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^cóenl^a ^JfiuóícaL
Diretor: Prof. CLOVIS DE OLIVEIRA
Ano III • SÃO PAULO, Outubro e Novembro de 1940
Ns. 26 e 27
Santa Gecilia
Padroeira dos Músicos
Aos Leitores
O
GRANDES
re
■ 9
Animado por suas màos de artista, o piano
BRASIL reviverá os grandes mestres. É de
mecanismo perfeito, de sonoridade impecá-
vel. Louvam no os interpretes mais famosos.
Encha seu lar de harmonias com esta obra
prima que é o orgulho da nossa industria.
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"BELAS ARTES”
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artistas e suas obras
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todo o país
Praça João Pessoa. 13
Rio de Janeiro
Música Popular Brasileira
Dr. Ulysses PARANHOS
Da Academia Paulista de Letras
e da Escola de Belas Artes de
São Paulo — Conferência pro-
nunciada no Teatro do Liceu
S. Coração de Jesus, em S. Paulo
em 28 de Setembro passado.
A pequena conferencia que vou fa-
zer constará de duas partes, ambas
seguidas de uma parte musical. Na
primeira, falaremos sobre certas fôr-
mas musicais brasileiras; na segun-
da, disertarei sobre alguns elementos
representativos da musa popular que,
espontaneamente, assimilaram, em
suas produções, a música nacional.
Ouviremos, então, em aprimoradas
execuções, artistas e amadores de
nossas escolas de arte.
É necessário que se confesse, desde
já, que poucos documentos informa-
tivos existem sobre nossa música po-
pular, provinda da vida colonial, e
mesmo do l.° Império. Somente, ago-
ra, começamos a encarar o assunto
criteriosamente e com espirito posi-
tivo; faz-se preciso, neste ponto,
prestar uma homenagem, muito par-
ticular, ao esforço de um musicólogo
paulista, o sr. Mario de Andrade, que
muito tem feito para que se elucide,
por um método coerente, os numero-
sos problemas referentes a nossa mú-
sica, — a nossa folcmúsica popular,
— na expressão feliz de Luiz Heitor,
atual catedrático do Folclore musical
da Escola Nacional de Música.
Um povo sem individualidade étni-
ca, como é o brasileiro, ainda na fase
confusa de transformação, oriundo
da mescla de prêtos, indigenas, lusos,
espanhóis, holandeses, e de outras ra-
ças que, todos os dias, desembarcam
em nossas plagas, deve ter por for-
ça das circunstancias, uma música
popular representativa das cantigas
e dansas de cada uma das migra-
ções que entram em sua formação,
absorvendo da fusão delas os seus
motivos rítmicos e a sua inspiração.
Assim, do ameríndio, nos ficou o
chocálho, adoção moderna, — do ma-
racá guarani e o boré, trombeta feita
de bambú, e muito usada entre os
sertanejos do Ceará, e, ritmicamente
certas formas poéticas, determinan-
do, no canto, a adatação do rifão
curto, depois de cada verso da estro-
fe. Êsse processo se depara, em mui-
tas canções, de nossos tempos; aqui
ficam dois padrões atuais, demons-
Pág. 4
RESENHA MUSICAL
trativos do processo estilisado pelo
indígena brasileiro:
Cha munham muracé
Uacará
Cha ricó ce patrão
Uacará
Chc rc raça arama
Uacará
(Barbosa Rodrigues)
OU :
Vou-me embora, vou-me embora,
Prenda minha.
Tenho muito que fazer;
Tenho de ir parar rodeio,
Prenda minha.
Nos campos de Bemquerer!
(Mario de Andrade)
Em nossas dansas a influencia
ameríndia é considerável. Começa
com o cateretê, bailado existente en-
tre os guaranis paulistas antes da
colonisação, e que Anchieta aprovei-
tou na catequése, introduzindo-o nas
festas religiosas da Santa Cruz e do
Espírito Santo. Êste uso ainda sub-
siste no Interior de alguns Estados
meridionais e do Centro do Brasil.
O cateretê, sendo cantado em versos,
adaptaveis a situação, desenvolve a
inteligência e a memória e foi, talvês,
uma das fontes de inspiração de nos-
sos violeiros e seresteiros.
Os cabocolinhos, — nome dado a
diversos bailados muito espalhados
pelo nordéste brasileiro — são de pro-
cedência indigena e objetivam cênas
interessantes do viver da comunida-
de ameríndia.
Ainda aparece a influencia tribal,
bem nítida, nos atuais córos e desa-
fios onde é utilisado o ritmo dialogai.
Às vezes, regista-se, nos cantos
sertanejos, reminiscências de música
religiosa. E ouvimos a monodia do
canto chão nos lábios côr de pitanga
da cabocla bonita.
O africano também colaborou na
gênese do canto popular nacional. En-
tre os cantos de origem negra estão
o acalanto, a berceuse brasileira, o
chula e o lundú.
Estes são os cantos de origem afri-
cana que tem nomes especiais; exis-
tem outros que possuem denomina-
ção incerta , variavel, conforme o lu-
gar de origem.
O acalanto veio da época da escra-
vidão: esse termo é uma deforma-
ção glótica de acalento. Constitui-se
de pequenos períodos com versos pró-
prios, às vezes sem rima, e que se
cantam, com vóz monótona, caden-
ciada, para adormentar as crianças.
O seu ritmo lento, é delicioso, como
poesia e sentimento melódico:
Dorme, dorme, filinho.
Dorme anjinho inocente (bis)
Dorme, meu queridinho,
Tua mãe está contente.
(Rodrigues Valle)
Dos acalantos nenhum, porem, tem
mais meiguice e ternura do que o
“Tutú Marambá”, padrão da nossa
canção de ninar, onde se retrata a
doçura infinita da alma de nossa
mãe. São de “Tutú Marambá” os se-
guintes versos escritos por Olegario
Mariano:
“No berço de rendas, com brocardos de
(oiro,
Os olhinhos redondos de espanto e alegria,
Ele olha a vida, como quem olha um
[tesouro.
— Meu filho é o mais lindo desta fre-
T guezia ! ”
Todos os acalantos são profunda-
mente comoventes, possuem um sau-
dosismo enternecedor, envolvem nos-
so coração num véo de recordações,
tão cheio de lembranças que as lá-
RESENHA MUSICAL
Pág. 5
grimas, sem querer, molham-nos os
olhos.
O chula é uma canção brejeira, de
procedência africana, entoada nos
folguedos de gente humilde, com ver-
sos improvisados e meneios dos qua-
dris, invocando, quasi sempre, cênas
lascivas. É uma forma democrati-
cissima do lundú. Lundu não é sinó-
nimo de modinha, como muitos pen-
sam. Os lundus são verdadeiras can-
çonetas e diferem das modinhas pela
ausência do sentimento poético, bra-
sileiramente sentimental. Sobra-lhes,
vivacidade, contentamento, causti-
cidade. Em meio de um tom pican-
te, muitas vezes, torna-se uma sa-
tira corrosiva, mordaz, a costumes e
tipos e que ferem profundamente, co-
mo uma ferrotada de abelha. Isso
sem ofensa grave à moral, o que fá-
lo afastar do chula onde a presença
da obscenidade é geral mente a regra.
O lundú brasileiro, no século
XVIII, fez um sucesso louco em Por-
tugal. Quando o mulato Caldas de
casaca de seda e cabeleira arripiada
repenicava a viola, nos salões da
Marquêsa de Aguiar, a nobresa lusi-
tana sentia cócegas na alma e reme-
chimentos no corpo.
Da passagem, apontamos a exis-
tência de lundus que se aproximam
bastante, na sua forma, das canço-
netas francêsas que têm o estribilho
após as coplas e também das baladas,
romances dos trovadores, figurantes
nos antigos cancioneiros.
Dia a dia, as pesquisas confirmam
a tése de que a música popular pos-
sue carater internacional. Isso se
confirma, frequentemente, na músi-
ca brasileira: Augusto de Lima ou-
viu, no Alto de São Francisco, uma
tirana, cuja melodia coincide, quasi
testualmente, com o “Joyeux Labo-
reur de Schumann e o “Fio Bôto Si-
nhô”, batuque amazonense, recorda
logo a “Canção dos barqueiros do
Volga”.
De gênero trovêsco é o lundú re-
gistrado por Mello Morais, no seu
livro “Canções populares do Brasil”
com o título de “Canto do Pescador”.
É a historia de um pescador, altivo,
vaidoso, que, passeiando entre os ro-
chedos e as ondas, assim fala ao
deus do amôr:
“Que te curvo meus joelhos,
Não esperes, rei traidor,
Minha canôa, meu remo.
Minha rêdc, meu amôr.
Os dois últimos versos repetem-se
alguma? vezes na composição poéti-
ca das dez quadras, — numa espécie
de éco, motivo condutor, muito em
moda nos lundús antigos.
Existem alguns lundús de inspi
ração francamente africana, visan-
do satirisar, causticar os brancos que
martirisavam os pobres prêtos no
inferno das senzalas, nos canaviais
do Norte e na cultura caféeira de
São Paulo. A citação de duas qua-
dras desse lundú dá uma idéia do
que isto seja:
Dizafôro de baranco
No si pod' aturr.
Ta cumendo... tá drumindo
Manda nego trabaiá.”
Nosso pleto condo fruta
Vae pará no Coreção.
Sinhô branco, condo fruta,
Logo sae sinhô barão.
(Eustorgio Wanderley)
Muitos outros lundús existem nes-
sa mixórdia afro-brasileira, recor-
dando sertões congolêses e compa-
rando a existência feliz e tranquila
do branco com o cativeiro doloroso
e atormentado do negro: — sem pá-
tria, lar e liberdade.
Entre os improvisadores, cantado
res de lundús, tivemos Laurindo Ra-
Pág. 6
RESENHA MUSICAI
bello, o poeta-Iagartixa, Xisto Bahia,
um seresteiro magnifico de voz líri-
ca e nostálgica, Francisco Cardoso,
Bruno Serra, e tantos outros canto-
res anónimos, que deixaram fama
pela maviosidade de seus versos e
sua voz dulçurosa e melódica.
Foram ainda introduzidos, na mú-
sica brasileira, pelos prêtos o chôro
e a seresta. Não são formas novas
de música mas, simplesm'ente, um
genero especial de música popula**
onde um solista é acompanhado por
instrumentos plebeus : — cavaqui •
nho, bandolim, flauta, clarineta,
ocarina. Alguns bordando de impro-
viso, um contra-canto, que enfeita
tão graciosamente a melodia que
realmente bóie com a gente e atiça
o coração.
Na serenata sobrepuja a voz hu-
mana, ferindo a melodia, dominando
o naipe instrumental; no chôro é di-
ferente, não se ouve a voz do cantor,
os instrumentos comtrapõem-se as
melodias, o cantor e os instrumentis-
tas conjugam-se em feliz devaneio.
A seresta ou serenata, é cantada
geralmente ao ar-livre, à claridade
da lua, pelas ruas afóra ou na vizi-
nhança da casa onde dorme, emba-
lada pelo sonho, a namorada bonita.
A lua foi sempre a grande amiga
de nossos serenatistas : a sua luz opa-
lina e mansa sugere ternuras à voz
e enche de sentimentos suaves o co-
ração.
Como é linda essa serenata de Ab-
don Lira musicada sôbre versos de
Aldemar Tavares:
É noite: o plenilúnio
É como um sonho.
Assim risonho.
Boiando pelo azul,
Beijando o mar...
E como é cheia de brasilidade
tropical essa outra seresta de Catu-
lo, oração ao luar prateado de nosso
sertão :
A gente pega na viola
Que ponteia
E a canção da lua cheia
Vae-se ouvindo na amplidão.
Não há, ó gente, ó não
Luar, como este do sertão.
Às vezes, é a inspiração anónima
que surge, nas serenatas, como nos
versos daquela serenata estilisada
pelo músico Cardoso de Menêses:
Aos frouxos raios da lua,
Que se derramam no ar,
Vae-se deslocando a falua
No liso espêlho do mar.
■e
A influencia lusa foi preponderan-
te em nossa música popular. De
Portugal recebemos os instrumentos
musicais, as dansas infantis de roda,
as de cunho dramático, e os reisados
e pastoris.
O fado não se aclimatou em nosso
meio. Em compensação frutificou a
modinha, que embora seja reinol de
nascimento, desnacionalisou-se, abra-
sileirando-se sobremaneira, tanto
que hoje é bem nossa; ela está para
nossa música popular como lied para
os alemães e a chanson para os fran-
cêses.
A modinha é um éco de nossa al-
ma, espêlho de nosso sofrimento e,
na sua cadencia languida, soluçante,
adormece-nos os sentidos, como os
movimentos ritmados de um berço ao
som de um acalanto, cantado pela
voz da mãe-preta. É sempre inten-
samente sentimental, música de co-
ração, em sua toada docemente tris-
te. Na maioria das vezes, possue te-
mas gemeos, porém, ambos, bastante
melódicos, atuando em contrastes rít-
micos, um como recitativo e o outro
bordejando o acompanhamento, que
o violeiro ornamenta no sabôr de sua
veia poética improvisando.
RESENHA MUSICAI.
Pág. 7
A melodia é quasi sempre triste,
triste o ritmo, e triste o cantador.
E toda essa tristesa se esprime até
por aqueles que, comovidos, ouvem
êste refluxo da alma do Brasil for-
mada da melancolia do indio, — sa-
crificado a cubiça do bandeirante,
— e da saudade do negro e do luso:
nostálgicos da sóba africana e da al-
deia risonha, enfeitada de flores i
mulheres lindas, de sua província
natal.
A modinha é a voz de nossa terra,
— não ha rincão no Brasil onde ela
não exista; — multiplica-se como as
ondas do mar.
É um produto do nosso coração e
corporifica-se na voz do seresteiro e
no resoar do pinho dos violões e ca-
vaquinhos. Mais tarde, ganhou fóros
aristocráticos; o cravo e o piano de-
ram-lhe a honra de acompanhá-la e,
sob os sorrisos de D. Maria Victoria,
e as palmas dos duques de Lafões
entrou, aprimorada, nos salões dos
paços reais. Mas a modinha, cantada
nos saráos de luxo não é bem a mo-
dinha; perdeu o seu cunho; banali-
sou-se.
A modinha para ser verdadeira-
mente modinha precisa viver dentro
do cenário de sua tradição: luar, rua
deserta, cantador apaixonado e ou
vidos românticos para percebê-la e
corações amorosos para sentí-la e
amá-la.
Não foi despresada mesmo pelos
nossos maiores músicos: José Mau-
rício compôs modinhas; Carlos Go-
mes escreveu diversas e, não faz
muito tempo, ouvimos, na represen-
tação da comédia, “Marquesa de
Santos”, uma das mais formosas, es-
tilisada por Villa-Lobos. Mas as mais
lindas modinhas são, entretanto, as
que não trazem certidão de legitimi-
dade; não se sabe donde vieram, são
de proveniência desconhecida, vêm
da paixão e da dôr.
Irrompem do peito, como gritos
do destino, caprichos que refletem os
mistérios e as inquietações da alma
do cantador e as belezas e a poesia
da terra. Tivemos inúmeros compo-
sitores de modinhas que vieram, qua-
si todos, na época imperial. Desta-
cam-se, entre êles, Rocha Mussuran-
ga, um músico de valôr; Padre San-
tana; D. Baltazar Teles, Bitencourt
e Sá e tantos outros cujos nomes
ainda figuram, com letras maius-
culas, nos cancioneiros de cordel.
Houve, mesmo, entre os autores
de modinhas, dois grandes nomes na-
cionais: Tobias Barreto e o Marquês
de Sapucahí, que compôs “Mandei
um eterno suspiro” e “Já que a sorte
destina”, que fizeram imenso suces-
so nos salões aristocráticos do Se-
gundo Império.
Hoje o mais apreciado compositor
de modinhas brasileiras é Catullo da
Paixão Cearense, verdadeiro espiri-
to de troveiro nortista, cuja musa é
um tesouro de inspiração, imagens
luminosas, e que nos dá a impressão
perfeita da alma rústica, bondosa,
poética da gente nordestina.
Entre as músicas que ainda abri-
lhantaram as nossas festas tradicio-
nais, — Natal, Ano- Bom e Reis e al-
gumas datas populares nortistas, —
existe ainda muita coisa onde se en-
contra a influencia portuguesa, vinda
com os colonos que primeiro povoa-
ram a terra e forjaram nosso ho-
mem. Nas cheganças, a interferên-
cia lusa é manifesta; o mesmo se dá
nos reisados e cantos pastoris, que
se entoam, em frente ao presepio, na
semana poética do Natal.
É enorme o acérvo de páginas de
música anónima nas quais se nota
a cooperação lusa, mas, existem, tam-
bém, diversos compositores essen-
Pág. 8
RESENHA MUSICAL
cialmente nacionais de cheganças,
reisados e cantos pastoris.
Entre os compositores de versos
para os bailes pastoris tornou-se cé-
lebre uma Madre Carlinda, prima de
Junqueira Freire e Monja no Con-
vento de Humildes na Bahia, e os
poetas Veiga Murici, Santos Veiga.
Olímpio Pitanga e, ainda, o Major
Patrício, que pôs em solfa uma bôa
porção de versos pastoris para adap-
tá-los a cêna teatral na sua provín-
cia do Rio Grande do Norte.
Referindo-nos as músicas popula-
res, que receberam colaboração por-
tuguêsa, é bom recordar o cito e o
mutirão. O cito é o trabalho na roça ;
o mutirão é o auxilio que os lavra-
dores prestavam-se mutuamente na
ocasião da colheita. Existe nêle lem-
branças bem visiveis da festa da
vindima e de certas romarias lusas.
Há nêles especimens de lindos can-
tos-corais e de duetos e tercetos
cheios de sentimento fino, comove-
dor, e que nos enche de uma recor-
dação ancestral de gerações que nós
não conhecemos, mas que ainda sen-
timos presentes em nosso soma bra-
sileiro. É o perfume da saudade. . .
O perfume da saudade que é seme-
lhante o de certas flores, que só se
percebe quando de longe o recebemos,
se eivados, o tentamos aspirar de
perto, dissipa-se, porque a saudade
é folha morta que não resiste ao
olhar duro da realidade.
2.* PARTE
Falaremos agora, nesta segunda
parte, de alguns elementos represen-
tativos de nossa musa popular que
espontaneamente assimilaram, em
suas produções, a nossa música.
Envolvendo às múltiplas manifes-
tações da música popular nacional,
brotadas da musa anónima, existem
algumas produções de compositores
que se impuzeram com seus excelen-
tes trabalhos. São artistas, cujos
nomes seria injustiça olvidar e cuja
obra merece ser recordada numa sín-
tese de música popular brasileira.
Eles, na placidês do ritmo das mo-
dinhas, e no obstinado sincopar dos
tangos, sambas e maxixes, estão nos
dando uma música, que, se não pode
chamar-se erudita, está longe, tam-
bém, das côres barbarescas da mú-
sica oriunda diretamente das massas
democráticas em que nasce, com>
um desafogo de almas recalcadas, o
em que não ha o equilíbrio da fórma.
Representam o traço de união entre
a musa popular e a erudita.
Entre estes artistas, destacam-se
Francisca Gonzaga, Marcelo Tupi-
nambá. Ernesto Nazareth, Haeckol
Tavares, Joubert de Carvalho, Eduar-
do Souto e outros.
