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rMiVARD COLLEGf LIBRARf
«miNT OF SANTA EUULH
COLLECTION
6IFT OF
lOHIia STETSONblfl
i^ ^ 19 23.
PORTO
TYP. CATHOLICA de José Fructuoso da Fonseca
72-Rua da Piciíia-Ti
1903
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Advertências
I.* Em cada dia do mês daremos em primeiro logar
o Santo ou mysterio que n'aquelle dia se commemora no
Calendário da Ordem de' S. Francisco ; em seguida irão
os Santos mais conhecidos, ou de maior devoção popu-
. lar, n^aquelle dia celebrados nos martyrologios francisca-
no e romano ; e mencionaremos por fim as indulgências
e outros favores concedidos péla Igreja aos fieis para o
mesmo dia.
2.* São estes os signaes convencionaes usados no
nosso Almanach:
>Ii íi Dia santo de guarda.
(í< *) e (•!«) Dia santo dispensado. ,
'Ap. — Apostolo (App.—ApostDlos).
Ev. — Evangelista.
M. — Martyr. (Mm.— Martyres).
Pp. —Papa.
B. — Bispo (Bb.-^Bispos).
C. — Confessor (Ge. — Confessores).
D. — Doutor da Igreja.
Abb. — ^Abbade.
V. — Virgem (Vv. — Virgens).
i.a O, — ^Santo da i.a Ordem de S. Francisco (religioso fran-
ciscano).
2. a O. — Santa da 2.* Ordem de S. Francisco (religiosa clarissa).
3.a O. — Santo ou Santa da 3.a O. de S. Francisco.
Vig. — Vigília.
Jej. — Dia de jejum.
Temp. — ^Temporas.
-<-^^ — ^^^
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CHRONOLOGIA
Computo ecciesiastico
Áureo namcro.
Eftarla . . .
Cycio solar. .
5
13
Indicarlio romana Q.
Leira a«iuioical C B
Têmporas
Ferereiro 24, 26 e 27 1 SclcMiibro 2l,23e'>4
Maio 2ò, 27 e 28 I Dezembro 14, 16 e 17
Festas mo¥eis
Soptuagesima.
Cinza . . .
ra^sclioa . .
Asc«*nsão . .
Espirito Sauto
OUTOMNO.
INVERNO .
31 de janeiro
17 du Fevereiro
3 de abril
12 de maio
22 de maio
SS. Trindade . .
Corpo de Deus •
CoraçAo de Jesus.
Dom. 1.** advento.
Estações
24 de setembro
22 de dezembro
PRIMAVERA
ESTIO . .
29 de maio
2 (ie junho
10 de junho
27 de novembro
21 de marro
22dejuubu
Bênçãos matrímoniaes
São prohibidas' desde 12 de fevereiro ató ao dia 31 de março e desde o 1.* do-
mingo do Advento ^27 de novembro) até 6 de janeiro, dia de Heis.
í^^?^^
ECLIPSES ND ANl^D DE 19D4
LISBOA
Haverá no anno de 1904 dois eclipses, ambos do Sol.
I. — Eclipse annular do Sol no dia 17 de março, in-
visivcl em Lisboa.
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CHRONOLOGI A— Eclipses do annO de 1904
Começa o eclipse geral ás 2^ o"^ m.
Acaba ás S^ 8^" m.
Este eclipse será visível no sul da Ásia e no oceano
Indico, no Archipelago malaico e no mar da china.
II. — ^Eclipse parcial do Sol, no dia 9 de setembro, invisí-
vel em Lisboa.
Começa o eclipse geral ás 5^^ 31™ t.
Acaba ás. . , 10*» 44™ t.
Este eclipse será visiyel no Pacifico.
^
Tempo por que se de¥e usar luio
Pelas pessoas reinantes, 6 meses. — Por marido ou mu-
lher, I anno. — Por pães, filhos, avós, bisavós, netos ou
bisnetos, 6 meses. — Por sogras, sogros, genros, noras, ir-
mãos ou cunhados, 4 meses. — Por qualquer parente mais
afastado, 15 dias.
Nota. — Metade do tempo aqui designado^ é luto pe-
sado, e o resto luto allíviado, comquanto já hoje não esteja
adoptado o luto alliviado.
Dias de grande gala e recepção na corte
Janeiro, i. — Boas-festas e entrada do Anno Novo.
Março, 21. — Anniversario do Ser. Príncipe Real, D.
Luiz Filippe, filho d'El-Rei.
Abril, 29. — Outorga da Carta Constitucional.
Julho, 31. — Juramento da Carta Constitucional e an-
niversaiio de S. A. o Sr. Infante D. Affonso, irmão d'El-Rei.
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to
ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Setembro, 28. — Anniversario de SS. MM. El-Rei o
Sr. D. Carlos e da Rainha a Sr.* D, Maria Amélia.
Outubro, 16. — Anniversario de S. M. a Rainha a
Sr." D. Maria Pia de Saboya.
Pequena gala
Fevereiro, 17. — Anniversario da Ser. Sr.* Infanta
D. Antónia, tia d'El-Rei.
Abril, 12. — Domingo de Paschoa.
Maio, 22, — Anniversario do Consorcio de SS. MM.
(1886).
Junho, II. — Corpo de Deus.
Junho, 19. — Festa do SS. Coração de Jesus.
Julho, 10. — Pronome de S. M. a Rainha D. Amélia.
Setembro, 8. — Nome de S. M. a Rainha D. Maria Pia.
Novembro, 4. — Nome de S. M. El-Rei D. Carlos.
Novembro, 15. — Anniversario de S. A. o Sr. Infante
D. Manoel.
Dezembro, i. — Acciamação de El-Rei D. João iv.
Dezembro, 25. — Dia de Natal.
Dezembro, 31. — Ultimo dia do anno.
Férias
I â 6 de Janeiro e 27 de Fevereiro, de 9 a 23 de
Abril. — 24 de Julho. — 24 de Setembro. — 19 de Outu-
bro. — 24 e 31 de Dezembro e todos os dias de grande*
gala. Noa tribunaes é feriado todo o mês de Setembro.
£'poca8 memoro¥eÍ8
(BelatlTas ao anno de tOU-i)
Da rreação do mundo. . . 7:103 an.
Do Diluvio universal . . . 4:861 »
Da Fundação de Koma . . 2:656 »
UQ:^aj5ci(úeQto.de J. Gbristo 1:U04 ».
Destruirão do império ro-
ina'iio do Occiriento 146) 1:488 an.
/d<?mdo Orienie (H53) . . 451 »
JHevolução fraoceza . « . . \iV. f
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CHRONOLOGIA — Serviço telegraphico i5
SERVIÇO TELEGRAPHICO
ENTRE AS ESTACÕES DO REINO
A) Telegrammas ordinários
Taxa fixa 50 réis; cada palavra 10 réis.
B) Telegrammas noticiosos e suburbanos
Taxa fixa 25 réis; cada palavra 5 réis.
C) Te/egrammas urbanos
Taxa fixa 20 réis; cada palavra 2 réis.
Nota — Para os despacho^ suburbanos é limitada a i5 kilome-
tros de Lisboa, 10 kilometros do Porto, e 5 kilometros de qual-
quer outra cidade, a distancia das localidades por onde se podem
expedir.
— Os telegrammas urgentes (com prioridade de trans-
missão sobre os telegrammas particulares) pagam a taxa
ordinária que lhes competir pela sua categoria, e mais o
duplo da mesma taxa. Se o telegramma tiver operações
accessorias, accresce a taxa respectiva.
— Telegrammas com resposta paga, além da taxa or-
dinária que lhes competir pela sua categoria pagam mais
a mesma taxa pela resposta, segundo o numero de pala-
vras até ao máximo de 30, quando fôr indicado o seu
numero, ou a de um telegramma de 10 palavras, quando
não fôr indicado o numero preciso de palavras,
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i6 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
— Telegrammas para fazer seguir (transmittidos suc-
cessivamente ás direcções indicadas no endereço, até á
sua entrega, ou para as direcções que forem indicadas
no domicilio do destinatário), pagam a taxa ordinária que
lhes competir segundo a sua categoria, e mais a taxa
para reexpedição.
IMPOSTO DO SÉLLO
ALGUMAS TAXAS MAIS USUAES
Annuncios
Em qualquer periódico, incluindo o Diário do Go-
verno, e em qualquer livro, folheto ou program-
ma, cada um lo
Arrendamentos (escríptos particulares de)
Sêllo de papel , , 200
Taxa fixa 100
Taxa proporcional :
De loSooo a 40$ooo réis 50
De mnis de 40$ooo ate 8o$ooo 80
^De mais de 8o$ooo até ioo$ooo réis 100
Por cada ioo$ooo réis ou fracção a mais 100
Assentos
De casamento, de nascimento e de baptismo, nos
livros de registo (cada um) 100
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CHRONOLOGIA — Imposto do sello 17
LêtmÉ (êaeadaê nà contwentB ih r&inp
Sendo a mais de 8 dias de praso^
De 5$ooo a 20$ooo réis 20
De mais de 20S000 a ioo®cxx) réis 100
Cada lõôSoòo réis, ou fracção à mais 100
Protesto (além do sêllo do papel, 100 réis 200
Ucençaê
Para caçar, incluindo, ou não, uso e porte de ar-
ma para esse fim, cada anno 2$5CK)
Para uso e porte de arma, em defesa própria ou
de propriedade 2$ooo
Para velocipede, cada anno i$ooo
Passaporte»
A nacionaes, para fora do reino -e das possessões
ultramarinas, pela via marítima:
Até 3 pessoas 3S000
Por cada pessoa a mais, (exceptuando as creanças
até 7 annos) iSooo
Pr JCL rações
Sêllo do papel 100
Forenses 100
Com poderes para quitação,, perfilhação, reconhe-
cimento de foreiro, ou qualquer outro acto
extra-judicial, que não envolva contracto. . . . 300
Com poderes para qualquer contracto, arrematação
e opção eni' hasta publica. . . ". 600
Com poderes para qualquer administração-. .... ifRooo
%
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i8 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Cada substaiecimento na mesma meia foihô da pro-
curação ou de úatto substaleehnento 200
Fora da procuração ou de outro substalecimento. icx>
Recibo» (etftre particu/areê, ou de parficufares ofi estado)
De i$cxx) a ro$ooo réis 10
De io$ooo a 50$cxx) réis 20
De 5o$cxx) a looScoo réis. . . 30
De looSooo a 250$cxx> réis , 50
De 25oèooo a 5oo$cxx) réis icx>
Por cada 250$cxx) réis, ou fracção a mais d'aquel-
la quantia 50
Quando o valor não fôr conhecido ou declarado . 500
Reco/ihecimento»
De assignaturas feitas por tabellião (cada um). . . 5a
Sendo mais de uma assignatura, por cada assigna-
tura a mais lO
JEJUM E ABSTINÊNCIA
Quanto a este assumpto notaremos os princípios ge-
raes clara e resumidamente.
Cros e iacthifíio».
Podem comer-se em todos os dias do anno, em todas
as Dioceses d'cste reino por costume immemorial; e por
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^GHRONOLXXjIA-*- J[$:n^ E.AB^Tií^Ei^ciA 19
conseguinte não é i^eces^arío paca isso a Bulia da Cru-
zada.
Estão dispensados todos os sabbados, em que não
occorrer obrigação de jejum ; e para isto ^ão é preciso tôr
Bulia da Cruzada.
TetnperoB ifunto e redsnho de porco.
Podem usar-se, nas Dioceses de Braga, Porto e ou-
tras, onde ha costume immemorial, em todos os dias do
anno sem excepção alguma; e para isso não é preciso
Bulia da Cruzada.
Com quaesquer gorduras.
Pode temperar-se em todos os dias de jejum ; excepto
nos seis dias da quaresma, a saber: quarta-feira de cinza,
Vigílias de S. José, da Annunciação e os três últimos dias
da Semana Santa, mas com a condição de haver cada
um tomado a Bu/la da Cruzada de competente esmola e
previamente assignada.
Também é indispensável tomar cada um
Bulia da Cruzada
para comer carne em dias de jejum, tanto dentro como
fora da quaresma; exceptuando sempre na quaresma:
quarta-feira de cinzas, sextas e sabbados, Vigilias de S.
José e da Annunciação, e os três últimos dias da Semana
Santa ; e fora da quaresma : todas as sextas-feiras e as Vi-
gilias do Natal, Pentecostes e de todos os Santos; nos quaes,
ainda que qualquer tenha Bulia da Cruzada, nunca po-
derá comer carne.
Além de tomar cada um a sua Bulia da Cruzada,
para comer carne e usar de qtiaesquer gorduras^ é preciso
também
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âo AÚlANACtl DE SÁTÍTO ANTOííIO
InéuHo quttretmál
que basta tomar o chefe de fomilia, cujos rendimentos su-
Hrem de 300$ooo réis, dando a esmola de 50 réis ; e de
lõo réis, se subirem de 500$ooo réis, mas os pobres, e
os que não tiverem rendimentoà acima dé 300^000 réis,
não são obrigados a tomar este Indulto; ficando porém
obrigados a rezar um Padre-Nosso e Ave-Maria segundo
a intenção do Summo Pontífice, quando comerem carne.
As pessoas que jejuarem- só podem comer carne na
principal refeição; podem porém temperar de gorduras
em todas as refeições. .
Nos dias de jejum (e mesmo nos .Domingos da qua-
resma) tanto ás pessoas que jejuam, como ás que não são
obrigadas ao jejum, é^lhes prohibida a mistura de carne
e peixe na mesma refeição ; mas bem podem tomar caldo
ou sopa de carne, e comer peixe. (Conf. Indulto quaresmal).
No Almanach notamos os dias de rigorosa abstinência
em que só é permittido o uso de adubos de azeite nas
dioceses em que não é uso adubar com unto e redenho
de porco.
IITDULGEITCIAS
Quanto ás indulgências apontadas n'cste almanach
só temos que notar o seguinte.
Só notamos as indulgências planarias e das principaes
confrarias: Confraria do Rosário, do Rosário Vivo, da Im-
maculada Conceição, das Dores, do Carmo, de S. José e
da Ordem Terceira, e algumas annexas a certos exercí-
cios piedosos. Para pão occupar o logar que é necessa-
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CHRONOLOGIA— Indulgencus ai
rio para outros -assumptos que deve conter um almanach,
não notamos as condições d'essas indulgências sempre;
por isso lembramos aqui que a indulgência plenária so-
põe sempre confissão a oommunhão e .visita d*rUma igreja*
Para satisfazer a esta visita basta commungar na igreja
que se deve visitar e orar durante as acções de graças
pelas intenções do Summmo Pontífice. A igreja que deve
visitar-se, regra geral, é a da ordem da respectiva coq:-
fraria; não a havendo, a distancia commoda á da mesma
confraria. Os Terceiros Franciscanos, não podendo visi-
tar a igreja da Primeira ou da Terceira Ordem, podem
visitar a igreja Parochial. As capellas semi-publicas dos
Hospitaes, coUegios, cadeias, etc, só podem ser, visitadas
pelos Terceiros que ahi habitam ou servem.
As indulgências que se ganham todo o anno resando
certas orações ou fazendo certos exercícios piedosos, não
vão apontadas^ por não pertencer, intendo eu, a um al-
manach» mas aos catálogos das confranas*
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Janeiro 31 Dias
No crescente planta arvores' têmporas, dispõe alhos, cebolas,
roseiras, etc.
No minguante muda hortaliças, pjóda, corta madeiras,
mergulha vides, semeia legumes e pevides, goivos e rainunculos.
N'este mez se preparanvos terrenos.
por meio de cavas para a plantação das alcachofras e batatas.
Cavam-se e estrumam-se
0% quarteirões que estiverem desoccu pados.
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M ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
1 — S9Xta*f6Íra — ^ ^ Círcumcisão do Sekhor. —
S. Fulgçnçio, B. — Abs. 'Geral e Ind. Plen. da Bulla. —
Ind. Plen. para os Irmãos Terceiros de S. Francisco —
para os confrades dó. Escapulário de S. José^ e do Rosá-
rio Vivo, —Os irmãos da Confraria dajmmaculada Con-
ceição podem ganhar duas vetes as indulgências das basí-
licas de Roma e dos Lagares Saktos visitando por cador
vez sete aJtares. — Os Irmãos da Senhora do Carmo ga-
nham indulgmcia plenária assistindo á procissão da Con-
fraria e não podendo visitando a^sua igreja,
DYNANYMO SOdAI.
(Airanfâ^ do secuh XÍX)
fARECE que o século XIX foi propositadamente a synthese es-
pantosa de todas as manifestações da vida humana, para tra-
çar aos espíritos cultos a ecliptica da civilisaçâo ventura.
Desde a atmosphera agitada das intelligencias até ao fundo
labyrinto das paixões sociaes, cruzam-se em todiís ^s .dirc;cçães as
correntes da actividade humana, e nâo sabemos que admirar mais,,
se a vasta cadeia dos acontecimentos, se a sua eloquente dispa-
ridade. . *
Dir-se-ia que o nosso século — resultante assombrosa dos sé-
culos anteriores, foi rude como a selvageria dos bárbaros, erudito
como a época de Carlos Magno, subtil com a Escolástica, raciona-
lista com philosophismo, encyclopedico. comsigo mesmo.
Mar revolto em que se desataram todas as tempestades, o sé-
culo XIX pôde conglobar todos os vícios e, todas as virtudes. Le-
vou de arrancada os templos de Deus e genuâeçtiu*lhe pesaroso;
estrebuchou até vasquejar entre a consciência do dever e o adul-
tério da liberdade, e confessou-se vencido ; deificou-se nas culmi-
nancias do talento, prostituindo-o, e deciarou*se impotente; tra-
vou duello em o capitalismo c o capital, e ficou |X)bre; quiz em-
fim |t;matar a sua galeria com a litteratura p>antheistica e perdeu-
se, e desnudou>se, e enlameou-se como o ultimo patriarcha do na-
turalismo.
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JANEIRO 25
Mas. . . perdão, elle não se chegQu a afufidar 4e ve^^i j)OÍs éi^sde
o leito da aêonia jfiagellou ha pouco os seus transvios !
De veraade, o ultimo arranco do século XIX tinha dé ser o
do arrependimento, porque o seu primeiro esforço fora o esforço
do crime.. •
Fr. a. Motta.
2 — Sabbado. — St^ Isidoro, B. M-^-S. Macário,
Abb.— St-* Theodata, M.
ENTRE EXCURSIONISTAS
— ^Eu sou da Califórnia: é uma terra tão productiva, oue um
ratão perdeu n'um certo sitio uma caixa de phosphoros ae pau^
e passados dois diaâ encontrou lá uma floresta de postes telegra-
phicos.
-—Isso não é nada comparado com o Illinois, que. é a minha
pátria. Um primo meu, qu2 vive lá, perdeu uma vez um botão de
jaqueta, e no dia seguinte encontrou um fato completo pendurada
n'uma arvore ao pé do sitio onáe perdera o botão.
3 — Domingo (l.** do anno) — Oitava de S. João Apos-
tolo — St* Antíiero, Pp. M. — S. Aprigio, B. de Beja. —
St* Genoveva. — Ind. Plen. para o Escap. da Im. ConCy e
para a confraria do Ros., assistíkáh d procissão : não po-
dendo, recitar o Terço.
Sentença foi de Chilon — Sábio da Grécia: Sic ama, tanquam
osurus, sic aderis, tanquam amaturus : «De tal sorte hãs de amar,
como que podes aborrecer ; de tal sorte aborrecer, como que po-
des amar.»
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a6 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
4— Segunda-feira— S. Gregorid, B.— S. Tito, dis-
cip. de S. Paulo. ,
NA PALESTINA
Rubro se esconde o sol» A calma suffocànie
Empresta á Palestina o ambiente das fogueiras,
Tranquilla, a noite desce; e a brisa do levante
Agita, brandamente, as frondes das palmeiras.
Ao longe, tta ampHdão, movendor o passo incerto,
Vê-se uma caravana a encaminharse a Meca;
E o camello olha, triste, a areia do deserto
Momo, amarello e nú, crestado pela seca.
D' este lado o Carmello. A sua crista ingente
. Lyrios brancos, cecéns,, e madresHvas tem ;
É o aroma subtil das plantas do Oriente
Embalsama e perfuma as casas de Bethlem.
Desce a noite; mas, ainda antes que a noite raspe
As tintas com que o sol os cômoros doirou,
Vt'Se um pé feminino, um pé talhado em jaspe,
Da planicie surgir, e, ao longe, caminhou!
E um vulto de mulher assoma entre os harpejos
Das palmeiras de Jafa, e rasga a escuridão.
O seu pé virginal vam húmido dos beijai^
Das violetas a:{ues das margens do Jordão.
Depois, vae-se esvaindo ao longe, entre a nebrina, '
Como um sonho de amor, um sonho ardente e vario ;
E some-^e, a final, no extremo da campina
Onde descança agora o exausto dormedariol
Quem era essa mulher, que, assim serena e grave.
Rasga o seio da noite, e além passou, quem è?
Tem o ^arbo gentil, e tem o andar suave
Da corça, que nasceu junto de Na^^areth.
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JANEIRO 27
Mais tarde essa Mulher hã-^g sêr mãe: no emtanto
Virgem sempre Sérã ; as' aguas do ' Cedron
fíão^e engrossar um dia d custa do seu pranto,
E o abysmo ha-de tremer da sua voiç ao som,
E esse .pé virghtal, que, agora, o itinerário
Marca sobre os rosais, na areia resequida,
Ha-de rasgar^se andando as rochas do Calvário,
E ha-de calcar afronte d serpe entumecida!
, . Sebastião Perora, da Cunha.
5 — Terça-feira — Vig. sem jej. — S. Telesphoro,
Pp. M.-^S. Simeão Estilita. — Ind. PI. para as Jjessoas
que nas egrejas franciscanas assistem a -exposição do. SS.
Isto em todas as Tevças-feiras do anno.
-A.FFEOT-A.çA.C>
D. João de Menezes dizia, que poucos homens mostravam me-
nos do que podiam.
Era sentença sua, que mais haviam de temer os soldados o
seu capitão, que o inimigo. Sentença também de Clearcfho : Militi
ducem magis esse metuendum, quam hostem.
6— Quarta-fejra— í< >í< OS SANTOS REIS MA-
GOS. — Abs. Geral e Ind. Plen. da Blllx.^^^ Grande Gala.
— Ind, Plen. para os Irm. Terceiros, Escapulário de S.
jfosé, da Conceição, Associados do Rosário Vivo^ Confra-
ria do Rosário. — Ind. Plen. da Bulia. .
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a&
ALMANACH DJC SANTO ANTÓNIO
^^^^&
(lembran<;:a de uma primeira cx>mmunhâo :
6 DE JANEIRO DE l88. . •)
Jesus ipenino!
qudhào té vejo
iáa pequenino
em d<^e adejo,
olho^nõ çéo.,.
extasiado^,.,
o seio teu
esbra^adú^
{urfando amor!
£ fraco, imbelle,
quando em langor
o v3o te impelle
ao céo irtfirtdoy
e sobre a terra
desce, fluindo
o amor, que encerra
teu peito debíL.*
Quando esse pranto
p'lo rosto fleèil
a flux e tanto,
rola silente,
o duro bèrfb
do feno algente
deixando immerso. . .
Quando os bracinhos
a tiritar,
frios, nusmhos
vejo elevar
toa suppUcante,
como ave implume
que, vacilante^
o ninho assume^ . •
Quando assim eu
te vejo em goso
fitar o céo
tão mavioso,
por sobre o mundo
vertendo am^r.,,
no peito fun^
precinto a dôr
mar9 a saudade,
Jkrir-me o seiol
Lembra-^me a idade
do puro etdeio
d'essa innocenci^,
quando, Jesus,
minha existência
abrindo d lui,
ai! Caro infante,
a yeif primeira
poisaste, amante,
affoito d beira
a*um coração
que era singello» . .
E vindo então. . .
Como n*um elo
de forte amor,
. a elle unir-te
encantador!
eu presentir^te
o peito ardente,
e com teus braços
tão docemente
atal-^ em laços
de- caridade
e 'strmt» a$nâ$í'tL .
Minha saudade
é o amargor,
que sinto agora!
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1
3o ALMANACU DE SANTO ANTÓNIO •
A uma jânella dos Paços Reaes, das qué olhava^ Pjàfá o Ter-
reiro do Paço, coitversílvam os marquezes de Frbfiteirá 'e Távora,
que ambos aspiravam ab valimento do rei D. Pedro II.
Caminhando para elles P. Pedro e pondo-lhes as mãos sobre
ôs hombros, lhes perguntou: - '
— Em que discorrem os-marqu^zes^^.
O de Távora, que era promplo e vivo, lhe respondeu :
— Ambos, Senhor, estamos vendo como havemos de enganar
um ao outro, e também a Vossa ^ag^sia^e.
._ . (s^."^..:^^^^"^
8 — Sexta-feíra — S. Lourenço Justiniano, Patriar-
cha de Veneza, S. Paciente, B. de Metz, S. Eugeniano»
M. S. Theophilo, diácono, M., S. Máximo, B. S. Seve-
rino.
Se te excusas, Deus te acusa; e se tu te acusas, Deus te ex-ri-
cusa.
(S. Franc. d' Assis). ;
i
S. José foi puríssimo, humilissimo, amantíssimo; emumapa-*
lavra, digno companheiro de Maria e a ella mui semelhante.
(S. Bernardo).
9 — 3) Sabbado — S. Julião e sua esposa S. Basi-
lisa Mm., S. Marceilino, M. — (Quarto crescente).
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JANEIRO
3i
N*um exame: .
— Qual é a distancia entre a terra e a lua?
— Trinta e sete milhões de ieguas.
— Como acha o sr. essa distancia?
— Enorme!
1Ò— Domingo— B. Gil de Laurenzana C. P. Ò.
S. Gonçalo de Amarante.
Ponte de S. Gonçalo
— Não alcanço maior riqueza do que ter a Deus, nem maior
pobreza que carecer d*EUe.
— Somente a Religião polé marcar a linha que separa a li-
berdade da libertinagem.
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3z ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
^— J£' mais fácil uqE3i.talefi>to^ue/utn verdadeiro caracter ^^
— Nada tso f^cil conK)iiiKf^ revaltiçóe^; nada tão difficil'c^
fortalecê-la, e dirígi-laao bem commum.
11 — Segunda-felra— S. Hygino^ Pp. M., S. Ale-
xandre, S. Honorata — Começa a novena de S. Sebastião
— Nasce o sol ás 7 k. e i^ min. e põe-se ás 4 h. e 47 min.
AS UNHAS
Parece existir uma certa relaç£o entre as unhas e o caracter
das pessoas. Ahi vão algumas notas a este respeito.
Unhas compridas e ^delgadas — querem dizer imaginação e
poesia amor das artes e preguiça.
Compridas e chatas, — sensatez, intelligencia, e todas as facul-
dades serias do espirito.
Largas e curtas — cólera e grosseria, controvérsia, opposição
e pertinácia. . • /
Bem coloridas — virtude, saúde, felicidade, coragem, libera-
lidade.
Duras e quebradiças — crueldade, discussões, assassínio e que-
rellas.
Em forma de garras — hypocrisia e malvadez.
Afiles — Fraqu2za de corpo e de espirito.
Curtas e vermelhas até á carne viva — estupidez e liberti-
nagem.
12— Terça-feira— S. Alfredo, Ab., S. Taclaaa, V.
M., S. Satyio, M.
o amor de Deus é o que faz da vida má, vida boa, e da vida
trabalhosa, vida descansada.
(P. Estrflla).
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jmEmo ^3
13— Qiiaitó-feira — S. l^ocio^^^ Bu>S, HUírio, B.
— Começa a novena de S. Vicente*
^^^^^^■■i^^^VM
Hs^via um $»pi£^teiro que,- emquanto v^balhfiva, costumava
cantar esta cantiga:
Náo sei bem se foi de noite,
Ou se foi de manhâsinha,
A rainha disse ao rei
E o rei disse á rainha.
. , ■ ■ t r
Um visinho, farto de o ouvir cantar sempre a mesma cois^,
perguntou-lhe um diá :
— O* mestre, mas que diabo disseram, çliês tim ao outro?
— Eu sei cá disso? Eu não me metto em politica!
^^HlK^-
14— Quinta^felra^TriuniphQ do. SS., Nome de Je-
sus, S. Feliz d3 Nola — Os fieis que assistirem hoje á
missa e officio divino ganham muitas indulgências parciaes.
PENSAMENTOS
A fé é uma luz que se não arde muito è nos descuidamos die
pôr-lhe azeite da piedade nos deixa ás escuras^ .
Um escetico é um cadáver vivo o mais digno de compaixão.
O orgulho foi o primeiro pecçado que se commetteu; até no
Céo fez suas victimajs. '
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34 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
1 5 — Sextà-felra~S. Paulo, ■ l.*" Eremita— S. Ama-
ro, Abb. ' . :. ; .
No tribunal.
— Dizem que você^tnata um homem com uma destreza adrri-
raveL e que da liçóes de navalha. Que responde á istaV •
O réo (modestamente) — Quando v. ex.» quizer experimentar^
. 16 — Sabbado — Os Santos Martyres de Marrocos»
Trotomartyres da i.^ 0:—Ind: Plen: jfara os Irm. Terc^
— Ind. Plen. nas egrejas franciscanas.
V ^^^Gi^ y
o "CIIEDO,, DO LEITOR GISTI
i.o Creio que a leitura é o alimento moral da alma, e que as
doutrinas fazem os homens.
Os séculos o testimunham com este axioma: «Dize-me com
quem vives, e dir-te-hei os costumes que tens. »
2. o Creio que o temperamento inteílectual se forma como o
do corpo, com o que se lhe ministra.
3.0 Creio que é impossível ao mais forte caracter resistir
sempre á mesma leitura; um commercio assiduo é sempre victo-
rioso.
4.0 Creio que um mau' livro é' um amigo corrupto e corru-
ptor.
5.0 Creio que as más leituras são perniciosas á alma, como
o veneno ao corpo.
6.0 Creio que as leituras dos romances tira ao caracter a
sua gravidade, á vida a sua seriedade, ao coração a sua pureza, á
vontade a 5ua força.
7.0 Creio que um grande numero de pessoas se illudem so-
bre as leituras que fazem, e permittem.
8.0 Creio que as pessoas que permittem, favorecem, impõem
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JANEIRO 35
ou aconselham leituras frívolas, perigosas ou más, contráhem uma
terrível- responsabilidade deante de Deus.
9.0 Creio que á hora da morte muitas illusões se dissiparão
-com detrimento d'um grande numero de alníàs*
lo.o Creio que se almas perdidas pelas más leituras nos appa-
recessem, ficaríamos assombrados pelo seu numero.
II. o Creio que se os livros' podessem falar, revelariam coisas
espantosas sobre o apostolado de perversão que exerceram nas
almas.
12.0 Creio que um christão não deve ler maus livros, que
perderá o seu dinheiro se os procurar, o seu tempo, a sua intelli-
gencia, a sua alma se os ler, e que^ a este respeito, só lhe resta
um dever, deital-os ao fogo. Prestaria serviço de alto valor á boa
causa, e faria bem ímmenso ás almas quem mandasse imprimir
milhares de exemplares d'este Credo, e os espalhasse por todo o
paiz.
Padre Benevenuto.
17 — ® Daminga (2.° depois da Epiphania) — S. An-
tão^ Ab. — S. Mariano, M. — S. Sulpicio — St.* Servula, M.
L. nova ás j horas e 12 m, da L
Jesus mostra suas chagas á alma fiel para que, como cândida
pomba, faça n'ellas seu ninho.
Santo António de Lisboa.
A memoria da Vida e Prixáo de Nosso Salvador me occupam
quafi continuamente.
S. Francisco d' Assis.
18 — Segunda-feira — A Cadeira de S. Pedro em
Roma— St.* Prisca, V. M.— B. Beatriz.
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36 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Conta-se de Alexandre Magno, que tendo nomeado juiz um
parente de Antipatro, seu amigo, soube depois, como psintava as
^barb^s e os cabellos. Passou logo ordem para que fosse riscado da
pasta, dizendo: que não fiava tantas cabeças de quem não era íiçl
com a sua.
19 — Terça-feira— S. Canuto, M., Rei da Dinamarca
-St.* Germana, V. M.
&M MMmm §miè(SM
Parece reclamo, mas não é.
Ao Journal des Debata enviaram a seguinte receita contra a
febre typhoide :
Amachucam-se umas poucas de cebolas cruas, faz-se d*ellas
uma cataplasma, e cobrem-se os pés do doente, de forma que fi-
quem bem envolvidos. Ao fim de se:e ou oito horas, tira-se a ca-
taplasma, e a febre tem desáoparecido.
Este remédio, de uma simpliriAade extrema, como ?e vê, tem
dado resultados magriíicos. Os me:H:os não sabem explicar o fa-
cto, nem çomprehendem como a febre assim desapparece de re-
pente.
Uma pobre creança de quatro annos atacada de meningite, de-
veu a sua salvação a essa catapla^^ma.
• Fazemos nosso, em vista d'isto, o conselho de um jorn?.l es-
trangeiro, que recommencia a experiência do remédio aos práticos,
em razão de ser tão si .n pies e iriofíensivo.
20— Quarta-feira — S. Sebastião, M. — S. Fabião,
Pp., e M.
JANEIRO 37
Que Raio de Lumes
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38 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
ELOca-ios x>o Tia:BA.xRO
I — «Os theatros são logares de licenciosidade, escola de impu-
reza, cadeiras de pestilência». — (S. Basílio).
II — «Fugi dos espectáculos e do theatro infernal da immundi-
cie, não quero vêr-vos transformados em companheiros do demó-
nio; porque no theatro, Satanaz está em suas pompas e espectácu-
los ; ir ao theatro é abandonar a fé de Jesus Christo». — (á. Agos-
tinho).
III — «Todos os christãos fervorosos condemnaram o theatro
moderno, sabendo que difficilmente se sae d*elle sem peccado».
— (Benedicto XIV).
Se queres ser puro, foge do mundo.
Foge das creaturas, se queres encontrar o Creador.
(S. Francisco d' Assis).
21 — Quinta-feira — (Jej. no Patriarchado e no Al-
garve) — ^S. Ignez, V. e M. — S. FructUoso, B. — Nasce o
sol ás y, h, e 6 m.i e põe- se ás 4. k. e $4. m, ,
UM VESTIDO
\ixixv
f^^K^'l|p|jj?-^UMA populosa cidade de Andaluzia estabeleceu-«e
•^Hr^ll ^^ uma vez um cavalheiro, que durante muitos annos
tinha estado na America, e d*ahi trouxera muitos
tesoiras y como resava a opinião popular no seu
modo de intender.
Era porém certo que uma jóia trouxera de mais remontado
valor do que as de ouro e prata, que se lhes propunham, e vinha a
ser uma mulher, boa, honrada, modesta e caritativa, bem dada en-
tre as quatro pacificas e modestas paredes de sua casa, feliz e con-
tente na sua tranquilidade interior.
Em breve acertou o marido de ver o desenfreado luxo, que
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JANEIRO' 39
ostentavam 'em seu traje as mulheres da sua nova residência, com
o qual contrastavam a mod^tia e simplicidade que sua mulher gas-
tava no seu.
£ assim foi que indo ambos a sair um dia dis^eo çiarido :
— Luiza, é necessário que compres para ti um vestido, egual
aos que usam estas senhoras.
— Felipe, retorquiu a esposa, esses vestidos, que vês nas ou-
tras, custam 20D;£kxx) reis; para Osanno que vem jl se não usarão e
d'ahi. . . são duzentos mil reis que lá se váo para a corda do sino,
o que é um desperdiço, ou para melhor falar, uma impropriedade
para quem não tem nem a ro ição nem o cabedal de uns príncipes.
— Tendo mais meios do que outras que os trazem, quero que
não sejis tu menos, coisa que darias azo a que criticassem e mo-
fassem de nós.
Luiza deixou brincar nos lábios um sorriso e calou-se; mas o
que menos lhe deu cuidado foi a compra do vestido.
Cada vez que saíam juntos perguntava-lhe D. Felipe :
— Luiza, ainda não compraste o vestido ?
E ella, por via de o não contrariar, procurava mil desculpas
pelo não ter feito.
• -^ Luiza, ponderava então seu marido, todos sabem que eu
tenho meios, e se uma senhora não traz um rico fato como con-
vém á sua pessoa é natural^ que ninguém diga que seja por seu
motu próprio d*onde. resulta: que atribuam á minha avareza e não
á tua vontade a causa por que o não tenhas.
ym dia que os acomfianhava á mesa um amigo intimo de D.
Felipe, contou-lhe est€ muito sentido, o que chamava a mania de
sua mulher por não querer comprar o vestido; e levantando^se
trouxe duzentos mil reis em oiro, que pôz nas mãos de Luisa
com a expressa condição de os empregar na compra do vestido.
Saíram logo os dois amigos para o passeio e Luiza entrou no
seu gabinete sentou-se sobre uma cadeira baixinha e uma vez em
sui camará começou a trabalhar de suas mãos..
Alli esperava uma das muitas pessoas necessitadas, que esta
senhora piedosamente so:corria com suas esmolas e consultava es-
cutando com o mais vivo interesse a relação de seus males ç de
suas desgraças.
A pessoa por quem Luiza esperava conservava um aspecto de-
cente no meio da mais completa miséria, graças çl Luiza, que lhe
tinha fornecido a? peças de vestir para isso necessárias.
O marido d'esta desgraçada, toda a sua vida exercera um em-
prego subalterno, havia porém algum tempo que sem causa nem
pretexto tinha sido privado d'elle para com elle favorecer outro.
Decrépito já, sem conhecimento, nem força, nem proporção
para grangear um modo de alentar a vida de sua família, a an-
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ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
õ que se Í
«A revolução coroará 05 '■< «E passam por consegum-
hòmens com verdadeiros me- t^ á escala de reserva.»
ritos.»
«Ao numero 58 — 5:oooíkxx)!»
«Ao numero 84—70:000^000! ...»
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tos Ji
JANEIRO 41
jornaes
«A causa do crime j«lga-se «O Zé Guinha deu^sc bem
que foi o roubo.» ♦ com a muleta; mas íoi teme-
rário com o estoque.»
«Margarida soltou um ai!
lancinante...
Estava louca! j»
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42 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
gustia, a tristeza e a irritação que .se assenhoreavam de seu aninio
nzeram-no cair de cama.
E o vestido? perguntava de vez em quando D. Felipe; já o
compraste? ^ ,
Luiz a, que era tímida, não se atrevia a dizer a seu marido o
que tinha feito do dinheiro, e tratava de se desembaraçar do pe-
rigo por meio d'evasivas. Umas ♦ezes dizia que lhe desagradavam
os que estavam á venda, e que lhe tinham dito nas tendas mais
concorridas que esperavam novas remessas; outras que mo tinha
saído por causa do frio ou falta de tempo e assim foram correndo
dias e mezes. A paciência de D. Felipe já estava gasta.
Queres tu crer, disse a seu amigo um dia que estavam jantan-
dOj que fazendo, como V. deve estar lembrado, dois mezes que
dei a minha mulher o importe do vestido para o comprar no
mesmo momento, quer V. çrêr que ainda o não comprou? E' isto
leal? Não será escarnecer de mim com seu ar gracioso.
Luiza que como dissemos era timida, e que agora péla primei-
ra vez ouvia palavras desabridas e duras na bocca do seu marido
para lhe acalmar a ira disse :
— Está comprado.
— Até que emfim! Alviçaras, accrescentou D. Felipe. Onde
está?
— Tem-o a nwiista, respondeu sua mulher cada vez mais per-
turbada, como todo aquelle a quem falta serenidade para seguir
com passo firme o bom caminho.
N'este instante um criado veio dizer a meia voz a Luiza que
estava alli uma das pobres que ella favorecia que precisava falar-
Ihe com urgência. Luiza levantou-§e.
Aonde vaes mulher? preguntou D. Felipe; é uma pobre, di-
ze-lhe que venha outra o:casiâo.
— É* a modista acudiu Luiza.
— Entro vai, não te demores e manda trazer o vestido porque
queremos vê-lo.
Mal tinham passado cinco minutos, quando Luiza penetrou
na sala apressuradamente.
Seus negros olhos scintilavam, reflectindo-se n^elles uma es-
plendida alegria como brilha um puro crystal ao ferirem-no os
flamejantes raios do sol; suas faces estavam abrazadas como duas
fogueiras de regozijo ; seus lábios tremiam" indecisos entre um sor-
riso d'alegria e um pranto suave. Trazia na mão uma carta des-
dobrada.
— Toma ! Felipe, toma 1 exclamou estendendo-a a seu marido,
ahi tens o vestido 1
Seu marido aterrado e sem percebex ^ sentido d*aquellas pa-
lavras tomou a carta e leu : ^
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JANEIRO . . 4?
«Pais de meu coração ; acabaram-se os vossos soffrimentos e
os meus. Deus fez-nos felizes por mão d*um d'aqu3lles anjos que
o ceu envia á terra para bem e consolação da humanidade. .
Graças a este e ao inesperado soccorro que nos prestou que
foi tal que deveu custar-lhe algum sacrifício, o que augmenta seu
valor e mérito, embjrquei-me e chegu2i aqui depois a'uma feliz
travessia completamente restabelecido. — Apenas desembarquei,
quando me deram a coUocaçâo qm para mim tinha meu tio em
casa de seus antigos amos poderosos commerciantes, qut o esti-
mam em muito; pou:os dias depois demonstrou-me o senhor estar
tão contente do meu zelo e intelligencia, que me augmentou o sa-
lário e esta manhã preguntando-me se também eu estava contente
respondendo-lhe eu que o não podia estar pela ausência de meus
pais e saber que elles estavam em tão desafrontada posição, me
disse elle que escrevesse a V. que viessem visto que tem onde eól-
io :ar vosso pai.
Envio adjunta, para a viagem, uma letra que é o importe do
salário dos dois mezes, que não gastei com o fim uni:o de vol-o
enviar tendo-me o tio acceitado em sua casa, etc.
Quando D. Felipe concluiu a leitura da carta, cravou os olhos
em sua esposa com um olhar que bem espressava toda a admira-
ção, todo o carinho, todo o enternecimento de que transbordava
seu coração e só pôde dizer :
— Perdoa, Luiz a.
A suave e modesta esposa lhe respondeu:
— Perdoa tu, pois te enganava.
— Minha é a culpa, pois não soube inspirar-te confiança, con-
tinuou o marido; se m'o tivesses dito ter-se-ia feito a boi obra
sem que por isso houvesse de privar-te d*um bom vestido.
Agora eu me encarrego de proporcionar-t'o ; e de certo que
das fabricas de Lyáo não saiu ainda outro melhor.
— Não, não, Felipe não exclamou Luiza; se acaso o qu3 eu fiz
é uma boa obra, e tu m*a houvesses de recompensar, não seria eu,
mas tu, quem doesta teria o mérito e a satisfação, e eu não t'os
quero tirar.
Além de que, o bem que se faz sem que nos custe um sacrifí-
cio ou uma privação pequena ou grande, nem deixa o coração de
todo satisfeito, nem completamente alegre a consciência.
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44 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
22 — Sexta-feira— (iíl no Patriarchado e no Algai-ve)
— S. Vicente, M. — S. Anastácio, M.
Cálix offerecido por El-Rei D. Luiz a Leão xiii
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JANEIRO 45
Cãlix oííerecido por ENRei D. Luiz a Leão XIII
Por occasião do jubileu pontifical de LeSo XIIT, o fallecido
monarcha D. Luiz fez presente a este Papa d'um primoroso cálix,
executado nas officinas de Leitão & Irmão, reproduzindo integral-
mente um cálix portug[uez do século XV, existente na preciosa col-
lecçâo do palácio da Ajuda.
23 — Sabbado — Desposorios de N. Sçnhora — S.
Emerenciano — In(L Plen, para os confrades do Rosaria
Vivo.
A' VIRGEM
Oh Filha de Deus mimosa^
Oh casta Mãe de Jesus!
Olhae, olhae carinhosa
Pelos filhinhos da cru:^,
II
Junto á cru:{ vj.'; foiçam dados
Entre as angw:iias da dòr^
Mas ficar am-v )s gravad js
lS'*esse coração de amor.
III
Tanta doçura elle encerra,
Consola tanta ajlicção.
Que sois chamada na terra
Fonte de graça e perdão.
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46 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
IV
Olhae-noSy pois, carinhosa,
Levae^nos da terra aos céos.
Oh Mãe de Jesus niimosa,
Oh casta .Filha de Deus !
P.e Nunes Tavares.
24 — Domingo — (3.° depois da Epiph.) — St* Fa-
ir.ilia — S. Timotheo, B. — Ind. Plen. fará os confrades da
Losario Vivo,
Um annuncio divertido, colhido n'um jornal :
«Precisa-se, para. casa diurna familià, americana, um professor
de linguas, para reformar a pronuncia viciosa d'um papagaio do
Brazil».
25—3) Segundá-f eira— Conversão de S. Paulo —
St.* Elvira. — Q. crescente às 8 h. e 5 m. da tarde.
Leva a Jesus o que por seu amor supporta com paciência o
mal que lhe acontece.
Santo António de Lisboa.
-♦<^#-
26— Terça-feira— S. Policaipo, B. M.— St.* Paula^
Viuva — S. Tlieogono, B. M.
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JANEIRO 47
— Que te parece o dr. Picarôa? Aquelle diabo rão diz duas
palavras a um doente. Receita e sae*logo pela porta fóra.
— Bem sei; é dos taes que desfecha sem fazer pontaria.
27 — Quarta-felra— S. Jpão Chrysòstomo, B. e Dr.
-S. Vitalino, -Pp.
Ditoso o que ouve minba voz, e está de vigia continuamente
esperando ás portas de minha misericórdia.
(Prov., XIII, 34.)
28 — Quinta-feira— B. Matheus, C. da i." O.— Ss.
Flaviano e Lionides, Mm.
\ • •
-^ O menino não vê que está a calçar a meia do avesso ?
'• — E7 que ella está rota do outro lado.
29 — Sexta^feíra — S^. Francisco de Sales, B. Dr,
— S. Sulpicio Severo, B. — Santa Badelundes, V.
Só o principio da desgraça é espantoso; quando o homem
chega ío cumulo da adversidade, encontra á medida que se alonga
da terra regiões serenas e tranquillas: assim quem sobe pelas mar-
gens çi*uma corrente impetuosa, espanta-o no fundo do valle o es-
trondo das aguas; porém ro passo^que sobe a montanha, as aguas
diminuem, attenua-se o ruido, e o viajante vae terminar seus pas-
sos nas regiões do silencio, e na visinhança do céo.
Chateaubriand (Os Martyreí').
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48 ALMANACH DEi SANTO ANTÓNIO
Educador de Palmatória
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JANEIRO 49
JESUS E AS CREANCINHAS
(Aot coUegas no profeuoradoj
SioitA parralos venire ad me et ne pro-
bibueritis eos.
Um dia Jesus Chrhtofoi sentar-se
Para alem do Jordão;
cercavam-no os discípulos, pisava-o
compacta multidão.
As brisas ondeam-lhe as madsixas
em louras es pirões; .
a turba emudecera; ouvem-se as queixas,
dos enfermos os ais.
Era a humanidade perdolente
chorando por Jesus, doce e clemente,
E Christo estende os olhos piedosos
por sobr^ a turba ingente,
- e que olhar paternal!
— Ouvi chorar alguém; tendes leprosos
surdos, coxos, pocessos, algum doente? —
MostramAhos, cura a todos, depois falà-lhes
do Reino Celestial.
A turba é toda ouvidos ; sempre alerta
bebe o néctar — o verbo do Propheta: — .
Perorava e sermão.
As mães a/adigadas vão levar-lhe
seus filhos pela mão
fra lhos abençoar, e supplicar-lhe
por elles oração.
Os disci]f>ulos oppôem-se inclementes,
não as deixam passar,
e as pobres creancinhas innocentes
desatam a chorar.
As^ mães porfixm, t2imam em romper;
não as deixam pa';sar os inclementes ; *
e redobram di choro a^ innocentes
por a Jesus não ver.
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5o ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Jesus calou-se, ouviu-as a gen^er :
— Deixae as creancmhas,
porque as trataes assim? —
E estende os braços, chama-as meigamente.
— Pobres innocentinhas, ,
deixai-as vir a mim, —
Senta-as no collo e abraça-as ternamente.
— Deixae-as que os seus anjos v2em sempre
a meu Pae, o seu Deus ;
olhae que é para ellas
o meu Reino dos Céus.
— Juro que se não fordes pequeninos
doces, humildes bons
como estes caros meus innocentinhos
não gos areis no csu meus ricos dons.
— E mal do que^ lhes der um mau exemplo
que mos *scandali:^ar!
Melhor lhe fora atal-o a mó da atenha
e arrèmeça-lo ao mar.
Se as acções de Jesus são mandamentos
de Vida para ncs,
Pedagogos de seco e palmatória,
este exemplo é pr'a vós.
As creança'; a quem c'iamaes discípulos
são filhinhos do Pae celestial,
não vo-los confim, educadores,
para a pau lhos matar, tratar-lhos maL
E se «quem mos recebe, a mim recebe
e o que se lhes fizer se faz a mim,
como nos affirmou do mundo a Lu^,
din^ei-me, educadores, pois não é assim.
que açoitar as creanças
é bater em Jesus ?
Demais, ó imbecis educadores,
cuja alma não tem fibra sem labéu,
é bonito que espanquem peccadores
os caros de Jesus, anjos do ceu ?
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JANEIRO 5i
Ha para o burro espora
para p bei aguilhão,
para as feras ha Jaulas, . .
chicote para o cao.
Mas são mais que animaes as creancinhas ;
umas inteUigencias tenrinhas;
homens ainda em flor, \
almas ainda em botão,
que só abrem os raios do amor.
— O furacão não deixa abrir a flor —
Muitas v^f e? é grave a sua cru:{
por não comprehender o educador
a educação do amor
— a de Jesus. —
P. B. Ribeiro.
30 — Sabbado — S. Jacintha, V.^-S. Hypolito, M.
— S. Feliz IX, Pp. — Inei, p/n. ims igr. franciscanas e
iud. plen. para os Irm, Terceiros.
IQSTIÇA D'RESPASMA
No Cárcere Modelo, em Madrid, via-se escripta a lápis n'uma
parede a seguinte quadra :
Aqui por justa sentencia
Está um principiante
Que ro robô lo bastante ,.
Para probar su inocência.
Lá como cá . . .
31 — Domingo da Septuagesima — B. Luiza de AI-
bertoni, Viuva da 3.* O. — Ind. plen. n.7s igrejas francis-
canas — Ind. plen. da Bulia.
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fva
^infraeLo o um aeleiaeLo
ONT.VDO n*unia pacifica mula mo-
destamente ajaezada caminhava
um religioso pela estrada soli-
tária que de Toledo levava' a
Segóvia. Era na segunda metade
do século quinza.
Povoava o rosto do frade
uma longa barba gris ; sua fron-
seu olhar, penetrante, e as faces
nhava o bom religioso ao passo
sua cavalgadura, parando de vez
lo a mar chi para contemplar o
que se rasgwa perante os seus
i na verdade era mui triste e som-
que manifestasse exteriormente
^*j, ^icio de temor, não obstante a so-
ledade d'aquelles logares e a malvadez da gente, que, em tempos
de revoltos populares, abunda em Castella, assim como em todas
as partes, em idênticas circumstancias.
De repente ao terminar uma curva que fazii o caminho, avis-
tou um cavalheiro montando um arrogmte corcel, d'espada ao
lado, punhal á cinta e machado d'armas pendente do sellim do ca-
vallo. Apenas avistou o frade deteve aquelle o fogoso cavallo, e
quando o religioso se approximou foi saudado pelo cavalheiro ti-
rando o barrete adornado de pennas, com estas palavras :
— Deus vos guarde, Padre.
— Elh vos acomp-inhe, respondeu o r^rgioso.
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JANEIRO 53
— Para onde vos dirigis sósinho por estes caminhos, expon-
do-vos a mil perigos?
— Vou a Segóvia; o perigo não n^ assusta; confio na divina
Providencia.
— A que Ordem pertenceis?
. — Meu habito o indica; sou franciscano.
— Grande santo foi na verdafde o fundador de vossa Ordem.
— I>epois de Jesus Christo o prototypo da humildade e do amor.
Suspendeu-se a conversa dos viajantes e caminharam largo es-
paço o religioso e o cavalheiro guardando rigoroso silencio ; porém
como não é fácil conservar esta atitude por muito tempo entre
duas pessoas que viajam juntas, o cavalheiro, que parecia soldado
por seu aspecto e pelas armas, quebrou o silencio, dizendo :
— Desculpae, Padre, minha pouca discripçâo; porém se o não
levaes a mal, quizcra fazer-vos uma pergunta.
— Seja em boa hora.
— Que negocio vos leva a Segóvia?
— Desculpe o nobre cavalheiro que lhe responda com outra
interrogação ; que fim tendes em conhecer o motivo de minha
viagem t
— Eu vol-o digo, Padre. Quando eu parti de Sçcovía corria
pela cidade um rumor de que a rainha Isabel tinha determinado
escolher para confessor um frade franciscano, do qual se diz que
tem um caracter duro e áspero, sábio e humilde ao mesmo tempo;
e quando vos avistei persuadi-me que. ..
— E não vos enganasteis. senhor. . .
— Aqui tendes ÍS. João cie Pacheco, marquez de Vilhena para
servir a Deus c a vossa paternidade.
— A Deus primeiro que tudo, respondeu o religioso.
— E vós quem sois? perguntou o fidalgo.
— Fr. Francisco Jimenez de Gisneros, escolhido por Sua Ma-
gestade para director de sua alma.
— Dou-lhe os meus parabéns.
— Não me felicite retorquiu o re'igioso; porque se é diííicil e
espinhoro confessar os humildes camponezes, ouvir em confissão e
dirigir príncipes poderosos deve ser um múnus de grandíssima res-
ponsabilidade perante Deus e a historia. A rainha é boa.
— Assim o dizem quantos a conhecem, confirmou o cavalhei-
ro ; se fosse El-Rey. , . era outra coisa.
— Vamos, interrompeu o frade, já vejo que não sois partidário
d*El-Rey Fernando.
— É' que o Rey tem mais carinho £0 reino d' Aragão que ao
de Gastei la.
— Eom; naturalmente corno vós tendes mais carinho a Gas-
tella do que a Aragão. I^ão é facir perder o amor que nasceu no
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ALMANACH T>È SANTO ANTÓNIO
•berço; por isso cada uirt ama sobre tudo as coisas da terra onde
viu a luz do dia a primeira vez.
Òlhae ; eu sou um pobre religioso que fiz renuncia de todos
os affectos do mundo quando entrei na Ordem de que fou mem-
bro; porém uma coisa é renunciar o gozo de honestos prazeres, e
outra o sentimento que a elles nos arrasta ; e aqui aonde me ve-
des, sem aspirar a outra cousa além do cumprimento exacto de
meus deveres, recordo com grandissima satisfação de minha alma,
minha pobre casa^ a humilde aldeia que me viu nascer e os pobre-
sinhos companheiros de minha infância 1 Que quereis? O homem
é assim ; e e inútil pretender modifical-o n'esse sentilo, que afinal
^de contas, rão considero uma coisa vitanda.
^ — De modo que não pensaes, retorquiu o cavalheiro, influir
ii'essa matéria no animo da rainha para que El-Rey. . .
— Não continueis n*esse caminho. Vou ser conselheiro espiri-
tual de Sua Magestade, porém rão em coisas temporaes.
— E se chegardes a ser mais alguma coisa?
— Que quereis dizer com isso?
— E se chegaes a ser conselheiro do governo, que fareis?
— Deus o sabe e eu ignoro; porque jamais me veio ao pensa-
mento tal ideia cuja realisação me parece tão difficil, como o pro-
jecto que se attribuiu ao vosso illustre tio de fazer-se immortal
dentro d^uma redoma, como se o homem fosse uma ginja posta no
akoDl I
— Sois enygmatico, Padre.
— Não tanto como vós quando éreis partidário de D. Joanna
la Bellraneja. Porém ouvi o que vos digo : Se eu chegasse a ter in-
fluencia nos negócios temporaes do reino, procuraria a todo o custo
a sua união, porém sem pretender sacrificar os affectos e legitimas
inclinações, manifestadas em forma pacifica, qne cada qual tivesse
em pró do logar em que nasceu.
— Adeus, bom Padre, e cuidae bem da vossa penitente.
— Ide com Deus, sr. Marquez de Vilhena, e tende cuidado
com vossas velleidades.
O cavalheiro metteu esporas ao cavallo ; partiu o bruto a toda
a brida deixando após si uma nuvem de pó que envolveu o pobre
frade, e, acompanhando o passo da sua mansa cavalgadura, prose-
guiu a viagem resando de quaiído em quando, e contemplando as
paisagens gue se desdobraram ante seus olhos.
Náo tmham passado muitos annos e o marquez de Vilhena e
outros nobres exaltados d*aquella época, tiveram que humilhar-se
-ante o burel do frade franciscano.
^'^^••••'
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fevereiro sj^Dias
Na lua cheia e minguante semeia espinafres e murcianas,
dispõe alfaces, semeia mangericóes,
planta limosiros e larangeiras. Na lua nova e crescente, corta
madeiras, poda e m^Vgulha vides e limpa arvores.
1 — ® Segunda-feíra — (Jejum excepto nos bispa-
dos de Elvas e de Vizeu). Pôde usar-se de carne ao jan-
tar e de temperos de quaesquer gorduras em todas as re-
feições. — S. André dos Condes, C. da i.* O. — Ind. Plen.
para os Irm. Terceiros, — Nasce o sol ás 6 h. e ^g. w., e
pôe-se ás 5* A. e 5 nt.-^Lua cheia ás 3 k. e 56 m. da tarde.
Zeno, príncipe dos philosophos estóicos, tinha na sua escola
um creado. a quem também ensinava as suas doutrinas. Um dia
faltou^he lá um objecto que elle muito estimava, pelo que julgoa
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56
ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
necessário castígal-o; o rapaz ao levar o castigo defendia-se di-
zendo: foi fado que eu furtasse, (seu mestre attribuia tudo ao
acaso). E o amo respondia : também é fado que te castgue.
2 — Terça-felra — >í< i^t Purificação de Nossa Se-
nhora. — Ind. Plen. para os Irm. Terceiros^ para o Esca-
pulário de S. yoséy e da ConceiçâOy para o Rosário Vivoy
para a Confraria do Rozario.
(Á CABECEIRA DE UM ENFERMO)
Deus te salve, Rainha*
dos Archanjos do céo !
Da natura mesquinha
não te manchou labéu.
Sois qual pura açucena
lá n*essa estancia amena
dos prados etemaes,
yáe de rrisericordia
dos affiictos mortaes.
Vós sois vida e alento
do que soffre tormento
da existência no mar;
a enchente da doçura
d' essa fonte a mais pura,
n*este campo de agrura,
yinde, ó Mãe, derramar.
Salve, nossa esperança l
nossa pa^ e bonança
da vida no lidar.
Virgem, a ti clamamos,
íilho de Eva e da dor;
por ti, Mãe, suspiramos,
ouvi nosso clamor.
Nós, gemendo e chorando,
vamos sempre arrastando
do peccado os grilhões; .
n*este vale de prantos,
de crimes, laços tantos
de infemaes tentações.
Eia, nossa advogada,
livrae-nos desviada
do infame tropeçar.
E teus piedosos olhos
a nós, que nos escolhos
do mundo naufragamos
aos tristes, que, choramos.
Senhora a nós volvei
E na hora derradeira,
quando a nossa carreira
extincta se acabar ;
quando a lu:{ da existência
de Deus a providencia,
nos vi^ apagar,
vós,' penhora potente,
o fructó do teu ventre,
o bemdito Jesus,
oh! Depcis d* este exilio
nos mostrae, e o auxilio
dae aos filhos da Cru^;
soccorrei~nos, clemente,
doce Mãe nossa e pia;
ouvi da humana gente
gritos de dôr pungente,
que a vosso throno envia,,
P4 B. Ribeiro.
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58 ALMANAGH DE SANTO ANTÓNIO
— Quando quizer, responde o réu; isso ptra-ipirji é ipdiffe-
rente. Queira marcar o dia.
— Olhe que é uma cousa séria e grave, e então reflicta bem.
A lei concede um certo praso para os condemnados se prepararem.
O' escrivão, queira ver se de hoje a um mez é domingo.
-#'
4 — Quinta-feira — S. José de Leonissa (Capuchi-
nho) — O B. João de Brito, jesuita portug. — St.** André
Corsiho, B. C.
EFFICACIA DE UM PADRE NDSSO
Achava-se Frederico Soulié, romancista francez, próximo á
morte. Edu:ado fora de toda a crença religiosa, e não sabendo o
que era orar, o infeliz não se preo ocupava nem pouco, nem muito
com os negócios da sua alma. Uma irmã da caridade, que lhe as-
sistia, estava ajoelhada aos pés d* cama, recitando devotamente o
santo rosário. Os seus olhos e as suas faces estavam innundados
de pranto. O enfermo levantou a cabeça: «Que estaes dizendo, mi-
nha irmã? Padre Nosso que estaes nos céos... que formosas pa-
lavras! Repeti-as outra vez.» A irmã começou de novo a oração.
«Isso é magnifico ! quero dizel-a comvosco. . .» E como um menino
a aprende dos lábios de sua mãe, assim Frederico Soulié aprendeu,
palavra por palavra a oração dominical dos lábios d*aquelle anjo
de caridade, cuja oração tinha chegado até ao throno de Deus, e
repetia enternecido: «Santificado seja o vosso nome, venha a nós
o vosso reino. . .» E morreu na paz do arrependimento, depois de
se ter reconciliado com Deus, murmurando aquellas vivificantes e
doces palavras.
5— Sexta-Jfeíra — Os Ss. Pedro Baptista e 22 Comp.
Mm. do Japão, da i/ e 3.* O. — Ind. Plen. nas egrejas
franciscanas.
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FEVEREIRO Sg
CASOS RAROS
Ha casos que succedem, e nunca se realisam, como, cahir a
cara de vergonha. Receber uma pizadura e ver as est relias. For-
mar castellos no ar. Morrer-se de medo. Escangalhar-se de riso.
Dar ás de Villa-Diogo.
S. P,, S. J.
6— Sabbado — St.^ Águeda, V. M. — St.^ Dorothea,
V. M.
O primeiro telegramma expedido da Europa para a America
foi em i858 pelos directores do telegrapho em Inglaterra, por meio
do cabo transantlantico.
Era concebida n'estes termos a primeira saudação entre os
dois mundos ;
A Europa e a America estão unidas pelo telegrapho. Gloria a
Deus altissimo ! Pa:{ e concórdia entre os homens.
7 — Domingo da Sexagésima — O B. António de
Estronconio, C. da i." O. — S. Ricardo, rei da Inglaterra.
— Ind. Plen. da Bulia.
Tem para com os outros a ternura de uma mâe ; para comtigo
sê juiz severo.
S. João Berchmans.
8 — C Segunda-feira — S. João da Matta, C—S.
Juvencio, B. — Q. mingtiante ás ç h.. e 20 m. da manhãs
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6o ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Aguarella:
Felizes bichos, que faria de vós o Rei Eduardo?
Medico — Felicito-o sinceramente.
Doente — Então sempre escapo?
Medico — Talvez rão; depois de uma conferencia descobrim.os
que o seu caso é fatal, mas mteiramente novo e resolvemos dar
o seu nome á doença se o diagnostico fôr confirmado pela autopsia»
9— Terça-feíra— B. Gil de S. José, C. da i." O.—
St* ApoUonia, V. M.
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Dialogo d'outrorí1l
qUB PARBCB D AGORA
NCONTRETj não ha muitOj estando a fazer o catalogo de
certa bibliotheca um livreco descosido e usado, d*es-
ses que náo teem principio nem fim. Faltava-lhe por-
tanto o nome do auctor e a 4ata da impressão ; mas li-
das poucas paginas, 'vim no conhecimento de que o tal
opúsculo era parto d'um Pensadjr matuitense, que, em
forma de discursos critico >, censurava os vicios da sua
época ahi pelos annos de 1760.
Percorri curioso o que restava d'aquella ruina litteraria, vi-
ctima do vandalismo de eruditos e de ratos, e a pouco' trecho to-
pei com um capitulo interessante que o auctor sentenciosamcnte
encabeçava com aquellas palavras de Juvenal na satyra sexta : A mu-
lher gastadora nao repara em que a fazenda se dectrua. Comtudo
os maridos acertam alguma ve:ç a cmhec^r o que é prêveitoso.
O Pensador de Madrid havia siio testemunha d'um dialogo
curioso que referia aos seus leitores. Travara-se este en>tre uma pe-
ralta de primeira grandeza, jovem, ladina e bem parecida, mas de
pouco ou nenhum tino ; e um rharido sensato, pacifico e honrado.
Passeava o marido ao longo d'uma sala com vários papeis na mão,
« como fora de si, dizia com os seus boróes o monologo seguinte:
— «Não. . . isto vae mal: não pode continuar esta dissipação,
nem esta vida. Diga minha mulher o que quiz3r, ralhe, pragueje,
zangue-se ou rebente ; não ha remédio senão pôr um termo. E se
continuarmos assim, em que venho a parar? Tenho só dois mil
ducados de renda. Quinhentos vão-se no carro, trezentos na casa,
}á são oitocentos; e duzentos que leva o cabelleireiro da senhora,
são mil ducados certos. Agora entremos com os gastos ordinários
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62 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
de alimentação, creados e creadas, que não se fazem seguramente
com mil ducados, refrescos que passam de quatrocentos, c cama-
rote no theatro, que rão desce de duzentos; já gasto muito mais
do que tenho. È d'onde tiraremos agora para leques, chambres,
coifas, fitas, flores, alamares e outras mil farandulagens que só o
demo podia inventar?
Oitenta dobrões de divida (dizia olhapdo para um dos papeis)
em casa da modista! E hei de soífrer que minna mulher gaste em
caprichos e bugiarias uma quantia com que pudera sustentar-se
uma familia honrada durante um anno inteiro r
Não, decerto: não o sofTrerei, nem que' me matem. E não digo
nada d'esta conta (e olhava para outro papel). Sessenta dobrões por
um leque ! Senhores estamos ao meio dia, ou á meia noite ? Ha tal
pouca vergonha, como gastar sessenta dobrões n'uma coisa que não
vale nem sessenta reales,.. Que fizesse isso uma senhora muito
ri:a que tivesse grandes rendimentos, vá com a breca: mas que
queira competir com as fidalgas uma pobre, que não pôde contar
senão com o magro ordenado de seu marido, isto é uma inconve-
niência e uma loucura intolerável ; e quem tal frz não merecia es-
tar em minha casa, mas na das oratçs em Saragoça ou Toledo. Eu
rão quero vtr meãs papeis porque me falta a paciência; o que
agora quero é começar a cortar por estes excessos.
Quero- fallar a minha mulher, e fallar-lhe em tom que lhe in-
funda respeito. Estas despezas arruinam-me; se continuam, dei-
xa m-me por pontas ou dão commigo na cadeia. E primeiro está a
minha honra que os seus caprichos.
Além d'isto também não gosto da sua pouca assistência em
casa e de vel-a sempre rodeada d^esses peralvilhos ociosos que a
seguem por toda a parte. . .
Isto ha de acabar; já usei de quantos meio> me dictou a pru-
dência, para retrahir minha mulher d'estes delírios c tolices, e
nada consegui. Fiada ella na bondade do meu génio, inimigo de
dissensões, entendeu que em minha casa a regra ha-cie ser o seu
gosto, e trata-me como se eu fosse um creadp, destinado a respei-
tar e executar os seus caprichos. E' preciso portanto tiral-a doesta
illu ão, e fazer-lhe comprehender que tem um marido que sabe
distinguir a bondade da estupidez, e que não está para ser o ludi-
brio e escarneo dos outros. . . E' peroso chegar a usar de remédios
violentos : se porém minha mulher se não render á razão, estou re-
solvido a tudo ante? que a soffrer a continuação das suas phantasias.
Concordo em que a mulher, destinada segundo os nossos cos-
tumes a ser guarda da habitação a maior parte da vida, necessita
de ter pe-soas com quem possa espairecer nos intervallos que lhe
deixam livres os cuidados domésticos. Por isso mesmo procurei
attrahir a minha casa pescoas virtuosas e di-cretas.
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FEVEREIRO 63
Bem amável sou para com ellas, trato-as com todas- as atten-
ções, com toda a affabilidade possível, e todavia é rara a que che-»-
ga á terceira visita. Pelo contrario estes pelotiqueiros, estes mata-
chins ociosos, que. chamam v cortejadores^ perece que apostaram
ter a minha casa sitiada, nas poucas horas que n^ella pára minha
mulher. Ora isto faz desconfiar, isto precisa de remédio, isto é in-
supportavel para quem tem um génio... Mas ahi vem n:inha mu-
lher. Eil-a; é boa occasião de me. declarar. . .
— Senhora, approxime*sc. . . •
mulher — Olá; que novidade teremos.
ilíarf í/o— Novidade nenhuma. Só uma coisa muito velha, que
a senhora sabe; e ter-me-hia feito* muito favor se me tivesse evi-
tado uma explicação, que- me deve ser muho odiosa. ■ - .
Mulher — Temo5 sernáo. Ainda bem que hoje me acho de bom
humor e muito diíficil será fazer*m'o perder; mas já sabes que
não é uso ouvir «sermões em pé. Quero sentar-*me n'esta cadeira
para ouvir com mais attençáo. O senhor meu marido dá licença
nâo é assim?.. .
Marido — Senhora, não comece com brincadeiras, que eu náo
estou para el las: sente-se ou fa^a o que quizer, mas não zombe.
Mulher^ — Eu zombar? Deus me livre.. Eu havia de zombar do
meu marido? Nunca tive geito pr.ra zombarias. Meu senhor re-
tire essa palavra tão mal soante e escandalosa; e venha d* ahi a
pratica. Ha de ser uma pratica multo pathetica, com essa cara que
tem hoje, e já estoj com furioso desejo de ouvir.
Afnr/Vyr— Será. servida; mas primeiro queria que desse uma
vista d'olho3 a estes papeis.
Mulher — Isto tem pouco que ver. Sto papeis de varias bagatel-
las que comprei ha pouco para. . .
Marido — A senhora chama a isto bagatellas?
Mulher — E que nome lhe hei de dar. Não sei outro. Grandes
coisas 1 Veja lá que não s?jam negorios de Estado.
Maridc — Está muito bem; mas vá-me dizendo as parcellas.
Mulher — Esta primeira c d' um leque que comprei para as vi-
sitas de confiança, e só custou sessenta dobrões, que foi dado.
Maridc — E para as visitas de ceren-.onia que leque levará sua
excellencia?
MulhQr — Nenhum, e por isfo não fiz ainda a visita de noivado
a D. Anna Maria; porque náo quero ficar lá envergonhada entre
as outras, nem que tenham o meu homem por um miserável so-
vina. Mas disseram-me que s^ esperam por estes dias uns leques
da Cochinchina, áz nova moda, que nío passarão de noventa
dobrões, e ent£o comprarei para não me tornar a ver n'estes
apu) os.
Maridc — Passe adeante.
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64 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
miulher — Esta é a conta de varias miudezas que comprei na
modista e sobem apenas a oitenta dobrões e al^ns reales.
Marido — Creio facilmente que foram só muidezas.
ÊUtílh^r — Est*outra é a conta do neaociante de sedas, que só
importa em cento e nove dobrões. . . Was elle poie esperar, por-
oue ainda não ha três mezes que se lhe pa^ou tudo o que se lhe
aevia; e além d*isso estou sem batas de primavera e estio; e ne^
cessito de quatro, nada menos,« sem contar uma meia dúzia de
chambres brancos de que tenho necessidade, porque se sujam mui-
to, e é preciso andar liniM.
ilífl/vi/o-^Pois não? Terá qu2 esperar o negociante de sedas.
mtulher — Isto qua se segue é uma ninharia: é a conta da lo);a
de fazendas, onde fiquei a dever cento e quarenta duros^ mais
nada.
Marido — Bem! Cento e quarenta duros na loja de fazendas*
e eu não tenho uma camisa para vestirl.. Isto é admirável! Va
seguindo.
Mulher — O resto não merece o nome de conta. Dez pares de
sapatos que me fez o sapateiro da Princeza, a dobrão cada par ;
feitio de quitro roupões guarnecidos a dobrão cada um, quatro
chailes a cinco pesos^ e outras frioleiras que tudo excede apenas
seis mil reales.
Marido — De sorte que todas essas friíleiras^ como a senhora
diz, somente orçam por quatrocentos dobrões.
Muther — Jesus! Que miséria! Julguei que custassem mais.
Marido — Pois não importa. Agora só resta ver d*onde hão-de
sahir estes quatrocentos dobrões. A senhora, não creio que tenha
dinheiro algum nem sei^d^onde lhe possa vir. Eu também não o
tenho: os credores hão de berrar, eu não hei de ir furtal-o, nem
tenho nenhuma mina: ainda não achei nenhum thesouro, nem o
meu ordenado pode com estes excessos. Vejamos pois, como esse
grande tino da minha senhora e essa grande alteza e serenidade
conseguem pagar esta continha calada.
Mulher — Ah! não tem dinheiro?... Pois^é pena; mas a culpa
não é minha nem se me dá d^isso. Eu sou sua mulher e o senhor
é meu marido, tudo eítá dito. Se não tem dinheiro pro:ure-o; se
o não encontrar, furte-o; e se nem uma nem outra coisa^pode...
enforque-se ! . .
AfíiWrfo— Modere-se senhora, e não acabemos a conversa antes
do tempo.
Mulher — ^ío tenho qu2 moderar-me: o senhor tem obriga-
ção de me dar tudo o que é necessário para eu andar decente^
Marido — Sim senhora, nias não para andar com disparates e
loucuras. . . E quem lhe disse que seja decência um leque de ses-
senta dobrões e para visitas de familiaridade?
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FEVEREIRO 65
ÊUtilhér — Jesus! de que elle se espanta! Que pobreza de espi-
rito! . . . Olhe para o D. António, que só tem seiscentos ducados de
renda, e noutro dia deu á mulher para ò mesmo fím um leque de
oitenta dobrões. Afãs é quê nem todos os maridos são tão pelin-
tras como o senhor, nem de coração tão apertado.
Marido — Não sei como se fazem esses milagres nem quero sa-
Tbel-o ; e se a mulher de D. António é louca, não é modelo que a
senhora deva imitar, nem eu soffrel-o. Quatrocentos dobrões 1 Lá
se vae mais d*um anno de ordenado. E com que havemos de su&*
tentar-no5? Com qu2 pagar renda de casa. cabelleireiro e crea-
-dos? Com que se ha de ter a carruagem? A senhora quer gastar
assim? Pois sujeite-se ao que vier.
Muiher — O senhor é que está zombando. Então que ha de vir?
Que me ha de succeder ? Que o senhor pagará estas dividas e as
mais que occorrerem e ainda lhe ha de sobrar tempo. Olhe meu
senhor se não tinha ordenado sufficiente para manter uma mulher
das minhas circumstancias, para que me procurou? Casasse com
uma campoheza, e 'teria feito a despeza com quatro varas de fita,
uma agulha de prata para o cabello, uma mantiiiha de flanella e
uma saia de droguete. . . Eip conclusão não faz mais que falar no
seu ordenado, como senão houvesse no mundo outra coisa de que
viver, e como se fosse eu uma mulher encontrada no meio da rua
ou tirada da lama.
Êfarído — Naturalmente dirá isso por causa do seu dote...
Mulher — Já se vê que digo!.. Vinte mil pezos que trouxe
' de dote; parecenne que são alguma coisa, com sua licença.
Mari0o — Mais: valera que não tocasse n 'essa tecla. Maldito
«eja o dote e o primeiro patife que inventou enganar os homens
•de bem com esta patranha!. . . Um governo iilu?trado e ju^to de-
via remediar este abuso. Nenhuma carta de dote s*- devia fazer
até depois de seis mezes de casado. Asseguro que as coisas corre-
riam aoutro modo... Mas que succede.'* Um pobre rapaz affei-
çoa-se a uma donzella : os namorados são cegos e ordinariamente ■
estão com pressa. . . Os pães e parentes (e muito mais um tutor
-que comeu a maior parte dos bens) aproveitam-se d'esta vanta-
gem. O pobre noivo recebe por mrl o que nem vale cincoenta, e
ii'aquelle instante julga ter feito bom negocio na feira; mas, pas-
sada a precipitação, encontra o que eu encontrei: quatro bonecos
com titulo de pinturas, outras tantas mezas de nogueira, trapos e
trastes de cosinha... E fique vossa mercê logo responsável por
vinte mil pesos.
Mbíher^^Tuio isso será muito bem pensado mis não me
convence. O senhor era de maior edade, e se não teve juízo a
ninguém tem que lançar a culpa.
Marido — Se a senhora não se convence com isto,, a n-^im o seu:
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66^ ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
prtíceder é que me convence assaz para mudar dè vida para o fu-
turo. •
Muiher-^Bd^o-lht as máos pelo muito que me honra. Nfo di-
ria qualquer que ouvisse isto que sou uma mulher desacreditada?
Porque o mau proceder comprehende muito.
. Marido — A esperteza da senhora é oue adeanta de mais. Por
muitos capitulos se pôde ter mau proceder, e exceptuando isso a
que a sennora allude, os outros pontos não me podem dar muita
satisfação. Não sei se se recorda que estamos casados, nem sei que •
idéas tem acerca do laço que nos une porém. . ;
Mulher — Pois é muito fácil*.. De que estamos casados não
me esaueci nunca, ainda que ás vezes bem o quizera. Quanto ás
idéas aó nosso enlace, as que tenho, são que vossa mercê, sem
consultar o meu gosto, me: pediu a meus pães: que estes em vez de
consultarem a minha inchnação, só se detiveram a calcular os
rendimentos do senhor, tendo em conta que eu necessitava d'um
marido que pudesse manter-me carro, lacaios, creadas, e o mais
que correspondesse a uma dama da minha, qualidade: que em vir-
tude d'este calculo, me propuzeram a conveniência, não para que
eu usasse livremente da minha vontade, senão para que acreitasse
o partido, e que afinal, vim para sua casa, onde em logar de res--
peitos e obséquios que esperava, só encontrei semsaborias e con-
tradições.
