o FAZENDEIRO DO B R A Z I L, CULTIVADOR, OFAZENDEIRO DO BRAZIL, CULTIVADOR, Melhorado na economia rural dos géneros já cultivados > c de outros , que se podem introduzir ; e nas fa- bricas , que lhe são próprias , segundo o me- lhor, que se tem escrito a este assumpto, DEBAIXO DOS AUSPÍCIOS, ^ E DE ORDEM PE SUA ALTEZA REAL príncipe 'regente, NOSSO SENHOR. .Collegido de Memorias Estrangelraç POR Fr. JOSÉ' MARIANO DA CONCEIÇÃO VELLOSO. TOMO llf. BEBIDAS ALÍMENTOSAS. C A C A O. PARTE III. — Qtils pottim Chocolatae nesclt ediiísin> Dot vecretmn meml>ris hahltum , floreimive venustae Píirpurhtm Maiestatis , dat dulcia cordl JLumina Loctitiae , me forte yiotentiof olter Lenè Ciere viros , Venerenf^tte accendeie succus. Coul. jUlS^OAi Na IíMPressam Regia. J^or QrÁam Superior, Anno Sic Chocolat* mitrlt y semençue accenãlt y et Auget , Hinc Veneris vires amplificando valet Bst hypoíondriacis , senibus , gravidisque saluirls , Rol; 01 c debilihus i tais y lai ore macris, Habersach p. 6o. Alíud. JJaec tona nux nummus popuVis erat unlciis Utis^ Censiis erat magnus , non tum sextertia mille Sed numerare domi''Cacaorum mille posse y Una arhor y parvi vectigol nohiíe fundi 'Et pascit Dominós , et vestit , et ornat , et armat * fíoc emitur penus omnis , et omne utensiie nummo\ •Eí si magna cíbum penúria denegat omnem , Jiic cihus , hic ipse est. O vera pecunia i at inter Vivitias mundi ( pudet , ah\) nostratis ineptas Possnmus et dites simul esse y fameque perire: Qiiam tu fausta , tuae si tantiim Hispanus avarus Qíiitis ofCSj gl non TeUtiris ^ America nvsseti Coul, p. 301» SENHOR- A Augusta Protecção de V.A R. , conce^ dlda aos primeiros tomos do Fazendeiro do Brazil , que tive a indizível honra de fazer subir â Real Presença de V* A,\ o Alvará . pelo qual V, A, R. foi servido mandar con* tinuar os trabalhos , principiados na Officina Litteraria do Arco do Cego , unida d Im- pressão Regia . 7ne animarão , sobre o pouco , que podem as minhas mesquinhas forcas lit- ter ar ias , e débeis talentos , a apresentar a Y* Á* R* , na cQntinuação dos mesmos traba- i^- lhos ^ lhos , huma afectiva prova da minha mnea interrompida obediência ás Sagradas deteve minaçSes de V. A. R. Isto he , SENHOR , a que pertendo dar , apresentando a V. A. R- nesta terceira parte do terceiro tomo do mesmo Fazendei- ro 5 que tem , em geral ^ por objecto Bebidas alimentos as , a cultura , a preparação , e o commercio da interessante ameiídoa do Cacao , de que se faz a alimentos a , e mais que to^ das saudável ^ bebida do Chocolate ^ conhech ãa feios Botânicos com o nome de 'Bebida di-* *vina ; Theobroma. O Chocolate , este presente , que o Me* ocico , e o Amazonas fizerao a Europa , he ho' je nella tão commum , principalmente , em Hespanha , e Itália , que os velhos sobre tu* do não poderião viver sem este precioso //- quor. No México era tão necessário , come se pôde conjecturar ^ vendo-se que oCacaofa-- %ia o fundo da sua riqueza y e servia em ^ lugar de moed^ no Commrcia , para se tet, enz ipi todas íis cousas necessárias aõ uso d^ 'vida , assim como entre nós os metaes \ mnda hoje se conserva a vulgar expres- são ^ o ter muito Cacao ^ por ter muito di- nheiro , o que deo occasião a Fedro Martyr Historiador d" America {contra os avaros) de o chamar dinheiro bemaventurado , qu^ se nao podia occultar de baixo da terra. Esta importantissima arvore , e fru* €to , que singularmente characteriza , e enri- ^ueeç os vastQs. bosques das margens d'ar quem , •quem , e d^além do grande rio do Aúazonâ^ no Estado do Grão Pard^ por se não achar em algum outro Continente , ou libas da -niundo y e ainda na mesma America ^ fora dos Trópicos 5 e mui principalmente , de baixa da linha equinocial , onde os raios do Sol re^ partem com igualdade as trevas , e a lu%^ digo 5 os dias , e as noites todo o anno^ Este singular património , daquelk njasta Continente , ainda hoje , SENHOR y existt tntre as Dri^das agreste ^ montesinha , t frík* fr agueira ; ainda hoje marchao Canoas a% 'Sertão a bater mattas distantes para reca* iher as suas salutiferas amêndoas. A sua fropria Pátria^ a seu respeito^ repousa nos braços da providente Natureza , esperando desta as espontâneas oblações dos seus fru- et os , que com nulo liberal lhes nao nega annual , e diariamente para os repartirem com o resto do mundo "velho , e novo : Âpe* Tias algum consente compensar' a sua bem fadeja indok com btfw,^ indiwivd. gota d^ sei^ seu suor. Como ella , entre nós , seja priva^ tiva deste Rei dos Rios , á vista do desleixa dos seus compatriotas , o resto do Brazil a. Ma com huma insensível indifferença , coma senão merecesse esta preciosa arvore , pela transplantação , huma pequena porção dos seus cuidados nos seus vergéis. Até d data presente se não tem ahra- çado o exemplo das Nações estranhas , e activas ^ estabelecidas no Continente^ e Ilhas •adjacentes , que a tem transferido para os. seus. !| A ; seus tertitorhs y plantado^ e ohsèrvado pela cultura a sua marcha natural , formando com ella deliciosas , e interessantes alamedas , e recebendo a dobre recompensa do seu útil na bebida , e na venda. Assim o fizer ao os Inglezes na Jamaica^ Barbadas^ etc. \ e os Francezes na Martinica , e Sc:o Domingos ^ etc. Assim o fazem os Hespanhoes em Cara-- tas ^ apesar àa sua naturalidade \ pois , pelo beneficio da cultura^ tem conseguido o seu Ca-- çao ter a melhor reputação , e , por conse-^ quen"^ quencia , no Qommerm , 0 maior valor \ > estimação* Dos Authores copiei tudo o que uai escrito a este respeito , que he até onde se poder ião^ estender os meus deveres , e for-* cas 5 faltando-me os conhecimentos práti- cos , deixo aos seus cultivadores , o juizo do que a respeito desta grande cultura se tem ercrito. Offerecendo aos Ceos ardentes votos pela perennidade , e felicidade do /7- l^minado Ggverno de F. A. R. , estabili^ '4ade da Real Família, t Monarquia, leija §s pés De V. A. R; O seu mais humilde vassallo -^r.Josc Mariana dn Conceição Vf^^*^^- FÁZENDEI RO t) O B R A Z I L CULTIVADOR BEBIDAS ALIMENTOSAS. TOM. Ill PJRT. III. MEMORIA I SOBRE O CACAO Pelo Abbade Rosief. • ^ Vkclon. unlven. d'Jgriciillura. ) §. I. Do Cacao , oji Cíicaoseirfi D O Cacao , ou Cacaoseiro se dão em Cayenfia flores* tas ou matas inteiras ; e os seus fructos servem de sus- tento aos Macacos. Observa-se que nasce espontanea- mente. Quando os Hespanhoes se estabelecerão no Me^ xico, se admirarão de ver que o Cacao fazia principal alimento daquelles povos ; e que se mantinhão em hum bello estado os que d^lle usavão. Esta planta nasço CO íiatiiralmcnte em a Zona tórrida d'America , principal- mente, em as regiões de Nicarágua, e de Guatimala, ao longo do rio dos Amazonas , sobre às Costas de Ca- racas, na Ilha de S. Domingos, etc. Como nunca cultivei, nem ri esta preciosa ar- vore , ignoro as particularidades , que lhe são concer- nentes. Eu extrahirei do novo Diccionario de Chomel este artigo inteiramente. Deve-se a siia descripção a M. de Jussieu , isto he a hum resummo da i\lemoria feita por elle em Cayena no anno de 17 n 7 ^endo enviado a ella em qualidade de Medico do- Rei , e como cor- respondente da Real Academia. Deve-se mais refe- rir á sobredita- Memoria que á obra impressa em Paris com o titulo de Historia Natural do Cacaoseiro enr 1719. Esta arvore se crava pela terra com a raiz mes- tra a hum.a profundeza admirável. Na sua superfície pro- duz esta raiz principal muitos barbalhos fibrosos que se alastiSo pela terra. A casca do tronco e ramos mais e menos he parda conforme a idade das arvores , delga- da , soffrivelmente igual , assas adherente ao lenho y que he leve,- esbranquiçado, poroso, molle , e que tem as fibras directas , em qualquer estação , que se corte' se lhe acha huma abundante seiba ; e se tiver pouca , se pode estar certo que a arvore caminha para a sux inexistência. As folhas na<;cem huma a huma revesadamente sobre hum mesmo plano. No principio são avermelha^ das 3 e mui tenras , ao depois duras j e se voltão d'huirt yer- ' ( 3 ) ^erde mais ou menos gaio á proporção que ellas en- x-elhecem : comtudo a parte superior he maij escura que a inferior. São penduradas , inteiras , c sem denta- duras, lisas, terminadas em pontas agudas, pouco drf- ferentes das folhas do limoeiro , divididas pelo seu com- primento em duas partes ignaes por hum forte nervo, donde por hum , e outro lado sahcm fibras obliquas assas sensíveis. O volume das folhas varia, segundo o grão de forca das arvores : tem ás vezes vinte pol lega- das de comprido e quasi quatro de largo na sua par- te media ; e outras não tem mais que nove , e quatro de largo , e outras tem proporções relativas a hum dos dous extremos. O peciolo , que oí> sustem ^ pode ter huma boa linha de diâmetro , e quasi pollegada e meia de comprimento , e he inchada em ambas as extremidades. Elias cahem successivamehte ,■ e outras, as substituem. Á arvore nunca parece despida. As fiores são mui pequeoas , e sem cheiro : nas- cem aos feixes , desde o pé da arvore até o teiço dos ramos grossos. As do tronco sahem dos lugares em que subsistem os vestígios da articulação das folhas , que a arvore produzio em a sua mocidade. Cada flor he sostida por hum pedúnculo débil , longo de sete a dez linhas , guarnecido de pelos muito curtos. O botão he feito como hum coração , paliido , com cinco faces , alto de quasi três linhas e de duas de diâmetro , quando muito. Estando a flor aberta , se percebe hum caiis da cinco folhinhas , estreitas , terminadas em ponta aguda , conravas com.o colheres , de hum branco ajasminauo A 2 HQ llil (4) ija sua totalidade ^ pallidas por fora , lavadas de inca?- nado por dentro. Tem cinco petalos dispostos em rosa ^ compostos 5 por dizer assim , de duas partes , das quaes a primeira pegada na base do pistillo he concava , em feição de capacete , de huma côr branca suja , mas cor-* tada no seu interior de baixo para cima de três linhas purpúreas qu« sobem até os dous terços da sua altura. Na extremidade superior e posterior deste capacete co- meça a outra parte do petalo , que representa huma es- pécie de espátula muitO' estreita , que sé vai alargando á proporção que ella desce e se lança para fora. Esta seí^unda parte do petalo he de hum amarello pallido. O pistillo occupa o centro do calis e cinco fios estrei- tos 5 pardos , compridos- , assds grossos na sua ori- gem, e termina-los em ponta 5 rodeão a base do pistillo. Desta mesma base sahem igualmente cinco estames que são fios menores , os quaes se lanção em forma de ar- co com a summidade ou topo na cavidade da primei- sa parte de cada petalo. Dfentro em quatro mezes o embrião se volta em- h^im fructo mais ou menos com- prido a que chamão cabaça. Tem este o feitio d'hum pepino 5 do comprimento de seis para sete poiiegadas , e três de diâmetro ^ salpitado de verrugas , terminado na parte inferior por huma ponta curva. Este fructo no principio he verde , ao depois pallido , e ultimam.ente amarello , quando fica maduro. AV vezes começa por ser de huma côr vermelha de vinho , e escura princii- palmente pelos lados , que dominão as rugas , e gra- dualmente se muda para mais pallido e para claro ;• áa ve- CO vezes , ao depois de huma mistura confusa de verme- lho eamarello, as cores , descahindo , formão hum ver- melho matizado de amarello escuro : e outras Tezes as mesclas de verde e de branco , que produ-zem por gráos huma espécie de ajuarello , se terminão no tempo da madureza por hum vermelho escuro ou carregado , mas salpicado de pequenos pontos amarellados. Estas cores não penetrão muito pelo interior da casca do fiucto : e esta casca a que chaiíião cabaça nas Ilhas te;xi a grossura de três até seis linhas , conforme a grandeza do friicto , e a idade da arvore , o qual con- tém hum.a substancia polposa , quasi de huma pollegada de grossura , no principio firme , branca , e alguma cousa tiiicta de vermelho ; ao depois , tomando huma consis- tência mais branda , ella figura ser huma pluma mui branca , acompanhada dliuma mucilagem , m.ais ou me- nos abundante , que goza d'hum sabor acidulo , quasi como o das sementes da romã. Tem no meio as suas sej-ncntes , ás vezes sem.:eíhantes ás nossas favas , ás ve- zes menoies , menos chatas , quasi da mesma figura que as folhas da arvore , mais grossas pela ponta , que se prende na plocanta. Esta placenta parece produzida pe- lo pedúnculo , que , prolongando-se , fórm.a hum eixo , ao qual correspondem as columnas , sobre que estão ar- ranjadas as sementes em andares. O numeio destas- varia de vinte a quarenta. O p^irenchyma he branco , algu- mas vezes hum pouco tinto de vermelho , compacto , car- pudo, molle, liso, mui carregado de óleo , amargoso, 4'imin gosto cstiptico 3 assas pezado relativamente a seu vo- CO volume , mui csmlgalhadico entre os dedos , e forma- do de dous lobos dobrados hum sobre o outro. A pelli^- cuia, quecobrç çstas amêndoas , lie lisa , mui delgada, da mesma còr que o parenchyma , mas, seccando-se , se faz d'hum vermelho pallido ou pardo. Dastas amen^ doas se faz o chocolate. §. II. Uso do Cúcati. O principal objecto , para que se cultivKo 03 Cacauseiros , he o grande consummo das suas amêndoas para a factura do chocolate, liquor muito alimentoso , e nutritivo 5 engraçado, que deo occasião , a que M, Von Linne o chamasse Theobroma , palavra Grega que se interpreta bebida dos Deozes , ou Divino. Tambern as amêndoas fornecem hum óleo por expressão, que se espessa, ou coalha naturalmente, q recebe então o nome de manteiga. Quer o P. Lr-J- ;;^ que se soquem ou pizem estas amêndoas, e se lancem cm huma grande quantidade de agua quente, para que , sobre aguando o seu óleo , se haja de tirar com maior facilidade : ao depois , quando já não sobe a superfície da agua, se expreme fortemente o marco, borrifando-o ainda com agua quente. Este meíhodo somente convém íí America , onde as amêndoas frescas são abundantes de óleo ; mas com.o eilas chegão seccas á Europa , e por consequência privadas de huma grande porção d^ sua humidade , se vem obrigados a torrallas , antes de as pilar, e quando tem fervido bastanre por meia hora, ?9 (7) «e tira tudo bem quente , e se esprertie com força : o óleo se ajunta na supetíicie do iiquor. Senão for suffi- cientemente puro , se repassão por muitas aguas quen- tes : o óleo se coalha , esfriando. O oieo de Cacao se conserva por muitissimo tempo , sem se fazer rançoso ; não tem cheiro , he assa's branco , e de Irum sabor agradável. Póde-se empregar nos mesmos usos que o da oliveira. Algumas vezes pa- cifica e faz cessar a dor das liemorroidas ^ applicando-se .^Igum alc-odão embebido nelle. As pessoas pacientes desta m.olestia podem, admittir o seu uso utilmente duas ou três vezes cada mez, para prevenirem a volta deste accesso, e fazer fluir brandamente as hemorróidas. As creoulas Hespanholas servem-se delle para embellezar a •sua pelle , e íirar-lhe as vermelhidões , e botões. §. III. Cultura do d acaoseiro. Chama-se Cacaosal ou Caçoai huma vergel ou plantação de Cacaoseiros ou Cacoeiros. Estas arvores re- querem hum terreno , que tenha fundo e maior fortaleza que levidão, fresca, bem regada, mas não inundada. Elles se produzem muito bem em huma terra argillosa. O terreno , que melhor lhe convejn , he o de huma terra negra , ou avermelhada , entremreada àe huma ter- ça , ou quarta parte de areia, com bastante pedregulho. Em os terrenos mais fortes , e mais húmidos o Cacao- •seiro se faz grande , e vigoroso , mas produz menos , por ficarem as suas flores sujeitas a cahirem , por causa s so- me..ce podem conter huma diminuta quantidade de ter- ra , o calor a penetra , e a dessecca , o que faz que o grão se não desenvolva tão depressa , nem também , como quando se planta em toda a terra. Poder-se-hia pòr em outra terra, mas elles morrerião promptamente. Outra incoramodidade destes cabazes he que , tardando- se algum tempo em as transplantar , as raizes os sobre pnssão 5 e ficando privado d^alimsnto o excedente , lica exposto ao calor do ar , e se secca a planta. Cs grãos não podem vegetar bem , senão em t^rienos íibsolutamcníe ncvos ; porque fornecem muito me- nrenos herva , e porque a violência e duração do fogo , que consummio as arvores , tem ao mesmo tempo des- truído as formigas, e gafanhotos, etc. Pelo menos no primeiro anno são mais raros. Para se plantar o grão se escolhe lium tempo de chuva , ou actual , ou pró- xima : Colhem-se as Cabaças maduras , e se lhe tirão os grãos , para os metter sem perda de tempo na terra. Faz-se esta operaçã® ou no fim de Junho , ou no de Dezembro : poem-se duas ou três amêndoas cm distan- cia d*algumas poliegadas humas das outras , ao redor de cada estaca, em duas ou três poliegadas de profun- deza , o que se faz facilmente com a mesma enxada , quando a terra he novamente lavrada , e se move ligeiramente com huma espécie de sacho : introduz-se cada amêndoa no seu buraco com o fim grosso para baixo , e se cobre com alguma terra. Como seja sujeita a mor- rerem alguns cada dia mais ou menos, os supranume- rários , que se plantarão juntos , e nascerão em hunj mesmo monte , podem servir para preencher os luga- res , dos que houverem de vir a faltar , e também ain^ da para se plantarem em outros lugares. Não se hajáo de escolher as mudas , que devem permanecer no lugar, senão ao depois de terem avan- çado de quinze atc-^vmte e quatro poliegadas de alto : as que se tirarem , devem ser conduzidas com destreza para lhes não offenderem as raizes, nem as das outras plantas, junto das quaes se arrancão , e também de não desordenar as que ficão ; porque o Cacaoseiro he mui- to delicado. Devem ser replantadas com a mesma prés- ( »o teza 5 e com a caiitella de não lhe deixar alguma raiz com a posição de se curvarem. He muito mais provei- toso de pòr , passados quinze dias , novos grãos no lugar daquelles que morrerão; e ainda, para supprir os pés, dos que se acharem adoentados. Não se determinou ainda em que distancia se hajâo de pòr as arvores humas das outras. Plantão-se de cinco a doze e ate quinze pés, sobre tudo, plantan- do-se em lugares montuosos. Os que as plantão jun- tas , observão que os Cacaoseiros , assim como os Cafc- seiros , conservados deste modo nas nossas Ilhas dão muito mais fructos do que se colhem em terra firme > onde estas arvores mais apartadas empregão huma maior parte da sua semente em se fortificar a si mesmas , de maneira que toda a vantagem , que tem sobre as das nossas Ilhas, he a da altura e da grossura. He sabido que , plantando-se estas arvores perto humas das outras , cobrem com maior presteza o terre- no ; e que , sendo espacejadas de outo pés , cada huma delias pode fazer huma sombra de mais de trinta pcs de circumferencia em três ou quatro annos. As hervas cessão de crescer debaixo deIJas : todo o trabalho se reduz em lhe tirar a herva de passarinho, e destruir os insectos : por cujo meio sem se multiplicar os braços , se pode replantar em outra parte huma grande quanti- dade d'arvGres , e augmentar por progressão em poucos annos o numero de Cacaoseiros. Quanto mais as arvo- res estiverem distantes humas das outras , por mais tempo seião obrigados a mendar , e a alimpar o ter- re- C Í4 5 reno. E assim , plarttando-se perto humas das outras , se podem ter vinte e quatro mil pcs de arvores , que rendão : ao meL-mo tempo que outros com as mesmas forcas , e em hum terreno igualmente bom só terão outo mil. As arvores , que não tardão em se tocarem , e entrelaçarem os seus ramos, parece, que e>tâo em me- lhor estado de se sosterem mutuamente, para resistirem aos ventos. O seu reciproco abrigo também faz que a chuva liies destrua menos fl-^res , e qr.e produzão mui- to mais cedo. Finalmente no casO , que ak"u.v.as ve- nhão a acabar, o vão que íka he muito menos sensí- vel. Pelo contrario , quando estão em doze ou quinze pés dedisrancia, huma ou duas arvores, rue venhão a faltar , formão hum gi^ande vazio , qus os ramos vizinhos nunca poderão encher , e que deixão por muitos annos muitas outras expostas a toda a acção do vento. Disse-se quç o ardor do Sol podia prejudicar aos Cacaoseiros , sobre tudo , nas terras aro^ilosas , e na- quellas , em que a areia dom.ina ; mas vio-se antes qus hum Cacaosal não pôde ser bom por causa da qualida- de do terreno , em hum terreno argiloso ; porqufe as raí- zes não podem entranhar-se. Em quanto ao que se dis- se acerca das terras soltas e seccas , a planta nova pa- decerá muito por causa do Sol , não se lhe pondo pe- los seii:i lados duas ordens ou írl eiras de Mandioca , a pé e meio do distancia dos Cacaoceiros : o que se faz ao rnesmo tempo , em que se planta o Cacaoseiro , ou ain- da antes hum m.ez, ou seis semanas. Este methodo taz cue vi nhuUa se veja abrigada, quando nasce ^ e qa. as her- C>5 ) hervas bravas não tenhão teinpo de adquirirem supe- rioridade. Neste caso se poderia preferir o Eambú ou Tacuara á Mandioca. A nrática da Mandioca requer c^ue se capine ou monde continuamente até que ella esLeja tão cres.ida que affogue as hervas. No fim de cuinze mezes, quando se taz a colheita da mandioca , se re- plantão outras em huma fileira , somente no meio de cada allea , ou avenida , e se providencea o resto do terreno com Melancias , Pepinos , Quigcmbos , Inhames batatas. Taiobas. Todas estas plantis cobrem a super- fície , embaratão a producção das hervas e fornecem ao mesmo tempo alimentos para a escravatura. Convém muito affastar estas plantas , quando se avizinhão .aos Cacaoseiros. Alguns cultivadores fazem regos nos seus Cacao- saes j para regarem 03 pés das novas plantas no tempo da estarão , até que a sua raiz mestra chegue a huma protundeza, onde encontre huma humidade habitual. O vento he muito mais perigoso para os Ca- caoseiros que o Sol. Já se tem fallado dos abrigos , que se fazem com muito cuidado ao redor dos terrenos com arvores : a pezar disto convém ainda também plantar algumas arvores pelo meio do Cacaosal , ou dos Cacao- seiros. As mais convenientes são as Bananeiras , ou Pacobeiras , arvores por outro principio muito úteis , mas muito desprezadas. Elias costumão ser quasi da al- tura dos Cacaoseiros , e adquirem toda a sua perfeição em doze , ou quinze m.ezes. O tronco tem quasi quin- ze para dezoito pcller^adas de tircumferencia , e só he com- C i6 ) composto dos peciolos , ou costas das primeira^ foIhâs-^ que se cobrem Inimas ás outras em feição de escamai de peixes. As folhai , que fazem liuma copa assas grandi no seu topo , ou summidade , tem cinco para seis pés de comprimento ^ e huma largUra proporcionada. Estas arvo- res dão xhuma multidão de renovos , ou filhos que den- tro em pouco , ou com muita presteza , adquirem o seti grão de grandeza ordinária , e á grossura das próprias arvores , e que a mãi e os filhos juntos fazem huma circumferencia de quinze para vinte pés de" contorno : finalmente são muito aquosas , e conservão actualmente a terra húmida e fresca : o que he muito conveniente ao Cacaosal. He verdade que estas arvores só fructiíicão huma vez , e que logo , que se lhes corte o fructo', morrem \ mas deve dizer-se que elllas nunca morrem ;"- porque os seus renovos , ou filhos Ó3 substituem e re- produzem sempre com proveito , fructificando no fim de oito mezes. Tudo isto indemniza as despezas do Ca- caosal. Deve-se lo^o rodear os qaàdrâdos com huma ou duas fileiras destas arvores plantadas a cinco e a seis pés de distancia huraas das outras , e formar outras or- dens pelo interior da peça. Em algumas paragens plantão Milho , Mandioca, e Algodoeiros, para as abrigar dos ventos ; mas estas plantas gastão muito tempo para ganharem huma certa ;\Itura , que não merecem contemplação alguma. O Ivlilho c a Mandioca, que tem precisão de serem colhi- dos em certos tempos determinados, deixão então os C 17) Cacaosíiros sém abrigo algum. A Mandioca serve de ri.?^-?nir o mal que os Cacaoseiros recebem das formi- ^-i ; porque estas são amantissimas desta planta e a preferem. Deita se na terra de ordinário ^ o grão do Cacao , antes de se desenvolver oU rebentar ^ sete até doze dias : os seus progressos varião muito segundo os ter- renos. A' proporção que a nova planta se faz grande , © botão j que constantemente termina a haste ou tron- co 5 se divide em muitos ramos , cujo numero communi-^ mente he de cinco , e a estes se chamão coroa da ar" vore. Quando haja de ter menos ramos , julgão qua se devem chapotar para dar oeeasião a que eJIa se fa-» ça huma coroa nova , que seja melhor que a primeira^ Cortão-se es ramos , que excedem este numero , como podendo fazer tomar a arvore huma apparencia defeituo- sa. Estes ramos produzem hum sem numero d^outros mais pequenos j e se alargão ou estendem horisontal- mente. O tronco continua em engrosssr e crescer ^ e as folhas somente vem nos ramos. A penas se coroão os Cacaoseiros , logo enttao a brotar ^ de huns a outros tempos , hum pouco por baix da sua coroa , novos pimpolhos chamados garfos. Ab donando-se estas arvores j sem os garfos ; estes la mentos formão y dentro em pouco tempo , hum gunda coroa , sobre a qual nasce ao depois hum pimpolho _, donde sahe hum terceiro , etc. ; e por destes rebentões , ou pimpolhos vem a primeira c^o*^ a íkar quasi anniquillada: A arvore se defina, e a T. 111. P. III. B S* gaça , sobindo consideravelmente , e todos os seos rir- mos se espalhão á direita , e á esquerda , de sorte qus a arvore se assemelha , em pouco tempo , a hum ar- busto enano sem tronco. Os Cultivadores ou Granjei- ros do Cacao acautellâo estas producçóes nocivas ás colheitas do fructo , cortando estes novos garfos o que quer dizer castrando estes novos rebentões , ou quando mondão , ou quando colhem. Deve-se fazer parar o lançamento , ou subida da Cscaoseiro em huma altura conveniente ; para se ter, não só maior facilidade em o colher ; mas também para não ficar tão exposto á tortura dos ventos : esta altura varra , segundo os lugares. A idade , em que comsça. a florecer , e a dar algum fructo não he fixa : de ordinário isto acontece ao depois de dezoito mezes , ou dous annos. Os que são plantados dão cinco ou seis mezes mais cedo. Em todas as estações- ou qiradras estão ornados de flores c de fructos. Todavia se costmna fazer ordinariamente duas colheitas principaes , huma em Dezembro , Janeiro , e Fevereiro ; e outra em Maio , Junho , c Julho. A colheita feita no inverno he de todas a mais estimada : a pezar drsso a humidade da quadra deve concorrer a que os fructos se hajão de se seccar mais diffícultosa- mente , e também de se conservar do mesmo modo.- O fructo gasta quarto mezes a formar-se , e a amadu- recer. O signal da sua madureza he ter, em os fundos ou cavidades dos arregoamentos , mudado de côr , e que o pequeno botão do fructo , que lhe fica. por baixo, se- C 19) seja a ultima cousa , que appareça de côr verde : neste tempo se deve colher o fructo; Para se fazer a sua colheita , se põem hum esera- Vo em cada fileira de Cacaoseiros pela allea , ou ave- nida para fazer descer òs fructos , que estiverem de vez. Ao mesmo tempo que os colhe , os mette em hUm cestOí. Este cesto algumas vezes está nas mãos de outro, que o acompanha j e qUe o vai despejar no fim da fi- leira. Estando tudo junto e posto em montes , se lhe tjiiebrão as cascas , ou cabaÇas no mesmo lugar passados três ou quatro dias. Despegão~se as amêndoas da mas- sa ou mucilagem , que tem 5 e de tudo , qtie as rodeia ^ c se trazem para casa. As cascas ficando juntas , nos Cacaosaes j apodrecem nelles ; e lhes servem de adiibo $ iras devem-se acaute.llar ^ que se lhe não hajão de ajuntar insectos. Far-se-hia hum grande prejuizo ás plan- tas , que lhes houvessem de ficar próximas^ Ás folhas dos Cacaoseiros adubão as terras igualmente , ou qtiando seenterrão, lavrando-as , ou deixando-as ficar espalhadas pela sua superfície , pois ellas concentrão a humidade. Tão de pressa que as amêndoas hajão deehegat a casa , se ajuntem nos cestos , ou em grandes cochos , feitos de madeira , levantados da terra em alguma dis- tancia. Deixão suar por quatro ou cinco dias 5 mais, oU menos, bem cobertos de folhas de caetc, ou bananeira do mato , ou também com algumas esteiras seguras com tábuas , que se lhe põem por cima , ou com pe- dras. Todas as manháas e tardes se devem vokar de C =10) baixo para cima. No tempo desta fermentação elles sé fazem de huma còr vermelha denegrida. Passado este tempo , se expõem por algumas horas ao sol vivo e ardent^ sobre grades , ou em tabo^ leiros 5 cujo fundo seja raso , para que se lhe dissipe o resto da humidade , que os poderia arruinar. Movem-se c revolvem-se frequentemente , e ao depois se acaba de fazer seccar a hum Sol mais moderado , tendo-se cuidado de os cobrir de noite , e quando o tempo es- tiver húmido , ou chuvoso. Estando as amêndoas bem seccas , se guardão em barricas y e em saccos no celeiro até se ter occasião de as vender. Ivl. Artier approva muito , que se hajão de pôr de infusão em agua do mar por meio dia , e que ao depois se façâo seccar segun- da vez. Hum Cacaosal bein conservado rende extraordi- nariamente. As plantas , que servem de as defender , ou abrigar ,, reembolsão com o seu rendimento todas as despezas , e gastos , que se fazem na sua plantação ,. e cultura. Todas estas despezas se reduzem ao sustento d'alguns escravos , que talvez possão viver com as pro- ducções destinadas , principalmente , ou de primeira objecto , a favC^recer , e a conservar o Cacaosal. As a- mendoas do Cacao dão hum ganho muito real. Ava- liando-se o producto de cada arvore em dous arráteis de amêndoas seccas , e seu valor pela renda de sete soldos , se lucrará quinze soldos de cada arvore. Vinte negros podem muito bem cuidar em cincoenta mil Csb* caoseiros. Pâ- C 2' ) Para se conservarem os Cacaoseiros em bom es- tado , por vinte ou trinta annos , precisa-se ter cuidado de lhe dar todos os annos dous trabalhos ; o primeiro , ao depois da primeira colheita do estio , e algum tem- po antes das aguas , a saber , de os aquecer com terra quente , depois de os ter bem cavado ao redor. Isto «mbaraça que as pequenas raizes apanhem ar, e se se- quem. Segundo de cortar as pontas dos ramos estando seccos 5 de os cortar o mais rente á arvore que for pos- sível , os que estiverem damnificados , mas não he mis- ter lembrar-se de encurtar, ou diminuir os ramos, que estiverem vigorosos , nem fazer-lhes grandes feridas. Como estas arvores abundão em suecos lactescentes , e glutinosos se fariáo huma dilatação , que sem grande trabalho se não poderia remediar. Os Cacaoseiros reconhecem por seus declarados inimigos diversas espécies de formigas , bizouros , e ga- fanhotos a que chamao crujuets. Estes comem as fo- lhas , e por preferencia os grelios , ou ramos novos : o que faz acabar a arvore , e pelo menos a retarda muito. Até o presente se não tem conhecido outro meio de as defender , senão de os fazer procurar cuidadosamente, para os destruir o mais que for possível. Os cupins , chamados em Cayenna piolho da ma^ deira , ou formiga branca , fazem grandes estragos ; mas as formigas vermelhas ainda o fazem maior. Basta huma noite unicamente , para destruírem as maiores plantações. Elias procurao , por escolha , as arvores no- vas , principalmente. Destroem-se j deitando algumas pi- c «o pitadas de sublimado corrosivo no ninho , oó na sua vereda. Os insectos que tocarem o sublimado acabâo , cm poucas horas , e passãp a contagio , e com elie a inorte a todos os de mais , que com os tocados se mis- turão nos seus ninhos. Em quanto ás formigas vermelhas , o melhor meio de as destruir he cavar-lhes os formigueiros , on^ de morão , e lançar-lhes em cima potes ou barris de agua fervendo. Eu julgo que se poderião acrescentar aos meios , applicados contra os insectos pelo Author desta Memo- ria 5 os de que se servem , para fazer morrer os ralos, Tendo-se descoberto o ninho das formigas ^ he preciso cobrir com algum azeite á superfície do terreno crivado de buracos ; mas antes precisa molhalla ligeiramente , para que, se a terra estiver secca , não haja de absor- ver o oleo , ou azeite. E logo ter vasos promptos com agua 5 e derramallos nestes buracos em pouca quanti- dade sem interrupção ; míis tanto quanto os buracos possão receber. Esta agua ., enchendo suçcessivamente ^s cavidades , leva consigo o aztâite ; e todos os inser ctos 3 que deste se cobrem , acabão. Como elles todos em a abertura dos seus bofes , ou traquea arterií^ nas costas , perto do coçolete , este azeite lhe fecha ^ artéria , e , n^o podendo o animal respirar , morre. #^R- (íj) ARTIG O SOBRE O CACAO Por M. Bryan Edwarcfs. (Hlstonj õf tlie West Indles tom, II. pag. 507.) O Cacao 5 ou noz do Chocolate , producção tão dè- Jicada , como util , he natural do Sul d*Ameiica , e di- zem que viera á Hespanhcla , ou S. Domingos, de al- guma das Províncias da nova Kespanha ^ onde , além de produzir aos seus naturaes hum artigo de sustento , lhes servia em lugar de moeda , como hum médium descambar. Cento e cinco caroços valiáo j como hum real dos Hespanhces. Fsta circunstancia parece mostrar que, se seus antigos moradores do Sul d'America foião emigrados d''algum dos. paizes da Europa, cu da Azia esta emigração fora feita era tempo táo recuado què ainda nelle os metaes não tinhão sido convertidos em moedas , e ou de alguma sociedade , --^ujo progresso. na civiiisação não tinha feico grande avanço. Os Hespanhoes ^ entre os quacs ò- Cacao forma hum grande artigo do seu ccuimercio , dirigem a sua cultuia da maneira seguinte. Tendo-se e?;colhido hum. lugar plano (preferem as terras negras profundas , que sejão abrigadas em roda poF mattos espessos , enj razão de ficarem os Cacaoseiros abrigados dos ventos} ,, lhe ar* C24) arrancão os cepos , c alimpão toda a herva , então o, cultivador Jhe abre hum certo numero de covas , que. tenhão hum pc de comprimento ;. sendo estas abertas , com seis, ou oito pollegadas de altura, neste meio tem- po , escolhem os fructos do Cacao mais grossos , e com- pridos , e que estejão bem maduros , lhe tirão os grãos e os põem de infusão na agua, dentro em huma vasilha. Cpm este artificio rej,e.itão , como inúteis , os que sobre, íiadão, e os que vão ao fundo, lavados, limpos, ou çsfollados da. pelle, 5e conservão na agua, até que prin- cipiem a abrolhar, çu a germinar , e nestes termos, 5e juh:ãp promptos , para serem plantados. O granjei- ro , ou proprietário , tonria então folhas de bananeira , ou outras , qiie sejãp fargas , e forra em torno toda a cova 5 deixando todavia huxna porção delias de algur mas pollesradas acima da terra, ou do nivel da cova» enche-a de terra , e mçte nesta três, ou quatro giãos, em figura triangular , fazendo para isto hu;n pequeno^ buraco com o dedo , que tenha cada hum perto de, duas pollegadas de profundeza , dentro dos quaís pcem. os grãos com o topo , donde, rebenta o olho , para baixo , e se cobre levemente de terra , e se passa por cima o excedente da folha , ç segura a. esta, pondo» lhe huma pedra , para embaraçar a que se abra. Desta maneira se plantão todas as avenidas do Cacaosal. No, cabo de oito dias se encontrarão todas as, plantas já j^erminadas , e postas fora da terra. As folhas então se, rasgão , de sorte que não hajão de impedir o seu cres- cimento, para lhe seivirem de anteparo contra os ardo*. C ^5 ) fes do Sol. Poem-se também outras foJhas , ou ramos ao redor da cova , e para isto escolhem as folhas das Palmeiras reaes. Estas se cravão facilmente na terra pelo talo Cjue he rijo , o que se continua por cinco ou seis mezes , substituindo-sc-lhes outras , quando estas mur- chão , ou seseccáo. Também, aconselhão que se plante a arvore do coral (TuinÕtúbo) a que também chamão arvo- re dos feijões , e esta gosa para este effeito de huma geral acceitação. Deve-se plantar da parte doSudueste, e cresce igualmente com os Cacaoseiros , servindo-lhes de anteparo. Convém lembrar sempre que os Cacaosei- ros unicamente ílorecem á sombra. Nascendo todos os três caroços , que se pozerâo nas covas , he mister que , quando tiverem dezoito até vinte dedos de altura , se tire hum , e se deixem dous , os quaes , tomando diversas direcções , se deixao ficar ; porem raias vezes acontece que todos , ou verdadeira- mente mais do que hum destes , hajáo de nascer ou tomar raiz , e este he o motivo y que ha , para se plan- tarem três na mesma cova. Logo do primeiro anno as arvores entrao a pro- duzir, e só no oitavo cher^ao ao ultimo ponto da sua perfeição. Então produzem cada anno duas novidades , dando cada arvore em cada huma destas de dez a vin- te arráteis , conform.e for o terreno j em que se planta- rem ; e lhe correr o tempo ou estação. Mas a delicadeza do talo, que assignala a sua infância, se faz distinguir em todos os tempos co seu crescimento. He mui ar- riscada nas ventanias fortes , e no primeiro repontamen- to C 26) to das secca<;. Tem acontecido morrer a maior parte de hum CacaosaJ no curto período de huma única noi- te 5 sem se lhe poder conhecer a causa de hum tão fu- nesto acontecimento. Estes casos tem dado fundamen- to, para levantarem idéas supersticiosas a respeito des- ta arvore , e entre outras he que o apparecimento de algum cometa lhe he sempie funesto. Sem embargo da malignidade da influencia dos cometas 5 e a pezar dos cuidados e precauções, que se requer para o primeiro estabelecimento de hum Cacao- sal 5 he certo que a cultura desta arvore foi tão exten- siva 5 como intensiva , nas Ilhas do Assucar por muitos annos , depois que passarão a estar sujeitas ao dominio Inglez. Blome _, que publicou huma breve relação da Ja- maica em 1672, falia do Cacao , como fazendo naqueile tempo hum dos principaes artigos da sua exportação. (( Ka nesta Ilha , diz elle , neste tempo dezaseis ave- nidas de Cacao , e muitas outras plantadas de novo. » Presentemente julgo que não ha huma só avenida de huma a outra extremidade da Ilha. As poucas arvores , que ainda hoje nella se vem interpolladas , ou destaca- das , todas são restos daquelles bellos e floridos passeios que em outros tempos aformoseavao e adornavão este paiz. Tudo acabou debaixo da pezada mão da exacção JVlinisterial. A alcavala , que pagava o Cacao já embar- yicado , montava não menos que a duas libras e dous xelins por quintal, fora sete xelins , e penis e meio , que se pagavão nas Alfandegas , ou Aduanas : o que tudo vinha a montar acima de quatro centos e oito porcento sobre o seu valor commcrd-J, Con- (»7 ) Confio que o gravíssimo erro de onerar com im- j:^siçôes as nossas producçoes Coloniaes se tenha mui- to bem feito conhecer. Alem disto , he necessário saber-se neste lugar : <]ue as nossas Ilhas do Assucar não poderão já mais, ao depois deste facto , entrar segunda vez em concorrência com os Hespanhocs Americanos na cultura do artigo, de que fallo. Presentemente os únicos Cacaosaes de al- guma montanha 3 que existem nas nossas Colónias, são em as Ilhas de Granada, e Dominica ; e a quantidade, que se exporta delias annualmente não pôde ( ao meu ver) ter huma avaliação mais avultada que a de qua- tro mil saccas de cem arrobas cada huma : que pode na Praça de Londres ter o valor de dez até dezasete fiiú Jijíras esterlinas (56.000(^000 até 61.200^000.) Nota. O Cacaoseiro assim em grandeza como em fígurg, se pôde comparar com huma ceiejeira negra, A sua flor tem a còr açafroada , he sumn.amente linda , e seus fructos , estando verdes , se assemejhão ao pepino ; e rebentão de qualquer ponto do seu tronco im.mediata-- mente , e também dos seus grandes ramos. Quando amadurecem varião de côr , passando então para huma azul avermelhada puxando para a morada , ou purpú- rea , e toda de veias de pontinhos colorados. Fallo do Cacao ordinário ; pois ainda se dá outra variedade que produz fruçtos maiores de huma côr delicada amarella , QU a 2% ) ou côr de limão. Cada hum dos seus fructos contém de vinte até trinta sementes ou grãos mui semelhantes ás nossas amêndoas, que tem hum segundo envoltório feito de huma substancia polposa , branca, molle , e doce 5 coberta immediaíamente de huma tona mem- branosa. Seccão-se estes grãos , e ao depois se embarri- cão 5 para se enviarem ás praças , e mercados da Europa. Ora estes grãos requerem mui poucos preparativos. A final se lhe tira a pelle , quando se quer fazer hum bom chocolate. Ptirece-me que os páos , que se usão em In- glaterra com este nome , trazem da legitima e genuina semente só a ametade , e que a outra , ou o que lhe falta-se , e suppre com a farinha , ou sabão Castelhano. Contemplado medicalmente dizem que o Choco- late he muito forte , ou pezado aos estômagos débeis ; mas 5 pelo contrario , nas índias Occidentaes , por repetidas experiências , se tem demonstrado que he em alto gráo balsâmico, e restaurante. O Coronel Montagú , Inglez, Crioulo de Jamaica ; e o primeiro branco , que nasceo nesta Ilha , ao depois de ser conquistada aos Castelha- nos pelos Inglezes , avançou até á grande idade de cento e quatro anmos , e nos últimos trinta que viveo ratissima vez usou de outro alimento, fora do Choco- late. mt' C^9) MEMORIA 11. SOBRE O CACAOSEIRO Por Guilherme Piso Hol landes. (^Manússa aromática Cap. XVlII. p. 187.) A S arvores denominadas Cacaoseiros espontaneamen- te vicejão nos lugares banhados e lenteiros da Nova Hespanha, especiahnente, em Guatimala, e Nicarágua. Os Médicos Mexicanos distinguem ; huns quatro espécies , outros cinco. Entre tanto todos os Médicos concordão C|Ue os fructos de todos , cujo conhecimento he, o que nos interessa , gozão da mesma faculdade , c tem o mesmo uso, a pezar de se apartarem huns dos outros, «guando descrevem as arvores , variando entre si na des- ci ipção , figura , e tamanho. Estas sáo de huma indole tão delicada , que não somente estranhão os terrenos forasteiros, mas ainda, dentro do seu próprio, no seio da sua pátria , não soffrem os frios nocturnos , os ven- tos tempestuosos , os ardentes calores do Sol. Donde vem que só nos valles sombrios hajão de apparecer aquellas, que nascem espontaneamente dos grãos, ou caroços , cabidos das próprias arvoves : e de cujo facto a arte , imitadora da natureza , ensinou aos Cultivadores , seos compatriotas que , para gozarem do seu rendimen- to, ( 50) to, as cíeVenâo plantar junto de alguma arVoré sombria ,■ e copftda, á qual por este motivo derão na língua Me-^ xicana o nom^ de Cacao(]uananthH , que quer dizer mãi do Cacaoseiro ; para que lhe servisse , como de escudo , que a ampare contra as injurias , e inclemências das es- tações. Elias porém se domesíicão com muita facilidade. OsHespanhoes cultivão florestas inteiras de Cacaoseiros , com o mesmo gosto , com que na Europa se plantãa vinhas , e Olivaes. Desde o segundo anno principião a fructificar , e em cada anno duas vezes offerecem os seus fructos. Fazem-se duas colheitas ; porém a mais abundante , e de melhores fructos he a de Junho , a outra he em Janeiro. Envelhece nó vigessimo anno , © então se faz infecunda ,- ou infructifera. O que temosf dito he commum para qualquer espécie. Em quanto a estas 5 a primeira e mais estim.ada, ou reputada princi- pal, he a chamada Caçava (juathiutl ^ sobre qUe falíare- 1-nos ao depois. He próxima esta á segunda , chama-- àTiMecacauatl^ assim na corpulência do tronco, grande- za das folhas , como no tamanho dos fructos. A ter- ceira appelidão Xoehícacaitat! , que he menor, e produz- fructos menores, e cuja semente por fora he rebicada , ou vermelha ; e por dentro tem a eòr das outras. A quarta he a menor de todas , e por isso a conhecem pelo nome de Tlascacaiuul y ou Cacao humilde. O seit fructo he o menor de todos , mas com a mesma côr dos primeiros. Todos estes fructos gozão de faculdades idênticas : as ultimas tem o maior uso nas bebidas : e as primeiras, para servirem de dinheiro no Commercio* A ih CiO A primeira , que he a principal cie todaf? , lie de huma grandeza mediana na altura , e lindamente fron- dosa, e copada : tem as folhas acuminadas , mais estrei- tas, e maiores que as das laranjeiras. Herrera as com- para ás folhas do castanheiro , sentadas no tronco , e dotadas de hum único nervo, direito, do qual se repar- tem muitas veias obliquas, que se dirigem, para aponta. A suix l3or he muito vistosa pela sua grandeza , e eôr amarella para a esbranquiçada , como a do açafrão. Quando caduca, lhe sobrevem certos filamentos delica- dos, verdes, oblongos, e pennujentos, e depo is appa recém os fructos com figura turbinada , aos qiiaes cha^ XTiZO Cacniiccntli, E?;tes , quando ficão de vez , ou madu- res, não cedem em bondade aos melões em grandeza, grossura, e peza. Sáo da huma côr açafroada, passandp- da amarella para a alvadia. , ou alvaçã. Prendem-se Uíts arvores por hujii pé muitíssimo curto.. Tem pelo- comprimento do corpo vários regos., vinte caroços ^ cu amêndoas, que se agarrão a huma pilastra , que a fru cia tem no meio. Jmitão no seu íamanlio a-s sementes; grandes dos Carrapiteiros , ma^ a]gi;m tanro maiores.. i^ão vestidas de huma pellicula ruiva, a cual . quando: se tira, aparecem em figura renal , cu de rim de vacca ,. pelas incisuras , com que se divid-. A sua substanci^, interior he branda , pela maior parte de côr parda , di« Vidida em partículas desiguaes ; mas que estão intima- mente unidas., e de tal sorte unctuosas , que sem vio>- lencia, ainda que com muita lentidão, leçumbra algu» «na gordura. :. dejia, se tir,a huma. nuiito miiior: quantidade- des» desta , Ho ciie costunião dar as nossas arnendoas por expressão. Esta polpa tem í;ua iiiaiugerr: , sem que cem tudo a haja de fazer desagradável ao gosto. He mui nutritiva , refrigerante , e de hum temperamento quasi frio, e húmido. Taes s2o os caroços, chamados pelos conterrâneos Cacaliuatl , cuja palavra corrompe- rão os Hespanhoes em Cacao ; e por cujo motivo se procura coni tanta anciã esta arvore ; que faz a base principal do Chocolate , género de muita conveniência, que a faz ter em muita estimação, assim pelos Hespa-. nhoes , como pelos índios. Estas sementes , seccas ao Sol , durão por muito tempo , sem se corrorpperem , ainda que em.barcadas , as conduzão á Europa. Ante^ de entrarem os Hespanhoes nestas ter- ras , tendo os seus naturaes desprezado a factura do vinho, sem embargo de possuírem muitas videiras bravias , que nascem de si nícsinas , strn cultura al- guma , pelos seus territórios , e produzc^m uv;is de çòres differentes. Prepararão huma simples bebida , unicamente , destas amêndoas , sem ll;e entrar outro algurn ingrediente , nem cousa ah'Uma d;;qucllas , que agora constituem esta bebida no ponto de .soberba, cm que se aclia. Delia usavao coa^.o de liuma tizana para extinguir a sede, e moderar o calor do fígado, e. dos bofes. Ora devemos ajuntar aqui : que os seus patri* cios as estimavam tanto, que náo só se servião delias, como in<4redi.