Francisca Gonzaga é a primeira
do grupo em ordem cronológica. Ain-
da ha três anos, no Rio de Janeiro,
festejou-se, com todo o entusiasmo e
justiça, o cincoentenario da primei-
ra representação de sua ópera “Côrte
na roça”, onde se expande, numa ri-
quêsa enorme, uma série de músicas
inspiradas em motivos eminente-
mente populares. Mais tarde, escre.
veu a ópera-cómica “As três graças”,
cuja música é bastante colorida e
sentimentalmente brasileira.
A fecundidade artistitca de Fran-
cisca Gonzaga é enorme. Represen-
tou 72 obras teatrais e publicou cer-
ca de mil peças musicais, quasi todas
acolhidas com a maior simpatia e
sucesso.
Figuram, entre esta coleção enor-
me de produções, algumas mediocres
é verdade mas, também, páginas de
valôr e inspiradas em nosso folclore
como às cançonetas “Cêra para o
Santíssimo” e o “Corta jaca”, que
RESENHA MUSICAI
Pág. 9
dansado pelo Duque, nos Estados
Unidos, alcançou franco êxito e fi-
cou como sendo uma das músicas re-
gionais mais típicas de seu tempo.
O pianista-compositor Fructuoso de
Lima Viana estilisou para piano o
tema do “Corta jaca”.
Marcelo Tupinambá é bem nosso
e entre nós vive. Compositor inte-
ressante e espontaneamente artista,
nas suas dansas, escritas ao correr
da pena com displicência, e expandin-
do as belezas de seu temperamento
nativo, revela-se Tupinambá um dos
expoentes máximos da nossa músi-
ca popular. Esse pseudónio oculta
a personalidade do Dr. Fernando
Lobo — engenheiro pela Escola Po-
litécnica Paulista.
Não se fixa no desenvolvimento
de um tema. varia a fonte de sua ins-
piração, adeja sôbre os motivos a
estilisar e, isso, é um dos seus cara-
terísticos como compositor dos mais
estimáveis. Assim encontramos gra-
vado, na sua música, a tristeza me-
lancólica de nosso indio, a fatalidade
típica de nosso sertanejo, e o deses-
pero pungente da saudade brasileira,
que se não mata, maltrata. No ma-
tuto e nos Versos escritos na areia
e em outras composições, todos êsses
sentimentos de brasilidade inten-
sa, irradiam-se por toda a parte, co-
mo uma nuvem de fumaça batida do-
cemente pela aragem.
Essa nota de melancolia, essa tris-
teza angustiosa, que se depara em
quasi todos os trabalhos de Tupi-
nambá, é um produto sincrónico de
sua biotipologia e da terra natal on-
de o céu e frequentemente pardacen-
to e o povo pouco expansivo, mas in-
finitamente sincero, forte, bravo e
bom.
Falta à música de Tupinambá i
quentura do sol carioca, o abraço gri-
tante da gente da Avenida, as ex-
pansões alacres do nortista, que em-
prestam a tudo, um otimismo, às ve-
zes ilusorio, mas sempre bondoso e
consolador. E isso o torna bem di-
ferente de Ernesto Nazareth e de
Eduardo Souto. A música de Tupi-
nambá guarda geralmente a nota
grave de sua gente e de sua taba,
como na Minha Terra. Excepcional-
mente ele expande-se com a alegria
sadia, exuberante, farta da “Nhá
Moça” e de outras lindas páginas,
nue são como os dias luminosos que,
de vez em quando, surgem, no de-
curso sombrio do inverno. Sua alma
possue alguma cousa da grêga.
As dansas de Tupinambá, como
tudo escrito para gente futil, talvez,
passem da moda e fujam dos salões
e dos programas dos cabarés e dos
jantares-concertos. Mas sua música
original, popular, buscada nas raizes
do povo brasileiro, esta ficará na
nossa historia, porque procede de um
dos melodistas mais espontâneos e
de um intérprete leal, sincero da al-
ma nacional.
Não deixaremos a figura simpá-
tica de Marcelo Tupinambá sem lem-
brar o Passo do soldado e a Redenção.
Ambos sintetisaram a alma dolorida
e heroica do paulista na Revolução
de 32. A primeira escrita sôbre ver-
sos de Guilherme de Almeida, que
toda gente recorda com funda emo-
ção.
A melodia cabocla de Marcelo Tu-
pinambá fez, nos concertos de Villa-
Lobos, um sucesso enorme na Eu-
ropa.
A êste nosso músico, um crítico
parisiense perguntou se o composi-
tor modernista francês Dario Mi-
lhaud, vivendo alguns anos no Bra-
sil, não se teria inspira, do em Tupi-
nambá. Vila Lobos, assomadamente,
respondeu :ele copia, ele edita Tupi-
nambá.
Pág. 10
RESENHA MUSICAI
Ernesto Nazareth é o contraste
de Marcelo Tupinambá. Sua música
apresenta-se sempre, vibrante e cheia
de fagulhas doiradas de sol.
Suas composições mais originais
são escritas sob forma dtè dansas
cantadas. A estrofe é substituida
pela melodia ; a frase oral pelo ritmo.
E são êstes os fundamentos sôbre
que assentam suas construções so-
noras que se divorciam dos métodos
usados pelos compositores coreográ-
ficos modernos, — é o seu lado ori-
ginal e que lhe dá uma feição rítmi-
ca muito pessoal, como se vê no buli-
çoso e encantador “Caboré”, que re-
presenta uma das mais lindas e ex-
pressivas composições de seu ge-
nero, Ernesto Nazareth é um com-
positor pianistico, e, com êsse ins-
trumento, traduz, com um talento
invejável e uma maestria prodigiosa,
o instrumental das serestas e dos
choros, dando-nos composições atre-
vidas de ritmo e personalidade como
o célebre "Apanhei-te cavaquinho” e
no “Amêno resedá”, que ouviremos
executado por Gaó, em que, a viva-
cidade da música, nos arrasta inces-
santemente para os bamboleios se-
resteiros.
A música buliçosa, ritmicamente
brilhante de Nazareth, encontra-se
num paradoxo inesplicavel, uma in-
fluencia de outra música de compo-
sitor que não é brasileiro e cujas
idealidades são bem diferentes da-
quelas de nosso patrício, Frederico
Chopin.
Ernesto de Nazareth confessou is-
so a um seu amigo e disse gostar
muito de Chopin. Os traços da obra
chopiniana deram um certo senso
pianistico intrínseco ao compositor
e que se revela em certos tópicos
do Carioca, no Sarambéque e no Ra-
mirinho.
Possuidor de uma excelente téc-
nica pianistica, as composições de
Nazareth revestem-se de certa maes-
tria, dessa linha formosa de elegân-
cia, principalmente nas valsas, co-
mo a “Expansiva”, “Confidencias”
e outras, distinção nobre, que lhe
afastam das rodas humildes, pro-
curando centros mais altos e inteli-
gentes. Ele proprio repelia os elo-
gios que se faziam aos seus maxixes
e que julgava deprimentes e humi-
lhantes a sua personalidade e seus
trabalhos.
Mario de Andrade, que fez uma in-
teressante conferencia sôbre Ernesto
Nazareth, aponta um aspecto curioso
na existência artística deste músi-
co. A sua posição na formação histó-
rica, aliás tão pouco conhecida, —
do maxixe, cujo nome ainda não se
sabe bem onde veio e, no entanto,
é visceralmente brasileira.
Apenas corre, adotado por alguns,
que o maxixe tomou sua denomina-
ção de um bohemio apelidado Maxixe
que, durante o carnaval carioca, num
clube da época, dansou o lundú de
uma maneira diferente e nova. Imi-
taram-no e, daí por diante, toda a
gente começou a dansar “como o
Maxixe”. Esta é uma versão espa-
lhada por Vila Lobos que a ouviu
de um antigo carnavalesco do Rio
de Janeiro.
Seja como fôr, o maxixe não é
muito novo. Já entrou no cincoente-
nario e devia ter surgido de 70 para
80.
O tango marca para a música bra-
sileira a evolução da sincopa, e do
contra-tempo da música ocidental,
usada para exprimir agitação e que
nos veio dos reinoes e desenvolvemos
como o toque do ritmo negro, dan-
do-lhe individualidade bem nacional
e bastante diversa da usada nas de-
mais dansas modernas, como o fox-
trote e outras. Essa evolução da
RESENHA MUSICAL
Pág. 11
sincopa brasileira, se permitem a ex-
pressão, se encontra esteriotipada
toda inteira, integralmente, na obra
pompeante de Ernesto Nazareth.
Um outro aspeto digno de nota
nos trabalhos de Nazareth, é a rela-
ção do título com a natureza, dos
ethos da música. No Brasil, os mu-
cisistas populares crismavam sua mú-
sica a esmo, como os pastores do
nordeste a povoação do seu rebanho,
— Fubá, Canéco, Bem-te-vi, Yayá.
ou ainda mais extravagantemente:
Tem roupa na corda. Estou com dôr
de dentes.
Nazareth, embora algumas vezes
colabore nessa nomenclatura ridícula,
na maioria das ocasiões, parece rela-
cionar a denominação da página mu-
sical com o argumento nela tratado.
Assim, Está chumbado, descreve o
ritmo da marcha hesitante do ebrio.
Desengonçado exprime o sentimento
de balbúrdia, de ostentação mágica,
ruidosa, esparramada, enquanto que,
ao contrario, o Tenebroso e o Brejei-
ro são cerrados e escuros, como uma
tarde invernosa. (Isso podereis notar
ouvindo as execuções de Gaó).
O que caraterisa. dissemos no prin-
cipio, a música de Nazareth, é o
contentamento, a galhofa, o prazer
irradiante, luminosamente sonoro,
que não se perde mesmo no Tene-
broso, onde se divisa, às vezes, cla-
rões de sol no meio da caligem da
terra.
Nazareth descende, em linha reta,
da gente alegre do suburbio flumi-
nense, que circunscreve a existência
num violão cantante e no baile rui-
doso, onde se esquecem as cousas
tristes da vida, as dividas e os des-
gostos e só se pensa na graça das
dansas e no sabor da ceia suculenta
e apetitosa.
Entre os compositores mais ex-
pontâneos e inspirados de nossa mú-
sica popular está Joubert de Carva-
lho. A sua música é cheia de melo-
dia clara e tipicamente brasileira;
individualidade e identifica rapida-
mente suas tendências artisticas.
As suas primeiras peças datam de
1921 e, desde logo, tiveram brilhante
aceitação e divulgação tão vasta que
não temos memória, em nossa épo-
ca, de sucesso igual. O fox-trot “O
Principe” alcançou um exito verda-
deiramenbe notável, sendo cantado
até em Paris, no Ba-ta-Clan, com
aplausos entusiastas, do auditorio in-
ternacional, frequentador daquêle ca-
baré de luxo. No domínio da música
popular, Joubert estreou com diver-
sas peças de dansa como “Caçador
de Esmeraldas” e o tango “Zezé”
dos quais os cariocas guardam ainda
saudosa recordação.
Mas, onde a música apresenta um
verdadeiro sentimento de nacionali-
dade, que traduz bem o sabôr fino,
delicado e leve de nossas canções,
são nas peças classificadas com o
nome de “Brasilidades”.
Dentre estas figuram, em primei-
ra linha, a “Rolinha”, “Canarinho”
e “Sacy Pererê”, páginas musicais
que, conservando um carater genui-
namente nacional, por se baseiarem
sempre em nossos ritmos e melo-
dias, aprsentam, no entanto, uma fei-
tura bem cuidada.
São numerosas as composições de
Joubert de Carvalho e seria dificil
citar todas elas. Vamos mencionar
algumas das principais nas quais se
manifestam o cunho nacionalista, a
inspiração fecunda e a maneira de
escrever desse nosso patricio, que, se
dedicasse à música artística seria
certamente um dos nossos melhores
compositores modernos.
Dentre as suas numerosas músi-
cas é linda, e fala enormemente à
altura a canção “Cae, Cae Balão”,
Pág. 12
RESENHA MUSICAI
escrita sobre magníficos versos de
Olegario Mariano, e que, ao lado de
uma sentimentalidade sincera, pos-
sue uma visão filosófica, nitida e cla-
ra das incertezas da vida. “Tutú Ma-
rambá” e “Sac.v Pererê” são duas
outras canções que obtiveram um
êxito formidável cantada pela voz ex-
pressiva e dolente de Gastão For-
menti e constituem duas toadas im-
pregnadas de espirito sertanejo e
desse feitichismo encantador e su-
gestivo ainda dominante na alma sin-
gela de nossa gente.
Entre as suas emboladas e maxi-
xes póde-se mencionar os “Filhos da
Candinha”, Côco pelado”, maxixe de
de fundo intensamente carnavalesco,
e a “Boca Pintada”, cujo ritmo lem-
bra bailes alegres, onde se canta e s?
bamboleia, esquecendo-se as cousas
más.
Ao lado destas músicas, Joubert
de Carvalho escreveu tangos, can-
ções e valsas, cheias de um fundo
sentimento lírico e que refletem bem
o nosso coração tão acolhedor de
emoções tristes e às vezes alegres
mas sempre sinceros. Como padrão,
dêste gênero, aí estão “João Capê-
ta”, “Traição”, a “Nha Maria”,
“Gosto de você”, Para o “Amor” e
a valsa “Castelo de Luar” que colo-
cam Joubert de Carvalho como um
dos bons cultores da atual música
popular brasileira. Dêle ouviremos
hoje, cantado pela Sra Carmen Dulce
“Tarde Dourada” — bela canção
brasileira
Cheio de inspiração, dono de uma
melodia sugestiva e emplogante, e
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RESENHA MUSICAL
A Revista Musical de
Maior Circulação
de um lirismo poético e endulçorado,
é o compositor alagoano 'Heckel Ta-
vares. Tem cultivado, com talento,
nosso folc-lore, ora adatando temas
populares, ora compondo canções e
páginas de sabôr genuinamente bra-
sileiro, nas quais, ao lado de uma con-
cepção apaixonada e sincera nota-se
um estilo cheio de brasilidade e bem
ordenado
Apezar de ser moço sua obra á
vastíssima refletindo a encantadora
música popular nortista, fonte pere-
ne de melodias tão lindas e gracio-
sas. Sua coleção “Raças” é uma an-
tologia de canções de fundo africano
onde destaca-se o acalanto “Mamãe
Prêta”, impregnado de uma poesia
intima, senso nostálgico e que, co-
mo uma varinha maga, nos evoca as.
canções de ninar entoadas pela voz
fresca de nossa ama.
Publicou, também, um lindo alburr.
de música, contendo seis canções in-
fantis sôbre temas de roda, com su-
gestivas palavras de Ribeiro Couto
e Manoel Bandeira. São meia duzia
de pedacinhos de ouro, que todas
as crianças brasileiras deviam cantar
e dansar no recreio dos colégios, por-
que lhes projeta, no ouvido, quadros
nobres e impressionantes de nossa
vida de povo novo: “Brasil, Canção
da bandeira, O Brasil é bom. Sortea-
do, Princêsa Izabel, Nana-Nana”.
Para as crianças, pequenas e gran-
des, escreveu uma outra coleção de
composições, também de carater in-
fantil, cuja música é uma lembrança
do lar carinhoso, reminiscência de
um tempo que passou e nos deixou
a impressão de manhã lavada e doi-
rada de sol: “Mamãezinha está no
Céu, Menino quer saber e o Realejo”.
Heckel Tavares tem outras páginas
de sincera emoção e arte: “Estrela
pequenina. Me deu uma vontade de
cborar. Tenho uma raiva de você, Sa-
RESENHA MUSICAL
Pág. 13
biá. Casa do Caboclo”, que são gen-
tilíssimas pela pureza da inspiração,
correção de forma, colorido, brilho
de expressão. Heckel ainda não per-
deu o vicio de sonhar e ‘‘não perca
não”, é o único vicio que não enve-
nena o corpo e nem esfrangalha a
alma. Ao contrario, transforma o
coração num céo ponteado de estré-
ias e numa mata engrinaldada de
flores.
No dominio da música erudita,
desviando-se de suas tendências,
Heckel Tavares escneveu o poema
musical, inspirado em versos de Cas-
siano Ricardo, André Leão, o demo-
nio de Cabelos encarnados, onde, em
dois quadros descreve simbolicamen
te, a luta entre o bandeirante e o
curupira, o combate ingente entre o
luso conquistador e a terra virgem
em que se defronta. É um trabalho
interessante, na sua arquitetura mu-
sical, procurando-se inspirar nas in-
gênuas melodias populares, mas in-
felizmente com pretenções orques
trais exageradas.
Mas, apezar disso, possue pági-
nas empolgantes, cheias de uma poe-
sia toda brasileira, como o alegre vi-
vace do 3.° quadro e o cair do cre-
púsculo do andante, ma non tropo, do
4.° quadro, em que o colorido é mag-
nífico, descrevendo-se poéticamente
os funerais do dia. O final, a manei-
ra de romance é, também, um lindo
trecho de poesia e sentimento natu-
rista.
Junto aos mucisistas que estamos
estudando, existem outros que dese-
javamos prestar homenagem since-
ra de nossa admiração pela contri-
buição pessoal que deram, tão gra-
ciosamente, e com tanto carinho, à
música popular brasileira. O carater
desta conferência nos impede, no
entanto, de fazer trabalho analítico
sôbre cada um dêles.
Mas, apezar disso, queremos men-
cionar vários nomes, porque esque-
cê-los seria ingratidão. Irão em con-
junto: a bôa companhia não faz mal
a ninguém.
Luiz Moreira, um compositor de
talento e fina observação artística.
Viajou com Abigail Maia e o humo-
rista João Phóca, o Brasil inteiro.
Nessa vida itenerante êle, como Vila
Lobos, anotou o cantar e o ritmo de
quasi toda a nossa gente, do norte
ao sul, e transplantou-o para sua mú-
sica apaixonada e irradiante de ter-
nura: Meu boi morreu, cantiga nor-
tista; Nhô Juca, samba côro baiano
e Chico-Manuel-Nicolau, — delicioso
e buliçoso batuque de prêtos.
Compositor de inspiração sadia, to-
nalidade bem brasileira, tendências
românticas, foi Antonio Carlos Ri-
beiro de Andrade, um dos fundado-
res do Conservatorio. São saborosas,
transbordantes de deliciosas melo-
dias, suas canções “Morena se tu
quiseras”. . . FÍôr do Maracujá, Não
me deixes. Teus olhos. Tudo isso é
escrito com elegancia e absoluta cor-
reção de um grande sabedor de mú-
sica.
Alberto Costa, senhor de um ta-
lento pessoal brilhante e que trata
os seus temas com uma fantasia tí-
pica inimitável é, apesar de médico
de profissão, um dos nossos compo-
sitores mais interessantes, possuindo
nas suas músicas, laivos de escola
russa, como no pungitivo Canto da
Saudade. São impregnados de suave
melancolia o seu Cysne e a Serenata.
Ainda, no dominio da música po-
pular, encontram-se um grande nú-
mero de compositores que sairam do
anonimato e fizeram sucesso, em sua
época, pela melodia de suas canções
e os sincopados de seus sambas e
maxixes, — semi-barbarescos.
Neste número figuram Alves Mes-
Pág. 14
RESENHA MUSICAL
quita, célebre pelas suas quadrilhas
— “Soirées Brasileiras” e “Raios
de Sol; Aurélio Cavalcanti, autor de
numerosas valsas de motivos popula-
res como a Cachôpa; Eduardo Souto,
autor de vibrantes marchas carna-
valescas, estonteantes de côr e som;
Sinhô (J. B. Silva) e Sivan (Castelo
Neto), dupla transbordante de ins-
piração e brasilidade, e tantos outros
que, nos discos, no radio, vão espar-
ramando a sua inspiração através da
voz simpática de Francisco Alvfcs,
Jorge Fernandes, Gastão Formenti,
Cândido Botelho e Carmen Miranda
empolgando-nos com os ritimos de
nossa natureza, que são as manifesta-
ções expontâneas de nossa alma po-
pular, o sentir de nossa gente, que
sedimentados pelo tempo, constitui-
rão, com o auxilio da inteligência e
da cultura, a fonte de inspiração da
nossa arte pura e elevada.
