargo pranto ,

Tendo entre os roxos lábios franca entrada,

A lingua humedeceo-me 5 que fecca

Eftava ao paladar quafi pegada.

22 Com lingua pois banhada em pranto trifte . « Coroado co' a rama do Cypreíle . . . Com face macilenta, errantes olhos, Envolto em fepulcral 5 efcura véíle.

Com

ir'írrirM^M'rii'1'r 1 ~r m rini

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6 NoiTESjoSE FINAS

Com voz , que cortâo ais . . queixas . . foluços ,

Ao diílbnante fom da negra Lyra ...

Myrtillo te annuncia o maior golpe.

Que podia vibrar dos Ceos a ira.

24 O voíTo ... ali crua Parca enfurecida !

que para o ferir tiveíle alento ,

Ajuda-me a efpalhar o doce nome ,

Que objeélo foi do teu rigor cruento.

VoíTo Príncipe amado ... o virtuozo . . .

Jozé Auguílo . . . Mas perdeis as cores ? . .

Voííos cabellos o fuílo eriça ? . .

Ah ! . fim ! . morreo ! . foltai triftes clamores.

26 viíles n' outro tempo a medo o Tejo

Erguer fobre o feu leito cryílailino

A cabeça croada d' efpadana ,

Para obfervar de AíFonfo o máo deftino.

27 Lembrai-vos do pavor arrebatado ,

Com que deixando o Pai , as claras aguas

Para Aífonfo eftendeo , com são defejo

De poupar-lhe co'a vida as voíTas mágoas.

Mas

^jÊ^^^j, y^.

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N o I T E L 7

28 Mas a pezar dos voíTos vãos gemidos ,

Quando o Rio chegou furiozo, O indómito animal c'os pés ferrados Terminara o feu fado defditozo. 29 D' hum pobre pefcador na vil palhoça

O viftes expirar acompanhado

Da carinhoza mai , da efpoza terna ,

E do Rio, que a dor tinha efpraiado.

Não he, Povo diílinto , a vez primeira,

Que te rouba nos Príncipes a Morte

As tuas efperanças , quantas vezes

O teu feio rafgou feu fatal corte?

31 Do terno Dom Miguel no peito brando

O punhal não cravou atraiçoada ?

Sem reparar, que do Leão ao throno

Lhe dava a defcendencia aberta entrada ?

Do terceiro João o nono filho Defprezando ameaços do futuro , A enfurecida Parca fanguinoza Não levou dos Irmãos ao fim efcuro ?

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Noites Josefinas

33 de Alcácer Seguer , quando o terreno

Com o fangue dos noíTos foi regado ,

Amargurada por teu Rei a fama

Os pêzames náo deo ao mar falgado ?

34 Do amável Theodofio a gravidade,

O terno coração, faber prudente

Sufpendêrão-lhe o braço por ventura?

Não fez efpadanar feú fangue quente ?

35', Mas tu , Povo fiel 5 me refpondes . . .

NolTo Auguílo Jozé promettia

Mais bens que Micerino, que Adriano

Derramarão no Povo, que os fervia.

Ah Noite! que mais triíte hoje ennegreces O carregado ar, que refpi ramos , Das noíTas juílas mágoas em obfequio , Em attenção á dor, que fupportamos.

37 Reprime hum pouco mais co' as fittas negras

O voo dos pardos mochos penugentos ,

Que o teu carro conduzem denegrido

Sobre as efpadoaç dos canfados ventos.

Noite I. 9

Gyra mais de vagar noíTo terreno . . E que nos fugio toda a alegria, Dos affliftos mortaes amiga Noite Nunca chegar a nós deixes o dia.

39 Pára , . . e efcuta como ao fom horrendo ,

Com que raivozo o mar folto rebenta ,

Nos cortados penedos efcabrozos ,

Que fe cobrem de efcuma macilenta.

40 Efcuta as froxas vozes dolorozas.

Com que trifte Myrtillo fufpirando.

Da amortecida Luíitania bufca

A vida defpertar no feio brando.

Infpiraíte a Young , a Hervey didlafte , A Bertóla eníinaíle a dar gemidos Pelo fabio Clemente : a mim náo deixes , Jozé também merece os ais fentidos.

4^ Mãi fecunda de Heroes , ó Luíitania ,

A quem hoje o deílino mais perverío

Que o louco Epymetéo , com mortal golpe

Sacrificar bufcou ao fado adverfo.

Di-

tírj>^^iiíií9^^YríniryÊí^m^íSfrw% 1 1 1 1 1

IO

Noites Josefin as 43

Dlíoza Pátria, a cujo illuftre nome Ainda ergue oBaxá o feu turbante, A Gujos eftandartes refpeitozo Encolhe hum pouco os hombros Atlante.

44 Sentada nefta tua longa praia ,

Que eítás vendo deferta , fólta , fólta

As rédeas ao teu pranto , chora , chora ,

Em quanto em noite aqui te vês envolta.

45' Porém , a fím que a dor te não fuíFoque

Myrtillo 5 que em teu feio tens creado

Entreter-te defeja . . . Ouve-me attenta ...

Por ora enxuga o pranto derramado.

46

Mas . . ai ! . que inda de Phebo o gyro certo Não perturbou a noíTa defventura! Ravaillaques , e Probos fem abalo nas trevas entrar da fepultura.

47 Ao dia mais fatal vem feguindo

Outro dia mais claro, e tranfparente,

A mãi de Mémnon por entre as nuvens

Sóita o cabello mais que o Sol luzente.

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JÍ^-E^MJ^m^LÍ^^^Í^^J^..^^ ^JJLLP^^.4,^ -^^^/J^Wi»

N o I T E I. II

48

A Noite ligeira vai fugindo . , . Fujamos nós também ... em cavas grutas Vamos humedecer com trifte pranto Faces, que nunca devem fer enxutas.

49

Vamos , affliíla Lizia , e em diante ,

Quando virmos que o Sol mergulhado

Deixa entregue ao filencio , á efcuridade

O noíTo ameno Tejo amargurado.

SO Quando ás curvas fatexas amarrados

Deixarem os bateis os Pefcadores ,

E levarem o peixe inda faltando

Para nutrir d' Amor ternos penhores.

Quando Glauco , e Palemo com as Ninfas Defcendo ás fundas lapas cavernozas , Cederem ao vapor das dormideiras Sobre as moles efcumas falitrozas.

Quando todo o vivente adormecido

Adquirir novas forças para a vida ,

A paz 5 que habita entre os mortos homens

Será c' os noílbs ais interrompida.

^ Trif-

árréià

12 NOITESJOSEFINAS

Triítes ais enlutados foltaremos, Que efpalharáo fieis os noíTos males : SoaráÓ nolTos fervidos gemidos Nos altos montes, nos profundos valles.

Filha do coração noíía triíleza Rodeada de pávidos fufpiros Por entre as fombras , que de íi bafeja Da Noite feguirá errantes gyros.

Cedendo ao triíle fom dos noflbs gritos A pezada, voraz Melancolia Solto o negro cabello , folto o manto Fazer-nos-ha gemendo companhia.

,S6

Tantos ferão os ais, tantas as queixas,

Que daremos ao ar entriftecido , Tantas as quentes lagrimas faudozas Com que o chão ficará humedecido.

Tantos ferão os íntimos fufpiros , Que dos Ceos fubiráo aos altos cumes , Que os Divinos talvez compadecidos Ouviráô noífos lúgubres queixumes.

Os

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5!!aZ

Noite I.

y8 OsDeofes não são duros, nem tyrannos,

Não são bárbaros, crus, não são perjuros;

São benignos 5 fieis, são piedozos.

Virtudes nutrem nos feios puros.

Cedem á compaixão mui facilmente, Achão doce prazer, doce alegria Em refgatar a pobre humanidade Da efcravidão, da dor, e d' agonia.

6o Mudos nem fempre vem o innocente SoíFrer o pezo da injuítiça infame, A ambição dos Perféos nem fempre deixão Que dos Demetrios as ruinas trame. 6i He verdade que virão focegados Nas praias deCorintho hum cazo infaufto; O enteado de Fedra inceítuoza Virão á Fúrias vis feito holocaufto. 62 A fatal onda virão montuoza , Que rebentando fobre a folta areia , Lançou do prenhe feio entre alva efcuma Monflro de catadura horrenda , e feia.

Vi-

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Srwytjrg^rÉ^aae

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14 Noites JosEFiNAs

63

Virão delle aíTuílados os cavallos

Lançando fogo, e fangue pelas ventas. Os duros freios com furor mordendo Ceder do crime á imprecações cruentas.

64

Os pés nas rédeas flucluantes prezos,.

Todo o corpo gentil ao chão cahido , Virão de raftos ir, em quanto o carro O eixo não largou em dois paftido.

O feu manto Real cortado virão . Pelas rápidas rodas, que foavão, E cuberras as fdvas dos cabellos , Que os agudos efpinhos lhe arrancavâo.

66

O carro virão fobre agudas penhas.

Dos brutos c' o furor defpedaçado ,

Hippolyto infeliz virão quietos

Da vingança ao rigor facriíicado.

67 _ Capacete, e broquel virão quebrados.

As limpas armas com a queda rotas ,

Do feu vertido fangue fobre os feixos

Virão fumar as encarnadas gotas.

Vi-

XÍ0S^S^.^

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N o I T E I. 15*

68 ^ Vírâo da Morte o nevoeiro efcuro

Nos olhos apagar-lhe a luz da vida.

Virão nas azas d' um mortal fufpiro

Sua alma pura aos altos Ceos erguida.

69

Hippolyto gentil 5 modeílo, e nobre

Virão da vil paixão viâima feito ,

E a innocencia em Trezeno aífim tratada.

Deixaria de tér nos Ceos eíFeito ?

70 Os Deozes juftos fem perder inílantes

Determinão croando o innocente,

E de Fedra punindo o brutal erro

Dar mais hua lição á humana gente.

71- Talvez que ouvindo as triíles mágoas duras ,

Que publicando vão noíTos gemidos ,

Affim como em Trezeno fe moítrárao ,

Também por nós fe moílrem condoídos.

7^ De Tefêo , aíTim como o filho augufto

Da Parca defpedaça o grilhão forte :

Talvez o noíTo Príncipe adorável

Poífa quebrar também laços da Morte.

Tal-

>>.-^^aa#^»^^>^^y-if-f-^^^^ TTT

Noites Josefinas

73 Talvez aos Povos, que por elle gritão

Concedido outra vez Jozé fe veja;

Co Hippolyto porém julgo o divizo :

Entre os Aílros no Ceo . . ah . , íim . . chameja.'

74 . Arbitra opinião ... tu que abfoluta

Os homens levas fempre onde defejas,

Phocas , eCromwels tu que enthronizas,

Menzikofs, eColberts tu que apedrejas.

. , 75- Em obfequio á verdade, e mais virtudes,.

Do futuro bom Rei Jozé fegundo ,

Quanto nelie perdemos , vai ligeira

Com pranto publicar por todo o mundo.

Eíle efpeíTo vapor, que em noíTos peitos

A penetrante dor túrbida infefta,

Seccará pelos valles , pelos prados

Papoila , Malmequer , Lirio , Gieíta.

11 Da Murta a branca flor, a Madre-filva ^

Alvos Jafmins , cândidas Boninas,

Tintas por elle fiearáó mais negras,.

Que os Efacos nas aguas cryílaliinas.

En-

ir

Noite I.

78 Entre os defcarnados efqueletos

Na prezença do tumulo fevero ,

Que encerra dentro em 11 o varão jufto

Por quem entriftecer as penhas quero.

79 Ao foar melancólico, e fentido

Das cordas, que a triíleza dezaíina ,

Chorando efpalharei quanto a Virtude

Dos homens a favor fábia me eníina.

2o

Por Myrtillo jamais fera cantado O bruto frenezi, que a guerra infpira; Ferozes Kouli-Kans de louro eterno De Myrtillo croar não ha de a Lyra. 81

Do Principe Jozé a faudade Meu pleélro move fobre as negras cordas^ Da íábia Natureza ferei Vate Rábida Inveja, inda que os pulfos mordas. 82

Hoje em meu coração extinta fíca ^ lembrança dos c^anos fofFridos ; Oas feias fem-razoes j tenções perverfas; Dos males por defvelcs recebidos.

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iS N o I T E S J o S E F I N A S

Os homens forao taes em todo o tempo 5 Por elles nunca o bem foi premiado : Servillos quero em fim para vingar-rae, Podellos emendar não me foi dado.

84

A ambição de íer útil aos humanos : De virtudes louvar o alto deíejo : E em fim por dar á gratidão tributo , Ao fom da Lyra erguer a voz forcejo.

E como o extinto Humano , que choramos , Além dadiftinção, que aoThrono o erguia: Das Artes , e Sciencias no theatro para o noffo bemxfe diftinguia: 86

Das bellas Artes , das Sciencias claras

O importante favor invocaremos ,

A fim de dignamente aos Povos dar-mos

Verfos com que feu Nome eternizemos.

87

Vamos*, que raiando vai o diá :

Adeos , Lizia fiel , a quem venero ,

Na efcura habitação dos mortos homens

Ao pôr do Sol para chorar te efpero. ./ NOI-

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NOITE II.

POR entre o nevoeiro efcuro , e denfo. Que exhala efte lugar fem fazer pauza, Fruftrando a oppoíiçâo efpeíTa , e negra , Que do Sol creador aos raios cauza.

2

De Hefperion fe o filho amado

Defcer ás verdes ondas fomnolento :

canfado fufter não pode os brutos,

Que vão forver do mar o frefco 'alento.

B ii Pe-.

Wi2^ÈSm:^éQeSíi.

^-i^^^^^/^^

20

Noites Joze finas

3

Pelo efcuro Oriente vagaroza , vem a triíle Noite facudindo As errantes madexas defgrenhadas, Entre as quaes mil eílrellas vem luzindo.

4

Com ella vem no tenebrozo carro

G timido Silencio penfativo ...

Na mão efquerda traz firmada a frente,

Onde as azas defdobra hum génio efcjuivo.

AíTuftado quanto he . . quanto he medrozo;

Tudu llit faa pavor ... treme com tudo 5

Eílremece ao fentir do vento os fopros . . Dos ecos o intimida o fom agudo.

6 Em fim, oh Luíitania, a faudade Çonduzio-me da morte ao triíle azylo : Entre os mirrados, mudos efqueletos Teu Príncipe bufcar veio Myrtillo.

7 He poíTivel que hum Principe formado ,

Capaz de leis diélar ao mundo todo,

Houveffe de nafcer também fujeito

A' lei fatal do organizado Iodo !

Que-

Noite II. ai

8

Querida Luíitania , aqui fiquemos ;

Deixar não poíTo eíle lugar efcuro ; Qiie ideias nao me infpira quanto vejo; Eíle dos homens he Lyceo feguro.

9

Empreguemos aqui o tempo todo,

Que for gaitando aNoite fomnolenta. Em cercar noíTo lúgubre horizonte Apôs a trifte Lua macilenta.

IO

Hum fagrado temor defconhecido

Prende meus curtos paíTos vacilantes :

Receio . . . e não fei que ... eu divi/o

Amontoados oííos alvejantes.

II Tu fofte , Lizia , quem me conduzifte

Para em tudo cumprir o meu defejo ,

Da Morte ao domicilio . . . alvas reliquias

Dos extintos mortaes fomente vejo.

Que frio regelando vai meus nervos!..

O meu fangue nas veias fe congela . . .

Que efpeíTa névoa nos meus olhos pouza !

Faminta a Morte devorar-rae anela . . .

Ef-

gã^2ããâ£^É^2^

wrr^wrmn

^^í^êO^^^Ê>^-re>.^^

22

Noites JozEF IN AS 13

Eftes morta es fymptomas fempre habitão Efta das Parcas lúgubre morada . : . , Onde dormem em paz.;. onde defcansao Aquelles, cuja vida foi cortada. 14

Por npíTà defventura aqui rezide O Principe , que foi dos Luzitanos . . . Chorai frios Efpeélros ; convencei-nos De que inda mortos fabeis fer humanos.

Qual aíTanhada ferpe venenoza , No afílido coração que mal palpita, O cruento pezar todo enrofcado , Seu venenozo humor quente vomita. 16

Supportò íim da mágoa a raiva toda Ao ver na flor da idade fepultado NoíTo Principe amável . . . Deofes juftos , Que gofto achais no pranto derramado?

17 Mas, Deofes , perdoai , que no meu feio

O damnozo pezar, e a mágoa he tanta,

QuQ me faz delirar. . . toda minha ahtia

Com o pezo das anfias fe quebranta... .

Aqui

^myii^E^

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N o I TE 11. 2.3

18

Aqui habita o plácido focego ; Aqui os mudos oíTos alaftrados Eaílflão aos mortaes a arte preciza , De fugirem no mundo aos vãos cuidados.

Depois de fe defpirem da matéria, De que andarão na vida revertidos : Depois que por fieis ferem á terra , Hoje fobre ella pouzão defpidos. 20

Em paz durando vão . . e como entre elles

As poífes são iguaes . . da bruta inveja ,

Não achando matéria, em que fe ceve,

O devorante ardor nunca chameja.

21 EíTa nua caveira , que faminta ,

A voraz podridão defcarnára,

SojíFre em cima de íi huns poucos de oíTos ,

Que inadvertido acazo lhe lançara.

22 _ -^

E não fe queixa ... nem fequer fe move ,

Para moftrar que o grave pezo fente :

Se antes da oppreísão calada eftava.

Ao depois não murmura defcontente.

^^^^=^=^'^^^^'^rmrM^£'\\rv'i ^^wrrirrr^-

Trrr^lr

14 NOITESJOZEFINAS

E talvez dentro delia moraíTe Alguma alma diítinta , e ennobrecida; E que os oíTos, que muda eftá foíFrendo, Sejão de algum Tartufo Regicida.

M Pode fer; mas pacifica nos moftra,

Que nefte fitio efcuro não dominão

Felizmente as riziveis diíFerenças ,

Com que os homens no mundo fe arruinão.

A Coroa; aTyara; o Elmo; a Toga Tudo do Cemitério á porta fica ; Aqui de todos he igual a forte. Igual a Parca nunca efpecifíca.

26

Todos fem diftinçao no mundo entrarão , Natureza a nenhum deo veftidura : O Demónio do Sul , e feus efcravos Forão-fe achar iguaes na fepultura.

Mas de donde procede , que no inftante De efpirar os malvados Torquemadas , Deixão com os humanos , que offendêrão , Eternas pazes fem querer firmadas?

Don-

^.^J!AMIJL^J^.^'L^^A^.^^^ MJU^.^m^''^jJMxm

N O I T E II. 2jr

28

Donde vem que os Cartuxos , mais os Kirkes , Ficâo depois de mortos emendados ? E que de Ordonhos crus , ambiciozos \ Morte faz efpeílros moderados? 29 EíTes frios oíTos por ventura Não são os mefmos aífaíTmos braços , De que o inhumano Nunhes fe fervia ?ara eílalar da Natureza os laços?

Pois de donde provêm , que em quanto vivos» ;empr€ em fangue banhados praticavão lorrorozas cruezas , mil abfurdos , ^Q a vingança dos Deofes provocavao?

Se a idêntica matéria feparada Do efpirito a feus crimes póe limite, ^ogo das almas vem fomente os erros , ^e viva a gente humana fe permitte.

3^ Convençamo-nos pois de que a matéria

ie para o bem, e o mal indiíFerente :

3s braços são huns m.udos inftrumentos ,

De que as almas abuzao fatalmente.

Emen-

^^SãâGíCÍ2^lS^

Yrvií'^''wrr\rrr

20 N O I T E S J o Z E F I N A S

Emendai pois, humanos, a fubftancia. Que as voíTas decizoes livre dirige : Corrigi voíTas almas; que a matéria, Tomando-lhes o exemplo , fe corrige.

34 Do.nafcer, e morrer nos dois extremos,

Não baila Ceos a progrefsão conftante ,

Para que o homem defabuzado,

Se amoldei vida entre elles femelhante?

Se ao nafcer , e morrer fomos os mefmos , Por que, por que na vida o nâo feremos ? que em fortuna fer iguaes repugna , Ao menos nas tenções nos igualemos.

Aquelle, que embalou em berço de oiro O Deos, que ás cegas repartio riqueza , Náo pize ao que naíceo em pobres palhas > Alargue de feu circulo a eílreiteza.

._ 37

JMcm o pobre infeliz ^ a quem fem culpa.

Hum Cynico por Pai a forte dura ,

Mefquinha concedera por inveja,

Defpreze ao que nafceo com mais ventura. _

Os

/-j/->v^^.'

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lllE^AA^

•sJÍ%rfjí!f^íSgiá

N o I T E II.

^>J>.

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^7

3^

Os olhos não fecheis , oh loucos homens i' luz 5 que a verdade em vós derrama , l,embrai-vos que he traidor á humanidade Fodo aquelle , que os outros bem não ama.

39 Imitai , homens ) efte Auguílo humano

^ cuja campa venho dar gemidos :

VIorreo Jozé . . . mas entre nós ficarão

5eus exemplos affás bem conhecidos.

40 Em fim, juíla huma vez do mar a filha,

lepartio com Jozé como devia...

í^afceo Jozé deftinado ao Throno . .•

í^inguem moftrou melhor que o merecia.

E quem vio deíle Principe perfeito ,

Sm toda a aproveitada , curta vida ,

3ua acção . . quem lhe ou vio foltar hum termo,

^e fua alma nos moítre corrompida ?

42 Falia fem fufto torpe , vil calumnia . . .

^guça a lingua rábida Impoftura . .

^alfo Intereffe folta a voz, fe podes,

Jvida Inveja teu veneno apura.

Quem

^-"^^^^^^^^^^rniir ^"faf ^f i rr I nr ^" g^r

><ÍÊ?:Z*^^^^

28 Noite sJozEFiNAs

43 (>iem o Príncipe vio hum momento,

C o refplandor do Trono alucinado ?

Qual foi o pobre humano defvalido.

Que fe viííe por elle defprezado ?

44 Quem a feus pés chegou banhado em pranto,

Qiie o nâo viíTe também enternecer-fe ?

De fer útil aos homens no exercicio

Vaciilante a Jozé , quem vio deter-fe ?

Jtíim quanto de òccupar o régio folio O tempo não chegava . . . quantas vezes Nâo defcia ao feu povo, a quem alegre Confolava do fado entre os revezes?

D^Atys, eEndymiâo ás lindas graças. De Platão ajuntava a gravidade. De ter nafcido para Pai dos Povos , Ninguém deo mais íinaes na tenra idade.

17 . , 47

Ij^mulava dos Deofes a virtude :

Mais que Tito no bem fe exercitava : E quando contra o mal não tinha forjas, Os dois braços cruzando fufpirava.

Sem-

'^^SJJWJÊ^JSL.^*L^k^ULiã^ ^^J

Noite II.

Sempre foi da virtude amigo certo , )nde quer que a aviftaíTe a protegia , í como aíFeito a ella ^ ou na indigência , )u reveítida de oiro a conhecia.

delle fe temia o vício horrendo; l^uando o via paíTar tapava o roílo : krbaros Arrisões , falfarios Guizas , ^unca nelle efperárão ter encofto.

Eíle he Carlos feroz o trilho certo 3e aos vindouros deixar faudozo nome; i^ai da Pátria não foi chamado nunca, !^em nutrio com fangue bruta fome.

Alexandre, Selim, Cezar, António^ \nibal, Tamerlão , Sefoílris , Cyro, ^ajaceto. Sultão, Xerxes , Dionyzio , Mitridates, Bazilio , Acmet, Buziro;

Em quanto infelizmente refpirárão, 5eu raivozo furor os fez temidos , Mas no ditozo fim d^íia tal vida , aritos mil de prazer forão ouvidos.

29

Do

e^^^^^j^^^^^a^^^^^gTvntf^rrrrri"'»^

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^jíf/^^^X.

30 NOITESJOZEFINAS

Do Livro, onde com Tangue a Humanidade Chorando põe em rol feus aíTaíIinos , Meu Príncipe imitando rifca o nome, Como elle efcreve-o apar dos Antoninos.

Joze amava os homens , porque jufto, Conhecia o valor de cada humano ; Por não lhes dar valor defconhecido, Bufcou Filippe fer o feu tyranno.

Se á gloria felizmente acazo afpiras, Não deixes pela falfa a verdadeira: A falfa das paixões foi fempre alumna, A outra he das virtudes companheira.

Se ateimas em feguir eíTe caminho. Em que a ambição fatal teus paíTos guia, Morrerás infeliz 5 e os teus vaífallos Cantando efpalharáó doce alegria.

Si' Fazendo de fg raçádos a fortuna

Não terás,, que Jozé entre nós teve: Amou feu Povo, promettia amalloj Dos Luzos ao morrer mil ais obteve. ^

Quan-

^M^^í^^:.^Kíí0^^:ss^'^^mi!^:?:m^:^^^

^'.^JMÒJt-^i3L,j;}i3M&

Noite II. 5^

31

Quando o feii corpo em fim defanimado ^oi trazido com pranto á fepultura, ?ãl foi do grato povo a dor vehemente, ^e até á Providencia chamou dura.

/9 Os Reis na terra são dos altos Deofes

)elegados Miniftros , são Juizes,

hjLQ á imitação dos Deofes foberanos ,

)s feus povos fazer devem felizes.

60 Oh dos inclytos Cezares herdeiros !

'oíTos povos d' humanos são compoftos, Ihorão quando fe vem tyrannizados , ^ando em premio de amor colhem, defgoftos,

61 Difto mefmo vos hum novo exemplo . Morte, que fanguinea anda pouzando , >os Tronos fobre as Cúpulas doiradas ,

>as Regias mãos os Sceptros arrancando.

62 Morreo Carlos Terceiro das Hefpanhas > mais benigno Rei, o mais humano, 1 o povo ao feu favor agradecido ,

!hora a perda fatal d' hum Pai fobrano.

Ma-

v^^t^^^a^/^P^^a

32 Noites JozÉFiNAs

63

]^Ianes , que n' outro tempo déftes vida

Aos brancos oíTos , que efpalliados vejo;

Refpeitai o cadáver preciozo

Do Varão , por quem trifte os paíTos rejo.

. . ^4

E a fím de inteiramente perfuadir-vos Da razão com que trifte entre vós gemo : Da juftiça, com que eu aos Deozes grito, E entregue ao crii pezar vacilo , e tremo,

. . 6?

Do Principe , que morto em vão choramos, A feliz producçâo foi tão illuftre NeíTe Coro Celefte, que os decretos ^

Firma fem fufto de que alguém lhos fruftre.

Entre os Deofes eternos, fabios , juftos Era tão precioza , e importante Do alto Jozé a geração preclara , Que a dotavão, quando inda era diftante. Gj

O Omnipotente Pai das Divindades , Jove fupremo , que difpoe de tudo : EíTe que do alto , pedregozo Orphino A tefta quebra com o raio agudo.

De-

l^.^Aò^^^ii}SIL>s*^ãM3JB,

N O I T

68 Decidindo-fe a dar á Humanidade

3um tão perfeito Rei/ tao exceliente;

iye depois de o criar delle encantado --/^^

) aíTentou junto a íi no Ceo luzente. ' '

69

Quando antes de illuílrar com fuás luzes

)' hum tão célebre humano o nafcimento

Ulreia vizitar o Sol devia '^- '--^

leílenta e huma vez , mais cento , e cento .''^

70 O olympico Tonante meditava

ia efcolha da nação nobre, e potente,

i quem c'huma tal dadiva fízeíTe

obre as outras erguer croada a frente.

71 Em attenção ao filho delirante,

iue armado de Leão co'a força brava '--^

'elpzo o defendêi-a da cohorte

)os monílros , que abatelio procurava.

Humas vezes de Bacco em juílo premio

tueria do Indofiao ao vaílo Império, -^

ara honrar de Genghis-Kan o alto íblio, ''-^

Im Jozé conceder hum Rei mais ferio.

G Da

srj^^^fíi^iís^i/yrrw^^^wirn^ -^wrirrr--

^XÍU

^SS^^^Si^

34 NorTES JOZEFIN AS

73 Da filha de Agenor doces lembranças "

Outras vezes o inclinao aosSydonios;

Que forão contra os mares mais forçozos

Que contra a Perfia altiva os Macedonios.

74

^Cheio deftas idéas ; todo entregue

A' efcolha que a attençao lhe poffuia , De Acrizio paíTeava os frefcos valles , Que Danae carinhoza ennobrecia,

.75' De occulta commifsão com a relpoíta

De Maya fe aprezenta o filho alado :

Jove quanto em fi volve lhe repete :

Hermes no Caduceo o ouve firmado.

Logo que expoz quanto no feio tinha

Encantado da nova creatura.

Que para fer modelo dos Regentes

Júpiter conceder aos homens jura.

17 Dos Talares fechando as áureas penas ,

E puchando o galero da cabeça ^

Obtida de explicar-fe a liberdade

Mercúrio voador affim começa;

Omni-

^^m^i^ai^^-K^si0íá^s^^:^^y!!iÊí^

?ÍM^.í»«JL^P'%.^JLA£L

N O I T E> II. 35*

Omnipotente Deos , tremendo Jove , Que nos futuros lês com vifta aguda : Tu ante cujos olhos fulminantes O mefmo claro Sol de face muda.

