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Full text of "A “Procissão do Enterro” de Sexta-Feira Santa: subsídios para as reconstituições musicais"

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A PROCISSÃO DO ENTERRO DE SEXTA -FEIRA SANTA: 
SUBSÍDIOS PARA AS RECONSTITUIÇÕES MUSICAIS 



Paulo CASTAGNA 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa: subsídios para as 
reconstituições musicais. III SIMPÓSIO LATINO- AMERICANO DE MU- 
SICOLOGIA, Curitiba, 21-24 jan.1999. Anais. Curitiba: Fundação Cultural 

de Curitiba, 2000. p.227-261. 



RESUMO. A Procissão do Enterro de Sexta-feira Santa surgiu no Mosteiro de Vilar de Frades 
(Portugal) entre os séculos XII e XIII e foi incorporada à liturgia do Bispado de Braga, sendo descrita 
pela primeira vez no Missale Bracharense de 1558. Esta cerimónia subsistiu após o Concílio de Trento, 
pois a Bula Quod a nobis de Pio V (1568) permitiu a manutenção das liturgias que já fossem praticadas 
há mais de 200 anos. Com isso, a Procissão do Enterro difundiu-se para as colónias portuguesas da 
Ásia, África e América, sendo praticada até hoje em vários países de fala portuguesa. No Brasil, tornou- 
se uma das mais importantes celebrações da Semana Santa, com a utilização de composições musicais 
portuguesas e brasileiras em latim, preservadas sob a forma de manuscritos em vários arquivos do país. 

1. Introdução 



A Procissão do Enterro é uma celebração religiosa de origem medieval, pratica- 
da ainda hoje em Portugal e no Brasil, como a última cerimónia religiosa da Sexta-feira 
Santa. Embora em franco declínio, o costume ainda é observado em Portugal, sobretudo 
em Braga, como informa a publicação lusitana Festas religiosas: 1 



"Durante séculos senhorio dos arcebispos, Braga conserva nos 
seus monumentos muita de sua grandeza medieval. Nas imponentes 
Festas da Semana Santa, além das cerimonias que decorrem na Catedral 
românica, salientam-se as grandiosas procissões de 'Senhor Ecce Ho- 
mo', na noite de Quinta-feira e a do 'Enterro do Senhor', na Sexta-feira 
Santa, num percurso que acompanha as muralhas da velha cidade ro- 
mana ao longo dos 'passos', autênticos altares de rua; [...]" 

O Brasil é a região na qual esta devoção está mais difundida e preservada, sendo 
praticada mesmo em grandes cidades, como São Paulo, onde ocorre todos os anos em 
vários bairros, cantando-se, em alguns deles (como na Lapa), música com textos que 



; Pesquisador da música brasileira e Professor do Instituto de Artes da UNESP - Uni- 
versidade Estadual Paulista. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



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remontam, pelo menos, ao século XVIII. Em Minas Gerais, entretanto, a Procissão do 
Enterro é mais frequente e mais tradicional, especialmente na cidade de São João dei 
Rei, que, para a ocasião, atrai centenas de pessoas de cidades vizinhas e mesmo de ou- 
tros Estados. 

Existem muitos detalhes envolvidos nessa devoção. Em termos gerais, a cerimó- 
nia inclui um ou dois Sermões alusivos à Paixão (o Sermão do Descendimento e o Ser- 
mão da Soledade), no local em que está instalada a representação da crucifixão de 
Cristo, diante de uma das igrejas da cidade. Junto ao local, postam-se pessoas que, com 
o auxílio de vestes e símbolos, representam personagens do Antigo e do Novo Testa- 
mento, como evangelistas, profetas, apóstolos, soldados romanos, etc. Ao final da pre- 
gação, a imagem do Cristo morto é retirada da cruz por personagens que representam 
José de Arimatéia e Nicodemus e colocada em um esquife. O coro começa a cantar o 
texto Heu! Heu! Domine! Heu! Salvator noster!, normalmente sem acompanhamento 
instrumental, e o esquife é seguido pelos personagens bíblicos, pelos membros das ir- 
mandades que promovem o ato e pelo povo, por várias ruas da cidade. 

Ao terminar a procissão, o esquife é depositado em um local apropriado, no inte- 
rior de uma outra igreja, iniciando-se a segunda parte da cerimónia, na qual a imagem 
do Senhor Morto é incensada, enquanto o coro canta, geralmente, o Sepulto Domino 
(existem outros textos para a incensação do senhor Morto, como veremos adiante), sem 
o concurso do povo. A cerimónia termina com a visitação dos fiéis à imagem, os quais 
passam diante dela em silêncio. Embora encerrada a Procissão do Enterro, no Domingo 
da Ressurreição (ou de Páscoa) os mesmos personagens retornam para a Procissão do 
Santíssimo Sacramento, cuja temática é agora a da ressurreição de Jesus. 



2. Origens 



1 PORTUGAL. Festas religiosas. Lisboa: ICEP, [c.1990]. p.4-5. 

Jorge de Campos Teles informa que, em Lisboa, após a Procissão do Enterro era feita 
a Procissão do Regresso de Nossa Senhora, no antigo Convento de São Francisco de 
Xabregas, encerrada pelo canto do Stabat Mater e pelo Sermão da Soledade, lá também 
conhecido como Sermão das Lágrimas de Nossa Senhora. Cf.: TELES, Jorge de Cam- 
pos. A Paixão de Cristo na devoção popular lisboeta. Lisboa: Rei dos Livros, 1999. 
p.132. 



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Uma das raras notícias conhecidas sobre a origem esta celebração encontra- se no 
Thezouro de ceremonias (1734), de João Campelo de Macedo, segundo o qual a Procis- 
são do Enterro surgiu no Convento de Vilar de Frades, que existiu no Bispado de Braga, 
em Portugal, nos séculos XII e XIII, então ocupado pelos Cónegos de S. João Evange- 
lista. 3 De acordo com o cerimonial de Macedo, embora não conste dos livros litúrgicos 
tridentinos, a Procissão do Enterro não se opõe às rubricas e, por ser "uso pio e devoto", 
não foi proibida pela Igreja: 4 

"Porém, como a Procissão do Enterro, que neste dia [Sexta-feira 
Santa] se faz neste Reino, é tão pia e devota, e em nada encontra as ru- 
bricas do Missal, e Cerimonial Romanos, antes se conforma muito com 
eles, e com as Bulas da sua aprovação, porque permitem todas as ceri- 
mónias e pios usos, que não se opuserem às rubricas e Cerimonial a 
quem esta Procissão se não opõem, porque se não proíbe, e é uso pio e 
devoto, e representação muito conforme à realidade do ato que repre- 
senta, inventada neste Reino pela devoção dos Religiosos de Vilar de 
Frades, introduzida e praticada nas mais Igrejas deste Reino pela pieda- 
de católica dos seus naturais." 

Antônio de São Luiz, no Mestre de ceremonias (1789), confirma as informações 
de João Campelo de Macedo, acrescentando que, já em fins do século XVIII, essa ceri- 
mónia possuía algumas variantes: 5 

"No Convento de Vilar de Frades dos Cónegos de S. João Evan- 
gelista teve princípio esta Procissão do Enterro do Senhor; e daí se pro- 
pagou e estabeleceu tanto neste Reino, que são poucas as igrejas secula- 
res e regulares em que se não faça. O modo, porém, de se fazer é diver- 
so, porque em algumas partes se faz com o Santíssimo Sacramento, em 



"O mosteiro de S. Salvador de Vilar de Frades, beneditino, constava nos século XII e 
XIII, segundo os livros de linhagens desta época ter sido fundado por um prócer da 
região, D. Godinho Viegas [...], o que pode aliás corresponder, como geralmente suce- 
dia, a uma restauração. [...]" Cf.: GRANDE enciclopédia portuguesa e brasileira: ilus- 
trada com cerca de 15.000 gravuras e 400 estampas a cores. Lisboa e Rio de Janeiro: 
Editorial Enciclopédia Ltda., s.d. v.35, p. 801-809. 

Cf.: MACEDO, João Campelo de. Thezouro de ceremonias... Braga: Francisco Duarte 
da Matta, 1734, p.533, § 2. 

5 SÃO LUIZ, Antonio de. Mestre de ceremonias, que ensina o Rito Romano, e Seráfico 
aos religiosos da Reformada, e Real Provinda da Conceição no Reyno de Portugal, 
exposto em duas únicas classes para utilidade também dos mais ecclesiasticos, que 
praticão os mesmos ritos [...]. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. Lição LXX, § 
1025, p.306. 



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outras com uma imagem do Senhor morto. Este segundo modo é o mais 
perfeito e o que se deve praticar, para nem se inverter a ordem dos ritos 
da Igreja, nem se desprezarem as determinações da Sagrada Congrega- 
ção [dos Ritos], que refere Piton e outros. [...]" 

O estudo musicológico mais significativo sobre essa devoção foi realizado por 
Solange Corbin, no Essai sur la musique religièuse Portugaise au Moyen Age (1100- 
1385), 6 situando a Procissão do Enterro nas cerimónias próprias do Bispado de Braga, 
em Portugal. 

A liturgia bracarense surgiu no século VI, mas foi substituída pela liturgia his- 
pânica após o IV Concílio de Toledo (século VII) e pela liturgia romana após o Concílio 
de Burgos (século XI). Ressurgindo entre fins do século XII e inícios do século XIII, a 
liturgia bracarense subsistiu após a Bula Quod a nobis (9 de julho de 1568) de Pio V, 
que permitiu a manutenção das liturgias que já fossem praticadas há mais de 200 anos. 7 

O período de ressurgimento da liturgia bracarense e as informações dos autores 
dos cerimoniais citados permitem supor, portanto, uma origem da Procissão do Enterro 
entre os séculos XII e XIII, embora a mais antiga descrição conhecida do ato, como 
adiante veremos, encontra-se em um missal bracarense de 1558. Jorge de Campos Te- 
les, assim como os autores dos cerimoniais acima referidos, sustenta a origem dessa 
devoção no Convento de Vilar de Frades, com base em uma cerimónia trazida de Jeru- 
salém: 8 



"Esta Procissão começou por ser feita em Portugal em finais do 
século XV e início do século XVI. Utilizando -se uma das hóstias consa- 
gradas na missa solene de Quinta-feira Santa. A sagrada Partícula fica- 
va exposta até o dia seguinte e, na Sexta-feira Santa de manhã, era leva- 
da em procissão e encerrada num cofre ou 'túmulo' até Domingo de 
Páscoa." 

[•••] 

"O padre Paulo de Portalegre, da congregação dos Cónegos se- 
culares de São João Evangelista parece ter sido o responsável pela ins- 
tauração do cortejo em território português. A Procissão terá sido trazi 

6 CORBIN, Solange. Essai sur la musique religièuse portuguaise au moyen age (110- 
1385). Paris, Societé D'Edition "Les Belles Lettres", 1952. Livre II (Etudes de Textes), 
Cap.VIII (Les pièces caractéristiques de la liturgie dans les livres portugais), item "La 
depositio Christi, au Vendredi Saint", p. 302-3 10. 

Cf.: COELHO, Antônio. Curso de liturgia romana. 3 ed. Negrelos: Edições "Ora et 
Labora" / Mosteiro de Singeverga, 1950. v.l, p.231. 

TELES, Jorge de Campos. A Paixão de Cristo na devoção popular lisboeta. Lisboa: 
Rei dos Livros, 1999. p. 102. 



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da de Jerusalém, tendo começado a fazer-se no Arcebispado de Braga, 
mais concretamente no convento de Vilar de Frades, a partir do qual se 
espalhou um pouco por todo o reino." 

A mais antiga descrição da Procissão do Enterro foi localizada por Solange Cor- 
bin, na edição de 1558 do Missale Bracharense, com música em cantochão (exemplo 
1). A autora informa ter encontrado descrição da mesma cerimónia em um Processional 
cisterciense de 1757 9 e no Methodo da Liturgia Bracharense (1837), de Antônio Tho- 
mas dos Reis (exemplo 2), 10 ambos com música em cantochão, além de um manuscrito 
da Biblioteca da Universidade de Coimbra (Portugal), datado de 1825, com o título 
"Mottetos a quatro para o Enterro de Jesus Christo, por Toscano e música em canto de 
órgão", ou seja, em música polifônica. 11 A quantidade de espécimes conhecidos em 
acervos brasileiros, entretanto, é bem maior que os até agora descritos em Portugal. 