^nte de huma bebida mui delicada , e alimentosa ; mas também como hum numerário, qua re- Ci) ) representasse os outros bens , substituimlo-os ao di- nheiro metallico, cujaS vezes faz tão primorosamente,; quanto lie o nenhum risco que tem de poder ser fal- sificado pela sua duração branda , e tenaz substancia, e os mais principaes prémios da vida erão comparados aelles, quando era necessário. Pedro Mar tyr , hum dos primeiroá historiadores d'America , á vista do uso po- lychresto deste fructo , exclamou admirado, e com ra- 2ão : í:^ oh ditosa moeda ^ (jite administras ao género hu^ mano hitma suave , e ittil bebida , e preservas aos seus possuidores da infernal peste da avareza ; por quanto ^ nem podes ser enterrada , nem guardada por muito tem-' po ? -i Hernandes , outro Escriptor , descobrio na$ folhas desta arvore os grandes volumes da condição hu- mana. :r; No velho mundo (diz elle ) , e nos antigos tempos , (jiiando se necessitava d'alguma coma necessá- ria à vida do homem , (jue se procurava dos (jue a ti- nhão , não se pagavão a dinheiro metallico. Ainda nao tinha entrado no gijro o ouro , e a prata , em que se visse insculpida a Imagem dos Reis , Príncipes , e do ^ado. Vlvla-se permutando , como cantou Homero , oS Jructos , que se guardavao , e dando-se huns aos outros se prestavão reciprocamente hum mutuo soccorro. Elles cunharão metaes , exprimindo nelles milhares de figu- ras diversas , como se tem visto , e actualmente se vc. Mas estes signaes , representativos da avareza , e da ambição, não tinhão ainda abordado a este novo mun- do , menos penetrado o seu interior , ou erguido a sua T.IIÍ- P.JÍI. C ça- (34) íabeça até o témpò, ém que os nossos, impeli idos da força dos ventos , e das vellas , o afferrárão , e accom- mettêrão. (^0 nsta nos tomos da Matma Medica dê Biazii^ MÈ- C JO mmÊBmam MEMORIA IIL 5,OBRE O CACAO Por Felippe Miller. ( Dícítlonàire des Jardiniers, ) S2j Sta arvore he de origerh Americana , pois nasce na America abundantemente , sem cultura alguma , en- tre os trópicos j mas principalmente em Caracas ^ énai Carthageha ] junto ao rio das Amazonas •, no isthmo dd Darien , no paiz de Honduras , em Guatimála , Nica- rágua. Cultiva-se em muitas posísessões Francezas das ilhas , e também nas dos Hespanhoes. Mas, a aígun^s annos ^ que totalmente se abandonou a siia cultura nas possessões Inglezas d'America , de sorte que , consum-^ - mindo os Inglezes muito Chocolate , se verh obrigados a comprar as suas amêndoas aos Francezes ^ e aos Hespanhoes , que lhas vendem caríssimas ^ o que na realidade deve causar hum grande descahimento na bar» lança do Commercio em prejiíizo dlnglaterra. Se os plantadores , ou cultivadores de nossas Colonial .applicasscm alguma industria , ainda que esta fosse mui .pequena, seria muito facil de se; remediar este inconve- <íiiente , plantando-se o Cacao , naquellas paragens ^^ •que nao fossem boas para a plantação á,\i Cannas as- C US' '. ,J: . C í« ) sucarelras , ou assucaradas. He muito provavef , que cilas nestes lugares produzirião muito bem ; pois , sem dúvida alguma , antigamente as nossas Ilhas produzião huma quantidade muito grande destas amêndoas , que não só fartavao ao consummo Ingfez , mas ainda se distribuião em huma muito grande quantidade por toda o resto da Europa. Pelo fim de se animarem os nossos Americanos Colonos á cultura desta planta , quero dar huma sua des- cripção muito exacta ; eu indicarei a cultura , que' lhe he mais conveniente nestes climas : eu farei conhecer a que tiverão os que o procurarão multiplicar em as nos"- Sas Ilhas, e, por fim , darei os meios , que se devem ^ ou merecem empregar, para poder ser conservados nos jardins , ou hortas d'lnglaterra dos curiosos. Querendo-se fazer hum Cacaosal , ou plantação de arvores de Cacao , ou Cacaoseiros , antes de tudo se deve escolher o terreno que lhe seja próprio , e a ■melhor exposição , que lhe pôde convir , e sem estas duas circunstancias , ou condições, o seu êxito seria muito incerto. Como quer que os grandes ventos lhes sejão muito contrários , e que , sem perda de tempo , oa n'iujm instante possuo ser destruídos , se elles ficasseiíi expostos a elles , piecisa-se escolher hum sitio , ou posição , em que hajão de ficar abrigados. As baixadas , cavadas pelas torrentes , que se precipitão ou correm dos montes, lhes são muito favoráveis: estas quebradas ou baixas , a que os moradores ou visinhos costumão clumíT G«í//íVj y (e no Brazil bihcas^ são mui con>- muns ; (57) nnins ; ecomo geralmente sejáo muitq extensas , muitd largas, e muito profundas, e que de ordinário são mui pouco cultivadas, o seu terreno he rico, e húmido, e por isso estas arvores prosperarião nelles , e farião cres- cer indizivelmente ns reiídas dos seus proprietários , ou donos , que actualmente lhes não servem de cousa air guma. Além disto, fallo com a experiência die muitas pessoas, que apouco tempo tem procurado fazer tenta- tivas acerca destas mesmas paragens , as. quaes forão compensadas por acontecimentos felicissim.os e comple- tos. Quando não hajão , ou não possuas semelhantes quebradas, ou que o seu numero, ou quantidade não sejão bastantes para fazerem granjearias deste género , se hajão de escolher lugares bem abrigados por grandes arvores ; e no caso de que não hajão estas , queirão plantar três , ou quatro fileiras de outras ao redor do espaço de terra , que se houver de escolher para este esta- belecimento, empregando aquellas espécies de arvores, cujo crescimenro for mais prompto. Ora , além do que fica dito , será preciso plantar nor dentro destas fileiras , e em distancias convenientes algumas bananeiras , que crescem com huma indizível presteza , e cujas folhas , sendo tão largas , são muito próprias para formarem bons abrigos para os novos Cacaoseiros. Os Cacaoseiros , que são cultivados ralamente , se levantão a huma altura maior que a de quatorze, ou quinze pés , e os seus ramos igualmente não se a- líirgão muito : de maneira que , sendo as barnaneiras plantadas em linhas apartadas de vinte e quatro pés, hU" ( 3«3 fiumas áas outras, haverá entre ellas hum espaço suP. ficienté para duas fileiras dfe Cacãoseiros, que se situa^ ráò muito ásuà vontade, esfando éstès separados entre si por hum intervalo de dez pés. Ás arvores desta es- jjeçie, que se encontrão bravias pelas fragas, e lugareS incultos, geralmente síbmúitò mais corpulentas que as qufc se cultivâo, o4ue pôde ser causado pela visinhan- Ç3 das outras arvores, em cujo meio ellas nascem. Nes^ ia posição acão abrigadas de todos os ventos, e não es- tão expostas ao5 mesmos perigos que as que forao t>lantadas : d'outra sorte , como estão mais fechadas , cu apertadas , que o vento não pódc circular ao redor del- Jas livremente , são obrigadas a procurar a altura. Em huma granjearia não se deve pertender que as arvores çubão a huma grande altura ; porque , quanto mais cl- Jas forem baixas , tanto mais seráo fáceis em deixar co- Jher os seus fructos , e também ficaráõ menos arruina- das na sua colheita , e ultimamente ficão muito me- pos expostas a serem açoutadas pelos ventos, e venta- tieiras. Os visinhos das nossas Ilhas não querem que ellas subão á maior altura que a de quatorze ou quinze pés, O terreno , em que estas arvores se dão melhor , he o que se compõem de huma terra húmida , rica , e profunda : ellas produzem geralmente hum.a raiz , que se crava pela terra perpendicular , e profundamente. Se neste seu encravamento encontrarem algum rochedo perto da superfície da terra , rara vez prosperarão , e te- lão huma existência de mui curta duração j mas poréiii em C 39) cm huma terra rica, profunda, e húmida, produzirá^ fructos em grande abundância, passados três annos da sua plantação, e os continuaráp a dar por outros mui- tos annos. Antes de se começar esta plantação, se prepara aterra, cavando-^ profundamente , aceirando-a detodas as raizes das arvores , e das plantas ndcivas , que repuj. JuJarião , passada a primeira chuya , se as deixassem ficar pela terra , e prejudicariao muito ao crescimento da plantação ; por que seria quasi impossiyel de purgar -a terra deJJas , sem offender aos Cacaoseiro?. , que come- çassem a nascer. Estando a terra preparada desta sorte , se riscão a cordel as' fileiras, por que se devem plantar as amên- doas , e se arranjão em quinconce em iguaes distancias por todos os lados , e de maneira que as bananeiras postas entre estas linhas possao concordar com o quin- conce dos Cacaoseiros , postos em cada ordem , ou lenque. Plantão-se os grãos pelos lugares, eiíi que as ar- vores devem existir ; porque, se ellas houvessem de ser transplantadas , diffícul.tosamente poderiao subsistir nel- hs , e quando houvessem de resistir, certamente não fariãp então progresso algum; pois que, sendo as suas raizes principaes muito delicadas , todas as vezes que as quebrassem , lhes causaria infallivelmente a sua to- tal , e inteira destruição. Convém que se plantem sempre estas amêndoas cm hum tempo chuvoso, ou nas aguas j e ao menos em it-: C 40) emhnm tempo anuviado, que dó algumas esperanças de virem as chuvas proximamente. Como os seus fructós amadurecem em duas estações differentes , a saber , por São João , e pelo Natal , as plantações se podem fazer em ambas. Escolhem-se as raiiendoas mais maduras , e mais sans; porque, sendo más as que se empregarem', se perderia todo o trabalho , e seria boWada toda a des- peza. O modo de as plantar he , fazendo três buracos m terra de duas , ou três pollegadas de distancia hum do outro , no lugar destinado para cada huma das ar- vores : ponha-se em cada buraco huma boa amêndoa , em quasi duas pollegadas dé profundeza ^ e se cubrão ligeiramente de terra. Planta-se de ^rdinario três amêndoas em cada buraco •, porque he huma casualida- de germinarem todas , e quando venha a acontecer, não poderão ter a mesma força , e hum vigor igual. Quando as plantas , que delias provierem , houverem de ter hum anno de crescimento , se arranquem as que, forem mais fracas , e no lugar somente se hajão de deixar as que estiverem mais vigorosas ; porem he necessário ter-se muita cautella , quando se fizer esta operação , para não desordenar , e damnificar as arvores , que íicão. Convém observar-se , que as amêndoas só conser- vSo o seu gérmen , e por consequência , só são pró- prias a serem plantadas muito pouco tempo, depois de passada a colheita , de sorte que he impossivel trans- portallas para longe para este uso ', e assim também tellas por muito tempo fora da terra no seu paiz natal. (41 ) Os Anthores , que tratarão da cultura desta plan- ta , se lembrão de três espécies d amêndoas , que elles distinguem pela còr da sua pelle ; a primeira , he de hum verde esbranquiçado ; a segunda , dlium vermelho denegrido ; e a terceira , entre vermelho , e amarello ; mas estas variedades não constituem espécie , e por tanto não são especificas , e a mesma arvore pôde pro- duzir humns , e outras , como acontece ãs nossas avel- lans , que differem muito entre si pela côr da sua pel- le , ainda que todas tenhão o mesmo gosto , e que in- teriormente sua còr seja tal. Outros também tem que- rido distinguir estas amêndoas pela sua grossura , e pe- la sua forma : algumas são grossss , e espessas, e as outras quasi tão chatas , como as favas ; mas eu estou certo que estas differenças somente provem de algum accidente: as arvores, que nascem em hum terreno ri- co , e profundo , dão sempre fructos maiores , melhores , c mais bem nutridos , que aquelles , que se acháo em huma terra secca , e pouco profunda : a idade da arvo- re causa também huma grande mAidança na grandeza do fructo ; porque se nota sempre que os pés antigos produzem fructos mais pequenos , e mais chatos que aquelles que se colhem de arvores novas. Como os Cacaoseiros , quando com.eção a sahir da terra, são mui tenros, e que estão expostos a serem maltratados pelos í;randes ventos, pelas seccas , e pela impressão de hum Sol ardente , devem ser defendidos exactamente de to- dos estes seus contrários , que os poderião offender, esçolhendo-se hum.a situação abrigada, para lhe formar hum (42) hum vergel dos suas plantas : plantando-se arvores que as hajão de reparar, c servir íle anteparo contra todos os ventos impetuosos , e da«do-lhe , sendo possível , a visinhança de algum ribeiro , ou rio para facilitar a rega ás plantas no seu primeiro anno, e até que ellas tiverem lançado raízes assas fortes ^ e assas profundas , para encontrarem alguma humidade. Poem-se estas tw- vas plantas cobertas dos raios do Sol , plantando-se em cada fileira mandioca, que, subindo até sete, ou oito pés d'altura , lhes darão hum abrigo sufficiente no seij^ primeiro anno. Passado este tempo , as novas arvore$ correm me- nos risco , e nas estações seguintes se podem tirar es- tas mandiocas , e lavrar a terra nos intervallos , com cuidado , para não maltratar as raízes dos Cacaoseiros. Este methodo de plantar mandioca entre os Cacaos náo só he muito útil a estas arvores, mas também he mui proveitoso aos proprietários pelo ganho de os mdemni- sar das despezas , que serião obrigados a fazer em arran- car as más hervas ; porque sem esta precaução os no- vos Cacaoseiros não prosperarião. Ainda aqui não está tudo : a utilidade das bananeiras, para o sustento dos escravos , basta para indemnisar de todas as despezas , que esta granjearia houver de fazer, ou custar, de maneira que o rendimento do Gacaosal ficará todo em favor, ou beneficio de seus donos ; porque as bananei- ras , sendo cortadas no fim d'hum anno , repullularáõ com renovos , que tornarão a dar fructos no fim de .oito mezes ao depois , c que continuamente os darão pa- (45 ) para o sustento dos escravos , ate que òs CaCáoseiros cheguem ao estado de poderei-n produzir , o que quer dizer , passados três annos ao depois de terem sido plantados. Os Colonos estão no uso de plantarem bana- neiras dous , ou três mezes antes que as sementes de Cacao se facão maduras , para que adquirão grossura sufficiente para poderem abrigar as novas aivores ', «juando nascerem , e a mandioca hum mez , ou mez e TTÍeio antes pelo mesmo motivo. Algumas pessoas cos- tumão plantar batatas , pepinos, melões , melancias entre os renques , ou fileiras dos Caçaoseiros ; porque querem que estas espécies de plantas , lastrando-se pela terra , vistão a sua superfície , embaracem o nascimento das hervas bravias ; porém , praticando-se este methodo , lie preciso attender-se que a nimia quantidade destas plantas não liaja de piejudicar muito aos novos Cacao- sçiros , que não poderão já mais reçstabelecerem-se. E por esta razão se deverão sempre cortar as vergontas destas plantas , quando se avisinharem muito aos Ca- çaoseiros, e sem isto farião hum damno miUito grande i plantação , e acabarião pela destruir de todo inteira- mente. Passados sete , ou oito dias de plantadas ais' amêndoas , começão estas a apparecer greladas por cima da superfície : neste tempo se devem examinar cuida- dosamente , para se ver , se alguma delias foi accommet- tida pelos insectos , para que estes possão 'ser destruidos em tempo , e acautellar deste ^eito a perda total da *»-■ ( 44 ) granjearia. Se nascerem algumas más hsrvas pelas visi-, nhanças das novas plantas j se arranquem , e desarrei- guem a enxada , tomando todas as cautellas necessárias , para não maltratar as jiasteas dos novos Cacaôseiros , nem ainda offender a sua casca. Passados vinte dias , te- rão os Cacaos cinco , ou seis pollegadas de alto , e cin- co j ou seis folhas mais , ou menos , conforme a força das plantas : estas folhas são produzidas aos pares , op- postas humas ás outras , de sorte que formão bellas copas ^ e regulares , quando não são maltratadas pelos ventos. Dez , ou doze mezes ao depois já terão dous pés e meio d'alturaj e quatoize, ou quinze folhas. Então a man- dioca , que se tiver plantado nas suas fileiras terão já grossas raizes , que se poderáô tirar para o uso : isto fei- to , se lavrará a terra outra vez , para se fortificarem as novas plantas. Passados dous annos , terão já chegado á altura de três pés e meio , ou de quatro. Alguns priri- cipiaráó a dar suas flores ; mas os bons cultivadores lhes tirão sempre estas ílores , porque , deixando-as pro- duzir fructo 5 as arvores se affracassarião de tal sorte que correrão risco de se não reestabelecerem já mais. Em dous annos e meio estes Cacaôseiros darão novas flores 5 das quaes se poderáô já deixar algumas para lhe colher os fructos ; mas os cultivadores attentos ainda ás disposições delias , só lhas consentem passado o terceiro anno , para que possão fructificar. Ainda neste lhes permittem muito poucas , e proporcionão sempre o seu numero, conforme a fortaleza, e força das arvo- res ; por este m&thodo os Cacaôseiros produzem con- 5taM- C 45 ) stantemente fructos mais fortes , e mais nutridos que o daquelles que se deixão dar huma grande quantida- de , e se conser\'ão por muito tempo em todo o seu vigor. No quarto anno deixão nas arvores huma porção moderada para a colheita ; mas sempre lhe diminuem alguma cousa , a saber , as flores nas mais fracas , para que possão vigorar-se, e adquirir forças , antes de se envelhecerem. Gastão-se quatro mezes ordinariamente da flor -ao fructo maduro. Conhecc-se facilmente , quando chega a este ponto , pela côr da sua casca , que amarellece no lado exposto ao Sol. Para se colherem estes fructos , se põem em cada fileira, ou enfiada de arvores, hum ne- gro com o seu jaca , ou cesto , o qual tira todos os qu3 estão maduros , c deixa os que ainda não estão. Quando o jaca , ou cesto está cheio , o traz á extremi- dade do Cacaosal , e os despeja , amontoando-os. Acaba- da esta colheita , se abrem as cabaças pelo seu compri- mento , tirão-se as sem.entes , e se lhe raspa a carne, que lhe está adherente. Isto feito , se trazem para casa , e se põem em taboleiros , ou tonneis levantados acima da terra , e se cobrem com caités , ou esteiras , sobre que se põem pezos , para os segurar , ou de taboas , ou de pedras , ou de huma , e outra cousa juntamen- te 3 para os ter. apertados , e conservão-se as semen- tes nestas tabuleiros por quatro , ou cinco dias , em cujo tempo se revirão todas as manhãas , e sem esta circunstancia se arruinariâo pela grande fermentação , em que estão ^de ordinário-. Mediante esta fermentação , as SC- ;l h: ' ( 40 sementes , de brancas , que eráo , passão a pgrdas , ou a hum vermelho denegrido. Os cultivadores pertendem ^]ue, sem esta operação, estes fructos se não -conserva- ndo, mas antes germinarião em hum lugar húmido, e çue se encolherião , e desseccariâo muito , estando em Jugar secco , e quente. E assim , tendo as sementes fermentado , se ti- rão das caixas , para se espalharem sobre qualquer pannp grosso, e pôren>se de maneira que apanhem a Sol , e p vento. Se o tempo for chuvoso , ou húmido , se devem abrigar , e ainda, sendo secco, se devem tirai de tarde para as acautellar da humidade da noite. Bas- tão três dias de bom tempo , para as seccar , com tanto' porém que se hajão de mover de huns a outros tem- pos , para que não se humedeção em algum ponto^ Feita esta operação, se recolhem em eaixóes , ou em ^accos , que se guardão em lugares seccos , até á hora de os fazer partir , ou embarcíir , ou que hajão de ter outra determinação differente. Quanto mais estas se- mentes forem novas, ou frescas, tanto itiais cotiterão de azeite ; e quanto mais ellas forem antigas ,. ou ve- lhas , tanto menos ; e tanto menos estimadas. Os Cacaoseiros não produzem os seus fracto§ nos ramos novos , Ou nas suas pontas,- como a maior parte das outras arvores ; mas os botóes das suas flo- res , e dos seos fructos rebentão dos ramos grossos, e do tronco da mesma arvore, elles jamais na sua mo- cidade dão munto fructo ; porque , tendo ainda só oito «nnos, apenas a sua eoUieita chega a viute oito, ou' a trin- (47 ) trinta fructos em cada pc. A colheita que se faz por São João he a maior que a que se faz pelo Natal , do que he causa a o:rande seccura da primavera , e as chuvas dooutomno. Quando estas arvores se achão em pleno crescimento , e vigorosas , produzem algumas vezes duzentas , ou duzentas e cincoenta cabaças em huma das estações , com as quaes se podem fazer de dez até doze arráteis de Chocolate, estando as sementes seccas. Esta quantidade faz hum rendimento considerável , e Somente requer módicas dcspezas de plantação, relatii>a* mente ás que são obrigadas afazer para o Assucar. Hum Sujeito de grande merecimento que residio por algum tempo n'America , me certificou que vira colher n^hum «nno, d'huma só arvore, em sf mentes deCacao, libra e meia esterlina (5400) vendidas no mesmo lugar; fe que as despezas da colheita , e preparação, erao muitj menos fortes que as de muitos outros géneros , prepara- dos nas mesmas Colónias Britannicas : de sorte que pa- rece cousa extraordinária o ter-se abandonado esta cultu- ta , e com tanta menor razão , com quanta os habitantes ricos das mesmas Colónias fazem annualmente htím grande consummo em Chocolate , e que elles se vem obrigados a comprallo dos Francezes , e dos Hespa- nhoes por hum grande preço. Ah! esta negligencia, t desleixo òs virá a empobrecer pelo tempo adiante. Tendo-se plantado o Cacaosal em hum bom terreno , e que se tenha empregado nelh o cuidado com- petente , permanecerá por muito tempo em :seu vigor, e frutificará por vinte cinco, até trinta annos. Aindlesl ta ( 4^ ) U he outra razão forçosa , pela qual as despezas da SLíi cultura devem ser muito diminutas, ou menos conside- ráveis que as do Assucar ; porque , sem embargo de que a terra entre as fileiras , ou avenidas deva ser cavada muitas vezes , e lavrada , com tudo , a primeira obra , para se estabelecer huma nova planta(,ão d'Assucar dlndigo, de Mandioca , etc. , exige muito maior despeza que o trabalho necessário aos Cacaoseiros. Ainda mais : as cannas assucaiadas , ou assucareiras pedem mais lavou- ras na sua cultura que algumas outras plantas ; e, depois de se terem os insectos multiplicado nas Colónias Ingle- zas , não ha cousa tão incerta como as colheitas do As- sucar. A' vista de todas estas razoes , julgo que seria muito vantajoso aos cultivadores o fazerem algumas tentativas , havendo ds ter lugares convenientes , para que se hajâo de convencer da verdade do que tenho dito, e avançado. As folhas dos Cacaoseiros são largas , c fazem muita humidade , oquehe summamente proveitoso para que, cobrindo ellas a superfície da terra, conservem a sua fresquidãOj e humidade, impedindo-a que se eva- pore : por onde ficão favorecendo as novas , e tenras raizes que se arrastão qua-i pela supeificie da mesma precisamente. Apodiecidas estas folhas , se enterrão quando se lavra a terra , e ellas então se voUao n'hum maravilhoso adubo. Algumas pessoas amiontoão as ca- baças, ao depois de tirada as sementes, e assim as de ir xão apodrecer , passando , ao depois de podres , a espa^ Ihallo pelas terras , como hum estrume. Todos estes adu- C49) adubos são óptimos , com tanto que sejíío bem apodrcn-' tados , antes de os espalhar , acautellando de não intro^ diizir os vermes com elles nos Cacaosaes. Independentemente de tudo , quanto se acabou de dizer acerca das lavouras ^ cavações á enchada , estrumes , devo advertir que he cousa essencialissima decotar os ramos petiseccos , e os que estiverem ma! dispostos , em todos os lugares , em que se encontrarem ; mas ^ quando se houver de fazer esta operação , he mis- ter que se acauteilem de encurtar os ramos vigorosos 5 e de fazer grandes amputações ; por quanto , sendo estas arvores cheias d'hum sueco medulloso , ou molle , e glutinoso j esta seiba decorre por muitos dias pelas íeridas, que ellas receberão , e assim as vem a enfraque- cer consideravelmente. Todavia os ramos j cujas pon- tas , ou extremidades são mortas ^ ou petiseccas , devem ser cortados para impedir que o mal passe avante , e se estenda mais longe : e os que já estiverem damniíi^ cados 5 querem também ser separados jiinto ao tronca da arvore. Isto se deve executar em hum tempo see-* CO, e logo que se completar a colheita. Pensarão talvez que o methodo , que acabo dtà prescrever , requer hUm trabalho considerável , te- dioso , e que exige huma grande multidão d^eàcravos ; mas quem não vê que isto he hum grande erro ; pois estou certo que cinco oií seis escravos bem instruidos conservarão hum Cacaosal de dez mil plantas muito bem-, E que tem que ver este pequeno numero de escravos 3 que cuidão na cultura d'huma granjearia de Cacao com T.JII. P.IIh D 5> o rtumero de homens que requer a cultura da Ginha, e do Assucar na mesma extensão de terreno. Ora se quizermos comparar, e conferir ©benefi- cio das duas colheitas , ou os seus rendimentos ; se ha de encontrar, entre hum, e outro, huma grande differen- ça ; porque , suppondo-se que o producto de cada arvor» deCacao, em vigor, seja de cinco Xelins (900 rs.) (es- timação bem moderada , como se pôde ver pelo que se disse a cima) achar-se-ha que huma granjearia de dez mil plantas de Cacao deve produzir 9,000(1^000 (vinte e dous mil cruzados e meio.)> Mas , como quer que nesta senãa emprega mais do que seis ou sete escravos , e que , fora destes , não tem outra despeza a fazer de fornos , etc, concordará que não ha granjeio algum , que possa ser melhor que este , nem que possa dar maior rendi- mento. ME. MEMORIA IV. SOBRE O CACÁO DÓ PÁÍtA'. Ç De hum m. s. anon^jmo Portugaez, ) O Egue-se o Cacaò ^ muito bem conhecido no miindo pela excelJencia do seu tratamento entre as outras be- bidas j e grande entrada que tem nos Palácios , e Casas opulentas. A sua planta he huma arvore de mediana grandeza corn a folha miii semelhante á do nosso cas- tanheiro, menos em ser algUm tanto maior. Produz o seu fructo pelo tronco acima do feitio de peqUerios melões , mas alguma cousa mais agudos para as pon- tas , ou extremidades , e com feitio oitavado , ou no todo , ou na parte inferior. A sua casca he mais dura que a das Melancias , e quando maduro he amarella ; por dentro estão cheios estes pequenos melões de se- mentes , que se não deitão fora , como nas demais fru- etas 5 ante^ se aproveitão , e estimão tanto, que já no Amazonas houve morador , que os mandava encravar nos anneis em iugar de pedras preciosas ; e na verdade , houve tempos , em que as suas arrobas erão avaliadas em moedas de ouro , ainda na primeira mão ; e quando aportavão a Li:]boa , dobravão aparada, valendo a duas Lisboninas , e isto quânto apparecia. C 50 listas sementes são entre pardas , e escuras do fei-lio de favas unidas na fructa por humas filagranas , que tem no meio , por não dizer tripas envoltas com favas em huma massa alva como algodão ; e posto que tenha pouco' que comer , he gostosa por agro^doce 5 mui fresca , substancial , e cordial , de sorte que os Ma- cacos 5 que pelo seu vivíssimo paladar são destros cozi- nheiros , a comem ; e por elles he que nos veio o des- cobrimento deste grande género do commercio. Os moradores , e índios , quando quebrão as' fructas no tempo da colheita do Cacao , fazem vinhos^ desta massa mui" gostosos , e regalados , a que chamão vinho de Cacao, e se o bebem logo não tem perigo; porém poderão embebedar, se o deixarem azedar. Mas, azedando faz hum exccllente vinagre,- e se poderia fa- zer agua-ardente. Também se faz hum mui delicioso- doce, que conserva o seu pequeno , e regalado acido. A mesma casca da fructa he tão substancial que o gado- vaccum^ não a perdoa , encontrando-a. Estas pevides' pois , ou estas favas , tiradas da fructa, se põem ao Sol, seccão-se , e bera seccas , se exportão para a Europa em saccas dè panno d algodão sem mais outro algum trabalho ; e por ser tão fácil , c ao mesmo tem.po tão precioso , he o mais estimado , e cultivado género pebs ssus natiiraes ; pois assas se accomoda a sua preguiça. Estas sementes tem enrique- cido a muita gente , não só dos naturaes , que todos os^ annos mandão fazer colheitas ; nias ainda a muitos fo- rastcitos , e marabivíos , que , alcançando a protecção^ C50 d\\Iguns moradores , para os mandarem por arráes das suas canoas 5 ou embarcações , tem avultado tanto que a sua riqueza , tendo-lhes amaciado as mãos caJlejadas pelas cordas dos nav lOS e que puxarão aos hombros pelos chouriços de Lisboa , os faz aspirar ás honras da ^primeira fidalguia , devendo isto ao Cacao. Voltemos ao asjumpto. Ha immensidade destas arvores, fructo , e pevi- des por quasi -todo o destricto do Amazonas , e princi- palmente no rio Solimoens , e destricto Hespanhol , mas sem mais utilidade do que serem colhidas por al- guns Missionários para o seu Chocolate , e o resto só serve para pasto dos animaes , -e macacos , por não ter •outra sahida ; porque , para o levarem aos portos ^o mar , he maior a despeza do que será o proveito , por ser rio -acima com grandes difficuldades nas correntezas, c ca- •choeiras , e maiores nas conducçoes de terra. Este in- .conveniente porém não tem os Portuguezes , por terem XI regalia de navegarem rios abaixo ; e por isso fazem •delie grandes colheitas 5 e muitas vc^zes tem sido tanto o Cacao , que , náo ccibendo já r.as frotas , fica em terra com grande perda dos seus donos ; j-orque se lhe corrompe , a não andarem com cuidado de o pôr de •Cjuando cm quando ao Sol , até esperarem as fretas do seguinte anno. Tem havido de embarque para a Euro- pa oitenta mil arrobas. Na m.esma bocca do rio Amazonas, desde a Ci- dade do Pará até o Tajupurú , ha paragens de muito Cacao 3 produzido pela natureza 5 e no dito Tajupurú ha t $4) fia Ilhas cheias , as quaes alguns Governos prohibírão aos moradores , reservando-as para o fardamento da JVlilicia , que nunca appareceo. Ka , alem da muit* abundância do mato, jmuito hortense, que os morado- ii«s forão cultivando pelas suas fazendas , levados da sua muita estimação ; e os que assim fizerão , são hoje os mais ricos ; porque sem os grandes gastos, e peii? ^os das viagens pelo Amazonas acima , tem de casa .grandes Condados com trinta , quarenta , e mais mil cruzados , conforme o numero das plantas por Capital. Além dos macacos outros mujtos bixos o co- jjuem pelos matos como os papagaios. Também muitas nações de índios o comem , não em Chocolate ; por ser este privativo de melindrosos , e regalados , mas «•ssim como Deos o creoii , e como o comem os ma- 4cacos. Destas sementes , que são oleosas , se distilla huma manteiga muito fresca , e medicinal para vários lisos da Medicina, Dão-se muitas espécies de Cacao , entre as quaes humas são mais doces que outras , e por isso pedem menos assucar na factura do Chocolate, A espécie , a que chamão Caraça , por ser da Provincía deste nome no Governo de Santa Martha , hoje intir tulada Nova Granada , he entre os Castelhanos o de jnaior estimação , mas parece ser menos oleoso , e pa- ia se ligar a massa , se lhe mistura Cacao ordinário. Principia a fructiíicar no terceiro anuo da sua plantação cuja praxe daremos adiante. * * * IPra^ (55) (Praxe de se plantar os Cucaoseiros rtê Paráy secundo o mesmo Aitthor acima Part. 4. ) Feito o roçado, e plantada a Mamba (Mandioca) para o sustento , e pão usual , .entrao então no projecto de fazerem ricas as suas quintas , ou os seus sitios com bons Cacuaes , e Cafcsaes , menos os índios ^ que só cuidão na sua roça de farinha , e com elia só vivem contentes : e apenas tratão , e cuidão de algumas pou- cas plantas. Os brancos por fim , como mais ambicis- sos , põem algum cuidado em fazerem nos seus sitios bons Cacuaes , e Cafcsaes , que são os seus bens está- veis , e mais permanentes , á differença dos roçados da farinha, arroz, e algodão, e outros, cuja terra, e si- tio varião todos os annos , e só , ao depois de muitos, tornão a servir. Para os Cacuaes usão :da mesma diligencia 3 e trabalho de roçar , como já dissemos ; outros porém , e são os que inelhor acertão , usão para os Cacuaes do mesmo roçado da Mandioca , depois de tirada da terra ; porque , antes de lhe deixarem crescer o mato , alimpão muito bem o terreno , entrão a plantar nelle as arvo- íes Pacobeiras , que são especial requisiío para os Ca- cuaes pela conveniência da sombra , e também pela grande utilidade dofructo, que elle só basta para fazer farto e delicioso qualquer sitio. E como he arvore , que logo pega , e arraiga na terra , em pouco tempo se foeni frondosa ^ e capaz da plantação dg Cacaosal. F<9- C50 Porém o costume he fazerem canteiros levanta- dos de terra, a que chamão giraos , e-no nosso Portu- guez se podem chamar aterrados , em que semeião as pevides , e alguns tem a providencia de as cobrirem ffom ramadas, para as livrarem dos ardores do Sol, ten- do cuidado de as descobrir de noite para a conveniên- cia do sereno ; e quando -estas plantas já tem hum anno, ou mais , entrão a dispollas no lugar assignalla- do por baixo das sobreditas Pacobeirgs , e as dispõem distantes humas das outras, huma braça em bem direi- tas e bem dispostas ruas : também lhe acrescentáo ou- tras arvores como Laranjeiras , Beribaseiros , Acajusei- ros 5 e muitas outras que dispõem em proporcionadas distancias , não só para refresco , e conveniência das fru- ctas , mas também por ter a experiência mostrado que á sua sombra medra melhor o Cacao , e fructifica em mais abundância. Assim plantão , e dispõem muitos inil pés de Cacao , conforme a vontade de cada hum , cujo fructo entrão a colher no terceiro anno da data da sua plantação. Ao depois de plantado , pouco ou nenhum tra- balho tem , senão conservallo limpo sempre da herva do passarinho, que nasce da semente que elles levão , ■e deixão no seu esterco alguns passarinhos pelas rama- das das plantas de Cacao , e de outras arvores, onde pegão , crescem , estendem-se , e se enramão por cim:* chupando a substancia das plantas pelo sueco ; por cu- ja razão ellas se esterilisao , e secção , a não haver o pequeno cuidado de arrancarem estas chupadoras , e pe- ga. ( 57) taioras , em quanto pequenas , o que se faz com faci- liJade. Deve-se porem advertir que as sementes , que se semeião , não devem ser seccas , mas tiradas immedia- taniente da casca ; pois d outra sorte não nascem. O segundo inimigo dos Cacaoseiros he os re- hent6es , a que chamao os naturaes lagartoes , o que consiste em huma varinha muito viçosa , que lhe reben- ta do pc , ou tronco , e tão viçosa que , dentro em vinte e quatro horas , rebenta , e cresce a huma vara , ou mais , extrahindp a substancia á mai , que em breve tempo a deixa , ou totahnente secca , ou esterilisada , e por esta razão he necessário haver cautella nos Quin- teiros , para que logo que virem o lagartão , o escachem com hum.a bordoada. Em alguns annos he tanto este vicio lagartão , que chegão a destruir qualquer grande Cacaosal ; e muitas vezes será por castigo de Deos por não pagarem os Dizimos. ME- ( JS ) Eoa 'M if o MEMORIA V. SOBRE O CACACT^ Por M. Prefontaine, ^Maison KastiíjiiQ de Calenne.') Cacao he o fiucto de huma arvore chimada vuU garmente Cacaoseiro, que nasce j>er ú mesma cm mui- tos Paizes de terra firme , ou continente da America , onde se dão bosques, e florestas inteiras , e principal mente nas alturas do Oyapok da Província de Guyena. Ao depois do Algodão não ha planta alguma ^que re- queira menos forças , ou menores despezas. Elle se planta pelas suas sementes , ou grãos. Toda a terra não he para ^Ih jndifferente , como acontece no Alijodão, He mister que, antes de se estabelecer qualquer Cacao- sal 5 se sonde o terreno , cm que se pertende fundallo. A sua raiz mestra se prolonga , e profunda em a terra a prumo do seu tronco. Qualquer camada de tufo , ou de pedras , que o haja de embaraçar na sua descida , a fará dobrar , e a arvore , não encontrando mais alimento , dentro em pouco tempo acabará. He da primeira imr portancia que a terra haja de ter , pelo menos , seis pcs de profundeza. Tendo-se encontrado hum terreno desta nature- za , e que se tenha muito bem aceirado , se divida , c tra- £ xãirr ' *mmmr^ C !9) trace a extensão , que se pertende , e que se quer em- |Hegar. Para este fim se servem de cordéis , que tenhão o comprimento do terreno , dividido por nós em dis- tancia de oito pcs. Poem-se huma estaca cm cada nó. Estando feito o primeiro alinhamento , se transporta o cordel para oito pcs de distancia , e se prosegue o mais do mesmo modo. Dão-se muitas razoes , que aconselha© este alinhamento. Primeiro : Pela ordem ; porque esta certamente he muito preferivel pela sua belleza á feal- dade da confusão. Segundo : Em hum Cacaosal , bem alinhado a cordel , os escravos náo podem evadir os olhos do seu senhor , ou do seu feitor. Terceiro : No tempo da colheita se podem seguir em regra humas fil- leiras , ou alleas ao depois das outras ; e por este geito tudo se aproveita , e não se deixão fructos na arvore. Os Cacaoseiros são muito amigos de ordinário das coUinas , ou encostas dos outeiros , e da visinhança dos córregos , o que se pôde am.pliar , dizendo dos jugares , que não forem "nem muito seccos , nem mui- to húmidos. Não faltão Authores , que escrevão que os ven- tos fazem mal aos Cacaoseiros , eu poiém não conhe- ço algum , em que se verefique isto , a não serem as ventaneiras , ou Acentos tempestuosos. Por quanto es das Costas de JVlalhuri são os mais expostos , que po- dem sei 5 e com tudo isso são lindíssimos , e de hum rendimento excessivo. Quando muito he muito fácil a hum granjeiro c remediar , plantando arvores ao redor do Cacaosal , e dçi- \'t ^ ■ 1 1 m \i •; *• ■deixando em torno bosquetes. He muito importante a- èrigallos do Sol , em quanto as arvoyes forem novas , o que se executa, plantando bananeiras perto delias. Estando o terreno dividido, e alinhado , junto a cada estaca se põem hum cesto , em que se tem fei- to brotar , ou germinar as sementes dos Cacaos. Estes se enterrão , segundo o alinhamento das estacas. Requer a delicadeza desta nova arvore nos ter- renos 5 em que ha formigas, grillos, e outros pequei nos insectos , a precaução de plantar os grãos em cestos , c^uQ tenhão a figura da copa d'hum chapeo. Hum es- cravo faz trinta destes cestos por dia. Mandão-se se le^ var os grãos em lugar , onde as formigas lhe não ha- jão de dar ; pois , tendo a muda adquirido certa força , está menos exposta a ser damnificada pelas formigas, ou outros insectos. Plantão-se então , onde devem pe^r iTjanecer ; e os cestos , ou cabazes apodrecem. Se a na- tureza do terreno não exigir estas precauções , se se- mearão as sementes em covas , feitas na profundeza de quatro para cinco pollegadas. A amêndoa lhe deve ser deitada direita com a extremidade mais grossa para baixo. En\ cada cova se lançarão três. Quando as ar^- vores tiverem pé e meio daltura , se deixa a que for melhor , e se lhe arrancão as outras no <:aso de que tenhão nascido. Não convém de sorte alguma viveiros de Cacao ; porque , sendo , como de facto he , a raiz desta arvore tão delicada, será impossivel arrancando-a , c íornando-a a plantar , deixar de a offender. •O cabaz , ou cesto he o único remédio desta inconveniente. Plantao-se , como já disse , bananeiras , ou mandiocas nas avenidas, para darem abiigo , e ante- paro ás novas arvores contra os faios do Sol. Deve-se- llie conservar a terra bem mondada , e Jimpa de toda a herva bravia. A mandioca , arrancando-se somente ao cabo de dez mezes , e de hum anno , e brotando com maior rapidez , faz o officio de hum quita Sol á esta planta em todo o tempo , que ella permanecer na terra. Ao cabo de dous annos e meio , o Cacaoseiro, tendo quatro pés e meio d'altura , começará a florecer, O fructo , que então houver de dar , he de muito pouca importância , de sorte que muitos não duvidáo fazer ca- hir as primeiras flores , para dar com isto occasiao á ar- vore de se hir fortificando mais. Passados três annos , já se lhe podem colher os fructos. Chegado que seja a contar seis annos , então se acha o Cacaoseiro em toda a sua força de produzir. Tendo chegado a huma certa altura , não reque? mais cuidado em o mondarem. A própria sombra , que eJle espalha sobre a terra , as folhas , que sobre ella ca- hem , e a cobrem , impedem que lhe haja de nascer herva alguma^ e simultaneamente servem para a estru- mar. No tempo da colheita dos seus fructos he pre- ciso ter toda a attenção , e cuidado de se lhe tirar a herva de passarinho, de se lhe arrancar, e fazer cahir todos os fructos velhos , e cabaças , que ainda nellas se houverem dencontrar ; de se lhe cortarem, e dece- parem todos os ramos petiseccos , e mortos ^ e ultima- iiien- (éO , T ■ «I mente as gomineleiras , ou ladrões , que lhe houvercitf de ter rebentado ( 'lo Pará h^artões. ) A pTecauçío de decotar, ou chapotar as pontas destas arvores me parece necessária , a pezaf da negli- gencia , e desleixo dos seus cultivadores , e granjeiros a' este respeito. O tempo , em que este se deve fazer, he quinze dias anfes do inverno. Os Hespanhoès de Cara- cas o praticão do mesmo modo , e talvez , segundo creio , que daqui liie venha , terem elles nesta Provin- cia o Cacao , que tem no Commercio a melhor reputa- ção. A força da colheita do Cacao be pelo mcz de Junho. Neste tempo he muito importante que se visi- te , e espreite muitas vezes o Cacaosal , para que lhe náo aconteça o deixar brotar , e ainda ennegrecer aS suas cabaças , que algumas vezes cahem de si iTvesmas ,- deixando-se permanecer por muito tempo os seus fru- ctos nas arvores. Quando os escravos colhem as cabaças de Cacao ,• se faz indi^jpensavel embaraçar-lhes a que não hajão de abalar, e sacudir as arvores ; porque, estando ellas car- regadas de flores , como acontece muitas vezes no tem- po da colheita , se as chegão a sacudir com os seus podões encabados , lhes lancão por terra as flores , e assim as vem empobrecer de fructos na futura colhei- ta , na qual ficão privadas dos frucíos , que dariao estas flores. Cada hum dos escravos tem o seu jaca , ou ces- to , que deve encher das cabaças , que colher , para as levar do Cacaesal a casa , onde se prepara o Cacao. Es- C ^3 ) tsíancío bom o tempo , se quebrão as cataças debaixo dos mesmos Cacaoseiros , é se ajuntão ao pc da arvo- re, í]ue a prodLízio, as cascas da cabaça ; porque elJa? servirão á arvore de adubo , ou estrume. Neste caso só SC trazem para casa os grãos , ou sementes^ Porém havendo de se trazer as cabaças para ca- sa , se deve cuidar em que as sementes se não hajão de demorar dentro nellas mais de três dias , principal- mente em tempo de aguas , ou chuvosos ; porque ão sujeitas, ou arriscadas a grelarem. As cabaças tem nove para dez pollegadas de comprido , e trez ou quatro de diâmetro. Assemelhao-se -a pepinos repartidos em diversos lados ou faces. Com- mumente encerrão vinte e sinco amêndoas. Logo que as amêndoas estiverem na manufactura ^ ou casa em que se devem preparar, se devem pôr, ou nos cochos, ou barricas , para lhe espremer o vinho : cobrem-se en^ tão , ao depois de esprimido , com folhas de caete , e se lhe põem taboas por cima, carregadas de pedras, p'ara as opprimir, fazer pezo , e ajudar a fermentação, que se lhe excita. Elias fermentão no espaço de quatro dias até cinco : tendo-se o cuidado de as mexer todas as manhans. Tendo as amêndoas adquirido huma côr verme- lha denegrida , se tirão então da barrica , e se expõem ao Sol , para iíaverem de seccar. Ao depois se guardão nos armazéns , donde devem sahir algumas vezes para as enxugar. Se aspozerem nas estufas, conservarão huma côr vioiete. Q 'H fi CÓ4) O Cacao he , ao depois do Algodão , o ^eneró' de maior facilidade para se cultivar , e fabricar , sobre* tudo, para aquelles que se sentem com falta de meios , ou de escravos , para emprehenderem outras cousas. Não ha género algum , que se lhe possa comparar a respeito da sua facilidade. Os utensílios , ou ferramentas necessárias con- sistem em podões encabados de differentes compiimen^ tos , em cestos , ou cabazes , saccos , cochos , grandes taboleiros expostos ao meio dia , levantallos da terra ,^ e que possão conter hum milheiro , ou cinco quintaes de amendoaSo ME- CGj } MEMORIA VI. SOBRE A CULTURA , E COLHEITA DO CAGÃO Por M. Savary de Brusloni (^í^ktionaire Vnlversel de Commeree toní. IL pa^. 14,) A Terra profpria , para se fazer hum Caçoai , ou Cá- caosal , deve ser virgem ^ o que quer dizer , terra que ainda não tenha servido para planta alguma ; a arvore , que produz o Cacao , terá necessidade de todo o sue- co , por causa de sua delicadeza , e de toda a sub- stancia de hum terreno novamente derrubado ,. e aceira- do : a experiência tem feito conhecer qUe , quando se planta , em terra , que não he nova , ainda que se te- nha deixado repousar , ou nao nasce , ou , se nasce ^ dura muito pouco , e nao produz bom fructo ^ nem em abundância. A terra , que se lhe destina , cíeve ser mui pro- funda j porque contra o ordinário das outras arvores das Ilhas, lança muitas raizes, e se profunda em terra sem interrupção , sem cessar por isso de crescer , dar ílores , e fructos. Entre tanto , por este motivo , sendo- lhe os rochedos , e as pedras contrarias , se accomodão muito bem , ou em hum terreno arenoso , ou em hum T. m. P. UL E te- ., .V terreno argilloso , tendo este a altura de cinco a seis pés por cima de alguma terra boa. Tome-se outra precaução de se dispor o Cacao- sal em hum terreno fresco , e em lugares baixos , risi- nhos d'algum rio , ou cortado por alguns pequenos regatos , ou córregos ; e principalmente se devem res- guardar de que estejão muito expostos ao grande ar , ao calor, aos ventos. A extensão , que se llie deve dar , he de duzentoj passos em quadrado pela medida das Ilhas , que tem cem varas , ou quasi. Se o terreno, que se lhe des- igna , for maior , será muito melhor separallo em mui- tos quadrados desta grandeza , e rodeiallos de boas sebes , do que expollas aos inconvenientes , que se acabão de re- ferir 5 se houvesse de ser vasto , e muito descoberto. O Cacaosal deve ter fortes orlas de grandes ar- vorei , que o rodeem , ou , pelo menos , que o cubrãa do lado, que for exposto aos ventos regulares. Como, com tudo, podem acontecer frequentes accidentes pela aahida destas arvores , por causa dos furacões , alguns gos- tEo mais de fazer estes anteparos , ou resguardos de duplas, ou triplicadas fileiras de Laranjeiras, de Arati- euseiros, de Tuinãtiibeiras , que pela sua molleza resis- tem melhor aos veiuos , ou das que ainda que acon- tecão cahir , não se vai de mal a peior , porque não podem prejudicar aos Cacaoseiros, que estiverem perto delles , on ao seu lado. He mister que se observe , oubrir-se as próprias extremidades de algumas fileiras de Bananeiras. ÇÍ7 ) Se o terreno for tal , qual se acaba áe cíizer , se deve primeiramente lavrar aterra á enxada , o mais fun- do que for possível ; seja , porque a terra igualmente lavrada está em estado de receber a chuva com maior igualdade , seja , porque , estando mais unida , se lhe possão traçar mais cOmmodamente as divisões diffe- rentes , que o plano concebido pode ter. Servem-se para traçar ò terreno d'hum cordel do comprimento de tod® o espaço , que sequer plantar, dividido por nós de oito em oito pés ; e em cada di- visão se ponha huma estaca , o que sendo repetido de oito em oito pés das primeiras , até que se tenha cheic» todo o terreno , forma hum quinconce perfeito ; de sorte que hum espaço de cem braças , ou de duzentos pés em quadra possa conter 5ÓS5 plantas de Cacaosj Alguns as plantão em seis pés de distancia , hú- mas das outras , e ainda unicamente em cinco pés ; masí he certo que a nimia proximidade Ihe-s embaraça o cres- cimento 7 e a producção de bons fruetos , destruindo-so mutuamente , pelo dfzer assim , híimas a's outras ^ huma parte dos suecos , e do nutrimento , que cada huma ha mister: além da precisão, qucí cada huma tem d'hinTi terreno arrazoavcl , para estenderem os seus ramos , e para se deixarem de prejudicar. Esta distancia de oiío pés somente he regulada por conformidade ao território 5 ou terreno das IJhas, ou Antilhas; porquanto nas Ilhas ^ que são grandes, e no continente, ou terra firme, onde asteíras são mais profundas, e mais gordas, se lhes E 2 :ve dar a distancia de 'rt3> ,.:.^ I|(;; •!■ de dez para doze pés , para que as arvores , que nella? sãa muito maiores, e corpulentas ,• ordinariamente possâo ter todo o terreno, que lhes competir , cm razão da sua maior grandeza , e grossura. Convém que as allcas , avenidas , ou ruas , qHC; houverem de formar as fileiras das plantas , sejão as mais directas que forpossivel, não só ^ em- razão da foí- mosura , e belleza , que lhes deve resultar deste alinha- mento , mas ainda pela maior facilidade , que certamen- te este dá ao trabalho dos escravos, para colherem mais cominodamente as suas amêndoas. Devem-s€ plantar no quarto miwguante, e quan- do o tempo estiver chuvoso-, oti-, pelo menos , quando estiver anuviado , e sombrio ,. e disposto a chover. To- mão-se as cabaças do Cacao , que estão promptas a se- rem colhidas, abrem-se^, e se tirão as amêndoas , e sem peFda de tempo se mettem na terra , devendo-se fcer medo que, com qualquer demora, quehaj*, não se ve-^ Bhão ellas a seccar , e consequentemente a perderem- se , o que acontece com qua~!quer seccura , que impe- diria o seu nascimento. Ordinariamente se põem três amêndoas ao redoí de cada estaca em distancia de três pol legadas humas das outras, e em quatro de profundeza: p que se exe- cuta facilmente , se a terra tiver sido lavrada de novo. E quando o não tenha sido, se servem d'hiima espécie denchada deHortellão, para lavrar aterra, em que se quer, ou devem plantar. Tem-sc visto , que não devem plantar mais que três amêndoas , para que se possão sub- C69) substituir is que houverem de f;dhar. E do mesmo mo- do , no caso de que todas venliao a brotar , se deixáo cr-escer ate que chegem a dez e oito pollegadas de altu- ra , ou a dous pcs ; e então , conservando-se a que for melhor , e mais bem conservada , se arrancão as ou- tras , que servem para substituírem outros lugares , em que ellas tKvereiíi falhado , ou para se plaiitarem , onde quizerem. Podem fazer viveiros de Cacaoseiros , mas mui poucas vezes as arvores , que se tirão dos viveiros, prosperão , em razão de serem as suas plantas delica- or muito tempo j a saber , de as recalcar, isto he , chcgar-Jhes teria ao pé , para impedir, que os seus bar- balhos , ou pequenas raizes fiquem descobertas , apa- nliem ar , e. se sequem ; e de lhes decota.r as pontas dos seus ramos , para os renovar. A negligencia , a res- peito de qualquer destas duas cousas , ou culturas , he capaz de fazer pouco a pouco morrer os mais bellos vergéis de Cacaos. O rendimento de hum Cacaosal , cu de hum vergel de Cacaos , he m.uito grande ; e a sua cespeza mui limitada. Vinte escravos bastão para çonservareiTi cincoenta mil arvores de Cacaoseiros , que podem rei> der, anno commum , ou huns por outros, cem mil ar- ráteis de amêndoas, as quaes , a sete soldos, e seis di- nheiros ao arrátel , que he o mienor pre<;o , .porque se vende produzem 3 7^ 5 c>o libras de França (6,poOj^ooo) .quinze mil <;ruzados. HIS- (76) MEMORIA VII. HISTORIA NATURAL POCACAO Por M, deCaylus. tA I !(.•;: it' WJ E j em facto de Historia natural , o merecimento de qualquer relação se dáve tirar do caracter de verda- de, que hum author de gosto , que o vio, he mais capaz de lhe dar , que outro algum , devo lisonjear-me que a presente nao desagradará ao público , a pesar de algi^r^a semelhança que parece ter, pelo seu assumpto com os tratados particulares, que escreverão Salmasia, Colmenero, Èufour, e outros muitos, pois examinada a fundo, conhecerão tanta differença, que não poderei ser arguido de mô ter aproveitado do que disserão. Este pequeno traíado he o fructo das observa- ções , que fiz na America , em quinze annos , que nel- la estive , obrigado pelo Serviço do Rei. O grande commercio, que nella se faz de Cacao , e Assucar, me obrigou a huma maior reflexão , que a commum , na origem cultura, propriedades, e uso de duú!* plantas, que tanto proveito dão : e a minha curiosidade se au- gmentava década vez mais , a proporção que descobria , em. a natureza, c costumes do paiz, huma infinidade da C77>, e a branca , no principio de lium verde tão claro , que assim parece , e pouco a pouco passa para a cor de Limão , e colorarwíoTse mais * mais, chega a ficar amareilo, estando madura. Ater- x:eira , que he manchada de vermelho , e amarello , oc- cupa o meio entre as duas primeiras ; porque , amadure- cendo , 0 vermelho se faz pailido , e a amarello se vigora. Tenho observado que as brancas são mais gordas que as outras , principalmente do lado que se unem á arvore , e que as desta casta de ordinário produzem muito mais. Abrindo-se huma destas cabaças pefo com- -primento, se acha ter ella quasi quatro linhas de gros- sura , e que todo o seu vão se acha clieio das amên- doas do Cacao , e os intervallos , antes da sua madu- reza , estão cheios de huma substancia branca , e firme , mas que se muda em huma espécie de mucilagem , qui tem hum acido mui agradável, que muitas vezes con- vida a metter na bocca as taes amêndoas com a sua coberta, para- a refrescar, e apagar a sede ; mas não se deve tocar com os dentes ; porque , ferindo-se com elles » pelle do Cação, se senteria huma indizivel amargura. c sn Èxaminancio-se com delicadeza a estructura interior des.» tas cabaças , e anatomizando-se todas as partes , se acha que as fibras do pé da fríicta , abrindo-se á cabaça , se dividem em cinco ramos , e cada hum destes em mui- tos filamentos , que se terminão na ponta grossd de hu- ma das amêndoas , e que ò todo forma huma espécie de cacho de vinte, vinte e cinco, trinta, ate trinta e cinco grãos ao mais , arranjados , c situados hum con- tra outro na cabaça córít hilma ofdem maravilhosa. Não devo deixar de notar nesta passagem que a maiot parte das relações tem sido pôticò exactas na exposiçãd do numero das amêndoas , que se encontrão em cada cabaça. Dampief diz que tem qúási cem , outros modernos de setenta a oitenta , dispostas , como' grãoâ dé RòmáliJí Gage de trinta a quarenta. Colménero de dez a doze. Oexmelin dez , doze , ou quatorze. Posso certificar poí mil experiências de não ter encontrado, nem mais , nem menos i de Vinte e cinco. Talvez que, se examinassem as cabaças mais grossas , nascidas de arvores vigorosas , creadas em terras profundas , sé éncòntrârião até quarenta amêndoas ; pòrcm não excederia esta quantidade : ào mesmo modo he certo qtje se não encontrão cabaças, que tenhão mais de quirtíe , á excepção das abortadas , Ou fructo dé arvore cansada ,• ou envelhecida , ou de> máo fundo , ou de nenhuma Cultura. Tirando-se a pellea qualquer amêndoa ^ se Ihç descobre huma substancia branca, qué parece tenfa , hV sa, hum tanto arroxada, e cojmo dividida em muitos» lobos, ainda qu« na realidade só tem dqu* mvíito irre- F ^ gu- i^: I IC.v .^íl: Também precisa que o Caçoai seja de hutna grandeza mediocre ; porque , se tor pequeno , principal- mente em valles, não receberá ar, e ficará como affo- ^ado ; e se com excesso for grande ficará muito cxpoi- to a sequidão , -aos grandes ventos , que na America chamâo furacões. Tendo-se escolhido hiUTi íugar prcprio , e deter- minado o seu tamanho, «dimensões, s^deriuba o mat- to , se arrancão as pequenas plantas , rossâo-se os arbus- tos maiores e menores : ao depois se torão os troncos , grossos ramos , e medíocres , fazem-se fogueiras , e se lhe deita fogo por todos os lados , c as grandes arvo- res, por se poupar o trabalho de as derrubar, se quei- mão em pé. Queimado tudo , só ficão os cepos ou troncos cortados das grandes arvores, que se procurão destruir, ate ficar todo o rossado limpo , então se dirigem com humu corda ás ruas , ou alléas , todas equidistantes , e parallelas , e se fincão estacas de dous a três pés de comprimento com o intervallo de cinco , seis , sete, oito, nove, ou dez pés, emhuma palavra, em distan- cia tal , qual a quizerem dar aos Cacoeiros , que as esta- cas representão. Finalmente se lhe planta hum quartel de Mandioca em todo o espaço rossado, observando-se o não plantar pé algum junto ás estacas. Advirta-se que os Cacoeiros , plantados em grandes distancias de oito , nove , e dez pés , dão hum maior trabalho em os alimpar nos primeiros annos , co- mo se dirá ao depois -, mas se as terras forem boas, se- *.•■•' ^^ Ur vv ^i- serSo muito melhores, duraráó mais, e rendera'6 muito. Os moradores necessitados os plantão ir.ais juntos ; por que lhe augmenta o numero das plantas , diminue o trabalho das limpas ; e quando ellas vem a fazer mal humas ás outras pela sua visinhança , já tem feito co- lheitas de Cacao , e provido as suas necessidades mais urgentes ; e , hindo a cousa a peior , cortão então hu^ ma parte das açyores , para darem ar ás que ficão. Nas Costas de Caraça se plantão Cacoeiros a doze, e a quinze pés de intervallo , e se fazem rigollas , para os regar de tempos em tempos , havendo seccas grandes. Tarpbem na Martinica , a alguns annos , se tem praticado esta feliz experiência. Finalm.ente a Mandioca he hum arbusto, cujas raizes raspadas , e cozidas ao fogo , fazem a farinha , que serve de pão no Paiz a todos os moradores naturaes da America. Planta-se em os rossados novos , não só pela necessidade , que se tem , de sustentar os escravos ; mas também para diminuir o máo matto , e hcrvas ; c, finalmente, para dar sombra ás novas plantas de Ca- cao , que vem arrebentando , cujo grelo he tão tenro , que não pode resistir ao calor excessivo do Sol. Por este motivo se espera que a Mandioca possa dar som- bra ào pé das estacas , para então se plantar o Cacao , pela maneira que diremos no seguinte. ÇA' CAPITULO III. Do modo de yliinior hum Caçoai ^ e de o cultivar atC' à madureza de seus J'ractos, X Odo o Cacao se planta por semente. O seu lenho não pega por estaca. Abre-se huma cabaça , e , confor- me a necessidade , se lhe tirão as amêndoas , e se plan- tão huma a huma , começando , por exemplo , na pri- meira estaca , que se arranca , e com huma sorte de cnchada bem amolada , tendo-se cavado antes , e cor- tado , picando , em roda a terra , todas as raizes , que a poderião empecer , se mette em terra a amêndoa na pro- fundeza de três ou quatro pollegadas , e se lhe torna a pôr a estaca, algum tanto affastada, para se conhe- cer o lugar ; e deste modo de huma á outra se corre todo o Caceai. ^ Precisa-se advertir. Primeiro: Que sa não deve plantar em tempo secco : se bem , isto se pode fazer em todos os quartos de lua, estando o tempo fresco, e o lugar prompto ; mas commummente se julga que, \ desde Setembro até Dezembro , seja o melhor ; porque as arvores se antecipão em dallo alguns mezes antes. Segundo : De plantarem só as amêndoas grandes , bem nutridas ; pois que seria imprudência plantar as amên- doas movidas , que se encontrão nas cabaças grandes. Terceiro : De plantar com a ponta grossa para baixo, ^ue :i)' ?'l V: y '1* C90) que he a que se prende por hum fio ao centro da ci- Ijaça , quando se lhe tira a amêndoa. Se a plantassem ásvessas, a planta cresceria torta, e não seria boa : ain- da que , plantando-a deitada , a planta não seria ma'. Quarto : De pôr três ou quatro amêndoas em cada es- taca, para que, se, por infelicidade , os pequenos inse- ctos cortarem o grei lo , ou pluma de huma ou duas , quando tenras , haja de ficar huma terceira , para supprir a falta das duas. Ora , não acontecendo isto , se tem a liberdade de escolher das três a melhor , isto he , a mais direita , e mais viçosa : porém não queirão cortar os pés supranumerários , senão , quando o que tiver escolhido , esteja coroado ; e , com toda a probabilida- de , fora de perigo. As amêndoas do Cação brotão , ou grelião em oito , dez , doze dias , mais ou menos , conforme o tempo, em que se plantar , favorecer mais ou menos a vegetação. O grão cylindrico do gérmen , inchando- se , lança por baixo a radicula , que ao depois passa a ser a raiz mestra , ou principal da arvore , e no alto a pluma ou giello , que he hum resumo do tronco , e dos ramos : estas partes crescem , e desenvolvem , de cada vez mais ; os dous lobos da amêndoa , hum pouco af- fastados , e curvados , são os primeiros que rebentão fora da terra , c á medida que o pé se vai levantan- do, elles se endireitao, e se separão, mudando-se em duas folhas dessemelhantes , d'hum verde escuro , gros- sas desiguaes , e d^algum modo entortilhadas , que vem a ser o que se chama orelhas da planta, A pluma sq ma- »■ :)i (9« ) pianifcsta ao mesmo tempo, e se abrt em duas folhas tenras d'luim verde claro ; a estas duas primeiras folhas, pppostas de duas a duas , succedem outras do mesmo thcor , e a estas duas terceiras : o pc cresce á propor^ içáo , e do mesmo modo no decurso d'hum anno , ou perto. Neste periodo toda a cultura do Cacao se reduz a duas cousas. A primeira , em preencher cada quinze dias de griíos novos , os lugares , em que se náo virem nascidos , ou melhor, onde os insectos os tiverem comido, que muitas vezes fazem hum estrago terrível nestas novas plantas , ainda , julgando-se fora de todo o perigo, JViuitos moradores fazem viveiros á parte , para os trans- plantarem nos lugares , em que falharem ; mas porque , nem todos pegão , principalmente , sendo hum tanto grandes , e não sendo a est.