. ifarido — Se são estas as idéas que tem do matrimonio, e, se
prescindindo da veneração que se lhe deve como Sacramento, não^
acertou a consideral-o como a mais suave das sociedades, e o mais
santo e inviolaveJ de todos os contractos, não me admira que
d'elle e de mim faça tão pouco apreço.
Mulher — (cantando) — Esta^ é otura, esta é outra, esta é outra no-
vidade. . . Ora bem, em que consiste esse pouco apreço? Em eu procu-
rar apparecer com decência? Com ella- me crearam e com ella hei de
morrer. . . Consiste accaso (hei de dizer tudo,. já que me excita) em
que não estou sempre mettida em casa? Em que recebo esta ou
aquella visita, e que estas não são d'esses velhos caducos, imper-
tinentes e rabujentos, ou d'esses Gatões com cabelleira de que o-
senhor tanto gosta? Em que vou uma irez por outra á comedia^ aa
passeio, a ver uma amiga, ou merendar ao canip^?... Pois, meu
caro- se consiste em qualquer d'estas coisas, queira enchef^tíáe
resignação, porque eu não estou resolvida á mudar de systema,
nem tive nunca vocação para ser enterrada viva.
Marido — Sim minha senhora; em muitas d*essas coisas^ con-
siste; porém não como a senhora o pintou, senão como na reali-
dade, e. Não consiste o pouco apreço em apparecer com decência,
sertío em gastar totalmente em loucuras e caprichos o que não^
pôde pagar, expondo o meu credito e estima a uma vergonha. . .
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FEVEREIRO 67
Também não consiste em neo estar sempre mettida em casa; mas em
tratar a sua casa- como os médicos os seus doentes. Isso porventura
fica bem a uma mulher de obrigações que deve cuidar de seu ma-
rido, de seus fittios, de seus creados e de sua casa?
Mv/fiet — Meu marido pode fazer o mesmo que eu; e se não o
faz, nem gosta de divertimentos, não hei de eu pagar pelo seu
génio melancholiço. Os meus filhos comem já por sua mão; os
creados farão a mercê de mè dispensarem de ser sua tutora; e a
minha casa não cahiu até aqui na tentação de mudar de sitio.
Marido — Deixe-me contmuar sem me interromper com dicho-
tes, que não lhe fazem muita honra. Digo que não está o pouco
apreço em ter visitas; pois sabe que eu mesmo tenho procurado
trazer-lhe as que me pareciam a propósito, mas está em que, não
fazendo caso d'estas, aesconsiderando-as, tratando-as com sobran-
ceria só dá attençâo a uma casta de homens que são a peste da
corte, uns mandriões viciosos, cuja occupaçao única é andar de
sala em sala e de passeio em passeio.
ÊÊulhar — Basta, basta, não se canse mais... Entendo-o.já. .
De maneira que não gosta de ver ao meu lado pessoas alegres, que
me acompanhem, sirvam e entretenham; mas só uns ginjas inúteis
e rabugentos, que a cada instante, nos vêem com um trecho de
moral, e nos quaes cada palavra minha encontra uma contradi-
cta... Não é assim?. .. O projecto é admirável.
^ar/</o— Senhora, não é assim.
Kulher — Seja como for, não ha duvida que o pensamento é
engraçado. . . Mas ainda não sabem.os qual é a intenção de V. Ex.a,
ou o meio de que intenta valer-se para despedir estes a que Cha-
mou mandriões.
Morído — Despeça-os a senhora, que sabe muito bem o miodo
de despedir pessoas. . . Faça com estes o mesmo que tem feito com
os que eu lhe trouxe.
Mulher — Que os despeça eu ! . . . E porque razão?. . . Que mal
me fizeram?... Nunca me escandalisei de me ver servida, nem de
que me tenham por form.osa; antes se hei de dizer toda a verdade,
tudo isto me dá muito go5to.
Marido — Ha de a senhora despedil-05 ou verá. . .
Mulher — Verei que não; e creia esta verdade que lh'a diz
quem a sabe.
Marido — Eu sou seu homem, e eu é que mando isto.
Mulher — Eu sou sua mulher e não quero fazer isso.
Marido — Não sei quem me contem, que não faça. . .
Mulher — Como se põe feio quando se zanga!. . . Se o meu ma-
rido se visse a um espelho, nunca se arrenegaria, porque fica tão
désengraçado, com uma cara tão feia !
Mariac — E com toda essa frescatã ouve isto? . . . E quando eu
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68 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
reprimi o meu justo desgosto, persuadido de que fazia maiseíFei o
a brandura, são estas as respostas que se me dão?. . . Pois, senhora,
saiba qu3 já estou cançado de suas loucuras* que não posso, nem
quero soffrel-as ; que se até aqui uma tola- bondade me tem feito
usar de condescendências, d* aqui por deante ha de ser ou:ra coi-
sa; e que desde hoje começa a mintia senhora uma vida nova, que
eu terei cuidado de regular.
Kulher — Valha-me Deus com tantas coisas 1 Pois não seria
mau pol-as por escripto ; porque realmente são engraçadíssimas,
e sentiria que me esquecessem... porém deixando esta conversa-
ção que já começa a enfastiar-me, mande-me pôr a sege, porque
quero sahir.
Marido — Não é hora de sahir,
miulher — Ora essa ! se são quatro I
Marido — Por i>so mesmo... Está enganada se pensa em con-
tinuar as tardes, noites e manhãs fora de casa. Já estamos n'outro
tempo : sahirá a uma visita quando haja motivo justo : também irá
ao passeio quando não tiver negócios domésticos que a impeçam,
mas eu é que a hei de acompanhar.
Mulher — O senhor!... Não faltava mais nada para se rirá
minha cuita toda a gente do passeio. . . Ora vamos 1 Não pode dis-
simular que está talhado á antiga.
Marido — Esteja talhado á antiga, ou á moderna, ha de ser
isto. Pouco se me dá de que haja meia dúzia de tolos que se riam
ae ver um marido acompanhar sua mulher... Elles tetím procu-
rado tornar ridiculo este u o e lá sabem porquê. . . Quanto a mim,
estou resolvido a não continuar a dar este mau exemplo. Nunca .
vae uma mulher tão bem acompanhada, como quando vae com seu
marido. Não quero entrar a examinar que mysterio ha em que as
mulheres, para bailes, passeios, visitas e outras diversões aborre-
çam tanto a Companhia do j maridos, mas é coisa bem dissonante
que se lembrem d'elles para arruinal-os em gastos supérfluos; e
para ir a um passeio, ao theatrò, ou á merenda se excluam absolu-
tamente estes, e só vá o cortejador, o vaido o, o peralvilho, e mais
caterva de vadios. . . Talvez me dirá que ha marido» que não iriam
ao passeio com suis mulheres, nem por toda a prata ao Potosi. De
accordo; mas tão mal me parece esta caturri:e n' um sexo como
ii'outro ; e emfim se ha homens que tem vaidade de ir com a mu-
lher do vivinho, e se envergonham de acompanhar a própria tião
<5U2ro eu imital-ps.
Mulher — Mudará de parecer, e senão o tempo o dirá.
f f Marido — Não mudarei decerto; o tempo e a reflexão tem impé-
rio sobre os caprichos, mas nf o sobre as resoluções ditadas pela razáo.
Mulher — Com que então se eu for ao passeio, ou ao theatro
quer-me acompanhar sempre?
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FEVEREIRO 69
lAarído — E* como dix.
Mulher — E é negocio decidido?
Marido — Nem mais, nem menos.
Mulher — E pensou bem n*isso ?
Marido — Tanto que náo haverá mudança.
3fi//Af»r^— Pois é uma grande pouca vergonha querer-me tratar
doesse modo.
Marido — Senhora, devagar...
Mulher — Náo estou com vagares I . . . Digo que é uma grande
pouca vergonha; e eu é que tive a culpa de me casar com um ho-
mem mesquinho.
Ma: ido — Cale a bocca.
Mulher — Sim ! . . . com um homem mesquinho.
Marido — Repare bem no que diz. ..
■ Mulher — Com um vilão indigno de beijar a terra que piso...
Marido — Cautela! que faço alguma...
Mulhbr — Com um miserável sovina, que me nega o mais ne-
<:essario.
Marílo — Menina, cuidado! que se me acaba a paciência.
Mulh^ir — Com um patife que me quer tractar como se eu fosse
uma escrava.
Marido — O' amor, olha que não posFo aguentar mais.
Mulher — Sim, sim, com um viláo ruim, biltre! ! . . .
Aqui confessava o bom Penftador matuitense haver deitado a
correr para râo presencear o desenlace. Eu deixei também o livra
porque o advinhava; tinha presenceado no ultimo terço do século
XIX diálogos muito parecidos ao escutado pelo pensador no segun-
do terço do século XVIIL e esta similhança me trazia á memoria
aquillo de D. Ramon de la Cruz, o festejado auctor dos sainetes
de então :
Loco estaba el mundo
Mil afíos atrás :
Loco le encontramos
Y asi quedará. . .
Agora só uma reflexão: — E* certo que ha mulheres gastado-
ras, e de mau génio; e homens não os haverá?. .. Só ajogatina^
a taberna, etc, de quantas famílias náo causam a ruinal . . .
10 — Quarta-feira — St* Escolástica, V. — S. Gui-
lherme, C. e Eremita, duque da Aquitania.
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70 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
— Esta Carta pesa muito, necessita outro sêllo.
— Pois com outro sêllo ainda pesará mais.
11 — Quinta-feira — Apparição de N. Senhora de
Lourdes. — A B. Joanna de Valois, Viuva. — S. Lazaro, B.
— Nasce o sol ás 6 h, e 4j w., e põe-se ás ^ h, e /f m.
N. S. DE Lourdes da Sé de JBragança
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i
FEVEREIRO 71
(S. Boaventura — ^Psalterio)
'l ^
E' feli^ o varãoy Tu és ^ntre as mulheres
que o nome teu, ó Virgem . ... berndita, abenfoada^
ama de coração, sobre todos os seres
Sua alma desde a origem, . tu brilhas sublimada,
o doce alento, Maria, porque teu coração-
fruirá, como bálsamo, virtuoso, é santo, é crédulo,
que tua graça envia. é vaso de eleição.
Qual tronco vicejante. De todas as domçellas
que a lympha rega em flòr^ disputas os primores,
trotando exuberante, e vences as mais bellas;
assim, jd com vigor e os célicos 'splendores
farás, que em si renasça da angélica cidade
áureo fructo, odorífero superas na excellencia
de justiça e de graça. de rara santidade.
Tua misericórdia
tua graça, reunindo
a harmonia e a concórdia,
p'lo mundo soa, infindo;
porque de tuas mãos
toda a obra magnifica ^ .
Deus preencheu de bênçãos»
P. Freitas.
12— Sexta-feira— S. Pedro Nolasco, C— st.' Eu-
Jalia, V. M. — S. Damião, soldado, M.
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72 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
A neidhelf batice na sciencia
A nomenclatura actual da chimica orgânica dá logar á for^
fnaçf o de termos e períodos que fazem lembrar a litteratura ne-
phelibata. Ahi vae uma amostra, que tiramos de um livro recente ^
«A oxyditrichloroethylidenadiamina que devia ser, pela rua
formula^ clinorhoolbica, e orthorhombica ; mas concebe-se muita
bem que a reunião de dois ou três prismas clinorhombicos dê um
prisma orthorhombico.»
Não é raro encontrar em publicações sobre aquella sciencia
palavras de trinta e mais lettras ; n'uma d*ellas cita-se o acido pa-
ranitrophenyldehydrohexonecarboxylico!
E' necessário fazer estações pelo caminho para se chegar aa
fim!
13 — Sabbado — Os SS. Fundadores da Ordem dos
Servitas. A B. Viridiana da 3.* O. — S. Gregório II, Pp-
M. St.* Catharina de Ricci,. V.
Tudo nos deve ser indifferente com tanto que o Coração de
Jesus esteja contente.
B. Margarida.
14 — Domingo da Quínquagessima — S. André Cor-
sino, B. 'C. — S. Valentim, M. — Ind. plen. da bulia.
Regra para conhecer e distinguir um hespanhol, um francez e
um allemão. Póe-se, deante de cada um, um copo de cerveja com
um insecto afogado no liquido. O hespanhol deita fora a cerveja
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FEVEREIRO
c o insecto. O francez deita fora o insecto e bebe a cerveja ; c o
allemâo bebe tudo : a cerveja e o insecto.
C^<X><X>-<>><X><X><<>-OC><D
15 — Segunda-feíra — Trasladação de Santo An-
tónio. — Os Santos Faustino e Jovita Mm. — S. Decoro-
so, B. — Ind. pL para os membros da Pia União de S.
António:
Uma coisa deves desejar, e é que em vida ou em morte seja
Deus sempre glorificado em ti.
Kempis.
16 — • Terça-feira — Beata Phillippa Mareria, V,
da 2.* Ordem. — S. Porphirio, M. — O B. Bernardo de Cor-
ieone, C. (Capuch.) — Lua nova ás lo h. e 28 m, da
manhã.
:^S^
O alcoolisiuo
o álcool é uma despega : primeiro inconveniente.
O álcool não mata a sede : quanto mais álcool se bebe, mais
sede se tem.
O álcool não nutre: nutre tanto como a chicotada o cavallo.
O álcool gera doenças: doenças de estômago, de intestinos^
etc, etc. Diga-o a medicina.
O álcool gera a loucura : 60 doidos sobre 100 devem a sua lou-
cura ao álcool.
O álcool gera o vicio : a este respeito não digo nada, com medo
de dizer muito.
O álcool gera o crime. As cidades, ou povoações onde mais se
bebe, são aquellas onde mais crimes se commettem.
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74 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
O álcool mata a geração presente, depois de a ter corrompido.
O álcool mata a geração futura : 5o o. © dos idiotas são élhos
de alcoólicos. 6o o/o entre os epilépticos. . .
Combata-se o alcoolismo :
Em nome da nossa bolsa, que tem muito a lucrar com isso.
Em nome da nossa ^aude, mais preciosa que todos os thesouros.
Em nome das familias^ que vêem inutilisados os seus mem-
bros mais prestáveis.
Typos Populares de Cabinda
Impassível, é uma palavra que só existe no diccionario dos
parvos.
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1
FEVEREIRO
— Disseste a essas senhoras que me procuraram, que eu não
«stava em casa?
— Sim, minha Senhora.
— E que disseram ellas?
— O' que fortuna!
Typos populares de Cabinda
Durante a Quaresma podem os que tiverem comprado a Bulia
c ©"Indulto quaresmal, comer carne, excepto nas sextas-f eiras e sab-
bados e nos dias em que n*este almanach se preceituar abstinência
rigorosa. — Podem os mesmos usar de temperos de qualauer gor-
dura em todas as refeiç5e$, excepto nos ditos dias.— No Norte do
reino (Minho, Douro e Traz-os-Montes) póde-se, por co5ítume in^-
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76 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
memorial, usar sempre de adubo de unto c redenhp, vulgarmente
chamado, adubo magro.
Todos os dias de jejum durante a Quaresma, teem indulgên-
cia plenr:ria para os que comprarem a Bulia.
17 — Quarta-feira (de cmze) — yejum (até á Pas-
choa)— abstinência rigorosa. Por uso imtnemorial no Douro,
Minho e Traz-os-Montes, pode-se adubar com unto e
redenho, — S. Faustino Martyr, M. — St.* Beatriz, V. — Pro-
hibem-se as bênçãos nupciais até ao iJ* domingo depois da
Paschoa. — Pequena gala.
POLEMICA RELIGIOSA
«A religião, dizem alguns, é só boa para of: mulheres e para
as creanças,>» porque são seres fracos; mas quando se chega ao uso
da razão, quando se conhece perfeitamente o bem e o mal, já não
é precisa para nada.»
Que loucura ! Basta observar que quem conhece o bem e o mal,
por isso mesmo que o conhece, está em condições muito peiores
que as creanças; pois que a consequência fatal. d*esse conhecimento
e augmentarem as tentações e os perigos, crescendo assim também
a necessidade de auxilio sobrenatural, que só da Religião nos
pôde vir.
A Religião nso serve só para fazer conhecer o bem, e aborre-
cer o mal ; dá também os meios para evitar este e procurar aquelle^
— oooo—
18 — Quinta-feira — S. MarceUo, Pp. M. — S. Si-
meão, B. M. — S. Theotonio, i.^ Prior de St» Cruz de
Coimbra.
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FEVEREIRO 77
CONSELHOS E RECEITAS
CONTRA A MORDEDURA DOS MOS:^UITOS
Estamos no tempo em que os mosquitos mais incommodam,
chegando n*algumas partes a constituir uma verdadeira praga.
Um meio simples de attenuar consideravelmente o inchaço e a
comichão resultantes da sua mordedura, é humedecel-a com saliva.
19 — Sexta-feíra — S. Conrado, C. da 3." O. — O
B. Álvaro de Córdova. — Ind. ,Plen. para os Irm. Terceiros.
^%^
 aaual geração morre por chasquear de tudo o que nós admi-
ramos.
Th. Gouthier.
O crime por mais que se esconda, tem lume do inferno que
fumega sempre.
Camillo.
20 — Sabbado — S. Eleutheno, B.— S. Raymundo
de Pennafort, C. — St.** Paula 'Barbada, V. — 25'.*' anníver-
sario da Eleição de Sua Santidade o Papa Leão XlIIy
(20 de fevereiro de 1878).
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78 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Consegue-se introduzindo uma sanguesuga n*um vidro de crys-
tal que contenha três quartas partes de agua.
Quando a sanguesuga está quieta no fundo indica bom tempo;
quando sobe indica, variável; subindo até acima, chuva; e se se
meche muito, vento.
jM^ERcuLES chegara precisamente á- idade, em que se torna neces-
^/ sario ao joven sensato e previdente, estudar a carreira a se-
guir, no precurso mais ou menos longo da existência.
Para esse fim, acolhera-se ao deserto, onde ao abrigo da soli-
dão e do silencio interroga a serio a sua consciência.
Com o espirito occupado por milhares de pensamentos,
caminhava a passos vagarosos, quando de chofre, no extremo do
pequeno valle, que lhe era todo o abrigo, defronta com dois ca-
minhos.
Por cada um d'elles, vem uma mulher, correndo ao seu en-
contro : ambas bcllas, formosas ambas.
A* primeira impressío uma era tão grave e modesta, como a:
outra parecia leviana e vaidosa.
Despojada de adornos, trajando um simples vestido, mais
branco que a pura neve cabida no cimo das n:ontanhas, — a pri-
meira possuia o segredo de produzir um arroubamento na alma,
misturado d*um grave respeito á sua belleza augusta. — A segunda
carregada de europeis, toda cheirando a vaidade e soberba, traba-
lhava cuidadosamente por acarear a attençáo e o seu olhar só
bastava para lançar a perturbação no espirito. Dirige-se ao joven
e assim lhe fallou : — «Galhardo joven, vem após de mim çor este
caminho bordado de flores! Anda commigo até lá baixo até
aquèlles bosques onde formarei uma coroa de rosas e poisar-ta-ei
fobre a tua fronte!
Vem ! Abunda no micu palácio tudo quanto pode lisongear e
embriagar os sentidos! Lá não resoam os ruidos do perpassar
continuo da plebe, nem os carpidos lancinantes da desgraça; nem
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FEVEREIRO 79
as vozes invejosas da intriga; —tudo é repouso tudo são encantos,
tudo são delicias n*aquella vivenda encantada.»
Emquanto isto se passava, eis que, a passo grave, vem appro-
ximando-se a mulher do vesitido branco. Toma uma attitude nobre
e modesta, desprende os lábios de carmim e falia também :
— «Oh jovem, vem antes commigo! Tu que tens um coração .
nobre e puro, trilha os meus passos ! Esperam-te os combates ru-
des e os feitos heróicos, todos os sofFrimentos que temperam, e
engrandecem a alma ! »
— Onde me quereis levar, pergunta o jovem indeciso, e quem
sois vós ?
— «Eu sou a Volúpia, respondeu uma: levo-te commigo á
regão do Prazer ! »
— «Eu sou a Virtude, respondeu a outra: convido-te a se-
guir-me até á pátria da Honra !«
Hercules ouvindo isto, determina-se immediatamente.
Era generoso em demasia para dissipar a juventude em pra-
zeres ephemeros: Lança um sorriso desdenhoso á Voluptuosiaade
e encaminha-se pela senda áspera e gloriosa da Virtude.
Esta historia, meu caro jovem, é uma fabula, mas esta fabula
é ou será a tua historia.
Praza a Deus que em face da grandeza dos sacrifícios, nunca
vacilles na escolha do caminho, que conduz não ao Prazer, mas á
Honra.
A Greci^ fez de. Hercules um semi-Deus — Deus fará de ti um
santo e o Céo um predestinado.
(Amil).
21 — Domingo (i.° da Quaresma) — St/ Angela
Mericia, V., da 2.^ O. -= S. Maximiano, B. — Ind. p/n. para
os Irm. Terceiros — Os membros da Confraria do Rosário
podem ganhar ind, pln. em duas sextas feiras durante a
Quaresma, d sua escolha, — Ind. plen, da Bula»—r-Nasce o
sol ás 6 h. e 34 min, e põe-se ás 5 e 20 min*
' Mah se ganha nos paços ás barretadas, que na campanha ás
lançada».
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8o ALMANACH BE SANTO ANTÓNIO
PACIÊNCIA
Faz-se com um baralho de cartas.
Tirám-se do baralho successivamente duas cartas de cada vez
e voítam-se Sobre a meza uma por cima da outra. Sempre que ap-
parece um az póe-se de lado ; quando apparece o duque do mesmo
naipe póe-se em cima do az, depois o terno e assim successivamen-
te 9té chegar ao rei. Depois de se deitarem na meza todas as cartas,
apanham-se na ordem em que ficaram, voltam-«e e recomeça-se
do mesmo modo.
Faz-se a paciência quando se completam os quatro naipes.
22 — Segunda-feira — St.* Margarida de Cortona,
Penitente, da 3.* O. — Indulg. Plen. nas igrejas francisca-
nas — Ind* pln, para os Irm. Terceiros.
SE TODAS AS MÃES FOSSEM ASSIM
"TOiRA eu um rapazola dos meus dezoito annos, refere um digno
^JT' sacerdote, e vindo da escola um dia, proferi, sem pensar no
que dizia, uma palavra grosseira em casa, palavra que eu tinha
ouvido pronunciar a um meu companheiro por varias vezes.
Passou-se isto na cozinha onde estava minha máe mui afana-
da em suas occupaçóes. Ouviu ella muito bem o que eu tinha dito
e não ítz mais que lançar-me um olhar severo acompanhado d'esta
breve reprehensão : «filho, esta palavra nunca mais ha-de sahir de
teus lábios».
Por aquella vez bem me escapei eu, , . . inclinei a cabeça e co-
rado de vergonha sahi sorrateiramente do logar.
Depois de jantar, me disse aquella boi máe: «Zé, vem com-
migo a meu quarto». Vacilei um pou:o, sem saber em que viria a
parar aquillo, mas tive de sejuil-a, ainda que com pouca vontade.
No aposento de minha máe havia um grande e muito devoto
crucifixo, ante o qual costumava ella ajoelhar-se com frequência.
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FEVEREIRO . Bi
Collocou*me defronte d^aquieUli commovectora knageâi e com
~\oz insinuante mas repassada de carinho/ dirígiu-me estas pala-
vras : «meu filho, esta manhã offendeste a este Senhor de Summa
Bondade com aquella palavra grosseira que sahiu de teus lábios.
Bem sei que tu ignoras o que ella significa e por isso mesmo ^não
quero castigar-te por esta vez. Porem repara bem no que te digo:
munca mais ha^de sahir.de tua bocca esta nem outra palavra- simi-
Ihante ! £ agora ajoelha-te commigo e pediremos ao. nosso Boip
Jesus perdão e misericórdia por essa palavra feia, rezando cinco
Padre nosso > em reverencia das Cinco Cnagas que padeceu por nós.»
Cahi em joelhos junto de minha mãe e ambos rezamos alter-
nadamente os cinco Padre nossos.
A impressão que em meu coração de criança produziu este
-modo de reprehender foi tam profunda, que jamais se apagará de
minha' memoria.
Oh ! se tantas mães que se qusixam de não poder trazer ao
bom caminho os seus filhos, os tivessem corrigido assim desde
crianças I Quanta eíficacia tem a mais uma reprehensão grave e
•serena, alliada. com a piedade, do que tantas outras cheias de có-
lera juntas a castigos cruéis, filhos da ira vingadora mais bem que
•do zelo?! Estas em vez de conciliar o respeito aos pães rebaixam
sua dignidade originando nos filhos o desamor e um ódio recon-
centrado !
Oh ! se houvesse muitas mães como esta ! . . .
(De El Mensageiro del Corazon de Jesus).
23 — Terça-feira — A Cadeira de S. Pedro em An-
tiochia. — S. Lazaro, Monge. — S. Pedro Damião, B. Car-
•deal e Dr.
Mulheres e perfumes, tudo são fumov
D. Francisco Manoel de Mello.
\
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ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
' 24' 5 — Quârtâ-feiraL'— (Têmporas) S: Sérgio. —
Quarto, crescente ,ds lo h, è 32 .min, da n^anhà. , '
Réis e bellicosos; reis e pòliticos; reis e deliciosos, quanto
quizerdés, mas i-eis e santos muito poucos.
f • ' * P. António Vieira.
.25 — Quinta-feira — S. Mathias, Ap. — Ò B. Se-
bastião de Apparicio, C. da 1/ O. — S. Cesário, irmãode
S. Gregório Nazianzeno.
A Providencia- não deu barba ás mulheres, porqua ellas,.
nem barbeando-sé, se calariam.
26 — Sexta-feira (têmporas) — SS. Lança e Cravos
dó Senhor — St.*" Ignacio, B. M. — S. Torquáto, M., Ar-
cebispo de Braga.
iUUnO DOS FILI??ES
(thomar)
Contíguo ao de Santa Barbara, amplo^ magestoso noi seus
quatro lanços com duplas galerias, talhado em soberba cantaria,
finamente matisada, constitue a maii opu!enta e formosa de quan-
tas obras nos ficaram da archi^ectura da Renascença.
A exhuberancia decorativa das suas n-ultipias columnas é-lhe^
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FEVEREIRO 83
talvez, prejudicial; comtudo, o claustro dos Iii}it?pe«' tem 4|ue. ver
e que admirar.
Claustro dos Fiuppzs (Thomar)
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«4 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
27 — Sabbado — (têmporas) — A B. Eustachia, V.
da 2.' O. — A B. Christina, V.
Um sábio sem obra é uma nuvem sem chuvas.
A educação é tão poderosa que ehega a domesticar as feras.
S2SÍSÍS
28— Domingo (2.** da Quaresma) S. Romão, Abb.
A mais sublime de todis as phiiosophias é conhecer a Jesus
crucificado.
S. Bernardo.
29 — Segunda-feira — B. Thomaz da i.* O.
•^^ ^Xv^^^9%S^í^
ACAÇA DAZEBRA
fE uma descripcão de viagem ao Kilimandjaro altamente im-
portante de M. J. Chanel deprehendem-se curiosos episoi"os
sobre a casa da zebra, ou antes sobre a maneira singular como se
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I
FEVEREIRO 8;f
I
i
Cidade da Horta (Faial — Açorfs)
porta este gracioso animal em face do caçador. N'esta região não
raro se encontram rebanhos de 200 cabeças para cima; manobram
com extraordinária regularidade como se obedecessem á voz de
destro commandante. Quando, porem, de improviso as surpre-
hende o tiro do caçador, em continente começam a saltar deses-
peradamente, a dar gritos estridentes e selvagens, similhantes ao
latido do cão; em seguida póem-se todos em fuga. Se, passados
3oo ou 400 metros, não descobrem o caçador, formam de novo
esquadrão, como o faria um exercito bem disciplinado. Todas as
cabeças estão symetricamente erguidas, e os ouvidos attentos para
o logar d'onde viera o tiro. Se se restabelece a calma, recomeçam
a pastar ; algumas sentinellas, porém, observam de continuo o
horizonte.
A sentinclla está exposta a ser morta ou ferida. No primeiro
caso as zebras, depois de se porem em marcha ordenadamente,
param muitas vezes a poucos metros de distancia e vão bafejar o
corpo ainda quente do mallogrado camarada. Ficam por instantes
immoveis, afastando-se depois mui de passo, a não ser que novo
alarme as faça fugir de novo. No segundo caso resguardam o fe-
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86 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
rido com rara habilidade ; se, porém, o rovo tiro urge accelerar
o passo dois ou três companheiros o esperam e defendem ; os que
fugiram, poucos metros andados, porém, olham para traz, e n£o
proseguem caminho, sem que os que ficaram, os alcancem.
Curioso, nâo acnam?
Esta solidariedade entre anmaes deixa confundidos alguns
homens para os quaes a vida rão parece mais que a guerra de um
contra todos, como cyricamente ensinava Hobbes.
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Jyíarço
Em terras quentes semeia, no crescente da lua, pepinos,
melões, abóboras e alface.
Dispõe buxo e murta, enxerta videiras e arvores serôdias.
No minguante semeia flores e limpa arvores ;
lavra os campos, traspíanta roseiras, faz mergulhias e alporques.
1 — Terça-feira — A B. Mathias de Nazareis, V. da
2.* O. — Santo Adrião, M. — S. Rosendo, portuguez. — N*este
dia nasce o sol ás 6 h. e 23 m.^ e põe-se ás § h. e 2y m.
Durante o mês crescem os dias i h, e 2 m.~ Os que fize-
ram o mês de S, José, ganham por cada dia 300 dias de
indulgência^ e uma plenária n*um dia qualquer do mês á
jua escolha.
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CONTO PARA AS CREANÇAS DO CATECISxMO
— Pap^ xxmq se chama o menino do vizinho que hontem
veio para a tâsá diali?' . >
— FJWio.
— Então é como eu?
— E', e tem seis annos como tu.
— E também lê no livro e sabe rezar?
—Ler talvez; rezar não porquê o pae d'elíe nem á missa vae:
' — Entáo é mau, pois não é píapá?
— E\ meu filho j quem não vai á missa, nem se confessa nem.
reza, è mau.
— E o menino d*elle sabe jogar o pião?
— Não sei, amanhã pergunta-lho.
— E eu posso jogar com elle?
— Podes com tanto que não faças marotciras?
«—Eu não sei. cOmO' se fazem. . • . í
—Pois não aprendas com tíUe; e sç elle as souber fazer dis^
mo, sim.
\ ^Diêo.
Julinho podia jogar o peão; foi o que elle qiíiz ouvir. Havia
dous annos que ficara sem mãe;. o mano^maís velno sahira de casa
para ganhar a vida; a única casa que havia n^aquelje arrabalde da
cidade estava sém mclino á mais de um anno, e o pobre do Juli-
nho passava o dia em casa a brincar com os dedaes e agulhas e
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MARÇO 89
Segredo dos Dois
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90 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
com os carrinhos das linhas do açafate de costura da avó. Depois
de um anr.o de prisão um companheiro de pião vinha a matar.
Isto passava-se á ceia. No finG| da reza o Juiinho pegou no
piéo enlaçou-lhe a baraça e metteu-o debaixo do travesseiro.
De noite quanto nao sonharia a creança com pião e crearçis
aodesaf.o?..
Ao outro dia os dois Julinhos lá estavam na rua: de cabellos
loiros o do vizinho, pretos de azebiche os do outro .
Como se apresentaram, como se fizeram os primeiros cum-
primentos, como se convidaram pela primeira vez para o jogo,
elles lá o souberam; o pião é que teria sido o pretexto para essa
camaradagem.
O certo é que o dos cabello> pretos deitava o pião e o dos
cabellos loiros observava a agilidade do companheiro. Depois pas-
sou-o para as mios do Loirinho e ensinou-o a enrodilhar a bara-
ça e a deita-lo .
— Então Quem deita melhor o pião.
— O Julinno já quasi que sabe, papá í
— Vamos a ver, meu Loirinho — disse Ernesto passando a
irão meigamente pela loira cabelleira da creança.
Juiinho, o Loiro, enleou a baraça e arrumou com o pião para
aquella rua como se fora uma pedra.
— Sim senhor, está bem. — E subiu as escadas para jantar que
«ram horas.
Minutos depois assomava á janella para chamar o seu Júlio
de cabellos pretos para jantar. Estava a segredar ao ouvido do
Loirinho.
— O' minha mãe, — chrimo^ Ernesto parado dentro, — quer
ver: os garotos jl teem segredos.
— Olha pari aquillol — exclamou a avosinha chegando-se de
mansinho á janella.
— Olha os pimpõe-í! Mas não vá, Ernesto, levar a mal a com-
panhia o nosso >Í2Ínho; dizem que não é boa rolha.
— E' fraco christã), mas parece bom homem. E dizem que
ouanto ao filho, não se empoita; desde que lhe morreu a mulher
aeixa anda-lo ao deus dará.
— Chama-o que está o caldo na mesa.
— Menino, deixe ficar o pião ao Juiinho e venha cá já.
Os dois cochicharam mais uns segredos, e o dos cabellos pre-
tos galgou as escadas d'um pulo.
—Papá, papal. .. !
— Que queres? Anda que vamos jantar.
— O papá ha de dar-me outro pião para eu dar ao menino
Jullo, sim?
— O pae que lh*o compre.
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MARQD -91
— Elle diz que o pae d'elle que lhe nâa dá nada*
— Pois sim; trago-to á noite.
— E traz-me também baraça?
— Pois sim, filho; trago-te tudo; agora janta que te arrefece
o caldo.
— E' que depois jogávamos á galla.
— Não galleis vós a nvca qualquer dia • • .
Ernesto acabou de jantar, rezou com o pequeno, ç sahiu para
a typograhia.
— O papá náo se esqueça do pião e da baraça, não?
— Não; mas has-de ensinar o Julinho a rezar.
— Pois sim, papá. Entáo não lhe esquece, náo?
— Não esqueço, não homem.
E sahiu.
Os dois dos segredos juntara m-se logo .
Pela tarde a avó do Julinho da cabelleira preta, chamou por
«He, tornou a chamar mas náo deu fé d'elle.
— Já começam os segredos a fazer fructo — rosnou pouco
contente a velha.
Punha-sc o sol e o Julinho sem apparecer.
— Foram aos ninhoí^, ficaram-se pelas bordas aos morangos,
mas deixa estar que os s^redos ...
E a avosinha ascenou com a cabeça ameaçando em sêcco.
Pelo cahir da noite Ernesto ao voltar da fabrica, passando
pelo cemitério, viu os dois dos segredos ajoelhados sonre uma
campa de nr.ãos erguidas a rezar.
Parou a observa-los.
Acabaram a reza, e o JulinJ;io da cabelleira preta pegou do
hvssope ç aspergiu a campa com agua benta. O Loirinho olhava
aamirado para aquillo.
Ernesto por de traz do tronco d* um arcy preste observava tudo
com duas lagrimas nos olhos.
—Como deve alliviar a alma de nrinha mulher a oração does-
te anjo que ella me deixou I — Dizia no seu coração.
Os dois pegaram-se amigavelmente pela . mão e sahiram. Er-
nesto escondeu-se para lhes expiar a conversa.
— Mas para que rezar. por tua mãe, se ella já não está viva?
— Perguntava o Loirinho.
— Para que esteja no ceu e para que eu a torne a vêr.
— »E se rezares por ella tornas a vê-la.
— p' se torno 1 . . .
—Quando?
—Quando eu for para o ceu lá estará ella á minha espera.
~E eu também posso vêr outra vez a minha?
— Também.
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^ ALMANACH M: SANTO ANTÓNIO
— E aon<k posso* Té^la?
— No ceu se ella foi boa.
— Se era toa! Muito melhor que meu pac.
— Pois se souberes rezar, e a doutrina, e fprcs á primeira
communh^o has-de ver tua mãe outra vez. Inda m*o disse hon-
tem o papá.
— E o teu papá sabe da tua mãe? .
— Sabe.
— Mas eu não sei rezar, nem a doutrina nem sei ir á primei-
ra communhão! . . . Entáo não torno a vêr a minha?
— Mas o Senhor abbade ensina-te. Amanhã vaes commigo ao
catecismo e lá aprendes. ,
— E aonde e o catecismo?
— E* na egreia.
— Mas o papa não me deixa entrar nas egrejas.
— Mas olna — e deitou-lhe a rrâosita pelo hombro para lhe fa-
lar ao ouvido — amanha é dia de catecismo; nós de tarde vamos
jogar o pião para a tua porta e quando elle sahir, vamos ambos.
— Mas se elle o sabe. . . mela-me com íueirada; que elle é
muito ruim. , , ,
—Mas elle rão o sabe; também não te queria deixar ver o ce-
mitério e já lá fomos e elle sem o saber.
— Mas pode sabê-lo, e elle não era como era a mamá^
— Pois o meu é. .
Ernesto a estas ultimas palavras deixou correr as lagrimas, e
pé ante pé subiu as escadas da casa sem que dessem por eUe os
dois amigos. - .
Conieçava a escurecer. Elle,a chegar ao topo das escadas, e a
avozinha toda escandalisada.
— O' Ernesto! Olha que o pequeno ainda não appareceu; nem
á merenda veio. Não vá ás vezes o do vizinho ou mesmo o pae
d*elle ensinar-lhe o que não deve saber. .
— Não ha duvida, minha mãe: eíles vinham agora do cemité-
rio com muitos segredos. Não tarda ahi.
— Papá! papá! ....
— OM ahi vem elle. Já sei o que quer.
E Ernesto metteu a mão ao bolso.
— O pião e a baraça, papá?
— Aqui os tens. Mas já ensinastes o Julinho a. rezar.
— Já rezou commigo na campa da mãe, no cemitério i «
— Está bem reza muito por ella.
E virou-se para occultar as lagrimas da viuvez.
. Emquanto o pequeno estriava o pião na sala, Ernesto debru-
çado sobre o encosto de uma cadeira, pensava na feiecidade dos
que têem uma esposa para tomar o devido cuidado dos filhinhos
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MARÇO 93
« para lhes ajudar a levar o peso da vida de um pae. As lagrimas
<aniam-lhe no sobrado duas a duas.
O Julinho dos cabellos pretos pouco se lhe dava das tristezas
<io pae. Tinha -um pião. novo; o outro dava-o ao Julinho do vizi-?
*3iho: no outro dia depois da missa jogava á ^alla. ; . estava rico.
No outro dia de manhã lá estavam os dois a desaíiarem-se.
Até ao jintar náo fizeram outra cousa.
Depois do jantar recomeçaram a faina, mas com certa preo>
<upação. A's duas por trez lançavam o> olhitos para a porta da
casa do Loirinho. Estavam á espreita, a ver quaâdo o papá
«doeste sahia, para fugirem para o catecismo.
— Talvez já sahisse. — Disse o da cabelleira de azebiche ao
ouvido do Loirinho.
— Ainda está a acabar de jantar.
Depois de uma partida mais, abriu-se a porta, e sahiu o ho-
mem com o seu fato domingueiro.
— Então o que se faz por aqui? Joga-se o pião? Quem joga
melhor?
— E' o Julinho.
— E tu já jogas.
— Ainda jogo pou:o.
— Está bem; Não se magoam, nem se sujçem, sim?
— Sim, senhor....
Apenas virou costas os dois segredaram quilquer coisa e en-
traram em casaca correr e sahiram logo com as boinas na cabeei-
ta, e por aqu^lla. TU JL abaixo,. ó pernas para qu3 voi quero, lá vão
•em direcção á igreja.
Iam em doido fugir, quando uma voz roufenha de velha, —
Onde vais Júlio — lhes quebrou a carreira.
— Vamos para o cathecismo, avó.
— Ainda é cedo.
— E' que o Julinho queria ver a igreja antes.
A um gesto aííirmativo da velha avó, continuaram na sua
carreira.
O que se passou com os dois no cathecisrro elles lá o sabem;
o que é certo, é que o* Loirinho íicoj fora de si com os santos,
<:om os altares, ço.n as luzes, com os cânticos, com tudo o aue
viu na igreja, onde nunca tinha entrado. A partir d*aquelle do-
mingo sempre que apanhava o pae fora abalava co n o tal collega
<io pião e ia para a cgreja rezar e ver tudo aquillo de que tanto
gostava.
D'ahi em diante os piões foram postos de parte.
A communhão dos meninos era d'ahi a oito mezes, e os dois
Julinhos queriam saber a doutrina bem, para fazerem a primeira
communhão, para depois irem ver as suas mamãs. Era esta inno-
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94 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
cente crenja quasi o único móbil de tantos cuidados. Já nâo hdfvia
piões, havia catecsmo todos os dias. A' tarde depois da escola a
julinno dos cabellos ptetos sentava-se nas escadas que davam para
o pateo, c lia o catecismo. O Loirinho ouvia com attençáo. Parava
o leitor de estantes a estantes e fazia ao connpanheiro as pergun-
tas pelo catecismo, depôs passava o livro para o ouvinte que lhe
fízia as mesmas. Estudada assim uma lição pássava-se a outra.
Este estudo findava cosi a luz do dia. Jiilinho o Loiro despedia-se
e entrava em Cisa. ' •
-^DWde vens Júlio, a estas horas?
— De casa do Julinho, papá!
— Que tens tu que cheirar tolos os dias em casa d*elle.
Julinho ficava-se calado.
Este interrogatório dava-se todos os dias quando o Loirinho
chegava a casa depois do pae. Mas como nâ:) passava d'aqui, o Ju-
linho pouco se lhe dava e o catecismo entre ambos continuava
cada vez com mais fervor.
D'entro em poucas semanas nzo havia entre as cre ancas da
catequese qusm melhor respondesse ás perguntas do Senhor Ab-
bade. Tolos engraçavam con as duis creanças a quam chamavam
irmãos gemeo3. Já tinham ganhado muitas medalhas e santinhos
em premio.
O pai do Loirinho, andava já desconfiado; tinha dado pelst
falta do filho em alguns domingo;, tinha-o visto algumas vez*s
vir no caminho da egreja e sobre tudo causava-lhe infipres?áo na
mioleira o porte da cre anca. Desde quí começara o fadário do
pi?o e os segredos com q Júlio dç visinho, o louro an o erá multo
mais dócil e obediente, nada* lhe era pesado, não dava uma res-
posta mal dada, estava sempre prómpto para tu lo; e de mais a
mais pedia-lhe a benção no fim da mesa, antes de se ir deitar e â
noite qumdo chegava da fabrica, coisa que nunca lhe ensinara.
Reparava n*isto o mau christão, mas não se importava ; dei-
xava correr, porgue afinal tinha outros maiores amores que aquelle
filho, embora criminosos.
E ò Julinho loiro e o Julinho doscabellos pretos continuavam
a aprender o catecismo, a ser bons e a aprender a doutrina para
irem â primeira còmmunhãó e verem as mamãs.
O porte das duas creanças a tolos captivava e os conhecidos-
chamavam-lhe os dois anjinhos.
Quanto ao pai do Loirinho era certo que se sentia mu to mais
affeiçoado ao seu filho que d' antes. Tinha um coração bom e sen—
sivel aos affectòs de dedicação e amor e a bondade qu3 o seíi anjo
loiro' lhe mostrava quando o cumprimentava á noite aó chegar a
casa, o beijo que lhe poisava na mão trespassava-lhe do:e mente a
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MARÇO 03
alma. Viu-se obrigado por tanto carinho angelical a mostrar-se
grato e um dia trouxe ao pequeno uma flauta de barro.
Julinho ficou como umas páscoas. Ha que tempos qu2 seu pae
lhe não dava um bonitinho 1
— O papá dá*me a gaita porque eu sou bom, pois não dá?
— Dou meu filho dou. Julinho beijoj-ihe a mão em signal dè
agradecimento. Ernesto oarvou-se insensivelmente e sem saber
como deu um beijo no loiro Julinho. A creança, doida de conten-
tamento, pois se era o primeiro osculo que recebia de seu pae de^
pois de ficar orpháo, pendur o u-se-lhc no pescoço, e beijou a face
do que agora começava a ser seu pae. Ernesto apertou nos braços
tremulos.de alegria, O loiro anjinho vendo-se no collo do pae pela
primeira vez depois de quatro anno3 de orphandade continuou na
sua co-iversa de. gosto con uTia candura seraphica:
— Entáò eu já sou bom papá pois não sou?
— E's meu iilho és — e estorvava com a dire*ta as lagrimas
de amor paterno que lhe queriam rebentar dos olhos — por isso
te dei esta flauta. '■• \
*— Então — continu ou Julinho passando a mãosita pelas longas
suissas do pae -^ já posso ver a mamã?
— Onde a qu3res vêr ! — E continuava a reprimir as lagrimas
eo3 soluços que lhe sofFo:avam a voz.
— No céu; o menino Júlio diz que os orphãos bons e que sa-
bem o catecismo e que vão á prime.ra communhão vão vêr as ma-
mãs. Elle vae vêr a d'elle.
—Pois sim filho, podes vel-a; vae com elle. '
— E o papá não qu2r também ir vêl-a?
— Qu3ro, vamos ambos. Ernesto queria chorar á vontade e
para se t rar das innocentes interrogações da creança accrescentou.
— Vae experimentar a flauta.
E poisou a creança no chão e retirou-se para o quarto.
— feem me parecia que aqui andava mais que pião. De pião
passou a catecismo. . .
Feliz creança I Tivesse eu a simplicidade da tua fé para acre-
ditar no céo... — para vêr tua mãe que eu julgava morta para a
vida e para o meu coração !
E chorava, chorava muito. Julinho lá fora na sala atordoava
tudo com a flauta, e os desconcertados apitos da gaita repassavam
como setas o coração de Ernesto. Era um anjo a reprehender
um criminoso; a innocencia em doloroso confronto com o re-
morso.
Este primeiro abalo da graça divina passou. Ernesto ceou,
deito j-se e recomeçou a sua vida ordinária, fiscalizando com tudo
os passos do filho mais por curiosidade que por contradizel-o.
Logo na noite seguinte observou que o pequeno se demorava
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96 ALMANACH 0E SANTO ANTÓNIO
com a luz accésa antes de-4<Htar-áe, lims não se unportou. Na noite
seguinte egual demora.
— Hei de yêr o que faz o pequeno.
E foi esprèital-o pela fechadura. .
O Loirinho levantou o enxergão, tirou um livrinho, ajoe-
Ihou-se aos pés da cama, desatou a blusa tirou do seio unias me-
dalhas, beijou-as, abriu o livrinho tirou uns santinhos, beijou-os e
p^*os sobre a cama; tirou do pescoço umas contas e começou a
TBzal-as. Em seguida rezou alemãs orações pelo livrinho. Ben-
zeu-se; depois despiu-se com encantadora modéstia, sentou-se na
cama^ fez o signal da cruz, apagou a casdeia e deitou-sc.
Ernesto observara o filho commovido e retirou-se com as la-
grimas nos olhos.
— Que sonhos celestes não terá este anjol... dizia comsigo.
— Feliz creançal Saboréas fructos que teu pae mal chegou a pro-
var, perdeu bem cedo a innocencia, e consciência nunca mais a
teve...
Deitou-se, fez esforços por dormir, mas as vozes da conscien^
cia nâo lhe deixaram pregar olho. Nunca suppôz que a vida des-
regrada era tão amarga como n'essa noite de remorsos.
E revirava-se um milhão de vezes no leito que só agora lhe
parecia de pedra.
No quarto fronteiro Julinho resonava placidamente :
^ — Era a antitese do pai criminoso I — »
" DejSois de um século de viravoltas accendeu a luz para ver as
horas. Eram cinco. Levantou-se para ir para a fabrica e como de
costume abriu a porta de Julinho, accendeu-lhe a luz e chamou-o
para se levantar.
Sahiu, cerrou a porta e poz-se á espreita.
Juiinho ergu2u-se, sentou-se na cama, fez o signal da cruz,
vestiu-se, lavou-se e murmurando quiesquer preces, levantou o
enxergão, pegou no livrinho e rezou durante alguns minutos. De-
pois tornou a fazer o siçnal da cruz e levantou-se. Ernesto fingiu
passear na sala immediata. JuHnho sahiu e comprimentou o
pae.
— O papá passou bem a noite, e beijou-lhe a máo.
— Nem por is o; Deus te abençoe.
Era a primeira vez qua invocava o nome de Deus depois da
viuvo. E qu2 havia elle de responder áquelle anjo qu2 lhe pedia e
benção? A consciência dizia-ihe que não era digjio de abençoal-o.
Deus pois qu2 o abençoasse, pois de Deus era.
— E tu dormistes bem?
— O' se dormi ! . . . E sonhei tanto, tanto com a máe.
— Então qu5 vistes?
— Via a mãe, e muitos meninos muito lindas com azas e ella
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waíqo ^
%lisse-mê qUe tm f«^ndo a prkneira commmlhão que ia para o pé
<l'ella... '
— Está bem, — atalhoa Ernesto para não ouvir nuás^ — vafe
•contar o s^Hiho ao menino. 4o vizinho.
— £ o pai vae já para «í fabrica ?
— Vou, Que não é cedo.
O Loirinho sáhiu logo p^ra a rua á procura do cotManheiro
do catecisrro e do piáo.
• A avó doeste ao descer às escadas, 9entiu-K>s a cochichar^ e fí-
cou-se de traz da porta á escuta. N^
— Tainfeem rezastes á noite, e esta manhã pelo livrinho ^omo
manda a Senhor Abbade ?
— Rezei.
— E o teu pae não viu?
— Não, qu2 eu escondo o Jivrinho debaixo da cama.
— E traces às medalhas?
— Trago e nunca as tiro senão elle vê-mas.
— Mas ellè já é melhor?
— Quanto melhor! e deu-me hoje outro beijo. Já é mais meu
•amigo.
— Tens rezado o terço á Mãe do ceu por elle, como te disse
a avó hontem!
— Inda esta noite o rezei. Se elle á noite estiver bom como
hoje, hei de pedir-lhe que. me deixe ir á primeira communhão com-
tigo e que me dê um fato novo como o teu e um laço de seda p
uma gravata branca como a tua*
Depois d'esta entrevista seguiu-se partida de pião, árias reve-
zadas de flauta, aula e licóe> costumadas do catecismo nas escadas
da casa do Julinho da cabelleira preta.
Pelo pôr do sol os pães das duas creanças encontraram-se de
volta do trabalho.
Depois dos cumprimentos, o tvpographo puchou a conversa
para a p-imeira communhão a propósito de um livrinho que estavam
imprimindo na typographia, para brinde das creanças. O fabricante
tocado pelas reflexões do typographo, abriu-se francamente com o
seu vizinho. , , . :
—O vizinho é que é feliz; nunca perdeu os costumes dignos,
nunca teve outros amorei que não fossem a siíCi esposa e o seu anj3
dé cabellos pretos.
, — E os de Deus e da sua Santa Egre;a.
— Sim, mas n'este mundo digo eu. Mas eu..; não séi se a ma-
çã ainda tem algum sío que se lhe aproveite. . .
A conversa loi cortada pelas duas creanças, que logo que os
presentiram desataram a correr para os cumprimentar.
•' ■ - . 1
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98 ALMANACH bE SÀÍÍTO ANTÓNIO
— Alegre-se, Julinho, disse o typographo para Loirinho, o-
papá traz-lhe aqui uma linda prenda.
— Traz, papá?— e beí)ou-lhe a mão.
— Trago. . . Beija a mão águi acífioíso bom vizinho que é mais
teu pae do que cu. Pega lá ; é parrf lêíés aos domingos este cate-
cismo.
— E' papá, é?I— interrògoíi acreança abrindo o livrinho com
grande e alegre anciã.
— E*^ meu filho, é. Não o estragues.
— Nao estrago, papá.
E desatou a correr e mais o companheiro, rua abaixo com al-
voroço alegre.
— E dizias que elle te não dava nada, — dizii o dos cabellos
preto>, vendo as estampas do livro.— Vê como te dá coisinhas tão-
bonitas.
— Mas isso é agora ; aqui ha tempos era muito mau para mim
e batia-me mais e ralhava-me mais que a creada.
— Pede-lhe para te deixar ir commigo á primeira communháo-
qu2 elle deixa-te.
— Peç-vlhe á noite.
Os dois pães, que tinham reatado a conversa, pafsaram para
deante dos dois amigilhotes que se ficaram a co:hi:har, deriím-se
as boas noites e entraram para casa.
As creanças entraram logo. O Loirinho galgou as escadas de
um pulo.
— Papá, então deixa-me ir no domingo ao catecismo?
— Deixo. E tu sabes o caminho?
Depois de um momento de hesitação :
— O Julinho sabe.
— E tu também te não perderias, pois não?
Julinho encolheu os hombroí.
— Está bem, sê bom e aprende depressa o catecismo,
— E depois deixa-me ir á commiinhâo com o menino Júlio,
deixa?
— Isso. . . falamos depois. Já tocas bem na flauta?
— Já, e o Julinho do vizinho também.
— Pois não a quebrem. — E retirou-se para evitar mcis pedidos^
Julinho ficoti a ler no livrinho ao candieiro.
Passaram-se dias e o Loirinho sem obter a licença desejada ;
màs seu pae já era bom e tinha esperança.
Um dia vindo da aula de que se havic.m de lembrar as duas
creanças?... de ir aos morangos e trazer um raminho d*ellès to-
pae do Julinho loiro.
O Anjo da Guarda lhes deu tal lembrança.
A* noite logo que chegou da fabrica, as duas creianças subiram.
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MARÇO 99
de traz d*elie, e depois de o cumprimentarem entregaram-lhe o
presente.
— Bonitos, meus meninos. E elles estão tco bonitos e maduros.
O que lhes hei-de dar cm paga?. . .
O dos cabellos. pretos.de repente:
— Um. Éjta novo como o meu aoJuIinho para eUe ir á com-
rr.unháo commigo; — e agarra va-se-lhe ás pernas com angelical cari-
cia. — Porque elle quer ir comrnigo ao céo vêr a mamã.
— E quando é que os meninos vão ao céo? — interrogou para
espalhar a com moção da alma.
— Quando commungar-mos, Jesus leva-nos.
— Pois isso ha de se arranjar.
E virou, fingindo ir pousar o ramilhete dos morangos, para
o:cultar as lagrimas.
Os dois amigos fartiram-se de tocar g:ita e de jogar o pião na
sela, tal era a sua alegrií.
Entretanto Ernesto no quarto chorava e pensava na sua vida
e no contraste entre a sua consciência e aquelles folgoresinnocentes.
Julinho n'essa noite ceou e ficou com o seu amigo, para quem
já não havia segredos.
Estava tudo arranjado ; os dois amigos contavam todas as ho-
ras, os dias que faltavam para a festa.
Uin dia Ernesto ao entrar em casa trazia um embrulho debaixo
do braço. Desembrulhou e estendeu sobre a mesa. Era uma fazen-
da, uma gravata branca, e um lindo laço de seda branca bordado
a no doirado.
— E' para mim, papá, é? — Interrogou ancioso o Julinho, sal-
tando para cima da cadeira e estendendo-se sobre a mesa.
— E' meu filho,. não mexas que estragas: é para o dia da festa.
— E o papá não compra para si também?
— D'aqui até lá temos tempo.
— Mas o senhor Abbade disse que o papá devia commungar
commigo.
■ —Pois sim^ filho, mas n'esse dia estou occupado.
— Mas então quem me acompanha ?
— O pae do Julinho acompahha-vos a ambos.
—Mas.,.. — e ficou-$e triste como reflexionando. — Mas o pae
rão quer ir comnosco vêr a mamã/ não quer?
— Quero, filho, mas ainda não é tárae. Tu vaes agora, que eu
depois, . . penso n'isso. Guarda isso lá para dentro.
E retirou-se para não ouvir a creançi, pois lhe partia o cora-
rão, tanta simplicidade c candura.
Chegou o dia do festa. Os dois Julinhos lá se apresentaram.
Pareciam dois anjos do paraizo. O povo todo não tirava os olhos
d'elles e chamava-lhe os dois irmãosinhos.
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I9P ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Sobce tudo causou adiniraç&> a presença.do Eroesjto á func-
çâo, e mais que adiriraçáo, devoção o respeito e recolhimento
com que assistia á cerimonia, e espanto o beijo que potsQu nas fa-
ces do lourinho Anjo quando lhe foi çedir perdão. As lagrimas
rebentaram de todos os olhos quando viram aquelle pac cuja con-
versão todos desejavam, chorar como uma crença por de traz de
um andor, onde queria occultar o pranto..
Termioou-se a cerimonia.
Alguém pjrocurou o senhor Abbade :
— Não pode attender ninguém ; está em conversa particular
com o snr. Ernesto M.
O tempo que durou esta visita não importa sabel->o. O que to-
dos viram foi no domingo seguinte á mesa da communhão, Ernesto
M. acompanhado pelo vizinho e os dois Julinhos.
Passou anno e meio depois d*esta cerimonia tocante e de re-
gosijo para todos os conhecidos de Ernesto M.
E Julinho de cabellos pretos, e Juliaho o Lourinho, que será
feito d^elles?
Ninguém os vê, ha já cinco mezes, a jogar o piáo. . . Iriam ver
as mamãs e não voltaram ainda? Ficariam com ellas?...
Ha quatro mezes mais ou menos que o snr. Ernesto M. vive
solitário, e traja de luto.
De um quadro do Coração de Jesus, lembrança da primeira
communhão, qua tem á cabeceira da cama, pende um laço da pri-
meira communhão, uma pequenina chave com laço preto e uma
gravata branca. A sua viagem de recreio são a fabrica e o cemité-
rio. Nf o se passa um dia que o não visite duas vezes pelo menos.
O sol quando se levanta por detraz da serra, já o encontra de joe-
lhos diante de um pequeno jazigo, e os últimos raios do poente ao
despedir-se das lages dos túmulos refle:tem-se nas lagrimas que
lhe banham a face. Ernesto ao ir para a fabrica e ao vir vae rezar
no ja^ig'0 dos dois meninoí; da primeira communhão, como lhe cha-
ma o povo, por se levantar a cabeceira uma peanha alta e sobre
ella dois meninos da primeira communhão abraçados, em attitiide
de subirem £0 céo.
Uma tarde quiz um curioso devassar o mysterio das lagrimas
de Ernesto e entrou a ler o epitaphio do jazigo «nde costumava
rezar.
N'um lado da peanha lia-se:
A meu filho Jidio^ amor, reconhecimento e saudade de-seupae,
Ernesto M. '
No outro lado :
A meu filho Júlio, amor e saudada, de seu vae. Augusto G.
• Os dois Julinhos tinham sido. levados pelo sarampo. Cs dois
anjos bateram as azas e foram visitar as mamãs ao céo e lá^ se fica-
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MAltÇO loi
ram prendidos com a ifMiáear<los aiàjintol dos céo% á esflera dos
pães que na ferra or.àbmrâm.
Que podero^^O' ntb é o tf^^tohRlò daí^ ctífÁtí^ na íbfViilial
Uma creançá falk -côm rtrais eloquenâa âo co"iía^ò pe:^á6 de um
pae que cem pregadores. .
Ensinâe as creafiçàs a serem kUfiH^, a âíetf^ttTâpé^ofbs, e oóhcor-
rereis para a regeneração de muitos lares paternos.
Redacção d* A Voz de Santo António.
. P. B. Ribeiro.
2— ® Quarta-feira— A Beata Ignês de Praga, V.
da 2.* O. — S. Simplício, Pp. — Ltia cheia ás 2 k. e 13
min. da manhã.
Entre todas as obras boas, nenhuma ha com que Deus tanto
seja adorado, como pela misericórdia dos pobres.
S. Gregório Nazianseno.
3— Qtlinta-feira— S. Tito, B. C — St*^ Hermite-
rio, M. — St.* Cunegundes, Imperatriz.
O ALCOOLISMO
Em 1873, dizia o Monitor Toscano, no seu n.o de i5 de Ja-
neiro :
«EfFeitos do álcool no ultimo decénio.
Além das extraordinárias despezis directas e indirectas, que
occasionou :
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102 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
i.o Causou a morte a 3oo:ooo pessoas.^ - -
2.0 Reduziu a casas de azylo a JOd:ooD. meninos.
3.0 Levou á prisão i5o:ooo indivíduos.
4.0 F^roduziu a loucura em mais de 100:000 indivíduos.
5.0 Provocou» I : Soo assassinatos, . e 2 :ooo suicídios.
6.0. Occasipnou a destruição de çdifícios^ e mercadorias, na
valor de 10:000.000 de pezos.
7.^ Deitou 20o;ooo mulheres viuvas, e 1:000.000 de meninos
orphá^s. . ^. : . :
Taes são os lamentáveis efeitos da arte de destilar.»
4— Sexta-feira — SS. Lençol do Senhor — S. Casi-
miro, Rei e C. — S. Lúcio, Pp. M.
*- M(5 ^
A esn^ola é só metade de um acto de caridade, o modo de
dal-a constitue a outra metade.
Padre Sei^na Freitas.
5 — Sabbado — S. João José da Cruz, C. da i.* O.
S. Theophilo, B. — Ind. Plen, nas igrejas franciscanas^
— e para os irmãos da Immacu/ada Cjpueiçâo.
Adulando um lisongeiro ao Imperador Çigismundo, de sorte
aue o igualava a Deus, o Imperador fhe deu uma grande bofeta-
aa. Exclamou o lisonéeiro: Cur me verberas? «Senhor, porque
me castigas?» Respondeu o Príncipe : «E, tu porque me mordes .^»
Tu vero cur me mordes?
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MARÇO. io3
6— DoiTlf iq^ (3- da ;^t»fesma)^ St/c Ç<rf^ta, V. da
2.* O. — St.^ Oaegaító,:BÍ,-^S. I^n^ U.—Ind.
Jtlen. na$ igrejas frcmcisckna^jM^^^m plçi^s^faru os Irm.
Terceiros — e ind. plen.,da Éi^à, '• í !
•'i^
i
\ *.. ■ ■ • 1
Para as creaixças, dez bons còh^jhos nio valeit um bom
•exemplo. .
: • ■ • •^--^, . I ■.
A violçncia n^o cónvép.seaÂo ao despotismo. ?
N*uma aula: v 4 { , ,
O professor: ;:?/ ?
— O que nos rod^^^ ^ >i^ cãtmiiciar at^ospherica; Portanto, a
que nós a^iraiíios como àjs, ;chama?-^ * ■ Vy ^
O alumno: v ' .." ♦
— São astros 1 , . i
■ ■ ■ ■' i . ' •
■ ■■ '^ / _' ■ ■ y \ '
7— èegunda-^feira— S. Thomaz d' Aquino, C. e
Dr. Padroeiro d^ escolas catholicas.— As St**jPerpetua
e Felicidade, Min/ V^-,!'! , \ "
i-.. . r': :. -^ - í ■•
Assim como a alma é a vida do corpo, assim a caridade é a
vida e perfeição da alma. . •
A salvação entremostra a fé, preluz a esperança, mias só a ca-»
ridade se da. ' ' ,
S. Francisco d^Salles.
^ 8 — Terça-feíra — S. João de Deus, C, português.
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104 ALMANACH ÚE «AfTTO ANTÓNIO
T^ftRB-DOftvCtEnioos (IHxitò) * ■
A caridade jamais se ha de acabar ; ou deixem de ter logar as
prophecias ou cessem as línguas ou seja abolida a sciencia.
S, Paulo.
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'MARÇO • ' •/ i^
Um discipuio que ensinai^ mi^tf«.
— Diga-me cá o menino: Eu dou um tiro n'uma arvore onde
estão cinco pássaros, e mato tirèts; ^«neoftcficafn? ■
—Três. ' ■■■ ■■ - ' '
— Não, senhor, lh»Éiâ|)i*, / " .^
— Eu julgava que ficavam os três miMios^ porque os* outros
voavam.
a\mo
9— C Quarta4eirft — St' Catharina de Bolonha,
V. da 2.* 0:~lnd. Plen. da O., — St* Fi?ftncisca Romana,
WxxvHi—índ. plen. nas igrejas franciscanas — ind. plen.
para os Irm. Terceiros. — Quarto minguante aos 24. min.
da manhã.
IJLSpLOÇCa^p^
Não hà rt3âj;s clara Ikiguageití, na» mftis pcd? roeta, ^o^ttencta,
do que a caridade, ainda quando é muda. .
Padre João de Lucena.
10 — Qu í nta-f ei ra — Os Santos Quarenta Martyres
(S. Militão e Comp,) Começa a novena de S. José.
PROVÉRBIOS DE SALOMÃO
A mulher litigiosa
aos telhados, que di^llam,
quando ha nevada.
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io6 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
XXÍ— 19/ ', (.
E* melhora habitação . . . ^
n*um errro, funda,
que estar com mulher pleit^ante
e iracunda.
XXX-30
Gentileza.. Formusura...
é enganador;
Só a mulher, que tenie a Deus,
terá loUvôr.
P. Freitas.
11 — Sexta-feira — As Cinco Chagas. — S. Cândido
M. — S. Militào e Companheiros. — Nasce o sol ds 6 h. e r
m. da w., e põe-se ds § k. e 5 m.
NÓDOAS DE GORDURA NO PAPEL
Um meio simples de as, tirar- quando estão frescas é deitar-lhes
em cima cal da parede, que se raspa com uma faca, e pôr um peso
sobre o papel. Passado algum tempo e repetindo-se a operação uma
ou duas vezes, a nódoa sae.
. /,/r
12 — Sabbado — S. Gregório, i, Pp., C. e Dr.
— 00 — — ,'';
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MARÇO 107
A castidade sem caridade é lâmpada sçin azeite^ Tirae o azei-
te, a lâmpada se apagará; tirae a caridade, a castidade perde o
encanto.
S. Bernardo.
13 — Domingo (4.** da Quaresma) — O B, Rogério,
C. da I.* O.— A B. Sancha, V., Infanta de Portugal.— S.
Rodrigo,'M,— St" Eufrásia, :V.—/«rf. Plen. da Bulia.
DICTOS E ANECDOTAS
— Venho receber a conta da roupa.
— De que roupa?
— Do lato que o senhor mandou fazer lá na loja.
— Não tenho nada a pagar.
— Qraessa!...
— É aNsim mesmo. Quando eu lá mandei fazer o fato, combi-
nairos pagar-lhe metade *e ficar-lhe a dever a outra metade. Não
foi este o ajuste ? .
— Foi, sim senhor.
— Paguei-lhe a metade, nLo paguei?
—Pagou; mas o resto?
—O rç.no não pago. Se lh'o pagasse náo lh'o ficava a dever:
era contra o ajuste.
14 — Segunda-feira — O B. Pedro de Treja, C. da
I.* O. — Trasladação de S. Boaventura, B. C. Dr. « Car-
deal da I.* p.— St.* MathiMe. Rainha.
o fim da religião, a aloaa das virtudes, o compendio da fé» o
resumo da lei é a caridade.
BosauET.
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io8 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
15 — Térça-féíra — s. Zachariôs, Pp. — s. Longui-
nhos, soldado, M. — St."" Henrique, Rei da Dacia.
Càyo Pompilio, jurisconsulto dos que nfo eram mui peritos^
foi trazido por testemunha em certa controver?ia ; e respondendo^
que do que lhe perguntavam nada sabia, lhe disse Cicero : Putas
jortassis te de jure interrogari? «Cuidas porventura que te per-
guntam em Direito?»
—^^^
16 — Quarta-feira~B. Pedro de Seram, C. da 3.^
O. — S. Cyriaco, M.
CARRUAGENS DA MADEIRA
^JE sobre duas travessas de madeira de nove palmos de compri-
'^^ das, chapeadas de ferro na parte inferior c deitadas hdrison-
talmente em sentido parallélo, posermos duas enormes cadeiras
de verga, uma em face da outra, ligadas entre si por frágeis ta-
boas que sirvam de escabéllo, teremos um simples carrn do monte.
Se, porem, as cadeiras assentarem sobre vergóes d*aço dobra-
dos á maneira de molas e firmemente apoiados nas sobreditas tra-
vessas, como se vê na nossa gravura, teremos a mais fafistuosa
carruagem que possa encontrar-se nas alquilarias do Funchal*
Um toldo sustentado pçr quatro coiumnas de ferro, com cor-
tinas de encerado, de panno de linho branco ou de cores, é todo
o resguardo que exigem no verfo e no inverno os mais delicados.
Ha alguns carros de titulares, ou para uso das auctoridades
superiores, e ainda para^pessoas de categoria inferior, que em vez
das cadeit^as de verga sâo de madeira polida, o assento e espaldar
tem oommo^ aimofadâs^ apavíàieim^é^taf^otSMio^eãCtéosltôcom
cortinas bordadas artisticamente a fio de sèdH^ mas o typo <do ori-
giosal tl^evKS madeirense jamais se altera com estes requintes.
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MARÇO 109
Uma Carruagem na Madeira
O officio da lança é desempenhado por um tose© timão que
engata ao carro por meio d'um groíso látego.
Dois bellos garraios da Ilha de Porto^Santo ou deis desageita-
<Í05 bois dos Açores, afoitados com o aguílhão e á voz do carreiro
que lhe repete infinitas vezes a consagrada phrase : —quiá pr'a
mein boeheinho — troteiam, gallopam mesmo, seguindo . fielmente
um rapaz chamado candieiro que os volta e os segura pelas cor-
reias que trazem enfiadas de pequenos buracos na extremidade das
pontas. Sem lhes faltar a propriedade de muito firmes, trepam
coro cabras pelas mais Íngremes calçadas feitas de pequenos ba-
salto; polidos na praia pelas ondas do oceano.
Aqui e alem corre o carreiro á dianteira do carro e deija «o
-chão em frente das travessas uma sacca com cêbo afim ile diminuir
a difficuídade do attrito.
O rpovimento é sempre tam suave que pode comparar-se ao
<ie um barco deslisando sobre as aguas d'um lago.
Nenhum touriste deixa de experimentar este meio de locumo-
cão qu2 encontra sempre próximo do cães de desembarque. Toda-
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no ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
via os que não teem o bolso recheado não abulam, porque sendi
este meio de transporte já de si caro, deve ser scmpte ággravado
com loo reis de gorgeta ao carreiro e 5o ao candieiro..
P. M.
17 — • Quinta-feíra — S. Patrício, B. e C. Apos-
tolo, da Irlanda. — St.* Gertrudes, V. — Lua nova ás § h.e
2 m. da manhã.
Quanto mais trabalhoso é o combate, tanto mais brilhante
será a coroa.
Beato Gil d^Assís.
t8 — Sexta«-f6Íra — Preciosíssimo Sangue. — O B. Sal-
vador da Horta, C. da i.^ O. — S. Narciso, Arceb. de Braga.
AFFLIÇÕES E TRABALHOS
Noso Senhor disse ao Beato Henrique Suzo: »<Qu2m CDlhe
boninas, não se contenta com uma flor ; antes qu.indo colhe uma,
já tem o pensamento nas outras que ha de apanhar. Assim ha de
fazer quem padecer por mim; em pade:endo um trabalho, desejar
outro maior.»
19 — >í« "^ Sabbado — S. José, Esposo de N. Se-
nhora e Padroeiro da Igreja Catholica. — AbsL Geral para
o^s Terceiros Franciscanos, —- Ind, Plen. para o Escapulá-
rio de S. José] para o Escapulário da Conceição^ niais
uma para o mesmo.
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MARÇO III
PROVÉRBIOS D£ SilOliO
XXIX— 14
Rei que fa^ justiça ao pobre
com a verdade,
verá seu throno firmar-se
na eternidade,
XXIX— 12
Principe, que á vil mentira
presta os ouvidos
só ao lado tem ministros
Ímpios, fiiigidjs.
XIX— 6
Muitos honram a pessoa
do poderoso^
e se affeiçòam ájuelle
que é generoso.
•5>-c83*-&
P. Fritas.
20 — Domingo (da, Paixão) — O B. João de Parma,
C. da !.■ O. — S. Martinho de Dume, Arceb. de Braga. —
Ind. Pleu. da Bulia. — lud. Plen. para o Escapulário da
Conceição e das DôreSy visitando a egreja da confraria.
ADVOGADOS
Tendo noticia El-rei D. João II que certo Cof regedor da corte
era pouco limpo de méos, e mui remisso para as partes^ lhe disse
um dia : «Corregedor, olhae por vós, e da maneira que viveis, por-
que me dizem que tendes as portas cerrad^^s, e as mãos abertas.»
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1 12 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
21 — Seguricla-lBira — S. Bento» Abb. — Começa a
Primavera — Nasce o sol ás 5 A, e §8 m,, e põe-se ás 6 h.
e 12 m. — Faz ly annos o S^f. Snr. D. Luiz Filipe, Prín-
cipe Real. — Grande gala*
No tribunal. O advogado á testemunha :
— E elle olhou, assim como eu estou agora olhando para si,
por exemplo ?
— Tal qual... assim como um parvo.
22 — Terça-feíra — S. Benevenuto, B. C, da i.* O.
— St.° Emygdio, B. M. — St.^ Ambrósio dfe Sena. — ^'^
duas horas começam as visitas nas egr£jas onde esteja o
SS. Sacramento, para ganhar o jubileu de amanhã.
Um pedia perdão a Marco Catão, pelo ter ferido inadvertida-
mente, e elle lhe respondeu: Atqui nunquam m^m^áuod wiemime"
rem, percussisti : «homem, não me lembra que me ferisses.»
23 — Quárta-feira — S. Pedro Danião, B," C. e Dr.
-S. Félix e Comp., Mm.
A VELOCIDADE NAS TECLAS
* Ha algjns annos um nusico declarou que poderia emitir un
irilhão de rotas com o piano em 12 horas. Tomando um compasso
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MARÇO ii3
de 3 oitavas, baixando e saindo as differcntes escalas, emitiu
io9<296 notas na primeira l^ra, 125.928 na segunda, 121. 176 na
terceira, 121. 176 na quarta, 12 5. 1 36 na quinta, I25.i36 na sexta,
127.512 na sétima, 127.512 na oitava, 44.520 em 20 minutos, prc-
fazendo total de i.o3o.3q2 notas em pouco mais de oito horas, as
quaes com os períodos de descanço que se tomou, paravam, pas-
savam uns poucos de minutos das 12 noras convencionadas.
-•»-»«— »-
24—31 Quintai-^Mra- Aòstinencia rigorosa — S,
Gabriel Archanjo. (Em Portugal e Domínios, Festa da
Institução do SS. Sacramento) —S. Marcos, M. — St.**
Agapito, M. — Ind, plen. para o Escapulário da Conceição
— Jubileu como o da Porciuncula nas igrejas onde esteja
/> SS. Sacramento. — Quarto crescente ás ç h. ih tarde.
ív"^
Descompondo Lúcio Metello injuriosamente no Senado a
Tácito, disse este : Facile est in me dicere, quia responsurus non
sum: potentia ergo tua, non mea patientia est accusanda: «Bem
podes dizer o que quizeres, que te não heide responder ; e assim a
tua potencia, e não a minha paciência, deve ser accusada.»
25 — SôXta-feira ^ >í« Annunciação de N. Senhora
— Ind. plen. para os Irm. Terceiros^ para o Escapulário de
S.t yosé, e da Conceição — mais uma para o mesmo— para
os associados do Rosário Vivo ^— para a Confraria do^
Rosar ic.
c>ooo
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"4
ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Madonna de Foligno (Raphael)
CANÇONETA A- VIRGEM
Sois formosa casta rosa
Terna Mâe do Salvador,
Sois a aurora, sois a estrella
a mais bella em resplendor.
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MARÇO ii5
Que alegria, quando um dia
vos ppdej?mQS contemplar^ .
arfa o pèitó/suí peitando,
só lembrando tal gosar.
Se esse dia, que extasia,
faz a prece alvorecer
A ti,. Virgem que nos presas
nossas resas se hão de erguer.
0-^i Ti7»ic»Ti>ii»n»ii-*ii» i t*!!*! J^— o
P. R. Ribeiro.
26 — Sabbado — As Dores de N. Senhora.— O B.
Rizzerio de Mucia, C. da i."" O, - S/Ludgero, B. — S.
Braulio, B. — Ind, Plen. para a confraria do Rosário e para
os associados do* Rosário Vivo,
O coração ingrato, assemelha-se a um deserto que bebe ávida-
ir.ente a chuva cahida do céo e que nada produz.
. . Salomão.
Os prejuizos são o valor do espirito: encontram-se somente
onde n£0 entra luz.
Bacon.
A dor mais tremenda do espirito qu2bráíità-a e entorpe-
ce-a as íagrimas.
Alexandre Herculano.
27 — Domingo de Ramos — S. João Damasceno, C.
Dr.— S. Roberto, B.— St.* Augusta, V. M,—Lid. Plen. da
Bulia.
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ii6 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
DOR E ESPERANÇAI
Eece eloogaTi fagiens et manú ii>
N'um dia em que mais cansado
jiãs homens, do meu soffrer,
corri ao despovoado,
fui-me em solidão metter.
Não podia por mais tempo
supportar tão vil tormento.
^^P' • • /w' tomar alento
no solitário vivjr.
Fugi. . . no solitário monte,
na mude:; da solidão,
lá sentado ao pé da fonte
ergui a Deus oração.
Como a rola perseguida
do milhano, e foragida
fa'{ na tocha sua guarida,
era ali meu coração.
Dos homens além se ouvia
estridente barulhar,
e q^al pélago^ bramia
a meus pés — revolto mar.
A avesinha gorgeava,
de ramo em ramo saltava,
e a corrente deslisava
pela encosta a murmurar.
Meiga a tarde descahia
no horisonte de rubor,
e o sol no monte extendia,
seu moribundo fulgor!
oh! que encantos! que magias!
oh! que sons! oh! que harmonias!
Das aves as melodias
revoam, gemendo amor.
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MARÇO 117
Tudo ri,., só eu chorava
no serro^ fitando os céos. . .
Lã no fundo, o mar arfava
em altivos escarcéus!. . .
Eu suppliquei á planura
tapetada de verdura,
que avistava lá da altura,
ouvisse os gemidos meus.
Mas, planura quer só galas,
mati:{es e lindas cores,
«Peito triste, que te ralas,
— di!f — não ouço teus clamores!»
Eu chamei pela averinha,
que trinava innocentinha,
que viesse na dor minha
junto^a mim cantar amores.
kSou pequena» — di^j um canto,
que pelos ares soou;
«Eu não posso c*0'teu.pranto,?>
Um segundo resoou.
Com o gemer da corrente,
que se roja, qual serpente
pela encosta, um ai plangente
meu coração misturou.
