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Full text of "Níveis de organização na música religiosa católica dos séculos XVIII e XIX: implicações arquivísticas e editoriais"

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NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO NA MÚSICA CATÓLICA DOS SÉCULOS XVIII 
E XIX: IMPLICAÇÕES ARQUIVÍSTICAS E EDITORIAIS 



Paulo CASTAGNA* 



CASTAGNA, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e 
XIX. I COLÓQUIO BRASILEIRO DE ARQUIVOLOGIA E EDIÇÃO 
MUSICAL. Mariana, Coordenadoria de Cultura e Artes da UNI-BH, Secretaria de 
Estado da Cultura de Minas Gerais, Fundação Cultural e Educacional da 
Arquidiocese de Mariana, 18 a 20 de julho de 2003. Mariana: Coordenadoria de 
Cultura e Artes da UNI-BH, Secretaria de Estado da Cultura de Minas Gerais, 
Fundação Cultural e Educacional da Arquidiocese de Mariana, 2004. (no prelo) 



RESUMO. Neste trabalho pretende-se, inicialmente, discutir a diferença entre Unidade Documental e 
Unidade Musical na música religiosa manuscrita dos séculos XVIII e XIX presente em acervos brasileiros 
e, posteriormente, estudar os níveis de organização de cada uma dessas unidades. Para a primeira dessas 
unidades serão discutidos os níveis de Grupo, Conjunto e Parte, enquanto para a segunda os níveis de 
Unidade Cerimonial, Unidade Funcional e Seção, além do nível mais complexo de Unidade Musical 
Permutável. Tais conceitos possuem implicações arquivísticas, musicológicas e editoriais, sendo já 
aplicados na reorganização e catalogação de alguns acervos brasileiros. Essas idéias serão particularmente 
discutidas em relação à música para a Quaresma (principalmente a Semana Santa), justamente aquela que 
apresenta os problemas mais complexos em relação aos níveis de organização. 



1. Introdução 



No tratamento dos acervos brasileiros de manuscritos musicais e, especialmente, 
nos catálogos até agora publicados, vêm surgindo vários problemas de ordem 
metodológica, referentes aos critérios de individualização das unidades documentais e 
das unidades musicais. Embora este trabalho esteja mais voltado à discussão dessas 
questões dentro da arquivologia musical, tais aspectos possuem profundas implicações 
na musicologia e na edição musical, especialmente na segunda, uma vez que a edição de 
uma obra necessariamente a individualiza, seja qual for o critério adotado. 

Em outras palavras, trata-se de responder a duas distintas questões: 1) qual a 
diferença entre composição musical e manuscrito musical; 2) onde começa e onde 
termina uma composição musical. Embora tais problemas mereçam uma discussão 
semelhante no âmbito da música profana, é em torno da música religiosa que surgem as 
principais questões relacionadas aos critérios de individualização e que, portanto, 
nortearão este trabalho. 



Instituto de Artes da UNESP (São Paulo - SP). 



CASTAGN A, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



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Em 1999, no III Simpósio Latino-Americano de Musicologia, já havia me 
referido a seis questões metodológicas que permeavam a organização e catalogação de 
música religiosa dos séculos XVIII e XIX em acervos brasileiros de manuscritos 
musicais, a saber: 1 

1) a concepção de obras "cristalizadas" no momento de sua composição 

2) a concepção de um manuscrito "original" 

3) a função cerimonial das composições 

4) a unidade funcional nos manuscritos 

5) a utilização de frontispícios de manuscritos ou designações funcionais como 

títulos das composições 

6) a necessidade de atribuição autoria às composições 

Em 2000, expandi o quarto item em minha tese de doutorado, 2 o que permitiu o 
estabelecimento de critérios de catalogação baseados em níveis de organização 
documentais e musicais que, depois de terem sido aplicados pela primeira vez na 
organização da Série manuscritos Musicais Avulsos dos Séculos XVIII e XIX do 
arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo, que passaram a ser utilizados na 
reorganização e catalogação da hoje denominada Coleção D. Oscar de Oliveira do 
Museu da Música de Mariana. 

Foi durante esse processo de reorganização e catalogação, no qual adotamos, 
entre outros, os critérios do RISM - Répertoire International des Sources Musicales - 
que se percebeu que tais normas foram idealizadas com base principalmente na música 
profana e que, portanto, não resolvia boa parte dos problemas verificados na música 
religiosa. O fato de o RISM ser um projeto europeu também acarreta várias limitações 
em sua utilização, uma vez que suas normas não atendem as características específicas 
dos manuscritos brasileiros. 

A solução de tais problemas começou a surgiu apenas quando foi levada em 
consideração a existência de níveis de organização documental e musical implícitos no 
material catalogado. Em função da pequena divulgação que tiveram até agora os 
critérios de catalogação baseados nos níveis de organização, mas também de sua própria 

1 CASTAGNA, Paulo. Reflexões metodológicas sobre a catalogação de música religiosa dos séculos 
XVIII e XIX em acervos brasileiros de manuscritos musicais. III SIMPÓSIO LATINO-AMERICANO 
DE MUSICOLOGIA, Curitiba, 21-24 jan. 1999. Anais. Curitiba: Fundação Cultural de Curitiba, 2000. 
p.139-165. 

2 CASTAGNA, Paulo. O estilo antigo na prática musical religiosa paulista e mineira dos séculos XVIII e 
XIX. Tese (doutorado). São Paulo: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São 
Paulo, 2000. 3v. 



CASTAGN A, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



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necessidade de discussão e aperfeiçoamento, parece-me oportuno voltar a abordá-los, 
agora de forma um pouco mais aprofundada. 

Para a discussão sobre os níveis de organização, a primeira tarefa é o 
estabelecimento da diferença que existe entre manuscrito musical e composição 
musical. O manuscrito musical é um suporte físico, um documento, 3 que não possui 
necessariamente uma única obra, nem uma obra completa e, muitas vezes, não possui 
música de um único autor. 

Existem muitos casos em que um determinado documento, pelo intenso 
manuseio e desgaste, rasga-se ao meio ou suas folhas se desprendem, porém somente 
uma das duas metades é encontrada. Trata-se, então, de um documento, ou de meio 
documento? E se, porventura, a metade perdida é localizada, as duas metades, que 
poderiam ter sido consideradas dois documentos, ao juntar-se tornam-se um único 
documento? E ainda mais, se duas folhas com duas obras diferentes são juntadas e 
costuradas, temos um único documento ou um documento "duplo"? 

Por essas razões, não existe, principalmente na música religiosa, uma necessária 
identidade entre composição e manuscrito musical. Em lugar dessa identidade, é 
fundamental reconhecer a existência de duas categorias arquivísticas distintas em um 
mesmo objeto: uma delas é o manuscrito, o documento, o suporte físico, enquanto a 
outra é a composição, a peça, a obra musical. Confundir as duas categorias é o mesmo 
que confundir o barco com o barqueiro, o cavalo com o cavaleiro, o piloto com o carro. 

Explorando essa analogia, para participarem de uma corrida automobilística, 
piloto e carro necessitam estar associados, mas possuem particularidades bastante 
distintas. Além disso, alguns pilotos podem usar seus carros titulares ou suas cópias 
(denominadas carros-reserva), sem contar o fato de poderem trocar de equipe e passar a 
pilotar um carro de marca diferente. Mas apesar dessas trocas, o piloto sempre mantém 
sua individualidade enquanto piloto, sempre será reconhecido por essa individualidade e 
sempre será chamado pelo mesmo nome. Nessa analogia, o piloto equivale à 
composição e o carro equivale ao manuscrito. Assim, a relação dos participantes de uma 
determinada corrida pode ser feita pelo nome do piloto ou pelo número do carro, assim 
como de um determinado acervo podem ser relacionados os manuscritos musicais ou as 
composições que estes contêm. 



3 Documento, neste trabalho, é qualquer manuscrito, musical ou não, que perdeu o significado funcional e 
assumiu significado histórico. 



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Assumindo, portanto, a existência dessas duas categorias, acredito que o 
catálogo de um acervo de manuscritos musicais possa ser realizado a partir de duas 
visões distintas: 1) um catálogo de manuscritos; 2) um catálogo de obras. Como essas 
duas categorias, apesar de sua distinção, manifestam uma inevitável dependência, uma 
vez que não existe obra escrita sem um suporte, e um suporte sem música não fará parte 
de um catálogo musical, é perfeitamente possível produzir um catálogo de manuscritos 
que explicite as obras que cada um deles possui, assim como um catálogo de obras que 
indique com precisão quais os manuscritos em que tais obras foram registradas. 

De maneira geral, os catálogos de obras religiosas que têm sido publicados no 
Brasil desde a década de 1960 misturam as duas categorias, apresentando unidades de 
descrição que ora se referem à obra e ora se referem ao documento ou manuscrito. Essa 
indecisão metodológica, que somente corrobora a existência das duas categorias, 
transfere para o consulente um problema que o arquivista ou musicólogo não consegue 
resolver, criando uma confusão às vezes insolúvel sem a consulta das próprias fontes. 

2. Níveis de organização documental 

O copista que registrava música manuscrita para um coro, não estava, 
necessariamente, preocupado com a unidade composicional do manuscrito. Existia uma 
praticidade na organização de tais cópias, que nem sempre resultava na individualização 
das composições ali presentes. Observe-se que não está em discussão, aqui, a tipologia 
das fontes manuscritas (autógrafos, apógrafos, apócrifos, cópias, etc), mas sim os seus 
níveis de organização, pelos quais se pode saber o que está contido no que e o que 
contém o que. 

O conceito de nível de organização aqui utilizado está baseado nos assim 
denominados níveis de organização biológica. Tais níveis representam conjuntos que 
contêm conjuntos menores, os quais contêm conjuntos ainda menores, em uma 
progressão teoricamente infinita. Para os biólogos, todos os serem vivos estruturam-se 
em níveis de organização, de tal maneira que célula, tecido, órgão, sistema e organismo 
constituem cinco níveis de organização, citados do menor para o maior, enquanto 
células, organelas celulares, moléculas, átomos e partículas subatômicas também 
constituem cinco níveis de organização, agora citados do maior para o menor. 