Exemplo 1. Estribilho e primeiro versículo da Primeira parte da Procissão do Enterro, 
de acordo com o Missale Bracharense (1558), f.xcvi, no qual constam as indica- 
ções "pueri" (meninos, ou tiples) e "chorus" (coro). Transcrição em notação 
moderna. 



9 Processionale / cisterciense / reverendissime DD / Abbatis / Generalis / Reformatoris 
/ Congregationis Lusitânia; / S. Bernardi / Fidelissimi Régis / Consiliarii, eleemosinari- 
que Maximi / Nati etc. etc. / Jussum editum / Lisbonx MDCCLVII / Apud Josephum da 
Costa Coimbra / Cum facultate Sueriorum. Apud: CORBIN, Solange. Op. cit, p.307. 

10 REIS, Antonio Thomas dos. Methodo da Liturgia Bracharense, ou modo de celebrar 
com a devida perfeição o Sacrossanto Sacrifício da Missa. Braga, 1837. Apud: COR- 
BIN, Solange. Op. cit, p.309-310. 

11 Trata-se, de acordo com José Carlos Miranda, de Antônio Vaz Toscano (7-1633), 
Mestre de Capela da Sé de Coimbra. Cf. MIRANDA, José Carlos. Programa da Tempo- 
rada Ançã-ble 1997-1998 [Portugal], p.5. 



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Tiples 



He- u! He-u! Do-mi-ne! — He - u! He - u! Sal-va-tor no - ster! 



Coro 




































































Pu-pil-li fa - cti su-mus abs-que pa - tre, — ma- ter no- stra vi - du- a. 



Exemplo 2. Estribilho e primeiro versículo da Primeira parte da Procissão do Enterro, 
de acordo com o Methodo da Liturgia Bracharense (1837), de Antônio Thomas 
dos Reis. Transcrição em notação moderna. 



Tiples 



He - u! He - u! Do - mi - ne! He - u! He - u! Sal - va - tor no - ster! 



Coro 

Pu - pil - li fa - cti su- mus abs-que pa - tre, — ma - ter no- stra — vi - du - a. 



A origem do cantochão apresentado no Missale Bracharense (1558) e no 
Methodo da Liturgia Bracharense (1837) de Antônio Thomas dos Reis ainda merece 
novos estudos. Existe, entretanto, nítida semelhança dessas melodias com a versão ro- 
mana do primeiro tom salmódico (exemplo 3). A correspondência é ainda maior com o 
tom de recitação utilizado na terceira Lição (ou Oração do Profeta Jeremias) das Mati- 
nas do Sábado Santo e aplicado, entre outros, à frase "Pupilli facti sumus absque patre, 
matres nostrce quasi vidud", a única dessas Matinas que também aparece (com modifi- 
cações) na primeira parte da Procissão do Enterro. 

A análise de uma versão portuguesa pré-tridentina, 12 da versão tridentina 13 e da 
versão restaurada pelos monges do Mosteiro de Solesmes (impressa a partir de 1910) 14 



VILLA-LOBOS, Mathias de Sousa. Arte de cantochão. Coimbra: Manoel Rodrigues 
de Almeyda, 1688. p.183-184. 

13 y 

ROSARIO, Domingos do. Theatro ecclesiastico, e manual de missas offerecido á 
Virgem Santíssima, Senhora Nossa [...]. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1786. v.2, 
p.372. 

14 LÍBER Usualis Missae te Officii pro Dominicis et Festis cum canto gregoriano ex 
Editione Vaticana adamussim excerpto et rhythmicis signis in subsidium cantorum a 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



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da frase acima referida das Matinas do Sábado Santo (exemplo 4) revela que algumas 
particularidades das melodias de 1558 e 1837 da Procissão do Enterro correspondem à 
melodia portuguesa (impressa por Mathias de Sousa Villa- Lobos em 1688) e outras à 
melodia tridentina reformada por Giovanni Guidetti no Cantus Ecclesiasticus Officii 
Majoris Hebdomadce (1587). 

Exemplo 3. Primeiro tom salmódico, de acordo com a tradição romana. 



Initiu m Tuba Mediatio * Tuba Finalis 











9+ • • 




— m — 0 — . » — . — - — ■- « — 0 — « — 


' ' ' * • ' ' *\* 0 



Exemplo 4. Tom de recitação da terceira Lição das Matinas do Tríduo Pascal, aplicado 
à frase "Pupilli facti sumus absque patre, matres nostrce quasi vidua", impressa 
por Mathias de Sousa Villa-Lobos em 1688 (MSVL), por Giovanni Guidetti em 
1587 (GG) e pelos Monges do Mosteiro de Solesmes em 1910 (MS). 



Solesmensibus Monachis diligenter ornato. Parisiis, Tornaci, romae: Typis Societatis S. 
Joannis Evangelista? descelée & Socii, 1950. p.719. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 









(fo • • • • • • 




. • • • • . • 


Pu-pil - li fa- cti su-mus abs-que pa - tre, 


ma-tres no - strasqua-si vi - du - se. 














Pu-pil - li fa- cti su-mus abs-que pa- tre, 


ma-tres no - strsequa-si vi - du-se. 




7^ ^ 







Pu-pil - li fa- cti su-mus abs-que pa - tre, ma-tres no - stras qua-si vi 



du-a:. 



Uma terceira versão do cantochão para a Procissão do Enterro foi impressa em O 
Eclesiástico instruído (1788), de Bernardo da Conceição. Infelizmente, o autor apre- 
senta música somente para a primeira parte da celebração (exemplo 5), 15 prescrevendo, 
para a segunda parte, apenas os textos latinos. A melodia desse espécime é bem dife- 
rente das versões impressas em 1558 no Missale Bracharense e em 1837 no Methodo 
da Liturgia Bracharense, de Antônio Thomas dos Reis, mas ainda é perceptível sua 
relação com o primeiro tom salmódico e com o tom de recitação empregado na terceira 
Lição das Matinas do Sábado Santo. 



Exemplo 5. Estribilho e primeiro versículo da primeira parte da Procissão do Enterro, 
de acordo com O Eclesiástico instruído (1788), de Bernardo da Conceição (p. 
448). Transcrição em notação moderna. 



15 CONCEIÇÃO, Bernardo da. O Eclesiástico instruído... Lisboa: Francisco Luis Ame- 
no, 1788, p.448-451. A consulta desse exemplar somente foi possível pela colaboração 
do Pe. Paulo Faria, do Colégio do Caraça (Santa Bárbara - MG). 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro " de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



[Estribilho] 



He - u! He - u! Do - mi - ne! He - u! He - u! Sal - va - tor no - ster! 



[Versículo 



"D 



Pu - pil - li fa - cti su - mus abs - que pa - tre, ma - ter no - stra vi - du - a. 



3. Difusão 

A Procissão do Enterro difundiu-se, a partir do século XVI, para as colónias 
portuguesas da Ásia, África e América, principalmente devido à atuação missionária 
jesuítica. O primeiro registro conhecido desta cerimónia, fora de Portugal, ocorreu em 
Goa (índia), no ano de 1558, 16 mas, na mesma região, os jesuítas descreveram minucio- 
samente a Procissão do Enterro na Sexta-feira Santa de 1576: 17 



"Faz-se esta procissão desta maneira: que à noite que precede a 
Sexta-feira se arma um sepulcro todo coberto de negro, muito bem feito, 
e depois de acabada a missa, à Sexta-feira, saem todos os padres e ir- 
mãos em procissão da sacristia, com a fralda do manto sobre a cabeça, 
com que fica cobrindo a cabeça à maneira de dó; e outros seis padres, 
vestidos com alvas e cobertas as cabeças e os rostos com os amictos, tra- 
zem uma tumba coberta de veludo preto, diante da qual vão uns anjos 
com os mistérios da paixão e, após eles, dois coros de apóstolos e, detrás 
da tumba, um coro das Marias, os quais se representam pelos meninos 
de casa e alguns outros cantores da nossa capela. Estes todos vão can- 
tando uns versos da Sagrada Escritura a propósito do que se representa, 
ora cantando uns, ora respondendo outros, com as vozes tão lacrimosas 
e tristes e com um Heu! Heu! Domine! Salvator noster!, que respondem 
as Marias, que bastam para quebrar os corações." 

O jesuíta informa que os textos cantados eram todos de origem bíblica e que as 
Três Marias - simbolizadas pelos "meninos de casa e alguns outros cantores da nossa 
capela" - cantavam, alternadamente com "dois coros de apóstolos", o texto Heu! Heu! 
Domine! Salvator noster! (Ai! Ai! Senhor! Salvador nosso!) que consta no Missale 
Bracharense de 1558 e nas versões atuais desta cerimónia. As personagens simboliza 



16 DOCUMENTA indica. Roma, 1956, v.4, p.197. Apud: MARTINS, Mário. O teatro 
nas cristandades quinhentistas da índia e do Japão. Lisboa, Brotéria, 1979. p.52. 

17 DOCUMENTA indica. Roma, 1968, v.10, p.721. Apud: MARTINS, Mário. op. cit., 
p.52-53. 



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das são Maria Madalena, Maria Salomé e Maria Cléofas que, segundo a tradição cristã, 
choraram a morte de Jesus em Jerusalém. 

No Brasil, a Procissão do Enterro foi descrita pela primeira vez no Colégio de 
Porto Seguro, Bahia, na Sexta-feira Santa de 20 de abril de 1565, pelo jesuíta Antônio 
Gonçalves: 18 

"[...] À Sexta-feira seguinte, se fez o ofício do Desencerramento 
do Senhor, com o mesmo sentimento e devoção, levando dois padres 
vestidos com suas alvas e descalços ao Santíssimo Sacramento em uma 
tumba toda coberta de preto, que para isso estava feita, indo diante as 
Três Marias, cantando Heu! Heu! Salvator noster!, cobertas com seus 
mantos e coroas em as cabeças, o que tudo causava grande devoção e 
admiração a esta gente, por não haverem visto outra tal nesta terra, de- 
pois de ser povoada, dizendo que no Reino se poderia fazer tão bem e 
melhor não. [...]" 

A cerimónia parece ter sido bastante difundida entre os jesuíticas da costa bra- 
sileira, já no final do século XVI. De acordo com Fernão Cardim, a Procissão do Enter- 
ro celebrada no Colégio Jesuítico de Salvador, em 30 de março de 1584, foi acompa- 
nhada de disciplinas (auto-flagelação), prática comum naquele período: 1 

"O padre visitador [Cristóvão de Gouveia] teve as Endoenças 
[em 29 de março] na aldeia do Espirito Santo [...]. Tiveram Mandado 
[Lava-pés] em português por haver muitos brancos que ali se acharam, e 
Paixão na língua, que causou muita devoção e lagrimas nos índios. A 
Procissão [do Enterro] foi devotíssima, com muitos fachos e fogos, disci- 
plinando-se a maior parte dos índios, que dão em si cruelmente, e têm 
isto não somente por virtude, mas também por valentia, tirarem sangue 
de si, e serem abaeté, scilicet, valentes. [...] 

Difundindo-se pelas colónias portuguesas, a Procissão do Enterro tornou-se 
parte da tradição católica dessas regiões. Em meados do século XVII esta cerimónia já 
era celebrada pelo clero diocesano, oficializando- se nas Constituições Primeiras do Ar 



GONÇALVES, Antônio. Carta ao Padre Diego Mirón, Lisboa. Porto Seguro, 
15/02/1566. In: LEITE, Serafim. Monumenta Brasiliae. Roma, Monumenta Histórica 
S.I., 1960. v.4, doe. 31, p.316-318. 

