/60 FLORES^
Yrn
LIVttARIA ACADÉMICA
J. GUEDES DA SILVA
8, R. Mártires da Liberdade, 12
PORTO — TELEFONE, 25988
■ ■ m m m
i" • • * ■
■ • • * ■
• * • «
0 • * «
:;:::
i a V ■
'■'•':'* • ■
■ ■ ■
< » * * -
• • iuftut
•
a ■ • •
■ m
■ ■
• *
V m
• <*•»■■■•
■ ■
. a a a a • a aaaaaaB.aaaaaa .BBBBBBBaaa a • a a * a a a a a a • ■ :«".B- '. ■ « a
■ •-••: ••••••••••••••■•••■ ■ ■ ■ ■ • a a a • • ■ '■•; ■ • • • a a a a a a ■ ■ ■ • a a
a a a a a a • a :• a a a a a a a a a a a a a a a a a a a a a' a 'a "a a a a a a a a • a a ■ a a a a a a a
a a a 'a a a a a a' è a a a a av.... •...'. asa a a aaaaaaaaaaa
a • a a' a
a a a a a a a a a a a a aaaaaaaaa mm a a a a a a a ....bb* a*. ...... .......
a ai' a a .«'BB a a a a a a • BB a a a a a a a a a a a a • aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa
a ia - a a «^ a a a a a a a a a ■ a a- a • • • a a «a a a" a a a a a a a a a a a a a a a a a a a a a a a a a a
'-. a a a a a a a a a a ia: '.'>.. "• ."•'■'« aaaa«aaa'aaaaaaaa«a»«aaaaa»a
rraH:;Ír" a a a a a a •':'jt":iit"é a a a a * a- a a • a •" a ' a a a a a ':a a a a a a a a a a a a a ' a B' •} '
M
a a
afmMipml
aa aaaaaaaaaaa' aaaaaaaaa
'
a a a a a a a a a a a a a a a a a a a
a ;(; ;;' B ■■ ;,; ■ ',,1 :;j ,:; B ,,i B | !
aaaaaaaaaaaa a a ■*■■
'■'•aaaaaaaaa a a a a
a a
. a
n!inIw«fliSll» a» . aaaaaaaaaaaaaaa aaaaaaaaaaa
Kiifillíii-iíluiiíi^'» aa*aaa««aa»«»aa«a'»»«a»«aB a aaaaaaaaa ..-••«•«»»••
T
a
a" a a a a a a a a a a a 'a a a a 'a a
a a a a a a a a a a a a a a a a a. a
aaaaaaaaa
aaaaaaaaaaaa
............
aaaaaaaaaaaa
a a a a a a a a a a ■' a a a a a a a ■•' a '• ' a
a a: 'a a a a
a a a a a a r é a
aaaaaaaaa
aaaaaaaaa
a aa a a a ' a : a a
a a a :a 'a- a a a a
• a a a a
*••••••»•••••••••••
a' a a a a a a" .:,!.: ■ ; ai a a a a a a a a' a •' '•' a ••:'■■'/'• •/■ è' •■' a ' a' '■■ a a a a a
a a a a a a a a a a a a a » a :■;•; a a a aaaaaa a. aaaaaaaaaaa
a a' a b 'a a a a- •' a a a a ' a '■' a a- a a a a a a a a a a a a a a 'B' a a a a ' a a/ a a a a a - a a a 'a. a 'a a a b a a a a
.. aaaaaa a a a ...... .aaaaaaaaaaaaaa a a a a:''é a a a a a a a' a; a -'a a a a a a a a a a
aaaaaaaaaaaa. '• BB* aaaaaaaaa. a a b a a a a a é a a a' a a a a a a a a a' a a: a a a a "a a
a a a a a a a' a a a a a
a a a a a:' a : a a .- ;. a' a a
aaaaaaaaaaaaaa
aaaaaaaaBaaaaa'
a b a a a
a a a" aaaaaaaaaaaa
4 Jfl W ffi II
i • • a a ...asasaaaa
a a a a -a a a a a a a a s B' s a a a ' •' a- :b a .-itf
aaaaaaaaaaaa.aa
■ a a a a a a a a a a • a a a
a a a a aa a à a a a a a a a •'■■-■ "a'' ■■"•;'.•!'
aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaBBasaaasaBa a a a a a a
aaaaaaaaaass a a a a aaaaaa a aaaaaaaaaaaa a «BaaBaaaaa' aaaaaaaa
a a a
...... .......... .
«•••«•«a • * m • * » * • «
**»•**>«*#
• • i • ■ *■ *
**#•■•■
»••••€■
■ • • * • • * a a iirn • •
aaaaaaaaaaaaaa
* i • ■ i** aaaaaaafcaaaaaaaaaaaa
■ a a a a a a a >a a •■''»■:'■ a m a a ■ '■' ■ • • i
H |H (ti B) fll
..........
a a a a a
.aaaaaaaaaaaaaa a.. » a aaaaaaaaaa
aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa .ii! JwiÉ" íf!'«"iife«*ir|í
a a a a
aaaaaaaaaaaaaa.
............. a
aaaaaaaaaaaaaa
. aaaaaa. Baaaa.
aaaaaaaaaaaa*
aaaaaaaaaaaa»!
aaaaaaaaa a aaaaaaaaaa
• aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa
aaaaaaaaaaa.BBaaaaaaaaaaa
i a a a ■' ■ ...... aaaaaaaaaaaaa
aaaaa-aaaaaaaaaaaaaaaaaaaa
aaaaaaaaraaaaaaaaaaaaaaaa
• aaaaaaaaaBaaaaaaaaaaaaaa
a a a a a
aaaaaaaaaaaaaa
aaaaaaaa
aaaaaaaaaa
......
.' a a a a •
aaaaaa
aaaaaa
1 »"p IR 'JPi
1 •■ i s
. a . . .
■ * a
■ ■
*I » # •
* * * » ■
. a a a ■
mm
m
i • ■
• ■ a • •
• •••«««
■ a a • a
ARCHEOLOGIA CHRISTÃ
depositado para os effeitos do art.° 5 76
do Código Civil
t^H^iA^yV^jU^
Í3
ALBANO BELLINO
Areheologia Christâ
descripçào histórica de todas as egrejas,
capellas, oratórios, cruzeiros e outros monumentos
de Braga e Guimarães
PUBLICAÇÃO COMMEMORATIVA
>
do Jubileu Universal do Anno Santo
illustrada co vi óõ photogravuras
dos monumentos religiosos mais notáveis
DAS DUAS CIDADES DO MINHO
LISBOA
Empreza da Historia de Portugal
Sociedade editora
livraria moderna typographia
g5< Rua crfugusta, g5 35, Rua Ivens, 3j
MDCCCC
DO MESMO AUCTOR
Inscripçóes e Lettreiros da cidade de Braga e algumas freguezias
ruraes. Typ. Occidental, Porto.
Inscripçóes Romanas inéditas de Braga. Typ. Lusitana, 'Braga.
Discurso proferido no Atheneu Commercial de Braga. Imprensa
Henriquina, "Braga.
Aqui (versos). Typ. Silva Caldas, Guimarães.
Novas Inscripçóes Romanas inéditas, de Braga. Typ. Lusitana,
"Braga.
Cartas sobre epigraphia romana. Typ. Lusitana, "Braga.
Questionário Archeologico. Imprensa Henriquina, "Braga.
Catalogo das moedas romanas, celtiberas e wisigothicas, perten-
centes á Sociedade Martins Sarmento. Typ. QÂ. J. da Silva
'Teixeira, Porto.
AO
Instituto de Coimbra
(Merece grato
O Auotor
ADVERTÊNCIA
Descends du liaut des cieux, auguste verité
Henríoiie, cbant i.
o segundo Congresso Internacional de Ar-
cheologia Christã, realisado em Roma desde
17 a 25 de abril findo, sob a presidência de
Mgr. Duschene, obtive inesperado incentivo
para dar publicidade a este meu trabalho
commemorativo do Jubileu Universal do
Anno Santo, ultimo do século xix, procla-
mado pelo incomparável Pontífice Leão XIII
(Joaquim Pécci), o diplomata distincto, o
santo e sábio Chefe da Egreja Universal,
tão justamente considerado a mais lidima gloria do Pontificado Ro-
%£ ■
mano
Quando ha annos a imprensa portugueza, sem distincção de
crenças partidárias, o saudava por mais uma vez empregar em fa-
vor da fraternidade humana toda a força moral de que dispõe, di-
zia o Jornal de Lisboa: «Na sua mão de octogenário brilha o dia-
mante do ar.nel de S. Pedro com uma intensidade que illumina
todo o mundo !». E' que em todo o mundo os louvores tributados
ao venerando velhinho despertam enthusiasmos, mesmo entre
aquelles a quem por vezes terá repetido as palavras do seu pre-
Vlll
decessor Alexandre III dirigidas a Frederico Barbaroxa, imperador
da Allemanha, para lhes assegurar que tentam em vão destruir a
barca de Pedro, pois não sossobrará ao impulso do vento rijo que
de contínuo a persegue :
«Niteris in cassum navem dissolvere Petri
Fluctuat ; ast nunquam mergitur illa ratis».
Nestas breves palavras quero que fique exarado o testemunho
da minha admiração pelo actual representante de Jesus Christo
na terra. •
Para que geralmente se reconheça a utilidade d'este trabalho
histórico, único no género, nada mais será mister que a sua lei-
tura attenta.
Vale muito, muitíssimo, a critica auctorisada, imparcial e justa,
por semelhar a luz que alumia e não queima ; e também não vale
pouco a verrina da mediocridade invejosa que denuncia o mereci-
mento alheio e diverte a populaça ávida de distracções banaes.
Portanto prometto nada oppor aos desfavoráveis conceitos que se
façam do presente livro, salvo se houver de contestar affirmações
inexactas.
Não conseguirá deleitar pelo aprimorado do estylo, porque á
sua elaboração presidiu especialmente o desejo de o tornar instru-
ctivo pelos factos e reflexões que apresenta, mas provará á sacie-
dade que trabalhei com extrema dedicação, com desusado esforço
para, como nos demais estudos que até hoje tenho dado á es-
tampa, fornecer aos curiosos da especialidade a citação de factos
inéditos, ou quasi de todo ignorados, não lhes occultando nem
pervertendo a verdade, que la perita xe una so/a, diz o pro-
vérbio veneziano, e esta, na opinião do escriptor inglez Gold-
smith, impõe á Historia o dever de delinear egualmente o justo e
o injusto.
Todos: os que se interessam a serio pelas cousas do prssado
— IX
afrirmam, e com razão, que nem sempre o estudioso de gabinete
lhes conquista o agrado em seus trabalhos históricos, não obstante
serem estes por vezes considerados primorosos na forma ; por isso
eu procuro proporcionar-lhes apreciáveis elementos de estudo,
apresentando aqui numerosas photogravuras dos principaes monu-
mentos de que me occupo e o resultado das minhas investigações
que mais connexão têem com o assumpto.
As referencias históricas illucidativas dos muitos monumentos
sagrados de importância archeologica ou artística — pregoeiros
da crença das gerações extinctas — e ainda dos séculos a que cada
um pertence, foram colhidas de preferencia nas obras dos escri-
ptores catholicos mais considerados, como Josephi Binghami (Ori-
gines sive Antiquitates Ecclesiasticae), e do Abbade Ducreux,
cónego da egreja de Auxerre, a quem Pio VI enviou um Breve
de approvação á sua preciosa Historia do Chrislianismo, que mais
que nenhuma outra consultei.
D'esse Breve, dado em Roma a 27 de setembro de 1775, re-
cortarei o seguinte:
«Tum ex ipsa operis fronte, cum ex iisdem tuis litteris perspi-
cué profecto cognovimus quam praeclarum consilium tuum fuerit
suscipiendae Christianorum rerum enarrationis, quaque institeris
via, ut omnia aptê dilucidèque, ac ex Historiae legibus nativo co-
lore describeres et quae corrupta ac temerata recentiorum Aucto-
rum audácia ac fraude fuerant, ad puríssimos originis fontes, ac
ad veritatis suae speciem revocares.»
Norteado por estas palavras de Pio VI a propósito da carta e
plano da obra de Ducreux, egualmente procurei caminho seguro
para referenciar vários successos com exactidão e clareza, pintal-os
com as suas cores naturaes e restabelecer, recorrendo ás fontes
mais puras, muitas verdades históricas.
Foi este o único fim que tive em vista quando no decurso
deste meu trabalho citei varias passagens da Historia, pouco ou
nada edificantes. Ninguém de são critério poderá pôr em duvida
o bem que resulta do confronto dos actos bons e maus para po-
dermos abraçar contentes a causa da virtude e da fé, embora
repellindo com energia abusos e incoherencias de quem por de-
ver a defende. «Da confusa amalgama de bem e mal, de justos
e precitos, sae mais radiosa a gloria divina.»
Os synchronismos que dou de cada século tendem a esclare
cer o leitor sobre algumas occorrencias mais notáveis e sobre o
caracter dominante de cada epocha para mais facilmente deter-
minar os costumes.
Sem prejuiso do titulo desta obra faço, nos logares compe-
tentes, levissima referencia aos monumentos profanos e a tudo
quanto numa e noutra cidade possa chamar a attenção do visitante
curioso.
Este livro deve portanto offerecer vantagens como guia de
quem se proponha examinar de perto o que nos resta de passa-
das glorias.
Interessei-me quanto pude por evitar omissões de egrejas, ca-
pellas, oratórios, cruzeiros e outros monumentos de arte christã
pertencentes ás duas cidades do Minho — Braga e Guimarães. De
tudo o que existe dou aqui noticia histórica desenvolvida e con-
scienciosa.
Das freguezias ruraes dos dois concelhos vão os oragos em
grupos. As egrejas e capellas, na sua máxima parte, são destituí-
das de merecimento architectonico ou archeologico.
*
Termino com este os meus trabalhos do século que expira e
que me lega recordações muito gratas: deu-me o berço risonho
e enflorou quasi continuamente a minha adolescência.
O que nasce recebe-me desde pouco mais de meado do quinto
período da edade adulta e, sem o mínimo respeito por esta que é
já trinta e oito vezes superior á d'elle, apresenta-me a sepultura
para onde, d'aqui a minutos, horas, dias, mezes ou annos, poderei
ser levado, como diria Victor Hugo, pela onda que passa, pelo
vento que sopra, pela pedra que rola, pela hora que sôa.
Embora! Não devo querer-lhe mal por me notificar o predo-
mínio que tem n^ste enygma — a vida. E para que o porvir, longo
Xi
ou breve, seja para mim ditoso, clamarei com Leão XIII na sua
bella ode ao século que nasce: — Jesus, arbitro do íuturo, sorri
ao novo curso da edade que surge !
«Jesu, futuri temporis arbiter,
«Surgentis aevis cursibus annue».
Depois forcejarei por continuar a colher os fructos da paz da
consciência para que esta alma, solta dos laços terrenos, voe ao
seio do Eterno abençoada por quantos me comprehendem ou
sabem que espero e confio na productibilidade da sementeira do
bem.
«Quae enim seminaverit homo, haec et metet.»
3i de dezembro de 1900
Remate do século xix
Albano Bellino.
Sc tornar-se christáo pode este mundo
Sem que milagre houvesse que o movesse,
Não conheço milagre mais profundo
Dante [Trad. do C. de S.)
Data da origem da humanidade a crença na vida futura. O
homem primitivo, dando largas ao natural desejo de inves-
tigar, progredir e viver feliz, foi levado a concebel-a pelos
múltiplos phenomenos de que a natureza o cercava, e os quaes
elle instinctivamente attribuia a um ente desconhecido que lhe
inspirava respeito e adoração. Era a primeira religião com seus
mysterios, base de todas as religoes do mundo !
N'esses períodos — paleolithico e neolithico — existiu em pri-
meiro logar o culto fervoroso do sol e da lua, (soli . et . lvnae,
ou, como se lê na mscripção de Melide (Collares) : sou . aeterno
lvnae); o dos animaes, e ainda o dos mortos queridos (necro
latria), prestando-se a estes todas as honras fúnebres, e dando-
se-lhes condigna sepultura para que de modo algum lhes faltasse
o ambicionado repouso.
Era então ponto de fé que a sagrada trepanação, ante ou post
mortem, expulsava do enfermo os maus espíritos, a que se attri-
buia a morte, ou facilitava a entrada da alma no corpo; que de-
pois d'este havia um outro mundo onde os que partiam encontra-
vam uma vida egual á que deixavam ou quiçá melhor, e que na
sepultura, junto do cadáver, deviam ser depostas offerendas para
que o extincto protegesse ou não vexasse os vivos! As offerendas
— 2 —
juntavam-se utensílios e armas, todos os objectos de que o morto
mais necessitava para a continuação do seu mister n'aquelle ou-
tro mundo feliz ! (Rei. na Lus. por J. L. de Vasconcellos).
Entre as muitas superstições curiosas, que a idolatria inaltera-
velmente manteve, encontramos as famílias e as tribus a venera-
rem, como deuses protectores, as almas boas dos seus antepas-
sados.
Originaria da Grécia, a religião polytheista, esplendorosa no
culto, divertida e tolerante, conquistou sem custo o agrado do
povo-rei, esse grande povo que nenhum outro excedeu ou ex-
cederá jamais na civilisação material e na riqueza, como ainda
hoje por toda a parte o demonstram numerosos vestigios d'esses
tempos.
O Capitólio em Roma e o Templo de Serapis no Egypto
sobresaiam pela sua magnificência aos demais Templos pagãos.
Entre nós também os romanos, que no anno de 5i antes da
nossa era, mais de dois séculos depois de entrarem na Hispânia,
dominaram a Lusitânia, erigiram aos seus deuses muitos Templos
de que nos dão noticia authentica as inscripções lapidares. Em
Évora ainda agora podem ser admirados estes restos venerandos
que em 1860 se encontravam profanados por uma construcção
ameiada, assente sobre as columnas corinthias, provavelmente
desde o século xv. (Vide gravura a pag. 3.)
Artemidoro, geographo grego, estuda então no Promontório'
Sagrado os costumes religiosos dos bárbaros e os seus ritos —
Gaulezes, Germanos e Celtas — que os romanos baniram por
completo depois de livremente os permittirem aos povos que con-
quistavam.
Os judeus professavam grande aversão aos Ídolos, porque esta
religião contrariava em absoluto as doutrinas moraes do Antigo
Testamento e todos os actos do culto prescriptos pelo próprio
Deus verdadeiro, os quaes podem ser encontrados desde o Gé-
nesis ao livro II dos Machabeus.
Micheas, o sexto dos doze prophetas menores, vaticinou o nas-
cimento do Messias em Bethlem quando ainda a religião poly-
theista possuía, com seus altares e sacerdotes, Templos mages-
tosos consagrados ás divindades pagãs que só na ordem inferior
attingiam o numero de vinte mil, segundo Doêllinger, auctor das
Origens do Christianismo.
Isaías, um dos quatro prophetas maiores, predisse que Jesus
nasceria d'uma Virgem: «Ecce virgo concipiet, et pariet Filium,
et vocabitur nomen ejus Emmaniiel».
Tudo isto se realisou.
Esse fulgente sol que despontara alfim n'um pobríssimo esta-
CS
a
CO
•■-1
p
XS
O
£
0)
EH
— 4 —
bulo de Bethlem, dissipou por completo as trevas do paganismo ' ;
e a humanidade soffredora anteviu na vinda do Messias o termo
de todas as vexações a que a reduzira a fereza dos potentados,
forque n'aquelle tempo predominava a tyrannia dos soberanos so-
bre a humildade dos vassallos, a oppressao dos poderosos sobre
os fracos, a ambição desmedida, a corrupção da virtude e da jus-
tiça, tudo quanto o christianismo condemnou, estabelecendo de
vez os meios conducentes á verdadeira felicidade humana.
A humanidade curva-se na presença do grande Apostolo,
ouve-o enlevada pela simplicidade das suas parábolas, pela subli-
midade da sua doutrina, pela bondade da sua moral; acclama-o
propheta e rei; e, embora alguns homens o declarem embusteiro
e amotinador do povo, levando-o por isso ao supplicio dos escra-
vos, a mesma humanidade guarda as suas doutrinas em que en-
contra a objectivação da verdade e da justiça, e adora a cruz, onde
vê o lábaro santo da paz e do amor 2.
1 Affirma Mosheim que os primeiros christãos não conservaram a memoria
do nascimento de Christo; santificavam apenas a sua resurreição e a descida
do Espirito Santo no pentecostes. E de facto só em ">32 é que um monge de
reduzida estatura — Dyonisius Exiguus, — pertencente á egreja romana, e na-
tural da Scithia, fixou o dia s5 de dezembro do anno de Roma 753. Vejamos,
porém, como os differentes auctores divergem n'esta matéria.
Clemente de Alexandria dá-nos o Natal em maio ; Euzebio e Santo Epi-
phanio no dia 6 de janeiro de 4>. Outros crêem que no calculo de Dyonisio
Exiguo se commetteu um erro de 4 annos, verificado pela data do fallecimento
de Herodes, conhecida com exactidão chronologica, devendo portanto admittir-
se que Jesus Christo nasceu em 749 e morreu aos 3b annos de edade. César
Cantu quer que a era vulgar seja contada do anno "47 de Homa, 40 da era Ju-
liana, 39 do reinado de Augusto, 25 depois da batalha de Accio, 35 do reinado
de Herodes na Judéa, sendo cônsules em Roma Caio Antisdo Veter e Decimo
Lélio Balbo. Dá portanto um atrazo de 5 annos, 9 mezes e 7 dias.
Calmet e Jansens notam a differença de 3 annos e t> dias. Tertuliano e
Santo Ireneu citam o anno 41 do reinado de Augusto. Dannemayr nota uma
differença de 4 annos.
Domingos Magnan, no seu Problema de ar.no nativitatis Christi, Roma
1772, encontra a differença de 8 annos. Alzog citando S. Lucas:
«Anno quinto decimo imperii Tiberii Caezaris, procurante Pontio Pilato
Judaeam, tetrarcha autem Galilaerc Herode (Antipas), Philippo autem fratre ejus
tetrarcha Ituraea; etc. sub principibus sacerdotum Anna et Caipha: factum est
verbum Domini super Joannem, Zachariee filium, in deserto. Et venit in omnem
regionem Jordanis, praedicans baptismum poenitentiae in remissionem peccato-
rum».
O anno i5 do reinado de Tibério corresponde ao de 750. E portanto im-
possível saber-se hoje ao certo o dia, mez e anno em que nasceu Jesus.
2 Em Aquilla, cidade Italiana, foi achada no anno de 1820 a sentença de
Poncio Pilatos condemnando Jesus Christo á morte. Estava dentro d'um vaso,
D
E, com effeito, a cruz que a morte do Salvador consagrara,
não tardou a ser adorada por numerosos fieis que a faziam repe-
tidas vezes com a mão direita sobre a testa e sobre o peito.
Funda-se a Egreja de Jesus Ghristo, e a mythologia pagã foi
desde logo perdendo os seus melhores seguidores. Em Roma o
christianismo recrutou os primeiros e mais dedicados adeptos en-
tre a multidão enorme dos escravos e dos opprimidos, aos quaes
o novo culto garantia a trilogia santa: — Liberdade, Egualdade,
Fraternidade — , a rehabilitação, emfim, para uma vida indepen-
dente e pacifica, inteiramente opposta á dos gladiadores que ainda
mesmo nas proximidades da morte saudavam, por dever, no am-
phitheatro e no circo, o imperador tyranno: — Ave Ca.\ar, mori-
turi te salutant!
Não mais se impacientariam os que aspiravam d classe dos li-
bertos, horrorizados pela lei Sempronia que prescrevia a punição
de uma família escrava quando apenas um dos seus membros
perpetrasse o crime.
Por isso até ao século m, em que a Egreja estabeleceu o
catechumenado, a inscripção dos adeptos do christianismo no res-
pectivo catalogo attingiu extraordinário desenvolvimento pela fa-
encerrada em caixa de ébano, e é gravada n'uma lamina com esta inscripção em
hebreu :
EGVAL LAMINA FOI ENVIADA A CADA TR1BV
Conserva-se na capella de Caserta, Bispado de Nápoles, o vaso e a sen-
tença de que aqui dou copia:
«Ao decimo sétimo anno do Império de Tibério Cezar, e vigésimo quinto
dia do mez de março, na cidade Santa de Jerusalém, sendo Annaz e Caifaz
sacerdotes e sacrificadores do povo de Deus, Poncio Pilatos, governador da
Baixa Galliléa, sentado na sede presidencial do Pretório condemna a Jesus de
Nazareth, a morrer numa cruz entre dois ladrões, visto que os grandes e no-
táveis testemunhos do povo dizem :
I.° Que Jesus é seductor; II.0 Que é sedicioso; III.0 Que é inimigo da lei;
IV.0 Que se diz falsamente filho de Deus; V.° Que se diz falsamente Rei de
Israel; VI.0 Que entrou no templo seguido de grande multidão e com palmas
na mão. Ordena ao primeiro Centurião, Quirilio Cornelio, o conduza ao logar
do supplicio. Prohibe a todas as pessoas, pobres ou ricas, que impeçam a morte
de Jesus. Assignados como testemunhas, Daniel Robani, Phariseu, Thomaz
Zorobatel, Raphael Robani, Capet.
Jesus sairá da cidade de Jerusalém pela porta Struenea».
Ha entre nós uma tradição curiosa que explica do seguinte modo a origem
do antigo costume de se enfeitarem de flores e ramos, no dia i ° de maio, as
casas de habitação : Pilatos e Caifa2 tendo sido avisados de que Jesus se escon-
dia n'uma casa a cuja porta havia uma giesteira florida, enviaram de noite ao
logar os soldados da Judéa com ordem de prenderem o Redemptor. A madru-
gada rompeu, e, á porta de todas as casas appareceu, por milagre, uma gies-
teria florida !
cilidade da operação que apenas consistia no baptismo a que
se procedia em virtude de testemunharem publicamente as suas
crenças. Para este e outros fins as reuniões tinham logar nas ca-
tacumbas onde se julgavam a coberto da perseguição inimiga.
Todavia a nova religião do crucificado teve de luctar com os
poderosos elementos da civilisação antiga e com os preconceitos
da religião preponderante.
Se exceptuarmos Gallieno (253-268) que permittiu por um edito
o livre exercício da religião aos christãos, entregando-lhes as egre-
jas e cemitérios, pôde dizer-se que até ao reinado de Constantino
Magno o fogo da perseguição não se extinguiu uma vez única,
embora o imperador Alexandre Severo, assassinado por Maxi-
mino, e depois d'elle Filippe, o Árabe, se lhes mostrassem extre-
mamente benévolos. Os seus actos criminosos e a adhesão ao rito
gentílico, não abonam o qualificativo de christão que a Chronica
de Eu\ebio dispensa principalmente a Filippe, o Árabe, julgando-o
o primeiro de todos: «Philippus primus omnium ex romanis impe-
ratoribus christianus fuit » .
E certo que o christianismo dilatou o seu império desde o fim
do reinado de Septimio Severo (anno de 211) até esta data; mas
nem por isso se pôde crer que os imperadores Caracalla e Geta,
Macrino, e Heliogabalo, concorressem voluntariamente para os pro-
gressos da Egreja. Os christãos aproveitavam, como lhes cumpria,
esses períodos de tempo que os imperadores destinavam á defeza
dos interesses mais caros; mas, fechado que fosse o Templo de
Jano, os furores da perseguição recrudesciam a ponto de se
exigir a renovação do edito de Septimio para que as egrejas fos-
sem immediatamente fechadas e destruídas. Não esfriavam, po-
rém, os perseguidos e caminhavam cada vez mais alentados pela
fé na defeza do ideal sublime. Oh! se a Egreja não fora uma ins-
tituição divina e se a promessa de Jesus Christo «... et portae
inferi rion pratvalebunt adpersus eam» pudesse oíferecer duvida,
as luctas quasi sem tréguas dos christãos com as diíferentes seitas
nos primeiros séculos e ainda nos subsequentes, a simonia, a in-
continência, os desatinos emfim d'aquelles a quem foi confiada
a defeza de quanto interessa ao Dogma e á Moral, todas essas
innumeraveis desgraças teriam ha muito promovido a ruina do
grandioso edifício que, a despeito das perseguições continuas, já
transpoz incólume a longa serie de mil e novecentos annos.
Com effeito, não somente os perseguidores da Egreja tenta-
vam destruil-a; muitas vezes os mesmos, que deviam contribuir
para a preservar de desordens disciplinares, eram, pelos esforços
que empregavam para a destruir, argumento seguro da origem
divina da instituição de Jesus e a prova provada da indefectibili-
dade d'aquellas palavras — non vraevalebunt.
A historia é e deve ser a narração fiel dos factos, não uma
descripção apaixonada em que predominem as intenções reserva-
das. É por isso forçoso dizer-se que empregar meios illicitos para
se levar a eífeito a eleição do Papa João XII aos dezoito annos
de edade e a de Bento IX aos doze, é descurar intencionalmente
o bom governo da Egreja, ou antes, contribuir para o augmento
dos seus revezes, que já então (955 e io33) não eram poucos nem
pequenos. As leis ecclesiasticas, não prevendo os desastrados effei-
tos de algumas determinações, auctorizaram meios de averiguação
e repressão que accusavam restos bem evidentes da tyrannia pagã.
Outra cousa não eram os Ensaios, que consistiam em levar aos lo-
gares celebres, pelos milagres, o accusado sem prova testemunhal,
para alli prestar seu juramento; em conhecer pelo duello de que
lado estava a justiça; em tomar na mão um ou mais ferros em
braza e leval-os até certa distancia; em lançar a uma tina cheia
de agua fria o individuo, completamente nú, com os pés e as mãos
atados, reconhecendo-se-lhe a innocencia no caso de ir ao fundo;
e finalmente em conservar-se o accusado de joelhos deante de uma
cruz, com os braços estendidos, emquanto se celebrava o oíficio
divino ou a resa do Psalterio.
Estes Ensaios também se denominavam Jui^o de Deus, pela
confiança que os julgadores depositavam no esclarecimento da ver-
dade e da justiça por intervenção dos milagres. Felizmente o Papa
Honório III condemnou e prohibiu esta pratica originaria duma
lei wisigotica.
No século xiii exerceu-se a repressão com um rigor de tal or-
dem, que os inimigos da Egreja encontraram n'essa medida uma
arma de combate da qual jamais largam mão. Abalisados escri-
ptores catholicos procuram justificar o estabelecimento do Tribunal
da Inquisição, demonstrando a necessidade de então se recorrer
a um remédio enérgico para ser applicado aos grandes males da
epocha, por isso que se julgava inefficaz o esbulhamento dos do-
mínios dos soberanos, protectores dos Albigenses, o incêndio das
cidades mais notáveis e o assassinato dos habitantes d'estas !
Como é sabido, estas medidas rigorosas tiveram o seu inicio
no terceiro Concilio geral de Latrão, em 1 179, devendo-se ao Papa
Innocencio III a idéa da instituição do Tribunal, em que os Com-
missarios tinham por encargo descobrir os herejes «segundo a fama
publica e denuncias particulares», para obrigar os infiéis a receber
o baptismo e os herejes ao regresso á Egreja! Estes actos violentos
de desenterrar os herejes sepultados em sagrado, de lançar os vi-
vos ao fogo, etc, provocaram a consternação e a revolta, a ponto
de serem assassinados entre as maldições do povo os inquisidores
e immediatamente suspensa a Inquisição.
O poder civil que, por permissão dos Papas, se ingeria em
— 8 —
assumptos disciplinares da Egreja, teve também grande quinhão
nas responsabilidades d'estas scenas de tristíssima memoria.
O Papa Lúcio III, que em 1 184 presidiu ao Concilio de Verona,
reuniu n'aquella assembleia os dois poderes, ecclesiastico e civil,
para accordarem no modo de ser fundado o Tribunal da Inqui-
sição.
Annos depois pedia-se o restabelecimento da antiquíssima lei
hespanhola, creada para a extirpação do arianismo, a qual no
Fuero-Real, liv. 4, tit. i.°, diz: «Firmemente prohibimos que ho-
mem nenhum se faça hereje, nem tenha a ousadia de receber,
nem defender, nem encobrir hereje nenhum, de qualquer heresia
que seja; mas a qualquer hora que saiba que alguém é hereje, o
laça logo saber ao bispo da terra, ou aos que as suas vezes fize-
rem, e ás justiças dos logares, e todos sejam obrigados a prendel-os
e a arrecadal-os : e que os bispos e prelados da Egreja os julguem
por herejes, aos quaes queimem se não quizerem tornar á f é e
fazer o mandamento da Santa Egreja». (Hist. Verd. da Inq. por
D. Francisco Xavier G. Rodrigues, pag. 3i8).
O Tribunal foi primeiramente fundado em Languedoc e na
Hespanha, onde os Albigenses e Valdenses fizeram a sua appari-
ção e progrediram assombrosamente no fim do século xu, espa-
lhando por todas as povoações principaes a sua seita, composta de
duas ordens bem diíferentes, exactamente como a dos Manicheos.
Uma occupava-se da vida contemplativa, com seus erros sobre a
Eucharistia e a Penitencia; outra, pelo contrario, mantinha a liber-
tinagem e o vicio, pretextando a sua opposição aos desígnios do
mau principio, Auctor das cousas creadas, para dirigir ultrages á
Natureza.
O Bispo de Lisboa, Agapito, foi encarregado, por Bulia de
Gregório XI, datada de 17 de janeiro de 1376, de nomear «por
esta só vez» um inquisidor Franciscano, cabendo a sorte a Frei
Martim Vasques. Exerceu a judicatura inquisitorial (Inquisidor ge-
ral do Reino), desde 1 539 a 1578, o Cardeal Infante D. Henrique.
Arcebispo de Braga, tendo então 22 annos de edade. O Tribunal
foi estabelecido por elle na cidade de Coimbra, exercendo depois
o mesmo cargo o licenceado em direito canónico D. António Dias
Cardoso, cónego da Sé de Braga1.
1 O escudo ou emblema do Santo Officio tinha ao centro uma cruz verde
sobre campo escuro, e aos lado* o ramo de oliveira, symbolo de paz, e a es-
pada da Justiça. Na orla o versículo: Exurge, Domine, et judica causam tuattt
(Levanta-te, Senhor, e julga a tua causa). A Inquisição accrescentou-lhe : me-
mor esto improperiorum tuorum, eorum qui ob insipiente sunt tota die (tem pre-
sente os teus ultrajes, ultrajes que te fazem de continuo uma gente insensata).
— 9 —
Os Albigenses obstinados eram entregues á Inquisição e á Cru-
zada, que então se publicou em Roma contra a terrível seita, ex-
terminando-se de vez, ao cabo de 20 annos de lucta, pouco depois
de se descobrir o meio de os queimar aos centos.
Aos excessos da Inquisição talvez fosse preferível a adopção
de meios persuasivos, tão consentâneos á índole do Evangelho e
ao conceito de S. Thomaz de Aquino que julgava a Fé «ao mes-
mo tempo dom de Deus e etfeito da persuasão». Era a lição da
philosophia nominalista fundada no principio de que a fé não passa
de uma simples opinião, quando não seja apoiada na razão. Elle,
o celebrado Anjo das escholas, dizia como Santo Agostinho «que
ninguém pôde crer sem querer, que a vontade não se pôde cons-
tranger, que a instrucção é o único caminho que conduz segu-
ramente á convicção, e que de nada vale a profissão exterior do
Christianismo quando a Fé não domina egualmente o espirito c
o coração».
Os bárbaros ignorantes e grosseiros do século vil, que depois
da sua conversão pela pregação dos missionários desempenhavam,
por condescendência dos christãos, os cargos espirituaes mais ele-
vados, não cessaram de enfraquecer, com os vestígios das suas
crenças passadas, a religião de Jesus.
Adalberto, por exemplo, obteve a incorporação de alguns Bis-
pos na sua classe, captando a sympathia do povo supetsticioso,
mormente do sexo feminino, que em grande massa o seguia jul-
gando-o um segundo Ghristo. Elle apregoou-se santificado e, como
S. João Baptista, purificado por Deus no ventre maternal; que um
anjo lhe havia trazido relíquias maravilhosas para operar prodí-
gios, obtendo de Deus quanto desejasse. Distribuía as unhas e o
cabello, como relíquias, por todos os que o seguiam. Só a elle
próprio consagrava oratórios e altares, o que deu logar ao aban-
dono dos templos, porque os fanáticos preferiam adorar as cruzes
que Adalberto levantava nos campos, nas estradas e nas proximi-
dades das fontes. Aos penitentes affirmava, na confissão, que co-
nhecia todos os seus peccados, não lhe escapando os mais occultos
pensamentos. Os Concilios baldadamente procuravam destruir as
praticas supersticiosas que os bárbaros introduziram na Egreja.
Adivinhações e agouros como os do paganismo romano, cujos
Arúspices (ab aris inspiciendis), inspeccionando as entranhas das
victimas-, e os Augures vendo a forma como os frangos sagrados
comiam e observando o voo e o canto das aves (civis et inspicio)
conjecturavam o futuro ; tudo lhes merecia credito.
Aplacavam os Manes immolando victimas sobre os túmulos,
e as festas eram por elles celebradas com a degolação dos ani-
maes em honra de qualquer santo, próximo das egrejas ou orató-
rios da sua invocação. Estes restos do paganismo persistiram du-
10
rante séculos na egreja enrista, e ainda hoje o nosso povo mais
crente commette desacatos religiosos que seria necessário repri-
mir, se a intenção não fosse, como é, digna dos maiores respeitos.
O que fica exposto acerca dos bárbaros conversos explica em
parte o aforismo frequentemente applicado pelo nosso povo : —
nunca de mouro bom christão.
# *
Eu creio que os melhores e mais importantes serviços presta-
dos pela Inquisição á Egreja consistem na extirpação dos feitiços,
malefícios, encantamentos, sortilégios, necromancias, e de toda
essa horda de fanáticos e forjadores de milagres, que desde o sé-
culo ii tão graves embaraços crearam aos progressos da religião
christã. Já o Antigo Testamento e leis civis d'aquelle tempo com-
minavam contra elles penas graves. Os embustes da freira Maria
da Visitação, dominicana de Évora, que apresentava, como sendo
abertas milagrosamente, as numerosas chagas do seu corpo, não
foram tolerados, e a embusteira teve de confessar que as abria
propositadamente.
Os benzedores e feiticeiros que faziam vigílias nas egrejas fi-
cavam sujeitos á pena da marcação na testa com dois FF, unidos,
á similhança do que determinavam as leis de 22 de março de 1449,
e 26 de fevereiro de i523, mandando a primeira ferrar nas faces
e a segunda marcar com um L na espádua os ladrões de Lisboa,
e com um P os do Porto. As leis antigas também applicavam aos
roubadores dos objectos sagrados que se guardavam nos templos
a pena de orelha cortada ou fendida. S. Luiz, rei de França, or-
denou «que todo e qualquer ladrão, pela primeira vez, fosse des-
orelhado; pela segunda, lhe cortassem um pé e pela terceira o
enforcassem».
*
Discute-se e apregoa-se a incompatibilidade da sciencia com a
religião de Jesus, aflfirmando-se que esta combate pelo obscuran-
tismo e pelo retrocesso, negando a sua approvação ao resultado
das modernas investigações scientificas em que a intelligencia do
homem por vezes se tem affirmado dum modo verdadeiramente
assombroso! Mas a verdade é que a religião christã não se res-
ponsabilisa pelos actos d'aquelles que ainda agora se julgam no
período quinhentista.
A Egreja não repugna de forma alguma o esclarecimento da
verdade, desde que aos novos descobrimentos da sciencia não falte
absoluto rigor histórico. Por exemplo, não é dogma de fé a data
1 1
do começo do mundo, porque não ha no Génesis referencia á edade
da espécie humana; por isso já hoje a Egreja condescende com os
que affirmam que existia ha muitos milhares de annos quando Je-
sus Christo nasceu, e que os dias da creação do mundo não re-
presentam realmente o período actual de vinte e quatro horas.
Desde Cuvier, que em 1821 defendeu a theoria dos dias-periodos
referindo-se aos seis que Deus gastou para crear o mundo, assim
se interpreta com a approvação dos theologos essa palavra dia,
embora não tenha sido possível até hoje determinar a duração
exacta de cada um dos períodos. Não ha pois antinomia entre a
sciencia com provas e a fé catholica, porque Deus, considerado a
própria Verdade, é auctor d'uma e cToutra, e a crença glorifka-se
com os voos da intelligencia humana por effeito da liberdade de
investigação de que a sciencia não prescinde. Assim o compre-
hende uma grande parte do clero iílustrado que devotadamente se
dedica aos estudos pre-historicos. O Bispo de Châlons-sur-Marne,
monsenhor Meignan, os padres Delaunay, Bourgeois e Lambert
affirmam que existe a concordância das novas descobertas pre-
historicas com o livro de Movsés.
Muito respeitado dos catholicos era Chabos, notável homem
de sciencia, fallecido na França em outubro de i88q, o qual pro-
curou provar que o homem appareceu sobre a terra ha dez mil
annos, ou sejam mais quatro mil do que os que até hoje nos da-
vam os chronologistas que interpretaram erradamente a Biblia. A
geologia e a paleontologia têem auxiliado os archeologos na clas-
sificação das ossadas humanas encontradas de mistura com obje-
ctos de uso domestico, nos terrenos quaternários antediluvianos,
bem conservados pelos saes calcareos.
Depois do século vm, em que teve principio a philosophia
escholastica, encontraremos o Papa Silvestre II a estabelecer, no
século x, o ensino da geographia, mathematica e astronomia, es-
crevendo para esse rim alguns tratados. Aqui temos nós uma prova
da protecção da Egreja ás sciencias naturaes.
Ouçamos agora o padre Arduin quando diz: «estou longe de
partilhar do receio dos sábios que julgam encontrar no Génesis a
doutrina da fixidez das espécies».
Outros auctores de renome julgam o transformismo applicavel
ao homem, sem prejuízo da revelação. O padre dr. Maisonneuve,
d'Angers, declara que as idéas evolucionistas não estão condem-
nadas pela Biblia» ; e Santo Agostinho (De Genesi, L. VI) accres-
centa que «no acto da creação deu Deus aos elementos as razões
causaes, em virtude das quaes se desenvolveram mais tarde os
diversos phenomenos da matéria inorgânica e da vida orgânica».
O desenvolvimento da anthropologia mereceu a Nadaillac estas
palavras: «Não pôde suppor-se que o Creador, ao principiar a sua
— 12
obra, dotasse alguns seres, sahidos de suas mãos, d'um poder mo-
dificador, de plasticidade, como lhe chamou Gaudry?... Esta
concepção parece ser mais religiosa, se assim o posso dizer, do
que suppor o Omnipotente ac proceder por creações bruscas
e successivas, retocando e modificando a sua obra atravez do
tempo e do espaço, como o oleiro amassa a argilla e forma o con-
orno da estatua»! (Cons. sobre a missão do padre, pelo bacharel
tem theologia Joaquim Luiz da Assumpção.)
SYNCHRONISMOS DO SÉCULO I
A Egreja de Jesus Christo teve principio com a instrucção
que elle próprio ministrara durante quarenta dias, depois da sua
ressurreição, aos Apóstolos * e Discípulos, acerca do governo
d'ella, dos sacramentos, doutrina e cultos; com a descida das
cento e vinte línguas de fogo ás 9 horas da manha do dia de
Pentecostes (dia 5o), symbolisando o espirito, a luz e a caridade;
com os três mil ouvintes das pregações de S. Pedro que abraça-
ram contentes a f é e o baptismo; com os cinco mil judeus con-
versos pelo milagre da cura d'um coxo á porta do Templo; com
os milagres da morte dos cônjuges Annanias e Saphira, da som-
bra de S. Pedro e da roupa branca de S. Paulo, prodígios estes
que tanto assombro causaram aos herejes Simão, Himeneo, Ebion,
Menandro e Cerintho, philosopho judeu, natural de Antiochia,
que primeiro aggrediu a divindade de Jesus.
S. Lucas escreveu o livro sagrado — Actos dos Apóstolos — ,
trinta annos depois da ascenção de Christo; e em 42 estabeleceu
em Roma a sua cadeira o glorioso filho de Bethsaida que o Ho-
mem-Deus constituiu cabeça visivel da sua egreja.
Pregou Jesus a egualdade, a fraternidade e o amor para que
os costumes dos povos se humanisassem; e d'ahi nasceu a com-
miseração dos ricos para com os pobres manifestada por occasião
das solemnidades nas egrejas em que havia permanente a Me%a
do Senhor. Alli, e outras vezes nos adros, os abastados e os mí-
seros realisavam conjunctamente, a expensas dos primeiros, seus
banquetes em honra do Salvador.
1 Apóstolos, entre os Hebreus, eram os cobradores das contribuições para
reparos do Templo, os quaes ao mesmo tempo zelavam a observância da lei
de Moysés. S. Paulo disse que era Apostolo «não instituído pelos homens, mas
sim por Jesus Christo».
— i4 —
No anno de 5i, segundo diz Fleury, celebrou-se em Jerusalém
o primeiro Concilio (Jerosotymitanum) para serem desobrigados,
da circumcisão e das cerimonias das Leis de Moysés, os gentios
que acceitavam o Evangelho. Ainda hoje os principes da Egreja
precedem de uma cruz o seu nome, como era de uso na assigna-
tura dos Concilios. Até á data da publicação do Código Civil
Portuguez as pessoas que não sabiam escrever traçavam com
a penna uma cruz no encerramento dos documentos públicos a
que assistiam como testemunhas, valendo qual se fora o verda-
deiro nome, pois aquelle signal feito pelo próprio, era tido como
um juramento solemne. Este signal fazia-se no meio do nome que
outro escrevia, v. g. : — De José >b da Silva.
Neste século apparece-nos um grande numero de virgens que
se consagram a Deus (Sanctimonialis fcemtna, quce Deo, cònti-
nenticc, et integritatis votum vovit); intitulavam-se Virgo-Dei, e
Deo-vota, usavam trajes modestos e viviam na companhia dos
pães. Os seus nomes estavam inscriptos nos livros da egreja para
que do património d'esta fossem soccorridas quando carecessem
dos meios de subsistência, e eram por isso denominadas Virgem
canónicas.
Frequentes vezes os pães as offereciam a Deus, por devoção,
em tenra edade. As muitas lapides funerárias conhecidas em Por-
tugal com a designação Famula Dei, — Famula Christi — Anedia
Christi — Ancilla Dei, dão testemunho seguro da propagação des-
tas virgens.
No século iv os povos bárbaros guerrearam e quasi de todo
extinguiram a instituição das virgens claustraes, que era composta
das do século primeiro; mas foram indubitavelmente restauradas,
porque no primeiro quartel do século x, D. Flammula, sobrinha
da condessa D. Mumadona, principiou assim o testamento em que
ordenou que a conduzissem, doente como estava, da sua villa de
Lalim ao Mosteiro de Guimarães: In Nomine Domini Flammula
Deo -Vota, etc.
A mesma condessa D. Mumadona e sua filha Oneca também
usavam do referido titulo quando esta resolveu consorciar-se com
Guterres Rodrigues, não sendo já então, como primitivamente,
julgadas incestuosas e adultevinas estas uniões conjugaes que os
Concilios excommungaram.
A decadência manifestava-se no uso frequente do titulo Deo-
Vota por solteiras, casadas e viuvas, vivendo cada uma em suas
casas. Desde o século xu ao xv houve em Lisboa, Porto, Gui-
marães, Braga, Santarém, Coimbra e outras localidades do reino,
algumas mulheres que, por desgostos da vida, se recolhiam a uma
pequena cella, cuja porta era acto continuo fechada a pedra c
cal para não mais tornar a ser aberta emquanto a recolhida vi-
ID
vesse! Os alimentos, que de ordinário não passavam de caldo e
pão, eram ministrados por uma fresta rasgada na referida porta,
assim como a confissão e a communhão. Chamavam-se, por isso,
Emparedadas. Ao cabido da Sé de Lamego deixou Margarida Af-
fonso, emparedada no claustro d'aquella cathedral e fallecida no
anno de 1419, um cálice e uma bacia de prata.
Durou quatro annos a perseguição iniciada em 64 por Nero
contra os cnristãos. A de Domiciano, iniciada em 92, terminou ao
cabo de egual tempo.
SYNCHRON1SMOS DO SÉCULO II
Não obstante a insistente punição dos christãos, ordenada por
Marco Aurélio, imperador de Roma, e a guerra dos Valentinia-
nos, Marcionitas, Encrutitas e Montanistas que dezejavam conci-
liar as opiniões philosophicas com as verdades christãs, a religião
de Jesus progride dum modo admirável !
No anno de 120 estabelece-se o uso da agua benta que já no
Antigo Testamento era um rito destinado á purificação; e lança-se
em pias collocadas á entrada das egrejas para os fies humedece-
rem os dedos, fazendo com ella o signal da cruz sobre a fronte
para que fiquem purificados do peccado venial e Deus attenda os
rogos que lhes vão dirigir.
O Papa S. Telesphoro instituiu, em meiado deste século a
missa da meia noite na vigília do Natal.
A perseguição de Trajano contra os christãos durou 16 an-
nos, tendo principio no de 100. A de Hadriano, que principiou
em 125, durou i3, tantos como a de Marco Aurélio principiada
em 161.
SYNCHRONISMOS DO SÉCULO III
Foi no anno de 253 que o 3." Concilio Carthaginense reconhe-
ceu o peccado original, decidindo que se baptizassem os innocen-
tes; também então se estabeleceram os suffragios pelos defunctos,
e as primícias, que eram os primeiros fructos da colheita annual
offerecidos pelos fieis aos Bispos e aos padres para que estes di-
vidissem com os diáconos e clérigos inferiores.
A perseguição de Severo durou 9 annos, tendo principio em
202; a de Maximino 3, tendo principio em 235; a de Decio 2,
tendo principio em 249; a de Valeriano 3, tendo principio em
257; a de Aureliano 2, tendo principio em 273; a de Deocleciano
e Maximiano 25, tendo principio em 286.
i6
SYNCHRONISMOS DO SÉCULO IV
A violenta e aturada perseguição contra os christãos teve n'este
século o verdadeiro termo, desde que Constantino Magno, sem
companheiro no império, restituiu a paz e a liberdade á Egreja.
Allude a este facto uma inscripção lapidar da epocha romana,
encontrada por occasião da visita da família real a Braga, em 27
de novembro de 1891, n'um desaterro do campo das Carvalhei-
ras, pacientemente copiada, estudada e publicada por mim, como
inédita que era, no meu livro InscripçÕes Romanas, pag. lvii.
Essa inscripção, bastante gasta do tempo, diz o seguinte :
nMix.MÊSÊSlMÊÊÊÊ^^d^-
*«;.„
Leitura :
pacis et qvietis avctori libertatis restitvtori
et victori hostivm d • n • flávio constantino
máximo invicto • avg • ^emil ivs maximvs • • •
Versão: — A nosso senhor Flávio Constantino Máximo. . . in-
victo, augusto, auctor da paz e tranquillidade, restítuidor da liber-
dade e vencedor dos inimigos (consagra) Emilio Máximo. . .
As duas ultimas linhas estão de todo apagadas; mas a parte
legível da inscripção leva-me a crer que o imperador Constantino
l7 -
prestou a Braga algum serviço importante. D'elle são também
milhares de pequenos bronzes que na cidade e subúrbios a cada
passo apparecem.
Ainscripção refere-se talvez ao anno de 3 1 2, em que o imperador
Constantino, para combater o arianismo que após a morte de Ario
(anno de ru) tanto se radicou entre nós, creou novas circum-
scripções ecclesiasticas tornando consular a Província da Galliza.
Foi celebrado no anno de 3 14, em Ancyra. metrópole da Ga-
laria, o Concilio Ancyranum que num dos 2 5 cânones (o nono)
determina «que se um Diácono, no instante de receber a Ordem,
declarou que não pôde viver no celibato, pôde casar-se depois,
sem por isso ficar interdicto das suas funcções; mas, se não fez
esta declaração, não pôde já cuidar em casar-se ou se o fizer deve
renunciar o Diaconato».
O imperador Constantino assistiu ao Concilio geral de Nicéa
que durou desde 19 de junho a 25 de agosto de 325. Um ma-
nuscripto do Vaticano, a que allude Riccioli fChronol. Reform.
ix, 4) mostra que o Synodo de Nicéa, a que presidiu Osio em
nome do Papa S. Silvestre, tem a data de 19 de dezembro de
636 da era grega, que corresponde a 16 de junho de 325.
Foi n'este Pontificado que o arianismo começou (anno de 319).
Os paternianos (Venustianos) «que attribuiam ao diabo a forma-
ção das partes inferiores do corpo humano, permittindo o uso del-
ias para toda a sorte de crimes», foram condemnados em 3óy no
Concilio primeiro Romanum; e o regulamento sobre o celibato
dos padres diáconos fez-se a 6 de janeiro de 386.
Á alleluia durante o anno, o credo e a confissão geral
na
missa, tudo foi determinado pelo Papa S. Damazo, natural de
Guimarães, a quem o seu secretario S. Jeronymo deu a denomi-
nação de Vir egregiiis et cruditus in Scripturié: Nasceu este no-
tável Pontífice em Guimarães, fallecendo (seg. Onuphrio Vero-
nense) no anno de 384. Quasi todos os auctores o denominam
Damasus I Imaranensis.
Kebedo, cónego Toletano do principio do século xví, diz que
Guimarães foi antigamente cidade: «Inter Viscellae, et Avi con-
jluentis, \lmaranensis est civitas, sancti Pontijicis Damasi qnon-
dam pátria».
Esta opinião é corroborada por um arrendamento que el-rei
D. Fernando fez em i382 de todos os direitos e emolumentos
de Entre Douro e Minho ao seu contador João de Santarém «com
obrigação de levar os rendimentos á Cidade de Guimarães, para se
pagar o soldo e a quantia aos que a devem haver». (Eluc. p. 277).
O costume de celebrar Matinas á noite, Laudes e Prima de
manhã, Tertia, Sexta e Nôa durante o dia, e Vésperas á tarde
não deve ser anterior ao presente século.
— iS-~
Nas Escripturas e livros dos padres dos três primeiros séculos,
não se encontra o nome de Santa Anna, avó de Jesus Christo,
prova evidente de que nem tudo aproveitava á historia d'aquelles
tempos em que o próprio nascimento do Redemptor foi tido como
um acontecimento destituido de importância.
Com a sagraçao da basilica Lateranense por S. Silvestre Papa
teve esta ceremonia principio no anno de 3 14, applicando-se a
todas as egrejas onde no anno immediato foram, pela primeira
vez, collocadas as imagens dos santos. Isto deu logar a que os
judeus principiassem a odiar os Ídolos, por julgarem mal enten-
dido que os christãos venerassem nos seus templos homens que
elles martyrizavam como criminosos incorrigíveis. O filho de Santa
Helena aproveitou este feliz ensejo para proscrever a idolatria, a
que a Escriptura chama abominação, mandando demolir os seus
Templos ou entregando-os aos christãos para o seu culto.
Os Donatistas foram também obrigados a restituir as egrejas
que occupavam, pois Constantino assim o determinou com os seus
primeiros éditos publicados contra os herejes no anno de 3 16. Aos
Bispos concedeu muitas basílicas, para serem por elles destinadas
ao culto christão, e mandou então edificar a monumental basilica
Lateranense ou Áurea. Até este tempo, os ministros da Egreja,
querendo distinguir-se dos sacerdotes de Ists e de Sei^apis, que
rapavam á navalha o rosto e a cabeça, aparavam amiudadas ve-
zes a barba e os cabellos, que apenas se conservavam compridos
em signal de ignominia. O quarto Concilio Carthaginense, no anno
de 398, dispoz num dos seus cânones que os clérigos não fossem
cabelludos nem lampinhos, exigindo por isso que conservassem o
costume de aparar os cabellos: clericus nec comam nutriat, nec
barbam rada/.
Pelos mosteiros e ermos, os monges e os anachoretas, inter-
pretando exageradamente a resolução do Concilio, rapavam por
completo a cabeça e deixavam crescer muito as barbas. Os mon-
ges leigos do século vn, que se salientavam no saber e na virtude,
eram promptamente nomeados sacerdotes e Bispos. Como os Pres-
cillianistas apenas rapassem o alto da cabeça, usando cabelleira
grande, o quarto Concilio Toletano, celebrado em 63o, resolveu
«que todo o clero, sem distinccão alguma, tosquiada a parte su-
perior da cabeça, só na inferior e pela raiz das orelhas deixasse
um circulo de cabellos mais compridos, em modo de coroa orbi-
cular e redonda, sem se referir á barba». Adoptaram esta coroa
os monges de ordens sacras que rapavam á navalha o resto da
cabeça. Fora de Roma, foram estas coroas e barbas alteradas no'
século IX.
Punham e depunham as barbas e o cabello sobre o altar ou
juncto das imagens os indivíduos que no século x, em presença
— 1 9 —
da communidade e dos parentes, se faziam monges, para d'este
modo provarem e jurarem que de todo se entregavam a Deus.
Quantas vezes, no século vn, se oífereciam ao mosteiro por
uni dos seus cabellos, cortado peio abbade juncto do altar, para
que Nosso Senhor o acceitasse em signal de escravidão? Era fre-
quente essa pratica.
Os godos, que julgavam o cabello comprido um indicio de
honra, não consentiam que os penitentes usassem cabello e barba
senão aparados. Em Portugal, foi el-rei D. Fernando quem pri-
meiro cortou o cabello e*fez a barba. O nosso D. João de Castro,
com um simples péllo delia, deu penhor das sommas enviadas a
Diu; e no século xn os sellos de cera continham uma porção de
pontas da barba para que a escriptura ou contracto ficasse firme
e valiosa.
A prohibição de serviços mannaes e negócios forenses ao do-
mingo, foi pela primeira vez decretada pelo imperador Constan-
tino, exceptuando os trabalhos agrícolas, a que só em 585 o Con-
cilio de Macon poz termo, impondo aos delinquentes graves penas
corporaes.
Por estes e outros meios, a Egreja promovia o extermínio das
praticas pagãs, decretando nos séculos immediatos, do v ao vm,
a prohibição do culto das pedras. Ainda no século xvi as con-
stituições do Bispado de Lamego nos mostram um Bispo da Dio-
cese a ordenar que as procissões deixem de ir a outeiros e pene-
dos, logares afamados pelos vestígios que conservavam do viver
e crer de povos anteriores ao nascimento de Christo, os quaes
prestavam grande culto aos Ídolos. Os iconoclastas, como o Bispo
intruso de Hieraple chamado Xenaias Persa, diziam «que os an-
jos sendo espíritos não podiam ser pintados com corpo, que era
lazer affronta a Jesus Christo pintal-o ou fazer a sua imagem,
porque só a adoração em espirito lhe podia ser agradável. Que
era uma invenção pueril representar o Espirito Santo em uma
pomba».
A lei antiga já prohibia as imagens, mas parece que com o
único fim de não serem confundidas com os Ídolos, pois é certo
que Salomão mandou fazer para o seu Templo duas grandes ima-
gens de Seraphins. O Concilio de Elvira deliberou que nas egre-
jas todas as imagens fossem portáteis, para poderem ser condu-
zidas a logares occultos, como succedeu por occasião da entrada
dos mouros na península, em que os fieis fugiram com ellas, en-
terrando umas e escondendo outras nas grutas de altos montes,
onde mais tarde o seu apparecimento deu logar ás romarias que
ainda hoje se realisam com caracter accentuadamente pagão. O
cap. III das actas do primeiro Concilio de Braga, celebrado em
411, diz que os Bispos Lusitanos resolveram esconder os «corpos
— 20
ou relíquias dos santos, tomando nota dos Jogares e cavernas •>
(de locis et speluncis), onde ficassem, entregando-se d'isso um re-
latório minucioso «para que se não perdesse a memoria d'ellas
com o decurso do tempo». O costume era já antiquíssimo: Jere-
mias, como se lê no L. II dos Machabeus, cap. II, subiu a um
monte e escondeu numa espelunca o Tabernáculo, a Arca e o
Altar do incenso (Invenit locum speluncce et Tabérnaciilum et
Arcam et Altare incensi. . .). Exceptuando um limitado numero
de fieis que vão ao local amortalhados, sem fala, de joelhos, des-.
calços, não estando a isso habituados, conduzindo vellas e outros
objectos de cera representativos da parte affectada do corpo, ma-
deixas de cabello, um tourinho, ou outras quaesquer promes-
sas feitas aos santos quando, por sua intercessão, alcançam de
Deus alguma graça temporal ou espiritual, exceptuando estes, as
romarias são para o nosso povo, não uma prova publica da sua
fé, mas um meio fácil de se distrahir ou satisfazer a curiosidade
própria \ jogos, tocatas, descantes immoraes como os que dirigem
ao Santo Precursor, petiscos, vinho verde e doces, desordens pre-
meditadas de longe com promessa de se liquidarem na romaria
de tal, tudo isto são, entre nós, as romarias, uma imitação ava-
riada das peregrinações que nos primeiros tempos da Egreja se
effectuavam em occasiões de calamidades publicas, sendo a mais
notável a que se dirigia a Jerusalém, de visita aos logares santos,
e a mais celebre a que ia a Roma (Romahia = origem da palavra
Romaria?) visitar os sepulchros dos apóstolos S. Pedro e S. Paulo.
Esta devoção era vivíssima no anno de 836, em que todos os pe-
regrinos se confessavam nas vésperas da partida.
Das romanas e do transporte das relíquias originaram-se as
procissões, parecendo que a primeira, digna de tal nome, fosse a
ceremonia da trasladação da Arca, de Cariathiarim para a casa
de Obededom e d'alli para a cidade de Hebron.
SYNCHRONISMOS DO SÉCULO V
O Concilio Viennense, celebrado em 474 por S. Mamerto, me-
tropolitano de Vienna, no Delfinado, estabeleceu o jejum e as la-
dainhas menores para ser impetrado o auxilio do ceu contra os
bárbaros, inundações, terremotos, esterilidades, etc. Foram ainda
instituídas, no segundo Concilio Bracarense, cap. 9, outras ladai-
2 1 —
nhãs para o principio da quaresma; e no decimo sétimo Tole-
tano, cap. 9, para todos os mezes do anuo pro statu Ecclesioe, et
incolwnitate Principum.
Entre nós, no século VII tiveram o seu inicio os Ladarios,
que se tornaram frequentes, fazendo-se estes votos «para sus-
pender a justa vingança de Deus irado». S. Gregório Magno ins-
tituiu, no dia de S. Marcos (anno de 5go), as Ladainhas maiores
para se pedir a Deus o termo da peste inguinaria ou bubonica.
Chamavam-se das cruzes, porque estas e os altares estavam co-
bertos de preto, e os fieis que tomavam parte íVellas vestiam-se
de lucto, descalçavam-se e abstinham-se da carne e do vinho.
Desobrigaram os penitentes da lei da confissão publica dos seus
peccados, sujeitando-os apenas á auricular e secreta, e determi-
nou-se que a penitencia publica nunca fosse imposta a qualquer
dos cônjuges sem consentimento do que ficasse isento.
A Egreja não approvou o Concilio Seleuciense, de Seleuca na
Pérsia, que o metropolita Nestoriano Barsumas celebrou em 485,
e no qual se permittia o matrimonio aos padres e aos monges
(Assemani, Biblioth. Orient. tom. 111). Babueu condemna a de-
cisão de Barsumas perante os Nestorianos que no referido anno
também reuniu em Concilio; porém o metropolita irado celebrou,
ao cabo de 10 annos, (em 495), três conciliábulos — Napetense, Se-
leuciense e Adriense — confirmando n'elles a heresia e todos os
decretos do seu Concilio anterior. Esta confirmação foi ainda se-
cundada em 499 pelo Concilio Persicum celebrado por Hoseo,
metropolita de Nisibe.
O virtuosíssimo Arcebispo de Braga, D. Frei Bartholomeu dos
Martyres (1559-90), desejando remediar os males do seu tempo,
declarou-se em franca opposicão ao celibato dos padres, valendo-
lhe esse louvável zelo pela moralidade do seu rebanho gravíssi-
mos dissabores.
Está hoje averiguado que a nossa mais antiga obra lithurgica
— O Sacramentario — é devida ao Pontífice Gelasio (anno de 492).
Divide-se em 3 volumes contendo todo o ceremonial da Egreja,
missas para o decurso do anno, modo de ministrar Sacramentos,
etc, etc.
Os Bispos do século V, não podendo transportar-se a todos os
logares da Diocese, crearam os seus delegados que denominaram
Bispos coadjutores, modestos ecclesiasticos que tempo depois se
elevaram, por desleixo dos superiores, parecendo na auctoridade
os próprios Bispos. A consequência d'estes excessos foi a aboli-
ção total da Dignidade nos séculos X e XI.
Terminou com a invasão dos Árabes o convento de cónegos
regrantes de Santo Agostinho, fundado na Sé de Braga pelo Bispo
S. Profuturo. quando as Províncias romanas eram entregues aos
'2 2
bárbaros que assolavam a Hespanha, mais tarde conquistada pelo*
godos.
SYNCHRON1SMOS DO SÉCULO VI
N'este século os reis visi-godos governavam toda a Hespanha.
O sétimo dos i3 cânones estabelecidos por 10 Bispos reunidos no
Concilio de Tarragona (Tarraconense) aos 6 dias de novembro
de 5i6, manda começar na noite de sabbado a observância do
domingo.
Charvet, na sua historia da egreja de Vienna, pag. 118, diz-nos
que a consagração das viuvas chamadas Diaconisas foi abolida
pelo 21. ° cânon do Concilio Epaonense (de Albon, Diocese de
Vienna), celebrado pelo Bispo santo Avito, desde 6 a i5 de se-
tembro de 5 17.
A Diaconisa era, na Egreja primitiva, uma mulher com certo
grau ecclesiastico que substituía o diácono, especialmente em
actos do culto para o sexo feminino.
No I." Concilio Bracarense, celebrado por Lucrécio, Bispo de
Braga, no dia 1." de maio de 563, Theodomiro, rei Suevo, e todos
os seus súbditos, foram definitivamente convertidos á fé catholica,
deliberando-se, por essa occasião, fazer manter o antigo systema
de baptisar; ordenar aos diáconos que usem a estola sobre o
hombro e não escondida sob a túnica, parecendo subdiaconos;
«que os sacerdotes, que não comiam carne por evitar a suspeita
de heresia de Priciliano, os obriguem alguma vez a hervas cosidas
com carne ; e se desprezarem este preceito pela suspeita d'estes
herejes, serão excommungados e totalmente privados do officio
sacerdotal. Que os corpos dos defunctos de nenhum modo se se-
pultem dentro nas egrejas dos Santos, mas, quando fòr necessário,
da parte de fora junto do muro da egreja, aonde não é tanto de
extranhar; porque suas cidades até nosso tempo guardam firmissi-
mamente este privilegio; que do circuito dos seus muros a dentro
se não sepulte o corpo de qualquer defuncto em nenhum modo,
quanto mais o deve ter a reverencia dos martyres veneráveis».
O pagamento dos dízimos foi ordenado, como esmola, em
carta-circular escripta pelos Bispos, depois de encerrado o segundo
Concilio Turonense, no dia 17 de novembro de 567.
Sob a presidência *do Bispo S. Martinho de Dume, e achando-
se presente o de Briteiros, que se chamava Maybom, celebrou-se
no primeiro de junho do anno de 572 (18 das kalendas de janeiro
da era de 610), o segundo Concilio Bracarense, determinando
— 23 —
«que os catechumenos concorram á purificação do exorcismo vinte
dias antes do baptismo, ensinando-se-lhes o symbolo Credo in
unum Deitm; que não se consagre egreja sem primeiro se lhe fazer
património para serviço cfella, confirmado por doação em escri-
pto, porque não é culpa leve, antes é temeridade consagrar uma
egreja sem cera e sem renda para sustentação, etc; que aos que
levam meninos ao baptismo não se receba alguma cousa senão
quando o queiram dar por sua devoção; que seja suspenso das
ordens pelo seu Bispo todo o sacerdote que consagrar no altar
não estando em jejum».
Os christãos, que desprezaram o costume do pagamento dos
dízimos á egreja, foram ameaçados com pena de excommunhão
expressa no quinto cânon do segundo Concilio Matisconense, a 23
de outubro de 585. Também n'elle foi prohibido o baptismo fora
do tempo da Paschoa, sem motivo justificado.
A disciplina ecclesiastica, bastante descurada n'este século,
mereceu a Recaredo, rei godo, a máxima attenção, a ponto de
requerer que sobre o assumpto fossem feitos 23 cânones no ter-
ceiro Concilio Toletano, celebrado em 6 de maio de 58q, e no
qual o mesmo rei declara que todos os godos abjuraram o aria-
nismo, e que elle, por si e em nome dos seus súbditos, fazia pro-
fissão de fé. A 5 de novembro do anno immediato e i de novem-
bro de 592, os Concilios Hispalense i°, de Sevilha, e Ca;saraugus-
tanum, de Saragoça, oceuparam-se desenvolvidamente dos arianos
conversos.
Em 5t)8 são os sacerdotes, diáconos e subdiaconos, rigorosa-
mente obrigados ao celibato.
Uma determinação do Concilio de Epona, celebrado em 517,
exigia que todos os altares fossem de mármore.
O Papa S. Gregório Magno (anno de 5qo), para evitar que o
espirro continuasse a fazer victimas, como por occasião da grande
epidemia, indicou aos fieis a conveniência de no mesmo acto pro-
nunciarem as palavras Dominus tecum, ainda hoje em uso entre
nós. A origem da saudação do espirro vem de tempos remotíssi-
mos. Os Gregos diziam: Júpiter o conserve; e os Romanos : salve,
como presentemente em Monomotapa (Africa) e na America.
O mesmo S. Gregório Magno concedeu a Santo Agostinho
o uso do Palio, unicamente para a celebração da missa. A sua
origem vem dos sacerdotes pagãos. No Ceremonial Romano, L.
I, cap. V, encontra-se o seguinte: «O cuidado de fazer e conser-
var os Pálios pertence aos Subdiaconos Apostólicos, que cuidam
em mandal-os fabricar da maneira seguinte : — As freiras do Mos-
teiro de Santa Ignez e os Religiosos que alli assistem, offerecem
todos os annos dois cordeiros brancos sobre o altar da dita egreja
no dia da festa da Santa, quando na missa solemnc se canta o
— 24 —
Agnus Dei. Aquelles dois cordeiros se entregam com certas ce-
remonias a dois cónegos da egreja de S. João de Latrao, os quaes
cuidam em os mandar alimentar até chegar o tempo de se lhes
cortar a lã; e d:ella se fabricam os Pálios.
Estes são uma espécie de estolla da largura de três dedos, que
consta de 4 cruzes negras e de outras tantas pontas, das quaes
duas descem pelo peito e outras duas pelas costas do Prelado até
á cinta ; no fim das quaes prendem umas pequenas laminas de
chumbo. Este Palio mette-se pelo pescoço, porque é formado,
quasi, como em circulo.»
23 —
INSCRIPÇÃO WiSIGOTHICA
A pag. 85 do meu livro InscripçÕes e Lettreiros, encontra-se
gZincographada a inscripção wisigothíca de que presentemente dou
photogravura. Apresentava então uns leves erros de copia prove-
nientes das successivas camadas de tinta de óleo que no decorrer
do tempo lhe applicaram com o fim de egualar a lapide, que é de
silex escuro, á cor alvíssima da parede da sacristia da egreja de
S. Vicente, onde se encontra embebida.
Essas camadas de tinta, que posteriormente mandei raspar e
lavar, tomavam alguns traços dos caracteres, que são finos, alte-
rando por isso a leitura. A versão portugueza d'esta lapide, que
mede im,4o de comprimento por o"1. 41 de altura ou largura, é
como segue :
.«Aqui descança Remismuera, desde o primeiro de maio de f>i8,
dia de segunda-feira. em paz. amen.»
O eminente escriptor e epigraphista madrileno sr. Padre Fidel
Fita, a quem no dia 18 de fevereiro de 1896 enviei copia pho-
tographica. estudou magistralmente esta lapide no Boletin de
la Real Academia de la Historia de Madrid, tom. XXVIII, cor-
respondente a março d'aquelle íinno, dizendo :
«O nome da defunta é teutonico. O seu primeiro elemento sáe
do nome de Remisol, bispo de Vizeu, que assistiu ao 2.0 Concilio
de Braga, (anno de 572), no de Remismundo, rei suevo, e n'ou-
— 26 —
tros. A photographia permitte conjecturar que o segundo elemento
seja mutera, por ter algum traço de ligadura de T com E, em
cujo caso vem á memoria o allemão mutter (mãe)».
Esta inscripção lapidar é, sem duvida, o monumento authentico
mais antigo do christianismo em Braga. Por isso todos nós deve-
mos tributar-lhe o respeito a que tem jus.
Quando a copiei, para a publicar em primeira mão, semelhava
uma taboleta de madeira com as lettras avivadas a tinta preta e
alteradas em parte, de modo que ninguém lhe podia entrar, como
dizia o velho sacristão.
Convenci immediatamente os mezarios de S. Vicente de que
estava alli uma -inscripção de valor, obtendo d'elles auctorizaçao
para ordenar a lavagem que não foi pouco difficil.
Ao lado esquerdo d'ella está outra lapide em que se lê que no
anno de i565, por occasião da reedilicação da egreja, appareceu
nos alicerces antigos a referida inscripção wisigothica. Esta lapide
uinhentista mostra bem gravados estes dois dísticos latinos :
iivmxccEmiRMwis
li
[T.N0V\PRO.TOI.iPi/T.ARABMO ,
Os lusitanos professaram livremente a religião christã no tempo
do rei suevo Hermenerico 5 e de tal modo a crença se propagou,
que no anno de 464 poucos suevos havia que não fizessem parte
do grémio da egreja catholica. Theodomiro, acclamado em 558,
abjurou, dois annos depois, o arianismo a que conseguiu pôr termo
em 563, por occasião de convocar o 2." Concilio Bracarense. Seu
filho Ariamiro succedeu-lhe em 570, prestando á causa do christia-
nismo relevantíssimos serviços. Este teve também um filho de
nome Eburico, que por intimação de Endeca foi monge do mos-
teiro de Dume, sendo o mesmo Endeca obrigado, no anno de 5S5,
a seguir egual caminho. Foi então que o successor Leovegildo uniu
o reino á monarchia gothica.
A veneranda inscripção lapidar wisigothica data das proximi-
27
dades do estabelecimento da religião de Maíoma (islamismo) por
Abul Kasen Ibn Abdallah Mohammed, natural de Meca.
#
Desde os tempos primitivos a humanidade tributou aos mortos
a mais rendida veneração e respeito. No primeiro periodo da epo-
cha pre-historica (paleolithico), eram os cadáveres inhumados de
cócoras, e só no segundo periodo (neolithico) teve principio a in-
cineração que não se adoptou geralmente. Numa caverna da mon-
tanha de Hov foi inhumado Aarão, filho de Amrão e de Jocabed,
e irmão de Moysés, com 1 23 annos de edade. A sua morte era
annualmente commemorada com jejuns pelos judeus.
Os egypcios guardavam em urnas, nas suas casas, os cadá-
veres embalsamados, eos gregos e os semiticos inhumavam e cre-
mavam os seus.
Entre os romanos o costume da cremação durou até ao tempo
do imperador Graciano, (anno de 867), que o prohibiu de vez.