«Não posso, —'di^-^n*est4t leitQ
tantas penas aba/ar,
E' sepulcro muito estreito
para os teus ais sepultar.»
Meu peito des/allecido
fe^ novo es/orço, e um gemido
mais cortante, e estremecido
dirigiu ao fero mar.
Mas o pélago agitado
fugiu, tomado de horror!!!
E mal tinha elle provado
a taça da minha dôr.
A quem recorrer agwa?
Aos céos, alma triste, exora^
♦ escuta Deus a quem chora,
ouve do ^kto o clamor.
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1 18 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Chorava. . . quando sonora
Vo:{ de esp'rança redempiora
ouvi nos céos :
«Mais um passo, toma alento,
animo que em breve tempo
premio tens ao soffrimento
— lá junto a Deus, —
« Vae-te ao mundo, e quando irado
for contra ti revoltado,
— ohl Fita os céos! —
<( Recorda a gloria futura,
despe a negra vestidura
da tristeza; olka, ventura, .
— só junto a Deus, —
« Quando vires tua fama
arrastada pela lama,
— recorda os céos. —
«O pobre, que despresado
viu seu nome esfarrapado,
senta-se em throno ac irado
— junto a seu Deus, —
*t Quando fores sacudido,
pelos homens repellido,
— ala-te aos céos.-^
<iOh ! Lá te espera um abrigo,
lá encontrarás amigo,
que suffoque o teu gefnidol
— Acharás Deus, —
« Vae-te ao mundo, sê constante
no soffrer. Confiança, avante,
— que lindos céos! —
«São premio do soffrimento .
ao desfallecido alento;
mais um passo, em breve tempo
—estás, com Deus. —
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1
MAI\ÇO 119
Alentado, o calvo serro í,
deixei com a solidão.
Eu findei o meu desterro
e calei meu coração.
Corri, novamente ao mundo,
e lá n'esse qhàrço immundo
fy a minha habitação.
E se os homens revoltados
contra mim rugindo irados
em túmidas escarcéus •*
coniam, fitava os céos.
E èe bramem a meu lado,
como leãa.assanhado, -;.; /
recordo dó descampado J^
redemptora vo:ç :
j tiCéos!.. . Deus!.\,»
(16-^—1898)/
P. B. Ribeiro.
28 — Segunda-fôira — O B. Marcos de Montégal-
lo, da I.* O.— St.** AlexaíWrev M.
DICTOSxk ÀNECpÔTAS
Um commendador, recèhi-chegado dp Brazil com muitos con-
tos de réis e muita ignorqpcia dos usc^a da sociedade, resolveu
deitar grande estadão e mandou mobil^numa casa com todo o
luxo e commodidades moderrnas. ^ f \
Insiallado no seu piii^cio, o njbsso. h^mem depois d'almoço
foi para a sala ler os jorhaes. Um criaa% deparando oue elle es^
carrava para o tapeti^V p^z-lt^ ao lado títna cuspideira. Ê!le, quan-
do ia a escirrar fQ4tr/i vez, viendo dqueiia bonita peça de porcel-
lana, escarrou par a^' outro mdo ; o criado, vendo isso, mudou a
escarradeira para esse l«do. O comaittndador vae outra vez para
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CONTRA Ali
— poeiD diz epidemia, diz bacilo. O me-
lhor, julRo eu, é redaclar ora memorial soUre -Acreditem os Snrs. nSo ha como o sys-
o sea exame, seu deíeavolTimento, wn cnl- tema velho; ea com cataplasmas, sanirriai e
tiTo, etc, ptc, lel-o depois Da academia cor- sanpuesagajP,4>btenho óptimos resultados. O*
respondente, e. . . esperar os resultados. meti» trvgu^es que o digam.
—Agua, amia; nada mais que agua; In-
dISGUtivelmeote é-o tralameoto mais seguro,
e por conaeguinte o melhor.
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EPIDEMIAS
—Depois de consultar as eminências me- —Não, meus senhoYes não ha como a»
dica* da Ajemanha, Franfae Inglaterra, creio fumigações aromáticas e os dcsinfetantes.
quejo mais segui o e eficaz é procurar evitar ° ^
o cuuta^jio.
—Não ha que Ter, desenganem^se: o ra-
mo de perfumaria oíferece especificoa sem
rival joM chimica e oa pbarmacopeia.
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122 ALMANACH DE SANTa ANTÓNIO ' .
escaí^rar, mas vê iá a coisa e escarra^para o outro lado. Torna a
cri^dp; a xnudar a e^arradeira; vae o pomem para escarrar nova-
mente, "mas espanta-se vendo a bonita peça de porcellana, e diz
zangado para o criado : ( .
— Tirâ-me isto d* aqui. . . quando não escarro-lhe dentro I
29 — Terça-feira — A B. Paula Cambara da Cos-
ta, Viuva da 3.* O.^ — S. Victorino e Comp., Mm. "'
' ■ "i \
i ÍTodas as vezes que á sombra da impunidade, p homem abusa
do seu poder, a justiça divina apoderàrse d'elle è castigà-o cotn
rigor..
30— Quarta-feira— A B. Angela de Fulgino, Viu-
va, da 3/ O. — S. João Climaco.
Perguntando El-Rei Agesiláo, como poderia um homem agra-
daria todos, respondeu : «Falando bem^ e obfáhdo virtuosamen-
te»: Si dicat óptima^ et/aciat honestíssima.
31 — ® Quinta-fèira í^; >b (^o meio até á manhã)
— * Abstinência rigorosa — O- B, Marcos Tantuco, C, da
i.^O. — St.* Balbina, V. — S. Benjamim, M. Lua cheia
ás 8 k. da tarde.
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MARÇO 123
;^^ aexribra do ^aarario
flgffuANDo impellido pelas fúrias das paixões, o meu baixel está
^ prestes a bater sobre os rochedos doeste mar do mundo, le-
vanto" a ti ó Jesus na Eucharistia, os meus olhos marejados de la-
grimas, e entf o á rombra do sacrário alcanço a luz para me guiar
para a eternidade.
Quando pergunto a mim mesmo como poderei rasgar as nu-
vens sombrias que se estendem sobre minha cabeça e que me im-
pedem de ver o bello ceu, o firmamento azul-celeste, a mansão
dos Santos, dos anjos, de Maria, minha Mãe, de Jesus, uma voz
cheia de ternura se ouve na t.ua priráo d*anr.or, na Divina Eucharis-
tia, ella diz : «Meu filho á sombra do sacrário descubrirás o Parai-
zo, que é a tua pátria.»
Quando pensamentos medonhos me assaltam em immensos
turbilhões, e sinto minha pobre alma esmagada debaixo do pezo
de meus crimes, quando a esphynge do desespero se apresenta
diante de meus olhos, lá do sacrário resòa a minha alma desfalle-
cida um écco de amor — é uma voz doce, pura, suave e diz: po-
bre alma que sofFrcs, que tens peccados, que vives desolada, cor-
re, vem a mim, lança-te em meus traços e eu te consolarei, eu te
estreitarei contra meu am.oroso coração e depois ficarás em ]3az !
Eom Jesus, quantas vezes, quando eu te procuro n*essa prizáo
d'amor, n*esse tabernacuta dèsôlàflo, n*esse Gethesemani amargu-
rado, quando eu corro junto a ti, ó Pae ! quantas vezes não tendes
murmurado estas palavras á minha desgraçada alma.
Sim, ó Jesus! a minha alma, é qual barquinho acoçado pelas
tormentas da vida; os furacões dos vieios irreigados no fundo
d'este coraçfo, despedaçaram os mastro > doeste barco, esfarrapa-
ram em pedaços to Jo o velame, e as vagas, as immensas e medo-
nhas vagas passam furibundas por sobre o convez; minha pobre
barca vae a sossobrar ! . . . mas eu levanto os olhos para o vosso
sacrário e a tua voz de Pae amoroso, murmura baixinno a este in-
f.el coração ; «Meu filho sou teu pae ; repousa tua fronte afoguea-
da pelas paixões sobre este coração, sou porto seguro. E quando
deixo cahir esta fronte sobre aquelllc Coração, fornalha de amor,
as tempestadas serenam, o cyclone que parecia arrpzar a terra
desfaz-se, a voz sinistra do trovão emudece |:ouco a pouco, o sibi-
lar do furacão transforma-se em branda briza, o relâmpago ace-
nas illumina o horizonte... rasgam-se as nuvens, apparece o hr-
mamento azul, e os raios vivilicantes do astro-rei 1 . . .
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IH ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Tu disseste um dia, ó Jesus, chamando por todos os filhos da
terra, que o teu jugo era suave e leve, e e junto ao teu sacrário-
que se sente esta verdade sublinhe emanada de teus lábios divinos.
Sim, é lá, que osgrilhões pesadis^ imos, que roxeavam meus pui-»
SOS cahem á terra def feitos em pó; é lá que os espinhos que cin-
gem a minha fronte se transformam em rosas; é la que este cora-
ção rasgado em pedaços pela espada da dor encontra bálsamos
para cicatrizar todas as feridas.
Descançarei sempre á sombra de teu sacrário, ó Jesus ! e as-
sim como a pomba coUoca seu rinho nos ramos da krargeira, as-
sim eu collocarei o meu rinho de terno amor junto a teu Coração,
junto á sombra do teu sacrário.
P. Alberto Teixeira.
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JIbríl
30 Dias
->^~^r"
No crescente semeia milho, feijão, melancias e melões ;
planta toda a casta de hortaliça e enxerta os alamos de escudo,
damasqueiro s, pereiras e pejeguelros,
e semeia cravos.
No minguante limpa as cilmeiiis dos insectos
e corta o cicio £OS po mi res.
G."^-^/^v
1 — Séxta-feira— "^ (até ao meio dia)— St.^ Mar-
tinha, y. M. — S. Macário, Abb. — Nasce o sol ás 6 h. e
44 segundos e põe-se ás é k. e 16 segundos.
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126 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Egreja de S. Basílio (Moscow)
Obscurecida a humanidade pelos erros d'uma philosophia atheis-
^ ta, envolta no immenf^o tremedal da sensualidade revoltante,
avançou a passos agigantados para o abysmo de todas as paixões
degradantes.
Gangrenada pelas ondas assoladoras do egoismo, adormeceu
nos braços do crime, qual immensa Sodoma ou Gomorrha.. .
. Foi um somno prolongado como o do cadáver que tem a exis-
tência chumbada no seio do mármore pela jnáo da morte. Mas de
repente a humanidade accordou d*esse somno lethargico. Do alto
do Calvário, partiu medonha convulsão, immenso fragor, que fez
gemer em seus eixos este oõniinème de> lagrimas.
As rochas do Gol^otha fizeram-se pedaços e rolaram sobre a5
iruralhas da cidade de Jerusllem; e ao seu fragor levantou-se a
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ABRIL 127
humanidade, rasgou o sudário da morte que a cobria, olhou para
^o alto do monte do^^ suppliciados, e, cheia de espanto, viu uma
cruz arvorada de cujos braços pendia um coademnado á morte. . .
Clarões sinistros envolviam entáo a montanha das caveiras;
mortos envoltos em algidos sudários cercam o patibulo d' onde
pende o justo... Um cantiro uni^ono irrompeu d'esses lábios mu-
dos, havia séculos, no valle de Jò>aphat !
Saudaram a cruz! saudaram o glorioso por vir da sociedade.
Passaram-se séculos. Gerações succederam a gerações e todas
ellas «eteem ajoelBadò diante doCálvarío e saudado a cruz.
Ao sahir do cenáculo Pedro e os demais apóstolos saúdam a
cruz, e á sombra de seus braços benéficos convertem-se milhares
de judeus. .- .
Nas cavernas soturnas das catacumbas, os christãos saudaram
a cruz e á sua sombra acharam conforto na dor. . .
Ao entrar no Coliseu o rhartyr- saudava a cruz, e ella appare-
cia em traços fulgentissimos por sobre a arena do" combate e á
sombra da cruz morri i o martyr com o sorriso nos lábios.
Saudaram a cruz os reis é os imperadores, as grandes socie-
dades.
Felizes eram essas sociedades de crentes que amavam a cruz.
Fecundados pelo seu amor, avançaram impávidos no caminho da
civilisação.
Hoje que importa a cruz. esse pharol de artnor e paz ?
Ninguém a saúda, sosinna, imolada com o divino Suppliciado
de seus oraços eito vive, a arvore, redemptora, ahi no meio d'essa
sociedade de descrentes.
Apagou-se no lar o amor porque a cruz não refulge ahi*
Apagou-se o amor na sociedade e deu logar ao egoísmo bru-
tal, porque a cruz foi destroçada e feita em pedaços* e por isso
as gerações nâo teem um symboío em torno do qual se possam
reunir Iraternalmente.
Restabelecei o amor á cruz na sociedade egoista dos séculos
<i'hoje e vereis florescer as virtudes dos séculos que foram.
(Sermão sobre a crU:{)\
- P. Alberto Teixeira.
2 — SabbadO (AUeluia) — Abstinência rigorosa — S.
Francisco de Paula.» — St* Maria Egypciaca, Penitente.
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128 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
A mais aprazível e a mais primorosa de todas ás artes, é a mu-
sica, qu2 foi inventada pelo- homem para fazer sentir tudo quanto
a linguagem articulada não pôde exprimir.
Gluk.
^!^
^A^
3 — Domingo (de Paschoa) — S. Benedicto de S.
Philadelpho (O Santo Preto), C. da i.* O. — S. Pancracio,
B. e M. — S. Ricardo, B. — AbsoL geral para os Irm. Ter-
ceiros. — Ind. Plen. das Estações de Roma. — Ind. Plen. da
Bulia. — Ind. Plen. para o Escapulário de S. José^ da Còn-
ceição e para o Rosário Vivo.
Um christão não deve ler maus livros (auando se diz maus li-
vros, diz-se maus jornaeN); perde o seu dinheiro em os procurar,
o seu tempo e a sua intelligencia em os ler. O seu dever é só este :
deital-os ao fogo«
José de Maistre.
O livro é o campo de batalha onde J. Christo e Satanaz travam
uma guerra implacável.
Mgr. Gai.
-lr-t%-l-
ItMIt
Mil ve^es ^esadelo^ me afanaram
Que de máo cosimento e ff eitos foram,
liemos que eu sonho, que indo de jornada
Se me atravessOj em meio de asp'ra brenha.
Um urso negro — metto máo á folha:
Puxo, puxo, com quanta força tenho.
Na bainha emperrada a ferrugenta :
Autos nullos. . . Um susto d' improviso
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ABRIL r29
Se apodera 4t inim^/alhdm^me as forças:
A vista d'olhos, o Urso^ cresce em vulto.
Abre uma bocca* . . (Escancarado it\femú 1)
Fugir traço : eis que os pés, no chão se arraigam.
Sonho outra, veíç, que ao vir de larga ceia
Passo junto d' um velho cemitério*..
Eis que se abre um postigo; os goniç^s ringem^
Sahe xtm nari^ç. . . — nari^ desmesurado!-^
Cala-me o pavor na alma. Eis fujo. Eis cercam-me
Espectros que em mim cravam torvos olhos;
Línguas de fogo vão desenrolando
Das esguias gargantas. . . Lonsce, longe. . .
Todo medo, me co^o co*a parede
Fronteira : — Uma mão secca rompe súbito
D' um buraco, que d vista se occultava» • •
Mão que gela o sangue, a/oroando
O coração entre a camisa e a carne.
No toutiço o cabello se arripia
Baldo é o fugir: vae-se encolhendo a rua.
Mais longo o narisfão, e a mão mais gelo.
— Nada é mais trivial do que esses sonhos
Que (certo) mais não são que disparates
Que armam da Noiee a sombras lá no cérebro.
Mal que acordaes, adeus narizes e sustos.
FiLINTO ElYSíO.
4— Segunda-feira~(í4 í») S, foidoro, Are. de
Sevilha. — S. Zózimo.
PARA OS PETIZES
O pescador qu? tocava flauta
Era uma vez um pescador muito estúpido, que S2 pôz a tocar
flauta á borda do mar. Dizia elle :
— Tanto hei-de tocar, que ha-de vir peixe! Mas tocou e far-
tou-se de tocar, e o peixe nem sequer assomava f
— Ai! os velhacos que ráo gostam de musical— Dizia elle.
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i3o ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
E vae e resolvesse entâo^ deitar a- rede, e cahlu peisè em gran-^
de abundância. •* . •
Dizia elle depois qiktido recolheu arede, e viu os peixes a
saltarem na areia : ' ' ,
— Canalhoria! Emquanto tOqiíeinÊO quisestes dançar: — ago-
ra que não toco é que dançaes ! " •'
— Nãô^wia O parvo ^^e com flautas râo sé" pescam peixes^
e quem quer as coisas ha de fezef por ellas! — • - •
' Trindade Coelho.
Cidade do Mimdelo (Cabo^Verde) .
5 — Terça-feira — S.Vicente Ferrar, C.
Passando o Venerável Padre Pascasio Broéto, da Compa-
nhia, por onde estavam uns extravagantes," começaram estes a
apupal-o com yaias, chamando-lhe hypoQrit2i,,e outros, .nomes in-
juriosos": Parou o servo de Deus arrimando-se ao.s^u bordão, co-
no se quizera lograr uma boa mysiça, até que elle s. já de cança-
dos se callaràm. E o Padre continuançlo seu caminho, com rosto
alegre, lhes disse, fazendo-lhes o signal da Cruz : «Deus vos aben-
çoa, e faça bem a todos.»
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ABRIL i3i
6 — Quarta-feira— O B. Thomas cie Tolentina, M.,
da I.* O. — O B. BentivoHo, C, da i.*'0. — S. Marcelli-
no, M.
CURIOSIDADES E EXTRAVAGÂNCIAS
Querem os senhores saber a reproducçáo dos animaes?
Queiram ouvir o que dz umà revista ingleza :
A mosca póe 144 ovos; a aranha, 107; a rã, 1:000; a tartaru-
ga, 1:000; o camarão fêmea, 6:000; á ascarióa,' leraco.-.
Quanto aos peixes: uma perca dá 9:843 ovos; um peixe-rei,
2 5: 112; o arenque, 36:ooo; a carpa, 342:000; a tença, 382:000; o
linguado, um irilhão; o esturjão, três milhões; o bacalhau, cerca
de dez milhões de ovos.
As lagostas põem 21:000 ovos, em gerai.
7 — (£ Quinta-feira — A B. Antónia de Florença,
Viuva, da 2.^ O. — S. Epiphanio, B. M. — Qtiarto min-
guante ds 5 L e 18 min, da tarde,
PHRASES POPULARES
— A* formiga, Diz-se de nuikas.pessoas que seguem na mes-
ma direcção, uma a uma, em linha continuada.
— Auferir lume. Zangado, irado.
— A vCr em que param as modas. A' espera dos aconteci-
mentos.
— A' mão de semear, A propósito : próximo.
— A* tripa forra. A' larga.
— A rego cheio. Sem restrirções. Em toda a plenitude.
— Ad kphesios, Distrahido. Aiheiado do caso.
— Ao cantar do gallo. Antemanhã.
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i32 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
— Ao cantar do pisco, Aò raiar da alvorada.
— Ao largar da agulha. Crepúsculo da tarde.
— Andar d lisa, Nao ter real.
— Andar d toa. Sem propósito determinado; sem direcção.
— Andar d tuna. Passar o tempo na pandega.
— Andar com 'a carinha na agua. Estar satisfeito; contente.
— Andar por arames. Estar muito doente.
— Andar na dependura, O mesmo.
— Andar ás do chão. Estar muito decahido; por baixo.
(2 nV 6)
8 — Sexta-feira — O B. Juliano de St.** Agostinho,
C, da 1.* O. — St.** Amândio, B.
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Caridade d'uma creatiça
iia o sol rompendo as nuvens
5, que pareciam fazer-lhe cor-
iva aqui e alem os vares, for-
jm quadro caprichoso que só
za sabe desennar.
avesinhas começavam, coma
íspertar do lethargo, em que
nverno tinham jazido, e afi-
5 suas vozes, gorgeiavam mil
que enviavam como tributo
i\ 4u^"v; que as creou. Toda a natu-
reza sorria ; a primavera ía entrar festiva e rompeu o manto es-
curo com que até então o aborrecido inverno envolvera toda a na-
tureza. Tudo se reanimava, tudo sorria, tudo era belleza e en-
cantos.
*
Entremos na cidade. Que animação por toda a cartel Metta-
nros por esta rua, . . Passemos agora para aqui. . . mais alguns pas-
sos ainda... Eis-nos, leitor, chegados ao sitio, onde eu te queru
trazer, e onde tu já enfastiado me acompanhaste.
Uma porta baixa, mal e mal aprumada dá entrada para uma
casa escura é térrea. Entremos. . . Duas enxergas, velhas, esfarra-
pada$, cobertas por inaíntas ainda peiores; mn caixote, algumas^
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1 34 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
as rotas, e outros seiri}lbantes objectos de cosinha. todos em
avel estado, occupam o único quarto, que serve de cosinha,
a roupa e alcova.
[*uma das enxergas jaz um homem dos seus sessenta annos.
ba descurada, o rosto macilento e as rugas que lhe sulcam
es, mostram evidentemente, que todos os dias a miséria lhe
i porta, para com a sua mão descarnada o apartar mais de-
i dos entes que lhe são caros. , .
L miséria e a doença^ qtmndo casadas entre si vão collo:ar o
lamo junto ao leito do nomcm, fazem vacillar ainda as almas
fortes ! . . . Tal era o estado do tio Joaquim. O desespero ti-
ttingido o seu auge. Já desconfiava da Providencia, quando
visitou amável e encantadora. . .
!ra uma creança dos seus no\re para dez annòs, meiga e^ sor-
te. Pelo trato, trajar, pejas maneiras, pela alvura das mãos e
sto via-se que devia pertencer a uma das mais illustres fami-
a cidgide. E na verdade assiiji era. Os seus progenitores alta-
? coUocados na fociedade captavam o respeito e a veneração
dos os que tinham a honra de os conhecer. A creança já não
2sconhecida para o tio Joaquim, que já mais d*uma vez tinha
lido a mão á caridade do pequsnito. N*aqu3lle dia porem,
Providencia que lh'o enviou.
-Olá tio Joaquim; então ainda a estas horas* na cama?. . .
- Que quer, o meu menino, sou velho e sinto-me tão doente
ie não posso levantar, e demais nem tenho com que me aque-
lem com que matar a fome.
l uma lagrima deslisava-lhe pela face cavada.
-Então está muito doente, não é verdade?
-Tão doente, nieu menino, que creio não me tornarei a le-
r da cama. . .
-E* preciso confessar-se então.
- Eu confesFo-me todos os mezes.
-Deixal-o, mas agora ainda se não confesísou.
-Não... já.
-Quando.''...
-Ainda no dia. ..
- Mas eu quero que se confesse agora.
-Porque?...
- Porque eu quero. E vou já chamar o padre.
•ahiu, dirigiu-se a casa d*um sacerdote respeitável, subiu as
as, bateu á (rorta do quarto, e entrou.
-Que deseja, meu menino?
-Oh ! . . . queria que viesse confessar o tio Joaquim que está.
Ter ! . . . ' ■
) semblante da creança era tão triste, a voz tão meiga, o
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ABRIL i35
olhar tão supplicante, aue o sacerdote' não quh inquerir mais,
lançou a capa pelos homoros e sahiu acompanhado dò menino.
Minutos depois estava junto á enxerga do pobre velho, que es-
condia no? ouvidos do digipo sacerdote òs seus erros e as privações
com que Deus o ia dispondo para as consolações que lhe preparava.
A mesma creança que o tinha feito renascer para a vida da
^aça, e sentar ao banquete celestial^ ia4he também matar a fome
que de dia para dia lhe minava a existência.
Salve, caridade christã I exclainarei eu, virtude por excellen-
<:ia, o maior thesouro que o homem pode possuir na terra ! Oh I
se todos te comprehendessem^ como o mundo seria feliz 1 . . . Tu,
e só tu podes trazer a vtvásideira fraternidade ao mundo, táo enal-
tecida ç)elos modernos socialistas! tu, e só tu podes tornar o mun-
do á primitiva felicidade 1 ... * Oh Tse todos te CO£aipr«iatidessem! ...
A hora de jantar tinha soado. No vasto salão dos pães da mei-
ga creanca era servido um opiparo jantar. Todos folgam, todos
riem, toaos são felizes. Amam a Deus, distribuem com os pobres
largamente, teem a consciência em paz, nada ha que lhes tolde a
felicidade.
A creança sentada ao lado da mãe, é a única que parece preoc-
cupada. Permanece muda e triste contemplando os manjares que
tem diante de si.
• — Que tens minha flor? porque não comes?. . .
— Porque queria antes pedir um favor.
— Então que é ?
— Mas a mamã faz-mo?
— Porque não?...
— Queria dar o meu jantar ao tio Joaquim, coitadinho ! está
doente e não tem que comer ! . . .
E as lagrimas corriam-lhe fio a fio.
A mãe, com uma emoção digna d'uma mãe christã, apertou-o
ao seio e bei;ou-o eíFusivamente. Sentia-se orgulhosa de ser mãe
d' um filho que em edade ainda tão tenra, assim comprehendia os
conselhos evangélicos 1
— Sim, meu filho, levarás o jantar ao tio Joaquim, mas não é
preciso que seja o teu ; come que para elle ainda ha. Jantou : e no
fim acon?panhado pela mãe^ foi restaurar as forças ao pobre velho,
que desesperava já da Providencia.
Alguns dias depois doesta scena, quem isto escreve, visitou o
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i36 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
tio Joaquim, que no meio de lagrimas Ihier contou o qu« ábi fica es^
cripto, acrescentacido que «desde então o seu protector lhe levava •
tooos os dias a comidinha.»
£' assim que o catholtcismo sabe educar seus alhos. Queres^
dar soluçfo a essa chasa da soeiedsde que se chama pauperismo ^
Eduquem a sociedade cnristãmente ; façam comprehender a todos,
grandes e pequenos as suas olmga^ões e em breve veremos a so-
ciedade renascer, realisando*se então essa edade d'oiro oom que o
socialismo sonha, mas que pelas siias theorias nunca se reaiisará.
•c.
Pina.
. 9 — Sabbado — O B. Arcangdo de Caiataphimo, da.
I.* O.
Náo te esqueças nunca de que a vida é breve.
Plauto.
De que serve a vida, se náo vae dar seiva a outra vida?
Emilio Castellar*
10 — Domingo (de Paschoela)—0 B. Carlos de Ser-
zia, C, da i.* O. — St."" Ezequiel, Propheta.
A tranquilidade da alma é uma magica feiticeira: faz d'utTi
pobre um nco. d*uma cabana um palácio; converte as penas emp
satisfações, as lagrimas em sorrisos.
Jesus deixou o céo para tomar a cruz : nós deixaremos a crus
para voar ao céo.
M. dbC.
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ABRIt.
i37.
11 ^Segunda-fetra— «. Leáo i, Pp. C. Dx.— Nasce
o sol ás II k. e js ^'y ^ põCrse ás 6 k. e 2*j m. — Acabam-se
as ferias.
-í^nt^/íMU-
DITOS POPULARES
Assarapantado — Aturdido; atrapalhado.
Agua que os passarinhos beberam no ar, — ^Diz-se da chuva le-
víssima.
As necessidades não são só em setembro — Como que consola-
ção dada a quem se quixa de precisões e apertos por que está pas-
sando.
Apenar, — Ordenar. Embargar. Por exemplo: O regedor ape-
nou dous cabos para certa diligencia.
Apenas ardeu a escorva — Successo que podendo ter efFeitos
terríveis, de pouco ou nada valeu.
12 — Terça-feira — O B. Angelo de Clavasio, C,
da I.* O. — S. Victor, M. Portuguez. — Ind. plen. para o
Escapulário da Conceição,
"U
"\r
'^
FAl^WB.AliJi.
Conto é bella a tarde,
que após longo dia
ao estiot declina!. . .
Que nova poesia,
que summo prazer
innun4a meu ser.
Saudando o hemispherio
já o sol cae ufano
na orla purpurina,
que roça o oceano;
e a lua sem véo
campeia no céo.
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1 38 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Deus! Belle^çã eterna!
Deus, que se retrata
n* um froixo reflexo^
eis auem me arrebata.
Éelle:fa! Meu fim,
oh ! vem, reina em mim.
-•a— «> —©•-
P. Freitas.
13 — Quarta-feira — St.° Hermenegildo, M. — St.*
Euphemia Bracarense.
X>IK.EIXO E X.IBER.IDA3DE
Duas magnificas sentenças achamos em Cícero— O direito é a
fonte da egualdade e o fundamento da liberdade. Bellissimo é o
commentario que lhes faz Donoso Cortez.
Nas sociedades catholicas o homem obedece sempre a Deus, e
nunca obedece ao homem.
Nas sociedades catholicas o filho obedece ao pae, porque Deus
quiz que o pae fosse seu representante na familia e porque fez da
paternidade uma cou>a venerável e santa.
Da mesma sorte, o povo obedece á auctoridade suprema, por-
que sabe que, obedecendo, obedece a Deus, que quiz que essa au-
ctoridade o representasse no Estado e que fosse uma cousa sagrada:
Omnis potestas a Deo.
Ora, onde quer qua o homem obedece a Deus, ha liberdade.
Como aos nossos olhos apparecem Céo e Terra unidos e dis-
tinctos, e a sua união é symbolisada pelo horizonte, assim ao nosso
espirito mais ou menos claros, mas distinctos, indivisíveis e fixos,
resplandecem dous pensamentos : Natureza e o que a transcende.
Terra e Céo, o Natural e o Sobrenatural, eis ahi a vista, eis alii o
pensamento.
Augusto Comte.
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ABRIL i39
' 14 — Quinta^feira — S. Justino, M. — Os Santos
Thiburcio e Valeriano, Mm.— S. Pedro Gonçalves Telmo»
^.^^
Um sujeito disse a outro no theatro :
— Que malcreado !
— Isso é commi^o? bradou o lisboeta.
— - Não senhor ; é com aquelle insolente Beneventano, que não
fne deixa ter o prazer de admirar a linda voz que você tem.
15 — • Sexta-feira — S. Cyrilo de Alexandria, B.,
C e Dr. — Santas Basilissa e Anastácia, Mm. — St.^ Euti-
chió, M. — Liut nova ás ç h, e zf m. da tarde.
Por mais soberbas que sejam as distincções de que os homens
se lisongeiam, a verdade é que todos elles provém da mesma origem.
jggsfc^»<» ysL
16 — Sabbado — S. Raphael Archanjo. — St.* En-
gracia, V. M. — S. Fructuoso, Are. de Braga. — Passa hoje
o anniversario do dia em que S. Francisco fez a sua pro-
Hssâo religiosa, A todos os membros das suas Três Ordens
que, em memoria doeste facto, renovarem n'este dia a sua
profissão, é concedida pela Santa Sé uma indulgência
PLENÁRIA.
Morreu um negro muito rico, deixando por tutor de seus fi-
lhos a um grande avarento.
— E' preciso comprar luto para estas creanças — disseram ao
tutor.
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ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
—Ao contrario — respondeu. este com presteza — para ficarem
to rigoroso, o que devemos fazer é despir-lhe o ratinho.
7 — Domingo (>." depois da Pasckoa) — S. Cyríllo de
salem, B. C. e Dn— St.^ Aniceto, Pp. M.— St.° Elias^
ge portuguez.
3 homem para robustecer o corpo precisa alimentos fortifi-
s; assim o espirito necessita bons livros, boa conversação il-
ida, estudo e sciencia, para evitar a molleza do espirito que
i os inúteis, os maus, muitas vezes.
Maria Christina Arriaga.
18 — Segunda-feira— O B. André Hibemon, C, da
3.— S. Gualdino, B.
Jma menina, vendo que um creado estava a vestir um fidalgo^
: — O' papá, aquelle homem não tem mãos?
19 — Terça-feira — O B. Conrado de Asculi, C.
.* O.— St.^ Hermogenes, M.
/\
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ABRIL I4t
VICTOR HUGO E OS JESUÍTAS
No momento actual é próprio reproduzir o que Victor Hugo
dizia: «Homens reunem-se e vão viver em commum. Em virtude de
ou 2 direito? Em virtude do direito de associajáo. Conservam-se
fechados em suas casas. Em virtude de que direito? Em virtude
do direito que tem todo o homem de abrir ou fechar a porta de
sua casa. Nao sahem. Em virtude de que direito? Em virtude do
direito de sahir ou de entrar em casa, sem que n'isto seja impe-
dido por ninguém.
Ficando em casa o que fazem? Rezam. A quem? A Deus.
Os espiritos irreflectidos, volúveis, dizem: Para que servem
estas figuras immoveis do lado do mvsterio? Qual a sua utilidade?
Que fazem. Não ha trabalho mais sublime do que o que fazem es-
tas almas. Não ha trabalho mais útil. Fazem bem os que rezam
para os que não rezam.»
W
20 — Quarta-feira — O B. Leopoldo de Gaixe, da
I.* O. — St.* Ignês de Montepoliciano, V.
O estylo é o homem, o homem um problema.
O talento não depende do tempo.
A alma é um reflexo da divindade.
Quem pergunta quer resposta.
21 — Quinta-feíra — St."* Anselmo de Cantuaria, B.
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142 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
C. e Dr.-'-^ Nasce o sol ds-^ A. -e^S 'minJi põe-se ás 6 lu
e 12 min.
Andfé encontra Simão montado n'um burro.
— Onde vão vocês dois?
— Buscar palha para ti. .
22 — Sexta-feira — Os Santos Sótão e Caio, Pp,
Mm. — St.* Senhorinha, V., portuguesa.
CONSELHOS ÁS MÃES
Cuidai da honestidade de vossas filhas como das meninas dos
vossos olhos ; não consintaes coisa alguma que possa macular sua
consciência, ou afeiar o candor de sua fronte ; não permittais ja*-
mais que estejam sós com jovens, ainda que seja com esperança de
matrimonio; porque essa esperança, assim profanada, é funesta, e
vossa conducta é delicto de responsabilidade immensa diante do
Senhor. DeusJ Pae de todos, cuiaará, se vossas filhas são virtuosas,
de deparar-lhes, como a Sara, esposos dignos d^eiias, quando não
recebam do Céu mais alta vocação.
Leão xiii.
23— D Sabbado — O B. Gil d\\ssis, C. da i.* O,
— S. Jorge, defensor do reino de Portugal. — Quarto cres^
cente ás 4. e i8 m, da tarde.
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ABPIL 143
Pia d' agua benta (Convento de Santa Clara — Porto)
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't44 ALMANACH DM SANTO ANTÓNIO
PSALMO
De profundis clamavi I . . .
Domine, exaudi vocem meam ! . • .
Psalmo, cxxxvin
Dos profundos abismos d' esta vida
eu te invoquei. Senhor;
ouvi d' esta alma triste e perseguida
seu plangente clamor.
Que em. teus ouvidos caiem os gemidos
do afiicto coração
dos morlaes, que na terra foragidos^
suspiram por Sião.
Oh! Não esquadrinheis nosso peccado
no crime e o tropeçar.
Então do rosto teu vibrando irado
quem ha^de a /uf fitar?!. . .
Mas vós sois temo pie. Israel gemente
confia em teu amor;
e pêra na lei, que d^entre a chamma ardente,.
Viis lhe deste. Senhor.
Desde o romper da matutina aurora
espera em seu Deus
te quando, desmaido o sol descora
e perde os brilhos seus.
Espera em Deus; n*elle piedade abunda;
dentro em seu peito ha redempção fecunda
vem a Israel sahar^
A Israel, que em seus crimes vis se (tfunda^
Deus vird re^^ar,
1S99 P. B«Ill»&IRO.
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ABRIL . I4S
24 — DomiMgút — (3i° depois, da Paschoa) —Patrocí-
nio de S. José — Tnd. plen. para os Irm. TeHeiros epara
u> Escapulário de S. José.
Um escríptor que acabava de recopiar uma das suas mais bel*-
las* paginas, com um cuidado particular, exclamou multo contente :
O fímcorôsta.obral . .
Finis corónat ópus,
E, pronunciando estas palavras, pega no tinteiro, em vez do
-areeiro, e cobriu o ^eu precioso traixslho c^om um lago de tinta...!
Finis çorónat ópu^f
M
*"-' 25 — Segunda-feira — S. Marcos Evangelista. -
•Procissão das Ladainhas. — Ind. Plen. da Bula.
ORIGEM DAS LADAINHAS
A Santa Igreja manda que seus filhos orem incessantemente,
pois sempre teem necessidade do auxilHo divino. Ha porém oc-
casióes em que precisámos de redobrar as nossas preces. Quando
Deus parece esqu2cer-se da sui infinita misericórdia, e descarrega
^obre a hunanidade os golpes de sua inexorável justiça, então é
.que como mãe carinhosa, nos ensina como poderemos, desarmar o
-seu braço justamente irado por causa dos nossos peccados.
Ella charria-nòs ao templo n^aquellas epochas em que a natu-
reza está disposta a proporcionar seus fructos a disvellos dos agri-
cultores, e em tempos de grandes calam dades publica^, e exhorta-
x\oi á oração para impetrar da divina clemência, se não malogrem
.as esperanças de uma colheita superabundante.
Para isto ^estabeleceu oraçoís espcciaes, isto é, as Ladainhas.
10
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1^6 ALMANACH OÈ SANTO ANTÓNIO
Ladainha é umá palavra ^egà que úgD&àcê. ovação humilde^
fervente prece.
Dizem-se maiores ou menores. As maiores gue se cantara no
dia de S. Marcos, sâo assim chamadas poraue a principio cantavam-
se com grande solemnidade em todo o orbe catholico, e em Roma
a procissão das Ladainha^ dirigi%-$e^.á Egreja de Santa Maria
Maior.
As menores assim ditas por se fazerem com menor solemni-
dade, e potque a prindipio ãs suas procissões se encaminhavain
para as igrejas rtienos importantes, cantam-se nos três dias que pre-
cedem a soiemn idade d' Ascensão de N. S. Jesus Christo.
As Ladainhas maiores, chamadas commumttiente de S: Mar-*
cos, trazem a sua origem d*uma horrivel peste que jfiagiciou líoma
pelos annos de 588, causada pelas aguas do Tibrè que sahidas do
seu leito invadiram a grande metrópole. Uma das victimas doeste
grande flagello foi o Summo Pontifice Plagio.
Foi por isso que S. Gregório Magno, seu successor, ordenou
se fizessem preces publicas para suster o braço vingador. Distri-
buidos, pois, os fieis em sete coros, sabiam das sete principaes Ba-
sílicas e í)ercorrendo as sete colinas de Roma clamavam a Deus
misericórdia.
As menores que a Igreja manda se cantem nos três dias que
precedem a Ascensão, teem comtudo uma origem mais remota.
Foram estabelecidas por S. Mamerto, Bispo de Vienna, por
causa também de grandes calamidades que pelos annos de 469 as-
solavam aquellas terras.
Esta pratica foi depois recebida pela Sagrada lithurgia que or-
dena se cantem com os fieis nos sobreditos dias e em tempos de
grandes calamidades, para ^ue n*estas epochas de crise venham em
nossa ajuda a Santíssima Virgem e todos os santos.
26 — Terça-felra — Nossa Senhora do Bom Con-
selho. — ^^S. Pedro de Rates, M., Arceb. de Braga. — Os Ss.
Cleto e Marcellino, Mm. — Ind. plen, para o Rosário Vívo^
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'AÉSRa«
^47
Ave liarias
(HARPfiJOS sacros)
No Olympo cérulo
V^us sorri ;
tão alva e nítida
eu nunca a yi.
ni •
Virgem deifica y
dos céos de atém/
um raio vivido
me dá também.
II
Imagem typica
do eterno alvor,
lá do céo 'splendida
projecta amor.
IV
Salve, ó Maria,
astro divino;
no eterno dia
ouve o meu hymno.
Todo o mundo vos adorai
Eu, ,, p*ra lá da sepultura,
canção infinda e sonora,
ao som aa minha harpa obscura
alçarei com a harmonia,
que a terrra cantar já ouvia!
Ave Maria!
P. Freitas.
=íe:í
27 — Quarta-feira — o B. Thiago de Bitecto, C,
da I.* O.— A B. Joanna Maria Maille, da 3.* 0.4-St.** Tçr-
túlliano, B. — S. Thuribi, Are. de Lima.
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148 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Porta d\ Egreja de Marvilhe (Santarém)
(anecdota)
Um litterato de polpa, que apanhou o habito de diz^r mal de
toda a gente, e mais de Christo, para metter a ridículo um seu
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ABRIL • j^
collega, pe^çul:ltp^-Ihe . n*uína sala, com ar.de superioridade, em
frente de muitas, jeohoras, para o confundir: '• •
— Dize lá depressa^ ó Dias; o que é tempo perdido?
— E* o que se gasta comtigo, meu louro.
Luiz d'Ar\ujo.
28 — Quinta-feira— O B. Lúcio ou Luchesio, C,
e Primogénito da V. Ordem Terceira da Penitencia. S.
Vital, M. — S. Prudencio B. — Ind. plèn. para os Irm.
Terceiros,
CONSCIÊNCIA
A consciência do justo é um; espelho de áço polido^ que o so-
pro impuro do máu não pode embaciar.
— r Uma consciência pura é o melhor travesseiro, sobre o qual
o homem de bem pode repousar sua cabeça.
— O verdadeiro bem náo se encontra senão no socego da con-
sciência.
— A consiciencia é o único espelho, que não lisongêa nem
engana.
Conselheiro Bastos.
29—® Sexta-feíra — S. Pedro, M.— S. Antónia,
V. e M. — St.** Hugo, Abb. — Ltia cheia ás lô k: da tar-
de. Grande gala, Náo ha despacho. Recepção, Feriado.
^
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IS»
ALMANACH DE SAXTO ANTÓNIO
O furto... de um gato
ill.n»o Snr. Juiz de paz tinha um gatinho tão engraçado, que
era um çosto vel-<5; e o barbeiro, ao contrario, tmha uma
gata velha, feia e pellada, que era um horror.
— Se pudessenros tomar para nós o gato do Snr. Juiz! . . . dis-
se o barbeiro á Catharina sua mulher.
— E' no que estava pensando, respondeu-lhe a mulher; é tão
l;H>nltinl^o... Mas o caso náo é difficil. Amanhã, emquanto fizeres
a barba ao Snr. Juiz, pego o gato pelos bigodes... e será no>so.
No dia seguinte, emquanto o barbeiro segurava o nariz do
Juiz, Catharina foi ter com sua criada, disse-lhe em segredo não
sei que, e, aprovei tando-se do momento opportuno no qual a dita
criada sahira da coúnha para fazer qualquer cousa, toma o gato,
deita-o n*uma cesta que para tal fim levara comsigo, e cumpri-
mentando a criada á pressa, no momento em que esta entrava
na cosinha. retirou-se. O grande roubo havia sido praticado com
a máxima facilidade.
Na hora do jantar não se via mais o gato, como de costume
ça casa do Juiz.
— Onde anda o gato que o não vejo? Bichano, bichano. . .
M^s o gato saboreava o jantar na casa do barbeiro, que, para
acostumal-o, lhe havia dado saborosa pitanÇa.
— Bichano, bichano. . . continuavam a chamar o Snr. Jfuiz, sua
veneranda Snr.« e á pobre criada, que já receia va ter de responder
pelo desapparecimento do gato.
—Terá fugido?
— Ter-se-a perdido ?
— Quem sabe se o não furtaram?
— O' Brigida, porque nâo tomaste cuidado...
— Tomei, sim, Snr.; ainda esta manhã o gato estava em
casa. . .
— ^^Então?..,
E aqui entre o temor e a esperança começaram queixas e la-
mento$.
»
« *
Mas o remorso, companheiro kpievitavel e terrível do pecca-
-do, estava dilacerando a alma do barbeiro e de Catharina, sua
jnulher.
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mos o gato?
— Que s^r^ de nós^ cpapào q Snr. J«4?j ^ViNr q^ ]h^ A}rta-
:o?
não tardará myito em sabel-o, porque, eotr^ t^t^ gi$9ic
tia loja...
— Pobres de nósl mettemo-nos em camisa de onze varas...
— Agora vamos tratar de remediar ò mal.
— Como?
— Como? Indo ao mesmo Snr. Juiz coníessar-lhe o nosso
-delicto.
— Ai I que tremo só a^o pensar a!isso.
— £ esse é o caminho mais curto e seguro de sahirmos d'essa
«mbrulh^.
« «
Ao anoutecer, o barbeiro e Catharina, sentidos e confusos,
com o c;ato na cesta, foram ter com o Juiz.
— Ahl perdôe-nos! O seu gato era táo bonito... tão interes-
sante... que...
— Então foram vocês. . .
— Na verdade não fui eu, mas foi... Catharina, minha
mulher.
— Sim; fui eu que peguei o gato; mas porque tu desejavas
possuil-o.
— Ah! marotos!... commettestes um crime que, segundo o
art. 9:909 da lei, devia ser punido com dez annos de prisão.
— Pelo amor de Deus, sr. Juiz! Olhe, estoa prompto a fazer-
Ihe a barba sempnre de gra^a, mas perdôe-nos. . .
— Sendo assim, considerando que peccado confessado está
meio perdoado, e que, pela outra metacte, você me fará a barba
grátis, perdôo-lhes a pena merecida, restabeleço a paz entre nós e
vos deixo o gato... como pensionista, para que o trateis como
deve ser tratado o gato d' um Juiz de paz.
-ÍOKZX-
30 — Sabbado — Sf Catharina de Sena, V. — S.
Peregrino, Servita.
=xo<=
A temperança exerce na vida phisiologica as funcçoes que a
prudência exerce na vida moral.
Renato.
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i5» ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Jorge recebe um telcgràmma do Porto, e exclama ao abri-lo :
— Que rapidez a do telegrapho! Este telegramma vem da
Porto, e ainda está hiimidaa gomma do sobrescripto.
— Vae pVá casa do diabo, respondeu irado o patráo no jardim.
— Quando você estivei- em casa, respondeu o criado.
Os fieis que assistirem ao exercício publico do mez de Maria,,
ou não podendo, em suas casas, ganham 3oo dias de indulgência e
uma plenária em qualquer dia do mèz á sua escolha.
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yiaio
31 Dias
Na lua cheia e minguante semeia melões e melancias,
arvores de espinho e palmeiras,
e dispóe alfaces/ Na lua nova c crescente dispõe mangericões
e cebolas de angélicas, e limpa as vides de lagartas.
H>o<==>cx-
1 — Domingo (4.° depois da Paschoa)— Ss. Filipe e
Thiago, Ap. — S. Jerennias, Propheta. — Nasce o sol ás § h.
e 12 m.y e pôe^se ás 6 k, e 48 m.
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i54
ALMANAGH DE SANTO ANTÓNIO
Madonna. das Uvas
WhQR A MAEiA
(recordação infantil)
Ail Que saudade me inunda,
quando triste, vja d mente
a lembrança d' esses dias
da infância tão sorridente l
Adorava-te eu, ó Virgem,
quando a noite se encobria^
e tu no céo despontavas,
enchendo-me de alegria.
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MAIO
i55
Adorava-te, 6 Maria,
quando o bronze doermeterio
ondulava em sons alegres,
annunciando o teu rhysterio.
Adorava-te, 6 mãe tema,
quando teus filhos rodeavam
teu altar querido, e as preces
41 teus pés depositavam,
Attrahiam-te meus lábios,
quando innocente*í, saudavam
o teu nome gracioso^
^ em pure^fa te louvavam.
Enlevava^te a candura
d' este ingénuo coração,
porquê, simples já te amav%
CO* a mais tema devoção.
n
Fui o teu encanto .' E agora,
ue me resta de alegria ?.,,
)h ! Cobre-me com teu manio,
que ainda vivo, ó Maria!
Mas, lembrando-me essa idade
tão aueriid ao teu amor,
saudoso inda o peito di:{ :
— Kjá murchou tão linda flori >i^
P. Freitas.
2 — Segunda-feira ^— S. Athanasio, B., C, e Dr.
-A B. Mafalda, V., Infanta de Portugal.
MIM
E' uma palavra allemã de 77 lettras :
Oesterreichischenamerikanischengummifabrikátdoiisgesells-
<:haftatbtheilungschef ; o que quer dizer: Chefe da administração
4a Sociedade por acções auátro-americana da fabricação do cautcnú.
3 — Terça-felra — Invenção da Santa Cruz. — Os
Ss. Alexandre e Juvenal, Mm. — Ind. plen, para os irmãos
da Conceição,
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156 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
A prosperidade faz com que appareçam- bem claramente as>
nossas virtudes e os nossos vícios, como a luz faz com que se tor-^
nem bem visíveis todos os objectos.
La Rochefoucaúlt.
.4 — Quarta-feira — St* Mónica, Viuva, mãe de-
Santo Agostinho.-^O B. Christovam de Milão, C, da i.* O.
N*uma aula de direito Pátrio :
— Porque é que D. Affonso Henriques foi o fundador da mo-
narchia portugueza?
— Porque D. Affonso Henriques estava por assim dizer encar-
regado pela Historia de fundar a monarchia portugueza.
— Também pôde ser isso.
y/y^^
5 — Quinta-feira — S. Pio v, Pp. C. — St.^ Angelo,
M. — ^A Conversão de St.^ Agostinho.
— «Çiii)« —
Curiosidade aritlunetica
Meio fácil de fazer fortuna ! . . .
O pobre A. . . tendo falta de dinheiro pede ao seu amigo B. . ..
que lhe empreste 4 tostões.
— De boa vontade, respondeu B. . ., nias ha de me dar o qua-
drupulo d'csta quantia ; negócios são negócios: tome lá os 4 tostóes.
Oito dias depois A. . . vae pagar sua divida :
— 4 vezes 4 tostóes, são 10 tostóes, (4x4=16); eis os teus 16
tostóes !
—O que?! respondeu B... não foi isso que lhe emprestei L
foram 40 dez réis que lhe dei, e o snr, tem que me dar o quadru-
pulo de 40. isto é 40 dez reis vezes 40 dez reis são 1.600 dez reis,
<4o><4o=iooo).
Por isso tem que me dar 1.600 dtz reis ou i6J!ooo reis.
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MAIO i57
6 — Sexta-falra — S. João, Ante Portam Latinam.
S. João Damasceno.
Aconselhavam, maus estadistas, a Henrique IJI de Castella que
lançasse certo tributo ao povo para sustentar as guerras. O pnn-
cipe responde, castigando o mau conselho, dizendo: «Não me
aconselheis tal, que mais temo as lagrimas dos pobres que as ar»
mas dos inimigos».
7—3 Sabbado — S. Estanlslau, B. M. — o B.
Agnello, C, da i.* Q. — St.^ Augusto, M. — Quarto min-
^gnante ás ii h. e 15 m. da manhã.
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ORRiA O inverno de 1877.
A scena passa-se no secular
•casteUo de Fouquerolles entre
Dreux e Rogent-le-Royal.
Era noite feita e ádeantada.
O céo estava toldado de nuvens
negras^ presagio certo de fortes
aguaceiros n^essas longas e frias
noites de inverno. Dentro, na
castello, jazia no leito da dor um
bravo, celebrado em tempos por
suas façanhas bellicas e militares;
era o quasi nonagenario coronel
Chandres. Prostrou-o não tanta
a enfermidade, como a velhice e
decrepitude; acabrunhado de an-
nos e fadigais esperava-se a ca-
eiró e fatal. O velho contorcia-se
lOS chammejavam foso. suas faces
sua fronte rasgada lazia entrever
ia arte da guerra, na táctica mili-
á porta, carcomida já pela acção-
ndante Coulomb e o capitão Lor-
do enfermo coronel.
es pareceu rejuvenescer ; assoma-
agos d'e5se facho quasi extincto e
lua memoria débil e apagada pou-
í glorias d*outras eras. O velha
; de passarmos á longa e interes-
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MAIO i59
sante entrevista tios três velhòâ.amiso9, atteatemos n*unna ^mpa-
thicã figura, que silenciosa e taciturna está á cabeceira do doente:
cobre-lhe um véo a cabeça, pende-lhc da mão un^ rosário, os olhos
estão velados de lagrimas, á sua^physioRomiá toda revela longas e
continuadas insomnias; ora segreda palayras de consolação, qual
anjo do bem, aos ouvidos do moribundo, ora se levanta com de-
dicação míiis que de esposa para prestar-lhe seus desinteressaàos
serviços ; é uma Irmã de Caridade.
Fermitte-me agora, leitor amigo, uma digressãos que vem
aqui muito erti seu logãr.
Far-te-ia injuria se te suppuzeáse um d*esses cathoUcos pelo
cérebro e pelo coração, que de tudo procuram chasquear, e que in-
tentam com risotas sarcásticas e saU/^rentas depreciar as miais be-
neficwites e caritativas — lê philantropicas se te apraz melhor—ins-
tkuiçóes do christianismo. Dize-me, pois, aaui muito á puridade
sem rebuço nem peixão: viste já alguns desses anjos desvela-
dos? Se não viste, vi-ita commigo esses hospitaes, esses asylos da
mendicidade e infância desvalida. Vamos mais longe ainda; trans-
portemo-nos co Japão, ás ilhas Sandwich, ás intempéries dos cli-
mas africanos; aaui vemol-os tratar as ms is asquerosas doenças,
vemol-os pensar alli as pústulas mais nauseabundas e repugnantes,
acolá catechisam o selvagem, mais além chamam ao caminho da
honra a prostituição, esse repellente cancro social, que corróe tan-
tas victimas, que para ahi vivem mergulhadas no lodiaçal iramundo
do vicio e do crime. ^ -
E não são em boa verdade credores da estima e gratidão da
sociedade? Ha ahi mais digno apostolado, ministério m^is nobre ?
Mas Teatcmos o fio do discurso não perdendo de vista a boa
Irmã da Caridade, que é parte interessante da narraçío.
Coulomb e Lormay entraram de mansinho no aposento do
doente: reinava o mais fundo silencio, que só de quando em
quando era quebrado pelo bocejar afflictivo do coronel.
Os três amigos éstreitaram-se n'um doce amplexo e n*esta at-
titude estiveram largos nromentos sem proferir palavra; grossas
lagrimas sulcaram as faces Jividas do coronel. No entretahto a
Irmã de caridade orava pela conversão do moribundo. Vem niuito
a pello dizer-se que Chandres era um d^esses scepticos practicos,
que não querem saber de religião para nada ; professava o credo
voltaireano, e não obstante os esforços de muitas pessoas não se
resolvia a caminhar pela via segura e táo pouco trilhada infeliz-
mente da virtude ; já o espectro negro da morte estava sentado no
limiar da porta, do histórico casiello e Chandres continuava inde-
ciso; a recordação vaidosa de seus feitos, que afin«l fugiram nas
jazas ligeiras do tempo, o entretinha e embebia todas as suas atten-
^õcs; e o que é mais, sua alma e sua salvação eram por completo
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i6b ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
descuradas n'áauelle itioméitto ultimo e soletnne. Eis o porquê
das lagrimas e aa constante e ininterrupta oração da Irmã de Ca-
ridade, la-se travar renhida e vporfi^^^ lucta, e veremos como a
praçáo é arma efficaciséinía para Yeftcer combates,, para arrostar
os mais formidolosos perigos, quaes sáo as pelejas eairc a carne e
o cspifrito.
Mas aonde me levam todas estas considerações? dirá o leitor
indiscreto e impertinente. Continuemos a historia, e ver-se-ha
sua appllcaíção practica. "
A conversação dos três veteranos cahiu naturalmente, neces-
^ariain^ente sòbtQ guerras; sobre cercos, §obre os perigos que cor-
reram, - sói»€ as glorias, de que se revestiratn ; este recordava o
descobrimento de uma traição no mais acceso da refrega, aquelle
o aprisionamento do inimigo, aquelPoutro a debandada dos con-
trários. • '
Assim se passou a noite ; não obstante as chuvas torrenciaes
e continuas a manha raiou serena; dois raio> dourados do sol en-
travam de soslaio janellas a dentro e iam bater no catre, que vira
passar já tantas gerações, e no qual jazia o representante d'uma fi-
dalga e nobre familia.
Seriam oito horas da manhã pouco mais ou menos; a con-
versação continuava animadíssima ; o coronel parecia reviver para
os anno5 fogosos e cheios de renome da sua mocidade. N'este meio
tempo entrava um vulto alto e macilento : era o velho cura da al-
deia, que vinha repetir suas visitas diárias, qual medico, que náo
perde ensejo de dar saúde ao enfermo, qual pastor, que procura
reduzir ao aprisco a ovelha tresmalhada ; sem o querermos biogra-
phar diremos ao menos, que era assiduo, como o dever, em pro-
porcionar todos o5 meios úteis e necessários para a salvação de
seus parochianos, apesar dos seus bons oitenta annos ahi o temos
é cabeceira dos doentes pròdigalisando4hes bênçãos com mãos pro-
fusas e ajudando-os a bem morrer.
O cura tomou parte na conversa a qual continuou ainda so-
bre coisas militares, cscutou-os attentameynte, e n*uma dada occa-
sião fez uso da palavra para chamar o doente a assumpto de mais
importância; quiz fallar-lhe de confissão, ao que o enfermo res-
pondeu com um gesto indeciso, mcerto.
O velho não queria dar de mão a essas doutrinas voltaireanas,
de que estava eivado, e permanecia abysmado n'esse scepticismo
medonho, para onde as tendências do século XIX arrastaram tan-
tos espíritos, aliás nobilíssimos e illustrado>.
Não ha negal-o : se o século XIX foi um século de progresso
e civilisação^ foi por egual um século de pronuuciada descrença,
e bem accentuado indiiTerentismo : os mesmos coripheos do livre
pensamento são quasi unanimes em reconhecer a cris;*, que a so-
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wm ièí
tes è' !âitfià»ôtât4íis múmiMi tCídò fòTífmiéhd&Kò éSrêciàHiénte
ou indirectamente por; ellet Mas fechemos o parenthesis e remate-
mos a nossà historia*.
Vendo o bom cura, que a Irm^ de Caridade velava ha três
noites, fez-lhe signal para ^úè fb^[ repousar. Accedeu a Irmã.
Virou-se então para os veterailo^ e deu em falar-lhes assim :
«Senhores : Muito hei ouvido de vossas p>assadas elorias^e de
voíisâs aventuras cntíxtarés. A' fé^ c^vtéaiot^i (Mi Méú-émàqêoÒ) es-
ses ímpetos d0 mais sagrado patriotismo;. sois effectivtcíitinte cre-
dores da admiração dos vindouros, e podeis legitimamente exigir»
que vossos filhos acatem vos^a memoriaj deveis, porém, concor-
dar commigo em que ha Òufrà' iVnifcra em nada inferior á vossa,
e que teve e tem hoje ainda os seus heroes; pensaes vós que essa
Irmã dé caridade, que tem asástido a éstè fíhíSttt énTéf mt>, não
operou grandes façanhas, que a ennobreçam? Pois é um facto: e,
com a afétdá 4i& Betis, éstá4he reservado koje um novo triumpno;
ella, porém, vive ignorada na sombra ao passo que vós prégaes aos
quatro ventos os feitos d^outras eras; cpmtudo está promettida á
heroina uma palma cfue patenteará á luz do sol a grandeza de
quem viveu na obscuridade, e de quem fOsihou /atendo b^ht a des-
peito de criticas mordazes, de dicterios soezes, d.e cadúiimias vil-
lás. Concordaes?»
A resposta foi um longo e bem significativo silencio. A face
de Chandres transformou-se ao oovir' o elogio da Irmã de Cari-
dade.
A Irmã de Caridade retomou o seu. posto de honra; redobrou
de esforços e actividade para trazer á' vià dò atrependimento a
ovelha desgarrada. Instou, instôà, instòU. . , Movía-o a actos de fé,
de esperança, de caridade òerffea pàrá com Deus.
O velho reflectiu émnm, e como que aíítíntiado de superna
luz, e tocàdo de invisível mão significou^ que dfi,sejava falar a sós
com o padre, e momentos aiMad^^s appàreccT-^ò^ lavado nas aguas
regeneradoras da penitencia ó sceíítico e vòftàiréano coronel, para
o qual a confissão não passava âé simples especulação de padres ;
de voltaireano e séptico eil-o crente fervO|r'oso e at)ostolo devotado
do bem; os olhos vertiam-lhe amargoso pranto, as fices b^inha-
11
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i62 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
yain-nas.doiís rio$ de grossas lagriqnas, er^j Q^uixia palavra, um no-
vo^ honiibin. A. Irmã da Caridade apertava-ihe entre aç» mãos o Cru-
cifixo; aò. entretanto as condcfcorações rodavam pplo pavimento;
abraçado estreitamente com a Cruz, momentos idos, o veterana
transpunha os umbraes da eternidade. Os.mysteriosdealem-tumu-
lo náo ha devassal-osj diz-:nos,'jporém, um^ bem fundada esperan-
ça que, graças á oração da Irma de Caridade è do bom Cura, Deus
se terá amerciado d'elle. Aos já muitos títulos de floria, que cin-r
giam a fronte dp glorioso e valente militar foi ai Bar^e eçte ine-
gualavel triumpho: o Crucifixo foi a ultibia das condecorações.
• Fr. Zeferino Gonçalves.
8 — Domingo (5.** depois da Paschoa) — Dedicação
da Basílica de Assis, Casa-mãe dà Ordem Franciscana.
Homem muito bebedor é pouco vivedor I
(Sabedoria das Nações),
9— Segunda-felra (Rogações)— ?>, Gregório de Na-
zianzeno, B.C. e Dr.
/^^^^
N*um restaurante entra um dia
certo fregue;[ abastado, ..
Senta-se commodamente,
e di^ d* es farte ao criado :
Um copo d' agua! Um palito!
O «Illustrado» £ a «Nação» I
Fecha também essa porta,
e enxota-me aquelle cão ! . . .
♦ CM.
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Mkltí '' •/'^•.•'. •' " íáS
^0-7^m-fÒ\fá'^(4yldéÊ^^.15(kf^ S. An.
tonino, B. C. — Ss. Gordiano e Epimacho, Mm.
Pensa bem se podes cumprir o que prometteres.
A lei divina é o pharol^ por que nos. havemos.de reger bo mar
d.a vida, para chegarmos ao porto 4s^ s^]vaç^. ^ i ^
11 — Quarta-fefra (Ra^açJes e ji^m)-^S, AnàstSLciOy
M. — S. Mamede, M. — Nustè o éoI ás 5 h.e i m, e pôe-se ás
6 h. e 5ç m.
(B (D SÍ 9 T9 o S a o
Dissolve-se èm 3 litros d'agua: ' \ . '
Sulphato de cobre (capa rosa), 2 grammas.
Sulphato de zinco, 6 grammas. ... . . •.
Açafrão, 5 decigrammas. / / ^ • . .
Álcool alcanforadò, 25 grammas.
Agita-se bem, deixa-se repousar, e no .fim àe 3 dias estará em
estado de poder ser usado o remédio.
12 — © >i< Quinta-feíra de Ascènção — Ss. Nereu
e Achileu, Mm. — St.* Joann^, Princesa dè Portugal, V.
— Ind. plen. da Bulia. — Ind. pUn.das Estações de Ronia.
— Ind, plen. para os Irm. Terceiros^ para o Escapulário da
Conceição, de S. José, Rosário Vivàe Confraria do Rosário.
*>fitttr*fff*t**M^
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sãi ALMANACH DE SafÚlITO ANTÓNIO
I
Que dia. suhUfne^ que ãnt/oumoso,
em que .9^ recorda de Ckristo a Ascensão!
Ot ciiHtnihs mèltspmrú» sòfnHèmde gosok
Parece, que os frãihsmÊis bi^o^èstSo.
Ao temvlo nos cham am r ep hjvts 4e sinos.
E o sot hoje brilha, sem mivens, sem vJu!
Namente^ ^Hta^os í^eUcas hynmwè
e vjsmos o Eterno )mlhai^dç> no Céu !
Os templos se vestem de fulgidas cores l
E os cantos das ayes mais graça hoje tem.
Mais bellas parecem dos campos as flores,
e bem mais sonoras as fontes também.
E' Hora da Nôa I Conjuncto sublime,
o Hymno recorda divino poder.
Em Deas trino e uno maiJtcrenças exprime'^
e di^-nos, que n*ellas devemos Viver!
Recorda, nos templos, a ekuva d0 ftCfres,
a chuva de graças, que trouxe JHult.
Do maifS' purjo incenso se go^am odores
e os psalmos recordam victorias da cru^!
II
Jesus, qu^ soffreraimartjyrio ajtrentoio^
por todos cumprira terrena missão.
Soltou para o seio do Pae afnoroso.
Reinar foi com Elle na eterna mansão 1
jyaquelles, que amaya, Jesus se^ despede!
Discipulos meigos já via chorar.
Mas graças divinas, que a todos concede
Ihgs di^em, que podem ao Céu aspirar!
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mtcy :••■./ ' ■' m
Ascensão de N. Senhor
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166. ALMANACH DE $imTO ANTÓNIO
Por sua virtud e, subi ra, subira,
dlT^tSI^/g^W0^Wm&it^ bf-òii, ' " :
Em riiii^^ mvÔlto^Uepôis não H vira
e. pávidos iodos, ^ue o' viram deixou .
Feli^ quem pudera, com intima crença,
ept tão Santo dia subir com Jesus,
as nuvens transpondo da abobada immensa,
ao reino sublime de mystica lu:^.
J^sus, tu subirte, mas não desamparas,
nó Ceu, os que te amam, que são filhos teus.
Xu VÍV3S cimnosco. Tu, como faiíáras
outr'orá, hoje falias do reino de Deus!
ni
Jesus, que na terra foi tão amoroso,
que d pátria celeste qui^ hoje subir,
julgar todo o mundo virá, magestoso,
dar premio ds virtudes, os crimes punir.
Mas bem mais, que os erros, que nós commettemos,
valor tem o sangue do temo Jesus.
Se formos contrictos, perdão nós teremos,
que as almas d pátria celeste condu:{.
Rainha das Virgens, excelsa Maria,
ao, Ceu, como disse, teu Filho ascendeu.
A Egreja te louva também n'este dia
e ao teu patrocínio também recorreu.
Que dia sublime, que dia formoso,
em que se recorda de Christo a Ascensão!
Os crentes mais puros sorriem de goso.
Parece, que os prados mais bellos estão.
(Aveiro) , Rangel dk Quadros.
13 — Sexta-feira — S. Pedro Regalado, C. da i.' O,
— N. Senhora dos Martyres.— /«í/. plen, nas egrejas fran-
ciscanas.
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MAIO 167
.' ^.iFrognjosticos do tempo
PELAS SENSAÇÕES DO HOMEM
Ha diversas sensações no homem, que lhe podem servir para
reconhecer as mudanças que vão subitamente occorrer na tem-
peratura.
Todo o mundo sabe, por exemplo, quedas pessoas que tem cai-
los experimentam n'elles mais dores quando sê approxima a chuva:
que as que são nervosas sentem-se peiores nas mudanças de tem-
po : que as exhalações boas ou más, são mais sensiveis pouco antes
da chuva, taes como o cheiro das flores ou dos estrumes, que é
muito mais forte quando vae chover, ou está ãnminente tormenta:
emfim, quando o som dos sinos ou dos instrumentos músicos, o
grito do homem, e o latido dos cães, estrugem mais, e de modo
mais claro, que de costume, no campo, é signal de menor seccura
no ar, e por consequência aviso de que humidade próxima trará
comsigo chuva.
14 — Sabbado — O B. Francisco de Fabriano, C. da
I.* O.- -S. Gil. — S. Bonifácio, M.
Com os meninos e com as pessoas que estamos obrigados a
ajudar, lembremo-nos que se obtém mais resultado com uma pala-
vra de animação e com um elogio, que com a reprehensâo e exi-
gência.
15 — • Domingo — O B. Benevenuto de Recineto,
C, da I.* O. — St.*" Isidro, lavrador.— S. Simplicio, B. M»
— Lua nova ás 2 fu e 22 tn. da manhã.
cioiMi:
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^ ALM
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PROVEITADO
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170 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
N'um mercado de peixe. (A uma velha): *.
— O* santinha, esta pescada está fresca? t 1 . '- ^
— O* meu rico snr., táo fresquinha q'inté está viva. t
— Isso náo prova nada, porque você ainda está viva e já não
está fresca.
r * • ■•
; ■ >n^3^n^
16 — Segurtda-feira — S. João Nepomuceno, M,
St.^ Ubaldo, B. C— S. Simáo Stock.
Jesus é o piloto de vossa alma ; abandonae-vos completamente
á sua discrição.
B. Margarida.
17 — Terça-felra — S. Paschoal Bailão, C, da i.*
O. e Padroeiro das Obras e Congressos Eucharisticos. —
S. Possidonio — Ind. Plen. nas igrejas franciscanas —
Ind. plen. para os Irm. Terceiros.
Um sujeito alugou um quarto por loo francos ao mez. Como
a paga era adiantada o senhorio perguntou-lhe se queria recibo.
— Para que, entre pessoas de bem ? Deus vê tudo.
— Vós ainda acreditaes em Deus?
— Certamente, e vós?
— Eu não.
— Então dae-me depressa o recibo.
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íMAIO ' 17^
S. Pascoal Bailão
18 — Quarta-f eira — S. Félix de Cantalicio, C. Ca-
puch. — St.° Eurico, rei da Suécia. — S. Venâncio, M,
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ipk ALMANACH DE<MNTO ANTÓNIO
Quem, fazendo o beneficio, o lembra, é vil ; quem, receben-
19 — Qulnta-felra — St.° Ivo, C. da 3.* O. — St*
Pudenci^a, V, — Ind. Plen. para os Irm. Terceiros.
ANNUNCIOS DE MODA
Chapéus para senhoras de junco.
Sombrinhas para meninas de damasco.
Novidade! Sapatos para meninos de atanado.
Meias para pés de senhoras pequenas.
Vestido completo para cocheiro azul.
Fato para homem completo cor de burro.
Selins de passeio para meninas novas.
Correntes e cordoes ! Aos homens casados !
R. da Pechincha.
-S-
20— Sexta-feíra— S. Bernardino de Sena, C. da i.*
O. — Ind, plen, nas egrejas franciscanas — Ind. fUn. para
os Irm, Terceiros. <
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uma vfi
Mt n mmmu
(iWCtUPTOé)
ÍuANDO O homem reflectido alonga os olhos para os. tempos que
já lá vio. e dá de rosto com os monumentos qué trasladam
as memorias ao génio íiel ou prostituto, um pensamento systema-
tico e seguro como a verdade lhe acode para logo ao espirito : «O^
factos soo a Imffuagiêm da Providencia coffio oft monumentos são a
expressão dos Jactos.^
Se aos grande N accommett mentos presidiu sempre uma idéa
nobre> ás grandes idéas assistiu d'antemâo o principio inalterável
que regula os mundos, e que disse ao homem — crescei e multi^
pticeuh-¥õs.
Ao abrigo d'esta verdade que orojecta lu.2 intensíssima por so*
bre os destinos da humanidade^ toao o grande caracter se aífírma,
toda a nobreza humana se explica. A nobreza do homem é um fa-
cto na historiologia dos seres livres, e a operosidade dos povos
uma epopeia de grandezas.
Se alguma vez a dé&graça e a miséria marcarem a triste sorte
d'algum povo ingrato ao seu Deus, oikd^unaa oração adulterada da
fé, guardemo-nos de expandir fora o grito de indignação provo-
cado pela perfídia humana, mas aprendamos a ver no fundo da
onda movediça da acção sodal o pensamento eterno ^que a deter-
mina.
Negaram a Providencia ante a perspectiva do mal como se o
mal descendesse de Deus, e Deus não soubesse auferir de grandes
inales maiores bens.
Quanto a mim desadoro o pensar de pérfidos atrabiliários que
groclamam a absoluta necessidade da revolução para obtenção da
umana perfectibilidade ; mas reconheço convicto què os revira-
mentos sociaes são correlativos das grandes producções intellectuaes
c moraes. A sociedade dos homens como as forças physicas está de
continuo sujeita ás leis da evolução que presuppóe a tempestade á
bonança, e o movimento ao repouso.
Não foi a idéa humanitária de liberdade proclamada precisa-
mente quando mão de ferro a tentava encadear ao peso d*uma
dura escravidão?
O paganismo, ridículo como as sua» deidades, vergonhoso
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Í74 ALMANACH DESANTO ANTÓNIO
como as sua^ |)^s^^ ffeto^ ot^ifionos ^efis idBtlpift^s, denunciou
com teimosia* B} X^^i^u^:^ ^^nftji]^^^^ ma| gâo }|egl^tniou também a
braço^ amigo a'uma Providencia sabia ?
A voz de Paulo soaria no Areópago se Athenas náo estivesse
cançada já da austeridade egoísta cie seus philosophos e poetas?
Poma daria ouvidos a Pedro se elle não fosse a concretação pujante
da humildade e da abnegação, da caridade e da misericórdia, vir-
tudes tanto mais queridas quanto mais ignoradas da dominadora
do mundo?
• ••••,• • • • • , • • • •^r^
Março de 1898, . * \ ; . ' . / .
, . • Fr, a, Mo-ít^.
21— Sabbàdp (Vigilià çom jejum ;e abátinehcià ri-
gorosa).. S. Venâncio, M-t-S. :>Ianço,. ÍVÍ., x,**' Bispo d^
Évora. — Ind, pien. da Bula até ao sabbado seguinte, -^
Nasce o sol ás 4 h,:e jj min, e pôe-se As *j h, e "j min.
Boas pãiãíras rimadas
A tristeza vem dó inferno, * ' '' '
A alegria vem do Eterno.
Quem padece é nada sofTre^ , ,
Nada ganha, perde um cofre.
Ama a Deus, a teus pães,' ao desgraçado,
Que a felicidade jassim terás achaco. r •
.22 — '3> Domingo do Espíf-ito Sanw— O B. Joâjo
Forest, M., dá/i.* O. — A B. Hiamiliana, Viu\/a, da 3/ O.
— St.* Rita de Cássia, Viuva. — St.* Quitéria, V.. M. com.
8 irmás portuguesas. ---St.^ Helena, V.-^S. Auto B.
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MAK> ;: »/ :; 175
plen, para .a, conferia dc^ Conceição-^ jR.qsaifio^ Viva~Çon^
fraria do Rosário, — Q, crescente ás 9 L e 42 m. ^e^i^anhéL.
$;08TU«/ljE$ CHIl^ÇiZfJB fj
Os homens trazem saias é as múlheras calças.
Os homens são costureiras^ e as mulheres carregam fardos.
A linguagem faltídá náò. se esci^eve, e a' IJhguagem escripta
não se falia. , . ■ . >L
Os livros são lidos ao contrario : con-mda-se no fim da pagi-
na, e no fim das linhas. •' ^ . n. ...\
A notação faz-se no alto da pagina e não em baixo.
Os chinezes vestem^se-de branco^ piíâ os funeraes e de preto
para os casamentos. . ■ .•...•.
No jantar começarSift, .pela» sobrem©^, e acaba-se pelo peixe e
pela sopa. . - i, , . * \^
Em vez de extenderem as mãos a um amigo, sacôdem-no em
ptova de amisade. , . , ,
Lançam os seus navios na agua, de lado, e montam a cavallo
pela esquerda.
Cada terra com* seu uso, ' "
Cada roca coní seu fuso.
23 — Segunda-féira — S. Peíjro Celestino Pp. G.
- — S. Basílio Arceb. de Braga. — S. Desiderio, B. M.
Se J. Chrino, diz S. Agostinho, fez milagres e estabeleceu
uma doutrtna divina ié Dçus:— Se Jesus Christo não ítz milagres,
o fundamento de sua doutrina é o maior e o mais portentoso de
todos os milagres, e prova que a vontade divina quer aue J. Chris-
to seja reverenciado como o único e. verdadeiro filho ae Deus.
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il» ALMÀNACH 6É'#Jb>ITO itf>ITOPaO
'24 ^ ttirça-IWhi — N. Serihorti mtííimím.-m.''
Afra, M.— S. miSdióéCaitíp. W^fiKt. Oiit. ismt o J^
»— cp4>i«i.».il> Kil«il«Ít*««»^ g|i I
]^s Sóis mãe Umi\^^^
éreste ptóãigp teuftth&;
.Ms-me tpá. mar d^ésui inia
Iwji dk refulgente Wííha.
outra mâefruir,
descançar, dormir.
Áo que deixou cá da terra
às glorias mtíhdiiná^.
ddrihe^ ó mãe, que só àepk^e
aos prài^és celestiaeg.
Ampara teujilho,
estende4ke a mão,
aquece-^ ao fogo
S feu coração.
Dae-me ancoro, força^ auxilio
contra o inimigo que me agride,
esconde-mém teu seio,
yós, ó Torre de David.
Qne eur mãe, buseOrM
te» nome lombar,
tua gl&rta e briUto^
no mundo espalhai^. -
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:MAK> • ifj^
(3— V— 1900)
Da mikd(^:é€ Ftcmçji^ca'^ 7
vim a banãeira jurar,
ao novo soldado ajuda
as, armas a manejar,
' . '. <■■'.(.' ' ■
Que as Itostès do in/emo:
não possam vencer ' •
um jUhpque jura
' suamnedegénder. '
Quando o braço já cangado
a peleja recusar,
p^gae Vós nas minhas armas
efa^ei-^as triumphar.
Não vença o.fHimigú
um filho que é teu ;
quem jura servir-vos
não o prives do céo.
P. B. Ribeiro.
"^^
26— Quarta-f ei ra (Têmporas com jejum)— A Tras-
Jadaçáo do Corpo de S. Francisco;--^ St;** Urbano, Pp. M.
Londres — Vista tirada do Tamisa
Ai
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178 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Dôr de dentes
Limpa-se bem o buraco do dente e introduz-se n'elle uma
bolinha d^algodâo epnbebida fiajseguinte mistura :
Essência de cravo é lo gramma&
Acido phenico crystalisado. • • • lo grammas
Azeite de meimendro .....*. . . . 5 grammas
Agite-se antes de usar, e 5 minutos depois desapparecerá adôr^
' ' La Bruyérk.
26— Quinta-feírâ— S. Filippe Nery, C— St.°Eleu-
therio, Pp. M.
Ditos populares
i . :• ■ ■ -■ I
— Ah bom cerquinho! (carvalho). O mesmo que o seguinte.
— Ah bom marmeleirol Corresponde a de«ejar-se a aíguem que
apanhe boa sova.