19

que irado dos Reis contra os exceíTos

Cincoenta , e mais dous luftros gaílar queres , Em difpôr hum varão, tão fublimado , Qiie exercite na terra os teus poderes. 80 De entre todos os Povos , que efpalhados As quatro, partes cobrem deíTe globo : índa a pezar do ixnpavido Leonidas . E do outro, que nutrio fêmea de Lobo. ' 81 ^

A pezar dos Egypcios, Perfas , Gregos, Carthaginezes 5 Scytas, e Romanos: A pezar de Efclavonios, Parthos , Celtas, Vândalos, Godos, Búlgaros, e Alanos. 82 A pezar deíTas gentes portentozas Por quem gritado tem a Fama tanto: EíTe preclaro humano , que preparas , Deve entre osLuzos fer ao mundo efpanto. C ii E

^^^^^^^^^^^^^ry^tf^^rifrí^^r^^^irr rn^" -

'^^í^^^^2

^ /^^r>^T^c^a^/^>^^

56 Noites JoZEFiN AS

E a fím que , oh Deos , conheças quanto he juíla A dádiva, que dou ás Luzas gentes; Quanto delias são dignas para veres , Baila que os faílos feus tenhas prezentes*

84

NeíTes paíTados feculos efcuros Tão antigos, que aHiftoria apenas Os fucceíTos achar pode, que efcondem Nas encrefpadas cans , alvas melenas :

Em todo o tempo vês os Luíitanos Diílinguir-fe entre os povos que os rodeião \ Ornados de valor, e mais virtudes. Com que os homens Divinos fe nomeião. U

Defde que Gerião delles na frente Com fangue falpicou do Guadiana A florida grinalda entretecida Com juncos , roxos lyrios , e efpadana :

Defde que elles de Ofnís fuftiverao

O invedivo furor, a fanha bruta;

Até que Ulyíles levantou Lisboa

Sobre a grenha do Tejo mal enxuta.

No

»Sii^^^^lX>.Ég^-2g^.^^

*l

N o I T E IL 37

88 No efpaço deftas fetecentas voltas ,

Que do Sol ao redor formou a terra.

Que eítrondozas acções não praticarão

Tanto a favor da paz, como da guerra!

89

E defde que Dyomedes do Minho Cravou na areia branda a proa Grega; A.té que atraiçoando a cara pátria Sertório aos Luzos fem pavor fe entrega.

Nefte efpaço tão longo , tão extenfo , Que o mefmo velho Tempo algumas vezes Se quiz expreguiçar de fatigado , Quão gloriozos não vês os Portuguezes !

91

Defde qu-e Afranio em fim fem algum fruto

Prende entre os muros d'Ofma osLuíItanos, Até efte dia quão virentes palmas Não tirarão dos punhos dos Romanos !

9^ 'Do Conde Henrique deílemido , e bravo

Pai dos Luzos por elle remoçados.

Quem pode ouvir os feitos gloriozos ,

Sem deixar meus dezejos approvados ?

Qi^em

^j^^j^^^f^í^íf^

^y^y^<^ ^

-MVéVS^

38 N o í T E S J o Z E F I N A S

93

Quem o primeiro AíFonfo , ò Rei primeiro Pintar de Ourique pode na campina , >

Que digna a gente Luza não declare m^. ti v Do produdo á que Jove fe deftina ? 94

Quem o fílho^ Veria , Sancho forte Nos campos de Axarrafe embravecido j-vín 3 Ou ante Sylves com mingoada gente O grão Miramolim deixar punido ?

.•:o:-

95-

Quem do fegundo ÂfFonfo na regência 1 O zelo admirará íempre incanfavel ; E 'inda do quarto Rei a alta franqueza , Que eílragou Martim Gil abominável?

! D' outro por quem Brifeiros, e Viegas, O deftino fízerao inconftante \ Com mãos traidoras arraftando ao trono Quem nafcêra fomente para Infante?

Eííe a quem Innocencio entrega o Sceptro ; E Urbano reílitue o alvedrio : Quem do terceiro AíFonfo tem lembrança. Que lhe não do mundo o fenhorip?

^^•jis^^ --te^yfes^^^^vKw^-sg^:

-? ' No I T E 11.

O fexto Rei de Lizia , Deos fupremo. Para humanos reger apto creafte ; Na fciencia de reinar foi tão perito, Que parece em teus braços o eduçafte.

99 , . .

O honrado Dom Diniz deo ás fciencias

Em feus Reinos magnifico apozento :

A' Coimbra as attrahio onde ficarão

Sendo dos Luzos lúcido ornamento.

100

Ao Lara premiar foube briozo;-^^^*^* ^^^

Como jufto punil"' pS' d€ Leiriaí : i.i

Cuidadozo amiiiár a Agricultura :

E á Legislação dar mais valia.

lOI

?ítj;aliza, e Badajoz do quartil '/Affonfo

Dizei o que labeis :-^jura''Salâd<^, ^ ' ^'^ Qae por de Hifpalo ver fatvos os povos --"^ Affbnfo te deixou enfanguentado.

10 1 Entre os Mihiftrós feus , Pedro fevero Suftentando a balança da Juftiçâ v^M on -oKi Era hum vivo modelo de rondas ,

Quando em Thurio fubjuga a vil preguiça.

Tri-

rj^iytji^i&^^^y^^^^

Wíií'^^wir\rrr "

40 No it E s J o ;z e f r n a s

Trifulco Deos ! aps ; tms Jp ^Rei Feriíandi Os erros forao muito parecidos,^,,, r>iíiuá £ Mil vezes por Ampf te defcuidáftein^bl Fernando por Amor teye defçuidos. -■■ -.. 104

Se comtigò porém partio dos erros, f ;

Que poríeusftHiobrece a Natureza ;;:rí>l - Também ía>Tèijíedôu Jove Diymo avícO '1 Teu geniajbem&itor, tua grandeza. - - ' n^ 1-05': De Barcelos õ Conde , e Jpão AíFoíííq A ' Chamado o de Mexíça. ejçprimefitárão', orno! Se de Fernando as .dádivas -aca^í)., r ' ' "

As dádivas 4ejjf) ver arrertíedárãõ. ; ._

ic6 E qíianípry^Iem mais do <{ue os thezoiros

As leis com.que Fernando previdente ,^v\C

Entre as Jeivas, íiais Arte^^j i^oíCoinmercior:

Buícou favorecera íua gent^,,.>. ■_■, ui. :!j^

João 4^ Regras ,6:^0 poflânte Nqnp. t o A Dâo no Meftr^ide Aviz^oí^ Luíítanos..::,j>íj? Hum Rei^,.;que p trono firma , doura , ilIiiftráF; A'.oufta-.4e H^ípanlioes ,; e Mauritanos. - ; íl

ri Duar--

JJ^^>ft^^^J.m..'J^^..>MJUfc^ ^JiJLP^^

*^JtlMMjm

N O I T E II. 41

108

Duarte eni Ceuta manejando a efpada

íoftra tanto valor, e força tanta , (J

iye Arraquio o Atleta o não vencera, 1

nda quando o Alpheo de o ver fe efpanta^ '

109

A fim de fe fazer inda mais digno

)o lugar que então ledo poíTuia ,

'orno Agrícola ás fciencias fe entregava,

i como Oélavio delias efcrevia.

IIO

As ameias de Alcácer, e de Arzila

ejâo do quinto AíFonfo pregoeiras:

Lotos de Muley Xeque os eilandartes

Leveftio-as dos Luzos co' as bandeiras,

III Ao fegundo João invariável ,

iue á adliva Decizao fervio confiante ,

bbre as ondas do Lethes fomnolentas

i Fama levantou altar brilhante.

112. Do fabio Manoel não ^igo nada : ^ês quanto vai por elle acontecendo; )s eilandartes feus do Oriente as ondas

á meigas andão com prazer lambendo.

Dos

1

í

'^^:y^í=^*'Sf^^y^fr^^^-M^ã^í\rrt ^wrr rr

^•"^^^^^^^^

^:.?*'^^^^^X^í^:^^'^^^.

4% N o I T E S J o Z E FINAS

113

Dos Reis dos Luzos vês rifcado em breve O valor, a conílancia, e mais virtudes j E quem melhor que tu Júpiter fabe Não terem lido Reis de povos rudes ? 114

EíTes paíTados Séculos vaidozos, Que as aras do Heroifmo tanto alçarão ; - Que aos rezolutos Ifcolas fobrè ellas >

De refplandor eterno coroarão^

115' Qiie Heroe , eiitre os Heroes pode louvar-fe ,

Que as palmas efcureça gloriozas ,

Com que a Memoria premiou dos Luzos

Nunca ouvidas acções ; acções palinozas.'

116

Apimano; Apuleyo ; Viriato;' -••^."^'^ a A

Egas Monis ; Mendes Gonçalo Amaya; ,0 Sueiro; Pedro Paes; Fuás , que o Mouros Na terra, e«mar fe o vê, frio defmaáa. .

117 Os dous Martins, o Lopes, e o de Freitas j

Fernão Rodrigues; e o feroz Dom Payo ; ^

Mem Tougues , João Pires Vafconcellos ; -■

Pedro Rodrigues de Mouriícos rayo:

Mar-

i^^

iqnil

r No I T E II. 43

ii8 Martim Vafques da Cunha ; Egas Coelho ;

)om Pedro de Menezes; e o grão Nuno;

''afque-Anes infoíFrido, a quem primeiro

)e Ceuta no areal cro-ou Neptuno :

119.

Vás Fernando ;, e João ambos Menezes;

/'afco Coutinho; Pedro de Mendanha: '^

^ês^ Diogo de Almeida valeròzo

íntregue de Mavorte á crua fanha.

120 Inda hia por diante; porém Jove,

^e o tinha então ouvido mudo; "■

fomando-lhe a palavra , principia

raes coizas a dizer em tom fezudo. y^'

121

Baíta... não digas mais dos Lufitanos . . .

rodos os feitos feus tenho prézentes . . .

iuero com hum bom Rei em íim pagar-Ihes

) esforço , que os eleva entre as mais gentes.-

122

O Príncipe, que occupa o meu cuidado,

►erá Principe em fim do Luzo Povo : oíSín 1

lífim deixo a Virtude premiada ,

i de Lizia o explendor allim renovo.

Def-

iir^

mm^

44 ÍÍOI*rESjoZEFINAS

Defde que o claro Sol com o feu fogo Anima os muitos globos que o rodeião ; Vaidozos de feus povos c'os triunfos. O Tejo, e oDouro fobre o m.ar ondeião. 124 :Venus , que gofta de louvar os dignos Como provou aíTás com os Romanos , Chorando o meu poder tem muitas vezes Implorado a favor dos Lulltanos. i^n-^-n. 125- E eu fempre os protegi emtodo o tempo. Como filhos d' hum clima deleitozoít o ^rjf Que nos feios que nutre influe tanto,; 0I Que tem lido de Heroes Pai gloriozo.

126 .Quem deo aos Luzos o illuílrado Henrique j Que cheio de fieis conhecimentos , .>o eobol Defde Sagres mandou exploradores o oispf 4^ffoitos arroftar mares ,. e veníos ? - rríolns C 127 Por quem , fenão por Jove defendidos Triílão Vas; e João Gonçales Zarco j f Gil-Yanes ; e o ouzado Pereftrelo

Tomarão do mar poífe em curto barco?

Por

n^^^j^^jf!^.^m.^Mrj^^^ ■'g^^i.sfeag»^^^

}J^jm^^.

Noite II. 45'

128 Por quêrn Nuno Triílao \ Antão Gonçales ; )om Álvaro Fernandes \ e Gonçalo ) de Cintra nas coitas Africanas )s cabos fubjugárão fem abalo ?

129 Quem ? fenão meu favor foi conduzindo

)iniz Fernandes ; e Vicente Lagos \

oão de Santarém; João de Aveiro

)e nunca arado mar entre os eílragos ?

130 A quem fenao a mim devem os louros,

iue o Dias mereceo , quando animozo

^ntes 5 que o Gama triunfou no Cabo

)o monftro que abati por orgulhozo ?

Pedro da Covilhã ; e AiFonfo Paiva *or mim levados para eítranhas terras : íum da quente Ethiopia, outro do Indo 7"írâo as gentes , montes , valles , ferras.

E de favores taes o fim qual era ?

íntre os viventes diftinguillos tanto,

iue foíTem pelo Gama os que da Aurora

/"iíTem primeiro o berço de Amarantho.

Sim,

■cr>:x^ii«^^yí'Y'ir'^^€-\'r''f--'wr'Ti^''^~'x-*-f'-'(r

^ie^^f^Ssii^^^MS^;S^l^^^^^^

46 No I T ESJOZEFINAS

133

Sim 5 Hermes ; para cm fim te convencere De quão propicio eíTa Nação protejo, Nas areias que o Sol ao nafcer doura Pouzão com meu favor quilhas do Tejo,

134 E agora para mais inda exaltallos

Por Colombo lhes fiz oíFrecimento

D' huma terra famoza , rica , e fértil ,

Que do Oeíle entre os mares tem aíTento.

135'

A deílruidora Entriga fermentava

Do intrépido João então o eítado :

Razão por que Colombo defgoftozo

O feu plano fiel vio defprezado.

136 ,

Na Corte ambicioza de Fernando

Sua propozição foi mais aceita ;

E a inftancia de João Peres a entrega

Ficou por Ifabel á Hefpanha feita.

Três navios boiarão logo armados

No eftreito porto da pequena Paios :

Colombo , e os dois Pínfons fahem nelles ,

De Amphitrite açaimar verdes cavallos.

Def-

Í^SâS^^^;^

iB^^^^||H

..'-^<MJj^>€im.v?jiK^^^,^&g^^

No I T E ir.

SE2SSZSR

47

133

Defcub rirão em fim para defgraça )a pobre, perfeguida Humanidade i efpaçoza Atlântida, previfta *elo fabio Platão na antiga idade.

139 Terra por Manilio annunciada,

l por Diodoro Siculo fuppoíla :

^or Cetheíias; Nearco; e Marco Paulo

^eíTes mares Atlânticos expoíla.

140 Porém defde que alegres derâo fundo

)a frefca Guanahani na bahia ,

ité efte momento as gentes novas

nvocão meu poder de noite, e dia.

141 de Vega-Real correr nos Campos

í^írão feu fangue eftas coitadas gentes:

/"irão dos ternos Pais tremer as carnes

)efpedaçadas por caninos dentes.

142 Tantas forão por fim as trilles quei^xas, iye fubírão cJiorozas ao meu trono , iue a parte auílral do defcoberto mundo ^roteftei conceder á melhor dono.

O

f^^^^^j^^^^s^^y^i^jT^^^^jírriím^^^

48 Noites Jozbfinas

O Rei 5 que premedito pára prova De que o creei capaz de dar exemplos , A' emulação , á Honra , e á Juítiça Ha de, e á razão dedicar Templos,

144 Deflas virtudes ante os buftos claros

Os povos s'irão pondo ao bem difpoftos:

E nelias por coílume difcorrendo

Deíterraráó de íi vicios oppoílos.

145- Vai Mercúrio voando fem tardança.

Vai do Oriente procurar o vento ;

E a fim que attenda ácommifsão, que levas,,

Dize te manda o Rei do firmamento. ^

146 Que os ventos que domina ajunte logo v

E quando o Euro entre os mais todos vires ,

Firmado nas compridas, foltas azas,

Taes coizas mando , que do feio tires.

147 Por mandado dejove eterno, e jufto,

A quem tens fiel fempre obedecido",

A nova empreza que por mim te envia ,

Vai logo executar dos teus feguida.

Na

'^■^''Wf/Y'W^m

gfe5^>^>X^%ií^^-^^.^^

Noite IL

148

49

Na foz antiga do efpraiado Tejo, Irguendo o ferro eftá com lefte gente, edro Alvares Cabral para de novo 'ir fulcar eftes mares do Orieate.

149 Logo que folta a cevadeira toda

ires que fe enche de teus fopros frios ,

judado por efles , que te fervem

los Luzos proteger vai os Navios.

15-0 Dos lemes a pezar , fem fazer cazo

>a reziílencia , que farão briozos ,

or de Jove ignorantes não faberem

^s dezignios a elles proveitozos.

Da terra nova , que a Auítral Zona enfaxa , loítrai-lhe a coíla , que primeiro acciara ) Sol, quando fe eleva fobre as ondas, Jue para os Luzos Júpiter guardara :

Depois do Malabar ter-llies entregue

) importante , e honrozo fenhorio ;

)a America viçoza a melhor parte

(landa Jove lhes deis neíle defvio.

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yo Noites JozE FINAS

Efta porção de terra prolongada, ~ A quem rodeia lúcido hemifpherio Rezervo para erguer fobre ella o trono, Em que fe ha de fentar o quinto Império.

í5'4 O Brazil terra amena, e abundante

Seja, dos L.uzos Principes efpero

Património ; e Jozé fera cliamado

Principe do Brazil, aíTim o quero.

Mercúrio, ao fabio Deos fazendo vénia. Foi dar execução logo ao preceito, E em prova de que a deo..Jozé. .ah morn Principe do Brazil jurado, e feito.

Luíítania , o vapor da noite efcura Parece-me fe vai diíiipando : Sobre a lagem que o Principe nos rouba Vamos paíTar o dia em vão chorando.

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NOITE III.

DESTERRAR defta praia os vãos prazeres Ide meus triftes ais, ide voando Aos troncos , ventos , plantas , aos roche- le a noíTa defgraça publicando. (dos

2

Inípirai noíTa dor nas ondas quanto ede o cruel pezar, que nos confome; -nos cavados feios dos penhafcos >o Principe fazei foar o nome.

D ii E

MM I l9!^=^^^^^iEgy.^^.^»^^-^«ii>^^>^>^

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.^

Noites Jozefinas

E vós 5 miúdas lagrimas , que a pares Nos meus olhos eílais fempre nafcendo. Molhai também os olhos , que ainda enxuta A ignorância tiver do cazo horrendo.

4 Mas ah!, bem vinda fejas, Luíitania,

Defde que aqui cheguei, meus triftes olhos

Do coração cedendo aos movimentos,

Borrifarão com pranto eíTes efcolhos.

5 Á extensão, e o valor da noíTa perda,

Qiie tenho n'alma vivamente efe ri ta ,

Em pranto me converte o mefmo fangue,

Faz-me efpalhar com ais noíla defdita.

6

A enganoza efperança nos pintava

Nos annaes do Univerfo os mais ditozos ; As promeíTas porépj traçou no fumo, Qiie diíTipárão furacões ruidozos.

A viíla deííe rio, cujas ondas

nos foberbos colos fuíliverao

Quilhas 5 em que do mundo as quatro partes

Seus preciozos dons oíferecêrao :

Do

^í^^J^^/^^-^

53

Noite III.

8

Do noflo Tejo a viíla deleitoza

3c novo a alma canfada me atormenta ,

i^ejo a futura gloria di/fipada

I^uai névoa que desfez rude tormenta.

Amada Luíltania, não podia íía caixa de Pandora achar o fado 3efgraça mais capaz de encher de mágoas [) teu povo fiel hoje enlutado.

IO

Como deve abarcar o feu objedo, 3o fuccefíb fatal o fentimento , im quanto a muda Noite os mochos guia, li nas cortadas rochas dorme o vento.

IT

Agora 5 que nas lapas do Oceano Dorme a mádida Corte de Neptuno; Fanto que as limpas aguas não perturbao 3s Tritões fervos do infiel Portuno.

12

Qiiero contar-te huma vizão eftranha,

Hom que Morfeo em fonhos me entreteve;

3epois que te deixei n' huma caverna ,

Brando fono em meus olhos fe deteve.

Lo-

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->3Ci.iigíf^/i^^^^-<-'-fcr^#^f^^

^4 Noites JozEFiNAs

Logo que o groíTo humor entorpecendo Os meus froxos , fatigados nervos ; Quando os chorozos olhos não vião Sénecas juítos, Polióes protervos.

Deixando o pobre corpo entregue ao fone

Pelos Deofes minha alma foi levada

A hum prado , onde a riqueza d' Amaltheia

Com grata profuzao vi derramada.

15- Logo por entre ramos , cujos pomos

Com feu cheiro diverfo 5 e varias cores,

A favor de Vertumno difputavao

O premio da belleza dado ás flores.

16

Rodeado de Zéfiros que alegres

Brincaváo entre as folhas fonorozas , E de Aves mil , que vagas revoando Soltaváo ternas vozes amorozas.

Pelo trilho da plácida alegria Cheguei a hum frefco íitio defviado ; Onde huma Deofa vi a mais galante. Que Zeuxis pintaria delicado.

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Noite III. yj

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Tinha fciencia nas faces efculpida:

^os olhos reflexão myfterioza :

Sm todo o corpo hum ar grave, e fereno,

Sas acções liberdade gracioza.

Da fua llngeleza em teílemunho 3eu bem formado^ corpo vi defpido ; Livre da prevenção, com que a malícia []apcioza nos tem corrompido. 20

Faziâo corte á Deofa aíFavel, terna

3s quatro envelhecidos Elementos :

i^ingião quatro humanos refpeitaveis ,

;jue da morte viverão fempre izentos.

21 Inflammado o femblante o Fogo tinha,

5eus abrazados olhos faifcavão ;

2 as fuás quentes mãos por paíTatempo

i/^ermelhas brazas, vivas manejavão.

22 Do Ar as faces erao macilentas ;

5 do feu defaíFogo fempre amante

5oprava em liberdade, a alva madexa

Movia-fe c'os fopros ondeante.

So-

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S6 Noites Josefinas

Sobre a miúda relva debruçado Da Agua todo o corpo gotejava, E no claro ribeiro, que nafcia, O mufgozo cabello fludluava.

De todos quatro a Terra era a mais grata Eftava reveftida de mil cores ; E o feio creador lhe guarnecião Mimozas frutas, matizadas flores.

Ca d' hum tinha a feu lado companheiro. Com quem vinha afallar de quando em quandc *Examinei-os bem, e pelos géítos Nelles as eftajoes fui encontrando.

De efpigas feccas o Verão* croado Eftava junto ao tórrido elemento , Que avivando-lhe mais a cor do rofto , Lhe queimava a grinalda co' alento.

O Outono eftava ao do Ar delgado ,

Cujos frefcos bafejos o animava o,

E as flores facudião., mais os pomos

Dos ramos , que viçozos o croavao.

Ao

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Noite III. 5'7

28

Ao liquido cryítal da Agua ferena 'azia corte o regelado Inverno , "inha de branca neve prenhe a barba, ! o rugozo femblante cor do averno, 29

A terra acompanhava a Primavera ]om faces mais do que as cerejas rubras: ^ais linda do que tu Lais caprichoza, guando de aíFedlaçao teu rofto cubras.

Vi também as mimozas Artes bellas rão cheias de prazer como coílumâo; ^ roda de Amphitrite as Ninfas lindas lobre as aguas brincar tanto que efcumão.

A Deoza tinha em \i por arte nova unta huma tal doçura á gravidade , iue quando o feu refpeito me affaítava, )e fugir-lhe não tinha liberdade.

Sem eu faber porque, dentro em m«u peito íentla o coração enternecido ^ara a Deoza fugir, como querendo VLoílrar-íe a algum favor agradecido.

^^^^2&Éâ£^â^^;aKSãíá^âsâ2ãâatkí^

i^É^

Noites Jozefinas

33 Ellava toda abforta modelando

D' um Cupidinho a eftatua mais perfeita

Phidias na execução poílos os olhos

Os rafgos de fua arte attento efpreita.

34 A Efcultura d' hum lado refpeitoza

Os cinceis delicados lhe oíFrecia :

D' outro lado a Pintura na palheta

As animadas cores revolvia.

35- ^ Depois de modelada , tão fublirae

Ficou nas perfeições a eftatua bella ,

Que beijando da Deofa as mãos divinas.

De Scopas quiz a arte agradecella.

3^ Fez huma curta pauza. . e obfervando

Seu trabalho por todos approvado :

Retocando de novo os olhos lindos ,

E o cabello gentil todo anelado :

^37 A carinhoza Irmã da Poezia

Pedio os cucos das maTs brancas flores,

D'osjafmins5 das mofquetas , d' alvas rozas

Que mais cqlhem juvenis Amores.

De-

gfes^>^;^^x-^ii;g5^-ag^.

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Noite III. 38

S9

Depois de todo o corpo contornado ^er coberto da neve com a alvura , edio novos pincéis, palheta nova, ) dentro de fi mefma a fciencia apura.

39 Dos morangos , maçans , e dos medronhos

!om as cores pintou-lhe as faces bellas ;

I vendo lhe luziâo pouco os olhos

ara lhes dar tirou luz ás eftrellas.

Das rozas que vermelhas fez o fangue , ^e o filho de Cyniras derramara, )om o çumo pintou bocca mais doce, ^e a bocca onde Ericina fufpirára.

Quando vio que acabada fua eftatua lo ^efpozo de Cydipe excedia , ía rara gentileza , que era tanta , ^ue á mefma Anaxarete abrandaria.

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€k^

w^íS^r^

Olhando para o Ceo . gritou . . oh Jove ,

^e fabio reges meus fieis intentos :

leu poder exhauri : formei-lhe o corpo :

ru huma alma lhe rica em talentos.

Qual

6o Noites JozEFiNAs

43 Qual de Pigmalião a eftatua morta

Efta fermoza eftatua fe ficava :

Quando, eis-que derepentehum trovão soa .

Julguei do Olympo o feio fe rafgava.

44 Com eíFeito dos Ceos huma faifca

Rápida o longo vácuo trafpaffando ,

No feio fe introduz da eftatua bella ,

Que de vida fmaes foi logo dando*

Nifto os olhos ergui cheio de pafmo : Quando eis vejo huma nuvem, quedefcend» Vinha também á terra íobre as azas De ventos , que fieis a vem fuftendo.

Tanto que o chão tocou , rafgou-fe a nuvem E do feio dourado lhe fahírãò, Não os ferozes , ardilozos Gregos , Que o defgraçado fim de Tróia urdirão.

47 . Palas, Mercúrio , Marte, Apollo , Vénus

Se prezentão da eftatua á meiga Authora ^

A rara producção cada hum admira ,

Cada hum em contemplalla fe demora.

Tu-

^>^ix-^igjgLag^.

Noite III.

48 Tudo fufpenfo eílava . . quando Apollo

;hegando-fe da eítatua ao lindo rofto,

fa bocca lhe bafeja gracioza,

.efpirando prazer, fuave gofto.

49 Vénus lhe encheo de graças o femblante,

obrigada c' o a tenra gentileza ,

íos encarnados lábios amoroza

Iguns beijos foltou em fogo acceza.

Sobre a lingua Mercúrio lhe refpira : alas o alento lhe foltou na frente : iarte porém no peito lhe derrama lonftancia , intrepidez , valor prudente.

O Deos Silenio, cuja viíta nunca ler pode os carafteres do futuro, idmirando da Deoza disfarfada ) confiante faber, o ar maduro.

Gritou-lhe . . Quem es tu , fabia Matrona ,

Jue pudefte obrigar a Jove eterno

L foltar do feu feio huma faifca?

l moftrar-fe comtigo aíFayel , terno ?

Quem

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iíããfa

:^^-d^.^ak^;j^aB^ggBi

6z No I T ESJOZEFINAS

Quem es tu, cujo grito pode tanto. Que obriga a cinco Deofes foberanos A deixarem dos Ceos a alta morada Para virem honrar pobres humanos ?

Logo a Deofa fem muito foçobrar-fe, Refpirando brandura , e gravidade , Refpondeo com voz doce, e focegada Nos feus olhos brilhando a verdade.

E?i fou loquaz Mercúrio aquella mefma, A quem deve o feu fer tudo o que exifte; Por quem tudo exiílio antigamente, Em quem todo o futuro sao coníiíle. '

Eu fou aquella, cujo feio immenfo Calígulas produz , e Caracálas j . Ariftípos fieis ; Marcos Aurelios ; Sócrates redlos ; bárbaros Abdálas.

Damiens porém de mim não teve queixa. Não fui mais liberal com Belizarioj Com o mefmo cuidado exjílir faíFo O Efémero, o Pulgão, o Dromedário.

Eu

w=:^^^y^^L^.0^^j^^y^^i,ié?^.

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35^52

■>P^JA

Noite III. 58

63

i

Eu fou benignas , Celeftiaes Deidades , V antiga, previdente Natureza... ^ogo os quatro Elementos refpeitozos íncurvárão feus colos com preíteza.

S9 A pezar do inconftante, vil capricho,

S do rigor cruel do Fanatifmo :

\. pezar das paixões fanguinolentas ,

iye vomita íem pauza o negro abyfmo :

60 Sempre no globo confervei dominio,

Jempre fui dos mortaes confervadora ,

Panto, que inda nos campos dou remédios,

iue o homem por inerte alegre ignora.

A humana geração de mim depende, Cantar íem mim não pode Anacreonte : 5u movi de Arquimedes o compaíTo : 2 os paíTos dirigi de Xenophonte.

61

Huma nação protejo cuidadoza ,

He deíTas, que o Sol quando fe deita,

Fecunda mãi de creadora gente,

Da geote para prodigios feita.