Gallieno havia publicado um edito ordenando a entrega dos
cemitérios e egrejas aos christãos; porém, no anno de 38i, reco-
nhecendo-se que era nocivo á saúde publica o costume das inhu-
maçóes nos templos, publicou o imperador Theodosio Júnior uma
constituição prohibindo-as alli e nas cidades. (Vid Acta SS.
tom. 3, pag. 44). Foram então iniciadas nas casas de campo e á
margem das vias publicas, terminando muitas das inscripções se-
pulchraes com esta supplica meiguissima e poética:
ORO VT PRAETERIENS DICAS :
SIT T1BI TERRA T EVIS
A CINERIS QVOQVE FLORES LEGANTYR
«Rogo-te que digas quando por aqui passares: A terra te seja
leve, e de flores se cubram as tuas cinzas».
Foi nas catacumbas de Roma (conhecidas minas de piçarra
— pirx\ollana — de que se fazia o cimento), que os christãos tiveram
as primeiras egrejas e os primeiros cemitérios denominados coeme-
tevia (dormitórios) ou cryptas ; e porque se reuniam n'estes Joga-
res occultos eram conhecidos dos seus perseguidores por lucifugos
(inimigos da luz) como nos diz Minucio Félix, ou geralmente chris-
tãos, de Christo, ou de chrest (pobres).
Aqui o espaço da sepultura era pago quando a preferissem
próximo das dos martyres, sendo estes contractos effectuados com
os coveiros (Fossores), segundo se deprehende da inscripção de
uma sepultura Comprada por Artemisio para dois cadáveres. O
systema das inhumações em cavidades (sepulturas) abertas nas
--28 —
paredes dos caminhos interiores das catacumbas, que ainda no anno
de 35o funccionavam, adopta-se presentemente nos muros inte-
riores dos nossos cemitérios, dando-se á sepultura o nome da sua
origem — catacumba.
Uma das sete maravilhas do mundo, o tumulo de Mausolo,
rei de Caria, construído por ordem de sua irmã e esposa a cele-
bre Artemísia II, legou o nome a todos os monumentos funerá-
rios. Por seu turno o nome da rainha Artemísia ficou também
memorado pelas formosas flores d^sta planta composta que des-
abrocham na quadra triste do Outomno.
Os christaos, confiados na resurreição, não queriam ser cre-
mados nem consentiam que nas sepulturas fosse gravada a pala-
vra enterrar. Por isso diziam sempre depositar. Os amigos e os
parentes do morto, para annualmente poderem efíectuar, no dia
próprio, a commemoracão fúnebre, embebiam na argamassa da
campa armeis, conchas, moedas, etc. Uma das muitas inscripçÕes
encontradas diz :
M • ANTONIVS • RESTITVTVS
FECIT YPSO CEV SUBI • ET SVIS
FIDENTIBVS • IN • DOMINO
«Marco António Restituto fez esta sepultura subterrânea para
si e sua família, que confiam em Deus».
Também nas catacumbas foi encontrada esta do coveiro Dió-
genes, sem duvida mais moderna :
DIÓGENES FOSSOR IN PACE DEPOSlTVS
OCTABV KALENDAS OCTOBR •
Outras inscripções christãs terminavam com os dizeres: — Vive
no Senhor e roga por nós — Vive em pa~ — Consola-te e possa o
teu espirito gósar do eterno bem — Christo Senhor Omnipotente,
consolae seu espirito em vós, etc, etc.
Quasi sempre eram lacónicas como por exemplo esta do sepul-
chro de Santa Philomena, existente no museu de Latrão :
PAX TECVM FILVMENA
Por occasião dos anniversarios dos martyres, sepultados nas
catacumbas em numero de oitenta mil, e mais quarenta e cinco
Bispos, celebrava-se junto das sepulturas o Officio Divino e fa-
zia-se uma homilia aos fieis que alli se reuniam em grande nume-
ro, collocando-se sobre pilares de pedra a lâmpada do azeite aro-
matisado. S. Gregório Magno presenteou a rainha Theodolinda,
da Lombardia, com alguns tubos de zinco cheios de aceites das
lâmpadas dos Papas martyres.
Aos fieis, que diflicilmente concorriam á communhão em virtu-
de da grande distancia que mediava entre as portas de Roma e as
catacumbas, foi permittido levarem, muito embrulhada, no seio
ou numa pequena caixa de ouro pendente do pescoço, a Eucha-
ristia para a distribuírem pelos amigos em jejum.
Crê-se que datam do século u os cemitérios christãos, e do
meado do v a notação da era nas lapides funerárias. Por isso deve
ser considerada apocrypha esta do anno 77 que Vaseo nos dá no
tom. I como achada na Biscaia: — «Bellila Hispana serva Jesu
Christi requievit in Domino. Obiit aera u5 hoc cst anno Domini
septuagesimo septimo» .
Pertence ao ultimo quartel do século ív esta inscripção lusi-
tano-christã, a mais antiga da Península, existente no Museu de
Merida, a qual tem no alto o monogramma de Christo:
p
X
I.VPERCVS
FIDELIS • RE
CEPTVS • IN • PACE
VIXIT • AN • XXX
Refere-se a um Luperco fiel que foi recebido na eterna paz do
Senhor aos 3o annos de edade.
E muitíssimo antiga a formula: Receptus in pace.
O monogramma no alto indica a epocha em que o imperador
Constantino Magno concedeu a paz e a liberdade á Egreja (anno
de 33o). Por essa occasiao os fieis edificaram um grande numero
de Templos nos quaes os imperadores e reis, os Bispos e os de-
mais ecclesiasticos começaram a ser inhumados junto dos monu-
mentos dos martyres, tornando-se por fim extensiva a todos os
fieis esta especial concessão.
As sepulturas apresentavam então vários emblemas mysticos
e as formulas: Requievit in pace Domini — Tibi detur pax a Deo.
Algumas tinham na parte superior a primeira e a ultima lettra
do alphabeto grego A O, alludindo ás palavras de Christo: «Ego
snm Alpha et Omega, principinm et finis.»
Sendo revogada a lei das doze taboas, que Theodosio Júnior
lizera executar, os terrenos vedados junto das basílicas chama-
ram-se dormitórios, do verbo koimáo.
O cânon 18 do Concilio de Braga celebrado em 563 prohibiu
expressamente as inhumaçÕes nas egrejas, permittindo-se apenas
que fossem effectuadas junto dos seus muros.
Desde o pontificado de S. Gregório Magno até ao Concilio de
J>0 —
Trento nunca os padres deixaram de propugnar pelo estabeleci-'
mento dos cemitérios, mas é possível que já no século xi princi-
piassem de novo as inhumações nas egrejas. No mosteiro benedi-
ctino de Paço de Sousa, freguezia do Douro, foi sepultado em
capella particular, na era de 1182 (anno de 1144) o nosso Egas
Moniz, rilho de Muninho Hermigues, descendente de nobreza
neo-gothica.
No seu tumulo gravou-se esta inscripçao:
HIC ■ REQVIESCIT • FYS | DEI | EGAS j MONIZ \
VIR : 1NCLITVS ;
ERA • MILLESIMA • CENTÉSIMA • 2XXXII :.
Para este século xu ha ainda muitos outros exemplos; e para
o immediato não faltam documentos comprovativos como o do
mosteiro de Tarouca, onde se lê que Martinho Annes e sua mu-
lher Elvira Pires foram sepultados pouco depois de 1228, no re-
ferido mosteiro, tendo feito ambos uma doação aos monges. No
século xiv faziam-se as inhumações próximo, dos altares e simul-
taneamente nos adros.
O velhíssimo costume de tosquiar a cabeça e a barba aos de-
functos terminou no século xvi.
Quando em 1 832 Portugal foi flagellado pelo cholera, proce-
deu-se á benção de alguns terrenos para íVelles se fazerem enter-
ramentos, porque então não havia entre nós cemitérios públicos.
O Direito canónico admitte o enterramento nas egrejas, mas não
deixa de preferir que sejam procurados os cemitérios. O Ritual
Romano, (tit. 6, cap. 1, n.° 9) diz: «Ubi viget antiqua consuetudo
sepeliendi mortuos in coemitefiis, retineatur; et ubi íieri potest,
restituatur».
Até ao anno de 1 835 todos os enterramentos se eífectuavam
nos recintos e adros das egrejas, nos cemitérios privativos dos
hospitaes militares (Reg. an. ao Alvará de 27 de março de i<8o5.
secção 3.a, tit. vu, art. 25), e nos das Misericórdias (Alvará de 18
de outubro de 1806, § 12). Havia para as communidades religio-
sas o privilegio de poderem dar sepultura aos seus membros nas
cercas e nos claustros dos seus conventos. Os decretos de 21 de
janeiro de 1834 e 21 de novembro de i836, destinaram uma ca-
pella da egreja de S. Vicente de Fora para jazigo de Reis e Prín-
cipes. Gomo providencia geral foi pela primeira vez determinado,
em decretos datados de 21 de setembro de i835 e 8 de outubro
do mesmo anno, que se criassem cemitérios em todas as povoa-
ções do reino, sendo de dois metros quadrados o espaço minimo
de cada sepultura, cinco palmos de profundidade, quatro de lar-
gura e dez de comprimento. Este decreto diz no seu i ." artigo :
— 3i —
«Em todas as povoações serão estabelecidos cemitérios públi-
cos para n'elles se enterrarem os mortos».
A esta medida do governo, fiscal da hygiene e salubridade
publica, dizem também respeito muitas portarias, entre as quaes
as de 24 de janeiro de 1872; 17 de dezembro de 1866; 17 de no-
vembro de 1868 e 29 de maio de 1877, que mandam designar os
«espaços de terreno sufficientes para o enterramento dos indiví-
duos que não professem a religião catholica, ou foram privados
de sepultura ecclesiastica, em relação ao logar em que houverem
de ser sepultados, vedando-se por um pequeno muro com entrada
própria»; que antes de 10 annos não poderão ser abertos alicer-
ces ou feitas excavaçÕes dentro dos cemitérios que tenham sido
fechados. O legislador não preveniu, como convinha, a remoção
das ossadas depois de findo aquelle prazo. Por isso com razão
ordenou S. Carlos, no Concilio provincial de Milão «que em to-
dos os cemitérios houvesse uma casa de abobada chamada Ossoa-
rio, para n"ella serem guardados os ossos que se fossem tirando
das sepulturas».
E concebido nos seiíuintes termos o relatório do decreto de
21 de setembro de i835:
Senhora: — Muitas providencias executivas se tem determinado
em diversos tempos para acabar com a pratica supersticiosa de
enterrar os mortos dentro dos templos — pratica offensiva do res
peito, e veneração devida aos logares sagrados em que se adora
a Divindade. Estas providencias não produziram o desejado eífeito,
porque lhes faltava o caracter solemne de medida geral, e por-
que se não tornaram responsáveis ou os executores, ou os que
se oppozessem á execução das ordens. Outra rasão se deu sem-
pre para illudir taes providencias, e rasão plausível. A auetori-
dade, que vedava os enterros nos templos, não tornava effectivo:-'.
os estabelecimentos dos cemitérios, ou apenas lhes designava por-
ções de terreno, abertas e devassadas por animaes, com escândalo
dos fieis, que não podiam supportar que fosse tratado com irre-
verências o jazigo dos mortos. Estes inconvenientes eram ainda
encarecidos pelo interesse d^quelles que lucravam com a pratica
funesta á saúde dos seus concidadãos, vindo assim a fazer um tra-
fico da pestilência, e da morte, que quanto mais frequente, mais
proveitoso lhes era! Eis os motivos porque durou por tantos sé-
culos este abuso vergonhoso, — a ignorância da edade media o
transformou em dever de religião, cedendo a suggestões insidiosas
dos que derramavam a fatal crença de que alcançariam a gloria
das almas aquelles, cujos corpos jazessem em companhia das ima-
gens dos santos, dentro dos templos sagrados. Mas ainda n' esses
tempos de obscuridade e de fereza de costumes a voz da religião
esclarecida e livre de prejuízos soou contra taes praticas, prohi-
— 32 —
bindo-as, posto que sem effeito, porque desgraçadamente os cos-
tumes podem mais do que as leis; e porque os ditames de poucos
homens illustrados se perdem no meio da cegueira geral. Nos
Concílios de Braga em 663, de Meaux em 845, de Tribur em 8g5
e de Reims em 11 17, foram condemnados os enterros dos mortos
nos templos. Em epochas posteriores repetiu-se a mesma con-
demnação; mas só foi dado á illustração dos povos, sob governos
justos e zelosos do bem da communidade, extirpar um mal, origem
de immensos males, e que tanto mais difficil era de desarraigar,
quanto se fundava em noções religiosas, mal applicadas, sim, porém
úteis á cobiça que cega o entendimento, e fecha os ouvidos á voz
da humanidade. Auctorisado o governo de Vossa Magestade para
prover á organisação de administração do reino, devia elle prestar
a devida attençao a um ramo tão importante d'ella; mandar logo
proceder á demarcação dos terrenos para os cemitérios, fazer
eftectiva a ordem em tempo determinado; indicar as circumstan-
cias dos logares designados; tornal-os próprios para o fim a que
são dispostos; ordenar as ceremonias ecclesiasticas, segundo a pra-
tica da egreja; apromptar os meios necessários para o acabamento
das obras em certo praso, commettendo o negocio aos primeiros
agentes da administração. Pareceu também necessário prover a
uma circumstancia importante. Muitas famílias estão de posse, por
direito adquirido, de jazigos particulares para os membros delias;
a piedade filial, um dos caracteres mais salientes da moral publica,
venera esses logares; porque Telles se conservam as relíquias de
seus maiores; e para que nem similhante respeito se perca, nem
sentimentos tão louváveis sejam contrariados deshumanamente, se
concede áquelles, que possuem taes jazigos, egual acquisição de
terrenos separados nos cemitérios públicos e que para elles pos-
sam transportar os sarcófagos, lapides e despojos mortaes, que
tinham nos carneiros que possuíam. Algumas medidas particula-
res, que agora são omittidas, formarão o objecto de instrucçoes,
que hão de ser enviadas aos governadores civis, e outras, depen-
dentes de circumstancias locaes, elles as darão como melhor con-
vier.
Para preencher tão necessários fins o governo, pela repartição
dos negócios do reino, propõe a Vossa Magestade o seguinte de-
creto. Secretaria de estado dos negócios do reino em 21 de setem-
bro de i835.= Rodrigo cia Fonseca Magalhães, ministro e secre-
. * - . • ~ Cs *
tano d'estado dos negócios do reino.
Em 18 de setembro de 1844 ampliou-se a disposição dum ar-
tigo permittindo-se a construcção de jazigos ou carneiros privati-
vos a distancia não inferior a 800 passos do povoado,, precedendo
para isso licença do governo.
Primitiva capella de S. Fructuoso
(S. Salvador de Montelios)
34
S. SALVADOR DE MONTELIOS
Entre a cidade de Braga e a suburbana freguezia de Dume,
no logar denominado Montclhos, Montelios ou, como se lê num
documento do século ix, Monte Módico, construíram os povos
romanos, que alli deixaram preciosos vestígios da sua civilisação,
a Torre Capitolina e um Templo dedicado a Esculápio, deus da
medicina.
No próprio local d'este velho Templo pagão, fundou S. Fru-
ctuoso, Bispo de Dume e simultaneamente de Braga desde o i.°
de dezembro de 656, em que foi eleito no io.° Concilio de To-
ledo, um mosteiro da invocação do Salvador, afim de ser nelle
sepultado, exigindo que os operários trabalhassem de dia e de
noite, continuamente, para que se concluísse durante a sua vida
cujo termo sentia approximar-se. E não errou o calculo, porque
pouco depois, a 16 de abril de 665, entregou a alma a Deus.
Para evitar desavenças, quiz ficar sepultado no referido mos-
teiro, a egual distancia dos bracarenses e dumienses, que já em
sua vida disputavam a posse do seu cadáver.
E1 de suppor que S. Fructuoso christianisasse o Templo de
Esculápio, como annos antes suecedera ao celebre- Pantheon de
Roma. e que a presente photogravura nos mostre em parte o que
elle foi.
Esses restos venerandos existem numa capella interior da actual
egreja de S. Fructuoso, á direita de quem entra, denominação que
data da morte do santo Bispo alli sepultado em tumulo de már-
more que ainda hoje existe.
. Essa egreja, como todas as da epocha, tinha a porta para o
occidente, sendo de forma quadrangular a capella de que me oc-
cupo e que mede interiormente 5,3y ao comprimento e á largura.
CompÕe-se de quatro arcos perfeitos que servem de supporte ás
paredes.
O da frente e os dois lateraes téem cada um três pequenos
arcos decorativos sotopostos que descançam sobre columnas de
mármore de Extremoz, districto de Évora, as quaes medem 3 me-
tros de altura. D'estes pequenos arcos, o do meio não abrange mais
de i'",3. e os lateraes o"', 55. Os dois capiteis das columnas da frente
são corinthios, os do lado do Evangelho compósitos e os da Epis-
tola compõem-se da mesma folhagem ornamental das pilastras.
O facto de assentarem directamente no solo, sem pedestal, os
fustes das seis columnas que existem e de se distanciarem tão
— 03
Interior da primitiva capella de S. Fructuoso
— 36 —
pouco umas das outras, faz pensar na divisão interior das antigas
basilicas, que eram construcções civis, aproveitadas pelos christãos
para o exercício do culto.
O que me parece fora de toda a duvida é que esta obra per-
tence ao segundo periodo da architectura medieval, estylo byzan-
tino com leves modificações. Do que nos diz em 1706 o Padre
António Carvalho na sua Chorografia, tom. I, pag. i?7, depre-
hende-se que ainda então existia a egreja com 22 columnas ! «Foi
este convento (de S. Fructuoso) um dos mais notáveis que teve a
Ordem de S. Bento, e o destruíram todo os mouros, ficando só
a egreja que hoje existe, lavrada em forma de crit{, com vinte e
duas columnas de mármore que a sustentam. »
Faz referencia a essa destruição uma lapide que D. Diogo de
Sousa mandou embeber na parede do lado direito da escada de
14 degraus de granito, que do pavimento da nova egreja dá ac-
cesso para a vetusta capella. Esta inscripção foi pela primeira vez
publicada em 1893 no meu livro InscripçÕes e Lettreirosi e é
como segue :
FRVLJWOlTEWíA.
«MWWS.EKPVGNMltTVR.CO
NFWMETltòEIO
MTISJN10NllSTEtíMiTW.!m
.XlIM/AENSMEEEjtjS.
Por motivo da deserção dos bracarenses, doou el-rei D. Af-
fonso III ao Bispo de Iria, em 883, este mosteiro de S. Salvador
de Montelhos e o de S. Martinho de Dume.
As dezeseis columnas que faltam desappareceram com o resto
do edifício em 18 de junho de 1728, dia em que teve principio a
construcção da actual egreja, com a assistência do Arcebispo D. Ro-
drigo de Moura Telles, fallecido ás 1 1 horas da noite de 4 de se-
tembro do referido anno.
As cadeiras coraes, com os 14 magníficos retratos de Arce-
bispos, em tela, e ainda a preciosa estante com incrustações de
— o7 —
metal amarello, pertenceram á Sé de Braga, sendo tudo cedido
aos religiosos de S. Fructuoso no anno de 1737, por motivo de
então se construírem na cathedral os grandes órgãos e as actuaes
cadeiras de pau preto envernizadas e douradas. Os retratos que
substituiriam com vantagem os do salão archiepiscopal, represen-
tam:— S. Faustinus Marts — S. Profuturus — B. Godinus — V. D.
Fr. Bartholomeus a Martyribus vir apostolicus — B. Calidonius —
Henricus S. R. E. Card. et Lusit. rex — S. Serenianus — S. Petrus
Julianus — Joannes XXI Pontifex Max. — D. Potamius Paenitens
— S. Quiricus — S. Paternus — S. Tholobeus.
Ao fundo do coro: — V. D. Laureníius e S. Policarpus. No
alto:
BENED1C1TE BENEDICITF
SERVI SACERDOTES
DOMINI DOM1NI
DOMINO DOMINO
A tribuna d'esta egreja é de bella talha dourada com colum-
nas torciculadas. Tem no alto a imagem da Conceição e aos lados
S. Fructuoso e S. Francisco. No corpo ha os altares de Santo An-
tónio, Família sagrada, Senhora das Dores e S. Domingos.
Existe na sacristia um relicário de prata dourada offerecido
pelo Arcebispo D. fr. Agostinho de Jesus, cujas armas tem na base
com o seguinte lettreiro:
d. s.
FRVCTVOSO
ARC."
Contém este relicário um pequeno pedaço do cordão, habito e
cabello de S. Fructuoso.
A fachada da egreja é bem esculpturada. A pequena distancia
levanta-se um elegante cruzeiro com as armas de D. Diogo de Sou-
sa, em tudo egual ao que ora se vê ao fundo da rua dos Pella-
raes.
N'este século celebrou-se o quinto Concilio Toletanum (anno
de 636) em que o rei Cinthilla diligenciou que alguns cânones se
occupassem do seu poder para melhor e mais facilmente governar
os povos. A este monarcha se deve, em parte, a deliberação to-
mada no VI Concilio Toletanum, de 9 de janeiro de 638, sobre a
elevação dos reis ao throno. para que antes do acto nenhum dei-
xasse de prometter a conservação da fé catholica. No Toleta-
num VIII, que durou desde dezembro a janeiro de 653, leu el-rei
Recesvinto, na presença de 52 Bispos, a sua profissão de fé, pro-
mettendo admittir os quatro Concílios geraes. O 10." cânon de-
— 38—.
termina que a eleição do rei seja sempre feita onde o antecessor
morrer, e pelos Bispos e officiaes maiores do Paço que então alli
se acharem.
Os peccadores principiaram a ser feprehendidos publicamente
desde o XI Concilio Toletanum (7 de novembro de 675) onde tam-
bém se resolveu que fossem presos ou desterrados, pronuncian-
do-se a sentença na presença de 3 testemunhas e sendo em seguida
assignada pelos Bispos.
As principaes resoluções do 3.° Concilio Bracarense, que teve
logar em 673 sob a presidência de Leodigio, Bispo de Braga, e
do rei Wamba, são as que seguem: «Porque de certas pessoas
nos foi referido que otfereciam, nos sacrifícios do Senhor, leite em
logar de vinho, e que tinham para si haver-se de dar ao povo a
Kucharistia lançada no vinho para inteireza da communhão. E o
porque de todas estas cousas é, que não faltam assim sacerdo-
tes que põe suas eguarias nos vasos do Senhor, e costumam co-
mer n'elles. De outros sacerdotes se nos disse que esquecida a
ordem do costume ecclesiastico, costumam di/er missa sem esto-
la, e que nas solemnidades dos martyres lançando reliquias ao
pescoço e sentados em cadeiras, eram levados por diáconos. Que
muitos sacerdotes sem approvação moram com mulheres. Que ou-
tros oíferecem vinho espremido da uva no cálix do Senhor».
Estes abusos foram então condemnados, declarando-se além
d'isso incurso «na lei de penitencia por espaço de seis mezes
qualquer sacerdote ou pessoa ecclesiastica que trate com mulheres
que não seja sua própria mãe».
N'este Concilio esteve presente, como no segundo, um Bispo
de Briteiros chamado Froarico. Parece, pois, fora de duvida que
antigamente existiu no concelho de Guimarães, a cidade episcopal
de Briteiros, que comprehenderia toda a ária das três actuaes fre-
guezias d'este nome: — Santo Estevam, Santa Leocadia e S. Sal-
vador, no meio das quaes se ergue sobranceiro o monte da Ci-
tania, tão notável pelos vestígios que hoje mostra das três civili-
sações que o habitaram, pouco distante do outro denominado do
Sabroso, habitado na epocha proto-historica.
E' tradição que n'esta antiga cidade, sede de bispado, foi se-
pultado Hermerico rei Suevo, e que os seus Bispos existiram até
á destruição da Hespanha. Na divisão da jurisdição dos bispados,
feita no Concilio de Lugo (anno de 579), coube ao de Briteiros
«desde a ponte de Donim até á ponte de S. João, tendo pelo norte
e poente a serra de Espinho, ao nascente Morreira, sul rio Ave.»
Nos Concílios celebrados em 634. 653 e 666, tomaram parte
os Bispos de Briteiros Adulfo, Somna, etc. A egreja parochial de
Santa Maria de Yilla Nova de Sande, que por aquelle tempo se
denominava Mosteiro de Máximo, era uma das 2(5 demarcadas
-39 —
pelo rio Ave (Apus jlupius), pertencentes á comarca de Briteiros.
A festa de Todos os Santos, que ainda hoje é celebrada no
i." de novembro, teve a sua origem na dedicação do templo Pan-
theon a Nossa Senhora da Rotunda, quando o Papa Bonifácio
IV (608-61 5) o obteve de Focas.
Bonifácio A" (619-625), sentindo approximar-se a morte, quiz
presentear Eduino, rei de Northumbria. na Inglaterra, enviando-lhe
uma camisa bordada a ouro e uma riquíssima capa ; e para a
rainha Edelburga, um espelho de prata e um pente de marfim en-
castoado em ouro. Com estes valiosos objectos foram duas car-
tas, uma convidando Eduino a abraçar a religião christã, e outra
felicitando Edelburga por se converter á fé.
Admittiram-se pela primeira vez na egreja os órgãos em tempo
do Papa Yitaliano, cujo governo durou desde 3o de julho de fõy
a 27 de janeiro de 672.
O titulo de Soberano Pontífice foi pela primeira vez conferido
a Theodoro (642-649), no Concilio Africano, celebrado no anno
de 646. Anteriormente a esta data apenas os imperadores roma-
nos o usavam com esta alteração : pontifex maximvs (Pontífice Má-
ximo). Os títulos de Vigário de Jesus Lhristo e Vigário Apostólico,
que os Bispos do século ix usavam, passou no xui para os Summos
Pontífices que antigamente se denominavam Vigários de S. Pedro.
O costume de beijar os pés ao Papa data do anno de 700.
Santo Agathão (679-682) conseguiu que o imperador de Roma
dispensasse a Egreja do pagamento da pesada contribuição a que
estava obrigada pela sagração dos Papas, acto este que nem sem-
pre se effectuava dentro de breve prazo depois de serem eleitos ;
por isso no tempo de Bento II (684-685) a sagração principiou a ter
logar seguidamente d eleição do Papa.
No presente século vir, a sociedade civil sentiu-se enfraquecida
pela deserção dos indivíduos que se dispunham a povoar os nume-
rosos mosteiros fundados n'àquella epocha. Entre nós os fieis do
século x legaram aos dos dois séculos seguintes o frequente cos-
tume de oílerecerem em parte ou no todo os seus bens aos mos-
teiros e demais corporações ecclesiasticas, ficando por esse facto
denominados Oblatos, Oííertos, Donatos, Condonatos, Confrades
e Familiares, com direito aos bens espirituaes da corporação ; e
se declaravam que queriam entrar na communidade, ficavam sendo
commensaes d'ella, gosando varias regalias que nem sempre foram
úteis á causa do ebristianismo, como o demonstra S. Pedro Ve-
nerável determinando, nos estatutos de Cluni, cap. XLVIII a que
não fossem admittidos similhantes indivíduos ainda que houves-
sem de trazer á Ordem muitas riquezas temporaes». Não obstante,
a missa que . em differentes mosteiros era diariamente celebrada
pro Famtliaribus, prova a continuação dos externos, aos quaes
-4o —
faz referencia o Concilio Lateranense (anno de 121 5) no seu cap.^
LVII, mostrando que só com licença do Prelado do mosteiro po-
deriam fazer testamento. Denominavam-se serros dos quatro di-
nheiros aquelles que se declaravam escravos do mosteiro com a
mulher, filhos e bens, lançando sobre o altar esta moeda que an-
tes haviam collocado na cabeça ; e seri'os da gleba por prenderem
íio pescoço a corda do sino.
Para remédio de suas almas havia muito quem doasse aos
mosteiros uma pitança annual. Outros, então, embora raros, dei-
xavam á egreja os seus haveres para que Nosso Senhor lhes per-
doasse as mortes que tinham feito!
No X Concilio Tolentino, celebrado cm hòb, sob a presidên-
cia do Arcebispo Santo Eugénio, instituiu-se a festa da Annuncia-
cao que tem logar sete dias antes do Natal. Santo Ildefonso, so-
brinho do referido Arcebispo, ordenou que a esta festa fosse dado
o titulo de Expectação ou do O', que é a exclamação do principio
das Antiphonas maiores. As Cathedraes, as Collegiadas e os Mos-
teiros deram este nome ao beberete que até ao principio do sé-
culo xv offereciam, iVaquelles sete dias, e o qual constava de vi-
nhos brancos e vermelhos, fruetas e espécies, confeitos, tâmaras e
passas».
O 18.0 Concilio Toletanum, celebrado em 701, foi o ultimo do
tempo do rei Witisa, recente suecessor de Egica. No Constantino-
politanum que durou, com reprovação da egreja, desde 10 de fe-
vereiro a 8 de agosto de 754, achavam-se 338 Bispos que todos
collaboraram no extenso decreto contra as imagens sagradas. Em
Roma determinou-se a 12 de abril de 76(1 que se anathematizasse
o Concilio e que as imagens e relíquias continuassem a receber
as honras dos christãos. Occasionavam esta controvérsia os anti-
gos costumes dos bárbaros conversos cuja interferência nos negó-
cios da Egreja foi altamente ruinosa. Muitos monges ignorantes,
como o prova Alcuino em seus escriptos, oppunham-se á confissão
auricular estabelecida como dogma, insinuando aos fieis que de-
veriam confessar-se unicamente a Deus. Classifico-os de ignorantes
fundando-me nas determinações dos Concílios d^quelle tempo que,
referindo-se não só a estes mas ao clero cm geral, exigiam «que
ao menos soubessem explicar o Symbolo e a Oração Dominical aos
povos, todos os que fossem promovidos ás Ordens Sacras».
Os regulares distinguiam -se pelos eabellos curtos, tonsura e
casula, que era o seu vestuário, pois traziam os seculares um saio
e sobre elle uma capa. O habito talar data de i3Go. Até ao anno
de 255, todos os sacerdotes celebravam o santo sacrifício da missa
com os seus vestidos de uso ordinário.
O culto do gentilismo, conservado até este século pelos habitan-
tes ruraes (pagf, pequenas povoaçÕesj, deu origem á palavra pagão.
— 4i —
Em 789 determinou Carlos Magno que se applicasse a pena
de morte a quem infringisse a lei quaresmal que prohibia o uso
de vinho, ovos e leite. Muitos fieis evitavam os alimentos cosidos,
limitando-se a pão e agua, ou tâmaras, nozes e amêndoas. S. Ma-
cário de Alexandria não dormia e apenas comia aos domingos
uma folha de couve crua! Santa Maria Egypciaca passava sem ali-
mentos. Em compensação já havia quem, como Erasmo, respon-
desse aos que censuravam a irregularidade quaresmal: «Saibam
que a minha alma é catholica, mas que o meu estômago é pro-
testante».
A instituição da quaresma, que teve em vista pôr termo ao
costume de muitos christãos jejuarem todo o anno, deve alludir
aos quarenta dias de duração do diluvio, penitencia de Jonas aos
ninivitas, jejum de Moysés, demora de Elias no deserto, ou aos
40 dias e 40 noites do jejum de Christo. Entre nós este jejum ou
abstinência termina com o ultimo dia de vida do Judas de Kerioth
que, pendente de cordas pelas ruas e largos, é queimado ás 10
horas da manhã de sabbado de alleluia, quando desperta festiva
a sinarada.
SYNCHRONÍSMOS DO SÉCULO ÍX
Desde 822 até 886, a cruel perseguição musulmana contra os
christãos na Hespanha, que era o centro da potencia árabe no
occidente, attingiu o maior grau de intensidade, em virtude da
independência do chefe da nação para com o califa de Bagdad. O
fanatismo de Abderrame II, rilho de Moavias, foi posto a toda a
evidencia com a severidade das suas leis de ódio contra os filhos da
Egreja catholica, ordenando com o voto do seu Conselho a morte
de quem deixasse de respeitar Mafoma. A' vista do seu Paço e a
pouca distancia delle, funccionavam diariamente numerosas forcas
levantadas nos arredores de Córdova, grande e rica cidade penin-
sular, onde em 852 foi celebrado o Concilio Cordubense a que
assistiram vários metropolitas convocados pelo impio Abderrame,
que receiava a sublevação dos christãos contra os infiéis exalta-
dos, tratando-se especialmente do socego d'estes. O Concilio de-
cretou que, de futuro, ninguém mais se ofYerecesse ao martyrio.
Estevão VI (806-897) fez trazer á presença do Concilio por elle
celebrado, o corpo do Papa Formoso (891-896), Bispo da Diocese
do Porto, quando foi eleito para a cadeira de Roma, e, não con-
tente com o desterro que lhe dera em vida, mandou-o revestir
com os ornamentos sagrados, sendo em seguida collocado na ca-
deira patriarchal, como se ainda estivesse vivo; o advogado que
lhe nomearam para o julgamento não ponde obstar a que o morto
— 42 —
fosse novamente condemnado ao degredo (!! !), ao corte de três
dedos, á decapitação e ao lançamento do cadáver ao rio Tibre
(H. Ecc. vol. 3, pag. 3y5), onde no anno de 898 uns pescadores
o acharam sendo então solemnemente reconduzido á sepultura dos
Papas, por ordem do suecessor Theodoro que promptamente res-
tabeleceu os clérigos a quem Formoso dera a ordenação.
Esta scena, bastante parecida com a de D. Ignez de Castro.
que depois de morta foi rainha, serviu talvez de modelo ao vin-
gador do bárbaro assassinato, o nosso rei D. Pedro I (o crú).
Hincmar escreveu, no anno de 874, os Estatutos Synodaes,
em que se faz referencia á agua benta com que desde o século 11
se aspergia o povo, ao pão bento que os lieis recebiam antes da
communhão, e á instituição dos Deões das aldeias para inspeccio-
narem os curas do seu districto e darem ao Arcediago conta de
qualquer irregularidade que ao Bispo competisse punir.
Estes curas, posteriormente estabelecidos nas cidades, eram
no seu principio o que hoje são os parochos ruraes a quem é con-
fiado o governo das egrejas, com a dilferença de lhes permittirem
trabalhos manuaes, especialmente agrícolas, depois de cumpridas
as obrigações pastoraes — visita aos enfermos e resa do officio Di-
vino. Os Concilios prohibiam a celebração de missas sem ouvintes
e lembravam aos padres a obrigação dt resarem quotidianamente
as horas canónicas.
O IV.0 Concilio geral de Constantinopla, celebrado no anno
de 869, refere-se ao antigo costume de, nas vésperas dos Santos In-
nocentes, ser entregue pelo Chantre ao menino mais novo do coro
o báculo episcopal para que ficasse a governar o clero até ao final
do Officio do dia immediato. O Bispo dos meninos (assim se de-
nominava) visitava então a Cathedral e as egrejas da cidade.
Ainda em 1182 nos diz João Beleth (L. dos OJficios Divinos,
cap. lxxii):
«Depois do Natal quatro grandes bailes se fazem na egreja, a
saber: o dos Levitas, o dos Sacerdotes, o dos Meninos e o dos
Hypodiaconos, etc.»
Em Inglaterra durou este costume até ao anno de i53o.
O Cardeal Pedro Capuano, Legado Apostólico em França,
foi quem primeiro se oppoz a estas costumeiras indecentes. De-
pois a Faculdade Theologica dirigiu aos Bispos, em 1444, a Ene-
gelica em que se refere que na occasião dos officios Divinos
entravam na egreja mascarados com danças e cantorias; «uns
comiam sopas e gorduras sobre o mesmo altar em que se estava
celebrando o incruento sacrifício; jogavam dados, incensavam com
pratos de carne e botelhas cheias de vinho, ou com fumo de sa-
patos velhos, etc.» Em 1 145 o Concilio de R'jão anathematisou
estes divertimentos impróprios da casa do Senhor.
-43-
E' de todos conhecido o que a este respeito se passava nas
nossas communidades religiosas nos dias i.° de janeiro e Reis de
cada anno; porém essas folganças, alem de não terem logar fora
dos conventos, eram respeitosas, nunca immoraes.
Egreja de S. Miguel do Castello (Guimarães) '
A architectura singella e tosca d'esta pequena egreja, a espes-
sura das paredes, os modilhões largos e lizos e o próprio remate
da porta em desalinho com o da fachada, tudo nos assegura que
a sua construecão data dos fins da epocha primordial romano-
byzantina, século x.
Alguns dos nossos mais notáveis archeologos, como o sr. Vi-
lhena Barboza, descobrem no arco da porta principal a forma
ogival, quando apenas existe uma leve elevação no fecho, e crêem
por isso que data do século xn em que este estylo architectonico,
segundo elles, foi introduzido em Portugal. Eu não sei em que se
1 Cópia de photographia do distincto amador bracarense Manuel Carneiro.
Esta egreja apparece hoje pela primeira ves photographada do lado norte e de
frente.
-44 —
fundam os que aflirraam que entre nós não se adoptou a ogiva an-
tes do século xn, julgando possivel que n'esta mesma epocha se con-
struíssem edifícios religiosos de tão bárbaro aspecto, quando pelo
contrario se acredita que os soldados peregrinos das cruzadas
aprenderam as artes de Byzancio procurando desde logo chamar
para Portugal quem melhor soubesse produ^il-as. Arcos como o
de S. Miguel do Gastello são mais velhos que os próprios Roma-
nos; e é por isso um erro julgar que tanto estes como os outros
povos da antiguidade, que por aqui viveram, só tinham conheci-
mento do arco de volta inteira. As duas portas lateraes, interior-
mente rematadas em ogiva, são traçadas de maneira que se diria
não terem os nossos respeitáveis antepassados conhecido o uso
da régua e do compasso.
A circumstancia de tudo aquillo ser tosco deve estar bem pre-
sente a quem fizer a critica d'aquella architectura. Eu insisto que
pertence ao século x em que os bárbaros procuravam imitar igno-
rantemente as construcções dos romanos.
A ornamentação do primeiro dos dois arcos tumulares, abertos
na parte exterior da parede norte, é perfeitamente egual á da
porta principal. Em epocha remotíssima serviu de sepultura ao
Chantre de Coimbra D. Martim Paes, que instituiu capella com
duas missas cantadas e quatro resadas. Como porém se perdesse
a memoria d^sta instituição, encarregou-se el-rei de prover os
seus administradores, sendo em i658 Jeronyma de Castro, mu
lher de Gaspar Mendes da Guerra, da casa de Sentiães, fregue-
zia de S. Faustino de Yizella.
O segundo arco, sem ornatos, pertenceu a Joanne Annes En-
xate, procurador do numero d'esta então villa de Guimarães '
instituindo capella para que deixou suas herdades com obrigação
de uma missa semanal. O seu testamento, bastante curioso, é
como segue, na linguagem da copia que possuo: «Em nome de
Deus amen. Saibam todos q eu Joani Anes procurador do nu-
mero da V.a de Guimarães em minha vida e saúde com todo o
meu sizo e entendimento qual me o Deus deu fasso minha manda
c meu testamento em esta guiza, mando a minha alma a Deus e
peço e rogo á Virgem S.;i nossa q me queira perdoar e mando
enterrar o meu corpo em a igreja de Santa Margarida, seja minha
madre e mando á dita igreja para todo o sempre i Maravedim de
moeda antiga, e q o hajam pelas minhas herdades e outro sim
lhe mando 20 libras d'esta moeda q trasem com meu corpo. E
mando ao abbade que for da dita igreja me faça cantar huma ca-
1 Guimarães foi elevada á categoria de cidade por decreto de 10 de feve-
reiro de i85">, recebendo-se a participação de D. Maria II aos 22 de junho do
referido anno.
— 45 —
pella des este dia para todo o sempre por as minhas herdades na
dita igreja. E mando a qualquer abbade q for da dita igreja 4
maravedis da dita moeda antiga por me fazer cantar a dita ca-
pella, e não a querendo fazer cantar, q d1 isto não haja nada e
q a faça cantar o mays chegado do meu linhagem, e haja estes
4 maravedis, e elejo por substitutos como o direito outorga Af-
fonso Anes do Castello e a Gonçalo Romeu, a Joani q se diz
meu filho morrendo o dito Joani sem filho ou filha ou sem
neto elles ambos possao haver todos os seus bens e os ven-
dam e dêem por minha alma em. . . virem que comprou, e manda
se vendão todos os meus bens e se dem por minha alma, e
mando a cada hú dos sobreditos mil libras a cada hú por o afam
que hí filharem, e mando aos cónegos da igreja de Santa Maria
da dita villa 70 libras d'esta moeda e que me digam húa missa
officiada e vigilia e me farão honra, e aos clérigos do coro no dito
dia 3o libras e aos frades de S. Domingos e de S. Francisco a
cada ordem outrotanto pela dita condição, e aos frades do Mos-
teiro da Costa 5o libras, e aos de S. Trocade e de Souto trinta
libras por a dita condição e outro sim lhes mando outro tanto aos
q dias e outro tanto aos 3o dias, e outro tanto ao 'anno e mando
me obradem hú anno na dita igreja de Santa Margarida cada
dia com 20 soldos antre pão e vinho e candea, e mando ao ca-
pellão da igreja de Santa Margarida por dízimos e por falhas
q não paguei á dita igreja 20 libras e mando q dem por minha
alma aos 9 dias húa baça por Deos com 100 libras de pão e ou-
tro tanto ao mez e outro tanto ao anno, e mando a Thereja mi-
nha sobrinha 5oo libras para cazamento e aos outros meus sobri-
nhos e sobrinhas, a cada um vinte libras e isto o q me devem.
Deveme Fernam Roiz Besteiro 685 libras sob 6 botões e uma co-
lher de prata, e me deve Luiz Miz meu visinho 3 10 libras d'esta
moeda e mais uma alda de panno pardo e devo Affonso Vasques
meu visinho 60 libras, e mando ao dito Luiz Miz q lh'as pague
d'estas q me deve, e Nicolau Esteves almoxarife da dita villa
me tem uma taça de marco e meio a penhor por 2(>o libras, e
mando a dem a Senhorinha Vasques q foi minha mulher a dita
taça e todolos outros bens q acharem em minha casa q acharem
seus sam e q elle de a mim uma taça de marco e meio de
prata e a roupa q me tem Me deu Martim singello 206 libras
que me emprestou e mando que lh'as paguem e tenho eu e G.1"
Romeu pellos e somagre 72 pelles cabruani e i5 arrobas de so-
magre e a esto me deve o dito G.c" Romeu duas pelles e 5o li-
bras e do somagre cento e uma libra e meia e eu devo a elle 200
libras e temme uma taça de prata pequena, e anda em sepaes 1
boi q é meu e seu, e tenho 12 botões de prata de Vasco Dinis
Abbade de Polvoreira por 5o libras e estes botões lancei eu a
-4(5-
penhor a João Geraldes, e que o abbade pague as ditas 5o libras
a meus testamenteiros os sobreditos G.' ° Romeu e Aftbnso Annes
e lhes mando o q já hei mandado e q cumpram este meu tes-
tamento por os meus bens e os seus não sejam obrigados e me
deve Álvaro Vasques Cizeiro q hora é de Guimarães 1.000 li-
bras desta moeda que hei de haver delle e me tem João Garcia
da porta da Frieira uma taça de prata de i marco por 200 libras
desta moeda e digo q recebi de João Carreira, o aluguer das
casas em q morou de 3 annos e os 2 q ellas mais morou hão
de fazer seu, mando que de a Gonçalo Romeu 3oo libras de pa-
pel que é uma resma que eu devo que eu delle recebi e mando
q a dita Senhorinha Vasques pague a meus testamenteiros 3. 000
hbras q paguei a Martim Nz" por razão da partição de seu fi-
lho e por esta manda revogo todalas mandas testamentos codeci-
Ihos q feitos hei antes d'esta dou e mando q não valhão e
valha esta q esta é a minha e postumeira vontade e o assim o
outorgo feito foi na dita viila 21 dia de dezembro era de 1436.
Testemunhas Gonçalo Romeu, Alíonso Pires tabellião mestre Ma-
theus Christovão das Cizas, Estevão Pires e Aifonso Roiz Albar-
deiro e Bartholameu Miz Cónego da Costa e João Carreira, e ou-
tro e eu Aifonso Frz tabellião de nosso Senhor ei Rei na dita
villa de Guimarães, q este testamento por mandado e outorga-
mento do dito Joani Anes escrevi c aqui meu sinal fiz q tal é.»
O pavimento da~egreja está coberto de campas com emblemas
grosseiros gravados n'aquellas pedras informes, taes como: — lanças,
espadas, machados, cruzes gregas, etc, as quaes devem ser pos-
teriores ao século xi. Em frente da porta principal, no espaço que
outr'ora teve alpendre, como o denotam os modilhoes da fachada,
ha algumas d'essas sepulturas, numa das quaes se lê: de ioam
frz • As três que pude ler no pavimento da egreja dizem:
s.A DE p.°
. S.A DE DAM PIRES
— S DANT.0 IORGE E ERD —
IAO DIAS MOSTE1R
O R OS
Pertencem á egreja de Santa Margarida todas as oliveiras que
a cercam, pois assim foi determinado em sentença proferida ;•
17 de novembro de 1763.
Os sete modilhoes que se destacam em volta da egreja, a par
d\ima rigula rasgada a todo o comprimento da parede sul, sem
duvida para apanhar as aguas pluviaes, indicam que houve alli
um claustro talvez destinado aos frades capuchos da Piedade que
— 47 —
no dia 7 de fevereiro de i(5(55 lavraram o termo da licença pedida
ao D. prior D. Diogo Lobo da Silveira/para possuírem por emprés-
timo a egreja, onde já celebravam os olticios divinos, emquanto
não terminavam as obras da construcção do convento. Este termo
foi assignado pelos religiosos: — fr. Hieronimo de Villa Real,
guardião; fr. João da Barca-, fr. Manoel de Verdemilho ; fr. Pe-
dro de Beja e fr. Francisco do Porto. Entraram na posse tem-
porária desta egreja no dia 12 de novembro de 1G64, e sairam
d'alli para o seu convento, que fica a poucos metros de distancia
no dia 29 de julho de 1668. Na procissão solemne que os acom-
panhou á nova casa, encorporou-se o revd."10 Cabido, camará mu-
nicipal, communidades e um numeroso concurso de povo.
Esta egreja de S. Miguel do Castello (vulgo Santa Margarida)
foi sagrada pelo Arcebispo de Braga D. Silvestre no armo de 1239.
e reza-se da sua dedicação a 3o do mez de abril: Ecclesia ista
dicata est a Domino Silvestro Archiep. Brach. in honorem beati
Michaelis, et S. Martirum Salurnini, Juliani et Ba^iliae, Fausti
et Januarii, era MCC2XXVII.
A capella mór mede 6"',4o por 4"\4o. Do arco á porta princi-
pal, i3m,8o por 6in,2o de largo. A abertura do arco não excede a
2m,55. Sete frestas em forma de setteiras, incluindo a que se vê
sobre a porta principal, fornecem luz á egreja. E' possivel que as
três representem a Trindade, assim como as sete frestas os Sa-
cramentos da Egreja.
Dentro guarda-se uma grande lapide que mede om,99 por om,77,
com a inscripcao seguinte:
íETERNit : sacr : im.ma-
cvlatissim.e : concep-
tiomi : marle : joan : iv port-
vgall : rex : vna cvm gen-
ERAL : comitiis : se : et re-
GNA SVA : SVB ANN\'0 CENS-
V TR1BVTARIA PVBL1CE VO-
VIT : ATQVE DEIPARAM IN
IMPERII TVTELAREM ELEC.
TAM : ALABE 0RIG1NALI PR-
jESERVATÃ PERPETVO D-
EFENSVRV : 1VRAMENTO
FIRMAV1T : V1VERET VT P-
1ETAS LVSITAN : HOC VIVO L-
AP1DE MEMORIALE PEREN-
NE : EXARARI 1VSSIT : ANNX-
HRISTI M • D • C • XLVI IMPE-
RII : svi : vi : anno 1G54 •
-48-
Versão: — Para perpetua memoria. D. João IV, rei de Portu-
gal, juntamente com as cortes geraes, se consagrou publicamente,
e aos seus reinos, á Immaculatissima Conceição de Maria, com o
tributo de um censo annual. E firmou com juramento, que defende-
ria sempre, que a Mãe de Deus, escolhida para padroeira do reino,
fora preservada da culpa original. Para que a piedade dos portugue-
zes sempre constasse, mandou gravar em pedra esta memoria no
anno de Christo de 1646, sexto do seu reinado. Anno de 1654.»
O censo annual era de cincoenta cruzados de ouro applicados
á egreja de Villa Viçosa; e o juramento foi feito a 24 de março
de 1646, (Domingo de Ramos), na capella real, e pelos cathedra-
ticos da Universidade de Coimbra no sabbado 28 de julho.
A collocação desta inscripção lapidar nas entradas das cida-
des, villas e logares, deve-se ao alvitre de fr. António das Cha-
gas (o Escoto) e á approvação de el-rei que logo commetteu ao
seu ministro António de Sousa de Macedo o encargo de a redi-
gir. Quiz fr. António que o juramento real se perpetuasse por
este meio. E' notável que não se encontre em Braga, a Roma
portugueza, uma única d'estas inscripções. E' realmente notável !
A Camará Municipal não ordenaria a sua collocação? O Ca-
bido da Sé de Braga jurou solemnemente defender a immaculada
Conceição, sendo o respectivo auto assignado no dia 24 de feve-
reiro de 1647 pelo clero, nobreza e povo.
Em Guimarães ainda existem, além d'esta, outra embebida
na torre da casa dos Laranjaes, e a do cunhal esquerdo do edifí-
cio da Camará.
Para o effeito de se cumprir a resolução real, enviou D. João
IV á Camará de Guimarães a seguinte carta :
«Juiz, Vereadores e Procuradores da Camará da villa de Gui-
marães. Eu El-Rei vos envio muito saudar, para que seja mais
notório a obrigação, que eu, e todos os meus vassallos tem de
defender, que a Virgem Senhora nossa foi consebida sem pecado
original, Ouve por Bem Rezolver, que em todas as partes, e en-
tradas das Cidades, Vilias e Logares de meus Reinos, se ponha
em húa pedra lavrada a inscripção, de que será a copia com esta
carta, encomendovos que a façais pôr nas portas, e lugares d'essa
Villa, e me avizeis de como o tendes executado, escripta em Al-
cântara a 3o de Junho de 1654. Rei • ■ • para a Camará de Gui-
marães».
Desde que foi tomada em cortes esta resolução não mais os
nossos monarchas collocaram a coroa na cabeça. Vê-se sobre uma
almofada, ao seu lado direito, nas occasioes solemnes.
Fernando III, imperador da Allemanha, fez levantar em iÓ2Q,
na principal praça de Vienna, uma columna encimada pela ima-
gem da Virgem e contendo uma inscripção latina em que também
—49 —
dedicou e consagrou festivamente á Virgem tudo o que possuia
«a sua pessoa, seus filhos, seus povos, seus exércitos, suas pro-
víncias». •
S. Casimiro, filho de Casimiro III, rei da Polónia, compoz em
latim alguns versos encantadores dentre os quaes especialisarei
os seguintes:
Também me alcança que seja
Doce, brando, pio, recto,
Despido de fingimento,
Sábio, casto, circumspecto.
A 8 de dezembro de 1854, Pio IX definiu, como dogma, a
Immaculada Conceição de Maria, sendo esta decisão festejada
em 9, 10 e ii de abril do anno immediato.
NPoutros tempos o nome de Maria chegou a ser prohibido em
attenção ao respeito devido á Virgem Mãe de Jesus.
*
Como parochia tem a egreja de S. Miguel do Castello as hon-
ras de Prima\ de todas as do Arcebispado, por já o ser muito
anteriormente á fundação da nossa monarchia. Foi baptisado
nella o infante, depois rei D. Affonso Henriques, filho do Conde
D. Henrique e de D. Thereza, os quaes no século xn viviam no
visinho castello onde nasceu o referido monarcha. A pia baptis-
mal foi d'alli retirada em 1664, por ordem do D. Prior D. Diogo
Lobo da Silveira, achando-se desde então na egreja de Nossa Se-
nhora da Oliveira acompanhada d'esta inscripção em fundo azul
e caracteres dourados :
NESTA • PIA • FOI
BAVTISADO • EL
REY • DOM ■ AFFÓ
SO HENRIQUES • PE
LO ARCEBP" S • GE
RALDO • NO AN
NO ■ DO • SÓR ÍÍ06
Em virtude das divergências dos nossos historiadores antigc=
e modernos acerca do anno do nascimento de D. Affonso Hen-
riques, deve julgar-se completamente perdida a esperança de se
esclarecer esta data da nossa Historia. A Chronica de Duarte
Galvão diz que nasceu em ioq4; outra opinião em 1106, sendo
esta a que se acha gravada na inscripção da pia e a que João de
Barros queria que se tivesse por certa; outra em 1 108; no Livro
de Noa de Santa Cruz de Coimbra, em 1109; outra opinião, em
4
— DO —
iiio; Alexandre Herculano, em nu; e a Chronica contempo-
rânea Gothica em iii3! Nada menos de sete opiniões que n'este
momento recordo.
As quatro ultimas põem fora do acto do baptismo o Arcebispo
S. Geraldo fallecido em 1108.
Coube á egreja de S. Miguel do Castello a prerogativa de im-
mediata ao Papa sendo d'este modo isenta da jurisdicção archie-
piscopal de Braga.
O orago d'esta egreja teve uma irmandade que ainda em 1064
existia; houve alli também a Confraria do Anjo que mandava an-
nualmente celebrar 100 missas, 12 das quaes eram cantadas na
primeira quinta-feira de cada mez com responso e procissão de
defuntos em volta da egreja, pelos confrades e pelo instituidor
d'aquella obrigação.
Estavam encarregados de todo este serviço os 4 capellães que
annualmente recebiam de ordenado 1:000 réis!
Na relação das ceias pagas pela Confraria no anno de 1620,
rigura, como fornecedor, Miguel Francisco Matadiabos, morador
na rua da Fonte Nova, hoje rua nova de Santo António, e ainda
agora vulgarmente denominada do Mata-diabos em homenagem
ao Hercules taberneiro !
Próximo do arco cruzeiro está uma sepultura rasa, com a fi-
gura da morte, que o Abbade António Machado de Oliveira ce-
deu ao capitão José de Oliveira e Silva e a sua mulher D. Rosa
Maria de Sousa em recompensa da obrigação que aos 4 de agosto
de 176c) fizeram de Soo.^ooo réis para azeite da lâmpada do S S.
que desejavam collocar alli « por o não haver nunca », e uma
missa cantada annualmente por intenção dos dois. Como porém
a sepultura não fosse do Abbade, o Procurador Geral da Mitra
annullou este contrato. O D. Prior D. Domingos de Portugal e
Gama auctorisou a referida collocação na «Real Egreja de S. Mi-
guel do Castello », sendo o S S. processionalmente condusido da
Insigne e Real Collegiada pelo Chantre dr. Francisco José Pereira,
e encorporando- se todas as irmandades, confrarias, Curaria e Ca-
bido, e os frades Franciscanos, Dominicos e Capuchos, aos 5 de
junho do anno immediato. Num dos ângulos formados pelo arco
cruzeiro e corpo da egreja ( lado esquerdo ), vê-se o padrão das
teigas, medida do século XII, que consiste numa pedra grosseira
e mal cortada, contendo ao centro duas cavidades de um e de
meio alqueire.
Achando-se em estado de ruina esta pequena egreja, que foi
capella real do Conde D. Henrique, o Arcebispo D. José Joaquim
de Azevedo e Moura publicou uma portaria annexando a fregue-
zia á de Nossa Senhora da Oliveira. Uma commissão composta
dos srs. dr. Francisco Martins Sarmento, cónego Aquino, padre
— 5 1 —
António José Ferreira Caldas e João Pinto de Queiroz, abriu em
Guimarães uma subscripção que rendeu 700.^000 réis, e obteve
do governo' o subsidio de 1:200.^000 réis, iniciando em 17 de
agosto de 1874 uma restauração conscienciosa que em nada preju-
dicou a architectura antiga.
Em 20 de julho de 1880 foi esta egreja benzida pelo rev. Abí-
lio Augusto de Passos. A pequena distancia, para a frente, fica o
pobrissimo albergue de S. Miguel do Castello cuja origem se des-
conhece.
Na serie dos Abbades de S. Miguel do Castello é conhecido,
como o mais antigo, Domingos Tristão apresentado na era de
i383.
A poucos metros de distancia d'esta velhíssima egreja, lado do
nascente, vê-se o venerando castello fundado pela condessa D.
Mumadona que o denominou de S. Mamede, e o qual mais tarde
foi alcaçar do Conde D. Henrique e da rainha D. Thereza. Alli
nasceu D. Affonso Henriques, fundador da monarchia portugue
za. A torre de menagem tem interiormente uma escada que con
duz as ameias de onde se descobre um horisonte vastíssimo !
Na humbreira direita da porta d 'essa torre gravou-se em 1868
um nome que, por extranho ao monumento, devia ser apagado.
E' o nome de Lui\ Vermell, pintor-esculptor hespanhol que resi-
diu em Braga até o anno de 1870.
No dia 9 de novembro de 1887, a Camará poz em arremata-
ção por io5:ooo réis a cobertura metálica; e na sessão do dia 1
de abril de i88q, propoz-se que se organisasse um projecto de
melhoramentos em volta d^ste castello. Como porém se tratasse
duma obra honrosa para a terra que justamente se ufana de ser
o berço da nossa nacionalidade, não faltou quem logo lhe creasse
entraves !
Em 19 de março de 1881 foi este castello classificado monu-
mento histórico de primeira classe.
A egual distancia da egreja, para o sul, fica o Paço incom-
pleto dos Duques de Bragança, magestoso edifício construído pel<>
Conde de Ourem e primeiro Duque de Bragança D. Affonso, fi-
lho natural de el-rei D. João I que o estimava muito por se pa-
recer comsigo.
Este D. Affonso era casado em primeiras núpcias com D. Bri
tes Pereira, filha de D. Nuno Alvares Pereira, e em segundas com
D. Constança de Noronha, filhado conde de Noronha D. Affonso.
Fallecendo o Duque em Chaves, no mez de dezembro de 1461 ,
sua mulher D. Constança continuou a habitar o Paço de Guima-
rães em que falleceu a 26 de janeiro de 1480, sendo sepultada na
capella-mór da egreja de S. Francisco, onde apenas se guarda a
tampa do tumulo com a sua estatua jazente.
í>2
Numa parede interior ainda se conserva este pórtico Joannino^
com três arcos reintrantes sobre columnas de mármore branco,,
que pertencia d grande sala régia:
Nas costas d'esta grande sala conservam-se as duas janellas.
que aqui se representam :
— 53
E' notável a solidez das quatro enormes chaminés de tijolo
■que ha cinco séculos resistem á acção do tempo !
Anteriormente a 1F07, em que este edifício principiou a ser oc-
cupado pelos corpos militares, recolhiam-se alli as rendas do Re-
guengo. Para esse fim conseguiu o Almoxarife Jeronymo de
Mattos Feijó que a parte habitável fosse coberta de telha.
Um velho documento dá a seguinte medição do Paço :
«Sendo medido pela parte do norte tem de comprido de nas-
cente a poente 52 varas e meia •, confronta d'esta parte com o oli-
val e egreja de S. Miguel do Castello ; tem por esta banda um al-
pendre assentado em 8 pilares de pedra, para cuja parte tem duas
portas fronhas com suas escadas de pedra e entrada do celleiro
dos mesmos Paços ; e medidos pela parte do poente tem de largo
de norte a sul 52 varas e meia \ parte com o olival da dita egreja,
Tem para esta parte duas portas, entradas das lojas e uma d'ellas
é larga e tem por cima um alpendre telhado e assentado em dois
pilares de pedra ; e sendo medidos pela parte do sul tem de nas-
cente a poente 52 varas ; confronta com o muro das freiras de
Santa Thereza, para cuja banda tem muita quantidade de janellas
feitas ao tempo antigo com suas cruzes de pedra nos largos del-
ias ; e medidos pela parte do nascente tem de norte a sul 53 va-
ras, parte confronta com o muro da villa e roxio que possue Tor-
quato Luiz que fica entre o dito muro e os ditos Paços, e por esta
banda tem três torriões de pedra, e no primeiro torrião tem
um escadorio de pedra e tem para esta banda muitas janel-
las e barandas de pedra, e tem cruzes de pedra pelo meio e
algumas estão tapadas e outras abertas entre as ditas janellas, e
estão muitas relosias pequenas, e dentro d'estes Paços tem o arco
da entrada para o logar aonde foi a capella, e o dito arco está for-
mado sobre 6 columnas de pedra de jaspe ou mármore, tem va-
rias chaminés e arcarias e tem 3 salas cobertas de telha, que
actualmente servem de celeiro, e uma cosinha sobradada com suas
janellas para a parte de dentro do Palácio, e tem quatro lojeas
duas grandes e duas pequenas que servem de celeiro do vinho e
mais despejos».
Neste século X os Concílios Asturicense (946) e Compostel-
lanum (971 ), viram com magua o clero regular e secular perder
a noção dos seus deveres a ponto de vários auctores ecclesiasti-
cos dizerem que « muitos retiros dedicados ao silencio e á oração
se converteram em logares de desordem».
Bispos e sacerdotes casavam, dotando os seus filhos com fo-
ros, dízimos, egrejas e outros rendimentos.
Alguns d'esses Bispos ambiciosos conseguiram possuir simul-
taneamente varias Dioceses.
_54-
O Arcebispo de Corintho aconselhou a S. Lucas o Moço, soli-
tário do monte de S. Joannico, que tivesse em seu poder um vaso
para conservar hóstias consagradas com que se desse a si próprio
a communhão a miude, e um copo expressamente destinado ao vi-
nho que apoz a communhão devia beber. E' que os anacoretas
poucas vezes assistiam á celebração da missa. Seguindo a pratica
dos mais antigos christãos, ainda n'este século era permittido a
cada um commungar debaixo de uma só espécie, pelas próprias
mãos, rcstringindo-se a quatro vezes no anno esta devoção !
Os regulamentos dos Concílios prohibiam os consórcios entre
parentes até ao 7.0 grau e ordenavam a separação dos que exis-
tissem com este impedimento.
A disciplina canónica, o jejum e a penitencia publica, relaxa-
ram-se grandemente em virtude de se commutarem as penas es-
tabelecidas pelos cânones em romarias, fundações de egrejas e
Mosteiros e em muitas outras obras pias.
O Papa João XIII benzeu solemnente emq65 os sinos de S. João
de Latrão, dizendo se que por esse facto ficou instituída a ceremo-
nia pelo alludido Pontífice. Alguns dos nossos historiadores, que
a julgam mais antiga, fundam-se fta prohibição da referida ben-
ção dos sinos estabelecida em 789 pelo capitular de Carlos Ma-
gno, e nos Rituaes manuscriptos onde se determinam as ceremo-
nias próprias para estas bênçãos.
O Papa Silvestre II (Gerbert) foi o introductor dos relógios
de pêndula e dos algarismos árabes na Europa.
— 55 —
O sino de S. Geraldo
Pendente dos dois arcos ogivaes que se encruzam formando
a cúpula da torre do lado norte da Sé de Braga, está o sino das
horas ou do relógio, vulgarmente denominado de S. Geraldo,
porque a tradição nos diz que tocava de per si sempre que o san-
to Arcebispo sahia do Paço Archiepiscopal. Suppondo que seja
este o sino mais antigo do paiz, e que mais curiosidade otíerece
pela proveniência, dizeres e emblemas, entendo que deve ser con-
siderado uma reliquia archeologica de valor.
Quem primeiro se occupou d'este sino foi o Contador d^rgote
D. Jeronymo, (1G76-1749), nas suas Memorias de Braga, livro 6,
cap. IV, n." 544, ti. 35>7, dizendo-nos que se lia em toda a volta
d'elle esta pequena inscripçao: — magister marti valenciis me fecit
anno domini millesimo, — sendo esta a versão: «Mestre Martinho
me fez no anno de mil do Senhor, em Valença».
Desde então ninguém se deu ao trabalho de reverificar estes di-
zeres para se evitarem constantes reproducções d'uma leitura ine-
xacta devida ao informador d'Argote, D. Luiz Alvares de Figuei-
redo, Bispo de Uranopolis e coadjutor do Arcebispo D. Rodrigo de
Moura Telles.
Não se justifica o pouco escrúpulo do Bispo em copiar, apenas e
muito mal, a primeira linha dos dizeres do sino que no seu tempo
-56—
ainda se conservava no campanário entre as torres anteriores a
estas, e portanto em óptimas condições para um exame seguro. Eu
tive necessidade de fazer construir sobre a balaustrada da cupuia
da torre uma estada de madeira á qual subi cerca das 3 horas da
tarde de sabbado 8 de maio de 1897, volteando o sino três vezes,
que tantas são as linhas da inscripção em elegantes caracteres go-
thicos, e lendo o seguinte, cuja ndelidade garanto:
B MA&ISTER*MATWCMINSIS*ME FES1T<»AN(W)NI»MIIE
a
fflECCEBCRVCtIA«DKH»FVQT8PARTES«AWERSE"VmC1T«
LEOBDE«TR\BV«WDABRRKO\X"ttAV»ToALElVíA
iQVINaENTEMMO^^MO^AIVTORwBáflNOSfRÍÊftffllN
NOMNEjkBNh! DEVSl INCME|\/ENiT|PROMOBlS|«ED0
O diâmetro do bordo (im,07) é egual á altura exterior. A pri-
meira linha, nos hombros, não coube na circumferencia da forma
terminando por isso debaixo da primeira palavra com as qua-
tro ultimas lettras n'um parallelogrammo.
As palavras fecit com um s, anno com um n apenas, rfiille$i-
mo só com um /, fugite sem o e, radix com dois rr, allehtia sem
um /, e ainda outros defeitos na linha ultima, tudo se encontra no
sino; e não é isso raro, mesmo nos que foram fundidos no decurso
dos séculos subsequentes.
Matricalensis é nome próprio da naturalidade do fundidor ou
da localidade onde estava installada a fundição. Provavelmente o
proprietário óccultava o seu nome por desnecessário ou por então
ser única e de grande fama a fabrica de Madrigal, pequena ci-
dade hespanhola que fica distante quatro léguas de Medina-del-
Campo, e da qual era natural o celebre pasteleiro Gabriel de Espi-
nosa que, por se apresentar como sendo o desditoso rei D. Sebastião,
foi enforcado com o seu cúmplice portuguez fr. Miguel dos San-
tos, no anno de i5o,5.
Leitura da inscripção: — «Mestre de Madrigal me fez no anno
de mil do Senhor. Eis a cruz do Senhor; evitae as partes adver-
sas; vence o leão da tribu de Judá, raiz de David.
Quinhentos e um (numero de sinos fundidos). O nosso auxilio
em nome do Senhor. Creio que Deus veiu encarnar por nós».
E' curiosíssima a notação do numero de sinos que a fundição
-57-
produziu até á data de ser fundido o de Braga! E para que não
otíereça duvida a allusão do numero 5o i, lá está a seguir á pala-
vra quingentesimo um pequeno sino em relevo, da altura dos ca-
racteres gothicos. A restante pontuação d'esta linha representa um
sino-saimão (signum Salomonis) que livra das cousas más, a egreja
da Sé, um leão e outro emblema.
Por occasião da benção de que fazem parte, depois do canto
dos Psalmos, a lavagem interior e exterior do sino com agua ben-
ta salgada, as quatro unções exteriores e as quatro interiores com
o santo Chrisma, devia ser nomeado, para a invocação, um santo
cujo nome é hoje desconhecido. O de S. Geraldo não, porque
como fica dito, o sino é bastante mais velho. O emblema do cen-
tro representa um calvário, com S. João e a Virgem.
Ahi fica pela primeira vez copiada e lida toda a inscripçao do
sino de S. Geraldo, que muito contribue para o conhecimento da
antiguidade da fundição de sinos na nossa visinha Hespanha, pro-
veniência d'esta relíquia de um passado remoto, bem digna de esti-
mação.
Este sino e o pequeno cálice que se guarda em cofre de mar-
fim no thesouro da Cathedral, loc. cit., teem sempre sido denomi-
nados de S. Geraldo por se ignorar a procedência dum e d' outro.
Seguia-se a tradição do sino tocar de per si, e do cálice ter ser-
vido para o santo celebrar as missas. Nada mais se procurou ave-
riguar, não obstante haver no cálice e no sino inscripções que
muito me auxiliaram para apurar da verdade.
Sabe-se que os musulmanos conquistaram e arruinaram a cida-
de de Braga em 716, demorando-se por estes sitios quasi 3oo annos.
Os Bispos bracarenses, que durante o século vm, procuravam o
conforto do Paço, eram perseguidos com insistência a ponto de os
obrigarem a refugiar-se nas Astúrias, assim como as famílias gradas
da epocha a procurarem sitios elevados onde se fortificavam para
alli residirem com liberdade e socego. Por isso a velha cidade de
Braga ainda em Sbg se conservava arruinada, porque então D.
AíFonso o Casto, como consta das actas do Concilio de Oviedo,
ao mesmo tempo que aconselhava com interesse a restauração das
Cathedraes destruídas, doava á egreja de Lugo a cidade e Bispado
de Braga com as egrejas e freguezias próximas, entrando n'esse
numero das que os Árabes conservaram para agradar aos chris-
tãos pobres que ficaram sob o seu domínio com o fim de lhes cul-
tivarem as terras, S. Pedro de Maximinos, S. Fructuoso com a
torre Capitolina, S. Vicente e outras mais afastadas (.. concedo
civitates Bracarensem videlicet Metropolitanam cum suo Episco-
patu, et in circuitatis. . . Ecclesia Sancti Petri, Sancti Fructuosi,
turrís Capitolina, Sancti Vincentii cum villis suis Infidias, etc),
confessando que a este procedimento nada honroso, com que
— 58 —
procurava a salvação das almas, o obrigavam os mouros irre-
quietos (quia docus est quod nunc pro animarum salute necessi-
tate pagancrum compulsi facimus).
Sobre a conservação das egrejas pelos Árabes existia em 1642,
no cartório de Lorvão, como dizem Purificação e Brito, o docu-
mento seguinte :
«Alboacem, rilho de Mahumet Athamar, filho de Tarife, a rogo
dos christaos, fiz esta firma conforme o seu costume — O — e de-
ram-me pela confirmação dous bons cavallos, e eu lhes confirmei
tudo o sobredito. — Paguem os christaos dobrado tributo dos mou-
ros.— Das egrejas por cada uma 25 pezos de boa prata, e as
episcopaes 100, e os mosteiros 5o. — Os bispos christaos não amal-
diçoem os reis mouros, e se tal fizerem sejam mortos. — Os sa-
cerdotes não celebrem suas missas senão com as portas fechadas ;
fazendo o contrario paguem 10 pezos de prata. — Os mosteiros,
que estão em meu território e senhorio possuam seus bens em paz,
e paguem os sobreditos 5o pesos. -- O mosteiro das montanhas,
que se chama de Lorvão, não pague pezo algum ; porque com boa
vontade me mostram onde trazem veados, e fazem aos mouros
bom gazalhado, e nunca achei naquelles, que ahi moram mentiras
nem má vontade ; e possuam em paz e boa quietação todas as
suas herdades... e vão e venham a Coimbra com toda a liberdade, de
dia e de noite, quando quizerem, e comprem, e vendam sem pa-
gar direitos ; com tal condição que não saiam fora de minhas
terras sem minha licença. Carta de lei na era dos christaos 722
(de Christo 734), e segundo os árabes 147 aos i3 da lua Dulhija
(lua de dezembro).»
Fallecendo em Q99 Bermudo II, foi immediatamente acclama-
do rei de Leão seu filho Affonso, de 5 annos de edade, e a direc-
ção dos negócios públicos entregue aos Condes de Castella San-
cho Garcez, e da Galliza Menendo Gonçalves. N'este anno de
1000, em que El-Mansur venceu o Conde de Castella, ordenou o
da Galliza Menendo Gonçalves a fundição do sino em Madrigal,
oíferecendo o, com o pequeno cálice e outros objectos, a Santa
Maria de Braga que, sem duvida, já então aqui tinha reedificada
a sua egreja. (. . .offerimus cruce, cálice et patena argêntea, si-
gnum de metallo, libros perfectus, etc.) A Galliza, que durante
muitos séculos teve Braga por capital, foi por Estrabão e Ptolo-
meu denominada : Kallaecia.
Seguiu se-lhe em io65, como benemérito de Braga, cuja cidade
principiou a reedificar, e da sua Sé Cathedral, que protegeu,
obrigando as famílias nobres a restituírem ao Bispo as rendas que
possuíam, D. Garcia rei da Galliza e de Portugal, tão notável pela
coragem com que em 1073 venceu, entre a cidade de Braga e o
rio Cavado, o grupo capitaneado pelo Conde Nuno Menendes.
— D9
DQ
Seu irmão D. Sancho II de Castella, que o privara do reino,
nomeou em 1067 Bispo de Braga D. Pedro II, o ultimo da série
dos Bispos e o primeiro que usou Dom.
Durante o governo d'este Prelado rloreceu muito a Cathedral
Bracarense pela restauração de antigos direitos e regalias e por
numerosas doações que os povos lhe fizeram.