19 CARDIM, Fernão. Tratados da terra e gente do Brasil: introduções e notas de Ro- 
dolpho Garcia, Baptista Caetano e Capistrano de Abreu. Belo Horizonte: Itatiaia; São 
Paulo: EDUSP, 1980 (Coleção Reconquista do Brasil, nova série, v.13). Doe. 3: "In- 
formação da missão do P. Christovão Gouvêa às partes do Brasil ou narrativa episto- 
lar de uma viagem e missão jesuítica", p.159. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



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cebispado da Bahia, ordenadas pelo Arcebispo da Bahia, Sebastião Monteiro da Vide, e 
aceitas no Sínodo Diocesano de 12 de junho de 1707: 20 

"£ na Sé Metropolitana, depois do Ofício de Sexta-feira Santa, 
como é costume, se fará a Procissão do Enterro, e ficará o Senhor no 
túmulo até dia de Páscoa, alumiado sempre com cera bastante: e nas 
mais igrejas de nosso Arcebispado não ficará o Senhor até o dito dia; 
salvo precedendo licença nossa in scriptis. E o Pároco que consentir, e 
oficiais do Senhor, ou fregueses, que concorrerem com o necessário, 
para que o Senhor fique sem nossa licença, serão castigados a nosso ar- 
bítrio." 

Desde fins do século XVII, a Procissão do Enterro, além de ser celebrada em 
igrejas diocesanas (matrizes ou catedrais), começou a ser também praticada por ordens 
conventuais e ordens terceiras, com preferência pela Ordem Terceira de Nossa Senhora 
do Carmo. Jaime Diniz informa que, em Salvador, a Ordem Terceira do Carmo promo- 

21 

via tal cerimónia desde 1696 (obrigação essa presente em seu Compromisso), en- 
quanto as Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia determinavam que esta fos- 
se celebrada apenas pelos "Religiosos de Nossa Senhora do Monte do Carmo em Sexta- 

22 

feira da Paixão". 

A Procissão do Enterro poderia ser promovida por mais de uma comunidade 
religiosa em uma determinada vila ou cidade. Raul Leno Monteiro informa que em São 
Paulo, durante os séculos XVIII e XIX, esta fora celebrada na Ordem Terceira do Car- 
mo, mas também na Catedral: 23 



CONSTITUIÇÕES Primeiras do Arcebispado da Bahia feitas, e ordenadas pelo 
Illustrissimo, e Reverendissimo Senhor Sebastião Monteiro da vide, Arcebispo do dito 
Arcebispado, e do Conselho de Sua Magestade: Propostas, e aceitas em o synodo Dio- 
cesano, que o dito Senhor celebrou em 12 de junho do anno de 1707. Impressas em Lis- 
boa no anno de 1719, e em Coimbra em 1720 com todas as Licenças necessárias, e ora 
reimpressas nesta Capital. S. Paulo, na Typographia 2 de Dezembro de Antonio Louza- 
da Antunes. 1853. Livro Primeiro, Título XXXIII, n.119, p.52-53. 

21 DINIZ, Jaime. Gregório de Souza e Gouvea. III Encontro Nacional de Pesquisa em 
Música, 5 a 9 de agosto de 1987, Ouro Preto, Minas Gerais. Anais; promoção: Escola de 
Música UFMG (DTGM), Orquestra Ribeiro Bastos de São João dei Rei, Museu da In- 
confidência de Ouro Preto. Belo Horizonte, Imprensa Universitária, 1989. p. 33-55. Esta 
informação encontra-se à p.48. 

22 CONSTITUIÇÕES Primeiras do Arcebispado da Bahia... op. cit, Livro III, título 14, 
n.491,p.l92. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



12 



"A Procissão do Enterro que saía da Igreja da Ordem Terceira 
do Carmo, por causa do seu aparato, era mais concorrida do que a que 
saía da Sé Catedral, pois grande número de pessoas, com empenho, de- 
sejavam acompanhá-la, munidas de lanternas ou de tocheiros e, para 
poder obter estes, tornava-se preciso que o candidato rogasse, antes, a 
alguns dos irmãos da ordem ou aos irmãos sacristães, para não esperar 
a distribuição geral das referidas lanternas e tocheiros, que eram, no 
meio de empurrões, feitas aos pretendentes, os quais, nessa ocasião, se 
machucavam, rasgando, alguns, as suas roupas, tal era o desejo de fazer 
parte do préstito." 

A utilização do canto de órgão (polifonia) nas Procissões do Enterro já estava 
estabelecida em Portugal no século XVII. De acordo com Diogo Barbosa Machado (Bi- 

24 

bliotheca lusitana, v. 2, 1743) e com Joaquim de Vasconcelos (Os músicos portugue- 
ses, 1870), 25 o compositor lisboeta Henrique Carlos Corrêa (1680 - após 1747), frade da 
ordem militar de São Tiago e Mestre de Capela da Catedral de Coimbra, destinou à Pro- 
cissão do Enterro música polifônica com os textos Pupilli facti sumus, Cecidit corona, 
O vos omnes, Defecit gaudium e Sepulto Domino. Na Sé de Elvas, nesse período, a Pro- 
cissão do Enterro também já era celebrada em canto polifônico e com o concurso do 
povo, como informa Agostinho de Santa Maria no Santuário mariano (v. 6, 1718): 

"[...] Na Sexta-feira Maior [na Sé de Elvas] se faz o Descendi- 
mento na capela mor. A Imagem do Senhor está em um caixão no Altar 
da mesma Senhora [N. Senhora da Soledade], que se mostra somente em 
as sextas-feiras da Quaresma. Na mesma Sexta-feira Maior tem dous 
Sermões: o primeiro do Descendimento, e o segundo da Soledade, em 
que se mostra o Santo Sudário. Depois do Sermão da Soledade, se põe o 
Senhor em um esquife de prata, coberto com um rico pano de tela de 
Milão, e se dá principio à Procissão do Enterro, depois das Ave Marias, 
por algumas ruas da cidade, e se torna a recolher à mesma Sé: vão nela 
mais de seiscentos irmãos com tochas amarelas. Levam ao Senhor qua- 
tro Cónegos, e outros quatro a imagem da Senhora; e junto a cada um 
dos Andores vai um coro de música. Vão detrás do Andor do Senhor, até 
o da Senhora, mais de duzentas pessoas fazendo penitencia." 



MONTEIRO, Raul Leno. Carmo: patrimônio da história, arte e fé. São Paulo: em- 
presa Gráfica da Revista dos Tribunais S/A, 1978. p.39. 

24 

MACHADO, Diogo Barbosa. Bibliotheca Lusitana. Lisboa: Ignacio Rodrigues, 1743. 
v.2, p. 321-445-446. Apud: NERY, Ruy Vieira. A música no ciclo da lí Bilioteca Lusita- 
na". Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1984. p.65. 

VASCONCELLOS, Joaquim de. Os músicos portugueses: biographia-bibliographia 
por [...]. Porto: Imprensa Portugueza, 1870. v.l, p.56. 

26 SANTA MARIA, Agostinho de. op. cit., v.6, 1718, Livro III, Título I (Da milagrosa 
Imagem de Nossa Senhora da Soledade, que se venera na Sè de Elvas.), p.471. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



13 



A atuação das ordens terceiras, no Brasil, entre fins do século XVII e inícios do 
século XVIII, gerou um aumento na solenidade da Procissão do Enterro e a adoção de- 
finitiva do canto de órgão (polifonia) para os textos anteriormente cantados em canto- 
chão, com absoluta predominância, entre os espécimes conhecidos, do estilo antigo, ou 
seja, aquele baseado em normas composicionais do século XVI. Um exemplo típico é a 
composição anónima para a Procissão do Enterro, encontrada em três grupos de manus- 
critos, que incluem cópias do séculos XVIII e XIX (exemplo 6): 1) no Arquivo da Cúria 
Metropolitana de São Paulo (SP), cód. ACMSP P 253 ; 27 2) na Orquestra Lira Sanjoa- 

28 

nense (São João dei Rei - MG), sem código; 3) no Museu da Música de Mariana 

29 

(MG), cód. MA SS-16 [M-2 V-ll , com muitas diferenças em relação aos grupos pre- 
cedentes, sobretudo nos versículos da primeira parte. 



Exemplo 6. Anónimo. Estribilho (c. 1-8) e primeiro versículo da Primeira Parte (c. 1-9) 
da Procissão do Enterro, encontrada em três grupos de manuscritos musicais 
brasileiros: 1) no Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo (SP), cód. 
ACMSP P 253 ; 2) na Orquestra Lira Sanjoanense (São João dei Rei - MG), sem 
código; 3) no Museu da Música de Mariana (MG), cód. MA SS-16 \M-2 V-ll . 



ACMSP P 253 C-Un - "Suprano Tracto Primeiro". Sem indicação de copista, sem 
local, [final do século XIX]: partes de SATB. 

28 

OLS, sem cód. [C-Un] - "Soprano a 4 Vozes / dos / Tratos Paxaõ e Adoração / da 
Crus Prossiçaõ do Enterro / do Senhor / 17 / 1928 / Pertence a Hermenegildo f de 
Sousa Trindade / P r dadiva de Manoel Jose da S a ". Cópia de Carlos Antônio da Silva, 
[São João del-Rei?, meados do século XIX]: partes de SATB. 

29 MMM MA SS-16 \M-2 V-11 : rC-11 - "Sexta Fr." Suprano" . Sem indicação de copis- 
ta, sem local, [final do século XVIII]: partes de SAT; [C-21 - "Sexta fr. a Suprano". Sem 
indicação de copista, sem local, [1- metade do século XIX]: parte de S. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



14 















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Pu - pil- li - fa- cti su - mus abs-que pa - tre, 



A mais antiga composição polifônica para a Procissão do Enterro encontrada no 
Brasil parece ser, também, o mais antigo exemplo português conhecido com música 
polifônico para tal cerimónia, embora essa particularidade não tenha sido observada no 
Brasil ou em Portugal. Trata-se de uma composição para a segunda parte da Procissão 
do Enterro, de um manuscrito obtido em Minas Gerais por Francisco Curt Lange entre 
1944-1945 (talvez de algum acervo da região de Ouro Preto), hoje recolhido à Coleção 
Curt Lange do Museu da Inconfidência / Casa do Pilar (Ouro Preto - MG). 

A cópia, catalogada sob o n. 298, 31 está assinada pelo compositor Francisco 
Gomes da Rocha, que viveu em Vila Rica entre c.1754 e 1808, embora o exame do do- 
cumento permita a suposição de que esse músico pode nem ter realizado tal cópia, pois 
a tinta e caligrafia utilizadas na assinatura são diferentes da tinta e caligrafia emprega- 
das na música e no texto latino. Régis Duprat observou a identidade de uma das seções 
da obra, o Cum descendentibus in lacum, com a composição homónima de Ginés de 



MIOP/CP-CCL 298 [C-Un] - "Populemeus a Quatro vozes e- / cum descendentibus 
in- / Lacum / Para Sesta feira da Paixaõ. / Fran. co Gomes da Rocha". Cópia de Francis- 
co Gomes da Rocha [?], sem local, [final do século XVIII]: partes de S^AT (Cum des- 
cendentibus in lacum) I SATB, bx (Sepulto Domino). 

3 1 

MIOP/CP-CCL 298 - lí Populemeus a Quatro vozes e- / cum descendentibus in- / La- 
cum / Para Sesta feira da Paixaõ. / Fran. co Gomes da Rocha". Cópia de Francisco Go- 

1 2 

mes da Rocha [?], sem local, [final do século XVIII]: partes de S^AT. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



15 



Morata, encontrada em dois livros manuscritos do Paço Ducal de Vila Viçosa (Portu- 
gal) e publicada em 1956 pelo musicólogo português Manoel Joaquim (exemplo 7). 
Manoel Joaquim e Régis Duprat, contudo, referiram-se a essa obra como oitavo Res- 
ponsório das Matinas do Sábado Santo, mas o exame dos textos não deixa dúvidas 
quanto a tratar-se, esta, de uma composição para a Procissão do Enterro de Sexta-feira 
Santa. 



Exemplo 7. Ginés de Morata. Segunda parte da Procissão do Enterro, do Arquivo do 
Paço Ducal de Vila Viçosa (Portugal), Livro de Música Polifônica n. 3, f.56v- 
57r, com o título "feria Sexta In parasceue" e Livro de Música Polifônica n. 4, 
f.53v-54r. Alturas originais transpostas uma quarta abaixo, em virtude da utili- 
zação de claves altas. 