Mer-

■^^y^^^^^^ rirr iri^inrrríTn^^^^

^^^s^ss^^ss^^^

Honrarão

Noites Jozefinas

Mercúrio accrefcentou : Julgo nos falias Da nobre Lulirania , por quem Marte Tantas vezes defceo do Olympo á terra Com quem Apollo feu faber reparte.

Tornou-lhe o Deos guerreiro: Não, Mercúrio Auxilio nunca dei aosPortuguezes : Os Albuquerques , Caílros , os Sampaios

íi mefmos feus Payezes. 65'

Pois eu 5 gritou Apollo , não me atrevo A roubar-te o louvor, ó Natureza; Os Lobos 5 os Camões, Garção, Bernardes^ A ti deverão tão gentil deílreza.

66

Continuou do mundo a Produílora

Da Luíitania os Povos são-me acceitoíT; Não por louca paixão das mais tão própria Mas por feus raros , celebrados feitos.

67

Logo que Adamaílor vi fufpii*ando

Chegar- fe triíle a mim co' as mãos alçadas

Gritando: Terna mai , as minhas ondas.

São por foberbas quilhas retalhadas.

Hum

■:a^ss^r^;>^>tfsía-l

:r»r5ç?5?^3B

MmUL

Noite III. 6f

68 Hum novo Deucalião lançou no mundo

entes, do que as antigas menos cautas j

[uito mais atrevidas que os Phenícios,

[ais deítras fobre o mar , que os Argo-Nautas,

Por defender-me em vão hoje foprárao

s foltos Aquilôes embravecidos :

m vão para fe oppôr os meus rochedos

Dbre o raivozo mar moftrao-fe erguidos.

, , , 70

Mil precipícios lhe prezento ás proas ,

bdos porém defprezão vakrozos:

3r entre as penhas, a pezar dos ventos,

argem pelo golfão vidro riozos.

71 ConfeíTo , que fiquei hum pouco abforta

o' a eftranha narração d' um tal fucceíTo;

pela intrepidez extraordinária ,

ouvei dos Luzos o fublime exceíTo.

Fiquei-lhes defde então aíFeiçoada :

irei-lhes em diante protegellos ,

ti das Zonas nos tórridos dezertos,

'u do Septentrião por entre os gelos.

E Tu,

g^:xãa^>^^v^^^-^'fc-^#^l^^^

Noites Jozêfinas

73 Tu, ó Vénus gentil, que hoje meefcutas

Defcefte a agradecer o meu protefto ;

E em final grato por teus fortes povos.

De rozas me oíFrecefte cheio hum cefto.

Defde então protegi os Luzos fempre; E fe acazo os deixei foíFrer ás vezes, Foi por firmallos mais na experiência. Que enfioao bem fataes revezes,

7S Vendo agora , que os fados me auguravã(

Também auxiliar os meus intentos j

Juntando de Jozé , e de Carvalho

Dos Luzos a favor claros talentos.

76

A fim que tal ventura lhes duraíTe, Júpiter dar-lhes quiz hum Rei perfeito: Ahi o tendes por vós enriquecido D^Acjs acara tem, de Henrique o peito.

77 No Príncipe feliz os olhos logo

Com fufpenfa attençao mudos fídlárão:.

E entretido co' as Artes , e Sciencias ,

Não km geral prazer todos o acharão.

De

SSe^S^^:^Êí^S^

'i-^^-^as

Noite III.

78

67

De Maria fera chamado filho : A fabia Natureza inda profegue) PAriftomenos sãos co' as vivas luzes , ará com que a ignorância nunca o cegue. -^

Ella a gloria terá de dar á Lizia

>' entre todos os Reis o mais completo : '.-

ío repartir dos prémios Alexandre ;

ío caíligar mais que Licurgo reto,

80 Eu 5 e Vénus com Jove de mãos dadas

irámos exaltar os Luíitanos ,

obre a gloria deMemphis, deCarthago,

obre as façanhas dos fieis Romanos.

81

AíFim continuava . . quando hum Fauno

>a caverna Senhor, onde eu dormia,

> feu caprino firmando grita,

lyrtillo, vai-te, que acabou o dia,

82 Logo que abri meus olhos, triíle pranto

urbulhou nelles mais que nunca ardente :

>s Ceos mais nos convencem com meu fonho

>a razão com que chora a noíía gente. ^ E ii Hum

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6B N o I T E S J o Z E F I N A S

Hum Príncipe, a quem derao os Divinos 3^ Quanto dar lhe podião : revertido De luzentes virtudes, de talentos: Para o noflb prazer produzido.

Foi Pátria inconfolavel o tezouro , Que a pezar de Polybio ,. e Tourneforte A moleítia cruel roubou-nos fera Em cumprimento da malvada forte.

O dia vai nafcendo chorar vamos : Vamos derramar ais , triíles fufpiros : Adeos á manhã... aqui de novo Ouvir-nos-hão gemer eftes retiros..

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NOITE IV.

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'lOi^il.

NEssE azulado Ceo efcurecido Como as eílrellas tremulas fcintilâo : Como por entre as ramas denegridas rriíles os ventos com pavor íibilâoi

Nefte íitio de paz, que hum fútil medo

Aos mortaes horrorozo reprezenta;

Minha canfada voz ergo de novo,

Queixoza Luíitaíiia, efcuta attenta.

Tan-

^2^^^í^^:^2SS^^iíS^SÊaEm^

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70

^1

Noites Jozefinas

3

Tanto que hoje fugindo á luz do dia , Dos fepulcros bufquei a efcuridade ; Qiiando abraçado com a muda campa, Lhe dava amargo pranto a Saudade.

Hum Génio dos que os Deofes deftinárão Para fer tua guarda , e tua guia, Pouzou na fria terra tão canfado, :^Q^Q~ nem quaíi íiifter-íe eoníeguia.

Depois de defcanfar alguns momentos, Gritou com triíle voz, froxa, e doente.. Em fim achei-te, Principe querido , Morta efperança da Ul^ífeia gente.

6

Achei-te ; e antes de contar o muito

Que para te encontrar corrido tenho ,

Chorar quero , e gemer em liberdade

De minha eommifsâo em defempenho.

7 E voítando-íe a mim , diíTe.'. Myrtillo ..

Que choras fem canfar dos Geos a ira, Efcuta-me,e verás horrorizado. Quem cego bufca o mal, o bem que tira.

No

^/msT^

■g^^S^^^vX-^HJ^S^-^S^^.

\v

N o I T ET IV. 71

8 No funeílo momento, em que feus olhos

Miortos não pudérao ver o dia:

^ando nas praças repartido em bandos

) povo lamentava o que perdia.

9 Quando ricos, e pobres, fabios, rudes,

^amentavão da Parca o rigor bruto :

ío momento , em que a dor fe efpalhou tanto ,

}ue nos roítos fe via da alma o luto.

10 Eu , infeliz de mim ! que encarregado

)a fua precioza vida eílava;

Hu que banhado em lagrimas abforto,

leu roílo amortecido contemplava.

II Tornei a mim do pafmo em que me via ,

abrigado de Lizia c'os gemidos ;

obiegou a mim banhada em pranto amargo ^

E os dourados cabellos efparzidos.

12

5 gritando me diíFe entre foluços . .

Oh Génio vigilante, a quem as Parcas

O nais perfeito Príncipe roubarão,

qiie com ò teu voo o mundo abarcas.

Vai

72. Noites Joze finas

13 Vai á alma bufcar eíclarecida

Deíle corpo , que vês desfigurado :

Vai bufcaila entre os Deofes ^ e chorózo

Lhe conta o que entre nós tens obfervado.

Vai, e as mágoas lhe pinta em que deixaft Eíte meu coração que afflido vifte ; Qiie envolta em negros lutos eu ficava; Que minha alma também deixaíte triíte.

15'

Conta-lhe a confuzao, em que ficarão

Os feus aíFeiçoados , dóceis povos : E que inílante não ha, em que não rafguen NoíTo horizonte mil gemidos novos. .

16 Que as condenfadas nuvens não podendo/ Com o pezo dós ais, que foi tos voao , Carregadas defcendo novamente A noíTa terra, e mar com ais povoao. 17 Qiie entre mortaes fufpiros dolorozos^/ Que co'as languidas anfías fahem rotos j Te mandei procuralloj que benigno De fua amante Lizia aceite os votos.

Eu

^5Si.S>^^,N%ig^-Vfe^7^

Noite IV.

i8

^^JA

73

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Eu , que inda nao podia por confuzo i eílrada diftinguir, que aos Ceos fubia )o caminho fatal , que ao negro verno.^4>- ^s defgraçádas almas conduzia.

.19

Peneirando empinei-me o mais que pude

íobre o foco mais alto horizonte;

rão erguido me vi , que debruçado -^

i meus pés julguei ver d' Atlas o monte/ -

20 Logo a viíla eftendi toda em redondo,

) d' almas defcubrindo hum grande bando p

) trilho que feguião fui feguindo ,

lares , e novas terras vizitando.

21 Volvendo os hombros para a foz do Tejo

) Promontório Sacro atrás deixámos, T

)epois por íiraa dos azues Titanes ,

ls columnas de Alcides procurámos.

22

Livres de maítareos, de remo, e velas

âíTámos todo o vaíto mar interno ;

)nde vimos nadar guerreiras quilhas ,

oitos os pannos ao infiel galerno.

So-

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^^^^1

p^ Noites JozE FINAS

23 Sobranceiros ás ondas do Tyrreno

Aviftámos por fim o longo Epiro,

Onde todas as almas defcanfárão

Do trabalho , que tão longo gyro.

Pouco tempo correo, e hum trifte Génio De fanhudo femblante carregado, Levou-nos por hum árido deferto De, penhafcos , e lilyas alaftrado.

PaíTámos reroando hum largo efpaço., Qiiando eis-que nosfúfpende, e abfortos vim^ Couza, que eftremecer nos fez a todos j Tanto 5 que compaixão ao Ceo pedimos.

^6 , A^ borda nos achámos d'hum abyfmo Tão hórrido , tão vafto , e tão profundo , Que por mais que alongámos noíTa viíla. Não pudemos fitar o efcuro fundo, 27 Quê tal feria o noílo fufto ao vermos Que o dezabrido Guia defcer manda Ao negro precipício cavernozo . . . Cada qual olha para a oppofta banda. 'O^ Ma:

■^j^^-y^^ÊÈi^^^jt-;;^.

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MJLàJ.JÊ^y i

Noite IV. 75:

28 Mas o groíTo vapor , que o fundo valle

Ixhalava de íi , era tão denlb , S

'ao efcuro , e pezado , que impedia

''ermos do largo vácuo o vão extenfo.

Obrigados em fim nas azas firmes , omos cortando a névoa denegrida : ulfureo cheiro o ar efpeíTo infeíta; ~i

. luz fe nos moftra amortecida. '^^

Por entre o cego fumo tão quente , lue inda nem refpirar fe pôde apenas; ■> >e efpaço a efpaço foltâo guincho agudo > A etricas aves de enlutadas penas. ^■

31 Em fim cercados de pavor chegámos

.0 vafto fundo do medonho valle;

m todo o noíTo globo achar não poíTo

fada que a quanto vi de longe iguale.

No mais profundo fitio preguiçozo •efcia entre penhafcos retalhados 'um rio de tão feia catadura, iue ficámos de medo trafpaífados.

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76 Noites Jozefinas

t;as retrocidas margens as areias Erâò efcuras mais que o efcuro lodo; Mais do que os corvos, era a veia negra j Que murmurava por eftranho modo.

34 Pelas fombrias praias horrorozas

Arvores obfervámos desfolhadas.

Em cujos pardos ramos alternando

Guinchavão negras aves magoadas.

35' Sobre as defpidas pontas dos rochedos >

Que efcurecião mais a praia oppofta ,

Algumas almas vi , que blasfemavao

Da inalterável lei aos homens pofta.

36 Entre elias defcubri algumas deíTas ,

Cuja lembrança o mundo inda abomina :

Vi o fordido , e vii Sardanapalo ,

Vi a bárbara, e torpe Meffalina.

Vi outras muitas mais, que nâo declaro Por ferem entre nós mais conhecidas; E logo diíTe em mim.. Ah certamente! As horas, que empreguei, forão perdidas.

>v^>^^-x-^Éi.^-^->^

^■^J^JM^^^J^.^^^l^^J^l^^Jf^^ MAA}^.

N O I T E IV. yj

Enganei-me no trilho ; agora vejo razão com que todo o mundo grita: uem dos malvados vai apôs o bando, nganado também fe precipita.

39

As almas 5 cuja eíleira vim feguindo,

lo almas criminozas certamente,

ue deixando os vis corpos nos fupplicios ,

em no Averno chorar eternamente.

* 40 Sâo almas defgraçadas , que abuzando

os bens que os Deofes juílos oíFrecêrão,

ntes penar aqui, do que no Olympo

ternos bens gozar cegas quizerão.

41 Logo não pode fer efta a morada

ue eu vinha procurar com tanto cuílo;

emer não pôde no profundo Averno

efpirito d^hum Principe tãp jufto.

4^ Pelo que eu vejo agora , o turvo rio

e o fulfureo , lúgubre Acheronte : ifto os olhos voltei , e vi na praia arar a barca rígido Charonte.

Aos

r

^v-igEaa^;^^:;^..:>^:^^

t^^r-y.-.^^^^sí^Xt

78 NOITESJOZEFINAS

43 Aos toletes deixando os remos prezos,

Manejava robufto a longa vara ,

Que cravando d' hum, d' outro lado^

A barca para nós encaminhara.

44 Seu rugozo femblante o moílra velho :

Tem hedionda, negra, e hirfuta a grenha

EfpeíTa a barba , e o gretado corpo

Na folidez, e cor parece penha.

45- Hum pouco em nós fitando os turvos olh(

Com império gritou: Então que efperão?

Eu não poíTo perder aqui mais tempo . .

Todas no mefmo inftante efmorecêrão.

Então o duro Génio , que trazido Tinha das almas infiéis o bando, Por conta huma por huma ao vil barqueirc As foi inda que triíles entregando.

47 Vendo que partia., alto gritei-Ihe..

Terás no teu batel paíTado acazo

O Príncipe dos Luzos ? Refpondeo-me :

Na minha Barca tyrannos paíTo.

Tor

^^^V) ^-.■J'».v ^^^JÍJ^^

M^MÃJm.

Noite IV. 48

79

Tornando então a mim arrependi-me, >e tal lhe perguntar j mas do receio fão nafceo a pergunta . . em fim didlou-ma . dor amarga, que me enchia o feio.

49 Firmando a longa vara fobre a praia,

encoftando-lhe em íima o corpo duro,

a negra areia arranca a férrea quilha ,

om o pezo a agua fez rouco murmuro.

50 E fentindo que a névoa carregada

o vento revolvia hum bafo ardente ;

mbiciozo de largar as prezas ,

)rque nefta praia mais gente.

Bem no meio da barca hum groífo maftro om rara promptidao forçozo eíleia , Dgo huma grande vela fuja , e rota atregue ao mole vento folta ondeia.

Sentando-fe na poppa a efcota firma , vela fe embolfou fem mais demora : bóia a negra efcuma. . das almas uai geme , e grita . qual foluça , e chora.

To-

^s^í^^y^y^r^ms^i^m^^^r^xsmi^fs^^:^

"^^S^JWé

^..fsm^^JLm^

Sn

80 Noites Jozefinas

5'3 Tocão por fim na oppoíta , fatal margen

Sem tardar logo o velho a praia ferra :

Eu que os tinha co'a vifta ido feguindo,

Sufpirei , quando os vi faltar em teria.

5-4 Saltarão do que vião aíTuftadas ,

Derramando fem fruto inútil pranto ;

E apreffado Charonte, huma porhuma

Ao Miniílro as largou de Rhadamanto,

Erão oito entre todas , delias quatro Tinháo-fe neíle mundo dado á uzura : Huma á murmuração ; com fangue as outras Allinárão a fua defventura.

Cheio de humana dor as fui feguindo Com os olhos, que o pranto humedecia, E vi que a huma caverna efcura , horrenda O inexorável Bronte as conduzia.

57 Dous coloflaes penedos efcabrozos

Os agudos cabeços ajuntando ,

Formavâo da caverna a porta horrível^

Qiie eílá negro vapor fempre exhalando.

Che-

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N o I T E IV.

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Chegão ♦. e parao .. porque o medo as prende^ iuando a morada triíle vem da Noite; /Ias o duro Miniílro rigorozo iobre todas defdobra hum longo açoite.

Sepultou-as por fim , e meus olhos ellas não podem mais por entre o fumo. - eus gemidos ouvi paíTado hum pouco , \ cheio de pavor voltei o rumo, 6o

Com medo de perder de novo a eftrada, "im buícar com trabalho a fepultura: .qui derramarei lagrimas triíles ío regaço da Efpoza terna , e pura. 6i

Aqui, Myrtillo, decorando os verfos, (ue a tua Muza ao Príncipe oíferece, ia certeza feliz de que no Elyfio eu efpirito claro refplandece. 62

PaíTarei chegar o ultim.o inílante , m que eu aqui de dor também expire; erto de que depois de minha morte ao faltará quem triíle em vão fufpire.

F Con-

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NoiTESjoZEFINAS

ConfeíTo , que fiquei horrorizado

C huma tal narração \ e exaggerando

As fabias precauções , com que os Divinos

Os homens para o bem forão levando.

64 Não contentes de haver formado o mune

De forte, que fem delle fahir fora '

Dos Eróílratos vis fe pune o crime,

E Plácido por íím c'o as Leis defcóra.

Vendo que os corpos pagando fícao A parte que tiverao nos delitos; E que fendo dos erros os authores , Das penas fogem os fubtís efp ritos.

GG

Rezervárão a íi dar-lhes caftigos,

Que ás fuás infracções prefcriptos erão. Entre os homens as Leis cedem ás vezes , Entre os Deofes porém nunca fe ai terão.

As paixões entre os homens podem tant^ Que a pezar da razão, que noite, e dia A fim de os refrear lhes reprezenta A eterna mágoa, com que o mal fe expia,

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•J. -Ji^h^mÊaao^^smk^LmjLAjju^jit

Noite IV. 83

68 A pezar do rigor com que ameaçao , Qtn que eternas , e humanas Leis fulminão^ echando os olhos fem receio os homens bandonando o bem, ao mal fe inclinâo.

69 Refpeitavel Jozé . . Principe excelfo. .

xemplar dos varões affinalados ,

m teu feio a Virtude agazalhaílc,

eparárâo-te os Deoíes dos culpados.

7^ . ,

Vendo o Génio por fim determinado

. ficar entre nós também chorando , "

sdi-ihe não julgaíTe fatisfeito,

ormoza Lizia, teu afFavel mando.

71 Moftrei-lhe que outra vez abrmdo as azas

> Principe infeliz bufcar devia:

►lie a não o achar da Confuzao no reino,

offe aos campos bufcallo da Alegria.

Tornou-me , que fer vi<ílima receia 'o engano em que o puzerão feus pezares : .efpondi , que feguiíTe as almas ledas , >ue entre os rizos cortando achaíTe os ares. F ii Qiíe

^^::'^^í^frré^'%í^ê^rm^^mr<ír^t

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84 NoiTESjoZEFINAS

Que deftas fem temor os vos feguiíTe , Certo de em fim chegar ao campo ameno ^ Onde de immortal luz fendo croado Triunfante fe o homem terreno.

74 Fundado em que do impávido Pacheco,

Quando entrou por Lisboa triunfante :

Comparado a Gilfort indo ao fupplicio ,

Ver-fe-Jiia diíferença no femblante.

Convencido voou , . . . e por coílume Entre os mortos fiquei em vão chorando^ Co' a lembrança d' um bem que nos roubarão Minha voraz trifteza alimentando.

76

A efcura Noite para oppôr-fe ao dia

Envolveo-fe em efpeíTos nevoeiros ;

Defpindo-a vão , porém ,. do Sol os raios

A névoa fe desfaz toda em chuveiros.

77 Mas ah! ..da Noite o fumo diífipou-fe;

E em quanto o Sol brilhando vai de manfo

Encoílado na campa fria , e dura ,

Vou á dor procurar alsum defcanfo.

^ NOI-

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tíeí(f<f y^e. í-jx.

NOITE V.

P Assei o dia todo, óLuíitania, Abraçado co' a pedra , que he tão dura , Que não pude obrigalla a que cedeíTe De meus negros gemidos á amargura.

2

DaAugulla Mareia em attenção ao pranto

Pedi-lhe fe voltaíTe hum pouco ao menos ,

Para vermos chorando, quem jurava

Dar-nos com feu favor dias ferenos.

El-

^^^!'&^f^rr^T'^í^€\'rr€^^^rirr^

>^^>>e^!^

86

Noites Joze finas

3

Ella banhada em lagrimas gritava , Imitando a Ifabel , . . ó dura lagem , Meu Efpozo adorado ou ver me deixa , Ou ás minhas lagrimas paíTagem.

4

De minha juíla dor compadecida ,

Deixa a elle chegar meu pranto ardente. Talvez que alguma lagrima aquecendo O feu peito de novo o avivente.

S Ergue-te hum pouco fó, para que eu caiba

Com elle quero íupportar teu pezo ; ,

Quero animar feu feio amortecido

Com a chamma , em q o meu tenho inda accezo

6

Mas apenas me vires abraçada

Com elle eftreitamente, fem demora Occupa o teu lugar, fecha de novo, Quero .morrer com quem minha alma adora.

7 Quero que para os feculos futuros ,

Quando nos encontrarem abraçados ,

Conheçáo os vindouros a pureza

Do fogo, em^que vivemos abrazados.

Su-

^^^^^^'^^^^^^^^'''lâ-irrrr?

Noite V. 87

8

Supremos Deofes , vós a cujo mando

arão os rios : adormece o vento : I colo pedregozo os montes dobrão : , do Olympo eftremece o fundamento.

9

A efta impenetrável, crua lagem

abrigai a ceder aos meus gemidos ... i que Hymeneo nos fez refpirar juntos, ^eixai-nos no fepulcro eftar unidos.

10 EUe amava-mé tanto , que gemia empre que não podia eftar comigo : )oce Efpozo . . comigo em vida eftavas . . )epois de morto eu quero eftar comtigo.

ir AíTim aos Ceos bradava em altos gritos ,

'or abrandar da pedra a vil dureza j

íías ella cada vez mais obftinada ,

lem a eícutar fobre o cadáver peza.

12 Que refpeito me infpira , ó Luíltania ,

)a Natureza a folidez conftante..

léus eternos Decretos não revoga ,

Slem fe moftra ao paíTallos vacillante.

^ Ho-

!iKál^ig.g!ja

88 Noites JozEFiNAs

TT ^3

-tlomem nas decizoes arrebatado, Efta curta lição de novo âprefld^; Antes de proceder ferio examina; Quem cego corre, ao precipicio tende.

Quaíi fem reparar, ó Pátria amada, Faz-me a dor do Epidleto a falia tome. De Cenfor me arrebata c'o a mania; Mas juro de Catão não quero o nome.

O Amor próprio , eíla occulta , afli va mola , Que fobre as almas tem maior domínio, Que o fogo elementar tem na matéria, Inda que o não diíFeífe Stal, ou Plinio.

16 Eíle Agente fagaz , que entre os humanos Mais formas, queVertumno larga, e toma : Qiie em Diógenes ora anda de raftos , Ora em Carlos ao mundo poe diploma. 17 Eíle eílímulo, a quem Lucílio^ deve Seus verfos, e os feus quadros Ticicino;. Por quem Juméli atrás deixou Terpandros : Por quem Nero foi monítro, lieroe Trajano.

Em-

^^J^iiAjMàjf^i.' J jljlMlÚLÍA^.JJJLi,^Jf

Noite i8

V.

Embrulhado no manto da bondade , lando os homens tirar bufca do abyfmo, i fútil gloria no mais alto cume , rma o feu trono crédulo Egoifmo.

19

De Sócrates, Sólon , e Zoroáílre,

> próprio amor devemos os confelhos :

>dos da diftinção á croa afpirao,

3J0S robuftos y encurvados velhos.

20 ru porém , Muza minha , que ferido

s o meu coração de aguda mágoa ;

I que vês no meu roílo a dor pintada,

tre os meus lábios ais , nos olhos agoa.

^i A. que fim adejando fem focego ,

)curas diftrahir meu penfamento ?

ixa os homens feguir feus vários rumos,

ixa a cada hum morrer no feu intento.

22 íuvenal 5 eBoileau, Regnier, ePeríio,

e aproveitarão com feus bellos ditos ?

ro , e Paris viverão como d' antes,

mbou Cotin dos maldizentes gritos.

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j^as^^^^^^G^âOí^j^

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90 Noites JozEF IN AS

DeíTe alto tribunal , óMuza, defce: Effe acre frenezim larga por ora: Reconcéntra-te mais : na fepultura Do Príncipe querido chora, chora.

Chora o Príncipe. . chora a grande falta D' hum Mancebo nafcido para Augufto \ A quem juravao dever favores Os mefmos povos do terreno adufto»

Livre da prevenção efcandaloza, Tão fatal á cortada Humanidade, Largando Charlevoix amava os homens, Qiie o clima reveítio de efcuridade. 26

Vendo-fe humano, os homens refpeitava : Entre elles diíFerenças nao fazia : Amava o Patagâo agigantado, E o, pequeno Lapónio protegia. 27

Todos para Jozé erao os mefmos ; E do primeiro Par mui bem lembrado , DaGroelandia, e Sandwich c' os frios povo Se julgava igualmente aparentado.

Lo-

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N O I T E V. 91

Logo fe geralmente os homens todos, Dr Jozé tinhão fido amados tanto : odos devem por elle dar gemidos , )ltar amargos ais , derramar pranto.

29

Sim , minha terna Lizia , que fufpenfa ftás por me efcutar toda efta noite : ezafio a chorar os homens todos,

não pafmes que a tanto me eu aíFoite.

Como jufto varão a fua morte eve pelos humanos fer chorada: orno Príncipe dado aos noíTos povos Dr elles com mais queixas tributada.

Mas vós 5 ó reftos, defanimados os mizeros mortaes , que vos nutrirão : os que foítes os mudos inftrumentos , e que as mortas vontades fe fervírão.

3^ Hoje eftais, frios oíTos , defcançanda

•as difficeis fadigas trabalhozas,

•ue vos davão os fúteis, vãos dezejos

ilhos de loucas almas caprichozas :

^ Ho-

^^^j^^,^^^^^^Ê^^ms^j^Ar^^^!^ts^:ii,r^^

lg/>M4^^fg;ag^

92, NoitES JOZEFINAS

Hoje eftais defcanfando , em quanto afflidtc Inútil pranto íobre vós derramo: Eftais emmudecidos, quando eu triíle Por hum amável Príncipe em vão chamo.

^im 5 entre vos repouza também morto O futuro Senhor do Trono Luzo, Da Lei pofta aos viventes neile a Parca Fez. ao noíTo pezar bárbaro abuzo.

Quantos homens occupão hoje as terras, Que o balançozo mar, azul rodeia, Certamente por elle faudozos Soltâo do acerbo pranto a quente veia.

36

Amar he próprio ao homem , quando cert(

Eftá de que por. outro vive amado, O homem natural nunca rezifte , Ama quando fe co' amor tratado. 37 Por iflo Egito, e França moderai-vos, O epítheto que dais , foi merecido j Mas voíTos Reis amados nunca forao Como entre nós Jozé amado ha íido.

Pto-

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N O I T E

Ptolemeo , e Luiz forão amados >s povos, que prudentes governarão ; irém por noíTo Príncipe excellente 5 mais eftranhos povos fufpirárão.

39 Todos os dias em eícuro bando

ra juíliíicar noíTos gemidos ,

eíta habitação trifte da Morte,

je occupão feccos oíTos defunidos.

Chegão em bufca doíepulcro avaro, le nos rouba a pezar do juílo pranto íu efpozo fiel, feníível, terno, le adorando-te a ti ^ nos amou tanto.

41 Chegão em bufca do letal fepulcro

fpiros, queixas, e ais defentoados,

je em prova de pezar também ?4he envião

! povos dos certoes mais apartados.

T ^^

Juntos pouzando vão na campa fria ,

com trifte rumor , e fons agudos ,

bre ella batem as efcuras azas

é que em íim canfados ficão mudos.

g^^gfg^g^

i

94 Noites JozEFiN AS

43 Das azas co' o bater na eílreita pedra

Largando vão as lagrimas queixozas ,

Com que ao nafcer as tinhao eníopado

Povos diftantes , gentes carinhozas»

.44 O noíTo morto Príncipe gozava

De fazer-fe adorar o privilegio ;

Da Parte Nova os povos mais ferozes

Gemiáo por beijar-llie o Sceptro régio.

45-

Não feguia o fyftema ruinozo

Com que os Mahomets alçarão feus Imperic Dos Calígulas tinha horror aos crimes , As conquiílas chorava dos Rogerios.

46

Ao rouco eftrondo , com que ardendo o bron: Por entre o efpeíTo fumo enovelado , Solta as rápidas balas faifcantes , Ou duro ferro em lafcas retalhado.

47 , ^

Ao fom dos arcabuzes , das bombardas.

Das ardentes panelas , ou petardos ;

Ao incerto das agudas lanças ,

Farpadas fettas , ou buidos dardos.