Na collecção dos retratos do Paço archiepiscopal existem, do
século xi, mais dois Bispos anteriores ao D. Pedro, sendo Sige-
fredo em 1060 e Julião em io38. D'essa collecção, que segue
composta de 123 retratos, apenas podem ser considerados authen-
ticos desde D. Lourenço, visto ser inventada a pintura a
óleo, no século xiv, por João Van-Eyk (1370- 1441), o celebre fun-
dador da eschola flamenga. O retrato de L>. fr. Bartholomeu dos
Martyres foi pintado em sua vida pelo pintor portuguez António
Maciel, de ordem do Arcebispo D. fr. Agostinho de Jesus, que
lhe succedeu na cadeira Bracarense :
BISPOS
1 S. Pedro de Rates anno
2 S. Basileu M _. »
3 S. Ovidio »
4 S. Policarpo . »
5 S. Sereniano »
6 S Faviano »
7 S. Félix.. »
8 Grato »
9 S. Secundo »
10 Galidonio »
1 1 S. Narciso M • »
12 Paterno I »
1 3 B. Salomão »
14 Senagrio »
1 5 S. Lioncio »
16 S. Apolonio »
1 7 Idacio »
18 Lampadio »
1 9 S. Paterno II »
20 S. Profuturo »
21 Pancracio »
22 Balconio »
23 Valério I »
ix Idacio II «
25 Castino »
26 Valério II »
27 Profuturo II »
28 S. Ausberto »
29 S. Julic.no »
30 Eleuterio »
3 1 Lucrécio »
32 S. Martinho de Dume »
45,
60,
93,
i3i,
200,
23o,
245,
260,
2t>3,
268,
270,
275,
299,
3oo,
32b,
3i8,
366,
38 1,
3Q2,
40S,
410,
448,
456,
4Q4,
524,
525,
526,
527,
538,
55o,
569,
583,
barba e mitra
» barrete
» mitra
» barrete
» mitra
» barrete
» aureola
» barrete
» mitra
» barrete
» »
» mitra
» aureola
» barrete
» »
» »
o a
» »
» »
» mitra
» »
» barrete
» »
«mitra
-6o
3o S. Benigno anno
34 Pantardo »
35 S. Tobeu »
36 Julião II »
37 Potamio »
38 Manucino »
09 pancracio »
40 S. Fructuoso »
41 S. Quirico »
42 S. Leodicisio »
43 1 iuva I »
44 Faustino »
45 S. Félix Torquato »
46 S. Victor M »
47 Eronio »
48 Hermenegildo »
49 Thiago I »
50 Ferdisendo »
5 1 Arcarico »
52 Argimundo »
53 Nostrano »
Í4 Dulcidio »
55 Gladila »
56 Argimiro »
57 Theodomiro »
58 Silvanacto
5g Hero
60 Gonçalo
6 1 Hermenegildo
62 Julião
63 bigefredo
64 D. Pedro II
588, barba e mitra
58g, » » barrete
6i?, » » mitra
0^6, » » barrete
t>56, » » »
060, » » »
66 1 , » » »
6t>5,
081,
083,
684,
694,
7'4,
7^4,
73o,
737, » » »
738, » » y>
746, » » >i
780, »> » w
8í3, » » »
832, bigode e pêra, barrete
84.2, 1» » » »
863, « » » >»
899, « » » »
910, « » » »
9- o, » » » »
Cd 2, » a » »
u5o, » » » »
96c, » » » >'
10 is, » » » »
1060, » » >> »
1079, » « » »
» mitra
» barrete
» descoberto
» barrete
ARCEBISPOS
65 S. Geraldo anno
60 D. iviauncio »
67 D. Paio Mendes »
68 O B. D. Godinho
09 D. João Peculiar »
70 D. Martinho Pires »
71 D. Pedro S »
72 D. Estevão Soares «
73 D. Sancho I «
74 D. Silvestre Godinho »
75 D. Gualterio »
76 D. João Egas II »
77 D. Martinho Giraldes »
78 Papa João XXI (D. Pedro Julião) . .
79 D. Sancho »
80 D. Ordonho »
81 D. Frei Tello
82 D. Martinho de Oliveira »
83 D. João de Soalhães »
84 D. Gonçalo Pereira . . . . • »
IOQQ,
b
arba e
mitra
1 I IO,
b
godé e
pêra,
barrete
Ul8,
» »
«
ti
I 100,
» H
»
»
U?Q,
» tf
»
ij
1189,
tf Jl
»
m
l no,
» tf
u
u
121 ',
» tf
»
tf
1226,
tf »
»
0
122p,
» »
>;
tf
1240,
tf 1)
»
»
1244,
» »
»
tf
1259,
» M
»
»
1272,
» »
»!
solideo
1275,
tf »
",
b
arrete
1 27O,
tf »
M
»
128o,
tf tf
»
1»
i3i3,
tf M
»
}>
i3i8,
tf y
tf
>i
1 325,
» u
U
1*
6i —
85
Só
«7
hS
89
9o
91
Q2
93
U4
95
90
97
9S
99
00
O!
02
o3
04
03
06
07
09
o
I
2
7
8
9
2o
2 I
22
li
D. Guilherme anno i35o,
D. João Cordolaco » i36:>,
D.Vasco » i3yi,
D Lourenço » 1^97,
D. .loão Garcia » 1 397,
D Martinho de Miranda » 14 16,
D. Fernando » 1416,
D. Luiz Pires » i4t7i
D. João de Mello » 1480,
D. João Galvão » 1480,
D. Jorge da Costa » 1486,
Cardeal D. Jorge da Costa (Irmão).. » 1488,
D. Diogo de Sousa » i532,
Cardeal D Henrique » 037,
D. Diogo da Silva » iS^ 1,
O S. D. Duarte » \b*\
D. Manuel de Sousa » i549,
D. Frei Balthazar Limpo » i558,
D. João Affonso de Menezes » i !>87,
D. Frei Bartholomeu dos Martyres. . » 1590,
D. Frei Agostinho de Jesus > ió 1 7,
D. Affonso Furtado de Mendonça... » 1625,
D. Rodrigo da Cunha » 1Ó27,
D Frei Aleixo de Menezes » i63o,
D. Sebastião de Mattos de Noronha. » it>36,
Cardeal D. Veríssimo de Lencastre. » 1677,
D. Luiz de Sousa » ió8y,
D. José de Menezes I » 1002,
D. João de Sousa » 1697,
D Rodrigo de Moura Telles » 1704,
D. Jo^é II » 1741,
D. Gaspar » 170,
D. Frei Caetano Brandão » 1790,
D José III » i^or-,
D, Frei Miguel da Madre de Deus . . » 181 5,
C ardeal Figueiredo da Cunha e Mello » 1843,
D. José Joaquim d'Azevedo e Moura » 1 856,
D João C. cTAmorim Pessoa » 187o,
D. António José de Freitas Honorato. » 1 883,
bigode e pêra, barrete
a
»
■
»
■
»
»
»
»
»
»
D
»
•
D
»
«
»
»
»
»
»
»
»
»
»
»
))
■
»
»
a
sem
barba, barrete
»
»
»
»
u
a
»
■
»
»
»
»
»
»
»
»
»
»
»
»
»
j;
»»
descoberto
»
»
»
»
»J
barrete
»
»l
descoberto
»
»
»
»
»
u
»
»
•
>l
u
0
a
»
»
»
D
u
»
»
»
»
»
n
»
»
»
»
»
a
»
Actualmente preside aos destinos da Archidiocese bracarense
o ex.mo rev.mo sr. D. Manuel Baptista da Cunha, n.° 124 da serie
c n.° do nome.
As datas foram por mim fielmente copiadas dos quadros; refe-
rem-se, umas á nomeação e outras ao fallecimento de cada Pre-
lado, com bastantes erros que convém corrigir. Por isso entendo
que devo aqui dar para cada numero as que designam a duração
completa: N.os i-3y a 44; 19-400 a 400; 21-410 a 414; 22-415
a 448; 3i-56o a 57o; 32-5;o a 583; 1^4-583 a 59o; 36-633 a
646,; 37-653 a Õ56; 4o-()5<"> a 665; 42-675 a 683; 43-678
a 684; 44-687 a 6q3; 45-693 a 714; 64-1 067 ji 1079; 65-1096
a 1109; 66-1:10 a 11 19; 67-1119 a 1137; 69—1 i3o a iitS;
62 —
68-i i 7^ a 1188; 70-1191 a 1209; 71-1210 a 1212; 72-1213 a
1228; 74-1229 a 1244; 76-1244 a 1255; 77-1259 a 1271; 78-1272
a 1277; 79-1275 a. . . . ; 80-1276 a 1279; 82-1292 a i3i3;83 -i3i3
a i325; 85-i349 a i35o; 86-1 365 a i3y3^ 88-1371 a 1397; 90-1398
a 1403; 91-1416 a 1467; 92-1467 a 1480; 93-1480; 96-1483 a 148'S
e i5oi a i5o5; 95-1488 a i5oi; 97~i5o5 a 1 532; g8— 1 533 a 1540;
99-1540 a 1541; 101-1544 a 1549; io2-i55o a i558; 104-1559 a
1590; 1 o5— 1 587 a 1609; 108-1611 a 1617; 109-1636 a 1641; 1 10—
1671 a 1677; 1 1 1-1677 a 1690; 1 12-1692 a 1696; , 13-1696 a 1703;
114-1704 a 1728; 115-1741 a 1756; 116-1758 a 1789; 117-1790
a i8o5; 1 18-1806 a 181 3; 1 1 9— 1 8 1 5 a 1827; 120-1840 a iSírô;
i2i-i856 a 1875; 122-1876 a 1888; i23-iS83 a 1898.
— 63
Egreja Cathedral de Braga
l)esconhcce-se a origem da Sé de Braga, não obstante abali-
zados historiadores, fundando-se principalmente no que diz Flávio
Dextro, presumirem que date dos primeiros tempos da religião
christã. Na opinião d'aquelle historiador a Hespanha foi a pri-
meira Provinda que no mundo, depois da Judea, Galilea e Sa-
maria, abraçou a fé de Christo, por motivo de S. Thiago levantar
em todas as cidades um grande numero de egrejas, creando pri-
meiro Bispo de Braga S. Pedro de Rates que constituiu primaz de
-64-
todos os outros *: «Hispânia prima Provinciarum mundi post Ju-
deam, Galileam, et Samariam, in partibus Occidentalibus Christi
ridem amplexa est, ejusque gentilitas ad íidem conversa fuit, verte
primitiae caeterarum gentilium, nam et Jacobus, S. Zebedsei filius
peragratis urbibus Hispânia;, multis que erectis Ecclesiis, et Epis-
copis creatis, ex Advenis Petrum Bracharae primum reliquit.»
Esta opinião é porém impugnada por escriptores de auctori-
dade, como fr. Miguel de Santa Maria, da Ordem dos Eremitas
de Santo Agostinho, na sua obra I o^ da Verdade, em que se
esforça por contestar a vinda de S. Thiago á Hespanha. Mostra
que no século xi o Papa Gregório VII escreveu a D. Affonso e
D. Sancho, reis de Hespanha, o seguinte que transitou em julga-
do: «Como o Apostolo S. Paulo signifique que veiu á Hespanha,
e depois conste que foram mandados para instruir aos povos de
Hespanha 7 Bispos por S. Pedro e S. Paulo, os quaes destruindo
a idolatria, fundaram a christandade, plantaram a religião etc.
E assim como não duvidaes que d'aqui recebestes o principio da
religião catholica . . »
Do Registo das Epistolas Decretaes dos Summos Pontífices,
tom. 3, epist. 64, também consta que «foi S. Paulo quem deu
principio á religião catholica em Hespanha». Santo Isidoro, Dou-
tor da egreja, no livro De Ortu, et obitu Patrum diz que «S. Paulo
pregou no Occidente e em Hespanha, aonde Christo não tinha
sido antes nomeado». S. João Chrisostomo (Homilia 70, in Ma-
thaeum, cap. 22), mostra que os Apóstolos, fieis ás ordens do
Divino Mestre se conservaram por largo tempo na Judea não
obstante serem feridos e açoutados pelos Judeus, até que os expul-
saram (Apostoli praedicaverunt judaeis, longoque temporis spatio
caesi, et flagellati in Judaea manentes, ac demum ab ipsis pro-
pulsi in gentes profecti sunt).
S. Jeronymo e outros auctores affirmam que S. Thiago Maior,
rilho de Zebedeu e irmão de S. João, foi cedo sentenciado á morte
e degolado por ordem de Herodes Aggripa, no anno de 44. Por
isso é tida por verdadeira a noticia da distribuição dos Apósto-
los: pela Ásia Menor, S. João; pela Scythia, Santo André; pelos
Parthos, S. Thomé; pela Ásia Maior, S. Philippe; pelas índias,
S. Bartholomeu; pela Ethiopia, S. Mathias; pela Pérsia, S. Simão;
por Epheso, Grécia, Provença e em ambas as Hespanhas, Saulo
ou S. Paulo, etc.
D. Rodrigo Ximenes, Arcebispo de Toledo, acceitando a opi-
nião de Fleuri sobre o culto do corpo de S. Thiago em Compos-
1 O jesuíta rev. Jeronymo Romano de la Higuera diz que S. Pedro, i.° Bispo
de Braga, era judeu de nação e que lhe chamavam propheta Samuel, o moço, ou
Malachias o velho, pela gravidade dos seus costumes e fermosura do rostro.
— e>5 —
tella no viu.0 século, o qual foi para alli conduzido, não admitte
comtudo que as regalias da egreja Compostellana sejam considera-
das superiores ás da sua, e diz na presença do Papa e dos nume-
rosos prelados que se achavam presentes no Concilio Lateranense :
«Se é certo que S. Thiago foi o primeiro que pregou a fé nas
Hespanhas, eu leio somente que elle recebeu o poder de pregar
na Hespanha; mas que pregando primeiro na Judeia e na Sama-
ria, Herodes o fez degolarem Jerusalém: como, pois, podia elle
pregar em um paiz onde nunca entrou jamais?».
Na opinião d'este prelado hespanhol, perdeu S. Thiago a vida
antes de se dirigir á Península.
Ha também quem sustente que S. Paulo não pôde, como pro-
mettêra na epistola aos Romanos, vir da Itália sugeitar á lei evan-
gélica os povos das Hespanhas, porque o seu apostolado difficil,
complicadíssimo, o obrigou a partir para Colosso.
Todas estas divergências teem contribuído para se acreditar
que S. Pedro de Rates não foi, como geralmente se diz, o pri-
meiro Bispo de Braga, dando-se como certo um tal Sinagrio a
que succedeu S. Leôncio, natural de Constantinopla, fallecido
em Guimarães a 19 de março de 826, quando regressava do Con-
cilio de Nicea. Assim o refere Juliano: «Sanctus Leontius Bra-
charensis Pontifex rediens ex Concilio moritur Guimaranii in
Gallecia, quae tunc dicebatur Appollonia 19 Martii, anno 326».
Esta opinião, muitas vezes combatida, como todas as que têem
origem no Chronicon Juliano, prejudicaria um pouco a antiguidade
da origem dos prelados Bracarenses, no caso de alguém poder
provar que o alludido Sinagrio não pertence ao numero conside-
rável dos duvidosos.
A meu ver, pouco ou nada importa que, em vez de S. Thiago,
viesse á Hespanha S. Paulo, comtanto que a proeminência da Pri-
mazia de Braga se mantenha, embora como a resolveu o Papa
Urbano II que fez Primaz de toda a Hespanha D. Bernardo Ar-
cebispo de Toledo, permittindo comtudo que o de Braga conti-
nuasse no goso do mesmo titulo e respectivos direitos, os quaes
consistem no uso da cruz dobrada e na auctoridade de presidir e
fazer pontifical em diíferentes Províncias.
*
Diz-se que o templo de Isis, a que faz referencia uma lapide
romana, ainda hoje existente nas costas da capella de S. Geraldo,
estivera no logar que hoje occupa a egreja Cathedral. De facto os
templos dedicados á deusa Isis eram sempre construídos nas pra-
ças do mercado, como refere Vitruvio (De Architectura, liv. I,
cap. 7), e os homens do commercio d'aquelle tempo realizavam
ao que parece, as transacções no referido local, porque na parede,
-66-
interior do altar do transepto da Sé, lado do Evangelho, encontrou
ha bastantes annos o mestre pedreiro Manuel Fernandes, uma
base de estatua que tinha numa das faces esta inscripçao dedicada
ao deus do Mercado:
GÉNIO
MACELLI
FLAVIVS
VRBICIO
EX VOTO
POSVIT
SACRVM
Versão : — «Flávio Urbicio consagrou, por voto, este monumento
ao génio de Macello».
Em frente á porta principal da Sé descobriu-se, á profundidade
de um metro, por occasião da abertura da rua do mesmo nome,
um lageado muito bem construído e ainda algumas sepulturas e
ossadas humanas junto da rua do Cabido. O padre Torquato de
Azevedo (Ant. Guimarães), referindo-se ao templo de Isis, diz que
este idolo foi destruído por effeito da pregação de S. Pedro de
Rates que logo dedicou o mesmo templo á virgem Nossa Senhora
collocando irelle a sua imagem. No i.° Concilio Bracarense de-
nomina-se a egreja cathedral de Braga — Fanum Sanctae Mariae;
esta denominação de templo, n'aquella epocha, pôde indicar que o
edifício pertenceu á divindade gentílica.
Consta de velhos documentos, considerados authenticos, que esta
egreja fora metropolita da Galliza, destruindo-a os Árabes quando
em 716 se apoderaram de toda a cidade, dois annos depois da
perda da Hespanhapor eífeito da celebre batalha deGuadalete, em
que el-rei D. Rodrigo foi derrotado (11 de novembro de 714).
Em princípios do século XI, cedendo ás instancias do Bispo
de Lugo e Iria, ordenara D. Garcia, rei da Galliza e de Portugal,
a segunda restauração em honra de Santa Maria de Braga, in-
terrompendo-se esta obra e a da reedificação da cidade, por mo-
tivo das luctas travadas entre o mesmo monarcha e seu irmão D.
Sancho II, rei de Leão, que depois a impulsionou, nomeando se-
guidamente Bispo de Braga D. Pedro, promotor solicito dos seus
progressos, como consta do livro Fidei.
Morto D. Sancho, succedeu-lhe no throno D. Affonso que não
tardou em depor o antistite bracarense. Foi reedificada e ampliada
esta egreja pelo Conde D. Henrique, pae do fundador da nossa
monarchia, no anno de no3, presidindo á egreja Bracarense o
successor d'aquelíe ultimo Bispo D. Pedro, o seu primeiro Arce-
bispo S. Geraldo. D'ésta reedificação, a que também pertencia a
capella mor, hoje substituída, apenas restam: — o formoso arco
perfeito ornamentado, com os respectivos fustes e capiteis antigos,
-6y-
que o Arcebispo D. Diogo de Sousa conservou quando lhe soto-
poz o[ de volta de sarapanel que hoje forma a porta principal, an-
tigamente dividida ao centro ; a lateral :
Porta lateral da Sé de Braga
-68
chamada do So/, por ficar da parte do sul, mudada em 1780
quando no seu logar primitivo se construiu o altar de Santa Bar-
bara, um pouco mais acima, como ainda hoje se nota na parede
exterior que defronta com o rocio de Traz da Sé ; o friso que por
este lado assenta sobre modilhoes com figuras exquisitas ; e inte-
riormente os arcos e columnas das três naves, tudo de granito
Nave central da Sé de Braga
~G9-
íino levemente pintado e dourado e hoje coberto a cal, exceptuando
os capiteis que, como pude verificar, foram barbaramente desfei-
tos a picão e substituídos pelos que ora tem, compósitos, de ma-
deira dourada ! Tudo mais é posterior.
Pelo lado norte vê-se, entre a egreja da Misericórdia e a ca-
pella de D. Gonçalo Pereira, um lanço de muralha ameiada com
uma porta ogival do tempo de D. Diogo de Sousa (i5o5-i532)
cujo brasão se acha embebido um pouco a cima do fecho.
Ao lado direito da referida porta, que em 1891 recebeu um
accrescimo de om,o,o á altura, tirando-se-lhe os degraus do lado
de dentro, vê-se numa das pedras esta inscripção romana fra-
gmentada que tem de comprimento im, i5 ; altura 0,44 e a lettra
ora,i2:
CONDITVM. SVB
IMP. CAESARIS
PATRIS. PATRI E
Encontra-se fora da lapide, a seguir á terceira linha, um E
apocrypho. Emilio Hubner, o sábio berlinez, diz que «o resto da
inscripção estava sobre outra pedra do mesmo tamanho da exis-
tente, ou ainda sobre duas», e suppoe que formavam a architrave
de um sacellum. O celebre epigraphista Mommsen completou-a
assim: «Conditum sub divo ex jussu imp. (eratoris) Gaesaris Au-
gusti divi filii patris patri (ae) Ponti fieis Maximi».
Allude a um pequeno templo sem cobertura construído por or-
dem do imperador César Augusto, filho do Divo, sendo pae da
pátria e Pontífice Máximo.
Não é, como alguém presume, o titulo do orago da Sé de
Braga Nossa Senhora da Assumpção.
Em antiquíssimos documentos latinos e ainda na Doação do
Mosteiro de Pombeiro, datada do anno de 1069, e doutra, de uma
herdade, pelo Conde D. Henrique em iio3, encontra-se invaria-
velmente o titulo de Santa Maria de Braga.
São consideráveis no numero e na qualidade as doações, pri-
vilégios e regalias com que os monarebas e Pontífices enriqueceram
esta egreja Cathedral antiga. A Diocese de Lisboa deixou de ser
sua suíFraganea quando el-rei D. João V creou alli o Patriarchado
auetorizado para esse fim pelo Pontífice Clemente XI, aos 7 de
novembro de 1716.
As suas avultadíssimas rendas, que eram divididas por egual
entre as mezas arcebispal e capitular, foram-lhe cerceadas no anno
de 11 65, pelo Arcebispo D. João, o Peculiar, determinando que
aquella pertencessem duas partes e a esta uma.
Para que esta e as demais rendas da Mitra podessem arreca-
dar-se integralmente, obteve D. Diogo de Sousa um alvará data-
— 70 —
do de 1624, privilegiando esta cobrança cono fazenda real, sendo
esse privilegio renovado em 9 de agosto de 1777 pela rainha D. Ma-
ria a seu tio o Arcebispo D. Gaspar de Bragança, que levantara
o sequestro feito pelo seu antecessor D. José a todas as rendas
dos cónegos, encontrando elle menos dc\ moedas em ouro no cai-
xão que então estava em poder dos frades carmelitas. D. José foi
nomeado Arcebispo de Braga por seu irmão el-rei D. João V, a
11 de fevereiro de 1739, em virtude da renuncia do rev. António
dos Reis, da Congregação do Oratório de Lisboa, para o cargo
que el-rei lhe dera de governador do Arcebispado quando, por
motivos ponderosos, ordenara, em 1787, que fossem obrigados a
viver á distancia de 40 legoas de Braga sete cónegos revoltosos.
Antes de me occupar do interior d'este vasto edifício religioso,
vejamos o que nos ofterece de curiosidade histórica toda a sua fa-
chada hoje composta de três estylos architectonicos.
O arco perfeito, a que D. Diogo sotopoz, com as suas armas,
o de sarapanel que forma a porta principal, pertence, como o do
lado sul da egreja, ao primeiro quartel do século xn, e tem ana-
logia com o da antiga porta da egreja de Villar de Frades. E1 co-
mo elle adornado de esculpturas que representam pelicanos, se-
reias e muitos outros animaes mythologicos. Na parte superior tem,
em toda a volta, uma cinta de xadrez, e as columnas são baixas e
delgadas com capiteis de figuras e folhagem longa. A1 sua esquer-
da está cravada na parede uma inscripção gravada em mármore,
memorando a consagração da Archidiocese ao Sagrado Coração
de Jesus, no anno de 188
E' como segue :
wwwMkSDLtMMiTATEDmTÃ EçrtÀAacwDKíags iS.CoRksu
ÍUBFWSl|SDUSPlt|IShrMi1WfftD.ANlONIllfl^PHl»
[RtlI^Ho«TO,Aa(l(ltPliC0?lAcl)0MMI0Rl5BíUtAR,ll\oOUiTlL
MlSmNIMtlWPRIMATIS.aUtADHOcFESTUiy^ERMiNOUMARSíENTlS
ilMUWSTUOiyAA MPENSAMQUL OPUUUA N/WiWff.
toPyfiu(ftMftcPEaptmMRíiMttóORiwnujy\MCHiiitt(Btõs
ikBUaFiB^TlAtPERLMj^lMílWMEriUSjlPONllyMI
Um pouco abaixo d'ella encontra-se, fazendo parte da velha
construcção, esta lapide romana muito gasta do tempo :
_7l —
Versão : — A Aulo Caelio Flac- — 7- r---r^
co, filho de Tito, da tribu Quirina. á g" _ if^^tM
Na extremidade norte está em- £s|\ |- IfJ J y&
bebida outra grande lapide de pe- f^s^W- "J"
dra de Ançã, com esta inscripção J£^|3^*X_ lil
referente á segunda sagraçao da p
Sé, em 28 de julho de i5g2, pelo p\ ll|S|p|
Arcebispo D. fr. Agostinho de Je- t -^< ^^^S^y^^^é
sus, por não apparecerem doeu- \
mentos da sagraçao anterior
»IIKIJS?2Wftòl^l>l«ifl«I»ftMíá!DY0íiWM[RtNII-
iimWMttU(M*Tfcl|TO&ESPiyEHO»ÍI :
JEWIIlÕtLlVí.íEWfMaiMOtttWaWlSilWOOl^WNHT?
WLVrr DE0HUÍllrtA6»tTVBTE KtttV«t»S«EWllttUWWiNin»KMSTD
'LOUNl)Rtl!ltOEIBaílTiLÍ)WU<MliTH|kELItí(t£\SWaOMlfVÍIE$r[íl(ll
ILttEI/Tll,VlliaiiTll,mttLtLMTH,llEÍMlW)l)lWl5tEBtlill-
VAtEtllIWl.lWOWMiWlilíll.tôminftWlliNU.TSiaoaíONFES-
©WEtOWUMfllLÍIM^WWllIillílEINlWUlIlElOlliMíJET^aO
íW(l«!,ETlAfâl»íÉílWfL,WTt#()llWl£n«fflBtaiÍÍÍiiíC
plllUIJÍft|lEMlEUNf()iiAEaLLi!Ã.t(WW[IiíVNtWfll)Elíl8iiE.C
aEítSlNIEIWHIÍiiPíEWIEViSlMfíEVERlilNWlJÍNmWailT.
Desde 1488 a i5oi, o Arcebispo D. Jorge da Gosta II, irmão
do Cardeal de Alpedrinha, mandou construir a abobada de pedra
que forma o pórtico ; e o seu suecessor D. Diogo de Sousa, (i5o5
a i532), collocou lhe no alto, em pequenos baldaquinos, sete esta-
tuas esculpturadas em granito fino, representando o Anjo da Guar-
da, S. Pedro, S. Paulo, S. Martinho, S. Fructuoso, S. Geraldo e
S. Pedro de Rates.
Esta abobada de pedra, com elegantes nervuras, tem do lado
sul um arco ogival rendilhado, egual em tudo aos dois que na
frente ladeiam o da entrada, que é de volta perfeita. Todos qua-
tro estão vedados desde 1 722 com as curiosas grades de ferro ba-
tido e vasado, estylo Renascença, que o Arcebispo D. Diogo de
Sousa, mandou fazer para os arcos da capella-mór, que também
foi feita á sua custa no primeiro quartel do século xvi, e das qua
— 72-
tro que formam o transepto. Foi D. Rodrigo de Moura Telles,
quem ordenou a transferencia, e D. Gaspar de Bragança quem as
fez cortar em [784 assentando-as sobre a balaustrada de granito
que lá se vê.
A expensas da fabrica da Sé, e sendo fabriqueiro o cónego
Bento da Silva Telles, encanou- se no anno de 1739 a agua do cha-
fariz do Paço Archiepiscopal para os dois gigantes da abobada do
pórtico, prestando-se com esta obra um bom serviço ao publico,
que se aproveita d'aquella agua potável. E' de simplíssimo gosto
architectonico a parte superior da fachada, com as respectivas
torres que rematam em dois arcos ogivaes cruzados, semelhando
as cúpulas duas coroas imperiaes.
Entre uma e outra torre, vê-se a estatua da Virgem, com o me-
nino ao collo, esculpturada em granito e collocada dentro de um
nicho com cúpula conchoidal. Sobre este nicho pousa um globo
encimado pela cruz primacial. Esta imagem foi benzida á 1 hora
da tarde de 4 de novembro de 1724 pelo Arcebispo D. Rodrigo de
Moura Telles e acto continuo elevada áquella altura em quanto os
músicos entoavam na egreja a ladainha. Em cada face das torres,
ha duas sineiras bem rasgadas, excepto na da frente da torre sul,
por estas serem reduzidas a uma bastante larga para a collocaçao
do sino grande, tão grande e tão pesado que já lhe calcularam
i65 arrobas. Tem em volta os dizeres seguintes:
IHS MARIA IOZE 1 797
FEITO * SENDO * ARCEBISPO * DESTA * DIOCEZE
O EXf° ER5?0 S°.K D FREI CAETANO BRANDAM
E FABRIQVEIRO O R. JOÃO CAETANO DE OLIVR* BARROS
Esta alteração contribuiu por certo para o deslocamento de al-
gumas pedras que lá se vêem gateadas de ferro. A fachada foi
construída a expensas do Arcebispo D. Rodrigo de Moura Telles
(alma generosa e grande em corpo demasiado pequeno), princi-
Diando os trabalhos em fevereiro de 1723 e terminando em 4 de
novembro do anno immediato.
Sobre as duas janellas quadrilongas existem as armas do refe-
rido Prelado, que aispenaeu com toda a obra 4:400^000 réis e
mais 3:200-^000 réis com os sinos que então ficavam na frente.
As primeiras torres d'este velho edifício, que por certo datavam
da reedificação feita pelo Conde D. Henrique, cederam, como ou-
tras construcções robustas da província, ao impulso violento de um
tremor de terra, no anno de 1 1 38- Na fachada da antiquíssima ca-
pella de S. Lourenço da Ordem, sita nos limites da próxima fre-
guezia de Dume, existe, embebida á direita da porta, uma gran-
-73-
de pedra com desenho em relevo representando a antecedente
frontaria da Sé que fora feita a expensas de D. Diogo de Sousa.
A actual egreja da Sé, toda pavimentada de granito e com va-
rias sepulturas brazonadas, oc-
cultas sob os taburnos de ma-
deira que as cobrem d'um e ou-
tro lado da nave central, mede
desde o arco cruzeiro á soleira
da porta principal, 53m, 20 por
i8m,io de largo no corpo.
Por occasião das obras de
1780 accrescentaram-se os dois
altares de S. Bento e Santa Bar-
bara construídos nas duas anti-
gas portas de communicaçao
com o claustro e rocio de Traz
da Sé, abrindo se então as
actuaes, alguns metros abaixo,
junto das paredes sobre que se
erguem as torres. No alto da
que dá para os claustros appa-
receu em setembro de 1722,
quando se caiava a egreja, uma
pedra quadrada cheia de íet-
tras, como diz a Gaveta de Lis-
Porta principal da Sé de Braga
boa, «com muitas abreviações», as quaes Pedro da Cunha Souto
Maior, alcaide-mór, mandou limpar e copiar do seguinte modo :
ERIT
PRESVLIS HVIVS, SECVLS
MEMORANDA FVTVRIS \ ■
SEDIS ET ANTIQVI MAGANIMOS PIE
PRIMATES VETERES REPAR Al QV1S MAGIOR CVI
RVGASO MATERI ANNO SÍNTETER VOE
ERA • I ; • QVINGENTESS1MA PRIMA •
Essa pedra desappareceu por occasião da obra da nova porta,
ignorando-se o paradeiro d'ella. Parece que se refere a melhora-
mentos feitos na Sé pelo Bispo do anno de 463, que era Valério I.
A commissão de obras de 1780 legou-nos de si tristíssima me-
moria. A ella se deve o estucamento das naves, cujos tectos eram
de madeira de cedro, como ainda se pode ver junto do anteparo,
onde se lêem os dizeres seguintes :
S. PETRVS RATENSIS ARCHIEPISCOPVS BRACHARhNSIS.
Para este forro das três naves e do transepto mandou D. Diogo
-74-
de Sousa cortar a madeira no souto que então havia desde o cas-
tello e campo de Santa Anna ao largo de S. João.
Actualmente ha no corpo da egreja, lado do Evangelho, os
altares de Nossa Senhora da Conceição, de Nossa Senhora do
Loreto, de S. José e de S. Bento. No lado da Epistola: — S. João
Baptista, S. Sebastião, S. Rodrigo e Santa Barbara, todos com
quadros a óleo devidos ao pincel de João Glamma Stroberle, pin-
tor da eschola romana, o qual nasceu em Lisboa no anno de 1708.
Nos intervallos dos altares foram collocadas em 1780 as estatuas
dos Apóstolos e Doutores da egreja, tamanho natural, represen-
tando S. Paulo, S. Thiago Maior, S. Thomé, S. Filippe, S. Ma-
theus, S. Mathias, Santo Ambrósio, S. Jeronymo, S. Pedro, S.
André, S. João, S. Thiago Menor, S. Bartholomeu, S. Simão,
S. Gregório Papa e S. Agostinho.
A nave central é composta de doze arcos, tendo os quatro
últimos interceptados pelo coro que o Cabido de 1787 mandou
fazer, enriquecendo-o em 1757 com as cadeiras de pau preto
dourado. Os órgãos actuaes, que substituíram os anteriores fei-
tos a expensas de D. Diogo de Sousa, construíram se em 1737
(lado do Evangelho) e 1738 (lado da Epistola), sendo seu auctor
o religioso Franciscano F. R. Simon Fontanus Gallencianus. No
alto, sobre as estatuas da Fé, Esperança, Caridade, ReligiãovCon-
cordia e Fortaleza, vê-se uma águia com estes dizeres numa fita :
qvis vidit hvic e outra águia com estes: qvis avdivit vnqvam
SÍMILE? TALE ?
Referem-se á magestade da obra : Quem viu aqui semelhante ?
Quem ouviu jamais egual?
Encostados ás columnas do arco primeiro d'esta nave, existem
dois púlpitos de mármore rosado, sendo o da Epistola obra de
D. fr. Agostinho de Jesus e o do Evangelho de D. Rodrigo de
Moura Telles, como o indicam os respectivos escudos.
A' direita de quem entra vê-se, dentro de um arco aberto na
parede, o precioso tumulo de cobre dourado, que encerra os res-
tos mortaes do infante D. Aífonso, filho primogénito de el-rei
D. João I, que, tendo nascido em Santarém a 3o de julho de 1390,
falleceu em Braga a 22 de dezembro de 1400, com 10 anno- de
edade, por occasião da estada aqui de seu augusto pae, sepultan-
do-se na Sé «entre as duas columnas que dividem a nave do meio
da do Evangelho, começando do cruzeiro», como diz D. Rodrigo
da Cunha em principio do século xvn. (Vide gravura a pag. j5).
Annos depois foi trasladado para o referido tumulo de cobre
que sua irmã a infanta D. Izabei, casada em 1429 com Filippe V,
(o Bom) Duque de Borgonha e Conde de Flandres e de Henao
75-
:
Tumulo de cobre dourado (Phot. do sr. João San Romão)
(Hainaut) lhe mandou para Braga, collocando-se «detráz da co-
lumna a que arrima o altar de Nossa Senhora do Rozario, por
baixo do púlpito, e defronte de onde primeiro esteve enterrado».
Quando seria d'alli trasladado para o arco onde se encontra ?
Provavelmente por occasião das grandes obras de 1780. Esjá es-
tendida sobre o tumulo, em tamanho natural, a figura' do infante
com as mãos cruzadas sobre o peito. Falta-lhe a perna direita,
roubada como os quatro leões que sustentavam o tumulo, o ca-
— 7b —
chorro que a figura tinha aos pés e os dois anjos que se viam em
adoração aos lados da cabeça ! O docel que cobre o tumulo é
sustentado por quatro columnas lavradas e tem ao centro as armas
de Portugal, e não se lhe descobrem vestígios do outro escudo de
flores de lis. D. Rodrigo da Cunha achou tão gasto do tempo o
lettreiro que cercava o tumulo, que não lhe foi possível lel-o.
E' de suppor que dissesse: «Aqui jaz o infante D. Aífonso de
Portugal, a quem Deus perdoe ; filho do nobre rei D. João de
Portugal, o primeiro, e da rainha D. Filippa ; falleceu aos 22 de
dezembro de 1400».
O que porém unicamente lhe resta numa linha de caracteres go-
thicos que lhe toma a frente e um dos lados, é o seguinte que fiel-
mente copiei:
r AQVI YAZ O YNFANTE DON AFONSO
DE PORTVGAL A QVEM DE FYLHO
DO NOBRE REY DOM YOAN DE PORTVGAL
Ao lado esquerdo fica a pia baptismal, ricamente esculpturada
em pedra de Anca, representando na base dois leões a devorar
creanças. Aesculptura deve ser quinhentista. Aporta que junto d'ella
communica com o claustro,
tem a servir de soleira a pe-
dra tumular de D. Fernan-
do da Guerra, neto de el-
rei D. Pedro I por bastar-
dia, fallecido a 20 de setem-
bro de 1467, e sepultado na
capella de S. Geraldo, que
elle reedificara, mandando
collocar n'ella o tumulo que
encerra os restos veneran-
dos do santo.
Na frente d' este sarco-
phago lê-se :
BEATI
GERALDI
CORPUS
A sepultura de D. Fer-
nando elevava-se om,qo aci-
ma do pavimento, e a pe-
dra que a cobria tinha em
relevo a estatua jacente do
Prelado, em pontifical, e a
toda a volta este lettreiro
gothico :
— // —
AQVI JAZ O MVITO NOBRE SENHOR
D- FERNANDO ARCEBISPO DE BRAGA E
BISNETO DELREI D- PEDRO- E FINOV AOS
XXVI DE SETEMBRO DE MCCCCLXVII -
O Arcebispo D. fr. Agostinho de Castro, trasladando para a
referida capella de S. Geraldo os ossos dos seus predecessores
D. Diogo da Silva e D. Manuel de Sousa, mandou cortar o tu-
mulo alinhando a tampa com o ladrilho!
Reedificando-se pela terceira vez a capella no anno de 1712,
foi a referida pedra applicada ao capeamento do altar que era de
granito; e demolido este em dezembro de 1780, data das grandes
obras, para ser substituído por outro de madeira, foi logo nos
principios do anno immediato menospresada, virando-se para a
terra a estatua!
Por privilegio datado de 1443, o infante D. Pedro, regente do
Reino, coutou ao referido Arcebispo «as perdizes com seus ovos,
condemnando quem as caçasse por cada perdigão, perdiz ou ovo,
vinte reaes brancos; e que á distancia d^ima légua, meia acima
da ponte de Guimarães e meia abaixo, ninguém pescasse no rio
Este, sob pena de pagar por cada peixe 10 reaes brancos».
E' obra de D. João de Sousa, Arcebispo que foi de Braga
desde os annos de 1696 a 1703, a actual sacristia onde se guarda
o thesouro. Tem ao centro, em frente do primoroso relicário, a
sua sepultura que elle próprio mandou fazer com a seguinte ins-
cripção gravada em mármore:
S DE D • JOAM DE
SOUSA • X • DO NOME
E ■ CXI -EM N° ARCB°
PRIMAS E SENHOR
DE BRAGA
No mesmo sitio esteve primitivamente a capella fundada pelo
Arcebispo D. João Martins de Soalhães, fallecido em i325 e se-
pultado n'ella a seu pedido. D. Diogo de Sousa, vendo que a
sacristia da Sé, então do lado norte, era acanhada e muito falta
de luz, estabeleceu-a no anno de i5ii onde ora é, recolhendo os
ossos do fundador n'um sarcophago de pedra que fez embeber
na parede da referida capella com estes dizeres na frente:
HVC TRANSLATA SVNT OSSA
DNI 10ANNIS DE SOALHÃES
ARCHIEPISCOPI BRACHARENSIS
ANNO SALVTIS I 5 I I
-Tê-
Com a reedificação da capclla tudo isto desappareceu. Con-
serva-se alli o thesouro que possue bastantes preciosidades, como
por exemplo:
— Uma collecção de doze quadros em papel representando os
bustos dos Apóstolos, magistralmente desenhados, sendo dignos
de especial menção os de S. Matheus e S. João. Na extremidade
inferior d'estes quadros lê-se, em caracteres miúdos: — Johann
Baptista Pia\\etta Venetus delineavit. Johann Loren\ Haid Scul-
psit.
Outro quadro em papel representando o nascimento de Ghristo.
Tem a marca : — London — Alex. í ran Haecken feci.
— Os pequenos sapatos que D. Rodrigo de Moura Telles
usava nas solemnidades da Sé, medindo ora,io de altura no tacão
e om,i9 de comprimento!
— A cabeça de S. Fortunato, com alguns ossos, e estes dize-
res no cofre:
SACRVM CAPVT RESTAVRATVM
CV PAVCIS OSSIBVS S • FORTVNATI • M •
— A de S. Gandida:
SACRVM CAPVT RESTAVRATVM
CV PAVCIS OSSIBVS S ■ CANDIDjE • M •
— Uma custodia de prata dourada, com profusa cravação de
brilhantes avaliados em vinte mil cruzados.
— O pequeno cálice de prata dourada, denominado de S. Ge-
raldo, com esmalte e lavores, copa hemispherica e estes dizeres
na base em duas linhas circulares:'
-f-IN NNE DNI MENENDUS GUNDI SALUI ,
-f ET TUDA DOM NA SUM •
Este cálice, que mede om,i i de altura, foi offerecido pelo Conde
da Galliza Menendo Gonçalves que também fez restituir á egreja
bracarense todos os seus bens até então invadidos. Guarda-se num
cofre cylindrico de marfim que figurou na exposição retrospectiva
de arte ornamental, de Lisboa, em 1882, achando-se assim des-
cnpto no respectivo cathalogo:
«Cofre hispano-arabe de marfim. Altura om,i9. E' de forma
cylindrica; a tampa convexa com ferragens de cobre dourado.
Em volta da tampa uma inscripção árabe. Ornamentação em
baixo-relevo representado fitas entrelaçadas, arcos de volta de
ferradura, figuras humanas, aves e outros animaes». (Vide gravu-
ra a pag. ygj.
79
Cálice de S. Geraldo e o respectivo cofre
E1 esta a inscripção:
t\z\ LL -01
*jyU 1 LjJ' ^jJ J^ *Uj ^1 U^ *iM
No/lrc/zfo/. Portug., vol. i, pag. 273 e 11, 204, o sr. David Lopes
traduziu-a do seguinte modo: — Em nome de Deus. A benção de
Deus, felicidade e fortuna sejam com o hágibe Seifadaula — glori-
fique-o Deus! — por ter mandado fazer esta obra ao seu servi-
dor amirita.
— «Báculo de cobre dourado. Altura om,24. A crossa representa
uma serpe com a cabeça atravessada pela cruz». Denomina-se de
Santo Ovidio por constar que appareceu no seu sepulchro.
— «Cálix de prata dourada com sua patena. Altura om,33.
Copa hemispherica adornada com seis figuras de anjos susten-
tando os emblemas da Paixão, e na parte inferior outras seis
sustentando outros tantos tintinabulos. O nó decorado com arca-
— 8o —
nas gothicas, tem debaixo de baldaquinos as estatuetas de seis
Apóstolos. Base dividida em doze gomos, dos quaes os maiores
têm em baixo-relevo as figuras de Apóstolos, excepto um, que
tem um escudo com as armas do arcebispo D. Diogo de Sousa,
e a data de i5oo,. Nos seis gomos menores, ornatos esmaltados.
Entre a copa e o nó, e entre este e a base ha dois anneis com o
mesmo género de esmalte. No bordo exterior da copa, lê-se: hic
est cálix sangvinis mei novi et éter • A patena tem no meio da face
inferior a figura do cordeiro esmaltada-, na face superior S. João
Baptista; á roda em caracteres gothicos: do vobis pacem relinco
vo pacem meam- Fins do século xv ou princípios do século xvi».
— Dois cofres de prata dourada em que se guardam as cabe-
ças de S. Martinho de Dume e S. Thiago Interciso.
— Outro cofre de prata dourada contendo as reliquias a que
se refere a lapide da sagração. Tem na frente quatro estatuetas
de santos da Ordem franciscana.
— Um relicário de prata dourada, elegante e bem lavrado,
contendo parte do santo lenho. Tem na frente onze diamantes e
na base uma pequenina placa com as armas do Arcebispo D. Ro-
drigo de Moura Telles, que o oífereceu, e estes dizeres em volta;
RODER • ARCH • PRIMAS • HISPAN •
— Um cálice de prata dourada offerecido por el-rei D. Filippe.
Na base tem as armas d'este monarcha, e em toda a volta esta
inscripçao com pontos triangulares :
ELREI • FELIPE • DEV ■ ESTE • CALEZ • AESTA • CASA
— Uma cruz de prata dourada com os dizeres seguintes :
SALVE CRVZ PRETIOSA QVAE IN C0RP0RE X DIC
— Uma estatua de prata representando Nossa Senhora com o
menino. O Arcebispo D. Lourenço (137 1 -1397) usou-a sobre o
murrião, em logar de pluma quando na memorável batalha de
Aljubarrota luctava com denodo ao lado de el-rei D. João I.
Vae na gravura que representa o corpo incorrupto do Prelado-
guerreiro.
Assenta sobre uma peanha do mesmo metal feita em i653,
como se lê n'esta inscripçao gravada na face posterior :
DON IGNACIO DEA PRIMAS E M8.L PR t DE
MELLO MANDARÃO FAZER ESTA SNAR SENDO
JUIZES NO ANNO DE l653.
— 81 —
A palavra Senhora deve ser substituída por Pecinha. O estylo
da esculptura da imagem e a circumstancia de não poder d'este
modo applicar-se ao murrião denunciam o erro do gravador.
Esta estatua, a de Santo António, da Senhora da Abbadia e
de S. Nicolau, todas quatro de prata, escaparam milagrosamente
á rapacidade dos invasores francezes.
— Frontal com sanefa, bordado a matiz e ouro em alto relevo,
representando, nos quatro retábulos que as três faxas dividem, os
doze Apóstolos primorosamente bordados. Veio da índia e oífere-
ceu-o á Sé el-rei D. Manuel. Faltam-lhe os coraes e as pedras
preciosas que o ornavam em grande quantidade. Existe, da mes-
ma procedência, a casula, o manipulo e a estola, representando o
desenho d'este bordado : folhagens, conchas, estrellas, pássaros e
flores.
— Dois pontificaes completos, branco e vermelho, industria
franceza, offerecidos pelo Arcebispo D. Gaspar de Bragança
i [758-89;.
— Frontal e paramento completo, bordado a ouro em relevo,
industria italiana.
— Paramento completo, bordado a ouro no Recolhimento da
Tamanca, em Braga, e offerecido por D. fr. Caetano Brandão.
— Outro paramento completo, vermelho, que pertenceu ao mos-
teiro de Tibães, também bordado na índia. Apenas se faz uso
d'elle no dia de S. Geraldo.
Além doestes objectos ha ainda dois pares de jarroes da índia,
muito apreciáveis, numerosas reliquias e as pratas do serviço de
pontifical que são muitas e valiosas.
Nas duas extremidades do transepto da egreja estão os altares
do Senhor da Agonia (Evangelho) com a urna que encerra o
corpo de Santo Ovidio, o Bispo bracarense a quem Jéronymo Ro-
man dedica os seguintes versos por ter baptisado e preservado da
morte as nove filhas de C. Atilio :
Gaude Sacerdos Ovidi
Tu bracharencis Pontifex,
Qui meruisti filias
Tot ad poios transmittere.
e o da Senhora das Angustias (Epistola) com a urna que encerra
o corpo de S. Crescencio.
Aos lados da capella-mór ha quatro capellas sendo a primeira
actualmente consagrada ao Coração de Jesus e guardando-se n'ella
os ossos de S. Thiago Interciso, para alli trasladados do thesouro
pelo Arcebispo D. fr. Agostinho de Castro.
82
A urna, que primitivamente apresentava esta inscripção :
AQVI ESTÁ O CORPO DE SANT-IAGO INTERCISO, PERSIANO DE NAÇÃO,
QVE DE ROMA TROVXE PÊRA ESTA S™ EGRE.TA DE BRAGA O ARCEB •
D • MAVRICIO, PELOS ANNOS DE I J IO • E NO DA ERA DO SENHOR
1606, O COLLOCOV NESTE TVMVLO O ARC • D • FR • AGOSTINHO
DE JESV DE BOA MEMORIA, NO SYNODO QVE CELEBROU NO MEZ
DE OVTVBRO DO DITO ANNO, ESTANDO TÉ ENTÃO NO THESOVRO
DESTA SE, NO COFRE GRANDE DAS RELIQVIAS.
tem agora apenas os dizeres seguintes :
OSSA
BEATI JACOB I
INTERC1SI
A segunda capella é dedicada ao Sacramento. O frontal do
Frontal do altar do Sacramento
seu altar compoe-se de uma só peça de riquíssima talha, repre-
sentando num primoroso figurado em relevo a Sagrada Eucha-
ristia condusida pelo Vigário de Christo em um carro triumphal
que arrasta presos muitos hereges e despedaça outros sob as ro-
das. Na frente caminham os crentes enthusiasmados, empunhando
palmas e tocando trombetas. Ao centro tem estes dizeres : eccle-
SIA PER S . EUCHARISTIAM TR1UMPHANS .
A terceira tem a invocação de S. Pedro de Rates. No seu altar
ha um cofre de madeira a vestir outro de pedra onde em tempo
se gravou a inscripção :
—83-
AQVl JAZ O CORPO DE S • PEDRO MARTYR
DIC1PVLO DO APOSTOLO S • THIAGO TRESLADADO
DA EGREJA DE RATES POR D • BALTAZAR LIMPO
ARCEBISPO DE BRAGA A ESTA SEPVLTVRA QVE SE
LHE EEZ PÊRA MAIOR VENERAÇÃO E POR SER O
PRIMEIRO PRELADO DESTA EGREJA AOS 17 DE
OVTVBRO DE I 552.
Na frente do cofre de madeira lê-se :
BEATI
PETRl DE RATES
CORPVS
Os azulejos desta capella e, certamente, os das demais da Sé,
foram pintados por António de Oliveira Bernardes, cujo nome se
acha no lado esquerdo, e no direito um breve de altar privilegiado
para todos os dias, concedido pelo Papa Gregório XIII a D. fr.
Bartholomeu dos Martyres, no anno de ib-jb.
A quarta é da invocação de Nossa Senhora da Roza.
Tem também sobre o altar um cofre de madeira a vestir ou-
*ro de pedra onde esteve esta inscripção :
AQVI ESTÁ O CORPO DE S • MARTINHO
ARCEBISPO QUE FOI DESTA SANTA EGREJA
DE BRAGA PELOS ANNOS DE 5y4 O QVAL
O ARCEBISPO D . IR . AGOSTINHO DE JESVS
DE BOA MEMORIA NO SYNODO QVE CEI.EBROV
NO MEZ DE OVTVBRO DO ANNO DE 1606 TRÊS
LADOV DA EGREJA DE DVME NA QVAL PRIMEIRO
FOI BISPO E NELLA ESTAVA SEPVLTADO E O
COLLOCOV NESTE TVMVLO .
O cofre de madeira apenas diz :
S . MART . DVMIENS .
ARCHIEP . BRACH .
SACRA OSSA
8-4-
Exterior da Capella-mór da Sé
— 85 —
Exteriormente a capella-mor da Sé recommenda-se pela ele-
gância da esculptura, correcção e pureza do estylo architectonico.
O Arcebispo D. Diogo de Sousa, que occupou com extraordinário
zelo e inexcedivel patriotismo a cadeira archiepiscopal de Braga
desde i5o5 a 1 532, vendo prestes a cair em ruinas todo o edifício
da sua Sé Cathedral, e muito particularmente a capella-mor con-
struída a expensas do Conde D. Henrique, illustre progenitor do
nosso primeiro monarcha D. Afíbnso Henriques, ordenou o corte
de madeiras no souto que então occupava todo o espaço compre-
hendido entre o actual campo de Santa Anna e o largo fronteiro
á egreja parochial de S. João, dando principio á obra de repara-
ção no corpo do vasto templo e reconstruindo a capella mor, cujo
trabalho correu sob a direcção de artistas Biscainhos, moradores
numa das nossas ruas que ainda os faz lembrados. Os contrafor-
tes ornados de columnas rematam em elegantes coruchéos a que
se associam os do formoso parapeito rendilhado que coroa em
toda a volta o edifício por sobre a cornija bellamente ornamen-
tada. Tem três grandes janellas ogivaes, e por baixo da do cen-
tro uma imagem de Nossa Senhora do Leite esculpturada em pe-
dra de Ançã, com o escudo de D. Diogo de Sousa na peanha e á
sua esquerda, e o de el-rei D. Manuel á direita, repetidos ambos
no alto do edifício e no interior da mesma capella-mor, provavel-
mente para D. Diogo testemunhar ao monarcha a muita conside-
ração que lhe votava, e á qual el-rei correspondia, como nos fins
da vida lh'o demonstrara nomeando-o um dos seus testamentei-
ros. Ao rés do chão abriram posteriormente o arco onde se exhi-
be durante a semana santa um dos passos da via sacra. O cemi-
tério que D. Diogo construirá junto da Sé, também certamente
occupou esta rua onde em 1867 foi encontrada uma sepultura com
alguns ossos humanos.
Esta capella-mor mede interiormente 10, 5(5 de comprido por
'"i.yS de largo. A abobada de pedra, coberta de nervuras, está
pintada a fingir o que é, si vera est fama, para evitar o desagra-
dável elfeito do granito gasto e falto de homogeneidade na cor !
O baldaquino de madeira, na abside, fez-se em tempo do Ar-
cebispo D. João Chrisostomo de Amorim Pessoa. Tem no alto as
suas armas. Collocaram alli a preciosa imagem da Virgem e con-
serva-se ainda o altar mor, tudo de pedra de Ançã como o reta-
bolo que tivera dourado e com estatuas, considerado um dos me-
lhores da Hespanha, e do qual hoje restam alguns fragmentos
numa loja escura do claustro. Na demolição effectuada em tempo
de D. Gaspar de Bragança appareceram relíquias de S. Victor,
S. Alexandre e S. Marianno.
86-
Altar mor da Sé
O altar-mór, que representa em baixorelevo Jesus Christo e os
Apóstolos aos pares, foi cortado no lado direito... para que se
não julgue que o reinado da insensatez é exclusivo de uma ou de
outra epocha ! Provavelmente este vandalismo data da reconstruc-
çao da capella-mór, pois no thesouro ainda hoje se conserva o já
citado frontal que el-rei D. Manuel mandou comprar na índia com
as dimensões exactas do mesmo altar cortado, para o qual o olfe-
receu. A facear com este altar-mór, lado do Evangelho, esteve
desde 1 5 1 3 até maio de 1877, o tumulo em que o Arcebispo.
D. Diogo de Sousa mandara encerrar os restos mortaes do Con-
de D. Henrique, fallecido em Astorga no anno de 11 12 e sepul-
tado a seu pedido na Sé de Braga, assim como os da rainha D.
Thereza, fallecida em Coimbra no i.° de novembro de iiSo.
transportada para aqui por ordem de seu filho D. Affonso Henri-
ques, e ambos primeiramente sepultados na capella sagrada (on-
de presentemente se encontram de regresso em dois túmulos) man-
dada construir pelo referido seu filho iVaquelle sitio que servira de
cemitério aos reis suevos catholieos. A inscripção que D. Diogo
mandou gravar no tumulo é como segue :
D. O. M.
DOMINO HENR1CO HVNGARORVM REGIS
FILIO PORTVGALL1AE COM1T1 DOMINVS
DIEGVS SOVSA ARCH1EP VIRO CLARÍSSIMO
AQVO PORTVGALLIAE REGES ESSE REGNVMQ
ACCEPISSE CONSTA T DE REPVBLICA CHRISTIANA
PATRÍAQ SVA OPTIME MERENTI POSVIT ANN.
A CH RI ST NA MDXIIL
«A Deus de toda a bondade e grandeza. D. Diogo de Sousa
Arcebispo, levantou esta sepultura ao Conde D. Henrique, filho de
el-rei da Hungria e Conde de Portugal, no qual este reino e seus
reis tiveram principio. Anno de i5i3».
-87-
A 28 de novembro de 1598 o Arcebispo D. fr. Agostinho de
Jesus fez abrir este tumulo na presença dos cónegos, cirurgiões,
etc, sendo então encontrados os restos de dois cadáveres dos sexos
masculino e feminino, envoltos num grande panno de damasco.
Os ossos femininos de D. Thereza, foram separados, depositam
do-se no tumulo que D. Diogo de Sousa tinha destinado para sua
sepultura collocando-o do lado da Epistola sem comtudo o apro-
veitar, e gravou-se-lhe a inscnpção :
d. o. M.
REGINAE TARESIAÉ ALFOXS1 CASTELLAE
ET LEONIS REGIS IMPERATORIS NVNCVPAT1
FILIAE COMITIS HENRIG." VXORI DIDACVS A SOVSA
ARCHIEPlsdbPVS BRACHAR HISP PRIMAS MP AN.
A CHRISTO NATO MDXIII
«A Deus de toda a bondade e grandeza. D. Diogo de Sousa,
Arcebispo de Braga, Primaz das Hespanhas, levantou esta sepul-
tura á rainha D. Thereza, filha de L). Aífonso rei de Castella e
Leão, chamado o imperador, mulher do Conde D. Henrique. No
anno de 1 5 1 3 » .
Em maio de 1877 foram estes túmulos, de i'",6o de comprido,
removidos para a capella dos reis, assim denominada por ser
construída a expensas de D. Aífonso Henriques sob a invocação
de S. Thomaz e posteriormente de S. Lucas, onde se conservam
com as estatuas jacentes sobre a tampa.
A capella-mór da Sé foi noutros tempos sepultura de homens
notáveis como os Condes Alvito Nunes, ferido quando os Nor-
mandos aportaram com i5o navios a Villa do Conde no anno de
»)68 ; e Menendo Gonçalves, offerente do sino e cálice denomina-
dos de S. Geraldo. No dia 4 de junho de 1756 também aqui foi
sepultado o Arcebispo D. José, filho de el-rei D. Pedro II, como
o indica a inscripção gravada em campa de mármore. As duas.
grandes lâmpadas que pendem da abobada, e que teem a data de
181 5, vieram do convento de Tibães em 18^4, por occasião da
extincção das Ordens religiosas. E' da mesma procedência a ban-
queta e o pequeno órgão que defronta com o coreto nos segundos
arcos da nave central. Este órgão e coreto foram mudados de en-
tre os primeiros arcos, onde cada um assentava sobre quatro co-
lumnas de que ainda hoje ha signaes nos taburnos que cobrem o
pavimento, em tempo de D. João Chrisostomo de Amorim Pessoa.
O claustro hoje ajardinado foi cemitério da Misericórdia até
16 de outubro de 1724 em que o Arcebispo D. Rodrigo de Mou-
ra Telles o inutilisou ordenando a remoção das ossadas para a
-88 —
adro da egreja de S. João do Souto. Datam d'essa epocha as
actuaes arcadas, só agora (desde abril de 1899 a novembro de
1900), fechadas de abobada de tijolo e rematadas por uma balaus-
trada de cimento. O fingimento da abobada, a imitar granito, é ma-
ravilhoso. Alem da capella dos reis, a que já me referi, tem este
claustro mais a de Nossa Senhora da Piedade ou de Jesus, fun-
dada por D. Diogo de Sousa, em i5i3, para sua sepultura, como
se deprehende da seguinte inscripção:
ESTA CAPELA MANDOV FAZER
O ARCEBPO DO D I.° DE SOVSA PÊRA
SVA SEPVLTVRA E DE SEVS IRMÃOS
AS PESSOAS CAPITVLARES DESTA E
GRE1A QVE SE NELA QVISERE LAN
CAR-FOI FEITA NA ERA DE I 5 I 3.
Km arco aberto na parede do lado da Epistola acha-se o tu-
mulo deste grande Prelado com a sua estatua jacente, de ponti-
fical, e na frente esta inscripção:
AftWZD0MÕ!3CV0I)Ei0VSA.fii!(Ee"P().eiííltóJILIi0l)EI0ío
ROIZt£WiC0íEUK.$(lS'.DtFlGtflliO.£P0FEl|fOtJÍÍ)
EDED0WA8MaD«!LCSWíaHE(<t'rtALtLHtl.l)uw
WA0.)EurMMraoV.?iJREgWXAOORMltyA0E[?APA
MlOAlHf D^RSW MENFCIA [EUWOTIJNWU^Dtí
0.FEI EOUpa MJMORDA Ml MHA. DM/i MARIÍW AMOl m
mmjm wi m dih ia n> m mosan do e e i ri i
|Ui)MJ()ÍO.TfRCEIIlDflFEZfflPELAÕ.MOaWiiMNHÁDONi\
CATfRlNAiUAMOLHER .OÚVLFLZ ESTAUVEL N PÊRA
W<.iEPl/LTV(UlW\l£OLX)l[-.II.JINN0itEMElÉ0JI
Xyiyi.PIftSDOMESDElVItfHOPA ERUDEI 53 7*
ETRE5LADM10 DOME!lT(APRLA MMXIi DEFLv r do
AMO DE lílZANNftJWDDADMIlH ÍHLZa<5MORlvlANí)EL
'lN"DtMATT0^ZACAR00ZO
Do lado do Evangelho, em logar correspondente, está o tu-
mulo de D. fr. Caetano Brandão. Ao centro tem a sepultura do
-8Q-
chorado Arcebispo D. António José de Freitas Honorato, falle-
cido em cheiro de santidade, a 28 de dezembro de 180,8, como se
prova com as numerosas offerendas dos devotos.
A capella denomina-se Misericórdia velha por aqui ter sido
fundada esta santa instituição.
As capellas de Nossa Senhora do Livramento, de Santa Lu-
zia, Santa Catharina e Senhor da Paciência, e a já referida ca-
pella dos reis onde se venera o corpo incorrupto do Arcebispo D.
Lourenço que a 8 de agosto de i3é)i fez testamento instituindo
Corpo incorrupto do Arcebispo D. Lourenço
aqui uma capella onde mandou construir o seu tumulo com es-
tatua jacente, de pontifical, a que elle próprio fez um golpe na
face com a sua espada. Esse tumulo ja não existe. No testa-
mento ordenou a seu filho Vasco Lourenço «q pêra esta capella
lhe trouxesse seu corpo, em caso q morresse fora de Braga nestes
Reynos, nos de Castella, Leão, Navarra, Aragão,, Fraca, Fra-
des, Allemanha, Itália, Toscana, ou Roma». Tem no tumulo esta
inscripção:
AQUI JAZ D. LOURENÇO NATURAL DA LOURINHAM
ARCEBISPO DE BRAGA A Q FOI PROMOVIDO NA
ERA DE 141 I, E MORREU NA ERA DE 1436
Ha ainda a communicar com este o claustro de S. Geraldo ou
S. Amaro, com seis capellas reformadas em 1766, dedicadas ao
— 9°
Espirito Santo, Senhora da Boa Memoria, Santo Amaro, Senhor
da Piedade ou S. Pedro Martyr, que tem ao lado um coro deno
minado dos morcegos, onde diariamente resam dois minoristas que
percebem 8o réis, o dobro do que o instituidor estabeleceu, por
então serem 4 os coreiros; de Santo António e das Almas com
esta inscripção em lamina de metal:
S0& PERPETVOS POILA MMMNNAFR5
KDEVOESMlROEIVWEHVPlWo
DE25NULRSIflMIFRAR\ABSAMTiS
Sl^OSACRWALUTO EÇMMtO MIL
^&BNROKdNKK SNMUiMttaMO
©STASANTASLt ÔQVAKi SAMOBRICA
DASAHftNDMlDiZtESJtSNlASfON-
FRHRItóNOFINlô(AOftMDftSMim&fê
MEÃS DOAtOENS AMMO /é2 S
No alto da parede interior da capella da Boa Memoria, lado
esquerdo, pude ler, por indicação do digníssimo sa:ristão-mór da
Sé o sr. António Maria Lopes da Silva, esta inscripção lapidar em
caracteres gothicos, embebida junto de um arco de pedra que se
dirigia da parede da Gathedral para o referido claustro :
ESTE ARCO : MAND0V :
FASER : LOPO AFONCO \
CÓNEGO : DE BRAGA :
ERA : MCCCC9VI.
Ao fundo da capella de S. Geraldo, que tem ao lado esquerda
da porta principal uma imagem de S. Nicolau toscamente escul-
pturada em granito mas com a qual o povo tem grande devoção.
— 9i —
depositando ao seu lado promessas que faz a Santo Ovidio, pois
não acredita que seja S. Nicolau, ha na parede esta lapide refe-
rente á dotação de 240:000 réis, feita em 1606 pelo cónego Fran-
cisco da Costa para uma capella de 5 capellães que resem em
coro e celebrem diariamente missa em louvor da Conceição da
Virgem :
AMI.VI Fttlfcto GOSTA -
CAN0NtCVS-8RACH.AVCTJRM.D-D.FR
AV&.DEÍW.ARe.PRiWl.INSTmiTmil
NdAÉMWÕIC(sNSPTÍ0NI5B.M.,?/lNH\C
ecC.OiVi GERALDI DIVJNVM OFF. ÍN
CHOWCANTENTPSEXPRO
PR1ÍS 80N1S.B0TAVÍT EORVMELLU
TIOADADMiNÍSTRATORES ABEO
0RDlNAT©ÍN SOliOVM SPECTM.
Na Hist. Eccl. de 'Braga, por D. Rodrigo da Cunha (vol. II,
pag. i3i), lê se o seguinte a propósito de ter sido sepultado n'esta
capella o famigerado alcaide-mór de Coimbra D. Martim de Frei-
tas, fallecido em Braga quando se dirigia a Compostella: «Jazia
na capella de S. Geraldo, um pouco afastado da sepultura do
santo, dentro na parede d'aquelle mesmo lado. Tinha a pedra que
fechava o seu moimento três flores de lis. Mudaram-se os seus
ossos, quando em tempo do arcebispo D. Frei Agostinho de Cas-
tro a capella se azulejou, pêra outra sepultura posta no chão ao
pé da antiga».
Ao centro, próximo do altar, vê-se a sepultura rasa do Arce-
bispo D. Rodrigo de Moura Telles, e na sacristia um bello quadro
em tela, com o retrato do alludido Prelado ao centro, e em volta
-92-
cTelle entre flores, os desenhos de quantas egrejas, conventos e
demais edifícios mandou construir e restaurar: São os seguin-
tes : Egreja de Santa Quitéria, convento de S. Bento de Vianna,
Sanctuario da Senhora da Apparecida, Paço de Braga, Egreja dos
Terceiros, Penha de França, S. Vicente, Bom Jesus de Fão, con-
vento de Barcellos, Aljube de Braga, S. Sebastião, Santa Alaria
Magdalena, convento dos Remédios, Chafariz do Paço, Guada-
lupe, convento de Chaves,, aljube de Valença, Hospital de Braga,
Congregados, aljube da Torre. Ao fundo do quadro: — D. Rodri-
go M. Telles Ar. de B. Prim. das Hesp., premeditando grandezas
eguaes ao seu animo, illustra o Arcebispado com sumptuosos edi-
fícios para sua memoria e funda em 1723 n'esta Cathedral a ir-
mandade das Almas, de que foi juiz perpetuo.
D. Rodrigo exigia que a imagem do santo do seu nome fosse
sempre collocada nas egrejas ou capellas que construía.
Das paredes interiores da capella pendem oito grandes qua-
dros a óleo allusivos á vida de S. Geraldo, todos com a rubrica
egeas que de certo nada tem com o pintor inglez egg (i8i6-63).
O maior, que representa os últimos paroxysmos do Santo, tem
ao fundo estes dizeres:
S. GERALDVS 1ND1E SVI OB1TVS ROGANDO
DIXIT EAMILLIARIBVS, ECAETERIS ADSTANTIBVS \
QVI DEVM D1LIIGVN/T, POTV, ET CIBO, ET LVXVR1A
ABSTINERE PERENE.
O numero de cónegos doesta Cathedral era de 34; presen-
temente apenas conta 10.
Ha na ca\a das ?niirsas uma simples cruz de madeira com de-
senho a óleo, bastante correcto, representando Christo na agonia.
- 93 -
Capella de Nossa Senhora da Gloria (Braga)
Contigua á capella de S. Geraldo existe esta que o Arcebispo
D. Gonçalo Pereira fez construir em i33o, e juntamente o castello
ameiado que lhe serve de sacristia, concluindo-se toda a obra a
27 de abril de i334 no local que era occupado pelas Casas do
Conselho, pertencentes á egreja de Braga.
Instituiu-lhe então seis capellães obrigados a resar quotidiana-
mente em coro o Officio Divino em favor do Papa João XXI, que
lhe concedeu o breve para a fundação da capella; de el-rei D.
Diniz e de seu filho D. Affonso III ; dos reis seus successores ; dos
prelados que lhe succederem e de todos os seus parentes.
Nas costas da capella de S. Geraldo, ainda se conservam es-
tas duas lapides de jaspe com inscripções gravadas em caracteres
gothicos. (Vide gravura a pag. g#).
94 —
KOGPraro
\ 1/15^0; opurJsíjmpvjmio DIU Jlt .
íutxwi.
L
O fundador entregou a administração da capella aos Deões da
Sé, exigindo que fossem portuguezes de nascimento, bem como
seus pães ; e em caso contrario que o encargo passasse para os
Chantres.
Tumulo de D. Gonçalo Pereira
— cp —
Em i336, dois annos depois da conclusão da capella, ordenou
a construcçao do seu formoso tumulo ao centro, com a estatua
jacente, de pontifical, pintando-se-lhe posteriormente em volta es-
tes dizeres :
FM MARÇO DE 1 537 ERA ADMINISTRADOR
DA CAPEI LA O DEÃO D. CARI OS.
Hoje, numa cinta de madeira, tem a inscripçao seguinte :
i348
AQUI JAZ O ARCEBISPO 1>. GONÇALO PERA AVO DO CONDE
ESTABEL DE PORTUGAL D. NUNO ALVARES PEREIRA, DO
QUAL PROCEDE O IMPERADOR CARLOS QUINTO, E EM
TODOS OS REINOS DL CHR1STAONS DA EUROPA OU OS
REIS, OU RAINHAS DELLES, OU AMBOS &. REFORMADA
PELO DEÃO ADMINISTRADOR D. LUIZ NO ANNO DE 1789.
Os modilhões da frente e do lado direito indicam que esta ca-
pella teve alpendrada.
A meio da vidraça que existe sobre a porta, conserva-se uni
vidro antigo pintado a cores vivas representando a Virgem com o
menino nos braços. Tem na parte inferior estes dizeres: tota
PVLCR ES AMICA MEA.
Este vidro precioso é bem digno de ser preservado por uma
ç^rade de arame.
96
Collegiada de Guimarães
No primeiro quartel do século x (armo de 929) a Condessa D.
Mumadona Didaz e seu marido D. Hermenegildo Gonçalves Men-
des, Conde de Tuy e do. Porto e governador da Província de
— 97 —
Entre Douro e Minho fundaram na quinta de Vimaranes, patro-
nímico do nome Guimarães, um templo que dedicaram á Virgem,
ao Salvador do Mundo e aos Apóstolos. Viuvando a Condessa, fez
logo construir junto do templo um mosteiro benedictino duplex
com o rim de terminar alli os poucos dias que lhe restavam de vida.
O infante Ranemiro concedeu-lhe a permissão e oífereceu-lhe a
quinta de Creximir (Creixomil), na era de ncccc2xnn (anno de 926).
Das palavras da doação do castello de S. Mamede, que a Con-
dessa fez construir em 9Õ7, ao seu mosteiro duplex «para defen-
são dos frades e das freiras», em data de 4 de dezembro da
era de 1006 (anno de 968), mostra-se que a egreja de Nossa
Senhora da Oliveira está realmente situada na sobredita quinta
de Vimaranes a pouca distancia do Monte Latito sobre que as-
senta o referido castello: «Quorum baselica sita est in iam dca
villa Vimaranes território urbis Bracharae aud procul ab alpe
latito, inter bis alveis vehementibus Ave, «Sc Avizella.»
Em virtude da prohibição de S. Gregório Papa sobre a habi-
tação de frades e freiras no mesmo mosteiro (Iam nullo loco Mo-
nachos permitimus in uno Monasterio habitare, sed nec ca, quac
duplicia sunt : et si quid tale est ?~eligiosus Episcopus mulieres in
suo loco manere stuaeat, Monachos autem aliud Monastenum edi-
jicare), foram ellas retiradas em 1089. Em 1 io3 o Conde D. Hen-
rique organizou a Collegiada dando-lhe o titulo de capella-real.
A actual egreja foi construída no mesmo local da primitiva a
expensas de el-rei D. João I em memoria da batalha de Aljubar-
rota (14 de agosto de i385), sendo encarregado da obra o mestre
pedreiro e vedor, que havia sido, das obras de el-rei D. Fernando,
João Garcia, de Toledo, que lhe deu principio a 6 de maio de
i38y, concluindo-a em i3c>3 (?), como se lê na seguinte lapide de
mármore embebida na frente da egreja, ao lado esquerdo da porta
principal :
L— ERA DE MILICCCCEXXV ANOS; SF.IS DIAS \ DO'
MES; DE; MAYO • FOI COMECCADA- ESTA; OBRA •
2— POR; MANDADO : DELREY ■ DOM ÍOHÃO \ DADO ; PELA
GRAÇA'. DE> DEOS AESTE REINO DE; PORTVGAL
3- FILHO DO MVY.: NOBRE ) REYi DON PEDRO \ DE.: POR
TVGALi ESTE BO REY ; DON IOHAN \ OVE \ BATALHA
4- REYAL : IX CANPO; CO ELREY ■ DOX IOHÃO DE
CASTELLA NOS CAMPOS; DE- ALIVBAROTA j I. FOY •
5- DELA VENCEDOR : \\ A HONRA DA VICTORIA; QVE
LHE DEV A VIRGE S MARIA MANDOV FAZER ESTA j
6- OBRA ; DA OVAL FOY MEESTRE ; POR SEV MANDADO;
IOHAN GARC. : ; MESTRE; EN PEDRARIA; I; FOY •
7— ACABADA; ; ; ; 3 DIAS DO MES DE; ; ; ; ; ; • I PA DF •
MIL: ICCCC3 I : •' •' •' WOS ' • :
-98-
Esta inscripção é hoje pela primeira vez publicada na integra '.
As copias conhecidas são imperfeitas como a que o Cabido de
1608 mandou gravar em granito, um pouco acima da primitiva,
que se acha bastante gasta do tempo e de tal modo mutilada na
extremidade inferior que já hoje é inteiramente impossível conhe-
cer-se ao certo o anno e o mez da conclusão da obra em que se
empregaram 100 homens castelhanos que el-rei fez prisioneiros. O
altar-mór foi sagrado a 23 de janeiro de 1400.
No primeiro degrau da porta principal collocou-se, em i5 de
julho de 1891, uma lamina quadrilatera de metal amarello com as
seguintes lettras e algarismos :
N P
79
«Nivelamento de precisão, placa 79 em numero». Ordenara
esta collocação um emissário do governo que foi a Guimarães em
serviço da commissao geodésica, demorando-se alli 2 dias para o
alludido fim.
A porta de pau-ferro, que era pintada de verde, foi raspada e
envernizada em março do anno corrente, mostrando no alto em
lettras e algarismos de metal amarello a seguinte data : anno 1727.
Da elegante janella gothica, rasgada sobre esta porta e hoje
inutilisada por enchimento grosseiro de granito, resta ainda a mol-
dura vasada em pedra de Ançã e profusamente ornada de festões,
baldaquinos, estatuetas e bustos em duas ordens. Na primeira,
principiando pelo lado direito, ha seis bustos, cada um com seu
livro aberto, lendo-se no do frade dominico em caracteres eguaes
aos da inscripção em mármore :
SANTA .... DEEV PREDJCAMVS
No livro segundo: — santvs:santvs:santvs:dominvs
No livro terceiro: — santvs:santvs:santvs:dnsdevs
Nos livros quarto e quinto : — santvs:santvs:santvs:dominvs
No livro sexto (frade franciscano) : — sante:francisce:vidi:domi
nvm:in:lino -f-
Na segunda ordem tem seis estatuetas, uma das quaes susten-
ta nas mãos uma fita com estas palavras da saudação : — ave gpa-
T1A PLENA DOMINVS TECVM.
1 Illescas, no livro 5.° da sua Hist. cTEl-rei D. Affonso 6.°, cita uma escri-
ptura de Pombeiro em que se mostra que D. Affonso, sogro do Conde D. Hen-
rique, viveu por algum tempo junto do Mosteiro de Guimarães.
— 99 —
Esta janella tem a toda a largura, voltada para o interior da egre-
ja, uma grande estatua jacente esculpturada em pedra de Ançã,
com barba comprida e gorro na cabeça que recosta na mão esquer-
da sobre dupla almofada onde ainda se lê em pequenos caracte-
res gothicos:. . . .eivs acendet et reqvie (sicj.
Provavelmente esta estatua esteve voltada para a rua, antes do
bárbaro enchimento da janella, pertencendo á arvore de Jessé que
com seus ramos formasse o caixilho da vidraça. Ficava assim per-
feitamente de harmonia com o estylo do terceiro período ogival
ou gothico flammejante.
Que bello effeito produziria uma restauração n^ste sentido !
E' notável o silencio que a este respeito guardam todos os his-
toriadores da Collegiada, principalmente o cónego Gaspar Estaco
(iÔ25); e os padres Torquato d' Azevedo (1692) e António Carva-
lho da Costa (1706).
Na frente da pedra sobre que se acha estendida a estatua res-
tam ainda estas lettras :
PO GO DA S1LVH. . .
Pertencem ao nome do D. Prior D. Diogo Lobo da Silveira,
fallecido em 1666, o qual provavelmente ordenou a pintura e dou-
ramento da estatua e columnas das humbreiras da janella quan-
do, um anno antes da sua morte, mandou abrir dois dos quatro
óculos do enchimento.
A isto se refere do seguinte modo um inventario antigo exis-
tente no archivo :
«Fizeram-se duas frestas no coro de cima, ovadas com suas
vidraças. Fizeram-se mais duas na capella mór. . . e nestas qua-
tro se pozeram grades de ferro e vidraças e se pozeram mais vi-
draças em outras. . . e redes de arame em todas por conta de Gon-
çalo Francisco Infanção e sua mulher Ignez Dias Villas, morado-
res na sua quinta da Porcarice, que mandou fazer o D. Prior
D. Diogo da Silveira no mez de março e maio de i665».
A desastradíssima obra do enchimento da janella estava por-
tanto concluída anteriormente a i6()5 e abriram-lhe depois três
óculos por ser insufficiente o maior que fica ao centro a fornecer
luz ao orgao construído em 1838-41, como se lê dentro do respe-
ctivo someiro do lado esquerdo :
FEITO POR LUIS ANTÓNIO I>E CAR
VALHO GU1MARAENS, NATURAL DLS
TA VILA NO ANNO
DE 1838
IOO
Na tampa do mesmo
A HONRA E GLORIA DE DEOS E SUA
MAY MARIA SS."'a FOI MANDADO ACABAR
ESTE ORGÂO POR ORDEM DO ILL.'110 R.mo CA
BIDO DESTA VILLA.
POR IOSÉ ANTÓNIO DA CRUZ, EM 7 DE
SETEMBRO ANNO DE 1 84 1
Dentro do someiro do lado direito :
FOI REFORMADA TODA ESTA IGREIA
E FEITO ESTE ÓRGÃO POR ORDEM DO
ILL."10 E R.mn CABBIDO DE N. S. DA OH
VEIRA, DEBAIXO DA INSPECÀO DO
ILL."10 CÓNEGO IOÃO BA.PTISTA SAMPAIO
NO ANNO DE 1 838
Na tampa do mesmo :
A HONRA E GLORIA DE SANTA MARIA
DA OLIVEIRA FOI MANDADO ACABAR
ESTE ORGÁO POR ORDEM DO ILL."10 E R."1"
CABIDO DESTA V.A POR IOZE ANT.° DA
CRUZ ANNO DE I 84 l .
A primeira e terceira d'estas inscripções referem-se á constru-
cção do órgão pelo vimaranense Luiz António de Carvalho Gui-
marães em 1 838 e á condemnavel reforma da egreja, iniciada em
14 de junho de i83o, da qual também nos ficou a pilastra e capi-
tel Jónico no cunhal esquerdo da fachada !
O tecto d'esta egreja Collegiada era todo de vigas bem lavra-
das. Hoje está estucado e os capiteis das naves desfeitos a picão
como os da Cathedral de Braga !
A segunda e quarta dizem que 1 1 annos depois foi concluído
o órgão por José António da Cruz, official do já então fallecido
Carvalho Guimarães. Junto da porta lateral norte existe um tumulo
de granito com esta inscripção em caracteres ligados :
Aqvi iaz Ignes de GvimarÃes mbk, do Ldo, I0Á0 de Valladares
BISNETA DE MARTINHO DE GeS F°, DE DOM FERNANDO DA GvER
RA BISNETO DEL REY D. P.° O CRV ; E DA SRA, DONA IGNES DE CASTRO
E VALLADARES. MORREO A 8 DE SETEMBRO l634
No painel do altar de Santa Anna lê-se o seguinte psalmo :
VENTVROSO AQVELI.E QVE ESPERA
DE VOS O SEO SOCCORRO
lOI
No do altar da Virgem da Conceição :
CYNODÒ
CELEBRADO NA SANTA SÉ DE BRAGA
14 DE 1VNHO DE IÓ46
Evidentemente está errada esta data, porque o Synodo foi ce-
Iebrado em i(536 pelo Arcebispo D. Sebastião de Mattos de Noro-
nha que occupou a cadeira bracarense desde 5 de setembro do
referido anno (dia em que tomou posse) até 1641 em que falleceu
prisioneiro na torre de S. Julião, reconhecendo n'aquella hora ex-
trema o crime que praticara de traição á pátria e pedindo por
isso que o seu corpo fosse sepultado em campa rasa no adro de
qualquer egreja «para que não ficasse memoria do que tinha sido».
Neste Synodo foi dado o juramento seguinte :
«Promettemos e juramos, todos os que n^este Synodo estamos
congregados, em nossos nomes e de nossos successores, de sem-
pre termos e guardarmos, e defendermos, que a Virgem Maria
Nossa Senhora foi concebida sem macula de peccado original, na
forma das Constituições e Breves Apostólicos passados sobre esta
matéria».
Os dois altares restantes são dedicados ao Espirito Santo e a
S. Nicolau, e, por uma rubrica que se lê na margem inferior d'este
ultimo painel, foram pintados em 1848 pelo fallecido lente da aca-
demia de bellas-artes, de Lisboa, sr. Joaquim Raphael.
No friso do arco da antiga capella de S. Nicolau acha-se gra-
vado o seguinte :
ESTA CAPELLA MANDARÃO FAZER OS ESTVDANIES
DESTA VILLA NO ANNO 1)0 SENHOR DE 1 663
E toda abobadada de pedra, apainelada, e não tem culto des-
de que construíram na sua frente o altar da mesma invocação.
A capella-mór, que na reedificação da egreja ficara acanhadís-
sima, foi ampliada, tanto quanto o espaço o permittia, por ordem
do príncipe D. Pedro (depois rei D. Pedro II) que para esse fim
concedera, aos 6 dias d'outubro de 1677, as sobras da nova contri-
buição. Esta obra ficou concluída em 1682 '.
Por occasião dessa reforma desappareceu uma pedra sepul-
chral que estava debaixo do degrau da porta da sacristia, e na
qual se lia o seguinte :
1 Padre Caldas, Girimirães, pag. iS.
— 102 —
AQUI [AZ PÊRO
AFFONSO
DE GVIMARAES E
ABBADE DE SAM
GONSALO DE AMARANTE *
A segunda linha pode ser completada com a palavra cónego,
porque os houve na Collegiada beneficiados que ao mesmo tem
po tinham abbadias, como se deprehende de uma notificação dos
Estatutos de 1405.
No alto da tribuna venera-se a devota imagem da Virgem da
Oliveira que se representa de mãos postas. A coroa de uso é de
prata dourada e foi feita no anno de 1 563, data que se lê num
dos seus arcos.
Acha se actualmente no museu esta antiquíssima esculptura a
que el-rei D. João I recorria nos transes mais difriceis do seu reinado :
Os sábios e o caruncho tém-
lhe feito estragos ; aquelles esca-
racando-a para se averiguar a
qualidade da madeira, o que não
puderam conseguir até hoje, e
este roendo-a grandemente pela
parte posterior.
E1 ponto averiguado que nos
primeiros tempos christaos as
imagens da Virgem eram de pre-
ferencia esculpturadas em pau de
pereira, symbolo da fecundidade.
O saudoso padre Caldas 2 pergun-
ta se esta imagem será a mesma
que a Condessa D. Mumadona e
seu marido o Conde D. Hermene-
gildo Mendes retiraram da Mes-
quita de Ceres (posteriormente
capella de S. Thiago hoje extin-
cta) para a collocarem no altar
maior do templo que fundaram.
Não deixa de ter logar esta per-
*fc ' gunta, embora seja forçoso acre-
ditar-se que, em tal caso, a es-
culptura não se conservou ate
agora isenta de retoques.
s ~ li
'Sip-^y -^^^ ■'' m ,
1 Gaspar Estaco, pag. i3o.
2 Guimarães, vol. II, pag. i3.
IOO —
Os revolucionários de 170/2 queimaram em Chartres uma an-
tiquíssima imagem da Virgem que se venerava com romarias e pro-
messas abundantes na Sé Cathedral d'aquella cidade franceza, e
a qual se representava assentada numa cadeira, tendo sobre os
joelhos o menino Jesus que amparava com as mãos. Media 4 pal-
mos de altura e, pela sua muita antiguidade, o povo chamava-lhe
a Virgem dos Druidas.
A velhíssima imagem da Collegiada vimaranense mede exacta-
mente os 4 palmos de altura (o™, 88) e conserva ainda vestígios
da posição da de Chartres. O vestido é coberto de panno bem
collado e com p1'ritura antiga em ramagem. Ora sendo, como
creio, do mesmo pau de pereira esta esculptura, e attendendo ás
demais circumstancias que exponho, não se poderá duvidar da
sua origem remota e de que fosse esta a esculptura aproveitada
por D. Mumadona e marido.
Existe na tribuna uma pequena caixa de madeira, forrada de
veludo, sobre a qual é collocada a custodia em dias de exposição
do Sacramento. Foi exteriormente enriquecida de grossos arabes-
cos de ouro. Dentro lê-se em caracteres miúdos:
ANNO
1662
PRODE GES
D D°
LOBO
Fez-se no anno de 1ÓÕ2 sendo D. Prior de Guimarães D. Diogo
Lobo da Silveira.
Havia rfesta Collegiada 28 cónegos que, como os de Braga,
usavam solideo. Tinham além disso o titulo de capellães reaes,
que ainda agora usam.
Sobre a porta do palácio do priorado encontra-se o seguinte
brazão dos D. Priores : (Vide granira a pag. 104).
104 —
DE O HONORE
i576
Certamente a data allude á collocaçao das armas por honra
a Deus, e não á construcção do espaçoso edificio que parece
mais antigo, talvez o mesmo que serviu de aposentadoria a el-rei
D. João I, quando este monarcha, auxiliado por Affonso Lourenço
de Carvalho, tomou a então villa de Guimarães a Aires Guedes
da Silva que a defendia em favor de Castella.
Por honra de Deus ! dizem as palavras latinas gravadas sob o
brazao dos Dom Priores de Guimarães, divisa assaz parecida com
a dos padres da Companhia de Jesus — Ad majorem Dei glo-
riam— (para maior gloria de Deus).
Por honra a Deus! diria em iooi o Conde D. Henrique de-
pois de apresentar n'esta Collegiada Insigne o seu primeiro Prior
Dom Pedro, predecessor do doutor Pedro Amaral ou Amarello,
físico mór de el-rei D. Affonso Henriques aperfeiçoador da Colle-
giada, e ultimo Abbade dos antigos monges com quem ainda con-
tinuou a viver em rigorosa clausura.
Por honra a Deus ! repetirão ainda os que não desconhecem
que desempenharam este cargo altamente honroso muitos sábios
illustres e nobres distinctissimos, entre os quaes 2 príncipes da
casa de Bragança; e que d^lli chegaram a sahir 1 Pontífice,
3 Cardeaes, 9 Arcebispos e 18 Bispos, motivo seguro por que os
Dom Priores de Guimarães mereceram a classificação de primei-
ras pessoas do reino.
Apresentavam in solidwn um grande numero de egrejas e
eram emfim considerados Bispos d'esta pequena Diocese, por se
isentar da jurisdicção Archiepiscopal, tornando-se immediata á
Santa Sé Apostólica, a sua Insigne e Real Collegiada.
10D
Assim o indica a seguinte concordata celebrada em 1216 por
intermédio dos Arcediagos de Çamora e Astorga, aos quaes Inno-
cencio III commetteu o encargo de apaziguar o Arcebispo de
Braga Dom Estevão Soares da Silva, concordata confirmada por
Honório III e, trese annos depois, em 1229, pelo Cardeal Sabi-
nense, legado a laíere, determinando- se :
«Que os priores fossem prelados ordinários, da egreja de Gui-
marães, e tivessem jurisdicção nos beneficiados e clérigos delia,
como a teem os bispos e somente reconhecessem os arcebispos
de Braga como metropolitanos; mas que não podessem os priores
conhecer dos casos, que por direito merecessem deposição ou sus-
pensão perpetua-, e que emtudo o mais fossem os priores como
bispos sutfraganeos, tendo nos seus cónegos e porcionarios, aquella
jurisdicção que qualquer bispo tem nos seus e na sua diocese».
O Cardeal infante D. Henrique foi quem primeiro violou
este accordo na parte referente á visitação, seguindo-se em i35o
D. fr. Balthazar Limpo que entrou á força na egreja arrombando
as portas e o sacrário !
Reorganisando-se em 8 de janeiro de 1891 a Collegiada de Gui-
marães que, como todas as do reino, havia sido extincta, foi pro-
vido no logar de Dom Prior o sr. Dom José cTAndrade Sequeira,
fallecido em 1894, substituindo-o em 20 de junho de 1895, o actual
sr. Dom Manuel d" Albuquerque, ao qual foi conferida a posse no
dia 28 de setembro immediato.
E' o primeiro do nome e, como supponho, o sexagesimo-
quinto da serie.
No florescente museu da Collegiada guarda-se uma lapide de
pedra de Ançã que o antiquário sr. João Lopes de Faria ulti-
mamente encontrou numa loja escura do claustro. E1 toda orna-
mentada em volta e tem no alto as armas de D. João I e da
rainha D. Filippa. Os caracteres da inscripção, ainda inédita, são
gothicos miúdos como os da lapide da frente da egreja. Mede o, 5 2
em quadrado e é esta a copia fiel:
-[-era de miliccccxxxix anos*;
xxiii imas do mes de ianero • dia
santo ylefonso; foy sagrada esta i
gresa; por mandado do mvy nobr
1-: ri-:y don iohan de portvgalj e dam
vy nobre raynhaj dona felipa sva mv
lher filha del dvq dl' lencastre! i sag
roa o bispo do porto don iohan dazanb
v.1a- esta obra fez iohan garcia mêstr1
Refere-se ú sagração da egreja, pelo Bispo do Porto D. João
d' Azambuja, aos 23 de janeiro de 1401.
Fica ao fundo da nave da Epistola a capella do Sacramento.
instituída pelo cónego Gonçalo Eanes, com seu custoso e elegante
sacrário de prata lavrada. Nas portas apresenta em primoroso re-
levo as duas passagens bíblicas: — O maná do deserto e a Pará-
bola das bodas; e além disso os seguintes textos de S. Lucas e
do Êxodo gravados em caracteres miúdos :
EGO PLVAM VOlílS PANES DE CCTO (sic)
l XOD IK •
BEATVS ovi MANDVCAVIT PANEM
IN lv 1 GNO hl I • LVC. 14.
[STE EST PANIS o\ l \l DOMINVS DEDIT
VOBIS Ah VESCENDVM- EXOD. XVI.
MANHV QVIT ESI llo<:
EXOD. XVI.
Homo QVIDAM FECIT CAENAM MAGNAM
& VOCAVIT MVLTOS, ET MISIT SERVVM
SWM \ r VENIRENT S- LVC. XIV.
EXICITO' IN IMA I IAS ET PAVPERES ■
AC DEBILES II CUCOS [NTRODVC IIIC
i.uc. 14.
VXOREM DVXIT ET tDEO NON POSSVM
VENIRE ■ LVC. 14.
VILLAM EMI, ET NECESSE HABEO
EXIRE, ET VIDERE II.I.AM- LVC. 14.
JVGA liov.M EMI, ET HO PROBARE III. A
ROGO I K HABE ME ESCVSATVM ■ LVC. 14
O altar tem um 1'rontal de prata ricamente ornamentado, e os
seguintes textos gravados, allusivos á Eucharistia:
ACCIlTIli- ET' CO OVI ENIM' MAN
MEDITTÈ- IIOC EST DVCAT ■ ET- BIBIT« IN
CORPVS- MEVM • DIGNE* [VDICIVM ■ SI
MA IH. 26 Hl • MANDVCAT
CORINTH. II
IIIC EST PA PROBET- AVTEM
NIS- DE GELO D SE- IPSVM- HOMO
ESCENDENS* ET- SIC- DE PANE- M.o
JOAN. C. 6 EDAT- AD CORINT. I. 1.
AN NO 1735
Dispendeu-se com o sacrário e frontal a quantia de 1:476^002
— 107 —
reis. As mezas de 170D e [706 destinavam as sobras da festa para
se dar principio ao frontal, pois o sacrário era então de madeira
prateada; por fim resolveram applical-as a este, dando-lhe logo
principio, e mandaram também fazer um prato e um jarro do
mesmo metal. Em 1708 levantou-se a quantia de 8<j~õ<o réis para
pagamento de obras etíectuadas na capella e sacristia, reservan-
do-se nesse anno a primeira verba para se fazer o frontal.
No anno immediato, sendo juiz Luiz Pimenta de Távora e Le-
mos, applicou-se á construecão do sacrário a quantia de 100-000
réis. Km 25 de maio de 1711 foi adjudicada a obra ao ourives
Hieronymo Lopes Moreira, sendo depois este substituído por
Francisco Cardoso de Macedo em 7 de julho de 1720. O sacrário
era encimado por uma esculptura de prata representando Christo
resuscitado, a qual em 1788 foi substituída pela actual custodia
radeada. Da obra do frontal encarregou-se, em maio de 1 73r, o
ourives João Pereira Ribeiro ; não cumprindo porém a promessa
que fizera de o concluir até á véspera do Natal, nem ainda até \o
de agosto do anno immediato, a meza encarregou da conclusão o
artista Francisco Teixeira.
Km 1686 construiu-sc
na sacristia uma pequena
capella interiormente azu-
lejada na qual é muito ve-
nerado o verdadeiro retra-
to da Virgem, conduzido
de Roma para aqui por
I). Payo Domingues D.
Prior de Guimarães e Deão
de Kvora, nos fins do sé-
culo xiii. Este D. Payo de-
terminou ao seu procura-
dor num pergaminho es-
cripto em Coimbra a 14
de março de 1 296 (secundo
idus maii era mcccxxxiiij,
que desse 4 soldos da moe-
da velha { a cada cónego
que no dia de paschoa can-
tasse deante do mesmo re-
trato a antiphona Regina
Coeli c a Salve Regina; 2
soldos a cada sacerdote; um a cada diácono ou sub-diacono, e
seis dinheiros (65 réis ':) a todo o mechanico.
* Sendo de ouro valia cada um ?:o réis ; e de prata 10 réis.
— io8 —
A tradição diz-nos que este retrato é copia fiel do que se ve-
nera na egreja de Santa Maria Maior, em Roma, 1 pintado por S.
Lucas ; e na verdade essa tradição é bem acceita por todas as
pessoas que conhecem o original e o nosso.
Lê-se ao fundo da tela : — ora pro nolis. s. maria.
Na mesma sacristia guarda-se uma caixa de madeira contendo
o santo sudário. Na face interior da tampa tem esta inscripção :
I-ESTA CAIXA E SANTO SUDAIRO MANDOV
FAZER DOM DIOGO LOBO DA SILVEIRA EMDIG
2-NO PRIOR DESTA REAL GOLLEGIADA DE NOSSA
SR.a DA OLIVEIRA ANNO DL 1664.
Também aqui esteve o antigo e precioso thesouro com estes
dizeres nas portas :
PVLCHRA VT LVNA — ELECTA VT SOL
Hoje todos esses objectos constituem o núcleo do florescente
museu de archeologia christã, fundado numa das salas da casa ca-
pitular, por deliberação do illustrado Cabido, que em 22 de de-
zembro de i8q8 reunira para este fim sob a presidência do sr.
cónego dr. António Júlio de Miranda, encarregando de todo esse
trabalho o então Thezoureiro-mór sr. cónego Alberto da Silva
Vasconcellos, que no dia 6 de janeiro do anno immediato, auxi-
liado pela dedicação enthusiastica do antiquário João Lopes de
Faria, removeu para alli todos os objectos de valor, dispondo-os
com a melhor ordem possível. Descreverei aqui os principaes,
transcrevendo parte do que a este respeito publiquei no «Echo de
Guimarães», semanário vimaranense de que era redactor habilis-
simo o meu particular amigo padre Gaspar da Costa Roriz -.
1 Esta egreja foi primeiramente denominada basílica Liberiana. pelo nome
do Papa que a consagrou ; depois Santa Maria Maior por ser o principal san-
ctuario da Virgem ; de Nossa Senhora das Neves pelo milagre da sua origem
no meado do século ív ; Santa Maria do Presepe, por se trasladar de Bethlem
para aquelle sitio o presepe em que nasceu Jesus.
2 O primeiro numero d'este excellente jornal publicou-se em 3i de de-
zembro de 1899.
1 OQ
0èé!£ÊMMêá£Ê^&ÊàÊèÊi^ê^Mk í :
.>T,~
r/k 'Mi/ >£.M
Triptyco ou oratório de prata dourada
E' este um dos mais preciosos monumentos que figuraram na
exposição retrospectiva de arte ornamental, de Lisboa, e em cujo
catalogo foi assim descripto : «Triptyco de prata dourada de es-
tylo gothico. Altura im,35". Largura im,23. Na parte principal a
Virgem num leito, tendo junto, sobre a roupa que a cobre o Me-
nino Jesus. Próximo do leito S. José.
Em plano superior as cabeças dos animaes do presepe e dois
anjos com thuribulos. Cobrem o leito quatro arcos ogivaes ; junto
delles estão cinco anjos empunhando brandões, debaixo de balda -
quinos. Elevam-se sobre os arcos quatro corpos architectonicos
fenetrados. Do alto de cada um dos lateraes debruça-se um anjo
sustentando um escudo com o brazão das armas reaes portugue-
zas. As outras partes do triptyco tem cada uma quatro nichos oc-
cupados por estatuetas, que representam a Annunciação, e Visi-
tação de Santa Izabel, Apresentação, Adoração dos Pastores e
Adoração dos Reis. Fins do século xiv ou princípios do século xv.»
Alguns dos nossos escriptores como o P. Torquato de Aze-
vedo, P. António Carvalho, Vilhena Barbosa, Oliveira Martins e
1 IO —
outros, dizem que este oratório ou triptyco, proveio do saque das
tendas do rei de Castella na memorável batalha de Aljubarrota,
ofterecendo-o o nosso rei D. João I á Virgem da Oliveira quando
aqui veio a pé agradecer-lhe a intercessão no vencimento da allu-
dida batalha. Oliveira Martins, na Vida de Nuri alvares, accres-
centa que do referido saque recebeu mais o nosso monarcha os
balsões e bandeiras de Castella, uma Bíblia que foi para o coro
de Alcobaça, um relicário precioso e o próprio sceptro Caste-
lhano de crystal engastado em ouro com lavores delicadíssimos,
que Nun' alvares deu para o convento do Carmo, por elle fundado
em Lisboa. Gaspar Estaco (Varias Ant. de Porl., pag. jyy, cap.
481-1625), que foi cónego da Insigne e Real Collegiada e que deu
publicidade ao seu trabalho primeiro que nenhum dos outros, af-
firma que «o retavolo de prata do presépio de Christo nosso Se-
nhor, q nos dias solemnes se põe no altar maior», foi feito da
prata que el-rei D. João I offereceu, producto do seu peso quando,
como diz o livro dos milagres, veio a pé dar graças á Senhora da
Oliveira, entrando na sua egreja e dizendo: «Sr.;i eu confesso e
quero que todos saibam, q eu por vossa virtude somente venci
esta batalha, e que no ponto e hora em que estava pêra nella en-
trar dei hum grande espirro, o qual houve e tomei por mui grande
agouro, pelo qual cessei por entonces hum pedaço de mover pêra
ella, no qual espaço me deitei de bruços e non sei se dormindo,
se acordado, porê posto en mui grande pensamento e agonia vi
en visam aquesta vossa casa tal quejandahagora vejo, com aquesta
oliveira, e veiome ao entendimento que eu por exemplo do pri-
meiro Rei me devia encomendar a vos e haver por tomadas as
minhas armas da vossa mam, pelo qual eu logo votei e prometti
de fazer o que hagora faço dizendovos en minha oraçam, Eu vos
peço Sr.a de grande mercê assi como vos ao ditto Rei dom Af-
fonso fostes principio daqueste reino, seiaís a mi vosso devoto de-
fenson d' elle. E entonces lhe mandou pôr as dittas armas encima
do seu altar dizendo, Vós Sr.;i mas destes, vós as tomai e guardai».
A opinião de Gaspar Estaco foi reproduzida em 1731-82 pelo
Académico José Soares da Silva nas Memorias para a historia de
Portugal, e tem a corroboral-a o Inventario feito em 1 527 onde
se lê textualmente : «Hum retabollo de prata dourada q deu elrey
Dom Joham da boa memorya quando venceu a batalha Reall e
veio visitar nossa Sr.'1 a q se encomendou na dita batalha o qll
en chygando aa dita Igia armado de todas armas como elle an-
dava na dita batalha e có a lança e laudell o qll está aquy e
aquy o deixou por devaçam de nossa Sr.a se pesou apta da qll
pta se fez o dito retabollo e dose appllos e quatr.a0 anjos de pta
e quatro septros e hua caldeyra co seu essope e hum tbollo com
sua naveta a qll pta toda q se aquy nomea afora o retabollo, le-
— 1 1 1 —
vou jelrei Dom A." pa Castella e o dito retabollo foy remydo pr
ceys centos cruzados segundo se verá pilo est q lia envia ho ar-
cecl.0 a sua senhorya, q dizem a villa e termo pagou este dn.°,
etc».
O Arcediago era então Pêro Machado, vigário e provisor do
Dom Priorado, e Dom Prior Sebastião Lopes. A falta de docu-
mentos coevos não auctorisa ninguém a resolver a questão.
É digno de ponderação este Inventario antigo, visío ser feito
numa epocha em que a batalha de Aljubarrota não contava ainda
mais de 142 annos.
E' verdade que um objecto como o tryptico, em forma de pe-
queno e pobríssimo armário de madeira sem ornatos exteriores e
com argolas de ferro para facilitar a remoção, não indica, a meu
ver, seguramente, que tenha sido feito para ser exposto numa
cgreja ampla, em determinados dias, como de antigo costume, a
8 de setembro e 25 de dezembro de cada anno. Será por isso mais
acceitavel a opinião dos que o julgam tomado a D. João I de Cas-
tella, n^quelles tempos em que as grandes victorias se alcança-
vam com uma fé viva na protecção do céo ?
Que duvida ? Assim como D. João de Portugal se apresentava
de cruz vermelha sobre o peito com escudos de S. Jorge, e o Con-
destavel de estandarte representando em todo o campo o Christo,
S. João, Santa Maria, S. Jorge e S. Thiago •, o moço rei Caste-
lhano, que na occasião da batalha tanto necessitava dos desvellos
da sciencia medica, poderia ter feito transportar para a sua tenda
o alludido altar, a fim de melhor se encommendar a Deus e en-
corajar a sua gente que, no ardor da batalha, ao grito continuo
de — Portugal e S. Jorge!, teria de oppor o de — Castella e S.
S. Thiago ! O próprio Estaco, descrevendo os ornamentos e peças
de prata offerecidos á Virgem da Oliveira por D. João I de Por-
tugal, diz : «hum anjo grande dourado que está en geolhos, de
vinte, e hum marcos, que foi tomado na batalha, e fora da capella
dei Rei de Castella.»
O que não offerece duvida é que este rico objecto, ou a prata
de que se fez, foi offerta de D. João I de Portugal, como o indi-
cam as suas armas nas extremidades superiores. Pesa este orató-
rio 7 arrobas e 23 arráteis, e foi concertado, limpo, dourado e es-
maltado, por dois italianos que appareceram em Guimarães no verão
de 1798. dispendendo-se com esse trabalho a verba de 5o:ooo réis.
As portas são exteriormente pintadas, representando no alto dois
anjos com uma fita em que se lê : gloria in excelsis deo ; e ao
fundo algumas ovelhas e quatro pastores, um dos quaes toca uma
gaita de fólle. Ordenou esta pintura o cardeal infante D. Henri-
que, Arcebispo de Braga, na visita de 9 de outubro de 1 5 3 7 ^ pelas
palavras seguintes: «...e mandaraam pintar as portas do reta-
— 112 —
bollo de prata da parte de fora, de boa pintura, o que compri-
raam até páscoa de resurreiçam sob pena de quatro cruzados.»
O Cabido ligou pouca importância ao caso, tendo de soffrer
nova ordem na visita de 12 de setembro do anno immediato.
CRUZ PROCESSIONAL GRANDE
(Vide gravura da pagina seguinte.)
E' toda de prata, estylo gothico, obra executada a buril. Offe-
receu-a o cónego Gonçalo Eannes depois de 1227, visto não exis-
tir ainda então descripta no Inventario, e antes do fim de 1540.
pois o seu testamento foi aberto no dia 28 de setembro d^ste an-
no «em sua casa onde jazia morto».
Do Inventario de i63i consta que «esta obra se acabou de fa-
zer com mais sessenta mil réis que a fabrica deu para esse fim.»
Desconhece-se, infelizmente, o nome do artífice e a sua naturalida-
de ou residência. O que fica demonstrado é que a cruz não foi
unicamente feita a expensas do cónego oíferente, como todos os
historiadores nos dizem. Este facto deverá ser attribuido á sua
morte occorrida quando a obra se achava ainda em via de con-
clusão.
Também esta cruz foi concertada, limpa, e dourada em parte
pelos dois alludidos italianos, dispendendo-se com esse trabalho a
verba de 7.7*200 réis. O douramento do rosto e mãos das esta-
tuetas desappareceu quando em 1880 se mandou limpar a cruz.
Antigamente sahia nas procissões da camará e agora apenas
apparece na do Corpus Christi. Acha-se assim descripta no cata-
logo da exposição de Lisboa :
«Cruz processional de prata. Altura i'",55. Largura na base
0,46. A base, cuja forma é a de uma pyramide hexagona, assenta
sobre uma columna adornada no pedestal com carrancas, no fuste
com festões e cabeças de anjos, no capitel. A parte inferior da
base é distribuída em seis secções adornadas com tropheus, ara-
bescos e chimeras. O corpo da base tem três ordens de nichos,
sendo os da primeira e terceira ordem encimados por baldaqui-
nos e separados por feixes de pilares com estatuetas e baldaqui-
nos na parte inferior e terminados por coruchéus. Os nichos, com
a forma de concha na sua parte superior, contém baixo-relevos.
que representam passos da vida de Christo, a Virgem e os Evan-
gelistas. De cada lado, na parte inferior, destaca-se um nicho maior,
com as estatuas de Moisés e de David. Exteriormente muitas ou-
tras estatuetas e arcarias adornam o corpo da base. A columna e
as diíferentes faces do corpo da base são do estylo do renasci-
mento. As arcarias, pilares e baldaquinos, que são um como re-
Cruz processional grande
— 114 —
vestimento, téem o estylo gothico. A haste e os braços, remata-
dos em rosáceas, terminam á maneira de flores de liz, e são co
bertos de cabeças, bustos e outros ornatos de estylo da renascen
ca. A figura de Christo é de prata dourada. O reverso é similhan
temente ornamentado. Século xví».
Não se encontra em todo o paiz outro exemplar egual. A junta
de parochia de Montelavar e a confraria do Sacramento em Bel
las, possuem cada uma a sua cruz processional de prata, de egual
estylo, mas de inferior trabalho e dimensões. A que mais se appro
xima d'esta é a da Sé do Funchal que ainda assim mede menos,
om,36 de altura.
Outra «cruz processional de prata, estylo gothico, muito co-
berta de ramos de carvalho e cujas extremidades terminam em
flor de liz. Servem lhe de base dois castellos sobrepostos, dos quaes
o primeiro é guarnecido de pilastras terminadas em coruchéus.
Altura om,82. Século xv».
Esta cruz pertenceu á antiga confraria da egreja de S. Miguel
do Castello (vulgo Santa Margarida) e diz-se que no tempo da in-
vasão franceza fora escondida numa caixa entre o centeio d'um
campo.
O cónego José Martins Gonçalves que por occasião da referi-
da invasão era abbade de S. Miguel do Castello, entregou-a por
escriptura publica feita na nota do D. Priorado em 24 de outubro
de 1818, ao abbade seu successor João Machado de Araújo Amo-
roza, declarando que a conservara sempre em seu poder desde a
referida época. Tem de pezo nove marcos com cinco onças e meia.
Sendo annexada a freguezia de S. Miguel do Castello á Colle-
giada em 16 de dezembro de 1872, a cruz foi alli recolhida segui-
damente á publicação da portaria do Arcebispo de Braga. El-rcio
sr. D. Fernando, assaz perito nestas questões de arte, manifestou
o seu alto apreço por esta cruz que tem no reverso gravada a fi-
gura do Padre Eterno, acompanhada da legenda: — deo patff
ONIPOTENT (SIC).
n5
É de estylo gothico, esta cruz, composta de duas faces ligadas
por levíssimo rendilhado, tendo em toda a volta e pelo centro uma
ornamentação simples mas bastante vistosa e apreciável. Mede de
alto ora,88 e peza trinta e seis marcos. Do douramento apenas res-
tam alguns vestígios. A base é hexagona formada por dois corpos
sobrepostos, em arcos ogivaes, separados por pilastras. Ao centro
por traz da imagem de Christo, tem um baixo relevo que repre-
senta a prisão ; um pouco acima a imagem da Virgem da Concei-
ção ; nos braços dois escudos, e quasi ao fundo a Virgem da
Espectação. Por sobre a cabeça de Christo tem a seguinte inscri-
pção em caracteres gothicos :
jesus :nas are
nus:judeorum
Ao centro do reverso tem gravada a imagem do Padre Eterno
— u6 —
com os emblemas dos quatro evangelistas •, no alto o Pelicano ;
nos braços os mesmos dois escudos do anverso e em baixo o La
zaro (?) saindo do tumulo.
Esta cruz foi limpa, concertada e dourada no anno económico
de 1881-82 dispendendo-se com o seu trabalho 129.^830 réis. O
cónego José Bento Ribeiro Agra encarregou-se de ordenar a com
postura que foi confiada ao ourives José de Sousa Dias.
Cabe a este a gloria de deslocar algumas peças, substituir in-
habilmente outras que faltavam, e a pregagem, que era de prata,
por belmazes amarellos ou pequenas tachas de pregar cintas de
soccos !
CUSTODIA DE PRATA DOURADA
Depois da grande cruz processional é este um dos mais apre-
ciáveis objectos do recente museu da Collegiada. Tem no catalo-
go a seguinte descripção :
«Altura om,8o. A parte superior é formada por uma arcaria go-
thica dividida por quatro feixes de pilares, formando baldaquinos,
sob os quaes estão as estatuetas dos quatro Evangelistas. Remata
esta parte uma cimeira do mesmo estylo, sobre a qual se vê o
fragmento de uma cruz. A parte média contém o ediculo, rendi-
lhado por fora, e por dentro, na face anterior, ornado com cabe-
ças de seraphins. A face posterior é rendilhada exterior e interior-
mente. Aos lados dois grandes feixes de pilares com quatro bal-
daquinos e três estatuetas dabaixo de cada um, rematados por ci-
meiras do mesmo estylo, e ligados á parte superior e á parte
inferior por ornatos. A base da parte média é dividida em quatro
taboleiros, e cercada por um acroterio rendilhado. A face inferior
é dividida por seis gomos com ornatos similhantes. Na peripheria
da base elevam-se quatro anjos tocando instrumentos, os quaes
se firmam sobre pendores com tintinabulos, bem como os feixes
de pilares. Falta um d'estes tintinabulos. A parte inferior termina
por uma aba hexagona, sustentada em quatro ornatos, á maneira
de misulas, e com a seguinte inscripçao na face superior :
esta costodia foi acabada
na era de 1:5:3:4-
O nó consta de arcarias formando baldaquinos, dois dos quaes
abrigam estatuetas de santos. Na parte superior ha um annel he-
xágono com vestígios de esmaltes. Da parte inferior pendem três
pingentes e falta um quarto. O nó descança sobre seis dragões, si-
milhantes ao do cálix. A base é distribuída em oito gomos, cujas
superfícies são ornadas com figuras de santos.
Nos intervallos, losangos esmaltados. A peripheria rendilhada.
— ii7
A base descança sobre um emmolduramento, contornado por uni
festão de louro, e sustentado por três animaes de phantasia, fal-
tando um quarto, e sobre garras apoiadas em espheras. Século
XVI.»
A pequena cruz da cimeira existe exposta numa vitrine com
os demais objectos do museu. Ao grande feixe de pilares do lado
esquerdo da face posterior falta uma estatueta, e ao do lado di-
reito da parte anterior, outra. A base não é, como se diz, distri-
buída em oito gomos mas em quatro, com o mesmo numero de
figuras de santos nas superfícies e os dizeres seguintes: s elisabet
— S PETRVS — S IOANES — O MATER DEI MEM.
Esta custodia peza vinte e cinco marcos e meio e foi oliere-
•cida pelo cónego Gonçalo Eannes, o mesmo que oífereceu a cruz
grande. A tradição diz-nos que esta obra foi executada pelo grande
vimaranense Gil Vicente.
Em tal caso occorre perguntar se a cruz processional também
será obra do mesmo glorioso filho de Guimarães.
CÁLICE DAS CAMPAINHAS
Este cálice de prata dourada, que tem de pezo oito marcos
menos uma onça, foi offerecido pelo Chantre Fernando Alvarez,
no século xvi. «Altura om,3i. Copa hemispherica, adornada com
seis figuras de anjos que sustentam os emblemas da Paixão, e na
parte inferior, com outros seis, sustentando outros tantos tintina-
bulos. O nó adornado com arcarias gothicas, contendo as esta-
tuetas de seis santos cobertos por baldaquinos. Baze dividida em
•doze gomos, dos quaes os maiores têem em baixo-relevo figuras de
santos: Nos seis gomos menores ha ornatos esmaltados. Entre a
copa e o nó, e entre este e a baze, dois anneis com o mesmo género
de esmalte. No bordo exterior da copa lê-se em caracteres gothi-
cos: hic est cálix samgvinis mei novite (sic). Século xvi». E egual
ao da Sé de Braga, feito em Roma, o que não admira, porque
aquellle serviu de modelo a este. Mede menos de altura om,02, e
deixa ver no interior da copa a martellagem do artifice. A patena
tem no reverso um agnus esmaltado e no anverso a figura de
Jesus Christo, egualmente esmaltada, em attitude de subir ao céu.
c á roda: do vobis pacem relinco vo pacem meam.
CÁLICE DE S. TORQUATO
E assim denominado porque a tradição nos diz que appareceu
na sepultura do glorioso martyr, junto do seu corpo que ainda
se venera incorrupto a pequena distancia de Guimarães, e que o
referido santo celebrava missa com elle!
— n8 —
E de prata dourada e esmaltada. «Altura om,22. Copa lisa e
pyramidal. Nó hexágono, ornado de ramagens e esmaltes. Base
também hexagona, dividida em gomos e com seis esmaltes nos
ângulos reintrantes. Uns e outros esmaltes representam bustos de
santos. A patena tem no centro um esmalte que representa o Pa-
dre Eterno. Século xm».
Muito semelhante a este ha outro que pertence á irmandade
das almas, da freguezia de Santa Marinha da Costa, como logo
se verá.
#
Um relicário de prata dourada, em que se guarda o tornozello
de S. Torquato. Na frente lê-se esta inscripção:
d dioq0 iobo da silvr * indigno prior
desta real coleqiada de n sr f
d"liveira dev esta costodia anno 1664
Do lado opposto :
esta relíqvia he de s- torcato disi
pvlo de samtiaqo apostolo çvio
corpo se achov inteiro-)-
Quando em 1637 se dirigiram á freguezia de S. Torquato o
doutor Ruy Gomes Golias, mestre-eschola da Collegiada, e outros
capitulares, com o fim louvável de mandarem restaurar o tumulo
do santo, aquelle mestre-eschola extrahiu parte do calcanhar di-
reito do bemaventurado martyr, trazendo para a capella da sua
casa da rua das Lamellas aquella veneranda relíquia. Surprehen-
dido pela morte a 29 de março de 1649, ter>do completado 20 an-
nos do seu mestre-escholado que principiou a exercer em 7 de
abril de 1629 por ter permutado com o seu antecessor a abbadia
de Villa Nova de Sande, não pôde ordenar que depois do seu fal-
lecimento a referida reliquia fosse entregue a quem mais cuida-
dosamente a venerasse. Decorridos i3 annos constara ao activís-
simo D. Prior d'esse tempo D. Diogo Lobo da Silveira, que existia
essa reliquia em poder de Ignez de Guimarães, Catharina Golias,
e Luiza de Guimarães, sobrinhas do fallecido Ruy Golias, e con-
seguiu que aquellas senhoras a cedessem sendo trasladada festi-
vamente da capella do Menino Jesus, da casa das Lamellas (hoje
Tribunal) para a egreja da Collegiada no dia 21 de dezembro
de 1662. Assim se conservou durante 2 annos, findos os quaes o
mesmo D. Prior lhe mandou fazer á sua custa o relicário allu-
dido.
— ii9 —
Cofre de relíquias
É de prata dourada e encerra numerosas relíquias encontradas
em 1419 pelo D. Prior Luiz Vasques, dentro de uma caixa que
estava no altar-mór. A tomar toda a frente e os lados, tem esta
inscripção em caracteres gothicos ligados:
ERA DE MIL E CCCCLVII ANNOS EN DIA DE
S • MARIA DE MÇO LVIS VASQES POL DESTA
IGIA FEZ ABRIR HVA ARCA QESTA' EN O ALTAR
MOOR A QVAL NO SABIAN ABERTA DES MAMORIA
DOS OMES E FORON EN ELA ACHADAS ESTAS RE
FICAS PAR DA VESTEDVRA DE NOSO SENHOR
[HV XP E PTE DE HV BEO DE SATÃ MARIA
E DAS VESTEDVRAS DOS APÓSTOLOS E MAR
TtS E DE OVTRAS RELIQIAS DE SANTOS
E SANTAS OTRAS
Leitura: — Na era de 1437 annos, em dia de Santa Maria de
março, Luiz Vasques, Prior d'esta egreja, fez abrir uma arca que
está no altar-mór, a qual não sabiam aberta desde a memoria dos
homens, e foram n'ella achadas estas relíquias: — parte da vesti-
dura de Nosso Senhor Jesus Christo e parte de um véo de Santa
— 120 —
Maria e das vestiduras dos Apóstolos e maityres e de outras ich-
quias de Santos e Santas outras.
Sobre a tampa lê-se:
AVTEM
1HUS
— Oito purificadores de prata que o cónego António de Sousa
mandou fazer por conta da Fabrica no anno de i665. O primeiro
tem esta inscripçáo em toda a volta:
O CÓNEGO ANT" D SOVSA MANDOV FASER
8 CASTISSA DESTE LOTE POR CONTA DA FABRICA
Nos restantes sete :
SOSA POR CONTA DA FABRICA- ANNO l665
— Um jarro de prata e bacia do mesmo metal, com estes di-
zeres ao centro :
VT POTIAR PACIOR
— Um cofre de prata que encerra o craneo de S. Rodrigo, e
no qual está gravado: ano 1787.
Antes d'este houve outro cofre de marfim e arame dourado,
como se diz no inventario de 1D27: «Item outra arca de marfim
chapeada de arame dourado, aonde está a cabeça de um santo
que presta para mordeduras de cães damnados».
O cónego prebendando Pedro de Mesquita deixou um livro
manuscripto em que nos diz ter fallecido pelos annos de 1480 «um
homem virtuoso» de Villa Cova. concelho de Felgueiras, e accres-
centa que os devotos tiraram da sepultura a cabeça do morto «e
a trouxeram a Guimarães a casa de um ourives chamado Pedro
Alves, qie morava na rua sapateira, nas casas da esquina da
travessa que vae para a cadèa da correição, o qual foi avô do
cónego Manuel da Silva; e este tirou da cabeça os queixos de-
baixo, e encastoados em prata á sua custa os deu aos que a trou-
xeram, por lhe deixarem o resto da cabeei, o qual guardou em
sua casa aonde os doentes (de mordeduras cie cães hydrophobos)
a hiam tocar, e recebiam saúde; e por sua morte a mandou col-
locar na egreja cie Nessa Senhora da Oliveira» *.
#
Junto da lapide da sagração, a que já fiz referencia, appare-
Antiga Guimarães, pag. 210.
— 121 —
ceu outra sem ornatos que mede ora,44 em quadrado e que tem gra-
vada esta inscripçao:
ESTA CAPELA / MANDO
V FAZER AFONSO ANDRÉ
CONIGO/ DESTA IGREEA
E ABADE DE SANGEES/a
lovvor de santo andr
e / e foi feita en a era de
mil e qvatro centos
e coreenta/e sete
os/devs se ammercee-
Leitura: — Esta capella mandou fazer Affonso André, cónego
d'esta egreja e abbade de S. Gens, a louvor de Santo André; e
foi leita na era de 1447 autios. Deus se amerceie d'elle.
Sem duvida esta lapide refere-se á capella de Santo André,
no claustro, visto não constar que em tempo algum existisse alli
outra da mesma invocação.
A esquerda de quem entra para o referido claustro, pela rua
de Nossa Senhora da Guia, vê-se um tumulo aberto em arco na
parede interior, com estes dizeres sobre a tampa :
ESTE : HE : DE AFOM VIEIRA : E DE SVÁ : GERA
Leitura: — Este fjaçigo) é de Affonso Meira e de sua geração.
#
A direita, e por sobre dois arcos egualmente com túmulos,
está embebido na parede um brazão pintado a cores, tendo em
volta este lettreiro gothico, em relevo, de leitura difficil:
ESTA : OBRA : E DE GIL : LOVRENCO \
CAVALEIRO : CRIADO DELREI : DOM LHA
Leitura: — Esta obra é de Gil Lourenço, cavalleiro creado de
el-rei Dom João.
Foi este Gil Lourenço de Miranda, alcaide-mór de Miranda
do Douro, que aos 4 dagosto de 1430. instituiu o morgado de
S. Miguel, em S. Clemente de Sande, com casas e torre entre
as ruas do Ferreiro e das Flores, nascente e poente do campo
da Misericórdia por isso que as referidas casas e torre ficavam
ao centro, a defrontar com a egreia.
122
Caiu em ruinas aquelle grande edifício, e a sua pedra íoi ven -
dida em 17 de janeiro de ió56 pela quantia de 140:000 réis, para
a construcção do hospital da Misericórdia, hoje casa do despacho
da mesma prestantissima instituição.
Capella do Capitulo
A porta desta capella antiquíssima, situada ao 1 Lindo do claus-
tro, é de architectura romano-byzantina.
Tem dos lados, duas grandes janellas do mesmo estylo tapadas
a pedra e cal que vão em breve ser postas a descoberto.
123
A torre antiga foi demolida em idi5, dando principio á actual
o doutor Pedro Esteves Cogominho, ouvidor das terras do Duque
de Bragança, e sua esposa D. Izabel Pinheiro, filha de Tristão
Gomes Pinheiro, que por ordem do Duque cercou Barcellos, os
quaes apenas puderam fazer construir o primeiro terço em forma
de capella abobadada de pedra com dois túmulos ao centro enci-
mados pelas suas estatuas jacentes em tamanho natural, trajando
ricos vestidos da epocha, tudo primorosamente esculpturado em
pedra de Anca.
O doutor Pedro Esteves, que em 1448 fundou em Barcellos a
Casa-solar dos Pinheiros, era avô da ex.ma esposa do illustre ge-
nealogista sr. José de Azevedo e Menezes, da Casa do VinhaL
A' cabeceira dos túmulos ergue se um altar de granito fino onde
se encontram gravadas as cruzes da sagraçao, e no qual se cele-
brava missa aos domingos e dias santificados, podendo o publico
assistir a cila do largo fronteiro por uma das duas janellas rendi-
lhadas que fornecem luz á capella. A abobada, os túmulos e as
paredes interiores, tudo está de tal modo salitrado, que dentro de
breves annos nada existirá distinguivel.
Por morte dos instituidores coube a administração d'esta ca-
pella a seu filho o dr. Diogo Pinheiro, D. Prior de Guimarães desde
i5o3, que lhe collocou na frente as armas da familia com esta
inscripção gravada ao fundo em caracteres miúdos e já bastai. te
apagados :
r n ESTAS ARMA:. MADOV AQVI POR
D. DIOGO PINHEIRO ADMI
N1STRADOR DESTA CAPELLA
O mesmo D. Diogo, que em 1 5 1 3 concluiu a obra da construc-
ção da torre, íoi commendatario dos mosteiros de Carvoeiro, da
Junqueira e de Castro de Avelans, Bispo do Funchal e Prelado
do convento de Thomar onde falleceu em julho de 1 5 14, sendo
sepultado na egreja de Santa Maria dos Olivaes.
O sino de Nossa Senhora, que apenas se faz ouvir nos dias
mais solemnes, foi alli collocado em 5 de dezembro de 1822, e
peza 67 arrobas e 6 arráteis, na importância de réis 646:000.
Entre as ameias da frente da torre construiu- se uma sineira
elegante, sendo encarregado da obra o mestre pedreiro Manuel
dos Santos, como o indica esta inscripção gravada no lado es-
querdo :
MANO
f:l dvs (siç)
SANTOS
O MESTRF
— 124 —
Collocaram alli o sino do relógio que foi feito em 1744, sendo
vereadores Luiz Pimenta e Gonçalo Peixoto.
Ao lado direito, pendente dum arco de ferro, está o sino das
meias horas com estes dizeres em volta :
IHS MARIA .IOSFPH
ANNO 1686
HE DA GAMARA DESTA VILLA GES
Esteve primitivamente no castello e dava signal para se fecha-
rem á noite as portas da antiga villa.
A vereação emprestou-o á irmandade de S. Torquato, poroc-
casião da trasladação do Santo, a qual teve logar no dia 4 de ju-
lho de i852. Quebrou então, e a irmandade ohrigou-se a mandar
fundir este pela forma do quebrado, com todos os dizeres e ornatos.
O PADRÃO
Na faceta da frente da columna oitavada do cruzeiro gothico
que se levanta sob a abobada do padrão de Nossa Senhora da
Victoria, mondado construir no reinado de D Aífonso IV, em
frente á porta principal da Collegiada, está embebida uma pequena
lamina de bronvce com esta inscripção gravada cm caracteres
gothicos miúdos:
Leitura : — A' honra de D sus
e de Santa Maria, e por esta
villa mais honrada ser e o po-
vo, fez fazer esta obra Pedro
Esteves, de Guimarães, merca-
dor morador em Lisboa, filho
de Estevão Garcia e de Martha
Peres, na era de i38o annos.
aos 8 dias de setembro.
A AUNRA-f-D-|-DEv:5+ED-i-
SCÁ -f MARIA+EPOR+ES
TA+VII-A-f-MAIS-f-ONRA
DA-|-SEER-r-EO 1'OBOO + F
EZ-j-FAZER-fESTA-L-OBR
A+1'ERESrEVEZ-t-D-fGV
IMAKAAES— MERCADOR-f-
MORADOR-|-EN-f LIXBOA
FILHO-j-D-fSTEVÃ-j-GCl
A-f E 1 > -j-MT A -f PEZ-|-NA-f-E
-j-M-f-CCG-(-LXXX-|-ANOS-f-
VlIl4-[>IAS-j-D-i-STENBRO
-j-MLAFEX-f-
As lettras da orla inferior
indicam certamente o nome do
auctor da obra :
M. L. a fe\.
Em quatro dos lados da co-
lumna estão gravadas umas
abreviaturas que representam
os nomes dos pães e filho a
que a inscripção allude, e ain-
da de outro filho Gonçalo que
foi encarregado de ir á Nor-
— 125-
mandia comprar a cruz. Estão abreviados do seguinte modo :
g.° — p° — st — MT
Leitura : — Gonçalo— Pêro— Estevão — Martha.
Em volta da cruz encontram-se as estatuetas da Virgem, S. João
Evangelista, S. Damazo, S. Torquato, Senhora do Rosário, o
Apostolo S. Filippe e S. Gualter.
Num dos quatro arcos ogivaes d'este padião fez-se de estuque,
á altura dos capiteis das columnas, um pequeno oratório envidra-
çado, com a imagem de Nossa Senhora da Victoria. Aos lados da
referida imagem havia estas duas taboas com esculptura antiga^
em relevo, que actualmente existem expostas no museu :
A primeira representa D. João I ajoelhado junto do padrão a
agradecer á Virgem o vencimento da batalha de Aljubarrota; e a
segunda o advogado Pedro de Oliva, que se propunha, como na
— 125 —
occasião dissera, destruir os privilégios do Cabido e dos seus ca-
seiros, o qual caiu repentinamente «com a lingua fora da bocca,
a fala perdida e o rosto disforme» aos pés dos cónegos Luiz Gon-
çalves e Abbade de Freitas, que o reprehenderam em publico.
Este Pedro de Oliva morreu horas depois, sendo sepultado na
egreja de S. Francisco. Ao cabo de 33 annos, quando o corpo de
sua mulher baixava á mesma campa, appareceu o cadáver incor-
rupto, e foi então exposto ao exame do publico, encostando se á
parede da egreja para de novo se lhe dar sepultura, juntamente
com o de sua esposa.
O cónego Gaspar Estaco encontrou em i6a5, no archivo da
Collegiada, um pergaminho que reproduziu do modo seguinte nas
suas Antiguidades, cap. 41, pag. ibb: «Senor. Aífonso Peres ta-
balliam na vossa villa de Guimarães faço saber a v. m. q na era
de M.CGG.LXXX annos, oito dias de setembro foi posta a cruz
na flvaçaria de Guimarães, a a aduceu hi P." Steves nosso natu-
ral, filho que foi de Stevo Garcia en outro têpo mercador de Gui
marães, e a qual cruz G.° Steves irmam do ditto P.° Steves diz
que foi vontade de Deus, que lhe deu a entender, que fosse a
Normandia Anafrol, e que comprasse a ditta cruz, e a ducesse a
este lugar de Guimarães hu está assentada a par da Oliveira, a
qual oliveira quando esta cruz a par delia assentaron era seca, e
da quel dia a três dias começou de reverdecer e deitar ramos, e
eu A.° Peres taballiam esto escrevi».
O documento transcripto refere-se á inscripção e mostra-nos
que a cruz foi levantada no dia 8 de setembro de 1342.
A palavra Alvaçaria, que os antigos e modernos historiadores
da Collegiada não esclarecem, foi certamente mal copiada do per
gaminho onde devia estar escripta com um c em logar de v~Al-
caçaria, corrupção de Alcaíçaria, que os Árabes derivam de Cai-
çar, (César), por crerem que este imperador foi quem primeiro
mandou edificar no Oriente umas casas que por tal motivo assim
se denominaram, e ás quaes deu a forma dos claustros dos nos-
sos conventos, com bastantes lojas para os mercadores se reco-
lherem. Estas casas tinham, para maior segurança dos recolhidos,
uma única porta que estes fechavam á noite.
Pêro Esteves era mercador natural de Guimarães ; a actual
rua da Rainha, n'outro tempo dos mercadores, termina a poucos
passos da cruz ; e el rei D. Manuel, em princípios do século xvi,
faria surgir das ruinas d'aquelle velho edifício a alpendrada que
mandou construir em toda a volta do largo onde se ergue o Pa-
drão e a vasta egreja Collegiada, como ainda se pôde ver aos la-
dos norte e sul, incluindo a casa do Senado, e como ha alguns
annos egualmente se via na parte do poente.
Por tudo isto sou levado a crer que no século xiv havia no
— 127 —
largo fronteiro á egreja da Collegiada uma Alcaçana, i. é. um
edifício em que os commerciantes da villa se recolhiam.
Normandia anafrol, é também um problema onomástico que
me obrigou a empregar bons esforços para poder propor uma hy-
pothese que se me affigura acceitavel. A' Normandia, uma das 36
provincias da antiga divisão administrativa de França, pertence a
considerável cidade de Honíieur (Huneflorium) que em princípios do
século presente contava 8:600 habitantes '. A verdadeira pronun-
cia d'este nome francez, pouco se approxima do Anafrol ; porém
vertida em portuguez pelo Affonso Peres, taballiam, e ainda por
outros do seu tempo, dá sem duvida o Anafrol do pergaminho :
e em tal caso ficaremos sabendo que a belía cruz do padrão foi
feita na referida cidade de Honjleur, pertencente á aha Normandia.
Este padrão foi considerado monumento nacional de 2.a classe por
decreto publicado no «Diário do Governo» n.°62, do anno de 1881.
Parte do lado norte d'este largo é oceupado pelo curioso edi-
fício da Camará, construído no século xvi sobre grandes arcos ogi
vaes chanfrados que oíferecem livre transito para os lados da pra-
ça de S. Thiago.
No cunhal esquerdo tem uma inscripção lapidar como a d^
egreja de S. Miguel do Castello, de que já falei referente ao. voto
de el-rei D. João IV.
Em 2i de junho de 1877, collocou-se no alto da fachada a ele-
gante estatua de granito representando Guimarães, apeada do en-
tão arruinado edifício da Alfandega que logo principiou a ser
demolido para em seu logar se construírem as casas que hoje afor-
moseam a praça de D. Affonso Henriques.
A Insigne e Real Collegiada de Nossa Senhora da Oliveira,
extincta como todas as do reino, foi reorganisada por carta regia
de 8 de janeiro de 1891, depois da competente auetorisação dada
ao governo pela carta de lei de 14 de setembro de 1890, crean
do-se junto d'ella um instituto de instrucção publica gratuita com
a denominação, de Pequeno Seminário de Nossa Senhora da Oli-
veira. Em 20 de fevereiro do mesmo anno foi aberto concurso
para provimento dos logares de 10 collegiaes (7 cónegos e 3 be-
neficiados) e do Dom Prior (presidente) os quaes foram providos
no mesmo anno. Este primeiro Dom Prior, sr. D. José d'Andrade
Sequeira, falleceu em dezembro de 1894, sendo substituído pelo
actual sr. conselheiro D. Manuel d'Albuquerque, apresentado por
decreto de 20 de junho da 1895, o qual tomou posse no dia 28
de setembro do mesmo anno.
' Dictionnaire Geographique, par Vosgien, pag. 290.
— 128 —
Por Provisão de 12 de novembro de 1891 foram dados á Col-
legiada, pelo chorado Arcebispo D. António José de Freitas Ho-
norato, os novos estatutos datados de 3o de setembro, e approva-
dos pelo governo em 3o de outubro. Pelo decreto, hoje com força
de lei, de 18 de abril de 1895, foi reduzida a côngrua do Dom Prior
e supprimidos os dois logares de coadjutores otficiosos.
O Pequeno Seminário foi organisado em Lyceu Nacional por
decreto de 16 de setembro de i8qó.
N'outro tempo esta Gollegiada compunha-se do D. Prior, Chan-
tre, Thesoureiro-Mór, Mestre-Eschola, Arcediago de Sobradello,
Arcipreste, Arcediago de Villa Cova, 14 cónegos prebendados,
8 meios prebendados e 12 padres coreiros.
Egreja de S. Pedro de Rates
Não pertence ao concelho de Braga esta preciosa egreja, mas a sua
historia está intimamente ligada á da nossa cathedral, por que se diz
que S. Pedro de Rates foi o primeiro Bispo de Braga. Por isso
D. fr. Balthazar Limpo ordenou em 1 552 a trasladação dos veneran-
dos restos, até então guardados na egreja de que dou gravura, para
a Sé onde se se conservam em capella da mesma invocação.
Data do anno de 716 a fundação d'esta egreja. Destruída pe-
los Árabes foi em noo reconstruída a expensas da rainha D. The
reza que alli estabeleceu os monges da Caridade.
— I2g —
O actual edihcio deve pertencer, em grande parte, aquella
epocha por ser exemplar precioso da architectura românica.
Em í3i5, esta egreja, que, apezar de pequena, tem três naves,
pertenceu aos cónegos Regrantes que tiveram alli o seu mosteiro.
No adro ainda se conservam algumas sepulturas cavadas em
grandes pedras. Por proposta minha, foi classificada monumento
nacional em 1897.
Egreja de Cerzedello (Guimarães)
- 1 DO —
A Ordem Militar dos Templários teve origem na Palestina, e
crê-se que a sua fundação data de 1119 por ser este o anno em
que principiou com votos.
Em 11 28 recebeu a Regra que lhe foi dada pelo Papa Honó-
rio II. Ao cabo de quasi dois séculos de existência terminou na
França e, em virtude dos conhecidos Decretos Apostólicos, extin
guiu se egualmente em Portugal no reinado de D. Diniz, sendo os
seus bens encorporados na nova Ordem de Christo que o mesmo
monarcha instituirá.
A extincção da Ordem dos Templários foi publicada por Cle-
mente V na segunda sessão do XV Concilio Geral Viennense que
teve logar no dia 3 de abril de i3 1 2.
Os Templários não haviam sido fieis ao juramento solemne
com que prometteram perpetua fidelidade, sugeição, castidade, e
obediência a Jesus Christo, ao Pontífice e ao Reverendo Mestre
da Ordem. Aquelles que em Jerusalém pugnaram pela conquista
da cidade e libertação do Santo Sepulchro, regressaram a Portu-
gal com grandes conhecimentos das artes de Byzancio adquiridos
na visita que fizeram aos monumentos da Grécia e principalmente
da Ásia. Desde logo a architectura romana tomou uma feição in-
teiramente nova, enriquecida pelos primores do estylo que ainda
hoje podemos admirar-lhe. Urbano III, Gregório IX e Clemente IV
permittiram que a Ordem mandasse edificar egrejas nos logares
conquistados aos infiéis, declarando as isentas da Jurisdição Pre-
laticia e immediatas á santa Sé Apostólica.
A actual egreja parochial de Santa Christina de Cerzedcllo, no
concelho de Guimarães, foi edificada pelos Templários em meado
do século xii. Esta vasta egreja, de uma nave e sem transepto,
mede exteriormente 34 metros de comprido e 7'", 78 de largo.
No remate da fachada pousa uma pequena pedra em forma de
palmatória tendo gravada ao centro a cruz octogona da Or
dem, a qual nas quatro extremidades corta para dentro em semi-
círculo.
A porta principal, com a archivolta bellamente ornamentada,
está para o Occidente como era de uso antigo entre os povos ca-
tholicos e pagãos.
Estes entravam no templo ficando voltados ao Oriente em ado-
ração ao sol nascente ; e aquelles alludiam á posição de Jesus
Christo quando expirou no Calvário.
A cimalha, em volta do edifício, é de molduras simples, ornada
de pérolas a espaços, e descança sobre grossos modilhões comple-
tamente lizos. Ao lado esquerdo da fachada ergue-se, em forma
de muralha forte, com dois campanários no alto, o origirialissimo
torreão, genuína construcção da epocha. Não obstante ser coberta
de madeira, tem a egreja contrafortes ou gigantes.
3i -
Lado sul da egreja de Cerzedello
Próximo da capella-mór ha duas portas lateraes, vendo-se a do
lado sul coberta por pequeno alpendre com as respectivas colum-
nas encostadas a dois túmulos de pedra onde provavelmente des-
cançam um ecclesiastico £ um guerreiro, visto haver no da es-
querda uma espada gravada com um brazão ao lado, e o da di-
reita estar collocado com a. cabeceira para fora.
Numa das pedras da parede exterior norte, próximo da porta
lateral e junto do friso que outr'ora pertenceu á alpendrada, estão
cravadas as lettras :
SES
N NN
D O
Não pertencem á primitiva obra estes poucos caracteres nem
tampouco podemos admittir que fossem gravados de lado como
estão. A segunda e terceira linhas poderiam ser tomadas como
abreviaturas das primeiras palavras da divisa dos Templários —
Son nobis domine sed nomini tuo da gloriam.
Transpondo a porta principal da egreja o visitante entra numa
galilé curiosa que mede 9,53 de comprido por 5,67 de largo, com
dois túmulos abertos em arco na parede e o pavimento coberto de
sepulturas com grandes espadas toscamente gravadas sobre as
tampas. Numa d'estas existe um swastica de crusamentos duplos,
terminando em curvas, emblema funerário dos tempos do paga
nismo. D'aqui passa-se ao corpo da egreja por um arco que mede
na abertura apenas ira,97.
- IJ2 --
Todas as janellas inclusive a que fica sobre a porta principal,
conservam ainda a forma de setteiras.
O arco da capella-mór mede 3,68 na abertura e descança em
duas grossas columnas com os capiteis antigos. Por proposta mi-
nha foi 'esta egreja considerada monumento nacional em dezem
bro de 1897.
EGREJA E HOSPITAL DE S. xMARCOS (BRAGA)
(Vide gravura a pcg. i33)
No largo dos Remédios, onde nos primórdios do século xn ha
via uma pequena ermida e Albergaria adjunta com frente para les-
te, construiu-se em meado do século xvm a actual egreja e am
pliou-se o hospital que D. Diogo de Sousa reconstruíra em i5o8,
unindo- lhe as gafarias de S. Lourenço, Santa Margarida, Lazaro^
íque estava onde hoja se vê a egreja parochial de S. José de
S. Lazaro), a Albergaria da rua Nova de Sousa, e a Contraria
de Roque Amador e do Corpo de Deus.
A construcção do primitivo hospital de S. Marcos foi iniciada
pelo cónego Diogo Gonçalves. O Arcebispo D. Fernando da
Guerra, em seu testamento com data de 2 de setembro de 1467,
deixou «aos doentes do Hospital de S. Marcos outras de\ Livras».
Neste local existiu o convento dos Templários, extincto, como
todos os da Ordem, no anno de i3i2. O Arcebispo de Braga
D. Payo Mendes, conhecendo quão grandes eram os rendimentos
da capella, deu no anno de 11 18 a sua administração em Com-
menda a seu sobrinho D. Gualdim Paes, Mestre da Ordem em
Portugal. Este D. Gualdim, filho de D. Payo Ramires e de
D. Gontrode, nasceu em Amares, a 10 kilometros de Braga, no
anno de 1 1 18, sendo armado cavalleiro no campo de Ourique, por
el-rei D. Affonso Henriques, seu amigo, a 25 de julho de 1 i'òg.
Numa apostilla do Concilio de Troya, celebrado a 14 de ja-
neiro de 11 28, mostra-se que em 19 de abril do referido anno,
Braga possuia a Ordem do Templo. Diz a apostilla: «Et hanc
Cartam fílit roborata in manu D. Raymundi Bernardi in Civitate
Bracara; tali modo, & tali pacto: ut, si illud Castellum ante morte
nostra dederimus, nullis de nostris inimicis-in eo recipiant. Et si
ibi intraverit, mittant eum forus: sic, qui nulla contraria inde nobis
exeat». Este D. Raimundo Bernardo foi o II Mestre da Ordem.
Com data de 1 1 52 existe em Thomar um documento no qual
se declara que Ejeuva Aires e seus filhos venderam «vobis Jero
solimitani Templi Militibus, Pelagio Gontimiris, & Martino Pe-
lagii» uma Herdade que possuíam in Civitate Bracara, circa
illum vestrúm puteum de Hospitali... Fada Carta II. K. Junii
E.M.C.2X. E ainda em junho de 1148 o Mestre Gualdim Paes
-i33 —
cn
o
p
õs
CO
<D
■o
-t-J
a
to
O
I
d
'©
i_
ao
— 134 —
se concordou com Godinho Godins acerca da herdade de Banca
Mala, «sita na ribeira do Aliste, aítirmando o Mestre Guaidim,
que ella sempre fora de Domo Templi, quae est in Bracharensis
Civitate». O contendor termina d'este modo a doação: Ego Go
dinus Godinis hoc scriptum tibi Fratri Johani, qui pr0edictam Do
mum Templi custodis, & regis, própria manu roboro».
Era pois director e claviculano da Casa e Hospital de Braga
o dito Frei João.
O Arcebispo D. João Ovelheiro confirmou em agosto de 1 145
este Hospital fundado e dotado pelo seu predecessor D. Payo,
em beneficio dos pobres, e doou-lhe metade dos dizimos de todas
as rendas.
Em carta datada de 1 146 permitte e confirma D. Affonso Hen-
riques a doação, e ordena que as fazendas e herdades com que
D. Payo dotara o Hospital, e as quaes depois da sua morte os
bracarenses usurparam, sejam restituídas na integra.
A administração Camarária do Hospital terminou quando D. fr.
Bartholomeu dos Martyres o entregou de vez á Misericórdia.
As obras do actual edifício terminaram em 1780; e as da egre-
ja, que já em i8o5 prestava a sua capella mór á celebração do
culto, apenas se concluíram em i836, tudo dirigido e executado
por José Fernandes da Graça (o Landim). Foi auctor do desenho
e planta d'este vasto edifício o illustre bracarense (capitão de enge
nheria) Carlos Amarante, parente do sr. dr. Carlos Braga. So
bre o parapeito que serve de remate á frontaria assentam as
grandes estatuas de granito representando S. Simão, S. Bartho-
lomeu, S. Thiago Menor, S. João Evangelista, Santo André.
S. Pedro, S. Paulo, S. Thiago Maior, S. Thomé, S. Pbilippe.
S. Mathias e S. Lucas. Ao centro da fachada da egreja, que per-
tence á architectura Compósita, ha num nicho bem lavrado a es-
tatua do orago com esta inscripção por baixo:
BEATUS JOANNES MARCUS ChRISTI ■
Domini Discípulos Anagrama Js • in
Mundo pius • est Medicus • tuis incolis • bracara •
A urna que encerra os ossos de S. João Marcos e que est>
em arco aberto na parede do lado da epistola, na capella-mór.
é de mármore com embutidos de varias cores, tendo na frente
as insígnias prelaticias e os dizeres seguintes:
sacra ossa
divi joannis marci
Ao centro da capella mór existe uma campa de mármore onde
jaz o cónego João de Meira da Silva Carrilho, que em 2 de ou-
tubro de 1682 instituiu capella e coro com 6 capellães na ante-
-i35-
nor egreja do Hospital, denominada do Espirito Santo. Tem esta
inscripção:
s:bioaobverjuahr
\LHOCONEGOqF0IMAS7r
"MSSAW0 0DSATOOFF?
EDABVlírADACRVZAM
FALECE0EM25BJ/W?
&.l<ffrfr.téSTDlMM
OFF?TODOS0SAN0S.
,
Ha também na varanda do Hospital uma grande lapide com esta
inscripção:
E^MZAPERAOICONVAtCENTF!
GMTOBAFAMQNEfcAESTAEASIM
^ZAPWENWMAO.FAZERTV
&ASVA(vSTA.TEDRÔB^VIARÍ(lMIIÍftR
■&S!mOESW^MEIItKÉI\l!M
WSTD BRfSO NSMS.^tlS.SENTOSMIL Rcl S
| P*SE &RtWMW0SRENI!W<lTrSEB5'PEIIEr
'NAFORMADMDOIOMMHWlSA
p» ' ■ ' — ■ .. .... ntgf
LSTAVtDWVSUPRA tSTfNA NA C 0
WS/ALEt tNC, I A , AWTIGDAE FOI TRE
SíffcDADMESTEUJCARNOANNO
mm.
— 136 —
A casa da Convalecença, como se lê no meu livro InscripçÕes
e Lettretros, pag. 108, foi fundada por Pedro Aguiar, sirgueiro,
familiar do Santo Officio, morador no Rexio do Castello, por doa-
ção e contracto exarado nas notas do tabelliao geral de Braga e
seu termo, Matheus Gonçalves, aos n de fevereiro de 1648.
Sob a arcaria do claustro ha, sobre uma fonte, estes dizeres :
O 1LI.M.0 SENHOR D. RODRIGO DE
MOVRA TELLES ARC.° PRIMAZ FEZ
MERCÊ DESTA AGOA AOS 25
DE MAIO I723
A pouca distancia d'esta fonte conserva-se embebida na pare-
de uma lapide romana funerária que pertenceu á sepultura de
Heleno, servo de Talavo, de 3o annos de edade. Diz assim :
HELENVS
TALA VI
SER
ANNORV
M.XXX
H.S.E
Ao lado d'esta existiu outra, egualmente funerária, de Amaranto,
filho de Senecião. Dizia:
AMARANTVS SENECIONIS
H.S.E
Foram ambas encontradas nas escavações feitas para se assen-
tarem os alicerces do Hospital.
Quando mais tarde, em i835, se abriram os alicerces para a
nova enfermaria, oppareceram também estas duas lapides que se
acham embebidas na frente do edifício:
iovi . o . M
PROSALVTE
hEBVRRVS CAMAL TRIARIMAG
AV...S...NVS LEG.1VR.C V
XXX ET . PROCVLAE . VX
EIVS.AEMII .CRÉS
CENS . COMES . V . S . L . M .
Encostada á parede exterior do lado esquerdo deste vasto edi-
fício vê-se a capella de S. Bento, construída a expensas dos devo-
-i37-
tos por intervenção da Meza administradora da Misericórdia que
para este fim dirigiu ao Arcebispo D. José de Bragança uma pe-
tição em que se lê: «Diz o provedor e irmãos do serviço da meza
da Misericórdia, que vários devotos com suas offertas e esmollas,
querem fazer um nixo á emitação das capellas dos Passos e nel-
les collocar a pintura de S. Bento, que existe na parede detrás
do Hospital para se louvar a imagem tão milagrosa; e como na-
quelle sitio de trás do Hospital ha um claro e nelle um cruzeiro
antigo, querem neste mesmo sitio encostado ás paredes fazer o
tal nixo ou capella, pondo o cruzeiro mais á ilharga, cinco ou seis
palmos».
A capella construiu-se realmente e foi benzida por provisão
do Arcebispo no anno de 1755. A obra de pedreiro importou em
256:3q6 réis que com a de carpinteiro, pintor, ferreiro e caiador
prefez o total de 487:116. Importou em 34:3 15 a grade da porta,
e em 4:800 a imagem de S. Bento que está num nicho sobre a
mesma porta.
Que destino levaria o cruzeiro e a milagrosa pintura de S.
Bento ? E' certo que com esse descaminho não decresceu a devo-
ção popular, pois o S. Bento moderno recebe annualmente milha-
res de ovos numa caixa de madeira que está dentro da capella
com dois tubos de ferro que vêem á grade recebel-os.
Utilíssima devoção esta de oíferecer ovos ao S. Bento do Hos-
pital para se occorrer ás necessidades dos seus doentes !
Aos bons officios do meu presado amigo sr. Sebastião M. An-
tunes da Silva Monteiro, illustrado ofiicial da secretaria do Hospi-
tal, devo, alem d'outros obzequios, a seguinte nota dos ovos offe-
recidos a S. Bento durante os últimos oito annos:
Anno económico Numero de ovos
1891-92 8:644
1892-93 10:590
1893-94 10:490
1894-95 11:730
1895-96 14:254
1896-97 12:354
1897-98 12:368
1898-99 10:094
Com justificado motivo o povo, na sua phrase humorística, vae
chamando ao S. Bento do Hospital a melhor gallinha dos pobres!