-.ção favorável ; e que , ain- da a maior parte dos que pegão , por muito tempo , fi- do languidos , julguei sempre que era melhor replan- tar a amêndoa ; e estou persuadido , que , equilibrada hu- ma , e outra cousa , esta he a melhor. A segunda , de não consentir que nasça hervâ alguma no Caçoai, limpando-se sempre de huma 3 ou- tra ponta 5 sem permittir que alguma chegue a dar se- piente ; porque , deixando-a huma vez , se lhe duplicará o trabalho em alimpar o Caçoai , destruindo as más her- vas , visto que o frio neste paiz não retarda a vegeta- ção , como acontece no nosso. Estas limpas durão , até ^s arvores chegarem a ser grandes , e os seus ramosi se ■<■': '\ODt-as , ou extremidades dos ramos.- Nao se deve du- vidar da utilidade de se lhe separar esta parte com o' podão ; mas , como este proveito não seria tão pre- sente j ou sensivel, como o tempo, e o trabalho que se gastaria , provavelmente sempre se despreSará- est* operação ,- e se julgará inútil , o§ Hespanhoes não o' julgão assim ; pois tem , pelo contrario , muito cuida- do de Hie separar os petiseccos- , donde vem que as" suas arvores são mais vigorosas que as no^saí , é dão-" maior abundância de frUctos. Creio que elle? nunca: c-uidárão em as enxertar , e também duvido se pessoa alí^uma o tenha feito, cora tudo ,- altamente vivo^ per- suadido de que, se as enxertassem , serião melhores os seus fructos , visto que os melhores dos nossos não são devidos a outra causa , Senão aos repetidos enxerto», que se tem feito , de muitos modos , dos garfos de plantas svlvestres , que o acaso mostrou pelos mattos , levando-as com esta arte ao sublime ponto- de as fa-» ?er dar fructos tão excellentes. A' proporção que os Cacoeiros crescem , se des-> pem C9> ) peni , pouco a pouco , das folhas do tronco , que se dei- xão cahir de si mesmo ; porque , em se despindo , nao tardio a florescer , ainda que as primeiras Horas , de ordinário, murchão : e só devem esperar fructo maduro , passados três annos ; estando em boa terra , aos qua- tro , a colheita será medíocre ; aos cinco , estará em toda a sua força. Desde este tempo commummente os Cacoeiros dão por todo o an no flores , e fructos de toda a idade. Na realidade se dão mezes , em que os não tem , e outros em que estão carregados. Nos solis- ticios constantemente as colheitas sío mais abundantes que nas outras estações. Como nos furacões os ventos fazem huma vol- ta de compasso ao redor do globo em vinte e quatro horas , he desagradável que , penetrando pelo lugar mais fraco , e menos coberto de Cacoeiros , faça muita «lesordem , o que se precisa remediar com toda a prés- teza possível. Quando o vento unicamente revira as arvores , sem lhe quebrar a raiz principal , deve-se abra- çar , como melhor, o partido, principalmente, em ter- ras boas , de as endireitar logo , e restituillas ao seu propno lugar ; cscorando-as com forquilhas ; e calcan- dolhe toda a terra em roda. Desta sorte em menos de seis mezes se restabelecem , e entrão a dar , como an- tes , ou como se nada tivessem padecido. Em terras má. he melhor deixaljas deitadas, calcando a terra, e cultivar em cada pé o melhor , ou o mais vigoroso -garto, que estiver mais próximo á raiz, decepando tó- rios os outros. Por todo este tempo a .rvore continua (90 a dar flores, efructos; e, passados dous annos , quan- do já o garfo deixado se tem feito luima nova arvore ^ se tora a velha em distancia de meio pé do garfo dei-^ xado , ou renovo. CAPITULO IV. Da colheita do Cacdo , da maneira de ò fazer resitar ^ e seccar , para se poder guardar , e transportar pa- ra a Europa^ '^^^^ T •' jf\ S reflexões feitas no primeiro capitulo , sobre a mu- dança da côr das cabaças do Cacao , fazem conhecer o' tempo da sua madureza , em que estão promptos gs' s€us fructos para serem colliidos y ficando de regra- ge- ral: que, se deve fazer, tendo mudado todo o fructo' de Gor, e que só a ponta de baixo eátá verde.- Vai-re então de arvore em arvore , de fileira em fUeka , e com varinhas afurquilhadas se fazem eahir as eabaças madu- ras , tomando sentido de não toearr nas vades ^ e tani- bem nas llores. Devem Occupíar nisto os escravos mais destros, aos qaaes acompanha© outros cem cestos- y e as vão amantoando na terra á direita , e á esquerda n<> Caçoai , onde ficão por quatro dias sem as mexer , ou tocar. Nos mezes de maior colheita se deve correr o Caçoai de quinze em quinze dias : nas outras estações de mez em mez. Se os grãos estiverem mais de quatro dias C97 5 ^ias nas cábaçns germinarão e se arruinaráo. He neces-» sario abrillas na manhãa do quinto dia , quando mais tarde ; e isto se faz, dando-lhe, com hum páo , huma pancada no meio das cabaças , para as raxar ^^ e a mão se acaba de abrir a través , e se lhe tirão as amêndoas j que se põem em cestos , mandando deitar no Caçoai as cabaças vasias , para lhe servir de adubo, e estrume ^ RO depois de apodrentadas , com pouca differença , como as folhas, de que as arvores se despem, que lhe ser- vem d 'hum continuo adubo. Ao depois se leva para huma casa todo õ Ca- ção esburgado , e se amontoa sobre taboleiros j cober- tos de folhas de ban^ieiras , que tem perto de sete pés de comprimento , e vinte poUegadaí de largo, e se rodea o Caeao de taboas , cobertas das mesmas folhas ^ e fazendo-se hum paiol j que possa guardar todo o Cacao estendido j se cubra tudo com as mesmas folhas j ou outras semelhantes j pondo-se-lhe por cima algumas ta- boas. O Cacao amontoado , coberto , e embrulhado d© todos os lados, se aquece pela fermentação de suas par- tes insensíveis , e isto he o que se chama ressuar. Todas as m.anhãas , e noites se fazem entrar os escravos, que o movem com os pés , emãcs, e o me- xem muito bem , voltando o que está por baixo para cima , e ás vessas ; o que feito , se torna , como an- tes , a cobrir com as mesmas folhas , e taboas. Continua- sse esta operação diariamente até o quinto dia , no ouai já tem ressuado , o que basta , o que se conhece pej^ côr, que fica muito mais densgiida, ou carregada .j -q T.lll, PAU. Q ab- •a' ■■ ^ •r •' -v^ alisolutamente ruiva. Quanto o Cacao mais ressu^f^ outro tanto ficará mais leve, ou perderá o seu peso; 9 C seu amargo, pois faltando isto, será amargosissimo y e terá o sabor de verde , e aJ^umas vezes germinará-; por este motivo , para que esta obra seja muito bem- feita , se precisa hum certo meio , que se deve ter,; que só se aprende pelo exercicio , ou uso. Logo que o Cacao tenha ressuado se põem ao- ar, e ao Sol, para o fazer seccar da maneira seguinte,^ Diante mão , se deve ter feito muitas mezas de dòus, ou perto de três pés de altura sobre o pavimento de huma casa destinada para isto (são dous taboleiros , ou tablados parallelos coma distancia de dous pés , hum do outro, postos sobre pequenas estacas mettidas na terra) sobre que se estendem esteiras feitas de canas Qacoaras} rachadas , e prezas humas ás outras eom esteiras ; e por cima destas se deita o Cacao ressuado na altura dv duas polfegadas, mexem-se por muitas vezes com hum rodo de páo , e sobre tudo os dous primeiros dias. Pof noite se dobrão as esteiras do Cacao , cobrindo a este com folhas de Banarídra y por amor da chuva ; e isto' mesmo se fa7 de dra , se chover. Os que temem, que de noite o furtem,, o recolhem para alguma casa. Alguns moradores se servem de taboleiros de c]ua.si cinco pés de comprido , e dous de largo , com huma borda levantada de quatro polTegadas , para sec- car o Cacao. Estes gozão docommodode poderem re- colher , em monte , huns sobre outros , não tendo para cobrir mais que o ultimo, que se faz, ou com folhas de de Bananeira , ou com algum t:it3oleiro voltacío , sobra- vindo , e de repente , grandes chuvas , quando o Cacao começa a seccar. Porém o que obriga a se pieferir o usó de esteiras , vem a ser , o ar que atravessa 05 vãos , que faz a cana (jucoàra) ; porque faz seccar me- lhor o Cacao. Os taboleiros , que tivessem o fundo de esteira , ou de rede de arame de latão , serião excellen-« tes , porem , sendo obrigados a mandallas ir da Europa , Sc faria hiima grande despeza. Estando o Cacao ressuado ^ se estenda sobre es- teiras por algum tempo, seja qual for; Desconfiando- se haver muita chUva , e que dure , será bom qUe ain- da se deixe ressiiar por meio dia , ou perto. Déve-se advertir que algumas horas de chuva no ptrineipiio, longe de o prejudicat ^ só servirá de ò fazer melhor. Na primavera porém em lug^r da chuva j se exponha nas primeiras noites ao relento , ou sereno ^ c orvalho das primeiras noites.- Também a chuva de hum j ou dpus dias lhe não fará mal , com a advertência de o deixar por hum dia , ou ao menos , per meio , ao Sol ^ porque sendo o dia bom , por noite se dobra hai sua esteira (como se disse) , e sendo meio dia sem dobrar a esteira , se cobre com folhas de Bananeira , pondo-lhe pedras por cima em as duas extremidades. Mas muita chuva fará abrir o Cacao, e só ficará servindo p»ara (> Chocolate áo paiz ; parque durará pouco tempo. Se o Cacao não tiver fcssuado , quanto baste , por se teí dobrado muito cedo a sua esteira , fica su* jeito a grellar o que fari ^ sua amêndoa muito amar* Q 2 go- «I:' .• .i U:.-*^'^': !rf!l ( ICO ) gosa , e totalmente má. Tendose por huma vez do^ brado o Cacao na sua esteira , e que começa a seccar- se , não devem consentir , que se molhe. Desta época somente se deve mexer de tempos em tempos , até fi- car absolutamente sccco , o que se conhece , se , to mando hum punhado nas mãos , e apertando-o , ratv gerem , então he tempo de o pôr no armazém , e ven^ dello. Os que caprichão em ter , e vender hum bom Cacao , se empenhão , antes de o embarricarem , em o escolher, pôr de parte as amêndoas mui pequenas ,- mo»- vidas , e chatas , que á vista fazem huma má figura , e dão menos Chocolate. Assim he que trazem á Euro*, pa , seccas ao Sol , e se vendem pelos Especieiros , os quaes, não sei porque , as distinguem cm grande, e pequeno Caraça , em grande ,. e peq'.ieno Cacao das Ilhas y porque onde ellas nascem, se lhe não faz esta distinção ; e por isso, com toda a probabilidade , se deve crer que os Negociantes forão , por aigum provei- to delles ,. os qae inventarão estes nomes , por quan^ to naturalmente todo o Cacao , que provem da mesma arvore ,, e da mesma cabaça , nunca he do mesmo tama- nho, He verdade qua , comparando-se huma parte in- teira do Cacao com outro ^ se acha de ordinário huma composta de maiores amêndoas que a outra , o que pode ser causado , ou pela idade da planta , ou do vi- gor das arvores , e ainda também da fecundidade par- ticular das terras : mas , a final , c com toda a certe- za 3 não ha espécie alguma de Cacao , que se possa cha- f ic Cioo chamar grande , e outra , que se possa chamar pequeno , relativamente hum a outro. O Cacao , que nos trazem de Caraça , he mais un- ruoso , e menos amargo que o que nos vem de nossas Ilhas , e se lhe dá a preferencia as^sim em Franca co- mo em Hespanha ; mas , segundo dizem , no Norte , c Allemanha , pelo contrario , querem antes o outro. Mui- tos misturão o Cacao de Caracas com osdasHhas, ame- tade de lium , e outra de outro , e querem que esta mistura faça melhor Chocolate ; mas eu julgo que, a fundo , se houver diflerença entre os Cacaos , que não seri muita, visto que só obriga a mais ou menos- do- se do assucar , para modificar mais ou menos o seu amargo. Porque , precisa-se , como já se disse , consi- derar , que ha somente huma única espécie de Cacao , cue naturalmente nasce em os mattos de Martinica, da mesma maneira que em os de Caraça , sendo o cli- ma destes lugares quasi o mesmo, e por consequência a temperatura das estações igual , e por tanto náo pô- de haver entre estes fructos differença intrínseca , qu« seja muito essencial. A respeito das differenças exteriores , que se notão, estas unicamente podem provir da maior, ou menor fecundidade do terreno , do maior , c menor cuidado, com que se cultivão as arvores, da maior, « menor industria , e applicação dos que o preparao,' « o trabalhão, desde a colheita até á sua entrega , e talvez de todas estas três circunstancias juntas ; o que ainda na Martinica mesmo se pôde observar, he que se dãq 1*' iii::-«í^ dão quartéis , em que se crião muito melhores que em outros , pela única ditferei.ça das terras mais ou menos fwteis, mais ou n.enos húmidas. Seo^undo a experiência de hum dos meus ami- gos a cultura , e a preparação do Cacao augmentão o seu valor. Este Ca\'alheiio, que se applicava com toda a energia , e intelligencia nesta cultura , descobrio q meio de o fazer o género melhor de toda a Ilha , e também , de attrahir os Negociantes para a sua com- pra com preferencia aos dos outros , e de reputar o seu preço sobre o de todos os seus visinhos. O Cacao de Caracas he hum tanto achatado ; e j, pelo seu volume , e figura , se assemelha muito ás nos- sas favas ; o de São Domingos , Jamaica , e Cuba he ^ais grosso geralmente que o das Antilhas. Quanto o Cacao for mais grosso , ç mais nutrido , tanto menos tem de quebra, sendo torrado, e m.ondado , o que , i annos , era huma razão, que favorecia o Cacao de Ca- racas ; mas , presentemente , pelo regulamento do Com- meicio de 1717 , diminuindo-se a dous soldos os direir tos do Cacao de nossas Colónias , e pagando o que não for, a quinze , a differença de treze soldos o in- demniza com tanta vantagjem da sua pequena quebra que se deve suppòr , que apenas os curioso:; , e os faltos de economia preferirão o Cacao de Caraça ao de nossaç Ilhas , e que a sua barateza fará dobrar o seu consuni» mo. !rf.^' $1^ t. C lí^i ) Slenacs do bom Cacao. O bom Cacao deve ter a pelle parda escura , irtui igual , e , tirando-se esta , deve apparecer a sua a- jnendoa farta, bem nutrida, e lisa, de còr de avellã, •inuito escuia por fora , hum pouco mais avermelhada por dentro , com o gosto algum tanto amargo , e ad- stringente , sem. saber a verde , nem a mofo , em hu- Xiia palavra ; sem cheiro, e sem ser picado de bixos. O Cacao he o fructo de mais óleo, que se co- íihece na natureza, Gosa da prerog^tiva maravilhosa de nunca íficar rançoso , por mais velho que seja , com© •licão o de outros fructos , que ihe são análogos em qualidade -, comiO são as nozes , pinhões , pistachias , azeitonas , etc. Também no-lo tracem .arro , tiravio-lhe -ao depois a pelk , e ttem quebra- do , e moido entr^ duas pedras, o formavão em mas- sas com as mãos. Os Hespanhoes , mais industriosos que os índios , «.agora as de muis Nações j a exemplo daquelles , escolhem C Í04) Hi*^ ^0' o iTielhor Cacao, e o mais novo, põem dous arráteis cm hiima grande panelJa de ferro sobre hum fogo cla- ro j mexem-no , e remexem-no continuamente com hu' ma grande espátula , até ficarem as amêndoas bem tor- radas , para se lhes poder tirar com toda a facilidade a pelle , o que se faz , huma por huma , e se vão pondo de parte , e com todo o escrúpulo se lhe rejeitão os grãos cariados , e mofentos , e toda a casca dos bons , porque liquor algum não dissolve estas peliculas , e nem ainda estômago algum he capaz de as digerir , e íis do Cacao ^ que não for bem mondado , se precipi-» tão no fundo das chicaras , em que se bebe. Tendo-se tido a cautcUa de pesar o Cacao , quando se compra ao Especieiro , e que , ao depois de torrado , e mondado , se torna a pesar , se achará , que tem perdido a sexta parte do seu peso, mais, ou mc^ nos 5 segundo for a sua natureza , e qualidades ( por exemplo) de trinta arráteis se reduzirá , depois de mon- dado , a vinte e cinco arráteis. Ao depois de estar , por diversas vezes , o Ca- cao torrado desta maneira , ainda outra vez se repete esta operação na mesma panella de ferro ; porem com hum fogo menos forte , mexendo-se sempre as amen^ doas ate que fiquem torradas no mesmo grão , e no ponto preciso : o que se conhece pelo gosto soboroso , e pela côr parda escura (não negra) . Toda a destreza , está em evitar os dous extremos , o que quer dizer o de o não torrar sufficientemente , e o de o torrar mui- vo , ou queimar, Não se torrando , o que basta , ficão ÇQR- (CotnservanJo Inim certo gosto groí^seíro , e desagradável ; c torrando-se muito, até queimallo , alem do amargo , e máo sabor , com que ficão , perdem de todo o seu óleo, e a melhor parte de suas boas qualidades. Em França , onde de ordinário se encarece tu- do , se faz hum particular caprixo do gosto do Cacao c^ueimado, e de còr negra, como qualidades necessárias para o bom Chocolate , não vendo que vale tanto o carvão do Cacao , como o que se faz no fogão , quan- do se quer carvão. Esta observação não só se confor- ma á razão , c ao bom senso ; mas também se confir- ma pelo unanime consentimento de todos os que tem csci-ipto sobre esta matéria ; e posso certificar que o que digo está mesmo authorisado pela prática univer- sal d'America. Sendo o Cacáo bem torrado , bem limpo , se pisa em hum grande pilão , para o reduzir a huma gros- sa massa , que ao depois se passa em huma pedra , para fazer desta huma massa subtil , de huma delicadeza ex- trema , o que requer maior explicação. Escolha-se hu- ma pedra , que naturalmente resista ao fogo , e qne tenha huma grã íirm.e , sem que seja , ou muito doce , cjue se desfaça , nem muito rija , que não receba o polido. Corta-se de d^zaseis até dezoito pollegadas de largura , e vinte e quatro a trinta de comprido , com ti-ez de grossura , de sorte que a sua superfície seja cur- va , c concava no meio em pollegada e meia. Firma- stí esta pedra sobre hum caixilho de madeira , ou de ferro hum pouco mais alto , ou levantado de hum lado, que Tt' C 106) que do outro ; poem-se por baixo hum fogareiro para esquentar a pedra , para que o calor , pondo em movi- mento as partes oleosas do Caca.o , e reduzindo-o em consistência liquida de mel , facilite mais a acção da. rolo de ferro , de que se servem , para o trabalhar com força, moello , eaffinallo, até que não tenha gru- mos , ou a menor dureza. Este rolo he hum cylindro de ferro liso , de duas pollegadas de grossura , e dezoito ou perto de comprido , que em cada extremidade , ou ponta tem hum cabo de madeira da mçsma grossura com seis pollegadas de comprimento , em que o tra- balhador põem as mãos. Estando a massa tão moída , como se julgar ne- cessário , se mette ainda quente nos moldes de folha , onde coalha, e se faz solida em breve tempo. As formas de folha dos moldes são arbitrarias , c cada hum as faz como quer ; com tudo as cylindricas , que podem con- ter de duas até três libras, ou arráteis de matéria, me parecem mais convenientes , porque os páos mais gros- sos se conservão por muito mais tempo na sua bonda- de, e são muito mais commodos para se raparem. Es- tes páos se guardão embrulhados em papel em lugar secco, e se deve attender que são mui susceptiveis de bons , c máos cheiros, segundo o que, he bom guar- dallos cinco , ou seis mezes antes de seu uso. Finalmente , estando o Cacao sufficientemente moido, e passado porhuma pedra, como temos dito, quercndo-se acabar a composição do Chocolate em mas- sa , procura-se ajuntar a esta massa canella , e assucar pui- I ( 107 7 rulverisado ; e, querendo-se , alguma Eaunilha , confor- me as doses, e proporções, que se ensinarão em outra parte ; e de tornar a repassar tudo sobre a pedra , para bem a misturar , incorporar , e distribuir-se então esta composição Americana em os moldes de folhas de F lan- des, como pequenas taboas com quatro onças cada hu- pia , oy , querendo-se , meio arrátel, PAR^ (io8) PARTE II. . ■!: Las propriedades do Cacao. A Té aqui contemplamos mui superficialmente , e tal qual se apresenta aos sentidos. A ordem requer que examinemos primeiramente as suas qualidades intrínse- cas , e que 5 penetrando mais avante pelo seu interior , manifestemos o que huma razão applicada , e huma di- latada experiência nos tem ensinado sobre os saudáveis effeitos deste fructo. M.'.«' CA- ti ( Í09 ) CAPITULO Antio^os prejititos contra o Casão, X Ara caminharmos mais methodicamente , e com maior clareza no exame , cjue vamos fazer do Cacao , julgo ser necessário de ante-mão desabusar o público dos falsos prejuízos , com que a rançosa Fysica tem preoccupado a todos os Authores , que escreverão a es- te respeito , e cujas impressões ainda agora se achão profundamente gravados no espirito de hum a infinidade de pessoas. Os Hespanhoes , que forão os prim.eiros , ao depois da conquista do novo mundo , cue conhece- rão o Cacao , assentarão , como hum principio , ou com hum axioma , que o Cacao era frio , e secco , e que participava da terra. Não acompanharão esta resoiu- ção , e decisão com algum exame , discurso , e experiên- cia ; menos se sabe, donde souberão isto, que talvez fosse da tradição , e opinião dos habitantes primitivos. Seja o que for , he mui natural que d'hum principio tão falso houvessem de tirar consequências mui erróneas , das quaes as seguintes ^^0 as pnncipaes. < tio ) íi Consequência J'ahái O Cgicao 5 sendo de natureza fria , se deve ásst delle com a mistura de aromas, por serem commum- mente quentes, para que a acção, efeacção dos contra-» tios. híijai de resultar huma qua:lidade temperada, c in- capaz de prejudicar. Esta era a linguagem , e a prática .desses tempos. Desta maneira também os antigos Mé- dicos , tendo supposto muito mal que o ópio era frio no quarto gráo, nunca deixarão , para corregir esta frie- za , pertendida intrinseca , de misturar , em todas as suas composiçóies narcóticas, drogas summamente quentes ^ como o Euphorbio , Piretro , Pimenta , ctc. II. Consequência, H t. Que o Cacao , sendo secco , e terrestre ,• e poí isso julgado d'huma qualidade estiptica, e adstringente,^ a não sei corregido , deveria por si mesmo gerar ob» strucçoes nas vísceras , e levar a huma cacochímia , é á infinidade de outros maíes incuráveis. Todos estes prejuizos passarão dos Hespanhoe* a outras Nações. Seria inútil citar aqui os livros dos differentes Authorei , porque , tendo-se lido hum , s» tem lido a todos , pois que os últimos nada mais fize- rão que trasladar os primeiros ,• se bem , pela maior parte encarecerão as suas illu-^ões ; e assim, pelo empe- nho , que faziãa nestas exagerações ,• do pertendido frio do (nt) tJo Cacao , cíiegárão ao excesso de affírmar , que era hunvã espécie de veneno frio ; e qiie , tomando-se com excesso, se cahiria em Iiuma atfophia. Não hei extraordinário que todos os qiíe gostão mais de crer que de examinar ([ pessoas de que todo o mundo está cheio) se entregassem a esta opiniáo unanime de tantos Authores. Seria hum mal, não dei- í(ar-se arrastar pela torrente d'huma pervenção tão ge- ral. Mas não poso deixar de me admirar que tão gran- de clamor contra o Cacao não tenha totalmente aboli- do o seu uso. Se a experiência diária dos seus bons ef- feitos o não tivesse podido sustentar ^ e embaraçar a sua queda debaixo de tantfi calúirinia. Com tudo , para destruir este antigo systema ,. basta , ao que me parece , observar o pouco discerni- mento , com que por esse tempo se tratava a Historia Natural. Na realidade cessará a admiração , lembrando-se que neste século se julgava-, pOr exemplo , que o Al- canfor era frio, e húmido, que he huma espécie de re- sina , de que senão pôde tirar huma só gotta de agua, cujo sabor acre, e clieiro penetrante, juntos á sua ex- cessiva volatibilidade , e á inflammabilidade de suas par- tes , até na mesma agua são signaes tão evidentes de tanto calor j que custa muito crer, como, através dis- to , se poderáô persuadir do contrario. Na realidade , as qualidades do Cacao , nem são tão assignaladas , nem tão activas , como as da campho- ra ; mas qualquer attenção faz ver : Que o muito óleo , ^ue contém, e o seu amargo , quando se prova, nÍD são ^ II ■' são indicies d'hum muito frio , visto qiíe todóí o* amargos se julgão quentes , e que o óleo he matéria próxima e necessária do fogo. Este he , com pouca rfifferença , o que a seu respeito dizia hum celebre Me- dico de Roma , contra a opinião antiga. Segundo a mi- nha opinião ,- sinto o contrario. Julgo que o Cacao não he quente nem frio , sim temperado : remetto-me ao juizo de todas as pessoas sensatas , que o tem bebido , e examinado cuidadosamente. Confirmarei estas reflexões na Secção- primeira do Capitulo seguinte ^ onde , pela experiência , farei ver que o Cacao he huma substancia mui temperada , hum alimento doce , e benigno , e incapaz de fazer mal ; e por esta razão , não se devendo temer a sua pertendida frieza intrínseca , concordar-se-ha , em que não só he ridículo 5 mais ainda pernicioso ajuntar-lhe especiarias acres, e quentes y só próprias a alterar, e anniquilar aS suas boas , e verdadeiras qualidades ^ e não de corregir as más , que nunca teve. Com tudo não duvido que , a sensualidade do cheiro , e o gosto favorito dos sabo*- res picantes , achando sua proporção nesta mistura , na® hajão de conservar ainda partidistas , quis , levados mais do deleite presente que do prejuízo insensível que es- tes ingredientes podem fazer á saúde, não se delibera- rão a passar sem elles. Neste caso não os admittírão como correctivos , mas sim como temperos , com que lisonjearão seu appetite , sem se embaraçarem com as suas consequências. Mas todo , o c,ue quizer pasar pelo incommodo de discorrer , e que for mais dócil , e me- nos t\m sensual , se absterá sabiamente de sfcmelhantes ex- cessos, e sua moderação nSo será serh premio. A saúde Jie hum bem tão grande, que o cuidado de a adquirir, e corjservjr deve prevalecer a todas as outras conside- rações. A respeito das pertendidas obstrucçoes que se imputáo á adstringência ào Cacao > eátá táo longe que o seu uso as cause , que nas nossas Ilhas da Americ2 experiências repetidas tem mostrado o contrario ; pois , pelo seu soccorro , mUitas donzellas sujeitas á paliides da còr , se livrarão deste incommodo , comendo , de manhãa em jejum , doze amêndoas de Cacao. Sabe-se que as obstrucções são causa deste mal , e assim , o Cacao as destroe , em lugar de as causar. Em quanto a outras moléstias que Se attribuiáo ao seu uso immoderado , ao depois referiremos tantos factos oppostos a estes chymericós medos ^ que toda a pessoa de bom senso ficará inteiramente desabusada , e se convencerá das saudáveis propriedades , e maravilhosas deste fructo. Este será o objecto do seguinte capitulo. T. m. p. ni. H CA- ( IM) CAPITULO II. Das verdadeiras propriedades do Caeao. O Em me valer da linguagem dos Peripateticos der qualidades quentes , e frias , presentemente abominadas , não me será difíicil mostrar que o Cacao lue huma sub- stancia y primeiro , rnui temperada; segundo, mui nu- tritiva , e de fácil digestão ; terceiro , mui própria a res- taurar os espíritos dissipados , 6 forças abatidas ; quar- to , finalmente , mui conveniente para conservar a saú- de, prolongar ávida dos velhos. Demonstrar-se-hão es- ^- quatro artigos nas quatro Secções seguintes^ I^ O Cacao he irutl temperado^ ;^'.lli M.«' Nada ha que possa persuadir coi» maior força qtrs, o. trigo, o arroz, o mel, a mandioca são alimentos* temperados , e saudáveis , como o uso geral que fa^eirt Nações inteiras destes alimentos , e se algumas destas substancias tivesse alguma qualidade predominante , seria logo manifesta pelo prejuizo que faria á saúde. Os po- vos ,. que delles sesustentão , os deixar ião, como huin alimento perigoso j e prejudiciaL Queirão fazer este mesmo discurso a respeito- do Cacao. Os habitantes , naturaes da nova Hespanha ,. e de huma boa parte da Zona Tórrida d'AmcrJca, fazem del- ít as suas cíelicias , e presentemente tocías as Colonial Europeas , estabelecidas nestes paizes , lhe dão hum pasmo so consummo. A toda a hora , e cm todas as estações , usão delle , como hum alimento diário , sem distinção de idade , temperamento , sexo , oU condição , e sem que ate agora alguém se tenha queixado da menor in- commodidade. Pelo contrario , experimèhtão que apaga a sede , que refresca , ou refrigera j que engorda , que procura hum somno tranquillo j e produz outros bons effeitos 5 dos quaes tratarcmoá nas Secções seguintes. Poderia citar muitos factos em favoí deste excel- lente alimento ; mas contentarme-hei com os dous se- guintes , igualmente certos , e decisivos , para fazer julgaf da sua bondade. O primeiro he huma experiência do» Cacao 5 de que unicamente se alimentava a mulher d'hum Cirurgião da Martinica , que por hum funesto accidente tinha perdido o queixo inferior ^ que a obrigou aò esta- do de não saber , como poderia prover a sua subsisten-^ cia : não podia usar de manjares sólidos : não era assas rica , para se nutrir de geléas de carne : nesta triste cir- cunstancia se resolveo a tomar ^ três vezes cada dia^ três escudellas de Chocolate , feito á moda do paiz, huma de manhãa , outra ao meio dia ^ outra á noit© (este Chocolate nada era mais que Cacao dissolvido em agua quente com assucar ^ e huma pitada de Ca« nella por tempero) , novo regimen , e vida , que lhe sortio tão bem 5 que viveo , ao depois, muito tempo jf mais fresca, mais robusta , do que antes do sé-u' acci- dente tinha sido, H 2 Te- ir m Tenho hum segunda facto , contado por hum Cavalheiro de Martinica , incapaz de faltar á verdade , c vem a ser , que no seu bairro do Rio de Lezard hum menino de quatro mezes , tendo infelizmente per- dido sua ama , e que não podendo seus parentes en- contrar ama , que o aleitasse , se resolverão a criallo com o Chocolate, no que foi tão feliz, que se achou maravilhosamente tão são , e tão vigoroso , como os que SC crião com os melhores leites , e amas» São tão evidentes todas as inducçoes , que se poderião tirar destas duas historias , e provão tão de- monstrativamente , que o Cacao não tem qualidade alguma excessiva , e perniciosa , que eu me não demo- rarei mais , deixando a cada hum a liberdade de ajun- tar-lhc de si mesmo as suas próprias reflexões. II. O Cacao he mui nutritivo y e de Jacll digestão. Esta proposição he huma necessária consequência, da' precedente , estabelecida pelos factos , que acabo de leferir , e nó-s não temos menos experiências que nos- confirmem a facilidade , que o estômago tem , de coser este alimento, que a bondade do chilo , que produz; mas amais familiar, que se apresenta, he o estado de gordo , em que põem os que o usao ordinariamente. Hum sábio Inglez encareceo tanto esta particu- lar propriedade do Cacao cm hum elogio, que lhe tez, que não duvidou afíirmar em huma Dissertação , que imprimio a este assumpto : que hunu onça át Cacao con- contem tanto sueco oleoso , e nutritivo , como Iium ar- rátel de carne de vacca. Ainda que esta proposição seja excessiva, faz comprehender muito bem que se não di alimento algum tão capaz de fornecer hum alimento mais abundante, comparando-se com todos os outros, não só pelo volume , e quantidade que se come , co- mo também pelo tempo que gasta o estômago na sua digestão. Presentemente se divide a escóUa medica em duas opiniões sobre as causas da digestão. Cada partido tem a seu favor razões de peso , e patronos illustres. Convencido da minha insufficiencia n^sta matéria , que , aliás, requei hum campo mais vasto, e sem. me obri" gar a entrar no partido da fermentação , ou da tritura- ção, basta-me dizer em duas palavras : que estas dua«? opiniões , não sendo absolutamente incompatíveis , não seria tulvez impossivel fazer entre ellas huma espécie de alliança bem entendida; pois, unindo-se o que am- bos os systemas tem de mais luminoso , e mais bem provado , e separando-se o que cada lium delles tem de incerto , se poderia formar hum terceiro , que, sendo somente a união do melhor dos dous precedentes , seria mui judicioso , e mui excellente. Estas duas causas concorrem , incontestavelmen- te , para a alteração que os alimentos padecem na boc- ca. Devem convir que a mastigação , ou a saliva os desfaz , e os penetra , como se fosse hum maravilhoso fermento, que os penetrasse, e que a lingua , que os »•!.' '■í y'^:. .f': I '" ':V Ç n8) agita , e os dentes , que o movem , não sejao os instru- inentos desta primeira trituração. Ora a n?.tureza , que de ordinário he uniforme cm todas as duas operações , faz presumir que conti" núd , e acaba a digestão com os mesmos meios , com que começou. Por hum instante supponhamos isto , pa* ra se poder applicar ao assumpto , que tratamos , e ve- remos a evidencia 5 que tem, isto he, que o Cacao he de huma fácil digestão. 1, As substancias amargas , e alcalinas , como estas amêndoas , são estomaticas , e análogas á saliva , e ao fermento que faz , em o estômago , a dissolução dos alimentos , e por tanto hum meio , que, sendo dotado destas qualidades , pôde difficultar a digestão. 2. Conciderando-se attenciosamente o Cacao tor- rado , moido, e alcoolisado , dizendo-o assim, sobre a pedra , e , finsilmente , derretido , e dissolvido no fo- go , em hum liqiior quente , que lhe serve de vehicu- lo , certamente parece que , depois destes preparativos , não deve o estômago ter trabalho algum , em huma palavra , qua toda , ou mais da ametade da digestão se ^cha feita. A experiência diária confirma estes discursos o mais que pôde ser : a digestão se faz com toda a pres- teza sem afílicção alguma , ou trabalho ; e sem que o pulso se altere sensivelmente : o estômago sem empre- gar as suas forças naturaes , adquire novas , e mais ef- icazes 3 e posso certificar , que conheci a muitas pessoas , 'i' ( 119) as quaes , tendo-as tido mui débeis , e totalmente ar- minadas, se recstabelec tomar hum.a boa taça de Chocolate , immiediatamentt conhece que a sua fraqueza cessa, e que as suas forças lhe voltão , apenas a digestão estiver começada a fazer. A experiência explica melhor este effeito que o discur- so ; porque o Cacao se representa aos sentidos huma matéria doce, tranquilla , e pouco disposta por quali- dades activas a pôr os espiritos em movimento. Com tudo , tendo-me resolvido a não despresar cousa alguma , por procurar o descobrir a causa de huiVi effeito tão prompto , e tão maravilhoso , emprehendi hum dia fazer a Analyse Chymica do Cacao , se bem estava preocupado da opinião de que por este caminho , só se teria o conhecimento , assas superficial dos mix- tos , com tudo não deixei de lisongear-me de que a mi~ niu curiosidade não seria baldada. Slon- V •! í.' C 120 ) !■(: '• ^: M •'■■'.: Mondei dezaseis onças de Cacao sem o torrar pisei-as em hum gral de pedra , e as metti , ao depois , em huma retorta de vidro lutada , e a puz em hum forno de reverbero para servir de seu recipiente e lu- tada exactamente , lhe dei fogo por gráos. Sahio pri- meiramente a fleuma , gotta a gotta , por espaço de duas horas, na qual nadava por cima huma pouca de maté- ria branca , e unctuosa. Augmentando-se o fogo ás '^gcttas , sahírão avermelhadas ; e se congellárâo , logo que cahírão na redoma , o que durou ainda outras duas ho- ras. Augmentado o fogo , a redoma se encheo de nu- vens brancas , que vi resolver-se em huma espécie de orvalho branco , e unctuoso , que parte , era hum es- pirito , e outra, hum óleo branco. Entre tanto as got- tas avermelhadas continuarão a correr até o fim , isto he, por duas horas e meia. Esta operação me faz co- nhecer , que o Cacao contém duas sortes de óleo , hum vermelho, e fixo, que se congellava do lado da redo- ma, e a outra branca , e volátil matéria das nuvens brancas, que se resolvião do outro Jado do balão. Ao outro dia de manhaa , depois de lutado o balão , e tello posto em huma bacia cheia de ar ;ua em banlio maria , para lhe fazer derreter as matérias con- gelada- , ficuei surprendido pelo gosto de o ver repen- tinamente cheio de nuvens brancas ; admirei a extrema volatilidade desta primeira unctuosidade , e plenamente me convenci , que o Cacao continha verdadeiramente este óleo volátil , tão estimado na Medicina , e que só- men- mente se deve procurar no Cacao para a prompta ra- p.iração dos espíritos fatigados , confirmado pela expe- riência diária no uso do Cacao. Tendo separado o espirito pelo filtro de papel pardo , fiz duas porções de matéria butyrosa , e puz liu- ma sem addiçao em huma eucurbita de vidro, e a puz em hum banho de areia, para o rectificar, e por esta operação tirei hum óleo com côr de âmbar , nadando sobre- alguma íleuma, ou espirito. Fiz derreter outra parte, c encorporando-a com cal viva , a puz em huma pequena retorta de vidro lutada , e lhe puz fogo por baixo, primeiramente correo hum óleo claio , succedérão as nuvens brancas , e finalmente huma manteiga averme- lhada. Tendo delutado o recipiente , e posto tudo em huma pequena eucurbita em banho de arca , as nuvens brancas deiao no principio hum óleo còr de arnbar , e au^mentando-lhe o fogo destillou hum pouco de óleo vermelho o óleo còr de âmbar nada he mais que o óleo volátil branco que a violência do fogo dto alguma còr j em quanto ao avermelhado , provavelmente he a porção de manteiga avermelhada a mais própria a ser exaltada. Estes dous oleos em nada se confundem , c o vermelho, mais fixo que o prim.eirc , se precipita sem- pre no fundo. Mr. Boyle diz que tirara do sangue hu- mano duas sortes de oleos , ambos semelhantes aos áe que fallo, e esta conformidade de substancias , tão ho- mogéneas 5 me confirma altamente na opinião da gran- de analogia , que sempre , suppuz que sç dava entre o Cacao ^ e o nosso sangue. A '■^:} '• .^; H • C 122 ) A respeito do espirito devo dizer que se náo dá cousa alguma , que seja tão desagradável , assim ao gos- to como ao cheiro. Não fermenta sensivelmente com os alkalis , não muda de sorte alguma a cór do papel azul; com o tempo o acido se manifesta algum tanto, e o espirito se azeda mais fracamente. Tendo calcinado o coput mortuum , que he violete filtrado , e evaporado a lexivia á maneira acostumada , somente tirei huma pouca de cinza hum tanto salgada, e em tão pequena quantidade, que se não tivesse o trabalho de repetir a calcinação , dissolução , filitração , e evaporação , escas- samente teria conseguido tirar cinco , ou seis grãos de sal fixo purifi«ado. Curiosamente observei que nem nos balões, nem nos capiteis das tucurbitas apparecia vestígio algum de sal volátil concreto. Mr. Lemery , com tudo , affirma que o Cacao contem muito , e provavelmente o disse pelo ouvir a alguém ; porque não poderia dizello de sua cabeça , pois era mui sábio para se enganar. Destas duas observações se pode tirar esta conclusão : Que o Cacao talvez seja o mixto em que entre menos sal. IV. O Cacao he muito próprio para conservar a saúde , € para prolongar a vida dos velhos. Antes de se conhecer o Cacao na Europa , com» mummente se chamava o bom vinho velho , o leit« dos velhos ; mas esta antonoma<;ia com maior razão se applicou , depois que o seu uso se fez ordinário , co- nhe- C i^J ) rliecendo que o Cacao lhe faz a sua base , he a seu respeito , o que o leite hc para o sustento das crian- ças. Na realidade , examinando-se qualquer cousa a na- tureza deste fructo relativamente á constituição das pessoas idosas , sem traballio se conhece que hum pa- rece ter sido feito para remediar as faltas do outro , de forma que o Cacao he verdadeiramente a panacea da velhice. A nossa vida , como adverttá hum douto Medi- co ( Bíigllvlo ) , nada he mais que hum desseccamento contínuo, mas esta Physica natural he como imperce- ptível até huma idade avançada , na qual o húmido radical se consomme de hum modo mais sensível : en- tão as porções , mais sulfúreas , e mais voláteis do san- gue se dissipão pouco a pouco , os saes se despegão dos sulfures , se desenvolvem , e o acido se manifesta ^ri- gem fecunda das moléstias chronicas) . Os ligamentos tendões, e cartilagens não gosao mais da unctuosidade que as fazia tão macias , e tão flexíveis na sua mocida- de , a pelle se enruga assim por dentro , como por fora ; em huma palavra , todas as partes solidas se des- seccão , e engrovinhão. Dir-se ha que a natureza encerrou no Cacao hum remédio para todos estes inconvenientes ; o volátil sul- phureo , de que abunda , he capaz de repor todos os dias tudo quanto a grande idade faz o sangue perder ; embota a força dos saes , os envolve , os concentra , c repõem ao sangue a sim doçura acostumada , com pouca differença, como o espirito de vinho, circulai> do «(i ^-c M '•'•:; . C 124) do com o espirito de sal , forma hum liquor doce de hum poderoso corrosivo. Esta mesma unctuosidade sul- fúrea , se reparte , ao mesmo tempo , por todas as* par- tes solidas , e que de alguma sorte lhes cá a sua ma- cieza natural ; ella unta as membranas , tendões , liga- mentos, e cartilagens, de huma espécie de óleo, que as faz lizas , e fiexiveis ; assim também restabelece o equilíbrio entre as partes fiuidas ; o jogo, e a elastici- dade da maquina se renova , a saúde se conserva , e a vida se prolonga. Estas consequências, não nascem de reflexões Filosóficas , sim de mil experiências , e mais , que mutuamente se coníirmão , e neste grande nume- ro bastará huma só. Acaba de moner em Martinica hum conselheiro de quasi cem annos de idade, o qual, ha- vião trinta annos , que somente vivia de Chocolate , algwm biscouto , e rara vez de alguma hortalice , sem comxer já mais carne, ou peixe, nem algum outro ali- mento , e com tudo era tão vigoroso , e com tanta disposição , que na idade de oitenta e cinco annos ain- da montava a cavallo sem estribos. / Não são só ás pessoas idosas que o Cacao he ca- paz de prolongar a vida , mas também ás pessoas d'huma constituição magra, c secca , de temperamentos fracos, c cacochimios , ás pessoas , que fazem exercícios violen- tos do corpo ; e aos que pela sua profissão são obriga- dos a sustentar longas applicações de erpirito , que muitas vezes os enfraquecem extraordinariamente , o Cho- colate ccnvcm sobre tudo , e a respeito destes se volta em hum alimento alterante. Eu i ' • Èii não aconselharia, por motivos oppostos , aos gordos o seu uso diário ; o mesmo aos que estão no costume de beberem vinhos exceJIcntes , c a comerem de ordinário carnes as mais succu lentas , aos que dor- mem muito tempo , aos que não fazem quasi exerci, cio algum ; em huma palavra , aos que passão huma Vida molle , sedentária , e vpluptuosa , como a maior parte das pessoas abastecidas de Paris. Estes corpos cheios de sangue , e de gordura, não tem precisão al- guma de augmentar a sua substancia , e a dieta Jhe conviria muito melhor segundo o Divino OracuJo : In muUls escls erit injirmltas j propter crapulam multi ohie* runt 5 qiii atitem obsíineiis est , adjlcit vitam. ?AR, Mj.-»' t 146) —Bgg-j.. i«^-,m^.ii..-. PARTE III. Dos usos ào Cacao* p Odem se reduzir os usos ordinários doCacao a três ; primeiro , para doce ; segundo , para a bebida do Cho* colate ; terceiro , para se lhe tirar o óleo , a que tanr bem se dá o nome de manteiga. Passo a tratar dog trçs usos nos seguintes capítulos. CAÍ C 127) CAPITULO I, Do Cacao cm doce. E Scolhem-se cabaças mui maduras , tirao-se-lhes com limpeza as amêndoas , sem as arruinar , e se põem de molho por alguns dias em agua , que tenha sido cor- rente, mudando-se esta de m.anhãa , e de tarde, ten- do-as ao depois tirado , e enxugado , se lardéão com pe- quenas tiras de casca de Cidra , e Canella , quasi do mesmo modo , com que em Ruão se preparão as No- 2es. Neste comenos se prepara huma calda de bom assucar , mas com poucoponto , isto he , onde haja mui- to pouco assucar , e depois de o ter bem purificado , se tira totalmente do fogo , e se lhe deita os grãos do Cacao , e se deixão de infusão por vinte e quatro ho- ras , ao depois do que se tirão desta calda , e no en- tietanto que deixão escorrer , se faz outra nova , se- melhante á premente , porém mais forte , ou aperta- da , na qual , do mesmo modo que em a primeira , se deixa estar de infusão outras vinte e quatro horas. Tu- do isto se repete de cinco a seis vezes ^ augmentando de cada vez a porção do assucar , sem os pôr sobre o fogo , nem dar-lhe outro cozimento mais. Finalmente , tendo feito cozer o ultimo xarope , em consistência de assucar , se deita sobre os Cacaos , posto em huma va«p si- -.,'7^ sílha vidrada , para os conservar, e estando a calda qtíaíi fria , se lhe misturão algumas gotías de essência de âmbar, Querendo-se tirar o sueco a este doce, se tirão as amêndoas fóra do xarope , e tendo deixado escorrer bem , se tornão a lançar em huma bacia de calda de assucar purificado , e forte , mettendo-o logo em Iluma estufa , onde encandilão , ou se faz candi. CAPITULO II, Do Chocolate^ Emos que examinar duas cousas a reípeiCo ãests bebida ; a primeira , a origem do Chocolate , e os dilTe- rentes modos de o preparar ; a segunda , as suas utili* dades relativamente á Medicina o que fará o assumpto das Secções seguintes, §. I. Ba origem do Chocolate^ e os dlfferentss m&cf&s de o preparar. O Chocolate he originariamente huma bebida Americana que os Hespanhoes acharão muito em uso no México, quando o conquistarão no anno de ij20^ Os índios , que de tempo immemorial usavão desta bebida , a prepa^a^'ão de differente maneira , e muito simples. Torravão o Cacao em panellas de bar- ro, J M X í^9 ') fo , e o molao entre duas pedras , tendo-o antecederv temente mondado , desfazião-no em agua quente , e o lemperavão com pimenta ; e os que o fazem com maior ceremonia lhe ajuntavío o Urueú , para lhe dar còr , c o JtolU para lhe augmentar o volume. Todos estes ingiedientcs juntos lhe davao huma apparencia tão bru- ta, ehum gosto tão selvagem, que hum soldado Hes- panhol dizia , que era mais própria para ser lançada aos porcos que ser apresentada a homens , que já mais se poderia acostum-r a ella , faltando-lhc d vinho , cuja falta somente o obrigaria a beber agua pura. Os Hespanhoes , ensinados pelos Mexicanos , e convencidos pela sua própria experiência, que esta be- bida, apesar de ser rústica, como se lhe representava, era com tudo huma bebida mui saudável , procurarão corregir o seu dissabor pela adicqão do assucar , e d'al- gumas especiarias orientaes, e de outras drogas dopaiz, as quaes seria por ora inucil recenseallas , pois que apenas lhes conhecemos os nomes ; e que de tantos in- gredientes unicamente a Bisunilha nos tem chegado, da mesma maneira que a Canella , que he a única que tem merecido a approvação geral , e com que se con- tinua a composição do Chocolate. A Baunilha he huma baje de còr trigueira , e d'hum cheiro suavíssimo. He mais chata, e mais com- prida que a dos nossos feijões , e contém huma me- dulla meliosa, cheia de pequenas sementes pretas, e iusidias. Deve-se escolher a mais nova, gorda , bera T. III. P-ÍIX. I ^^- I I mrtrida ; e precaver , qu« a nao tenhão untado dts bálsamo , nem posto em lugar húmido. O cheiro agradável , e o gosto elevado , qtie eP- h communica ao Chocolate , a fizera© muito recomern davel ; mas , huma longa experiência tendo ensinado que ella era muito quente , se diminuio muito a fre- quência do seu uso ; e as pessoas que preferem o cui- dado da sua saúde ao gosto de seus sentidos , todavia seabstiverão absolutamente. Actual nefíte se chama em «espanha , e França , ao Chocolate , que não leva Bauni- lha , Chocolate de saúde , e nas nossas Ilhas Francezas tia America, onde a Eaunilha , nem he rara, nem he cara , como na Europa , he desconhecido o seu uso, íião obstante ser tão grande o consummo do Choco- late 5 coroo- em outra qualquer parte do mmido. No em tanto , como se dão ainda sobejas pes- soas , que são apaixonadas pela Baunilha , e que , de algum modo he justo deferir ao seu gosto , ou paixão , quero fazer a Baunilha na composição do Chocolate , que me parece a melhor y e a mais bem receitada y unica- mente digo que me parece tal ; porque y como em iTi ateria de gostos se dá huma infinita diversidade de opiniões, cada hum quer que se respeite , a que segue, e que se lhe acrescente o que outro quer que se lhe xliminua. Ainda quando se conviesse em misturar to- das estas cousas, não seria possivel determinar-se entre ellas porporções, que universalmente se approvassem ; e, por tanto , basta-me escolhellas taes , que possa-» con- Ctínvir ao maior numero , e que consequentemente fóf- inctn o gosto mais seguido. Estando a massa do Cacao berri moído na pe- fira, Gomo já expliquei , se lhe ajunta assucar em pó, passado por peneira de seda ; a verdadeira proporção do Cacao , e assucar he deitar-lhe pesoá Iguaes de hum , e outro ; o que não obstante j se lhe diminUe a quart» patte do assucar > para impedir que O assucar não des- seque muito a massa , e a faça menos susceptivel daç impressões do ar ; e ser , ao depois disso j mais sujeita a ser picada pelos bixos. Restitue-se-lhe esta qUart?. parte de assucar , qUando se ia? a bebida que chamã(j CliQcolcitei. Misturando-se bem 6 assijcar com a massa do Cacao , se lhe ajunta , feito em pó subtil , as bajes d? iiaunilha , e Canella ^ socadas , e peneiradas juntamen* te ; répassa-se também esta mistura pela pedra , e , es- tando tudo bem encorporado , se põem a massa em moldes de folhas de Flandes , onde toma a forma , qir? se lhe quer dar , e a sua dureza natural. Querendo-se- cheiros, se lhe deita alguma essência de âmbar, aijtes de a deitar nos moldes* Fazendo-se o Chocolate sem Baunilha , a pro- porção da Canella he de duas drachmas por arrátel ; mas , empregando-se Baunilha , pelo menos , se lhe di^ jTiinue ametade da dose da Canella. A dose a respei-- .tp da Baunilha he arbitraria ; huma , duas , ou íref Í3ajes j e ainda mais , por cada arrátel de Cítcao , confor- me a fantesia de cada .hum. I ^ Os ' 'I Os authores do Chocolate , para fazerem ver qoe empregarão muita Baunilha , lhe misturão pimenta, e gengibre , etc. Dão-se a pessoas acostumadas ás cousas ie alto gosto, que o não cjuerem feito de outra sorte; mas estas especiarias unicamente servem para incerydiar o corpo. As pessoas sabias nunca cahiráõ neste excesso , e cuidarão muito em nunca usar do Chocolate , sem te- rem todo o conhecimento , e certeza dos ingiedientes de sua composição. O Chocolate , composto deste modo , tem a com- modo de que, quando se vem obrigados a sahir de ca^ sa, ou que se viaja, c não ha tempo para fazer a bc^ bida , se pôde comer huma onça de qualquer pio . t beber em cima hum copo de agua , deixando trabalhar o estômago, para dissolver ptomptamente este almoço; Nas Antilhas se fazem páos de Cacao puro> , e sem addicção alguma , como ensinei no fim da Segun- da Parte, e quando se quer o- Chocolate em bebida ^ se procede do seguinte modo. Methodo' de 5& preparar o Chocolate á maneira das Ilhas Fra/jcezas d' America. Raspa-se com htmi=a faca íigeiramente áos páos ck> puro Cacao a quantidiíde que se deseja, (porexeim- pio quatro grandes colheradas cheias, que pesem h»ma onça) misturão-se-lhe dous , ou três pugillos de Ca- nella em pó , e peneirada por peneira de seda , e quasi duas colheradas de assucar em pó. Põem- ( nO Poem-se esta mistura cm hiima cliocolateira com hum ovo fresco inteiro, quero dizer, clara, e gema, mistura-se tudo com o páo ; redu2-se a consistência de mel liquido , sobre que , ao depois , se faz deitar o li-* as íttlU^ades ^ (jiie se podem tirar do ClwcoíiUe ^ nos usos da Medicina, Sempre me pareceo que seria muito vantajoso a M^dieina encontrar iium meio de offereccr aos doentes çs remédios de baixo de huma fórma agradável , e dô Jbiixo de hum gosto conhecido, O mesmo artificio, r^ue lhes cffereceria ocultas , de baixo do nome , e ap- parencií^s Irsanjeira: de hum ^^limenta delicioso n^o seria seni sem proveito. O.