Música pura que, no futuro, teré*
um pouco da alma do gaúcho rio-
grandense, do caipira paulista, do se-
renatista carioca, e do cantador e vio-
leiro nordestino. E o sentido glorio-
so, imenso, do Brasil único, indivi-
sível e com um homem tão grande,
como é a beleza e a magestade da
terra que DEUS nos deu!
RESENHA MUSICAL
MENSAL
Diretor: Prof. Clovis de Oliveira - Secretaria: Profra. Sra. Ondina F. B. de Oliveira
Redação: Rua Conselheiro Crispiniano, 79 — 8.° andar — Edifício Itaíba.
São Paulo
É a revista musical de maior circulação no paiz.
Fundada em Setembro de 1938 — Assinatura anual, 20$000.
Registrada de acôrdo com a Lei e no DIP.
Colaboração escolhida e solicitada — Suplemento Musical, especial.
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DR. ROBERTO BOVE
— Advogado —
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9.° andar — Salas 91-?
Fone 2-4747 - S. PAULO
W e b e r
Weber embora fosse um menino
vadio e travêsso, mostrou sempre ap-
tidões para a música. A sua primeira
ópera foi representada em Viena
quando êle contava apenas 14 anos.
Vinte e dois de novembro
PROF. SAMUEL ARCHANJO DOS SANTOS
Do Conservatorio Dramatico e Musical de S. Paulo
e do Conselho de Orientação Artística do Estado.
(Especial para “ RESENHA MUSICAL”)
Para vós, contemporâneos de uma
época de quasi completa materializa-
ção de costumes, em que o valor do
homem mensura-se pela primazia da
força é atrevimento, contar-vos uma
lenda tão singela na qual se vê trans-
parecer o sentimento, tão delicado,
duma Virgem Mártir — qual é SAN-
TA CECÍLIA — padroeira dos mú-
sicos, digamos melhor, dos artistas —
penso será como que vos dar um oá-
sis em pleno deserto, onde a sêde de
bonança se evidencia tão intensa an-
te as calamidades que, dia a dia, ve-
mos desensolar pelo velho mundo on-
de a sanha dos gladiadores da mo-
dernidade ameaça ruir todo um pa-
trimónio artístico que marca o glorio
so passado de labores da pobre huma-
nidade. Passemos logo à lenda:
CECÍLIA, essa nobre da velha Ro-
ma jurou a Deus virgindade perpé-
tua. Destinava-lhe, no entanto, a
vontade paterna o jovem Valeriano.
Em obediência à vontade de seus
pais aceitou Cecília o nobre romano.
E, em seguida aos esponsais, cele-
braram-se as bodas nupciais. Ao en-
trarem os esposos em confidências,
diz a Virgem a seu marido: “Meu es-
poso, si hoje, no dia de nossas núp-
cias tu me jurares nada dizer a nin-
Imagem da Padroeira dos Músicos,
da Igreja de Sta. Cecília, em
São Pau!o
guém, revelar-te-ei um grande se-
gredo. Valeriano jurou, como Cecília
lhe pedia, e esta continuou: “Eu tra-
Pág. 16
RESENHA MUSICAL
go sempre ao meu lado um anjo de
Deus o qual preserva meu corpo de
toda mácula pecaminosa. Si tomares
meu corpo com intenção de pecar
morrerás, mas si teu amor fôr feito
de pureza, o anjo que me guarda mos-
trar-te-á a gloria da bemaventuran-
ça. — Ao que Valeriano respondeu:
“Mostra-me o anjo de que falas e
acreditarei nas tuas palavras, assim
como farei o que me pedires, 6 mi-
nha doce esposa.” — Santa Cecília
tornou-lhe: “Si acreditares no ver-
dadeiro Deus e pedires o batismo, ve-
rás, com certeza, o anjo que me acom-
panha. Para isso irás à Via Appia e
ali chegado dirás a uns mendigos que
virão ao teu encontro : “Venho a man-
dado de Cecília, para que me apre-
senteis a Urbano a quem tenho algo
a dizer. E depois que das mãos deste
tenhas recebido o santo sacramento
do batismo teus olhos terão a gloria
de ver o anjo de Deus. Valeriano, em
seguida a estas palavras, dirigiu-se
à Via Appia onde encontrou Urbano;
este, escutou-o com atenção; depois,
louvando e agradecendo o Senhor dis-
se: “O’ Senhor Jesus Cristo, semea
dor de virtude e de bondade, recebe
o fruto da santa semente que lan-
çaste em Cecília, a qual te serve com
amorosa solicitude da abelha indus-
triosa. Seu esposo era feroz como o
leão dos desertos e ei-lo a teus pés,
manso como um cordeiro ! E neste
momento apareceu-lhes um formoso
varão, vestindo uma túnica alvíssima
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RESENHA MUSICAL
A Revista Musical de Maior
Circulação no país e no
exterior
e trazendo na mão um livro escrito
com letras de ouro.
Então Valeriano, deslumbrado,
prostrou-se por terra, ali ficando na
humildade da poeira. O varão ergue-
o e abrindo o livro fez com que Vale-
riano lêsse as seguintes palavras:
“Um Deus pai de todas as creatura3,
o qual está acima de todas as coisas
e habita em todos os sêres.” Crês,
tu, Valeriano na verdade destas pa-
lavras?” — Creio! — respondeu o
esposo de Santa Cecília, já tocado da
divina redenção.
No mesmo instante o formoso va
rão, que era um anjo de Deus, desa-
pareceu. Valeriano pediu imediata-
mente o sacramento do batismo, re-
cebido o qual tornou a Cecília. En-
controu-a em sua alcova de pureza,
conversando com um anjo do Senhor,
o qual tinha na mão duas grinaldas,
uma de rosas, outra de lírios, que deu
a Cecília e a Valeriano dizendo:
“Guardai estas grinaldas sem nun-
ca macular vosso corpo e vosso cora-
ção; celestes coroas, jamais murcha-
rão elas nem perderão o perfume e
a beleza, sendo, como são, visíveis so-
mente àqueles que, como vós, guar-
darem a virtude excelsa da castida-
de; quanto a ti, Valeriano, já que se-
guistes o bom conselho de Cecília,
péde o que desejares que te será con-
cedido.”
E assim vai a lenda de Santa Ce-
cília que se encontra no livro: “Santa
Cecília e outras lendas” — n. 1 da
coleção “As mais belas lendas do
Cristianismo”.
Donde viria o título de “Padroeira
da música” dada a Santa Cecília ? . . .
Sabemos que o título simbólico de
“Padroeira da música e especialmen-
te da música religiosa” dado a Santa
Cecília vem de longo tempo, não sen-
do possivel precisar uma data sem
demorada e metódica pesquiza por
RESENHA MUSICAL
Pag. 17
entre a sua iconografia e demais
obras inspiradas nessa Santa.
É sobremaneira lendaria a prero-
gativa que se ihe quer dar de inven-
tora do órgão. Pensamos que essa
simbólica denominação liga-se aos
seus serviços tão dedicados, uma
sorte de catequése no tempo da anti-
ga Roma, serviço esse que lhe valeu
a gloria do martírio e consequente
canonização. Assim é que, consoan-
te reza a sua história — esoarsa
por diversos livros — ha alusões às
suas faculdades musicais, possivel-
mente chefiando massas corais em
unísonos de cânticos religiosos das
catacumbas romanas-.
Cecília deveria ser considerada, de-
vido à promiscuidade de manifesta-
ções artísticas, não somente padroei-
ra da música como dos artistas em
geral, pois que tanto os poetas, co-
mo os pintores, escultores e músicos
concretizaram em suas principais
obras a admiração e o encanto pela
linda Virgem mártir.
Ha uma grande produção de obras
inspiradas em Santa Cecília e suas
lendas. Da Enciclopédia Internacio-
nal de W. V. Jackson citamos tex-
tualmente o que encontramos: “Foi
representada por muitos pintores, e
suas ações foram traçadas sôbre as
guarnições da Igreja de S. Urbano,
em Roma. Mais tarde, Cimabue pin-
tou o martírio de Santa Cecília para
a Igreja consagrada a esta Virgem,
em Florença. Esse quadro passou de-
pois para a Igreja de Santo Estevão.
De ordinário Santa Cecília é repre-
sentada tocando órgão e entoando
louvores ao Senhor acompanhada por
anjinhos. Entre as representações
desse gênero, citaremos os quadros
de H. Van Dyck, no Museu de Ber-
lim ; de Guerchin e de Jacobo Cavi-
done (Louvre) ; de Pellegrino Tibal-
di (Viena) ; de Simone Cantarini
(Munich) ; de J. C. Procaccini (Par-
ma) ; de Caracciilo e de Paulo Brie
(Nápoles) ; de Poussin e de M. Cox-
eie (Madrid). Pode-se citar ainda:
uma Santa Cecília tocando órgão, de
Cario Dolci (Dresden). Uma outra
Santa Cecília do mesmo, vê-se no Mu-
seu Eremitério, em Petrogrado ; a fi-
gura pintada por Rubens (Berlim)
é a de uma jovem e bonita flamenga.
Pelo seu lado, Paulo Veronese deu
?. Santa Cecília tocando sistro, as fei-
ções de uma loura veneziana (Museu
de Viena). E. na Santa Cecília, que
é uma das obras primas de Rafael,
vê-se a. Santa de pé, tendo próximo
de si S. Paulo, S. João, Sto. Agosti-
olhos para o céu e escutando com ar-
olhos para o céu, escutando com ar-
rebatamento um concerto pelos aa-
jos.”
Contam que o francês Delaroche
pintou Santa Cecília morta, flutuan-
do sôbre as aguas, banhada pelos
raios do luar”; esse quadro se en-
contra no Museu do Louvre.
No presbitério da Matriz de Santa
Cecília, em São Paulo, encontrará o
leitor amavel, trabalhos inspirados
na vida de Santa Cecília executados
pelo artista brasileiro B. Calixto.
Entre as esculturas, existe o seu per-
fil. obra do genial Donatello, que se
acha em Londres, e a estatua de Ste-
fano Maderno, que apresenta a Vir-
gem, reclinada sôbre u mflanco, em
ato de repouso, como foi encontrada
após 13 séculos, quando foi aberto o
seu túmulo. Dedicaram-lhe missas
diversos compositores; citaremos
Adolph Adam, Niedermeyer, Gounod,
Tomás, e outras produções em sua
honra foram escritas por Purcell,
Haendel, a ópera. “Cecília” de F. Kes-
sler (1810), e de Davaux (1786) soba
denominação de “Ceciade ou Le Mar-
tire de S. Cecile”, tragédia ornada
de córos, representada em 1606, ela-
Pág. 18
RESENHA MUSICAL
borada sôbre a forma dos antigos
mistérios, escrevendo a música Ni-
colas Soret. E, muito recentemente
a ópera sacra de Monsenhor Récife,
que foi levada com grande sucesso
em nossos Teatros municipais di Rio
e S. Paulo.
Numerosas associações surgiram
sob a denominação de Santa Cecília.
Riemann dá-nos como mais antiga a
fundação de Palestrina, em Roma:
uma espécie de Congregação que go-
zava de numerosos previlégios con-
cedidos pelos Papas de então, sendo
que em 1847, Pio IX a transformou
em uma "Academia de Sta- Cecília”
que prodiganiza grandes serviços à
arte musical religiosa. Delia Corti e
Gatti, no entanto contradizem o mu-
sicólogo alemão, dando entre as mais
antigas a “Congregação de Santa Ce-
cília” fundada em Roma no ano de
1584, não por Palestrina, dizem eles,
porém pelo veneziano Alexandre Ma-
rino, canonico lateraense, e aprovada
em 1575 com um Breve de Xisto V.
Em 1785, surge, em Londres, a “Ce-
cilian Society”, notável pelas exe-
cuções de Oratórios de Haendel,
Haydn e outros. A “Cecilien verein
für I Kinder deutscher Zunge”, fun-
dada em Ratisbona, no ano de 1867,
por F. Witt, e confirmada em 1870
por um Breve pontifical, cuja fina-
lidade visava combater a introdução
de instrumentos na música religiosa,
assim como os clássicos dos séculos
XVIII e XIX. Seria alongar por de-
mais o meu “artiguête” tomando o
precioso tempo do amavel leitor em
citações de tantas invocações que vão
pelo mundo homenageando a nossa
formosa padroeira.
A usança de festejar Santa Cecí-
lia a 22 de novembro, vem de longe.
Dizem que para execuções de conjun-
tos corais, constituiu-se, em 1571, em
Evreux, na Normandia, a sociedade
“Le puy de musique”. Em S. Paulo,
é todos os anos cultuada fidalgamen-
to a memória de Virgem mártir com
execuções de música sacra; e essa
festa, que celebra-se na Matriz de
Santa Cecília, costumamam associar-
se os estabelecimentos de ensino ar-
tístico.
Mone (F. J.) bibliotecário e pro-
fessor de história da Universidade
de Louvania, que possui uma obra
em 3 vol. sobre hinos, afirma que
Santa Cecília foi uma das santas pre-
dilétas dos hinógrafos dos primeiros
séculos. Entre os trabalhos que se
ocuparam de Santa Cecília é muito
citado um estuod publicado em 1874
em Paris pelo eminente D. Próspero
Gueranger, Abade do célebre mostei-
ro de Solesmes, obra essa sob o tí-
tulo “Santa Cecília e a sociedade ro-
mana nos dois primeiros séculos de
nossa éra”.
Quem sabe si esse trabalho escla-
rece a dúvida que muitos têm em sa-
ber a origem da adoção do nome de
Santa Cecília para nossa padroeira.
Em todo caso, se não se pode afir-
mar essa origem Ela é, de fato con-
siderada tal. É o suficiente.
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Foi magnífico o concerto realizado
em 4 de Outubro, pelo ilustre vio-
loncelista Mario Camerini, no Salão
Nobre do Instituto Musical Sta. Mar-
celina.
O violoncelo que possúe cultores
capazes de suavizar-lhe a aspereza,
muitas das vezes rúde, encontrou em
Mario Camerini, mãos, alma e inteli-
gência, capazes de torná-lo macio,
persuasivo e humano.
Mario Camerini é um artista ideal
na sua arte. Possuidor de uma sono-
ridade grandiosa, clara e aveludada,
tem o seu arco inflexões dulcíssimas
ao mesmo tempo que dramatiza vi-
brantemente os ritmos mais difíceis.
Não abusando dos recursos técni-
cos que possúe com largueza, Mario
Camerini mostra-se um espírito ar-
tístico elevado. Pelo programa exe-
cutado firmou os conceitos emitidos
pela crítica em suas apresentações
anteriores, de uma maneira vantajo-
sa, magnitizando o público que o
aplaudia, com sua arte superior.
Na primeira parte executou com
modalidade clássica as Séte Varia-
ções de Beethoven sôbre um têma de
Mozart, o Adagio e Allegro de Boc-
cherini, Arioso de Bach e obras de
Valensin e Francoeur. Na 2.“ parte
executou a Suite Espanhola de Joa-
quin Nin, com um calor bem ibérico,
ardente na Marciana e Andaluza, ar-
rebatado e languido em Vieja Castilla
e Asturiana. Concluindo o excelente
programa com obras de Villa Lobos,
Faure, Cassado, Camerini (Bercouse
Popular Brasileira, que foi bisada) e
Popper, demonstrou uma concepção
musical que vai além dos limites das
acrobacias musicais porque suas exe-
cuções cheias de pensamento, pos-
suem algo raro nos concertistas da
atualidade. Possuem alma!
C. de O.
CONCERTO ORQUESTRAL DA
FILARMÓNICA DE S. PAULO
Na noite de 18 de Outubro, reali-
zou-se no Teatro Municipal, o grande
concerto sinfônico promovido pela
Sociedade Filarmônica de S. Paulo,
sob a regência do ilustre maestro
Ernesto Melich.
Lulli, Bach, Casabona e Beetho-
ven foram os compositores ujas
obras integraram o magn’fico pro-
grama.
Sem dúvida alguma, o “ciou” do
saráu foi a execução da II Sinfonia
de Beethoven. Correspondeu ao in-
teresse do numeroso público, pela fe-
licidade com que se houve o grande
conjunto orquestral. Principalmen-
te no Scherzo, a orquestra bastante
hemogenea, conseguiu belos efeitos de
sonoridade, volume proporcionado e
riqueza de timbres.
Onde porém a orquestra portou-se
com mais acerto, foi indubitavelmen-
te na Suite de Lulli, cujo Noturno
objetivou uma requintada interpre-
tação. Um pouco desencontrados os
Pág. 20
RESENHA MUSICAL
Tomás Teran
violinos nos “pizzicate”, não atin-
giu a percepção dos ouvidos menos
acurados e nem, por sorte, a influir
com inconvenientes na execução da
linda Suite.
O concerto de Bach, para dois pia-
nos e orquestra de cordas, agradou
bastante. Prestaram seu valioso con-
curso as pianistas Mercês da Silva
Telles e Gilda Gusso. Ambas bem
amparadas pela resoluta atuação or-
questral, sob a regência do maestro
Melich, puderam executar com extre-
ma liberdade as partes importantís-
simas de que estavam incumbidas.
Técnica, ritmo e interpretação, não
faltaram aos jovens pianistas.
O maestro Melich continua a ser
o mesmo regente conciencioso que es-
tamos acostumados a ouvir. Enérgi-
co no ritmo, delicado nas sonorida-
des, jocoso nos contrastes e artista
na interpretação.
C. de O.
TOMAS TERAN NA
PRO ARTE
Pro Arte, a bem organizada socie-
dade cultural e artística com séde
no Rio de Janeiro e com ramifica-
ções nas principais cidades do país,
apresentou ao público paulistano o
notável pianista espanhol Tomás
Teran.
O concerto que realizou-se em 21
de Outubro, no Salão Vermelho do
Esplanada, reuniu uma platéia culta
que soube fazer jús ao valôr do bri-
lhante artista.
Tomás Teran para essa apresenta-
ção, organizou um programa de mo-
do a poder demonstrar os diversos
fluentes da arte pianística admiravel
que suas mãos sabem traduzir capa-
citadas por uma técnica finamente la-
pidada. Os seus pianíssimos são sub-
tis e os fortes e fortíssimos, vibran-
tes e amplos. Qualidades invejáveis
que fizeram realçar a execução fir-
RESENHA MUSICAL
Pág. 21
me da Ouverture da 28.® Cantata de
Bach, da Sonata Apassionata d-* Be-
thoven, das Fantasias op-12 de Schu-
mann, das obras de Debussy, Migno-
ne , Falia, Villa Lobos, Albéniz e Gra-
nados.
ínfelizmente o piano não corres-
pondeu ao valôr do artista que viu
grandemente prejudicada sua exe-
cução pelos inúmeros defeitos do ins-
trumento. Porém este detalhe não
impediu que a exuberância musical
do ilustre virtuose se revelasse asse-
gurando-lhe mais uma noitada vito-
riosa da sua longa carreira artística.
Promete-nos, agora, a Pró-Arte, pa-
ra o mês de Novembro, um concerto
da aplaudida cantora brasileira Alice
Ribeiro.