Fica a poucos passos de distancia a quinta do Fojacal, onde
em novembro de 1750 appareceu uma pequena talha lavrada con-
tendo mais. de mil moedas wisigothicas.
i3S
SYNCHRONISMOS DOS SÉCULOS XI E XII
Das Cruzadas e das Ordens Religiosas foram, com rasão, de-
nominados estes séculos. Eram então frequentes as reuniões dos
Concílios, e as suas resoluções contribuiram efficazmente para o
bem estar geral.
Alguns sacerdotes, despresando a prohibicão decretada no an-
no de 387, contrahiam matrimonio ; e o concubinato chegou a
attingir taes proporções que os meios de repressão mais enérgica
eram muitas vezes de effeito negativo. Procurou-se a extincçáo
d'esse escândalo na declaração terminante de não poderem ser
admittidos a ordens sacras os filhos dos ecclesiasticos.
Os Bispos, reconhecendo a insuficiência das Tréguas de Deus
para a consecução da paz, da moderação do vicio e do respeito
aos actos do culto, ordenaram a suspensão das armas determinan-
do «que desde a quarta-feira á tarde até segunda de manhã, em
todas as semanas, ninguém atacasse o seu inimigo, nem exerci-
tasse violência ou hostilidade alguma, e que os que violassem
este regulamento, sendo reputados como incursos na pena de
morte, pagariam uma multa em comrrutação d'esta pena, ou se-
riam excommungados ou banidos».
No Concilio Romauum, celebrado a 18 de janeiro de io5o„ foi
coroado o Papa Nicolau II, fazendo a ceremonia o Arcebispo Hil-
debrando que poz sobre a cabeça do Papa uma coroa real com a
inscripção seguinte no circulo inferior :
CORONA REGNI DE MANV DEI.
No immediato : diadema imperii de manv petri.
Não nos diz a Historia que outro Papa fosse coroado anterior-
mente a este, podendo por isso acreditar-se que de todos fosse elle
o primeiro.
A tiara é a insígnia do poder temporal dos Papas iniciado com
as doações territoriaes de Spoleto, Ravennas e Pentapola. Pio VI
possuía quatro de que Bonaparte se apoderou. Annos depois Na-
poleão I offereceu a Pio VII algumas pedrarias para uma tiara
nova.
Mr. Eugénio Muntz, depois de consultar inventários e manda-
— i3g —
dos de pagamento existentes nos archivos secretos do Vaticano,
diz-nos que a tiara foi a principio cónica, depois tumescida pelo
meio e, finalmente, quebrada no alto, onde poisava uma pedra pre-
ciosa formando um globo em que se erguia uma cruz. Modificou-se
quando o papado se estabeleceu em Avignon, substituindo-lhe os
motivos gothicos pelos romanos. As três coroas sobrepostas fo-
ram-lhe applicadas sob o pontificado de Bento XII (i338-i342).
Gregório VII (1073 85) reservou para os Pontífices de Roma o
nome de Papa que todos os Bispos usavam.
No Concilio Barcinonense (1068) tratou-se da substituição do
rito gothico pelo romano, ficando o assumpto para ser estudado no
Concilio Burgense (em Castella-a-Velha) no anno de 1080, onde
definitivamente el-rei D. Aífonso VI ordenou a adopção do rito ro
mano em toda a Hespanha.
Não sendo porém geralmente bem recebido este decreto, pro-
poz-se a decisão por meio de um duello, pelejando um cavalleiro
a favor do rito gothico e outro a favor do romano. Venceu o go-
thico ; mas o rei fez prevalecer a sua vontade ! !
Em 1072 decretou se que todos os presbyteros ministrassem o
baptismo em jejum, salvo em caso de necessidade, e prohibiu-se-
lhes que conservassem por mais de 8 dias as partículas e a agua
benta.
O uso de queijo e ovos na quaresma íoi prohibido em io85
pelo Concilio Quintiliburgense ; e em 1090 inventou Pedro Ere-
mita os rosários. Não obstante, porém, conta a Chronica Sera-
phica que a matriarcha Santa Clara resava por pedrinhas.
Durante este século decorriam por vezes tumultuosos os Con-
cílios, prendendo-se agora um Bispo, logo um Pontífice em plena
assembleia, só porque era costume, na discussão de casos graves,
dizer todas as verdades. Para pôr cobro a desmandos e irreve-
rências resolveu-se que as relíquias dos santos mais notáveis es-
tivessem alli presentes, sendo processionalmente conduzidas e
acompanhadas por innumeras pessoas cantando Psalmos, Hymnos
e Ladainhas. O clero ás vezes não queria restituil-as e os donos
dispunham-se a tomal-as de assalto quando regressavam do Con
cílio ás egrejas, travando-se por isso desordens sanguinolentas cm-
quanto os clérigos e os monges as dividiam entre si, desappare-
cendo em seguida.
O motivo de muitos indivíduos do referido século procurarem
obter de Deus perdão para os peccados e remédio para os soffn-
mentos physicos, vivendo em continua romaria ás sepulturas dos
santos, era o desejo de fugirem ás responsabilidades sociaes da
epocha e de se entregarem ao ócio e á curiosidade, pretextando
uma piedade irrequieta e falsa, a propósito da primeira expedição
dos Cruzados á Terra Santa.
— J4-0 —
Os cenobitas solitários, arroteando matagaes incultos onde vi-
viam, por assim dizer, entre feras, prestavam á sociedade altíssi-
mos benefícios temporaes, porque os seus humildes cenóbios fo-
ram d'esse modo mais tarde convertidos em povoações importan-
tes. Esta circumstancia é bem digna de ponderação para que se
reconheça ao menos este importante serviço dos humildes reli-
giosos.
Os leigos conscienciosos, usurpadores dos bens das egrejas,
temiam tanto as penas que os Concílios comminavam contra elles,
que se apressavam a restituil-os doando-os aos Mosteiros. Os Bis-
pos não viam com bons olhos este systema de restituições, mas os
monges, defendendo os interesses da communidade, oppozeram-se
á opinião dos Bispos e conseguiram a approvação pontifícia !
Por esse motivo os Mosteiros se reproduziam ricos embora a
Ordem lhes designasse a profissão de pobreza.
No anno de io5o o procurador do Mosteiro de Guimarães,
fr. Fagildo, queria prender Sueiro Exemeniz por ser accusado
de um homicídio e por se inculcar senhor dos homens de Mata-
má. Na sua defeza, Sueiro alegava que a villa erat sua reritas
como já o havia sido dos seus Avós. fr. Fagildo teimava, quia
erat, vertias da casa de Vimaranes. Por fim esta questão foi deci-
dida em Jugueiros na presença de Gomizo Eitaz, grande numero
de homens bons, Senhores de Guimarães, (clérigos e monges) e o
juiz da localidade, em favor dos frades e freiras que habitavam in
Cimiterio Vimaranes.
E' sabido que no presente século foi quasi geralmente abolida
a vida claustral dos cónegos estabelecida no século íx e que alguns
Bispos a renovaram nas suas Cathedraes, embora com tão grande
diíferença que podiam receber curatos e outros empregos eccle-
siasticos.
Por isso D. João Pires, no seu testamento datado de i23o,
deixou ao Cabido dos cónegos da Collegiada de Guimarães um
copo de prata para seu filho beber por elle no refeitório.
O Papa Alexandre III, aconselhado por D. Aftònso Henriques,
ordenou em 1 165 ao Arcebispo de Braga D. João Peculiar que de-
terminasse em Provisão que os cónegos da sua Sé não fossem mais
de quarenta, que vivessem em communidade, e que não fossem
bastardos, nem infames, nem soberbos. Alexandre IV, em I2Ô5,
prohibiu que na referida Sé houvesse mais de vinte e que os res-
tantes fossem expulsos. Bento XIV, por Breve de 1746, concedeu
ás dignidades e cónegos de Braga o uso de solideo, inclusivamente
nas missas. Egual concessão foi feita aos cónegos da Collegiada
de Guimarães.
O sigillo da confissão era insistentemente recommendado por-
que, com verdade ou sem ella, havia muito quem aceusasse os
— 14» —
padres de não o saberem guardar. A celebração de missas foi
reduzida a uma diariamente, excepto quando se exigissem para
suffragio de qualquer defunto. Aos padres que por negligencia
deixavam cair a hóstia consagrada, impunham-se pesadas peniten-
cias, e os réos de grandes crimes iam a Roma, com cartas dos
seus Bispos, receber do Papa a penitencia devida.
Ainda n'este século se instituiu a commemoração dos fieis de-
funtos no dia seguinte ao da festa de todos os santos; e o canto
da egreja foi grandemente aperfeiçoado pela invenção de Gui,
monge de Arezzo na Toscana, que em 1026 descobriu o methodo
das linhas da musica (escalas) e as claves (posições).
No Concilio Ovetanum, celebrado em iii5, adoptaram-se as
mais enérgicas providencias e comminaram-se penas graves contra
os que violavam os asylos sagrados e praticavam roubos nas
egrejas.
A canonisação dos santos pertenceu exclusivamente aos Me-
tropolitanos até ao século x em que os Pontífices reservaram para
si esse direito. Porém alguns prelados não acataram a determi-
nação pontifícia e mantiveram-se no propósito de continuar a exer-
cer aquelle antigo direito. O Arcebispo de Ruan, por exemplo,
canonisou em 11 53 S. Gotiero, Abbade de Pontoise, sendo este
o ultimo abuso, pois Alexandre III os prohibiu terminantemente.
As Ordenações, a administração dos Sacramentos, a collação
dos Benefícios e outras funcções espirituaes, que eram pagas
pelos fieis, passaram a ser gratuitas, permittindo-se comtudo a
esmola voluntária pela celebração da missa, que n'este século xn
era de um soldo, no seguinte de dois, e no principio do xiv de
três. No anno de i52o celebravam-se nos Mosteiros missas de três
em renge, a canto e órgão, com assistência da communidade,
por 20 réis de esmola! As resadas 12 réis, e três annos depois
18 réis. O Synodo celebrado em Coimbra no anno de ;566, ele-
vou esta esmola a 3o réis. Em i5cjo, el-rei D. Manuel, por uma
Provisão que dirigiu á Misericórdia de Coimbra, concedeu que
fosse de 40 réis a esmola da missa resada-, e depois d'isso as
Constituições marcavam estas em 120 réis e as cantadas em 480.
Antigamente nem só ao incruento sacrifício se dava o nome
de missa. Nos adros das egreja distribuiam-se esmolas pelos po-
bres para estes resarem por alma de um defunto, e a esta esmola
chamou- se missa dos pobres. Em sufrágio da alma do defunto
soccorriam-se os Hospitaes, e essas esmolas denominavam-se mis-
sas dos espritaaes, etc.
No Concilio Beneventanum, celebrado em abril de n 17, o Papa
Paschoal II excommungou o Arcebispo de Braga D. Maurício
Bourdim, seu Legado, por haver coroado em Roma o Imperador
quando Sua Santidade se achava em Monte Cassino.
— 142 —
No Nannetense, em n 27, aboliu-se o velho costume de serem
entregues para o Senhor todos os moveis do consorte lallecido;
e no Trecense, a i3 de janeiro de 1128, presidido pelo Legado
Matheus de Albano, foi resolvido que se desse aos Templários a
Regra e o habito branco, por se reconhecer essa necessidade du-
rante os 10 annos que a Ordem já contava de existência.
O uso dos Monitorios foi introdusido pelo Papa Alexandre III
(u59-8i).
N'este século desenvolveu-se o uso das antigas mortificações
voluntárias, as disciplinas, os cilícios; e muitos dos fieis recom-
mendavam que nos paroxismos da morte os estendessem numa
cama de cinza ou lhes vestissem um habito de monge. O costume
de juntar na cpmmunhão as duas espécies, pão e vinho, foi ter-
minando, havendo já nos fins do século quem não recebesse mais
que uma, como agora.
Os Cruzados trouxeram á Europa a enfermidade da lepra
cousiderada incurável a qual, por esse motivo, era tratada numa
habitação isolada chamada gafaria ou Ordem de S. Lazaro, por-
que este santo também foi leprozo. O terceiro Concilio geral de
Latrão occupou-se da Ordenação dos Lazaretos concedendo lhes
cgrejas particulares, padres e cemitérios.
Todos os indivíduos que attingiam o uso da rasão eram obri-
gados a confessar ao seu parocho os peccados commettidos du-
rante um anno e a receberem, ao menos pela Paschoa, a Sagrada
Eucharistia, depois de satisfeita a penitencia que lhes íosse im-
posta, a qual então consistia na peregrinação á Terra Santa; no
combate aos infiéis durante certo numero d'annos; em jejuar a
pão e agua; em não vestir seda nem linho; em mendigar o ali-
mento; em não cazar segunda vez; e.. em se postar, nos dias
mais solemnes, á porta da egreja, em camiza, com um feixe de
varas para com ellas ser fustigado pelo clero e pelo povo!
O impedimento de parentesco na celebração do matrimonio
restringiu-se do 7.0 ao 4/ grau, e condemnavam-se os que por
esse tempo se effectuavam clandestinamente, ordenando-se que de-
pois de justos fossem pelo cura publicados na egreja a fim de se
descobrirem os impedimentos que porventura houvesse. Esta me-
dida que se tornou geral, já em alguns logares estava estabeleci-
da. Havia no século vn uma classe de maridos denominados co-
nuçudos (conhecidos como tal), que não eram canonicamente re-
cebidos. Já existia o casamento como hoje se usa, havia o con-
tracto matrimonial de que davam testemunho os parentes e visi-
nhos na presença dos quaes era feito. Este systema prolongou-se
até ao século xiv. Outro era um matrimonio segundo o direito na-
tural, dependendo apenas da vontade dos contrahentes. Matrimo-
nio e casamento eram duas cousas distinctas. O matrimonio da
— 143 —
mão esquerda era contrahido por uma pessoa de elevada posição
social com uma mulher do povo.
Até ao fim do século xv continuou entre nós a usança dos
matrimónios clandestinos, que el-rei D. Aftbnso IV procurara ex-
terminar em i352 com a sua carta sobre reformas ecclesiasticas,
dirigida aos Bispos do reino, dizendo-lhes que «muitos clérigos se
achavam casados», e ordenou que «todos os recebimentos fossem
feitos pelo respectivo parocho, perante um tabellião da mesma
freguezia, destinado para escrever em um livro todos os casamen-
tos que alli se celebrarem, para se saber depois os que são ou
deixam de ser casados, e a condição dos contrahentes».
Em 1499 conseguiu el-rei D. Manuel por termo ás inconve-
niências dos casamentos clandestinos, promulgando em 14 de ju-
lho uma lei na qual determinava «que sem excepção de pessoa,
todos se recebam publicamente, em face da egreja, e na forma
que os sagrados cânones decretam. E casando-se escondidamente,
por esse mesmo feito, assim o noivo como a noiva, percam todos
os seus bens, metade para a camera real e metade para captivos.
E todos os que a similhantes casamentos forem presentes ou tes-
temunhas, percam também todos os seus bens, com a mesma ap-
plicação, e sejam degradados por dois annos para Ceuta. Mas
d'estas penas serão isentos os que taes casamentos fizerem por
prazer e consentimento dos pães e mães dos noivos, se os tiverem,
porque n'esse caso, haverão somente as pessoas do direito canó-
nico» !.
No Concilio Tridentino, convocado em 1545 pelo Papa Pau-
lo III e terminado em i563, foi julgado impedimento derimente o
casamento celebrado clandestinamente; ainda assim el-rei D. João
IV não pôde deixar de decretar, em i3 de novembro de i65i, o
desherdamento dos filhos destes matrimónios. Também n'aquelle
tempo Martim Paes, cavalleiro de S. Miguel de Lobrigos, «doou
a sua mulher Maria Lourenço, certos bens em Santa Comba e
em outras partes per compra do vosso corpo, concedeu-lhe a posse
emquanto viva somente, perdendo-os se casasse 2. Esta doação
era denominada praetium virginitatis, por ser feita depois da pri-
meira noite do consorcio, quando o marido se julgava habilitado
a conhecer de perto os merecimentos da noiva.
Soeiro Viegas, em 1190, fez a sua mulher D. Sancha Vermu-
des uma carta de arrhas, deixando-lhes muitas propriedades, que
só possuiria se não casasse.
El-rei D. Affonso Henriques, na carta que endereçou a Celes-
1 Ord do tfeino. livro 5, tit. 27-1514.
- Doe. de Salsedas.
— i44 —
tino II, offereceu a S. Pedro quatro onças de ouro, por si e seus
successores, pagas annualmente. Desta carta existe copia no ar-
chivo do Arcebispado, gav. das Not., n.° 2, e termina do se-
guinte modo: «Facta oblationis, Firmitudis K. Idus Decembris
E.M.CLXXXI. Ego supradictus Adfonsus, Portugalensium Rex,
qui hanc K. fieri jussi, libenti animo, coram idoneis testibus pró-
pria manu confirmo».
Durou este tributo até ao principio do século xm. Hoje existe
em todo o orbe catholico uma collecta voluntária que se destina
ao mesmo fim. O dinheiro de S. Pedro, que estava estabelecido
em Aries, na Bohemia e na Polónia, era na Inglaterra uma con-
tribuição expontânea dos numerosos fogos, paga para a Sé Apos-
tólica.
Terminou* no tempo de Henrique VIII em vista do modo co
mo applicavam a pena de excommunhão áquelles que deixavam
de a pagar.
Durante este século, e muito especialmente no anno de 11 55,
havia nos Mosteiros um edifício denominado Sanguilexia, desti-
nado á sangra dura dos monges, de harmonia com o que dispunham
as Constituições de Pombeiro para que fossem sangrados de 2
em 2 mezes, e a fundação do Mosteiro do Tojal (Vizeu), para que
as religiosas fossem sangradas de 6 em 6 mezes.
A profanação das egrejas, os roubos, a falta de ordem e o
desprezo pelos serviços da lavoura, moveram o Concilio de Ovie-
do, celebrado em iii5, a determinar em favor da agricultura:
«Que ninguém faça penhora em bois, quer sejam mansos, quer
bravos: e quem o contrario fizer, seja maldito, e excommungado,
e tenha i5 annos de penitencia publica».
Sendo os Arcebispos e o clero bracarense uma potencia nos
primórdios da monarchia, quiz D. Aífonso Henriques obter as
suas boas graças, concedendo-lhes em 27 de maio de 1 128 al-
guns privilégios importantes, entre os quaes o de cunhar moeda,
com o fim de serem applicados á fabrica da Sé os rendimentos
da cunhagem d'ella: «Et sicut Avus meus Rex Alfonsus dedit
adjutorium ad Ecclesiam S. Jacobi faciendam: simili modo do,
atque concedo Sanctae Mariae Brach. Monetam, unde fabricetur
Ecclesia.. . Insuper etiam dono, atque concedo in Cúria mea to-
tum illud, quod ad Clericale Officium pertinet, scilicet, Capella-
niam, et Scribaniam, et caetera omnia; quae ad Pontificis curam
pertinent».
D. Aífonso II privou d'estes rendimentos a Sé de Braga ; e o
Pontifice Honório III publicou um rescripto, com data de 23 de
dezembro de 1221, ordenando aos Bispos de Astorga.e Tuy que
fizessem restituir á egreja bracarense, entre outras cousas, Cancel-
lariam, Capellariam, e Monetam de que a despojara o rei. Tudo
143-
Egreja de S. Domingos (Guimarães)
— i4<> —
porém foi infructifeio, porque a 26 de novembro de 1 238, estan-
do em Guimarães el-rei D. Sancho II, alli se concordou com o Ar-
cebispo D. Silvestre Godinho e seu Cabido, renunciando estes ao
direito que tinham super Moneta, Capellania et Cancellaria Domi-
ni Regís, mediante a doação que o monarcha então lhes fez das
egrejas de Ponte do Lima e Touguinha, em 'Feiras de Faria, livres ,
e isentas de todo e qualquer direito real : e as suas villas e terras
de Pedralva, Gouviães e Adauffe em terra de Panoias, as quacs
mandou coutar per lapides; sicut àliud Cauiam de Regno, quod me-
lius caiitatum est.
-147-
EGREJA DE S. DOMINGOS (GUIMARÃES)
('Vide gravura a pag. 145)
Tendo os frades dominicanos iniciado em 1271, á entrada da
actual rua da Rainha, a edificação do convento e egreja, concluí-
ram toda a obra ao cabo de 8 annos. El-rei D. Diniz ordenou
em 1 323 que tudo fosse derrubado, visto achar-se junto da mura
lha e poder ser novamente atacada a villa pelas tropas de seu
tilho D. Aífonso. Annos depois construíram, onde ainda agora se
vê, a espaçosa egreja de três naves em cinco arcos joanninos e o
convento adjuncto, con:orrendo grandemente para o adeantamento
e conclusão da obra o Arcebispo de Braga D. Lourenço, João Aífon-
so de Briteiros, um Bispo de Burgos e D. Maria de Berrcdo, mulher
de Ruy Vaz Pereira. A capella mor mede 18 metros de comprido
por 5,72 de largo, e o corpo da egreja 29 metros por 16, 3o.
O corpo de São fr. Lourenço Mendes, mudado da parede
do altar de S. Braz para o de S. Thomaz, foi encerrado num
sarcophago de pedra com estes dizeres na frente:
H1C SUA LAVRENTJ MENDES SYNT OSSA BEATI
Em 1770, por voto de Rodrigo de Sousa da Silva Alcoforado.
fez se a porta principal que a gravura representa, magnifica en-
trada d'este templo, no dizer da inscripção, mas em perfeita des-
harmonia com o estylo da fachada, onde ^e admira um roseta» ■
primoroso. A porta primitiva, cuja substituição de modo algum
se justifica, deveria ser egual á da egreja de S. Francisco. No
alto da actual tem a inscripção:
REGIN-íE OPTIMjE MAXIM V.
SACRATISSIMI R0SAR1I
MAGNIFICO HVIVS TEMPLI LIMINE
VOTVM SOLVIT
1>- RODERICVS Dlí SOVSA DA S? ALCOF °
MDCCLXX
A rainha D. Maria II cedeu esta egreja á Ordem Terceira de
S. Domingos, em 24 de janeiro de i85i. A camará foi concedido
o convento e cerca por lei de 27 de dezembro de 1870, e por
consentimento d'esta, em 3o de julho de 1887, foi o convento con-
cedido á Sociedade Martins Sarmento, que tomou posse d'elle pe-
las 6 horas da tarde de terça-feira 10 de julho de 1888, a qual sobre
a curiosa arcada do claustro, que datado século xiv, fez reconstruir
em 1889 a galeria que hoje serve de installação ao museu archeolo-
gico. Na extremidade norte collocaram uma pequena pedra com
esta inscripção em caracteres gothicos:
- ,4s-
A SOCIEDADE MARTINS SARMENTO MANDOV
RECONSTRVIR ESTA GALERIA SOURE A ARCA-
DA DO ANTIGO CLA ASTRO DO EXT1NCTO COX
VENTO DE S- DOMINGOS XO ANNO DE 1 889
As inscripções lapidares romanas e as pedras ornamentadas
do museu acham-se expostas sob a referida arcada de que aqui
dou gravura em parte :
Arcada e andor
— J4Q-T
n
C/3
CD
>tí
i-
rf
S
o
o
o
co
'õ
c
ri
co
(D
"O
ri
-g?
Í3D
LU
— J DO —
O curioso andor das candeias, que também aqui se representa.
foi salvo por minha intervenção quando fundei no edifício da Or-
dem de S. Francisco um pequeno museu de archeologia christã.
Encontrei-o, quasi de todo desfeito, no sótão do edifício dos Paços
do Concelho, sendo desde logo offerecido á Sociedade Martins
Sarmento.
Este andor era conduzido na procissão das marafonas ou dos
pães bentos, que annualmente se eífectuava a 10 de junho, em
cumprimento de uma antiga promessa feita por occasião de grande
calamidade. Nesta procissão, que -sarna da egreja de Santa Clara
recolhendo na Collegiada, tomavam parte a Camará e o Cabido.
O andor ia adornado de vellas de cera, que prefaziam o pezo do
rolo com que se devia cercar a muralha da cidade.
Finda a festa eram benzidos os pequeníssimos pães, repartin-
do-se por todas as auctoridades e lançando-se d'uma janella do
edifício da Camará á multidão, que os apanhava.
Nos primeiros séculos da Egreja, o povo que assistia ao sacri-
fício incruento offertava ao sacerdote um ou mais pães, que, de-
pois de benzidos, eram distribuídos por todos em signal de com-
munhão.
Os que não offereciam pão entregavam dinheiro para a sub-
sistência do Padre e conservação da egreja, uma practica que
justifica o actual costume dos pedidores nas missas. Os judeus
também offereciam sacrifícios a Deus depondo nas mãos do sacer-
dote o que queriam sacrificar. O pão e o vinho que no acto se
consagra era egualmente ofíertado pelos fieis.
EGREJA DE S. FRANCISCO (GUIMARÃES)
( Vide gravura a pag. t4q)
A construcçao da actual egreja e respectivo convento de X
Francisco, foi auçtorizada por el-rei D. João I, em carta que escre
veu de Braga no dia 3 de novembro da era de 1408 (anno de
1 400) .
A primeira fundação do convento teve logar na Fonte Santa,
em tempo de D. Affonso II; em i2cjo, reinando D. Diniz, veiu a
Guimarães o Arcebispo D. fr. Tello e" lançou solemnemente a
terra a primeira pedra para a segunda construcçao na actual rua
de S. Damazo, sendo finalmente demolido, como o de S. Domin-
gos, por ordem do mesmo monarcha na occasião da guerra com
seu filho.
A egreja, de uma nave, mede no corpo >2'",4o por i2m,8o de
largo, ou antes ib'n,o,o, pois era esta a sua grande largura no tem-
po dos altares primitivos !
131
Capella-mór da egreja de S. Francisco
102 —
A capella-mór, toda azulejada e de abobada de pedra fina com
elegantes nervuras, considerada urna das melhores do reino, mede
:om,3o por 7"', 35. Tem 7 grandes janellas de estylo ogival radiado
ou florido, das quaes apenas existem duas livres, mas despojadas
dos caixilhos de pedra. Outras duas que communicavam com as
capellas lateraes, estão cobertas com o magnifico azulejo, e as
três restantes com a tribuna compósita de riquíssima talha doura-
da e grossas columnas torcidas, entre as quaes existem em tama-
nho natural as imagens de Santo António, S. Domingos, S. Fran-
cisco e S. Thomaz d'Aquino.
.Ao fundo desta capella-mór, mesmo junto da abside, vé-se a
tampa do tumulo da Duqueza de Bragança D. Constança de No-
ronha, com a sua estatua jacente, criminosamente abandonada. Foi
cila a piedosa senhora, fallecida em cheiro de santidade, quem
mandou construir a alludida capella-mór, onde então lhe deram
sepultura condigna de que actualmente nem o logar se conhece!
No referido tumulo havia a inscripção seguinte:
ALFONS1 CONIVX DVCIS HOC CONSTANÇA NORONHA
REGIA PROGENIKS CONDITVR IN rVMVLO
Aos lados do arco veneram-se as imagens de Santa Cecília e
Santa Clara, e as capellas abobadadas de pedra consagradas ao
Senhor Jesus e a Santa Arma.
Xas extremidades do transepto. os altares de S. Guaiter ou do
Deseendimcnto, e o do Senhor da Paciência com um pequeno ora-
tório onde se admira a pequeníssima imagem de S. Boaventura
que o representa assentado á meza em que escreve e tendo a ador-
nar o acanhadíssimo recinto uma mobilia de execução esmerada.
No corpo ha os altares collateraes de Santo António, S. Francisco.
S. José, Senhora da Conceição, Senhora do O', e Senhora do
Soccorro com S. Matheus. A imagem de S. Francisco, tamanho
natural, tem na peanha estes dizeres:
G. BERARD1
M0DEI.L0 :-COI l'l
ROMA l888
O coro é sustentado por um arco abatido, com gume. notável
pela sua elevação diminuta e considerável distancia de uma á ou-
tra extremidade. A sacristia, com o tecto pintado e dourado, tem
ao centro uma grande meza de mármore com embutidos a core*-,
e pendentes da parede dois primorosos quadros a óleo, em tela.
representando a Família Sagrada e Nossa Senhora do Leite. Le-
£íou-os á Ordem o commissario fr. Manuel Luiz da Conceição
Guimarães. Pertencem ã eschola romana (século xv) de que foi
fundador Raphael Ssnzio de Frbino e attribuem-se, com os melhò
1 53
res fundamentos, ao laureado pincel do pin
ma Stroberle, falletido com 84 annos de e
no de 1792. Pertencem egualmente a este
altares da Sé de Braga. No claustro, que se
toscanas e degual numero d'cllas mais peq
tem profanadas duas capellas da invocação
e de S. João Baptista.
D'esta, que foi fundada no primeiro qu;
doutor Gonçalo Dias de Carva'ho e que se
frades, dou a photogravur 1 seguinte:
tor lusitano João Glam-
dade em Lisboa no an-
auetor os quadros dos
compõe de 44 columnas
uenas na varanda, exis-
dc S. Pedro e S. Paulo.
arte! do século xvi pelo
rviu para o capitulo dos
Os profanadores âpplicaram aos três bellos arcos da frente gros-
sas camadas de cal que desfiguraram a ornamentação dos capiteis.
Hoje serve de deposito de madeiras e ferros velhos, conscr
vando-se milagrosamente as curiosas grades de madeira de casta-
nho que vedam a porta e as janellas.
Sobre a portaria do extincto convento fundei em [890 um pe-
— ID4 —
queno museu, cuja inauguração se efrectuou no domingo 3 dè
agosto cio referido anno. Entre outros objectos de valor consegui
reunir alli um grande quadro a óleo em madeira, representando um
milagre de S. Francisco, outro egualmente grande representando
a rainha I). Mafalda, fundadora do convento da Costa, outro em
cobre representando o acto heróico de Judith, etc. Também alli ^e
encontra a grade do milagre com estes dizeres :
I STA HE A REDE Q ST. O ANT.O LANÇOU SOBRE 0 LADRAM
MANOFL DIAS, A 20 DE ABRIL DE iyiO
•Da primitiva fachada da egreja apenas resta intacta a porta
principal, estyío joannino:
T>n}àt.%r.
Porta principal cia egreja cie S. Francisco
— \DD -
Os dois gigantes lateraes, que deviam ser chanfrados na extre-
midade superior, rematam em pirâmides de pedra, erro egual ao
da cruz latina que o memorável temporal de 3i de dezembro de
1897 houve por bem derrubar. Aproveitando este ensejo consegui,
com o auxiho do illustre membro da Meza sr. M. M. Barbosa de
Oliveira, auctorisação para delinear outra cruz apropriada, a qual
foi feita pelo mestre pedreiro Ricardo Leite e collocada ás 6 horas
da tarde do dia 27 de junho de 1898, dispendendo-se com esta
obra a quantia de 20:000 réis.
A photogravura da egreja representa a pouca distancia, no lo-
gar primitivo, o cruzeiro quinhentista posto alli por mandado do
padre Mestre fr. António Fernandes, no anno de 043 a demarcar
o terreno que pertenceu aos frades e portanto a jurisdição da
Ordem.
A Meza actual não se oppoz, como devia, á resolução da Ca-
mará Municipal que no mez de março d^ste anno o removeu
para junto da parede norte da egreja. O pedestal tem ao centro
uma inscripção apagada que por esse motivo se reproduziu na
frente por estas simples palavras:
O PAhl'!: Ml S I
]• AMO I 5 4-3
Em 18GG, sendo secretario José Ferreira d1 Abreu, foram com-
prados por _po:ooo réis os paramentos de lhama e a seguinte
riquíssima capa bordada a matiz e ouro com pedras preciosas:
— )5<> —
Um arco de volta inteira que se divisa na parede a que en-
costa o cruzeiro, fez parte da extincta capella de S. Gualter, para
onde foram trasladados pelo D. Prior de Guimarães D. Fulgencio.
filho do Duque de Bragança D. Jayme, os ossos do venerável
santo. Na sua sepultura, que o povo de Guimarães mandou fazer
ao patrono da cidade e discípulo de S. Francisco, no anno de 1577,
por voto quatro vezes, renovado, gravou-se esta inscripção:
GVALTERI- TEGIT- HOC • VENERABILIS • OSSA • SEPVLCHRVM •
Tinha no alto esta inscripção allusiva ao voto do povo, gra-
vada numa padieira de pedra que felizmente ainda se conserva
á porta da cosinha do extincto convento:
DIVO- GVALTHERO I» I D- VIMARAN- PATRONO- INS
TAVRATI ■ FESTI ■ VOTO- lllí ■ ANNO QVE ■ MDLXXVI1 • P- V- I- C-
A' entrada do largo das Carvalhas, junto do arco que alli ha-
via, representou-se, no dia 8 de abril de i8o3 (sexta- feira Santa),
o descimento da cruz, dispendendose com essa representação
mais de doze contos de réis! O monte Calvário elevava-se bas-
tantes metros acima do solo. Com estudantes organizou-se a guar-
da romana, e as principaes figuras eram representadas por padres
e frades. O padre Bernardo Rôlla, representando S. João, maii-
teve-se por espaço de 3 horas numa posição forçada com admi-
ração dos muitos milhares de espectadores que se accumulavam
no largo e pelos telhados em terraços expressamente construídos.
Disse-se então que não havia em todo o reino memoria de tão
pomposa commemoração religiosa.
Na grande praça que fica próximo d'esta egreja vê-se a esta-
tua de D. Affonso Henriques, em bronze, com esta inscripção na
frente do pedestal de mármore :
A D AFFONSO
HENRIQVES
A CIDADE DE
GVIMARAES
MDCCCLXXXVI1
Ao fundo da estatua lè se : «188/ fundição de Massarcllos.
Porto» — ,1. S. dos Reis, esailp.
Este monumento, embora o pedestal não corresponda á vasti-
dão da praça, faz honra ao fallecido esculptor António Soares dos
Reis e ao architecto José António Gaspar.
A estatua chegou a Guimarães ás 2 horas da madrugada de
segunda-feira 19 de setembro de 1887, tirada por duas juntas de
bois. As 3 horas da tarde de 20 de outubro do referido anno foi
inaugurada na presença da família real que depois da 1 hora da
tarde havia chegado de Braga. O chorado monarcha D. Luiz I e
o príncipe D. Carlos (hoje Rei) desceram do pavilhão que para o
acto loi construído sob a direção do scenographo portuense Gui-
lherme Augusto Alves de Lima, e descerraram a estatua que estava
coberta com a bandeira nacional. Quem primeiro photographou
o monumento foi o sr. Leon Ardau, do Porto. A grade de ferro
collocou-se a 6 de setembro de 1888.
A família real também n'esse dia, ás 3 horas da tarde, lançou
a primeira pedra para o edifício da eschola industrial, collocando
se-lhe numa cavidade um pequeno cofre de prata contendo moe-
das. A pedra tem esta inscripção: — S. M. el-rei D. Lui\ I, n<>
dia 20 de outubro de i8Sj, collocou a pedra fundamental da es-
chola industrial Francisco d' Hol landa.
SYNCHRONISMOS DOS SÉCULOS XIII E XIV
No Canon xxi do iv Concilio Lateranense (duodécimo geral)
celebrado em novembro de 121 5. renova-se o decreto' do século
antecedente sobre a confissão sacramental, pela vez primeira orde-
nada geralmente, communhão na paschoa, etc, sob pena de serem
expulsos da egreja e privados de sepultura ecclesiastica. Presume-se
que esta medida tendesse a prevenir os fieis contra os erros dos
Albigenses que se julgavam dispensados d'estes actos para obte-
rem a remissão dos peccados, porque ainda 8 annos depois o
Cardeal Conrado, Bispo do Porto e Legado em França, celebrou
no dia 6 de julho o xxu Concilio Parisiense, acerca da referida
seita.
A lucta continuou terrível, e o Legado João, Cardeal e Bispo
de Sabina, celebra no anno de 1228, em Portugal, o Concilio
Lusilanum que fulminou a pena de excommunhão contra quem
impedisse as liberdades da egreja e dos seus ministros, o socego
e a honra das religiosas clausuradas.
Os Cruzados e vários outros christãos guerreavam e matavam
os Judeus confiscando por vezes os seus haveres; estes excessos
foram porém rigorosamente prohibidos pelo Concilio Turonense
— 158 —
em io de junho de 1286 com um Estatuto de 14 artigos em que
se principia por aconselhar aos fieis inteira humanidade «pois
que a egreja os soffre, não querendo a morte do peccador, mas
que se converta».
No xm Concilio geral, primeiro Lugdunense, celebrado a 28
de junho, 5 e 17 de julho de 1246, o Papa Innocencio IV deter-
minou que os Cardeaes usassem o barrete encarnado «como sym-
bolo da diposição em que deviam estar de derramar o seu sangue
pelos interesses da Egreja». Esta côr do barrete passou também
a ser a dos seus vestidos, muito pouco tempo depois.
Gerardo de Malemort, Arcebispo de Bordéus, publicou no
Concilio Burdigalense, que teve logar a i3 de abril de 1 255, uma
constituição composta de 3o artigos, ordenando um d'elles, o 5.",
que na communhão da paschoa se ministrasse aos meninos pão
bento em logar da hóstia consagrada.
O Sacramento da confirmação era antigamente ministrado ás
creancinhas, como se deprehende do terceiro dos 17 Cânones
feitos em 1260, no Concilio Arelatense, presidido por Florentino
Arcebispo de Aries, quando determina que esse Sacramento seja
recebido em jejum, excepto pelos meninos que ainda mammam.
O artigo 4.0 da constituição feita no Concilio Tarraconense em
1294, poz termo ao banquete que entre nós os parochianos costu-
mavam pedir aos seus curas, o que estes faziam por praxe antiga
com avultado dispêndio.
A ordem Dominicana foi approvada por Honório III em duas
Bulias datadas de dezembro de 12 16.
Foi Gregório X (1271-76) quem primeiro ordenou que em se-
guida á morte do Papa os Cardeaes se conservassem fechados em
conclave, não saindo sem terem feito a eleição do novo Pontífice.
A respectiva Constituição determina que «quando a eleição não se
concluisse nos três primeiros dias, teriam os Cardeaes um só prato
a hora de comida nos 5 dias seguintes, e que findo este termo se
lhes daria somente pão e agua emquanto não terminasse o acto
eleitoral.» Com todo este rigor quiz Gregório X prevenir intrigas
e delongas \ mas os seus successores, Innocencio e Hadriano V,
fizeram todo o possível por obstar á execução da lei, revogando-a
por fim o notável Pontífice portuguez João XXI.
Celestino V e Bonifácio VIII vendo que se renovavam os velhos
inconvenientes, restabeleceu-a e ordenou que fosse observada inin-
terruptamente.
No anno de 1247 teve principio em Liége a festa do SS. Sa-
cramento, sendo em 1264 ordenada a sua celebração em todo o
mundo catholico, por Bulia de Urbano IV. Em 22 de maio de
1820 resolveu-se que fosse exposto e que sahisse processional-
mente.
— i bq —
O Jubileu do Armo Santo foi instituído cm i3oo por Bonifácio
VIII. para ser celebrado no ultimo de cada século. Clemente VI
determinou que a sua celebração tivesse logar aos 5o annos, e
Paulo II aos 25, como ora é.
Egualmente n'este século xm foi estabelecida a festa da Con-
ceição de Maria, e crê-se que o seu começo tivesse logar na
egreja de Nossa Senhora de Pariz. Em 12S8 o Bispo da capital
franceza, Reynaldo de Homblieres, legou á sua cathedral uma
importante somma destinada ao alludido fim. De Viterbo expede
Clemente IV uma Bulia datada de 1267 em que ordena ao Pro
\incial dos Dominicos, em Hespanha. que encarregue dois frades
de pesquizar os herejes em toda a sua Província, a que então per-
tenciam os conventos de Portugal, Castella e Navarra. A divisão
d'esta Província em três — Portugal, Hespanha e S. Thiago — foi
mais tarde determinada pelo considerável augmento que attingiu.
El-rei D. Fernando III (o santo) instituiu, em 1240. o piedoso
costume de servir á meza 12 pobres na ceia que lhes dava em
quinta-feira-maior depois do lava-pedes.
No xiv Concilio geral de Leão, celebrado desde 7 de maio a
17 de julho de 1274, e presidido pelo Papa Gregório X, reconci-
liaram-se os gregos com os latinos submettendo-se ás leis da Egreja
Romana e reconhecendo a Primazia Papal.
Começou neste século o uso geral dos órgãos nas egrejas.
tendo apparecido o primeiro no armo de 757, na egreja de S. Cor-
nelio, em Compiègne.
A invenção é attribuida por uns a David e por outros ao im-
perador dos chins Hoang-Ti (2:601 annos ant. de J. C.)
Falleceu em maio de 1277, por effeito de desabar sobre elle o edi-
ricio dos Paços que acabava de fazer construir em Viterbo, o Pon-
tífice portuguez de nação Pedro Hispano (João XXI) que nascera
em Lisboa e fora Arcediago de Vermoim, D. Prior de Guimarãe-
e Arcebispo de Braga. Foi sepultado em S. Lourenço, gravando-
se-lhe na sepultura este epitaphio: ioaxni i.vsitani xxi • i-ontifica-
TVS MAX • SVl MEXSE Vrií • M0RITVR MCCLXXVII •
O século immediato denominou-se da artilheria por então se-
rem inventadas as armas de fogo a que pela vez primeira a His-
toria se refere no anno de 1342, quando ArTonso IX as empregou
com vantagem contra os Mouros no cerco de Algezira.
O segundo dos oito cânones publicados no Concilio Toleta-
num, a 21 de novembro de 1824, determina que os clérigos sejam
barbeados ao menos uma ve\ cada mt>-x\
O Arcebispo de Braga D. Martinho, que em 129G publicou
uma Constituição desonerando do património com que os paro-
chos exercitavam a Hospitalidade, todas as egrejas que não ren-
dessem mais de 80 libras de dinheiro portuguez (i:328 réis!).
— i6o -
ordenou em i3oq que se pagasse di\imo dopam e do vinho, do
linho, da ferram, da lãa, «e de todDs os parimentos das ovelhas.
Outro si das Dizimas pessoaes stabelecemos, e mandamos, que
os Mercadores, que vendem os pannos de cóor, que soyam em
outro tempo de dar huum maravidil de Leonezes : que dem hora
'hi soldos de Portugal; cá achamos, que tanto monta no maravidil
dos Leonezes d' outro tempo».
Os maravidis portuguezes valiam então 27 soldos, ou 27 reis
brancos.
O desejo de accumular prebendas, honras, benefícios, levou
muitos Bispos e Abbades a presença do Papa que adulavam,
deixando abandonadas as Diocezes e os Mosteiros. As Ordens
mendicantes aproveitaram algo com esta sede de dinheiro e de
prosápia, porque o fieis concorriam então mais que nunca aos
seus templos affeiçoando-se aos religiosos e ás corporações de que
estes faziam parte.
Quando Clemente V notou a vulgarisaçao das Commendas,
arrependeu-se da facilidade com que as havia dado. Revogou-as
Bento XII, mas nem por isso os seculares deixaram de possuir
numerosas e ricas Abbadias que os Papas continuaram a cohferir-
Ihes sob aquella denominação.
Redundou em desproveito da Egreja a frequência de excom-
munhões e interdictos, n'este século, porque os excommungados,
que eram aos milhares, principiaram a relaxar-se deixando de
implorar a absolvição, e muita gente reagia contra a prohibição
expressa de todo o trato com ellès.
São sempre maus os excessos.
A abstinência dos sabbados, que os seculares não guardavam.
foi pela primeira vez determinada para todos os ecclesiasticos.
Diz-se que Santo António de Lisboa instituiu para o tempo da
Semana Santa a Disciplina publica de sangue, muito edificante,
diíferente da barbara FlcCgellaçãò que em 1260 instituiu em Pe-
ruza o Heremitão Rainier.
O mesmo Santo, estando em Tolosa, escreveu a Gil Anncs,
capellão de Santa Sancha, infanta, animando-o a supportar com
coragem os seus trabalhos e afHicções que nunca apparecem des-
acompanhados :
«Nem vos esgaraviseis com a mansilla dos vossos Marteviros :
bem mostram serem mesquinhos; pois quando fagam cilada, som
de gram companha teudos».
Assignou a carta do seguinte modo: Fr. António de la Vera
Cruz.
O Papa Innocencio IV, em Bulia datada de i^Sq, determinou
— i6i —
que os Arcebispos de Braga, quando visitassem a sua Archidio-
cese, apenas recebessem de Procuração e Colheita um marco de
prata (3 :34o réis?)
Em carta circular dirigida por el-rei D. Affonso IV aos Bispos,
em 23 de fevereiro de i352, recommenda-se a creação de um
livro para assentos de casamentos.
«
EGREJA DA MIZERICORDIA (BRAGA)
Está situada no alto da rua Nova de Sousa e encosta ao claus-
tro de S. Geraldo, da Sé, com o qual tem communicação interior.
A fachada, muito parecida com a da Mizericordia de Guimarães,
é de riquíssima esculptura. A porta de arco é de volta inteira ; de
cada lado tem duas grandes columnas compósitas striadas, e sobre
ellas outras mais pequenas que ladeiam nichos vasios. O frontão
recebeu um accrescimo em 1891, substituindo-se por essa occasião
a cruz que o encimava, pequena como todas as da epocha, prejudi-
cando-se d'este modo o estylo architectonico d'aquelle bello edifício.
Na frente da porta principal havia uma varanda com escada
para o poente, e sob ella a imagem de S. Geraldo e uma fonte
que d'elle tomou o nome. Nos primórdios do século xvm desfez-se
a escada e retirou-se a imagem, ficando a fonte sob os degraus da
frente. Esta fonte, cuja porta se conserva aberta quando a agua
potável da cidade é insuínciente, denomina-se da Preta.
Fundada na capella de Jesus ou de Nossa Senhora da Piedade.
do claustro da Sé, a santa instituição de fr. Miguel de Contreiras,
da Ordem da Trindade, fallecido a 29 de janeiro de i5o5, * foi an-
nos depois mudada para a extincta capella de Santa Anna ; no
anno de i5Go, tendo precedido accordão da meza em data de 2
de janeiro de 1 558, sendo seu Provedor Balthazar Paes, e por con-
sentimento da camará municipal e do Arcebispo por sua provisão
de 12 de março do mesmo anno, deu-se principio á actual egreja
no local em que havia umas moradas de casas de Branca d'Aze
vedo, viuva de Diogo Lopes Homem, e outras da Mitra, as quaes
D.Diogo de Sousa lhe offerecera, pela cedência da capella de Jesus.
A obra de pedreiro terminou em 1362, data que se vê gravada
no alto do frontespicio ; porém só ao cabo de 9 annos, em 22 de
maio de 1Õ71, é que a confraria occupou definitivamente a egreja,
eífectuando-se a transferencia com uma procissão solemne em
1 Em Alvará datado de 26 de abril de 1627, ordenou-se a todas as Mizericor-
dias a execução do Accordão de i5 de setembro de 1576 que determinou a pin-
tura do retrato de fr. Miguel na bandeira da Mizericordia com as iniciaes
F. M. I. (Frei Miguel Instituidor).
11
102
que se cncorporou o Arcebispo D. fr. Bartholomeu dos Martyres.
A primitiva tribuna d*esta formosa egreja é toda de granito
fino, pintado e dourado. Está hoje vedada por outra de madeira
de riquíssima talha. O frontal do altar-mór é primorosamente es-
culpturado em madeira, representando em alto relevo o milagre
dos pães. Do lado da Epistola tem o altar do Sacramento.
Esta egreja foi solemnemente benzida na quinta-feira 5 de de-
zembro de 1895, por terminarem pouco antes as grandes obras de
pintura e douramento que a tornaram digna da visita de aprecia-
dores exigentes. Do douramento foi encarregado o sr. José da
Cunha, e da pintura decorativa das paredes e tecto o sr. Domin-
gos A. Teixeira Fanzeres que se revelou, como sempre, artista
de muito mérito.
EGREJA DA MIZERICORDIA (GUIMARÃES)
A edificação d'esta egreja. com frente para o largo do mesmo
nome, deve-se á iniciativa de Pedro de Oliveira, cavalleiro de S.
Thiago, que lhe deu principio no anno de 1 588. Foi para alli tras-
ladada em 1606 a irmandade que se havia fundado, ânuos antes,
na capella de S. Braz, dos claustros da Collegiada.
A fachada, elegantíssima, semelhante á da egreja da Mizericor-
dia de Braga, pertence á ordem corinthia, e tem no alto uma
imagem de Nossa Senhora da Mizericordia com estes dizeres so-
bre o nicho :
ESTOTE M1ZERICORDES
No corpo da egreja, que mede 22,70 por 9,80, ha os altares
do Senhor da Pedra Fria, S. Bento, instituido pelo dr. João Car-
neiro de Moraes, Senhor da Canna Verde, Senhora das Dores e
Senhora da Paz, fundado por Francisco José Mendes que o dotou
com missa quotidiana. Ao centro existe esta inscripção gravada em
campa raza :
AQVI JAZ .10 DE JANR0 d' 1817
ZE LOPES DA pf MEMORIA
CUNHA VELHO DA SUA CARlOE
O MAIOR BEM A ILLMA MEZA
FEITOR DESTA DESSE TEMPO
SANTA CAZA MANDOU LAVB
DESDE A SUA ESTA INSCRIP3
INSTITUIÇÃO E Q NESTA SEPE*
ATHE ODIA DO SE NÃO INTER
SEO FALECIMTO RASSE MAIS ALCM
Q FOI AOS l3 ,
- i63-
A capella-mór mede 9,90 de comprido por q de largo.
A bandeira da irmandade tem d'um lado estes dizeres :
UNDE HOC MIHI UT VENIAT
MATER DOMIN1 MEI AD ML! ?
De onde me vem isto, que a mãe do meu Senhor venha a mim ?
Do outro lado f. m. i. (Frei Miguel Instituidor).
O tecto da egreja foi de madeira apainelado. Hoje é todo co-
berto de estuque com trez figuras em relevo representando as virtu
des theologaes -Fe, Esperança e Caridade.
A escadaria de pedra que dá passagem para a casa do despa-
cho e coro da egreja, foi construída em 1640. Por baixo teve uma
fonte publica.
A parte restante d'este edifício que alinha com a antiga rua da
Arrochella, foi construída, como fica dito a pag. 122, com a pedra
da torre e pardieiros do Morgado dos M>randas, vendida á Mize-
ricordia por 140:000 réis no dia 17 de janeiro de 1667.
Esta venda foi feita por Filippe Pereira do Lago e seu filho
Manuel Machado de Miranda, descendentes de Gil Lourenço e
a mulher d'aquelle, Joanna Gonçalves, os quaes, aos 4 de agosto
de 1430, instituíram o referido Morgado no largo fronteiro á egreja
da Mizericordia.
Os dois primorosos retratos a óleo, existentes na alludida casa
•do despacho, foram pintados pelo insigne Roquemont, filho do Prín-
cipe allemao Frederico dHesse Darmstadt, o qual esteve hospe-
dado em casa do conde da Azenha, e representam Vicente Pimenta
de Lemos Sousa Menezes, fallecido no dia i.° de fevereiro de 1834,
•e o capitão Francisco da Silva Guimarães Pinto.
A confraria foi, no seu principio, administrada por homens de
elevada representação social, como o D. Prior de Guimarães, D.
Fulgencio, filho de D. Jayme, quarto Duque de Bragança; D. An-
tónio de Lima, alcaide-mór de Guimarães, e outros muitos.
Sendo a confraria denominada irmandade desde o anno de
1 585, teve por primeiro Provedor António Pereira da Silva, fidalgo
da casa real e cavalleiro da Ordem de Christo. Nos dois annos im-
mediatos foi este cargo desempenhado por Francisco Ribeiro de
Carvalho, commendador de Unhão, sendo escrivão Pedro de Oli-
veira iniciador das obras da egreja.
Em 1661 foi Provedor o activíssimo D. Prior D. Diogo Lobo
da Silveira.
Na torre, que fica ao lado esquerdo da capella-mór, collocou-se
em princípios de abril de 1899 um novo sino que, por incumbência
do então thesoureiro Alfredo Bellino, meu estimado irmão, man-
dei fundir em Braga na fabrica dos srs. José Maria Rebello da
— IÓ4 —
Silva & C.a. Este sino, que pesa 484'^ ,704, mede o,Q2 de altura
por 0,99 de diâmetro no bordo, e tem sob a imagem da Virgem
os dizeres seguintes :
ESTOTE MIZERICOKDES
-}-XP- V+XP- R-j-XP ip-j-
A MEZA DE 1898-1899
ME FVNDERE FECIT
ANNO DOMINI MDCCCXCIX
Leitura — «Sede mizericordiosos. Ghristo vence, Christo reina>
Christo impera.»
A meza de 1898-99 me fez fundir. Anno de 1899 do Senhor. »-
No bordo tem a antiga marca da fabrica :
JOANNES FERREIRA
LIMA ME FECIT
BRACARAE
SYNCHRONISMOS DO SÉCULO XV
E' bem certo o que Viollet-Le-Duc disse da architectura, con-
siderando-a entre todas as artes como a de mais affinidades «com
os instinctos, com as idéas, com os interesses, com os progressos
e com as necessidades dos povos».
A influencia racionalista nas construcçoes que a theologia ins-
pirava, principiou a revelar-se pelo cinzel do artista do século xm.
O grande S. Bernardo quiz já então evitar o desenvolvimento da
ornamentação immoral na esculptura, mas, no seu tempo, o espi-
rito da epocha não cedeu, e a satyra no século xiv ganhou fôlego
fomentada pela vingança dos que mais deviam combatei a.
Du Breul refere-se ao desforço do clero de Notre-Dame contra
o advogado de Philippe de Valois, Pedro de Luignet, que em 1329
attentou contra a jurisdição temporal ecclesiastica, sendo immedia-
tamente excommungado e posto em figura horrenda ao canto da
tribuna para apagarem sobre o seu rosto as vellas da egreja !
Na arte, como na oratória sagrada, também o materialismo do
século xv se revela frisantemente.
Na ornamentação das egrejas, a esculptura em pedra e madeira,
representa os frades e os pregadores com a cabeça de quadrúpe-
des : cabeças de mulheres com chifres de carneiro, raposas com
o habito franciscano pregando do púlpito ás gallinhas que de ca-
beça erguida e bico aberto as escutam ; suinos organistas, lobos
foleiros, etc.
— lto —
E' de sobra conhecida a descripção da esculptura que a um
■canto da nave de Strasburgo representava ou representa ainda um
asno de casula desempenhando o acto mais elevado do ministério
sacerdotal, e servindo-lhe de diáconos vários outros animaes. Em
toda a parte a architectura d'essa epocha revela mais ou menos
as scenas immoraes que a caracterisam. Em Braga temos, como
exemplar precioso, a gárgula do lado esquerdo das costas da ca-
pella-mór da Sé, e em Guimarães a do lado direito da frente da
torre da Collegiada, duas construcções coevas que na ornamenta-
ção recordam as nossas conquistas e o arrojo das descobertas ma-
rítimas.
A mythologia tem egualmente um logar importante na archite-
ctura enrista desde o século xiv até ao xvm. Primeiramente os
Gryphos, animaes fabulosos que servem de suporte á cruz, depois
os Centauros e os Faunos como os que encimam o pórtico da ca-
pella de N.a S.a da Conceição ou Senhor Morto, em Braga, e os
que se encontram sob os órgãos de muitas egrejas como a Sé de
Braga, egrejas de Santa Rosa de Lima e S. Domingos de Guima-
rães, etc. Ás Misulas são egualmente frequentes na talha das
egrejas.
Na antiga egreja de Santa Rosa de Lima, actualmente sede da
parochia de S. Sebastião de Guimarães, ha mais no órgão o cele-
bre Macacão, figura de homem que annualmente, á passagem da
ronda da Lapinha, canta movendo os lábios e os braços e empu-
nhando uma solfa e uma batuta !
Data dos fins do século xv (anno de 1498) a instituição das
Mizericordias pela piedosíssima rainha D. Leonor de Lencastre,
viuva d^l-rei D. João II, effectuando-a a instancias de fr. Miguel
de Contreiras.
Este facto sobresahe a todos os outros que este século das
innovaçoes produziu 110 campo da caridade christã.
Por decreto de 3i de março de 1492 foram desterrados da
Hespanha todos os Judeus que não quizeram o baptismo. O nosso
rei D. João II concedeu 6 mezes de residência aos que aqui
se acolheram, obrigando-os ao pagamento de um cruzado por
cabeça.
Por occasião da festa da Paschoa havia o extravagante cos-
tume de castigar os clérigos preguiçosos, apanhando-os na cama
e obrigando-os a atravessar nus as ruas até darem entrada na
egreja, onde eram postos sobre o altar e banhados com agua
benta ! Este espectáculo selvagem manteve-se longo tempo, pres-
crevendo o os Concílios Nanetense, em 143 1, e Andegavense em
1448.
A ignorância dos ecclesiasticos era em grau tão elevado, que
— 1 66 —
poucos conheciam rudimentarmente o latim. Por isso em Castella-
a- Velha e Madrid foram celebrados, no anno de 1473, dois Con-
cílios para se resolver o que mais conviria á illustração do clero,
então d'uma disciplina relaxada a ponto dos Procuradores de
muitos Concelhos representarem contra essa relaxação nas Cortes
de 1425, convocadas em Braga por el-rei D. João I.
Alguns prasos deste tempo referem se á distribuição do pão
cosido aos pobres, no dia dos fieis defuntos, dizendo: «Pagaredes
o dito foro em cada hum anno em dia de pão por Deus».
A Camará Municipal do Porto, determinou em 1491 : «que
os Mesteiraes (officiaes mecânicos) da cidade não fizessem obra
alguma desde o sabbado ao sol posto, até á segunda-feira, sol
sahido».
N'este século celebrava-se em Braga a procissão de Corpus-
Christi com corrida de touros na véspera, cavalhadas, etc. Um dos
dois juizes da cidade conduzia a bandeira, que era em forma de
pendão com uma pintura ao centro representando a Virgem.
O S. Jorge, que desde o reinado de D. João I tem n^sta pro-
cissão um logar distincto, era seguido dos doze Apóstolos, quatro
Patriarchas, alguns anjos e numerosos andores.
Levava mais o carro das hervas offerecido pelos hortelões de
Maximinos; as dançadeiras, a mourisca, as mascaradas. Em i566
o Concilio Provincial bracarense determinou que se modificassem
as exhitições profanas. A camará offerecia um jantar com o qual
dispendia a verba de iS.rooo réis.
No tempo de D. Rodrigo de Moura Telles, os lavradores das
freguezias de Navarra, Crespos, S. Lucrécia, S. Paio da Ponte do
Porto e Adaufe, vinham annualmente á cidade varrer as ruas e as
praças que no dia immediato (do Corpus-Christi), eram tapetadas
de hervas cheirosas — juncos e espadanas — offerecidas desde tem-
pos immemoriaes por lavradores das freguezias de Semelhe, Gon-
dizalves, Frossos, S. Jcronymo, S. Martinho, recebendo cada um
40 réis. A procissão levava na frente o boi bento, com as pontas
enfeitadas de íitas multicores e grandes folhos ao pescoço. Este
boi era offerecido pelos marchantes e conduzido por um lavrador
de Nogueira. Na frente os clarins tocados por pretos ; atraz do
carro das hervas quatro gigantes, sempre levados por quatro ho-
mens da visinha freguezia de Esporões, a cada um dos quaes eram
entregues 480 réis, e junto d'elles um anão, chamado pae dos gi-
gantes, também da mesma freguezia, saltando continuamente. Um
gallego conduzia a Serpe mettido dentro d^ella. Seguia-se o grande
dragão preso por uma fita e conduzido pela Dama do Drago ; a
seguir um individuo a cavallo representando o S. Jorge cercado
do seu estado. A guarda de honra do Drago e da Serpe era feita
pelos ferreiros que empunhavam espadas ferrugentas. O andor de
-1*7-
Braga — Capella de N. S. da Conceição, da egreja
de S. João do Souto
— i68 —
S. Christovão com um pinheiro enfeitado pelos procuradores da
comarca, o qual servia de bordão ao santo. A conducção d'este an-
dor pertencia, por privilegio, ás vezes judicialmente questionado,
a oito moradores da vidinha íreguezia de Ferreiros, com opas ver-
melhas, cada um dos quaes percebia 240 réis.
D. José de Bragança (1741-56), modificou tudo isto, mas o seu
successor D. Gaspar (1758-89) permittiu que os parochos acom-
panhassem de estola e auctorizou as velhas danças no couce da
procissão.
Em Guimarães também até 1797 esta procissão era organizada
com grande numero de andores, irmandades e confrarias. Depois
todas as classes trabalhadoras, o commercio, as artes, a industria,
se encorporavam com as suas bandeiras e uma banda de musica. Nas
danças faziam-se ouvir violas, rabecas e harpas ; e os marchantes
da villa também eram obrigados a fornecer os touros para as cor-
ridas no campo do Toural.
A' semelhança do que se praticava em Braga, também an-
nualmente, desde a memorável batalha de Ceuta em que o he-
roísmo vimaranense não trepidou em occupar e defender o posto
abandonado pelos barcellenses, as ruas e praças de Guimarães
eram varridas nas vésperas das festas mais notáveis, incluindo a
do Corpus-Christi, mas. .. por dois vereadores de Barcellos, até
que o Duque D. Jayme incorporou no termo de Guimarães as
duas freguezia? barcellenses — S. Miguel de Cunha e S. Paio de
Ruilhe — para que dois dos seus moradores dessem cumprimento
ao antigo costume imposto por el-rei D. João I.
Em 23 de junho de 1744 deu- se por expiada a pena.
EGREJA PAROCHIAL DE S. JOÃO DO SOUTO
(BRAGA)
(Vide gravura a pag. 16-)
Está situada na rua do mesmo nome, contigua á capella de
Nossa Senhora da Conceição ou do Senhor Morto, como vulgar-
mente se denomina. A construcção actual data do tempo do Ar-
cebispo D. Gaspar de Bragança (1758-89). Como fosse necessário
accrescentar a egreja até facear com a capella adjuncta, ficando
dentro o arco rendilhado que defronta com o grupo do enterro,
celebrou-se uma escriptura de contracto entre a Junta de parochia
e o administrador do Morgado dos Coimbrãs, a fim de também
ser vedada a entrada para a sala do archivo, substituindo -a por
uma pequena porta que se rasgou a meia altura da torre- capella
da Conceição. A elegante escadaria que lhe dá accesso pelo lado
da rua de S. João, data da construcção da capella de Santo An-
— iOu —
tonio Esquecido, encostada ao lado posterior da mesma torre-ca-
pella. Esta imagem de Santo António, esculpturada em alabastro
e pertencente ao numero das que exteriormente volteiam a torre,
mede 1,10 de altura. A muita veneração dos fieis deu logar á re-
tirada da imagem, do seu logar para junto do grupo do Senhor
Morto, emquanto o doutor Provisor Francisco de Torres mandava
proceder á construcção da capella.
Ainda hoje se vê bem conservada a escada orbicular com 41
degraus livres desde a entrada que se inutilisou com o referido ac-
crescimo.
E' de forma quadrangular a capella da Conceição e foi fundada
em 1 5 1 5 pelo doutor João de Coimbra, provisor' do Arcebispado
em tempo de D. Diogo de Sousa, como se lê nesta inscripção que
se acha embebida na parede interior da sala do archivo :
ímw&Km\m.Mi IM DECO
lllliW^H()íi[M<(7iill\^MliiW.(>iii.^-i
O fundador consagrou-a á Mãe de Deus em i5-28 e instituiu
n'ella Morgado aos 16 de fevereiro de i53o, dotando-a com bens
de raiz, auctorisado por el-rei D. João III aos 12 de março de
1527. São de primorosa esculptura as estatuetas de alabastro que
exteriormente adornam o edifício, um Centauro, um Fauno, S.
Paulo Heremita e S. Antão Abbade com um magestoso leão em
descanço, tudo sobre a abobada do pórtico que apresenta no friso
um corvo e aos lados estes dizeres :
CORWS PAVLVSPRIMVS HEREMITA
Sobre este friso havia ao centro uma columna encimada por
um corvo de pedra com cabeça de ferro e um pão no bico.
Caiu ha bastantes annos despedaçando-se tudo.
Esta capella é também denominada do Senhor Morto, por se
venerar grandemente, ao lado da Epistola uma imagem de
Christo no sepulchro, tamanho natural, primorosamente esculpru-
i7o
rada em pedra como o figurado que a rodeia. D'esse formoso grupo
dou aqui a seguinte photogravura :
As imagens do altar são de granito fino, como toda a orna-
mentação interior, inclusive a abobada com suas nervuras que tem
no fecho o escudo dos Coimbrãs.
171
A cúpula d'esta capella, toda coberta de telha vidrada como a
dos zimbórios da egreja da Sé e da capella do Paço Archíepisco-
pal, tem uma grimpa de ferro, bastante curiosa, de <3"ue faz parte
uma esphera, a lua e o sol com um dos raios em forma de ban-
deira e n^ella as armas dos Coimbrãs, e a cruz, encimada por
uma pomba, com um grande circulo de estrellas.
O palacete pertencente ao instituidor do Morgado, ainda hoje
se vê em frente, com duas janellas de grande riqueza esculptural,
das quaes o referido instituidor e sua família podiam, por permis-
são especialíssima, assistir ás missas celebradas na capella, não
obstante haver entre um e outro edifício a rua de S. João !
Todos os historiadores, entre os quaes especialisarei o Padre
Luiz Cardoso (Diccionario Geographico), dizem que a primi-
tiva egreja de S. João do Souto foi construída a expensas do
Arcebispo D. Diogo de Sousa (i5o5-32). Contestei todas estas
opiniões, no meu livro Inscripções e Lettreiros, pag. 47 e segg.,
citando documentos inéditos, authenticos, de que possuo copias por
mim extrahidas dos orignaes, para pela primeira vez provar que
D. Diogo apenas reedificou uma ermida que nos principios do sé-
culo xii doaram ao Cabido para se estabelecer n'ella a parochia
de S. João, muito antes instalada na Sé.
A doação foi feita pelos fundadores Pedro Aurifice (ourives)
e por sua mulher Gelvira Midis, ao Arcebispo D. João Peculiar,
no anno de 1 i3i.
EGREJA E CONVENTO DE NOSSA SENHORA
DOS REMÉDIOS E PIEDADE (BRAGA)
Tendo o Arcebispo D. Diogo de Sousa nomeado em i523 seu
coadjutor, com o titulo de Bispo de Dume, o religioso da Ordem
Terceira Franciscana da Andaluzia, D. fr. André de Torquema-
da, este deu principio á fundação da egreja e convento dos Re-
médios em IÔ44, concluindo-se toda a obra cinco annos depois.
Foi o primeiro convento que se fundou em Braga, e teve por
isso preferencia a sua egreja para serem sepultadas n^lla todas
as pessoas nobres.
O próprio fundador, que falleceu em Braga no dia 2 de agosto
de iò52, alli ficou sepultado em campa raza, de mistura com as
muitas brazonadas.
A Abbadessa D. Francisca dos Seraphins encarregou da con-
strucção da egreja o architecto vimaranense António Pinto de
-172 —
Sousa, por escriptura de 29 de fevereiro de 1724, concluindo-se
a curiosa fachada com suas 6 estatuas e columnas corinthias tor-
cidas, em 1726, um anno antes de toda a obra de pedraria. Tem
sobre a porta este lettreiro em caracteres elegantes:
ANNO • DOMINI • MDCCXXV ■
As freiras eram franciscanas do instituto da Annunciada de
Santa Úrsula, de Salamanca. A cerca do convento, que toma to-
das as -trazeiras das casas da rua de S. Marcos, foi ampliada em
1741 com a compra de alguns quintaes e casas do doutor Eusébio
do Vai Façanha, á entrada da rua das Aguas, onde ainda se con-
serva o mirante com o brazao do Arcebispo D. José de Bragança,
collocado na esquina esquerda do edifício por ordem das freiras,
em attenção aos serviços que lhes prestara o Prelado, obtendo de
el-rei, no anno de 175 1 , um subsidio da renda do real d'agua
para se construir o muro de vedação da cerca á margem da rua
da Palmatória. Conservam-se embebidas n'este muro, por ordem
do referido Arcebispo, duas lapides romanas bastante salitradas,
uma das quaes, por ter vestígios de uma patera, com a forma de
palmatória, deu o nome á rua que hoje se acha vedada. Foram
encontradas a 14 palmos de profundidade. A primeira, que além da
patera representa outros emblemas da escravidão como a amphora
ou o pileits, um feixe de varas e um machado, diz o seguinte:
AGATHOPODI
T- SATRI
ZETHVS
CONSERWS
A outra d'um soldado natural de Pax Iulia:
M • ANTONIVS • MF
GAL- AVGVSTINVS
PACE • M1LES ■ I EG
Vil ■ GEM- FEL-
D • MAMILI
LVCANI -AN.
XLV AER • XIIX
H • S • ]■:
SEMPRONIVS
GRAECINVS
HERES • F • C-
Sobre a antiga porta principal do convento existem esculptu-
radas em mármore as armas da Ordem Franciscana com estes
dizeres no campo:
ARMA MILICLE NOSTRJE
i73-
EGREJA DO SEMINÁRIO CONCILIAR
Está situada no largo de S. Paulo. Promoveu a sua construcção
o Arcebispo D. fr. Bartholomeu dos Martyres que a destinava,
com o edifício adjuncto, á fundação de um convento dominico a
cuja Ordem elle Prelado pertencia. Por isso aos lados da ca-
pella mór tem gravadas na parede as armas portuguezas e do-
minicas, com estes dizeres por baixo :
IHS
VIRGA IVA ET BACVLVS TVVS
Na vossa vara e no vosso báculo está toda a minha consolação.
disse o Propheta-rei. «Virga tua, et Baculus tuus ipsame conso-
lata sunt».
Aproximava-se do seu termo a obra quando em i56o passa-
ram por Braga, com destino a Coimbra, alguns padres jesuítas
que o Arcebispo obsequiou, pondo á sua disposição o convento
para pernoitarem n'elle. A hospedagem não lhes desagradou, e o
Arcebispo levou a sua generosidade mais longe offerecendo-lhes o
convento e egreja mediante contracto feito com S. Francisco de
Borja, commissario geral da Companhia, aos 3o de agosto do refe-
rido anno. O Cabido reprovou o procedimento do Prelado ; e
quando, seis annos depois, foi celebrado em Braga o Concilio Pro-
vincial, protestou contra o voto que o presidente-Arcebispo tivesse
a seu respeito, porque o considerava suspeito, visto ter dado aos
padres da Companhia os estudos da cidade com as egrejas a elles
unidas e a ermida de S. Paulo, que já não existe, e ainda por que
o Arcebispo fizera novo Aljube e n'elle uma casa sem janella e
quasi sem luz, a qual se denominava : casa para os cónegos.
A lucta foi renhida, ficando vencedor o Arcebispo; e os fi-
lhos de Santo Ignacio, que desde maio de 1540 (reinando
D. João III) introduziram em Portugal a sua Ordem, alli se con-
servaram até que a lei de 3 de setembro de 1759 os expulsou do
reino, 14 annos antes da dissolução decretada pelo Papa Cle-
mente XIV.
Partiram desta cidade na madrugada do dia 3i.
Desde 17 de julho de 1769 a 1 1 de novembro de 1784 foi o
convento occupado pelas freiras Franciscanas de Monsão e Va-
lença, que a rainha D. Maria I fez por fim distribuir pelos con-
ventos da Conceição e Remédios, para em seu logar ficarem 10
religiosas Ursulinas que fizeram a sua entrada no dia 20 de janeiro
do anno immediato. No dia 14 de outubro de 1880 foi solemne-
— i74-
mente transferido para esta casa o Seminário de S. Pedro que
então era no antigo campo da Vinha e tinha sobre a porta do edi
ticio esta inscripção hoje existente na alameda das Carvalheiras:
WtTl)0L0^MllilíHP»(.!ilÍíliOIMilS.()ll!).
NlS.PRBI(:EXttE[lttíflií(ILinil.4yB!W^'ÍÍÍIIII0Í.ltt3
(lllINRMOWIWimtUíIíiMOWttfVMlfllHE
RENTVR.ty OIFKMI \MM ÍU» ,
DMTVMMVIIWMftfiW Ih MM. 572 .
N'este edifício também foram alojadas em janeiro de 1704
as freiras de Monsão, passando por isso os seminaristas, para
a casa do Passadiço, na rua de S. João, e annos depois para
as casas 1 19 e immediata, na rua Nova de Sousa e esquina da rua
da Mizericordia.
Em 21 de julho de 1769 foi superiormente ordenado á ve-
reação bracarense que recolhesse e fechasse com três chaves, no
seu archivo, todos os papeis que se achassem no cartório do Coi-
tegio dos Jesuítas.
Não consta porém que esses papeis fossem alli recolhidos e
muito menos que existam em qualquer outra parte.
Em 21 de dezembro do mesmo anno foi este edifício, do actual
Seminário Conciliar, concedido á camará para estabelecer n'elle
a alfandega emquanto durassem as obras da reedificação dos al-
pendres da rua da Fonte da Carcova, hoje dos Capellistas, exis-
tentes nas trazeiras da casa que ha dois annos se construiu e que
ora é occupada pela Associação Catholica.
A aula de physica do Seminário está estabelecida na extincta
sacristia do tempo dos Jesuítas, sem prejuiso da pintura do tecto
com arabescos e emblemas, e em volta destes os seguintes dize-
res allusivos:
HOC TECTVM EST CEI.VM : SVNT SlGXA K.MBI.EMATA :
PHCEBVS LOYOLA : H1C V1T.E SOL TIBI SIGNA DABIT
S' IGNATII SKPVLCRVM STELL1S ILLVSTRATVR •
SOL1S IN OCCASV COLLVGENT SIDERA
l?3 -
SIC POST MORTEM VISVS EST CflELVM AD1RE
CVRRVS ET EQVI IGNEI RAPVERVNT El IAM
S . IGN • NON PATITVR DE PINGI
MAIOR QVAM PINGI DICl VE QVEAT
S. IG- EXCLAMATIO : SORDET TERRA CVM CCELVM
aspicio prt: ccelo nvlla VENVSTAS SOLO EST •
S. IG- LVDENDO HOMINEM AE DEVM LVCRATVR
LVCRATVR VTERQVE •
S. IGN- A CALVMNIIS CEARIOR
SOLEM NVLLA SAG4TTA ET ERIT •
S . IGNATII CONVITIATOR CREMATVR
DVM PREMIT OPPRIMITVR
S. IG- BACVLO AB IGIT DAEMONES
HAC VMBRAS IN" TÁRTARA MITTIT •
S. IG- VT AD CONFESSIONEM DVCAT SACERDOTE
El CONFITETVR ELECTITVR VT CAPIAT •
S. IG- AD LABORANDVM GRÁTIS SOCIETATEM
OBLIGAT ABSQVE ÓLEO ILLVMINAT •
S. IG- SOCIETATI DIGNITATES IN TERDIXIT
NEMO QVIDEM SAPIENS REGIA SCEPTRA PETIT
S. IGN- MITTIT IN INDIAM S. 1 • XAVERIVM
VADE AGE NATE
S. IGN- ZELVS ANIMARVM IGNEM
VENT MITTERE IN TERRAM •
S. IG- EVINCVL1S MAIORE TERVORE CONS1GNATVR
ALTIVS HINC VOX INTER CLVSA SONAT ■
. . .AD FIRMANDAM SOCIETATEM NOV- •• DLEG1T
PROPTER DECEM
S. IG- SOCIETATI- NON SVVM, SED IESV NOMEN
IMPONIT- NON NOBIS DOMINE, SED NOM1NI
TVO DA GLORIAM.