' — AndA com a fralda de fora ejd quer aer homem! Appltca-
se a pessoa moça que sem ter idade para a ter, se dá ares d*impor-
tancia. . ,:.
— Atirar^e de cabeça para baixo. Obrar decidida e resoluta-
mente.
— Alma até Almeida, Diz-se de pessoa corajosa, intemerata.
— Apertar as ilhargas, Rir-se excessivamente, a ponto de ser
preciso...
— Arino melhorado, Anno promettedor. ^
— A corda quetíra sempre pelo mais f rato. Ter cuidado em:
jogar as cristas com pessoa mais poderosa, pois que, . .
— Argueireiro, Horíieni fino, agencianao bem a sua vida.
— Apega-te com Santa Rita que é advogada dos impossíveis,
Diz-se a quem espera cousa difficil se não impossível de alcançar-sc
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MAIO 179
27 — Sexta'^f eira— (TQmporíis.çQn? jejum) S. João,
Pp. M. — S. Beda.
O maior dos infelizes é o. que não áabe supportar uma des-
graça. . .
(^■^^^
28 — Sabbado — (Têmporas com jejum) S. Gre-
gário VII, Pp. e C. — S. Germano, B.
r\a^.
>Q)-
^r^^
FOC-0 HA R03FÀ
. Quando alguma pesroa conhecer que se lhe pegou foeo á rou-
pa, deve tratar de 9 abafar immediatamente, começando por se
deitar ro chão e emquanto não lhe accudirem,'arrastâr-se até che-
gar a um cobertor, uma cortina ou qualquer objecto em que possa
embrulhar-se. Nunca correr porque isso concorreria para intlam-
mar mais o fogo.
29 — ® Domingo ua SS. Trindade (/.'' depois da
Pentecostes) — O B. João do Prado, M., da i.* 0.=«S. Má-
ximo, B. — Ind, plen. para os Irm. Terceiros^ para a Con-
fraria da Conceição é para ò Rosário Vivo. — Lua cheia
ás 8 h. e 18 m. da manha.
-OX€>SN$©X€-
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n
iSo ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Provérbio» de Salomão
XX— 2p
A bizarria nos jovens,
é a fortaleza,
A dignidade nos velhos
é a madureíça,
A alegria pura a idade
toma jflorida,
A tristeza mirra os ossos,
encurta a rida.
XVIII— 24
O homem na sociedade
amável, dado;
mais que um irmão, com amor
será estimado.
P. Freitas.
30 — Segunda-feíra - S. Fernando, Rei de Cas-
tella, C. da 3.* O. — S. Félix, Pp. yí.—Ind. plm. para os
Inn. Terceiros,
Um sujeito entrega o cavallo a um gallêgo para lh'o levar a
casa, mas desde logo lhe recommenda que não monte, porque o
bicho é espertinho.
O gallêgo, porém, considera que levar um cavallo ámão e ir
a pé era tolice e eil-o a cavallo.
Elle a cavallo e este a partir á desfilada.
O bom gallégo trata de se segurar á crina do animal e deixal-o
ir sem destino.
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MAIO i8i
Ao passar n*uma esquina, perguntam-lhe uns collégas:
— O' Xuatrl -pVa-enae-tóA? -^ r-
— Ainda Nun xe xabel respondeu o outro.
31 — Terça-feira — O B. Gerardo de Villamagna,
C. da I.* O.— St.^ Petronilla, V.
"' 5)0(d"
^ori5 Sari Juisman»
(duas palavras sobre a sua obra)
wná-se, em geral, nos espiritos superiores, lúcidos e penetrantes,
"^ que não se sujeitam a um cego sectarismo, mergulhado no
erro, um retorno para a luz da verdade.
feob a acçáo da graça divina, umas vezes, esse retorno é rápi-
do; oul:ras vezes, segue uma lenta evolução que vae pouco e pouco
trazendo ao recto caminho da virtude, que os vae esclarecendo e
illuminando, semelhante ás trevas da noite que fogem ante os cla-
rões, cada vez mais intensos, da alvorada.
Foi este ultimo retorno que se deu no grande espirito de Joris
Karl Huysmans.
Huysmans, o il lustre descendente d*uma familia hoUandeza
de pintores, na sua phase acathólica, sem que fosse agressivo para
a Eçreja, seguiu a escola de Zoh. Mas uma radical differença dis-
tanciava estes dois espiritos, então nos abysmos do erro : o espirito
de Zola não tinha ideal, ou se o tinha estava adormecido peio sen-
sualismo dos brutos; Hu/smans já, nas suas obras peores, mostrava
as tendências do seu espirito para as concepções superiores do bello
e librava a sua potente imaginação d^artista ás regiões do Ideal.
A lenta evolução do seu espirito para a verdade, a sua volta
90 seio da Egreja, as luctas intimas e as interrogações do seu espi-
rito atribulado e inquieto, sob a influencia do toque da graça, pa-
tenteia-4i, elle mesnrb nos seus romsnces, que são, poç, assim dizer,
a historia da sua conversão,, especialmente o En Route,
Marca o En Route já a phase catholica do 11 lustre asylado da
Trappa. Note-se que, sob o influxo da Fé, o notável esçriptor
adquiriu vistas muito nicis largas, grandiosos lipri^ontes se Ihedepa-
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i82 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
JORIS KarL HUISMANS
ram sob o calor da crença, expande-se, em todo o seu esplendor^
a sua alma de artista.
Exemplo formidável, extrema confusão d*aquelles que fazem
a apologia do romance de montuta, é a notável conversão d'este
antigo seguidor do desgraçado auctor do «Lx>uFde»»», «Paris» e
«Roma».
O «En Route»^ onde brilha o mysticismo; a «Cathédrale»,
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MAIO i8S
onde se patenteia o symbolismo; e o «Oblato», onde a. liturgia so-
bresahe, formam a coroa de gloria de Hu)rsn)ans^ a luminosa tri-
logia, onde se apresenta em toda a sua grandeza o acto de fé, sin-
cero e ardente, da sua alma de artista.
Para terminar estas desataviadas linhas só temos de calorosa-
mente felicitar o snr. B. da Costa Pereira, que nos honra com a
sua amisade e que foi nosso condiscípulo nos oancos da Academia
Polytechnica. So o temos a animar por ir transladando no mais
vernáculo portuguez, vencendo brilhantemente as numerosas difi-
culdades da traducção, a obra de Joris Karl Huysmans.
E* um relevante serviço que presta, por diíFundir uma obra
que se recommenda pela sa doutnna oue expõe, e perfeição litte-
raria. já do illustre auctor da admirável «Vida de Santa Lydwina»,
já pelo elegante traductor do «A Caminho».
Hoje quem seguir o nobre exemplo do snr. B. da Costa Perei-
ra, é diçno de todo o louvor, para contrariar e contrabalançar a
nefasta influencia de romances de cano de esgoto e gravuras por-
nographicas que profusamente se patenteam nas estantes dos li-
vreiros, prevertendo e atrophiando a mocidade.
Na nossa humilde opinião, aconselhamos a leitura das formo-
sas traducçóes do nosso antigo condiscípulo, da grande obra de
crente e de artista, da obra de Huysmans, o notável converso,
asylado na Trappa. (*)
António J. D^ALMEmA C. Lemos Ferreira.
Três camponios diri^m-se um dia á feira na villa mais
próxima da sua frcguezia; quando no meio do caminho se lhes de-
parou um lobo monstro.
Pararam estupefactos, e querendo /«^«r espirito, apostaram
que pagaria o jantar para todos trez o que peior applicasse uma
sentença ao falíecido.
Concordaram.
— Este lobo teve um fado, diz o primeiro, andou mais tempo
descalço que calçado.
(f ) As obras de Uuysmaos cuias tradocçDes Já fdiatn editados pela Livraria
rovoeose Editora, do snr. José l^ereíra da Costa sflo as segaiotes:
Santa Lydwina de Schiedam»
A Caminho
A Cathedrctle
O Oblato (a shhir do prelo).
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i84 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
—Este lobo teve «ma briga comeu mais carne crua do que
cosida;- ajuntou o segundo.
— A este iobo4esde que nasceu nunca outra tal lhe aconteceu;
acrescentou o terceiro. * '
Checados á vílla consultam o doutor sobre qual dos treis devia
pagar o jantar. Ouvidas as trez sentenças o doutor exclama: —
— Como de feito, como de facto, pagae todos trez, comeremos
todos quatro.
Os fieis que fizerem o mez de Junho em honra do Coração de
Jesus lucram cada dia sete annos de indulgência e uma plenária em
qualquer dia do mez, á escolha dè cada um.
Os que fizerem a novena em honra do mesmo Sagrado Cora-
ção, que começa amanhã, lucram as indulgências concedidas ao
mez de maio.
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Junho 30 Dias
No crescente enxerta de escudo as árvores que teem a casca
grossa, como figueiras^ oliveiras e íimeiídoeiras:
e nas terras frias semeia alhos, borragens e hortaliças.
No minguante colhe e malha favas,
rega trigo, centeio, cevada, etc. ; sacha os" milhos, tosquia lã^
levanta da terra cebolas de pulitas e deita aves no choco.
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í85 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
1— Quarta-feira — O B. Thiago de Strepa, B. C.
da I.* O. — S. Firmo, M. — S. Fortunato, Presb. — Começa
n trezena de Sf* Antónia, — N*este dia na^ce o sol ás 4. k.
£ 4.6 m. e pôe-se ás y h. e 14 vi.
Conselhos d'um Sábio
— Fallar pouco e a propo ito!
— Não julgar mal de ninguém !
— Evitar a convivência dos^nescios e dos bebedores I
— Fazer justiça a todos e pagar a quem se deve !
— Seguir os dictames da consciência e fazer ouvidos de mer-
cador quando falia a parlacatice.
— Fugir do dise tu e airei eul
— Antes louvar que vituperar !
— Dar a todos audiência e ouvir e consolar os infelizes.
— Fazer o bem que se puder!
— Não trocar a si por outrem !
— Parecer franco, mas sel-o a propósito!
— Fazer com que os nossos actos mereçam louvor e não
-censura !
— Embora a opinião publica seja fácil em absolver nossas
faltas nunca a devemos afrrontar,.mas sempre respeitar.
2 — ^ íi< Qujnta-feira — Corpo de Deus. — A B.
Baptista Varani, V. da 2.* O. — S. Marcellino, M. — Ind.
Jflen, para o Rosário Vivo e para a Confraria do Rosário.
— Os fieis que assistirem hoje e durante o oitavario se-
^inte á missa e officio divino ganham muitas indulgen-*
xias parciais.
c^^
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JUNHO ifi7
o MiRTÍll lU EUCiRISTIt
(dialoso)
-^K Minha mãe, o que era aquillo,
que deu o senhor abbadè
vestido de branco, d grade?» —
— *c Falia baixinho, menino, . .
'stás na casa do Senhor;
cala,., resa com fervor,» —
— <(Mas tu^ ó mãe, di^-me o que era ?,,,
Tão bonita parecias,
quando alegre recebias
^uella rodinha branca,»^-
— «Filho, aquillo era Jesus!,,,
Veio dar ao mundo lu:{,
*svalhar a pa:{ e a bondade!
Depois, n^este captrveiro,
querendo estar prisioneiro
e fechado n*um sacrário,
escondido só ficou
no alvo pão, que abençoou, , ,
e tu cuidas,, que elle dorme?, , ,
Não. , , sósinho, lindo, infante,
cada dia e cada instante
lá dentro encerrado, vela
por todos, por mim, por ti,,,
de amor vive preso alli!» —
— «E,,, pois,, , o minha mãfi, , , deixà-me.
Já que elle é tão nosso amigo, .
iambem eu quero ir comtigo,,^» —
— «Filho, não chores, , , espera, , .
j>ara bem o receber,
é necessário rever
muito bem a consciência;
e depois de examinados,
confessar nossos peccados;
Jesus é puro, innocetite, , .
não entra n*um coração
manchado na imperfeição,» —
— «Também eu, ó mamã, quero,. m.
confessar os meus peccados ;
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i88 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
para serem perdoados ...
eu fos digo já. . . mas, deixa-me.».-
— <iSoce^a, filho, ao reitor ,
quando jd fores maior,
então has-^e confessar-te . . .
e depois tão casto e puro
irás commigo seguro;
Jesus bom, cândido e meigo
ao teu coração virá
e não mais o deixará, n —
— Mas eu.,, agora. . . ó mamã, . .
deixa-me , . . vou já comtigo ...
o Jesus, que é meu amigo,
me, perdoa os meus peccados . . .>» —
— «Cala-te, filho, outro dia ;
não ouviste o que di^ia
o senhor abbade ha pouco ?
ainda és muito pequenino,
não tens idade, és menino;
e é precisa a penitencia. . .
o soffrer é a nossa cru:^. . .
— <iQuero papar o Jesus l. . . (#)
Hoje. . . mamã. . . hoje. . . sim? . . .
Nao ouves ? Chama por mimh* —
Jesus «o amor enlevado,
quando a sós, occulto ouvira
essas vo^fes de innocencia
p*ra o bello infante sorrira. •
Echos de amor no sacrário
lhe parecia escutar ;
e prestes vôa attrahido,
deixando os umbraes do altar.
{*) Reproduzindo esta 'historia, como authentica e verdadeira, aprcveita
esta expressão, consoante ella brotou doa lábios infkntis.
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JUNHO 189
£ cotn o amor impellido,
a elle se arremeçou;
e qual setta esbraseadas
no seu peito se cravou.
E logo o amor vivo, intenso
ferira o seio infantil. . .
Jesus colhe fascinado
esta flor primaveril !
Vós, ó mães, lã junto ao berço
cantae, chorae. . . Mas. se bem
ama Jesus' a innocencia,
por ella velae também!
P. Freitas.
'^-^
3 — Sexta-feira — O B. André de Hispello, C. da l.
O.— St." Ovidio, Are. de Braga.— Sf Paula, V. M.
MENDIGOS RICOS
O mendigo mais ri:o de que se tem noticia, é Simão Oppasich,
um austriaco que nasceu sem pés e sem mãos, e cujo aspecto inspi-
rava verdadeira compaixão.
Em 1880, aos 47 annos de idade, tinha reunido uma fortuna
de 70.000 duros, que em 1888 tinha au^mentado mais do dobro e *
•que na actuilidade é o quádruplo, graças ás especulações bolsateis.
O famoso mendigo italiano Tori, morto em 1899, deixou mais
de 400.000 duros.
Um mendigo, fallecido em Auxerre (França), ha seis annos,
deixou papel de Estado no valor de um milhão de francos. .
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igo ALMANACH ÚE SANTO ANTÓNIO
No mesmo anno de iSgS morreu uma mulher que pedia esmola
pelas ruas de Paris, que tinha uma renda de mais de loolooo reis^
Outro mendigo írancez, chamado- Marcelino, fallecido em no-
vembro de 1892, deixou um capital de 100.000 duros, que legou .
metade a seu povo natal (Avignon) e a outra metade á beneficência
publica.
W
4 — Sabbado — S. Francisco Caricciòlo, C. — S. Qui-
rino, B.
A indifferença publica é um mar morto onde navegam com.
ventos de feição os piratas sociaes.
J, Taibner.
-<^ *-©•-
5 — Domingo (>/ depois do Pentecostes)— o B. Pa-
cifico de Ceredano, C. da i.* O. — S. Marciano, M. — S-
Bonifacio, B. M.
M^Mlé^ êéêé ^éS êi€êé§
Extracto de marmelleiro 6 gottas
Ar livre 6 Hectares-
Separadamente de semana em semana.
PARA OS COMPADRES
Summo de limão q. s.
Sal 0,'or
Casca de nabo q* s^
m. e beba 100 léguas longe de casa.
Repita por 00 annos seguidos.
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JUNHO 191
O Princips Ching
6— C Segunda-felra—St.^ Norberto, B. C.—St*^
Paulina, V. M. — - Qtiarto minguante ás 2. h, e í6 m. dOr
manhã.
— — €:»c«:a
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iga t ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
^a^^S^^^
(d'uMA ALLOCUÇÃO pronunciada na MISSA-NOVA do meu CONDISaPULO
Manoel J. da Silva Macedo, no templo do Sameiro)
Desde aquella noite mysteriosa do Cenáculo, em que Jesus
Christo fez a instituição augusta da Eucharistia e, na pessoa do
Apostolado, creou o sacerdócio, tem-se desenrolado atravez dos
séculos a bandeira tremulante ae muitas glorias ganhas no campo
do sacrifício e da abnegação, colhidas por entre as lacerações do
martyrio: a humanidade tem coberto de bênçãos e a historia re-
gistado admiravelmente o nome de muitos filhos do Akar, minis-
tros do Senhor. .
£ que admirai
Esse^ homem que ahi passa trilhando insultos, macerado de
ingratidões, cuspido de escarneos, vestido com a mortalha negra
que o ha de acompahar sempre, na vida e morte, é o anjo da Paz
e do Consolo, porque é o enviado do céo, mensageiro de Deus.
Do seu coração arranca as flores mais naturaes e espontâneas
e vai desfolhal-as pelos caminhos do mundo, a suavisar tormentos,
a banir desgraças e a confortar desesperanças.
O calor da sua alma acjuece toda a humanidade, porque toda
a humanidade é a sua familia:
A' esposa — a Miséria. '
Irmãos — os Orfansinhos.
Filhos-^ todos os Desgraçados: os que têm lagrimas nos olhos
e dores no coração.
Sem consorte e sem lar, faz-nos lembrar um ser ethereo e
divinal absorto na contemplação dos seus ideais queridos !
Traz nos lábios sempre o sorriso bom das consolações e espa-
Iha-o em feixes de luz, no peito dos infortunados.
Vive no completo esauecimento de si para se lembrar dos ou-
tros, até d'aquelles que a sua passagem estralejam as gargalhadas
do insulto e cobrem os seus crepes venerandos de' insultos he-
diondos.
Passa um véo escuro nas lembranças mais queridas e nas mais
saudosas recordações e vai caminhando por esta via escabrosa de
contrariedades, arrimado ao bastão da esperança, d'oIhos postos
no céo e o coração nas mãos, todo rasgado e cheio de sangue.
E, quando o redemoinhar da phanta"-ia levanta esse véo que
lhe encobre os laços do sangue e do coração, suffo:a na garganta
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JUNHO 193
um soluço dolorido, enxuga os olhos chorosos e obriga a saudade
a um eterno silencio ; e a sua alma, purificando-se no cadinho da
resignação e da caridade e alando-se nas azas da Fé, vae sempre
voando, voindo a aproximar-se de Deus cada vez mais.
O ministério do sacerdócio é entretecido de espinhos, mas de
entre espinhos nascem flores.
A coroa de escarneos que a Jesus poseram na cabeça e lhe
rasgou a fronte, fazendo-a gottejar sangue nas pedras do Calvário,
trâ-la o sacerdote no coração.
Mas, cada espinho d'e3sa coroa floresce em rosas, e elle, com-
passivamente, desfolha-as nos caminhos onde passam os desprote-
gidos da sorte, os tristes e os fracos. . . e até debaixo dos pés dos
próprios inimigos, para lhes amenisar as agruras d'esta jornada de
exilio.
S. Lourenço de Sande.
P. Silva Gonçalves.
7— Terça-feira — Os Bb. Estevam e Coup. Mm.
da 1/ O.— S. Roberto, Abb.
boa resposta
Encontravam-se ha algum tempo èm um waeon vários presu-
midos, d' esses que se mostram como mof adores de officio, e estan-
do, como parecia, discutindo entre si, acertou de entrar um sa-
cerdote.
— O* Senhor cura — disse um com muita çortezia — V. Rev.cia
^m duvida, saberá a grande noticia?
— Não, senhor — repHcou o sacerdote; — eu não hio os perió-
dicos.
— Como' nãò ha-de saber isso, se hoje não se fila de outra
<oisa?
— Pois francamente lhe digo que. não sei a que V.c^ se refere,
— Enteo tenho a honra de communicar-lhe a grande nova. ..
31orreu o diabo 1 . . .
13
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194 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
— Caramba I — contestou o sacerdote. Sinto-o por V/ôs^ pois
sempre me movem á compaixão os orphãos ; receba o senhor esta
moeda de dois tostões em prova do meu sentimento.
8 — Quarta-felra— O B. Bartholomeu Pucci, C. da.
I.* O. — S. Sallustiano. — S. Severino, B. — Ind. Plen.parit
os Irm. Terceiros.
, O fim de todas as virtudes é pôr^-nos na posse da união com-
Deus no qual consiste toda a nossa dita.
S. João da Cruz.
9 — Quinta-feira (iejunt)~S. Paulo da Cru2. C. —
Os Ss. Primo e Feliciano, Mm.
TRASES POPULARES
Assoese agora a esse guardanapo — Frase endereçada a quen>
sobrevem caso inesperado e contrario que lhe debella as esperan-
ças que punha em determinado negocio.
Aprumar-se — Pôr-se no seu lugar. Dar de mão a familiarida-
des ou inconveniências.
A vista fa^ fé — Vendo-se uma cou>a, acredita-se.
Arrumar-lhe com uma ^iica— Dar-lhe utfl bofetão ou um sôcco.
Agora resa-lhe pela alma — Consolação que se dirije a quem
porfiava no con seguimento de uma cousa, e a vê ir para outrem»
Andar, andar, morrer á beira — Perder um negocio, depois de
muito lidar, e quando tudo fazia esperar seu vencimento. E' o^
iresmo qu2 nadar, nadar, morrer d beira,
• "v!/lSS5 v!/
''à^ 2^ /á^
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JUNHO
195
10 — >b ^ Sexta-felra — S. Coração de Jesus — A
B. Jolenta, Viuva, da 3.* O.— St.* Margarida, da Escócia.
— Absolvição geral para os Irm. Terceiros. — Todos os fieis
que assistirem a festa do Coração de Jesus^ ganham ind.
plenária^
^^T^^
T
Pombal.
^ Paridade
Deponde vens? — Do eterno dia.
Quem te conduz ? — A bonança.
Que procuras? — A desgraça.
Que lhe levas? — Uma esp' rança.
Quem te envia? — O Ser supremo.
E onde vaes? — A todo o mundo.
Quem so:corres? — Não escolho.
Quem te espera?— O mal profundo.
Quem te maldiz? — O usurário.
Quem te ignora? — O egoista.
Quem te sorri? — A miséria.
E quem te implora? — A desdita.
Que te cinge? — Luz celeste.
Quem t*a deu? — Foi outra luz.
Quem te guia? — O bem eterno
E' a mio que me conduz ! . . .
« « »
11 — Sabbado (jejum no Patriarchado) — S. Bamabé,
Ap. e os Ss. Félix e Fortunato, Mm. — Nasce o sol ás 4 h.
e 43 m. e põe-se ás y h, e ij m.
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196 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
DiCTôS E ANEGBOTAS
Um camponio vae chamar um medico á cidade para acudir a
sua mulher, que estava muito doente. O medico, porém, declarou-
Ihe que não eslava para ir á aldeia se o homem se não cofnpromet-
tesse a dar-lhe uma libra, quer elle curasse quer matasse a mulher.
— Lá por isso não seja a duvida, declarou o camponio. Ou
n'um caso ou no outro o senhor receberá a libra.
O medico foi, tratou da mulher, mas esta morreu.
Passa-se tempo e como o camponio náo apparecia a pagar, foi
o medico a casa d'elle e pediu-lhe a libra por ter tratado da mulher.
— Ora essa! respondeu o outro. Eu não lhe devo nada. O
nosso contracto foi dar-lhe eu uma libra se o senhor curasse ojl
matasse minha mulher, não foi? #
— E* verdade.
— Então, diga-me cá: O senhor matou minha mulher?
— Está cl iro que não.
— Mas também a não curou. Portanto não lhe devo nada!
12 — Domingo — (3."* depois do Pentecostes) — O
B. Guido de Cortona, C. da i.* O. — Os St.°« Basilides
e Comp. Mm. — St."" Onofre.
eco
INSECTOS MORAES
Despreza os ditinhos e as intrigas, com um litro de paciência.
Faze que não sentes, nem perguntes para náo te incommo-
dares.
\
Se te perturbares com as pícc das. . . é porque ainda precisas
de muita grandeza d*espirito.
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JUNHO 197
13 — • Segunda-feira (>í< »í< no Patriarchado)
-= Santo António de Lisboa, C, da I.* O. — Ind. Plen.
para os fnembros da Pia Unido y para os Irm, Terceiros e
tias igrejas franciscanas. — Ltia nova ás 8 h, e 33 min.
da tarde.
Jb^.^;.^.^:.:..
S. António da Paz (Falperra)
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igS ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
^ â^sa^© ^sa^^saa©
António illustre, que, na lusa terra
Alçando ousado salutar pendão.
Fizeste ao erro inexorável guerra ^
E aos povos deste a Iu:j[ da salvação l
Ínclito sant% d 2 Jesus amado.
Cuja doutrina proclamaste e lei
Com :^elo tanto, só do amor gerado.
Que a Fé trouxeste a transviada grei!
A^tro da Lysia, Facho do Occidente
Que illuminaste c' o fulgor sem vau
Da santidade que ti exorna a frente
E que mil bênçãos nos valeu do Ceul
Fa^e que em vida, d' esse teu exemplo
Seguindo firmes a perpetua lu:^,
Tenhamos n'alma sempre a pa^ d' um templo,
Embora pese sobre nós a Cru:^,
Fa^e que o p*rigo ohl affrontando audazes,
Sempre na brecha combatendo o mal,
O Bem plantemos sobre eternas bases
Pelo teu culto caro a Portugal.
Seja o teu nome fulgurante estrella
Sorrindo meiga c*um sorrir sem pari
Seja a bonança na feroz prccella
D* este revolto e encapellado mar!
Seja-nos lu^ e carinhoso amparo,
íris bemdito de celeste a^ull, . .
Dê-nos abrigo n'este exilio amaro
O manto teu de filigrana e tulVl
Dos males todos que este mundo encerra
Livra-nos, di-nos a ventura e a pa!(,
E assim, ó gloria d* esta nossa terra.
Um peito grato sempre em nós terás.
Setúbal Nunes Formigão.
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o SONHO DO TIO LUCAS
(Petição a S. António)
letn diga ser a vida pastoril a mais pittoresca
ocente e poética. E não diz mal ; em parte não
sngana. Comprova-o a natureza, que tão pródiga
enfeites e galas, sorri nas nossas provincias, mor-
nte nas do norte. Attestam-no os nossos pasto-
, que teem casto os mais puros enlevos da in-
cia n'este mister tão cheio de encantos. A bel-
leza d*aquelles sitios, a magia, que os circunda, não já de satyros
e nymphas, mas de alados paranimphos celestes, jDodem-na elles
exprimir e contar lá aos peraltas da cidade. Quem ainda não ouviu
fallar o pastor, que torneia as nossas cercanias e subúrbios, deixe
a monotonia cidadã, e vá sentar-se á beira do seu rebanho, repare
nas suas phrases rústicas mas portuguezas, fíte o seu olhar singello
e attrahente, copie-lhe as toadas melancholicas, que lança çor so-
bre os vales e balseiras, e contemple através d*aquelle peito tão
alheio a pezares o coração puro e simples, que lhe puUula em meio
das alegrias e das bellezas campestres.
Pode ser innocente o pastor; a sua alma pode ser casta e vir-
gem como a natureza, que o rodeia. Longe da amizade traidora^
-e das seducçóes preversas : longe do murmurinho da cidade e da
tráfego industrioso, a sós com o seu espirito, possue a natureza
toda que é como um espelho chrystallino, onde se reflecte subli-
me e grandioso o throno de Deus, e por ella se eleva continua-
mente ás regiões dos campos elyseos da eternidade.
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7XX) ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Mas, não era assim o Tio Lucas, o pastor ambicioso e pouca
dado a contemplações especulativas. Antes bem alheio a sensações
lyricas, e longe de apreciar o seu torrão tão rico de quadros arre-
batadores e scenas surprehendentes, néo penetrava no mysterio-
d'aquelles idyllios, que a orchestra da creaçâo inspira a corações,
que se chocam e despedem sacro fogo para cantar o Creador.
O Tio Lucas preoccupava-sé pouco com a natureza. O sensa
pratico ia-lhe até aos ossos levar argumentos a favor, e persua-
dil-o, que devia angariar melhor officio e de mais pingue rendi-
mento. E lá ia elle n*um bello dia de primavera a costear o mon-
te, gesticulando e dardejando ao mesmo tempo mil pragas sobre
o numeroso armentio, que o amo lhe confiara. Andava de mau hu-
mor* tudo lhe fazia moléstia. *
È' uma historia, que merece ser reproduzida, a do Tio Lucas.
— Caia sobre mim a ronha, — dizia elle a um seu companhei-
ro de surráo — se eu tornar outra vez ao pico d'este oiteiro.
— Tu perdestes o si?o, ó Lucas. . . porque praguejas assim?
— Mal haja a minha sorte. Anda aqui um homem todo o dia
com estas cabras ao calor e ao frio para ganhar no fim de contas
três vinténs!...
— Antão tu com três mezes já te enjoas? E eu, que ha 4 an-
nos não ganho mais que um safado pataco?. . .
— Mas eu tenho mulher e filhos ; e com que os hei-de susten-
tar? Ainda assim, se o jornal fosse de todos os dias... mas um
pouco chove, outro pouco neva; e passo uma semana e duas sem
ganhar um real, e a fome a fazer das suas cá n'este corpo. D'aqui
a nada caio n'uma sepultura.
— Tem paciência ; não digas mal da Providencia.
-—Ora, se ao menos tivesse 2l jorna de dois. . . tostões, como
aquelles pimpões, que andam a roçar na Costeira!, . .
E assim caminhava o tio Lucas já perto da povoação, vocife-
rando queixas contra a sua vida.
A* entrada da freguezia destacava-se^ pela sua alvura de entre
o verdor dos robles e olmos, uma ermidmha dedicada ao bemdito
S. António.
O pastor, movido não sei porque instincto, entra n*ella, dei-
xando á porta o surrão e o báculo em signal do respeito, que con-
sagrava ao Thaumaturgo portuguez.
— «Meu santo milagreiro — disse, depois de ajoelhâr-se — ó se
mexesses lá os pausinhos da roda, e me cahisse a sorte grande, eu
promettia trajar melhor, e faria por entrar no numero dos roça-
dores da Costeira; assim, havia de ganhar com mais descanso o
sustento para a minha familia.
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JUNHO 20I
Fora o Tio Lucas muito devoto das cautellas, e tudo o que
por ellas lucrava, era logo consummido no jogo, tendo parceiro
um seu amigo e visinho, que, como elle, anciava a grande fortuna
para dar largas á faina do azar, tolerado então pelo governo.
E esta é a razão da supplica do Tio Lucas, que em todos os
sorteios da loteria, ainda os mais baratos, recorria ao santo dos
milagres.
E prestaria, benévolo, o bemdito Santo António attençáo ao
Tio Lucas? Não se sabe. O certo é, que ao entrar na povoação, sen-
tiu grande algazarra, em razão de um [M-emio remediado, que ti-
nha cahido ao numero do seu companheiro de batota, com o qual
tinha concorrido com metade do preço da loteria. A boa nova dos
seus amigos e conhecidos, fel-o rejubilar ; e cada vez se apressava
mais em tomar conta do seu quinhão.
Escusado é dizer também, se o tio Lucas poz em pratica o seu
propósito de mudar de oííicio, porque ao cabo de poucos dias, se-
guia todo campeiro a caminho da roça com uma enxada de bicos
ás costas, de ha pouco forjada ; ia em direcção do monte da Cos-'
tetra. O seu sonho era ganhar os dois tostões diários, que tinha co-
biçado antes aos pobres raçadores. E já não havia mais que pedir,
quero dizer, havia muito mais, porque logo o Tio Lucas começou
outra vez a dizer mal da sua sorte, invejando a de um seu visinho,
que, tendo mercado uma* cautella de dois pataco >, fora premiado
de sobejo, tornando-se senhor de uma boa herdade com a compe-
tente casa de lavoura e operários necessários.
Lucas, o avaro, tão ougado ficou, que todo se ralava ao obser-
var o seu emulo, alheio a minguas e trabalhos, livre de andar,
como elle, sempre atravessando barrocas, e palmilhando devezas,
exposto ás garras do lobo e ás traças dos ladroes.
E voltou á ermida a pedir de novo ao Santo melhoras de for-
tuna para de roçador, se fazer também lavrador abastado, como o
seu visinho; e não é preciso dizer, que o santinho milagroso ac-
cedera aos rogos de um compatricio seu, senão que o Tio Lucas,
fanando um dia a ponta da enxada ao bater em coisa dura, topara
com uma panella de ferro cheia de pintos e peças de ouro, das
quaes ia levando para casa até comprar uma quinta, como a do
seu competidor.
E meu dito, meu feito. Os povos circumvisinhos estavam pas-
mados e toda a freguezia cahia em peso na auinta do tio Lucas
para saber como o antigo pastor tinha alcançado tão rendosa for-
tuna.
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ao2 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
N'aquelles mezes mais chegados tudo era jubilo e alegria no
peito do Tio Lucas ; risonho e satisfeito, passeava pela sua espa-
çosa quinta com maneiras de um grande senhor, olhando por cima
do hombro a todos os seus convismhos. Um dia porem, espraiando
a vista pelas cimas da freguezia, deu com os olhos na magnifica
herdade do morgado da Portella tão politico, como opulento ma-
gnate, e dono da maior parte dos campos e eidos d'aquelle contor-
no. Aquella sim, qu2 era uma quinta e não a do Tio Lucas, que
comparada com as immensas propriedades do morgado, era como
um chicharo perdido n'uma eira.
E o pastor, que tinha enriquecido, começou a sentir no seu
peito, antes jubiloso, o travo da inveja e da cubica, e, como tinha
de'co>tume, correu á ermida de S. António, e prostrou-se ante
a sua imagem, orando lacrimoso:
— «Santo bemd to, concede-me a graça de eu possuir uma
quinta, como a do n^orgado da Portella.»
E após esta oração, se é digna de tal nome a petição manhosa
e interesseira do Tio Lucas, voltou outra vez para sua casa confia-
do na protecção do Santo, que assim como outras vezes fora soc-
côrro para as suas pretensóírs e desejos, feita uma promessa de
visitar a egreja do grande Thaumaturgo de Lisboa, lhe havia de
succeder o mesmo em dada orcasião.
E era interessante, ver como o Tio Lucas ia pelo caminho, lan-
çando as suas contas, c votando cálculos sobre o que poderia ren-
der uma propriedade, como a do n-orgado, e, supposta a boa admi-
nistração e o seu pujante rendimento, 'quanto havia de atulhar os
cofres e as hurras.
Com o que prestes seria o homem mais rico da província, e
estabeleceria, como tinha ouvido d'oatros, uma casa bancaria em
Lisboa, aonde o governo recorreria, como á de Rostchild, ou á do
Snr. Eurnay, e o governo, todo attencioso e agradecido aos favo-
res prestameiros, que fizera, o honraria com o titulo de Visconde
da Costeira^ pe'o qual gosaria o direito de ser deputado e par do
reino, e quem sabe, se presidente do Conselho de ministros. E
n^estes tempo?, em que as revoluções por toda a parte parecem
ameaçar uma erupçío repentina, talvez o traste lograsse ainda es-
carrapachar-se n'um throno como presidente da republica, até que
por um golpe de Estado, como o de Napoleão III, se visse coroado
imperador.
E imperador foi elle na sua mente, até que chegou a sua casa,
onde o esperava já lusido cortejo de lacaios e o competente chefe
preparado com o sceptro e a coroa rematada com uma águia de
duas cabeças.
E, má sina, foi o caso, que, ainda não tinha transposto as va-
las, que marcavam a extensão d!a sua propriedade, quando reparou
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JUNHO 2o3
vir ao seu encontro um dos creados da sua lavoura, que gritava a
sete fôlegos:
— Alerta 1 Grande cheia I Ai, que nos afogamos todos 1 . . .
£ efectivamente, as aguas do rio, trasbordando, começavam
3. inundar a campina, e n'um momento se viu o Tio Lucas em ta-
las no meio de um vasto lago, que foi crescendo, crescendo, che-
gando-lhe primeiro aos tornozellos, depois aos joelhos, logo á cin-
tura, e ultimamente ao pescoço 1
— Santo bemdito — exclamou — salvae-me, que me afogo.
Porem a agua subia, subia, e já lhe falseavam os pés; e como
o Tio Lucas era um homem veleirinho, isto é, nadava pouco mais
ou menos, como um prego, estava mais tempo debaixo da agua do
que em cima ; erà pena vel-o arquejar em anciãs e abrir a bocca,
quando a largos tragos sorvia a agua, que lhe entrava ás golfadas^
me is do que podia supportar o seu corpo.
E não cessava de invocar o seu santo Patrono com aquellas
angustias, que poderá comprehender quem já se viu em taes as-
pados.
— Santo meu — dizia — dou-te a propriedade do morgado, mas
salvae-me.
Porem a agua ia subindo.
— O* Santo António da minha alma, — exclamou momentos
-depois — não só te dou a propriedade do morgado, mas a herdade,
que possuia antes.
E a agua a subir, a subir.
— O' bemdito Santo António— gemeu então — pegae também
tios dois. . . toes e na minha enxada de dois bicos, mas livrae-me
doeste perigo !
E as aguas sem darem de si.
— Oh! meu advogado: Tudo, mdo te darei, até o meu bácu-
lo e o surrão, que deixei á porta da ermida no dia em que te pedi
melhorasses a minha sorte.
Eh... homem de Deus,— diz-lhe o companheiro, chegando á
ermida — então ainda aaui está? Você esteve a dormir? C)lhe que
o sol já cahiu para lá da Costeira, Basta, que vae sendo hora de
ir para casa.
O Tio Lucas esfregou as sobrancelhas, remelhou os olhos, e
mirou a custo para todas as partes espantado, e depois de um mo-
mento de sobresalto, exclamou :
— Já baixaram as aguas?
— Qual agua, nem qual cabaça ; aqui não ha mais agua do que
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àQ4 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
a da pia, que é benta pelo senhor abbade. Benza-se Você, levan-
te-se. enfie o surráo e toca a andar.
.O Tio Lucas, cada vez nniais pasmado, tornou a olhar para to-
dos os cantos e por fim comprehendeu, que estava na ermida,
aonde tinha ido pedir a S. António melhor emprego, e o premia
da sorte grande, e que no meio das supplicas e responsos ficara a
dormir.
E efFectivamente, assim foi ; tudo aquillo de converter-se de
pastor em roçador, e depois em proprietário, foi somente um so-
nho, de que se ergueu confortado o Tio Lucas para resignar-se
com a sua sorte, e ainda conduzir com alegria a manada de cabras,
que por muito favor lhe confiaram, convencido de que as riquezas
náo trazem comsigo a felicidade.
E tomem d'aqui sentido os avarentos e cubiçosos ; quando se
virem, como o Tio Lucas, náo extranhem, nem maldigam a sua
sorte e contentem-se com o pouco para náo ficarem sem nada. Esta
mazella já é muito antiga; lá dizia o Aristóteles: «a cubica das ri~
quezas, vae até ao infinito», da qual sentença um poeta nosso ti-
rou este anexim:
A saccóla do avarento,
nunca di^:
— basta, hasta, que arrebento,-^
14-VII-903.
P. Freitas.
14 — Tetça-feira — S. Basílio o Grande, B., C. Dr.
St.° Eliseu, Propheta.
FORA COM OS FRADES l
— Mas porque ?
— Porque sáo inúteis, ociosos*
— Seja assim ; mas então fora também com as mulheres ricas
— e sáo tantas!— que só cuidam da toilette, de se ornar para agra-
dar a estes e áquelles. ,
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JUNHO 2o5
— Estão na siia liberdade, podefn fazer o que quizerem.
— E não o estarão as religiosas, e religiosos para amar, louvar
« glorificar a Deus?
— Fora com os frades e freiras !
— Porque não dizeis antes: fora com os saltimbancos, os co-
mediantes, 03 emprezarios dos cafés concertos, etc, etc?
— Porque estes são do agrado, têm a approvação «de muita
^ente.
— Se essa é a razão, calae-vos, porque os frades e freiras são
respeitados, estimados, e amados pelo que ha de melhor na socie-
dade. E' uma enorme injustiça dar-se liberdade para tudo o c^uç
pode prejudicar a sociedade, animar a vaidade, fomentar o vicio
— como são as casas de má nota, as tabernas, as casas de jogo, a
imprensa pornographica, etc, e negar-se aos religiosos e religio-
sas, que se dedicam ao ensino, que se consagram ao allivio das
misérias humanas I . . .
Soldados chins do Yun-nan
15 — Quarta-feira — S. João de S. Fecundo. —Os
St.** Vito e Modesto, Mm.
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!io6 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
VIS HA THEOBIA. OUTKOS IA PBATICA
Mr. Sturnel, nas suas Souvenirs de 1881 — falia d'um socialis-
ta francez, refugiado em Genebra — um energúmeno que para ga-
nhar a vida começou a publicar um semanário petroleiro intitula-
do A divisão,
N'elle, dividia a terra em pedaços, e a riqueza em partes
eguaes, e applicava-lhe a sua máxima favorita : A propriedade deve
ser repartida por esçual.
Quiz a sorte do socialista que lhe morresse um parente dei-
xando-o herdeiro de t5:ooo francos.
No numero seguinte do periódico o nosso homem continuava
a exposição de suas theorias com esta ligeira variante : A proprie-
dade deve ser repartida por egual.,. quando passar de 1:^:000
francos.
16 — Quinta-feira — N. Senhora do Soccorro. — S-
João Francisco Regis. — St.** Aureliano, B. — St.* Ger-
maua. — Ind. Plen, para o Rosaria Vivo,
AMOR BE MÃE
o melhor amor do mundo
Mais forte e mais persistente ;
Puro eterno omnipotente,
Amor sem mácula profundo.
Capaz de tudo arrostar,
Que morre pelo seu bem;
E' mui fácil d*encontrar
E' o amor da nossa máe.
— >-í3Íg3t>-<—
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JUNHO 207
17 — Sexta-feira — S. Bonifácio, B. M. — A B. Te-
resa, rainha de Leão, portuguesa. — S.. Manoel e seus Ir-
mãos, Mm.
Um inglez que ia ser enforcado com um seu camarada, vendo
que este chorava, diz-lhe :
— Poltrão! Tu não es digno de ser enforcado.
18 — Sabbado — St.° Agostinho de Cantuaria. — Os
Ss. Marcos e Marcellino, irmãos. Mm.
o professor, acerca da revolução de 24 d'agosto de 1820:
— Qual foi o grito d*esta revolução?
— Foram as cortes constituintes.
— Não, senhor.
— Então foram os brados enthusiasticos de «Viva a liberdadel»
— Também não. Veja bem qual seria o terrivel grito. . .
— Icnoro-o...
— Oh ! senhor ! foi a junta provisória. . .
19 — Domingo — (4.'' depois do Pentecostes) — A
B. Michelina, Viuva, da 3.* O. — Os Ss. Gervásio e Pro-
tasio. Mm. — Ind. Plen, nas egrejas franciscanas.
~W^
PARA dUE SERVE A CONFfSSAO?
E' a égide da perseverança e da virtude. E* a casca,» áspera e
rude, mas a casca protectora que conserva intacto este fructo ma-
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2o8 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
ravilhoso que se chama a consciência. A confissão conserva, e res-
titue a paz ao coração, previne e repara uma multidão de crimes,
e desgraças. Recorda aos filhos, a mãe, ao pae, a todos o cumpri-
mento dos deveres mais sagrados. Faz restituir o bem injustamen-
te adquirido ; corrigir os defeitos mais graves e mais leves ; prati-
car as virtudes as mais heróicas, e, segundo a bella expressão de
S. Francisco de Sales, concerta o relógio da alma.
E' sobretudo uma confissão cincerá, que consola o moribuudo
prestes a apparecer diante do seu Deus e seu Juiz.
Abb. Garnier.
20 — 3) Segunda-feira (Oitava de Santo António).
— S. Silvério, Pp. M. — Quarto crescente ás 2 k. e 34 m.
da tarde.
JOGO DO ANNEL
As crianças, de pé, formam roda, tomando nas mãos um cor-
del em que se enfiou um annel e cujas extremidades se atarão.
Uma que fica ao centro trata então de agarrar o annel onde o
vê parado ; mas * as outras imprimem-lhe um movimento com as
mãos, segurando sempre o cordel, de modo que se torne diíiicil
agarrar o annel.
A roda deve ser larga.
A que, pot falta de habilidade, deu causa a que o annel íbsse
agarrado, passa para o centro.
F. AiKH-PHO Coelho.
21 — Terça-feira — S. Luiz Gonzaga, C. — Nasce
o sol' ás 4 h. e 41 m, da manha e põe-se ás y h, e iç m.
^!oí^
^j^ n\
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JUNHO
209
S. José foi eleito guarda dos thesouros de Deus, que sio Jesus
e Maria.
S. Bernardino de Senna.
22-«-Quartafeira — St.^ Juliana de Falconeri, V.
— S. Paulino, B.
Não se deve lêr nâ cama
E' inconveniente a leitura na cama porque provoca uma forte
tensão do nervo óptico; sobretudo quando a luz é escassa, oscil-
lante e muito afastada. As pessoas que teem este mau costumede-
vem lavar as pálpebras com agua salgada ; mas o melhor seria que
perdessem este mau habito.
23 — Quinta-feira — S. Vicente de Paula, C —
S. João Sacerdote. — St.* Edelrudes, rainha da Bretanha^
;^^ — ^
RATICES AMERICANAS
Na cidade de Providencia realisou-se ha pouco uma experien-
<:ia que teve consequências absolutamente inesperadas. Uma mul-
tidão considerável comprimia-se em uma grande casa recentemen-
te construída, a fim de assistir ás experiências de um ascensor de
novo modelo. Este, segundo o inventor, em logar de resvalar po-
<iia cahir do quinto andar até ao rez do-chão, — mais de 20 metros
u
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210 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
cl*altura, — sem que, graças a um apparelho próprio para amorte-
cer a queda, as pessoas que o occupassem sentissem o menor mal.
Para provar a excellenciar do systema colbcaram no ascensor
uma cesta d'ovos e um copo d*agua. Mas, enthusiasmados, o pre-
sidente da Sociedade dos Inventores, uni repórter e o empreiteira
da construcção tomaram logar ao lado dos ovos e do copo d*agua.
A um signal dado o empreiteiro cortou resolutamente o cabo, e o
ascensor cahiu com rapidez vertiginosa. Quando se abriu a porta
do ascensor para se ver o resultado, dois dos experimentadores es-
tavam litteralmente esmagados no meio d3 uma abominável ome-
leta d'ovos e de restos do copo. Só o jornalista estava vivo, mas
gravemente ferido.
Só na America !
24 -^ ^ Sexta-feira — S. João Baptista. -7;^:/.
p!en, para os Inn, Terceiros e para os da Conceição,
Infância de Jesus
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^9sras 9 ^, ^oãó
9
ERTo dia passando Jesus menino pelos arredores de Na-
1^ zareth teve sede. Não lhe faltavam fontes de crysral-
Ç^tte^5!i3| i^ linas aguas a gemer bem perto, mas o Salvador não
^^•^'^♦^^^ quiz beber; sentado á sombra aa idosa palmeira sof-
freu securas d*aquella dolorosa sensação.
E chorou.
^^ Passaram as vismhas, cujo enlevo era Jesus, e as ca-
§ ritativas nazarenas, vendo o pranto do amor da sua al-
ma, choraram com EUe, e correram a trazer-lhe agua,
mas Jesus não acceitou, não quiz beber,
Continuou a chorar.
VÍ3ram as aves da selva, pipitaram-lhe mil canções amorosas,
passaram-lhe as astas pelo rosto para lhe enxugar as lagrimas,
trouxeram-lhe agua nos bicos, instaram com mil caricias, mas en-
? otou-as, não quiz beber. Ficaram-se as avesinhas chilreando tris-
tes sobre a palmeira.
Jesus chorava com ellas.
Chegaram-se os cordeirinhos, alvos como as flores de Jericó,
que pasciam perto, coçavam-se uns aos seus pés outros puxavam-
Ihe pela túnica, outros guiando á fonte chamavam-no com ternos
balidos, mil astúcias amorosas, inno:entes, mas Jesus não se le-
vantoj, não foi beber.
Deitaram-se-lhe aos pés balando, choro:os.
Jesus chorava com eíles. .
Sopraram , frescas, balsami :as, dulci?onas brisas, en :urvaram-se-
Ihé sobre o collo os ramos da palmeira prenhe de namorados fructos,
c balançando-os sagazmente perante o rosto lacrimoso tentavam-n*o
a cortal-os. Jesus nem os viu, não quiz matar a sede.
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2 12 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
A brisa começou a suspirar melancholica pelo palmeiral.
Jesus com ella gemia.
Desceram anjos do céo, com crystallinas taças de celeste be-
bida para dessedentar o seu Rei e Senhor, mas despediu-os, não
quiz matar a sede.
Os paranymphos do empyreo, cobriram o rosto com as azas de
neve, e voltaram chorosos ao Paraiso.
Jesus ficou a chorar.
Maria, a mãe extremosa, que tudo presenceára de teaz de uma
palmeira, levou agua a seu filho, que lhe morria á sede. Mas Jesus
fez-lhe um aceno negativo e não guiz acceitar.
A Virgem Mãe, para quem nso era nova aquella triste scena^
retirou-se com as lagrimas a borbulhar dos olhos, e o pranto de
Jesus continuou a regar o tronco da palmeira secular.
Jesus chorou. . . chorou.
Com elle suspirava a Virgem dolorosa e triste; pranteavam os
anjos, carpiam as nazarenas com lastimas o menino de Maria, a
quem estremeciam como mães, balavam tristezas os cordeirinhos,
trinavam melancholias as aves, murmura suspirante mil queixas a
brisa, e a mesma fonte gemia amarguradas canções.
Tudo chorava com Jesus.
E não havia quem lhe chegasse aos ardidos lábios uma agua
de que gostasse, que lhe matasse a sede que parecia assal-o.
Jesus chorava ainda. . .
Instantes depois, passava ao largo S. João Baptista, em direc-
ção da casa do seu divmo primei de Nazareth.
Jesus chamou-o.
S. João correu para o primo da sua alma.
Chegou, e ao ver correr-lhe dos olhos pisados tantas lagrimas,
deitou-se-lhe ao pescoço, n*um abraço prolongado deu-lhe muitos
beijos, e com as lagrimas nos olhos — pois o amava tanto, tanto —
perguntou-lhe o que lhe doía.
Jesus em resposta pediu-lhe agua.
N'um abrir e fechar de olhos o Baptista apresenta-lhe a sua
escudella de viagem a transbordar.
Jesus bebeu então e saciou-se. Deu em paga a João um demo-
rado abraço poisou-lhe nas rosadas faces dois divinos ósculos e não
mais chorou.
Ambos abraçados irtrãmente dirigiram-se para Nazareth.
Os cordeirinhos pularam de contentes e foram para o pasto,
as avesinhas acompanharam o divino par, chilreando alegres de
palmeira em palmeira, a brisa pelo arvoredo era uma harmonia fesr-
tiva ininterrupta, nos céos ouviam-se coros, de anjos, os caminhos
eram um tapete de mil florinhas b.ellas, as arvores tinham mais flô-
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JUNHO 2i3
Tes, mais aromas os lyrios e açucenas, mais murmúrios os regatos,
mais suavidade, musica, extasis a natureza.
Toda a visinhança da casinha de Nazareth abraçou e beijou
cem vezes os dois primos, rivaes em graças e innocencia.
Jesus passou o resto da tarde entretido com S, João, e n'aquelle
dia não chorou mais.
Ouvistes creancas innocentes? Reparastes educadores?
E* para vós am bos esta parábola ; penetraste-lhe o sentido ?
A sede de Jesus não era eíFeito de calores ou fadigas, não erà
secura de lábios, era sede que lhe queimava o coração, que Ihè
repassava de calor o intimo da alma.
— Era a sede da innocencia.
Maria e os anjos não lh*a puderam matar, por que são creatu-
ras do céo, e Jesus tem sede das almas innocentes dos seus irmãos
da terra.
Esta sede que nasceu com elle no berço, que, morreu com elle
na cruz, mitigada apenas, só os innocentes lh'a podem niatar,
Creancas, em cuja alma não fez abrolhar ainda o crime os es-
pinhos lacerantes do remorso, Jesus tem sede da vossa candura, da
vossa simplicidade, da vossa pureza de coração,— da vossa innocen-
cia — quereis dar-lh*a? Jesus pede-vos com lagrimas esse refrigé-
rio para o seu coração sedento, quere s matar-me a sede?
Quando vossa mãe, sedenta de amor, vos estendeu os braços,
para vos apertar ao coração, negastes-lhe um abraço?
Quando vosso pae, faminto, de um beijo de vossos lábios vos
'offereceu o rosto não lho poisastes nas faces? Quando os vossos fa-
miliares e visinhos, fascinados pela vossa sympathica candura, vos
oftertaram coUo e afagos, negastes-lhos? Não.
Mataste-lhes a sêoe do coração — o amor que vos testemunha-
vam tão francamente.
E a Jesus, que tem sede de vossa innocencia, que chora por
ella, não lha matareis, dando-lhe o vosso coração immaculado?
Dae, innocentes, dae essa esmola a Jesus, que elle saberá re-
compensal-a: cá com uma vida socegada, sem remorsos, nem du-
vidas cruciantes de consciência, lá no Paraiso.com 05 hymnos dos
anjos, com a felicidade eterna.
É vós pães de íamilia, lembra:2-vos que Jesus exige de vós a
innocencia dos filhos que vos deu. Entregou-os innocentes aos vos-
sos cuidados, á vossa educação, c quere-os receber innocentes. En-
tregou-vos uns anjos sem mancha, não quer receber uns devassos^
uns criminosos.
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n 14 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Concorrei, com este dever do vosso estado, para o refrigeria
do coração sedento de Jesus.
Recordae-vos também vós, educadores, quem quer que sejaes,
recordae-vos continuamente gue Jesus tem sede das almas inno-
centes, que dos braços da n:ae sahiram para a .vossa casa, para o
vosso coUegio; que Jesus quer os abaços as caricias d*esses inno-
centQs. Recordae-vos que perpetraes um sacrilégio e iuaudito furto,
se roubardes a esses corações esse dote que é o seu enlevo, a sua
graça a sua única grande riqueza. Qiie esses botões mirro^os entre-
abertos cos raios da graça divina, que as mães confiaram ao vosso
acreditado zelo, que transplantaram para o vosso jardim, não per-
cam as cores e os attractivos, não murchem, não lhe caiam as pé-
tala s mimosas na lama. Que ní^o saia do vosso aposento criminoso,
quem entrou um anjo.
B. Ribeiro.
^
25 — Sexta-feíra— S. Guilherme, Abb.— St.* Fe-
brodia, V. M.— S. Tude.
Entre mulheres:
— Mas a ser certo o que me contas, essa tal mulher é um ver-
dadeiro horror!'
— A ser certo, dizes tu ! Imaginas acaso que eu, a sua melhor
amiga, seria capaz de a calumniar?.. .
26 — Domingo (5.° depois do Pentecostes) — Os
Sts. João e Paulo, Mm. — S. Pelagio, M.
veí:^(S^^^
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JUNHO 2i5
O TROVADOR
(a. p. b. r.^
DejaO pttsa^ ái trovador errante;
DejAil que á sombra dei paterno techo
Guudriua que vuulve, aiiid y cante.
ZORRILLA.
Abre a manhã esplendida
seu manto virginal^
que d terra mostra o magico
fulgor aurorial.
Na franja do horisonte
o sol ridente e loiro
começa a face d'oiro
alegre a desvendar.
Ali junto d balseira verde e vicejante
ouve-se em melodioso e tremulo descante
das aves o acordar,
Apra^-me aqui o olhar, nos longes espargir
monstro giganteOf o mar ao largo eil-^ a bramir,
revolve^e furioso aos ares vomUando
ondas de pura prata,
que em 'spuma apó& desata
' n*um rancor execrando»
Sobre o seu dorso horrendo
lá vae uma barquinha;
sobe, afunda, caminha.
E em timido balanço, agitor-se. tremendo;
um vulto se descobre
reclinado ruf proa;
escuro manto o cobre,
e a barca deixa ir sobre as aguas, d tôa.
Parece inda dormir,
ou é, que dor atro^, minandorihe as entranhas,
permitte4he esquecer do oceano as bravas sanhas,
e deixai assim languir.
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1 16 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
— Quem será,
que n'este mar irado,
torvo monstro inflado,
navega socegado ^.
em tão linda manhã? . . . —
Perguntei eu aos ceos,
ao vento, aos escarcéus.
Eis que do mar, Mncando perfumada aragem,
deslisa mansamente, e beijando a folhagem,
nos meus ouvidos pára. Envolta em seu pudor,
di^-me timidamente: — «aquelle é o trovador, v* —
— O trovador?! — repito imerso na surpre:{a^
— Aquelle é o trovador? —
A aragem indefesa,
resposta não me deu; fugiu para a verdura,
que em seu manto lustroso' acolhe com ternura.
Então mais fixamente olhando aquelle vulto,
cheguei a descobrir4he sob o manto occulto
um antigo alaúde.
As faces descamadas
pendem em languidé:ç aos ^braços recostadas,
e triste, lá por dentro em luto ruminava
a dôr, que o coração então lh'exçruciava.
Ao veUo n*esse estado, ergui a minha vo^,
rogando ao pego undoso, levasse nas aguas
estes sentidos sons, a affugentar4he as maguas,
ou sequer, minorar-lhe aquella dôr atro^.
— «Sobre o oceano indómito
ó trovador a esta hora?
não vês, que nasce a aurora,
oh! trovador!
— «O mundo em jubilo ergue-^e,
alenta e revigorai
e tu não surges fora,
oh! trovador!
--«Cantor dá» auras tépidas,
o teu rosto descora,
diiç, que dôr te devora,
oh l trovador f
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JUNHO 2t7
— «i4 etherea luir esplendida
o a^ful do ceo colora^
ergue-te, surge fera,
oh! trovador!
— ttQue duro fado, ríspido
assim te desadora?!. . .
Ai! o teu vulto chora^
oh! trovador!.^.
Erguesse então em pé. No pallido semJ^lante
lia bem claramente a minha vista errante
as afflicçôes cruéis, a íivtda amargura^
que lhe cravava n*alma a crua desventura ;
erguendo assim ao céo os olhos lacrimantes
d*um brilho encantador , saudosos, fascinantes,
empunha o alaúde^ e ergue um cântico á dôr.
Assim cantou:
ouvi, é a vof do trovador:
^^«Manhãs de casto enleio,
vertei-me no meu seio
' a pa:ç, a quietação ,
ondas do mar errante,
quanto é mais revoltante
a dôr, que ora lacera este meu coração.
Correi profusamente, 6 bagas do meu pranto,
as faces me inundai, que o meu soffrer é tanto!
— «O* auras murmurantes,
que, temas, sussurrantes,
nos ramos suspirais,
vós tendes quem. mitiga
a dor, que vos fustiga,
só não ouve ninguém, os meus languidút^ais.
Correi profusamente, ó bagas do meu pranto,
as faces me inundai, que o meu soffrer é tanto!
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2i8 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
— f<Lua, primor das pérolas,
as tuas queixas quérulas,
attende-as, meigo o sol;
mas eu no meu tormento
não tenho, astro d' argento
sobre a terra ninguém, que na dôr me consoV.
Correi profusamente, ó bagas do meu pranto,
as faces me inundai, que o meu soffrer é tanto?
— «O' tUy ultima estrella,
que alem scintillas, bellà
quem ama teu pallôr?!.. .
, < riinguem? . . . ó sorridente
meu pranto àlviritente
acolhe no teu seio, e ligue-nos a dôr.
Correi profusamente, ó bagas do meu pranto,
as faces me inundai, que o meu soffrer é tanto!
— *<0s homens sobre a terra
movem-me crua guerra,
mais bravos^ que leões ;
oh! se a ventura existe,
não é para mim, triste;
Só fervem contra mim negras accusações
Correi profusamente, ô bagas do meu pranto,
as faces me inundai, que o meu soffrer é tanto!
Callou-se o trovador.
Após alguns instantes,
trouxeram-me ainda a custo as brisas sussurrantes
uns sons entrecortados,
dolentes, soffreados:
— «Senhor, o mundo ingrato
assim me deixa ao trato
d*estaafflicçáo atro:[;
em vão a natureza
invoco, ella em surpresa
escusa-se attender a minha triste vo^.
Correi profusamente, 6 bagas do meu pranto,
as faces me inundai, que o meu soffrer é tanto!»
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JUNHO 219
E/esf-se ao largo a barca, O mar horrivd
bdlouçando-a nas ondas furiosas,
levou-a ao longe. ,. e o trovador prefere
d terra ingrata, as vagas alterosas.
Homens em cujo peito mora o affecto
sincero, dedicado, puro e amante,
ide acolher— «ao trovador errante,
deixar, que d sombra do paterno tecto
andorinha, que volve, aninhe e cante. y> —
(3o — VII — 1 899. Silvio Passos.
27 — ® Segunda-feira— O B. Benevenuto de Eu-
gubio, C, da I.* O. — Ltia cheia ás 7 h. e 48 m. da tarde.
->^<i>^-
Experimentareis menos pezares na hora da vossa morte, se a
vossa consciência estiver tranquiUa.
CONFUCIUS .
28 — Terça-felra (jejum) — S. Leão n, Pp. C.
-i-%
Um sujeito que fazia'"gala da sua valentia, estando uma vez a
•contar um caso, confessou, que tinha apanhado um murro.
-T- Mas isso teve com "certeza consequências graves ? disse al-
guém.
:— Gravissimas 1 Fiquei com dois dentes partidos e andei com
a cara inchada mais de, oito dias, .
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220 ALMANACH DÈ SANTO ANTÓNIO
29 — Quarta-fòira ^ ^ S. Pedro e Si Paulo^
App. -r-índ. plen. para os Imu TerceiroSy para os da
Conceição^ para o Rosário Vivo.
Cidade de Macau
DOIS MINUTOS DE MISSA
Chegaram dois compadres á egreja para ouvir missa em um
dia de festa,, e como o sacerdote já ejstivesse a dar a benção, disse
um d'estes grandes talentos: caramba, compadre, se nos descuidá-
vamos mais um pouco, ficávamos hoje sem missa.
Se estes mestres em catecismo soubessem que antes da bençãa
já o sacerdote tinha dito *ílte, missa est», que g[uer dizer, «está
acabada a missa» entenderiam melhor a obrigação que tinham de
ouvir outra, pois d*aquella não ouviram nada.
D^aqui a obrigação que incumbe aos pães e mães de familia d^
educar seus filhos nos mysterros da religião, leval-os em sua com-
panhia para que assistarA desde pequeninos aos divinos officios e
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JUNHO
Esperando Esmola
para que depois quando jovens não se envergonhem de manifes-
tar as suas crenças respeitando a egreja e os sacerdotes seus mi-
nistros .
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222 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
30 — Quinta-feira — Commemoração de S. Paulo^
Ap. — S. Marçal, B.
Um inglez vendia na sua loja vassouras a dois vinténs. Um diat
estabeleceu-se outro defronte d'elle e começou a vender a vinten>
aquelie artigo. Grande admiração do primeiro, que lhe disse:
—Eu para vender as vassouras a dois vinténs. roubo a palha,
o cordão e o pau; como arranja você o seu negocio?
— Eu? roubo-as já feitas!
Em Epsom, perto de Londres, realisou-se ha pouco um casa-
mento em circumstancias curiosas.
Os noivos eram cyclistas enthusiastas ; e tanto elles como os
padrinhos e convidados foram para a egreja em bicycleta e depois
da ceremonia partiram todos do mesmo modo para úm restaurante
a nove milhas de distancia.
O mais interessante, porém, foi que, sendo o noivo muito novo
e imberbe e estando a noiva vestida com o trage de ciclysta, muito
semelhante ao d'elle, o clergjmian viu-se tão embaraçado que se
dirigiu ao> dois, dizendo:
— Perdão. . . Qual dos dois é a noiva?
Nas cinzas do cemitério
Pensemos um pouco a serio.
O que o:culto nos convém
Não se descobre a ninguém.
Tem a alma apparelhada
Para a eterna jornada.
Alves d'Almsu>a.
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Julho
31 Dias
No quirto crescente guarda os craveiros á sombra, limpa
as sementei. No minguante recolhe legumes, amêndoas e outros
fructos, e ceifa trigo.
1 — Sexta-feira — S. Theodorico, Abb. — N'este dior
nasce o sol ás 4. h, e yj m, e pôese ás 7 h, 16 m,
nao bebo
NTRE os frequentadores da tabena do Maurício, não havia
IF^4 para vinho como o Quelhas. To los os garotos d'aquella ci-
dade o conheciam. -
— Mais um litro, ó Mauricio. Quantos já lá vão?
— Uns oito.
— A pipa leva mais ; venha de lá outro.
Mais outro. Isto fão dois goles.
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224 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
. £ lançou-lhe as manoplas tremulas da ebriedade e embor—
cou-o de um gole.
— Ha 1 . . . Isto cada litro é um anno de vida. O vinho é san->
gue, sempre ouvi dizer aos velhos.
— Então muito tens que viver, ó Quelhas?
— Alguns só vivem, Maurício, se não acabar a pinga. Dizem
Eois, ai que o Quelhas não vae longe, que o Quelhas está por una
o, o Quelhas emquanto beber está vivo. Com esta edide. . .
Quantos são, ó Jorge?
— Quarenta e dez e cem . . .
Respondeu com voz resonante de embriaguez o bêbado esti-
rado sobre o escabello e amodorrado como giboia em digestão.
— Pois um homem d'esta edade, anda ahi por essas ruas sem
ir a terra e os outros vejo-os sempre para ahi de lombos na rua.
E esforça-se por se pôr em pé, mas tremelica e senta-se de
golpe.
— E se não fora esses palácios e montes fugirem-me como com-
boios, e faltar-me a terra debaixo dos pés, não haveria honneni
mais firme.
— Mas afinal Quelhas, tu já te não tens em pé.
— Como um rapaz novo.
E agarra-se ao bordão e íirma-se com a esquerda ao mostra-
dor para se pôr a pé.
— Eu não sou ali como o Jorge que se vae a terra com qual-
quer meia dúzia de litros.
E ao virar para apontar para o do encobelo, entra de treme-
licar, tatea com os pés e mãos e senta-se desamparado.
— E*s um valentão para vinho, mas não aguentas mais.
— Não leva mais?...
E sahiu meio de gatas, agarrado á parede, e pé na soleira da
porta e pé fora, mette os dedos á bocca e
— Grrró. . . grrró — E carga para a rua que parecia uma pipa
arrombada a largas horas. Pela bodega espalhou-se um fartum
azedo.
— Mais vinho, Mauricio; a pipa ferveu e trasbordou; leva cá
muito vinho. Mais um litro, Mauricio.
E vinha entrando firmado com a direita ao varapau e a es-
querda á parede.
— Você é um valente, seu Quelhas. Olhe que cor tentadora.
— Cá em vinho não ha. outro como o Quelhas.
E levantava a caneca que lhe tremia como uma pandeireta nas
mãos de dansarina hespanhola.
— A* tua saúde, Mauricio.
Procura levar a caneca aos beiços mas entorna^se-lhe o vinho,
que lhe cae pelas suissas enxovalhadas com um mastigado cor de
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JULHO mS
vinho, ensopa-lhe a desabotoada camisa e alaga-Uie o peito <masi nú
e sujo do vomito.
— Hal. • . o vinho é sangue, é amor e vida. O' Jorge, vá lá
mais um quartilho.. •
E aíinca-lhe o pau á barriga e dá-lhe um solavanco para o
despertar.
— Mais um quartilho homem. £'^ um palha, vaes ao chão com
\im dedal de vinho; olha cá para o Quelhas com uns doze nas tri-
pas e aqui tezo que mette inveja aos moços.
Quer emçertigar-se para se fazer forte, afinca-se ao pau, per-
de o equilíbrio, atira com o bêbado do escabello a terra e cae de
narizes sobre elle. Volteia no cháo térreo coberto de espinhas de
sardinha, pontas de cigarro, cascas de fructa e de tremoços e sali-
vas e escarros purolentos \ e agarra-se ao Jorge que só então é
que acorda com muita placidez.
—Já é dia ó Quelhas. . . a noite hoje foi d'um pulo; não ha
para dormir como o vinho;, tu também já acordastes.
E agarrava-se ao escabello para se levantar, de traz agarra-áe-
Ihe o Quelhas e lá vae o escabello por cima de ambos: Quer le-
vantar-se o Jorge, agarra-se ao Quelhas, cae Quelhas e Jorge ; quer
levantar-se o Quelhas, afincasse ao Jorge, afocinha Jorge e Que-
lhas.
No meio do vozear rouco e surdino da embriaguez ouviu-se
um profundo arroto. Era o Jorge que vomitava para cimado Que-
lhas uns resíduos estomacais mal cozidos de broa, cascas de tre-
moços e caroços de cereijas.
— ^Encha Jorge, encha outra vez a pipa que já esvasiou.
Dizia o Quelhas tentando erguer-se, e revolteando por cima
do vomito que cheirava a azedo que trezandava, sem mostrar des-
agrado.
N'este entretanto viu-se uma cabeça feminina que espreitava
para dentro, firmando-se sobre os dois como pretendendo conhe-
cêl-os. Depois de alguns momentos de hesitação entrou uma mulher
pálida e triste. Trajava lenço de malha ruço do uso, mantilha ro-
dada dos anros com |ins pedaços de renda aqui e ali soUos ao
vento, saia de cor indecisa e teitio fidalgo; nos pés umas; velhas
alpercatas-^os empréstimos da caridade— Era mendiga, mas o seu
porte e semblante resignado, as suas maneiras recommendavam-na
1 piedade e attenção publica.
— O Senhor Mauri:io para que dá vinho a estes desgraçados?
Não vé que concorre para a ruina d'eiles e das famílias?
— Deixe lá ; o vintio é que dá vida a seu marido; se não fora a
pinga o seu Quelhas já não era ninguém.
Elle diz e diz bem, que o vinho é sangue ; olhe como elle ahi
15
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ft«6 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
«Btá qnediCRilio^ còm o ssngue na guelfa amo tOa rapâ2 noVo e
alegre como umas paschoas.
£ gesticulava com as manapoias, que parecia uma dobadoira ;
e arremelgava uns olhos avinhados e escumava que mettia medo.
Utna creança de calção e perna e pés nus^, cabeçâ ao sol e
quasi em mangas de camisa olhara estranho para os dois -que
âinda gatanhavam no chão. A pobre conhecendo o estado do ven-
deiro, pegOQ peia mâo á creança lançou um olhar fugitivo sobre
os dois e saiu com duas lagrimas nos olhos.
Quando d'ahi a pouco tomava a passar em frente da bodega
do Mauricio, já o Quelhas ia pela rua abaixo rodeado de garotarem.
— O' Quelhas levas as calças velhas; ó Quelhas que vinho
levas...
E puchavam-lhe pelo fraque ruço, e empurravam-no e punham-
se-lhe em peso sobre os tamancos por de traz, para que afocinhas-
se, e lama e pedras e areia para cima do envinhado, e saltos, e apu-
pos e gargalhadas de arrebentar e. . • um inferno em volta do
fjobre bêbedo»
— Hal meus.i.. que vos faço em... que vos escangalho... —
E levantava o passo e queria ir-se atraz d'elles, mas tremeli-
eavae zás, costados a terra. A rapaziada saltava com hilaridade cres^
Cente sobre o pobre como vespas sobre o desgraçado que as
pisou.
— O' Quelhas que vinho levas. . . O* Quelhas que agora levas.
E depenincam-^no todo, como um bando de galinhas a uma
minhoca.
A pobre senhora, — que pelos modos o parecia, — passou de
largo lançou um olhar lacrimoso sobre aquella comedia acenou
tfom tristeza profunda e seguio caminho coitt a creança peia mão,
olhando de vez em quando para traz com anciedade, até desap-
parecer.
— Olha que desgraça, íilho, que coisa tão feia é um homem
com vinho! . . .
— Mas elle não trazia nenhum, mâe, sertão entornava-o.
-^Trazia filho e muito; bebeu demais^ perdeu o juizo e fez-
aquillo que vistes.
— £ aquillo é peccado, é mãe?
— E' meu iilho ; é um peccad© muito grande e muito fero para
com Deus e perante os homens.
Vês como vem roto e sujo? Pois era rico, muito rico. Mas
entrou de beber de mais e esbandalhou tudo, dei^ndo a mulher e
um filho, a morrer de fome.
— E o menino d'elle mâe? quem lhe dá de comer.
— Anda a pedir por essas ruas com a máe.
— Então é comç nós?
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JULHO 227
— Como nós meu filho. . .
E as lagrimas rebentaram-lhe dos olhos. Depois de uma páu§á
continuou limpando os olhos.
— Olha filho nunca sejas assim não?
— Nâo mãe, que é feio e o Senhor raíha que é peccado.
Rua de S. Paulo (Brazil)
O Quelhas lá ficou com o rapazio em redor e a pobre senhora
empurrou uma velha porta que rangeu e abriu sem dificuldade, e
entrou na casinha térrea, mal alumiada pelo sol que pela porta en-
trava. A um canto duas enxergas cobertas com alguns pedaços de
manta cozidos, servindo de colchas ao outro alguns cabaços, uns
púcaros e um pequeno lar; um quadro pequeno do Coração de
Jesus encaixilhado á cabeceira de uma enxerga, á da outra uma
imagem defumada do Coração de Maria, uma cadeira já sem en-
costo, era toda a mobilia d'aquèlle tugúrio.
Passaram-se annos. Já rão se topava o Quelhas na bodega do
Maurício. Dizia-se que morrera de uma queda envinhado con^o um
lagar, e as boas almas d'aquelle bairro lamentavam a sua desditosa
sorte. Dizia-se também que a sua pobre e triste viuva, que elle
desgraçara com o vinho não tardava muito que o não seguisse, que
já tinha sido ungida.
N'uma linda manhã de outomno, a rua d*aquelle arrabalde ap-
pp.receu juncada de alecrim e flores até á entrada de uma habita-
ção térrea e baixa allumiada pela luz que lhe entrava por uma
porta baixa e fendida em muitas partes. O curto recinto d'este
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2^8 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
aposento estava forrado de lencoes de alvíssimo linho, recama-
dos de flores pregadas sem oroem, nem escolha: Ao meio doesta
branca e improvisada capellinha erguia-se um pouco o leito de
uma enferma, coberto com uma colcha branca, já usada, que descia
dos lados e pelos pés a lamber o pavimento tosco convertido agora
em alcatifa de rosmaninho e malmequeres. A' cabeceira da en-
ferma uma pequena mesa coberta com um pedaço de chita, em
cima um crucifixo antigo e duas velas accesas.
As outras habitações tinham ás janellas luzes e jarras de flores,
Esperava-se o Pai do Ceu. Por alta manhã começou de ouvir-se
ao longe o Bemdito.
As luzes das janellas accenderam-se. Passados minutos a pro-
cissão do Sagrado Viatico apparecia no principio da rua e entrava
n'aquella casinha armada com o empréstimo da caridade.
A moribunda commungou. O povo dispers6u-se e depois de
alguma demora sahiu também o sennor Abbade.
Antes da tarde, aquella cheirosa e branca capellinha, honrada
com a visita de Jesus, voltara á sua primitiva pobreza.
Ficou a pobre agonisante só. Vigiava-lhe á cabeceira uma
creança de dez annos sentada n'una cadeira desconjunctada e sem
encosto.
Cahia a tarde, e cpneçava a anoitecer n'aquelle tugúrio.
A luz das pinhas que crepitavam entre dois púcaros a um canto
sobre uma laga aue servia de lar, alumiava bastante. A creança
ergueu-se, tirou de um buraco da parede um phosphoro, raspou
ro assento da cadeira e accendeu uma candeia d& petróleo, pen-
di^'ada á cabeceira da doente.
— Accende, meu filho, accende, que é a ultima vez que m'o
fazes. . . Antes aue m'a apares. . .
E rolar am-íhe pelas faces duas volumosas lagrimas que lhe
embargaram a voz.
— Então a máe morre hoje?
— Morro, filho, se Deus o quizer. Sinto à morte chegar-me ao
coração. Has de chamar a nossa vizinha para me rezar e encom-
nienaar a Deus. Mas antes, senta-te oue te quero uma coisa.
O pequeno sentou-se na meia cadeira.
A mãe pe^ou-lhe nas nr.ãositas, apértou-as entre as suas e co-
nceçou a falar-lhe com voz tremula e pausada.
— Olha, filho, vou morrer. Deixo-te em testamento o coração
e com elle a resignação com a vontade de Deus. Tua mãe não {X}s^
sue outros teres. Para a e:ernidade só levo um espinho atravessado
na alma ; e tu podes tirar-mo. Eazes^mo Miguelinho,' meu filho da
minha alma.
, As lagrimas da, creança responderam ás da mãe.
— Olha, conheces teu pae ?
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JULHO 229
O pequeno alagado em pranto acenou negativamente.
— Conheces esse bêbado infeliz, o Quelhas, que morreu aqui
á mezes desgraçadamente?. . . Pqis era teu pae e meu. . .
As lagrimas não lhe deitaram acabar. Depois de uma pausa
reatou o seu testamento.
— Era meu marido. Fomos muito ricos, filho, e a grande quin->
ta d*essas senhoras, nossas visinhas, que tanta esmolinha nos teeih
dado, era nossa; na cidade tinhamos muitos e bonitos prédios,
deu-nos o Senhor muito, mas tudo esbandalhou teu pae com o vi-
cio do vinho.
Pois filho, ó espinho que levo atrancado no coração para a
eternidade é a lembrança de vires a ser como elle.
E chorava como uma fonte.
— ^^promettes a tua moribunda mãe que o não farás assim? que
morrerás pobre mas honrado como tua mãe?...
Miguel inho caiu de joelhos, chegou as méos da mãe aos lábios
e banhou-lhas de lagrimas, de muitas lagrimas. A mãe puchou j>ara
si o rosto da creança, esforçou-se por suerguer a cabeça e pousou-
ihe um demorado osculo.
Era o ultimo que dava em seu filho. Sellava com elle o seu
pobre mas honrado testamento.
Pela madrugada expirava.