Assim, no plano arquivístico-musical, é possível reconhecer três níveis básicos 
de organização, do mais simples para o mais complexo: 



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1) partes 

2) conjuntos 

3) grupos 

A parte é um documento com música para uma única voz, instrumento ou naipe 
(conjunto de vozes ou instrumentos) e não deve ser confundido com partitura. No caso 
de naipes (geralmente instrumentais), como o das flautas, trompas, oboés, etc, o 
documento pode eventualmente conter música para dois ou mais instrumentos, mas 
continuará a ser denominado parte. Quando a parte contiver música para um naipe, as 
siglas empregadas podem indicar, em algarismos romanos unidos por hífen, o número 
de instrumentos. Para uma parte com duas flautas (flauta I e flauta II), por exemplo, a 
sigla adotada pode ser fl I-II, mas no caso de partes separadas de flauta I e flauta II, a 
melhor referência é fl I, fl II. Existem casos em que um manuscrito musical não está 
organizado em partes, mas sim em uma partitura, que passa a ser o seu menor nível de 
organização documental. 

O conjunto, por sua vez, é uma unidade documental correspondente à totalidade 
das partes vocais e/ou instrumentais referentes à(s) mesma(a) obra(s), elaboradas por 
um mesmo copista e em uma mesma época. O conjunto é o sistema básico de referência 
na classificação dos documentos musicais, podendo ser aplicado também a uma 
partitura, caso especial em que se fundem dois níveis de organização. 4 Para acentuar 
sua precisão, pode ser usado na forma conjunto de partes. As siglas que estão sendo 
adotadas na numeração dos conjuntos são C-l (conjunto 1), C-2 (conjunto 2), etc, 
empregando-se C-Un para designar o conjunto único. 

O grupo, finalmente, é uma reunião de conjuntos que possuem a mesma música, 
ou de conjuntos que compartilham obras entre si, podendo ter ainda outras 
características comuns (para acentuar sua precisão, pode ser empregado na forma grupo 
de conjuntos). Um grupo pode até reunir conjuntos copiados pelo mesmo copista, porém 
em épocas diferentes, ou que exibam características documentais muito diferentes. 

É somente pelo reconhecimento desses níveis de organização documentais que 
se pode, por exemplo, separar e indicar com precisão as diferentes cópias - e, portanto, 
conjuntos - que contêm uma determinada obra, cada um deles com seu copista, seu local 



A partitura é um documento musical, no qual as partes vocais e/ou instrumentais estão superpostas, 
permitindo a apreciação da música como um todo, como é frequente, por exemplo, entre os autógrafos 
preservados de André da Silva Gomes em São Paulo e José Maurício Nunes Garcia no Rio de Janeiro. 



CASTAGNA, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



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de cópia, sua data, seu título ou frontispício. A reunião de todos esses conjuntos que 
contêm a mesma obra ou as mesmas obras é, portanto, o grupo, que representa a maior 
unidade de descrição documental em um catálogo. 

Para facilitar a visualização desses níveis de organização, podemos representá- 
los no diagrama 1, no qual as partes aparecem dentro dos conjuntos e os conjuntos 
dentro dos grupos. 

Diagrama 1. Níveis de organização documental (G = Grupo; C = Conjunto; P = Parte) 




Em um sistema baseado na utilização de partes vocais e instrumentais, o 
conjunto é o resultado da elaboração de todas as partes de uma obra por um 
determinado copista, independente de terem sido essas partes compostas pelo autor da 
obra ou acrescentadas por esse copista. O que o arquivista tem diante de si é um 
conjunto de partes elaboradas pelo mesmo copista na mesma época, que, além da 
música composta por um determinado autor, reflete os acréscimos, supressões e demais 
interferências do copista. 

O grupo, por sua vez, inicialmente resultou da elaboração de novos conjuntos, a 
partir da cópia de conjuntos mais antigos, pelo mesmo copista ou por copistas 
diferentes. Sua função foi a de copiar música pertencente a outra pessoa, com a 
finalidade de usá-la profissionalmente, ou então renovar um conjunto envelhecido e 
danificado, pertencente a uma mesma pessoa, ou até mesmo produzir cópias de uma 
música para venda ou presente. Às vezes conjuntos diferentes de uma mesma obra, 
elaborados por copistas diversos em diferentes locais e épocas acabaram sendo juntados 
por um determinado músico ou mesmo pelo arquivista, figurando lado a lado em um 
determinado acervo, dentro do mesmo grupo. Existe até mesmo o caso de peças cujas 
partes foram copiadas por discípulos de um determinado mestre e posteriormente 



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juntadas por este, como parece ter ocorrido em papéis do Grupo de Mogi das Cruzes, 
cópias de composições predominantemente portuguesas elaboradas em Mogi das Cruzes 
(SP), provavelmente na década de 1730. 5 

Minha opinião, na organização dos acervos de manuscritos musicais, tem sido a 
de reunir, sempre que possível e conveniente, os conjuntos pertencentes a um mesmo 
grupo dentro de um determinado fundo documental, pois esse arranjo permite maior 
praticidade na consulta dos documentos. Muitas vezes, os antigos proprietários de 
arquivos musicais já possuíam o costume de justapor conjuntos diferentes com as 
mesmas obras e até de costurar conjuntos diferentes, criando grupos de conjuntos em 
um arquivo ainda funcional. Em casos mais raros, apenas uma parte de um conjunto era 
substituída por uma nova cópia, obrigando o arquivista a posicioná-la em um segundo 
conjunto, apesar de, funcionalmente, ter sido mantida pelo músico junto ao primeiro 
conjunto. 

Obviamente, na organização de um acervo de manuscritos musicais é 
fundamental atentar-se ao princípio de respeito aos fundos, mas quando não existe uma 
ordem intencional, ou quando os documentos estão visivelmente embaralhados, o 
organizador deve reunir e descrever os conjuntos correspondentes a um mesmo grupo, 
dentro de um determinado fundo documental, para dar ao acervo uma organicidade e 
uma praticidade de consulta que o mesmo não possuía antes dessa organização. Evitar a 
reunião dos conjuntos em um mesmo grupo dentro de um mesmo fundo não é um 
procedimento ético nem científico, mas um desvio metodológico, sem qualquer 
fundamentação prática ou teórica. 

3. Níveis de organização musical 

Independente dos níveis de organização documental, a música religiosa católica, 
nos séculos XVIII e XIX, foi nitidamente estruturada em pelo menos três níveis de 
organização musical, do maior para o menor, embora adiante mencionarei a existência 
de mais dois: 

1) Unidade cerimonial ou "ofício" 

2) Unidade funcional 

5 CASTAGNA, Paulo. Uma análise codicológica do Grupo de Mogi das Cruzes. IV ENCONTRO DE 
MUSICOLOGIA HISTÓRICA, Juiz de Fora, 21-23 de julho de 2000. Anais. Juiz de Fora: Centro 
Cultural Pró-Música; Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 2002. p.21-71. 



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3) Seção 

A Unidade cerimonial designa a cerimónia ou ofício religioso (e a música para 
ela escrita) que possui uma unidade intrínseca, tal como prescrita em um livro litúrgico 
ou cultivada por tradição, no caso de cerimónia paralitúrgica. Exemplos litúrgicos são a 
Missa de Quinta-feira Santa, as Matinas de Sexta-feira Santa e as Laudes do Sábado 
Santo, enquanto exemplos paralitúrgicos são a Procissão dos Passos da Quaresma, a 
Novena de Nossa Senhora da Conceição e a Encomendação de Almas. 

A Unidade funcional designa cada um dos textos de uma unidade cerimonial (e 
a música para eles escrita) que possuem uma unidade intrínseca e uma denominação 
específica, de acordo com os livros litúrgicos ou com a tradição, no caso de unidade 
paralitúrgica. Exemplos litúrgicos são o Intróito, o Kyrie, o Gloria e o Gradual da 
Missa, uma Antífona, um Salmo, uma Lição e um Responsório de Matinas, enquanto 
exemplos paralitúrgicos são cada um dos Motetos da Procissão dos Passos, o 
Invitatório, o Hino, a Antífona e cada uma das Jaculatórias das Novenas. 

A Seção designa a música e o texto correspondente aos menores trechos de uma 
unidade funcional. As seções geralmente estão divididas, nos manuscritos, por barra 
dupla (pode ocorrer barra simples no cantochão) e podem corresponder a frases, 
versículos, metades de versículos, estrofes, ou mesmo a todo o texto de uma unidade 
funcional. Cada seção pode conter uma única palavra ou dezenas delas. Exemplos 
(referem-se aos textos e sua música): "Jesum Nazarenum" , das Turbas da Paixão de 
Sexta-feira Santa; "Pupilli facti sumus", dos Versículos da primeira parte da Procissão 
do Enterro de Sexta-feira Santa; "Jesu Redemptor omnium", do Hino das Vésperas do 
Natal; "Gloria Patri, et Filio, et Spiritui Sancto", da Doxologia dos Salmos de Horas 
Canónicas. 

Assim, podemos novamente utilizar um exemplo gráfico para representar os 
níveis de organização musicais (diagrama 2). 



CASTAGNA, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



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Diagrama 2. Níveis de organização musical em composições religiosas dos séculos 
XVIII e XIX (UC = Unidade cerimonial; UF = Unidade Funcional; S = Seção) 




Atrás, informei que existiam mais dois níveis de organização. Um deles possui 
uma definição muito simples: em alguns casos, existe um nível superior ao da Unidade 
Cerimonial ou Ofício, quando dois deles são justapostos pela eliminação do tempo que 
existiria entre as duas cerimónias, gerando o que aqui denominarei super-ofício. E o 
caso do Ofício e Missa de Domingo de Ramos (resultado da justaposição do Ofício de 
Ramos e da Missa de Ramos), dos Ofícios de Trevas do Tríduo Pascal (resultado da 
justaposição das Matinas e Laudes desses três dias) e da Missa e Vésperas de Quinta- 
feira e do Sábado Santo (resultado da justaposição da Missa e das Vésperas desse dia). 
Esses super-ofícios surgiram da dilatação temporal de determinadas cerimónias, sendo 
conhecidos nos próprios livros litúrgicos respectivamente como OJficium et Missa in 
Dominica Palmarum, OJficium Tenebrarum e Missa et Vesperis. 

O quinto e último nível de organização é, sem dúvida, o mais complexo de todos 
e está ligado ao conceito de obra, destinado a definir onde começa e onde termina uma 
composição musical dentro de uma cerimónia religiosa. Como a definição desse nível 
não é nada simples, teremos de levantar alguns problemas até chegar à formulação dessa 
proposta metodológica. 