-I70-
S . IGNATII STINA '. AD MAIOREM DEI GLORIAM
HAEC CVN OSVRA MIHI.
S. IG- PRO ANIMARVM SALVTE IN VINCVLA
CONSICITVR DANT VINÇLA DE COREM •
S. IG • AQVIS ME -SUS TVRREM IN
IVVENTE AMOREM EXTINGVIT •
VNDA DEDIT ERAM AS ET DEDIT IGXIS AQVAS
S . IG MATVRVS MVLTVM IX LITERIS
PRO TE EGIT SERIS PROFICIT ANNIS •
S. IG- VVLTVS C.ELESTI LVCE RADIAT
QVIT MIRVM ET AT IGNTS •
S . IGN • H.ERESIS PRO TE LIGATOR
SOLO IGNAE TRIVMPHAT
S . IG • ECCLESIAE SVSIDIVM
EGO F • • • O El MVRVS IGMS
S. IG- ROMAE REGENS TOTVM ORBEM ILLVMINAT
STANS EIXVS CIRCVIT ORBEM •
O órgão, construído sob a direcção do organeiro bracarense
sr. Augusto Joaquim Claro e com o auxilio do rev. padre Kempf,
inaugurou-se no dia 25 de junho de 1898. Tem dois teclados de
pedal e dois de mão, para dois organistas, 29 jogos e 2:o38 tubos
de madeira e de metal.
O organista fica voltado para a capella-mór; e o órgão, que
se considera o primeiro do paiz, é pneumático e compoe-se de
2 1 1 folies, 6 dos quaes movidos por motor a gaz.
Ao centro do largo de S. Thiago, em frente do Seminário, existe
um chafariz em forma de obelisco encimado pela cruz primacial,
construído em 1746. Desde 1623 esteve esta fonte na extremidade
poente do referido largo, á entrada da rua dos Pellames.
— 177 —
EGREJA DE SANTA CLARA (GUIMARÃES)
Esta egreja está situada a meio da rua de Santa Maria e pertence
ao Seminário que em 8 de outubro de 1893 se installou no edifí-
cio contíguo, extincto convento de Santa Clara. E' fundação
do cónego mestre-eschola Balthazar de Andrade que lhe lançou a
primeira pedra no anno de 1548. *
A entrada das religiosas no convento effectuou-se em i5Ô2, no
dia da Santa matriarca, mas a actual fachada do edifício, de tra-
balhosa esculptura, construiu se em 1741.
Ha no corpo da egreja três altares: — Gruta de Lourdes, Se-
nhor dos Passos e Coração de Jesus.
O convento e a egreja foram cedidos á Insigne e Real Col-
legiada, por decreto de 19 de agosto de 1893, para o Seminário
creado pela carta regia de 8 de janeiro de 1891, reorganizadora
da mesma Collegiada.
No dia 8 de dezembro do referido anno de 1891 teve logar a aber-
tura do Seminário, com internato, no palácio dos D. Priores e aulas
na casa n.° 20 da antiga rua Escura. A 27 de agosto de 1893 tiveram
principio as obras no arruinado convento, onde a 8 de outubro im-
mediato se eftectuou a installação do internato e aulas. E' datado
d-e 16 de setembro de 1896 o decreto que organizou o Seminário
em Lyceu Nacional.
SYNCHRON1SMOS DO SÉCULO XVI
O frade Augustiniano allemão Martinho Luthero, natural de
Eisleben (Thuringia), nomeado em i5j8 professor de dialéctica
na Universidade de Witemberg, fundou em 1 5 1 7, quando contava
25 annos de edade, a egreja protestante que aconselhava aos chris-
tãos o estudo e a interpretação das Sagradas Escripturas. Tomou
esta resolução por se revoltar contra as indulgências que Leão X
estabeleceu para occorrer ás grandíssimas sommas que dispendia
com a construcção da egreja de S. Pedro, em que Miguel Angelo
revelou notável talento na arte do desenho.
A primeira sessão do Sacrosanto Ecuménico e Geral Concilio
Tridentino, celebrou-se a i3 de dezembro de 104.5. Ordenou-se
então que os Prelados residissem nas suas egrejas «como melhor
meio de emendar os costumes depravados do clero.»
1 Oliveira Guimarães, Convento de Santa Clara.
li
— 178 —
O cap. VII da sessão XXI dá faculdade de «converter as egre-
jas pobres ou destruídas em usos prolanos, decentes, levantando
ahi uma cruz.» No cap. VII da sessão XXII (17 de setembro de
i562) : «O sacerdote deve lançar agua no cálice quando offerece,.
porque no Apocalypse de S. João, os povos são comparados ás.
aguas e d'este modo fica representada a união dos fieis.»
A denunciação dos contrahentes do Matrimonio principiou a
ser feita logo que foi resolvida a 1 1 de novembro de 1 563.
N'este século principiou o registo parochial de baptismos. Em
Lisboa já se achava estabelecido pelas Constituições de 25 de
agosto de i536, anteriormente á convocação do Concilio Triden-
tino que na sua sessão XXIV — De reformatione matrimonii ',.
cap. I, impoz aos parochos a obrigação de possuírem um livro em
que escrevessem os nomes dos cônjuges e das testemunhas, e os
nomes dos padrinhos do baptismo para se conhecer o parentesco
espiritual. No viu século não era ainda commum o baptismo por
infusão ; mas o parentesco espiritual que d'este Sacramento re-
sulta, era observado com o máximo rigor, o que hoje mal pôde
ter logar em virtude da facilidade com que muitas pessoas se pres-
tam ao encargo, contando dezenas de afilhados vivos.
Eguaes encargos pertenciam aos padrinhos e madrinhas que
se davam a quem recebesse o Sacramento da Confirmação.
Começou com a egreja o uso de padrinhos no baptismo para
se evitar que os pães, tão expostos ao martyrio, deixassem ao des-
amparo os filhinhos. Então as fontes baptismaes tinham degraus
de pedra, pois ficavam inferiores ao pavimento. Por elles ainda no
século xiv desciam os catechumenos, para serem solemnemente
baptisados no sabbado de alleluia. Também as creancinhas, nas-
cidas de pães christãos, eram baptisadas pela Paschoa do anno
em que nascessem ou do seguinte, prolongando- se esta ceremonia,
quando o numero de baptisados fosse grande, desde a terceira
Dominga da quaresma até á sexta-feira anterior á Dominga in albis.
A sahida da egreja para o baptistério ou fonte, que era um
edifício contíguo, effectuava-se processionalmente, encorporando-se
n'ella o clero e muito povo, e atravessava sempre o claustro ou o
cemitério (Gallilé), procedendo se em seguida ao escrutínio. Este
acto practicava-se annualmente, ainda mesmo não havendo cate-
chumenos, sendo hoje entre nós representado pela benção da fonte
baptismal no sabbado de alleluia.
Em 1596 decidiu-se «que cada pia de baptisar pagasse de Sy-
nodatico 800 réis, todas as vezes que se fizesse Synodo.»
No anno de i5go instituiu Gregório XIV a Bulia da Sai ta
Cruzada «para a propagação do Evangelho nas terras de infiéis,
erigir e ornar egrejas, educar e manter missionários.»
Até ao século xm os sellos tiveram o nome de Bulias por se
— i79-
parecerem na configuração com as bolhas d'agua (Bullae). Só de-
pois foi dado este nome aos diplomas Pontifícios que tinham sello
pendente feito de ouro (Bulias áureas), ou de prata (Bulias ar-
gênteas), como se usavam anteriormente ao christianismo.
As Bulias vulgares, usadas pelos Papas depois de Constantino
conceder a paz á egreja, pertencia o sello de chumbo ou cera.
O de chumbo apparece nas de S. Gregório Magno, S. Leão I e
S. Silvestre com o nome impresso. Parece que Clemente VI ape-
nas lhes consentia, em logar das cabeças de S. Pedro e S. Paulo,
as cinco rozas do brazão de família.
N'este século xvi advertiu-se ao povo «que as imagens não
teem em si virtude alguma, que lhes seja própria, e que só se
expõem nas egrejas para excitarem no espirito a lembrança de
Jesus Christo e dos Santos, a fim de se moverem a imital-os por
este meio; que se dê a Deus um culto de adoração e perfeita de-
voção, e aos Santos um culto de honra e simples veneração, por
serem amigos de Deus».
Não obstante porém esta advertência (sempre a herança do
velho paganismo!) numerosíssimos indivíduos observam a religião
christã do modo mais nccommodado ás suas conveniências, sem
aquelle espirito de caridade que a sã doutrina de Jesus Christo
aconselha. Salva-os a intenção, que é boa, pois também por cá
temos frequentes casos como o que se deu com o historiador in-
glez Hume que, por ser considerado heterodoxo, não foi prom-
ptamente soccorrido por uma mulher de Edimburgo que o viu
cair d'uma ponte provisória sobre um montão de lodo. E só lhe
prestou auxilio depois de o obrigar a resar em voz alta o credo !
Adoram-se as imagens sagradas como o paganismo adorava
os idolos, julgando-se que existe dentro d'ellas o ser que repre-
sentam; prégam-se alfinetes nos hábitos dos defuntos; lancam-se
punhados de terra nas sepulturas e adornam-se estas com flores
e luzes; esconjuram-se graves doenças procurando á meia noite
as pontes construídas pelos mouros e, apoz umas benzilhices em
que entra o nome de Jesus e da Virgem, lançam-se ao rio três
punhados de sal e meio alqueire de painço para que o diabo fique
longo tempo a contar as sementes emquanto o doente foge a toda
a pressa para casa, e acredita-se na existência de almas penadas
que vém aconselhar a divisão do seu espolio e umas restituições
engendradas, pro domo sua, por impostores eméritos.
Ha mesmo indivíduos illustrados que n'estas questões de fé
manteem e defendem o que aprenderam na infância ou seguem
o que em geral se adopta. Com dimculdade se lhes fará crer, por
exemplo, que é errónea a interpretação geralmente dada ás se-
guintes passagens do Evangelho: «Faze o bem com a mão direi
ta, de modo que não o veja a esquerda».
— i8o -
«Acautelae-vos de fazer as vossas acções boas perante os ho-
mens a fim de serdes vistos por elles».
Deste modo, quantos não vão a deshoras, com receio de serem
vistos, enchugar lagrimas amargas e reanimar corações desalen-
tados pelos horrores da miséria! Recebem, é certo, o premio con-
solador do bem que fazem, mas auxiliam involuntariamente a im-
postura de muitos que se dizem esmoleres como elles, e prejudi-
cam assim os pobresinhos.
O grande Santo Agostinho diz: «Se temes espectadores, não
terás imitadores».
Apregoemos, pois, as nossas boas acções, para que o exemplo
fructifique, e occulte-se apenas a intenção como o Evangelho acon-
selha.
«Veja o mundo as vossas obras boas, afim de dar gloria ao
Pae do céu».
EGREJA DO POPULO (BRAGA)
Está situada ao poente do referido campo da Vinha. A sua
construcção deve-se ás divergências havidas entre o Arcebispo
D. fr. Agostinho de Jesus e o Cabido de Braga que não lhe
consentiu a fundação de uma capella na Cathedral para seu jazigo.
Por isso escolheu a Vinha de Santa Eufemia, actual campo
de D. Luiz I, onde no anno antecedente fundara o convento do
Salvador, e alli fez construir a egreja e convento da Ordem de
Santo Agostinho, lançando-lhe a primeira pedra no dia 3 de julho
de i5g6. A primitiva fachada da egreja, dum gosto simples e
sem torres, erguia-se onde agora encosta o anteparo. A torre de
então vê-se ainda nas costas da egreja, faltando- lhe a elegante
cúpula que uma faísca destruiu.
A actual fachada, muito elegante e com duas torres, é com-
posta das Ordens architectonicas Toscana e Jónica, e foi levan-
tada a 6 metros de distancia da primitiva, no anno de 1780, em-
pregando-se na sua construcção a pedra que sobrou da obra do
augmento do Seminário, que para esse fim obtivera provisão re-
gia e auctorização para demolir a torre de Santo António que
era uma das portas da muralha da cidade.
A egreja fecha toda em abobada de pedra e tem no corpo
6 altares collateraes em amplas capellas. Ao lado direito do ante-
paro venera-se uma formosa imagem de Christo na Agonia, ta-
manho natural, e ao lado esquerdo Nossa Senhora da Correia.
Na capella-mór, lado do Evangelho, está mettido em arco
aberto na parede o tumulo do fundador, feito por ordem do go-
— iSi —
verno em 1628, ficando -lhe fronteiro o do seu successor D. fr.
Aleixo de Menezes.
O extenso convento, que mede 5814 metros quadrados, é quar-
tel militar de infanteria n.° 8, desde 27 de fevereiro de 1841. Na
grande cerca, actualmente propriedade particular, ainda se podem
ver, em estado de abandono, as sete capellinhas ligadas por uma
escadaria de pedra, nas quaes se representa a via-sacra em gran-
des imagens de barro.
Ao centro da sacristia da egreja ha uma meza de mármore
escuro que assenta sobre uma pedra sepulchral onde se lê:
AQVI JAZ D • FR • ANT ?
DOS ST?S BISPO DE
NICOMEDIA RELIGI
OSO DE ST0 AG0
Da parede pendem 5 quadros em relevo, dourados, represen-
tando milagres de Santo António.
A estes pertenciam os 1 1 que hoje existem coloridos na ca-
pella da Praça Municipal.
A irmandade da SS. Trindade foi para aqui trasladada da Sé
no dia 24 de agosto de 1868. Na antiga rua das Conegas, que lhe
fica próxima, fundou o Arcebispo D. João Peculiar, em 1140, um
convento de freiras Augustinianas (conegas). Hoje apenas nos
resta o nome que d'ellas ficou á rua.
EGREJA DO SALVADOR (BRAGA)
O Arcebispo D. fr. Agostinho de Jesus (1587 1609) vendo o
antigo campo da Vinha transformado em vastíssimo largo da ci-
dade, por effeito da troca e emprasamento que se eftectuou aos
3 de dezembro de i5o8 entre o Alcaide-Mór de Braga, Affonso da
Costa, seu proprietário, e o Arcebispo D. Diogo de Sousa que lhe
cedeu diversos foros e outras propriedades sitas na Veiga de
Penso, mandou construir no referido local um mosteiro denomi-
nado do Salvador para ser habitado pelas religiosas benedictinas
do convento de Viciorino das Donas, (Ponte do Lima). A pri-
meira pedra da egreja foi lançada á terra em i5g5.
O convento era apenas a parte que corre ao poente da egreja.
Em 1734 construiu- se o novo dormitório e casa para os capellães,
entre a capella-mór e o actual edifício do collegio Inglez, com-
prando para este fim as religiosas duas moradas de casas com
quintaes que n'aquelle sitio havia.
- 182-
O tecto do corpo da egreja é todo apainellado com 40 magní-
ficos quadros representando a vida de Jesus e da Virgem. A talha
da tribuna e do púlpito, que data de 1736, é de grande mereci-
mento, bem como o azulejo que decora as paredes interiores, re-
presentado na seguinte gravura do púlpito:
O pórtico, voltado ao sul, é puramente Jónico, muito ele-
gante, com suas columnas de caneluras e duas imagens de pedra
representando Santa Escholastica e S. Bento. No alto ha um ni-
— 183 —
cho com a imagem do Salvador e por baixo a inscripção se-
guinte:
SALVA NOS SALVATOR MVNDI
DE VICTORINO AVGVôTINVS TRANSTVLIT OLIM. l6o2
STRVXIT AB ALMEYDA DOMNA MARIA MODO. l6l6.
Falleceu no dia 7 de fevereiro de 1893 a ultima freira professa
D. Thereza Máxima do Espirito Santo, sendo sepultada na campa
n.° 382 do cemitério publico. Todo o edifício passou então para a
posse da Fazenda Nacional que depois o cedeu ao Asylo de Men-
dicidade, actual possuidor.
N'este campo, quasi ao principio da rua do Carmo, ha um
elegante chafariz construido em 1721.
No mesmo sitio da casa da esquina, pertencente á familia do
fallecido dr. António Vieira d' Araújo, tiveram os frades benedi-
ctinos de Tibães o seu Hospício.
Também alli esteve a capella de Nossa Senhora do Amparo.
EGREJA DO CARMO (BRAGA)
Esta egreja está situada no principio da rua do mesmo nome.
A obra da construcção teve principio no dia 4 de maio de 1634,
logo depois de os religiosos largarem ao Cabido o campo do
Carvalhido, em S. Martinho de Dume, e o campo da Deveza,
em Urjaes, pela cedência do campo de Santa Eufemia, na rua
do Carvalhal, assim como de umas casas térreas para se edificar
o convento.
No dia 22 de outubro de i655 os religiosos trasladaram-se
processionalmente para este seu novo convento, d'umas casas do
largo das Carvalheiras, (agora matadouro Municipal), nas quaes
no i.° de fevereiro de i635 tinha sido fundado pelo seu primeiro
prelado fr. José do Espirito Santo, natural de Braga, o primitivo
convento.
A egreja tem quatro altares collateraes em arcos, que se com-
municam interiormente, mais dois aos lados do arco cruzeiro, e
a capella do Sacramento com porta para a capella-relicario onde
se admiram mais de mil relíquias de santos, distribuídas pelas
quatro paredes interiores, e entre ellas apreciáveis trabalhos de
pintura em pergaminho, em vidro, em cobre, desenhos a matiz e
pequenas esculpturas de santos. Esta capella que Pio VII indul-
genciou, foi grandemente venerada pelos frades. Tem ao centro
— 184 —
uma sçpultura de mármore que encerra os restos mortaes do
i.° conde de Vinhaes.
Os venerandos restos do milagroso fradinho guardam-se em
campa raza, de mármore, junto da capella-mór. Tem esta inscri-
pção a referida campa sobre que arde uma luz permanente, não
obstante a prohibicão do Arcebispo em 17 de dezembro de
1866:
AQVI JAZ
O RMO FR- JOÃO
d'aSCENCÁO NEIVA
>
RELEGIOSO CARMELITA
DESCALÇO
>
NASCEV A 26 d'0VTVBR0 DE
I787
FALECEV A l6 DE MARCO DE
l86l
E' construída de mármore a curiosa escada suspensa que con-
duz ao púlpito.
EGREJA DE S. DAMAZO (GUIMARÃES)
Está situada á entrada da rua do mesmo nome em terreno
que foi de Diogo de Miranda dAzevedo e que a irmandade das
Chagas comprou em 1625.
Construiu-se por disposição testamentária do Abbade de Santa
Comba de Regilde, rev. Lucas Rebello, que em 9 de junho de
1609 instituiu sua universal herdeira a irmandade das Chagas e
Coridão de S. Francisco. A fachada, com uma torre á direita, é
de gosto bastante simples ; mas interiormente esta egreja recom-
menda-se pela riqueza da talha dos quatro altares collateraes e da
tribuna, onde se venera a pequena imagem de N.a S.a da Penha
de França que outrora teve capella própria no largo do Carmo
(hoje de Martins Sarmento) e da qual ainda existe, a fazer parte
do muro da quinta do Bringel, uma janella crucifera interessante.
Lucas Rebello também dispoz que se construisse unido á egreja
o hospital que lá se vê, para serem recolhidos nelle ecclesiasticos
pobres e os seculares indigentes da freguezia de Santa Comba.
Durou esta obra muitos annos e parece que se refere ao começo
da capella-mór a data gravada no primeiro degrau do altar : anno
DOMINI M.DC.XXXVI.
Em pequeno arco aberto na parede interior do lado direito da
capella-mór, está o sarcophago de granito em que se guardam as
— 185 —
cinzas do benemérito fundador. Mede im,o5 de comprido por 1^,20
de alto, e tem na frente esta inscripção :
RE-BELLVS LVCAS ABBAS QVI REXERAT OLIM
REGILDAE TEMPLV, CONDITVS HOCCE JACET
IPSE SIBI TVMVLV DÂMASO QVOQ CONSTRVXIT
AEDEM.
1ACT1TE VT NATOS PÁTRIA TANTA D VOS.
IAM QVOD PASTOR OVE CAELEST1 SEDE LOCAVIT
PASTOREM TEMPLO GRATA REPON1T OVIS.
RENOVADA
NO ANNO DE l825
Junto da sacristia construiu se a expensas do commendador
Manuel José Teixeira uma pequena capella de S. Sebastião, ben-
zida no dia 20 de janeiro de i8q6. Venera-se n'ella uma nova ima-
gem do glorioso martyr, tamanho natural, primorosamente escul-
pturada em madeira.
Ao lado direito da porta principal havia uma cruz de pedra
com o Christo pintado a óleo e resguardada por uma caixa de
madeira. Fof ha annos apeada a despeito da grande veneração dos
visinhos que todas as noites lhe accendiam uma luzinha d'azeite.
EGREJA DOS CAPUCHOS (GUIMARÃES)
No dia 2 de janeiro de i663 o D. Prior de Guimarães D. Diogo
Lobo da Silveira lançou á terra junto do altar-mór a primeira pe-
dra d'esta egreja e convento dos frades capuchos da Piedade,
tudo construído a expensas dos devotos e da contribuição de 7
réis que os frades foram auctorizados a cobrar por cada arrátel
de lombo que em Guimarães se vendesse. Uma provisão real
também lhes concedeu para a obra toda a pedra dos Paços do
Conde D. Henrique!!!
Esta concessão ainda hoje, volvidos mais de dois séculos, faz
corar de vergonha quem ama as glorias da pptria.
Na sessão camarária de 3i de janeiro de 1666, o povo de
Guimarães protestou contra esta concessão absurda e estúpida,
mas os vândalos levavam já bastante adeantada a obra destruidora,
e lá foram para a alvenaria dum convento aquellas muitas paginas
de pedra pertencentes ao livro mais precioso da historia nacional !
Dois annos depois, a 29 de julho de 1668, os frades entraram
solemnemente n'este novo convento.
— ,86 —
Ao centro da capella-mór da egreja ha uma lapide funerária
ellíptica com esta inscripção :
AQVI JAZ FREI
LVJZ DO PORTO
OV DAS CHAGAS
FALESCIDO A 21 DE
JAN. DE 1797 E
TRESLADADO PA
RA ESTE l.VGAR
A l3 DE JVLHO
DE 1806
Tem aos lados da tribuna Compósita as imagens de S. Fran-
cisco e Santo António, e junto do arco os altares da Virgem das
Dores e do Coração de Jesus.
No claustro ha grandes quadros representando a vida e mila-
gres de Santo António. Um destes, sem duvida o mais digno de
attençao, mostra o thaumaturgo portuguez no inferno a colher de
João de Moreno uma tira de papel (um recibo !) com estes dize-
res curiosos :
RECEBI
DESSE MEV
FEITOR TV
DO Q.TO LHE PE
DEM MEVS ER
D.os E POR VERDA
DE PACCEI ES
TE E ME ASIG
NO. INFERNO
7 DE MAIO
i363
JOÃO DE MORENO
A irmandade da Mizericordia comprou á Fazenda Nacional
este convento e egreja por 1 :6oo-Tooo réis, em i3 de julho de
1842, e installou alli o seu hospital recebendo nelle os primeiros
doentes em julho do anno immediato.
As grandes obras a que se procede, iniciaram-se com o lança-
mento da primeira pedra pelo D. Prior de Guimarães D. José
Francisco de Paula d' Almeida, no dia 1 de julho de 1861.
— 187 —
EGREJA E CONVENTO DAS CAPUCHINHAS
(GUIMARÃES)
A pequena distancia da egreja dos Santos Passos, no campo
do Gallego, que foi pertença de Francisco de Sousa da Silva, ini-
ciou o commissario da Ordem Seraphica, fr. Francisco do Salva-
dor, a construcçao da actua! egreja e convento da Madre de Deus,
no anno de 1681, concluindo-se toda a obra anteriormente ao dia
4 de abril de 1 683, dia em que as religiosas do recolhimento da
rua do Valle de Donas, alli fizeram a sua entrada solemne, regi-
das por Gatharina das Chagas, que a i3 de maio de 1694 foi sepul-
tada em Carauz (Pamplona).
Decorridos 22 annos, o Arcebispo D. Rodrigo de Moura Tel-
les, que obtivera de Clemente XI um Breve, nomeou primeira ab-
badessa sua irmã D. Luiza Maria da Conceição.
A egreja é bastante soturna e húmida. No altar que fica ao
lado esquerdo do arco, são muito veneradas as imagens da família
sagrada, esculpturadas em Lisboa e offerecidas pelo vimaranense
padre Luiz António da Costa Pego, capellão de D. João V, sendo
collocadas no logar que ora occupam a 25 de julho de 1748.
EGREJA E CONVENTO DO CARMO (GUIMARÃES)
A edificação d'esta egreja e convento, na rua de Santa Maria,
com frente para o largo de Martins Sarmento, teve principio no
dia 26 de março de i685, e crê-se que a expensas do mercador
Francisco Antunes em honra de Santa Thereza.
As recolhidas eram carmelitas calçadas e o convento foi pos-
teriormente denominado de S. José, tendo ainda sobre a porta um
nicho com a sua estatua em pedra. O Arcebispo D. José de Bra-
gança mandou construir a capella-mór. Por fallecimento da ultima
freira professa, em 1854, o governo cedeu a egreja á irmandade
do Carmo, hoje Ordem Terceira, e por decreto de 3o de maio
de 1860, cedeu o convento para n'elle ser fundado o Asylo de
Santa Estephania, que se inaugurou ao cabo de 3 annos.
As grades de madeira dourada que vedam a capella-mór, as
duas mesas que estão aos lados do altar, e a tribuna, que foi da
egreja da Costa, merecem a attenção dos peritos.
Em frente d'esta egreja ergue-se o antigo chafariz do Toural
que tem a data de i583. E' de elegante esculptura, perfeitamente
igual ao do campo do Salvador, em Braga.
— 188
EGREJA PAROGHIAL DE S. VICTOR (BRAGA)
Está situada em plano superior, á margem esquerda da rua do
mesmo nome, e foi construída em 1686, a expensas do Arcebispo
D. Luiz de Sousa, como o indicam as suas armas, e as duas in-
scripções lapidares embebidas aos lados da porta principal :
D. LVDOVICVS A TEMPLVM HOC VE
SOVSA ARCHIEPIS TERI FERE COLLA
COPVS AC DNS BRA BENTE A FVNDAMEN
CHARENSIS HISPA TiS EREXIT ET Dl
NIARVM PRIMAS RE VO VICTORI DICA
GI,E MAIESTATIS AS VIT ANNO INCARNA
TATVS CONSILIIS TIONIS DOMINI • 1 686
•:
A architectura da fachada pertence á ordem Jónica.
Nas paredes da anterior egreja appareceu uma lapide sepul-
chral romana que se empregou na construccão da actual, onde
deve estar coberta de cal, ao lado norte. Diz a inscripção:
IVLIVS PILIDES
ORESTES
H • S • E
(Jiilhis b ilides Or estes, hic siíus est).
A origem d'esta egreja matriz é antiquíssima.
O clérigo Vasco Mendes doou a S. Martinho de Dume, em 565r
a sua quinta de S. Victouro, impondo-lhe a obrigação de crear
alli um mosteiro com capellães. A egreja foi depois reedificada
em io3i por um padre Nuno Forjaz. Em 1096 o seu padroeiro
Nuno Soares doou o mosteiro ao Arcebispo S. Geraldo. D. Payo
Mendes (11 18-37), reedificou e sagrou a egreja, tomando o titulo
de Abbade de S. Victor, transmittido a todos os successores por
confirmação do Papa Eugénio III, como se lê na iespectiva Bulia
existente no Archivo da Mitra: — Ecclesiam Sancli Victoris cum
Villa sua — datada de 1 148.
EGREJA DOS CONGREGADOS (BRAGA)
No lado sul do campo de Santa Anna ergue-se magestosa esta
egreja de construccão arrojada como nenhuma outra de Braga.
-i89-
Em i3 de fevereiro de 1686, cento e onze annos depois de
S. Filippe Nery instituir em Roma a Congregação do Oratório, o
Arcebispo D. Luiz de Sousa concedeu ao padre José do Valle,
(pouco depois fallecido e substituído pelo companheiro rev. Manuel
de Vasconcellos) licença para lundar em Braga uma filial da Con-
gregação de Lisboa. Este comprou então no campo de Santa Anna
uma morada de casas e quintal, principiando por um pequeno hos-
pício onde em breve foram admittidos mais de vinte padres, sendo
por isso necessário comprar, junto d'aquella, outras moradas de
casas e terrenos onde finalmente foi lançada pelo Arcebispo a pri-
meira pedra para a egreja a 16 de outubro de 1689.
O papa Alexandre VIII concedeu a confirmação em i3 de se-
tembro de 1690 e isentou-a da jurisdicção parochial, obtendo elles
de D. João V o régio beneplácito.
A porta principal, á distancia de 117 palmos e meio da extin-
cta capella de Santa Anna *, teve principio em 1739; e em maio
de 1765 concluiu -se toda a fachada. Nos annos de 1783-84 fez-se
o retábulo da capella mor e foi estucada a egreja.
Aos lados do arco e a toda a sua altura, tem quatro grandes
nichos com estatuas de granito representando David, Abraham,
Jacob e Isaac.
Os primitivos altares collateraes são oito.
Ha porém mais dois nas portas que ficam aos lados do ante-
paro.
Soore uma porta interior da sacristia ha um bello quadro em
tella, representando o Agnus Dei, obra de muito merecimento.
Indicou-m'o o sr. José Maria d' Albergaria Guerra, muito di-
gno chefe dos serviços telegrapho-postaes do Districto de Braga.
A egreja pertence á irmandade de Nossa Senhora das Dores,
cuja imagem foi alli collocada no dia 18 de janeiro de 1761, tendo
sido esculpturada pelo padre Martinho Pereira, nascido aqui em
Braga, no anno de 1723 e fallecido a 7 de agosto de 179o.
Diz se que por falta de recursos pecuniários não pôde ser con-
struída a torre do lado esquerdo.
E' inacreditável que para a conclusão de um edifício grandioso,
como este, não se pudesse então e não se possa ainda hoje conse-
guir do publico bracarense a verba indispensável.
O edifício do convento e cerca pertencem, por lei de i3 de ju-
lho de 1841 e 2 de dezembro de 1844, á bibliotheca publica, (or-
ganisada com os livros de muitos conventos e inaugurada em 1857),
e ao lyceu, que desde 1840 funccionava no Seminário de S. Pe-
dro, tomando posse a 1 1 de julho de 1845, e abrindo pela primeira
vez as aulas no dia i5 de outubro.
1 Esta capella principiou a ser demolida no dia o de agosto de 1769
— |i9° —
Desde o violento incêndio do Paço Archiepiscopal, em 1866.
todas as repartições publicas passaram para o edifício dos Congre-
gados e alli se conservaram até que se adquiriu o palacete dos
Falcões, no campo de S. Thiago, onde se acha installado o Go-
verno Civil, Repartição de Fazenda Districtal, Policia Civil, Com
missão Districtal e a Agencia do Banco de Portugal.
Sobre um milliario do campo das Carvalheiras vê-se esta in-
scripção:
ataLVpíMtípyTBaiMioSa
STMLVIDES(D15ERSLREP£RW.0B.l)RÀ[ôílftE»S
BÊ.MEMORIAaôMMMIimmiíoé
Refere-se á construcção da extincta capella de Santa Anna que
D. Diogo de Sousa fez construir e junto da qual reuniu vários mil-
liarios romanos.
Também D. Rodrigo de Moura.^Telles, em 1725, fez remover
para alli outras lapides que D. Rodrigo da Cunha conservara nos
jardins do Paço.
EGREJA DE S. FRANCISCO (BRAGA)
A Ordem Terceira da Penitencia foi aqui fundada por fr.
Francisco do Salvador, Commissario do convento dos Menores
Regulares de Guimarães, no anno de 1669, sendo seu primeiro
Juiz o padre João de Oliveira Carrilho e installando-se na capella
de S. Francisco das Chagas, na Sé, que era o terceiro altar da
— l9I —
nave do Evangelho, hoje dedicado a Nossa Senhora do Loreto. Ao
cabo de 5 annos mudou-se para a capella do Espirito Santo do
Hospital de S. Marcos, e em 7 de maio de 1690 deu principio
á sua egreja na extremidade da rua da Fonte da Carcova (Capel-
listas), onde lhe foram doadas duas moradas de casas.
. Dispendeu 94,35000 réis na compra de mais três moradas con-
tíguas que demolira, e em 17 12 foi benzida a egreja pelo Deão
D. Francisco Pereira da Silva, da nobre casa dos Biscainhos, o
qual sendo Abbade titular da freguezia de S. Eulália de Tenões,
chamou a si a administração do Sanctuario do Bom Jesi.s do
Monte quando notou que a devoção augmentava e com ella os ren-
dimentos.
A torre, que teve principio com a capella- mór em 1722, con-
cluiu-se em 1733, dispendendo se com uma e outra 1:270^000
réis.
Aos lados da porta principal tem estas inscripçôes:
TEMPLO DA SAGRADA
ORDEM TERCEIRA DA
PENITENCIA Q INSTI
T\IO O SERÁFICO P • S •
FRANCISCO PR1NCIPI
ADO A 7 DE MAYO 169O
FFITO \ CVSTA DOS FI
LHOS SECVLARES DA
MESMA ORDEM AIVDA
DOS DA PIEDADE DOS
FIEIS Q CONCORRERÃO
COM SVAS FSMOLAS ■
A fachada remata com a estatua da Virgem da Conceição es-
culpturada em granito.
EGREJA DE S. VICENTE (BRAGA)
No alto da rua do mesmo nome, em ponto elevado, recon-
struiu-se pela segunda vez esta egreja no anno de 169 1. A fachada
de esculptura trabalhosa, remata com a estatua de S. Vicente, em
granito, dentro de um nicho encimado pela cruz pontifical. Na pa-
rede interior da sacristia estão embebidas três preciosas inscri-
pçôes lapidares, alludindo a mais pequena ás indulgências da Sé
Lateranense concedidas á capella de S. Vicente.
A do lado esquerdo diz que a wisigothica, de que me occupo
a pag. 25, appareceu nos alicerces da antiga egreja, quando em
1 565 foi reconstruída.
A egreja tem exteriormente aos lados da porta principal estas
duas inscripçôes:
192 -
MEMBRO DA SACROSANTA
IGRE1A LATERANENSE
DE CVIOS PRIVILÉGIOS
GOZA COM OBRIGAÇAM
DE DVAS LIBRAS DE CERA
PAGAS EM ROMA CADA
ANNO DESDE A ERA DE
i598
AQVI SE GANHAM COP1
OSAS 1NDVLGENCIAS VI
SITANDO EVTA CAPELLA
DEDICADA A S • VICENTE
NA ERA DO SENHOR DCLVI •
REEDIFICADA EM MDLXV •
E TERCEIRA VEZ FVNDADA
169I
A irmandade de Santo Homem Bom, creada para venerar a
imagem que esteve no oratório da Porta Nova, uniu- se á de S. Vi-
cente no anno de 1783.
EGREJA DE SANTA CRUZ (BRAGA)
(Vide grav. a pag. ig3.)
Dos cruzeiros que o Arcebispo D. Diogo de Sousa fez distri-
buir pelos differentes largos da cidade, ficou um entre as ruas de
S. Marcos, Anjo, e largo dos Remédios, denominado cru\ de
S. Marcos, ao qual o mestre eschola padre Jeronymo Portillo
creou certa devoção de que se originou a íundação da confraria
do Bom Jesus da vera cru\, no anno de i58i, instalando-se pro-
visoriamente, por obsequio, na velhíssima capella de S. Marcos
que então existia onde hoje está a egreja e hospital da mesma in-
vocação. Foram instituidores, além do padre Portillo, os seus alu-
irmos Pedro da Grã Botelho, Francisco Gomes, António Martins
Tinoco, João Dias Leite e outros.
Em 1592 foram alterados os estatutos e cinco vezes reforma-
dos—em i63o, 1664, 1702, 1720 e 1762.
No anno de 1617, como consta do livro t.° das Memorias, re-
soLveu-se a edificação da egreja «aonde se hão de gastar mais de
dois mil crusados», comprando se para esse fim algumas casas na rua
do Anjo, para que a obra pudesse occupar parte do espaço denomi-
nado Castello Rodrigo, onde então ainda havia restos d'uma torre da
muralha romana de que se encontram vestígios na quinta do Avellar.
Oito annos depois, em 1 6^,5, o Arcebispo D. AfTonso Furtado de
Mendonça procedeu á benção do terreno, dando-se immediatamente
principio á obra que, por decorrer morosíssima, fora impulsionada
pelo referido Arcebispo com a licença que concedeuaos omciaes de
pedreiro para cortarem a pedra nas tardes dos dias santos de guarda.
D. Sebastião de Mattos de Noronha (1636-41) ordenou a remo-
ção do cruzeiro para as proximidades da capella de Santa Justa e
ponte dos Pellames, onde ainda hoje se vê com uma cavidade no
globo que encima a frágil columna e que primitivamente teve uma
pedra com o escudo de D. Diogo de Sousa.
ig3~
Egreja de Santa Cruz (Braga)
1 1
— 194-
A obra da egreja ficou concluída de pedreiro em i653, dispen-
dendo-se mais de 5o:ooo cruzados, excepto as torres que em 1693
o mestre de pedraria Manuel Fernandes da Silva foi convidado a
ultimar. A 28 de abril de 1725 foi adjudicada a Francisco Macha-
do, mestre entalhador, a obra do retábulo das capellas.
A egreja principiou cedo a dar signaes de ruina, sendo neces-
sário, em 16 de novembro de 173 1, convidar o mesmo Manuel
Fernandes da Silva, que dirigia as obras reaes de Mafra, para a
reparar em parte. Porém depois de lhe ter dado principio deste-
lhando a e demolindo parte das paredes, deixou-a exposta aos tem-
poraes, toda interiormente occupada com escoras e madeira solta, os
altares desfeitos, sendo por tudo isto necessário conservar guardas
durante algumas noites n'aquelle recinto, até que a confraria repre-
sentasse a el-rei pedindo-lhe para <r mandar que o sargento mór não
impessa que o dito mestre com seus officiaes que também se acha-
rem libertados das reaes obras de Mafra, posca continuar no dito
reparo».
A construcção d'esta egreja foi adjudicada ao mestre Francisco
Vaz, dirigindo-a Geraldo Alvares, o licenceado João Dias Leite e
o dr. Pedro de Coimbra d'Andrade. Encarregou-se da constru-
cção do pateo, que custou ibo-^ooo réis, o mestre António d'01i-
veira. No dia 9 de maio de 1861 chegaram a Braga os 10 sinos
afinados, lundidos em Lisboa.
Douraram-se dois altares em 1754. Ao cabo de i3 annos (1767)
foram encarregados de fazer o retábulo da capella-mor, pela quan-
tia de 1:610-^000 réis, Manuel da Silva e Manuel Carneiro da Cos-
ta, da rua de Santo André.
A irmandade foi elevada á cathegoria de real em 1 1 de outu-
flro de 1822. O commendador Fernando d'01iveira Guimarães
legou-lhe, em 19 de janeiro de 1 852, duas moradas de casas para
o hospital que se inaugurou a i3 de setembro do anno immediato.
Em novembro de 1890 teve começo a sua restauração, que se
concluiu em dezembro de 1893.
A fachada, riquissima de esculptura, com emblemas da paixão
de Christo, é composta das ordens architectonicas Dórica e Jónica
e tem gravados os dizeres seguintes:
ANNO MDCCXXXVI
JPS1-: L1GNVM TVNC NOTAVIT REGNAVIT A l.IGNO DE
ANNO MDCXXXXIl
VEXILLA REGIS • PRODEVNT
FVLGET- CRVCIS • MYSTERIUM
ECCE ASCENDIMVS TRADETVR AD CRV
JEROSOLYMAM CIFIGENDVM
ET F1L1VS HOMINIS
ígb —
EGREJA DA PENHA DE FRANÇA (BRAGA)
No campo de Santa Anna, lado sul, o benemérito Pedro de
Aguiar e sua mulher, instituidores da extincta Convalescença do
hospital de S. Marcos, e do coro na egreja de Nossa Senhora a
Branca, fundaram em 3i de maio de iG52 o Recolhimento de Bea-
tas da Penha de França, destinado a 7 recolhidas, nomeando sua
primeira Regente Anna de Santa Maria, natural de Guimarães.
D. Rodrigo de Moura Telles ampliou em 1720 o Recolhimento,
e fez construir a egreja, que ainda existe, com a tribuna de bella
talha dourada e as paredes imeriormente azulejadas, celebrando
n'ella a primeira missa a 18 de dezembro do anno immediato.
Dispendeu com toda a obra 22:000^000 réis.
O púlpito é, como se vê, de primorosa esculptura. (Vide grav.
a pag. icp).
Por fallecimento da ultima recolhida foi tudo cedido pelo go-
verno ao Asylo de infância desvalida de D. Pedro V, em 12 de
maio de 1870,, demolindo se então o Recolhimento para em seu lo-
gar ser construído o actual edifício.
Havia n'este Recolhimento um rabecão notável, com estes di-
zeres gravados: SARCOPHAGVS MEFECIT — l6ll — GÉNOVA — , O qual
foi vendido em hasta publica por 1^200 réis.
Do Porto veiu logo a Braga Mr. Joseph Debrun que o obteve
do comprador por 45^000 réis. Acha-se no museu de Paris que
fez acquisição d'elle por mais de trezentos mil réis! ! !
Na extremidade poente da alameda fronteira vê-se a estatua
que o cónego José Narciso da Costa Rebello e seu irmão o Barão
da Gramosa dedicaram ao chorado monarcha D, Pedro V, collo-
cando-se em 7 de março e inaugurando se em 3i de julho de 187.J.
Esta casa da Gramosa está situada onde os Religiosos da Provín-
cia da Soledade (S. Fnictuoso) fundaram no século xvn o seu Hospí-
cio. O Abbade de Fonte Boa, D. Jeronymo José da CostaRebello (o
Canavêta), mais tarde Bispo do Porto, comprou em hasta publica
o edficio, deixando-o por sua morte áquelle Barão da Gramoí-a.
Também no campo de Santa Anna, os cónegos seculares de
S. João Evangelista (Loyos), do convento de Villar de Frades,
fundaram em meado do século xvi o seu Hospício, vendendo-se
em hasta publica o edifício ao sr. João Feio Soares d' Azevedo.
EGREJA PAROCH1AL DE MAXIM1NOS (BRAGA)
Está situada no Monte de Penas, próximo do local em que
existiu uma das portas acastelladas e onde no tempo dos romano^s
— iq6 —
Púlpito da Egreja da Penha de Franca
— '97 ~
a companhia dos cidadãos fez á sua custa a casa da sociedade,
como nos diz a inscripção que no primeiro quartel do século pas-
sado appareceu alli encostada:
SODALICIVM • VRBANORVM
D S • F- C
(Sodalitium Urbanorum de suo fieri curaverunt).
E' esta uma das mais antigas parochias da cidade.
No tempo do Abbade Manuel José Leite, secretario do Arce-
bispo D. Gaspar de Bragança, demoliu-se a primitiva egreja, que
estava um pouco afastada da actual, intitulada de Nossa Senhora
da Conceição, cuja imagem é venerada em nicho aberto na facha-
da. O Arcebispo D. José de Bragança obteve da Confraria a de-
sistência d'esta egreja e respectivas rendas para a fundação de um
convento de Ursulinas n'aquelle sitio, sendo essa desistência con-
firmada pela Sé Apostólica. A morte porém veiu impedir a execu-
ção do plano.
Das inscripções lapidares que se encontram a capear o extenso
muro do adro, dou a seguinte, como a de maior importância:
ESTA QPEUMANDOV !
FAIERORW.WDMÍ}
V)RTORQFO!uEQV£IMP]
TTMDWSMMSSOMr
ANARIAS PORSV/ITEN-
ÇAM CONISEPVLTÍPÍf fc=
A inscripção do muro
[l€M*DffiViAKRPET
JADEIWWCDNIE
DBPEL0SPM/W!9>:£^
NFWr/fo-.NOAft/ODE
ií>°4ETEMfclM&?P|E
yWAOPADAMOIlTE
A Inscripção da sacristia
A segunda, d'estas duas, existe na parede interior da sacristia.
E' toda pintada a azul e tem as lettras douradas em signal de apreço.
A sua leitura é como segue: — Memoria de Bulia perpetua de
indulgências concedidas pelo Papa Paulo V e confirmadas por
Clemente VIII no anno de 1604; e tem indulgência plenária na
hora di morte. Anno de 1722.
iq8 —
EGREJA E RECOLHIMENTO DA TAMANCA (BRAGA)
Esta denominação proveiu-lhe das duas mulheres que deram
origem co Recolhimento na cangosta da Palha e que para aqui
vieram calçadas de tamancas. Expulsas pelos padres congregados
fundaram novo Recolhimento em S. Victor, onde agora estão,
sendo-lhes impedida pelo Arcebispo D. Rodrigo de Moura Telles
a continuação da obra. Ao fallecimento d'este Prelado, em 1728,
obtiveram licença do Cabido para a construcção da egreja; mas
tendo-lhe collocado as armas dominicanas, foram immediatamente
intimadas por dois cónegos para as tirarem d'alli. Eram os effeitos
da rigorosa observância d'um curioso compromisso.
O mirante foi construído em i?55, e a actual egreja é obra do
Vigário Capitular, D. fr. Aleixo de Miranda Henriques, da Ordem
de S. Domingos, o qual comprou a Lopo António de Vasconcellos
Abreu e Lima todo o terreno do largo que lhe fica em frente.
EGREJA DA CONCEIÇÃO (BRAGA)
Foi iniciada a construcção da actual egreja em 1720, concluin-
do-se 3 annos depois, como se lê no alto da porta principal :
17 DE AGOSTO DO ANNO DE I728
Tem, além do altar-mór, três collateraes, contando o da Gruta
de Lourdes.
Quando o cónego dr. Geraldo Gomes fundou nas casas da sua
habitação o convento de freiras da Conceição, o primeiro d'esta
Ordem fundado em Portugal, sendo lhe lançada a primeira pedra
em 1625, e concluída toda a obra 4 annos depois, construiu-se a
respectiva egreja na extremidade sul, sendo sepultados n^lla o fun-
dador e seu irmão o dr. Francisco Gomes e a primeira Abbadessa
D. Martha de Santa Anna.
Esta egreja, que ha muito estava inutilizada, foi demolida pai a
em seu logar se construir o novo edifício das officinas de tecelagem
do Collegio de Regeneração, creado em 1879 e installado n'este
velho convento em dezembro de 1 863. No anno de 1893 ainda exis-
tia a porta principal com esta inscripção :
BRACHARAE H(EC VIRGO EST E1VS SVNT TEMPLA
GERALDO ILLA SVO SVMPTVS CONTVL1T 1LLA ÂNIMOS
- i99 —
No muro contíguo á portaria está embebida esta lapide:
A DOMINA TVRR1VM FAC
TVM • ET EST MIRABILE
ET SIC NON EST- IN TOTA
SANCTIOR VRBE LOCVS •
ESTADO PRESETE E ROMA
O DOVTOR GERALDO GO
MES NATVRAL DESTA CIDA
DE NO ANNO D 1 588 O PA
PA XISTO QVINTO D BOA
MEMORIA LHE DEV A CO
NESIA NESTA SEE QVE SER
VIO PESSOALMENTE 6o
ANNOS E TODOS OS REN
DIMENTOS DELLA APLI
COV A ESTA OBRA FALLE
CEO NO ANNO D 1648 D ABR •
Junto d'este mosteiro, no sitio de Urjães (Gazeta de Lisboa n.° 26,
anno de 17 19), descobriram-se quatro estatuas de prata de 6 pal-
mos de alto !, sendo uma de mulher, outra de um Fauno e duas de
Centauros, elmos de prata lavrados, e mais de trinta laminas de
prata com debuxes de caçadores. Foi tudo comprado por varias
pessoas, entre as quaes figuram o Arcebispo D. José de Bragança
e o cónego Falcão.
Um dos dormitórios das religiosas foi devorado por violento
incêndio á 1 hora da noite de 5 de janeiro de 1761, sendo uma
d'ellas victimada. As demais fugiram para a casa dos Falcões e
d'alli para os Remédios, levando as pratas da egreja e condu-
zindo a Eucharistia para a egreja de S. Thiago.
Próximo do convento appareceu numas excavaçoes feitas em
1840, uma lapide romana funerária com esta inscripção :
IVNIA
M- L
VRBANA
H S • E
«Junia Urbana, liberta de Marcos, aqui está sepultada.»
Na quinta do Avellar ainda se pode ver um grande lanço da
muralha romana. Havia alli uma das portas acastelladas, em forma
de torre, que foi demolida no primeiro quartel do século xvm.
200 —
EGREJA E CONVENTO DE SANTA ROSA DE LIMA
(GUIMARÃES)
r:?i Está situada na antiga rua do mesmo nome, hoje de S. Sebas-
tião, por ter sido para alli transferida a sede daparochia em 1893,
como logo se verá.
A construcção da actual egre)a terminou em 1734.
O desenho do retábulo do altar-mór, que em 1741 foi execu-
tado por 65o$ooo réis, deve-se ao mestre entalhador José d'Af-
fonseca Lima, da cidade do Porto.
Incluindo o antigo coro das freiras, que hoje faz parte da egre-
ja, esta mede de comprimento interiormente 37,10 por 7 de lar-
gura, e tem do lado do Evangelho o altar do Senhor Jesus e
do da Epistola o de Santo António. Collocaram próximo da
porta a antiga imagem de Christo na cruz, que as freiras vene-
ravam ao fundo do coro de baixo. A construcção do convento
iniciou-se com a compra d'algumas casas e quintaes, por meio
d'esmolas.
Por escriptura publica de 3 de fevereiro de 1680, a confraria
da Senhora da Graça, que administrava a antiga Albergaria de
S. Roque, cedeu ás freiras o hospital, hortas e capella para au-
gmento do convento, com obrigação de continuarem a recolher
por três dias os pobres passageiros numa casa que actualmente
é occupada pelo parocho, e junto da qual está o mirante princi-
piado a construir em 3i de março de 1727.
A irmandade de Santo António, que estava erecta na egreja de
S. Francisco, installou-se n'esta de Santa Rosa de Lima na 5.a feira
22 de dezembro de 1887.
Na sexta feira 9 de março de 1888 falleceu a ultima freira pro-
fessa, soror Joaquina Carolina, natural de Font'Arcada, concelho
da Povoa de Lanhoso.
Contava 72 annos de edade e 56 de professa. Ficou então ex-
tincto o convento, dando logo entrada no Ministério da Fazenda
os seus haveres em títulos da divida publica, na importância de
18:700^000.
Dois annos depois, em 24 de maio de 1890, cedeu o governo
á Camará de Guimarães o convento e a cerca. A egreja passou a
ser a sede da parochia de S. Sebastião, eífectuando-se processio-
nalmente a transferencia pelas 5 horas da tarde de domingo 25 de
setembro de 1892. Desde logo a Camará procurou fazer desap-
parecer a velha egreja construída em 1570 por ordem do D. Prior
e Cabido da Collegiada, na extremidade Oeste do Campo de
— 201 —
S. Francisco, hoje praça de D. Affonso Henriques, auxiliando
esta remoção com 1 :ooo$ooo que concedeu em 27 de outubro
de 1887.
Para que fique memoria do local, dou a medição do terreno
occupado por esta egreja e respectivo adro: — Media 48,30 de
comprimento por 33, 20 de largura. Desde o adro á esquina
da mercearia Andrade, alto da rua de Caldeirôa, havia 9, 3o
de largura; e desde a porta principal da casa do sr. António
Ribeiro da Gosta Salgado á parte do adro com que defronta-
va, io,o5.
No dia 3i de agosto de 1892 o sr. Manuel Pinheiro Caldas
Guimarães arrematou por 246.^000 réis a tribuna, sanefas da ca-
pella-mór e o altar do Senhor Jesus.
A torre foi arrematada no dia 14 de setembro do referido anno
pelo sr. Joaquim Mendes da Silva Cerqueira que deu por ella
ioo^ioo réis, para ser levantada ao lado direito da egreja de
Creixomil, onde pôde ser vista. Os trabalhos da demolição da egreja
começaram no sabbado 1 de outubro com a descida dos sinos. As
ossadas foram removidas do adro no dia 3, e no seguinte arrema-
taram-se por n:3oo réis as quatro sanefas dos altares collate-
raes.
Em 2 de novembro arremataram-se por 6o:5oo a sala do des-
pacho, as sacristias de S. José, Senhor Jesus e Sacramento, sendo
esta reconstruída ao lado direito da egreja de S. Damazo com a
sua janella de quatro semi-circulos.
A torre começou a ser apeada na quinta-feira 1 7 de novembro,
seguindo-se a egreja, cuja pedra e entulhos se applicaram ao en-
chimento da entrada da nova avenida sobre a antiga rua de Relho,
ao alteamento da rua da Caldeirôa, no logar do Arquinho, e ao
concerto do caminho da Costa entre os logares de Fato e Rio,
concerto aproveitado para a estrada de macadam que presente-
mente se conclue até á egreja parochial de Santa Marinha. O cru-
zeiro que estava encostado á torre foi remo\ido para o claustro da
Sociedade Martins Sarmento.
BASÍLICA DE S. PEDRO (GUIMARÃES)
Está situada no largo do Toural e teve principio em 1737. A
29 de novembro de 1750 foi para aqui transferida do claustro de
S. Francisco, onde esteve por espaço de 17 annos, a irmandade
de S. Pedro fundada na capella da mesma invocação que existe no
claustro da Collegiada, crendo-se que fosse esta a primeira d'este
titulo em Portugal. Extincta em 1768, foi restabelecida em 1787
— 202 —
pelo rev. José Amaro da Silva que sobre a sua campa, ao centro
da egreja, tem a inscripção seguinte :
AQVI JAZ MAND.e DE
ORD. JOSÉ S. PEDRO,
AMARO DA FALECIDO
S.a RESTAV A 27 DE
RADOR E DEZEMBR.O
BEMFEIT." DE 1826
DESTA IR
Por Breve de Bento XIV datado de 26 de março de 17D1, foi
esta egreja, ainda então incompleta, elevada á cathegoria de Basílica.
As obras paralisaram em 1824 recomeçando ao cabo de 57 annos
nomez demarco e faltando-lhe ainda hoje a torre do lado esquerdo.
A architectura da fachada, cujo desenho foi offerecido pela Real
Associação dos Architectos Civis e Archeologos Portuguezes, não pri-
ma pela elegância e bom gosto. Ao centro do frontão sobre que as-
senta a cruz pontifical, tem as armas de S. Pedro e um livro aberto
em que se lê :
TU ES
UB1 PETRUS
'ETRUS.
IBI ECLESIA
^TH. XVI
\
S. AVG.
Palavras de Jesus Christo a S. Pedro : Tu es Petrus, et su-
per hanc petram aedificabo Ecclesiam meam, et portae inferi non
praevalebunt adversus eam.
Na sacristia existem dois pequenos quadros de altíssimo me-
recimento, pintura a óleo representando as cabeças dos apóstolos
S. Pedro e S. Paulo.
Os Francezes, tendo entrado em Guimaiães no dia 23 de
março de 1809, occuparam a i3 de maio esta egreja e a sacristia
com numerosos cavallos, encheram de palha e milho os altares e
commetteram outras profanações roubando toda a prata, que não
era pouca.
EGREJA PAROGHIAL DE S. LAZARO (BRAGA)
Está situada ao fundo da rua das Aguas, no local da antiga er-
mida de S. Lazaro. Tomou a invocação de S. José em homenagem
ao santo do nome do Arcebispo D. José de Bragança filho bas-
tardo de D. Pedro II e de D. Francisca Clara da Silva, o qual
instituiu a parochia no anno de 1747, dividindo assim a de S. Vi-
ctor que era demasiadamente grande.
20_"> —
A actual egreja, de architectura simplíssima, foi construída a
expensas do Arcebispo D. fr. Caetano Brandão. Tem a poucos
passos um apreciável cruzeiro de que me occuparei no logar com-
petente dando d'elle photogravura.
O celebre monumento antigo, vulgarmente denominado ídolo
dos Granjinhos, fica num quintal muito próximo, ao lado esquerdo
da egreja.
A egual distancia, na rua das Aguas, está instalado o Asylo de
entrevados, cuja fundação teve logar no anno de i852,
EGREJA PAROCHIXL DE SANTA MARINHA
DA COSIA (GUIMARÃES)
A construcçao d'esta egreja com os respectivos p ueos frontei
ros teve principio no tempo do Prior fr. José de Castro, eleito em
25 de setembro de 1748, sendo toda a obra justa por i5:5oo cru-
zados, como nos diz o fallecido padre Caldas na sua obra Guima-
rães, vol. II, pag. 171.
Até o anno de i528 pertenceu este convento aos cónegos re-
grantes de Santo Agostinho, para quem a rainha D. Mafalda, mu -
lher de D. Aífonso Henriques, o fez edificar.
— 204 —
A isto faz referencia um grande quadro em madeira com o re-
trato da fundadora, oíferecido pelo sr. Visconde de Sendello, pos-
suidor de parte do convento, ao museu da Ordem de S. Francisco.
O quadro tem na parte inferior estes dizeres :
HOC PIA CAENOBIVM AEDIF1CAT MAFALDA PRIORIS
ALFONSI CONIVX: LYS1A FIRMA MANET
NAM CHRISTO ADVERSOS ALFONSVS CONCVTITENSE
SED MAFALDA PIÁ RELLIGIONE QVAT1T. 17:6.
A fachada da egreja é de trabalhosa esculptura e remata com
um nicho onde se vê, em granito, a estatua de Santa Marinha
martyr.
Interiormente é esta egreja muito airosa e acha se em óptimo
estado de conservação, graças aos desvellos do actual parocho rev.
Hermano Amândio.
A ladear a porta prin-
cipal, e já dentro do alinha-
mento, das torres, tem mais
dois nichos com as estatuas
de S. Jeronymo e de Santa
Paula, como no altar-mór
onde se veneram duas ima-
gens dos mesmos santos
esculpturadas em madeira,
muitíssimo recommenda-
veis pelo primor da execu-
ção.
Interior da egreja da Costa
Fachada do convento da Costa
Lor>
Alinha com a frente da egreja o magestoso convento que te
principio em meado do século xvu.
Pertence áirman-
dade das Almas, ere-
cta n'esta egreja, o
preciosíssimo cálice
de prata dourada
(século xn) que aqui
se representa.
Sendo em 1 884
extinctos todos os
conventos, os frades
Jeronymos entrega-
ram este cálice á ir-
mandade das Almas
em pagamento de
uma divida.
O fallecido Ar-
cebispo D. António
Honorato não o en-
viou á exposição de
Lisboa, em 1888, re
ceiando que levasse
descaminho.
Mede 0,17 de
altura, o, 52 de cir-
cumferencia no bor-
do da copa, e 0,48
em volta da base
onde tem esta inscripção
ve
Cálice de D. Dulce (século XII)
-f- Ej M: CC: XX-; Vi REX; SANCI • ET REGINA]
DVLCIA ; OFFtRVNT ] CALICEM \ ISTVM \ SCE j MARINE : DE • COSTA j
Foi, como aqui se lê, offerecido por el-rei D. Sancho e pela
rainha D. Dulce, a Santa Marinha da Costa, na era de 122Õ (anno
de 1187).
Foi ultimamente depositado no pequeno museu da Collegia-
da, bem como outro do século xvi, pertencente á mesma ir-
mandade, representado na grav. a pag. 206.
Sob a protecção de el-rei D. João III fundou-se neste convento
um estabelecimento scientifico com foros e regalias de Universi-
dade, como diz o talentoso padre António Hermano, para o estudo
de humanidades, Phylosophia e Theologia, sendo os lentes aucto-
2o6 —
risados a conferir os graus de licenciados, bacharéis e mestres em
Artes. Instruiram-se e educaram-se n'ella os infantes D. Duarte e
D. António, filho do infante D. Luiz.
Em 1889, quan-
do ainda Guimarães
não possuía um úni-
co estabelecimento
de ensino secundi-
rio, alguns padres
beneméritos funda-
ram n'este arruina-
do convento um Col-
legio denominado de
S. Damazo, o illus-
tre Pontifiee vimara-
nense. A cidade,
pouco habituada a
benefícios gran les,
recebeu com indiffe-
rença o feliz melho
ramento, porque du-
vidava do êxito que
alfim se obteve !
O auctor d'estas
linhas (permittase-
lhe a immodestia)
promoveu-lhe então,
com outro seu ami-
go, uma festa inau-
gural brilhante, ape-
nas custeada pelos
dois.
Este Collegio foi
installado á pressa,
num breve intervallo
de ferias de verão.
O inicial corpo do
cente e discente destacou-se do Collegio de Santa Quitéria do vi-
sinho concelho de Felgueiras. Constituiram-se em Direcção os pa-
dres seculares, seus fundadores, António Hermano Mendes de Car-
valho, Firmino António da Silva Bravo, e Domingos Dias de Faria,
abrindo-se o Collegio no dia 6 de outubro do referido anno de 1889
com aulas para os cursos secundários dos lyceus e seminários.
Teve de principio logo uma frequência vistosa e animadora :
eram 75 alumnos internos e 25 externos.
Cálice da Costa (século XVI)
— 207 —
Nos annos seguintes o numero de estudantes augmentou até
cerca de 200 internos.
Essa notável prosperidade, deveu-a o estabelecimento ao êxito
singular obtido nos exames no lyceu de Braga. Um anno os Dire-
ctores até julgaram conveniente inventar as reprovações para que
ao publico não parecesse inverosímil o quadro sern sombra? das
numerosíssimas approvações e distincções !
Nos últimos annos, por influencia da reforma de instrucção se-
cundaria de 1894, a população escholar algo tem diminuidoj toda-
via tem mantido a auspiciosa cifra de ioocollegiaes.
O ed.rkio é grandioso e o local superrimamente salubre. Vi-
sinho de Guimarães, ligava-o todavia á cidade um caminho peor
que um calvário ; mas hoje graças aos esforços de alguns vimara-
nenses e da Direcção do Collegio, serve-o uma bella estrada de
macadam que principiou a ser construída no dia i.° de marco de
1898.
EGREJA DE NOSSA SENHORA. DA LAPA (BRAGA)
No largo do mesmo nome, onde alguns missionários acompa-
nhados do padre Angelo de Sequeira", collocaram em 1757 um
quadro de Nossa Senhora da Lapa, construiu se a expensas dos
fieis esta egreja, lançando-lhe a primeira pedra, a q de novembro
de 1761, o Reitor do Seminário Conciliar e Chanceller-mór do
Arcebispo, o rev. António Barbosa de Góes, com assistência de
vinte ecclesiasticos e por mandado do Arcebispo D. Gaspar de
Bragança. Ao cabo de seis annos concluiu-se a obra da capella,
sendo benzida a 7 de setembro de 1767 e celebrando-se n'ella a
primeira missa no dia immediato. A obra dos altares collateraes
terminou em 1781 e a do altar mor em 1792, tudo subsidiado pela
irmandade de S. Thomaz d'Aquino que no dia 8 de novembro de
1774 fora para alli trasladada da capella dos reis, no claustro da
Sé. Por escriptura de 16 de junho de i8o5 uniu-se-lhe a irman-
dade de S. Pedro que, segundo se crê, foi erecta em 1 556 na ca-
pella de S. Pedro de Rates, na Sé.
A arcada, que dum e outro lado alinha com a fachada da
egreja, teve ao centro da construcção exterior a bella estatua de
Braga, tudo feito a expensas do Arcebispo D. Rodrigo de Moura
Telles, na anno de 1716. Também então se construíram nas ex-
tremidades as duas casas redondas, denominadas caramanchões,
que a camará emprazou.
Quando a egreja da Lapa principiou a ser construída em 5 no-
vembro de 1761, tendo ainda por campanário uma das torres do
castello da cidade, passou a estatua para a extremidade norte e
- 208 —
tfalli para o arco da rua nova de Sousa, onde actualmente se en-
contra.
Em janeiro de ,1718 o referido Prelado deu principio á cons-
trucção do Aljube, que fica nas costas da egreja, e contíguo á
antiga muralha do castello da cidade, dispendendo com esta obra
4:400:000 réis.
Quando em i853 foi demolida aporta do Souto, que encostava
ao castello, appareceu nos alicerces um cofre contendo moedas do
reinado de D. Diniz.
O pelourinho, que se achava no largo hoje do Barão de S.
Martinho, e na base do qual se lia — anno de 1 585— foi removido
pela camará no dia 12 de dezembro de 1844 para ° anngo campo
dos Touros, onde se conservou até 18 de julho de i853, dia em que
foi inutilisado para em seu logar ser construído o actual chafariz.
O edifício do theatro de S. Geraldo, que fica no largo da Lapa,
teve começo em 27 de setembro de i855.
No dia 8 de junho de 1860 foi inaugurado pela actriz Emilia
das Neves.
EGREJA E CONVENTO DE SANTA THEREZA
(BRAGA)
No alto da rua das Oliveiras, em uma casas compradas a Pe-
dro Fernandes, iniciou-se no dia 18 de maio de 1763 a construcção
da actual egreja de Santa Thereza, concluindo-se em 1766. Toda
a pedra empregada n'esta obra foi cortada no largo que lhe fica
em frente, onde ainda ha vestígios de penedia. A 14 de junho de
1767 o cónego Francisco de Mendonça benzeu solemnemente esta
egreja e no dia immediato cantou-se alli a primeira 'missa a que
assistiu o Arcebispo D. Gaspar de Bragança.
O pequeno convento ainda hoje é habitado por uma freira
professa.
— 209 —
EGREJA DOS SANTOS PASSOS E VISTA DA SERRA
DA PENHA (GUIMARÃES)
Na extremidade sul do antigo campo da Feira e no mesmo lo-
cal onde o vimaranense Duarte Sodré mandou construir uma ca-
pella de Nossa Senhora da Consolação com alpendrada em volta,
instituindo-se-lhe uma irmandade de estudantes com seus estatu-
tos approvados em 9 de dezembro de i5m_i, iniciou-se em 1769 a
construcçao da actual egreja, cujo corpo foi benzido a 16 de outu
bro de 1785.
Encarregou-se da planta o bracarense André Ribeiro Soares da
Silva.
No dia j 1 de dezembro de 1787, a reliquia de S. Fortunato, que
ainda hoje se venera, foi collocada na egreja em urna especial, des-
envolvendo-se de tal modo a devoção dos fieis, que, por esse motivo, a
conclusão da obra nãose fez esperar muito. Astorres, elegantíssimas,
tiveram principio no dia 28 de maio de 1862 e terminou a obra em
1878 sendo Pedro Ferreira o auctor da respectiva planta. A torre
do lado direito principiou a ser construida com a quantia de réis
(ioo^ooo, producto de três espectáculos de prestidigitação desem-
penhados pelo ofterente sr. Sebastião Augusto de Magalhães Bran-
dão, que por esse motivo tem o seu retrato na galeria dos bem-
feitores. Em 1798 concluiu-se a capella-mór, empregando-se na sua
edificação a pedra da torre da freiria e a do lanço de muralha que
lhe ficava contíguo.
O carrilhão de sinos afinados estreou-se no dia 28 de maio
de 1875.
— 2IO —
Venera-se n'esta egreja a imagem do Senhor dos Passos, que
annualmente é conduzida em magestosa procissão no domingo de
Lazaro. Foi feita sendo Juiz da irmandade Manuel da Cunha
Maranhas.
No dia i5 de março de 1861, duas das mais novas coristas do
próximo convento das Capuchinhas, dispondo-se, como de costu-
me, a preparar a imagem para a alludida procissão, encontra
ram-lhe o rosto tão humedecido, que chegou a molhar a toalha a
que o limparam e a qual o povo desfez em numerosas reliquias.
Este caso era a repetição do que se havia dado 56 annos antes.
A túnica do Christo e os demais paramentos de velludo roxo,
ricamente bordados a oiro fino, fazem a admiração de todas as
pessoas que de longe concorrem á procissão.
A irmandade dos Santos Passos comprou aos herdeiros de
Manuel de Magalhães d'Araujo Pimentel uma morada de casas, e
ainda outras com campo junto, pertencentes á Condessa de Basto,
para a fundação do Asylo de Mendicidade, solemnemente inaugu-
rado a 4 de fevereiro de 1877, e dum Collegio de meninas com
internato.
A obra do alargamento do campo da Feira para a parte d'este
Asylo custou 780^000 réis e foi arrematada no dia 10 de setem-
bro de 1890 pelo empreiteiro sr. José Rodrigues, de Vizella.
EGREJA DE NOSSA SENHORA A BRANCA (BRAGA)
Está situada no largo do mesmo nome.
A parte superior da fachada foi construída durante o pontifi-
cado de D. Gaspar de Bragança. A inferior pertence á archite-
ctura dórica.
Sobre o arco da porta principal tem as armas de D. Diogo de
Sousa.
No alto do oratório da Virgem acha-se gravada a seguinte in-
scripçao:
NIVE
DEALBABVNTR (SIC)
IN SELMON
MONS DEL
MONS IN QVO
BENEPLAC1TVM
EST DEO
HABITARE IN EO
ANNO D- I77I •
No espaço que esta egreja occupa houve antigamente uma ca-
pella denominada de Nossa Senhora da Carreira, na qual estava
— 211 —
instituída a irmandade de Nossa Senhora das Neves, como refere
o Arcebispo D. João Martins de Soalhães, no seu testamento feito
em i3 19, presentemente guardado no real archivo da Torre do
Tombo. Também no seu testamento o Arcebispo D. João Affonso
de Brito diz : « . . . . e 60 Livras para reFa\imento da ermida dê
Nossa Senhora das Neves A 'Branca a par de S. Victonro.»
Essa velha capellinha foi reedificada a expensas de D. Diogo
de Sousa (i5o5-32) por occasião de mandar construir todo aquelle
largo e o vasto campo de Santa Anna.
Pedro d'Aguiar e sua mulher Maria Vieira instituíram n'esta
egreja coro de 5 capellães com obrigação de missa quotidiana por
suas almas.
Estão ambos sepultados na capella do Nascimento, lado do
Evangelho. O coro, o retábulo e um alpendre que teve, foram
feitos desde 1627 a i635. Acham- se exteriormente encostadas a
esta egreja as 14 cruzes de pedra que se erguiam ao longo dos
campos de Santa Anna e da Vinha.
EGREJA PAROGHIAL DE S. PAIO (GUIMARÃES;
No largo do mesmo nome onde desde o primeiro quartel do
século xiii existiu a terceira e ultima egreja parochial do burgo,
construiu-se desde 1789 a 96 a actual egreja com a torre ao cen-
tro da fachada. As oito cruzes da sagração a que se refere o sau-
doso padre Caldas podem ter sido aproveitadas da primitiva egre-
ja. Ha d'isto numerosos exemplos.
No largo que lhe fica em frente existiu um elegante cruzeiro,
-com a imagem de Christo esculpturada em granito fino, apeado
no dia 18 de fevereiro de 1879 por ordem da illustre vereação que
logo o fez levantar no cemitério municipal da Athouguia. Pouco
depois vendeu-o para a freguesia de Polvoreira, onde se conserva
próximo da egreja parochial muito venerado por aquelle povo.
Ao lado d'esta egreja de S. Paio existe o Asyío de inválidos
administrado pela meza da Mizericordia. Foi inaugurado em 1844,
para receber 26 indivíduos dos dois sexos.
Na frente do edifício tem os dizeres seguintes:
ASILO
DE
INVÁLIDOS
— 212 —
Sanctuario do Bom Jesus do Monte (Braga)
Quem ha que não conheça, ao menos por tradição, a feiticeira
estancia do Bom Jesus de Braga, onde nacionaes e extrangeiros se
extasiam na contemplação da natureza e da arte que alli se dão
as mãos?
A escadaria antiga e a moderna, a que minudentemente se
refere o sr. Azevedo Coutinho no seu livro publicado ha um anno
sob o titulo — Bom Jesus do Monte, o lago, as grutas, os jardins,
as estatuas, o figurado das novas capellas e a magestosa egreja,
tudo prende a attenção do visitante. Uma simples cruz levantada
ha séculos entre as asperezas d'aquelle Monte Espinho, deu ori-
gem á formosíssima egreja e ao embellezamento do local que de-
ha muito se considera o mais attrahente do Minho !
'1 1
3-
Vista geral do Bom Jesus
A tradição da cruz é de todo o ponto acceitavel. O que ainda
se ignora é o anno em que foi construída a primitiva ermida. Já
no meu livro InscripçÕes e Lettreiros, pag. 1 56, anno de i8g5,
mostrei que a lapide gravada em 1839 e collocada no muro do
primeiro patim é inexacta quando attribue ao anno de 1474 o go-
verno do Arcebispo D. Jorge da Costa II, que teve logar na au-
sência de seu irmão o Cardeal de Alpedrinha desde 1408 a i5oi.
Por isso com razão o sr. Azevedo Coutinho corrige aquella data
dando lhe mais 20 annos. Em que se fundou porem o auctor da
— 214 —
referida inscripção para attribuir a D. Jorge a construcção da pri-
mitiva capella, se as suas armas encontradas nas escavações po-
diam ter sido applicadas a qualquer melhoramento effectuado a
expensas do Prelado, e se 22 annos depois o Deão D. João da
Guarda mandou fa^er a egreja e capella?
A esta construcção ou reedificação se refere a lapide seguinte
existente no patim do lado opposto e de cuja authenticidade não é-
licito duvidar :
O
'ESTORLIPCEtKPf.LKMJT
DOMFASERO.PRETONOTTTIRQ
DOjOff:DAbV/TRDfí:DR\\,R
DEBRR6R--ELW6VO: .
1 0(J^ EL HO: DE ELREI. '
C0NDEPfíWTlNOPOlUVAD
EVAIR HXb-D DOMES: DE-
SETÈl^^DOflNO-.BlWaJf
Leitura:- — Esta egreja e capella mandou fazer o Protonotario
Apostólico Dom João da Guarda, Deão das Sés de Braga e^ La-
mego, do conselho de el-rei, conde Palatino, por sua devoção, a
16 dias do mez de setembro do anno de i522.
2ID —
Escadaria antiga do Sanctuario
— 2l6 —
A actual egreja, com fachada composta das três Ordens archi-
tectonicas — Dórica, Jónica e Compósita, foi desenhada por Carlos
Amarante. Principiou a ser construída no dia i.° de junho de 1784
c concluiu a 20 de setembro de 181 1.