-; doentes sempre sentem a sua molés- tia, sem haver precisão alguma de lha augmentar pelos dispostos dos remédios ; poupar-se-lhes hia as revoluções do estômago, que os antoja em tudo o que se chama medicamento, e talvez que este alimento, ao mesmo tempo, lhes haja de servir dehuma boa nutrição, e de hum cxcellente vehiculo aos remédios. Fiz algumas applicações deste pensamento ao Chocolate , e me animo a cçrtiíicar que por muita» vezes fui bem succedido, e o meu prejuizo foi confir- mado: desejarei que este ensayo > bem que imperfeito , como he , haja de servir de despertar a attenção de al- gum sábio Medico , que se digne ter o incommodo de profundar huma matéria , que as minhas pequenas lu- zes nada mais me permittem , que tocallas superficial, xnente. I. Quantos não se querem purgar, e se obsti- não em a não querer , ainda quando tem a maior neces- sidade , somente pela aversão excessiva que tem de tomar os remédios ordinários ? Ensinallos a purgarem-se por hum modo delicioso, e ainda não ©sabendo elles» he fazer lhes hum importante serviço. Isto se executa , misturando jalapa em pó (mais, ou menos, conforme fòr a idade , e suas forças) com o pó de Canella des- tinada para huma taça ordinária de Chocolate. Tenho feito muitas experiências , e isto purga muito bem sem torminos. Muitos, que o tem assim tomado, o repu- tarão por hum beneficio da Natureza, sem saberem o cfíicioso engano de que me tinha servido a seu respei- to. M i:-. M ■^k to. Que proveitos senão poderião tirar deste modo dô purgar as crianças , que tem tanta repugnância em beber o que lhes náo sabe bem, II. As preparações Galenicas , e Chymicas , que áe tem feito da Quina Quina , não tem feito hum bom effeito , bem que antigamente tão gavadas. A sua infusão em vinho só contém huma parte da sua virtude ; pois que lhe fica no fundo da botelha o se* dimento , que gosa da propriedade de parar a febre ; e assim , depois de mil experiências infriictuosas , se veio a tornar a dar em substancia posra em pó mui- to fino , de que se formão bolos , que se desfazem em agua. Esta prática tem também seus inconvenien- tes ; porque muitas pessoas , e também as crianças, não a podem tomar ®m massa , ou pillulas , e me- nos se accomodão com ella desfeita em agua : ora por qualquer modo destes , este pó , precipitando-se ao fundo do estômago , não pôde deixar de as fatigar ex- cessivamente. Para se remediar tudo isto , misturando-se mei» drachma de Quina empo, passada por peneira de seda, e moida a secco em gral de pedra com a Canella des- tinada para huma taça de Chocolate , da qual se au- gmente alguma cousa a d©se do assucar , se tomará s Quina sem dissabor algum , e talvez sem a perceber ; nutrir-se-ha melhor , ao mesmo tempo , que com. o caldo, que se corrompe facilmente no estômago febri- citante ; e não se temerá que as partes da Quina , se forem bem moidas, ou divididas , e embaraçadas conir as i ( U7 5 fts do Chocolíite, se reuníío ; e se precepitcm. Posso certificar que , por muitas A^ezes , tenho curado a febre desta maneira , e que sempre tive muito bom successo. ill. As preparu<íôes de ferro, mais bem feitas, não são por isso as melhores. A sua simples limadura tem na Medicina maior viftude que tudo quanto a arte tem tirado deste metal ; e com tudo o seu uso tem o inconveniente de que , reunindo-se todas as partículas de ferro pelo seu próprio peso , formão huma espécie de barra no fim do estômago, que lhe diminue a foiça, c exctfssivameiíte o fadiga. Para se remediar isto , se precisa que j ao depois de se ter moido a secco no gral a limagem do ferro , até reduzillo a pó subtillissimo , que se misture com o pó da Canella destinada para huma taça de Chocolate feito como de ordinário se faz. He certo que as partí- culas do ferro pelo nioyimento do moinho se acharão divididas , e tão embaraçadas entre as do Cacao , que senão deve jt^mer ipais alguma separação. Além disto : ;as partes aromáticas da Canella , e as alcalinas do Ca- cao , augmentaráó muito os effeitos , que se pertendem deste remédio. IV. Do mesmo modo se poderião mJsturar com o Chocolate os pós d;.^ cloportas , das -vdboras , das jTiinhocas , do fel, das enguias^ e outros semelhantes , para apagar aos doentes ^ desgostosa idca destes remé- dios. V. O uso do leite he hum remédio especifico para o curativo de muitos males ; mas , infelizmente se SC dão muitos estômagos que não o aguentão , a pesa? de se terem procurado muitos meios de se prevenirem estes inconvenientes. Sem me demorar em os recen- sear, e menos em os examinar, este meio seria muito simples , e natural , para impedir que o leite se náo coalhasse no estômago , preparando, como commum- mente sç pratica , huma taça de Chocolate , e lançar- íhe dentro quente hum quartilho , ou menos , de leite. Na realidade, as partes butyrosas do leite, eCacao são análogas , e com muita propriedade para se unirem , e procurarem ambas o mesmo fim ; e o que o Cacao tem de amargo , e alcalino, necessariamente deve impedir toda a coagulação do leite no estômago. Este discurso se pôde facilmente verificar pela experiência do uso deste leite achieolatado. CAPITULO III. Do óleo 5 ou manteiga de Caca», A Amêndoa do Cacao he hum fructo muito oleoso, mas seu óleo se acha tão embrulhado com outros prin- cípios 5 que se faz preciso huma industria muito particu* lar , para lho separar , e para o fazer puro. Rejeitamos o primeiro dos três meios ordinários , a saber , distilla- ção , espressão , e decocçáo , de que ordinariamente se usa , para a extracção cos oJeos , por ser muito imper- feito , porque a violência do fogo desnaturaliza todos* os C U9) fes óleos , que se adquirem por este meio. Não aconte-» ceria melhor , usando da espress5o , porque o que se cxtrahisse, seria muito impuro , e nliuma mesquinha quantidade : e, por tanto, unicamente a decocção kô o verdadeiro meio , e o uiuco de se tirar este óleo , sem alguma alterarão, e em toda a sua pureza. Toma-se o Cacao torrado , mondado, pela pe-* dra , e se lança esta massa mui fina em huma grande caldeira de agua quente em hum fogo claro, onde se deixa terver , até coiísummir-se quasi toda a agua : en- tlo se lhe deita nova agua até encher a caldeira ; o óleo sobe á superfície , e coalha , como manteiga , á proporção que a agua se vai esfriando. Se este óleo não sahir bem branco , se torne a derreter em outra caldei-* ra cheia de agua quente , onde elle se despegará , e purificará de todas as partes arruivadas , e terrestres , que lhe íicáráo. Este óleo , em Martinica , íica em consistência de manteiga ; mas , quando se traz para França , chega rijo, como queijo , e que, com tudo, a hum fogo mui brando se derrete. Não tem cheiro algum sensí- vel , e gosa da boa qualidade de náo criar ranço em tempo algum. Presentemente o tenho de quinze annos. Faitando-nos o azeite em hum anno , usamos ào do Cacao huma quaresma inteira. Tem hum gosto muito bom 5 e , longe de ser malfazejo , contém as partes mais essenciaes , e mais saudáveis do Cacao. Tive a curiosidade de lhe fazer huma espécie de analyse cbymica^ pondo três onças em huma pequens cu- C 140 5 cucurbita de vidro em banho de cinzas, que distiUou hum liquor unctuoso que, quando cahia , se congella- va , o qual não difteria em cousa alguma da mantei- ga , que descrevi , a não ser por huma leve impressão , que tinha recebido do fogo. Unicamente lhe notei , que tinha deixado no fundo do recipiente duas , ou três gottas de hum liquor claro , de hum , algum tanto, acre ; mas muito agradável. Como este oleo he muito anodyno, he excellen- te paraeurar, tomado interiormente, a rouquidão , en - botar aacrimonia dossaes, que nos catharros estimulão o peito ; quando se quer servir delle , se lhe mistura liuma sufíiciente quantidade' de assucar candi ; e se for- mão pequenos rebuçados , que se conservão por muito tempo na bocca , deixando-os derreter por si sem os engolir. O oleo de Cacao , tomado convenientemente, pode também ser maravilhoso contra os venenos cor- rosivos. Não tem menores virtudes para o exterior. I. He a melhor, e a mais natural das pommadas para as Senhoras que tem a pelle secca , porque a faz branda, c polida, sem aparecer gordura, ou luzida. Os Hespa- nhoes Mexicanos lhe conhecerão bem o merecimento ; mas, como em França endurece muito, se faz de ne- cessidade preciso , misturallo com oleo de Ben , ou de Amêndoas doces , tirado sem fogo. II. Estou persuadido que , querendo-se reestabe- lecer o antigo costume , que os Gregos , c Romanos ti- nha» C >4i 5 nlião , de untarem o corpo com óleo , não ha outro , cujo uso podesse preencher mcliior esta indicação, que este , para amaciar as partes , augmentar-lhes a força , e inacieza dos músculos, e preservai los dos rheumatismos, c outras dores que os affligem. Não se pode imputar o desejo destas unções , senão ao máo cheiro , e pou- co aceio , que o acompanhavão ; mas, como substi- tuindo-sc-lhe o óleo do Cacao ao da azeitona , não se padecerião estes inconvenientes ; porque o do Cacao não deixa indicio algum , seccando-se logo sobre a peU le , certamente seria muito vantajo , particularmente para as pessoas idosas, renovar presentemente hum uso, tão authorisado pela experiência de toda a antiguidade. III. Os Boticários devem , por preferencia a to- dos os outros, empregar este óleo na base de seus bál- samos apoplécticos , porque todos elles ficão rançosos, e o óleo de moscada, alvejado pelo espirito de vinho, conserva sempre alguma cousa do seu cheiro, quando o óleo de Cacao não he sujeito a estes accidentes. IV. Não ha algum mais próprio , para livrar as armas da ferrugem , pois contém menos agua que os outros óleos , de que de ordinário se servem. V. Nas Ilhas da America se servem muito deste oleo para o curativo de hemorrhoidas. Hun^ o usão sem mistura. Outros , fazendo derreter duas, ou treâ libras de chumbo , lhe ajuntão a escoria , a reduzem em po , passão pela peneira , o encorporâo com este oleo , e fazem delle hum lenimento efficacissimo para esta moléstia. — Ou. C '42 ) Outros com a mesma intenção rtiisfurao oleo com o pó de cloportas , assucar de satuFno , pampholia, € algum laudano. Otítros se servem utilmente deste óleo para pa- cifioaí as dores da gotta, applicando^a quente sobre a |?arte .com huma compressa embebida que cobrem com iium guardanapo quente. Poderião fazer o mesmo notf rrheumatismos. Em fim 5 o óleo de Cacao entra na composição eCacaotier,. se impede o confundirem-se dous fru- ctos , € duas arvores mutdifferentes em grandeza , em fo- lhas , e cm fructos, como os Coqueiros, e os Cacoeiros, dos cuaes ( 145 ) faUaes o? priíheiros dáo as grandes nozes chamadas Cocos ^ e os sc^^undos os Cacaos i de que se faz o Chocolate. O Cacao he tão próprio da America , como o Cafc da Arábia , e o Chá da China, e d'outrOs paizes visinhos. Os Americanos se Serviao delle j antes que os Hespanhoes abordassem ao seu paiz : delle faziao as suas delicias, e estavão de tal maneira affeitos a ella , que leputavão pela ultima de todas as misérias , a de nao ter o Chocolate ^ que he a bebida , que se faz deste fructo. Os Hespanhoes aprenderão delles assim o uso , GOmo a preparação j a qual elles ao depois aperfeiçoarão ^ misturando-lhe muitos ingredientes , que a fazem mui- to mais agradável ao gosto , e ao olfato ^ o que não acontecia na dos índios. Ao depois se examinará , se el- les íizerão bem, ou mal. As arvores , que produzem d Cacao , nascem es- pontaneamente j e sem cultura , em huma infinidade de lugares da America , que se situão entre os dous Tró- picos. Encontrão-se florestas inteiras nas visinhanças do rio do Amazonas , ao longo das costas de Caraça > e de Carthagena , em o ísthmo de Darien , em Jucatan , Honduras , nas Províncias de Guatimala j Chiapa , So- conusco, Nicarágua, Cosía-R.ica , e em muitos outros lugares , que seria prolixidade referillos. As Ilhas de Couve, ou Cuba, São Domingos^ Jamaica, e Porto- Rico , são também abastecida de muitas , que até ago- ra as reputáo silvestres, em razão das que secultivão, ainda que na verdade os fructos de huns , e de outros T.III. P.llL K, Sê- ■m m C I40 sejáo igualmente bons , e que , havendo de se dar al- guma preferencia , eu seguramente a daria ás silvestres , c não sou o único neste sentimento. As Antilhas, denominadas pequenas, em razão das quatro grandes , de que fallei , náo estão privadas deste fructo , particularmente a Martinica , Granada , e Dominica ; e como se tem encontrado nestas três Ilhas he provável que também as outras habitadas pelos In- glezes , e Selvagens o hajão de ter. He certo que cu o não encontrei em Guadalupe, tendo corrido as mattas desta Ilha , mas isto não basta , para provar que o não haja. He verdade que as arvores cultivadas vem com maior perfeição, e produzem melhores fructos. Deve-se , por tanto , confessar que entre tanto as nossas Ilhas , e a Martinica produzem os Cacoeiros com maior facilidade. Tem-se encontrado espontâneos pelas mattas , e por paragens , que nunca forão , nem derru- badas , nem habitadas , e que ainda ò não são , e pro- vavelmente se passará muito tempo , sem o ser, Encon- trou-se nas terras de hum Cavalheiro da Fregu^ezia de Santa Maria, chamado o Snr. Mervilíe , que, em razão de sua altura, grossura, e pela belleza de seus fructos, davão indicios de huma excessiva velhice. Hum ho- mem , chamado Brindacier , famoso caçador , e outros muitos , que , tendo hido á caça dos porcos montados pelos lugares mui distantes das bordas áo mar , pelo centro da Ilha , me certificarão tellos encontrado em muitos lugares. He provável , que estas arvores multi- plicarião muito mais , se , a pesar da sua summa deli- ca- («47) Cadeza $ os seus frtictos , cahindo , náo fossem comidoí pelos animaes. Estas descobertas bastão , ao que me parece ) para provar , qile estas arvores nascem tão na- turalmente em Martinica , como no resto da Terra fir- me da America. A pesar destas vantagens, os Francezes somente Principiarão acultivallo no anno cie 1660. Hum Judeo , chíimado Benjamin da Costa, foi o primeiro que plan- tou hum Caçoai , quero dizer , hum pomar , ou ver- £;el destas arvores , mas ^ tendo as Ilhas passado das jr.ãos dos particulares para as da Companhia, em 1664, for-ão expuhos os JudeOs , e o Caçoai ficou perfencen- xio ao Senhor Guilherme Bruneau , Juiz Real da Ilha cm 1694* Todavia , como não era huma mercadoria de bo» venda em França , por se usar nesse tempo muito pou- co do Chocolate j e porque estava onerado de direitos muito fortes de entrada , os moradores somente se ap- plicavão ao Assucar , ao Tabaco, ao Anil, ao Urucu, ao Algodão , e a outros géneros semelhantes , cuja ven- da era fácil , e vantajosa , pelo grande consummo delles 3 que se faz na Europa. Tendo o Chocolate chegado , por fim , a fazer- se moda, e o Cacao a ter sahida em todas as partes, seriamente se cuidou na cultura das arvores, junto ao anno de 1684, e esta he com pou.ca .differença a idade dos Cacoaes , que seguirão .de perto ao de Benjamin da Co5ta , cujo jaumero ^e a^igmeataría 4e íada ver K,2 mais.. ■•"•■'*■ ri ,;*'■'■ í' 1 w: mais , se houvessem de reflectir , no que direi hum pouco depois. O Cacoeiro silvestre , ou o não cultivado , se faz muito grande, muito grosso , e muito ramoso; mas o cultivado se faz parar, de modo que não excede na al- tura de doze a quinze pés ; não só para se ter maior facilidade na colheita de seus fructos , mas também pa* ra que fique menos sujeito ao vento, e ao grande ar; por ser huma arvore de hum extraordinário melindre, A sua casca he parda, viva, delgada, e mui adherente ao lenho, que he esbranquiçada, leve, e poroso. Tem as fibras compridas , direitas , não misturadas , mui gros- sas , sem deixarem de ser macias. Em qualquer esta- ção 3 que se corte , se conhece a sua muita humidade , e seiba : o que pôde proceder , assim da sua natureza , como do terreno-, em que se apraz ser plantada ; poi: ser de bom fundo, fresco, e hum ido. Loga que se lh« corta hum ramo, e não se Ibe nota huma seiba abun»- dante , se pôde contar que ella não exirtirá por muito tempo. A foflra de ordinário tem de oito pata nove poí- legadas de comprimento, algumas vezes mais , e rara vez menos , não sendo arvores abortadas , ou plantadas cm huma mi terra. Na sua maior largura pouco mais tem do que hum terço do seu comprimento. Nas suas duas extremidades he pontuda, e se pega ao ramo por hum pcsinho forte , e bem nutrido , de duas a três pol- legadas de comprimento. Tem por cima a còr de hum ver- f C 149 ) verde vivo , e por baixo mais carregado. O contorno da folha, principiando do seu maior diâmetro até á sua ponta , he de huma bella còr de carne , e esta parte he táo tenra , e táo delicada , que o menor vento , ou os raios do Sol, a queimão com muita facilidade. As fi- bras , ou nervos, que sustentão a folha, se asseme- Ihâo mui^o ás da Cerejeira. O seu numero depende da grandeza da folha. Já mais se vc esta arvore despojada inteiramen- te deste seu adorHO , porque as folhas , que cahem , são immediatamiente substituídas pelas que estão promptas a apparecer. §. II. Flores do Cacoelro, Florece , e fructifíca duas vezes cada anno , co- mo quasi todas as arvore? da America. Também se po- deria alíirmar que florece , e fructifica todo o anno ; po;s que não ha tempo algum , em que se não deixe ver com flor , e fructo. Todavia fazem-se as suas co- lheitas mais abundantes junto aos solsticios , digo, por São João , e pelo Natal , com a differença porém , que a do Natal he sempre a melhor. Contemplando-se o fructo do Cacoeiro , e vendo-se a sua ílor , se fica pasmado , pois , que , sendo esta tão diminuta, haja de dar hum fructo tão avultado. Fersua- do-me que não ha no mundo huma flor tão pequena. O botão 5 que a envolve , não chega a duas linhas de diâmetro, e menos a três de altura. Distin^em-se-lhe dez <• i ■ C no:) der folhas , estando aberto , que formão hum pequeno cOpo , ou calis , ein cujo centro se vê hum pequeno botão, allongado , rodeado de cinco fios, e de cinco es- tames. As folhas são de côr de carne pálida com man- chas, e pontas vermelhas. Os fios são vermelhos , tirando a purpura , os estames de hum branco prateado , e o botão de hum branco mais descorado. Este \íQ o botão ( gérmen ) que produz o fructo. As flores não gosão de cheiro algum , nem são solitárias ; iriãs sempre em feixes , das quaes a maior parte caducão , e cahem. , e l«enos a arvOre poderia nem aguentar os fructos , se to- das as flores vingassem , nem dar aos fructos a nutri- ção necessária. Estas flores não são produzidas pelas pontas dos ramos , como nas arvores da Europa ; porque nascem desde o pc do tronco da arvore , atç o terço , ou os cinco grandes ramos, Nota-se, que ellas nascem pelos lugares velhos , em que a arvore tinha tido folhas , quando nova , como se estes lugares , em que ainda se divisão as cicatrizes do pé da folha , fossem mais tenros, e mais fáceis de se pcnçtrar , ou dç se abrir, que o rçsto. §. III. Fructos do Cação. Os fructos , què succedem nestas flores , se asse- rnelhão aos pepinos, pontudos porhuma das suas extre* midades , repartidos por todo o seu comprimiento á ma- neira dos Melões de gommos , e salpicados de pequenas ver- C MI) verrugas , ou protuberâncias , e outras desigualdades. A sua casca , conforme a grandeza , c idade da arvore , que a produzia, pôde ter de três até cinco linhas de gros- sura , e todo o fructo de sete a dez poJIegadas de com- primento , e- três para quatro de diâmetro. O tamanho do fructo nos desperta a causa ; porque a Natureza o poz junto ao tronco da arvore , € no grosso nos cinco ramos principaes , que nascem no seu copado ; pois nos faz ver , que se viesse nas pon- tas dos ramos, seria impossivel que a arvore houvesse de sustentar huma carga de tanto peso ; porque os ra- mos estallarião, e se perderia o fructo. Distinguem-se-lhes ties cores , a saber, branco pallido , tirando alguma cousa para verde , vermelho escuro , vermelho , e amareMo. Falla-se a respeito da casca; porque o interior, e as amêndoas, que nella se contem , he tudo da mesma côr , substancia , e gosto , o que tiiz que estas três cores nao constituão três es- pécies de Cacaos : O não contar eu mais que huma es- pécie , assim nas Ilhas , como em Terra firme , pÁde desagradar a Francisco Ximenes , e a outros Escritores, que o trasiadáráo, que affirmão haver quatro, por te- rem visto arvores de quatro grandezas differentes , sem reílectirem que a differença de grandeza , e de grossura podia vir da idade da arvore , do terreno, em que fosse plantada, da sua exposição ao So] , ou ao vento, e de ^ccidentes , que tivessem no seu Hascimento. Talvez o engano deste Escritor induziria ao Se- nhor Pomet 5 Mercador , Drçguista , e Especieiro de Pa- '•.' ilr ( M4) O (íc Sío Domingos, de Cuba, e Porto-Rico, tem a mesma figura , a reserva de ser sempre maior , mais bem nutrido , e mais pesado. O de Caraça mais chato , maior, e mui semelhante ás nossas grandes favas. Esta he toda a differcnça , que se nota entre os Cacaos. Estando seccos , todos sáo d'hum vermelho par- do. Ignoro onde , o Capitão Dampiere vio Cacaos bran* cos. Sei por hum sem numero de pessoas , que traficarão no México , nas costas de Guatimala , Carthagena , e Caiaca , que nunca ouvirão fallar desta espécie de Cacao , e certamente este não he o maior engano deste Au- thor. Basta o que tenho dito, para dar huma idéa as- sas distincta do Cacoeiro , e do seu fructo , do qual des- creverei a natureza , uso , e propriedades , ao depois de ter dado a maneira de plantar , e cultivar a arte , que o produz , a de accomm.odar o fructo para o transpor- tar para todas as partes \lo mundo , e de lhe conhecer a bondade , e os seus defeitos. I t §. IV. Escolha de hum terreno^ para se fundar Caçoai. Quando fallei do modo de fazer as novas der- rubadas, ou fazendas novas , disse, que os que destina- rão terrenos para fazerem hum Caçoai devião ter hum cuidado muito particular em deixar fortes anteparos de grande-; arvores , que rodeem este lugar , ou pelo menos que o cubrão , sobre tudo , do lado , que estiver exposto aos ventos regulares , que ordinariamente soprão no paiz. Was C Mç ^ Mas, como podem acontecer grandes accideiites com 2 cahida destas arvores , quando algum furacão as arranca, iie muito mais seguro fazer sebes dobradas, ou triplica- das de laranjeiras, e araticuseiros de Tuinantubas ; por- que estas arvores por sua flexibilidade resistem podero- samente aos ventos , e que, quando mal o seu desa- raií^amento não pôde ser de huma grande consarquen- cia , quero dizer , que , em cahindo , não podem que- brar osCncoeiros, que estiverem a par delles , como as íirvores maiores , e mais ramozas não deixaráo de fazer. Ainda devo dizer mais : Que he muito bom cobrir es- tas sebes com algumas renques de Bananeiras e de Fi- gueiras silvestres ou do matto. O que disse destas plan- tas na minha primeira parte , c a discripção , que delias dei , mostrão que ellas crescem muito depressa , que ellas íiuarnecem muito, e dão hum abrigo muito, bom, alem da utilidade , que se tira do seu fructo. Não basta que qualquer terra esteia abrigada dos ventos , necessita ainda mais , porque deve ser virgem , quando se quer estabelecer hum Caçoai , que he o mesmo que dizer , que necessita não ter ainda servido. Os Cacoeiros requerem todo o sueco , e toda a gordu- ra da terra. A experiência tem feito conhecer que he baldado plantalloí em terras , que já tenhão .servido ; ainda que as tenhao feito descansar pòr muito tempo , e que, sem embargo do cuidado , que hajão de ter, não tem bom êxito , ou totalmente não nascem , ou se nascem , tendo huma curta existência , nem produ- zem bom fructo , nem em abundância. A razão disto he ; U f : he ; porque o Cacoeiro he huma arvore , summamente melindrosa em todas as suas partes , somente Jança hu- ma só raiz , assas pequena , e tenra , que não penetra a terra , á proporção da facilidade , que encontra para se profundar , e para se nutrir. Ke certo que esta raiz prin- cipal, que he como o aguilhão da arvore , se acom- panha de outras menores , mas que só se devem con- templar , como barbalhos , que se estendem em torno do pé da arvore , sem entrar mais pela terra , apenas, que duas , ou três pollegadas ; de sorte que , se a terra he dura , secca , e cansada , como são todas as das Ilhas , por pouco que tenhâo servido , a raiz princi- pal he destituída de forças para a furar , e penetrar, vendo-se obrigada a curvar-se jobre si mesma , donde vem 5 que , não encontrando a frescura , e gordura , de que tem mister , se secca logo , e á arvore , que ella sustenta, acontece o mesmo, ao passo que, quando en- contra huma terra nova , que não tem sido calcada ; e que ainda tem. toda a sua força, ella a penetra facil- mente , alarga-se , e se fortifica : ora , achando fres- cura , e sueco em abundância , produz huma bella ar- vore, e fructos em abundância. Precisa também , antes de se resolver a preparar qualquer terreno para hum Caçoai , sondallo em mui- tos lugares ; porque he muito commum encontrarem-se terras pingues, e bellas , cheias de arvores boas , eque, entretanto , não tem profundeza alguma. Já adverti n outro lugar que as arvores da Am.erica tem mui pou- cas raizes cm terra j a natureza as sustenta por espias com- \ ( IS7 ) compridas , que occupão muito terreno , ou com raízes , que , rodeando os seus pcs , não encontrão quasi pela terra. O clima sempre quente, e húmido, lhes dá o meio de crescerem, de brotarem continuamente, e sem interrupção , e sem que a raiz trabalhe debaixo da ter- ra , como acontece nos paizes frios , ou , ao menos , naquelles, em que se distingue o inverno, nos quaes a raiz cresce , e se fortifica na terra todo o tempo que a arvore se conserva em huma inacção. O Cacoeiro he , quasi , a única arvore da Ame- rica, que prosegue a sua raiz, sem interrupção, pela terra dentro, e sem que por isso a arvore deixe tam- bém de crescer , de produzir flores , e fructos ; e he por esta razão que ella precisa de huma terra profunda de maneira que, se na altura de quatro, ou cinco pcs abaixo da superfície , encontrar bancos de pedra , ou al- guns montões , he certo que logo que a sua raiz os topar, se curvará sobre si mesma, cessará de se pro- ver , e a arvore que ella entretinha acabará a olhos vistos. Não acontece o mesmo nos terrenos 5 em que se encontra areia em huma distancia arrazoada por bai- xo da superfície , ou ainda huma terra barrosa , ou como dizem , boa para louça , ou hum terreno saibroso. A raiz do Cacoeiro se accomodará, ainda que o haja de penetrar com trabalho, ella os fura, e se estabelece; e se ella não tira tanto sueco como de huma terra boa , franca , ao menos não se vg obrigada a curvar , o que infallivelmente a faz seccar. §. V. "■'s í!\ ciín §. V« extensão dos Cacoacs^ v: I I A's qualidades do terreno acima mencions-cía» Ácvo acrescentar outra , e vem a ser , que o terreno destinado ao Caçoai seja fresco. São maravilhosos par» isto os lugares baixos , iguaes, visinhos de hum lio , cortado por alguns pequenos regatos. Não se precisa que tenhão muita extensão , nem também muito e»' treitos ; porque então as arvores se affogarião na segun- do caso ; e no primeiro ficariâo muito expostos aos raia? ào Sol , e grandes ventos. Hum Caçoai de duzentas 'passos em quadro , pela medid;* das Ilhas , digo , de cem braças , ou perto de bum.a boa granrleza , lie mc- 'íhor separalio em muitos quadrados desta grandeza o seu terreno 5 e abrigaHo de boas sebes, que expollo aos irn 4;oLivenientes , de que tenho fallado , fazendo htim plaf- no de arvores de huma maior extensão. Os reversos das collinas , ou encostas dos mofí- tes , que tem muito declive , aind.^ que sejão de mui- to boa qualidade , com tudo não prestão para Cacoaes ; porque ,, alem de estarem mais sujeitos aos ventos , « serem mais difficeis de se abrigarem^ he certo que du- rão muito pouco , e que as raizes das arvores ficão em pouco tempo descobertas , e immediatamente seccas. A razão disto he clara : não se devem consentir hervas algumas por baixo dos Cacoeiros , e sendo assim , he ,facil, quando chove , que as aguas levem comsigo a terra , e cxponhão em muito pouco tempo as peque- nas ^ C '!9 5 nas raizes , que rojão pela superfície ; e ao depois a raiz principal , a ficarem descobertas , e a lhes faltar a fres- cura , o sueco, e o alimento. §. VI. Maneira de se plantarem as arvores. Suppondo por tanto ser a terra tal , como tenho dito , e as arvores , que a cobrião , derrubadas , e quei- madas com os seus cepos , ou troncos , as sebes , ou anteparos plantados , e em estado de ter mão nos ven- tos , e, do mesmo modo , que as Bananeiras, que as devem cobrir , ou fazer a sombra , se deve cavar á en- xada todo o terreno mais profundamente que poder ser. Sei muito bem que algumas pessoas despresão esta pre- paração : apesar disto, eu sempre a julguei necessária, e na realidade não o deixa de ser. Qualquer terreno, sendo cavado , está em melhor disposição de receber em toda a sua extensão igualmente o beneficio das chuvas, e do orvalho. Quando se cava, se lhe arran- cão as raízes , os pequenos cepos dos arbustos , e her- Vas , que se m\o vem , ou apparecem , as quaes , vindo ao depois a crescer, e a granar, darão muito exercício aos que forem encarregados de terem cuidado no Ca- cual. Além de que, hum terreno lavrado, ou cavado, •he sempre mais unido , e por consequência majs facii a dividir-se , e a fraçar-se. Trabalho , a que se não de- ra faltar, apenas o terreno estiver prompto. Para isto se servem de hum cordel , que tenha o comprimento de todo o terreno , dividido por nd-S , ou s-ignaes de > oito V^" C 160 ) oito a oito pés , e em cada divisão destas se fÍAca no ehão huma estaca. Estando acabada huma fileira , se ti-> ra o cordel , e se estende a oito pés de distancia das primeiras estacas, observando que estejão bem paralle- las 5 e as estacas em quinconce^ Dei a razão disto no meu Tratado sobre o Tabaco. Os que quizerem saber* mais alguma cousa , tenhão o trabalho de con-sultar a M.. d& la Quintinie no seu exc-ellente Tratado da Jai^ dinagem ,- e Cultura das Arvores. Desta: maneira se tra- ça 5 e se reparte o terreno , em que se quer fazer hum Caçoai : o que faz ver que hum terreno de cem bra^ ças , ou de duzentos passos em quadrado ,•: pôde conter cinco mi-1 pés de Cacaos. Alguns- habitantes- plantão as suas arvoíes asei? pés de distancia humas das- outras ; e outras de cinco em cinco.' Os primeiros pertendem que esta distancia he suffieiente, e que a: visinhanca das arvores faz que j estando coberto o terreno , nik) nasção más hervas , e se conserve o Caçoai limpo , como deve ser , com muito menos trabalho. Estas razoes serião boas , se a grande proximidade destas arvores não as imj^dissera de crescer , e de encontrar hum alimento sufficiente ,- par ra produzirem hum bom fructo ; porque , como já dis- se , querem terra de muito sueco ,e , produzindo ell-as , como acontece , duas vezes por anno ,• fructos mui gran- des , he certo que háo mister hum terreno considerável , assim para poderem estender os seu» ramos, como pa- ra encontrarem o seu sueco nutritivo. Os segundos , que plantão de cinco em cinco pés, i C 1^1 ) Jiés , tem, e In seu favor, a razão dos primeifòs , que ttcabei de dar, e com effeitci as arvores, estando perto luimas das outras, cobrem em poiico tempo o terreno , e impedem o nascimento da§ hervas ; porem , quando sé lhes estranha a sobeja visinhança das arvores ^ respon- dem de mais, quê tem tenção de as cortar pela ame* tade , apenas entrarem no conhecimento j de que hu-' mas principião a embaraçar as outras , deixando dez pés de distancia entre fileira , e fileira ^ como ós Hespanhoes praticão. Ora , se isto se executasse , nada tefiamos que instar ; mas , como parecerá duro á hUm Fazendeiro cortar ametade do seu Caçoai , quando elle está produ- zindo ; 0LÍ ainda de Se privar da amétade do seu ren- dimento, se gosta mais deixar todas as arvores empe, lisonjeando-se , ou persuadindo-se , qUe ellas hãó de en- contrar muito , de que sé possão nutrir , e manter ; e j a íinal ^ S2 esbarrão no engano da sua loUca j e va es- perança , vendo as suas arvores acabar , humas depois das outra? , sem haver tempo j para lhes acodir com o remédio. Sobejas experiências me tem convencido , que st proporção mais justa , que se pode dar ás arvores , he a de oiro pés de distancia de huríias ás outras nas Antilhas; porque nas grandes Ilhas, e na Terra firme, onie as terras são mais profundas, e mais pingues, se }he devem dar de dez para doze pcs , para que as ar- vores , sendo commummente rtiaiores , e mais corpu- lentas , gosem da totalidade do terreno _, que háo mis- ter. T. IIL P. nt L Fa^ '"l^ m <- .' C 162 ) Fazem-se as ruas , avenidas , ou alléas , o ma» direito que for possiveí , nío só em razão da formosu- ra , mas também do proveito 5 porque , sendo assim , se pode ver , com mais facilidade, o trabalho dos es- cravos, que não poderão subtrahir- se avista do senhor, ou do feitor , estando o Caçoai bem alinhado , coma o poderião fazer, se as arvores fossem plantadas a bar- çisco, o^ confusamente, e ao acaso. Além disto, não se fica t3p sujeito ao risco de escaparem fructos pelas arvores , porque se colhem , seguindo aa alléas y e hu^ mas ao depois das outias. §. VII. Maneira de plantar as amêndoas^ Estando o terreno prompto , se espera pelo quar- to minguante , e que o tempo esteja chuvoso , ou ao menos nebuloso, e que prometta chuva. Tomão-se as bainhas do Cacao , que estão em termos de se colher, abrcm-se , tirão-se-íhe as amêndoas , e ira-mediatamente se mettem na terra. He certo que , demorando-se al- gum tempo , por pouco que seja , em as plantar , es- tando tiradas da bainha , o ar , trabalhando por cima , as seccaria quanto fosse bastante para não nascerem. De ordinário se põem três amêndoas , ao redor de cada estaca , apartadas quasi três poílegadas , human das outras. Sc o terreno tiver sido cavado de novo , se Gontentão de fazer com a estaca huma cova , ou bura- co de três para quatro policiadas de profundeza , e de lhe deitar a amêndoa perpendicularmente com a extre- mi- iriklácle grossa pita baixo , e se cobrérii le-t^erhente dè terra. NSo tendo sido a terra cavada ^ se pica a terra ào redor das estacas , com hum pequeno instrumento ftitò a modo de enxada , faz-se-lhe hum buraco , e se Iht introduz a amêndoa. A razão pòrqiiè se põem três amêndoas em dida, êstataj vem aser^ para qúe, sfe houver de faltar algu- fna j cdrfio ordinariamente ácbntecfe ^ se tenhão outfàs Gom qiit encher. Não aconteíCendo isto , e qííe as arvo- res tém pé e meio , ou dous de altura , se escolha a qiié parecer melhor , para a deixar ficar ^ e se tirão as outras ^ para íis pòr nos lugares ,' em que houver falta , eom este fim também se fazem, viveiros^ Tenho inquirido de fazendeiros expeitos a tazão porque não planfavão todas as siiâsf amêndoas em vi- deiros , para as tirar ao depois ^ e phntallas para perma- fteGereoi nas terras dtstínadas para isto. Pvespondêrão- rnè : que a experiência lhes tinha ensinado que as arvo- res plantadas desía maneira não proíiperavão bem, pOí- que 5 sendo a sua raiz principal muito delicada j erà im^ J>ossivel , a pezár de qualquer cuidado , qUe tivessem , para a tirar da terra ,• que a nao dámnificassem , ou na mesma raiz principal , ou nos seus barbalhos ; e tam- bérri de a pôr ém outro lugar , sem lhes mudar a si- tuação , ou vari'a<;ftO dé alguma das suas partes : o que bastava , para impedir de tornar a pegar , é de fazer-se htfma bel la arvore. T'rv& muitas- véze? OccasiSo de me convencer pof mmhdt própria' experiência desta verdade , e de ver L 2 que <. r que âs arvores , transplantadas desre modo , morriao a pesar de todas as precauções, que tomava, para pôr a raiz em terra , sem a constranger , ou forçar o menos possível. Eu tirei a- terra do pé a muitas, e achei que a raiz , em lugar de estar perpendicularmente , como de- via ser , estava curvada : de sorte que o único expe- diente, que se pode tomar, para encher os vãos de hum Caçoai , he o de plantar amêndoas nos lugares , em que faltarem as arvores , ou que as amêndoas tenhão falha- do , ou que o seu tronco seja roído pelos insectos , ou se tenha quebrado., O melindre y e delicadeza excessiva doCacoeiro, obriga a tomar grandes precauções , para que não haja de ser queimado pelo Sol. As sebes, de que fallei an- tes , somente o podem defender dos ventos ; também o Sol lhe he pernicioso , sobre tudo , quando princi- pia , ou he novo ; e por este motivo jamais se deixa de plantar mandioca , ao mesmo tempo que se mettem na terra, as amêndoas.. Isto já. se vio na primeira parte , e por isso he inútil repetillo agora. §. VIII. Modo de cohrh" as novos Caçoei iros. Abrem-se duas fileiras de covas de mandioca , em todas as allcas , de sorte que fiquem affastadas das estacas quasi pé e meio : alim do proveito que se tira , preservando as novas arvores do excessivo ardor do Sol , se occupa a terra utilmente com huma planta tão ne- cessária , que se não pôde passar sem ella , nem ter-se de ão obrigados de o mondar continuamente até que a Mandioca tenha crescido a boa altura , e cubra inteiramente a terra , e neste estado impeça que as más^ hervas vão avante. No fim de doze , ou quinze mezes se arranca a Mandioca , este he o tempo mais ou menos , que pre- cisa para ter a sua competente grossura , e madureza, coniorme for a espécie , e immediatamente se passa a plantar outras 5 mas em menor quantidade , explico-me, somente se faz huma ordem de covas no meio das alleas ; e, para se ter menos trabalho em se conservar ■i. terra limpa, se haja de plantar, entre a Mandioca, c os Cacoaes , melancias , melões , pepinos , abobaras , jerumús, e batatas 5 porque as folhas destas plantas, cobrindo a terra, impedem produzir más hervas, con- servão-na fresca, sem prejudicar ao Cacoeiro , e abastão de cousas muito úteis a qualquer fazenda, ou sitio. Nlo faltão fazendeiros , que plantão a sua Man- dio- n 'H mx 4 . dioca hum mcz antes , que hajáo de plantar o Cacaa. Eu os tepho imitado , quando tive occasiao. de o poder fazer , e me sortio muito bem 5 porque este mez de avance , que a Mímdjoca tem sobre o Cacao , lhe d^ tempo , para se pôr em estado de cobrir o Cacao , dev fendendo-o com a sua sombra dos ardores do Sol , desde que elle sahe fora da terra j e a mim tempo pa- ra mondar as primeiras hervas , que a terra produzia , cujai vantagem não era pequena. A amêndoa çommummente se demora sete ou oito dias na terra , antes de repontar fora delia , ou nascer, Repetidas experiências me íizeráo ver , que ella se desabrolha íjo mesmo tempo , por ambas as extremi? dades , a míjis grossa rompe a pellicula , de que se cor bre a amêndoa , e o pequeno pistillo se avança pel^ terra, fazendo a raiz grossa; amais delgada forma a arr vore , sabindo da terra coberta dessa mesni^ pellicula , pomo hum botão , que , abrindo-se , acaba de a rom- per, e a faz cahir. Estando este bot^o absolutamente aberto , se çonhpce que siòmer>te continha duas folhai dobradas 5 e embrulhadas huma na outra por hum modo maravilhoso, de huma cpr de carne viva, tenras, c delicadas , fora de tudo p que se pode imaginar. Tendo sahido fera d^ terra, por quinze ou vinta dias , çontio cjnco para seis pollegadas de altura , e qua- tro até seis folhas : vem todas aos pares , e se alargao ^ com muita igualdade , em torno do seu commum cen- tro , que sempre he hum botão , por baixo do qual reber)t|o , á mçdid^ qije o tronco çrçsce para cima. Dez ou C ^^1 ) ou doze mezes , ao depois , a arvore já tem avançado perto de dous pcs de altura , e doze , quatorze, até dczascis íbihas. Passados vinte , ou vinte e quatro me- ies, chega á altura de três pés e meio , c muitas vezes a quatro, e então este botão, que tem apparecido con- stantemente no centro das duas folhas ultimas , se a- bje , e se divide em cinco ramos , rara vez em seis , e nunca em sete. Corta-se o sexto , e sétimo , porque arruinariáo a divisão ordinária dos ramos desta arvore, que faz parte da sua belleza. Então cessão as folhas de vir pelo tronco , crescendo pelos ramos principaes , que , clevando-se , e engrossando , produzem outros menores , em quanto o tronco cresce , e se engrossa á proporção da frescura , e do sueco que o terreno lhe administra. Tendo dous annos e meio , começa a florecer. As pessoas intelligentes fazem cahir estas primeiras flo- res , para que a arvore possa adquirir maior fortaleza, passados porem tíes annos, se lhe deixao algumas , e passados quatro, não se lhe tocão : porque já tem for- ças bastantes , jiara supportar o fiucto , sem que isto lhes embarace o crescimento , e o fortificarem-se mais. A proporção que crescem , augmentão-se suas flores , e a belleza de seus fructos , que se fazem maiores, mais cheios, e de melhor qualidade, á medida que, ou engrossa envelhecendo , ou encontrando huma melhor terra , e hum sueco muito mais abundante. J:^!^ ■'t 5. IX. ( 168) §. IX. Accidentes que sobrevem aos Cacoaes. Se os Cacoeiros v\%o tivessem accidentes ,• he cer^ to que no sexto anno estarião na sua força , e produ^ zirião muito melhores fructos , e em muito maior abun-r dancia , mas são sujeitos a tantos desastres , que se olha como huma espécie de milagre , quando chegão a esta idcide , sem experimentarem alguma desgraça. Os accidentes mais ordinários , que lhes sob.re- yem 5 são: primeiro 3 a çahida d^s arvores , que imprur dentemente lhes deixarão ficar muito visinhas , que pe-» Ip seu peso quebrão os ramos dos melindrosos Cacoei- ros , e muita? vezes os esmagão inteiramente : segunv do , as tempestades , e furacões de ventos , que ainda lhes são muito mais ruinosos ; porque , arrancando-se as sebes , que os abrigão , ou se quebrão pela violência dos ventos 5 immedic^tamente se despojão os Cacoeiros das suas folhas, se quebrão, se revirão, desarraigão , OU ficão inteiramente arrancados. Muitas vezes tenho si- do testemunha de semelhantes desolações , sobre as quaes nada ha , que possa ser m5iis triste , nem mais infeliz, ^e as arvores se arrancão j e que a raiz mestra fica to- talmente fora da terra , fica sendo inútil pensar-se mais em as replantar, por ser hum trabalho perdido ; pois não tornarão d, pegar ; mas , se sór^iente forem revira- dos , de m.odo que a grande , ou grossa raiz ainda pene- tre a terra, ao menos , a sua maior parte, precisa evi- tar de a torpar a endireitar , a experiência tem ensinado Mê^ C ifi9 ) rue com esta manobra se ajudão a morrer mais depres- sa ; porque se faz de novo o abalo , que já tinha pade- cido , e que se não poderá jamais restituir á sua an- tjo-a posição , ou primeira situafjão. O que se deve fa- xer , nesta occasiáo , he cobrir prontamente , e sem per- da de tempo j o pé da arvore , e todas as raízes , que ap- pareceiem a superfície, com boa terra, e fazer susten- tar com pequenas forquilhas , fincadas na terra , o tron- co , e ramos principaes , para que o peso das folhas, jquando as tiverem novas , e dos fructos , não as facão pender mais , e rojar sobre a terra. Estas arvores não tieiião de produzir , e a natureza , no cabo de algum tempo, produz hum novedio direito, que se conserva tom cuidado , para vir a ser o tronco da arvore , quan- do ella fructificar ; porque nesse tempo se corta o que estava pendente , ou inclinado , e a arvore íica desta maneira renovada. I\ias não pode sobievir ao Cacoeiro hum acci- «íente tão funesto , e que não soffre remédio ah-ura , eomo encontrarem as suas raízes hum tufo , ou banco de pedras ; porque , neste caso debalde estendem as suas raízes pelas pedras , e não encontrando nellas sus- tento algum , são constrangidas a recurvarem-se sobre si mesmas , o que basta para as fazer seccar , e por consequência as arvores que ellas sustcntâo. E por esta razão disse antes , que era necessário , e da ultima im- portância , ter-se sondado primeiramente o terreno , an- tes de se plantar o Caçoai , a não querer-se trabalhar de balde, ou, ao menos, por poucos annos , o que não ';•.:;. i:'^ 'ti m C 170 > não pôde deixar de confundir , e de prejudicar aos que ennprehendeicm estabeJecimentos desta natureza , não precedendo huma semelhante precaução. Entre tanto , por ser quasi impossível . sobre tudo, napequenhes destas Ilhas, encontrar-se hum ter- reno , ainda que se represente bom , que não tenha pe- dras , se devem contentar , que , examinando-se com diversas sondas , se reconheça ter seis pcs de altura, ou profundidade , e que as pedras , que estiverem por baixo, não hajáo de formar hum banco. §. X. Madureza do Cacao , 70 madeira , ou arrancando-o ; e tendo os negros os cestos cheios , os trazem i extremidade do Caçoai , e fazem hum monte de todos os que apanharão. Tendo-se apanhado os fructos maduros , e que , segundo a grandeza do Caçoai , ou a quantidade do fructo , se tem feito hum, ou mais montes, se tirão 3S amêndoas. A est<í fim os pretos cortão com huma {aca as cabaças pelo meio, segundo o seu comprimen- to j e se despedação , batendo-os com huma pedra em cima , ou hum pedaço de p.áo. As amêndoas estão ro- deadas de huma polpa , ou mucillagem , de que já fal- iei : não custa muito scparallas , e somente se tirão as iinaiores , e se põem nos cestas , para as trazer para casa. Não I14 necessidade alguma de despejar as caba^ (ças , logo que se colhem ; pois se podem deixar amoa- fc-oadas no Caçoai, por dous , ou três dias, sem o me- jior receio de que ejlas se arruinem. Não tem outro pe- rigo mais que o de poderem ser furtadas ; mas , quan- do se tem muitas , não se deve septir o perder algu- mas j e fora disto , precisa-se dar lugar ao prorerbio que diz : Ser preciso que todo o mundo viva , não só os ladrões , n^& também os outros. Não se espera tra- zer para casa as fructas , para se abrirem : além de seif çste transporte custoso aos escravos , obrigaria também a outro trabalho , que seria o transporte das cascas já evacuadas , que ate agora se tem reputado tão inúteis ,. como as castanhas da índia. Deixao-se , por tanto , apo- drecer no Caçoai , onde podem servir de estrume para adubar as terr^js. 'C 1 m ?- C T70 §. XI. Modo de as Jax,cr ressuar , ou fermentar. Immediatamente que as amêndoas estejão em casa nos coxos , ou em hum quadrado feito de taboas hum pouco levantado da terra. Cobrem-se de folhas de Bananeira do matto , e de algumas esteiras, pcndo-lhc taboas por cima com pedras para as ter bem apertadas , e bem cpprimiuas. Conservão-se neste estado quatro , ou cinco dias, e neste tempo se tenha o cuidado de as mexer , e de as virar de huma , para outra parte , todas as manhãas. Elias fermentão , perdem a còr esbranquiçada , com que tinháo sabido da casca ,6 se fazem de hum vermelho escuro. Querem que sem esta fermentação ellas não se conseivajrião , que abolocerião , e que , estando em hum lugar húmido 5 poderião germinar. Deve-se olhar este ul- timo caso como hum impossível , pois , por pouco que se tarde , em mettellas na terra , quando se tirão da bai- nha, não germinarão jamais, e avista disto como ger- minarão ellas sós , privadas do sueco , e da frescura da terra ? A obra desta fermentação he a descarga da hu- midade supérflua , de que estavao , embebidas de manei- ra que só lhes liça o olco , que as conserva , e no qual se deve pensar que consiste a melhor parte de sua bon- dade. Também he hum erro grosseiro de alguns via- jantes o dizerem , que s« lanção cm huma lexivia , cuja com- k C '70 composição he hum mysterio ; onde , depois de as ter de infusão por algum tempo, as fazem seccar á sombra, e que sem esta preparação senão poderião transportar, sem que se corrompessem. Tudo isto he tão verdade, como o que escreverão alguns mal informados da le- xivia , em que elles pertendião , que se mettião os cra- vos girofes , a nóz muscada , a pimenta; e do Café, que o fazião ferver , antes de os transportarem para a Europa , pelo receio que os não semeassem , ou plantas- sem ; e que se não privasse aos que os transportavão da Ásia, do proveito, que tinhão, destas mercadorias. §. XII. Como se fa:!,em seccar. Ih' Tendo-se tirado as amêndoas do lugar, em que fermentarão, ou como dizem nas Ilhas, do lugar, em que ressuárão , se estendem sobre grades , esteiras , ou tabuleiros rasos, que tenha o fundo como crivo, e se põem ao Sol, para fazer seccar. Tem-se cuidado de as mexer , e revolver de tempos a tempos , e de as reco- lher de noite, estando o tempo húmido, ou que cho- va ; porque a agua , ou a humidade lhes faria mal in- fallivelmente. Três dias de Sol , e de vento bastão pa- ra os seccar inteiramente , e isto feito se põem em bar- ricas , saccos , ou em celleiío , até haver occasião de os vender. Conservão-se o tempo , que se quer , sem se ar- ruinar , com tanto que o lugar seja secco , e que ss ponha ao Sol duas , ou três vezes no anno. Na verda- de a sua bondade não se augmenta com a velhice ; por- ''^'^>''ij M ( 174 ) patqtle o seu óleo se diminue pouco apoúcO, e' (^uc, chegartdo a seccar desta sorte , perdem a substancia , e a virtude , que finhão antes. Eu advcTti antes qUe âs bainhas ccntinhlo y qua- si sempre , vinte e ciíicO amendo-as ; e muitas vezes te- nho experimentado que são preciísas quasi quatrocentas amêndoas suecas para fazer o peso déhum arrátel. Isto se deve entender do Cacao das Ilhas, qfie he' mais pe- queno. Precisa menos em São Domingos , e em Cuba ,, onde elle he maior, e do de Caraça mtiito menos pOr ser dé toxlos omafior, e só se precisão de trezentas; ât sorte que dezaseis fructas rendem bum- arrátel' de amên- doas seccas , mas como o peso do CíTcao diminue á pro- porção ,, ao menos ,. da ametade , quando Sesecca, oito fructas cti hum arrátel de a^mendoas vefdeí, §. XIII.