DUPRAT, Régis. A polifonia portuguesa em obras de brasileiros. Pau Brasil, São 
Paulo: ano 3, n.15, p. 69-78, nov./dez. 1986. Reimpresso em: A polifonia seiscentista 
portuguesa em Minas Gerais no século XVIII. Barroco, Belo Horizonte, n.14, p. 41-48, 
1986/1987. Mais uma vez reproduzido em: A polifonia portuguesa no século XVIII em 
Minas Gerais. In: REZENDE, Maria Conceição. A música na história de Minas coloni- 
al. Belo Horizonte, Ed. Itatiaia; Brasília, Instituto Nacional do Livro, 1989. p. 223-232. 
33 VINTE livros de música polifônica do Paço Ducal de Vila Viçosa: catalogados, des- 
critos e anotados por Manoel Joaquim. Lisboa: Fundação da Casa de Bragança, 1953. 
f.53-56 e 70v-72r. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



16 



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cen - den- ti - bus, cum des - cen - den - ti 



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De acordo com José Augusto Alegria, o músico espanhol Ginés de Morata foi 
Mestre de Capela do Paço Ducal de Vila Viçosa entre fins do século XVI e inícios do 
século XVII, conhecendo-se dele algumas obras em manuscritos portugueses e espa- 
nhóis. 34 A presença da mais antiga composição portuguesa para a Procissão do Enterro 
em uma cópia mineira do século XVIII sugere que a recepção, no Brasil, de música es- 
crita em Portugal para essa cerimónia, pode ter sido comum já no século XVII. 



4. Estrutura dos textos 



4.1. Versículos da primeira e segunda parte 



A Procissão do Enterro, como vimos, é uma cerimónia litúrgica, instituída pelo 
rito bracarense, mas, embora não tenha sido proibida pela Bula Quod a nobis (1568) de 
Pio V, não é uma celebração tridentina, pois não consta nos livros litúrgicos reformados 
por determinação do Concílio de Trento (na seção XXV, segunda parte, item 3, de 
1563) 35 e impressos a partir de 1568. A partir da reorganização da música sacra em 
Portugal, instituída no reinado de D. João V (1706-1750) e, sobretudo, após a publica- 
ção do Theatro ecclesiastico (1743) de Domingos do Rosário, cujo objetivo foi a difu 



ALEGRIA, José Augusto. História da Capela e Colégio dos Santos Reis em Vila Vi- 
çosa. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, Serviço de Música, 1983. Cap.VIII (Os 
mestres da capela), p.156. 

35 O SACROSANTO, e Ecuménico Concílio de Trento em latim e portuguez: dedicado 
e consagrado aos exceli., e Rev. Senhores Arcebispos, e Bispos da Igreja Lusitana. Nova 
Edição. Rio de Janeiro: Livraria de Antônio Gonçalves Guimarães & C. a , 1864. v.2, 
p.301-303. 

36 ** 

ROSARIO, Domingos do. Theatro ecclesiastico em que se acham muitos documentos 
de Canto chão para qualquer pessoa dedicada ao culto Divino nos Officios do coro, e 
Altar. Offerecido á Virgem Santíssima Senhora Nossa com o Soberano Titulo da Imma- 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



17 



são do cantochão tridentino no império luso, foi sendo gradualmente perdida a noção da 
Procissão do Enterro enquanto uma cerimónia própria do rito bracarense, a qual passou 
a ser reconhecida quase somente como uma devoção religiosa, porém externa à liturgia 
tridentina. 

Embora a Procissão do Enterro não esteja descrita nos livros litúrgicos tridenti- 
nos, vários cerimoniais portugueses dos séculos XVII e XVIII abordam essa prática, 
relacionando-se, abaixo, os principais títulos, em ordem cronológica: 

SÃO JOSÉ, Leonardo de. Economicon sacro (1693) 37 
MACEDO, João Campelo de. Thezouro de ceremonias (1734) 38 
SARMENTO, Francisco de Jesus Maria. Manual da Semana Santa (1775) 
CONCEIÇÃO, Bernardo da. O Eclesiástico instruído (1788) 40 
SÃO LUIZ, Antônio de. Mestre de ceremonias (1789) 41 

42 

De acordo com essas fontes e com o próprio Missale Bracharense (1558), ci- 
tado por Solange Corbin, a Procissão do Enterro, desde o século XVI, possuía música e 
texto latino específico para as duas partes da cerimónia. As descrições apresentadas por 
essas fontes são longas e detalhadas, mas é possível resumir os principais aspectos refe- 
rentes à música. Na primeira parte, durante a procissão propriamente dita, três meninos 
ou tiples, que representam as Três Marias, cantam o refrão Heu! Heu! Domine!, alterna 



culada Conceyçam, venerada em huma das capellas. Na Officina Joaquiniana da Musi- 
ca de D. Bernardo Fernandez Gayo, 1743. xxxii p. não num., 383 p. Cf.: VASCONCE- 
LLOS, Joaquim de. Os músicos portugueses: biographia-bibliographia por [...]. Porto: 
Imprensa Portugueza, 1870. v.2, p.298. 

37 SÃO JOSÉ, Leonardo de. Economicon sacro... Lisboa: Manoel Lopes Ferreyra, 1693, 
p.647-651. O exemplar utilizado pertence à Biblioteca dos Bispos de Mariana (MG) 

ao 

MACEDO, João Campelo de. Thezouro de ceremonias... Braga: Francisco Duarte da 
Matta, 1734, p. 533-540. O exemplar utilizado pertence à Seção de Obras Raras da Bi- 
blioteca Municipal Mário de Andrade (São Paulo - SP). 

SARMENTO, Francisco de Jesus Maria. Manual da Semana Santa... Lisboa: Regia 
Officina Typografica, 1775, p. 209-210. O exemplar utilizado pertence ao Museu Padre 
Anchieta (São Paulo - SP). 

40 CONCEIÇÃO, Bernardo da. O Eclesiástico instruído... Lisboa: Francisco Luis Ame- 
no, 1788, p.448-451. O exemplar utilizado pertence à Biblioteca do Colégio do Caraça 
(Santa Bárbara - MG). 

41 SÃO LUIZ, Antonio de. Mestre de ceremonias, que ensina o Rito Romano, e Seráfico 
aos religiosos da Reformada, e Real Província da Conceição no Reyno de Portugal, 
exposto em duas únicas classes para utilidade também dos mais ecclesiasticos, que 
praticão os mesmos ritos [...]. Lisboa: Simão Thaddeo Ferreira, 1789. Lição LXX, § 
1025, p.306. O exemplar utilizado pertence à coleção do autor. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



18 



dos com o coro, que canta quatro versículos, identificados pelas letras a, b, c e d no 
quadro 1. 

Quadro 1. Texto da primeira parte da Procissão do Enterro, de acordo com o Missale 
Bracharense (1558), com o Economicon sacro (1693) de Leonardo de São José, 
com o Thezouro de ceremonias (1734) de João Campelo de Macedo, com o Ma- 
nual da Semana Santa (1775) de Francisco de Jesus Maria Sarmento e com O 
Eclesiástico instruído (1788), de Bernardo da Conceição. 



Versículos da primeira parte 


Tradução 43 


Heu! Heu! Domine! Heu! Heu! Salva- 
tor noster! 


Ai! Ai! Senhor! Ai! Ai! Salvador nos- 
so! 


a - Pupilli facti sumus absque patre, ma- 
ter nostra vidua. 


a - Estamos órfãos de pai, nossa mãe está 
viuva. 


Heu!... 


Ai!... 


b - Cecidit corona capitis nostri, vce nobis 
quia peccavimus. 


b - A coroa caiu de nossa cabeça, ai de 
nós que pecamos! 


Heu!... 


Ai!... 


c - Spiritus cordis nostri, Christus Domi- 
j nus, morte turpissima condemnatus 


c - Sopro de nosso coração, o Senhor 
Cristo foi condenado a morte torpís- 
sima 


Heu!... 


Ai!... 


d - Defecit gaudium cordis, versa est in 
luctum cithara nostra. 


d - Coro: Acabou-se a alegria de nosso 
coração, nossa cítara está de luto. 


Heu!... 


Ai!... 



A forma poética - o estribilho Heu! Heu! Domine! alternado com os quatro ver- 
sículos - é semelhante à forma da segunda parte da Adoração da Cruz de Sexta-feira 
Santa, cerimónia litúrgica romana originada no século IV, na qual o estribilho Popule 
meus é alternado com 9 versículos contendo supostas queixas de Jesus contra o povo, 
baseadas em informações do Antigo e do Novo Testamento. Na Adoração da Cruz é 
Cristo vivo quem se refere ao povo, mas na Procissão do Enterro é o povo que chora sua 
morte, o que sugere uma correspondência não acidental entre o assunto e a forma poéti- 
ca dessas duas cerimónias. 



4/ MISSALE Bracharense. Lugduni: Petrus Fradin, 1558, f. XCVI. Citado em CORBIN, 
Solange. Op. cit. 

43 Esta tradução foi gentilmente enviada pelo Pe. Nereu de Castro Teixeira (Belo Hori- 
zonte - MG). 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



19 



Na segunda parte, diante do túmulo de Jesus, canta somente o coro (sem os ti- 
ples que, na primeira parte, cantaram o estribilho Heu! Heu! Domine!). Existem, nas 
fontes portuguesas, duas versões para esta ocasião: na primeira delas, descrita apenas 
por Leonardo de São José (Economicon sacro, 1693) 4 e por Francisco de Jesus Maria 
Sarmento (Manual da Semana Santa, 1775), 45 cinco versículos cantados pelo celebrante 
são seguidos por cinco respostas do coro, como se pode observar no quadro 2. 



Quadro 2. Texto latino da segunda parte (versão 1) da Procissão do Enterro, de acordo 
com o Economicon sacro (1693), de Leonardo de São José, e tradução portugue- 
sa de Francisco de Jesus Maria Sarmento, no Manual da Semana Santa (1775). 



Versículos e respostas da segunda parte 


Tradução 46 


!_ (versão 1) 




V. /Estimatus sum 


V. Fui computado 


R. Cum descendentibus in lacum factus 
sum sicut homo, sine adjutorio inter 
mortuos líber 


R. Com os que descem ao lago do sepul- 
cro. Fui feito, como um homem sem 
auxilio, porém livre entre os mortos. 


V. Sepulto Domino 


V. Sepultado o Senhor, 


R. Signatum est monumentum, volventes 
j lapidem ad ostium monumenti, po- 
nentes milites, qui custodirent illud. 


R. Fechou-se o Monumento, encostando- 
Ihe à porta uma pedra, e pondo-lhe 
soldados, que o guardassem. 


V. In pace factus est 


V. Formou-se na paz 


R. Locus ejus 


R. 0 seu lugar: 


V. In pace in idipsum 


V. Na paz com ele mesmo 


R. Dormiam et requiescam 


R. Dormirei, e descansarei. 


V. Caro mea 


V. A minha carne \ 


R. Requiescet in spe 


R. descansará na esperança. \ 



A segunda versão é mais simples. Descrita no Missale Bracharense (1558), no 

48 

Thezouro de ceremonias (1734) de João Campelo de Macedo e nO Eclesiástico ins 



SAO JOSE, Leonardo de. Economicon sacro. Lisboa: Manoel Lopes Ferreyra, 1693, 
p.647-651. 

45 SARMENTO, Francisco de Jesus Maria. Manual da Semana Santa... Lisboa: Regia 
Officina Typografica, 1775, p.209-210. 

46 SARMENTO, Francisco de Jesus Maria. Manual da Semana Santa. Op. cit, p.209- 
210. 

47 MISSALE Bracharense. Lugduni: Petrus Fradin, 1558, f. XCVI. 

MACEDO, João Campelo de. Thezouro de ceremonias... Braga: Francisco Duarte da 
Matta, 1734, p.533-540. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



20 



truido (1788) de Bernardo da Conceição, consiste no canto de apenas três versículos 
do celebrante e de três respostas do coro, seguidos pelo mesmo Responsório que se 
canta na nona Lição das Matinas do Sábado Santo (quadro 3). 