Miguelinho, n*esta manhã e tarde chorou sobre a campa de sua
boà mãe.
Viveu da esmola da caridade até que alguém apiedado do seu
infortúnio lhe alcançou logar na tripulação de um vapor.
Tinha doze annos mai começados quando assentou praça.
Já em dois dias de jgromete os collegas marujos intenderam
que já podiam começar-lne o noviciado.
— Para que nfo digas que não somos amigos, vá lá, gromete,
um golo de parati.
— Obrigjado, não bebo.
— Não gostas do Ucor, da vida do marinheiro?!. ..
— Gosto, mas não bebo; obrigado.
— Pois ou bebes parati ou não serás marinheiro. Vá lá; dei-
xe os escrúpulo?; lá da aldeia, meio copo ao menos.
— Muito obrigado, não bebo.
— E não sae da sua. O rapaz é teimosissimo, é necessário es-
coval-o. O marinheiro quere-se sem pêllo.^0* meu capitão, temos
aqui um gromete peludo dos peludos, nem pelo demo quer beber
parati.'
—Ora essa! Tragam-mo cá.
Miguelinho foi levaiio á presença do capitão.
— Vá; beba, e d*um golo e sem empiscar.
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y
a3p ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
E apresentava-lhe vun copo da celebre aguardente brasileira,
a trasbordar.
—Desculpe, meu capitão, mas não bebo.
— Náo bebo?!...
E n'um ai lança-lhe a esquerda ao cachacho e com a direita
pée-lhe aos beiços p copo e faz por obrigal-o .a beber. Mas não
conseguiu nada. O gromete fechou os lábios e o licor entornou-se
tpdo. A maruja ria ás gargalhadas.
, --Náo Queres beber y N§io?
— Desculpe o meu capitão, mas náo bebo.
— Pois então espera-lhç pela volta. Rapazes, açoitem-no beai
açoitado; as ordens de um capitão, náo se discutem.
Os marinheiro > malharam no pobre gromete sem dó, nem
piedade. Apiedados do choro do infeliz orphão levaram-no outra
vez £0 capitão.
— Pega, anda, bebe agora.
— Desculpe meu capitão mas não bebo — Respondeu a creança
com os olhos rasos de agua.
— Ai, não bebes pois ou aprendes a obedecer ou morres.
Pega-lhe pelas orelhas e hva-o até junto do mastro grande.
— Sobe, vamos e nem ai, que passarás lá encima a noite á
fresca.
A creança levantou um demorado e lacrimo o olhar para o
mastro. Nunca linha andado sobre o mar, as ondas eram como
«erras, o frio regelava e a creança hesitou.
— E' muito alto é, e o mar não está para festas, e vai uma
noite de congelar o sangue, se náo queres morrer lá em cima,
anda beber o parati.
O pequeno ficou-se por um pouco. Depois benzendo-se.
— Subirei antes.
E subiu. O capitão retirou-se, ceou e dormiu despreoccupado
como nos mais dias.
Na manha seguinte passeava na coberta do vapor, fumando no
seu cachimbo e esfregando as máos enluvadas.
— rBons dias, meu capitão saudouna um marinheiro embuçado,
de cachimbo acceso.
— O rapaz ainda lá está em cima. Já será demais meu capitão.
Elle agora ha-de-lhe beber com vontade.
. ! Aquillo hão-de ser escrúpulos de algum abbade rabugento a
•<juem se confqs^ovi antes de vir. .
.' — E' verdade, já me tinha esquecido do pobre rapaz.
— O* lá de cima! Vamos descer.
Mas nem nada. Não se ouviu resposta.
— Não ouves. Toca a descer, vamos.
Nem um único signal de movimento.
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JUL90 23f
— Estará morto capitão? ?
— Nada; oão era caso par^ taato. Com tudo manda subir um
gromete.
O gromete veio e subiu*
O pobre MigueUnho enregelara çocn p frio da noite ; os braços
e pernas empedernidos iicaram agarrados ao pnastro coi:iio uma esk-
tatua de bronze á cruz de uq^ mausoléu.
Desceram-no. O pe<}ueno mal respiraya. Frixion^am-no for-
temente até que veio a si.
— Vá lá ajgora um copo, anda homçm que te faz ben>.
E o capitão apresentava-lhe um copo do parati,
A creança ficou perplexa pojr. alguns instante^.
— Anda deixa-te de escrúpulos, as ordens de um capitão sãp
sag?-adas, e necessitas de calor. ,.
— Desculpe meu capitão mas não bebo.
O capitão esbravejou.
— Pois ou bebes ou morres.
A creança encolheu os hçmbros e inclinou a ■Qsd>eça..
— Paciência...!
E dos olhos pretos do Miguelinho corriam dois fios de la^imas
^ue teriam partido o coração humano mais duro, se corações hu*
manos tal vissem.
— Pois bem has-dé escarmentar. Mettapi-no no beliche e,
dêem-lhe uma só refeição diária de páò e agua.
Foram cumpridas as suqs ordens.
Passaram-se três mezes. Ò infeliz orphão chuiiado pela forme
iá se não tinha em pé e esperava de um para outro dia a derradeira
hora. Bem teimou com elle o que lhe servia de carcereiro para qme
tebesse ^ a^juardente^ mas não sahia dp seu propósito.
Miguehnho não iria muito longe.
— Meu capitão, aquelle rapaz mette-me dó. Morre de fome e
tem uma historia de partir p coração. O meu capitão vá-me ouvil-o
que elle pede pára lhe falar.
— Pois sim. .
O gromete que fazia de carcereiro retirqu e Q capitão foi.
•T- Então amigo, como lhe. yae? (^^ria-nne algump» cousa?
— Queria^ meu çapitlQ... .. *.
— Algum copo de parati I
— Não, meu capitão, isso não.. Queria ante^ de. morrer pedir-
vcis p^dão do meu pFÇQeç^ para cqjbwosco. Não {bi„ nem é por
perrice ou por maldade p<ú:a cpmyo£>cç; 6>i por c^junprir lètnapi^h
messa solémne que fiz. ' ...
— Mas não sabes que quando um capitão manda não ha votos
nem promessaa. sejam a que santo forem que lhe ponb^m barreira
ás suas ordens?
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ii32 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
— Ai, meu capitáDl mas uma promessa feita á cpbeceira de
uma máe moribunda, selada comi o ultimo beijo dos lábios já frios
de uma mãe agonizante. «.
E soltaram-se-lhe as lagrimas. Chorou.
O capitão commôveu-se. Era talvez a primeira ver que aquel-
la alma fria como a a^ua salgida do mar, sobre que nascera, se
enternecia com as lagrimas huma^s. '
Migueiinho limpou os formosos olhos pretos e esforço a-se por
continuar.
— Sou actualmente orphSo, não tenho mãe. . •
E as lagrimas voltaram-lhe aós olhos.
— Foi a sua cabeceira quando agonizava, que soube que meu
pae tinha sido um bêbado, muito aíàmadO) que eu vii muita vez
estendido na rua, quando com minha mãe mendigava de porta em
porta o pão; que tmhdmos sidD muiro ricos, mas que tudo desba-
ratara com o vinho o meu desgraçado i>ae.
Antes de dar o ultimo suspiro pediu-me com as lagrimas nos
olhos... pediu-me minha mãe hioríbunda, meu capitão...
£ as lagrimas não o deixaram continuar.
— Basta, meu heroe. Já sei tudo. — Disse o capitão profunda-
mente commovido. — Juraste» a tua mãe moribuiida que nunca se-
rias como teu pae, que nunca beberias álcool.
E levantou-o nos braços e abraçoa-o com ternura demorada-
mente.
— Desculpa os castigos que te dei. Porque me não contastes
logo tudo isso?
Mandou lo^o preparar um lauto jantar e no fim d'elle deante
4e toda a marinha pediu desculpa ao l^roico gromtte qu3 com
tanta coragem se sustentou fiel â palavra dida á sua mae mori-
bunda.
— Depois entregou-lhe um envelope.
— Toma e onde quer que neceàsites de mim podes apresentar
este bilhete meu.
O pequeno inclinou-se para lhe beijar a mão.
O capitão levantou-a e abraçou^ cordealmente.
Ao abrir á noite o envelope do>^ftpitão, Migueiinho encontrou
dentro o seu cartão embrulhado n'uipa lettra de um banco inglez,
do valor de 120 francos.
O vapor continuou viagem.
Não se soube mais noticias do bom e heróico Migueiinho. Mas
feliz d'elle se permaneceu fiel á promessa jurada á cabeceira de
sua mãe agonizante.
5—7—903 P. B. Ribeiro.
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JULHO 233
2 — Sabbado — A Visitação de Nossa Senhora. —
St.* Mareia, M. — Ind, plen. para o Rosaria Vivo — para
a Confraria do Rosário.
AVÉ MAKIA
Avé Maria
Cheia de graças mil, Deus é comtigo,
fulge em teus olhos a divina luz.
E's bemdita entre todas as mulheres,
bemdito o filho teu, doce Jesus I
Santa Maria, que de Deus és Mâe,
agora e quando findem nossas dores,
roga pede por nós, os peccadores.
AmenI
Thoma3 Ribkiro.
3 — Domingo (6.° depois do Pentecostes) — Precio-
síssimo Sangue — S. Jacintho, M. — St.® Heliodoro, B.
Ir buscar lâ. . .
Um official de cavallaria, que montava muito mal, passava em
frente da Havaneza, onde estava um grupo de rapazes seus conhe-
cidos.
Um d'elles, querendo mettel-o a ridiculo, acercou-se do cá-
valleiro, e disse4he :
— Sabes o que succedeu a Balaão?
— O mesmo oue a mim, replicou o official, sahiu-lhe um bur-
ro ao encontro e tallou-lhe.
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334 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
4^S6gunda-feíra — Dedicação. de Todas as Igre-
jas DAS Tres Ordens de S. Francisco'.
I
Respeita o catholicismo
No santo do christianismo.
Mal haja o que sobre a terra
Primeiro fallou em guerra.
Elege um governo crente,
Mais recto que transigente.
Alves d' Almeida.
5 — (£ Terça-feira — St.° António Maria Zacharias,
Fundador. — St.^ Athanasio, M. — Quarto minguante ás lo
k. e i8 m, da tarde,
AV fÇi^ vf>^
OSTRA O BICHO DOS PÁSSAROS
Quando um pássaro começar a entristecer, a erriçar as peimas
e a metter a miúdo a cabeça debaixo da aza, catando-se também
frequentemente, é quasi certo que está atacado de bicho em grande
quantidade.
Para o livrar d'^clle, um remédio simples, é pôr-lhe á noite
um panninho branco na gaiola, sendq poisçivel çm çonta<^o coqi
elle. Passado algum tempo tira-se o panno, para o qual tem pas-
sado um certo numero de bichos, que se matam. Repete-se a ope-
ração os dias e vezes necessárias para que o pássaro recupere o seu
estado habitual.
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JULHQ a35
6 — Quarta-f^ir^-rSt.* Domincas, V. M.
ADVERTÊNCIA ÚTIL
Muitas pessoas, não pensando nos eíFeitos que podem produ-
zir aj flores, n*um recinto fechado, esqueçem-se de retirar do
quarto de dormir, durante a noite, as flores que lá coilocaram,
cuidado qu2 nunca devem esquecer.
As emanações que exalam sáo d'um effeito toxico muito enér-
gico e se forem mmtas e o quarto pequeno, podem caysar a mortç.
Ordinariamente a cntoxicaçâo apenas se manifesta por violen-
tas dores de cabeça.
Vista dá Bahia (Brazil)
7 — Quinta-feira — S. Lourenço de Brindis, Capuch.
— St.* Pulcheri^, Y. — S, Cláudio e Coipop.» Mm. — Ind.
f^len. nqs égrejas françisçç^fias e ind. pkn.pàràos Irvwfs
Terceiros.
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236 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
INQUÉRITO
Qual a primacial qualidade da mulber ?
A virtude.
B. R.
A primacial qualidade da mulher é a belleza ; é esta a opinião
insuspeita d'uma mulher feia.
D. Branca.
Qual a primacial qualidade da mulher? '
Para o libertino, a formosura; para o calculista, a fortuna; e
para o digno e verdadeiramente amante, a virtude.
• ■ '- P. P. B.
Qual a primacial qualidade da mulher?
A honestidade.
A. Sette,
8 — Sexta-feira — Santa Izabel, Rainha de Portu-
gal, Viuva, da 3.' O. — S. Procopio, M.—Ind. fíen.para
os Terceifos.
Toda a mulher que voluntariamente se mettc em negócios
acima dos seus conhecimentos e fora dos limites dos seus deveres,
é uma intrigante.
Rainha Maria-Antonietta.
Não será antes uma abelhuda ? !
9 — SabbadO — Os Ss. Nicolau e Comp. Mm. Gor-
gonienses da r.* O. — S. Cyrilio, B. M. — Ind. Plen. nas
egrejas franciscanas.
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JULHO
289
N*uma aula de Direito Civil, o professor da ^
JUhosposthumos:
São os infelizes que tiveram a desdita de vé,
ainda no ventre de sua mãe.
10 — Domingo (7.° depois do Pentecos.
Irmãos, Mm. — St* Amélia, V.
CONTO ÁRABE
Havia um homem ambicioso que sempre escarnecia dos ou-
tros. Um dia comprou um cesto com objectos de vidro, copos, gar-
rafas, candieiros, etc.
Approximou-se d*uns carregadores e disse-lhe? :
— Quem me leva este cesto? Eu sou dérvlcke, (monje maho-
metano) e, como não tenho dinheiro, ensinar-lhe-hei três máximas.
Um d'elles levantou-se logo e pegou no cesto, para o levar.
Depois de ter andado um 'bocado, o carregador âisse aíoderviche:
— Qual é a primeira máxima?
— Aquelle que te disser que mais vale ter fome que estar far-
to, mente, disse o ambicioso monje.
—Bem.
Andaram mais um pouco e o carregador pede-lhe que diga a
segunda máxima.
— Sim. Aquelle que te disser que mais vale andar a pé que a
cavallo, mente.
— Bem.
Continuaram a andar até que se approximaram da casa do dér-
viche :
— Dize agora a terceira máxima.
— Sim. Aquelle que disser que ha carregador mais burro do
que tu, mente.
O carregador calou-se, andou mais um bocado, e atirou com
tudo ao chão. dizendo :
— Aquelle que disser que ficou no cesto' alguma coisa inteira,
mente.
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236/^ ALMANACH DE èANTO ANTÓNIO
11 — Sègunda-feíra — (Oitava da Dedicação de toa-
das as igrejas Franciscanas), — S. Pio i, Pp., M. — S^
Sabino. Nasce o sol ás 4 h. e 46 min. e pôesè ás T h, e 4I
min.
CONCEITOS ÁCERC& M MDLHER
Nós somos a razáo da humanidade; vós, mulheres, sois o co-
ração d*ella.
D. António da Costa.
* »
Mas quantas vezes náo é a mulher a razão, e o homem o co-
ração ? ! . . .
Mas quantas vezfes nao é a mulher, simultaneamente, coração
e razão e <> homem desvario e loucura? 1 . . .
12 — Terça-feira— S. João Gualberto, Abb. — Os
Sts. Félix e Nabor, Mm.
COLUMBA MEA
(ao p. a. T.)
Quis mlhi dabit píBnas pt columbae?. .
et vulabo et reqúlt^seatn.
Pombinha, dd-me as a:^as que eu perdi l.k .
Implutnés, por ditosas primaveras,
altearem-^e nos ceos não mais as v/.* .
vamos, pomba innocente, porque esperas ? • . •
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JULHO 239
Quero as a^as d'UfH anjo como as mas,
brancas, nítidas, bellas; e da terra
contigo irei ao ceo; de lá, se duas
pombas virem, ambas transpor a serra.
outro bando de pombas a librar-se
em gracioso espiral, amplo cortejo
fará ás exiladas; com díafarce
ha de olkar-nos o mundo então sem pejo!
Acima, ao alto, . . é tempo de nos ceos
poisar, fruir descanço; vamos, pomba, . .
ail grato symbolo es dos annos meus!.. .
E quem di:^ na alva á flor, que á tarde tomba? l.
Mas, que importa? Ainda dura a primavera
talva^ da ultima quadra da innocencia ;
voemos, pomba, avante!. , . Sobre a esphera
que alem passa, oh quam. triste é a existência.
E as minhas aíças fendem os espaços,
adejam sobre a ga:{e em veos de anil;
e as minhas a^as bellas vão sem laços
já transpor-me ás campinas d*outro abril.
Eu amo as a^^as, queja pombinha solta
longe do limo da mesquinha terra;
eu amo as a^as, que a minhajilma envolta,
aos campos rouba onde fluctúa a guerra.
Eu offio as a!^as, que me deixam triste,
a sés pensar nos mvndanaes haveres ;
eu amo as a^as, quando n'alma existe
doce alegria de infantis prazeres.
Eu amo as aí^as, que me elevam, ágeis,
do mundo vario á mansão da paj ;
eu amo as azas, que dos homens frágeis
me afastam logo, e de paixões tão más.
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240 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Entremos, pomba, abriuse, oparaii^o;
avante. . . gO!(ò injfindo nos espera;
Junto <i Deus, mais dois anjos, um sorriso
lançarão sobre a eterna primavera,
(IV— 1903.) P. Freitas.
13 — • Quarta-feira — St.^ Anacleto, Pp., M.-
Ltca nova ás 4 h. e 50 min, da manhã.
(2
OS DOIS CAMARADAS
(de TOLSTOt)
Dois amigos passeavam na floresta ; appareceu um urso e lan-
çou-se sobre elles.
Um trepou a uma arvore e escondeu-se, emquanto o outro
ficava no caminho. Deixou-se cair ^e fingiu-se morto. O urso aj>-
proximou-se e cheirou o homem; mas como este retinha a respi-
ração, o animal julgou-o morto e afFastou-se. Quando o urso es-
tava longe, o outro desceu da arvore e perguntou, a rir, ao seu
camarada :
— Que te disse o urso ao ouvido?
— Disse-me que aquelle que abandona o amigo no petigo é
um cobarde.
-©:»©«:®-
14 — Quinta-feira — S, Boaventura, Dr. e Cardeal
da I.* ^0. — Ind, Plen. nas igrejas franciscanas — ind,
plen. para os Terceiros,
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JULHO a4r
No ámor sejn affeiçSo
íl
Actua. . . o sentir do cão.
Toda a guerra, toda a paz,
Termina por: «Aqui jaz.»
Para o namoro... pureza,
Para o marido franqueza.
Mulhet 'gorda e pequenina,
Formosura conimbrina.
«Se queres o cão de caça
«Procura-lhe a boa raça.»
Alves d' Almeida.
15 — Sexta-felra — A. B. Angelina.de Marsciana,
Viuva da 3.* O.
— Manoel 1 Já deitaste outra agua na redoma dos peixes ?
— Não, minha senhora !
— Então porque?
— Saberá a senhora que elles ainda não beberam a que eu lhe
deitei honteml
16 — Sabbado — Nessa Senhora do Carmo. — S.
Sizenando, M. == Ind. plen. para os Irniãos do Carmo. —
Jitbileu cmno o da Porciuncula, para as mesmos, nas igre-
jas das Carmelitas,
Hpi"-nnpil(|i"""n)|Hj|i»""'i:!7'4ii'""'m)|i
16
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242
ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
-AD TE CLAMAMUS,.
Vós que dos mortaes sois guia
O' Maria
Pomba de meiga candura
Sede alegria e manto
Em seu pranto
E conforto n amargura
Ouve, Mãe doce e clemente
Prece ardente
D* estes filhos que te invocam
Lança piedosa os olhos
Aos escolhos
Dos mares que nos suffocam.
Na arena da existência
Com clemência
Guia teus filhos. Senhora
Levae~os vor santa via
O* Maria
Pois que d'elles sois aurora.
Tu, Senhora, Id dos céos
Filhos teus
Vê com brandura e ainor
Encaminha, ó Maria
N*esta via
Os tristes filhos da dor.
Nós n^èste mar velejamos
Caminhamos
Entre a esperança e o temor
E assim vamos caminhando
Supportando
O vaivém de triste dar.
Eia, pois, ó Mãe bondosa
E amorõsa
Dá-nos a tua protecção
Não esqueças os mortaes
Que entre ais
Luctam sempre na afflicção.
Fr. C. Rodrigues.
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JULHO 243
17 — Domingo (8.** depois do Pentecostes)— S. Alei-
xo, C.
Bom SENSO E BOi EXEMPLO
Um cultivador de Niérre dirigia-se a uma parochia da diocese
de Sens para assistir a um casamento. Logo que lá chegou disse-
ram-lhe que o casamento nso era na igreja mas sim era casamento
puramente civil. Entío o convidado cumprimentando os noivos
disse-lhes :
« Soube agora aue o vosso casamento não é religioso. Lasti-
mo-o. Ora como podeis dispensar Deus não vos custará muito dis-
pensar-me também a mim.»
Emprega m-se todos os esforços para o resolver a ficar pretex-
tando mil coisas a que elle responde :
«Não, não quero com a minha presença mostrar que approvo
um acto que a minha consciência reprova.»
E poz-se a caminho.
Ora muitos dos convidados até então mudos como penedos
arrastados pelo seu exemplo, resolvem a imita-lo. Então o pae do
noivo que tinha dado o seu consentimento com a condição de que
o seu casamento fosse civil vendo que ficava sem convivas renun-
ciou á insensata pretensão e d^ahi a alguns instantes todos se di-
rigiam á egreja.
Exempla trahunt.
-^xm^^ext;-
18 — Segunda-feira — O B. Simão de Lipnica, C.
da I.* O. — St.* Symphorosa e seus 7 filhos, Mm. — S. F're-
derico, B. M.— St.^ Marinha, V. M.
^^y^^
o Tjí?lBA.OO
o distincto medico hespanhol dr. Santillan, tem a respeito do
tabaco a seguinte opinião :
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:i44 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
«O tabaco não só causa enfermidades do corpo, senão também
do espirito. São as seguintes as doenças que resultam do seu uso :
«Envenena a saliva, ataca os sentidos do gosto, olfacto, vista
e ouvidos; estraga o estômago, produzindo dispepsia; faz amiu-
dadas vezes perder o appètite ; ataca o coração produzindo palpita-
ções; debilita os músculos, produzindo tremuras; excita os nervos
e paralysa o cérebro».
19—3) Terça-feira — O B. João de Duckla, C,
da I.* O. — As St.** Justa e Rufina, Mm. — Quarto cres-
cente ás 8 h. e 12 min, da tarde.
A descrença é um tyranno
Que detesta o género humano.
«Cumpre á risca o teu dever,
«Succeda o que succeder.»
Não busques satisfação
Onde não ha perfeição.
Alves de Almeida.
20 — Quarta-felra— S. Jeronymo Emiliano, C. — •
St.* Margarida, V. M.— S. Elias, Propheta.
-D^^e-
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JULHO 245
Leão XIII
(20^ — 9o3)
Morreu!. . . Velouse a Lur que illuminava o mundo
E o mundo em treva ao golpe que o pungiu tão fundo-
Estremeceu de dor.
De pranto amaro um rio inunda ainda a terra^
Que o letheo oceano um pae lhe arrebatou e encerra.
Nas ondas ae furor.
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246 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Morreu! Seu nome augusto repercute ainda
Em fúnebre murmúrio de saudade infinda
No ceuy fia terra e mar.
Choram mil peitos que ficaram na orphandade.
Inconsolável chora inteira a humanidade
Seu coração sem par,
O cedro da montanha^ altivo e venerando.
Que destroncado cede ao golpe formi dando
De irado furacão,
Nãofa!^, ruindo, taes destroços nas vertentes
Como os que a dor causou nos corações dos crentes
Da morte de Leão,
E* que da senda amargurada da existência
Aos. filhos do Calvário sem cessar a ardência
Lenia — Astro no ceu,
Da Barca eterna firme sustentando o hme^
Qual nauta ousado que defronta mas não Ume
A fúria do escarcéu.
Agora dorme, O corpo inerte encobre a lousa
E o grande espirito liberto jd repousa
No páramo eternal,
Entre as delicias perennaes d' um goso santo
A* gloria de Jehovah erguendo excelso canto,
O canto do immortal.
Mas enxuguemos nossos prantos, que a ventura
E* d*essa Luz que um fogo ethereo alli depura
Esplendido crisol:
Se d' antes era n*esse espaço qual estrella.
Hoje refulge, embora occulta, inda mais bella.
Mais bella do que o soL
Setúbal. ^ Nuj«s Fcwmigão.
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JULHO 247
Fallando ao desditoíío proletário
as mais temas palavras carinhosas
perfumouAhe a aride^jf do seu calvário
com a fragrância das mais puras rosas.
Ha-de aquelle sorriso casto e brando
cheio de amor e cheio de clemência
jicar eternamente illuminando
a triste cerração d*esta existência.
AUneffavel doçura das caricias
d*aqxiella vo^f amiga, etherea e mansa
ha-de-nos envolver sempre em delicias
de SQnhps côr d^ rosa e 4e esp^ança.
A ardente chatnma de sua alnia dâce
deixou tamanho luminoso rastro
no seu peregrinar como se fosse
feita dos vivos lampejos de um astro.
Pregando o Amor e a Pa^ cantava,
em jubilosa^ ardência de propheta,
a redempção da humanidade escrava,
**-a sua aspiação mais predilecta.
Seu yuíto airoso e branco surge agora
cercado d'uma aureola de bondade
gosando o esplendido festim da aurora
d' esse dia de Eterna GUaidade.
P. Silva Gonçalves.
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Í48 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
21 — Quinta*feira — (Oitava de S. Boaventura) —
S. Praxedes, V. — Nasce o sol ás 4 h. e fj min. e pôe-se
ãs 'j h. e 'j min.
A Cascatinha (arrabaldes do Rio dé Janeiro)
£ FORT A DO GOLLEGIO
^ulia era filha d'uma família muito estimada no mundo mais
^ por suas riquezas que por suas virtudes. Tanto seu pae como
sua mãe visitavam os salÓes mais concorridos da capital, onde se
faziam notar pela elegância no vestir e pela desenvoltura com que
saltavam na Polka.
Não tinham o minimo sentimento reii^so e Amélia (mãe de
Júlia) até algumas vezes tinha escripto nos jornaes as mais violen-
tas diatribes contra os padres e a egreja catholica em jgeral.
Não curava da educação de seus íilhos, mas seguindo a moda
hoje tão generalisada, desde o primeiro dia, que vi^iin^a kiz, entre-
gava-os a uma aia, para n^s. livremente «e poder entregar aos seus
divertimentos quotaoiapo^.
Tal era a família de j^l^a que .v6u s^<e$eiit.ar aos meus lei-
tores.
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JULHO 24^
Júlia era então uma menina dos seus doze para treze annos,
branca de cabellos e olhos pretos, com o sorriso brincándo-lhe
sempre nos lábios, folgazã e até algumas vezes um pouco estouvada.
Havia pouco mais de dois anno*^ que sua mãe cedendo a um
impulso do coração, a tinha mandado para educar n*um coUegio
catholico dos de mais nomeada.
E* ahi que nós a vamos encontrar falando com sua mamã, que
lhe vem fazer uma d*essas visitas, que as mais das vezes prejudi-
cam tanto como deviam aproveitar.
Entre mil despauterios, que a intelligencia menos illustrada
repelliria corro incentivos á noveUa, veiu-íhe a perguntar :
— As tuas mestras são muito zangadas, nco é verdade ?
— Não mamã, são muito boas, tratam-nos com muito carinho.
— Umas santas, que se podem pôr no altar? Não te pjarece, Ju-
linha?
A menina impallideceu, vendo a fina ironia que feria a quem
desde ha muito se tinha acostumado a respeitar, e não respondeu.
Amélia calou-se também, como que arrependida de ter ferido
a filha n'um dos sentimentos mais nobres do seu coração : o amor.
— Trago-te uma caixa de doces, só para ti ; entendes?
— Obrigada; quanto custaram?
— Seis tostões.
— Pois se a mamão não leva a mal, vendo-Fhos; antes quero
o dinheiro que os doces. . .
— Mas. . l mas para que queres tu o dinheiro?
— Ora ! . . . para comprar doces, não é. . .
— Não compro sem saber para que queres o dinheiro.
— Então vá lá. . . E' para dar a uma pobre mulher que tem
cinco meninos peaueninos, e não tem pão para comer ! . . . E duas
lagrirnas rolaram-lne pela face.
Ámclia tão descuidada toda a sua vida, e que jamais tinha dei-
xado cair um óbolo nas mãos dos desamparados da fortuna, sen-
tiu, como gue accender-se em seu peito a chama da caridade, e
n'um extasi d'amor maternal apertou-a affectuosamente ao cora-
ção, exclamando:
— ^Não, minha filha, não será assim, comerás os doces que são
para ti, e para os pobresinhos aqui tens 2íi5oo reis.
Esta scena que pouco tempo ha, teve logar no locutório d*um
recolhimento, fez com aue aquella mãe emendasse a vida frivola^
que até então tinha levaao.
Pina.
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25o ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
22 — Sexta-feira — St.* Maria Magdalena.
CONTRA AS QUEIMADURAS
O melhor remédio para curar queimaduras é applicar á parte
queimada sabão amollecido em agua quente, correr em seguida
azeite de linhaça, e espalhar depois sobre a queimadura farinha de
flor de trigo.
Quando estiver secca, torna-se a correr azeite de linhaça, e
polvorisar com flor de farinha ; e repete-se esta operação 3 vezes,
ao cabo da qual cria uma crusta impenetrável que faz desapparecer
toda a dor, e pouco tempo depois a ferida estará curada.
23— Sabbado— S. Apolinário, B. M. — S. Libório, B.
Quando entrares na Igreja A flor mais casta e bella
Que o respeito em ti se veja, E* o *cpudor da don:çella.»
A Dança é um incentivo Amor que vara o bem pende
Ao appetite, . . lascivo. Não macula nem offenae.
Se não queres ser iniquo Belleíça sem ihstrucção
Olha o pobre como o rico. E' plumagem. . . de paixão,
O amor é casto lyrio
Que Anteros toma em martyrio.
Alves d' Almeida.
/á^ Z&Z ^k^
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JUIHO 25i
S. Francisco Solano O. F; M. o Apostolo da America
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a52 ALMANACH DE" SANTO ANTÓNIO
24 — Domingo (9.*" depois do Pentecostes) — S.
Francisco Solano, C. da i.* O. — St."" Christina, V, M.
— Ind. Pkn^ nas igrejas franciscanas,
6)^ I^Qji®®
Ha annos realizaram-se em França diversas montarias aos lo-
bos, cheg5ando-5e a suppor que se achava extincta ali esta raça de
animaes.
E' certo, porém, qu2 só no anno pasaado foram nrortos em
França, segundo consta da respectiva estatística, u5 lobos, pelos
quaes se deu razoável recompensa. Só por uma loba gravida foram
pagos 200 francos a quem a matou a tiro.
Em Po^-tugal tcem-se realizado nos últimos annos diíFerentes
caçadas aos lobos, algumas d'ellas com bom resultado.
Deve estar ainda na memoria de todos o facto heróico, prati-
cado ha poucos meses por um valente trabalhador portqguez, que
depois d'uma lucta terrível com um lobo de extraordinárias propor-
ções, conseguiu mata-lo a golpes de machado.
Ha anoos contaram os jornaes um outro caso verdadeiramente
assombro|50. Um pastor, rapaz de i5 annos apenas, viu-se atacado
por um lobo quando andava a guardar um rebanho de gado, n*uma
povoação próxima da guarda.
O vaíente pastorsito nâo perdeu a coragem, e sena ter com
que defeii!bder-se da fera, agarra-lhe a língua e segijQ'a assim o ani-
mal emqujanto grita por <occorro, qtte náo se demorou^
Feitc» d'estes são raros, mas na aicida quem os pcatique no
nosso pai«»
25 — * S«gttWte-teíra — S>, TimAm^, Ap.— S-
ChristovâQ^ M. — St.' Valentim, V. M.
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JULHO ' a53
Marido—- For ma-ae <las palavras mar ido pela similhançà que
ha entre easar-se e deit^r-^e ao mar.
26 — Terça-feira — St* Anna, Mãe de Nossa Se-
nhora. — Os Sts. Symphronio e Comp., Mm.
Trez devotas donzellas afim de se prepararem para a festa da
Purificação de Maria SS.ma e por conselho de seu confessor reza-
ram durante 40 dias o rozario da Virgem. Na vigília da dita festa
a Mãe de Deus appareceu á primeira com um riquíssimo vestido
bordado a ouro agradecendo-lhe e abençoando-a. Appareceu de-
pois á segunda porém com um vestido muito mais simples, agra-
<iecendo-ine também. Mas perguntando-lhe esta qual a razão por-
que apparecêra á primeira com um vestido mais rico? porque ella
lhe havia feito um vestido mais precioso, respondeu a y ãe de Deus.
Depois appareceu á terceira com um vestido muito grosseiro pelo
■que esta lhe pediu perdão de ser tão tibia ná sua reza.
No anno seguinte todas três se prepararam para a dita festa
xesando o rosano com o máximo fervor ; e na noite precedente,
apparecendo-lhes a SS.i^ía Virgem avisou-as de que na manha se-
\guinte a veriam no Paraizo. E assim aconteceu que na manhã se-
guinte á hora de prima foram acompanhadas pela Rainha das Vir-
gens á pátria dos bemaventurados.
27—® Quarta-feíra — A B. Cunegundes, V„ da
-2.* O. — S. Pantaleão, medico, M. — Lua cheia ás ç h. e ^
min. da manhã.
28— Quinta-felra— Os St.°» Nazario e Comp. Mm.
— o B. Nevolio, C, da 3.* O. — St.^ Innocencio, Pp.
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254 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Estando um cardeal próximo á morte por éffeito de um gran-
de incommodo que se reputava inciTtarvel, vê entrar no quarto O'
seu macaco, coberto com o chapéu d'elle cardealista! riso o domi-
nou, que lhe arrebatou um absccsto interior que era o seu mal, e
assim escapou á morte.
Claustro do Silencio jm S.^nta Cruz de Coimbra
29_Sexta-feíra — St." Martha, V.-^S. Félix e
Comp. Mm.— St.° Olavio, rei da Noruega.
Fazer a nossa fortuna nío c synonyroo de fazer a nossa feli-
cidade. Esta póie, comtudo, desenvolvér-se com aqueila, quanda
regida com tom :ri:cr:o.
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JULHO 255
Todo o contentamento dos mortaes*, é mortal.
30 — Sabbado — S. Camillo de Lellis, C — Os Ss.
Abdon e Sennen, Mm.— S. Rufino, M.— As St.'*^ Máxima
e Donatila.
^uwxin áe $m
— Levsivi óculos meo in monles,
uiirie veijiet anxiliuíii luhi...
— Auxilium meum a Domiijo.
Ps. CXX. V. 1, 2.
(AopoetaP.B.R.)
Sião ! Grato Sião / . . .
Monte sublime y altivo promontório !
Da saudade, mystsrio de meu seio,
mansão querida, célica morada !
Meus olhos vagos, tristes, lá de longe
ó meu Deus, que de ve:{es no teu cume
brumoso, embaciado, sem alento
eu fitei I Remontado, saudoso ermo,
densos nimbos velavam-te de roda,
coroavam-te as nuvens. Transparecendo
de entre um véo desmaiado, so te via
no espaço confundido, sem esperança
de o^teu solo pisar! E quantas ve^es
após a fera e ríspida procella
o teu céo bronzeado incendiando,
e o trovão despedindo pelos vales
até repercutir-se no meu peito,
arco-iris de bonança tão jucundo
de áureas cores, brilhando no horisonte
sobre o teu dorso eu vi pairar com 'sp*rança!
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256 ALMANACH DE SAKTO ANTÓNIO
E tu, caro Sião!
dourada cathedral de minha mente,
phantastico Thabôr,.ld só nos longes,
na cerração espessa translu:fias
sem fanal, cujo brilho me alentasse!, . .
De minha cru^ pesada sob o jugo,
de funda magua, triste, possuído,
fallecêra! Da cara juventude
os bellos, áureos dias consumindo,
da vida na vereda pedregosa,
perto. Junto ao regato, que os queixumes
unia a minha dor, eu vacilldra
opprimia-me a crunf! Ao duro solo
atirando meu corpo languecido,
tão só, sentado na orla do caminho,
do alaúde soltando accentos tristes,
meu canto ao ceo erguera. . .
Dos rios de Babylonia
sobre as margens sussurrantes
entre fiebil pranto e lúgubre,
Sião! como agonisantes
nos reclinamos ahi,
recordando-nos de til
E pendentes nossas cytharas
dos salgueiros, saudosas,
as toadas amorosas
fuardaram para si,
para longe da pátria,
nos, proscriptos, exiladas,
palavras, canções jucundas
nos rogaram mui irados,
e disseram : «de Sião qu*rida
cantae-nos um hymno, um cântico^»
«Em terra desconhecida,
oh! Como cantar com jubilo
o hymno, — sem dâr, —
que é do Senhor?»
Se eu me esquecer de ti
ó Jerusalém ditosa,
fique inerte a minha dextra,
minha lingua jubilada
emmudeça para eterno.
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JULHO 257'
se de ti perder memoria;
e, Salem, falleça temo
o meu cantar
se não te amar!
No dia nefasto e triste
de Jerusalém, Senhor,
dos preversos de Edom
relemhrae-vos, com ardor
elles di!çem: «vós, violentos,
n*ella até os fundamentos
eis, derrtibae,
desbaratael»
Pobre filha, Babylonia !
oh! Bem haja quem a sorte,
com que aflora nos fadastes,
contra ti verter em morte!
Bem haja quem teus filhinhos
de encontro às pedras, tenrinhos
for triturar,
despedaçar!...
Mas, confio. Senhor! Em ti eu 'spero!
Do meu peito lanceado surja embora
€L dor minas[ e lenta. Tenho esperançai
E a aurora sorridente eis que desponta,
jd no ceo claro e bello reapparece;
de Sião sobre o cume, róseo brilho
o firmamento doura; fresca aragem,
jn-opicia viração, mis ti ca esperança,
dentro em meu peito exhausto, dtffundindo,
a cruíjf tão longa e dura; jubiloso
a arrastar sobre os hombros me reanimam.
E tu. Senhor, bem hajas, que do afflicto
e pobre viador, os seus lamentos
quiseste ouvir, viadoso, e de meu pranto
acolher tantas lagrimas amargas!
Era errante ! mas sob as tuas as[as
este ser débil, fraco, dirigias;
e a minha cru:^, jd leve, o anciado norte
seguia então, o Deus, que me apontavas.
Bem hajas, ó Senhor, que me acolhestes!
17
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1^58 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
E tu, Sião, Sião! Oh! quanto és bello;
titã lu^ esplendente a minha fronte
inundada em suor amaro e frio,
banhando radiosa, me deu vida.
Meu peito outr*ora exangue, sem conforto
agora frue o jubilo^ a ale seria,
resvira amor, saudade!
Salve o Sião amada!
(5— V— 1900).
P. Freitas.
31 — Dominga — (10.** depois do Pentecostes) —
St.** Ignacio de Loyola, C, Fundador da Companhia de
Jesus. — Ind. plen, para os Inn, da. Conceição.
¥
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i
A HISTORIA DA PESCADA
Qui ha annos, morava na rua da Rosa^ um sujeito
(^ue quasi todos os dias realisava o milagre, quasi
inconcebível, de comprar por um vintém ou trinta
reis a mais formosa e volumosa pescada do alto
que Corria as ruas de Lisboa, nas canastras das
irinas.
Como fazia eVe isso?!
D'um modo miito simples, muito engenhoso,
I, até certo ponto, porque fazendo-o, ganhava elle
im bom par de vinténs e nâo fazia perder cinco reis
ninguém.
O caso parece incomprehensivel, mas nâo é.
Lá vae a explicação.
O sujeito da rua da Rosa ia pela manhã á ri-
beira do peixe e comprava uma pescadinha marmota, não muito pe-
quena, uma pescadinha marmota, já começada a entrar na adoles-
cência.
Custava-lhe um vintém, trinta réis ou um pataco quando mui-
to : trazia-a para casa, punha-a n'um prato e elle punha-se á janella.
Passava uma varina com peixe.
Elle mirava attentam.ente a c mastra.
Se iam lá deritro algumas pescadinhas d'essas de partir ao
meio para frigir chamava a peix?ira.
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25o ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
A creada ia á porta, e trazia as pescadinhas para elle ver e
ajustar.
— Quanto é?
— Seis vinténs, por exemplo, pedia a peixeira.
O nosso homem tomava a pescadinha, examinava-a, punha-a
ao' pé da outra que trouxera da ribeira.
A da varina era maior os seus dois centimetros. *
— Nada, diga-lhe lá que dou um vintém por ella. A creada
levava a pescadinha no prato e offerecia um vintém.
A varina furiosa, por lhe oíTerecerem tão pouco, agarrava
malcreadamente na pescadinha, atirava-a *para a canastra, rogando
pragas, e cantarolando na sua voz aveirense uma formidável des-
compostura.
• E ia rua abaixo, desempenada, roncando palavrões intercala-
dos, pelo pregão tradiccional :
— Fresquél Fresqué!
Entretanto o sujeito voltava para a janella esfregando as mãos
de contente : o tour estava feito.
A marmota que a creada levara á peixeira e que esta deitara
furiosa na canastra, quasi sem olhar para ella, não era a mesma
que dera á creada, era a que o homem trouxera da Ribeira e era
mais pequena dois centimetros.
Mas uma peixeira fula dá lá pela difíerença de dois centime-
tros n'uma pescadinha que um segundo antes tirara da canastral
D*ali a nada vinha outra peixeira.
Repetia-se a mesma scena; a pescadinha que o homem trou-
xera da ribeira havia iá crescido quatro centimetros.
Feita esta sorte vinte vezes, o que é façilimo, a pescadinha
que o homem da rua da Rosa comprara por um vintém tinha mais
•}á*40 centimetros, meio metro quasi.
E aqui tem como o homem da rua da Rosa, realisava todos os
dias esse milagre improvável de comprar por um vintém uma pes-
cada que custava slís ou sete tostões.
Gervas.o Lobato.
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j/ig osfo 31 Dias
r=rz ^_ _:^= ^v^s^-s ^-^;ç^
No crescente estruma os campos e arranca as cebolas ;
e, em chovendo, semei^ tremoços,
rábanos, repolho', nabos e couve > tardias.
No minguante desfolha a> vides, colhe Iructos, guarda sementes
e semeia cravos.
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202 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
MÃE DE Pio X
— e)0(õ~
1 — Segunda-feira— S. Pedro ad Vincula. — Os Ss.
Martyres Machabeus. — Os Martyres de Cheias. — N'este
dia nasce sol ás ^ h. e j 7n, e pôe-se ás 6 h. e^^g m.
♦-^■difl t ^%ff| fc|jj|p'f|ftfri'f ^ fr'"-o
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.••••%^
EO
(ANECDOTA HISTÓRICA)
ELA quaresma dç 1870, um pobre
operário, por nome Joáj, en-
trando pela manhã na egreia de
Santa Maria de Alcoy, em Hes-
panha, avisinhou-se do confes-
sionário do P. Mariano Juliá,
. franciscano exclaustrado, sa-
cerdote de muita popularidade,
de todos bemquisto, que pçlo
seu fervor e esmolas angaria-
das, tornára-se o principal pro-
vedor da Casa de Beneficência.
Mal João dobrou o joelho dean^
te do confessor, disse-lhe :
— P. Mariano, desculpe V.
R. a minha ousadia, nlas não
venho confessar-me^ .
— — Então, a que vens?
— Ha tempQS, que minha mulher, me anda pregando, que
hei-de confessar-me como nos annos anteriores, zumbindo-me aos
ouvidos todos os dias com a mesm^ cantilena, averbando-me de
he^rege e excommun^do. Como sempre, armamos um charivari
medonho, um bam^é insoífrivei, resolvi-me vir ao confessionário
de V. R. para q'ueUa vendo-*me aUi estar de cocaras, se callas-
£e d'uma v^z para sempre, e d*eata fóroia haja paz e nfio guerra
«m casa.
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264 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
— Mas, ó João, dize-me cá, porque, tendo nos demais annos
procedido como boqi christâo, vens agora fazer de comediante ?
— P. Mariano, já aue V. R. m-o precisa, falarei sem rebuço.
; Saiba V. R. que na Religião o que mais vivamente me impressio-
nava, obrigando-me a ser honesto é honrado, era o temor do in-
ferno, onde, segundo V. dizem, os homens atrabaliarios e Ímpios,
padecem horrivelmente, em companhia dos demónios. E como
agora está averiguado que não ha inferno, disse de mim para com-
migo: Eu confessar-me ? Para quê? Basta não fazer mal a nin-
guém, como diz a moral universal,, que nos pregou o marquez de
Albaida.
— E COTIO podeste averiguar a não exi^^tencia do inferno?
— Lendo o folheto de Roque Garcia e outros papeluchos que
no Club se dão grátis.
— E tu crés nas babuseiras e sandices d' aqueWes paveis-trapos?
— Sim, senhor; n'elles está a verdade e o evangfcího do povo,
qiie mais illustram que os sermões dos curas.
— Obrigado pelo obsequio que me fazes. Sabes tu quem sf,o-
Roque Garcia e os seus apaniguados que taes mentirolas te dizem?
— São homens tão sábios como V.
—Embora; dize-me, são rmh sábios qu'í S. Agostinho, S.
Thomaz, S. Boaventura, Scoto, Balmes e os grandes philosophos
de vinte secuHs que creram e defenderam o dogma do inferno ?
—Isso não sei; mas dizem que sáo sábios que bem podemos
dar-lhes fé.
— Acaso disseram-te qu3 eram tão virtuosos e santos, que, por
não dizer uma mentira, se deixavam tratar, e que haviam feito mi--
lagres em prol de suas doutrinas? ' \^- ■ ^
— Isso ninguém avançou ainda.
— Então para que has de prestar mais credito a esses charla-
tães, que aos Santos e Doutores da Egreja. aos Apóstolos e ao mes-
mo Jesus Christo, Filho de Deus Infalliveí?
— Eu não tenho que lhe: dizer a este respeito ; mas asseguro-
Ihe que temos ouvido já tanto contra os curas e contra o inferno
com tanta copia de razoes que é impossível que V. tenham razão.
— Quaes são as razões? •
—Agora não as tenho presentes, ma§ apresental-as-hei n'outra
occasião, e V. talvez se capacite de que o inferno não é senáo uma
antigualna indigna dos nossos tempos.
—Pois olha, filho, interesso-me maisque tu por este novo des-
cobrimento; porque bem sabes que nada lucro com estar horas in-
teiras, de manhã e de tarde, gastando saliva, exeotando a (^ciência,
como U19 Job. Nada cobro também em. ir confessar os empestados
da Casa de Beneficência e as tuberculosos do Hospital; e se sou
chamado a deshoras para auxiliar algum infermo, não colho outrem
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AGOSTO 265
salatio senão algum nojento escarro ou um ataque pulmonar, como
me succedeu ha três mezes, quando fui, entre o gelo e um tur-
bilhão dè vento que se' desenroscava do despenhadeiro do Zinc,
confessar uma pobre creatura agonisante. Porisso, ficas incumbido
de te assenhoreares bem das razões allégadas, e vem domingo,
afim de que eu também dê balanço á vida, pois se te assiste o de-
'ver de te confessares, mais me cumpre a mim o confessar-me e
confess tr os outros.
— P. Mariano, fala-me a serio ou a brincar?
— A serio, Jcâo; que interesse tiro eu de confessar e de men-
tir? Apenas te recommendo uma cousa, é que náo venhas com du-
vidas; porque bem sabes que em caeo de duvida sobre se ha ou néo
inferno é preciso tomnr o partido mais seguro, longe de nos arris-
carmos a que o demónio nos empalme, assando-nos nas grelhas es-
brazeadas, depois de nos ter amolgado a cabeça nas caldeiras de
Pedro Botelho.
— Esteja tranquillo; perguntnrei ás pessoas mnis illustradas
que eu o que ha de certo, omittind*^ tudo o que for duvido o.
— Pergunta-lhes as cousas seguintes:
1. Provem claramente q\ii J. Christo (que tantas vezes nos
falou do inferno) nõo foi senão uoi enganador e embuteiro?
2. Provem que foram uos embusteiros e embaúcadores da
plebe, os- Apóstolos e todos o> Santos Doutores da Egreja, como
também os sábios philo^-ophos que ha dois mil annos ensinam o
dogma do inferno.
3. Demonstrem^ alem d'isso, que todos os milap-es feitos para
provar a verdade catholica relativa á existência do inferno, foram
puras mentiras e embustes.
4. Demonstrem se é ou não contrario á razão e á justiça que
os malvados doeste mundo, impunes durante a vida, sonram eter-
namente no cárcere de fogo.
5. Provem, finalmente, que Roque Garcia e Companhia teem
mais auctoridade para definir o assumpto, e merecem maior crç-
dito que os Apóstolos e Doutores e sábios do Catholicismo ?
— Não sei, P. Mariano, se poderei com tantas provas, quesáo-
tantas como os dedos das mãos; chegando a casa, hei-de escre-
vel-as para me não esquecer.
Oito dias depois, João, apezár de haver matutado, repassado-
o folheto de Roque Garcia, mortificando os amigos, reptando-os a
que respondessem; compareceu deante do P. Mariano edisse-lhe:
nunca temi tanto o inferno como n*estes di is. Ninguém é capaz de
aventurar as provas terminantes que V. exige.
Interpellei 03 amigos do club, que faltos de razões, responde-
ram-mecom uma estridente gargalhada, zombando de minha pes-
soa, do inferno e dos demónios.
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266 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Mas, como entendo que não basta rirmo-nos do inferno para
evital-o, e...
O P. Mariano abraçou ternamente o pobre João, dizendo-lhe:
— Pois bem, íilho, que deve fazer um homem que está em
horrorosa duvida sobre se ha ou não inferno, se se condemnará
ou não?
O pobre João confessou-se, e viu-se livre dos temores, fican-
do satisfeito e radiante de alegria.
Quantos operários não ha por esse Portugal alem, cheios de
preconceitos contra a religião, sempre na pista para atacar os do-
gmas sagrados, trazendo á baila argumentos de cacaracã, fúteis
arrazoados, que nos causam engulho^; de morte? Eram dignos de
bem melhor sorte esses pobres operários que prezam mais o dinhei-
ro que tilinta na algibeira — lucro escasso dos dias de suor que
a religião au^çusta, sobre que versavam as conversas de seus pães
nos tempos de mais fervor religioso. I-^amentamos esses parias da
sociedade— verdadeiras machinas de trabalho— absorvidos sofFrega-
mente no labutar da industria, sem sequer poderem dar fôlego ao
coração an cioso de repouso.
Que miséria ! O nosso operário não só está enbruteeido intel-
ectualmente, pois ignora o cathecismo catholico, a única arma de
combate,' mas, nos dias de liberdade, vae desenfreadamente atas-
car-se no> antros da crápula, da abominação e hediondez.
Pelas ruas vemol-os passar com o rosto ferreteado pelo crime
vergonho'0, cambaleando irrisor lamente, sem a virilidade de sua
Taça. E são estes os elementos do socialismo? E são estes os que
nos atordoam os ouvidos com os reclames de promessas douradas ?
E são estes os leitores constantes dos jornaes hybridos e anti-ca-
tholicos? E são estes os agitadores, os grevistas^ que alvorotam
as multidões d'uma estupidez detestável? E são estes os escravos
dos patrões que não albergam um átomo sequer de espirito chris-
tão? E são estes os oppositores da causa catholica, que tem por
lemma : Pela Pátria e pela Egreja/ E são estes os vermes nausea-
bundos que, com o seu veneno, nos salpicam e mancham o traje?
E são estes òs que desdenham de pertencer á cathegoria dos cam-
peões do Bem e da Liberdade catholica? '
Pobresinhos 1 Falta-lhes o pão d'alma — á educação.
Olympius.
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AGOSTO 267
Hoje das duas horas por diante começa o grande Jubileu da
Porciuncula que pode ganhar-se nas seguintes igrejas :
i) Em todas as igrejas da i.a Ordem de S. Francisco.
2) Em todas as da 2.» Ordem (freiras clarissas).
3) Nas da 3.a Ordem regular (ou com votos soiemncs).
4) Nas das religiosas da 3.a Ordem com votos simp es, não só
para as mesmas religiosas, nias para todos os fieis (Padre Monsa-
no Collect. (Indulg., n.o 340 e seg.)
5) Nas da 3.» Ordem secular qu2 sejam propriedade da mes-
níia Ordem ; n*este caso, porém, deverá solicitar-se di Santa Sé a
oportuna autorizaçãOj apresentando previamente documentos com-
provativos de que enectivamente está em legitima posse da igreja.
ô) Fmalmente em outros templos que tenham alcançado da
Santa Sé um rescrito de concessão particular, concessão ordina-
riamente temporária e reduzida.
Podem lucrar esta singuiarissima indulgência todos os fieis
nas condições seguintes: devem confessar-se e commungar, visi-
tando depois algumas das igrejas a que por direi :o ou privilegio
foi concedida ^ indulgência, e ahi devem rezar alguma oração, se-
gundo as intenções do Soberano Pontífice.
A confissão, para ganhar a indulgência deve fazer-se desde
o dia 3o de Julho; mas as pessoas que teem o louvável costume
de se confessar toias as semanas não precisam de repetir a con-
iissão.
A communhâo feita no dia i d*agosto é sufficiente para os
dois dias ; como também se podem fazer as visitas no dia i e com-
mungar no dia 2.
Entre uma visita e outra nío é preciso interpor grande espa-
•ço de tempo; basta sair e entrar logo. Não está prescrita uma
oração certa e determinada; basta, por exemplo, um Padre Nos-
so, ainda que seja para louvar o uso de algumas pe-soas que re-
zam uma estação a cada visita. Advirta-se no entanto, que a ca-
da uma das visitas deve repetir- se a oração, nem vale rezar de
uma vez por todas as visitas.
Os Terceiros seculares que moram em logares onde não ha-
ja igreja, que tenha ou por direito ou por privilegio a concessão
do jubileu, podem ganha-lo na própria igreja parochial.
2— Terça-feira — Nossa Senhora dos Anjos. — St.*"
Estevam, Pp., M. — A B. Joanna de Aza, mâe de S. Do-
mingQS.
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268 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
A irmã da caridade
Na terra, como a lu^, ou Ivrios entre abrolhos.
Ha uns entes sem par em bem da humanidade;
Deus chama-lkes talvez o enfevn dos seus olhos,
E chama-lhes o mundo irmãs de caridade.
Cercada de ouropein, no sei ■) da opulência,
Onde o vicio exi':tir, onde morar o crime.
Não julgueis encontrar esse anjo de innocencia
Essa aurora de pa^, essa mulher sublime,
Buscae-a no hospital, coberta de sarcasmos,
Curvada sobre um leito onde pairar a morte,
A<ípirando d) enfermo os pútridos marasmos^
Olhos fitos no Céo como aguardando a sorte,
E a sorte oh l quantas ve:^es a sorte é o contagio,
E a morte entoo lhe estende o seu terrível braço.
Ou também quantas vei^es um minero apanágio
A obriga a succumbir exhausta de cançassol
Sebastião Pereira da Cunha.
_jvw>^_
3— Quarta-f eira — Invenção do corpo de St.° Es-
tevam, Protomartyr.
SYMBÔLO DA ESPERANÇA
♦
. Os antigos poetas a figuravam na imagem de uma mulher mo-
ça, (porque da mocidade é prooria a esperança), vestida de verde,.
encostada a uma ancora, e rodeada do arco-iris. Nas mãos, um pavão.
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AGOSTO 269
Outros a representavam vestida de amarello (ouro) cor própria
<i'aurora, que é a esperança do dia, o principio a*alegria ; davam-
lhe azas nos hombros, e em acção de abnçar o Amor, que alimenta
no pe.to quem espera conseguir o objecto dos seus desejos.
Hesperitano.
4 — Quinta-feira — S. Domingos de Gusmão, C. fun-
<iador da Ordem dos Frades Pregadores. — Anniversario
da eleição de Stia Santidade Pio X,
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TfTflttnTfTTTTTTtfm
UEM em 1859 viajasse por Treviso^
diocese de Itália, encontraria, a
caminho da escola, entre Riese e
Castelfranco uma gentil creança,
com os livros de primeiras let-
tras n*uma sacola e n*outra po-
lenta fria para a merenda.
ueno José Sarto e Sanzoni que te-
ípoca 10 annos, distinguia-se entre
heiros pelo progredir diário na lei-
ripta e mais ainda pela bondade e
candura dos seus modos e costu-
:is.
i bom padre que dava! — diziam
:es os vizinhos.
2u pae, João Baptista Sarto que vi-
desto officio de official de deligen-
j ..lal lhe ganhava o pão para os seus
nove filhos, não podia realizar a vocação do seu caro José Sarto,
nem os seus grandes desejos.
Valeu-lhe o cardeal Jacopo Monico, Patriarca de Veneza, que
serviu de Mecenas ao seu pequeno, alcançando-lhe enttada e estada
gratuita no seminário de Pádua.
José Sarto era admirado por todos os seminaristas, quer pela
applicaçf o e progresso scientifico, quer pela madureza de costumes
e rara piedade.
Completou com applauso do professorado e condiscipulos o
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AGOSTO 271
curso litterario e scientifico aos 23 annos, sendo ordenado de pres-
bnero a 18 de dezembro de i858.
Pouco depois foi nomeado paro:ho de Tombolo e em 1867 de
Salzano.
Os méritos relevantes do Padre José Sarto na administração
parochial e os seus talentos e instrucção revelados muitas vezes
captivaram o bispo de Treviso que o nomeou cónego, secretario
provisor, e í;ede vacante vigário capitular da sua Sé. Exerceu t inda
o cargo de director espiritual do seminário, professor de religião
e examinador synoJal.
Os talentos do Padre Jo=:é Sarto iam-se salientando cada vez
mais. Leão xni conhecedor dos seus méritos nomeou-o Bispo de
Mantua.
Uma anecdota occorrida n'esta occasião revela ao vivo a mo-
déstia do novo dignatario.
Alguns dias antes da sua consagração episcopal, dirigiu-se a
Pádua, para visitar o seu antigo Ei^po, Monsenhor Callegari.
Entrou no templo de S. Justina para dizer missa.
Mas orno trajava muito modestamente, o reitor da egreja ao
ver aquelle sacerdote desconhecido e í^em insígnias dignatarias e
de mais a mais sem carta do seu prelado duvidou d'elle.
— D'onde sois?
— De Treviso.
— Que fazeis na diocese?
— Nada.
— Nada! Nío sois paracho, ou coadjutor, capellâo...?
— Nada d'isso, não faço lá nada.
— Pois admira is:0, porque em Treviso ha escacêz de sacer-
dotes!
— Apesar de tudo não faço lá nada.
—Se V. R. quer, o recommendarei ao seu prelado? Entre-
tanto celebrei.
— E sahiu, recon^mendando ao sacristão que vigiasse pelo sa-
cerdote qu2 ia celebrar.
Terminada a missa o sacristão disse ao Reitor:
— Celebrou com muita piedade, não parece intrujro.
— Ainda bem.
Terminada uma longa acção de graças, o sacerdote recem-
chegado pediu o livro da celebração das missas e escreveu:
Jos.é Sarto t Eif-po eleito de Mantua.
Imagine-se a confusão do Reitor da egreja.
O governo da diocese de Mantua era difficilimo n'aquella epo-
cha, já pela má imprensa, já principalmente pela decadência scien-
tifica e religiosa do clero.
O zelo:o Irispo reuniu synodos diocesanos, assistiu a muitas
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272 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
reunióes do clero fundou, um seminário, para elevar o clero de
Mantua á dignidade moral e scientiíica do seu estado.
A sua bondade para com todos, a sua piedade fascinadora
conquistava os ânimos, que se deixavam levar á mercê dos seus
desejos.
— Bem se lhe podia dar o epíteto de — reformador de Mantua. —
D'aqui foi chamado a Roma muitas vezes por Leáo xiu que
gostava immenso de o consultar.
Sarto era o conselheiro intimo de Leão xiii que lhe votava
frande e intima amizade ; o que provou elevando-o a cardeal de
. Bernardo nas Termas, e a Patriarcha de Veneza em 12 de junho
de 1893.
Iam brilhar intensissimamente n*esta dignidade as suas facul-
dades de coração e de intelligencia,- mais que nunca.
Introduziu grandes reformas na organização do palácio e ser-
viços officiaes, abateu a auctoridade illimitada de alguns persona- '
gens, corrigiu doce mas efficazmente os costumes do clero, e
«iniciou, diz uma revista italiana, aquella acção sabia e discreta
que deu a Veneza uma Administração Çommunal, a que anda unido
o amparo dos interesses materiaes dos povos e o amor e respeito
á Religião.»
Era popular, simples caritativo para com todos. Vêl-o tratar
os pobres com mil caricias e fallar meigamente sos gandoleiros dos
canaes da cidade, fazia lembrar Jesus no meio das multidões dos
enfermos que lhe pediam cura.
Os poores tinham-lhe particular affeição. Quando ia a Roma
via-se obrigado a pedir dinheiro emprestado para repartir pelos
indigentes da capital que o rodeavam aos centos, ao descer do
carro. Chegou a empenhar-se em 20:000 liras, mais de quatro,
contos.
Na ultima visita feita ao fallecido Papa pediu de empréstimo
2:000 francos.
Era tal a veneração do povo para com o bondoso prelado que '
um dia, certo pobre altercando no meio dos outros acerei, de pa-
dres, dizia: «Não sou amigo de padres, mas com respeito ao Pa-
triarcha, por elle me lançaria a uma fogueira se fosse necessário».
O seu modesto palácio era franco a todos: pequenos, gran-
des, politicos de todas as cores e para todos tinha palavras doces
e trato franco e bondoso, motivo porque todos, democratas e bo-
rocratas sem excepção notável o amavam.
O mesmo Victor Manoel tinha-lhe afeição particular, o que
provou em maio ultimo visitando Veneza, mandando que o Pa-
triarcha fosse o primeiro a ser admittido a sua audiência. E como
o Patriarcha tardasse, nem por isso alterou suas ordens, mas es-
perou conversando entretanto com o pessoal da sua corte até que
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AGOSTO 273
***•■ V>r?-^>y,- - -■'■^^ .-■*//'■'<■?- .. -„ yã,^ '
Pio X
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274 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
se apresentasse o Amigo dos gondoleiros, attenção que nunca teve-
para nenhum cardeal italiano.
Para apreciar a alta e gen^ sympathia do Cardeal Sarto em
toda a Veneza, basta lembrar a imponente despedida que lhe fize-
ram a nobreza é povo d'aqu3lle patriarchado.
Muitas pes 03s nobres entre as quaes D. Carlos de Bourbon^ e
sua esposa adiaram a sua saída de Veneza, para tributarem ao seu
amado Patriírcha mais uma prova de respeitosa homenagem.
Ouçamos um correspondente de Veneza:
«Para se formar uma idei i exacta da popularidade que gosava
Monsenhor Sarto entre os Venezianos, séria preciso ter presefi-
ceado as manifestações qm acompanharam sua partida para o Con-
clave. Uma multidão immensa accudlu á Estação do Caminho de
Ferro muito antes da sahidi do comboyo, para saudar e despedir-
se do Patriarcha. ' . ^
Um prcsentiment") g''ral dominava todos os espíritos : voltaria
Veneza a ver o S2u amado Pas:or ?
NâD podiam tolerar a ideia de o perder; com tudo gritavam
de todos oí lados: — Permitta o sacro collegio que Vossa Eminên-
cia não volte. —
HoTiens, mulheres e creanças, gente de toda a edade, sexo e
condição, n'uma onda verti?inosa, atropellavam-se n*uma revolta
confusão para se acercarem do seu prelado.
Todos o queriam ver de per:o e beijar-lhe o anel episcopal
para recordação d'aqaelh a qu^m p^irdiam para sempre.
Todos gritavam: A Vo si benção! Queremos a Vossa benção-
papal antes que sej les ehiro Pap\.
O Patriarcha entrego j-^e por rlguns momentos áscommoções
da mulddão; e qumdo, ní'o sem ar^nde trabalho conseguiu subir
para a carru-gem deu a se a amado povo a triplice benção.
Ao part r a carruagem v^^o vam coxo um climor formidável
as ultimas vo^es de despedida: «Adeus Eminência! — Exclamavam,
todos — Não vo^ tornarenos a ver mais!»
O Patri rcha mui^o commo /ido continuou abençoando as suas
ovelhas e ao desapparecer da vi-;ta o comboyo, a multidão perma-
necia immovel ro me mo sitio^ abismada em dòr extrema. Muitos
sensibilisados dizlan^ choro ■o>:—Vfo romeal-o Soberano Ponti-
íice, porem nós pcrde.To^ p:.ra sempre o nosso pae. »
São presiigio^ os or ç^^es • mante.. Não se enganavam.
— Se o nosso Patri ircha f^r eleito Papa abre-nos as portas do-
ceu só para n-^s tornar a ver, diriam uns entre os outros.
E' a única ideia que íicoa consolando a magoa da perda de tão
bom pae.
O Cardeal Jo>d Sarto tem as chaves de S. Pedro na mão, a
Igreja chama-llie o Seu Pc.e Pio x, pode implorar de Deus a graça
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AGOSTO • 275
de no dia ultiitíò da humanidade, níáo se apattar de nenhum dos
seus filhos venezianos.
Pio X é de alta. estatura. O magestoso de seu corte une-se á
simplicidade das suas maneiras e a sympathía que irradia do seu
semblante attrahe as atrençóes de todos. , *
O olhar dos seus olhos clafò-azues é bondoso mas firme indi-
çio de não ceder perante os principio? verd.ideiros.
Sobre a espaçosa fronte caenvlhe os longos e brancos cabei-
los. O seu caracter brando e aflfavel captiva a todos o> que o tra-
tam. Nutre grandes enlevos pela musica. Perosi deve-lhe a actual
carreira arristici.
A sua rectidão de caracter é proverbial entre qiiem o conhece.
De>pedindo-se de Pio X depois de cerrado o conclave, um dos
serviçaes seus, para voltar a Veneza em vdião do seu officio, per-
guntou ao novo Papa o que queria para o seu sobrinho, parocho
em Veneza.
— Nada. Dizei-lhe que continue sendo virtuoso como até aqui
e entrega- lhe a minha benção.
Diz- se no Vaticano cus este sobrinho do Papa subirá muito
na gerarchia eccleeiastica, mas Pio x tem d-^do manifestas inten-
ções do contrario; acha indigno da sua dignidade favorecer mem-
bros da sua familia.
A sua modéstia e humildade ní.o pôde amoldar-se á alta di-
gnidcide a que Deus o elevou.
Três dias depois da sua eleição dizia a um seu camareiro.
— Não me poso acostumar a :er papa. Esta fnanhã acordei
perguntando a mim tresmo onde estava e se er-a papa ou se acor-
dava de um sonho'. Olhei e vi junto do leito uma sotaina branca,^
duas sandálias pont ficias... era papa não havia duvida. Não po.--
SC acreditar n'e>ta ideia que me entristece e acabrunha. —
Fouco depois da sua eleiçí.0 o esculptor Giovaruscio, de mui-
ta nomeada em Itália pediu para se demorar como novo Papa afim
de ser o prime*ro a lhe esculturar o busto. O Papa demorou-se
perante o artista vinte minutos. Chegaram-sè mais alguns artis-
tas; o Papa julgava-se ainda em Veneza e conversava afíavelmente
com os artistas e outros personagens acerca de seus irmãos, dos
seus caros venezianos
^ Adiantava-se o tempo e o Papa metteu a mfo por entre a bo-
toeira da batina e tirou o relógio — um relógio de niquel compra-
do em qualquer tenda de feira. —
Vendo a admiração dos que o rodeavam escondeu-o nova-
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276 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
mente e ao vàr-se rodeado de tanta gente e3K;lamou com sincera
admiração.
— Tanto personagem illustre para servir um homem insigni-
ficante !
As ideias democráticas de Leão xiii tiveram sempre em Car-
deal Sarto um propagador. Nas cerimonias pomposas da sua co-
roação deu provas d'isso.
Perguntaram-lhe quantas tribunas queria que se armassem
para a sua coroação.
— Duas somente. Uma para o Corpo Diplomático e a outra
para a nobreza romana fiel servidora dos Summos Pontifices.
Alguém lhe advertiu.
— Foi sempre costume destinar alguns logares distinctos para
vários di^natarios, viajantes illustres etc. . .
— Só duas replicou o Papa; os outros cabem bem no templo.
Perante Deus todos hão-de ser eguaes.
Segundo correspondências romanas dignas de credito, Pio x
tem grandes similhanças em piedade e sciencia com o seu veneran-
do e saudo-o antecessor Pio ix. Os catholicos esperam muito em
Pio X e os mesmos liberaes têem-se mostrado contentes com a es-
colha do cardeal José Sarto para successôr de Leão xni.
Os Redactores do Almanach de Santo António ficam implorando
20 grande Thaumaturgo Portueuez a sciencia e fortaleza neccesa-
rias ao novo successôr de Pedro para o difficilimo cargo a que
Deus se dignou eleval-o.
P. B. Ribeiro.
5 — Sexta-feira — Nossa Senhora das Neves.— /«rf.
J>/en, para o Rosário Vivo,
. SAUDAÇÃO Á VÍRGEM
Quero saudar Maria,
se ri no ceo a aurora;
quero saudal-a d hora
em que declina o dia.
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I
AGOSTO 477
Dulcíssima Maria
és minha mãe do ceo,
sempre dos lábios meus
teu nome brotará,
P. Freitas.
6 — Sabbado — A Transfiguração de Nosso Senhor
Jesus Christo. — Os Sts. Xisto e Comp., Mm. — S. Thia-
go, eremita.
DIFINIÇÕES
Cego — Enfermo, a quem nunca falta um magro cão e puras
vistas. ""
F elipse — Jogo das escondidas entre o sol, a lua e a terra.
Experiência — Pobre cabana construida com os destroços d*esse
palácio de oiro e mármore chamado «nossas iliusóes».
Suffrascio universal — A estrada publica.
M(*âecma — Arte de coveiro.
Vida — Viagem em que náo se compra bilhete de volta.
Mnr.ica — iJinguagem universal dos homens e animaes.
Fconomia — Arte de ser rico.
Es;oií:ta — Homem que só pensa n'uma coisa: em si mesmo.
Flagrante delicio — Garganta de Adão.
Recommendado — Termo que nem sempre á synónymo de re-
commendavel.
Suicidio — Cumulo de loucura.
Boato — Pombo correio.
Lobinho — Peccado callejado.
7 — Domingo (ii."* depois do Pentecostes) — S. Cae-
tano, C. — S.. Donato, B. M. — St.^ Alberto, C. — S. Seve-
rino, M. — Ind, Plen. para os Irm. da Conceição,
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278 ALMANACH. DE SANTO ANTÓNIO
O DIA DO SEÍIH.OR
Isto disse o Senhor : Guardae vossas almks, e náo queiráes le-
var cargas no dia do Senhor nem as metaes pelas portas de Jeru-
salém.
E ní o façaes tirar cargas de vossa casa no dia do Senhor, e náo
façaes obra nenhuma: santificae o dia do Senhor como mandei a
vosso ^ pães, E assim santificareis o dia do Senhor, sem fazer obra
alguma.
Será para sempre povoada esta cidade. Mas se não me escu-
tardes pira santificar o dia do Senhor, acenderei fogo nas suas
portas; devorará as casas de Jerusalém e não se apagará.
Jerem. C. xvii.
8 — Segunda-feira — Os Ss. Cyriaco e Comp., Mm.
-S. Severo, Presbyt. . ,
=a=<
D. Amélia disp6e-se a sahir á noite, beija Bebé que fica brin-
cando em casa com uma gata e um gatinho.
— Muito feliz é o gatinho, diz Bebé chorando, a mamã d'elle
não vae ao baile.
9 — Terça-feira — O B. João de Alverne, C da i.*
O.— S. R^mão, M.
«O desespero dos povos que já não têm mais que perder é de-
veras para recear.»
Carta escripta por Jeronymo Bonaparte a seu irmão impera-
dor. Pouco tempo depois rompia a campanha da Rússia e a fortuna
do grande general, que também havia dito : «na guerra um grande
desastre indica sempre um grande culpado», atufava-se nos gelos
4do norte.
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AGOSTO ) 279
10 — Quarta-feira — S. Loureííço, M.— St^ Philo-
inena, V. M: '
Casa onde naszeu Pio X
lUA HÂE CIBISll
Um dia, um missionário encontrou ás portas de Lavàl um me-
nino tranquillamente sentado. O menino olnava-o com olhos cheios
de intelligencia e sympathia. O missionário approximou-se, e per-
guntou-lhe:
— «Meu menino, sabes fazer bem o signal da cruz»?
O menino sorriu-se e náo deu resposta. Mas a máe ouviu a
pergunta e disse :
— «Perguntae-lhe, meu Padre, um pouco de catecismo, e ve-
reis que vos responde».
Com effeito o menino respondeu sobre as principaes verdades
da Religião e sobre os principaes deveres da vida christã, muito
melhor que alguns bacharéis.
— «Mas que edade tem este menino? perguntou o missionário
admirado.
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2«o ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
— «Padre, ha de £azer breve três annos.
— «Três annos ! Como é que pôde ensinar-lhe tudo o aue sabe?
— «Doesta maneira, meu Padre : Quando tenho meu filno no re-
gaço, quando o visto, quando lhe dou comida, ensino-lhe a Reli-
gião; e repetindo-lhe assim as coisas, consegui que as aprendesse.»
Que exemplo para todas as mãesl Merinos assim formados
para a vida christã, são mais tarde a honra da familia, e $l alegria
de suas mães.
11 — • Quinta-feira — (Oitava de S, Domingos) —
Os Ss. Tiburcio e Suzana, Mm. — Ltm nova aos 21 tn.
da tarde.
A mocidade de Leão XIXI
Revue Eldesieinc, refere o seguinte facto da vida do Sobe-
rano Pontifice, na sua juventude :
«Nos primeiros dias das ferias do verão os alumnos do Colle-
gio dos jesuitas de Viterbo sahiram a passeio pelos bellos arredo-
res da cidade, e, na occasião em que merendavam em uma hospe—
daria situada á margem de um barranco, em cujo fundo corria utr^
profundo arroio.
— « Pecci, disse um dos mais velhos, recita-nos uma das tuas
poesias em latim.»
-»-«Com muito prazer, replicou o.interpellado, mas com a
condição que cada um por sua vez, ha de exhibir sua aptidão no
que fôr de sua especialidade.»
E logo começou a declamar, com vigor e accentuação, uma das
poesias que tinha por costume compor nas horas de mer.
— «Bravo! exclamaram todos, applaudindo-o, apenas havia
terminado.. Sendo, porém, o calor intenso demais, dentro de casa,
sahiram fora, e por instancia de todos, Humberto, intimo amigo
de Pecçi, dispoz-se a recitar um discurso, para cujo eíFeito se col-
locou no alto do. barranco á beira dá corrente; mas, tão mal se
houve, que quando exclamava, extendendo os braços e reclinando
a cabeça pata traz: « Athenienses 1 . . . », perdeu o equilíbrio, e foi
parar no fundo do rio.
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AGOSTO 281
Em presença de um accídente táo imprevisto, estavam todos
consternados c attonitos, quando Joaquim Pecci, despindo a rou-
pa, se atirou á agua, e com muito custo e não menor perigo de
afogar-se, conseguiu suspender pelos cabellos a seu querido com-
panheiro. Vendo-os salvos, soltaram seus companheiros outro bravo
mais estrepitoso que o que haviam merecido seus versos, como
testemunho de admiração, alegria e reconhecimento, e todos se
acercaram de Humberto e Joaquim, para prodigalizarem áquelle
seus cuidados e a este suas felicitações, o qual prostrando-se de
joelhos, rendeu a Deus graças por Ine ter ajudado a salvar o seu
querido amig .
-€tir«t»^-
12 — Sexta-feira— St.*' Clara, V. e Primogenita.da
2.* O. — Ind, Plen, nas egrejas franciscanas, — Ind. Plen.
para os Irm. Terceiros,
(A José Ribeiro Braga)
fUANDO se desfazem, vaporosamente, as alegrias que nos enflo-
ravam a alma, vêm-se estender em nosso peito sombras tris-
tes, baixando dos encantados horisontes onde nos sorriram jú-
bilos e encantadoramente nos acenaram esperanças.
Se nos desvia o destino do pedaço de terra, onde se embalou
o nosso berço, lá de longe, olhamos para aquelle ponto do céo,
que o cobre, e ficamos quietos, extáticos, absortos, em uma con-
templação muda e extra-terrena, na evocação da felicidade da nossa
despreoccupada infância ; a conviver com as creanças amigas, que
brincaram comnosco; a prender os mesmos braços, a calcar as
mesmas flores, a correr os mesmos campos, a subir os mesmos oi-
teiro5 — a imaginação a voar n'um céo azul, com azas leves de ar-
minho e seda...
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a82 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Despertamos da atonia doce d' um viver despreoccupado e va-
iros, embarcados na galera verde da esperiinça, pelo mar do So-
nho, demandar a terra. . . da lUusáo.
Ha tempestades no mar. As vagas enfurecidas fazem pedaços
o batel. .
Agarrados a uma taboa, lá andamos perdidos, arriscados, no
fluxo e refluxo da inconstância, de olhos fitos, nos ténues bruxolea-
mentos da esperança.
Na travessia d'este mar gosamos as sensações deleitosas do in-
citamento que nos conforta e sentimos as decepções amargas do
desengano que nos punge.
E afinal, nos braços das ondas, ^s vezes somos arremessados
contra os recifes agudos que nos espicaçam o coração e outras ve-
zes cuspidos n'uma praia deserta: — lofige do pharol que nos guia-
va, do lado opposto á e^trella que nos attrahia.
Sosinhos, a estender o olhar pela extensão do largo oceano
que nos separa da objectividade das nossas esperanças queridas, a
névoa fria da saudade enlucta-nos a alma e vemos tudo atravez
d' um crepe negro.
E, na praia deserta dos desenganos, a contemplar o céo esfar-
rapado das illusóes, só vem a Saudade conversar comnosco. Mas é
então quando mais crentes ajoelhamos : é n'esta soledade do cora-
ção quando a alma verte mais ardentes lagrimas ao pé da cruz —
lagrimas que são lenitivo santo. . . se a desgraça não partiu ainda
uma por uma todas as cordas do sentimento e estancou o desafogo
do pranto.