- Prodtteçãa oi^dlnaría dos Gaceeiror, I I Tenho visfó arvores carregadas de' duzentas t cjncoéíita e duas fructas ,- e" particularmente admirei is- to nó desfficto do Páo' de assucar da Martinica. H-e ver- dade que erão arvores de Vinte annos ,- grandes, fortes, em boa terra , e bem abriga-da-s dos' ventos , mas he raro ver-se cousa semelhante. Os fazendeiros somente reputão a sua colheita sobre o pé de arrátel , até arrá- tel e meio, por arvore, na colheita áo Natal , e de hum arrátel na de São João, desde que as suas arvores tem de cinco para oito annos , não acontecendo , além disto, alguns accidentes ás arvores, e que ellas estejão bem C '75 ) bem mantidas , c que encontrem huma terra fre«!ca , prufiinda , e bem pingue , podem esperar mais , sobre tudo na colheita do Natal, que he sempre melhor que a de São João. A razão desta differença , vem da dif- ferença que ha das duas estações nas Ilhas , explico-me, das seccas , c das aguas. Esta ultima começa , de ordi- nário , pelo São João , e acaba em Novembro , ou prin- cípios de Dezembro. Do que disse acima , se pôde ver que as chuvas são necessárias aos Cacoeiros , em vez que as seccas , que commummente vem do Natal ate São João , lhe são contrarias. §. XIV. Conservação dos Cacoaes. He certo que, tendo os Cacoeiros três annos e íneio , ou quatro > seus ramos , todos abastecidos de fo- lhas , cobrem todo o espaço que ha entre elles ; e que as folhas , que lhe cahem no principio da estação das chuvas , e que elles brotâo de novo ao mesmo tempo , c á medida que ellas caheni , rão em quantidade extraor- dinária, para occupar , e cobrir toda a terra em torno, e impedir consequentemente o nascimento das más her- \'as. Todavia não basta isto inteiramente ; porque a força da terra , o calor , e humidade do clima , nã^ obstante a sombra, e as folhas , que as cobrem, em muitQ menor quantidade, sempre as produzem ; eu o confesso , mas sempre quanto basta para affeiider as arvores, que requerem huma extrema iiir.peza , e que querem singularmente Qccupar todo q seu terreno. Des- ta 'h^ È Si li,')' '■4 i ■''■ ta sorte se faz indispensável repassallas , e álimpíílaâ déf tempos a tempos. Também se faz preciso ter cuidado de chegaf terra ao pé das arvores ; porque as chuvas degradâo scvtí cessar, e arrastrão a terra y sobre tudo em lagares incli- nados 5 descobrindo-lhes as suas pequenas raizes , que , como já disse , só servião de serpejar ao íedor da ar* vore a duas ou três políegadas pela terra. Ora estas rai* zes- não podem ficar expostas ao' Sol' sem seccarem , « sem defraudarem aa mesmo tempo a arvore do áucco ^ que ellas lhe conduzem , e causaT , por consequência ,- huma diminuição nos fructos considerável. Por tanto he' muito necessíçrio cobrillas com boa terra", depois deter sido bem cavada toda em roda , para facilitar a chuva , e o orvalho o penetralla , e hUmedecelh. Não se desprese chapotar , ou cortar a extfemí- dadtí dos ramos ,• ou porque estejão seccòs , ou para que se renovem. Haja-se de fazer isto depois da colheita de São João 5 e pou€o antes que" comecem as chuvas. Os que entendem a cultura das aivoíes fruetiferas ,• sabem muitO' bem a consequência desta precaução ^ e quanto* he prejudicial a negligencia a este re,-peito. Os Hespa- nhoes, ainda que muito indolentes ^ e preguiçosos , não fultáo jamais a este dever ; e assim se vê que seus Ca- coaes , proporcionadas- todas as cousas , são muitO' me- lhores que OS nossos , e que produzem melhores fru- ctos 5 e em muito maior quantidade. Tenho visto pela Martinica morrerem pouco a pouco bellos Cacoeiros , por faltarem, a final, absolutamente todas estas precauções. De ( 177) De tudo, quanto tenho dito, se colhe, quer o trabalho de hum Caçoai não he táo pequeno , como se poderia imaginar , ainda que na realidade seja muito menos que em huma Assucararia , e muito inferior á despega , que exige esta manufactura* Estaráó talvez con- vencidos pelo que escrevi no meu Tratado do Assucar no fim do ultimo tomo. Assim aconselho a todos , os que tem terras próprias a Cacoaes , de as empregar , sem cuidar em ser Senhor de Engenho , e eu os posso certi- ficar que lhes farão maior conta , gastarão muito me- nos , c se livraráó de huma infinidade de embaraços , e de paixões , que são companheiras inseparáveis de huma Assucararia. Muitas experiências me tem demonstrado que vinte negros podem manter j e cultivar cincoenta mil pés de Cacaos , plantar ainda mandioca , milho , legu- mes , batatas ^ solanos , e convolvidos ) , c outros vi- veres em muito maior abundância 3 que a precisa para seu sustento. §. XV. Rendimento de hum Caco aí. c ■ '''';í:: ; f Ora estas cincoenta mil arvores bem entretidas darão pelo menos , humas por outras , boas ou más , cem mil arráteis de amêndoas, que, sendo vendidas a sete vezes , sete dinheiros ao arrátel , que he o preço mais medíocre , e mais baixo , pelo qual nunca se tem vendido Cicao algum , produzirão trinta c sete mil e quinhentos francos (6.000^000); que hehuma somma T. ÍÍI. P. UL M taa- tanto mais considerável , quanto volta quasí toda intei- ra a bolsa do proprietário ; porque não despende coni o sustento dos escravos , que cultiváo as arvores , que he todavia a única despeza , a c^ue se vê obrigado. Não se pode dizer outro tanto de huma fabrica de Assucar ; pois, para ella poder produzir o mesmo proveito , au somma em Assucar branco , ou mascava- do, precisão-se três tantos mais de escravos , de ma- quinas, de carros, de bois, de cavallos , huma quanti- dade de trabalhadores de todos os officios , e sobre tu- do , de refinadores caros , e insolentes no ultimo pontp. Oxalá se disponhio a comparar as despesas de huma Assucararia com a de hum Caçoai , que houverem de dar o mesmo rendimento ; e se virá no conhecimento da differença , que se dá entre huma , e outra , pois o Caçoai se representará , como huma rica mina de ouro, no comenos que a Assucararia apparecerá , como huma mina de ferro., sobre tudo presentemente , que o Cho- colate com.eça a ter huma maior voga , que não tem tido antes, não somente pela prova diária de suas boas qualidades , mas também , vista a barateza , em que se acha, pelo abatimento de deus soldos por arrátel, qu« devemos á bondade do Rei , dos direitos de entrada 4o Cacao Francez pelo Edito de 1717. 5.XVJ. C >íO 5. "XVI. Natiwezã do Cacete, A?ova fiassamos a fallar da natureza do Cacao\ Este negocio não he pequeno , eu o confesso ^ paras ínim. Respeito os antigos , que escreverão deste assum- pto, e por M. Caylus, qUé foi o ultimo, tenho huma •veneração particular. Quereria concordar com eites , Inas isto me não parece pratkaVeL Colmencer , e os Escriptores Hespanhoes Médicos ,> dizem qiíe oCacao he fíioj e secco; M. deCaylUs, e alguns Médicos novos, affirmSo que he temperado. Pergunto quaes são entre élles os que tem lazão? Queirão dar a sentença sobre O que eu disser.- NSd »é póde negítf que o Cacao' seja amargo , e oleoso : ora tudo ^ quanto he oleoso ^ e amar- go 5 hé quente ; e tantoí mais quente ^ quanto mais for amargo, e oleoso. Segundo M. de Caylus , não hafrwcfa algum , de que se possa tirar mais óleo qUe do Cacao ^ nem que tenha maior amargo. Logo, como afftrma , que Retemperado? Será talvez por se lhe misturar assucar"^ Canelía j girofe . essência de ambaf ^ ora todas estas dro^ £^as são quentíssimas , e ainda que somente entrem no Chocolate em huma dose pequena , lie visivel que o ca- lor , que contém em si , junto ao moderado do Chocola- te , deve fazer hum composto quentissimo. Eu julgo que oufro qualquer , que não seja M. de Caylus ^ se Kvraria deste embaraço dificultosamente ; mas coma o sèii juiío he grande , lhe não será difficil descobrir-no5' iia Siia reposta as razões-, que o obrigarão a seguir es^te ií ;1 m 'i »'.t JSÍsí par- í ■! partido : e esta será huma nova illustração que me deverá o público, pois eu a tenho procurado. Os Hespanhoes justiíicâo facilmente a sua práti- ca universal, que tem , de misturar com o Cacao hum» quantidade de ingredientes muito quentes ; elies o jul- gão frigidissimo , e alguns delles chegai ão a levar tão longe esta sua opinião, que o reputarão huma espécie de veneno tão frio , que fazia cahir em thisica os que o tomávão com excesso. Sobre este fundamento tem ra- zão de misturarem com. o Cacao huma grande quantida- de de canella j assucar , pimenta , ou pimento de Jamai- ca, girofes, âmbar, almiscar, c, sobre tudo , baunilha , ingredientes todos calidissimos , como se sabe ; porque , tomando-se huma cousa frigidissima , sem estes podero- sos correctivos , se exporião a grandes inconvenientes , e , talvez , a huma morte anticipada. Os Authores Hes- panhoes , que nos derão com maior exacção a compo- sição do Chocolate, certificão, que o Cacao misturado, com estas drogas , composm hum todo summximente temperado. Parece-me bom o seu discurso , e , confoime o seu principio , he muito bem seguido , e muito ver- dadeiro. Este Author prova a bondade do Chocolate pe- lo consummo prodigioso que delle se faz em toda a America , quer Hespanhola , quer Portugueza , assim Francezes , como Inglezes , e outros Europeos estabele- cidos neste paiz. Podia acrescentar , sem o temor de se , ^enganar , que este consummo não he menor cm Hespa- . .nha , Portugal , e Itália , © que também Inglaterra , e ( <«' ) o Norte , bastantemente o consommem , e que a não ser o preço excessivo , a que tem chegado , presentemente cm França , seu uso seria tão forte , como o do taba- co ; e se certifica , que de todos estes povos tão diffe- rentes que delle usão sem distinção de idade , de sexo , c muitas vezes sem regra , nem moderação , com tu- do nenhum , ate agora , se tem queixado de lhe ter causado o menor incommodo , antes que tem experi- mentado o contrario ; que apaga a sede , que refresca , que engorda , que repara em hum instante as forças perdidas , ou abatidas pelo trabalho ; que fortifica , que causa hum doce somno , que ajuda a digestão , que adoça , e purifica o sangue , em huma palavra , que conserva a saúde , que prolonga a vida. Em tudo con- cordo com elle ; mas hc preciso também , que concor- de commigo , que todos estes povos , á excepção dos Francezes das Ilhas , tomão o Chocolate accommodado á maneira Hespanhola. Se por tanto o Cacao accommo- dado á maneira Hespanhola , misturado com tantos in- gredientes 5 tão quentes , he ainda temperado ( porque hc preciso sello para produzir estes bons effeitos) não se deve concluir que elle de si mesmo não he tempe- rado y mas frio ; pois que tem necessidade de tanto ca- lor estranho para o fazer temperado , ou que , a pesar de tantas cousas quentes , elle he temperado. Julgue o público. A causa está instruída ; mas eu desejo ser dispensado de dizer o que sinto , porque por ambas as partes se dão razoes , que me impedem determinar, qual delias se deva seguir ; e sobre tudo res- '*! %, I 1^ C i8í ) respeito muito a M. de Caylus , para concluir contra clie. Muitas pessoas pertendem que o Cacao de Ca- raça , ou , por fallar pnais justo , todo o que vem da |Çova Hespanha , e todo o que vem desde Carthagena , até Cumaná , he melhor que o das Ilhas. Nesta opinião tem o prejuizo mais partp que a verdade. Julga-se com fundamento que forão o^ Hollapdszes que o fizerão pas- cer ; porque , commefceando muito nestas costas , de que tirão quasi todo p Cacao , era do seu interesse louf var a sua bondadç , pelo í?m dp o venderem , e por piaior preço. Não causa admiração alguma que os Hespanhoes fallem a mesma lingucigem, Todo o mupdo sabe que esta Nação só estima o que nasce entre elles , e sobre tudo 5 como hão de elles lopvar o Cacao das Ilhas , que conhecem muito pouco , ç prejudicar com isto p que entre elles nasce, Convenho que , nascendo o Cacao de Caraça en? terras baixas , húmidas , mais gordas , e mais profundas que as nossas ^ e sendo as arvores ^ que p produzem , piais velhas , mais grossas , ç mais bem pútridas que as de possas Ilhas , por isso deve ser muito mais grosso, e as arvores dar huma ipaior quaptjdade, Também con- cordo que as arnendoas çonteráq rnais óleo ; isto he muito patural , pois são piaiores ; que copservarão por mais tempo ; pois que o seu volume os susteptarão piais facilmente contra as securas, Isto he conceder jji^ito , e convir taly^z em mijit^s cousas , mas n^o C '«i 5 concederei jamais', que tenha mais substancia nutritiva , mais oleo , mais virtude em huma libra de Cacao de Caraça , que em huma libra de Cacao de nossas Ilhas ; suppondo em ambos o mesmo grão de fresquidão , ou de sequidáo. Fora disto , que importa que o nosso Cacao con- serve o seu oleo menos tempo que o de Caraça ; pois que o podemos ter todos os dias fresco, e pelo dizer, ao sahir da arvore , quando o de Caraça tem passado muitos annos pelos armazéns de Hollanda , e Cádis , onde seguramente tem tido tempo bastante de se sec- car , e deixar evaporar o seu oleo , que faz a parte principal da sua bondade. O que acabo de dizer , he tão verdade que os mesmos Hespanhoes indifferentemente comprâo hum , e outro, conibime lhe faz conta. Sou testemunha ccular que, achando-me em Cádis nos fins de 170$ em hum navio de Marselha, por nome São Paulo, em compa- nhia de outros dous navios , que também vinhão de' Martinica , e que trazião huma grande carregação de Cacao das Ilhas , e de Caraça , hum , e outio foião igualmente vendidos aos Hespanhoes , e como eu re- parasse , em que comprassem o nosso Cacao tão caro , como o de Caraça , sem differenca alguma de preço. A resposta , que me derão , foi : Que elles lhe não ccnhe- cilo differenca alguma intrinseca em hum , e outro, quando o nosso era novo , e que por este motivo (* compravão , para o misturarem com o seu, que era ve- lho 5 e por consequência secco , e menos oleoso. Destes mes- ^|- 4 « ii C i?4 ) mesmos Hespanhoes sube , o que acima disse , que a grossura do de Caraça só servia, para lhe fazer conser» var por mais tempo o seu óleo , ao tempo que a pe- quenhes do nosso , lhe facilitava huma prompta evapor- ração. Também me disseráo que , segundo a qualidade dos Caçaos , isto hç , velhos, e por tanto seccos , novos, ou cheios de óleo , proporcionão a qualidade de huns , e de outros , para fazerem huma mistura , que os possa fazer gastar, sem diminuir a bondade do Chocolate, Vi a verdade disto, que acabo de dizer, alguns dias depois , porque , achando-me em casa do Marquez de La Rosa , Vice-Almirante dos Galliões , casado com huma filha de Martinica , onde se fazia huma grande quantidade de Chocolate , adverti, que se empregava ametade por ametade do Cacao de nossas Ilhas , e o de Caraça , e a razão , que me derão foi , que o seu Cacao d$ Caraça era velho , e quasi secco, em lugar que q dç Martinica era fresco , c estava ainda cheio do seu óleo , que melhorava , e reanimava , pelo assim dizer , ao de Caraça, Parece-mç que estes testemunhos bastão para provar a bondade do Cacao das Ilhas. J. XVIJ, Qiialid(iclçs do Chocçlat^. Nos paizes , cm que «asce , qualquer que este se» ja , com tanto , que seja bem feito , he certo que tem liuma infinidade de boas qualidades. He nutritivo , e ao mesmo tempo de mui fácil digestão y cousa que não se or4contra jamais çm alguma espécie dos outros alimen- tos. ( >«5 ) tos. Ajuda a digestão , sem excitar no sangue hum movi- ínento mais violento que o ordinário. Aiites cousa algu- ma não he mais própria para o adoçai , e sustentar nos humores este equilíbrio , que causa á saúde. Sóellepóde bastar para o sustento de pessoas de qualquer idade que sejão. O que disse do Snr. Monel na minha primeira parte , he huma prova , mas que não convenceria , se €lla fosse só. E-u as poderia íeíerir aos centos , senão ti- vesse medo de enfastiar ao meu Leitor, contentar-me- hei pof tanto de certificar , que os fazendeiros pobres , que cukivão o Café nas gargantas do monte de bairro de Oeste de São Domingos., não sustentão a seus filhos com outra causa. Dão-lhe de manhã Chocolate com milho. Este ahno^o lhe serve de jantar , c ceia , de tudo juntamente , sem precisar de outra cousa o resto do dia. Conhece-se a bondade deste alimento , pela gordu- ra , vig.or , c for^a das crianças. O que vou a dizer , se- rá huma prova de ser elle hum especifico para a thi.',í'- ca. Desde que vivo até á idade de trinta annos , que fui para as Ilhas , sempre fui de huma magreza extre- ma , padecia huma fome canina , que me devorava , e quanto mais comia , quanto mais ficava magro , e sec- Co , de maneira que os Médicos affírmavão que eu es- tava thisico em todos os modos , e que viviria mui pouco tempo. A pesar desta sentença , fui ás Ilhas , pa- deci a moléstia de Siam na minha chegada , e logo que comecei a tomar o Chocolate , entrei a engordar a olhos vistos , e ainda que trabalhasse muito , comecei a gosar de huma saúde , como nunca antes tinha tido, Ad- Adverti que também era aperitivo , que manti- nha o ventre livre, e que provocava hum suor doce, depois de o tomar, que ajuda muito a transpiração. He certo que purifica os espiritos muito melhor que o Café,, cujo movimento violento , e a agitação que causa no sangue , e nos humores , não podem , a finai, deixar de ser prejudiciaes á saúde. Necessita-se para isto que o Chocolate seja bem feito , quero dizer , que o Cacao , de que se compõem , seja bom , são , e fresco , que só se metta em sua com- posição a quantidade de assucar, e de especiarias abso- lutamente necessárias , para corregir sua frieza , suppon- do-se que a tem , ou para o não fazer excessivamente çuente , suppondo-se temperado ; porque , a que ser- vem estas drogas tão quentes , e tão odoriferas que se Ihemisturão sem discripção ? Na verdade , eu o confes- so 5 o fazem muito mais agradável ao gosto , e ao cheiro , mas isto só pôde ser corrompendo-lhe a natu- reza, e destruindo-lhe as boas qualidades. Vou a dar as differentes maneiras , com que se prepara o Chocolate na America , e na Europa. Expo- rei , como as vi praticar , e de passagem farei algumas advertências. Fazem-se torrar as amêndoas do Cacao em hu- ma panella , como se faz queimar o Cafc. Esta primei- ra preparação he universal , e absolutamente necessária. Serve para esbulhar o Cacao da sua pellicula dura , e secca , que a cobre , e para excitar nas suas partes , que são mui compactas , e seccas ^ hum movimento , de que C l«7^ qiie ellas tem himia verdadeira precijSo, para <íar sz\\U da ao óleo , de que são cheias. Fazcm-se queimar mais ou menos , segundo o «osto de cada luim. Os Hespanhoes, e á sua imita<^ãQ os Francezes que niorão na America , o torrão muito me- nos. Pertendem os primeiros , que a massa, ficando mui- to mais fina , o assucar se lhe não incorpora facil- mente. He verdade , que as amêndoas , que se torrão com o excesso , com que elles as torrão , se pizão çom maior facilidade na pedra. Então quasi ficão carvão , mas bem se vè que a sua substancia fica mudada inteíiamen- te , o óleo exhalado , e dissipado , e que apenas conser- vão assas amargura , para fazer conhecer o que forão. Em quanto a côr negra , que adquirem , isto de nada serve á bondade do Chocolate. Seria melhor beber hu- ma taça de tinta , que hum liquor pouco mais ou me- nos trigueiro. Os índios , e Francezes da America , são , aa meu parecer, mais sábios, Elles unicamente, queimão as amêndoas , o que lhes he ijeces';ario , para tirarem as pelliculas , que as cobrem com facilidade ^ e para excitar nas suas partes o movimento , que lhes he necessário , mas sem prejudicar a substancia , e sem a privar do seu sueco , e do óleo espirituoso , que faz a maior par- te da sua bondade, E por isso observamos que o Cho- colate nas Ilhas he mais substancial ou nutritivo , mais oleoso , e que , por absorver a sua amargura , requer iíiaior quantidade de assucar, JEstando tQrrad3.s as amêndoas, , e mondadas de sua ( x88 ) sua pellc , SC pizáo cm hum gral d? bronze , ou már- more. Na America se servem de hum pilão de madeira duríssima , e quasi sem poros ; mas he da mesma ma- deira. Deste modo reduzem as amêndoas em massa; mas como, apesar disto, seria grosseira , c desigual , se móe sobre huma pedra com hum rollo de ferro poli- do , para acabar de esmiuçar as partes , que escaparão ao pilão , e fazella muito mais fina , ou subtil , mais unida , e a mais delicada , ou delgada que ella pôde ser, §. XVIII. Pearas de moer o Chocolate, I %■ As pedras , de que se servem , devem ser fir- mes , algum tanto porosas , para que o fogo , que se põem por baixo , as possa aquecer com facilidade , ain- da que , se deve attender a que não estallem , ou se não calcinem ; e a sua grã deve ser assas dura , para não se desfazer ; porque arruinaria a massa. Devem , além disto , ser polidas com cuidado , limpas , lavadas , e bem enxutas, logo que acabem de servir. Ordinariamente lhe dão de quinze a dezoito pollegadas de largura , dous pés e meio dé comprimento. São cavadas em toda a sua longitude , de sorte que ficão concavas , ficando-Ihe três para quatro pollegadas de grossura. Nas quatro ex- tremidades se lhe põem quatro pés, para sustentar ape- dra , e tella levantada da terra , de sorte que se lhe possa pôr fogo por baixo. O rollo , de que se ser- vem , hc de ferro bem Jiso ordinariamente : também se C «89 ) se faz de pedra mármore. Eu os tenho visto de páo santo , ou guáiaco. Os de ferro tem duas pollegadas de diâmetro. O seu comprimento he igual á largura da pedra , e , além disto , tem a de hum punho por cada Jado , ou extremidade , de huma pollegada de diâme- tro, e 6 a 7 pollegadas de comprido. Aos de mármo- re , ou madeira , se dá o mesmo comprimento , porém maior diâmetro , para que a sua grossura suppra a falta do seu peso. Nos paizes tão quentes , como as Ilhas., se não precisa pôr fogo debaixo da pedra. Basta o ca- lor do clima , sobre tudo , trabalhando-se ao Sol., §. XIX. MaJfi de se fazer a inassa. O que a faz , poem-se de joelhos diante da pe- dra , se está posta em terra , ou em pé , se está sobre alguma mesa, para que poSsa trabalhar com maior força. Poem-se alguns pannos ao redor da pedra , para receber os fragmentos da massa , que cahem das folhas. Para isto se servem nas Ilhas do Caete. Não ha cousa mais própria , nem mais barata. Por cada vez se põem pouca massa sobre a pedra ; móe-se , estendendo-a , e apertaiido-a foi temente com o rollo, do mesmo modo que os pas- telleiros estendem a massa , que querem fazer fina , e, de folhados. Ajunta-se , á proporção que se estende so- bre apedra, com huma faca, para a metter debaixo do rollo , até que , aos olhos , e ao tacto , se julgue da maior delicadeza , a que ella pôde chegar ; pois neste trabalho consiste o Chocolate bem feito , porque se pre- C ^9© 5 se precisa que as suas partículas se dissolvão mtíitò bem na agua , em que se faz ferVer , que estas nât) hajão de ficar no fundo da chocolateira , ou das taças , que pos-. são fazer conírecet a matcYía , de que se fazem^ Querendo»se conservar , por muito tempo , o' Chocolate , ou enviàllo a paizes distantes , he muita melhor não lançar assucar , ou especierias na massa í Gontentando-se unicamente com a trabalhar beru na pe- dra , deixando-a , ao depois disto , assentar bem , es- friar , e seccar ametade á sombra. Fazem-se deihs pe- quenos pães , como tijoUos pequenos , ou cylindricos ,■ com O' peso que quizerem ;' o que se faz acabar de sec- car á soiTiSra- ,, embrulharido-se ao depois cm papeis. Deste modo se c-onser^í^a pOr muito tempo ^ e nSo fica «ujeito afjolôrecer , como ,• pela maior parte , acontece , quando se lhe põem assucar ; que, sendo susceptível ât i?umidad« , por consequência produz o bolor. A massa- do CacaO de si só se faz rija , e neste estado conserva melhor o' seví- ofeo. §., XX. Composição do Cliocohte a Jíesfanhola , e Mas , querendo-se preparar inteiramente ^ este" he o modo que vr praticar em Hespanha ,- e Itália. Pa- ra se fazer cem arráteis de Chocolate mais fino , e me- lhor , se tomão quarenta arráteis de massa de Cacao bem trabalhado sobre a pedra , misturão-se-lhe sesenta arráteis de assucar bem branco, e bem secco, bem pi- sa- C i9t ) sado, duas libras de canella , quatro onças de girofe , e dezoito onças de baunilha , junte tudo com huma porçáo de ahiíiscar , e de essência de âmbar , quem quizer ; e para impedir que o assucar se não derreta, misturando-o com a massa , e mocndo-o na pedra , se Jhe ajuntão alguns punhados de farinha de favas , coada por peneira de seda , e estando tudo incorporado , de sorte que não se conheça a alvura do assucar , se deixa por algum tempo esfriar a m^ssa , e passado este se põem nos moldes de folha , onde se formão os páos, que se deixão acabar de esfriar em huma mesa bem limpa , e que , ao depois , se cobre com hum papel. Dão-se algumas pessoas , que deitão o Cacao , e assucar em iguaes porções ; mas sempre acontece , que o assucar não he quanto basta , para absorver o amar<^o do Cacao ^ e para dar gosto ao liquor, em que se quizer dissolver , de maneira que íicão obrigados a repetir-lhe o .assucar, quando o fazem em bebida, mas cessará este embaraço , se o fizerem como acabei de dizer. Querendo-se servir deste Chocolate , se deitão na chocolateira tantas taças de agua, quantas se quizer de Chocolate; e tendo esta agua fervido por alguns mo- mentos , se lhe deitão tantas onças de Chocolate , cuan- tas forão as da agua. Mexe-se tudo fortemente com o páo de bater , ou molinete , para dissolver a matéria , é se põem outra vez a chocolateira no fogo , para lhe fa- zer dar algumas fervuras mais , mexe-se novamente rom o páo de bater , para o fazer espumoso , ou levan- tar- C 192 5 tar-lhe a espuma, e a seu turno, cu poúço a pouco ^ se vão enchendo as taças. Não se pôde deixar de dizer que o Chocolate, feito desta maneira , não lisonjea summaoiente o gosto , e o olfato ; mas também não se pódc negar que to- das estas drogas ^ sendo excessivamente quentes , não facão o composto de hum calor excessivo , ainda sup"- pondo que o Cacao era frio , e quanto não será' elle se o Cacao for temperado? Donde concluo: qu« esta es- pécie de Chocolate está mui longe de ser útil á sairde, como seria naturalmente , pelo fazerem de' huina natu- reza tão contraria , que pôde causar tristes consequeu^ eias. Nas Ilhas Francezas se prepra de huma maneira mui simples, na verdade, mas que o não esbulha dar suas bellas qualidades , e que o faz mui saudável , e mui substancial, ou nutritivo. § . XX^. Mod(^ de se fazer o^ ClwcoUte nas Ilhes Fraiicex.as^ Não se torra tanto o Cacao, como já o disse, mai somente quanto basta para o despojar da sua pellicula com facilidade. Se isto basta para pòr as suas partes em movimento , sem risco de lhe fazer exhalar o oleo , que he a sua melhor parte , o que nunca deixa de aconte- cer , quando se queima , ou se torra muito. Assim ad- vertimos, que requer muito mais assucar que o Cacao, que C 19O t\ii6 hé muito queimado , e o que he hum sígnal infaU Ih'cl de se não ter transpirado todo o seu óleo , e de ter toda a sua substancia inteiramente. Trabalha-se so- bre a pedra , e não se poupa cousa alguma para fazer- Jhc a massa finissima , e delicadíssima. Quer se faça , para o gastar no paiz , ou para o enviar á Europa , jamais se lhe deitão assucar , e especierias. O almíscar, o âmbar, e a baunilha, nunca nesta massa occupárão lugar. Queiráo acreditar que não tem sido por não ha- ver ewas drogas , e que , havendo-as , a sua careza fosse a causa de não as misturarem para o seu uso. Quem assim discorrer , mostra que desconhece o génio dos nossos llheos , visto não haver no mundo quem tenha maior caprixa da sua honra , e do seu commodo que eiles ; mas a sua experiência he que os tem feito co- nhecer que estas drogas mudão inteiramente a santa na- tureza do Chocolate" ; e qUe de huma das melhores cou- sas do mundo , as taes drogas tem feito muito má , e muito arriscada , de maneira que elles nada mais ajun- tão que assucar , dissolvendo em agua quente hum quasi nada de canella em pó , outro tanto de girofe , Gomo vou a dizer. Dizem que os Hespanhoes , incitados pelos índios, lhe ajuntão o aracn , pelo fím de lhe dar huma côr a- ▼ermeihada. Duvido deste facto , não sendo que o ajun- tem , quando o bebeín. Tenho , por muitas vezes , vis- to o Chocolate da Nova Kespanha , e certamente era muito negro, e não vermelho. Eu o vi fazer, estando em Cádis , e não vi que o misturassem , talvez que T.III. P.III. N íis- I ( »' ' ( Í94 ) assim se fizesse nos tempos de Colmenero , de Thoma^ Gage , nos quaes reinava a simplicidade , que queria dar todas as idéas da Medicina ; porém , como o ho- mem se faz sábio á sua custa , quero dizer , ao depois de ter sido enganado muitas vezes , deve-se crer , que os índios 5 eHespanhoes se despirão dos seus prejuízos, a favor da Medicina , e que abandonarão huma prática , que , por não dizer que era má , lhes era inutiL Pelo que escrevi na minha primeira parte se terá visto , que , fazendo-se. de qualquer sorte , sempre tem hurr^gosto muito desagradável ; e pelo que respeita á côr , que dá ao Chocolate ^ seria preciso deitar-lhe muito para sobre- pujar a còr negra do Cacao queimado da sorte que o queimáo , ou torrão , convindo todo o mundo , que a côr negra absorve todas as outras. Dizem alguma cousa mais racionavel , quando affirmão , que misíurão o Attolle no seu Chocolate. O AttolU nada he mais que huma espécie de leite , que se faz do grão de milho , quando verde , espremido. Sendo verdade que o milho he refrigerante , esta composição não pode deixar de ser muito nutritiva, ou substancial, e por isso não a devo reprovar , e particularmente , aos Hespanhoes , cujo modo de viver, e a côr de sua pel- le , advertem que elles tem huma muito grande neces- sidade de se refrescarem. Representa-se-me que he tão difficultoso desco- brir-se a etymologia do nome Chocolate , como inútil o sabella. O que a este respeito se tem escripto , causa compaixão. Na realidade os Hespanhoes lhe dcrão o no- me, Ç m ) me, e uso, que os índios lhe davao , e nada mnis fi- zerão que espalhar o seu conhecimento , e uso , pelas ou- tras partes do mundo , tendo-o feito muito mais agra- tlavel ao gosto , e cheiro , do que antes era. §. XXII. Chocoíateiva , e o pão de bater j ou molinete. Chama-se o vaso , de que se servem , para fazer o Chocolate , chocolateira ; do mesmo modo que, appe- lidão ao em que se faz o Café y cafeteira. Não me de- moro em dizer qual seja o Seu feitio por ser assaz co- nhecido. Fazem-no de todos os metaes , prata , cobre estanhado , e ferro , ou folha de Flandres , e também de barro. Os últimos para nada prestão j porque logo que se esquentão , fazem sahir fora o liquor em borbo- Ihõe- , sem consentir que o molinete, ou páo , bata, ou mexa o hquor para o fazer espumoso. Os de prata, ou cobre estanhado , são os mais convenientes! , senão forem bojudos, como são de ordinário, o que dá mui- ta extensão á matéria, e faz perder muita acção ao páo do molinete. Fazem-se de folha, ou lata, que sío ba* ratos , e se limpao bem , e com facilidade , com. a íi^ «ura de hum cone truncado, e duião por muito tem- po. As maiores devem conter de oito a dez taças , co- mo o direi logo , com oito pollegadas de altura , três de largura no alto, e no baixo quatro. O páo , dito molinete , deve ser de madeira rija. Em FrancH o fazem de buxo. Nas Ilhas se tem infini- dade de madeiras muito próprias. Dão-se-lhe três ate N 2 qua- t <' h ^ C '9« ) quatro linhas menos que o diâmetro , ou largura do aí- to da chocolateira , e quasi três pollegadas de altura. Fazem-se-lhe muitos talhos assaz profundos , ou cava- dos , que o fazem parecer com huma pinha , para que estas desigualdades ajudem a dividir mais a matéria, e a reduzilla em espuma : por cima deste pomo se põem huma lamina , ou chapa redonda , com o mesmo diâ- metro que serve para tirar a espuma á medida que se vão enchendo as taças. O pomo , ou grosso do mo- linete, tem hum cabo, como hum bastão de quatorze pollegadas de comprido , e seis para sete linhas de diâ- metro da mesma madeira. Deve ser redondo, bem igual , para que não offenda as palmas das mãos , quai\do se faz andar á roda na chocolateira. Não havendo quem o faça ao torno , se suppre , escolhendo hum páo redondo do comprimento , e gros- sura que acabei de dizer, e se applica a huma das suas extremida-des pequenas taboinhas bem delgadas , que se cruzem , entrando pelas duas fendas , que se devem fa- zer na extremidade do páo, ou ba^stão , com. huma pe- quena chnpa , ou lamina redonda por cima. Este moli- nete se faz depressa . e sem custo. §, XXIII. Páo de bater o Chocolate, Faz-se muito preciso este páo , ou molinete, para haver de separar as partes da massa , que forem difficeis de se dissolverem no liquor. Agita-se fortemen- te na chocolateira^ voltando-o entre as palmas de am- bas -É C "97 ) has as mãos , que se tem abertas. E<5tc movimento não só acaba de dissolver as partes da massa ; mas também o cjiie he mais , reduz o liquor a huma espuma , mais , ou menos espessa , segundo a bondade do Chocolate ; porque se sabe , que quanto a massa for mais gorda ^ oleosa , e nova , e que for mais bem trabalhada na pe- dra , tanta maior será a quantidade da espuma , cuja extrema delicadeza , e leveza fazem a maior parte da bondade do Chocolate. ^ §. XXIV. Qualidades do bom Chocolate, Muitas pessoas se descuidão em o fazer espumar , € imaginão que basta que a massa se desfaça muito bem no liquor , e que este seja grosso. A este não posso comparar melhor que com os que não conhe- çam a difterença que se dá entre o pão , que leveda bem , e se íaz leve, e fofo, e outro que he grosseiro, pesa- do, e mal feito. Esta differença não nascerá, sendo a mesma farinha , a mesma quantidade , senão de ser es- ta trabalhada por dous homens differentes , hum sábio, e diligente , outro ignorante , e preguiçoso. O pão se- rá o mesmo , mas hum se comerá com apetite ^ e gos- to , sem temor de lhe fazer mal , e o outro , lhe car- regará o estômago , e lhe fará huma indigestão perigo- sa. A delicadeza da espuma não embaraça totalmente que o Chocolate não seja muito nutritivo. A sua leve- za não diminue a sua substancia. As pessoas , que o co- nhecem 5 e que ordinariamente usão delle , não se em- ba- ■■<'. ( 198) 1 * baração que este liquor seja espesso , e solido , quasi como hum caldo , com tanto que tenha delicadeza , ligeireza , e bom gosto : estáo certos de tomar o mais agradá- vel 5 benéfico , o mais nutritivo de todos os alimentos , e deixão sem difíiculdade alguma para os gulosos , d ignorantes o seu Chocolate espesso , e pesado , mais pró- prio a sobve-carregar o estômago , do que a fazer nelle hum bom sueco , hum sustento agradável , e de fácil digestão. O melhor liquido , e o mais natural , em que se pôde dissolver o Chocolate , he a agua. Algumas pessoas ©dissolvem em leite , em lugaF de agua. Sendo o leite puro , engrossa muito o Choco- late , e o faz muito nutritivo e de huma mais diffícil digestão. Tomei-o assim algumas vezes , e sempre achei o estômago carregado. Não he o mesrtno , fazendo-o com hum terço de leite , e dous ou três quartos de agua. Este pouco leite ajuda a fazelio espumoso , e muito delicado. Os Inglezes das Ilhas o fazem muitas vezes com vinho da Ilha da Madeira. Huma vez o bebi assim por curiosidade , e tive tão pouca satisfação , que não me fi^ cou vontade alguma de repetir a experiência. §. XXV. Behida Iii^leza chorn.^da Saliboí, Paliando das bebidas Inglezas na minha I. parte , me olvidei de huma muito singular, e A'em a ser: en-r çhem pel^ ametade huma ponch^ira com vinho madei-r ( '99 ) ra , assucar , canella, girofe em pó , e a acabão de encher com leite de vacca. Este leite faz espumar todo o outro lir^uor , con^.o cren-.e talhado. Elles o bebem <.]uejite , e pura elles nada ha mais dilicioso , mais são, mais peitoral. Faça a prova quem quizer , que me con- tento de dar a receita. Nas Ilhas Francezas havia hum Capuchinho, Cu- ra em Martinica , que era o único que tomava Choco- late com Madeira. Admiravão-se todos de que só se ali- mentasse huma vez por dia , e isto perto da noite , tendo unicamente atií então tomado huma taça de Cho- colate, mas cessou a admiração, quando se soube que esta taça era huma grande escudella, em que se deita- vão quatro onças de Chocolate , com seis onças de as- sucar, três ovos dissolvidos em hum quartilho de bom vinho de Madeira. Estou certo que qualquer, que não for Capuchinho , tomando este Chocolate , poderá existir vinte e quAtro horas sem outro alimento. §. XXVI. Chocolate á Promana. Não aconselho a alguém fazer esta receita , a não ter vontade de se desoccupar promptamente deste mundo , por algumas razoes muito fortes. Foi praticada em Roma no anno de 1706 por hum homem venerá- vel por sua idade , virtudes , conhecimentos , occupa- çoes q.ue tinha tido , tendo-se queixado a seu Medico de huma grande fraqueza do estômago , e de huma tal frieza , que lhe embaraçava a digestão , o que não da- via m C 200 "^ via parecer extraordinário em hum homem de setçnta € quatro annos , quebrantado por estudos , e trabalhos. O Charlatão o certificou , que não podia urar de outro algum remédio melhor, para reestabekcer o seu natural calor , que lhe faltava , e ajudar a digestão dos seus alimentos , como o Chocolate com agua ardente. Fosse ignorância, fosse malícia, o Chocolate em poucos dias lhe causou huma infiammação do peito, acompanhada de huma febre terrível , que lhe abbreviárão a vida. A pesar do dito , certa pessoa , muito recommen-^ davel por suas virtudes , e letras , me certificou que humi certo Governador vivera muitos annos , tomando Chocolate com agua ardente de Cognac da melhor , sern sentir o menor incommodo. Podia isto acontecer , ou do costume de muitos annos , ou da fortaleza de sua constituição , etc. Os que quizcrem fazer estas eX'? períencias, as participem ao público , que lhe ficará obri* gado, e ao menos os contratadores de aguas ardentes. \ * §. XXVÍI, Modo de J'ax,er o Chocoíatc ccin jterfeição. Queirão lem.brar-se do que disse ante-? , isto he , que nas Ilhas se não lançava na massa do Cacao nem assacar , nem especierias , o que faz ficar esta massa muito dura , de sorte que se rela com huma grosa de lata , ou folha , ou se raspa com huma faca. Cumpre não se rapar , mais áo que se quer empregar de cadit vez ; por que se conserva melhor no seu páo , c se secca ípuito menos que sendo rapado , ou em pó, Çup^ ( 201 ) Suppondo-se pois , que se querem fazer oito ta- ças de Cliocolate de hunia grandeza crdiíiaria , se ponha hum quartilho de agua ao fogo , cm hum tal vaso, que possa ferver, e se deite na chocolateira duas onças de massa de (7acao em pó , com três onças de assticar , até quatro , sendo a massa nova , e por consequência mais oleosa , e mais amarga ; ajunte-se-lhe hum ovo fresco, clara, e gema, e outro de agua fria, ou quen- te , o qiie he in,difíerente ; poem-se caiic]la em pó pas- sada por peneira de seda , quanto caiba sobre huma moeda de dez reis , e querendo-se hum pouco mais pi- cante , se pize doze dentes de cravo girofe , em duas onças de canella , para compor este pó. Dilua-se , o que for possível , a massa , o assucar , e a canella com o ovo , e alguma agua, que se lhe ajunta, e estando a agua c-uente , se derrama pouco a pouco na chocolateira , e se bate fortemente a matéria com o molinete , nij só para a separar bem , e dissolver ?.s partes do C.'acàO , c assucar ; mas tambeni para o fazer bem. espumoso. Estando toda a agua na chocolateira , e que se tem muito bem batido, se põem. ao fogo, onde se dci::a , até espumar , ou esteja a subir acima. Então se tiia , c se bate bem , para que esta espuma , que he a parte mais oleosa do Cacao , se espalhe bem por todo o li- cuor , e o faça igualmente bom , assim no principio , eomo no fim. Poem.-se outra vez a chocolateira ao fo- ro, e se tem cuidado de bater , e em fervendo , e que- rendo z fervura derramar-se por fora da chocolateira , se deixa tomar algumas fervuras, a fim de lhe dar hum co- \Á r; v-,'1 I. C 202 ) cozimento racionavel , se tira do fogo , faz-se bater, e d medida que vai espumando no alto , se faz deitar brandamente nas taças , por meio da pequena lamina redonda , que está por cima do pomo. Bate-se a ma- téria , para a reduzir toda em espuma, e pelo menos, o que se poder , e ao depois se reparte pelas taças o resto do liquor, que fica na chocolateira. §. XXVIII. Sig/iaes do bom Chocohte , e do bem feito. » í' t t I y Quanto mais o Chocolate for novo, e bem fei- to, tanto mais espumoso será. Deve ser pardo, grosso, e com olhos pequenos , e tão leve que o contheudo de huma taça , não pese mais de ties onças. Quando se lhe ideita hum terço de leite , não se lhe precisa pôr o ovo, nem fazer ferver a agua , e o leite antes, basta que a agua esteja bem quente , o resto se faz, como já disse. Alguns , em lugar de porem a chocolateira ao lume , a põem em banho maria , querendo que isto fa- ça o Chocolate mais delicado. Tomei-o feito assim mui- tas vezes , e não achei differença alguma do que se faz simplesmente ao lume. Deve-se procurar que não saiba i fumaça , e a este fim se prefere fazello ao lume de carvão sobie hum fogareiro , ou em hum Rlchò , e não ao de chaminé , e com lenha. He huma verdade constante , e que todos se podem certificar , pela experiência , que o Chocolate feito desta maneira he de huma bondade , e delicadeza , que ex- C 20J -) excede á imaginação. He leve , mui substancial , sustenta nos trabalhos , tomado em jejum , e ao depois de co- mer ajuda a digestiío. Em huma palavra , he hum ali- inento tão próprio a todos os temperamentos , que os í]ue usão delle com discrição, se ach&o muito bem, e o estômago se acostuma de tal sorte que sente repu- gnância na sua falta : no que parece que o prefere aos de mais alimer.tos. Os Kespanhoes , e , a seu exemplo , muitas outras nações fazião fatias , e talhadas de pão commum tor- radas, ou biscoito feito de propósito, que molhão rio seu Chocolate , e que o comem antes de o toir.ar. Este niethodo parece não ser máo , especialmente , se for ver- dade , como querem, que as fleumas , cruezas, e outras impurezas , que estão no estômago , se apegão a este pão , e que o Chocolate , achando-as juntas , as preci- pita com m.aior facilidade , o que não he huma pequena virtude do Chocolate. Quando se toma esta bebida , he bom ficar em repouso alguns momentos ; porque excita hum pequeno suor , ou huma humidade , que abre os poros , e que faz transpirar os humores máos , ou inúteis. Também quasi sempre obri/a a ourinar, algum tem.po , ao depois de o ter tomado. Este he hum si- gnal certo de ser diurético , a que po>so acrescentar , que he raro que as pessoas , que usão delle , sejão durei- ras , e que padeção males de cabeça , vertigens , e ob- strucçôes. Póde-se conhecer os effeitos , que produz o Chocolate feito , como acabapios de dizer ^ do outro car- 1 ( 204 ^ carregado de especicrias , pelos seus contrários, porque o nosso sempre conserva , aos que o toraão , a gordu- ra , firmeza de carne , e isenção de iium cento de m.oles- tias ; e o das especierias ficão magros , seccos , e sujei- tos a muitos males. Os Médicos Italianos pretenderão remediar estes mács effeitos , aos que assim o tomão , mandando to- mar hum grande copo de agua fria , antes de o bebe- rem y e de pieferirem certa agua a todas as outras. Quem não vê que Jie mais fácil corrigir o Chocolate, ou a sua composição , impedindo que nella não entras- sem tantas drogas tão quentes, que vão incendiar o es- tômago. §. XXIX. Vantagens ã Fazenda Real. \ t I I Servem-se do Chocolate , para fazerem varias sor- tes de rebuçados , pastilhas , etc. , e huma espécie de marmelada , em que se mettem pinhões em doce. Seria muito bom que o uso deste excellente alimento se estabelecesse em França , do mesmo modo que na AmiC- rica 5 e Hespanha ; porque , além do proveito , que os particulares tirai ião do seu uso, he certo que haveria hum grande proveito para todo o Reino em geral , para as Ilhas em particular ; e sobre tudo ao Rei pe- los direitos de entrada , que ainda , sendo módicos , pro- duzirião sempre grandes sommas , que se poderião au- gmentar , segundo as precisões do Estado , sem temer que por isso se deixasse de tomar, logo que o povo a elle se acostumasse. Contemple-se a este respeito os di- reitos do tabaco, que, sendo no tempo presente gran- des , ou que o possão ser mais para o futuro , nem a sua venda , nem o seu consummo , se diminuirão por causa do costume, e necessidade a que elle obriga. Até faz persuadir que o consummo cresce em proporção á carestia. Isto acontece em tudo o que se consomme pela bocca. §. XXX. Manteiga de Cacao. Precisa não esquecer-se que se tira do Cacao hu- ma espécie de óleo , ou de manteiga que se pode em- pregar em difterentes usos. O Auíhor da Historia do Cacao ensina hum modo de a tirar , que não succedc bem em as Províncias frias de França , onde se não po- de ter Cacao novo , e tão oleoso , como nos paizes em que elle nasce. Eu dou outros dous methodos de o ti- rar 5 que são os seguintes. §. XXXI. Primeiro Methodo. 1 Fazei torrar j mondar, e pizar o Cacao ào mes- mo modo que se faz para o Chocolate , e no mesmo instante o ponde a cozer em huma caldeira com muita agua por meia hora ; mettei-o assim quente em hum panno , coai-o , e espremei o marco , ou fezes , e quan- do a agua começar a ficar fria , colhereis facilmente o óleo que sobrenada. Senão for assas limpo , repassai-o p.^r 'àm Ç 206 ) por muitas íií^nas quentes , e tornai a apanhar, quan- do a agua se esfriar, pela superfície. Este óleo se con- gela facilmente , e fica como hum queijo gordo , mui branco, sem cheiro, com bom gosto, sem nunca crear ranço , e se guarda todo o tempo que se quer. §. XXXII. Segundo Methodo que sò serve nos lufares em que nasce. \ I M t Depois de ter o Cacao ressuada,' antes de o fa- zer seccar ao Sol , se piza em hum pilâo , como se qui- zesse redu/ir em mas.^a , o que logo se faz. Ponha-se a ferver em muita agua, e tire-se oolco, que sobre-nada, e quando já não apparecer algum , se passe a agua , e marco, por hum panno , e se esprema bem, regando- se sempre com agua quente , para acaba-r de lhe tirar todo o óleo , qi:e he também como o da azeitona , e que se emprega no.s mesmos usos. Dizem que he ex- cellente para as hemorroidal em huQT pouco de algo- dão ensopado , e posto na parte que o requer , faz ces- sar a dor ao mesmo tempo. Se os que as padecem , fi- zessem este remédio duas ou três vezes cada mez , não somente não as sentiriao mais , como também este- óleo amaciaria de tal modo estes vasos hemorrhoidaes , que elles se descarregariao do sangue , que os faz inchar , sem o menor incommodo ; pois a sua abundância he a causa de dores tão sensíveis , e muitas vezes perigosas. Quando se abrem as cabaças do Cacao , logo que se cdhem, se lhes tira a polpa, ou nuicilagem , C 207 ) que cerca a amêndoa, e se faz desta huma espécie de creme e>pesso de hum branco , cor de carne , de hum gosto summamente agradável , e que he muito refrir^e- rante. Para isto só ha mister batelío , como se pratica com o leite , quando se faz a manteiga , se bem em muito menos tempo , e com menos trabalho. Pulveri- sando-se este creme com hum pouco de assucar, e que se lhe deite algumas gottas de agua de ílor de laranja , fica Sendo hum delicioso manjar. Também faz o mes- mo effeito que o seu óleo em amaciar apelle, tirando- Ihe as manchas, e impingens. Applica-se como pomma- da, pondo-3e-lhe por cima papel pardo. Pertendem ter experiências certíssimas da bondade deste remédio , o que não afianço ; por que fallo sobre fé alheia ; posso sim certificar, que he muito refrigerante , e que faz tanto beneficio , quanto também fíiz , sendo comido. Podem-se servir com toda a segurança , que se hão de achar bem. Fallei na minha primeira parte do doce das a- mendoas , agora ensinarei o como se faz toda inteira. Querendo-se fazer doce de toda a fructa , que- ro dizer , da cabaça com as amêndoas , he preciso co- lheitas ainda muito novas , que tenhao só três policia- das de comprido. Fervem-se em agua por huma hora , depois se lhe fazem três ou quatro incisõe- pequenas ao longo dos seus hdos , e se põem de infusão em agua doce, e fria, que se muda duas vezes ao dia no espa- ço de seis; lardéa-se com cascas de laranja, limão, ou cidra, alguma gengibre, e canella , e se pcern como a; amêndoas em diversas caldas por outros seis dias, e no • fim ',♦'' 'i }; •: 1 íl.l I 11, $.\ ( 2o:? ) fim destes se põem em huma calda »rossa. He hum bom doce ,. edelicado-, aquando se faz secco , faz hum belJo effeito , para terminar hmna pyramide de outros frtíctos seccos , ou para ca^nton-ar hum ananás, ou ou* tro fructo grande. Parece-me que não seria- difficultojo fa^er doce ào Cacao , quando se avisinha a sua madureza , e que tem toda a sua grandeza , como os limões de cinco ou seis pollegadas de diâmetro ^ ou como as laranjas gran^ des de Barbadas , a- que chtimão Chadecjttes , pois que a grossura das cascas destes fructos as nãa impede de sè fazerem doces todo- inteiros.- '^ 'l \ ' §.. XXXI 11.. Chacoltte de Ccju,- M tomei Chocolate , que era feito- «metade peia íimetade de amendous de Cacao ,- e Castanhas de Caji?. Achei este Chocolate muito bom , espumava maravi- lhosamente, e se lhe conhecia o gosto do Caju , que he, mui agradável. • • §. XXXíV. Tlnttircv do Cacmr, Também tomei huma- tintura de Cacao, quero dizer , Cacao queimado moido , infundido em agua quente, com.o o Café. Pareceo-me que tinha hum gosto bom ; mas como só o tomei huma vez , não posso di- zer mais. ME- C 209 ) MEMORIA IX. SOBRE O CACA O. (^/le histonj of Jamaica Bootc IIL cáp. VIÍl. pa^. 695.5 E Stas arvores nascião tão abunddsamente èm Jamaica ^ que seus visinhos se congratulavão liuns eom outros , de terem nellas huma fonte inexhaurivel de riquezas, Em 1671 se contaváo dezaseis bellos Vergéis em pro- ducção , e rendimento , e muitos outros em cultura ; mas j alguns annos ao depois ^ se destruirão todos de huma vez , dizem , por hum vento quente ^ que pene* trou toda a Ilha , de maneira que nunca mais se reco- brarão, e^ présenteiTlente , são mlii poucos. Tem sido a maior causa do desacoroçoamento de não ir avante este artigo 3 assim a excessiva delicadeza , e mimo des* ta planta, quando nova, eomo a delonga do tempo, tjue requèr para produzir, pela qual muitos fazendeiros são tão soffregoS , e impacientes , que a não querem esperar ; e só sim applicar-se a outros géneros , que produzem com maior presteza ^ ao mesm.o tempo que he certo que hum bom vergel de Cacao , huma vez estabelecido^ he muito mais rendoso, c lucrativo, e requer muito menos braços que qualquer outro género vendavel das índias Qccidentaes. Ainda agora nesta X. IIL P. UL O Ilha .1 t ( 210) Ilha se vem muitas arvores quasi espalhadas pelo? matto? principalmente em terrenos ricos , e quentes , que sáa abrigados dos ventos. Como o Cacao he hum artigo mui capital ào commercio , e se pôde produzir muita bem, passo a dar as melhores regras para a sua cultura, que pude aprender, O terreno mais próprio para esta planta he o húmido, fértil, e de terra profunda ; porque ella ge- ralmente lança huma raiz perpendicular , que penetra piuito pela terra dentro, a qual se encontrar perto da superfície algum rochedo , nem medrará , nem vivirá muito. Hum pedaço de terra demattos, barrosa , fértil , perto de agua talvez he a melhor situação de todas. Antes de se plantarem he mister ter-se a terra bem pre- parada, cavando-a profundamente, alimpando-a de to- das as raizes de arvores , e das de mais plantas nocivas* Estanda a terra preparada desta maneira y se hajão de marcar as ruas com hum cordel, Escolhão algumas das mais grossas , e melhores cabaças , e deixando passar dous ou três diasy se abrem y se lhe tirão as sementes, se deitão em agua n alguma pequena vasilha , rejeitão- se as que nadão , alimpa^se-lhes a polpa , e a pelle ex- terior, e se deixão ficar n'agua á sombra, até que pa- reção jVstamente que estão a grelar. Então se faz huma cova de hum pé quasi de diâmetro , e seis pollegadas de profundeza na terra, que se tem preparada para as receber. Forra-se a cova com huma folha de bananeira , deixando-se fora da terra huma das suas extremidades , que tenha quasi oito pollegadas. Lança-se levemente a ter- ' Alt I ir (211 5 fCtra donlro da folha ale que a cova fique eliéia. ístâ feito se Jhe iiitroduzem triangularmente as sementes, tres em cada cova em duas pollegadas dfe profundeza. Tenha-se o cuidado de as introduzir perpendicularmen- te. Cobrem-se de terra solta, e a extremidade da folha de bananeira se dobra para baixo , e se obriga a esta po- sição , píondo-lhe por eima huma pequena pedra. Pas* Sados oito ou dez dias , as plantas começão a apparecer por cima da terra , e neste tempo se lhe tira a folha de bananeira , e alguns as cobrem de tres , e quatro fo- lhas fortes postas á roda , para abrigar com a sua som- bra os novos pimpolhos do calor do Sol. Talvez se de^ verião preferir bumas pequenas latadas de quasi dezoito pollegadas feitas em grades ou redes grosseiras , tecidas em canastra , ou abauladas , que se segurão na terra com maior firm.eza por estacas , e assim não podem fa- cilmente ser derrubadas pelos ventos , nem abalar as folhas das plantas que então anicamente são òs delica- dos , ou melindrosos lobos do caroço , ou amêndoa di- vidida , cuja perda lhe causará inteiramente o não hirem avante.- Continuão^se estes anteparos , ou abrigos pela tempo de seis mezes , os quaes passados,' os Hcspanhoeá fomão ramos do Corallcdendron ( Tulnantuba ) , e o põem a Susueste^ e na Jamaica a Nornoiueste , cm pe- quena distancia das plantas , e misturados pelas ruas. Estas varas ^ ou estacas ,■ pegão ^ ef cfesceín com os Ca- eoeiros , e os ahrigão das venfaneiras , e tempestades. Assim as grandes ventos, como os grandes Soes ^ c grandes scecas , podem prejudicar as novas plantas g O 2 SQ ^' 't |V- ■) •■• ', t 1 1 ' * i 1 1 C 212 ) \ se se nao tiverem acauteilado estes accidentes ; por este motivo se deve cuidar muito em escolher huma situa- ção bem abrigada. Os ventos temíveis em Jamaica, são Nordestes , Suduestes , e Sues. Alguns os costumão precaver , plantando bananeiras perto de dous mezes an- tes , e j sendo mandiocas , seis semanas. Plantão-se es- tas amêndoas no tempo das chuvas , ou , ao menos , em tempos nublados , cu anuviados , que se esperão por ellas , e , quando o tempo corra secco , e quente , e as novas plantas estejão já fora da terra , procurão regalias, pondo-lhe em roda dos talos trapos,- algodão, e ainda vestidos totalmente ensopados , ou molhados com todo o mimo , e os deixão ficar até que a terra tenha embebido huma porção considerável da humida- de ; ora 3 hum regador que tivesse pequenos furos na sua boeca, faria a esta operação menos laboriosa , e a executaria, sem dúvida alguma,, muito melhor ; porém esta agua , applicada a este fim , se for tomada der al- gi^m rio , se deve deixar estar por algum tempo pou- sada em alguma vasilha, ou tanque,- antes que se po- nha em uso. As bananeiras dão huma sombra mui na- tural, e agradável a estas plantas, em quanto são no- vas ; mas , logo que ellas cresção , se lhes deve dar abrigos mais Fortes, qu3 as defendão- da inclemência dos tempos , até que ellas cheguem ao estada ultimo de sua perfeição ; e então se removão estes abrigos , tuto- res , e anteparos com toda a precaução. Se o vergel , ou parque , for extenso , ou grande , se lhe podem dei- xar algumas arvores das que se cham.