^ Ao

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^-^g-^x.^te^

3M^^JÁ^^^F^,

Noite V.

48

9?

Aos fataes inftrumentos fanguinozos

) fanguinozo , bárbaro Mavorte ,

10 queria dever a fua gloria,

^e he fatal fempre, quando a croa a Morte,

49 Do illudido Sebafto co' a imprudência

raçar não pertendia novos mappas :

cífico 5 bom Rei de paz queria

í dos mares encher as fundas Japas.

A moleza porém , nem froxa inércia , pânico temor, vil fufto, ou medo, apego á fértil Paz não lhe infpiravão , a-íe da fraqueza de Sagredo,

Os preceitos fataes , porém precizos efta arte dos humanos deítruidora, i memoria fiel tinha tão claros, >mo fe a guerra feu prazer fora.

Imitando de York ao grande Duque, da França ao Heroe fabio Turena , bre a arte pelos Dauns também traçada diciozo moyeo fua- hábil penna.

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"^t^^fe^^ÉíJí^jíri^s^^-^^çisí^íSC*^

Noites Jozefinas

Sabia: mas feu fim era o mais jufto. Certo de que a defeza he neceffaria , A quem forças não tem, com que fubjugu( Huma força maior, que lhe he contraria.

Sabia a fim de defender feus povos ; A fim de os confervar na paz ditoza D'Eugenios5 deMaIbroughs fcintiilava Nelle a fciencia , e conítancia vigoroza.

Dezeja moítrar que hum Rei podia Verificar a antiga^ idade de oiro. Que aos ítalos Saturno prodigára , Quando do filho fupportou o defdoiro.

A vifta da feliz grata abundância , Com que de Brandeburg o Chefe adivo , E outros Príncipes mais enriquecerão Seu pingue terreno , antes efquivo.

^ 57

Dos noffos fexto , e nono Reis antigos

Ao exemplo cedendo protegia

As fúpplicas dos próvidos Colonos,

Moftrando quanto o feu valor bem via.

Jul-

>a>ygí;y^

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òèSAjA^^j^jm.>jmj^

^^^^yy^AMJm

97

N o I T E V.

Julgo mais 5 que Anco Mareio convencido e que no feio da Agricultura s Sciencias, Artes, Armas, o Commercio chavão nutrição confiante, e pura.

Mil ternos rizos no engraçado roílo

s azinhas batiao prazenteiros,

Liando via rafgar o curvo arado ,

amidos valles, áfperos oiteiros.

6o VendoTyro 5 Carthago, Sparta^, Athenas j

hoj eHoUãda, Inglaterra 5 Hefpanha, eFrãça , utrir co' os bens , que o pródigo Commercio íbre os feus povos ás mãos cheias lança,

6i Do Minho 5 Douro, Tejo, e Guadiana )r canaes dezejava miíturadas 5 claras, frefcas , nítidas correntes, je os verdes mares bufcao defprezadas.

62 Por eíles novos rios das Províncias

5 géneros depreíTa fe trocarão,

os povos, que a diílancia faz eílranhos,

:lices paílos entre íi firmarão.

G Den-

^3CS^^gv^^^^-^igss<^^^^-^!aB

fe^ê^í^^^

jlS' Noites JozE FINAS

Dentro em feu coração conter nao pode O rizonho prazer, doce alegria. Que o aíTaltou ao ver que a Mai Augufta Largos caminhos ao feu povo abria.

Eíle exemplo feliz da Soberana De todo o perfuadio, de que as eftradas A comraunicação facilitando , As Frovincias tem fempre de mãos dadas.

: Vendo, que a fituação do feu terreno. Seu curto comprimento, e eftreiteza. aos Luzos antigos obrigara A dárem-fe dos mares áafpereza:

66 '

Vendo que, Luíítania , ao mar devias

As palmas, que arrancafte aos Africanos: De Cabral a importante defcuberta : E n'Azia os eftandartes Mauritanos.

67

Vendo que ás bravas ondas ellrondozas -^

A pezar da cruel ferocidade.

Devíamos não a gloria antiga ,

Mas também a prezente utilidade*

Vei:

;>xaiisy^^^-A-%<!^v^^^.cà^

Iv^E^^SSS

V.

MJUJL

^XTTTJr^

N o I T E

68 Vendo que nefte eílado indifpenfaveis -ao elTas boiantes Fortalezas , ue osNacionaes Direitos defendendo, ^nfervão fempre as allianças prezas.

De Neptuno as efpaduas quando via )' alguma nova quilha retalhadas, i carinhoza Mâi as mãos benignas nu feus beijos dezejava mais coradas.

70 De tudo quanto concorrer podia ,

ra hum bom Rei formar fe tinha orna^ko: ido o que o Povo enriquecer pudeíTe, nha íido por elle dezejado.

Quanto o não moftrão feus defejos certo íffe Evangelho, que a razão d^fcobre: rvido em pratos de oiro Americano, lo pode fer o Rei de gente pobre.

Ludluozos gem.idos, triíles queixas, le voais entre os mortos efqucletos, uzai : não perturbeis a paz efcura m ruidozos voos inquietos. G ii

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lOO N O I T E S J O Z E F I N A S

Chegai do noíTo Príncipe ao Sepulcro, E vereis encerrado em vão eftreito O faraozo Varão , que os altos Deofes Para illuftrar o mundo tinhão feito.

Aquelle, que aos prazeres verdadeiros Dava feu coraçrão , fua alma pura ; Sempre que via fobre algum humano Bem-feitora voar, qualquer Ventura.

Vinde ver da fublime Natureza , E da noffa Sobrana os sãos intentos Convertidos em . . . fim lamentável Da beileza , das fciencias , dos talentos.

Dos Cedros, e dos fúnebres Cypreftes Por entre os verde-ncgros , crefpos ramos Vejo a Noite fugir ... ah mágoa minha ! Do novo dia á luz também fujamos.

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NO]

ZEfiros, que voais por entre os ramos Dos altos, defiguaes, verdes Pinheiros: Torpes , longevos Faunos fugitivos : íJinfas dos bofques, Ninfas dos ribeiros.

De roxas faudades coroados ^o ar queixozos ais vinde efpalhando /"inde aos mefmos íilvados efpinhozos íoíTas pungentes mágoas inípirando.

^^^ís^^mrr^

Noites Jozefinas

. 3 , Vinde comigo, vinde ás praias frefcas

Do noflb ameno Tejo entriílecido :

Vinde ajuntar ao meu o voíTo pranto,

E mifturar co' os meus voíTo gemido.

4 . Cubri os roftos co' os fubtís cabellos ,

A fim , que o rizo nunca nelles pouze :

Com pena de traidora fer chamada

Dár íinal de prazer nenhuma ouze.

S Faunos, ventos, e Ninfas todos juntos

Deveis também chorar noíTa defgraça :

A paz desfrutarieis deleitoza,

Que vos roubou também a forte efcaça.

6

Viçozas Primaveras vinte, e fete

Chegao feu roílo a ver de Primavera ; E em fans appíicaçóes gaitava o tempo, Qiie outros Principes derao á Quimera,

7 Fugi de no? , ó prazenteiros goftos,

Doc^s fatisfaçóes , meigos carinhos :

Batendo as pandas azas cor da noite,

Vinde a nós fuílos lúgubres, daniphos.

SSiesesiiSÊlSà

gAfcyRg3^:^lbfL&eaJE<rfL>>.^JLAI^^

N o I

T E

8

VI.

J^3

benignos feus olhos derramavão Doce confolação em groíTa enchente., \nte elles o pezar abrindo as garras Soltava o coração da afflidla gente.

9 Broncos penedos , que n' outro tempo

y Ino a forte infeliz choraftes tanto ,

?or entre ofrefco mufgo, que vos cobre,

\h ! deixai gotejar amargo pranto.

IO

A fua bem formada , rubra bocca í^eita Oráculo vivo derramava Jentenças , com quem a cândida Verdade i*or fua língua aos homens fe explicava.

II

Ligeiras nuvens, que efcutais paradas

Ds dolorozos ais , que ao ar foltamos ... )os hórridos trovões ao fom tremendo ífpalhai o pezar, que fupportamos.

12

Jozé . . Jozé . . por nós Príncipe amado ,

3nde eílás ? . . Onde eítás ? . . díze-nos onde . *

Síós te iremos bufcar . . mas chorai olhos ,

fozé defcanfa . . onde ninguém refponde.

Com

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104 Noites Jozefinas

Com a força da dor eítalai penhas ; Abri os feios do meu pranto ás gotas ; Sufpire íobre vós todo o vivente Por hum Príncipe tal ao ver-vos rotas.

A vingativa Alteia ás chammas lança O tição por punir a Meleágro ; Mas fem crime a cruel Morte fuíFoca Hum Príncipe , a quem lagrimas confagro.

15' Mas Rómulo também antes de tempo

Por feus crimes não foi aos Ceos fubido : Tirando-lhe hum bom Rei, oCeo mil vez( Os erros do máo povo tem punido.

16 Quebrai-vos de chorar canfados olhos . E as lagrimas que abforbe o campo enxuto Convértâo-fe em violas denegridas , E outras flores da cor do triíle luto.

Oh mágica Medeia, que infpirada Pela triforme Hecáte fubjugando Os fogozos Dragões 5 que co' as farpadas A;&as forão por ti nuvens rafgando.

Tu,

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BUg^g^lg»»!

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il^9=JíJl-ÁM^^.^^ J ^

Noite VI. 105'

iB

Tu, que em volante carro ao ar fubindo

''ifte das Tempeftades a morada ; )s gemidos efcuta defditozos , )a defditoza gente magoada.

As faudaveis plantas , que arrancafte

lO fom de imprecações myíleriozas ,

íos Montes d'Oíía, Pélion , O th ris , Pindo,

1 do Enípeo na praia deleitoza :

20 Traze do Liizo aos deleitozos campos ,

í com os feus aélivos , quentes fuccos ,

m lugar de perder fem fruto o tempo

m remoçar de novo Efsoes caducos.

21 Vem-nos refufcitar o mais perfeito

rincipe , que formarão mãos Divinas ;

Ias coitados de nós . . hervas não podem

h raios inverter, que, óCeo, fulminas.

22 vejo as altas Faias , verdes Chopos ,

m que as triftes Helíadas chorozas

e virão convertidas : doirado âmbar

ormão do pranto as gotas amargozas.

->^g^^^g^v^^^-^ig^.i^.^^^^^

lo6 N o I T E S J o Z E F I N A S

Tarfoi a compaixão, que aos altos Deoí Merecerão os ais , que ao ar foltárão : D' outra maior são dignas certamente Lagrimas , que entre nós fe derramarão. 24

As Irmana de Phaetónte lamentavão A morte d^hum Irmão defvanecido, Que para remover do mundo a ruina. Foi pelo mefmo Júpiter ferido.

Se alcançou piedade a fua mágoa, C^anta a noíTa também obter não deve ? Quanta cauza maior de chorar temos , Qiie nas margens do Lampezia teve. 26

Nós choramos a morte inefperada . . . Ah Lizia 5 eftimo bem a tua vinda ; Moftrão bem teus cabellos defgrenhados , Que a tua alma o pezar devora ainda.

27 A eftas Ninfas , Zéfiros , e Faunos ,

Que apôs mim conduzirão meus gemidos ,

Convidava a chorar os noíFos males.

Males por nolTos erros merecidos.

»sygag»g^ iN%g=5j:fe^^.^p.^

^-ãJu^^jgL^jac^

JLAJLLM^f é^J^ UL.U .

N Ó I T E VI. 107

28

E como algumas Náiades formozas •'ormão o meu intriítecido coro: ^or ellas terem fido as que enterrarão 'haeiónte infeliz com triíle choro. 29

Convencéndo-as do exceíTo incomparável

)a tua perda fobre a deCliméne,

)ezejei commovellas de maneira ,

iue não fique nenhuma, que não pene.

30 Pintáva-lhes as raras qualidades

!om que te mereceo maior ternura,

)o que Júlia Profcíla formentára

or hum filho, que á gloria erguer procura.

Que efcura névoa hoje enegrece a praia )o noíTo triíle rio adormentado... 'içou de ouvir as noíTas triftes queixas obre a molhada areia debruçado.

Que fepulcral filencio dominando

Ifte lugar eftá triíle , e medonho ! . . .

Ias ai !.. que finto ?. . fuo . . tremo . . eu morro

.cordado eílarei?.. ou iílo he fonho?

If-

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"f^^^f^s^^^rr^mísp^

^5^S^

io8 Noites Jozefinas

Ifto he de minha dor hum novo eíFcito : Chorai olhos . . chorai em liberdade . Meu triíle corarão ah defaffoga ! . Solta gemidos . . folta á faudade.

34 Melancólica irmã do claro Phebo ,

Que encoftada em teu carro prateado

Penfativa caminhas 3 dirigindo

Teus alvos potros pelo ar delgado.

Desbruçando-te vens por ver fe acazo Por entre as crefpas nuvens que prateias Vês teu Endjmião . . também gememos Por Jozé neftes campos , que allumeias.

Não te canfes porém . . em vão a vifta Eílendes pelo mar, valles, e prados: Do teu Endymião Jove fupremo Os bellos dias quiz ver terminados.

T . 37 ^ .

Jove por termmar tua alegria

Do eterno fono o fez cahir nos braços :

Arimáno a Jozé para chorarmos

Duro abyfmou nos fepulcraes efpajos.

12^^^

gg^É^^fc^^^

Á^^^A^^L^^lim^m^SíAiAX^''^ ^ J JJ^J^^màmLJÊLM^J^^TSgW!^

N O 1 T E

gays^gr^s^

A fraudulenta Inveja deftruídora )e tudo quanto he bom, não podendo or mais tempo obfervar as efperanças , ^e de Lizia no colo hião crefcendo.

Cuílándo-lhe a foíFrer , que as alegrias lerd eiras de efperanças tão fecundas j íncheíTem de prazer não os prados , áas dos montes as cavernas fundas.

Furioza de ver nos feios fortes, )os fortes , generozos Luíitanos ]o' a poífe d' um tal Príncipe animados .edos pular os corações ufanos.

Os Povos de Mavorte protegidos /'endo no mar, e terras mais diítantes )erramarem contentes meigos rizos nimigos das mágoas penetrantes.

Não podendo fem dor ver tanta gente íorver do goílo a viração fuave : *ara moítrar melhor , que produzido )em não-exifte, que ella não deprave.

wssssmrws^^s;sm

I IO Noite s J o z e f i n a s

No feio de huma ferpe enraivecida, Chupando o ardente fel , que á raiva incit Ligeira deixa a gruta peftilente, ^ cj.f. E os feios monílros, com que fempré habi

Por inhófpitos cat^pos folitarios: Por defpidos dezertos efcabrozos , Onde ventos não ha, que irados foprem, Nem Zéphiros , que foprem carinhozos.

45' Por terrenos incultos , alaílrados

De cadáveres tanto differentes ,

Quanto o sáo as efpecies variadas

Dos que para morrer nafcem viventes.

Por fitios, onde amefma agua encharcai Exifte morta , guarnecida á roda De amarellados mufgos também mortos, Que enfeílâo podres ^ atmofphera toda.

47 Pelo reino da Morte pavorozo ,

Onde tudo em letal abatinlento

Defcanfa : onde tudo inanimado

Durava fem vigor, fem movimento.-

D;

viffir^,

.^^^iN^^it^g.;^^^

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JJkAAfiMafrv. ^^JP^^^JP.^niÉ^^^gJi-A^.A^.^

N O I T E VI.

Da Parca bufca a habitação medonha que chega por fim , e nelJa entrando íu venenozo fangue fe congela ; s oíTos o pavor lhe vai calando.

49 O dragão efcamozo , que enrofcado

le cinge quatro vezes a cintura ,

as víboras famintas , que aíTanhadas

le mordião nos peitos a alma impura.

Apenas chegão á prezença horrível

a hórrida , tartárea Libetína ,

orrendo largão a malvada preza,

jie expirando também ao chão fe inclina.

De fua mortal vifta por hum pouco Parca fufpendcndo o adivo eíFeito : ra lhe ouvir a voz á Fúria manda ílenha a vida, que inda tem no peito»

A Morte fanguinoza defcanfava bre hum montão de esbranquiçados oíTos, le por terem formado homens infignes da mais illuftravão feus deílroços.

A

i

112 Noites Joze finas

A Tyíica voraz , comprida , e magra : A íúbita 5 feroz Apoplexia : As Febres aíTaíIinas , cuja ardência Nos roftos abrazados , bem íe via.

A empachada Soberba; a torpe, bruta, Defvelada Avareza; o enfanguentado , Bárbaro Diípotifmo ; a Hypocrizia; E oFanatifmo vil atraiçoado.

Velhas Preoccupaçoes ; triftes Moleíliasá Simuladas Traições fanguinolentas ; òà j As malditas Paixões , que os vicios nutrerx Rodeavão a Parca fomnolentas.

Mas a todos acorda o fom agudo , Qtie ao nafcer faz hum ai da bruta Inveja Fidla os oihos na Parca filencioza , ( Olhos em que o furor livre chameja,

Co' alento, que lhe reíla forcejando Taes palavras foltou a Fúria enorme . •■ Funérea Libetína inexorável Por quem- quanto exiílio morto dorme.:

»SfeSg<5>-^T^;^M!gS>;!2fe>>r.

"^

:^^x^^pssBsse^^

JLMàJLM^i béi^il^gJ^/ A^^

N O I T E VI.

Tu, cujo defcarnado, erguido braço os viventes jamais algum refpeita : ■.

ú , que matas os Reis tão focegada i

orno as flores, que o prado ameno engeita.

Tu 5 Miniftro fiel, fempre incanfavel :

a lábia, produdora Natureza: >

u , cujo coração impedernido

s clamores das víftimas defpreza.

6o Attende ás anfias , com que vim pizando

eus fepulcra es domínios defabridos:

que eu também te íirvo cuidadoza,

i por hum pouco á minha voz ouvidos.

ói Fu tens-meencommendadoj quedos homens panto poffivel for perturbe as ditas; n fervir-te leal gaílo o alento , ae de novo tu grata em mim exçiía^.

62 Eu fempre vigilante entre os humanos ívoltozas difcordias vou nutrindo : ilfas cavillaçoes: entrigas feras, ue os laços da amizade andab partindo, H Do

^^->!<^;^í^^p^y^^^^^,i:2^/M^^^^^^

Noites JozEFÍN AS

Do velho Pai canfado o frio peito Faço que o filho rafgue furiozo: E a cruel Laodicéia a fua prole Sepultou no teu feio tenebrozo.

D^ Adriano queimei tanto as entranhas.

Que do Danúbio a ponte fum^tuoza ,

Defmantella , arruina unicamente

Por desfalcar do Author a fama idoza.

6s A pezar das virtudes que o ornavao

Sabes delle alcancei, que em trifte choro; Moftrando feu tenaz refentimento, Delle vídlima foíTe Apolodoro.

66 Pacheco, Lopo Vaz, Bing, Albuquerqu

E o forre Belizario cuidadoza

Sacriíicar-te pude; e inda me lembra

Que ufana os aceitaíle mui goftoza.

67 Sabes que por te fer mais agradável,

Illuílrando inda mais os teus ferviços;

Perverti coraçóes ao bem propenfos ,

Os feios corrompi dos Magrijos,

Bej

j;jA&v>jji>^5ak.^gfe&&gaaA j^. jRAm^^*È^

No I TE VI,

68 Bem vês que para entrar por toda aparte, [uaes em Miranda entrarão os Hyfpanos : [il formas largo, e tomo, com que abuzo 'a crédula fraqueza dos humanos.

Por ti de emulação 5 de ardente zelo

a amizade , e carinho as formas vifto :

ntre os froxos de fraca o nome adquiro ,

[anha com que ao depois fegura inviílo, ^

70 De todos eftes trages reveílida

ibes quanto por ti tenho fuado :

uão foberbos troféos poílo por terra j

uão inúteis muralhas levantado.

. ^ 71 Qiiantos milhões de vídlimas fem culpa

os magotes lancei nos teus altares;

om feu fangue inundando a eíleril terra,

om feus últimos ais turvando os ares.

72 Sabes, que em toda a parte , em todo o tempo 's Artes, eSciencias íiz mil damnos; armando dos feus mais fieis alumnos ,

;us mais damnozos , pérfidos Tyrannos.

H ii Em

1

ff """Tirii I

NoitÉS JOZEFIÍTAS

, Em premio pois de quanto obrado tenhi Para dar cumprimento a teus preceitos, Quero me ajudes, tétrica Deidade, A ferir d' um golpe muitos peitos.

74 Em fím não poíTo fupportar, que vivo

O Príncipe dos Luzos mais refpire :

Eu darei por bem pagos meus trabalhos.

Quando o fabio Jozé morrendo expire.

Como da Fúria o rogo por objedlo Entre as ruínas tinha a mais diftiníla: A devorar de Lizia o Rei futuro Das Febres todas manda a mais faminta.

Por teu Endymião em vão fufpiras.. Nós também por Jozé em vão gememos*, Mas que em chorar alivio achamos. Triíle Diana , fem canfar choremos.

77 ^ Choremos noite, e dia pelos montes..

Com lagrimas reguemos noííos prados..

Choremos o maior de quantos m.ales

Sobre eíle globo devem fer chorados.

Pei

^..È^J^^^ê^^-Jt-.-lr^à^

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"^ai^gsxz^l^.

-^^ .

Noite VL 117

Perdemos lium bom Príncipe , Juftiça , nduftria, Sciencias, e Artes , que osEftados abeis enobrecer , dizei fe acazo ode vir maior mal aos povoados.

19

Hum bom Príncipe , ílm de cujo braço

''em os Povos feu bem eftar pendente M

le a perda maior, que fazer pode : H

L deftribuída, culta gente.

80 guando hum Príncipe bom occupa o trono

Ira attençâo a elie as Divindades ^

"udo j)rorperão : liberaes repartem

lom fua alma das fantas qualidades.

81 E quanto os povos vivem convencidos

)os altos bens , que d' um bom Rei fe efperão ,

Dão Augufto, nos teus Luzos vifte /.

^anto com o teu mal efmorecerão.

82

Quanto he noíTo pezar mais generozo ,

^vifta Luíltania, do que o pranto

tue Roma derramou por feu Marcelo ;

ijjie por Thoas verteo também Lepantho. - Seus

xmÊT^^^í^-r-^

Tssss^sm

^5551^55555!

xi8 Noites JozEFr> AS

Seus queixumes . . feus triftes ais queixo2 Forão paga dos bens recebidos , Gemerão por feus Chefes Bem-feitores A feu valor, e zelo agradecidos. 84

Ao Augufto Jozé . . ao Rei futuro

Lizia^evia zelo conftantc.

Hum tão fólido amor, tão bem formado.

Que o invocava feu Atlante.

mortas eíperanças lamentamos.. Mas ellas, juftos Ceos , valiâo tanto;/ . Que defde que ha mortaes entre os dois polo Nenhum mais digno foi de amargo pranto,

86

Ai . .já não poílo mais . . anilas, foluços

5uffócão-me a voz débil na garganta . . q Adeos, choroza Lizia . . adeos , ó Ninfas," Ah,.íde-!vôsv que o Sol fe levanta. <

^ oh j';;ÍnLj;'u.J ú':>vi\ í 0i'5j:!i,in,iji;i ^ii;.q UQmf{VVòh í,;moií sr»

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NOITE VII.

COmo vem hoje a Noite carregada. De tão efpeffa névoa reveftida , Que nem de Syrio penetralla pode L fcintillante luz efclarecida.

Nidliméne brutal , que por feu crime Convertido fe vio em ave negra, jeme no Cedro , em quanto Filomela , -antando da vinganja vil fe alegra :

120 Noites Jozefinas

Mízera condição da humana gente . .- TeftemunJio fatal da variedade.. Prova conftante do chorado abuzo. Que o homem faz da grata liberdade.

De pranto em gotas mi! vertendo as mago Heraclito lamenta noite, e dia; Em tanto o Abderitáno ás gargalhadas Zombava fem ceifar de quanto via.

Dos homens a acanhada intelligencia , Em nada mais fe vé, que na incerteza,;. Com que cegos difcorr^m muitas vezes- Do mefmo objeélo fobre a Natureza.

6

Huns a Juliano dão fumantes piras;

Veftem-Ihe a frente c' o enrofcado loiro; Ornão-lhe a bellicoza, forte dextra Co' cravejado, nobre Sceptro d^oiro.

7 Outros delle formando outras ideias,

O defpem do imperial,, pompozo manto ;

Huns chamáo-lhe infiel , perverfo , duro ,

Outros chamão-lhe jufto^ humano, fanto.

^y^^^-^^^^^f^^^^^^^

.4^4^y4^jE^ia^^m<5^d»ea»iiL'v aaaljê.

N o I T E VII.

8 A geração de Pyrrha vicioza Iin tudo bufca deíiguaes extremos : )u a Jove arrancar intenta os raios , )u ao velho Charonte os duros remos.

121

As pedras do Thezálio organizadas , )ifcordando entre íi dois bandos feguem^t) [uns d'Ephezo fufpirâo com o trifte , ^i )s outros com o Trácio a rir profeguem. '

IO

Do mundo o deftruidor, bárbaro abuzo las Sciençias e Artes bellas o Tyranno, I^- obre a mízera, pobre Humanidade; lomínio o mais cruel , pratica ufano.

II

Os homens são os mefmos , que antes erão :

empre por não parar nos termos dados '^'''■ >o Abuzõ vil, fatal no abyfmo efcuro ao ás tontas cahir precipitados,

12

Todos ao cego Abuzo são propenfos ;

odos fem o cuidar no mundo abuzaoj "^

r depois ao pagar tributo ao erro ,

lom os acazos íímidos fe efcuzão. C

12!^ ^ Noites JozE FINAS

Newton dedicou á efte Numen Seu Paraphrazeado Apocalypfe ; Pelo mefmo furor arrebatado Tofca da Lua, e Sol mede o Eclipfe,

14 Das mais fagradas , importantes luzes

O? homens desleaes abuzao cegos ;

Da Religião o Abuzo em Cufco ,

Fez com fangue fumar leivas, e regos.

15'

Perrault femfc lembrar quanto aos human<

He mais preciza a arte foberana.

Que a dezejada vida prolongando

As vídlimas arranca á Morte infana.

16 : oDe Galeno , e Hyppócrates a Sciencia ,

'Sem ver quanto foi fempre mais precioza,

Que de empinar foberbos obelifcos ,

EíTâ Arte fempre altiva, e caprichoza.

17 Pçrrault atraiçoando a Humanidade ,

Em pbfequio ao feroz, cruento Abuzo,

Abandona deCelfo as defcubertas ,

Por tradu^r Vitrúvio vâo, diíFuzo.

01

MiCTgrar^rí

m^^SSafe^ . JLAILM.

liS^gJAft^^

No I TE VII. 123

iB Oh vós de Mufa dignos fucceíTores!

ós , Miníftros da fabia Natureza !

os, fobre cujos hombros a exiftencia

a humana Geração bufca firmeza.

Certos do curto vão, que hoje medeia,

ntre os limites da esfalcada vida,

da extensão immenfa da Sciencia

>r Efculapio aos homens ofFrecida.

20 Vendo que de cem annos os inftantcs

ao podem fobej ar a quem fe entrega,- ^ Q

3s Théíalos, Menécratos, Dracónios , ^-

' Sciencia, que a moleza faz mais cega. '

21 Da importância por fim do voíTo cargo ,

ippóndo^vos hum pouco hoje advertidos :^-

brigado das queixas innocentes , ^^^-^

3s órfãos que deixaíles defvalidos. '"^*-

Da parte da oíFendida Natureza, P C£;M

da efterilizada Humanidade,

3s rogo não façais malvado abuzo ,

i Scieaciâ q^ue -éftender coiifegue a idade. ■■

.x,^ De

^>:?i^aig^^^^-^i^^^.^^^-^B^.^>^^

Noites JozEFiNAs

De Petrarca deixai os doces cantos ; Nem o pincel d'ApélIes vos diftraia; Prender-vos não coníiga Pergolézo , Nem a voíTa attençao Lizípo attraia.

De quantas fciencias entretém dos home A curta reflexão fempre alienada, Nenhuma deve fer mais feriamente Pelos hábeis humanos eíludada.

De nenhuma o errar he mais fenfivel , Do amante Gabriel arranca aos braços A internecidaEfpoza, e fem tardança Nelle mefmo da vida folta os laços. 26

Bem fei que o Creador firinou limites A^ noíTa duração ; mas he eoherente: Eíle não , mas dos Crátcros a inércia Mata na mocidade a mais da gente. 27

Não queirais por defcuido refponfaveis: Ficar das defventuras laftimozas. Em que Pylades íicâo fem amigos ,

Em que ficão Acróncios fem Efpozas.

Con

^^iSíZ^ltS^j^íã

^jjjA^JWji:^3L.<^h^^íísx0jÈí

Noite

28 Com Lemério , Difcórides , e Albino domai voíTos lúcidos talentos: aftai em converfallos toda a vida, a qual fobejos nao vereis momentos*

Ditoza Arte feliz , Arte Divina ,

ue a vida prolongando os Heroes forma j

s Sciencias enriquece, apura as Artes,

os fuftos em prazeres mil transforma.