Ah ! felizes das almas saudosas que ainda podem chorar.
S. Lourenço de Saúde, 25 d'outubro de 1902.
P. Silva Gonçalves.
13 — Sabbado — (jejum) O B. Pedro de Molleano,
C. da I.* O. — Os Sts. Hypolito e Cassiano, Mm.
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AGOSTO 283
No palácio da princesa de Lorena havia frequentemente ter-
tulia composta das pessoas mais distinctas da altíi soiedadi. Cer-
to dia foi também convidado o celebre D'Alembert. I a adps pou-
cos momento í gaba-se este publicamente das suas o^)inióes anti-
religiosas dizendo:— Eu sou o único n'ene p.ila:io qu ^ nâo creio
nem adoro a Deus: — Justamente offendida a nrinceza peia imoru-
-dencia tão descarada do seu hospede lhe replicoa: — Nro, senhor,
não é V. o único n'este palácio que não aiorc; a Deu>. — Então
quem é mais, minha senhora? — São toio. oscavallos e mulas, etc,
que tenho n i cavallariça.
Os fieis que commungarem durante cinco domingos seguidos,
a partir da amanhã, em honra das cinco chagas de S. Francisco
(a 17 de setembro) jS^anham indulgência plenária em cada domingo
visitando qualquer igreja.
14 — Domingo— O B. Sancho, C. da i.* O. — St/
Athanasia, Viuva.
O nosso dever social
Quanros operário;» ha que morram antes do tempo! Morrem,
victimas da sua miséria, 'victimas do seu. trabalho, victimas do
abandono a que oí votam de '^humanos patrões. E d'esta de^raça
hade Deus ped:r contas a muitos; pôde diz^r como a Cain: dá-me
contas d'aqueíhs teas irmãos, infelizes no corpo e na alma !
«Senhor, respondereis, não fui eu que os matei.» «Mas foste
tu, dirá Deus, que os deixaste morrer.»
Não será injusta a accusaçlo de Deus : morreram pela inércia
•dos bons, morreram pelo deí^preso dov ricos, morreram pelaapa-
thia do clero, morreram pila iodifterença das classes elevadas.
Todos, uns com o seu dinheiro, outros com seu conselho e direc-
ção, outros com seu trabalho, os podiam soccorrer, levantar da
miséria, e nada fizeram.
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284 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
A inércia das vontades é hoje um grande mal social.
A inércia, como diz um publicista, em muitos casos é um
crirtie.
15— Segunda-feira >í* He*— Assunção de Nossa.
Senhora. — Ind, p/en, para os Irm, Terceiros — para os da
Conceição — do Rosário Vivo — de S. José e do Carmo.
"@)í
A ASSUMPÇÃO DA VIRGEM
Casta mãe de Jesus, a tua morte
foi como um somno brando! O Ceu fitaste
e no teu pensamento ao Ceu voa*:te
com pra\er e com intimo transporte.
Os effeitos da morte não sentiste.
Teu rosto não deixou de ser formoso,
E mostraste, antevendo o eterno goso.
que a morte para ti não era triste.
Os fisiSf que tiveram a ventura
de te verem morrer, como choraram!
Mas logo com prazer se resignaram
vasia vendo a tua sepultura.
Morreste! E um coro de anjos desce d terra
e ao throno te elevou de altiva gloria.
— Tu na morte alcançaste mais victoria,
do que todo o poder, que o mundo encerra! —
No Ceu te collocára sobre a fronte
diadema brilhante o Padre Eterno.
E Jesus te sorriu com amor terno
e de graças tefe^ perenne fonte!
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AGOSTO 285
Como Esposa do Espirito Divino
poder maior tu acceitar podehte.
E, de praj^er, na habitação cdeste,
em tua honra se escutou um hjrmno!
Tu pagaste o tributo d natureza.
como paga a in/eli^ humanidade,
mas, depois que subiste á immençidade,
tens, ao pé da Trindade, alta grande:^a!
E por isso te louvam hoje os crentes
e a Santa Egreja te consagra cantos,
— Tu sabes enxugar na morte os prantos
aos, que passam a vida descontentes.
Morreste, mas no Ceu és protectora
d'aquelles, que te invocam, 6 Maria,
Na terra, o nome teu é nossa guia;
e, no Ceu, reinarás, como Senhora!
O' Maria, concede feli:^ sorte
aos crentes, que em ti sempre confiarem;
e, para eternamente te louvarem,
qu^ tenham, como tu, serena morte !
(Aveiro) Rangel dk Quadros.
16 — Terça-feira — S. Roque, C. da I.* o. — Ltd.
J>ien. para os Irm, Terceiros,
Um sub-inspector visitando uma escola faz algumas perguntas
de Historia Sagrada.
— Com que arma matou Sansão ps philisteus? Os meninos não
atinam com a resrosta.
— Mas eu sei que os meninos sabem. — Vamos lá attenção (e,
ao mesmo tempo apontava para a sua região dental).
Os rapazes Levantando-se de repente esvozeam estrepitamcnte:
— Com a queixada d'um burro. ..!... I
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286 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
^m.
Veneza
* 17 "Quarta-feira — S. Mamede, M. — A B. Emilia
V., Dominicana.
A desconfiança excessiva, attrae muitas vezes os males, que
se desejam evitar.
18 — 3 Qumta-feira— St.^ Helena, Imperatriz. —
St.° Agapito, M. — Quarto crescente ás () h, e ^o min. da
manhã.
— Sabe!s, perguntava na Camará dos deputcdòs o conde de
Arontaleir.bert,— sabeis o re:ult;.do d'esta perseguição ao Catholi-
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AGOSTO 287
cismo? — O resultado é augmentar mais em nós o amor fecundo e
fervoroso a essa Religião que insultaes.
19 — Sexta-feira — S. Luiz, Bispo de Tolosa, Prote-
ctor da Juvent\âáe.~-/nd, p/en, nas ígr^as franciscanas —
e para os Terceiros,
(T^
. Quem com mau visinho ha-de visinhar, com um olho ha-de
dormir e com o outro vigiar.
vf/
20— Sabbado— S. Bernardo, Abb. e Dr. da Igreja.
Seguia montado no seu bégueiro um camponio aragonez, pela
linha dó caminho onde em poucos minutos havia de passar o com-
boyo; ouve a distancia os silvos da locomotiva, mas não se preoc-*
cupa ! Porém quando estava prestes a ser victima d^aquelle desen-
freado cavalio arreda-se para a valleta e furibundo lhe diz:
■ * Vaya ! . . . porque te náo retiras tu? ! . . .
' 21 — Domingo — st* Joanna Francisca de Chantal,
Viuva. — St-'' Anastácio, M. — St.^ Umbellina.— A^a^a' o
sol ás ^ h, e 22 VI. e põe-se ás 6 h. e 38 m.
'-^=^;^í^
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288 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
ORO0]ilNOL,C.mORDACRE.iÇ5O
Quando os primeiros silêncios da noite e os últimos rumores
do dia se emulam á porfia nas encostas, á margem dos rios, nos
bosques e nos vales; quando os arvoredos emmudecem e não sus-
pira uma folha, nem um fio de musgo ; quando a lua esplende no
firmamento^ e os ouvidos do homem estão attentos, o rouxinol,
cantor da CÍreação, entoa os seus hymnos ao Eterno.
Ao principio, os brilhantes accordes do prazer despertam os
echos. A desordem apossa-se do canto. O artista salta do grave ao
agudo, do brando ao forte: faz pausas, é lento, é vivo, é um cora-
ção inebriado de alegria.
Mas, de repente, a voz cae, a ave cala-se. Recomeça. Como os
sons difFerentes na ternura d'aquellas melodias ! Ora, são modula-
ções languidas, posto que variadas; lo°(o é um canto monótono
como o das velnas xacaras nacionaes, primores de simplicidade. O
canto exprime tão facilmente a tristeza como a alegria. A ave que
perdeu os filhitos canta ainda, gemendo as endeixas da dor.
E' possivel perseguir os ho>pedes dos arvoredos,' roubar-lhes
os ninhos, dar-lhes caça, feril-os a tiro ou em boizes, fazel-os sof-
frer, emfim, mas nunca forçal-os ao silencio. Mesmo a despeito da
nossa vontade, é preciso que cumpram as ordens da Providencia;
e a sua voz abençoa incessantemente as maravilhas do Creador.
C HATE AUBRIAND.
. 22 —SegUn(ÍdL'ÍaÍr3,~(0iíava da Assumpção)— S.
Timotheo e Conip. M.
Esperança ! Estrella brilhante que de longe nos fita ; bálsamo
consolador que attenua as agruras da viia; mãe carinhosa, prote-
ctora dos infelizes.
J. Fragoso.
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290
ALMANACH !>£ SANTO ANTÓNIO
A' semilhança do occeano que os nossos olhos vêem, ha outro
invisível, ctijâ cxmencia só pelos resultados se manifesta.
Parece immovel no começo, principia logo a agitar-se, a es-
tender-se, ambicioso d*abranger o mundo, e oxalá que algum dia
o abranja, prara ventura de todo elle. Este occeano é a caridade.
Congénita ao coração humano, formulou-a o Nazareno como
virtude e preceito.
D. ANTÓNIO DA CoSTA.
24— Quarta-^^eira— S. Bartholomeu, Ap.— s. Ro-
mãóy B.
m ^ m %tÊmÈÊà
ITA TJÃ MzmOA
(A UM POETA E AMI<?o)
Poeta melijluo
e méu doce dffiifo,
oh! Và-me um abrigo
no tèu coração;
andai abr^e-me o $eto;
eu sòu a ãndorinhãf
que ¥dg6 Soàinka
em negra solidão*
Minha alma em doce extasit
está mergulhada,
se a V07 maguada
Ihe/ajes sentir:
ser-te-ha uma cythara
o meu duro peito,
íe estiver a/eito
a V3r^te sorrir.
Teu canto módulo
desprende n*est*horâ
ó ave canora,
é btando caMots
Teu suave murmúrio
semelha o das aguas,
dii^endo áç fragoas
segredos d* amor.
Oh! vnn, p<mh^ quérulor
vòa a meu regaço,
prende-me no laço
dt teu cãHa mtm
Em sonho appareee^4ney
gemendo, amorosa,
cantando, mimosa *
teu hymno d' amor.
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AGOSTO
a^i
N'€Ste mnhô tépido,
em ledo folguedo
dir^-me-nas o segreâo-
d*essa. inspiração.
Jubiloso cântico
aqui entoaremos,
e ambinhos teremos
um só coração.
Ed tw taéemacuh^
dentro da nos&a airrut
Será paí{ e calma,
eêleste pruí^er.
Mas seja-nos bússola
durante esta vida
a estreila lupd^,
que já vês nascer.
7 — 2 — 1901.
Poeta melifluo,
e meu terno amigo,
oh! Dá-me um abrigo
no teu coração;
anda, abre teu peito
a esta andorinha,
que fica sosinha^
em negra solidão.
^^Vrm^
A. D03 Santos.
25^-Qulnta-feÍra — S. Luiz Rei de França, C. da
3*^ O. e Patrono dos Terceiros secvXdiVQS.—- AbsoL gieral
para os Imt, Terceiros,
^S DUAS BOLSAS
(economia)
Para ensinar á economia praticamente a suas filhas, M.mft Cé-
contey deu a cada utna umÊt oolsa económica, onde deviam guar-
dar as mesadas para o toucador.
Maria ^nopve trrfha dtnhetr<!>, porque poqfcfrf^oMfilii^^laras
yezes 4i<egBva ao fim 4o mez com um írap^eo»
©rá tendo adoecido gravemente a visínlia Cartota^ amiga de-
dicada dos meiíHiss, mandou esta pedir uma ésmoia á csrsa*áW vi^
sinhas.
Maria, que tinha eeonamias, pediu licença á mãe para soccor-
rer a sua amiga com parte do que ella tinha poupado, accrescen-
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292 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
tando que depois ella mesma lavaria as luvas e não compraria um
novo par. Deferido.
Adélia, porém, nada possuía, e pediu á mãe lhe emprestasse
um franco, para mandar á visinha.
— Não, filha, respondeu severamente a mãe; a caridade é doce
è meritória para quem se priva do que possue para dar a quem
precisa; mas quando se gasta totalmente, como tu, não se merece o
pra:{er de fa:{er um bem.
26—® Sexta-feira— S. Jacintho, C— S. Zeferino,
Pp. M. — Lua cheia aos 25 m, da ^nankà»
/^ '--^ ^'^^''^ "~^
Os grandes futuros tém ninho na escola.
Castilho.
27 — Sabbado — S. José de Calazans, C — O B.
Timotheo de Montículo, C. da i.* O.— S. Rufo, B. M.
A teima não é mais que a energia da tolice.
Descuret.
2B — Domirrgo (U."" depois do Pentecostes) — St.*"
Agostinho, IJ. C. e Dr. — S. Hermes,^ }A,.—Ind. P/m. para
os Irm, da Conceição., /
-Í3-
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ÁGÒSTÒ ' 293
Veneza
(a. um amigo)
Vinte e seis annos .,, do viver escasso,
Fis um pedaço, que lá fica atra:^ ;
Curto é verdade, mas da curta vida
Para a medida, grande peso fa^.
Que em vida assim, cheia de mil enganos.
Vinte e seis annos, sempre se háo-de amar;
Não só porque esta quadra seja bella,
Mas é porque ella não pod'ra voltar,
£sse tempo do passado^
Ou vem ou mal empregado,
Passou^e^ não volta mais,
(hide estão trabalhos tantos.
Onde essas, dores e prantos,
Onde os suspiros e ais?.
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294 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Tudo lá voe com o vanto
Tudo, tudo n*um momento
O vorã!^ tempo deatroe.
Mas que digo?. . . da virtude
Vem este meu canto rude,
Celebrar hoje um heroe,
E o heroe assim chamado,
Não chora lá do passado,
O tempo aiie lhe fugiu;
Porque elte ó um brado constante
Que lhe está lembrando ovante
caminho que seguiu.
1898.
Sempre alegre e sempre forte,
Não tem receio da morte.
Porque soube viver bem ;
Nem desmaia na carreira.
Segue a esperança lisongeira.
Que lhe aponta para lem.
J. J. Souza Martins.
29— Segunda-feira— DegoUação de S. João Ba-
ptista — St.* Sabina, M. — S. Basilisca M. Portuguesa.
— Um allemfio pachorrento teve a lembrança de sommar to-
dos os desastres de que, durante um anno, teve noticia; depois^
munido d*esse numero cjue era o 9:948, procurou os dias da sema-
na responsáveis pelo maior numero de desastres. E encontrou que
a sexta feira era extremamente cakimniada'; é um dos dias mais
innocentes e inoffensivos da semana.
Desconfiemos, por exemplo, da segunda ilsira que figura á
frente de todos com a bonita somnia de 1:647 deàastres.
Quanto ao domingo, entce cavalleinos, wdoci^çdistas, caçado*
res e outros não chegam a um notai de âoo.
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yWGOSTO 295
30 — Terça-feira — -St.* Rosa de Lima, V. ~S. Fé-
lix e Comp., Mm.
Polemica religiosa
TLDO ACABA COM A MORTE
Quem fallar assim náo se distingue d' um animal senão pela
pelle e figura ; vale menos que um animal porque este corre mais,
vê mais longe, exige menos cuidados.
Não; em nós ha algo mais que matéria, porque pensamos,
porque raciocinamos, porque inventamos, porque progredimos.
Não temos alma, tudo acaba com a morte.
Meu Deus! A que terríveis, e espantosas consequências nos
arrastaria este principio I Se assim ÍDsse, estavam legitimados os
maiores, e mais horrorosos crimes.
Vós que lamentaes a perda d'um amigo virtuoso, dizia Robes-
pierre n'um discurso celebre, gostaes de pensar que a sua mais
bella parte escapou á morte 1
«Vós que choraes sobre a tumba d'um filho, d'uma esposa,
podeis sentir consolação, lembrando-vos que d'elles nada resta se-
não pó?»
Quem, deante dos despojos inanimados d'um ser adorado, será
capaz de exclamar : Deus, justiça, amor, immortalidade, são pala-
vras vazias de sentido !»
Assim dizia O. Feuillet — auctor moderno depois da morte
d^uma pes$oa querida.
^>\\\\\Y>lMMlr^l^MBBL\\\\v. ;>
31 — Quarta-feira — S. Raymundo Nonato, C. e
Cardeal.
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296 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
UMA HISTORIA JAPOHEZA
!m|a no Japão um peixe chamado /m^m que é excellente mas que-
^i nem sempre se pode comer porque tem a particularidade des-
agradável de ser venenoso em certa epocha do anno. E o peor é
que se não determina com certeza quando principia a epocha em
que elle é venenoso nem quando acaba.
Sabe-se que é do verão mas nro se sabe mais nada.
Um dia certo japonez muito rico que tinha a jantar muitos
convidados recebe de presente um magnifico fugu. Mostra-ojás
visitas, lamentando não saber se seria perigoso comel-o ou não-
nem como verifitar o perigo. Uma das visitas lembra entáó que
alli passa todos os dias um mendigo ; cozinha-se o fúgu muito bem
dá-se um pedaço ao pobre e como o veneno d'esse peixe mata em
duas horas espera-se o resultado.
A ideia foi acolhida com enthusiasmo e logo que appareceu o
mendigo, deram-lhe uma boa porção de peixe, com um pão que
elle foi comer para um canto. Da janella o ricasso e as visitas se-
guiam com anciedade todos os movimentos do pobre.
Passam duas, passam três, passam quatro horas e elle cada
vez mais cheio de vida.
Não ha perigo decididamente. Vamos ao fugu. E dito e feito
saltam no petisco acompanhando-o de uns copinhos de saké licor
bastante alcoólico muito usado ali. No fim da refeição um pouco
exaltados pelas libações lembram-se de contar ao mendigo a par-
tida que lhe haviam feito. Elle ouve-os com todo o socego e no fim
diz-lhes :
— Ah eu logo conheci o peixe pelo cheiro e percebi a ideia
com que m'o davam. Por isso só comi o pão, o fugu guardei-o
aqui na sacola. Agora estou á espera de vêr o effeito que elle lhes
produz e se d'aqui a duas horas não estiverem mortos, salto n'elle
que é um regalo...
-íH:if^^5^-5i$G«
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Setembro 30 Dias
No minguante e na lua nova semeia pecegos,
ervilhas, favas, tremoços e couves; ^ ^
faz os alporques dos craveiros, estruma as terras e abre minas j
e poços. No crescente vindima e seca uvas.
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298 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
1 — Quinta-feira — A B. Isabel (irmã de S. Luz,
rei de França), V., da 2.* O.— St.° Egydio, Abb.— Os Ss,
Doze Irmãos, Mm. — S. Constâncio, B. — N'este dia nasce
o sol ás 5 k, e 31 m,y e põe-se ás 6 h. e 2Ò m»
Alameda do Monte da FalperRA
C o
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Na Falperra
alperra! Legendaria estancia
que hz acuiir á mente negras
tragedias sinistras, porque a
tradicçco conta scenas canibaes
de bandidos que, solapados na
extens£0 do ermo, assaltavam
oò viandantes a ferro e fogo.
E, no espirito de quem
nunca logrou ver isto, dese-
nha-se .então a Falperra medo-
nha serrania pavorosa de bre-
nhas espei^sas entre penedias
escarpadas; picos soberbos;
barrancos profundos; abysmos
insondáveis; precipicios tene-
brosos.
ConseguintemGnte inna-
cessivel, intransitável, obscuro
e selvagem lugar abandonada, á hiwa em ^ue a luz do progresso se
esbate límpida, clareando íi terra, bienefiçiando omnimo lamente .a
sociedade.
Completo eng^ao^
A Falperra não é o que na phantasia assim se emmoldura.
. Herculano, sobre a reputaçéo terrorista de que esta formosa
altura goza, conta no Panorama, que, ao passar aqui, lhe deu von-
tade de « metter na mala a Falperra >» e de a levar para Lisboa a
£m de ter a cada motnoQto a. representarão clara do c^q^.e são e o
4ue vakm .as respunaçiSfus i^m Portugal . . .. »
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300 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Sobre isso, falia com saber de experiência feito quem estas li-
nhas escreve, desataviadas, insulsas.
Ha tempo que estas carvalheiras annosas, ramalhando confu-
sas em dias e noites hibernaes, gemem aos meus ouvidos a litania
das solidões.
E, para mim, sedento da paz embaladora que se goza longe do
barulho estonteante dos povoados; para mim, avesso ás bisbilho-
tices vãs dos pequenos centros ociosos; para mim que vivia na as-
piração anciosa da melancolia do ern^o, foi a quadra mais triste do
anno — o inverno, a que mais doces enlevos trouxe á minha alma
sequiosa de tranquilidade, anhelante de imperturbável socego.
Mas, eu, que idealisava na Falperra um eremitério encantado
onde reconfortasse o organisn:o com ar puro e, no refugio das in-
constancias da vida, temperasse o caracter na inquebrantável cons-
tância da meditação e desprezo das vaidades do século, avivasse a
intelligencia e enrigecesse a vontade para a lucta que me propuz
travar braço a braço com o mundo, eu vi desfeito o meu ideal
querido.
A Falperra, longe de ser o monstro horrendo que se afigura a
muitos, é um sitio ameno, cheio de paisagens deliciosas, com re-
cortes surprehendentes por onde se côa a luz em mil gradações
cambiantes, d*onde se desfructam panoramas bellissimos, de lon-
ginquos e largos horisontes, variados conforme as ondulações e
outros acc"dentes da montanha, que na sua maior altitude mede
562 metros.
Sendo assim aprazivel, embriaçantemente delicioso: cheio de
luz e ar terrificante, lavado e sadio este arrabalde sobranceiro á
augusta Braga, não admira que, nos dias de sol de primavera e ve-
rão enxameiem por aqui excursionistas em cavalhadas, em trens e
a pé, a toda a hora, constantemente: — coUegiaes que põem notas
de alegria ignorada n'este remanso largo, correndo á vontade e
bebenao, soffr.ego% o ar bom do deserto, no fraterno convívio
descuidado da linda quadra de illusóes ; proletários ique nos dias de
descanço fogem ao surdo rumor que os atormenta nas fabricas e
'procuram este agreste e confortável retiro; a elite que traz varia-
dos tons elegantes e prazenteiros:, eth piqueniques ruidosos, tudo
fáz a transformação do eremitterío sonhado em colmeia agitada, bo-
liçosa, onde zumbe a inquieta e variada coterie mundana fugida
dos salões, dos theatros, dos cafés e dos clubs.
"''<«■
No alto do monte, que é em forma de esplanada, anda a mesa
da Irmandade de St.» Maria Magdaléna construindo um hotelsobre
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SETEMmO 3oi
os escombros do antigo convento fundado por frei António de Je-
sus, celebre franciscano qu2 faUeceu em Mofreita em 1841.
AqueUas apertadas cel as m^tnachaes con as suas janellas a
olhar para o nascente ; os corredores e s ilóes onde entrava a luz
velada, serena, com medo de prof inar o silencio religioso d'aquel-
le recinto, tudo, tudo táo sugge.^tivo de piedade e crença, eaoci-
navd a alma do fora^^teiro, deixandoo. por ventura menos humano
— porque lhe infundia á idcfa do Aleiji na consid^eracáb intensa do
yanitas vanitatum de Salomão — deixvmdo o menos humano, quer
dizer menos carnal, menos preso á terra, enlevava-o na contem-
plação d* um mundo supra sen>.ivel, nrendii-o mais £0 Creador,
aproximava-o mais de Deus, enchendo-lhe miús e mais o coração
— sò com a idéa da austeridade dos moig3s que suggeria logo a de
quanto são cadycase vás as coifas do mundp, de apparencias faus-
tosas', deslumbrantes, mas ephemeras..
Porem, d'isto nada existe iá.
A. rajada procelloía do gosto moderno profanou, destruiu
aquella memoria que, mesmo bitiia do tempo, abalada, enegreçi-
íla, musgo^i,. «havia de ser agradável, de um agrado delicio o, en-
tranho é ííalutar ás almas que possuem o mysterioso dom cpiimu-
jiicdtivo da svmpa^thiiíiffecLUOsa,. terna pelas coisas venerandas.
Assim, dentro em poaco, favorecido este pittoresco local por
commodas vias de co.-nmuniciçao com a. ci.i^de e concluidas as
obras em projecto :-^8u(?stiUiidos o> enca^átófe e as bellezas monte-
sinhas: o aroma das flores agrestes, o susí^urrodas arvores e das
aguas correntes, a luz pieiga. e serena do luar é das estrelias pe-
los elegantes globos luminosas e arcos voltaicos, pelos fons, do
pianno, pelas verduras desmaiadas da> plantas de estufa, peloi tó«-
doirs cheioi de esquisitas essenciasíirtiticiaès: — subst tuída a na-
tureza pela arte, dentro em pojo a Falperra será um dos mais
bellos refúgios vernaes e estivo i di predilecção do mundo elegan-
te e tourifite.
O brilho de alegrias falsas ha-de aíjui ostentar^^e a par de ri-
diculas velleidadeSfc \ . , - .. - ,.. *^ .
Humorismo^ lúçant^^ s^diço5 biode profanar /estes lugares
saúdo os. i
. E :a alma anciosa de paz ha-de fugir d'aqui batendo as azas
como pomba amedrontada pelos negrores do escarcéo...
P. Silva Gonçalves.
2 — SextaTÍeira—St.'' Estevam, rei de Hungria.— S.
Àròcardo, C. . "" .
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3ô» ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
1 IMO DE PMiRA mnm t m pastor mmm ' '
— Então tu acreditas que na Hóstia está Deus em corpo e alma?
— Creio, sim, senhor.
— Ora dize-me. Sabes o Padre Nosso?
— Sim, senh<)r.
— Dize lá.
— Padre Nosso que estaes no céo. . .
— Entáo já vês que, se está nos céos, não pôde estar na Hóstia»
O pequeno ficou um boccado perplexo, mas logo replicou :
— O senhor sabe ô Credo .^
— Sei, já t*o digo: Creio em Deus Padre, todo poderoso. . .
— Basta. Que quer dizer : Todo poderoso?
— Que pôde fazer tudo o que quizer.
— Então se Deus quizer estar ria Hostiá sem sair do céo, tam-
bém o poderá fazer.
O pastor deu o dialogo por terminado e continuou o sei^ ca^
minho. •
--•55 <^
3 — C Sabbado— Os Bb. João da Pemsia e Pedro
áe Xaxíiferrato, Mm., da i.* O.— St.** Eufemia, V. M.—
Qujprta minguante ás 2 k, e 22 m. da ^nanhã.
«Os annos são marcos na senda da vida,
Nos qua€» o viajante costuma pttar
E 08 olhos volvendo na estrada cofTvitt,
As si:eAaB passadas làe apra^ recordar.»
>: ^ HíSPBRtTANOr
4 — Domingo — Santa Rosa de Viterbo, V., da 3."-
0w--^-St.* Gandiida.~/«rf.- Pien, nas igrejas fi^tínêís mmLi ík
ind. plen, para os Irm, Terceiros,
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SETEMBRO 3o3
O DUELLO
Paulo de Cassagnac, é um dueWistâ pratico: inúmeras ve-
^JÍo»2Cs se tem batido em desafios d*este género.
"^^ Interrogado recentemente por M. Chanvelin, a emittir
seu autorisado parecer a respeito do procedimento do conde de El-*
bée, que desafiado pelo dito Chanvelin, se negara a acceitar orepto,
alegando sua qualidade de catholico ; respondeu-lhe Cassagnac :
«Estou em que me permittireis, não me intrometter n*um as-
sumpto que me não viza : comtudo não vos negarei a minha opi-
nião acerca do desafio em geral.
«Considero-o um absurdo e algumas vezes uma iniquidade ; e
êstotí betn longe de me vangloriar a*este absurdo, sob o ponto de
vista social e principalmente leligioso ; apezar de não poucas vezes
tér n'elle incorrido: e talvez, pelo facto mesmo do conde se ter
negado a acceitar vosso repto, mostrando um valor, do qual diffi-
cilmértre tne julgo capaz, é que vos não nego a minha opinião sin-
'cera.
«Devemos sempre admirar nos outros ainda aquillo que nos
não sentimos capazes de imitar, quando mesmo a isso nos impeça
o bom senso e as crenças religiosas.»
Qu2 lógica a dos lar^antes dos dudlos !
5 — Segunda-feira — O B. Gentil de Mathelica, M.,
da O. — St.** Antonino, M.
—A parte mais nobre e mais alta do ser humano, a alma,
também padece (e betíí cruéis), aâ suas fomes, as suassedesvas9tn(&
dores, os seus desamparos, as suas nudezas, os seus captiveiroi.^^
Visconde de CaaiiUio (Júlio),
6— Terca-fetra— Os Sts. Cyrillo t Methodlo, Ôb.
Ce.— O B. Viceate d*Aquina.
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3o4
ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Do Igitim : O mau quando pretende passar por bom, torna-;
péssimo.
7 — Quarta-feira — S. Lourenço Justiniano, B. C-
S. João, M.— St.*^ Anastácio, M.
Contra as moscas. — Os talhos dos marchantes de Genebra es-
tão quasi sempre abertos, vendo-se nas paredes exteriores grande
quantidade de moscas, mas nem uma so dentro dos referidos es-
tabelecimentos.
Deve-se isto ao facto dos marchantes terem o interior dos ta-
lhos pintado com óleo de bagas de louro.
A mesma receita é applicada para evitar que as moscas poi-
sem nas molduras dos espelhos, quadros, etc.
87— >í< >í< Qtlinta-f eira -—Natividade DE No$sa
Senhora. — St.° Adriano, M. — St* Regina, V. — Ind. plen.
para os Irm, Terceiros— para os da Conceição — de S. yo^
sé — do Rasario Vivo — da Confraria do Rosário.
%\it Sífiioa
Sahe^ ó Rainha
Mãe dos peçcadores
Doce esperança minha
J^*este mar de dores.
Da^e-^fw a bonança
Sede meu auxilio*
Sede minha esperança
N'este meu exilio.
Dos mortaes abrigo
N'este mar profundo
Livra-me do p'rigo
D*esne triste mundo.
Ouve, Mãe Clemente
Oi*vj id do céa
Esta prece ardente
jyeHe filho teu.
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SETEMBRO
3o5
^Strella matutina
Ouve quem te implora
-Guia na campina
Quem pranteia e chora.
A mim que entre escolhos
Lucto so na d)r
Mãe' volve esses olhos
Só de pasf, de amor. i
' Onmtdo- finde o dia
D'esta escassa lu:ç
Mostra-me ó Maria
Esse teu Jesus.
Mãe clemente e pia
Roga a Deus por mim
Que eu consiga um dia
Meu ultimo fim.
C. Rodrigues,
9 — • Sexta-feira- A B. Serafina Sforzia, Viuva, da
2,^ O. — S. Georgino, M. — S. Sérgio, Pp. — Ltia nova ás 8
Jt. e 6 m. da tarde.
10 — Sabba^O -S. Nicolau Tolentino, C— S. Pa-
ciente.
O olho do dono engorda o c avalio.
O pé do dono é o melhor estrume.
A boa diligencia é mãe da boa ventura.
11 — Domingo — 3t.° Afforso Maiia de Ligorio -Ind.
Flen, para o Rosaria Vivo.
' '^C *^ -
20
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3o5 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Estudos physionomicos
\
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SETEMBRO 3ô7
8OCC0RR0 MUTUO
POR Camillo Castello Branco
O incrédulo do christianismo e da associação, ao passar na sui
carruagem, assaltado de cuidados, pela porta do operário, sente-se
affrontado pelas risadas alegres, que lá vão dentro d*aquelle sotáo
raso com o chão. Tal honem não possue o capital que mais feli-
cidade produz. Não sabe que a religião e o soccorro mutuo são o
incentivo do trabalho. Com prebende apenas, gui o trabalho é o
capital único do proletário. Julga elle que o artifice, alquebrado de
yigor^ no fim do dia atira com o corpo ás palhas do repouso para
mentir no somno ao3 fíagellos do dii futuro. Não sabe que o amor
em todo o tempo, em todas as idades, e em toda a hora do dia, é
quasi um exclusivo do pobre. Não sabe que o artista é pae, é es^
poso, é christão e possue um thesòuro d^aíTectos que o deixam á
beira do tumulo para entrarem no seio de Deus, como paga de u ii
empréstimo contrahido para adoçar as amarguras da terra. Não
sabe aue o so:corro mu:uo derivado do trabalho faz a tranquilli-
dade do homem laborioso.
■^m^^
12 — Segunda-feira — Os Ss. Apoliinario e 39 CoKip.,
Mm., da i.* O., no Japão. — St.* Anta, V. M.— S'. Júven-
cio, B.
^^^^^
A MULHER
tUEM é essa nobre figura, que depois de ter animado com seu
sangue o recem-nascido, o cria, o acaricia, lhe sorri, e o en-
sina a balbucear, a caminhar e a orar ?
E* a mulher mãe, '
Quem é essa bella figura, graciosa e embellezada no espirito e
no corpo, cuja perfeição revela a Omnipotencii da creaçao; essa
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3o8 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
alma pura, que ás vezes sacrifica seus impulsos naturaes, porque crê
que este sacrifício lhe é necessário para alcançar a perfeição?
E* a mulher virgem.
Quem é essa sublime figura, terna companheira do homem na
adversidade e na ventura, que o aconselha,- guia, alenta, commo-
ve, sujeita e ama, que vive n'elle e para elle, cheia de amor e abne-
gação?
E* a mulher ertpona.
Quem é essa affectuosa figura, que se instala á cabeceira da
ancião, allivia suas dores, suaviza suas largas horas de soífrimen to,
suppre seus olhos, que já não vêem, seus ojvidos qu3 já não o-i-
vem, sua bo:ca, que já não fala?
E* a mulher solteira.
Quem é essa heróica figura, que atravessa os campos da bata-
lha, semelhante ao anjo da paz, para recolher os moribundos, sem
reparar nas balas que sibilam, nem no canhão que ruge ; essa fi-
gura c|ue sempre se acha onde ha enfermos a cuidar, meninos a
instruir, dores a mitigar e lagrimas a limpar?
E' a mulher irmã de Caridade.
Quem é essa perfumada fiôr, frágil, delicada, angélica; essa
effigie venerável que adquire pela fé a força sobrenatural, e eatôa
cânticos ao Senhor no meio dos mais cruéis supplicios, sabenda
morrer por seu divino Mestre, afim de renascer para a eternidade?
E* a mulher martyr.
Quem é a uni:a privilegiada que um Deu^ se dignou fazer con-
substancial sua; a figura que esse mesmo Deus, ao fazer-se ho-
rnem, e por uma anthitesis mysteriosa, escolheu de toda a huma-
nidade para conceder-lhe a suprema honra de ser filha, mãe e es-
posa da divindade ?
E* a Mulher por excellencia.
13— Terça-felra— St.^ Verónica de Juliani, V., da
2.* O. — S. Filippe, M. — Ind, plen. para os Irm, Terceiros.
»
O homem, ainda o mais depravado pelos prejuizos e falsidades
doeste mundo, nem sempre se dedigna de o avir filar da felicidade
que dão a natureza e a virtude.
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SETEMBRO Sog
14 — Quarta-feira — Exaltação da Santa Cruz. —
S. Comelio, P. — Ind. plen, para os irntàos da Conceição.
^^1H>
^ @5^^í?2
Estrellas
singelas,
luzeiros
fagueiros
Esplendidos orbes qu'o mundo aclaraes,
Desertos e mares, florestas vivazes
Montanhas audazes qu'o sol rastejaes!
campinas
divinas
cavernas
eternasi ^
extensos
espaços
celestes
rochedos
b r avios !
Abysmos
sombrios!
Ergástulos frios!
Infernos terrestes!
Sepulchros e berços, mendigos e grandes!
Curvae-vos ao vulto sublime da Cruz!
Só ella nos mostra da gloria o caminho I
Só ella nos fala das leis de Jesus!
15 — Quinta-feira — S. Nicomedes, M. — S. Domingos
em Soriano. — St.* Militana, M.
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3 IO ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
O ALCAHCE OA VOZ HOMAIA
Por algumas experiências feitas no Colorado, provou-se que
a voz humana propaga-se a uma distancia de 3o kilometros.
Um homem coUocado no cimo d*uma montanha, gritou o
nome de «Eob», e ouviu-se distinctamente a uma distancia de 4
léguas e meia.
M?.s o alcance da voz humana não é uniformie : varia segundo
as regiões e com o clima. Foi así^im que o tenente Foster membro
d'uma expedição ao pólo Norte, fallou com um companneiro qu3
estava a 2 kilometros de distancia.
Sir John Franklim sustenta a opinião de que a voz humana
não pôde ser ouvida mais que a Soo metros.
O doutor Young diz que em Gibraltar a voz humana estende-
se a 16 kilometros. Na agua, porém, a voz humana é ouvida a 140
kilometros.
16 — Sexta-feira — Os Ss. Comello e Cypriano, Mm.
— St.* Euphemia e Comp., Mm.
Quem nãofa:{ o que aconselha: O monarcha não altera
Ao que mente se assemelha, A lei da morte que o espera.
Na sabença que não^ crê Quem não sonda o pó da ceva
Mora o cego que não vê. Não segue o sol da lei nova.
Alves de Almeida.
dc
17 — Sabbado — As Cinco Chagas de N. Seraphico
Padre S. FRANCISCO.— S. Pedro Arbues, M.— St.* Corn-
ija, V. M. — (Ind, Plen. da O, e Abs, Ger, para os Tercei"
ros Franciscanos),
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SETEMBRO 3ii
VISÃO D,E JESUS
E dezembro ainda; c'rôa o Burgo a neve,
Aias Jesus dorme, dorme ledo e bello
no colo de Maria ; a brisa em selo
roça-lhe as faces puras ao de iev3,
Jesus sorrira emjim, d* um sonho em flor,
e em dezembro tao frio sente calma!...
Ante a visão^ que lhe revoa na alma,
um heroe divisou roubar-lhe amor.
No Fmpyreo resôam ledos hvmnos
de gloria e pa^ sobre o ^a^ai da serra;
quando elle viu a lu:ç, também na terra,
Jesus derrama cânticos divinos.
Em vil enxerga, repoisou, nasceu:
e em vida pela Cru\ enamorado,
com Jesus foi também crucificado;
e o novo Seraphim voou, morreu.
Quem não viu o tugúrio da Judeia
onde Jesus sonhou no heroe de amor;
quem não viu seu Calvário de dor,
corra d Umbria, ao Alverne; é li a Judeia.
P. Freitas.
18 — Domingo — S, José de Cupertino, C, da
Ordem dos Frades Menores Conventuaes. — Ind. Plen.
para os Irm. Terceiros.
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3 12 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Vingança
Um dia um menino da missão, discutindo com outro, cha—
mou-lhe hippopotamo. Achando-?.e gravemente offendido, o outro
não respondeu nada, mas em presença do seu insultador pega
d'uma navalha, põe o index na soleira da porta, e diz :
«Estamos em casa do Padre, olha.»
E d'uma só vez cortou o index e veiu pacificamente pedir ao
Padre um remédio para cicatrizar a ferida.
Ao vêl-p exclamou o Padre : «Desgraçado, quem te fez isso?»
Fui eu, respondeu-ihe. «Escuta : disseste que não era bom dar fa-
cadas nos outros, como acontece nas aldeias pagãs; também dis-
seste que era mau bater nos companheiros. Aquelle chamou-me-
hippopotamo. Que outra cousa podia eu fazer para lhe provar
quanto sentia a aífronta que elle me fez?»
19 — Segunda-feira — S. Januário e Comp. Mm*
-St.* Constança, M.
Voz mysteriosa
Na Allemanha, um homem cahiu em peccado grave. D*um lado
a vergonha que o impedia de se confessar ; d'outro os i-emorsos,
que não podia supportar, resolveu deitar-se a afogar; mas chega-
do á margem do rio náo ousou precipitar-se, e pediu a Deus com
effusão de lagrimas que lhe perdoasse sem confissão. Uma noite
durante o somno, sentiu bater no hombro. e ouviu uma voz .que
lhe dizia: Vae-te confessar. No desígnio de lhe obedecer, foi â
egreja; mas não se confessou. Na noite seguinte, ouviu a mesma
voz. Voltou á egreja; mas sempre embaraçado pelo temor: antes
quero morrer, disse, que confessar este peccado. Entretanto, antes
ae sair, foi orar deante d*uma imagem de Maria. Apenas se ajoe-
lhou sentiu-se logo mudado; levantou-se, chamou um padre e fez
confíss£o inteira de seus peccados com grande abundância de la-
grimas; e depois confessou que a satisfação que sentira era sup)e-
rior á que experimentaria se possuísse todo o ouro da terra.
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SETEMBRO 3i3
20 — Terça-feira — St.° Eustachio e Comp., Mm.
Duelos estava a banhar-se no Sen na. Passou uma senhora
n'um trem. Este yolta-se e a senhora enche-se de lama. Duelos
corre a ella, estende a máò para a ajudar a levantar, dizendo-lhe:
«Minha senhora, estou sem luvas, mas V. Ex.a deeerto des-
culpa esta incivilidade.»
21 — Quaria-ieira— (Têmporas com jejum) — S. Ma-
theus, Ap. e Ev. — S. Ephigenia. — Ind. plen. da Bulia.
A LIBERDADE
«Palavra magica que transporta as multidões, a liberdade ráo
se tornou uma realidade senão pelo Evangelho.
«Foi Jesus Christo, diz Lacordaire, que introduziu no mundo
a egualdade civil, e com ella a liberdade politiea, que não é senão
uma partieipação de cada povo no seu governo.»
Mons. Parisis diz: «só a Egreja pede liberdade para todos,
porque só a Egreja nada tem a temer d*clla, e d*ella tudo pode es-
perar.»
Em todas as plagas em que a Egreja se restabelece, o seu pri-
meiro cuidado é proclamar a liberdade, e egualdade dos homens,
fritar a todos que o Evangelho os libertou para formar uma gran-
e familia de irmãos. Emquanto a voz da Egreja se ouviu nunca
o povo foi opprimido.»
Leon Harmel.
22 — Quinta-felra — S. Thomaz de Villanova, B.,
C — S. Maurício e Comp., Mm.
^=^yp^
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3 14 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
jj^pp^
O Na^arenOf o santo Crucifrario,
a transbordar de mel o coração,
ia avançando ao cume do Calvário,
Alli affixo d cru^ prometie d humanidade
restar perpetuamnte o emblema da ami^^ade.
E foi, que o sangue aue verteu y di:{ia:
ksou vosso amigo, on homens, porque um dia
«desci dos céos onde era o rei potente,
«ao virginal sacrário de Maria,
«desci do tudo ao nada, ao nada, ao pó,
«para de vós que tantos éreis, tantos,
«fa^er apenas um coração só,
«um jardim bello com flores e cantos!»
Bem hajas, oh divino sangue de Deus,
que transformaste a treva em rebrilhante lu:^l
Mas hoje tudoja^ no feio esquecimento,
ninguém se lembra jd, que o Martyr se finou
para fa:{er da terra um áureo firmamento
onde essa Estrella santa que uma ve:{ brilhou,
a todos luzirá eternamente,
(Extracto)
Emílio Augusto Conde Robertine.
23 — Sexta-feíra — Invenção do Corpo de St.* Cla-
ra, V., da 2.* O.— St.* Tecla, V. M.—índ. Plen. da Bulia.
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SETEMBRO 3i5
MEIO DE ENCONTRAR AGUA
A Gaveta Agrícola informa que ha um meio de conhecer a
-existência da agua em um terreno qualquer e a que profundidade,
accrescentando que a melhor época de fazer a experiência é quan-
do a terra nf o estiver demasiadamente secca, nem muito húmida.
A formula é a seguinte, que otferecenros aos lavradores, que luctam
com a falta d*este elemento creador : — Juntem-se dez grammes de
enxofre, cem de verdeto, egual porção de cil viva e outro tanto
de incenso branco; reduza-se tudo a pó, misture-se bem e lan-
ce-se n'um vaso de barro novo e vidrado, pese-se e enterre-se
n'uma cova que tenha trinta centimetros de profundidade.
Passadas 24 horas, tire-se e pese-se outra vez ; se houver di-
minuição de pezo, não existe agua ali ; mas dando-se augmento, é
este prova iníVllivel de que se encontrará agua. Se o augmento for
de 40 grammas, estará a agua a 21 metros de profundilade, se fôr
de 80, achrr-re-ha a 14, se de [20, a ro, se de 160, a 7, e se fôr de
1200 grammas, a agui apparecerá a 3 metros.
V/ yU .
24 — f) Sabbado — S. Pacifico de S. Severino, C.
da I.* O. — S. Geraldo, B. M. — Ind, Plen, nas Igrejas
fianciscanas -ind, plen, da Biilla—Lzia cheia ds $ L e 13
min, da tarde,
, Para sua emenda deve ter cada qual de nós ou um grande
amigo ou um grande inimigo. Este ros descobre as filhas e aquel-
le não as approva.
Amador Arbaes.
t»ii«ii»t ■ ■ ■
25 — Domingo —Nossa Senhora das Mercês. — S.
Firmino, B. M. — St."* Herculano, soldado, M. — Começa a
novena ds S. Francisco a que estdo concedidas muitas in-
dulgências — Ind, plen, para o Rosário Vívj,
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3r6 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
w:^^'^^^mm-^
Era o fim do banquete; e n'ir,to entra na sala
esta mulher formos^a, cuja fronte ailicta
se verga pela djr^ mas- cuja alma bemuta
sorri de santo amor, que o coração lhe embala.
Pisa os fitos tapetes, ma^ não olha a gala;
entre os demais convivas logo a Jesus fita,
e passa, como um anjo, em anciã infinita,
cabellos soltos, olhos tristes, muda a /alia,
E emquanto o Phariseu, lingua de fé, murmura,
ella chora contricta aos pés do Salvador, . .
Enxuga-os com as tranças. . . beija-os com ternura;
E o Christo augusto e santo, á vista de tal dor,
sorri enternecido, e di:{4he com doçura :
«mulher, eu te perdoo^ immenso é teu amor!»
P. Nunes Tavares.
26^-Segunda-feira — A B. Luzia de Calatajerone,.
V., da 3.* O. — Os St."*** Cypriano e Justina, Mm.
— Em que condições hvgienicas se encontra esta rua! em
óptimas— contesta o dono de uma casa que tinha quartos para
alugar.— Em vinte anros não morreu aqui senão uma pessoa. —
Quem? Um medico. — E de que morreu? — De fomel
27 — Terça-felra — S. Elzeariof, C, da 3.* O.— S-
João Marcos. B., M. — Ind. Plen. para os Irm. Terceiros.
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SETEMBRO ' 3 1.7
S. Eltearjo e S. Delfina
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3 18 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
O X.A.-R IDOJS^CESTXOO
Um esforço devem empregar to Aos os homens de boa vonta-
de, é reorganisar a fimilia, reconstituir o lar. A familia, o lar, neo
serão o qíie podem e devem ser emquinto a mãe passar o dia na
fabrica oa na officina.
Para obstar a este mal, teem-se creado creches, azylo^, pa-
tronatos, e oucras obras; mas, mais vale, diz o abbade Nandet^
permictir a dez mães quê cumpram seu dever em casa, que guar-
dar na creche os filaos de vinte.
Injustiça social. Nós cooperamos de vontade na injustiça so-
cial por negligencia ou coatempori>açco. «Assim, pensamos noi
carregadores, e outros empregados do correio, quando pomos nas
caixas as nosssa cartas e encommendas .'' Que precauções tomamos
para evitar, na medida do po^sivel, augmentar o trabalho do do-
mingo? A questão de saber se o exemplo será seguido pouco im-
porta; o qu3 importa é cumprir co.ai o dever.»
(Abbade Nandet).
)0<
Um interessante episodio
(com vista â imprensa)
tUTTEMBERG passa commumentc por in-
ventor da imprensa. Não ha quem des-
"^ ' conheça o grande ascendente para que
era fadada tão prestante invenção, e o mui-
to, que devia actuar nos costumes do povo.
Um jornal pode ser foco de grandes bens,
mes pode cutrosim (e uma lamentável ex-
periência rol-o comprova) implantar os
germens da imrr oralidade, que arruinam
tantos espiritos. Não ha negal-o.
1 ois conta-5e um bello episodio, que
demos a titulo de curiosidade, o qual acom-
panhou o invento, que dizemos imprensa.
Guttemherg embebido na sua obra col-
lossal, passava roites e dias inteiros na
composiçco dos tvpos. Um dia, era noite
morta e adeantada, que estava elle traba-
lhando despreoccupadamente, tocou alguém
á campainha. Abriu, e deparou-se^lhe um
jovem, que, a julgar celas appafencias, não
Typo mexicano (vc^Ld.dor ^^^^^ ^^^^^ ^^,1^^^^ ™ ^ <^^"^0' ™^^,f
dhgua) era velho, velho. . . Fizeram-se os cumpn-
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SETEMBRO 3 19
mentos do estylo, (o tal jovem-velho conhecia, de feito, todas as
regras da etiqueta), e entraram em amigável mas animada conver-
sação.
Falou-se demoradamente de coi>as e loisas, e de modo parti-
cular do novo invento, que collo:aria Guttemberg no pantheá>da
historia, e insculpiria seu nome com cara:teres irrefragavei^ nos
fastos da so:iedade. A horas tantas metteu-se a propheta o no-
cturno visitante.
«Amigo, dizia para Gut-
temberg com ares de satisfa-
ção, tui obra é de grande e
transcendental alcance. Não
saberás talvez o bem que po-
des, e vaes incontestavelmente
fazer-me. Eu t'o explico. Te-
nho por officio caçar almas.
Até hoje têm sido poucos, pou-
quissimos até os meios, de que
poule dispor: sete pe:cado5
mortaes, uma meia duzii de
mandamentos e. . . mais nada.
Sâo^ porém, já gastos em de-
masia, uma tropa fandanga^
rota e indisciplinada; tinha
precisão de al^o mais efficaz,
e, a meu ver, nada mais pro-
fícuo e farto de praticas van-
tagens, que a obra a que tão
sabiamente pozeste mãos. Dir-
me-has mais tarde o que ha de
verdade em minhas palavras.»
No entremente; escuta-
va-o Guttemberg silencioso e
pensativo. Seu rosto alterá-
ra-se por vezes, e a medo, por
entre dentes, murmurou: '^^^ mexicano (trajo de egreja)
— Quem és.'' .
— Isso de nomes é uma accidentalidade, amigo, respondeu-lhe
o fúnebre propheta.
— Ainda não percebi bem o porquê de tua visita a estas horas
tão fora d*ellas, torna-lhe Guttemberg.
— :Sabel-o-has! mas vamos ao nosso propósito.
— «Como eu dizia és um grande amigo, que tenho, bom ou
mau grado teu. De feito, attento o meu officio de caçar almaa não
pôde ser d'outra sorte. Pois não te parece? Até aqui para fazer
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320 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
uma caçada fructuosa, era-me necessário... eu sei lá o quê?!
Agora náo preciso grandes fadigas; virá o jornalismo, que com a
rapidez do relâmpago corre mundo, o folheto, que captará os in-
cautos, as folhas soltas, que correrão velozes de mão em mâo e,
com boas artes, hão-de ir fazendo germinar as hervas do mal, e
suffo:ar as plantas virentes da virtude. Virá o romance, que, filho
bem vezes das paixões, ha-de produzir necessariamente um bem
immenso um pró da causa, que tenho a peito; fará morrer na
alma do joven inexperto o amor da verdade, e leval-o-ha a dar
largas á corrente da voluptuosidade e prazeres. Será um facto, ve-
rás. Ha, porém, um contra, um deplorável senão, que é difficil,
impoisivel mesmo, em que me pese, vencer por completo. Se a
imprensa (não sei se o propheta a chamou iá assim) está para ser-
vir-me de poderoso auxiliar, sel-o-ha também de meu mais figa-
dal inimigo da religião. No entretanto muito ha-de fazer-se.»
Guttemberg continuava cabisbaixo, e entregue a profundas co-
gitações; na solidão de sui alma passava-se o que quer que é d«
anormal e inexplicável. Com olhos desconfiados olhava o propheta
de quando em quando, e tremia. A*s furtadellas benzeu-se; o es-
tranho visitante desappareceu n'um abrir e fechar d^olhos.
Assim reza a tradicção.
Quem era? Não eoIk) diz a historia. Fica ao critério do leitor
adivinhal-o.
Para onde se sumiu? A historia cala; perguntae-o a Guttem-
berg, mas não saberá dizer-vol-o.
Quanto á prophecia está, nem é dizel-o, verificada.
Fr. Z. Gonçalves.
-«^W'^
28 — Quarta-feíra— O B. Bernardino de Feltro, C,
da I.* O.
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SETEMBRO Zzi
UM TRUC POLICIAL
^rtis^iSTA scena -çassou-se na Rússia, mas nem por isso deixa de. ser
yjãh, uma bella historia para ensinamento dos policias de vários
' — paizes.
Um homem compra um cavallo por vinte rublos, paga-o e diz
ao vendedor que o leve a casa. O vendedor assim faz, mas quando
entrega o cavallo pxige os vinte rublos allegfindo que os não recebeu.
Debalde o comprador protesta, o outro insiste e a questão vae
ao juiz da aldeia.
Este vê-se atrapalhado na decisão. Parece-lhe evidente que o
comprador pagou e que o vendedor é um patife, mas não ha provas.
— Então você affirma que pagou 05 vinte rublos?
— E* a pura verdade.
— Tem testemunhas.'*
— Não senhor.
— Tem recibo?
— Também não.
— Então tenha paciência, ficará sem o dinheiro. Eu estou con-
vencido que você tem razãOj mas é impo?sivel que o outro a não
tenha também. Talvez elle perdesse o dinheiro depois de o receber,
<que o mettesse n'algum sitio onde o não encontra. Em todo o caso
não se lhe pode valer. Mas corro você parece homem honrado a quem
hão de fazer muita falta os vinte rublos que tem de dar outra vee,
proponho que se abra entre nós uma subscripção para o indemni-
sar um pouco. Eu dou cinco rublos.
E voltando-se para o vendedor accrescentou :
— E você dá alguma coi^a?
— Dou sim, senhor, disse o homem generosamente; dou três
rublos.
E estendeu uma nota ao juiz.
Este olhou para ella, e de repente soltou um grito:
— Pouca vergonha! Esta nota é falsa. Prendam este homem!
— Falsa I exclama o homem atrapelhadissimo, não pode ser !
— E* falsa, repito.' Hei-de-o mandar para a Sibéria.
— O* se nhor juiz, eu rão sou moedeiro falso.
— Então quem lhe deu esta nota? Diga.
O homem atrapalha-se, balbucia, mas,a&íal vendo que o caso
é serio, exclama :
, — Pcis CD*a breca! Ir para a Sibéria c que não. Quem me deu
«ssa nota foi esse patife que ahi está quancío me pagou o cavallo.
O juiz tranqúillamente: . ,
21
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322 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
— Pois bem me parecia que elle já tinha pago. Podem-se ir
embora. A nota é excellente.
29 — Quinta-feira — S. Miguel ArchaT\jo.
PROVÉRBIOS DE SALOMÃO
XX— /
O preguiçoso c* o frio
não qui:{ lavrar;
em vindo o estio, ha-de em vão
ir mendigar.
A resposta doce, amai ia,
confrange a ira;
palavra dura, enfurece
a quem a ouvira.
XXIII-'24
Pae condescendente, o filho
lança em desdém,
mas o que sempre o corrige
quer-lhe o seu bem»
•*~^ç(r
P. Freitas.
30 — Sexta-feira — S. Jeionymo, C. Dr. Festa era
Belém.
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D. B08CO E i m OBRA SOCIAL
E O aIvof«cér do século XIX trou-
xe dias amargurados- á Europa^
como consequência dos prtnci*
pios proclamados pela Revolu-
ção no ultimo quartel do século
aVIII, no mead.0 do século XIX
desponta na Itália uma nova
época que trazendo á sociedade
a reforma da familia pela refor-
ma do operário christáo, nos
aponta um homem único, um
outro S. Vicente de Paulo em
todas as manifestações da cari-
dade, prevendo e remediando
todas as necessidades humanas,
pobre e soccorrendo todos os
desgraçadinhos, sem meios de
fortuna e enviando os seus mis-
sionários a todas as nações da
Europa e até á America do SuL á Terra-do-Fogo e Patagónia; este
homem, vós bem o sabeis, foi D. João Basco.
Fortalecido pelas mais abundantes bencâos do Ceu^ illumina-
do pelo fulgor das suas virtudes, o seu zelo pela gloria de Deus
não tem limites. E assim, lança os^ fundamentos d'essa admirável
obra que vem tão de molde no século XIX : a Pia Sociedade Sale-
siana, destinada a difundir-se por toda a parte.
O seu íim é o exercido das obras áe piedade e caridade epar^
ticularmente o cuidado pela educação da juventude pobre e aban-
donada, de que depende certamente o futuro feliz ou funesto da
sociedade.
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324 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Haverá obra que inspire maior sympathia que esta, — ^a de sal-
var de uma queda inevitável as pobres crianças lançadas pela igno-
rância ou pelo abandono á influencia do mal ? !
D. Posco recolhia essas crianças, fazia-lhes ensinar um officio ;
e, instruidas nos princípios da Fé, tornavam-se mais tarde homens
úteis a si e á so:iedade. Mais ainda : — fazia-lhes conhecer a belleza
immortal da sua alma feita á imagem e semelhança de Deus que
ultrajaram, sem O conhecerem*; e, por ultimo, elevava alguns
d'esses filhos do povo d mais alta das dignidades sobre a terra —
o Sacerdócio!
.D. BOSCO, FUNDADOR DOS SaLESUNOS .
Nasce^este grande apostolo a i6 d^agosto de i8i5, e, consa-
grado desde logo por sua mãe á Santissmia Virgem, manifesta
depois decidida vocação para o estado ecclesiastico, no qual entra
por disposição divina a 5 de junho de 1S41, tendo 26 ânuos de
edade. .. . • .
Destinado a visitar os preso: no cárcere de Turim, encheu-se
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SETEMBRO 325
de tal compaixão para com as creanças, tão cedo corrompidas pelo
vicio, que, ao seu espirito observador, vem logo o convencimento
de que, entrando elias na cadeia, sahiam d'ahi mais pervertidas
pejos maus exemplos.
Preoccupa-o então a idca de moralisar essas creanças, cjue in-
festavam a cidade de Turim, apartando-as do erro e conduzindo-«s
ao conhecimento e amor de Deus; e para isso, dá começo aos Ora-
tórios Festivos dos Domingos, ensinando o catecismo, o canto, e va-
riados jogos para entreter os rapazinhos.
Esta obra começou aos 8 de dezembro de 1841, e em 1847
abre um internato com 7 alumnos, posto que a escola e oratório já
eram frequentados por mais de 800 creanças I
Em 1857 contava i5 sacerdotes, seus auxiliares, que carinho-
samente havia educado desde creanças.
Em 1872 funda a Obra de Maria Auxiliadora, para estimular
e favorecer as vocações para o estado ecclesiastico.
A par d*esta obra de tanto alcance, funda a das Irmãs de Ma-
ria Auxiliadora, para arhparar as filhas do povo e depois a Obra
dos Coo-Salesianos, a que quasi todos que me escutam já perten-
cem — que é uma espécie de Ordem Terceira da mesma congrega-
ção, merecendo que Pio IX em 1874 approvasse definitivamente a
Constituição da Pia Sociedade Salesiana.
A* morte d*este venerável sacerdote contavam-se 600:000 crean-
ças educadas nos Institutos Salesianos !
O prestigio das suas virtudes vale mais que a eloquência dos
melhores discursos.
Nunca se viu homem mais admirável no amor para com as
creanças nem que soubesse attrahil-as tanto para Deus, como D.
Bosco; e por isso, quanto maior era o* abandono das mesmas crean-
ças, tanto maior a caridade e aíFecto com que as acolhia. O seu bra-
zão era a Cruz : o livro onde aprendia tanta sciencia o Crucifixo:
o logar de seu retiro o Coração de Jesus. Era padre nas horas de
trabalho e de repouso, no meio do mundo, e no retiro de seu apo-
sento, ou lendo ou estudando, ou orando, ou pregando! Operário
da vinha do Senhor, trabalhou sempre: viveu com a inteireza de sa-
cerdote e morreu com o mérito de santo!
«Deixae vir a mim as creancinhas»: Sinite párvulos venire ad
me, era a phrase divina que sempre repetia: «Uae-me almas para
Deus e ficae com o resto» — Da mihi animas, costera tolle — era a
phrase que fluia de seus lábios.
A* semelhança do Divino Mestre que para todos deixou um se-
guro asylo no seu coração quando dizia : Venite ad me omnes qut
taboratis et onerati esiis... «Vinde a mim todos os que trabalhaes
e estaes onerados. . .» D. Bosco só procura por toda a parte edifi-
car coUegios, levantar officinas e casas de abrigo para a infância
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326 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
desvalida. Morre abençoado pelo povo que lhe entregava seus filhos
. para os educar na religião e no trabalho.
Durante sua vida fundaram-se na Itália 24 casas salesianas,
duas das quaes, Alassio e Turim, tive eu a ventura de visitar na
companhia do próprio D. Eosco. Na França, desde Marselha a Pas-
de-Calais, funaaram-se 7. Os filhos de D. Èosco abriram diversas
casas, ainda na vida de seu fundador, na Hespanha, na Áustria, na
Inglaterra, na Bélgica, na Suissa e até na America do Sul.
E' que a Obra Salesiana, meus senhores, não tem outros re-
cursos alem dos que lhe são fornecidos pela caridade, nem outro
fim qu2 não seja dilatar o reinado social de Jesus Ghristo — e pre^
servar a juventude do vicio e da queda a que arrastaria fatalmente
uma educação sem Deus.
P. Sebastião Leite de Vasconcellos.
•••••••••• ••^...••*
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Outubro 31 Dias
No crescente semeia cevada, centeio, trigo, favas, ervilhas,
e coentros ; alporca os craveiros e semeia caroços
4e fructas,J pevides de arvores de espinho e linho. No minguante
recolhe frutas e milho.
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328 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
1— Sabbado — A B. Luiza de Sabóia, Viuva, da 2.*
O. — S. Remegio, B., C. — Os Sts. Veríssimo, Máxima e
Júlia, irmãos. Mm. portugueses. — N'este dia nasce o sol
ás 6 k. e IO m., e põe-se ás § k. e /)0 m.
Bruxellas— Palácio do Município
^^^l^-scvy-eJí?^
nxT'
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^-K®^®^®^®^^'^®-.®^®-.®-.®^®^®-.^^®^®^®^^)^©^©;
O ROSÁRIO
(fragmento)
m
Lbramos a historia do Posario. Estamos no século
l r^^ XIII, no século de Francisco de Assis, António de
Tf '<è>!7 Lisboa e Domingos de Gusmão. Foi a este admi-
^ (j<:P>^ <^<^Ql ravel athleta da verdade que a Virgem do Rosário
ÍQ) escolheu para o propagar pela Europa insurrecio-
b nada contra a invasão no manicheismo albigense,
que por toda a parte semeava a discórdia e a re-
volução nas ideias e nos espíritos contra a Santa
Egreja. Esta fulminava os mais terríveis anathe-
mas sobre os heresiarchas, mas nada se lograva
com repressão tão peremptória.
Os cruzados bandeavam-se unidos pela mesma bandeira para
combater a seita formidável que lavrava fundo no coração da Eu-
ropa.
Os sábios e controversistas desembainhavam a espada temivel
d'uma dialecta invencível.
O colosso, porem, não quebrava pela base; retalhado estre-
buchava ainda, e parece que revivia, quando do sangue que gol-
phava de suas veias fazia arma para salpicar as faces dos comba-
tentes.
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33o ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Furiosa como a torrente de lava infernal gue secca e estiola o
tronco da arvore que baba, a seita levara a sociedade a um rebaixa-
mento moral, insusceptivel litteralmente de reformas humanas.
Os ricos e os pobres odiavam-se ferinamente; o rico, em
quem luzia o oiro e a prata, tinha sob seu despótico império o po-
bre, o indigente para o explorar a seu talante na larga esphera
d'um feudalismo atrophiante.
Maria inventa a panacéa que ha-de curar esta enorme chaga
social. Apparece a Domingos n'uma nuvem de aspecto deslumbran-
te e falla-lhe.
Que lhe dirá ? Recruta os mais valentes soldados da Europa,
concentra as forças militares mais aguerridas, consulta os gabine-
tes do> sábios de primeira linha, invoca a vingança dos elementos
colligados contra a onda que vos submerge no canos. Diria assim.^
E' muito aquém d'isso o que a historia nos relata.
«O Domingo!: f diz Maria, prega o meu Rosário, e renovarás a
face da terra!» Eis o remédio.
Domingos vae restaurar a sociedede que caminhava fora da li-
nha recta do dever catholico. Por todas as nações faz ouvir a sua
voz argentina, como a d'uma trombeta e clama repetindo as pala-
vras de Maria: «Re:{ae o Rosario,>»
Esta voz foi um como raio que feriu aquelle povo adormecido
no peccado. A Europa começa a respirar e a atmosphera toma-se
menos densa. O reinado do Rosário é desde essa faustissima data
o pharol a illuminar os extraviados do porto de eterna salvação.
Eis o primeiro triumpho do Rosário.
Qual o segundo?
Estamos no século XVI.
Vae uma tal fermentação diabólica que não tenho tinta nem
pincel para carregar no quidro os desmandos d*este século des-
graçado.
O protestantismo ergue-se coruscante de raiva, serpenteando
por entre todas as camadas sociaes.
O Alcorão empunha o bacamarte, e tenta conquistar esta belLa
Europa, creada á sombra do pontificado civilisador. Aquelle —
aborto de Luthero — emancipa a sociedade do centro da auctori-
dade divina e lança c>s povos no abysmo da perdição eterna.
Este abalroa e afunda as esquadras christãs no roteiro de o
atacar imperterritas. Mas o Rosário vence. O Concilio de Trento
esmaga a hydra do protestantismo e Lepanto ficará na posterida-
de famoso pela batalha sangrenta.
Pio V alcança de Veneza e Hespanha uma numerosa esqua-
dra. Esta^^ capitaneada pelo valente João de Áustria, filho do im-
perador Carlos V, avança para o foco das arremettidas do atrevi-
do Selim II. Trava-se a lucta, a terra junca-se de cadáveres, o ini-
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OUTUBRO 33i
tnigo recrudesce, o sangue corre a jorros, mas o Rosário, sob cuja
protecção se milita, vence. O inimigo deserta do campo e os chris-
tãos entoam o hymno da victoria.
O' sublime victoria do Rosário ! O Rosário venceu, o Rosaria
venceu !
Que espectáculo tão imponente, tão grande! Nunca, diz um
historiador, pesaram sobre as aguas do oceano enquadras mais fu-
riosas pela valentia e pelo numero; nunca o mediterrâneo viu nem
verá mortandade mais horrivel e mais obstinada.
O Rosário fez retroceder a Meia-Lua na senda vertiginosa com
•que se abalançava a uma conquista universal. O orgulno da «5m-
blime Porta» foi abatido e Constantinopla aprendeu a temer esta
Europa, centro de toda a civilisaçâo operada pelo christianismo in-
defesso.
Foi n^esta gloriosa peleja que o insif^ne Cervantes perdeu o
seu braço esquerdo. Também elle, o principe dos litteratos hespa-
nhoes a'aquella epocha d^oiro, sentia em seu coração o amor ar-
dente á causa do Rosário. O Rosário foi e será sempre o refugio
dos povos e ancora de salvação social.
Rosário de Maria— ew tè saúdo!
26 — VII— 903 Olympius.
-^^
2 — Domingo — Os Ss. Anjos da Guarda.
— '^ —
Os bens doeste mundo, como são corruptíveis, ainda que não
haja quem os. furte, elles mesmos se nos roubam ; porque as rou-
pas, por preciosas que sejam, come-as a polilha que nasce das mes-
mas roupas, e os metaes, ainda que sejam ouro e prata, roe-os a
ferrugem que nasce dos mesmos metaes. Tudo o que nasce na ter-
ra, o sol ou a chuva o cria; mas o mesmo sol, se é demasiado o
-queima; e a mesma chuva, se é muito continuada o afoga; para que
acabemos de nos desenganar da pouca firmeza, ou segurança, que
pode haver nos bens que são da terra, pois as mesmas causas que
^$' dão, os tiram, e as mesmas causas que os produzem, os matam.
Padre António Vieira.
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332 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
3 — Segunda-feira — Os Ss. Cosme e Damião, ir-
mãos, Mm. — Trasladação do corpo de St.* Clara, V. da
2.* O. — S. Cândido M. — S. Maximiano, B.
4 — Terça-f ei ra — Solemnid ade de N. Seraphico
Padre S. FRANCISCO DE ASSIS, Fundador das Três
Ordens Franciscanas. — Pela tarde^ ao pôr do sol, hora em
que S, Francisco voou d\este mundo a gloria, comniemo-
rase o seu glorioso Transito. — Ind. Plen. para os Irm.
Terceiros.
CS
'. círHitdsto de %m%
.^^RA uma noite bella, essa que escondeu em suas sombras o des-
J^ troço do asceta penitente de Assis. .
* A lua, que pouco a pouco se tinha elevado sobre os mon-
tes da Umbria, jorrava torrentes de doce e tranquilla claridade so-
bre a velha cidade que dormia um pesado somno no seu berço se-
cular, embalado pelas brizas nocturnas que perpassaram vagarosa-
mente por entre a ramagem das oliveiras que cobriam a encosta
do monte.
Lá ao longe, levantava-se um gigante castello feudal. A luz
escoava-se pallidamente das setteiras, descobrindo apenas ijm ro-
chedo escarpado que servia de alicerce ao gigante colosso.
Lá dentro havia festa. Os cantos dos menestréis perdiam-se
nas arcarias gothicas pouco a pouco semelhando cântico funéreo;
o patinhar da dansa enfraqueceu, as libações do Falerno tinham
arrastado ao somno os habitantes do castello... Deixemol-os en-
tregues a esse repouso de devassos. . .
E' meia-noite. Hora solemne em que se passam dramas mys-
teriosos sobre a terra, e em que as larvas do cemitério vêem pousar
sobre o peito dos criminosos em horrendos pesadelos.
Tudo dorme?... Não.
Quem a essa hora solemne descesse por a encosta do monte
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OUTUBRO
333
até ao fundo do valle descobriria uma pequenina capella, erma,
sósinha, abandonada aô repoufo tranquillo, que só era perturbado
pelo voltejar continuo de borboletas no:turnas que em phantasti-
't<\-
S. Francisco de Assis (Murrillo)
cas èsplraes doudejavam em . volta do lawpadarium antigo, que
allumiava a imagem da Virgeni da Porçiuncula.
. È a capeíla dormia sósinha, erma ! . . . NáíO. . .
Lá dentro ouvem-se gemidos d'um penitente, ...gemidos de
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334 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
amor.. . Entrae de mansinho na ermida; não accordeis do seu êx-
tase amoroso ao asceta penitente. Que faz elle ahi a essas horas ca-
ladas da noite? Ora. Pede o páo do espirito, o amor, a cruz ! . . -
Escutae as suas palavras : « Meu Deus e meu tudo » ! . . . Nâo
vedes como as lagrimas correm abundantes por sobre seu rosto
emmagrecido pela fome voluntária, pelas vigilias e penitencias?!...
«Meu Deus e meu tudo», continua o asceta ; e seu rosto co-
meça a illuminar-se por um explendor celeste que nimbou na fron-
te d*uma aureola do céu 1 . . .
«Meu Deus e meu tudo», continua o penitente, e a luz era
cada vez mais brilhante, e o coração palpitava com anciedade den-
tro do peito abrazado. . .
«Meu Deus e meu tudo» e n'um impeto de amor o penitente
ergue-se das lages frias, e avança com rapdc* para um grpnáe
ciuciíixo diante do qual estava ajoelhado. Abraça-se ao crucifixo,
gritando «meu Deus c meu tudo», repousa a fronte sobre o peito
ensanguentado de Jesus ! . . . Mas, ó prodigio de amor ! o braço di-
reito do crucifixo desprega-se da cruz e aperta a fronte d*esse pe-
nitente contra seu coração 1 . . . e Francisco, eis o seu nome, dor-
miu toda a noite sobre o peito de Jesus 1 . .".
Quando raiou a manhã, um penitente, com um habito grossei-
ro, cingindo os rins com uma corda de esparto, atravessa as ruas
de Assis, gritando «o Amor nâo é amado! o Amor nâo é amado!»
As multidões cercaram a Francisco e diziam : está louco ! . . . Es-
tava louco, mas louco de amor de um Deus.
E desde esse dia Francisco de Assis foi todo amor para Jesus,
até á consummaçâo do Aniôr no alto do Alverne em que o Chris-
to do século XIII foi assignalado com os estigmas d!a Paixão do
Redemptor.
P. Alberto Teixeira.
5— Quarta-feira— O B. João da Penha, C, da i/
O. — S. Plácido e Comp., Mm.
Bismark entendeu sempre que o esforço da vontade era suf-
fíciente para se resolverem os confiictos da Wida. Foi um dia á caca
com um amigo seu, homem gordo e pezado, o qual cahiu no meio
d'um atoleiro.
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OUTUBRO 335
— Venha em meu auxilio, Bismark.
. — Saia o senhor.
— Mas...
— Creio que o meu amigo nunca mais poderá safar-se d'ahi^
e como me horrorisa vel-o morrer afogado, vou metter-lhe uma
bala na cabeça, para lhe evitar tão prolongada agonia. E com a
maior tranquillidade fez a pontaria.
— Amigo! gritou o outro assustado. — Se não quero morrer
afogado, também não quero morrer d'um tiro.
— Pois saia promptamente, continuou Bismark com a arma
na mesma posição.
E o pobre diabo taes esforces empregou que se sacudiu do
lodo.
— Já vê, concluiu o principe, que eu tinha razão. Muito pode
quem quer.
6— Quinta-feira— St.* Maria Francisca, V., da 3.*
O. — Ind. Plen, da O, — Ind. plen, nas igrejas francisca-
nas — Ind, plen, para os Irni. Terceiros.
o rico não é rico para si mesmo, mas para os pobres.
Padre Bourdaloue.
7 — Sexta-feira— St."* Henrique, Imperador, C. — S.
Marcos, Pp. C.
— Um abysmo chama outro abysmo.
— Nas lagrimas, ha um certo gozo; as lagrimas alliviam as
penas.
— O fructo colhido depois de muitas diíficuldades, é mais doce.
Cn/^^ ^ "^ •mO .
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336
ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
8— Sabbado-
Pelagia, Penitente.
-St* Brígida, Princeza, Viuva. — St.*
Ti meu de Lo crés, philòsopho antigo da Itália, e que morreu
antes de Sócrates, foi discipulo de Pithagoras, ou, pelo menos,
como alguns querem, pertenceu á sua eschola. Escreveu uma obra
intitulada Tratado da natureza do mundo.
Tem de notável esta oora, entre outras coisas, o affirmar
aquelle philòsopho gentio a crença do peccado original. EUe mes-
mo lhe chama 3. /alta primitiva aos nossos primeiros pães.
Certamente Timeu tirou esta crença da tradição universal, e
talvez ainda da leitura da Escriptura feagrada dos hebreus, que
era bem conhecida dos philosophos pagãos.
E depois também notaremos que aquelle tratado de Timeu
serviu de thema a uma obra de Platão.
9 -® Domingo — (20.° depois do Pentecostes).—
Maternidade de N. Senhora. — Os St.°* Diniz e Comp. Mm.
—Os St.""* Andronico e.Athanasio, Mm. — Ind, plen, para
o Rosário Vivo, — Lua nova ds 4. h. e 4.8 min. da nianhcL
KN^E. MARIA
Ave preclara Maria!
casto lyrio d* Israel!
Vos saúdo n'este dia
como outr'ora Gabriel.
Cheia de graça, tão pura
como límpido crystal;
das mãos do Eterno feitura)
amais bella e genial.
Desde sempre, em sua graça
o Senhor Lomtígo é,
nosso amparo na desgraça
Virgem Santa de Jessé.
Entre as mulheres bemditaf
Tu eSy Rainha dos Céus!
Pois d'elias foste a dita.
Mãe dos homens, Mãe de Deus!
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OUTUBRO 337
Mãe de Deus, bemdito fructo Santa Maria das dores!
do Teu ventre immaculado. Nossa Mãe e Mãe de Deus!
Jesus, d' um povo corrupto roga por nós peccadores
c Martyr crucificado. a Teu filho td nos céus.-
O perdão no seu amor
que dos céus nos venha agora,
esse p'erdão redemptor
da nossa morte na hora.
P. F. DA Silva.
10 — Segunda-feira — S. Francisco de Borja, Pa-
droeiro do Reino e Conquistas. — S. Luiz Beltrão, C.
Quando Mgr. Charbonnel foi preconizado Bispo por Pio IX, o
Sumn:o Pontifice offereceu-lhe como lembrança um cálix ou uma
pyxide á escolha. O novo Bispo que tinha grande necessidade de
vasos sagrado^ para a sua Diocese escolheu primeiro a pyxide, de-
pois fitando o Pqpa lhe disse: Quid retribuam domino pro omnibus
qua^ retribuit mihi? Caliceu salutar is acci p iam. . .—tomaindo as-
■sim 05 dois vasos sagrados. Pio IX riu-se da ingerihosa occorren-
cia, offerecendo-lh'os ambos da melhor vontade.
S-
ete \í/ e?a Q
11 — Terça-feira^— S. Firmino, B. — Nasc^ o sol ás 6
Á. e 23 min, e põe-se ás 5 h. e 37.
O mundo é mar, a ambicáo é sede. Nâo me espanto que o
ambicioFO se não sacie com os bens do mundo; porque a agua sal-
gada não apa.ííci, antes accende as seccuras. Impossível é apagar,
bebendo, a sede que nasce de beber; e satisfazer, possuindo, a cu-
bica que nasce de possuir.
Paer'í; M. Bernardes.
22
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338 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
12--Quarta-feíra— S. Seraphim, Capuch.