ão de lei , que o bor- 1^ bordam, ou cerquem, e que aqui, ealli, ou por toda a parte, quebrem a força dos ventos. Os Hespanhoes costumão plantar laranjeiras ; mas , ao que me parece , estas sao mui morosas, ou tardias, no seu crescimento. Tenho visto usar-se a este íini da canafistula , e me per- suado serem muito melhores em razão da sua grande- za , e espessa sombra de suas folhas. Contando o Cacoeiro seis mezes , não deve o fazendeiro ser escrupuloso , neste período , em mondar o vergel, ou parque, de toda a herva , e gramma , que encontrar , visto que ellas conservão a terra fresca , mas deve destruir todas as plantas rasteiras , enlaçadeiras , ou trepadeiras , e as que sobrepujao pela sua sobeja al- tura aas Cacoeiros. A distancia de huma a outra planta pôde ser de dezaseis a dezoito pés. A razão , que ha , para se deitarem três semen- tes em cada cova , vem a ser , porque raras vezes todas nascem ; e , também , ainda que todas nasção , não tem a mesma força , ou vigor , e quando já tem dezoito pollegadas de altura , se arranca a mais fraca , e que nada promette , tendo porem o cuidado de não preju- dicar as raizes das duas que fícão. A experiência tem ensinado ser necessário plantarem-se sementes nos luo-a- res , em que as arvores devem permanecer ; porque, transplantadas , nem mediao , nem produzem bem , em razão, segundo supponho , do melindre da sua princi- pal raiz, que ao menor damno, que haja de padecer, causará hum descahimento da sua arvore. No espaço de dous annos, tendo chegado perto d» .1 1> ,1 "\}\ i ' da altura de cinco pcs , principia a ílorecer , e se lhe tirão estas primeiras flores ; porque se lhas deixassem ficar, e produzissem fructos , se diminuiria muito o vi- o-or das arvores ; e por isso se lhe não deixão os fructos senão depois do terceiro anno , julgando-se proporcio- nados ao vio^or 3 e forças da arvore. Em virtude des* tas precauções darão ao depois maiores , e m.elhores fru^- çtos, e durarão as iirvores muito mais tempo. No quar- to anno mesmo só se lhe deve consentir huma mode- rada colheita , deitando-se abaixo as flores das que pa^ j-ecerem fracas , para que as arvores possão adquirir a íobustes , que lhe he própria , p^^ra poder avançar. Quan^ do se planta em huma boa terra , e se trata bem , po-r dem continuar a subsistir , e a produzir com vigor trin- ta annos. Dão cada anno duas colheitas , a maior em Dezembro , ou Janeiro , a outra em Maio ; e o tempo què gastão as ílores desde que cahem a madureza dos íructos são quatro rnezes quasi. Aamarellidão de cabaça faz co-* nhecer o tempo da madureza, e também pelo estrondo das amêndoas , quando dentro delias estas se abalão , ou se movem. A este tempo se colhem as mais antigas, se lhe tirão as amêndoas , e he miclhor não se lhe tirar ^ polpa , que tiverem em roda , que as faz conservar por mais tempo. Expoem-se todos os dias ao Sol , por espaço de hum mez sobre esteiras , m.antas , ou pelles. Costuma-se deixallas estar, por três dias, amontuadas para ressuarem , antes que se descubrão. Neste estado se colhem as mais antigas, quebião-se , tiião-se-lhes as Umendo^s , e se lhe dçixa a polpa , no caso que algu- mas .1^' mas a tenhao , c todos os dias se põem ao Sol , por tempo de hum mez , sobre esteiras de junco , coberto- res , e pelJes. O costume tem adoptado o uso de dei- xar as cabaças em montes , para huma certa fermenta- ção , a que chamao ressuar , por três ou quatro dias antes de as abrirem. He muito melhor não as alimpar da polpa , porque as faz conservar por tempo mais di' latado. As cabaças não contem numero certo de amên- doas ; tem de dez ate vinte , e na realidade chega a trinta , mas esta certeza depende princi|^lmente do mo- do 5 com que tratarão a esta arvore no primeiro trien- nio quadriennio de sua existência. Estando as amêndoas seccas , ou curadas , estão promptas a serem vendidas , ou exportadas. Tendo-se huma vez estabelecido o vergel , per si mesmo se renova , brotando das suas raízes novas mudas , sem que se haja mister providenciar o lugar das antigas, que tiverem acabado, ou que se tiverem der- ribado. Geralmente se avalia o rendimento de huma ar, vore em perto de vinte arráteis , que , vendidas a cinco libras (dinheiro da Jamaica) por quintal , vem a sahir por huma libra. Hum vergel , que tenha lo^ooo arvores produzirá annualmente lo^ooo libras (36,000^000). E, segando os acres de Jamaica, em i^o^o libras arráteis de amêndoas poranno, alternando huns por outros, os de rendim.ento com os que não o forem. Nos terrenos pobres 3 ou estéreis, e não havendo com > • (21(5) com ellas hum melindroso comportamento , o proHucto ou rendimento de cada arvore escassament-^ excede o de oito arráteis por cada huma , e iOit^coo arvores , con- sequentemente, produzirão 4(;^ooo libras. Se forem bem curadas , as amêndoas serão cheias , brandas ao tacto , oleosas , e de hum gosto amargo , comendo-se cruas. O óleo Chymico , que delias se extrahe , he summamente quente, e avaliado por hum.a boa fomen- tação nas moléstias paralyticas. Dizem que os Mexica- nos usão comer estas amêndoas cruas , quando s5o ata- cados , de males nas visceras , para os remediar. Os índios Occidentaes preferem a bebida do seu Chocolate, e com justiça, aos de mais alimentos, em razão de ser hum restaurante tão grande , que , segundo crem , huma única onça nutre tanto quanto hum arrá- tel de carne de vacca. O mesmo se acredita em todos os paizes , onde tem chegado o seu conhecimento ; e , além disto , se julg^ que he alimento conforme a to- das as idades ; mas , com particularidade , as crianças , e aos velhos , aos valetudinários , e aos que , ao depois de çstarem doentes , se procurão reestabelecer ; e , ulti- míimente , sendo feito com leite , he o mais que pode ser, approvado em moléstias de consumpção. Disto , que se tem dito , se colhe não ser huma planta, que possa cultivar-se em qualquer lugar. Ella não medra na? partes baixas , e seccas do Sul , menos nas partes altas , ou espaços penhascosos dos montes. Requer terreno plano , fértil , húmido , que tenha altu- ras ^ ou montes que o rodeem. Isto obrigou ao Senho.r Sloa- 1^^ ( 217) Sloane n c^izer : í^iie senão deve viver nas paragens ^ em tjiw os verí^cis do Cacao são bons ^ por ser asna residcn. cia nestes lugares húmidos , c n5o ventilados , mui pou- co sadios a esrecie hunuina. A pevar disto, onde se en- contrão estes espaços de terras , certamente se não devem reduzir a outra qualquer cultura , íóra desta , que possa liar inaior proveito que ella , visto seguir se , que não lia necessidade alguma que o fazendeiro, que a houver lie possuir, viva ahi, porquanto, nas vizinhanças, se darão paragens mais altas, que tenhão toda a proporção, para estabelecer a sua casa nobre , ou de moradia , em que constantemente possa residir. O Senhor Thomaz Modiford , em 1670, deo hum plano para o cstabelecim.ento , e manejamento de hum vergel de Cacao , ou Caçoai , computando justamente as suas despezas. Neste tempo os pretos , ou escravos , custavão menn<; huma terça parte que hoje custão. Os feitores , ou criados brancos não excedião a vinte e qua- tro libras em razão do seu salaiio , e sustento , cada anno (86(f;400) . As despezas , fora destas, compara- das com asactuaes, são como setecentos para duzentos e cincoenta , ou como mais de três para hum : he des- necessário por tanto comprovar este calculo, e unica- mente pôde ser útil dar as regras geraes para dirigir a plantação de hum vergel deste género. O mencionado Author propõem seis escravos, e quatro brar com seu feitor , e a terra ainda em matto virgem. A primeira obra, feitas as casas de mo- rad;a , ou nobres, he deriubar , alimpar', e plantar ena- ■. ' ' ■ 1,1- i ' (2lS) quatro acres de batatas do norte , que, se o trabalho principiar nos meiados de Março , pôde estar acabado em meiados de Abril sem dúvida alguma , tendo dea operários. Isto conciuido , podem continuar a derrubar, a alimpar, e a plantar filhos de Bananeiras até fins de Fevereiro do anno seguinte. Neste tempo , que quasi tem passado dez mezes , podem ter limpo, e plantado dez acres , além de terem feito conservar limpa a terra , ou plantada. Tendo provisões de mantimentos prom- ptos , cumpre comprar mais dez escravos , e no mez de Março plantem-se os Cacaos entre as fileiras , ou ruas dç Bananeiras, que a este tempo já terão cinco , ouseis pés de altura , de modo que no primeiro de Junho tenha já plantado vinte e hum acres inteiramente de Cacao. Estes em cinco annos (conforme o Senhor Modi* ford) rendem i^feooo arráteis por acre , que ao toda dará 21^000 arráteis , que na feira de Jamaica (pelo preço actual) de cinco libras a seis por quintal chega- rão de i(èo$o libras a 1^^260- libras. ( 5:700^^000 ) a. ( 4: 5 3 (í^jOOD ). O total deste pequeno vergel se completará em menos de quinze mezes , e nos cinco annos , que o Ca-» Cao esperará fazer-se vendavel , oij a chegar i sua per" feita madureza , se lhe podem annualmente fazer ao vergel addicçoes , ou acréscimos de alguns acres. Podem- se, alcra destes^ plantar gengibre, ou Café; criar por- cos , e outras criações, e em quanto os vergéis camiK nhão a sua. perfeição cabal , se podem emprehender cousas içaiorcs ^ yisto que a sua colheita requer mui poucos braços,. ME* C 219 ) . ■ ,1 «^"i^l— — — — p— — — ■^»— I I ■ MEMORIA X. SOBRE O CACAO (^Commerce de VÀmerujiie tom. II. pag. 25?.) ,/\ Pesar deter ji fallado do Cacao , explicando a ta ri* fa das drogas , este lie o lugar de me lembrar do pou- co cue então disse , e de fazer conhecer melhor hum género que , em parte , nos he próprio , e interessa muito O çommercio dç nossas Ilhas. A Historia do Café nos conduzio mais longe do que queriamos , mas Marselha , tem tão grande parte em todas as Ordenanças feitas por este motivo , que , escrevendo eu principalmente para os seus visinhos , não pude ser mais breve. O mes- mo acontecerá sobre o Cacao, e outros géneros, cujo conhecimento importa menos (excepto o assucar) aos nossos commerciantes da America. Seguirei o mesmo methodo , pois me parece claro. Paliarei da origem, da cultura, uso, propriedades, e do çommercio década hum destes geneios. Crivem do Cacao, Antes do descobrimento do novo mundo , ò Cacao , fructo de huma arvore de medíocre grandeza , era totahnente desconhecido ao antigo continente , e até :' 'III fe: * até esse tempo nenhuma Relação dos que viajarão Eu- ropa, Africa, e Ásia delle fízerão menção, o que nos deve persuadir ser esta iiuma producção particular , e natural da America. Mas, talvez, seria huma temeridade o dizer que o não havia em outra parte. Muitas vezes a negligencia , e a ignorância terp sido a causa de desapa- recer huma planta de hum paiz , e totalmente acabaria , íQ a Providencia a não conservasse em hum canto do mundo, corno em hum entreposto, para a fazer servir aos misteres do homem , quando os seus novos conheci- mentos os obrigar a cultivallas. Na Guiana se enconn tra huma quantidade tão grandç de Cacoeiros , que se corre huma grande extensão de mattos , que unicamente constão destas arvores , cujo fructo serve de sustento aos macacos , de que o paiz abunda ; donde se tem ob» servado que em Cayenna se çrião sem cultura , e que o seu fructo he excellente, Tern-se por consequência , grande repugnância em o plantar nesta Ilha, O seu rendimento indemnizaria muito bem todo o trabalho que houvessem de ter a este respeito. Este fructo era o principal sustento dos mora- dores do México. As suas crianças não tinhão outro. Os Hespanhoes na conquista do México observarão pas- mados a universalidade do seu uso. A gordura , a bel- leza da côr de todos os que delle usavão , as maravi- lhas que contavão , dos seus effeitos para a cura das iriolestias, os persuadi© qua era necessário que este fru- cto fosse verdadeiramente saudável. Elles o beberão , * não gostarão por c^uja da svia amargura. Somente, ten- 1>' C 221 ) tendo mudado a sua preparação , se accostumaráo a clle como direi ao depois* Os Hespanhoes , tendo ouvido aos naturaes cha- nialio Cacaiintli mudarão este nome em Cacao. Ignora- se a sua etymologia. A' arvore chamão Cacaoeiro. Esta nasce sem cultura debaixo da Zona tórrida da Ameri- ca , e particularmente no paiz de Nicarágua , Guati- mala , pelas hordas do rio do Amazonas , nas costas de Caraça, e na Ilha de São Domingos. Também se en- contrão algumas nas mattas de Martinica , onde ao de- pois pelos cuidados dos seus visinhos , se multiplicarão tanto c]ue farião a riqueza dos mesmos , senão houvesse a mortalidade causada pelo tremor de terra do mez de Novembro de 1727. Contem-se este fructo em huma cabaça , ou bage 5 que , dentro em quatro mezes , ciiega ao tamanho de hum pepino , do qual tem a figura hum pouco pon- tiaguda por baixo , e formando talhadas , como o mel- lão. Esta cabaça he gtossa quasi quatro linhas , e o seu vão he cheio de amêndoas ^ e por huma substancia esbran- quiçada , que se muda em huma mucilagem de hum gosto acido , summamente agradável , e refrigerante. Estas amendoiís de ordinário são vinte e cinco , algu- mas vezes chegão a quarenta ; mas rara vez são menos de vinte e cinco. O lenho do Cacoeiro he poroso , e leve : a cas- ca he igual, côr decanella, escurecendo-se tanto mais, quanto a arvore se envelhece , suas folhas tem nove pollegadas de comprido , e ametade de largo no meio , com M » i com a figura das cerejeiras , de hum verde eScuro , ma'» mais claro por baixo. Os peciolos y que as sustem , terrt a terceira parte ào Seu comprimento , e quasi três li- nhas de cirGUraferencia. A' medida que estas folhas ca- hera , são substituidas por outras novas , de maneira que parece que a arvore sempre está verde , o que não lie particular ; mas sim o dar duas colheitas, e ter todo o anno flores, e fructos ao mesmo tempo. As flores nas- cem pelas axillas das antigas folhas em feição de pe- quenas rosas y sem cheiro, mas mui regulares, e em ra- malhetes muito bem providos. Eu disse pequenas , e naf verdade o são summamente , tendo ,- quando rnuifo , duas linhas de diâmetro, postas sobre hum peciolo de cinco aseis linhas. He manifesto que sendo hum fructa tão grande , se fodaá as suas flores vingassem , não poderia ser nutrido- por hum peciolo tãro diminuto ; e assim de todas as flores y de que o ramalhete se compõem , ape- nas huma produz o fructo ; e o proprietário tem toda a satisfação , quanda de quinhentas flores huma lhe di G fructo. Isto faz que o terreno por baixo dos Cacoei- ros esteja sempre coberto de flores. A' medida- que o botão se abre ,- se pode distinguir o calis , o centro da flor , e as folhas da mesma. O calís se forma de cinco folhas, côr de carne pallida ,, guardando a coberta do botão. No centro tem cinco fios , e ciílco estames com o pistillo no meio. Os filamentos são direitos , postoa nos intervallos das folhas. Tem a eòr de purpura, e á dos es.tames he branca , e estes são cumbados com hu^ ma C 225 ) ma cabecinha no topo , que sustenta o meio de cada follia. As íinco folhas tem duas partes , huma se curva para o centro , e outra tem a figura de lança , e pare- ce separada da primeira, Fórma-se a sua cabaça no centro da flor , em pouco tempo se engrandece , e n'algumas arvores appa- rece de còr vermelha , em outras branca , e algumas vezes misturada de vermelho , e amarello. As verme- lhas, amadurecendo-se , íicío paljidas ; as brancas còr de limão, e as vermelhas misturadas de amarello, de hum amarello mais vivo , e de hum vermelho muito pallido. Tem-se observado que os Cacoeiros que dão mais fructos , tem as cabaças brancas. Esta variedade de cores não designa e>pecies differentes. Easta a natu- reza do terreno para a causar , visto que as sementes colhidas na mesma arvore dão toda esta variedade de cores. Só hão mister quatro mezes para a inteira matu- ração do Cacao contidas nas ditas cabaças. Não ha pes- soa alguma dos que isto lerem , que não conheça as amêndoas do Cacao , e que por si mesmo , abrindo-as , não possa ver que os lobos , que as compõem , não são differentes como os das nossas amêndoas , que o todo he enleiado por differentes ramos , e que o gérmen, que está na parte pontuda das nossas amêndoas se situa na ponta da extremidade grpssa das do Cacao. Çul- C 224 ) Cultura do Caceio^ A experiência tem rrivostríido que o Cacao pôde ser muito bem cultivado em toda a parte meridionaf d^ America , onde naturalmente nasce. Com tudo quando os Hespanhoes , e Portuguezes a descobrirão , só erão comm;uns as prorincias de Nicazaque , México , Guati- mala y rio do Amazonas , Costas de Caraça ,■ que apa- nha de Cumaná até Carthagena , Ilha- do ouro. Ao de^- pois que os Hespanhoes , e Portuguezes conhecerão & uso , que podido fazer deste fructo , e os proveitos , que' podião tirar delle no sustento dos moradores do píiiz j ncgáráo o seu conheGimento as Nações Europeas , qus se estabelecerão nas Ilhas. Em 1^5 f for o anno , em que se plantou o pri- meiro pé de Cacao na Ilha de Santa Cruz, e em. 1659 os índios fizerão conhecer outra arvore nos mattoy de Martinica. Fazendo-se maior diligencia , encontrarão^ ou* tros , GUJGS fructos servirão para se multiplicar a espécie. Antes de 1680 somente a curiosidade fazia estas ar* vores mais communs , e desta data foi que entrarão a pedir estas amêndoas de Cacao pelos negociantes Fran- cezes aos mofradoies de Martinica ; porque jiiígáTão que a sua colheita viria a ser hum objecto de commercio , e que começarão a fazer plantações regulares. Huma longa cultura emendou os inseparáveis erros das primei- ras experiências , e se veio a concordar , que para se ter hum bom Caçoai , se precisa escolher hum lugar igual 3 1>' C 225 ) Igual , húmido j ou que se possa regar por algum rega- to , e que esteja abrigado dos ventos. A terra cansada não vaie cousa algumai Estas arvores requerem terra nova , ou novamente derirubada , queimando os mattos no me>mo lugar , cuja cinza misturada com a mesma terra iiie dão o seu primeiro vigor. O terieno deve ser profundo, solto, e mediocremente gordo. Todas estas precauções são absolutamente necessárias , e sem ellas se perderia o trabalho sem esperança alguma de produ- cto. O Cacoeiro não lança as suas raizes , como as outras arvores , por todos os lados , que se estendem , e se insinuão j e dobrão por toda a parte ^ em que encontrão alimento. A raiz do Cacoeiro desce perpendicularmen- te quasi como a do rabano; Disse raiz , porque ella he única , e que seus barbalhos j ou pequenas raizes , que sahem todas da raiz mestra ^ se espalhão pela superfície da terra. Conhecesse que esta raiz ha mister huma ter- ra profunda j e que esta deve ser solta, e húmida, e não muito gorda , para que todos estes pequenos ramos a possão penetrar, e receber os saes , que devem formar os fructos. i>e o terrePiO não for unido , a menor chu- va , aiTastanda comsigo a terra , lhe descobrira as pe- quenas raizes , que o ardor do Sol as desseccara logo. E;ta terra deve ser nova , ou b-ni reparada , para que possa dar o sueco , que baste, para o nutrimento das flo- res , do fructo , das folhas, que Se renovão continua- mente, e estas arvores devem estar abrigadas dos ven- tos , que na America são mui violentos 5 pois , sacudin- do as fibras de suas raizes , as quebrão com iacilidade T.III. P.UI, pe- ■ít';.r t í|v^ <,,:• 1 ' ■ ^ 1 1 1 (216) peia sua sobeja delicadeza , o que faz perecer a arvore infallivelmente. Para se defender hum Caçoai da impe- tuosidade do vento , se escolha hum lugar cercado de grandes arvores , e na «ua falta se plantem bananeiras , em muitas fileiras, ao redor do local destinado ao Ca- çoai, que deve ser de mediocre grandeza. Se for mui- to pequeno , não terá o ar que baste ; e muito grande , estaria muito arriscado a padecer pelos furacões. Esco- lhido o local , se dirige a cordel ruas em quinconce , fincando estacas de dez em dez pés , ou de cinco em cinco. O espaço de dez pés he o mais conveniente, para que os Cacoeiros possâo chegar a huma certa gros- sura , e para que durem mais tempo ; mas , plantando- se de cinco em cinco , também tem huma vantagem grande, porque o Cacoeiro, não vindo de estacas, e estando exposto a grandes accidentes , em razão de sua grande delicadeza, em casa de mortalidade, o Caçoai se acha fornecido melhor de arvores , ainda que plan- tadas menos regularmente. Isto supposto , estando" ater- ra bem movida , e arrancadas todas as hervas , e raizes , se escolhem as melhores cabaças , se lhe tirão as maio- res amêndoas, e as mais sãs, e se mettem tre-s na co- va, ou buraco, de huma estaca, que.se tira a hurn quarto de pé de profundeza, advertiníia x) pôr as ditas amêndoas com a extremidade grossa para baixo , que tem hum pequeno fio , com que se prende na cabaça , para que o seu germe se possa enraigar perpendicular- mente , .sem ser obrigado a torcer-se : a arvore he sem- pre melhor. Plantão-se , ou semeão-se em todo o tempow Com- 0' Ç ^27 ) Com tudo tem-sc advertido que de Setembro ate Ja- neiro as plantas nascem muito melhor j principalmente, sendo a terra húmida , ou pelas chuvas , ou pelas re- gas. Ao oitavo dia já as sementes tem apparecido fó- ia da terra , e algumas vezes ainda antes dous dias , outras dous dias depois, conforme o adiantamento , e atrazamento da estação influe na vegetação. As amên- doas , inchando-se , lanção por baixo huma radiculaj este he o nome que se dá a esta raiz mai , que faz o peão da arvore , e no seu topo lança dous lobos da amêndoa hum tanto separados , e curvos , e pouco a pouco , á medida que o tronco cresce, e eJles se endireiíáo , fór- ínão duas folhas grossas, desiguaes j e de hUm verde obscuro. A pluma , nome particiílàr do tronco , sahe «o mesmo tempo , e se divide êni duas folhas , de hum verde claro , e continuando a brotar , produz novaS folhas, sempre de duas a duas em òpposição. Escolhe- se a planta mais vigorosa , e se arrancão as outras j e se por infelicidade alguma das amêndoas não brotar , he necessário plantar outra , e isto he melhor que metter mudas , tiradas dos viveiros , que nunca são boas. O cultivador deve ter o maiOr cuidado ^ que for posSivel , em não consentir que nasça herva alguma ao pé dos Cacoeiros novos , tendo-os sempre limpos. Descobrio-sê hum proveitoso irleio de destruir todas aS hervas de hum Caçoai í ate que as arvores tenhão adquirido gran- deza, para lhes -fazer sombra , e cobrii: o terreno pela -cahida de suas folhas , o qual foi de lhe plantar man- =dioca 5 advertindo de a não plantar pela linha de lon- P 2 ci> .1 v'^;,; . ■ ' .'■■■; > V I V Ç 228 ) gitude do renque , ou fileira dos Cacoeiros. A laiz da mandioca raspada , e cozida ao fogo àd a farinha , que he o pão do paiz , de que se alimentáo os negros. Dentro do anno os Cacoeiros chegão á altura de quatro pés , e formão sua copa ^ ou coroa , deitando cinco ramos : os que deitao menos , são defeituosos , e os que deitão mais, dão muito pouco fructo , não se cortando os que excederem aquelle numero. No quinto anno está em toda a sua força, e produz huma abun- dante colheita. Vindo qualquer ^ufão de vento, estan- do a arvore boa, que a revire, não he mister endirei- talla^ a delicadeza, e m.eiindre de sua raiz se abalaria sobejamente por esta operação , e viria a morrer , basta sustentalla por estacas fincadas ao pé : continuará a dar G seu fructo maduro , e muitas vezes hum novo lança- mento j que vencendo a curvatura, substitue a arvore , que neste tempo se corta. Conhece-se que as cabaças estão maduras , quando já não tem a cór verde ; co- Jhem-se com destreza , fazTendo-as eabir com hum páo a forquilhado , sem of fender as flores , e os outros fru* ctos , de que sempre a arvore está carregada. Ainda que se faça esta colheita em todo o tempo, ella vem a ser mais abundante nos soisticios ,. c rara vez se faz com menor intervallo de tempo que o de quinze em quinze/ dias. Juntas, todas as cabaças, se faz preciso, antes do quinto dia, abrillas dando-lhe com hum. páo, para iheí tirar as amêndoas á mão , e polias em cestos , que se levão para casa. Estendem-se sobre hum tablado, ou ta- boleiro, em altura de hum palmo cobrem-se de folhas de Ç 229 ) de caetc , que tçnhao seis palmos de comprido, cmais de dons de larí^o ; pocm-se taboas sobre estas folhas , c sobre estas taboas novas amêndoas , se o espaço for estreito. As amêndoas assim cobertas, e embrulhadas, aquecendo-se , fcrmentão , o que chamao ressoar. Des- cobrem-se todos os dias , de manhãa , e á noite , mo- vem debaixo para cima pelos escravos , e se tornão a cobrir , e se continua isto mesmo por cinco dias. Esta ressuagem dá ás amêndoas do Cacao huma còr inteira- mente avermelhada escura. Feita esta operação , se tira o Cacao dos taboíeiros , e se põem a todo o ar , para o fazer seccar ao Sol , e para isto se lança sobre taboas , que estejão forradas de esteiras , e por cima destas se deita o Cacao em altura de duas pollegadas que todos os dias se mexe muitas, vezes , cobrindo-o á noite com esteiras , ou amontoando-o para o livrar da humidade do sereno. De manhaa se espalha de novo até ficar bem secco o que se conliece pelo seu roido , ou soni- do na mão , quando se aperta. Alguns fazendeiros põem o Cacao , ao depois de ressuado , em taboíeiros leitos a este fím , e de noite , ou em tempos de chu- va amontoão huns sobre os outros , e cobrem o ulti- mo com hum dos mesmos posto ás vessas. Se estes tabuleiros tivessem o fundo penetrado de buracos , pa- ra \\\Q facilitar a circulação do ar , menos se deveria te- mer o mofo , ou bolor , e se deverião preferir ás es- teiras. Devem com todo o escrúpulo cuidar , quando se fazem re«suar as amêndoas , ou depois de estarem pos- r.' rr, ,.i ( 2J0 ) postas ao Sol em as mexer, e remexer bem, para to- dos os lados, p-ua que ellas não germinem., o que, a haver descuido, ha de acontecer, e então a sua quali. dade se arruinará totahnente, Tendo as amêndoas pas- sado pela ressuagem , já a chuva não as oflenvlera ; mas , passado o primeiro dia , cumpre defendellas com cuida- do por amor da podridão. A ressuagem , e depois a dessecação , lhe fazem, perder a sua amargura , e o gesto de verde , que as farião desagradáveis , e sujeitas a serem mor- didas , outocadíis pelos insectos. Preparadas desta sorte ^s amêndoas, se escolhem, ensaccão , e guardão nos arr mazens , para se venderem. Disse que o Cacao do Mer xico , e Caraça eião superiores em bondade ao de nossas Ilhas. Todos os discursos , feitos em louvor do ultimo dos dous acima , não poderão destruir hum facto , con- firmiado pela experiência diária. Pode muito bem ser, que nos tempos vindouros se não haja de encontrar differença alguma entre este , e outro qualquer Cacao ; pôde muito bem ser que em Caraça se haja eJle de pre? parar muito melhor que nas outras partes ; pôde muir -to bem ser , que o terreno , e o clima lhes hajão de ser miais favoráveis , e , além disso , que os nossos Ca- cociros não tenhão tanta idade , quanta o de Canica. Seja o que for : o certo he , que se* prefere pagar o preço dobrado do que se paga pelo das nossas Ilhas, e, ain- da que se misturem ambo.^ , isto se deve attiibuir mais á economia, que a outra qualquer cousa. Apesar de tu- iio ponheço alguns que o preferem misturado. Esçolha-se o Cacao mais grosso ; porque se perdo me- "^ menos , t que haja de ter huma pelle trigueira igual , e a casca inteira ; a amêndoa deve ser lisa , bem nutrida , còr de avcllãa maduia por fora, avermelhado por den- tro, de hum gosto algum tanto amargo, e sem cheiro. O de Caraça he alguma cousa mais chato que outro qualquer. A* primeira vista pode enganar com facilidade ; visto que em todos os paizes se produzem grandes , e pequenos. As suas amêndoas , ainda que scjão mais abundantes de óleo que todas as demais , de qualquer qualidade que sejão , nunca se enranção ; com tudo porem se faz preciso escolher as mais novas, pois , quando se envelhecem , são furadas pelos ver- mes, que as chegão a pôr em pó. Os naturaes do paiz torravão o seu Cacao em panellas de barro , tiravão-lhe a pelle , moião-no entre duas pedras, ou o soccavão em hum gral, ou pilão, íoí mando da sua massa páos com as mãos. XJio do Cacao. Os Kespanhoes , e Portiigiiezes , tendo experi- mentado esta bebida J\]exicana , não S2 acostumai ão a ella , senão ao depois de Jhe terem corregido a amar- gura , e de a terem melhorado de gosto , misturando- Ihe o assucar , e as especierias. Som.os obrigados ás Freiras Hespanholas do actual methodo , com que se pre- para esta massa do Cacao relativamente á quantidade do assucar sufíiciente, e á das especierias, para os que gostão delle assim feito \ que facilitou muito o seu uso, An- ',fh •|t'- 1. ■V ;'. iv'! ■yy>- ^..i*" t 1 ' ' ( 232 ) Antes desta invenção somente se delia , 011 desfazia em agua bem quente aquelia massa , acrescentando-Ihe , ao depois disto, certa porção deassucar, eespecieria, con^ forme o gosto de cada hum , quando elle fervia , o que requeria muita attenção. Chama-se Chocolate a esta massa de Cacao mis-r turada já com o assucar, e este mesmo nome se deo á bebida que se faz desta massa. Quando em outio lu- gar expliquei o modo de fazer o bom Chocolate , disse isto mesmo. Mas , não querendo deixar este artigo im-^ perfeito , tornarei a dizer , que as amêndoas de Cacao , ao depois de torradas em panella de ferro , até que sol- te a sua peliicula, se estendem sobre huma m,eza , se lhe passa por cima hum rollo de ferro , ou huma ta- boa 5 para lha separar inteiramente. Não se devem tor- rar mais nem menos , porque ambos os extremos são viciosos: joeirão-se ao depois , e estando, bem limpas de todas aspelliculas, e amêndoas defeituosas, se tornão a pôr na mesma panella a hum fogo brando , onde se mexem sern parar com huma espátula , até que fiquem as amêndoas torradas igualmente , o que se conhece pela cor fusca , prom.pta a passar-se a negra , a não se tirar logo: soccão-se n'hum pilão, ou gral , para as reduzir a huma massa grosseira , que se passa por hu- ma pedra chamada de Chocolate. Assim se chama hu- ma pedra , que se inventou para este uso. Em Marselha esta pedra são de dous palmos quadrados , curvas , como hum arco , sostidas por quatro pés , para haverem de deJJiar por baixo hum vasio , ou vao capa? de conter o fogo , que se precisa para a haver de aquentar. Es- tende-se a massa por cima destas pedras, e com hum roUo de ferro se adelgaça , e se moe com toda a for- ça , ate que fique perfeitamente fina , sem se lhe en- contrar dureza alguma. Ahi se lhe ajunta o assucar, canella , cravo , e baunilha , para os que gostião de es- pecjerias , e se torna a passar tudo com o mesmo cy- íindro , ate estar tudo bem encorporado , e misturado. O Cacao, e assucar andáo em partes iguaes , e devem ser passados por peneiras de seda , duas drachmas de canella a cada arrátel de Cacao , e duas bajes de bau- nilha. Poíido-se maior quantidade de assucar , ficará o Cliocolate sujeito aos bixos , e ^ quando se faz esta massa, se queirão lembrar desta circunstancia, e muito iiiais se devem leanbrar disto , quando o houverem de comprar , porque , sendo o assucar muito mais barato que o Cacao, e que quem fabrica o Chocolate , nao tem maior trabalho em o misturar , quanto maior for a por- ção que misturar , tanto mais avultado será o seu ganho sobre a matéria , e sobre o fabrico. Poem-5e a massa em moldes , ou formas de folha de Flandres , onde se endurece com a figura , que lhe quizerem dar. Os que gostão de cheiros , lhe deitão algumas gottas de essência , antes de porem a massa nos moldes. Mar- ca-se os páos do Chocolate na sua superfície com li- nhas a quantidade necessária para huma taça. Cada qual toma a quantidade , que for conforme á sua paixão , e i sua saúde , segundo a sua experiência. Geralmente todos oacháo bom, ç para quem viaja he hum grande soe- t ' H",i ( ^34) soccorro. Para se fazer , se põem no fogo huma choco- lateira com a quantidade de agua sufficicnte , e desti- nada a hum certo numero de taças , fervendo a agua se lhe deita o Chocolate , que se tem raspado com hu- iTia faca , ou quebrado em pequenos pedaços : mexe-se tudo ao depois com hum páo , ou molinete , e se tor- na a pôr em fogo brando a chocolateira , onde se deixa estar mais meio quarto de hora , mexendo-a sem ces- sar 5 para impedir o entornar-se , e para o fazer espu- moso totalmente , e assim quente se deita nas taças , pois esta bebida deve ser tomada quente. Este he o inethodo , com que se faz em toda a Europa , com al- gumas pequenas mudanças , conforme o gosto particu- lar de cada hum. Os visinhos das nossas Ilhas o tomão de huma maneira particular, que pensão ser melhor que acossa. O P. Labat, bom conhecedor de iguarias , louva muito o methodo, com que elles o fazem.. Será melhor, mas requer maiores trabalhos. He o seguinte. Quando se faz a massa do Chocolate , não se lhe mistura assucar , e assim se passa pela pedra. Raspão-se os páos em pro- porção de huma onça para cada taça , ajuntão-se-lhe hu- ma onça de assucar , duas pitadas de canella , passada pela peneira. Feita esta mistura , se deita em huma cho- colateira com hum ovo fresco , gemma , e clara , ao fogo , ou banho maria , isto he , em hum caldeirão de agua quente. Continúa-se a mexer fortemente tudo com ©molinete, cu páo, até formar a consistência de mel , c se lhe deita dentro huma taça de agua fervendo, hu- imma colher de agua de flor de laranja com âmbar , e se torna a pôr a chocolateira ao fogo, e á medida que a espuma se levanta , se vai derramando nas taças. Algumas vezes se servem, em lugar da agua , de leite puro , ou ametade de huma amctade de outra , segun- do o capricho de quem o toma. Concordo em que o Chocolate deve ser summamente agradável, e nutriti- vo ; mas não saberia dizer , qual fosse mais saudável. A clara de ovo desfeita , e tomada com o Chocolate , o deve fazer de alguma sorte indigesto. He verdade que, fozendo-se desta maneira , só se lhe deita o assucar , e a caneila , que se julga conveniente , e que se não esti obrigado a tomallo, como se vende : satisfaz-se mais ao gosto ; mas náo se podem fazer os páos como se querem , e a pena sobre-puja ao gosto. Propriedades do Cacao,. Os Médicos imaginarão que o Cacao era frio de sua natureza : a experiência tem mostrado o contrario , e o seu amargo assas o confessava. Na realidade he hum .alimento muito temperado , e de fácil digestão, pró- prio , pela abundância do seu óleo , e de seus sulfures , a reparar com promptidão as forças can.çadas, ou inani- das. He hum fructo de vida para os velhos. Já se tem dito o modo de o preparar , para áúIq se fazer o Choco- late. As.^ás se tem patenteado o gosto da Nação por esta bebida ; e por isso não temos necessidade alguma de m.ostrar es seus prx)veitos. He façil.em se preparar, de 'í'- C ^36 ) de huma grande commodidade para os que viajão , o de hum grande soccorro para a economia da vida. Os estudantes , e artistas , podem , tendo tomado huma taça de Chocolate de manhaa , poupar o almoço sem perda alguma de temipo , e conheço miUitas pessoas, que -só usão de huma comida , tendo tomado esta bebida , que se pôde , sem escrúpulo algum , usar delia duas horas antes de se deitar. Os Hespanhoes encarecem sobre ma- neira suas virtudes , e a julgão tão necessária que pare- ce que a vida não poderia subsistir sem ella. Nós a juL gamos saudável , agradável , e de pouca derpeza. Isto nos basta. He certo que, preparando-se em casa , pode- rá chegar seu custo a dous soldos a taça, sendo Cacao das Ilhas. Também se fazem doces do Cacao , e se lhe tira hum óleo , conhecido pelo nome de manteiga de Cacao. Para o doce se precisa cscolhello m.eio maduro , e tello de infusão cm agua cinco dias , mudando-o to- dos os dias manhãa , e tarde , enxugallo bem , efardeallo com tiras de casca de cidra, preparar a calda, e fazer tudo o mais , que se faz com o doce de nozes. Faz-se a manteiga ào Cacao , tomando-se a mas- sa do Cacao , ao depois de bem moido na pedra ; dei- ta-se n'huma caldeira de agua quente tanta massa , quan- to houver de agua , faz-se evaporar toda a agua em foíro de carvão , enche-se de novo a caldeira de agua euente, o azeite sobe á supeificie , e se coalha á pro- porção que a agua se esfria, se este azeite não for as- sas branco , seiã, este hum signal de que não foi bem des- ■V4 C ^37 } despojado ; neste caso precisa-se tornalJo a deitar em agua quente, porque todos os corpos estranhos se pre- cipitarão no fundo, e somente ficará sobre a agua lui, mu gordura branca da consistência de manteiga , que se endurecerá como o queijo. Nós atemos em França , nesta consistência, sem cheiro algum, c que se derteti ao menor calor do fogo , sem jamais criar ranço. Fa- zem-se com assucar cawdi, outro tanto, rebuçados ex- celleiítes para os defluxionarios , e moléstias do peito. Junto com óleo de Ben , se fazem pomadas , cujo uso , sem dúvida , he assas conhecido pelas senhoras ciosas em conservar a belleza da sua còr , que ella reestabe- lece sem deixar vestígio algum de gordura , e luzidio. Cura a§ impigens , e todas as moléstias cutâneas ; pa- cifica as dores do rheumatismo , misturado com alvaia- de: he hum remédio soberano para as hemorroides. Os Boticários só deverião usar esta manteiga na composi- ção dos seus emplastos , por nunca criar ranço. Na Historia doCacao de M. Caylus sq km pommadas espe- cificas contra muitas molestií compostas com manteiga de Cacao. Só direi huma palavra mais sobre as suas pro- priedades para as pessoas idosas , cuja pelle tem perdido a sua macieza , á força de rugas, que leestabeleceráo com esta manteiga o movimento dos músculos. Nao fallo das armas, e instrumentos de ferro , que eila pre» serva da ferruo-em. Citm- Commercio éo Cacao. O descobrimento d'America pelos Portugaezes ,• e Hespanhoes , fez entrar no commercio hum grander numero de géneros , que nos erão desconhecidos. O Cacao he hum destes , e por consequência omittida nas tarifas. Só do meado do ultimo Século (1650) o principiámos a usar em França. Os Hespanhoes erão os que nos administravâo. Os Portuguezes , e Hollandezes ,. ao depois repartirão com elles este commercio , de que nos appropriámos pela cultura que fizerão os moradores de nossas Colónias dos Cacoeiros. Na Historia do Caf6 se vio o privilegio exclusivo para a venda do Chocola- te , concedido no Edito de Janeiro de 1692 ,-e os direi- tos que se impozerão ao Chocolate, e Cacao, em 169^. líão os repetirei.- A grande taxa deste direito suspendeo a actividade deste ramo de commercio , e só vinha a Marselha o Cacao , que se deveria transportar para Ila- lia , ou o necessário para o consummo de seus mora- xlores. Só em 1717 > e 1719- foi que os direitos do Cacao das Ilhas Franceza-s se reduzirão a dez por cento corn- o que o seu commercio principiou a florecer. Marselha recebeo. muita, e seu uso se fez mais geral. ME- c 259 :) MEMORIA XI. SOBRE O CACAO , E CHOCOLATE Por M. PeJlisard. Em íjue se examlnão os proveitos^ e inconvenientes ^ (jtie podem resultar do uso destas substancias allmentosas. Tudo fundado na experiência , e exames analjjticos da amêndoa do Cacao, PARTE I Do Cacoeiro ^ e seu fructo. CAPITULO I. Descrlpção do Cacoeiro ^ e seu fructo. V_/Cacao, propriamente fallando , he huma amêndoa contida em hum fructo muito grosso, que gosa da fi- gura de hum pepino, ou hum melão de gomos. Tqvú oito para dez polbgadas de comprimento , e três para cua- C 240 ) quatro de diâmetro. Chama-se á arvore , que o produz ,■ Cacavíi , slve orhor Cacarljcra Mexícanorum , ciijus frit- ctas Cacao Americana slve A-^ellitiia Mexicana. Thcohroma Joíiis lntec;errlmls. Hoit. Cliftort J79, Ca- caoyer,- oti Cacaotier (em Portuguez , Cacaoseiro , ou Cncoeiro ) . Esta arvore he natural das índias Occiden- taes na America , e das Illias de Jamaica , Martinica , das margens do rio Amazonas, lugares,, ou Costas de Caraça ; e de outrOs muitos da Zona toírida no vasto continente deste novo mundo. O Cacoeiro se veste ccncinuamente de fofhas , flores, e frUctos. Este fru- cto , chegando á sua grandeza' , he íiuma espécie de capsula vermelha , ou branca , ou misturada de ver- melho-, eaTfiaTelío. Estas Variedades, da còi do seu tra- cto não constituem espécies diíferentes , e por este" iTiotivo, disse (7 Senilor Toúrneforf , que só conhecia huma única espécie. M. deCaylus, Engenheiro Mór do Kei nas Iliias- Frtvncezas da' America , e O P. Labat ,. Dominicano, que estiveiao muito tempo nestas Ilhas,- certific-âo que somente- se óà huma única espécie. O fructo desta arvore , sendo nova, encerra kuma sub- stancia branca ,■ viscosa , de hum acido 'agradável ,• e de cuinze até vinte e cinco amêndoas, rara vez mais ,^ e nunca menos. O Cacao , portanto, he huma espécie de atnea- cfoas, que, debaixo de huma peliicula entre parda, e clara , avermelhada , contém huma substancia de huma fcella còr de pecego , cheia de desigualdades , que pene- trão , c varão todo o seu interior , como se ella fosse di- dividida em ínuitos lobos , de hurri sabor muito ur> ctuoso, misturado eom algum amargo , e de alguma ligeira estipticidade: Talvez esta amêndoa he a mais oltos^ de todas as qUe se conhecem ; porque se sabe j conforme as experiências de M. Hombetg , e de outros Académicos ^ que ella pode dar mais da ametadé do seu peso de substancia gorda aSsim por cozimento , co-^ rho por expressão, e por distillaçlo , o que, como ao depois Se verá, o temos verificado. Mas está amêndoa do Cacao ^ além dá grande doçura do óleo , de que he abastecida j tem a preciosa Vantagem dé nunca se al- terar, ou criar ranço; Examinei msinteigá de Cacâo de dezoito annos, e a achei tão boa , e tão doce, como se fora recente 5 e fresca totalmentei 5. I< O Cavao he a base do Chocolate^ Todos srfbem qtie d Cadào forma á base dests bebida , que se faz de huma espécie de massa feita des- te fructo ligeiramente torrado, assucar, e algumas es- pecierias, moido tudo muito bem, eertcoíporado jun- to com toda a perfeição : de que se faz huma bebida mHito substancial, e alimentosa; O Chocolate, sendo bsm feito, se conserva,- e guarda por hum grandtí nu- mero de a^nos sem mudança alguma. Eu o vi que ti- nha de trinta para quarenta j e e$tava tão bai-ft , que parecia haver pouca tempo^ , em que se tinha acabado" de fazcrr. He verdade que , para o conservar assim , se faz preciso guardallo cm lugares seccos 5 porque se fo- TAlhF.llh q ,,,^ 1 ■''■:,'.; 1 \ rem fiumidos, se arruinará. Mas queiráo ofescTvaf, qófe o bolor que cria , com fudo , he mui ligeiro , e não "tem o cheiro , e sabor do mofo, ou bolor ordinário. O Assucar talvez seja a causa deste mofo , pois entr» na composição do Chocolate. Todo o mundo sabe que, esta substancia salina he múi susceptível de humidade.- O uso do Chocolate ^cua ar mais remota antiguidade. Conquistando os Hespanhoec o México em 1520, já cf acharão estabelecido. Estes, e os Portuguezes , forão os primeiros Europeôs , que o conhecerão, e que o usárão= por muito tempo ,. antes de participarem as outras Na- ções o seu uso, mas , sabendo-o estas y. começarão a cultivar esta preciosa arvore j e a formar com cilas lin- dos vergéis , a qUe ckatnárão Cacoaes ^ ou Cacoeiraes. G primeiro foi plantado em Martinica , junto ao anno de 1660 y por amêndoas tiradas do matto por M. Du- parguet.. O grande tísQ, que ao depois se fez por toda a Europa do Chocolate, formou do Cacao, que he^ a sua Base,, hum grande ramo de comraercio entre a Ameri- ca , e a nosso. Continente ^ pela intervenção dos nossos grandes Negociantes^ §. lí. Açtmlmente se (íistíngítem três series de Amen" doa-s di CúSífo, Os Mercadores Especieifos , qtie lhes vem o Ca- são de primeira mão, presentemente o distinguem em três espécies; principaes. Primeira : Cacao de Caraça. Se- gunda : De Eerbichc ou d» Costa* Terceira : Das Antilhas.. Não Náo lia ) com tudo , piecisío al^iuma de admittit tantas espécies deCucoeirosi porque unicamente ha hu- ma arvore, (a pesar de M. Linne Jembrar-se de a!<^u- ma mais) como já disse, que a mesma produz diffe- rfcntes frUctos , qile contém estas amêndoas , è que es- fes realmente náo differem eíitre si , senito pela varie-' dade da còr da sua capsula ^' e qualidade das amêndoas , que contem. Esta ultima diffcrença , que fie a essen- cial , nasce da natureza dos (jaizes ^ da cultura , e da qualidade dos terrenos, em qiie se crião os Cacoèiros è também d.1 sua idade , da sua grandeza , ou do vi^^oV da arvore, que produz o fructo ,- e, igualmente, da ésicolha, qiie se faz, das síias amêndoas i' para se terem as mielhores , e maii bem níitridaSi A amêndoa do Ca- tão , de si mesma he inalterável , sendo Colhida j è tira- da da ^ua capsula ,- ou cabaça , bem madura ,- e como deve Ser, A massa , que se faz desra amêndoa bem tòr- facia , e não se lhe pondO o assucar, áe conserva, é guarda, par dilatados annos,- com toda a sua: bonda- de , c deste modo nos tem vindo algumas vezes éé Turin , de Hespanhá , e ,■ aincfa , da mesma America.' Apesar drstd,- devemos f^zer aig-Jma escolha importan- te no Cacao. Trazem-no de differente? lugares da Amé- rica j tí trímbem de ditlsrentes sortes , ma;scomo a Ame- rica seja a única parte do mundo conhecida, que pio- duza este fructo, realmente estas amencíoas, mais òíf j^eno, ,. tem alguma supeTiorld^de nas siías- qmlidádèS;- m 0^ §-• Hl.- (244) ■■È / - \ 1 1 '■ ; ^ •:>,; §. III. Cíicao ãe Cavaca^ a sua peJIlciiía he salpicada . de pequenas partículas brilhantes. Este he o melhor dos que os nossos Mercado- res vendem. Ainda que a temperatura do ar em as. Costas de Caraça, donde nos trazem este Cacao , seja como dizem y o mesmo que a de Martinica , com tudo y este Cacao he mais unctuoso , e menos amargo que o dç nossas Ilhas. A maior parte destas amêndoas , se a^semelhão muito , em quanto ao seu volume , e figu- ra , ás grandes amêndoas doces , ainda que menos cha- tas , e menos regulares em sua figura. Alguns acredi- tarão que a tinhão , conforme ás nossas favas , na ver- dade algumas se assemelhão , mas isto acontece na me- nor parte. As menores tem de dez a doze linhas de comprimento, e cinco a seis de diametra, ou giossu- ta. São cobertas de huma pellicula delgada- , se bem mais grossa que a das outras espécies de Cacao , provi- da de linhas ,, algum tanto salientes , que chegão a ambas as extremidades, secca , de côr trigueira, aver- melhada , e que se despega mais facilmente da amea- doa. Hum signal distinctivo , e bem singular, pelo qual os nossos Negociantes reconhecem o verdadeiro Cacao de Caraça , são as pequenas^ palhetas lustrosas ,. e brancas , como a prata , de que a pellicula da amêndoa st acha semeada. Estas só são partículas talcosas da mica cr^^cntea alba , ou ar^entim filUm , que se lhe ajuntão ao C 24? ) ■ iqiieno Garaca , mas esta distinção somente se funda n^ pscolha das amêndoas. Como as folhetas talcosas , que se achão sobre a pellicula das amêndoas do Cacao deCaiaca, ihe sejãq estranhas, e se Ihg podem tirar pelo transporte, e agi- íaçlo destes fructos nas b^irriças ^ ou sacços , se reco- nhecerá sempre a belleza , e grandeza da amêndoa , cuja substancia he de huma bell^ cpr de castanha , que se faz ainda mais brilhante por huma leve tostão, ou torradura , e também pelo seu sabor , que he ;nais dor çe, e majs unçtuoso que o dos outros Cacaos , acom- panhado de huma ligeira amargura , e alguma adstrin- gência , e de hum sabor ^^gradavel de avellãa. IViasti- gando-se a amêndoa do Cacao de Caraça, e engolindo- se por sucção, ao mesmo passo, toda a substancia bu- byrosa , e extractiva , se lhe derrete na bocca , fica-lhe mui pouco marco, que tem huma linda còr de canel^ l3 , em lugar que os outros Cacaos examinadoç do mes- mo modo deixão mais marco em a bocca , maior amar- gura , e adstringência , e o seu residuo he de huma côr m.enos amarella ^ tirando sobre a trigueira, e par- ticularmente o Cacao das Hhas. O P. Labat , que nos deo huma ampla historia deste paiz , parece não dar iriaior estimação ao Cacao de Caraça , que ao de nossas Ilhas , bem escolhido. Entre tapto , não se pôde recur sar a preferencia ao de Caraça , sobre 05 de mais Ca* caos , a não tçr elle perdido por huma grande antigui^ dade as suas boas qualidades,. §. IV. I .If (247) §. IV. Cácsa (Je Berhlchc , ou ãa Costg. O Cacao de segunda qualidade , que os Nego- ciantes chamão de Berbiclie , ou da Costa provavel- mente lie o que nostrayem de São Domingos , da Jamai- ca , eCuba que na realidade he maior que o das Anti- lhas, e se aproxima na boiídade ao de Caraça. Cobre-sc a sud amêndoa de huma pellicula , com pouca differença , da mesma grossura que o de Caraça , mas he totalmen- te trig-ueira , gu de hum vermeliio escuro , aijida ao -depois de lavadas. Nota-se sobre a sua casca nervos, ou iinha-s traçadas em fórma de raios divergentes, que vão de huma a outra extremidade, onde se unem como i:obre o Caiaca , mas inejios sensíveis , ou salientes. A pellicula deste Cacao de Berbiche he salpicada de par- tes térreas, e arenosas; e se lhe percebe alguma partí- cula brilhante , talcosa , e argentada , como tem as amêndoas de Caraça. Provavelmente se enterrará também o Cacao nestes lugares ., para o fazer ressuar, se bem que o seu terreno he purament-e arenoso , e náo talco- so. A amêndoa , por baixo da pellicula , he de huma cor escura avermelhada , mais forte <]ue o de Caraça ; assemelha-se quasi na doçura , mas contém alguma cousa menos da substancia unctuosa. Este Cacao he mui sujeito a ser furado pelos bijCòs, o que parece f*- 2ÇX o elogio da sua qualidade. % r. §. V. Cacao das Jlfias, Este hc o menor de todos , e inferior na qua- lidade. Distingue^i-sç pelos Negociantes duas espécies, primeiro de Caiena , segundo o de Martinica. O primei- ro se diz ser rpais doce que o segundo. As amêndoas destas duas espécie^ são mui pequenas, oblongas, po^ rém chatas : não se lhe notão partículas térreas , e arq- entas como po de Careca , e da Costa. A su^ substan- cia medullosa puxa mais par^ a cor trigueira que parg vermelha. Não sendo o Cac^o das Ilhas muito antigo , o seu oiço ou a sua manteiga não deixa de ser de mui- to bpa qualidade , deixando na bocça hum sabor fresco , e agradável ; porém consta de menos partes gordas , e balsâmicas qye o de Caraça ; se este não for muito secco cjTi razão da sua antiguidade ; porque então o cjas Ilhas , novo , e bem escolhido , seria certamente me^ Ihor que o velho de Cpraca , cujas partes balsâmicas , c piais subtis se tçrão dissipado pelo grande lapso do tem- po. Este tem de ordinário dobrada grandeza que as me- lhores amêndoas , com o duplo do s,eu peso. Nota-se que as amêndoas do Cacao geralmente adquirem a do cura , envelhecendo-se , e que perdem por tanto a su<» íispereza, e amargura , que tem no primeiro anno de colhidas. Dcverse çoi-n tudo considerar qi^e a aspereza, c amarr,ura deste fructo não tem quasi qualidade algu- ma nociva , mormente , estando envolvido em huma ini^i grapde q\iaptidade de parles subtis oleosas , que C 249 ) effcctivamente se aio no Cacao. Estas sao as diffcren- cas essenciaes, com que os nossos Negociai\tes julgao os diffeientes Cacaos , que vendem, e não se pôde negar a sua admissão até hum certo ponto , ou que estas nas- ção da qualidade dos terrenos , em que se crião , ou do escrúpulo com que se colhem , fazem ressuar , e seccar o fructo, ou da escolha, que fazem das amên- doas já scccas , antes de as ensaccarem , ou embarrica- rem para as remetter. Todas as espécies de amêndoas do Cacao são cheias , como tenho observado , mais que outro qualquer fructo de huraa porção butyro- oleosa , que he de muito maior doçura , e que excede a todos os de mais fructos oleosos , cm nunca crear ranço , ainda que não falta quem diga o contrario. Dis- to se não deve duvidar. Está muito confirmado pela experiência. A parte oleosa , ou butyrosa , que se ex- trahe na America do Cacao novo, ou recente , tem mui- to pouca consistência , ou solides ; alguma vez se usa nas cozinhas em lugar do azeite,, ou manteiga de vac- ca ; as quaes he mui superior , poique o fogo lhe não communica cheiro , sabor rançoso 5 ou fedorento. A manteiga , extrahida em França , das mesmas amêndoas tem a mesma doçura , mas he duríssima , e se quebra como f^z o çebo de carneiro, ou de bode. CA- ■■ ' í i ■'♦^; >!' c *5o :> CAPITULO II. Analjjsç dp Cacao Jelta por dlfferentes Sablot. o Senhor Hoíuberg , Sábio Membro da Academia Real das Sciencias de Paris , submetteo o Cacao a ana- lyse da expressão , ebulição , e distilacão. O Senhor Ray, também fez a sua analyse , como o Senhor Cay- lus, Eiie diz que, pondo oito onças de Cacao em fogo de reverbero por vinte c quatro horas , lhe resultou três onças e meia de hum óleo vermielho , côr de san» gue , e coalhado, muito aromático, carregado de mui- to sal volátil , e duas onças de espirito penetrante com hum cheiro assas agradável , que continha muitos prin* cipios ácidos. O Historiador d' Academia das Sciencias , diz que duas libras de Cacao cru produzirá pela analyse muitos riquor^,s misturados de sai acido , e acre , e quatorze onças 5 e quatro oitavas e meia de óleo , com quatro oitavas e dez grãos de sal mui lexivioso. Mas não fez menção alguma de sal volátil. O Senhor de Caylus , na sua Historia natural do Cacao, diz que fizera também a sua analyse Chimica , e que lhe extrahíra duas qualida- des de óleo , que se não confundião , hum volátil , e branco , e outro vermelho , e que este ultimo era mais fixo que o outro, precipitando-se sempre no fundo, á semelhança dos óleos que o Senhor J^oyle diz que tira- rá -.Sfi. C 251 ) TÀ do sangue humano , o c|ual só se misturava com o .oK'o, e agua. O Senhor de Cj\ lus diz mais: oiie o espirito tirado do Cacao não era desagradável assim ao gosto, como ao cheiro 5 e que elle não fernientava sni}- sivchnente com os alkalis , nem mudava de sorte algu- ma a cor do papel azul ; porem que no decurso do tcmpò este espirito se voltara acido , e que no decur.s/3 da sua operaCjão não virá indicio algum de sal volátil concreto ; que o çapnf mortiium calcjpado era tão pouco salgado que escassamente poderia tirar seis grãos de sal fixo mui j)uro de hum arrátel de Cacao , que tinha su- jeitado a esta experiência , se intentasse reiterar as ííl- tracóes , e evaporações. O Senhor de Caylus çonclue , do seu exame analytico , que o Cí^cao he talvez hum mixtOj em cuja composição entra meno^ sal. Nós ver remos que, se elle isto prolerio , foi por não ter levado piais avante as suas indagações. /VI. Lemery disse, pelo fontrario , que o Cacao continha sal voiatil, CA- C2)0 CAPITULO iir. Nova anaíyse do Cacao. A-se huma tão grande differença no resultado do Cacao , posto entre as mãos destes sábios , que julguei dever por mim mesmo certiíicar-me dos verdadeiros princípios que podião entrar na composiCjão destas Ame- ricanas amêndoas. §. I. Tintura, amarga. A tenacidade da substancia butyrosa , que con- tém o Cacao, me pareceo muito grande, para poder ser esbulhada pela expressão ; e por isso me resolvi a em- pregar a ebullicão. Consegui por meio de quatro ebul- liçóes tirar de huma onça de massa de Caoao , ligeira- mente tonado , três outavas , e quarenta e dous grãos de manteiga mui pura , de hum branco amarello , du- ro, e quebradiço, de hum sabor smnmamente doce, c agradável , que conservava o do Cacao. Observei, que , deitando hum pouco de sal alkali nas ebullições , era hum meio seguro , para lhe extrahir mais partes bu- tyeosas. O sal mediante á penetração , se insinua nas partes térreas , rompe as cellulas , que retém as partes gordurosas , e as obriga a virem sobre-nadar na super- fície da agua , sem se unir ao alkali , por não ser assas po- (2>0 poderoso , e estar muito affo^ado na a^ua para se ap» piopiiar a parte butyiosa , e cjiiebradiça , e formar com eJla hum corpo saponaceo. Houverão de certo partes butyrosas perdidas nas ebulliçôes que fizemos. Deve-se fOr tanto avaliar, sem temer ajgum enj^ano, que se pôde tirar das amêndoas do Cacao ametade do seu pezo desta substancia unctuosa, o que concorda assas com os productos que M. Homberg tirou do Cacao submettido aos mesmos exames. A massa do Cacao feita nas Ilhas , rratada da mesma maneira , pareceo prodwcir tanta , cu pouco mais de manteiga, que a que se faz na Europa. A agua, que resultou das ebulliçôes levemente alkaiisa- das, formou huma tintura avermelhada de huma agra- dável anpargura. Podia-se empregar esta tintura em Me- dicina com bom effeito em muitas circunstancias , ou rssta forma liquida, ou reduzindo-a a hum cxtrjcto. 