Ah nao vos admireis de que zelozo um pouco alémi paíTaíTe da baliza , evoltou-fe em meu íeio a viva mágoa om a vifta d' aquella pedra liza.

^ 31 Debaixo delia eftá ! . . ah chorai olhos ,

[eu trifte peito geme,. geme. .geme

ftão mortos os pulfos deílinados

ara de Lizia manejar o Leme.

Eftá oAugufto Príncipe formado.. h Deofes foberanos ! . ccnfortái-me . ftá Jozé . . fim . , Jozé . Jozé defcanfa , legras filhas do abyfmo a voz foltai-me

^?í

^J^JJ^MJL

N o I T E S J O Z E F I N A S

Eftá . . mortos Efpedros . . da Virtude, Hoje efcudado com a voz fuprema, Mando-vos, que o lilencio interrompendo Cad'um por elle furdamente gema.

34 Se os Deofes a Jozé capaz fízerão ,

De produzir Phenómenos preclaros ,

A favor dos humanos venturozos ,

Que ainda por íieis fe moílrão raros.

Que ,muito d' hum tal Príncipe em memoi Hum Phenómeno outorgue á Natureza, Pelo morto Jozé . . mortos humanos , Soltai a voz ha tantos annos preza»

Aquelles deentrevós, que entre os vivent Ficarão. fendo Pais reproduzidos: Lamentem mais, que os outros os proveito: Que lamentão feus filhos por perdidos.

37 Oh cultores das Sciencias , e Artes bellas

VoíFo exemplar chorai . .chorai faudozos*

A morte d' um mancebo infatigável,

N' ambição. de fazer-vos mais ditozos.

A

>s^l\^tfg==^-^gr:,>^

"^^SB^i^^físaB^^^^s^sai^.

N a I TE VIL

127

A' importante, e fublime arte fobrana e nutrir dos humanos a ventura, Jozé pelos Ceos dedicado, anto nelle a aptidão brilhava pura.

39 Porém nunca abuzou . . prevendo ás claras ,

ue a ignorância dos Reis he a tyranna \

ue nelles á ambição vídlimas dando,

D povo humilde as efperanças dana.

40 ^édo que mais aos Reis que aos outros homens

ecíza fera fempre a immeníidade;

que ella concedida nunca fora

s pobres mãos da pobre Humanidade.

41 Sabendo rnais, queosDeozes providentes,

ira fu PP rirem efta grande falta,

5 Sciencias defde os Ceos nos enviarão,

)m que dos homens o valor fe exalta.

42 Vendo que de reger os outros homens ,

e das Artes a mais difficultoza ;

que das Sciencias a luz ciara

faz nas mãos d' hum Rei fer proveicoza.

De

^>>c^;^g^^^^

^S5^^^5^

I

128 Noites JozEFtKAs

.43 De noite , e dia fempre diligente

Em faber confumia feus alentos :

De fer útil a fome o obrigava

A enriquecer fe.m tregoas feus talentos.

44 Ah ! dos homens ca d' um dentro em fua arí

Tome do noffo Príncipe o exemplo ;

Jozé nunca abuzou, fempre confiante.

na Arte dada aos Reis vos-lo contemp]

,45' . E aílim como Jozé dos mais Auguftos

Na turba le via aíUnalado :

Cad'hum de vós também em jufto premio

Em fua arte virá a fer croado.

46 Meu illuftre Mecenas ! . . que chorozo

Junto a efla lagem fria eftás ouvindo

Os verfos fepulcraes , que entre foluços

Do meu canfado peito vão fahindo :

47 Chorar, e rir da gente humana extremo

São defde que dura conhecidos ;

Porém fe Young , e Hervey nada jfizerão ,

Qiie efpero eu façâo meus mortaes gemidc

í

g.B,^'-\-<Kg=,-^e^^.

Noite

48 Ah fenfivel Humano , nada efpero !

s meus queixozos ais não darão fruto!

econhecido a fer tu me enfinafte,

[eu roílo a Gratidão não quer enxuto.

A calúmnia oíFufcar não pode nunca 5 Virtudes que n' alma recebeíte ; os teus rubros olhos não íe veda anto de Epheftião , pranto deOrefte.

Do alto Carvalho herdaíle claro Henrique confiante eíFeição aos Luíitanos: apego ás Sciencias , ás fecundas Artes refpeito , e amor aôs Soberanos.

Por iíTo em attenção ao facro Trono , iQ com pranto de mai a pia Augufta, m ceifar humedece faudoza , um Filho, que lhe rouba a Sorte injuíla.

Em attenção ao Trono entriftecido ,

á perda, que ninguém melhor conhece,

mentas emjozé morta a efperan ja ,

que o povo fiel mil ais offrece.

^ 1 Eu

^•^JUMJL

£>j

551555

Noites JozEFiNAs

Eu, que defde os primeiros, tenros annc Sou alumno feliz dos teus exemplos ; Eu, que aprendi de ti a amar os homens, E a obedecer á voz, que falie dos Templo

Eu, que gozo a fortuna incomparável De me chamares teu , eu que refpiro Ao teu lado tão junto , que fe choras , Choro y e fe gemes , eu também fufpiro.

Aproveito os inftantes preciozos. Em que poíTa fervir á Humanidade j Convencido por ti, de que os talentos São credores da humana utilidade.

Sei que o tempo , em que geme triíle a gen He de todos o mais proporcionado , Para diflar-lhe máximas íinceras , Que pofsão melhorar feu triíle eílado.

Tuas lagrimas triftes co' as de Lizia ,

Meu triíle coração tanto enlutarão.

Que a minha Muza ha muito adormentada.

Com feus ais dolorozos defpertárao.

D

ir»>ii^/?-r?^g^

àrgrrri

^^^j^j^^^j^^^m^^^^^^^^j.. jl.ui.ljvl>^

Noite

De tua companhia infeparavel , teus feguros paflos vim feguindo, companha de Lizia conílernada

ui ficamos iioíTo mal carpindo.

Mas qual foi noflb pafmo , quando vimos Auguíla Mareia, da gentil Efpoza, [lo ao lado João . . o Rei futuro , feu lí-mão chorando a morte iroza.

6o ^uiz Treze defde o Trono derribado . vio na fepultura, e com mil vivas folio dirigio feu filho os paílos , tando poucas lagrimas efquivas.

6i \. experiência convence a cada inftante , e entre os humanos d' uns as defventuras, ) mais fecundas das doiradas fortes , m que outros fobem d' Ancion ás alturas^

62 í vendo que elles ao julgar-fe erguidos efquecem da defgraça que os levanta, nerózo João . . . teu íeniimento

tão raro entre os homens , que me efpanta* I ii Sim ^

i^^^^^

J

NOITESJOZE FINAS

Sim 5 Rei futuro , peJos Ceos deixado Por columna do Reino Luíitano, No cume erguido do partido monte Te inaugura Mirtylo fopre humano.

64

Da corrompida , humana , trifte prole He próprio fe efquecer do mal alheio; Tu porém invertendo , opp6es-te ao vicio ; A defgraça do Irmão fere o teu feio.

Ah l permittão os Ceos , os Ceos conceda Qiie vejamos em nós verificados Os bens , que pelo teu fublime pranto Por teu Povo fiel são efperados.

Cheio pois, bom Henrique, da amargurs Que infpira dentro d' alma huma defgraça^ Qiie não cinge fomente os luzos Povos, Que a humana prole geralmente abraça.

A minha terna Muza ao ver choroza

Prompta a infpirar-me fepulcraes conceitos

Com que chorar fizeíTe enxutos olhos.

Com que ais tiraffe dos mais duros peitos.

Eni

Z£2^^A

i^^^j^,^

Noite VIL 133

68 Em obzequio leal á Pátria Luza ,

quem devo agazalho, e favor tanto;

ntre os defcarnados efqueletos

enfraquecida voz aos Ceos levanto.

Levanto minha voz . . oh Humanidade . . m attençâo também ao teu defgofto : cn Jozé , com quem te recreavas , inhas benigna Mãi teus olhos pofto.

Tu cheia de prazer á Natureza., avas os parabéns internecida , }r não veres ha muito os loucos homens o enfanguentado chão perder a vida.

71 Hoje porém eu creio eílar-te vendo

Litra vez delgrenhada com teu pranto

5 feridas molhar dos mizeraveis,

lie mata a Guerra , quando a voz levanto.

Colhendo que da paz o bem provinha

)s corações dos Reis humanizados ,

) Príncipe applaudindo as qualidades ,

iierias dar exemplo aos entronados.

Ven-

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134 NOITESJOZEFINAS

Vendo que dos bons Reis unicamente Da humana Geração a paz depende. Em Jozé dar modelo dezejavas . . Mas a morte voraz a nada attende.

74 A nada attende a Parca inalterável..

Dos preceitos fieis da Natureza

Fiel Executora o braço erguendo

Mata fem diftinção Plebe, e Nobreza.

7S Tu de novo foluças , Luíitania ,

Do novo mal ferida co'a lembrança;

E eu trifte de mim também comtigo.

Contra a Parca feroz grito vingança.

76 Mas a luz tranfparente , que bafeja

Sobre o noíTo horizonte o claro dia ,

Diílipando vai da Noite as fombras,

Co' a madrugada vem doce alegria.

Meu triíle coração prende por ora

Os dolorozos ais ; os teus gemidos :

A' noite os foltarás em liberdade

/Entre eíles frios oíTos carcomidos.

NOI-

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NOITE VIII.

FO G E , Sono 5 de mim . bufca os dltozos Que feus Príncipes gozão inda vivos . Foge . . foge de nós , a quem as Fúrias >a defgraça cruel querem cativos.

i> Voando vem a Noite ludluoza,

ledonha, triíle, feia , e carrancuda;

odo o noíTo horizonte ennegrefcendo ,

ini negra cor todas as cores muda*

^

sí3S^!Í^^^iiis2^

^^:^j^Ji.jm

136

NOITESJOZEFINAS

i

Pela fria eftaçao protegida , Muito mais cedo vem aos noíTos prados , Onde a defenfreiar começa o Inverno Os Auftros , que do mar vem enfopados.

4 De efpaço a efpaço das pezadas nuvens

Rafgar^fe vejo os abrazados feios;

E acclararem de forte a névoa efcura ,

Que até fe vem de luz os valles cheios.

Para moftrar-nos , que do Averno he filhz Do Averno traz a Noite hoje os horrores? Eftrondozos trovões retumbao roucos , Soão nas grutas ecos rugidores.

6

Que quadro tao pompozo á Natureza Delineando eftá nos fufcos ares : Gomo bramão os ventos furiozos. Coma as vagas aos ceos lançãq os Mares.

7 Não te aíFuíleSj humilde, pobre humanoj

Quando ouvires o hórrido eftampido

Do trovão eftalar; eíTe teu fuílo

NValgum crime te moílra comprehendido.

Apre-

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Noite VIII. 137

8 Aproveita o teu tempo em faber quanto

íos deixa inveftigar a Natureza:

olheia bem feu volumozo livro,

entrarás dos myílerios na inteireza.

De Franklin obferva as experiências ,

verás , que o eftrondo , que te aíluíla ,

'e hum deíTes phenómenos precizos ,

jppofta da Matéria a força adufta.

10 MufTembroek eftuda, Wals procura...

a Garrafa de Leyden obfervando

vifta da geral força do Eléitro

eu pueril temor fera mais brando.

II

Não dos trovões ruidozos, mas do crime

endo o femblante acautelado treme :

ftuda, e cede ás Leis tua vontade:

iiem tem Virtude , e Sciencia , nada teme.

12 EíFe teu fútil medo nos convence e que inda quando tremes és foberbo : orno tu nas vinganças és ferino,

as vinganças teu Deos julgas acerbo.

Mas

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Noites JozEFiíTAS

Mas olha para ti , e fe acazo O teu cego amor próprio te ennobrece A ponto de julgares com verdade, Qiie o Ceo por punir-te fe embravece.

Homem degenerado . . Ente indomável , Da tua vaidade olha o extremo . . Tal he o precipício em que te lança , Que vendo-te caJiir, também eu tremo.

Frenético emulando a authoridade

Que vês teu Creador goza fem fullo ;

Intentas feus fazer os teus exceíTos j

Por te juftificar chamas-Ihe injuílo.

16 Invejas tanto do feu fer a^ gloria.

Que efquecendo orefpeico, que lhe deves

Sacrílego querendo envilefcello

Tuas paixões lhe dás, quando o defcreves.

17 Se tão franco ao crear-te houvera fido ,

Como com ç\\q es tu fempre , que o pintai

Na efpecie refpiráras dos infeílos ,

Que as forças ao nafcer fentem extinílas.

Ah

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sf&f&USSEiil ^ ."-P>M>»^^. km^^XJL

Noite VIII. 139

18

Ah defprezivel homem , cego , e louco ! ílo teu frenezim arrebatado . . Igas que ao teu Author tanto entimidas, ue de hórridos trovões te bufca armado.

Que conceito farias da formiga ,

quem ouviíTes proferir ufana ;

) por me anniquikrem três Impérios,

oje feguem da guerra a fúria infana?

20 Púnhas-te logo a rir do louco infeílo :

eu me riria então de ti fomente , sndo o mal que medias as diftancias D infeílo a ti 5 de ti ao fummo Ente.

21 Se da tua locura ver quizeres

uão diílantes eílao os dois extremos

camína-te bem.. de barato..

*gue os olhos aos Ceos , e contemplemos.

22 O Omnipotente Ser, aquém ingrato,

crílego difputas a grandeza,

e o Ente eterno , de quem depende

ia as fuás funções a Natureza.

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140 Noites JozEPiNAS

23 A fua mão direita pode tanto ,

Que formando q'^^^ globos fcintillantes ,

Deo-lhes c'um leve aceno movimentos

Com que fempre gyrar hão-de confiantes.

Argos do que elle tinha menos vifta, O futuro, e paíTado prezentes ; Em fim he Deos Omnipotente, Immenfo, A quem devem feu fer todos os Entes.

Mede agora, coitado, as tuas forças , A tua comprehensão olha bem, olha: A formar não te atreves hum mofquito ; A eíTencia ignoras da mais fimples folha. 26

No ver te excede o mais canfado Lince No ouvir o Javali i no tadlo a Aranha; O Bugio no gofto ; e que no olfaélo Te vence, moftra o Cão pela montanha. 27

O incorpado Elefante he mais forçozo. Que hum cento dos antigos athletas ; E na induftria efcurecem mil Philónios As Abelhas , que voão inquietas.

De

SaS^;^;^^

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Noite VIIL I41

28 Do palTado colher podes apenas

pouco, que permitte a curta vida;

como Leibnitz vio , e Fontenélle

é iíTo rouba a idade encanefcida.

A política ver não pôde nada 3 futuro, por mais que a viíla esfregue: >rd Chatan fe acertou , foi hum acazo , )mo os mais , com que cega nos alegue.

De Raméses Miámo o Obelifco

10 concorra a nutrir tua vaidade,

3 vinte mil efe ra vos foi trabalho

odudlo de huma bárbara vontade.

^ 31 As Egypcias Pyrámides fe juílo

uizeres refleélir, nada concorrem

fomentar a tua foberba ,

ambem de durar cansão, também morrem.

De Nino os monflruozos Baluartes:

torre de Babel, que aos Ceos fubiaj

e Semíramis os largos muros *,

ColóíTo, que o Sol ao nafcer via.

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142 N o I TE S J o Z E F IN A S

O Depózito immenfo, em que do Nilo Meris foube encerrar as aguas claras: O Gonfuzo 5 e extenfo labyrintho , Que em Arfinoe croava emprezas raras. .

34 Sao monumentos , que nos poe aos olh

Não dos homens Divina prepotência:.

Osreftos, que durar deixa ainda o Tempo

Moftrão dos pobres homens a demência.

35' O bem maior , que a Natureza

He hum bom coração ; organizado _

Com dócil propensão para a Virtude ,

Do Vicio contra os golpes fempre armado,

Efte em Caio; corrompe, e adultera A alteração moleíla dos humores; Nelle moílra que pode a enfermidade Voltar em máos os corações melhores.

37 Quanto do coração , e da alma o preço

He inftantane.o , é frágil , nos convence

Hoje o Terceiro Jorge , o Rei amado

De fezuda Nação que os mares vence.

Deoí

P:^g=^.g>g^ Viiíe:^-^^

mÊ^Êmi!^^^m^!S!5^fsxsÊ^.

Noite VIII. 143

Deos tem por duração a eternidade, a rua, inda a pezar de fer tão curta,

?-fe fujeita a cinco mil moleftias , quantas yezes hum infeélo a encurta.

39 Bafta huma gota d' agua; a mais pequena

irção deíle alimento teu conforto,

pezar daEpiglóta introduzido

a Trache-Arteria para ver-te morto.

Se os acazos contares infinitos,

rque podes do Erébo ver a filha:

ío frágil acharás da vida o fio,

le terás teu viver por maravilha.

Homem ! tu não es nada , que mereças

mínima attenção, da extenfa terra

im ponto occupas ; para anniquilar-te

íu Author não preciza armar-fe em guerrav^'

42 Qjiero em fim acclarar tua cegueira

)■ as luzes, que derrama a sa Verdade?

huma vez morra . . morra fuíFocada

?ntro em teu corajão tua vaidade.

Lem-

n J

g^^i^S^g^^

qgggg^i^gg

144 Noites Jozefinas

43 Lembrado de que ao mundo mais tori

Aquelle, que huma vez delle fahíra;

E que náo dos mortos , mas dos vivos

A fereza cruel pavor infpira.

44 Deftemido encaminha os largos paíTos

Por efte tribunal incontraftavel :

Tudo o que nelle vês são monumentos.

Que te moílrão quanto és pouco durável.

45- Vem , e logo prendendo os teus fentidoj

Com fezuda attençâo , feria , e madura ;

Deixando as fepulturas , que nos cercão.

Fita os teus olhos neíta fepultura.

46 Aqui fup porta o pczo rigorozo

Defta lavrada pedra endurecida.

Encerrada em efpaço eftreito, e curto,

Sem por lado nenhum achar fahida.

47 A Terra , que ha mui pouco organizada

Formava hum gentil corpo, tão perfeito,

Que dos mais duros corações obtinha

Não provas d' amor, ma? de refpeito^

-^^--'-"'^ i^ir -^w x-crií ' I r-r^rTi "'

i^^^^^^ysá

^^S^Xa^ia^SiS^BBBBSSSi

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Noite VIII. 145-

.48

A vívida matéria , que animava

melhor coração , mais bem formado )

í quantos tem as mãos da Natureza h

í o inílante , em que eu choro aos homés dadoi

49 O ja exangue, pálido cadáver,

quem a melhor alma dava alento:

' viveza, e fciencia alma tão rica,

le era dos efpíritos portento.

Huma alma de potencias tão fublimes, le em memoria aos Cynéias excedia ; >s Germânicos sãos no entendimento ; lis que Luiz doze, ao bem fe dirigia.

[ozé.Jium novo Príncipe creado

;*a fazer feliz o Reino Luzo :

ja vida tão cedo foi cortada ,

le á Parca de cruel chorando accuzo.

Do vaidozo Necáo fofo imperante

raonftruoza, agigantada empreza ,

3Ílra , que quanto mais do mundo á origem ,

ais vigor infpirava a Natureza.

K O

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146 N o í T E SjoZEFINAS

O Novo Heroe , que canto , conhecendc Que nafcêra n'um tempo, em que canfad A terra de foíFrer do arado os cortes Produzia muito violentada.

5-4 Vendo dos diíFerentes alimentos,

Que a fubílancia por muito enfraquecida.

Debilitando o Pliyzico nos homens ,

Lhes tira a força, lhes encurta a vida.

55' Nefte tempo, em que o fucco nutritivo

Por froxo dimínue toda a energia:

Invocava da índuílria o pingue auxilio ,

E a influencia da Economia,

E vendo que hum Rei por íi não A fortuna fazer dos feusEftados: Que preciza tirar todo o proveito, De quantos ao feu grito proílrados.

^ . 57

Da activa Emulação , da Honra , e Brio

Se propunha avivar a extinfla chama;

A fím de desfazer os vãos efpeques ,

Com que edifícios vãos fuftenta a Fama.

De

":iNi

wWfafi

^^^!3Ç55SC5fg:5^Sí

Noite

Defejava animar os feus vaíTalIos quererem por 11 valer no mundo , não á fombra dos trofeos , eefcudos, jjos donos forveo o Erébo fundo.

Seu cuidado, e eíludo nos convence, ue ninguém mais do que elle conhecia iler mais Rafael cora os feus rafgos, je o inerte fucceíTor da Fidalguia.

6o Sabia 5 que a ambição funefta , e louca í não ceder aos annos a vidloria: : deixar entre os homens fucceílivos erna , fempre fólida memoria.

6x Que o dezejo irrizorio , de confiante car depois de morto ainda vivendo, bricar o Guindaíle, a mola aéliva , le as Pyrámides foi aos Ceos erguendo,

62 Cavilozas ideias, de que os tempos fins pouco íinceros pervertêrâa: s Pyrámides durão as reliquias , nomes dos Autores perecerão. K ii

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^y^n^T^rsss^í^

148 Noites Jozefinas

Jozé menos altivo, e mais prudente Não queria paíTar além do ponto. Que marcar-lhe devia o fim da vida : Do Ceo ásdecizdes ninguém mais pronto.

A' vifta daconftancia inalterável. Com que via a Matéria obediente , Seguir da Natureza as Leis eternas , Cedia ás Leis também do Omnipotente.

Ambicionava gaftar o alento Em nutrir dos feus Povos a ventura , Para da Humanidade no aiireo Templo Deixar erguida duração fegura.

Pois fe hum Principe tal obter não pód Nem por fua figura, nem talentos: Nem pelos rogos de feus triftes povos : Da vida dilatados os momentos:

67

Se o Auguílo Jozé obter não pôde

O Decreto dos Deofes revogado ?

Se inda a pezar da mefma Humanidade

Jozé nefte fepuicro eílá fechado :

En

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^^S^3^S!9BS^!fS?5^S3BiS5l-

Noite VIII.

6S

Em que fundas , mortal defvanecido.

Ta aérea grandeza , que levantas ? sfenvolve tua alma., abre eíTes cofres, yamos eíTes bens, com que te encantas.

69

Por mais que acautelado, e cavilozo

odos os teus defeitos efcureças; '

da que em cima de globozos fumos

! tuas perfeiçóes nos ennobreças.

70 Se íiâares os ollios nos femblantes

)s ínclytos, invídlos .Portuguezes ,.

je aos Deofes por feu Pfincipe oíferecem

janto pode formar feus intereíTes :

Ao ver nos mefmos olhos dos meninos igrimas .innocentes burbulhando : ^^er os ternos Pais com ais queixozos feu pezar nos filhos infpirando :

Ao ver toda a Nação ao Ceo pedindo u Príncipe outra vez lhe reftitua : ) veres que não quem fufpirando fereza da Morte não argua:

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mmsam.

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ijo Noites Jozefinas

Ao ver o mefmo Tejo andar varrendo Com as barbas mufgózas, eenfopadasj Na força do pezar as longas praias , Praias co' as noíTas lágrimas banhadas.

As úteis Artes, refpeitaveis Sciencias Defgrenhàdas ao ver faliir aos prados, E coroadas de efpinhozas íilvas , Tornarem outra vez aos povoados :

75' Podes cora taes llnaes bem convencer-te

De não teres hum a alma tão fubida ,

Que poffa ao menos igualar os dotes

Da que deixar-nos quiz por melhor vida.

Porque a maiores coizas o chamava Mais liberal com elle , que comtigo Tinha fido a prudente Natureza , Entregando-lhe bens, que inda não digo.

77 Tu de noite, e de dia ao fer Supremo

Perguntas a razão do quç executa, -

Quando ás eternas Leis obediente

Mudo o golpe foffreo da Parca bruta.

Se

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N ô I T E VIIL

78

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Se o Auguíto Jozé com feus talentos ' foberba dar páreas nunca pode : Dmem defvanecido, o voo fufpende, Fa névoa fatal de ti facode.

79 Se ao Augufto Jozé tantas virtudes

ao puderão livrar da injufta morte,

j que vales do que elle muito menos ,

10 efperes , mortal , mais feliz forte.

80 Enrola as velas deíTe curto barco,

Tl que fulcas o mar das incertezas ;

te porto demanda, lança ferro,

[ui darás valor ao que defprezas.

81 Aqui aprenderás a fer humilde :

1 Morte o roíto fúnebre , fanhúdo

2 o açaimo , que coníegue ás vezes ,

ae Campanélla os Ceos adore mudo,

82 Eíluda nas funéreas , negras folhas

2Íle livro, que trille te aprezento,

obedecer ás Leis , que do Ceo defcem :

amar os homens fem nenhum izento.

Apren-

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No rTEsJoZE FINAS

Aprende a fer feliz quanto o permittem

As fans difpoziçoes da Natureza:

chegar fem trovões a hora , em que o fang

Te congele também mortal frieza.

84 cantão fem pezar as tenras aves ;

fe vão fubtís névoas desfazendo ; fe veftem de luz valles, e montes j vai o claro Sol refplandefcendo. 85- vejo , Mareia Augufta , com o dia

As lágrimas brilharem no teu rofto : Quanto, Mareia fiel, tua conftancia Não concorre a nutrir o meu defgoílo,

86

Santa Religião ! as brancas azas

Defprega fobre nós . . .ah ! tu fomente Podes como dos Ceos filha Divina As mágoas moderar da trifte gente.

Vamos , 6 Luíltania , he dia ,

Solta o teu ludluozo , efcuro manto :

Vamos feguindo as fombras , que fe efconden*

Suípendamos por ora o noíTo pranto.

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NOITE IX.

3 UE pezo o coração me eftá quebrando.. Morto Jozé . . ah ! quantos ais ine cuftas Ah Deofes! quâtas mágoas dão aos homés s voíTas decizoeí, inda que juftas!

Mas agora que os olhos por acazo

rgui aos Ceos, que eftão efclarefcidos .

h meu Príncipe ! . lim . . por tua gloria

bu aos homens fervir inda illudidos.

Quan-

^

i5'4 Noites JozEFiNAs

Quanto abateo a guerra d' onte os ventos Quanto as nuvens ficarão fatigadas, Bem fe no focêgo, com que limpas As eílrellas fcintillão prateadas.

4 Agora ílm, que eílao livres de nuvens

Aos homens dapdo huma lição bem clara

D' harmonia, de paz, de obediência.

Ergue , humano , teus olhos , e repara.

Vês eíTes deziguaes, luzentes globos Que o azul, etéreo campo marchetando Da Noite entre as efpeíTas , negras fombras Em defiguaes alturas vão brilhando.

6

. Nelles tens hum fiel, vivo modelo,

Que a todos nós d' útil exemplo ferve :

EUes moftrando eftão o fácil modo ,

Por que a ordem no mundo fe conferve.

7 EíTes erguidos corpos luminozos ,

De que fempre nos vemos rodeados , Em defiguaes porçòes diftribuidos Arremédão dos homens os ellados.

Huns

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r^^^ l\^tfe==^-^>x>ia^-

^M&^B!^^g^^ak^glfe^^^aBkfeJl^^^

Noite IX. 155'

8

Huns chamão-fe entre nós eftrellas fixas ,

e que os Reis vivas cópias fer deviao ; em própria luz, que liberaes derramão^ mais dos feus tronos fe defviao.

9

Cad' hum deites , que Soes chamar devemos ,

em em torno de fi número certo 'outros aftros efcuros, que ilJuminao huns de longe , a outros de mais perto.

10 D'eílrellas, e Planetas povoado

o immenfo vácuo immeníuravel: íVaíTallos, eReis compôe-fe os Povos, Lie povoão noíTo aftro variável.

II

As luzentes eftrelias defde o centro

3S feus extenfos, fólidos fyítemas, fluindo nos aftros, que asrodeiao, 5 diftancias acclarao mais extremas.

12 Os Planetas em premio da clareza ,

attracçáo que recebem fem mudança,

id^um reconhecido o mais que pode

) feio bem-feitor grato fe lança.

Def-

«^síT]

-'[■S,

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lj6 N O I T E S J O Z E F I N A S

13

Deftas duas recíprocas tendências Tão igual, e confiante he a harmonia. Que produz o focego , a paz ditoza , Qye entre os aftros domina noite, e dia.

Agora vós , humanos , conhecendo Qye não bem , que ao bem da Paz exceda Dos Aftros aprendei fobre efte globo A nutrir entre vós a paz mais leda.

A humana gente , que povoa o mundo

Dividida refpira em feus eftados ,

Em cujos centros, como em feus fyftémas.

Os efcoihidos Reis são adorados.

16 EUes como as eftrelks radiantes

Sobre os povos humildes , que os rodeião

Devem com igual mão derramar fempre

A luz, com que os exemplos alumeião.

17 Os Soes attrahem benignos , carinhozos

Seus aftros , e fobre elles diíFundindo Fértil , vital calor , nova exiftencia Vão fempre nos feus feios produzindo.

Af'

s^^r^!'*.É'^-Jf.^.

Noite

18

Allim os Reis também entre osfeus povos

Induftria fomentando , e a Cultura : evião influir, facilitando s meios do prazer , e da ventura.