(sem tom nem som)
Ao nuMi amipo P. Sfafiliiui Prílrcit.%
miss oiiario HCncuni, ri i seu Uia iMiniuaslini,
Querix ãar-ts hoje um: v.'r/.o.ç,
mofi vJTííOs^ p*ra um Seraphim
convinha vi e/:sem dacio,
e isso não é c-i p'ra mim.
Inda que eu tivjra um f^eni ?,
que o]fu!:caí^!:e o dí Camòe.':,
e aí: muí:aít vriraem prodijas
inspirar miiihas canções ;
ou soubera colher flores
da poe/ íj no jardim ;
nlo soubera tecer c'rôa
que servi :se a um Seraphim.
Alem d3 que, bem o rabeSy
vou péssimo de saúde,
e estas molertias prohibem
c finar o alaíde.
Mas, apesar de tudo isto
tomei-o p'ra o dedilhar :
dãi-lhe, redd'lhe d cravelha,
nãojoi capa!( de tocar.
Faspei-lhe a*^ ctrdas cim força,
como eu nunca fi^ af.ri.n,
pov: nio quis, tinha vergonha
de cantar um Seraphiíti.
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OUTUBRO 339
Mas inda que entre poetas
eu seja baixo fedelho,
ouso, crymo teu amigo
dar-te hoje em verso um conselho:
Olha: tens um nome lindo,
foste-o escolher ao ceo;
certo, que não ha na terra
nome bello como o teu.
Dos Seraphins és irmão,
e dos Cherubins também,
prerogativa,que eu creio
no mundo não ter ninguém.
Pois bem: seja a tua vida
qual é a ds teus irmãos,
para que possam na morts^
darem-4e p*ra o ceo as mãos.
(12— X— 1899). P. B. Ribeiro.
13 — Quinta-feira— Os Sts. Daniel e Comp., Mm. da
I.* O. — Ind. Plen. nas igrejas franciscanas — ind. plen.
para os Irm. Terceiros.
Quantas vezes as nossas acções não desmentem a3 nossas pa-
lavras? I . . .
14 — Sexta-felra — S. Calisto, B., M. -S. Gaudêncio,
B. M.
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340 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Nápoles
UMA LIÇÃO APROVEITÁVEL
Para um litterato de bom serso e grande saber dizia uma re-
nhora que queria figurar de philosopha e livre pensadora: A reli-
gião é boa, não pôde negar-se; n^r s para que serve o culto exte-
rior, para que servem es cercn-orias da Egreja, o incenso^ a cera,
as genuflexões, etc. ? Se Deus c espirito não carece de coisas ma-
te riaes nem é mais venerado porque lhe queimam o incemo e
cantam hymnos e louvores.
E seguia o seu discurso n*este teor.
O interlo:utor, porém, da philoopha, enfadado com os dis-
parates, Qviz dar-lhe uma lição. Desfiu o casaco, descalçou as bo-
tas, acendeu o cachimbo e encostou-se regaladamente na cadeira,
com grande surpreza da livre pensadora, que, irdignada, lhe disse:
«O senhor está-me insultando, não tem educa<;áoI Como se atreve
a portar-se tio gros.eiramente com uma senhcra respeitável?»
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OUTUBRO 341
— Desculpe, minha senhora, respondeu o litterato, tenho a
mcior con id3ração por V. Ex.a, mas segundo as suas theorias^
entendi desnecessário prestar-lhe culto exterior, bastava o respeita
interior que lhe professo.
Imigine-se com que cara ficaria a philo>opha.
15 — Sabbado— Santa Theresa de Jesus, V., refor-
madora das Carmelitas. -Ind. plen, para os Irmdos da
Conceição,
— .3^5j..*g,^
— Um padre ri:o e avarento, não sabendo onde guirdar o seu
dinheiro, escondeu-o em un logar da sachristia e escreveu em
cima :
«Dominus en in ips:) lo:o!>'
(O Senhor estí n'este lo^ir).
O sachristão tirou d'ahi o thesouro, deixando a seguinte ins-
cripçf o :
'«Ressurrexit non est hi:l»
(Ressuscito j, não es:á aqui)
16 - If Domingo — (21.° depois do Pentecostes) —
PcREZA DE N. Senhora — S. Wenceslau, M. — S. Martinia-
no, M. — S. Gallo, \bh,—Quaréo crescente ás 5 L e 18
jnin, da inanitd.
:^^
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■.*s...*<.illii.. ,.,rt(llii^'' '^lu ..„-i!i«>,.„,-i1i»i6k ..,.i'i <i ,.' ^ ,
•*»-"'iW"«i'" "«iiW" -«Hl i\|«"- ■■*ili('lj||i-"ipni^--"ii;f(5K"— '(."ir ■••'HfWil '— "f.")!* -»»(;iri(r-«<i|f>:r- "^jf^f— . .|j»,fw.
.._g^^^j^^
'^auãe dos enferines
(tradiç/.o)
/.o longe da antiga corte do ca-
lifado do o:cidente, n'um dos
cun-.es da serra, ergue-se um
pequeno santuário dedicado á
Rainha dos Anjos, sob a invo-
cação de Nossa Senhora da
Saúde. A devoção da gente
d'aquelles contornos para com
a veneranda Imagem, que exis-
te naernrida, e a fama de seus
nilagres e mercês, trazem a
seus pés grande numero de de-
votos que lhe levam suas of-
fertas e dirigem para ella suas
preces.
Nós tivemos occasifo de
visitar o peqyeno santuário, e
nunca se ros poderá varrer di
imaginação as impressões que produziu em nossas almas.
Situado n'um logar agreste e selvagem, com sua modesta cruz
de pedra e sua campainha engastada na parede, destacava-se pela
cor escura de seus muros sobre a neve que cobria o campo, ven-
do-se brilhar, como a estrella polar ou como um pharol, que dirige
o navegante ao desejado porto, a luz, que allumia a bemdíta Imagem.
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OUTUBRO 343
O aspecto que nos apresenta, traz-nos á memoria os cantos de
Zorrilha e os contos de António Trova, em que tantas paisagens
semelhantes nos pintam com inspirada penna e em que se respira,
por assim dizer, o ar das montanhas, e se gosa dos simples costu-
mes do povo.
No interior da ermida éindiscriptivel o aíTecto que enche a alma.
Grande e magestosa é a vista dos nossos templos, grandes e
magestosas são a nossos olhos a> luxuosas egrejas e as magnificas
cathedraes com seus pavimentos de mármore, suas elevadas torres,
suas paredes revestidas de cortinados de damasco e seda, seus doi-
rados arcos a formar as capellas e os formo-os altares de rica tape-
çaria adornados com lustres e grinddas, onde apparecem as sa-
f radas imagens de Jesus e Maria, revestidas com precioros pannos
e veluio e enriquecidas de esplendidas jóias ; o perfume do in-
censo, a harmoniosa e robusta voz do orgáo que verte caudaes de
notas, ora doces como a harpa d'uma virgem de Sian, ora tristes
como os lamentos da Mãe do Nazareno junto da cruz de seu Filho,
já, fortes e inspirados como os cantos de Débora, já, emfim, des-
maiadas como o suspiro que exhala o justo, quando sobe a*este
mundo enganador ao eterno repoufo. Dentro d'ellas nos sentimos
cheios d'um santo recolhimento e parece que algo superior pesa
sobre nos?o espirito, não nos atrevendo a levantar os ollios para as
sagradas imagens : a alma com prebende a grandeza do Creador.
Não menos imponentes, porém, são as pequenas ermidas com
suas paredes nuas e branqueadas, seus singelos bancos de madeira
-e seu modesto altar adornado com um perfumado ramo de flores
campestres e uma lâmpada de azeite que allumia o Crucifixo e a
imagem de Marii, modestamente servida e sem adornos.
Aqui a alma se approxima mais da divindade, o silencio dos
campos e a simplicidade que nos rodeia fazem que nosso animo,
affastando o temor, não hesite em chegar a seu Deus e que nossos
olhares se fitem nas augustas imagens ; aqui as pulsações do nosso
coração são pulsações de amor, fé e esperança.
Na cathedral para estarmos vendo o Deus do Sinai, admira-
mos a grandeza e poder do Omnipotente ; Maria é o altivo cedro
<io Libano, a poderosa Rainha e Senhora de tudo.
Na ermida contemplamos e adoramos aquelle Deus que veio
ao mundo para dar sua vida pelo homem, que pregou sua doutri-
na, que consolou as mulheres, restituiu a saúde aos enfermos, e
acariciou as creanças; na Mãe Santis^ima, em taes capellinhas. fru-
cto da devoção popular, a perfumada rosa de Jericó, a humilde vio-
leta, o modesto lyrio e a mais sublime c perfeita incarnação da
caridade.
Nosso coração dilata-?e, nossa alma enobrece-se e eleva-se até
ao throno em que se assenta a Trindade bemaventurada.
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344 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Com amor e confiança contemplamos a fiffura da celeste flôr^
em que resplandece a poesia do Catholicismo, a'aquella que é acla-
mada continuamente por milhões de seres que imploram seus fa-
vores e a amam ternamente.
Na verdade : qual é a mulher, qual é a mãe, que, vendo cor-
rer perigo o objecto do seu amor, ou o filho de suas entranhas, não
o encommenda á Virgem, em fervorosa supplica? Qual é o ho-
mem, que, tendo a dita de ser educado por uma mã chrÍ5tá, não
sente nos dias tristes da vida desejos de elevar a Maria suas preces?
Qual o marinheiro que não roga á Mãe de Jesus, entre o sibi-
lar do vento e o rugir das vagas, quando se desencadeia formidá-
vel procela?
Qual o escriptor ou poeta christão. qiie lhe não dedica uma de
suas poesias ou oe suas obras?
Qual o musico, que não lhe consagra um hymno sublime e ar-
rebatador, em que louve e cante suas glorias e maravilhas?
EUa é o sol que illumina nossa esperança e o astro que coro
sua luz e calor vivifica a grande fibrica do universo.
Muitas imagens de Maria, que se veneram em nossos altares,
são objecto de poéticas tradições, taes como Loreto, em Itália, La
Saletey em França, La Virgen de Almudena, na capital da Hcspa-
nha e Nossa Senhora de Isa^areth, em Portugal. A do santuário
de que falamos também tem uma lenda de ternura que vamos re-
ferir aos nossos leitores.
II
Pelo meado do século passado, havia no sitio que hoje occupa
a ermida, uma pequenita habitação, a cuja entrada prestava som-
bra uma formosa parreira, que com suas verdes folhas quebrava a
monotonia da agreste paisagem, dando-lhe uma nota agradável e
risonha.
Habitavam a casa uma anciã paralyti:a e um seu filho, jovem
de vinte e cinco annos, juntamente com uma criada encarregada
do cuidado da enferma e da limpeza da casinha.
A anciã adorava seu filho ; todos o> seus desejos se dirigiam a
um mesmo fim ; ella queria ver feliz a seu filho ; mandava-o assis-
tir ás festas e romarias das proximidades e costumava di^er-lhe :
— Trabalhas muito, meu filho; nunca me deste o menor des-
gosto, e temo deixar-te só, quando sair d'este mundo ; meu maior
desejo, é que encontres uma companheira virtuosa que me substi-
tui junto de ti.
— Não me affli"a, minha mãe— respondia o jovem — só a minha
jnãe amo, e ninguém a pôde substituir a meu lado.
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OUTUBRO 345
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345 . ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
E o jovem seguia sua vida coiro de costume, entregado ao tra-
balho, ao cuidado de sua mãe e á contem plaçí o da natureza.
N'aquellas noites silenciosas e bellas que se disfructamn'aquelle
delicioso paiz, assentava-se debaixo da p?.rreira, accendia um ci-
garro e deixava vagar sua imaginação, emquanto contemplava o
camoo e as estrellas que brilhavam no céo.
Uma noite que gosava de tão venturosa paz, parece u-lhe ouvir
um suspiro a seu lado ; ergueu a cabeçi e viu uma sombra escura
sobre a branca alfombra de neve que cobria o campo; levan:ou-se
para ver o que era, e com surpreza divisou a elegante figura d'uma
mulher envolta d'um largo manto, com a cabeluira estendida so-
hre o? hombros e d'uma formo ura sobrenatural e divina.
Aquella mulher, porém, não era um ser real ; era somente uma
figura qu3 a sombra projectava no solo. O jovem contemplava-a
absorto; procurou o objecto que a produzia, sem o poder encon-
trar, e permaneceu extático ante ella, ate que a lua se escondeu, e
a escuridade, dissipando os objectos, lh*a tirou da vista.
Desde então, a vida do jovem mudou inteiramente ; tornou-se
melancholico, taciturno, descuidou-se do trabalho e passava a vida
sentado debuxo da parreira, fixa a vista no lugar onde vira a fi-
gura d'aquella mulher que perturbava S2us sonhos, esperando que
a lua a tornasse a representar na neve.
Quando isto succeiia, o ;ovem approximava-se, cruzava as mão%
prostrado por terra, adorava-a com extisis; e quando a lua se es-
condia, chorava e dese?perava-se, sem poier explicar o que lhe ia
por dentro do peito.
Sua saúde alterou-se com os soífrimentos, c a pobre enferma
temeu que seu filho baixasse á tumba.
Chamou-o para o seu 1 :do e com essa ternura que é patrimó-
nio das mães, conseguiu qu3 lhe confiasse S3us segredos; e então
o jovem lhe referiu o amor purissimo que devorava sua alma por
aquelle ser immaterial, intangível.
A anciã, r.obresaltada por tal revel^.ção, mandou chamar o ve-
lho Frior do n:o teiro immediato, a qusm narrou a situação.
O Prior esperou que ch^gis-e a noi:e, e quando a lua encheu
de chridade todo o campo, e o jovem cahiu de joelhos ante a ado-
rada imagem, approximaou-se ancioso e não viu nada que offuscasse
a alvura da neve.
Então, temeroso e desconfiado, tocou no hombro do pobre
mancebo, dizendo-lhe:
— Pedro, levanta-te e segue-me.
— Agora não. Padre, agora não. Permitta-me que a contem-
ple, porque só sou feliz nos momentos que goso de sua encanta-
dora presença.
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OUTUBRO 347
— Mas nío vês, pobresinho, que é o espirito das trevas qu3
^em perturbar tua paz?
— Padre, não blasphemeis; tal belleza só pôde reidir em se-
res celestiaes; uma adoração táo pura que por ella sinto, só S3
pôde ter por alguma coisa divina.
— Mas essa sombra existe só na tua imaginação, porque eu es-
tou aqui. e nada vejo.
— E* que eila só se deixa ver de mim, porque só eu sou ca-
paz de a adorar como adoro.
— Tu estás louco, ou preso das redes de Satanaz !
— Dtus das alturas — exclamou Pedro de> esperado— fazei bri-
lhar a immaculada mulher quç adoro, e juro dedicí.r-vos minha
vida !
— E corro se Deus escutasse a supplica e accsitass.e o juramen-
to, um forte vento fez tremer as paredes da Cisa ; a parreira ca-
hiu ao s5pro do furacfo e uma erorme pedra, que poisava sobre
ella veio cahir no sitio em que Pedro via a figura da apparição.
Vendo-a dssapparecer, o jovem dando um grito precipitou-se
para ella.
— Vês, desgraçado — disse o monge assustado — provocas-te a
cólera divina !
Ambos, porém, emmudeceram de surpreza, quando viram sa-
hir, correndo ágil e cheia de saúde, á anciã paralytica, que gritava
cheia de alegria :
— Pedro, Padre! Ali, ali está a Virgem ! Vede.
Com etfeito, ao cihir a pedra ddxára patente uma formosa
imagem da Virgem da Saúde, cuji rosto ferido pelos clarões da
luí, apre entava na parede a figura ideal que tanto adorava o jo-
vem Pedro, e este, sua mãe e o Prior, ajoelharam, entoando peira
a sí-udar as mesmas palavras que muitos serulos antes pronunciou
o Anjo em Nazireth quando annunciava a Boa-Nova.
III
Pedro e sua mãe não quizeram ficeT sem a sagrada imagem,
venderam ;uis terras e com o produ-to d'ellas derribe: rim a casa e
construiram a pequena ermida que hoje existe, vivendo dedicados
£.0 serviço da excelsa Senhora.
A fama dos nihç^res da Virgem extendeu-se por todo o orbe.
De todas zs partes vinham rome ros prostar-se a seus pés e a pe-
quena ernidi é a tocha que mantém vivo o foL;o da íé nos cora-
-çóes dos habitantes d'aquelia privilegiada comarca.
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348 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
17— Segunda-feira— St* Hedwiges, Viuva, Du-
queza da Polónia.
As doenças do espirito são psores do que as do corpo.
— A esperança é o sonho da pessoa acordada.
18— Terçafeira -S. Lucas, Evang.
— Ha occasi5es, em que nada podemo» dizer; ha outras, etn
quí podemos dizer algumas coisas; não ha nenhuma, em que pos-
samos dizer tudo.
19 — Quarta-feira — S. Pedro d'Alcantara — Ind.
Plen, nas igrejas franciscanas. — Ind. plen. para os Irm.
Terceiros.
O imperador Valente, arimo, prohibiu sob pena de morte aos
catholicos de Ede>sa, onde elle se achava então, que praticassem
em publico actos da sua religião; mas os catholicos, longe de obe-
decerem, continuaram as suas reuniões no logar costumado. Senda
informado d'isto. o imperador ordenou ao prefeito que fosse no
dia seguinte ao logar aa assemblea asompanhado do> soldados e
que matasse todos os que encontrasse. O prefeito, que não era
cruel, ao ouvir esta ordem estremeceu e mandou informar em se-
gredo os catholicos da ordem que tinha recebido e que não podii
deixar de executar. Este aviso, em lojar de os atemorisar, fez
com que na manhã seí^uinte apparecessem todos com grande ale-
gria, por terem occasião favorável de dir a vida por Jesus Chris-
to. O prefeito, escoltado pelos soldados, poz-se a caminho e na
estrada que conduzia ao logar da reunião encontrou uma joven que
levava jpela mão um menino.
— Onde ides com tanta pressa? — perguntou o prefeito.
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OUTUBRO 349
— Vou para onde vío os outros christáos,— respondeu ella.
— Esperae, replicou o prefeito, não sabeis que o Infiperador
-deu ordem para serem n orto» todos o§ que se achassem na reunião?
— Bem sei, respondeu ella, e por isso nr.esnro me dirijo para
lá com meu filho, o único que Deus nre deu, para ter a felicidade
<ie morrer com elle pela fé cie Jesus Christo.
O prefeito ao ver tanti constância, voltou para traz e chegan-
do junto do Imperador, disse o que tinha feito á vista da respos-
ta a*aquella joven.
Valente, confundido e râo podendo deixar de admirar acora-
fem dos catholicos, orderou-lhes que saissem d*aquella cidade,
eixando assim em paz os discípulos do Salvador.
20— Quinta feira— S. João Cancio, C— St.* Iria,
Portuguesa, V. M.
Os avaros de louvores provam que sáo pohresde merecimentos.
Plutarcho.
A liberdade conquista-se, não se pede.
Castellar.
21 — Sexta-feira— St." Úrsula e suas Comp., Vv.
Mm.,— St."* Hilarião, Abb. — Nasce o sol ás ò h, e 2j min.
£ põe-se ás $ h. e 25 .
A fimilia é o sanctuario, a família c a oíficina, a familia c o
I>araiso.
Leão xii,
22— Sabbado— O B. Ladislau de Gielniovv., C, da
I.* O. — Dedicação da RealBasilica de Mafra — St.^ Maria
Salomé.
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35o ALMANACH BE SANTO ANTÓNIO
HORÁCIO VERNETE
TEMPESTADE
Longe, no verde-cérulo
das- aguaf: palpitantes,
lobrigou por instantes
rubea aurora a assomar.
*<Scena d* um dia, ephemera!
Eis Id se esvae, — murmura, —
e envolta em nuvim 'scura
se afunde no alto mar,y>
Fugindo os raiis últimos,,
nas franjas prateadas
as Untas iriadas
se viram desbotar;
d' um seio no^ latibulo
em commoçáo occulta
a esperança ahi sepulta
também Joi desmaiar.
E receioso e timido
aperta o nauta o leme,
olhando o ceo, que freme
Id do horisonte alem;
presdga, a noite lúbrica,
lutando com o dia,
o chãos annuncia,
que prestes sobrevem.
«E* só o barco!...»
Trémula,
no fanal jd latente
rejrange a /uf somente;
não a enxerga ninguém,
E no farilhdo twríido
os echos dã tormenta,
que virbéra violenta,
perpassam n'um vaivjm.
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OUTUBRO 35i
«E' só o barco ! . . . »
— diíís:era, rovco, o nauta -
e perigam^r.e a.v vi doai
do mar aít noííf^aíf lidas
o ceo vara .wmente e ofundn abysmol»
Como em negro í:endaU
que entende o V3ndaval,
súbito se encobrira a nau pejante;
e jd no ethereo espaço
recusando igneo traço,
por longs, os c3o^: de bronze incendiava;
e\i':itho, defronte,
rolava no horisonte
o carro do trov.io; apjs, das vagas
pendera a nave solta
na procella revjlta.
Sobre as gc^veas, ao sopro do aquilão,
que lá, rispidj brama,
a turba se une, clama.
E sereno a mirava com desdém
obscuro navegante;
no pallido semblante
e nos turbados olhos se revela
do setj o is^noto arcano;
'spiríf) sohrehumano,
o génio da procella o arrebatara,
« Vem, — <í/ j, — desce, marujo,
basta, ce^se o roteiro;
eis, guinda-me ás antennas, ao Sublime,
eu do mafitro real
voarei ao ideal!»
E firme, resoluto, após instantes,
como senhor do mar,
por sobre aquelle a^çar,
que envúve a natureza n'um mysterio,
myxto de sentimento,
o genii, o pensamento
remonta ao i ifi lito, como a águia,
que de aita regido
desdmha o furacão.
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35% ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Mas logo chora o artista l A bella scena ^ ^-
não sabe retratar!
Sublime a nature:^a! acima da arte
se vira ^triumphar,
(Roma— 1901). - P. Freitas.
23— Damlngo— (22.'? -depois do Pentecostes). — S.
João de Capistrano, C, da l.* O. — ^S. Romão, B. — S.
João Bom. — Ind. Plen, nas igrejas franciscanas.
GAMARA DE LCBOS
ji^EPOis de ter deitado ferro n*uina extensa e bella bahia, de ter
^ explorado uma dareira povoada de fyncho entre denso arvo-
redo, de ter lançado a primeira pedra nos alicerces d'uma flores^
cente cidade, reentrou z!arco no seu frágil barco, ton*-ou o rumo
oeste seguindo a costa, e, com vento fresco pela popa, chega em
3o minutos á ponta mais meridional da ilha da Madeira. Era em
julho de 14 19. Collocada uma tos a cruz n'aquelle rochedo, que.
ficaria para sempre a Ponta da Crus(^ prosegue a sua derrota em
direcção a uma enseada que já avista a algumas milhas de dis-
tancia.
Verificando que era seguro ancoradouro, com iruita facilida-
de saltou em terra toda' a marinhagem e coríieçaram a procurar
cojn afan qualquer vestigio áz seres viventes.
O silencio da morte reinava em toda a parte. Apenas se ouvia
o surdo ruido das ondas que, umas atrás as outras, se erperguiça-
vam sobre os roliços e pequenos basaltos da pruia, o ramalhar n-o-
notono do arvoredo levemente agitado pela bisa, o echo que re-
petiam as colinas admiradas £0 ouvir pela vez primeiras vozes hu-
manas. . . Cançados reqolhijmjA a bordo os companheiros de Zar-
co quando junto ao mar descobrem uma caverna com claros si-
gnae> de ser frequentada.
A' mingua de melhor intrepretação concluem os bravos argc-
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OUTUBRO : 353^
Gamara de Lobos (Ilha da Madeira)
■nautas ser alli o local onde vinham retouçar os lobos marinhos que
abundavam n'aquelles mares... Ficou pois baptisado o sitio: — Ca-
tnara de Lobos—. . .
Os colono^, desde os primeiros tempos, souberam aproveitar-se
<i'aquelle torrão feracissimo e fizeram ae Gamara de Lobos centro
de producção saccharina e á principal adega da Madeira.
E em tanta, estima teve o descobridor e donatário a nova po-
^'oação, que adoptou para si e seus descendentes o appelido de Ga-
mara que airda hoje juntam ao de Zarco as nobres Casas Ribeira e
Oastello Melhor.
Gamííra de Lobos ç uma parochia de 6:200 habitantes.
E* cabeça d*um concelho de quinze mil almas n'uma área de
fS:8oo he:tares. Está para o Funchal quasi como Gascaes para Lis-
"bpa pela pequena distancia qu2 as separa, p2las fáceis e regulare>
<:ommuni cações por terra e mar, e ainda mais porque lhe pods
abastecer o mercado. Não tendo homens de grande representação
11
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354 ALMANACH DÉ SANTO ANTÓNIO
social, tem muitos homens de bem, porque é de todas as terras da
Madeira a mais religiosa.
Tirado um pequeno e rasoavel cães de desembarque, nada ha
alli oue não seja de iniciativa local.
Teve um convento franciscano desde 1450 a 1834 onde entre
itiuitos padres de virtude floresceu em santidade o leigo Fr. Pedro
da Guarda, conhecido ainda hoje pelo Santo Servo de Deus. São-
Ihe attribuidos muitos prodígios e de toda a ilha vr.o devotos a Ca-
itiara de Lobos pedir graças ou agradecer benefícios recsbidos pela
iptercessão d*este venerável.
Que elle seja junto de Deus e santo tutelar d'aquelle bom povoL
P. M.
24—® Segunda-feira— St."* Eduardo, Rei da In^
glaterra.— S. Fortunato, M. — Ltia cheia ds 11 k, e iç 7ni:u
da niankáJ
A çoiúa mais duvidosa
E* o «pudor da vaidoí:a.^> ,
Quem ultrajar o ontendyr
J\ão tem honra, nem valor.
Sé queres sorrhos lhanos.
Desposa a graça aos do![e annos.
«Antes canfàr, qUe al^ra^ãr»f
Di\ um grande luminar.
«Quem quer, vae; quem não quer, mandai
Porque a mensagem desmanda.»
\ Alves de Almeida.
. 25— Terça-feira— S. Francisco Calderola.— I.» O^
Sé Crespim e Crispinkno, Mm.
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IMJTUBRO 355
8
S^|?Ão causeis damno ás andorinhas. E' este um preceito universal.
'm As andorinhas o sabem, e voam sobre nossas cabeças; pas-
sam sem ruído ao alcance de nossa n!ão; fazem seus ninhos sobre
r ossos telhados ou entre as vigas de nossos caramyanchões; são as
nossas melhores amigas.
No fundo de tucfo isto ha, além de um pouco de egoísmo, uma
tradição popular.
As andorinhas sío-nos úteis, pois diariamente destroem mi-
lhares de insectos, e são objecto de culto, pela seguinte lenda po-
pular:
— Dizem que a andorinha, estando Jesus cravado na Cruz re-
demptora, quiz quebrar com seu bico* os duríssimos cravos que
prendiam as mãos e os pés do Redemptor do mundo.
Conta a tradicçto, que passado pouco tempo depois que íôra
levantada ao alto a Cruz de que pendia o divino corpo de Jesus
Christo, e quando só restavam ao pé do sagrado madeiro a Virgem
Santíssima, a mãe de Cleóplias e Maria Magdalena, viu-se vir- em
direcção ao Calvário uma nuvem de andorinhas, que começou a
voar em torno do lenho sagrado, sem atrever-se a acercar-se da
Senhor, que estava agonisante. Mas, pouco durou a indecisão das
aves^inhas. O bando dividiu-sc em quatro partes, e uma atraz da
outra todas poisaram sobre a cruz, e começaram a picar nos cra-
vos que seguravam os pés e n*los do Senhor, e na coroa de: espi-
nho?, que, por escameo, lhe puzeram os verdugos.
É era digno de.vêr-se o ardoí; febril e verdadeiramente louco
com que as ternas avezinhas intentaram tirar os pungentes íetROS
e arrancar os agudos espinhos que feriam os pés^ as mâoi, ea
fronte do Filho de Deus, cuen^aquelle momento redimia a huma<-
n idade de todas as suas culpas e peccados.
As andorinhas não cessavam; cançada uma, cutra occupava
im mediatamente o seu logar. Trabalho, porém, inútil! Nada po-.
diam conseguir com todos os seus esforços!
Só uma andorinha tinha permaneci Jo quieta e afFastada das
demais, sem tomar parte no árduo e Ímprobo trabalho de suas
cooipanheiras^ O Senhor notou-^a, e com voz ditlcissirna lhe disse :
— Porque não te chegas a mim? Não me Julgas, áccaso, digao
de ser soccorridô?
— Não digaes isso. Senhor! — respondeu com tristeza e tom
lastimoso a avezinha. — Vede, Senhor, que estou cega! Um homem
deshumano logrou colher-me e me tirou os olhos. Graças á cari-
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356 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
dade de minhas companheiras (sosso viver; e ^Uas me guiaram para
este n:onte onde Vos ãchaes.
— Quanto dera eu, Senhor— juntou com voz débil — por poder
vêr-vos 1
— Não necessitas d'isso— respondeu Jesus — basta que creias em
mim.
— Tendes raeSo— disse a andorinha — os olhos do corpo de nada
valem se os'da alma estio fechados. Olhos tinham vossos juizes, e
vos condemnaram, sem verem vossa omnipotência, vossa alteza, e
vossa suprema bondade.
N'estc n^om^nto o bando tornou a acommetter com novo brio
o trabalho de descravar o corpo do Redemptor. Porém este lhe
disse :
— Cessae com vosso desejo: o que está escripto, cumprir-se-ha.
Deixae que o Filho do Homem morra na Cruz como o mais infa-
me do> malvados.
— Bem, Senhor — disse a ardoí inha cega — cumpra-se a vossa
vontade ; porem, dae-nos ao menos uma prova de vossa inexgota-
vel bondade.
— Tomae, disse o Senhor.
E inclinando a cabeça, deixou cahir sobre as avezinhas algu-
mas gotas de sangue, do que corria por sua puríssima fronte, san-
gue que lhes salpicou a p'Um?gem, e ellas, tomadas de maior ale-
gria, começaram a piar, dando graças ao Todo-Poderoso.
Duas gottas d'aquelle sangue redemptor do Crucificado cahi-
ram sobre as orbitas da avesinha ccga^ que logo recobrou a vista
perdida: ■ * ... • .
Essa mancha em vo sa plumagem— juntou o Senhor — será desde
hoje vossa salvaguarda. A me rada do homem será desde hoje em
diante vossa morada, e todos. vos. respeitarão, pois é esta a oúnha
vontade.
E desde então trazem as ar^orinhas na c^ibeça e ix> peito umas
manchas encarnadas, e todo o mundo, jovens '€ anciãos, as respei-
tam, querem e veneram.
Fodem ellas ter melhor defeza ?
26— Quarta-felra— S. Uno, Pp. M.=-St.** Evaristo,
Pp. M.-^S. Luciano e Corap. Mm.
■ ' ", ■ _ .1
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OUTUBRO 357
LEI INGLEZA
A maior parte das nossas leitoras sabem- )á (^ue as leis ingle-
zas não são codificadas. D*ahi se segue qu2 os magistrados, podem
quando lhes appetecer, folhear nos archivos juoiciarios para ahi
<le$encantãr uma porção de leis po ^as de parte, çahidas em desuso.
A propósito de uma d'estas applicaçóes feitas muito recente-
mente por um magistrado de uma «countrycoart» a «Schoolmis-
tress» acaba de exhumer um curioso «ac; of parliament» promul-
gado em 1670, no reinado de Cario i III. Esta Jei diz:
«Todas as mulheres, seja quil for a sua edade, posição^ pro-
fissão ou classe social, sejam virgens, casadas ou viuvas, que impo-
serem ou induzirem a casamento súbditos do sexo masculino de
sua magestide, por emprego de es-encia, caracterisação, cosméti-
cos, dentes artinciaes, cabellos postiços, espartilhos achumaçados,
sapatos de saltos altos, incorrerão na penalidade das Leis em vigor
contra os bruxos e bruxas e o seu casamenti será declarado nullo.»
Esta lei não tendo sido revogada, expõe todas as filhas de
Jonh Buli a serem condemnadas amanhã como bruxas e a verem
dissolver o seu casamento.
27— Qumta^eira— S. Btuno, C-t-Os Martyres de
Évora. — St.** Estevão, ímp, da Ethiopia.
E' tão fácil conhecer o inimigo do pobre quanto é difficil co-
nhecer o verdadeiro amigo do rico.
Perde-se mais em adular o rico do que em dispender com os
pobres, '
28— Sexta-feíra— S. Simão e S. Judas Thadeu, Ap-.
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358 ALMANACH^DE SANTO ANTÓNIO
PMBASES POPULAftS
Andar a raposa aos grilos. — ^^Lançar-se mâo de pequenos re-
cursos e proveitos á mingua de outros maiores.
Andar com à barriga chegada ás costas. — Cheio de fome.
Andar para tra^ como o caranguejo. — Correrem os negócios^
mal, e de mal a peior.
Andar na desanda. — O mesmo.
Andar n*uma roda v/va. ^Diligente ; açodado.
Agarrar com ambas as mãos. — Segurar uma cousa. •
Arder em pouco fogo. — Atrapalhar-se; atarantar-se com pe-
quena cousa.
A^edo como rabo de gato, — Cousa muito amarga.
Ainda lhe não nasceu o dente do siso. — Appíica-se a pessoa
pouco ajuizada apesar de ter idade para o ser.
Aos pares como os frades. — Diz-se de duas pessoas que andana
sempre juntas.
€)
©a
29 — Sabbado— AB. Paula de Mantua, V., da 2.*
O. — Trasladação de Santa Isabel, Rainha de Portugal,
Viuva, da 3.^ O.— S. Feliciano, M.— St.* Eusebia, V. M.
■^çgxj^xgp::
O general Fiabert, governador da praça de Sedan extranhou
certa occasiâo que o não saudava um sacerdote seu conhecido ao
passar por elle; mas não tarefou em saber que aquelle sacerdote
levava o Viatico a um enfermo occultamente para evitar os insul-
tos dos calvinistas que eram mui numerosos n*aquella cidade. Ap-
Eroximando-se então do ministro do Senhor com a cabeça desco-
erta lhe disse: — Rev. Padre, podereis esperar ao menos meia
hora? — E ante uma resposta affirmativa, ajuntou,: — Tende a bon-
dade de entrar na egreja de S. Lourenço. — E depois de o acompa-
nhar ao templo, mandou formar a guarnição para acompanhar o
SS. da egreja a casa do enfermo, levando elle mesmo uma tocha
íia mão que também sabia man^ejar a espada.
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OUTUMtO 359
30 — Domingo— (23-° depois da Pentecostes) — O B.
Theophilo de Curte, C, da i.*" O.— S. Quintino, M,
MÁXIMAS D'UM REI MAHOMETAND
O reino do Decan^ na lodia, foi até ao anno de i3i2 da nossa
«era,. habitado por gentios sujeitos aos reis do Canadá, passando etn
seguida para o domínio d'um rei do Dely que. lá estabeleceu uma^
dvronastia gue durou até ao período das nossas conquistas na Ásia.
Um dos reis mais notáveis do Decan foi Soltáo Piros, que fundou
uma cidade a que deu o nome de Xar Bedar, que quer dizer cidade
sem medo, no sitio onde, andando á caça, uma lebre resistiu a um
cáo que a perseguia.
âáo d*este rei philosopho e moralista as máximas seguintes,
que Diogo do Couto, na Ásia, diz que devem envergonhar os reis
^hristãos :
«Com os grandes ser temeroso,
Com os pequenos amoroso.
Os pequenos me; dão do seu.
O grande sempre quer muito,
O pequeno folga com pouco.
Os peixes, que andam no mar,
Os homens que andam na terra,
Aos pequenos fazem guarra.
Aos pequenos se ha-de ter amor,
Que aos grandes não falta favor ».
No tempo de Diogo do Couto, ainda andava na tradição o
-nome d*este rei moralista cõm o nome de pai dos pobres e o cele-
bre historiador affirma que, ao tempo em que escreveu as suas Dé-
cadas, ainda se podiam ver estas máximas gravadas na porta de
seus templos.
31— (£ Segunda-feira— 0>;'«íw com abstinência rigo-
rosa),— o B. Ttiomaz de Florença, C. da i.' O. — S. Quin-
tino, yí.— Quarto minguante às xq k. e 4.8 ittin. da, tarde^
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36o ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
UM PADRE IGNOmiNTilO
O anoitecer d'uin lindo dia de vèrâo, passeavam juntos por
A um dos jardins públicos de Roma dpis casquilhos e alegres
estudantes, levesinhos de cabeça e com uma lingu i de alto lá com
ella I . . .
Depois de haverem vagueado ao acaso e aventura, como se diz,
por varias alamedas, pegou cada um no seu charuto e foram sen-
tar-se a fumar junto d um sacerdote que descansado sobre um ban->
CO rústico, resava com toda á attenção o officio divino.
O sacerdote era já adiantado em idade ; a batina indicafva que
mais de dois tinha ella de existência e os sapatos bastante velhos
estavam resolvidos a deixar fugir os dedos em breve se unia tom-
ba não os resguardasse. Isto não era propriamente falta de asseio
n*aguelle sacerdote, era mais uma espécie de descuido negligente,
iiiuito próprio a quem pensa mais nas coisas do espirito do que nas
que nos prendem a esta miserável matéria.
Os nossos jovens casquilhos, pensaram logo que tinham ao
seu lado algum pobre parocho da aldeia, falto de instrucçáo e de
intelligencia, e decid'ram passar um pouco de tempo divertindo-sc
á custa do pobre sacerdote.
Começava então o ceu a adornar-se com as primeiras estrellas
da noite, as quaes refulgiam com umá luz encantadora lá no fundo
azulado do firmamento.
Um dos jovens dirigindo-se ao padre :
— Ha! que parece a vossa Reverencia, este espectáculo que s*
desenha sobre nossas cabeças?
— Admirável, magnifico, contestou o padre, magnifico como
todas as obras de Deus. CcbH enarrante gloriam Dei,
— Ohl e.se V, R. soubera o que são a$ estrellas,^. então é
que ficaria assombrado deveras]. «•
— Certamente, contestou com profunda humildade o sacer-
dote, quanto mais nos profundamos no conhecimento das coisas^
mais e mais admiramos a eterna sabedoria de Deus.
— Pois, sim senhor, disse o outro caloiro : ... a sciencia mo-
derna tem feito muitas descobertas. . . e esteja V. Ex.« descansado^
<]ue hoje não comemos as tolices que nos impingiam os padres
ignorantóes e os jesuitas.. . poraue o mundo marcha, como disse
Pelletan, e passou já da moda a taeocracia e o obscurantismo.
— Pois olhem, meus caros jovens, eu até hoje acreditei que a
Igreja protegera sempre as sciencias, e na classe a que indignamen-
te pertenço parece-me haver sábios de todas as classes e condiçÓes;^
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OUTUBRO 36i
porem se V. Ex.as dizem o contrario é porque ò conhecem muito
bem... Ora vamos a ver. — contem-me, contem-me o que diz a
sciencia moderna a respeito d*essas maravilhas celestes que no 5
assombram.
— Em primeiro luçar, diz que tudo isso què vemos náo foi
creado do nada por Deu>, conio dizem os ígnorantóes dos padres,
mas que tudo isto foi produzido por uma constante evolução át
matena eterna...
— Muito bem, muito bem, replicou o sacerdote: até agora acre-
ditávamos que nada pode criar-se a si mesmo, e que o corruptivel
e composto não pode ser eterno, porem V. Ex.«s que são tao sá-
bios, oizem o contrario... E què mais?
— E que esses astros não são estrelhs de oxaláta cravadas no
ceu, mas mundos co:tio o nosso, e com tudo como o nosso n'uma
palavra.
— Anda. burro ! E eu acreditava que eram umas estrellilas de
prata cravadas n'uTia abobada de crystal azul... Oh! mas quanta
se aprende f aliando coii estes sábios !
— Continue, continue meu sábio ioven.
O mais audaz dos dois estudantúhos^ chegou-se ao ouvido do
companheiro e disse-lhe a meia voz :
— Parece-me que este jesuita está a fizer escarneo de nósl
Porem vais ver como lhe dirijo uma piada de embatucar.
— Pois, sim senhor, disse o estudantelho audaz, vocês os ca-
thol cos, como não estudam senão esses latins que para nada ser-
vem, não sabem uma palavra de sciencias positivas que são as
únicas sciencias, e até ignoram o intermédio de hypoteuma com a
parábola do pericárdio,
— Estou assombrado de o ouvir, e comprehendo que nós o>
am^s do latim nada sabemos d'isso que V. Éx.» diz.
roeste ponto começaram a tocar os sinos d^uma egreja cha-
mando os crentes á oração.
O sacerdote poz-se em pé, rezou o Angelus Domini e depois
dirigindo-se áquelles cmeliantes, disse :
— Sinto muito que seja tarde já, e que por essa circumstancia
não tenha o prazer de os continuar a ouvir a dissertar sobre o hy-
poteuma e sobre o pericárdio.
Porem qualquer dia nos tornaremos a ver, e V. Ex.as conti-
nuarão a illustrar-me com as prelecções sobre a sciencia mo-
derna.
Por isso fiquem com Deus, e disponham d'e>te pobre saper-
dote.
Se em alguma coisa lhe posso ser prestavel. . . eu me chamo
Angelo Secchi, sou jesuita, e na minha casa é a casa dos senhores.
Aquelle pobre padre, era com eíFeito o P. Secchi, o grande
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362 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
çtôtronomo cuJas descobertas e estudos causaram e causam a admi»
ração de todo o mundo.
Os dois estudantilhos, ficaram estupefactos ç boqueaberto%
querendo n*aquelle momento que a terra se abrisse para os tragar ;
mortos de vergonha balbuciaram uma louca desculpa, apressando-
se. a fugir d'aquelle lugar temendo que o P. Secchi se risse á sua
•custa.
(Do hespanhol),
Braga.--24— IO— 902. P. Alberto Teixeira.
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Jíovembro 30 Dias
No crescente deita mergalhias, alporcõeí e planta alhos,
castanheiros e carvalhos; semeia trigo serôdio e ervilhas; planta
arvores de bacelo e roseiras, e acaba de plantar
as raizas bulbosa$. No mingumta faz salmoeiras e limpa
oa corta madeiras.
1 — -'Terça-feira — Festa de Todos os Santos. —
— N*estc dia nasce o sol ás 6 k, e 45 ;«., e põe-se ás $ k.
e 13 m, — Ind, plen, para os irmãos da Conceição^ do Ro-
sário e do Rosário Vivo. — Os fieis qite fizerem o mez das
/limas ganham cada dia sete annos e sete quarentenas e
uma plenária em qualquer dia do mez á escolha de cada um.
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Hj^-i i i ^ . .ii m i ii .. ..yi ) i|ii»Ni«y^,..«,,||,y.»q^H|i,»^|)|i,|^,||,i y <i i i n >^-^ n i.i | ii - »nry ■ ■
(A J. Ribeiro Braga)
UNTO ao mar de Tiberiades — tantas vezes celebrado na
Evangelho com os proiigios de Jesus, havia \i:n for-
moso castello, resguardado por altivas torres, circum-
dddo de jardins extensos, luxuriantes, onde as palmei-
ras e os terebint03 abriam seus frondosos ramos for-
mandp delicio 50s caramartcheis.
Os magniíicentres síílóes do stíiíij^íJjoso palácio, artezoa-
|S^ dos de caprichoso; labores, rescendèndo àrômas exquisitos
eram abertos frequentemente á juvenil soriedade elegante
q\i2 vinha disputar os olhares e o'. sorrisos da liberal dona
d'aquelle cden encantado, que era moça e rici, gentil e
formosa.
A esbelta castellâ recebia os seus cnanK)rados hosp^lcs
com luxo variado c surprehendente : tra|iví os melhore? enfeites
que eram o prilíKJf industrial da Phenicia, perfumava-se com as
essências mais caras do oriente e mandava servir aos seus admira-
dores lautos banquetes onde appareciam os mais deliciosos vinhos
de EphraYm e ds Eugaddi. (')
Quando as ultimas claridades 4# dia vagimente lampejjvani,
em dúbios tons, ao longe, nas copíks frondentes dos cedros do Li-
(h Ephruim:— ao sul da f>1anicíe de Jcsrnô!, a intiMvalIo médio <io Jurdão e
do M 'diterraneo.
BugaiitJi:>-sotjm o AspliallUe) ao oçeldeaU) : Hiouteá il« ubefrímo solo, pro^
ductoivs de famosos viiibus.
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NQVEA^RO' 365
bano, a senhora do Castello, donaiixJSa. e triumphante, acompa-
nhada de creadas e convivas ébrios do encanto da sua belle^, des-»
cia ao. jardim a gozar, entre delirantes ovações, a emanarão balsâ-
mica das flores que a briza da tarde baloiçava r os canteiros.
E, quando a roite estendia o triste véo de pesada sombra na
amplidão, a folgazá con:itiva subia ao palácio onde os mais precio-
sos crystaes brilhavam phantastic imente ao reflexo da luz dos can-
delatros.
È então a festa era mais viva com o enthufiasmo da dansa,
com p doido phreneri em que as harmonias da mufica e da poesia
embriagavam a assembleia.
No fim, quando os convivas, encantados, desciam as escadas do
castello, roberbamente engalanadas, a jovem castellã adormecia e
fonhava com covas diversões com que havia de siirprehender os
seus apaixonados.
Ao outro dia, como a fua peixão dominante era a de bem pa-
recer, fazia-se acompanhar dos seus dorr.esticos, enfeitada no re-
quinte do luxo, ostentando o coUo adornado de perolr;9, coberta áz
perfumes e passeava pela Galiléa despertando attençóes, enr-ocio-
nando os corações frivolos e famintos de commoções mundanas, e
deixando na sua passagem, por toda a parte^ um surdo rumor, que
em breve tempo resultou aberta murmuração de escândalo. '.
Forem, umà noite, quando no castello de Magdallo terminou
o festim, se.apagaram as luzes e fecharam as portas, a altas horas
de silencio é de pez, quando apenas se ouvia o brando susf inr das
aguas do mar de Genezareth e a levç agitação das frondosas pal-
.meíras, á luz branca do luar d^aq^uellaroite formosa distinguir-se,
recostado ao peitoril d*uma jãhella, um vulto airoso de mulher gen-
íil, esparsas pelos honabros as comas loiras a qu2 a luz da lua dava
um aspecto magico e deislumbrante. Os seus olhos scintillanteí^,
n'um scismador enleio, perdiamTse na amplidão, sem fixar um
ponto certo. O pensamento d*aquella solitária da noite vagueava
longe d'£lli, bem longe, dorido de siudades talvez... oii nem se-
ria a coisas do mundo que ella se prendia então.
E esteve horas e horas, n'aquelle scismar dolente, embebecidi
eril mysterios, a linda mulher de comas loiras esparsas como fios
de seda e ciro; e, ao erguer-se d*alli, d*aguella prostração contem.-
plativa, soltou uni suspiro magU£.do, profundo, e de certo chorou,
porque o pranto, com.o disse alguém, é a respiração da alma aba-
fada pela dor.
• Essa mulher formosa,, qup, áquella Hora roceg^da da noite,
devera re{!)oisar da alegria folgas ã da ir.ocldade, embalada em ro-
nhoí de esperanças de ventura, alheia a maguas e á tristezas;
aquella mulher melancholica e triste que procurou o silencio dà
noita para se embrenhar em largas meditrções profundas é a volu-
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366 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
vel Magdalena, a elegante^ dona do palácio, a rainha das festas, a
invejável soberana dos salões que subjuga a rodos, com seus admá-
nes senhoris, realçada a natural fortr;OSura pelos adereços brilhan-
tes de jóias caras e pfeciosas.
E* que ao final dos esplendidos festins em que ella dominava
pela seduçfo, rodeada de pompas, cheia de gallas, sorridente, en-
cantadora, triumphante, o seu òoraçâo acordava do lethargo do
prazer sensório e a triste Magdalena reconhecia que dentro de si
havia alguma coisa mysteriosa á qual n£o satisfazia' o ruido das
festas nem o luxo das gallas-^os prazeres e as vaidades do mundo,
A sua esbrazeada iraaginaçfo de oriental já tinha esgotado a
inventiva dos mais exquisitos adornos, dos mais invejáveis confor-
tos, das mais variadas e caprichosas ostentações.
Pois bebendo ?offregamente a áurea taça das mais requintadas
delicias sentia-se cada- vez. mais. sequiosa, fera como Tântalo: r<>-
deada dç amor e prazer e náo podendo nunca saciar-se de amor e
sentindo sempre, cada vez mais forte, o próprio prazer a cavar-lhè
o abysmo do coração.
"E* que a nossa alma tem sede do infinito e $ó o infinito lh'a
pode apagar.
E a Magdalena, em silencioso retiro nocturno, ao váo d'unia
janella do seu palácio,— theatro de dissipações e objecto de escân-
dalos, sósinha concentrada na consideração da sua vida de munda-
nalidades, meditava no que ouvira contar, na ultima tarde, acerca
d'um jovem Nazareno que andava pelos arredores, seguido de
grande turba de homens descalços, de mulheres e creanças, pre-
gando uma doutrina carinhosa a que humanos ouvidos não anda-
vam afFeitos.
De temperaníento vivo e impressivel, Maria Magdalena só es-
perou que os primeiros clarões da aurora surgissem no horisonte
para sanir do castello e procurar a Jesus, afim de lhe ouvir a doce
moral cuja fama corria por toda a Galiléa.
Foi a conver: áo da Peccadora.
P.e Silva Gonçalves.
2 — Quarta-feíra — CommemoraçAo dos Fieis De-
funtos. — S. Victórino; M. — Ind. Plen, para os irmãos da
Conceição e do Rosaria Vivo.-^A primeira missa de hoje i
privilegiada.
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NOVEl^RO 367
Cemitério de Fregim (Amarante)
Que em pa^ destcanca^ quem áMeffra sorte
Lançou ncu: trevas: d' um eterno oíviio.
Quem perdeu tudo-^a grande^ai of: porias ^
D*algída lousa com o v.ío *stampido,
Oue em pax dercance, quem ousou outr*ora
Com frágil lenho, valor mais que humano.
Cruzar os tHares, conquistando glort^s^
Domando as fúrias d' esse vasto oceano,
Defxance em pa^f, o que morreu cantando,
De t^ortugal, e yictorias;
Deícance em pa^, e a mude^ da campa
Tributj ás cin\as as devidas glorias.
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3$8 ALMANACH DE SANTQ- ANTÓNIO
Pa:ç e repouso aos que soffreram tanto!, . .
Bavendo sempre as armas por mortalha:
Dcscanço eterno a quem morreu pugnando
Pela pátria nos campos da hatalna,
Defícance afora quem no frio tumulo.
Sob essas J olhas y que soltou o outomno, •
Jd longe e livre dos vaivéns da sorte,
Repousa e dorme seu eterno somno.
Que o nauta ousado, que morreu nas aguas
£ em ondas tristes, solitário ja^,
Descance asrora, jd de tantas maguas.
Repouse e durma n*uma eterna pa^.
E a mãe saudosa que adorou seus filhos
E ja^ agora solitária e só,
Descance e durma n'uma pa:f tranquilla
Ld n'essa campa de gelado pó...
Fr.^CAsiMiRo R.
3~QuÍnta-feíra— S. Malaquias, B. Primaz da][Ir-
landa.
Para o p>obre que soffre em doloroso abandono, néo ha esmo-
la msis suave, que uma phrase de consolação, proferida por um
verdadeiro amigo.
Fluahnensf.
4 — Sexta^feíra — S- Carlos Burromeu, Arceb. Car-
deal.
O amor não é o prazer, não é o egoísmo do gozo, não é a il-
lusáo d' uma paixão brutal.
Quem ama dá-se antes de tudo: o ultimo termo do amor é o
sacrifício.
— ^A doçura é uma força conquistadora. .
Henrií^ue Pekreyve.
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NOVEMBRO • . ; 3%
5— Sabbado— O B. Raynçrip, C. 4a í-* O.— A. B,
Helena, V., da 2." Ordián.— S. Zachádas e St.* Isabel,
pães de S. João Baptista.
— Olá! quantos sâo hoje?
— Conte pelos dedos.
6— Domingo— 34.'' depois do Pentecostes).— A B.
Teliz Meda, V., da 2.* O.— S. Severo, B. "M.— S. Leo-
Tiardo.
(Madonna de Raphael)
Jd vi o amor, como em pérolas
cair de olhos crystalUnos ; . .
astros cadentes . . divinos. # .
pareciam. . . a vir do ceo.
Já vi a dor, cómò émgúttulàs
de myrrha verter O pranto;
rocio era, amaro í . . tanto, . . .'
qual nunca erguera o escarcéu.
Quando meigo o somno plácido
adejava sobre o infante,
•cessa o mavioso descante,
já se não ouve embalar, .
Junto do berço, entre júbilos
era a mãe, . . e n'este enlace,
eis, lhe oscula a ebúrnea face,
e de amor fica a chorar!
ii
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370 ALMANACHDÉ SANTO ANTÓNIO
Jâvi o amor, como em pérolaà
cair de olhos ckrystailinos ;
astros cadentes,,, divinos..,.,
eram estes, a raiar.
Quando, tarde, sobre u/n féretro
viu pairar sombras de morte,
geme! E ao ver do filho a sorte,
cae na tumba a soluçar!
Como a violeta do cômoro
sobre a campa está pendida,
. sobre o filho a mãe dorida,-
* com a dor ja:^ a penar!
Já vi a dor, como em gútullas
de myrrha, verter o pranto;
rocio era, amaro, . . tanto, . ,
qual só ergueria esteayir.
* *
Mãe do Ceoloh! assim lagrimas
outra mãe não choraria;
eras tu!,,, doce agonia,
ai! calava a tua vo^.
Perto do berço, do tumulo, .
o amor, a dôr te ferira,
e em Jesus prantQ caíra;
— Mãe! chora, tombem por Jtós!-^ '.
(Roma— -IX— 1901. P. Freitas.
^^
7 — • Segunda-feira— O B. Bernardino de Fos-
sa, G., da I." O. — S. Florêncio, B. — Ltia nova ás 3 h, da
tarde.
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í
NOVElVffiRO A S7Í
^Ha núiito qu^nfaçabenu,
t<Assim elle hoi^vas$e a .quepiJy»
A informe ingratidão
Morde a mão que dá pão,
«Quem não quer quf o mundo f alie,
tíNão vagueia. ', . pel& yalle.y»
,. O mundo S£m seus amores.
, Era um jardim. sem flores, ,
• Mulher que não toca o solo,
Se a tens, . . é tra^el-a ao collo.
Alves de / lmeida.
B—TerÇÁ-ieirdi^Oiíava da Festa de Todos os San-
-tos). 4^0s Sts. Coroados, Mm.- — S. Severiano e Gomp.^
Mm.
Dedical-Tos á pratica de estas duas grandes virtudes : doçuri
e humildade.
S. Magdalena de Pazzi.
-^mi^
9— Quarta-feira—rDedicaçao da Basílica. da SS.
Salvador (em Roma).=St.^ Theodora, M.
O verdr.deiro fim da sciencia é distingi!ir ò bem do mal.
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372 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
10— Quínta-feira — ^St** André Avelino.— S. Florên-
cio, M. — Os Sts. Tryphon eComp., Mm. — Ind. plen. para
os irmãos da Conceição.
TRISTES
A mãe sentada d lareira^ E quando ia ao cemitério
Vendo os filhos com ternura^ En/eitar-lke a campasita.
Chorava a pobre Marias Di:^ia sempre: Que sonho!
Que estava na sepultura. Moi;tajá e tão bonita!
A morte não tem remédio
E* somno eterno^ infinito;
Somno que para uma mãe
E' como um somno maldito!
José Victorino.
11— SòXta-feira— S. Martinho, B., C— St.* Menna,
M. — Nasce o sol ás 6 k. e 57 min. e põe-se ás 5 h. e Jj
min.
Alimento é da culpa a lisonja, coxo o óleo é nutrimento da
clxâfnnia.
12— Sabbado— 0>/'«w;— S. Diogo, C, da i.' O. —
S. João dá Paz, C, da 3.* 0,—Ind. Plen. nas igrejas
franciscanas.
O homem mais auer ser lifongeado com mentira, que rc-
prehendido co.ti verdade.
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NOVEMBRO
37^
13— Domingo— (25.* depois do Pentecostes).— Pa-
trocínio de N. Senhora. — St.** Eugénio, B. de Toledo.—
S. Martinho I, Pp., M. — Itui. plen. para o Rosário Vivo.
Oh lu!i da noite f oh lua!
Que lu^ suava a tua!
E como se insinua
Na alma que fluctua
De enganos em desenganos!
Oh creação sublime! . ,
A tua lu!j[ reprime
As tentações, do crime,
E d dòr que nos opprime
Abre-lhe um oceano!
Será o ceu um lago,
E tu reflexo vago
A a alma onde o afago,
Na alma onde o aspecto!
Oh lu^ do dia!
Que mystica harmonia
Ha n*essa lu^ tão fria,
E a sombra que me guia
N'este areal deserto !
Embora as nuvens tragam
Do dia outra roupagem,
O sol de que és imagem
Não tem outra roupagem
Não tem essa linguagem
Que encanta, que enamora !
Mira-te a gente, estuda.
Sem medo que se illuda.
Essa linguagem muda;
O teu olhar ajuda,
E a gente sente e chora
Ah sempre que descrevas
A orbita que levas,
Confia-me o que escreves
De quanto ve:^ .nas trevas
Que a lu^ do sol encobre!
As victimas que escutas
De raças mais astutas
Que a.v d* essas /eras brutas,.^
E as lagrimas, as luctas ,
Da orphd, e do pobre ! \
João de Deus.
""^fíÔ^
14—2) Sègunda-felra — O B. Gabriel Perréti, C.
da i.^ O. — O B. Nicolau Tavilei, M. da i.^ O. — Quarta
crescente ás 11 h. e ^8 f«. -da^ tarde.
-^7Ít^
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374 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Lê taes matérias :que te de^m mais compunçâp q^ie o:ciipação.
• - Ktsmcfís.
15 — Terça-feira — St.* Gertrudes, V. — Dedicação
da Real Basílica do Coração de Jesus. — Ind, Plen. para
os irmãos do C armai * •
- BRIGA ENTRE CAVEIRAS
«Vr^jí» Guardião d'um <?erto convento querendo ter mais presente o
yra pensamento da morte levou para a sua cella uma caveira. Os
"^' demais religiosos seguíndo-lhe o exemplo levaram também
cada um a sua, mas em vez de as tirarem do cemitério onde se
enterravam só religiosos, alguns as tomaram do adro da egreja do
logar visinhò.
Aconteceu, porém, que estando á noite no refeitório para to-
mar a sua frugal refeição sentiram um desusado estrondo pelas
ccllas e corredores do convento. Continuiram a sua coUação em-
quanto dois religiosos dos de mais coragem foram saber da causa
d*aquelle estrépito. Mas, qual não foi o espanto d*aquelles corajo-
sos monge > quando viram que as caveiras se moviam d* umas cellas
para as outras e se chocavam mutuamente enraivecidas! Trémulos
ainda lá .se poderam, posto que com difficuldade, tornar ao refei-
tório dar conta do acontecido. Reinou o pavor por alguns minutos
n*aqu2lla communidade. Mas oh! notável acontecimento! quando
se apressava a descer o primeiro degrau do subterrâneo topa com
duas filias de caveiras, estando as aos religiosos á direita e á es-
querda as que tinham sido tiradas do adro da freguezia, prestes
a apresentar combate.
Vendo pois que aquillo era sobrenatural, determinara voltar
á oração com os seus súbditos para que, com o auxilio divino, podesse
desvendar o mysterio. Acabada a qual concordaram todos de que a
causa d'aqu3llas anthipjathias entre oscraneos era: que tendo sido
tirados alguns do cemitério da visinha freguezia, onde também
se sepultavam homens amigos de brigas coléricas e que raras ve-
zes ou quasi nunca frequentavam a egreja do convento, e occupas-
sem os logares mais recônditos do mosteiro, indignados os dos
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NOVEMBRO. 375
santos e pacíficos religiosQS; que alli tinh^inv vivido, e^^ morrido tom
fama de santidade, iquizéram moyer-lhe^uniá atrocíssima guerra.
E tanto isto era verdade qus postas as caveiras no seu antigo logar,
cessou o ruido. - > .
Por este facto quiz Nosso Senhor mostrar que nem na sepul-
tura os maus devem jer parte doni:ós l)pQs. . "]
16— Quarta-feira— St.* Ignês d' Assis (irmã de San-
ta Clara), V., da 2.* O.—S. Valério, M.—Ind. Plen, nas
igrejas franciscanas.
Cidade de Moçambique
Se a loucura meditasse Da criminosa descrença
Talve:^ que um dia acabasse. Provem a torpe licença.
O sábio ensubercido
E* um louco envilecido,
Alves d'Almeida.
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376 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
17— QUÍnt(Hfaíría--A B. Sálomea, V., da 2/ O.
Para dtimniítr a febra
Fazer fricções d'agua fria, no corpo, amiudadas vezes, e be-
ber agua ou limonada aos poucos.
18 — Sexta-feira — Dedicação da Basilica dos Após-
tolos S. Pedro e S. Paulo. — S. Romão, M.
Um dia fallava-se deante do commandante Marceau, acerca da
communhão. Diziam alguns, que era abster-se da communhão por
respeito.
Pois eu, disse o commandante, se commungo tfo amiudadas
vezes, é porque sou um miserável. Careço de um remédio quoti-
diano para me sustentar. Quando commandava a Arca da AlUança,
soube que alguns marinheiros murmuravam, vendo-me commun-
gar com tanta frequência. Reuni então a tripulação e lhe disse:
«Meus homens em vez de criticar a minha devoção, devieis alle-
grar-vos, porque se eu não commungasse todos os dias, á menor
coisa que fizfsseis, irieis todos de cabeça ao mar.
E o valente e piedoso marinheiro continuou a commungar
toda a sua vida, chegando assim a veilcer completamente o seu ca-
racter irascivel.
19 — Sabbado — Santa Isabel, Rainha da Hungria,
Viuva, da 3.* O. e Padroeira das Religiosas da mesma
Ordem. — S. Ponciano, Pp. M. — íhd. Plen. nas egrejas
franciscanas. — AbsoL geral para os Irm. Terceiros.
-cíxaiNíQXo-
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NOVEMBRO 377
Santa Izacel d^Hunguia
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378 ALMANACH PE SANTO ANTÓNIO
ReçprtajTips dç.juroa- fiuriosa estatisLCi o. seguinte: Em todo
o globo, morrem cada anno 33 milhões de indivíduos, o que per-
faz á niôdia de qi:54^ pòr dia, 3:73o por hora e 42 por minuto. A
duração m^di a "da vida hutn.ana jí de 38 annos proximamente. A
quarta parte á\ população morre antes de chegar aos 7 annos, a
metade antes dos 17. Em iookx» pessoas ha urtia apenas que viya
looi; láiinos. Por cada 1:000 p^essoas que chegam aos 70 anno3, 43
perté^pem ao clero ou á política, 40. á agricultura, 33. á classe ope-
TarÍ3lv'32 á militar, 29 advogaaps ou engenheiros, 28 professores e
24 i6 mediçQs.
^0 --- Domingo — (26.'** depois do Pentecostes) —
S. Felíx de Valeis, C. ,
Hm saber e fidalguia Não enrAnes: a ninguém
lia muito alarde hoje em dia. O que a ti te não convém.
Cá fiobre a esíphera mesquinha
Tudo ao nada se encaminha.
Alves de Almeida.
-.•55^ <$> — ©•—
21 — Segunda-feira — Apresentação de Nossa Se-
nhOTs.— Nasce o sol ás y h, e 6 m, e põe-se às 4. h. e 54. tn.
— Ind, Plen. para o Rosaria Vivo.
Ao terminar a sanguinolenta batalha de Forbach, entrada a
noite, uiti capitão dó exercito francez chegou á ambulância, com
alguns soldados, muito poucos. O capitão, um dos bravos da Itá-
lia e da Argélia, cujo rosto estava coberto de pó e sangue, appro-
ximando-^e do pesso 1 da ambulância, exclama com animação:
-7. Vede o que resta da mii)ha companhia. De tí>.do§ os meus
soldados, são estes os únicos que restam. Eu, accrescêntou o mili-
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NOVEMBRO 379
tar, í^ãó sei sé vós tenáes fé, pòréani devo dizsfrvos, que todos os
-que voltamos, traziamoí o escapulário da YkTg^; « to i(M^ cremos^
<iue foi Elh a que nos salvou.
E desapertando o uniforme, o veiho capitão, nrosrrou com tal
fé e piedade o escapulário, que despertou admiraçã:> em todos os
assistentes.
22 — Terça-feira — St.* Ceciliá, V.. M.
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> g>» S >»^»»^»» ^»^» g» ft ^» » ^ »^ > » ^ » ^ '» ^ »>^» ^>»^ »»^ »^»»g K>^w £
O LACO DA PRIMEIRA- COMMUNHÃO
í alegre c feliz foi a véspera do dia em que Gre*
;orio e Filippe fizeram sua primeira communháol
Eram dois amigos que se conheciam no col—
egio desde pequeninos; trocaram muitas vezes
iuas estampasinnas e brinquedos, e nunca lhes pas-
ou pela imaginação que teriam de separar-se al-
gum dia.
— Olha, dizia Gregório, quando formos maiores, tu serás meu
ajudante de camará, e estaremos sempre juntos, sem nos separar-
mos nunca, nunca. . .
— Já ouviste o que nos disse o P. António — replica vaFilipj)e:
—os meninos que fazem juntos a primeira communnão são irmãos^
e têem uma mesma mãe, a Santíssima Virgem Maria.
— E con-o nós somos táo bons e nos amamos tanto, não nos
custará muito sermos irmãos.
— Eu vou pedir a Deus que me faça um S. Luiz Gonzagia.
— E eu, além disso, pedir-lhe-hei que teu papá encontre um
saquinho de dinheiro; com elle poderás comprar a defeza de Pozo-
Negro, que está á beira da minha, para que vamos todas as prima-
veras tomar leite de vapca juntos.
— Porém, se disse o P. António que essas coisas não se pédcm...
— Sim, tonto; mas deve ajuntar-se sempre: «se convém».
— Falem.os da festa de amanhã, respondeu Filippe.
— Que bonitos estarem.os com nosso vestido novo! A mim es-
tão-me fazendo uns sapatos brancos, e vou estrelar um chapéu.
— A mim, respondeu Gregório, me está fl.zendo minha mama
um laço branco com fios de oiro.
— Estaremos, portanto, juntos todo o dia, e repartiremos no
convento de S. Francisco o pão aos pobres com o irmão Raphael.
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NOVEMBRO 38i
— E ncínKa tBanji nos difrá dôcc|s e brinquedo ^.
— E beijaremos a mão aõ P. António, que nos confessou.
— E...
À campainha do coUe^o veio interroimper o pueril dialo^;
toàos os collegiaes se dirigiram á capella para ouvir a ultima pra-
ctka que lhes fazia o Padre António.
Ma manhã 5e^inte, a câpelU do coUegia, ricamente adori^a-
da^ tendo o altar iliumiriado^ com profusão de luxes, e com um ér-
tisrico arco de ãôres em voUa da inqagem de Santo António, titu-
lar do collego, apresentava um aspecto grandio"^.
Ghe o j o momento da Communhâo. O padrje António, lan-
<io o «Amado de Jesu^», de Kerrer, inspirava affectos amorosos e
dese;o> vehementes aos meninos que pela primeira vez se acecça-
vain da sagrada meza, excitando-o> á dor- de suas faltas e ao desejo
<ie. receber em seu peito o Gordeiro sem mancha; a ij^elies co^a-
^óe&iohos desejavam por mogientos que chegasse a hora do divino
convite.
Depois da elevação reini^u um silencio sepulchral; a voz, ura
taiito bronca, do padre António, veio interrompel-o so proferir
aqucllas desejadas» palavra^: í< Corpus Do mini nostri etc.» O* roo-
memo supreifto, vida verdadeiramente celestial ! O' regosijo saoto
€ consolado^ que tâô breve passas I
Defoito anno) haviam decorrido, quando, encontrando-sc o
padre António em sua humilde cella^ folheando um antigo livro
de pergaminho, chegou o irarão porteiro, annunciando-lhe que um
cavalleiro o esperava no receptáculo. ^ '
Dê ceu o píadre, è encoótrou-se com^úm homem^pobremeote
vestido, em cujo semblante 'estavam retratados todos oi vicios.
Nâip pôde deitar de extranhàr uma vis.ta doeste género, e tratou
de hveriguar o moúvo.
— Perdoae-me, meu padre I— exclamou o jovem, lançando^se
a s^spcs. Fu sou GregoriQ Fernandes e Goo^ves, tilho do c^n-
de Sierra Piro- • • i
— Gregório Fernandes, filho dò: conde de Sierra Pino? —
exclamou estupefacto o bom padre Ántonio, que. l^vaiitando-^e,
IhÇ ditse:— Como vieste a esta situação, meu fílho? Conta-noe,
porque estou prompto a cscut^r-te.
— Depois que sani dò cojlegio, replicou Gregório soluçando,
niétt3 pães me mandaram estddar a Madrid; alli comecei a juntar-
nn^ com uns perverso^ .companheiros, e desde entáo minha vída
nãò tem «ido mais que uma cadeia nâò interrompida de escândalos.
[' Passados três annos depois que fui para Madrid, morreu meu
pa^ e quebrado o freio que me continna, se acossaram de mim
toios os vicios e libertinagem d'aquella corrompida cidade.
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as^ií^^â
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^Si^â3©5Ií^!Sia@©â
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384 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Depois casei-me, contra a vontade de minha n:Se, com unna
jovem que me igual iva. em fortuna, porém que me sobrepujava
em prodigalLdide. Elía com seu luxo, e eu com o maldito vicio do
jogo, 4estEOçamo; toda ^ rainha, fortuija, c sen^ insuppoj;£ayjçl sua
presença, separei-me d*ella por meio do divorcio.
Vcndo-me perdido e sem vintém, voltei para a minha povoí-
çáó. A pobresinha de ramha mãe, já anciã, vendo-me n'aquelle de-
plorável estado, foÍ tomada d' uma tal tristeza e melancho%, (|ue
por ella foi levada á sepultura. Como havia muito tempo que me
tinha apartado das praticas religk)sas, e é na religião que se en-
contra o único consolo, em vez de spfFrer com resignação aquelle
terrível golpe, entreguei-me á desesperação, e seguidamente lem-
brei-me do suicídio; n'aquelles momentos, meu padre, a vida tne
era insupportavel, principalmente quando me recordava dos m^us
primeiros annos; apresentav^m-^^e á minha imaginação meus que-
ridos pães, mortos quando cu d'elles mais necessitava; estas re-
cordações augmeptavam mais minha desesperação.
Decidi pôr fim á minha vida; para isso quiz servir-me de uma
arma de fogo que tinha meu pae em uma gaveta.
Entre os caixões havia um de minha mãe, e abri-o por curio-
sidade, e ao abril-o experimentei uma extranha impressão quando
vi uma multidão de brinquedos que me lembravam os felizes dias
dos meus primeiros annos, c ás vezes serviam para lançar-me em
rosto o crime que h f zer. Entre aquelles brinquedos vi um pe-
queno pacote, envolto em um papel de seda cor de rosa, abri-o,
e repentinamente appareceu ante meus olhos, collocado com mui-
to esmero, q laço branco com fioí ;de oiro, de minha primeira
communhão. Vêl-o, e deEran^ar copióáas lagrimas, foi coisa de um
momento.
— Vem, mãe da minha ajma, e perdoa a teu ingrato e malva-
do filho! Vem, e põe-me es^ laço com o. cuidado e esmero, com
que m'o puzeste no dia da minha primeira communhâo, que eu .te
proínetto sçr como n'aquelie.ciial
Beijei-o mil yez^s, e reguei-o com minhas lagrimas.
Rendido pela emoção adormeci, e quando acordei tinha em
miithas mãos aquelle laço para mim áanto, que teve mais eloquên-
cia oue todo um sermão.
Duas grossas lagrimas correram pelas já enrugadas faces do
padre. António ao ouvir esta relação.
—Desde este momento, meu padre, — disse Gregório —renego
da vida que tenho tido, e quero separar meus escândalos, entrando
n'uma religião austera e observante.
O padre Antónia abraçou contra seu peito seu querido disçi-
pulo antigo, e bemdisse ao Deus das Misericórdias, que se serve
das coisas mais pequenas, para converter o maior pecvador.
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NOVEMBRO ^ £85 •
— Nééessario é, meu 'filho,— dissfâ o í)adré António— ^uè ter-»
mines tua obra começada; conta com meu auxilip, « pÒé^értí prá-
tica tua resolução. Porém pafa isso éprccisfo que faças -uriía boa
•confissão eeral.
Passados seis dias voUou ao convento, íez uma confisfâo geral
dolorosa, e se despediu dó padre António para cumprir sua pro-
messa, y
Assim foi : nuo, bayiua decorrido um nae.aj,. ftuaji;^^ o p?uíre An-
tónio recebia uma carta, em que Ihè dizia Gregório que tírtha to-
mado o habito do Bemaventurado Patriarcha S. Francisco* díe As-
sis, e. que em sua pobre cella não tinha outra coisa senão um Cru-
cinso, e,a seus pés preso o laço de sua primeira comn.unhão.
23 — ® Quarta-feira—S. Clemente, Pp., M.— St.*
Felicidade, M.—Liià cheia âs 2 k, e jy m, da ruanhã.
Contempla as tuas loucuras Os annos, e só os annos
na cin^a das sepulturas. nos dão tristes desenganos-.
Os fumos da formosura A penitencia condu^ ,
acabam na sepultura, ao Império de Jesus,
Alves d' Almeida.
24 — Quinta-ífeira- S. João da Cruz, C— S. Chry-
sognp, M. — S. Estanislau Kostka,.S. J.
Homens de Estado, oradores, artistas e litteratos celebres,
teem encoptrado no rosário a paz, a energia, e a inspiração de que
careciam. . .* ■ C ..'
.CConfell recitava-o na camará dos communs, emquí^nLo a for:e
da Irlanda, se resolvia por meio das replicas que faziam aó.^eii ma-
gnifico discurso, no qual advogava a sua independência.
25
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386 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
G^rcv) Moreno, Presidente da RepubUca do Equador, rezava-o-
todos os dias.
SÂWio Pelliço, Gluk e Mozart tinham-Ihe grande devoçSo.
25— Sexta-feira — St* Catharina, V. M. — A B.
Izaj>çl Bona, V., da 3.* O. — Aòs. Ger,
«Miseremini mei
sattem vos ai
(Job. 19, 2.^
«Miseremini mei...
saltem vos amici roei».
Ah! quando correr Jd um suor frio
Sobre estas faces a' um pallôr mortal
E o mocho triste no cypreste esguio
Cangar o som presago^-o som fatal;
Lembrae-vos d* este filho da vaidade
Que morreu sem pensar na eternidade!
Quando a noute enlutando a natureza
Cair tristonha, e em véo caliginoso
Envolver meu jazigo de tristeza.
Lá solitário e só, silencioso!
Erguei a prece por quem dorme só
Etárno somno em gelado pó!
E quando o bronze lã no campanário
Em som festivo vos disser— re^^ae.
Lembrae o triste que cumpriu o fadário
Só em tristuras; e por elie orae,
Orae por elle que na campa fria.
Espera o ultimo e supremo aia.
P. Casimiro ft.
.0==;^^'
(g^
26— Sabbado — S. Leonardo de Porto UmríGk)^,
C-, da I.* O. — S. Pedro Alexandrino. M. — Iníd. Plett. nas
igrejas franciscanas.
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NOVEMBRO 587
'(Quem se veste de mau panno
«Compra dois fatos por amto.»
Do esperdicio da riqueza
Vivia a magra pobreja,
Quapdo impo^ere^ castigo
Sm^põe a coisa comtigo.
A. D*ÂLMEIDA.
Vista geral de S. Paulo de Loanda
27 -Domingo— (i.** do advento). — A B. Delphina,
V„ da 3.^ O.— O B. Raymundo Lullo, M., da 3.* O.—
Ind. plen, para os Irní. Terceiros.
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388 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
A, AUSÊNCIA
—«Adeus! até d volta!»— <€Âté mais ver!»
dissemos nts óJt dcià,- cònvúlsamente,
no peito comprimindo a magoa ingente,
e suffocando um ai, . . . como a prever
que a nuvem cor de rosa, auroreal,
que em sonhos de illu^o nos envolta,
se ia desvanecer na áspera agonia
d' esta ausência fatal.
^« Adeus! até d volta!» — «Até um dia!»
Voou rápido o trem, O meteoro
paS;Savelof também nofirmamentq.
Após d sombra, a ncite do tormento!
' " riÈ como aóiriso alegre da creança
]■ ■ : V svccede o pranto amargo,
• ; ao trémulo e!:vair da n inha èí^p*rança
seguiu-se o torpor lasso d'um!ethargo. ^
iHjem aue ha inda ertrellas pelo ceu,
noites de luar sereno, inebriant.?,
mas^ não ha lu^ que aclare^ irradiante,
o que viva n' um cárcere— como eu.
Quem sobre as fúrias do escarcéu
voga n*um mar de pena,— só, no mundo,
' . ausente de ventura, ::em alento,
não. tem mais que um conforto— o abysmo fundo,
e um lenitivo só— o esquecimento!. . .
— <c Adeus! até mais V3r!»—«Ai não sei quando!»
Hoje, ao lembrar, em anciã dolorida,
o momento cruel da de:ípedi da
entre- nós dois,
—maresia das dores e dos ais —
d mente sobrevem mil pans amentos-,
e fico-me scir:mando :
— Um adeus tem fatass preseníimentos.
Pouca vesf quer^4i:^er—«íité deppis,»
mas muita, quaci sempre, — «u t é j tiiii n is?.. » »
Barcellos— 22— VIII— o3. Souza Martins.
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NOVEMBRO 38^
28— Segunda-feÍra~S. Thiagq da Marca, C, da
I.* o. -S. Gregório 111, ?p,~LiU. P/en. da O.
Catarata de Blú-Blú (S. Thomí)
(A turba ompritm-r.e em frente da porta de um politico e dá
larga.": a uma manife!:taçío da*: mai': movimentadas),
Vo:es fjrios as —Morra o trailor ! morra o miserável !