C. de O.
•
MAGDALENA TAGLIAFERRO
NA FILARMÓNICA
Magdalena Tagliaferro, a eminen-
te pianista que óra visita S. Paulo,
onde tem desenvolvido uma atividade
salutar em nosso meio musical, apre-
sentou-se em 8 de Novembro, ao dú-
blico paulistano, por intermédio da
benemérita Sociedade Filarmônica
que completou assim, brilhantemen-
te, o seu 28.° saráu de arte.
Como era natural, o concerto da
Sociedade Filarmónica foi aguardado
por uma atmosféra de desusado in-
teresse, entusiasmo e simpatia, ’*a-
zão porque ao Teatro SanCAna,
afluiu uma assistência numero«a
que soube dispensar à notável vir-
tuose os aplausos mais significa-
tivos.
O programa constituído por óbras
de Schubert, Beethoven, Bach, Sehu-
Tomás Teran
mann, Mignone e Debussy, foi orga-
nizado sob diversas modalidades afim
de evidenciar as riquíssimas qualida-
des pianísticas e interpretativas da
emérita pianista, qualidades essas
que o nosso público soube compreen-
der e aplaudir.
Destacaremos do seu programa, a
Sonata op. 90, de Beethoven, exe-
cutada com muita finura e simplici-
dade; o concerto em dó, de Bach, in-
terpretado com admira vel justeza de
fórma. Onde, porém, Magdalena Ta-
gliaferro jogou com seus valiosos pre-
dicados de artista consumada foi no
Carnaval de Schumann. O público
acompanhou religiosamente a exe-
cução desta importante óbra da lite-
ratura pianística, cujas miniaturas,
pela novidade da interpretação, tor-
naram-se quadros vivos que a técni-
ca prodigiosa de Magdalena Taglia-
ferro, pincelou com as nuances mais
delicadas ou mais jogosas, dando-lhes
ambiente, corpo e alma.
Pág. 22
RESENHA MUSICAL
Magdalena Tagliaferro teve opor-
tunidade de patentear, com o concer-
to realizado para a Filarmônica, que
o seu temperamento brilhante e a
sua musicalidade excepcional, ao par
de uma técnica não menos maravi-
lhosa, a tornam uma das maiores
pianistas dentre os grandes intérpre-
tes contemporâneos.
Com a execução de Mignone e De-
bussy, findou o concerto sob uma ova-
ção prolongada da assistência, para a
qual concedeu numerosos extras. \
Sociedade Filarmônica dirigimos nos-
sos aplausos pelo êxito do grande
concerto que promoveu e que, nos
anais artísticos da Paulicéia, figura-
rá como mais uma das suas contri-
buições valiosas para o progresso da
arte musical entre nós.
C. de O.
ALICE RIREIRO NA
PRO - ARTE
Acompanhada pela ilustre pianis-
ta Maria Amélia de Rezende Martins,
apresentar-se-á ao público paulista-
no no mês corrente, antes de iniciar
uma excursão ao sul do país, pro-
movida pela Pró-Arte, a festejada
cantora brasileira Alice Ribeiro.
Mais uma valiosa realização da
Com este numero de
RESENHA MUSICAL
Coração Santo — Peça infantil para
piano — Clovis de Oliveira —
seu III Suplemento.
Pró-Arte, em benefício de seus as-
sociados e dos artistas nacionais que
sempre tem preferido para suas ex-
cursões culturais artísticas sem des-
prezar os elementos estrangeiros
radicados no país que contribuem di-
rétamente para o desenvolvimento e
progresso do nosso meio artístico,
pela cultura sólida e vasta de que
são possuidores.
Eis a razão pela qual a
Pró-Arte vem apresentando subse-
quentemente artistas nacionais e es-
trangeiros residentes no país.
Transcrevemos as palavras inspi-
radas com que o professor ilustre, que
é o sr. Murilo de Carvalho escreveu
apresentando aos riograndenses do
sul, a laureada cantora Alice Ribeiro:
“Desminto o velho provérbio:
“Longe dos olhos, longe do coração”.
Porto Alegre, ha tantos anos longe
dos meus olhos, nunca esteve tão
perto do meu coração como agora.
É com aleiria que escrevo estas pa-
lavras para apresentar aos meus pa-
trícios a minha discípula Alice Ri-
beiro. Alegria aumentada porque se-
rá durante as festas do segundo ceii-
tenário da fundação da cidade de que
me orgulho de ser filho, que ela vai
cantar pela primeira vez, no Rio
Grande do Sul. Nada direi do real
talento de Alice Ribeiro. Ides ouvi-
la. Ides julgá-la. Os vossos aplau-
sos nos darão a melhor das recom-
pensas. A Pró- Arte, que a leva, me-
rece todos os louvores. Dirigida pe-
la competência e pelo devotamento
da excelente pianista Maria Amélia
de Rezende Martins, graças aos seus
esforços, muitos artistas, principal-
mente brasileiros, têm podido apare-
cer nos Estados. E a escolha desses
artistas é sempre feita pelo critério
exclusivo do valor de cada um.”
RESENHA MUSICAL
Pág. 23
ODETE DE FARIA
Odete de Faria, a pianista patrí-
cia que tantos êxitos já tem alcança-
do e cujos méritos todos são unani-
mes em reconhecer, acaba de obter
mais um expressivo triunfo, com o
recital, que ha alguns dias levou a
efeito, para os associados da Socie-
dade de Cultura Artística de Piraci-
caba.
Fazendo a apreciação desse con-
certo, durante o qual Odete de Faria
foi entusiasticamente aplaudida, Al-
ceu Viegas, crítico do “Diário de Pi-
racicaba”, salientou, logo de inicio:
“Apresentando um ótimo programa,
em que figuravam páginas de ricas
sonoridades e inspiração profunda,
como “Cantata” de Bach, a “Sonata
em si menor”, de Liszt, a nossa reci-
talista soube traduzir, com precisão,
toda a riqueza melódica das partitu-
ras e o pensamento dos grandes mes-
tres. ”
Referindo-se, ainda, à interpreta-
ção dada à “Sonata em si menor”,
Dr. Amam Egydio de Oliveira Fillm
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AOS ASSINANTES
Lembramos os srs. assinantes
cujas assinaturas vencem com o pre
sente número, o obséquio de envia-
rem por cheque ou vale postal, a im-
portância de 20$000, correspondente
a uma assinatura anual, evitando
assim a interrupção da reméssa des-
ta Revista.
de Liszt, obra que é considerada co-
mo verdadeira enciclopédia da pia-
nística de todos os tempos e que exi-
ge dos que se abalançam a executá-
la, uma organização sem falhas, fri-
sou o nosso coléga que “essa obra
prima do compositor húngaro teve em
evidência, por parte de Odete, toda a
sublimidade e graça, que são a sín-
tese dessa reliquia musical.”
Aludindo, também, às outras peças
que constituíam o programa dessa
audição, quiz Alceu Viegas colocar
em relevo que todas elas tiveram, em
Odete, uma intérprete digna do me-
lhor apreço, digna, portanto, dos
aplausos calorosos que recebeu, e que
a obrigaram a conceder um “extra”.
Odete de Faria embarcou ha pou
cos dias, para o Rio Grande do Sul.
afim de participar dos festejos do
bi-centenário de Porto Alegre, ali
devendo realizar algWs concertos,
para dar cumprimento ao contrato
que firmou com a Prefeitura da Ca-
pital gaúcha.
A respeito da Música Sacra
Uma medida que se impõe
Desde o pontificado de Pio X, que
a questão da música sacra se impôz
na liturgia da Igreja. Esse Pontí-
fice que era uma alma nobilíssima
de artista, subindo ao trôno pontifi-
cal com a experiência própria das
suas pequenas igrejas paroquiais, que
êle, em pessoa, dirigira antes de che-
gar ao histórico patriarcado de Ve-
neza, preocupou-se imediatamente em
sistematizar essa parte importante
das cerimonias e das funções religio-
sas.
O Papa Pio X havia observado, ao
seu tempo, que nas igrejas humildes
e também nas monumentais das ci-
dades, se andava, pouco a pouco, in-
filtrando o péssimo hábito de utili-
zar como acompanhamento das ce-
rimonias e dos ritos de fé, música
por vezes profana e, muitas vezes,
realmente vulgar. Pio X interveiu,
então, com a sua conhecida energia
e, com um “motu proprio” propôz-
se a extirpar o máu costume profano
e fazer reflorescer para ornamento
do verdadeiro espírito cristão, a tra-
dicional música sacra da ortodoxa li-
túrgica e o maravilhoso canto gre-
goriano.
Aquele enérgico e oportuno “motu
proprio” fez muito bem à vida das
cerimonias da Igreja.
Após anos, já no pontificado de
Pio XI, o Santo Padre, voltou com
um novo “motu proprio”, ao assun-
to reafirmando as normas relembra-
das por Pio X, dando, além disso,
ordens aos bispos e aos “ordinari”
para que o canto litúrgico tivésse do
novo um galhardo impulso e fosse
reposto no seu antigo e puríssimo es-
tilo, porquanto ressurgia a tendên-
cia para reproduzir-se, em muitas
igrejas católicas de todo o mundo,
o reprovável hábito de enxertar mú-
sicas e cânticos profanos nas cerimo-
nias religiosas.
Mas, agora, como acontece em to-
das as coisas desta terra, mesmo
quando se referem às relações dos
homens com a Divindade, passados
muitos anos daquela severa admoes-
tação, sucedeu um novo relaxamen-
to resurgindo a tendência para re-
produzir-se, em algumas igrejas ca-
tólicas, o reprovável costume de in-
cluir música e cânticos profanos nas
cerimonas religiosas. Segundo te-
mos conhecimento, em algumas loca-
lidade do interior do nosso Estado,
indivíduos que se rotulam maestros
e compositores, vêm transgredindo
essas ordens de relevante importân-
cia religiosa, social e artística, na di-
reção dos córos, fazendo executar
suas próprias composições em fôrmas
de Missa ou de outras fôrmas, sem
nenhum valor musical ou artístico,
revelando a existência de um abuso
que precisa ser reprimido co mener-
gia pelas dignas autoridades eclesiás-
ticas, porque o povo precisa compre-
ender, na música, as profundas be-
lezas da música sacra e do canto gre-
goriano penetrando os segredos da
música religiosa de alto estilo -ecal
ou instrumental e não sentir-se in-
fluenciado por uma arte de modali-
dade inferior, mescla de profano, ig-
norância e vulgaridade.
(Transcrito do número
anterior, a pedido)
Sinfonia
Pensamentos sôbre a IX. a
de Beethovem
Gustavo A . STERN
Ao M.° George Kaszás
Especial para RESE-
NIHA MUSICAI,
Era um certo dia de Maio de 1824.
quando pela primeira vez, ouviram
homens, no teatro “Kárntertor” em
Viena, a Nona Sinfonia. Deviam ter
sentido uma profunda emoção, pois,
nessa hora, esclarecia-se a todos a
sua própria luta pela vida. Cada um
deles, combatendo os poderes entra-
nhos da sorte, sentia-se empolgado:
isso importa a mim.
Nunca haviam sido formados de
uma maneira tão elevada, o desafio
e a luta entre a humanidade e o des-
tino, desde a época de Esquilo. Eles
fremiam, pois ouviram, no primeiro
movimento da sinfonia, o homem
oprimido combatendo o cáos; sentiam
a luta dele como a sua própria e con-
cordaram.
Ele sai corajosamente no segundo
movimento, com cornetas para caça,
mas é derribado pelos tímpanos; re-
petindo a corrida, fica cada vez aba-
tido pelos tímpanos.
Porém, no terceiro movimento, o
homem esquece o destino. Lá se acha
um homenzinho a sós, numa vasta
planície e está sentindo o que é ve-
dado aos deuses : O amor, o sofrimen-
to e a grande dedicação dos mortais.
Tudo está suavemente movido e,
muito baixo, penetra de fóra no cor-
tejo eterno, o aviso do destino; mas
sempre, quando o tímpano se anun-
cia, a pele soante é subordinada pela
mão estendida. Tão longe está o des-
tino.
Agora começa um dueto de ho-
mens, cheio de paz, com olhos diri-
gidos para cima, para as nuvens do
destino; uma só vez é relembrado o
homem das lutas que estão à espera,
fora; mas, tudo está ainda pacífico.
Agora, após um período tão sua-
ve, de repente reaparece o cáos; os
tímpanos estão delirando, o ceu tro-
veja, — com uma pergunta proble-
Pág. 2(>
RESENHA MUSICAL
mática resalta o violoncelo — e a
tempestade renova-se.
Mas, o momento de grande trans-
formação mundial acordou os cati-
vos; são êles nécios? são êles escra-
vos? Impacientes, sacodem a cadeia:
Querem a liberdade. Ainda, porém,
continuam lutando a luz e as trevas
e, enquanto os cativos resmungam,
volta à lembrança a felicidade com-
pleta; hesitantes, advertem violonce-
los e baixos. É como se os instrumen-
tos tivessem achado a voz humana
e falassem antes dos homens se apro-
ximam. Iniciou-se uma longa conver-
sação dos dispertados para a liber-
dade, uma reunião de creaturas que
indagam, consultam e desafiam.
Parece aproximar-se, de distância
mágica, uma idéia nova, e, enquanto
os baixos acabaram de falar entre
si quasi com palavras, sentem-se du-
ma vez reunidos e começam a zumbir
a nova e grandiosa melodia. Cheios
de saudades, seguem os violinos e
cantam harmoniosamente juntos.
Mais uma vez, intervem o destino
para impedir a nova canção.
Mas, agora, levanta-se a voz de um
homem, entre os instrumentos falan-
tes; a primeira palavra dele é: Ale-
gria — e a segunda; Oposição.
Basta. Calai-vos poderes obscuros;
a grande transformação mundial
chegou. E segue, essa única voz hu-
mana, o grande côro dos outros; se-
guem, os solistas fieis, os versos es-
colhidos da ode de Schiller “À Ale-
gria”.
Escutai, aproxima-se lá uma pro-
cissão curiosa, acompanhada pelos
triângulos. Um herói marchando para
a vitória. Ele conseguiu a grande
obra, nunca realizada até agora: o
tímpáno, antigo instrumento bélico,
entrou aos serviços dos homens e
associou-se ao júbilo.
Emocionado e sensibilizado, fica
o côro calado; sómente os baixos
grossos falam uma lingua nova e agi-
tada até que, acompanhados com
largos acordes dos trombones, pri-
meiramente os homens, depois as
mulheres, exigem uma solene união
de toda a humanidade: sêde irmana-
dos aos milhões!
Agora, seguem todos, sem gravi-
dade humana, sem força; alegres da
liberdade, constroem por si mesmo
um poder elevado, predicam um pai
amado nas alturas do firmamento.
Da multidão cantante, separam-se,
devagar, as vozes dos solistas, repe-
tindo o côro da alegria, elevando e
diminuindo com êle a sua voz; mas,
a vasta multidão, a grande massa,
quer bradar; a época do indivíduo
passou; um segundo arriscam as vo-
zes femininas entrar no quarteto dos
solistas, mas em seguida a melodia
se perturba, se perde e os homens
libertaidos deliram; fica definitivh-
mente abolida a barreira entre deuses
e homens.
Sic itur ad astra!
PROFESSOR DE ALEMÃO E
INGLÊS
Professor da alta sociedade
paulista ensina o alemão e o
inglês particularmente e em
pequenas turmas.
R. Conceição, 34 — 3.° andar —
apto., 5 — Fone: 4-7931
S. PAULO
ôinteée da TLécníca '■ píaníóiíca
Profra. Ondina F. BONORA DE OLIVEiRA
Especial para “RESENHA MUSICAL"
A técnica propriamente dita pode-
mos dividir em : Agilidade, Flexibili-
dade e Sonoridade.
Da agilidade: desde que a claví-
cula. o braço e o pulso estejam intei-
ramente livres da tensão dos mús-
culos, em completa liberdade e os de-
dos fortificados — o que se conse-
gue com os diferentes exercícios co-
mo sejam: notas simples, duplas,
terças, sextas, escalas, arpejos, exe-
cutados da maneira mais simples pos-
sível e depois gradativamente com
variações — , se obtendrá a agilidade,
isto é, destreza no tocar.
Porém, agilidade não significa só-
mente tocar com ligeireza ou melhor,
com velocidade. É indispensável aliar-
se à agilidade: flexibilidade, sonori-
dade e dinâmica.
Da flexibilidade — movimentos
brandos flexíveis, delicados e elegan-
tes. Quanto aos movimentos, a maior
simplicidade para maior beleza e arte.
É conveniente evitar as quédas brus-
cas ou pesadas das mãos. Os movi-
mentos suaves muito importam nu-
ma execução porque fazem parte da
maneira de bem tocar. Os dedos tam-
bém devem estar aptos para com agi-
lidade e flexibilidade ferir as teclas
denotando sempre firmeza, precisão,
sem forçar o seu jogo normal quan-
to a posição. Deve-se apoiar as notas
com o auxílio do próprio dedo, sem
recorrer ao braço afim de não alte-
rar a posição natural e o que é mais
importante ainda, a sonoridade que
ficaria seriamente prejudicada.
Da sonoridade, esta absolutamen-
te, não póde e nem deve ser confun-
dida com agilidade. O andamento de
um trecho musical, salvo indicação do
autor, não deve ser alterado em fa-
vor da sonoridade. Esta deve ser ex-
pontânea, em qualquer andamento.
Se a sonoridade fôr posta de lado, a
execução se tornará sem expressi-
vidade, e mesmo as pessoas leigas
notarão a lacuna. A sonoridade é ob-
tida pelo maior número de vibrações
da corda correspondente a nota apoia-
da, não esquecendo-se que unicamen-
te os dedos conseguem com seguran-
ça êsse objetivo quando ao seu jogo
estão aliados os movimentos lógicos
dos braços e dos pulsos. A sonorida-
de béla, subtil ou ampla, é resultado
de um desenvolvimento táctil sensí-
vel em relação diréta a sensibilidade
física do executante.
A agilidade, flexibilidade, sonori-
dade e dinâmica fazem parte inte-
grante da bôa execução.
A pessoa que tóca deve sentir para
poder externar os sentimentos, se-
jam êles tristes ou alegres.
Realçar, dar nuances á execução,
eis uma das qualidades essenciais
para um artista de valôr ou que se
desenvolve na carreira pianística num
crescendo constante.
Saber dar vida às notas, traduzir
com clareza, calma e expontaneidade
os múltiplos sentimentos do coração,
é qualidade nata e quando não, é uma
das maiores dificuldades que pódem
encontrar na Arte Musical um ar-
tista, mesmo possuidor de uma me-
cânica invejável.
MICROFONE
BABY STAUBER
unia vienense que conquistou
São Paulo
Uma pequena que conquistou o co-
ração bandeirante, na Rádio Cultura
— Alguns dados de sua vida — Ou-
vida e admirada pelo Duque de Wind-
sor e por Lady Mendle — Novidades
que trouxe para o nosso Rádio —
Filha de grande artista — O que
pensa das nossas coisas.
Palavras de Baby Stauber a “Re-
senha Musical” — Reportagem de
Genésio Pereira Filho.
Ha 4 ou 5 mêses, que a Ránio Cul-
tura, emissora PRE-4, desta Capital,
vem apresentando ao seu microfone,
uma artista menina-e-moça, que con-
quistou o coração bandeirante.