Quadro 3. Texto latino da segunda parte (versão 2) da Procissão do Enterro, de acordo 
com o Missale Bracharense (1558), com o Thezouro de ceremonias (1734) de 
João Campelo de Macedo e com O Eclesiástico instruído (1788), de Bernardo 
da Conceição. 



Versículos e respostas da segunda parte 
(versão 2) 


Tradução 


V. In pace factus est locus ejus 


V. Habitou em paz no seu lugar i 


R. Et habitatio ejus in Sion. 


R. E em Sião fez sua morada. 


V. Caro mea 


V. Minha carne 


R. Requiescet in Spe. 


R. Descansará em pa.z 


V. In pace in idipsum 


V. Nesta mesma paz 


R. Dormiam, et requiescam. 


R. Dormirei e descansarei. 


R. Sepulto Domino, signatum est monu- 
mentum, volventes lapidem ad ostium 
monumenti: 


R. Sepultado o Senhor, lacraram o se- 
pulcro e moveram a pedra para a porta 
da sepultura. 


* Ponentes milites, qui custodirent illud. 


* Puseram soldados para guardá-la. 


V. Accedentes Príncipes Sacerdotum ad 
\ Pilatum, petierunt illum: 


V. Dirigindo-se os Sumos Sacerdotes a 
Pilatus, pediram-lhe [o corpo de 
Jesus] 


* Ponentes milites, qui custodirent illud. 


* Puseram soldados para guardá-la. 



Os manuscritos brasileiros, em geral, contém música baseada nos textos pres- 
critos nos cerimoniais portugueses. Nem sempre são utilizados todos os versículos da 
primeira parte e existem casos de omissão do estribilho Heu! Heu! Domine! e inclusão 
de três novos versículos, como em um manuscrito não catalogado do Arquivo da Or- 
questra Lira Sanjoanense (São João dei Rei - MG). 50 Nesse caso, a omissão do Heu! Heu! 
Domine! indica que os tiples estariam cantando o estribilho por outros papéis, não sendo 
necessário sua inclusão em tal manuscrito (quadro 4). 



49 CONCEIÇÃO, Bernardo da. O Eclesiástico instruído... Lisboa: Francisco Luis Ame- 
no, 1788,p.448-451. 

50 OLS, sem cód. - "Enterro do Senhor". Cópia de [Hermenegildo José de Souza Trin- 
dade?, São João dei Rei, 1^ metade do século XIX]: partes de SV B 1 / S 2 A 2 T 2 B 2 . 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 21 

Quadro 4. Texto latino da primeira parte da Procissão do Enterro, em manuscrito não 
catalogado da Orquestra Lira Sanjoanense (São João dei Rei - MG). 



Versículos da primeira parte 


Tradução 


a - Pupilli facti sumus absque patre, ma- 
1 ter nostra vidua. 


a - Estamos órfãos de pai, nossa mãe está 
viuva. 


b - Cecidit corona capitis nostri, vce nobis 


b - A coroa caiu de nossa cabeça, ai de ; 


c - Defecit gaudium cordis, versus est in 

lliftliYYI CnCíYM^ YICl^fPY 


c - Acabou-se a alegria de nosso coração, 

nnççn pnrn pçtíí ptyi luto 


d - Spiritus oris nostri, Christus Dominus, 
captus est in peccatis nostri 


d - Espírito de nossa vida, o Senhor 

Cristo foi condenado a morte torpís- . 

cirn q 

jlílLCL. 


e - Quomodo sedet sola civitas plena po- 
i pulo: jacta est quasi vidua domina 
gentium. 


e - Como ficou solitária a cidade, antes 
repleta de seu povo: ficou como viúva 
a que outrora foi a senhora das na- ' 
ções. 


f - Versa est in luctum cithara mea et or- 
ganum meum in vocem flectium. 51 


f - Tornou- se em luto minha cítara e em 
voz comovida o meu instrumento. 


g - Et convertam festivitates vestras in 
luctum et omnia cantica vestras in 
planctum. 


g - Converterei vossas festividades em 
luto e todos os vossos cânticos em 
lamentos. 


h - Et versa est victoria in luctum in die 
illa omni populo. 


h - Tornou-se a vitória em luto, naquele 
dia, para todo o povo. 



No Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo existe uma cópia de André da 
Silva Gomes com música para a Procissão do Enterro datada de 1778 (cód. ACMSP P 
118 C-l ), 52 que utiliza, na primeira parte, três versículos também não prescritos para 
essa cerimónia nas fontes portuguesas consultadas e incomuns nos manuscritos brasilei- 
ros até agora conhecidos (quadro 5). 

Quadro 5. Texto da primeira parte da Procissão do Enterro do Arquivo da Cúria Me- 
tropolitana de São Paulo, cód. ACMSP P 118 C-l (cópia de 1778). 



51 Jean Rousseau (1644 - após 1705) registrou uma variante desse texto, infelizmente 
sem indicação de origem ou função: "Cythara mea versa est in luctum, et organum 
meum in vocem flectium" . Cf.: ROUSSEAU, Jean.TrazYe de la viole: Avec une préface 
de François Lesure. Genève: Minkoff reprint, 1975. p.4. 

52 

ACMSP P 118 C-l - lí Procissam / do Enterro do Senhor, / em Sexta fr." de Paixam. / 
a 4 Vozes. / De Andre da S. a Gomes / 1778." Cópia de André da Silva Gomes, [São 
Paulo], 1778: parte de A. 



C ASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro " de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 22 



Versículos da primeira parte 


Tradução 


Heu! Heu! Domine! Heu! Heu! Salvator 
noster! 


Ai! Ai! Senhor! Ai! Ai! Salvador nosso! 


a - Jerusalém, surge, et exue te vestibus 
jucunditatis: induere cinere et cilicio. 


a - Levanta-te, Jerusalém, e deixa tuas 
vestes de júbilo: cobre-te de cinza e 
de cilício. 


Heu!... 


Ai!... 


b - Quia in te occisus est Salvator Israel. 


b - Pois em ti morreu o Salvador de Is- 
rael. 


Heu!... 


Ai!... 


c - Deduc quasi torrentem lacrimas per 
diem et noctem et non taceat pupilla 
oculi tui. 


c - Vertam teus olhos, dia e noite, tor- 
rentes de lágrimas e não cessem de 
chorar. [ 


Heu!... 


AU... [ 



Existem diferenças também na segunda parte da cerimónia. Alguns manuscritos 
possuem o texto /Estimatus sum I cum descendentibus in lacum, tal como no Economi- 
con sacro (1693) de Leonardo de São José e no Manual da Semana Santa (1775) de 
Francisco de Jesus Maria Sarmento, enquanto outros apresentam apenas o texto Sepulto 
Domino / Signatum est monumentum, extraído do segundo par de versículo e resposta 
destas mesmas obras, mas integralmente cantado pelo coro. Não foram estudados, até o 
momento, manuscritos brasileiros que contenham, para a segunda parte da Procissão do 
Enterro, música cujo texto inicia-se com V. In pace factus est locus ejus R. Et habitatio 
ejus in Sion, assim como descrito no Missale Bracharense (1558), no Thezouro de ce- 
remonias (1734) de João Campelo de Macedo e nO Eclesiástico instruído (1788) de 
Bernardo da Conceição. 

4.2. Canto da Verônica 

Uma nova unidade funcional foi introduzida na Procissão do Enterro, talvez já 
no século XVI: consiste em um canto monódico por uma pessoa (até o século XVIII um 
cantor masculino) que representa as lendas medievais da Verônica, costume que perdura 
até o presente em inúmeras cidades brasileiras. No século XVI já existia a exposição, 
durante a Procissão do Enterro, de um pano com a imagem de Jesus, denominado "Ve- 
rônica de Cristo", "Verônica do Senhor" ou, simplesmente, "Verônica". Foi Fernão 
Cardim, escrivão do Padre Visitador Cristóvão de Gouveia, da Companhia de Jesus, 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



23 



quem apresentou a primeira notícia conhecida dessa prática no Brasil, na Sexta-feira 
Santa celebrada no Colégio Jesuítico de Salvador em 30 de março de 1584: 

"Tornando à Quaresma em nossa casa [na Bahia, em 21 de feve- 
reiro de 1584], tivemos um devoto e rico sepulcro. A Paixão foi tão bem 
devota, que concorreu toda a terra; os ofícios divinos se fizeram em casa 
com devoção. Sexta-feira Santa [30 de março], ao desencerrar do Se- 
nhor, certos mancebos [indígenas] vieram à nossa igreja; traziam uma 
Verônica de Cristo mui devota, em pano de linho pintado, dous deles a 
tinham e juntamente com outros dous se disciplinavam, fazendo seus tro- 
cados e mudanças. E como a dança se fazia ao som de cruéis açoutes, 
mostrando a Verônica ensanguentada, não havia quem tivesse as lágri- 
mas com tal espetáculo, pelo que foi notável a devoção que houve na 
gente." 

Existiram pelo menos duas lendas em torno da palavra Verônica, encontradas 
em evangelhos apócrifos que não foram mantidos na Bíblia: 54 1) uma mulher chamada 
Verônica teria pintado ou mandado pintar um retrato de Jesus em um pano; 2) no cami- 
nho para a crucifixão, Verônica teria oferecido seu véu para que Jesus enxugasse o ros- 
to, nele sendo impressa sua imagem, véu esse levado para Roma no ano 700 e deposita- 
do junto às relíquias de São Pedro. Ao que tudo indica, no entanto, o nome Verônica 
resultou da expressão grega vera eikon - verdadeira imagem - que designava não exata- 
mente uma pessoa, mas a pintura ou representação do rosto de Jesus. 

A unidade funcional em questão surgiu a partir dessas lendas, mas com dois si- 
gnificados distintos para a palavra Verônica: 1) a imagem de Jesus; 2) a mulher que, de 
alguma forma, elaborou ou obteve a imagem de Jesus. No século XVIII, essa melodia 
era cantada por um homem, já que ainda existiam restrições em relação à participação 
de mulheres na música religiosa. 55 O mais antigo registro dessa prática portuguesa, até 



CARDIM, Fernão. Tratados da terra e gente do Brasil: introduções e notas de Ro- 
dolpho Garcia, Baptista Caetano e Capistrano de Abreu. Belo Horizonte: Itatiaia; São 
Paulo: EDUSP, 1980 (Coleção Reconquista do Brasil, nova série, v.13). Doe. 3: "In- 
formação da missão do P. Christovão Gouvêa às partes do Brasil ou narrativa episto- 
lar de uma viagem e missão jesuítica", p.159. 

54 Cf.: 1) RÒWER, Basílio. Diccionario litúrgico para o uso do Revmo. Clero e dos 
fieis. Petrópolis: Typographia das "Vozes", 1928. p.180; 2) PINTO, José Alberto L. de 
Castro. Dicionário prático de cultura católica, bíblica e geral. IN: Bíblia sagrada: tradu- 
ção do Padre Antônio Pereira do Nascimento. Rio de Janeiro: Barsa, 1971. p.278. 

55 Santo Ambrósio, no século IV, determinou que "Mulieres Apostolus in Ecclesia tace- 
re jubef . Cf.: ROMITA, Sac. Florentius. Jus Musicai Litúrgicas: dissertado historico- 
iuridica. Roma: Ediuzioni Liturgiche, 1947. p.23. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



24 



agora localizado, está no Manual da Semana Santa (1775), de Francisco de Jesus Maria 
Sarmento, no qual a palavra Verônica designa a imagem de Jesus e a melodia é prescrita 
a um cantor masculino. O texto sugere que o Canto da Verônica seria inserido na pri- 
meira parte da cerimónia (a procissão propriamente dita), em meio ao canto alternado 
dos tiples e do coro, sendo proferido logo após o Heu! Heu! Domine!: 56 

"Canta-se com voz terna o que vem a dizer: Ai! Ai! Senhor! Ai! 
Salvador nosso! E o que mostra a Verônica do Senhor, diz assim: O vós 
todos, que passais pelo caminho desta vida, vede e reparai, se há dor se- 
melhante à minha dor?" 