Na música profana, essa questão não é um dilema. É bem mais simples definir o 
início e o final de uma sonata, de uma sinfonia, de uma canção, de uma variação, de 
uma dança, embora esse problema possa surgir em relação a um prelúdio e fuga, a uma 
suite e a uma ópera, por exemplo. Um prelúdio e fuga está constituído de duas obras 
distintas ou corresponde a uma única composição com duas unidades musicais em um 
nível de organização inferior? Uma suite, com todas suas danças, é uma única 
composição ou um conjunto de obras diferentes? Uma ópera pode ser descrita como um 
grande conjunto de composições distintas em forma de abertura, recitativos, árias, 
cabaletas, duetos, trios, coros e interlúdios? 



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O grau de complexidade dos problemas acima apresentados, entretanto, ainda é 
muito pequeno na música profana, frente ao da música religiosa. Observe-se, por 
exemplo, as seguintes questões: em uma Missa, o que é uma composição, o conjunto da 
música utilizado para todos os textos dessa cerimónia, ou cada uma de suas unidades 
funcionais, como Kyrie, Gloria, Gradual, Ofertório, etc? E quando o Gloria é dividido 
em segmentos distintos e de caráter independente, como o Gloria, Laudamus, Gratias, 
Domine Deus, Qui tollis, Qui sedes, Quoniam e Cum Sancto Spiritu, seria cada um 
deles uma composição distinta? Precipita-se quem responde não a essas questões, pois 
existem muitos manuscritos em acervos brasileiros que contêm apenas um Laudamus, 
por exemplo, que não aparece no interior de nenhum outro Gloria, devendo ser 
considerado, portanto, uma composição única e independente, em termos musicais. 

Continuando a levantar questões com base na suposição acima formulada, 
imagine-se que o Laudamus de um determinado compositor tenha sido descrito como 
uma obra autónoma, mas que no acervo surgiu um Domine Deus do mesmo autor, que 
utiliza os mesmos motivos melódicos, rítmicos e harmónicos do trecho anterior, 
caracterizando o fato de terem sido compostos para integrar o mesmo Gloria. Se os dois 
trechos foram concebidos como duas obras diferentes, o que representaria, então, a 
reunião dessas peças, já que foram conjuntamente concebidas pela mesma pessoa para a 
mesma unidade funcional: uma super-obra, uma obra dupla? O que deve ser 
considerado, portanto, a composição autónoma: a Missa, o Gloria ou o Laudamusl 

Observe-se, portanto, que já estamos diante de três níveis diferentes de 
organização, cujo reconhecimento nem chega a ser uma novidade. Essa divisão do 
Gloria em trechos ou segmentos diferentes recebeu um pertinente comentário do 
musicólogo português Ernesto Vieira, em 1899, que vale a pena transcrever: 

"A parte musical que na Missa festiva ou solene se designa 
especialmente com o nome de Missa, compreende os Kyries e a Gloria. 
Esta última compõe-se do cântico Gloria in excelsis Deo e de diversas 
frases curtas exprimindo louvor (Laudamus), prece (Qui tollis) e 
exaltação (Quoniam). 

Estas três diferentes expressões da Gloria indicam a sua divisão 
em três peças de diferente caráter ; mas os compositores italianos nas 
grandes Missas de estilo teatral, para obterem maior número de trechos, 
retalham todas as frases, fazendo da Gloria um ato de ópera, com árias, 
coros, duetos, etc . E também uso antigo e tradicional fazer, nas Missas 



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de grande aparato, uma extensa fuga no final, com a letra: Cum sancto 
spiritu in gloria Dei Patris. Amen." 6 

Um interessante documento eclesiástico brasileiro, a Pastoral coletiva de 1910, 
foi explícita ao proibir a divisão das Missas em peças independentes, como 
normalmente ocorria nas composições dessa espécie desde o final do século XVIII. 
Observe-se a precisão da terminologia adotada e a analogia com o exemplo anterior: 

"Devem ser quanto antes proscritas e substituídas, porque estão 
por si mesmas reprovadas e condenadas, todas as Missas que não 
conservam a unidade de composição própria do texto. 

Tais são as missas, cujas partes do Gloria ou do Credo como, por 
exemplo, o Laudamus, o Gratias agimus, o Domine Deus, o Incarnatus, 
etc, são compostas por números separados, de modo a formarem por si 
sós uma composição à parte, que pode ser destacada e substituída por 
outra de igual jaez" 

Para colocar mais lenha na fogueira, como é possível definir a Missa enquanto 
uma única composição, quando seus trechos polifônicos eram entremeados por 
inúmeras passagens em cantochão, entoadas por coros e solistas e compostas por vários 
autores a partir da Idade Média? Seria, então, a Missa, um tipo de composição 
semelhante a uma esponja, que permite a infiltração de outras composições em seus 
interstícios, ou a Missa é constituída de um conjunto de composições que se integram 
em uma unidade cerimonial? 

Se as questões acima levantadas já se mostram complexas em relação à Missa, o 
que dizer, então, das Matinas, das Laudes, das Vésperas, da Procissão dos Passos da 
Quaresma, das Encomendações Fúnebres, das Novenas, Trezenas, Setenários e muitos 
outros géneros católicos - ou melhor, unidades cerimoniais -, tal como acima 
formuladas? Um exemplo paulista pode ser interessante, neste caso. Existe, no Arquivo 
da Cúria Metropolitana de São Paulo, um interessante conjunto manuscrito de 1878 com 
música do compositor tietense Vicente Antônio Procópio (fl. 1867-1878) para as 
cerimónias públicas dos principais dias da Semana Santa (Domingo de Ramos e Tríduo 
Pascal), em partes de SATB, violinos I e II, baixo, pistom I em dó, clarinetes I e II em 



VIEIRA, Ernesto. Diccionario musical; [...]. 2 ed, Lisboa: Typ. Lallemant, 1899. p.348. Grifos meus. 
7 PASTORAL collectiva dos Senhores Arcebispos e Bispos das Provincias Ecclesiasticas de S. Sebastião 
do Rio de Janeiro, Marianna, S. Paulo, Cuyabá e Porto Alegre communicado ao clero e aos fieis o 
resultado na cidade de S. Paulo de 25 de setembro a 10 de outubro de 1910. Rio de Janeiro: Typographia 
Leuzinger, 1911. n.3, p. 640-645. Grifos meus. 



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dó. Trata-se toda essa música de uma única obra? Em caso negativo, onde começa e 
onde termina cada composição? 

Nem sempre essas dificuldades têm sido abordadas em toda sua complexidade, 
existindo uma certa tendência, tanto no Brasil quanto no exterior, em uma definição de 
obra teoricamente pouco fundamentada, além da tendência de se tratar a música 
religiosa com critérios próprios da música profana. Um exemplos importante é a 
utilização de títulos uniformes como títulos da composição, tal como recomendado pelo 
RISM, 9 o que gera inúmeros problemas de referência e uma dificuldade de compreensão 
do real significado da obra. Às composições católicas é insuficiente dar um título 
uniforme como ocorre na música profana. Assim como uma pessoa precisa ter um nome 
e um sobrenome, para um registro preciso, uma composição religiosa deve ser 
designada por seu incipit literário e por sua função cerimonial, como, por exemplo: 
Astiterunt reges terrce (Primeira Antífona das Matinas de Sexta-feira Santa), Christus 
factus est (Antífona final das Laudes do Tríduo Pascal), Te Deum laudamus (Hino de 
Ação de Graças). A inversão da posição do incipit literário e da função cerimonial na 
referência à obra é possível, mas a utilização de somente uma delas em um catálogo 
dificulta a localização da obra e não permite uma rápida apreciação de seu significado. 

Outro problema ligado a essa tendência é a divisão das composições em 
movimentos, utilizando-se, para isso, os andamentos. Ora, o conceito de movimento, 
enquanto parte de uma obra, está essencialmente ligado à música instrumental, 
especialmente àquela cujas partes não possuem caráter pré-determinado (como as partes 
de um concerto, ou os prelúdios e fugas), podendo ser definido como "parte auto- 
suficiente de uma composição instrumental extensa, como uma sinfonia, concerto ou 
sonata." 10 Esse conceito de movimento, que entra na história da música no século XVII, 
especialmente ligado às sonatas, não tem uma aplicação garantida na música religiosa: 
nas sonatas, concertos e sinfonias existem movimentos, mas na música religiosa católica 
existem Antífonas, Responsórios, Lições, Salmos, Hinos, Cânticos, Graduais, Tractos, 
etc, ou seja, unidades funcionais. Por isso, já nas pastorais brasileiras do século XVIII 
eram citados segmentos de obras religiosas, mas esses eram referidos por meio de 

8 AMCP, n.308. Cópia de José Marcelino Rodrigues, São Roque, 2/10/1878: SATB, vl I, vl II, pt I dó, cl I 
dó, cl II dó, bx 

9 COTTA, André Guerra. O tratamento da informação em acervos de manuscritos musicais brasileiros. 
Dissertação (Mestrado). Belo Horizonte: Escola de Biblioteconomia da Universidade Federal de Minas 
Gerais, 2000. p.162-168. 

10 ISAACS, Alan e MARTIN, Elisabeth. Dicionário de música Zahar. editoria Luiz Paulo Horta. Rio de 
Janeiro, Zahar Editores, 1985. p.248. 



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designações específicas, quando se determinava, por exemplo, que o mestre da capela 
não consentisse "[...] que nas matrizes e capelas da dita comarca se cantem músicas 
com composições de letras profanas ou outras que não sejam Antífonas, Salmos, Hinos, 
Graduais e as mais que se contêm na ordem da reza do Ofício Divino e Missa, 
conforme o rito da festa [...]."" 

As unidades cerimoniais e funcionais na música católica nem sequer dependem 
da música, sendo intrínsecas do texto litúrgico, tal como encontrado no Breviário, 
Missal, Antifonário, Vesperal, Saltério, Santoral ou qualquer outro livro litúrgico 
católico. Casos mais problemáticos estão relacionados à música religiosa paralitúrgica 
(portanto não referida em livros litúrgicos), como Novenas, Trezenas, Encomendações, 
algumas Procissões, etc. Os textos paralitúrgicos, se não foram registrados em algum 
livro cerimonial ou descritos por pesquisadores da área, necessitam ser estudados 
diretamente da tradição, para que se possa conhecer seu conteúdo e sua estrutura. 
Assim, para uma correta definição das unidades cerimoniais e funcionais na música 
litúrgica, não existe outra maneira a não ser o estudo das cerimónias a partir dos livros 
litúrgicos contemporâneos às composições. 12 No caso da música paralitúrgica é preciso 
estudar a tradição, mas esse estudo é análogo ao da música litúrgica, uma vez que estão 
envolvidos, nos dois casos, a estrutura das cerimónias e os textos religiosos musicados. 