Ela é vienense, nasceu nessa Áus-
tria cortada pelo calmo e azul Danú-
bio, é filha desse país que nos brin-
da com tão lindas e sublimes valsas.,
a música qoe recebeu mesmo o nome
da terra de sua origem. Música que,
outróra, imperou nos salões, nas dan-
sas elegantes da vida de côrte, ou em
toda festa nobre. Que reinou no tem
po em que o “frou-frou” punha ares
bonitos nas pequenas casadouras e
em que se dansava afastado, em que
o contáto dos corpos era substituído
pelos rodopios de gaze, deixando to-
dos felizes e, envoltos em atmosfera
de sonhos . . .
Foi dessa Áustria que veiu a me-
nina-e-moça que ora encanta S. Paulo.
Foi de lá que nos veiu Baby átau-
ber, uma moreninha de sorriso fa-
RESENHA MUSICAI.
Pág. 29
cil e bonito, de ritmo estranho no seu
corpo elegante.
‘Microfone” quiz ouvi-la para seus
leitores. E, foi na própria Rário Cul-
tura. numa tarde de outubro es-
tranhamente frio, que fomos pro-
curá-la. Estava em ensáio, com seu
pai, que é quem a acompanha em
harmônica.
E lhe perguntamos: — Onde come-
çou seus estudos e onde suas primei-
ras apresentações?
— Iniciei meus estudos em Viena,
minha terra natal. Aí, na Embaixada
Brasileira, cantei e consegui sucesso.
Depois, em Paris, no Castelo de Ver-
sailhes. cantei para o Duque de
Windsor e para Lady Mendle, que
muito me apreciaram. Iniciei-me aos
sete anos e, em Paris, meu pai era
chefe de orquestra e o foi por muitos
anos. É muito conhecido aí.
E, de fato, Rodolfo Stauber tem
agradado muito nesta capital. Tem
parte importante no êxito que sua
filha consegue.
— Sua mãe?
— Ah ! Chama-se Joana. Joana
Stauber. E, ainda sobre meu pai:
no navio em que viemos, um repór-
ter gostou muito do seu desempenho.
Baby, que é pol’glota, pois fala o
alemão, inglês, francês e checoslová-
quio, é assim. Procura desviar o as-
sunto para os seus, não desejando
ser o centro da conversa. Entretanto,
forçámo-la : — Vieram . . .
— ... Diretamente para o Brasil.
Chegados a Santos, rumamos lógo
para São Paulo. Aqui estamos ha
mais ou menos 4 meses.
— A permanência aqui será por
muito tempo?
A pequena passa as mãos pelos ca-
belos negros, onde uma pequena me-
cha aloirada se sobresai (lembrando
o loiro materno) e nos responde:
— Estamos muito satisfeitos com
a Rádio Cultura. De modo que, a nos-
sa permanência em São Paulo é por
tempo indefinido. Tenho tido contáto
com muitos artistas. Apresento dois
programas, um às terças-feiras, “Re-
vista Relâmpago”, e outro aos sá-
bados, “Gongo Mágico”. Ambos são
novidades para o Brasil.
— Sua impressão sobre o nosso
ambiente artístico?
— Ainda não poude aquilatar bem,
pois aqui estou ha pouco tempo. Po-
rém, já posso afirmar que é formi-
dável.
— Nossa música?
— Impressiona-me. Acho o seu rit-
mo notável, vibrante. Por exemplo:
o samba.
Foram essas as palavras que tro-
camos com a pequena austríaca. Ela
continua na Rádio Cultura, cativando
cada vez mais a simpatia do nosso
público.
o
ENTREVISTAS AO MICROFONE
RESENHA MUSICAL vem de
inaugurar em S. Paulo, interessante
sistema de entrevistas com os ele-
mentos do rádio paulistano, feitas
diretamente ao microfone.
As perguntas são feitas no mo-
mento, sôbre a vida e gostos do ar-
tista entrevistado, e, fdas propria3
respostas são tiradas outras pergun-
tas.
Dando início à série de entrevis-
tas que pretende realizar, “RESE-
NHA MUSICAL” realizou a primei-
ra, estando todas a cargo do seu
redator radiofônico, sr. Genésio Pe-
reira Filho, nosso brilhante colabo-
rador.
Pág. 30
RESENHA MUSICAI
Nhô Totico
A primeira foi realizada com geral
agrado, no dia 21 de Outubro, às 9
horas (da manhã), pelo microfone da
Rádio Tupi de S. Paulo, (PRG.-2),
com o diretor do programa sertane-
jo, diariamente apresentado àquela
hora, sr. Ochelsis Laureano.
A VOZ DO BRASIL
A Rádio Nacional anuncia a cons-
trução de uma grande emissora de
ondas curtas; potência: 50 kw. ; 11
antenas direcionais, sendo para a
Europa, África, América do Norte e
América do Sul. Os planos já se
encontram em poder do ministro da
Viação; essa emissora, que será po-
deroso fator de nossa propaganda,
apresentará, em suas irradiações, mú-
sica e arte em geral, propaganda do
nosso sólo, dissertações sôbre nos-
sas datas e acontecimentos de relevo,
tanto na nossa história política e
militai’.
* O programa sertanejo da Tupi,
desta capital, conta, agora, com estes
elementos: Laureano, Mariano, Joa-
nico e Arnaldo Meireles.
* A Rádio Educadora Paulista, após
paralizar suas irradiações, para re-
forma, agora se apresenta na fre-
quência de 890 quilociclos.
* A PST-3, diariamente das 21 às
22 horas, em ondas curtas e na fre-
quência de 7.340 quilociclos, está ir-
radiando diretamente do Pavilhão da
Feira Nacional de Industrias, divul-
gando serviço oficial e música sele-
cionada. A PST-3 é emissora da rêde
da Superintendência do Ensino Pro-
fissional. .Às 2.“ feiras não ha irra-
diação.
* Novamente esteve, na PRG-2,
Pedro Vargas, o conhecido intérprete
da música hispano-americana.
* Irmãs Rosetti, segundo noticia a
imprensa de Jaboticabal, são dois
ótimos elementos da PRG-4, daquela
cidade, numa dupla caipira.
* José Carlos Lisboa, orienta o rá-
dio-teatro de estudantes, na Rádio
Inconfidência, de Belo Horizonte. Têm
apresentado peças de Wilde, Piran-
dello, Ibsen, Dannuzio, 0’Neill, Co-
RESENHA MUSICAI
Pág. 31
ward, Somerset Maughan e autores
nacionais.
* Um dos maiores acontecimentos
radiofônicos, na Paulicéia, ultima-
mente, foi a visita de Hugo dei Car-
ril, o companheiro de Libertad La-
marque em “Madreselva”.
* Nhô Totico fez uma temoprada
no Rio, com grande sucesso. Após es-
sa sua estreia no Rio, regressou à
Cultura, onde continua apresentando
“Vila da Arrelia” e “Escola de D.
Olinda”, programas, que prosseguem
atraindo grande assistência ao Pa-
lácio do Rádio.
* A Rádio São Paulo inaugurou,
tm 11 de outubro, o “Programa do
Automobilista”.
* Fala-se, em Avaré, na organiza-
ção de uma estação rádio-emissora.
* A Rádio Bandeirante, PRH-9,
apresenta diariamente, às 8,30 horas,
o “Programa de Eugenia”, sob a di-
reção do dr. Castro Carvalho.
* A Rádio Cruzeiro do Sul apre-
sentou, no dia 13 de outubro, um pro-
grama em homenagem a Maruja
Águiar de Mariani, poetiza uruguaia
ha pouco falecida. Tomaram parte a
srta. Fani Luiza Dupré e o prof.
Shanchez Sáes. Essa homenagem foi
no “Programa do Livro”, que Cid
Franco dirige.
* Del Rio é uma das atrações da
Rádio Cultura. É interprete de mú-
sica hispano-americana.
* O auditório da Rádio Cultura fi-
ca diariamente lotado. Apezar de ser
o maior auditório de São Paulo, veio
provar que o povo paulistano gosta
do rádio, quando ha bons programas,
pois tal auditório ainda é acanhado
para a assistência que, todos os dias,
procura o Palácio do Rádio.
* A legislação sôbre Rádio, em nos-
.so paiís, passa por completa revisão,
num exame feito por uma comissão
Rosina de Remini
de representantes do D.I.P., Minis-
tério da Viação e representantes das
emissoras. A mesma comissão deverá
apresentar, em conclusão, o ante-pro-
jéto de um Código Brasileiro de Rá-
dio-Difusão. Da entrevista que o sr.
Paulo de Carvalho, presidente .ia Rá-
dio Recorde, concedeu à “Folha da
Noite”, local, em 15 de outubro, des-
tacamos: “Efetivamente - disse-nos
de inicio s.s. — acaba de ser orga-
nizada essa comissão, da qual somos
um dos membros. Não era mesmo de
se estranhar que o governo federal
tomasse uma medida nesse sentido,
visando unificar as leis que regem
a radiofonia no Brasil. Nada menos
que quatro decretos e cerca de oito
portarias regulam a matéria. São
os decretos ns. 20.047, de 26 de mar-
Pag. 32
RESENHA MUSICAL
ço de 1931; 21.111, de 1 de março
de 1932; 24.655, de 11 de junho de
1934; 24.771, de 14 de julho do mes-
mo ano e ainda o decreto-lei n. 1 .949,
de 30 de dezembro de 1939, que re-
gulou as atividades da imprensa e
propaganda, discriminando as fun-
ções do Departamento Nacional de
Laureano
Imprensa, em relação a esta, ao ci-
nema, ao teatro e à radiotelefonia.
Além disso, pesam na balança, co
mo dissemos, — continuou s.s. —
inúmeras portarias da Comissão Téc-
nica de Rádio. Um ponto digno de
ser ressaltado também é que, pela
primeira vez no Brasil, o governo pro-
cura ouvir um representante das es-
tações de rádio, a respeito da legis-
lação que as rege. ’ E mais adiante:
“ — Ha, por exemplo, o caso dos lo-
cutores estrangeiros. Segundo pare-
ce, para o próximo ano apenas será
concedida permissão a quatro esta-
ções brasileiras pata organizarem
programas em língua extrangeira.
com locutores extrangeiros. Até ago-
ra a nossa legislação não cogitara do
assunto.”
* Rosina de Remini regressou a es-
ta Capital, duma vitoriosa excursão
ao norte e à Argentina.
* O Brasil, em estações emissoras
vence numericamente Alemanha, In-
glaterra, França índia e Argentina.
Com 72 emissoras, no continente so-
mos os primeiros. 34 emissoras es-
tão localizadas no Estado de São
Paulo, 1 em Mato Grosso e outra em
Goiás. E, do Espírito Santo para o
Norte, existem 8.
* Heloisa Helena declarou que “o
cigarro é para mim, um ótimo re-
constituinte cerebral”.
* Pablo Zarre, cronista colombiano,
escreveu que Pedro Vargas é “o can-
tor feio que, cantando, encanta as
mulheres e as faz sonhar lindos so-
nhos de amor”.
* Em nossa última secção, nas le-
gendas da página ilustrada de “Mi-
crofone”, por um lapso de revisão,
em vez de “Vicente Celestino”, saiu
“Celestino Paraventi”. Aí fica a re-
tificação.
. . . Nos Estados Unidos, vendeu-
se, no ano findo, mais de 10 milhões
de rádios. Para o presente ancv cal-
cula-se a venda em 11 milhões.
A voz do mundo
A Teatrolândia da BBC, de Lon-
dres, vem apresentando as melhores
produções teatrais do West End. As-
sim, já foi apresentado Up and doing.
Fique sabendo que. . .
* '
#
RESENHA MUSICAL
Pág. 33
sucesso de Saville Theatre ; bem como
Thunder Rock, êxito também, mas co-
mo obra séria.
*** A mesma emissora londrina
apresenta, semanalmente, o progra-
ma “Querida Mamãe”. Os soldados
britânicos lêm ao microfone da BBC
a carta que enviarão à sua mãe. Esse
programa nasceu da leitura de uma
carta de um soldado a seu mano. O
sucesso fez com que fosse creado um
programa especial.
*** Todos sabem que os sinos, nas
guerras, são usados para fins mili-
tares. Velhos bronzes de tradicionais
templos são usados para a defesa da
nação. Assim, os intervalos inter-pro-
gramas eram marcados, pela BBC,
com os sinos da igreja de St. Mary-le
Bow em Holborn.
Agora, esses intervalos são assina-
lados com as notas si, si, dó, repre-
sentadas, na nomenclatura inglesa da
música, pela BBC ; antes disso, ado-
tara-se o “tic-tac” de um relógio, a
que jocosamente, os ouvintes, haviam
chamado de “os passos do fantasma
com tamancos”.
*** O serviço de onda curta da BBC,
para a América Latina, é dirigido
nas frequências .seguintes: norte do
Amazonas: — 9,51 meg. (31,55 m.)
GSB; sul do Amazonas: — 9,51 meg.
(31,55 m.) GSB; 11,86 meg. (25,29
m.) GSE; 15,14 meg. (19,82 m.) GSF.
GSF emite até 23 hs.; GSE até às
23 hs.; e GSB até às 23,30 hs. (Hora
do Brasil).
RECEBEMOS E AGRADECEMOS
“Boletim em Português”, da BBC,
de Londres, números 126 e 127.
(Convites, consultas ou qualquer
comunicação para esta secção, em
em nome do cronista, devem ser diri-
gidas a RESENHA MUSICAL, —
Rua Cons. Crispiniano, 79, 8.° and.).
Genésio Pereira Filho
RESENHA MUSICAL
Apreciada pelo mais importante diário de
informações comerciais de São Paulo, “Comer-
cio e Industria” — , em sua edição de 5-11-940,
publicou sobre a nossa revista, um brilhante
editorial, assinado pelo seu ilustre Redator-
chefe, sr. Moacyr de Barros Mello.
“RESENHA MUSICAL”
Quando verificamos que, na im-
prensa especializada, uma publica-
ção, pelo esforço de seu diretor e
acolhida de seus leitores, consegue
triunfar, ficamos sobremaneira sa-
tisfeitos. Satisfeitos, sim, porque te-
mos visto dezenas de pessoas, tam-
bém bem intencionadas, que se sa-
Pág. 34
RESENHA MUSICAI
crificaram para obter leitores para
sua publicação, e, às vezes, não ob-
têm o resultado merecido: perden-
do a coragem, ou porque não dispõem
de recursos, abandonam o trabalho,
quasi sempre com alguma mágua, de-
cepcionados.
E é por isso que, como dissemos de
início, quando nas lides jornalísticas,
vemos o triunfo de uma revista, já
sabemos dos sacrifícios por que pas-
saram os seus fundadores ou o seu
diretor.
Ainda, agora, recebemos um exem-
plar da magnífica publicação “RE-
SENHA MUSICAL”, editada e diri-
gida pelo Prof. Clovis de Oliveira, in-
telectual bastante apreciado em nos-
sa terra.
O número, em apreço, se refere às
festividades havidas na redação da
revista, por ocasião do seu II aniver-
sário, quando se inauguraram, tam-
bém, as suas novas instalações e o
retrato do Dr. Getulio Vargas, DD.
Presidente da República.
Trata-se de uma publicação estri-
tamente dedicada à música, à arte
e à literatura.
Está consagrada em todo o Brasil,
como sendo uma revista indispensá-
vel a todos quantos se dedicam à arte
de Mozart, Bach, Beethoven, Chopin,
etc.
“RESENHA MUSICAL”, como
bem frisou o Professor Clovis de Oli-
veira, seu diretor, “pequena que era,
se avoluma, cresce, agiganta-se sob
o incremento e influxo de um ideal
que não lhe é fictício, porque origi
na-se dele, viverá dentro dele e o
defenderá sempre, difundindo-o tan-
to quanto possível : Nacionalizar, ins-
truir e educar, pela música e pelo
idioma do Brasil.
Quem esse ideal abraça, persis-
tente e dedicadamente, não pode fa-
lhar, ao contrário, vence, como ven-
ceu o nosso confrade Clovis de Oli-
veira.
Conta, ainda, “RESENHA MUSI-
CAL”, com quadro de colaboradores
dos mais brilhantes em nossa terra.
O número que temos em mãos e
que se refere aos meses de Julho a
Setembro deste ano, além de ótima
colaboração e noticiário, insere, em
sua capa de frente, o retrato do in-
signe e pranteado campineiro, o gran-
de maestro CARLOS GOMES, que o
mundo inteiro conhece e consagra.
Ao Professor Clovis de Oliveira,
pois, os nossos efusivos abraços, por
tão brilhante vitoria, que vem alcan-
çando e votos por que continue a es-
palhar pelo Brasil afóra, através as
páginas de “RESENHA MUSICAL”,
os bons ensinamentos e a incentivar
os artistas brasileiros a trabalharem
para dar ao Brasil o fruto do seu
labor e ao mundo a prova do que so-
mos, na arte musical.
Moacyr de Barros Mello”
Leia e assine
RESENHA MUSICAL
A Revista Musical de Maior
I
, Circulação no país e no
exterior
Do Folclore Colombiano
As Festas de São João
Prof. Emirlo de Lima
Bai’ranquilla, Colombia) ,
especial para “Resenha
Musical” — Tradução de
Genésio Pereira Filho
Em outra crônica, referimo-nos ao
inveterado costume que têm quasi
todos os povos de nossa América Es-
panhola. de eleger, por especial pro-
tetor, a algum santo titular da Igre-
ja.
Os moradores do Bairro Sur, desta
capital, têm a São Roque não só-
mente como muito milagroso e com-
placente, senão como um patrono,
cuja proteção recebe a cidade, desde
sua remota fundação.
E. claro está, quando se aproxima
16 de agosto, dia deste Santo, au-
reolado de bondades e de ações ex-
traordinárias, toda a cidade se move
ao conjuro das vozes da tradição e
dos écos das recordações; e as con-
ciências religiosas e populares se des-
pertam, adejadas por doces rememo-
rações do passado.
As buliçosas festas roquenhas se
verificam ao largo da ampla ruh,
onde se acha localizada a suntuosa
Igreja de São Roque, administrada
por Sacerdotes pertencentes à Or-
dem Salesiana. O programa destes
festejos se elabora com antecipação
e na confecção do mesmo, intervêm
respeitáveis senhores do comércio e
de atividades industriais e sociais,
aconselhados por elementos popula-
res, chefes de grupos obreiros, conhe-
cedores do bairro e das possibilidades
folclóricas dos habitantes que mo-
ram neste setor. A primeira cousa
que se combina, na divisão ordenada
do programa, é a parte encomendada
à cúria: missas solenes, novenas,
procissões, comunhões especiais, pa-
negíricos a cargo de notáveis ora-
dores, etc.
Logo, segue a distribuição das ten-
das e estalagens improvisadas ao
largo de toda a rua da mencionada
igreja. Bazares, vendas de comestí-
veis e resfrescos, pequenas ferrarias,
minúsculas tendas repletas de telas
vistosas, sapatos, chapéus e outros
objetos de vestir, restaurantes tro-
picais, cantinas creadas à última ho-
ra, mesas de jogo, etc., tudo isto
se aperta em fileiras intermináveis.
E, em frente a estes estabelecimen-
tos de vida efêmera, se estabelece
uma numerosas quantidade de agou-
reiros, oradores populares, parolei-
ros, pregoeiros, adivinhadores da sor-
Pág. 36
RESENHA MUSICAL
te, narradores de historietas e ane-
dotas e gente desejosa de seduzir os
incautos, com suas narrações arre-
piantes, com o fim de conseguir uns
centavos, para continuar a festa.