O Canto da Verônica - desprovido de qualquer acompanhamento instrumental - 
utiliza o texto latino íl O vos omnes, qui transitis per viam, attendite et videte si est dolor 
similis sicut dolor meus" (acima traduzido por Francisco de Jesus Maria Sarmento) e as 
melodias até hoje conhecidas são quase sempre derivadas da estética operística italiana 
dos séculos XVIII e XIX. O registro mais antigo até o momento encontrado do Canto da 
Verônica, no Brasil, está no Livro de Despesas (1768-1819) da Irmandade do Santíssi- 
mo Sacramento da Vila do Príncipe do Serro do Frio (MG). Trata-se do pagamento a 
um cantor masculino em 15 de maio de 1779, no qual a palavra Verônica designa o per- 
sonagem e não o retrato de Jesus: 58 

"A Vicente huno (Luvo) de Mendonça de cantar o contralto nas 
domingas e Semana Santa e fazer o papel de Verônica na Procissão do 
Enterro do Senhor." 

5. Origem dos textos 

Os textos da Procissão do Enterro, descritos nos cerimoniais portugueses e até 
agora conhecidos em manuscritos musicais brasileiros, originaram-se em fragmentos do 
Antigo Testamento e dos Ofícios de Trevas do Tríduo Pascal. Na primeira parte foram 
baseados exclusivamente em versículos do Antigo Testamento, principalmente das La 

56 SARMENTO, Francisco de Jesus Maria. Manual da Semana Santa... op. cit, p.208. 

57 f.35v. 

58 

LANGE, Francisco Curt. História da música na Capitania Geral de Minas Gerais: 
Vila do Príncipe do Serro do Frio e Arraial do Tejuco. Belo Horizonte: Conselho Esta- 
dual de Cultura de Minas Gerais [Imprensa Oficial], 1983 [na ficha catalográfica: 1982] 
(História da Música na Capitania Geral das Minas Gerais, v.8). p.39. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



25 



mentações de Jeremias (com pequenas alterações no texto) e apresentados como la- 
mentações do povo cristão pela morte de Jesus. 

De acordo com Solange Corbin, o estribilho Heu! Heu! Domine! é uma espécie 
de planctus medieval, que a autora acreditava não ser de origem bíblica, mas a expres- 
são Heu! Heu! Heu! Domine Deus! pode ser encontrada no Livro do Profeta Jeremias 
(4, 10 e 32, 17) e no Livro do Profeta Ezequiel (9, 8), enquanto o Salvator noster! pode 
ter sido extraído de várias passagem bíblicas, entre elas da Epístola de São Paulo a Tito, 
1, 4. Corbin acrescenta que os três versículos seguintes foram extraídos das Lamenta- 
ções de Jeremias (versículo 3 - Pupilli facti summus; versículo 15 - Defecit gaudium; 
versículo 16 - Cecidit corona) e um deles pode ter sido baseado também em um trecho 
do Livro da Sabedoria (2, 20), que se refere aos ímpios: "Morte turpissima condemne- 
mus eum: erit enim ei visitatio ex sermonibus ////ws". 59 O terceiro versículo {Pupilli...), o 
único desta parte também utilizado nos livros litúrgicos triden tinos (terceira Lição das 
Matinas do Sábado Santo), deu origem a duas versões na Procissão do Enterro, uma 
delas com a expressão original "matres nostraz quasi viduce" (nossas mães estão como 
viúvas) e outra como nos cerimoniais portugueses: "mater nostra vidua" (nossa mãe 
está viúva). As indicações de origem podem ser observadas no quadro 6. 



Quadro 6. Origem bíblica dos textos da primeira parte da Procissão do Enterro apre- 
sentados pelos cerimoniais portugueses. 



Versículos da primeira 
parte 


Origem bíblica 


Heu! Heu! Domine!... 


Livro do Profeta Jeremias, 4, 10 e 32, 17, ou Livro do 
Profeta Ezequiel, 9, 8 + Epístola de São Paulo a Tito, 
1,4 


a - Pupilli facti sumus... 


Lamentações de Jeremias (oração do Profeta Jeremias), 
5,3 

(cantado na terceira Lição das Matinas do Sábado 
Santo) 


b - Cecidit corona... 


Lamentações de Jeremias, 5, 16 


c - Spiritus cordis nostri... 


Lamentações de Jeremias, 4, 20 + Livro da Sabedoria, 2, 
20 


d - Defecit gaudium... 


Lamentações de Jeremias, 5, 15 



"Condenêmo-lo [o ímpio] a uma morte torpíssima, pois será considerado segundo o 
seu discurso". 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



26 



A versão atípica do manuscrito não catalogado da Orquestra Lira Sanjoanense 
possui acréscimos originários das Lamentações de Jeremias, mas também do Livro de 
Amós e do Segundo Livro de Samuel. Ressalte-se, ainda, que os versículos c e d do ma- 
nuscrito sanjoanense não possuem as alterações verificadas nos textos descritos pelos 
cerimoniais portugueses e nos demais manuscritos brasileiros consultados, utilizando o 
texto latino tal como figura no Antigo Testamento (quadro 7). 



Quadro 7. Origem bíblica dos versículos da primeira parte da Procissão do Enterro da 
Orquestra Lira Sanjoanense. 



Versículos da primeira 
parte 


Origem bíblica 


a 


- Pupilli facti sumus... 


Lamentações de Jeremias (oração do Profeta Jeremias), 
5,3 

(cantado na terceira Lição das Matinas do Sábado San- 
to) 






b 


- Cecidit corona... 


Lamentações de Jeremias, 5, 16 


c 


- Defecit gaudium... 


Lamentações de Jeremias, 5, 15 (texto original) 


d 


- Spiritus oris nostri... 


Lamentações de Jeremias, 4, 20 (texto original) 


e 


- Quomodo sedet... 


Lamentações de Jeremias, 1, 1 


f ■ 


■ Versa est in luctum... 


Lamentações de Jeremias, 5, 15 


g 


- Et convertam... 


Livro de Amós, 8, 10 


h 


- Et versa est victoria... 


II Livro de Samuel, 19, 2 



Quanto à versão também atípica do manuscrito do Arquivo da Cúria Metropoli- 
tana de São Paulo ( ACMSP P 118 ), os versículos posteriores ao estribilho Heu! Heu! 
Domine! foram baseados no segundo Responsório das Matinas do Sábado Santo, como 
se pode observar no quadro 8. 

O texto do Canto da Verônica, por sua vez, é de origem bíblica e litúrgica, sendo 
cantado em quatro ocasiões, nos Ofícios de Trevas do Tríduo Pascal (quadro 9). 



Quadro 8. Origem litúrgica dos versículos da primeira parte da Procissão do Enterro de 
ACMSP P 118. 



Versículos da primeira 
parte 


Origem litúrgica 


a - Jerusalém, surge... 


Segundo Responsório das Matinas do Sábado Santo - 
primeira parte da resposta 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



27 



b - Quia in te occisus est... 


Segundo Responsório das Matinas do Sábado Santo - 
segunda parte da resposta 


c - Deduc quasi torrentem... 


Segundo Responsório das Matinas do Sábado Santo - 
versículo 



Quadro 9. Origem bíblica e litúrgica do texto do Canto da Verônica. 



Texto do Canto da Verônica 


Origem bíblica e litúrgica 


0 vos omnes... 


■ Lamentações de Jeremias, 1, 12 

■ 3- lição das Matinas de Quinta-feira Santa 

■ Verso do 9- Responsório das Matinas de Sexta-feira 
Santa 

■ 5 2 Responsório das Matinas do Sábado Santo 

■ Antífona do Salmo 150, das Laudes do Sábado 
Santo 



O fenómeno mais interessante, entretanto, ocorre em relação aos textos da se- 
gunda parte. Nas duas versões apresentadas pelos cerimoniais portugueses, os textos 
correspondem a fragmentos litúrgicos dos Ofícios de Trevas do Tríduo Pascal. Embora 
alguns deles sejam cantados em várias Horas Canónicas do Tríduo Pascal, todos os 
textos, sem exceção, encontram-se nas Matinas do Sábado Santo, como podemos obser- 
var nos quadros 10 e 11. 



Quadro 10. Origem litúrgica dos versículos da segunda Parte (versão 1) da Procissão 
do Enterro, apresentados pelos cerimoniais portugueses. 



Versículos da segunda parte 


Origem litúrgica 


/Estimatus sum / cum descendenti- 
bus... 


■ Salmo 87 (versículo 4) do terceiro Noturno 
das Matinas de Sexta-feira e do Sábado 
Santo 

■ Antífona do Salmo 87 do terceiro Noturno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ 8- Responsório das Matinas do Sábado 
Santo 


Sepulto Domino / signatum est... 


■ 9- Responsório das Matinas do Sábado 
Santo 


In pace factus e st / lo cus ejus 


■ Antífona do Salmo 75 do terceiro Noturno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ Salmo 75 (versículo 2) do terceiro Noturno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ Versículo e Resposta final do terceiro No 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



28 





turno das Matinas do Sábado Santo 


In pace in idipsum / dormiam... 


■ Antífona do Salmo 4 do primeiro No turno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ Salmo 4 (versículo 9) do primeiro Noturno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ Versículo e Resposta final do primeiro No- 
turno das Matinas do Sábado Santo 


Caro mea / requiescet in spe 


■ Antífona do Salmo 15 do primeiro Noturno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ Salmo 15 (versículo 9) do primeiro Noturno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ Versículo final das Laudes do Sábado Santo 



Quadro 11. Origem litúrgica dos versículos da segunda Parte (versão 2) da Procissão 
do Enterro, apresentados pelos cerimoniais portugueses. 



Versículos da segunda parte 


Origem litúrgica 


In pace factus est locus ejus / et ha- 
bitatio 


■ Antífona do Salmo 75 do terceiro Noturno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ Salmo 75 (versículo 2) do terceiro Noturno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ Versículo e Resposta final do terceiro No- 
turno das Matinas do Sábado Santo 


Caro mea / requiescet in spe 


■ Antífona do Salmo 15 do primeiro Noturno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ Salmo 15 (versículo 9) do primeiro Noturno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ Versículo final das Laudes do Sábado Santo 


In pace in idipsum / dormiam... 


■ Antífona do Salmo 4 do primeiro Noturno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ Salmo 4 (versículo 9) do primeiro Noturno 
das Matinas do Sábado Santo 

■ Versículo e Resposta final do primeiro No- 
turno das Matinas do Sábado Santo 


Sepulto Domino... / Ponentes mili- 
tes... 

Accedentes príncipes... / Ponentes 
milites... 


■ 9- Responsório das Matinas do Sábado 
Santo (completo) 



Como a Procissão do Enterro é uma cerimónia específica da Sexta-feira Santa e, 
no período anterior a 1955, era precedida pelas Matinas (e também pelas Laudes) do 
Sábado Santo, os textos foram baseados em passagens dessa Hora Canónica. Tal costu- 
me já era indicado no § 119 das Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



29 



(1707): "E na Sé Metropolitana, depois do Ofício de Sexta-feira Santa, como é costume, 
se fará a Procissão do Enterro". 60 Após o remanej amento das Horas Canónicas para 
suas posições originais, pelo Papa Pio XII (Decreto da Sagrada Congregação dos Ritos 
de 16 de novembro de 1955), gerando o que hoje se conhece como Semana Santa res- 
taurada, 1 as Matinas do Sábado Santo passaram a ser cantadas no próprio Sábado. 

A segunda parte da Procissão do Enterro contém, então, uma espécie de resumo 
das idéias mais expressivas do Ofício que acabara de ser cantado, adaptado a uma ceri- 
mónia de maior apelo emocional e participação popular. E foi o próprio interesse popu- 
lar por essa cerimónia que provocou sua permanência até o presente, enquanto os Ofí- 
cios de Trevas, com raras exceções, estão praticamente extintos no Brasil. 