Ao lado direito da porta principal existe esta lapide referente
as indulgências concedidas pelos Papas Pio VI e Pio IX:
1 Cjl% WT:- induuenTiam umm IN DONinHIJ P^WíHUM^JU W10IVIÍ,ET
ÍIVEMMÔUEMífoMMO^
RIAVI QUft5RftQtJSl»AAE,EriE^LiN ANNO QUOÍUMQi>e fti£s - ITEM OMMtS fcT ^t ^GU-
Us liVOUUiEíyiTiA^ STATiOWUM Vlft C Rgí tSVISirANTfôUV (APEU.AS HUlUS SAN"<.Tl>AWi •
Igit H lUUlMDaCLVlll COa/LESSITADDECEMNWM MMIC£iUiESlAM\/lilT?:-lJI^IUUa£A/
; rttkVÍESÍWftKXlW ^OT^NftTIVlTATl^EPiniAWI^ETASCEWSWKISaNaX^illWIMAàííííU
. ElJ)l£^^IVLKSARl0G£mCAT10NM.Ç|PSiUS£CL^i]^AM>yEÍ?FJíSUsaVj^ADoUAWMS0UÍ
| DlkKUStíiHU!U5AA0Df: !NSUP£HVII AHNO^ToTlDkMauEaUA0íl^tNASâUALlBETA|/k'!fCfltA;
[, VI .PMràkMiWTMlJMffl iNDlUTISEXfREM |
Ao lado. esquerdo tem esta da consagração da egreja pelo Ar
cebispo D. José Joaquim cTAzevedo e Moura, a Jesus Christo cru
cificado, com as respectivas indulgências:
I K.ft.WDUCL\IUltV£RO>l.MLNftUUU>ST|ExCtUi.NTíSS\MUS Aí-RWt--
KtN0ltílW^DíaOSTOi)OAlHllJUSDEAlt\/iI)OElA0Ullh,liílSHltf1$COWi ,
' í\ D QNUNfílOA MMí M MWMmWMtt MIN t EtCLEÇi ^ M 1 M
H0WtoD.N.ItiUíHWUltllOtlFlXllflNSt(WJlT^TftV)EINiiysWAR\WI\l0
Hl HB\ RELlflLUIAS II^C LUS I T: E% LIUIK>3> -CRUC tt.D£ t OLUWWA F UUEUATIONIS
ElU»fcMD.N0[XVElflB.V.^W£HPAlliOS|iNauiítPHlSPflNÇ|tlUtíE#
HAÍ^tT tX QUiBUS^S.APOST()L0RUra PETRl.fAUi.1, ANOKtft.lAU)ftl NUUOI^'1 AMlt
NAÍ£,X L ITEM ÍÍES S WUUL1S í HklU ) F|0EUauSKCl.iS(AÍAtftlM8£^T£ VISI
1ANTIBU5 IN D1E AMMlV£i)\llKIO rHIIUV£ OMSEU: RfCílOfVIVJlU I OOMtVtCASCCUAlQAAU^r.
Na fachada ha ainda outras inscripçÕes, uma das quaes, com-
memorativa da grandiosa festa do primeiro centenário, realisada
no dia 1 de junho de 1884. Em 29 de julho de ijbj ordenou-se a
abertura da calçada do Lanhoso que em 16 de maio do anno im-
mediato ainda não tinha attingido a conclusão. Todas as obras
2i7 —
que D. Rodrigo de Moura Telles effectuou na estancia do Bom
Jesus, importaram em mais de vinte e quatro contos de réis.
A nova estrada de macadam principiou a ser construída, e si-
multaneamente o jardim do campo de Santa Anna, em 1854. A
28 de março de i85q deu-se principio á estrada que parte do arco
até ao Sanctuario, e em 1874 inaugurou-se a linha americana.
No dia 14 de outubro de i853 collocaram-se na egreja os ór-
gãos que pertenceram á do convento de Bouro.
O elevador foi inaugurado em 25 de março de 1882.
No dia 8 de março de 1897 inaugurou-se com grande solemni-
dade a obra de reconstrucção da escadaria dos Cinco Sentidos,
sendo adjudicada por 3:8oo.7^ooo réis ao mestre pedreiro braca-
rense Guilherme José Pereira.
EGREJA PAROGHIAL DA CIVIDADE (BRAGA)
E' de origem antiquíssima esta egreja situada no local mais
importante da Bra-
cara romana. A con
strucção actual é mo-
desta e a decoração
interior pouco re-
commendavel. Tem
ao lado esquerdo a
capella das Santíssi-
mas Chagas, vedada
por grade de ferro, e
construída em 1 Scjy.
Foi instituída pelo 'dr.
Pedro da Grãa, fidal-
go da casa real. cora-
mendatario e admi-
nistrador vitalício do
mosteiro benedictino
de Santa Maria do
Carvoeiro. O insti
tuidor jaz em sarco-
phago de pedra den-
tro d'um arco aberto
na parede do lado da
Epistola, com o se-
guinte epitaphio:
No altar tem esta
<apella ura, primo-
S.DEPMGRAACOMEN"
MBRIQíMIFlRpi
UWEWLMAD8
FAZERfiTOÉPElUlCOM
IKORBPO
l.FA
LECEOA0S/9.DEFE
VEREIR0.DEICO2.
— 2l8-
roso quadro a óleo, representando Christo na cruz, e estes dize-
res ao fundo:
HAVRIETIS AQVAS IN GAVDIO
DE FONTIB'SALVATOR(/s)
EGREJA DE NOSSA SENHORA DO SÁMEIRO
(BRAGA)
A dois kilometros do Sanctuario do Bom Jesus, na parte su-
perior do Monte Espinho, passeava em setembro de 1861 o pa-
dre Martinho António Pereira acompanhado d'outro individuo seu
amigo a quem expôz a ideia de se promover a erecção de um mo-
numento n'aquelle sitio, em honra da immaculada Conceição, me-
morando assim a definição dogmática por Pio IX em 8 de dezem-
bro de 1854.
A 1 1 de maio do anno immediato nomeou-se uma commissão
que a 28 de julho de i863 obteve de D. Flaviana Claudina Re-
bello da Silva a cedência de 40 metros quadrados de terreno para
a erecção do monumento, assentando-se a primeira pedra a 14 de
junho do referido anno. A 12 de outubro de 1864 tiveram princi-
pio as obras, e a estatua da Virgem, esculpturada pelo estatuário
portuense Emygdio Carlos Amatucci, com 14 palmos de alto e
pelo preço de i:3oo$ooo réis, foi collocada ás 7 horas da tarde de
12 de agosto de 1869, e derrubada por uma faisca eléctrica a 9 de
janeiro de i883. Não tardou a ser substituida pela actual que tem
na base estes dizeres*.
FEITA A EXPENSAS
DO BEMFEITOR
JOÃO ANTVNES GVIMARAES
A' distancia de 28 metros fica a modesta capella que mede 3o>
metros de comprido por 19 de largo, sendo lançada a primeira pe-
dra no dia 3i de agosto de 1873.
Vae bastante adiantada a construcção d'uma formosa egreja que
ha de substituil-a em breve.
A encantadora imagem da Virgem da Conceição que se venera
no alto da tribuna, foi esculpturada em Roma por Eugénio Macca-
gnani, no anno de 1876 e benzida por Pio IX, como se lê na pea-
nha:
O SS. PADRE PAPA PIO IX
BENZEU ESTA IMAGEM
NO DIA 22 DE DEZEMBRO DE 1876
2ig
Egreja e convento de Montariol (Braga)
Num dos locaes mais aprazíveis dos subúrbios de Braga, o
Monte Calvelo que com o Castro Máximo, (Monte de Castro) con-
tiguo, dividiu no século ix o território de Braga e Dume (Doação
de el-rei D. AtYonso o Casto, era de 878), os religiosos da Com-
panhia de Jesus adquiriram por compra em ibôi uma grande ária
de terreno de cultura e n'elle fizeram construir uma casa aboba-
dada de pedra, para recreio seu e feriado dos estudantes do Col-
legio (hoje Seminário de S. Pedro e S. Paulo) que também lhes
pertencia.
O nome de Montariol, certamente originado de Areal, nome
do logar que lhe rica nas fraldas, é tão antigo que já assim o de-
signa uma escriptura do Livro Fidei datada da era 1 1 1 1 (anno
de 1078).
O padre Contador de Argote, que escreveu a sua Hist. EccL
de Braga no ultimo quartel do século xvn, diz a este respeito:
«... que chamão de Montariol, e se dá este nome ao tal sitio ha
mais de duzentos annos».
O Arcebispo de Braga D. Martinho Geraldes, natural da fre-
guezia de Semelhe, instituiu em 1243 o Morgado de Montariol.
Os padres da Companhia possuíram esta casa e quinta até á
— 220 —
expulsão determinada pelo Marquez de Pombal, sendo então ven-
dida pelo estado ao pae do Visconde de Montariol, passando d'este
a seu rilho o sr. Visconde de Negrellos.
No anno de 1890 veiu á praça por ordem do Banco de Credito
Predial, de Lisboa, a quem estava hypothecada. Foi n'esta epocha
precisamente que o provincial dos Franciscanos visitou a quinta e
achando-a optimamente situada para ser transformada num con-
vento da sua Ordem, aconselhado por muitas pessoas de Braga,
tractou da sua acquisição, o que se effectuou em Lisboa, fazendo
alli a escriptura no dia 8 de agosto de 1890. A primeira missa que
os religiosos franciscanos celebraram no seu novo convento teve
logar no dia 16 do mesmo mez e anno, e no dia 18 chegou a esta
casa o virtuoso velhinho fr. Joaquim da Purificação que falleceu
no dia 20 de outubro de 1899, sendo elle o primeiro Superior.
As obras da magestosa egreja começaram no dia 5 de maio
de iS()i e, ás 1 1 horas da manha de 27 de setembro do referido
anno, foi benzida a primeira pedra pelo chorado Arcebispo sr. D.
António José de Freitas Honorato, acolytado pelos cónegos Fran-
cisco José Pibeiro de Vieira e Brito (hoje Bispo de Angra) e Mo-
reira Guimarães (Arcipreste de Braga), e pelo Desembargador
João Nepomuceno Pimenta, fazendo de mestre de ceremonias o
rev. sr. João Vicente da Costa e Cunha, Abbade da Sé. A este
acto assistiu como auctoridade o conselheiro Jeronvmo Pimentel,
Governador Civil do Distncto.
A fachada está concluída, restando-lhe apenas as duas torres.
A parte nova do convento é a de dois andares que a gravura re-
presenta encostada á egreja.
~ 22 1 -
Egreja de S. Torquato (Guimarães,
(Copia da planta geral da obra em execução)
— 222 —
Nas proximidades de Guimarães, á distancia de pouco mais de
légua e quarto (6:3oo, metros de estrada de macadam, visinhal n.°
i, construída em 1872-73), venera se na egreja da sua invocação
o corpo incorrupto de S. Torquato que, segundo se crê, foi mar-
tyrisado por Muça, capitão Árabe, a 26 de fevereiro de 719, nesta
freguezia a que o santo deu o nome.
Na Mon. Lusit, lê-se que S. Torquato nasceu na Cinania (Ci-
tania) e que foi alli primeiro Bispo, sendo martyrisado a cacete e
á pedrada pelos moradores da serra de Vieira que prestavam culto
á idolatria; e que estes desde muitos séculos vinham annualmente,
por voto, cingidos por cordas e descalços, visitar a sepultura do
Santo. Jorge Cardoso, no seu Agiologio Lusitano, diz que o refe-
rido voto foi commutado pelo Arcebispo de Braga D. fr. Bartholo-
meu dos Martyres em certa quantia de cera.
No sitio onde a preciosa relíquia appareceu sob um montão de
pedras por indicação de «luzentes chammas nomeio de entrelaçados
matos», como em 1692 nos diz o padre Torquato d' Azevedo (Ant.
Guim., pag. 422), construiu-se uma capellinha tosca, e junto da
parede exterior do lado esquerdo collocou-se uma pia de pedra
onde cae a milagrosa agua nascida na primitiva sepultura do Santo.
Os frades benedictinos do convento próximo levaram, tempo de-
pois, para a sua egreja o estimável thesouro e alli o conservaram
encerrado em tumulo de pedra branca, de Ançã ou mármore.
O padre António Carvalho (Chorogr., liv. 2, cap. 8) íala-nos
da abertura do tumulo em i5i2. O precioso manuscripto de Silva
Thadim, fallecido antiquário bracarense, conta quenoanno de 1579,
o Arcebispo D. fr. Agostinho de Jesus (Castro), acompanhado de
numerosos bracarenses, partiu em direcção á egreja de S. Tor-
quato para ordenar a abertura do tumulo. O povo porém oppoz-se
dizendo que o Arcebispo tentava levar o Santo para Braga, e o
Prelado teve que retirar-se a toda a pressa para evitar tumultos
de que nem elle próprio sairia illeso.
O mesmo succedeu em 1637 ao Arcebispo D. Sebastião de
Mattos de Noronha.
Foi então que o tumulo se reforçou, a expensas dosparochianos,
com paredes novas e grossas grades de ferro, como actualmente
se encontra, gravando-se-lhe na frente, em caracteres ligados, esta
• inscripcão:
HOC TUMULO 1LLES1S CONDUNTUR
CARN1BUS OSSA TORQUATI D • 1'IGNORA CHARA
ANNO DE l637
SE GUARNECEU ESTA SEPULTURA
E ABR1U-SE E ACHOU-SE
O CORPO E CARNE INTEIRO,
VESTIDO DE PONTIFICAL, COM BÁCULO
— 22:>
O tumulo antigo
Esta obra, principiada a 14 de julho do referido anno, dias de-
pois da visita prelaticia, concluiu-se a 18 (tal era apressa!), como
consta da Memoria inserta no livro dos usos (Estatuto velho), es-
cripta pelo vigário de S. Torquato o licenciado Jeronymo Coelho,
da qual existe copia no archivo da Collegiada de Guimarães. No
dia da conclusão assistiram á abertura do tumulo, entre grandís-
simo concurso de povo, o dr. Rui Gomes Golias, mestre-eschola
da Collegiada, que arrancou o tornozello ao Santo, vários cónegos,
Diogo de Barros notário Apostólico, etc. Por todos os assistentes
foi visto incorrupto «mirrado o rosto, virado para a banda esquerda,
— 224 —
com olhos, nariz, bocca, barba e orelhas» e ao lado um pau de
três a quatro palmos de comprido. ( Vide »rav. a pag. 225).
Os falsos Chronicôes de Juliano Peres, padre Higuera e Flávio
Dextro, originaram entre os escriptores João de Barros, Gaspar
Estaco, padre Carvalho da Costa, Silva Thadim, D. Nicolau de
Santa Maria, D. Thomaz da Encarnação, padre Torquato d'Aze-
vedo, fr. Bernardo de Brito, Jorge Cardoso, D. Rodrigo da Cunha,
Vaseu, padres Bollandistas (antuerpianos) fr. Henrique Florez e
outros, desencontradissimas opiniões á cerca d'este Santo, muito
especialmente da sua authenticidade como Bispo de Acci (Guadix
em Granada), da Citania de Briteiros, ou de Braga.
O dr. João de Barros, na sua geographia, chega a suppor que
este vocábulo S. Torquato seja corrupção de S. Donato !
O Arcebispo D. fr. Agostinho de Jesus, na carta histórica Ad
limina que enviou ao Papa, diz «que se acreditava» que este S.
Torquato fosse discípulo de S. Thiago.
Esta contenda considera-se porém terminada, mormente desde
que o Arcebispo D. Rodrigo de Moura Telles deu publicidade a
um folheto de Santos, incluindo nelle este Félix Torquato a que
prescreveu rito e lições em 29 de janeiro de 17 18.
Está hoje averiguado que S. Torquato Bispo de Guadix existe
no convento de Cella-Nova e que o Citaniense não tem a seu fa-
vor provas suficientemente seguras, crendo-se portanto que este,
de que me occupo, seja o Bispo bracarense Félix Torquato ou
Torquato Félix, como dum e d'outro modo se lê no Breviário, o
qual na serie tem o numero i5, principiando o seu governo no
anno de 6q3, depois de haver sido nomeado Arcipreste de To-
ledo, Bispo de Iria e por ultimo do Porto.
Por ordem do Arcebispo D. fr. Caetano Brandão abriu-se pela
ultima vez o tumulo, que ainda hoje se conserva dentro da capella
de Santa Catharina, lado do Evangelho, examinando minuciosa-
mente o cadáver o medico vimaranense Miguel Rebello de Bastos
que o julgou perfeito. No dia 3o de junho de i8o5, compareceu
na freguezia o Arcebispo e dirigindo-se á alludida capellinha re-
vestiu de pontifical o Santo que acto continuo foi exposto á vene-
ração dos fieis, durante i5 dias, na egeja parochial.
Os povos cTaquellas immediações, desconfiando sempre do Ca-
bido de Guimarães, esperavam com anciedade que terminasse o
praso concedido para immediatamente penetrarem de noite na
egreja e reconduzirem o Santo para a capella contigua, fechando-a
com a grade de ferro que ainda agora conserva.
Pensou-se desde logo na edificação de uma egreja, para a qual
apresentou a planta o architecto vimaranense Luiz Ignacio de Bar-
ros Lima, e a 7 de março de 1825 tiveram principio estas obras
no local denominado — Penedos de Maria do Monte Maio, em
225
EK| '...
(tf
cr
s_
o
H
có
(D
T3
O
-t->
Q.
3
1.
s.
O
O
c
o
a
O
o
J
— 220 —
terreno cedido por vários \ roprietarios e por el-rei D. João VI
que também auctorisou a demarcação effectuada em 9 de abril
do referido anno pelo Corregedor de Guimarães José Antó-
nio de Almeida, com o comprimento de 194 varas e a largura
de 88, conforme o que se lê na inscripção lapidar da capella-
mór, lado da Epistola :
TEVE PRINCIPIO ESTE TEM
PLO NO DIA-7-DÉ MARÇO (de l8'25) •
EM-Q-d'aBR1L DE- 182 5-0 CORREGEDOR DE
GVIMARAES EMPOSSOV A MEZA DO TE
RRENO PERTENCENTE AO SANTO E('m Virtude)
da regia provisão de (2g) de (novembro de 1824 • Mede)
DE NORTE A SVL-I94-VARAS E DE
NASCENTE A POENTE-(?fW PãVãS) •
A inscripção vae completada em itálico na parte que o salitre
destruiu. Do lado opposto ha outra referente á irmandade do Santo.
Diz assim :
EESTA IRMANDADE DE S • TORQVA
TO ESTÁ ERECTA E CONFIRMADOS
OS SEVS ESTATVTOS POR ELREI O SENHOR
DOM J0Á0-6.°-QVAND0 REGENTE, EM RfcSO
LVÇÁO DE-2I-D,OVTVBRO DE 1 806 • NA MES
MA PROVISÃO SE VE : QVE EM-1Ò93-.1A
HAVIA ESTATVTO E CONFRA
RIA DE S • TORQVATO
Aos lados do altar existem outras duas lapides onde, por assim
dizer, está compendiada a historia do notável sanctuario.
A primeira, lado do Evangelho, diz :
4-
i
FOI MARTYRIZADO O GI.ORI CAETANO BRANDÃO ARCEBIS
OSO S • TORQVATO A-26-DE PO PRIMAZ NO DIA-4-DE JV
FEVEREIRO DE-719-LOGO DE LHO DE-l852-FOI TRASLADA
POIS FOI TRASIADADO PARA DO PARA ESTE TEMPLO PELO
O MOSTEIRO VELHO • NO DIA EMINENTÍSSIMO SENHOR
-30-DE JVNHO DE-l8o5-FOI EX CARDEAL DOM PEDRO PAVLO DE
POSTO A' PUBLICA VENERAÇÃO FIGVEIREDO DA CVNHA E MEL
PELO EX.mo SENHOR DOM FR ■ LO ARCEBISPO DE BRAGA •
— 227 —
A segunda, lado da espistola :
ESTE TEMPLO ESTA.' ISENTO DIA-8-d' AGOSTO DE-l8l2 •
DA JVRISD1ÇAO PAROCHEAL POR ESTE DOCVMENTO ESTA'
SENTENÇA PASSADA EM JVL ARCHIVADO NESTE TEM-
GADO, DADA PELO CORREGE PLO E REGISTADO NA NO-
DOR DE GVIMARAES EM-I I-d' TA N.° -3 I I -FOLHAS- 1 I 2-DO
ABRIL DE-l8lI-E CONFIRMADA TA BAI LIÃO -JOÃO TEIXEIRA
NA RELAÇÃO DO PORTO NO D'ARAVJO, EM GVIMARAES •
Principiaram pois em 7 de março de 1825 os trabalhos da con-
strucção do primeiro templo, de que apenas se concluiu a capella-
mór onde desde 4 de julho de i852 se acha exposta á veneração
publica, sob elegante baldaquino de castanho, a preciosa relíquia
do corpo inteiro de S. Torquato. A primeira pedra foi lançada
sobre os alicerces no dia 20 de junho do referido anno, terminando
em 1846 a obra de pedreiro que importou em 8: 17 1 íí)55o réis.
Oito annos depois, em 1854, fez -se o referido baldaquino, ainda
hoje em osso, com o qual se dispendeu a quantia de 2:35o$665 réis.
Esta capella-mor, que em i855 ficou de todo acabada e da
qual, além do baldaquino, apenas aproveitam os alicerces para a do
novo templo em construcção, custou 1 3:223.^047 réis. Nesta verba
não se incluem os 140,^000 réis do para-raios collocado em 1887.
A casa da irmandade, para residência do capellão e guarda
de alfaias, concluiu-se em 1870 por 4:59235560 réis. A torre pro-
visória construída em i852 pela quantia de 1 82^600 réis, recebeu
em 1877 quatorze sinos afinados (faltam 4 para o carrilhão), im-
portando todos em 5:i36$ooo réis. Cada um tem em volta estes
dizeres:
IRMANDADE DE S- TORQVATO SVBVRBIOS DE GVIMARAES
MANOEL ANTÓNIO DA SILVA FILHOS •
LISBOA ANNO DE 1 877 ■
O relógio foi collocado em 1880 e custou 3 18:475 réio.
Depois de concluída a capella-mór existente, pensou a meza
da irmandade na substituição do projecto ou planta geral da egreja
por outra que a excedesse muito em elegância e riqueza archite-
ctonica. Foi a lembrança bem acceita e a approvação recaiu n'esta
de que aqui dou gravura, a qual foi desenhada em Gotha pelo
architecto allemão L. Bohrtfledt, no dia 2 de abril de 1868.
-228-
Em 1857 principiaram a assentar os alicerces no mesmo tra-
çado que existia para a continuação da primeira egreja a que
pertencia a actual capella-mór, ficando concluídos em 1871 com o
importante dispêndio de 17:861:875 réis!
Gastou-se á farta o dinheiro e não se pensou então na sum-
ptuosidade da obra que já hoje, pela riqueza de ornamentação
delicada e profusa, e pela elegância do estylo architectonico roma-
nico-bysantino, com excepção das torres em que predomina a re-
nascença, é objecto da admiração dos peritos. Este monumento
de arte ficava mais magestoso se lhe ampliassem o espaço interior
que no corpo mede 36'", 20 por iom,6o e no transepto 34m,c)0.
A capella-mór deve ficar com as dimensões da actual que in-
teriormente mede i7m,6o por 7ra,8o.
Agora que alguns arcos da nave se approximam do fecho, co-
meça a ser notada a pouca largura interior.
Parte interior da nave em construccão
Apezar do grande numero de operários que diariamente se
empregam nesta obra, é de presumir que os indivíduos que ora
nascem não assistam á sua conclusão, salvo se o rendimento an-
— 229 —
nual das esmolas, que já ascende a mais de sete contos de réis,
encontrar auxilio decidido nos favorecidos da sorte.
A presente gravura mostra o adeantamento da obra da fachada:
Egreja de S. Torquato (parte construída)
Com os dois grandes anjos de pedra que em 1892 foram collo-
cados sobre o pórtico dispendeu-se 1:499:000 réis. Sustentam nas
mãos uma fita larga com esta interrogação gravada em caracteres
gothicos
GLORIANTES AD QVIT VALEB1MVS?
As estatuas de S. Damazo e S. Geraldo foram collocadas em
[899. Designou as, a pedido da meza de 1895-1896, o digníssimo
D. Prior de Guimarães sr. conselheiro dr. Manuerd'Albuquerque,
com approvação dos drs. Manuel Moreira Júnior, Arcipreste, e
Manuel de Jesus Pimenta, vice-reitor do Seminario-Lyceu.
A primeira empreitada d'este novo templo (lado esquerdo do
transepto até a altura das portas) foi adjudicada no mesmo anno
da conclusão dos alicerces (1871) a Francisco Thomaz Martins da
Motta e António José Pereira, da cidade de Braga, por 7:800 réis
cada metro cubico de cantaria.
— 23o —
A segunda (paredes lateraes e torres até próximo do primeiro
patamar da escada) foi adjudicada aos mesmos por diversos pre-
ços no dia 12 de março do anno immediato. A terceira (lado di-
reito do transepto até á altura das portas),' foi entregue ao mesmo
António José Pereira no dia 2 de novembro de 1878 por 12:000
réis cada metro cubico. A quarta (continuação da segunda) foi
egualmente entregue ao Pereira por i5:ooo reis o metro cubico.
A quinta e ultima (cornija do pedestal em toda a extensão da obra)
foi adjudicada a António Salgado, de Guimarães, em 29 de outu-
bro de 1876, por i3:5oo réis cada metro cubico.
Desde então continuaram as obras por administração da ir-
mandade e sob a direcção do fallecido conductor de i.a classe
de Obras Publicas, sr. Cesário Augusto Pinto até ao anno de 1895,
em que foi substituído pelo notável architecto portuense sr. José
Marques da Silva, a quem a primitiva planta deve alterações de
importância capital para as bellezas que se admiram na execução
do trabalho de esculptura. Em 20 de abril de 1897, a meza resol-
veu convidar o mesmo illustre architecto a visitar mensalmente
as obras; e em assembleia geral de 29 de junho de 1899 entre-
gou-lhe definitivamente a direcção.
— São duas as romarias que annualmente se realisam em honra
de S. Torquato: a primeira, denominada pequena, tem logar no
segundo domingo de maio; e a segunda no primeiro domingo de
julho. Esta considera se a maior do Minho pela extraordinária
concorrência de romeiros nos três dias.
— 23l —
EGREJA E CONVENTO DE TIBÃES
A Chorographia do padre Carvalho diz-nos que o rei suevo
Theodomiro, a instancias do seu capellão-mór S. Martinho, Bispo
de Dume, fundara em 562 este notável convento Benedictino, cujo
Abbade era o Geral de toda a Ordem em Portugal, dedicando-o
•a S. Martinho Turonense ; que o successor Miro ordenou a plan-
tação duma grande mata junto do convento, com arvores do Alem-
tejo que, por não serem de folha caduca, se presume fossem so-
breiros-, que D. Urraca, filha de D. Affonso VI, doara metade
do Mosteiro á Sé de Tuy, reedificando-o em 1080; que D. Payo
Guterres da Silva o ampliara, etc. Da pedra que se crê ter ap-
parecido com inscripção referente á fundação, não temos um
testemunho seguro, nem mesmo consta que exista a sua copia ;
porém existe desde ha pouco, para prova da reedificação no se-
sulo xr, um capitel d'essa epocha, descoberto pelo actual possui-
dor do convento, o meu illustre consócio da Associação dos
Archeologos, sr. commendador José António Vieira Marques, que
se dignou oíferecer-m'o, bem como outro compósito e outro ainda
pertencente ao século xiv, todos encontrados na alvenaria do an-
tigo claustro do Tronco, destruído pelo incêndio do dia 1 1 de ju-
lho de 1894.
E' da mesma procede icia uma fonte de preciosa esculptura,
estylo renascença italiana, em que se lê a data de 1657. O sr.
Vieira Marques aproveitou-a embebendo-a na parede interior do
edifício.
O capitel do século xi, encontrado na alvenaria do século xvn,
não nos deixa a menor duvida sobre a existência do convento ha
900 annos, plus minus.
Alem d'este testemunho temos na residência parochial um qua-
dro que se refere do seguinte modo ao Couto feito ao Mosteiro
pelo conde D. Henrique e a rainha D. Theresa, em 24 de mar-
co de 1 1 10:
«In nomine Patris & Filii & Spiritus Sancti: Ego Comes D. Henricus, &
uxor mea Infanta D Tarasia, Adfonsi Regis filia, placuit nobis, ut faceremus,
sicut & facimus Cautum, & lerminum ad Monasterium S. Martini de Tibia-
nes, &. facimus illum Cautum, et Terminum pro amore Domini nostri Jesu Christi
& ut mercedem inde habeamus ante Deum umnipotentem in diem Judicii, &
ut Servi Domini qui ibi habitant, vel habitaverint, in Missis, & in Psalmis, etiam
in totó opere, quod ad Djum pertinet, nostram semper memoriam habeant, <Sc
provobis Petro Plaiz, & Menendo Plaiz & Pelagio Plaiz, qui nobis semper cum
fide, & veritate servitium fecestis, et facitis. Et facimus per terminum, qui no-
bis placet, & rectus est, per terminum quomodo dividit Palatim cum Vilarinho,
& per montem Maiorem, quod est super Ulgóso; & inde vadit per montem de
— 232 —
Abeleiró, qui est super Ulgóso; & inde, per petram Taramelada, quae est pro-
pe de fonte de genti; & inde per terminum de Semelli; & inde quomodo divi-
dit Parada cum Semelli; & inde quomodo dividit Parada cum Forósos; & inde
per Gernádo; & inde per Gandarella; et inde, ad illum fontem de Sancto Petro
de Merelim; & inde ad Castrum Malum; & inde, per illam carreriam antiquam;
& exit in Mocoronni; & inde per médium flumen de Cadavo; & concludit in illa
foze de Gesmondi.
Et omnia Regalia nostra, quae continentur infra términos prenotatos, idcst
Palatim; & illam varzenam de Gerradello, quae jacet sub villa Merlim in littore
Catavi, damus, atque concedimus Sancto Martino de Tibianes, & Fratribus ibi
commorantibus, pro remédio animarum nostrarum. Et istam terminationem
Monasterii Sancto Martini de Tibianes, quam facimus, nos ita super nominati
ita facimus. Et ita Regalia super nominata damus, & concedimus, ut de hodie
die, vel tempore sedeat ipse terminus, sive Cautus de jure nostro abrafus, in
vestro jure, atque domínio, ad illud Monasterium traditus. Et si quis homo, tam
potens, quam impotens, vel Rex etiam, qui hujus terrae imperium obtinuerit,
ab hac die in antea, hoc factum nostrum infringere voluerit; in primis sit ex
comunicatus, & anathematisatus, & cum .luda Domini traditore habeat parteci-
pio & Pareat post partem prefacti Genobii, aut cui ejus vocem tenuerit, XII.
mille libras auri; & hoc factum nostrum ratum semper, & firmum permaneat.
Factum Cautum simul, & terminum. vu. Kalendas Aprilis. Era m c.xvm. Ego
Comes Henricus, una cum uxore mea Infanta Domna Tarasia, nostris manibus
confirmamus, & robor j- f amus. Nunus Tibianensis Cenobii Dei gratia Abbas,
quod vidi ofr. Petrus Vimaranensis Clerici Comitis HT.
Pro testes. — Petrus, Plagius,',Gondisalvus, Godinus. Bernardus Toletanae
sedis Archiepiscopus, & S. R. Eccl. Legatus, qui hujus operis adjuctor bónus
& actor extiti sub Dei gratia, & legatione comissa, hoc múnus ratum semper,
firmum manere praecipio, praecipiendo confirmo. Menendo Venegas continens
Castelu S. Grucis ofr. Gomice Nunis contin. S. Christophori ofr Egas Monis.
contin. S. Martini ofr. Eg&s Gondisindis contin. Bayam ofr. Plagius Soaris con-
tin. Amayam ofr. Fafila Lusi contin. Lnginoso. Egas Palais contin. Burio. Go-
mes Venegas contin. Penelam ofr».
E' toda abobadada de pedra a magnifica egreja com as suas.
capellas collateraes e rica talha dourada.
O órgão tem estes dizeres na frente :
«Sendo D. Abb f Gal da Congregam
O R1?0 P. M. D°r Fr. José Joaquim
de Sta Thereza.
Fez este órgão no anno de 1785
D. Francisco António Solha vice
Cônsul de Hespanha por
S. Mag. Cath.»
A dividir as cadeiras do coro que se fez em 1667, sendo Gerai
Fr. Bento da Gloria, ha bustos de santos a que se refere, por or-
— 233 —
dem numérica, o Index seguinte em dois quadros que por curio-
sidade copio :
n. p. s. bento foi o primeiro inventor do Rosário da Virgem.
Accrescèntou no officio Divino o Deus in adjutorium ; ordenou que
no principio das horas se diga a Gloria Patri e nas matinas o
hymno Te-Deum laudamus.
n. p. s. gregorio magno inventou o cantochão Gregoriano ; ac-
crescèntou Ora pro nobis Deum na antífona Regina Caeli ; com-
pôs a maior parte das ceremonias da missa ; instituiu a adoração
da cruz na sexta-feira da paixão; o lava pedes na quinta feira \ a
ceremonia da cinza na primeira quarta-feira da Quaresma, etc.
Vrbano ií. inventou o Officio menor de Nossa Senhora.
Vrbano iii. Instituiu a festa do Corpus Christi.
S.TA Ivliana a quem primeiro foi revelada a dita festa.
O cardeal cvido ordenou que quando se levantasse a hóstia na
missa se tocasse uma campainha e que também a fossem tangendo
deante do Senhor quando o levão aos enfermos.
S. oddo abb. Ordenou o Officio de S. Martinho.
S. leão ív. inventou a Octava da festa da Assumpção da
Virgem.
S. anselmo Arcebispo Cantuariense foi o inventor da festa da
Puríssima Conceição.
Innocencío iv Ordenou a festa da Natividade.
Pavlo diácono compôs o hymno do Baptista. O nosso Guido
Aretino achou as 6 sylabas ; ut Ré, Mi, Fa, Sol, La, sobre as
*quaes se compoz o dito hymno.
S. Ildefonso foi o inventor da festa da Expectação.
Evgenio iii. inventou a festa da Annunciação.
Gregório ix ordenou o costume de tocarem o sino ás Ave-Ma-
rias nas egrejas, depois do pôr do sol.
Gregório iv compôs o Officio e ordenou a festa de todos os
Santos, ordenando que se solemnisasse em o i.° de novembro.
S. odilio abbade inventou a devoção das almas dos fieis defun-
ctos que se costuma fazer em o primeiro dia depois da festa de
todos os Santos.
S. ovido abbad foi .ruem inventou a mão do canto das seis sy-
labas com que se aprende e compõe a musica.
No Arctfivo da Mitra guarda-se um Rescripto do Concilio de
Constança (anno de 141 7) o qual ordena ao Abbade de Tibães que
faça restituir os bens que andavam alheados da Mesa Archiepis-
copal.
-234-
No livro 7.", íi. 39 v. e 40, do município bracarense existe uma
concordata celebrada entre a camará e o convento de Tibães para
a reparação da ponte de Prado, sobre o Cavado. Provavelmente
resultou d'essa concordata a construcção da ponte actual, ?obre
as guardas da qual existem as armas do referido convento com
esta exquisita mas conceituosa inscripçao de leitura difficil :
ESTA OBRA FEZ ANTÓNIO DE
GRASTO DA VILA DE VI\NA
167o
EiVICO
TO
V
ES
SM
POR
EPR
NT
AN
TI
ER
DEIA
IRA
TIS
VDE
EAS
ICO
PA
LA
NTE
SEPA
MO
GA
PO
G4MVIDÃBREVENV£
NT E
Leitura: — Esta obra fez António de Crasto, da villa de Vianna,
no anuo de 1676.
Emquanto tiveres, deias (dá). Mira (olha) por ti, sê prudente.
Asi (assim) como se paga la ponte se paga la vida brevemente.
Pende da parede do pateo d'este convento um grande quadro
a óleo, de alto merecimento, representando as individual dades
mais notáveis em santidade e talentos, pertencentes á Ordem be-
nedictina. Tem á margem, em toda a volta, os pavilhões dos pai-
zes onde a mesma Ordem possuiu conventos.
—235
CRUZ DE S. GONÇALO
>
Tem esta denominação porque se diz ter assistido ao baptismo
de S. Gonçalo, nascido em Tagilde, concelho de Guimarães.
A'cerca d'esta cruz lê-se
na Revista de Guimarães,
vol. XI pag. 29: «Remonta
evidentemente aos séculos
xin ou xiv. E' de prata so-
breposta em madeira, os-
tentando em alto relevo
ornamentações de folhas
de vide e terminando as
hastes em forma de flor de
liz; na frente, no transepto
tem as lettras ihs, e quasi
nas extremidades meda-
lhões sobrepostos com
gravuras em alto relevo
que representam : no alto
da cruz uma figura mas-
culina nimbada sustentan
do um livro (?) nas mãos;
no do braço direito um
pelicano \ no do esquerdo
a imagem da Virgem (?) ;
no do fundo um anjo com
um papel de musica nas
mãos ; na parte posterior
tem outros quatro meda-
lhões, não sobrepostos com
os symbolos dos evan-
gelistas ; no do alto da cruz a águia ; no do braço direito o anjo ;
no do esquerdo o leão; no fundo o boi d'azas.
Na exposição d'ourivesaria feita em i883 no Palácio de Crys-
tal, do Porto, esteve exposta esta cruz, sendo apreciada como jus-
tamente merecia».
Esteve também na exposição de arte sacra-ornamental de Lis-
boa em i8q3 por occasião do centenário Antonino. O sr. Joaquim
de Vasconcellos escreveu no Commercio do Porto n.° 181 de 1 de
agosto de 1896: «Na mesma sala 4.a... está perdida, quasi oc-
culta, uma jóia de elevado preço — a cruz de prata attribuida
a S. Gonçalo d' Amarante. A depositaria d'esta jóia é a egreja
de Tagilde, perto de Vizella. . . Pertence ao estylo românico de
transição : os argumentos em que se funda a attribuição, em-
— 236
bora não sejam absolutamente seguros, merecem sério e detick>
exame » .
Em correspondência de Vizella para o mesmo jornal n.° 173
de 7 de julho de 1880, diz o
fallecido Manuel Maria Ro-
drigues : «a cruz de Tagilde
ambicionada pelos frades
d^marante que offereceram
outra de prata e 400:000
réis».
CÁLICE
DE S. SALVADOR
DE BRITEIROS
E' de cobre, excepto a
copa que não pôde deixar
de ser de prata dourada.
Este curioso cálice mede
de altura oin,3o e tem na
copa 0,08 de diâmetro. O
nó, bastante desenvolvido, é
bem lavrado como a base
que se divide em seis gomos
com emblemas, e em dois
d'elles as palavras : britei-
ros e bravo, designando a
primeira a freguezia a que
pertence e a segunda pro-
vavelmente o sobrenome da
offe rente.
— 237 ~
CAPELLAS '
GAPELLA DE S. LOURENÇO DA ORDEM
Nos subúrbios de Braga, a pequena distancia da egreja de S. Fru-
ctuoso, existe a capella de S. Lourenço da Ordem, notável pela
tradição de ter sido sagrada, de pertencer aos Templários, no
tempo em que tinha contigua uma Gafaria, de servir para os có-
negos alli resarem em coro quando grassavam na cidade epide-
mias, pelos preciosos azulejos que interiormente conserva, e pela
porta principal gothica a denunciar, a sua muita antiguidade. No
lado direito da sua fachada vê-se embebida uma grande pedra com
esculptura representativa da anterior frontaria da Sé com as suas
duas torres acastelladas e entre ellas a imagem da Virgem que
iem estes d.zeres na peanha :
A MA DASSCE DE BK A
GAPELLA DE SANTA MARTHA DAS CORTIÇAS
(BRAGA)
No alto do monte d'este nome, onde se conservam abundan-
tes vestígios de habitação luso-romana, construiu o Arcebispo
D. Diogo de Sousa uma capella da invocação de Santa Martha, da
qual ainda existe o arco interior com o brazao prelaticio.
Os frades do extincto convento da Falperra não levavam a
bem que o parocho de Esporões recolhesse as numerosos esmo
las que os fieis deixavam na referida capella, e construíram na
vertente do monte, junto do caminho dos romeiros, outra da mes-
ma invocação de Santa Martha que o povo denomina do leão, por
ter ao lado um leão de pedra a jorrar agua pela bocca. Esta ro-
maria é grandemente concorrida e os pedidores das duas capei
las divertem n'aquelle dia o povo com interminável aranzel para
1 Os nomes de capella e capellão provém do costume dos reis de França
levarem nas suas expedições a capa de S. Martinho juntamente com outras re-
líquias, alguns Bispos e ecclesiasticos que celebravam missa ao ar livre como se
fora na egreja. O uso das capellas domesticas é attribuido a Constantino que fez
construir uma no seu palácio.
A lei de 1860 extinguiu as capellas vinculares.
-238-
que se acredite que uma das imagens é mais milagreira que a
outra.
A pequena distancia d'esta ultima capella, e ao seu lado es-
querdo, ha um grande penedo, bastante gasto na parte inferior^
com estes dizeres em caracteres elegantes: grandia mala meia.
E' provável que os frades venerassem alli alguma imagem de
Santa Maria Magdalena a chorar os seus grandes males.
CAPELLA DE SANTA MARIA MAGDALENA
No referido monte da Falperra, logar antigamente denominado
da Portella de Espinho, pouco distante da capellinha de Santa
Mártha do Leão, construiu-se no século xv uma ermida em que
principiou a ser muito venerada a imagem de Santa Maria Ma-
gdalena, fundando-se-lhe em 1 635 uma confraria que pouco de-
pois dava principio á construcção da actual capella elegantemente
esculpturada.
No dia 22 de julho de 1738 foi para alli trasladada a imagem
que então se esculpturou em granito e que por occasião de gran-
des calamidades era devotamente conduzida para a cidade. Pa-
rece que a maior penitencia consistia na incommoda conducção.
Esse antigo costume persiste ainda, mas a imagem é outra e de
madeira. ,
Nas Antiguidades d'Entre Douro e Minho refere-se que os
parochianos da próxima freguezia de Santa Christina de Longos
eram obrigados a dar annualmente ao seu abbade, no dia da festa
da peccadora de Magdala, três figos lampãos e uma cabaça d' agua.
A designação de lampãos, como o indicam os prophetas Jeremias
e Micheas, aquelle elogiando os figos que viu num cesto á porta
do templo, e este dizendo : Precoces ficus desideravit anima mea,
indicam os temporaos.
CAPELLA E CONVENTO DO VARATOJO
Esta capella fica entre as de Santa Maria Magdalena e Santa
Martha do Leão. O convento, que era modestíssimo, e que foi
construído a expensas dos bemfeitores, distinguindo-se n'este nu-
mero Domingos Fernandes Lata, está sendo substituído por um
edifício elegante e vasto, graças á dedicação do Juiz da irmandade,
o sr. Manuel Simões Braga.
A primeira pedra do extincto convento que abrigou i3 frades
— 239 —
professos e que teve quatro portas exteriores sobre duas das quaes
havia os dizeres: — solidão, silencio e paz — casa de devs, porta
do cso, foi lançada no dia 24 de agosto de 1828 pelo Vigário Ge-
ral Manuel José Leite Pereira, Abbade de Maximinos, fallecido a
7 de março de i83o. Na egreja conserva-se, para memoria, uma
cadeira em que se assentou o sr. D. Miguel de Bragança quando
alli foi de visita.
CAPELLA DE SANTO ADRIÃO DA GORRICA
(BRAGA)
Na margem direita da antiga estrada de Guimarães, aguas ver-
tentes do monte do Picoto, construiu-se em 1676 esta capella que
tem porta de arco e alpendre, como todas as da epocha.
Sobre a porta lê-se :
ANT S OBF (SÍc)
INHO A M
ANDOV F
i576
Leitura :— António Sobrinho (?) a mandou fazer no anno de 1 576.
CAPELLA DE S. LAZARO (GUIMARÃES)
E' de construcção singelíssima esta capella. Está situada no
logar dos Pombaes, entrada da rua de D. João I.
Data do anno de 1600, como nos diz o seguinte lettreiro gra-
vado sobre a porta :
ESTA IGREIA SE FEZ NO ANO DE iÔOO.
Teve contigua a Gafaria dos Lázaros administrada pela Camará
Municipal e, desde 1681, pela meza administradora da Miseri-
córdia.
Fica-lhe quasi em frente o padrão coberto de abobada de gra-
nito, commemorativo da romana que D. João I fez a Nossa Se-
nhora da Oliveira em acção de graças pela tomada de Ceuta.
Desde 20 de março de i863 e 29 de agosto do anno immediato,
effectuou-se a sua mudança do centro da rua, á distancia de 2m,3o,
onde marcava o sitio em que o monarcha se descalçou para de-
votamente se dirigir á Collegiada.
— 240 —
O cruzeiro, que é todo de mármore branco, muito elegante,
compõe-se de uma columna alta e o Christo, bem esculpturado,
em cruz florida.
CAPELLA DE SANTA LUZIA (GUIMARÃES)
Está situada na rua do mesmo nome e foi construída no anno
do 1600. A porta principal é de arco e tem na frente um alpen-
dre sobre columnas toscas de granito, cobrindo um púlpito sin-
gello, egualmente de granito, que se encosta ao lado direito.
E' administrada pelo Cabido que no dia da romaria annual
manda alli celebrar missa cantada com sermão em troca das mui-
tas esmolas que então recolhe. Venera-se nesta capella a pequena
imagem de S. Bento que esteve numa das portas da cidade.
CAPELLA DE NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO
(GUIMARÃES)
Um pouco distante da ponte de Santa Luzia, antiga estrada de
Braga, alveja por entre frondoso arvoredo, em logar vistoso, esta
formosa capella com seu alpendre, construída em meado do sé-
culo xvii. E' possível que antes d'esta houvesse no mesmo local
outra muito antiga, pelo menos do tempo do cruzeiro que se er-
gue no largo fronteiro e que tem a data de i58o.
A capella é interiormente azulejada e o tecto apainellado re-
presentando a vida de Nossa Senhora.
A' novena que annualmente se faz nesta capella assistem, desde
tempos immemoriaes, os estudantes da cidade promotores dos
festejos escholasticos em honra de S. Nicolau, os quaes partem
para alli ás 4 horas da manhã rufando em tambores e regressam
á cidade com o mesmo enthusiasmo da partida.
CAPELLA DA MADRE DE DEUS (GUIMARÃES)
Na margem direita da estrada que conduz a S. Torquato existe
esta capella fundada em princípios do século xvi pelo cónego Gon-
çalo Annes. A actual construcção data do século passado. Tem
uma irmandade que annualmente realisa a festividade e romaria
no dominso do Bom Pastor.
— 241 —
CAPELLA DE NOSSA SENHORA DA LUZ
(GUIMARÃES)
Esta capella com seu alpendre sobre a porta, e púlpito de pe-
dra, está situada num pequeno monte, a pouca distancia do cemi-
tério publico. A sua construcção data do primeiro quartel do sé-
culo xvii. Effectua-se alli a 2 de fevereiro uma romaria numerosa-
mente concorrida de povo da cidade.
CAPELLA DE S. JOÃO DA PONTE (BRAGA)
E' assim denominada por estar próximo das pontes velha e
nova de Guimarães, entre as quaes annualmente se representa com
o máximo brilhantismo o baptismo de Jesus pelo propheta judaico,
que na vida pastoril gastou a mocidade abrigando-se numa Antra,
como nos diz Gavanto (Thes. Sacr.J:
«Antra deserti teneris sub annis,
Civium, turmas fugiens, petisti,
Ne levi posses maculare vitam
Crimine linguae.»
E' acanhada e de architectura singella, tendo á entrada um
al-pendre sustentado por seis columnas toscanas. Na verga da
porta lê-se: anno de 1616, o que indica uma reconstrucção da an-
terior fundada no mesmo local a expensas do Arcebispo D. Diogo
de Sousa (i5oõ-32), e na qual se instituiu uma irmandade para oc-
correr ás despezas dos festejos baptistinos, cuja fama data de tem-
pos afastadissimos, sem duvida muito anteriores ao reinado de
D. João I em que, por determinação real, todos os Municípios fo-
ram obrigados a realisar com pompa estes festejos. De longes ter-
ras accodem a Braga centenares de romeiros, embora nas suas vi-
sinhanças deixem as festas que se realisam em honra do mesmo
Santo que é o mais popular da longa lista do Flos-Sanctorum.
Em toda a parte estas folganças mantêem um caracter sacro-
profano que não pôde deixar de provir das velhas festas pagans.
As cantigas bregeiras do nosso povo em honra do Baptista, as
cavalhadas e montarias que em tempos afastadissimos os braca-
renses annualmente faziam nos arredores da cidade, na véspera
da festa do Precursor, tudo robustece a minha supposição.
Um documento inédito do século xvn, citado por Camillo
16
24'2 —
Casteho tíranco na Gaveta Litteraria do Porto, n.° 7, diz-nos que
ainda naquelle tempo os cavalleiros bracarences lançavam porcos
na contada dos Arcebispos, sendo um d'elles de cor preta, creado
durante todo o anno á custa d'um dos dois mordomos para esse
fim nomeados. Rompia a madrugada do S. João e os nobres diri-
giam-se ao alto do Picoto onde recebiam as orvalhadas e solta-
vam o porco preto para o perseguirem até á margem esquerda
do rio fste1, aonde o martyr pachiderme encontrava sobre a
ponte velha um grupo de moleiros que forcejavam por lhe impe-
dir a passagem.
Se o porco, entre os dois fogos, se decidia pela travessia do
no, vencia a moleirada que tomava conta d'elle, para o dividir ir-
mãmente ; e em caso contrario, isto é, conseguindo atravessar a
ponte, era comido pelos perseguidores victoriosos.
Depois d'isto dirigiam-se os cavalleiros á alameda das Carva-
lheiras e alli recebiam d'outro mordomo de S. João os vistosos
cestinhos de fructa, que tomavam toda a meza de pedra em que
ainda hoje se lê o seguinte dividido pelos quatro lados : bracara
avgvsta fidelis et antiqva, e lá os levavam alegremente ás pes-
soas da sua estima 2. A' corrida do porco preto e ás cavalhadas,
seguiu-se provavelmente a festa semi-pagan do candeleiro, pro-
movida pela Confraria de S. João na madrugada de 24 de junho
e extincta pelo Arcebispo D. Aífonso Furtado de Mendonça
(1618-1626,) em nome da moralidade publica.
No livro 6.° dos Accordãos da Confraria, anno de 1D43, pro-
põe-se a reducção das despezas do candeleiro para que apenas se
gastassem seis mil réis e vinte e duas libras de cera; e que no be-
berete ou consoada na madrugada de S. João não se gastasse mais
de três mil réis.
Succedeu a tudo isto a procissão do Rei David que ainda hoje
se observa muito modificada, sem andores, a contento dos povos
das freguezias ruraes que se acotovelam para assistirem á dança
do barbado Rei David com a sua comitiva, pastores, cantoria do
anjo da nuvem com o S. Joãosinho num nicho de verdura a dar
beijamão e a comer doces !
Desde o anno de 1893 que as commissões promotoras dos fes-
tejos baptistinos alteram o secular sistema de concentrar em volta
da capellinha as festas da véspera e do dia, promovendo desde
então vistosas illuminações, certamens musicaes, orpheons, rifas,
quadros dissolventes, fontes luminosas, etc, no jardim do campo
1 No dia 3o de junho de 1779 morreram 32 pessoas afogadas pela enchente
d'este pequeno rio.
2 Estes dizeres estiveram gravados no plano da meza até que a Camará de
1625 os fez mudar para os lados.
— 243 —
«de Santa Anna, onde concorrem milhares de pessoas que com o
producto das entradas cobrem as despezas todas.
O baptismo adoptado po.r S. João destinava- se unicamente a
purificar os que o recebiam. As maiores auetoridades da egreja
dizem que não remittia peccados porque lhe faltava a graça san-
tificante. Por isso os Efezios, que já eram baptisados, receberam
muito depois o verdadeiro baptismo que Jesus Christo instituirá
dizendo aos seus onze Apóstolos : Emites ergo docete omites gen-
tes, baptisantes eos in nómine Patris, et Filii, et Spiritus Sancti.
Pôde supprir a falta do baptismo pela agua, o baptismo pelo
fogo e pelo desejo.
A desproporcionada imagem de S. Christovão que se venera
na capella da Ponte e que figura na scena do baptismo, collocan-
do-a ao centro do rio em attitude de fazer a travessia, é muito
procurada por quem tem fastio; e em tempos que já vão longe o
Município concedia certos privilégios aos lavradores da visinha
freguezia de Ferreiros que a conduziam em andor na procissão do
Corpus Christi.
Parte do local de S. João da Ponte a estrada de macadam
que liga as duas cidades — Braga e Guimarães.
A' distancia de menos de 2 kilometros existiram dois pinheiros
mansos, muito copados, de proporções gigantescas, sendo ha bas-
tantes annos derrubado o da margem esquerda e conservando-se
o da direita até que em novembro de 1895 a proprietária snr.a
D. Maria Couto, da rua do Carvalhal, sem o minimo respeito por
essa vida tão longa, o vendeu por 3i.^5oo réis.
Os seus braços frondosissimos produziram 19 carros de lenha
que se venderam in situ pela quantia de i8$ooo réis. A serragem
custou 37.^000 réis e grande parte da sua madeira foi vendida ao
sr. António Fernandes Lopes que a empregou na casa que então
mandou construir na rua dos Capellistas, actualmente arrendada
á Associação Catholica.
O desapparecimento do pinheiro da Gregoria, que deu o no-
me ao logar e que muita gente de longes terras conhecia, foi ge-
ralmente lamentado. No mesmo sitio plantou-se em janeiro do an-
no immediato outro que já hoje mede uns 2 metros de altura.
— 244 —
CAPELLA DE SANTA JUSTA (BRAGA)
Está situada próximo da Ponte dos Pellames, ao fundo da rua
do mesmo nome. Foi construida a expensas de Gracia Mart.ns,
viuva de Rodrigo Ennes (o Peru), no anno de 1018, como se lê
na seguinte inscripçao da porta principal :
ESTA. CAP. ELA. MANDOV FAZER GRACIA. MZ
MOLHR.QVE.FIC.OV.DR.°.ENES.O PERV.l6l8.A
Pertenceu ao Morgado de Torneiros. Está nella erecta uma
irmandade das Almas indulgenciada pelo Papa Gregório xvi. Ao
fundo da sacristia ve-se uma cruz com a imagem de Christo em
pintura, sob a invocação do Senhor do Soccorro. Esteve em tempo
num oratório de madeira que ainda hoje existe na fachada da
casa n.° 41 da me^ma rua.
GAPELLA DE SANTO ANTÓNIO (BRAGA)
Está situada ao nascente do antigo campo dos Touros, actual-
mente praça Municipal, e teve a sua origem numa capella de Nossa
Senhora de Nasareth construida em 1546, a expensas do Arce-
bispo D. Manuel de Sousa, junto da porta da muralha da cidade,
que tinha no alto um nicho com a imagem do thaumaturgo por-
tuguez, muito da veneração do povo que subia ao alto da mura-
lha por uma escada de pedra. Esta servidão foi inutilisada por
ordem do Arcebispo D. fr. Bartholomeu dos Martyres em 1572.,
quando no antigo campo da Vinha fundou o Seminário de S. Pe-
dro, abrindo então sobre a muralha uma passagem com o fim de
o visitar diariamente. D'essa capellinha da Virgem de Nazareth
existem apenas as costas, uma pequena janella, um arco simples
e a pia da agua benta.
D. fr. Agostinho de Jesus (1 587-1609), projectando o alarga-
mento do Paço, obra realisada por D. José de Bragança (1641 -56}
e destruida por violento incêndio ás 11 horas da noite de i5 de
abril de 1866, mandou murar o espaço destinado áquelle fim, fi-
cando do lado de dentro a alludida capellinha. D. Rodrigo da Cu-
nha (1627-35) ordenou a sua demolição e a reedificação onde ainda
hoje se vê, collocando-lhe sobre a janella a primitiva padieira da
porta, em que está gravada esta inscripçao :
ANNO • XXV • IMPEFII • DIV1 • JOANNIS • III • LVS1TAN
REGIS • D • EMANVEL • DE • SOVSA • ARCHIEPS • BRACH
HISPAN • PRIMAS • EIVS DE REGIS • FACTVRA • HOC •
SACELLV • POSVIT • IN HONORE • MARIE • VIRGINIS •
— 245 —
Além do altar-mór tem mais dois — o de S. Roque e o da Vir-
gem da Piedade. Na sacristia podem ser vistos 1 1 curiosos qua-
dros de madeira com figurado em relevo representando os mila-
gres de Santo António.
Próximo d'esta capella, c rev. Domingos Pires, Abbade reser-
vatario de S. João da Balança, fundou em 1 588 o Recolhimento
das Beatas de Santo António, destinando o a 6 mulheres donzel-
las ou viuvas. Por effeito da demolição do edifício passaram essas
recolhidas para uma loja da antiga casa do Raio, hoje pertença
do Hospital de S. Marcos.
CAPELLA DE NOSSA SENHORA DA CONSOLAÇÃO
Nas freguezias de Dadim e Nogueiró (unidas), subúrbios da
cidade de Braga, construiu-se no ultimo quartel do século xvi uma
capellinha em honra de Nossa Senhora da Consolação. Assenta,
a poucos metros do pórtico do Bom Jesus, numa pequena eleva-
ção que os romanos fortificaram, como se deprchende dos vestí-
gios que os cortes do terreno apresentam, como por exemplo uma
mó manuaria, cerâmica e um pezo de fuso que pode ser visto no
meu pequeno museu estabelecido numa loja do Paço Archiepisco-
pal.
Por Bulia datada do 1 .° de maio de 1617 auctorisou Paulo V
a fundação 'duma confraria a que concedeu muitas indulgências.
No campanário tem um formoso sino denominado Vacca da
Consolação, que muitas vezes convidou o povo de Braga á lucta
em favor dos guerrilheiros Miguelistas, que alli estacionaram em
1846, sob o commando do celebre Padre Casimiro.
Este sino foi fundido em 1802 na fabrica bracarense de João
Ferreira Lima.
- 246
Gruta — Ermida de Nossa Senhora da Penha (Guimarães)
Sobranceira á cidade de Guimarães ergue-se magestosa a serra
de Santa Catharina, com 61 «"-,98 de altitude sobre o nivel do mar,
assim denominada por possuir, desde tempos remotos, no ponto
mais culminante, uma capellinha da mesma invocação, com um
púlpito curioso, portátil, em forma de cálice, muito apreciado
quando esteve exposto no museu da Ordem Terceira de S. Fran-
cisco.
Entre elevados penedos que, pela sua disposição curiosa, for-
mam ampla gruta ermida, venera-se a imagem de Nossa Senhora
do Carmo, denominada da Penha, em altar próprio, com mais
dois lateraes e ainda um púlpito e uma sacristia !
Sobre esta gruta concluiu-se a 18 de julho de 1881, a capella
relicário, que a gravura supra representa.
Ao seu lado esquerdo vê-se uma torre acastellada, de cujas
ameias se descobre um horisonte vastíssimo.
Esta obra concluiu-se no sabbado i3 de outubro de 1888, com
— 247 —
a collocação dos 4 sinos afinados que a classe dos curtidores man-
dou fundir pela quantia de 422:000 réis na fabrica portuense do
sr. Alexandre António Leão, os quaes chegaram á estação de Gui-
marães no comboio das 10 horas da manha de sabbado 1 de se-
tembro do referido anno. .
Pezam 646 kilos assim distribuídos: — Dó — 206; Ré— i5c,5oo
grammas; Mi — 104,800 grammas ; Fá — 84,700 grammas.
Além das moedas e jornaes cTaquelle tempo, também ficou
sob a primeira pedra da torre uma chapa de metal amarello
com os nomes dos membros da meza d'aquelle anno, da qual fa-
zia parte o auctor d'estas linhas, então presidente da primeira
commissão promotora de melhoramentos no local.
Essa commissão, composta de 55 indivíduos, organisou se a 29
de agosto de 1886, trabalhando dedicadamente durante os dois
primeiros annos em que levou a effeito a obra da escadaria dos
passos, construcção de muros, terraplenagem e arborisação do
largo e encanamento da agua a i3 de junho de 1887. Os seus no-
mes, que teem jus á gratidão geral, constam da Aurora da Penha,
numero único publicado em 29 de agosto do referido anno de
1887.
A 17 de julho de 1881 organisou-se a commissão promotora
do monumento que se erigiu a Pio IX no ponto mais elevado,
sendo-lhe lançada a primeira pedra pelo Arcebispo D. João Chri-
sostomo d' Amorim Pessoa, á 1 hora da tarde de 18 de junho de
1882. A inauguração solemne do monumento teve logar a 8 de
setembro de 1893. A's 10 horas da manhã d'este dia foi benzida
pelo Arcipreste a capella-relicario.
F' octogonal o pedestal, medindo 10 metros d' alto por 5 de
largo. As saliências do cornijamento são desenvolvidas a ponto de
no projecto se lhe destinar uma varanda com accesso por escada
interior.
A primorosa estatua, de 5 metros de altura é, como a da Vir-
gem de Lourdes que lhe fica próximo, esculpturada em mármore
de Carrara, e ambas no valor de 5:ooo:ooo, foram oíferecidas pelo
benemérito Fernando de Castro Abreu Magalhães, servindo de
intermediário o enthusiasta dos melhoramentos da Penha sr. Fran-
cisco Joaquim da Costa Magalhães.
A estatua representa Pio IX a abençoar, tendo na mão es-
querda a Bulia em que proclamou a immaculada Conceição da
Virgem. No cofre collocado sob a primeira pedra do templo em
construcção ficou uma lamina com os dizeres^seguintes
«Anno de 1895. Reinado de D. Carlos Primeiro e Pontificado
de Leão XIII. Sanctuario da Immacaulda Conceição erecto pela
cidade de Guimarães e catholicos portuguezes. Primeira pedra
-248 -
lançada a 8 de setembro pelo D. Prior de Guimarães D. Manuel
d' Albuquerque».
Em 1898, a Commissão de melhoramentos teve a feliz lem-
brança de fazer levantar a planta geral do parque, mas ... as
grandes obras projectadas não permittem que se eífectuem cedo.
CAPELLA DE GUADELUPE (BRAGA)
Ao lado da rua de Santa Margarida, num dos locaes mais ele-
vados e mais vistosos da cidade, denominado Monte do Reducto,
hoje transformado em alameda de recreio, havia em tempos afas-
tados uma caoella de Santa Margarida, a qual se demoliu para
em seu logar ser construída no anno de 1747 a que hoje existe
em forma de cruz grega, dedicada á Virgem Mãe de Deus, e para
cuja obra contribuiu com 100:000 réis o generoso Arcebispo D.
Rodrigo de Moura Telles. Tem sobre a porta estes dizeres :
PROTEGAM
VRBEM ISTAM
I747
A palavra Guadelupe significa em Árabe Rio do Seio, — Uad-
el-ubb ; mas provavelmente a invocação d'esta imagem provém da
Guadaloupe, (Aquae-LupiaeJ, Hespanha, onde foi fundado o no-
tável convento dos Jeronymos.
GAPELLA DO CEMITÉRIO (BRAGA)
E' de architectura singella e foi construída em 1870. Na tri-
buna de madeira liza, toda pintada a branco, ha apenas uma ima-
gem de Christo crucificado.
O cemitério foi benzido pelo Arcebispo D. José Joaquim d' Aze-
vedo e Moura no dia 1 de julho de 1870 e estreiou-se no dia im-
mediato com o cadáver de Francisco Soares, casado, da freguezia
de Lanhas, fallecido no hospital de S. Marcos.
— 24g-
CAPELLA DE SANTA TECLA (BRAGA)
No logar d'este nome, em sitio elevado, foi construída a ca-
pella de Santa Tecla (vulgo Santa Trega), com a estatua da Santa
no alto, esculpturada em granito.
Sobre a verga da porta lê-se :
a' custa
de jose pinheiro leite
ANNO Í729
CAPELLA DO SENHOR DAS ANCIÃS (BRAGA)
Está situada ao lado sul da rua da Boa Vista e foi construída
a expensas dos devotos, como se lê no friso da fachada :
ANNO 1735
ESTA CAPELLA FOI FEITA a' CUSTA DOS DEUOTOS
No alto da tribuna tem uma formosa esculptura em madeira
representando Christo na cruz.
A capella é administrada por uma Confraria.
CAPELLA DE NOSSA SENHORA DA BOA-MORTE
(GUIMAKÃES)
Esta capella, de proporções acanhadas, mas toda interiormente
■azulejada e com uma bella imagem de Nossa Senhora da Boa-
morte, sobre o altar, foi fundada por António Dias Pimenta e mu-
lher Maria Peixoto, instituidores do vinculo com a capella da Por-
ciuncula, em S. Francisco, junto das suas casas que ainda existem
no alto da rua de Santa Maria. E' hoje pertença de José Alves
Pereira de Magalhães Moura, de Basto.
O cónego Hyeronimo da Costa Pimenta vinculou-lhe as missas
do Natal.
Todos os domingos iam alli os padres da Curaria celebrar
missa e responso.
Os religiosos do convento de S. Francisco também eram obri-
gados a celebrar alli 4 missas com cruz alçada, sendo a primeira
no dia 25 de março, a segunda em 3 de maio, a terceira em i3
de agosto e a quarta no dia 8 de dezembro.
•2DO —
GAPELLA DO SENHOR JESUS (GUIMARÃES)
Junto á sua casa das Lamellas (hoje Tribunal, Administração
do Concelho e Repartição de Fazenda) o dr. Ruy Gomes Golias,
mestre-eschola da Collegiada, fundou esta capella instituindo mor-
gado em seu sobrinho. Com ella vinculou os bens a esposa d'este,
D. Maria dos Guimarães.
D'aqui sáe annualmente, para a procissão do Corpus-Christi, a
imagem de S. Jorge.
CAPELLA DE NOSSA SENHORA DO PILAR
(BRAGA)
No logar de Inflas, freguezia de S. Victor, está situada esta
capella que pertenceu ao Bispo d'Elvas D. Diogo d? Silva a quem
succedeu na posse sua irmã D. Nathalia da Silva que por sua vez
a deixou á irmandade de Santa Cruz.
Na data (1687) em que foi collocada a inscripçao sobre a porta
principal fez d'ella acquisição por compra á mesma irmandade
João Borges Pereira Pacheco, fidalgo da casa real e cavalleiro
professo na Ordem de Christo. Mandando-a restaurar, requereu
ao Arcebispo o necessário consentimento para de novo a benzer
e n'ella celebrar os officios divinos, o que o Prelado para logo
permittiu.
Pendente da parede sul vê-se um quadro a óleo representando
o martyrio dum padre jesuíta, irmão de D. Anna Borges Pacheco
avó do referido João Borges, o qual tem estes dizeres : — O lJa-
dre Francisco Pacheco, filho de Garcia Lopes Pacheco e de Maria
Borges de Mesquita da Villa de Ponte de Lima, provincial da*
Companhia de Jesus em Japão onde foi martyrisado queimado
vivo com Francisco Valente em Mangassa a 21 de julho de 1628.
O comprador da capella jaz em tumulo de pedra, ao lado da
Epistola, com estes dizeres em caracteres elegantes :
SEPVLTVRA DE JOAM BORGES I EREY-
RA PACHECO FIDALGO DA CAZA DE
SVA MAGESTADE CAVALEYRO
PROFESSO NA ORDEM DE CHRISTO
ANNO DE 1687
— 25l —
CAPELLA DE NOSSA SENHORA DA ABBADIA
(BRAGA)
Foi construída em iy38 onde actualmente se encontra no largo
do Barão de S. Martinho, encostada a uma das torres do castello
da cidade. Sobre o arco envidraçado tem a seguinte inscripção:
ASSVMPTA
EST MARIA IN
CELVM gav
DENT ANGELI-
ANNO 1738
A capella anterior tinha sido construída por D. Diogo de
Sousa, sobre três arcos, lateraes e fronteiro, vedados por grades
de ferro. Media i5 palmos de comprido por 12 de largo.
O pelourinho, que datava de 1 568, principiou a ser removido
d'aqui para o campo dos Touros, onde pouco se demorou, no dia
i3 de novembro de 1844.
CAPELLA DE S. GONÇALO (BRAGA)
Está situado á esquina da rua do mesmo nome, com entrada
pelo campo de Santa Anna, e foi fundada sob a invocação de
S. Bartholomeu pelo Arcebispo D. Jorge da Costa (1448- i5oi),
que lhe collocou sobre a porta o seu brazão com estes dizeres
em volta:
AÍOTESwlf»KMÃE
FAHSTAE&XANDlt.S.
NSTVMDEttET ODMINVS
PER VIAS RECTAS
C»„~. f-I"' 9*-
Leitura: — O Prirrfaz das Hespanhas D. George da Costa,
Arcebispo e senhor de Braga, mandou fazer esta egreja no anno
de i5oo.
— 252 -
No cap. io do Livro da Sabedoria lê-se deduxit e não deducet.
Este brazão e legenda foi trasladado por Duarte Mendes de
Vasconcellos para o muro da sua casa das carvalheiras, onde
actualmente se vê, por occasião da reediíicação da capella e fun
dação do Recolhimento das Convertidas, contiguo, pelo Arcebispo
D. Rodrigo de Moura Telles em 1722, auctorisado por Breve
Pontifício de Clemente XI, com data de 14 de agosto do referido
anno. O fundador destinou-o a 12 mulheres arrependidas que rece-
beriam, cada uma, diriamente 20 réis e meio alqueire de pão por
semana
A regente vencia 40 réis. Para edificar o Recolhimento com-
prou D. Rodrigo, em 1720, duas moradas de casas, dispendendo
ao todo 2:800-^000 réis.
O escudo que o Cardeal de Alpedrinha D. Jorge da Costa
adoptou, representa a roda de Santa Catharina, e dizem que em
reconhecimento dos muitos benefícios que a Infanta D. Catharina
lhe prestou, pois conseguiu accumular os cargos de Cardeal dos
Santos Martyres Marcello e Pedro, Bispo Albanense, Bispo Tus- v
culano, Bispo Portuense e de Santa Rufina, Bispo de Vizeu, Arce-
bispo de Braga e de Lisboa, Deão de Braga, Lisboa, Porto, La-
mego, Guarda, Vizeu, Silves, Burgos, e Chantre do mesmo;
possuiu oito Abbadias da Ordem benedictina, dez dos cónegos
regrantes de Santo Agostinho, seis da Ordem de S. Bernardo:
em Roma o rendosissimo beneficio de Santa Maria Trans Tibe-
rim; em Veneza uma Abbadia e a Villa de Arpanica com todas
as rendas; em Navarra e outras localidades, numerosas honrarias
ecclesiasticas! !
Seu sobrinho D. Pedro da Costa, Bispo do Porto, de Leão e
Osma, dividiu o escudo, escrevendo ao lado da roda :
Sy esta rueda Ezequiel viera
Com su prosápia remota,
Y su valor conociera,
Mui cierto está que dixera
Spiritus vitae erat in rota
E do lado das seis costas de prata :
Sy Adan viera las costillas
Deste escudo, que aqui veis,
Y sus grandes maravillas,
Dixera por mas subillas
• Hoc os ex ossibus méis.
— 2 53 —
CAPELLA E RECOLHIMENTO DA CARIDADE
(BRAGA)
E' da invocação de S. João da Matta e está situada na rua do
Carmo onde António Pinto, esculptor, da rua do Chãos de Baixo,
fundara o Recolhimento numas casas que para esse fim comprou
na rua do Carvalhal. As obras da pequena capella terminaram
em 1768, benzendo-a em 21 de janeiro do anno immediato, o pa-
ire José de Araújo Costa, Prior da Apúlia, e celebrando-se n'ella
a primeira missa a 23 do referido mez. O doutor Manuel da Sil-
veira, fidalgo da casa real, offereceu em 1785 ás recolhidas uma
grande casa contigua para augmento do Recolhimento. As religio-
sas usam habito de Trinas, e têem por fim ensinar meninas po-
bres a escrever, ler, costurar e fiar.
CAPELLA DO PAÇO ARCHIEP1SCOPAL (BRAGA)
E' obra do Arcebispo D. Rodrigo de Moura Telles que dis-
pendeu com a sua construcção a quantia de 2:000:000 réis e mais
1:600:000 com a torre e sinos. Tem a forma da cruz grega. O
edifício do Paço que a envolve, era acanhadíssimo. Augmentou-o
pela primeira vez o Arcebispo D. Fernando da Guerra (1418-67).
D. Manuel de Sousa (1544-49) obteve a cedência de umas casas
onde construiu a parte do nascente que alinha com a rua do Souto,
instituindo ao rez do chão o Auditório e Relação do Arcebispado,
como se lê na inscripção que existe sobre a porta :
ILLUSTRANDAE URBIS • CAUSA • SIT • VE UNDE PETANTUR
IURA • NEC - 1NSTABILI DENTUR • UT ANTE LOCO
SOUSA -PATER DNS QUE UFB1S MAGNUS Q SACERDOS
IUSTITIAE -EMANUEL NUB1LE STPUXIT -OPUS •
«Para engrandecer a cidade e saber-se o logar certo onde se
devia ir buscar o Tribunal da Justiça (que antes era incerto) man-
dou o grande Prelado, pae, e senhor d esta cidade, D. Manuel de
Sousa, elevar e erigir este edifício».
A parte do poente, sobre 14 grossas columnas, foi construida
por ordem de D. fr. Agostinho de Jesus, no anno de i5g3, como
o indica a inscripção que tem ao centro :
ANNO • DOM1NI • MD •
XCIII • SVB • D. F • AVG •
DE JESV • HISPÂNIA
RVM PRIMATE
— 2i>4 —
D. Rodrigo da Cunha (1627-35) e D. Rodrigo de Moura Telles
{em 1709), fizeram o restante. Foi este ultimo quem mandou gra-
var na verga da porta principal* este texto de Cicero (De officiis,
lib. I), que D. fr. Bartholomeu dos Martyres havia pronunciado
quando no dia 4 de outubro de i55o, transpunha aquelleshumbraes:
O DOMVS ANTIQVA !
QVAM DISPARI DOMINO
dominar; s !
O formoso chafariz do largo fronteiro é rematado pela figura
da Fanx <\wt sustenta na mão esquerda uma esphera armilar.
CompÕe-se de duas taças, uma d'ellas circumdada por uma mura-
lha com seis torres e sustentada por um grupo de meninos. Esta
obra também foi feita a expensas de D. Rodrigo de Moura Telles
importando em réis 1:000:000. Na parte inferior da arvore lê se :
D. ROD • MAVR • TE LI. ■ FEC1T • ANNO • 1723.
Desde i de novembro de 1 832 a i de junho do anno imme
diato, esteve hospedado no Paço Archiepiscopal o Senhor D. Mi-
guel de Bragança e suas irmãs as infantas D. Izabel Maria e D.
Maria da Assumpção.
CAPELLA DE NOSSA SENHORA DA TORRE
(BRAGA)
No tempo em que os jesuítas occupavam o actual edifício do
Seminário Conciliar, foi collocada em simplice oratório, na frente
da torre forte que mede 2,60 de espessura nas paredes, a imagem
da Virgem, desde logo com a invocação da rr orada. Esta imagem
foi para alli conduzida da freguezia de Santa Maria de Freiriz,
por um Abbade da família bracarense dos Barretos. Principiou então
a ser muito venerada, cantando-lhe os devotos todos os sabbados
a Magnificat e a Salve Regina, e conduzindo-a em procissões de
penitencia. A devoção porém subiu de ponto por occasião do ter-
remoto do i.° de novembro de 1755. Além de muitas outras de-
voções fundaram lhe a irmandade e instituiram-lhe a festa no i.°
domingo de maio de cada anno, o terço e ladainha no i.° de no-
vembro com procissão na qual ainda é conduzida a imagem em
volta dos muros da cidade.
Em abril do anno immediato (1756) teve principio a obra da
construcção da actual capella, custeada pelas esmolas dos fieis,
terminando em 1758.
r r
2DD
GAPELLA DAS ALMAS (BRAGA)
Está situada junto do novo edifício do Hospital de S. Marcos,
ao lado da capella de S. Bento. Construiu-se no anno de 1817.
Venera-se n'ella uma cruz com pintura que representa Christo
sob a invocação do Senhor dos Desprezos, titulo que provém do
desprezo que lhe haviam dado num logar immundo da antiga rua
dos Cegos.
CAPELLA DE S. VICTOR VELHO (BRAGA)
Foi construída em 1876 e teve origem num oratório que D. fr.
-Agostinho de Jesus mandou erigir, o qual representava em pin-
tura a degolaçao de S. Victor sobre a pedra que appareceu man-
chada de sangue, quando se procurava dar principio á reedificação
da ponte das Goladas. Esta pedra foi logo vedada por grade de
madeira, «em virtude de se suppor que sobre ella tivesse sido
degolado o santo.
CAPELLA DOS TERCEIROS DOMINICOS
(GUIMARÃES)
No anno de 1743 construiu-se esta capella em frente da egreja,
de S. Domingos. Tem quatro altares consagrados ao Coração de
Maria, a Santo Afíonso, á Virgem das Dores e a Santa Barbara.
A fachada é extremamente elegante. Tem no alto, esculptu-
rada em granito, uma grande estatua de Santa Catharina de
Senna.
A alinhar com o cunhal direito está o hospital, que principiou
íi ser construído no dia 4 de outubro de i836, sendo solemne-
mente inaugurado a 26 de maio de 1840, embora incompleto co-
mo está. Em 3o de maio de 1854 íundou-se no referido edifício o
Asylo de entrevados para 6 irmãos.
CAPELLA DOS TERCEIROS FRANCISCANOS
(GUIMARÃES)
Esta formosa capella, que fica a defrontar com a vasta egreja
de S Francisco, foi edificada a expensas da Ordem no anno de
1750. No alto da fachada, que é toda azulejada, tem a estatua
de Santa Isabel rainha de Portugal, em granito.
-256 —
Esta capella foi restaurada, benzendo-se no dia 3o de julho
de 1880.
No altar do lado direito venera-se uma imagem de Nossa Se-
nhora das Dores, tamanho natural, primorosamente esculpturada
por Soares dos Reis em madeira de oliveira, para cumprimento
d'um voto feito pelo sr. António de Mattos Chaves.
A esculptura, que é de vestir, sahiu das mãos do artista repre-
sentando a Virgem com lima camisa decotada, tão perfeita como
qualquer estatua profana que n'aquelle estado se destinasse a lo-
gar publico.
No altar do lado opposto venera-se a imagem do coração de
Maria esculptura em Roma pelo auctor da magnifica imagem de
S. Francisco. Tem estes dizeres na peanha:
G- BERARDI
ROMA 1882
MODELI.O
SCOLPI
Na campa n.° 8 d'esta capella foi sepultado em 21 de outubro
de 1826 o notável poeta e medico dr. João Evangelista de Moraes
Sarmento, nascido no Porto a 26 de dezembro de 1773 e, desde
1808, residente em Guimarães onde falleceu com 52 annos de
edade na madrugada de 20 de outubro.
Alinha com o cunhal esquerdo o magnifio hospital da Ordem
inaugurado em 3i de julho de 181 5, tendo então apenas as pri-
meiras seis janellas da fachada. Era ministro da corporação o
sr. Gaspar Leite de Azevedo. Para se calcular a simplicidade
d'esse edifício basta saber-se que se dispendeu com toda a obra
a quantia de 5:ooo$ooo réis.
No i.° de março de 1839 resolveu a mesa construir novas ins-
talações e accrescentar a fachada com as três janellas do lado da
rua de S. Francisco, gastando 8:000^000 réis.
Para esse fim compraram onze moradas de casas e o usofructo
d'outra, por 9:892:150 réis. Com a obra geral, que durou desde
i853 até i5 de abril de 1072, dispenderamse 33:827^280 réis.
Finalmente juntando a estas verbas o producto da subscripção
annual aberta em julho do referido anno e a importância das
obras que á sua custa mandou fazer o ministro Christovão José
Fernandes da Silva (o Cidade), temos ao todo um dispêndio de
75:719^430 réis.
O asylo de entrevados, destinado aos irmãos da Ordem, foi
tundado no dia 4 de outubro de i858. António Joaquim de Carva-
lho fez-lhe o donativo de 2:000^000 e legou-lhe mais 18:000^000
para que o numero de entrevados se elevasse a doze.
257
CAPELLA DE NOSSA SENHORA DA GUIA
(GUIMARÃES)
Esta capella principiou a ser construída em 1788 depois que
n'aquelle sitio se demoliu a torre da muralha da cidade. Nessa
torre esteve primitivamente a capellinha com sua confraria.
Por se conhecer que a conclusão da obra obstruía a passagem,
parou no arco cruzeiro e assim foi benzida no dia i5 de agosto de
i793.
CAPELLA DO EXTINCTO CEMITÉRIO
(GUIMARÃES)
Foi construída no anno de 1824. Tem ao fundo um grande
crucifixo e em volta seis imagens em tamanho quasi natural, re-
presentando a Via-Sacra. A próxima venda do terreno do cemité-
rio, em qye terminaram os enterramentos no dia 1 1 de maio de
1879, dará logar á sua demolição.
CAPELLA DE S. SEBASTIÃO (BRAGA)
Está situada na alameda das Carvalheiras, cujos paredões, es-
cadarias, etc, foram construídos desde i838 a 1839 pelo mestre
pedreiro Domingos Fernandes, da antiga rua da Conega.
O Arcebispo D. Rodrigo de Moura Telles mandou reedificar
a capella desde 26 de outubro de 1 7 1 5 a 18 de janeiro de 1 7 17,
dispendendo com a obra 2:200:000 réis. No mesmo local havia
restos d'outra mais antiga que D. Diogo de Sousa mandara ladri-
lhar fazendo- lhe um alpendre com columnas novas. A porta que
então ficava voltada para o occidente, como se prova com a ins
cripção sepulchral do dr. cónego João Aífonso de Beja, fallecido
a i5 de agosto de 1 585, foi aberta ao nascente, collocando se-lhe
no alto o brazão de D. Rodrigo e um pouco mais acima a primo-
rosa esculptura de S. Sebastião em granito.
Junto do altar da esquerda ha um rolo de cera com 1327 va-
ras, medida que abrange o circuito da antiga muralha da cidade.
Accende se aos domingos e dias santificados durante a celebração
das missas.
Em volta da capella, no espaço fronteiro e nos dois quarteirões
seguintes, existem desde agosto de 17^9 algumas inscripçÕes ro
manas milharias, votivas e sepulchraes, pertencendo as primeiras
17
— 258-
aos imperadores Tibério, Cláudio, Nerva, Hadriano, Caracalla,
Elagabalo, Maximino, Caro, Carino, Diocleciano, Maximiano, Ga-
lerio, Constâncio, Magnencio, Valentiniano e Valente e Constan-
tino II.
Esta ultima foi collocada por minha ordem, sobre uma co-
lumna, em março de 1898, com permissão da Camará.
Outra diz o seguinte : «t. caelicvs tripés fronto et m. et lv-
CIVS. TI ÍI PRONEPOTES CAELICI FRONTONIS, RENOVARVNT».
Parece que se refere á restauração de um sacellum consagrado
a qualquer deus pagão.
Outra, muito gasta do tempo, é uma dedicação dos ceves ro-
mani QVI NEGOTIANTVR BRACARAVGVSTAE â C fãtUS) CALERONIVS, que
se suppõe legado provincial.
Outra em que apenas se pôde ler: . . .laecia, a qual foi por
minha ordem extrahida do passeio norte da rua da Cruz de Pedra
em agosto de 1898.
Outra sepulchral que diz: aton gomvni-lxxv • h • s • e •
Ainda outra : favstvs-ivliae severae-s • an • xix • h . s • e •
Ha muito boas razões para se acreditar que esteve roeste local
das Carvalheiras o edifício da Chancellaria Romana que, no dizer
de Plinio (Hist. Nat. 1. 3.°, cap. 3.°, pag. 26), era a principal da
Galliza, com a junsdicção de 24 cidades e 275:000 habitantes.
Quando em 1620 se procedeu á demolição dum muro, pró-
ximo da referida capell.i, appareceu, a pequena profundidade do
solo, uma estatua de bronze dourado representando mercvrio, o
deus da eloquência, do commercio e dos ladrões. l
A imagem de Nossa Senhora da Ajuda, que alli é venerada,
esteve num oratório da porta de Maximinos, onde já tinha irman-
dade, até que em 3 de novembro de 1826 foi trasladada, por se
dar principio á demolição da torre.
D'esse monumento resta o escudo de el-rei D. Fernando, em-
bebido no primeiro paredão das Carvalheiras, ao lado do de D.
João I que pertenceu á torre de S. Francisco.
O edifício onde ora está estabelecido o Hotel do Igo, foi Hos-
pício dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho (Cruzios). Sobre
o portal encimado por uma cruz, ainda hoje se vê um Agnas Dei
com estes dizeres em volta :
EXORDIVM SVMPSIT ORDO CANONICVS
IN MONTE SION •
VIDI SVPRA MONTEM SION AGNVM
STANTEM
1 Memorial dei Marquez de Montebello— anno de 1642.
- 2D9 —
CAPELLA DOS ORPHÃOS DE S. CAETANO
(BRAGA)
No logar da Madre de Deus, um pouco além da egreja paro-
chial de Maximinos, está situado o Collegio dos Orphãos de S.
Caetano, instituído pelo Arcebispo D. fr. Caetano Brandão nas
casas que ora pertencem ao proprietário da phar macia dos Or-
phãos, com frente para o campo de D. Luiz I e praça Municipal.
Em i8õi foi esta casa decl irada imprópria para os fins da
instituição: e em 1880, depois de se obter uma planta de que foi
auctor o architecto Sardinha, deu-se principio á obra d'um novo
edifício na quinta das Carvalheiras, dispendendo-se com os alicer-
ces doze contos de réis e o tempo de 5 annos para logo se aban-
donar o terreno e toda a obra!
Comprada em praça a casa e quinta dos Falcões (na Madre
de Deus), foram para alli os Orphãos, projectando se então as
grandes obras orçadas em quarenta contos de réis, e iniciadas em
maio de. 1 8 ^8. Marcou-se o espaço indispensável para residirem
45o alumnos, pois mede de comprimento o edifício i3i metros
por 63 de largo, a principiar no portal.
Paralisaram as obras por falta de recursos, não obstante haver
deixado a esta sympathica instituição mais de 110 contos de réis
o sr. Joaquim José Ferreira Veiga, nascido em Braga a i3 de fe-
vereiro de 1798 e fallecido em Lisboa a 27 de junho de 1846.
Ao centro do edifício construiu-se a capella com a frente para
noroeste, sendo auctor do projecto o notável architecto Stamin.
E' este edifício um bello exemplar da architectura latino-byzan-
tina, fim da epocha, bem mais digno de figurar na frente do que
nas costas do Collegio, onde passa a linha férrea entre campos de
cultura !
O rosetão é bastante desenvolvido, e no remate da fachada
tem a cruz primacial em substituição da grega. Com um pequeno
dispêndio podia ser concluída a porta principal de arco perfeito.
Interiormente ha bastante rigor architectonico, se exceptuarmos
o arco de mármore liso na tribuna a contrastar com o granito !
São de primorosa esculptura as imagens de Nossa Senhora
Auxiliadora e de S. José, provenientes de Barcelona.
CAPELLA DE S. MIGUEL O ANJO (BRAGA)
E' de architectura simplíssima e está situada na rua do Ave-
lino, onde se reedificou depois que a vereação de 1841 promoveu
a sua demolição junto da porta de Maximinos, fronteira á Sé, no
- 200 —
mesmo local em que tinha sido fundada no anno de 1691 por um
devoto rico, do qual não consta o nome, na sua própria casa de
habitação.
Em 1743 installaram-se n'esta capella as confrarias de S. Lou-
renço e de Nossa Senhora da Purificação.
No anno immediato uniu-se-lhes a confraria de Nossa Se-
nhora do O; em 1 76 1 a de Nossa Senhora da Graça; em 176o a
de Nossa Senhora do Amor; em 1772 a de S. José no Presepe;
em 1781 a de Nossa Senhora da Paz, e em 1785 a das Almas
de S. Nicolau.
Desde que el-rei D. Filippe, em abril de 161 1, prohibiu por
Provisão que os Arcebispos continuassem a fazer a sua entrada
a cavallo debaixo do pallio, por achar pouco decente essa pra-
tica, os Prelados bracarenses revestiam-se de vestes sagradas,
n'esta capella e d1 aqui partiam para a Sé que fica em frente do
local. Também n'esta capella, se fazia a reposição dos santos óleos
benzidos em Diocese extranha.
Hoje os Prelados fazem a sua entrada na cidade depois de se
revestirem na egreja do Populo.
CAPELLA E RECOLHIMENTO DO ANJO
(GUIMARÃES)
Desconhece-se a verdadeira origem d'esta capella e Recolhi-
mento, sabendo-se apenas que existia no anno de 1600. A actual
capella, muito pobre de ornatos, foi benzida em 1748.
As beatas, da Ordem Franciscana com véo brancD e capa cor
de cinza, são hoje admittidas pela auctoridade administrativa.
Vê-se encostado ao Recolhimento um cruzeiro alto que para
alli foi removido do largo fronteiro. Tem esta inscripção na base :
SENHOR
DO BOM SU
SESO POSE
EM MAIO
DE I79O
Diz-se que por occasião da mudança cahiu sobre um operário
matando-o instantaneamente.
Na frente d'este Recolhimento existe o Albergue de Nossa Se-
nhora do Serviço, destinado a recolher oito velhas pobres, a cada
uma das quaes se dá um quarto para dormir, forno e cosinha com-
mum. A porta de arco, encimada por uma cruz, faz pensar numa
capella que dizem ter existido alli.
26 I —
CAPELLA DE S. CHRISPIM (GUIMARÃES)
Está situada na rua da Rainha junto do Albergue dos pobres
passageiros e no mesmo local da primitiva fundada em i3i5 pe-
los mestres sapateiros João Bahião e Pêro Bahião. A actual reedi-
ficação teve principio em 1849, concluindo-se pelo frontespicio,
que é elegante, no anno de i852. O compromisso foi reformado
em 1661.
Esta capella, que no altar-mór tem as imagens de S. Chrispim,
S. Chrispiniano e S. Miguel, e junto do arco os altares de Nossa
Senhora das Neves e de Nossa Senhora do Rosário, mede de
comprimento 12,40 por 6,65 de largo.
O Albergue recolhe nove mulheres velhas que têem annual-
mente á sua disposição cinco carros de lenha; recebe por 3 dias
passageiros pobres, e na véspera do Natal dá a todos os neces-
sitados que se apresentem, uma ceia de bacalhau com batatas,
pão e vinho! Santíssima instituição esta que tantas lagrimas de
commoção faz assomar aos olhos dos favorecidos da sorte!
Os fundadores da primitiva capella e confraria de S. Miguel
do Hospital, instituíram um responso e vigília sobre a sua sepul-
tura na egreja de S. Paio, isto na tarde de quarta-feira de cinza,
de cada anno, e ordenaram: acabado o acto «farão os ditos con-
frades pôr uma meza na dita egreja e todos assentados a ella
com muita quietação e farão uma consoada e gastarão n'ella aquillo
que lhe bem parecer, e os que estiverem em ódio o Juiz do dito
Hospital os fará amigos, e comerão, e beberão por um copo, etc.»
A celebre comesaina de pão de ló e vinho maduro em frente
da sepultura, foi ha mais de 20 annos convertida num rosário
(So réis) para cada confrade.
CAPELLA DO CEMITÉRIO DA ATHOUGUIA
(GUIMARÃES)
A Camará Municipal de Guimarães, na sua sessão de 14 de
janeiro de 1870, escolheu o local para o actual cemitério que foi
solemnemente benzido ás 12 horas da manhã de 11 de maio de
1879. Pensou se logo na construcção da respectiva capella que
deveria ser apropriada e nunca demasiadamente dispendiosa co-
mo a actual que custou ao Município 17:995^935 réis!
E' de architectura ogival ou gothica, elegante e rica como
poucas se encontrarão nos demais cemitérios do reino. Ao fundo
tem a forma absidal e um altar isolado com a imagem de Christo
— 20 2
na agonia, tamanho quasi natural. Em cada um dos dois altares
lateraes ha uma cruz apenas.
Teve esta obra começo em 1882 e teminou em :!
CAPELLA DO SENHOR DE CAMPELLOS
A pouco mais de 2 kilometros de Guimarães, em um local
aprazível, próximo da ponte romana que atravessa o rio Ave na
freguezia de S. João e onde appareceu ha annos uma moeda de
ouro do imperador Honório, vê-se esta capella que provavelmente
data do anno de 1743, como se deprehende da seguinte inscripçao
gravada no pedestal de granito grosso sobre que assenta o ele-
gante cruzeiro com imagem de Christo regularmente esculptu-
rada :
M- F- HIM? Dl
AS DE CASTRO CPL •
D • P • 1 • I 74 co
Leitura: — Me fez Jeronymo dias de Castro Campello. Deus
perdoar lhe queira. 1743.
Desde tempos muito afastados que annualmente alli tinha lo-
gar uma romaria em honra d'esta imagem. Porém a sua venera-
ção augmentou desde que em 7 de maio de 1890, aquelle logar
deserto principiou a ser povoado em virtude da construcção do
edifício da Companhia de Fiação e Tecidos de Guimarães, fun-
dada no referido dia.
Em Guimarães foi ha annos demolida a capella de S. Thiago,
na praça do mesmo nome onde, segundo alguns auctores, o Apos-
tolo collocára a imagem da Virgem numa gruta junto do templo
da deusa Isis, no simulacro de Ceres. Fr. Bernardo ie Braga
affirma que junto da torre demolida em i55g viu o seguinte let-
treiro :
IN HOC SIMVI ACRO CJERES JACOBVS FILIVS fcEBED.EI
GERMANVS JOANIS IMAGINEM SANT.E MARI.E III S.EOIS X
-263
ORATÓRIOS
EM GUIMARÃES
Oratório do Senhor dos Afflictos. — Está situado na rua dos
Terceiros, com frente para o antigo largo das Carvalhas, e foi
fundado em 1867 com o producto de uma subscripção aberta por
Jeronymo José d'Abreu e sua mulher. A cruz e o Christo são de
mármore branco.
Oratório do Senhor da Aponta. — Construiu se na rua do Pi-
coto e venera se n'elle uma pequena imagem de Christo esculptu-
rada em madeira.
Oratório da mesma invocação. — Foi aberto na parede da casa
que tem os números de policia 48 a 54 na rua Nova de Santo An-
tónio.
Oratório do Senhor do Amparo. — Está entre as casas n.° 34
e 35 do antigo campo do Salvador. Tem ao lado um pequeno
cruzeiro com esta inscripção na base :
pE NOSO
(SÍC) ANE MA
RIA 1> • AE
TENSÃO
ANNO 1779
Leitura : — Padre Nosso, Ave Maria por a intensao. Anno de
1779-
Um pouco acima, no logar da Arcella, houve junto da capella
de Santo António uma Gafaria.
Oratório de Santo António. —A poucos passos da egreja dos
Capuchos, no muro da cerca dos extinctos frades d'aquella Or
dem, que o fundaram. Fica lhe em frente um cruzeiro lavrado.
Oratório do Senhor da Esperança da boa sentença. — Na rua
de Villa-Flôr. A esculptura do Christo é bastante correcta. Na
— 264 —
base da cruz de granito, pintada a azul, tem esta inscripção em
caracteres doirados :
SR DA
ESPERA
NSA DA B
OMA SE
NTJENSA
ANNO I754
A inscripção indica a invocação da imagem, differente da que
lhe attribue o saudoso padre Caldas.
Oratório do Senhor do Bom Fim. — No logar da Cruz de Pe-
dra, extremidade da rua da Alegria, está este oratório aberto
numa das casas d'aquella rua com frente para a Meia Laranja.
Oratório do Senhor Bom Jesus. — Na rua da Caldeirôa junto
de uma fonte.
E' tradição que na casa de onde sáe a agua nasceu o Papa
S. Damazo.
Oratório do Senhor dos Desamparados. — Na rua Nova do
Commercio. Tem exteriormente esta inscripção :
ESTA • UEVAÇÃO • MANDARÃO • FAZER • OS MORADORES •
DESTA • RVA • ANNO • DE • I 7 I 2 •
Oratório do Senhor da Liberação. — No alto da rua de Ca-
mões. E' uma imagem de Christo na cruz bem esculpturada em
madeira.
Oratório do Senhor da Piedade. — Na rua de Villa Verde.
Foi seu fundador em 1866 Christovão José Fernandes da Silva (o
Cidade).
Oratório do Senhor da Piedade. — A' margem esquerda da
nova estrada da Costa. Antes da abertura d'esta estrada estava
ao lado opposto num recanto do caminho velho. As imagens de
Christo, da Virgem e de S. João são de esculptura rasoavel.
Oratório do Senhor dos Remédios. — No largo do Trovador.
Foi construído de pedra em 187o e substituídas por esculpturas
as pinturas de Christo, da Virgem e de S. João.
No muro que lhe fica superior esteve o antigo Pelourinho.
— 265 —
Oratório do Senhor dos Passos. — Próximo da capella de Santa
Luzia, entrada da travessa do Picoto, venera-se em oratório de
pedra envidraçado, a imagem de Christo com a cruz ás costas.
Oratório de Nossa Senhora de Bethlem. — Numa janella da
antiga egreja de Santa Roza, hoje sede da parochia de S. Sebas-
tião. Tem caixilho de ferro envidraçado e luz de azeite perma-
nente.
Esta formosa imagem, que conta numerosas afilhadas, foi por
uma d'ellas (D. Leonor Lucinda d^liveira Cardoso) aproveitada
da extincta egreja de S. Sebastião e exposta, a expensas suas,
onde agora se venera.
A irmandade dos Santos Passos mandou construir os sete
oratórios da Via-Sacra que se acham distribuídos pela cidade. O
figurado é todo de madeira em tamanho natural.
EM BRAGA
Oratório do Senhor da Boa Morte. — Está situado a meio da
rua de Payo Manta (vulgo Pae Amante). E' de madeira envidra-
çado. A imagem de Christo na cruz, que alli é venerada, recom-
menda-se pela correcção csculptural.
Oratório do Senhor dos Desamparados. — No largo das Lati-
nhas, próximo á nascente d'aguas sulphurosas denominadas dos
Gallos, existe um oratório envidraçado em que se venera uma
pintura de Christo em madeira sob a invocação do Senhor dos
Desamparados.
Oratório do Senhor. do Bom Principio. — Quasi a meio da rua
dos Pellames, venera-se esta imagem em oratório envidraçado.
Oratório do Senhor da Guia. — Na freguezia de S. Pedro de
Maximinos, um pouco abaixo da fabrica do gaz, ha um oratório
envidraçado em que se venera uma formosa imagem do Senhor
da Guia.
Oratório do Senhor do Bom Fim. — Está situado ao lado es-
querdo da antiga estrada de Guimarães, um pouco áquem da ca-
pella de Santo Adrião da Corrica. A imagem é de madeira. Foi
collocada alli no dia 3 de julho de 1 888.
Oratório do Senhor da Afflicção. — Está encostado ao lado di-
—266 —
reito da egreja parochial de S. Lazaro, com uma vidraça na frente.
Venera-se alli uma pintura de Christo em madeira sob o titulo
de Senhor da Afflicção.
Oratório de Nossa Senhora de Na^areth. — No alto do arco da
Porta Nova, sobre que assenta a estatua de Braga, ha um oratório
envidraçado em que se venera a imagem de Nossa Senhora de
Nazarcth, também de granito mas pintada. E' muito festejada a
expensas dos moradores da rua Nova de Souza, no dia 8 de se-
tembro de cada anno.
O referido arco da Porta Nova foi construido no anno de 17 16,
dispendendo-se com esta obra um conto de réis. Para este fim a
Camará obteve de el-rei o subsidio de 1 6:000 cruzados, das sobras
do rendimento das cizas.
Oratório da rua de Nossa Senhora do Leite. — Na esquina da
casa n.° 1, que defronta com o rocio detraz da Sé, ha uma cruz
de madeira com um quadro representando o Rosto do Senhor,
habilmente pintado em dezembro de 1870 pelo pintor-esculptor
hespanhol Luiz Vermell, que viveu durante algum tempo em Bra-
ga. Ao lado esquerdo do quadro tem estes dizeres em cursivo: —
Braga — Dezembro — 1870:, e ao lado direito: — Original de Luiz
Vermell (o peregrino Espanol). O trabalho revela a competência
do auctor. O olhar de Christo acompanha quem o fitar de frente
ou de qualquer dos lados com egual doçura de expressão.
Os visinhos construiram-lhe um oratório de madeira e todas
as noites lhe põem luz de azeite.
O quadro tem sido distribuído em pequenas photographias
pelos devotos que são muitos.
Antes d'esta pintura do Rosto do Senhor havia outra menos
correcta que foi d'alli retirada.
A cruz collocou-se naquelle sitio para^implorar as orações dos
fieis em favor das numerosas victimas do encontro que alli se deu
entre a divisão cabralista commandada pelo general José de Bar-
ros e Abreu Sousa Alvim (i.° Barão e depois Conde do Casal)
e as forças legitimistas, commandadas pelo general Macdonell, ao
meio dia de 20 de dezembro de 1846. Pelos chapéus de palha
com fitas vermelhas que os guerrilheiros miguelistas usavam, no-
tou-se que eram d'estes quasi todos os cadáveres que juncavam
a rua. O meu informador sr. António da Graça Faria, curioso
de antiguidades que assistiu a essas tristes scenas, diz-me que se
lembra de vêr correr o sangue das victimas de mistura com a
chuva miudinha. Os fieis que saiam da missa do meio dia fugiam
para suas casas horrorisados, e muitos foram assassinados no
Campo dos Remédios quando saiam da egreja de Santa Cruz.
207
Era o desforço desenfreado da cavallaria e infanteria cabralista
que haviam sido heroicamente dizimadas e vencidas quando por
vezes tentaram entrar pela rua dos Pellames.
Oratório do Senhor Jesus das Almas. — Está encostado á egreja
da Ordem Franciscana, com frente para a rua dos Capellistas, e
é todo de pedra vedado por uma grade de ferro. A imagem do
Senhor Jesus das Almas, em tamanho quasi natural, é de primo-
rosa esculptura e pintura. Os visinhos promovem-lhe annualmente
uma esplendida festividade. Do lado de dentro, á esquerda, tem
embebida na parede uma lapide com esta im.cripção:
CAPELLA DO SENHOR
JESUS DAS ALMAS, QUE MAX
DOU FAZER MANOhL AN
T° FERRf NEGO'lv DESTA
CID f XO ANNO DE I 83 I •
Oratório do Senhor do Bom fim. — E' de madeira envidraçado
e âcha-se encostado á casa n." 32 da rua de Santa Cruz. Tem
dentro uma cruz de madeira com pintura de Christo.
Oratório do Senhor da Boa I 'ista. — Está situado no alto da
rua de S. Sebastião, próximo da capella das Carvalheiras, e ve-
nera-se n^lle uma formosa imagem de Christo Agonisante. Os
visinhos devotos promovem-lhe annualmente luzida festividade.
Oratório do Senhor das Injurias. — Ao fundo da rua das Pa-
lhotas ha um oratório envidraçado onde se venera uma tormosa
imagem de Christo na cruz sob a invocação de Senhor das Inju-
rias, muito festejada em certo dia do anno.
■268
NICHOS
KM BRAGA
Nicho aberto na frontaria da casa n.os 57 a 59, da rua das
Aguas. Tem uma esculptura de S. João e na parte inferior:
anno — s. joÃo — 1702
Na frontaria da casa n.° 56 da rua da Cruz de Pedra, a ima-
gem de S. Bento, pintura em madeira.
Nicho aberto na frontaria da casa n.os 12 a 14, da referida rua.
Na rua de S. Sebastião, frontaria da casa n.° 3o, uma pintura
representando Nossa Senhora do Rosário.
Na rua de S. António das Travessas, frontaria da casa de
D. Henriqueta Barbosa, duas imagens do thaumaturgo portuguez.
No largo de S. Paulo, esquina da casa n.° 19, uma bella esta-
tua de granito representando S. Miguel o Anjo. Tem a servir-lhe
de docel uma grande concha egualmente de granito.
Na rua de S. Marcos, frontaria da casa n.os 34 e 36, uma ima-
gem de Santo António.
Na rua das Aguas, esquina do convento dos Remédios, um
quadro com o Rosto do Senhor, muito da veneração dos visinhos.
Na mesma rua, frontaria da casa n.os 166 a 168, uma pequena
imagem da Virgem da Piedade.
Ao lado da porta do Sol, da Sé, uma cruz de madeira com
pintura de Christo, sob a invocação do Senhor da Felicidade.
Esta cruz esteve na mesma parede, um pouco mais acima,
onde ainda existem os ganchos que a prendiam.
Na rua de S. Marcos, frontaria da casa n."s 94 e 96, um qua-
dro representando a imagem da Virgem com o menino Jesus.
- 26ç» —
Na mesma rua, esquina do convento dos Remédios, um qua-
dro com o Rosto do Senhor.
Na rua de S. Domingos, frontaria da casa n.° 43, uma cruz
com pintura representando Christo.
Na rua do Raio, írontaria da casa n.° 9, uma pintura da Vir-
gem, com luz de azeite permanente.
Na rua de S. Barnabé, frontaria da casa n.° 2, uma pequena
imagem do Santo de que a rua tomou o nome.
A mais de meio da rua da Boa-Vista, lado sul, ha uma fonte
com um grande nicho e a imagem de S. Thiago dentro d'elle. Os
visinhos promovem-lhe annualmente uma grande festa.
A fonte, e provavelmente a imagem, devem-se á generosidade
do Arcebispo D. Diogo de Sousa, segundo se deprehende do let-
treiro que esta gravado sob o nicho:
■
D • SOVSA ARCHIEP
ANNO SALVTIS I 53 I
Na rua do Anjo, frontaria da casa n.os 82 a 84, dois nichos
bem lavrados.
Na rua de S. Marcos, frontaria da casa n.° 1, um nicho com
peanha saliente na qual se lê :
ANNO — S- PEDRO — 1642
No largo de Infias, frontaria da casa n.° 10, um nicho bem
lavrado.
Na rua de S. Victor, frontaria da casa n.° 65, um nicho.
Na rua Nova de Sousa, frontaria da casa n.° 109, um nicho
com communicação interior.
No campo de Sant'Anna, frontaria da casa n.os 19 e 21, um
nicho bem lavrado.
270 -
CRUZEIROS
Já no tempo dos egypcios, carthaginezes, assyrios, persas, he-
breus e gregos, a cruz era applicada aos supplicios de malfeito-
res, introduzindo-a Tarquinio Soberbo em Roma para a execução
das sentenças de pena ultima; e subsistiu este costume até que
o imperador Constantino Magno, em attençao ao supplicio de
— 271 —
Christo, a fez venerar como symbolo que é da redempção huma-
na '. Desde então o lábaro santo principiou a apparecer hasteado,
como pregão de paz e amor, perdão, conforto e esperança, na
cúspide dos montes, nas povoações sertanejas e nas cidades e
villas, sobre a coroa dos monarchas, junto das encruzilhadas e
sobre as pontes, como na villa de Ponte do Lima e n'outra loca-
lidade portugueza, onde ainda se vê, levantada sobre o talha-mar,
uma cruz elegante com esta inscripçao que, por interessante, de-
corei :
CRVX IN PONTE QVIT EST? AMBO SVNT •
CREDITE PONTES :
rSTA VIAM CCELI • FLVMINTS ILLÉ PARAT •
«Uma cruz numa ponte que quer dizer? Podeis crer que são
duas pontes: por uma se vae ao céo, por outra se passa o rio».
A cruz também se ergue á cabeceira da campa e nos logares
onde alguém perde a vida.
No norte de Portugal é ainda frequente a pratica dos mon-
tinhos de pedras junto de uma cruz no local onde o individuo
morreu de desastre ou violência. Formam-se resando, por cada
pedrinha que se colloca junto da cruz, um padre-nosso, e chama-
lhes o povo Fieis de Deus.
Próximo da capella da Madre de Deus de fora, sobre a pa-
rede da margem direita do caminho que vae da capella da Con-
ceição e egreja de Azurey (subúrbios de Guimarães) ergue-se uma
pequena cruz de ferro com os seguintes dizeres: — Francisco Joa-
quim CARDOSO P N • A • M •
O infeliz Francisco morreu alli sob um carro de matto que se
voltou. Em torno á cruz amontoam- se numerosas pedrinhas que
os fieis vão collocando, quando passam, resando então, por alma
do finado, o padre nosso e a ave Maria que a cruz implora.
Os povos celtas sepultavam nas mamo as (montículos de terra
isolados) os seus homens mais notáveis; e formavam estes montí-
culos com pedras miúdas sobre a sepultura dos indivíduos pobres.
Os romanos também dedicavam a Mercúrio estes montículos
1 Um dos instrumentos do deicidio, o rotulo de madeira que se collocou no
alto da cruz, media 10 polegadas de comprido por 6 de largo.
Escreveram n'elle, da direita para a esquerda, como usavam os judeus, em
hebraico, grego e latim, esta inscripçao: mvro&dvi xek svnerazan svsei.
A forma da cruz de Christo, deis paus atravessados em angulo recto, é
egypcia. O vocábulo, derivado do latim crus, significa tronco de arvore abaixo
da bifurcação; assim as primeiras cruzes a que os condemnados eram presos
como o foi S. Sebastião.
— 272 —
(montes gaudios) nas encruzilhadas, com umas estatuas de pedra
(Mercuriaes) que apenas tinham cabeça. Consideravam Mercúrio
deus dos caminhos e acreditavam que as almas dos mortos eram
por elle levadas aos infernos e de lá trazidas quando lhe appete-
cesse. Por isso os gregos o denominavam psuxagogos (conduetor
das almas) e nekropompos (acompanhador dos mortos).
Em todas as povoações se erguia, n'outros tempos, a cruz,
mais ou menos rica de arte, a avivar a origem da religião christã
e o martyrio de Jesus no Golgotha!
Hoje as vereações portuguezas pensam na remoção dos cruzei-
ros como quem procura prover a uma necessidade urgente. Não
lhes aproveita, como catholicos, a liçção dos inglezes protestantes
que respeitam os seus antigos cruzeiros como o de Salisbury, de
Winchester e outros a que dão o nome de Marketcrosses por se
acharem nos locaes das feiras! Essa guerra de extermínio, entre
nós, por principio algum se justifica. Dos poucos cruzeiros que
havia em Guimarães, se exceptuarmos os dos padrões de Nossa
Senhora da Victoria e de D. João I, foram-se os melhores como
o da irmandade do rosário (cruzeiro do Fiado), do anno de i65o,
cuja columna fragmentada existe no museu da Sociedade Martins
Sarmento, e o do largo de S. Paio, que foi apeado a 18 de feve-
reiro de 1879.
Existem ainda:
Cruzeiro de Santa Cru\, no largo fronteiro á capella da mes-
ma invocação. Foi mandado fazer em 1O40 pelo cónego Arro-
chella.
Cruzeiro do Campo da Feira. — E' uma simples cruz de pedra
com uma pintura de Christo a óleo. Tem mais duas dos lados e
trez na frente.
Cruzeiro dos Capuchos. — E' uma grande cruz sem columna,
com seus lavores, que se ergue em frente á egreja dos extinctos
frades Capuchos.
Cruzeiro das Capuchinhas. — Fica em frente á egreja d'este
pequeno convento e tem a data de 177o.
Cruzeiro da crn\ de pedra. — Fica no alto da rua da Alegria
sob uma cobertura sustentada por quatro grossas columnas. A
cruz é de pedra, e o Christo, na agonia, pintado em madeira.
Provirá d'esta cruz o nome do local?
Cruzeiro da Senhora da Guia. — E' dedicado á Virgem da
2?3 -
Piedade. Esteve primitivamente junto da casa onde nasceu Mar-
tins Sarmento. D^lli foi removido para próximo do Passo, onde
se acha encostado. Na frente da cruz está a Virgem com o Christo
morto nos braços, e outras figuras em volta, dizendo-se que repre-
senta um frade a que se apresenta de joelhos com as costas para
a rua.
Creou se a este respeito uma lenda engraçadissima que o
sr. conde de Margaride descreve com extraordinária elegância a
pag. 28. e segg. do numero especial da Revista de Guimarães,
publicado em honra de Martins Sarmento.
Cruzeiro de S. Francisco. — A columna pertence á ordem
compósita. Foi mandado íazer no século xvi pelo padre mestre
fr. António Fernandes, collocando-se então á entrada do largo
das Carvalhas a demarcar a jurisdição da Ordem. A camará re-
moveu-o em maio do anno corrente encostando-o á parede da
egreja !
EM BRAGA
Cruzeiro do campo de Santa Anna. — Sobre a elegante co-
lumna bem lavrada, pertencente á ordem compósita, eleva-se a
cruz primacial. Essa columna, com pedestal ornamentado, assenta
em 7 degraus ao nascente do campo de Santa Anna onde foi col-
locada por ordem do Arcebispo D. Diogo de Sousa, no primeiro
quartel do século xvi.
Cruzeiro da praça do conde de S. Joaquim. — E' egual ao do
campo de Santa Anna e foi mandado fazer pelo Arcebispo D.
AfFonso Furtado de Mendonça no anno de 162 1. (Vide gr av. a
pag. 2-4).
A casa próxima, pertencente á illustre familia Brandão Pereira,
occupa o espaço da habitação de Lúcio Caio Atilio, governador da
Lusitânia e Galliza, no tempo dos romanos, e sua mulher Calcia,
na qual nasceram as suas nove filhas gémeas e santas, Liberata,
Quitéria, Martinha, Eufemia, Genebra, Germana, Basilissa, Victo-
ria e Marciana.
Cruzeiro da rua dos Pellames. — Ao fundo d'esta rua, que o
cardeal-infante D. Henrique mandou abrir sendo Arcebispo de
Braga, existe um cruzeiro que primitivamente esteve entre as ruas
do Anjo e de S. Marcos, dando origem á egreja de Santa Cruz.
Foi mandado fazer por D. Diogo de Sousa.
■
-274
Cruzeiro da praça do conde de S. Joaquim
Cruzeiro de S. Lazaro. — Está quasi contíguo á egreja d'esta
invocação e foi feito em 1 635.
Tem uma imagem de Christo morto, e a columna é dividida
em gomos salientes que se desenvolvem bastante na parte inferior
como se pôde ver da gravura que abre este capitulo.
Na base lê-se esta inscripção :
SENHOR
DAS NESSE
CIDADES
PEFORMADO a'
CVSTA DOS DEVOTOS
NO ANNO DE
1884
Inteiramente egual a este, e quiçá do mesmo auctor, existiu
outro no largo fronteiro á egreja de S. Paio da cidade de Guima-
— 270 -
rães. A camará, porém, desconhecendo o valor d'elle, vendeu-o e
acha-se agora na freguezia suburbana de Polvoreira.
Cru-eiro do Senhor da Saúde. — Mandou-o fazer o Arcebispo,
D. Diogo de Sousa collocando-se por sua ordem junto da porta
da Sé. Mais tarde removeu-se para as proximidades da capella de
S. Miguel o Anjo, hoje também removida, e d'alli para o campo das
Carvalheiras, applicando-se-lhe uma cobertura metálica suspensa
por quatro columnas. A invocação provém do oratório onde esteve,
na casa de saúde construída de madeira no local de S. João da
Ponte, por ordem de D. fr. Bartholomeu dos Martyres, para tra-
tamento de empestados no anno de 1670.
No capitel da preciosa columna tem, ao lado do escudo de D.
Diogo de Sousa as lettras lohi. •
Ainda hoje se vê na extremidade sul da ponte velha outro cru-
zeiro mais simples, feito a expensas da camará em memoria dos
serviços prestados por D. fr. Bartholomeu dos Martyres. Na base
tem, quasi de todo apagada, a inscripção seguinte :
SENDO ARCEBPO DF!
BRAGA DO. F. BERTOLA
MEV DOS MÁRTIRES
OVVE PESTE NESTACI
DADE O ANO DE ibjO E
OS EMPEDIDOS FORA TR
AZIDOS A ESTA DE VEZ A
Cruzeiro do Senhor das Anciãs, em Inflas, um pouco afastado
da egreja de S. Vicente. Foi para alli removido do local onde as
ruas dos Chãos e do Carvalhal se communicam.
A cobertura descança sobre três columnas corinthias.
Cru\eiro do Senhor da Boa Lm\. — E' uma cruz tosca que se
venera próximo do palacete Cunha Reis, entrada da rua da Cruz
de Pedra. Na frente é vestida de madeira com uma pintura de
Christo crucificado. Esta cruz assenta sobre um grande capitel co-
rinthio, cuja proveniência se ignora, e tem luz de azeite perma-
nente. Terá origem nesta cmrx de pedra o velho nome da rua ?
Cruzeiro das Palhotas. — Ao centro da rua d'este nome er-
gue-se um cruzeiro com uma imagem de Christo agonisante muito
venerada e festejada annualmente pelos moradores d'aquellessitios.
Tem uma cobertura que descança sobre quatro columnas jó-
nicas.
— 2y6 —
Em 14 de setembro de 1868 foi apeado o elegante cruzeiro do
largo de S. Francisco.
Dos campos da Vinha e de Santa Anna foram rtmovidas em
julho de ibb-j as 14 cruzes da Via-Sacra que estavam levantadas
ao longo d'aquelles largos, obtendo a Camará consentimento da
Confraria de Nossa Senhora a Branca para serem collocadas no
adro da sua egreja. Os visinhos distribuíram entre si a veneração
das referidas cruzes para cada um as illuminar e enfeitar de flores
no dia 3 de maio em que a egreja celebra a festa da Invenção da
Santa Cruz, por ser n'este dia descoberta por Santa Helena, mãe
do imperador Constantino, junto do monte Calvário onde estava
soterrada com duas mais, provavelmente as do bom e mau ladrão,
sendo necessário para a estremar, diz Theodoreto, reclamar a in-
tervenção do milagre. Collocado um cadáver sobre cada uma das
três, foi a de Jesus reconhecida porque immediatamente o morto
resuscitou quando o extenderam sobre ella.
A festa da Exaltação da Santa Cruz data do anno de 642 em
que o imperador Heraclius conduziu aos hombros, até ao monte
Calvário, a verdadeira cruz do Redemptor, a qual quatorze annos
antes fora d'alli retirada pelo rei da Pérsia Khosroés II, vencedor
de Jerusalém durante o império de Phocas.
Além das numerosas imagens de Santo António que particu-
larmente se veneram nos estabelecimentos commerciaes e indus-
triaes, com especialidade nas mercearias e nas tabernas, para que
os donos sejam felizes nos seus negócios, ha por quasi todas as
ruas das cidades e pelos caminhos públicos das freguezias ruraes
umas alminhas, espécie de nichos cavados em pedras que se en-
costam ás paredes e que teem dentro uma pintura representando
o Purgatório. N'essa pintura quasi sempre apparece um Pontífice,
um Bispo e um Monarcha de mistura com a gente do povo, allu-
são á fragilidade humana e á rectidão da Divina Justiça. E' o tes-
temunho mais frisante da crença na bemaventurança, destino das
almas purificadas, e no Inferno, cuja eternidade de penas Orige-
nes foi o primeiro a negar.
— 277—
ORAGOS DAS FREGUEZIAS DE GUIMARÃES
Santa Maria de
O Salvador de
S. JoÁo de.
S. Pedro de.
S. Thiago de .
S. Migull de.
S. Martinho de
Oliveira (cidade)
Airão
Arosa
Athaes (afanes)
Corvite
Gémeos
( Guardizella
IV." N.» das Infantas
Inhas
Mathamá
v.a N.a de Sande
Silvares
Souto
IBalazar
Briteiros
Donim
• Gandarella
Pinheiro
Tagilde
' Mosteiros do Souto
.Airão
[Brito
jCaldas
<Castellões
JGondar
I Pencello
' Ponte
ÍAzurem
Gominhães
Polvoreira
: Gandoso
Lordello
(Ronfe
, Castello (cidade)
t Caldas
jCerzedo (^ersedo)
Creix-mil (crexe-
mirj
Gonça
Paraizo
Landoso
Conde
[Gondomar
S. Martinho de. . . 'Leitões
| Sande
Figueiredo
Cidade
S. Pai j de I, Vizella
Moreira de Cóne-
gos (moraria)
S. Sebastião -Cidade
(Calvos
S. L ■'urenc j de . . Sande
(Selho
ÍFermentões
Nespereira (ncspe-
rana)
entieiros
S. Mamei e de . . . . ôldão.,
I Vermu
S. Chkutovâo de |cbitÇã°
I Selho
Santo Estevão de PTriteiros
| Urgezes
S. V.cente de....!^ascotellos
(Oleiros
S.THOMEde \£Dffi?
(Caldellas
S. Cláudio de. . . .-Barco
S.ta Ghkistina de|Cerzedello
(Longos
Santa Marimia da-Costa
S.CosMEda jLobeira (lupa-
I ria)
c n>~..-~ a~ iMezão-Frio
S. KOMAO de r, , c / j f^i
(Rendufe (randulfi)
Santa Eufemia de-Prazins
S^nto i hyrso de-Prazins
S. Clemente de ..-Sande
S. Jorge de -Selho
S. Cyp/xiano de. . .-Taboadello
S. Torquato
S. FawSTjno de. . .-Vizella
S\nta l iO-adia de-Briteiros
Abação : (ave^ani)
gnalado.
Abi e cam significa em Árabe Pae assi
> Cs
Airão : — Dava-se antigamente este nome aos ramos de pedras
preciosas com que as mulheres enfeitavam o cabello e ao penacho
dos chapéus ou capacetes dos homens.
— ,7«-
AldÃo : (aldiani) — Nasceu nesta freguezia o notável juriscon-
sulto D. Agostinho Barbosa que falleceu Bispo de Ughento.
Azurei: — Ha uma planta rosácea chamada A\ereiro, (cerasus
lusitamca) e outra gramínea Azevém, para forragem. Ha próximo
d^sta egreja parochial o velho solar dos Peixotos com uma torre
de aprimorada construcção.
Balazar: — Pinho Leal quer que seja corrupção de Valle d'A-
\ar.
.Brito: — D. Soeiro de Brito fundou alli, no reinado de D. Af-
fonso V, um mosteiro da Ordem de S. Bento.
Briteiros: (villa britteiros) — Consta que a egreja de Santa
Leocadia de Briteiros foi cathedral dos Bispos d'aquella Diocese,
extincta por effeito da invazão dos Árabes. Fora da porta ainda se
vê um tumulo que dizem ser de Wamba, religioso benedictino
pertencente á família do celebre rei Godo successor de Flávio
Recesvindo.
Fermentóes : — Fóra-montãos ou Fóra-montÕes.
Sande : — (S. Martinho) Foi mosteiro benedictino que teve por
Abbade Receswinto, poeta e orador, fallecido no dia 3 de março
de 668. Em 66o assistiu com o seu collega Wamba, de Briteiros,
ao X.° Concilio de Toledo.
Em maio de 1748 appareceu aqui sob um penedo uma talha
contendo 36o moedas de prata de D. João I.
A egreja de Santa Maria de Villa Nova de Sande teve mosteiro
de cónegos Regrantes.
'Owo *vv-t>1
Paraizo : — Denominou-se de 5- Miguel do Inferno, até que
D. fr. Bartholomeu dos Martyres lhe mudou o nome. Ainda hoje
alli ha o logar do Inferno.
Santa Maria de Silvares e Santa Maria de Athães, freguezias
celebres pela grande derrota que numa e n'outra soffreram os
castelhanos.
Villa Nova das Infantas deveria antes chamar-se dos Infantes,
pois foi dada em 1253 ao mosteiro de Santo Thyrso, por D. Mar-
tinho e D. Urraca, filhos de D. Sancho I.
Souto : — (S™ Maria) D. Gomes de Maceira fundou-lhe em
1200 um mosteiro de cónegos Regrantes.
~279 -
Souto: — (S. Salvador). D. Paio Guterres da Cunha fundou-
lhe em 1080 um mosteiro de frades Gruzios.
Tagilde: (atanagildi) — Foi fundada em 56o por Atanagildo,
rei Godo. No casal do Paço, d'esta freguezia, nasceu em 1200
S. Gonçalo da Amarante.
Caldas : — (S. Miguel) D. Affonso V de Leão e sua mãe a rai-
nha Geloira estiveram aqui no anno de 10 14, confirmando as es-
cripturas e privilégios que os frades do mosteiro de D. Mumadona
levaram áquella freguezia. (Vid. Estaco).
Longos: — (STA Christina). Sob uma lage appareceram aqui,
em maio de 1738, duas talhas cheias de moedas romanas dos im-
peradores Diocleciano, Maximiano, Maximino, Constantino, Cons-
tâncio e outros. Adquiriu-as o illustre vimaranense Thadeu Luiz
António Lopes de Carvalho.
28o
0RAG0S DAS FREGUEZIAS DE BRAGA
Santa M»ria de
O Salvador de
S. José de
S. JoÁo de
Santa Anna de.
S. Pedro de. . . .
S. Thiago de . .
/Sé (cidade)
Adaufe (ataulfu)
i Avelleda
I Ferreiros
Lamaçães
Lamas
Mire de Tibães
IPalmeira
[Panoias
Sequeira
\Sobreposta
í Arentim
iFigueirêdo
'Nogueiró
' jPedralva
Tebosa
I Trandeiras
.-S. Lazaro (cidade)
í Souto (cidade)
. ] Nogueira
(Semelhe
.-Vimieiro
IMaximinos (cidade)
Escudeiros
E'ste
' jLomar
/Merelim.
I Oliveira
(Cividade (cidade)
' | Esporões
S. Thiago de
S. Miguel de.
S. Martinho de.
S. Paio de.
S. VlC fOR
S. Loureisço de .
Santa Eulália de
S. Mamede de . . .
Santo André de. .
Santo Adrião de..
S. Julião de
Santo Este ao de
S. Vicente de. .
S. Jerowmo de. . .
Santa Licrecia
S. Bariholomeu de
Santa Cicuia de. ■
P>aião
Priscos
I Cabreiros
l Cunha
'Frossos
'■Gualtar
/Guizande
1 Morreira
l Espinho
{Dume
Arcos
Merelim
Pouzada
Parada
Ruilhe
-Cidade
\Celleirós
(Navarra
(Crespos
{Tenões
-Este
-Gondizalves
-Padim da Graça
-Passos
-Penso
-Penso
-Real
-Tadim e Fradellos
Villaça
Adaufe: — Nuno Odoris e sua mulher Adozinda Viscoi funda-
ram-lhe em 1070 um mosteiro benedictino.
Avelleda: — No tempo de Vespasiano havia na Germânia uma
prophetiza e druidiza celebre chamada Velleda.
Dume : — Em 566 fundou aqui Theodomiro, rei Suevo, um
convento benedictino, que S. Martinho dirigiu até 58o em que fal-
leceu.
Na actual egreja, construída em 1737, conserva-se o tumulo de
mármore em que S. Martinho esteve até que no anno de 1606
trasladaram os venerandos restos para a Cathedral de Braga.
N'esta freguezia viveram os romanos. Nas ruinas da antiga
egreja appareceram lapides votivas e funerárias d'aquelle grande
povo, e ainda hoje por aquelles sitios abunda a telha de rebordo e
os fragmentos de columnas e capiteis antigos.
-28l-
Esporóes : — Asperões. Em frente á nova escadaria da egreja
conserva-se a Capella da Caridade, feita em 1 638, a expensas de
dois beneméritos que lambem á distancia de quatro metros para
a frente fizeram construir uma pequena casa em que fundaram um
celleiro com o fim altamente sympathico de emprestarem aos la-
vradores d'aquel!es sitios o milho para as sementeiras, ficando es-
tes obrigados a entregal-o no S. Miguel com mais um quarto em
cada alqueire.
Na padieira da porta d'este pequeno edifício ainda se lê :
AQVI SE RECOLHERA
O PÃO DA CHARíDADE
Q ENTANTO DVRARA'
QT0 DVRAR AVERDAUE.
A POBRES O EMPRESTARÃO
P. FAZER OS SERVIÇOS.
NO S. MIGEL O TRARÃO
LIMPO SECO E SEM VÍCIOS
A VIRGEM LHES FAZ A GRAÇA
TERNA MAI DE PECADORES.
E QVE NÃO AJA. TRAPAÇA
DESSES FIEIS LAVRADORES.
E SE AVERDADE FALTOV
O QVE SE VE CLARAMETE
A CHARIDADE PASSOV
A capella tem na frente um alpendre sobre duas columnas tos-
canas, e no alto da porta estes dizeres :
ET VNDE HOC Mi Hl VT VENIAT
MATER DNI MEI ADME Lvo I .° C.
LOVVADO SEIA O SANCTISSIMO
SACRAMENTO DO ALTAR E TAMBE
A 1MMACVLADA CONCEIÇÃO DA VIR
>
GEM NOSSA SRA CONCEBIDA
SEM PECCADO ORIGINAL AVE M.a
FraiÃo: — Entr£ os Godos era nome próprio de homem.
Lomar : — Também nome próprio entre os Árabes — Al-Omar.
Palmeira : — O couto de Palmeira foi dado aos Arcebispos de
Braga em troca da rua Nova que possuíam em Lisboa (Pinho
Leal, Dicc.)
Pedralva: — Por estes sitios a pedra é bastante branca. O nome
da freguezia virá de Pedra alva? Em 26 de novembro de 1238,
el-rei D. Sancho II deu este couto ao Arcebispo D. Silvestre Go-
dinho.
— 282 —
Civídade : — Próximo d'esta egreja parochial urbana apparece-
ram, em julho de 1744, quasi 3oo moedas de ouro, romanas, de
Nero, Galba, Vitelio, Vespasiano, Tito, Domiciano, Nerva, Tra-
jano, Hadriano, Antonino Pio, Marco Aurélio, Lúcio Vero, Faus-
tina e Plautino. Um inglez comprou 200, e as restantes levaram
descaminho.
Appareceram mais, em i3 de julho de 1892, duas talhas cheias
d'estas moedas romanas soterradas na antiga rua do Coelho, que
então desappareceu com a abertura da rua Nova d'el-Rei.
Num desaterro da rua de S. Thiago, próximo da torre da
egreja, poz-se a descoberto em agosto findo um curioso mosaico
romano bastante extenso de que reuni alguns fragmentos no meu
pequeno museu.
FINIS
PRID1É KALENDAS .TANVARil
ANNO Á NATIVITATF DOMINI
MILÉSIMO NONGHNTESIMO
ÍNDICE
DAS MATÉRIAS CONTIDAS N'ESTE VOLUME
Pag.
Advertência vh
Antiguidade da crença na vida futura i
Varias opiniões acerca do nascimento de Christo 4
Fundação da egreja christã. — Copia da sentença de Pilatos i'ondemnando
Jesus á morte. — Tradição do adorno das casas com ramos e flores
no i.° de maio 5
Perseguições contra a egreja 6
Repressões rigorosas 7
O tribunal da Inquisição — Emblema do Santo Officio 8
Opposição dos Concílios ás praticas supersticiosas que os bárbaros con-
versos introduziram na egreja g
Extirpação dos feitiços — Contra o roubo de objectos sagrados 10
Theoria dos dias-periodos — A sciencia e a fé — A Bibha mal interpre-
tada— Protecção da egreja ás sciencias naturaes — O transfor-
mismo applicavel ao homem 11
Synchronismos do século I \ 3
Virgens canónicas — Virgens claustraes — Emparedadas 1 4
Synchronismos do século II — Progressos da religião— Uso da agua
benta — Missa da meia noite i5
Synchronismos do século III — Baptismo dos innocentes — Suffragios
pelos defunctos — Pr imicias 1 5
Synchronismos do século IV -Constantino restitue a paz e a liber-
dade á egreja — Lapide com inscripção 16
A alleluia durante o anno — O credo — A confissão peral na missa —
S. Damazo natural de Guimarães — Guimarães cidade no século XIV 17
Sagração das egrejas — /- s primeiras imagens nas egrejas — Ódio dos
Judeus aos Ídolos — Proscripção da idolatria — Concessão de Basí-
licas aos Bispos por Constantino — Sacerdotes de Isis e de Serâpis 18
Prohibição de serviços ao domingo e do culto das pedras — Contra as
pintura-, e esculpturas de Christo — Ordena -se que as imagens se-
jam portáteis para se poderem enterrar e esconder nas grutas »9
Origem das romarias e procissões 20
Synchronismos do século V — O Jejum e as ladainhas -ío
284
Ladarios — Antiguidade da peste bubonica — Termina a confissão publica
— Defeza do celibato dos padres — Bispos coadjutores — Cónegos
regrantes na Sé de Braça 21
Synchronismos do século VI — Observância do domingo — Diaconi-
sas— Conversão dos Suevos — Os sacerdotes obrigados ao uso de
hervas cosidas com carne — Prohibição de enterramentos nas egre-
jas — Dízimos como esmola 22
Profissão de fé dos Godos — O celibato — Sejam de mármore os alta-
res— Dominus tecum — Origem do Palio e sua descripção 2 3
Synchronismos do século IX — Leis de ódio de Abderrame H contra
os christãos — Forcas em Córdova — O Papa Formoso conde mnado
a torturas depois de morto 41
O Hispo dos meninos — Mascaradas nas egrejas 42
Synchronismos dos séculos XI e XII — Suspensão das armas — Coroa
do Papa — A tiara des ie a sua origem 1 38
Substiti ição do rito gothico pelo romano — Relíquias nos Concílios para
obstar a irreverências > . 1 3o,
Os cenobitas — Procurador do Mosteiro de Guimarães — Vida claustral
dos cónegos 140
Antiguidade da commemoração dos fieis defunctos — Descoberta das
linhas da musica — Canonisação dos santos — Esmola da missa 141
Mortificações voluntárias — Proveniência da lepra — Penitencias impos-
tas aos peccadores — Formas do matrimonio — Lei de D. Manuel
sobre o assumpto 142
O dinheiro de S Pedro— As sangrias — Protecção dum Concilio á agri-
cultura — Privilegio de cunhar moeda 144
Synchronismos dos séculos XIII e XIV — Contra os Albigenses 1 57
Determina-se que o barrete e vestes dos Cardeaes tenham a côr verme-
lha— O sacramento da Confirmação ás creanças - Termina o ban-
quete dos curas aos parochianos — A eleição dos Papas — Origem
da festa do SS. Sacramento 1 58
Instituição do Jubileu do Anno Santo — A festa da Conceição — Provín-
cia Dominicana — Órgãos nas egrejas — Sepultura do Papa João XXI
— Invenção das armas de fogo — Os clérigos principiam a ser bar-
beados 1 5g
O Arcebispo D. Martinho ordena que se pague dizimo do «parimento
das ovelhas»; do pam, do vinho, etc. — As excommunhões — Absti-
nência dos sabbados — Carta de Santo António 160
Certidões de casamentos 161
Synchronismos do século XV — A architectur>> e a esculptura 164
Instituição das Misericórdias — Os Judeus em Portugal — Clérigos pre-
guiçosos... 1 65
Cortes em Braga por D João 1 — Dia de pão por Deus — Procissões de
Compus Christi 1 bô
Synchronismos do século XVI — Fundação da egreja protestante .... 177
Agua no cálice — Pregões matrimoniaes — Registo de baptismos e d ma-
trimónios— Origem dos padrinhos — Bulia da Santa Cruzada 1 78
Adoração a Deus — Veneração aos Santos — Como devemos soccorrer
os necessitados 1 79
RESPEITANTE A BRAGA
Inscripção Wisigothica — Inhumação e incineração dos cadáveres —
Primeiras egrejas e primeiros cemitérios — Mausolo e Artemísia — As
catacumbas de Roma — A mais antiga inscripção christã da Penin-
— 285 —
Pag.
sula — Emblemas das sepulturas — Tumulo de Lgas Moniz — Cos-
tume de tosquiar a cabeça e a barba aos defunctos — Principiam os
cemitérios públicos — Decretos para a sua creação 25
S. Salvador de Montelios — El-rei Cinthilla promove que os reis antes
de occuparem o throno promettam conservara fé catholica — Onde
morre o rei ahi se elege o successor — Keprehendem-se em publico
os peccadores — Missas celebradas com leite — Iguarias nos vasos
sagrados — Bispado de Briteiros — Origem da fest i de todos os San-
tos— Presentes de Bonifácio V ao rei e á rainha de Northumbia —
Os títulos de Soberano Pontífice e de Vigário de Christo —Costume
de beijar os pès ao Papa — Sagração — Servos dos quatro dinheiros
— Servos da gleba — Institue-se a festa da Annunciação — Beberetes
nas Cathedraes, Collegiadas e Mosteiros — Decreto contra as ima-
gens— O habito talar — Origem da palavra pagão — Pena de morte
contra o uso oe vinho, ovos e leite na quaresma — Resposta de
Erasmo — Instituição da quaresma 3,4
O sino de S. Geraldo — Conservação de egrejas pelos Árabes — Bispos
e Arcebispos de Braga r 5
Egreja Cathedral de Braga — Contesta-se a vinda de S. Thiago á Pe-
nínsula e crê-se na vinda de S. Paulo — Templo de Isis — O deus
do mercado — Invasão Árabe — Porta lateral da Sé — Nave central
— Lapide de Augusto — Tumulo de cobre dourado — Pia baptismal
— Pesca no rio Este — Preciosidades do thesouro — Cálice de S. Ge-
raldo— Frontal do altar do Sacramento — Exterior da capella-mór
— O altar-mór antigo — Corpo incorrupto de D. Lourenço — Sepul-
tura de Martim de Freitas — Capella de Nossa Senhora da Gloria —
Tumulo de D. Gonçalo Pereira — Vidro antigo com pintura 63
Egreja de S. Pedro de Rates 128
Egreja e Hospital de S. Marcos — Convento dos Templários em Braga
— D. Gualdim Paes — Capella de S. Bento — Ovos que offerecem ao
Santo i33
Egreja da Misericórdia 161
Capella da Conceição ou Senhor Morto e Egreja de S. João do Sou-
to— Grupo do enterro — Palacete dos Coimbrãs 167
Egreja dos Remédios — Architecto vimaranense — Lapides romanas
da Palmatória 171
Egreja do Seminário Conciliar 173
Egreja do Populo — Quartel militar — Rua das Conegas 180
Egreja do Salvador L. 181
Egreja do Carmo — Relicário iS3
Egreja parcchial de S. Victor 1 88
Egreja dos Congregados — Bibliotheca e Lyceu tis»
Egreja de S Francisco '. iqo
Egreja de S. Vicente , . 191
Egreja de Santa Cruz 192
Egreja da Penha de França — Estatua de D. Pedro V— O celebre ra-
becão — Púlpito — Asylo de infância Desvalida 19}
Egreja parochial de Maximinos iõ5
Egreja e Recolhimento da Tamanca 198
Egreja da Conceição — Collegio de Regeneração — Muralhas romanas 198
Egreja parochial de S. Lazaro — ídolo dos Granjinhos — Asylo de en-
trevados 202
Egreja de Nossa Senhora da Lapa — A arcada — Estatua de Braga —
Pelourinho — Theatro de S. Geraldo 207
Egreja e Convento de Santa Thereza 208
— 28'J —
Pag.
Egreja de Nossa Senhora a Branca 210
Sanctuario do Bom Jesus do Monte — A inauguração do elevador —
Escadaria dos Cinco Sentidos 212
Egreja parochial da Cividade 217
Egreja de Nossa Senhora do Sàmeiro 218
Egreja e Convento de Montariol 219
Egreja e Convento de Tibães — Quadro de merecimento — Curiosa
inscripção da ponte de Prado 23 1
CAPELLAS
Capella de S. Lourenço da Ordem 23 7
Capella de Santa Martha das Cortiças — Castro Luso-Romano 237
Capella de Santa Maria Magdalena 23í5
Capella e Convento do Varatojo 2 >8
Capella de Santo Adrião da Corrica 2*9
Capella de S. João da Ponte — Festejos baptistinos — Festa do Can-
deleiro — Imagem de S. Christovão — Pinheiro da Gregoria 241
Capella de Santa Justa 244
Capella de Santo António 244
Capella de Nossa Senhora da Consolação 245
Capella de Guadelupe 24a
Capella do Cemitério 248
Capella de Santa Tecla 249
Capella do Senhor das Anciãs 249
Capella de Nossa Senhora do Pilar 25o
Capella de Nossa Senhora da Abbadia 25 1
Capella de S. Gonçalo — Recolhimento das Convertidas 25 1
Capella e Recolhimento da Caridade 253
Capella do Paço Archiepiscopal — O chafariz 25 5
Capella de Nossa Senhora da Torre 254
Capella das Almas 255
Capella de S. Victor Velho 255
Capella de S Sebastião — Monumentos romanos . . , 257
Capella dos Orphâos de S. Caetano 259
Capella de S. Miguel o Archanjo 259
Oratorio3 265
Nichos 268
Cruzeiros 270
Oragos das freguezias de Braga 280
RESPEITANTE A GUIMARÃES
Egreja de S. Miguel do Castello —Decreto elevando Guimarães a ci-
dade—Lapide da consagração á Virgem — Dogma da Conceição —
Prohibição do nome de Maria — Divergências acerca do nascimento
de D. Affonso nenriques — Padrão das Teigas — Castello de Guima-
rães Paço dos Duques de Bragança — Pórtico e Janellas — Benção
dos sinos 43
Collegiada de Guimarães — A primitiva imagem da Virgem - Brazão
dos D Priores — Sacrário e frontal de prata — Verdadeiro retrato
da Virgem —Preciosidades do thesouro (Museu)— Triptyco — Cruz
processional grande — Cruz gothica — Custodia de prata dourada —
Cálice das campainhas — Cálice de S. Torquato — Cofre de relíquias
— Capella do capitulo — O Padrão — O milagre — Alcaçaria 96
- 287 —
Pag.
Egreja de Cerzedello 1 29
Lado sul da mesma egreja 1 3 1
Egreja de S. Domingos — Arcada do claustro —Andor das candeias.. . . 145
Egreja de S. Francisco — Capella-mor — Tumulo de D. Constança de
Noronha — Capella do capitulo — Porta principal da egreja - Capa
bordada a matiz e ouro — Monumento a D. Affonso Henriques 149
Egreja da Misericórdia 162
Egreja de Santa Clara — Organisação do Seminário em Lyceu 177
Egreja de S. Damazo 184
Egreja dos Capuchos — Provisão real concedendo a pedra dos Paços
do Conde D. Henrique — Recibo curioso — Hospital da Mizericor-
dia i85
Egreja e convento das Capuchinhas 187
Egreja e convento do Carmo 187
Egreja e convento de Santa Rosa de Lima — Demolição da egreja de
S. Sebastião íoo
Basílica de S. "Fedro — Deis qua Jros de valor 20:
Egreja parochial de Santa Marinha da Costa — Interior da egreja
— Fachada do convento — Cálice de D. Dulce — Extincta Universi-
dade — Cálice do século XVI — Collegio de S. Damazo 2o3
Egreja dos Santos Passos . 209
Egreja parochial de S. Paio — Asylo de inválidos 211
Egreja de S Torquato 221
Cruz de S. Gonçalo 235
Cálice d 9 S. Salvador de Briteiros 236
. GAPELLAS
Capella de S. Lazaro 2:9
Capella de Santa Luzia 240
Capella de Nossa Senhora da Conceição 240
Capella da Madre de Deus 2 40
Capella de Nossa Senhora da Luz 241
Gruta-Ermida de Nossa Senhora da Penha — Monumento a Pio IX. 246
Capella de Nossa Senhora da Boa morte 249
Capella do Senhor Jesus 25o
Capella dos Terceiros Dominicos — Hospital da Ordem 255
Capella dos Terceiros Franciscanos — Uma esculptura de Soares dos
Reis — Sepultura de João Evangelista de Moraes Sarmento — Hos-
pital da Ordem 255
Capella de Nossa Senhora da Guia 257
Capella do extincto Cemitério 27
Capella do Recolhimento do Anjo 260
Capella de S. Chrispim 201
Capella do Cemitério da Athouguia 261
Capella do Senhor de Campellos 262
Oratórios »63
Cruzeiros 273
Oragos das freguezias de Guimarães 277
índice das gravuras
Tas?.
Templo de Diana (Évora) 3
Lapide de Constantino (Braga) 16
Inscripçâo Wisigothica (Braga) 25
Primitiva Capella de S. Fructuoso ( t raga) : 33
Interior da referida Capella 35
Egreja de S. Miguel do Castello (Guimarães) 43
Pórtico Joannino do Paço dos Duques de Bragança (Guimaiães). ...... 52
Janellas e chaminés do mesmo edifício 52
O sino de S. Geraldo (Braga) . 55
Egreja Cathedral de braga 63
Porta lateral da referida egreja 67
Nave central da referida egreja 68
Porta principal da Sé j3
Tumulo de cobre dourado (Braga) ... 75
Pia baptismal (Braga) rt6
Cálice de S. Geraldo e o respectivo cofre (Braga) ... . 79
Frontal do altar do Sacramento (fraga) £2
Exterior da capella-mór da Sé 84
Altar- mór antigo S6
Corpo incorrupto do Arcebispo D Lourenço £9
Capella de Nossa Senhora da Gloria (Braga) gi
Tumulo de D. Gonçalo Pereira (Braga) ... 94
Collegiada de Guimarães 96
Primitiva imagem de Nossa Senhora da Oliveira (Guimarães.) 102
Verdadeiro retrato da Virgem (Guimarães) 107
Triptico ou oratório de prata dourada (Guimarães) 109
Cruz processional grande (Guimarães) 1 1 3
Cruz gothica (Guimarães) 1 15
Cofre de relíquias (Cuiroarães) 119
Capella do Capitulo (Guimarães) ' 22
Milagre do Padrão (Guimarães) 125
Egreja de S. Fedro de Rates 128
Egreja de Cerzedello (Guimarães) 129
«9
— 2Q0
Pag.
Lado sul da referida egreja i3i
Egreja e Hospital de S. Marcos (Braga) i33
Egreja de S. Domingos (Guimarães) 145
Arcada do claustro de S. Domingos e andor das Candeias (Guimarães). 148
Egreja de S. Francisco (Guimarães) 149
Capei a mor da referida egreja i5i
Capella do Capitulo dos frades 1 Guimarães) i53
Porta principal da egrej a de S. Francisco (Guimarães) 1 54
Capa bordada a matiz, ouro e peJras (Guimarães) i55
Capella de Nossa Senhora da Conceição (Braga) 167
Grupo do Enterro (Braga) 170
Púlpito da egreja do Salvador (Braga) 182
Egreja de Santa Cruz (Braga) 193
Púlpito da egreja de Penha de França (Braga) . . 196
Egreja parochial da Costa (Guimarães) ío3
Interior da referida egreja 204
Fachada do Convento da Costa 204
Cálice de D. Dulce (Guimarães) 20Í
Cálice da Costa (Guimarães) 206
Egreja dos Santos Passos (Guimarães) 200
Sanctuario do Bom Jesus do Monte (Braga) 212
Vista geral do Bom Jesus 21 3
Escadaria Antiga do Sanctuario 2i5
Egreja e Convento de Montar iol (Braga) 219
Egreja de S. Torquato (Guimarães) 221
O tumulo antigo do Santo 223
Corpo incorrupto do Santo 225
Parte interior da nave em construcção 228
A parte construída da egreja 228
Cruz de S. Gonçalo (Guimarães) 235
Cálice de Briteiros (Guimarães) 236
Gruta-ermida de Nossa Senhora da Penha (Guimarães) 246
Cruzeiro de S. Lazaro (Braga) • 27o
Cruzeiro da praça do Conde de S. Joaquim (Braga) 274
>^7>^C
• 1 rfffj
• • ■ * • • *
« » • ■ ■
• • ■ ■
• ■ « i
■*••■•
#1**
• ••■AC?*
Í "»1
. • ■
• » 1
4
• • * *
::::::::: : :||f!j
í *
■ ■ >
ll«M«né!t»li!WI*!tlÉB
• ■ • * «
■ ''••'• •' • • • 8 * •" ■■■■ ■ ''■'<
■ 8 8 B • 8 «
• • a * * • •*■
■ aaaaaaaaasaaa
a a 8 a » • ar « a a a a a •
• -«.<'• • a
• « a • -» ■ •
• a m mr-m * -
• * «
• 1
1 • 8 8 a I
a.alilaaB
a 8 a a 8 8 a 1
I • * I
« n K i ';
• *■•••* ■'••■■■
■ '■*'■ ■ ■ ■ • . a ■
• • • * • * ■ ■ ».»»....
• •' ■ -ti
k ' a1' •' •
: : :
8 a a a a a
■ a
■ 0
• a « a a
. . . . .
a a a a
• •' a t
• ■ '■' *
■ • a s
a a a a
ti ■ ! 8 8
• • • ■ •
• ■ » • *
« • a m a
,a -a * • a •
• « ■ a a a
■ a a ■ * a
■ ai- a m ■ •■ -m
• a a 'a ■ • a
• »*■ ai • a •
a a a a a a
• • • • a a
a a a a * a
a a a à a •
a a. a a a
a a a a a
a a' a a *
a a ■ :-m a
8 ll»l
a a a a a
aaa mm aa a a a a ■ a a * a
aa a aa ai * a ■ a *'« aaa
, ...|* ». • •
- ■* a a
■ • « a
• • • '
■ aaa
■ aaa
aiiaaiaiiiiaiaa
aaaaaaaaaaa
a a a a a ■
a a a a
a a a • a a a
a a a a a
a ''■ a a
• • ■ •
a a a a
a a a a
a ■ a 'a a
a a a a
■ a a a
a a a a
i III li ti1 li i i > ii
. #- i ■ ai a a * a a a a a a
aaaaaaaa''iaa*t«4
• a a a a' -a
a a a ir a a
I a; a ■
;'i-;i''i/l ;l • ■•'aaaaaaaa
a a • ■• a a a a a. a a i ■ a a
«. a a • » • ■ • ■ a a a « a
a»«*saft«aaaaaaa«
a a ■ a a ■ ■ a a a> i ■uiíjímwmíí: ■ •
aa a aaa aaaaaaaaaa
aaaaaaaavaaaaaaa
i a a a a a a
mmmmmmmmm
a a * a a a a * a a a a i
aaaaaaaaaa
a a a* a a a a a a
a a a a ■ a a « a a
a a a « ■ a a » a a
a a a a a • • aaa
taaaiilaia
• a r a a ■
a ■ a a a.' « a
a a • a a a a
a a ■ a a aaa
* a a a a a a
a a a a a a a
a a a a a a1 a
a a a a i a 'a
■ • au »:"•" a;, a a
• • a a a a a a
a a a
m m- a1 a
a a a a
a •' a a
a • a a
a a
a a
ai a a
a a a a a a a
a ■
a i
■ ■
aaaaaiaiaaaaaa
■ •■aaaiiiasaai
■ aaaaaaaaaaaaa
■ a 'a ■
■ aia
• • a »
3 3125 00041 5832
• a a a