Como número terceiro dos festejos,
figura o seguinte: no final da Rua,
se erige um enorme aparato, feito de
madeira ordinária, sôbre o qual apa-
rece a Imagem de São Roque. Este
aparato, chamado pelos habitantes
da cidade “Castilho”, destinado a ser
consumido pelo fogo, forra-se antes
com foguetes, luzes de bengala e ou-
tros cartuchos cheios de pólvora, obra
dos senhores Altamiranda, mestres
da pirotécnica local. Na noite da quei-
ma, acodem a presenciar o luminoso
espetáculo, milhares de espectadores
ansiosos de emoções fortes. Fazem
sua aparição, duas ou três bandas,
que executam marchas ardorosas e
em meio de um entusiasmo e de uma
algaravia que raiam ao indizível, >
encarregado de colocar fogo à mecha
principal do castillo. cumpre sua mis-
são. Os moços cantam de gosto, as
donzelas lançam olhares e sorrisos
de satisfação e os velhos suspiram,
ao rememorar os tempos já idos, ern
que iam com a companheira tomar
parte nestas zambras “roquenhas”.
A quarta parte do programa se re-
fere à apresentação da tauromaquia
local, durante oito dias consecutivos.
Esta semana, consagrada à arte de
lidar os touros, é indispensável aqui,
porque a afeição a este espetáculo es-
tá muito arraigado no temperamen-
to dos filhos desta costa. As corridas
se efetuam das 4 às 6 da tarde, na
Rua da Igreja e os moradores se vêm
obrigados, para defender suas casas
das acometidas dos touros e dos atro-
pelos dos espectadores, a construir
sendos estacadas, frente às suas re-
sidências. Durante estas lidas tau-
rinas, sóe haver contundidos e feri-
dos; mas, também a meúdo, o gran-
de público que assiste a estas tardes,
sóe contemplar assombrosas evolu-
ções por parte dos improvisados lou
reiros locais.
A parte quinta das festas roque-
nhas, interessa diretamente ao fol-
clorista. E é a contribuição especial
que prestam a estes festejos os nu-
merosos trovadores, copleiros e mú-
sicos ambulantes, instrumentistas
boêmios que perambulam noites in-
teiras no bairro, com guitarra ou o
tiple nas mãos e seguidos de seus ad-
miradores, improvisando versos e me-
lodias, alguns dos quais resultam
verdadeiramente felizes. Lastime-se
que a maioria destas improvisações,
as leve o vento. Por acaso, de tarde
em tarde, algum viadante, observa-
dor perspicaz ou admh*ador destas
manifestações vernáculas, faz uso de
seu lapis, para tomar ligeiros apon-
tamentos.
É bem sabido que, em toda nossa
América Espanhola, dois dos princi-
pais elementos, que hão de figurar
sempre nestes festejos populares, são
as abundantes comidas e bebidas,
confecionadas saborosamente por
competentes mestres da arte culiná-
ria local.
Cada região, comarca, setor, etc,
tem suas bebidas e pratos prediletos.
Apresentamos, em ordem, o menú
corrente dos restaurantes típicos, que
funcionam na Rua São Roque, duran-
te a semana de festejos:
Pasteis
Butifarra (1)
Pão recheiado
Pescado em Escabeche
Saladas
1) — Nota do tradutor: “espécie de chouriço ou linguiça; pão dentro do
qual se mete presunto e salada”.
RESENHA MUSICAL Pag. 37
Perú recheiado
Galinha recheiada
Fritos de arepas
Carabanuelas (2)
Filhós.
Tudo isto, está claro, acompanhado
de mazato, garapa gelada, chicha de
arroz, essência de can.ela, cerveja,
rum branco, rum velho, vinho, ani-
sado e uma grande quantidade de re-
frescos, feitos com diversas essên-
cias.
O PAU DE SEBO
Como acontece em certas povoa-
ções da França, o povo costeiro da
Colombia gosta muito desta diversão.
A vara de prêmios, entre nós, a
forma uma vara muito alta e redon-
da, untada de sebo, em cujo extre-
mo se colocam guloseimas, vidrinhos
de perfume e agua florida, bolsinhas
com dinheiro, garafas de cerveja e
outras coisas, para que os alcancem,
trepando por êles, os afeiçoados a
este esporte, que, no geral, são mo-
ços hábeis nestas manobras. Com o
objetivo de alcançar os prêmios, sem
tantas dificuldades, costumam os ra-
pazes encher os bolsos de areia fina
e, durante a ascenção enchem as
mãos desta terra, e, assim, segundo
êles, agarram melhor e escorregam
menos. No geral os primeiros que
trepam pelo pau não chegam ao ex-
tremo. A enorme quantidade de se-
bo que é posta impedem a ascenção.
Mas os últimos em trepar alcançam
sua presa com relativa facilidade e
não menos emoção. Tudo isto se faz
também com música e entre furiosas
aclamações e constantes alaridos por
parte da grande massa assistente des-
te desporto.
OUTROS ESPETÁCULOS
EMOCIONANTES
Em outro sítio estratégico da rua,
colocam-se vários barris, cheios de
aparas de madeira. Depois de empa-
par devidamente este material infla-
mante de uma grande quantidade de
petróleo, a um sinal combinado, os
encarregados de fazê-lo põem fogo
ao conteúdo dos barris. Consequência
desta operação, são as enormes cha-
mas que se formam em seguida. E,
agora começa o verdadeiro espetá-
culo forte. Os saltadores, já alinha-
dos convenientemente, do outro lado,
umas vezes com fortuna, outras em
estado bastante deplorável. Depois
do espetáculo, comenta o público
quantos feridos e quantos queima-
dos houve e quais dos concorrentes
foram os mais valorosos. Os triunfa-
dores são convidados a libar abun-
dantes copos e os espectadores os
aplaudem freneticamente.
OS BAILES PÚBLICOS
Esta parte do programa dos fes-
tejos é também importantíssima.
É curioso verificar como trata sem-
pre o povo desta costa atlântica, de
estabelecer distintas classes sociais
entre êles. É este um costume que
vem de tempos pretéritos. Todos os
velhos costeiros recordam, por exem-
plo, que faz uns lustros, durante as
festas do Carnaval, enquanto uma
parte dos empregados de navegação
e dos artesanos de bôa educação, se
.(ivertia e msalões arranjados espe-
cialmente para ela, a outra classe
obreira, menos considerada social-
mente, não tinha abcesso a estes sa-
lões. E, para o povo de baixa esfera,
que era a última classe, construia-se
2) — Nota do autor: croqueta de yuca ou batata recheiada e carne ou
pescado.
Pág. 38
RESENHA MUSICAL
por um contratante (o qual, para to-
dos os gastos deste salão fazia uma
coleta no comércio) um Salão Públi-
co, situado na Rua de São Roque.
Pois bem, durante as Festas a que
fazemos hoje menção, ao tempo em
que muitos elementos populares or-
ganizam bailes e tertúlias em suas
casas, é indispensável também a
construção e o conseguinte ajuste da
um Grande Salão Público, onde en-
contram os pares populares, amplo
campo para suas evoluções coreográ-
ficas ... E, a uma distância de vá-
rias quadras, se coloca também a
Dansa da Cumbiamba, à qual os ele-
mentos de menor categoria social as-
sistem. Baile enervante, de ritmos
africanos e melodias turbadoras, i
Cumbiamba se prolonga até o ama-
nhecer, entre demonstrações de ale-
gria, gritos desafinados, incessante
golpe do tambor e dos movimentos
violentos e espasmódicos.
o
Com vossa permissão, amáveis lei-
tores, trazemos, agora, outros écos
de uma noite roquenha, captados
frente a um grupo mosqueado de
espectadores.
A hora é radiante de júbilo e de in-
quietudes.
Brotam do conglomerado vozes so-
noras e alegres. Acercam-se os hu-
mildes trovadores, rapazes sadios do
bairro, os quais, nesta hora enervan-
te e apaixonada, vêm disparar as
suas frechadas e galanteios, ou a con-
tar-nos suas aflições e angústias.
Revoltosas e expansivas, desfilam
ante as retinas dos assistentes à fes-
ta, as filhas do povo, enfeitadas de
suas melhores galas. São objetos de
estribilhos sazonados com pimenta,
por parte de um poeta desconhecido,
que se acha próximo de nós. Ameu-
dam os brindes e as bebidas. O am-
biente se abraza mais e mais. Aper-
tam-se os pares. As bandas executam
músicas violentas. O tambor retumba
incessantemente. Da face dos espec-
tadores, correm grossos fios de suor.
Ouvem-se, então, não muito distan-
tes, os estalidos dos fogos de artifí-
cio e os écos das vozes dos pregoei-
ros, que não cessam de proclamar a
excelência dos produtos que ofere-
cem à venda.
Repentinamente, aparece em um
alpendre um moço de bairro, que sa-
be tocar a guitarra com regular des-
treza e, possuído de grande fecundia.
começa a improvisar com graça. Os
assistentes disputam o palmo do ter-
reno. rodeam o cantor e o aplaudem
frenéticamente. Uma morena, com
ademan comunicativo, lhe pede que
cante novamente.
NosBo homem lança um sorriso
triunfal e, com um ar muito gitano.
começa a trovar de novo:
“Cuando quise no quisistes
Eram mis penas tus glorias
Y hoy que vós queréis
Otra reina em mi memória.”
E prosegue, entusiasmado:
“No canto porque me oigan
Ni porque mi gracia es buena
Canto por divertirme
Y darle alivio a mis penas.”
“Los ojos de mi chinita
Son ojos negros y azules
Se parecen a los cielos
Cuando se ocultan las nubes.”
Agora, olhando a uma camponêsa,
de negros olhos e oferecendo-lhe seu
instrumento musical, lhe diz:
“Quieres afinar la guitarra
Con el más dulce son
Con un son tan dulce
Como tu corazón.”
RESENHA MUSICAI
Pág. 39
Nêsse interim, um espectador lhe
pede uma copla, a mais sentida, mais
expressiva. Ele não tarda um instan-
te em oferecer esta copla:
“En la balanza de amor
Me puse a pesar firmeza
— Qué importa que el fiel sea
[bueno
Si la falia está en la pesa?
o
Existem outros detalhes, que con-
tribuem ao bom êxito dos festejos.
Por exemplo: a música dos concur-
rentes aos desportos, os caprichos da
indumentária feminina durante os
bailes públicos, as novas composições
musicais que são estreiadas, a deco-
ração com que se engalana o Grande
Salão Público, os chistes e as histo-
rietas que contam os hazmereires (3)
dos folguedos ,a combinação das lu-
zes com que adornam a Igreja, a or-
ganisação do trânsito de veículos pela
rua onde se efetuam os números do
programa elaborado, a ordenação do
movimento desenfreado que agita
convulsivamente aquela multidão
que salta e grita, extende-se pela
ampla rua, cheia de ansiedades que
repercutem e se enlaçam de paixões.
3) — hazmereires (nota do tradutor): “bobos, tolos, alvos da rizoti*’.
Músicas novas
RESENHA MUSICAL recebeu:
HOMENAGEANDO A
SUPERIORA
J. Capocchi — 1940
Ed. Música Para Todos
— São Paulo —
Um hino muito bonito para ser
cantado pelas colegiais, à duas vozes
iguais A letra é de Ikopac. O Maes-
tro J. Capocchi é autor de outro hi-
nos escolares e religiosos. Homena-
geando a Superiora veiu aumentar
valiosamente a rica e numerosa cole-
ção de suas obras.
Seis SONATINAS —
CLEMENTI —
Rev. Souza Lima —
Edição I. M. C.
n. 3.0Ò7 — São Paulo
As SONATINAS de Clementi são
como que um medicamento indispen-
sável a todos iniciantes nos estudos
pianístico e que atingem, vamos assim
dizer, o l.“ gráu de seu adiantamen-
to. Sôbre o valôr das mesmas, nada
mais teremos a acrecentar às tan-
tas apreciações feitas durante mais
de cem anos à preciosa obra de Cle-
menti. Apenas temos a salientar nes-
ta nova edição da Impressora Mo-
derna, de São Paulo, a excelência da
moderna e minuciosa revisão feita
pelo notável virtuose brasileiro
Souza Lima. Podemos afirmar, sem
receios de errar, que esta é a me-
lhor edição nacional das SEIS SO-
NATINAS DE CLEMENTI.
Xisto BARRETO
(Todas as obras para
esta secção, devem ser en-
dereçadas para Xisto Bar-
reto, Resenha Musical —
Rua Cons. Crispiniano, 79
— 8.° and. São Paulo).
A Maizena Brasil S/A
CAIXA POSTAL 2972 SÃO PAULO
Peço enviar-me, GRÁTIS, um Livro de Receitas com Maizena Duryea
Nome
Rua
Cidade
Estado
VARIAS...
MUSICA POPULAR BRASILEIRA
, Como adendo a linda conferência
que publicamos no presente número
sôbre MUSICA POPULAR BRASI-
LEIRA, pronunciada pelo ilustre
membro da Academia Paulista de
Letras e da Escola de Belas Artes
e nosso brilhante colaborador, dr.
Ulysses Paranhos, transcrevemos o
excelente programa que a ilustrou:
1) Marcha (abertura), pela Orques-
tra da A.E. A.S., sob a direção
do Maestro Elias Machado;
2) Discurso, dr. João Castellar Pa-
din;
3) 1.* Parte da Conferência, Dr.
Ulysses Paranhos;
4) Ilustrações musicais ao violão
por um grupo de alunas da pro-
fessora Julieta Corrêa Antunes:
Igualdade ilusória — João Car-
neiro ;
Borboleta do Natal — autor igno-
rado;
Um fado — autor ignorado;
Tayêras — autor ignorado;
Batuque — Jamil Andraus;
Gondoleiro do amor — autor ig-
norado ;
Chôro — autor ignorado;
J. Carvalho — Tarde dourada;
5) Intermezzo — pela Orquestra;
6) 2.® Parte da Conferência, —
Dr. Ulysses Paranhos;
7) Canto pela sra. d. Carmen Dulce
Marcondes Machado:
J. B. Julião — O coração é um
colibri ;
M. Tupynambá — Canção da gui-
tarra ;
H. Tavares — Casa de caboclo;
H. Tavares — Maria Rosa;
M. Tupynambá — Versos escritos
na areia;
J. Carvalho — Tarde dourada;
8) Sólos de piano pelo sr. Odmar
Amaral Gurgel (Gaó) :
E. Nazaret — Expansiva; Cario-
ca; Amaeno resedá; Bregeiro; De-
sengonçado; Confidências; Atrevido;
Travesso; Apanhei-te cavaquinho;
9) Canto pela sra. d. Celina Sam-
paio (da Escola Vera Janaco-
pulos) :
M. Andrade — Róseas flores de-
vorada ;
F. Mignone — Improviso;
Felix Otero — A flôr e a fonte;
F. Braga — Engenho Novo.
Os acompanhamentos ao piano fo-
ram feitos pela srta. Haydée Mene-
zes.
DOM JOÃO BATISTA SCALABRINI
RESENHA MUSICAL foi distin-
guida com honroso convite para as-
sistir a solene comemoração do Cen-
tenário de nascimento do grande
Bispo de Placência (Italia) e fun-
dador da Pia Sociedade dos Missio-
nários de S. Carlos, Dom João Ba-
Pág. 42
RESENHA MUSICAL
tista Scalabrini, que realizou-se em
2 de Outubro, às 20,30 horas, no sa-
lão do Círculo Iitaliano.
Do ótimo programa constaram nú-
meros musicais a cargo das srtas.
Henriqueta Peracchi, Lina dei Vec-
chio, Margarida Nagy e Norma Cai-
xe e srs. Armando Zóboli e Vasco
Bianucci.
O sr dr. Attilio Venturi fez por
ocasião uma conferência sôbre a per-
sonalidade e a obra de D. João Ba-
tista Scalabrini.
Numa das partes do programa três
orfãzinhas do Orfanato Cristovão
Colembo recitaram lindas poesias.
Maestro Armando Lameira
Deu-nos a honra de sua visita em
30 de outubro, o Maestro Armando
Lameira que se fez acompanhar pelo
nosso prezado amigo e brilhante co-
laborador, prof. dr. Artur de Macedo.
Durante estes últimos meses visi-
tou com êxito todas as cidades do
norte e nordeste do país, realizando
antes de vir a S. Paulo, dois impor-
tantes concertos no Rio de Janeiro.
O ex-aluno de Carlos Gomes, que
frequentou o Conservatório de Be-
lém, no tempo do saudoso e imortal
compositor campineiro, completou
seus estudos em Milão, com De Ao-
gelis e Galli.
Melodia
Genésio PEREIRA FILHO
(De “Cantos do Infi-
nito ”, em preparo)
Minha alma tinha vibrações de um
estradivárius . . .
Uma noite me disseste
Que amavas a música,
Que ela era a tua loucura
E na obseção dos ritmos te sublima-
[vas. . .
Contaste-me que a música
Aos céus te transportava
E que em ascése vivias
Quando uma serenata corria pelo
[éter
Ou quando uma valsa ouvias.
Disseste ainda que amavas o violino,
Que as vibrações de suas cordas
Te faziam sonhar,
Te faziam imersa em mundo subli-
[me. . .
Mas, o que não percebias
Era que meu sêr soluçava,
Pois se a música amavas,
Não sentias os acordes que minha
[alma
Para ti guardava,
Na vibração louca de um amor sem
[éco. . .
Não sondaste o violino
Que eu tinha no coração,
Não amaste as melodias de Cremona
Que eu trazia para ti.
Não percebeste que minha alma
Tinha vibrações de um estradivárius,
Que eram todas para ti
E que já em mim perecem sem éco. . .
Instituto Interamericano de
Musicologia
Realizou-se em 24 de Outubro, no
Salão da Associação Cristã de Mo-
ços, de Montevidéo, uma conferên-
cia do sr. dr. Ralph S. Boggs, cate-
drático de folclore da Universidade
de Carolina, Estados Unidos, que dis-
correu sôbre o têma: “O folclore nas
RESENHA MUSICAL
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Américas”. O ilustre conferencista
foi apresentado pelo sr. prof. Fran-
cisco Curt Lange, DD. Diretor do
Instituto Interamericano de Musico-
logia.
* Em 31 de Outubro, no Salão No-
bre da Universidade de Montevidéo,
promovido pelo Instituto Interameri-
cano de Musicologia, o sr. Prof. Jos-
sué Teófilo Wilkes, fez uma conferên-
cia sôbre o têma: “Investigações so-
bre a rítimica no Cancioneiro popu-
lar argentino”.
Audição de Alunos
Com o concurso de um grupo de
talentosos alunos, o sr. prof. Samuel
A. dos Santos, realizou em sua resi-
dência, em 26 de Outubro, uma audi-
ção escolar.
Tomaram parte no fino programa
organizado, que constou sómente de
números de piano, as srtas. Anezi»
Serrati, Angela Cipic, Alice Sabagg,
Joaninha F. Chiabotti, Nilce V. de
Oliveira e o jovem Roque Amaral
Gurgel Bueno Todos os números, sem
exeção, lograram agradar o auditório,
e os executores revelado grande pro-
gresso pianístico e musical.
RESENHA MUSICAL que se fez
representar, agradece o convite en-
viado e felicita o ilustre prof Samuel
A dos Santos, pelo sucesso de sua
1.* Audição de Alunos.
Conservatório Musical “Carlos
Gomes” de Campinas
Dentre os poucos estabelecimentos
de ensino artístico existentes no in-
terior do nosso Estado, acha-se na
vanguarda pelas suas realizações, o
modelar Conservatório Musical “Car-
los Gomes”, de Campinas, sob ins-
peção preliminar Estadual. O referi-
do estabelecimento de ensino artís-
tico, realiziu em 31 de Outubro, uma
brilhante audição infantil, na qual to-
maram parte inúmeros alunos dos
diversos cursos instrumentais do
Conservatório.