Pela não consideração dessa cerimónia pré-tridentina, a composição para a se- 
gunda parte da Procissão do Enterro, encontrada nos Livros de música polifônica n. 3 e 
n. 4 do Paço Ducal de Vila Viçosa (Portugal), acabou sendo catalogada por Manoel 
Joaquim e, posteriormente, por José Augusto Alegria, ~ como oitavo Responsório das 
Matinas do Sábado Santo. Baseando-se nas mesmas informações, Régis Duprat e Carlos 
Alberto Balthazar também atribuíram a mesma composição, encontrada no manuscrito 
da Coleção Curt Lange, às Matinas do Sábado Santo. 64 A sequência específica dos tex 



60 CONSTITUIÇÕES Primeiras do Arcebispado da Bahia. Op. cit, Livro Primeiro, Tí- 
tulo XXXIII, n.119, p. 52-53. Mas nem sempre a Procissão do Enterro era celebrada 
após as Matinas e Laudes (ou Ofício de Trevas) do Sábado Santo. Dois séculos mais 
tarde, em São Paulo, a Procissão do Enterro era prescrita antes do Ofício de Trevas, de 
acordo com Benedicta de Freitas (Actos diocesanos - Aviso n.16: A Semana Santa. Bo- 
letim Ecclesiastico: orgam official da Diocese de S. Paulo, São Paulo, ano 3, n.10, 
p. 186-187, abr. 1908): ''Sexta-feira Santa - 17 de abril. [...] As 6 horas da tarde: Pro- 
cissão do Enterro do Senhor, Sermão da Soledade pelo Revmo. Sr. Cónego Dr. João 
Evangelista Pereira Barros. Em seguida Ofício de Trevas." 

61 PINTO, José Alberto L. de Castro. Dicionário prático de cultura católica, bíblica e 
geral. In: Bíblia sagrada: tradução do Padre Antônio Pereira de Figueiredo. Nova edi- 
ção, publicada com a aprovação de Sua Eminência Cardeal D. Jaime de Barros Câmara. 
[Rio de Janeiro]: Edição Barsa, 1971. p.250, verbete "Semana Santa". 

VINTE livros de música polifônica do Paço Ducal de Vila Viçosa: catalogados, des- 
critos e anotados por Manoel Joaquim. Lisboa: Fundação da Casa de Bragança, 1953. 
f.53-56 e 70v-72r. 

BIBLIOTECA do Palácio Real de Vila Viçosa: catálogo dos fundos musicais organi- 
zado por José Augusto Alegria. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989. p. 13-16. 
64 MUSEU DA INCONFIDÊNCIA / OURO PRETO. Acervo de manuscritos musicais: 
coleção Francisco Curt Lange: compositores mineiros dos séculos XVIII e XIX / coor- 
denação geral: Régis Duprat; coordenação técnica: Carlos Alberto Baltazar. Belo Hori- 
zonte, Universidade Federal de Minas Gerais, v.2 [Compositores não-mineiros dos sé- 
culos XVI a XIX], 1994 (Coleção Pesquisa Científica), n.298, p.47. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



30 



tos desses manuscritos, no entanto, jamais ocorre como tal nessa Hora Canónica, além 
de estarem ausentes, em todos, os cinco versículos que, na Procissão do Enterro, são 
cantados pelo celebrante (Mstimatus sum, Sepulto Domino, In pace factus est, In pace 
in idipsum e Caro mea). 

A presença de fragmentos musicais anónimos para os textos Dormiam et requi- 
escam, Locus ejus e Requiescet in spe (exemplo 8), logo após o /Estimatus sum / cum 
descendentibus, no Livro de música polifônica n. 4 do Paço Ducal de Vila Viçosa 
(f.58v), não catalogados por Manoel Joaquim ou por José Augusto Alegria, somente 
corrobora a possibilidade de tratar-se esta de uma Procissão do Enterro e não do oitavo 
Responsório das Matinas do Sábado Santo. 



Exemplo 8. Anónimo. Fragmentos não catalogados da Procissão do Enterro, do Livro 
de música polifônica n. 4 do Paço Ducal de Vila Viçosa, Portugal (f.58v). Partes 
preservadas de "Cantus. l. us " (clave de sol na 2- linha) e "Tenor" (clave de dó na 
3- linha). Alturas originais transpostas uma quarta abaixo, em virtude da utiliza- 
ção de claves altas. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro " de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



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6. Reconstituição da Música para a Procissão do Enterro 



Devido à complexidade desta celebração, a reconstituição criteriosa da música 
para a Procissão do Enterro, encontrada em manuscritos brasileiros e mesmo portugue- 
ses, requer a observância das informações históricas e das prescrições cerimoniais até 
agora conhecidas. Este caso também permite compreender a diferença entre a cópia 
como atividade musical (preocupada apenas com questões estéticas) e a transcrição 
como atividade musicológica (preocupada também com questões históricas e docu- 
mentais). 

Exemplo particularmente interessante para esse trabalho é o da Procissão do 
Enterro de um manuscrito do final do século XIX do Arquivo da Cúria Metropolitana 
de São Paulo (cód. ACMSP P 253 ), 65 cuja música também foi copiada em um manus- 
crito sem código da Orquestra Lira Sanjoanense 66 e, com muitas diferenças, principal- 
mente nos versículos da primeira parte, em um grupo de manuscritos do Museu da Mú 



ACMSP P 253 C-Un - "Suprano Tracto Primeiro". Sem indicação de copista, sem 
local, [final do século XIX]: partes de SATB. 

66 OLS, sem cód. TC-Unl - ''Soprano a 4 Vozes / dos / Tratos Paxaõ e Adoração / da 
Crus Prossiçaõ do Enterro / do Senhor / 17 / 1928 / Pertence a Hermenegildo f de 
Sousa Trindade / P r dadiva de Manoel Jose da S a ". Cópia de Carlos Antônio da Silva, 
[São João del-Rei?, meados do século XIX]: partes de SATB. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



32 



sica de Mariana, cód. MA SS-16 \M-2 V-ll (contendo um conjunto do século XVIII). 
Nesses grupos não está indicada a alternância do coro que canta o Heu! Heu! Domine! 
com o coro que canta os versículos, no caso, apenas a, b e c. A reconstituição dessa 
música com a repetição do estribilho Heu! Heu! Domine! após cada um dos versículos, 
além da execução a dois coros da primeira parte, torna o resultado final compatível com 
as informações históricas e cerimoniais disponíveis. 

O ACMSP P 253 oferece duas possibilidades para a segunda parte: cantar o JEs- 
timatus sum e textos subsequentes (exemplo 11), como na primeira versão encontrada 
nos cerimoniais portugueses, ou cantar somente o Sepulto Domino, uma variante da 
segunda versão, aliás, a que se canta até hoje em São João dei Rei (MG). A indicação 
aparece em todas as partes do manuscrito, após o JEstimatus sum / cum descendentibus: 
"Fim. Quando não se cantar o Cum descendentibus, cantar-se-á o seguinte", surgindo, 
na próxima página, o Sepulto Domino (exemplo 9). Mais interessante ainda é a maneira 
como o manuscrito indica os cinco versículos ausentes na primeira opção para a segun- 
da parte {/Estimatus sum). Antes do Cum descendentibus pode-se ler: "O Padre diz &s- 
timatus sum". Os demais versículos entoados pelo celebrante estão indicados no docu- 
mento, mas a música de tais versículos não consta neste e em nenhum outro manuscrito 
brasileiro conhecido com textos para a Procissão do Enterro. 



Exemplo 9. Anónimo. Segunda parte (versão 2) da Procissão do Enterro de ACMSP P 
253 e OLS, sem cód. 



bl MMM MA SS-16 \M-2 V-ll : fC-ll - "Sexta Fr. a Suprano" . Sem indicação de copis- 
ta, sem local, [final do século XVIII]: partes de SAT; rC-21 - "Sexta fr. a Suprano". Sem 
indicação de copista, sem local, [1- metade do século XIX]: parte de S. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



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Se - pui - to Do - mi - no. Do - mi - no, si - gna-tum est 



Para reconstituir o cantochão entoado pelo celebrante na primeira versão, pode- 
se utilizar uma informação do Thezouro de ceremonias (1734), de João Campelo de 

68 

Macedo, segundo o qual: "O Celebrante, tanto que o túmulo está colocado sobre a 
peanha, o incensa com três duetos, e inclinado com os Ministros, diz os versos seguin- 
tes, descendo de fá a mi na última". NO Eclesiástico instruído (1788), de Bernardo da 
Conceição, o cantochão dos versículos da primeira parte já apresenta o intervalo fá-mi 
no final do estribilho Heu! Heu! Domine! e na cadência intermediária dos versículos 
(como no absque patre do exemplo 5). É possível, portanto, reconstruir os cinco versí- 
culos da segunda parte, cuja entoação cabe ao celebrante (exemplo 10), com base na 
versão apresentada por Bernardo da Conceição. 

Note-se que a estrutura escalar do JEstimatus sum aqui proposto também aparece 
na primeira frase do baixo vocal da Segunda parte de ACMSP P 253 e OLS, sem cód. 
(cum descendentibus in lacum), porém uma segunda maior abaixo (com as notas fá, mi 
bemol, ré bemol e dó, entre outras), corroborando a hipótese de ter sido utilizado canto- 
chão semelhante a este para os cinco versículos a serem cantados pelo celebrante 
(exemplo 11). 



Exemplo 10. Duas soluções possíveis para a reconstituição da melodia dos cinco versí- 
culos cantados pelo celebrante na segunda parte da Procissão do Enterro (versão 
1), apresentados na mesma transposição do Cum descendentibus in lacum de 
ACMSP P 253 e OLS, sem cód. 



MACEDO, João Campelo de. Thezouro de ceremonias... Braga: Francisco Duarte da 
Matta, 1734, p.§ 18, p.539. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



34 



JEs - ti - ma 



tus sum 



• • • 



/Es - ti - ma 



tus sum 



,,[ ! ■> 1,1, . • • 



000 0 



Sc - pui - to Do 



mi - no Sc - pui - to Do 



i rn 1 ' • • • • • 



• * • • 



V.3 



In pa - ce fa - ctus est In pa - ce fa 



V. 4 



In pa - ce in id - i 



psum In pa - ce in id - i 



psum 



» Q '^' • * ' ' 



Ca - ro me 



Ca - ro me 



Exemplo 11. Notas fá, mi bemol, ré bemol e dó, nos c. 5-10 da segunda parte da Procis- 
são do Enterro (composição anónima) de ACMSP P 253 e OLS, sem cód. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



35 



Largo 



Cum des - cen - den - ti - bus in la-cum, in la - cum: 



0 ÍÍCi—O. 



\>íi 



T 
i. u. 



TT 



Cum des - cen - den - ti - bus in 
Cum des- cen -den - ti - bus in 



la 
la 



o 

in la - cum: 

in la - cum: 

o ' 



O 0 



Cum des - cen - den - ti - bus in la 



7. Conclusão 



A Procissão do Enterro é uma das raras cerimónias religiosas, de origem medie- 
val e lusitana, ainda praticada em países de fala portuguesa. Existem dezenas de manus- 
critos, em acervos brasileiros, com música para essa devoção, predominantemente es- 
crita em estilo antigo. Tais manuscritos revelam estreita relação com informações apre- 
sentadas em livros litúrgicos bracarenses e em cerimoniais portugueses dos séculos 
XVII e XVIII, mas também apresentam particularidades não observadas nessas fontes, 
ou mesmo nos manuscritos até agora descritos em Portugal. 

Novos estudos sobre o texto e a música da Procissão do Enterro poderão escla- 
recer aspectos ainda desconhecidos da prática musical religiosa brasileira e portuguesa, 
desde que sejam relacionadas informações de fontes americanas e européias. Funda- 
mentais, entretanto, serão novos estudos sobre os aspectos sociais de tal cerimónia, in- 
cluindo o papel das irmandades, ordens conventuais, ordens terceiras e dioceses em sua 
celebração. 



8. Bibliografia 



ALEGRIA, José Augusto. História da Capela e Colégio dos Santos Reis em Vila Viço- 
sa. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, Serviço de Música, 1983. XI, 367p. 

BIBLIOTECA do Palácio Real de Vila Viçosa: catálogo dos fundos musicais organiza- 
do por José Augusto Alegria. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989. 466p. 

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/ Mosteiro de Singeverga, 1950. 2v. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



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Bento, e dada à luz por Jeronymo da Cunha Bento, irmão do author. Lisboa: por 
Francisco Luis Ameno. 1788. 1091p. 