Com alguns dos Planetas as eílrellas

epartírão da fua autoridade ;

os Satélites derao-lhe a regência ,

ue exercitão com plácida igualdade.

20 Do mefmo modo os Reis dos apartados

)vos 5 a quem por li dar luz náo podem ;

regência entregar devem á aquelles,

|ue c'o as cegas paixões menos fe engodem.

21 As eftrellas porém com feus Planetas

influencia confervão mais efl:reita ;

lias lhes dão a luz , a aílividade ,

^e diílribue cad' um , tal qual a acceita.

22

Jfto moftra aos bons Reis , que perfuadidos ^ •e que os regentes são os fcus retratos bm tenção de influir fobre elles fempre ,

'evem fempre efcqlher os mais cordato?, ,

Nos

I^n

tjS Noites JozEFiN AS

Nos immenfos efpaços, em que gyrão Sem nunca defcanfar globos luzentes, Nunca rodou da vil difcordia o pomo ; Nunca a intriga efpalliou negras fementes.

E quereis a razão da paz ditoza, Que entre os Aftros conftante fempre habita A' vil 5 torpe ambição não dão ouvidos , em fe coníervar cad'um medita.

Entre as vívidas , lúcidas eftrellas Nunca difputas houve em harmonia : Cada qual com a luz no feu fyftema Derrama com prazer doce alegria, 26

Com feus fete Planetas progreíTivos ,

E com feus dez Satéllites contente ,

E fatisfeita brilha a noíTa eítrella

De vaíTallos não quer número ingente.

.Por fer de Sírio o mundo mais extenio

Nunca Prócion fe vio menos briihaote:

Aldeharán fem mágoas de Canópo '

a Corte maior,, mais fcintillante.

Af-

lúC^faúí

ilg^lJ>^^g^g3iii^l^.;;MfeMLiig^

N o I TE IX. 28

AíTim y 6 Reis , do noílo fértil globo

líFocando a ambição voíTos Eftados,

)dião fer de paz favorecidos ,

e rizonhos prazeres habitados.

29 E vós 5 humanos , que os celeftes Deofes

os dominios dos Reis nafcer fizerão,

litai dos Planetas a candufa,

)m que a paz entre íi guardar fouberão.

Herfchel fua orbita não deixa , )rque Vénus mais perto ao Sol circule, em Marte fe embravece por Mercúrio : ao verão que Saturno á algum emule.

Cada qual gyra manfo , e focegado aquelle trilho , em que o firmou a forte ^ ílizmente allim vão durando fempre vres de que o feu fio a guerra corte.

3^ E fe deftas eftrellas deftinadas -

ra acclarar os aftros apagados ,

guma fe extinguiíTe , feus Planetas

cariâo de toda a luz privados.

Noites Jozefinas

Apagai pois, ó Luzos generozos. Nos femblantes as luzes da alegria: Deixai , que as voffas faces efcureçao As fombras da letal melancolia.

34.

A atraiçoada Morte rigoroza

Apagar confeguio o Aílro luzente , Qiie os Deofes tinhao próvidos creado Para illuftrar o noíTo Continente.

35' De todos os mortaes , que hoje refpirão ,

Certamente nenhum tinha mais lido

Nefte importante livro , cujas folhas

Tenho por bem dos homens revolvido*

36

Jozé Augufto: Principe dos Luzos, Como para reinar fe vio no mundo. De merecer o trono a feliz arte Aprendeo com cuidado o mais profundo*

37 E achou tão importante , e proveitoza

A lição 5 com que' os Ceos ao mundo enfinao

Qiie á fua comprehensão não efçapavão

Elles globos , que os Orbes illuminao.

Co-

ydt^í^Ê^

1^52?^ç?!

!^^^3I5SF

m^sma^m

Noite

Como os Deofes o tinhão produzido ra efpalJiar no mundo luzes belias , a fim de aclarar os obfecados brilhar fe enfaiava co'as eftreilas.

Vio pela reflexão, com que dos Áftros

Iculava os confiantes movimentos ,

le d' attracção , e repulsão provinha

equilíbrio em que girao luculentos.

40 Deitas duas oppoílas, vivas forças

admirável eíFeito conhecendo :

outra tanta igualdade dos feus povos

) cálculo moral apetecendo.

Das íiias ferapre lúcidas ideias

itridas da lição c'o firme eíleio,.

m a combinação clara , e fublime ,

le entre os mais dotes do alto Ceo Uiq veio.

Comprehendeo , que o Amor a par do Ódio do reino moral erao agentes -, le ambos pela razão avaíTailados , ao capazes de reger as gentes.

(^f1

I

162 Noites Jozefinas

43 Refledlio, que o Amor entre os humano

Faz quanto na matéria a AíEnidade,

Que une, aquenta, produz, e corrobora,

E ás moléculas marca identidade:

44 Qiie o Amor leva o homem fempre a tuc

Quanto a fua exiftencia guarda viva :

E que o Ódio o aíFafta da vereda ,

Que á fua duração foíTe nofciva.

Com eftas convicções fortalecido De feu povo em íi vendo os olhos fitos, Vendo-fe produzido para exemplo De alçar virtudes, de proíírar delitos:

46

Defde os feus tenros annosculdadozo Moftrou ceder também ás duas molas. Que no reino moral influem tanto , Que de temprailas traçava efcolas.

47 '- Entre as fuás acções íizudas fempre

O feu amor ao bem refplandecia :

E do feu ódio ao mal qualquer que foíTe,

Também o feio roílo defcubria,

Oi

Viirr

¥:^s.^>^..--v^m^^.^:^t^>,7^^^^

'ãM^A^^^^Sk^4^^^áéJ!.í^^^

N o I T

48

IX.

Os feus puros coílumes bera moílraváo , le íe cites ddus princípios nos humanos energia tiveíTem neceíTaria ra fomentar bens , e evitar danos.

49 Dos Burlamaques, mais dos Pufendorfios

ardára as reflexões menos volume,

da Natureza os sãos direitos

homens zelariao por coítume.

infelizes de nós , que bens tantos Morte nos roubou a crueldade : exemplo, que nos deo em quanto vivo,

)curemos tirar utilidade.

5obre os montes, e valles inda a Noite i liberdade vagaroza gira : ifados olhos meus., chorai fem fufto.. íu 3 meu peito.. íem pavor fufpira,

^erdêmos-te , Jozé . . Príncipe excelfo

5a fem fuílo pérfida Lifonja..

que abforves dos povos a fubílancia,

no o húmido licor abforve a efponja L ii

^^^^^^^^^sm^^^^^^ã^^^^

NOITESJOZEFINAS

Torna a ti dos ataques convulíivos Qye as entranhas cruéis te devoravao , Ao veres que os teus fórdidos Miniítros Indecizos ante elie fe íicavão.

Mais que Jozé ninguém em tal idade O humano coração conheceo nunca : Nem o Sueco affedlado , que do Narva As campinas com RuíTos mortos junca.

Que os homens todos á Ambição tributai O noíTo aíFavel Principe fabia : E que huns no templo a bufcão da memori Outros do Potosí na cava fria.

Conhecia que a hum Rei indifpenfavel O tino he fempre quando faz efcolhá: Para os Odlávios diítinguir dós Jóyces, Quando com attençao para elles olha.

57 ^ ;

Depois de íindo eíle importante eftudo,

E os homens conhecer pelos femblantes :

Depois de neíle livro , quaíi immenfo

Ter feito as reflexões mais importantes.

váTirri

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^s^s^^pms^^s^^sgs^^ssmim.

Noite

O Caftigo, e o Premio o convencerão ) alto poder, que nos humanos rinhão : le os Hélvios efperanças arraftavao, os Duríngs com penas fe condnhão.

A.chou que de pagar nobres exceíTos o contenta a mefma arte os homens todos: ie diíFerindo fempre nas ideias premialos ha diverfos modos.

6o

3'LongaErpada, de AíFonfo Henrique

por pago com os sãos louvores :

Heliodóro dos Cofres chapeados

pira aos lúcidos favores.

6i Da Zenóbia do Norte , da Heroina ,

e dos antigos Scytas valerozos ,

robuítos , adivos defcendentes

je buíca fazer povos ditozos :

Dos felizes eíFeitos , que produzem s gentes, que Rourík tyrannizára; que Pedro por íim depois de fabio fua alma iiluílrou com a luz clara.

ai

Noites Joze finas

Da Varonil Mulher . . de Catharina . . A's mãos , e ao roílo conheceo deviao ; Armas , Artes , Seiencias , e Commercio , Os altares , que em RúíTia íe lhe erguião.

também noíTo Príncipe avizado Gom eílas reílexóes , bem convencido Dos meios todos , que domina o trono , Prudente defejou tirar partido.

A' maneira do Sol, que com feus raios

Nos entes produzidos vidaaugmenta,

Que os páíTaros canoros defpertando

Da Noite as negras aves aíFugenta.

66 Do rofto os attradlivos judiciozo ,

E cordato de forte moderava,

Que os culpados co' os olhos reprehendia,

E os juílos com forrizos premiava,

67

AíTim o noíTo Príncipe tinha Nas feições de feu roílo tal concerto , Tão juíla economia entre os agrados , E o ar de gravidade real, aberto.

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=^-^g^>.^te^-^

.Noite IX.

68

Que dirigido de ler nos homens

la facilidade extraordinária :

nhor das propensões, que acad^um delles

ida a organização , que os rege varia.

69

Do femblante cMium leve movimento

os tímidos valor introduzia ,

3 defefperados animava ,

as efperanças de cad'um nutria.

Dos agrados d' hum Rei fabia tanto,

uanta foi , e íerá a força fempre :

)nhecia também não haver peito ,

ue com favores hum bom Rei não tempere.

71 Com feus ternos aíFagos carinhozos ,

3 feu bom coração annunciadores,

íz-fe tanto adorar entre os feus povos ,

ue ao feu fepulcro vem foltar clamores.

Enviados por elle erão capazes e obrarem mais por mar do que Néarco: e fe exporem a mais que Públio Décio, e praticarem mais do que eu abarco

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|68 Noites JozEFiN AS

73 Além do fácil , importante modo

De animar os feníiveis com aífagos ,

Fraze com que os bons Reis podem mil vez(

Felizmente evitar cruéis eílragos.

74 Sabendo fer maior em toda a parte

O número dos ânimos raíteiros,

Qiie afpirão mais á Prata, do que ás glorias

Mais ao Oiro , que aos bronzes verdadeiro:

Inda que a condição deites mais baxa. Era por elle aííás bem conhecida.* A poíTivei, maior utilidade Ambicionava delles extrahida.

Sempre de cada qual fabio eftudando O modo de penfar contemplava \ Em dos génios tirar utilidades , Alíim a reger homens fe enfaiava.

,.77 Efta {kx\ç. de ideias attendiveis

Com feus íinos-anneis encadeadas,

O forão conduzindo ao vafto Império,

Oiide o Oiro didta aos homens leis doiradas

He

TiÈÊÍ^armÈ^

■fe^^^ij^^g^y^^^gjaibg^k^^è^^

.Noite IX,

78

He fubterraneo , e fundo o Templo cfcuro ,

Im que de torpes , vis ambiciozos e compõe a cohórte defprezivel •os Miniílros do Oiro fequiozos.

Com medo de perder leu trono antigo

L itiais da terra larga o vaíto feio :

o nafcimento feu no frio leito

egeo mundo, fingindo eftar alheio.

'80 De todos quantos Reis no mundo imperao

miíTarios recebe de contino :

m muitas mil porções diítribuido

ai dominallos com rigor ferino.

81 As porções 5 que de íl aos Reis envia

's feus agentes são mais cavilozos ,

iie Tifaphérno, Aráfpe , Ariaméno

as fuás commifsóes aftuciozos.

Dos Reis apenas á prezença chegão , om o pezo fe moílrao debruçados [as em breves inítantes muda a forte, ifsâo nos tronos logo a fer croados.

S-^jg^^^^J^^^í^^^^^

li^íTi

i

170 NOITESJOZEFINAS

Com o jfeu refplandor tanto os Reis cegão Que o filho Priifias vil lhes facrifica , Antípatros a Mãi, o Pai Phráates , Philopátor a Efpofa, e irmã dedica.

E para os convencer da aíFeiçao terna , Que aotyranno do mundo guardâo cegos. Os alumnos de Marte póe no campo , Lizandro lhe refgata os mefmos Gregos.

Em facrificio ao Giro arrebatados Dos Deofes defpojar vão os altares Nabucodónozor , Cambízes 5 Pháylio; Co' roubo fe enchem de terror os mares. 86

Attentado não ha . . vil , feio crime , Que por meio dos Dóricos doirados. Em honra do metal que o mundo rege Se não tenhão vifto entronizados.

Ao virtuozo , puro Philopémen Com oiro corromper bufcou Sparta: E Dário confegue que Udiafte , Com o fangue da amigo a ambição farta.

Ju-

^SááS^is^SíZ^

àráffrTr^^aBw^

>.^j>jiij>^^jy^^5a^<4mr^^

Noite

88

IX.

Jugurta deílemido com o oiro )s chefes perverteo da altiva Roma, ) pérfidos depois comprao a Boco )* feu genro infeliz com menor foma,

89

Do oiro á infaciavel fede quantas

lidades forão facrifícadas ,

Ltila por oiro o Tibre aíTufta ;

yla as gregas muralhas proftradas.

90 Do ardente feio de encarnadas ehammas

or entre erguido fumo efpeífo, efeuro

!m faifcas desfeita a antiga Sardes

l's nuvens fóbe fem valer-lhe o muro.

91

Com fangue humano o Oiro as ondas cora

L^vifta da aíTuftada Salamina ,

^anto, queaefpuma, que guarnece as vagas ,

í fahe vermelha , quando o mar fe inclina.

92 Xerxes por oiro vai dos Jónios mares

.afgar os hombros com dez centas quilhas ,

1 faz com três milhões de armados Perías

)e Achelo-o fugir as lindas filhas.

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jjjlJÊjm^.t^^.^^

ijz Noite sJozEFiNAs

93

Não he fomente não dos Imperantes

De quem recebe o Oiro facriíicios: Os Pródicos também fabem ás vezes Seus direitos munir, fer-ihe propicios.

94

Timágoro venal na illuftre Arhenas ,

De que a virtude pura coniifte , No são deíintereíTe teve exemplos; Mas de Artaxerxe ao oiro não reíiíle.

De Sóphocles os filhos vis, ingratos O Pai facri ficar bufcão ao Oiro : Ceráuno o Bemfeitor; Scáuro á Pátria ; Táurion o amigo com brutal defdoiro.

A opinião fatal , que os homens liga,

He quem lhe guarda o preço inteiro. Tanto, que o ferro Lacedemonia Lhe antepóz, fendo muito mais raíleiro,

97 Mas a pezar das raras qualidades ,

Com que o mefmo Eftrabao o Oiro exalta :

A pezar da voraz, acre ferrugem.

Nunca poder no Oiro induzir falta.

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OÉS^^

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^S!^^^ai^^5^SRS^r!?SSBI!535SSgS^

A' eterna duração, inda que altivo, sempre intafla defcobre a áurea frente: )o áccido nitrozo na agua forte ) eíFeito inda que em íi mais confente.

,99

Amda que dos géneros preciozos ,

iue formou defvelada a Natureza , >eja o loiro metal o mais perfeito, ) bufcado com mais crua avareza.

lOO

Tanto que o mizeravel Píthio avaro 'or amor do feu oiro não dormia: í Perugíno fem feu oiro ao lado á mais de hum íitio ao outro fe movia.

lOI

Inda que de Pydna á áurea caverna 'agar-lhe forao annual tributo Ls pérolas, que o Sol ao nafcer cria; i do Búcino antigo o rubro fruto.

I02

Com os cinco metaes feus inferiores ,

nda que a Prata o faça feu Sobrano;

L adoração fervil da pedra limpa

iue Rúllia guarda ^ inda que aceite ufano.

Fof^

. ' .-e^n^.

1-^ JLZi.jiP.^ik -^ji^^r

Noites Joze finas

103 Pofto que do áureo Sol vendo-fe fílho

Seu áureo Sceptro fobre o mundo eftenda :

Inda que aos Reis da terra , ao Rei d' Olympc

VaíTallos defraudar cego pertenda :

104 Aííim como dos Lízias , dos Libanios ,

Dos Mdmios , Scypioes , dos Ariílídos

Adorações mais lhe confeguírão

Seus Miniílros por vis aborrecidos:

105-^ Aílim como vencer não pode nunca

Do áccido marino a força aíliva ,

Affim do meu gentil Principe amado

A grande alma encontrou aveíTa, efquiva.

T06 A Hidra , o Javali / o Leão fero

Não venceo mais robuíto Alcides forte,

Que o Principe Jozé venceo do Oiro

A intrigante, fagaz , bruta cohorte.

107 Perfuadido que dos quatro Impérios

Ouvida a hiftoria 5 unicamente o Oiro

Fora como do luxo Pai corrupto

Quem os Sceptros quebrou , murchara o loiro.

A'

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175'

Noite IX.

io8 A' vifta do horrorozo quadro , aonde

)s excelTos do Oiro com pranto lais vivoá do que a forte de Ephigenia )om o brando pincel expoz Timanto. 109 Vendo do mundo todo , em todo o clima la Natureza Mãi rotos os laços; endo do pejo , e honra , da decência .s miúdas cadeias em pedaços.

110 A fím de libertar feu povo amado >e tão péíTima , e dura tyrannia, .eduzir confeguio o invifto monftro .0 poder, que a Razão nelle infundia.

iir como ao virtuozo fabio Gélias . influencia do Oiro avaíTallava : ó para refgatar das mãos do Fado Lquelles , que a defgraça fubjugava,

T12 Com o exemplo deAugufto, conhecendo )ue fem homens não ha ditozo eílado, h educação feliz de homens perfeitos ) oiroj que era feu, tinha empregado.

Em

176 Noites JozEFiNAs

113 , .

Em attenção ás Artes , e ás Sciencias ,

Se acazo algum mancebo defcubria Capaz de fer Euménio , Théfpis , Xanto, Timócraro , ou Siláiiio , o protegia.

114

Co' Oiro a emulação nutria entre elles

Como fecunda Mãi , a quem as Artes

De Píndaro deviâo as eítrofes,

De PJiarrázio os trofeos, iuz deDefcartes.

Em ferrolhar o Oiro entre os limites

Da utilidade pública eftudava,

Para tello por fim domado , e manfo ,

Quando chegaíTe a fer o que efperava»

116 Do Oiro tinha tanto calculado

O dominio geral , que fe propunha

Com elle a praticar ditozos planos ,

Que com altas ideias compunha»

117 De Hypéridas no vil procedimento

Vio os damnos da fórdida avareza ,

EaíTentou em que hum Rei jamais he dign(

Se em prémios repartir não tem grandeza, (

Em

VíTtirr

^afS?'^.^-lgTgrgrff-?aFf^

1^

No I T E

it8

Em paga de tão fólida conílancia

)nlieceo fer depófito o tezoiro ,

ide como no mar a agua Te ajunta

IS eftados fe vai juntar o Oiro.

119 ^ E que alíim como a fabia Natureza

aguas de tal forte economiza,

le depois de regar valles , em^ontes,

mares outra vez grata indemniza:

120 liílim hum fabio Rei fe quer fecundos,

ditozos fazer feus pátrios Lares ,

0 franco deve abi4r os feus tezoiros ,

mo francos feu feio abrem os mares.

121 Fazendo circular aífim feu fangue

1 Eílado os membros BemFeitor anima 5

depois de bem fortalecidos,

ato cad'um* tâmbem o reanima.

122 Deíla circulação do Oiro lavrado

lanto he preciza a economia ,

prodigalidade nos eíFeitos

'm madura attenção prudente via

M

^*^^C«^^^

Noites Joze finas

Via que dos Erários a fubftancia

Devia nutrir utilidades,

E não projedos vãos, aéreos planos,

Deoícados a vans identidades.

124 Por fira tinha Jozé prudente , e fabia

Sujeitado á razão do Oiro o uzo :

Tinha podido fubjugar o monftro,

Que tantos males fez eom feu abuzo.

125- A' gloria caminhava, quando a Morte

O punhal lhe cravou , . . ah triíles gentes \

A^oíTos roílos feri .. mandai aos Deofes ,

Por ver fe os abrandais , vozes doentes.

T2Ó

Morreo o Bemfeitor . . tão exceiTivo, Qiie pode mais vencer, fendo mancebo. Do que Mínos vencera , quando velho Foi as fombras reger do fundo Erébo.

AhLizia! trifte Lizia..já não vive.. Vamo-nos abraçar co' a pedra fria.. Vamos cliorar fobre ella 5 em quanto os prad Encher de nova luz o novo dia.

NOl

^:^,g>^^iN.iM«;=>..:arú^

^^sãà^é^^J^jm^i^y^àkiaÊ^

O Sol terminou mais eíle dia , quem fegue de perto Noite efcura: ia reproducção de luz, e trevas, [oílra de tudo o fim , a pouca dura. M ii

NOITE X.

r TAmos, coração meu. . vamos gemendo \ Ver convertido em mar o noíTo Tejo :

Eton, e Flégon desfalecidos obre as ondas pouzar feu carro vejo.

Ji-JLUJIMLA

i8o Noites JozEFiN As

D^Auítral Zona gelada os moradores. Que de Argos vem os olhos fcintillantes, Preparão-fe a gozar hum longo dia Coroado de lúcidos inftantes.

4 Não vos cegueis porém do Auftro, ó viventes

Não vos cegueis do tempo co' a mudança.

Olhai, que ha-de roubar-vos Velocino

As luzes , que vos deo hoje a Balança.

5 Também rizonha a forte aos noíTos campo

Tinha hum Príncipe dado, em cujo rofto

Brincando mil nutridas efperanças

No feio do prazer nos tinhao poílo.

6

Mas a Morte feroz . « a Morte avara

Matando-o fuíFocou noíTa alegria . . Poz-fe o Sol 5 que alegrava os noíTos campos Fugio de nós o mais fereno dia,

7 Hoje choramos mais amargamente ,

Que do Septentrião as frias gentes :

Aílim he que os enluta a efcura Noite j

Mas efperão gozar dias luzentes.

Nós

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22ãâ^

iÊTiardíTSà

^^^^í^a^5^^aSiS!5

Noite X.

Nós porém . . de Jozé . .já renafcidas , ao veremos mais as efperanças . . horai . . Luzos fieis . . foltai gemidos aftas donzellas arrancai as tranças.

Em todas effas terras , que encruzados brangem ao redor os dois Coluro' ; 'incipe mais chorado inda nao virão , iffados annos 5 nem verão futuros.. IP

Mas . . ai . . Pátria adorada . . ah Luíitania ,

jpponho ha pouco tempo aqui chegafte ;

'ranfportou-me o pezar, como provarão

,s vozes 5 que admirada inda efcutafte.

II Sim . . o pezar em mim produz eíFeitos ,

kie nunca produzio paixão alguma :

)ra me eleva aos deíiguaes Cometas ,

)ra me abate d'Aquerónte á efcuma.

12

Qiie autómato infeliz não he o homem )e mil contradicçôes raro compofto : •ando os feus intereíTes por quimeras ,

arece que a fi mefmo nafce oppofto.

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282 NOITESJOZEFINAS

Vario por natureza , por capricho , Por froxa educação , por vil coílume : Nunca eílá fatisfeito ; fempre geme , Envolto de mil fuílos no negrume.

Se fe de Sultão alçado á gloria , Qual Carlos deixa o trono aborrecido.. Se desfruta ignorado a liberdade, Qual Xiib buíca ver-fe aos Ceos erguido.

15'

Se paiTeia do Ménalo nos boíques ,

Pelos jardins fufpira de Corcyro . . Se de Páphos fe entre as rozeiras , Lembrão-lhe os cardos da dezerta Scyro.

16

Da fenil Cerazónta inadvertido Deixa as rubras cerejas faborozas ; Pelas bolotas, que no Epyro engordâo Da Arcádia as feras, rífpidas, cerdozas.

.17 Fecundo Pai de eftéreis, vãos dezejos ,

Que de Saturno co'a brutal fereza

Elle mefmo devora, raras vezes

Se encoíla do feu bem fobre a certeza.

Trás

N o I T E X.

Trás d'huma gloria arrebatado, 2go fe lança aos enublados ares : za fem precizão ardentes Líbyas , )r capricho fe lança aos bravos mares

Feliz confervação, doce focego

[o os bens de que o homem mais preciza ;

)rém dejano, e d'Efculápio os Templos

ío os que louco menos vezes piza.

20 De íi mefmo inimigo ás paixões cegas

irga feu corpo , e alma inteiramente ;

ia ruina defde logo forjao,

'udido porém nella confente.

21 Quanta razão não temos de gritarmos

os humanos morraes contra a loucura ?

uão caro nos fahio o fiitil cazo ,

ue o homem faz da Sciencia a mais madura !

Mil vezes vendo a fabia Natureza defgarrado homem efquecido , o que mais o intereíía , de li mefmo ira as fúteis quimíras diítrahido ;

1S4 Noites JozE FINAS

Vendo 5 que quando devia attento , Confultalla fiel contra os feus males; Aproveitando os bens , que lhe oíFerece Nos verdes prados, nos fomb rios vales:

Vendo , que em confequencia do defcuidc Morre antes de chegar feu termo dado, Delle compadecida lhe prezenta Hypócrates , que excitem feu cuidado.

Mas elle que em errar tem firmeza , Aproveita o favor fubindo aos montes: Sobre elle Tiko-Bráhe perde o feu tempo Em os pálios contar dos quatro Ethontes. 26

Errou Ptoleméo ; mas logo veio

Da Prúííia, quem mais fabio o erro emenda; Copérnico rafgou em fim de todo Da ignorância fatal mais efta venda.

Em fim fabemos, que nos leva a Terra Em torno do, abrazado Sol brilhante : Elíptico fezKepler noíTo rumo,

Nev^^thon delle nos deo prova baílante.

'&r-iX%í!==-r'^

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N o I T É Xv 185

28

vemos fem receio o vagározo Aftro 5 que a cauda ante o íeu Sol defdobra: E o ígneo Meteoro, que da Noite Corre entre as fombras qual aceza cobra.

Os ângulos reflexos , e incidentes Da Luz tem íido tanto combinados , Que o Teleícópio achou mais hum Planeta Nos efpaços talvez nunca fonhados.

Accrefcentando a pequenhez eílranha O Microfcópio fez conhecidos. Os Mites agora imperceptíveis Por falta de Drobéles inftruidos.

.31 Em leves tafetás reprezado '.r.

O gaz ás nuvens levantando a gente,

Vereííca de Dédalo os defejos, ' ./:

E a aíldcia de Simão deixa patente.

Alegre triunfou o homem foberbo..

trilha os ventos j fobre os foltos ares

firma o feu docel : achando eítreitos

Sua louca ambição os longos mares.

No-

^22^

l86 NOITESJOZEFINAS

Novas combinações, e as infinitas Mil modificações , qu' a ágil Matéria Sem nunca defcançar ata, e defata , Mais varia , que entre as flores foi Gliceria.

34 Para eterno efplendor da Itália toda

Maféi o fabio deícubrio ás gentes ,

Hum Plienómeno elédrico ignorado ,

Os inílammados raios afcendentes.

O Abbade Chape, laureado Membro Deíía Congregação de homens preclaros : DeíTa illuílre Academia Parifienfe, Fecunda Mai de Heroes- nas Sciencias raros.

3^

O Abbade Chape, que nos deo Caíino

Por mais recommendar os condutores ; Elédrica também nos moítra aterra. Lançando ás nuvens raios deílruldores.

37 Repartidos fe vem nos três Reinos

Os trages , que a Matéria larga , e toma :

N'um exifte quanto he informe, e rude ,

Nos dois quanto vegeta , e ideias foraa.

Da

rsa^^v-;^ic^iirgfíriafT,^

Noite X. 38

187

Da retalhada terra nas entranhas »de a ambição abrir tão funda mina, ue do afFeílado luxo os vis altares matiza também a alva Platina.

O áureo filho do Sol , o áureo topázio , azul zafíra, a efmeralda verde, je produz vagaroza a Natureza Química em formar não fe perde.

O célebre Adanfón expondo ás claras )s vegetaes a geração pafmoza : íclarando uniféxas as Palmeiras , srmaphrodíta a Túlipa, e a Roza.

41 nos defcobre mais efte fegredo

)s muitos , que em feu feio inda encubria

í fingidos abfurdos entre as fombras

engenhoza, fagaz Mythología.

4^ fabcmos , que Dáphne no momento,

a que os defpidos pés fentio desfeitos

n torcidas raizes , e os dois braços

fozos ramos de loireiro feitos :

Que

i88 Noites Jozefinas

43 Que dePyramo, eTysbe o quente fangue ,

Quando da fua cor deo ás Amoras :

Jacinto 3 e Lotho , Dríope , e Narcizo

Ás forças confervárao produéloras.

44 Juíio das Plantas indagando o reino :

Bérgraan fuando na fornalha aceza :

E Mónro co' ícalpelo enriquecerão

A arte de guardar a vida illeza.

4S As bellas' Artes , Artes carinhozas ,

Que são das Sciencias juvenil ornato ,

Também do noíTo féculo doirado

Embelecem o lúcido retrato.

46

Garção, e Kléiílj Metaftázio , e Pope Com tantos frutos , e viçozas flores Das nove Irmans ornarão as grinaldas , Que fe efquecem de anciãos Cantores.

. . 47 Aiden, eNicolai, Rameau, e Soiza

A arte de abrandar os troncos duros

Tanto exaltarão , que também abrandao

Feras, e penhas, bronzeados. muros,.

Da

"^^^^-^-^ -^'^^^"^''-^^irí

S5IC^r^5^S!5^Sr?S

N o I T E X.

Da creadora , fabia Natureza ^s gentis producçóes tão variadas Em cores, geitos , formas, caradleres , Dom que todas fe moítrao decoradas.

Da inimitável Natureza n'Arte5 Que os rafgos com pincéis ao vivo imita , Diílinguírãc-fe Smit , Arlaud , Vieira , krros, e os mais que a noíTa Hiftoria cita.

EíTe fecundo Pai das incertezas 3 Acazo Padroeiro dos humanos , nda , que ás cegas fobre os entes lança Muitas vezes cruel , fúbitos danos :

Por mãos de Finiguerra na Tofcana \.os homens deo a liberal Gravura ; \rte, com que os buris em cobre lizo ds rafgos multiplicão da Pintura.

Nefta Arte delicada, e portentoza Pem eternos louvores merecido , 3ovarlé , e Edelinck , Audran , Carmona 5Ílva, eFrois nofla Croa hão guarnecido.

Nef-

ipo Noites Jozefinas

Si NeíTa de Policléto arte divina,

Que de mármore , e bronze alçando vultos

Obteve para Lízipo, e Machado

Seus alumnos fieis eternos cultos.

5'4 Nefla arte que o íincel ou move aftuta

Tanto, que anima a pedra, fe fabrica;

Ou lança em receptáculos cavados

Metal fundido , que ao depois íe explica.

DeLuizQiiatorze Girardón co'a eílatua, E do fabio Jozé , Jozé Primeiro O ColoíTo tirando d' hum fójaílo, Noílb Coíla aturdio o mundo inteiro.

56

De São Sulpício os alicerces fundos :

São Paulo em Londres templo mageftozo : De Mafra o edifício , e de Lisboa O aquedufto magnífico , e pompozo.

$7 Efta efpaçoza praça deleitavel ,

A quem deo liberal Commercio o nome:

A quem paga tributo o Indo, o Ganges,

Temendo, que outra vez o Luzo os dome.

To-

w^ít^

wwr(\<^^SÊ^

■^SMMí^^9kL.^^^^..és^lJÍ^M^^

N o I T

53

X,

Toda eíla Cidade , que das cinzas Qiial outra Fénis renafceo mais linda, Erguida por hum Rei , por hum Miniftro , Que a ter mais tempo a ennobrecêra ainda.

S9

Os outros fumptuozos edifícios,

Que eíle íéculo deo ás Catharinas ,

Aos Carlos , Jorges , Frederícos , Luizes ,

E aos fenhores das cinco Luzas Quinas.

EíTa arte, que até os Ceos torres levanta, Quando á foberba caprichoza ferve : Neíle féculo obteve monumentos, Que Saturno voraz jura conferve,

6i Os novos Reis porém mais prudentes Em lugar de Pyrámides erguidas. De ObeliTcos inúteis, curvos arcos, De circos , de muralhas defmedidas.

62 Em lugar de nutrir de feus vaíTallos

Zo^ importante íuor fofa vaidade , ^brem fundos canaes, eftradas novas, E alicerces, que dáo á utilidade.

Da

Noites Jozefinas

Da Natureza o proceder confiante Nos feus princípios fempre invariáveis : E a coheréncia , com que ella da Matéria Os elementos volve inalteráveis.

Por eíFeito da fólida certeza , Com que nas fuás leis íempre con fen te : Em louvor da immutavel coníiftencia , Cora que nunca a íi mefma fe defmente.

A Águia de Alexandre; do grão Numa

A Ninfa. ; de Sertório a Corça amada ;

E do falfo Mafoma a Pomba terna

Talvez foíTe entre nós hoje apupada»

66 Os pobres, perfeguidos moradores

DelTa a mais infeliz das novas Ilhas ;

Da rica São Domingos, que medroza á

A verde frente inda ergue entre as Antilhas!:

Os povos por Colombo intimidados

Com o rofto da Lua efcurecido ,

Da fua defculpavel ignorância

Tirar não deixariao partido. .

In-

af»?v-;^iCTiariírrtr»ãí^;

:^SM^^^^^Sk^l^^^^..és>.:SJ^^

Noite X.

68

Inda que hoje eclipfado o Sol fuglíTe omanzóf, e o Vizír não tremerião : 3rao Alyates Lydio, eCiaxáres, ue armados vendo tal efmorecião.

Becaría , Brifót , e de São Pedro Abbade dos humanos Proteélores ; campo deítemidos fahirao ,

)s homens arroftar os deítruidores.

Os Chefes da Nação, á cujas proas não querem oppôr com medo as vagas ^ XQ amontoas cruel Sul , quando irado í Jove o trono co' a verde onda alagas.

Os Brltanos Catões compadecidos favor dos humanos mais efcuros : bufcão fem temor defpedaçar-lhes L vil efcravidão os ferros duros.

O habitador dos montes abrazados , le a ígnea Zona com feu fogo tofta : mto que fatigado o turvo Zairo ) quente Congo no areal fe encoíla*

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WÊtÊmm

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l

194 NOITESJOZEFINAS

O inculto Orang-Outano agora Pela altiva Soberba defpedido, Da claíTe dos humanos reclamado por Lineo fe ao bem perdido.

74 As Górgonas medonhas , os Centauros :

Horrorozos Pitões também fingidos :

E os mais efpeílros , com que os feus direit<

A Ignorância alcançou ver protegidos.

,. 75' De Bodíno as ideias monílruozas ,

Qiie o Reino da Impoílura alçarão tanto ,

Nem aos que ainda entre as faxas balbuciâc

Miniftrar podem convulfo eípanto.

76

De Laudun as manhozas vizionarias Nem Leonor Gangé com os íeus fonhos \ A pública attenção confeguiriao , Não foão nos templos ais medonhos.

77 Còncíno o infeliz , nem Grandiéro

Não fe verião facrificados

De abfurdos feminis aos deívarios

Tão fataes neíTes féculos paíTados.

:^ Theo-

^raf^V- .^ItfríaríCTrrrtarf^

"^^ss^^^^a^s^s^gss^ÊS&ss^^

Noite X.

Theophraftos , Catões ,- os Epiéletos oje tem na Moral atrás deixado, í Philofofos sãos noíTos coevos , je tem á Humanidade trono alçado.

79 O tempo gaílador tem finalmente

ífpedaçado os vis, os ferros duros,

>m que a torpe Ignorância aferrolhava

triíle humano em feus covis efcuros.

8o O bárbaro , cruel , pérfido Engano rga o fceptro de ferro violento: s Preoccupaçoes acompanhado i no Averno occupar negro apozento.

8i Da Santa Paz feguindo o áureo trilho

Sciencia a nós chegou a luz preclara : fUpou da Ignorância a fombra efpeíTa mo as névoas do Sol a face clara.

82 3 pobre Humano, que gemia atado fatáes iíluzoes ao duro cepo, quaíi foíto lança fogo ao tronco , as vergontas por feu bem decepo.

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A^.

1^6 NOITESJOZEFINAS

Em fim chegando vai o feliz tempa De refpirar a Illuftre Humanidade : Os Deofes queirão cure bem as chagas. Que da opprefsão lhe abrio a crueldade.

Os homens felizmente cordatos O mal, porque he mal, de íi alheião : Defabuzados a Deos temem , E os Reis 5 que em nome delle as Leis eíleia

Da Moral nos recônditos arcanos Os homens da razão favorecidos , Mil preoccupaçoes tem debellado, E abuzos, que as Sphinges mais temidos.

86

BouíFón, e d'Upfal o avizado Meftre

A Química , e Botânica iiluftrando Da Natureza acharão nos tezoiros Riquezas , com que os Halers vão brilhand

A Fama grita parabéns aos Deofes , Os homens fuppae illuminados ; Cegos co' a falfa luz, os Lapónios

A ignorância lamentão dos paíTados.

Ne

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^^mÊrlÊTí^fT^ÊBv^

^^^n^g^^msg^Sí^ssst-

197

Noite X.

88 No vafto, erguido Templo de Saturno , ide em fundos fepulcros cavernozos, ! féculos 5 que pafsão vão ficando, i Morte entre os horrores pavorozos.

89

Onde os mortos inítantes , mortas horas ,

ide os mortos cadáveres dos annos ,

ti fubterraneos âmbitos efcuros

rticipão da forte dos humanos.

90 Diz a Fama . . . que as Artes , e as Sciencias

im túmulo foberbo tem formado ,

ra eterna fazer a gloria illuílre ,

le tem o noíTo féculo croado.

Embora o Mauzoleo aos Ceos fe eleve 5nio os feus rivaes embora dome; mto , que no Templo da Memoria leal Arthemiza rifque o nome.

^2^Si

Bem fei o eondecoráo mais os buftos

IS dois Jozés , do grande Frederico :

Carvalho , de Pitt , Kaunitz , Vergennes ,

muitos outros , cora que o julgo rico.

Con-

Noites Jozefinas

93

ConfeíFo que ha de fer para o futuro

Dos féculos o mais ennobrecido;

A's Artes bellas , as profundas Sciencias

Poz degráos , com que ao fummo as tem fubidi

94 Entre osfeus fetecentos mil volumes,

Que Brdchion não guardava concedamos

Tão sãos conhecimentos 5 como aquelles,

A cuja luz em íim refpiramos.

95' Porém o noíTo Príncipe adorável..

Neíle tempo feliz, e illuminado..

Na fior da fua idade., ah Ceos.. expira

D'Ofmans, eBoheráves rodeado.

Amiga Luzitania . . a Noite negra Foge do roílo da gentil Aurora: Os feus membros no carro efpreguiçando Defce áCaverna, onde Euridíce chora.

. 97

Vai o dia acclarando os noíFos campos ;

Mas noflbs corações nada acclara , Tanto, que a ter mais boccas mais gemera E a ter mais olhos, muito mais chorara.

NOI-

a^g^

ir7g7rr7»tfia

NOITE XI.

rjTOjE mais cedo vim do que devia L j^ A' longa praia , que inda eftá com gente: Onde me efcõderei ? . . mas todo o mudo 'e dezerto, ao que vive defcontente.

2

Qiie agradável painel para os ditozos ,

►ue de magoas tiverem a alma izenta . .

om que doçura encrefpa o vento as agoas . .

lom que doçura o mar brando rebenta.

Co-

Noites Jozefinas

Como as boiantes Náos prezas aos ferros Eftâo fobre a corrente defcanfando . . Como cheias de Zéfiros as velas, Os barcos devagar fe vem chegando.

4 O doirado reflexo do Occidente ,

Que vifta oíFrece aos olhos bem enxutos :

Meu triíle coração , não te diftraias ;

Não inyolvas prazer em negros lutos.

Phebo ao Efcorpião deo feus raios, E os merecidos ais medrozos voão . . Ah quanto crefce , o Ceos , minha amargura Ao ver que o mundo as prevenções povoâo,

6

Depois dos elementos homogéneos,

E heterogéneos pôr em movimento : Depois de dar acção ás limpas aguas. Luz ao efpeíTo ar, azas ao vento:

7 Depois do elementar calor interno

Dar aos montes de ramos verde grenha :

Depois de ornar com flores as campinas ,

E os valles reveílir de efpeíTa brenha :

De-

^2^^2a

jrígrTrrfifcía^fl!

i^hM^IS^^t:à..ãM^J^^^ÉÊL.^^%i<^àM^llé^

N o I T E XI. 20I

8

Depois de povoar a Atmofphera

De matizadas , voadoras aves ,

^e harmoniozas vozes efpalhando,

Fazião refoar éccos fuaves :

Quando defpontava as frefcas ervas V feu fabor entregue o manfo gado: guando as doiradas nuvens falpicava 3 Golfinho foprando o mar falgado :

IO

Quando os flóridos ramos fe dobravao

Dom o pezo dos pomos faborozos;

5 os rudes animaes livres corriao

i*eIos prados, evalles deleitozos :

II Deo a tudo o creado a Natureza

3um Rei , que no feu Orbe dominaíTe :

^io-fe o homem no trono collocado

3os Entes fuperior a qualquer claíTe.

12

Logo defde o principio as creaturas \.'s fuperiores Leis obedientes, ^agárão-lhe rendidas vaíTallagem , [lomo ao Ente maior entre os mais Entes.

99^

J

202 Noites Jo?EFiNAs

13 O foberbo Leão humilde, e manfo

Ledo acoitando com a cauda as ancas;

E o mofqueado Tigre carinhozos,

Vierão-lhe lamber logo as mãos brancas.

H

O feu triunfo as Aves com. doçura

Nos ares, e nos bofques feítejárão; E por dar-lhe prazer em torno deile. Os Zéfiros alegres fufurrárão.

15' Qual povo agricultor, que a vez primeira

Em tropel fe aprezenta ao Rei , que o rege , Do qual hum não ha que impaciente. Ser entre os mais fitado não dezeje: 16 AfUm cada huma das viçozas flores Dezejava pelo homem fer colhida : Das frutas cada qual ambicionava Entre todas as mais ver-fe efcolhida.

17 Eis-aqui como o homem defde logo

Proftrado a feus pés vio todo o Univerfo ; A formar feu prazer concorreo tudo , Nada achou repugnante , nada adverfo.

Po-

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rangTtrTUF^TI

^^^^^í>g«^.'.g^.^JB>g'afc^^^^

XI.

Noite

18

Porém efte feliz, ditozo eílado Em breve terminou fua loucura , Abuzando da doce liberdade. Sua forte ampliar cego procura.

Deíles vis, desleaes , fúteis dezejos, ÍSÍo coração humano concebidos , Nafcêrâo as paixões, nafceo o Capricho , E outros monftros fataes aborrecidos.

Da pérfida Ambição logo efta prole Fermentou dos humanos a defgraça; Elegerão por Chefe o vil Capricho, Que fero a perdição dos homens traça.

Enlaçando princípios, fez fyftema , Cujo cruel objeélo confiíle; Em converter hum Ente venturozo, De entre todos os Entes no mais trifte.

^?3Í

No efpírito , que livre domina , Do bem real apaga toda a ideia : E á viíta dos feus impuros olhos, O livro das Quimeras folheia.

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I

204 Noites Jozefinas

E para o indifpôr co'a Natureza, Grita-lhe, que com elle foi niefquinha; Que aos outros Entes dera armas , e forças , Que unicamente ao homem dar convinha. 24

Que o fizera pizar a dura terra,

Deixando ás aves remontar-fe aos ares; Que entre eílreitas balizas o encerrara, Sonegando-Ihe avara os longos mares.

Cahio infelizmente o homem cego

Neílas de vil Capricho, vis ciladas,

E cheio de li mefmo furiozo , .

Rompeo da Natureza as Leis fagradas.

26 Traidor , qual foi depois na Azia Artabano ,

Levantar-fe intentou co'o Império alheio:

Quiz nadar . . quiz voar . . quiz em Deofar-fe ,

E acabou por morrer de mágoas cheio.

27 Nafceo livre, e depois correndo o tempo,

Elle mefmo prendeo feus pés em ferros :

Nafceo puro, innocente, nafceo juílo;

Mas perverteo-fe em fim cedendo aos erros,

Co.

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'^gM^M^^^^^MMà^j^s?í^^^M^àMàaá^

N o I T E XI. lOfT

28

Coarílou fua doce , liberdade

A ponto de encubrir tudo o que fente ; No principio a Verdade lhe infpirava , Hoje he louco chamado, íe não mente,

29

Em fim por cume da cruel defgraça ,

Que elle por fuás mãos próprias forjara ,

Se víftima não quer fer da franqueza.

Do peito fentimentos não declara.

^o Seu círculo he poífivel , que pudeíTe

O homem reduzir a tão eílreito ,

Que não poíTa explicar d' alma as ideias ^

Sem da Verdade víélima fer feito?

... 3^

Ente o mais infeliz por tua culpa , De quantos fez viver a Natureza; Deixa-te confundir , penfando hum pouco Do teu prezente eftado na eftreiteza.

Clara Verdade ! a quem os Deofes juftos

Infpirar-me talvez hoje mandarão..

Ah ! divflame a favor dos cegos homens

Verfos j que n' outro tempo os illuftrárão.

D'

2o6 Noites Jozefinas

D' hum Príncipe fiel, que de Congfuzio tinha a redidão na mocidade : A lembrança me encheo de altas ideias . Ah ! dí6la-me verdades , sa Verdade.

34 A dor he de Ariadna o certo fio,

Que me guia noefcuro labyrintho,

Tanto da sa Moral , como no eftreito

Atalho da razão, que hoje vos pinto.

-"S

O deftino cruel roubou-nos fero Hum Príncipe entre os mais tão excellente, Qiie a lembrança das fuás qualidades DePhebo excita em mim achamma ardente.

_ 36

A pura Gratidão faz que interprete

Do Príncipe melhor os fentimentos , De fua alma fiel as fans ideias , Do terno coração os movimentos.

37 Sendo pois minha Guia hum fabio Augufto ,

Que de aos homens fer útil , foi morrendo

Entre os fieis dezejos, nada admira.

Que eu lhes queira fer útil efcrevendo.

Def-

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rgrJáTrtrrgfeff?

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Noite Xí. 207

Defde que os homens açaimar quizerão Suas boccas , e ás mãos lançar algemas j E das rans ao exemplo, Reis pedirão Do Ceo ás Divindades mais fupreraas :

Defde que elles fe virão obrigados

Al pedirem aos Ceos Pompilios juftos ,

Que defendendo as Leis á fua fombra

Os deixaífem dormir livres de fuílos :

40 Defde que para o bem das Sociedades

Entre os homens ha Reis, cujo cuidado-

Sciencia , zelo , e valor á feu proveito

3e veja unicamente deftinado :

Defde que o Mundo Principes obteve, Nenhum com tantos rogos foi pedido : Dos Antiochos , Cyros , nem Seléucos !^enhum foi por feu povo tão feguido.

_ , 4^

De quantos no áureo Templo da Memoria

Vem cercados de luz feus limpos buílos Em premio do cuidado , que empregarão Pelo nome alcançar de bons Auguítos.

Dos

U^JLLJJl

S

20S NoiTESjOZEFINAS

Dos bens, que pôde dar a Natureza, Mais ornado nenhum ao mundo veio ; Trouxe do grande Avô as qualidades , Benigna a Mâi lhas deo dentro em feu feio.

O Primeiro Jozé , o forte Alcides, Que Lizia te livrou de crus abuzos , De vis fuperíliçoes, brutos coílumes. De vans inclinações , bárbaros uzos :

O amigo dos Soloes, dos Philoftratos ; O Proteftor das Sciencias , e Artes bellas: Que em terra fez temer teus eítandartes ; E refpeitar no mar as tuas vélas.

46

Por hum feu Fenelón fabio , e fezudo O coração pulio do lindo Neto : Das puras mãos deíle avizado Meftre Sahe Jozé inftruido , ferio , e reto.

A cuidadoza Mãi, que vigilante Nelle hum completo Rei formar dezeja, Mais a hum novo Ariftóteles o entrega. Que da fua inftrucção os paíTos reja. /

-^MáMdma^^kmiSf

m

Noite XI. 48

209

Eftes dois fabios Meítres cuidadozos Panro por noíTo bem fe defvelárâo , iiie em quatro Luílros inda não inteiros )ois Principes perfeitos nos formarão.

49 Hum o vivo João, que o Ceo nos guarde;

)utro o morto Jozé . . que em vão choramos,

or quem . . triíles de nós . . em vão gememos ,

or quem . . em vão as tranças arrancamos.

Trinta vezes o Sol não tinha entrado )o redondo Zodíaco nas cazas, )cfde que por Jozé nafcer aos Luzos ''io ternos Vivas facudir as azas.

^ 5'! .

tinha de Sabino as juítas luzes,

. arte de Pergéo rival do engano: >'Artémon as ideias engenhozas , 1 o tezoiro immortal de Pediano.

Entre os alumnos do fatal Mavorte, Ias neceíTario por fatal defgraça: ra fabio Turéna , Címon juíto,

até de Proxéncs tinha a graça.

O ^ Eis

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BÍ5H

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2IO Noites JozEFiN AS

Eis huma copia breve do vivente^ Que no tempo mais crítico o deftino Nos roubou a pezar dos triftes gritos, Com que aos Ceos nos queixamos de contino.

'. Ah í triíle condição da pobre gente. Variedade fatal nas creaturas ! O Príncipe ao nafcer troufe alegrias, O Príncipe ao morrer deixa amarguras.

Os goftos , e afflicções encadeados Enchem dos pobres homens fempre a vida j D' uns n' outros vai faltando involuntário, o ínftante chegar feu homicida.

Nos braços tenros d' huma terna efpoza , Croão a Carlos mil geptis Amores , Na praça deWhitchal feu régio fangue Sem pejo vertem rábidos traidores.

57 Da humilde Cunerfdorf nos arrabaldes

Frederico . . Vifloria . ás tropas grita . .

Eis chega Láudoil , que lhe arranca a palma

E o põe na confuzâo do triíle Arfita.

Híe-

ZídÉÉ^

^^M^JMmtí^ShM^flS;^^

Noite XI.. 211

Híeron troca pelo arado o fceptro, elo alto folio deixa o campo Numa : ''io-íe ícaro em efcuma convertido, ; Ericina nafceo da mole efcuma.

S9

Efte certo cahir do fummo ao nada,

) poííivel voar do nada ao fummo :

L paílagem da dor ás alegrias,

> ver o goílo convertido em fumo,

60 A alternada mudança neceífaria ,

3 quizermos fuppôr do homem o eílado,

az com que o variar, tendo por uzo,

oluvel nunca firma o feu cuidado.

61

Diftrahido mortal, tu que infenfato

ua conílituição cego examinas:

u que em cháo plano a medo os paíTos moves,

u , que outras fem penfar te determinas.

62 Tir, que fabio te julgas, einfallivel )bre os outros viventes efparzidos, lha que fem fentidos não és nada , que elles te excedem nos fentidos.

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mmm^^^^^^í^^^^^6^:ím^

2í% Noites Jozefinas

O alto efcado te expuz , em que eítivefte Pintei-re o precipício em que caliiíle; Quero pois conduzir-te enternecido Com os chorozos ais, que efpalhas trifte»

Da tua fituaçao tira partido , Faze nella por fer o mais ditozo , QL«e as várias circum.ílancias permitíirem. Forceja por viver menos queixozo.

Quando a louca Fortuna entre forrizos

Derramar fobre ti os feus tezoiros :

Se as pedras do Oriente em ti luzirem ,

Quando te coroarem crefpos loiros.

66 Não te deixes cegar pelos reflexos

Das luzes , que ao redor de ti brilharem :

Nem illudir também pelos louvores ,

Com que os falfos Filócres te incenfarem,

67

Olha que a Sorte vária he mais confiante

Em Cézares proílrar nos Capitólios:

Do que pobres Ventídios ignorados

Aos cómmodos erguer dos altos fólios.

Quan-

f^^^:^^^ isiÊt-^^.

mbÊ^M^^^^Émí^^:mãí^:^^mm^jÊs;i^iSmm

N o I T E XL 215

68

Quando erguido te vires, treme, treme, L quaíi certa queda prevendo: )lh'ãy que o homem louco fez-fe eftranho L tudo o que não lie viver gemendo.

Do que mais te convém perfuadido ,

ufca a fanta Virtude carinhoza ;

fos feus braços te deita fem receio,

íella a mai acharás mais extremoza.

70 Ella moderará tua inconílancia ,

íutrirá tua paz, o teu focego ;

bntra as cegas paixões ha de efcudar-te , .

[a de vingar-te do Capricho cego.

Ella te enfinará a fer benigno lom aquelles , que vires abatidos ; ezudo , ferviçal , e verdadeiro !om os outros , que aos Ceos vires erguidos.

7^ Ella raefma a teus olhos dará pranto

íà falta dos Varões aíTmalados :

rágrimas te fará verter fem fuílo ,

or quantos merecerem fer chorados.

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■fSSMET-KHBi

99

214 NOITESJOZEFINAS

73 Ella te animará a dar gemidos

Dos Atalos 5 e Joaes ás triítes mortes ;

dos Neros , e Phálares nas vidas

Se não devem fentir da Fúria os cortes.

74 Homens , chorai em fím para moftrardes

Que não eftais de todo pervertidos :

Que inda nos corações guardais apego

Aos bens da alta Virtude efclarecidos,

7? Qiianto he vario o Deílino ! quão volúvel

Dos homens diftribue as varias fortes !

A huns caíliga com eternos loiros,

Premeia a outros com infauílas mortes.

Do fegundo Jozé , que a Fama eleva A vida confervou , vida importante , Para ver a feus pés hoje lançado D' Ofman Baxá o marcial turbante.

17 O alento lhe guardou , para que alegre

Nas triunfantes mãos de Láudon ferio

ViíFe reverdecer de novo a palma ,

Com que Eugénio illuftrou Águias do Império,

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Noite XI.

78

^l$

Prevendo a gloria, com que heroicamente )e premiar exemplo aos Reis daria troando a frente impávida, que em breve ) plano de vencer formar devia.

79

Permittio que Jozé , Jozé Segundo

•"oíTe vendo croados os feus planos :

'orem do noíTo Heroe cortando a vida

^ue altos bens não roubou aos Luzitanos.

80 Chorai . chorai . . affliílos , noite , e dia

\. falta d' um mancebo virtuozo:

>amentai de Jozé a auzencia dura.

^h ! faze-o reviver . . oh Ceo piedozo.

81 Ah Lizia ! . * vem comigo , e abraçada . .

/'eras co' a fria campa endurecida ^or feguir da Virtude os documentos, \. Conforte doPrincipe querida. 82 Verás cubrir com as madeixas foltas ,

5 humedecer com pranto a lagem dura, \ Efpoza mais fíel , que Amores virão )efde que de Hymineo arde a luz pura

Ma-

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Kit^

NoiTESjoZE FINAS

Maria Benedifta , tão ornada De raras perfeições , de qualidades , Que do amor dejozé a acharão digna Do Olimpo asjuílas, celeítiaes Deidades.

Maria Benediíla , oh Luzitanos . . A voíTa amiga, cândida Princeza.. Aquella, que em feus braços apertava O Objeélo digno de immortal trifteza.

Maria Benedifta inconfolavel ,

Em quem lugar não tem pueris mudanças.

Sobre o negro fepulcro eílá chorando

Suas 5 e as noffas mortas efperanças.

86 Triftes foluços . , lúgubres gemidos . .

Da enlutada Maria em torno voão :

E por entre o vapor , que a Morte exhala ,

Os ais batendo as negras azas soão.

87

Com a Efpoza adorável chorar vamos . . Vamos unir aos feus noíTos queixumes.. Vamos , que do Sol a face clara Vai da Noite apagando os claros lumes.

NOI-

^jÉ^

^r^^^^m'A^C

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NOITE XII.

SA xj D O z O s do Sol 5 que fatigado No regaço de Thétis efcumozo Reclinar-fe vai: os brandos ventos Revoão pelo valle , e prado ervozo.

Do Sol vendo-fe auzente o velho Tejo , Se encofta adormecido fobre a Urna , E da grenha enfopada a agua , que efcorre Entre os juncos fe eftende taciturna.

Rpm

2í8 Noites JozEFiNAs

Com a falta da luz , do Sol diílantes As vernizadas frutas , mais as flores Cubrindo-fe de lânguida triíteza , Perdem as engraçadas , várias cores.

4 As rezes innocentes , que animadas

Com o calor do Sol contentes paftao ,

Da Noite intimidadas com aviíta

Das longas várzeas triftes fe aíFaílão.

Os ribeiros azues , os frefcos rios, Que c' os raios do Sol trémulos brilhao , cubertos de fombras tenebrozas As miúdas areias manfos trilhão.

6

As aves , que entre os ramos prazenteiras

Na prezença do Sol humas cantavâo ; Outras as brandas penas fobrepoftas Com os bicos fonoros concertavâo :

7 Auzentes delle, e dos feus vivos raios

No mais efpeíTo, e fundo do arvoredo:

Saudozas fe efcondem , fem da Noite

Perturbarem o fúnebre fe^redo.

Po-

^lljf^''^ rrnn i-iii-B -d

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Noite XII.

8

Porém agora , que do Sol na auzencia Magoados os Entes produzidos; Com o pezo das pálidas faudades Efpalhados eftâo adormecidos.

9

Nós 5 que perdemos muito mais do que elles,

Pois perdemos também as efperanças, Comecemos de novo, Lizia amada, A lamentar da Morte as eíquivanças.

IO

Coloremos por Jozé . . fim , lamentemos A morte de quem tanto nos amava ; A morte d' um mancebo generozo , Que em fazer-nos ditozos penfava,

II

Ah ! quero confolar-te , afflidla Lizia ,

Se tanto confeguir acazo pode Hum trifte coração , que magoado As rubras azas mortal facode.