Vamos dar aqui o nome dos que fi-
guraram no lindo programa: Léa Zi-
giati, Mildrede Fernandes, Eunice
Nogueira, Dirce Paulo, ClariceA. de
Oliveira, Maria Stella Maia Grena-
dier, Paulo Porter, Zica Amaral, Ma-
ria H. Leme Franco Jorge, Edith Fer-
raz de Abreu, Teresinha de Vito, Ru-
bens do Amaral, Virgínia Nice Fer-
raz Vilaça, Dirce e Nidia Jacobucci,
Corrêa Rosa, Ivaní Corrêa, Pierina
Maria H. Fonseca Sampaio, Dirce
Tulio, Arací Tré, Arnaldo Peseiote,
Lizete Marcondes Machado.
Noivado
Recebemos a participação do noi-
vado da exímia pianista profra. Yole
dos Santos Rodrigues, ilustre profes-
sora do Curso Musical do Colégio
Kemper e nossa digna representante
em Lavras, Estado de Minas Gerais,
com o sr. Diogo Dias Paes Leme.
RESENHA MUSICAL agradecen-
do, deseja felicidades aos jovens noi-
vos.
E. di Cavalcanti
Com a presença de numeroso pú-
blico, realizou-se em 15 de Outubro,
a inauguração da primeira exposição
do ilustre pintor E. di Cavalcanti,
após o seu regresso da Europa.
Pág. 44
RESENHA MUSICAI
A fina mostra de arte que esteve
franqueada ao público pelo espaço de
quinze dias, conseguiu despertar a
atenção do meio artístico da Pauli-
céia, pelo valôr das télas expostas.
Frutuoso Viana
Depois de percorrer algumas cídii-
des do interior paulista, Campinas,
Pirajuí, Araçatuba e Marilia, seguia
para o sul do país o aplaudido pianis-
ta Frutuoso Viana que dará concer-
tos em Porto Alegre, Pelotas e Rio
Grande.
Igreja N. S. de Fátima
Em 24 de Novembro, sob a dire-
ção abalizada do prof. Frederico De
Chiara, será cantada uma Missa da
autoria do Maestro João Gomes de
Araújo, na Igreja N. S. de Fátima,
no Sumaré.
Prestará o seu concurso a êsse fes-
tival um côro de 250 vozes, que será
composto pelas alunas da Escola Nor-
mal “Caetano de Campos”.
AUDIÇÃO ORFEÓNICA
Como foi largamente noticiado pela
imprensa diaria desta Capital, reali-
zou-se em 25 de Outubro, às 16 ho-
ras, no Salão Nobre do “Circolo Ita-
liano”, uma audição orfeônico- in-
fantil, promovida pelo Departamen-
to de Educação, dedicada à impren-
sa e aos educadores.
O programa constituído de contos
educativos e que esteve a cargo do
Orfeon do Grupo Escolar “Eduardo
Prado”, sob a regência do Maestro
Fabiano Lozano, Chefe de Música e
Canto Coral, foi o seguinte:
1) Meu professor — F. Lozano;
2) Amigos — Folclórico;
3) Brincar e cantar — Folclórico;
4) A casinha branca — Folclórico;
5) Jagunço — Folclórico;
6) O bem-te-vi — F. Lozano;
7) Dádiva do coração — Folcló-
rico;
8) O filho do jangadeiro — F. Lo-
zano :
9) O pequenino vendedor de jor-
nais — L. Beethoven;
10) Pela Pátria - A. Carlos Gomes.
Sob a admiravel regência do prof.
Fabiano Lozano, os pequenos esco-
lares após a leitura dos contos infan-
tis que precederam os cantos e por
cujos assuntos se achavam ligados
entre si, cantaram de maneira segura
e encantadora as dez pequenas joias
que compuzeram o lindo programa.
RESENHA MUSICAL agradece o
honroso convite do sr. dr. Romano
Barreto, dd . Diretor do Departa-
mento de Educação, para assistir a
. eferida audição, à qual se fez re-
presentar.
RESENHA MUSICAI
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MAESTRO FABIANO LOZANO
visitou o Orfeon Infantil do
Grupo Escolar “João Vieira”
Visitou o Grupo Escolar “João
Vieira de Almeida”, desta Capital,
em fins de Outubro, o ilustre Chefe
de Música e Canto Coral do Depar-
tamento de Educação, prof. Fabiano
Lozano.
O fim principal de sua visita foi
ouvir uma demonstração do Orfeon
Infantil do referido Grupo Escolar,
que obedece a criteriosa e competente
direção da profra. Nair de Oliveira.
Foi executado um ótimo programa
musical, durante o qual foi oferecido
um fino ramalhetes de rosas ao digno
visitante.
A reunião agradou sobremaneira
ao ilustre visitante, que teve palavras
de entusiasmo pelo que lhe foi dado
ouvir. RESENHA MUSICAL, espe-
cialmente convidada fez-se represen-
tai'.
PUBLICAÇÕES RECEBIDAS
“Gazeta de Paraopeba” — jornil. —
Paraopeba, Minas Gerais;
“Revista Bridge” — n.° 7 — Setem-
bro - 1940 — S. Paulo;
“Cultura” — revista do Centro Nor-
mal de Cultura, n.° 2 — Setem-
bro de 1940 — Limeira;
“O Democrata” — jornal, Jabotica-
bal ;
“Belas Artes” — Agosto e Setem-
bro - 1940 — Ano VI — n.° 61-
62 — Rio de Janeiro;
“Comércio & Indústria” — boletim
diário de informações de São
Paulo — Diretores: José dos
Santos Júnior e Moacyr de Bar-
ros Mello;
“Ciências e Letras” — órgão da Aca-
demia de Ciências e Letras, de
São Paulo — Tomo VII - 1940
— Ano IV — Diretor: Dr. Ma-
nuel Viotti;
“Tribuna de Batatais” — jornal —
Batatais — São Paulo;
“Música Viva” — orgão do Grupo
Música Viva — Ano I - n.° 5 —
Outubro - 1940 — Rio de Ja-
neiro.
ANIVERSARIO DA INDEPEN-
DÊNCIA DE HONDURAS
Em regosijo pela passagem do ani-
versário da Independência da Repú-
blica de Honduras, 15 de Setembro,
o Cônsul de Honduras, sr. prof. Emir-
to de Lima ofereceu ao Governador
do Departamento do Atlântico e de-
mais autoridades civis e militares co-
lombianas, uma brilhante recepção
da qual transcrevemos o programa
musical :
Primeira parte
1 — Hino Nacional de Honduras,
Cantado pelo Côro do Colégio
Atlântico e violino por don Víc-
tor M. De Andreis.
2 — Hino Nacional da Colombia,
Cantado pelo mesmo Côro.
3 — Palavras do Cônsul de Hondu-
ras.
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RESENHA MUSICAI
Segunda parte
1 — Tu alma, Lied de Eduardo Sán-
chez de Fuentes (Cuba),
Interprete: Barítono Paco de la
Riera.
2 — Mirra, de Guillermo Bustillo
Reina (Honduras)
Valle de Lepaguare, de Froy-
lán Turcios (Honduras)
Ave Maria dei Mar, de Rafael
Heliodoro Valle (Honduras)
Intérprete : Senorita Carmen
Cajeli.
3 — Balada Mexicana, de Estanis-
lau Mejía (México)
Intérprete: Senorita Margarita
Olano.
4 — Marujita, de Maria Luisa Es-
cobar (Venezuela)
Intérpretes: Coro dei Colégio
dei Atlântico
Solista: Srta. Flor Tovar
Violino: Don Víctor M. De An-
dreis.
5 — Caneión Brasilena, de Francis-
co Mignone (Brasil)
Intérprete: Barítono Paco do
la Riera.
6 — Dulce, pequena mia, de Emirto
de Lima (Colombia)
Intérprete: Senorita Margarita
Olano.
7 — Zamba de Rosarito, de Felipe
Boero (Argentina)
Intérprete. Sefiora D R Matilde
Florido.
8 — Preludio, de Pedro Humberto
Allende (Chile)
Intérprete: Senora D a Matilde
Florido.
RESENHA MUSICAL
póde ser adquirida em
qualquer casa de música
ao preço de 3$000.
FALECIMENTO
Maestro Sílvio Motto
Faleceu em 9 de Novembro, às 22
horas, nesta Capital, o conhecido
maestro Sílvio Motto, competente e
estimado professor do Conservatório
D. e Musical de São Paulo. Deixou
viuva a sra. d. Ada Cantagno Motto
e dois filhos: Renato e João.
O féretro, com grande acompanha-
mento, saiu da residência da família,
à rua D. Inácia Uchôa, n.° 1, para o
cemiterio de Vila Mariana
RESENHA MUSICAL, ao trans-
mitir a infausta noticia aos seus lei-
tores, o faz profundamente pesarosa
porquanto o maestro Sílvio Motto
foi um dos seus grandes amigos, dos
primeiros a apoiarem o aparecimen-
to de RESENHA MUSICAL, tornan-
do-se posteriormente seu assinante,
logo que esta revista entrou em nova
fase de vida. Admirado sempre pe-
las suas invulgares qualidades de ci-
dadão e pela cultura musical brilhan-
te que possuia, o maestro Sílvio Mot-
to possuia largo círculo de admira-
dores e amigos. Professor dos mais
afeiçoados ao magistério, labutou du-
rante longos anos no Conservatório
desta Capital, tendo passado por suas
mãos um plêiade de jovens que atual-
mente divulgam a arte musical com
a mesma bôa vontade e confiança,
herdadas do mestre incansável. Ins-
pirado compositor, deixou numerosas
óbras das quais muitas publicadas pe-
las principais editoras do país.
À distinta Família enlutada, RE-
SENHA MUSICAL apresenta senti-
dos pézames, que torna extensivos a
Direção e ao Corpo Docente do Con-
servatório D. e Musical de S. Paulo.
I
PA G I N A
INFANTIL
Precocidade de João Sebastião Bach
João Sebastião Bach, para apren-
der a música, teve que lutar com os
Passagem do
batalhãosinho
— Clovis de Oliveira —
(para piano — duas mãos)
“A mais linda estilisação dos nossos
batalhões infantis”.
Nova Edição — Preço 3$000
Pedidos á Redação de “RESENHA
MUSICAL” ou ás melhores casas de
musica.
seus parentes e irmãos, ardentemen-
te.
O seu irmão mais velho Cristovão
Bach, que era um excelente organis-
ta, enciumara do talento musical do
menino e procurou por todos os meios
impedir-lhe o desenvolvimento. Ocul-
tou-lhe das vistas uma importante
coleção de músicas para cravo, de
compositores notáveis.
Sebastião, que era uma criança
muito viva, descobriu o livro que os
irmãos esconderam em um armário
velho e, cautelosamente, levou-o para
o seu quarto. Aí procurou copiá-lo.
sem véla, apenas à luz dos longos
crepúsculos do verão e da lua. Mas
quando copiava com entusiasmo, pa-
recendo-lhe ouvir uma orquestra di-
vina, o garoto é surpreendido pelos
irmãos que o invejavam. Imediata-
mente toma a cópia e o original e os
destróe em frente mesmo do pequeno
João.
Mas nenhum obstáculo impediu que
o talento do pequeno músico se desa-
brochasse. E é daí então que procura
com mais ardor o estudo musical e
vamos encontrá-lo aos 18 anos, mes-
tre da Côrte de Weimar. Foi um gran-
de organista e um dos maiores com-
positores de todos os tempis.
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RESENHA MUSICAL
Alfredo Luiz
Aluno da profra. sra. Ondina F.
Bonora de Oliveira, Alfredo Luiz Ca-
rona da Silva, vem apresentando
reais progressos em seus estudos mu-
sicais, podendo, embora com três me-
ses de estudos, apenas, executar ao
piano lindos trechos para encanto de
seus pais, o distinto casal Pinto da
da Silva, e de seus amiguinhos.
Alfredo Luiz comemorou em 14 de
Outubro, mais uma data natalícia,
completando oito primaveras.
Bravos ! RESENHA MUSICAL
felicita efusivamente o pequeno pia-
PIANO
Vende-se um piano alemão para
estudos. Bom estado. Informa-
ções na Redação de RESENHA
MUSICAL
nista e publica o seu retrato para tor-
ná-lo conhecido de todos os meninos
e meninas, amiguinhos desta “Pági-
na Infantil”.
RESENHA MUSICAL
homenageada pelo orfeon infantil do
Grupo Escolar “João Vieira de
Almeida” da Capital
Em 28 de Setembro passado, às
ln horas, à convite do DD. Diretor
do Grupo Escolar “João Vieira de
Almeida”, sr. prof. Hermelino Gon-
çalves Corrêa, a direção deste mer-
sário de arte, visitou aquele impor-
tante estabelecimento de ensino pri-
mário desta Capital.
Recebidos pelo sr. Diretor e auxi-
liar, os Diretores de RESENHA MU-
SICAL, sr. prof. Clovis de Oliveira e
Sra., percorreram o lindo edifício e
admiraram suas modernas instala-
ções, depois do que foi dado ouvir o
Orfeon Infantil do Grupo, que pres-
tou, por ocasião, uma significativa
homenagem aos ilustres visitantes.
Foi executado o seguinte progra-
ma:
Hino Nacional Brasileiro — Fran-
cisco Manuel) ;
Hino João Vieira (arranjo de Nair
de Oliveira) ;
C h o p i n
Chopin gostava muito de traçar
caricaturas e mais ainda em repro-
duzir os gestos e atitudes dos pianis-
tas mais em moda. Quando menino
êle macaqueava os professores do co-
légio; enfiando na cabeça uma pena
fingia o Pastor Tetzel a predicar ns
igreja.
RESENHA MUSICAL
Pág. 49
Tutú Marambá;
Sino da Capéla — João Gomes Ju-
nior;
Nosso Brasil — recitativo, — me-
nina Maria Ramos;
O sininho — 4 vozes;
Baile na flôr — João Gomes Ju-
nior;
Felicidade — B. Netto;
te entusiasmo em beneficio da arte
musical entre os escolares.
Entre os aplausos dos ouvintes e
das colegas, a graciosa menina Nor-
ma Pinto leu o delicado discurso que
transcrevemos :
“Exmo. Sr. Diretor Hermelino
Gonçalves.
Orfeon Infantil do Grupo Escolar “João Vieira de
Almeida”, da Capital
Os toureiros — recitativo — me-
nina Maria Rosa;
Sabiá — João Gomes Junior;
Os gatinhos — 4 vozes;
Patria — recitativo — menina
Ivete Giraldes ;
Barcarola — Ao mar — Ofembach.
Todos os números foram muito
apreciados pelos presentes que não
negaram aplausos ao Orfeon e a sua
inteligente, competente e esforçada
jegente, srta. profra. Nair de Olivei-
ira que demonstrou cabalmente os
resultados de seu vibrante e eficien-
Exma. Professora Auxiliar da Di-
reção.
Exmo. Professor Clovis de Olivei-
ra e Exma. Esposa, dignos Diretores
de RESENHA MUSICAL.
É de alegria e festa a nossa reu-
nião.
Alegria e festa, por termos a opor-
tunidade de cumprimentar-vos neste
risonho dia de vossas visitas ao nos-
so caro Grupo Escolar e a criançada
estudiosa.
Como musicistas que sois, sabeis
perdoar as nossas falhas e bem as-
Pág. 50
RESENHA MUSICAI
sim sentireis a sinceridade de nossos
sentimentos nestas palavras que vos
dirijo. Elas não aumentam a gloria
dos vossos nomes, mas a nossa ale-
gria em vos receber, enchem de en-
tusiasmo os nossos corações que já
compreendem o que é Grande e o
que é Bélo.
Na nossa modéstia oferecemos da
nossa alma, estas flores ungidas de
nossos beijos que com juvenil entu-
siasmo vos oferecemos neste dia fes-
tivo pedindo a Deus que faça os nos-
sos gentis visitantes felizes, muito
felizes, para alegria de nossos cora-
ções.”
Usou da palavra a seguir o sr. prof.
Hermelindo Gonçalves, DD. Diretor
do Grupo Escolar “João Vieira”.
Afim de agradecer as palavras bo-
nitas da pequena escolar e as refe-
rências do Diretor do Grupo, falou
então o sr. prof. Clovis de Oliveira
que disse da magnífica impressão
que levava e formulou votos para que
o Orfeon Infantil daquele Grupo, con-
tinuasse a progredir cada vez mais,
para exemplo aos congêneres desta
capital e do interior.
Após as palavras do Diretor de
RESENHA MUSICAL e do Diretor
do Grupo, que encerrou a sessão, foi
batida uma chapa fotográfica do ex-
plêndido conjunto vocal.
Ensino de Piano
Curso Infantil Espe-
cializado
Profra. Sra.
Ondina F. Bonora
de Oliveira
*
Rua Dona Elisa, 50 -
(Perdizes)
Fone: 5-5971
S. PAULO
FINADOS
O tumulo, o objetivo desta data,
vem de proclamar o zenith dos maio-
res sentimentos universais. O dia 2
de novembro que desde as épocas re-
Tumulo de Francisco Manuel
Cemiterio Catumbí — Rio
Extratos de um Discurso
do saudoso Prof. AMA-
RO EGYDIO DE OLI-
VEIRA.
motas fôra escolhido para os vivos
entenderem-se com os mortos, não
podia passar em pecaminoso esque-
cimento.
“Se os chinezes no dia de hoje, fa-
ziam os espíritos ou as almas, as v-,
lentes sentinelas de suas muralhas
inexpugnáveis; se os Drávidas pro-
curavam nos mortos qualidades béli-
cas que experimentavam; se o S.
Odilon, nos ano mil, encorporou-o no
Calendário Católico, organizando as
romarias evangélicas, perpetuando
os feitos dos mortos, é claro que nós
não poderiamos esquecer-nos dos
mortos que são a égide das refor-
mas sociais exigidas pela luz suavís-
sima do progresso, dando uma prova
cabal da grandesa de sentimentos
que professamos. Negamos em ab-
soluto o fetichismo e as vilanias de
preconceitos, que as doses quinadas
das antigas opressões vieram exta-
siar-se ante a potência do exemplo
de abnegação que havemos dado pro-
vas! Não. Nós só aceitamos a luz
que espanca as trevas; a paz que
equilibra as forças onipotentes da
terra, do mar e da exhuberancia da
natureza que sobrepuja o escopo de
Pág. 52
RESENHA MUSICAI
fidalguia que foge espavorido as cre-
dencias do rei Leal ! Sim ; aceitamos
a justiça, o direito, como liames es-
senciais da estabilidade do Univer-
so!”
“Mas, a justiça humana é tardia,
porém certa, porque é a verdade saí-
da das páginas da historia.
Onde pairam as grandezas do3 an-
tigos potentados, que ufanavam-se
de ter o destino do mundo encerrado
em suas mãos? Eles jazem no eter-
no esquecimento. Os fracos, suas
vítimas imoladas nas chamas das fo-
gueiras, revivem no desenvolvimen-
to das nações e eles, pobres míseros
de seu poderio, ficaram alroquelados
nos doestos malditos dos filhos da
Luz.
Uma geração ficou e outra seguiu.
Uma estafou-se com a lei viva dos
Cezares e outra arvorou-se com o di-
reito da razão dos Antoninos! Uma
glorifica-se com a crueldade de Fe-
lippe — o Belo e Gregorio VII, outra
ergue os manes de Jeronimo Nocau-
ley, de João Hus, que a sanha inqui-
sitorial tragou na voragem de um
vulcão.