Um onADoii popjL\R, (subindo para um banci) —Ciáàáãis,
canalha que vive n*este sumptuoso palácio ha de ficar impune? O
miserável que explorou o paiz, que o arrastou quasi á ruina, nâo
receberá um dia o castigo aa justiça popular í*
A TURbA— Sim ! sim !
O o!iADoa — Quando vamo' nós appli:ar-lhe a punição que me-
recem as suas tratantada>, os seus crimes e as siias^ traições?
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Sgo ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
ToD'>s— Immediatamentel Invadamos a casa í Atiremos o^ mo-
veis pela jinelia foral
Uma voz — £ a elle esquarteja-se, c atira-se com os bocados
para o*, canos.
Um garoto— Pois pudera I
A TURBA — ^Para os canos! (Precipita-se sobre. a porta earrom^
ba-a. Apparece ó guarda-portdo muito palltdj),
O GUARDA-pORTÃo — Quc descjam, senhores?
Uma voz — A cabeça do seu patrão!
A TURBA~Sim, a sua cabeça.
O GAROTO — Fo:inho, se faz favor.
O GUARDA-PDRTÂo -Meus srs., ro.^o-lhes que não entrem...
O meu amo morreu ha um quarto de hora.
A TURBA (ie f^rupo €m ^r«/?jj— Morreu! morreu !
Uma V03 — Perdemoi um grande cidadão !
Ou-fkA — Um grande patriota!
A TURBA — Sim ! era um grande patriota !
O ORADOR — Cidadãos, proponho que façamos immediatamente,
uma subscripção para levantar uma estatua em qualquer das nos-
sas praças publicas, ao illustre estadista, ao integro patriota que
Portugal acaba de perder!
Todos— Bravo! bravo! Uma estatua!...
O GAROTO — Eu concorro com um vintém!
M. Emilo.
^C7
"^^
29 — Terça-feira — Todos os Santos das Três Or-
dens DE S. Francisco. — S. Saturnino, M. — Ind. Plen. da
O. — Começa a Novena da Conceição.
Não cuides aue o casamento
é merp... divertimento.
A mulher mal': desgraçada
é a mãe. . . maçonisada.
Mulher, que a todos dá trella
tolo é quem, . • /af caso d*ella.
Os consorci^ venturosos
vão na escolha dos esposos.
A. d' Almeida.
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NOVEMBRO 391
S. Ro:íue
(
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392 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
30— Quarta-felra— St.° André, Ap.
No enterro do dr. D. ioãquini da Boa Morte
(ao SR. Abbade de Tagilde)
Voe sereno e lr.inco amortalhado em linho
deitado no esquife de tábuas estreitas.
Mulheres e creanças em pranto desfeitas
acenam-lhe adeus pelo vao do caminho.
As flores e as aves, que andavam affeitas
ao doce convivia do casto velhinho,
choram na orphandade de amor e carinho. . .
Só culto assim gosam as almas eleitas.
Os olhos do povo triste rasos d' agua!, . .
mesmo a nature:{a coberta de magua!. . .
Mais grata homenagem não ha quem a tenha*
Das glorias mundanas n'um despre^^o augusto,
a jóia mais c^ra do sábio, do justo
— inda o seu thesoiro — era a pobre estamenha.
%
P.e Silva Gonçalves.
(s^^^"Cõ V cT'^^^
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])ezembro 31 Dias
^^ ^— - — == — '^p^-^r^'^^^
No crescente phnta toda a casta de hortaliça
e mata porcos. No minguinte corta madeiras, que serão
de muito boa dura ; caça e pesca ;
semeia goivos, saudades e mangericões; planta jasmineiros,
estaca alfazema, alecrim
e baunilha ; pó? as arvores de espinheiro*
e as flores ao abrigo das geadas.
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394 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
1— Quinta-feira — St.° Eioy, B. — Acclamação de
El-Rei d. João iv e Restauração de Portugal (1640).
— N'este dia nasce o sol ás y h, e ij min,, e põe-se ás 4. h.
e 47 m. — Até 22 diminuem os dias 10 m., e d*ahi ao fim do
mês crescem 4 minutos, — Sdo prahibidas as bênçãos nu-
pciaes até 6 de janeiro.
Luiz de Cam5es
No dia r de Dezembro
A minha mãe e senhora, a minha Pátria, ao meu caro Poi^tugal
(Instantâneo)
Hosana! Hosana! Canções mil de gloria
em coro retumbem no ethereo aposento;
Hosana! Hosana! O pendão da victoria
fluctÁe triumphante no luso aposento.
Eis, filho da Lysea, é chegado o instante
de a pátria lusa saudar com ardor;
arranca do peito em acceso descante
um grito estridente de pátrio amor.
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[
DEZEMBRO 3^5
O* pátria, se um dia o audasf estrangeiro
erguer em teu seio bandeira fatal,
ó pátria minha, se algum carniceiro
tentar arrançar-te de livre o saial,
terás n*este peito rancor e bravura,
terás n'esta mente inspirado cantor,
vi^or n*este braço, ^ao estranho tortura.
A's armas, rapaces,» meu grito d' amor.
Se os /erros do escravo tolherem teu passo,
se em dura masmorra o teu filho gemer,
6 pátria, lançado em teu mundo regaço
d espada o meu peito hei por ti deoff*recer.
Hosana! Hosana! Canções mil de gloria
em coro retumbem no ethereo aposento;
Hosana! Hosana! O pendão da victoria
fluctÁe triumphante no luso aposento.
—1898— •
P. B. Ribeiro»
2— Sexta-feira^— Os Defunctos das Tres Ordens
i)E S. Francisco. —St.* Bibliana, V. M.— St.^ Aurélio, M.
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NOTICIA BIOGRAPHICA
DO FALLEaDO
|adrc Jlflarlinha gmtonio |críim da ^ilca
o dia 8 de abril de 1875 espalhoa-?e em Braga a fatal
^^ "rio:i:ii da morte inesperada do padre Martinho An-
j;^ tonio Pereira áw Silva. E' i"npo'.sivel descrever a do-
lorosa impressão e a dor profunda, que táo lúgubre
como inopinada nt>ti:ia, causoa no animo de todos
que conheceram de perto e adrriraram o padre Mar-
tinho, e n*elle viram o exemplo edificante do sacerdote
exemplar não só pelo seu profundo saber, mas muito
mais pela sua virtude. Braga inteira mostrou então o
quanto lhe erá sensivel e peno>a, a enorme perda d'um
de seus filhos mais illustre> e mais beneméritos; e prestou a devida
homenagem da justiça e do reconhecimento, ao homem de cara-
cter honrado, ao sacerdote respeitável que tanto a ennobreceu com
as luzes da sua variada erudição, e os exemplos da sua virtude
tão solida como illustrada.
O nome do padre Martinho tem na ciiade illustre qu^ lhe dera
o berço, uma popularidade que difficilmente acabará; está ligado
aos factos religiosos maií notáveis que nos ultimo í trinta anno'»
succederam na augusta cidade dos arcebispos; e será sempre pro-
nunciado com viva saudade por todos os que admiraram o grande
merecimento, e as raras qualidades d*aquelle homem modesto e
humilde. Eu, que tantas vezes e por tanto tempo, tratei com o pa-
dre Martinho, jl pura o consultar sobre pontos difficeis de con-
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(§.^ Martinho ^ntonio Sereira da §il7a
Fundador do Santuário do Sameiro
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DEZEMBRO 397
sciencia, que não podia só por mim resolver, ]à para conservar a
amizade com que me honrava e que jamais esquecerei, já finalmert-
te para me instruir ou delcit.r com a sua conversação sempre útil,
amena, e por vezes entremecda d'aquelle tino e delicado chiste
que lhe era tão patural, bem fos ò dir testen unho da iUuâtraçâo
d*aquella intelligencia rigorosa, d^aquella almiàipgenuae profun-
damente humiWÍe, d'aquelle carácter prudente, frencp e leí.l^ é fia
nalniçnte d'aquelle zelo verdadeiramente sacerdotal que bnlhavr
em todos qs actos do seu ministério sagrado. Pára não ultra passa-
os lin-ites d*uma simples no//c/a /lo^ríz^Âzcíi, compendiarei em rá-
pidos traço% a vida cheia de merecimento?", d*este homeni que
.ainda ha pouco transpoz os humbràes da eternidade, mas qutí ja é
proclamado por todos que tive;-am a dita de ò conhecer, como um
dos mais ;l lustres ornanientos da antiquissimia € primaoiel igreja
bracharénse.
» »
Martinho António I^ere'ra da Silva, nasceu a 8 de outubro de
.1S12, de pães humildes e pouco abastados, mas verdadeiramente
piedosos. Os apontamentos qus tenho á vista è que obsequiosa-
mente me foram fornecidos por um. respeitável rel-gioso carmeli-
ta, meu amigo, que os houvç de pessoa bem informada, narram
minuciosidíides curiosas e interessantes, sobre os piimeiros passos
do padre Martinho na carreira dí s lettras a que se dedicou em ten-
ros ^nnos linda, sob a protec(;ão do reverendo An.orio I_u z da
Cunha, abbade de S. Miguel de Carvalho, no a'rc?bispado de Bra-
ga. Era td a gravidade, a compostura q a afife'ção do jovcn estu-
-aante, quando cursava latim, que o seu proifes or o padre Mar.oel
Bento de Figueiredo— segundo eíle mesmo cóntòu— r ão teve o mais
peí^ueno motivo para o castigar ou refrehendcr sequer. « lèmbran-
do-se de procurar um pretexto para o castigar- a fim cte que o seu
discípulo nío se 'desvanecesse e vangloriasse da haver cursado a
.sua aul^ sem rurba rer castigado, desistiu, jor escrúpulo, de tal
interito, Cpncluidos os seus estudòâ em latim e grei o, lirguas em
que o. padre Mariinho era miito iido, prssou a esrudir philoâophia
PO. seminário diocesaró de Braga, com "ò padre mestre Ferreira do
.PopuJQ que foi um theologo profundo e um philosopho coKsunv
.madQ.-N*esta aula torribu-se singularmente notável o 'òvén Marti-
. nho, no qual se manifestava já uma decidida vocaçãD para. o estado
ecclesiastico.
.Um talento viyp, uma intelligencia perspie: z i uxilií da por um
«í^tudo consitante, è sobre tudo umà m.olestia sem affectacâo, e
uma náòralidade irref rehensivel ; grangearam-lhe nf.o sj a afleiçío
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.398 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
e estima do seu sábio professor, mas ainda a sympathia dos con-
discípulos.
Mereceu por isso approvaçáo distincta nos estudos de philo^
soph.ia, pomo a havia tfierecido já em latim e grego.
' Nas aulas superiores de theòlogia que frequentou còm os pa-
dres Manoel Ferreira, e Manoel Vieira, religiosos de Santo Ago^
tinho, no convento do Populo da cidade de Braga, não de?méntíii
o jovem Martinho, os seus bem fundados créditos de estudante diá-
tiacto e exemplar. Apesar de estranho áquella respeitável commu'-
nidade religiosa onde floresceram tantos hoínens i lustres na vir-
tude, Martinho António, tinha entrada ampla no convento e facul-
dade para consultar os livros da sua riquis* ima bibliotheca.
Embebido nos estudos theo^ogicos, todo entregue á meditação
dis verdades que a sciencia sublime de Deus exp5e e demonstra
com lucfSez, apaixonado por tudo quanto pertencia á Igreja, c pre-
sentindo na sua consciência a voz ae Deus que o chamava ao san-
tuário, determinou irrevogavelmente consagrar-se a Deus. Foi en-
tão que se iniciou na milícia sagrada, tomando ordens mânoref^, e
logo depois começou a exercer o n^iristerio da palavra por conces-
são especial do prelado diocesano que via no joven clérigo mino-
rista uma vocação decidida para o sacerdócio. Nos' manuscriptos
do padre Martinho não appareceu um só sermão, pregado qulndo
irinòrista; ihas os que foram dados á estampa servem optimamente
para o avaliar imparcialmente como orador sagrado. -
Os sermões do padre Martinho se não se tornam redomme»-
daveis pelo brilhante colorido do estylo, pela pompa e enfadonha
profusão d*imagens, pela eloquência verdadeiramente cáthencicn^
se, que converte a tribuna sagrada em cadeira académica, por essô
eloquência profana, imprópria, effeminada, contra a qual tão ener-
^camente bradava o nos?o grande padre Vieira, se rSo tem essa
falta de unidade sacrificada aos adetnanes da phrase por vezes in-
digna da cadeira evangélica, possuem os verdadeiros dotes da elo-
quência sacra, transcendem as fragancias da unção evangélica, os-
tentam riqueza d*erudição bíblica e patri tica, fontes mexhaiiri-
veis para o orador sagrado, e traduzem altíssimos conceitos e su-
blimes idéas em phrases singelas e sem affectação! Um só deAsko
notavam alguns nos sermões do padre Martinho : a voj(. £u;^dc tnim
nunca me importei com esse defeito que em nadi diminuía a im-
pressão agradável que os seus bellos sermões causavam no meu es-
pirito ; e demais nunca li no Evangelho ou nos Padres da I^^rejà,
que estavam isentos dá obrigação de pregar, ou peccasscm pagan-
do, os padres a quem a natureza njo deitou d'Uhia voz sonora, vi-
brante e agradável.
O padre Martinho na profunda humiljdade da sua bella alma,
pregava para a gloria de Deus, e rão olhava para os elogios dos
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J
DEZEMBRO 399
homens; os seus sermões eram verdadeiramente evangélicos, a
intenção com aue os pregava profundamente sacerdotal. Appa-
recém porém alguns pensamentos repetidos, prinçipalnaente cos
sermões, em honra an Virgem Immaçulada de quem o paílre
Martinho era fervorosissitro devoto, mas sáp elles tjo beUos qusf
nada perdem,- atnd^ repetidos. Aconselhamos esta preciosa col-
leccâo de sermões aos jovens oradores p£u>a que apren4aoèi n'el-
les a verdadeira eloquência sacra, aos oastorcs d*almas, com^
muito úteis para illustração de suas ovelhas, e ainck ás pesFpas
piedosas como utilissima lição espiritual. Mas reatemos o lio<d'e^9.
noticia.
Iniciado no clericato, o nosro minorista suspirava ardente-
mente pelo dia em que peio sacerdócio se consagrasse perpetua-
mente ao serviço de Deus e da Igreja. Mas a idade, e depois que
esta foi completa, as discórdias politicas de 1804 retardaram a rea-
lisação dos seus ardentes votos, e constantes aspirações. Termina-
da que foi essa lucta sangrenta que por alguns annos aflíligiu Por-
tugal, e terminadas as graves complicações que se lhe seguiratn, o
joven clérigo foi apresentar-se ao ex.rao,e rev.mo snr. arcebispo
frimaz D. Pedro Paulo da Cunha Figueiredo e Mello, depois car-
deal presbytero da santa Igreja romana. Examinado e approvado
para a recepção de todas as ordens m&iores, e preparado com 03
santos exercícios espirituaes que concluiu copi fervor edificante,
conseguiu por um breve apostólico, ser ordenado sacerdote dentro
em quinze dias. A ordenação sacerdotal do padre Martinho foi, ncO
só um motivo de verdadeira satisfação para as suas duas virtuosas
irmãs, ynica familia que então lhe restava, mas ainda de alegria e
regosijo para os fieis braclurenfes que conheciam de perto as ines-
timáveis qualidades do novo sacerdote.
A sua primeira missa foi celebrada no dia 26 de Dezembro de
1843 na igreja da Ordem Terceira de S. Francisco, da cidade de
Braga. Foi uma festa solemne. Ao Evangelho subiu $0 púlpito o
reverendo padr^ Rodrigo, sacerdote exemplarissimo e bem conhe-
cido de toda a cidade de Braga pela sua eloquência verdadeiramen-
te evangélica, pelo seu zelo e pelas suas virtudes. A pomposa e es-
plendida solemnidade da missa neva do padre Martinho, foi a
expensas do seu particular amigo e distincto cavalheiro bracbaren-
se, João Amónio d'01iveira Braga. Em nome das virtupsas irmãs
do fallecido padre Martinho, de saudosa memoria, aqui consignar
mofi áquelle filho benemérito da augusta Braga, um votp de lou--
vor e ^atidik).
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400 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Ordenado sacerdote, o padre Martinho via diante de si novos
horisontes, cuja conquista suspirava; conhecia bem as graves obri-
gações que lhe impunha o seu estado; e a necessidade urgente de
dedicar ao serviço dá Igreja os dotes e os talentos de que Deus li-
beralmente ò dotará.
, Animado de um espirito todo sacerdotal, iniciou o seu zelo
apostólico dando começo em 1848 á obra verdadeiramente christá
€ civilisadora das missões pòrtuguezas que rapidamente se espalha-
ram por toda a provincia do Minno, Douro e Traz-os-Montes, e que
tão relevantes serviços tem prestado á religião e á pátria.
Foi o padre Martinho quem deu vigoroso impulso á obra da
Propagação da Fé, consegumdo pelo seu zelo e immensa popula-
ridade, que innumeraveis heis concorressem com o seu obulo para
aquella obra grandiosa que é uma das maiores glorias da França.
Todos sapem como é grande a devoção das nossas províncias
do norte para com a Augusta Rainha dos céos, a Immaculada Maria.
Na' provincia do Minho difficilmente se ancontrará uma egre-
ja, uma capella oiide nfo haja um altar dedicado ao culto do Im-
maculádo Coraçío de Maria.
E' ao padre Martinho que se deve, em grande parte, o au-
gmento e prosperidade d'esta benéfica e consoladora devoção. A
piedade, o ardente affecto, a entranhada devoção do padre Marti-
nho, para com a mãe de Deus, manifestou-se principalmente, nas
duas grandes solemnidades verdadeiramente nacionaes, que por
iniciativa e efficaz cooperação dò padre Martinho se realisaram em
gloria da Virgem Immaculada. Foi a primeira o solemne triduo
celebrado no magnifico templo de S. Paulo, hoje collegio de Ur-
sulinas, em Braga, nos dias 3 1 de agosto, i e 2 de setembro de
i855, em applauso á definição dogmática da Immaculada Concei-
ção de Maricí, proclamada por Pio IX, o Grande ; foi a segunda a
erecção do grandioso monumento do monte Sameiro, subúrbios de
Praga, onde hoje se ostenta a bella imagem de Maria Santíssima
em sua Immaculada Conceição, na attitude d'abençoar o reino fi-
delíssimo. O monumento do Sameiro, sagrado pelo ex.mo e rev.rao
snr. D. José Joaquim d*Azevedo e Moura, no dia 29 d*Agôsto de
1869,* ^? "^^ s^ ^"^ piadrão de gloria para a Virgem Immaculada,
mas ainda uma recõrdaçío immortal do zelo e virtudes do padre
Martinho. Eu tive a im merecida honra de pregar, a convite d*aquel-
le meu saudoso ami^o, na solemne festividade da sagraçáo dô mo-
numento a Maria Immaculada, que foi concíuida no magestosa
santuário do Bom Jesus do 'Monte. -
À instalkçãp da archi-çónfraria do Santíssimo e Imnraculado
Coração de Maria na igreja do convento dos* Remédios daS religio-
sas franciscanas de Braga em i85o, a restauração da bella devoção
do Terço cantado aos sabbados pelas ruis da cidade augusta, a sa-
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DEZEMBRO ' ' ^j
graçãó do fóníosó tieitiplõ do^Boiti Jesifô do Monte em âgó^o de 1857;
a imponente e nurtierosissitíía peregrinação ao monumento do Sa-
méiro, onde sè ajuntaram, segundo os cálculos mais- exactos, para
cima de 60:000 peregrinos de todos os pontos do r èiflOj cm 25 de
junho de 1871; as manifestações de affecto e dedicação para com
o Soberano Pontiíice Pio IX que começaram em Braga em i863^ e
que depois se espalharam por todo o pa^iz, tudo se deve ao zelo in-
fatigável, á sciencia Jíolida, ao trabalho fecundíssimo do padre
Martinho, que sem ruido nem ostentações vaidosas, realisava as
mais importantes obras de gloria para Deus e utilidade para os
iieis.
Mas 06 importantes e numerosíssimos trabalhos em que se oc-
<:upava o padre Martinho, nunca o distrahiram dos seus estudos
theologicos e principalmente litúrgicos e moraes. O padre Mar-
tinho era talvez, sem oíFensa de ninguém, o primeiro rubricistà
portugusz do seu tempo, e um dos melhores moralistas. Temos
para aífirmar estas verdades, irrecusáveis testemunhos. O pro-
gramma da imponente procissão reaHsada em Braga, no dia 2 de
setembro de i855, que se pôde lêr no antigo jornal bracharense a
Atalaia Catholiça d'aquelle anno, jornal de que o padre Martinho
foi assíduo coUaborador, a explicação das cere mornas da missa do
padre Annanias Broobok. do rito oriental, que o padre Martinho
publicou, as suas sabias respostas a innumeraveis consultas sobre
casos de liturgia e de moral, à dignidade e proficiência com que
regeu varias cadeiras no seminário diocesano de Braga a convite
do cardeal Figueiredo e de D.. José de, Moura, 5s seus discursos sa-
grados, os seus artigos na Atalaia Catholiça e na tfnião Catholiça,
os seus livros de piedade e devoção, os seus preciosos manuscri-
ptos sobre vários assumptos theologicos e históricos, tudo revela
o grande talento e profundos conhecimentos do padre Martinho
nas doutrinas e seu ministério sagrado. O padre Martinho era
muito lido nas obras admiráveis dos dous padres doutores da Egre-
ja, S. Thomaz d* Aquino e Santo Affonso Maria de Ligorio. Deve-se
também a elle a magestosa solemnidade realisadá na egreja do Pò-
pulo em Braga, por occasião do . centenário da canonisaçáo, do
grande luminar da edade média, S. Thomaz d' Aquino.
Se o critério pira avaliar os sentimentos catholicos d'alguem, .
«7
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ijoft ALMANACH (DE SAWTO ANTÓNIO
é^a sua dcdioaçâo: para com o supremo lerarcha da Egrcja, pôde
di2er-«t. que o padre Martinho era um catnoUco fervorosíssimo.
Dedicava entranhado aífecto ao immortal Pio IX, e só para
ver a sua xnagestosa figura, ouvir a sua voz meiga, suave, enérgica
e terrível quando trovejava contra o erro e a impiedade, e receber
a sua benção apostólica, emprehendeu uma viagem á cidade eterna^
á Roma dos Papas, em maio de 1870.
Estava aberto o concilio ecuménico do Vaticano e -o padre
Martinho fazia fervorosíssimos votos para que fosse elevado á ca-
tegoria de dqgma de fé, a doutrina catholica, antiquíssima e emi-
nentemente conforme com a missão augusta do pontificado, a
doutrina da infallibilidade doutrinal do vigário de Jesus Christo.
No regresso da sua viagem, recebeu de Roma um telegramma
em quí lhe participavam a decisão do concilio do Vaticano de 18
de Julho de 1870,. e foi no oratório particular do pidre Martinho
qiie se entoou o primeiro Te^Deum ètn Portugal, em acção de
gr ças pelo dogma definido. Eu o vi delirante de alegria e conso-
lação, ao ver confirmada cõm a authoridade do Espirito Santo, a
auchoridade Suprema do magi^te^íoinfaIlivel do Pontífice romano.
Esta alegria era a expansão de suas ideias profundaniente ca-
tholicas.
Devotíssimo da Mãe de Deus, contemplou-a na formosura da .
sua Conceição Immaciilada; devotíssimo do Vigário de J. Christo^
ac:latr.ou-o com o m.undo catholico na infallibilidade do seu ma-
gistério supremo.
O Dadrc Martinho podia, pojs, repetir com Simeão: Nunc di-^
mitiSy Domine, sérvum tuum in pace.
Mas o Senhor queria qíie o seu fiel servo e digno sacerdote
continuasse por mais tempo no exercício do seu zelo infatigável, e
dar-lhe assim occasião de augmentar a coroa já rica dos seus me-
recimentos e das suas virtudes.
ÉfTectivamente, o pa.dre Martinho nunca afFrouxou na carreira
do seu apostolado.
Trabalhava sempre, e tiriha o segredo" de repartir o tempo de
modo, que sem faltar ás suas obrigações sacerdotaes, dava solução
a tolos os nego-ios de interesse espiritual para a Egreja e para os
íids.
Era escrupulosíssimo na sua consciência humilde, sem nunca
descer de sua dignidade por todos respeitada, grave e edificante no
exercido das funcçóes sagradas, austero para comsigo, e benigno
para com os outros, prudente e reservado em seus actos, e apezair
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DEZEMBRO 40!^
de seguir umas certas ideias politicas, soube pela sua tolerância e
caridade adquirir e conservar até ao ultimo dia da sua preciosa
existência, o respeito, a estima, o elogio e a veneração dos homens
de idéas politicas contrarias ás suas.
Em abril de 1875 havia o padre Martinho partido para^airão
onde existe um mosteiro de benedictinos, a qai o zeloso sacerdote
havia prestado relevantes serviços pelo ministério da pahvra e do
confissíonario ; e, chamado a Braga para substituir no seminário a
falta d'um professor, morre repentinamente em Villa do Conde,
em casa do seu amigo o padre Manoel da Co>ta Faria da Silva,
onde se havia hospedado no dia 7 de abril, para seguir no dia se-
guinte jornada para Bragi.
O padre Martinho appareceu morto na cama.
Parecia qne estava dormindo. Os olhos fechad:>s, a bo:ca per-
feitamente compona, o ro3to sereno, uma das mãos debaixo da
face, e a outra, sustendo uma medalha da SS. Virgem que se.upre
trazia contisigo.
No mesmo dia da morte do padre Martinho, foi o seu cadáver
conduzido para Braça.
Depois das 10 horas da noite, (escrevia um jornal de Braga),
chegou o carro funerário ao real templo de Santa Cruz, onde, no
dia seguinte, o finado teve pomposos officios, que se tornaram no-
táveis pelo numero de pessoas que alli compareceram a tributar
espontaneamente as ultimas homenagens de respeito e considera-
ção áquelle varão illustre por todos os titulos respeitável.
Além da grande aífluencia de pessoas de todas a> condições
sociaes, achavam-se pessoalmente no centro do templo 200 eccle-
siasticos de sobrepelizes, o corpo docente e communidade do se-
minário de S. Pedro e os alumnos do curso, triennal do mesmo, o
Sue ao tudo prefazia um numero não inferior a Soo. Suas ex.as
K José pelos seus fâmulos, e o snr. D. João pelo seu secretario,
ordenancio o mesmo senhor que em tributo de homenagem para
com o fallecido não houvesse aulas n'aquelle dia.
Acabada a missa celebrada pelo reverendo cónego Costa e os
responsorios, tudo a grande orchestra a que gratuita e voluntaria-
mente se prestaram os membros da capeíla dos snrs. Luiz Baptis-
ta e Paivas, foi o cadáver conduzido para o cerni :erio precedido
por vinte e uma confrarias e irmandades, indo na de N. Senhora
da Boa Memoria incorporados os alumno;. do curso theologico,
Ordem Terceira de S. Francisco, communidade do Seminário de
S. Pedro, irmandade do clero de S. Pedro e de S. Thomaz, que
levava grande numero de ecclesiasticos psalmeando, cuj") prior fe-
chava o préstito, e ia como preste de capa o reverendo cónego ho-
norário e abbade de S. JoId do Souto.
A*s borlas do caixão, pegavam os reverendisúmos abbades de
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404 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
S. Martinho do Campo e Bairro, e os desembargadores, abbades de
S. Pedro de Maximinos e Fontoura.
Era considerável o numero de pessoas que se reuniu em vá-
rios pontos para ver o acompanhamento, que na verdade, foi um
dos mais imponentes que aqui se tem visto.
Nos dois dias (8 e 9) dobraram todas as torres.
Quando terminaram os últimos responsorios no cemitério,
eram duas horas da tarde.
Assim prestou Braga a homena^m do seu respeito, saudade e
veneração, ao venerando padre Martinho António Pereira da Silva.
O seu corpo lá está sepultado no cemitério publico de Braga.
Está junto dos restos mortaes do sábio e virtuoso padre mes-
tre Machado, religioso Carmelita descalço, bispo eleitq de Angola
e capellão de Santa Cruz.
O padre Martinho não tem sobre a sua campa soberbos mau-
soléus e pomposos epitaphios, mas tem o seu nome escripto no
coração de todos, e a sua memoria perpetuará nas paginas mais
brilhantes da historia contemporânea da Egreja bracharense.
Que a luz perpetua alumie sua alma e gose do eterno descanço
no seio do Senhor a quem tanto amou.
•^=
Dr. Luiz Maria da Silva Ramos.
3 — Sabbado — (iejum) — S. Francisco Xavier.
Maria é o refugio dos que pretendem escapar-se da ira de Deus.
^ S. Alberto Magno.
4 — ® Domingo — S. Pedro Crysologo, B., C, Dr.
— St.* Barbara, V. M. — Lua cheia ás 5 hor. e 36 min. da
tarde.
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DEZEMBRO 4o5
Maria é o valle aromatisado pelos* lirios de todas as virtudes,
S. Athanazio.
ULTIMA PRECE Á VIRGEM
Um derradeiro lampejo! e empallidece
Ao mesmo tempo o sol: a sombra desce
E ao muribunao envolve; a escuridão
Já se apodera do teu ser, Leão !
Gelam-se as tuas veias; jd não corre
Vivido o sangue; o corpo exhausto morre.
Lançou a morte o seu dardo fatal;
Os teus ossos irão, no funeral
Sudário envoltos, repousar no tumulo.
Mas a alma vôa ao ceu, ascende ao cumulo
Da montanha ideal da aspiração,
E, livre, emfim, da temporal prisão,
Jd seu vôo accelera; ali termina
Toda a longa jornada a peregrina.
Escuta, oh Deus, na angustia os votos seus!
Escuta'lh*os clemente, oh grande Deus!
Se eu attingisse o Ceu! se contemplasse,
Por suprema mercê, de Deus a face!
E, oh Virgem, teu olhar visse também!...
Virgem! a quem queria como mãe.
Quando era pequenino, — fe envelhecendo
Mais e mais foi o meu amor crescendo ) —
Acolhe-me no ceu; e, se alifôr
Eu um d*aquelles da cidade santa.
Direi eternamente que ao favor
Da Virgem-Mãe aevi ventura tanta!
Leão xm.
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<o5 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Monumento do Sameiro
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DEZEMBRO 407
5— Segunda-fetra — O B. Humilde Jtie Biániano,
C. da I.* O.— S. Sabas, Abb.~S. Geraldo, Aíceb- de
Braga.
A mãe de Deus é o modelo sem mancha de toda a pureza e
virgindade.
S. Gregório Thaumaturgo.
-•-^#-t«
6— Terça-feira— S. Nicolau, B., C.
Maria é um abysmo de milagres. A profundeza 'de suas glo-
rias nem os anjos devassam.
S. J. Damasceno.
7— Quarta-feira— St.** Ambrósio, B., C, Dr.— Os
fieis que, no dia segiunte, ou durante a Oitava, assistire^n
a Missa ou Officio Divino, podem lucrar as mesmas indul-
gências que estdo concedidas par/i a festa do SS. Corpo de
Deus.
— >isss]r^.t—
Maria é a inspiradora e auctora de todo o bem que fazemo>;
casa bemdicta d'onde a vida dimana; throno de Deus levantada
para fazer misericórdia.
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4o8 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
8— >íí Qu:inta-4érra— A Imtnacukda Conceição de
N. Senhora, Padroeira das Três Ordens deS. Francisco e
do Reino de Portugal e Conquistas. — Aòs. geral para os
Irm. Terceiros. — Ind. plen, para os confrades da Concei-
çãOi — de S. José. — Rosário Vivo e confraria do Rosário,
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ia (irdcm Jjrannstana
devoção a Maria nasceu na Ordem Franciscana com
o Santo Patriarcha, seu fundador. São por demais
conhecidas as scenas de celestial convívio, em que o
abrasado Serafim de Assis passava as noites, na de-
serta capellinha da Porciuncula, dedicada á Senhora
dos Anjos, junto a Assis. AUi consagrou Francisco a
sua Ordem á Rainha dos Anjos, alli a seus joelhos aprendeu a dictar
aquelles sábios preceitos, que ainda hoje se conservam na sua aus-
tera pureza, serft que haja sido mister accrescentar-lhes ou subtra-
hir-lhes um jota, para que continuem sendo uma norma rectíssima
de vida chnstã e santa, a perfeição dk santidade. Alli gosou elle,
por muitas vezes, de celestes visões; alli recebeu, por intercessão
e inspiração de Maria, a mais singular das graças até então con-
cedidas, a favor dos peccadorcs, a celeberrima indulgência do Per--
dão ou da Porciuncula. Pelas palavras e pelo exemplo, o Santo
Patriarcha inculcou aos seus filhos o mesmo amor que elle consa-
grava á Virgem. Não exageramos se dissermos que não tem havido
ura só franciscano que não professasse uma terna devoção á Po-
derosa Mãe d^e Deus. Não nos deixam mentir os martyrologios, os
necralogios e, em geral, as chronicas minoriticas. Desde Francisco
de Assis, não houve pregador na Ordem que não proclamasse as
glorias de Maria e inculcasse a siia devoção. Attestam-no todos os
sermonarios que ainda ex!stem.
Desde Alexandre d*Alcs não houve doutor que não apregoasse
e defendesse, mais ou menos, os seus privilégios e graças extraor-
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410 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
dinarias, Comprova-o a assaz extensa biWiographia franciscana.
Desde Santo António de Lisboa, que pelo próprio S. Francisco foi
instituido mestre de theologia, nenhum protessor interrompeu a
gloriosa tradicção de ensinar publica e particularmente, dentro e
fora da Ordem, tanto nos simples collegios, ou seminários, como
nas grandes universidades, as prerogativas que, por direito e
graça, competiam á M^e^^dé Deus. Que o digam, como disseram,
todos os seus discipulos. E* que ros designios da Providencia, que
todas as cousas destina para um fim determinado, parece ter sido
plaro preconcebido escolhe? a Ordem franciscana para especial de-
jfen^pradas glórias da yã.e. de' Dciís;
Nem ha que estranhar se assim tiver acontecido. Factos simi-
Ihantes ráó são raros na economia geral da vida da Egreja militante.
Pondo agora de parte quanto a Ordem franciscana fez pela
exalta jí o da Mãe de Deus, em todas as manifestações da vida
christa, é nosso intento fallar apenas, e mui succintamente, dos es-
forços gue empregou para que na coroa das glorias immarcessiveis
de Maria fosse engastada a mais preciosa das jóias e, por sem du-
vida, a que ella mai«i estimou sempre: a Sua Conceição Jmmacw-
ladãt como dogma de fé. Não lhe negavam, é certo, esta prero-
gativa 05 filhos que a tinhani por Mâe muito querida ; mas no co-
ração lhes doia profundamente que nem todos . fossem obrigados
a pensar e a crer como elles. Nada menos de 12 séculos se tinham
passado ji, e a lucta entre os padres e doutores da Egreja e das es-
colas continuava indecisa, sem saber precisar em termos claros a
questão monumental. Chegou o momento, porém, e è á Ordem
Franciscana que a Rainha dos Anjos quiz dispensar ms^s esta glo-
ria. Levanta do nada um dos filhos do Sjeraphico Patriarcka. E
adprna-o de extraordinária sçiencia, depois d© o enriquecer de
admiráveis virtudes; Determina qu<? elle pas?e pela^ vniversidades
jnais cotáveis da Europa e vença os melhores theolpgqs que ent£0
eram os oráculos da sciencia. Fermitte; que, no entretanto, se ac-
cenda, mais do que nunca, a contenda sobi^a Conc^içáç de Ma-
ria,, e maximamente spbre o momento preci^ em que Ella havia
sido livre, immune, de rnapcba do peccado. Os seus iímáos, nnqs-
tres na Sorbonna, luctavam^-compheroes, por defenderas trac-
ções da Ordem* N 'estas alturas, o immortaLFr, João Dons Êscoto
era a admiração dos irilhares de . discipulos , que o esautavam na
Universidade ae Oxford, na Inglaterra. A sua- fama correra o man-
do. O Geral da Ordem manda-lhe, por santa obèdieiscia, que se
apresente em Paris. Apparece Escoto e é recebido com grande ale-
gria de todos, í)orqiie justamente esperavam encontrar n*eUe um
apoio poderosíssimo, ou ainda um adversário claro e rec^o. £* con-
vidado a entrar no, cpnibate. Escoto, desconfiado dç si mesmo, con-
fundido na $úâ grande humildade, não : ousa lu<;tar a descoberto
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Immaculada Franciscana
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DEZEMBRO 411
com tio poderosos adversários, como eram os grandes imestres da
mais celebre das universidades, a de Paris. Conserva-se n'uma al-
titude de reserva e modéstia, que a muitos podia parecer de medo,
ou de menos confiança na certeza da doutrina que defendia.
Mas a obediência impelliu-o para a frente, e Escote entra na
lucta. Entrou e venceu, ror demais tinha elle a certeza da victo-
ria. Por ventura não estava lá vigilante a sua protectora a quem
elle ia defender? Não lhe provara ella, por um milagre evidentes
oue estava com elle í No dia aprazado para a celeberrima disputa.
Paris tomou mi aspecto desusado. Todos fe encaminhavam para
a Sorbona, cheios de anciedade. Escoto fortalecera-se com a ora-
rão e penitencia. Caminhava elle também, ao lado de seus irmãos,
para o theatro da sua tpaior gloria. Passou Ueahte da capella real,
sobre cujo frontespicio estava uma imagem de mármore da Mãe de
Deus, sustentando nos braços o fructo das suas virginaes entra-
nhas.
O esculptor acommodara a imagem ao lo:al. Deliniara-lhe a
cabeça direita e os olhos em attitude de contemplar os c)ue lhe
passassem defronte. Alli chegado, Escoto pára, ajoelha e dírige-se
áqucUa que elle tanto amava: tiDignare me laudare te Vir^o Seh-
4xata — da miki virtutem contra hostes tuas». Virgem Sacratíssima,
faze que eu saiba celebrar os teus louvores, que eu defenda as tuas
florias — dá-me força que vença os teus inimigos. Oh! prodi-
gio! A imagem inclinou para Escoto a cabeça, em signal de que ou-
via a sua supplica, e de que o acompanhava na defesa dos seus
privilégios^ e para que ninguém podesse duvidar á'em favor con-
cedido a Escoto, nro mais retomou a posição primitiva que o ar-
tista lhe dera.
No .meio d'um silencio sepulcral, Escoto, ni attitude do dis-
cípulo mais humilde, com os olhos ao chão, as mãos cruzadas so-
bre o peito e escondidas nas mangas do pobre habito, ouve os ar-
gumentos de duzentos doutores contra a Conceição Im maculada de
Maria. Não se perturba. Nenhuma d'essas objecções era nova para
cUe. A sua intelligencia tinha^^lhe revelado outras bem mais aiífi-
ceis ainda, que por si mesmo resolvera. Com uni proiigio de n^-
moria nunca visto, repete-os todos pela mesma ordem, compen-
diados, resolve-òs, pulverisa-os, e fobre esta primeira victoria le-
vanta o pedestal para a secunda: estabelece elle então a sua dou-
trina, inteiramente nova, mteiramente desconhecida e proclama,
n'um assombro geral de toda a assistência, que Maria foi immune
de toda a culpa no próprio instante da Sua Conceição^ não antes,,
-não depois. Disse e provou. Nem um só dos seus adversários ousou
replicar, porque a maior parte íicou, para logo, convencida, e to-
dos vencidos. Elscoto triiimphou por Maria, Maria triumphou por
£scoto»
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412 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Desde aquelle dia menioravel para as glorias da Mãe de Deus,
^ questão sobre a Cohceiçâo da Virgem tomou outro aspecto.
' Pozeram-se de parte pontos apenas accidentaes sobre o assum-
pto, e d*ahi por deante limitava-se tão somente aos termos pre-
cisos em que Escoto a coUocara. Dentro em pouco a Universidade
de Paris adoptava a sentença de Escoto como própria. Um século
mais tarde obrigava todosos seus doutores a jurar defender a Imma-
culâda Conceição. '
' Para a Ordem Franciscana passou a ser um dogma, e todos os
filhos da Igreja exultaram com o triumpho de Escoto, por verem
n*6lle uma gloria assignalada para a Mãe de Deus e dos homens.
A escola de Escoto foi desenvolvendo, illucidando os preciosos
argumentos do Mestre^ conseguindo formar um corpo de doutri-
na indestructivel. De Paris partiu o exemplo para as. demais uni-
versidades, e em breve tornou-sea opinião quasi unanime.
Das universidades saiam os bispos que pregavam aos seus re-
banhos a mesma doutrina, já por si tão uniforme com a piedade
catholica. Os mesmos Romanos Pontifices seguiam esta opinião,
embora a não imposessem como dogma de fé. Todavia nâo falta-
vam contradictores, talvez mais por sustentar caprichos de escola,
do que por convicção de doutrina. Houve ainda luctas, no decor-
rer dos séculos, sustentadas com ardor de parte a parte, mas sem-
pre com triumpho certo para os defensores da Mãe de Deus. No
Pontificado de João XXII, então residente em Avinhão, julgaram oc-
casião opportuna os adversários da Immaculada Conceição para
lançar por terra a opinião de Escoto. Levaram o Pontince a de-
terminar que, na sua mesma ^presença, se realisasse uma disputa
entre eiles e os franciscanos, ajuizando erradamente que estes não
ousariam comparecer na presença d*u«m Papa que, por outras ques-
tóeis então ventiladas, os não olhava com mmto aíFecto, segundo
opinavam os mesmos adversários. Puro engano; os franciscanos
não só compareceram, senão que confundiram os seus adversários
e os de Maria Immaculada. Joáo XXII, arbitro da contenda travada
na sua presença, proclamou vencedora a doutrina de Escoto e os
fran^scanos, e determinou que d'alli por deante a festa da Imma-
culada Conceição fosse celebrada com maior esplendor. Mais tarde
subiu á cadeira de Pedro o Papa Sixto IV, franciscano. Como era
nWural, promoveu quanto lhe foi possivel a gloria de Maria Im-
maculada, cuja devoção e amor bebera na escola da sua Ordem.
Este facto foi, talvez, causa de maior irritação para os poucos
contrários que ainda existiam. Sixto IV, vendo que nem a sua au-
ctoridade de Pontifice Supremo da Igreja bastava para pôr termo
á lucta, quiíí provar-lhes que nâo obrava por outro motivo que
não fosse a -convicção plena^ 4a» verdade que a escola franciscana
defendia, e que era o sentir piedoso, quasi unanime dos fieis. Con-
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DEZEMTOO 4i3
vidou, pos, os seus adversários a virem á sua presença disputar
contra a opinião de Escoto e da sua escola. Foram, levando á fren-
te o celebre theologo Padre Bandelli.
Os franciscanoi deputaram o, não menos celebre, P. Francisco
Nano, então Ministro Geral da Ordem. Travou-se a.lu:ta, e com
tal copia de argumentos irrespondiveis o P. Francisco Nano con-
futou as razoei do P. Bandelli, que os assistentes irromperam em
vivas acclamaçóes á Virgem Immaculada, levando em triumpho o
seu novo defensor. A historia narra uma anecdota então occorri-
da. Sixto IV, enthusiasmado com este novo triumpho da Virgem
Mãe de Deus, não pôde conter-se que nfo abraçasse publicamen-
te o P. Francisco Nano, dizendo-lhe :«Ttt és um verdadeiro San^
são.y»
Desde então o P. Francisco Nano ficou sendo chamado por to-
dos, Francisco Sansáo, (Mau^ellãt il Domma, etc, wo\. I, pag. i58).
Parece que iá era bastante para fazer calar os adversários de Es-
coto e de Maria Immaculada. Pois não foi. Mais tarde, em Ferra-
ra, na presença do Duque Hercples, Mecennas das lettras e das ar-
tes, renovou-se a contenda. O celebre padre Bandelli entra de
novo em scena. Não lhe bastara a liccão recebida. Foi estudar mais,
muito mais, e quando se julgou habilitado, invencível, apresentou-
se em- campo. Similhante ousadia parece que devia ser preludio
d*uma victoria, doesta vez segura, para o P. Bandelli. Os Francis-
canos, para que se não julgasse que o triumpho da sua escola, de-
fendendo a Immaculada, era devido mais á perícia dos seus douto-
res que á verdade da causa pela qual com tanto amor pugnavam,
não quizeram que ou:ra vez entrasse no combate o já experimen-
tado P. Sansão. Enviaram, por isso, o simples mestre Bartholomeu ,
de Feltres. Ainda d'esta vez, como sempre, venceu Escoto. Ban-
delli depoz as armas, e confessou-se vencido, senão convencido.
Não só na defesa da doutrina de Maria se ennobreceu a Ordem
Franciscana. Achava pouco para a gloria da Rainha dos Céos obter-
Ihe triumphos nas academias, coroar de louros os mestres da sua
escola, alcançando victorias sem numero.
Não' lhe bastava ter conseguido que por toda a parte se fizes-'
sem festas em honra de Maria Immaculada, que os seus filhos mais
assignalados nas lettras composessem em honra da Immaculada,
hymnos, officio;, antiphonas, cânticos, louvores o'. niais bellos.
Para os filhos de Francisco tudo isso era pouco. Tinham postos
mais alto os olhos, porque a terna Mae de Deus e dos homens, que
na sua capellinha da Porciuncula vira nascer, acalentara e prote-
gera sempre a Ordem Franciscana, merecia mais do qu2 isso, e
ella muito mais lhe devia. A escola franc scana previu, desde o
principio, que um dia a sua doutrina havia de receber a sancção do
dogma. Para tal fim en^minhou todos os seus esforços. Porém,
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414 ALMANACH I>E SANTO ANTÓNIO
difficiUima empreza é esta! Para a conseguir, não bastam razSes
apresentadas á primeira vista.
Estas sáo, muitas vezes, mais do que o alicerce. O edifício s&
os séculos, e muitos séculos, acabam de construir, e não será para
admirar que muitas vezes fique incompleto. E' obra cjue só a Deus
pertence. Mas, dignou-se a Providencia coroar de feliz êxito os de-
nodados esforços dos admiradores e amantes de Maria, que, sobre
as pisadas de Escoto, haviam trabalhado pela sua gloria.
Impossível recordar os nomes illustres dos franciscanos, dou-
tores e santos, qne se empenharam n'este glorioso emprehendi-
mento.
Citaremos um apenas* cujo nome é universalmente conheci-
do: S. Leonardo de Porto Maurício. Com que afan S. Leonardo
tribalhou para que fo.se definido o dogma da Immaculada, com-
prová-se^ além de outros documentos, pela celebre carta que o
Santo dirigiu a um Prelado religioso, até hoje desconhecido, no
Pontificado de Bento XIV,
Alli se refere íios esforços empregados por S. Leonardo junto
dos Romanos Pontífices Bento XIV e Clemente XII para conseguir
d'elles a definição do^^matica da Conceição de Maria Immaculada.
Pelo seu zelo, tão ardente como santo, mereceu que aquelle ulti-
mo Pontífice o encarregasse de investigar o sentimento gefal do
mundo christão acerca do assumpto. S. Leonardo poz-se á obra
com todo o ardor do seu temperamento e da sua piedade filiíl para
com Maria Santíssima. Conferenciou largamente com todos os car-
deaes, achando a toios de opinião favorável, menos um. Dirigiu-se
depois a todos os embaixadores dos soberano^» catholicos, a todos
os bispos, a todos os superiores geraes das Ordens Religiosas, e
em fim aos superiores ecclesiasticos, e teve a consolação de ver que
estes todos, na sua immensa maioria seguiam a opinião favorável á
Immaculada Conceição. Sem o querer^ S. Leonardo tinha como
que convocado um concilio universal. Todavia, não lhe tinha Deus
reservado a consolação de ver, em seus diis, o êxito feliz dos seus
trabalhos.
Mris um século tem de passar ainda, e só então, Pio IX, o
Grande, leva a cabo os trabalhos encetados por S. Leonardo. Dis-
sera elle, S. Leonardo, que da definição doeste dogma grande bem
havia a esperar tanto para a Egreja conr.o para a sociedade.
Pio IX conheceu perfeitamente que era chegada a hora de con-
ceder esse bem tão desejado, e fçz reviver os trabalhos de S. Leo-
nardo. Como elle mesmo confessou em Gaeta, a um illustre per-
sonagem, os trabalhos preparados por S. Leonardo serviram-lhe
de norma ; e, na verdade, e isso o que se deprehende da bulia do-
gn-atica. Chegara o dia 8 de dezembro de 1854. A doutrina de Es-
coto e da sua escola recebeu plena sancçáo no triumpho de Maria
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DEZEMBRO 415
Imnaaculáda, proçlaanado. pelo oráculo infaOhrd «do Vigarki de
Christo. A Ordem Franciscana exultou,, vendo tão gloriosamente
coroado? o> trabalhos de sete séculos pela defesa da mais preciosa
jóia da coroa de Maria. N'esse mesmo dia, pela tarde, ajoelhavam
aos pés do Immortal Pontifice de Maria, os quatro superiores ge-
racs das grandes familiis de que então .se compunha a Ordem de
S. Francisco.
Iam agradecer-lhe em nome da sua Ordem edo mundo catho-
lico aquelle singularissimo favor, que era uma consolação partB
tantos milhões de corações amantes de Maria. Ao mesmo tempo
devi im ofFertar-lhe o symbolo da Immaculada. O P. Venâncio de
Celano, Ministro Geral do; observantes e reformados, apresentou
ao Romnno Pontifice um riquíssimo lirio de prata; e o P. Jacintho
Gualerni um ramo de Posas, em filigrana, da mesma matéria. Pio
IX acceitou, commovido até ás lagrimas, aquellss symbolos, que
eram ao mesmo tempo um testemunho de filial amor dos filho 5 de
Francisco de Assis para com Maria Immaculada e para com elle,
Abraçoj-os, dirigiu-lhes as mais consoladoras palavras de agrade-
cimento por quanto a Ordem fizera em sete séculos por Maria Im-
maculada, e, estendendo sobre elles as mãos, abençoou-os com as
palavras do Ecclesiastico : «ouvi-me, vós que sois os filhos que-
ridos de Deus, e fructificae como o rosal plantado sobre as corren-
tes das aguas. Difíundi um cheiro de suavidade com.o o Líbano.
Dai viçosas flores como o lirio, e recendei fragrante cheiro, e ves-
ti-vos de engraçados ramos, e entoai cânticos de louvor, e bemdi-
zei ao Senhor nas suas obras.»
A benção de Pio IX produziu toda a efficacia que encerra a
força de suas palavras, e a protecção especial de Maria Immacula-
da continua a velar pela sua ordem, a Ordem Franciscana.
P. J. J. S.
Q-Sextai-feira—OejumJ—S. Silvestre, Abb.— A B.
Joanna de Signa, V., da 3.* O. — St.* Leocadia, V. M.
'Maria éo iman dòs peccadores; o que por esta mãe foiatrahi-
do para Jesus é impossível perder-se.
Alberto Magno.
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4i6 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
tO— SabbadO (jejum)— Trasiadaçáo da Santa Casa
do Loreto.— -S. Melchiades, Pp., M.
Estatua de N. Senhora do Samhro (em frente ao monumento)
Maria é o espalho claríssimo de Deus nunca embaciado com
peccado original.
B, DE Busto.
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DEZEMBRO 4x7
11 — Domingo (3.** do adv6nth)—S. Dâmaso, Pórtu-
guez, Pp. C. — S. Franco, C. ,
^^C)- 9J== —
VIRGEM MARIA
A M. C. DE Mes^íuita
«"'Quem tão triste é como a Virgem
E o seU lindo nome tem.
Deve ser egual a Ella,
Pura em affectos também. — »
Consoladora Mãe dos desgraçados!
— Nome adorado em tantas orações —
Tu que soltaste lamentáveis brados.
Ao ver's teu Filho morto entre ladrões.
Tu que, abraçada d cruj, aUl choraste
Tanto pranto que ainda nos aquece.
Por esse pranto— ó Máel-^quf derramaste.
Vem escutar a minha triste prece!
Volve os teus olhos, sempre piedosos.
Do Céo d terra, lar doít desaitòsot^
Valle de amarguras, 4<? Suspiros^ ais...
E dis(e dquellès qué, soffrendo, choram.
Aos filhos que te buscam, que te ex&ram.
Que foste Santa, mas soffresie mais!
I_isboa, 25—7—902.
Armando A. Xavier.
(2 ^
ti
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4i8 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
12 — Segunda-feira — Invenção do Corpo de S,
Francisco. — S. Justino, M.
Maria, aurora ditosa dos dias fetizes; o goso das virgens.
S. Boaventura,
13 — Terça-feira— St.* Luzia, V. M.
Havia, n'outro tempo, cidades de franquia ou de refugio, as-
sim chamadas, porque, quem lá se refugiasse, escapava a muitos
incommodos e participava de muitas vantagens ; de sorte que estas
cidades attrahiam para dentro de seus muros 'novos habitantes c
conservavam os seus.
Graças ao céo, nós nada temos a invejar aos tempos antigos;
pois Deus nos proveu também, sob a lei evangélica, d uma cidade
de refugio, d'uma só, na verdade, mas immensamente superior a
todas as outras, porque é a mais forte ^ a mais bella e a mais segu-
ra, e todo aauelle que n*ella se refugia, escapa a todos os perigos
e assegura toaos os bens.
Qual é então a cidade afortunada? Ouvi ao Santo Rei David
celebrar os seus louvores: «O* cidade de Deus, còntam-se de ti
coisas gloriosas.»
Esta cidade é a Rainha do Céo, a Mãe de Deus, por isso que é
o refugio dos peccadores.
• ©
14—3) Quarta-feira — (Têmporas— jejum).— S. Gre-
gório Thaumaturgo, B., C. — St.° Agnello, Abb. — Quarta
crescente ás ç k. e 20 min, da tarde.
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DEZEMBRO 419
a ria foi mãe mas sem contagio nem mc^çula.
S. Boaventura.
— ^^^—
15 — Quinta-felra — Oitava da Immaculada Concei-
ção.— St." Eusébio, B. M. .
T
ODOS conhecem o Sameiro, cuido eu; a devoção do povo por-
tuguez tornara-o muito celebre, e está fadado para ser, n*um
uturo próximo talvez^ o centro do culto mariano em Portugal.
Quem o nâo viu amda?
A seus pés n'um longo tapete de verdura estende-se o gracioso
valle de Bra^a ; alongando olhos pelos seus horizontes vastíssimos,
intermináveis, descortinamos todas as bellezas, de que se reveste
o nosso pittoresco Minho. E por cinm a aboba4a azulada do fir-
mamento, que, similhante á sooerba cúpula, lhe serve de remate ;
e o céo minhoro é lindo, lindo... Respirando a sua aragem fresca^
á hora do sol poente, dir-sc-ha que no Sameiro se vive n'uma
atmosphera nova e superior; em baixo dorme Braga, a pacata
Braga; ao longe, dependurados pela encosta de verdeiantes eoUi-
nas, fumegam os casaes dispersos, e que, áquelia hora do crepúscu-
lo, semelham um ponto branco e imperceptível quisi no horison-
te ; por toda a parte essa vegetação riquíssima e variegante e poéti-
ca ao nosso Minho.
O lo:al é, na verdade, apropriadissimo. Tudo convida á ora-
ção, e.é para orar. que milhares de portpguezes, cujo coração la-
te j i amor, vão suoir ao cume d'aquelle monte, que em 1861 era
ainda um monte sem importância e quasi sem nome.
N'esse mesmo anno de 1861 dois sacerdotes, o Rev. P. Marti-
nho António Pereira da Silva e o Rev. P. Manoel Antunes dos
Reis dirigiam-se em passeio para o Sameiro.
As excepcionaes demonstrações de regosijo, que a definição
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420 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
do dogma da Immaculada Conceição tinha despertado em i854 em
todo o mundo cathoJico, não tinham amortecido de todo.
Recahiu, pois, a conversa robre este assumpto. As sumptuo-
sas festas na capital do catholicistro, o exemplo da França e de
outras nações, que levantavam estatuas e coUocavam lapides com-
^memorativas do faustoso acontecimento, os celebres festejos de
* i835 em Braga entretiveram-lhes as attençóes no percurso do Bom
Jesus até ro Sameiro.
Foi alli que o P. Martinho communicóu a seu companheiro o
projecto de levantar n*aquelle sitio um monumento, que comnie-
morasse a definição dogmática da Immaculada Conceição: d'este
modo Portugal, que é o reino de Maria, e que desde séculos en-
gastava na coroa da Virgem mcis esta pérola fulgentissima de /m-
maculada^ râo ficaria insen^ivel; por outro lado daria a catholica
Braga um robre eiemplo ao resto do paiz.
Prometteu o P. Manuel Antunes dos Reis todo o seu apoio e
coadjuvação em obra de tanto alcance, e que seria uma profissão
de fe n'aquclle século de descrença e materialismo. Desceram o
monte preoccupados com a maneira mais fácil de levar a effeito a
reaJisação da obra, e foram-no communicando aos amigos e pes-
soas de intimidade, até que em Maio de i852 se formou uma nu-
merosa com missão, composta de cavalheiros distinctos, e com a
approvaçáo do Arcebispo Primaz. Muito teve íque luctar a com-
missão, porque a indiílerença de uns, o egoismiO de outros estor-
vavam a prompta realisacão da obra ; mas devido á cooperação de
almas boas e generosas aeu-se principio ás obras e o monumento
era, dentro de poucos annos, um facto consummado-
ColJocou-se a 14 de junho de i863 a primeira pedra. Admirá-
vel coincidência! Séculos atr^z, em i637,celetrava-se em Braga
synodo diocesano sob a presidência do Arcebispo Primaz D. Se-
bastião de Mattos, e a 14 de junho fazia a Igreji bracarense, al-
guns annos antes do celebre juramento das Cortes de Lisboa, o
seguinte juramento:
tiPromettemos e juramos todos os que n'este synodo estamos
congregados, em nossos nomes ede nossos successores, de sempre
termos e guardarmos e defendermos^ quú a Virgem Maria Nossa
Senhora fci concebida sem macula de peccado original, na forma
das Constituições e Breves Apostólicos passados sobre esta mate^
ria,y>
O esculptor Amatucci foi encarregado da estatua. A acquisiçr o
de uma pedra de 14 palmos, porque devia ser de uma só pedra o
monumento, den-orou a confeiçío da estatua.
Afinal a 6 de acosto de 1069 chegava a estatua a Braga, es-
tando exposta seis dias no paço archiííspiscopal. A 12 d'esse mes-
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DEZEMBRO 4*1
mesmo mez era transjjortadâ festivameíite para o moate Sameiro
por entre os enthusiasmos e acclainações d*uma immensa mó
de povo, que affluira de todas as partes áquella festa, única nos
annaes de Braga ; finalmente a 29 d'esse mesmo mez o Arcebispo
Primaz D. Joíé Joaquim d* Azevedo e Moura benzia solemnemen-
te a colossal estatua da Virgem do Santeiro.
Ahi fica em resumo a historia do Sameiro. Não nòs alonga-
mos mais, porqua, além de não caber no; acanhados limites d'um
modesto artigo de Almanach, quasi todos 03 meus leitores a devem
conhecer.
Fr. Z. Gonçalves.
16— Sexta-feira (9eJum)SXJ' Adelaide, Imperatriz,
Viuva. — As Virgens de Africa, Mm.
Começa a novena ao Menino Deus. Os fieis que a fizerem lu-
cram cada dia 3od dias de indulgências e uma plenária em qualquer
dia d'ella á sua escolha.
AO MENINO JESUS
(PARA A novena)'
Nós ardemos em desejos
De v:r nascido a Jesus
. E calçar-lhe os vés de beijos
E V3Stir4he os braços nús.
Preparae-lhe um berço /ino
Dentro em vosso coração.
Porque Elk é o Rei Divino,
Rei d* amor e de perdão.
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422 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Vinde, ifinde, ó Deus Infantel
Rei da vida e Rei da dor;
Vinde reinar triumpkante
No vosso throno d* amor.
Oh virgens, castos amores,
Tracei um berço de lii^
E almofadinhas de flores
Ao pequenino Jesus,
Vamos convidar os anjos
Para aqui virem cantar,
E os Seraphins e Archanjos
Para o virem adorar,
O' Virgem bemdita e pura,
Rasgae do mysterio o véo:
Dae-nos Jesus, a ventura
Que nos vem abrir o céo.
(Musica do auctor). P. Nunes Tavares.
17 — Sabbado — (jejum), — A B. Margarida Columna,
V., da 2.* O. — S. Bartholomeu de Geminiano. — S. Laza-
ro, B.
Maria foi o jardim d'onde brotou o cândido lírio de toda a
pureza; a recuperadora do mundo naufrago.
B. DE Busto.
18— Domingo -(4.° do advento.) — ^Nossa Senhora
do O' (ou a Expectação do Parto de N. Senhora.) — S.
Espiridão.
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DEZEMKIO 425
O Patriarcha S. Domingos, estando um dia occupado cm exor-
cisar um possesso, pergunta, entre outras coisas, aos demónios qual '
•é o santo que mais temiam no ceu e que sobre elies tinha mais
poder n'este mundo.
Foi preciso intimal-os por mais d*uma vez a explicar em-se,
pois obstmavam-se em guardar segredo .sobre este ponto. Final-
mente, obrigados pelos exorcismos, responderam : A Máe de Cbris-
to é a que tememos mais entre todos os santos : é ella que tem
mais império sobre nós; é também ella que merece ser mais amada
•e venerada dos homens, porque uma única supplica de sua parte,
um só suspiro oíferecido por ella a Deus, vale mais que as orações
e os suspiros de todos os santos juntos; e somos forçados a con-
fessar, a nosso pezar, que náo podemos nada contra os fieis e ver-
•dadeiros servos de Maria. Mais ainda: devemos confessar que todo
aquelle que perseverar na sua devoção para com ella não desce com-
nosco ao interno.
19— Segunda-feira— O B. Conrado de Ophida, C,,
da I.* Ordem. — St* Fausta, Viuva.
Maria é a nau*queJDeus concedeu á humanidade para atraves-
sar o tempestuoso,mar^d*este mundo.
B. de Busto.
"C — w — ^
20— Terça-feira— S. Josaphat, B., M.— S. Domin-
gos de Silos, Abb.— S. Filigenio, B.
Na sua conceição Maria foi palma triumpho, pois que superou
o demónio sem nunca lhe estar sujeita.
B. de Busto.
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^^ ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Apotheose de João Duns Scoto, o doutor marianno
21— Quarta-feira— S. Thomé, Ap.
HYMNO DA IMMACULADV CONCEIÇÃO
Coro
Salyá, salve, ó Virgem Maria,
Salve, pomba sem culpa gerada,
Salve, salve, ó lu!^ que nos guia.
Salve, salve, ó Immaculadal
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DEZEMBRO 425
Soi"^ mais pura que a rosa entre espinhos,
Sois mais bella que a lua brilhante;
E no peito traceis mais carinhos
Do que a mãe mais bondosa e amante,
N* estas trevas da culpa e da vida
São estreitas de lu;^ vossos olhos;
Sem a culpa mortal concebida.
Só vàs sois casto Ijrrio entre abrolhos.
Sob o manto abrigaes a desgraça.
Sois conforto do pobre e dos tristes;
Sois a Mãe sempre cheia de graça
Que as portas do cào nos abristes,
(Musica do auctor). P. Nunes Tavares,
22—® Quinta-feira— St.** Hugolino, Eremita, C,
da 3.* O. — St."" Honorato, M. — S. Flaviano, M. — L, cheia,
ás fy h, e 24 min, da tarde,
Maria é a arca da alliança que nos precedeu na posse da gloria
eterna para nos preparar ahi logar de eterno goso.
Alberto Magno.
23 — Sexta-feira — O B. Nicolau Factor, C, da i.^
O.— S. Sérvulo.— St.* Victoria, V. M.
Maria foi uma apostola encarregada da altíssima missão de re-
conciliar os peccadores com Deus.
Alberto Magno.
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I
4^6 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
24 — Sabbado — Vig. do Nascimento de Nosso Se-
nhor Jesus Christo. — [jejum e abstinência rigorosa) — S.
Gregório, M. — St.* Hermínia, M.
Maria é um iman divino cuja força nos livra das ondas do
mundo e nos leva ao porto de salvação.
B. DE Busto.
25 — Domingo — Nascimento de Nosso Senhor Je-
sus Christo. — St.* Anastácia, M. — Abs. Ger.
SCHOS DÚ ITATAL
(para musica)
Canções de eterno jubilo
p'lo vasto céo reboem;
pa:ç^ gloria, amor, resoem,
ChristãoSy nasceu Deus!
De Belém surgiu 'splendida
a aurora Redemptora;
sigamos sem demora
os raios d' essa lu^.
Gloria a Deus! Hymno eterno de louvor;
Messias Redemptor,
Salve!
Tua lei foi o amor!
Salve!
P'ra nós o céo abrira-se,
raiara nossa esperança;
Jesus, eterna herança,
será nosso penhor.
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DEZEMBRO 427
Mas pobre, em noite frigida
nú ja^y e yagitando;
nosso crime nefando,
Jesus, roubou-te o amor!
Gloria a Deus! Hymno eterno de louvor;
Messias Redemptor,
Salve!
Tua lei foi o amor!
Salve!
E o cântico de gloria
verberando echo infindo,
se vae repercutindo
p'lo Burgo de Belém.
Ao hymno suave, angélico^
e ás vo^es dos pastores
unamos os louvares,
cantemos pa^ e bem.
Gloria a Deus! Hymno eterno de louvor;
Messias Redemptor,
Salve!
Tua lei foi o amor;
Salve!
Nas sombras d*um mysterio
Jesus se nos revela;
Salve! Tu és a estrella
da nossa redempção.
Lá dentro do tugúrio,
aos pés do meigo infante,
nosso amor lhe descante
hymnos de gratidão.
Gloria a Deus! Hymno eterno de louvor;
Mesiias Redemptor,
Salve!
Tua lei foi o amor!
Salve!
(12— XII=i90o). P. Freitas.
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428 ÁLMANACH DE SANTO ANTÓNIO
O SoM.NO DE Jesus
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DEZEMBRO 429
26~Sfegunda-feira— St.^ Estevão, Prot. — S.M.
DionisiOi Pp. — Ind. Plen, da Bulia. ^ .
27 — Terça-feira — S. João Ap. e Evang.
Maria é o consolo dos que choram; salvaguarda de preceitos;
principio da nossa salvação e esperança de todos os que a invocam,
S. Boaventura.
28 — Quarta-feira — Os Ss. Innocentes, Mm.
Quando Jesus nasceu, — ha qua/i dou: mil annos,
por entre o baço horror d'aquella noite algente,
ouviu-se um ruidoféro, rude, brusco, ingente;
—foi o rugir brutal dos labregos tyrannosl
Tremeram, sobre o throno, os Césares romanos;
o inundo estremeceu;, ». e as aves mansamente
entoaram pelo espaço, em cântico fremente,
«que Jesus era um Deus, — o rei dos soberanos,»
A humanidade olhou em roda espaventada.
Ao volver sobre si, viuse regenerada, . .
e em paga deu-te a cru^, 6 meigo Redemptor!
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43o ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
Mas se voltasses cá, os •pharíseús» d*agora,
mandavam-te ás galés, pregado á cru!f d*outr'ora, . . .
porque hoje, ó Nazareno, o mundo esta peior
20 —XII — 902. Sousa Martins.
29 — 3) Quinta-feira — S. Thomaz, Arceb. de Can-
tuaria. — Quarto minguante ás 3 k. e ç, da tarde.
30— Sexta-felra— S. Sabino, B., M.
Maria é a ostiarla do ceu; mãe immaculada do immaculado
filho de Deus, mãe dos orphãos.
B. DE Busto.
Q^y-^-^ uv ^.^
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iVEIRO E A COHCOCJÍO 01 VIRGEM MAIIIi
^1 VEIRO foi sempre uma povoação essencialmente re-
{^} ligiosa, muito embora um ou outro individuo d*aquí
^ tenha apregoado opiniões contrarias aos princípios
catholicos.
^ ^, Assim o demonstram o grande numero de tem-
^[^ plo% que outr'ora aqui existiam, muito embora de
'i' não vastas dimensões, e o seu grande numero de con-
' frarias, muito embora com pequenos rendimentos. '
E' grande o numero de festividades, que annualmente se fa-
zem em Aveiro, mas os aveirenses sempre tiveram especial devo-
ção com Jesus Sacramentado e com o seu culto gastam annual-
mente, os respectivos confrades, sommas importantes.
Não menos se esmeram os Aveirenses no culto da Virgem Ma-
ria sob diversas invocações e em diversas epochas do anno.
No entanto, a Conceição da Virgem mereceu-lhes sempre um
culto muito especial.
Isso prova-se pelo grande numero de imagens e quadros d*es-
sa denominação, que outr*ora existiram nos templos e nas casas
convcntuaes doesta cidade e pelas imagens, que ainda hoje restam
em alguns recintos sagrados.
A tal respeito darei umas noticias succintas.
— Na egreja do extincto mosteiro da Madre de Deus (vulço
Convento de Sá), o altar-mór era dedicado á Senhora da Concei-
ção.
Posto que não muito grande, a sua formosa imagem figurava
um pouco acima do Sacrário e tinha annualmente a sua festa, ain-
da que limitada.
— No claustro do Convento dos Carmelitas descalços (da Se-
nhora do Carmo), havia um altar, dedicado á Senhora da Concei-
ção. No dia 8 de Dezembro figurava a imagem n'um dos altares
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432 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
da Egreja e tinha uma devota festividade. O serviço do culto era
feito gratuitamento pelos religiosos. As despezas que além d'isso,
podiam fazer-se, eram pagas pelos estudantes de latim e de lógica.
— No templo da Misericórdia ainda existe um altar, dedicado
a Nossa Senhora da Conceição e, sob este nome, ali houve em
tempo uma numerosa Confraria, que dispunha de meios, sufficien-
tes para o culto.
— Na Egreja de S. Miguel e em altar especial venerava-se uma
bella imagem da Senhora da Conceição. E* quasi de tamanho na-
tural e tinha uma asfociação de devotos, que annual mente a feste-
javam e, que em diversos dias lhe prestavam culto.
Demolida aquella Ej^reja em i835, foi esta imagem conduzida
para o templo, que hav^a sido dos frades dominicos e que, sob o
titulo de Senhora da Gloria, ficou sendo a sede da freguezia, ao
sul do Cáes.
Ahi figura n*um altar especial e annualmente a festeja uma asso-
ciação de devotos, que tratam da limpeza e ornato do mesmo altar.
Este, bem como a imagem foi competentemente pintado e doprado,
ainda ha poucos annos, por hábil artista da Villa de Ílhavo.
— Na Egreja, que fora do extincto Recolhimento de S. Ber-
. nardino, (vulgo das Beatas) e que depois serviu de Sé, também
existia na capella-mór e defronte do coro de baixo, um altar, de-
dicado á Virgem da mesma invocarão. A imagem está actualmen-
te n'uma das sacristias do numerosissimo templo.
— No templo de S. João Evangelista, pertencente ao Conven-
to de Carmelitas descalços (hoje simples recolhimento), existe um
altar, dedicado a Nossa Senhora da Conceição. A imagem é for-*
n:osa e de tamanho regular.
Até á extincçfo do Convento não deixou de ter a sua festivi-
dade, sempre muito aparatosa, e para ella também concorriam al-
guns devotos, que estavam associados como em confraria regular.
Na capella-mór do mesmo templo, também existe um quadro, em
que figura a Virgem da Concçição, cercada por emblemas, mais
ou menos appropnados á sua historia e tos seus gloriosos epithetos.
— Imagens da mesma en vocação e de algum merecimento ar-
tistico existem na Egreja de Santo António, que pertencera ao
Convento do me^mo nome, da Ordem franciscana; e na dos Ter-
ceiros seculares da mesma Ordem. Em ambos os templos são mui-
to veneradas.
— No extincto Mosteiro de Jesus, de freiras dominicanas (ho-
je collegiq de Santa Joanna), ha uma formosa imagem da Senhora
da Conceição, que se venera n'um altar, que fica no ante-côro.
Não é muito grande, mas tem ricos vestidos. No dia 8 de dezem-
bro, figura n'um altar do respectivo templo e ahi é solemnemente
festejada, a, expensas de uma assoriaçío de pessoas devotas.
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PEZEMBRO 433
Em quanto o mosteiro não foi extineto (1874), a festividade
era a expensas dos rendimentos da mesma casa religiosa.
— O andor de Nossa Senhora da Conceição é o que na Pro-
cissão da Cinza precede todos os outros. Foi sempre tratado con
muito desvelo, por algumas jovens, pertencentes á Ordem terceira
de S. Francisco.
Apesar dos poucos recursos da mesma Ordem, foi mandada
fazer, ha pouco, uma nova imagem d'aquella invocação, e o seu
andor, que também é novo, é muito bem ornamentado de flores
artiticiaes.
A imagem é muito formosa, tem um bonito vestido bordado
a ouro e um manto egualmente bordado, o que tudo é effeito da
dedicação e das esmolas dos aveirenses devotos, e especialmente
das pessoas do sexo feminino. .
E* bem sabido, que em 1854 foi decidido um concilio, que a
Virgem Maria fora, na sua Conceição isempta da macula do pec-
cado original.
Como remate ao Jubileu, que por esse motivo fora concedido
por o immortal Pio IX, a mesma Ordem fez, na Egreja de Santo
António, uma solemne festividade em honra da Virgem da Con-
ceição.
Foi no dia i3 de Maio de i855. De tarde houve uma pro:is-
são, composta de todas as Confrarias erectas em Aveiro. E foi,
talvez, a pro:issão maior e mais aparatosa, que se fez em Aveiro
na segunda metade do Século XIX.
Na Aurora, jornal religioso e litterario, que então aqui existia
foi por essa occasião publicado um artigo descriptivo a respeito
de tal sole Tin idade. Foi escripto por José Joaquim de Carvalho e
Góes, que foi o Orador na festividade e que falleceu em 1860,
exercendo o cargo de Vigário geral da (hoje extincta) diocese de
Aveiro.
Este clérigo era natural d'esta Cidade.
Aqui, raras são as casas de familias devotas, que não tenham
uma estampa, imagem ou quadro da Senhora da Conceição.
Dou estas noticias, porque também me preso de ser devoto
da Virgem da Conceição e estirro, que a terra, onde nasci, de
sempre demonstrações de religiosidade e com exemplos, como ahi
ficam.
Oxalá, que não esfrie essa devoção dos meus conterrâneos e
que a Virgem proteja esta cidade, aonde, segundo uma devota
lenda, descera, para que fossem aqui edificados templos e um
mosteiro sob a sua invocação e em sua honra.
(Aveiro).
Rangel pç Quadros.
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434 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
31— >i< SabbadO- S. Silvestre, Pp., C.
O um DO MIIHEMATICO
(récita)
ftO MATHBMAtICO f*. p. ^foRABS
Perdoae, meu bom menino,
não sei versinhos fa^er,
bem sabes, sou mathematico,
e não sei lyras tanger.
Se quimeras, que traçasse
cathétoSy hyppthenusas,
vd láy com gosto o fizera.
Isso é Id para os poetas,
esses cabecinhas no ar;
a mim apra^-me entre os astros,
n' esses desertos vagar.
Quem me dera Id por^cima
tra^ d'um planeta correr,
para vCr se o apanhava,
p'ra v2r se o podia vjr.
Então, cadernó^na esquerda,
na outra lápis aguçado,
dos astros traçara as orbitas
no seu dorso escarranchado.
Áreas dos corpos terráqueos
sempre desejei medir,
mas descrever ribeirinhos,
choupos verdes a bolir.
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DEZEMBRO 435
ondeados pela brisa,
murmurando o dmdejar;
o velho roble da serra
da tempestade a encurvar;
a corrente serpeando
pela quebrada do monte,
o trinar da cotovia
junto aos suspiros da^ fonte;
do jardim a branca rosa
p*los s{éphiros embalada,
n violeta do vede
pelo rocio orvalhada,
a caudalosa corrente
a cahtr Id dos penhascos,
e não sei, que mais tolices,
quefa^em arder os cascos. . .
Tudo isso é Id para os poetas,
esses cabecinhas no ar;
a mim apra^^-me entre os astros,
n'esse deserto vagar.
Encadear quatro linhas
por lettra grande encetadas,
com isso que chamam rimas,
sonoras metrificadas,
andat semanas e me^es
a dar voltas á miôla,
e achal-a, sem nada escripto,
feitinha n*uma cebola;
ou Id como o meu visinho
e outros cá daredonde^a,
que passam dias inteiros
tocando tambor na me^a
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436 ALMANACH DE SANTO ANTÓNIO
á cata de phantasias,
atraz d' uma palavrinha,
dando tombos infinitos
á pobre da caxolinha.
Nada, nada, outro officio;
isso é lá para os poetas,
a mim apra^^-me, pensando,
vagar por entre os planetas,
Perdoae, pois, meu bom menino;
eu não sei metrificar,
sei tragar circumferencias,
mas nao lyras dedilhar.
—1898— P. B. Ribeiro.
i'
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AGRADECIME-NTO
A todos os nossos affmveis e caritativos collaboradores,
que n*este anno se dignaram concorrer para o melhoramento
do nosso almanacky aos ilbistres jornaes catholicoSy A Pa-
lavra, Correio Nacional, Commercio do Minho, Progresso
Catholico, e Grito do Povo, que tão amavelmente se digna-
ram enviar como suplemento^ aos seus assignantes o an-
núncio do Almanach de Santo António e a todos os
que se maçaram com a sua impressão e outros trabalhos
agradecemos penhoradissimos^ e deixamos-lhe aqui consi-
gnado o nosso eterno reconhecimento.
Aos nossos collaboradores avisamos que nem todo o seu
original pôde ser empregado^ mas sel-o-ha para o anno.
Bom anno e a protecção de Santo António é o que deseja
e pede para os seus amigos a
r
Redacção da «Voz de Santo António».
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m^aai^n 1 lui.n hl .ji [u-mmm^m ■miinuiii ; iiiii i i i i ■ '■ m' ., -. _ ipi t;. » ",■.■ j^^jF^ • "
yp^ de António
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