CONSTITUIÇÕES Primeiras do Arcebispado da Bahia feitas, e ordenadas pelo Illus- 
trissimo, e Reverendissimo Senhor Sebastião Monteiro da vide, Arcebispo do dito 
Arcebispado, e do Conselho de Sua Magestade: Propostas, e aceitas em o synodo 
Diocesano, que o dito Senhor celebrou em 12 de junho do anno de 1707. Impressas 
em Lisboa no anno de 1719, e em Coimbra em 1720 com todas as Licenças neces- 
sárias, e ora reimpressas nesta Capital. S. Paulo, na Typographia 2 de Dezembro de 
Antonio Louzada Antunes. 1853. XXII, 9, 526, 171p. 

CORBIN, Solange. Essai sur la musique religièuse portuguaise au moyen age (1100- 
1385). Paris, Societé D'Edition "Les Belles Lettres", 1952. XL, 436 p.(Collection 
Portuguaise, v.8) 

DINIZ, Jaime. Gregório de Souza e Gouvea. III Encontro Nacional de Pesquisa em Mú- 
sica, 5 a 9 de agosto de 1987, Ouro Preto, Minas Gerais. Anais; promoção: Escola 
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DUPRAT, Régis. A polifonia portuguesa em obras de brasileiros. A polifonia seiscen- 
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ZENDE, Maria Conceição. A música na história de Minas colonial. Belo Horizon- 
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FREITAS, Benedicta de. Actos diocesanos - Aviso n.16: A Semana Santa. Boletim Ec- 
clesiastico: orgam official da Diocese de S. Paulo, São Paulo, ano 3, n.10, p.186- 
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GRANDE enciclopédia portuguesa e brasileira: ilustrada com cerca de 15.000 gravuras 
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40v. 

LANGE, Francisco Curt. História da música na Capitania Geral de Minas Gerais: Vila 
do Príncipe do Serro do Frio e Arraial do Tejuco. Belo Horizonte: Conselho Esta- 
dual de Cultura de Minas Gerais [Imprensa Oficial], 1983 [na ficha catalográfica: 
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etatis Edita, volumen 79-81, 87, 99. Monumenta Missionum Societatis Iesu, v.X- 
XII, XVII, XXVI. Missiones Occidentales) 

LÍBER Usualis Missae te Officii pro Dominicis et Festis cum canto gregoriano ex Editi- 
one Vaticana adamussim excerpto et rhythmicis signis in subsidium cantaram a 
Solesmensibus Monachis diligenter ornato. Parisiis, Tornaci, romae: Typis Societa- 
tis S. Joannis Evangelistas descelée & Socii, 1950. xxix, 1920, 14, 12, lOp. 

MACEDO, João Campelo de. Thezouro De Ceremonias, Que Contem As Das Missas 
Rezadas, e Solemnes, assim de Festas, como de Defuntos. E Também As da Semana 
Santa, quartafeira de cinza, das Candeyas, Ramos, e Missas de Natal. COM O que 
toda à Sagraçaõ dos Bispos, suas Missas rezadas; e dos Capellaês em sua prezen- 
ça. E tudo o mais, que pôde succeder pelo discurso do Anno, com advertências 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



37 



particulares para melhor intelligencia das Rubricas, e outras curiozidad.es mais. 
Composto Pelo Lecenciado Joam Campello De Macedo Thezoureyro Mór, que foy 
da Capella Real. Segunda Vez Acrescentado Nesta impressão com algumas rezolu- 
çoês modernas na maneira da Reza: com huma direcção para os Domingos Ter- 
ceyros: Fórma de receber o Prelado vizitando, ou outro Vizitador inferior; e algúa 
noticia do Rito Bracharense. Tudo Pelo Cónego Joaõ Duarte Dos Santos, Preben- 
dado na Santa Sè de Braga Prrimaz das Hepanhas, natural da Corte, e Cidade de 
Lisboa, e à sua custa impresso. Em Braga: Na Officina de Francisco Duarte Da 
Matta. Anno de 1734. Com todas as licenças necessárias, e Privilegio Real. 8 f. 
inum, 642p., 68f. não num. 

NERY, Ruy Vieira. A música no ciclo da "Bilioteca Lusitana ". Lisboa, Fundação Ca- 
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MONTEIRO, Raul Leno. Carmo: patrimônio da história, arte e fé. São Paulo: empresa 
Gráfica da Revista dos Tribunais SA, 1978. 289p. 

MUSEU DA INCONFIDÊNCIA OURO PRETO. Acervo de manuscritos musicais: 
coleção Francisco Curt Lange: compositores mineiros dos séculos XVIII e XIX co- 
ordenação geral: Régis Duprat; coordenação técnica: Carlos Alberto Baltazar. Belo 
Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais, v.l [Compositores Mineiros dos 
séculos XVIII e XIX], 1991, 178p. e v.2 [Compositores não-mineiros dos séculos 
XVI a XIX], 1994, 92p.(Coleção pesquisa Científica) 

O SACROSANTO, e Ecuménico Concílio de Trento em latim e portuguez: dedicado e 
consagrado aos exell., e Rev. Senhores Arcebispos, e Bispos da Igreja Lusitana. 
Nova Edição. Rio de Janeiro, Livraria de Antônio Gonçalves Guimarães & C. a , 
1864. 630p. 

PINTO, José Alberto L. de Castro. Dicionário prático de cultura católica, bíblica e ge- 
ral. In: Bíblia sagrada: tradução do Padre Antônio Pereira de Figueiredo. Nova edi- 
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ROMITA, Sac. Florentius. Jus Musicai Litúrgica;: dissertado historico-iuridica. Roma: 
Edizioni Liturgiche, 1947. XX, 319p. 

ROSÁRIO, Domingos do. THEATRO / ECCLESIASTICO, E / MANUAL DE MISSAS / 
OFFERECIDO /A/ VIRGEM SANTÍSSIMA, / SENHORA NOSSA / COM O SO- 
BERANO TITULO DA IMMACULADA / CONCEIÇÃO: ORDENADO POR SEU 
AUTHOR / O P.Fr. DOMINGOS DO ROSARIO, /Filho da Provinda de Santa Ma- 
ria da Arrábida, e primeiro Vigário / do Coro, que foi do Real Convento de Mafra. 
/PARTE SEGUNDA, /NOVAMENTE DIVIDIDA, EM QUE SE TRATA DE TODAS 
/ as Missas Dominicaes, desde a primeira Dominga do Advento até á ul-/tima de- 
pois de Pentecostes, Festas de Christo, de Nossa Senhora, Mis-Zsas próprias de 
Santos, e dos Communs, Kyrie, Gloria &c. para to-/das as Solemnidades. Tudo 
correio, e acrescentado com as quatro / Missas das Domingas Infra octavas do 
Natal, Epifania, Ascenção, e / Corpus Christi, Vigília de Pentecostes, vinte e tres 
domingas depois / de Pentecostes, sinco depois da Páscoa, tres depois da Epifania, 
Trans-Zfiguração de Christo, Exaltação da Cruz, Anniversário de Dedicação / da 
Igreja, e do Patrocínio de S. José para os Regulares. / Dado ao prélo pelo Illustris- 
simo, e Excellentissimo Senhor Duque do / Cadaval, Syndico Geral da sobredita 
Provinda. / Oitava impressão. / [grav.] / LISBOA: / Na Officina de SIMÃO THA- 
DDEO FERREIRA. / ANNO M. DCC. LXXXVI. [1786] / Com Licença da Real 
Meza Censória, e Privilegio Real. 3f. não num., 573p., lf. não num. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



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ROUSSEAU, Jean.TrazYe de la viole: Avec une préface de François Lesure. Genève: 
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RÒWER, Frei Basílio, O.F.M. Diccionario litúrgico: para o uso do revmo. Clero e dos 
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sas De Nossa Senhora, E das milagrosamente apparecidas [...]. Lisboa: Antônio 
Pedrozo Galrão, 1707-1723. lOv. 

SÃO JOSE, Leonardo de. Economicon Sacro Dos Ritos, E Ceremonias, Ecclesiasticas 
aplicado ao uso naõ só dos Cónegos Re-grantes Augustinianos da Congregação de 
S. Cruz de Coimbra, mas também de todo o Clero, [gravura do pilar encimado por 
coroa e ladeado por dois anjos] Haec Est Sola & Non Plvs Vltra. Consagrado A ' 
Soberana E Imperial Senhora Do Pilar Oráculo Divino Do Universo, Pelo Ca- 
ppelaõ da Sua [Cappella Dom Leonardo] de S. Joseph, Olys-ponense, Cónego Re- 
grante [Augustiniano], et Pregador de S. Mag. Lisboa: Na Officina de Manoel Lo- 
pes Ferreyra Com todas as licenças necessárias. Anno 1693. Com Privilegio Real. 
12f. inumeradas, 696p. 

SÃO LUIZ, Antonio de. Mestre De Ceremonias, Que Ensina O Rito Romano, E Seráfi- 
co Aos Religiosos Da Reformada, E Real Provinda Da Conceição No Reyno De 
Portugal, Exposto Em Duas Únicas Classes Para utilidade também dos mais Ec- 
clesiasticos, que praticão os mesmos ritos, Pelo M. R. P.M. Fr. Antonio De S. Luiz, 
Ex-Leitor De Theologia, E Padre Da Mesma Província. Terceira impressão Mais 
correcta, e notavelmente accrescentada com algumas Li-ções, varias Doutrinas, 
muitas Declarações da Sagrada Con-gregação, e Determinações novíssimas do 
N.SS. P.Pio VI. Por Hum Filho Da Sobredita Provinda, [grav.] Lisboa: Na Offici- 
na De Simão Thaddeo Ferreira. Anno de M. DCC. LXXXIX. [1789] Com Licença 
da Real Mesa da Commissão Geral, sobre o Exame e Censura dos Livros. 4f. não 
num., 450p. 

SARMENTO, Francisco de Jesus Maria. Manual Da Semana Santa Para Os Offtcios 
Ecclesiasticos, que se celebrão nas Horas Matutinas dos veneráveis Dias De Do- 
mingo De Ramos, Quinta Feira Santa, E Sesta Feira Da Paixão. Traduzidos no 
idioma Portuguez Para espiritual consolação, e proveitosa intelligencia dos que 
ignorão a Lingua Latina. Ajuntão se algumas Orações para antes, e depois dos 
Santos Sacramentos da Peni-tencia, e Eucaristia, e para visitar de-votamente as 
Igrejas: E varias Illustrações Históricas, e Reflexões Moraes sobre os Mysterios, 
que se recordão em toda esta Semana até Domingo de Páscoa. Por Fr. Francisco 
De Jesus Maria Sarmento, Comissionario da Venerável Ordem Terceira do Con- 
vento de Nossa Senhora de Jesus de Lisboa. LISBOA: Na Regia Officina Typogra- 
fica Anno MDCCLXXV [1775]. Com Licença da Real Meza Censória. 26 lp. 

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VASCONCELLOS, Joaquim de. Os músicos portugueses: biographia-bibliographia por 
[...]. Porto: Imprensa Portugueza, 1870. 2v. 

VILLA-LOBOS, Mathias de Sousa. ARTE / DE / CANTO CHÃO / OFFERECIDA /AO 
ILLUSTRISSIMO, E REVERENDÍSSIMO / SENHOR / DOM IOAM DE MELLO / 
BISPO DE COIMBRA, CONDE DE ARGA-Mil, Senhor de coja do Cõselho de S. 
Magestade &c. / COMPOSTA /POR MATHIAS DE SOUSA VILLA-LOBOS / Natu- 
ral da Cidade de Elvas Bacharel formado em Leys, / pella Vniversidade de Coim- 
bra, & Mestre da / Capella da See da mesma Cidade. EM COIMBRA / Com todas 
as licenças necessárias. / Na Officina de MANOEL RODRIGUES DE ALMEYDA 
/Anno de 1688. 7f. inum., 214p. 



CASTAGNA, Paulo. A "Procissão do Enterro" de Sexta-Feira Santa [III SLAM] 



39 



VINTE livros de música polifônica do Paço Ducal de Vila Viçosa: catalogados, descri- 
tos e anotados por Manoel Joaquim. Lisboa: Fundação da Casa de Bragança, 1953. 
300p.