3em embargo de ser a ebuilição hum exceJlente ÍTieio para extrahir todas as parles gordas do Cacao, ou huma mui gr; nde parte, com tudp náo nos faz conhe- cer exactamente iodos os seus principios. Precisa se pa- ra isto submcttelJo á acção dç hum fogo bem gradua- do. Ora, para proceder com ordem neste geneio deexa- ine tão delicado, fiz encher pela amétade huma retorta de viJj-o lutada íoncata ^ com três onças de bom Cacao. d^ Caraça, mondada de .ua pelhcula, e s.ummame«.le secco, sem ter sido torrado antes. Posto ao depois ova-, sp em hum Corno de reverlpero, e adaptandolhe hum ^ailáo de vidro , que levava seis para sete canadas e. ír.eia. Deitou^se-lhs o, fogo , no prmcipip com gr,u>. de (254) de moderação , e era de carvão de padeiros. Passadst meia hora do primeiro calor , se formarão no bico d* retorta gottas de hum espirito muito limpo. Para po- der julgar exactamente da qualidade das producçóes , o- ballão foi unido á retorta somente com hum linho en- sopado 5 o que facilitava o tirallo em cada mudança de fenómeno , que a operação apresentava , para lhe contestar bem os productos. Examinando este primeiro espirito , achei que tinha hum cheiro , e sabor aromati» CO muito agradável , misturado com hum pouco dfr empyreuma , mui pouco acidulo , avermelhando fraca» mente o papel azul. §. II, Oleo etherea coalhado. Nenhum sal vólatit concreto. Pouco tempo depois , sahio da retorta hum va- por branco , mui leve , que depositava na parte supe- rior , e interna do collo do ballão hum óleo coalhado butyroso fino , branco , tendo hum cheiro , e sabor aromático muito engraçado , hum pouco picante na língua , porém menos do que o costumão ser ordinaria- mente os óleos essenciaes aromáticos , finos , e ethe- reos. Ao depois disto se lhe augmentcii o fogo alguns ráos ; vierão os vapores brancos em maior abundân- cia 5 e condensando se , produzião constantemente hum óleo branco que coalhava pelas paredes do vaso. Ao mesmo tempo também cahião ào. bico da retorta got- tas limpas , avermelliadas , que erão aquosas , e oleosas. Os (=55 ) Os vapores então entrai ão a eni i aquecer- desenvolvi* das huma da outra pela acção do fogo não se mistu- rassem. Ficava no ballão com os óleos derretidos hunt' pouco de liquido espirituoso, amareUo , e turvo, que por tudo pesou nove oitavas. Ainda estavão unctadas as paredes do vaso com quasi duâs oitavas de substan- cia butyrosa , que se tirou com agua quente. Além d is- "■■*í , C^57 ) dtsto havia no collo da retorta óleo coalhado , mui escu- ro, que se tirou , chegundo-Ihe hum poucp de fogo por baixo. Pesou este huma oitava , c se derretia ao menor calor , mas coalhava-se ao ar com a mesma facilidade : o seu cheiro com pouca differença era igual ao que tinha passado pelo ballão , se bem alguma cousa mais Cmpyreumatico. O total deste resultado Vem. a ser onça e meia de producções oleosas, e três para quatro oitavas de espíritos aquosos* O caput mortutim , que fi- cou na retorta ^ pesou cinco oitavas e meia , e se veio a ter duas para três oitavas de perda , ou que escapou pelos vapores , oti pelo que ficou nos vasos , que ao justo não se podia avaliar. Desta analysc consta , que o Cacao , pelo menos -, tem am.etade de seu peso de partículas butyrosas , das quaes passo a dar o exame ^ como também dos outros seus princípios. §. IV. Oho fino ethereo, Estando asáás persuadido que aS ptoducçôeíí bu- tyrosas , resultadas da operação j que individuei , conti- nhão partes oleosas ethereas capazes de serem levadas pela agua , por meio de hum calor brando , se pozerao em huma eucurbita de vidro todas as producçóes oleo- sas, ô espirituosas, tiradas dp ballão , e quasi três quar- tilhos , óu meia canada de agua quente , que tinha ser- vido de tirar tudo o que podia ter ficado pegado pelas paiedes do vaso. Ao depois se poz a eucurbita com o seu capelo em hum banho de areia , cujo fogo no prin- T. JU. P. XII. R ^ ci- •m i I" I'l dpio foi brando. Com este gráo de calor se levantarão partes oleosas. Augmentou-se o calor ate fazer ferver » agua ligeiramente , continuou a levantar-se hum óleo" mui fino , claro , e algum tanto da còr do âmbar , mas í)ão houve indicio algum de sal volátil concreto , o que de mais a mais confirma não o haver debaixo des- ta forma. Por este meio se obtiverão três oitavas de hum bellissimo óleo ethereo , que se não coalhou , tendo o cheiro , volatibilidade , e a penetração do óleo ani- mal de Dlppalíus ^ do qual se conhece as grandes pro- priedades que tem contra a epylesia nervosa , a mais temivel de todas as moléstias que pode padecer o sys- tema dos sólidos. Mas o óleo ethereo do Cacao tem a superioridade sobre o óleo de Dlppaliics em ser o seu cheiro , e sabor , muito mais suave. Não alterou a còr do papel azul cousa alguma. Póde-se, por tanto, pre- sumir com fundamento , que o bálsamo ethereo do Ca- cao deve ser muito amigo dos nervos , ainda que não seja tão desenvolvido , como este , na amêndoa que o - contem 5 senda necessário , com tudo , confessar nellas a sua existência , a qual talvez será por hum modo mais analepíico , e mais amigo do género nervoso. §. V. Espírito Recton A única, e ligeira torrefacção, que se dá ao Ca- cao , para se fazer o Chocolate , basta , para favorecer o primeiro desenvolvimento deste precioso bálsamo , e se deve attribuir a estas finas partículas , e etheieas o ef- effeito cordeal , e repentino que se sente , quando Se toma hum bom Chocolate , e bem feito , sem que se haja de acrescentar especieria alguma : qualidade que se transmitte aos nervos , ainda antes que esta substancia tenha tempo de se cómmunicar ao sangue por via do chylo. O Senhor de Caylus conheceo muito bem este bom , e prompto effeito , e o attendeo com particula- tidade : circunstancia feliz na acção do Chocolate ; mas que nao deve causar admiração ; porque este óleo fi- no , ethereo , e aromático , de que o í^acao abunda contém todas as riquezas do espirito rector , que o o-ran- de Eoerhave recoiíheceo em todos os vegetaes ódorife- íos , dos quaes com grandes elogios celebrou as suas cxcellentes propriedades. Quando se não levantou mais ó oled etheréo, se deixarão esfriar os vasos. No liquido aquoso qiie ficou na eucurbita , se encontrarão sete para oito oi- tavas de hum óleo negro coalhado , de hum cheiro rnuito cmpyreuraatico , mas de hum sabor mui doce na lingua , deixando-lhe apenas , ao depois que se pro- va , hum gosto pouco picante. Misturou-se , com huma porção deste óleo espesso , algumas gottas de oleo ethe- reo , para examinar de novo , se a grande tenuidade deste , impediria que se não misturasse com a parte grosseira , e butyrosa ^ como diz o Senhor de Caylus por estas palavras: Estes doas oJeos não se confundem , e o vermelho mais fixo que o primeiro , sempre se pre- cipita no fundo : aconteceo o contrario ; pois o oleo fino etherso se misturou inteiramente com o oatio, e ain- 3 R 2 díl ( 26o ^ ,;:'i' i •'■'; » ( M' ,1.' ( l » ■.!;„,, 1 ' :y . ',»■ ■ i 1 da estancio frio. A mistura se executou muito melhor, e com m.aior proi-npíidao a hum calor brando ; e es- friando , ambos juntos formão hum corpo butyroso mui- to homogéneo , da qual se não separarão , senão algumas partículas aquosas , que ficarão i^o olea butyroso negro , tirado por cima da agua , onde sobre-nadava na cucurbita. Isto 5 com tudo 5 não embaraçou que o Senhor de Caylus não concebesse , acerca desta substancia oleosa , fina , hum juizo mui verdadeiro , quando disse : que estava plenamente convencido que o Cacao continha na \'er- dade este óleo volátil, de tanta estimação na Medici- na ; e que se não devia procurar em outra parte a causa da prompta reparação dos espiritos cansados , confir- mada pela experiência diária do uso do Cacao. §. VI. Sal fixo aíkaíi. Substancia taJcosa. O capiit mortutim , ficado na retorta , proveniente das três onças do Cacao submettidas á experiência da djstillação 5 que pesava cinco oitavas e meia , era em pedaçQS negros , da grandeza das amêndoas , duros , ten- do a sua superfície de huma còr azul , ou de pescoço de pomba , que o Senhor de Caylus observou , e que chamou vlohie. Perdeo-se esta còr no espaço de dous ou três dias, ficando negros os carvões. Então não ti- nhão sabor algum. Po^erao-se em bum cadinho de AI- lemanha mui limpo, e se tapou ligeiramente para lhe entrar algum ar, e sahirem os vapores fuliginosos. Ao depois se poz sobre brazas. Continuou-se-lhe hujn fogo for- M*í forte por muitas horas. Estando o cadinlio meio frio, SC achou huma cinza branca em torrões, como os das cinzas gravelladas bem calcinadas ; a qual , sendo pe- sada , ainda quente , pesava huma oitava ' : tinha hum sabor salino alkalino muito forte , e humedecia promptamente posta ao ar. O ferro cevado nada at- trahia. Deitárão-sc nestas cinzas cinco a .seis onças de agua da chuva fervendo: íiltrou-se este liquido, e, fi- cando muito'claro, deixava na lingua huma impressão alkalina , maior que a da cinza. Fez-se-Ihe huma segun- da lavagem com duas onças de agua da chuva quente , dei/-ada sobre o marco , ou sedimento , para lhe tirar perfeitamente o sal. Pozerão-se a evaporar estas lava- gens , em banho maria , em hum vaso de vidro. Sendo este liquido , reduzido a duas onças , se achou pegado pelas paredes do copo certa substancia branca , terrosa , e fina. Também a havia igualmente no mesmo liqui- do , á maneira de huma fécula ligeira , que , estando di- vidida , e examinada a todo o ar , e ao sol , parecia ser composta de huma infinidade de particulas luzentes, em folhetas muito finas, como de talco, ou malaca- cheta. Separou-se pelo filtro de papei esta substancia, e , ao depois de secca , pesou escassamente hum grão. Es- te liquor filtrado tinha hum sabor alkalino mui forte, decompondo a saliva , deixando-lhe escapar as partes ourinosas, comiO o fazem todos os alkalis salinos fixos ^ í; Depois áe se terem lavadas as cinzas , e seccas , só pesarão quarenta grãos , e por consequência as lava- gens tinhão diminuido trinta e dous grãos da substan- cia salina. Lavadas , c seccas estas cinzas , erão de hu- ma côr branca , manchada , com particulas avermelhsH <(das 5 que se não percebião muito bem , a não ser soc- çorrido por hum vidro de augmentar , cujo foco tivesse huma poUegada ; porém muito melhor , por meio de hum ferro cevado , pois que com muita facilidade as attrahia de tal modo que as particulas brancas , que não erão attrahidas , estavão unidas a molleculas averme- lhadas. Esta circunstancia prova evidentemente que se llão particulas férreas nas amêndoas do Cacao. Com ef- feito : quaes são as substancias vegetaes , que , sendo bem examinadas , rmo mostrão porções deste minerai ? Kinguem deve desconfiar que as taes particulas férreas viessem de outra parte , que não fosse do Cacao , vis- to terem os vasos , empregados nesta analyse , sido {muito limpos. Tendo-se evaporado o liquor alkali- no em hum banho de areia mui brando , no fim se formou huma grande quantidade de crystaes chatos , e brilhantes , como os áo sal sedativo. Deixou-se evapo- rar tudo até ficar secco todo o liquido. Poz-se o vaso em huma casa subterrânea inclinado para deixar cahir -per àellquium todo o alkali que se poderia derreter pe- Jfi buipiclficlçç (2fi5 ) Decorrido hum mez , se achou no vaso de o teceber per delit^nium hum liquor muito cJaro. que ti- nha , alem do gosto , todos os signaes de hum alkali salino muito puro. No vaso inclinado ficaráó muitos crystaes finos, e chatos, de que temos fallado, mas ainda húmidos. Deitou-se-lhe ao depois algum espirito de bom vinho, para os lavar, e se pozerao na estufa a seccar. Eião , quando seccos , de hum branco sujo , em folhetas delicadas, e brilhantes , que nesta figura se pa- recião assas com o sal sedativo. Rangião alguma cousa postos entre os dentes, deixando na lingua hum leve sabor alkalino , e algum de tart^iro vitriolico. Este sal ferveo notavelmente com o espirito de vitríolo , e a 5ua maior parte nelle se dissolveo ; o que parecia indi- car que havia pouco tártaro vitriolado neste sai ; e que he todo quasi alkalino. Este sal constituiria, portanto, hum alkali salino , que deveria ter hum caracter parti- cular, pois se não conhece algum que se haja de crys- tallizar em folhetas finas , e brilhantes. i? §. VIII. Extracto c.mar^o salino. Empenhei-me , o que foi possivel , em profundar a natureza , e qualidades das partículas espirituoso-aquati- cas , que passarão da retorta para o ballão. Para encher estas vistas, e estes relativos exames, quanto podesse , íiz guardar toda a agua que tinha servido a tirar do ballão as partículas gordurosas , e espirituosas , e que , ao depois foião empregadss em rectificar estas mesm.as sub- ^ -.. C 264 ) substancias , para lhes extrahir o óleo cthereo. Perto de três arráteis desta agua , tendo sido bem separadas pelo filtro de papel das partes oleosas , e grosseiras , que lhe ficarão 5 depois da rectificação, erão de còr de âm- bar 5 tinhão o seu sabor hum tanto amargoso. Evapo- rárão-se em hum vaso de vidro em banho maria , em fogo brando á reducção de cinco a seis onças. Filtrou- se de novo este liquido , para o separar de hum depo- sito fusco, que se lhe tinha formado. Ficou, ao de- pois disto , o liquor filtrado de huma côr fusca aver- melhada , mui clara , mui amargoso , e tendo hum gos- to acido mui sensivel , que avermelhava o papel azul alguma cousa mais do que o fazia o espirito ao sahir da retorta. Submetteo-se ao depois novamente este li- quido a evaporação , até ficar na consistência de hum extracto espesso , m.as em banho maria , para que hou- vesse de ter hum calor brando, e igual. Este extracto era denegrido, mui amargoso , sem ser desagradável, quando frio , e se achou cheio de huma substancia sa- lina amontoada , que se distinguia claramente , sendo vista , ou examinada a toda a luz com huma lente, percebendo-lhe juntamente huma côdea, ou crosta sa- lina bruta , que estava por cima do extracto. Além disto , se lhe notavão crystaes formados em agulhas fi- nas , que se prolongarão pelas paredes do vaso , junto i parte extractiva , com a figura de pincéis , cuja pon- ta era a parte superior. Poz-se toda esta parte extractiva em hum pe- ^^\^ç^Q funil de vidro , forrado de huma mossellina , ou cas- ÇíÍ5 5 cassa raJa , a qual , ao depois , se po^ em hiima casa sub- terrânea , para haver de deixar derreter ( cahir indeli- quium ) unicamente a parte extractiva , para se poder ter, por este meio, separadamente o sal.no. Na reali- dade , passado quasi hum mez , se achou só na cassa , ou mosselina huma pequena massa , composta de crys- taes finos , cahidos IndeUqmum , e duas ate três oitavas de hum liquido muito bruto , com hum cheiro singu- lar , que parecia ao de bitume , que não desagradava , c hum sabor alguma cousa acido , como se contivesse muito sal essencial. Avermelhava prompta , e perfeita- mente o papel azul , e , melhor , este perdia a cór , deixando huma côr vermelha descorada , que tendia a branca. V,.' §. IX. Sal essencial do Cacao , que se derrete em es- pirito de vinho. Para se haver de ci ^egurar da qualidade da parte salina extractiva , e para se conseguir a mais pura , se lhe deitarão duas até três oitavas de hum bom espirito de vinho, Conheceo-se que tinha derretido huma parte do sal : tudo se aquentou em banho maria ; e o sal se derretco ainda mais : e , tendo-se visto que se não der- retia mais , se lhe mandou pôr mais agua, quasi a quar- ta parte da quantidade do liquido espirituoso , que se tinha empregado. Então toda a substancia salina se der- reteo , e nada mais ficou que huma espécie de fécula parda ligeira , que se separou por meio do filtro. Ao de- iilí' I • ( 266 ) depois se poz todo o liquido filtrado em hum vidro, que se metteo em huma estufa branda. A' medida que o liquido se evaporava , formava pelas paredes do vi- dro huma côdea salina bruta , aonde se distinguião j ainda que com difíiculdade , alguns pequenos crystaes longos mui finos. Tendo-se evaporado todo o liquor, se lançou outro novo em o vidro , e huma , ou duas oitavas de bom espirito de vinho, que se colorio logo, e muito , ficando com hum sabor amargo , e hum chei- fo aromático , que parecia o de Castor, ou o da raiz da valeriana pequena : cheiro singular , e penetrante , que descobre nesta substancia hum espirito Rector pre- so , e enfreado por muitas partes extractivas , e bitu- minosas. Ficou no vidro hum pó branco, que o espiri- to de vinho não pode dissolver. Passou-se brandamente e^te liquido espirituoso para outro vidro , tendo-se. o cuidado de deixar no fundo do primeiro o pó , que el- ]e tinha precipitado. Poz-se o vidro , que continha o es- pirito de vinho colorado, na estufa. Tendo-se evapora- do todo o fluido , havia nas paredes do vidro huma muito grande quantidade de crystaes muito finos em agulhas , e debaixo de huma forma de vegetação ramo- sa , cujos crystaes , entre tanto , estavão mui cerrados. Os da parte superior erão brancos , tendo alguma amar- gura , mas não algum acido , que se conhecesse ; os ramos salinos , que estavão mais abaixo , se achavão confun- didos com huma substancia avermelhada , gordurosa, viscosa , muito amarga. Este he o sal essencial singular , que gosa da pro- (267) ^opriedade de se derreter em espirito de vinho iniii puro , e que na agua sò muito imperfeitamente , e com XTiuito trabalho, o que com toda a probabilidade nasce de estar internamente unido a partes untuosas , e co- mo bituminosas. Para me certificar de que este sal nada continha do amoniaco , ou do acido , precisava-se pro- curar o penetrar a traves as partes gordurosas , que o envolviáo , com este sentido , se deitou em agua da chuva quente , muito impregnada do alkali do tártaro. No tempo da m.istura , se fez huma ligeira effervescen- cia, que unicamente se manifestou pelas bolhas de ar, <;ue Se formarão em alguns lugares ; mas não se levan- tou cheiro algum ourinosO : por onde nada tinha de amoniacal neste sal bituminoso, mas somente alguma porção de acido vegetal desenvolvido. Formou-se no liquido desta ultima mistura huma fécula escura erft muita abundância. O liquor filtrado era escuro , de hum sabor salino, neutro, saponaceo , onde não se co- nhecia o acido, ou o alkali, não avermelhando o pa- pel azul. O cheiro bituminoso agradável , que este sal tinha antes de sua união ao alkali , estava alguma cousa degenerado. Poz-se o liquor íiltrado em hum vaso de vidro 5 que se poz n'humá estufa branda a evaporar lentamente , e a favorecer por este meio a crystaíliza- ição. Reduzindo-se o liquido a sécco , ficou pelas pare- des do vidro hum sai pardo, ou escuro amargoso mui- to bíuto , onde, com tudo, se vião alguns crystaes fi- nos , que tinhão o sabor hum pouco picante , mas não acido j visto que esta substancia salina nío alterava o IV» Iw» (268) '■\ papel azul , e por tanto era hum verdadeiro sal neu- tro, ficando mais saponaceo , que antes da sua união, ^ parte alkalina , cue se lhe ajuntou ; e que também se Jhe havia misturado muito intimamente com a parte unctuosa bituminosa. : .::'' ^H ' '1''; 1 ' ' ri ^B A,? §. X. Nenhum acido vitriollco. Sal térreo amarelo. Tendo a examinar o pó branco , que ficou in- solúvel no espirito de vinho , se lhe derramou por este motivo por cima a agua da chuva quente , que o derre- teo com muita facilidade , e o fez muito amargoso. Esta solução ficou limpa , ligeiramente colorida de côr de âmbar , mas , com tudo , esfriando-se , ficou alguma cousa turva. Deitou-se n'hum vidro , e se poz na es- tufa. Evaporando-se , até ficar secco , a hum calor mui- to brando , se achou no fundo do vidro huma substan- cia branca , grosseira , á maneira de terra , e somente pelas bordas do vaso , e nas paredes , se encontrou hu- ma côdea , ou costra salina , fusca. A parte branca , que estava no fundo do vidro , tinha hum sabor muito amargo. Lançou-se-lhe hum pouco de espirito de vi- tríolo , não fez effervescencia alguma apparente , e o pó se disso] veo n'hum espirito acido. Outra porção deste pó amargoso , posta em agua da chuva quente , se derreteo perfeitamente. A costra salina , que estava pelas paredes do vidro , era , do mesmo modo que o •pó , de huma grande amargura , não ferveo com o acido vitriolico : e se derreteo com toda a prompti- dão, .' '3( Ç ^í^9 ) dão 5 c inteiramente na agua fervendo. Deita'rao-se na agua , em que se tinha derretido o pó branco, algu- mas gotías de óleo de tártaro alkalino , e não resultou efter%'escencia alguma sensivel. Com tudo, a agua de alguma sorte se turvou , e deixou hum sedimento de huma fécula ligeira em pequena quantidade , que deo ocasião a julgar-se , que este pó branco amargoso hô huma espécie de sal térreo, que comsigo retém huma parte bituminosa , que lhe communica esta amarc^ura. Kão parece ser o acido vitriolico o que se une á parte térrea , para lhes formar o pó branco salino amargo ; porque , por meio da evaporação lenta , que soffreo muitas vezes á solução deste pó , havia de fornecer crystaes selenitosos , ao passo que somente deo de pro- ducto hum pó bruto , salino amargoso , que se desfa- zia na agua com muito maior presteza, que o costuma fazer o selenite de todas as espécies. Estes differentes exames dão lugar a concluir : que o Cacao contém , além da abundância de hum sal essencial , outra sub- stancia térrea bruta de huma natureza singular , que apresenta absolutamente hum caracter salino , que deve entrar na classe dos saes neutros tensos 3 visto não ferver com os ácidos. :i5 !?. I §.XI. C 270 ) • v^>' §* XI. cheiro do Casforemn êo liqitor extractiva^ Sal sdeintosQ. O liquor , cabido em óelíejuium , da parte extra?» ctiva , que tinha fornecido hum sal bituminoso , cujo exa- me acabamos de ver , também merecia ser considerado de mais perto , em si mesmo , do que tem sido até o preseríte. Por este motivo deitei neste liquor extractivo algumas gottas de espirito de vitriolo. Turvou-se a mistura , sem effeito algum sensivel , e espalhou hum cheiro aromático singular , que se parecia com o da gordura do castoreum , quero dizer , desta matéria que se acha fluida na bolça das verilhas do castor , tirada recentemente. Passados alguns minutos o liquido se' clarificou, e o seu precipitado se assemelhava a parti»- Gulas salinas brutas. Derramou-se por inclinação todo o fluido , e , em seu lugar , se deitou agua quente no resr- duo. No mesmo instante se deríeteo , sem deixar pre- cipitado algum , o que mostra ser huma substancia ver- dadeiramente salina. Misturando-se o todo , filtrou-se o liquor , e poz-se a evaporar em huma estufa branda. Reduzida a secco , haviáo pelas paredes do vidro crys- taes parte brutos , parte em agulhas : tudo de hum sa- bor acido ; porque o vitriolico ahi predominava alguma cousa , mas no fundo se formarão crystaes brancos dispostos em flocos. Estes crystaes nâo tinhão sabor al- gum, nem avermelhavao o papel azul, o que fez jul- gar com fundamento , que era huma selenite fina , pro- du- " Ml C ^71 5 duzida pela uniSo do acido vitriolico côm huma pe- íjuena porção de terra leve , cjue se encontra na parte extractiva , e que concorre a formação do pó branco , salino amargo , de que temos fallado. Os crystaes fi- nos selenitosos gosao da particularidade de que huma grande parte se desfaz com presteza qa agua fria. Laii* çando-se-ihe ao depois óleo de tártaro ,. a mistura se fez lactescente, e depositou muita fécula branca, o que confirma serem elles hum verdadeiro sal selenitoso. I? §. XII. Sal volátil oiirtonoso. :]i Não nos contentando só com estes exames, at*- taquei o liquor extractivo por meio dos alkalis fixos salinos. No instante da mistura se levantou huma gran- de quantidade de espiritos voláteis ourinosos , que feriáo fortemente o olfato , e que indicavao muito sal amonia- cal. Deitou-se este mixío em huma portão de agua quente de chuva , e precipitou com muita abundân- cia huma fécula fusca. Filtrou-se o liquido , e se achou de hum fusco claro , não tendo cheiro algum , ou mui pouco. Fez-se evaporar n'hum vidro, ao calor de huma estufa muito branda, até ficar secco. Ficou pelas pare- des, e no fundo do vaso hui-rf saí bruto, fusco, debil- mentc amargoso , rangendo entre os dentes , com hum sabor levemente picante. Certamente estas experiências devem ser feitas em grande, o que facilitaria os meios de se desembru- lhar, e de contestar também, com maior precisão, as- sim ■■'H "é\ 'M C 272 ) sim a quantidade , como a qualidade destes saés sln^ií»- lares. Porque não se pôde ver sem admiração em huma só substancia vegetal , como o Cacao , huma tão gran* de diversidade de combinações , tanto das partes sali- nas , como das bituminosas , ou oleosas , e de térreas , das quaes humas, e outras apresentão caracteres parti^ culares , e talvez pela maior parte únicos. Isto pôde dar matéria aos nossos Sábios de faze- rem sobre este assumpto indagações , e descobertas im- portantes , que 5 á falta de tempo , e talvez também de luzes , nos não permitte profundar tanto quanto a utili- dade , e extensão deste objecto o requerem. Serei feliz 5 se tiver dado occasião , com o que tenho feitO , a que se execute este pensamento. 1 < ) ••'ii CA- C ^7J 5 I! CAPITULO IV. Ajitiíysc das pclllcidas do Cacao. SP Altava-iTle examinar a pellicula do Cacao , oii das amêndoas. A anal} se , que se fez , foi sobre o que se chama amêndoa , qile he a única parte , que entra no Chõ-» colate. Tanto queria fazer este exame ^ quanta era a vontade de conhecer , se o sal volátil que M. Ray , e Lemery , disserão que tinhão tirado do Cacao ^ estava contido na sua pellicula , porque na distillação da amên- doa se encontrarão alguns indieios. Para verificar este facto , se dei:ou em huma retorta de vidro lutada duas onças de pelliculas de Cacao de Caraça bem limpas ^ não torradas. A este vaso ^ posto ao depois em hum forno de reverbero, provido de seu balláo , se lançou hum fogo brando. Na primeira impressão do fogo , sabioí pe- lo bico da retorta hum espirito debaixo da forma de gottas claras , hum tanto avermelhadas , com o cheiro do óleo etherco em py reumático , e carregado com ef- fcito de algumas porções de hum oleo fuseow Este es- pirito tinha hum sabor picante j e amargoso , averme- lhando o papel, e muito mais fortemente o azul, do que o fazia o espirito da amêndoa do Cacao privada de sua pelie í assim como se vio acima. Mas esta côr vermelha , se bem muito viva , se perdeo quasi toda «m vinte e quatro horas , do mesmo modo que o fez T. m. p. uh s o )k m C 274 7 ò espirito da amêndoa no mesmo papel , o que indícíi ser este espirito acido volátil de sua natureza , e com cffcito o deve ser , visto ser hi-çm acido vegetal , qufe tem de mais o ter sido attenuado pelo fogo. Passado algum tempo, saháão da retorta vapores brancos , mas não tão ligeiros , como os primeiros pro- duzidos pela distillação das amêndoas do Cacao , e as- sim o óleo coalhado, que resultou da sua condensação y não foi branco, mas fusco. No fim da distillaçao , fa/- zendo se-lhe hum fogo- de lavareda hum tanto forte , se elevou hum sal volátil concreto muito branco, que se pegou ramificado pelo colio do ballão , e particular- mente , pelo da retorta.. As ramificações deste sal erão bi irias , e irregulares em o collo do ballão , e hum pouco mais finas, e mais segiridas no da retorta. De- pois de se terem esfriados 03 vasos , se tirarão algumas portões deste sal. Tinhão huma forma crystallina bran- ca ^ hara sabor amoniacal , sem amargo algum. Este he o sal volátil , que os Senhores Ray , e Lemery annun- crárã® ,1 qtte ícalmenite se encontra na casca do Cacao , c talvez também na sua amêndoa-, mas que está nesta substancia mui envolvida , pela grande quantidade de va-» pores oleosos , qtie se levaníão , e se condensão ncf tempo da distillaçao, que senão pôde perceber vestígio algum seu. Fazendo-se a analyse do Cacao em gran- de , talvez poderia produzir a estes Senhores o sal Volátil , de que fallão. Mas O Seníior de Caylus , que trabalhou sobre htim oiratel destas amêndoas, certifica não ter achado indicio akmn deste sal. l Na verdade dii I diz que dercascara o que empregou na sua anályse. Se foi da sua casca , que elle a mondou , seria huma prova reaJ de que o sal volátil concreto realmente sô existe na casca desta amêndoa , e neste caso seria preciso que òs Senhores Ray , e Lemery houvessem de ter empre- gado o Cacao com a sua casca nos seus processos , pa- ra obterem o sal volátil , como disserao , se acaso O Cácao nas mãos destes Sábios o não prodúzio , tendo» clles dado tanto fogo , que levasse o calor a hum ex- cessivo gráo. O Senhor de Caylus , todavia , está tio persua» dido qUe o Cacao não contém sal algUm volátil , que diz : Que Lemery o affirmára sobre ditos alheios , e não de si , pois era muito Sábio , para se ter tanto en- ganado. Poder-se-hia argumentar contra o Senhor de Caylus ; que os vapores ourinosos , levantadoá em gran- de quantidade pela addicção de hum alkali fixO no It- tjtior extractivo proveniente da distillação daí amêndoas do Cacao sem a sua pellicula , do modo que o obser-í •Vei , parecem provar , que no ternpo delia passou hum' ial volátil concreto ; porém que este estava* de tal sor-^ te envolvido pelos vapores unctuosos y que não pode- rão apparecer na sua própria figura, e que, unindo-sd âo depois a parte acida , que igualmente sahe do Cacaa por esta analyse, se a^untão todos, e fazem hum sal amoniacal , que fica fixamente no liqúor extractivo ,- mas que se manifesta de novo , aíjuntando-se-Ihe hum alkali fixo. A final , se o sal volátil concreto jpparece distintíimente na anahse da casca dp Cacao , he. porque ' 1 '!, * I i '-'^k C ^7<5 ) não tem bastantes partículas oleosas, para o envolvei ^ até o ponto de não poder ser percebido, ou porque o haja de conter mais que a mesma amêndoa. Seja o que for , a operação que fiz sobre a cas- ca 5 e pellicula das amêndoas de Caraça , faz ver que ella contém hum sal volátil concreto muito bom , se bem em quantidade medíocre. Também cumpre obser- var que parece não ter este sal tanta voíatilidade , co- mo o que se tira das substancias animaes. O espirito , e óleo extrahidos das pelliculas não tinhão , nem no cheiro, nem no gosto,, a doçura, e a suavidade des- tes mesmos princípios provenientes da amêndoa. O seu cheiro dominante era igual ao que produz toda a sub- stancia animal , que se sujeita á mesma experiência ^ particularmente á das ponta? do cervo. Tirou-se p^lo intermédio da agua quente todo o oleo coalhado , e to- das as outras producçoes , que se achavão no coHo do ballão, e da retorta. Tudo se poz em huma cucurbita de vidro para se passar á sua rectificação. Não appare- ceo no alto do capello do alambique sal algum volá- til , o que confirma que este sal se não exalta coma o das substancias animaés , que se ievantão unicamen- te em a sua rectifica^ção , e^ pelo menos, em parte, ao menor calor, e pôde ser, porque se tenha neutraH- sado na cucurbita com o espirito acido. Elcvárão-se com as partículas aquosas certas pequenas gottas de oleo ethereo , das quaes as primeiras erão muito bran- cas, mas as que se lhe seguirão, tinirão huma côr ver- melha escura, ainda que transparente. Este oleo ethc- leo 'K ( ^77 ) reo cia ao gosto muito menos doce que o que provém das amêndoas do mesmo Cacao sem a sua pellicula. A agua , ou o espirito que distilla com este óleo h« muito limpo , tendo a còr hum tanto avermelhada, que lhe vem do óleo, que levou comsigo, e de qu« parece estar muito impregnado, por lhe ter contrahido muito o seu sabor. Em nada muda a còr do papel azuí. Ainda parece dar hum maior lustre , o que prova não ser carregado de algum acido , visto que este se teria combinado totalmente com os outros princípios na cu- curbita. O liquor 5 que reside no vaso com o oleo ne- gro fétido , tendo-se esfriado , foi filtrado por papel , pa- ra o separar do oiço grosseiro : tinha hum sabor de- scnchavido sem amargura alguma sensível. Poz-se a evaporar em banho de areia. Tendo-se reduzido a três para quatro onças , começou a ficar amargoso , e se fil- trou de novo , para se lhe separar algumas partículas grosseiras escuras , que se formarão na sua superfície. Tornou-se a pôr o resto deste liquido a evaporar n'hum vaso de vidro em banho maria , muito brando , até fi- car secco. Ficou de resto huma massa extractiva , como mel, de huma muito grande amargura, cheia de sal es- sencial , parte deste em forma de codca , ou costra , parte em ram^ificaçóes finas, appiicadas ao longo pelas paredes do vaso. Estas producçóes extractivas pouco a pouco forão parecendo serem as mesmas que as do Ca- ção submettidas aos mesm.os processos. Ajuntando-se- Ihe o alkali tartsieo particularmente , sahio muito espi- ri- M. ,• V » ( í^7« ) rito volátil ourinoso , como já o tinha acontecido ao extracto amargo da analyse da amêndoa exposta ámcs- pia prova , ou sujeita ao mesmo exame. O Cnpiit mortuum , que ficou na retorta , pesou cinco oitavas. Ora tinha eu empregado duas onças de pelliculas, que produzirão huma onça, três oitavas de principios activos , cuja maior parte consistia em óleo butyroso. Também se achou nas mesmas particulas es- pirituoso-aquosas que a analyse da amêndoa não tinha produzido. Poz-se em hum cadinho novo este residuo , cxpondo-o a hum fogo sufficiente , para reduzir o carvão das pelliculas a huma cinza bem calcinada. Custarão a çalcinar-se perfeitamente mais que o caput mortmcm das amêndoas. Tinhao neste estado de incineração hum sa- bor , que indicava á presença de huma grande porção de sal alkali puríssimo. Também estas cinzas continhão particulas ferruginosas , que se attrahião pelo iman. Deste exame se colhe : que a pellicula do Cacao não he íie'vti (2SO fiuma mobilidade que as fará trabalhar com liberdade sobre os fluidos , porque tudo quanto poderia haver nelles de irritante , ficando como embotado pela doçu- ra da substancia butyrosa da amêndoa do Cacao , náo jjoderá fazer sobre as fibrasinhas dos vasos impressão alguma rebelde ; por consequência não haverá eretismo , nem crispatura , nem perturbação. As columnas dos Jiquidos , que forem impregnadas por ella , terão uni- camente sobre as membranas dos vasos huma acção mo- derada, que repulsará brandamente a íibra fora do seu tom natural , afim de lhe dar lugar á reacção, e a hum (espasmo doce , amigo da natureza , donde resultarão movimentos heterocrones , mais pacificos , e em finí , hum jogo systaltico protector de todas as funções animaes , e o sustento da vida. Donde necessariamente se seguirá huma saúde longa , forte , e cheia de vigor ; porque se sabe que huma tal saúde depende essencialmente de hu- ma justa proporção da acção dos líquidos sobre os só- lidos , e da reciprocidade dos sólidos sobre os íluidos. O que suppoem huma giande homogeneidade nos prin- cipios do sangue , assim como também huma grande doçura. Porque , estando eljes carregados de partículas estimulantes , lhe resultaria huma acção muito viva so- bre os sólidos ; neste caso se levantão contra os flui' dos , e lhes imprimem hum movimento projectivo fo- goso , que perturba as secreções , qije produz hum ca^ ior consumptivo , e que infallivelmente conduz o ente jíinimado á sua destruição.. psU reciprocidade dos sólidos sobre os iluidos , iBMili * » C ^H ) et vice versa , existe incontestavelmente em todas as funções da economia animal , e com particularidade na circulação do sangue , e dos líquidos primitivos , que delle se deriváo. Quer se admitta por causa physica destas operações huma sorte de orgasm.o , ou de espas- mo determinado pelo sangue sobre as artérias , ou so- bre o coração , como o solido primitivo , ou que se re- conheça com Galeno , e com o immortal Harveo , como quasi geralmente se tem feito ate acui, hum ba- timento, ou huma dilatação, e huma reacção das pa- redes dos vasos arteriaes sobre os fluidos que as dila- tarão, mechanismo que M. de Ia Mure , Medico, e Aca- démico de Mompelher não queria reconhecer como cau- sa do batimento das artérias. Com effeito mostra que a pouca dilatação , que o sangue occasiona nas artérias distantes da sua origem , no tempo que o coração o lança nellç , não pode ser a causa do batimento arte- rial. Dizemos pois , conforme a experiência , que a amêndoa do Cacao traz comsigo mesmo com que pre- veriir muitas desordens entre os sólidos , e os fluidos , e também com que remediai! os , podendo-se fazer com que esta substancia balsâmica nutridora haja de chegar ao sangue com as justas proporções , e com as quali-» dades , que requer a natureza. Pela decomposição ana- lytica do Cacao , com effeito , vimos que este fructo unicamente contém princípios benéficos ; huma grande quantidade de óleo , ou de sujjstancia butyrosa da maior doçura I» e inalterável, intimamçnte ;^lliada com hum ) sal ( ==25 y sal essencial oleoso , amargo , e luima parte extfactlvi tónica , que também Jigeiramente Jie amarga. O sal essencial, como vimos, iie mui abundante ; porque, alem cio observado nos productos da distilla(;ão , o sal alkali fixo , que delle se tira pela calcinação , não esta' sem dúvida dtbaixo desta lorma na amêndoa do Cac e muito vibrateK taes como as Senhoras , ca- j-a maior parte be atacada destas moléstias, a que cha- mzó vapores , e cujos accessos , ás vezes , são tão fo3> tes que dereneiao em convulsões. As partem unctuosas do Ch<)co!ate o fazem multo próprio- a remediat as impressões dos venenos corrosivos, ou porque lhe amor- teção a acção nas entranhas dos que o tomarão , e nô tempo em que r.inda trabalhão , ou porque lhe reme- deião as penosas impressões já feitas , principalmente nas membranas delieada<; das vísceras da região inferior do ventre; que são as primeiras, que soffrera a ací^ãa das partículas corrosivas-. Pa- C í89 5 Pafa fallar com maior certeza, e dar peso ao qlie se pode dizer das benéficas propriedades do Cacao , e Cliocolate , e para não liie exagerar as suas virtudes^ rejamos o que a seu tespeito dizem pessoas de probi- dade 5 que estiVerão muito tempo na America. Nin- guém esteve tanto no alcance de appreciar as qualida- des do Chocolate em seu justo valor , e de testemu- nhar os seus effeitos como o P. Labat, Dorriinicano, e M. de Caylus. Ambos residirão muito tempo neste no- vo mundo, e virão com olhos verdadeiramente Filoso-' íícos tudo quanto nelle ha de maior interesse. O P. La- bat , conformando-se a milhares de experiências obsef- vadas , e vistas por elle ein muitos annos, diz: Que o Chocolate he hum alimento diário dos Americanos ; que he dos mais substanciaes , de huma facílima diges- tão ) sem excitar no sangUe mais vioknto movimen^ to que o ordinário ; que não ha cousa mai5 própria pa- ra o abrandar ; que elle somente basta para aliiTicntaf pessoas de qualquer idade que sejão ; que os moradores de São Domingos que cultivão O Cacao não crião , ou alimentão seus filhos com outra cousa ; pois lhe dão Chocolate de manhãa com bolo de milho, e que não precisão de alimento o resto do dia ; que a bondade deste alimento se conhece pela gordura ^ vigor, e força destes rapazes. Respeita o Cacaò como o remédio espe- cifico da thysica. Eu, diz elle, era de huma magreza summa , e temivel havião muitos annos , e me affirma- vão que estava hetico em todas as formas , e que me restavão poucos dias de vida. A' proporção que entrai T. III. P,UL T a ■|^',í J';. i • v''f 'f* -:( ( 290 ) a usar do Chocolate na America , engordei á vista de olhos , e ainda que trabalhasse muito , comecei a gosar de huma saúde que nunca antes tinha tido : Este Re- ligioso também nota : Que o Chocolate he aperitivo ; que conserva o ventre livre ; que favorece a transpi- ração 5 que purifica os espiritos de huma maneira doce , e melhor que o Café , que causa hum movimento vio- lento , e huma grande agitação no sangue. Cita tam- bém outros exemplos do bom effeito do Chocolate , e acrescenta : Podia contallos aos centos. O testemunho do Senhor de Caylus não he me- nos favorável a este género de alimentos , diz na sua Historia Natural do Cacao : Que elle he huma substan- cia mui temperada , que fornece hum alimento doce incapaz de offender , mas que se não precisa associalla a especierias acres , e quentes ; que esta substancia he das mais nutritivas , mui própria a reparar os espiritos dissipados , e as forças cançadas , a conservar a saúde , e a prolongai ávida. (A este assumpto refere) que vi- via na America , no tempo que lá estivera, hum Conse- lheiro com perto de cem annos de idade , que havião trinta annos , que se alimentava quasi unicamente de Chocolate ; que estava tão vigoroso , e tão bem dispôs-: to que de oitenta e cinco annos ainda montava acaval- lo sem estribos : O Senhor de Caylus observa a respeito do Chocolate : Que o uso geral , que se faz de hum alimento, entre hum grande povo de tempo immemo- rial, e com que sempre se acharão bem pelo que res- peita á saúde , he hum elogio completo das boas qua- " m C 291 ) lídades deste alimento ; que se tivesse alguma md qua- lidade predominante , teria sido certamente percebida , e os povos se não serviriao delle , por ser huma cousa prejudicial; que os habitantes da Nova Hespanha , e de huma boa parte da Zona tórrida da America sempre fi- zerão o seu regalo deste alimento tirado do Cacao. To- das as Colónias Europeas , que habitão estes paizes , igualmente usão delle como de hum alimento diário, sem distinção de idade , de temperamento , de sexo , nem de condição , sem que tenha havido , já mais , huma só pessoa que se queixasse do menor incommodo causado por elJe. Antes que pelo contrario provão , que apaga a sede , que refresca , que engorda , que procu- ra hum somno tranquillo. Muitas pessoas o tem toma- do três vezes por dia por todo o sustento , por hum dilatado tempo , e tem gosado da mais perfeita saúde , tendo-se elias achado mais frescas , e m.ais robustas. Tem-se dado em lugar de leite a crianças, que se cria- rão muito bem. • O Cacao he muito nutritivo , acrescenta o Se- nhor deCaylus, oseffeitos acima referidos o provão : o estômago digere este alimento com grande facilidade ; o chilo que produz he muito bom. O estado de gordo , a que chegao os que neste paiz se habituão a tomai- lo , o confirma. Deve ser de huma facil digestão , hs' huma substancia amarga : todos os amargos são esto- machicos , e assim a digestão se obra com facilidade grande , sem affliçSo , sem trabalho , sem que o pulso SC «n2ross€ sensivelmente ; o estômago muito longe T 2. de m C 292 ) de gastar as suas forças , digerindo este alimento , záquU re novas : conhecemos pessoas , cujos alimentos erão muito fracos , e arruinados , que se reestabeleccrão per- feitamente pelo uso frequente do Chocolate ; repara promptamente os espíritos , e forças cansadas ; e isto não só pelo que tem decommum còm os outros alimen- tos de bom sueco , mas também por conter hum prin- cipio oleoso fino volátil , differente da substancia oleo- sa, butyrosa, e fixa, que constitue a matéria doce, e tranquilla deste alimento : vio-se pelo exame analyti- eo, feito do Cacao , que realmente contém hum prin- cipio oleoso fino , volátil , penetrante , de hum aroma doce 5 e agradável , o qual , mediante o menor calor , se desenvolve , e se eleva do Cacao exposto a analyse. Em virtude deste principio he que o Chocolate restaura com tanta presteza , como observa o Senhor de Caylus as forcas ao ponto, que , como diz elle , se huma pes- soa fatigada de hum longo, e penoso trabalho do cor- po 5 ou de huma violenta contensão do espirito, to- mar huma boa taça de Chocolate , immediatamente Terá cessar a sua canseira , e reanimarem-se as suas forças , tendo apenas princip^iado a digestão : a expe- riência todos os dias confirma este ef Feito. Também o Cacao logra a riqueza de bum espirito mui penetrante, que o fogo mais violento o não pód^ mudar. M. Ray contestou este facto em a sua analyse , e o nosso pró- prio exame o verificou , no em tanto que as de mais substancias , quer vegetaes , quer animaes , submettidas_ as mesmas provas, dão como se sabe, espíritos fetidos: acres , C^9J ) acres , mui desagradáveis , assiin no cheiro , como no gosto. Não he isto porque estes princípios ahi se achem taes no estado natural das cousas , mas sim porque el- les tem huma disposição próxima para o serem , seja isto por hum calor forte, e contínuo, seja pelos movi- mentos quer grandes , quer continuados por muito tempo ; e , ultimamente , seja por hum repouso , ou pela lentidão , ou vagar que estas substantias são obri- gadas a supportar nos corpos animados. Ora isto , ainda suppondo-se o que temos provado , que os principios do Cacao estão na impossibilidade de poderem de-^e- nerar das suas boas , e bem fazejas qualidades , a pe- sar de qualquer experiência , que quizerem fazer da sua amêndoa. Ainda que os principios do Cacao não sejão neste fructo tão voláteis precisamente , como se en- contrão nos vasos chymicqs, com tudo, não se deve duvidar , que elle o tenha ;, e isto he quanto basta, para se suppcr que , quando se desenvolveiem algu- ma cousa , pela ligeira toriefacção , que se dá a esta amêndoa , para se fazer delia o Chocolate , possão obrar em nós o bom effeito , digo , o cordial esto- machico, que se experimenta , quando se tem usado deste alimento ; effeito que se concebe facilmente, quando se considera a sua acção sobre o pleccus nervo- so estomachico, cuja communicaçao , particularmente com o par vago, e entrecostal , transmitte ao cérebro, e em todo o habito do corpo esta energia tónica, que reanima em hum instante tcdas as forças vitaes. Aparte do- ( 294 ) e , verdadeiramente alimentosa do Chocolate , pas- sa , ao depois disto, para o commercio dos liquores, pelo caminho das veias lácteas , onde os movimentos syltasticos dos sólidos assemelhão a este chilo balsâmico do sangue , sem que sejão mister grandes esforços , o que he muito vantajoso a descarga da natureza, da cual se não podem economizar as forças , visto que, if^mentando a actividade de suas mol?s , caminha inevitavelmente a sua destruição. Esta he huma verda- de conhecida nas escolas de Paris , que deo occasião a este bello axioma , que o que he causa vitae , também o he causa mortis. Talvez queirSo dizer que os elogios magníficos, dados ao Cacao , e ao Chocolate , são muito bem de- vidos , e muito merecidos pelos bons effeitos , que constantemente resultão delles na America , e que se não podem deixar de aceitar , visto serem fundados era feitos que se não podem negar , em razão de terem muitos povos deposto a favor deste alimento , mas que ainda se precisa mais alguma cousa, isto he, saber, se cm França , e na Europa , obrão o mesmo bem , pois se dão muitas pessoas , as quaes o Chocolate incom- moda , e muito , cujo facto tem toda a certeza , pois vemos^ muitos , que o não podem digerir , porque huns sentem hum grande peso no estômago , outros , pouco tempo depois de tomado , sentem huma grande soltu- ra com precipitação rápida do Chocolate , ainda nos intestinos grossos ; outros sentem desgostos fastidiosos , que lhe dão repugnância a este alimento, outros cinfina são sSo atormenta(íos de borborismos , ou ílatuosidades fati- gantes. As partes gordas , e sebnceas do Chocolate , fei- to na Europa , podem entupir as embocaduras das veias lácteas , e ainda obstruir as glândulas do mesentereo, sobre tudo com pessoas melancólicas , cujas primeiras vias são cheias de fermentos azedos , e ácidos , que fixão , e endurecem ainda mais estas partículas gordas ; porque se sabe que os suecos ácidos , quando são superabundan- tes, tem huma tal acçáo sobre as substancias oleosas, 'k: sa a assemelhar-se a cera na firmeza. Transporta-se i Europa deste feitio com esta dureza , e solides a parte butyrosa do Cacao ; e a isto devemos attribuir os nxios effeitos que o Cacao faz ás pessoas , que delle se quei- >:ão. Com effeito não custa comprehçnder que huma substancia gorda , dura , como o cebo j deva fazer pade- cer o estômago , e as outras visceras da digestão, se não forem fortes , e vigorosas, hum grande trabalho cm lhe formar hum chylo homogéneo em todas as suas partes ; ainda ao depois desta operação fatigante , e admissão dos suecos saponaceos hepáticos , lhe ficarão muitas partículas cebaceas , que não terão sido reduzi- dos em huma forma solúvel nos aquosos , e que por este motivo se acharão fora do estado de poder ser ab- sorvidos peias boccas , ou sorvedores das veas lácteas. Todo o mundo sabe quanto as pessoas , que se enfar- tão de gorduras nas suas comidas, vem a. padecer por esta causa. Assim por huma parte o dobrado trabalho do estômago sobre as partes gordas , e compactas , que o Chocolate contem , e pela outra o grande numero de moléculas butyrosas , que escaparão á acção perys- taltico das primeiras vias , e como também a penetrabi- lidade dos suecos digestivos , não podem deixar de cau- sar a muitas pessoas delicadas os accidentes , de que se tem faiiado. Deve-se acrescentar a tudo isto o uso , cm que se está de comer fatias de pão torrado, e, ao depois ensopado nesta gordura sebacea do Chocolate. Isto na realidade não pôde deixar de augmentar muito o trabalho da digestão ', porque se sabe que o pão, ten- .