12

De minha dor entregue ao vário impulfo , Querida Luzitania, me efquecia Referir-te as noticias , que o teu Génio Troufe dos campos, onde mora o dia

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H

220 Noites JozEFiNAs

13 Hoje eftava gemendo, quando o vejo

Arrebatado vir abrindo os ares

Em bufca do fepulcro luduozo

Com roílo limpo de fataes pezares.

Logo que me aviílou ^ com voz alegre Gritou . . Ah meu Mirtylo amargurado ! Alvíçaras, ..o Principe, que choras Refpira nos Elízeos coroado.

15' Eu fentia o coração tão cheio

De mágoas , anilas , afflieções , e dores , Que o prazer forcejou por entrar nelle Impedido c'os férvidos clamores. 16 Mas com tudo , a certeza indubitável Do feu eterno eftado venturozo , Algum tanto prendeo o meu tormento , Confegui meu pezar menos irozo.

Depois de defcanfar alguns inílantes , (Continuou o Génio brandamente) Venho pafmado ao ver por bagatelas Os grandes bens, que perde a humana gente.

Lo-

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^^^iC^RS^^^SS^^^B

Noite XII. lai

i8 Logo que por teus rogos obrigado

Outra vez revolvi os ares foltos

Em procura doPrincipe, que os Luzos

Chorão da Morte no vapor envoltos.

Encontrei por acazo hum Génio amigo ,

Que chorando também triíte voava :

Perguntei-lhe tremendo o feu defgoílo ,

Inda mais c'o a pergunta foluçava.

20 Inflei com elle, encaminhando fempre

Meu voo a par do feu , e com ternura

Me diíTe: Eu vou aos campos deleitozos.

Onde o doce prazer conftante dura.

21 Vou ver fe encontro huma alma efclarecida

Ao lado de Jozé Principe Luzo :

De ouvir ais , e gemidos , brados , gritos

Venho foltando o voo quaíi confuzo,

22

Do Principe, que morto chora Lizia

A carinhoza Irmã não refpira :

Abraçado com ella o meigo Efpozo

Sobre a face mortal em vão fufpira.

Em

!5»ai

222 NoiTESjoZEFINAS

Em vão os Van-fwietens são chamados Com Armánia não forao maisditozos, Que o forão com Jozé . . Príncipe digno De eternos monumentos gloriozos. 24 Accrefcentei então , também ligeiro Impaciente venho bufcando O íitio , onde os ditozos são aceitos O meu Principe amável procurando.

25- Para confolação da amargurada Rainha Luzitana , vou em bufca Dos campos do prazer contar ao filho Quanto o noíío horizonte a dor ofFufca. 26 Em torno de Maria foberana Três luftros Jia , que a Morte irada voa : Matou-lhe o grande Pai.. Pai dos feus povos O Primeiro Jozé , que ergueo Lisboa.

Roubou-lhe a illuftre Mâi , e de être os braços

O Principe João fendo menino :

E duas filhas mais , á quem da infância

-^ innocencia não deo melhor deftino.

Suf-

■^iKT-arÉrrírrtiBiáaWj^

^^ã^SÊSt^

Noite XII. 223

28 SufFocou-lhe do Efpozo o vivo alento ;

E depois mais que nunca embravecida , A fim de ennobrecer mais feus furores^ Ao Príncipe Jozé tirou a vida. - 29 Vida a mais precioza fobre todas ,

Quantas cortar o feu furor podia ^ Vida , que da alma Ceres c'o as efpigas as frentes dos Luzos guarnecia.

Vida 5 que hoje aos Ulízeos , nobres Povos, Mais lagrimas amargas tem cuftado, Do que por Nikarágua virtuozo A América infeliz tem derramado.

E inda não faciada de ruínas Com o gume, em que tépido fumava Do Príncipe gentil o puro fangue, Matou aArmánia, quando o Irmão chorava.

Arrancando porém a illuftre palma A^s mãos da alta Rainha dos Romanos > Excedendo-a invencível na conftancia De fupportar mortaesp tétricos danos.

í

224 Noites JozE FINAS

33. Qual fólido penedo incontraílavel ,

Contra quem furiozo em vão fe lanja

O embravecido mar; aílim Maria

Do Ceo nas decizões fabias defcança.

Vendo tinha acabado o meu difcurfo De novo o Génio a fufpirar entrava; E pucliando do feu canfado peito Novos gemidos, com que o ar toldava.

35' Exclamou .. Inda mal , que femelhantes

São tanto as noíTas commifsoes violentas.

Tu por Armánia , e eu pelo Irmão caro

Voamos entre nuvens macilentas.

Ifto dito ob fervei que, muito ao alto Remontava feu voo meu triíte Guia; A cauza examinei , e vi-me erguido Sobre o valle , em que o Cérbero latia.

Tremendo a voz ergui . . vamos errados ..

Eífe valle, a que eílamos fobranceiros ,

He o valle horrorozo, onde em vao gemem

Tântalo com feus filhos carniceiros*

Por

p^r»^^.^^:\w^-^.gr,

^m^^B^f!^m^^!s^s?sm^ss.

Noite XII.

Por lírcme tornou, ergui ao cimo 3 meu rápido voo : aos bens celeíles Sião fe pode chegar, feni fe calcarem iberos Atreos , pérfidos Thyeftes.

39 Julgo difpozição alta dos Deofes

!)os juílos começar logo a ventura,

*or faberem o mal , de que os livrara

^ fujeição ás Leis, que Aftreia apura.

Nâo tardou muito tempo que não viíTe ) valle para traz ir-fe ficando; í em lugar dos efcuros nevoeiros , )oiradas nuvens clara luz foltando.

.41 Livres de perigo pouco a pouco

lobre a terra feliz fomos defcendo :

l alguns Favónios de pintadas plumas

/'ierão para nós o ar fendendo.

42 . Huma corda de montes , que formava

Lm círculo dobrada huma ária immenfa,

Continha dentro em o Elízeo campo ,

)nde a affeiçáo ao bem fe recompenfa

220 N O í T ES JOZE FINAS

43 o monte circular n^hum íitio roto

Dava rizonha entrada ao reino eterno ;

Onde as flores gentis da Primavera

mais desfolha defabrido Inverno.

44 Por mais que em torno os olhos efpalhava ,

Defcubrir não podia fenâo flores ,

Com que a felpuda relva matizada

Avivava em feu verde outras mil cores.

45- Os mefmos iguaes montes , que abraçados

Servindo eftavao de muralha erguida ,

Guarneciâo Sicómoros , e Murtas ,

A roxa Olaia , a Alféna encanecida.

46

Dois corpulentos Loiros enlaçando No cimo os feus viçozos, verdes ramos. Em final de triunfo ennobrecião A mageftoza entrada , a que chegamos.

. 47 Por ambos irmos totalmente alheios

Do humilde , do terreno trage humano : Entrámos cheios de prazer inteiro Pelo reino feliz do defengano.

Dif-

rjUJCÍ^

w^rrr^

■it^^s^

Noite XII

48 Difpenfa-me, Myrtilo, que te conte

3 que obfervei no inílante em que fui dentro;

Síâo tenho termos , exprefsóes nao acho ,

^om que te eu pinte da Ventura o centro.

, 49 Livres da monótona fymmetria ,

/[ por entre os corados Aíedronheiros,

"heias de fruta , e íior diverfas ramas ,

salpicava a Gieíla os Azereiros.

5-0 A terra, que ao pizar-fe era fuave,

^orravão ervas mil todas cheirozas ,

) Tomilho, Serpão, a Mangerona,

Intre as quaes rebentavão frefcas Rozas.

Os Junquilhos , as alvas Campainhas , Lçucenas, Rainúnculos , e os Lyrios , .s ervas matizavao : fobre os troncos h Jafmins fe enlaçavão c' os Martyrios.

O chelrozo, o efquivo Alegra-Campo , - a branda Madre-Silva de mãos dadas !om os mais altos ramos fe mifturáo >as Pereiras c'os frutos carregadas P ii

91HP9^

Noites Jozefinas

Por entre as folhas, em que mais luzia O verniz, quanto eílavao mais viçozas, Soltavâo fem canfar vozes fuaves , Diverfas, lindas aves fonorozas.

5'4 Progne 3 fem fe lembrar de antigos males.

Refpondia á mimoza Philomela ^

Cujos cantos alli são tao alegres ,

Que fazem qualquer flor nafcer mais bekr

Vi lagos mais formozos, que os de Hyría 3 Cujas ferenas aguas cryílallinas Erão mais claras do que asdoChoafpe, Correndo fobre margens de Boninas.

As focegadas aguas revolvia, Enrofcando o feu colo mageftozo O branco Cyfne , fem ter lembrança Da imprudência de Phílio rigorozo.

Dos lagos ao redor havia aíTentos, Não deíTes , que a arte faz c'o ferro duro; Erão foltos pedaços de Oiro em bruto , Que moftrava em luzir quanto era puro.

Noite XII.

A riqueza das penhas augmentavão )s vermelhos Rubins , os Diamantes , '}ue de miítura c^o metal doirado ^afeados fcintillavão faifcantes.

Vi outras coizas mais , cuja belleza Cxplicar-fe não pode fem engano : ífte o íitio por onde livremente ^aíTeia em fim fem fufto o erguido humano 6o

Eíte o Reino da cândida igualdade, )nde ao homem fiel faz venturozo ^certeza em que vive, de que nunca 'ode contra o bem fer criminozo. 6i

ás paixões attribuir-fe deve

)os homens nefte mundo o prejuízo ; /Ias como paixões náo tem entrada )os juílos a morada he Paraizo. 62 Achei entre humas altas Larangeiras ) grande Dora Diniz com ledo rofto, ? o amável Sydnei de braços dados rratando objeílo , que lhes dava gofto.

^■^C2^í^

230 N o I T E S J o Z E F'r N A S

Vi n' outro lado o nobre Cazimiro A' fombra d' uns mui flóridos arbuftos Converfando c' o Ariíto , a quem fevero Inda chamão por os varões juftos.

Vi Traja no embebido com o noíTo Uluílre Gil-hianes virtuozo, Que atrendeo de Pacheco mais aos feitos. Que o Rei, a quem fervíra valerozo,

65-

Também noíTo immortal João o Segundo

Com o incorrupto Tello confultando ,

De efpaço a efpaço erguia as mãos ao alto.

Como algum cazo trifte lamentando.

66 Vi Buzurge Mehír, Fernando, Alfredo,

Luiz Doze, e com feu Nuno João Primeiro ;^

De todas claíTes vi os homens juftos,

Que o coração guardarão fempre inteiro.

Vi com fatisfaçâo , cheios de gloria ,

Inteiramente em fim recompenfados ,

Todos quantos fervindo á Humanidade

Forão por fazer bem aíTmalados.

E

'rfiTir

wvayir^,

iráTirriiET

w^m.

Noite XíI. 231

68 E como da gloria a maior parte

Coníifte do bem feito na lembrança;

í\.quelle , que mais útil foi no mundo ,

iSíos Elízeos também mais gloria alcança.

Volvia impaciente a hum , e outro lado

Os olhos para achar quem procurava,

CJuando ao longe applicando os meus fentidoSj

Do Principe julguei a voz foava.

70 Tanto corri, que em íim achei adita

De o ver entre alegrias encoftado

ko tronco d' uma verde, alta Palmeira ,

De outros Príncipes juftos rodeado.

Explicar-te porém , ó meu Myrtilo , Mão poíTo a mageítade gracioza, ^e efpalhava entre quantos o cercavão Do Principe a prezença generoza.

72 Hum decizivo af tinha entre todos;

Fodos c' o a atíençâo , com que o ouviâo ,

Moítravão que das luzes , e talentos

\ fuperioridade conhecião.

%^1 NOITESJOZEFINAS

73 , ^ \

Inda nos poucos annos , que o formarão (

De Jove arremedava a autoridade,

Qyando dos outros Deofes no confelho

ExpÓe em grave tom fua vontade.

74 Por acazo João Príncipe egrégio ,

Filho do Rei Catholico Fernando,

A cabeça voltou, e logo a viíla

Por algum tempo fobre mim firmando:

Soltou em alta voz . . aquelle Génio Julgo, que de entre nós algum procura.. Logo o Principe meu , feu rofto volta , E diíTe ao defcubrir-me com ternura:

76

Chega-te pai-a nós, Génio agradável, De minha terna Lízia menfageiro j A feu Principe chega deftemído , Abraça o Neto de Jozé Primeiro.

77 » Graças vos dou , ó Deozes , por quererdes

Que eu recebeíTe de meus Luzos novas :

Quanto Génio feliz com tua viíla

Minha grata aíFeição hoje renovas.

Em

'^^^^ ^^-^-ráT ir?5iifffl|]1

m

N o

Em recompenfa da paixão confiante, Qiie obti verão de mim meus Luzitanos , Chorarão mais João , que em tua morte Pelos campos deHefpéria os teus Hifpanos,

Cada lágrima foi ta, que largarão |

Tinha íido por mim bem merecida :

ISÍâo houve inda Nação, que venturoza

Por feu Príncipe foíTe mais querida.

8o O meu defcanfo, e paz, a vida mefma

Sempre menos amei , que a gente minha :

de ver os meus povos illuftrados ,

Dentro em meu coração dezejos tinha.

8i Sim , meus Luzos fieis , voflb futuro ,

E agradecido Rei conhecia,

Da regência de gentes tão illuftres ,

Ciuanto era precioza a alta valia.

82 E tanto o conheci, que não me accuza

Aqui mefmo a razão ter defprezado,

Para vir a fer útil aos meus povos,

Por cuftozo que foíTe algum cuidado.

Por

234 Noites Jozefinas

Por elles folheava noite , e dia O Código dafábia Natureza: Nelle aprendi primeiro a conh'ecer-me , Para nos homens ler com mais certeza.

84

D' Euclides, com os fólidos preceitos, Coílumei-me ao amor da verdade , Tanto, que dos Cretenfes dera o fceptro , por lhes não foiFrer a falíidade, 85-

De Plínio , e de Linéo com as fadigas

Da Matéria aprendi a força adliva ,

A fim de promover entre os meus povos

A cultura em acção confiante, e viva.

86 De Newton, e Lebnitz as defcubertas

Nas luzidias azas me elevarão

Dos aftros obfervar os movimentos,

E as Leis, que fempre firmes obfervárâo.

%7 Ty Heródoto , Tucídides , Plutarco ,

De Lívio, ejaques Thou aHiíloria lendo,

Creei apego aos bens da alta .Virtude ,

E infaciavel ódio ao vicio horrendo.

p/4fe«:^^^í^^^.^::í5>9ífe!s^á^ /z

N o I T 88

XII.

efta imparcial, fevera Meítra Convencer-me alcançou da feriedade Do cargo , á que o Deílino me guiava Defde a minha primeira , tenra idade.

Ella me perfuadio , de que os Eftados

Sâo inteiras familias numerozas.

De que os Reis sao os Chefes obrigados

A fazellas durar fempre ditozas.

90 Que aílim como hum bom pai fomente cuida

Em bufcar de feus filhos a fortuna \

Em libertallos de cruéis pezares ;

Em tecer laços firmes , com que os una :

91

Aílim hum jufto Rei deve fó-mente

Na educação cuidar dos feus vaíTallos ,

Propondo-fe com penas reprimillos ,

E com úteis aífagos animallos.

92 A Hiíloria me enfinou , que dos Procuffios

O livre proceder ás gentes moftra

A dívida a qUe fica refponfavel,

Quem os crimes punindo , o mal não proftra. c Apren-

^^K^^^s^^^^.^m.

i

X36 Noites Jozefinas

93

Aprendi, que os Auguílos imperantes

Vivera a toda a hora tão fujeitos

A tirarem dos povos, que governao

Do feu público em bera novos proveitos ;

94

Que qualquer dos vaíTallos , que o feu tempo

Confome da inacção no mole feio ,

E cad' um dos mendigos , que obrigado

Pede o pão, que lucrou fuor alheio.

95^

Sao outros tantos documentos vivos,

Qiie depõe contra o Pai do eítado todo , O qual deve partir feus bens de forte, Que de lucrallos oíFereça o modo.

Hum Reino fecundario , diminuto Nunca aos Ceos levantar pode a cabeça ; Quando de dar acção geral aos povos, Cravando o ferro em íi cego fe efqueça.

As antigas Repúblicas durarão , Porque a todos, o Todo protegia: '

E porque ao Todo todos reunidos Serviâo ao depois com alegria.

Os

r^^^t^^ vwr-a^.cr^»'.

^:M^éMSf^»^^mf^^^^^S>é^

Noite XíL 98

337

Os oclozos fempre dos Eflados Fermentando vão mudos a defgraça, Pouco a pouco a fubftancia lhes confomem , Qual ferrugem voraz, ávida traça.

A vil ociozidade he hum dos monftros ,

Que deve pelos Reis fer debeJlado :

As fabris Artes bellas dem-lhe auxilio,

E para as confervar o pingue arado.

100 De féculos em féculos correndo

O vão immenfo, que defcreve aHiftoria,

Separando as acções , que anima o erro ,

Daquellasj que o feu voo erguem á gloria.

lOI

Conclui d' huma vez , que a Independência , E a Força são as que erguem os Eftados : Que d' huma , fértil mãi , foi fempre a Induílria, Nutrem a outra Martes reforçados. 102

De Memphis, Babylonia, Sparta , Athenas Vi a perturbação lançar as artes ; E fallando em geral , vi a Ignorância Ser dos homens tyranna em todas partes^ .

De

«ES

238 Noites JozE FINAS

103 De Luiz Sétimo, eNono asvans emprezas Sempre defapprovei cpmo danozas: Dos Mários , e Alarícos conhecendo As palmas por fanguíneas , vergonhozas. 104 A antiga , fabuloza idade d' Oiro,

Se era poííivel, procurei attento ;

E vendo que das mãos dos Reis pendia ,

dar-lhe me propunha cumprimento.

105'

Difpofto eftava, meus^ queridos Luzos,

A mefma vida a prodigar contente, Por cumprir o dezejo , em que eu ardia De ver-me Rei dMiuma dltoza gente.

106

Vendo, que de Anaxágoras á fciencia

Péricles feu faber todo devera :

E do fabio Platão, luzes tão claras

O applicado Ariftóteles houvera:

107 Vendo em Plutarco os fazonados frutos ,

Que produzirão as lições de Aumonio;

Meus Meftres refpeitei, quanto Graciano

Amou, e refpeitou feu Meftre Aufonio.

Tan-

rr r r ^ p^^-^^^^.^ _ v w-^a^^gr^

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^j^^^^^^í^^jC^^^^ss^:^.^

N O I T E XIL 239

108

Tanto era de fazer feliz meu povo Sincero, e verdadeiro o meu dezejo, Qiie ver nunca podia hum defgraçado , Sem moílrar no meu roílo hum triíle pejo. T09

Porém os Deofes , cuja vontade

Sem obítáculo algum difpde de tudo; decretado tinha , que da Morte Cedelle antes de tempo ao ferro agudo.

IIO

Mas, ó fciencia Divina, que devemos Todos reconhecer obedientes: Para encher meu lugar, os Deofes reílos O meu Irmão creárao providentes. III

Dérâo-Ihe hum coração tão bem difpofto , E ao que me animava tão conforme, Que certo das funeftas confequencias , Também aborrecia o crime enorme. T12

Ao meu lado confiante a toda a hora Pambem comigo o tempo aproveitava ; Com hum puro dezejo de ajudar-me. As artes de fer útil decorava.

Qiian-

^^:^^^^^^^:^7ãm

a4o Noites Jozefikas

113

Em premio de eftudar a Natureza

TaÒ bem chegou a ver, que ella fomente Desfruta o privilegio de entre os homens Produzir generoza , nobre gente.

Sabia, que os humanos refpeitaveis Sâo aquelles, que a fabia Natureza Enriquece com lúcidos talentos, E não os que a paixão ás cegas preza.

Conheceo , que dos homens o mais nobre

He aquelle, que aos outros he mais útilj

fabia antepor merecimentos ,

Da Defcendencia á arvore inútil.

116 Por iíTo de entre os homens defprezava

os que via indignos de alta gloria,

Eííes , que a Natureza produzira ,

Como qualquer metal produz a efcoria.

117 Quantas vezes as fuás qualidades

Erguer aos limpos Ccos me não fizerão

As mãos agradecendo-Ihes rendido,

Porque benignos tanto o enriquecerão.

^b^^M^M-

'^^^^^M9^

Noite XII. %\%

it8

Elle era meu fíel^ meu terno Acates,

Com quem eu repartia os fentimentos : Sempre minhas chamei fuás ideias , E fempre feus chamou os meus intentos. 119 Nem os filhos de Atreo 5 nem Tito, e Lúcio Da fraternal , recíproca amizade Tanto apertar puderao nunca o laço, Que de duas fizeíTe huma vontade.

120 E em prova de que nós o confeguimos, Nutríamos dezejos tão acordes , Qiie animar parecia huma alma NoíTos dois corações fempre concordes.

I2T

Em premio do cuidado com que a noífa Auguíla Mãi , e Régia Soberana , D' ambos a educação auxiliando, Vigilante imitou Acia Romana»

122

De Cléobis, e Bíton c'o a ternura No dezejo vivíamos unidos De ajudalla- a fuíler do fceptro o pezo, Vivendo ao feu querer fempre rendidos.

a Obe«

'^:S^'^^

Noites JozE FINAS

123

Obedecer da Mai á vontade: Os povos dezejar aproveitados , Erão fomente os noíTos intereíTes , Emo os noíTos fempre iguaes cuidados. 124

Prendeo hum pouco a voz . . mas tornou logo Vai-te , Génio leal , vai fem tardança Contar como obfervaíte os bens eternos, Que o homem bem-feitor no Elízeo alcança. 125

A' minha terna Mai corre primeiro;

E beijando-Ihe a mão reconhecido , Tu por mim lhe agradece a alm ventura, A que por feu amor me vejo erguido. 126

Dos feus confelhos sãos 5 dos feus exemplos Alegre desfrutar vim o proveito j Sou nos campos Elízeos venturozo Do feu zelo, e carinho efte o eíFeito. 127

Bufca a minha querida, doce Efpoza , E jura-lhe, que em premio da amargura, Que o terno coração lhe vai gaitando , Do feu íiel Amor na auzencia dura :

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Noite XIL 24J

128 A conftante aíFeicâo , viva , fuave ,

Que cila mefma nutrir foube em meu feio. Ao ameno, feliz, eterno campo Dentro em meu coração intafta veio. 129 Que fe ella de Cleónide, e Pantheia Por mira geme no mundo co' a firmeza , Eu excedo a Nicócles . . . que não choro , Porque neíle lugar não ha triíteza.

J30 A meu prudéte Irmão, que aosDeofes Santos

Quanto podia fer, tem fido grata

A fua exemplar dor, mais o carinho,

Com que a minha fiel Efpoza trata.

Que em prova de que as fuás qualidades Dignas do exeelfo trono eu conhecia, Condefcendente mais , que Patezítho , A croa lhe larguei com alegria.

Depois bufca o fepulcro , onde o meu corpo

Entre lavrados mármores defcanca:

E dize á afflidla Lizia , que confiante

Inútil pranto de feus olhos lanca ;

Que

■r^

^44 NoiTESJoZEPINAS

(^ue do muito , que a amei , lhe peço em paga Suas queixas fufpenda , mais não chore ; Que aíFague a meu Irmão , pois lho merece , Que firya a minha Mãi, e os Ceos adore.

Os braços me eftendeo por defpedida, Beijei-lhe a mão benigna, e faudozo Tornei por onde tinha antes paíTado De deixar hum tal íitio pezarozo.

Co a viíla examinava os bens celeítes. De que fem querer m'ia aíFaílando^ Quando fobre a felpuda, amena relva Vi quatro Varões férios paffeando»

^30

Fiz nelles reflexão , e facilmente

O Pai reconheci dos Luzitanos'

Jozé Primeiro, com o Quarto Henrique,

Carvalho ^ e mais SuUj com feus Sobranos,

137 Dos noíTos mais alguns Príncipes dignos

Juntos não muito longe ccvnverfavao ,

E contentes também , vendo-fe juftos ,

As etçrnas delicias desfrutavao.

Não

Noite XII. 13S

HS

Não quiz interrompellos , vagarozo Da lúcida morada vim fahindo : De deixar tanto bem peito fempre Hum triíle defprazer em vão fentindo.

Em íim . . aqui me tens , brando Myrtilo , Completei felizmente o teu dezejo ; Chorar me deixa agora em liberdade Sobre o corpo , que a alma aqui não vejo. 140

Quem tiver coração íincero , e puro ,

Pode fuppôr o meu qual ficaria

No íim de narração tão extremoza.

Que as mefmas penhas fufpirãr faria.

141 Efta prova de novo indubitável.

Do carinhozo amor, que nos conferva:

Da eftranha vigilância, do cuidado.

Com que do mefmo Elízeo nos obferva.

142 No meu feio crefcer fez tanto as mágoas.

De que minha faudade he mãi fecunda ,

Que de novo os gemidos me fuíFocao,

De novo o pranto minha face inunda.

O

246 NOITESJOZEFINAS

O meu pezar levou-me a hum tal extremo , Que explicar não poíío quanto íinto : Faltão-me as exprefsões , . o alento falta , com ais minha dor . . ai . . triíle pinto.

Prmcipe virtuozo , amável , fabio , Do teu Myrtilo aceita os ais fentidos: E os enlutados verfos , que chorozos Soltou meu coração entre gemidos.

145' De Amarílis gentil , quando os amores

Cantei, fiz jura aosCeos, jurei a gente

Ao fom de ebúrnea Lyra, em cordas d' oiro

Algum dia cantar de ti fomente.

146 Porém o aveíTo Fado inexorável ,

O deílino fatal, pérfido, efquivo,

Arrancando-te a vida precioza ,

Tirou-me o gofto de cantar-te vivo.

Apenas expiraíle em Lyra trifte

De Ébano, do que a Noite mais efcuro :

Ao fom de diíTonantes, férreas cordas,

Que o meu pranto ao foar largavão puro.

Con-

OR^Tm'

.vãdb^^M>ft€lia^;^^JJfeaag^

Noite XII. 14S

247

Convidando a gemer os Ceos luzentes Os troncos 5 penhas, mar, o furdo vento. Com verfos , que o pezar pode infpirar-me , Chorando-te cumpri meu juramento.

149

Engraçadas , mlmozas , Ninfas ternas ,

Cujos verfos iguaes o Tejo efcuta.

Rodeado de Zéfiros fuaves

Dentro da fua frefca , húmida gruta.

E vós 5 fonoros Vates Luzitanos , Que dos Gregos herdaftes a doçura : Por cujos verfos o Danúbio , o Tibre Suas frentes guarnecem de verdura.

.15-1 Com loiros coroai os Pátrios Lares,

Livres de fuílos , afinai as Liras;

E do traveílb Amor ora deixando

Os duvidozos bens

Do Príncipe Jozé cantai vós quanto

Nâo puderâo colher meus verfos rudes :

Veja o mundo, que foi dado ás Muzas

O dom de eternizar altas virtudes.

Pru-

148 NOITESJOZEFINAS

Prudente, e fabio, magoado Henrique, Que á minha grata Lyra, dás. alento, Venceo a minha dor, mais não poíTo, Calado imitarei teu fentimento.

X5'4 Entriftecida Lizia ! . . ó inviílos povos !

Cahe-me a lyra das mãos, entre anilas fico..

Aceitai eíles verfos luíluozos,

Que fobre a fria lagem vos dedico.

- rrr r ^ iP^^-'.^^<^.vw;^^.grf^>;

■kÊã^^^L^^W>^>.^^^^/-^^t^:^^^

Poezias jd imprejfas de Luiz Rafael Soyé , que fe vendem nas lojas de Francifco Tavares Nogueira , debaixo da arcada \ na de Ber- trand ao da Igreja dos Martyres ^ e na de Reycend ao Calhariz,

COnho Erótico, Poema Paftoril 8/ rima. ^ 6 Cantos, i. vol. 8.° com eílampas finas , e vinhetas, preço 6oo. encadernado.

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Dythirambos , Poezias Báquicas. i. vol. em 8.° 480.

Noites Jozephinas áinfaufta morte do Se- reniíTimo Senhor D. Jozé Principe do Brazil , 12. Noites 5 quartetos endecafyliabos. i. vo- lume com eftampas finas. 8.*" preço 1200. em papel.

Poezias do mefmo Author promptas pa* ra o prelo. O 2.° Tomo das Cartas Paftoris. Os Idylios j Canções , e Elegias. l. vol, em8.«

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I

O primeiro Tomo do feu Theatro , que fe compõe diurna Comedia Original , O Pai honrado , em que o público vendo nella o vicio corrigido , e coroada a virtude , fe con- vencerá mais evidentemente do íincero defcr jo que feu Authortem, e terá fempre de buf- car o útil por todos os modos que fe lhe pof- iibilitão.

Traducção em verfo endecafylkbo folto da Phedra j chefe de obra das tragedias do deli- cado Racine. ' ' Dous Dramas.

Traducção literal em verfo dos Salmos de David. I. vol. 8.0

Foi talxado cílc livro em papel a mil e duzentos reis. Meza 2|. de Julho de i-j^jQ*

Com ms Rubricas.

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