Por outro lado, o estudo da liturgia não resolverá todos os problemas, uma vez 
que os compositores e/ou os copistas geravam desvios do padrão litúrgico corrente - por 
costume ou por iniciativa própria - acarretando mais um problema para o pesquisador. 
Um caso interessante desse tipo de desvio está nos Responsórios Fúnebres de João de 
Deus de Castro Lobo. De acordo com Olímpio Pimenta, o compositor faleceu antes de 
iniciar o Responsório VII (já que as Matinas de Defuntos possuem nove Responsórios) 
e, por essa razão, cita apenas "[...] os Seis Responsórios de Defuntos, último pensamento 

13 

com o qual cerrou o escrínio glorioso de suas composições [...]", obra impressa no 

11 Provisão de Julião da Silva e Abreu para Mestre da Capela da Comarca do Rio das Mortes, registrada em 
1/2/1749. Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana, Livro do Registro Geral (Provisões) 1748-1750, 
v.l,f.l05v/106v. 

12 Para uma tipologia e descrição dos livros litúrgicos católicos, ver: CASTAGNA, Paulo. Cantochão e 
liturgia: implicações na pesquisa da música católica latino-americana (séculos XVI-XX). IV SIMPÓSIO 
LATINO- AMERICANO DE MUSICOLOGIA, Curitiba, 20-23 jan. 2000. Anais. Curitiba, Fundação 
Cultural de Curitiba, 2001. p. 199-222. 

13 PIMENTA, Olympio. Recordação do passado - 1794 a 1832: o Maestro Padre João de Deus. Boletim 
Eclesiástico, Mariana, ano 10, n.5, p.110-113, maio 1911. Esse interessante artigo, que representa a mais 
antiga notícia biográfica de João de Deus de Castro Lobo, já havia sido referido por D. Oscar de Oliveira 
em um texto de 1986, também dedicado à biografia e à produção musical do compositor mineiro, mas não 
chegou a ser citado por Raimundo Trindade em sua breve notícia de 1929 (reimpressa em 1955) sobre 
Castro Lobo. De todos os textos conhecidos, no entanto, o de Pimenta é o único que possui uma 



CASTAGNA, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 14 

último volume da série Acervo da Música Brasileira. 14 A julgar pelo depoimento de 
Olímpio Pimenta, os Responsórios VII, VIII e IX que, em alguns manuscritos aparecem 
associados aos Responsórios I a VI de Castro Lobo, não foram compostos por esse 
autor, mas agregados aos principais por copistas e mestres de música, com a finalidade 
de prover música para o restante das Matinas. 

Podemos usar também uma descrição do século XVIII para perceber que, muitas 
vezes, não era exigido que o compositor escrevesse música para toda uma unidade 
cerimonial, mas apenas para algumas de suas unidades funcionais, gerando-se obras que 
ocupam diferentes níveis de organização. Na Memoria dos escriptores na arte da 
muzica, documento que integra o códice 8942 da Divisão de Reservados da Biblioteca 
Nacional de Lisboa, redigido provavelmente em 1737, 15 existe uma pequena notícia 
biográfica sobre Antão de Santo Elias (7-1748), lisboeta que recebeu o hábito no 
Convento do Carmo da Bahia em 1696, posteriormente retornando a Portugal, onde 
atuou como harpista no Convento do Carmo e na Sé Oriental de Lisboa. Nesse 
documento estão citadas suas composições, em geral unidades funcionais ou conjuntos 
de unidades funcionais de cerimónias que em sua maioria sequer foram mencionadas: 

"[...] Compôs o primeiro Te Deum laudamus que se cantou na 
Igreja de S. Roque da Casa professa da Companhia [de Jesus] no dia 
último do ano, como se costuma, compôs mais os Responsórios 
Matutinais para a soleníssima festa de Nossa Senhora do Carmo, para 
Santo André Cursino, para São Brás, para o Natal, mais muita variedade 
de Psalmos, Magnificas e Missas, tudo com instrumentos vários; compôs 
os Responsórios dos três dias da Semana Santa, vários Misereres, Lições 
e Lamentações da mesma Semana. Compôs mais um livro de Hinos de 
música de estante a quatro vozes, o qual se acha no seu Convento de 
Lisboa. E no tempo em que se cantavam Vilancicos, muita quantidade 
deles compôs para as festas principais do ano." 16 



explicação satisfatória para a ausência dos Responsórios VII a IX. Cf.: OLIVEIRA, D. Oscar de. Padre 
João de Deus, preclaro musicógrafo mineiro: 1794-1832. O Arquidiocesano, Mariana, ano 28, n. 1.412, 
p.l, 12 out. 1986; TRINDADE, Côn. Raimundo. Arquidiocese de Mariana: subsidios para sua historia. 2. 
ed. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1955. v.2, p.94. 

14 CASTRO LOBO, João de Deus de. Seis Responsórios Fúnebres. In: CASTAGNA, Paulo (coord.). 
Música fúnebre; coordenação musicológica Paulo Castagna; coordenação editorial Carlos Alberto 
Figueiredo; coordenação da revisão Marcelo Campos Hazan; assessoria litúrgica Aluízio José Viegas; 
pesquisa, edição e texto Carlos Alberto Figueiredo, Marcelo Campos Hazan, Paulo Castagna. Belo 
Horizonte: Fundação Cultural e Educacional da Arquidiocese de Mariana, 2003. n.l, p.51-147 (Acervo da 
Música Brasileira / Restauração e Difusão de Partituras, v.9) 

15 Memoria dos Escriptores na Arte da Muzica de que / temos noticia, filhos da Provinda de NS do 
Carmo da Antiga e Re-/gular obseruancia neste Reyno de Portugal, f. 164r. 

16 NERY, Rui Vieira. Para a história do barroco musical português (o códice 8942 da B.N.L.). Lisboa, 
Fundação Calouste Gulbenkian, 1980. p.61. 



CASTAGN A, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



15 



Foi devido à dificuldade de se estabelecer um conceito fixo e único de obra, de 
composição musical, que cheguei, em 1998, à formulação do conceito de unidade 
musical permutável, uma categoria arquivístico-musical (e, portanto, não documental) 
que não deixa de ser um nível de organização, mas não se apresenta de maneira 
mecânica e linear como os quatro níveis anteriormente descritos. 

A Unidade musical permutável (UMP) designa o conjunto de textos (e não, 
necessariamente, de unidades funcionais ou seções) que receberam uma composição 
autónoma e que pode ser associada a uma outra unidade musical permutável, mesmo 
que escrita por autor diferente. Esse tipo de unidade, portanto, é decorrente da atividade 
de compositores e copistas em uma determinada época e região, e não somente de 
particularidades dos textos religiosos, sendo exemplos as Lições das Matinas, os Hinos 
das Vésperas, as Turbas das Paixões, os Impropérios da Adoração da Cruz, os Tractos 
das Lições da Missa do Sábado Santo, etc. 

A UMP, portanto, pode ser ora uma unidade cerimonial, ora uma unidade 
funcional e ora uma seção, sendo definida enquanto um nível transversal, que pode 
abarcar porções de níveis distintos. Além disso, essa categoria arquivístico-musical 
possui o importante caráter de ser permutável, ou seja, contém em si a possibilidade de 
ser copiada ao lado de uma outra UMP em um mesmo manuscrito, para ser usada em 
uma mesma cerimónia, ainda que a música de ambas tenha sido escrita por autores 
diferentes. Esse é o caso, por exemplo, de algumas Missas de Domingo de Ramos, que 
normalmente possuem polifonia para o Intróito, para as partes corais do Ordinário 
(Kyrie, Gloria, Credo, Sanctus, Benedictus e Agnus Dei), para o Tracto, para a Paixão 
(segundo São Mateus), para o Ofertório e para o Comúnio. Em determinados 
manuscritos pode-se encontrar justapostos um Ordinário e uma Paixão, mas em outros o 
mesmo Ordinário, porém com uma Paixão diferente. Permutas como essas são 
observadas também entre o Intróito e o Ordinário, entre o Intróito e a Paixão, etc, sendo 
ainda mais complexas em outros tipos de unidades cerimoniais, como as Matinas do 
Tríduo Pascal, ou a Missa e Vésperas do Sábado Santo. 

Muitas vezes, obras diferentes escritas para os mesmos textos, comportam-se de 
maneira diferente em relação às UMPs. Na Missa - para aproveitar as discussões 
anteriormente formuladas - existe música para todas as partes corais do Ordinário, que 
ora se comporta enquanto uma única composição e ora se comporta enquanto duas: do 
final do século XVIII ao final do século XIX era comum entre os copistas e mesmo 
entre os compositores, a divisão do Ordinário da Missa festiva em duas partes, agora 



CASTAGN A, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



16 



denominadas Missa (com o Kyrie e o Gloria) e Credo (com o Credo, o Sanctus, o 
Benedictus e o Agnus Dei). Ernesto Vieira, que reconheceu esse fenómeno em 1899, 
informa que "<a parte musical que na missa festiva ou solene se designa especialmente 
com o nome de Missa, compreende os Kyries e a Gloria" e que "o Credo constitui a 
segunda parte da Missa festiva [...]." 17 Por isso, é comum encontrar, em arquivos 
brasileiros, manuscritos contendo apenas o Kyrie e o Gloria (intitulados Missa) e 
manuscritos contendo apenas o Credo e unidades subsequentes do Ordinário (intitulados 
Credo), além de manuscritos que contêm todas as unidades do Ordinário (intitulados 
Missa e Credo). Obviamente, a Missa e o Credo festivos eram permutáveis, ou seja, 
uma determinada Missa poderia ser combinada ora com um Credo e ora com outro. Já 
nas Missas feriais (destinadas à maior parte da Quaresma e do Advento), esse fenómeno 
não era comum, utilizando-se normalmente uma Missa que se comportava enquanto 
uma composição única. 

Diante desses casos, em lugar de um genérico conceito de obra ou composição 
musical, geralmente claro (ou bem menos problemático) na música profana, a 
arquivologia musical requer um conceito diferente para a classificação da música 
religiosa, especialmente dos séculos XVIII e XIX, mostrando-se até aqui eficaz a 
categoria de unidade musical permutável. Tal conceito foi aplicado no Arquivo da Cúria 
Metropolitana de São Paulo, no Grupo de Mogi das Cruzes, no Museu da Música de 
Mariana, no Arquivo Histórico Monsenhor Horta e em inúmeros documentos 
repertoriados em acervos brasileiros de manuscritos musicais, solucionando problemas 
que não puderam ser resolvidos apenas pela abordagem litúrgica ou pelo estudo dos 
documentos nos quais a música foi registrada. 

Para analisar um exemplo mais concreto, tomemos o conjunto único do grupo 
n.253 do Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo, 18 cuja música é, afora pequenas 
variantes, idêntica a um conjunto sem código do arquivo da Orquestra Lira Sanjoanense 
(São João dei Rei - MG), 19 obviamente copiado por outro copista, em outra época e em 



Cf.: VIEIRA, Ernesto. Diccionario musical, op. cit., p. 348-349. 

18 ACMSP P 253 - "Suprano Tracto Primeiro". Sem indicação de copista, sem local, [final do séc. XIX]: partes de 
SATB. 

19 OLS, sem cód. - ''Soprano a 4 Vozes / dos / Tratos Paxaõ e Adoração / da Crus Prossiçaõ do Enterro / do Senhor / 
17 / 1928 / Pertence a Hermenegildo f de Sousa Trindade / P r dadiva de Manoel Jose da S a ". Cópia de Carlos 
Antônio da Silva, [São loão del-Rei?, meados do séc. XIX]: partes de SATB. Este manuscrito está citado em: 
BARBOSA, Élmer Corrêa (org.). O ciclo do ouro. o tempo e a música do barroco católico; catálogo de um 
arquivo de microfilmes; elementos para uma história da arte no Brasil; Pesquisa de Élmer C. Corrêa 
Barbosa; acessória no trabalho de campo Adhémar Campos Filho, Aluízio José Viegas; Catalogação das 
músicas do séc. XVIII Cleofe Person de Mattos. Rio de Janeiro: PUC, FUNARTE, XEROX, 1978. p. 271. 
A data "17/1928", nesse manuscrito, foi aplicada a lápis por um copista diferente de Carlos Antônio da 



CASTAGN A, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



17 



outro local. Como tais conjuntos são únicos em cada acervo, pode-se afirmar que são 
grupos constituídos por um único conjunto. Mas se conjuntos como esses aparecessem 
no mesmo fundo de um mesmo acervo, deveriam ser reunidos em um mesmo grupo, 
justamente por conterem as mesmas obras. 

O quadro 1 apresenta o título ou incipit latino dos trechos musicais existentes 
nos três níveis de organização musical dos citados documentos nos arquivos de São 
Paulo e São João dei Rei. Observe-se a existência de três unidades cerimoniais com, 
respectivamente, três, duas e duas unidades funcionais. Cada uma dessas unidades 
funcionais, contudo, possui um número variável de seções. 



Silva ou do proprietário Hermenegildo José de Sousa Trindade (1806-1887). Carlos Antônio da Silva é o 
mesmo nome de um músico que figura como copista de alguns manuscritos do Arquivo da Cúria 
Metropolitana de São Paulo, copiados entre 1841 e 1864, não sendo claro, no momento, se correspondem 
á mesma pessoa. 



CASTAGNA, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 18 



Quadro 1. Unidades cerimoniais, unidades funcionais e seções de ACMSP 253 e de 
OLS, sem código . 



Unidades cerimoniais 


Unidades funcionais 


Seções 






Domine, audivi 


Missa dos Pré- 


Primeiro Tracto 


V. In médio duorum 


Santificados 




V. In eo, dum conturbata fuerit 


ou dos Catecúmenos 




Eripe me, Domine 




Segundo Tracto 


V. Qui cogitaverunt 






V. Acuerunt línguas suas 






Passio... Joannem 




Paixão 


1 . Jesum Nazarenum 




(Proêmio e Turbas) 


2. Jesum Nazarenum 






3. Numquid et tu [...] ejus es 






4. Si non esset hic 






5. Nobis non licet 






6. Non hunc 






7. Ave, Rex Judazorum 






8. Crucifige, crucifige eum 






9. Nos legem habemus 






10. Si hunc dimittis 






1 1 . Tolle, tolle, crucifige eum 






12. Non habemus regem 






13. Noli scribere 






14. Non scindamus eam 






[Ecce lignum crucis...] Venite, adoremus 


Adoração da Cruz 


Invitatório e Impropérios 


Popule meus 






Hagios o Theos 






Crux f ide lis 




Hino 


Nulla silva 






Dulce lignum 






Heu! Heu! Domine! 


Procissão do Enterro 


Primeira parte 


Pupillifacti summus 






Cecidit corona 






Spiritus cordis nostri 






Defecit gaudium 






{/Estimatus sum] cum descendentibus 




Segunda parte 


[Sepulto Domino] Signatum est monumentum 






[In pace factus est] Locus ejus 






[In pace in idipsum] Dormiam et requiescam 






[Caro mea] Requiescet in spe 



O estudo dos dois documentos e de sua música, no contexto em que foram 
localizados, permitiu a identificação de nove UMPs em seu interior, número que 
obviamente não corresponde às três unidades cerimoniais, sete unidades funcionais e 
trinta e sete seções. Tais UMPs aparecem marcadas, no quadro 2, por linhas mais 
espessas, para facilitar sua visualização. 



CASTAGNA, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



19 



Quadro 2. Unidades cerimoniais, unidades funcionais e seções de ACMSP 253 e de 
OLS, sem código (as UMPs estão marcadas na terceira coluna pelas linhas mais 
espessas do quadro). 



Unidades cerimoniais 


Unidades funcionais 


Seções / UMPs 






Domine, audivi 


Missa dos Pré- 


Primeiro Tracto 


V. In médio duorum 


Santificados 




V. In eo, dum conturbata fuerit 


ou dos Catecúmenos 




Eripe me, Domine 




Segundo Tracto 


V. Qui cogitaverunt 






V. Acuerunt línguas suas 






Passio... Joannem 




Paixão 


1 . Jesum Nazarenum 




(Proêmio e Turbas) 


2. Jesum Nazarenum 






3. Numquid et tu [...] ejus es 






4. Si non esset hic 






5. Nobis non licet 






6. Non hunc 






7. Ave, Rex Judceorum 






8. Crucifige, crucifige eum 






9. Nos legem habemus 






10. Si hunc dimittis 






1 1 . Tolle, tolle, crucifige eum 






12. Non habemus regem 






13. Noli scribere 






14. Non scindamus eam 






[Ecce lignum crucis...] Venite, adoremus 


Adoração da Cruz 


Invitatório e Impropérios 


Popule meus 






Hagios o Theos 






Crux fidelis 




Hino 


Nulla silva 






Dulce lignum 








Procissão do Enterro 


Primeira parte 


Pupilli facti summus 






Cecidit corona 






Spiritus cordis nostri 






Defecit gaudium 






[Aistimatus sum] cum descendentibus 




Segunda parte 


[Sepulto Domino] Signatum est monumentum 






[In pace factus est] Locus ejus 






[In pace in idipsum] Dormiam et requiescam 






[Caro mea] Requiescet in spe 



O critério para a identificação da UMP é de origem dupla: litúrgico e musical. 
Inicialmente é necessário um conhecimento mínimo da estrutura, significado, 
convenções e origem dos textos da cerimónia à qual se refere a música, além da 
descrição de seus três níveis básicos de organização. Paralelamente, é necessário 
constatar se cada um dos trechos identificados aparece em outras cópias musicais, 
associados a músicas diferentes, ou seja, se os trechos em questão se permutam com 
outros, uma vez que esse é o fenómeno principal que define a UMP. 



CASTAGNA, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 20 

Assim, o isolamento da UMP é uma tarefa complexa, que requer uma reflexão 
grande caso a caso, aliada a um estudo do próprio acervo ao qual pertencem os 
manuscritos estudados e mesmo de vários acervos musicais. Isso significa que a UMP 
não é uma categoria fixa, porém depende de circunstâncias do meio em que a obra foi 
criada. Trata-se, portanto, de uma espécie de conceito ecológico-musical, se é que é 
possível tal neologismo: se o estudo dos três níveis básicos de organização musical 
(unidade cerimonial, unidade funcional e seção) pode ser comparado à anatomia, ou 
seja, ao estudo das estruturas internas dos seres vivos, a UMP somente pode ser 
comparada à ecologia, a ciência que estuda a relação entre os seres vivos e o meio 
ambiente. Ora, nada mais atual, interdisciplinar e brasileiro que o conceito ecológico- 
musical de UMP. 

É certo que sua definição é muito trabalhosa, mas a quantidade de soluções 
oferecidas pelo conceito de UMP, dentro de uma concepção da música religiosa 
segundo níveis de organização, é extremamente vantajosa. Paralelamente, a evolução 
das pesquisas que já levaram em consideração esse conceito, especialmente pelos 
pesquisadores do projeto Acervo da Música Brasileira, vem estabelecendo 
configurações mais definidas para o repertório religioso brasileiro dos séculos XVIII e 
XIX, fazendo com que, em breve, seja bem mais simples identificar as UMPs em nossos 
acervos. 

Minha opinião é que, na atividade de catalogação de acervos manuscritos, a 
solução mais adequada para o efetivo conhecimento de seu conteúdo é a catalogação 
separada de documentos e obras, estas últimas com base nas UMPs. Mas apesar desse 
conceito ter uma implicação principalmente arquivística, seu âmbito se estende também 
à área de edição, embora com um grau bem maior de flexibilidade. 

Sabendo-se que as UMPs se articulam livremente nas cópias brasileiras dos 
séculos XVIII e XIX, nada impede de se destacar de um determinado grupo 
documental, as UMPs que se deseja editar, sem a obrigatoriedade de se editar toda a 
música contida no grupo. Bom exemplo é a música para a Semana Santa de Vicente 
Antônio Procópio, anteriormente mencionada. Desse manuscrito, o editor pode 
perfeitamente selecionar apenas as Matinas de Quinta-feira, a Missa e Vésperas do 
Sábado ou a Procissão do Enterro de Sexta-feira, como também pode editar toda a 
música do conjunto, em um único volume. Mas se o editor tem essa liberdade, isso 
somente é justificável, do ponto de vista metodológico, frente a uma consciência sobre 



CASTAGN A, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



21 



os níveis de organização e sobre as UMPs identificadas, o que exige uma permanente 
abordagem interdisciplinar envolvendo música e liturgia (e um pouco de biologia...). 

4. Níveis de organização e tipologia 

Existem certas unidades cerimoniais, cuja variabilidade na maneira com que a 
música é aplicada em seus textos gera uma tipologia distinta de obras, quanto à presença 
ou ausência de música polifônica em suas unidades funcionais ou mesmo em suas 
seções. Esse fenómeno é especialmente complexo na música litúrgica e paralitúrgica da 
Quaresma, período de quarenta e seis dias entre a Quarta-feira de Cinzas e o Domingo 
de Páscoa, que termina com a Semana Santa. 

Entre as unidades cerimoniais particularmente afetadas por esse fenómeno, estão 
as Matinas do Tríduo Pascal, ou seja, aquelas cantadas na Quinta- feira, na Sexta- feira e 
no Sábado Santo. Nessas Matinas pode-se reconhecer pelo menos cinco níveis de 
organização distintos: unidade cerimonial, noturnos, partes, unidades funcionais e 
seções. As Matinas possuem três noturnos e a estrutura de cada um deles está 
representada no quadro 3. 

Quadro 3. Estrutura dos noturnos das Matinas do Tríduo Pascal. 



Partes 


Unidades funcionais 


Primeira parte 
(Salmodia) 


1- Antífona / l 2 Salmo / 1- Antífona 


2*- Antífona / 3 2 Salmo / 2^ Antífona 1 


T- Antífona / 4 2 Salmo / T- Antífona 1 


Segunda parte 
(Lições e Responsórios) 


1- Lição / l 2 Responsório 


2- Lição / 2 2 Responsório 


3- Lição / 3 2 Responsório 



Embora a maneira teoricamente correta de se numerar as Antífonas, Salmos, 
Lições e Responsórios seria reiniciar a numeração a cada Noturno, o costume, tanto nos 
livros litúrgicos como em muitas composições musicais, foi o de numerar as Lições e os 
Responsórios de forma contínua, como se pode observar nos quadros 4, 5 e 6, com o 
incipit de cada um dos textos cantados do Tríduo Pascal. 



CASTAGNA, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 22 



Quadro 4. Incipit dos textos tridentinos do primeiro Noturno das Matinas do Tríduo 
Pascal. 



Unidade 


Quinta-feira Santa 


Sexta-feira Santa 


Sábado Santo 


Funcional 








Antífona I 


Zelus domus tua: 


Astiterunt reges terra: 


In pace in iddipsum 


Salmo I 


Salvum me fac, Deus (68) 


Quare fremuerunt (2) 


Cum invocarem (4) 


Antífona I 


Zelus domus tua: 


Astiterunt reges terra: 


In pace in iddipsum 


Antífona II 


Avertantur retrorsum 


Diviserunt sibi vestimenta 


Habitat in tabernáculo 


Salmo II 


Deus, in adjutorium (69) 


Deus, Deus meus (21) 


Domine, quis habitabit (14) 


Antífona II 


Avertantur retrorsum 


Diviserunt sibi vestimenta 


Habitat in tabernáculo 


Antífona III 


Deus meus, eripe me 


Insurrexerunt in me 


Caro mea requiescet 


Salmo III 


In te, Domine, speravi (70) 


Dominus illuminatio (26) 


Conserva me, Domine (15) 


Antífona III 


Deus meus, eripe me 


Insurrexerunt in me 


Caro mea requiescet 


Versículo 


Avertantur retrorsum 


Diviserunt sibi vestimenta 


In pace in idipsum 


Resposta 


Qui cogitant mihi mala 


Et super vestem meam 


Dormiam et requiescam 


Lição I 


Incipit Lamentatio 


De Lamentatione 


De Lamentatione 




Jeremia:.. . Aleph. Quomodo 


Jeremia:... Heth. Cogitavit 


Jeremia:... Heth. 
Misericórdia: 


Responsório I 


In Monte Oliveti 


Omnes amici mei 


Sicut ovis ad occisionem 


Lição II 


Vau. Et egressus est 


Lamed. Matribus suis 


Quomodo obscuratum est 


Responsório II 


Tristis est anima mea 


Velum templi scissum est 


Jerusalém surge 


Lição III 


Jod. Manum suam misit 


Aleph. Ego vir videns 


Incipit Oratio Jeremia:... 
Recordare, Domine 


Responsório III 


Ecce, vidimus eum 


Vinea mea electa 


Plange quasi virgo 



Quadro 5. Incipit dos textos tridentinos do segundo Noturno das Matinas do Tríduo 
Pascal. 



Unidade 


Quinta-feira Santa 


Sexta-feira Santa 


Sábado Santo 


Funcional 








Antífona IV 


Liberavit Dominus 


Vim faciebant 


Elevamini porta: 


Salmo IV 


Deus judicium tuum (71) 


Domine, ne infurore (37) 


Domini est terra (23) 


Antífona IV 


Liberavit Dominus 


Vim faciebant 


Elevamini porta: 


Antífona V 


Cogitaverunt impii 


Confundantur 


Credo videre 


Salmo V 


Quam bónus Israel (72) 


Expectans exspectavi (39) 


Dominus iluminatio (26) 


Antífona V 


Cogitaverunt impii 


Confundantur 


Credo videre 


Antífona VI 


Exsurge, Domine 


Alieni insurrexerunt in me 


Domine, abstraxisti 


Salmo VI 


Ut quid, Deus (73) 


Deus, in nomine tuo (53) 


Exaltabo te, Domine (29) 


Antífona VI 


Exsurge, Domine 


Alieni insurrexerunt in me 


Domine, abstraxisti 


Versículo 


Deus meus, eripe me 


Insurrexerunt in me 


Tu autem, Domine 


Resposta 


Et de manu contra legem 


Et mentita est iniquitas 


Et resuscita me 


Lição IV 


Ex Tractatu Sancti 


Ex Tractatu Sancti 


Ex Tractatu Sancti 




Augustini... Exaudi, Deus 


Augustini... Protexisti me 


Augustini... Accedet homo 


Responsório IV 


Amicus meus osculi 


Tamquam ad latronem 


Recessit pastor noster 


Lição V 


Utinam ergo qui nos modo 


Nostis, qui conventus erat 


Quo perduxerunt illas 


Responsório V 


Judas mercator pessimus 


Tenebra: facta: sunt 


0 vos omnes 


Lição VI 


Quoniam vidi iniquitatem 


Exacuerunt tamquam 


Posuerunt custodes milites 


Responsório VI 


Unus ex discipulis meis 


Animam meam dilectam 


Ecce, quomodo moritur 



CASTAGNA, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 23 



Quadro 6. Incipit dos textos tridentinos do terceiro Noturno das Matinas do Tríduo 
Pascal. 



Unidade 
Funcional 


Quinta-feira Santa 


Sexta-feira Santa 


Sábado Santo 


Antífona VII 


Dixi iniquis: Nolite loqui 


Ab insurgentibus in me 


Deus, adjuvai me 


Salmo VII 


Confitebimur Tibi (74) 


Eripe me de inimicis (58) 


Deus in nomine tuo (53) 


Antífona VII 


Dixi iniquis: Nolite loqui 


Ab insurgentibus in me 


Deus, adjuvai me 


Antífona VIII 


Terra tremuit et quievit 


Longe fecisti notos meos 


In pace factus est 


Salmo VIII 


Notus in Judaia Deus (75) 


Domine, Deus salutis (87) 


Notus in Judaia Deus (75) 


Antífona VIII 


Terra tremuit et quievit 


Longe fecisti notos meos 


In pace factus est 


Antífona IX 


In die tribulationis mece 


Captabunt in animam justi 


Factus sum sicut homo 


Salmo IX 


Você mea ad Dominum (76) 


Deus ultionum (93) 


Domine, Deus salutis (87) 


Antífona Tlí 


In die tribulationis mecp 


nntnbunt in animam iusti 


Factus sum sicut homo 


T vi illvlIUI 


Eysuvqp Domine 


7 \ocnti vunt ndversnm me 


In lince factus est 


Resposta 


Et judica causam meam 


Et sermonibus odii 


Et in Sion habitado cjus 


Lição VII 


Dp F.nistnla nrimn fípati 

l S C- L-t IJ t l> l 1 Li IJ / til V Lí l J C- Li L t 

Pauli... Hoc autem 


Dp F.nistnln fípnti Pauli 
Festinemus ingredi 


Dp F.nistnla fípati Pauli 
Christus assistens Pontifex 


Responsório 
VII 


Eram quasi agnus 


Tradiderunt me in manus 


Astiterunt reges terra 


Lição VIII 


Ego enim accepi a Domino 


Adeamus ergo cum fiducia 


Et ideo novi Testamenti 


Responsório 
VIII 


Una hora non potuisti 


Jesum tradidit impius 


JEstimatus sum 


Lição IX 


Itaque quicumque 


Nec quisquam sumit 


Lecto enim omni mandato 


Responsório 
IX 


Seniores populi consilium 


Caligaverunt oculi mei 


Sepulto Domino 



A análise das Matinas descritas em catálogos de acervos brasileiros de 
manuscritos musicais (incluindo catálogos de obras de alguns autores de música 

20 

religiosa), bem como o exame de espécimes de Matinas em acervos não catalogados 
permitiu o estabelecimento de cinco tipos básicos de Matinas, como se pode observar no 
quadro 7. 



20 BARBOSA, Élmer Corrêa (org.). O ciclo do ouro. op. cit., 454 p.; MUSEU DA INCONFIDÊNCIA / 
OURO PRETO. Acervo de manuscritos musicais: Coleção Francisco Curt Lange: coordenação geral 
Régis Duprat; coordenação técnica Carlos Alberto Baltazar e Mary Angela Biason. Belo Horizonte: 
Universidade Federal de Minas Gerais, 1991, 194 e 2002. 3v. (Coleção pesquisa Científica); 
NOGUEIRA, Lenita Waldige Mendes. Museu Carlos Gomes: catálogo de manuscritos musicais. São 
Paulo: Arte & Ciência, 1997. 415p.; MATTOS, Cleofe Person de. Catálogo temático das obras do padre 
José Maurício Nunes Garcia. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura, 1970. 413p.; DUPRAT, 
Régis. Música na Sé de São Paulo colonial. São Paulo: Paulus, 1995. 23 lp.; JUNQUEIRA 
GUIMARÃES, Maria Inês. L'(Euvre de Lobo de Mesquita Compositéur Brésilien (71746-1805): contexte 
historique, analyse, discographie, catalogue thématique, restitution. Paris: Presses Universitaires du 
Septentrion, 1996. 659p. 



CASTAGN A, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



24 



Quadro 7. Tipos de Matinas polifônicas para a Semana Santa, em catálogos brasileiros 
de manuscritos musicais. 



Tipos 


1 


- Somente com a Primeira Antífona 


2 


- Com primeira Antífona, Lições (geralmente apenas I, VI e VII) e Responsórios 


3 


- Com primeira Antífona e Responsórios 


4 


- Somente com Responsórios (todos ou alguns) 


5 


- Somente com Lições (uma ou mais) 



Nas Paixões das Missas de Domingo de Ramos e Sexta-feira Santa, o fenómeno 
é ainda mais complexo. Esse tipo de música possui textos que na Idade Média foram 
destinados a três tipos de cantores eclesiásticos: o Cronista, o Cristo e o Sinagoga 
(quadro 8). Com o advento das Paixões polifônicas, ao redor do século XVI, foram 
estabelecidas diferentes maneiras de se distribuir a polifonia para os textos que 
originalmente haviam sido destinados a cantores solistas. A partir da tipologia das 
Paixões portuguesas estabelecida pelo musicólogo lusitano José Maria Pedrosa 
Cardoso, 21 estudei o fenómeno em acervos paulistas e mineiros, chegando à formulação 
de cinco tipos, os dois últimos até agora descritos somente no Brasil (quadro 9). 



Quadro 8. Cantores das Paixões monódicas. 



Símbolo 


Parte 
(cantor) 


Personagens representados 


C 


Cronista 


Evangelista (ou narrador) 


t 


Cristo 


Jesus Cristo 


S 


Sinagoga 


Personagens singulares (Pedro, Caifás, Ancila, Pilatos, etc.) 


Personagens coletivos ou Turbas (judeus, soldados, discípulos, etc.) 1 



Quadro 9. Tipos de Paixões polifônicas encontradas em acervos paulistas e mineiros de 
manuscritos musicais. 



Categorias 


Número de espécimes 


1. Proêmio 


Polifonia somente no Proêmio 


2. Turbas 


Polifonia na fala dos personagens singulares do Sinagoga 


3. Texto 


Polifonia somente na parte do Cronista 


4. Texto e Turbas 


Polifonia no Proêmio, na parte do Cronista e na fala dos 
personagens singulares do Sinagoga 


5. Ditos de Cristo e Turbas 


Polifonia na parte do Cristo e na fala dos personagens 
singulares do Sinagoga 



CARDOSO, José Maria Pedrosa. O canto litúrgico da Paixão em Portugal nos séculos XVI e XVII: os 
Passionários polifónicos de Guimarães e Coimbra. Tese de Doutoramento. Coimbra: Faculdade de Letras, 
1998. v.l,p.295. 



CASTAGN A, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



25 



Tanto nas Matinas quanto nas Paixões, é visível a necessidade de utilização de 
um critério classificatório flexível, como a UMP. Nenhum dos tipos detectados 
apresenta música polifônica para todo o texto da unidade musical à qual se referem, e a 
permuta entre determinados trechos é flagrante nos acervos. 

Finalmente, para ilustrar esse tipo de fenómeno, é interessante mencionar o caso 
da Procissão dos Passos da Quaresma. Nesse tipo de cerimónia, são cantados diversos 
Motetos ao ar livre, diante de pequenos oratórios denominados passos, e um último 
Moteto no interior de uma igreja. No Brasil são conhecidos onze textos diferentes para 
essa cerimónia, indicados em ordem alfabética no quadro 10. 

A experiência no exame de dezenas de coletâneas de Motetos de Passos 
demonstra que não existiu, no Brasil, um número e uma ordem padronizada para os 
mesmos. Variaram, na grande maioria dos casos, de quatro a nove e sua seleção, até 
agora, parece quase aleatória. A permuta entre Motetos de uma fonte para outra foi 
intensa e também aparentemente aleatória: um Moteto com o mesmo texto e música às 
vezes é o primeiro em um determinado conjunto, o segundo em outro, o terceiro em 
mais outro, e assim por diante. Inúmeros conjuntos manuscritos com Motetos de Passos 
apresentam obras que não possuem necessariamente uma uniformidade estilística entre 
si e que provavelmente foram escritos por autores diferentes. Ora, como descrever 
enquanto única composição um conjunto de Motetos que aparenta terem sido escritos 
por pessoas diferentes? 

Na maioria dos casos, cada Moteto de Passos apresenta-se como uma unidade 
musical permutável, porém existem exemplos nos quais todos os Motetos foram escritos 
pelo mesmo autor, apresentando uma clara uniformidade estilística. Nesse caso, todo o 
conjunto de Motetos poderá ser classificado como uma única UMP, ou seja, como uma 
única composição. 

Obviamente, ainda faltam trabalhos aprofundados sobre essa questão, mas 
justamente para permitir seu estudo, é interessante, em um catálogo de obras, abrir uma 
entrada para cada Moteto de Passos, de maneira que todos os Angariaverunt, por 
exemplo, apareçam lado a lado, mesmo que sejam a primeira, segunda, terceira ou 
quarta peça da coletânea. 



CASTAGN A, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



26 



Quadro 10. Motetos para a Procissão dos Passos da Quaresma, com indicação da 
origem bíblica e/ou litúrgica dos textos. 



Textos 


Origem 


Á 11 Ctn Vlfl\l£>Y1iVtt \1 11 1 /~\ Tl £> 111 1 "\ ? Yt> 11 /T>1 1 111 

f±llgLlf lLlVt.1 lAlll OlfflUflt-ffl *^y§ t-flCcvlifi 


■ P^an CTfl ílO Cf^íTlinHo XaO IVTaTVOC 1 S V 1 

■ Paixão da Missa de Terça-feira Santa 


Bajulans sibi Crucem 


■ Evangelho segundo São João, 19, 17/18 

■ Paixão da Missa dos Pré-Santificados de Sexta-feira Santa 


Exeamus ergo 


■ Epístola de São Paulo aos Hebreus, 13, 13 


Domine Jesu 


. 9 22 

■ f 


Filiai Jerusalém, nolite flere super me 


■ Evangelho segundo São Lucas, 23, 28 

■ Paixão da Missa de Quarta-feira Santa 


Jesus clamans voce magna 


■ Evangelho segundo São Lucas, 23, 46 

■ Paixão da Missa de Quarta-feira Santa 


0 vos omnes, qui transitis per viam 


■ Lamentações de Jeremias, 1, 12 

■ Lição III das Matinas de Quinta-feira Santa 

■ Verso do Responsório IX das Matinas de Sexta-feira Santa 

■ Responsório V das Matinas de Sábado Santo 

■ Antífona Ho Calino 1 SO Ha*; í anHpç Ho ^láhaHo ^lanto 


Pater mi, si possibile est 


■ Evangelho segundo São Mateus, 26, 39 

■ Paixão da Missa de Domingo de Ramos 


Pater, in manus tuas commendo 


■ Evangelho segundo São Lucas, 23, 46 

■ Paixão da Missa de Quarta-feira Santa 


Popule meus, quidfeci tibi? 


■ Impropérios da Adoração da Cruz de Sexta-feira Santa 


Tristis est anima mea 


■ Evangelho segundo São Mateus, 26, 38 

■ Evangelho segundo São Marcos, 14, 34 

■ Paixão da Missa de Domingo de Ramos 

■ Paixão da Missa de Terça-feira Santa 



5. Unidades musicais permutáveis na Semana Santa 



Definir as UMPs de forma genérica é bastante temeroso, pois para todos os 
casos pode haver exceções, uma vez que não é somente a liturgia que está em jogo, mas 
também questões importantes ligadas aos compositores, aos copistas e às convenções 
práticas de uma determinada época. Em minha tese fiz uma tentativa de identificação de 
UMPs na música para a Semana Santa encontrada em acervos paulistas e mineiros de 
manuscritos musicais, especialmente aquela composta em estilo antigo, considerando- 
se que a Semana Santa é o período litúrgico que possui os problemas mais complexos 
em relação aos níveis de organização, vale a pena apresentar, nos quadros 11 a 14, as 
UMPs localizadas em obras destinadas ao Domingo de Ramos e ao Tríduo Pascal, para 
que tais informações orientem novas pesquisas sobre o assunto. 



Este é o único texto empregado nessa cerimónia que não foi localizado na Bíblia ou nos livros 
litúrgicos, não tendo sido possível, até o momento, estabelecer sua origem. 

23 CASTAGNA, Paulo. O estilo antigo na prática musical religiosa paulista e mineira dos séculos XVIII e 
XIX. op. cit, v.2. 



CASTAGN A, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



27 



Observe-se que, nesses quadros, estão relacionadas unidades cerimoniais tanto 
litúrgicas quanto paralitúrgicas, as últimas assinaladas com asterisco. A Procissão do 
Enterro de Sexta-feira Santa, embora assinalada com asterisco, pois seu texto não é 
encontrado em qualquer livro litúrgico tridentino, é uma cerimônica litúrgica do Rito 

24 

Bracarense, difundida no Brasil desde o século XVI. Nem todas unidades cerimoniais 
estão representadas com música em acervos brasileiros de manuscritos musicais, ou 
nem para todas foi possível identificar UMPs, razão de alguns campos estarem vazios 
na coluna da direita de alguns quadros. 

Quadro 11. Unidades cerimoniais e UMPs nos Ofícios de Domingo de Ramos 
(segundo Domingo da Paixão). 



Unidades cerimoniais 


UMPs localizadas 


Matinas 




Laudes 




Prima 




Terça 




Sexta 




Nona 




Aspersão da Agua Benta 


Aspersão da Agua Benta 


Bênção dos Ramos 


Bênção dos Ramos 


Distribuição dos Ramos 


Distribuição dos Ramos 


Procissão dos Ramos 


Procissão dos Ramos 


Missa 


Intróito 


Kyrie (Ordinário) 


Tracto 


Unidades da Paixão 


Ofertório 


Consagração do cálix 


Consagração da óstia 


Comúnio 


Vésperas 




Completas 





Cf.: CASTAGNA, Paulo. A Procissão do Enterro: uma cerimónia pré-tridentina na América 
Portuguesa. In: JANCSÓ, Istán e KANTOR, íris. Festa: cultura e sociabilidade na América Portuguesa. 
São Paulo: Hucitec, Editora da Universidade de São Paulo, Fapesp e Imprensa Oficial, 2001. v.2, p.827- 
856 (Coleção Estante USP - Brasil 500 Anos. v.3) 



CASTAGNA, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 28 

Quadro 12. Unidades cerimoniais e UMPs nos Ofícios de Quinta-feira Santa (da Ceia 
do Senhor). 



Unidades cerimoniais 


UMPs localizadas 


Matinas 


Primeira Antífona 


Lições 


Responsórios 


Laudes 


Miserere (Salmo 50) 


Antífonas do Benedictus e Miserere 


Benedictus (Cântico de Zacarias) 


Christus factus est (Antífona final) 


Prima 




Tércia 




Sexta 




Nona 




Missa Comemorativa da Ceia do Senhor 


Kyrie (Ordinário) 


Próprio 


Bênção dos Santos Óleos 


0 Redemptor... / Ut novetur... (Hinos) 


Procissão de transladação (ou reposição) 
do Santíssimo Sacramento 


Pange língua (versos 1-4 do Hino) 


Tantum ergo (versos 5-6 do Hino) 


Vésperas 




Desnudação dos altares 




Lava-pés (ou Mandato) 


Mandatum novum (1- Antífona) 


Domine, tu mihi (4- Antífona) 


Completas 




Procissão do Mandato (*) 


Miserere (Versículos do Salmo 50) 



Quadro 13. Unidades cerimoniais e UMPs nos Ofícios de Sexta-feira Santa (ou da 
Paixão). 



Unidades cerimoniais 


UMPs localizadas 


Matinas 


Primeira Antífona 




Lições 




Responsórios 


Laudes 


Miserere (Salmo 50) 




Antífona do Benedictus e Miserere 




Benedictus (Cântico de Zacarias) 




Christus factus est (Antífona final) 


Prima 




Terça 




Sexta 




Nona 




Missa dos Pré-Santificados ou dos 


Domine audivi... Eripe me Domine... 


Catecúmenos 


(\°- e 2°- Tractos) 




Unidades da Paixão 


Adoração da Cruz 


Venite adoremus (Invitatório) 




Popule meus (Impropérios) 




Crux fidelis (Hino) 




Pange língua (Hino à Santa Cruz) 


Procissão ao Santíssimo Sacramento 


Vexilla Régis (Hino à Santa Cruz) 


Vésperas 




Completas 




Procissão do Enterro (*) 


Heu! Heu! Domine! (Estribilho) 




Versículos da primeira parte 




Segunda parte 



CASTAGNA, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 29 



Quadro 14. Unidades cerimoniais e UMPs nos Ofícios de Sábado Santo (ou de 
Aleluia). 



Unidades cerimoniais 


UMPs localizadas 


Matinas 


Primeira Antífona 


Lições 


Responsórios 


Laudes 


Miserere (Salmo 50) 


Antífona do fíenedictus e Mi seveve 


fípwpdictus ÍC^ãntico de* 7,acarias^ 


Ohn 'ftti v foctus pst ( Antífona finais 


Prima 




Terça 




Sexta 




Nona 




Procissão do Fogo Novo 




Bênção do Círio Pascal 




Lições da Vigília Pascal 


Cantemus Domino... / Vinea facta... / 
Attende ccelum (l 5 , 2 5 e 3- Tractos) 


Bênção da Agua Batismal 


Sicut cervus desiderat (4 2 Tracto) 


Kyrie (Ladainha de Todos os Santos) 


Missa da Vigília Pascal ("de Aleluia") 


Kyrie (Ordinário) 


Alleluia (Próprio) 


Vésperas 


Alleluia (Vésperas) 


Completas 





6. Conclusão 



Após essa discussão é possível perceber que, na arquivologia musical, 
especialmente no que se refere à música religiosa, estamos trabalhando com conceitos 
cuja formulação foi realizada há décadas, sem que tenha havido suficiente reflexão 
sobre os mesmos, especialmente no Brasil. Ao decidir pela utilização de um 
determinado critério, o arquivista ou editor se depara com dois caminhos: 1) utilizar 
conceitos já formulados, aceitando suas limitações e, portanto, os problemas que 
porventura poderão gerar; 2) adaptar aos seus problemas conceitos já existentes, ou 
mesmo desenvolver novos conceitos. 

O reconhecimento dos níveis de organização da música religiosa e, 
especialmente, das unidades musicais permutáveis, apresenta- se como uma real 
possibilidade de desenvolvimento metodológico, resultado da inconformidade com as 
limitações de uma terminologia obsoleta. Espera-se, assim, que, ao lado da assimilação 
da metodologia atual e internacional, haja igualmente uma reflexão sobre sua 
aplicabilidade no Brasil, para, sempre que possível, alavancar o desenvolvimento de 



CASTAGN A, Paulo. Níveis de organização na música católica dos séculos XVIII e XIX 



30 



novos métodos, bem como de novas visões e novas abordagens do patrimônio 
arquivístico-musical brasileiro. 



7. Bibliografia 

BARBOSA, Élmer Corrêa (org.). O ciclo do ouro. o tempo e a música do barroco 
católico; catálogo de um arquivo de microfilmes; elementos para uma história da 
arte no Brasil; Pesquisa de Élmer C. Corrêa Barbosa; acessória no trabalho de 
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séc. XVIII Cleofe Person de Mattos. Rio de Janeiro: PUC, FUNARTE, XEROX, 
1978. 454p. 

CARDOSO, José Maria Pedrosa. O canto litúrgico da Paixão em Portugal nos séculos 
XVI e XVII: os Passionários polifónicos de Guimarães e Coimbra. Tese de 
Doutoramento. Coimbra: Faculdade de Letras, 1998. 2v. 

CASTAGNA, Paulo (coord.). Música fúnebre; coordenação musicológica Paulo 
Castagna; coordenação editorial Carlos Alberto Figueiredo; coordenação da 
revisão Marcelo Campos Hazan; assessoria litúrgica Aluízio José Viegas; 
pesquisa, edição e texto Carlos Alberto Figueiredo, Marcelo Campos Hazan, 
Paulo Castagna. Belo Horizonte: Fundação Cultural e Educacional da 
Arquidiocese de Mariana, 2003. 272p. (Acervo da Música Brasileira / Restauração 
e Difusão de Partituras, v.9) 

CASTAGNA, Paulo. Uma análise codicológica do Grupo de Mogi das Cruzes. IV 
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. Cantochão e liturgia: implicações na pesquisa da música católica latino- 

americana (séculos XVI-XX). IV SIMPÓSIO LATINO-AMERICANO DE 
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de Curitiba, 2001. p. 199-222. 

. O estilo antigo na prática musical religiosa paulista e mineira dos séculos 

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Letras da Universidade de São Paulo, 2000. 3v. 

. A Procissão do Enterro: uma cerimónia pré-tridentina na América 

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na América Portuguesa. São Paulo: Hucitec, Editora da Universidade de São 
Paulo, Fapesp e Imprensa Oficial, 2001. v.2, p. 827-856 (Coleção Estante USP - 
Brasil 500 Anos. v.3) 

. Reflexões metodológicas sobre a catalogação de música religiosa dos 

séculos XVIII e XIX em acervos brasileiros de manuscritos musicais. III 
SIMPÓSIO LATINO-AMERICANO DE MUSICOLOGIA, Curitiba, 21-24 
jan.1999. Anais. Curitiba: Fundação Cultural de Curitiba, 2000. p. 139-165. 

COTTA, André Guerra. O tratamento da informação em acervos de manuscritos 
musicais brasileiros. Dissertação (Mestrado). Belo Horizonte: Escola de 
Biblioteconomia da Universidade Federal de Minas Gerais, 2000. 284p. 

DUPRAT, Régis. Música na Sé de São Paulo colonial. São Paulo: Paulus, 1995. 23 lp. 

ISAACS, Alan e MARTIN, Elisabeth. Dicionário de música Zohar, editoria Luiz Paulo 
Horta. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1985. 424p. 



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Brésilien (71746-1805): contexte historique, analyse, discographie, catalogue 
thématique, restitution. Paris: Presses Universitaires du Septentrion, 1996. 659p. 

MATTOS, Cleofe Person de. Catálogo temático das obras do padre José Maurício 
Nunes Garcia. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura, 1970. 413p. 

MUSEU DA INCONFIDÊNCIA / OURO PRETO. Acervo de manuscritos musicais: 
Coleção Francisco Curt Lange: coordenação geral Régis Duprat; coordenação 
técnica Carlos Alberto Baltazar e Mary Ângela Biason. Belo Horizonte: 
Universidade Federal de Minas Gerais, 1991, 194 e 2002. 3v. (Coleção pesquisa 
Científica) 

NERY, Ruy Vieira. Para a história do barroco musical português (o códice 8942 da 

B.N.L.). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1980. 97p. 
NOGUEIRA, Lenita Waldige Mendes. Museu Carlos Gomes: catálogo de manuscritos 

musicais. São Paulo: Arte & Ciência, 1997. 415p. 
OLIVEIRA, D. Oscar de. Padre João de Deus, preclaro musicógrafo mineiro: 1794- 

1832. O Arquidiocesano, Mariana, ano 28, n. 1.412, p.l, 12 out. 1986 
PASTORAL Collectiva dos Senhores Arcebispos e Bispos das Provincias Ecclesiasticas 

de S. Sebastião do Rio de Janeiro, Marianna, S. Paulo, Cuyabá e Porto Alegre 

communicado ao clero e aos fieis o resultado na cidade de S. Paulo de 25 de 

setembro a 10 de outubro de 1910. Rio de Janeiro: Typographia Leuzinger, 1911. 

767p. 

PIMENTA, Olympio. Recordação do passado - 1794 a 1832: o Maestro Padre João de 
Deus. Boletim Eclesiástico, Mariana, ano 10, n.5, p. 110-113, mai. 1911. 

TRINDADE, Côn. Raimundo. Archidiocese de Marianna: subsidios para a sua historia. 
2. ed. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1953-1955. 2v. 

VIEIRA, Ernesto. Diccionario musical; contendo Todos os termos technicos, com a 
etymologia da maior parte d'elles, grande copia de vocábulos e locuções italianas, 
francezas, allemãs, latinas e gregas relativas à Arte Musical; noticias technicas e 
históricas sobre o cantochão e sobre a Arte antiga; nomenclatura de todos os 
instrumentos antigos e modernos, com a descripção desenvolvida dos mais 
notáveis e em especial d'aquelles que são actualmente empregados pela arte 
europea; referencias frequentes, criticas e históricas, ao emprego do vocábulo 
musical da lingua portugueza; ornado com gravuras e exemplos de musica por 
Ernesto Vieira. 2 ed, Lisboa: Typ. Lallemant, 1899. llp., lf. inum, 551p., lp. 
inum.