Uma bebeu no martiriológio a
constância e a perseverança, nifi-
cando a patria, a família e a socie-
dade, como átomos indissolúveis da
humanidade e outra encafuou-se na
casta, no previlegio, nos tronos °om
resplendores de sua corôa, morreu,
extinguiu-se, submersa na poeira que
os seus galardões e ouropéis produ-
ziram ao esbandalhar o cétro em
suas próprias mãos.
A ultima está morta fatalmente,
porque traz em suas tradições .« n>
bresa e os reis e outra vive forte e
possante com divindade de suas es-
peranças, avançadas e vencedoras
com a democracia e com o povo!
Deixemos, pois, as lagrimas de
sangue, vertidas sobre as montanhas
de luzes — que são as ciências — e
caminhemos firmes e resolutos com
suas vidências pregando o evangelho
do futuro que é o sentimento do bem,
da caridade e da igualdade.
Obreiros que dormis o sôno eter-
no, que fostes o consolo dos aflitos;
o balsamo suavisante das feridas mal
saradas, recebei a saudade que pun-
ge o nosso coração como expressiva
veneração em considerar-vos os nais
finos brilhantes da corôa da Huma-
nidade.
Veneremos a saudade: que a Hu-
manidade está de luto!”
Prêmio "Pró Música”,
para violinistas
Promovido pela Sociedade Propa-
gadora da Música Sinfônica e de Câ-
mara, do Rio de Janeiro, deverá rea-
lizar-se na segunda quinzena de De-
zembro, em data e local que serão
previamente comunicados aos con-
correntes e ao publico, um concurso
violinístico para a disputa do valio-
so Prêmio “Pró Música”, que conr-
tará de um violino Guido Pascoli.
As inscrições serão recebidas até
o dia 30 de Novembro próximo. A
Redação de RESENHA MUSICAL
dará todos os esclarecimentos aos in-
teressados.
Composto e impresso
nas oficinas gráficas
do LEGIONÁRIO —
Rua Imaculada Con-
ceição, 59 — Telefone
5-1536 — S. PAULO
Edições Músicais
ENSAYOS SOBRE LA MUSICA
NASCA — André Sas — Separa-
ta da Revista do Museu Nacional
de Lima, Perú, Tomo VIII, n.° 1.
Antes de tecermos alguns comen-
tários à cerca da valiosa óbra “Ensa-
yo sobre la música nasca”, falare-
mos, embora rapidamente, sobre a
personalidade de seu autor, o ilustre
maestro André Sas.
André Sas, nasceu em Paris, em
6 de Abril de 1900. Fez seus estu-
dos musicais na Academia de Músi-
ca de Anderlecht — Bruxelas e no
Real Conservatório de Bruxelas. Lau-
reado por diversos primeiros prê-
mios, recebeu particularmente con-
selhos e ensinamentos de Johan
Smitt (violino) e Maurice Imbert,
de Paris (Harmonia, Contraponto e
Fuga). Dedicou-se primjeiramente
ao magistério musical, ensinando vio-
lino na Escola de Música de Forest-
Bruxelas, atuando seguidamonte,
como solista na Sociedade Nacional
de Compositores Belgas, da qual é
hoje Membro Honorário.
Veiu para a América do Sul, em
1924, contratado pelo Governo da Re-
pública do Perú, para reger as clas-
ses de violino e dirigir os Concertos
de Música de Camara na Academia
Nacional de Música e Declamação de
Lima. Sua operosidade no campo ar-
tístico musical peruano tem sido uma
continuação de sua atividade inicial
nos centros de arte do Velho Mundo.
Prof. Clovis de Oliveira
Pela cultura, inteligência e trlaba-
lho — três qualidades brilhantes
que orlam rica e invejavelmente sua
vida, dando-lhe as láureas da admi-
ração pública e o respeito do meio
intelectual americano — André Sas
é membro honorário de inúmeras aca-
demias e instituições de arte espalha-
das pelos continentes. Tem publica-
do muitas obras para piano e violi-
no e mantem, ainda inéditas, muitas
outras.
Segundo a opinião abalizada do
prof. Rodolfo Barbacci, nosso bri-
lhante colaborador, residente em Li-
ma, André Sas é um dos maiores mu-
sicistas com que conta o Perú pre-
sentemente.
André Sas depois de ter fixado
residência no Perú, voltou suas vis-
tas para o estudo do folclore perua-
no, investigando com argúcia e sa-
bedoria os motivos e instrumentos
musicais. Como resultado de uma
dessas afanosas investigações, o es-
tudo “Ensayo sobre la música nas-
ça”, que publicou na Revista do Mu-
seu Nacional de Lima, Tomo VIII,
n.° 1, e, agora, em Separata.
O autor inicia seu trabalho agra-
decendo o erudito Diretor Geral dos
Museus Nacionais do Perú, dr. Luis
Valcárcel, por haver facilitado o exa-
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RESENHA MUSICAI
me, sem restrição alguma, dos instru-
mentos pre-incaicos que se acham
expostos aos olhos do público que
visita diariamente o Museu Nacional
de Arqueologia de Lima.
“Entre os instrumentos construí-
dos no Perú, desde a época pré-his-
panica até nossos dias, os da civili-
zação nasca são indubitavelmen e de
um modo geral e desde o exclusivo
ponto de vista musical, os mais in-
teressantes”. E somente deles e uni-
camente dos sucetíveis de reproduzir
uma melodia, o autor faz uma rela-
ção longa e preciosa.
Segundo o autor, seu principal ob-
jetivo foi estabelecer que a música
dos Incas não foi a única que encar-
tara os ouvidos peruanos pré-colom-
bianos.
Depois de vários argumentos so-
bre a arte musical dos Incas, relata
os únicos instrumentos cantantes co-
nhecidos pelos antigos peruanos :Ke-
na, flauta vertical e Antara flauta
de Pan. Ambas de metal ou de ter-
racota ou, ainda, construídas com ca-
nas ou óssos. E a Ocarina, feita ge-
ralment com terracota. A seguir o
sr. André Sas estuda em análise téc-
nica, vinte e oito antaras, inclusive
as escalas que cada uma delas ainda
são capazes de reproduzir, embora
mutiladas pelo tempo. É neste ponto
que a óbra de André Sas torna-se
inestimável, substanciada por exem-
plos musicais e táboas comparativas,
inclusivé ilustrações.
Podemos apreciar o admiravel es-
tudo do prof. André Sas, como um
importantíssimo prelúdio — bem as-
sentado nas suas bases técnicas —
às futuras investigações que serão le-
vadas a efeito na República perua-
na, cujo povo na opinião do autor,
“é um dos mais artistas da América
toda e, talvez, do mundo”.
PROGRAMA - GUIA PARA O
Curso Fundamental
de Piano
José Capocchí — 1940
Ed. Musica Para Todos
Os proprietários da Casa Música
Para Todos editaram um programa
para o ensino do piano, dedicado ao
Curso Fundamental.
Assunto especializado, a organiza-
ção de um programa de ensino musi-
cal, devia competir exclusivamente
às escolas de música, porém, até ho-
je essas escolas, com algumas res-
trições naturalmente, nunca cuida-
ram de organizá-lo devidamente com
obras nacionais ou revisões de pro-
fessores brasileiros, motivo pelo qual
a Casa Música Para Todos resolveu
incumbir o sr. José Capocchi para
reunir num plano mui bem traçado,
o material de ensino para o curso fun-
damental do piano.
“Todos os professores de piano,
não sómente os particulares, mas es-
pecialmente os professores de colé-
gios, farão obra de patriotismo, pas-
sando a adotar este programa que
inclui em grande maioria métodos
impressos no Brasil, programa que.
aliás, nada deixa a desejar sob o pon-
to de vista técnico”. Com estas pa-
lavras é apresentado ao público pela
casa editora, o pequeno opúsculo.
Adotar livros didáticos de autores
nacionais ou revistos por professo-
res também nacionais, é criar uma
independência que carecemos pelo
progresso da arte musical e, mesmo,
do comércio editorial, entre nós. Eis
a razão pela qual a iniciativa da Mú-
sica Para Todos, é louvabilíssima.
f^uccíní na intimidade
Puccini era natural de Lucca, on-
de nasceu a 23 de Dezembro de 1858,
sendo seus paes o maestro Miguel
Puccini e D. Albina Maggi.
Entre os antepassados do autor de
“Boheme” e de “Gianni Schicchi”,
contaram-se vários musicistas, quer
executores, quer compositores.
Desde a mais tenra infanda, Puc-
cini cultivou a musica, demonstran-
do magnifica aptidão para a execu-
ção do orgão. Em 1877 a municipa-
lidade de sua cidade natal instituiu
um curso para a composição de um
hino sobre a letra “I figli dTtalia
bella”. Puccini apresentou-se ao con-
curso e a composição com que con-
correu não foi premiada, voltando ele
a seu estudo. Em seguida a este pri-
meiro concurso compoz Puccini um
“motteto”.
Um dia em que, a pé se dirigia pa-
ra a cidade de Pisa, afim de assistir
a uma representação da “Aida”, foi
tal sua impressão sobre a velha ope-
ra de Verdi e o seu desejo de conhe-
cer o grande compositor, que essa
idéa ficou firme em seu cerebro. A
sua familia, entretanto, não queren-
do afasta-lo dos estudos já iniciados,
resolveu pedir o auxilio da rainha
Margarida, que foi solicita em con-
seguir uma matricula para Puccini,
numa escola de Milão. O jovem
maestro ficou contentíssimo, pois
Verdi alí se achava. Decorrido o pri-
meiro ano e terminada a pensão real,
que era sómente para aquele prazo,
Puccini com o auxilio de um seu tio,
estudou os dois anos que faltavam
para a terminação do curso prelimi-
nar, matriculando-se, em seguida, no
Conservatorio de Milão, no qual fez
intima amizade com Mascagni, Cata-
lani, Bazzini e Ponchielli. Nesse tem-
po, Puccini escreveu um “Capricho
Sinfônico”, que causou grande sucés-
so, sendo proclamado como verdadei-
ra revelação, tanto que a casa musi-
cal da Viuva Lucca, de Milão, a com-
prou para edita-la.
Saboreando aqueles aplausos, Puc-
cini sonhou com um publico bem
maior do que o que elogiava o seu
“Capricho”, e no firme proposito de
agradar às multidões, compoz, sobre
o libreto de Ferdinando Fontana, a
opera “Villy”, que foi lida em pre-
sença de Arrigo Boito.
O empresário Stefanoni po-la em
cêna, a 31 de Maio de 1884, perante
um publico numerosíssimo. O sucés-
so foi completo e Puccini foi obriga-
do a comparecer à cêna 18 vezes con-
secutivas. O final do primeiro áto
foi repetido tres vezes.
Morrendo, logo depois, a sua pro-
genitora, Puccini ficou inconsolável e
desesperado, só encontrando lenitivo
no trabalho. Nessa época produziu a
opera “Edgard”, drama lírico em 4
atos, representado no Teatro Scala,
sem sucésso. Compoz pouco depois a
“Manon Lescaut”. As sucessivas
obras de Puccini nasceram na sua
quinta de Torre dei Lago, situada
entre Lucca e Viareggio. Foi na-
quele tranquilo logar que viu a luz
“La Boheme”, opera em 4 atos, so-
bre libreto de Giacosa e Illica e ex-
trahida da “Vie de Boheme”, de
Murger.
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RESENHA MUSICAL
Apresentada no Teatro Regio, de
Turim, no dia l.° de Fevereiro de
1896, sob a batuta de Toscanini, al-
cançou um sucésso fantástico. A se-
guir foram musicadas: “Tosca”,
drama lírico em 3 atos, de V . Sardou,
lllica e Giacosa, representado no Tea-
tro Costanzi de Roma, a 14 de Janei-
ro de 1900, sob a direção de Leopol-
do Mugnone; “Madame Butterfly”,
tragédia japoneza em 3 atos, de lllica
e Giacosa, representada perante um
público hostil, no Scala de Milão, no
dia 17 de Fevereiro de 1904. Repre-
sentada novamente, depois de ligei-
ramente modificada, a 28 de Maio
daquele ano, no Teatro Grande, de
Brescia, obteve enorme sucésso;
“Fanciulla dei West”, opera em 4 atos,
representada pela primeira vez no
Metropolitan de Nova York, a 10 de
Dezembro de 1910.
As mais recentes operas de Pucc 1 -
ni são: “La Rondine”, escrita sobre
libreto de Adami, representada no
Teatro de Monte Cario, no dia 28 de
Março de 1917, sob a direção de Ma-
rinuzzi; O Tríptico: “Soror Angéli-
ca”, em um ato. de Forzano; “II Ta-
barro”, em 1 ato, de Gold; e “Gianni
Schicchi”, que alguns criticos julga-
ram como obra prima.
Puccini foi um grande amigo dos
humildes. Durante os anos que vi-
veu em sua quinta de “Torre dei La-
go”, manteve a mais cordial cama
radagem com pescadores, caçadores
e barqueiros dos arredores. Gran-
de amador de caça e da pesca, as
horas que seus trabalhos e estudos
lhe deixavam livres, empregava-as
ele em excursões pelos arredores, ou
em passeios cinegéticos por entre as
moitas de caniços do tranquilo lago.
Conta-se que certa vez caçava ele no
lago em companhia de um dos seus
tantos simples e rudes amigos.
O dia estava lindíssimo, o ar cal-
mo, o lago tranquilo como um espe-
lho. Tudo, portanto, autorizava a
crer que a partida seria coroada pelo
mais brilhante sucésso. Sómente ha-
via um inconveniente: a caça estava
proibido. Puccini e seu companheiro
tinham tomado lugar num pequeno
barco, e deslisavam silenciosamente
sobre as aguas do lago, o olhar aten-
to, o dedo pronto no gatilho da es-
pingarda. A embarcação penetrava
por entre uns espessos caniços, na
linha divisória entre as províncias
de Pisa e de Lucca, quando, de re-
pente, a vegetação abriu-se e surgiu
a proa de outro barco.
Tripulavam-no dois carabineiros:
— Alto lá!
— Estamos bem arranjados! —
murmurou o companheiro do maes-
tro.
— Que estão fazendo os senhores,
pelo lago, de espingarda em punho?
— perguntou severamente um dos
policiais.
— Passeavamos — respondeu
candidamente Puccini.
Bem. Tenha a bondade de me dar
seu nome.
— Giacomo Puccini, musicista...
O “maresciallo”, perfeitamente
impassível, escreve em um “carnet”
o nome do maestro. Gengino deu,
igualmente, seu nome e sobrenome,
feito o que os dois caçadores foram
deixados em liberdade.
Pouco tempo depois deste inciden-
te, recebeu o maestro a intimação
respectiva. Puccini e seu compa-
nheiro tiveram que responder à
“Pretória dei Bagni San Giuliano”.
por infracção à lei que proibe termi-
nantemente a caça durante o perío-
do de seu encerramento. Gengino
está preocupado ; Puccini alguma
coisa, também . . . De resto o autor
de “Manon” entregou sua causa a
dois advogados muito eloquentes, em
RESENHA MUSICAL
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quem depositava a maxima con-
fiança.
No dia dos debates os dois advo-
gados falaram durante horas pro-
vando a “gaffe” dos dois zelosos po-
liciaes, que tinham tomado por caça-
dor clandestino o maesti-o Giacomo
Puccini, uma das nascentes glorias
do teatro lírico italiano e seu respei-
tável companheiro Gengino. O acu-
sados, como era natural, foram ab-
solvidos, o que deu lugar a uma ma-
nifestação de regosijo por parte dos
numerosos admiradores do maestro,
e à seguinte arguta observação de
Gengino:
— Ah, nada como a sabedoria! Si
o maestro fosse um pobre diabo co-
mo eu, acabaríamos na cadeia tanto
um como outro. Mas é justo. Ele é
um sabio e por isso merece a absol-
vição.
Outra característica do tempera-
mento pucciniano era a eterna insa-
tisfação do maestro a respeito de li-
bretos. Quantos e quantos calhama-
ços de papel não foram lidos, discu-
tidos, aceitos, em parte ou de todo e.
finalmente, postos . . . à margem !
Depois de sucésso de “Edgard”, o
grande músico tornou-se intransi-
gente para com o “símbolo”.
— Não — dizia — nunca mais me
apanham em semelhante esparre-
la. . . Ferdinando Fontana, depois de
“Villy” impuzera-se ao maestro,
completamente. Puccini, sentia mui-
ta vez, trabalhando, que o convencio-
nalismo dos personagens estava em
irritante contraste com sua própria
sensibilidade, que era clara, aberta,
sincera. Daqui sua libertação...
E eis, alguns anos depois, a “Ma-
non”, isto é, o triunfo... sem sim-
bolismo!
Certa vez... tratava-se de “Tos-
ca”, Giacosa e Illica tinham posto
mãos à obra; depois da grande pro-
va da “Boheme” não era licito pôr
em duvida a impressão que o novo
libreto causaria sobre o espirito do
maestro. Mas sucedeu justamente o
contrario. A primeira edição de
“Tosca” pareceu não satisfazer com-
pletamente o maestro. Procurou Giu-
lio Ricordi, o conhecido editor musi-
cal italiano a quem disse mais ou
menos o seguinte:
— Parece que a respeito da Tosca
nada faremos. Renuncio ao libreto.
Mais tarde, porém, arrependeu-se.
Chamou Illica. Expoz-lhe suas idéas
e i> arrependido que estava em ter
renunciado a musicar aquela opera.
— Mas — respondeu o poeta —
quanto a mim, com o maior prazer
t’á cederia; ha só um obstáculo. É
que o libreto já não está comigo. En-
treguei-o a “fulano”. . .
Fulano, por sua vez, não parecia
estar muito satisfeito com o libreto.
Para obriga-lo a desistir definitiva-
mente era necessário uma obra de
demolição que Illica levou a efeito,
atrozmente. E uma bela manhã o
poeta apareceu em casa de Puccini:
— Não percas um minuto — gri-
tou ele ao maestro — corre à casa
de Giulio Ricordi: Fulano acaba de
lhe devolver o libreto da Tosca.
E foi assim, que “Tosca” voltou
às mãos de Puccini.
Era, como se vê, dificil de contes-
tar a respeito de libretos, o autor de
“Gianni Schicchi”.
E quando alguém lhe perguntava
que é que desejava, o que aspirava,
o que queria, enfim, muito tranqui-
lo ele respondia:
— Quero um libreto que consiga
comover o mundo!
Pouca coisa, como se vê.
"
Departamento Social e de Informações
d e
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Brevemente dará início às suas
atividades, o Departamento Social
“RESENHA MUSICAL”.
De suas futuras atividades, cons-
tarão conferências e recitais para os
assinantes de RESENHA MUSICAL.
Estas realizações artísticas, serãc
oferecidas sómente aos assinantes
que participarem do quadro do De-
partamento Social. Não poderão fi-
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que não sejam assinantes de RESE-
NHA MUSICAL.
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RESENHA MUSICAL avisa a to-
dos os concertistas em geral (pianis-
tas, violinistas, violoncelistas, etc),
que o seu Departamento Social se
prontifica a preparar seus concertos
em São Paulo.
Uma vez entregue ao Departa-
mento Social de “RESENHA MU-
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tos, os srs. artistas poderão livrar-
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desperdício de tempo e de energias.
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DA MUSICA
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gos, todas as informações que dese-
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instrumentos musicais e acessórios.
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mento de Informações, do qual fa-
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e completo do nosso Departamento
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sino artístico do interior do Estado
de São Paulo, que estão sujeitos ao
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lado, pelo seu Departamento de In-
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