♦•■11,11 C !0i ) tendo embebido qualquer gordura , se digere com mui- ta diíficuldadej e^ com muito maior razão, tendo si- do penetrado por huma substancia sebosa , ou sebacea. Ora , preparando-se o Chocolate com leite , como mui- tas vezes acontece , e , algumas vezes , com a sua na- ta , ou creme , ainda terá muito maior trabalho á natu- reza. Isto supposto , he pasmoso que pessoas de hum temperamento fraco queirão queixar^se da fadiga , do peso 5 do incommodo no tempo da digestão do Choco- Jate , e ainda de huma frouxidão , que muitas vezes st Jhe segue. Eis-aqui , por tanto, hum alimento , por sua natureza , de que geralmente , se não tira todo o proveito , que se poderia , e de que elle he capaz , sem~ estes inconvenientes. Entre tanto se conhece que, sem embargo disto , se dão muitas pessoas , que se achão muito bem com este alimento Inedicamentoso. A arte de curar , como tal , effectivamente o emprega com muita felicidade, em huma infinidade de circunstancias. A pesar disto , não deixa de :ser certo que a solides, das matérias gordas do Cacao fará sempre perder ao Chocolate Europeo huma porção dos seus bons eífeitos quer este se tome como alimento , ou como remé- dio. Esta pena , que muitos estômagos tem de dige- rir o Chocolate , tem persuadido que o Chocolate era huma substancia fria , e a acrescentar muitas especiarias , que só fazem o eífeito de esquentarem , sem remedia* rem o vicio principal , que hz o Chocolate de huma digestão tão difíiwil a muita gente ; defeito que não nas- I Éi Ç 302 ) nasce na verdade , senão da grande quantidade de partes oleosas mui attenuadas de que este alimento he cheio por ser de huma consistência compacta, e muito firme. Estes máos effeitos do Chocolate preparado na Europa subsistio por muito tempo, sem cuidarem nisto. Entre tanto estas causas erão plausíveis , e saltavão aos olhos , e os meios de as remediarem erão simples, fá- ceis, e innocentes. Bastava somente reflectir-se alguma cousa hiais do que se sem feito até aqui. Ter-se-hia reconhecíllo , pelo menor exame , que , para se dar ao nosso Chcjcolate Europeo a qualidade do d'America , e para que os seus proveitos fossem iguaes , era preciso fazer que as partes oleosas deste alimento , que tinhão adquirido a consistência do sebo , ou cera , houvessem de ter o mesmo gr?.o , ou ponto de attenuação, fine^ za , e de solubilidade , que tem nos lugares de sua ori- gem, por serem as amêndoas do Cacao ainda recentes. Actualmente se faz isto mesmo com felicidade. Tendo- se conhecido que, dando-se as partes sebaceas do Cacao á divisibilidade de todos os corpos gordos reduzidos 2 saponaceos , e misciveis com os aquosos , ó Chocolate , que delle se fizesse , teria todo o merecimento, e a ex- celíencia, do que se usa na America. Vimos pelo exame analytico do Cacao quanto esta amêndoa he rica em saes saponaceos, attenuante? amargosos, e em óleo finoethereo. Estes piincipios tão capazes de obrarem bons effeitos, quando obrigados li- geiramente nas partes oleosas deste fructo, não poden> fezcr o mesmo beneficio , ficando a« suas partes un- ttuo- C }"i ) ctuosas muito compactas , que as prendem com entra- ves. E por isso j para se fazerem entrar estes princípios attenuantes em todos os seus direitos , nada mais se deveria procurar , que desunir a cohesão das particulas sebaceas , reduzindo-a$ a huma forma saponacco solúvel , que as faça exactamente misciveis com os aquosos. Isto íazem presentemente, pelo menos, alguns dos nossos Chocolateiros. Esta substancia alimentosa 5 preparada deste mo- do , faz hum Chocolate realmente homogéneo , visto que a preparação , que se lhe dá , estabelece huma união perfeita entre todos os seus principios. Este alimento, feito saponaceo , se derrete com toda a facilidade na agtia quente. Todas as suas particulas se derretem, e suas particulas s« misturão com toda a intimidade pela agitação, de tal sorte que as partes butyrosas , e gordas , cjue nella entrão, em tanta quantidade, não sejão vi- síveis, ainda ao depois de frias, ao passo que o Cho- colate , preparado pelo modo antigo , tendo-se derre^ tido na agua quente , tem as suas partes sebaceas , tão pouco misturadas com a agua que , deixando-se res- friar esta solução , a parte butyrosa , contida neste liquido aquoso, ganha a superfície em grande quantida- de , onde coalha , e ao depois se enrija. A experiência tem milhares de vezes confirmado estas experiências. Esta substancia sebosa , dura , e compacta , e muito mal attcnuada, será sempre, a que fará sempre o nos- so Chocolate da Europa, de huma digestão trabalhosa; I e li n , a J04) e daqui pouco proveitosa a temperamentos fracos , é delicados. Ainda pessoas de huma boa constituição nâó tirão delle o bem , que podem , pelas razues , que te- mos examinado 5 e desenvolvido j da maneira que nos foi possivel , a mais clara. O Chocolate , pelo contrario , que se preparou àe hum modo tal , que faz toda a sua substancia gorda bem dividida, e com toda a perfeição misturavel em os aquo- sos , reunirá -todas as qualidades innatas a substancia nutritiva da amêndoa do Cacao. Com estas condiçõe'! se terá realmente hum Chocolate muito effectivo- y e muito são. Preparado desta sorte não se tem , de modo algum ,. necessidade destas especierias mcendia"^ fias , que os Hespanhoes , e outros povos lhe fizerão entrar ; porque, segundo o que dizem, lhe fazem en- trar estes ingredientes quentes y tão somente para cor- rigir a sua qualidade fria , que quizerãa suppor gratui- tamente. Actualmente se está na figura de se poder jul^ gar á vista dos exames , que communicamos y se o Ca* cao, de que se tem attenuado ^ dividido, e feito so- lúvel a parte butyio-ssbosa , deve ser fria. Queirão lembrar-se que esta amêndoa he dotada de particulaá finas, aromáticas, etliereas, salino-saponaceas , e amar- t^osas, unidas, e e.icorporadas com muitas molécula? oleosas de muito maior doçura. Desta maneira huma só combinação não pôde ser fria , destruindo-se unicamente i solides da substancia gorda, ainda que sede aosprin- ci- C i»! 5 cij^iõs adtlvos hum desenvolvimento conveniente, Ter- se-ha , pelo contrario , nesta preparação hum alimento temperado , estomachico , e peitoral , sem que qualquer de suas virtudes haja de prejudicar as outras , coma acontece em alguns remédios j ainda que sejão bons de sua própria natureza. Não se precisa , para se convencer da existência destas duas qualidades essenciaes no Choco- late feito muito homogéneo , mais do que lançar a vista sobre o qUe acabámos de dizer deste mixto vegetal , qiie tem por base hum fructo ^ em que a natureza parece ter tomado a natureza de unir, e combinar eom a ar- fe , que lhe he própria , todoà os princípios , mais be- néficos j em faVor do homem. Tendo-se feito o Chocolate bem soIuVel em agua quente pela mistura dcJs seus sttccos butyrosos com ít parte extractiva amarga , e com os saes saponac-os , ò es- tômago , e os outros órgãos digestivos terão sobre este alimento huma superioridade que O fará com presteza hum alimento dos mais Saudáveis; Os liquores digesti- vos o penetrarão com hama facilidade muito maior, e faraó delle , como já dissemos , huma emulsão chylosa , fina j que de si mesma se insinuará a traves dos filtros ào canal intestinal , para passar dahi ao sangue pe- los caminhos que elle sabe. Este alimento balsâmico ^ amigo de nossos órgãos, deixará sobre as fibras, e tú- nicas das primeiras Vias huma impressão de ductiíida-- de, demacieza, e de vibratilidade , de taí sorte pro- porcionada que o seu tom lhe será sustentado de huma maneira análoga ás vistas da natureza, donde resultará T.IÍJ. P.Jii. V hu- i C 306) buma abunrdante secreção dos suecos digestivos, que, tendo pouco trabalho que fazer sobre a substancia nuf tritiva do Chocolate , pjjra fovmar delle hum sueco chy- Ipso, empregará toda a siia acção em fazer a homoge- neidade deste alimento ainda mais intima , e mais perfei- ta , ç a dar a esta emulsão alimentosa maior disposi- ção, e aptidão, para se misturar, e assemelhar no Ocea- no da circulação aos suecos sanguineos , e limphaticos, que formão todos os géneros de canaes , dos quaes o movimento perpetro caminha também continuamente ^o desseccamento destas mesmas fibras. He fácil ver-se os bons effeitos , que deve obrar hum talchylo, assim como sueco nutritivo , e como re- nie.dio, Pela sua qualidade primeira reparará abundante, è facil9ie.nte ás pessoas jornaleiras , assim os sólidos como os fluidos. Também he de natureza a impedir hun;i mui grande dçsçahiraento da substancia dos sóli- dos , dando-ltjes huma sorte de ductilidade pelas parti- çuJas finas , e unçtuosas , de que abunda. Desta sorte as pessoas de hum temperamento secco , as que tem a fibra muito, elástica , e particular.m.ente os velhos não podem deijçar. de se. achar muito bem com o uso de bum tal alimento, porque nelles as fibras musculosas, tendões , ligamentos , va^os , pelle , e finalmente todos, os solidps se, des.seçcão. Na realidade toda a nos;- sa vida nada mais he que hum contínuo desseccamento. vlvcre eiilm ^ nostrum hseçere est (Ragliv. pag. 414' )> Na velhice os mesmos vasos tendem: a aniquilsr-se ; a-f, suas grandes paredes se approximio , e não admittem. cjr- ^ C ^01 ) *ircu1a<íão alguma n'huma grande quantidacíe de capít lares. Ora- não ha cousa alguma ^ que seja mais própria à oppor-se , e a aftastar este estado destruidor, que a grande ductilidade das partes do Gacao feduzidas enl Chocolate homogéneo. Alem destes proveitos da pdrttí do Chocolate considerada como unctuosa , tem de mais outra, qtié não he menos preciosa para os velhos. Por i^jUanto, estando solúvel nos aquosos, resulta delle hu- ma espécie de substancia gelatinoso-mucosa , que favo- rece muito a nutrição , e qUe fica sendo a sua maté- ria , dando huma grande doçura á Ijmpha , e adminis- trado-lhe hum glúten bem fazejo , que indispensável- mente lhe he necessário por se adaptar aos sólidos , e para lhe reparar as perdas. Este he o que M. Lorry de- monstrou perfeitamente no seu exceílente Tratado Es- sai Síir les Aliinents. Per isso com toda a maior razãd sé" deveria cíia-^ mar ao Chocolate o íeite dos velhos ^ e não ao vinho como se diz ; pois que a uso immoderado deste lhe aligeira o de^seccamentd dos sólidos ,' enfraquece pouccr a pouco' o jo^o das vísceras , e as faz" chegar a huma total privação de suas' funçoes. O Chocolate não só' tem a vantagem de conservar a macieza dos sólidos,' mas também he hum poderoso correctivo contra todas" as espécies de' sáès , e acrimonias , que de ordinário se encontrão no sangue dos velhos. Sabe-se a propensão que tem cm'" ficar acre , e dissolvido , sem adhesão , nem consistência em seus prihcipios. O Cacao contérri nV siia- parte- extractiva'" huir.a propriedade liL-eirafnente'' Ém % ( 308 ) tónica, e estiptica , que se manifesta ainda pelo sabor' desta amêndoa, como temos observado, e he mui pró- prio desta qualidade dar aos principios do sangue huma união 5 e cohesão capaz de impedir as fundições colli- quativas , e pituitosas que tanto , e tão frequentemente incommoda aos velhos , e do mesmo modo as pessoas de huma meia idade , mas de hum temperamento íleu- matico. êà 1 CAPITULO II. iJso do Chocolate nas moléstias chronlcas. \3 Chocolate em virtude das qualidades reunidas , is- to he , oleosas balsâmicas tónicas íka igualmente sau- tlavel aos atacados do escorbuto , ou que tenhão dis- posi(i6es para o ter ^ pois se sabe que esta temivel mo- léstia nada h€ mais que huma depravação do sangue , e dos suecos nutridores, que delle sederivão, cuja al- teração cacochymica perverte todas as funções animaes , e lança as pessoas attacadas em languores funestos. A ligeira amargura do Cacao , que lhe he communicada pelos sa€S -amargosos bituminosos , que contém , e que examinamos , não he menos utjl a estes enfermos pela força digestiva que dá a seus órgãos. Com effeito con- serva as primeiras vias no exercício de suas funções , donde em caso igual fica sendo bum excellente antise- ptico para todos os liquores humanos em huma mo- les- / ( 309 5 Icstia , que tem maior necessidade delles que as outras , visto ser propriedade do vicio escorbutico fazeJJos ten- der a corrupção. A faculdade doce , e unctuosa do Chocolate o constitue hum excellente remédio contra is acrimonias , e defluxóes cathartaes , que irritão a «Gar- ganta , como também as partes superiores da Trachea artéria, e que lhe excitão tosses violentas. Em tal caso se ha mister deixar derreter brandamente na garganta , e de tempos em tempos , alguns rebuçados de Chocola- te. Este remédio certamente he superior em taes cir- cunstancias a todos os outros rebuçados de malvaisco , e ao menos lisonjeia mais ao- paladar. Considerando-se a abundância, e a grande doçu- ra dos suecos unctuosos balsâmicos, e gelatinosos , que se achão como concentrados em o Chocolate bem pre- parado , tendo ficado homogéneo em todas as suas par- ticulas , e solúvel ernagua quente, se concluirá que elle hs hum alimento dos mais convenientes para as pessoas attacadas deste pernicioso desseccamento , que caminha para esta thysica ardente , e mortal , a qual se chamão consumpção. Com effeito a propriedade unctuo- sa temperante , e inalterável deste alimento , tomado ha- bitualmente, e muitas vezes perdia, seria hum dos me- lhores remédios que se lhe pôde applicar , e sobre tudo ajuntando-se-lhe o uso dos vegetaes farinosos , dos nitros aquosos , como alfaces , espinafres, chico- reas , borragens , pepinos , e oíitras plantas da mesma classe , e , do mesmo modo , fructos bem escolhidos. Também se pode presumir com fundamentp , que ha mui- Vi' * I, muitas moléstias cjue seolliâo como incuráveis, c^t se curariâo perfeiumente , sobre tudo, febres heticas, es- çorbutos, consumpçóes, gottas , rheumatismos , e ou- tras desta natureza , se os doentes, tivessem a, constân- cia de se sujeitarem a hum tal regimen dirigido com ordem por hum Medico prudente , « douto. Póde-se igualmente tirar grandes proveitos do. Chocolate contra a thysica pulmonar , ou contra quaU quer outra , que nascesse da presença de hum ajunta- mento purulento em qualquer viscera. A grande quan- tidade de suGços oleosos , e mucosos que o Chocolate fornece ao sangue, n^o pôde , com effeito , deixar de corrigir a aspereza purulenta de que fosse impregnada , pelo menos , tanto^ quanto este humor scçpticp fosse, capaz. Não se conhece remédio algum mais próprio, que este para. o envolver , e embotar quaesquer.aspc- «lízas, e reprimir^he as innpressões maléficas , e destru- çtivas , e a impedir a acção irritante , que os suecos, degenerados do sangue costumão fazer em iguaes mo* lestias. Sabe-se , como vimoç , que a parte oleosa do Ca^ eao he de huma. doçura inalterável , e que esta subr stancia não pode em tempo algum contratar a máqua«» lidade do ranço, e fétido, como são sujeitas todas as demais manteigas , e isto a pesar de qualquer prov^. que queirão fazer, assim nos sólidos , como nos fluidos do corpo humano, A parte extractiva desta amêndoa igualmente he injÇQrruptivel , e do mesmo modo os saç§ dpçes qwe el_U çontim. N^ida se teju que.temeç des- deste ultimo principio salino ,. tencfô visfô ptla iúilf» SC , que está sempre tão envolvido de partes unctuosas doces , e balsâmicas , que ha mister hum liquido espi- rituoso , ou sémiespitituoso , para se dissolver, e que, além disáO , a ligeira torrefacção , que se lhe faz , quan- do se fabrica o Chocolate , fica sempre este sal fortè- tnente embrulhado na parte butjrosa , de modo que só pode obrar, como hum brando attenuímte, capaz uni- camente de contribuir a divisão , e a attenuação da par- te sebOsa do Cacao , o que effeitua , tendo esta amen- doai síoffrido hum.a combustão , e huiti conveniente trabalho. Para termos a maior certeza possível da quali- dade incorruptível do Chocolate bem feito , sobre til- do, quando fica solúvel, e homogéneo, se fez derre- ter eili agua quente em quantidade proporcionada pára ter hum liquor de consistência de creme , ou nata , e se poz ao depois n'hum copo cónico cobèrtò Uíiicameív te cem pápél 5 vendo-se no fim de hum mez , n^o sh lhe encontrou decomposição alguma ; e ainda qiie ti* ríha formado na sua superfície hum mofo ligeiro, con- servava com tudo a mesma consistência, a mesíiia côr. Tinha a sua parte butyròsa intimainente misturada , è cncorporada nâ totalidade dô liquido ; o cheiro, e sa- bor do (^acao se lhe distinguiãó còm perfèitçâo ; btlièiíò parecia estar mais descubeito' ou desèilvòrvido ; ò gòstò - algUm tanto desagradável , por câusa do mofo, mas sem azedume algum , porque , tendo sido posto sobre feuma colher de eobrej o liquido^ sé'-scceba*setti deixar in- í >. ^r ■ff indicio , ou rasto de ginabre. Seguc-se deste exapiç : que D Chocolate , feito desta forma , passará como gelatinp mucoso , e sem alguma ^Iteração as veias lácteas , sera embargo de outra qualquer acção , que possa ter aa- tes de chegar a ellas. A incorruptibilidade n/$ primei- ras yias aind? se vé nisto : que os resíduos deste ali- inento não contrahem nos intestinos fedor algum , ^ não sere)Ti misturados com huma grande quanudíide de outros géneros , que sejão de sua natureza capazes de corrupção : também estes no mesmo lugar tomão muir ta çonsistenciai : o que serre de mestr^r 5 quantidade de chylo , que este alimento fornece , e o vigor quç fáá ás viscçras destinadas a digestão. Esta he huma sor- te de constipação feliz que nasce da força dos órgãos , que tirão dos alimentos todos os suecos nutritivos , que podepi conter ^ e não de hum calor çstranho que desseçca. Em tal caso dizer-se : qup see^tá esquentado, porque se estd duro, ou dureiro, seria mudar a lingua-r gem. Todos sabem que injecções de agua quente he |ium mçjo fficil de remediar este pequeno incpnvenienr te 5 que ^ de outra sorte he effejto de hum mui granr ^e bem. Tem-se demais observado que as dejecções dos que tomão habitualmente bom Chocolate , são sempre de côr amarell^ , o que faz ver que este alimento dá muita macieza aos çanaes secretorios da bilis , que os aliinpa , e que deste modo favorece huma descarga abundante deste suçço íimargo saponaceo em o tó- de no, ■ Es^^iç são as vantagens tanto mais preciosas d^ par- :l parte da incorruptibilidade, quanto lie raríssimo encon- trallas em alguns outros alimentos ; pois se sabe que os melhores alimentos mais ou menos soffrem alguma altefação nas primeiras vias , e ainda nas segundas , con- forme a sua natureza , a sua qualidade , e disposição dos órgãos , que os recebem. Ora nós acabamos de vér que o Chocolate não pode soffrter cousa alguma nas primeiras vias. Elle também o não soffre nas segundas a não ser pelo fim de favorecer a natureza. Funda-se isto em huma prova de facto. Por quanto , ao depois de ter esta substancia nutridora rolado no sangue , por muitas horas , a parte sorosa , e aquosa , que delle se separa pela via das ourinas , conserva , e exhalla , estan- do ainda quente, hum ligeiro cheiro engraçado, e bal- sâmico do Cacao. Isto se tem observado muitas vezes , principalmente, quando esta parte aromática do Cacao não tem sido afogada no sangue por outros alimentos, c por outras bebidas , ou quando se toma o Chocolate habitualmente , ainda desprovido de qualquer especieria y ou aroma , menos da que lhe he própria , e innata. Todas estas propriedades do Chocolate estão contesta- das , e bem sabidas , e por isso devem convencer da grande utilidade , que pode ser , contra a thysica , e contra outras muitas moléstias , e muito mais, trazendo-se a seu favor o testemunho das experiências feitas por mui- tas pessoas de probidade que usarão delle com feliz suc- ctsso em taes circunstancias. Isto não acontece na maior parte dos alimen- tos, que se cosíuiTiíiO dar aos doentçs dç thysica ; os CM4> •.í:>; I.Í iiq.uidos perveitidos alterão todos ds alimentoí , que to* mão , ainda que de bom sueco , e muito sãos para os que estão bons : Cmnia sana sanls , o pão fermentado , pOE exemplo , bem feito , e da melhor farinlw , toma €0111 tudo facilmente com taes doentes disposições ac- cessantes , e nocivas. Aí carnes , e todos os suecos ti- rados de animais , logo contrahem , pela disposição que ellas tem a alkalecencia ,, esta fuiiesta qualidade , em o sangue, que já circula com matérias purulentas. O mesmo leite , ainda benéfico , como he , t€m gran- des inconvenientes para estes doentes ; as partes buty- rosas , que elie contém em grande quantidade, e que tem huma propensão mui próxima a faretem-se ranço- sas , e fétidas 5 o tornão summamente prejudicial a muitas pessoas attacadas da thysica pulm.onar , a pesar das precauções que se toma, dando-se ainda o leite o mais ligeiro ,. e ao sahir do ente animado, que o pr©^ duz, sobre tudo quando o corpo, que o recebe , trás em si muito calor. Sem dúvida este fedor que contrahe a parte butyrosa do leite com os doentes, que tem con- centrado em si este calor hectico , e consumptivo , he que muitas vezes faz os alimentos lactescentes muito mais nocivos que úteis nas thysicas pulmonares , d^o mesnío modo que em todas as moléstias chronicas a- companhadas de muito calor , nas quaes o leite , de outra sorte, podia ser muito útil , sobre tudo pela sua parte sorosa , e diluente. Quem pôde comeffeito conceber , quíal seja esta qualidade rançosa , e fedorenta , que adquirem as parteá bu- ( MS ) tiulyrosas^ do mçlhor leite , circulando pelos vasos deste» doentes cheios de fo^ío. Sabe-se , quanto este vicio hs funesto, quando vem a dominar nos liquores animaes, que he de todos o nuis temivel. Com tudo este he aquelle , ao qual os homens estão mais sujeitos pe- la grande quantidade de substancias gordas animaes, de que diariamente usão no seu sustento , sobre tudo nas casas opulentas, onde a cozinha se faz cm grande, on- de quasi tudo he cozido , e macerado por tempo infi- nito em. lardo, manteiga, azeite, ou em outras gor-. duras quentes. Sabe-se que o calor destes corpos gor- dos quentes he incomparavelmente maior que o da- agua chegada ao seu ponto de fervura , e que se s& precisa duzentos e doze.gráos de calor no thermometro- de Fahrenheit, para fazer ferver a agua , necessita-se mais de quatro centos e vijíte , para fazei fervei o azei- te , e assim huma tal intensidade de fogo deve dar lium prodigioso gráo de ustão di partes animaes , que ahi se farão cozer : assim se adverte que , quando ellas sahem dcíitas gorduras quentes , estão seccas , quebradiças em hun.'a palavra , meia queimadas. Sábc-se que os co- zinheiros., tem cuidado de as levar a este ponto, para li- sonjearem, mais o apetite embotado de seus amos ; mas d^stasocte fie ão mais prejudiciaes á saúde. As gor-dm^as quentes. adquirem^ estia perniciosa alteração no corpo hu- mano , a qual Eoerhaye. conheceo muito bem , e t characterizou debaij^o do nome de Ptitreda Oleosa.,., Aívis . . . . Faetc:(s ^ vicio a que certamente se nio -àt- t«ude, quando se trata de moléstias^ sem embargo de o o merecer, e muito, assim pelas funestas desordens, que causa , em a economia animal , como pela difficul- dade de a destruir. Certamente nada se tem que receiar das partes gordas do Cacao , e por consequência das do Chocola- te. Porque , ainda que seja cheio de huma grande quari- tidade de partículas oleosas , vimos que estas erão incor- ruptíveis , e incapazes da menor alteração , a ponto , que a pesar da grande acção do fogo , que se he obri' gado a empregar, para se fazer a analyse do Cacao, o óleo butyrpso , que deilè resulta , conserva ainda a doçu- ra , e que seu espirito longe de ficar fedorento por es- ta prova ígnea , tem hum cheiro suave , e hum sabor doce. Vimos por consequência que esta substancia bu- tyrosa somente podia offender pela sua grande opaca- cidade , pou sua dureza , e pelo grande trabalho que re- queria dos órgãos digestivos , quando estava debaixo da forma sebacea , mas , que estando attenuadas , se faz sa- ponacea , e vem a ser exactamente miscivel com o aquo- so , tendo então vantagens reaes a favor da saúde cm huma infinidade de circunstancias. Os thysicos acharião por tanto no uso do Cho- colate bem feito , e homogéneo , hum alimento medica- mentoso j que de balde o encontiaiáõ em outra parte, no caso de que se quizessem sujeitar a não se alimen- tar de otitra cousa , e de substancias farinhosas adoçan- tes, conio o sagú , letria , bolo de Bretanha, e outras desta natureza. He certo que se curaria muito melhor pelo §DCCorro destes alimentos que pelo uso de qual- quer C n? ) quer leite que fosse. Por quanto sabe-se que este ulti- mo alimento, ainda que muito bom em muitos casos ^ causa aos doentes muitos inconvenientes, não só em ra- zão de suas partes butyrosas , das cuaes já mostramos 5eus márs efteitos , mas também em virtude das suas partículas caseosas , que , coalliando-se nas primeiras vias se não podem attenuar, e reduzir em hum bom chylo ^ principalmente pelas visceras digestivas tão enfraqueci- das , como estes doentes as tem j de sorte que nada mais tem que a parte sorosa do Jeito, que lhe possa ser de alguma utilidade , como diluente , e não como alimen- to, se bem que alguma vez não deixa de contrahir al- guma acidez prejudicial. Muitos grandes Médicos, conhecendo o compa- cto , e dureza das particulas buty rosas do Chocolate, prohibirão expressamente o seu uso em certas circun- stancias. Cheyne achou que he muito oleoso, e muito tenaz , e que em consequência disto não convém aos convalescentes. Mas este célebre Medico Inç^lez confes- sa que fora disto produz todos os bons effeitos de hum alimento sadio para as pessoas fortes, e vigorosas, aos quaes o aconselha, como muito próprio a embotar os humores acres , salgados , e irritantes. M. de Jussíeu a <]uem os sublimes conhecimentos em Botânica depozerão no estado de appreciar bem os inconvenientes , e as vantagens dos vegetaGS , também prohibe o uso do Chocolate ás pessoas de letras ; pela mesma razão Ba- glivi, CaJdera , e outros Sábios Médicos o accusárão de máQ efíeita , mas eiks confessão que estes inconve- nien- m ( n« ) nientes Ihê pfovem da tenacidade àii partes biítVrdS^às^ e sebaceas do Gaeao. Donde se segue , que , tendo-sè destruído a Solides , e grande dureza das partes gofdaí do Cacao , e que sâ tem feito perfeitamente solúvel em agua quente , sem que se llie possa íeparar aiglima parte butvrosa , não pode este alimento causar os in- convenientes , que fazem «'eitier o seu uso com furida-- mento , e qu^s , pelo contrario, só' produzida bons ef- feitos á saúde como alimento ^ e também comof remé- dio. He fácil conceber que , debaixo deste ponto de vista da solubilidade da parte gorda sebosa dò Choco- late nos aquosos , se precisa considerar o Sem que pode obrar , e oliiar esta propriedade , como hum.a con-' dição essencial, e necessíaria ,- para qlle a^ pessoas deli* cadas possão tirar deste alimento todos os pfOV€^itosí possíveis , evitando os' inconvenientes, de que se tem f ai lado. Vio-se que o Chocolate bem preparado , cujas partes estão perfeitas, e juntamente unidas,- he ha rea- lidade hum ejíceilcnte alimento ,^ e hum óptimo remé- dio estomachico , assim em virtude de suas^ panes eic- tractivas amargas , como dos saes saponacet»^ bàlsamí-' cos diíTestivos, de que abunda. He igualmente peitorat em razão da abundanciar dos succoS' butyrosos doces- >• e inalteráveis , que contem. Os nossos exrfmés pi ora-^ rão a existência de todos estes principiOs nó Chocolate. Tem elle outra propriedade singular , e muito- precio-' , evem- aser, o dar ás pancadas do cortcão , c das^ artérias hum desenvolvimento que- faz; o pUiso larga',^ ma- lAMÉili (519) macio, vigoroso, sem lhe accelerar as pulsações. Vere- ficamos este bom effeito em infinitas pessoas , e em nós mesmos , onde nos foi facij observar este jogo in- terior cio coração, e das artérias, que se fazia ser^ per- turbação, sem eretismo, em huma palavra, com toda a ordem possivel ; donde he fácil concluir, que todas as funções das visceras devem participar desta boa or- dem , e fazerem-se perfeitamente. O Chocolate gosa , como a Quina , da propriedade de fazer o pulso gran- de, e desenvolvido, quando começa a obrar contra as forças febri», e quando se observa esta acção, e este vigor no pulso do febricitante , se fica certo que o fe- bricitante, que está no uso da Quina , se curará presto, em lugar de que, havendo outra causa, fora da que de ordinarip move as febres iníermit tentes , o puiso se conserva pequeno , a pesar da acção da casca febrífuga. Então he mister que o Medico , attendeado tudo'' o sue .se passa em o seu doente , desconfie do seu re- médio , o deixe , ou que Ibe haja de sustentar os ef- feitos por outros meios, que a sua arte, e a sua. pru- atínçia lhe sugg^rir em ta! caso. Pôde por taato appli- car.Jhe o Chocolate , como lium b^m febrifogo, não só Oas febres intermit:^eI.t:cs „ centra, as qtraes obraria, por seus priacipios tónicos-, amargx3s , e saij^o dr^e^tiroj, raas tamBem na^ outra^v que tirassem por ca^. in-^r- njçôes, iangux)r3s-,, atonia ,. qu falta de a^íío áa solida nervos. Nestas: aJtJmas- ciroinstandas ohiJt com ener- gia pelo- sptt- principia aieaso. fínr? ethereu , cheia da Wpiriííí rtKtQf; N<^mentg. vimos: hum ©cempiu,. emre ou- ( J20 ) outros muitos , deste bom effeito do Chocolate etíi díiai pessoas inanidas , hum homem , e huma mulher , aiii* bos estavão cabidos em hum estado de languor , e dé magreza extraordinária , padecendo- huma febre lenta actual nío podendo suster , nem coiiser%^ar aHmentó algum ; a mulher principalmente estava reduzida a ul- tkna extremidade por perdas abundantes. Poz se a estes doentes no uso do ChoroJate bom , feito com agua j por todo o remédio , e sustento , m^io muito shnples j mas que teve toda a efficacia , para os reestabelecer per- feitamente com grande pasmo de todos os que os ti"- nhão viste no seu estado de defmamento. Em: particu- lar a mulher tinha hum pulso tão pequeno qtíe" se ex- tinguia aa menor tacto. Não podia tomar quasi qua- tro eolheres de caldo sem padecer, fazendo-a suar , G cahir em desmaio. Passados algims dias do .uso àú Chocolate ,, que se lhe dava de hora cm- hora por cg- Iheres , com.t) se dá huma bebida cordeal , o pulso eo- meçou a descobrir-se , e a fazer-se grande. A enferma não padecia trabalha, ou fraqueza , tomando o seu no- vo alimento. Augmentou-se-lhe p^cidaihn a quantidade. Adoçou-s€ alguma cousa mais ao depois , deitando-se-lhe hum oitavo de leite, e successivamente h-um tanto mais, ajuntando^se-lhe huma gemma de o^^o , e sem* pre sem pão, ou outra substancia solida. No cabo qua- $i de seis semanas ou dous m.ezes tinha recobrado for- ças bastantes , e saúde , para ir passando pouco a pou- co para o uso dos alimentos ordinários , paira voltar ás suas occupações , e da hi a hum anno ver-se mãi de hum hhm filho. Tacs curas feitas por hum remédio alimeri* tar, tal .]ual o pôde ser , seiâo sempre pasmosas , e muito interessantes , para se privar ao público da sua noticia. Náo se deve todavia dissimular que , pelo mòti- vo de ser o Chocolate muito bem dividido , e feito perfeitamente homogéneo , c haver de ficar hum remedid salutifero , ou alimento , he preciso que as primeiras vias não estejão impregnadas de máos fermentos. Por quanto , se estes órgãos se acharem entupidos , ou como cobertos de matarias viscosas he fácil julgar-se que seria preciso remediar estes vicios , antes de se pas- sar ao uso do Chocolate. Mas as pessoas me.mo deli- cadas , que presumem ter princípios destas moléstias tias primeiras vias podem-no usar eom segurança. T. iij. p. nt X CA. (3") CAPITULO III. Vsâ ào Chocolate prejudicial em algumas circtmstanutis. I '.'^^ C^Omo não ha regra sem excepção, cumpre advertir que ©Chocolate, supposta qualquer qualidade , convém poiíco ás pessoas repktas , aos que se sustentão regala- damente de carnes succulentas , que fazem pouco, ou ©enhum exercício , e que por isso ficlo muito gordas : em qualquer destes casos nunca o deve tomar ao depois de comer immediatamcnte ; porque então não só não digereria , mas perturbaria a digestão dos outros alimen- tos. O bom Chocolate , sendo mui substancial de si mesmo, he ao menos supérfluo, por não dizer nocivo., ajuntar-lhe pão , sobre tudo tomado por almoço , e so- mente por esperar o jantar , com tudo se está no uso de o ajuntar , mas por pouco que se coma ou muito , ou que o estômago esteja fraco , o pão o sobrecarrega ; porque o Chocolate , formando hum liquido unctuoso , e espesso, longe de favorecer a digestão do pão , lhe impede, ou lhe retarda a divisão, e o estômago o di- serc mal , principalmente , se he torrado ; então passa a íncommodar : o que se não deixa de attribuir ao Choco- late , no comenos que este effeito he só do pão : que- rendo-se comer este absolutamente , hc mister que seja em mui pequena quantidade, ou beber ao depois hum copo de agua. Fa- Faíendp-se derreter o Chocojatfi em leitg puro, este modo de o preparar, o fará mais prejudicial muitas Vezes , como temos advertido , sobre tudo jis pessoas de estômago delicado , ou enfartado de fermcmos azedos ; mas , querendo-se a doçur? do leite , se precisa ante? fazello derreter em agua , e juntar-lhe ao depgis mui f)Ouco leite , huma ou duas colheres por ta^a serão bas- tantes para o fazer delicioso , dando-lhe a graça lactes- cente que se appetece , sem que possa incommodar, debaixo do supposto de náo haverem máps fermentos íias primeiras vias. Qwerendo-se absolutamente preparai- Jo com a am.etade de leite, seria então preciso conten- tar-se com derreter meia dose, ou meia onça de CLoco- Jate , n'huma meia taça de agua , e ao depois de bem -derretido , e dividido com o moliiiete ou batçdor a- erescentar-lhe então outro tanto de leite. Tem-se vis- to , que algumas pessoas delicadas , que usão do Jeite de qualquer qualidade que este seja, de vacca , de ca- bra, de burra, se dão muito bem, cçmendo huma ou .duas oitavai de pastilhas de Chocolate , tomando a sua dose de leite pela manhâa em jejum. Finalm.ente pôde- SC muito bem passar sem se comer pão , ^ ^ ainda de misturar o leite com o Chocolate homogéneo , com p pretexto de mais substancial , visto qu« a uniáo inti- ma das suas pçarticulas buty rosas com as extractivas for- marão hum liquido gelatinoso, de tal sortç^^ sj íhçí- ..nio restaurador , que huma onça derretida em seis dè agua , que enchem huma grande taça , será bastante pa- W SMstentí^r ^^,u^s pessoas .por <)it<:> dj^., ^^t® teíçi^i X z pre- ( 524) precisão de outro alimento , o que he bom aos C)ue viajão , e a Militares , ou que não tem que comer , ou que precisão de tempo para o terem. Ora a ser assjm podião-no tomar cm substancia , digo, em pão, huma onça de cada vez , bebendo , em cada huma destas hum copo de agua fria, podendo-a ter, ao depois de o co- mer 5 o que bastaria para os sustentar com abastança todo este tempo. Talvez este alimento lhes seria mais útil , mais commodo , c mais engraçado em taes cir- cunstancias, que as taboletas de caldo de carne, feitas dos suecos desta espessados, que só podem ser boas, sendo derretidas ^ e amplificadas com muita agua quer>- te, para lhes abrandar, ou adoçar o calor dos suecos, e culis da carne j de que se compõem. Seria conveniente que todo o Caeao nos houves- se de vir d'America feito em massa perfeitamente moí- do, e posto em grossos páos, ou pães, feitos apenas fosse elle colhido , e sem perder tempo , immediata- mente ressuado', de cuja preparação neeessitão , para terem a perfeição necessária* Tendo sido oCacaO redu- zido desta forma em massas grandes, no seu paiz natal conservaria maior quantidade de particulas oleosas fi- nas , e deste ligeiro amargo, que lhe lie próprio, as quaes todas, unindo-se j fazem este frueto mui substan- cial , ou riutridor , mui estomacal , e mui cordial ; mas he preciso que esta preparação seja feita facilmen- te com todo o escrúpulo preciso. Não era menos ne- cessário que houvessem poucos direitos sobre este. ge- • nero mercantil, por qiie, sendo de hum módico pfc- ço, C }25 ) ço, pocíessem os pobres fazer delle o mesmo uso que fazem os ricos. Para se pôr o novo Chocolate em forma liqui- íia , como presentemente se pratica em França , e de ^ue já fizemos ver o proveito , são precisos alguns cuidados indispensáveis ; porque , sem estes , não agra- darião , c serião mal feitos. Precisa pois , para cada vez , que se toma , raspalio com huma *rosa de rapar assu- car, ou reduzir a pequenos bocados, com, huma faca, huma onça de taboletas , ou páos deste Chocolate, que se deve pôr cm chocolateira de barro , de lata , ou fo- Jha de Flandes , ou de prata. Devem-se deitar tantas onças de agua fiia , quantas forem as do Chocolate ra- pado. Ponha-se a chocolateira ao fogo , para que haja de ferver pouco a pouco por meio quarto de hora , pre- cavendo, cuidadosamente que o liquido se não levante, fervendo muito. Ao depois se lançará na chocolateira o molinete, ou páo de bater , para mover bem o liqui- do , o que se deverá fazer por treS' vezes , alternativa- mente, tendo o cuidado de o conservar quente ; para que assim haja de ser tomado o mais que for possivel. Debaixo desta forma o Chocolate he delicioso , de hum sabor doce, eunctuoso, como se fosse a nata de leite , mui doce , que se tivesse na bocca. Percebe- se esta doçura, principalmente no palato, nas paredes doesophago, donde transmitte para o estômago as suas impressões favoráveis , etc. Comsigo tem hum agradável aroma , que conserva os principies activos do Cacao levemente desenvolvidos , sem ter necessidade de algu- ** ■ ' mas tííai fftistiirài de èspeèièrias incendiária^ , fiètí! alflda. dl canella, menos da Baunilha, ou do almíscar, âmbar, bii ambreta. Este Chocolate espuma muito bem , mas precisasse, por causa do creme , ou nata, que seja batido èm hum vasb alguma cousa mais lârg© , de maneira que, ao menos, tenha meia pollegada de distancia en* tre as paredes da chocolateira , e a superfície da extremi* tiade inferior dó páo , ou molinete. Não havendo este instrumento , se pôde muito bem íupprir com hum pe- queno bátbdor feito de quinze até vinte ramos de vi- meiro , que se mette em o liquido do Chocolate quen- te , e que sê move assas , rolando-o entre as mãos. Convém muito esta agitação do Chocolate para aper* feiçoar a homogeneidade , e divisão das suas partes pos- tas pela preparação antecedente á sua massa, em huma disposição próxima ao maior desenvolvimento possível , ao passo que os páos de Chocolate , preparados pelo me- thodo antigo , sendo desfeitos em agua , dando-se-lhe qualquer batedura , ou agitação com o batedor , óu t-nolinete o liquido se deccmpoem , quando esfria ; as partes butyrosas se coalháo na superfície do liquido , o sedimento se precipita no fundo, e todo o lesto se fica como hum fluido claro , e aquoso. Observamos que desta falta de união dependem principalmente os máos tffeitos que obra e§te Chocolate em muitas pessoas de» liçada'', Quando se quer que o Chocolate espume muito, •se precisa lançar-lhe , antes.de o tomar, huma gemma de ovoírçsça para tiuas taças, sçm precisar ^sfazer o ovo C !27 ) evo antes , mas logo que se pozer o batão bem , e o licitem nas taças. Com isto o liquido toma maior con- sistência , e para muita gente seria muito grosso , vis- to que o Chocolate sem esta aíádicçâo já o era , e por tanto isto fica ao gosto de cada hum. Preparado assim o (>hocoJate , tem hum sabor menos assucarado ; porque ficando a parte gorda saponacea , e gelatinosa envolve , e embota a acçáo do assucar sobre as papillas nervo- sas , espalhadas pelo órgão do gosto. Se algum desejar leite no Chocolate , se lhe deite em cada taça duas o\i três colheres de assucar de mais de bom leite fresco , antes da ultima batedura. Precisa-se não exceder esti quantidade de leite, porque o Chocolate sobrecarregaria os estômagos delicados , ou seria preciso por-lhe menos Chocolate ; como já se disse. Também se não deve es- quecer que o pão se digere mal com esta substancia alimentosa , e que elle he bastantemente nutritiva d« si mesma , feita como se disse , para servir em lugar de pequenas comidas aos convalescentes , aos valetudi- nários , e ás pessoas delicadas , observações que já se fizeráo ; mas que he útil tornar a lembrallas. €A- (3^0 CAPITULO IV. |>» Chocolate , reduzido desta maneira a huma forma liquida mui homogénea , unctuosa , e em huma espécie de creme licyaido , fornece hum meio proveitoso de se empregar nas moléstias , especialmente , nas chronicas , em certos purgativos acres ; irritantes , desagradáveis , e nauseabundos , como o diagridio , a jalapa , a que os JVSedicos çhamão com razão rheub^rbo branco , pelo sua- vizar aos doentes , aps quaes convém esta raiz , cue elles yecusio : em fim este mesmo creme também cfferece a vantageni de tqm^r rpubarbo , lirio florentino , ker- mes mineral , e outros purgativos pioprios a, differentes moléstias , ainda em doses porporcionadas ás differentes idades , sexos 3 e temperamentos. A doçura privilegiada do Chocolate correge o sar bor desagradável , e temperará a acção irritante dos pur^s gativQs, sem lhes embaraçar os effeitos. Faciiitar-lhes- ha , além disto , o uso ao ponto que não somente não causará alguma repugnância ; mas também se adoptara çpm tíinto gosto , como satisfação. Assim , querendo-se fa. fazer esta bebida laxativa, bastará desfaíer com cilicia- do liuma destas purgas , feitas em pó subtil , só no ins- tante c;ue o doente estiver a ponto de a tomar. Este modo de purgar tem sempre proescripção do Cacociro. . . 79 CAP. ,11.. C'í ^scolha^, e dijposjção de In^ar , pcnra se Jazer hum -vergel de Cacao , ou CacoaL . . %^ CAP. III. "D^ '"^^^ ^^ plantar himi Caeoal ^ e de o cul- tlo Chocolate §. I. Da origem do Chocolate ^ e o5 dlff crentes modos dé ' P'V'^'^^r iÍ3Íd, 2\'íethodo de se preparar o Chocolate h maneira das Ilhas Franceias d' America, ' ' » . . . . l^Z §. II. Das i,íllldades, (jue se podem tirar do Chocolate nos usos da Medicina. . ♦ * ' ' ' . 154 CAP, III. Do oleo, ou ivântelgã de Cacao. . , 13 g IVIEMOR. VIII. SOBRE O CACAO, (D.. Noveau:^ voya^e.f falte au:c Istcs Francolses de VAmerUjué. Part. VI. tom. II. pg„ 34p.) ^ j^^ §. I. Do Cacao y e sua cultura \ . jj^jj §. II, Flores do Caeoelro. . , ,.-< §, III. FraefDS do Cacao. •......, I^O J. Iv.' Escolha de hum terreno , para se Jundar o Ca^ ""'■ ••••,/ ,54 T. IH. p. m. X §, V, §. V. Extensão dos Cacoaes. . . a • s • . 15S §. VI. Maneira de se plantarem as arvores. . . 159 §. VII. Maneira de plantar as amêndoas. . , . 162 §. VIII. Modo de cobrir os novos Cacoeiros. . . 164 §. IX. Accld entes que sobrevem aos Cacoaes. . . 16S §. X. Madureza do Cacao , e o modo de se colher. 170 §. XI. Modo de as fazer ressuar ^ ou fermentar. . 172 §. XII. Como se Jazem seccar 173 §. XIII. Producção ordinária dos Cacoeiros. . , 174 §. XIV. Conservação dos Cacoaes. . . , . . 175 §. XV. Kendimento de hum Caçoai. , . . , 177 §. XVI. Natureza do Cacao ^ . . 179 §. XVII. dualidades do Chocolate 184 §. XVIII. Pedras de moer o Chocolate, ... 188 §. XIX. Modo de se fazer a massa 189 §. XX. Composição do Choco Jate ã Hespanhola , e Ita- liana ...:,.,. 190 §. XXI. Modo de se fazer o Chocolate nas Ilhas Fran-. cezas , . 19a §. XXII. Chocolateira , e a pâo de bater , ou moline^ ' *'' ' 195 §. XXIII. Píio de bater o Chocolate. . , , , 196 §. XXIV. (Qualidades do hom Chocolate. , . . 197 §.xxv. 5. XXV. Bdiifa Inglcza chamada SallhoL , , j^g §• XXVI. Chocolate ã Romana. 199 S. XXVir.' Modo dcfa.cr o Chocolate com perfeição. .03 $. XXVÍII. Slsnacs do bom Chocolate , e do bem Jci. to 20a í. XXIX. Winta^ens ã Fazenda Real. • • . . 204 §. XXX. Mantel(ra de Cacao 204 §. XXXI. Primeiro Methodo. . u • . ibid, S. XXXII. Segundo Methodo cjue só serve nos lugares fm íjue nasce. 2Q6 §. XXXIII. Chocolate de Caju -^ 2.0% §. XXXIV. Tintura do Cacao .j^.^ ^EMOR. IX. SOBRE O CACAO. '(T/. 'just.^ \j Jamaica Book III, cap. VIU. pag. 69J.) . ^oç> JV3EMOR. X. SOBRE O CACAO. QCommerce de V.U merhjue tom. II. pa^. 255.^ Origem do Cacao. . ., . ibid. Cultura do Cacao. 224, Uso do Cacao. ''••••... 231 Propriedades do Cacao ^^S Commerclo do Cacao. MEMOR.XI. SOBRE O CACAO, E CHOCOLATE Por M.PeJIisard. £,„ y,,, „ i:cami„S<, os proveitos, e l/í- It' r% t 340 "5 inconvenientes, ç«e podem resultar do uso desias subn stancUs\nmentosas. Tudo fundado na experiência , « exanies analijtlcos da amêndoa do Cacao, , , 2 39 PARTE I. Vo Cacoclro ^ e seufntcto. , . . ibid, CAP. I. Vesçrlpção do Cacoelro , e seu fructo. . ibid. §. I. O Cacao he a base do Chocolate. . , .24; §. II. Actualmente se distinguem ires sortes de Amêndoas de Cacao. . . . • "^ §. IIL Cação de Cavaca , a sua peUicuh he salpicada de peíjitenas f articulas hrilhantes, . . . , . 244 |. IV. Çcic^o de Berhiçhe, ou da Costa, . , . 247 §. V. Cac^o das Ilhas -4^ ÇAP. IL 4nali]se do Cação Jeita por differentes Sá- bios, . ^51 CAP. III. I{ova ^nalyse do Cacao. . . , . . 2^2 §. I. Tintura amarga. ....... ^ ibid. 6. II. Óleo ethereo coalhado. Nenhum sal volitil con- creto., ... 5 •••♦•**■ ■ ^^"^ §. III. Liquido espirituoso. ,,►..•• ^5^ §. IV, Çlea fino ethereo. ... 257 §. V. Espirito Redor. ...,.•••• ^5 ^ §. VI. Sal fixo alkaií. Substancia uhosa. . . 260 |, yiL f eiTí^. $al scAatm. .,,.... ^^^^ §.vm. Ç J40 Ç. VIII. Extracto fíwargo salino. s í ^ 4 ■, '26^ §. IX, Snl essencial do Cacao , (juc SC derrete em espU rito de vinho, , -^^^ §. X. Nenhum acido vltrlollco. Sal tcrreo amargo. 26Z §. XI. Cheiro do Castoreum do lujiior extractivo. Saí selenltoso. , ^_^ ■• 270 §, XII. Sal volátil oiirionoso. .... „ 2-71 CAP. IV. Malyse das pelliculas do Cacao. ; . 27 j CAP. V. Compararão da analise do Cacao , com o do Ca- f'- 279 PARTE II. 'Do uso do Chocolate. . , . , . 281 CAP. I. Exame da acção , e effeitos do Cacao , e do Chocolate , sobre os sólidos j e fluidos. . , . ibid, CAP. II. Uso do Chocolate nas tnolesllas chronleas. 308 CAP. III. Uso do Chocolate prejudicial em algumas cir- cunstancias. •••»...,... 223 CAP. IV. Do Chocolate considerado como vehkalo doce ^ e agradável de purgantes amargos ^ c Irritantes. 32S CAP, V, Conclusão da Obra. .^.^.^.331 F I M, Ç í-fj ) APPENDIGE. (Rcliicíoii Histórica dei vla^e a la Aniirlca Mcridionai y tom. I. parf, I.) Por D. Jorge Juan , y D. António de UJloa. Niim, 1 5 gí, JL Roduz támbei^n muito Cacao nàs itiárgená dõ Rio Magdalena , e em outros sitios adequados para elJe, tí deste termo gosa o priviíegio da primazia em a bondade entre todos oi que se conhecem assim, por sef o grão maior que o Caraça, Maracaybo , Guayaquil , e òutra^ partes , domo por ser muito mais mánteígoso que o^ outros. Nao he mui conhecido em Hespanhá ; porque só o conduzem por mimo ; por quanto , excedendo aos outros em qualidade , se consomme todo em o m^esmd termo , e em outras partes das índias ^ onde se nego- cea com elle ; ainda que também levao alguma porção" do Caracas , e se conduz parte ao interior do paiz,' pof causa de não bastar para o seu crescido consum- mõ o de Magdalena 5 nem deixa de ser conveniente o misturar o de Magdalena com o de Caracas , para que líão fique aquelle tio mantéigoso , como aconteceria , se t. llh P, 111 % fos- C 544 ) fosse só. Este Cacao , em distincção do que se eíis nas outras partes se veíide por milheiros , em Cartage- na , e o seu peso be de quatro libras, sendo que o de Caracas se vende porfanegas, que cada huma consta di cento e dez libras , e o de Maracaybo de noventa e seis. Num. 445.. í , Neste paJz abunda da arvore do Cacao , como já disse , e se levanta com a sua copa da terra regular- mente de dezoito , a vinte pés ; e não de quatro , ou cinco, como'disserão alguns Authores, Começa do chaa a sahir dividido em cu^atro, ou cinco troncos, mais, ou menos, conforme o vicio, e vigor da raiz, que faz as brotas. Cada hum engrossa de quatro , a sete poUe* gadâs de diâmetro, huns mais, outros menos; porem desde logo sobem com alguma inclinação, oú obliqui- dade ; por cuja razão as suas ramalhadas estão humas separadas das outras, A Tolha he de quatro a seis poi- legadas de comprido, e três , a quatro de largo, muí Jisa , suave, e terminada em ponta. Semelhante na fi- gura á da larangeira ; na còr diftere para hum vende entre escuro, e ciiizeiíto , e não^hrttrosa , «em tein tantas: do mesm.o tronco, e igualmente do» seus ra- ir-os brota as caboças , que contém o Cacao ,• píece» dendo-llies huma flor branca nÃo mui grande em cujo coração está a mazorcn em pequeno. Esta creSce até seis , oií sete pollegadas de comprido , e quatro , a cin- co de grosso j em figura de hwm melão pontiagudo , ç; d*- ( Í45 ) dividido em cascos assÍ£;naiatlos pelo comprimento desdo o pé até á ponta , ainda que com alguma profundida- de mais que no melão. ToJas as mazorcas não são do mesmo tamanho precisamente, que ííca apontado , nem a sua grossura se proporciona sempre á grandeza , ou grossura do ramo, ou tronco, que as produz , e nas quaes estão pegadas , como se fossem verrugas das mes» mas ; porque as tem muito menores ; e talvez huma pequena em a parte do tronco principal, e huma mui grande na parte debil do ramo ; poicm he notado, £\ue , regularmente , quando nascem duas immediatas hu- ma i outra^ huma cresce, engrossa, attrahindo a su^ sUncia nutritiva; e a outra fica pequena, c miúda. Num. 446. A côr desta mazorca , no tanto que cresce , he verde , como a mesma folha ; porém logo que chega a seu ponto , se vai mudando em amarelJa , até que toda fica com esta côr alguma cousa clara. A casca , que a cobre heJisa, e lustrosa , colhida ^mazorca , estando de vez, e partida em rodas, se lhe descobre a côr branca da sua carne interior, succosa , embrulhadas, ou en- voltas , ou formadas delia mesma humas sementes , or- denadas segundo os cascos, então pequenas, e não de outra consistência que o resto da carne ; ainda que mais brancas, e compostas de huma membrana mui fi- na, e delgada, que contém hum liquor, á maneira de leite 5 porém transparente , e alguma cousa viscosa : cn- ( 546 ) então se pode comer como outra qualquer fructa : he «'ostosa , e seu sabor agiodulce não he desagradável ; porém, segundo diz opaiz, nociva , e occasiona febres. Estando a raazorca amarella no exterior , he quando o Cacao se começa a nutrir da mesqna carne , e a con- solidar-se, enchendo, e crescendo a amêndoa; e neste tempo o seu exterior vai desmaiando a cór , até que, estando perfeita a granaçáo interior , fica a casca por fora com huma còr parda , tirando a escura , que he O çignal de estar em estado de se poder colher; e então o grosso da casca he pouco mais de duas linhas , e inda a amenáoa se encontra encerrada em huma das divisões , que formão as membranas , que atravessão 9 inazorca ^ assim pelo^compiimento dos mesmos cascos > como seguindo as suas divisões. i , '(*'! IVí(/;;. 447. Logo que sç despega a mazorca da arvore , a a- brem , e despejão a semente sobre huns couros de boi seccos , que tem para este fim , ou sobre folhas de Pa- cobá que he,o ordinário, nas quaes a deixão seccar ao vento , e seçcas as metem em surroes , em outros cou- ros, e a transportão , aonde querem vender. O metho- do , que tem para isto , he por cargas , e cada huma contem oitenta e hqm arráteis. O preço varia muito ; pois sedão occasióes , que , não havendo quem o com- pre , o òio por sei^, coito reales a carga , muito mer íios qqe o importe da colheita ; porcai , tendo sabida, he \ C !47) hc o seu preço regular três , a quatro pesos , e no tem- po de frotas , e outras occasióes semelhantes , que ha muitos compradores, sobe a muito mais. Num. 448. Dá esta arvore duas colheitas annuaes, nSo menos abundantes, e de boa qualidade huma , e outra, enel* Ias se colhe em todo o termo dos partidos de Guaya- quil , que o produz de quarenta mil , a cincoenta mil cargas. Num, 449. As arvores do Cação requerem tanta abundância de agua, que he mister se faça hum lodo aterra, donde çe semeia : faltando lhes esta , cessão de dar fructo , çeccão-se, e se perdem : além desta, devem ter humí^ sombra contínua , de sorte que lhes não toquem os raios do Sol immediatamente, e assim, quando se semeão, se deve juntamente fazer huma plantação de outras ar- vores de maior corpulência , a cujo abrigo vão cres- cendo , e se mantenhão ao depois. O terreno de Gua- yaquil he próprio para estas arvores ; porque gosa dos benefícios , que requer. Hum por ser todo ern várzeas , ou planicies dilatadas , que , como fica dito , se inunda pelo inverno , e se regão pelo verão , por meio das ze- quias , ou canos , que se tirão dos rios ; e o outro , porque as outras espécies de arvores crescem sem dif- |iculdadc com maito vicio. Num, Cl4Í ) Num. 450. Toda a cultura desta arvore consiste em limpar as plantas níenores, que com o auxilio da mesma hu- midade produz o terreno , porque se se ommitte esta diligencia , cttscem em poucos annos , e consommem os Cacoacs, tirando-lhes o nutrimento, que os havia dç Biaater , c fecundar. ■'■; I' exí C J49 ) c EXTRACTO TIRADO DO CORREIO MERCANTIL PORTUGUEZ Num. 3. Níi/ites 2^ de Novembro. Onsta pelas ultimas noticias de Cayenna que a cul- tura da terra prosegue alJi agora com a maior activi- dade : t]ue as arvores preciosas da especiaria da índia prosperão ao Jado das plantações do paiz , e que hu- ma mesma mão colhe no mesmo terreno o Cacao, o Algodão, o Café d'Arabia , o Cravo de Ceilão, o Pi- rnenta de Malabar , e a Noz-Moscada das Molucas , que são verdadeiramente antjpodas de Cayenna. Só a Fazen- da chamada da Gabriela , que pertence ao Governo, dará em breve o Cravo , de que necessita a França. A caneleira não prospera menos que as de mais arvores de especieria , .se bem que a sua casca he de inferior qua- lidade. Alguns melhoramentos na cultura desta arvore talvez lhe darão a perfeição que lhe ialta , pois tem de mais em volume o que lhe falta na parte aromática. A arvore do pão começa a multiplicar se. Esta arvore reúne a huma vista formosa muitas utilidades , pois de- Verá dar aos Colonos , e aos seus escravos hum alimen- to sadio, e nutritivo.- He hum dos mais bellos presen- tes que o mundo antigo tem feito ao novo. Finalmen- te a Guyana Franceza não tardará em competir em ri- queza com as Colónias vizinhas. Rr.?«^i'li '>/-^' ' W^r^l ^^ ' y/n'c^/y?xy;//cf /^ acao. í Al. I :% ■I 'tiíi ■J %^w: