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Full text of "Archeologia christã; descripção historica de todas as egrejas, capellas, oratorios, cruzeiros e outros monumentos de Braga e Guimarães. Publicação commemorativa do jubileu universal do Anno Santo.."

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LIVttARIA    ACADÉMICA 
J.  GUEDES   DA   SILVA 

8,   R.    Mártires    da    Liberdade,    12 
PORTO  —  TELEFONE,    25988 


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ARCHEOLOGIA   CHRISTÃ 


depositado  para  os  effeitos  do  art.°  5  76 
do  Código  Civil 


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Í3 


ALBANO    BELLINO 


Areheologia  Christâ 


descripçào  histórica  de  todas  as  egrejas, 

capellas,  oratórios,  cruzeiros  e  outros  monumentos 

de  Braga  e  Guimarães 


PUBLICAÇÃO    COMMEMORATIVA 

> 

do  Jubileu  Universal  do  Anno   Santo 

illustrada  co vi  óõ  photogravuras 
dos  monumentos  religiosos  mais  notáveis 

DAS  DUAS  CIDADES  DO  MINHO 


LISBOA 

Empreza  da  Historia  de  Portugal 

Sociedade  editora 

livraria  moderna  typographia 

g5<  Rua  crfugusta,  g5        35,  Rua  Ivens,  3j 

MDCCCC 


DO   MESMO   AUCTOR 


Inscripçóes  e  Lettreiros  da  cidade  de  Braga  e  algumas  freguezias 

ruraes.  Typ.  Occidental,  Porto. 
Inscripçóes  Romanas  inéditas  de  Braga.  Typ.  Lusitana,  'Braga. 

Discurso  proferido  no  Atheneu  Commercial  de  Braga.  Imprensa 
Henriquina,  "Braga. 

Aqui  (versos).  Typ.  Silva  Caldas,  Guimarães. 

Novas  Inscripçóes  Romanas  inéditas,  de  Braga.  Typ.  Lusitana, 
"Braga. 

Cartas  sobre  epigraphia  romana.  Typ.  Lusitana,  "Braga. 

Questionário  Archeologico.  Imprensa  Henriquina,  "Braga. 

Catalogo  das  moedas  romanas,  celtiberas  e  wisigothicas,  perten- 
centes á  Sociedade  Martins  Sarmento.  Typ.  QÂ.  J.  da  Silva 
'Teixeira,  Porto. 


AO 


Instituto   de   Coimbra 


(Merece  grato 


O  Auotor 


ADVERTÊNCIA 


Descends  du  liaut  des  cieux,  auguste  verité 
Henríoiie,  cbant  i. 


o  segundo  Congresso  Internacional  de  Ar- 
cheologia  Christã,  realisado  em  Roma  desde 
17  a  25  de  abril  findo,  sob  a  presidência  de 
Mgr.  Duschene,  obtive  inesperado  incentivo 
para  dar  publicidade  a  este  meu  trabalho 
commemorativo  do  Jubileu  Universal  do 
Anno  Santo,  ultimo  do  século  xix,  procla- 
mado pelo  incomparável  Pontífice  Leão  XIII 
(Joaquim  Pécci),  o  diplomata  distincto,  o 
santo  e  sábio  Chefe  da  Egreja  Universal, 
tão  justamente  considerado  a  mais  lidima  gloria  do  Pontificado  Ro- 


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Quando  ha  annos  a  imprensa  portugueza,  sem  distincção  de 
crenças  partidárias,  o  saudava  por  mais  uma  vez  empregar  em  fa- 
vor da  fraternidade  humana  toda  a  força  moral  de  que  dispõe,  di- 
zia o  Jornal  de  Lisboa:  «Na  sua  mão  de  octogenário  brilha  o  dia- 
mante do  ar.nel  de  S.  Pedro  com  uma  intensidade  que  illumina 
todo  o  mundo  !».  E'  que  em  todo  o  mundo  os  louvores  tributados 
ao  venerando  velhinho  despertam  enthusiasmos,  mesmo  entre 
aquelles  a  quem  por  vezes  terá  repetido  as  palavras  do  seu  pre- 


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decessor  Alexandre  III  dirigidas  a  Frederico  Barbaroxa,  imperador 
da  Allemanha,  para  lhes  assegurar  que  tentam  em  vão  destruir  a 
barca  de  Pedro,  pois  não  sossobrará  ao  impulso  do  vento  rijo  que 
de  contínuo  a  persegue : 


«Niteris   in  cassum  navem  dissolvere  Petri 
Fluctuat ;  ast  nunquam  mergitur  illa  ratis». 


Nestas  breves  palavras  quero  que  fique  exarado  o  testemunho 
da  minha  admiração  pelo  actual  representante  de  Jesus  Christo 
na  terra.  • 


Para  que  geralmente  se  reconheça  a  utilidade  d'este  trabalho 
histórico,  único  no  género,  nada  mais  será  mister  que  a  sua  lei- 
tura attenta. 

Vale  muito,  muitíssimo,  a  critica  auctorisada,  imparcial  e  justa, 
por  semelhar  a  luz  que  alumia  e  não  queima ;  e  também  não  vale 
pouco  a  verrina  da  mediocridade  invejosa  que  denuncia  o  mereci- 
mento alheio  e  diverte  a  populaça  ávida  de  distracções  banaes. 
Portanto  prometto  nada  oppor  aos  desfavoráveis  conceitos  que  se 
façam  do  presente  livro,  salvo  se  houver  de  contestar  affirmações 
inexactas. 

Não  conseguirá  deleitar  pelo  aprimorado  do  estylo,  porque  á 
sua  elaboração  presidiu  especialmente  o  desejo  de  o  tornar  instru- 
ctivo  pelos  factos  e  reflexões  que  apresenta,  mas  provará  á  sacie- 
dade que  trabalhei  com  extrema  dedicação,  com  desusado  esforço 
para,  como  nos  demais  estudos  que  até  hoje  tenho  dado  á  es- 
tampa, fornecer  aos  curiosos  da  especialidade  a  citação  de  factos 
inéditos,  ou  quasi  de  todo  ignorados,  não  lhes  occultando  nem 
pervertendo  a  verdade,  que  la  perita  xe  una  so/a,  diz  o  pro- 
vérbio veneziano,  e  esta,  na  opinião  do  escriptor  inglez  Gold- 
smith,  impõe  á  Historia  o  dever  de  delinear  egualmente  o  justo  e 
o  injusto. 

Todos:  os  que  se  interessam  a  serio  pelas  cousas  do  prssado 


—   IX 


afrirmam,  e  com  razão,  que  nem  sempre  o  estudioso  de  gabinete 
lhes  conquista  o  agrado  em  seus  trabalhos  históricos,  não  obstante 
serem  estes  por  vezes  considerados  primorosos  na  forma  ;  por  isso 
eu  procuro  proporcionar-lhes  apreciáveis  elementos  de  estudo, 
apresentando  aqui  numerosas  photogravuras  dos  principaes  monu- 
mentos de  que  me  occupo  e  o  resultado  das  minhas  investigações 
que  mais  connexão  têem  com  o  assumpto. 

As  referencias  históricas  illucidativas  dos  muitos  monumentos 
sagrados  de  importância  archeologica  ou  artística — pregoeiros 
da  crença  das  gerações  extinctas  —  e  ainda  dos  séculos  a  que  cada 
um  pertence,  foram  colhidas  de  preferencia  nas  obras  dos  escri- 
ptores  catholicos  mais  considerados,  como  Josephi  Binghami  (Ori- 
gines sive  Antiquitates  Ecclesiasticae),  e  do  Abbade  Ducreux, 
cónego  da  egreja  de  Auxerre,  a  quem  Pio  VI  enviou  um  Breve 
de  approvação  á  sua  preciosa  Historia  do  Chrislianismo,  que  mais 
que  nenhuma  outra  consultei. 

D'esse  Breve,  dado  em  Roma  a  27  de  setembro  de  1775,  re- 
cortarei o  seguinte: 

«Tum  ex  ipsa  operis  fronte,  cum  ex  iisdem  tuis  litteris  perspi- 
cué  profecto  cognovimus  quam  praeclarum  consilium  tuum  fuerit 
suscipiendae  Christianorum  rerum  enarrationis,  quaque  institeris 
via,  ut  omnia  aptê  dilucidèque,  ac  ex  Historiae  legibus  nativo  co- 
lore describeres  et  quae  corrupta  ac  temerata  recentiorum  Aucto- 
rum  audácia  ac  fraude  fuerant,  ad  puríssimos  originis  fontes,  ac 
ad  veritatis  suae  speciem  revocares.» 

Norteado  por  estas  palavras  de  Pio  VI  a  propósito  da  carta  e 
plano  da  obra  de  Ducreux,  egualmente  procurei  caminho  seguro 
para  referenciar  vários  successos  com  exactidão  e  clareza,  pintal-os 
com  as  suas  cores  naturaes  e  restabelecer,  recorrendo  ás  fontes 
mais  puras,  muitas  verdades  históricas. 

Foi  este  o  único  fim  que  tive  em  vista  quando  no  decurso 
deste  meu  trabalho  citei  varias  passagens  da  Historia,  pouco  ou 
nada  edificantes.  Ninguém  de  são  critério  poderá  pôr  em  duvida 
o  bem  que  resulta  do  confronto  dos  actos  bons  e  maus  para  po- 
dermos abraçar  contentes   a   causa  da  virtude  e  da  fé,  embora 


repellindo  com  energia  abusos  e  incoherencias  de  quem  por  de- 
ver a  defende.  «Da  confusa  amalgama  de  bem  e  mal,  de  justos 
e  precitos,  sae  mais  radiosa  a  gloria  divina.» 

Os  synchronismos  que  dou  de  cada  século  tendem  a  esclare 
cer  o  leitor  sobre  algumas  occorrencias  mais  notáveis  e  sobre  o 
caracter  dominante  de  cada  epocha  para  mais  facilmente  deter- 
minar os  costumes. 

Sem  prejuiso  do  titulo  desta  obra  faço,  nos  logares  compe- 
tentes, levissima  referencia  aos  monumentos  profanos  e  a  tudo 
quanto  numa  e  noutra  cidade  possa  chamar  a  attenção  do  visitante 
curioso. 

Este  livro  deve  portanto  offerecer  vantagens  como  guia  de 
quem  se  proponha  examinar  de  perto  o  que  nos  resta  de  passa- 
das glorias. 

Interessei-me  quanto  pude  por  evitar  omissões  de  egrejas,  ca- 
pellas,  oratórios,  cruzeiros  e  outros  monumentos  de  arte  christã 
pertencentes  ás  duas  cidades  do  Minho — Braga  e  Guimarães.  De 
tudo  o  que  existe  dou  aqui  noticia  histórica  desenvolvida  e  con- 
scienciosa. 

Das  freguezias  ruraes  dos  dois  concelhos  vão  os  oragos  em 
grupos.  As  egrejas  e  capellas,  na  sua  máxima  parte,  são  destituí- 
das de  merecimento  architectonico  ou  archeologico. 


* 


Termino  com  este  os  meus  trabalhos  do  século  que  expira  e 
que  me  lega  recordações  muito  gratas:  deu-me  o  berço  risonho 
e  enflorou  quasi  continuamente  a  minha  adolescência. 

O  que  nasce  recebe-me  desde  pouco  mais  de  meado  do  quinto 
período  da  edade  adulta  e,  sem  o  mínimo  respeito  por  esta  que  é 
já  trinta  e  oito  vezes  superior  á  d'elle,  apresenta-me  a  sepultura 
para  onde,  d'aqui  a  minutos,  horas,  dias,  mezes  ou  annos,  poderei 
ser  levado,  como  diria  Victor  Hugo,  pela  onda  que  passa,  pelo 
vento  que  sopra,  pela  pedra  que  rola,  pela  hora  que  sôa. 

Embora!  Não  devo  querer-lhe  mal  por  me  notificar  o  predo- 
mínio que  tem  n^ste  enygma  —  a  vida.  E  para  que  o  porvir,  longo 


Xi 


ou  breve,  seja  para  mim  ditoso,  clamarei  com  Leão  XIII  na  sua 
bella  ode  ao  século  que  nasce: — Jesus,  arbitro  do  íuturo,  sorri 
ao  novo  curso  da  edade  que  surge  ! 


«Jesu,  futuri  temporis  arbiter, 
«Surgentis  aevis  cursibus  annue». 


Depois  forcejarei  por  continuar  a  colher  os  fructos  da  paz  da 
consciência  para  que  esta  alma,  solta  dos  laços  terrenos,  voe  ao 
seio  do  Eterno  abençoada  por  quantos  me  comprehendem  ou 
sabem  que  espero  e  confio  na  productibilidade  da  sementeira  do 
bem. 

«Quae  enim  seminaverit  homo,  haec  et  metet.» 


3i  de  dezembro  de  1900 
Remate  do  século  xix 


Albano  Bellino. 


Sc  tornar-se  christáo  pode  este  mundo 
Sem  que  milagre  houvesse  que  o  movesse, 
Não  conheço  milagre  mais  profundo 

Dante  [Trad.  do  C.  de  S.) 


Data  da  origem  da  humanidade  a  crença  na  vida  futura.  O 
homem  primitivo,  dando  largas  ao  natural  desejo  de  inves- 
tigar, progredir  e  viver  feliz,  foi  levado  a  concebel-a  pelos 
múltiplos  phenomenos  de  que  a  natureza  o  cercava,  e  os  quaes 
elle  instinctivamente  attribuia  a  um  ente  desconhecido  que  lhe 
inspirava  respeito  e  adoração.  Era  a  primeira  religião  com  seus 
mysterios,  base  de  todas  as  religoes  do  mundo ! 

N'esses  períodos  —  paleolithico  e  neolithico  —  existiu  em  pri- 
meiro logar  o  culto  fervoroso  do  sol  e  da  lua,  (soli  .  et  .  lvnae, 
ou,  como  se  lê  na  mscripção  de  Melide  (Collares) :  sou  .  aeterno 
lvnae);  o  dos  animaes,  e  ainda  o  dos  mortos  queridos  (necro 
latria),  prestando-se  a  estes  todas  as  honras  fúnebres,  e  dando- 
se-lhes  condigna  sepultura  para  que  de  modo  algum  lhes  faltasse 
o  ambicionado  repouso. 

Era  então  ponto  de  fé  que  a  sagrada  trepanação,  ante  ou  post 
mortem,  expulsava  do  enfermo  os  maus  espíritos,  a  que  se  attri- 
buia a  morte,  ou  facilitava  a  entrada  da  alma  no  corpo;  que  de- 
pois d'este  havia  um  outro  mundo  onde  os  que  partiam  encontra- 
vam uma  vida  egual  á  que  deixavam  ou  quiçá  melhor,  e  que  na 
sepultura,  junto  do  cadáver,  deviam  ser  depostas  offerendas  para 
que  o  extincto  protegesse  ou  não  vexasse  os  vivos!  As  offerendas 


—  2  — 

juntavam-se  utensílios  e  armas,  todos  os  objectos  de  que  o  morto 
mais  necessitava  para  a  continuação  do  seu  mister  n'aquelle  ou- 
tro mundo  feliz !  (Rei.  na  Lus.  por  J.  L.  de  Vasconcellos). 

Entre  as  muitas  superstições  curiosas,  que  a  idolatria  inaltera- 
velmente manteve,  encontramos  as  famílias  e  as  tribus  a  venera- 
rem, como  deuses  protectores,  as  almas  boas  dos  seus  antepas- 
sados. 

Originaria  da  Grécia,  a  religião  polytheista,  esplendorosa  no 
culto,  divertida  e  tolerante,  conquistou  sem  custo  o  agrado  do 
povo-rei,  esse  grande  povo  que  nenhum  outro  excedeu  ou  ex- 
cederá jamais  na  civilisação  material  e  na  riqueza,  como  ainda 
hoje  por  toda  a  parte  o  demonstram  numerosos  vestigios  d'esses 
tempos. 

O  Capitólio  em  Roma  e  o  Templo  de  Serapis  no  Egypto 
sobresaiam  pela  sua  magnificência  aos  demais  Templos  pagãos. 
Entre  nós  também  os  romanos,  que  no  anno  de  5i  antes  da 
nossa  era,  mais  de  dois  séculos  depois  de  entrarem  na  Hispânia, 
dominaram  a  Lusitânia,  erigiram  aos  seus  deuses  muitos  Templos 
de  que  nos  dão  noticia  authentica  as  inscripções  lapidares.  Em 
Évora  ainda  agora  podem  ser  admirados  estes  restos  venerandos 
que  em  1860  se  encontravam  profanados  por  uma  construcção 
ameiada,  assente  sobre  as  columnas  corinthias,  provavelmente 
desde  o  século  xv.  (Vide  gravura  a  pag.  3.) 

Artemidoro,  geographo  grego,  estuda  então  no  Promontório' 
Sagrado  os  costumes  religiosos  dos  bárbaros  e  os  seus  ritos  — 
Gaulezes,  Germanos  e  Celtas  —  que  os  romanos  baniram  por 
completo  depois  de  livremente  os  permittirem  aos  povos  que  con- 
quistavam. 

Os  judeus  professavam  grande  aversão  aos  Ídolos,  porque  esta 
religião  contrariava  em  absoluto  as  doutrinas  moraes  do  Antigo 
Testamento  e  todos  os  actos  do  culto  prescriptos  pelo  próprio 
Deus  verdadeiro,  os  quaes  podem  ser  encontrados  desde  o  Gé- 
nesis ao  livro  II  dos  Machabeus. 

Micheas,  o  sexto  dos  doze  prophetas  menores,  vaticinou  o  nas- 
cimento do  Messias  em  Bethlem  quando  ainda  a  religião  poly- 
theista possuía,  com  seus  altares  e  sacerdotes,  Templos  mages- 
tosos  consagrados  ás  divindades  pagãs  que  só  na  ordem  inferior 
attingiam  o  numero  de  vinte  mil,  segundo  Doêllinger,  auctor  das 
Origens  do  Christianismo. 

Isaías,  um  dos  quatro  prophetas  maiores,  predisse  que  Jesus 
nasceria  d'uma  Virgem:  «Ecce  virgo  concipiet,  et  pariet  Filium, 
et  vocabitur  nomen  ejus  Emmaniiel». 

Tudo  isto  se  realisou. 

Esse  fulgente  sol  que  despontara  alfim  n'um  pobríssimo  esta- 


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bulo  de  Bethlem,  dissipou  por  completo  as  trevas  do  paganismo  '  ; 
e  a  humanidade  soffredora  anteviu  na  vinda  do  Messias  o  termo 
de  todas  as  vexações  a  que  a  reduzira  a  fereza  dos  potentados, 
forque  n'aquelle  tempo  predominava  a  tyrannia  dos  soberanos  so- 
bre a  humildade  dos  vassallos,  a  oppressao  dos  poderosos  sobre 
os  fracos,  a  ambição  desmedida,  a  corrupção  da  virtude  e  da  jus- 
tiça, tudo  quanto  o  christianismo  condemnou,  estabelecendo  de 
vez  os  meios  conducentes  á  verdadeira  felicidade  humana. 

A  humanidade  curva-se  na  presença  do  grande  Apostolo, 
ouve-o  enlevada  pela  simplicidade  das  suas  parábolas,  pela  subli- 
midade da  sua  doutrina,  pela  bondade  da  sua  moral;  acclama-o 
propheta  e  rei;  e,  embora  alguns  homens  o  declarem  embusteiro 
e  amotinador  do  povo,  levando-o  por  isso  ao  supplicio  dos  escra- 
vos, a  mesma  humanidade  guarda  as  suas  doutrinas  em  que  en- 
contra a  objectivação  da  verdade  e  da  justiça,  e  adora  a  cruz,  onde 
vê  o  lábaro  santo  da  paz  e  do  amor  2. 


1  Affirma  Mosheim  que  os  primeiros  christãos  não  conservaram  a  memoria 
do  nascimento  de  Christo;  santificavam  apenas  a  sua  resurreição  e  a  descida 
do  Espirito  Santo  no  pentecostes.  E  de  facto  só  em  ">32  é  que  um  monge  de 
reduzida  estatura  —  Dyonisius  Exiguus,  —  pertencente  á  egreja  romana,  e  na- 
tural da  Scithia,  fixou  o  dia  s5  de  dezembro  do  anno  de  Roma  753.  Vejamos, 
porém,  como  os  differentes  auctores  divergem  n'esta  matéria. 

Clemente  de  Alexandria  dá-nos  o  Natal  em  maio  ;  Euzebio  e  Santo  Epi- 
phanio  no  dia  6  de  janeiro  de  4>.  Outros  crêem  que  no  calculo  de  Dyonisio 
Exiguo  se  commetteu  um  erro  de  4  annos,  verificado  pela  data  do  fallecimento 
de  Herodes,  conhecida  com  exactidão  chronologica,  devendo  portanto  admittir- 
se  que  Jesus  Christo  nasceu  em  749  e  morreu  aos  3b  annos  de  edade.  César 
Cantu  quer  que  a  era  vulgar  seja  contada  do  anno  "47  de  Homa,  40  da  era  Ju- 
liana, 39  do  reinado  de  Augusto,  25  depois  da  batalha  de  Accio,  35  do  reinado 
de  Herodes  na  Judéa,  sendo  cônsules  em  Roma  Caio  Antisdo  Veter  e  Decimo 
Lélio  Balbo.  Dá  portanto  um  atrazo  de  5  annos,  9  mezes  e  7  dias. 

Calmet  e  Jansens  notam  a  differença  de  3  annos  e  t>  dias.  Tertuliano  e 
Santo  Ireneu  citam  o  anno  41  do  reinado  de  Augusto.  Dannemayr  nota  uma 
differença  de  4  annos. 

Domingos  Magnan,  no  seu  Problema  de  ar.no  nativitatis  Christi,  Roma 
1772,  encontra  a  differença  de  8  annos.  Alzog  citando  S.  Lucas: 

«Anno  quinto  decimo  imperii  Tiberii  Caezaris,  procurante  Pontio  Pilato 
Judaeam,  tetrarcha  autem  Galilaerc  Herode  (Antipas),  Philippo  autem  fratre  ejus 
tetrarcha  Ituraea;  etc.  sub  principibus  sacerdotum  Anna  et  Caipha:  factum  est 
verbum  Domini  super  Joannem,  Zachariee  filium,  in  deserto.  Et  venit  in  omnem 
regionem  Jordanis,  praedicans  baptismum  poenitentiae  in  remissionem  peccato- 
rum». 

O  anno  i5  do  reinado  de  Tibério  corresponde  ao  de  750.  E  portanto  im- 
possível saber-se  hoje  ao  certo  o  dia,  mez  e  anno  em  que  nasceu  Jesus. 

2  Em  Aquilla,  cidade  Italiana,  foi  achada  no  anno  de  1820  a  sentença  de 
Poncio  Pilatos  condemnando  Jesus  Christo  á  morte.  Estava  dentro  d'um  vaso, 


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E,  com  effeito,  a  cruz  que  a  morte  do  Salvador  consagrara, 
não  tardou  a  ser  adorada  por  numerosos  fieis  que  a  faziam  repe- 
tidas vezes  com  a  mão  direita  sobre  a  testa  e  sobre  o  peito. 

Funda-se  a  Egreja  de  Jesus  Ghristo,  e  a  mythologia  pagã  foi 
desde  logo  perdendo  os  seus  melhores  seguidores.  Em  Roma  o 
christianismo  recrutou  os  primeiros  e  mais  dedicados  adeptos  en- 
tre a  multidão  enorme  dos  escravos  e  dos  opprimidos,  aos  quaes 
o  novo  culto  garantia  a  trilogia  santa: — Liberdade,  Egualdade, 
Fraternidade  — ,  a  rehabilitação,  emfim,  para  uma  vida  indepen- 
dente e  pacifica,  inteiramente  opposta  á  dos  gladiadores  que  ainda 
mesmo  nas  proximidades  da  morte  saudavam,  por  dever,  no  am- 
phitheatro  e  no  circo,  o  imperador  tyranno:  —  Ave  Ca.\ar,  mori- 
turi  te  salutant! 

Não  mais  se  impacientariam  os  que  aspiravam  d  classe  dos  li- 
bertos, horrorizados  pela  lei  Sempronia  que  prescrevia  a  punição 
de  uma  família  escrava  quando  apenas  um  dos  seus  membros 
perpetrasse  o  crime. 

Por  isso  até  ao  século  m,  em  que  a  Egreja  estabeleceu  o 
catechumenado,  a  inscripção  dos  adeptos  do  christianismo  no  res- 
pectivo catalogo  attingiu  extraordinário  desenvolvimento  pela  fa- 


encerrada  em  caixa  de  ébano,  e  é  gravada  n'uma  lamina  com  esta  inscripção  em 
hebreu : 

EGVAL   LAMINA  FOI   ENVIADA   A  CADA   TR1BV 

Conserva-se  na  capella  de  Caserta,  Bispado  de  Nápoles,  o  vaso  e  a  sen- 
tença de  que  aqui  dou  copia: 

«Ao  decimo  sétimo  anno  do  Império  de  Tibério  Cezar,  e  vigésimo  quinto 
dia  do  mez  de  março,  na  cidade  Santa  de  Jerusalém,  sendo  Annaz  e  Caifaz 
sacerdotes  e  sacrificadores  do  povo  de  Deus,  Poncio  Pilatos,  governador  da 
Baixa  Galliléa,  sentado  na  sede  presidencial  do  Pretório  condemna  a  Jesus  de 
Nazareth,  a  morrer  numa  cruz  entre  dois  ladrões,  visto  que  os  grandes  e  no- 
táveis testemunhos  do  povo  dizem  : 

I.°  Que  Jesus  é  seductor;  II.0  Que  é  sedicioso;  III.0  Que  é  inimigo  da  lei; 
IV.0  Que  se  diz  falsamente  filho  de  Deus;  V.°  Que  se  diz  falsamente  Rei  de 
Israel;  VI.0  Que  entrou  no  templo  seguido  de  grande  multidão  e  com  palmas 
na  mão.  Ordena  ao  primeiro  Centurião,  Quirilio  Cornelio,  o  conduza  ao  logar 
do  supplicio.  Prohibe  a  todas  as  pessoas,  pobres  ou  ricas,  que  impeçam  a  morte 
de  Jesus.  Assignados  como  testemunhas,  Daniel  Robani,  Phariseu,  Thomaz 
Zorobatel,  Raphael  Robani,  Capet. 

Jesus  sairá  da  cidade  de  Jerusalém  pela  porta  Struenea». 

Ha  entre  nós  uma  tradição  curiosa  que  explica  do  seguinte  modo  a  origem 
do  antigo  costume  de  se  enfeitarem  de  flores  e  ramos,  no  dia  i  °  de  maio,  as 
casas  de  habitação  :  Pilatos  e  Caifa2  tendo  sido  avisados  de  que  Jesus  se  escon- 
dia n'uma  casa  a  cuja  porta  havia  uma  giesteira  florida,  enviaram  de  noite  ao 
logar  os  soldados  da  Judéa  com  ordem  de  prenderem  o  Redemptor.  A  madru- 
gada rompeu,  e,  á  porta  de  todas  as  casas  appareceu,  por  milagre,  uma  gies- 
teria  florida  ! 


cilidade  da  operação  que  apenas  consistia  no  baptismo  a  que 
se  procedia  em  virtude  de  testemunharem  publicamente  as  suas 
crenças.  Para  este  e  outros  fins  as  reuniões  tinham  logar  nas  ca- 
tacumbas onde  se  julgavam  a  coberto  da  perseguição  inimiga. 

Todavia  a  nova  religião  do  crucificado  teve  de  luctar  com  os 
poderosos  elementos  da  civilisação  antiga  e  com  os  preconceitos 
da  religião  preponderante. 

Se  exceptuarmos  Gallieno  (253-268)  que  permittiu  por  um  edito 
o  livre  exercício  da  religião  aos  christãos,  entregando-lhes  as  egre- 
jas  e  cemitérios,  pôde  dizer-se  que  até  ao  reinado  de  Constantino 
Magno  o  fogo  da  perseguição  não  se  extinguiu  uma  vez  única, 
embora  o  imperador  Alexandre  Severo,  assassinado  por  Maxi- 
mino, e  depois  d'elle  Filippe,  o  Árabe,  se  lhes  mostrassem  extre- 
mamente benévolos.  Os  seus  actos  criminosos  e  a  adhesão  ao  rito 
gentílico,  não  abonam  o  qualificativo  de  christão  que  a  Chronica 
de  Eu\ebio  dispensa  principalmente  a  Filippe,  o  Árabe,  julgando-o 
o  primeiro  de  todos:  «Philippus  primus  omnium  ex  romanis  impe- 
ratoribus  christianus  fuit » . 

E  certo  que  o  christianismo  dilatou  o  seu  império  desde  o  fim 
do  reinado  de  Septimio  Severo  (anno  de  211)  até  esta  data;  mas 
nem  por  isso  se  pôde  crer  que  os  imperadores  Caracalla  e  Geta, 
Macrino,  e  Heliogabalo,  concorressem  voluntariamente  para  os  pro- 
gressos da  Egreja.  Os  christãos  aproveitavam,  como  lhes  cumpria, 
esses  períodos  de  tempo  que  os  imperadores  destinavam  á  defeza 
dos  interesses  mais  caros;  mas,  fechado  que  fosse  o  Templo  de 
Jano,  os  furores  da  perseguição  recrudesciam  a  ponto  de  se 
exigir  a  renovação  do  edito  de  Septimio  para  que  as  egrejas  fos- 
sem immediatamente  fechadas  e  destruídas.  Não  esfriavam,  po- 
rém, os  perseguidos  e  caminhavam  cada  vez  mais  alentados  pela 
fé  na  defeza  do  ideal  sublime.  Oh!  se  a  Egreja  não  fora  uma  ins- 
tituição divina  e  se  a  promessa  de  Jesus  Christo  «...  et  portae 
inferi  rion  pratvalebunt  adpersus  eam»  pudesse  oíferecer  duvida, 
as  luctas  quasi  sem  tréguas  dos  christãos  com  as  diíferentes  seitas 
nos  primeiros  séculos  e  ainda  nos  subsequentes,  a  simonia,  a  in- 
continência, os  desatinos  emfim  d'aquelles  a  quem  foi  confiada 
a  defeza  de  quanto  interessa  ao  Dogma  e  á  Moral,  todas  essas 
innumeraveis  desgraças  teriam  ha  muito  promovido  a  ruina  do 
grandioso  edifício  que,  a  despeito  das  perseguições  continuas,  já 
transpoz  incólume  a  longa  serie  de  mil  e  novecentos  annos. 

Com  effeito,  não  somente  os  perseguidores  da  Egreja  tenta- 
vam destruil-a;  muitas  vezes  os  mesmos,  que  deviam  contribuir 
para  a  preservar  de  desordens  disciplinares,  eram,  pelos  esforços 
que  empregavam  para  a  destruir,  argumento  seguro  da  origem 
divina  da  instituição  de  Jesus  e  a  prova  provada  da  indefectibili- 
dade  d'aquellas  palavras  —  non  vraevalebunt. 


A  historia  é  e  deve  ser  a  narração  fiel  dos  factos,  não  uma 
descripção  apaixonada  em  que  predominem  as  intenções  reserva- 
das. É  por  isso  forçoso  dizer-se  que  empregar  meios  illicitos  para 
se  levar  a  eífeito  a  eleição  do  Papa  João  XII  aos  dezoito  annos 
de  edade  e  a  de  Bento  IX  aos  doze,  é  descurar  intencionalmente 
o  bom  governo  da  Egreja,  ou  antes,  contribuir  para  o  augmento 
dos  seus  revezes,  que  já  então  (955  e  io33)  não  eram  poucos  nem 
pequenos.  As  leis  ecclesiasticas,  não  prevendo  os  desastrados  effei- 
tos  de  algumas  determinações,  auctorizaram  meios  de  averiguação 
e  repressão  que  accusavam  restos  bem  evidentes  da  tyrannia  pagã. 
Outra  cousa  não  eram  os  Ensaios,  que  consistiam  em  levar  aos  lo- 
gares  celebres,  pelos  milagres,  o  accusado  sem  prova  testemunhal, 
para  alli  prestar  seu  juramento;  em  conhecer  pelo  duello  de  que 
lado  estava  a  justiça;  em  tomar  na  mão  um  ou  mais  ferros  em 
braza  e  leval-os  até  certa  distancia;  em  lançar  a  uma  tina  cheia 
de  agua  fria  o  individuo,  completamente  nú,  com  os  pés  e  as  mãos 
atados,  reconhecendo-se-lhe  a  innocencia  no  caso  de  ir  ao  fundo; 
e  finalmente  em  conservar-se  o  accusado  de  joelhos  deante  de  uma 
cruz,  com  os  braços  estendidos,  emquanto  se  celebrava  o  oíficio 
divino  ou  a  resa  do  Psalterio. 

Estes  Ensaios  também  se  denominavam  Jui^o  de  Deus,  pela 
confiança  que  os  julgadores  depositavam  no  esclarecimento  da  ver- 
dade e  da  justiça  por  intervenção  dos  milagres.  Felizmente  o  Papa 
Honório  III  condemnou  e  prohibiu  esta  pratica  originaria  duma 
lei  wisigotica. 

No  século  xiii  exerceu-se  a  repressão  com  um  rigor  de  tal  or- 
dem, que  os  inimigos  da  Egreja  encontraram  n'essa  medida  uma 
arma  de  combate  da  qual  jamais  largam  mão.  Abalisados  escri- 
ptores  catholicos  procuram  justificar  o  estabelecimento  do  Tribunal 
da  Inquisição,  demonstrando  a  necessidade  de  então  se  recorrer 
a  um  remédio  enérgico  para  ser  applicado  aos  grandes  males  da 
epocha,  por  isso  que  se  julgava  inefficaz  o  esbulhamento  dos  do- 
mínios dos  soberanos,  protectores  dos  Albigenses,  o  incêndio  das 
cidades  mais  notáveis  e  o  assassinato  dos  habitantes  d'estas  ! 

Como  é  sabido,  estas  medidas  rigorosas  tiveram  o  seu  inicio 
no  terceiro  Concilio  geral  de  Latrão,  em  1 179,  devendo-se  ao  Papa 
Innocencio  III  a  idéa  da  instituição  do  Tribunal,  em  que  os  Com- 
missarios  tinham  por  encargo  descobrir  os  herejes  «segundo  a  fama 
publica  e  denuncias  particulares»,  para  obrigar  os  infiéis  a  receber 
o  baptismo  e  os  herejes  ao  regresso  á  Egreja!  Estes  actos  violentos 
de  desenterrar  os  herejes  sepultados  em  sagrado,  de  lançar  os  vi- 
vos ao  fogo,  etc,  provocaram  a  consternação  e  a  revolta,  a  ponto 
de  serem  assassinados  entre  as  maldições  do  povo  os  inquisidores 
e  immediatamente  suspensa  a  Inquisição. 

O  poder  civil   que,  por  permissão  dos  Papas,  se  ingeria  em 


—  8  — 

assumptos  disciplinares  da  Egreja,  teve  também  grande  quinhão 
nas  responsabilidades  d'estas  scenas  de  tristíssima  memoria. 

O  Papa  Lúcio  III,  que  em  1 184  presidiu  ao  Concilio  de  Verona, 
reuniu  n'aquella  assembleia  os  dois  poderes,  ecclesiastico  e  civil, 
para  accordarem  no  modo  de  ser  fundado  o  Tribunal  da  Inqui- 
sição. 

Annos  depois  pedia-se  o  restabelecimento  da  antiquíssima  lei 
hespanhola,  creada  para  a  extirpação  do  arianismo,  a  qual  no 
Fuero-Real,  liv.  4,  tit.  i.°,  diz:  «Firmemente  prohibimos  que  ho- 
mem nenhum  se  faça  hereje,  nem  tenha  a  ousadia  de  receber, 
nem  defender,  nem  encobrir  hereje  nenhum,  de  qualquer  heresia 
que  seja;  mas  a  qualquer  hora  que  saiba  que  alguém  é  hereje,  o 
laça  logo  saber  ao  bispo  da  terra,  ou  aos  que  as  suas  vezes  fize- 
rem, e  ás  justiças  dos  logares,  e  todos  sejam  obrigados  a  prendel-os 
e  a  arrecadal-os  :  e  que  os  bispos  e  prelados  da  Egreja  os  julguem 
por  herejes,  aos  quaes  queimem  se  não  quizerem  tornar  á  f é  e 
fazer  o  mandamento  da  Santa  Egreja».  (Hist.  Verd.  da  Inq.  por 
D.  Francisco  Xavier  G.  Rodrigues,  pag.  3i8). 

O  Tribunal  foi  primeiramente  fundado  em  Languedoc  e  na 
Hespanha,  onde  os  Albigenses  e  Valdenses  fizeram  a  sua  appari- 
ção  e  progrediram  assombrosamente  no  fim  do  século  xu,  espa- 
lhando por  todas  as  povoações  principaes  a  sua  seita,  composta  de 
duas  ordens  bem  diíferentes,  exactamente  como  a  dos  Manicheos. 
Uma  occupava-se  da  vida  contemplativa,  com  seus  erros  sobre  a 
Eucharistia  e  a  Penitencia;  outra,  pelo  contrario,  mantinha  a  liber- 
tinagem e  o  vicio,  pretextando  a  sua  opposição  aos  desígnios  do 
mau  principio,  Auctor  das  cousas  creadas,  para  dirigir  ultrages  á 
Natureza. 

O  Bispo  de  Lisboa,  Agapito,  foi  encarregado,  por  Bulia  de 
Gregório  XI,  datada  de  17  de  janeiro  de  1376,  de  nomear  «por 
esta  só  vez»  um  inquisidor  Franciscano,  cabendo  a  sorte  a  Frei 
Martim  Vasques.  Exerceu  a  judicatura  inquisitorial  (Inquisidor  ge- 
ral do  Reino),  desde  1 539  a  1578,  o  Cardeal  Infante  D.  Henrique. 
Arcebispo  de  Braga,  tendo  então  22  annos  de  edade.  O  Tribunal 
foi  estabelecido  por  elle  na  cidade  de  Coimbra,  exercendo  depois 
o  mesmo  cargo  o  licenceado  em  direito  canónico  D.  António  Dias 
Cardoso,  cónego  da  Sé  de  Braga1. 


1  O  escudo  ou  emblema  do  Santo  Officio  tinha  ao  centro  uma  cruz  verde 
sobre  campo  escuro,  e  aos  lado*  o  ramo  de  oliveira,  symbolo  de  paz,  e  a  es- 
pada da  Justiça.  Na  orla  o  versículo:  Exurge,  Domine,  et  judica  causam  tuattt 
(Levanta-te,  Senhor,  e  julga  a  tua  causa).  A  Inquisição  accrescentou-lhe :  me- 
mor  esto  improperiorum  tuorum,  eorum  qui  ob  insipiente  sunt  tota  die  (tem  pre- 
sente os  teus  ultrajes,  ultrajes  que  te  fazem  de  continuo  uma  gente  insensata). 


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Os  Albigenses  obstinados  eram  entregues  á  Inquisição  e  á  Cru- 
zada, que  então  se  publicou  em  Roma  contra  a  terrível  seita,  ex- 
terminando-se  de  vez,  ao  cabo  de  20  annos  de  lucta,  pouco  depois 
de  se  descobrir  o  meio  de  os  queimar  aos  centos. 

Aos  excessos  da  Inquisição  talvez  fosse  preferível  a  adopção 
de  meios  persuasivos,  tão  consentâneos  á  índole  do  Evangelho  e 
ao  conceito  de  S.  Thomaz  de  Aquino  que  julgava  a  Fé  «ao  mes- 
mo tempo  dom  de  Deus  e  etfeito  da  persuasão».  Era  a  lição  da 
philosophia  nominalista  fundada  no  principio  de  que  a  fé  não  passa 
de  uma  simples  opinião,  quando  não  seja  apoiada  na  razão.  Elle, 
o  celebrado  Anjo  das  escholas,  dizia  como  Santo  Agostinho  «que 
ninguém  pôde  crer  sem  querer,  que  a  vontade  não  se  pôde  cons- 
tranger, que  a  instrucção  é  o  único  caminho  que  conduz  segu- 
ramente á  convicção,  e  que  de  nada  vale  a  profissão  exterior  do 
Christianismo  quando  a  Fé  não  domina  egualmente  o  espirito  c 
o  coração». 

Os  bárbaros  ignorantes  e  grosseiros  do  século  vil,  que  depois 
da  sua  conversão  pela  pregação  dos  missionários  desempenhavam, 
por  condescendência  dos  christãos,  os  cargos  espirituaes  mais  ele- 
vados, não  cessaram  de  enfraquecer,  com  os  vestígios  das  suas 
crenças  passadas,  a  religião  de  Jesus. 

Adalberto,  por  exemplo,  obteve  a  incorporação  de  alguns  Bis- 
pos na  sua  classe,  captando  a  sympathia  do  povo  supetsticioso, 
mormente  do  sexo  feminino,  que  em  grande  massa  o  seguia  jul- 
gando-o  um  segundo  Ghristo.  Elle  apregoou-se  santificado  e,  como 
S.  João  Baptista, purificado  por  Deus  no  ventre  maternal;  que  um 
anjo  lhe  havia  trazido  relíquias  maravilhosas  para  operar  prodí- 
gios, obtendo  de  Deus  quanto  desejasse.  Distribuía  as  unhas  e  o 
cabello,  como  relíquias,  por  todos  os  que  o  seguiam.  Só  a  elle 
próprio  consagrava  oratórios  e  altares,  o  que  deu  logar  ao  aban- 
dono dos  templos,  porque  os  fanáticos  preferiam  adorar  as  cruzes 
que  Adalberto  levantava  nos  campos,  nas  estradas  e  nas  proximi- 
dades das  fontes.  Aos  penitentes  affirmava,  na  confissão,  que  co- 
nhecia todos  os  seus  peccados,  não  lhe  escapando  os  mais  occultos 
pensamentos.  Os  Concilios  baldadamente  procuravam  destruir  as 
praticas  supersticiosas  que  os  bárbaros  introduziram  na  Egreja. 
Adivinhações  e  agouros  como  os  do  paganismo  romano,  cujos 
Arúspices  (ab  aris  inspiciendis),  inspeccionando  as  entranhas  das 
victimas-,  e  os  Augures  vendo  a  forma  como  os  frangos  sagrados 
comiam  e  observando  o  voo  e  o  canto  das  aves  (civis  et  inspicio) 
conjecturavam  o  futuro ;  tudo  lhes  merecia  credito. 

Aplacavam  os  Manes  immolando  victimas  sobre  os  túmulos, 
e  as  festas  eram  por  elles  celebradas  com  a  degolação  dos  ani- 
maes  em  honra  de  qualquer  santo,  próximo  das  egrejas  ou  orató- 
rios da  sua  invocação.  Estes  restos  do  paganismo  persistiram  du- 


10 


rante  séculos  na  egreja  enrista,  e  ainda  hoje  o  nosso  povo  mais 
crente  commette  desacatos  religiosos  que  seria  necessário  repri- 
mir, se  a  intenção  não  fosse,  como  é,  digna  dos  maiores  respeitos. 
O  que  fica  exposto  acerca  dos  bárbaros  conversos  explica  em 
parte  o  aforismo  frequentemente  applicado  pelo  nosso  povo :  — 
nunca  de  mouro  bom  christão. 


#         * 


Eu  creio  que  os  melhores  e  mais  importantes  serviços  presta- 
dos pela  Inquisição  á  Egreja  consistem  na  extirpação  dos  feitiços, 
malefícios,  encantamentos,  sortilégios,  necromancias,  e  de  toda 
essa  horda  de  fanáticos  e  forjadores  de  milagres,  que  desde  o  sé- 
culo ii  tão  graves  embaraços  crearam  aos  progressos  da  religião 
christã.  Já  o  Antigo  Testamento  e  leis  civis  d'aquelle  tempo  com- 
minavam  contra  elles  penas  graves.  Os  embustes  da  freira  Maria 
da  Visitação,  dominicana  de  Évora,  que  apresentava,  como  sendo 
abertas  milagrosamente,  as  numerosas  chagas  do  seu  corpo,  não 
foram  tolerados,  e  a  embusteira  teve  de  confessar  que  as  abria 
propositadamente. 

Os  benzedores  e  feiticeiros  que  faziam  vigílias  nas  egrejas  fi- 
cavam sujeitos  á  pena  da  marcação  na  testa  com  dois  FF,  unidos, 
á  similhança  do  que  determinavam  as  leis  de  22  de  março  de  1449, 
e  26  de  fevereiro  de  i523,  mandando  a  primeira  ferrar  nas  faces 
e  a  segunda  marcar  com  um  L  na  espádua  os  ladrões  de  Lisboa, 
e  com  um  P  os  do  Porto.  As  leis  antigas  também  applicavam  aos 
roubadores  dos  objectos  sagrados  que  se  guardavam  nos  templos 
a  pena  de  orelha  cortada  ou  fendida.  S.  Luiz,  rei  de  França,  or- 
denou «que  todo  e  qualquer  ladrão,  pela  primeira  vez,  fosse  des- 
orelhado;  pela  segunda,  lhe  cortassem  um  pé  e  pela  terceira  o 
enforcassem». 


* 


Discute-se  e  apregoa-se  a  incompatibilidade  da  sciencia  com  a 
religião  de  Jesus,  aflfirmando-se  que  esta  combate  pelo  obscuran- 
tismo e  pelo  retrocesso,  negando  a  sua  approvação  ao  resultado 
das  modernas  investigações  scientificas  em  que  a  intelligencia  do 
homem  por  vezes  se  tem  affirmado  dum  modo  verdadeiramente 
assombroso!  Mas  a  verdade  é  que  a  religião  christã  não  se  res- 
ponsabilisa  pelos  actos  d'aquelles  que  ainda  agora  se  julgam  no 
período  quinhentista. 

A  Egreja  não  repugna  de  forma  alguma  o  esclarecimento  da 
verdade,  desde  que  aos  novos  descobrimentos  da  sciencia  não  falte 
absoluto  rigor  histórico.  Por  exemplo,  não  é  dogma  de  fé  a  data 


1 1 


do  começo  do  mundo,  porque  não  ha  no  Génesis  referencia  á  edade 
da  espécie  humana;  por  isso  já  hoje  a  Egreja  condescende  com  os 
que  affirmam  que  existia  ha  muitos  milhares  de  annos  quando  Je- 
sus Christo  nasceu,  e  que  os  dias  da  creação  do  mundo  não  re- 
presentam realmente  o  período  actual  de  vinte  e  quatro  horas. 

Desde  Cuvier,  que  em  1821  defendeu  a  theoria  dos  dias-periodos 
referindo-se  aos  seis  que  Deus  gastou  para  crear  o  mundo,  assim 
se  interpreta  com  a  approvação  dos  theologos  essa  palavra  dia, 
embora  não  tenha  sido  possível  até  hoje  determinar  a  duração 
exacta  de  cada  um  dos  períodos.  Não  ha  pois  antinomia  entre  a 
sciencia  com  provas  e  a  fé  catholica,  porque  Deus,  considerado  a 
própria  Verdade,  é  auctor  d'uma  e  cToutra,  e  a  crença  glorifka-se 
com  os  voos  da  intelligencia  humana  por  effeito  da  liberdade  de 
investigação  de  que  a  sciencia  não  prescinde.  Assim  o  compre- 
hende  uma  grande  parte  do  clero  iílustrado  que  devotadamente  se 
dedica  aos  estudos  pre-historicos.  O  Bispo  de  Châlons-sur-Marne, 
monsenhor  Meignan,  os  padres  Delaunay,  Bourgeois  e  Lambert 
affirmam  que  existe  a  concordância  das  novas  descobertas  pre- 
historicas  com  o  livro  de  Movsés. 

Muito  respeitado  dos  catholicos  era  Chabos,  notável  homem 
de  sciencia,  fallecido  na  França  em  outubro  de  i88q,  o  qual  pro- 
curou provar  que  o  homem  appareceu  sobre  a  terra  ha  dez  mil 
annos,  ou  sejam  mais  quatro  mil  do  que  os  que  até  hoje  nos  da- 
vam os  chronologistas  que  interpretaram  erradamente  a  Biblia.  A 
geologia  e  a  paleontologia  têem  auxiliado  os  archeologos  na  clas- 
sificação das  ossadas  humanas  encontradas  de  mistura  com  obje- 
ctos de  uso  domestico,  nos  terrenos  quaternários  antediluvianos, 
bem  conservados  pelos  saes  calcareos. 

Depois  do  século  vm,  em  que  teve  principio  a  philosophia 
escholastica,  encontraremos  o  Papa  Silvestre  II  a  estabelecer,  no 
século  x,  o  ensino  da  geographia,  mathematica  e  astronomia,  es- 
crevendo para  esse  rim  alguns  tratados.  Aqui  temos  nós  uma  prova 
da  protecção  da  Egreja  ás  sciencias  naturaes. 

Ouçamos  agora  o  padre  Arduin  quando  diz:  «estou  longe  de 
partilhar  do  receio  dos  sábios  que  julgam  encontrar  no  Génesis  a 
doutrina  da  fixidez  das  espécies». 

Outros  auctores  de  renome  julgam  o  transformismo  applicavel 
ao  homem,  sem  prejuízo  da  revelação.  O  padre  dr.  Maisonneuve, 
d'Angers,  declara  que  as  idéas  evolucionistas  não  estão  condem- 
nadas  pela  Biblia» ;  e  Santo  Agostinho  (De  Genesi,  L.  VI)  accres- 
centa  que  «no  acto  da  creação  deu  Deus  aos  elementos  as  razões 
causaes,  em  virtude  das  quaes  se  desenvolveram  mais  tarde  os 
diversos  phenomenos  da  matéria  inorgânica  e  da  vida  orgânica». 

O  desenvolvimento  da  anthropologia  mereceu  a  Nadaillac  estas 
palavras:  «Não  pôde  suppor-se  que  o  Creador,  ao  principiar  a  sua 


—  12 


obra,  dotasse  alguns  seres,  sahidos  de  suas  mãos,  d'um  poder  mo- 
dificador, de  plasticidade,  como  lhe  chamou  Gaudry?...  Esta 
concepção  parece  ser  mais  religiosa,  se  assim  o  posso  dizer,  do 
que  suppor  o  Omnipotente  ac  proceder  por  creações  bruscas 
e  successivas,  retocando  e  modificando  a  sua  obra  atravez  do 
tempo  e  do  espaço,  como  o  oleiro  amassa  a  argilla  e  forma  o  con- 
orno  da  estatua»!  (Cons.  sobre  a  missão  do  padre,  pelo  bacharel 
tem  theologia  Joaquim  Luiz  da  Assumpção.) 


SYNCHRONISMOS   DO   SÉCULO   I 


A  Egreja  de  Jesus  Christo  teve  principio  com  a  instrucção 
que  elle  próprio  ministrara  durante  quarenta  dias,  depois  da  sua 
ressurreição,  aos  Apóstolos  *  e  Discípulos,  acerca  do  governo 
d'ella,  dos  sacramentos,  doutrina  e  cultos;  com  a  descida  das 
cento  e  vinte  línguas  de  fogo  ás  9  horas  da  manha  do  dia  de 
Pentecostes  (dia  5o),  symbolisando  o  espirito,  a  luz  e  a  caridade; 
com  os  três  mil  ouvintes  das  pregações  de  S.  Pedro  que  abraça- 
ram contentes  a  f é  e  o  baptismo;  com  os  cinco  mil  judeus  con- 
versos pelo  milagre  da  cura  d'um  coxo  á  porta  do  Templo;  com 
os  milagres  da  morte  dos  cônjuges  Annanias  e  Saphira,  da  som- 
bra de  S.  Pedro  e  da  roupa  branca  de  S.  Paulo,  prodígios  estes 
que  tanto  assombro  causaram  aos  herejes  Simão,  Himeneo,  Ebion, 
Menandro  e  Cerintho,  philosopho  judeu,  natural  de  Antiochia, 
que  primeiro  aggrediu  a  divindade  de  Jesus. 

S.  Lucas  escreveu  o  livro  sagrado  —  Actos  dos  Apóstolos — , 
trinta  annos  depois  da  ascenção  de  Christo;  e  em  42  estabeleceu 
em  Roma  a  sua  cadeira  o  glorioso  filho  de  Bethsaida  que  o  Ho- 
mem-Deus  constituiu  cabeça  visivel  da  sua  egreja. 

Pregou  Jesus  a  egualdade,  a  fraternidade  e  o  amor  para  que 
os  costumes  dos  povos  se  humanisassem;  e  d'ahi  nasceu  a  com- 
miseração  dos  ricos  para  com  os  pobres  manifestada  por  occasião 
das  solemnidades  nas  egrejas  em  que  havia  permanente  a  Me%a 
do  Senhor.  Alli,  e  outras  vezes  nos  adros,  os  abastados  e  os  mí- 
seros realisavam  conjunctamente,  a  expensas  dos  primeiros,  seus 
banquetes  em  honra  do  Salvador. 


1  Apóstolos,  entre  os  Hebreus,  eram  os  cobradores  das  contribuições  para 
reparos  do  Templo,  os  quaes  ao  mesmo  tempo  zelavam  a  observância  da  lei 
de  Moysés.  S.  Paulo  disse  que  era  Apostolo  «não  instituído  pelos  homens,  mas 
sim  por  Jesus  Christo». 


—  i4  — 

No  anno  de  5i,  segundo  diz  Fleury,  celebrou-se  em  Jerusalém 
o  primeiro  Concilio  (Jerosotymitanum)  para  serem  desobrigados, 
da  circumcisão  e  das  cerimonias  das  Leis  de  Moysés,  os  gentios 
que  acceitavam  o  Evangelho.  Ainda  hoje  os  principes  da  Egreja 
precedem  de  uma  cruz  o  seu  nome,  como  era  de  uso  na  assigna- 
tura  dos  Concilios.  Até  á  data  da  publicação  do  Código  Civil 
Portuguez  as  pessoas  que  não  sabiam  escrever  traçavam  com 
a  penna  uma  cruz  no  encerramento  dos  documentos  públicos  a 
que  assistiam  como  testemunhas,  valendo  qual  se  fora  o  verda- 
deiro nome,  pois  aquelle  signal  feito  pelo  próprio,  era  tido  como 
um  juramento  solemne.  Este  signal  fazia-se  no  meio  do  nome  que 
outro  escrevia,  v.  g. : — De  José  >b  da  Silva. 

Neste  século  apparece-nos  um  grande  numero  de  virgens  que 
se  consagram  a  Deus  (Sanctimonialis  fcemtna,  quce  Deo,  cònti- 
nenticc,  et  integritatis  votum  vovit);  intitulavam-se  Virgo-Dei,  e 
Deo-vota,  usavam  trajes  modestos  e  viviam  na  companhia  dos 
pães.  Os  seus  nomes  estavam  inscriptos  nos  livros  da  egreja  para 
que  do  património  d'esta  fossem  soccorridas  quando  carecessem 
dos  meios  de  subsistência,  e  eram  por  isso  denominadas  Virgem 
canónicas. 

Frequentes  vezes  os  pães  as  offereciam  a  Deus,  por  devoção, 
em  tenra  edade.  As  muitas  lapides  funerárias  conhecidas  em  Por- 
tugal com  a  designação  Famula  Dei,  —  Famula  Christi — Anedia 
Christi — Ancilla  Dei,  dão  testemunho  seguro  da  propagação  des- 
tas virgens. 

No  século  iv  os  povos  bárbaros  guerrearam  e  quasi  de  todo 
extinguiram  a  instituição  das  virgens  claustraes,  que  era  composta 
das  do  século  primeiro;  mas  foram  indubitavelmente  restauradas, 
porque  no  primeiro  quartel  do  século  x,  D.  Flammula,  sobrinha 
da  condessa  D.  Mumadona,  principiou  assim  o  testamento  em  que 
ordenou  que  a  conduzissem,  doente  como  estava,  da  sua  villa  de 
Lalim  ao  Mosteiro  de  Guimarães:  In  Nomine  Domini  Flammula 
Deo -Vota,  etc. 

A  mesma  condessa  D.  Mumadona  e  sua  filha  Oneca  também 
usavam  do  referido  titulo  quando  esta  resolveu  consorciar-se  com 
Guterres  Rodrigues,  não  sendo  já  então,  como  primitivamente, 
julgadas  incestuosas  e  adultevinas  estas  uniões  conjugaes  que  os 
Concilios  excommungaram. 

A  decadência  manifestava-se  no  uso  frequente  do  titulo  Deo- 
Vota  por  solteiras,  casadas  e  viuvas,  vivendo  cada  uma  em  suas 
casas.  Desde  o  século  xu  ao  xv  houve  em  Lisboa,  Porto,  Gui- 
marães, Braga,  Santarém,  Coimbra  e  outras  localidades  do  reino, 
algumas  mulheres  que,  por  desgostos  da  vida,  se  recolhiam  a  uma 
pequena  cella,  cuja  porta  era  acto  continuo  fechada  a  pedra  c 
cal  para  não  mais  tornar  a  ser  aberta  emquanto  a  recolhida  vi- 


ID 


vesse!  Os  alimentos,  que  de  ordinário  não  passavam  de  caldo  e 
pão,  eram  ministrados  por  uma  fresta  rasgada  na  referida  porta, 
assim  como  a  confissão  e  a  communhão.  Chamavam-se,  por  isso, 
Emparedadas.  Ao  cabido  da  Sé  de  Lamego  deixou  Margarida  Af- 
fonso,  emparedada  no  claustro  d'aquella  cathedral  e  fallecida  no 
anno  de  1419,  um  cálice  e  uma  bacia  de  prata. 

Durou  quatro  annos  a  perseguição  iniciada  em  64  por  Nero 
contra  os  cnristãos.  A  de  Domiciano,  iniciada  em  92,  terminou  ao 
cabo  de  egual  tempo. 


SYNCHRON1SMOS   DO   SÉCULO   II 

Não  obstante  a  insistente  punição  dos  christãos,  ordenada  por 
Marco  Aurélio,  imperador  de  Roma,  e  a  guerra  dos  Valentinia- 
nos,  Marcionitas,  Encrutitas  e  Montanistas  que  dezejavam  conci- 
liar as  opiniões  philosophicas  com  as  verdades  christãs,  a  religião 
de  Jesus  progride  dum  modo  admirável ! 

No  anno  de  120  estabelece-se  o  uso  da  agua  benta  que  já  no 
Antigo  Testamento  era  um  rito  destinado  á  purificação;  e  lança-se 
em  pias  collocadas  á  entrada  das  egrejas  para  os  fies  humedece- 
rem os  dedos,  fazendo  com  ella  o  signal  da  cruz  sobre  a  fronte 
para  que  fiquem  purificados  do  peccado  venial  e  Deus  attenda  os 
rogos  que  lhes  vão  dirigir. 

O  Papa  S.  Telesphoro  instituiu,  em  meiado  deste  século  a 
missa  da  meia  noite  na  vigília  do  Natal. 

A  perseguição  de  Trajano  contra  os  christãos  durou  16  an- 
nos, tendo  principio  no  de  100.  A  de  Hadriano,  que  principiou 
em  125,  durou  i3,  tantos  como  a  de  Marco  Aurélio  principiada 
em   161. 


SYNCHRONISMOS  DO   SÉCULO   III 

Foi  no  anno  de  253  que  o  3."  Concilio  Carthaginense  reconhe- 
ceu o  peccado  original,  decidindo  que  se  baptizassem  os  innocen- 
tes;  também  então  se  estabeleceram  os  suffragios  pelos  defunctos, 
e  as  primícias,  que  eram  os  primeiros  fructos  da  colheita  annual 
offerecidos  pelos  fieis  aos  Bispos  e  aos  padres  para  que  estes  di- 
vidissem com  os  diáconos  e  clérigos  inferiores. 

A  perseguição  de  Severo  durou  9  annos,  tendo  principio  em 
202;  a  de  Maximino  3,  tendo  principio  em  235;  a  de  Decio  2, 
tendo  principio  em  249;  a  de  Valeriano  3,  tendo  principio  em 
257;  a  de  Aureliano  2,  tendo  principio  em  273;  a  de  Deocleciano 
e  Maximiano  25,  tendo  principio  em  286. 


i6 


SYNCHRONISMOS  DO   SÉCULO   IV 

A  violenta  e  aturada  perseguição  contra  os  christãos  teve  n'este 
século  o  verdadeiro  termo,  desde  que  Constantino  Magno,  sem 
companheiro  no  império,  restituiu  a  paz  e  a  liberdade  á  Egreja. 
Allude  a  este  facto  uma  inscripção  lapidar  da  epocha  romana, 
encontrada  por  occasião  da  visita  da  família  real  a  Braga,  em  27 
de  novembro  de  1891,  n'um  desaterro  do  campo  das  Carvalhei- 
ras, pacientemente  copiada,  estudada  e  publicada  por  mim,  como 
inédita  que  era,  no  meu  livro  InscripçÕes  Romanas,  pag.  lvii. 

Essa  inscripção,  bastante  gasta  do  tempo,  diz  o  seguinte : 


nMix.MÊSÊSlMÊÊÊÊ^^d^- 


*«;.„ 


Leitura  : 

pacis  et  qvietis  avctori  libertatis  restitvtori 
et  victori  hostivm  d  •  n  •  flávio  constantino 
máximo invicto  •  avg  •  ^emil  ivs  maximvs  •  •   • 

Versão:  —  A  nosso  senhor  Flávio  Constantino  Máximo.  .  .  in- 
victo, augusto,  auctor  da  paz  e  tranquillidade,  restítuidor  da  liber- 
dade e  vencedor  dos  inimigos  (consagra)  Emilio  Máximo.  .  . 

As  duas  ultimas  linhas  estão  de  todo  apagadas;  mas  a  parte 
legível  da  inscripção  leva-me  a  crer  que  o  imperador  Constantino 


l7  - 


prestou  a  Braga  algum  serviço  importante.  D'elle  são  também 
milhares  de  pequenos  bronzes  que  na  cidade  e  subúrbios  a  cada 
passo  apparecem. 

Ainscripção  refere-se  talvez  ao  anno  de  3 1 2,  em  que  o  imperador 
Constantino,  para  combater  o  arianismo  que  após  a  morte  de  Ario 
(anno  de  ru)  tanto  se  radicou  entre  nós,  creou  novas  circum- 
scripções  ecclesiasticas  tornando  consular  a  Província  da  Galliza. 

Foi  celebrado  no  anno  de  3 14,  em  Ancyra.  metrópole  da  Ga- 
laria, o  Concilio  Ancyranum  que  num  dos  2  5  cânones  (o  nono) 
determina  «que  se  um  Diácono,  no  instante  de  receber  a  Ordem, 
declarou  que  não  pôde  viver  no  celibato,  pôde  casar-se  depois, 
sem  por  isso  ficar  interdicto  das  suas  funcções;  mas,  se  não  fez 
esta  declaração,  não  pôde  já  cuidar  em  casar-se  ou  se  o  fizer  deve 
renunciar  o  Diaconato». 

O  imperador  Constantino  assistiu  ao  Concilio  geral  de  Nicéa 
que  durou  desde  19  de  junho  a  25  de  agosto  de  325.  Um  ma- 
nuscripto  do  Vaticano,  a  que  allude  Riccioli  fChronol.  Reform. 
ix,  4)  mostra  que  o  Synodo  de  Nicéa,  a  que  presidiu  Osio  em 
nome  do  Papa  S.  Silvestre,  tem  a  data  de  19  de  dezembro  de 
636  da  era  grega,  que  corresponde  a  16  de  junho  de  325. 

Foi  n'este  Pontificado  que  o  arianismo  começou  (anno  de  319). 
Os  paternianos  (Venustianos)  «que  attribuiam  ao  diabo  a  forma- 
ção das  partes  inferiores  do  corpo  humano,  permittindo  o  uso  del- 
ias para  toda  a  sorte  de  crimes»,  foram  condemnados  em  3óy  no 
Concilio  primeiro  Romanum;  e  o  regulamento  sobre  o  celibato 
dos  padres  diáconos  fez-se  a  6  de  janeiro  de  386. 


Á   alleluia   durante  o   anno,   o   credo  e  a  confissão   geral 


na 


missa,  tudo  foi  determinado  pelo  Papa  S.  Damazo,  natural  de 
Guimarães,  a  quem  o  seu  secretario  S.  Jeronymo  deu  a  denomi- 
nação de  Vir  egregiiis  et  cruditus  in  Scripturié:  Nasceu  este  no- 
tável Pontífice  em  Guimarães,  fallecendo  (seg.  Onuphrio  Vero- 
nense)  no  anno  de  384.  Quasi  todos  os  auctores  o  denominam 
Damasus  I  Imaranensis. 

Kebedo,  cónego  Toletano  do  principio  do  século  xví,  diz  que 
Guimarães  foi  antigamente  cidade:  «Inter  Viscellae,  et  Avi  con- 
jluentis,  \lmaranensis  est  civitas,  sancti  Pontijicis  Damasi  qnon- 
dam  pátria». 

Esta  opinião  é  corroborada  por  um  arrendamento  que  el-rei 
D.  Fernando  fez  em  i382  de  todos  os  direitos  e  emolumentos 
de  Entre  Douro  e  Minho  ao  seu  contador  João  de  Santarém  «com 
obrigação  de  levar  os  rendimentos  á  Cidade  de  Guimarães,  para  se 
pagar  o  soldo  e  a  quantia  aos  que  a  devem  haver».  (Eluc.  p.  277). 

O  costume  de  celebrar  Matinas  á  noite,  Laudes  e  Prima  de 
manhã,  Tertia,  Sexta  e  Nôa  durante  o  dia,  e  Vésperas  á  tarde 
não  deve  ser  anterior  ao  presente  século. 


—  iS-~ 

Nas  Escripturas  e  livros  dos  padres  dos  três  primeiros  séculos, 
não  se  encontra  o  nome  de  Santa  Anna,  avó  de  Jesus  Christo, 
prova  evidente  de  que  nem  tudo  aproveitava  á  historia  d'aquelles 
tempos  em  que  o  próprio  nascimento  do  Redemptor  foi  tido  como 
um  acontecimento  destituido  de  importância. 

Com  a  sagraçao  da  basilica  Lateranense  por  S.  Silvestre  Papa 
teve  esta  ceremonia  principio  no  anno  de  3 14,  applicando-se  a 
todas  as  egrejas  onde  no  anno  immediato  foram,  pela  primeira 
vez,  collocadas  as  imagens  dos  santos.  Isto  deu  logar  a  que  os 
judeus  principiassem  a  odiar  os  Ídolos,  por  julgarem  mal  enten- 
dido que  os  christãos  venerassem  nos  seus  templos  homens  que 
elles  martyrizavam  como  criminosos  incorrigíveis.  O  filho  de  Santa 
Helena  aproveitou  este  feliz  ensejo  para  proscrever  a  idolatria,  a 
que  a  Escriptura  chama  abominação,  mandando  demolir  os  seus 
Templos  ou  entregando-os  aos  christãos  para  o  seu  culto. 

Os  Donatistas  foram  também  obrigados  a  restituir  as  egrejas 
que  occupavam,  pois  Constantino  assim  o  determinou  com  os  seus 
primeiros  éditos  publicados  contra  os  herejes  no  anno  de  3 16.  Aos 
Bispos  concedeu  muitas  basílicas,  para  serem  por  elles  destinadas 
ao  culto  christão,  e  mandou  então  edificar  a  monumental  basilica 
Lateranense  ou  Áurea.  Até  este  tempo,  os  ministros  da  Egreja, 
querendo  distinguir-se  dos  sacerdotes  de  Ists  e  de  Sei^apis,  que 
rapavam  á  navalha  o  rosto  e  a  cabeça,  aparavam  amiudadas  ve- 
zes a  barba  e  os  cabellos,  que  apenas  se  conservavam  compridos 
em  signal  de  ignominia.  O  quarto  Concilio  Carthaginense,  no  anno 
de  398,  dispoz  num  dos  seus  cânones  que  os  clérigos  não  fossem 
cabelludos  nem  lampinhos,  exigindo  por  isso  que  conservassem  o 
costume  de  aparar  os  cabellos:  clericus  nec  comam  nutriat,  nec 
barbam  rada/. 

Pelos  mosteiros  e  ermos,  os  monges  e  os  anachoretas,  inter- 
pretando exageradamente  a  resolução  do  Concilio,  rapavam  por 
completo  a  cabeça  e  deixavam  crescer  muito  as  barbas.  Os  mon- 
ges leigos  do  século  vn,  que  se  salientavam  no  saber  e  na  virtude, 
eram  promptamente  nomeados  sacerdotes  e  Bispos.  Como  os  Pres- 
cillianistas  apenas  rapassem  o  alto  da  cabeça,  usando  cabelleira 
grande,  o  quarto  Concilio  Toletano,  celebrado  em  63o,  resolveu 
«que  todo  o  clero,  sem  distinccão  alguma,  tosquiada  a  parte  su- 
perior da  cabeça,  só  na  inferior  e  pela  raiz  das  orelhas  deixasse 
um  circulo  de  cabellos  mais  compridos,  em  modo  de  coroa  orbi- 
cular  e  redonda,  sem  se  referir  á  barba».  Adoptaram  esta  coroa 
os  monges  de  ordens  sacras  que  rapavam  á  navalha  o  resto  da 
cabeça.  Fora  de  Roma,  foram  estas  coroas  e  barbas  alteradas  no' 
século  IX. 

Punham  e  depunham  as  barbas  e  o  cabello  sobre  o  altar  ou 
juncto  das  imagens  os   indivíduos   que  no  século  x,  em  presença 


—  1 9  — 

da   communidade   e  dos   parentes,  se  faziam  monges,  para  d'este 
modo  provarem  e  jurarem  que  de  todo  se  entregavam  a  Deus. 

Quantas  vezes,  no  século  vn,  se  oífereciam  ao  mosteiro  por 
uni  dos  seus  cabellos,  cortado  peio  abbade  juncto  do  altar,  para 
que  Nosso  Senhor  o  acceitasse  em  signal  de  escravidão?  Era  fre- 
quente essa  pratica. 

Os  godos,  que  julgavam  o  cabello  comprido  um  indicio  de 
honra,  não  consentiam  que  os  penitentes  usassem  cabello  e  barba 
senão  aparados.  Em  Portugal,  foi  el-rei  D.  Fernando  quem  pri- 
meiro cortou  o  cabello  e*fez  a  barba.  O  nosso  D.  João  de  Castro, 
com  um  simples  péllo  delia,  deu  penhor  das  sommas  enviadas  a 
Diu;  e  no  século  xn  os  sellos  de  cera  continham  uma  porção  de 
pontas  da  barba  para  que  a  escriptura  ou  contracto  ficasse  firme 
e  valiosa. 

A  prohibição  de  serviços  mannaes  e  negócios  forenses  ao  do- 
mingo, foi  pela  primeira  vez  decretada  pelo  imperador  Constan- 
tino, exceptuando  os  trabalhos  agrícolas,  a  que  só  em  585  o  Con- 
cilio de  Macon  poz  termo,  impondo  aos  delinquentes  graves  penas 
corporaes. 

Por  estes  e  outros  meios,  a  Egreja  promovia  o  extermínio  das 
praticas  pagãs,  decretando  nos  séculos  immediatos,  do  v  ao  vm, 
a  prohibição  do  culto  das  pedras.  Ainda  no  século  xvi  as  con- 
stituições do  Bispado  de  Lamego  nos  mostram  um  Bispo  da  Dio- 
cese a  ordenar  que  as  procissões  deixem  de  ir  a  outeiros  e  pene- 
dos, logares  afamados  pelos  vestígios  que  conservavam  do  viver 
e  crer  de  povos  anteriores  ao  nascimento  de  Christo,  os  quaes 
prestavam  grande  culto  aos  Ídolos.  Os  iconoclastas,  como  o  Bispo 
intruso  de  Hieraple  chamado  Xenaias  Persa,  diziam  «que  os  an- 
jos sendo  espíritos  não  podiam  ser  pintados  com  corpo,  que  era 
lazer  affronta  a  Jesus  Christo  pintal-o  ou  fazer  a  sua  imagem, 
porque  só  a  adoração  em  espirito  lhe  podia  ser  agradável.  Que 
era  uma  invenção  pueril  representar  o  Espirito  Santo  em  uma 
pomba». 

A  lei  antiga  já  prohibia  as  imagens,  mas  parece  que  com  o 
único  fim  de  não  serem  confundidas  com  os  Ídolos,  pois  é  certo 
que  Salomão  mandou  fazer  para  o  seu  Templo  duas  grandes  ima- 
gens de  Seraphins.  O  Concilio  de  Elvira  deliberou  que  nas  egre- 
jas  todas  as  imagens  fossem  portáteis,  para  poderem  ser  condu- 
zidas a  logares  occultos,  como  succedeu  por  occasião  da  entrada 
dos  mouros  na  península,  em  que  os  fieis  fugiram  com  ellas,  en- 
terrando umas  e  escondendo  outras  nas  grutas  de  altos  montes, 
onde  mais  tarde  o  seu  apparecimento  deu  logar  ás  romarias  que 
ainda  hoje  se  realisam  com  caracter  accentuadamente  pagão.  O 
cap.  III  das  actas  do  primeiro  Concilio  de  Braga,  celebrado  em 
411,  diz  que  os  Bispos  Lusitanos  resolveram  esconder  os  «corpos 


—  20 

ou  relíquias  dos  santos,  tomando  nota  dos  Jogares  e  cavernas  •> 
(de  locis  et  speluncis),  onde  ficassem,  entregando-se  d'isso  um  re- 
latório minucioso  «para  que  se  não  perdesse  a  memoria  d'ellas 
com  o  decurso  do  tempo».  O  costume  era  já  antiquíssimo:  Jere- 
mias, como  se  lê  no  L.  II  dos  Machabeus,  cap.  II,  subiu  a  um 
monte  e  escondeu  numa  espelunca  o  Tabernáculo,  a  Arca  e  o 
Altar  do  incenso  (Invenit  locum  speluncce  et  Tabérnaciilum  et 
Arcam  et  Altare  incensi. . .).  Exceptuando  um  limitado  numero 
de  fieis  que  vão  ao  local  amortalhados,  sem  fala,  de  joelhos,  des-. 
calços,  não  estando  a  isso  habituados,  conduzindo  vellas  e  outros 
objectos  de  cera  representativos  da  parte  affectada  do  corpo,  ma- 
deixas de  cabello,  um  tourinho,  ou  outras  quaesquer  promes- 
sas feitas  aos  santos  quando,  por  sua  intercessão,  alcançam  de 
Deus  alguma  graça  temporal  ou  espiritual,  exceptuando  estes,  as 
romarias  são  para  o  nosso  povo,  não  uma  prova  publica  da  sua 
fé,  mas  um  meio  fácil  de  se  distrahir  ou  satisfazer  a  curiosidade 
própria  \  jogos,  tocatas,  descantes  immoraes  como  os  que  dirigem 
ao  Santo  Precursor,  petiscos,  vinho  verde  e  doces,  desordens  pre- 
meditadas de  longe  com  promessa  de  se  liquidarem  na  romaria 
de  tal,  tudo  isto  são,  entre  nós,  as  romarias,  uma  imitação  ava- 
riada das  peregrinações  que  nos  primeiros  tempos  da  Egreja  se 
effectuavam  em  occasiões  de  calamidades  publicas,  sendo  a  mais 
notável  a  que  se  dirigia  a  Jerusalém,  de  visita  aos  logares  santos, 
e  a  mais  celebre  a  que  ia  a  Roma  (Romahia  =  origem  da  palavra 
Romaria?)  visitar  os  sepulchros  dos  apóstolos  S.  Pedro  e  S.  Paulo. 
Esta  devoção  era  vivíssima  no  anno  de  836,  em  que  todos  os  pe- 
regrinos se  confessavam  nas  vésperas  da  partida. 

Das  romanas  e  do  transporte  das  relíquias  originaram-se  as 
procissões,  parecendo  que  a  primeira,  digna  de  tal  nome,  fosse  a 
ceremonia  da  trasladação  da  Arca,  de  Cariathiarim  para  a  casa 
de  Obededom  e  d'alli  para  a  cidade  de  Hebron. 


SYNCHRONISMOS   DO   SÉCULO   V 


O  Concilio  Viennense,  celebrado  em  474  por  S.  Mamerto,  me- 
tropolitano de  Vienna,  no  Delfinado,  estabeleceu  o  jejum  e  as  la- 
dainhas menores  para  ser  impetrado  o  auxilio  do  ceu  contra  os 
bárbaros,  inundações,  terremotos,  esterilidades,  etc.  Foram  ainda 
instituídas,  no  segundo  Concilio  Bracarense,  cap.  9,  outras  ladai- 


2  1  — 

nhãs  para  o  principio  da  quaresma;  e  no  decimo  sétimo  Tole- 
tano,  cap.  9,  para  todos  os  mezes  do  anuo  pro  statu  Ecclesioe,  et 
incolwnitate  Principum. 

Entre  nós,  no  século  VII  tiveram  o  seu  inicio  os  Ladarios, 
que  se  tornaram  frequentes,  fazendo-se  estes  votos  «para  sus- 
pender a  justa  vingança  de  Deus  irado».  S.  Gregório  Magno  ins- 
tituiu, no  dia  de  S.  Marcos  (anno  de  5go),  as  Ladainhas  maiores 
para  se  pedir  a  Deus  o  termo  da  peste  inguinaria  ou  bubonica. 
Chamavam-se  das  cruzes,  porque  estas  e  os  altares  estavam  co- 
bertos de  preto,  e  os  fieis  que  tomavam  parte  íVellas  vestiam-se 
de  lucto,  descalçavam-se  e  abstinham-se  da  carne  e  do  vinho. 
Desobrigaram  os  penitentes  da  lei  da  confissão  publica  dos  seus 
peccados,  sujeitando-os  apenas  á  auricular  e  secreta,  e  determi- 
nou-se  que  a  penitencia  publica  nunca  fosse  imposta  a  qualquer 
dos  cônjuges  sem  consentimento  do  que  ficasse  isento. 

A  Egreja  não  approvou  o  Concilio  Seleuciense,  de  Seleuca  na 
Pérsia,  que  o  metropolita  Nestoriano  Barsumas  celebrou  em  485, 
e  no  qual  se  permittia  o  matrimonio  aos  padres  e  aos  monges 
(Assemani,  Biblioth.  Orient.  tom.  111).  Babueu  condemna  a  de- 
cisão de  Barsumas  perante  os  Nestorianos  que  no  referido  anno 
também  reuniu  em  Concilio;  porém  o  metropolita  irado  celebrou, 
ao  cabo  de  10  annos,  (em  495),  três  conciliábulos — Napetense,  Se- 
leuciense e  Adriense  —  confirmando  n'elles  a  heresia  e  todos  os 
decretos  do  seu  Concilio  anterior.  Esta  confirmação  foi  ainda  se- 
cundada em  499  pelo  Concilio  Persicum  celebrado  por  Hoseo, 
metropolita  de  Nisibe. 

O  virtuosíssimo  Arcebispo  de  Braga,  D.  Frei  Bartholomeu  dos 
Martyres  (1559-90),  desejando  remediar  os  males  do  seu  tempo, 
declarou-se  em  franca  opposicão  ao  celibato  dos  padres,  valendo- 
lhe  esse  louvável  zelo  pela  moralidade  do  seu  rebanho  gravíssi- 
mos dissabores. 

Está  hoje  averiguado  que  a  nossa  mais  antiga  obra  lithurgica 
—  O  Sacramentario  —  é  devida  ao  Pontífice  Gelasio  (anno  de  492). 
Divide-se  em  3  volumes  contendo  todo  o  ceremonial  da  Egreja, 
missas  para  o  decurso  do  anno,  modo  de  ministrar  Sacramentos, 
etc,  etc. 

Os  Bispos  do  século  V,  não  podendo  transportar-se  a  todos  os 
logares  da  Diocese,  crearam  os  seus  delegados  que  denominaram 
Bispos  coadjutores,  modestos  ecclesiasticos  que  tempo  depois  se 
elevaram,  por  desleixo  dos  superiores,  parecendo  na  auctoridade 
os  próprios  Bispos.  A  consequência  d'estes  excessos  foi  a  aboli- 
ção total  da  Dignidade  nos  séculos  X  e  XI. 

Terminou  com  a  invasão  dos  Árabes  o  convento  de  cónegos 
regrantes  de  Santo  Agostinho,  fundado  na  Sé  de  Braga  pelo  Bispo 
S.  Profuturo.  quando  as  Províncias  romanas  eram  entregues  aos 


'2  2 


bárbaros  que  assolavam  a  Hespanha,  mais  tarde  conquistada  pelo* 


godos. 


SYNCHRON1SMOS  DO  SÉCULO  VI 


N'este  século  os  reis  visi-godos  governavam  toda  a  Hespanha. 
O  sétimo  dos  i3  cânones  estabelecidos  por  10  Bispos  reunidos  no 
Concilio  de  Tarragona  (Tarraconense)  aos  6  dias  de  novembro 
de  5i6,  manda  começar  na  noite  de  sabbado  a  observância  do 
domingo. 

Charvet,  na  sua  historia  da  egreja  de  Vienna,  pag.  118,  diz-nos 
que  a  consagração  das  viuvas  chamadas  Diaconisas  foi  abolida 
pelo  21. °  cânon  do  Concilio  Epaonense  (de  Albon,  Diocese  de 
Vienna),  celebrado  pelo  Bispo  santo  Avito,  desde  6  a  i5  de  se- 
tembro de  5 17. 

A  Diaconisa  era,  na  Egreja  primitiva,  uma  mulher  com  certo 
grau  ecclesiastico  que  substituía  o  diácono,  especialmente  em 
actos  do  culto  para  o  sexo  feminino. 

No  I."  Concilio  Bracarense,  celebrado  por  Lucrécio,  Bispo  de 
Braga,  no  dia  1."  de  maio  de  563,  Theodomiro,  rei  Suevo,  e  todos 
os  seus  súbditos,  foram  definitivamente  convertidos  á  fé  catholica, 
deliberando-se,  por  essa  occasião,  fazer  manter  o  antigo  systema 
de  baptisar;  ordenar  aos  diáconos  que  usem  a  estola  sobre  o 
hombro  e  não  escondida  sob  a  túnica,  parecendo  subdiaconos; 
«que  os  sacerdotes,  que  não  comiam  carne  por  evitar  a  suspeita 
de  heresia  de  Priciliano,  os  obriguem  alguma  vez  a  hervas  cosidas 
com  carne ;  e  se  desprezarem  este  preceito  pela  suspeita  d'estes 
herejes,  serão  excommungados  e  totalmente  privados  do  officio 
sacerdotal.  Que  os  corpos  dos  defunctos  de  nenhum  modo  se  se- 
pultem dentro  nas  egrejas  dos  Santos,  mas,  quando  fòr  necessário, 
da  parte  de  fora  junto  do  muro  da  egreja,  aonde  não  é  tanto  de 
extranhar;  porque  suas  cidades  até  nosso  tempo  guardam  firmissi- 
mamente  este  privilegio;  que  do  circuito  dos  seus  muros  a  dentro 
se  não  sepulte  o  corpo  de  qualquer  defuncto  em  nenhum  modo, 
quanto  mais  o  deve  ter  a  reverencia  dos  martyres  veneráveis». 

O  pagamento  dos  dízimos  foi  ordenado,  como  esmola,  em 
carta-circular  escripta  pelos  Bispos,  depois  de  encerrado  o  segundo 
Concilio  Turonense,  no  dia  17  de  novembro  de  567. 

Sob  a  presidência  *do  Bispo  S.  Martinho  de  Dume,  e  achando- 
se  presente  o  de  Briteiros,  que  se  chamava  Maybom,  celebrou-se 
no  primeiro  de  junho  do  anno  de  572  (18  das  kalendas  de  janeiro 
da  era   de  610),   o   segundo   Concilio  Bracarense,   determinando 


—  23  — 

«que  os  catechumenos  concorram  á  purificação  do  exorcismo  vinte 
dias  antes  do  baptismo,  ensinando-se-lhes  o  symbolo  Credo  in 
unum  Deitm;  que  não  se  consagre  egreja  sem  primeiro  se  lhe  fazer 
património  para  serviço  cfella,  confirmado  por  doação  em  escri- 
pto,  porque  não  é  culpa  leve,  antes  é  temeridade  consagrar  uma 
egreja  sem  cera  e  sem  renda  para  sustentação,  etc;  que  aos  que 
levam  meninos  ao  baptismo  não  se  receba  alguma  cousa  senão 
quando  o  queiram  dar  por  sua  devoção;  que  seja  suspenso  das 
ordens  pelo  seu  Bispo  todo  o  sacerdote  que  consagrar  no  altar 
não  estando  em  jejum». 

Os  christãos,  que  desprezaram  o  costume  do  pagamento  dos 
dízimos  á  egreja,  foram  ameaçados  com  pena  de  excommunhão 
expressa  no  quinto  cânon  do  segundo  Concilio  Matisconense,  a  23 
de  outubro  de  585.  Também  n'elle  foi  prohibido  o  baptismo  fora 
do  tempo  da  Paschoa,  sem  motivo  justificado. 

A  disciplina  ecclesiastica,  bastante  descurada  n'este  século, 
mereceu  a  Recaredo,  rei  godo,  a  máxima  attenção,  a  ponto  de 
requerer  que  sobre  o  assumpto  fossem  feitos  23  cânones  no  ter- 
ceiro Concilio  Toletano,  celebrado  em  6  de  maio  de  58q,  e  no 
qual  o  mesmo  rei  declara  que  todos  os  godos  abjuraram  o  aria- 
nismo, e  que  elle,  por  si  e  em  nome  dos  seus  súbditos,  fazia  pro- 
fissão de  fé.  A  5  de  novembro  do  anno  immediato  e  i  de  novem- 
bro de  592,  os  Concilios  Hispalense  i°,  de  Sevilha,  e  Ca;saraugus- 
tanum,  de  Saragoça,  oceuparam-se  desenvolvidamente  dos  arianos 
conversos. 

Em  5t)8  são  os  sacerdotes,  diáconos  e  subdiaconos,  rigorosa- 
mente obrigados  ao  celibato. 

Uma  determinação  do  Concilio  de  Epona,  celebrado  em  517, 
exigia  que  todos  os  altares  fossem  de  mármore. 

O  Papa  S.  Gregório  Magno  (anno  de  5qo),  para  evitar  que  o 
espirro  continuasse  a  fazer  victimas,  como  por  occasião  da  grande 
epidemia,  indicou  aos  fieis  a  conveniência  de  no  mesmo  acto  pro- 
nunciarem as  palavras  Dominus  tecum,  ainda  hoje  em  uso  entre 
nós.  A  origem  da  saudação  do  espirro  vem  de  tempos  remotíssi- 
mos. Os  Gregos  diziam:  Júpiter  o  conserve;  e  os  Romanos  :  salve, 
como  presentemente  em  Monomotapa  (Africa)  e  na  America. 

O  mesmo  S.  Gregório  Magno  concedeu  a  Santo  Agostinho 
o  uso  do  Palio,  unicamente  para  a  celebração  da  missa.  A  sua 
origem  vem  dos  sacerdotes  pagãos.  No  Ceremonial  Romano,  L. 
I,  cap.  V,  encontra-se  o  seguinte:  «O  cuidado  de  fazer  e  conser- 
var os  Pálios  pertence  aos  Subdiaconos  Apostólicos,  que  cuidam 
em  mandal-os  fabricar  da  maneira  seguinte  : — As  freiras  do  Mos- 
teiro de  Santa  Ignez  e  os  Religiosos  que  alli  assistem,  offerecem 
todos  os  annos  dois  cordeiros  brancos  sobre  o  altar  da  dita  egreja 
no   dia   da   festa   da   Santa,  quando  na  missa  solemnc  se  canta  o 


—  24  — 

Agnus  Dei.  Aquelles  dois  cordeiros  se  entregam  com  certas  ce- 
remonias  a  dois  cónegos  da  egreja  de  S.  João  de  Latrao,  os  quaes 
cuidam  em  os  mandar  alimentar  até  chegar  o  tempo  de  se  lhes 
cortar  a  lã;  e  d:ella  se  fabricam  os  Pálios. 

Estes  são  uma  espécie  de  estolla  da  largura  de  três  dedos,  que 
consta  de  4  cruzes  negras  e  de  outras  tantas  pontas,  das  quaes 
duas  descem  pelo  peito  e  outras  duas  pelas  costas  do  Prelado  até 
á  cinta  ;  no  fim  das  quaes  prendem  umas  pequenas  laminas  de 
chumbo.  Este  Palio  mette-se  pelo  pescoço,  porque  é  formado, 
quasi,  como  em  circulo.» 


23  — 


INSCRIPÇÃO  WiSIGOTHICA 


A  pag.  85  do  meu  livro  InscripçÕes  e  Lettreiros,  encontra-se 
gZincographada  a  inscripção  wisigothíca  de  que  presentemente  dou 
photogravura.  Apresentava  então  uns  leves  erros  de  copia  prove- 
nientes das  successivas  camadas  de  tinta  de  óleo  que  no  decorrer 
do  tempo  lhe  applicaram  com  o  fim  de  egualar  a  lapide,  que  é  de 
silex  escuro,  á  cor  alvíssima  da  parede  da  sacristia  da  egreja  de 
S.  Vicente,  onde  se  encontra  embebida. 

Essas  camadas  de  tinta,  que  posteriormente  mandei  raspar  e 
lavar,  tomavam  alguns  traços  dos  caracteres,  que  são  finos,  alte- 
rando por  isso  a  leitura.  A  versão  portugueza  d'esta  lapide,  que 
mede  im,4o  de  comprimento  por  o"1. 41  de  altura  ou  largura,  é 
como  segue  : 

.«Aqui  descança  Remismuera,  desde  o  primeiro  de  maio  de  f>i8, 
dia  de  segunda-feira.  em  paz.  amen.» 

O  eminente  escriptor  e  epigraphista  madrileno  sr.  Padre  Fidel 
Fita,  a  quem  no  dia  18  de  fevereiro  de  1896  enviei  copia  pho- 
tographica.  estudou  magistralmente  esta  lapide  no  Boletin  de 
la  Real  Academia  de  la  Historia  de  Madrid,  tom.  XXVIII,  cor- 
respondente a  março  d'aquelle  íinno,  dizendo  : 

«O  nome  da  defunta  é  teutonico.  O  seu  primeiro  elemento  sáe 
do  nome  de  Remisol,  bispo  de  Vizeu,  que  assistiu  ao  2.0  Concilio 
de  Braga,  (anno  de  572),  no  de  Remismundo,  rei  suevo,  e  n'ou- 


—  26  — 

tros.  A  photographia  permitte  conjecturar  que  o  segundo  elemento 
seja  mutera,  por  ter  algum  traço  de  ligadura  de  T  com  E,  em 
cujo  caso  vem  á  memoria  o  allemão  mutter  (mãe)». 

Esta  inscripção  lapidar  é,  sem  duvida,  o  monumento  authentico 
mais  antigo  do  christianismo  em  Braga.  Por  isso  todos  nós  deve- 
mos tributar-lhe  o  respeito  a  que  tem  jus. 

Quando  a  copiei,  para  a  publicar  em  primeira  mão,  semelhava 
uma  taboleta  de  madeira  com  as  lettras  avivadas  a  tinta  preta  e 
alteradas  em  parte,  de  modo  que  ninguém  lhe  podia  entrar,  como 
dizia  o  velho  sacristão. 

Convenci  immediatamente  os  mezarios  de  S.  Vicente  de  que 
estava  alli  uma -inscripção  de  valor,  obtendo  d'elles  auctorizaçao 
para  ordenar  a  lavagem  que  não  foi  pouco  difficil. 

Ao  lado  esquerdo  d'ella  está  outra  lapide  em  que  se  lê  que  no 
anno  de  i565,  por  occasião  da  reedilicação  da  egreja,  appareceu 
nos  alicerces  antigos  a  referida  inscripção  wisigothica.  Esta  lapide 
uinhentista  mostra  bem  gravados  estes  dois  dísticos  latinos  : 


iivmxccEmiRMwis 

li 


[T.N0V\PRO.TOI.iPi/T.ARABMO      , 

Os  lusitanos  professaram  livremente  a  religião  christã  no  tempo 
do  rei  suevo  Hermenerico  5  e  de  tal  modo  a  crença  se  propagou, 
que  no  anno  de  464  poucos  suevos  havia  que  não  fizessem  parte 
do  grémio  da  egreja  catholica.  Theodomiro,  acclamado  em  558, 
abjurou,  dois  annos  depois,  o  arianismo  a  que  conseguiu  pôr  termo 
em  563,  por  occasião  de  convocar  o  2."  Concilio  Bracarense.  Seu 
filho  Ariamiro  succedeu-lhe  em  570,  prestando  á  causa  do  christia- 
nismo relevantíssimos  serviços.  Este  teve  também  um  filho  de 
nome  Eburico,  que  por  intimação  de  Endeca  foi  monge  do  mos- 
teiro de  Dume,  sendo  o  mesmo  Endeca  obrigado,  no  anno  de  5S5, 
a  seguir  egual  caminho.  Foi  então  que  o  successor  Leovegildo  uniu 
o  reino  á  monarchia  gothica. 

A  veneranda  inscripção  lapidar  wisigothica  data  das  proximi- 


27 


dades  do  estabelecimento  da  religião  de  Maíoma  (islamismo)  por 
Abul  Kasen  Ibn  Abdallah  Mohammed,  natural  de  Meca. 


# 


Desde  os  tempos  primitivos  a  humanidade  tributou  aos  mortos 
a  mais  rendida  veneração  e  respeito.  No  primeiro  periodo  da  epo- 
cha  pre-historica  (paleolithico),  eram  os  cadáveres  inhumados  de 
cócoras,  e  só  no  segundo  periodo  (neolithico)  teve  principio  a  in- 
cineração que  não  se  adoptou  geralmente.  Numa  caverna  da  mon- 
tanha de  Hov  foi  inhumado  Aarão,  filho  de  Amrão  e  de  Jocabed, 
e  irmão  de  Moysés,  com  1 23  annos  de  edade.  A  sua  morte  era 
annualmente  commemorada  com  jejuns  pelos  judeus. 

Os  egypcios  guardavam  em  urnas,  nas  suas  casas,  os  cadá- 
veres embalsamados,  eos  gregos  e  os  semiticos  inhumavam  e  cre- 
mavam os  seus. 

Entre  os  romanos  o  costume  da  cremação  durou  até  ao  tempo 
do  imperador  Graciano,  (anno  de  867),  que  o  prohibiu  de  vez. 

Gallieno  havia  publicado  um  edito  ordenando  a  entrega  dos 
cemitérios  e  egrejas  aos  christãos;  porém,  no  anno  de  38i,  reco- 
nhecendo-se  que  era  nocivo  á  saúde  publica  o  costume  das  inhu- 
maçóes  nos  templos,  publicou  o  imperador  Theodosio  Júnior  uma 
constituição  prohibindo-as  alli  e  nas  cidades.  (Vid  Acta  SS. 
tom.  3,  pag.  44).  Foram  então  iniciadas  nas  casas  de  campo  e  á 
margem  das  vias  publicas,  terminando  muitas  das  inscripções  se- 
pulchraes  com  esta  supplica  meiguissima  e  poética: 

ORO   VT   PRAETERIENS  DICAS  : 

SIT  T1BI   TERRA   T  EVIS 

A   CINERIS    QVOQVE   FLORES    LEGANTYR 

«Rogo-te  que  digas  quando  por  aqui  passares:  A  terra  te  seja 
leve,  e  de  flores  se  cubram  as  tuas  cinzas». 

Foi  nas  catacumbas  de  Roma  (conhecidas  minas  de  piçarra 
— pirx\ollana — de  que  se  fazia  o  cimento),  que  os  christãos  tiveram 
as  primeiras  egrejas  e  os  primeiros  cemitérios  denominados  coeme- 
tevia  (dormitórios)  ou  cryptas ;  e  porque  se  reuniam  n'estes  Joga- 
res occultos  eram  conhecidos  dos  seus  perseguidores  por  lucifugos 
(inimigos  da  luz)  como  nos  diz  Minucio  Félix,  ou  geralmente  chris- 
tãos, de  Christo,  ou  de  chrest  (pobres). 

Aqui  o  espaço  da  sepultura  era  pago  quando  a  preferissem 
próximo  das  dos  martyres,  sendo  estes  contractos  effectuados  com 
os  coveiros  (Fossores),  segundo  se  deprehende  da  inscripção  de 
uma  sepultura  Comprada  por  Artemisio  para  dois  cadáveres.  O 
systema   das  inhumações  em  cavidades   (sepulturas)  abertas  nas 


--28  — 

paredes  dos  caminhos  interiores  das  catacumbas,  que  ainda  no  anno 
de  35o  funccionavam,  adopta-se  presentemente  nos  muros  inte- 
riores dos  nossos  cemitérios,  dando-se  á  sepultura  o  nome  da  sua 
origem  —  catacumba. 

Uma  das  sete  maravilhas  do  mundo,  o  tumulo  de  Mausolo, 
rei  de  Caria,  construído  por  ordem  de  sua  irmã  e  esposa  a  cele- 
bre Artemísia  II,  legou  o  nome  a  todos  os  monumentos  funerá- 
rios. Por  seu  turno  o  nome  da  rainha  Artemísia  ficou  também 
memorado  pelas  formosas  flores  d^sta  planta  composta  que  des- 
abrocham na  quadra  triste  do  Outomno. 

Os  christaos,  confiados  na  resurreição,  não  queriam  ser  cre- 
mados nem  consentiam  que  nas  sepulturas  fosse  gravada  a  pala- 
vra enterrar.  Por  isso  diziam  sempre  depositar.  Os  amigos  e  os 
parentes  do  morto,  para  annualmente  poderem  efíectuar,  no  dia 
próprio,  a  commemoracão  fúnebre,  embebiam  na  argamassa  da 
campa  armeis,  conchas,  moedas,  etc.  Uma  das  muitas  inscripçÕes 
encontradas  diz  : 

M  •  ANTONIVS  •  RESTITVTVS 
FECIT     YPSO  CEV   SUBI  •  ET   SVIS 
FIDENTIBVS  •  IN  •  DOMINO 

«Marco  António  Restituto  fez  esta  sepultura  subterrânea  para 
si  e  sua  família,  que  confiam  em  Deus». 

Também  nas  catacumbas  foi  encontrada  esta  do  coveiro  Dió- 
genes, sem  duvida  mais  moderna  : 

DIÓGENES   FOSSOR   IN   PACE   DEPOSlTVS 
OCTABV  KALENDAS    OCTOBR  • 

Outras  inscripções  christãs  terminavam  com  os  dizeres: — Vive 
no  Senhor  e  roga  por  nós —  Vive  em  pa~ —  Consola-te  e  possa  o 
teu  espirito  gósar  do  eterno  bem  —  Christo  Senhor  Omnipotente, 
consolae  seu  espirito  em  vós,  etc,  etc. 

Quasi  sempre  eram  lacónicas  como  por  exemplo  esta  do  sepul- 
chro  de  Santa  Philomena,  existente  no  museu  de  Latrão : 

PAX   TECVM   FILVMENA 

Por  occasião  dos  anniversarios  dos  martyres,  sepultados  nas 
catacumbas  em  numero  de  oitenta  mil,  e  mais  quarenta  e  cinco 
Bispos,  celebrava-se  junto  das  sepulturas  o  Officio  Divino  e  fa- 
zia-se  uma  homilia  aos  fieis  que  alli  se  reuniam  em  grande  nume- 
ro, collocando-se  sobre  pilares  de  pedra  a  lâmpada  do  azeite  aro- 
matisado.    S.   Gregório  Magno  presenteou  a  rainha  Theodolinda, 


da  Lombardia,  com  alguns  tubos  de  zinco  cheios  de  aceites  das 
lâmpadas  dos  Papas  martyres. 

Aos  fieis,  que  diflicilmente  concorriam  á  communhão  em  virtu- 
de da  grande  distancia  que  mediava  entre  as  portas  de  Roma  e  as 
catacumbas,  foi  permittido  levarem,  muito  embrulhada,  no  seio 
ou  numa  pequena  caixa  de  ouro  pendente  do  pescoço,  a  Eucha- 
ristia  para  a  distribuírem  pelos  amigos  em  jejum. 

Crê-se  que  datam  do  século  u  os  cemitérios  christãos,  e  do 
meado  do  v  a  notação  da  era  nas  lapides  funerárias.  Por  isso  deve 
ser  considerada  apocrypha  esta  do  anno  77  que  Vaseo  nos  dá  no 
tom.  I  como  achada  na  Biscaia:  —  «Bellila  Hispana  serva  Jesu 
Christi  requievit  in  Domino.  Obiit  aera  u5  hoc  cst  anno  Domini 
septuagesimo  septimo» . 

Pertence  ao  ultimo  quartel  do  século  ív  esta  inscripção  lusi- 
tano-christã,  a  mais  antiga  da  Península,  existente  no  Museu  de 
Merida,  a  qual  tem  no  alto  o  monogramma  de  Christo: 

p 

X 

I.VPERCVS 

FIDELIS  •  RE 

CEPTVS  •  IN  •  PACE 

VIXIT  •  AN  •  XXX 

Refere-se  a  um  Luperco  fiel  que  foi  recebido  na  eterna  paz  do 
Senhor  aos  3o  annos  de  edade. 

E  muitíssimo  antiga  a  formula:  Receptus  in  pace. 

O  monogramma  no  alto  indica  a  epocha  em  que  o  imperador 
Constantino  Magno  concedeu  a  paz  e  a  liberdade  á  Egreja  (anno 
de  33o).  Por  essa  occasiao  os  fieis  edificaram  um  grande  numero 
de  Templos  nos  quaes  os  imperadores  e  reis,  os  Bispos  e  os  de- 
mais ecclesiasticos  começaram  a  ser  inhumados  junto  dos  monu- 
mentos dos  martyres,  tornando-se  por  fim  extensiva  a  todos  os 
fieis  esta  especial  concessão. 

As  sepulturas  apresentavam  então  vários  emblemas  mysticos 
e  as  formulas:  Requievit  in  pace  Domini — Tibi  detur  pax  a  Deo. 

Algumas  tinham  na  parte  superior  a  primeira  e  a  ultima  lettra 
do  alphabeto  grego  A  O,  alludindo  ás  palavras  de  Christo:  «Ego 
snm  Alpha  et  Omega,  principinm  et  finis.» 

Sendo  revogada  a  lei  das  doze  taboas,  que  Theodosio  Júnior 
lizera  executar,  os  terrenos  vedados  junto  das  basílicas  chama- 
ram-se  dormitórios,  do  verbo  koimáo. 

O  cânon  18  do  Concilio  de  Braga  celebrado  em  563  prohibiu 
expressamente  as  inhumaçÕes  nas  egrejas,  permittindo-se  apenas 
que  fossem  effectuadas  junto  dos  seus  muros. 

Desde  o  pontificado  de  S.  Gregório  Magno  até  ao  Concilio  de 


J>0  — 

Trento  nunca  os  padres  deixaram  de  propugnar  pelo  estabeleci-' 
mento  dos  cemitérios,  mas  é  possível  que  já  no  século  xi  princi- 
piassem de  novo  as  inhumações  nas  egrejas.  No  mosteiro  benedi- 
ctino  de  Paço  de  Sousa,  freguezia  do  Douro,  foi  sepultado  em 
capella  particular,  na  era  de  1182  (anno  de  1144)  o  nosso  Egas 
Moniz,  rilho  de  Muninho  Hermigues,  descendente  de  nobreza 
neo-gothica. 

No  seu  tumulo  gravou-se  esta  inscripçao: 

HIC  ■   REQVIESCIT  •   FYS   |  DEI   |   EGAS   j   MONIZ  \ 
VIR   :    1NCLITVS  ; 
ERA  •   MILLESIMA  •    CENTÉSIMA  •    2XXXII  :. 

Para  este  século  xu  ha  ainda  muitos  outros  exemplos;  e  para 
o  immediato  não  faltam  documentos  comprovativos  como  o  do 
mosteiro  de  Tarouca,  onde  se  lê  que  Martinho  Annes  e  sua  mu- 
lher Elvira  Pires  foram  sepultados  pouco  depois  de  1228,  no  re- 
ferido mosteiro,  tendo  feito  ambos  uma  doação  aos  monges.  No 
século  xiv  faziam-se  as  inhumações  próximo,  dos  altares  e  simul- 
taneamente nos  adros. 

O  velhíssimo  costume  de  tosquiar  a  cabeça  e  a  barba  aos  de- 
functos  terminou  no  século  xvi. 

Quando  em  1 832  Portugal  foi  flagellado  pelo  cholera,  proce- 
deu-se  á  benção  de  alguns  terrenos  para  íVelles  se  fazerem  enter- 
ramentos, porque  então  não  havia  entre  nós  cemitérios  públicos. 
O  Direito  canónico  admitte  o  enterramento  nas  egrejas,  mas  não 
deixa  de  preferir  que  sejam  procurados  os  cemitérios.  O  Ritual 
Romano,  (tit.  6,  cap.  1,  n.°  9)  diz:  «Ubi  viget  antiqua  consuetudo 
sepeliendi  mortuos  in  coemitefiis,  retineatur;  et  ubi  íieri  potest, 
restituatur». 

Até  ao  anno  de  1 835  todos  os  enterramentos  se  eífectuavam 
nos  recintos  e  adros  das  egrejas,  nos  cemitérios  privativos  dos 
hospitaes  militares  (Reg.  an.  ao  Alvará  de  27  de  março  de  i<8o5. 
secção  3.a,  tit.  vu,  art.  25),  e  nos  das  Misericórdias  (Alvará  de  18 
de  outubro  de  1806,  §  12).  Havia  para  as  communidades  religio- 
sas o  privilegio  de  poderem  dar  sepultura  aos  seus  membros  nas 
cercas  e  nos  claustros  dos  seus  conventos.  Os  decretos  de  21  de 
janeiro  de  1834  e  21  de  novembro  de  i836,  destinaram  uma  ca- 
pella da  egreja  de  S.  Vicente  de  Fora  para  jazigo  de  Reis  e  Prín- 
cipes. Gomo  providencia  geral  foi  pela  primeira  vez  determinado, 
em  decretos  datados  de  21  de  setembro  de  i835  e  8  de  outubro 
do  mesmo  anno,  que  se  criassem  cemitérios  em  todas  as  povoa- 
ções do  reino,  sendo  de  dois  metros  quadrados  o  espaço  minimo 
de  cada  sepultura,  cinco  palmos  de  profundidade,  quatro  de  lar- 
gura  e  dez  de  comprimento.  Este  decreto  diz  no  seu  i ."  artigo : 


—  3i  — 

«Em  todas  as  povoações  serão  estabelecidos  cemitérios  públi- 
cos para  n'elles  se  enterrarem  os  mortos». 

A  esta  medida  do  governo,  fiscal  da  hygiene  e  salubridade 
publica,  dizem  também  respeito  muitas  portarias,  entre  as  quaes 
as  de  24  de  janeiro  de  1872;  17  de  dezembro  de  1866;  17  de  no- 
vembro de  1868  e  29  de  maio  de  1877,  que  mandam  designar  os 
«espaços  de  terreno  sufficientes  para  o  enterramento  dos  indiví- 
duos que  não  professem  a  religião  catholica,  ou  foram  privados 
de  sepultura  ecclesiastica,  em  relação  ao  logar  em  que  houverem 
de  ser  sepultados,  vedando-se  por  um  pequeno  muro  com  entrada 
própria»;  que  antes  de  10  annos  não  poderão  ser  abertos  alicer- 
ces ou  feitas  excavaçÕes  dentro  dos  cemitérios  que  tenham  sido 
fechados.  O  legislador  não  preveniu,  como  convinha,  a  remoção 
das  ossadas  depois  de  findo  aquelle  prazo.  Por  isso  com  razão 
ordenou  S.  Carlos,  no  Concilio  provincial  de  Milão  «que  em  to- 
dos os  cemitérios  houvesse  uma  casa  de  abobada  chamada  Ossoa- 
rio,  para  n"ella  serem  guardados  os  ossos  que  se  fossem  tirando 
das  sepulturas». 

E  concebido  nos  seiíuintes  termos  o  relatório  do  decreto  de 
21  de  setembro  de  i835: 

Senhora:  — Muitas  providencias  executivas  se  tem  determinado 
em  diversos  tempos  para  acabar  com  a  pratica  supersticiosa  de 
enterrar  os  mortos  dentro  dos  templos  —  pratica  offensiva  do  res 
peito,  e  veneração  devida  aos  logares  sagrados  em  que  se  adora 
a  Divindade.  Estas  providencias  não  produziram  o  desejado  eífeito, 
porque  lhes  faltava  o  caracter  solemne  de  medida  geral,  e  por- 
que se  não  tornaram  responsáveis  ou  os  executores,  ou  os  que 
se  oppozessem  á  execução  das  ordens.  Outra  rasão  se  deu  sem- 
pre para  illudir  taes  providencias,  e  rasão  plausível.  A  auetori- 
dade,  que  vedava  os  enterros  nos  templos,  não  tornava  effectivo:-'. 
os  estabelecimentos  dos  cemitérios,  ou  apenas  lhes  designava  por- 
ções de  terreno,  abertas  e  devassadas  por  animaes,  com  escândalo 
dos  fieis,  que  não  podiam  supportar  que  fosse  tratado  com  irre- 
verências o  jazigo  dos  mortos.  Estes  inconvenientes  eram  ainda 
encarecidos  pelo  interesse  d^quelles  que  lucravam  com  a  pratica 
funesta  á  saúde  dos  seus  concidadãos,  vindo  assim  a  fazer  um  tra- 
fico da  pestilência,  e  da  morte,  que  quanto  mais  frequente,  mais 
proveitoso  lhes  era!  Eis  os  motivos  porque  durou  por  tantos  sé- 
culos este  abuso  vergonhoso,  —  a  ignorância  da  edade  media  o 
transformou  em  dever  de  religião,  cedendo  a  suggestões  insidiosas 
dos  que  derramavam  a  fatal  crença  de  que  alcançariam  a  gloria 
das  almas  aquelles,  cujos  corpos  jazessem  em  companhia  das  ima- 
gens dos  santos,  dentro  dos  templos  sagrados.  Mas  ainda  n' esses 
tempos  de  obscuridade  e  de  fereza  de  costumes  a  voz  da  religião 
esclarecida   e  livre  de  prejuízos  soou  contra  taes  praticas,  prohi- 


—  32  — 

bindo-as,  posto  que  sem  effeito,  porque  desgraçadamente  os  cos- 
tumes podem  mais  do  que  as  leis;  e  porque  os  ditames  de  poucos 
homens  illustrados  se  perdem  no  meio  da  cegueira  geral.  Nos 
Concílios  de  Braga  em  663,  de  Meaux  em  845,  de  Tribur  em  8g5 
e  de  Reims  em  11 17,  foram  condemnados  os  enterros  dos  mortos 
nos  templos.  Em  epochas  posteriores  repetiu-se  a  mesma  con- 
demnação;  mas  só  foi  dado  á  illustração  dos  povos,  sob  governos 
justos  e  zelosos  do  bem  da  communidade,  extirpar  um  mal,  origem 
de  immensos  males,  e  que  tanto  mais  difficil  era  de  desarraigar, 
quanto  se  fundava  em  noções  religiosas,  mal  applicadas,  sim,  porém 
úteis  á  cobiça  que  cega  o  entendimento,  e  fecha  os  ouvidos  á  voz 
da  humanidade.  Auctorisado  o  governo  de  Vossa  Magestade  para 
prover  á  organisação  de  administração  do  reino,  devia  elle  prestar 
a  devida  attençao  a  um  ramo  tão  importante  d'ella;  mandar  logo 
proceder  á  demarcação  dos  terrenos  para  os  cemitérios,  fazer 
eftectiva  a  ordem  em  tempo  determinado;  indicar  as  circumstan- 
cias  dos  logares  designados;  tornal-os  próprios  para  o  fim  a  que 
são  dispostos;  ordenar  as  ceremonias  ecclesiasticas,  segundo  a  pra- 
tica da  egreja;  apromptar  os  meios  necessários  para  o  acabamento 
das  obras  em  certo  praso,  commettendo  o  negocio  aos  primeiros 
agentes  da  administração.  Pareceu  também  necessário  prover  a 
uma  circumstancia  importante.  Muitas  famílias  estão  de  posse,  por 
direito  adquirido,  de  jazigos  particulares  para  os  membros  delias; 
a  piedade  filial,  um  dos  caracteres  mais  salientes  da  moral  publica, 
venera  esses  logares;  porque  Telles  se  conservam  as  relíquias  de 
seus  maiores;  e  para  que  nem  similhante  respeito  se  perca,  nem 
sentimentos  tão  louváveis  sejam  contrariados  deshumanamente,  se 
concede  áquelles,  que  possuem  taes  jazigos,  egual  acquisição  de 
terrenos  separados  nos  cemitérios  públicos  e  que  para  elles  pos- 
sam transportar  os  sarcófagos,  lapides  e  despojos  mortaes,  que 
tinham  nos  carneiros  que  possuíam.  Algumas  medidas  particula- 
res, que  agora  são  omittidas,  formarão  o  objecto  de  instrucçoes, 
que  hão  de  ser  enviadas  aos  governadores  civis,  e  outras,  depen- 
dentes de  circumstancias  locaes,  elles  as  darão  como  melhor  con- 
vier. 

Para  preencher  tão  necessários  fins  o  governo,  pela  repartição 
dos  negócios  do  reino,  propõe  a  Vossa  Magestade  o  seguinte  de- 
creto. Secretaria  de  estado  dos  negócios  do  reino  em  21  de  setem- 
bro de  i835.=  Rodrigo  cia  Fonseca  Magalhães,  ministro  e  secre- 

.  *  -  .  •  ~      Cs  * 

tano  d'estado  dos  negócios  do  reino. 

Em  18  de  setembro  de  1844  ampliou-se  a  disposição  dum  ar- 
tigo permittindo-se  a  construcção  de  jazigos  ou  carneiros  privati- 
vos a  distancia  não  inferior  a  800  passos  do  povoado,,  precedendo 
para  isso  licença  do  governo. 


Primitiva  capella  de  S.  Fructuoso 
(S.  Salvador  de  Montelios) 


34 


S.   SALVADOR   DE   MONTELIOS 


Entre  a  cidade  de  Braga  e  a  suburbana  freguezia  de  Dume, 
no  logar  denominado  Montclhos,  Montelios  ou,  como  se  lê  num 
documento  do  século  ix,  Monte  Módico,  construíram  os  povos 
romanos,  que  alli  deixaram  preciosos  vestígios  da  sua  civilisação, 
a  Torre  Capitolina  e  um  Templo  dedicado  a  Esculápio,  deus  da 
medicina. 

No  próprio  local  d'este  velho  Templo  pagão,  fundou  S.  Fru- 
ctuoso,  Bispo  de  Dume  e  simultaneamente  de  Braga  desde  o  i.° 
de  dezembro  de  656,  em  que  foi  eleito  no  io.°  Concilio  de  To- 
ledo, um  mosteiro  da  invocação  do  Salvador,  afim  de  ser  nelle 
sepultado,  exigindo  que  os  operários  trabalhassem  de  dia  e  de 
noite,  continuamente,  para  que  se  concluísse  durante  a  sua  vida 
cujo  termo  sentia  approximar-se.  E  não  errou  o  calculo,  porque 
pouco  depois,  a  16  de  abril  de  665,  entregou  a  alma  a  Deus. 

Para  evitar  desavenças,  quiz  ficar  sepultado  no  referido  mos- 
teiro, a  egual  distancia  dos  bracarenses  e  dumienses,  que  já  em 
sua  vida  disputavam  a  posse  do  seu  cadáver. 

E1  de  suppor  que  S.  Fructuoso  christianisasse  o  Templo  de 
Esculápio,  como  annos  antes  suecedera  ao  celebre-  Pantheon  de 
Roma.  e  que  a  presente  photogravura  nos  mostre  em  parte  o  que 
elle  foi. 

Esses  restos  venerandos  existem  numa  capella  interior  da  actual 
egreja  de  S.  Fructuoso,  á  direita  de  quem  entra,  denominação  que 
data  da  morte  do  santo  Bispo  alli  sepultado  em  tumulo  de  már- 
more que  ainda  hoje  existe. 

.  Essa  egreja,  como  todas  as  da  epocha,  tinha  a  porta  para  o 
occidente,  sendo  de  forma  quadrangular  a  capella  de  que  me  oc- 
cupo  e  que  mede  interiormente  5,3y  ao  comprimento  e  á  largura. 
CompÕe-se  de  quatro  arcos  perfeitos  que  servem  de  supporte  ás 
paredes. 

O  da  frente  e  os  dois  lateraes  téem  cada  um  três  pequenos 
arcos  decorativos  sotopostos  que  descançam  sobre  columnas  de 
mármore  de  Extremoz,  districto  de  Évora,  as  quaes  medem  3  me- 
tros de  altura.  D'estes  pequenos  arcos,  o  do  meio  não  abrange  mais 
de  i'",3.  e  os  lateraes  o"', 55.  Os  dois  capiteis  das  columnas  da  frente 
são  corinthios,  os  do  lado  do  Evangelho  compósitos  e  os  da  Epis- 
tola compõem-se  da  mesma  folhagem  ornamental  das  pilastras. 

O  facto  de  assentarem  directamente  no  solo,  sem  pedestal,  os 
fustes   das   seis   columnas   que   existem  e  de  se  distanciarem  tão 


—  03 


Interior  da  primitiva  capella  de  S.  Fructuoso 


—  36  — 

pouco  umas  das  outras,  faz  pensar  na  divisão  interior  das  antigas 
basilicas,  que  eram  construcções  civis,  aproveitadas  pelos  christãos 
para  o  exercício  do  culto. 

O  que  me  parece  fora  de  toda  a  duvida  é  que  esta  obra  per- 
tence ao  segundo  periodo  da  architectura  medieval,  estylo  byzan- 
tino  com  leves  modificações.  Do  que  nos  diz  em  1706  o  Padre 
António  Carvalho  na  sua  Chorografia,  tom.  I,  pag.  i?7,  depre- 
hende-se  que  ainda  então  existia  a  egreja  com  22  columnas  !  «Foi 
este  convento  (de  S.  Fructuoso)  um  dos  mais  notáveis  que  teve  a 
Ordem  de  S.  Bento,  e  o  destruíram  todo  os  mouros,  ficando  só 
a  egreja  que  hoje  existe,  lavrada  em  forma  de  crit{,  com  vinte  e 
duas  columnas  de  mármore  que  a  sustentam. » 

Faz  referencia  a  essa  destruição  uma  lapide  que  D.  Diogo  de 
Sousa  mandou  embeber  na  parede  do  lado  direito  da  escada  de 
14  degraus  de  granito,  que  do  pavimento  da  nova  egreja  dá  ac- 
cesso  para  a  vetusta  capella.  Esta  inscripção  foi  pela  primeira  vez 
publicada  em  1893  no  meu  livro  InscripçÕes  e  Lettreirosi  e  é 
como  segue  : 


FRVLJWOlTEWíA. 


«MWWS.EKPVGNMltTVR.CO 

NFWMETltòEIO 

MTISJN10NllSTEtíMiTW.!m 
.XlIM/AENSMEEEjtjS. 

Por  motivo  da  deserção  dos  bracarenses,  doou  el-rei  D.  Af- 
fonso  III  ao  Bispo  de  Iria,  em  883,  este  mosteiro  de  S.  Salvador 
de  Montelhos  e  o  de  S.  Martinho  de  Dume. 

As  dezeseis  columnas  que  faltam  desappareceram  com  o  resto 
do  edifício  em  18  de  junho  de  1728,  dia  em  que  teve  principio  a 
construcção  da  actual  egreja,  com  a  assistência  do  Arcebispo  D.  Ro- 
drigo de  Moura  Telles,  fallecido  ás  1 1  horas  da  noite  de  4  de  se- 
tembro do  referido  anno. 

As  cadeiras  coraes,  com  os  14  magníficos  retratos  de  Arce- 
bispos,  em   tela,  e  ainda  a  preciosa  estante  com  incrustações  de 


—  o7  — 

metal  amarello,  pertenceram  á  Sé  de  Braga,  sendo  tudo  cedido 
aos  religiosos  de  S.  Fructuoso  no  anno  de  1737,  por  motivo  de 
então  se  construírem  na  cathedral  os  grandes  órgãos  e  as  actuaes 
cadeiras  de  pau  preto  envernizadas  e  douradas.  Os  retratos  que 
substituiriam  com  vantagem  os  do  salão  archiepiscopal,  represen- 
tam:—  S.  Faustinus  Marts  —  S.  Profuturus  —  B.  Godinus — V.  D. 
Fr.  Bartholomeus  a  Martyribus  vir  apostolicus — B.  Calidonius — 
Henricus  S.  R.  E.  Card.  et  Lusit.  rex  —  S.  Serenianus  — S.  Petrus 
Julianus  —  Joannes  XXI  Pontifex  Max. — D.  Potamius  Paenitens 
—  S.  Quiricus  —  S.  Paternus  —  S.  Tholobeus. 

Ao  fundo  do  coro: — V.  D.  Laureníius  e  S.  Policarpus.  No 
alto: 

BENED1C1TE  BENEDICITF 

SERVI  SACERDOTES 
DOMINI  DOM1NI 

DOMINO  DOMINO 

A  tribuna  d'esta  egreja  é  de  bella  talha  dourada  com  colum- 
nas  torciculadas.  Tem  no  alto  a  imagem  da  Conceição  e  aos  lados 
S.  Fructuoso  e  S.  Francisco.  No  corpo  ha  os  altares  de  Santo  An- 
tónio, Família  sagrada,  Senhora  das  Dores  e  S.  Domingos. 

Existe  na  sacristia  um  relicário  de  prata  dourada  offerecido 
pelo  Arcebispo  D.  fr.  Agostinho  de  Jesus,  cujas  armas  tem  na  base 
com  o  seguinte  lettreiro: 

d.  s. 

FRVCTVOSO 
ARC." 

Contém  este  relicário  um  pequeno  pedaço  do  cordão,  habito  e 
cabello  de  S.  Fructuoso. 

A  fachada  da  egreja  é  bem  esculpturada.  A  pequena  distancia 
levanta-se  um  elegante  cruzeiro  com  as  armas  de  D.  Diogo  de  Sou- 
sa, em  tudo  egual  ao  que  ora  se  vê  ao  fundo  da  rua  dos  Pella- 
raes. 

N'este  século  celebrou-se  o  quinto  Concilio  Toletanum  (anno 
de  636)  em  que  o  rei  Cinthilla  diligenciou  que  alguns  cânones  se 
occupassem  do  seu  poder  para  melhor  e  mais  facilmente  governar 
os  povos.  A  este  monarcha  se  deve,  em  parte,  a  deliberação  to- 
mada no  VI  Concilio  Toletanum,  de  9  de  janeiro  de  638,  sobre  a 
elevação  dos  reis  ao  throno.  para  que  antes  do  acto  nenhum  dei- 
xasse de  prometter  a  conservação  da  fé  catholica.  No  Toleta- 
num VIII,  que  durou  desde  dezembro  a  janeiro  de  653,  leu  el-rei 
Recesvinto,  na  presença  de  52  Bispos,  a  sua  profissão  de  fé,  pro- 
mettendo   admittir  os   quatro  Concílios  geraes.  O  10."  cânon  de- 


—  38—. 

termina  que  a  eleição  do  rei  seja  sempre  feita  onde  o  antecessor 
morrer,  e  pelos  Bispos  e  officiaes  maiores  do  Paço  que  então  alli 
se  acharem. 

Os  peccadores  principiaram  a  ser  feprehendidos  publicamente 
desde  o  XI  Concilio  Toletanum  (7  de  novembro  de  675)  onde  tam- 
bém se  resolveu  que  fossem  presos  ou  desterrados,  pronuncian- 
do-se  a  sentença  na  presença  de  3  testemunhas  e  sendo  em  seguida 
assignada  pelos  Bispos. 

As  principaes  resoluções  do  3.°  Concilio  Bracarense,  que  teve 
logar  em  673  sob  a  presidência  de  Leodigio,  Bispo  de  Braga,  e 
do  rei  Wamba,  são  as  que  seguem:  «Porque  de  certas  pessoas 
nos  foi  referido  que  otfereciam,  nos  sacrifícios  do  Senhor,  leite  em 
logar  de  vinho,  e  que  tinham  para  si  haver-se  de  dar  ao  povo  a 
Kucharistia  lançada  no  vinho  para  inteireza  da  communhão.  E  o 
porque  de  todas  estas  cousas  é,  que  não  faltam  assim  sacerdo- 
tes que  põe  suas  eguarias  nos  vasos  do  Senhor,  e  costumam  co- 
mer n'elles.  De  outros  sacerdotes  se  nos  disse  que  esquecida  a 
ordem  do  costume  ecclesiastico,  costumam  di/er  missa  sem  esto- 
la, e  que  nas  solemnidades  dos  martyres  lançando  reliquias  ao 
pescoço  e  sentados  em  cadeiras,  eram  levados  por  diáconos.  Que 
muitos  sacerdotes  sem  approvação  moram  com  mulheres.  Que  ou- 
tros oíferecem  vinho  espremido  da  uva  no  cálix  do  Senhor». 

Estes  abusos  foram  então  condemnados,  declarando-se  além 
d'isso  incurso  «na  lei  de  penitencia  por  espaço  de  seis  mezes 
qualquer  sacerdote  ou  pessoa  ecclesiastica  que  trate  com  mulheres 
que  não  seja  sua  própria  mãe». 

N'este  Concilio  esteve  presente,  como  no  segundo,  um  Bispo 
de  Briteiros  chamado  Froarico.  Parece,  pois,  fora  de  duvida  que 
antigamente  existiu  no  concelho  de  Guimarães,  a  cidade  episcopal 
de  Briteiros,  que  comprehenderia  toda  a  ária  das  três  actuaes  fre- 
guezias  d'este  nome:  —  Santo  Estevam,  Santa  Leocadia  e  S.  Sal- 
vador, no  meio  das  quaes  se  ergue  sobranceiro  o  monte  da  Ci- 
tania,  tão  notável  pelos  vestígios  que  hoje  mostra  das  três  civili- 
sações  que  o  habitaram,  pouco  distante  do  outro  denominado  do 
Sabroso,  habitado  na  epocha  proto-historica. 

E'  tradição  que  n'esta  antiga  cidade,  sede  de  bispado,  foi  se- 
pultado Hermerico  rei  Suevo,  e  que  os  seus  Bispos  existiram  até 
á  destruição  da  Hespanha.  Na  divisão  da  jurisdição  dos  bispados, 
feita  no  Concilio  de  Lugo  (anno  de  579),  coube  ao  de  Briteiros 
«desde  a  ponte  de  Donim  até  á  ponte  de  S.  João,  tendo  pelo  norte 
e  poente  a  serra  de  Espinho,  ao  nascente  Morreira,  sul  rio  Ave.» 

Nos  Concílios  celebrados  em  634.  653  e  666,  tomaram  parte 
os  Bispos  de  Briteiros  Adulfo,  Somna,  etc.  A  egreja  parochial  de 
Santa  Maria  de  Yilla  Nova  de  Sande,  que  por  aquelle  tempo  se 
denominava   Mosteiro  de   Máximo,    era  uma  das  2(5  demarcadas 


-39  — 

pelo  rio  Ave  (Apus  jlupius),  pertencentes  á  comarca  de  Briteiros. 

A  festa  de  Todos  os  Santos,  que  ainda  hoje  é  celebrada  no 
i."  de  novembro,  teve  a  sua  origem  na  dedicação  do  templo  Pan- 
theon  a  Nossa  Senhora  da  Rotunda,  quando  o  Papa  Bonifácio 
IV  (608-61 5)  o  obteve  de  Focas. 

Bonifácio  A"  (619-625),  sentindo  approximar-se  a  morte,  quiz 
presentear  Eduino,  rei  de  Northumbria.  na  Inglaterra,  enviando-lhe 
uma  camisa  bordada  a  ouro  e  uma  riquíssima  capa  ;  e  para  a 
rainha  Edelburga,  um  espelho  de  prata  e  um  pente  de  marfim  en- 
castoado em  ouro.  Com  estes  valiosos  objectos  foram  duas  car- 
tas, uma  convidando  Eduino  a  abraçar  a  religião  christã,  e  outra 
felicitando  Edelburga  por  se  converter  á  fé. 

Admittiram-se  pela  primeira  vez  na  egreja  os  órgãos  em  tempo 
do  Papa  Yitaliano,  cujo  governo  durou  desde  3o  de  julho  de  fõy 
a  27  de  janeiro  de  672. 

O  titulo  de  Soberano  Pontífice  foi  pela  primeira  vez  conferido 
a  Theodoro  (642-649),  no  Concilio  Africano,  celebrado  no  anno 
de  646.  Anteriormente  a  esta  data  apenas  os  imperadores  roma- 
nos o  usavam  com  esta  alteração  :  pontifex  maximvs  (Pontífice  Má- 
ximo). Os  títulos  de  Vigário  de  Jesus  Lhristo  e  Vigário  Apostólico, 
que  os  Bispos  do  século  ix  usavam,  passou  no  xui  para  os  Summos 
Pontífices  que  antigamente  se  denominavam  Vigários  de  S.  Pedro. 
O  costume  de  beijar  os  pés  ao  Papa  data  do  anno  de  700. 

Santo  Agathão  (679-682)  conseguiu  que  o  imperador  de  Roma 
dispensasse  a  Egreja  do  pagamento  da  pesada  contribuição  a  que 
estava  obrigada  pela  sagração  dos  Papas,  acto  este  que  nem  sem- 
pre se  effectuava  dentro  de  breve  prazo  depois  de  serem  eleitos  ; 
por  isso  no  tempo  de  Bento  II  (684-685)  a  sagração  principiou  a  ter 
logar  seguidamente  d  eleição  do  Papa. 

No  presente  século  vir,  a  sociedade  civil  sentiu-se  enfraquecida 
pela  deserção  dos  indivíduos  que  se  dispunham  a  povoar  os  nume- 
rosos mosteiros  fundados  n'àquella  epocha.  Entre  nós  os  fieis  do 
século  x  legaram  aos  dos  dois  séculos  seguintes  o  frequente  cos- 
tume de  oílerecerem  em  parte  ou  no  todo  os  seus  bens  aos  mos- 
teiros e  demais  corporações  ecclesiasticas,  ficando  por  esse  facto 
denominados  Oblatos,  Oííertos,  Donatos,  Condonatos,  Confrades 
e  Familiares,  com  direito  aos  bens  espirituaes  da  corporação  ;  e 
se  declaravam  que  queriam  entrar  na  communidade,  ficavam  sendo 
commensaes  d'ella,  gosando  varias  regalias  que  nem  sempre  foram 
úteis  á  causa  do  ebristianismo,  como  o  demonstra  S.  Pedro  Ve- 
nerável determinando,  nos  estatutos  de  Cluni,  cap.  XLVIII  a  que 
não  fossem  admittidos  similhantes  indivíduos  ainda  que  houves- 
sem de  trazer  á  Ordem  muitas  riquezas  temporaes».  Não  obstante, 
a  missa  que  .  em  differentes  mosteiros  era  diariamente  celebrada 
pro   Famtliaribus,  prova   a  continuação  dos  externos,  aos  quaes 


-4o  — 

faz  referencia  o  Concilio  Lateranense  (anno  de  121  5)  no  seu  cap.^ 
LVII,  mostrando  que  só  com  licença  do  Prelado  do  mosteiro  po- 
deriam fazer  testamento.  Denominavam-se  serros  dos  quatro  di- 
nheiros aquelles  que  se  declaravam  escravos  do  mosteiro  com  a 
mulher,  filhos  e  bens,  lançando  sobre  o  altar  esta  moeda  que  an- 
tes haviam  collocado  na  cabeça  ;  e  seri'os  da  gleba  por  prenderem 
íio  pescoço  a  corda  do  sino. 

Para  remédio  de  suas  almas  havia  muito  quem  doasse  aos 
mosteiros  uma  pitança  annual.  Outros,  então,  embora  raros,  dei- 
xavam á  egreja  os  seus  haveres  para  que  Nosso  Senhor  lhes  per- 
doasse as  mortes  que  tinham  feito! 

No  X  Concilio  Tolentino,  celebrado  cm  hòb,  sob  a  presidên- 
cia do  Arcebispo  Santo  Eugénio,  instituiu-se  a  festa  da  Annuncia- 
cao  que  tem  logar  sete  dias  antes  do  Natal.  Santo  Ildefonso,  so- 
brinho do  referido  Arcebispo,  ordenou  que  a  esta  festa  fosse  dado 
o  titulo  de  Expectação  ou  do  O',  que  é  a  exclamação  do  principio 
das  Antiphonas  maiores.  As  Cathedraes,  as  Collegiadas  e  os  Mos- 
teiros deram  este  nome  ao  beberete  que  até  ao  principio  do  sé- 
culo xv  offereciam,  iVaquelles  sete  dias,  e  o  qual  constava  de  vi- 
nhos brancos  e  vermelhos,  fruetas  e  espécies,  confeitos,  tâmaras  e 
passas». 

O  18.0  Concilio  Toletanum,  celebrado  em  701,  foi  o  ultimo  do 
tempo  do  rei  Witisa,  recente  suecessor  de  Egica.  No  Constantino- 
politanum  que  durou,  com  reprovação  da  egreja,  desde  10  de  fe- 
vereiro a  8  de  agosto  de  754,  achavam-se  338  Bispos  que  todos 
collaboraram  no  extenso  decreto  contra  as  imagens  sagradas.  Em 
Roma  determinou-se  a  12  de  abril  de  76(1  que  se  anathematizasse 
o  Concilio  e  que  as  imagens  e  relíquias  continuassem  a  receber 
as  honras  dos  christãos.  Occasionavam  esta  controvérsia  os  anti- 
gos costumes  dos  bárbaros  conversos  cuja  interferência  nos  negó- 
cios da  Egreja  foi  altamente  ruinosa.  Muitos  monges  ignorantes, 
como  o  prova  Alcuino  em  seus  escriptos,  oppunham-se  á  confissão 
auricular  estabelecida  como  dogma,  insinuando  aos  fieis  que  de- 
veriam confessar-se  unicamente  a  Deus.  Classifico-os  de  ignorantes 
fundando-me  nas  determinações  dos  Concílios  d^quelle  tempo  que, 
referindo-se  não  só  a  estes  mas  ao  clero  cm  geral,  exigiam  «que 
ao  menos  soubessem  explicar  o  Symbolo  e  a  Oração  Dominical  aos 
povos,  todos  os  que  fossem  promovidos  ás  Ordens  Sacras». 

Os  regulares  distinguiam -se  pelos  eabellos  curtos,  tonsura  e 
casula,  que  era  o  seu  vestuário,  pois  traziam  os  seculares  um  saio 
e  sobre  elle  uma  capa.  O  habito  talar  data  de  i3Go.  Até  ao  anno 
de  255,  todos  os  sacerdotes  celebravam  o  santo  sacrifício  da  missa 
com  os  seus  vestidos  de  uso  ordinário. 

O  culto  do  gentilismo,  conservado  até  este  século  pelos  habitan- 
tes ruraes  (pagf,  pequenas  povoaçÕesj,  deu  origem  á  palavra  pagão. 


—  4i  — 

Em  789  determinou  Carlos  Magno  que  se  applicasse  a  pena 
de  morte  a  quem  infringisse  a  lei  quaresmal  que  prohibia  o  uso 
de  vinho,  ovos  e  leite.  Muitos  fieis  evitavam  os  alimentos  cosidos, 
limitando-se  a  pão  e  agua,  ou  tâmaras,  nozes  e  amêndoas.  S.  Ma- 
cário de  Alexandria  não  dormia  e  apenas  comia  aos  domingos 
uma  folha  de  couve  crua!  Santa  Maria  Egypciaca  passava  sem  ali- 
mentos. Em  compensação  já  havia  quem,  como  Erasmo,  respon- 
desse aos  que  censuravam  a  irregularidade  quaresmal:  «Saibam 
que  a  minha  alma  é  catholica,  mas  que  o  meu  estômago  é  pro- 
testante». 

A  instituição  da  quaresma,  que  teve  em  vista  pôr  termo  ao 
costume  de  muitos  christãos  jejuarem  todo  o  anno,  deve  alludir 
aos  quarenta  dias  de  duração  do  diluvio,  penitencia  de  Jonas  aos 
ninivitas,  jejum  de  Moysés,  demora  de  Elias  no  deserto,  ou  aos 
40  dias  e  40  noites  do  jejum  de  Christo.  Entre  nós  este  jejum  ou 
abstinência  termina  com  o  ultimo  dia  de  vida  do  Judas  de  Kerioth 
que,  pendente  de  cordas  pelas  ruas  e  largos,  é  queimado  ás  10 
horas  da  manhã  de  sabbado  de  alleluia,  quando  desperta  festiva 
a  sinarada. 


SYNCHRONÍSMOS   DO   SÉCULO   ÍX 

Desde  822  até  886,  a  cruel  perseguição  musulmana  contra  os 
christãos  na  Hespanha,  que  era  o  centro  da  potencia  árabe  no 
occidente,  attingiu  o  maior  grau  de  intensidade,  em  virtude  da 
independência  do  chefe  da  nação  para  com  o  califa  de  Bagdad.  O 
fanatismo  de  Abderrame  II,  rilho  de  Moavias,  foi  posto  a  toda  a 
evidencia  com  a  severidade  das  suas  leis  de  ódio  contra  os  filhos  da 
Egreja  catholica,  ordenando  com  o  voto  do  seu  Conselho  a  morte 
de  quem  deixasse  de  respeitar  Mafoma.  A'  vista  do  seu  Paço  e  a 
pouca  distancia  delle,  funccionavam  diariamente  numerosas  forcas 
levantadas  nos  arredores  de  Córdova,  grande  e  rica  cidade  penin- 
sular, onde  em  852  foi  celebrado  o  Concilio  Cordubense  a  que 
assistiram  vários  metropolitas  convocados  pelo  impio  Abderrame, 
que  receiava  a  sublevação  dos  christãos  contra  os  infiéis  exalta- 
dos, tratando-se  especialmente  do  socego  d'estes.  O  Concilio  de- 
cretou que,  de  futuro,  ninguém  mais  se  ofYerecesse  ao  martyrio. 

Estevão  VI  (806-897)  fez  trazer  á  presença  do  Concilio  por  elle 
celebrado,  o  corpo  do  Papa  Formoso  (891-896),  Bispo  da  Diocese 
do  Porto,  quando  foi  eleito  para  a  cadeira  de  Roma,  e,  não  con- 
tente com  o  desterro  que  lhe  dera  em  vida,  mandou-o  revestir 
com  os  ornamentos  sagrados,  sendo  em  seguida  collocado  na  ca- 
deira patriarchal,  como  se  ainda  estivesse  vivo;  o  advogado  que 
lhe  nomearam  para  o  julgamento  não  ponde  obstar  a  que  o  morto 


—  42  — 

fosse  novamente  condemnado  ao  degredo  (!! !),  ao  corte  de  três 
dedos,  á  decapitação  e  ao  lançamento  do  cadáver  ao  rio  Tibre 
(H.  Ecc.  vol.  3,  pag.  3y5),  onde  no  anno  de  898  uns  pescadores 
o  acharam  sendo  então  solemnemente  reconduzido  á  sepultura  dos 
Papas,  por  ordem  do  suecessor  Theodoro  que  promptamente  res- 
tabeleceu os  clérigos  a  quem  Formoso  dera  a  ordenação. 

Esta  scena,  bastante  parecida  com  a  de  D.  Ignez  de  Castro. 
que  depois  de  morta  foi  rainha,  serviu  talvez  de  modelo  ao  vin- 
gador do  bárbaro  assassinato,  o  nosso  rei  D.  Pedro  I  (o  crú). 

Hincmar  escreveu,  no  anno  de  874,  os  Estatutos  Synodaes, 
em  que  se  faz  referencia  á  agua  benta  com  que  desde  o  século  11 
se  aspergia  o  povo,  ao  pão  bento  que  os  lieis  recebiam  antes  da 
communhão,  e  á  instituição  dos  Deões  das  aldeias  para  inspeccio- 
narem os  curas  do  seu  districto  e  darem  ao  Arcediago  conta  de 
qualquer  irregularidade  que  ao  Bispo  competisse  punir. 

Estes  curas,  posteriormente  estabelecidos  nas  cidades,  eram 
no  seu  principio  o  que  hoje  são  os  parochos  ruraes  a  quem  é  con- 
fiado o  governo  das  egrejas,  com  a  dilferença  de  lhes  permittirem 
trabalhos  manuaes,  especialmente  agrícolas,  depois  de  cumpridas 
as  obrigações  pastoraes — visita  aos  enfermos  e  resa  do  officio  Di- 
vino. Os  Concilios  prohibiam  a  celebração  de  missas  sem  ouvintes 
e  lembravam  aos  padres  a  obrigação  dt  resarem  quotidianamente 
as  horas  canónicas. 

O  IV.0  Concilio  geral  de  Constantinopla,  celebrado  no  anno 
de  869,  refere-se  ao  antigo  costume  de,  nas  vésperas  dos  Santos  In- 
nocentes,  ser  entregue  pelo  Chantre  ao  menino  mais  novo  do  coro 
o  báculo  episcopal  para  que  ficasse  a  governar  o  clero  até  ao  final 
do  Officio  do  dia  immediato.  O  Bispo  dos  meninos  (assim  se  de- 
nominava) visitava  então  a  Cathedral  e  as  egrejas  da  cidade. 

Ainda  em  1182  nos  diz  João  Beleth  (L.  dos  OJficios  Divinos, 
cap.  lxxii): 

«Depois  do  Natal  quatro  grandes  bailes  se  fazem  na  egreja,  a 
saber:  o  dos  Levitas,  o  dos  Sacerdotes,  o  dos  Meninos  e  o  dos 
Hypodiaconos,  etc.» 

Em  Inglaterra  durou  este  costume  até  ao  anno  de  i53o. 

O  Cardeal  Pedro  Capuano,  Legado  Apostólico  em  França, 
foi  quem  primeiro  se  oppoz  a  estas  costumeiras  indecentes.  De- 
pois a  Faculdade  Theologica  dirigiu  aos  Bispos,  em  1444,  a  Ene- 
gelica  em  que  se  refere  que  na  occasião  dos  officios  Divinos 
entravam  na  egreja  mascarados  com  danças  e  cantorias;  «uns 
comiam  sopas  e  gorduras  sobre  o  mesmo  altar  em  que  se  estava 
celebrando  o  incruento  sacrifício;  jogavam  dados,  incensavam  com 
pratos  de  carne  e  botelhas  cheias  de  vinho,  ou  com  fumo  de  sa- 
patos velhos,  etc.»  Em  1 145  o  Concilio  de  R'jão  anathematisou 
estes  divertimentos  impróprios  da  casa  do  Senhor. 


-43- 

E'  de  todos  conhecido  o  que  a  este  respeito  se  passava  nas 
nossas  communidades  religiosas  nos  dias  i.°  de  janeiro  e  Reis  de 
cada  anno;  porém  essas  folganças,  alem  de  não  terem  logar  fora 
dos  conventos,  eram  respeitosas,  nunca  immoraes. 


Egreja  de  S.  Miguel  do  Castello  (Guimarães)  ' 


A  architectura  singella  e  tosca  d'esta  pequena  egreja,  a  espes- 
sura das  paredes,  os  modilhões  largos  e  lizos  e  o  próprio  remate 
da  porta  em  desalinho  com  o  da  fachada,  tudo  nos  assegura  que 
a  sua  construecão  data  dos  fins  da  epocha  primordial  romano- 
byzantina,  século  x. 

Alguns  dos  nossos  mais  notáveis  archeologos,  como  o  sr.  Vi- 
lhena Barboza,  descobrem  no  arco  da  porta  principal  a  forma 
ogival,  quando  apenas  existe  uma  leve  elevação  no  fecho,  e  crêem 
por  isso  que  data  do  século  xn  em  que  este  estylo  architectonico, 
segundo  elles,  foi  introduzido  em  Portugal.  Eu  não  sei  em  que  se 


1  Cópia  de  photographia  do  distincto  amador  bracarense  Manuel  Carneiro. 
Esta  egreja  apparece  hoje  pela  primeira  ves  photographada  do  lado  norte  e  de 
frente. 


-44  — 

fundam  os  que  aflirraam  que  entre  nós  não  se  adoptou  a  ogiva  an- 
tes do  século  xn,  julgando  possivel  que  n'esta  mesma  epocha  se  con- 
struíssem edifícios  religiosos  de  tão  bárbaro  aspecto,  quando  pelo 
contrario  se  acredita  que  os  soldados  peregrinos  das  cruzadas 
aprenderam  as  artes  de  Byzancio  procurando  desde  logo  chamar 
para  Portugal  quem  melhor  soubesse  produ^il-as.  Arcos  como  o 
de  S.  Miguel  do  Gastello  são  mais  velhos  que  os  próprios  Roma- 
nos; e  é  por  isso  um  erro  julgar  que  tanto  estes  como  os  outros 
povos  da  antiguidade,  que  por  aqui  viveram,  só  tinham  conheci- 
mento do  arco  de  volta  inteira.  As  duas  portas  lateraes,  interior- 
mente rematadas  em  ogiva,  são  traçadas  de  maneira  que  se  diria 
não  terem  os  nossos  respeitáveis  antepassados  conhecido  o  uso 
da  régua  e  do  compasso. 

A  circumstancia  de  tudo  aquillo  ser  tosco  deve  estar  bem  pre- 
sente a  quem  fizer  a  critica  d'aquella  architectura.  Eu  insisto  que 
pertence  ao  século  x  em  que  os  bárbaros  procuravam  imitar  igno- 
rantemente as  construcções  dos  romanos. 

A  ornamentação  do  primeiro  dos  dois  arcos  tumulares,  abertos 
na  parte  exterior  da  parede  norte,  é  perfeitamente  egual  á  da 
porta  principal.  Em  epocha  remotíssima  serviu  de  sepultura  ao 
Chantre  de  Coimbra  D.  Martim  Paes,  que  instituiu  capella  com 
duas  missas  cantadas  e  quatro  resadas.  Como  porém  se  perdesse 
a  memoria  d^sta  instituição,  encarregou-se  el-rei  de  prover  os 
seus  administradores,  sendo  em  i658  Jeronyma  de  Castro,  mu 
lher  de  Gaspar  Mendes  da  Guerra,  da  casa  de  Sentiães,  fregue- 
zia  de  S.  Faustino  de  Yizella. 

O  segundo  arco,  sem  ornatos,  pertenceu  a  Joanne  Annes  En- 
xate,  procurador  do  numero  d'esta  então  villa  de  Guimarães  ' 
instituindo  capella  para  que  deixou  suas  herdades  com  obrigação 
de  uma  missa  semanal.  O  seu  testamento,  bastante  curioso,  é 
como  segue,  na  linguagem  da  copia  que  possuo:  «Em  nome  de 
Deus  amen.  Saibam  todos  q  eu  Joani  Anes  procurador  do  nu- 
mero da  V.a  de  Guimarães  em  minha  vida  e  saúde  com  todo  o 
meu  sizo  e  entendimento  qual  me  o  Deus  deu  fasso  minha  manda 
c  meu  testamento  em  esta  guiza,  mando  a  minha  alma  a  Deus  e 
peço  e  rogo  á  Virgem  S.;i  nossa  q  me  queira  perdoar  e  mando 
enterrar  o  meu  corpo  em  a  igreja  de  Santa  Margarida,  seja  minha 
madre  e  mando  á  dita  igreja  para  todo  o  sempre  i  Maravedim  de 
moeda  antiga,  e  q  o  hajam  pelas  minhas  herdades  e  outro  sim 
lhe  mando  20  libras  d'esta  moeda  q  trasem  com  meu  corpo.  E 
mando  ao  abbade  que  for  da  dita  igreja  me  faça  cantar  huma  ca- 


1  Guimarães  foi  elevada  á  categoria  de  cidade  por  decreto  de  10  de  feve- 
reiro  de   i85">,  recebendo-se  a  participação  de  D.  Maria  II  aos  22  de  junho  do 
referido  anno. 


—  45  — 

pella  des  este  dia  para  todo  o  sempre  por  as  minhas  herdades  na 
dita  igreja.  E  mando  a  qualquer  abbade  q  for  da  dita  igreja  4 
maravedis  da  dita  moeda  antiga  por  me  fazer  cantar  a  dita  ca- 
pella,  e  não  a  querendo  fazer  cantar,  q  d1  isto  não  haja  nada  e 
q  a  faça  cantar  o  mays  chegado  do  meu  linhagem,  e  haja  estes 
4  maravedis,  e  elejo  por  substitutos  como  o  direito  outorga  Af- 
fonso  Anes  do  Castello  e  a  Gonçalo  Romeu,  a  Joani  q  se  diz 
meu  filho  morrendo  o  dito  Joani  sem  filho  ou  filha  ou  sem 
neto  elles  ambos  possao  haver  todos  os  seus  bens  e  os  ven- 
dam e  dêem  por  minha  alma  em.  . .  virem  que  comprou,  e  manda 
se  vendão  todos  os  meus  bens  e  se  dem  por  minha  alma,  e 
mando  a  cada  hú  dos  sobreditos  mil  libras  a  cada  hú  por  o  afam 
que  hí  filharem,  e  mando  aos  cónegos  da  igreja  de  Santa  Maria 
da  dita  villa  70  libras  d'esta  moeda  e  que  me  digam  húa  missa 
officiada  e  vigilia  e  me  farão  honra,  e  aos  clérigos  do  coro  no  dito 
dia  3o  libras  e  aos  frades  de  S.  Domingos  e  de  S.  Francisco  a 
cada  ordem  outrotanto  pela  dita  condição,  e  aos  frades  do  Mos- 
teiro da  Costa  5o  libras,  e  aos  de  S.  Trocade  e  de  Souto  trinta 
libras  por  a  dita  condição  e  outro  sim  lhes  mando  outro  tanto  aos 
q  dias  e  outro  tanto  aos  3o  dias,  e  outro  tanto  ao  'anno  e  mando 
me  obradem  hú  anno  na  dita  igreja  de  Santa  Margarida  cada 
dia  com  20  soldos  antre  pão  e  vinho  e  candea,  e  mando  ao  ca- 
pellão  da  igreja  de  Santa  Margarida  por  dízimos  e  por  falhas 
q  não  paguei  á  dita  igreja  20  libras  e  mando  q  dem  por  minha 
alma  aos  9  dias  húa  baça  por  Deos  com  100  libras  de  pão  e  ou- 
tro tanto  ao  mez  e  outro  tanto  ao  anno,  e  mando  a  Thereja  mi- 
nha sobrinha  5oo  libras  para  cazamento  e  aos  outros  meus  sobri- 
nhos e  sobrinhas,  a  cada  um  vinte  libras  e  isto  o  q  me  devem. 
Deveme  Fernam  Roiz  Besteiro  685  libras  sob  6  botões  e  uma  co- 
lher de  prata,  e  me  deve  Luiz  Miz  meu  visinho  3 10  libras  d'esta 
moeda  e  mais  uma  alda  de  panno  pardo  e  devo  Affonso  Vasques 
meu  visinho  60  libras,  e  mando  ao  dito  Luiz  Miz  q  lh'as  pague 
d'estas  q  me  deve,  e  Nicolau  Esteves  almoxarife  da  dita  villa 
me  tem  uma  taça  de  marco  e  meio  a  penhor  por  2(>o  libras,  e 
mando  a  dem  a  Senhorinha  Vasques  q  foi  minha  mulher  a  dita 
taça  e  todolos  outros  bens  q  acharem  em  minha  casa  q  acharem 
seus  sam  e  q  elle  de  a  mim  uma  taça  de  marco  e  meio  de 
prata  e  a  roupa  q  me  tem  Me  deu  Martim  singello  206  libras 
que  me  emprestou  e  mando  que  lh'as  paguem  e  tenho  eu  e  G.1" 
Romeu  pellos  e  somagre  72  pelles  cabruani  e  i5  arrobas  de  so- 
magre  e  a  esto  me  deve  o  dito  G.c"  Romeu  duas  pelles  e  5o  li- 
bras e  do  somagre  cento  e  uma  libra  e  meia  e  eu  devo  a  elle  200 
libras  e  temme  uma  taça  de  prata  pequena,  e  anda  em  sepaes  1 
boi  q  é  meu  e  seu,  e  tenho  12  botões  de  prata  de  Vasco  Dinis 
Abbade   de   Polvoreira    por   5o   libras  e  estes  botões  lancei  eu  a 


-4(5- 

penhor  a  João  Geraldes,  e  que  o  abbade  pague  as  ditas  5o  libras 
a  meus  testamenteiros  os  sobreditos  G.'  °  Romeu  e  Aftbnso  Annes 
e  lhes  mando  o  q  já  hei  mandado  e  q  cumpram  este  meu  tes- 
tamento por  os  meus  bens  e  os  seus  não  sejam  obrigados  e  me 
deve  Álvaro  Vasques  Cizeiro  q  hora  é  de  Guimarães  1.000  li- 
bras desta  moeda  que  hei  de  haver  delle  e  me  tem  João  Garcia 
da  porta  da  Frieira  uma  taça  de  prata  de  i  marco  por  200  libras 
desta  moeda  e  digo  q  recebi  de  João  Carreira,  o  aluguer  das 
casas  em  q  morou  de  3  annos  e  os  2  q  ellas  mais  morou  hão 
de  fazer  seu,  mando  que  de  a  Gonçalo  Romeu  3oo  libras  de  pa- 
pel que  é  uma  resma  que  eu  devo  que  eu  delle  recebi  e  mando 
q  a  dita  Senhorinha  Vasques  pague  a  meus  testamenteiros  3. 000 
hbras  q  paguei  a  Martim  Nz"  por  razão  da  partição  de  seu  fi- 
lho e  por  esta  manda  revogo  todalas  mandas  testamentos  codeci- 
Ihos  q  feitos  hei  antes  d'esta  dou  e  mando  q  não  valhão  e 
valha  esta  q  esta  é  a  minha  e  postumeira  vontade  e  o  assim  o 
outorgo  feito  foi  na  dita  viila  21  dia  de  dezembro  era  de  1436. 
Testemunhas  Gonçalo  Romeu,  Alíonso  Pires  tabellião  mestre  Ma- 
theus  Christovão  das  Cizas,  Estevão  Pires  e  Aifonso  Roiz  Albar- 
deiro  e  Bartholameu  Miz  Cónego  da  Costa  e  João  Carreira,  e  ou- 
tro e  eu  Aifonso  Frz  tabellião  de  nosso  Senhor  ei  Rei  na  dita 
villa  de  Guimarães,  q  este  testamento  por  mandado  e  outorga- 
mento  do  dito  Joani  Anes  escrevi  c  aqui  meu   sinal   fiz  q  tal  é.» 


O  pavimento  da~egreja  está  coberto  de  campas  com  emblemas 
grosseiros  gravados  n'aquellas  pedras  informes, taes  como: — lanças, 
espadas,  machados,  cruzes  gregas,  etc,  as  quaes  devem  ser  pos- 
teriores ao  século  xi.  Em  frente  da  porta  principal,  no  espaço  que 
outr'ora  teve  alpendre,  como  o  denotam  os  modilhoes  da  fachada, 
ha  algumas  d'essas  sepulturas,  numa  das  quaes  se  lê:  de  ioam 
frz  •    As  três  que  pude  ler  no  pavimento  da  egreja  dizem: 

s.A  DE  p.° 

.      S.A   DE  DAM  PIRES 

—  S   DANT.0  IORGE  E   ERD  — 
IAO   DIAS  MOSTE1R 

O   R      OS 

Pertencem  á  egreja  de  Santa  Margarida  todas  as  oliveiras  que 
a  cercam,  pois  assim  foi  determinado  em  sentença  proferida  ;• 
17  de  novembro  de  1763. 

Os  sete  modilhoes  que  se  destacam  em  volta  da  egreja,  a  par 
d\ima  rigula  rasgada  a  todo  o  comprimento  da  parede  sul,  sem 
duvida  para  apanhar  as  aguas  pluviaes,  indicam  que  houve  alli 
um  claustro  talvez  destinado  aos  frades  capuchos  da  Piedade  que 


—  47  — 

no  dia  7  de  fevereiro  de  i(5(55  lavraram  o  termo  da  licença  pedida 
ao  D.  prior  D.  Diogo  Lobo  da  Silveira/para  possuírem  por  emprés- 
timo a  egreja,  onde  já  celebravam  os  olticios  divinos,  emquanto 
não  terminavam  as  obras  da  construcção  do  convento.  Este  termo 
foi  assignado  pelos  religiosos:  —  fr.  Hieronimo  de  Villa  Real, 
guardião;  fr.  João  da  Barca-,  fr.  Manoel  de  Verdemilho  ;  fr.  Pe- 
dro de  Beja  e  fr.  Francisco  do  Porto.  Entraram  na  posse  tem- 
porária desta  egreja  no  dia  12  de  novembro  de  1G64,  e  sairam 
d'alli  para  o  seu  convento,  que  fica  a  poucos  metros  de  distancia 
no  dia  29  de  julho  de  1668.  Na  procissão  solemne  que  os  acom- 
panhou á  nova  casa,  encorporou-se  o  revd."10  Cabido,  camará  mu- 
nicipal, communidades  e  um  numeroso  concurso  de  povo. 

Esta  egreja  de  S.  Miguel  do  Castello  (vulgo  Santa  Margarida) 
foi  sagrada  pelo  Arcebispo  de  Braga  D.  Silvestre  no  armo  de  1239. 
e  reza-se  da  sua  dedicação  a  3o  do  mez  de  abril:  Ecclesia  ista 
dicata  est  a  Domino  Silvestro  Archiep.  Brach.  in  honorem  beati 
Michaelis,  et  S.  Martirum  Salurnini,  Juliani  et  Ba^iliae,  Fausti 
et  Januarii,  era  MCC2XXVII. 

A  capella  mór  mede  6"',4o  por  4"\4o.  Do  arco  á  porta  princi- 
pal, i3m,8o  por  6in,2o  de  largo.  A  abertura  do  arco  não  excede  a 
2m,55.  Sete  frestas  em  forma  de  setteiras,  incluindo  a  que  se  vê 
sobre  a  porta  principal,  fornecem  luz  á  egreja.  E'  possivel  que  as 
três  representem  a  Trindade,  assim  como  as  sete  frestas  os  Sa- 
cramentos da  Egreja. 

Dentro  guarda-se  uma  grande  lapide  que  mede  om,99  por  om,77, 
com  a  inscripcao  seguinte: 

íETERNit  :  sacr  :  im.ma- 

cvlatissim.e  :  concep- 
tiomi  :  marle  :  joan  :  iv  port- 
vgall  :  rex  :  vna  cvm  gen- 
ERAL :  comitiis  :  se  :  et  re- 

GNA  SVA  :  SVB  ANN\'0  CENS- 

V  TR1BVTARIA  PVBL1CE  VO- 

VIT  :  ATQVE  DEIPARAM  IN 

IMPERII  TVTELAREM  ELEC. 

TAM  :  ALABE  0RIG1NALI  PR- 

jESERVATÃ  PERPETVO  D- 

EFENSVRV  :  1VRAMENTO 

FIRMAV1T  :  V1VERET  VT  P- 

1ETAS  LVSITAN  :  HOC  VIVO  L- 

AP1DE  MEMORIALE  PEREN- 
NE  :  EXARARI  1VSSIT  :  ANNX- 
HRISTI  M  •  D  •  C  •  XLVI  IMPE- 
RII :  svi  :  vi  :  anno  1G54  • 


-48- 

Versão: — Para  perpetua  memoria.  D.  João  IV,  rei  de  Portu- 
gal, juntamente  com  as  cortes  geraes,  se  consagrou  publicamente, 
e  aos  seus  reinos,  á  Immaculatissima  Conceição  de  Maria,  com  o 
tributo  de  um  censo  annual.  E  firmou  com  juramento,  que  defende- 
ria sempre,  que  a  Mãe  de  Deus,  escolhida  para  padroeira  do  reino, 
fora  preservada  da  culpa  original.  Para  que  a  piedade  dos  portugue- 
zes  sempre  constasse,  mandou  gravar  em  pedra  esta  memoria  no 
anno  de  Christo  de  1646,  sexto  do  seu  reinado.  Anno  de  1654.» 

O  censo  annual  era  de  cincoenta  cruzados  de  ouro  applicados 
á  egreja  de  Villa  Viçosa;  e  o  juramento  foi  feito  a  24  de  março 
de  1646,  (Domingo  de  Ramos),  na  capella  real,  e  pelos  cathedra- 
ticos  da  Universidade  de  Coimbra  no  sabbado  28  de  julho. 

A  collocação  desta  inscripção  lapidar  nas  entradas  das  cida- 
des, villas  e  logares,  deve-se  ao  alvitre  de  fr.  António  das  Cha- 
gas (o  Escoto)  e  á  approvação  de  el-rei  que  logo  commetteu  ao 
seu  ministro  António  de  Sousa  de  Macedo  o  encargo  de  a  redi- 
gir. Quiz  fr.  António  que  o  juramento  real  se  perpetuasse  por 
este  meio.  E'  notável  que  não  se  encontre  em  Braga,  a  Roma 
portugueza,  uma  única  d'estas  inscripções.  E'  realmente  notável ! 

A  Camará  Municipal  não  ordenaria  a  sua  collocação?  O  Ca- 
bido da  Sé  de  Braga  jurou  solemnemente  defender  a  immaculada 
Conceição,  sendo  o  respectivo  auto  assignado  no  dia  24  de  feve- 
reiro de  1647  pelo  clero,  nobreza  e  povo. 

Em  Guimarães  ainda  existem,  além  d'esta,  outra  embebida 
na  torre  da  casa  dos  Laranjaes,  e  a  do  cunhal  esquerdo  do  edifí- 
cio da  Camará. 

Para  o  effeito  de  se  cumprir  a  resolução  real,  enviou  D.  João 
IV  á  Camará  de  Guimarães  a  seguinte  carta : 

«Juiz,  Vereadores  e  Procuradores  da  Camará  da  villa  de  Gui- 
marães. Eu  El-Rei  vos  envio  muito  saudar,  para  que  seja  mais 
notório  a  obrigação,  que  eu,  e  todos  os  meus  vassallos  tem  de 
defender,  que  a  Virgem  Senhora  nossa  foi  consebida  sem  pecado 
original,  Ouve  por  Bem  Rezolver,  que  em  todas  as  partes,  e  en- 
tradas das  Cidades,  Vilias  e  Logares  de  meus  Reinos,  se  ponha 
em  húa  pedra  lavrada  a  inscripção,  de  que  será  a  copia  com  esta 
carta,  encomendovos  que  a  façais  pôr  nas  portas,  e  lugares  d'essa 
Villa,  e  me  avizeis  de  como  o  tendes  executado,  escripta  em  Al- 
cântara a  3o  de  Junho  de  1654.  Rei  •  ■  •  para  a  Camará  de  Gui- 
marães». 

Desde  que  foi  tomada  em  cortes  esta  resolução  não  mais  os 
nossos  monarchas  collocaram  a  coroa  na  cabeça.  Vê-se  sobre  uma 
almofada,  ao  seu  lado  direito,  nas  occasioes  solemnes. 

Fernando  III,  imperador  da  Allemanha,  fez  levantar  em  iÓ2Q, 
na  principal  praça  de  Vienna,  uma  columna  encimada  pela  ima- 
gem da  Virgem  e  contendo  uma  inscripção  latina  em  que  também 


—49  — 

dedicou  e  consagrou  festivamente  á  Virgem  tudo  o  que  possuia 
«a  sua  pessoa,  seus  filhos,  seus  povos,  seus  exércitos,  suas  pro- 
víncias».   • 

S.  Casimiro,  filho  de  Casimiro  III,  rei  da  Polónia,  compoz  em 
latim  alguns  versos  encantadores  dentre  os  quaes  especialisarei 
os  seguintes: 

Também  me  alcança  que  seja 
Doce,  brando,  pio,  recto, 
Despido  de  fingimento, 
Sábio,  casto,  circumspecto. 

A  8  de  dezembro  de  1854,  Pio  IX  definiu,  como  dogma,  a 
Immaculada  Conceição  de  Maria,  sendo  esta  decisão  festejada 
em  9,  10  e  ii  de  abril  do  anno  immediato. 

NPoutros  tempos  o  nome  de  Maria  chegou  a  ser  prohibido  em 
attenção  ao  respeito  devido  á  Virgem  Mãe  de  Jesus. 

* 

Como  parochia  tem  a  egreja  de  S.  Miguel  do  Castello  as  hon- 
ras de  Prima\  de  todas  as  do  Arcebispado,  por  já  o  ser  muito 
anteriormente  á  fundação  da  nossa  monarchia.  Foi  baptisado 
nella  o  infante,  depois  rei  D.  Affonso  Henriques,  filho  do  Conde 
D.  Henrique  e  de  D.  Thereza,  os  quaes  no  século  xn  viviam  no 
visinho  castello  onde  nasceu  o  referido  monarcha.  A  pia  baptis- 
mal foi  d'alli  retirada  em  1664,  por  ordem  do  D.  Prior  D.  Diogo 
Lobo  da  Silveira,  achando-se  desde  então  na  egreja  de  Nossa  Se- 
nhora da  Oliveira  acompanhada  d'esta  inscripção  em  fundo  azul 
e  caracteres  dourados : 

NESTA  •  PIA  •  FOI 

BAVTISADO  •  EL 

REY  •  DOM  ■  AFFÓ 

SO  HENRIQUES  •  PE 

LO  ARCEBP"  S  •  GE 

RALDO  •  NO    AN 
NO  ■  DO  •  SÓR  ÍÍ06 

Em  virtude  das  divergências  dos  nossos  historiadores  antigc= 
e  modernos  acerca  do  anno  do  nascimento  de  D.  Affonso  Hen- 
riques, deve  julgar-se  completamente  perdida  a  esperança  de  se 
esclarecer  esta  data  da  nossa  Historia.  A  Chronica  de  Duarte 
Galvão  diz  que  nasceu  em  ioq4;  outra  opinião  em  1106,  sendo 
esta  a  que  se  acha  gravada  na  inscripção  da  pia  e  a  que  João  de 
Barros  queria  que  se  tivesse  por  certa;  outra  em  1  108;  no  Livro 
de  Noa  de  Santa  Cruz  de  Coimbra,  em  1109;  outra  opinião,  em 

4 


—  DO  — 

iiio;  Alexandre  Herculano,  em  nu;  e  a  Chronica  contempo- 
rânea Gothica  em  iii3!  Nada  menos  de  sete  opiniões  que  n'este 
momento  recordo. 

As  quatro  ultimas  põem  fora  do  acto  do  baptismo  o  Arcebispo 
S.  Geraldo  fallecido  em  1108. 

Coube  á  egreja  de  S.  Miguel  do  Castello  a  prerogativa  de  im- 
mediata  ao  Papa  sendo  d'este  modo  isenta  da  jurisdicção  archie- 
piscopal  de  Braga. 

O  orago  d'esta  egreja  teve  uma  irmandade  que  ainda  em  1064 
existia;  houve  alli  também  a  Confraria  do  Anjo  que  mandava  an- 
nualmente  celebrar  100  missas,  12  das  quaes  eram  cantadas  na 
primeira  quinta-feira  de  cada  mez  com  responso  e  procissão  de 
defuntos  em  volta  da  egreja,  pelos  confrades  e  pelo  instituidor 
d'aquella  obrigação. 

Estavam  encarregados  de  todo  este  serviço  os  4  capellães  que 
annualmente  recebiam  de  ordenado  1:000  réis! 

Na  relação  das  ceias  pagas  pela  Confraria  no  anno  de  1620, 
rigura,  como  fornecedor,  Miguel  Francisco  Matadiabos,  morador 
na  rua  da  Fonte  Nova,  hoje  rua  nova  de  Santo  António,  e  ainda 
agora  vulgarmente  denominada  do  Mata-diabos  em  homenagem 
ao  Hercules  taberneiro ! 

Próximo  do  arco  cruzeiro  está  uma  sepultura  rasa,  com  a  fi- 
gura da  morte,  que  o  Abbade  António  Machado  de  Oliveira  ce- 
deu ao  capitão  José  de  Oliveira  e  Silva  e  a  sua  mulher  D.  Rosa 
Maria  de  Sousa  em  recompensa  da  obrigação  que  aos  4  de  agosto 
de  176c)  fizeram  de  Soo.^ooo  réis  para  azeite  da  lâmpada  do  S  S. 
que  desejavam  collocar  alli  «  por  o  não  haver  nunca  »,  e  uma 
missa  cantada  annualmente  por  intenção  dos  dois.  Como  porém 
a  sepultura  não  fosse  do  Abbade,  o  Procurador  Geral  da  Mitra 
annullou  este  contrato.  O  D.  Prior  D.  Domingos  de  Portugal  e 
Gama  auctorisou  a  referida  collocação  na  «Real  Egreja  de  S.  Mi- 
guel do  Castello  »,  sendo  o  S  S.  processionalmente  condusido  da 
Insigne  e  Real  Collegiada  pelo  Chantre  dr.  Francisco  José  Pereira, 
e  encorporando- se  todas  as  irmandades,  confrarias,  Curaria  e  Ca- 
bido, e  os  frades  Franciscanos,  Dominicos  e  Capuchos,  aos  5  de 
junho  do  anno  immediato.  Num  dos  ângulos  formados  pelo  arco 
cruzeiro  e  corpo  da  egreja  ( lado  esquerdo ),  vê-se  o  padrão  das 
teigas,  medida  do  século  XII,  que  consiste  numa  pedra  grosseira 
e  mal  cortada,  contendo  ao  centro  duas  cavidades  de  um  e  de 
meio  alqueire. 

Achando-se  em  estado  de  ruina  esta  pequena  egreja,  que  foi 
capella  real  do  Conde  D.  Henrique,  o  Arcebispo  D.  José  Joaquim 
de  Azevedo  e  Moura  publicou  uma  portaria  annexando  a  fregue- 
zia  á  de  Nossa  Senhora  da  Oliveira.  Uma  commissão  composta 
dos  srs.    dr.   Francisco  Martins  Sarmento,  cónego  Aquino,  padre 


—  5 1  — 

António  José  Ferreira  Caldas  e  João  Pinto  de  Queiroz,  abriu  em 
Guimarães  uma  subscripção  que  rendeu  700.^000  réis,  e  obteve 
do  governo'  o  subsidio  de  1:200.^000  réis,  iniciando  em  17  de 
agosto  de  1874  uma  restauração  conscienciosa  que  em  nada  preju- 
dicou a  architectura  antiga. 

Em  20  de  julho  de  1880  foi  esta  egreja  benzida  pelo  rev.  Abí- 
lio Augusto  de  Passos.  A  pequena  distancia,  para  a  frente,  fica  o 
pobrissimo  albergue  de  S.  Miguel  do  Castello  cuja  origem  se  des- 
conhece. 

Na  serie  dos  Abbades  de  S.  Miguel  do  Castello  é  conhecido, 
como  o  mais  antigo,  Domingos  Tristão  apresentado  na  era  de 
i383. 

A  poucos  metros  de  distancia  d'esta  velhíssima  egreja,  lado  do 
nascente,  vê-se  o  venerando  castello  fundado  pela  condessa  D. 
Mumadona  que  o  denominou  de  S.  Mamede,  e  o  qual  mais  tarde 
foi  alcaçar  do  Conde  D.  Henrique  e  da  rainha  D.  Thereza.  Alli 
nasceu  D.  Affonso  Henriques,  fundador  da  monarchia  portugue 
za.  A  torre  de  menagem  tem  interiormente  uma  escada  que  con 
duz  as  ameias  de  onde  se  descobre  um  horisonte  vastíssimo  ! 

Na  humbreira  direita  da  porta  d 'essa  torre  gravou-se  em  1868 
um  nome  que,  por  extranho  ao  monumento,  devia  ser  apagado. 
E'  o  nome  de  Lui\  Vermell,  pintor-esculptor  hespanhol  que  resi- 
diu em  Braga  até  o  anno  de  1870. 

No  dia  9  de  novembro  de  1887,  a  Camará  poz  em  arremata- 
ção por  io5:ooo  réis  a  cobertura  metálica;  e  na  sessão  do  dia  1 
de  abril  de  i88q,  propoz-se  que  se  organisasse  um  projecto  de 
melhoramentos  em  volta  d^ste  castello.  Como  porém  se  tratasse 
duma  obra  honrosa  para  a  terra  que  justamente  se  ufana  de  ser 
o  berço  da  nossa  nacionalidade,  não  faltou  quem  logo  lhe  creasse 
entraves  ! 

Em  19  de  março  de  1881  foi  este  castello  classificado  monu- 
mento histórico  de  primeira  classe. 

A  egual  distancia  da  egreja,  para  o  sul,  fica  o  Paço  incom- 
pleto dos  Duques  de  Bragança,  magestoso  edifício  construído  pel<> 
Conde  de  Ourem  e  primeiro  Duque  de  Bragança  D.  Affonso,  fi- 
lho natural  de  el-rei  D.  João  I  que  o  estimava  muito  por  se  pa- 
recer comsigo. 

Este  D.  Affonso  era  casado  em  primeiras  núpcias  com  D.  Bri 
tes  Pereira,  filha  de  D.  Nuno  Alvares  Pereira,  e  em  segundas  com 
D.  Constança  de  Noronha,  filhado  conde  de  Noronha  D.  Affonso. 

Fallecendo  o  Duque  em  Chaves,  no  mez  de  dezembro  de  1461 , 
sua  mulher  D.  Constança  continuou  a  habitar  o  Paço  de  Guima- 
rães em  que  falleceu  a  26  de  janeiro  de  1480,  sendo  sepultada  na 
capella-mór  da  egreja  de  S.  Francisco,  onde  apenas  se  guarda  a 
tampa  do  tumulo  com  a  sua  estatua  jazente. 


í>2 


Numa  parede  interior  ainda  se  conserva  este  pórtico  Joannino^ 
com  três  arcos  reintrantes  sobre  columnas  de  mármore  branco,, 
que  pertencia  d  grande  sala  régia: 


Nas  costas  d'esta  grande  sala  conservam-se  as  duas  janellas. 
que  aqui  se  representam  : 


—  53 


E'  notável  a  solidez  das  quatro  enormes  chaminés  de  tijolo 
■que  ha  cinco  séculos  resistem  á  acção  do  tempo  ! 

Anteriormente  a  1F07,  em  que  este  edifício  principiou  a  ser  oc- 
cupado  pelos  corpos  militares,  recolhiam-se  alli  as  rendas  do  Re- 
guengo. Para  esse  fim  conseguiu  o  Almoxarife  Jeronymo  de 
Mattos  Feijó  que  a  parte  habitável  fosse  coberta  de  telha. 

Um  velho  documento  dá  a  seguinte  medição  do  Paço  : 

«Sendo  medido  pela  parte  do  norte  tem  de  comprido  de  nas- 
cente a  poente  52  varas  e  meia  •,  confronta  d'esta  parte  com  o  oli- 
val e  egreja  de  S.  Miguel  do  Castello  ;  tem  por  esta  banda  um  al- 
pendre assentado  em  8  pilares  de  pedra,  para  cuja  parte  tem  duas 
portas  fronhas  com  suas  escadas  de  pedra  e  entrada  do  celleiro 
dos  mesmos  Paços ;  e  medidos  pela  parte  do  poente  tem  de  largo 
de  norte  a  sul  52  varas  e  meia  \  parte  com  o  olival  da  dita  egreja, 
Tem  para  esta  parte  duas  portas,  entradas  das  lojas  e  uma  d'ellas 
é  larga  e  tem  por  cima  um  alpendre  telhado  e  assentado  em  dois 
pilares  de  pedra ;  e  sendo  medidos  pela  parte  do  sul  tem  de  nas- 
cente a  poente  52  varas  ;  confronta  com  o  muro  das  freiras  de 
Santa  Thereza,  para  cuja  banda  tem  muita  quantidade  de  janellas 
feitas  ao  tempo  antigo  com  suas  cruzes  de  pedra  nos  largos  del- 
ias ;  e  medidos  pela  parte  do  nascente  tem  de  norte  a  sul  53  va- 
ras, parte  confronta  com  o  muro  da  villa  e  roxio  que  possue  Tor- 
quato  Luiz  que  fica  entre  o  dito  muro  e  os  ditos  Paços,  e  por  esta 
banda  tem  três  torriões  de  pedra,  e  no  primeiro  torrião  tem 
um  escadorio  de  pedra  e  tem  para  esta  banda  muitas  janel- 
las e  barandas  de  pedra,  e  tem  cruzes  de  pedra  pelo  meio  e 
algumas  estão  tapadas  e  outras  abertas  entre  as  ditas  janellas,  e 
estão  muitas  relosias  pequenas,  e  dentro  d'estes  Paços  tem  o  arco 
da  entrada  para  o  logar  aonde  foi  a  capella,  e  o  dito  arco  está  for- 
mado sobre  6  columnas  de  pedra  de  jaspe  ou  mármore,  tem  va- 
rias chaminés  e  arcarias  e  tem  3  salas  cobertas  de  telha,  que 
actualmente  servem  de  celeiro,  e  uma  cosinha  sobradada  com  suas 
janellas  para  a  parte  de  dentro  do  Palácio,  e  tem  quatro  lojeas 
duas  grandes  e  duas  pequenas  que  servem  de  celeiro  do  vinho  e 
mais  despejos». 

Neste  século  X  os  Concílios  Asturicense  (946)  e  Compostel- 
lanum  (971 ),  viram  com  magua  o  clero  regular  e  secular  perder 
a  noção  dos  seus  deveres  a  ponto  de  vários  auctores  ecclesiasti- 
cos  dizerem  que  « muitos  retiros  dedicados  ao  silencio  e  á  oração 
se  converteram  em  logares  de  desordem». 

Bispos  e  sacerdotes  casavam,  dotando  os  seus  filhos  com  fo- 
ros, dízimos,  egrejas  e  outros  rendimentos. 

Alguns  d'esses  Bispos  ambiciosos  conseguiram  possuir  simul- 
taneamente varias  Dioceses. 


_54- 

O  Arcebispo  de  Corintho  aconselhou  a  S.  Lucas  o  Moço,  soli- 
tário do  monte  de  S.  Joannico,  que  tivesse  em  seu  poder  um  vaso 
para  conservar  hóstias  consagradas  com  que  se  desse  a  si  próprio 
a  communhão  a  miude,  e  um  copo  expressamente  destinado  ao  vi- 
nho que  apoz  a  communhão  devia  beber.  E'  que  os  anacoretas 
poucas  vezes  assistiam  á  celebração  da  missa.  Seguindo  a  pratica 
dos  mais  antigos  christãos,  ainda  n'este  século  era  permittido  a 
cada  um  commungar  debaixo  de  uma  só  espécie,  pelas  próprias 
mãos,  rcstringindo-se  a  quatro  vezes  no  anno  esta  devoção  ! 

Os  regulamentos  dos  Concílios  prohibiam  os  consórcios  entre 
parentes  até  ao  7.0  grau  e  ordenavam  a  separação  dos  que  exis- 
tissem com  este  impedimento. 

A  disciplina  canónica,  o  jejum  e  a  penitencia  publica,  relaxa- 
ram-se  grandemente  em  virtude  de  se  commutarem  as  penas  es- 
tabelecidas pelos  cânones  em  romarias,  fundações  de  egrejas  e 
Mosteiros  e  em  muitas  outras  obras  pias. 

O  Papa  João  XIII  benzeu  solemnente  emq65  os  sinos  de  S.  João 
de  Latrão,  dizendo  se  que  por  esse  facto  ficou  instituída  a  ceremo- 
nia  pelo  alludido  Pontífice.  Alguns  dos  nossos  historiadores,  que 
a  julgam  mais  antiga,  fundam-se  fta  prohibição  da  referida  ben- 
ção dos  sinos  estabelecida  em  789  pelo  capitular  de  Carlos  Ma- 
gno, e  nos  Rituaes  manuscriptos  onde  se  determinam  as  ceremo- 
nias  próprias  para  estas  bênçãos. 

O  Papa  Silvestre  II  (Gerbert)  foi  o  introductor  dos  relógios 
de  pêndula  e  dos  algarismos  árabes  na  Europa. 


—  55  — 


O  sino  de  S.  Geraldo 


Pendente  dos  dois  arcos  ogivaes  que  se  encruzam  formando 
a  cúpula  da  torre  do  lado  norte  da  Sé  de  Braga,  está  o  sino  das 
horas  ou  do  relógio,  vulgarmente  denominado  de  S.  Geraldo, 
porque  a  tradição  nos  diz  que  tocava  de  per  si  sempre  que  o  san- 
to Arcebispo  sahia  do  Paço  Archiepiscopal.  Suppondo  que  seja 
este  o  sino  mais  antigo  do  paiz,  e  que  mais  curiosidade  otíerece 
pela  proveniência,  dizeres  e  emblemas,  entendo  que  deve  ser  con- 
siderado uma  reliquia  archeologica  de  valor. 

Quem  primeiro  se  occupou  d'este  sino  foi  o  Contador  d^rgote 
D.  Jeronymo,  (1G76-1749),  nas  suas  Memorias  de  Braga,  livro  6, 
cap.  IV,  n."  544,  ti.  35>7,  dizendo-nos  que  se  lia  em  toda  a  volta 
d'elle  esta  pequena  inscripçao:  —  magister  marti  valenciis  me  fecit 
anno  domini  millesimo, —  sendo  esta  a  versão:  «Mestre  Martinho 
me  fez  no  anno  de  mil  do  Senhor,  em  Valença». 

Desde  então  ninguém  se  deu  ao  trabalho  de  reverificar  estes  di- 
zeres para  se  evitarem  constantes  reproducções  d'uma  leitura  ine- 
xacta devida  ao  informador  d'Argote,  D.  Luiz  Alvares  de  Figuei- 
redo, Bispo  de  Uranopolis  e  coadjutor  do  Arcebispo  D.  Rodrigo  de 
Moura  Telles. 

Não  se  justifica  o  pouco  escrúpulo  do  Bispo  em  copiar,  apenas  e 
muito  mal,  a  primeira  linha  dos  dizeres  do  sino  que  no  seu  tempo 


-56— 

ainda  se  conservava  no  campanário  entre  as  torres  anteriores  a 
estas,  e  portanto  em  óptimas  condições  para  um  exame  seguro.  Eu 
tive  necessidade  de  fazer  construir  sobre  a  balaustrada  da  cupuia 
da  torre  uma  estada  de  madeira  á  qual  subi  cerca  das  3  horas  da 
tarde  de  sabbado  8  de  maio  de  1897,  volteando  o  sino  três  vezes, 
que  tantas  são  as  linhas  da  inscripção  em  elegantes  caracteres  go- 
thicos,  e  lendo  o  seguinte,  cuja  ndelidade  garanto: 


B  MA&ISTER*MATWCMINSIS*ME  FES1T<»AN(W)NI»MIIE 


a 


fflECCEBCRVCtIA«DKH»FVQT8PARTES«AWERSE"VmC1T« 
LEOBDE«TR\BV«WDABRRKO\X"ttAV»ToALElVíA 

iQVINaENTEMMO^^MO^AIVTORwBáflNOSfRÍÊftffllN 
NOMNEjkBNh!  DEVSl  INCME|\/ENiT|PROMOBlS|«ED0 

O  diâmetro  do  bordo  (im,07)  é  egual  á  altura  exterior.  A  pri- 
meira linha,  nos  hombros,  não  coube  na  circumferencia  da  forma 
terminando  por  isso  debaixo  da  primeira  palavra  com  as  qua- 
tro ultimas  lettras  n'um  parallelogrammo. 

As  palavras  fecit  com  um  s,  anno  com  um  n  apenas,  rfiille$i- 
mo  só  com  um  /,  fugite  sem  o  e,  radix  com  dois  rr,  allehtia  sem 
um  /,  e  ainda  outros  defeitos  na  linha  ultima,  tudo  se  encontra  no 
sino;  e  não  é  isso  raro,  mesmo  nos  que  foram  fundidos  no  decurso 
dos  séculos  subsequentes. 

Matricalensis  é  nome  próprio  da  naturalidade  do  fundidor  ou 
da  localidade  onde  estava  installada  a  fundição.  Provavelmente  o 
proprietário  óccultava  o  seu  nome  por  desnecessário  ou  por  então 
ser  única  e  de  grande  fama  a  fabrica  de  Madrigal,  pequena  ci- 
dade hespanhola  que  fica  distante  quatro  léguas  de  Medina-del- 
Campo,  e  da  qual  era  natural  o  celebre  pasteleiro  Gabriel  de  Espi- 
nosa que,  por  se  apresentar  como  sendo  o  desditoso  rei  D.  Sebastião, 
foi  enforcado  com  o  seu  cúmplice  portuguez  fr.  Miguel  dos  San- 
tos, no  anno  de  i5o,5. 

Leitura  da  inscripção:  —  «Mestre  de  Madrigal  me  fez  no  anno 
de  mil  do  Senhor.  Eis  a  cruz  do  Senhor;  evitae  as  partes  adver- 
sas; vence  o  leão  da  tribu  de  Judá,  raiz  de  David. 

Quinhentos  e  um  (numero  de  sinos  fundidos).  O  nosso  auxilio 
em  nome  do  Senhor.  Creio  que  Deus  veiu  encarnar  por  nós». 

E'  curiosíssima  a  notação  do  numero  de  sinos  que  a  fundição 


-57- 

produziu  até  á  data  de  ser  fundido  o  de  Braga!  E  para  que  não 
otíereça  duvida  a  allusão  do  numero  5o i,  lá  está  a  seguir  á  pala- 
vra quingentesimo  um  pequeno  sino  em  relevo,  da  altura  dos  ca- 
racteres gothicos.  A  restante  pontuação  d'esta  linha  representa  um 
sino-saimão  (signum  Salomonis)  que  livra  das  cousas  más,  a  egreja 
da  Sé,  um  leão  e  outro  emblema. 

Por  occasião  da  benção  de  que  fazem  parte,  depois  do  canto 
dos  Psalmos,  a  lavagem  interior  e  exterior  do  sino  com  agua  ben- 
ta salgada,  as  quatro  unções  exteriores  e  as  quatro  interiores  com 
o  santo  Chrisma,  devia  ser  nomeado,  para  a  invocação,  um  santo 
cujo  nome  é  hoje  desconhecido.  O  de  S.  Geraldo  não,  porque 
como  fica  dito,  o  sino  é  bastante  mais  velho.  O  emblema  do  cen- 
tro representa  um  calvário,  com  S.  João  e  a  Virgem. 

Ahi  fica  pela  primeira  vez  copiada  e  lida  toda  a  inscripçao  do 
sino  de  S.  Geraldo,  que  muito  contribue  para  o  conhecimento  da 
antiguidade  da  fundição  de  sinos  na  nossa  visinha  Hespanha,  pro- 
veniência d'esta  relíquia  de  um  passado  remoto,  bem  digna  de  esti- 
mação. 

Este  sino  e  o  pequeno  cálice  que  se  guarda  em  cofre  de  mar- 
fim no  thesouro  da  Cathedral,  loc.  cit.,  teem  sempre  sido  denomi- 
nados de  S.  Geraldo  por  se  ignorar  a  procedência  dum  e  d' outro. 
Seguia-se  a  tradição  do  sino  tocar  de  per  si,  e  do  cálice  ter  ser- 
vido para  o  santo  celebrar  as  missas.  Nada  mais  se  procurou  ave- 
riguar, não  obstante  haver  no  cálice  e  no  sino  inscripções  que 
muito  me  auxiliaram  para  apurar  da  verdade. 

Sabe-se  que  os  musulmanos  conquistaram  e  arruinaram  a  cida- 
de de  Braga  em  716,  demorando-se  por  estes  sitios  quasi  3oo  annos. 
Os  Bispos  bracarenses,  que  durante  o  século  vm,  procuravam  o 
conforto  do  Paço,  eram  perseguidos  com  insistência  a  ponto  de  os 
obrigarem  a  refugiar-se  nas  Astúrias,  assim  como  as  famílias  gradas 
da  epocha  a  procurarem  sitios  elevados  onde  se  fortificavam  para 
alli  residirem  com  liberdade  e  socego.  Por  isso  a  velha  cidade  de 
Braga  ainda  em  Sbg  se  conservava  arruinada,  porque  então  D. 
AíFonso  o  Casto,  como  consta  das  actas  do  Concilio  de  Oviedo, 
ao  mesmo  tempo  que  aconselhava  com  interesse  a  restauração  das 
Cathedraes  destruídas,  doava  á  egreja  de  Lugo  a  cidade  e  Bispado 
de  Braga  com  as  egrejas  e  freguezias  próximas,  entrando  n'esse 
numero  das  que  os  Árabes  conservaram  para  agradar  aos  chris- 
tãos  pobres  que  ficaram  sob  o  seu  domínio  com  o  fim  de  lhes  cul- 
tivarem as  terras,  S.  Pedro  de  Maximinos,  S.  Fructuoso  com  a 
torre  Capitolina,  S.  Vicente  e  outras  mais  afastadas  (..  concedo 
civitates  Bracarensem  videlicet  Metropolitanam  cum  suo  Episco- 
patu,  et  in  circuitatis. . .  Ecclesia  Sancti  Petri,  Sancti  Fructuosi, 
turrís  Capitolina,  Sancti  Vincentii  cum  villis  suis  Infidias,  etc), 
confessando    que  a  este  procedimento    nada    honroso,    com    que 


—  58  — 

procurava  a  salvação  das  almas,  o  obrigavam  os  mouros  irre- 
quietos (quia  docus  est  quod  nunc  pro  animarum  salute  necessi- 
tate  pagancrum  compulsi  facimus). 

Sobre  a  conservação  das  egrejas  pelos  Árabes  existia  em  1642, 
no  cartório  de  Lorvão,  como  dizem  Purificação  e  Brito,  o  docu- 
mento seguinte  : 

«Alboacem,  rilho  de  Mahumet  Athamar,  filho  de  Tarife,  a  rogo 
dos  christaos,  fiz  esta  firma  conforme  o  seu  costume  —  O  —  e  de- 
ram-me  pela  confirmação  dous  bons  cavallos,  e  eu  lhes  confirmei 
tudo  o  sobredito. — Paguem  os  christaos  dobrado  tributo  dos  mou- 
ros.—  Das  egrejas  por  cada  uma  25  pezos  de  boa  prata,  e  as 
episcopaes  100,  e  os  mosteiros  5o. —  Os  bispos  christaos  não  amal- 
diçoem os  reis  mouros,  e  se  tal  fizerem  sejam  mortos.  —  Os  sa- 
cerdotes não  celebrem  suas  missas  senão  com  as  portas  fechadas  ; 
fazendo  o  contrario  paguem  10  pezos  de  prata.  —  Os  mosteiros, 
que  estão  em  meu  território  e  senhorio  possuam  seus  bens  em  paz, 
e  paguem  os  sobreditos  5o  pesos.  --  O  mosteiro  das  montanhas, 
que  se  chama  de  Lorvão,  não  pague  pezo  algum ;  porque  com  boa 
vontade  me  mostram  onde  trazem  veados,  e  fazem  aos  mouros 
bom  gazalhado,  e  nunca  achei  naquelles,  que  ahi  moram  mentiras 
nem  má  vontade  ;  e  possuam  em  paz  e  boa  quietação  todas  as 
suas  herdades...  e  vão  e  venham  a  Coimbra  com  toda  a  liberdade,  de 
dia  e  de  noite,  quando  quizerem,  e  comprem,  e  vendam  sem  pa- 
gar direitos ;  com  tal  condição  que  não  saiam  fora  de  minhas 
terras  sem  minha  licença.  Carta  de  lei  na  era  dos  christaos  722 
(de  Christo  734),  e  segundo  os  árabes  147  aos  i3  da  lua  Dulhija 
(lua  de  dezembro).» 

Fallecendo  em  Q99  Bermudo  II,  foi  immediatamente  acclama- 
do  rei  de  Leão  seu  filho  Affonso,  de  5  annos  de  edade,  e  a  direc- 
ção dos  negócios  públicos  entregue  aos  Condes  de  Castella  San- 
cho Garcez,  e  da  Galliza  Menendo  Gonçalves.  N'este  anno  de 
1000,  em  que  El-Mansur  venceu  o  Conde  de  Castella,  ordenou  o 
da  Galliza  Menendo  Gonçalves  a  fundição  do  sino  em  Madrigal, 
oíferecendo  o,  com  o  pequeno  cálice  e  outros  objectos,  a  Santa 
Maria  de  Braga  que,  sem  duvida,  já  então  aqui  tinha  reedificada 
a  sua  egreja.  (.  .  .offerimus  cruce,  cálice  et  patena  argêntea,  si- 
gnum  de  metallo,  libros  perfectus,  etc.)  A  Galliza,  que  durante 
muitos  séculos  teve  Braga  por  capital,  foi  por  Estrabão  e  Ptolo- 
meu denominada  :  Kallaecia. 

Seguiu  se-lhe  em  io65,  como  benemérito  de  Braga,  cuja  cidade 
principiou  a  reedificar,  e  da  sua  Sé  Cathedral,  que  protegeu, 
obrigando  as  famílias  nobres  a  restituírem  ao  Bispo  as  rendas  que 
possuíam,  D.  Garcia  rei  da  Galliza  e  de  Portugal,  tão  notável  pela 
coragem  com  que  em  1073  venceu,  entre  a  cidade  de  Braga  e  o 
rio  Cavado,  o  grupo  capitaneado  pelo  Conde  Nuno  Menendes. 


—  D9 


DQ 


Seu  irmão  D.  Sancho  II  de  Castella,  que  o  privara  do  reino, 
nomeou  em  1067  Bispo  de  Braga  D.  Pedro  II,  o  ultimo  da  série 
dos  Bispos  e  o  primeiro  que  usou  Dom. 

Durante  o  governo  d'este  Prelado  rloreceu  muito  a  Cathedral 
Bracarense  pela  restauração  de  antigos  direitos  e  regalias  e  por 
numerosas  doações  que  os  povos  lhe  fizeram. 

Na  collecção  dos  retratos  do  Paço  archiepiscopal  existem,  do 
século  xi,  mais  dois  Bispos  anteriores  ao  D.  Pedro,  sendo  Sige- 
fredo  em  1060  e  Julião  em  io38.  D'essa  collecção,  que  segue 
composta  de  123  retratos,  apenas  podem  ser  considerados  authen- 
ticos  desde  D.  Lourenço,  visto  ser  inventada  a  pintura  a 
óleo,  no  século  xiv,  por  João  Van-Eyk  (1370- 1441),  o  celebre  fun- 
dador da  eschola  flamenga.  O  retrato  de  L>.  fr.  Bartholomeu  dos 
Martyres  foi  pintado  em  sua  vida  pelo  pintor  portuguez  António 
Maciel,  de  ordem  do  Arcebispo  D.  fr.  Agostinho  de  Jesus,  que 
lhe  succedeu  na  cadeira  Bracarense  : 

BISPOS 


1  S.  Pedro  de  Rates anno 

2  S.  Basileu  M _. » 

3  S.  Ovidio » 

4  S.  Policarpo .  » 

5  S.  Sereniano » 

6  S   Faviano » 

7  S.  Félix.. » 

8  Grato » 

9  S.  Secundo » 

10  Galidonio » 

1 1  S.  Narciso  M • » 

12  Paterno  I » 

1 3  B.  Salomão » 

14  Senagrio » 

1 5  S.  Lioncio    » 

16  S.  Apolonio » 

1 7  Idacio » 

18  Lampadio » 

1 9  S.  Paterno  II » 

20  S.  Profuturo » 

21  Pancracio » 

22  Balconio    » 

23  Valério  I » 

ix  Idacio  II « 

25  Castino » 

26  Valério  II   » 

27  Profuturo  II » 

28  S.  Ausberto » 

29  S.  Julic.no » 

30  Eleuterio » 

3 1  Lucrécio » 

32  S.  Martinho  de  Dume » 


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60, 

93, 
i3i, 

200, 
23o, 

245, 

260, 

2t>3, 

268, 
270, 

275, 
299, 

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32b, 
3i8, 
366, 
38 1, 

3Q2, 

40S, 
410, 

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456, 

4Q4, 
524, 
525, 
526, 
527, 
538, 
55o, 

569, 

583, 


barba  e  mitra 


»  barrete 
»  mitra 
»  barrete 
»  mitra 
»  barrete 
»  aureola 
»  barrete 
»  mitra 

»  barrete 
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3o  S.  Benigno anno 

34  Pantardo » 

35  S.  Tobeu » 

36  Julião  II » 

37  Potamio » 

38  Manucino » 

09  pancracio » 

40  S.  Fructuoso » 

41  S.  Quirico » 

42  S.  Leodicisio » 

43  1  iuva  I » 

44  Faustino » 

45  S.  Félix  Torquato » 

46  S.  Victor  M » 

47  Eronio » 

48  Hermenegildo » 

49  Thiago  I » 

50  Ferdisendo » 

5 1  Arcarico » 

52  Argimundo » 

53  Nostrano » 

Í4  Dulcidio » 

55  Gladila    » 

56  Argimiro » 

57  Theodomiro » 

58  Silvanacto 

5g  Hero 

60  Gonçalo 

6 1  Hermenegildo 

62  Julião 

63  bigefredo 

64  D.  Pedro  II 


588,  barba  e  mitra 

58g,  »  »  barrete 

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0^6,  »  »  barrete 

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832,  bigode  e  pêra,  barrete 

84.2,  1»  »  »          » 

863,  «  »  »          >» 

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1079,  »  «  »          » 


»  mitra 


»  barrete 


»  descoberto 
»  barrete 


ARCEBISPOS 


65  S.  Geraldo anno 

60  D.  iviauncio » 

67  D.  Paio  Mendes » 

68  O  B.  D.  Godinho 

09  D.  João  Peculiar » 

70  D.  Martinho  Pires » 

71  D.  Pedro  S » 

72  D.  Estevão  Soares « 

73  D.  Sancho  I « 

74  D.  Silvestre  Godinho » 

75  D.  Gualterio » 

76  D.  João  Egas  II » 

77  D.  Martinho  Giraldes » 

78  Papa  João  XXI  (D.  Pedro  Julião)  . . 

79  D.  Sancho » 

80  D.  Ordonho » 

81  D.  Frei  Tello 

82  D.  Martinho  de  Oliveira » 

83  D.  João  de  Soalhães » 

84  D.  Gonçalo  Pereira  . . . .  • » 


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D.  Guilherme anno  i35o, 

D.  João  Cordolaco »  i36:>, 

D.Vasco »  i3yi, 

D   Lourenço »  1^97, 

D.  .loão  Garcia »  1 397, 

D  Martinho  de  Miranda »  14 16, 

D.  Fernando »  1416, 

D.  Luiz  Pires »  i4t7i 

D.  João  de  Mello »  1480, 

D.  João  Galvão »  1480, 

D.  Jorge  da  Costa »  1486, 

Cardeal  D.  Jorge  da  Costa  (Irmão)..  »  1488, 

D.  Diogo  de  Sousa »  i532, 

Cardeal  D   Henrique »  037, 

D.  Diogo  da  Silva »  iS^  1, 

O  S.  D.  Duarte »  \b*\ 

D.  Manuel  de  Sousa »  i549, 

D.  Frei  Balthazar  Limpo »  i558, 

D.  João  Affonso  de  Menezes »  i  !>87, 

D.  Frei  Bartholomeu  dos  Martyres. .  »  1590, 

D.  Frei  Agostinho  de  Jesus >  ió  1 7, 

D.  Affonso  Furtado  de  Mendonça...  »  1625, 

D.  Rodrigo  da  Cunha »  1Ó27, 

D  Frei  Aleixo  de  Menezes »  i63o, 

D.  Sebastião  de  Mattos  de  Noronha.  »  it>36, 

Cardeal  D.  Veríssimo  de  Lencastre.  »  1677, 

D.  Luiz  de  Sousa »  ió8y, 

D.  José  de  Menezes  I »  1002, 

D.  João  de  Sousa »  1697, 

D    Rodrigo  de  Moura  Telles »  1704, 

D.  Jo^é  II »  1741, 

D.  Gaspar »  170, 

D.  Frei  Caetano  Brandão »  1790, 

D  José  III »  i^or-, 

D,  Frei  Miguel  da  Madre  de  Deus  . .  »  181 5, 

C  ardeal  Figueiredo  da  Cunha  e  Mello  »  1843, 

D.  José  Joaquim  d'Azevedo  e  Moura  »  1 856, 

D   João  C.  cTAmorim  Pessoa »  187o, 

D.  António  José  de  Freitas  Honorato.  »  1 883, 


bigode  e  pêra,  barrete 


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Actualmente  preside  aos  destinos  da  Archidiocese  bracarense 
o  ex.mo  rev.mo  sr.  D.  Manuel  Baptista  da  Cunha,  n.°  124  da  serie 
c  n.°  do  nome. 

As  datas  foram  por  mim  fielmente  copiadas  dos  quadros;  refe- 
rem-se,  umas  á  nomeação  e  outras  ao  fallecimento  de  cada  Pre- 
lado, com  bastantes  erros  que  convém  corrigir.  Por  isso  entendo 
que  devo  aqui  dar  para  cada  numero  as  que  designam  a  duração 
completa:  N.os  i-3y  a  44;  19-400  a  400;  21-410  a  414;  22-415 
a  448;  3i-56o  a  57o;  32-5;o  a  583;  1^4-583  a  59o;  36-633  a 
646,;  37-653  a  Õ56;  4o-()5<">  a  665;  42-675  a  683;  43-678 
a  684;  44-687  a  6q3;  45-693  a  714;  64-1 067  ji  1079;  65-1096 
a    1109;    66-1:10    a    11 19;    67-1119   a    1137;  69—1 i3o    a    iitS; 


62  — 


68-i i 7^  a  1188;  70-1191  a  1209;  71-1210  a  1212;  72-1213  a 
1228;  74-1229  a  1244;  76-1244  a  1255;  77-1259  a  1271;  78-1272 
a  1277;  79-1275  a. . . . ;  80-1276  a  1279;  82-1292  a  i3i3;83  -i3i3 
a  i325;  85-i349  a  i35o;  86-1 365  a  i3y3^  88-1371  a  1397;  90-1398 
a  1403;  91-1416  a  1467;  92-1467  a  1480;  93-1480;  96-1483  a  148'S 
e  i5oi  a  i5o5;  95-1488  a  i5oi;  97~i5o5  a  1 532;  g8— 1 533  a  1540; 
99-1540  a  1541;  101-1544  a  1549;  io2-i55o  a  i558;  104-1559  a 
1590;  1  o5— 1 587  a  1609;  108-1611  a  1617;  109-1636  a  1641;  1  10— 
1671  a  1677;  1 1 1-1677  a  1690;  1 12-1692  a  1696;  , 13-1696  a  1703; 
114-1704  a  1728;  115-1741  a  1756;  116-1758  a  1789;  117-1790 
a  i8o5;  1 18-1806  a  181 3;  1 1 9— 1 8 1 5  a  1827;  120-1840  a  iSírô; 
i2i-i856  a  1875;  122-1876  a  1888;  i23-iS83  a  1898. 


—  63 


Egreja  Cathedral  de  Braga 

l)esconhcce-se  a  origem  da  Sé  de  Braga,  não  obstante  abali- 
zados  historiadores,  fundando-se  principalmente  no  que  diz  Flávio 
Dextro,  presumirem  que  date  dos  primeiros  tempos  da  religião 
christã.  Na  opinião  d'aquelle  historiador  a  Hespanha  foi  a  pri- 
meira Provinda  que  no  mundo,  depois  da  Judea,  Galilea  e  Sa- 
maria, abraçou  a  fé  de  Christo,  por  motivo  de  S.  Thiago  levantar 
em  todas  as  cidades  um  grande  numero  de  egrejas,  creando  pri- 
meiro Bispo  de  Braga  S.  Pedro  de  Rates  que  constituiu  primaz  de 


-64- 

todos  os  outros  *:  «Hispânia  prima  Provinciarum  mundi  post  Ju- 
deam,  Galileam,  et  Samariam,  in  partibus  Occidentalibus  Christi 
ridem  amplexa  est,  ejusque  gentilitas  ad  íidem  conversa  fuit,  verte 
primitiae  caeterarum  gentilium,  nam  et  Jacobus,  S.  Zebedsei  filius 
peragratis  urbibus  Hispânia;,  multis  que  erectis  Ecclesiis,  et  Epis- 
copis  creatis,  ex  Advenis  Petrum  Bracharae  primum  reliquit.» 

Esta  opinião  é  porém  impugnada  por  escriptores  de  auctori- 
dade,  como  fr.  Miguel  de  Santa  Maria,  da  Ordem  dos  Eremitas 
de  Santo  Agostinho,  na  sua  obra  I  o^  da  Verdade,  em  que  se 
esforça  por  contestar  a  vinda  de  S.  Thiago  á  Hespanha.  Mostra 
que  no  século  xi  o  Papa  Gregório  VII  escreveu  a  D.  Affonso  e 
D.  Sancho,  reis  de  Hespanha,  o  seguinte  que  transitou  em  julga- 
do: «Como  o  Apostolo  S.  Paulo  signifique  que  veiu  á  Hespanha, 
e  depois  conste  que  foram  mandados  para  instruir  aos  povos  de 
Hespanha  7  Bispos  por  S.  Pedro  e  S.  Paulo,  os  quaes  destruindo 
a  idolatria,  fundaram  a  christandade,  plantaram  a  religião  etc. 
E  assim  como  não  duvidaes  que  d'aqui  recebestes  o  principio  da 
religião  catholica .  .    » 

Do  Registo  das  Epistolas  Decretaes  dos  Summos  Pontífices, 
tom.  3,  epist.  64,  também  consta  que  «foi  S.  Paulo  quem  deu 
principio  á  religião  catholica  em  Hespanha».  Santo  Isidoro,  Dou- 
tor da  egreja,  no  livro  De  Ortu,  et  obitu  Patrum  diz  que  «S.  Paulo 
pregou  no  Occidente  e  em  Hespanha,  aonde  Christo  não  tinha 
sido  antes  nomeado».  S.  João  Chrisostomo  (Homilia  70,  in  Ma- 
thaeum,  cap.  22),  mostra  que  os  Apóstolos,  fieis  ás  ordens  do 
Divino  Mestre  se  conservaram  por  largo  tempo  na  Judea  não 
obstante  serem  feridos  e  açoutados  pelos  Judeus,  até  que  os  expul- 
saram (Apostoli  praedicaverunt  judaeis,  longoque  temporis  spatio 
caesi,  et  flagellati  in  Judaea  manentes,  ac  demum  ab  ipsis  pro- 
pulsi  in  gentes  profecti  sunt). 

S.  Jeronymo  e  outros  auctores  affirmam  que  S.  Thiago  Maior, 
rilho  de  Zebedeu  e  irmão  de  S.  João,  foi  cedo  sentenciado  á  morte 
e  degolado  por  ordem  de  Herodes  Aggripa,  no  anno  de  44.  Por 
isso  é  tida  por  verdadeira  a  noticia  da  distribuição  dos  Apósto- 
los: pela  Ásia  Menor,  S.  João;  pela  Scythia,  Santo  André;  pelos 
Parthos,  S.  Thomé;  pela  Ásia  Maior,  S.  Philippe;  pelas  índias, 
S.  Bartholomeu;  pela  Ethiopia,  S.  Mathias;  pela  Pérsia,  S.  Simão; 
por  Epheso,  Grécia,  Provença  e  em  ambas  as  Hespanhas,  Saulo 
ou  S.  Paulo,  etc. 

D.  Rodrigo  Ximenes,  Arcebispo  de  Toledo,  acceitando  a  opi- 
nião de  Fleuri  sobre  o  culto  do  corpo  de  S.  Thiago  em  Compos- 


1  O  jesuíta  rev.  Jeronymo  Romano  de  la  Higuera  diz  que  S.  Pedro,  i.°  Bispo 
de  Braga,  era  judeu  de  nação  e  que  lhe  chamavam  propheta  Samuel,  o  moço,  ou 
Malachias  o  velho,  pela  gravidade  dos  seus  costumes  e  fermosura  do  rostro. 


—  e>5  — 

tella  no  viu.0  século,  o  qual  foi  para  alli  conduzido,  não  admitte 
comtudo  que  as  regalias  da  egreja  Compostellana  sejam  considera- 
das superiores  ás  da  sua,  e  diz  na  presença  do  Papa  e  dos  nume- 
rosos prelados  que  se  achavam  presentes  no  Concilio  Lateranense  : 
«Se  é  certo  que  S.  Thiago  foi  o  primeiro  que  pregou  a  fé  nas 
Hespanhas,  eu  leio  somente  que  elle  recebeu  o  poder  de  pregar 
na  Hespanha;  mas  que  pregando  primeiro  na  Judeia  e  na  Sama- 
ria, Herodes  o  fez  degolarem  Jerusalém:  como,  pois,  podia  elle 
pregar  em  um  paiz  onde  nunca  entrou  jamais?». 

Na  opinião  d'este  prelado  hespanhol,  perdeu  S.  Thiago  a  vida 
antes  de  se  dirigir  á  Península. 

Ha  também  quem  sustente  que  S.  Paulo  não  pôde,  como  pro- 
mettêra  na  epistola  aos  Romanos,  vir  da  Itália  sugeitar  á  lei  evan- 
gélica os  povos  das  Hespanhas,  porque  o  seu  apostolado  difficil, 
complicadíssimo,  o  obrigou  a  partir  para  Colosso. 

Todas  estas  divergências  teem  contribuído  para  se  acreditar 
que  S.  Pedro  de  Rates  não  foi,  como  geralmente  se  diz,  o  pri- 
meiro Bispo  de  Braga,  dando-se  como  certo  um  tal  Sinagrio  a 
que  succedeu  S.  Leôncio,  natural  de  Constantinopla,  fallecido 
em  Guimarães  a  19  de  março  de  826,  quando  regressava  do  Con- 
cilio de  Nicea.  Assim  o  refere  Juliano:  «Sanctus  Leontius  Bra- 
charensis  Pontifex  rediens  ex  Concilio  moritur  Guimaranii  in 
Gallecia,   quae  tunc   dicebatur  Appollonia   19  Martii,  anno  326». 

Esta  opinião,  muitas  vezes  combatida,  como  todas  as  que  têem 
origem  no  Chronicon  Juliano,  prejudicaria  um  pouco  a  antiguidade 
da  origem  dos  prelados  Bracarenses,  no  caso  de  alguém  poder 
provar  que  o  alludido  Sinagrio  não  pertence  ao  numero  conside- 
rável dos  duvidosos. 

A  meu  ver,  pouco  ou  nada  importa  que,  em  vez  de  S.  Thiago, 
viesse  á  Hespanha  S.  Paulo,  comtanto  que  a  proeminência  da  Pri- 
mazia de  Braga  se  mantenha,  embora  como  a  resolveu  o  Papa 
Urbano  II  que  fez  Primaz  de  toda  a  Hespanha  D.  Bernardo  Ar- 
cebispo de  Toledo,  permittindo  comtudo  que  o  de  Braga  conti- 
nuasse no  goso  do  mesmo  titulo  e  respectivos  direitos,  os  quaes 
consistem  no  uso  da  cruz  dobrada  e  na  auctoridade  de  presidir  e 
fazer  pontifical  em  diíferentes  Províncias. 

* 

Diz-se  que  o  templo  de  Isis,  a  que  faz  referencia  uma  lapide 
romana,  ainda  hoje  existente  nas  costas  da  capella  de  S.  Geraldo, 
estivera  no  logar  que  hoje  occupa  a  egreja  Cathedral.  De  facto  os 
templos  dedicados  á  deusa  Isis  eram  sempre  construídos  nas  pra- 
ças do  mercado,  como  refere  Vitruvio  (De  Architectura,  liv.  I, 
cap.  7),  e  os  homens  do  commercio  d'aquelle  tempo  realizavam 
ao  que  parece,  as  transacções  no  referido  local,  porque  na  parede, 


-66- 

interior  do  altar  do  transepto  da  Sé,  lado  do  Evangelho,  encontrou 
ha  bastantes  annos  o  mestre  pedreiro  Manuel  Fernandes,  uma 
base  de  estatua  que  tinha  numa  das  faces  esta  inscripçao  dedicada 
ao  deus  do  Mercado: 

GÉNIO 
MACELLI 
FLAVIVS 

VRBICIO 
EX  VOTO 

POSVIT 
SACRVM 

Versão :  —  «Flávio  Urbicio  consagrou,  por  voto,  este  monumento 
ao  génio  de  Macello». 

Em  frente  á  porta  principal  da  Sé  descobriu-se,  á  profundidade 
de  um  metro,  por  occasião  da  abertura  da  rua  do  mesmo  nome, 
um  lageado  muito  bem  construído  e  ainda  algumas  sepulturas  e 
ossadas  humanas  junto  da  rua  do  Cabido.  O  padre  Torquato  de 
Azevedo  (Ant.  Guimarães),  referindo-se  ao  templo  de  Isis,  diz  que 
este  idolo  foi  destruído  por  effeito  da  pregação  de  S.  Pedro  de 
Rates  que  logo  dedicou  o  mesmo  templo  á  virgem  Nossa  Senhora 
collocando  irelle  a  sua  imagem.  No  i.°  Concilio  Bracarense  de- 
nomina-se  a  egreja  cathedral  de  Braga — Fanum  Sanctae  Mariae; 
esta  denominação  de  templo,  n'aquella  epocha,  pôde  indicar  que  o 
edifício  pertenceu  á  divindade  gentílica. 

Consta  de  velhos  documentos,  considerados  authenticos,  que  esta 
egreja  fora  metropolita  da  Galliza,  destruindo-a  os  Árabes  quando 
em  716  se  apoderaram  de  toda  a  cidade,  dois  annos  depois  da 
perda  da  Hespanhapor  eífeito  da  celebre  batalha  deGuadalete,  em 
que  el-rei  D.  Rodrigo  foi  derrotado  (11  de  novembro  de  714). 

Em  princípios  do  século  XI,  cedendo  ás  instancias  do  Bispo 
de  Lugo  e  Iria,  ordenara  D.  Garcia,  rei  da  Galliza  e  de  Portugal, 
a  segunda  restauração  em  honra  de  Santa  Maria  de  Braga,  in- 
terrompendo-se  esta  obra  e  a  da  reedificação  da  cidade,  por  mo- 
tivo das  luctas  travadas  entre  o  mesmo  monarcha  e  seu  irmão  D. 
Sancho  II,  rei  de  Leão,  que  depois  a  impulsionou,  nomeando  se- 
guidamente Bispo  de  Braga  D.  Pedro,  promotor  solicito  dos  seus 
progressos,  como  consta  do  livro  Fidei. 

Morto  D.  Sancho,  succedeu-lhe  no  throno  D.  Affonso  que  não 
tardou  em  depor  o  antistite  bracarense.  Foi  reedificada  e  ampliada 
esta  egreja  pelo  Conde  D.  Henrique,  pae  do  fundador  da  nossa 
monarchia,  no  anno  de  no3,  presidindo  á  egreja  Bracarense  o 
successor  d'aquelíe  ultimo  Bispo  D.  Pedro,  o  seu  primeiro  Arce- 
bispo S.  Geraldo.  D'ésta  reedificação,  a  que  também  pertencia  a 
capella  mor,  hoje  substituída,  apenas  restam: — o  formoso  arco 
perfeito  ornamentado,  com  os  respectivos  fustes  e  capiteis  antigos, 


-6y- 

que  o  Arcebispo  D.  Diogo  de  Sousa  conservou  quando  lhe  soto- 
poz  o[  de  volta  de  sarapanel  que  hoje  forma  a  porta  principal,  an- 
tigamente dividida  ao  centro  ;  a  lateral : 


Porta  lateral  da  Sé  de  Braga 


-68 


chamada  do  So/,  por  ficar  da  parte  do  sul,  mudada  em  1780 
quando  no  seu  logar  primitivo  se  construiu  o  altar  de  Santa  Bar- 
bara, um  pouco  mais  acima,  como  ainda  hoje  se  nota  na  parede 
exterior  que  defronta  com  o  rocio  de  Traz  da  Sé  ;  o  friso  que  por 
este  lado  assenta  sobre  modilhoes  com  figuras  exquisitas ;  e  inte- 
riormente   os    arcos    e    columnas  das  três  naves,  tudo  de  granito 


Nave  central  da  Sé  de  Braga 


~G9- 

íino  levemente  pintado  e  dourado  e  hoje  coberto  a  cal,  exceptuando 
os  capiteis  que,  como  pude  verificar,  foram  barbaramente  desfei- 
tos a  picão  e  substituídos  pelos  que  ora  tem,  compósitos,  de  ma- 
deira   dourada  !   Tudo  mais  é  posterior. 

Pelo  lado  norte  vê-se,  entre  a  egreja  da  Misericórdia  e  a  ca- 
pella  de  D.  Gonçalo  Pereira,  um  lanço  de  muralha  ameiada  com 
uma  porta  ogival  do  tempo  de  D.  Diogo  de  Sousa  (i5o5-i532) 
cujo  brasão  se  acha  embebido  um  pouco  a  cima  do  fecho. 

Ao  lado  direito  da  referida  porta,  que  em  1891  recebeu  um 
accrescimo  de  om,o,o  á  altura,  tirando-se-lhe  os  degraus  do  lado 
de  dentro,  vê-se  numa  das  pedras  esta  inscripção  romana  fra- 
gmentada que  tem  de  comprimento  im, i5 ;  altura  0,44  e   a  lettra 


ora,i2: 


CONDITVM.    SVB 

IMP.    CAESARIS 

PATRIS.    PATRI   E 

Encontra-se  fora  da  lapide,  a  seguir  á  terceira  linha,  um  E 
apocrypho.  Emilio  Hubner,  o  sábio  berlinez,  diz  que  «o  resto  da 
inscripção  estava  sobre  outra  pedra  do  mesmo  tamanho  da  exis- 
tente, ou  ainda  sobre  duas»,  e  suppoe  que  formavam  a  architrave 
de  um  sacellum.  O  celebre  epigraphista  Mommsen  completou-a 
assim:  «Conditum  sub  divo  ex  jussu  imp.  (eratoris)  Gaesaris  Au- 
gusti  divi  filii  patris  patri  (ae)  Ponti fieis  Maximi». 

Allude  a  um  pequeno  templo  sem  cobertura  construído  por  or- 
dem do  imperador  César  Augusto,  filho  do  Divo,  sendo  pae  da 
pátria  e  Pontífice  Máximo. 

Não  é,  como  alguém  presume,  o  titulo  do  orago  da  Sé  de 
Braga  Nossa  Senhora  da  Assumpção. 

Em  antiquíssimos  documentos  latinos  e  ainda  na  Doação  do 
Mosteiro  de  Pombeiro,  datada  do  anno  de  1069,  e  doutra,  de  uma 
herdade,  pelo  Conde  D.  Henrique  em  iio3,  encontra-se  invaria- 
velmente o  titulo  de  Santa  Maria  de  Braga. 

São  consideráveis  no  numero  e  na  qualidade  as  doações,  pri- 
vilégios e  regalias  com  que  os  monarebas  e  Pontífices  enriqueceram 
esta  egreja  Cathedral  antiga.  A  Diocese  de  Lisboa  deixou  de  ser 
sua  suíFraganea  quando  el-rei  D.  João  V  creou  alli  o  Patriarchado 
auetorizado  para  esse  fim  pelo  Pontífice  Clemente  XI,  aos  7  de 
novembro  de  1716. 

As  suas  avultadíssimas  rendas,  que  eram  divididas  por  egual 
entre  as  mezas  arcebispal  e  capitular,  foram-lhe  cerceadas  no  anno 
de  11 65,  pelo  Arcebispo  D.  João,  o  Peculiar,  determinando  que 
aquella  pertencessem  duas  partes  e  a  esta  uma. 

Para  que  esta  e  as  demais  rendas  da  Mitra  podessem  arreca- 
dar-se  integralmente,  obteve  D.  Diogo  de  Sousa  um  alvará  data- 


—  70  — 

do  de  1624,  privilegiando  esta  cobrança  cono  fazenda  real,  sendo 
esse  privilegio  renovado  em  9  de  agosto  de  1777  pela  rainha  D.  Ma- 
ria a  seu  tio  o  Arcebispo  D.  Gaspar  de  Bragança,  que  levantara 
o  sequestro  feito  pelo  seu  antecessor  D.  José  a  todas  as  rendas 
dos  cónegos,  encontrando  elle  menos  dc\  moedas  em  ouro  no  cai- 
xão que  então  estava  em  poder  dos  frades  carmelitas.  D.  José  foi 
nomeado  Arcebispo  de  Braga  por  seu  irmão  el-rei  D.  João  V,  a 
11  de  fevereiro  de  1739,  em  virtude  da  renuncia  do  rev.  António 
dos  Reis,  da  Congregação  do  Oratório  de  Lisboa,  para  o  cargo 
que  el-rei  lhe  dera  de  governador  do  Arcebispado  quando,  por 
motivos  ponderosos,  ordenara,  em  1787,  que  fossem  obrigados  a 
viver  á  distancia  de  40  legoas  de  Braga  sete  cónegos  revoltosos. 


Antes  de  me  occupar  do  interior  d'este  vasto  edifício  religioso, 
vejamos  o  que  nos  ofterece  de  curiosidade  histórica  toda  a  sua  fa- 
chada hoje  composta  de  três  estylos  architectonicos. 

O  arco  perfeito,  a  que  D.  Diogo  sotopoz,  com  as  suas  armas, 
o  de  sarapanel  que  forma  a  porta  principal,  pertence,  como  o  do 
lado  sul  da  egreja,  ao  primeiro  quartel  do  século  xn,  e  tem  ana- 
logia com  o  da  antiga  porta  da  egreja  de  Villar  de  Frades.  E1  co- 
mo elle  adornado  de  esculpturas  que  representam  pelicanos,  se- 
reias e  muitos  outros  animaes  mythologicos.  Na  parte  superior  tem, 
em  toda  a  volta,  uma  cinta  de  xadrez,  e  as  columnas  são  baixas  e 
delgadas  com  capiteis  de  figuras  e  folhagem  longa.  A1  sua  esquer- 
da está  cravada  na  parede  uma  inscripção  gravada  em  mármore, 
memorando  a  consagração  da  Archidiocese  ao  Sagrado  Coração 
de  Jesus,  no  anno  de  188 

E'  como  segue  : 


wwwMkSDLtMMiTATEDmTÃ  EçrtÀAacwDKíags  iS.CoRksu 

ÍUBFWSl|SDUSPlt|IShrMi1WfftD.ANlONIllfl^PHl» 
[RtlI^Ho«TO,Aa(l(ltPliC0?lAcl)0MMI0Rl5BíUtAR,ll\oOUiTlL 
MlSmNIMtlWPRIMATIS.aUtADHOcFESTUiy^ERMiNOUMARSíENTlS 
ilMUWSTUOiyAA  MPENSAMQUL  OPUUUA N/WiWff. 

toPyfiu(ftMftcPEaptmMRíiMttóORiwnujy\MCHiiitt(Btõs 

ikBUaFiB^TlAtPERLMj^lMílWMEriUSjlPONllyMI 

Um  pouco  abaixo   d'ella   encontra-se,  fazendo  parte  da  velha 
construcção,  esta  lapide  romana  muito  gasta  do  tempo  : 


_7l  — 

Versão  :  —  A  Aulo  Caelio  Flac-         — 7- r---r^ 

co,  filho  de  Tito,  da  tribu  Quirina.  á  g"   _      if^^tM 

Na  extremidade  norte  está  em-  £s|\  |-       IfJ  J  y& 

bebida  outra  grande  lapide  de  pe-  f^s^W-   "J" 

dra  de  Ançã,  com  esta  inscripção  J£^|3^*X_ lil 


referente   á  segunda   sagraçao   da   p 

Sé,  em  28  de  julho  de  i5g2,  pelo   p\         ll|S|p| 

Arcebispo  D.  fr.  Agostinho  de  Je-    t     -^<  ^^^S^y^^^é 


sus,   por  não   apparecerem  doeu-    \ 


mentos  da  sagraçao  anterior 


»IIKIJS?2Wftòl^l>l«ifl«I»ftMíá!DY0íiWM[RtNII- 

iimWMttU(M*Tfcl|TO&ESPiyEHO»ÍI  : 
JEWIIlÕtLlVí.íEWfMaiMOtttWaWlSilWOOl^WNHT? 
WLVrr  DE0HUÍllrtA6»tTVBTE  KtttV«t»S«EWllttUWWiNin»KMSTD 

'LOUNl)Rtl!ltOEIBaílTiLÍ)WU<MliTH|kELItí(t£\SWaOMlfVÍIE$r[íl(ll 

ILttEI/Tll,VlliaiiTll,mttLtLMTH,llEÍMlW)l)lWl5tEBtlill- 

VAtEtllIWl.lWOWMiWlilíll.tôminftWlliNU.TSiaoaíONFES- 

©WEtOWUMfllLÍIM^WWllIillílEINlWUlIlElOlliMíJET^aO 

íW(l«!,ETlAfâl»íÉílWfL,WTt#()llWl£n«fflBtaiÍÍÍiiíC 
plllUIJÍft|lEMlEUNf()iiAEaLLi!Ã.t(WW[IiíVNtWfll)Elíl8iiE.C 

aEítSlNIEIWHIÍiiPíEWIEViSlMfíEVERlilNWlJÍNmWailT. 


Desde  1488  a  i5oi,  o  Arcebispo  D.  Jorge  da  Gosta  II,  irmão 
do  Cardeal  de  Alpedrinha,  mandou  construir  a  abobada  de  pedra 
que  forma  o  pórtico ;  e  o  seu  suecessor  D.  Diogo  de  Sousa,  (i5o5 
a  i532),  collocou  lhe  no  alto,  em  pequenos  baldaquinos,  sete  esta- 
tuas esculpturadas  em  granito  fino,  representando  o  Anjo  da  Guar- 
da, S.  Pedro,  S.  Paulo,  S.  Martinho,  S.  Fructuoso,  S.  Geraldo  e 
S.  Pedro  de  Rates. 

Esta  abobada  de  pedra,  com  elegantes  nervuras,  tem  do  lado 
sul  um  arco  ogival  rendilhado,  egual  em  tudo  aos  dois  que  na 
frente  ladeiam  o  da  entrada,  que  é  de  volta  perfeita.  Todos  qua- 
tro estão  vedados  desde  1 722  com  as  curiosas  grades  de  ferro  ba- 
tido e  vasado,  estylo  Renascença,  que  o  Arcebispo  D.  Diogo  de 
Sousa,  mandou  fazer  para  os  arcos  da  capella-mór,  que  também 
foi  feita  á  sua  custa  no  primeiro  quartel  do  século  xvi,  e  das  qua 


—  72- 

tro  que  formam  o  transepto.  Foi  D.  Rodrigo  de  Moura  Telles, 
quem  ordenou  a  transferencia,  e  D.  Gaspar  de  Bragança  quem  as 
fez  cortar  em  [784  assentando-as  sobre  a  balaustrada  de  granito 
que  lá  se  vê. 

A  expensas  da  fabrica  da  Sé,  e  sendo  fabriqueiro  o  cónego 
Bento  da  Silva  Telles,  encanou- se  no  anno  de  1739  a  agua  do  cha- 
fariz do  Paço  Archiepiscopal  para  os  dois  gigantes  da  abobada  do 
pórtico,  prestando-se  com  esta  obra  um  bom  serviço  ao  publico, 
que  se  aproveita  d'aquella  agua  potável.  E'  de  simplíssimo  gosto 
architectonico  a  parte  superior  da  fachada,  com  as  respectivas 
torres  que  rematam  em  dois  arcos  ogivaes  cruzados,  semelhando 
as  cúpulas  duas  coroas  imperiaes. 

Entre  uma  e  outra  torre,  vê-se  a  estatua  da  Virgem,  com  o  me- 
nino ao  collo,  esculpturada  em  granito  e  collocada  dentro  de  um 
nicho  com  cúpula  conchoidal.  Sobre  este  nicho  pousa  um  globo 
encimado  pela  cruz  primacial.  Esta  imagem  foi  benzida  á  1  hora 
da  tarde  de  4  de  novembro  de  1724  pelo  Arcebispo  D.  Rodrigo  de 
Moura  Telles  e  acto  continuo  elevada  áquella  altura  em  quanto  os 
músicos  entoavam  na  egreja  a  ladainha.  Em  cada  face  das  torres, 
ha  duas  sineiras  bem  rasgadas,  excepto  na  da  frente  da  torre  sul, 
por  estas  serem  reduzidas  a  uma  bastante  larga  para  a  collocaçao 
do  sino  grande,  tão  grande  e  tão  pesado  que  já  lhe  calcularam 
i65  arrobas.  Tem  em  volta  os  dizeres  seguintes: 

IHS   MARIA  IOZE    1 797 

FEITO  *  SENDO  *  ARCEBISPO  *  DESTA  *  DIOCEZE 

O   EXf°  ER5?0   S°.K    D     FREI  CAETANO   BRANDAM 

E  FABRIQVEIRO  O   R.   JOÃO   CAETANO   DE   OLIVR*    BARROS 

Esta  alteração  contribuiu  por  certo  para  o  deslocamento  de  al- 
gumas pedras  que  lá  se  vêem  gateadas  de  ferro.  A  fachada  foi 
construída  a  expensas  do  Arcebispo  D.  Rodrigo  de  Moura  Telles 
(alma  generosa  e  grande  em  corpo  demasiado  pequeno),  princi- 
Diando  os  trabalhos  em  fevereiro  de  1723  e  terminando  em  4  de 
novembro  do  anno  immediato. 

Sobre  as  duas  janellas  quadrilongas  existem  as  armas  do  refe- 
rido Prelado,  que  aispenaeu  com  toda  a  obra  4:400^000  réis  e 
mais  3:200-^000  réis  com  os  sinos  que  então  ficavam  na  frente. 
As  primeiras  torres  d'este  velho  edifício,  que  por  certo  datavam 
da  reedificação  feita  pelo  Conde  D.  Henrique,  cederam,  como  ou- 
tras construcções  robustas  da  província,  ao  impulso  violento  de  um 
tremor  de  terra,  no  anno  de  1 1 38-  Na  fachada  da  antiquíssima  ca- 
pella  de  S.  Lourenço  da  Ordem,  sita  nos  limites  da  próxima  fre- 
guezia  de  Dume,  existe,  embebida  á  direita  da  porta,  uma  gran- 


-73- 


de  pedra   com  desenho  em  relevo   representando   a  antecedente 
frontaria  da  Sé  que  fora  feita  a  expensas  de  D.  Diogo  de  Sousa. 

A  actual  egreja  da  Sé,  toda  pavimentada  de  granito  e  com  va- 
rias sepulturas  brazonadas,  oc- 
cultas  sob  os  taburnos  de  ma- 
deira que  as  cobrem  d'um  e  ou- 
tro lado  da  nave  central,  mede 
desde  o  arco  cruzeiro  á  soleira 
da  porta  principal,  53m,  20  por 
i8m,io  de  largo  no  corpo. 

Por  occasião  das  obras  de 
1780  accrescentaram-se  os  dois 
altares  de  S.  Bento  e  Santa  Bar- 
bara construídos  nas  duas  anti- 
gas portas  de  communicaçao 
com  o  claustro  e  rocio  de  Traz 
da  Sé,  abrindo  se  então  as 
actuaes,  alguns  metros  abaixo, 
junto  das  paredes  sobre  que  se 
erguem  as  torres.  No  alto  da 
que  dá  para  os  claustros  appa- 
receu  em  setembro  de  1722, 
quando  se  caiava  a  egreja,  uma 
pedra  quadrada  cheia  de  íet- 
tras,  como  diz  a  Gaveta  de  Lis- 


Porta  principal  da  Sé  de  Braga 


boa,  «com  muitas  abreviações»,  as  quaes  Pedro  da  Cunha  Souto 
Maior,   alcaide-mór,   mandou  limpar   e  copiar  do  seguinte  modo : 

ERIT 

PRESVLIS    HVIVS,   SECVLS 

MEMORANDA  FVTVRIS    \  ■ 

SEDIS   ET  ANTIQVI   MAGANIMOS   PIE 

PRIMATES  VETERES   REPAR  Al  QV1S    MAGIOR  CVI 

RVGASO   MATERI   ANNO   SÍNTETER   VOE 

ERA    •     I    ;     •    QVINGENTESS1MA  PRIMA    • 

Essa  pedra  desappareceu  por  occasião  da  obra  da  nova  porta, 
ignorando-se  o  paradeiro  d'ella.  Parece  que  se  refere  a  melhora- 
mentos feitos  na  Sé  pelo  Bispo  do  anno  de  463,  que  era  Valério  I. 

A  commissão  de  obras  de  1780  legou-nos  de  si  tristíssima  me- 
moria. A  ella  se  deve  o  estucamento  das  naves,  cujos  tectos  eram 
de  madeira  de  cedro,  como  ainda  se  pode  ver  junto  do  anteparo, 
onde  se  lêem  os  dizeres  seguintes : 

S.   PETRVS    RATENSIS  ARCHIEPISCOPVS   BRACHARhNSIS. 

Para  este  forro  das  três  naves  e  do  transepto  mandou  D.  Diogo 


-74- 

de  Sousa  cortar  a  madeira  no  souto  que  então  havia  desde  o  cas- 
tello  e  campo  de  Santa  Anna  ao  largo  de  S.  João. 

Actualmente  ha  no  corpo  da  egreja,  lado  do  Evangelho,  os 
altares  de  Nossa  Senhora  da  Conceição,  de  Nossa  Senhora  do 
Loreto,  de  S.  José  e  de  S.  Bento.  No  lado  da  Epistola: — S.  João 
Baptista,  S.  Sebastião,  S.  Rodrigo  e  Santa  Barbara,  todos  com 
quadros  a  óleo  devidos  ao  pincel  de  João  Glamma  Stroberle,  pin- 
tor da  eschola  romana,  o  qual  nasceu  em  Lisboa  no  anno  de  1708. 
Nos  intervallos  dos  altares  foram  collocadas  em  1780  as  estatuas 
dos  Apóstolos  e  Doutores  da  egreja,  tamanho  natural,  represen- 
tando S.  Paulo,  S.  Thiago  Maior,  S.  Thomé,  S.  Filippe,  S.  Ma- 
theus,  S.  Mathias,  Santo  Ambrósio,  S.  Jeronymo,  S.  Pedro,  S. 
André,  S.  João,  S.  Thiago  Menor,  S.  Bartholomeu,  S.  Simão, 
S.  Gregório  Papa  e  S.  Agostinho. 

A  nave  central  é  composta  de  doze  arcos,  tendo  os  quatro 
últimos  interceptados  pelo  coro  que  o  Cabido  de  1787  mandou 
fazer,  enriquecendo-o  em  1757  com  as  cadeiras  de  pau  preto 
dourado.  Os  órgãos  actuaes,  que  substituíram  os  anteriores  fei- 
tos a  expensas  de  D.  Diogo  de  Sousa,  construíram  se  em  1737 
(lado  do  Evangelho)  e  1738  (lado  da  Epistola),  sendo  seu  auctor 
o  religioso  Franciscano  F.  R.  Simon  Fontanus  Gallencianus.  No 
alto,  sobre  as  estatuas  da  Fé,  Esperança,  Caridade,  ReligiãovCon- 
cordia  e  Fortaleza,  vê-se  uma  águia  com  estes  dizeres  numa  fita : 

qvis  vidit  hvic      e  outra  águia  com  estes:      qvis  avdivit  vnqvam 

SÍMILE?  TALE  ? 

Referem-se  á  magestade  da  obra  :  Quem  viu  aqui  semelhante  ? 
Quem  ouviu  jamais  egual? 

Encostados  ás  columnas  do  arco  primeiro  d'esta  nave,  existem 
dois  púlpitos  de  mármore  rosado,  sendo  o  da  Epistola  obra  de 
D.  fr.  Agostinho  de  Jesus  e  o  do  Evangelho  de  D.  Rodrigo  de 
Moura  Telles,  como  o  indicam  os  respectivos  escudos. 

A'  direita  de  quem  entra  vê-se,  dentro  de  um  arco  aberto  na 
parede,  o  precioso  tumulo  de  cobre  dourado,  que  encerra  os  res- 
tos mortaes  do  infante  D.  Aífonso,  filho  primogénito  de  el-rei 
D.  João  I,  que,  tendo  nascido  em  Santarém  a  3o  de  julho  de  1390, 
falleceu  em  Braga  a  22  de  dezembro  de  1400,  com  10  anno-  de 
edade,  por  occasião  da  estada  aqui  de  seu  augusto  pae,  sepultan- 
do-se  na  Sé  «entre  as  duas  columnas  que  dividem  a  nave  do  meio 
da  do  Evangelho,  começando  do  cruzeiro»,  como  diz  D.  Rodrigo 
da  Cunha  em  principio  do  século  xvn.  (Vide  gravura  a  pag.  j5). 

Annos  depois  foi  trasladado  para  o  referido  tumulo  de  cobre 
que  sua  irmã  a  infanta  D.  Izabei,  casada  em  1429  com  Filippe  V, 
(o  Bom)  Duque   de  Borgonha  e  Conde  de  Flandres  e  de  Henao 


75- 


: 


Tumulo  de  cobre  dourado  (Phot.  do  sr.  João  San  Romão) 

(Hainaut)  lhe  mandou  para  Braga,  collocando-se  «detráz  da  co- 
lumna  a  que  arrima  o  altar  de  Nossa  Senhora  do  Rozario,  por 
baixo  do  púlpito,  e  defronte  de  onde  primeiro  esteve  enterrado». 
Quando  seria  d'alli  trasladado  para  o  arco  onde  se  encontra  ? 
Provavelmente  por  occasião  das  grandes  obras  de  1780.  Esjá  es- 
tendida sobre  o  tumulo,  em  tamanho  natural,  a  figura' do  infante 
com  as  mãos  cruzadas  sobre  o  peito.  Falta-lhe  a  perna  direita, 
roubada  como  os  quatro  leões  que  sustentavam  o  tumulo,  o  ca- 


—  7b  — 


chorro  que  a  figura  tinha  aos  pés  e  os  dois  anjos  que  se  viam  em 
adoração  aos  lados  da  cabeça !  O  docel  que  cobre  o  tumulo  é 
sustentado  por  quatro  columnas  lavradas  e  tem  ao  centro  as  armas 
de  Portugal,  e  não  se  lhe  descobrem  vestígios  do  outro  escudo  de 
flores  de  lis.  D.  Rodrigo  da  Cunha  achou  tão  gasto  do  tempo  o 
lettreiro  que  cercava  o  tumulo,  que  não  lhe  foi  possível  lel-o. 

E'  de  suppor  que  dissesse:  «Aqui  jaz  o  infante  D.  Aífonso  de 
Portugal,  a  quem  Deus  perdoe ;  filho  do  nobre  rei  D.  João  de 
Portugal,  o  primeiro,  e  da  rainha  D.  Filippa ;  falleceu  aos  22  de 
dezembro  de  1400». 

O  que  porém  unicamente  lhe  resta  numa  linha  de  caracteres  go- 
thicos  que  lhe  toma  a  frente  e  um  dos  lados,  é  o  seguinte  que  fiel- 
mente copiei: 

r       AQVI  YAZ  O  YNFANTE  DON  AFONSO 

DE  PORTVGAL  A  QVEM  DE FYLHO 

DO  NOBRE  REY  DOM  YOAN  DE  PORTVGAL 

Ao  lado  esquerdo  fica  a  pia  baptismal,  ricamente  esculpturada 
em  pedra  de  Anca,  representando  na  base  dois  leões  a  devorar 
creanças.  Aesculptura  deve  ser  quinhentista.  Aporta  que  junto  d'ella 

communica  com  o  claustro, 
tem  a  servir  de  soleira  a  pe- 
dra tumular  de  D.  Fernan- 
do da  Guerra,  neto  de  el- 
rei  D.  Pedro  I  por  bastar- 
dia, fallecido  a  20  de  setem- 
bro de  1467,  e  sepultado  na 
capella  de  S.  Geraldo,  que 
elle  reedificara,  mandando 
collocar  n'ella  o  tumulo  que 
encerra  os  restos  veneran- 
dos do  santo. 

Na  frente  d' este  sarco- 
phago  lê-se  : 

BEATI 
GERALDI 

CORPUS 

A  sepultura  de  D.  Fer- 
nando elevava-se  om,qo  aci- 
ma do  pavimento,  e  a  pe- 
dra que  a  cobria  tinha  em 
relevo  a  estatua  jacente  do 
Prelado,  em  pontifical,  e  a 
toda  a  volta  este  lettreiro 
gothico  : 


—  //  — 

AQVI  JAZ   O   MVITO   NOBRE   SENHOR 

D-    FERNANDO  ARCEBISPO  DE   BRAGA     E 

BISNETO   DELREI   D-    PEDRO-    E   FINOV  AOS 

XXVI  DE   SETEMBRO   DE   MCCCCLXVII - 

O  Arcebispo  D.  fr.  Agostinho  de  Castro,  trasladando  para  a 
referida  capella  de  S.  Geraldo  os  ossos  dos  seus  predecessores 
D.  Diogo  da  Silva  e  D.  Manuel  de  Sousa,  mandou  cortar  o  tu- 
mulo alinhando  a  tampa  com  o  ladrilho! 

Reedificando-se  pela  terceira  vez  a  capella  no  anno  de  1712, 
foi  a  referida  pedra  applicada  ao  capeamento  do  altar  que  era  de 
granito;  e  demolido  este  em  dezembro  de  1780,  data  das  grandes 
obras,  para  ser  substituído  por  outro  de  madeira,  foi  logo  nos 
principios  do  anno  immediato  menospresada,  virando-se  para  a 
terra  a  estatua! 

Por  privilegio  datado  de  1443,  o  infante  D.  Pedro,  regente  do 
Reino,  coutou  ao  referido  Arcebispo  «as  perdizes  com  seus  ovos, 
condemnando  quem  as  caçasse  por  cada  perdigão,  perdiz  ou  ovo, 
vinte  reaes  brancos;  e  que  á  distancia  d^ima  légua,  meia  acima 
da  ponte  de  Guimarães  e  meia  abaixo,  ninguém  pescasse  no  rio 
Este,  sob  pena  de  pagar  por  cada  peixe  10  reaes  brancos». 

E'  obra  de  D.  João  de  Sousa,  Arcebispo  que  foi  de  Braga 
desde  os  annos  de  1696  a  1703,  a  actual  sacristia  onde  se  guarda 
o  thesouro.  Tem  ao  centro,  em  frente  do  primoroso  relicário,  a 
sua  sepultura  que  elle  próprio  mandou  fazer  com  a  seguinte  ins- 
cripção  gravada  em  mármore: 

S  DE  D  •  JOAM  DE 
SOUSA  •  X  •  DO  NOME 
E  ■  CXI  -EM  N°  ARCB° 
PRIMAS  E  SENHOR 
DE  BRAGA 

No  mesmo  sitio  esteve  primitivamente  a  capella  fundada  pelo 
Arcebispo  D.  João  Martins  de  Soalhães,  fallecido  em  i325  e  se- 
pultado n'ella  a  seu  pedido.  D.  Diogo  de  Sousa,  vendo  que  a 
sacristia  da  Sé,  então  do  lado  norte,  era  acanhada  e  muito  falta 
de  luz,  estabeleceu-a  no  anno  de  i5ii  onde  ora  é,  recolhendo  os 
ossos  do  fundador  n'um  sarcophago  de  pedra  que  fez  embeber 
na  parede  da  referida  capella  com  estes  dizeres  na  frente: 

HVC  TRANSLATA   SVNT  OSSA 

DNI   10ANNIS   DE   SOALHÃES 

ARCHIEPISCOPI   BRACHARENSIS 

ANNO   SALVTIS    I  5  I  I 


-Tê- 

Com  a  reedificação  da  capclla  tudo  isto  desappareceu.  Con- 
serva-se  alli  o  thesouro  que  possue  bastantes  preciosidades,  como 
por  exemplo: 

—  Uma  collecção  de  doze  quadros  em  papel  representando  os 
bustos  dos  Apóstolos,  magistralmente  desenhados,  sendo  dignos 
de  especial  menção  os  de  S.  Matheus  e  S.  João.  Na  extremidade 
inferior  d'estes  quadros  lê-se,  em  caracteres  miúdos: — Johann 
Baptista  Pia\\etta  Venetus  delineavit.  Johann  Loren\  Haid  Scul- 
psit. 

Outro  quadro  em  papel  representando  o  nascimento  de  Ghristo. 
Tem  a  marca :  —  London  —  Alex.  í  ran  Haecken  feci. 

—  Os  pequenos  sapatos  que  D.  Rodrigo  de  Moura  Telles 
usava  nas  solemnidades  da  Sé,  medindo  ora,io  de  altura  no  tacão 
e  om,i9  de  comprimento! 

—  A  cabeça  de  S.  Fortunato,  com  alguns  ossos,  e  estes  dize- 
res no  cofre: 

SACRVM  CAPVT  RESTAVRATVM 
CV  PAVCIS   OSSIBVS    S  •  FORTVNATI  •  M  • 

—  A  de  S.  Gandida: 

SACRVM  CAPVT  RESTAVRATVM 
CV  PAVCIS  OSSIBVS  S  ■  CANDIDjE  •  M  • 

—  Uma  custodia  de  prata  dourada,  com  profusa  cravação  de 
brilhantes  avaliados  em  vinte  mil  cruzados. 

—  O  pequeno  cálice  de  prata  dourada,  denominado  de  S.  Ge- 
raldo, com  esmalte  e  lavores,  copa  hemispherica  e  estes  dizeres 
na  base  em  duas  linhas  circulares:' 

-f-IN  NNE  DNI  MENENDUS  GUNDI  SALUI , 
-f  ET  TUDA  DOM  NA  SUM  • 

Este  cálice,  que  mede  om,i  i  de  altura,  foi  offerecido  pelo  Conde 
da  Galliza  Menendo  Gonçalves  que  também  fez  restituir  á  egreja 
bracarense  todos  os  seus  bens  até  então  invadidos.  Guarda-se  num 
cofre  cylindrico  de  marfim  que  figurou  na  exposição  retrospectiva 
de  arte  ornamental,  de  Lisboa,  em  1882,  achando-se  assim  des- 
cnpto  no  respectivo  cathalogo: 

«Cofre  hispano-arabe  de  marfim.  Altura  om,i9.  E'  de  forma 
cylindrica;  a  tampa  convexa  com  ferragens  de  cobre  dourado. 
Em  volta  da  tampa  uma  inscripção  árabe.  Ornamentação  em 
baixo-relevo  representado  fitas  entrelaçadas,  arcos  de  volta  de 
ferradura,  figuras  humanas,  aves  e  outros  animaes».  (Vide  gravu- 
ra a  pag.  ygj. 


79 


Cálice  de  S.  Geraldo  e  o  respectivo  cofre 


E1  esta  a  inscripção: 


t\z\    LL  -01 


*jyU  1   LjJ'    ^jJ   J^  *Uj  ^1   U^  *iM 


No/lrc/zfo/.  Portug.,  vol.  i,  pag.  273  e  11,  204,  o  sr.  David  Lopes 
traduziu-a  do  seguinte  modo:  —  Em  nome  de  Deus.  A  benção  de 
Deus,  felicidade  e  fortuna  sejam  com  o  hágibe  Seifadaula  —  glori- 
fique-o  Deus!  —  por  ter  mandado  fazer  esta  obra  ao  seu  servi- 
dor  amirita. 

—  «Báculo  de  cobre  dourado.  Altura  om,24.  A  crossa  representa 
uma  serpe  com  a  cabeça  atravessada  pela  cruz».  Denomina-se  de 
Santo  Ovidio  por  constar  que  appareceu  no  seu  sepulchro. 

—  «Cálix  de  prata  dourada  com  sua  patena.  Altura  om,33. 
Copa  hemispherica  adornada  com  seis  figuras  de  anjos  susten- 
tando os  emblemas  da  Paixão,  e  na  parte  inferior  outras  seis 
sustentando  outros  tantos  tintinabulos.  O  nó  decorado  com  arca- 


—  8o  — 

nas  gothicas,  tem  debaixo  de  baldaquinos  as  estatuetas  de  seis 
Apóstolos.  Base  dividida  em  doze  gomos,  dos  quaes  os  maiores 
têm  em  baixo-relevo  as  figuras  de  Apóstolos,  excepto  um,  que 
tem  um  escudo  com  as  armas  do  arcebispo  D.  Diogo  de  Sousa, 
e  a  data  de  i5oo,.  Nos  seis  gomos  menores,  ornatos  esmaltados. 
Entre  a  copa  e  o  nó,  e  entre  este  e  a  base  ha  dois  anneis  com  o 
mesmo  género  de  esmalte.  No  bordo  exterior  da  copa,  lê-se:  hic 
est  cálix  sangvinis  mei  novi  et  éter  •  A  patena  tem  no  meio  da  face 
inferior  a  figura  do  cordeiro  esmaltada-,  na  face  superior  S.  João 
Baptista;  á  roda  em  caracteres  gothicos:  do  vobis  pacem  relinco 
vo  pacem  meam-  Fins  do  século  xv  ou  princípios  do  século  xvi». 

—  Dois  cofres  de  prata  dourada  em  que  se  guardam  as  cabe- 
ças de  S.  Martinho  de  Dume  e  S.  Thiago  Interciso. 

—  Outro  cofre  de  prata  dourada  contendo  as  reliquias  a  que 
se  refere  a  lapide  da  sagração.  Tem  na  frente  quatro  estatuetas 
de  santos  da  Ordem  franciscana. 

—  Um  relicário  de  prata  dourada,  elegante  e  bem  lavrado, 
contendo  parte  do  santo  lenho.  Tem  na  frente  onze  diamantes  e 
na  base  uma  pequenina  placa  com  as  armas  do  Arcebispo  D.  Ro- 
drigo de  Moura  Telles,  que  o  oífereceu,  e  estes  dizeres  em  volta; 

RODER  •  ARCH  •  PRIMAS  •  HISPAN  • 

—  Um  cálice  de  prata  dourada  offerecido  por  el-rei  D.  Filippe. 
Na  base  tem  as  armas  d'este  monarcha,  e  em  toda  a  volta  esta 
inscripçao  com  pontos  triangulares  : 

ELREI  •  FELIPE  •  DEV  ■  ESTE  •  CALEZ  •  AESTA  •  CASA 

—  Uma  cruz  de  prata  dourada  com  os  dizeres  seguintes  : 

SALVE   CRVZ   PRETIOSA   QVAE  IN  C0RP0RE  X  DIC 

—  Uma  estatua  de  prata  representando  Nossa  Senhora  com  o 
menino.  O  Arcebispo  D.  Lourenço  (137 1 -1397)  usou-a  sobre  o 
murrião,  em  logar  de  pluma  quando  na  memorável  batalha  de 
Aljubarrota  luctava  com  denodo  ao  lado  de  el-rei  D.  João  I. 

Vae  na  gravura  que  representa  o  corpo  incorrupto  do  Prelado- 
guerreiro. 

Assenta  sobre  uma  peanha  do  mesmo  metal  feita  em  i653, 
como  se  lê  n'esta  inscripçao  gravada  na  face  posterior : 

DON    IGNACIO  DEA   PRIMAS   E   M8.L  PR  t    DE 
MELLO    MANDARÃO   FAZER  ESTA   SNAR   SENDO 
JUIZES   NO  ANNO   DE    l653. 


—  81  — 

A  palavra  Senhora  deve  ser  substituída  por  Pecinha.  O  estylo 
da  esculptura  da  imagem  e  a  circumstancia  de  não  poder  d'este 
modo  applicar-se  ao  murrião  denunciam  o  erro  do  gravador. 

Esta  estatua,  a  de  Santo  António,  da  Senhora  da  Abbadia  e 
de  S.  Nicolau,  todas  quatro  de  prata,  escaparam  milagrosamente 
á  rapacidade  dos  invasores  francezes. 

—  Frontal  com  sanefa,  bordado  a  matiz  e  ouro  em  alto  relevo, 
representando,  nos  quatro  retábulos  que  as  três  faxas  dividem,  os 
doze  Apóstolos  primorosamente  bordados.  Veio  da  índia  e  oífere- 
ceu-o  á  Sé  el-rei  D.  Manuel.  Faltam-lhe  os  coraes  e  as  pedras 
preciosas  que  o  ornavam  em  grande  quantidade.  Existe,  da  mes- 
ma procedência,  a  casula,  o  manipulo  e  a  estola,  representando  o 
desenho  d'este  bordado  :  folhagens,  conchas,  estrellas,  pássaros  e 
flores. 

—  Dois  pontificaes  completos,  branco  e  vermelho,  industria 
franceza,  offerecidos  pelo  Arcebispo  D.  Gaspar  de  Bragança 
i  [758-89;. 

—  Frontal  e  paramento  completo,  bordado  a  ouro  em  relevo, 
industria  italiana. 

—  Paramento  completo,  bordado  a  ouro  no  Recolhimento  da 
Tamanca,  em  Braga,  e  offerecido  por  D.  fr.  Caetano  Brandão. 

—  Outro  paramento  completo,  vermelho,  que  pertenceu  ao  mos- 
teiro de  Tibães,  também  bordado  na  índia.  Apenas  se  faz  uso 
d'elle  no  dia  de  S.  Geraldo. 

Além  doestes  objectos  ha  ainda  dois  pares  de  jarroes  da  índia, 
muito  apreciáveis,  numerosas  reliquias  e  as  pratas  do  serviço  de 
pontifical  que  são  muitas  e  valiosas. 


Nas  duas  extremidades  do  transepto  da  egreja  estão  os  altares 
do  Senhor  da  Agonia  (Evangelho)  com  a  urna  que  encerra  o 
corpo  de  Santo  Ovidio,  o  Bispo  bracarense  a  quem  Jéronymo  Ro- 
man  dedica  os  seguintes  versos  por  ter  baptisado  e  preservado  da 
morte  as  nove  filhas  de  C.  Atilio : 

Gaude  Sacerdos  Ovidi 
Tu  bracharencis  Pontifex, 
Qui  meruisti  filias 
Tot  ad  poios  transmittere. 

e  o  da  Senhora  das  Angustias  (Epistola)  com  a  urna  que  encerra 
o  corpo  de  S.  Crescencio. 

Aos  lados  da  capella-mór  ha  quatro  capellas  sendo  a  primeira 
actualmente  consagrada  ao  Coração  de  Jesus  e  guardando-se  n'ella 
os  ossos  de  S.  Thiago  Interciso,  para  alli  trasladados  do  thesouro 
pelo  Arcebispo  D.  fr.  Agostinho  de  Castro. 


82 


A  urna,  que  primitivamente  apresentava  esta  inscripção  : 

AQVI   ESTÁ  O  CORPO  DE   SANT-IAGO  INTERCISO,  PERSIANO  DE  NAÇÃO, 

QVE  DE  ROMA   TROVXE   PÊRA  ESTA   S™  EGRE.TA  DE  BRAGA   O  ARCEB  • 

D  •    MAVRICIO,   PELOS   ANNOS   DE   I  J  IO  •    E  NO  DA  ERA  DO   SENHOR 

1606,  O   COLLOCOV  NESTE  TVMVLO  O  ARC  •    D  •    FR  •    AGOSTINHO 

DE  JESV  DE   BOA   MEMORIA,   NO   SYNODO  QVE  CELEBROU  NO   MEZ 

DE   OVTVBRO  DO   DITO  ANNO,    ESTANDO   TÉ   ENTÃO   NO   THESOVRO 

DESTA   SE,   NO   COFRE   GRANDE   DAS   RELIQVIAS. 


tem  agora  apenas  os  dizeres  seguintes  : 


OSSA 

BEATI   JACOB I 

INTERC1SI 


A  segunda  capella  é  dedicada  ao  Sacramento.  O  frontal  do 


Frontal  do  altar  do  Sacramento 


seu  altar  compoe-se  de  uma  só  peça  de  riquíssima  talha,  repre- 
sentando num  primoroso  figurado  em  relevo  a  Sagrada  Eucha- 
ristia  condusida  pelo  Vigário  de  Christo  em  um  carro  triumphal 
que  arrasta  presos  muitos  hereges  e  despedaça  outros  sob  as  ro- 
das. Na  frente  caminham  os  crentes  enthusiasmados,  empunhando 
palmas  e  tocando  trombetas.  Ao  centro  tem  estes  dizeres :  eccle- 

SIA  PER   S   .    EUCHARISTIAM  TR1UMPHANS  . 

A  terceira  tem  a  invocação  de  S.  Pedro  de  Rates.  No  seu  altar 
ha  um  cofre  de  madeira  a  vestir  outro  de  pedra  onde  em  tempo 
se  gravou  a  inscripção  : 


—83- 

AQVl   JAZ   O   CORPO   DE   S  •    PEDRO  MARTYR 
DIC1PVLO   DO  APOSTOLO    S  •    THIAGO       TRESLADADO 

DA   EGREJA   DE   RATES   POR  D  •    BALTAZAR  LIMPO 

ARCEBISPO  DE   BRAGA  A  ESTA   SEPVLTVRA   QVE   SE 

LHE   EEZ   PÊRA  MAIOR  VENERAÇÃO   E   POR  SER  O 

PRIMEIRO   PRELADO  DESTA   EGREJA   AOS    17  DE 

OVTVBRO   DE    I  552. 

Na  frente  do  cofre  de  madeira  lê-se  : 

BEATI 

PETRl   DE   RATES 

CORPVS 

Os  azulejos  desta  capella  e,  certamente,  os  das  demais  da  Sé, 
foram  pintados  por  António  de  Oliveira  Bernardes,  cujo  nome  se 
acha  no  lado  esquerdo,  e  no  direito  um  breve  de  altar  privilegiado 
para  todos  os  dias,  concedido  pelo  Papa  Gregório  XIII  a  D.  fr. 
Bartholomeu  dos  Martyres,  no  anno  de  ib-jb. 

A  quarta  é  da  invocação  de  Nossa  Senhora  da  Roza. 

Tem  também  sobre  o  altar  um  cofre  de  madeira  a  vestir  ou- 
*ro  de  pedra  onde  esteve  esta  inscripção  : 

AQVI   ESTÁ   O   CORPO   DE    S  •    MARTINHO 

ARCEBISPO   QUE   FOI  DESTA   SANTA   EGREJA 

DE   BRAGA   PELOS   ANNOS    DE   5y4  O   QVAL 

O  ARCEBISPO   D  .    IR  .    AGOSTINHO   DE  JESVS 

DE   BOA   MEMORIA   NO    SYNODO   QVE   CEI.EBROV 

NO   MEZ   DE    OVTVBRO   DO   ANNO   DE    1606  TRÊS 

LADOV  DA   EGREJA  DE   DVME   NA   QVAL  PRIMEIRO 

FOI   BISPO    E   NELLA   ESTAVA   SEPVLTADO   E   O 

COLLOCOV  NESTE   TVMVLO  . 

O  cofre  de  madeira  apenas  diz : 

S  .  MART  .  DVMIENS  . 
ARCHIEP  .  BRACH  . 
SACRA  OSSA 


8-4- 


Exterior  da  Capella-mór  da  Sé 


—  85  — 

Exteriormente  a  capella-mor  da  Sé  recommenda-se  pela  ele- 
gância da  esculptura,  correcção  e  pureza  do  estylo  architectonico. 
O  Arcebispo  D.  Diogo  de  Sousa,  que  occupou  com  extraordinário 
zelo  e  inexcedivel  patriotismo  a  cadeira  archiepiscopal  de  Braga 
desde  i5o5  a  1 532,  vendo  prestes  a  cair  em  ruinas  todo  o  edifício 
da  sua  Sé  Cathedral,  e  muito  particularmente  a  capella-mor  con- 
struída a  expensas  do  Conde  D.  Henrique,  illustre  progenitor  do 
nosso  primeiro  monarcha  D.  Afíbnso  Henriques,  ordenou  o  corte 
de  madeiras  no  souto  que  então  occupava  todo  o  espaço  compre- 
hendido  entre  o  actual  campo  de  Santa  Anna  e  o  largo  fronteiro 
á  egreja  parochial  de  S.  João,  dando  principio  á  obra  de  repara- 
ção no  corpo  do  vasto  templo  e  reconstruindo  a  capella  mor,  cujo 
trabalho  correu  sob  a  direcção  de  artistas  Biscainhos,  moradores 
numa  das  nossas  ruas  que  ainda  os  faz  lembrados.  Os  contrafor- 
tes ornados  de  columnas  rematam  em  elegantes  coruchéos  a  que 
se  associam  os  do  formoso  parapeito  rendilhado  que  coroa  em 
toda  a  volta  o  edifício  por  sobre  a  cornija  bellamente  ornamen- 
tada. Tem  três  grandes  janellas  ogivaes,  e  por  baixo  da  do  cen- 
tro uma  imagem  de  Nossa  Senhora  do  Leite  esculpturada  em  pe- 
dra de  Ançã,  com  o  escudo  de  D.  Diogo  de  Sousa  na  peanha  e  á 
sua  esquerda,  e  o  de  el-rei  D.  Manuel  á  direita,  repetidos  ambos 
no  alto  do  edifício  e  no  interior  da  mesma  capella-mor,  provavel- 
mente para  D.  Diogo  testemunhar  ao  monarcha  a  muita  conside- 
ração que  lhe  votava,  e  á  qual  el-rei  correspondia,  como  nos  fins 
da  vida  lh'o  demonstrara  nomeando-o  um  dos  seus  testamentei- 
ros. Ao  rés  do  chão  abriram  posteriormente  o  arco  onde  se  exhi- 
be  durante  a  semana  santa  um  dos  passos  da  via  sacra.  O  cemi- 
tério que  D.  Diogo  construirá  junto  da  Sé,  também  certamente 
occupou  esta  rua  onde  em  1867  foi  encontrada  uma  sepultura  com 
alguns  ossos  humanos. 

Esta  capella-mor  mede  interiormente  10, 5(5  de  comprido  por 
'"i.yS  de  largo.  A  abobada  de  pedra,  coberta  de  nervuras,  está 
pintada  a  fingir  o  que  é,  si  vera  est  fama,  para  evitar  o  desagra- 
dável   elfeito  do  granito  gasto  e  falto  de  homogeneidade  na  cor ! 

O  baldaquino  de  madeira,  na  abside,  fez-se  em  tempo  do  Ar- 
cebispo D.  João  Chrisostomo  de  Amorim  Pessoa.  Tem  no  alto  as 
suas  armas.  Collocaram  alli  a  preciosa  imagem  da  Virgem  e  con- 
serva-se  ainda  o  altar  mor,  tudo  de  pedra  de  Ançã  como  o  reta- 
bolo  que  tivera  dourado  e  com  estatuas,  considerado  um  dos  me- 
lhores da  Hespanha,  e  do  qual  hoje  restam  alguns  fragmentos 
numa  loja  escura  do  claustro.  Na  demolição  effectuada  em  tempo 
de  D.  Gaspar  de  Bragança  appareceram  relíquias  de  S.  Victor, 
S.  Alexandre  e  S.  Marianno. 


86- 


Altar  mor  da  Sé 

O  altar-mór,  que  representa  em  baixorelevo  Jesus  Christo  e  os 
Apóstolos  aos  pares,  foi  cortado  no  lado  direito...  para  que  se 
não  julgue  que  o  reinado  da  insensatez  é  exclusivo  de  uma  ou  de 
outra  epocha  !  Provavelmente  este  vandalismo  data  da  reconstruc- 
çao  da  capella-mór,  pois  no  thesouro  ainda  hoje  se  conserva  o  já 
citado  frontal  que  el-rei  D.  Manuel  mandou  comprar  na  índia  com 
as  dimensões  exactas  do  mesmo  altar  cortado,  para  o  qual  o  olfe- 
receu.  A  facear  com  este  altar-mór,  lado  do  Evangelho,  esteve 
desde  1 5 1 3  até  maio  de  1877,  o  tumulo  em  que  o  Arcebispo. 
D.  Diogo  de  Sousa  mandara  encerrar  os  restos  mortaes  do  Con- 
de D.  Henrique,  fallecido  em  Astorga  no  anno  de  11 12  e  sepul- 
tado a  seu  pedido  na  Sé  de  Braga,  assim  como  os  da  rainha  D. 
Thereza,  fallecida  em  Coimbra  no  i.°  de  novembro  de  iiSo. 
transportada  para  aqui  por  ordem  de  seu  filho  D.  Affonso  Henri- 
ques, e  ambos  primeiramente  sepultados  na  capella  sagrada  (on- 
de presentemente  se  encontram  de  regresso  em  dois  túmulos)  man- 
dada construir  pelo  referido  seu  filho  iVaquelle  sitio  que  servira  de 
cemitério  aos  reis  suevos  catholieos.  A  inscripção  que  D.  Diogo 
mandou  gravar  no  tumulo  é  como  segue  : 

D.    O.   M. 

DOMINO   HENR1CO    HVNGARORVM   REGIS 

FILIO    PORTVGALL1AE   COM1T1   DOMINVS 

DIEGVS   SOVSA  ARCH1EP  VIRO  CLARÍSSIMO 

AQVO   PORTVGALLIAE   REGES    ESSE   REGNVMQ 

ACCEPISSE   CONSTA T  DE   REPVBLICA  CHRISTIANA 

PATRÍAQ   SVA   OPTIME   MERENTI   POSVIT  ANN. 

A     CH  RI  ST   NA    MDXIIL 

«A  Deus  de  toda  a  bondade  e  grandeza.  D.  Diogo  de  Sousa 
Arcebispo,  levantou  esta  sepultura  ao  Conde  D.  Henrique,  filho  de 
el-rei  da  Hungria  e  Conde  de  Portugal,  no  qual  este  reino  e  seus 
reis  tiveram  principio.  Anno  de  i5i3». 


-87- 

A  28  de  novembro  de  1598  o  Arcebispo  D.  fr.  Agostinho  de 
Jesus  fez  abrir  este  tumulo  na  presença  dos  cónegos,  cirurgiões, 
etc,  sendo  então  encontrados  os  restos  de  dois  cadáveres  dos  sexos 
masculino  e  feminino,  envoltos  num  grande  panno  de  damasco. 
Os  ossos  femininos  de  D.  Thereza,  foram  separados,  depositam 
do-se  no  tumulo  que  D.  Diogo  de  Sousa  tinha  destinado  para  sua 
sepultura  collocando-o  do  lado  da  Epistola  sem  comtudo  o  apro- 
veitar, e  gravou-se-lhe  a  inscnpção  : 

d.  o.  M. 

REGINAE    TARESIAÉ  ALFOXS1    CASTELLAE 

ET   LEONIS   REGIS    IMPERATORIS   NVNCVPAT1 

FILIAE  COMITIS   HENRIG."   VXORI  DIDACVS  A   SOVSA 

ARCHIEPlsdbPVS   BRACHAR   HISP   PRIMAS  MP   AN. 

A  CHRISTO   NATO    MDXIII 

«A  Deus  de  toda  a  bondade  e  grandeza.  D.  Diogo  de  Sousa, 
Arcebispo  de  Braga,  Primaz  das  Hespanhas,  levantou  esta  sepul- 
tura á  rainha  D.  Thereza,  filha  de  L).  Aífonso  rei  de  Castella  e 
Leão,  chamado  o  imperador,  mulher  do  Conde  D.  Henrique.  No 
anno  de  1 5 1 3 » . 

Em  maio  de  1877  foram  estes  túmulos,  de  i'",6o  de  comprido, 
removidos  para  a  capella  dos  reis,  assim  denominada  por  ser 
construída  a  expensas  de  D.  Aífonso  Henriques  sob  a  invocação 
de  S.  Thomaz  e  posteriormente  de  S.  Lucas,  onde  se  conservam 
com  as  estatuas  jacentes  sobre  a  tampa. 

A  capella-mór  da  Sé  foi  noutros  tempos  sepultura  de  homens 
notáveis  como  os  Condes  Alvito  Nunes,  ferido  quando  os  Nor- 
mandos aportaram  com  i5o  navios  a  Villa  do  Conde  no  anno  de 
»)68 ;  e  Menendo  Gonçalves,  offerente  do  sino  e  cálice  denomina- 
dos de  S.  Geraldo.  No  dia  4  de  junho  de  1756  também  aqui  foi 
sepultado  o  Arcebispo  D.  José,  filho  de  el-rei  D.  Pedro  II,  como 
o  indica  a  inscripção  gravada  em  campa  de  mármore.  As  duas. 
grandes  lâmpadas  que  pendem  da  abobada,  e  que  teem  a  data  de 
181 5,  vieram  do  convento  de  Tibães  em  18^4,  por  occasião  da 
extincção  das  Ordens  religiosas.  E'  da  mesma  procedência  a  ban- 
queta e  o  pequeno  órgão  que  defronta  com  o  coreto  nos  segundos 
arcos  da  nave  central.  Este  órgão  e  coreto  foram  mudados  de  en- 
tre os  primeiros  arcos,  onde  cada  um  assentava  sobre  quatro  co- 
lumnas  de  que  ainda  hoje  ha  signaes  nos  taburnos  que  cobrem  o 
pavimento,  em  tempo  de  D.  João  Chrisostomo  de  Amorim  Pessoa. 

O  claustro  hoje  ajardinado  foi  cemitério  da  Misericórdia  até 
16  de  outubro  de  1724  em  que  o  Arcebispo  D.  Rodrigo  de  Mou- 
ra  Telles  o   inutilisou  ordenando  a  remoção  das  ossadas  para  a 


-88  — 

adro  da  egreja  de  S.  João  do  Souto.  Datam  d'essa  epocha  as 
actuaes  arcadas,  só  agora  (desde  abril  de  1899  a  novembro  de 
1900),  fechadas  de  abobada  de  tijolo  e  rematadas  por  uma  balaus- 
trada de  cimento.  O  fingimento  da  abobada,  a  imitar  granito,  é  ma- 
ravilhoso. Alem  da  capella  dos  reis,  a  que  já  me  referi,  tem  este 
claustro  mais  a  de  Nossa  Senhora  da  Piedade  ou  de  Jesus,  fun- 
dada por  D.  Diogo  de  Sousa,  em  i5i3,  para  sua  sepultura,  como 
se  deprehende  da  seguinte  inscripção: 

ESTA   CAPELA   MANDOV  FAZER 

O   ARCEBPO   DO  D  I.°  DE   SOVSA  PÊRA 

SVA   SEPVLTVRA  E  DE   SEVS   IRMÃOS 

AS   PESSOAS   CAPITVLARES  DESTA   E 

GRE1A   QVE   SE  NELA   QVISERE   LAN 

CAR-FOI   FEITA   NA   ERA  DE    I  5  I  3. 

Km  arco  aberto  na  parede  do  lado  da  Epistola  acha-se  o  tu- 
mulo deste  grande  Prelado  com  a  sua  estatua  jacente,  de  ponti- 
fical, e  na  frente  esta  inscripção: 


AftWZD0MÕ!3CV0I)Ei0VSA.fii!(Ee"P().eiííltóJILIi0l)EI0ío 
ROIZt£WiC0íEUK.$(lS'.DtFlGtflliO.£P0FEl|fOtJÍÍ) 

EDED0WA8MaD«!LCSWíaHE(<t'rtALtLHtl.l)uw 

WA0.)EurMMraoV.?iJREgWXAOORMltyA0E[?APA 
MlOAlHf  D^RSW  MENFCIA  [EUWOTIJNWU^Dtí 
0.FEI  EOUpa  MJMORDA  Ml  MHA.  DM/i  MARIÍW  AMOl  m 

mmjm  wi  m  dih  ia  n>  m  mosan  do  e  e  i  ri  i 

|Ui)MJ()ÍO.TfRCEIIlDflFEZfflPELAÕ.MOaWiiMNHÁDONi\ 
CATfRlNAiUAMOLHER .OÚVLFLZ ESTAUVEL N  PÊRA 

W<.iEPl/LTV(UlW\l£OLX)l[-.II.JINN0itEMElÉ0JI 
Xyiyi.PIftSDOMESDElVItfHOPA  ERUDEI 53  7* 
ETRE5LADM10 DOME!lT(APRLA MMXIi  DEFLv  r do 
AMO  DE  lílZANNftJWDDADMIlH  ÍHLZa<5MORlvlANí)EL 
'lN"DtMATT0^ZACAR00ZO 


Do  lado   do   Evangelho,   em   logar  correspondente,  está  o  tu- 
mulo de  D.   fr.   Caetano  Brandão.  Ao  centro  tem  a  sepultura  do 


-8Q- 

chorado  Arcebispo  D.  António  José  de  Freitas  Honorato,  falle- 
cido  em  cheiro  de  santidade,  a  28  de  dezembro  de  180,8,  como  se 
prova  com  as  numerosas  offerendas  dos  devotos. 

A  capella  denomina-se  Misericórdia  velha  por  aqui  ter  sido 
fundada  esta  santa  instituição. 

As  capellas  de  Nossa  Senhora  do  Livramento,  de  Santa  Lu- 
zia, Santa  Catharina  e  Senhor  da  Paciência,  e  a  já  referida  ca- 
pella dos  reis  onde  se  venera  o  corpo  incorrupto  do  Arcebispo  D. 
Lourenço   que   a   8   de  agosto  de   i3é)i  fez  testamento  instituindo 


Corpo  incorrupto  do  Arcebispo  D.  Lourenço 

aqui  uma  capella  onde  mandou  construir  o  seu  tumulo  com  es- 
tatua jacente,  de  pontifical,  a  que  elle  próprio  fez  um  golpe  na 
face  com  a  sua  espada.  Esse  tumulo  ja  não  existe.  No  testa- 
mento ordenou  a  seu  filho  Vasco  Lourenço  «q  pêra  esta  capella 
lhe  trouxesse  seu  corpo,  em  caso  q  morresse  fora  de  Braga  nestes 
Reynos,  nos  de  Castella,  Leão,  Navarra,  Aragão,,  Fraca,  Fra- 
des, Allemanha,  Itália,  Toscana,  ou  Roma».  Tem  no  tumulo  esta 
inscripção: 

AQUI   JAZ  D.    LOURENÇO   NATURAL  DA   LOURINHAM 
ARCEBISPO   DE   BRAGA  A   Q   FOI  PROMOVIDO    NA 
ERA    DE    141  I,    E   MORREU   NA  ERA  DE    1436 

Ha  ainda  a  communicar  com  este  o  claustro  de  S.  Geraldo  ou 
S.   Amaro,  com  seis  capellas  reformadas  em  1766,  dedicadas  ao 


—  9° 


Espirito  Santo,  Senhora  da  Boa  Memoria,  Santo  Amaro,  Senhor 
da  Piedade  ou  S.  Pedro  Martyr,  que  tem  ao  lado  um  coro  deno 
minado  dos  morcegos,  onde  diariamente  resam  dois  minoristas  que 
percebem  8o  réis,  o  dobro  do  que  o  instituidor  estabeleceu,  por 
então  serem  4  os  coreiros;  de  Santo  António  e  das  Almas  com 
esta  inscripção  em  lamina  de   metal: 


S0&  PERPETVOS  POILA  MMMNNAFR5 

KDEVOESMlROEIVWEHVPlWo 
DE25NULRSIflMIFRAR\ABSAMTiS 
Sl^OSACRWALUTO  EÇMMtO  MIL 

^&BNROKdNKK  SNMUiMttaMO 

©STASANTASLt  ÔQVAKi  SAMOBRICA 

DASAHftNDMlDiZtESJtSNlASfON- 
FRHRItóNOFINlô(AOftMDftSMim&fê 
MEÃS  DOAtOENS  AMMO  /é2  S 


No  alto  da  parede  interior  da  capella  da  Boa  Memoria,  lado 
esquerdo,  pude  ler,  por  indicação  do  digníssimo  sa:ristão-mór  da 
Sé  o  sr.  António  Maria  Lopes  da  Silva,  esta  inscripção  lapidar  em 
caracteres  gothicos,  embebida  junto  de  um  arco  de  pedra  que  se 
dirigia  da  parede  da  Gathedral  para  o  referido  claustro : 


ESTE    ARCO  :    MAND0V  : 
FASER :    LOPO  AFONCO  \ 
CÓNEGO  :   DE   BRAGA  : 
ERA  :   MCCCC9VI. 


Ao  fundo  da  capella  de  S.  Geraldo,  que  tem  ao  lado  esquerda 
da  porta  principal  uma  imagem  de  S.  Nicolau  toscamente  escul- 
pturada  em  granito  mas  com  a  qual  o  povo  tem  grande  devoção. 


—  9i  — 

depositando  ao  seu  lado  promessas  que  faz  a  Santo  Ovidio,  pois 
não  acredita  que  seja  S.  Nicolau,  ha  na  parede  esta  lapide  refe- 
rente á  dotação  de  240:000  réis,  feita  em  1606  pelo  cónego  Fran- 
cisco da  Costa  para  uma  capella  de  5  capellães  que  resem  em 
coro  e  celebrem  diariamente  missa  em  louvor  da  Conceição  da 
Virgem  : 


AMI.VI  Fttlfcto  GOSTA  - 

CAN0NtCVS-8RACH.AVCTJRM.D-D.FR 
AV&.DEÍW.ARe.PRiWl.INSTmiTmil 
NdAÉMWÕIC(sNSPTÍ0NI5B.M.,?/lNH\C 
ecC.OiVi  GERALDI DIVJNVM  OFF.  ÍN 
CHOWCANTENTPSEXPRO 
PR1ÍS  80N1S.B0TAVÍT  EORVMELLU 

TIOADADMiNÍSTRATORES  ABEO 

0RDlNAT©ÍN  SOliOVM  SPECTM. 


Na  Hist.  Eccl.  de  'Braga,  por  D.  Rodrigo  da  Cunha  (vol.  II, 
pag.  i3i),  lê  se  o  seguinte  a  propósito  de  ter  sido  sepultado  n'esta 
capella  o  famigerado  alcaide-mór  de  Coimbra  D.  Martim  de  Frei- 
tas, fallecido  em  Braga  quando  se  dirigia  a  Compostella:  «Jazia 
na  capella  de  S.  Geraldo,  um  pouco  afastado  da  sepultura  do 
santo,  dentro  na  parede  d'aquelle  mesmo  lado.  Tinha  a  pedra  que 
fechava  o  seu  moimento  três  flores  de  lis.  Mudaram-se  os  seus 
ossos,  quando  em  tempo  do  arcebispo  D.  Frei  Agostinho  de  Cas- 
tro a  capella  se  azulejou,  pêra  outra  sepultura  posta  no  chão  ao 
pé  da  antiga». 

Ao  centro,  próximo  do  altar,  vê-se  a  sepultura  rasa  do  Arce- 
bispo D.  Rodrigo  de  Moura  Telles,  e  na  sacristia  um  bello  quadro 
em  tela,  com  o  retrato  do  alludido  Prelado  ao  centro,  e  em  volta 


-92- 

cTelle  entre  flores,  os  desenhos  de  quantas  egrejas,  conventos  e 
demais  edifícios  mandou  construir  e  restaurar:  São  os  seguin- 
tes :  Egreja  de  Santa  Quitéria,  convento  de  S.  Bento  de  Vianna, 
Sanctuario  da  Senhora  da  Apparecida,  Paço  de  Braga,  Egreja  dos 
Terceiros,  Penha  de  França,  S.  Vicente,  Bom  Jesus  de  Fão,  con- 
vento de  Barcellos,  Aljube  de  Braga,  S.  Sebastião,  Santa  Alaria 
Magdalena,  convento  dos  Remédios,  Chafariz  do  Paço,  Guada- 
lupe, convento  de  Chaves,,  aljube  de  Valença,  Hospital  de  Braga, 
Congregados,  aljube  da  Torre.  Ao  fundo  do  quadro: — D.  Rodri- 
go M.  Telles  Ar.  de  B.  Prim.  das  Hesp.,  premeditando  grandezas 
eguaes  ao  seu  animo,  illustra  o  Arcebispado  com  sumptuosos  edi- 
fícios para  sua  memoria  e  funda  em  1723  n'esta  Cathedral  a  ir- 
mandade das  Almas,  de  que  foi  juiz  perpetuo. 

D.  Rodrigo  exigia  que  a  imagem  do  santo  do  seu  nome  fosse 
sempre  collocada  nas  egrejas  ou  capellas  que  construía. 

Das  paredes  interiores  da  capella  pendem  oito  grandes  qua- 
dros a  óleo  allusivos  á  vida  de  S.  Geraldo,  todos  com  a  rubrica 
egeas  que  de  certo  nada  tem  com  o  pintor  inglez  egg  (i8i6-63). 
O  maior,  que  representa  os  últimos  paroxysmos  do  Santo,  tem 
ao  fundo  estes  dizeres: 

S.    GERALDVS   1ND1E   SVI   OB1TVS   ROGANDO 

DIXIT    EAMILLIARIBVS,    ECAETERIS  ADSTANTIBVS  \ 

QVI    DEVM  D1LIIGVN/T,    POTV,   ET  CIBO,   ET   LVXVR1A 

ABSTINERE    PERENE. 

O  numero  de  cónegos  doesta  Cathedral  era  de  34;  presen- 
temente apenas  conta  10. 

Ha  na  ca\a  das  ?niirsas  uma  simples  cruz  de  madeira  com  de- 
senho a  óleo,  bastante  correcto,  representando  Christo  na  agonia. 


-  93  - 


Capella  de  Nossa  Senhora  da  Gloria  (Braga) 


Contigua  á  capella  de  S.  Geraldo  existe  esta  que  o  Arcebispo 
D.  Gonçalo  Pereira  fez  construir  em  i33o,  e  juntamente  o  castello 
ameiado  que  lhe  serve  de  sacristia,  concluindo-se  toda  a  obra  a 
27  de  abril  de  i334  no  local  que  era  occupado  pelas  Casas  do 
Conselho,  pertencentes  á  egreja  de  Braga. 

Instituiu-lhe  então  seis  capellães  obrigados  a  resar  quotidiana- 
mente em  coro  o  Officio  Divino  em  favor  do  Papa  João  XXI,  que 
lhe  concedeu  o  breve  para  a  fundação  da  capella;  de  el-rei  D. 
Diniz  e  de  seu  filho  D.  Affonso  III ;  dos  reis  seus  successores  ;  dos 
prelados  que  lhe  succederem  e  de  todos  os  seus  parentes. 

Nas  costas  da  capella  de  S.  Geraldo,  ainda  se  conservam  es- 
tas duas  lapides  de  jaspe  com  inscripções  gravadas  em  caracteres 
gothicos.  (Vide  gravura  a  pag.  g#). 


94  — 


KOGPraro 


\  1/15^0;  opurJsíjmpvjmio  DIU  Jlt . 

íutxwi. 
L 


O  fundador  entregou  a  administração  da  capella  aos  Deões  da 
Sé,  exigindo  que  fossem  portuguezes  de  nascimento,  bem  como 
seus  pães  ;  e  em  caso  contrario  que  o  encargo  passasse  para  os 
Chantres. 


Tumulo  de  D.  Gonçalo  Pereira 


—  cp  — 

Em  i336,  dois  annos  depois  da  conclusão  da  capella,  ordenou 
a  construcçao  do  seu  formoso  tumulo  ao  centro,  com  a  estatua 
jacente,  de  pontifical,  pintando-se-lhe  posteriormente  em  volta  es- 
tes dizeres : 

FM  MARÇO  DE    1 537    ERA   ADMINISTRADOR 
DA   CAPEI  LA   O   DEÃO   D.   CARI  OS. 

Hoje,  numa  cinta  de  madeira,  tem  a  inscripçao  seguinte  : 

i348 

AQUI   JAZ   O   ARCEBISPO   1>.    GONÇALO   PERA    AVO   DO   CONDE 
ESTABEL    DE    PORTUGAL    D.   NUNO   ALVARES   PEREIRA,  DO 

QUAL   PROCEDE  O   IMPERADOR   CARLOS    QUINTO,   E   EM 

TODOS    OS   REINOS    DL   CHR1STAONS    DA    EUROPA   OU   OS 

REIS,    OU   RAINHAS    DELLES,    OU   AMBOS    &.   REFORMADA 

PELO   DEÃO  ADMINISTRADOR   D.    LUIZ   NO   ANNO  DE    1789. 

Os  modilhões  da  frente  e  do  lado  direito  indicam  que  esta  ca- 
pella teve  alpendrada. 

A  meio  da  vidraça  que  existe  sobre  a  porta,  conserva-se  uni 
vidro  antigo  pintado  a  cores  vivas  representando  a  Virgem  com  o 
menino  nos   braços.   Tem   na   parte   inferior  estes  dizeres:  tota 

PVLCR    ES   AMICA   MEA. 

Este  vidro  precioso  é  bem  digno  de  ser  preservado  por  uma 
ç^rade  de  arame. 


96 


Collegiada  de  Guimarães 


No  primeiro  quartel  do  século  x  (armo  de  929)  a  Condessa  D. 
Mumadona  Didaz  e  seu  marido  D.  Hermenegildo  Gonçalves  Men- 
des,  Conde  de   Tuy  e   do.  Porto  e  governador  da  Província  de 


—  97  — 

Entre  Douro  e  Minho  fundaram  na  quinta  de  Vimaranes,  patro- 
nímico do  nome  Guimarães,  um  templo  que  dedicaram  á  Virgem, 
ao  Salvador  do  Mundo  e  aos  Apóstolos.  Viuvando  a  Condessa,  fez 
logo  construir  junto  do  templo  um  mosteiro  benedictino  duplex 
com  o  rim  de  terminar  alli  os  poucos  dias  que  lhe  restavam  de  vida. 
O  infante  Ranemiro  concedeu-lhe  a  permissão  e  oífereceu-lhe  a 
quinta  de  Creximir  (Creixomil),  na  era  de  ncccc2xnn  (anno  de  926). 

Das  palavras  da  doação  do  castello  de  S.  Mamede,  que  a  Con- 
dessa fez  construir  em  9Õ7,  ao  seu  mosteiro  duplex  «para  defen- 
são dos  frades  e  das  freiras»,  em  data  de  4  de  dezembro  da 
era  de  1006  (anno  de  968),  mostra-se  que  a  egreja  de  Nossa 
Senhora  da  Oliveira  está  realmente  situada  na  sobredita  quinta 
de  Vimaranes  a  pouca  distancia  do  Monte  Latito  sobre  que  as- 
senta o  referido  castello:  «Quorum  baselica  sita  est  in  iam  dca 
villa  Vimaranes  território  urbis  Bracharae  aud  procul  ab  alpe 
latito,   inter   bis  alveis  vehementibus  Ave,  «Sc  Avizella.» 

Em  virtude  da  prohibição  de  S.  Gregório  Papa  sobre  a  habi- 
tação de  frades  e  freiras  no  mesmo  mosteiro  (Iam  nullo  loco  Mo- 
nachos  permitimus  in  uno  Monasterio  habitare,  sed  nec  ca,  quac 
duplicia  sunt :  et  si  quid  tale  est  ?~eligiosus  Episcopus  mulieres  in 
suo  loco  manere  stuaeat,  Monachos  autem  aliud  Monastenum  edi- 
jicare),  foram  ellas  retiradas  em  1089.  Em  1  io3  o  Conde  D.  Hen- 
rique organizou  a  Collegiada  dando-lhe  o  titulo  de  capella-real. 

A  actual  egreja  foi  construída  no  mesmo  local  da  primitiva  a 
expensas  de  el-rei  D.  João  I  em  memoria  da  batalha  de  Aljubar- 
rota (14  de  agosto  de  i385),  sendo  encarregado  da  obra  o  mestre 
pedreiro  e  vedor,  que  havia  sido,  das  obras  de  el-rei  D.  Fernando, 
João  Garcia,  de  Toledo,  que  lhe  deu  principio  a  6  de  maio  de 
i38y,  concluindo-a  em  i3c>3  (?),  como  se  lê  na  seguinte  lapide  de 
mármore  embebida  na  frente  da  egreja,  ao  lado  esquerdo  da  porta 
principal  : 

L— ERA    DE    MILICCCCEXXV    ANOS;    SF.IS    DIAS  \  DO' 
MES;   DE;   MAYO  •   FOI   COMECCADA-    ESTA;    OBRA  • 
2— POR;   MANDADO  :   DELREY ■    DOM  ÍOHÃO  \   DADO  ;    PELA 
GRAÇA'.    DE>    DEOS    AESTE    REINO    DE;   PORTVGAL 
3-  FILHO   DO   MVY.:   NOBRE )    REYi   DON   PEDRO  \   DE.:   POR 
TVGALi    ESTE   BO   REY ;    DON    IOHAN  \   OVE  \   BATALHA 

4-  REYAL  :    IX  CANPO;   CO    ELREY  ■   DOX    IOHÃO   DE 
CASTELLA    NOS    CAMPOS;    DE-   ALIVBAROTA  j   I.    FOY  • 
5- DELA    VENCEDOR :    \\   A    HONRA  DA  VICTORIA;    QVE 
LHE  DEV  A  VIRGE   S   MARIA   MANDOV  FAZER  ESTA  j 
6-  OBRA  ;   DA    OVAL    FOY  MEESTRE ;   POR   SEV  MANDADO; 
IOHAN    GARC.     :    ;   MESTRE;    EN    PEDRARIA;   I;    FOY  • 
7— ACABADA;    ;    ;    ;   3    DIAS   DO   MES      DE;    ;    ;    ;    ;    ;    •    I  PA    DF  • 
MIL:    ICCCC3  I  :     •'    •'    •'    WOS  '     •         : 


-98- 

Esta  inscripção  é  hoje  pela  primeira  vez  publicada  na  integra  '. 

As  copias  conhecidas  são  imperfeitas  como  a  que  o  Cabido  de 
1608  mandou  gravar  em  granito,  um  pouco  acima  da  primitiva, 
que  se  acha  bastante  gasta  do  tempo  e  de  tal  modo  mutilada  na 
extremidade  inferior  que  já  hoje  é  inteiramente  impossível  conhe- 
cer-se  ao  certo  o  anno  e  o  mez  da  conclusão  da  obra  em  que  se 
empregaram  100  homens  castelhanos  que  el-rei  fez  prisioneiros.  O 
altar-mór  foi  sagrado  a  23  de  janeiro  de   1400. 

No  primeiro  degrau  da  porta  principal  collocou-se,  em  i5  de 
julho  de  1891,  uma  lamina  quadrilatera  de  metal  amarello  com  as 
seguintes  lettras  e  algarismos  : 

N   P 

79 

«Nivelamento  de  precisão,  placa  79  em  numero».  Ordenara 
esta  collocação  um  emissário  do  governo  que  foi  a  Guimarães  em 
serviço  da  commissao  geodésica,  demorando-se  alli  2  dias  para  o 
alludido  fim. 

A  porta  de  pau-ferro,  que  era  pintada  de  verde,  foi  raspada  e 
envernizada  em  março  do  anno  corrente,  mostrando  no  alto  em 
lettras  e  algarismos  de  metal  amarello  a  seguinte  data  :  anno  1727. 

Da  elegante  janella  gothica,  rasgada  sobre  esta  porta  e  hoje 
inutilisada  por  enchimento  grosseiro  de  granito,  resta  ainda  a  mol- 
dura vasada  em  pedra  de  Ançã  e  profusamente  ornada  de  festões, 
baldaquinos,  estatuetas  e  bustos  em  duas  ordens.  Na  primeira, 
principiando  pelo  lado  direito,  ha  seis  bustos,  cada  um  com  seu 
livro  aberto,  lendo-se  no  do  frade  dominico  em  caracteres  eguaes 
aos  da  inscripção  em  mármore  : 

SANTA     ....    DEEV  PREDJCAMVS 

No  livro  segundo:  —  santvs:santvs:santvs:dominvs 
No  livro  terceiro:  — santvs:santvs:santvs:dnsdevs 
Nos  livros  quarto  e  quinto  :  — santvs:santvs:santvs:dominvs 
No  livro  sexto  (frade  franciscano) :  —  sante:francisce:vidi:domi 
nvm:in:lino  -f- 

Na  segunda  ordem  tem  seis  estatuetas,  uma  das  quaes  susten- 
ta nas  mãos  uma  fita  com  estas  palavras  da  saudação  :  — ave  gpa- 

T1A  PLENA   DOMINVS   TECVM. 


1  Illescas,  no  livro  5.°  da  sua  Hist.  cTEl-rei  D.  Affonso  6.°,  cita  uma  escri- 
ptura  de  Pombeiro  em  que  se  mostra  que  D.  Affonso,  sogro  do  Conde  D.  Hen- 
rique, viveu  por  algum  tempo  junto  do  Mosteiro  de  Guimarães. 


—  99  — 

Esta  janella  tem  a  toda  a  largura,  voltada  para  o  interior  da  egre- 
ja,  uma  grande  estatua  jacente  esculpturada  em  pedra  de  Ançã, 
com  barba  comprida  e  gorro  na  cabeça  que  recosta  na  mão  esquer- 
da sobre  dupla  almofada  onde  ainda  se  lê  em  pequenos  caracte- 
res gothicos:.  .  .  .eivs  acendet  et  reqvie  (sicj. 

Provavelmente  esta  estatua  esteve  voltada  para  a  rua,  antes  do 
bárbaro  enchimento  da  janella,  pertencendo  á  arvore  de  Jessé  que 
com  seus  ramos  formasse  o  caixilho  da  vidraça.  Ficava  assim  per- 
feitamente de  harmonia  com  o  estylo  do  terceiro  período  ogival 
ou  gothico  flammejante. 

Que  bello  effeito  produziria  uma  restauração  n^ste  sentido  ! 

E'  notável  o  silencio  que  a  este  respeito  guardam  todos  os  his- 
toriadores da  Collegiada,  principalmente  o  cónego  Gaspar  Estaco 
(iÔ25);  e  os  padres  Torquato  d' Azevedo  (1692)  e  António  Carva- 
lho da  Costa  (1706). 

Na  frente  da  pedra  sobre  que  se  acha  estendida  a  estatua  res- 
tam ainda  estas  lettras  : 


PO GO   DA   S1LVH.  .  . 

Pertencem  ao  nome  do  D.  Prior  D.  Diogo  Lobo  da  Silveira, 
fallecido  em  1666,  o  qual  provavelmente  ordenou  a  pintura  e  dou- 
ramento  da  estatua  e  columnas  das  humbreiras  da  janella  quan- 
do, um  anno  antes  da  sua  morte,  mandou  abrir  dois  dos  quatro 
óculos  do  enchimento. 

A  isto  se  refere  do  seguinte  modo  um  inventario  antigo  exis- 
tente no  archivo  : 

«Fizeram-se  duas  frestas  no  coro  de  cima,  ovadas  com  suas 
vidraças.  Fizeram-se  mais  duas  na  capella  mór.  .  .  e  nestas  qua- 
tro se  pozeram  grades  de  ferro  e  vidraças  e  se  pozeram  mais  vi- 
draças em  outras.  .  .  e  redes  de  arame  em  todas  por  conta  de  Gon- 
çalo Francisco  Infanção  e  sua  mulher  Ignez  Dias  Villas,  morado- 
res na  sua  quinta  da  Porcarice,  que  mandou  fazer  o  D.  Prior 
D.  Diogo  da  Silveira  no  mez  de  março  e  maio  de  i665». 

A  desastradíssima  obra  do  enchimento  da  janella  estava  por- 
tanto concluída  anteriormente  a  i6()5  e  abriram-lhe  depois  três 
óculos  por  ser  insufficiente  o  maior  que  fica  ao  centro  a  fornecer 
luz  ao  orgao  construído  em  1838-41,  como  se  lê  dentro  do  respe- 
ctivo someiro  do  lado  esquerdo  : 

FEITO   POR   LUIS   ANTÓNIO   I>E  CAR 

VALHO   GU1MARAENS,   NATURAL  DLS 

TA  VILA   NO   ANNO 

DE    1838 


IOO 


Na  tampa  do  mesmo 


A    HONRA   E   GLORIA  DE   DEOS    E   SUA 

MAY    MARIA   SS."'a  FOI   MANDADO  ACABAR 

ESTE   ORGÂO   POR  ORDEM  DO   ILL.'110   R.mo   CA 

BIDO   DESTA  VILLA. 

POR   IOSÉ   ANTÓNIO   DA  CRUZ,   EM   7   DE 

SETEMBRO    ANNO  DE    1 84 1 

Dentro  do  someiro  do  lado  direito  : 

FOI    REFORMADA  TODA   ESTA   IGREIA 

E   FEITO   ESTE  ÓRGÃO   POR  ORDEM  DO 

ILL."10   E   R.mn   CABBIDO   DE  N.    S.   DA   OH 


VEIRA,   DEBAIXO   DA   INSPECÀO   DO 

ILL."10   CÓNEGO   IOÃO   BA.PTISTA   SAMPAIO 

NO  ANNO   DE    1 838 

Na  tampa  do  mesmo  : 

A    HONRA   E   GLORIA   DE   SANTA   MARIA 

DA   OLIVEIRA   FOI    MANDADO  ACABAR 

ESTE  ORGÁO  POR  ORDEM  DO    ILL."10   E   R."1" 

CABIDO  DESTA  V.A    POR   IOZE  ANT.°  DA 

CRUZ  ANNO   DE    I  84  l . 

A  primeira  e  terceira  d'estas  inscripções  referem-se  á  constru- 
cção  do  órgão  pelo  vimaranense  Luiz  António  de  Carvalho  Gui- 
marães em  1 838  e  á  condemnavel  reforma  da  egreja,  iniciada  em 
14  de  junho  de  i83o,  da  qual  também  nos  ficou  a  pilastra  e  capi- 
tel Jónico  no  cunhal  esquerdo  da  fachada  ! 

O  tecto  d'esta  egreja  Collegiada  era  todo  de  vigas  bem  lavra- 
das. Hoje  está  estucado  e  os  capiteis  das  naves  desfeitos  a  picão 
como  os  da  Cathedral  de  Braga  ! 

A  segunda  e  quarta  dizem  que  1 1  annos  depois  foi  concluído 
o  órgão  por  José  António  da  Cruz,  official  do  já  então  fallecido 
Carvalho  Guimarães.  Junto  da  porta  lateral  norte  existe  um  tumulo 
de  granito  com  esta  inscripção  em  caracteres  ligados  : 

Aqvi  iaz  Ignes  de  GvimarÃes  mbk,  do  Ldo,  I0Á0  de  Valladares 

BISNETA  DE  MARTINHO  DE  GeS  F°,  DE  DOM  FERNANDO  DA  GvER 

RA  BISNETO  DEL  REY  D.  P.°  O  CRV  ;  E  DA  SRA,  DONA  IGNES  DE  CASTRO 

E  VALLADARES.  MORREO  A  8  DE  SETEMBRO  l634 

No  painel  do  altar  de  Santa  Anna  lê-se  o  seguinte  psalmo  : 

VENTVROSO   AQVELI.E   QVE   ESPERA 
DE   VOS    O   SEO    SOCCORRO 


lOI 

No  do  altar  da  Virgem  da  Conceição  : 

CYNODÒ 

CELEBRADO   NA  SANTA   SÉ  DE   BRAGA 
14  DE   1VNHO   DE    IÓ46 

Evidentemente  está  errada  esta  data,  porque  o  Synodo  foi  ce- 
Iebrado  em  i(536  pelo  Arcebispo  D.  Sebastião  de  Mattos  de  Noro- 
nha que  occupou  a  cadeira  bracarense  desde  5  de  setembro  do 
referido  anno  (dia  em  que  tomou  posse)  até  1641  em  que  falleceu 
prisioneiro  na  torre  de  S.  Julião,  reconhecendo  n'aquella  hora  ex- 
trema o  crime  que  praticara  de  traição  á  pátria  e  pedindo  por 
isso  que  o  seu  corpo  fosse  sepultado  em  campa  rasa  no  adro  de 
qualquer  egreja  «para  que  não  ficasse  memoria  do  que  tinha  sido». 

Neste  Synodo  foi  dado  o  juramento  seguinte  : 

«Promettemos  e  juramos,  todos  os  que  n^este  Synodo  estamos 
congregados,  em  nossos  nomes  e  de  nossos  successores,  de  sem- 
pre termos  e  guardarmos,  e  defendermos,  que  a  Virgem  Maria 
Nossa  Senhora  foi  concebida  sem  macula  de  peccado  original,  na 
forma  das  Constituições  e  Breves  Apostólicos  passados  sobre  esta 
matéria». 

Os  dois  altares  restantes  são  dedicados  ao  Espirito  Santo  e  a 
S.  Nicolau,  e,  por  uma  rubrica  que  se  lê  na  margem  inferior  d'este 
ultimo  painel,  foram  pintados  em  1848  pelo  fallecido  lente  da  aca- 
demia de  bellas-artes,  de  Lisboa,  sr.  Joaquim  Raphael. 

No  friso  do  arco  da  antiga  capella  de  S.  Nicolau  acha-se  gra- 
vado o  seguinte  : 

ESTA   CAPELLA    MANDARÃO   FAZER   OS   ESTVDANIES 
DESTA   VILLA  NO   ANNO   1)0    SENHOR   DE    1 663 

E  toda  abobadada  de  pedra,  apainelada,  e  não  tem  culto  des- 
de que  construíram  na  sua  frente  o  altar  da  mesma  invocação. 

A  capella-mór,  que  na  reedificação  da  egreja  ficara  acanhadís- 
sima, foi  ampliada,  tanto  quanto  o  espaço  o  permittia,  por  ordem 
do  príncipe  D.  Pedro  (depois  rei  D.  Pedro  II)  que  para  esse  fim 
concedera,  aos  6  dias  d'outubro  de  1677,  as  sobras  da  nova  contri- 
buição. Esta  obra  ficou  concluída  em  1682  '. 

Por  occasião  dessa  reforma  desappareceu  uma  pedra  sepul- 
chral  que  estava  debaixo  do  degrau  da  porta  da  sacristia,  e  na 
qual  se  lia  o  seguinte  : 


1  Padre  Caldas,  Girimirães,  pag.  iS. 


—  102  — 

AQUI   [AZ  PÊRO 
AFFONSO 

DE   GVIMARAES    E 

ABBADE    DE   SAM 

GONSALO    DE    AMARANTE    * 


A  segunda  linha  pode  ser  completada  com  a  palavra  cónego, 
porque  os  houve  na  Collegiada  beneficiados  que  ao  mesmo  tem 
po  tinham  abbadias,  como  se  deprehende  de  uma  notificação  dos 
Estatutos  de  1405. 

No  alto  da  tribuna  venera-se  a  devota  imagem  da  Virgem  da 
Oliveira  que  se  representa  de  mãos  postas.  A  coroa  de  uso  é  de 
prata  dourada  e  foi  feita  no  anno  de  1 563,  data  que  se  lê  num 
dos  seus  arcos. 

Acha  se  actualmente  no  museu  esta  antiquíssima  esculptura  a 
que  el-rei  D.  João  I  recorria  nos  transes  mais  difriceis  do  seu  reinado  : 

Os  sábios  e  o  caruncho  tém- 
lhe  feito  estragos  ;  aquelles  esca- 
racando-a  para  se  averiguar  a 
qualidade  da  madeira,  o  que  não 
puderam  conseguir  até  hoje,  e 
este  roendo-a  grandemente  pela 
parte  posterior. 

E1  ponto  averiguado  que  nos 
primeiros  tempos  christaos  as 
imagens  da  Virgem  eram  de  pre- 
ferencia esculpturadas  em  pau  de 
pereira,  symbolo  da  fecundidade. 
O  saudoso  padre  Caldas 2  pergun- 
ta se  esta  imagem  será  a  mesma 
que  a  Condessa  D.  Mumadona  e 
seu  marido  o  Conde  D.  Hermene- 
gildo Mendes  retiraram  da  Mes- 
quita de  Ceres  (posteriormente 
capella  de  S.  Thiago  hoje  extin- 
cta)  para  a  collocarem  no  altar 
maior  do  templo  que  fundaram. 
Não  deixa  de  ter  logar  esta  per- 
*fc  '  gunta,  embora  seja  forçoso  acre- 
ditar-se  que,  em  tal  caso,  a  es- 
culptura não  se  conservou  ate 
agora  isenta  de  retoques. 


s  ~     li 


'Sip-^y  -^^^     ■''    m , 


1  Gaspar  Estaco,  pag.  i3o. 

2  Guimarães,  vol.  II,  pag.  i3. 


IOO  — 

Os  revolucionários  de  170/2  queimaram  em  Chartres  uma  an- 
tiquíssima imagem  da  Virgem  que  se  venerava  com  romarias  e  pro- 
messas abundantes  na  Sé  Cathedral  d'aquella  cidade  franceza,  e 
a  qual  se  representava  assentada  numa  cadeira,  tendo  sobre  os 
joelhos  o  menino  Jesus  que  amparava  com  as  mãos.  Media  4  pal- 
mos de  altura  e,  pela  sua  muita  antiguidade,  o  povo  chamava-lhe 
a  Virgem  dos  Druidas. 

A  velhíssima  imagem  da  Collegiada  vimaranense  mede  exacta- 
mente os  4  palmos  de  altura  (o™,  88)  e  conserva  ainda  vestígios 
da  posição  da  de  Chartres.  O  vestido  é  coberto  de  panno  bem 
collado  e  com  p1'ritura  antiga  em  ramagem.  Ora  sendo,  como 
creio,  do  mesmo  pau  de  pereira  esta  esculptura,  e  attendendo  ás 
demais  circumstancias  que  exponho,  não  se  poderá  duvidar  da 
sua  origem  remota  e  de  que  fosse  esta  a  esculptura  aproveitada 
por  D.  Mumadona  e  marido. 

Existe  na  tribuna  uma  pequena  caixa  de  madeira,  forrada  de 
veludo,  sobre  a  qual  é  collocada  a  custodia  em  dias  de  exposição 
do  Sacramento.  Foi  exteriormente  enriquecida  de  grossos  arabes- 
cos de  ouro.  Dentro  lê-se  em  caracteres  miúdos: 

ANNO 

1662 
PRODE  GES 

D  D° 
LOBO 

Fez-se  no  anno  de  1ÓÕ2  sendo  D.  Prior  de  Guimarães  D.  Diogo 
Lobo  da  Silveira. 

Havia  rfesta  Collegiada  28  cónegos  que,  como  os  de  Braga, 
usavam  solideo.  Tinham  além  disso  o  titulo  de  capellães  reaes, 
que  ainda  agora  usam. 

Sobre  a  porta  do  palácio  do  priorado  encontra-se  o  seguinte 
brazão  dos  D.  Priores  :  (Vide  granira  a  pag.  104). 


104  — 


DE  O    HONORE 


i576 

Certamente  a  data  allude  á  collocaçao  das  armas  por  honra 
a  Deus,  e  não  á  construcção  do  espaçoso  edificio  que  parece 
mais  antigo,  talvez  o  mesmo  que  serviu  de  aposentadoria  a  el-rei 
D.  João  I,  quando  este  monarcha,  auxiliado  por  Affonso  Lourenço 
de  Carvalho,  tomou  a  então  villa  de  Guimarães  a  Aires  Guedes 
da  Silva  que  a  defendia  em  favor  de  Castella. 

Por  honra  de  Deus !  dizem  as  palavras  latinas  gravadas  sob  o 
brazao  dos  Dom  Priores  de  Guimarães,  divisa  assaz  parecida  com 
a  dos  padres  da  Companhia  de  Jesus  —  Ad  majorem  Dei  glo- 
riam—  (para  maior  gloria  de  Deus). 

Por  honra  a  Deus!  diria  em  iooi  o  Conde  D.  Henrique  de- 
pois de  apresentar  n'esta  Collegiada  Insigne  o  seu  primeiro  Prior 
Dom  Pedro,  predecessor  do  doutor  Pedro  Amaral  ou  Amarello, 
físico  mór  de  el-rei  D.  Affonso  Henriques  aperfeiçoador  da  Colle- 
giada, e  ultimo  Abbade  dos  antigos  monges  com  quem  ainda  con- 
tinuou a  viver  em  rigorosa  clausura. 

Por  honra  a  Deus !  repetirão  ainda  os  que  não  desconhecem 
que  desempenharam  este  cargo  altamente  honroso  muitos  sábios 
illustres  e  nobres  distinctissimos,  entre  os  quaes  2  príncipes  da 
casa  de  Bragança;  e  que  d^lli  chegaram  a  sahir  1  Pontífice, 
3  Cardeaes,  9  Arcebispos  e  18  Bispos,  motivo  seguro  por  que  os 
Dom  Priores  de  Guimarães  mereceram  a  classificação  de  primei- 
ras pessoas  do  reino. 

Apresentavam  in  solidwn  um  grande  numero  de  egrejas  e 
eram  emfim  considerados  Bispos  d'esta  pequena  Diocese,  por  se 
isentar  da  jurisdicção  Archiepiscopal,  tornando-se  immediata  á 
Santa  Sé  Apostólica,  a  sua  Insigne  e  Real  Collegiada. 


10D  

Assim  o  indica  a  seguinte  concordata  celebrada  em  1216  por 
intermédio  dos  Arcediagos  de  Çamora  e  Astorga,  aos  quaes  Inno- 
cencio  III  commetteu  o  encargo  de  apaziguar  o  Arcebispo  de 
Braga  Dom  Estevão  Soares  da  Silva,  concordata  confirmada  por 
Honório  III  e,  trese  annos  depois,  em  1229,  pelo  Cardeal  Sabi- 
nense,  legado  a  laíere,  determinando- se : 

«Que  os  priores  fossem  prelados  ordinários,  da  egreja  de  Gui- 
marães, e  tivessem  jurisdicção  nos  beneficiados  e  clérigos  delia, 
como  a  teem  os  bispos  e  somente  reconhecessem  os  arcebispos 
de  Braga  como  metropolitanos;  mas  que  não  podessem  os  priores 
conhecer  dos  casos,  que  por  direito  merecessem  deposição  ou  sus- 
pensão perpetua-,  e  que  emtudo  o  mais  fossem  os  priores  como 
bispos  sutfraganeos,  tendo  nos  seus  cónegos  e  porcionarios,  aquella 
jurisdicção  que  qualquer  bispo  tem  nos  seus  e  na  sua  diocese». 

O  Cardeal  infante  D.  Henrique  foi  quem  primeiro  violou 
este  accordo  na  parte  referente  á  visitação,  seguindo-se  em  i35o 
D.  fr.  Balthazar  Limpo  que  entrou  á  força  na  egreja  arrombando 
as  portas  e  o  sacrário ! 

Reorganisando-se  em  8  de  janeiro  de  1891  a  Collegiada  de  Gui- 
marães que,  como  todas  as  do  reino,  havia  sido  extincta,  foi  pro- 
vido no  logar  de  Dom  Prior  o  sr.  Dom  José  cTAndrade  Sequeira, 
fallecido  em  1894,  substituindo-o  em  20  de  junho  de  1895,  o  actual 
sr.  Dom  Manuel  d" Albuquerque,  ao  qual  foi  conferida  a  posse  no 
dia  28  de  setembro  immediato. 

E'  o  primeiro  do  nome  e,  como  supponho,  o  sexagesimo- 
quinto  da  serie. 

No  florescente  museu  da  Collegiada  guarda-se  uma  lapide  de 
pedra  de  Ançã  que  o  antiquário  sr.  João  Lopes  de  Faria  ulti- 
mamente encontrou  numa  loja  escura  do  claustro.  E1  toda  orna- 
mentada em  volta  e  tem  no  alto  as  armas  de  D.  João  I  e  da 
rainha  D.  Filippa.  Os  caracteres  da  inscripção,  ainda  inédita,  são 
gothicos  miúdos  como  os  da  lapide  da  frente  da  egreja.  Mede  o, 5 2 
em  quadrado  e  é  esta  a  copia  fiel: 

-[-era  de  miliccccxxxix  anos*; 

xxiii  imas  do  mes  de  ianero  •  dia 

santo  ylefonso;  foy  sagrada  esta  i 

gresa;  por  mandado  do  mvy  nobr 

1-:  ri-:y  don  iohan  de  portvgalj  e  dam 

vy  nobre  raynhaj  dona  felipa  sva  mv 

lher    filha  del  dvq  dl'  lencastre!  i  sag 

roa  o  bispo  do  porto  don  iohan  dazanb 

v.1a-  esta  obra  fez  iohan  garcia  mêstr1 


Refere-se  ú  sagração  da  egreja,  pelo  Bispo  do  Porto  D.  João 
d' Azambuja,  aos  23  de  janeiro  de  1401. 

Fica  ao  fundo  da  nave  da  Epistola  a  capella  do  Sacramento. 
instituída  pelo  cónego  Gonçalo  Eanes,  com  seu  custoso  e  elegante 
sacrário  de  prata  lavrada.  Nas  portas  apresenta  em  primoroso  re- 
levo as  duas  passagens  bíblicas:  —  O  maná  do  deserto  e  a  Pará- 
bola das  bodas;  e  além  disso  os  seguintes  textos  de  S.  Lucas  e 
do  Êxodo  gravados  em  caracteres  miúdos : 

EGO   PLVAM   VOlílS    PANES    DE   CCTO    (sic) 
l  XOD      IK  • 
BEATVS   ovi   MANDVCAVIT  PANEM 
IN    lv  1  GNO   hl  I  •      LVC.    14. 
[STE   EST  PANIS   o\  l  \l   DOMINVS   DEDIT 
VOBIS   Ah  VESCENDVM-     EXOD.   XVI. 
MANHV  QVIT  ESI    llo<: 
EXOD.   XVI. 
Homo  QVIDAM   FECIT  CAENAM   MAGNAM 
&    VOCAVIT   MVLTOS,   ET  MISIT  SERVVM 
SWM   \  r  VENIRENT     S-   LVC.   XIV. 
EXICITO'    IN   IMA  I  IAS    ET   PAVPERES  ■ 
AC   DEBILES    II    CUCOS    [NTRODVC   IIIC 

i.uc.  14. 

VXOREM    DVXIT   ET    tDEO   NON    POSSVM 

VENIRE  ■    LVC.    14. 

VILLAM   EMI,    ET  NECESSE   HABEO 

EXIRE,   ET  VIDERE    II.I.AM-    LVC.    14. 

JVGA    liov.M    EMI,    ET   HO   PROBARE    III. A 

ROGO    I  K   HABE    ME   ESCVSATVM  ■     LVC.    14 

O  altar  tem  um  1'rontal  de  prata  ricamente  ornamentado,  e  os 
seguintes  textos  gravados,  allusivos  á  Eucharistia: 

ACCIlTIli-   ET'   CO  OVI    ENIM'   MAN 

MEDITTÈ-   IIOC     EST  DVCAT  ■   ET-   BIBIT«   IN 

CORPVS-   MEVM  •  DIGNE*    [VDICIVM  ■   SI 

MA  IH.    26  Hl  •   MANDVCAT 

CORINTH.    II 


IIIC     EST  PA  PROBET-   AVTEM 

NIS-    DE  GELO   D  SE-    IPSVM-   HOMO 

ESCENDENS*  ET-   SIC-   DE  PANE-   M.o 

JOAN.   C.   6  EDAT-  AD  CORINT.   I.   1. 

AN NO    1735 

Dispendeu-se  com  o  sacrário  e  frontal  a  quantia  de  1:476^002 


—  107  — 


reis.  As  mezas  de  170D  e  [706  destinavam  as  sobras  da  festa  para 
se  dar  principio  ao  frontal,  pois  o  sacrário  era  então  de  madeira 
prateada;  por  fim  resolveram  applical-as  a  este,  dando-lhe  logo 
principio,  e  mandaram  também  fazer  um  prato  e  um  jarro  do 
mesmo  metal.  Em  1708  levantou-se  a  quantia  de  8<j~õ<o  réis  para 
pagamento  de  obras  etíectuadas  na  capella  e  sacristia,  reservan- 
do-se  nesse  anno  a  primeira  verba  para  se  fazer  o  frontal. 

No  anno  immediato,  sendo  juiz  Luiz  Pimenta  de  Távora  e  Le- 
mos, applicou-se  á  construecão  do  sacrário  a  quantia  de  100-000 
réis.  Km  25  de  maio  de  1711  foi  adjudicada  a  obra  ao  ourives 
Hieronymo  Lopes  Moreira,  sendo  depois  este  substituído  por 
Francisco  Cardoso  de  Macedo  em  7  de  julho  de  1720.  O  sacrário 
era  encimado  por  uma  esculptura  de  prata  representando  Christo 
resuscitado,  a  qual  em  1788  foi  substituída  pela  actual  custodia 
radeada.  Da  obra  do  frontal  encarregou-se,  em  maio  de  1 73r,  o 
ourives  João  Pereira  Ribeiro  ;  não  cumprindo  porém  a  promessa 
que  fizera  de  o  concluir  até  á  véspera  do  Natal,  nem  ainda  até  \o 
de  agosto  do  anno  immediato,  a  meza  encarregou  da  conclusão  o 
artista  Francisco  Teixeira. 

Km  1686  construiu-sc 
na  sacristia  uma  pequena 
capella  interiormente  azu- 
lejada na  qual  é  muito  ve- 
nerado o  verdadeiro  retra- 
to da  Virgem,  conduzido 
de  Roma  para  aqui  por 
I).  Payo  Domingues  D. 
Prior  de  Guimarães  e  Deão 
de  Kvora,  nos  fins  do  sé- 
culo xiii.  Este  D.  Payo  de- 
terminou ao  seu  procura- 
dor num  pergaminho  es- 
cripto  em  Coimbra  a  14 
de  março  de  1 296  (secundo 
idus  maii  era  mcccxxxiiij, 
que  desse  4  soldos  da  moe- 
da velha  {  a  cada  cónego 
que  no  dia  de  paschoa  can- 
tasse deante  do  mesmo  re- 
trato a  antiphona  Regina 
Coeli  c  a  Salve  Regina;  2 
soldos  a  cada  sacerdote;  um  a  cada  diácono  ou  sub-diacono,  e 
seis  dinheiros  (65  réis  ':)  a  todo  o  mechanico. 


*  Sendo  de  ouro  valia  cada  um  ?:o  réis  ;  e  de  prata  10  réis. 


—  io8  — 

A  tradição  diz-nos  que  este  retrato  é  copia  fiel  do  que  se  ve- 
nera na  egreja  de  Santa  Maria  Maior,  em  Roma,  1  pintado  por  S. 
Lucas  ;  e  na  verdade  essa  tradição  é  bem  acceita  por  todas  as 
pessoas  que  conhecem  o  original  e  o  nosso. 

Lê-se  ao  fundo  da  tela  : — ora  pro  nolis.  s.  maria. 

Na  mesma  sacristia  guarda-se  uma  caixa  de  madeira  contendo 
o   santo  sudário.  Na  face  interior  da  tampa  tem  esta  inscripção  : 

I-ESTA    CAIXA    E    SANTO   SUDAIRO  MANDOV 

FAZER    DOM   DIOGO   LOBO   DA   SILVEIRA   EMDIG 

2-NO   PRIOR    DESTA   REAL   GOLLEGIADA    DE   NOSSA 

SR.a    DA    OLIVEIRA    ANNO   DL    1664. 

Também  aqui  esteve  o  antigo  e  precioso  thesouro  com  estes 
dizeres  nas  portas  : 

PVLCHRA    VT    LVNA  —  ELECTA    VT   SOL 

Hoje  todos  esses  objectos  constituem  o  núcleo  do  florescente 
museu  de  archeologia  christã,  fundado  numa  das  salas  da  casa  ca- 
pitular, por  deliberação  do  illustrado  Cabido,  que  em  22  de  de- 
zembro de  i8q8  reunira  para  este  fim  sob  a  presidência  do  sr. 
cónego  dr.  António  Júlio  de  Miranda,  encarregando  de  todo  esse 
trabalho  o  então  Thezoureiro-mór  sr.  cónego  Alberto  da  Silva 
Vasconcellos,  que  no  dia  6  de  janeiro  do  anno  immediato,  auxi- 
liado pela  dedicação  enthusiastica  do  antiquário  João  Lopes  de 
Faria,  removeu  para  alli  todos  os  objectos  de  valor,  dispondo-os 
com  a  melhor  ordem  possível.  Descreverei  aqui  os  principaes, 
transcrevendo  parte  do  que  a  este  respeito  publiquei  no  «Echo  de 
Guimarães»,  semanário  vimaranense  de  que  era  redactor  habilis- 
simo  o  meu  particular  amigo  padre  Gaspar  da  Costa  Roriz  -. 


1  Esta  egreja  foi  primeiramente  denominada  basílica  Liberiana.  pelo  nome 
do  Papa  que  a  consagrou  ;  depois  Santa  Maria  Maior  por  ser  o  principal  san- 
ctuario  da  Virgem  ;  de  Nossa  Senhora  das  Neves  pelo  milagre  da  sua  origem 
no  meado  do  século  ív  ;  Santa  Maria  do  Presepe,  por  se  trasladar  de  Bethlem 
para  aquelle  sitio  o  presepe  em  que  nasceu  Jesus. 

2  O  primeiro  numero  d'este  excellente  jornal  publicou-se  em  3i  de  de- 
zembro de  1899. 


1 OQ 


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Triptyco  ou  oratório  de  prata  dourada 


E'  este  um  dos  mais  preciosos  monumentos  que  figuraram  na 
exposição  retrospectiva  de  arte  ornamental,  de  Lisboa,  e  em  cujo 
catalogo  foi  assim  descripto  :  «Triptyco  de  prata  dourada  de  es- 
tylo  gothico.  Altura  im,35".  Largura  im,23.  Na  parte  principal  a 
Virgem  num  leito,  tendo  junto,  sobre  a  roupa  que  a  cobre  o  Me- 
nino Jesus.  Próximo  do  leito  S.  José. 

Em  plano  superior  as  cabeças  dos  animaes  do  presepe  e  dois 
anjos  com  thuribulos.  Cobrem  o  leito  quatro  arcos  ogivaes ;  junto 
delles  estão  cinco  anjos  empunhando  brandões,  debaixo  de  balda - 
quinos.  Elevam-se  sobre  os  arcos  quatro  corpos  architectonicos 
fenetrados.  Do  alto  de  cada  um  dos  lateraes  debruça-se  um  anjo 
sustentando  um  escudo  com  o  brazão  das  armas  reaes  portugue- 
zas.  As  outras  partes  do  triptyco  tem  cada  uma  quatro  nichos  oc- 
cupados  por  estatuetas,  que  representam  a  Annunciação,  e  Visi- 
tação de  Santa  Izabel,  Apresentação,  Adoração  dos  Pastores  e 
Adoração  dos  Reis.  Fins  do  século  xiv  ou  princípios  do  século  xv.» 

Alguns  dos  nossos  escriptores  como  o  P.  Torquato  de  Aze- 
vedo, P.  António  Carvalho,  Vilhena  Barbosa,  Oliveira  Martins  e 


1  IO  — 


outros,  dizem  que  este  oratório  ou  triptyco,  proveio  do  saque  das 
tendas  do  rei  de  Castella  na  memorável  batalha  de  Aljubarrota, 
ofterecendo-o  o  nosso  rei  D.  João  I  á  Virgem  da  Oliveira  quando 
aqui  veio  a  pé  agradecer-lhe  a  intercessão  no  vencimento  da  allu- 
dida  batalha.  Oliveira  Martins,  na  Vida  de  Nuri alvares,  accres- 
centa  que  do  referido  saque  recebeu  mais  o  nosso  monarcha  os 
balsões  e  bandeiras  de  Castella,  uma  Bíblia  que  foi  para  o  coro 
de  Alcobaça,  um  relicário  precioso  e  o  próprio  sceptro  Caste- 
lhano de  crystal  engastado  em  ouro  com  lavores  delicadíssimos, 
que  Nun' alvares  deu  para  o  convento  do  Carmo,  por  elle  fundado 
em  Lisboa.  Gaspar  Estaco  (Varias  Ant.  de  Porl.,  pag.  jyy,  cap. 
481-1625),  que  foi  cónego  da  Insigne  e  Real  Collegiada  e  que  deu 
publicidade  ao  seu  trabalho  primeiro  que  nenhum  dos  outros,  af- 
firma  que  «o  retavolo  de  prata  do  presépio  de  Christo  nosso  Se- 
nhor, q  nos  dias  solemnes  se  põe  no  altar  maior»,  foi  feito  da 
prata  que  el-rei  D.  João  I  offereceu,  producto  do  seu  peso  quando, 
como  diz  o  livro  dos  milagres,  veio  a  pé  dar  graças  á  Senhora  da 
Oliveira,  entrando  na  sua  egreja  e  dizendo:  «Sr.;i  eu  confesso  e 
quero  que  todos  saibam,  q  eu  por  vossa  virtude  somente  venci 
esta  batalha,  e  que  no  ponto  e  hora  em  que  estava  pêra  nella  en- 
trar dei  hum  grande  espirro,  o  qual  houve  e  tomei  por  mui  grande 
agouro,  pelo  qual  cessei  por  entonces  hum  pedaço  de  mover  pêra 
ella,  no  qual  espaço  me  deitei  de  bruços  e  non  sei  se  dormindo, 
se  acordado,  porê  posto  en  mui  grande  pensamento  e  agonia  vi 
en  visam  aquesta  vossa  casa  tal  quejandahagora  vejo,  com  aquesta 
oliveira,  e  veiome  ao  entendimento  que  eu  por  exemplo  do  pri- 
meiro Rei  me  devia  encomendar  a  vos  e  haver  por  tomadas  as 
minhas  armas  da  vossa  mam,  pelo  qual  eu  logo  votei  e  prometti 
de  fazer  o  que  hagora  faço  dizendovos  en  minha  oraçam,  Eu  vos 
peço  Sr.a  de  grande  mercê  assi  como  vos  ao  ditto  Rei  dom  Af- 
fonso  fostes  principio  daqueste  reino,  seiaís  a  mi  vosso  devoto  de- 
fenson  d' elle.  E  entonces  lhe  mandou  pôr  as  dittas  armas  encima 
do  seu  altar  dizendo,  Vós  Sr.;i  mas  destes,  vós  as  tomai  e  guardai». 
A  opinião  de  Gaspar  Estaco  foi  reproduzida  em  1731-82  pelo 
Académico  José  Soares  da  Silva  nas  Memorias  para  a  historia  de 
Portugal,  e  tem  a  corroboral-a  o  Inventario  feito  em  1 527  onde 
se  lê  textualmente  :  «Hum  retabollo  de  prata  dourada  q  deu  elrey 
Dom  Joham  da  boa  memorya  quando  venceu  a  batalha  Reall  e 
veio  visitar  nossa  Sr.'1  a  q  se  encomendou  na  dita  batalha  o  qll 
en  chygando  aa  dita  Igia  armado  de  todas  armas  como  elle  an- 
dava na  dita  batalha  e  có  a  lança  e  laudell  o  qll  está  aquy  e 
aquy  o  deixou  por  devaçam  de  nossa  Sr.a  se  pesou  apta  da  qll 
pta  se  fez  o  dito  retabollo  e  dose  appllos  e  quatr.a0  anjos  de  pta 
e  quatro  septros  e  hua  caldeyra  co  seu  essope  e  hum  tbollo  com 
sua  naveta  a  qll  pta  toda  q  se  aquy  nomea  afora  o  retabollo,  le- 


—  1 1 1  — 

vou  jelrei  Dom  A."  pa  Castella  e  o  dito  retabollo  foy  remydo  pr 
ceys  centos  cruzados  segundo  se  verá  pilo  est  q  lia  envia  ho  ar- 
cecl.0  a  sua  senhorya,  q  dizem  a  villa  e  termo  pagou  este  dn.°, 
etc». 

O  Arcediago  era  então  Pêro  Machado,  vigário  e  provisor  do 
Dom  Priorado,  e  Dom  Prior  Sebastião  Lopes.  A  falta  de  docu- 
mentos coevos  não  auctorisa  ninguém  a  resolver  a  questão. 

É  digno  de  ponderação  este  Inventario  antigo,  visío  ser  feito 
numa  epocha  em  que  a  batalha  de  Aljubarrota  não  contava  ainda 
mais  de  142  annos. 

E'  verdade  que  um  objecto  como  o  tryptico,  em  forma  de  pe- 
queno e  pobríssimo  armário  de  madeira  sem  ornatos  exteriores  e 
com  argolas  de  ferro  para  facilitar  a  remoção,  não  indica,  a  meu 
ver,  seguramente,  que  tenha  sido  feito  para  ser  exposto  numa 
cgreja  ampla,  em  determinados  dias,  como  de  antigo  costume,  a 
8  de  setembro  e  25  de  dezembro  de  cada  anno.  Será  por  isso  mais 
acceitavel  a  opinião  dos  que  o  julgam  tomado  a  D.  João  I  de  Cas- 
tella, n^quelles  tempos  em  que  as  grandes  victorias  se  alcança- 
vam com  uma  fé  viva  na  protecção  do  céo  ? 

Que  duvida  ?  Assim  como  D.  João  de  Portugal  se  apresentava 
de  cruz  vermelha  sobre  o  peito  com  escudos  de  S.  Jorge,  e  o  Con- 
destavel  de  estandarte  representando  em  todo  o  campo  o  Christo, 
S.  João,  Santa  Maria,  S.  Jorge  e  S.  Thiago  •,  o  moço  rei  Caste- 
lhano, que  na  occasião  da  batalha  tanto  necessitava  dos  desvellos 
da  sciencia  medica,  poderia  ter  feito  transportar  para  a  sua  tenda 
o  alludido  altar,  a  fim  de  melhor  se  encommendar  a  Deus  e  en- 
corajar a  sua  gente  que,  no  ardor  da  batalha,  ao  grito  continuo 
de  —  Portugal  e  S.  Jorge!,  teria  de  oppor  o  de  —  Castella  e  S. 
S.  Thiago  !  O  próprio  Estaco,  descrevendo  os  ornamentos  e  peças 
de  prata  offerecidos  á  Virgem  da  Oliveira  por  D.  João  I  de  Por- 
tugal, diz  :  «hum  anjo  grande  dourado  que  está  en  geolhos,  de 
vinte,  e  hum  marcos,  que  foi  tomado  na  batalha,  e  fora  da  capella 
dei  Rei  de  Castella.» 

O  que  não  offerece  duvida  é  que  este  rico  objecto,  ou  a  prata 
de  que  se  fez,  foi  offerta  de  D.  João  I  de  Portugal,  como  o  indi- 
cam as  suas  armas  nas  extremidades  superiores.  Pesa  este  orató- 
rio 7  arrobas  e  23  arráteis,  e  foi  concertado,  limpo,  dourado  e  es- 
maltado, por  dois  italianos  que  appareceram  em  Guimarães  no  verão 
de  1798.  dispendendo-se  com  esse  trabalho  a  verba  de  5o:ooo  réis. 
As  portas  são  exteriormente  pintadas,  representando  no  alto  dois 
anjos  com  uma  fita  em  que  se  lê  :  gloria  in  excelsis  deo  ;  e  ao 
fundo  algumas  ovelhas  e  quatro  pastores,  um  dos  quaes  toca  uma 
gaita  de  fólle.  Ordenou  esta  pintura  o  cardeal  infante  D.  Henri- 
que, Arcebispo  de  Braga,  na  visita  de  9  de  outubro  de  1 5 3 7 ^  pelas 
palavras  seguintes:    «...e  mandaraam  pintar  as  portas  do  reta- 


—  112  — 

bollo   de  prata   da  parte   de  fora,  de  boa  pintura,  o  que  compri- 
raam  até  páscoa  de  resurreiçam  sob  pena  de  quatro  cruzados.» 
O  Cabido  ligou  pouca  importância  ao  caso,  tendo  de  soffrer 
nova  ordem  na  visita  de  12  de  setembro  do  anno  immediato. 

CRUZ  PROCESSIONAL  GRANDE 

(Vide  gravura  da  pagina  seguinte.) 

E'  toda  de  prata,  estylo  gothico,  obra  executada  a  buril.  Offe- 
receu-a  o  cónego  Gonçalo  Eannes  depois  de  1227,  visto  não  exis- 
tir ainda  então  descripta  no  Inventario,  e  antes  do  fim  de  1540. 
pois  o  seu  testamento  foi  aberto  no  dia  28  de  setembro  d^ste  an- 
no «em  sua  casa  onde  jazia  morto». 

Do  Inventario  de  i63i  consta  que  «esta  obra  se  acabou  de  fa- 
zer com  mais  sessenta  mil  réis  que  a  fabrica  deu  para  esse  fim.» 
Desconhece-se,  infelizmente,  o  nome  do  artífice  e  a  sua  naturalida- 
de ou  residência.  O  que  fica  demonstrado  é  que  a  cruz  não  foi 
unicamente  feita  a  expensas  do  cónego  oíferente,  como  todos  os 
historiadores  nos  dizem.  Este  facto  deverá  ser  attribuido  á  sua 
morte  occorrida  quando  a  obra  se  achava  ainda  em  via  de  con- 
clusão. 

Também  esta  cruz  foi  concertada,  limpa,  e  dourada  em  parte 
pelos  dois  alludidos  italianos,  dispendendo-se  com  esse  trabalho  a 
verba  de  7.7*200  réis.  O  douramento  do  rosto  e  mãos  das  esta- 
tuetas desappareceu  quando  em   1880  se  mandou  limpar  a  cruz. 

Antigamente  sahia  nas  procissões  da  camará  e  agora  apenas 
apparece  na  do  Corpus  Christi.  Acha-se  assim  descripta  no  cata- 
logo da  exposição  de  Lisboa  : 

«Cruz  processional  de  prata.  Altura  i'",55.  Largura  na  base 
0,46.  A  base,  cuja  forma  é  a  de  uma  pyramide  hexagona,  assenta 
sobre  uma  columna  adornada  no  pedestal  com  carrancas,  no  fuste 
com  festões  e  cabeças  de  anjos,  no  capitel.  A  parte  inferior  da 
base  é  distribuída  em  seis  secções  adornadas  com  tropheus,  ara- 
bescos e  chimeras.  O  corpo  da  base  tem  três  ordens  de  nichos, 
sendo  os  da  primeira  e  terceira  ordem  encimados  por  baldaqui- 
nos  e  separados  por  feixes  de  pilares  com  estatuetas  e  baldaqui- 
nos  na  parte  inferior  e  terminados  por  coruchéus.  Os  nichos,  com 
a  forma  de  concha  na  sua  parte  superior,  contém  baixo-relevos. 
que  representam  passos  da  vida  de  Christo,  a  Virgem  e  os  Evan- 
gelistas. De  cada  lado,  na  parte  inferior,  destaca-se  um  nicho  maior, 
com  as  estatuas  de  Moisés  e  de  David.  Exteriormente  muitas  ou- 
tras estatuetas  e  arcarias  adornam  o  corpo  da  base.  A  columna  e 
as  diíferentes  faces  do  corpo  da  base  são  do  estylo  do  renasci- 
mento.  As  arcarias,  pilares  e  baldaquinos,  que  são  um  como  re- 


Cruz    processional  grande 


—  114  — 

vestimento,  téem  o  estylo  gothico.  A  haste  e  os  braços,  remata- 
dos em  rosáceas,  terminam  á  maneira  de  flores  de  liz,  e  são  co 
bertos  de  cabeças,  bustos  e  outros  ornatos  de  estylo  da  renascen 
ca.  A  figura  de  Christo  é  de  prata  dourada.  O  reverso  é  similhan 
temente  ornamentado.  Século  xví». 

Não  se  encontra  em  todo  o  paiz  outro  exemplar  egual.  A  junta 
de  parochia  de  Montelavar  e  a  confraria  do  Sacramento  em  Bel 
las,  possuem  cada  uma  a  sua  cruz  processional  de  prata,  de  egual 
estylo,  mas  de  inferior  trabalho  e  dimensões.  A  que  mais  se  appro 
xima  d'esta  é  a  da  Sé  do  Funchal  que  ainda  assim  mede  menos, 
om,36  de  altura. 

Outra  «cruz  processional  de  prata,  estylo  gothico,  muito  co- 
berta de  ramos  de  carvalho  e  cujas  extremidades  terminam  em 
flor  de  liz.  Servem  lhe  de  base  dois  castellos  sobrepostos,  dos  quaes 
o  primeiro  é  guarnecido  de  pilastras  terminadas  em  coruchéus. 
Altura  om,82.  Século  xv». 

Esta  cruz  pertenceu  á  antiga  confraria  da  egreja  de  S.  Miguel 
do  Castello  (vulgo  Santa  Margarida)  e  diz-se  que  no  tempo  da  in- 
vasão franceza  fora  escondida  numa  caixa  entre  o  centeio  d'um 
campo. 

O  cónego  José  Martins  Gonçalves  que  por  occasião  da  referi- 
da invasão  era  abbade  de  S.  Miguel  do  Castello,  entregou-a  por 
escriptura  publica  feita  na  nota  do  D.  Priorado  em  24  de  outubro 
de  1818,  ao  abbade  seu  successor  João  Machado  de  Araújo  Amo- 
roza,  declarando  que  a  conservara  sempre  em  seu  poder  desde  a 
referida  época.  Tem  de  pezo  nove  marcos  com  cinco  onças  e  meia. 

Sendo  annexada  a  freguezia  de  S.  Miguel  do  Castello  á  Colle- 
giada  em  16  de  dezembro  de  1872,  a  cruz  foi  alli  recolhida  segui- 
damente á  publicação  da  portaria  do  Arcebispo  de  Braga.  El-rcio 
sr.  D.  Fernando,  assaz  perito  nestas  questões  de  arte,  manifestou 
o  seu  alto  apreço  por  esta  cruz  que  tem  no  reverso  gravada  a  fi- 
gura do   Padre  Eterno,    acompanhada   da  legenda:  —  deo  patff 

ONIPOTENT  (SIC). 


n5 


É  de  estylo  gothico,  esta  cruz,  composta  de  duas  faces  ligadas 
por  levíssimo  rendilhado,  tendo  em  toda  a  volta  e  pelo  centro  uma 
ornamentação  simples  mas  bastante  vistosa  e  apreciável.  Mede  de 
alto  ora,88  e  peza  trinta  e  seis  marcos.  Do  douramento  apenas  res- 
tam alguns  vestígios.  A  base  é  hexagona  formada  por  dois  corpos 
sobrepostos,  em  arcos  ogivaes,  separados  por  pilastras.  Ao  centro 
por  traz  da  imagem  de  Christo,  tem  um  baixo  relevo  que  repre- 
senta a  prisão  ;  um  pouco  acima  a  imagem  da  Virgem  da  Concei- 
ção ;  nos  braços  dois  escudos,  e  quasi  ao  fundo  a  Virgem  da 
Espectação.  Por  sobre  a  cabeça  de  Christo  tem  a  seguinte  inscri- 
pção  em  caracteres  gothicos  : 

jesus  :nas  are 
nus:judeorum 


Ao  centro  do  reverso  tem  gravada  a  imagem  do  Padre  Eterno 


—  u6  — 

com  os   emblemas   dos   quatro  evangelistas  •,  no  alto  o  Pelicano  ; 
nos  braços  os  mesmos  dois  escudos  do  anverso  e  em  baixo  o  La 
zaro  (?)  saindo  do  tumulo. 

Esta  cruz  foi  limpa,  concertada  e  dourada  no  anno  económico 
de    1881-82  dispendendo-se  com  o  seu  trabalho  129.^830  réis.  O 
cónego  José  Bento  Ribeiro  Agra  encarregou-se  de  ordenar  a  com 
postura  que  foi  confiada  ao  ourives  José  de  Sousa  Dias. 

Cabe  a  este  a  gloria  de  deslocar  algumas  peças,  substituir  in- 
habilmente  outras  que  faltavam,  e  a  pregagem,  que  era  de  prata, 
por  belmazes   amarellos  ou  pequenas  tachas  de  pregar  cintas  de 


soccos  ! 


CUSTODIA  DE  PRATA  DOURADA 


Depois  da  grande  cruz  processional  é  este  um  dos  mais  apre- 
ciáveis objectos  do  recente  museu  da  Collegiada.  Tem  no  catalo- 
go a  seguinte  descripção : 

«Altura  om,8o.  A  parte  superior  é  formada  por  uma  arcaria  go- 
thica  dividida  por  quatro  feixes  de  pilares,  formando  baldaquinos, 
sob  os  quaes  estão  as  estatuetas  dos  quatro  Evangelistas.  Remata 
esta  parte  uma  cimeira  do  mesmo  estylo,  sobre  a  qual  se  vê  o 
fragmento  de  uma  cruz.  A  parte  média  contém  o  ediculo,  rendi- 
lhado por  fora,  e  por  dentro,  na  face  anterior,  ornado  com  cabe- 
ças de  seraphins.  A  face  posterior  é  rendilhada  exterior  e  interior- 
mente. Aos  lados  dois  grandes  feixes  de  pilares  com  quatro  bal- 
daquinos e  três  estatuetas  dabaixo  de  cada  um,  rematados  por  ci- 
meiras do  mesmo  estylo,  e  ligados  á  parte  superior  e  á  parte 
inferior  por  ornatos.  A  base  da  parte  média  é  dividida  em  quatro 
taboleiros,  e  cercada  por  um  acroterio  rendilhado.  A  face  inferior 
é  dividida  por  seis  gomos  com  ornatos  similhantes.  Na  peripheria 
da  base  elevam-se  quatro  anjos  tocando  instrumentos,  os  quaes 
se  firmam  sobre  pendores  com  tintinabulos,  bem  como  os  feixes 
de  pilares.  Falta  um  d'estes  tintinabulos.  A  parte  inferior  termina 
por  uma  aba  hexagona,  sustentada  em  quatro  ornatos,  á  maneira 
de  misulas,  e  com  a  seguinte  inscripçao  na  face  superior  : 

esta  costodia  foi  acabada 
na  era  de  1:5:3:4- 

O  nó  consta  de  arcarias  formando  baldaquinos,  dois  dos  quaes 
abrigam  estatuetas  de  santos.  Na  parte  superior  ha  um  annel  he- 
xágono com  vestígios  de  esmaltes.  Da  parte  inferior  pendem  três 
pingentes  e  falta  um  quarto.  O  nó  descança  sobre  seis  dragões,  si- 
milhantes ao  do  cálix.  A  base  é  distribuída  em  oito  gomos,  cujas 
superfícies  são  ornadas  com  figuras  de  santos. 

Nos  intervallos,  losangos  esmaltados.  A  peripheria  rendilhada. 


—  ii7 


A  base  descança  sobre  um  emmolduramento,  contornado  por  uni 
festão  de  louro,  e  sustentado  por  três  animaes  de  phantasia,  fal- 
tando um   quarto,   e   sobre  garras  apoiadas  em  espheras.  Século 

XVI.» 

A  pequena  cruz  da  cimeira  existe  exposta  numa  vitrine  com 
os  demais  objectos  do  museu.  Ao  grande  feixe  de  pilares  do  lado 
esquerdo  da  face  posterior  falta  uma  estatueta,  e  ao  do  lado  di- 
reito da  parte  anterior,  outra.  A  base  não  é,  como  se  diz,  distri- 
buída em  oito  gomos  mas  em  quatro,  com  o  mesmo  numero  de 
figuras  de  santos  nas  superfícies  e  os  dizeres  seguintes:  s  elisabet 

—  S   PETRVS — S   IOANES  —  O   MATER  DEI   MEM. 

Esta  custodia  peza  vinte  e  cinco  marcos  e  meio  e  foi  oliere- 
•cida  pelo  cónego  Gonçalo  Eannes,  o  mesmo  que  oífereceu  a  cruz 
grande.  A  tradição  diz-nos  que  esta  obra  foi  executada  pelo  grande 
vimaranense  Gil  Vicente. 

Em  tal  caso  occorre  perguntar  se  a  cruz  processional  também 
será  obra  do  mesmo  glorioso  filho  de  Guimarães. 

CÁLICE  DAS  CAMPAINHAS 

Este  cálice  de  prata  dourada,  que  tem  de  pezo  oito  marcos 
menos  uma  onça,  foi  offerecido  pelo  Chantre  Fernando  Alvarez, 
no  século  xvi.  «Altura  om,3i.  Copa  hemispherica,  adornada  com 
seis  figuras  de  anjos  que  sustentam  os  emblemas  da  Paixão,  e  na 
parte  inferior,  com  outros  seis,  sustentando  outros  tantos  tintina- 
bulos.  O  nó  adornado  com  arcarias  gothicas,  contendo  as  esta- 
tuetas de  seis  santos  cobertos  por  baldaquinos.  Baze  dividida  em 
•doze  gomos,  dos  quaes  os  maiores  têem  em  baixo-relevo  figuras  de 
santos:  Nos  seis  gomos  menores  ha  ornatos  esmaltados.  Entre  a 
copa  e  o  nó,  e  entre  este  e  a  baze,  dois  anneis  com  o  mesmo  género 
de  esmalte.  No  bordo  exterior  da  copa  lê-se  em  caracteres  gothi- 
cos:  hic  est  cálix  samgvinis  mei  novite  (sic).  Século  xvi».  E  egual 
ao  da  Sé  de  Braga,  feito  em  Roma,  o  que  não  admira,  porque 
aquellle  serviu  de  modelo  a  este.  Mede  menos  de  altura  om,02,  e 
deixa  ver  no  interior  da  copa  a  martellagem  do  artifice.  A  patena 
tem  no  reverso  um  agnus  esmaltado  e  no  anverso  a  figura  de 
Jesus  Christo,  egualmente  esmaltada,  em  attitude  de  subir  ao  céu. 
c  á  roda:  do  vobis  pacem  relinco  vo  pacem  meam. 

CÁLICE  DE  S.  TORQUATO 

E  assim  denominado  porque  a  tradição  nos  diz  que  appareceu 
na  sepultura  do  glorioso  martyr,  junto  do  seu  corpo  que  ainda 
se  venera  incorrupto  a  pequena  distancia  de  Guimarães,  e  que  o 
referido  santo  celebrava  missa  com  elle! 


—  n8  — 

E  de  prata  dourada  e  esmaltada.  «Altura  om,22.  Copa  lisa  e 
pyramidal.  Nó  hexágono,  ornado  de  ramagens  e  esmaltes.  Base 
também  hexagona,  dividida  em  gomos  e  com  seis  esmaltes  nos 
ângulos  reintrantes.  Uns  e  outros  esmaltes  representam  bustos  de 
santos.  A  patena  tem  no  centro  um  esmalte  que  representa  o  Pa- 
dre Eterno.  Século  xm». 

Muito  semelhante  a  este  ha  outro  que  pertence  á  irmandade 
das  almas,  da  freguezia  de  Santa  Marinha  da  Costa,  como  logo 
se  verá. 

# 

Um  relicário  de  prata  dourada,  em  que  se  guarda  o  tornozello 
de  S.  Torquato.  Na  frente  lê-se  esta  inscripção: 

d  dioq0  iobo  da  silvr  *  indigno  prior 

desta  real  coleqiada  de  n  sr  f 
d"liveira  dev  esta  costodia  anno  1664 

Do  lado  opposto : 

esta  relíqvia  he  de  s-  torcato  disi 

pvlo  de  samtiaqo  apostolo  çvio 

corpo  se  achov  inteiro-)- 

Quando  em  1637  se  dirigiram  á  freguezia  de  S.  Torquato  o 
doutor  Ruy  Gomes  Golias,  mestre-eschola  da  Collegiada,  e  outros 
capitulares,  com  o  fim  louvável  de  mandarem  restaurar  o  tumulo 
do  santo,  aquelle  mestre-eschola  extrahiu  parte  do  calcanhar  di- 
reito do  bemaventurado  martyr,  trazendo  para  a  capella  da  sua 
casa  da  rua  das  Lamellas  aquella  veneranda  relíquia.  Surprehen- 
dido  pela  morte  a  29  de  março  de  1649,  ter>do  completado  20  an- 
nos  do  seu  mestre-escholado  que  principiou  a  exercer  em  7  de 
abril  de  1629  por  ter  permutado  com  o  seu  antecessor  a  abbadia 
de  Villa  Nova  de  Sande,  não  pôde  ordenar  que  depois  do  seu  fal- 
lecimento  a  referida  reliquia  fosse  entregue  a  quem  mais  cuida- 
dosamente a  venerasse.  Decorridos  i3  annos  constara  ao  activís- 
simo D.  Prior  d'esse  tempo  D.  Diogo  Lobo  da  Silveira,  que  existia 
essa  reliquia  em  poder  de  Ignez  de  Guimarães,  Catharina  Golias, 
e  Luiza  de  Guimarães,  sobrinhas  do  fallecido  Ruy  Golias,  e  con- 
seguiu que  aquellas  senhoras  a  cedessem  sendo  trasladada  festi- 
vamente da  capella  do  Menino  Jesus,  da  casa  das  Lamellas  (hoje 
Tribunal)  para  a  egreja  da  Collegiada  no  dia  21  de  dezembro 
de  1662.  Assim  se  conservou  durante  2  annos,  findos  os  quaes  o 
mesmo  D.  Prior  lhe  mandou  fazer  á  sua  custa  o  relicário  allu- 
dido. 


—  ii9  — 


Cofre  de  relíquias 

É  de  prata  dourada  e  encerra  numerosas  relíquias  encontradas 
em  1419  pelo  D.  Prior  Luiz  Vasques,  dentro  de  uma  caixa  que 
estava  no  altar-mór.  A  tomar  toda  a  frente  e  os  lados,  tem  esta 
inscripção  em  caracteres  gothicos  ligados: 

ERA   DE   MIL   E  CCCCLVII   ANNOS   EN   DIA   DE 

S  •   MARIA  DE   MÇO   LVIS   VASQES   POL  DESTA 

IGIA  FEZ  ABRIR   HVA  ARCA   QESTA'    EN   O   ALTAR 

MOOR  A   QVAL  NO   SABIAN  ABERTA   DES   MAMORIA 

DOS   OMES   E  FORON  EN  ELA  ACHADAS   ESTAS   RE 

FICAS   PAR  DA  VESTEDVRA   DE   NOSO    SENHOR 

[HV  XP   E   PTE  DE   HV  BEO   DE   SATÃ  MARIA 

E  DAS   VESTEDVRAS   DOS   APÓSTOLOS   E   MAR 

TtS   E  DE  OVTRAS   RELIQIAS  DE   SANTOS 

E    SANTAS    OTRAS 


Leitura: — Na  era  de  1437  annos,  em  dia  de  Santa  Maria  de 
março,  Luiz  Vasques,  Prior  d'esta  egreja,  fez  abrir  uma  arca  que 
está  no  altar-mór,  a  qual  não  sabiam  aberta  desde  a  memoria  dos 
homens,  e  foram  n'ella  achadas  estas  relíquias: — parte  da  vesti- 
dura de  Nosso  Senhor  Jesus  Christo  e  parte  de  um  véo  de  Santa 


—  120  — 

Maria  e  das  vestiduras  dos  Apóstolos  e  maityres  e  de  outras  ich- 
quias  de  Santos  e  Santas  outras. 
Sobre  a  tampa  lê-se: 

AVTEM 

1HUS 

—  Oito  purificadores  de  prata  que  o  cónego  António  de  Sousa 
mandou  fazer  por  conta  da  Fabrica  no  anno  de  i665.  O  primeiro 
tem  esta  inscripçáo  em  toda  a  volta: 

O  CÓNEGO  ANT"  D  SOVSA  MANDOV  FASER 
8  CASTISSA  DESTE  LOTE  POR  CONTA  DA  FABRICA 

Nos  restantes  sete : 

SOSA  POR  CONTA  DA  FABRICA-  ANNO  l665 

—  Um  jarro  de  prata  e  bacia  do  mesmo  metal,  com  estes  di- 
zeres ao  centro : 

VT   POTIAR   PACIOR 

—  Um  cofre  de  prata  que  encerra  o  craneo  de  S.  Rodrigo,  e 
no  qual  está  gravado:  ano  1787. 

Antes  d'este  houve  outro  cofre  de  marfim  e  arame  dourado, 
como  se  diz  no  inventario  de  1D27:  «Item  outra  arca  de  marfim 
chapeada  de  arame  dourado,  aonde  está  a  cabeça  de  um  santo 
que  presta  para  mordeduras  de  cães  damnados». 

O  cónego  prebendando  Pedro  de  Mesquita  deixou  um  livro 
manuscripto  em  que  nos  diz  ter  fallecido  pelos  annos  de  1480  «um 
homem  virtuoso»  de  Villa  Cova.  concelho  de  Felgueiras,  e  accres- 
centa  que  os  devotos  tiraram  da  sepultura  a  cabeça  do  morto  «e 
a  trouxeram  a  Guimarães  a  casa  de  um  ourives  chamado  Pedro 
Alves,  qie  morava  na  rua  sapateira,  nas  casas  da  esquina  da 
travessa  que  vae  para  a  cadèa  da  correição,  o  qual  foi  avô  do 
cónego  Manuel  da  Silva;  e  este  tirou  da  cabeça  os  queixos  de- 
baixo, e  encastoados  em  prata  á  sua  custa  os  deu  aos  que  a  trou- 
xeram, por  lhe  deixarem  o  resto  da  cabeei,  o  qual  guardou  em 
sua  casa  aonde  os  doentes  (de  mordeduras  cie  cães  hydrophobos) 
a  hiam  tocar,  e  recebiam  saúde;  e  por  sua  morte  a  mandou  col- 
locar  na  egreja  cie  Nessa  Senhora  da  Oliveira»  *. 


# 


Junto  da  lapide  da  sagração,  a  que  já  fiz  referencia,  appare- 


Antiga  Guimarães,  pag.  210. 


—  121  — 

ceu  outra  sem  ornatos  que  mede  ora,44  em  quadrado  e  que  tem  gra- 
vada esta  inscripçao: 

ESTA  CAPELA  /  MANDO 

V  FAZER  AFONSO  ANDRÉ 

CONIGO/ DESTA  IGREEA 

E  ABADE  DE   SANGEES/a 

lovvor  de  santo  andr 

e  /  e  foi  feita  en  a  era  de 

mil  e  qvatro  centos 

e  coreenta/e  sete 

os/devs  se  ammercee- 

Leitura:  —  Esta  capella  mandou  fazer  Affonso  André,  cónego 
d'esta  egreja  e  abbade  de  S.  Gens,  a  louvor  de  Santo  André;  e 
foi  leita  na  era  de  1447  autios.  Deus  se  amerceie  d'elle. 

Sem  duvida  esta  lapide  refere-se  á  capella  de  Santo  André, 
no  claustro,  visto  não  constar  que  em  tempo  algum  existisse  alli 
outra  da  mesma  invocação. 


A  esquerda  de  quem  entra  para  o  referido  claustro,  pela  rua 
de  Nossa  Senhora  da  Guia,  vê-se  um  tumulo  aberto  em  arco  na 
parede  interior,  com  estes  dizeres  sobre  a  tampa : 

ESTE  :  HE  :  DE  AFOM   VIEIRA  :  E   DE   SVÁ  :  GERA 

Leitura:  —  Este  fjaçigo)  é  de  Affonso  Meira  e  de  sua  geração. 

# 

A  direita,  e  por  sobre  dois  arcos  egualmente  com  túmulos, 
está  embebido  na  parede  um  brazão  pintado  a  cores,  tendo  em 
volta  este  lettreiro  gothico,  em  relevo,  de  leitura  difficil: 

ESTA  :  OBRA  :  E   DE   GIL  :  LOVRENCO  \ 
CAVALEIRO  :  CRIADO   DELREI  :  DOM  LHA 

Leitura:  —  Esta  obra  é  de  Gil  Lourenço,  cavalleiro  creado  de 
el-rei  Dom  João. 

Foi  este  Gil  Lourenço  de  Miranda,  alcaide-mór  de  Miranda 
do  Douro,  que  aos  4  dagosto  de  1430.  instituiu  o  morgado  de 
S.  Miguel,  em  S.  Clemente  de  Sande,  com  casas  e  torre  entre 
as  ruas  do  Ferreiro  e  das  Flores,  nascente  e  poente  do  campo 
da  Misericórdia  por  isso  que  as  referidas  casas  e  torre  ficavam 
ao  centro,  a  defrontar  com  a  egreia. 


122 


Caiu  em  ruinas  aquelle  grande  edifício,  e  a  sua  pedra  íoi  ven  - 
dida  em  17  de  janeiro  de  ió56  pela  quantia  de  140:000  réis,  para 
a  construcção  do  hospital  da  Misericórdia,  hoje  casa  do  despacho 
da  mesma  prestantissima  instituição. 


Capella  do  Capitulo 


A  porta  desta  capella  antiquíssima,  situada  ao  1  Lindo  do  claus- 
tro, é  de  architectura  romano-byzantina. 

Tem  dos  lados,  duas  grandes  janellas  do  mesmo  estylo  tapadas 
a  pedra  e  cal  que  vão  em  breve  ser  postas  a  descoberto. 


123 


A  torre  antiga  foi  demolida  em  idi5,  dando  principio  á  actual 
o  doutor  Pedro  Esteves  Cogominho,  ouvidor  das  terras  do  Duque 
de  Bragança,  e  sua  esposa  D.  Izabel  Pinheiro,  filha  de  Tristão 
Gomes  Pinheiro,  que  por  ordem  do  Duque  cercou  Barcellos,  os 
quaes  apenas  puderam  fazer  construir  o  primeiro  terço  em  forma 
de  capella  abobadada  de  pedra  com  dois  túmulos  ao  centro  enci- 
mados pelas  suas  estatuas  jacentes  em  tamanho  natural,  trajando 
ricos  vestidos  da  epocha,  tudo  primorosamente  esculpturado  em 
pedra  de  Anca. 

O  doutor  Pedro  Esteves,  que  em  1448  fundou  em  Barcellos  a 
Casa-solar  dos  Pinheiros,  era  avô  da  ex.ma  esposa  do  illustre  ge- 
nealogista  sr.  José  de  Azevedo  e  Menezes,   da  Casa  do  VinhaL 

A'  cabeceira  dos  túmulos  ergue  se  um  altar  de  granito  fino  onde 
se  encontram  gravadas  as  cruzes  da  sagraçao,  e  no  qual  se  cele- 
brava missa  aos  domingos  e  dias  santificados,  podendo  o  publico 
assistir  a  cila  do  largo  fronteiro  por  uma  das  duas  janellas  rendi- 
lhadas que  fornecem  luz  á  capella.  A  abobada,  os  túmulos  e  as 
paredes  interiores,  tudo  está  de  tal  modo  salitrado,  que  dentro  de 
breves  annos  nada  existirá  distinguivel. 

Por  morte  dos  instituidores  coube  a  administração  d'esta  ca- 
pella a  seu  filho  o  dr.  Diogo  Pinheiro,  D.  Prior  de  Guimarães  desde 
i5o3,  que  lhe  collocou  na  frente  as  armas  da  familia  com  esta 
inscripção  gravada  ao  fundo  em  caracteres  miúdos  e  já  bastai. te 
apagados : 

r    n  ESTAS   ARMA:.    MADOV  AQVI   POR 

D.   DIOGO   PINHEIRO  ADMI 
N1STRADOR  DESTA   CAPELLA 

O  mesmo  D.  Diogo,  que  em  1 5 1 3  concluiu  a  obra  da  construc- 
ção  da  torre,  íoi  commendatario  dos  mosteiros  de  Carvoeiro,  da 
Junqueira  e  de  Castro  de  Avelans,  Bispo  do  Funchal  e  Prelado 
do  convento  de  Thomar  onde  falleceu  em  julho  de  1 5 14,  sendo 
sepultado  na  egreja  de  Santa  Maria  dos  Olivaes. 

O  sino  de  Nossa  Senhora,  que  apenas  se  faz  ouvir  nos  dias 
mais  solemnes,  foi  alli  collocado  em  5  de  dezembro  de  1822,  e 
peza  67  arrobas  e  6  arráteis,  na  importância  de  réis  646:000. 

Entre  as  ameias  da  frente  da  torre  construiu- se  uma  sineira 
elegante,  sendo  encarregado  da  obra  o  mestre  pedreiro  Manuel 
dos  Santos,  como  o  indica  esta  inscripção  gravada  no  lado  es- 
querdo : 

MANO 

f:l  dvs  (siç) 

SANTOS 
O    MESTRF 


— 124  — 

Collocaram  alli  o  sino  do  relógio  que  foi  feito  em  1744,  sendo 
vereadores  Luiz  Pimenta  e  Gonçalo  Peixoto. 

Ao  lado  direito,  pendente  dum  arco  de  ferro,  está  o  sino  das 
meias  horas  com  estes  dizeres  em  volta : 


IHS   MARIA  .IOSFPH 

ANNO    1686 

HE  DA  GAMARA  DESTA  VILLA   GES 

Esteve  primitivamente  no  castello  e  dava  signal  para  se  fecha- 
rem á  noite  as  portas  da  antiga  villa. 

A  vereação  emprestou-o  á  irmandade  de  S.  Torquato,  poroc- 
casião  da  trasladação  do  Santo,  a  qual  teve  logar  no  dia  4  de  ju- 
lho de  i852.  Quebrou  então,  e  a  irmandade  ohrigou-se  a  mandar 
fundir  este  pela  forma  do  quebrado,  com  todos  os  dizeres  e  ornatos. 

O  PADRÃO 

Na  faceta  da  frente  da  columna  oitavada  do  cruzeiro  gothico 
que  se  levanta  sob  a  abobada  do  padrão  de  Nossa  Senhora  da 
Victoria,  mondado  construir  no  reinado  de  D  Aífonso  IV,  em 
frente  á  porta  principal  da  Collegiada,  está  embebida  uma  pequena 
lamina  de  bronvce  com  esta  inscripção  gravada  cm  caracteres 
gothicos  miúdos: 

Leitura  : — A'  honra  de  D  sus 
e  de  Santa  Maria,  e  por  esta 
villa  mais  honrada  ser  e  o  po- 
vo, fez  fazer  esta  obra  Pedro 
Esteves,  de  Guimarães,  merca- 
dor morador  em  Lisboa,  filho 
de  Estevão  Garcia  e  de  Martha 
Peres,  na  era  de  i38o  annos. 
aos  8  dias  de  setembro. 


A  AUNRA-f-D-|-DEv:5+ED-i- 

SCÁ  -f  MARIA+EPOR+ES 

TA+VII-A-f-MAIS-f-ONRA 

DA-|-SEER-r-EO  1'OBOO  +  F 

EZ-j-FAZER-fESTA-L-OBR 

A+1'ERESrEVEZ-t-D-fGV 

IMAKAAES—  MERCADOR-f- 

MORADOR-|-EN-f  LIXBOA 

FILHO-j-D-fSTEVÃ-j-GCl 

A-f  E 1 >  -j-MT  A  -f  PEZ-|-NA-f-E 

-j-M-f-CCG-(-LXXX-|-ANOS-f- 

VlIl4-[>IAS-j-D-i-STENBRO 

-j-MLAFEX-f- 

As  lettras  da  orla  inferior 
indicam  certamente  o  nome  do 
auctor  da  obra : 

M.  L.  a  fe\. 

Em  quatro  dos  lados  da  co- 
lumna estão  gravadas  umas 
abreviaturas  que  representam 
os  nomes  dos  pães  e  filho  a 
que  a  inscripção  allude,  e  ain- 
da de  outro  filho  Gonçalo  que 
foi  encarregado  de  ir  á  Nor- 


—  125- 

mandia   comprar  a  cruz.    Estão  abreviados   do   seguinte    modo  : 

g.° — p° — st — MT 
Leitura :  — Gonçalo— Pêro— Estevão — Martha. 

Em  volta  da  cruz  encontram-se  as  estatuetas  da  Virgem,  S.  João 
Evangelista,  S.  Damazo,  S.  Torquato,  Senhora  do  Rosário,  o 
Apostolo  S.  Filippe  e  S.  Gualter. 

Num  dos  quatro  arcos  ogivaes  d'este  padião  fez-se  de  estuque, 
á  altura  dos  capiteis  das  columnas,  um  pequeno  oratório  envidra- 
çado, com  a  imagem  de  Nossa  Senhora  da  Victoria.  Aos  lados  da 
referida  imagem  havia  estas  duas  taboas  com  esculptura  antiga^ 
em  relevo,  que  actualmente  existem  expostas  no  museu : 


A  primeira  representa  D.  João  I  ajoelhado  junto  do  padrão  a 
agradecer  á  Virgem  o  vencimento  da  batalha  de  Aljubarrota;  e  a 
segunda  o  advogado  Pedro  de  Oliva,  que  se  propunha,  como  na 


—  125  — 

occasião  dissera,  destruir  os  privilégios  do  Cabido  e  dos  seus  ca- 
seiros, o  qual  caiu  repentinamente  «com  a  lingua  fora  da  bocca, 
a  fala  perdida  e  o  rosto  disforme»  aos  pés  dos  cónegos  Luiz  Gon- 
çalves e  Abbade  de  Freitas,  que  o  reprehenderam  em  publico. 
Este  Pedro  de  Oliva  morreu  horas  depois,  sendo  sepultado  na 
egreja  de  S.  Francisco.  Ao  cabo  de  33  annos,  quando  o  corpo  de 
sua  mulher  baixava  á  mesma  campa,  appareceu  o  cadáver  incor- 
rupto, e  foi  então  exposto  ao  exame  do  publico,  encostando  se  á 
parede  da  egreja  para  de  novo  se  lhe  dar  sepultura,  juntamente 
com  o  de  sua  esposa. 

O  cónego  Gaspar  Estaco  encontrou  em  i6a5,  no  archivo  da 
Collegiada,  um  pergaminho  que  reproduziu  do  modo  seguinte  nas 
suas  Antiguidades,  cap.  41,  pag.  ibb:  «Senor.  Aífonso  Peres  ta- 
balliam  na  vossa  villa  de  Guimarães  faço  saber  a  v.  m.  q  na  era 
de  M.CGG.LXXX  annos,  oito  dias  de  setembro  foi  posta  a  cruz 
na  flvaçaria  de  Guimarães,  a  a  aduceu  hi  P."  Steves  nosso  natu- 
ral, filho  que  foi  de  Stevo  Garcia  en  outro  têpo  mercador  de  Gui 
marães,  e  a  qual  cruz  G.°  Steves  irmam  do  ditto  P.°  Steves  diz 
que  foi  vontade  de  Deus,  que  lhe  deu  a  entender,  que  fosse  a 
Normandia  Anafrol,  e  que  comprasse  a  ditta  cruz,  e  a  ducesse  a 
este  lugar  de  Guimarães  hu  está  assentada  a  par  da  Oliveira,  a 
qual  oliveira  quando  esta  cruz  a  par  delia  assentaron  era  seca,  e 
da  quel  dia  a  três  dias  começou  de  reverdecer  e  deitar  ramos,  e 
eu  A.°  Peres  taballiam  esto  escrevi». 

O  documento  transcripto  refere-se  á  inscripção  e  mostra-nos 
que  a  cruz  foi  levantada  no  dia  8  de  setembro  de  1342. 

A  palavra  Alvaçaria,  que  os  antigos  e  modernos  historiadores 
da  Collegiada  não  esclarecem,  foi  certamente  mal  copiada  do  per 
gaminho  onde  devia  estar  escripta  com  um  c  em  logar  de  v~Al- 
caçaria,  corrupção  de  Alcaíçaria,  que  os  Árabes  derivam  de  Cai- 
çar,  (César),  por  crerem  que  este  imperador  foi  quem  primeiro 
mandou  edificar  no  Oriente  umas  casas  que  por  tal  motivo  assim 
se  denominaram,  e  ás  quaes  deu  a  forma  dos  claustros  dos  nos- 
sos conventos,  com  bastantes  lojas  para  os  mercadores  se  reco- 
lherem. Estas  casas  tinham,  para  maior  segurança  dos  recolhidos, 
uma  única  porta  que  estes  fechavam  á  noite. 

Pêro  Esteves  era  mercador  natural  de  Guimarães ;  a  actual 
rua  da  Rainha,  n'outro  tempo  dos  mercadores,  termina  a  poucos 
passos  da  cruz ;  e  el  rei  D.  Manuel,  em  princípios  do  século  xvi, 
faria  surgir  das  ruinas  d'aquelle  velho  edifício  a  alpendrada  que 
mandou  construir  em  toda  a  volta  do  largo  onde  se  ergue  o  Pa- 
drão e  a  vasta  egreja  Collegiada,  como  ainda  se  pôde  ver  aos  la- 
dos norte  e  sul,  incluindo  a  casa  do  Senado,  e  como  ha  alguns 
annos  egualmente  se  via  na  parte  do  poente. 

Por  tudo  isto   sou   levado  a  crer  que  no  século  xiv  havia  no 


— 127  — 

largo   fronteiro   á   egreja  da  Collegiada  uma  Alcaçana,  i.  é.  um 
edifício  em  que  os  commerciantes  da  villa  se  recolhiam. 

Normandia  anafrol,  é  também  um  problema  onomástico  que 
me  obrigou  a  empregar  bons  esforços  para  poder  propor  uma  hy- 
pothese  que  se  me  affigura  acceitavel.  A'  Normandia,  uma  das  36 
provincias  da  antiga  divisão  administrativa  de  França,  pertence  a 
considerável  cidade  de  Honíieur  (Huneflorium)  que  em  princípios  do 
século  presente  contava  8:600  habitantes  '.  A  verdadeira  pronun- 
cia d'este  nome  francez,  pouco  se  approxima  do  Anafrol ;  porém 
vertida  em  portuguez  pelo  Affonso  Peres,  taballiam,  e  ainda  por 
outros  do  seu  tempo,  dá  sem  duvida  o  Anafrol  do  pergaminho  : 
e  em  tal  caso  ficaremos  sabendo  que  a  belía  cruz  do  padrão  foi 
feita  na  referida  cidade  de  Honjleur,  pertencente  á  aha  Normandia. 
Este  padrão  foi  considerado  monumento  nacional  de  2.a  classe  por 
decreto  publicado  no  «Diário  do  Governo»  n.°62,  do  anno  de  1881. 

Parte  do  lado  norte  d'este  largo  é  oceupado  pelo  curioso  edi- 
fício da  Camará,  construído  no  século  xvi  sobre  grandes  arcos  ogi 
vaes  chanfrados  que  oíferecem  livre  transito  para  os  lados  da  pra- 
ça de  S.  Thiago. 

No  cunhal  esquerdo  tem  uma  inscripção  lapidar  como  a  d^ 
egreja  de  S.  Miguel  do  Castello,  de  que  já  falei  referente  ao. voto 
de  el-rei  D.  João  IV. 

Em  2i  de  junho  de  1877,  collocou-se  no  alto  da  fachada  a  ele- 
gante estatua  de  granito  representando  Guimarães,  apeada  do  en- 
tão arruinado  edifício  da  Alfandega  que  logo  principiou  a  ser 
demolido  para  em  seu  logar  se  construírem  as  casas  que  hoje  afor- 
moseam  a  praça  de  D.  Affonso  Henriques. 


A  Insigne  e  Real  Collegiada  de  Nossa  Senhora  da  Oliveira, 
extincta  como  todas  as  do  reino,  foi  reorganisada  por  carta  regia 
de  8  de  janeiro  de  1891,  depois  da  competente  auetorisação  dada 
ao  governo  pela  carta  de  lei  de  14  de  setembro  de  1890,  crean 
do-se  junto  d'ella  um  instituto  de  instrucção  publica  gratuita  com 
a  denominação,  de  Pequeno  Seminário  de  Nossa  Senhora  da  Oli- 
veira. Em  20  de  fevereiro  do  mesmo  anno  foi  aberto  concurso 
para  provimento  dos  logares  de  10  collegiaes  (7  cónegos  e  3  be- 
neficiados) e  do  Dom  Prior  (presidente)  os  quaes  foram  providos 
no  mesmo  anno.  Este  primeiro  Dom  Prior,  sr.  D.  José  d'Andrade 
Sequeira,  falleceu  em  dezembro  de  1894,  sendo  substituído  pelo 
actual  sr.  conselheiro  D.  Manuel  d'Albuquerque,  apresentado  por 
decreto  de  20  de  junho  da  1895,  o  qual  tomou  posse  no  dia  28 
de  setembro  do  mesmo  anno. 


'  Dictionnaire  Geographique,  par  Vosgien,  pag.  290. 


—  128  — 

Por  Provisão  de  12  de  novembro  de  1891  foram  dados  á  Col- 
legiada,  pelo  chorado  Arcebispo  D.  António  José  de  Freitas  Ho- 
norato, os  novos  estatutos  datados  de  3o  de  setembro,  e  approva- 
dos  pelo  governo  em  3o  de  outubro.  Pelo  decreto,  hoje  com  força 
de  lei,  de  18  de  abril  de  1895,  foi  reduzida  a  côngrua  do  Dom  Prior 
e  supprimidos  os  dois  logares  de  coadjutores  otficiosos. 

O  Pequeno  Seminário  foi  organisado  em  Lyceu  Nacional  por 
decreto  de  16  de  setembro  de  i8qó. 

N'outro  tempo  esta  Gollegiada  compunha-se  do  D.  Prior,  Chan- 
tre, Thesoureiro-Mór,  Mestre-Eschola,  Arcediago  de  Sobradello, 
Arcipreste,  Arcediago  de  Villa  Cova,  14  cónegos  prebendados, 
8  meios  prebendados  e  12  padres  coreiros. 


Egreja  de  S.  Pedro  de  Rates 

Não  pertence  ao  concelho  de  Braga  esta  preciosa  egreja,  mas  a  sua 
historia  está  intimamente  ligada  á  da  nossa  cathedral,  por  que  se  diz 
que  S.  Pedro  de  Rates  foi  o  primeiro  Bispo  de  Braga.  Por  isso 
D.  fr.  Balthazar  Limpo  ordenou  em  1 552  a  trasladação  dos  veneran- 
dos restos,  até  então  guardados  na  egreja  de  que  dou  gravura,  para 
a  Sé  onde  se  se  conservam  em  capella  da  mesma  invocação. 

Data   do  anno  de  716  a  fundação  d'esta  egreja.  Destruída  pe- 
los Árabes  foi  em  noo  reconstruída  a  expensas  da  rainha  D.  The 
reza  que  alli  estabeleceu  os  monges  da  Caridade. 


—  I2g  — 

O  actual  edihcio  deve  pertencer,  em  grande  parte,  aquella 
epocha  por  ser  exemplar  precioso  da  architectura  românica. 

Em  í3i5,  esta  egreja,  que,  apezar  de  pequena,  tem  três  naves, 
pertenceu  aos  cónegos  Regrantes  que  tiveram  alli  o  seu  mosteiro. 

No  adro  ainda  se  conservam  algumas  sepulturas  cavadas  em 
grandes  pedras.  Por  proposta  minha,  foi  classificada  monumento 
nacional  em  1897. 


Egreja  de  Cerzedello  (Guimarães) 


-     1  DO  — 

A  Ordem  Militar  dos  Templários  teve  origem  na  Palestina,  e 
crê-se  que  a  sua  fundação  data  de  1119  por  ser  este  o  anno  em 
que  principiou  com  votos. 

Em  11 28  recebeu  a  Regra  que  lhe  foi  dada  pelo  Papa  Honó- 
rio II.  Ao  cabo  de  quasi  dois  séculos  de  existência  terminou  na 
França  e,  em  virtude  dos  conhecidos  Decretos  Apostólicos,  extin 
guiu  se  egualmente  em  Portugal  no  reinado  de  D.  Diniz,  sendo  os 
seus  bens  encorporados  na  nova  Ordem  de  Christo  que  o  mesmo 
monarcha  instituirá. 

A  extincção  da  Ordem  dos  Templários  foi  publicada  por  Cle- 
mente V  na  segunda  sessão  do  XV  Concilio  Geral  Viennense  que 
teve  logar  no  dia  3  de  abril  de  i3 1 2. 

Os  Templários  não  haviam  sido  fieis  ao  juramento  solemne 
com  que  prometteram  perpetua  fidelidade,  sugeição,  castidade,  e 
obediência  a  Jesus  Christo,  ao  Pontífice  e  ao  Reverendo  Mestre 
da  Ordem.  Aquelles  que  em  Jerusalém  pugnaram  pela  conquista 
da  cidade  e  libertação  do  Santo  Sepulchro,  regressaram  a  Portu- 
gal com  grandes  conhecimentos  das  artes  de  Byzancio  adquiridos 
na  visita  que  fizeram  aos  monumentos  da  Grécia  e  principalmente 
da  Ásia.  Desde  logo  a  architectura  romana  tomou  uma  feição  in- 
teiramente nova,  enriquecida  pelos  primores  do  estylo  que  ainda 
hoje  podemos  admirar-lhe.  Urbano  III,  Gregório  IX  e  Clemente  IV 
permittiram  que  a  Ordem  mandasse  edificar  egrejas  nos  logares 
conquistados  aos  infiéis,  declarando  as  isentas  da  Jurisdição  Pre- 
laticia  e  immediatas  á  santa  Sé  Apostólica. 

A  actual  egreja  parochial  de  Santa  Christina  de  Cerzedcllo,  no 
concelho  de  Guimarães,  foi  edificada  pelos  Templários  em  meado 
do  século  xii.  Esta  vasta  egreja,  de  uma  nave  e  sem  transepto, 
mede  exteriormente  34  metros  de  comprido  e  7'", 78  de  largo. 
No  remate  da  fachada  pousa  uma  pequena  pedra  em  forma  de 
palmatória  tendo  gravada  ao  centro  a  cruz  octogona  da  Or 
dem,  a  qual  nas  quatro  extremidades  corta  para  dentro  em  semi- 
círculo. 

A  porta  principal,  com  a  archivolta  bellamente  ornamentada, 
está  para  o  Occidente  como  era  de  uso  antigo  entre  os  povos  ca- 
tholicos  e  pagãos. 

Estes  entravam  no  templo  ficando  voltados  ao  Oriente  em  ado- 
ração ao  sol  nascente ;  e  aquelles  alludiam  á  posição  de  Jesus 
Christo  quando  expirou  no  Calvário. 

A  cimalha,  em  volta  do  edifício,  é  de  molduras  simples,  ornada 
de  pérolas  a  espaços,  e  descança  sobre  grossos  modilhões  comple- 
tamente lizos.  Ao  lado  esquerdo  da  fachada  ergue-se,  em  forma 
de  muralha  forte,  com  dois  campanários  no  alto,  o  origirialissimo 
torreão,  genuína  construcção  da  epocha.  Não  obstante  ser  coberta 
de  madeira,  tem  a  egreja  contrafortes  ou  gigantes. 


3i  - 


Lado  sul  da  egreja  de  Cerzedello 


Próximo  da  capella-mór  ha  duas  portas  lateraes,  vendo-se  a  do 
lado  sul  coberta  por  pequeno  alpendre  com  as  respectivas  colum- 
nas  encostadas  a  dois  túmulos  de  pedra  onde  provavelmente  des- 
cançam  um  ecclesiastico  £  um  guerreiro,  visto  haver  no  da  es- 
querda uma  espada  gravada  com  um  brazão  ao  lado,  e  o  da  di- 
reita estar  collocado  com  a.  cabeceira  para  fora. 

Numa  das  pedras  da  parede  exterior  norte,  próximo  da  porta 
lateral  e  junto  do  friso  que  outr'ora  pertenceu  á  alpendrada,  estão 
cravadas  as  lettras  : 

SES 

N  NN 

D   O 

Não  pertencem  á  primitiva  obra  estes  poucos  caracteres  nem 
tampouco  podemos  admittir  que  fossem  gravados  de  lado  como 
estão.  A  segunda  e  terceira  linhas  poderiam  ser  tomadas  como 
abreviaturas  das  primeiras  palavras  da  divisa  dos  Templários  — 
Son  nobis  domine  sed  nomini  tuo  da  gloriam. 

Transpondo  a  porta  principal  da  egreja  o  visitante  entra  numa 
galilé  curiosa  que  mede  9,53  de  comprido  por  5,67  de  largo,  com 
dois  túmulos  abertos  em  arco  na  parede  e  o  pavimento  coberto  de 
sepulturas  com  grandes  espadas  toscamente  gravadas  sobre  as 
tampas.  Numa  d'estas  existe  um  swastica  de  crusamentos  duplos, 
terminando  em  curvas,  emblema  funerário  dos  tempos  do  paga 
nismo.  D'aqui  passa-se  ao  corpo  da  egreja  por  um  arco  que  mede 
na  abertura  apenas  ira,97. 


-    IJ2  -- 

Todas  as  janellas  inclusive  a  que  fica  sobre  a  porta  principal, 
conservam  ainda  a  forma  de  setteiras. 

O  arco  da  capella-mór  mede  3,68  na  abertura  e  descança  em 
duas  grossas  columnas  com  os  capiteis  antigos.  Por  proposta  mi- 
nha foi 'esta  egreja  considerada  monumento  nacional  em   dezem 
bro  de  1897. 

EGREJA  E  HOSPITAL  DE  S.  xMARCOS  (BRAGA) 

(Vide  gravura  a  pcg.  i33) 

No  largo  dos  Remédios,  onde  nos  primórdios  do  século  xn  ha 
via  uma  pequena  ermida  e  Albergaria  adjunta  com  frente  para  les- 
te, construiu-se  em  meado  do  século  xvm  a  actual  egreja  e  am 
pliou-se  o  hospital  que  D.  Diogo  de  Sousa  reconstruíra  em  i5o8, 
unindo- lhe  as  gafarias  de  S.  Lourenço,  Santa  Margarida,  Lazaro^ 
íque  estava  onde  hoja  se  vê  a  egreja  parochial  de  S.  José  de 
S.  Lazaro),  a  Albergaria  da  rua  Nova  de  Sousa,  e  a  Contraria 
de  Roque  Amador  e  do  Corpo  de  Deus. 

A  construcção  do  primitivo  hospital  de  S.  Marcos  foi  iniciada 
pelo  cónego  Diogo  Gonçalves.  O  Arcebispo  D.  Fernando  da 
Guerra,  em  seu  testamento  com  data  de  2  de  setembro  de  1467, 
deixou  «aos  doentes  do  Hospital  de  S.  Marcos  outras  de\  Livras». 

Neste  local  existiu  o  convento  dos  Templários,  extincto,  como 
todos  os  da  Ordem,  no  anno  de  i3i2.  O  Arcebispo  de  Braga 
D.  Payo  Mendes,  conhecendo  quão  grandes  eram  os  rendimentos 
da  capella,  deu  no  anno  de  11 18  a  sua  administração  em  Com- 
menda  a  seu  sobrinho  D.  Gualdim  Paes,  Mestre  da  Ordem  em 
Portugal.  Este  D.  Gualdim,  filho  de  D.  Payo  Ramires  e  de 
D.  Gontrode,  nasceu  em  Amares,  a  10  kilometros  de  Braga,  no 
anno  de  1 1 18,  sendo  armado  cavalleiro  no  campo  de  Ourique,  por 
el-rei  D.  Affonso  Henriques,  seu  amigo,  a  25  de  julho  de  1  i'òg. 

Numa  apostilla  do  Concilio  de  Troya,  celebrado  a  14  de  ja- 
neiro de  11 28,  mostra-se  que  em  19  de  abril  do  referido  anno, 
Braga  possuia  a  Ordem  do  Templo.  Diz  a  apostilla:  «Et  hanc 
Cartam  fílit  roborata  in  manu  D.  Raymundi  Bernardi  in  Civitate 
Bracara;  tali  modo,  &  tali  pacto:  ut,  si  illud  Castellum  ante  morte 
nostra  dederimus,  nullis  de  nostris  inimicis-in  eo  recipiant.  Et  si 
ibi  intraverit,  mittant  eum  forus:  sic,  qui  nulla  contraria  inde  nobis 
exeat».   Este  D.  Raimundo  Bernardo  foi  o  II  Mestre  da  Ordem. 

Com  data  de  1 1 52  existe  em  Thomar  um  documento  no  qual 
se  declara  que  Ejeuva  Aires  e  seus  filhos  venderam  «vobis  Jero 
solimitani  Templi  Militibus,  Pelagio  Gontimiris,  &  Martino  Pe- 
lagii»  uma  Herdade  que  possuíam  in  Civitate  Bracara,  circa 
illum  vestrúm  puteum  de  Hospitali...  Fada  Carta  II.  K.  Junii 
E.M.C.2X.    E  ainda  em  junho  de  1148  o  Mestre  Gualdim  Paes 


-i33  — 


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—  134  — 

se  concordou  com  Godinho  Godins  acerca  da  herdade  de  Banca 
Mala,  «sita  na  ribeira  do  Aliste,  aítirmando  o  Mestre   Guaidim, 
que  ella  sempre  fora  de  Domo  Templi,  quae  est  in  Bracharensis 
Civitate».  O  contendor  termina  d'este  modo  a  doação:  Ego  Go 
dinus  Godinis  hoc  scriptum  tibi  Fratri  Johani,  qui  pr0edictam  Do 
mum  Templi  custodis,  &  regis,  própria  manu  roboro». 

Era  pois  director  e  claviculano  da  Casa  e  Hospital  de  Braga 
o  dito  Frei  João. 

O  Arcebispo  D.  João  Ovelheiro  confirmou  em  agosto  de  1 145 
este  Hospital  fundado  e  dotado  pelo  seu  predecessor  D.  Payo, 
em  beneficio  dos  pobres,  e  doou-lhe  metade  dos  dizimos  de  todas 
as  rendas. 

Em  carta  datada  de  1 146  permitte  e  confirma  D.  Affonso  Hen- 
riques a  doação,  e  ordena  que  as  fazendas  e  herdades  com  que 
D.  Payo  dotara  o  Hospital,  e  as  quaes  depois  da  sua  morte  os 
bracarenses  usurparam,  sejam  restituídas  na  integra. 

A  administração  Camarária  do  Hospital  terminou  quando  D.  fr. 
Bartholomeu  dos  Martyres  o  entregou  de  vez  á  Misericórdia. 

As  obras  do  actual  edifício  terminaram  em  1780;  e  as  da  egre- 
ja,  que  já  em  i8o5  prestava  a  sua  capella  mór  á  celebração  do 
culto,  apenas  se  concluíram  em  i836,  tudo  dirigido  e  executado 
por  José  Fernandes  da  Graça  (o  Landim).  Foi  auctor  do  desenho 
e  planta  d'este  vasto  edifício  o  illustre  bracarense  (capitão  de  enge 
nheria)  Carlos  Amarante,  parente  do  sr.  dr.  Carlos  Braga.  So 
bre  o  parapeito  que  serve  de  remate  á  frontaria  assentam  as 
grandes  estatuas  de  granito  representando  S.  Simão,  S.  Bartho- 
lomeu, S.  Thiago  Menor,  S.  João  Evangelista,  Santo  André. 
S.  Pedro,  S.  Paulo,  S.  Thiago  Maior,  S.  Thomé,  S.  Pbilippe. 
S.  Mathias  e  S.  Lucas.  Ao  centro  da  fachada  da  egreja,  que  per- 
tence á  architectura  Compósita,  ha  num  nicho  bem  lavrado  a  es- 
tatua do  orago  com  esta  inscripção  por  baixo: 

BEATUS   JOANNES   MARCUS    ChRISTI  ■ 

Domini  Discípulos  Anagrama  Js  •  in 
Mundo  pius  •  est  Medicus  •  tuis  incolis  •  bracara  • 

A  urna  que  encerra  os  ossos  de  S.  João  Marcos  e  que  est> 
em  arco  aberto  na  parede  do  lado  da  epistola,  na  capella-mór. 
é  de  mármore  com  embutidos  de  varias  cores,  tendo  na  frente 
as  insígnias  prelaticias  e  os  dizeres  seguintes: 

sacra  ossa 
divi  joannis  marci 

Ao  centro  da  capella  mór  existe  uma  campa  de  mármore  onde 
jaz  o  cónego  João  de  Meira  da  Silva  Carrilho,  que  em  2  de  ou- 
tubro  de  1682   instituiu  capella  e  coro  com  6  capellães  na  ante- 


-i35- 

nor  egreja  do  Hospital,  denominada  do  Espirito  Santo.  Tem  esta 
inscripção: 


s:bioaobverjuahr 

\LHOCONEGOqF0IMAS7r 

"MSSAW0  0DSATOOFF? 

EDABVlírADACRVZAM 
FALECE0EM25BJ/W? 
&.l<ffrfr.téSTDlMM 
OFF?TODOS0SAN0S. 


, 


Ha  também  na  varanda  do  Hospital  uma  grande  lapide  com  esta 
inscripção: 


E^MZAPERAOICONVAtCENTF! 
GMTOBAFAMQNEfcAESTAEASIM 


^ZAPWENWMAO.FAZERTV 
&ASVA(vSTA.TEDRÔB^VIARÍ(lMIIÍftR 
■&S!mOESW^MEIItKÉI\l!M 
WSTD  BRfSO  NSMS.^tlS.SENTOSMIL  Rcl  S 

|  P*SE  &RtWMW0SRENI!W<lTrSEB5'PEIIEr 
'NAFORMADMDOIOMMHWlSA 


p» '  ■  '  — ■        ..  ....    ntgf 


LSTAVtDWVSUPRA  tSTfNA  NA  C  0 
WS/ALEt  tNC,  I A ,  AWTIGDAE  FOI  TRE 

SíffcDADMESTEUJCARNOANNO 

mm. 


— 136  — 

A  casa  da  Convalecença,  como  se  lê  no  meu  livro  InscripçÕes 
e  Lettretros,  pag.  108,  foi  fundada  por  Pedro  Aguiar,  sirgueiro, 
familiar  do  Santo  Officio,  morador  no  Rexio  do  Castello,  por  doa- 
ção e  contracto  exarado  nas  notas  do  tabelliao  geral  de  Braga  e 
seu  termo,  Matheus  Gonçalves,  aos  n  de  fevereiro  de  1648. 

Sob  a  arcaria  do  claustro  ha,  sobre  uma  fonte,  estes  dizeres : 

O   1LI.M.0   SENHOR  D.    RODRIGO   DE 

MOVRA  TELLES  ARC.°  PRIMAZ  FEZ 

MERCÊ   DESTA  AGOA  AOS   25 

DE   MAIO     I723 

A  pouca  distancia  d'esta  fonte  conserva-se  embebida  na  pare- 
de uma  lapide  romana  funerária  que  pertenceu  á  sepultura  de 
Heleno,  servo  de  Talavo,  de  3o  annos  de  edade.  Diz  assim  : 

HELENVS 
TALA  VI 

SER 

ANNORV 

M.XXX 

H.S.E 

Ao  lado  d'esta  existiu  outra,  egualmente  funerária,  de  Amaranto, 
filho  de  Senecião.  Dizia: 

AMARANTVS   SENECIONIS 
H.S.E 

Foram  ambas  encontradas  nas  escavações  feitas  para  se  assen- 
tarem os  alicerces  do  Hospital. 

Quando  mais  tarde,  em  i835,  se  abriram  os  alicerces  para  a 
nova  enfermaria,  oppareceram  também  estas  duas  lapides  que  se 
acham  embebidas  na  frente  do  edifício: 

iovi .  o .  M 

PROSALVTE 
hEBVRRVS   CAMAL  TRIARIMAG 

AV...S...NVS  LEG.1VR.C    V 

XXX  ET . PROCVLAE . VX 

EIVS.AEMII  .CRÉS 
CENS  .  COMES  .  V  .  S .  L  .  M . 

Encostada  á  parede  exterior  do  lado  esquerdo  deste  vasto  edi- 
fício vê-se  a  capella  de  S.  Bento,  construída  a  expensas  dos  devo- 


-i37- 

tos  por  intervenção  da  Meza  administradora  da  Misericórdia  que 
para  este  fim  dirigiu  ao  Arcebispo  D.  José  de  Bragança  uma  pe- 
tição em  que  se  lê:  «Diz  o  provedor  e  irmãos  do  serviço  da  meza 
da  Misericórdia,  que  vários  devotos  com  suas  offertas  e  esmollas, 
querem  fazer  um  nixo  á  emitação  das  capellas  dos  Passos  e  nel- 
les  collocar  a  pintura  de  S.  Bento,  que  existe  na  parede  detrás 
do  Hospital  para  se  louvar  a  imagem  tão  milagrosa;  e  como  na- 
quelle  sitio  de  trás  do  Hospital  ha  um  claro  e  nelle  um  cruzeiro 
antigo,  querem  neste  mesmo  sitio  encostado  ás  paredes  fazer  o 
tal  nixo  ou  capella,  pondo  o  cruzeiro  mais  á  ilharga,  cinco  ou  seis 
palmos». 

A  capella  construiu-se  realmente  e  foi  benzida  por  provisão 
do  Arcebispo  no  anno  de  1755.  A  obra  de  pedreiro  importou  em 
256:3q6  réis  que  com  a  de  carpinteiro,  pintor,  ferreiro  e  caiador 
prefez  o  total  de  487:116.  Importou  em  34:3 15  a  grade  da  porta, 
e  em  4:800  a  imagem  de  S.  Bento  que  está  num  nicho  sobre  a 
mesma  porta. 

Que  destino  levaria  o  cruzeiro  e  a  milagrosa  pintura  de  S. 
Bento  ?  E'  certo  que  com  esse  descaminho  não  decresceu  a  devo- 
ção popular,  pois  o  S.  Bento  moderno  recebe  annualmente  milha- 
res de  ovos  numa  caixa  de  madeira  que  está  dentro  da  capella 
com  dois  tubos  de  ferro  que  vêem  á  grade  recebel-os. 

Utilíssima  devoção  esta  de  oíferecer  ovos  ao  S.  Bento  do  Hos- 
pital para  se  occorrer  ás  necessidades  dos  seus  doentes ! 

Aos  bons  officios  do  meu  presado  amigo  sr.  Sebastião  M.  An- 
tunes da  Silva  Monteiro,  illustrado  ofiicial  da  secretaria  do  Hospi- 
tal, devo,  alem  d'outros  obzequios,  a  seguinte  nota  dos  ovos  offe- 
recidos  a  S.  Bento  durante  os  últimos  oito  annos: 


Anno  económico  Numero  de  ovos 

1891-92 8:644 

1892-93 10:590 

1893-94 10:490 

1894-95 11:730 

1895-96 14:254 

1896-97 12:354 

1897-98 12:368 

1898-99 10:094 

Com  justificado  motivo  o  povo,  na  sua  phrase  humorística,  vae 
chamando  ao  S.  Bento  do  Hospital  a  melhor  gallinha  dos  pobres! 

Fica  a  poucos  passos  de  distancia  a  quinta  do  Fojacal,  onde 
em  novembro  de  1750  appareceu  uma  pequena  talha  lavrada  con- 
tendo mais.  de  mil  moedas  wisigothicas. 


i3S 


SYNCHRONISMOS  DOS  SÉCULOS  XI  E  XII 

Das  Cruzadas  e  das  Ordens  Religiosas  foram,  com  rasão,  de- 
nominados estes  séculos.  Eram  então  frequentes  as  reuniões  dos 
Concílios,  e  as  suas  resoluções  contribuiram  efficazmente  para  o 
bem  estar  geral. 

Alguns  sacerdotes,  despresando  a  prohibicão  decretada  no  an- 
no  de  387,  contrahiam  matrimonio ;  e  o  concubinato  chegou  a 
attingir  taes  proporções  que  os  meios  de  repressão  mais  enérgica 
eram  muitas  vezes  de  effeito  negativo.  Procurou-se  a  extincçáo 
d'esse  escândalo  na  declaração  terminante  de  não  poderem  ser 
admittidos  a  ordens  sacras  os  filhos  dos  ecclesiasticos. 

Os  Bispos,  reconhecendo  a  insuficiência  das  Tréguas  de  Deus 
para  a  consecução  da  paz,  da  moderação  do  vicio  e  do  respeito 
aos  actos  do  culto,  ordenaram  a  suspensão  das  armas  determinan- 
do «que  desde  a  quarta-feira  á  tarde  até  segunda  de  manhã,  em 
todas  as  semanas,  ninguém  atacasse  o  seu  inimigo,  nem  exerci- 
tasse violência  ou  hostilidade  alguma,  e  que  os  que  violassem 
este  regulamento,  sendo  reputados  como  incursos  na  pena  de 
morte,  pagariam  uma  multa  em  comrrutação  d'esta  pena,  ou  se- 
riam excommungados  ou  banidos». 

No  Concilio  Romauum,  celebrado  a  18  de  janeiro  de  io5o„  foi 
coroado  o  Papa  Nicolau  II,  fazendo  a  ceremonia  o  Arcebispo  Hil- 
debrando  que  poz  sobre  a  cabeça  do  Papa  uma  coroa  real  com  a 
inscripção  seguinte  no  circulo  inferior : 

CORONA   REGNI   DE   MANV  DEI. 

No  immediato  :  diadema  imperii  de  manv  petri. 

Não  nos  diz  a  Historia  que  outro  Papa  fosse  coroado  anterior- 
mente a  este,  podendo  por  isso  acreditar-se  que  de  todos  fosse  elle 
o  primeiro. 

A  tiara  é  a  insígnia  do  poder  temporal  dos  Papas  iniciado  com 
as  doações  territoriaes  de  Spoleto,  Ravennas  e  Pentapola.  Pio  VI 
possuía  quatro  de  que  Bonaparte  se  apoderou.  Annos  depois  Na- 
poleão I  offereceu  a  Pio  VII  algumas  pedrarias  para  uma  tiara 
nova. 

Mr.  Eugénio  Muntz,  depois  de  consultar  inventários  e  manda- 


—  i3g  — 

dos  de  pagamento  existentes  nos  archivos  secretos  do  Vaticano, 
diz-nos  que  a  tiara  foi  a  principio  cónica,  depois  tumescida  pelo 
meio  e,  finalmente,  quebrada  no  alto,  onde  poisava  uma  pedra  pre- 
ciosa formando  um  globo  em  que  se  erguia  uma  cruz.  Modificou-se 
quando  o  papado  se  estabeleceu  em  Avignon,  substituindo-lhe  os 
motivos  gothicos  pelos  romanos.  As  três  coroas  sobrepostas  fo- 
ram-lhe  applicadas  sob  o  pontificado  de  Bento  XII  (i338-i342). 

Gregório  VII  (1073  85)  reservou  para  os  Pontífices  de  Roma  o 
nome  de  Papa  que  todos  os  Bispos  usavam. 

No  Concilio  Barcinonense  (1068)  tratou-se  da  substituição  do 
rito  gothico  pelo  romano,  ficando  o  assumpto  para  ser  estudado  no 
Concilio  Burgense  (em  Castella-a-Velha)  no  anno  de  1080,  onde 
definitivamente  el-rei  D.  Aífonso  VI  ordenou  a  adopção  do  rito  ro 
mano  em  toda  a  Hespanha. 

Não  sendo  porém  geralmente  bem  recebido  este  decreto,  pro- 
poz-se  a  decisão  por  meio  de  um  duello,  pelejando  um  cavalleiro 
a  favor  do  rito  gothico  e  outro  a  favor  do  romano.  Venceu  o  go- 
thico ;  mas  o  rei  fez  prevalecer  a  sua  vontade  !  ! 

Em  1072  decretou  se  que  todos  os  presbyteros  ministrassem  o 
baptismo  em  jejum,  salvo  em  caso  de  necessidade,  e  prohibiu-se- 
lhes  que  conservassem  por  mais  de  8  dias  as  partículas  e  a  agua 
benta. 

O  uso  de  queijo  e  ovos  na  quaresma  íoi  prohibido  em  io85 
pelo  Concilio  Quintiliburgense  ;  e  em  1090  inventou  Pedro  Ere- 
mita os  rosários.  Não  obstante,  porém,  conta  a  Chronica  Sera- 
phica  que  a  matriarcha  Santa  Clara  resava  por  pedrinhas. 

Durante  este  século  decorriam  por  vezes  tumultuosos  os  Con- 
cílios, prendendo-se  agora  um  Bispo,  logo  um  Pontífice  em  plena 
assembleia,  só  porque  era  costume,  na  discussão  de  casos  graves, 
dizer  todas  as  verdades.  Para  pôr  cobro  a  desmandos  e  irreve- 
rências resolveu-se  que  as  relíquias  dos  santos  mais  notáveis  es- 
tivessem alli  presentes,  sendo  processionalmente  conduzidas  e 
acompanhadas  por  innumeras  pessoas  cantando  Psalmos,  Hymnos 
e  Ladainhas.  O  clero  ás  vezes  não  queria  restituil-as  e  os  donos 
dispunham-se  a  tomal-as  de  assalto  quando  regressavam  do  Con 
cílio  ás  egrejas,  travando-se  por  isso  desordens  sanguinolentas  cm- 
quanto  os  clérigos  e  os  monges  as  dividiam  entre  si,  desappare- 
cendo  em  seguida. 

O  motivo  de  muitos  indivíduos  do  referido  século  procurarem 
obter  de  Deus  perdão  para  os  peccados  e  remédio  para  os  soffn- 
mentos  physicos,  vivendo  em  continua  romaria  ás  sepulturas  dos 
santos,  era  o  desejo  de  fugirem  ás  responsabilidades  sociaes  da 
epocha  e  de  se  entregarem  ao  ócio  e  á  curiosidade,  pretextando 
uma  piedade  irrequieta  e  falsa,  a  propósito  da  primeira  expedição 
dos  Cruzados  á  Terra  Santa. 


—  J4-0  — 

Os  cenobitas  solitários,  arroteando  matagaes  incultos  onde  vi- 
viam, por  assim  dizer,  entre  feras,  prestavam  á  sociedade  altíssi- 
mos benefícios  temporaes,  porque  os  seus  humildes  cenóbios  fo- 
ram d'esse  modo  mais  tarde  convertidos  em  povoações  importan- 
tes. Esta  circumstancia  é  bem  digna  de  ponderação  para  que  se 
reconheça  ao  menos  este  importante  serviço  dos  humildes  reli- 
giosos. 

Os  leigos  conscienciosos,  usurpadores  dos  bens  das  egrejas, 
temiam  tanto  as  penas  que  os  Concílios  comminavam  contra  elles, 
que  se  apressavam  a  restituil-os  doando-os  aos  Mosteiros.  Os  Bis- 
pos não  viam  com  bons  olhos  este  systema  de  restituições,  mas  os 
monges,  defendendo  os  interesses  da  communidade,  oppozeram-se 
á  opinião  dos  Bispos  e  conseguiram  a  approvação  pontifícia ! 

Por  esse  motivo  os  Mosteiros  se  reproduziam  ricos  embora  a 
Ordem  lhes  designasse  a  profissão  de  pobreza. 

No  anno  de  io5o  o  procurador  do  Mosteiro  de  Guimarães, 
fr.  Fagildo,  queria  prender  Sueiro  Exemeniz  por  ser  accusado 
de  um  homicídio  e  por  se  inculcar  senhor  dos  homens  de  Mata- 
má.  Na  sua  defeza,  Sueiro  alegava  que  a  villa  erat  sua  reritas 
como  já  o  havia  sido  dos  seus  Avós.  fr.  Fagildo  teimava,  quia 
erat,  vertias  da  casa  de  Vimaranes.  Por  fim  esta  questão  foi  deci- 
dida em  Jugueiros  na  presença  de  Gomizo  Eitaz,  grande  numero 
de  homens  bons,  Senhores  de  Guimarães,  (clérigos  e  monges)  e  o 
juiz  da  localidade,  em  favor  dos  frades  e  freiras  que  habitavam  in 
Cimiterio  Vimaranes. 

E'  sabido  que  no  presente  século  foi  quasi  geralmente  abolida 
a  vida  claustral  dos  cónegos  estabelecida  no  século  íx  e  que  alguns 
Bispos  a  renovaram  nas  suas  Cathedraes,  embora  com  tão  grande 
diíferença  que  podiam  receber  curatos  e  outros  empregos  eccle- 
siasticos. 

Por  isso  D.  João  Pires,  no  seu  testamento  datado  de  i23o, 
deixou  ao  Cabido  dos  cónegos  da  Collegiada  de  Guimarães  um 
copo  de  prata  para  seu  filho  beber  por  elle  no  refeitório. 

O  Papa  Alexandre  III,  aconselhado  por  D.  Aftònso  Henriques, 
ordenou  em  1 165  ao  Arcebispo  de  Braga  D.  João  Peculiar  que  de- 
terminasse em  Provisão  que  os  cónegos  da  sua  Sé  não  fossem  mais 
de  quarenta,  que  vivessem  em  communidade,  e  que  não  fossem 
bastardos,  nem  infames,  nem  soberbos.  Alexandre  IV,  em  I2Ô5, 
prohibiu  que  na  referida  Sé  houvesse  mais  de  vinte  e  que  os  res- 
tantes fossem  expulsos.  Bento  XIV,  por  Breve  de  1746,  concedeu 
ás  dignidades  e  cónegos  de  Braga  o  uso  de  solideo,  inclusivamente 
nas  missas.  Egual  concessão  foi  feita  aos  cónegos  da  Collegiada 
de  Guimarães. 

O  sigillo  da  confissão  era  insistentemente  recommendado  por- 
que, com  verdade  ou  sem  ella,  havia  muito  quem  aceusasse  os 


— 14»  — 

padres  de  não  o  saberem  guardar.  A  celebração  de  missas  foi 
reduzida  a  uma  diariamente,  excepto  quando  se  exigissem  para 
suffragio  de  qualquer  defunto.  Aos  padres  que  por  negligencia 
deixavam  cair  a  hóstia  consagrada,  impunham-se  pesadas  peniten- 
cias, e  os  réos  de  grandes  crimes  iam  a  Roma,  com  cartas  dos 
seus  Bispos,  receber  do  Papa  a  penitencia  devida. 

Ainda  n'este  século  se  instituiu  a  commemoração  dos  fieis  de- 
funtos no  dia  seguinte  ao  da  festa  de  todos  os  santos;  e  o  canto 
da  egreja  foi  grandemente  aperfeiçoado  pela  invenção  de  Gui, 
monge  de  Arezzo  na  Toscana,  que  em  1026  descobriu  o  methodo 
das  linhas  da  musica  (escalas)  e  as  claves  (posições). 

No  Concilio  Ovetanum,  celebrado  em  iii5,  adoptaram-se  as 
mais  enérgicas  providencias  e  comminaram-se  penas  graves  contra 
os  que  violavam  os  asylos  sagrados  e  praticavam  roubos  nas 
egrejas. 

A  canonisação  dos  santos  pertenceu  exclusivamente  aos  Me- 
tropolitanos até  ao  século  x  em  que  os  Pontífices  reservaram  para 
si  esse  direito.  Porém  alguns  prelados  não  acataram  a  determi- 
nação pontifícia  e  mantiveram-se  no  propósito  de  continuar  a  exer- 
cer aquelle  antigo  direito.  O  Arcebispo  de  Ruan,  por  exemplo, 
canonisou  em  11 53  S.  Gotiero,  Abbade  de  Pontoise,  sendo  este 
o  ultimo  abuso,  pois  Alexandre  III  os  prohibiu  terminantemente. 

As  Ordenações,  a  administração  dos  Sacramentos,  a  collação 
dos  Benefícios  e  outras  funcções  espirituaes,  que  eram  pagas 
pelos  fieis,  passaram  a  ser  gratuitas,  permittindo-se  comtudo  a 
esmola  voluntária  pela  celebração  da  missa,  que  n'este  século  xn 
era  de  um  soldo,  no  seguinte  de  dois,  e  no  principio  do  xiv  de 
três.  No  anno  de  i52o  celebravam-se  nos  Mosteiros  missas  de  três 
em  renge,  a  canto  e  órgão,  com  assistência  da  communidade, 
por  20  réis  de  esmola!  As  resadas  12  réis,  e  três  annos  depois 
18  réis.  O  Synodo  celebrado  em  Coimbra  no  anno  de  ;566,  ele- 
vou esta  esmola  a  3o  réis.  Em  i5cjo,  el-rei  D.  Manuel,  por  uma 
Provisão  que  dirigiu  á  Misericórdia  de  Coimbra,  concedeu  que 
fosse  de  40  réis  a  esmola  da  missa  resada-,  e  depois  d'isso  as 
Constituições  marcavam  estas  em  120  réis  e  as  cantadas  em  480. 

Antigamente  nem  só  ao  incruento  sacrifício  se  dava  o  nome 
de  missa.  Nos  adros  das  egreja  distribuiam-se  esmolas  pelos  po- 
bres para  estes  resarem  por  alma  de  um  defunto,  e  a  esta  esmola 
chamou- se  missa  dos  pobres.  Em  sufrágio  da  alma  do  defunto 
soccorriam-se  os  Hospitaes,  e  essas  esmolas  denominavam-se  mis- 
sas dos  espritaaes,  etc. 

No  Concilio  Beneventanum,  celebrado  em  abril  de  n  17,  o  Papa 
Paschoal  II  excommungou  o  Arcebispo  de  Braga  D.  Maurício 
Bourdim,  seu  Legado,  por  haver  coroado  em  Roma  o  Imperador 
quando  Sua  Santidade  se  achava  em  Monte  Cassino. 


— 142  — 

No  Nannetense,  em  n  27,  aboliu-se  o  velho  costume  de  serem 
entregues  para  o  Senhor  todos  os  moveis  do  consorte  lallecido; 
e  no  Trecense,  a  i3  de  janeiro  de  1128,  presidido  pelo  Legado 
Matheus  de  Albano,  foi  resolvido  que  se  desse  aos  Templários  a 
Regra  e  o  habito  branco,  por  se  reconhecer  essa  necessidade  du- 
rante os  10  annos  que  a  Ordem  já  contava  de  existência. 

O  uso  dos  Monitorios  foi  introdusido  pelo  Papa  Alexandre  III 
(u59-8i). 

N'este  século  desenvolveu-se  o  uso  das  antigas  mortificações 
voluntárias,  as  disciplinas,  os  cilícios;  e  muitos  dos  fieis  recom- 
mendavam  que  nos  paroxismos  da  morte  os  estendessem  numa 
cama  de  cinza  ou  lhes  vestissem  um  habito  de  monge.  O  costume 
de  juntar  na  cpmmunhão  as  duas  espécies,  pão  e  vinho,  foi  ter- 
minando, havendo  já  nos  fins  do  século  quem  não  recebesse  mais 
que  uma,  como  agora. 

Os  Cruzados  trouxeram  á  Europa  a  enfermidade  da  lepra 
cousiderada  incurável  a  qual,  por  esse  motivo,  era  tratada  numa 
habitação  isolada  chamada  gafaria  ou  Ordem  de  S.  Lazaro,  por- 
que este  santo  também  foi  leprozo.  O  terceiro  Concilio  geral  de 
Latrão  occupou-se  da  Ordenação  dos  Lazaretos  concedendo  lhes 
cgrejas  particulares,  padres  e  cemitérios. 

Todos  os  indivíduos  que  attingiam  o  uso  da  rasão  eram  obri- 
gados a  confessar  ao  seu  parocho  os  peccados  commettidos  du- 
rante um  anno  e  a  receberem,  ao  menos  pela  Paschoa,  a  Sagrada 
Eucharistia,  depois  de  satisfeita  a  penitencia  que  lhes  íosse  im- 
posta, a  qual  então  consistia  na  peregrinação  á  Terra  Santa;  no 
combate  aos  infiéis  durante  certo  numero  d'annos;  em  jejuar  a 
pão  e  agua;  em  não  vestir  seda  nem  linho;  em  mendigar  o  ali- 
mento; em  não  cazar  segunda  vez;  e..  em  se  postar,  nos  dias 
mais  solemnes,  á  porta  da  egreja,  em  camiza,  com  um  feixe  de 
varas  para  com  ellas  ser  fustigado  pelo  clero  e  pelo  povo! 

O  impedimento  de  parentesco  na  celebração  do  matrimonio 
restringiu-se  do  7.0  ao  4/  grau,  e  condemnavam-se  os  que  por 
esse  tempo  se  effectuavam  clandestinamente,  ordenando-se  que  de- 
pois de  justos  fossem  pelo  cura  publicados  na  egreja  a  fim  de  se 
descobrirem  os  impedimentos  que  porventura  houvesse.  Esta  me- 
dida que  se  tornou  geral,  já  em  alguns  logares  estava  estabeleci- 
da. Havia  no  século  vn  uma  classe  de  maridos  denominados  co- 
nuçudos  (conhecidos  como  tal),  que  não  eram  canonicamente  re- 
cebidos. Já  existia  o  casamento  como  hoje  se  usa,  havia  o  con- 
tracto matrimonial  de  que  davam  testemunho  os  parentes  e  visi- 
nhos  na  presença  dos  quaes  era  feito.  Este  systema  prolongou-se 
até  ao  século  xiv.  Outro  era  um  matrimonio  segundo  o  direito  na- 
tural, dependendo  apenas  da  vontade  dos  contrahentes.  Matrimo- 
nio  e   casamento   eram  duas  cousas  distinctas.  O  matrimonio  da 


— 143  — 

mão  esquerda  era  contrahido  por  uma  pessoa  de  elevada  posição 
social  com  uma  mulher  do  povo. 

Até  ao  fim  do  século  xv  continuou  entre  nós  a  usança  dos 
matrimónios  clandestinos,  que  el-rei  D.  Aftbnso  IV  procurara  ex- 
terminar em  i352  com  a  sua  carta  sobre  reformas  ecclesiasticas, 
dirigida  aos  Bispos  do  reino,  dizendo-lhes  que  «muitos  clérigos  se 
achavam  casados»,  e  ordenou  que  «todos  os  recebimentos  fossem 
feitos  pelo  respectivo  parocho,  perante  um  tabellião  da  mesma 
freguezia,  destinado  para  escrever  em  um  livro  todos  os  casamen- 
tos que  alli  se  celebrarem,  para  se  saber  depois  os  que  são  ou 
deixam  de  ser  casados,  e  a  condição  dos  contrahentes». 

Em  1499  conseguiu  el-rei  D.  Manuel  por  termo  ás  inconve- 
niências dos  casamentos  clandestinos,  promulgando  em  14  de  ju- 
lho uma  lei  na  qual  determinava  «que  sem  excepção  de  pessoa, 
todos  se  recebam  publicamente,  em  face  da  egreja,  e  na  forma 
que  os  sagrados  cânones  decretam.  E  casando-se  escondidamente, 
por  esse  mesmo  feito,  assim  o  noivo  como  a  noiva,  percam  todos 
os  seus  bens,  metade  para  a  camera  real  e  metade  para  captivos. 
E  todos  os  que  a  similhantes  casamentos  forem  presentes  ou  tes- 
temunhas, percam  também  todos  os  seus  bens,  com  a  mesma  ap- 
plicação,  e  sejam  degradados  por  dois  annos  para  Ceuta.  Mas 
d'estas  penas  serão  isentos  os  que  taes  casamentos  fizerem  por 
prazer  e  consentimento  dos  pães  e  mães  dos  noivos,  se  os  tiverem, 
porque  n'esse  caso,  haverão  somente  as  pessoas  do  direito  canó- 
nico» !. 

No  Concilio  Tridentino,  convocado  em  1545  pelo  Papa  Pau- 
lo III  e  terminado  em  i563,  foi  julgado  impedimento  derimente  o 
casamento  celebrado  clandestinamente;  ainda  assim  el-rei  D.  João 
IV  não  pôde  deixar  de  decretar,  em  i3  de  novembro  de  i65i,  o 
desherdamento  dos  filhos  destes  matrimónios.  Também  n'aquelle 
tempo  Martim  Paes,  cavalleiro  de  S.  Miguel  de  Lobrigos,  «doou 
a  sua  mulher  Maria  Lourenço,  certos  bens  em  Santa  Comba  e 
em  outras  partes  per  compra  do  vosso  corpo,  concedeu-lhe  a  posse 
emquanto  viva  somente,  perdendo-os  se  casasse  2.  Esta  doação 
era  denominada  praetium  virginitatis,  por  ser  feita  depois  da  pri- 
meira noite  do  consorcio,  quando  o  marido  se  julgava  habilitado 
a  conhecer  de  perto  os  merecimentos  da  noiva. 

Soeiro  Viegas,  em  1190,  fez  a  sua  mulher  D.  Sancha  Vermu- 
des  uma  carta  de  arrhas,  deixando-lhes  muitas  propriedades,  que 
só  possuiria  se  não  casasse. 

El-rei  D.  Affonso  Henriques,  na  carta  que  endereçou  a  Celes- 


1  Ord  do  tfeino.  livro  5,  tit.  27-1514. 
-  Doe.  de  Salsedas. 


—  i44  — 

tino  II,  offereceu  a  S.  Pedro  quatro  onças  de  ouro,  por  si  e  seus 
successores,  pagas  annualmente.  Desta  carta  existe  copia  no  ar- 
chivo  do  Arcebispado,  gav.  das  Not.,  n.°  2,  e  termina  do  se- 
guinte modo:  «Facta  oblationis,  Firmitudis  K.  Idus  Decembris 
E.M.CLXXXI.  Ego  supradictus  Adfonsus,  Portugalensium  Rex, 
qui  hanc  K.  fieri  jussi,  libenti  animo,  coram  idoneis  testibus  pró- 
pria manu  confirmo». 

Durou  este  tributo  até  ao  principio  do  século  xm.  Hoje  existe 
em  todo  o  orbe  catholico  uma  collecta  voluntária  que  se  destina 
ao  mesmo  fim.  O  dinheiro  de  S.  Pedro,  que  estava  estabelecido 
em  Aries,  na  Bohemia  e  na  Polónia,  era  na  Inglaterra  uma  con- 
tribuição expontânea  dos  numerosos  fogos,  paga  para  a  Sé  Apos- 
tólica. 

Terminou* no  tempo  de  Henrique  VIII  em  vista  do  modo  co 
mo   applicavam  a  pena  de  excommunhão  áquelles  que  deixavam 
de  a  pagar. 

Durante  este  século,  e  muito  especialmente  no  anno  de  11 55, 
havia  nos  Mosteiros  um  edifício  denominado  Sanguilexia,  desti- 
nado á  sangra  dura  dos  monges,  de  harmonia  com  o  que  dispunham 
as  Constituições  de  Pombeiro  para  que  fossem  sangrados  de  2 
em  2  mezes,  e  a  fundação  do  Mosteiro  do  Tojal  (Vizeu),  para  que 
as  religiosas  fossem  sangradas  de  6  em  6  mezes. 

A  profanação  das  egrejas,  os  roubos,  a  falta  de  ordem  e  o 
desprezo  pelos  serviços  da  lavoura,  moveram  o  Concilio  de  Ovie- 
do, celebrado  em  iii5,  a  determinar  em  favor  da  agricultura: 
«Que  ninguém  faça  penhora  em  bois,  quer  sejam  mansos,  quer 
bravos:  e  quem  o  contrario  fizer,  seja  maldito,  e  excommungado, 
e  tenha  i5  annos  de  penitencia  publica». 

Sendo  os  Arcebispos  e  o  clero  bracarense  uma  potencia  nos 
primórdios  da  monarchia,  quiz  D.  Aífonso  Henriques  obter  as 
suas  boas  graças,  concedendo-lhes  em  27  de  maio  de  1 128  al- 
guns privilégios  importantes,  entre  os  quaes  o  de  cunhar  moeda, 
com  o  fim  de  serem  applicados  á  fabrica  da  Sé  os  rendimentos 
da  cunhagem  d'ella:  «Et  sicut  Avus  meus  Rex  Alfonsus  dedit 
adjutorium  ad  Ecclesiam  S.  Jacobi  faciendam:  simili  modo  do, 
atque  concedo  Sanctae  Mariae  Brach.  Monetam,  unde  fabricetur 
Ecclesia..  .  Insuper  etiam  dono,  atque  concedo  in  Cúria  mea  to- 
tum  illud,  quod  ad  Clericale  Officium  pertinet,  scilicet,  Capella- 
niam,  et  Scribaniam,  et  caetera  omnia;  quae  ad  Pontificis  curam 
pertinent». 

D.  Aífonso  II  privou  d'estes  rendimentos  a  Sé  de  Braga  ;  e  o 
Pontifice  Honório  III  publicou  um  rescripto,  com  data  de  23  de 
dezembro  de  1221,  ordenando  aos  Bispos  de  Astorga.e  Tuy  que 
fizessem  restituir  á  egreja  bracarense,  entre  outras  cousas,  Cancel- 
lariam,  Capellariam,  e  Monetam  de  que  a  despojara  o  rei.  Tudo 


143- 


Egreja  de  S.  Domingos  (Guimarães) 


—  i4<>  — 

porém  foi  infructifeio,  porque  a  26  de  novembro  de  1 238,  estan- 
do em  Guimarães  el-rei  D.  Sancho  II,  alli  se  concordou  com  o  Ar- 
cebispo D.  Silvestre  Godinho  e  seu  Cabido,  renunciando  estes  ao 
direito  que  tinham  super  Moneta,  Capellania  et  Cancellaria  Domi- 
ni  Regís,  mediante  a  doação  que  o  monarcha  então  lhes  fez  das 
egrejas  de  Ponte  do  Lima  e  Touguinha,  em  'Feiras  de  Faria,  livres  , 
e  isentas  de  todo  e  qualquer  direito  real :  e  as  suas  villas  e  terras 
de  Pedralva,  Gouviães  e  Adauffe  em  terra  de  Panoias,  as  quacs 
mandou  coutar  per  lapides;  sicut  àliud  Cauiam  de  Regno,  quod  me- 
lius  caiitatum  est. 


-147- 
EGREJA  DE  S.  DOMINGOS  (GUIMARÃES) 

('Vide  gravura  a  pag.  145) 

Tendo  os  frades  dominicanos  iniciado  em  1271,  á  entrada  da 
actual  rua  da  Rainha,  a  edificação  do  convento  e  egreja,  concluí- 
ram toda  a  obra  ao  cabo  de  8  annos.  El-rei  D.  Diniz  ordenou 
em  1 323  que  tudo  fosse  derrubado,  visto  achar-se  junto  da  mura 
lha  e  poder  ser  novamente  atacada  a  villa  pelas  tropas  de  seu 
tilho  D.  Aífonso.  Annos  depois  construíram,  onde  ainda  agora  se 
vê,  a  espaçosa  egreja  de  três  naves  em  cinco  arcos  joanninos  e  o 
convento  adjuncto,  con:orrendo  grandemente  para  o  adeantamento 
e  conclusão  da  obra  o  Arcebispo  de  Braga  D.  Lourenço,  João  Aífon- 
so de  Briteiros,  um  Bispo  de  Burgos  e  D.  Maria  de  Berrcdo,  mulher 
de  Ruy  Vaz  Pereira.  A  capella  mor  mede  18  metros  de  comprido 
por  5,72  de  largo,  e  o  corpo  da  egreja  29  metros  por  16, 3o. 

O  corpo  de  São  fr.  Lourenço  Mendes,  mudado  da  parede 
do  altar  de  S.  Braz  para  o  de  S.  Thomaz,  foi  encerrado  num 
sarcophago  de  pedra  com  estes  dizeres  na  frente: 

H1C   SUA    LAVRENTJ    MENDES    SYNT  OSSA  BEATI 

Em  1770,  por  voto  de  Rodrigo  de  Sousa  da  Silva  Alcoforado. 
fez  se  a  porta  principal  que  a  gravura  representa,  magnifica  en- 
trada d'este  templo,  no  dizer  da  inscripção,  mas  em  perfeita  des- 
harmonia  com  o  estylo  da  fachada,  onde  ^e  admira  um  roseta»  ■ 
primoroso.  A  porta  primitiva,  cuja  substituição  de  modo  algum 
se  justifica,  deveria  ser  egual  á  da  egreja  de  S.  Francisco.  No 
alto  da  actual  tem  a  inscripção: 

REGIN-íE   OPTIMjE   MAXIM  V. 

SACRATISSIMI   R0SAR1I 

MAGNIFICO   HVIVS   TEMPLI    LIMINE 

VOTVM  SOLVIT 

1>-   RODERICVS   Dlí   SOVSA  DA    S?    ALCOF  ° 

MDCCLXX 

A  rainha  D.  Maria  II  cedeu  esta  egreja  á  Ordem  Terceira  de 
S.  Domingos,  em  24  de  janeiro  de  i85i.  A  camará  foi  concedido 
o  convento  e  cerca  por  lei  de  27  de  dezembro  de  1870,  e  por 
consentimento  d'esta,  em  3o  de  julho  de  1887,  foi  o  convento  con- 
cedido á  Sociedade  Martins  Sarmento,  que  tomou  posse  d'elle  pe- 
las 6  horas  da  tarde  de  terça-feira  10  de  julho  de  1888,  a  qual  sobre 
a  curiosa  arcada  do  claustro,  que  datado  século  xiv,  fez  reconstruir 
em  1889  a  galeria  que  hoje  serve  de  installação  ao  museu  archeolo- 
gico.  Na  extremidade  norte  collocaram  uma  pequena  pedra  com 
esta  inscripção  em  caracteres  gothicos: 


-  ,4s- 

A   SOCIEDADE    MARTINS   SARMENTO    MANDOV 
RECONSTRVIR   ESTA   GALERIA   SOURE   A  ARCA- 
DA DO  ANTIGO   CLA ASTRO  DO   EXT1NCTO   COX 
VENTO   DE   S-    DOMINGOS   XO   ANNO   DE    1 889 

As  inscripções  lapidares  romanas  e  as  pedras  ornamentadas 
do  museu  acham-se  expostas  sob  a  referida  arcada  de  que  aqui 
dou  gravura  em  parte : 


Arcada  e  andor 


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O  curioso  andor  das  candeias,  que  também  aqui  se  representa. 
foi  salvo  por  minha  intervenção  quando  fundei  no  edifício  da  Or- 
dem de  S.  Francisco  um  pequeno  museu  de  archeologia  christã. 
Encontrei-o,  quasi  de  todo  desfeito,  no  sótão  do  edifício  dos  Paços 
do  Concelho,  sendo  desde  logo  offerecido  á  Sociedade  Martins 
Sarmento. 

Este  andor  era  conduzido  na  procissão  das  marafonas  ou  dos 
pães  bentos,  que  annualmente  se  eífectuava  a  10  de  junho,  em 
cumprimento  de  uma  antiga  promessa  feita  por  occasião  de  grande 
calamidade.  Nesta  procissão,  que  -sarna  da  egreja  de  Santa  Clara 
recolhendo  na  Collegiada,  tomavam  parte  a  Camará  e  o  Cabido. 
O  andor  ia  adornado  de  vellas  de  cera,  que  prefaziam  o  pezo  do 
rolo  com  que  se  devia  cercar  a  muralha  da  cidade. 

Finda  a  festa  eram  benzidos  os  pequeníssimos  pães,  repartin- 
do-se  por  todas  as  auctoridades  e  lançando-se  d'uma  janella  do 
edifício  da  Camará  á  multidão,  que  os  apanhava. 

Nos  primeiros  séculos  da  Egreja,  o  povo  que  assistia  ao  sacri- 
fício incruento  offertava  ao  sacerdote  um  ou  mais  pães,  que,  de- 
pois de  benzidos,  eram  distribuídos  por  todos  em  signal  de  com- 
munhão. 

Os  que  não  offereciam  pão  entregavam  dinheiro  para  a  sub- 
sistência do  Padre  e  conservação  da  egreja,  uma  practica  que 
justifica  o  actual  costume  dos  pedidores  nas  missas.  Os  judeus 
também  offereciam  sacrifícios  a  Deus  depondo  nas  mãos  do  sacer- 
dote o  que  queriam  sacrificar.  O  pão  e  o  vinho  que  no  acto  se 
consagra  era  egualmente  ofíertado  pelos  fieis. 

EGREJA  DE  S.  FRANCISCO  (GUIMARÃES) 

(  Vide  gravura  a  pag.  t4q) 

A  construcçao   da  actual   egreja  e  respectivo  convento  de  X 
Francisco,  foi  auçtorizada  por  el-rei  D.  João  I,  em  carta  que  escre 
veu    de  Braga  no   dia  3   de  novembro  da  era  de   1408  (anno  de 
1 400) . 

A  primeira  fundação  do  convento  teve  logar  na  Fonte  Santa, 
em  tempo  de  D.  Affonso  II;  em  i2cjo,  reinando  D.  Diniz,  veiu  a 
Guimarães  o  Arcebispo  D.  fr.  Tello  e"  lançou  solemnemente  a 
terra  a  primeira  pedra  para  a  segunda  construcçao  na  actual  rua 
de  S.  Damazo,  sendo  finalmente  demolido,  como  o  de  S.  Domin- 
gos, por  ordem  do  mesmo  monarcha  na  occasião  da  guerra  com 
seu  filho. 

A  egreja,  de  uma  nave,  mede  no  corpo  >2'",4o  por  i2m,8o  de 
largo,  ou  antes  ib'n,o,o,  pois  era  esta  a  sua  grande  largura  no  tem- 
po dos  altares  primitivos  ! 


131  


Capella-mór  da  egreja  de  S.  Francisco 


102  — 

A  capella-mór,  toda  azulejada  e  de  abobada  de  pedra  fina  com 
elegantes  nervuras,  considerada  urna  das  melhores  do  reino,  mede 
:om,3o  por  7"', 35.  Tem  7  grandes  janellas  de  estylo  ogival  radiado 
ou  florido,  das  quaes  apenas  existem  duas  livres,  mas  despojadas 
dos  caixilhos  de  pedra.  Outras  duas  que  communicavam  com  as 
capellas  lateraes,  estão  cobertas  com  o  magnifico  azulejo,  e  as 
três  restantes  com  a  tribuna  compósita  de  riquíssima  talha  doura- 
da e  grossas  columnas  torcidas,  entre  as  quaes  existem  em  tama- 
nho natural  as  imagens  de  Santo  António,  S.  Domingos,  S.  Fran- 
cisco e  S.  Thomaz  d'Aquino. 

.Ao  fundo  desta  capella-mór,  mesmo  junto  da  abside,  vé-se  a 
tampa  do  tumulo  da  Duqueza  de  Bragança  D.  Constança  de  No- 
ronha, com  a  sua  estatua  jacente,  criminosamente  abandonada.  Foi 
cila  a  piedosa  senhora,  fallecida  em  cheiro  de  santidade,  quem 
mandou  construir  a  alludida  capella-mór,  onde  então  lhe  deram 
sepultura  condigna  de  que  actualmente  nem  o  logar  se  conhece! 
No  referido  tumulo  havia  a  inscripção  seguinte: 

ALFONS1    CONIVX    DVCIS    HOC  CONSTANÇA    NORONHA 
REGIA  PROGENIKS  CONDITVR  IN    rVMVLO 

Aos  lados  do  arco  veneram-se  as  imagens  de  Santa  Cecília  e 
Santa  Clara,  e  as  capellas  abobadadas  de  pedra  consagradas  ao 
Senhor  Jesus  e  a  Santa  Arma. 

Xas  extremidades  do  transepto.  os  altares  de  S.  Guaiter  ou  do 
Deseendimcnto,  e  o  do  Senhor  da  Paciência  com  um  pequeno  ora- 
tório onde  se  admira  a  pequeníssima  imagem  de  S.  Boaventura 
que  o  representa  assentado  á  meza  em  que  escreve  e  tendo  a  ador- 
nar o  acanhadíssimo  recinto  uma  mobilia  de  execução  esmerada. 
No  corpo  ha  os  altares  collateraes  de  Santo  António,  S.  Francisco. 
S.  José,  Senhora  da  Conceição,  Senhora  do  O',  e  Senhora  do 
Soccorro  com  S.  Matheus.  A  imagem  de  S.  Francisco,  tamanho 
natural,  tem  na  peanha  estes  dizeres: 

G.   BERARD1 

M0DEI.L0   :-COI  l'l 

ROMA    l888 

O  coro  é  sustentado  por  um  arco  abatido,  com  gume.  notável 
pela  sua  elevação  diminuta  e  considerável  distancia  de  uma  á  ou- 
tra extremidade.  A  sacristia,  com  o  tecto  pintado  e  dourado,  tem 
ao  centro  uma  grande  meza  de  mármore  com  embutidos  a  core*-, 
e  pendentes  da  parede  dois  primorosos  quadros  a  óleo,  em  tela. 
representando  a  Família  Sagrada  e  Nossa  Senhora  do  Leite.  Le- 
£íou-os  á  Ordem  o  commissario  fr.  Manuel  Luiz  da  Conceição 
Guimarães.  Pertencem  ã  eschola  romana  (século  xv)  de  que  foi 
fundador  Raphael  Ssnzio  de  Frbino  e  attribuem-se,  com  os  melhò 


1 53 


res  fundamentos,  ao  laureado  pincel  do  pin 
ma  Stroberle,  falletido  com  84  annos  de  e 
no  de  1792.  Pertencem  egualmente  a  este 
altares  da  Sé  de  Braga.  No  claustro,  que  se 
toscanas  e  degual  numero  d'cllas  mais  peq 
tem  profanadas  duas  capellas  da  invocação 
e  de  S.  João  Baptista. 

D'esta,  que  foi  fundada  no  primeiro  qu; 
doutor  Gonçalo  Dias  de  Carva'ho  e  que  se 
frades,  dou  a  photogravur  1  seguinte: 


tor  lusitano  João  Glam- 
dade  em  Lisboa  no  an- 
auetor  os  quadros  dos 
compõe  de  44  columnas 
uenas  na  varanda,  exis- 
dc  S.  Pedro  e  S.  Paulo. 

arte!  do  século  xvi  pelo 
rviu  para  o  capitulo  dos 


Os  profanadores  âpplicaram  aos  três  bellos  arcos  da  frente  gros- 
sas camadas  de  cal  que  desfiguraram  a  ornamentação  dos  capiteis. 

Hoje   serve    de    deposito  de  madeiras  e  ferros  velhos,  conscr 
vando-se  milagrosamente  as  curiosas  grades  de  madeira  de  casta- 
nho que  vedam  a  porta  e  as  janellas. 

Sobre  a  portaria  do  extincto  convento  fundei  em   [890  um  pe- 


—  ID4  — 

queno  museu,  cuja  inauguração  se  efrectuou  no  domingo  3  dè 
agosto  cio  referido  anno.  Entre  outros  objectos  de  valor  consegui 
reunir  alli  um  grande  quadro  a  óleo  em  madeira,  representando  um 
milagre  de  S.  Francisco,  outro  egualmente  grande  representando 
a  rainha  I).  Mafalda,  fundadora  do  convento  da  Costa,  outro  em 
cobre  representando  o  acto  heróico  de  Judith,  etc.  Também  alli  ^e 
encontra  a  grade  do  milagre  com  estes  dizeres  : 

I  STA   HE  A   REDE  Q  ST. O  ANT.O  LANÇOU  SOBRE   0    LADRAM 
MANOFL    DIAS,    A    20   DE   ABRIL   DE    iyiO 

•Da   primitiva   fachada   da   egreja   apenas   resta  intacta  a  porta 
principal,  estyío  joannino: 


T>n}àt.%r. 


Porta  principal  cia  egreja  cie  S.  Francisco 


—   \DD     - 

Os  dois  gigantes  lateraes,  que  deviam  ser  chanfrados  na  extre- 
midade superior,  rematam  em  pirâmides  de  pedra,  erro  egual  ao 
da  cruz  latina  que  o  memorável  temporal  de  3i  de  dezembro  de 
1897  houve  por  bem  derrubar.  Aproveitando  este  ensejo  consegui, 
com  o  auxiho  do  illustre  membro  da  Meza  sr.  M.  M.  Barbosa  de 
Oliveira,  auctorisação  para  delinear  outra  cruz  apropriada,  a  qual 
foi  feita  pelo  mestre  pedreiro  Ricardo  Leite  e  collocada  ás  6  horas 
da  tarde  do  dia  27  de  junho  de  1898,  dispendendo-se  com  esta 
obra  a  quantia  de  20:000  réis. 

A  photogravura  da  egreja  representa  a  pouca  distancia,  no  lo- 
gar  primitivo,  o  cruzeiro  quinhentista  posto  alli  por  mandado  do 
padre  Mestre  fr.  António  Fernandes,  no  anno  de  043  a  demarcar 
o  terreno  que  pertenceu  aos  frades  e  portanto  a  jurisdição  da 
Ordem. 

A  Meza  actual  não  se  oppoz,  como  devia,  á  resolução  da  Ca- 
mará Municipal  que  no  mez  de  março  d^ste  anno  o  removeu 
para  junto  da  parede  norte  da  egreja.  O  pedestal  tem  ao  centro 
uma  inscripção  apagada  que  por  esse  motivo  se  reproduziu  na 
frente  por  estas  simples  palavras: 

O    PAhl'!:    Ml  S  I 
]•    AMO    I  5  4-3 

Em  18GG,  sendo  secretario  José  Ferreira  d1  Abreu,  foram  com- 
prados por  _po:ooo  réis  os  paramentos  de  lhama  e  a  seguinte 
riquíssima  capa  bordada  a  matiz  e  ouro  com  pedras  preciosas: 


—  )5<>  — 

Um  arco  de  volta  inteira  que  se  divisa  na  parede  a  que  en- 
costa o  cruzeiro,  fez  parte  da  extincta  capella  de  S.  Gualter,  para 
onde  foram  trasladados  pelo  D.  Prior  de  Guimarães  D.  Fulgencio. 
filho  do  Duque  de  Bragança  D.  Jayme,  os  ossos  do  venerável 
santo.  Na  sua  sepultura,  que  o  povo  de  Guimarães  mandou  fazer 
ao  patrono  da  cidade  e  discípulo  de  S.  Francisco,  no  anno  de  1577, 
por  voto  quatro  vezes,  renovado,  gravou-se  esta  inscripção: 

GVALTERI-  TEGIT-   HOC  •  VENERABILIS  •   OSSA  •   SEPVLCHRVM  • 

Tinha  no  alto  esta  inscripção  allusiva  ao  voto  do  povo,  gra- 
vada numa  padieira  de  pedra  que  felizmente  ainda  se  conserva 
á  porta  da  cosinha  do  extincto  convento: 

DIVO-    GVALTHERO      I»      I       D-    VIMARAN-    PATRONO-    INS 
TAVRATI  ■   FESTI ■   VOTO-    lllí  ■    ANNO   QVE  ■   MDLXXVI1  •    P-    V-    I-   C- 


A'  entrada  do  largo  das  Carvalhas,  junto  do  arco  que  alli  ha- 
via, representou-se,  no  dia  8  de  abril  de  i8o3  (sexta- feira  Santa), 
o  descimento  da  cruz,  dispendendose  com  essa  representação 
mais  de  doze  contos  de  réis!  O  monte  Calvário  elevava-se  bas- 
tantes metros  acima  do  solo.  Com  estudantes  organizou-se  a  guar- 
da romana,  e  as  principaes  figuras  eram  representadas  por  padres 
e  frades.  O  padre  Bernardo  Rôlla,  representando  S.  João,  maii- 
teve-se  por  espaço  de  3  horas  numa  posição  forçada  com  admi- 
ração dos  muitos  milhares  de  espectadores  que  se  accumulavam 
no  largo  e  pelos  telhados  em  terraços  expressamente  construídos. 
Disse-se  então  que  não  havia  em  todo  o  reino  memoria  de  tão 
pomposa  commemoração  religiosa. 


Na  grande  praça  que  fica  próximo  d'esta  egreja  vê-se  a  esta- 
tua de  D.  Affonso  Henriques,  em  bronze,  com  esta  inscripção  na 
frente  do  pedestal  de  mármore : 

A   D     AFFONSO 

HENRIQVES 
A   CIDADE   DE 

GVIMARAES 
MDCCCLXXXVI1 

Ao  fundo  da  estatua  lè  se :  «188/  fundição  de  Massarcllos. 
Porto»  —  ,1.  S.  dos  Reis,  esailp. 


Este  monumento,  embora  o  pedestal  não  corresponda  á  vasti- 
dão da  praça,  faz  honra  ao  fallecido  esculptor  António  Soares  dos 
Reis  e  ao  architecto  José  António  Gaspar. 

A  estatua  chegou  a  Guimarães  ás  2  horas  da  madrugada  de 
segunda-feira  19  de  setembro  de  1887,  tirada  por  duas  juntas  de 
bois.  As  3  horas  da  tarde  de  20  de  outubro  do  referido  anno  foi 
inaugurada  na  presença  da  família  real  que  depois  da  1  hora  da 
tarde  havia  chegado  de  Braga.  O  chorado  monarcha  D.  Luiz  I  e 
o  príncipe  D.  Carlos  (hoje  Rei)  desceram  do  pavilhão  que  para  o 
acto  loi  construído  sob  a  direção  do  scenographo  portuense  Gui- 
lherme Augusto  Alves  de  Lima,  e  descerraram  a  estatua  que  estava 
coberta  com  a  bandeira  nacional.  Quem  primeiro  photographou 
o  monumento  foi  o  sr.  Leon  Ardau,  do  Porto.  A  grade  de  ferro 
collocou-se  a  6  de  setembro  de  1888. 

A  família  real  também  n'esse  dia,  ás  3  horas  da  tarde,  lançou 
a  primeira  pedra  para  o  edifício  da  eschola  industrial,  collocando 
se-lhe  numa  cavidade  um  pequeno  cofre  de  prata  contendo  moe- 
das. A  pedra  tem  esta  inscripção:  —  S.  M.  el-rei  D.  Lui\  I,  n<> 
dia  20  de  outubro  de  i8Sj,  collocou  a  pedra  fundamental  da  es- 
chola industrial  Francisco  d' Hol landa. 


SYNCHRONISMOS  DOS  SÉCULOS  XIII  E  XIV 

No  Canon  xxi  do  iv  Concilio  Lateranense  (duodécimo  geral) 
celebrado  em  novembro  de  121 5.  renova-se  o  decreto'  do  século 
antecedente  sobre  a  confissão  sacramental,  pela  vez  primeira  orde- 
nada geralmente,  communhão  na  paschoa,  etc,  sob  pena  de  serem 
expulsos  da  egreja  e  privados  de  sepultura  ecclesiastica.  Presume-se 
que  esta  medida  tendesse  a  prevenir  os  fieis  contra  os  erros  dos 
Albigenses  que  se  julgavam  dispensados  d'estes  actos  para  obte- 
rem a  remissão  dos  peccados,  porque  ainda  8  annos  depois  o 
Cardeal  Conrado,  Bispo  do  Porto  e  Legado  em  França,  celebrou 
no  dia  6  de  julho  o  xxu  Concilio  Parisiense,  acerca  da  referida 
seita. 

A  lucta  continuou  terrível,  e  o  Legado  João,  Cardeal  e  Bispo 
de  Sabina,  celebra  no  anno  de  1228,  em  Portugal,  o  Concilio 
Lusilanum  que  fulminou  a  pena  de  excommunhão  contra  quem 
impedisse  as  liberdades  da  egreja  e  dos  seus  ministros,  o  socego 
e  a  honra  das  religiosas  clausuradas. 

Os  Cruzados  e  vários  outros  christãos  guerreavam  e  matavam 
os  Judeus  confiscando  por  vezes  os  seus  haveres;  estes  excessos 
foram  porém  rigorosamente  prohibidos  pelo  Concilio  Turonense 


— 158  — 

em  io  de  junho  de  1286  com  um  Estatuto  de  14  artigos  em  que 
se  principia  por  aconselhar  aos  fieis  inteira  humanidade  «pois 
que  a  egreja  os  soffre,  não  querendo  a  morte  do  peccador,  mas 
que  se  converta». 

No  xm  Concilio  geral,  primeiro  Lugdunense,  celebrado  a  28 
de  junho,  5  e  17  de  julho  de  1246,  o  Papa  Innocencio  IV  deter- 
minou que  os  Cardeaes  usassem  o  barrete  encarnado  «como  sym- 
bolo  da  diposição  em  que  deviam  estar  de  derramar  o  seu  sangue 
pelos  interesses  da  Egreja».  Esta  côr  do  barrete  passou  também 
a  ser  a  dos  seus  vestidos,  muito  pouco  tempo  depois. 

Gerardo  de  Malemort,  Arcebispo  de  Bordéus,  publicou  no 
Concilio  Burdigalense,  que  teve  logar  a  i3  de  abril  de  1 255,  uma 
constituição  composta  de  3o  artigos,  ordenando  um  d'elles,  o  5.", 
que  na  communhão  da  paschoa  se  ministrasse  aos  meninos  pão 
bento  em  logar  da  hóstia  consagrada. 

O  Sacramento  da  confirmação  era  antigamente  ministrado  ás 
creancinhas,  como  se  deprehende  do  terceiro  dos  17  Cânones 
feitos  em  1260,  no  Concilio  Arelatense,  presidido  por  Florentino 
Arcebispo  de  Aries,  quando  determina  que  esse  Sacramento  seja 
recebido  em  jejum,  excepto  pelos  meninos  que  ainda  mammam. 
O  artigo  4.0  da  constituição  feita  no  Concilio  Tarraconense  em 
1294,  poz  termo  ao  banquete  que  entre  nós  os  parochianos  costu- 
mavam pedir  aos  seus  curas,  o  que  estes  faziam  por  praxe  antiga 
com  avultado  dispêndio. 

A  ordem  Dominicana  foi  approvada  por  Honório  III  em  duas 
Bulias  datadas  de  dezembro  de  12 16. 

Foi  Gregório  X  (1271-76)  quem  primeiro  ordenou  que  em  se- 
guida á  morte  do  Papa  os  Cardeaes  se  conservassem  fechados  em 
conclave,  não  saindo  sem  terem  feito  a  eleição  do  novo  Pontífice. 
A  respectiva  Constituição  determina  que  «quando  a  eleição  não  se 
concluisse  nos  três  primeiros  dias,  teriam  os  Cardeaes  um  só  prato 
a  hora  de  comida  nos  5  dias  seguintes,  e  que  findo  este  termo  se 
lhes  daria  somente  pão  e  agua  emquanto  não  terminasse  o  acto 
eleitoral.»  Com  todo  este  rigor  quiz  Gregório  X  prevenir  intrigas 
e  delongas  \  mas  os  seus  successores,  Innocencio  e  Hadriano  V, 
fizeram  todo  o  possível  por  obstar  á  execução  da  lei,  revogando-a 
por  fim  o  notável  Pontífice  portuguez  João  XXI. 

Celestino  V  e  Bonifácio  VIII  vendo  que  se  renovavam  os  velhos 
inconvenientes,  restabeleceu-a  e  ordenou  que  fosse  observada  inin- 
terruptamente. 

No  anno  de  1247  teve  principio  em  Liége  a  festa  do  SS.  Sa- 
cramento, sendo  em  1264  ordenada  a  sua  celebração  em  todo  o 
mundo  catholico,  por  Bulia  de  Urbano  IV.  Em  22  de  maio  de 
1820  resolveu-se  que  fosse  exposto  e  que  sahisse  processional- 
mente. 


—  i  bq  — 

O  Jubileu  do  Armo  Santo  foi  instituído  cm  i3oo  por  Bonifácio 
VIII.  para  ser  celebrado  no  ultimo  de  cada  século.  Clemente  VI 
determinou  que  a  sua  celebração  tivesse  logar  aos  5o  annos,  e 
Paulo  II  aos  25,  como  ora  é. 

Egualmente  n'este  século  xm  foi  estabelecida  a  festa  da  Con- 
ceição de  Maria,  e  crê-se  que  o  seu  começo  tivesse  logar  na 
egreja  de  Nossa  Senhora  de  Pariz.  Em  12S8  o  Bispo  da  capital 
franceza,  Reynaldo  de  Homblieres,  legou  á  sua  cathedral  uma 
importante  somma  destinada  ao  alludido  fim.  De  Viterbo  expede 
Clemente  IV  uma  Bulia  datada  de  1267  em  que  ordena  ao  Pro 
\incial  dos  Dominicos,  em  Hespanha.  que  encarregue  dois  frades 
de  pesquizar  os  herejes  em  toda  a  sua  Província,  a  que  então  per- 
tenciam os  conventos  de  Portugal,  Castella  e  Navarra.  A  divisão 
d'esta  Província  em  três  —  Portugal,  Hespanha  e  S.  Thiago  — foi 
mais  tarde  determinada  pelo  considerável  augmento  que  attingiu. 

El-rei  D.  Fernando  III  (o  santo)  instituiu,  em  1240.  o  piedoso 
costume  de  servir  á  meza  12  pobres  na  ceia  que  lhes  dava  em 
quinta-feira-maior  depois  do  lava-pedes. 

No  xiv  Concilio  geral  de  Leão,  celebrado  desde  7  de  maio  a 
17  de  julho  de  1274,  e  presidido  pelo  Papa  Gregório  X,  reconci- 
liaram-se  os  gregos  com  os  latinos  submettendo-se  ás  leis  da  Egreja 
Romana  e  reconhecendo  a  Primazia  Papal. 

Começou  neste  século  o  uso  geral  dos  órgãos  nas  egrejas. 
tendo  apparecido  o  primeiro  no  armo  de  757,  na  egreja  de  S.  Cor- 
nelio,  em  Compiègne. 

A  invenção  é  attribuida  por  uns  a  David  e  por  outros  ao  im- 
perador dos  chins  Hoang-Ti  (2:601  annos  ant.  de  J.  C.) 

Falleceu  em  maio  de  1277,  por  effeito  de  desabar  sobre  elle  o  edi- 
ricio  dos  Paços  que  acabava  de  fazer  construir  em  Viterbo,  o  Pon- 
tífice portuguez  de  nação  Pedro  Hispano  (João  XXI)  que  nascera 
em  Lisboa  e  fora  Arcediago  de  Vermoim,  D.  Prior  de  Guimarãe- 
e  Arcebispo  de  Braga.  Foi  sepultado  em  S.  Lourenço,  gravando- 
se-lhe  na  sepultura  este  epitaphio:  ioaxni  i.vsitani  xxi  •  i-ontifica- 

TVS   MAX  •   SVl   MEXSE   Vrií  •   M0RITVR  MCCLXXVII  • 

O  século  immediato  denominou-se  da  artilheria  por  então  se- 
rem inventadas  as  armas  de  fogo  a  que  pela  vez  primeira  a  His- 
toria se  refere  no  anno  de  1342,  quando  ArTonso  IX  as  empregou 
com  vantagem  contra  os  Mouros  no  cerco  de  Algezira. 

O  segundo  dos  oito  cânones  publicados  no  Concilio  Toleta- 
num,  a  21  de  novembro  de  1824,  determina  que  os  clérigos  sejam 
barbeados  ao  menos  uma  ve\  cada  mt>-x\ 

O  Arcebispo  de  Braga  D.  Martinho,  que  em  129G  publicou 
uma  Constituição  desonerando  do  património  com  que  os  paro- 
chos  exercitavam  a  Hospitalidade,  todas  as  egrejas  que  não  ren- 
dessem mais   de   80   libras   de   dinheiro  portuguez  (i:328  réis!). 


—  i6o  - 

ordenou  em  i3oq  que  se  pagasse  di\imo  dopam  e  do  vinho,  do 
linho,  da  ferram,  da  lãa,  «e  de  todDs  os  parimentos  das  ovelhas. 
Outro  si  das  Dizimas  pessoaes  stabelecemos,  e  mandamos,  que 
os  Mercadores,  que  vendem  os  pannos  de  cóor,  que  soyam  em 
outro  tempo  de  dar  huum  maravidil  de  Leonezes :  que  dem  hora 
'hi  soldos  de  Portugal;  cá  achamos,  que  tanto  monta  no  maravidil 
dos  Leonezes  d' outro  tempo». 

Os  maravidis  portuguezes  valiam  então  27  soldos,  ou  27  reis 
brancos. 

O  desejo  de  accumular  prebendas,  honras,  benefícios,  levou 
muitos  Bispos  e  Abbades  a  presença  do  Papa  que  adulavam, 
deixando  abandonadas  as  Diocezes  e  os  Mosteiros.  As  Ordens 
mendicantes  aproveitaram  algo  com  esta  sede  de  dinheiro  e  de 
prosápia,  porque  o  fieis  concorriam  então  mais  que  nunca  aos 
seus  templos  affeiçoando-se  aos  religiosos  e  ás  corporações  de  que 
estes  faziam  parte. 

Quando  Clemente  V  notou  a  vulgarisaçao  das  Commendas, 
arrependeu-se  da  facilidade  com  que  as  havia  dado.  Revogou-as 
Bento  XII,  mas  nem  por  isso  os  seculares  deixaram  de  possuir 
numerosas  e  ricas  Abbadias  que  os  Papas  continuaram  a  cohferir- 
Ihes  sob  aquella  denominação. 

Redundou  em  desproveito  da  Egreja  a  frequência  de  excom- 
munhões  e  interdictos,  n'este  século,  porque  os  excommungados, 
que  eram  aos  milhares,  principiaram  a  relaxar-se  deixando  de 
implorar  a  absolvição,  e  muita  gente  reagia  contra  a  prohibição 
expressa  de  todo  o  trato  com  ellès. 

São  sempre  maus  os  excessos. 

A  abstinência  dos  sabbados,  que  os  seculares  não  guardavam. 
foi  pela  primeira  vez  determinada  para  todos  os  ecclesiasticos. 

Diz-se  que  Santo  António  de  Lisboa  instituiu  para  o  tempo  da 
Semana  Santa  a  Disciplina  publica  de  sangue,  muito  edificante, 
diíferente  da  barbara  FlcCgellaçãò  que  em  1260  instituiu  em  Pe- 
ruza  o  Heremitão  Rainier. 

O  mesmo  Santo,  estando  em  Tolosa,  escreveu  a  Gil  Anncs, 
capellão  de  Santa  Sancha,  infanta,  animando-o  a  supportar  com 
coragem  os  seus  trabalhos  e  afHicções  que  nunca  apparecem  des- 
acompanhados : 

«Nem  vos  esgaraviseis  com  a  mansilla  dos  vossos  Marteviros  : 
bem  mostram  serem  mesquinhos;  pois  quando  fagam  cilada,  som 
de  gram  companha  teudos». 

Assignou  a  carta  do  seguinte  modo:  Fr.  António  de  la  Vera 
Cruz. 

O  Papa  Innocencio  IV,  em  Bulia  datada  de  i^Sq,  determinou 


—  i6i  — 

que  os  Arcebispos  de  Braga,  quando  visitassem  a  sua  Archidio- 
cese,  apenas  recebessem  de  Procuração  e  Colheita  um  marco  de 
prata  (3 :34o  réis?) 

Em  carta  circular  dirigida  por  el-rei  D.  Affonso  IV  aos  Bispos, 
em  23  de  fevereiro  de  i352,  recommenda-se  a  creação  de  um 
livro  para  assentos  de  casamentos. 

« 

EGREJA  DA  MIZERICORDIA  (BRAGA) 

Está  situada  no  alto  da  rua  Nova  de  Sousa  e  encosta  ao  claus- 
tro de  S.  Geraldo,  da  Sé,  com  o  qual  tem  communicação  interior. 
A  fachada,  muito  parecida  com  a  da  Mizericordia  de  Guimarães, 
é  de  riquíssima  esculptura.  A  porta  de  arco  é  de  volta  inteira  ;  de 
cada  lado  tem  duas  grandes  columnas  compósitas  striadas,  e  sobre 
ellas  outras  mais  pequenas  que  ladeiam  nichos  vasios.  O  frontão 
recebeu  um  accrescimo  em  1891,  substituindo-se  por  essa  occasião 
a  cruz  que  o  encimava,  pequena  como  todas  as  da  epocha,  prejudi- 
cando-se  d'este  modo  o  estylo  architectonico  d'aquelle  bello  edifício. 

Na  frente  da  porta  principal  havia  uma  varanda  com  escada 
para  o  poente,  e  sob  ella  a  imagem  de  S.  Geraldo  e  uma  fonte 
que  d'elle  tomou  o  nome.  Nos  primórdios  do  século  xvm  desfez-se 
a  escada  e  retirou-se  a  imagem,  ficando  a  fonte  sob  os  degraus  da 
frente.  Esta  fonte,  cuja  porta  se  conserva  aberta  quando  a  agua 
potável  da  cidade  é  insuínciente,  denomina-se  da  Preta. 

Fundada  na  capella  de  Jesus  ou  de  Nossa  Senhora  da  Piedade. 
do  claustro  da  Sé,  a  santa  instituição  de  fr.  Miguel  de  Contreiras, 
da  Ordem  da  Trindade,  fallecido  a  29  de  janeiro  de  i5o5, *  foi  an- 
nos  depois  mudada  para  a  extincta  capella  de  Santa  Anna ;  no 
anno  de  i5Go,  tendo  precedido  accordão  da  meza  em  data  de  2 
de  janeiro  de  1 558,  sendo  seu  Provedor  Balthazar  Paes,  e  por  con- 
sentimento da  camará  municipal  e  do  Arcebispo  por  sua  provisão 
de  12  de  março  do  mesmo  anno,  deu-se  principio  á  actual  egreja 
no  local  em  que  havia  umas  moradas  de  casas  de  Branca  d'Aze 
vedo,  viuva  de  Diogo  Lopes  Homem,  e  outras  da  Mitra,  as  quaes 
D.Diogo  de  Sousa  lhe  offerecera, pela  cedência  da  capella  de  Jesus. 

A  obra  de  pedreiro  terminou  em  1362,  data  que  se  vê  gravada 
no  alto  do  frontespicio ;  porém  só  ao  cabo  de  9  annos,  em  22  de 
maio  de  1Õ71,  é  que  a  confraria  occupou  definitivamente  a  egreja, 
eífectuando-se   a  transferencia   com  uma   procissão   solemne    em 


1  Em  Alvará  datado  de  26  de  abril  de  1627,  ordenou-se  a  todas  as  Mizericor- 
dias  a  execução  do  Accordão  de  i5  de  setembro  de  1576  que  determinou  a  pin- 
tura do  retrato  de  fr.  Miguel  na  bandeira  da  Mizericordia  com  as  iniciaes 
F.  M.  I.  (Frei  Miguel  Instituidor). 


11 


102 

que  se  cncorporou  o  Arcebispo  D.  fr.  Bartholomeu  dos  Martyres. 

A  primitiva  tribuna  d*esta  formosa  egreja  é  toda  de  granito 
fino,  pintado  e  dourado.  Está  hoje  vedada  por  outra  de  madeira 
de  riquíssima  talha.  O  frontal  do  altar-mór  é  primorosamente  es- 
culpturado  em  madeira,  representando  em  alto  relevo  o  milagre 
dos  pães.  Do  lado  da  Epistola  tem  o  altar  do  Sacramento. 

Esta  egreja  foi  solemnemente  benzida  na  quinta-feira  5  de  de- 
zembro de  1895,  por  terminarem  pouco  antes  as  grandes  obras  de 
pintura  e  douramento  que  a  tornaram  digna  da  visita  de  aprecia- 
dores exigentes.  Do  douramento  foi  encarregado  o  sr.  José  da 
Cunha,  e  da  pintura  decorativa  das  paredes  e  tecto  o  sr.  Domin- 
gos A.  Teixeira  Fanzeres  que  se  revelou,  como  sempre,  artista 
de  muito  mérito. 

EGREJA  DA  MIZERICORDIA  (GUIMARÃES) 

A  edificação  d'esta  egreja.  com  frente  para  o  largo  do  mesmo 
nome,  deve-se  á  iniciativa  de  Pedro  de  Oliveira,  cavalleiro  de  S. 
Thiago,  que  lhe  deu  principio  no  anno  de  1 588.  Foi  para  alli  tras- 
ladada em  1606  a  irmandade  que  se  havia  fundado,  ânuos  antes, 
na  capella  de  S.  Braz,  dos  claustros  da  Collegiada. 

A  fachada,  elegantíssima,  semelhante  á  da  egreja  da  Mizericor- 
dia  de  Braga,  pertence  á  ordem  corinthia,  e  tem  no  alto  uma 
imagem  de  Nossa  Senhora  da  Mizericordia  com  estes  dizeres  so- 
bre o  nicho : 

ESTOTE    M1ZERICORDES 

No  corpo  da  egreja,  que  mede  22,70  por  9,80,  ha  os  altares 
do  Senhor  da  Pedra  Fria,  S.  Bento,  instituido  pelo  dr.  João  Car- 
neiro de  Moraes,  Senhor  da  Canna  Verde,  Senhora  das  Dores  e 
Senhora  da  Paz,  fundado  por  Francisco  José  Mendes  que  o  dotou 
com  missa  quotidiana.  Ao  centro  existe  esta  inscripção  gravada  em 
campa  raza : 

AQVI    JAZ  .10  DE  JANR0  d'    1817 

ZE    LOPES    DA  pf  MEMORIA 

CUNHA  VELHO  DA  SUA  CARlOE 

O    MAIOR  BEM  A  ILLMA   MEZA 

FEITOR  DESTA  DESSE  TEMPO 

SANTA   CAZA  MANDOU   LAVB 

DESDE  A   SUA  ESTA  INSCRIP3 

INSTITUIÇÃO  E   Q  NESTA   SEPE* 

ATHE  ODIA  DO  SE    NÃO  INTER 

SEO   FALECIMTO  RASSE    MAIS    ALCM 

Q    FOI    AOS    l3    , 


-  i63- 

A  capella-mór  mede  9,90  de  comprido  por  q  de  largo. 
A  bandeira  da  irmandade  tem  d'um  lado  estes  dizeres  : 

UNDE    HOC   MIHI   UT  VENIAT 
MATER   DOMIN1   MEI   AD    ML!  ? 

De  onde  me  vem  isto,  que  a  mãe  do  meu  Senhor  venha  a  mim  ? 

Do  outro  lado  f.  m.  i.  (Frei  Miguel  Instituidor). 
O  tecto   da  egreja  foi  de  madeira  apainelado.  Hoje  é  todo  co- 
berto de  estuque  com  trez  figuras  em  relevo  representando  as  virtu 
des  theologaes  -Fe,  Esperança  e  Caridade. 

A  escadaria  de  pedra  que  dá  passagem  para  a  casa  do  despa- 
cho e  coro  da  egreja,  foi  construída  em  1640.  Por  baixo  teve  uma 
fonte  publica. 

A  parte  restante  d'este  edifício  que  alinha  com  a  antiga  rua  da 
Arrochella,  foi  construída,  como  fica  dito  a  pag.  122,  com  a  pedra 
da  torre  e  pardieiros  do  Morgado  dos  M>randas,  vendida  á  Mize- 
ricordia  por  140:000  réis  no  dia  17  de  janeiro  de  1667. 

Esta  venda  foi  feita  por  Filippe  Pereira  do  Lago  e  seu  filho 
Manuel  Machado  de  Miranda,  descendentes  de  Gil  Lourenço  e 
a  mulher  d'aquelle,  Joanna  Gonçalves,  os  quaes,  aos  4  de  agosto 
de  1430,  instituíram  o  referido  Morgado  no  largo  fronteiro  á  egreja 
da  Mizericordia. 

Os  dois  primorosos  retratos  a  óleo,  existentes  na  alludida  casa 
•do  despacho,  foram  pintados  pelo  insigne  Roquemont,  filho  do  Prín- 
cipe allemao  Frederico  dHesse  Darmstadt,  o  qual  esteve  hospe- 
dado em  casa  do  conde  da  Azenha,  e  representam  Vicente  Pimenta 
de  Lemos  Sousa  Menezes,  fallecido  no  dia  i.°  de  fevereiro  de  1834, 
•e  o  capitão  Francisco  da  Silva  Guimarães  Pinto. 

A  confraria  foi,  no  seu  principio,  administrada  por  homens  de 
elevada  representação  social,  como  o  D.  Prior  de  Guimarães,  D. 
Fulgencio,  filho  de  D.  Jayme,  quarto  Duque  de  Bragança;  D.  An- 
tónio de  Lima,  alcaide-mór  de  Guimarães,  e  outros  muitos. 

Sendo  a  confraria  denominada  irmandade  desde  o  anno  de 
1 585,  teve  por  primeiro  Provedor  António  Pereira  da  Silva,  fidalgo 
da  casa  real  e  cavalleiro  da  Ordem  de  Christo.  Nos  dois  annos  im- 
mediatos  foi  este  cargo  desempenhado  por  Francisco  Ribeiro  de 
Carvalho,  commendador  de  Unhão,  sendo  escrivão  Pedro  de  Oli- 
veira iniciador  das  obras  da  egreja. 

Em  1661  foi  Provedor  o  activíssimo  D.  Prior  D.  Diogo  Lobo 
da  Silveira. 

Na  torre,  que  fica  ao  lado  esquerdo  da  capella-mór,  collocou-se 
em  princípios  de  abril  de  1899  um  novo  sino  que,  por  incumbência 
do  então  thesoureiro  Alfredo  Bellino,  meu  estimado  irmão,  man- 
dei fundir   em  Braga  na  fabrica  dos  srs.  José  Maria  Rebello  da 


—  IÓ4  — 

Silva  &  C.a.  Este  sino,  que  pesa  484'^  ,704,  mede  o,Q2  de  altura 
por  0,99  de  diâmetro  no  bordo,  e  tem  sob  a  imagem  da  Virgem 
os  dizeres  seguintes  : 

ESTOTE    MIZERICOKDES 

-}-XP-   V+XP-   R-j-XP     ip-j- 

A  MEZA   DE    1898-1899 

ME    FVNDERE    FECIT 
ANNO  DOMINI   MDCCCXCIX 

Leitura  —  «Sede  mizericordiosos.  Ghristo  vence,  Christo  reina> 
Christo  impera.» 

A  meza  de  1898-99  me  fez  fundir.  Anno  de  1899  do  Senhor. »- 
No  bordo  tem  a  antiga  marca  da  fabrica : 

JOANNES   FERREIRA 
LIMA   ME   FECIT 
BRACARAE 


SYNCHRONISMOS  DO  SÉCULO  XV 

E'  bem  certo  o  que  Viollet-Le-Duc  disse  da  architectura,  con- 
siderando-a  entre  todas  as  artes  como  a  de  mais  affinidades  «com 
os  instinctos,  com  as  idéas,  com  os  interesses,  com  os  progressos 
e  com  as  necessidades  dos  povos». 

A  influencia  racionalista  nas  construcçoes  que  a  theologia  ins- 
pirava, principiou  a  revelar-se  pelo  cinzel  do  artista  do  século  xm. 
O  grande  S.  Bernardo  quiz  já  então  evitar  o  desenvolvimento  da 
ornamentação  immoral  na  esculptura,  mas,  no  seu  tempo,  o  espi- 
rito da  epocha  não  cedeu,  e  a  satyra  no  século  xiv  ganhou  fôlego 
fomentada  pela  vingança  dos  que  mais  deviam  combatei  a. 

Du  Breul  refere-se  ao  desforço  do  clero  de  Notre-Dame  contra 
o  advogado  de  Philippe  de  Valois,  Pedro  de  Luignet,  que  em  1329 
attentou  contra  a  jurisdição  temporal  ecclesiastica,  sendo  immedia- 
tamente  excommungado  e  posto  em  figura  horrenda  ao  canto  da 
tribuna  para  apagarem  sobre  o  seu  rosto  as  vellas  da  egreja  ! 

Na  arte,  como  na  oratória  sagrada,  também  o  materialismo  do 
século  xv  se  revela  frisantemente. 

Na  ornamentação  das  egrejas,  a  esculptura  em  pedra  e  madeira, 
representa  os  frades  e  os  pregadores  com  a  cabeça  de  quadrúpe- 
des :  cabeças  de  mulheres  com  chifres  de  carneiro,  raposas  com 
o  habito  franciscano  pregando  do  púlpito  ás  gallinhas  que  de  ca- 
beça erguida  e  bico  aberto  as  escutam ;  suinos  organistas,  lobos 
foleiros,  etc. 


—  lto — 

E'  de  sobra  conhecida  a  descripção  da  esculptura  que  a  um 
■canto  da  nave  de  Strasburgo  representava  ou  representa  ainda  um 
asno  de  casula  desempenhando  o  acto  mais  elevado  do  ministério 
sacerdotal,  e  servindo-lhe  de  diáconos  vários  outros  animaes.  Em 
toda  a  parte  a  architectura  d'essa  epocha  revela  mais  ou  menos 
as  scenas  immoraes  que  a  caracterisam.  Em  Braga  temos,  como 
exemplar  precioso,  a  gárgula  do  lado  esquerdo  das  costas  da  ca- 
pella-mór  da  Sé,  e  em  Guimarães  a  do  lado  direito  da  frente  da 
torre  da  Collegiada,  duas  construcções  coevas  que  na  ornamenta- 
ção recordam  as  nossas  conquistas  e  o  arrojo  das  descobertas  ma- 
rítimas. 

A  mythologia  tem  egualmente  um  logar  importante  na  archite- 
ctura enrista  desde  o  século  xiv  até  ao  xvm.  Primeiramente  os 
Gryphos,  animaes  fabulosos  que  servem  de  suporte  á  cruz,  depois 
os  Centauros  e  os  Faunos  como  os  que  encimam  o  pórtico  da  ca- 
pella  de  N.a  S.a  da  Conceição  ou  Senhor  Morto,  em  Braga,  e  os 
que  se  encontram  sob  os  órgãos  de  muitas  egrejas  como  a  Sé  de 
Braga,  egrejas  de  Santa  Rosa  de  Lima  e  S.  Domingos  de  Guima- 
rães, etc.  Ás  Misulas  são  egualmente  frequentes  na  talha  das 
egrejas. 

Na  antiga  egreja  de  Santa  Rosa  de  Lima,  actualmente  sede  da 
parochia  de  S.  Sebastião  de  Guimarães,  ha  mais  no  órgão  o  cele- 
bre Macacão,  figura  de  homem  que  annualmente,  á  passagem  da 
ronda  da  Lapinha,  canta  movendo  os  lábios  e  os  braços  e  empu- 
nhando uma  solfa  e  uma  batuta  ! 

Data  dos  fins  do  século  xv  (anno  de  1498)  a  instituição  das 
Mizericordias  pela  piedosíssima  rainha  D.  Leonor  de  Lencastre, 
viuva  d^l-rei  D.  João  II,  effectuando-a  a  instancias  de  fr.  Miguel 
de  Contreiras. 

Este  facto  sobresahe  a  todos  os  outros  que  este  século  das 
innovaçoes  produziu  110  campo  da  caridade  christã. 

Por  decreto  de  3i  de  março  de  1492  foram  desterrados  da 
Hespanha  todos  os  Judeus  que  não  quizeram  o  baptismo.  O  nosso 
rei  D.  João  II  concedeu  6  mezes  de  residência  aos  que  aqui 
se  acolheram,  obrigando-os  ao  pagamento  de  um  cruzado  por 
cabeça. 

Por  occasião  da  festa  da  Paschoa  havia  o  extravagante  cos- 
tume de  castigar  os  clérigos  preguiçosos,  apanhando-os  na  cama 
e  obrigando-os  a  atravessar  nus  as  ruas  até  darem  entrada  na 
egreja,  onde  eram  postos  sobre  o  altar  e  banhados  com  agua 
benta !  Este  espectáculo  selvagem  manteve-se  longo  tempo,  pres- 
crevendo o  os  Concílios  Nanetense,  em  143 1,  e  Andegavense  em 
1448. 

A  ignorância  dos  ecclesiasticos  era  em  grau  tão  elevado,  que 


—  1 66  — 

poucos  conheciam  rudimentarmente  o  latim.  Por  isso  em  Castella- 
a- Velha  e  Madrid  foram  celebrados,  no  anno  de  1473,  dois  Con- 
cílios para  se  resolver  o  que  mais  conviria  á  illustração  do  clero, 
então  d'uma  disciplina  relaxada  a  ponto  dos  Procuradores  de 
muitos  Concelhos  representarem  contra  essa  relaxação  nas  Cortes 
de  1425,  convocadas  em  Braga  por  el-rei  D.  João  I. 

Alguns  prasos  deste  tempo  referem  se  á  distribuição  do  pão 
cosido  aos  pobres,  no  dia  dos  fieis  defuntos,  dizendo:  «Pagaredes 
o  dito  foro  em  cada  hum  anno  em  dia  de  pão  por  Deus». 

A  Camará  Municipal  do  Porto,  determinou  em  1491  :  «que 
os  Mesteiraes  (officiaes  mecânicos)  da  cidade  não  fizessem  obra 
alguma  desde  o  sabbado  ao  sol  posto,  até  á  segunda-feira,  sol 
sahido». 

N'este  século  celebrava-se  em  Braga  a  procissão  de  Corpus- 
Christi  com  corrida  de  touros  na  véspera,  cavalhadas,  etc.  Um  dos 
dois  juizes  da  cidade  conduzia  a  bandeira,  que  era  em  forma  de 
pendão  com  uma  pintura  ao  centro  representando  a  Virgem. 

O  S.  Jorge,  que  desde  o  reinado  de  D.  João  I  tem  n^sta  pro- 
cissão um  logar  distincto,  era  seguido  dos  doze  Apóstolos,  quatro 
Patriarchas,  alguns  anjos  e  numerosos  andores. 

Levava  mais  o  carro  das  hervas  offerecido  pelos  hortelões  de 
Maximinos;  as  dançadeiras,  a  mourisca,  as  mascaradas.  Em  i566 
o  Concilio  Provincial  bracarense  determinou  que  se  modificassem 
as  exhitições  profanas.  A  camará  offerecia  um  jantar  com  o  qual 
dispendia  a  verba  de  iS.rooo  réis. 

No  tempo  de  D.  Rodrigo  de  Moura  Telles,  os  lavradores  das 
freguezias  de  Navarra,  Crespos,  S.  Lucrécia,  S.  Paio  da  Ponte  do 
Porto  e  Adaufe,  vinham  annualmente  á  cidade  varrer  as  ruas  e  as 
praças  que  no  dia  immediato  (do  Corpus-Christi),  eram  tapetadas 
de  hervas  cheirosas  —  juncos  e  espadanas  —  offerecidas  desde  tem- 
pos immemoriaes  por  lavradores  das  freguezias  de  Semelhe,  Gon- 
dizalves,  Frossos,  S.  Jcronymo,  S.  Martinho,  recebendo  cada  um 
40  réis.  A  procissão  levava  na  frente  o  boi  bento,  com  as  pontas 
enfeitadas  de  íitas  multicores  e  grandes  folhos  ao  pescoço.  Este 
boi  era  offerecido  pelos  marchantes  e  conduzido  por  um  lavrador 
de  Nogueira.  Na  frente  os  clarins  tocados  por  pretos ;  atraz  do 
carro  das  hervas  quatro  gigantes,  sempre  levados  por  quatro  ho- 
mens da  visinha  freguezia  de  Esporões,  a  cada  um  dos  quaes  eram 
entregues  480  réis,  e  junto  d'elles  um  anão,  chamado  pae  dos  gi- 
gantes, também  da  mesma  freguezia,  saltando  continuamente.  Um 
gallego  conduzia  a  Serpe  mettido  dentro  d^ella.  Seguia-se  o  grande 
dragão  preso  por  uma  fita  e  conduzido  pela  Dama  do  Drago ;  a 
seguir  um  individuo  a  cavallo  representando  o  S.  Jorge  cercado 
do  seu  estado.  A  guarda  de  honra  do  Drago  e  da  Serpe  era  feita 
pelos  ferreiros  que  empunhavam  espadas  ferrugentas.  O  andor  de 


-1*7- 


Braga  —  Capella  de  N.  S.  da  Conceição,  da  egreja 
de  S.  João  do  Souto 


—  i68  — 

S.  Christovão  com  um  pinheiro  enfeitado  pelos  procuradores  da 
comarca,  o  qual  servia  de  bordão  ao  santo.  A  conducção  d'este  an- 
dor pertencia,  por  privilegio,  ás  vezes  judicialmente  questionado, 
a  oito  moradores  da  vidinha  íreguezia  de  Ferreiros,  com  opas  ver- 
melhas, cada  um  dos  quaes  percebia  240  réis. 

D.  José  de  Bragança  (1741-56),  modificou  tudo  isto,  mas  o  seu 
successor  D.  Gaspar  (1758-89)  permittiu  que  os  parochos  acom- 
panhassem de  estola  e  auctorizou  as  velhas  danças  no  couce  da 
procissão. 

Em  Guimarães  também  até  1797  esta  procissão  era  organizada 
com  grande  numero  de  andores,  irmandades  e  confrarias.  Depois 
todas  as  classes  trabalhadoras,  o  commercio,  as  artes,  a  industria, 
se  encorporavam  com  as  suas  bandeiras  e  uma  banda  de  musica.  Nas 
danças  faziam-se  ouvir  violas,  rabecas  e  harpas ;  e  os  marchantes 
da  villa  também  eram  obrigados  a  fornecer  os  touros  para  as  cor- 
ridas no  campo  do  Toural. 

A'  semelhança  do  que  se  praticava  em  Braga,  também  an- 
nualmente,  desde  a  memorável  batalha  de  Ceuta  em  que  o  he- 
roísmo vimaranense  não  trepidou  em  occupar  e  defender  o  posto 
abandonado  pelos  barcellenses,  as  ruas  e  praças  de  Guimarães 
eram  varridas  nas  vésperas  das  festas  mais  notáveis,  incluindo  a 
do  Corpus-Christi,  mas.  ..  por  dois  vereadores  de  Barcellos,  até 
que  o  Duque  D.  Jayme  incorporou  no  termo  de  Guimarães  as 
duas  freguezia?  barcellenses  —  S.  Miguel  de  Cunha  e  S.  Paio  de 
Ruilhe  —  para  que  dois  dos  seus  moradores  dessem  cumprimento 
ao  antigo  costume  imposto  por  el-rei  D.  João  I. 

Em  23  de  junho  de  1744  deu- se  por  expiada  a  pena. 

EGREJA  PAROCHIAL  DE  S.  JOÃO  DO  SOUTO 

(BRAGA) 

(Vide  gravura  a  pag.  16-) 

Está  situada  na  rua  do  mesmo  nome,  contigua  á  capella  de 
Nossa  Senhora  da  Conceição  ou  do  Senhor  Morto,  como  vulgar- 
mente se  denomina.  A  construcção  actual  data  do  tempo  do  Ar- 
cebispo D.  Gaspar  de  Bragança  (1758-89).  Como  fosse  necessário 
accrescentar  a  egreja  até  facear  com  a  capella  adjuncta,  ficando 
dentro  o  arco  rendilhado  que  defronta  com  o  grupo  do  enterro, 
celebrou-se  uma  escriptura  de  contracto  entre  a  Junta  de  parochia 
e  o  administrador  do  Morgado  dos  Coimbrãs,  a  fim  de  também 
ser  vedada  a  entrada  para  a  sala  do  archivo,  substituindo -a  por 
uma  pequena  porta  que  se  rasgou  a  meia  altura  da  torre- capella 
da  Conceição.  A  elegante  escadaria  que  lhe  dá  accesso  pelo  lado 
da  rua  de  S.  João,  data  da  construcção  da  capella  de  Santo  An- 


—  iOu  — 


tonio  Esquecido,  encostada  ao  lado  posterior  da  mesma  torre-ca- 
pella.  Esta  imagem  de  Santo  António,  esculpturada  em  alabastro 
e  pertencente  ao  numero  das  que  exteriormente  volteiam  a  torre, 
mede  1,10  de  altura.  A  muita  veneração  dos  fieis  deu  logar  á  re- 
tirada da  imagem,  do  seu  logar  para  junto  do  grupo  do  Senhor 
Morto,  emquanto  o  doutor  Provisor  Francisco  de  Torres  mandava 
proceder  á  construcção  da  capella. 

Ainda  hoje  se  vê  bem  conservada  a  escada  orbicular  com  41 
degraus  livres  desde  a  entrada  que  se  inutilisou  com  o  referido  ac- 
crescimo. 

E'  de  forma  quadrangular  a  capella  da  Conceição  e  foi  fundada 
em  1 5 1 5  pelo  doutor  João  de  Coimbra,  provisor'  do  Arcebispado 
em  tempo  de  D.  Diogo  de  Sousa,  como  se  lê  nesta  inscripção  que 
se  acha  embebida  na  parede  interior  da  sala  do  archivo : 


ímw&Km\m.Mi  IM DECO 

lllliW^H()íi[M<(7iill\^MliiW.(>iii.^-i 

O  fundador  consagrou-a  á  Mãe  de  Deus  em  i5-28  e  instituiu 
n'ella  Morgado  aos  16  de  fevereiro  de  i53o,  dotando-a  com  bens 
de  raiz,  auctorisado  por  el-rei  D.  João  III  aos  12  de  março  de 
1527.  São  de  primorosa  esculptura  as  estatuetas  de  alabastro  que 
exteriormente  adornam  o  edifício,  um  Centauro,  um  Fauno,  S. 
Paulo  Heremita  e  S.  Antão  Abbade  com  um  magestoso  leão  em 
descanço,  tudo  sobre  a  abobada  do  pórtico  que  apresenta  no  friso 
um  corvo  e  aos  lados  estes  dizeres : 

CORWS   PAVLVSPRIMVS   HEREMITA 

Sobre  este  friso  havia  ao  centro  uma  columna  encimada  por 
um  corvo  de  pedra  com  cabeça  de  ferro  e  um  pão  no  bico. 

Caiu  ha  bastantes  annos  despedaçando-se  tudo. 

Esta  capella  é  também  denominada  do  Senhor  Morto,  por  se 
venerar  grandemente,  ao  lado  da  Epistola  uma  imagem  de 
Christo  no  sepulchro,  tamanho  natural,  primorosamente  esculpru- 


i7o 


rada  em  pedra  como  o  figurado  que  a  rodeia.  D'esse  formoso  grupo 
dou  aqui  a  seguinte  photogravura  : 


As  imagens  do  altar  são  de  granito  fino,  como  toda  a  orna- 
mentação interior,  inclusive  a  abobada  com  suas  nervuras  que  tem 
no  fecho  o  escudo  dos  Coimbrãs. 


171 


A  cúpula  d'esta  capella,  toda  coberta  de  telha  vidrada  como  a 
dos  zimbórios  da  egreja  da  Sé  e  da  capella  do  Paço  Archíepisco- 
pal,  tem  uma  grimpa  de  ferro,  bastante  curiosa,  de  <3"ue  faz  parte 
uma  esphera,  a  lua  e  o  sol  com  um  dos  raios  em  forma  de  ban- 
deira e  n^ella  as  armas  dos  Coimbrãs,  e  a  cruz,  encimada  por 
uma  pomba,  com  um  grande  circulo  de  estrellas. 

O  palacete  pertencente  ao  instituidor  do  Morgado,  ainda  hoje 
se  vê  em  frente,  com  duas  janellas  de  grande  riqueza  esculptural, 
das  quaes  o  referido  instituidor  e  sua  família  podiam,  por  permis- 
são especialíssima,  assistir  ás  missas  celebradas  na  capella,  não 
obstante  haver  entre  um  e  outro  edifício  a  rua  de  S.  João  ! 


Todos  os  historiadores,  entre  os  quaes  especialisarei  o  Padre 
Luiz  Cardoso  (Diccionario  Geographico),  dizem  que  a  primi- 
tiva egreja  de  S.  João  do  Souto  foi  construída  a  expensas  do 
Arcebispo  D.  Diogo  de  Sousa  (i5o5-32).  Contestei  todas  estas 
opiniões,  no  meu  livro  Inscripções  e  Lettreiros,  pag.  47  e  segg., 
citando  documentos  inéditos,  authenticos,  de  que  possuo  copias  por 
mim  extrahidas  dos  orignaes,  para  pela  primeira  vez  provar  que 
D.  Diogo  apenas  reedificou  uma  ermida  que  nos  principios  do  sé- 
culo xii  doaram  ao  Cabido  para  se  estabelecer  n'ella  a  parochia 
de  S.  João,  muito  antes  instalada  na  Sé. 

A  doação  foi  feita  pelos  fundadores  Pedro  Aurifice  (ourives) 
e  por  sua  mulher  Gelvira  Midis,  ao  Arcebispo  D.  João  Peculiar, 
no  anno  de  1  i3i. 

EGREJA  E  CONVENTO  DE  NOSSA  SENHORA 
DOS  REMÉDIOS  E  PIEDADE  (BRAGA) 

Tendo  o  Arcebispo  D.  Diogo  de  Sousa  nomeado  em  i523  seu 
coadjutor,  com  o  titulo  de  Bispo  de  Dume,  o  religioso  da  Ordem 
Terceira  Franciscana  da  Andaluzia,  D.  fr.  André  de  Torquema- 
da,  este  deu  principio  á  fundação  da  egreja  e  convento  dos  Re- 
médios em  IÔ44,  concluindo-se  toda  a  obra  cinco  annos  depois. 

Foi  o  primeiro  convento  que  se  fundou  em  Braga,  e  teve  por 
isso  preferencia  a  sua  egreja  para  serem  sepultadas  n^lla  todas 
as  pessoas  nobres. 

O  próprio  fundador,  que  falleceu  em  Braga  no  dia  2  de  agosto 
de  iò52,  alli  ficou  sepultado  em  campa  raza,  de  mistura  com  as 
muitas  brazonadas. 

A  Abbadessa  D.  Francisca  dos  Seraphins  encarregou  da  con- 
strucção  da  egreja  o  architecto  vimaranense   António  Pinto   de 


-172  — 

Sousa,  por  escriptura  de  29  de  fevereiro  de  1724,  concluindo-se 
a  curiosa  fachada  com  suas  6  estatuas  e  columnas  corinthias  tor- 
cidas, em  1726,  um  anno  antes  de  toda  a  obra  de  pedraria.  Tem 
sobre  a  porta  este  lettreiro  em  caracteres  elegantes: 

ANNO  •    DOMINI  •   MDCCXXV  ■ 

As  freiras  eram  franciscanas  do  instituto  da  Annunciada  de 
Santa  Úrsula,  de  Salamanca.  A  cerca  do  convento,  que  toma  to- 
das as  -trazeiras  das  casas  da  rua  de  S.  Marcos,  foi  ampliada  em 
1741  com  a  compra  de  alguns  quintaes  e  casas  do  doutor  Eusébio 
do  Vai  Façanha,  á  entrada  da  rua  das  Aguas,  onde  ainda  se  con- 
serva o  mirante  com  o  brazao  do  Arcebispo  D.  José  de  Bragança, 
collocado  na  esquina  esquerda  do  edifício  por  ordem  das  freiras, 
em  attenção  aos  serviços  que  lhes  prestara  o  Prelado,  obtendo  de 
el-rei,  no  anno  de  175 1 ,  um  subsidio  da  renda  do  real  d'agua 
para  se  construir  o  muro  de  vedação  da  cerca  á  margem  da  rua 
da  Palmatória.  Conservam-se  embebidas  n'este  muro,  por  ordem 
do  referido  Arcebispo,  duas  lapides  romanas  bastante  salitradas, 
uma  das  quaes,  por  ter  vestígios  de  uma  patera,  com  a  forma  de 
palmatória,  deu  o  nome  á  rua  que  hoje  se  acha  vedada.  Foram 
encontradas  a  14  palmos  de  profundidade.  A  primeira,  que  além  da 
patera  representa  outros  emblemas  da  escravidão  como  a  amphora 
ou  o  pileits,  um  feixe  de  varas  e  um  machado,  diz  o  seguinte: 

AGATHOPODI 

T-    SATRI 

ZETHVS 

CONSERWS 

A  outra  d'um  soldado  natural  de  Pax  Iulia: 

M  •   ANTONIVS  •   MF 

GAL-  AVGVSTINVS 

PACE  •   M1LES  ■    I  EG 

Vil  ■    GEM-    FEL- 

D  •   MAMILI 

LVCANI  -AN. 

XLV     AER  •    XIIX 

H  •  S  •  ]■: 

SEMPRONIVS 

GRAECINVS 

HERES  •   F  •    C- 

Sobre  a  antiga  porta  principal  do  convento  existem  esculptu- 
radas  em  mármore  as  armas  da  Ordem  Franciscana  com  estes 
dizeres  no  campo: 

ARMA   MILICLE   NOSTRJE 


i73- 


EGREJA  DO  SEMINÁRIO  CONCILIAR 

Está  situada  no  largo  de  S.  Paulo.  Promoveu  a  sua  construcção 
o  Arcebispo  D.  fr.  Bartholomeu  dos  Martyres  que  a  destinava, 
com  o  edifício  adjuncto,  á  fundação  de  um  convento  dominico  a 
cuja  Ordem  elle  Prelado  pertencia.  Por  isso  aos  lados  da  ca- 
pella  mór  tem  gravadas  na  parede  as  armas  portuguezas  e  do- 
minicas,  com  estes  dizeres  por  baixo  : 

IHS 
VIRGA  IVA   ET  BACVLVS  TVVS 

Na  vossa  vara  e  no  vosso  báculo  está  toda  a  minha  consolação. 
disse  o  Propheta-rei.  «Virga  tua,  et  Baculus  tuus  ipsame  conso- 
lata  sunt». 

Aproximava-se  do  seu  termo  a  obra  quando  em  i56o  passa- 
ram por  Braga,  com  destino  a  Coimbra,  alguns  padres  jesuítas 
que  o  Arcebispo  obsequiou,  pondo  á  sua  disposição  o  convento 
para  pernoitarem  n'elle.  A  hospedagem  não  lhes  desagradou,  e  o 
Arcebispo  levou  a  sua  generosidade  mais  longe  offerecendo-lhes  o 
convento  e  egreja  mediante  contracto  feito  com  S.  Francisco  de 
Borja,  commissario  geral  da  Companhia,  aos  3o  de  agosto  do  refe- 
rido anno.  O  Cabido  reprovou  o  procedimento  do  Prelado ;  e 
quando,  seis  annos  depois,  foi  celebrado  em  Braga  o  Concilio  Pro- 
vincial, protestou  contra  o  voto  que  o  presidente-Arcebispo  tivesse 
a  seu  respeito,  porque  o  considerava  suspeito,  visto  ter  dado  aos 
padres  da  Companhia  os  estudos  da  cidade  com  as  egrejas  a  elles 
unidas  e  a  ermida  de  S.  Paulo,  que  já  não  existe,  e  ainda  por  que 
o  Arcebispo  fizera  novo  Aljube  e  n'elle  uma  casa  sem  janella  e 
quasi  sem  luz,  a  qual  se  denominava :  casa  para  os  cónegos. 
A  lucta  foi  renhida,  ficando  vencedor  o  Arcebispo;  e  os  fi- 
lhos de  Santo  Ignacio,  que  desde  maio  de  1540  (reinando 
D.  João  III)  introduziram  em  Portugal  a  sua  Ordem,  alli  se  con- 
servaram até  que  a  lei  de  3  de  setembro  de  1759  os  expulsou  do 
reino,  14  annos  antes  da  dissolução  decretada  pelo  Papa  Cle- 
mente XIV. 

Partiram  desta  cidade  na  madrugada  do  dia  3i. 

Desde  17  de  julho  de  1769  a  1 1  de  novembro  de  1784  foi  o 
convento  occupado  pelas  freiras  Franciscanas  de  Monsão  e  Va- 
lença, que  a  rainha  D.  Maria  I  fez  por  fim  distribuir  pelos  con- 
ventos da  Conceição  e  Remédios,  para  em  seu  logar  ficarem  10 
religiosas  Ursulinas  que  fizeram  a  sua  entrada  no  dia  20  de  janeiro 
do   anno   immediato.   No  dia  14  de  outubro  de  1880  foi  solemne- 


—  i74- 

mente   transferido   para   esta  casa  o  Seminário  de  S.  Pedro  que 
então  era  no  antigo  campo  da  Vinha  e  tinha  sobre  a  porta  do  edi 
ticio  esta  inscripção  hoje  existente  na  alameda  das  Carvalheiras: 


WtTl)0L0^MllilíHP»(.!ilÍíliOIMilS.()ll!). 
NlS.PRBI(:EXttE[lttíflií(ILinil.4yB!W^'ÍÍÍIIII0Í.ltt3 

(lllINRMOWIWimtUíIíiMOWttfVMlfllHE 
RENTVR.ty  OIFKMI  \MM  ÍU» , 
DMTVMMVIIWMftfiW  Ih  MM.  572 . 


N'este  edifício  também  foram  alojadas  em  janeiro  de  1704 
as  freiras  de  Monsão,  passando  por  isso  os  seminaristas,  para 
a  casa  do  Passadiço,  na  rua  de  S.  João,  e  annos  depois  para 
as  casas  1 19  e  immediata,  na  rua  Nova  de  Sousa  e  esquina  da  rua 
da  Mizericordia. 

Em  21  de  julho  de  1769  foi  superiormente  ordenado  á  ve- 
reação bracarense  que  recolhesse  e  fechasse  com  três  chaves,  no 
seu  archivo,  todos  os  papeis  que  se  achassem  no  cartório  do  Coi- 
tegio  dos  Jesuítas. 

Não  consta  porém  que  esses  papeis  fossem  alli  recolhidos  e 
muito  menos  que  existam  em  qualquer  outra  parte. 

Em  21  de  dezembro  do  mesmo  anno  foi  este  edifício,  do  actual 
Seminário  Conciliar,  concedido  á  camará  para  estabelecer  n'elle 
a  alfandega  emquanto  durassem  as  obras  da  reedificação  dos  al- 
pendres da  rua  da  Fonte  da  Carcova,  hoje  dos  Capellistas,  exis- 
tentes nas  trazeiras  da  casa  que  ha  dois  annos  se  construiu  e  que 
ora  é  occupada  pela  Associação  Catholica. 

A  aula  de  physica  do  Seminário  está  estabelecida  na  extincta 
sacristia  do  tempo  dos  Jesuítas,  sem  prejuiso  da  pintura  do  tecto 
com  arabescos  e  emblemas,  e  em  volta  destes  os  seguintes  dize- 
res allusivos: 

HOC   TECTVM   EST  CEI.VM  :    SVNT   SlGXA   K.MBI.EMATA  : 
PHCEBVS    LOYOLA  :    H1C   V1T.E    SOL   TIBI    SIGNA   DABIT 

S'    IGNATII   SKPVLCRVM  STELL1S   ILLVSTRATVR  • 
SOL1S   IN  OCCASV  COLLVGENT   SIDERA 


l?3  - 


SIC  POST  MORTEM  VISVS   EST  CflELVM  AD1RE 
CVRRVS   ET  EQVI   IGNEI   RAPVERVNT   El  IAM 

S  .   IGN  •  NON   PATITVR  DE   PINGI 
MAIOR   QVAM   PINGI  DICl    VE   QVEAT 

S.    IG-    EXCLAMATIO  :  SORDET  TERRA   CVM   CCELVM 

aspicio  prt:  ccelo  nvlla  VENVSTAS  SOLO  EST  • 

S.    IG-    LVDENDO   HOMINEM  AE   DEVM    LVCRATVR 
LVCRATVR  VTERQVE • 

S.   IGN-  A  CALVMNIIS   CEARIOR 
SOLEM  NVLLA   SAG4TTA    ET   ERIT  • 

S  .   IGNATII  CONVITIATOR  CREMATVR 
DVM  PREMIT   OPPRIMITVR 

S.  IG-  BACVLO  AB  IGIT  DAEMONES 
HAC  VMBRAS   IN"   TÁRTARA   MITTIT  • 

S.  IG-   VT  AD   CONFESSIONEM  DVCAT   SACERDOTE 
El   CONFITETVR  ELECTITVR  VT  CAPIAT  • 

S.  IG-   AD   LABORANDVM  GRÁTIS    SOCIETATEM 
OBLIGAT    ABSQVE   ÓLEO   ILLVMINAT  • 

S.  IG-   SOCIETATI   DIGNITATES    IN TERDIXIT 
NEMO   QVIDEM  SAPIENS   REGIA   SCEPTRA   PETIT 

S.  IGN-   MITTIT  IN   INDIAM   S.  1   •   XAVERIVM 
VADE AGE  NATE 

S.  IGN-   ZELVS     ANIMARVM   IGNEM 
VENT  MITTERE   IN  TERRAM  • 

S.  IG-   EVINCVL1S   MAIORE  TERVORE   CONS1GNATVR 
ALTIVS   HINC  VOX   INTER  CLVSA   SONAT  ■ 

.  .  .AD  FIRMANDAM  SOCIETATEM   NOV-  ••   DLEG1T 
PROPTER  DECEM 


S.  IG-   SOCIETATI-   NON   SVVM,    SED   IESV  NOMEN 
IMPONIT-   NON  NOBIS   DOMINE,    SED   NOM1NI 
TVO  DA   GLORIAM. 


-I70- 

S  .  IGNATII    STINA  '.  AD  MAIOREM  DEI   GLORIAM 
HAEC  CVN   OSVRA   MIHI. 

S.  IG-    PRO  ANIMARVM   SALVTE  IN   VINCVLA 
CONSICITVR  DANT  VINÇLA  DE  COREM  • 

S.  IG  •   AQVIS      ME -SUS   TVRREM   IN 

IVVENTE  AMOREM  EXTINGVIT  • 

VNDA  DEDIT  ERAM  AS    ET  DEDIT  IGXIS   AQVAS 

S  .   IG     MATVRVS MVLTVM  IX   LITERIS 

PRO   TE    EGIT  SERIS   PROFICIT  ANNIS  • 

S.  IG-   VVLTVS   C.ELESTI   LVCE   RADIAT 
QVIT   MIRVM   ET AT   IGNTS  • 

S  .  IGN  •    H.ERESIS  PRO  TE   LIGATOR 
SOLO    IGNAE   TRIVMPHAT 

S  .  IG  •   ECCLESIAE    SVSIDIVM 
EGO   F  •  •  •  O   El   MVRVS   IGMS 

S.  IG-   ROMAE   REGENS  TOTVM  ORBEM   ILLVMINAT 
STANS    EIXVS  CIRCVIT  ORBEM  • 

O  órgão,  construído  sob  a  direcção  do  organeiro  bracarense 
sr.  Augusto  Joaquim  Claro  e  com  o  auxilio  do  rev.  padre  Kempf, 
inaugurou-se  no  dia  25  de  junho  de  1898.  Tem  dois  teclados  de 
pedal  e  dois  de  mão,  para  dois  organistas,  29  jogos  e  2:o38  tubos 
de  madeira  e  de  metal. 

O  organista  fica  voltado  para  a  capella-mór;  e  o  órgão,  que 
se  considera  o  primeiro  do  paiz,  é  pneumático  e  compoe-se  de 
2 1 1  folies,  6  dos  quaes  movidos  por  motor  a  gaz. 

Ao  centro  do  largo  de  S.  Thiago,  em  frente  do  Seminário,  existe 
um  chafariz  em  forma  de  obelisco  encimado  pela  cruz  primacial, 
construído  em  1746.  Desde  1623  esteve  esta  fonte  na  extremidade 
poente  do  referido  largo,  á  entrada  da  rua  dos  Pellames. 


—  177  — 
EGREJA  DE  SANTA  CLARA  (GUIMARÃES) 

Esta  egreja  está  situada  a  meio  da  rua  de  Santa  Maria  e  pertence 
ao  Seminário  que  em  8  de  outubro  de  1893  se  installou  no  edifí- 
cio contíguo,  extincto  convento  de  Santa  Clara.  E'  fundação 
do  cónego  mestre-eschola  Balthazar  de  Andrade  que  lhe  lançou  a 
primeira  pedra  no  anno  de  1548.  * 

A  entrada  das  religiosas  no  convento  effectuou-se  em  i5Ô2,  no 
dia  da  Santa  matriarca,  mas  a  actual  fachada  do  edifício,  de  tra- 
balhosa esculptura,  construiu  se  em  1741. 

Ha  no  corpo  da  egreja  três  altares: — Gruta  de  Lourdes,  Se- 
nhor dos  Passos  e  Coração  de  Jesus. 

O  convento  e  a  egreja  foram  cedidos  á  Insigne  e  Real  Col- 
legiada,  por  decreto  de  19  de  agosto  de  1893,  para  o  Seminário 
creado  pela  carta  regia  de  8  de  janeiro  de  1891,  reorganizadora 
da  mesma  Collegiada. 

No  dia  8  de  dezembro  do  referido  anno  de  1891  teve  logar  a  aber- 
tura do  Seminário,  com  internato,  no  palácio  dos  D.  Priores  e  aulas 
na  casa  n.°  20  da  antiga  rua  Escura.  A  27  de  agosto  de  1893  tiveram 
principio  as  obras  no  arruinado  convento,  onde  a  8  de  outubro  im- 
mediato  se  eftectuou  a  installação  do  internato  e  aulas.  E'  datado 
d-e  16  de  setembro  de  1896  o  decreto  que  organizou  o  Seminário 
em  Lyceu  Nacional. 


SYNCHRON1SMOS  DO  SÉCULO  XVI 

O  frade  Augustiniano  allemão  Martinho  Luthero,  natural  de 
Eisleben  (Thuringia),  nomeado  em  i5j8  professor  de  dialéctica 
na  Universidade  de  Witemberg,  fundou  em  1 5 1 7,  quando  contava 
25  annos  de  edade,  a  egreja  protestante  que  aconselhava  aos  chris- 
tãos  o  estudo  e  a  interpretação  das  Sagradas  Escripturas.  Tomou 
esta  resolução  por  se  revoltar  contra  as  indulgências  que  Leão  X 
estabeleceu  para  occorrer  ás  grandíssimas  sommas  que  dispendia 
com  a  construcção  da  egreja  de  S.  Pedro,  em  que  Miguel  Angelo 
revelou  notável  talento  na  arte  do  desenho. 

A  primeira  sessão  do  Sacrosanto  Ecuménico  e  Geral  Concilio 
Tridentino,  celebrou-se  a  i3  de  dezembro  de  104.5.  Ordenou-se 
então  que  os  Prelados  residissem  nas  suas  egrejas  «como  melhor 
meio  de  emendar  os  costumes  depravados  do  clero.» 


1  Oliveira  Guimarães,  Convento  de  Santa  Clara. 

li 


— 178  — 

O  cap.  VII  da  sessão  XXI  dá  faculdade  de  «converter  as  egre- 
jas  pobres  ou  destruídas  em  usos  prolanos,  decentes,  levantando 
ahi  uma  cruz.»  No  cap.  VII  da  sessão  XXII  (17  de  setembro  de 
i562)  :  «O  sacerdote  deve  lançar  agua  no  cálice  quando  offerece,. 
porque  no  Apocalypse  de  S.  João,  os  povos  são  comparados  ás. 
aguas  e  d'este  modo  fica  representada  a  união  dos  fieis.» 

A  denunciação  dos  contrahentes  do  Matrimonio  principiou  a 
ser  feita  logo  que  foi  resolvida  a  1 1  de  novembro  de  1 563. 

N'este  século  principiou  o  registo  parochial  de  baptismos.  Em 
Lisboa  já  se  achava  estabelecido  pelas  Constituições  de  25  de 
agosto  de  i536,  anteriormente  á  convocação  do  Concilio  Triden- 
tino  que  na  sua  sessão  XXIV  —  De  reformatione  matrimonii ',. 
cap.  I,  impoz  aos  parochos  a  obrigação  de  possuírem  um  livro  em 
que  escrevessem  os  nomes  dos  cônjuges  e  das  testemunhas,  e  os 
nomes  dos  padrinhos  do  baptismo  para  se  conhecer  o  parentesco 
espiritual.  No  viu  século  não  era  ainda  commum  o  baptismo  por 
infusão ;  mas  o  parentesco  espiritual  que  d'este  Sacramento  re- 
sulta, era  observado  com  o  máximo  rigor,  o  que  hoje  mal  pôde 
ter  logar  em  virtude  da  facilidade  com  que  muitas  pessoas  se  pres- 
tam ao  encargo,  contando  dezenas  de  afilhados  vivos. 

Eguaes  encargos  pertenciam  aos  padrinhos  e  madrinhas  que 
se  davam  a  quem  recebesse  o  Sacramento  da  Confirmação. 

Começou  com  a  egreja  o  uso  de  padrinhos  no  baptismo  para 
se  evitar  que  os  pães,  tão  expostos  ao  martyrio,  deixassem  ao  des- 
amparo os  filhinhos.  Então  as  fontes  baptismaes  tinham  degraus 
de  pedra,  pois  ficavam  inferiores  ao  pavimento.  Por  elles  ainda  no 
século  xiv  desciam  os  catechumenos,  para  serem  solemnemente 
baptisados  no  sabbado  de  alleluia.  Também  as  creancinhas,  nas- 
cidas de  pães  christãos,  eram  baptisadas  pela  Paschoa  do  anno 
em  que  nascessem  ou  do  seguinte,  prolongando- se  esta  ceremonia, 
quando  o  numero  de  baptisados  fosse  grande,  desde  a  terceira 
Dominga  da  quaresma  até  á  sexta-feira  anterior  á  Dominga  in  albis. 

A  sahida  da  egreja  para  o  baptistério  ou  fonte,  que  era  um 
edifício  contíguo,  effectuava-se  processionalmente,  encorporando-se 
n'ella  o  clero  e  muito  povo,  e  atravessava  sempre  o  claustro  ou  o 
cemitério  (Gallilé),  procedendo  se  em  seguida  ao  escrutínio.  Este 
acto  practicava-se  annualmente,  ainda  mesmo  não  havendo  cate- 
chumenos, sendo  hoje  entre  nós  representado  pela  benção  da  fonte 
baptismal  no  sabbado  de  alleluia. 

Em  1596  decidiu-se  «que  cada  pia  de  baptisar  pagasse  de  Sy- 
nodatico  800  réis,  todas  as  vezes  que  se  fizesse  Synodo.» 

No  anno  de  i5go  instituiu  Gregório  XIV  a  Bulia  da  Sai  ta 
Cruzada  «para  a  propagação  do  Evangelho  nas  terras  de  infiéis, 
erigir  e  ornar  egrejas,  educar  e  manter  missionários.» 

Até  ao  século  xm  os  sellos  tiveram  o  nome  de  Bulias  por  se 


—  i79- 

parecerem  na  configuração  com  as  bolhas  d'agua  (Bullae).  Só  de- 
pois foi  dado  este  nome  aos  diplomas  Pontifícios  que  tinham  sello 
pendente  feito  de  ouro  (Bulias  áureas),  ou  de  prata  (Bulias  ar- 
gênteas), como  se  usavam  anteriormente  ao  christianismo. 

As  Bulias  vulgares,  usadas  pelos  Papas  depois  de  Constantino 
conceder  a  paz  á  egreja,  pertencia  o  sello  de  chumbo  ou  cera. 
O  de  chumbo  apparece  nas  de  S.  Gregório  Magno,  S.  Leão  I  e 
S.  Silvestre  com  o  nome  impresso.  Parece  que  Clemente  VI  ape- 
nas lhes  consentia,  em  logar  das  cabeças  de  S.  Pedro  e  S.  Paulo, 
as  cinco  rozas  do  brazão  de  família. 

N'este  século  xvi  advertiu-se  ao  povo  «que  as  imagens  não 
teem  em  si  virtude  alguma,  que  lhes  seja  própria,  e  que  só  se 
expõem  nas  egrejas  para  excitarem  no  espirito  a  lembrança  de 
Jesus  Christo  e  dos  Santos,  a  fim  de  se  moverem  a  imital-os  por 
este  meio;  que  se  dê  a  Deus  um  culto  de  adoração  e  perfeita  de- 
voção, e  aos  Santos  um  culto  de  honra  e  simples  veneração,  por 
serem  amigos  de  Deus». 

Não  obstante  porém  esta  advertência  (sempre  a  herança  do 
velho  paganismo!)  numerosíssimos  indivíduos  observam  a  religião 
christã  do  modo  mais  nccommodado  ás  suas  conveniências,  sem 
aquelle  espirito  de  caridade  que  a  sã  doutrina  de  Jesus  Christo 
aconselha.  Salva-os  a  intenção,  que  é  boa,  pois  também  por  cá 
temos  frequentes  casos  como  o  que  se  deu  com  o  historiador  in- 
glez  Hume  que,  por  ser  considerado  heterodoxo,  não  foi  prom- 
ptamente  soccorrido  por  uma  mulher  de  Edimburgo  que  o  viu 
cair  d'uma  ponte  provisória  sobre  um  montão  de  lodo.  E  só  lhe 
prestou  auxilio  depois  de  o  obrigar  a  resar  em  voz  alta  o  credo ! 

Adoram-se  as  imagens  sagradas  como  o  paganismo  adorava 
os  idolos,  julgando-se  que  existe  dentro  d'ellas  o  ser  que  repre- 
sentam; prégam-se  alfinetes  nos  hábitos  dos  defuntos;  lancam-se 
punhados  de  terra  nas  sepulturas  e  adornam-se  estas  com  flores 
e  luzes;  esconjuram-se  graves  doenças  procurando  á  meia  noite 
as  pontes  construídas  pelos  mouros  e,  apoz  umas  benzilhices  em 
que  entra  o  nome  de  Jesus  e  da  Virgem,  lançam-se  ao  rio  três 
punhados  de  sal  e  meio  alqueire  de  painço  para  que  o  diabo  fique 
longo  tempo  a  contar  as  sementes  emquanto  o  doente  foge  a  toda 
a  pressa  para  casa,  e  acredita-se  na  existência  de  almas  penadas 
que  vém  aconselhar  a  divisão  do  seu  espolio  e  umas  restituições 
engendradas,  pro  domo  sua,  por  impostores  eméritos. 

Ha  mesmo  indivíduos  illustrados  que  n'estas  questões  de  fé 
manteem  e  defendem  o  que  aprenderam  na  infância  ou  seguem 
o  que  em  geral  se  adopta.  Com  dimculdade  se  lhes  fará  crer,  por 
exemplo,  que  é  errónea  a  interpretação  geralmente  dada  ás  se- 
guintes passagens  do  Evangelho:  «Faze  o  bem  com  a  mão  direi 
ta,  de  modo  que  não  o  veja  a  esquerda». 


—  i8o  - 

«Acautelae-vos  de  fazer  as  vossas  acções  boas  perante  os  ho- 
mens a  fim  de  serdes  vistos  por  elles». 

Deste  modo,  quantos  não  vão  a  deshoras,  com  receio  de  serem 
vistos,  enchugar  lagrimas  amargas  e  reanimar  corações  desalen- 
tados pelos  horrores  da  miséria!  Recebem,  é  certo,  o  premio  con- 
solador do  bem  que  fazem,  mas  auxiliam  involuntariamente  a  im- 
postura de  muitos  que  se  dizem  esmoleres  como  elles,  e  prejudi- 
cam assim  os  pobresinhos. 

O  grande  Santo  Agostinho  diz:  «Se  temes  espectadores,  não 
terás  imitadores». 

Apregoemos,  pois,  as  nossas  boas  acções,  para  que  o  exemplo 
fructifique,  e  occulte-se  apenas  a  intenção  como  o  Evangelho  acon- 
selha. 

«Veja  o  mundo  as  vossas  obras  boas,  afim  de  dar  gloria  ao 
Pae  do  céu». 


EGREJA  DO  POPULO  (BRAGA) 


Está  situada  ao  poente  do  referido  campo  da  Vinha.  A  sua 
construcção  deve-se  ás  divergências  havidas  entre  o  Arcebispo 
D.  fr.  Agostinho  de  Jesus  e  o  Cabido  de  Braga  que  não  lhe 
consentiu  a  fundação  de  uma  capella  na  Cathedral  para  seu  jazigo. 

Por  isso  escolheu  a  Vinha  de  Santa  Eufemia,  actual  campo 
de  D.  Luiz  I,  onde  no  anno  antecedente  fundara  o  convento  do 
Salvador,  e  alli  fez  construir  a  egreja  e  convento  da  Ordem  de 
Santo  Agostinho,  lançando-lhe  a  primeira  pedra  no  dia  3  de  julho 
de  i5g6.  A  primitiva  fachada  da  egreja,  dum  gosto  simples  e 
sem  torres,  erguia-se  onde  agora  encosta  o  anteparo.  A  torre  de 
então  vê-se  ainda  nas  costas  da  egreja,  faltando- lhe  a  elegante 
cúpula  que  uma  faísca  destruiu. 

A  actual  fachada,  muito  elegante  e  com  duas  torres,  é  com- 
posta das  Ordens  architectonicas  Toscana  e  Jónica,  e  foi  levan- 
tada a  6  metros  de  distancia  da  primitiva,  no  anno  de  1780,  em- 
pregando-se  na  sua  construcção  a  pedra  que  sobrou  da  obra  do 
augmento  do  Seminário,  que  para  esse  fim  obtivera  provisão  re- 
gia e  auctorização  para  demolir  a  torre  de  Santo  António  que 
era  uma  das  portas  da  muralha  da  cidade. 

A  egreja  fecha  toda  em  abobada  de  pedra  e  tem  no  corpo 
6  altares  collateraes  em  amplas  capellas.  Ao  lado  direito  do  ante- 
paro venera-se  uma  formosa  imagem  de  Christo  na  Agonia,  ta- 
manho  natural,    e  ao  lado  esquerdo  Nossa  Senhora  da  Correia. 

Na  capella-mór,  lado  do  Evangelho,  está  mettido  em  arco 
aberto  na  parede  o  tumulo  do  fundador,  feito  por  ordem  do  go- 


—  iSi  — 

verno  em  1628,  ficando -lhe  fronteiro  o  do  seu  successor  D.  fr. 
Aleixo  de  Menezes. 

O  extenso  convento,  que  mede  5814  metros  quadrados,  é  quar- 
tel militar  de  infanteria  n.°  8,  desde  27  de  fevereiro  de  1841.  Na 
grande  cerca,  actualmente  propriedade  particular,  ainda  se  podem 
ver,  em  estado  de  abandono,  as  sete  capellinhas  ligadas  por  uma 
escadaria  de  pedra,  nas  quaes  se  representa  a  via-sacra  em  gran- 
des imagens  de  barro. 

Ao  centro  da  sacristia  da  egreja  ha  uma  meza  de  mármore 
escuro  que  assenta  sobre  uma  pedra  sepulchral  onde  se  lê: 

AQVI  JAZ  D  •   FR  •   ANT  ? 

DOS    ST?S    BISPO  DE 

NICOMEDIA  RELIGI 

OSO   DE   ST0  AG0 

Da  parede  pendem  5  quadros  em  relevo,  dourados,  represen- 
tando milagres  de  Santo  António. 

A  estes  pertenciam  os  1 1  que  hoje  existem  coloridos  na  ca- 
pella  da  Praça  Municipal. 

A  irmandade  da  SS.  Trindade  foi  para  aqui  trasladada  da  Sé 
no  dia  24  de  agosto  de  1868.  Na  antiga  rua  das  Conegas,  que  lhe 
fica  próxima,  fundou  o  Arcebispo  D.  João  Peculiar,  em  1140,  um 
convento  de  freiras  Augustinianas  (conegas).  Hoje  apenas  nos 
resta  o  nome  que  d'ellas  ficou  á  rua. 


EGREJA  DO  SALVADOR  (BRAGA) 

O  Arcebispo  D.  fr.  Agostinho  de  Jesus  (1587  1609)  vendo  o 
antigo  campo  da  Vinha  transformado  em  vastíssimo  largo  da  ci- 
dade, por  effeito  da  troca  e  emprasamento  que  se  eftectuou  aos 
3  de  dezembro  de  i5o8  entre  o  Alcaide-Mór  de  Braga,  Affonso  da 
Costa,  seu  proprietário,  e  o  Arcebispo  D.  Diogo  de  Sousa  que  lhe 
cedeu  diversos  foros  e  outras  propriedades  sitas  na  Veiga  de 
Penso,  mandou  construir  no  referido  local  um  mosteiro  denomi- 
nado do  Salvador  para  ser  habitado  pelas  religiosas  benedictinas 
do  convento  de  Viciorino  das  Donas,  (Ponte  do  Lima).  A  pri- 
meira pedra  da  egreja  foi  lançada  á  terra  em  i5g5. 

O  convento  era  apenas  a  parte  que  corre  ao  poente  da  egreja. 
Em  1734  construiu- se  o  novo  dormitório  e  casa  para  os  capellães, 
entre  a  capella-mór  e  o  actual  edifício  do  collegio  Inglez,  com- 
prando para  este  fim  as  religiosas  duas  moradas  de  casas  com 
quintaes  que  n'aquelle  sitio  havia. 


-   182- 

O  tecto  do  corpo  da  egreja  é  todo  apainellado  com  40  magní- 
ficos quadros  representando  a  vida  de  Jesus  e  da  Virgem.  A  talha 
da  tribuna  e  do  púlpito,  que  data  de  1736,  é  de  grande  mereci- 
mento, bem  como  o  azulejo  que  decora  as  paredes  interiores,  re- 
presentado na  seguinte  gravura  do  púlpito: 


O  pórtico,  voltado  ao  sul,  é  puramente  Jónico,  muito  ele- 
gante, com  suas  columnas  de  caneluras  e  duas  imagens  de  pedra 
representando  Santa  Escholastica  e  S.  Bento.  No  alto  ha  um  ni- 


— 183  — 

cho   com  a   imagem  do   Salvador  e   por  baixo  a  inscripção  se- 
guinte: 

SALVA  NOS   SALVATOR  MVNDI 

DE   VICTORINO    AVGVôTINVS    TRANSTVLIT  OLIM.    l6o2 

STRVXIT  AB  ALMEYDA  DOMNA  MARIA  MODO.    l6l6. 

Falleceu  no  dia  7  de  fevereiro  de  1893  a  ultima  freira  professa 
D.  Thereza  Máxima  do  Espirito  Santo,  sendo  sepultada  na  campa 
n.°  382  do  cemitério  publico.  Todo  o  edifício  passou  então  para  a 
posse  da  Fazenda  Nacional  que  depois  o  cedeu  ao  Asylo  de  Men- 
dicidade, actual  possuidor. 

N'este  campo,  quasi  ao  principio  da  rua  do  Carmo,  ha  um 
elegante  chafariz  construido  em  1721. 

No  mesmo  sitio  da  casa  da  esquina,  pertencente  á  familia  do 
fallecido  dr.  António  Vieira  d' Araújo,  tiveram  os  frades  benedi- 
ctinos  de  Tibães  o  seu  Hospício. 

Também  alli  esteve  a  capella  de  Nossa  Senhora  do  Amparo. 


EGREJA  DO  CARMO  (BRAGA) 


Esta  egreja  está  situada  no  principio  da  rua  do  mesmo  nome. 
A  obra  da  construcção  teve  principio  no  dia  4  de  maio  de  1634, 
logo  depois  de  os  religiosos  largarem  ao  Cabido  o  campo  do 
Carvalhido,  em  S.  Martinho  de  Dume,  e  o  campo  da  Deveza, 
em  Urjaes,  pela  cedência  do  campo  de  Santa  Eufemia,  na  rua 
do  Carvalhal,  assim  como  de  umas  casas  térreas  para  se  edificar 
o  convento. 

No  dia  22  de  outubro  de  i655  os  religiosos  trasladaram-se 
processionalmente  para  este  seu  novo  convento,  d'umas  casas  do 
largo  das  Carvalheiras,  (agora  matadouro  Municipal),  nas  quaes 
no  i.°  de  fevereiro  de  i635  tinha  sido  fundado  pelo  seu  primeiro 
prelado  fr.  José  do  Espirito  Santo,  natural  de  Braga,  o  primitivo 
convento. 

A  egreja  tem  quatro  altares  collateraes  em  arcos,  que  se  com- 
municam  interiormente,  mais  dois  aos  lados  do  arco  cruzeiro,  e 
a  capella  do  Sacramento  com  porta  para  a  capella-relicario  onde 
se  admiram  mais  de  mil  relíquias  de  santos,  distribuídas  pelas 
quatro  paredes  interiores,  e  entre  ellas  apreciáveis  trabalhos  de 
pintura  em  pergaminho,  em  vidro,  em  cobre,  desenhos  a  matiz  e 
pequenas  esculpturas  de  santos.  Esta  capella  que  Pio  VII  indul- 
genciou,  foi  grandemente  venerada  pelos  frades.  Tem  ao  centro 


— 184  — 

uma   sçpultura  de  mármore   que   encerra  os  restos  mortaes  do 
i.°  conde   de  Vinhaes. 

Os  venerandos  restos  do  milagroso  fradinho  guardam-se  em 
campa  raza,  de  mármore,  junto  da  capella-mór.  Tem  esta  inscri- 
pção  a  referida  campa  sobre  que  arde  uma  luz  permanente,  não 
obstante  a  prohibicão  do  Arcebispo  em  17  de  dezembro  de 
1866: 

AQVI  JAZ 

O   RMO   FR-   JOÃO 

d'aSCENCÁO  NEIVA 

> 

RELEGIOSO   CARMELITA 
DESCALÇO 

> 

NASCEV  A  26  d'0VTVBR0  DE 

I787 
FALECEV  A  l6  DE  MARCO  DE 

l86l 

E'  construída  de  mármore  a  curiosa  escada  suspensa  que  con- 
duz ao  púlpito. 


EGREJA  DE  S.  DAMAZO  (GUIMARÃES) 


Está  situada  á  entrada  da  rua  do  mesmo  nome  em  terreno 
que  foi  de  Diogo  de  Miranda  dAzevedo  e  que  a  irmandade  das 
Chagas  comprou  em  1625. 

Construiu-se  por  disposição  testamentária  do  Abbade  de  Santa 
Comba  de  Regilde,  rev.  Lucas  Rebello,  que  em  9  de  junho  de 
1609  instituiu  sua  universal  herdeira  a  irmandade  das  Chagas  e 
Coridão  de  S.  Francisco.  A  fachada,  com  uma  torre  á  direita,  é 
de  gosto  bastante  simples ;  mas  interiormente  esta  egreja  recom- 
menda-se  pela  riqueza  da  talha  dos  quatro  altares  collateraes  e  da 
tribuna,  onde  se  venera  a  pequena  imagem  de  N.a  S.a  da  Penha 
de  França  que  outrora  teve  capella  própria  no  largo  do  Carmo 
(hoje  de  Martins  Sarmento)  e  da  qual  ainda  existe,  a  fazer  parte 
do  muro  da  quinta  do  Bringel,  uma  janella  crucifera  interessante. 

Lucas  Rebello  também  dispoz  que  se  construisse  unido  á  egreja 
o  hospital  que  lá  se  vê,  para  serem  recolhidos  nelle  ecclesiasticos 
pobres  e  os  seculares  indigentes  da  freguezia  de  Santa  Comba. 
Durou  esta  obra  muitos  annos  e  parece  que  se  refere  ao  começo 
da  capella-mór  a  data  gravada  no  primeiro  degrau  do  altar :  anno 

DOMINI M.DC.XXXVI. 

Em  pequeno  arco  aberto  na  parede  interior  do  lado  direito  da 
capella-mór,  está  o  sarcophago  de  granito  em  que  se  guardam  as 


— 185  — 

cinzas  do  benemérito  fundador.  Mede  im,o5  de  comprido  por  1^,20 
de  alto,  e  tem  na  frente  esta  inscripção  : 

RE-BELLVS  LVCAS   ABBAS   QVI  REXERAT   OLIM 

REGILDAE  TEMPLV,   CONDITVS   HOCCE  JACET 

IPSE   SIBI   TVMVLV  DÂMASO   QVOQ  CONSTRVXIT 

AEDEM. 

1ACT1TE  VT  NATOS   PÁTRIA  TANTA  D  VOS. 

IAM    QVOD   PASTOR  OVE   CAELEST1   SEDE   LOCAVIT 

PASTOREM  TEMPLO   GRATA  REPON1T  OVIS. 

RENOVADA 

NO  ANNO  DE    l825 

Junto  da  sacristia  construiu  se  a  expensas  do  commendador 
Manuel  José  Teixeira  uma  pequena  capella  de  S.  Sebastião,  ben- 
zida no  dia  20  de  janeiro  de  i8q6.  Venera-se  n'ella  uma  nova  ima- 
gem do  glorioso  martyr,  tamanho  natural,  primorosamente  escul- 
pturada  em  madeira. 

Ao  lado  direito  da  porta  principal  havia  uma  cruz  de  pedra 
com  o  Christo  pintado  a  óleo  e  resguardada  por  uma  caixa  de 
madeira.  Fof  ha  annos  apeada  a  despeito  da  grande  veneração  dos 
visinhos  que  todas  as  noites  lhe  accendiam  uma  luzinha  d'azeite. 


EGREJA  DOS  CAPUCHOS  (GUIMARÃES) 

No  dia  2  de  janeiro  de  i663  o  D.  Prior  de  Guimarães  D.  Diogo 
Lobo  da  Silveira  lançou  á  terra  junto  do  altar-mór  a  primeira  pe- 
dra d'esta  egreja  e  convento  dos  frades  capuchos  da  Piedade, 
tudo  construído  a  expensas  dos  devotos  e  da  contribuição  de  7 
réis  que  os  frades  foram  auctorizados  a  cobrar  por  cada  arrátel 
de  lombo  que  em  Guimarães  se  vendesse.  Uma  provisão  real 
também  lhes  concedeu  para  a  obra  toda  a  pedra  dos  Paços  do 
Conde  D.  Henrique!!! 

Esta  concessão  ainda  hoje,  volvidos  mais  de  dois  séculos,  faz 
corar  de  vergonha  quem  ama  as  glorias  da  pptria. 

Na  sessão  camarária  de  3i  de  janeiro  de  1666,  o  povo  de 
Guimarães  protestou  contra  esta  concessão  absurda  e  estúpida, 
mas  os  vândalos  levavam  já  bastante  adeantada  a  obra  destruidora, 
e  lá  foram  para  a  alvenaria  dum  convento  aquellas  muitas  paginas 
de  pedra  pertencentes  ao  livro  mais  precioso  da  historia  nacional ! 

Dois  annos  depois,  a  29  de  julho  de  1668,  os  frades  entraram 
solemnemente  n'este  novo  convento. 


—  ,86  — 

Ao  centro  da  capella-mór  da  egreja  ha  uma  lapide  funerária 
ellíptica  com  esta  inscripção  : 


AQVI    JAZ    FREI 

LVJZ  DO  PORTO 

OV    DAS   CHAGAS 

FALESCIDO   A   21    DE 

JAN.    DE    1797   E 

TRESLADADO   PA 

RA    ESTE   l.VGAR 

A     l3   DE   JVLHO 

DE    1806 


Tem  aos  lados  da  tribuna  Compósita  as  imagens  de  S.  Fran- 
cisco e  Santo  António,  e  junto  do  arco  os  altares  da  Virgem  das 
Dores  e  do  Coração  de  Jesus. 

No  claustro  ha  grandes  quadros  representando  a  vida  e  mila- 
gres de  Santo  António.  Um  destes,  sem  duvida  o  mais  digno  de 
attençao,  mostra  o  thaumaturgo  portuguez  no  inferno  a  colher  de 
João  de  Moreno  uma  tira  de  papel  (um  recibo  !)  com  estes  dize- 
res curiosos  : 

RECEBI 

DESSE    MEV 

FEITOR  TV 

DO    Q.TO   LHE   PE 

DEM  MEVS   ER 

D.os    E    POR  VERDA 

DE    PACCEI    ES 

TE   E   ME  ASIG 

NO.    INFERNO 

7   DE   MAIO 

i363 

JOÃO   DE   MORENO 


A  irmandade  da  Mizericordia  comprou  á  Fazenda  Nacional 
este  convento  e  egreja  por  1 :6oo-Tooo  réis,  em  i3  de  julho  de 
1842,  e  installou  alli  o  seu  hospital  recebendo  nelle  os  primeiros 
doentes  em  julho  do  anno  immediato. 

As  grandes  obras  a  que  se  procede,  iniciaram-se  com  o  lança- 
mento da  primeira  pedra  pelo  D.  Prior  de  Guimarães  D.  José 
Francisco  de  Paula  d' Almeida,  no  dia  1  de  julho  de  1861. 


— 187  — 

EGREJA  E  CONVENTO  DAS  CAPUCHINHAS 

(GUIMARÃES) 

A  pequena  distancia  da  egreja  dos  Santos  Passos,  no  campo 
do  Gallego,  que  foi  pertença  de  Francisco  de  Sousa  da  Silva,  ini- 
ciou o  commissario  da  Ordem  Seraphica,  fr.  Francisco  do  Salva- 
dor, a  construcçao  da  actua!  egreja  e  convento  da  Madre  de  Deus, 
no  anno  de  1681,  concluindo-se  toda  a  obra  anteriormente  ao  dia 
4  de  abril  de  1 683,  dia  em  que  as  religiosas  do  recolhimento  da 
rua  do  Valle  de  Donas,  alli  fizeram  a  sua  entrada  solemne,  regi- 
das por  Gatharina  das  Chagas,  que  a  i3  de  maio  de  1694  foi  sepul- 
tada em  Carauz  (Pamplona). 

Decorridos  22  annos,  o  Arcebispo  D.  Rodrigo  de  Moura  Tel- 
les, que  obtivera  de  Clemente  XI  um  Breve,  nomeou  primeira  ab- 
badessa  sua  irmã  D.  Luiza  Maria  da  Conceição. 

A  egreja  é  bastante  soturna  e  húmida.  No  altar  que  fica  ao 
lado  esquerdo  do  arco,  são  muito  veneradas  as  imagens  da  família 
sagrada,  esculpturadas  em  Lisboa  e  offerecidas  pelo  vimaranense 
padre  Luiz  António  da  Costa  Pego,  capellão  de  D.  João  V,  sendo 
collocadas  no  logar  que  ora  occupam  a  25  de  julho  de  1748. 


EGREJA  E  CONVENTO  DO  CARMO  (GUIMARÃES) 

A  edificação  d'esta  egreja  e  convento,  na  rua  de  Santa  Maria, 
com  frente  para  o  largo  de  Martins  Sarmento,  teve  principio  no 
dia  26  de  março  de  i685,  e  crê-se  que  a  expensas  do  mercador 
Francisco  Antunes  em  honra  de  Santa  Thereza. 

As  recolhidas  eram  carmelitas  calçadas  e  o  convento  foi  pos- 
teriormente denominado  de  S.  José,  tendo  ainda  sobre  a  porta  um 
nicho  com  a  sua  estatua  em  pedra.  O  Arcebispo  D.  José  de  Bra- 
gança mandou  construir  a  capella-mór.  Por  fallecimento  da  ultima 
freira  professa,  em  1854,  o  governo  cedeu  a  egreja  á  irmandade 
do  Carmo,  hoje  Ordem  Terceira,  e  por  decreto  de  3o  de  maio 
de  1860,  cedeu  o  convento  para  n'elle  ser  fundado  o  Asylo  de 
Santa  Estephania,  que  se  inaugurou  ao  cabo  de  3  annos. 

As  grades  de  madeira  dourada  que  vedam  a  capella-mór,  as 
duas  mesas  que  estão  aos  lados  do  altar,  e  a  tribuna,  que  foi  da 
egreja  da  Costa,  merecem  a  attenção  dos  peritos. 

Em  frente  d'esta  egreja  ergue-se  o  antigo  chafariz  do  Toural 
que  tem  a  data  de  i583.  E'  de  elegante  esculptura,  perfeitamente 
igual  ao  do  campo  do  Salvador,  em  Braga. 


— 188 


EGREJA  PAROGHIAL  DE  S.  VICTOR  (BRAGA) 


Está  situada  em  plano  superior,  á  margem  esquerda  da  rua  do 
mesmo  nome,  e  foi  construída  em  1686,  a  expensas  do  Arcebispo 
D.  Luiz  de  Sousa,  como  o  indicam  as  suas  armas,  e  as  duas  in- 
scripções  lapidares  embebidas  aos  lados  da  porta  principal : 

D.    LVDOVICVS    A  TEMPLVM  HOC  VE 

SOVSA    ARCHIEPIS  TERI   FERE   COLLA 

COPVS    AC  DNS  BRA  BENTE    A  FVNDAMEN 

CHARENSIS    HISPA  TiS    EREXIT  ET  Dl 

NIARVM    PRIMAS   RE  VO   VICTORI   DICA 

GI,E   MAIESTATIS  AS  VIT  ANNO   INCARNA 

TATVS  CONSILIIS  TIONIS    DOMINI  •     1 686 

•: 
A  architectura  da  fachada  pertence  á  ordem  Jónica. 
Nas  paredes  da  anterior  egreja  appareceu  uma  lapide  sepul- 
chral  romana  que  se   empregou  na  construccão  da  actual,  onde 
deve  estar  coberta  de  cal,  ao  lado  norte.  Diz  a  inscripção: 

IVLIVS    PILIDES 

ORESTES 

H    •    S    •    E 

(Jiilhis  b ilides  Or estes,  hic  siíus  est). 

A  origem  d'esta  egreja  matriz  é  antiquíssima. 

O  clérigo  Vasco  Mendes  doou  a  S.  Martinho  de  Dume,  em  565r 
a  sua  quinta  de  S.  Victouro,  impondo-lhe  a  obrigação  de  crear 
alli  um  mosteiro  com  capellães.  A  egreja  foi  depois  reedificada 
em  io3i  por  um  padre  Nuno  Forjaz.  Em  1096  o  seu  padroeiro 
Nuno  Soares  doou  o  mosteiro  ao  Arcebispo  S.  Geraldo.  D.  Payo 
Mendes  (11 18-37),  reedificou  e  sagrou  a  egreja,  tomando  o  titulo 
de  Abbade  de  S.  Victor,  transmittido  a  todos  os  successores  por 
confirmação  do  Papa  Eugénio  III,  como  se  lê  na  iespectiva  Bulia 
existente  no  Archivo  da  Mitra:  —  Ecclesiam  Sancli  Victoris  cum 
Villa  sua — datada  de  1 148. 


EGREJA  DOS  CONGREGADOS  (BRAGA) 

No  lado  sul  do  campo  de  Santa  Anna  ergue-se  magestosa  esta 
egreja  de  construccão  arrojada  como  nenhuma  outra  de  Braga. 


-i89- 

Em  i3  de  fevereiro  de  1686,  cento  e  onze  annos  depois  de 
S.  Filippe  Nery  instituir  em  Roma  a  Congregação  do  Oratório,  o 
Arcebispo  D.  Luiz  de  Sousa  concedeu  ao  padre  José  do  Valle, 
(pouco  depois  fallecido  e  substituído  pelo  companheiro  rev.  Manuel 
de  Vasconcellos)  licença  para  lundar  em  Braga  uma  filial  da  Con- 
gregação de  Lisboa.  Este  comprou  então  no  campo  de  Santa  Anna 
uma  morada  de  casas  e  quintal,  principiando  por  um  pequeno  hos- 
pício onde  em  breve  foram  admittidos  mais  de  vinte  padres,  sendo 
por  isso  necessário  comprar,  junto  d'aquella,  outras  moradas  de 
casas  e  terrenos  onde  finalmente  foi  lançada  pelo  Arcebispo  a  pri- 
meira pedra  para  a  egreja  a  16  de  outubro  de  1689. 

O  papa  Alexandre  VIII  concedeu  a  confirmação  em  i3  de  se- 
tembro de  1690  e  isentou-a  da  jurisdicção  parochial,  obtendo  elles 
de  D.  João  V  o  régio  beneplácito. 

A  porta  principal,  á  distancia  de  117  palmos  e  meio  da  extin- 
cta  capella  de  Santa  Anna  *,  teve  principio  em  1739;  e  em  maio 
de  1765  concluiu -se  toda  a  fachada.  Nos  annos  de  1783-84  fez-se 
o  retábulo  da  capella  mor  e  foi  estucada  a  egreja. 

Aos  lados  do  arco  e  a  toda  a  sua  altura,  tem  quatro  grandes 
nichos  com  estatuas  de  granito  representando  David,  Abraham, 
Jacob  e  Isaac. 

Os  primitivos  altares  collateraes  são  oito. 

Ha  porém  mais  dois  nas  portas  que  ficam  aos  lados  do  ante- 
paro. 

Soore  uma  porta  interior  da  sacristia  ha  um  bello  quadro  em 
tella,  representando  o  Agnus  Dei,  obra  de  muito  merecimento. 

Indicou-m'o  o  sr.  José  Maria  d' Albergaria  Guerra,  muito  di- 
gno chefe  dos  serviços  telegrapho-postaes   do  Districto  de  Braga. 

A  egreja  pertence  á  irmandade  de  Nossa  Senhora  das  Dores, 
cuja  imagem  foi  alli  collocada  no  dia  18  de  janeiro  de  1761,  tendo 
sido  esculpturada  pelo  padre  Martinho  Pereira,  nascido  aqui  em 
Braga,  no  anno  de  1723  e  fallecido  a  7  de  agosto  de  179o. 

Diz  se  que  por  falta  de  recursos  pecuniários  não  pôde  ser  con- 
struída a  torre  do  lado  esquerdo. 

E'  inacreditável  que  para  a  conclusão  de  um  edifício  grandioso, 
como  este,  não  se  pudesse  então  e  não  se  possa  ainda  hoje  conse- 
guir do  publico  bracarense  a  verba  indispensável. 

O  edifício  do  convento  e  cerca  pertencem,  por  lei  de  i3  de  ju- 
lho de  1841  e  2  de  dezembro  de  1844,  á  bibliotheca  publica,  (or- 
ganisada  com  os  livros  de  muitos  conventos  e  inaugurada  em  1857), 
e  ao  lyceu,  que  desde  1840  funccionava  no  Seminário  de  S.  Pe- 
dro, tomando  posse  a  1 1  de  julho  de  1845,  e  abrindo  pela  primeira 
vez  as  aulas  no  dia  i5  de  outubro. 


1  Esta  capella  principiou  a  ser  demolida  no  dia  o  de  agosto  de  1769 


— |i9°  — 

Desde  o  violento  incêndio  do  Paço  Archiepiscopal,  em  1866. 
todas  as  repartições  publicas  passaram  para  o  edifício  dos  Congre- 
gados e  alli  se  conservaram  até  que  se  adquiriu  o  palacete  dos 
Falcões,  no  campo  de  S.  Thiago,  onde  se  acha  installado  o  Go- 
verno Civil,  Repartição  de  Fazenda  Districtal,  Policia  Civil,  Com 
missão  Districtal  e  a  Agencia  do  Banco  de  Portugal. 


Sobre   um  milliario  do  campo  das  Carvalheiras  vê-se  esta   in- 
scripção: 


ataLVpíMtípyTBaiMioSa 

STMLVIDES(D15ERSLREP£RW.0B.l)RÀ[ôílftE»S 
BÊ.MEMORIAaôMMMIimmiíoé 


Refere-se  á  construcção  da  extincta  capella  de  Santa  Anna  que 
D.  Diogo  de  Sousa  fez  construir  e  junto  da  qual  reuniu  vários  mil- 
liarios  romanos. 

Também  D.  Rodrigo  de  Moura.^Telles,  em  1725,  fez  remover 
para  alli  outras  lapides  que  D.  Rodrigo  da  Cunha  conservara  nos 
jardins  do  Paço. 


EGREJA  DE  S.  FRANCISCO  (BRAGA) 


A  Ordem  Terceira  da  Penitencia  foi  aqui  fundada  por  fr. 
Francisco  do  Salvador,  Commissario  do  convento  dos  Menores 
Regulares  de  Guimarães,  no  anno  de  1669,  sendo  seu  primeiro 
Juiz  o  padre  João  de  Oliveira  Carrilho  e  installando-se  na  capella 
de   S.  Francisco   das   Chagas,  na  Sé,  que  era  o  terceiro  altar  da 


—  l9I  — 

nave  do  Evangelho,  hoje  dedicado  a  Nossa  Senhora  do  Loreto.  Ao 
cabo  de  5  annos  mudou-se  para  a  capella  do  Espirito  Santo  do 
Hospital  de  S.  Marcos,  e  em  7  de  maio  de  1690  deu  principio 
á  sua  egreja  na  extremidade  da  rua  da  Fonte  da  Carcova  (Capel- 
listas),  onde  lhe  foram  doadas  duas  moradas  de  casas. 

.  Dispendeu  94,35000  réis  na  compra  de  mais  três  moradas  con- 
tíguas que  demolira,  e  em  17 12  foi  benzida  a  egreja  pelo  Deão 
D.  Francisco  Pereira  da  Silva,  da  nobre  casa  dos  Biscainhos,  o 
qual  sendo  Abbade  titular  da  freguezia  de  S.  Eulália  de  Tenões, 
chamou  a  si  a  administração  do  Sanctuario  do  Bom  Jesi.s  do 
Monte  quando  notou  que  a  devoção  augmentava  e  com  ella  os  ren- 
dimentos. 

A  torre,  que  teve  principio  com  a  capella- mór  em  1722,  con- 
cluiu-se  em  1733,  dispendendo  se  com  uma  e  outra  1:270^000 
réis. 

Aos  lados  da  porta  principal  tem  estas  inscripçôes: 


TEMPLO  DA  SAGRADA 
ORDEM  TERCEIRA  DA 
PENITENCIA   Q  INSTI 

T\IO    O   SERÁFICO   P  •    S   • 
FRANCISCO    PR1NCIPI 

ADO   A   7   DE   MAYO    169O 


FFITO    \   CVSTA   DOS   FI 
LHOS   SECVLARES   DA 
MESMA  ORDEM  AIVDA 
DOS  DA  PIEDADE   DOS 

FIEIS    Q  CONCORRERÃO 
COM   SVAS   FSMOLAS  ■ 


A  fachada  remata  com  a  estatua  da  Virgem  da  Conceição  es- 
culpturada  em  granito. 


EGREJA  DE  S.  VICENTE  (BRAGA) 


No  alto  da  rua  do  mesmo  nome,  em  ponto  elevado,  recon- 
struiu-se  pela  segunda  vez  esta  egreja  no  anno  de  169 1.  A  fachada 
de  esculptura  trabalhosa,  remata  com  a  estatua  de  S.  Vicente,  em 
granito,  dentro  de  um  nicho  encimado  pela  cruz  pontifical.  Na  pa- 
rede interior  da  sacristia  estão  embebidas  três  preciosas  inscri- 
pçôes lapidares,  alludindo  a  mais  pequena  ás  indulgências  da  Sé 
Lateranense  concedidas  á  capella  de  S.  Vicente. 

A  do  lado  esquerdo  diz  que  a  wisigothica,  de  que  me  occupo 
a  pag.  25,  appareceu  nos  alicerces  da  antiga  egreja,  quando  em 
1 565  foi  reconstruída. 

A  egreja  tem  exteriormente  aos  lados  da  porta  principal  estas 
duas  inscripçôes: 


192  - 


MEMBRO   DA  SACROSANTA 
IGRE1A  LATERANENSE 
DE    CVIOS    PRIVILÉGIOS 
GOZA    COM    OBRIGAÇAM 

DE  DVAS   LIBRAS   DE   CERA 
PAGAS    EM  ROMA  CADA 
ANNO    DESDE  A  ERA  DE 


i598 


AQVI   SE   GANHAM  COP1 

OSAS   1NDVLGENCIAS   VI 

SITANDO    EVTA  CAPELLA 

DEDICADA  A   S  •   VICENTE 

NA   ERA  DO   SENHOR  DCLVI  • 

REEDIFICADA  EM      MDLXV  • 

E  TERCEIRA  VEZ  FVNDADA 

169I 


A  irmandade  de  Santo  Homem  Bom,  creada  para  venerar  a 
imagem  que  esteve  no  oratório  da  Porta  Nova,  uniu- se  á  de  S.  Vi- 
cente no  anno  de  1783. 

EGREJA  DE  SANTA  CRUZ  (BRAGA) 

(Vide  grav.  a  pag.  ig3.) 

Dos  cruzeiros  que  o  Arcebispo  D.  Diogo  de  Sousa  fez  distri- 
buir pelos  differentes  largos  da  cidade,  ficou  um  entre  as  ruas  de 
S.  Marcos,  Anjo,  e  largo  dos  Remédios,  denominado  cru\  de 
S.  Marcos,  ao  qual  o  mestre  eschola  padre  Jeronymo  Portillo 
creou  certa  devoção  de  que  se  originou  a  íundação  da  confraria 
do  Bom  Jesus  da  vera  cru\,  no  anno  de  i58i,  instalando-se  pro- 
visoriamente, por  obsequio,  na  velhíssima  capella  de  S.  Marcos 
que  então  existia  onde  hoje  está  a  egreja  e  hospital  da  mesma  in- 
vocação. Foram  instituidores,  além  do  padre  Portillo,  os  seus  alu- 
irmos Pedro  da  Grã  Botelho,  Francisco  Gomes,  António  Martins 
Tinoco,  João  Dias  Leite  e  outros. 

Em  1592  foram  alterados  os  estatutos  e  cinco  vezes  reforma- 
dos—em i63o,  1664,  1702,  1720  e  1762. 

No  anno  de  1617,  como  consta  do  livro  t.°  das  Memorias,  re- 
soLveu-se  a  edificação  da  egreja  «aonde  se  hão  de  gastar  mais  de 
dois  mil  crusados»,  comprando  se  para  esse  fim  algumas  casas  na  rua 
do  Anjo,  para  que  a  obra  pudesse  occupar  parte  do  espaço  denomi- 
nado Castello  Rodrigo,  onde  então  ainda  havia  restos  d'uma  torre  da 
muralha  romana  de  que  se  encontram  vestígios  na  quinta  do  Avellar. 

Oito  annos  depois,  em  1 6^,5,  o  Arcebispo  D.  AfTonso  Furtado  de 
Mendonça  procedeu  á  benção  do  terreno,  dando-se  immediatamente 
principio  á  obra  que,  por  decorrer  morosíssima,  fora  impulsionada 
pelo  referido  Arcebispo  com  a  licença  que  concedeuaos  omciaes  de 
pedreiro  para  cortarem  a  pedra  nas  tardes  dos  dias  santos  de  guarda. 

D.  Sebastião  de  Mattos  de  Noronha  (1636-41)  ordenou  a  remo- 
ção do  cruzeiro  para  as  proximidades  da  capella  de  Santa  Justa  e 
ponte  dos  Pellames,  onde  ainda  hoje  se  vê  com  uma  cavidade  no 
globo  que  encima  a  frágil  columna  e  que  primitivamente  teve  uma 
pedra  com  o  escudo  de  D.  Diogo  de  Sousa. 


ig3~ 


Egreja  de  Santa  Cruz  (Braga) 


1 1 


—  194- 

A  obra  da  egreja  ficou  concluída  de  pedreiro  em  i653,  dispen- 
dendo-se  mais  de  5o:ooo  cruzados,  excepto  as  torres  que  em  1693 
o  mestre  de  pedraria  Manuel  Fernandes  da  Silva  foi  convidado  a 
ultimar.  A  28  de  abril  de  1725  foi  adjudicada  a  Francisco  Macha- 
do, mestre  entalhador,  a  obra  do  retábulo  das  capellas. 

A  egreja  principiou  cedo  a  dar  signaes  de  ruina,  sendo  neces- 
sário, em  16  de  novembro  de  173 1,  convidar  o  mesmo  Manuel 
Fernandes  da  Silva,  que  dirigia  as  obras  reaes  de  Mafra,  para  a 
reparar  em  parte.  Porém  depois  de  lhe  ter  dado  principio  deste- 
lhando a  e  demolindo  parte  das  paredes,  deixou-a  exposta  aos  tem- 
poraes,  toda  interiormente  occupada  com  escoras  e  madeira  solta,  os 
altares  desfeitos,  sendo  por  tudo  isto  necessário  conservar  guardas 
durante  algumas  noites  n'aquelle  recinto,  até  que  a  confraria  repre- 
sentasse a  el-rei  pedindo-lhe  para  <r mandar  que  o  sargento  mór  não 
impessa  que  o  dito  mestre  com  seus  officiaes  que  também  se  acha- 
rem libertados  das  reaes  obras  de  Mafra,  posca  continuar  no  dito 
reparo». 

A  construcção  d'esta  egreja  foi  adjudicada  ao  mestre  Francisco 
Vaz,  dirigindo-a  Geraldo  Alvares,  o  licenceado  João  Dias  Leite  e 
o  dr.  Pedro  de  Coimbra  d'Andrade.  Encarregou-se  da  constru- 
cção do  pateo,  que  custou  ibo-^ooo  réis,  o  mestre  António  d'01i- 
veira.  No  dia  9  de  maio  de  1861  chegaram  a  Braga  os  10  sinos 
afinados,  lundidos  em  Lisboa. 

Douraram-se  dois  altares  em  1754.  Ao  cabo  de  i3  annos  (1767) 
foram  encarregados  de  fazer  o  retábulo  da  capella-mor,  pela  quan- 
tia de  1:610-^000  réis,  Manuel  da  Silva  e  Manuel  Carneiro  da  Cos- 
ta, da  rua  de  Santo  André. 

A  irmandade  foi  elevada  á  cathegoria  de  real  em  1 1  de  outu- 
flro  de  1822.  O  commendador  Fernando  d'01iveira  Guimarães 
legou-lhe,  em  19  de  janeiro  de  1 852,  duas  moradas  de  casas  para 
o  hospital  que  se  inaugurou  a  i3  de  setembro  do  anno  immediato. 

Em  novembro  de  1890  teve  começo  a  sua  restauração,  que  se 
concluiu  em  dezembro  de  1893. 

A  fachada,  riquissima  de  esculptura,  com  emblemas  da  paixão 
de  Christo,  é  composta  das  ordens  architectonicas  Dórica  e  Jónica 
e  tem  gravados  os  dizeres  seguintes: 

ANNO  MDCCXXXVI 

JPS1-:   L1GNVM  TVNC  NOTAVIT  REGNAVIT  A  l.IGNO   DE 

ANNO  MDCXXXXIl 

VEXILLA   REGIS  •   PRODEVNT 
FVLGET-   CRVCIS  •   MYSTERIUM 
ECCE  ASCENDIMVS  TRADETVR  AD   CRV 

JEROSOLYMAM  CIFIGENDVM 

ET  F1L1VS    HOMINIS 


ígb  — 


EGREJA  DA  PENHA  DE  FRANÇA  (BRAGA) 

No  campo  de  Santa  Anna,  lado  sul,  o  benemérito  Pedro  de 
Aguiar  e  sua  mulher,  instituidores  da  extincta  Convalescença  do 
hospital  de  S.  Marcos,  e  do  coro  na  egreja  de  Nossa  Senhora  a 
Branca,  fundaram  em  3i  de  maio  de  iG52  o  Recolhimento  de  Bea- 
tas da  Penha  de  França,  destinado  a  7  recolhidas,  nomeando  sua 
primeira  Regente  Anna  de  Santa  Maria,  natural  de  Guimarães. 

D.  Rodrigo  de  Moura  Telles  ampliou  em  1720  o  Recolhimento, 
e  fez  construir  a  egreja,  que  ainda  existe,  com  a  tribuna  de  bella 
talha  dourada  e  as  paredes  imeriormente  azulejadas,  celebrando 
n'ella  a  primeira  missa  a  18  de  dezembro  do  anno  immediato. 

Dispendeu  com  toda  a  obra  22:000^000  réis. 

O  púlpito  é,  como  se  vê,  de  primorosa  esculptura.  (Vide  grav. 
a  pag.  icp). 

Por  fallecimento  da  ultima  recolhida  foi  tudo  cedido  pelo  go- 
verno ao  Asylo  de  infância  desvalida  de  D.  Pedro  V,  em  12  de 
maio  de  1870,,  demolindo  se  então  o  Recolhimento  para  em  seu  lo- 
gar  ser  construído  o  actual  edifício. 

Havia  n'este  Recolhimento  um  rabecão  notável,  com  estes  di- 
zeres gravados:        SARCOPHAGVS  MEFECIT — l6ll  — GÉNOVA — ,  O  qual 

foi  vendido  em  hasta  publica  por  1^200  réis. 

Do  Porto  veiu  logo  a  Braga  Mr.  Joseph  Debrun  que  o  obteve 
do  comprador  por  45^000  réis.  Acha-se  no  museu  de  Paris  que 
fez  acquisição  d'elle  por  mais  de  trezentos  mil  réis! ! ! 

Na  extremidade  poente  da  alameda  fronteira  vê-se  a  estatua 
que  o  cónego  José  Narciso  da  Costa  Rebello  e  seu  irmão  o  Barão 
da  Gramosa  dedicaram  ao  chorado  monarcha  D,  Pedro  V,  collo- 
cando-se  em  7  de  março  e  inaugurando  se  em  3i  de  julho  de  187.J. 

Esta  casa  da  Gramosa  está  situada  onde  os  Religiosos  da  Provín- 
cia da  Soledade  (S.  Fnictuoso)  fundaram  no  século  xvn  o  seu  Hospí- 
cio. O  Abbade  de  Fonte  Boa,  D.  Jeronymo  José  da  CostaRebello  (o 
Canavêta),  mais  tarde  Bispo  do  Porto,  comprou  em  hasta  publica 
o  edficio,  deixando-o  por  sua  morte  áquelle  Barão  da  Gramoí-a. 

Também  no  campo  de  Santa  Anna,  os  cónegos  seculares  de 
S.  João  Evangelista  (Loyos),  do  convento  de  Villar  de  Frades, 
fundaram  em  meado  do  século  xvi  o  seu  Hospício,  vendendo-se 
em  hasta  publica  o  edifício  ao  sr.  João  Feio  Soares  d' Azevedo. 

EGREJA  PAROCH1AL  DE  MAXIM1NOS  (BRAGA) 

Está  situada  no  Monte  de  Penas,  próximo  do  local  em  que 
existiu  uma  das  portas  acastelladas  e  onde  no  tempo  dos  romano^s 


—  iq6  — 


Púlpito  da  Egreja  da  Penha  de  Franca 


—  '97  ~ 

a  companhia  dos  cidadãos  fez  á  sua  custa  a  casa  da  sociedade, 
como  nos  diz  a  inscripção  que  no  primeiro  quartel  do  século  pas- 
sado appareceu  alli  encostada: 


SODALICIVM  •  VRBANORVM 
D      S  •   F-   C 


(Sodalitium  Urbanorum  de  suo  fieri  curaverunt). 

E'  esta  uma  das  mais  antigas  parochias  da  cidade. 

No  tempo  do  Abbade  Manuel  José  Leite,  secretario  do  Arce- 
bispo D.  Gaspar  de  Bragança,  demoliu-se  a  primitiva  egreja,  que 
estava  um  pouco  afastada  da  actual,  intitulada  de  Nossa  Senhora 
da  Conceição,  cuja  imagem  é  venerada  em  nicho  aberto  na  facha- 
da. O  Arcebispo  D.  José  de  Bragança  obteve  da  Confraria  a  de- 
sistência d'esta  egreja  e  respectivas  rendas  para  a  fundação  de  um 
convento  de  Ursulinas  n'aquelle  sitio,  sendo  essa  desistência  con- 
firmada pela  Sé  Apostólica.  A  morte  porém  veiu  impedir  a  execu- 
ção do  plano. 

Das  inscripções  lapidares  que  se  encontram  a  capear  o  extenso 
muro  do  adro,  dou  a  seguinte,  como  a  de  maior  importância: 


ESTA QPEUMANDOV   ! 

FAIERORW.WDMÍ} 

V)RTORQFO!uEQV£IMP] 
TTMDWSMMSSOMr 

ANARIAS  PORSV/ITEN- 

ÇAM  CONISEPVLTÍPÍf  fc= 

A  inscripção  do  muro 


[l€M*DffiViAKRPET 
JADEIWWCDNIE 
DBPEL0SPM/W!9>:£^ 

NFWr/fo-.NOAft/ODE 
ií>°4ETEMfclM&?P|E 

yWAOPADAMOIlTE 

A  Inscripção  da  sacristia 


A  segunda,  d'estas  duas,  existe  na  parede  interior  da  sacristia. 
E'  toda  pintada  a  azul  e  tem  as  lettras  douradas  em  signal  de  apreço. 

A  sua  leitura  é  como  segue:  —  Memoria  de  Bulia  perpetua  de 
indulgências  concedidas  pelo  Papa  Paulo  V  e  confirmadas  por 
Clemente  VIII  no  anno  de  1604;  e  tem  indulgência  plenária  na 
hora  di  morte.  Anno  de  1722. 


iq8  — 


EGREJA  E  RECOLHIMENTO  DA  TAMANCA  (BRAGA) 

Esta  denominação  proveiu-lhe  das  duas  mulheres  que  deram 
origem  co  Recolhimento  na  cangosta  da  Palha  e  que  para  aqui 
vieram  calçadas  de  tamancas.  Expulsas  pelos  padres  congregados 
fundaram  novo  Recolhimento  em  S.  Victor,  onde  agora  estão, 
sendo-lhes  impedida  pelo  Arcebispo  D.  Rodrigo  de  Moura  Telles 
a  continuação  da  obra.  Ao  fallecimento  d'este  Prelado,  em  1728, 
obtiveram  licença  do  Cabido  para  a  construcção  da  egreja;  mas 
tendo-lhe  collocado  as  armas  dominicanas,  foram  immediatamente 
intimadas  por  dois  cónegos  para  as  tirarem  d'alli.  Eram  os  effeitos 
da  rigorosa  observância  d'um  curioso  compromisso. 

O  mirante  foi  construído  em  i?55,  e  a  actual  egreja  é  obra  do 
Vigário  Capitular,  D.  fr.  Aleixo  de  Miranda  Henriques,  da  Ordem 
de  S.  Domingos,  o  qual  comprou  a  Lopo  António  de  Vasconcellos 
Abreu  e  Lima  todo  o  terreno  do  largo  que  lhe  fica  em  frente. 


EGREJA  DA  CONCEIÇÃO  (BRAGA) 


Foi  iniciada  a  construcção  da  actual  egreja  em  1720,  concluin- 
do-se  3  annos  depois,  como  se  lê  no  alto  da  porta  principal : 

17  DE  AGOSTO  DO  ANNO  DE  I728 

Tem,  além  do  altar-mór,  três  collateraes,  contando  o  da  Gruta 
de  Lourdes. 

Quando  o  cónego  dr.  Geraldo  Gomes  fundou  nas  casas  da  sua 
habitação  o  convento  de  freiras  da  Conceição,  o  primeiro  d'esta 
Ordem  fundado  em  Portugal,  sendo  lhe  lançada  a  primeira  pedra 
em  1625,  e  concluída  toda  a  obra  4  annos  depois,  construiu-se  a 
respectiva  egreja  na  extremidade  sul,  sendo  sepultados  n^lla  o  fun- 
dador e  seu  irmão  o  dr.  Francisco  Gomes  e  a  primeira  Abbadessa 
D.  Martha  de  Santa  Anna. 

Esta  egreja,  que  ha  muito  estava  inutilizada,  foi  demolida  pai  a 
em  seu  logar  se  construir  o  novo  edifício  das  officinas  de  tecelagem 
do  Collegio  de  Regeneração,  creado  em  1879  e  installado  n'este 
velho  convento  em  dezembro  de  1 863.  No  anno  de  1893  ainda  exis- 
tia a  porta  principal  com  esta  inscripção : 

BRACHARAE   H(EC  VIRGO  EST  E1VS    SVNT    TEMPLA 
GERALDO   ILLA    SVO    SVMPTVS   CONTVL1T   1LLA   ÂNIMOS 


-  i99  — 
No  muro  contíguo  á  portaria  está  embebida  esta  lapide: 

A  DOMINA  TVRR1VM     FAC 
TVM  •   ET    EST  MIRABILE 
ET     SIC    NON   EST-   IN  TOTA 
SANCTIOR  VRBE   LOCVS  • 

ESTADO   PRESETE   E  ROMA 
O  DOVTOR  GERALDO   GO 
MES   NATVRAL  DESTA  CIDA 
DE  NO  ANNO  D    1 588   O   PA 
PA  XISTO   QVINTO  D  BOA 
MEMORIA  LHE  DEV  A  CO 
NESIA  NESTA   SEE   QVE   SER 
VIO   PESSOALMENTE  6o 
ANNOS  E  TODOS   OS   REN 
DIMENTOS   DELLA  APLI 
COV  A   ESTA  OBRA     FALLE 
CEO  NO  ANNO  D    1648  D  ABR  • 

Junto  d'este  mosteiro,  no  sitio  de  Urjães  (Gazeta  de  Lisboa  n.°  26, 
anno  de  17 19),  descobriram-se  quatro  estatuas  de  prata  de  6  pal- 
mos de  alto !,  sendo  uma  de  mulher,  outra  de  um  Fauno  e  duas  de 
Centauros,  elmos  de  prata  lavrados,  e  mais  de  trinta  laminas  de 
prata  com  debuxes  de  caçadores.  Foi  tudo  comprado  por  varias 
pessoas,  entre  as  quaes  figuram  o  Arcebispo  D.  José  de  Bragança 
e  o  cónego  Falcão. 

Um  dos  dormitórios  das  religiosas  foi  devorado  por  violento 
incêndio  á  1  hora  da  noite  de  5  de  janeiro  de  1761,  sendo  uma 
d'ellas  victimada.  As  demais  fugiram  para  a  casa  dos  Falcões  e 
d'alli  para  os  Remédios,  levando  as  pratas  da  egreja  e  condu- 
zindo a  Eucharistia  para  a  egreja  de  S.  Thiago. 

Próximo  do  convento  appareceu  numas  excavaçoes  feitas  em 
1840,  uma  lapide  romana  funerária  com  esta  inscripção : 

IVNIA 

M-    L 
VRBANA 
H      S  •   E 

«Junia  Urbana,  liberta  de  Marcos,  aqui  está  sepultada.» 
Na  quinta  do  Avellar  ainda  se  pode  ver  um  grande  lanço  da 
muralha  romana.  Havia  alli  uma  das  portas  acastelladas,  em  forma 
de  torre,  que  foi  demolida  no  primeiro  quartel  do  século  xvm. 


200  — 


EGREJA  E  CONVENTO  DE  SANTA  ROSA  DE  LIMA 

(GUIMARÃES) 

r:?i  Está  situada  na  antiga  rua  do  mesmo  nome,  hoje  de  S.  Sebas- 
tião, por  ter  sido  para  alli  transferida  a  sede  daparochia  em  1893, 
como  logo  se  verá. 

A  construcção  da  actual  egre)a  terminou  em  1734. 

O  desenho  do  retábulo  do  altar-mór,  que  em  1741  foi  execu- 
tado por  65o$ooo  réis,  deve-se  ao  mestre  entalhador  José  d'Af- 
fonseca  Lima,  da  cidade  do  Porto. 

Incluindo  o  antigo  coro  das  freiras,  que  hoje  faz  parte  da  egre- 
ja,  esta  mede  de  comprimento  interiormente  37,10  por  7  de  lar- 
gura, e  tem  do  lado  do  Evangelho  o  altar  do  Senhor  Jesus  e 
do  da  Epistola  o  de  Santo  António.  Collocaram  próximo  da 
porta  a  antiga  imagem  de  Christo  na  cruz,  que  as  freiras  vene- 
ravam ao  fundo  do  coro  de  baixo.  A  construcção  do  convento 
iniciou-se  com  a  compra  d'algumas  casas  e  quintaes,  por  meio 
d'esmolas. 

Por  escriptura  publica  de  3  de  fevereiro  de  1680,  a  confraria 
da  Senhora  da  Graça,  que  administrava  a  antiga  Albergaria  de 
S.  Roque,  cedeu  ás  freiras  o  hospital,  hortas  e  capella  para  au- 
gmento  do  convento,  com  obrigação  de  continuarem  a  recolher 
por  três  dias  os  pobres  passageiros  numa  casa  que  actualmente 
é  occupada  pelo  parocho,  e  junto  da  qual  está  o  mirante  princi- 
piado a  construir  em  3i  de  março  de  1727. 

A  irmandade  de  Santo  António,  que  estava  erecta  na  egreja  de 
S.  Francisco,  installou-se  n'esta  de  Santa  Rosa  de  Lima  na  5.a  feira 
22  de  dezembro  de  1887. 

Na  sexta  feira  9  de  março  de  1888  falleceu  a  ultima  freira  pro- 
fessa, soror  Joaquina  Carolina,  natural  de  Font'Arcada,  concelho 
da  Povoa  de  Lanhoso. 

Contava  72  annos  de  edade  e  56  de  professa.  Ficou  então  ex- 
tincto  o  convento,  dando  logo  entrada  no  Ministério  da  Fazenda 
os  seus  haveres  em  títulos  da  divida  publica,  na  importância  de 
18:700^000. 

Dois  annos  depois,  em  24  de  maio  de  1890,  cedeu  o  governo 
á  Camará  de  Guimarães  o  convento  e  a  cerca.  A  egreja  passou  a 
ser  a  sede  da  parochia  de  S.  Sebastião,  eífectuando-se  processio- 
nalmente  a  transferencia  pelas  5  horas  da  tarde  de  domingo  25  de 
setembro  de  1892.  Desde  logo  a  Camará  procurou  fazer  desap- 
parecer  a  velha  egreja  construída  em  1570  por  ordem  do  D.  Prior 
e   Cabido   da  Collegiada,  na  extremidade    Oeste  do  Campo   de 


—  201  — 

S.  Francisco,  hoje  praça  de  D.  Affonso  Henriques,  auxiliando 
esta  remoção  com  1  :ooo$ooo  que  concedeu  em  27  de  outubro 
de  1887. 

Para  que  fique  memoria  do  local,  dou  a  medição  do  terreno 
occupado  por  esta  egreja  e  respectivo  adro:  —  Media  48,30  de 
comprimento  por  33, 20  de  largura.  Desde  o  adro  á  esquina 
da  mercearia  Andrade,  alto  da  rua  de  Caldeirôa,  havia  9,  3o 
de  largura;  e  desde  a  porta  principal  da  casa  do  sr.  António 
Ribeiro  da  Gosta  Salgado  á  parte  do  adro  com  que  defronta- 
va, io,o5. 

No  dia  3i  de  agosto  de  1892  o  sr.  Manuel  Pinheiro  Caldas 
Guimarães  arrematou  por  246.^000  réis  a  tribuna,  sanefas  da  ca- 
pella-mór  e  o  altar  do  Senhor  Jesus. 

A  torre  foi  arrematada  no  dia  14  de  setembro  do  referido  anno 
pelo  sr.  Joaquim  Mendes  da  Silva  Cerqueira  que  deu  por  ella 
ioo^ioo  réis,  para  ser  levantada  ao  lado  direito  da  egreja  de 
Creixomil,  onde  pôde  ser  vista.  Os  trabalhos  da  demolição  da  egreja 
começaram  no  sabbado  1  de  outubro  com  a  descida  dos  sinos.  As 
ossadas  foram  removidas  do  adro  no  dia  3,  e  no  seguinte  arrema- 
taram-se  por  n:3oo  réis  as  quatro  sanefas  dos  altares  collate- 
raes. 

Em  2  de  novembro  arremataram-se  por  6o:5oo  a  sala  do  des- 
pacho, as  sacristias  de  S.  José,  Senhor  Jesus  e  Sacramento,  sendo 
esta  reconstruída  ao  lado  direito  da  egreja  de  S.  Damazo  com  a 
sua  janella  de  quatro  semi-circulos. 

A  torre  começou  a  ser  apeada  na  quinta-feira  1 7  de  novembro, 
seguindo-se  a  egreja,  cuja  pedra  e  entulhos  se  applicaram  ao  en- 
chimento da  entrada  da  nova  avenida  sobre  a  antiga  rua  de  Relho, 
ao  alteamento  da  rua  da  Caldeirôa,  no  logar  do  Arquinho,  e  ao 
concerto  do  caminho  da  Costa  entre  os  logares  de  Fato  e  Rio, 
concerto  aproveitado  para  a  estrada  de  macadam  que  presente- 
mente se  conclue  até  á  egreja  parochial  de  Santa  Marinha.  O  cru- 
zeiro que  estava  encostado  á  torre  foi  remo\ido  para  o  claustro  da 
Sociedade  Martins  Sarmento. 


BASÍLICA  DE  S.  PEDRO  (GUIMARÃES) 


Está  situada  no  largo  do  Toural  e  teve  principio  em  1737.  A 
29  de  novembro  de  1750  foi  para  aqui  transferida  do  claustro  de 
S.  Francisco,  onde  esteve  por  espaço  de  17  annos,  a  irmandade 
de  S.  Pedro  fundada  na  capella  da  mesma  invocação  que  existe  no 
claustro  da  Collegiada,  crendo-se  que  fosse  esta  a  primeira  d'este 
titulo  em  Portugal.  Extincta  em   1768,  foi  restabelecida  em  1787 


—  202  — 

pelo  rev.  José  Amaro  da  Silva  que  sobre  a  sua  campa,  ao  centro 
da  egreja,  tem  a  inscripção  seguinte  : 

AQVI  JAZ  MAND.e  DE 

ORD.      JOSÉ  S.   PEDRO, 

AMARO    DA  FALECIDO 

S.a  RESTAV  A   27    DE 

RADOR   E  DEZEMBR.O 

BEMFEIT."  DE    1826 
DESTA   IR 

Por  Breve  de  Bento  XIV  datado  de  26  de  março  de  17D1,  foi 
esta  egreja,  ainda  então  incompleta,  elevada  á  cathegoria  de  Basílica. 
As  obras  paralisaram  em  1824  recomeçando  ao  cabo  de  57  annos 
nomez  demarco  e  faltando-lhe  ainda  hoje  a  torre  do  lado  esquerdo. 

A  architectura  da  fachada,  cujo  desenho  foi  offerecido  pela  Real 
Associação  dos  Architectos  Civis  e  Archeologos  Portuguezes,  não  pri- 
ma pela  elegância  e  bom  gosto.  Ao  centro  do  frontão  sobre  que  as- 
senta a  cruz  pontifical,  tem  as  armas  de  S.  Pedro  e  um  livro  aberto 
em  que  se  lê : 


TU    ES 

UB1    PETRUS 

'ETRUS. 

IBI   ECLESIA 

^TH.    XVI 
\ 

S.    AVG. 

Palavras  de  Jesus  Christo  a  S.  Pedro :  Tu  es  Petrus,  et  su- 
per hanc  petram  aedificabo  Ecclesiam  meam,  et  portae  inferi  non 
praevalebunt  adversus  eam. 

Na  sacristia  existem  dois  pequenos  quadros  de  altíssimo  me- 
recimento, pintura  a  óleo  representando  as  cabeças  dos  apóstolos 
S.  Pedro  e  S.  Paulo. 

Os  Francezes,  tendo  entrado  em  Guimaiães  no  dia  23  de 
março  de  1809,  occuparam  a  i3  de  maio  esta  egreja  e  a  sacristia 
com  numerosos  cavallos,  encheram  de  palha  e  milho  os  altares  e 
commetteram  outras  profanações  roubando  toda  a  prata,  que  não 
era  pouca. 

EGREJA  PAROGHIAL  DE  S.  LAZARO  (BRAGA) 

Está  situada  ao  fundo  da  rua  das  Aguas,  no  local  da  antiga  er- 
mida de  S.  Lazaro.  Tomou  a  invocação  de  S.  José  em  homenagem 
ao  santo  do  nome  do  Arcebispo  D.  José  de  Bragança  filho  bas- 
tardo de  D.  Pedro  II  e  de  D.  Francisca  Clara  da  Silva,  o  qual 
instituiu  a  parochia  no  anno  de  1747,  dividindo  assim  a  de  S.  Vi- 
ctor que  era  demasiadamente  grande. 


20_">  — 


A  actual  egreja,  de  architectura  simplíssima,  foi  construída  a 
expensas  do  Arcebispo  D.  fr.  Caetano  Brandão.  Tem  a  poucos 
passos  um  apreciável  cruzeiro  de  que  me  occuparei  no  logar  com- 
petente dando  d'elle  photogravura. 

O  celebre  monumento  antigo,  vulgarmente  denominado  ídolo 
dos  Granjinhos,  fica  num  quintal  muito  próximo,  ao  lado  esquerdo 
da  egreja. 

A  egual  distancia,  na  rua  das  Aguas,  está  instalado  o  Asylo  de 
entrevados,  cuja  fundação  teve  logar  no  anno  de  i852, 

EGREJA  PAROCHIXL  DE  SANTA  MARINHA 
DA  COSIA  (GUIMARÃES) 


A  construcçao  d'esta  egreja  com  os  respectivos  p  ueos  frontei 
ros  teve  principio  no  tempo  do  Prior  fr.  José  de  Castro,  eleito  em 
25  de  setembro  de  1748,  sendo  toda  a  obra  justa  por  i5:5oo  cru- 
zados, como  nos  diz  o  fallecido  padre  Caldas  na  sua  obra  Guima- 
rães, vol.  II,  pag.  171. 

Até  o  anno  de  i528  pertenceu  este  convento  aos  cónegos  re- 
grantes de  Santo  Agostinho,  para  quem  a  rainha  D.  Mafalda,  mu  - 
lher  de  D.  Aífonso  Henriques,  o  fez  edificar. 


—  204  — 

A  isto  faz  referencia  um  grande  quadro  em  madeira  com  o  re- 
trato da  fundadora,  oíferecido  pelo  sr.  Visconde  de  Sendello,  pos- 
suidor de  parte  do  convento,  ao  museu  da  Ordem  de  S.  Francisco. 
O  quadro  tem  na  parte  inferior  estes  dizeres : 

HOC    PIA    CAENOBIVM  AEDIF1CAT  MAFALDA  PRIORIS 

ALFONSI   CONIVX:    LYS1A  FIRMA  MANET 

NAM  CHRISTO  ADVERSOS  ALFONSVS   CONCVTITENSE 

SED   MAFALDA   PIÁ  RELLIGIONE  QVAT1T.    17:6. 

A  fachada  da  egreja  é  de  trabalhosa  esculptura  e  remata  com 

um   nicho  onde   se  vê,   em  granito,  a  estatua  de  Santa  Marinha 

martyr. 

Interiormente  é  esta  egreja  muito  airosa  e  acha  se  em  óptimo 

estado  de  conservação,  graças  aos  desvellos  do  actual  parocho  rev. 

Hermano  Amândio. 

A  ladear  a  porta  prin- 
cipal, e  já  dentro  do  alinha- 
mento, das  torres,  tem  mais 
dois  nichos  com  as  estatuas 
de  S.  Jeronymo  e  de  Santa 
Paula,  como  no  altar-mór 
onde  se  veneram  duas  ima- 
gens dos  mesmos  santos 
esculpturadas  em  madeira, 
muitíssimo  recommenda- 
veis  pelo  primor  da  execu- 
ção. 

Interior  da  egreja  da  Costa 


Fachada  do  convento  da  Costa 


Lor> 


Alinha  com  a  frente  da  egreja  o  magestoso  convento  que  te 
principio  em  meado  do  século  xvu. 

Pertence  áirman- 
dade  das  Almas,  ere- 
cta n'esta  egreja,  o 
preciosíssimo  cálice 
de  prata  dourada 
(século  xn)  que  aqui 
se  representa. 

Sendo  em  1 884 
extinctos  todos  os 
conventos,  os  frades 
Jeronymos  entrega- 
ram este  cálice  á  ir- 
mandade das  Almas 
em  pagamento  de 
uma  divida. 

O  fallecido  Ar- 
cebispo D.  António 
Honorato  não  o  en- 
viou á  exposição  de 
Lisboa,  em  1888,  re 
ceiando  que  levasse 
descaminho. 

Mede  0,17  de 
altura,  o, 52  de  cir- 
cumferencia  no  bor- 
do da  copa,  e  0,48 
em  volta  da  base 
onde   tem   esta  inscripção 


ve 


Cálice  de  D.  Dulce  (século  XII) 


-f-  Ej   M:   CC:   XX-;   Vi   REX;   SANCI  •  ET  REGINA] 
DVLCIA  ;   OFFtRVNT  ]  CALICEM  \  ISTVM  \   SCE  j   MARINE  :   DE  •   COSTA  j 


Foi,  como  aqui  se  lê,  offerecido  por  el-rei  D.  Sancho  e  pela 
rainha  D.  Dulce,  a  Santa  Marinha  da  Costa,  na  era  de  122Õ  (anno 
de  1187). 

Foi  ultimamente  depositado  no  pequeno  museu  da  Collegia- 
da,  bem  como  outro  do  século  xvi,  pertencente  á  mesma  ir- 
mandade, representado  na  grav.  a  pag.  206. 

Sob  a  protecção  de  el-rei  D.  João  III  fundou-se  neste  convento 
um  estabelecimento  scientifico  com  foros  e  regalias  de  Universi- 
dade, como  diz  o  talentoso  padre  António  Hermano,  para  o  estudo 
de  humanidades,  Phylosophia  e  Theologia,  sendo  os  lentes  aucto- 


2o6  — 


risados  a  conferir  os  graus  de  licenciados,  bacharéis  e  mestres  em 
Artes.  Instruiram-se  e  educaram-se  n'ella  os  infantes  D.  Duarte  e 
D.  António,  filho  do  infante  D.  Luiz. 

Em  1889,  quan- 
do ainda  Guimarães 
não  possuía  um  úni- 
co estabelecimento 
de  ensino  secundi- 
rio,  alguns  padres 
beneméritos  funda- 
ram n'este  arruina- 
do convento  um  Col- 
legio  denominado  de 
S.  Damazo,  o  illus- 
tre  Pontifiee  vimara- 
nense. A  cidade, 
pouco  habituada  a 
benefícios  gran  les, 
recebeu  com  indiffe- 
rença  o  feliz  melho 
ramento,  porque  du- 
vidava do  êxito  que 
alfim  se  obteve  ! 

O  auctor  d'estas 
linhas  (permittase- 
lhe  a  immodestia) 
promoveu-lhe  então, 
com  outro  seu  ami- 
go, uma  festa  inau- 
gural brilhante,  ape- 
nas custeada  pelos 
dois. 

Este  Collegio  foi 
installado  á  pressa, 
num  breve  intervallo 
de  ferias  de  verão. 
O  inicial  corpo  do 
cente  e  discente  destacou-se  do  Collegio  de  Santa  Quitéria  do  vi- 
sinho  concelho  de  Felgueiras.  Constituiram-se  em  Direcção  os  pa- 
dres seculares,  seus  fundadores,  António  Hermano  Mendes  de  Car- 
valho, Firmino  António  da  Silva  Bravo,  e  Domingos  Dias  de  Faria, 
abrindo-se  o  Collegio  no  dia  6  de  outubro  do  referido  anno  de  1889 
com  aulas  para  os  cursos  secundários  dos  lyceus  e  seminários. 

Teve  de  principio  logo  uma  frequência  vistosa  e  animadora : 
eram  75  alumnos  internos  e  25  externos. 


Cálice  da  Costa  (século  XVI) 


—  207  — 

Nos  annos  seguintes  o  numero  de  estudantes  augmentou  até 
cerca  de  200  internos. 

Essa  notável  prosperidade,  deveu-a  o  estabelecimento  ao  êxito 
singular  obtido  nos  exames  no  lyceu  de  Braga.  Um  anno  os  Dire- 
ctores até  julgaram  conveniente  inventar  as  reprovações  para  que 
ao  publico  não  parecesse  inverosímil  o  quadro  sern  sombra?  das 
numerosíssimas  approvações  e  distincções  ! 

Nos  últimos  annos,  por  influencia  da  reforma  de  instrucção  se- 
cundaria de  1894,  a  população  escholar  algo  tem  diminuidoj  toda- 
via tem  mantido  a  auspiciosa  cifra  de  ioocollegiaes. 

O  ed.rkio  é  grandioso  e  o  local  superrimamente  salubre.  Vi- 
sinho  de  Guimarães,  ligava-o  todavia  á  cidade  um  caminho  peor 
que  um  calvário  ;  mas  hoje  graças  aos  esforços  de  alguns  vimara- 
nenses e  da  Direcção  do  Collegio,  serve-o  uma  bella  estrada  de 
macadam  que  principiou  a  ser  construída  no  dia  i.°  de  marco  de 
1898. 

EGREJA  DE  NOSSA  SENHORA.  DA  LAPA  (BRAGA) 

No  largo  do  mesmo  nome,  onde  alguns  missionários  acompa- 
nhados do  padre  Angelo  de  Sequeira",  collocaram  em  1757  um 
quadro  de  Nossa  Senhora  da  Lapa,  construiu  se  a  expensas  dos 
fieis  esta  egreja,  lançando-lhe  a  primeira  pedra,  a  q  de  novembro 
de  1761,  o  Reitor  do  Seminário  Conciliar  e  Chanceller-mór  do 
Arcebispo,  o  rev.  António  Barbosa  de  Góes,  com  assistência  de 
vinte  ecclesiasticos  e  por  mandado  do  Arcebispo  D.  Gaspar  de 
Bragança.  Ao  cabo  de  seis  annos  concluiu-se  a  obra  da  capella, 
sendo  benzida  a  7  de  setembro  de  1767  e  celebrando-se  n'ella  a 
primeira  missa  no  dia  immediato.  A  obra  dos  altares  collateraes 
terminou  em  1781  e  a  do  altar  mor  em  1792,  tudo  subsidiado  pela 
irmandade  de  S.  Thomaz  d'Aquino  que  no  dia  8  de  novembro  de 
1774  fora  para  alli  trasladada  da  capella  dos  reis,  no  claustro  da 
Sé.  Por  escriptura  de  16  de  junho  de  i8o5  uniu-se-lhe  a  irman- 
dade de  S.  Pedro  que,  segundo  se  crê,  foi  erecta  em  1 556  na  ca- 
pella de  S.  Pedro  de  Rates,  na  Sé. 

A  arcada,  que  dum  e  outro  lado  alinha  com  a  fachada  da 
egreja,  teve  ao  centro  da  construcção  exterior  a  bella  estatua  de 
Braga,  tudo  feito  a  expensas  do  Arcebispo  D.  Rodrigo  de  Moura 
Telles,  na  anno  de  1716.  Também  então  se  construíram  nas  ex- 
tremidades as  duas  casas  redondas,  denominadas  caramanchões, 
que  a  camará  emprazou. 

Quando  a  egreja  da  Lapa  principiou  a  ser  construída  em  5  no- 
vembro de  1761,  tendo  ainda  por  campanário  uma  das  torres  do 
castello  da  cidade,  passou  a  estatua  para  a  extremidade  norte  e 


-  208  — 

tfalli  para  o  arco  da  rua  nova  de  Sousa,  onde  actualmente  se  en- 
contra. 

Em  janeiro  de  ,1718  o  referido  Prelado  deu  principio  á  cons- 
trucção  do  Aljube,  que  fica  nas  costas  da  egreja,  e  contíguo  á 
antiga  muralha  do  castello  da  cidade,  dispendendo  com  esta  obra 
4:400:000  réis. 

Quando  em  i853  foi  demolida  aporta  do  Souto,  que  encostava 
ao  castello,  appareceu  nos  alicerces  um  cofre  contendo  moedas  do 
reinado  de  D.  Diniz. 

O  pelourinho,  que  se  achava  no  largo  hoje  do  Barão  de  S. 
Martinho,  e  na  base  do  qual  se  lia  —  anno  de  1 585— foi  removido 
pela  camará  no  dia  12  de  dezembro  de  1844  para  °  anngo  campo 
dos  Touros,  onde  se  conservou  até  18  de  julho  de  i853,  dia  em  que 
foi  inutilisado  para  em  seu  logar  ser  construído  o  actual  chafariz. 

O  edifício  do  theatro  de  S.  Geraldo,  que  fica  no  largo  da  Lapa, 
teve  começo  em  27  de  setembro  de  i855. 

No  dia  8  de  junho  de  1860  foi  inaugurado  pela  actriz  Emilia 
das  Neves. 

EGREJA  E  CONVENTO  DE  SANTA  THEREZA 

(BRAGA) 

No  alto  da  rua  das  Oliveiras,  em  uma  casas  compradas  a  Pe- 
dro Fernandes,  iniciou-se  no  dia  18  de  maio  de  1763  a  construcção 
da  actual  egreja  de  Santa  Thereza,  concluindo-se  em  1766.  Toda 
a  pedra  empregada  n'esta  obra  foi  cortada  no  largo  que  lhe  fica 
em  frente,  onde  ainda  ha  vestígios  de  penedia.  A  14  de  junho  de 
1767  o  cónego  Francisco  de  Mendonça  benzeu  solemnemente  esta 
egreja  e  no  dia  immediato  cantou-se  alli  a  primeira  'missa  a  que 
assistiu  o  Arcebispo  D.  Gaspar  de  Bragança. 

O  pequeno  convento  ainda  hoje  é  habitado  por  uma  freira 
professa. 


—  209  — 

EGREJA  DOS  SANTOS  PASSOS  E  VISTA  DA  SERRA 
DA  PENHA  (GUIMARÃES) 


Na  extremidade  sul  do  antigo  campo  da  Feira  e  no  mesmo  lo- 
cal onde  o  vimaranense  Duarte  Sodré  mandou  construir  uma  ca- 
pella  de  Nossa  Senhora  da  Consolação  com  alpendrada  em  volta, 
instituindo-se-lhe  uma  irmandade  de  estudantes  com  seus  estatu- 
tos approvados  em  9  de  dezembro  de  i5m_i,  iniciou-se  em  1769  a 
construcçao  da  actual  egreja,  cujo  corpo  foi  benzido  a  16  de  outu 
bro  de  1785. 

Encarregou-se  da  planta  o  bracarense  André  Ribeiro  Soares  da 
Silva. 

No  dia  j  1  de  dezembro  de  1787,  a  reliquia  de  S.  Fortunato,  que 
ainda  hoje  se  venera,  foi  collocada  na  egreja  em  urna  especial,  des- 
envolvendo-se  de  tal  modo  a  devoção  dos  fieis,  que,  por  esse  motivo,  a 
conclusão  da  obra  nãose  fez  esperar  muito.  Astorres,  elegantíssimas, 
tiveram  principio  no  dia  28  de  maio  de  1862  e  terminou  a  obra  em 
1878  sendo  Pedro  Ferreira  o  auctor  da  respectiva  planta.  A  torre 
do  lado  direito  principiou  a  ser  construida  com  a  quantia  de  réis 
(ioo^ooo,  producto  de  três  espectáculos  de  prestidigitação  desem- 
penhados pelo  ofterente  sr.  Sebastião  Augusto  de  Magalhães  Bran- 
dão, que  por  esse  motivo  tem  o  seu  retrato  na  galeria  dos  bem- 
feitores.  Em  1798  concluiu-se  a  capella-mór,  empregando-se  na  sua 
edificação  a  pedra  da  torre  da  freiria  e  a  do  lanço  de  muralha  que 
lhe  ficava  contíguo. 

O  carrilhão  de  sinos  afinados  estreou-se  no  dia  28  de  maio 
de  1875. 


—  2IO  — 

Venera-se  n'esta  egreja  a  imagem  do  Senhor  dos  Passos,  que 
annualmente  é  conduzida  em  magestosa  procissão  no  domingo  de 
Lazaro.  Foi  feita  sendo  Juiz  da  irmandade  Manuel  da  Cunha 
Maranhas. 

No  dia  i5  de  março  de  1861,  duas  das  mais  novas  coristas  do 
próximo  convento  das  Capuchinhas,  dispondo-se,  como  de  costu- 
me, a  preparar  a  imagem  para  a  alludida  procissão,  encontra 
ram-lhe  o  rosto  tão  humedecido,  que  chegou  a  molhar  a  toalha  a 
que  o  limparam  e  a  qual  o  povo  desfez  em  numerosas  reliquias. 
Este  caso   era  a  repetição  do  que  se  havia  dado  56  annos  antes. 

A  túnica  do  Christo  e  os  demais  paramentos  de  velludo  roxo, 
ricamente  bordados  a  oiro  fino,  fazem  a  admiração  de  todas  as 
pessoas  que  de  longe  concorrem  á  procissão. 

A  irmandade  dos  Santos  Passos  comprou  aos  herdeiros  de 
Manuel  de  Magalhães  d'Araujo  Pimentel  uma  morada  de  casas,  e 
ainda  outras  com  campo  junto,  pertencentes  á  Condessa  de  Basto, 
para  a  fundação  do  Asylo  de  Mendicidade,  solemnemente  inaugu- 
rado a  4  de  fevereiro  de  1877,  e  dum  Collegio  de  meninas  com 
internato. 

A  obra  do  alargamento  do  campo  da  Feira  para  a  parte  d'este 
Asylo  custou  780^000  réis  e  foi  arrematada  no  dia  10  de  setem- 
bro de  1890  pelo  empreiteiro  sr.  José  Rodrigues,  de  Vizella. 

EGREJA  DE  NOSSA  SENHORA  A  BRANCA  (BRAGA) 

Está  situada  no  largo  do  mesmo  nome. 

A  parte  superior  da  fachada  foi  construída  durante  o  pontifi- 
cado de  D.  Gaspar  de  Bragança.  A  inferior  pertence  á  archite- 
ctura  dórica. 

Sobre  o  arco  da  porta  principal  tem  as  armas  de  D.  Diogo  de 
Sousa. 

No  alto  do  oratório  da  Virgem  acha-se  gravada  a  seguinte  in- 
scripçao: 

NIVE 

DEALBABVNTR  (SIC) 

IN   SELMON 

MONS  DEL 

MONS    IN   QVO 

BENEPLAC1TVM 

EST    DEO 

HABITARE    IN   EO 

ANNO  D-    I77I • 

No  espaço  que  esta  egreja  occupa  houve  antigamente  uma  ca- 
pella  denominada  de  Nossa  Senhora  da  Carreira,  na  qual  estava 


—  211  — 

instituída  a  irmandade  de  Nossa  Senhora  das  Neves,  como  refere 
o  Arcebispo  D.  João  Martins  de  Soalhães,  no  seu  testamento  feito 
em  i3 19,  presentemente  guardado  no  real  archivo  da  Torre  do 
Tombo.  Também  no  seu  testamento  o  Arcebispo  D.  João  Affonso 
de  Brito  diz :  « .  .  .  .  e  60  Livras  para  reFa\imento  da  ermida  dê 
Nossa  Senhora  das  Neves  A  'Branca  a  par  de  S.  Victonro.» 

Essa  velha  capellinha  foi  reedificada  a  expensas  de  D.  Diogo 
de  Sousa  (i5o5-32)  por  occasião  de  mandar  construir  todo  aquelle 
largo  e  o  vasto  campo  de  Santa  Anna. 

Pedro  d'Aguiar  e  sua  mulher  Maria  Vieira  instituíram  n'esta 
egreja  coro  de  5  capellães  com  obrigação  de  missa  quotidiana  por 
suas  almas. 

Estão  ambos  sepultados  na  capella  do  Nascimento,  lado  do 
Evangelho.  O  coro,  o  retábulo  e  um  alpendre  que  teve,  foram 
feitos  desde  1627  a  i635.  Acham- se  exteriormente  encostadas  a 
esta  egreja  as  14  cruzes  de  pedra  que  se  erguiam  ao  longo  dos 
campos  de  Santa  Anna  e  da  Vinha. 


EGREJA  PAROGHIAL  DE  S.  PAIO  (GUIMARÃES; 

No  largo  do  mesmo  nome  onde  desde  o  primeiro  quartel  do 
século  xiii  existiu  a  terceira  e  ultima  egreja  parochial  do  burgo, 
construiu-se  desde  1789  a  96  a  actual  egreja  com  a  torre  ao  cen- 
tro da  fachada.  As  oito  cruzes  da  sagração  a  que  se  refere  o  sau- 
doso padre  Caldas  podem  ter  sido  aproveitadas  da  primitiva  egre- 
ja. Ha  d'isto  numerosos  exemplos. 

No  largo  que  lhe  fica  em  frente  existiu  um  elegante  cruzeiro, 
-com  a  imagem  de  Christo  esculpturada  em  granito  fino,  apeado 
no  dia  18  de  fevereiro  de  1879  por  ordem  da  illustre  vereação  que 
logo  o  fez  levantar  no  cemitério  municipal  da  Athouguia.  Pouco 
depois  vendeu-o  para  a  freguesia  de  Polvoreira,  onde  se  conserva 
próximo  da  egreja  parochial  muito  venerado  por  aquelle  povo. 

Ao  lado  d'esta  egreja  de  S.  Paio  existe  o  Asyío  de  inválidos 
administrado  pela  meza  da  Mizericordia.  Foi  inaugurado  em  1844, 
para  receber  26  indivíduos  dos  dois  sexos. 

Na  frente  do  edifício  tem  os  dizeres  seguintes: 

ASILO 

DE 

INVÁLIDOS 


—  212  — 


Sanctuario  do  Bom  Jesus  do  Monte  (Braga) 


Quem  ha  que  não  conheça,  ao  menos  por  tradição,  a  feiticeira 
estancia  do  Bom  Jesus  de  Braga,  onde  nacionaes  e  extrangeiros  se 
extasiam  na  contemplação  da  natureza  e  da  arte  que  alli  se  dão 
as  mãos? 

A  escadaria  antiga  e  a  moderna,  a  que  minudentemente  se 
refere  o  sr.  Azevedo  Coutinho  no  seu  livro  publicado  ha  um  anno 
sob  o  titulo  —  Bom  Jesus  do  Monte,  o  lago,  as  grutas,  os  jardins, 
as  estatuas,  o  figurado  das  novas  capellas  e  a  magestosa  egreja, 
tudo  prende  a  attenção  do  visitante.  Uma  simples  cruz  levantada 
ha  séculos  entre  as  asperezas  d'aquelle  Monte  Espinho,  deu  ori- 
gem á  formosíssima  egreja  e  ao  embellezamento  do  local  que  de- 
ha  muito  se  considera  o  mais  attrahente  do  Minho ! 


'1 1 


3- 


Vista  geral  do  Bom  Jesus 


A  tradição  da  cruz  é  de  todo  o  ponto  acceitavel.  O  que  ainda 
se  ignora  é  o  anno  em  que  foi  construída  a  primitiva  ermida.  Já 
no  meu  livro  InscripçÕes  e  Lettreiros,  pag.  1 56,  anno  de  i8g5, 
mostrei  que  a  lapide  gravada  em  1839  e  collocada  no  muro  do 
primeiro  patim  é  inexacta  quando  attribue  ao  anno  de  1474  o  go- 
verno do  Arcebispo  D.  Jorge  da  Costa  II,  que  teve  logar  na  au- 
sência de  seu  irmão  o  Cardeal  de  Alpedrinha  desde  1408  a  i5oi. 
Por  isso  com  razão  o  sr.  Azevedo  Coutinho  corrige  aquella  data 
dando  lhe  mais  20  annos.  Em  que  se  fundou  porem  o  auctor  da 


—  214  — 

referida  inscripção  para  attribuir  a  D.  Jorge  a  construcção  da  pri- 
mitiva capella,  se  as  suas  armas  encontradas  nas  escavações  po- 
diam ter  sido  applicadas  a  qualquer  melhoramento  effectuado  a 
expensas  do  Prelado,  e  se  22  annos  depois  o  Deão  D.  João  da 
Guarda  mandou  fa^er  a  egreja  e  capella? 

A  esta  construcção  ou  reedificação  se  refere  a  lapide  seguinte 
existente  no  patim  do  lado  opposto  e  de  cuja  authenticidade  não  é- 
licito  duvidar : 


O 


'ESTORLIPCEtKPf.LKMJT 

DOMFASERO.PRETONOTTTIRQ 

DOjOff:DAbV/TRDfí:DR\\,R 
DEBRR6R--ELW6VO:   . 

1 0(J^  EL  HO:  DE  ELREI. ' 
C0NDEPfíWTlNOPOlUVAD 

EVAIR  HXb-D  DOMES:  DE- 

SETÈl^^DOflNO-.BlWaJf 


Leitura:- — Esta  egreja  e  capella  mandou  fazer  o  Protonotario 
Apostólico  Dom  João  da  Guarda,  Deão  das  Sés  de  Braga  e^  La- 
mego, do  conselho  de  el-rei,  conde  Palatino,  por  sua  devoção,  a 
16  dias  do  mez  de  setembro  do  anno  de  i522. 


2ID  — 


Escadaria  antiga  do  Sanctuario 


—  2l6  — 

A  actual  egreja,  com  fachada  composta  das  três  Ordens  archi- 
tectonicas — Dórica,  Jónica  e  Compósita,  foi  desenhada  por  Carlos 
Amarante.  Principiou  a  ser  construída  no  dia  i.°  de  junho  de  1784 
c  concluiu  a  20  de  setembro  de  181 1. 

Ao  lado  direito  da  porta  principal  existe  esta  lapide  referente 
as  indulgências  concedidas  pelos  Papas  Pio  VI  e  Pio  IX: 


1  Cjl%  WT:-  induuenTiam  umm  IN  DONinHIJ  P^WíHUM^JU  W10IVIÍ,ET 

ÍIVEMMÔUEMífoMMO^ 

RIAVI  QUft5RftQtJSl»AAE,EriE^LiN  ANNO  QUOÍUMQi>e  fti£s  -  ITEM  OMMtS  fcT  ^t  ^GU- 

Us  liVOUUiEíyiTiA^  STATiOWUM  Vlft  C  Rgí  tSVISirANTfôUV  (APEU.AS  HUlUS  SAN"<.Tl>AWi  • 

Igit  H  lUUlMDaCLVlll  COa/LESSITADDECEMNWM  MMIC£iUiESlAM\/lilT?:-lJI^IUUa£A/ 
;  rttkVÍESÍWftKXlW  ^OT^NftTIVlTATl^EPiniAWI^ETASCEWSWKISaNaX^illWIMAàííííU 

.  ElJ)l£^^IVLKSARl0G£mCAT10NM.Ç|PSiUS£CL^i]^AM>yEÍ?FJíSUsaVj^ADoUAWMS0UÍ 
|  DlkKUStíiHU!U5AA0Df:  !NSUP£HVII  AHNO^ToTlDkMauEaUA0íl^tNASâUALlBETA|/k'!fCfltA; 

[, VI  .PMràkMiWTMlJMffl  iNDlUTISEXfREM | 

Ao  lado.  esquerdo  tem  esta  da  consagração  da  egreja  pelo  Ar 
cebispo  D.  José  Joaquim  cTAzevedo  e  Moura,  a  Jesus  Christo  cru 
cificado,  com  as  respectivas  indulgências: 


I  K.ft.WDUCL\IUltV£RO>l.MLNftUUU>ST|ExCtUi.NTíSS\MUS  Aí-RWt-- 

KtN0ltílW^DíaOSTOi)OAlHllJUSDEAlt\/iI)OElA0Ullh,liílSHltf1$COWi  , 
'  í\  D  QNUNfílOA  MMí  M  MWMmWMtt  MIN  t  EtCLEÇi  ^  M 1 M 
H0WtoD.N.ItiUíHWUltllOtlFlXllflNSt(WJlT^TftV)EINiiysWAR\WI\l0 
Hl  HB\  RELlflLUIAS  II^C  LUS I T:  E%  LIUIK>3>  -CRUC  tt.D£  t  OLUWWA  F  UUEUATIONIS 
ElU»fcMD.N0[XVElflB.V.^W£HPAlliOS|iNauiítPHlSPflNÇ|tlUtíE# 
HAÍ^tT  tX  QUiBUS^S.APOST()L0RUra  PETRl.fAUi.1,  ANOKtft.lAU)ftl  NUUOI^'1  AMlt 

NAÍ£,X  L  ITEM  ÍÍES  S  WUUL1S  í  HklU )  F|0EUauSKCl.iS(AÍAtftlM8£^T£  VISI 
1ANTIBU5  IN  D1E  AMMlV£i)\llKIO  rHIIUV£  OMSEU:  RfCílOfVIVJlU  I  OOMtVtCASCCUAlQAAU^r. 

Na  fachada  ha  ainda  outras  inscripçÕes,  uma  das  quaes,  com- 
memorativa  da  grandiosa  festa  do  primeiro  centenário,  realisada 
no  dia  1  de  junho  de  1884.  Em  29  de  julho  de  ijbj  ordenou-se  a 
abertura  da  calçada  do  Lanhoso  que  em  16  de  maio  do  anno  im- 
mediato   ainda  não  tinha  attingido   a  conclusão.  Todas  as  obras 


2i7  — 


que  D.  Rodrigo  de  Moura  Telles  effectuou  na  estancia  do  Bom 
Jesus,  importaram  em  mais  de  vinte  e  quatro  contos  de  réis. 

A  nova  estrada  de  macadam  principiou  a  ser  construída,  e  si- 
multaneamente o  jardim  do  campo  de  Santa  Anna,  em  1854.  A 
28  de  março  de  i85q  deu-se  principio  á  estrada  que  parte  do  arco 
até  ao  Sanctuario,  e  em  1874  inaugurou-se  a  linha  americana. 

No  dia  14  de  outubro  de  i853  collocaram-se  na  egreja  os  ór- 
gãos que  pertenceram  á  do  convento  de  Bouro. 

O  elevador  foi  inaugurado  em  25  de  março  de  1882. 

No  dia  8  de  março  de  1897  inaugurou-se  com  grande  solemni- 
dade  a  obra  de  reconstrucção  da  escadaria  dos  Cinco  Sentidos, 
sendo  adjudicada  por  3:8oo.7^ooo  réis  ao  mestre  pedreiro  braca- 
rense Guilherme  José  Pereira. 


EGREJA  PAROGHIAL  DA  CIVIDADE  (BRAGA) 

E'    de  origem  antiquíssima  esta  egreja  situada  no  local  mais 
importante    da   Bra- 

cara  romana.  A  con 

strucção  actual  é  mo- 
desta e  a  decoração 
interior   pouco  re- 
commendavel.   Tem 
ao   lado  esquerdo  a 
capella  das  Santíssi- 
mas Chagas,  vedada 
por  grade  de  ferro,  e 
construída  em  1  Scjy. 
Foi  instituída  pelo 'dr. 
Pedro  da  Grãa,  fidal- 
go da  casa  real.  cora- 
mendatario   e  admi- 
nistrador vitalício  do 
mosteiro  benedictino 
de   Santa  Maria  do 
Carvoeiro.    O   insti 
tuidor  jaz  em  sarco- 
phago  de  pedra  den- 
tro d'um  arco  aberto 
na  parede  do  lado  da 
Epistola,   com  o  se- 
guinte epitaphio: 

No  altar  tem  esta 
<apella    ura,  primo- 


S.DEPMGRAACOMEN" 

MBRIQíMIFlRpi 
UWEWLMAD8 
FAZERfiTOÉPElUlCOM 

IKORBPO 
l.FA 
LECEOA0S/9.DEFE 

VEREIR0.DEICO2. 


—  2l8- 

roso  quadro  a  óleo,  representando  Christo  na  cruz,  e  estes  dize- 
res ao  fundo: 

HAVRIETIS   AQVAS    IN    GAVDIO 
DE    FONTIB'SALVATOR(/s) 


EGREJA  DE  NOSSA  SENHORA  DO  SÁMEIRO 

(BRAGA) 


A  dois  kilometros  do  Sanctuario  do  Bom  Jesus,  na  parte  su- 
perior do  Monte  Espinho,  passeava  em  setembro  de  1861  o  pa- 
dre Martinho  António  Pereira  acompanhado  d'outro  individuo  seu 
amigo  a  quem  expôz  a  ideia  de  se  promover  a  erecção  de  um  mo- 
numento n'aquelle  sitio,  em  honra  da  immaculada  Conceição,  me- 
morando assim  a  definição  dogmática  por  Pio  IX  em  8  de  dezem- 
bro de  1854. 

A  1 1  de  maio  do  anno  immediato  nomeou-se  uma  commissão 
que  a  28  de  julho  de  i863  obteve  de  D.  Flaviana  Claudina  Re- 
bello  da  Silva  a  cedência  de  40  metros  quadrados  de  terreno  para 
a  erecção  do  monumento,  assentando-se  a  primeira  pedra  a  14  de 
junho  do  referido  anno.  A  12  de  outubro  de  1864  tiveram  princi- 
pio as  obras,  e  a  estatua  da  Virgem,  esculpturada  pelo  estatuário 
portuense  Emygdio  Carlos  Amatucci,  com  14  palmos  de  alto  e 
pelo  preço  de  i:3oo$ooo  réis,  foi  collocada  ás  7  horas  da  tarde  de 
12  de  agosto  de  1869,  e  derrubada  por  uma  faisca  eléctrica  a  9  de 
janeiro  de  i883.  Não  tardou  a  ser  substituida  pela  actual  que  tem 
na  base  estes  dizeres*. 

FEITA  A  EXPENSAS 

DO   BEMFEITOR 

JOÃO  ANTVNES    GVIMARAES 

A'  distancia  de  28  metros  fica  a  modesta  capella  que  mede  3o> 
metros  de  comprido  por  19  de  largo,  sendo  lançada  a  primeira  pe- 
dra no  dia  3i  de  agosto  de  1873. 

Vae  bastante  adiantada  a  construcção  d'uma  formosa  egreja  que 
ha  de  substituil-a  em  breve. 

A  encantadora  imagem  da  Virgem  da  Conceição  que  se  venera 
no  alto  da  tribuna,  foi  esculpturada  em  Roma  por  Eugénio  Macca- 
gnani,  no  anno  de  1876  e  benzida  por  Pio  IX,  como  se  lê  na  pea- 
nha: 

O  SS.  PADRE  PAPA  PIO  IX 

BENZEU  ESTA  IMAGEM 

NO  DIA  22  DE  DEZEMBRO  DE  1876 


2ig 


Egreja  e  convento  de  Montariol  (Braga) 


Num  dos  locaes  mais  aprazíveis  dos  subúrbios  de  Braga,  o 
Monte  Calvelo  que  com  o  Castro  Máximo,  (Monte  de  Castro)  con- 
tiguo,  dividiu  no  século  ix  o  território  de  Braga  e  Dume  (Doação 
de  el-rei  D.  AtYonso  o  Casto,  era  de  878),  os  religiosos  da  Com- 
panhia de  Jesus  adquiriram  por  compra  em  ibôi  uma  grande  ária 
de  terreno  de  cultura  e  n'elle  fizeram  construir  uma  casa  aboba- 
dada de  pedra,  para  recreio  seu  e  feriado  dos  estudantes  do  Col- 
legio  (hoje  Seminário  de  S.  Pedro  e  S.  Paulo)  que  também  lhes 
pertencia. 

O  nome  de  Montariol,  certamente  originado  de  Areal,  nome 
do  logar  que  lhe  rica  nas  fraldas,  é  tão  antigo  que  já  assim  o  de- 
signa uma  escriptura  do  Livro  Fidei  datada  da  era  1 1 1 1  (anno 
de  1078). 

O  padre  Contador  de  Argote,  que  escreveu  a  sua  Hist.  EccL 
de  Braga  no  ultimo  quartel  do  século  xvn,  diz  a  este  respeito: 
«...  que  chamão  de  Montariol,  e  se  dá  este  nome  ao  tal  sitio  ha 
mais  de  duzentos  annos». 

O  Arcebispo  de  Braga  D.  Martinho  Geraldes,  natural  da  fre- 
guezia   de   Semelhe,  instituiu  em  1243  o  Morgado  de  Montariol. 

Os  padres  da  Companhia  possuíram  esta  casa  e  quinta  até  á 


—  220  — 

expulsão  determinada  pelo  Marquez  de  Pombal,  sendo  então  ven- 
dida pelo  estado  ao  pae  do  Visconde  de  Montariol,  passando  d'este 
a  seu  rilho  o  sr.  Visconde  de  Negrellos. 

No  anno  de  1890  veiu  á  praça  por  ordem  do  Banco  de  Credito 
Predial,  de  Lisboa,  a  quem  estava  hypothecada.  Foi  n'esta  epocha 
precisamente  que  o  provincial  dos  Franciscanos  visitou  a  quinta  e 
achando-a  optimamente  situada  para  ser  transformada  num  con- 
vento da  sua  Ordem,  aconselhado  por  muitas  pessoas  de  Braga, 
tractou  da  sua  acquisição,  o  que  se  effectuou  em  Lisboa,  fazendo 
alli  a  escriptura  no  dia  8  de  agosto  de  1890.  A  primeira  missa  que 
os  religiosos  franciscanos  celebraram  no  seu  novo  convento  teve 
logar  no  dia  16  do  mesmo  mez  e  anno,  e  no  dia  18  chegou  a  esta 
casa  o  virtuoso  velhinho  fr.  Joaquim  da  Purificação  que  falleceu 
no  dia  20  de  outubro  de  1899,  sendo  elle  o  primeiro  Superior. 

As  obras  da  magestosa  egreja  começaram  no  dia  5  de  maio 
de  iS()i  e,  ás  1  1  horas  da  manha  de  27  de  setembro  do  referido 
anno,  foi  benzida  a  primeira  pedra  pelo  chorado  Arcebispo  sr.  D. 
António  José  de  Freitas  Honorato,  acolytado  pelos  cónegos  Fran- 
cisco José  Pibeiro  de  Vieira  e  Brito  (hoje  Bispo  de  Angra)  e  Mo- 
reira Guimarães  (Arcipreste  de  Braga),  e  pelo  Desembargador 
João  Nepomuceno  Pimenta,  fazendo  de  mestre  de  ceremonias  o 
rev.  sr.  João  Vicente  da  Costa  e  Cunha,  Abbade  da  Sé.  A  este 
acto  assistiu  como  auctoridade  o  conselheiro  Jeronvmo  Pimentel, 
Governador  Civil  do  Distncto. 

A  fachada  está  concluída,  restando-lhe  apenas  as  duas  torres. 
A  parte  nova  do  convento  é  a  de  dois  andares  que  a  gravura  re- 
presenta encostada  á  egreja. 


~  22  1  - 


Egreja  de  S.  Torquato  (Guimarães, 
(Copia  da  planta  geral  da  obra  em  execução) 


—  222  — 

Nas  proximidades  de  Guimarães,  á  distancia  de  pouco  mais  de 
légua  e  quarto  (6:3oo,  metros  de  estrada  de  macadam,  visinhal  n.° 
i,  construída  em  1872-73),  venera  se  na  egreja  da  sua  invocação 
o  corpo  incorrupto  de  S.  Torquato  que,  segundo  se  crê,  foi  mar- 
tyrisado  por  Muça,  capitão  Árabe,  a  26  de  fevereiro  de  719,  nesta 
freguezia  a  que  o  santo  deu  o  nome. 

Na  Mon.  Lusit,  lê-se  que  S.  Torquato  nasceu  na  Cinania  (Ci- 
tania)  e  que  foi  alli  primeiro  Bispo,  sendo  martyrisado  a  cacete  e 
á  pedrada  pelos  moradores  da  serra  de  Vieira  que  prestavam  culto 
á  idolatria;  e  que  estes  desde  muitos  séculos  vinham  annualmente, 
por  voto,  cingidos  por  cordas  e  descalços,  visitar  a  sepultura  do 
Santo.  Jorge  Cardoso,  no  seu  Agiologio  Lusitano,  diz  que  o  refe- 
rido voto  foi  commutado  pelo  Arcebispo  de  Braga  D.  fr.  Bartholo- 
meu  dos  Martyres  em  certa  quantia  de  cera. 

No  sitio  onde  a  preciosa  relíquia  appareceu  sob  um  montão  de 
pedras  por  indicação  de  «luzentes chammas  nomeio  de  entrelaçados 
matos»,  como  em  1692  nos  diz  o  padre  Torquato  d' Azevedo  (Ant. 
Guim.,  pag.  422),  construiu-se  uma  capellinha  tosca,  e  junto  da 
parede  exterior  do  lado  esquerdo  collocou-se  uma  pia  de  pedra 
onde  cae  a  milagrosa  agua  nascida  na  primitiva  sepultura  do  Santo. 
Os  frades  benedictinos  do  convento  próximo  levaram,  tempo  de- 
pois, para  a  sua  egreja  o  estimável  thesouro  e  alli  o  conservaram 
encerrado  em  tumulo  de  pedra  branca,  de  Ançã  ou  mármore. 

O  padre  António  Carvalho  (Chorogr.,  liv.  2,  cap.  8)  íala-nos 
da  abertura  do  tumulo  em  i5i2.  O  precioso  manuscripto  de  Silva 
Thadim,  fallecido  antiquário  bracarense,  conta  quenoanno  de  1579, 
o  Arcebispo  D.  fr.  Agostinho  de  Jesus  (Castro),  acompanhado  de 
numerosos  bracarenses,  partiu  em  direcção  á  egreja  de  S.  Tor- 
quato para  ordenar  a  abertura  do  tumulo.  O  povo  porém  oppoz-se 
dizendo  que  o  Arcebispo  tentava  levar  o  Santo  para  Braga,  e  o 
Prelado  teve  que  retirar-se  a  toda  a  pressa  para  evitar  tumultos 
de  que  nem  elle  próprio  sairia  illeso. 

O  mesmo  succedeu  em  1637  ao  Arcebispo  D.  Sebastião  de 
Mattos  de  Noronha. 

Foi  então  que  o  tumulo  se  reforçou,  a  expensas  dosparochianos, 
com  paredes  novas  e  grossas  grades  de  ferro,  como  actualmente 
se  encontra,  gravando-se-lhe  na  frente,  em  caracteres  ligados,  esta 
•  inscripcão: 

HOC  TUMULO   1LLES1S   CONDUNTUR 
CARN1BUS   OSSA   TORQUATI   D    •    1'IGNORA  CHARA 


ANNO  DE    l637 

SE   GUARNECEU   ESTA  SEPULTURA 

E  ABR1U-SE   E  ACHOU-SE 

O   CORPO   E  CARNE   INTEIRO, 

VESTIDO   DE   PONTIFICAL,   COM  BÁCULO 


—  22:>  


O  tumulo  antigo 


Esta  obra,  principiada  a  14  de  julho  do  referido  anno,  dias  de- 
pois da  visita  prelaticia,  concluiu-se  a  18  (tal  era  apressa!),  como 
consta  da  Memoria  inserta  no  livro  dos  usos  (Estatuto  velho),  es- 
cripta  pelo  vigário  de  S.  Torquato  o  licenciado  Jeronymo  Coelho, 
da  qual  existe  copia  no  archivo  da  Collegiada  de  Guimarães.  No 
dia  da  conclusão  assistiram  á  abertura  do  tumulo,  entre  grandís- 
simo concurso  de  povo,  o  dr.  Rui  Gomes  Golias,  mestre-eschola 
da  Collegiada,  que  arrancou  o  tornozello  ao  Santo,  vários  cónegos, 
Diogo  de  Barros  notário  Apostólico,  etc.  Por  todos  os  assistentes 
foi  visto  incorrupto  «mirrado  o  rosto,  virado  para  a  banda  esquerda, 


—  224  — 

com   olhos,   nariz,   bocca,  barba  e  orelhas»  e  ao  lado  um  pau  de 
três  a  quatro  palmos  de  comprido.  (  Vide  »rav.  a  pag.  225). 

Os  falsos  Chronicôes  de  Juliano  Peres,  padre  Higuera  e  Flávio 
Dextro,  originaram  entre  os  escriptores  João  de  Barros,  Gaspar 
Estaco,  padre  Carvalho  da  Costa,  Silva  Thadim,  D.  Nicolau  de 
Santa  Maria,  D.  Thomaz  da  Encarnação,  padre  Torquato  d'Aze- 
vedo,  fr.  Bernardo  de  Brito,  Jorge  Cardoso,  D.  Rodrigo  da  Cunha, 
Vaseu,  padres  Bollandistas  (antuerpianos)  fr.  Henrique  Florez  e 
outros,  desencontradissimas  opiniões  á  cerca  d'este  Santo,  muito 
especialmente  da  sua  authenticidade  como  Bispo  de  Acci  (Guadix 
em  Granada),  da  Citania  de  Briteiros,  ou  de  Braga. 

O  dr.  João  de  Barros,  na  sua  geographia,  chega  a  suppor  que 
este  vocábulo  S.  Torquato  seja  corrupção  de  S.  Donato  ! 

O  Arcebispo  D.  fr.  Agostinho  de  Jesus,  na  carta  histórica  Ad 
limina  que  enviou  ao  Papa,  diz  «que  se  acreditava»  que  este  S. 
Torquato  fosse  discípulo  de  S.  Thiago. 

Esta  contenda  considera-se  porém  terminada,  mormente  desde 
que  o  Arcebispo  D.  Rodrigo  de  Moura  Telles  deu  publicidade  a 
um  folheto  de  Santos,  incluindo  nelle  este  Félix  Torquato  a  que 
prescreveu  rito  e  lições  em  29  de  janeiro  de  17 18. 

Está  hoje  averiguado  que  S.  Torquato  Bispo  de  Guadix  existe 
no  convento  de  Cella-Nova  e  que  o  Citaniense  não  tem  a  seu  fa- 
vor provas  suficientemente  seguras,  crendo-se  portanto  que  este, 
de  que  me  occupo,  seja  o  Bispo  bracarense  Félix  Torquato  ou 
Torquato  Félix,  como  dum  e  d'outro  modo  se  lê  no  Breviário,  o 
qual  na  serie  tem  o  numero  i5,  principiando  o  seu  governo  no 
anno  de  6q3,  depois  de  haver  sido  nomeado  Arcipreste  de  To- 
ledo, Bispo  de  Iria  e  por  ultimo  do  Porto. 

Por  ordem  do  Arcebispo  D.  fr.  Caetano  Brandão  abriu-se  pela 
ultima  vez  o  tumulo,  que  ainda  hoje  se  conserva  dentro  da  capella 
de  Santa  Catharina,  lado  do  Evangelho,  examinando  minuciosa- 
mente o  cadáver  o  medico  vimaranense  Miguel  Rebello  de  Bastos 
que  o  julgou  perfeito.  No  dia  3o  de  junho  de  i8o5,  compareceu 
na  freguezia  o  Arcebispo  e  dirigindo-se  á  alludida  capellinha  re- 
vestiu de  pontifical  o  Santo  que  acto  continuo  foi  exposto  á  vene- 
ração dos  fieis,  durante  i5  dias,  na  egeja  parochial. 

Os  povos  cTaquellas  immediações,  desconfiando  sempre  do  Ca- 
bido de  Guimarães,  esperavam  com  anciedade  que  terminasse  o 
praso  concedido  para  immediatamente  penetrarem  de  noite  na 
egreja  e  reconduzirem  o  Santo  para  a  capella  contigua,  fechando-a 
com  a  grade  de  ferro  que  ainda  agora  conserva. 

Pensou-se  desde  logo  na  edificação  de  uma  egreja,  para  a  qual 
apresentou  a  planta  o  architecto  vimaranense  Luiz  Ignacio  de  Bar- 
ros Lima,  e  a  7  de  março  de  1825  tiveram  principio  estas  obras 
no  local   denominado  —  Penedos  de  Maria  do  Monte  Maio,  em 


225 


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—  220  — 


terreno  cedido  por  vários  \  roprietarios  e  por  el-rei  D.  João  VI 
que  também  auctorisou  a  demarcação  effectuada  em  9  de  abril 
do  referido  anno  pelo  Corregedor  de  Guimarães  José  Antó- 
nio de  Almeida,  com  o  comprimento  de  194  varas  e  a  largura 
de  88,  conforme  o  que  se  lê  na  inscripção  lapidar  da  capella- 
mór,  lado  da  Epistola  : 


TEVE   PRINCIPIO   ESTE  TEM 

PLO   NO   DIA-7-DÉ    MARÇO   (de   l8'25)  • 

EM-Q-d'aBR1L  DE- 182 5-0   CORREGEDOR   DE 

GVIMARAES    EMPOSSOV  A  MEZA   DO   TE 

RRENO   PERTENCENTE  AO   SANTO   E('m   Virtude) 

da  regia  provisão  de  (2g)  de  (novembro  de  1824  •  Mede) 

DE   NORTE  A   SVL-I94-VARAS    E   DE 
NASCENTE   A   POENTE-(?fW  PãVãS)  • 


A  inscripção  vae  completada  em  itálico  na  parte  que  o  salitre 
destruiu.  Do  lado  opposto  ha  outra  referente  á  irmandade  do  Santo. 
Diz  assim  : 

EESTA    IRMANDADE   DE    S  •    TORQVA 

TO    ESTÁ   ERECTA    E  CONFIRMADOS 

OS    SEVS    ESTATVTOS    POR   ELREI   O    SENHOR 

DOM  J0Á0-6.°-QVAND0   REGENTE,    EM  RfcSO 

LVÇÁO    DE-2I-D,OVTVBRO    DE    1 806  •    NA   MES 

MA   PROVISÃO   SE  VE  :    QVE   EM-1Ò93-.1A 

HAVIA    ESTATVTO   E   CONFRA 

RIA  DE   S  •    TORQVATO 


Aos  lados  do  altar  existem  outras  duas  lapides  onde,  por  assim 
dizer,  está  compendiada  a  historia  do  notável  sanctuario. 
A  primeira,  lado  do  Evangelho,  diz  : 

4- 

i 

FOI   MARTYRIZADO   O    GI.ORI  CAETANO   BRANDÃO   ARCEBIS 

OSO  S    •     TORQVATO  A-26-DE  PO   PRIMAZ  NO   DIA-4-DE   JV 

FEVEREIRO   DE-719-LOGO   DE  LHO  DE-l852-FOI   TRASLADA 

POIS   FOI   TRASIADADO   PARA  DO   PARA   ESTE  TEMPLO   PELO 

O   MOSTEIRO   VELHO    •     NO  DIA  EMINENTÍSSIMO    SENHOR 

-30-DE  JVNHO  DE-l8o5-FOI   EX  CARDEAL    DOM    PEDRO   PAVLO   DE 

POSTO  A'    PUBLICA  VENERAÇÃO  FIGVEIREDO  DA  CVNHA   E  MEL 

PELO  EX.mo   SENHOR  DOM  FR  ■  LO    ARCEBISPO   DE   BRAGA  • 


—  227  — 

A  segunda,  lado  da  espistola : 

ESTE  TEMPLO   ESTA.'   ISENTO  DIA-8-d' AGOSTO  DE-l8l2  • 

DA    JVRISD1ÇAO    PAROCHEAL    POR  ESTE  DOCVMENTO  ESTA' 

SENTENÇA    PASSADA  EM  JVL  ARCHIVADO    NESTE   TEM- 

GADO,    DADA  PELO   CORREGE  PLO   E  REGISTADO   NA  NO- 

DOR   DE   GVIMARAES   EM-I  I-d'  TA  N.° -3  I  I -FOLHAS- 1  I  2-DO 

ABRIL   DE-l8lI-E    CONFIRMADA  TA BAI  LIÃO -JOÃO    TEIXEIRA 

NA  RELAÇÃO  DO   PORTO  NO  D'ARAVJO,   EM  GVIMARAES  • 


Principiaram  pois  em  7  de  março  de  1825  os  trabalhos  da  con- 
strucção  do  primeiro  templo,  de  que  apenas  se  concluiu  a  capella- 
mór  onde  desde  4  de  julho  de  i852  se  acha  exposta  á  veneração 
publica,  sob  elegante  baldaquino  de  castanho,  a  preciosa  relíquia 
do  corpo  inteiro  de  S.  Torquato.  A  primeira  pedra  foi  lançada 
sobre  os  alicerces  no  dia  20  de  junho  do  referido  anno,  terminando 
em  1846  a  obra  de  pedreiro  que  importou  em  8: 17 1  íí)55o  réis. 
Oito  annos  depois,  em  1854,  fez -se  o  referido  baldaquino,  ainda 
hoje  em  osso,  com  o  qual  se  dispendeu  a  quantia  de  2:35o$665  réis. 

Esta  capella-mor,  que  em  i855  ficou  de  todo  acabada  e  da 
qual,  além  do  baldaquino,  apenas  aproveitam  os  alicerces  para  a  do 
novo  templo  em  construcção,  custou  1 3:223.^047  réis.  Nesta  verba 
não  se  incluem  os  140,^000  réis  do  para-raios  collocado  em  1887. 

A  casa  da  irmandade,  para  residência  do  capellão  e  guarda 
de  alfaias,  concluiu-se  em  1870  por  4:59235560  réis.  A  torre  pro- 
visória construída  em  i852  pela  quantia  de  1 82^600  réis,  recebeu 
em  1877  quatorze  sinos  afinados  (faltam  4  para  o  carrilhão),  im- 
portando todos  em  5:i36$ooo  réis.  Cada  um  tem  em  volta  estes 
dizeres: 

IRMANDADE    DE   S-    TORQVATO   SVBVRBIOS  DE   GVIMARAES 
MANOEL  ANTÓNIO   DA   SILVA  FILHOS  • 
LISBOA  ANNO  DE    1 877  ■ 

O  relógio  foi  collocado  em  1880  e  custou  3 18:475  réio. 


Depois  de  concluída  a  capella-mór  existente,  pensou  a  meza 
da  irmandade  na  substituição  do  projecto  ou  planta  geral  da  egreja 
por  outra  que  a  excedesse  muito  em  elegância  e  riqueza  archite- 
ctonica.  Foi  a  lembrança  bem  acceita  e  a  approvação  recaiu  n'esta 
de  que  aqui  dou  gravura,  a  qual  foi  desenhada  em  Gotha  pelo 
architecto  allemão  L.  Bohrtfledt,  no  dia  2  de  abril  de  1868. 


-228- 

Em  1857  principiaram  a  assentar  os  alicerces  no  mesmo  tra- 
çado que  existia  para  a  continuação  da  primeira  egreja  a  que 
pertencia  a  actual  capella-mór,  ficando  concluídos  em  1871  com  o 
importante  dispêndio  de  17:861:875  réis! 

Gastou-se  á  farta  o  dinheiro  e  não  se  pensou  então  na  sum- 
ptuosidade da  obra  que  já  hoje,  pela  riqueza  de  ornamentação 
delicada  e  profusa,  e  pela  elegância  do  estylo  architectonico  roma- 
nico-bysantino,  com  excepção  das  torres  em  que  predomina  a  re- 
nascença, é  objecto  da  admiração  dos  peritos.  Este  monumento 
de  arte  ficava  mais  magestoso  se  lhe  ampliassem  o  espaço  interior 
que  no  corpo  mede  36'", 20  por  iom,6o  e  no  transepto  34m,c)0. 

A  capella-mór  deve  ficar  com  as  dimensões  da  actual  que  in- 
teriormente mede  i7m,6o  por  7ra,8o. 

Agora  que  alguns  arcos  da  nave  se  approximam  do  fecho,  co- 
meça a  ser  notada  a  pouca  largura  interior. 


Parte  interior  da  nave  em  construccão 


Apezar  do  grande  numero  de  operários  que  diariamente  se 
empregam  nesta  obra,  é  de  presumir  que  os  indivíduos  que  ora 
nascem  não  assistam  á  sua  conclusão,  salvo  se  o  rendimento  an- 


—  229  — 

nual  das  esmolas,  que  já  ascende  a  mais  de  sete  contos  de  réis, 
encontrar  auxilio  decidido  nos  favorecidos  da  sorte. 

A  presente  gravura  mostra  o  adeantamento  da  obra  da  fachada: 


Egreja  de  S.  Torquato  (parte  construída) 


Com  os  dois  grandes  anjos  de  pedra  que  em  1892  foram  collo- 
cados  sobre  o  pórtico  dispendeu-se  1:499:000  réis.  Sustentam  nas 
mãos  uma  fita  larga  com  esta  interrogação  gravada  em  caracteres 


gothicos 


GLORIANTES  AD  QVIT  VALEB1MVS? 


As  estatuas  de  S.  Damazo  e  S.  Geraldo  foram  collocadas  em 
[899.  Designou  as,  a  pedido  da  meza  de  1895-1896,  o  digníssimo 
D.  Prior  de  Guimarães  sr.  conselheiro  dr.  Manuerd'Albuquerque, 
com  approvação  dos  drs.  Manuel  Moreira  Júnior,  Arcipreste,  e 
Manuel  de  Jesus  Pimenta,  vice-reitor  do  Seminario-Lyceu. 

A  primeira  empreitada  d'este  novo  templo  (lado  esquerdo  do 
transepto  até  a  altura  das  portas)  foi  adjudicada  no  mesmo  anno 
da  conclusão  dos  alicerces  (1871)  a  Francisco  Thomaz  Martins  da 
Motta  e  António  José  Pereira,  da  cidade  de  Braga,  por  7:800  réis 
cada  metro  cubico  de  cantaria. 


—  23o  — 

A  segunda  (paredes  lateraes  e  torres  até  próximo  do  primeiro 
patamar  da  escada)  foi  adjudicada  aos  mesmos  por  diversos  pre- 
ços no  dia  12  de  março  do  anno  immediato.  A  terceira  (lado  di- 
reito do  transepto  até  á  altura  das  portas),' foi  entregue  ao  mesmo 
António  José  Pereira  no  dia  2  de  novembro  de  1878  por  12:000 
réis  cada  metro  cubico.  A  quarta  (continuação  da  segunda)  foi 
egualmente  entregue  ao  Pereira  por  i5:ooo  reis  o  metro  cubico. 
A  quinta  e  ultima  (cornija  do  pedestal  em  toda  a  extensão  da  obra) 
foi  adjudicada  a  António  Salgado,  de  Guimarães,  em  29  de  outu- 
bro de  1876,  por  i3:5oo  réis  cada  metro  cubico. 

Desde  então  continuaram  as  obras  por  administração  da  ir- 
mandade e  sob  a  direcção  do  fallecido  conductor  de  i.a  classe 
de  Obras  Publicas,  sr.  Cesário  Augusto  Pinto  até  ao  anno  de  1895, 
em  que  foi  substituído  pelo  notável  architecto  portuense  sr.  José 
Marques  da  Silva,  a  quem  a  primitiva  planta  deve  alterações  de 
importância  capital  para  as  bellezas  que  se  admiram  na  execução 
do  trabalho  de  esculptura.  Em  20  de  abril  de  1897,  a  meza  resol- 
veu convidar  o  mesmo  illustre  architecto  a  visitar  mensalmente 
as  obras;  e  em  assembleia  geral  de  29  de  junho  de  1899  entre- 
gou-lhe  definitivamente  a  direcção. 

—  São  duas  as  romarias  que  annualmente  se  realisam  em  honra 
de  S.  Torquato:  a  primeira,  denominada  pequena,  tem  logar  no 
segundo  domingo  de  maio;  e  a  segunda  no  primeiro  domingo  de 
julho.  Esta  considera  se  a  maior  do  Minho  pela  extraordinária 
concorrência  de  romeiros  nos  três  dias. 


—  23l  — 

EGREJA  E  CONVENTO  DE  TIBÃES 


A  Chorographia  do  padre  Carvalho  diz-nos  que  o  rei  suevo 
Theodomiro,  a  instancias  do  seu  capellão-mór  S.  Martinho,  Bispo 
de  Dume,  fundara  em  562  este  notável  convento  Benedictino,  cujo 
Abbade  era  o  Geral  de  toda  a  Ordem  em  Portugal,  dedicando-o 
•a  S.  Martinho  Turonense  ;  que  o  successor  Miro  ordenou  a  plan- 
tação duma  grande  mata  junto  do  convento,  com  arvores  do  Alem- 
tejo  que,  por  não  serem  de  folha  caduca,  se  presume  fossem  so- 
breiros-, que  D.  Urraca,  filha  de  D.  Affonso  VI,  doara  metade 
do  Mosteiro  á  Sé  de  Tuy,  reedificando-o  em  1080;  que  D.  Payo 
Guterres  da  Silva  o  ampliara,  etc.  Da  pedra  que  se  crê  ter  ap- 
parecido  com  inscripção  referente  á  fundação,  não  temos  um 
testemunho  seguro,  nem  mesmo  consta  que  exista  a  sua  copia ; 
porém  existe  desde  ha  pouco,  para  prova  da  reedificação  no  se- 
sulo  xr,  um  capitel  d'essa  epocha,  descoberto  pelo  actual  possui- 
dor do  convento,  o  meu  illustre  consócio  da  Associação  dos 
Archeologos,  sr.  commendador  José  António  Vieira  Marques,  que 
se  dignou  oíferecer-m'o,  bem  como  outro  compósito  e  outro  ainda 
pertencente  ao  século  xiv,  todos  encontrados  na  alvenaria  do  an- 
tigo claustro  do  Tronco,  destruído  pelo  incêndio  do  dia  1 1  de  ju- 
lho de  1894. 

E'  da  mesma  procede  icia  uma  fonte  de  preciosa  esculptura, 
estylo  renascença  italiana,  em  que  se  lê  a  data  de  1657.  O  sr. 
Vieira  Marques  aproveitou-a  embebendo-a  na  parede  interior  do 
edifício. 

O  capitel  do  século  xi,  encontrado  na  alvenaria  do  século  xvn, 
não  nos  deixa  a  menor  duvida  sobre  a  existência  do  convento  ha 
900  annos,  plus  minus. 

Alem  d'este  testemunho  temos  na  residência  parochial  um  qua- 
dro que  se  refere  do  seguinte  modo  ao  Couto  feito  ao  Mosteiro 
pelo  conde  D.  Henrique  e  a  rainha  D.  Theresa,  em  24  de  mar- 
co de  1 1 10: 


«In  nomine  Patris  &  Filii  &  Spiritus  Sancti:  Ego  Comes  D.  Henricus,  & 
uxor  mea  Infanta  D  Tarasia,  Adfonsi  Regis  filia,  placuit  nobis,  ut  faceremus, 
sicut  &  facimus  Cautum,  &  lerminum  ad  Monasterium  S.  Martini  de  Tibia- 
nes,  &.  facimus  illum  Cautum,  et  Terminum  pro  amore  Domini  nostri  Jesu  Christi 
&  ut  mercedem  inde  habeamus  ante  Deum  umnipotentem  in  diem  Judicii,  & 
ut  Servi  Domini  qui  ibi  habitant,  vel  habitaverint,  in  Missis,  &  in  Psalmis,  etiam 
in  totó  opere,  quod  ad  Djum  pertinet,  nostram  semper  memoriam  habeant,  <Sc 
provobis  Petro  Plaiz,  &  Menendo  Plaiz  &  Pelagio  Plaiz,  qui  nobis  semper  cum 
fide,  &  veritate  servitium  fecestis,  et  facitis.  Et  facimus  per  terminum,  qui  no- 
bis placet,  &  rectus  est,  per  terminum  quomodo  dividit  Palatim  cum  Vilarinho, 
&  per  montem  Maiorem,  quod  est  super  Ulgóso;  &  inde  vadit  per  montem  de 


—  232    — 

Abeleiró,  qui  est  super  Ulgóso;  &  inde,  per  petram  Taramelada,  quae  est  pro- 
pe  de  fonte  de  genti;  &  inde  per  terminum  de  Semelli;  &  inde  quomodo  divi- 
dit  Parada  cum  Semelli;  &  inde  quomodo  dividit  Parada  cum  Forósos;  &  inde 
per  Gernádo;  &  inde  per  Gandarella;  et  inde,  ad  illum  fontem  de  Sancto  Petro 
de  Merelim;  &  inde  ad  Castrum  Malum;  &  inde,  per  illam  carreriam  antiquam; 
&  exit  in  Mocoronni;  &  inde  per  médium  flumen  de  Cadavo;  &  concludit  in  illa 
foze  de  Gesmondi. 

Et  omnia  Regalia  nostra,  quae  continentur  infra  términos  prenotatos,  idcst 
Palatim;  &  illam  varzenam  de  Gerradello,  quae  jacet  sub  villa  Merlim  in  littore 
Catavi,  damus,  atque  concedimus  Sancto  Martino  de  Tibianes,  &  Fratribus  ibi 
commorantibus,  pro  remédio  animarum  nostrarum.  Et  istam  terminationem 
Monasterii  Sancto  Martini  de  Tibianes,  quam  facimus,  nos  ita  super  nominati 
ita  facimus.  Et  ita  Regalia  super  nominata  damus,  &  concedimus,  ut  de  hodie 
die,  vel  tempore  sedeat  ipse  terminus,  sive  Cautus  de  jure  nostro  abrafus,  in 
vestro  jure,  atque  domínio,  ad  illud  Monasterium  traditus.  Et  si  quis  homo,  tam 
potens,  quam  impotens,  vel  Rex  etiam,  qui  hujus  terrae  imperium  obtinuerit, 
ab  hac  die  in  antea,  hoc  factum  nostrum  infringere  voluerit;  in  primis  sit  ex 
comunicatus,  &  anathematisatus,  &  cum  .luda  Domini  traditore  habeat  parteci- 
pio  &  Pareat  post  partem  prefacti  Genobii,  aut  cui  ejus  vocem  tenuerit,  XII. 
mille  libras  auri;  &  hoc  factum  nostrum  ratum  semper,  &  firmum  permaneat. 
Factum  Cautum  simul,  &  terminum.  vu.  Kalendas  Aprilis.  Era  m  c.xvm.  Ego 
Comes  Henricus,  una  cum  uxore  mea  Infanta  Domna  Tarasia,  nostris  manibus 
confirmamus,  &  robor  j- f  amus.  Nunus  Tibianensis  Cenobii  Dei  gratia  Abbas, 
quod  vidi  ofr.  Petrus  Vimaranensis  Clerici  Comitis  HT. 

Pro  testes.  —  Petrus,  Plagius,',Gondisalvus,  Godinus.  Bernardus  Toletanae 
sedis  Archiepiscopus,  &  S.  R.  Eccl.  Legatus,  qui  hujus  operis  adjuctor  bónus 
&  actor  extiti  sub  Dei  gratia,  &  legatione  comissa,  hoc  múnus  ratum  semper, 
firmum  manere  praecipio,  praecipiendo  confirmo.  Menendo  Venegas  continens 
Castelu  S.  Grucis  ofr.  Gomice  Nunis  contin.  S.  Christophori  ofr  Egas  Monis. 
contin.  S.  Martini  ofr.  Eg&s  Gondisindis  contin.  Bayam  ofr.  Plagius  Soaris  con- 
tin. Amayam  ofr.  Fafila  Lusi  contin.  Lnginoso.  Egas  Palais  contin.  Burio.  Go- 
mes Venegas  contin.  Penelam  ofr». 


E'  toda  abobadada  de  pedra  a  magnifica  egreja  com  as  suas. 
capellas  collateraes  e  rica  talha  dourada. 
O  órgão  tem  estes  dizeres  na  frente  : 

«Sendo  D.  Abb  f  Gal  da  Congregam 

O  R1?0  P.  M.  D°r  Fr.  José  Joaquim 

de  Sta  Thereza. 

Fez  este  órgão  no  anno  de  1785 

D.  Francisco  António  Solha  vice 

Cônsul  de  Hespanha  por 

S.  Mag.  Cath.» 

A  dividir  as  cadeiras  do  coro  que  se  fez  em  1667,  sendo  Gerai 
Fr.  Bento  da  Gloria,  ha  bustos  de  santos  a  que  se  refere,  por  or- 


—  233  — 

dem  numérica,  o  Index  seguinte  em  dois  quadros  que  por  curio- 
sidade copio  : 

n.  p.  s.  bento  foi  o  primeiro  inventor  do  Rosário  da  Virgem. 
Accrescèntou  no  officio  Divino  o  Deus  in  adjutorium ;  ordenou  que 
no  principio  das  horas  se  diga  a  Gloria  Patri  e  nas  matinas  o 
hymno  Te-Deum  laudamus. 

n.  p.  s.  gregorio  magno  inventou  o  cantochão  Gregoriano  ;  ac- 
crescèntou Ora  pro  nobis  Deum  na  antífona  Regina  Caeli ;  com- 
pôs a  maior  parte  das  ceremonias  da  missa  ;  instituiu  a  adoração 
da  cruz  na  sexta-feira  da  paixão;  o  lava  pedes  na  quinta  feira  \  a 
ceremonia   da   cinza  na  primeira  quarta-feira  da  Quaresma,  etc. 

Vrbano  ií.  inventou  o  Officio  menor  de  Nossa  Senhora. 

Vrbano  iii.  Instituiu  a  festa  do  Corpus  Christi. 

S.TA  Ivliana  a  quem  primeiro  foi  revelada  a  dita  festa. 

O  cardeal  cvido  ordenou  que  quando  se  levantasse  a  hóstia  na 
missa  se  tocasse  uma  campainha  e  que  também  a  fossem  tangendo 
deante  do  Senhor  quando  o  levão  aos  enfermos. 

S.  oddo  abb.  Ordenou  o  Officio  de  S.  Martinho. 

S.  leão  ív.  inventou  a  Octava  da  festa  da  Assumpção  da 
Virgem. 

S.  anselmo  Arcebispo  Cantuariense  foi  o  inventor  da  festa  da 
Puríssima  Conceição. 

Innocencío  iv  Ordenou  a  festa  da  Natividade. 

Pavlo  diácono  compôs  o  hymno  do  Baptista.  O  nosso  Guido 
Aretino  achou  as  6  sylabas ;  ut  Ré,  Mi,  Fa,  Sol,  La,  sobre  as 
*quaes  se  compoz  o  dito  hymno. 

S.  Ildefonso  foi  o  inventor  da  festa  da  Expectação. 

Evgenio  iii.  inventou  a  festa  da  Annunciação. 

Gregório  ix  ordenou  o  costume  de  tocarem  o  sino  ás  Ave-Ma- 
rias  nas  egrejas,  depois  do  pôr  do  sol. 

Gregório  iv  compôs  o  Officio  e  ordenou  a  festa  de  todos  os 
Santos,  ordenando  que  se  solemnisasse  em  o  i.°  de  novembro. 

S.  odilio  abbade  inventou  a  devoção  das  almas  dos  fieis  defun- 
ctos  que  se  costuma  fazer  em  o  primeiro  dia  depois  da  festa  de 
todos  os  Santos. 

S.  ovido  abbad  foi  .ruem  inventou  a  mão  do  canto  das  seis  sy- 
labas com  que  se  aprende  e  compõe  a  musica. 


No  Arctfivo  da  Mitra  guarda-se  um  Rescripto  do  Concilio  de 
Constança  (anno  de  141 7)  o  qual  ordena  ao  Abbade  de  Tibães  que 
faça  restituir  os  bens  que  andavam  alheados  da  Mesa  Archiepis- 
copal. 


-234- 

No  livro  7.",  íi.  39  v.  e  40,  do  município  bracarense  existe  uma 
concordata  celebrada  entre  a  camará  e  o  convento  de  Tibães  para 
a  reparação  da  ponte  de  Prado,  sobre  o  Cavado.  Provavelmente 
resultou  d'essa  concordata  a  construcção  da  ponte  actual,  ?obre 
as  guardas  da  qual  existem  as  armas  do  referido  convento  com 
esta  exquisita  mas  conceituosa  inscripçao  de  leitura  difficil : 


ESTA  OBRA  FEZ  ANTÓNIO  DE 
GRASTO  DA  VILA  DE  VI\NA 

167o  


EiVICO 

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G4MVIDÃBREVENV£ 
NT  E 


Leitura:  —  Esta  obra  fez  António  de  Crasto,  da  villa  de  Vianna, 
no  anuo  de  1676. 

Emquanto  tiveres,  deias  (dá).  Mira  (olha)  por  ti,  sê  prudente. 
Asi   (assim)  como  se  paga  la  ponte  se  paga  la  vida  brevemente. 

Pende  da  parede  do  pateo  d'este  convento  um  grande  quadro 
a  óleo,  de  alto  merecimento,  representando  as  individual  dades 
mais  notáveis  em  santidade  e  talentos,  pertencentes  á  Ordem  be- 
nedictina.  Tem  á  margem,  em  toda  a  volta,  os  pavilhões  dos  pai- 
zes  onde  a  mesma  Ordem  possuiu  conventos. 


—235 


CRUZ    DE    S.    GONÇALO 

> 

Tem  esta  denominação  porque  se  diz  ter  assistido  ao  baptismo 
de  S.  Gonçalo,  nascido  em  Tagilde,  concelho  de  Guimarães. 

A'cerca  d'esta  cruz  lê-se 
na  Revista  de  Guimarães, 
vol.  XI  pag.  29:  «Remonta 
evidentemente  aos  séculos 
xin  ou  xiv.  E'  de  prata  so- 
breposta em  madeira,  os- 
tentando em  alto  relevo 
ornamentações  de  folhas 
de  vide  e  terminando  as 
hastes  em  forma  de  flor  de 
liz;  na  frente,  no  transepto 
tem  as  lettras  ihs,  e  quasi 
nas  extremidades  meda- 
lhões sobrepostos  com 
gravuras  em  alto  relevo 
que  representam  :  no  alto 
da  cruz  uma  figura  mas- 
culina nimbada  sustentan 
do  um  livro  (?)  nas  mãos; 
no  do  braço  direito  um 
pelicano  \  no  do  esquerdo 
a  imagem  da  Virgem  (?) ; 
no  do  fundo  um  anjo  com 
um  papel  de  musica  nas 
mãos ;  na  parte  posterior 
tem  outros  quatro  meda- 
lhões, não  sobrepostos  com 
os  symbolos  dos  evan- 
gelistas ;  no  do  alto  da  cruz  a  águia ;  no  do  braço  direito  o  anjo  ; 
no  do  esquerdo  o  leão;  no  fundo  o  boi  d'azas. 

Na  exposição  d'ourivesaria  feita  em  i883  no  Palácio  de  Crys- 
tal,  do  Porto,  esteve  exposta  esta  cruz,  sendo  apreciada  como  jus- 
tamente merecia». 

Esteve  também  na  exposição  de  arte  sacra-ornamental  de  Lis- 
boa em  i8q3  por  occasião  do  centenário  Antonino.  O  sr.  Joaquim 
de  Vasconcellos  escreveu  no  Commercio  do  Porto  n.°  181  de  1  de 
agosto  de  1896:  «Na  mesma  sala  4.a...  está  perdida,  quasi  oc- 
culta,  uma  jóia  de  elevado  preço  —  a  cruz  de  prata  attribuida 
a  S.  Gonçalo  d' Amarante.  A  depositaria  d'esta  jóia  é  a  egreja 
de  Tagilde,  perto  de  Vizella.  .  .  Pertence  ao  estylo  românico  de 
transição :    os    argumentos   em   que   se   funda   a  attribuição,   em- 


—  236 


bora  não  sejam   absolutamente  seguros,  merecem  sério  e  detick> 

exame » . 

Em   correspondência   de  Vizella  para  o  mesmo  jornal  n.°  173 

de  7  de  julho  de  1880,  diz  o 
fallecido  Manuel  Maria  Ro- 
drigues :  «a  cruz  de  Tagilde 
ambicionada  pelos  frades 
d^marante  que  offereceram 
outra  de  prata  e  400:000 
réis». 

CÁLICE 

DE    S.    SALVADOR 

DE    BRITEIROS 

E'  de  cobre,  excepto  a 
copa  que  não  pôde  deixar 
de  ser  de  prata  dourada. 

Este  curioso  cálice  mede 
de  altura  oin,3o  e  tem  na 
copa  0,08  de  diâmetro.  O 
nó,  bastante  desenvolvido,  é 
bem  lavrado  como  a  base 
que  se  divide  em  seis  gomos 
com  emblemas,  e  em  dois 
d'elles  as  palavras :  britei- 
ros  e  bravo,  designando  a 
primeira  a  freguezia  a  que 
pertence  e  a  segunda  pro- 
vavelmente o  sobrenome  da 
offe rente. 


—  237  ~ 

CAPELLAS  ' 
GAPELLA    DE    S.    LOURENÇO    DA    ORDEM 


Nos  subúrbios  de  Braga,  a  pequena  distancia  da  egreja  de  S.  Fru- 
ctuoso,  existe  a  capella  de  S.  Lourenço  da  Ordem,  notável  pela 
tradição  de  ter  sido  sagrada,  de  pertencer  aos  Templários,  no 
tempo  em  que  tinha  contigua  uma  Gafaria,  de  servir  para  os  có- 
negos alli  resarem  em  coro  quando  grassavam  na  cidade  epide- 
mias, pelos  preciosos  azulejos  que  interiormente  conserva,  e  pela 
porta  principal  gothica  a  denunciar,  a  sua  muita  antiguidade.  No 
lado  direito  da  sua  fachada  vê-se  embebida  uma  grande  pedra  com 
esculptura  representativa  da  anterior  frontaria  da  Sé  com  as  suas 
duas  torres  acastelladas  e  entre  ellas  a  imagem  da  Virgem  que 
iem  estes  d.zeres  na  peanha  : 

A   MA    DASSCE   DE   BK A 


GAPELLA   DE    SANTA   MARTHA    DAS    CORTIÇAS 

(BRAGA) 

No  alto  do  monte  d'este  nome,  onde  se  conservam  abundan- 
tes vestígios  de  habitação  luso-romana,  construiu  o  Arcebispo 
D.  Diogo  de  Sousa  uma  capella  da  invocação  de  Santa  Martha,  da 
qual  ainda  existe  o  arco  interior  com  o  brazao  prelaticio. 

Os  frades  do  extincto  convento  da  Falperra  não  levavam  a 
bem  que  o  parocho  de  Esporões  recolhesse  as  numerosos  esmo 
las  que  os  fieis  deixavam  na  referida  capella,  e  construíram  na 
vertente  do  monte,  junto  do  caminho  dos  romeiros,  outra  da  mes- 
ma invocação  de  Santa  Martha  que  o  povo  denomina  do  leão,  por 
ter  ao  lado  um  leão  de  pedra  a  jorrar  agua  pela  bocca.  Esta  ro- 
maria é  grandemente  concorrida  e  os  pedidores  das  duas  capei 
las  divertem  n'aquelle  dia  o  povo  com  interminável  aranzel  para 


1  Os  nomes  de  capella  e  capellão  provém  do  costume  dos  reis  de  França 
levarem  nas  suas  expedições  a  capa  de  S.  Martinho  juntamente  com  outras  re- 
líquias, alguns  Bispos  e  ecclesiasticos  que  celebravam  missa  ao  ar  livre  como  se 
fora  na  egreja.  O  uso  das  capellas  domesticas  é  attribuido  a  Constantino  que  fez 
construir  uma  no  seu  palácio. 

A  lei  de  1860  extinguiu  as  capellas  vinculares. 


-238- 

que  se  acredite  que  uma  das  imagens  é  mais  milagreira  que  a 
outra. 

A  pequena  distancia  d'esta  ultima  capella,  e  ao  seu  lado  es- 
querdo, ha  um  grande  penedo,  bastante  gasto  na  parte  inferior^ 
com  estes  dizeres  em  caracteres  elegantes:  grandia  mala  meia. 

E'  provável  que  os  frades  venerassem  alli  alguma  imagem  de 
Santa  Maria  Magdalena  a  chorar  os  seus  grandes  males. 


CAPELLA    DE    SANTA    MARIA    MAGDALENA 


No  referido  monte  da  Falperra,  logar  antigamente  denominado 
da  Portella  de  Espinho,  pouco  distante  da  capellinha  de  Santa 
Mártha  do  Leão,  construiu-se  no  século  xv  uma  ermida  em  que 
principiou  a  ser  muito  venerada  a  imagem  de  Santa  Maria  Ma- 
gdalena, fundando-se-lhe  em  1 635  uma  confraria  que  pouco  de- 
pois dava  principio  á  construcção  da  actual  capella  elegantemente 
esculpturada. 

No  dia  22  de  julho  de  1738  foi  para  alli  trasladada  a  imagem 
que  então  se  esculpturou  em  granito  e  que  por  occasião  de  gran- 
des calamidades  era  devotamente  conduzida  para  a  cidade.  Pa- 
rece que  a  maior  penitencia  consistia  na  incommoda  conducção. 
Esse  antigo  costume  persiste  ainda,  mas  a  imagem  é  outra  e  de 
madeira. , 

Nas  Antiguidades  d'Entre  Douro  e  Minho  refere-se  que  os 
parochianos  da  próxima  freguezia  de  Santa  Christina  de  Longos 
eram  obrigados  a  dar  annualmente  ao  seu  abbade,  no  dia  da  festa 
da  peccadora  de  Magdala,  três  figos  lampãos  e  uma  cabaça  d' agua. 
A  designação  de  lampãos,  como  o  indicam  os  prophetas  Jeremias 
e  Micheas,  aquelle  elogiando  os  figos  que  viu  num  cesto  á  porta 
do  templo,  e  este  dizendo :  Precoces  ficus  desideravit  anima  mea, 
indicam  os  temporaos. 


CAPELLA   E   CONVENTO   DO   VARATOJO 

Esta  capella  fica  entre  as  de  Santa  Maria  Magdalena  e  Santa 
Martha  do  Leão.  O  convento,  que  era  modestíssimo,  e  que  foi 
construído  a  expensas  dos  bemfeitores,  distinguindo-se  n'este  nu- 
mero Domingos  Fernandes  Lata,  está  sendo  substituído  por  um 
edifício  elegante  e  vasto,  graças  á  dedicação  do  Juiz  da  irmandade, 
o  sr.  Manuel  Simões  Braga. 

A  primeira  pedra  do  extincto  convento  que  abrigou  i3  frades 


—  239  — 

professos  e  que  teve  quatro  portas  exteriores  sobre  duas  das  quaes 
havia  os  dizeres:  — solidão,  silencio  e  paz —  casa  de  devs,  porta 
do  cso,  foi  lançada  no  dia  24  de  agosto  de  1828  pelo  Vigário  Ge- 
ral Manuel  José  Leite  Pereira,  Abbade  de  Maximinos,  fallecido  a 
7  de  março  de  i83o.  Na  egreja  conserva-se,  para  memoria,  uma 
cadeira  em  que  se  assentou  o  sr.  D.  Miguel  de  Bragança  quando 
alli  foi  de  visita. 


CAPELLA    DE    SANTO    ADRIÃO    DA   GORRICA 

(BRAGA) 

Na  margem  direita  da  antiga  estrada  de  Guimarães,  aguas  ver- 
tentes do  monte  do  Picoto,  construiu-se  em  1676  esta  capella  que 
tem  porta  de  arco  e  alpendre,  como  todas  as  da  epocha. 

Sobre  a  porta  lê-se  : 

ANT   S   OBF   (SÍc) 

INHO  A   M 

ANDOV  F 

i576 
Leitura :— António  Sobrinho  (?)  a  mandou  fazer  no  anno  de  1 576. 


CAPELLA    DE    S.    LAZARO   (GUIMARÃES) 

E'  de  construcção  singelíssima  esta  capella.  Está  situada  no 
logar  dos  Pombaes,  entrada  da  rua  de  D.  João  I. 

Data  do  anno  de  1600,  como  nos  diz  o  seguinte  lettreiro  gra- 
vado sobre  a  porta  : 

ESTA   IGREIA   SE  FEZ  NO  ANO   DE    iÔOO. 

Teve  contigua  a  Gafaria  dos  Lázaros  administrada  pela  Camará 
Municipal  e,  desde  1681,  pela  meza  administradora  da  Miseri- 
córdia. 

Fica-lhe  quasi  em  frente  o  padrão  coberto  de  abobada  de  gra- 
nito, commemorativo  da  romana  que  D.  João  I  fez  a  Nossa  Se- 
nhora da  Oliveira  em  acção  de  graças  pela  tomada  de  Ceuta. 
Desde  20  de  março  de  i863  e  29  de  agosto  do  anno  immediato, 
effectuou-se  a  sua  mudança  do  centro  da  rua,  á  distancia  de  2m,3o, 
onde  marcava  o  sitio  em  que  o  monarcha  se  descalçou  para  de- 
votamente se  dirigir  á  Collegiada. 


—  240  — 

O  cruzeiro,  que  é  todo  de  mármore  branco,  muito  elegante, 
compõe-se  de  uma  columna  alta  e  o  Christo,  bem  esculpturado, 
em  cruz  florida. 


CAPELLA  DE  SANTA  LUZIA  (GUIMARÃES) 

Está  situada  na  rua  do  mesmo  nome  e  foi  construída  no  anno 
do  1600.  A  porta  principal  é  de  arco  e  tem  na  frente  um  alpen- 
dre sobre  columnas  toscas  de  granito,  cobrindo  um  púlpito  sin- 
gello,  egualmente  de  granito,  que  se  encosta  ao  lado  direito. 

E'  administrada  pelo  Cabido  que  no  dia  da  romaria  annual 
manda  alli  celebrar  missa  cantada  com  sermão  em  troca  das  mui- 
tas esmolas  que  então  recolhe.  Venera-se  nesta  capella  a  pequena 
imagem  de  S.  Bento  que  esteve  numa  das  portas  da  cidade. 


CAPELLA    DE    NOSSA    SENHORA   DA   CONCEIÇÃO 

(GUIMARÃES) 

Um  pouco  distante  da  ponte  de  Santa  Luzia,  antiga  estrada  de 
Braga,  alveja  por  entre  frondoso  arvoredo,  em  logar  vistoso,  esta 
formosa  capella  com  seu  alpendre,  construída  em  meado  do  sé- 
culo xvii.  E'  possível  que  antes  d'esta  houvesse  no  mesmo  local 
outra  muito  antiga,  pelo  menos  do  tempo  do  cruzeiro  que  se  er- 
gue no  largo  fronteiro  e  que  tem  a  data  de  i58o. 

A  capella  é  interiormente  azulejada  e  o  tecto  apainellado  re- 
presentando a  vida  de  Nossa  Senhora. 

A'  novena  que  annualmente  se  faz  nesta  capella  assistem,  desde 
tempos  immemoriaes,  os  estudantes  da  cidade  promotores  dos 
festejos  escholasticos  em  honra  de  S.  Nicolau,  os  quaes  partem 
para  alli  ás  4  horas  da  manhã  rufando  em  tambores  e  regressam 
á  cidade  com  o  mesmo  enthusiasmo  da  partida. 


CAPELLA    DA    MADRE    DE    DEUS    (GUIMARÃES) 

Na  margem  direita  da  estrada  que  conduz  a  S.  Torquato  existe 
esta  capella  fundada  em  princípios  do  século  xvi  pelo  cónego  Gon- 
çalo Annes.  A  actual  construcção  data  do  século  passado.  Tem 
uma  irmandade  que  annualmente  realisa  a  festividade  e  romaria 
no  dominso  do  Bom  Pastor. 


—  241  — 

CAPELLA   DE   NOSSA   SENHORA   DA    LUZ 

(GUIMARÃES) 

Esta  capella  com  seu  alpendre  sobre  a  porta,  e  púlpito  de  pe- 
dra, está  situada  num  pequeno  monte,  a  pouca  distancia  do  cemi- 
tério publico.  A  sua  construcção  data  do  primeiro  quartel  do  sé- 
culo xvii.  Effectua-se  alli  a  2  de  fevereiro  uma  romaria  numerosa- 
mente concorrida  de  povo  da  cidade. 


CAPELLA  DE  S.  JOÃO  DA  PONTE  (BRAGA) 


E'  assim  denominada  por  estar  próximo  das  pontes  velha  e 
nova  de  Guimarães,  entre  as  quaes  annualmente  se  representa  com 
o  máximo  brilhantismo  o  baptismo  de  Jesus  pelo  propheta  judaico, 
que  na  vida  pastoril  gastou  a  mocidade  abrigando-se  numa  Antra, 
como  nos  diz  Gavanto  (Thes.   Sacr.J: 

«Antra  deserti  teneris  sub  annis, 

Civium,  turmas  fugiens,  petisti, 

Ne  levi  posses  maculare  vitam 

Crimine  linguae.» 

E'  acanhada  e  de  architectura  singella,  tendo  á  entrada  um 
al-pendre  sustentado  por  seis  columnas  toscanas.  Na  verga  da 
porta  lê-se:  anno  de  1616,  o  que  indica  uma  reconstrucção  da  an- 
terior fundada  no  mesmo  local  a  expensas  do  Arcebispo  D.  Diogo 
de  Sousa  (i5oõ-32),  e  na  qual  se  instituiu  uma  irmandade  para  oc- 
correr  ás  despezas  dos  festejos  baptistinos,  cuja  fama  data  de  tem- 
pos afastadissimos,  sem  duvida  muito  anteriores  ao  reinado  de 
D.  João  I  em  que,  por  determinação  real,  todos  os  Municípios  fo- 
ram obrigados  a  realisar  com  pompa  estes  festejos.  De  longes  ter- 
ras accodem  a  Braga  centenares  de  romeiros,  embora  nas  suas  vi- 
sinhanças  deixem  as  festas  que  se  realisam  em  honra  do  mesmo 
Santo  que  é  o  mais  popular  da  longa  lista  do  Flos-Sanctorum. 

Em  toda  a  parte  estas  folganças  mantêem  um  caracter  sacro- 
profano  que  não  pôde  deixar  de  provir  das  velhas  festas  pagans. 
As  cantigas  bregeiras  do  nosso  povo  em  honra  do  Baptista,  as 
cavalhadas  e  montarias  que  em  tempos  afastadissimos  os  braca- 
renses annualmente  faziam  nos  arredores  da  cidade,  na  véspera 
da  festa  do  Precursor,  tudo  robustece  a  minha  supposição. 

Um   documento  inédito   do    século   xvn,    citado  por   Camillo 

16 


24'2  — 

Casteho  tíranco  na  Gaveta  Litteraria  do  Porto,  n.°  7,  diz-nos  que 
ainda  naquelle  tempo  os  cavalleiros  bracarences  lançavam  porcos 
na  contada  dos  Arcebispos,  sendo  um  d'elles  de  cor  preta,  creado 
durante  todo  o  anno  á  custa  d'um  dos  dois  mordomos  para  esse 
fim  nomeados.  Rompia  a  madrugada  do  S.  João  e  os  nobres  diri- 
giam-se  ao  alto  do  Picoto  onde  recebiam  as  orvalhadas  e  solta- 
vam o  porco  preto  para  o  perseguirem  até  á  margem  esquerda 
do  rio  fste1,  aonde  o  martyr  pachiderme  encontrava  sobre  a 
ponte  velha  um  grupo  de  moleiros  que  forcejavam  por  lhe  impe- 
dir a  passagem. 

Se  o  porco,  entre  os  dois  fogos,  se  decidia  pela  travessia  do 
no,  vencia  a  moleirada  que  tomava  conta  d'elle,  para  o  dividir  ir- 
mãmente ;  e  em  caso  contrario,  isto  é,  conseguindo  atravessar  a 
ponte,  era  comido  pelos  perseguidores  victoriosos. 

Depois  d'isto  dirigiam-se  os  cavalleiros  á  alameda  das  Carva- 
lheiras e  alli  recebiam  d'outro  mordomo  de  S.  João  os  vistosos 
cestinhos  de  fructa,  que  tomavam  toda  a  meza  de  pedra  em  que 
ainda  hoje  se  lê  o  seguinte  dividido  pelos  quatro  lados :  bracara 
avgvsta  fidelis  et  antiqva,  e  lá  os  levavam  alegremente  ás  pes- 
soas da  sua  estima  2.  A'  corrida  do  porco  preto  e  ás  cavalhadas, 
seguiu-se  provavelmente  a  festa  semi-pagan  do  candeleiro,  pro- 
movida pela  Confraria  de  S.  João  na  madrugada  de  24  de  junho 
e  extincta  pelo  Arcebispo  D.  Aífonso  Furtado  de  Mendonça 
(1618-1626,)  em  nome  da  moralidade  publica. 

No  livro  6.°  dos  Accordãos  da  Confraria,  anno  de  1D43,  pro- 
põe-se  a  reducção  das  despezas  do  candeleiro  para  que  apenas  se 
gastassem  seis  mil  réis  e  vinte  e  duas  libras  de  cera;  e  que  no  be- 
berete  ou  consoada  na  madrugada  de  S.  João  não  se  gastasse  mais 
de  três  mil  réis. 

Succedeu  a  tudo  isto  a  procissão  do  Rei  David  que  ainda  hoje 
se  observa  muito  modificada,  sem  andores,  a  contento  dos  povos 
das  freguezias  ruraes  que  se  acotovelam  para  assistirem  á  dança 
do  barbado  Rei  David  com  a  sua  comitiva,  pastores,  cantoria  do 
anjo  da  nuvem  com  o  S.  Joãosinho  num  nicho  de  verdura  a  dar 
beijamão  e  a  comer  doces  ! 

Desde  o  anno  de  1893  que  as  commissões  promotoras  dos  fes- 
tejos baptistinos  alteram  o  secular  sistema  de  concentrar  em  volta 
da  capellinha  as  festas  da  véspera  e  do  dia,  promovendo  desde 
então  vistosas  illuminações,  certamens  musicaes,  orpheons,  rifas, 
quadros  dissolventes,  fontes  luminosas,  etc,  no  jardim  do  campo 


1  No  dia  3o  de  junho  de  1779  morreram  32  pessoas  afogadas  pela  enchente 
d'este  pequeno  rio. 

2  Estes  dizeres  estiveram  gravados  no  plano  da  meza  até  que  a  Camará  de 
1625  os  fez  mudar  para  os  lados. 


—  243  — 

«de  Santa  Anna,  onde  concorrem  milhares  de  pessoas  que  com  o 
producto  das  entradas  cobrem  as  despezas  todas. 


O  baptismo  adoptado  po.r  S.  João  destinava- se  unicamente  a 
purificar  os  que  o  recebiam.  As  maiores  auetoridades  da  egreja 
dizem  que  não  remittia  peccados  porque  lhe  faltava  a  graça  san- 
tificante. Por  isso  os  Efezios,  que  já  eram  baptisados,  receberam 
muito  depois  o  verdadeiro  baptismo  que  Jesus  Christo  instituirá 
dizendo  aos  seus  onze  Apóstolos :  Emites  ergo  docete  omites  gen- 
tes, baptisantes  eos  in  nómine  Patris,  et  Filii,  et  Spiritus  Sancti. 

Pôde  supprir  a  falta  do  baptismo  pela  agua,  o  baptismo  pelo 
fogo  e  pelo  desejo. 

A  desproporcionada  imagem  de  S.  Christovão  que  se  venera 
na  capella  da  Ponte  e  que  figura  na  scena  do  baptismo,  collocan- 
do-a  ao  centro  do  rio  em  attitude  de  fazer  a  travessia,  é  muito 
procurada  por  quem  tem  fastio;  e  em  tempos  que  já  vão  longe  o 
Município  concedia  certos  privilégios  aos  lavradores  da  visinha 
freguezia  de  Ferreiros  que  a  conduziam  em  andor  na  procissão  do 
Corpus  Christi. 


Parte  do  local  de  S.  João  da  Ponte  a  estrada  de  macadam 
que  liga  as  duas  cidades — Braga  e  Guimarães. 

A'  distancia  de  menos  de  2  kilometros  existiram  dois  pinheiros 
mansos,  muito  copados,  de  proporções  gigantescas,  sendo  ha  bas- 
tantes annos  derrubado  o  da  margem  esquerda  e  conservando-se 
o  da  direita  até  que  em  novembro  de  1895  a  proprietária  snr.a 
D.  Maria  Couto,  da  rua  do  Carvalhal,  sem  o  minimo  respeito  por 
essa  vida  tão  longa,  o  vendeu  por  3i.^5oo  réis. 

Os  seus  braços  frondosissimos  produziram  19  carros  de  lenha 
que  se  venderam  in  situ  pela  quantia  de  i8$ooo  réis.  A  serragem 
custou  37.^000  réis  e  grande  parte  da  sua  madeira  foi  vendida  ao 
sr.  António  Fernandes  Lopes  que  a  empregou  na  casa  que  então 
mandou  construir  na  rua  dos  Capellistas,  actualmente  arrendada 
á  Associação  Catholica. 

O  desapparecimento  do  pinheiro  da  Gregoria,  que  deu  o  no- 
me ao  logar  e  que  muita  gente  de  longes  terras  conhecia,  foi  ge- 
ralmente lamentado.  No  mesmo  sitio  plantou-se  em  janeiro  do  an- 
no  immediato  outro  que  já  hoje  mede  uns  2  metros  de  altura. 


—  244  — 

CAPELLA  DE  SANTA  JUSTA  (BRAGA) 

Está  situada  próximo  da  Ponte  dos  Pellames,  ao  fundo  da  rua 
do  mesmo  nome.  Foi  construida  a  expensas  de  Gracia  Mart.ns, 
viuva  de  Rodrigo  Ennes  (o  Peru),  no  anno  de  1018,  como  se  lê 
na  seguinte  inscripçao  da  porta  principal : 

ESTA. CAP. ELA. MANDOV  FAZER  GRACIA. MZ 
MOLHR.QVE.FIC.OV.DR.°.ENES.O  PERV.l6l8.A 

Pertenceu  ao  Morgado  de  Torneiros.  Está  nella  erecta  uma 
irmandade  das  Almas  indulgenciada  pelo  Papa  Gregório  xvi.  Ao 
fundo  da  sacristia  ve-se  uma  cruz  com  a  imagem  de  Christo  em 
pintura,  sob  a  invocação  do  Senhor  do  Soccorro.  Esteve  em  tempo 
num  oratório  de  madeira  que  ainda  hoje  existe  na  fachada  da 
casa  n.°  41  da  me^ma  rua. 

GAPELLA  DE  SANTO  ANTÓNIO  (BRAGA) 

Está  situada  ao  nascente  do  antigo  campo  dos  Touros,  actual- 
mente praça  Municipal,  e  teve  a  sua  origem  numa  capella  de  Nossa 
Senhora  de  Nasareth  construida  em  1546,  a  expensas  do  Arce- 
bispo D.  Manuel  de  Sousa,  junto  da  porta  da  muralha  da  cidade, 
que  tinha  no  alto  um  nicho  com  a  imagem  do  thaumaturgo  por- 
tuguez,  muito  da  veneração  do  povo  que  subia  ao  alto  da  mura- 
lha por  uma  escada  de  pedra.  Esta  servidão  foi  inutilisada  por 
ordem  do  Arcebispo  D.  fr.  Bartholomeu  dos  Martyres  em  1572., 
quando  no  antigo  campo  da  Vinha  fundou  o  Seminário  de  S.  Pe- 
dro, abrindo  então  sobre  a  muralha  uma  passagem  com  o  fim  de 
o  visitar  diariamente.  D'essa  capellinha  da  Virgem  de  Nazareth 
existem  apenas  as  costas,  uma  pequena  janella,  um  arco  simples 
e  a  pia  da  agua  benta. 

D.  fr.  Agostinho  de  Jesus  (1 587-1609),  projectando  o  alarga- 
mento do  Paço,  obra  realisada  por  D.  José  de  Bragança  (1641 -56} 
e  destruida  por  violento  incêndio  ás  11  horas  da  noite  de  i5  de 
abril  de  1866,  mandou  murar  o  espaço  destinado  áquelle  fim,  fi- 
cando do  lado  de  dentro  a  alludida  capellinha.  D.  Rodrigo  da  Cu- 
nha (1627-35)  ordenou  a  sua  demolição  e  a  reedificação  onde  ainda 
hoje  se  vê,  collocando-lhe  sobre  a  janella  a  primitiva  padieira  da 
porta,  em  que  está  gravada  esta  inscripçao  : 

ANNO  •   XXV  •   IMPEFII    •   DIV1   •  JOANNIS   •   III   •    LVS1TAN 
REGIS   •   D  •   EMANVEL  •   DE  •    SOVSA  •   ARCHIEPS   •   BRACH 
HISPAN   •   PRIMAS   •   EIVS   DE   REGIS   •   FACTVRA  •    HOC    • 
SACELLV  •    POSVIT  •   IN   HONORE  •   MARIE   •   VIRGINIS   • 


—  245  — 

Além  do  altar-mór  tem  mais  dois — o  de  S.  Roque  e  o  da  Vir- 
gem da  Piedade.  Na  sacristia  podem  ser  vistos  1 1  curiosos  qua- 
dros de  madeira  com  figurado  em  relevo  representando  os  mila- 
gres de  Santo  António. 

Próximo  d'esta  capella,  c  rev.  Domingos  Pires,  Abbade  reser- 
vatario  de  S.  João  da  Balança,  fundou  em  1 588  o  Recolhimento 
das  Beatas  de  Santo  António,  destinando  o  a  6  mulheres  donzel- 
las  ou  viuvas.  Por  effeito  da  demolição  do  edifício  passaram  essas 
recolhidas  para  uma  loja  da  antiga  casa  do  Raio,  hoje  pertença 
do  Hospital  de  S.  Marcos. 


CAPELLA  DE  NOSSA  SENHORA  DA  CONSOLAÇÃO 

Nas  freguezias  de  Dadim  e  Nogueiró  (unidas),  subúrbios  da 
cidade  de  Braga,  construiu-se  no  ultimo  quartel  do  século  xvi  uma 
capellinha  em  honra  de  Nossa  Senhora  da  Consolação.  Assenta, 
a  poucos  metros  do  pórtico  do  Bom  Jesus,  numa  pequena  eleva- 
ção que  os  romanos  fortificaram,  como  se  deprchende  dos  vestí- 
gios que  os  cortes  do  terreno  apresentam,  como  por  exemplo  uma 
mó  manuaria,  cerâmica  e  um  pezo  de  fuso  que  pode  ser  visto  no 
meu  pequeno  museu  estabelecido  numa  loja  do  Paço  Archiepisco- 
pal. 

Por  Bulia  datada  do  1 .°  de  maio  de  1617  auctorisou  Paulo  V 
a  fundação  'duma  confraria  a   que  concedeu  muitas  indulgências. 

No  campanário  tem  um  formoso  sino  denominado  Vacca  da 
Consolação,  que  muitas  vezes  convidou  o  povo  de  Braga  á  lucta 
em  favor  dos  guerrilheiros  Miguelistas,  que  alli  estacionaram  em 
1846,  sob  o  commando  do  celebre  Padre  Casimiro. 

Este  sino  foi  fundido  em  1802  na  fabrica  bracarense  de  João 
Ferreira  Lima. 


-  246 


Gruta  — Ermida  de  Nossa  Senhora  da  Penha  (Guimarães) 


Sobranceira  á  cidade  de  Guimarães  ergue-se  magestosa  a  serra 
de  Santa  Catharina,  com  61  «"-,98  de  altitude  sobre  o  nivel  do  mar, 
assim  denominada  por  possuir,  desde  tempos  remotos,  no  ponto 
mais  culminante,  uma  capellinha  da  mesma  invocação,  com  um 
púlpito  curioso,  portátil,  em  forma  de  cálice,  muito  apreciado 
quando  esteve  exposto  no  museu  da  Ordem  Terceira  de  S.  Fran- 
cisco. 

Entre  elevados  penedos  que,  pela  sua  disposição  curiosa,  for- 
mam ampla  gruta  ermida,  venera-se  a  imagem  de  Nossa  Senhora 
do  Carmo,  denominada  da  Penha,  em  altar  próprio,  com  mais 
dois  lateraes  e  ainda  um  púlpito  e  uma  sacristia  ! 

Sobre  esta  gruta  concluiu-se  a  18  de  julho  de  1881,  a  capella 
relicário,  que  a  gravura  supra  representa. 

Ao  seu  lado  esquerdo  vê-se  uma  torre  acastellada,  de  cujas 
ameias  se  descobre  um  horisonte  vastíssimo. 

Esta  obra  concluiu-se  no  sabbado  i3  de  outubro  de  1888,  com 


—  247  — 

a  collocação  dos  4  sinos  afinados  que  a  classe  dos  curtidores  man- 
dou fundir  pela  quantia  de  422:000  réis  na  fabrica  portuense  do 
sr.  Alexandre  António  Leão,  os  quaes  chegaram  á  estação  de  Gui- 
marães no  comboio  das  10  horas  da  manha  de  sabbado  1  de  se- 
tembro do  referido  anno.    . 

Pezam  646  kilos  assim  distribuídos: — Dó  —  206;  Ré— i5c,5oo 
grammas;  Mi —  104,800  grammas  ;  Fá  —  84,700  grammas. 

Além  das  moedas  e  jornaes  cTaquelle  tempo,  também  ficou 
sob  a  primeira  pedra  da  torre  uma  chapa  de  metal  amarello 
com  os  nomes  dos  membros  da  meza  d'aquelle  anno,  da  qual  fa- 
zia parte  o  auctor  d'estas  linhas,  então  presidente  da  primeira 
commissão  promotora  de  melhoramentos  no  local. 

Essa  commissão,  composta  de  55  indivíduos,  organisou  se  a  29 
de  agosto  de  1886,  trabalhando  dedicadamente  durante  os  dois 
primeiros  annos  em  que  levou  a  effeito  a  obra  da  escadaria  dos 
passos,  construcção  de  muros,  terraplenagem  e  arborisação  do 
largo  e  encanamento  da  agua  a  i3  de  junho  de  1887.  Os  seus  no- 
mes, que  teem  jus  á  gratidão  geral,  constam  da  Aurora  da  Penha, 
numero  único  publicado  em  29  de  agosto  do  referido  anno  de 
1887. 

A  17  de  julho  de  1881  organisou-se  a  commissão  promotora 
do  monumento  que  se  erigiu  a  Pio  IX  no  ponto  mais  elevado, 
sendo-lhe  lançada  a  primeira  pedra  pelo  Arcebispo  D.  João  Chri- 
sostomo  d' Amorim  Pessoa,  á  1  hora  da  tarde  de  18  de  junho  de 
1882.  A  inauguração  solemne  do  monumento  teve  logar  a  8  de 
setembro  de  1893.  A's  10  horas  da  manhã  d'este  dia  foi  benzida 
pelo  Arcipreste  a  capella-relicario. 

F'  octogonal  o  pedestal,  medindo  10  metros  d' alto  por  5  de 
largo.  As  saliências  do  cornijamento  são  desenvolvidas  a  ponto  de 
no  projecto  se  lhe  destinar  uma  varanda  com  accesso  por  escada 
interior. 

A  primorosa  estatua,  de  5  metros  de  altura  é,  como  a  da  Vir- 
gem de  Lourdes  que  lhe  fica  próximo,  esculpturada  em  mármore 
de  Carrara,  e  ambas  no  valor  de  5:ooo:ooo,  foram  oíferecidas  pelo 
benemérito  Fernando  de  Castro  Abreu  Magalhães,  servindo  de 
intermediário  o  enthusiasta  dos  melhoramentos  da  Penha  sr.  Fran- 
cisco Joaquim  da  Costa  Magalhães. 

A  estatua  representa  Pio  IX  a  abençoar,  tendo  na  mão  es- 
querda a  Bulia  em  que  proclamou  a  immaculada  Conceição  da 
Virgem.  No  cofre  collocado  sob  a  primeira  pedra  do  templo  em 
construcção  ficou  uma  lamina  com  os  dizeres^seguintes 

«Anno  de  1895.  Reinado  de  D.  Carlos  Primeiro  e  Pontificado 
de  Leão  XIII.  Sanctuario  da  Immacaulda  Conceição  erecto  pela 
cidade  de   Guimarães  e   catholicos  portuguezes.  Primeira  pedra 


-248  - 

lançada  a  8  de  setembro  pelo  D.  Prior  de  Guimarães  D.  Manuel 
d' Albuquerque». 

Em  1898,  a  Commissão  de  melhoramentos  teve  a  feliz  lem- 
brança de  fazer  levantar  a  planta  geral  do  parque,  mas ...  as 
grandes  obras  projectadas  não  permittem  que  se  eífectuem  cedo. 


CAPELLA  DE  GUADELUPE  (BRAGA) 

Ao  lado  da  rua  de  Santa  Margarida,  num  dos  locaes  mais  ele- 
vados e  mais  vistosos  da  cidade,  denominado  Monte  do  Reducto, 
hoje  transformado  em  alameda  de  recreio,  havia  em  tempos  afas- 
tados uma  caoella  de  Santa  Margarida,  a  qual  se  demoliu  para 
em  seu  logar  ser  construída  no  anno  de  1747  a  que  hoje  existe 
em  forma  de  cruz  grega,  dedicada  á  Virgem  Mãe  de  Deus,  e  para 
cuja  obra  contribuiu  com  100:000  réis  o  generoso  Arcebispo  D. 
Rodrigo  de  Moura  Telles.  Tem  sobre  a  porta  estes  dizeres : 

PROTEGAM 

VRBEM  ISTAM 

I747 

A  palavra  Guadelupe  significa  em  Árabe  Rio  do  Seio,  —  Uad- 
el-ubb  ;  mas  provavelmente  a  invocação  d'esta  imagem  provém  da 
Guadaloupe,  (Aquae-LupiaeJ,  Hespanha,  onde  foi  fundado  o  no- 
tável convento  dos  Jeronymos. 


GAPELLA  DO  CEMITÉRIO  (BRAGA) 

E'  de  architectura  singella  e  foi  construída  em  1870.  Na  tri- 
buna de  madeira  liza,  toda  pintada  a  branco,  ha  apenas  uma  ima- 
gem de  Christo  crucificado. 

O  cemitério  foi  benzido  pelo  Arcebispo  D.  José  Joaquim  d' Aze- 
vedo e  Moura  no  dia  1  de  julho  de  1870  e  estreiou-se  no  dia  im- 
mediato  com  o  cadáver  de  Francisco  Soares,  casado,  da  freguezia 
de  Lanhas,  fallecido  no  hospital  de  S.  Marcos. 


—  24g- 

CAPELLA  DE  SANTA  TECLA  (BRAGA) 

No  logar  d'este  nome,  em  sitio  elevado,  foi  construída  a  ca- 
pella de  Santa  Tecla  (vulgo  Santa  Trega),  com  a  estatua  da  Santa 
no  alto,  esculpturada  em  granito. 

Sobre  a  verga  da  porta  lê-se  : 

a'   custa 
de  jose  pinheiro  leite 

ANNO    Í729 

CAPELLA  DO  SENHOR  DAS  ANCIÃS  (BRAGA) 

Está  situada  ao  lado  sul  da  rua  da  Boa  Vista  e  foi  construída 
a  expensas  dos  devotos,  como  se  lê  no  friso  da  fachada  : 

ANNO    1735 
ESTA  CAPELLA  FOI  FEITA   a'   CUSTA  DOS   DEUOTOS 

No  alto  da  tribuna  tem  uma  formosa  esculptura  em  madeira 
representando  Christo  na  cruz. 

A  capella  é  administrada  por  uma  Confraria. 


CAPELLA  DE  NOSSA  SENHORA  DA  BOA-MORTE 

(GUIMAKÃES) 

Esta  capella,  de  proporções  acanhadas,  mas  toda  interiormente 
■azulejada  e  com  uma  bella  imagem  de  Nossa  Senhora  da  Boa- 
morte,  sobre  o  altar,  foi  fundada  por  António  Dias  Pimenta  e  mu- 
lher Maria  Peixoto,  instituidores  do  vinculo  com  a  capella  da  Por- 
ciuncula,  em  S.  Francisco,  junto  das  suas  casas  que  ainda  existem 
no  alto  da  rua  de  Santa  Maria.  E'  hoje  pertença  de  José  Alves 
Pereira  de  Magalhães  Moura,  de  Basto. 

O  cónego  Hyeronimo  da  Costa  Pimenta  vinculou-lhe  as  missas 
do  Natal. 

Todos  os  domingos  iam  alli  os  padres  da  Curaria  celebrar 
missa  e  responso. 

Os  religiosos  do  convento  de  S.  Francisco  também  eram  obri- 
gados a  celebrar  alli  4  missas  com  cruz  alçada,  sendo  a  primeira 
no  dia  25  de  março,  a  segunda  em  3  de  maio,  a  terceira  em  i3 
de  agosto  e  a  quarta  no  dia  8  de  dezembro. 


•2DO  — 


GAPELLA  DO  SENHOR  JESUS  (GUIMARÃES) 

Junto  á  sua  casa  das  Lamellas  (hoje  Tribunal,  Administração 
do  Concelho  e  Repartição  de  Fazenda)  o  dr.  Ruy  Gomes  Golias, 
mestre-eschola  da  Collegiada,  fundou  esta  capella  instituindo  mor- 
gado em  seu  sobrinho.  Com  ella  vinculou  os  bens  a  esposa  d'este, 
D.  Maria  dos  Guimarães. 

D'aqui  sáe  annualmente,  para  a  procissão  do  Corpus-Christi,  a 
imagem  de  S.  Jorge. 


CAPELLA  DE  NOSSA  SENHORA  DO  PILAR 

(BRAGA) 

No  logar  de  Inflas,  freguezia  de  S.  Victor,  está  situada  esta 
capella  que  pertenceu  ao  Bispo  d'Elvas  D.  Diogo  d?  Silva  a  quem 
succedeu  na  posse  sua  irmã  D.  Nathalia  da  Silva  que  por  sua  vez 
a  deixou  á  irmandade  de  Santa  Cruz. 

Na  data  (1687)  em  que  foi  collocada  a  inscripçao  sobre  a  porta 
principal  fez  d'ella  acquisição  por  compra  á  mesma  irmandade 
João  Borges  Pereira  Pacheco,  fidalgo  da  casa  real  e  cavalleiro 
professo  na  Ordem  de  Christo.  Mandando-a  restaurar,  requereu 
ao  Arcebispo  o  necessário  consentimento  para  de  novo  a  benzer 
e  n'ella  celebrar  os  officios  divinos,  o  que  o  Prelado  para  logo 
permittiu. 

Pendente  da  parede  sul  vê-se  um  quadro  a  óleo  representando 
o  martyrio  dum  padre  jesuíta,  irmão  de  D.  Anna  Borges  Pacheco 
avó  do  referido  João  Borges,  o  qual  tem  estes  dizeres  :  —  O  lJa- 
dre  Francisco  Pacheco,  filho  de  Garcia  Lopes  Pacheco  e  de  Maria 
Borges  de  Mesquita  da  Villa  de  Ponte  de  Lima,  provincial  da* 
Companhia  de  Jesus  em  Japão  onde  foi  martyrisado  queimado 
vivo  com  Francisco  Valente  em  Mangassa  a  21  de  julho  de  1628. 

O  comprador  da  capella  jaz  em  tumulo  de  pedra,  ao  lado  da 
Epistola,  com  estes  dizeres  em  caracteres  elegantes : 

SEPVLTVRA   DE  JOAM  BORGES  I EREY- 
RA    PACHECO    FIDALGO    DA   CAZA   DE 

SVA   MAGESTADE   CAVALEYRO 

PROFESSO    NA  ORDEM   DE   CHRISTO 

ANNO    DE    1687 


—  25l  — 

CAPELLA  DE  NOSSA  SENHORA  DA  ABBADIA 

(BRAGA) 

Foi  construída  em  iy38  onde  actualmente  se  encontra  no  largo 
do  Barão  de  S.  Martinho,  encostada  a  uma  das  torres  do  castello 
da  cidade.  Sobre  o  arco  envidraçado  tem  a  seguinte  inscripção: 

ASSVMPTA 
EST  MARIA  IN 

CELVM  gav 
DENT  ANGELI- 

ANNO   1738 

A  capella  anterior  tinha  sido  construída  por  D.  Diogo  de 
Sousa,  sobre  três  arcos,  lateraes  e  fronteiro,  vedados  por  grades 
de  ferro.  Media  i5  palmos  de  comprido  por  12  de  largo. 

O  pelourinho,  que  datava  de  1 568,  principiou  a  ser  removido 
d'aqui  para  o  campo  dos  Touros,  onde  pouco  se  demorou,  no  dia 
i3  de  novembro  de  1844. 

CAPELLA  DE  S.  GONÇALO  (BRAGA) 

Está  situado  á  esquina  da  rua  do  mesmo  nome,  com  entrada 
pelo  campo  de  Santa  Anna,  e  foi  fundada  sob  a  invocação  de 
S.  Bartholomeu  pelo  Arcebispo  D.  Jorge  da  Costa  (1448- i5oi), 
que  lhe  collocou  sobre  a  porta  o  seu  brazão  com  estes  dizeres 
em  volta: 


AÍOTESwlf»KMÃE 
FAHSTAE&XANDlt.S. 

NSTVMDEttET  ODMINVS 
PER  VIAS  RECTAS 


C»„~. f-I"'  9*- 


Leitura:  —  O  Prirrfaz  das  Hespanhas  D.  George  da  Costa, 
Arcebispo  e  senhor  de  Braga,  mandou  fazer  esta  egreja  no  anno 
de  i5oo. 


—  252  - 

No  cap.  io  do  Livro  da  Sabedoria  lê-se  deduxit  e  não  deducet. 

Este  brazão  e  legenda  foi  trasladado  por  Duarte  Mendes  de 
Vasconcellos  para  o  muro  da  sua  casa  das  carvalheiras,  onde 
actualmente  se  vê,  por  occasião  da  reediíicação  da  capella  e  fun 
dação  do  Recolhimento  das  Convertidas,  contiguo,  pelo  Arcebispo 
D.  Rodrigo  de  Moura  Telles  em  1722,  auctorisado  por  Breve 
Pontifício  de  Clemente  XI,  com  data  de  14  de  agosto  do  referido 
anno.  O  fundador  destinou-o  a  12  mulheres  arrependidas  que  rece- 
beriam, cada  uma,  diriamente  20  réis  e  meio  alqueire  de  pão  por 
semana 

A  regente  vencia  40  réis.  Para  edificar  o  Recolhimento  com- 
prou D.  Rodrigo,  em  1720,  duas  moradas  de  casas,  dispendendo 
ao  todo  2:800-^000  réis. 

O  escudo  que  o  Cardeal  de  Alpedrinha  D.  Jorge  da  Costa 
adoptou,  representa  a  roda  de  Santa  Catharina,  e  dizem  que  em 
reconhecimento  dos  muitos  benefícios  que  a  Infanta  D.  Catharina 
lhe  prestou,  pois  conseguiu  accumular  os  cargos  de  Cardeal  dos 
Santos  Martyres  Marcello  e  Pedro,  Bispo  Albanense,  Bispo  Tus-  v 
culano,  Bispo  Portuense  e  de  Santa  Rufina,  Bispo  de  Vizeu,  Arce- 
bispo de  Braga  e  de  Lisboa,  Deão  de  Braga,  Lisboa,  Porto,  La- 
mego, Guarda,  Vizeu,  Silves,  Burgos,  e  Chantre  do  mesmo; 
possuiu  oito  Abbadias  da  Ordem  benedictina,  dez  dos  cónegos 
regrantes  de  Santo  Agostinho,  seis  da  Ordem  de  S.  Bernardo: 
em  Roma  o  rendosissimo  beneficio  de  Santa  Maria  Trans  Tibe- 
rim;  em  Veneza  uma  Abbadia  e  a  Villa  de  Arpanica  com  todas 
as  rendas;  em  Navarra  e  outras  localidades,  numerosas  honrarias 
ecclesiasticas! ! 

Seu  sobrinho  D.  Pedro  da  Costa,  Bispo  do  Porto,  de  Leão  e 
Osma,  dividiu  o  escudo,  escrevendo  ao  lado  da  roda : 

Sy  esta  rueda  Ezequiel  viera 
Com  su  prosápia  remota, 

Y  su  valor  conociera, 
Mui  cierto  está  que  dixera 
Spiritus  vitae  erat  in  rota 

E  do  lado  das  seis  costas  de  prata : 

Sy  Adan  viera  las  costillas 
Deste  escudo,  que  aqui  veis, 

Y  sus  grandes  maravillas, 
Dixera  por  mas  subillas 

•    Hoc  os  ex  ossibus  méis. 


—  2  53  — 

CAPELLA  E  RECOLHIMENTO  DA  CARIDADE 

(BRAGA) 

E'  da  invocação  de  S.  João  da  Matta  e  está  situada  na  rua  do 
Carmo  onde  António  Pinto,  esculptor,  da  rua  do  Chãos  de  Baixo, 
fundara  o  Recolhimento  numas  casas  que  para  esse  fim  comprou 
na  rua  do  Carvalhal.  As  obras  da  pequena  capella  terminaram 
em  1768,  benzendo-a  em  21  de  janeiro  do  anno  immediato,  o  pa- 
ire José  de  Araújo  Costa,  Prior  da  Apúlia,  e  celebrando-se  n'ella 
a  primeira  missa  a  23  do  referido  mez.  O  doutor  Manuel  da  Sil- 
veira, fidalgo  da  casa  real,  offereceu  em  1785  ás  recolhidas  uma 
grande  casa  contigua  para  augmento  do  Recolhimento.  As  religio- 
sas usam  habito  de  Trinas,  e  têem  por  fim  ensinar  meninas  po- 
bres a  escrever,  ler,  costurar  e  fiar. 

CAPELLA  DO  PAÇO  ARCHIEP1SCOPAL  (BRAGA) 

E'  obra  do  Arcebispo  D.  Rodrigo  de  Moura  Telles  que  dis- 
pendeu  com  a  sua  construcção  a  quantia  de  2:000:000  réis  e  mais 
1:600:000  com  a  torre  e  sinos.  Tem  a  forma  da  cruz  grega.  O 
edifício  do  Paço  que  a  envolve,  era  acanhadíssimo.  Augmentou-o 
pela  primeira  vez  o  Arcebispo  D.  Fernando  da  Guerra  (1418-67). 
D.  Manuel  de  Sousa  (1544-49)  obteve  a  cedência  de  umas  casas 
onde  construiu  a  parte  do  nascente  que  alinha  com  a  rua  do  Souto, 
instituindo  ao  rez  do  chão  o  Auditório  e  Relação  do  Arcebispado, 
como  se  lê  na  inscripção  que  existe  sobre  a  porta  : 

ILLUSTRANDAE   URBIS    •  CAUSA    •  SIT    •  VE  UNDE  PETANTUR 

IURA    •  NEC    -  1NSTABILI   DENTUR    •  UT  ANTE  LOCO 

SOUSA    -PATER    DNS   QUE  UFB1S  MAGNUS   Q  SACERDOS 

IUSTITIAE    -EMANUEL  NUB1LE    STPUXIT    -OPUS    • 

«Para  engrandecer  a  cidade  e  saber-se  o  logar  certo  onde  se 
devia  ir  buscar  o  Tribunal  da  Justiça  (que  antes  era  incerto)  man- 
dou o  grande  Prelado,  pae,  e  senhor  d  esta  cidade,  D.  Manuel  de 
Sousa,  elevar  e  erigir  este  edifício». 

A  parte  do  poente,  sobre  14  grossas  columnas,  foi  construida 
por  ordem  de  D.  fr.  Agostinho  de  Jesus,  no  anno  de  i5g3,  como 
o  indica  a  inscripção  que  tem  ao  centro  : 

ANNO    •  DOM1NI    •  MD    • 

XCIII    •  SVB    •  D.    F    •  AVG    • 

DE  JESV  •    HISPÂNIA 

RVM   PRIMATE 


—  2i>4  — 

D.  Rodrigo  da  Cunha  (1627-35)  e  D.  Rodrigo  de  Moura  Telles 
{em  1709),  fizeram  o  restante.  Foi  este  ultimo  quem  mandou  gra- 
var na  verga  da  porta  principal*  este  texto  de  Cicero  (De  officiis, 
lib.  I),  que  D.  fr.  Bartholomeu  dos  Martyres  havia  pronunciado 
quando  no  dia  4  de  outubro  de  i55o,  transpunha  aquelleshumbraes: 

O    DOMVS    ANTIQVA  ! 
QVAM    DISPARI    DOMINO 

dominar;  s  ! 

O  formoso  chafariz  do  largo  fronteiro  é  rematado  pela  figura 
da  Fanx  <\wt  sustenta  na  mão  esquerda  uma  esphera  armilar. 
CompÕe-se  de  duas  taças,  uma  d'ellas  circumdada  por  uma  mura- 
lha com  seis  torres  e  sustentada  por  um  grupo  de  meninos.  Esta 
obra  também  foi  feita  a  expensas  de  D.  Rodrigo  de  Moura  Telles 
importando  em  réis  1:000:000.  Na  parte  inferior  da  arvore  lê  se : 

D.  ROD  •  MAVR  •  TE  LI.  ■  FEC1T  •  ANNO  •  1723. 

Desde    i    de    novembro  de   1 832  a  i  de  junho  do  anno  imme 
diato,  esteve  hospedado  no  Paço  Archiepiscopal  o  Senhor  D.  Mi- 
guel de  Bragança  e  suas  irmãs  as  infantas  D.  Izabel  Maria  e  D. 
Maria  da  Assumpção. 


CAPELLA  DE   NOSSA  SENHORA  DA  TORRE 

(BRAGA) 

No  tempo  em  que  os  jesuítas  occupavam  o  actual  edifício  do 
Seminário  Conciliar,  foi  collocada  em  simplice  oratório,  na  frente 
da  torre  forte  que  mede  2,60  de  espessura  nas  paredes,  a  imagem 
da  Virgem,  desde  logo  com  a  invocação  da  rr  orada.  Esta  imagem 
foi  para  alli  conduzida  da  freguezia  de  Santa  Maria  de  Freiriz, 
por  um  Abbade  da  família  bracarense  dos  Barretos.  Principiou  então 
a  ser  muito  venerada,  cantando-lhe  os  devotos  todos  os  sabbados 
a  Magnificat  e  a  Salve  Regina,  e  conduzindo-a  em  procissões  de 
penitencia.  A  devoção  porém  subiu  de  ponto  por  occasião  do  ter- 
remoto do  i.°  de  novembro  de  1755.  Além  de  muitas  outras  de- 
voções fundaram  lhe  a  irmandade  e  instituiram-lhe  a  festa  no  i.° 
domingo  de  maio  de  cada  anno,  o  terço  e  ladainha  no  i.°  de  no- 
vembro com  procissão  na  qual  ainda  é  conduzida  a  imagem  em 
volta  dos  muros  da  cidade. 

Em  abril  do  anno  immediato  (1756)  teve  principio  a  obra  da 
construcção  da  actual  capella,  custeada  pelas  esmolas  dos  fieis, 
terminando  em  1758. 


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2DD 


GAPELLA  DAS  ALMAS  (BRAGA) 

Está  situada  junto  do  novo  edifício  do  Hospital  de  S.  Marcos, 
ao  lado  da  capella  de  S.  Bento.  Construiu-se  no  anno  de  1817. 
Venera-se  n'ella  uma  cruz  com  pintura  que  representa  Christo 
sob  a  invocação  do  Senhor  dos  Desprezos,  titulo  que  provém  do 
desprezo  que  lhe  haviam  dado  num  logar  immundo  da  antiga  rua 
dos  Cegos. 

CAPELLA  DE  S.  VICTOR  VELHO  (BRAGA) 

Foi  construída  em  1876  e  teve  origem  num  oratório  que  D.  fr. 
-Agostinho  de  Jesus  mandou  erigir,  o  qual  representava  em  pin- 
tura a  degolaçao  de  S.  Victor  sobre  a  pedra  que  appareceu  man- 
chada de  sangue,  quando  se  procurava  dar  principio  á  reedificação 
da  ponte  das  Goladas.  Esta  pedra  foi  logo  vedada  por  grade  de 
madeira,  «em  virtude  de  se  suppor  que  sobre  ella  tivesse  sido 
degolado  o  santo. 

CAPELLA    DOS   TERCEIROS   DOMINICOS 

(GUIMARÃES) 

No  anno  de  1743  construiu-se  esta  capella  em  frente  da  egreja, 
de  S.  Domingos.  Tem  quatro  altares  consagrados  ao  Coração  de 
Maria,  a  Santo  Afíonso,  á  Virgem  das  Dores  e  a  Santa  Barbara. 

A  fachada  é  extremamente  elegante.  Tem  no  alto,  esculptu- 
rada  em  granito,  uma  grande  estatua  de  Santa  Catharina  de 
Senna. 

A  alinhar  com  o  cunhal  direito  está  o  hospital,  que  principiou 
íi  ser  construído  no  dia  4  de  outubro  de  i836,  sendo  solemne- 
mente  inaugurado  a  26  de  maio  de  1840,  embora  incompleto  co- 
mo está.  Em  3o  de  maio  de  1854  íundou-se  no  referido  edifício  o 
Asylo  de  entrevados  para  6  irmãos. 

CAPELLA   DOS   TERCEIROS    FRANCISCANOS 

(GUIMARÃES) 

Esta  formosa  capella,  que  fica  a  defrontar  com  a  vasta  egreja 
de  S  Francisco,  foi  edificada  a  expensas  da  Ordem  no  anno  de 
1750.  No  alto  da  fachada,  que  é  toda  azulejada,  tem  a  estatua 
de  Santa  Isabel  rainha  de  Portugal,  em  granito. 


-256  — 

Esta  capella  foi  restaurada,  benzendo-se  no  dia  3o  de  julho 
de  1880. 

No  altar  do  lado  direito  venera-se  uma  imagem  de  Nossa  Se- 
nhora das  Dores,  tamanho  natural,  primorosamente  esculpturada 
por  Soares  dos  Reis  em  madeira  de  oliveira,  para  cumprimento 
d'um  voto  feito  pelo  sr.  António  de  Mattos  Chaves. 

A  esculptura,  que  é  de  vestir,  sahiu  das  mãos  do  artista  repre- 
sentando a  Virgem  com  lima  camisa  decotada,  tão  perfeita  como 
qualquer  estatua  profana  que  n'aquelle  estado  se  destinasse  a  lo- 
gar  publico. 

No  altar  do  lado  opposto  venera-se  a  imagem  do  coração  de 
Maria  esculptura  em  Roma  pelo  auctor  da  magnifica  imagem  de 
S.  Francisco.  Tem  estes  dizeres  na  peanha: 


G-   BERARDI 
ROMA   1882 


MODELI.O 
SCOLPI 


Na  campa  n.°  8  d'esta  capella  foi  sepultado  em  21  de  outubro 
de  1826  o  notável  poeta  e  medico  dr.  João  Evangelista  de  Moraes 
Sarmento,  nascido  no  Porto  a  26  de  dezembro  de  1773  e,  desde 
1808,  residente  em  Guimarães  onde  falleceu  com  52  annos  de 
edade  na  madrugada  de  20  de  outubro. 

Alinha  com  o  cunhal  esquerdo  o  magnifio  hospital  da  Ordem 
inaugurado  em  3i  de  julho  de  181 5,  tendo  então  apenas  as  pri- 
meiras seis  janellas  da  fachada.  Era  ministro  da  corporação  o 
sr.  Gaspar  Leite  de  Azevedo.  Para  se  calcular  a  simplicidade 
d'esse  edifício  basta  saber-se  que  se  dispendeu  com  toda  a  obra 
a  quantia  de  5:ooo$ooo  réis. 

No  i.°  de  março  de  1839  resolveu  a  mesa  construir  novas  ins- 
talações e  accrescentar  a  fachada  com  as  três  janellas  do  lado  da 
rua  de  S.  Francisco,  gastando  8:000^000  réis. 

Para  esse  fim  compraram  onze  moradas  de  casas  e  o  usofructo 
d'outra,  por  9:892:150  réis.  Com  a  obra  geral,  que  durou  desde 
i853  até  i5  de  abril  de  1072,  dispenderamse  33:827^280  réis. 
Finalmente  juntando  a  estas  verbas  o  producto  da  subscripção 
annual  aberta  em  julho  do  referido  anno  e  a  importância  das 
obras  que  á  sua  custa  mandou  fazer  o  ministro  Christovão  José 
Fernandes  da  Silva  (o  Cidade),  temos  ao  todo  um  dispêndio  de 
75:719^430  réis. 

O  asylo  de  entrevados,  destinado  aos  irmãos  da  Ordem,  foi 
tundado  no  dia  4  de  outubro  de  i858.  António  Joaquim  de  Carva- 
lho fez-lhe  o  donativo  de  2:000^000  e  legou-lhe  mais  18:000^000 
para  que  o  numero  de  entrevados  se  elevasse  a  doze. 


257 


CAPELLA   DE   NOSSA    SENHORA    DA   GUIA 

(GUIMARÃES) 

Esta  capella  principiou  a  ser  construída  em  1788  depois  que 
n'aquelle  sitio  se  demoliu  a  torre  da  muralha  da  cidade.  Nessa 
torre  esteve  primitivamente  a  capellinha  com  sua  confraria. 

Por  se  conhecer  que  a  conclusão  da  obra  obstruía  a  passagem, 
parou  no  arco  cruzeiro  e  assim  foi  benzida  no  dia  i5  de  agosto  de 
i793. 

CAPELLA   DO    EXTINCTO    CEMITÉRIO 
(GUIMARÃES) 

Foi  construída  no  anno  de  1824.  Tem  ao  fundo  um  grande 
crucifixo  e  em  volta  seis  imagens  em  tamanho  quasi  natural,  re- 
presentando a  Via-Sacra.  A  próxima  venda  do  terreno  do  cemité- 
rio, em  qye  terminaram  os  enterramentos  no  dia  1 1  de  maio  de 
1879,  dará  logar  á  sua  demolição. 


CAPELLA    DE   S.    SEBASTIÃO   (BRAGA) 

Está  situada  na  alameda  das  Carvalheiras,  cujos  paredões,  es- 
cadarias, etc,  foram  construídos  desde  i838  a  1839  pelo  mestre 
pedreiro  Domingos  Fernandes,  da  antiga  rua  da  Conega. 

O  Arcebispo  D.  Rodrigo  de  Moura  Telles  mandou  reedificar 
a  capella  desde  26  de  outubro  de  1 7 1 5  a  18  de  janeiro  de  1 7 17, 
dispendendo  com  a  obra  2:200:000  réis.  No  mesmo  local  havia 
restos  d'outra  mais  antiga  que  D.  Diogo  de  Sousa  mandara  ladri- 
lhar fazendo- lhe  um  alpendre  com  columnas  novas.  A  porta  que 
então  ficava  voltada  para  o  occidente,  como  se  prova  com  a  ins 
cripção  sepulchral  do  dr.  cónego  João  Aífonso  de  Beja,  fallecido 
a  i5  de  agosto  de  1 585,  foi  aberta  ao  nascente,  collocando  se-lhe 
no  alto  o  brazão  de  D.  Rodrigo  e  um  pouco  mais  acima  a  primo- 
rosa esculptura  de  S.  Sebastião  em  granito. 

Junto  do  altar  da  esquerda  ha  um  rolo  de  cera  com  1327  va- 
ras, medida  que  abrange  o  circuito  da  antiga  muralha  da  cidade. 
Accende  se  aos  domingos  e  dias  santificados  durante  a  celebração 
das  missas. 

Em  volta  da  capella,  no  espaço  fronteiro  e  nos  dois  quarteirões 
seguintes,  existem  desde  agosto  de   17^9  algumas  inscripçÕes  ro 
manas  milharias,  votivas  e  sepulchraes,  pertencendo  as  primeiras 

17 


—  258- 

aos  imperadores  Tibério,  Cláudio,  Nerva,  Hadriano,  Caracalla, 
Elagabalo,  Maximino,  Caro,  Carino,  Diocleciano,  Maximiano,  Ga- 
lerio,  Constâncio,  Magnencio,  Valentiniano  e  Valente  e  Constan- 
tino II. 

Esta  ultima  foi  collocada  por  minha  ordem,  sobre  uma  co- 
lumna,  em  março  de  1898,  com  permissão  da  Camará. 

Outra  diz  o  seguinte  :  «t.  caelicvs  tripés  fronto   et  m.  et  lv- 

CIVS.   TI  ÍI   PRONEPOTES   CAELICI   FRONTONIS,   RENOVARVNT». 

Parece  que  se  refere  á  restauração  de  um  sacellum  consagrado 
a  qualquer  deus  pagão. 

Outra,  muito  gasta  do  tempo,  é  uma  dedicação  dos  ceves  ro- 
mani   QVI    NEGOTIANTVR    BRACARAVGVSTAE  â  C  fãtUS)    CALERONIVS,   que 

se  suppõe  legado  provincial. 

Outra  em  que  apenas  se  pôde  ler:  .  .  .laecia,  a  qual  foi  por 
minha  ordem  extrahida  do  passeio  norte  da  rua  da  Cruz  de  Pedra 
em  agosto  de  1898. 

Outra  sepulchral  que  diz:  aton  gomvni-lxxv  •  h  •  s  •  e  • 

Ainda  outra :  favstvs-ivliae   severae-s  •  an  •  xix  •  h  .  s  •  e  • 

Ha  muito  boas  razões  para  se  acreditar  que  esteve  roeste  local 
das  Carvalheiras  o  edifício  da  Chancellaria  Romana  que,  no  dizer 
de  Plinio  (Hist.  Nat.  1.  3.°,  cap.  3.°,  pag.  26),  era  a  principal  da 
Galliza,  com  a  junsdicção  de  24  cidades  e  275:000  habitantes. 

Quando  em  1620  se  procedeu  á  demolição  dum  muro,  pró- 
ximo da  referida  capell.i,  appareceu,  a  pequena  profundidade  do 
solo,  uma  estatua  de  bronze  dourado  representando  mercvrio,  o 
deus  da  eloquência,  do  commercio  e  dos  ladrões.  l 

A  imagem  de  Nossa  Senhora  da  Ajuda,  que  alli  é  venerada, 
esteve  num  oratório  da  porta  de  Maximinos,  onde  já  tinha  irman- 
dade, até  que  em  3  de  novembro  de  1826  foi  trasladada,  por  se 
dar  principio  á  demolição  da  torre. 

D'esse  monumento  resta  o  escudo  de  el-rei  D.  Fernando,  em- 
bebido no  primeiro  paredão  das  Carvalheiras,  ao  lado  do  de  D. 
João  I  que  pertenceu  á  torre  de  S.  Francisco. 

O  edifício  onde  ora  está  estabelecido  o  Hotel  do  Igo,  foi  Hos- 
pício dos  Cónegos  Regrantes  de  Santo  Agostinho  (Cruzios).  Sobre 
o  portal  encimado  por  uma  cruz,  ainda  hoje  se  vê  um  Agnas  Dei 
com  estes  dizeres  em  volta : 

EXORDIVM    SVMPSIT   ORDO  CANONICVS 
IN   MONTE   SION  • 
VIDI   SVPRA  MONTEM  SION  AGNVM 
STANTEM 


1  Memorial  dei  Marquez  de  Montebello— anno  de  1642. 


-  2D9  — 

CAPELLA  DOS  ORPHÃOS  DE  S.  CAETANO 

(BRAGA) 

No  logar  da  Madre  de  Deus,  um  pouco  além  da  egreja  paro- 
chial  de  Maximinos,  está  situado  o  Collegio  dos  Orphãos  de  S. 
Caetano,  instituído  pelo  Arcebispo  D.  fr.  Caetano  Brandão  nas 
casas  que  ora  pertencem  ao  proprietário  da  phar macia  dos  Or- 
phãos, com  frente  para  o  campo  de  D.  Luiz  I  e  praça  Municipal. 

Em  i8õi  foi  esta  casa  decl  irada  imprópria  para  os  fins  da 
instituição:  e  em  1880,  depois  de  se  obter  uma  planta  de  que  foi 
auctor  o  architecto  Sardinha,  deu-se  principio  á  obra  d'um  novo 
edifício  na  quinta  das  Carvalheiras,  dispendendo-se  com  os  alicer- 
ces doze  contos  de  réis  e  o  tempo  de  5  annos  para  logo  se  aban- 
donar o  terreno  e  toda  a  obra! 

Comprada  em  praça  a  casa  e  quinta  dos  Falcões  (na  Madre 
de  Deus),  foram  para  alli  os  Orphãos,  projectando  se  então  as 
grandes  obras  orçadas  em  quarenta  contos  de  réis,  e  iniciadas  em 
maio  de.  1 8 ^8.  Marcou-se  o  espaço  indispensável  para  residirem 
45o  alumnos,  pois  mede  de  comprimento  o  edifício  i3i  metros 
por  63  de  largo,  a  principiar  no  portal. 

Paralisaram  as  obras  por  falta  de  recursos,  não  obstante  haver 
deixado  a  esta  sympathica  instituição  mais  de  110  contos  de  réis 
o  sr.  Joaquim  José  Ferreira  Veiga,  nascido  em  Braga  a  i3  de  fe- 
vereiro de  1798  e  fallecido  em  Lisboa  a  27  de  junho  de  1846. 

Ao  centro  do  edifício  construiu-se  a  capella  com  a  frente  para 
noroeste,  sendo  auctor  do  projecto  o  notável  architecto  Stamin. 
E'  este  edifício  um  bello  exemplar  da  architectura  latino-byzan- 
tina,  fim  da  epocha,  bem  mais  digno  de  figurar  na  frente  do  que 
nas  costas  do  Collegio,  onde  passa  a  linha  férrea  entre  campos  de 
cultura  ! 

O  rosetão  é  bastante  desenvolvido,  e  no  remate  da  fachada 
tem  a  cruz  primacial  em  substituição  da  grega.  Com  um  pequeno 
dispêndio  podia   ser  concluída  a  porta  principal  de  arco  perfeito. 

Interiormente  ha  bastante  rigor  architectonico,  se  exceptuarmos 
o   arco   de  mármore  liso  na  tribuna  a  contrastar  com  o  granito  ! 

São  de  primorosa  esculptura  as  imagens  de  Nossa  Senhora 
Auxiliadora  e  de  S.  José,  provenientes  de  Barcelona. 

CAPELLA   DE   S.   MIGUEL    O   ANJO    (BRAGA) 

E'  de  architectura  simplíssima  e  está  situada  na  rua  do  Ave- 
lino, onde  se  reedificou  depois  que  a  vereação  de  1841  promoveu 
a  sua  demolição  junto  da  porta  de  Maximinos,  fronteira  á  Sé,  no 


-  200  — 

mesmo  local  em  que  tinha  sido  fundada  no  anno  de  1691  por  um 
devoto  rico,  do  qual  não  consta  o  nome,  na  sua  própria  casa  de 
habitação. 

Em  1743  installaram-se  n'esta  capella  as  confrarias  de  S.  Lou- 
renço e  de  Nossa  Senhora  da  Purificação. 

No  anno  immediato  uniu-se-lhes  a  confraria  de  Nossa  Se- 
nhora do  O;  em  1 76 1  a  de  Nossa  Senhora  da  Graça;  em  176o  a 
de  Nossa  Senhora  do  Amor;  em  1772  a  de  S.  José  no  Presepe; 
em  1781  a  de  Nossa  Senhora  da  Paz,  e  em  1785  a  das  Almas 
de  S.  Nicolau. 

Desde  que  el-rei  D.  Filippe,  em  abril  de  161 1,  prohibiu  por 
Provisão  que  os  Arcebispos  continuassem  a  fazer  a  sua  entrada 
a  cavallo  debaixo  do  pallio,  por  achar  pouco  decente  essa  pra- 
tica, os  Prelados  bracarenses  revestiam-se  de  vestes  sagradas, 
n'esta  capella  e  d1  aqui  partiam  para  a  Sé  que  fica  em  frente  do 
local.  Também  n'esta  capella,  se  fazia  a  reposição  dos  santos  óleos 
benzidos  em  Diocese  extranha. 

Hoje  os  Prelados  fazem  a  sua  entrada  na  cidade  depois  de  se 
revestirem  na  egreja  do  Populo. 

CAPELLA   E    RECOLHIMENTO    DO    ANJO 

(GUIMARÃES) 

Desconhece-se  a  verdadeira  origem  d'esta  capella  e  Recolhi- 
mento, sabendo-se  apenas  que  existia  no  anno  de  1600.  A  actual 
capella,  muito  pobre  de  ornatos,  foi  benzida  em  1748. 

As  beatas,  da  Ordem  Franciscana  com  véo  brancD  e  capa  cor 
de  cinza,  são  hoje  admittidas  pela  auctoridade  administrativa. 

Vê-se  encostado  ao  Recolhimento  um  cruzeiro  alto  que  para 
alli  foi  removido  do  largo  fronteiro.  Tem  esta  inscripção  na  base : 

SENHOR 

DO  BOM  SU 

SESO  POSE 

EM  MAIO 

DE  I79O 

Diz-se  que  por  occasião  da  mudança  cahiu  sobre  um  operário 
matando-o  instantaneamente. 

Na  frente  d'este  Recolhimento  existe  o  Albergue  de  Nossa  Se- 
nhora do  Serviço,  destinado  a  recolher  oito  velhas  pobres,  a  cada 
uma  das  quaes  se  dá  um  quarto  para  dormir,  forno  e  cosinha  com- 
mum.  A  porta  de  arco,  encimada  por  uma  cruz,  faz  pensar  numa 
capella  que  dizem  ter  existido  alli. 


26  I  — 


CAPELLA    DE    S.    CHRISPIM   (GUIMARÃES) 

Está  situada  na  rua  da  Rainha  junto  do  Albergue  dos  pobres 
passageiros  e  no  mesmo  local  da  primitiva  fundada  em  i3i5  pe- 
los mestres  sapateiros  João  Bahião  e  Pêro  Bahião.  A  actual  reedi- 
ficação  teve  principio  em  1849,  concluindo-se  pelo  frontespicio, 
que  é  elegante,  no  anno  de  i852.  O  compromisso  foi  reformado 
em  1661. 

Esta  capella,  que  no  altar-mór  tem  as  imagens  de  S.  Chrispim, 
S.  Chrispiniano  e  S.  Miguel,  e  junto  do  arco  os  altares  de  Nossa 
Senhora  das  Neves  e  de  Nossa  Senhora  do  Rosário,  mede  de 
comprimento  12,40  por  6,65  de  largo. 

O  Albergue  recolhe  nove  mulheres  velhas  que  têem  annual- 
mente  á  sua  disposição  cinco  carros  de  lenha;  recebe  por  3  dias 
passageiros  pobres,  e  na  véspera  do  Natal  dá  a  todos  os  neces- 
sitados que  se  apresentem,  uma  ceia  de  bacalhau  com  batatas, 
pão  e  vinho!  Santíssima  instituição  esta  que  tantas  lagrimas  de 
commoção  faz  assomar  aos  olhos  dos  favorecidos  da  sorte! 

Os  fundadores  da  primitiva  capella  e  confraria  de  S.  Miguel 
do  Hospital,  instituíram  um  responso  e  vigília  sobre  a  sua  sepul- 
tura na  egreja  de  S.  Paio,  isto  na  tarde  de  quarta-feira  de  cinza, 
de  cada  anno,  e  ordenaram:  acabado  o  acto  «farão  os  ditos  con- 
frades pôr  uma  meza  na  dita  egreja  e  todos  assentados  a  ella 
com  muita  quietação  e  farão  uma  consoada  e  gastarão  n'ella  aquillo 
que  lhe  bem  parecer,  e  os  que  estiverem  em  ódio  o  Juiz  do  dito 
Hospital  os  fará  amigos,  e  comerão,  e  beberão  por  um  copo,  etc.» 

A  celebre  comesaina  de  pão  de  ló  e  vinho  maduro  em  frente 
da  sepultura,  foi  ha  mais  de  20  annos  convertida  num  rosário 
(So  réis)  para  cada  confrade. 


CAPELLA    DO    CEMITÉRIO    DA   ATHOUGUIA 

(GUIMARÃES) 

A  Camará  Municipal  de  Guimarães,  na  sua  sessão  de  14  de 
janeiro  de  1870,  escolheu  o  local  para  o  actual  cemitério  que  foi 
solemnemente  benzido  ás  12  horas  da  manhã  de  11  de  maio  de 
1879.  Pensou  se  logo  na  construcção  da  respectiva  capella  que 
deveria  ser  apropriada  e  nunca  demasiadamente  dispendiosa  co- 
mo a  actual  que  custou  ao  Município  17:995^935  réis! 

E'  de  architectura  ogival  ou  gothica,  elegante  e  rica  como 
poucas  se  encontrarão  nos  demais  cemitérios  do  reino.  Ao  fundo 
tem  a  forma  absidal  e  um  altar  isolado  com  a  imagem  de  Christo 


—  20  2 


na  agonia,  tamanho  quasi  natural.  Em  cada  um  dos  dois  altares 
lateraes  ha  uma  cruz  apenas. 

Teve  esta  obra  começo  em  1882  e  teminou  em  :! 


CAPELLA    DO    SENHOR   DE  CAMPELLOS 

A  pouco  mais  de  2  kilometros  de  Guimarães,  em  um  local 
aprazível,  próximo  da  ponte  romana  que  atravessa  o  rio  Ave  na 
freguezia  de  S.  João  e  onde  appareceu  ha  annos  uma  moeda  de 
ouro  do  imperador  Honório,  vê-se  esta  capella  que  provavelmente 
data  do  anno  de  1743,  como  se  deprehende  da  seguinte  inscripçao 
gravada  no  pedestal  de  granito  grosso  sobre  que  assenta  o  ele- 
gante cruzeiro  com  imagem  de  Christo  regularmente  esculptu- 
rada : 

M-   F-    HIM?   Dl 

AS   DE   CASTRO   CPL • 

D  •  P  •   1  •    I  74  co 

Leitura: — Me  fez  Jeronymo  dias  de  Castro  Campello.  Deus 
perdoar  lhe  queira.  1743. 

Desde  tempos  muito  afastados  que  annualmente  alli  tinha  lo- 
gar  uma  romaria  em  honra  d'esta  imagem.  Porém  a  sua  venera- 
ção augmentou  desde  que  em  7  de  maio  de  1890,  aquelle  logar 
deserto  principiou  a  ser  povoado  em  virtude  da  construcção  do 
edifício  da  Companhia  de  Fiação  e  Tecidos  de  Guimarães,  fun- 
dada no  referido  dia. 


Em  Guimarães  foi  ha  annos  demolida  a  capella  de  S.  Thiago, 
na  praça  do  mesmo  nome  onde,  segundo  alguns  auctores,  o  Apos- 
tolo collocára  a  imagem  da  Virgem  numa  gruta  junto  do  templo 
da  deusa  Isis,  no  simulacro  de  Ceres.  Fr.  Bernardo  ie  Braga 
affirma  que  junto  da  torre  demolida  em  i55g  viu  o  seguinte  let- 
treiro : 

IN   HOC   SIMVI  ACRO   CJERES   JACOBVS   FILIVS  fcEBED.EI 
GERMANVS   JOANIS   IMAGINEM   SANT.E   MARI.E   III   S.EOIS  X 


-263 


ORATÓRIOS 


EM    GUIMARÃES 

Oratório  do  Senhor  dos  Afflictos. —  Está  situado  na  rua  dos 
Terceiros,  com  frente  para  o  antigo  largo  das  Carvalhas,  e  foi 
fundado  em  1867  com  o  producto  de  uma  subscripção  aberta  por 
Jeronymo  José  d'Abreu  e  sua  mulher.  A  cruz  e  o  Christo  são  de 
mármore  branco. 

Oratório  do  Senhor  da  Aponta.  —  Construiu  se  na  rua  do  Pi- 
coto e  venera  se  n'elle  uma  pequena  imagem  de  Christo  esculptu- 
rada  em  madeira. 

Oratório  da  mesma  invocação.  —  Foi  aberto  na  parede  da  casa 
que  tem  os  números  de  policia  48  a  54  na  rua  Nova  de  Santo  An- 
tónio. 

Oratório  do  Senhor  do  Amparo.  —  Está  entre  as  casas  n.°  34 
e  35  do  antigo  campo  do  Salvador.  Tem  ao  lado  um  pequeno 
cruzeiro  com  esta  inscripção  na  base : 

pE  NOSO 

(SÍC)  ANE  MA 

RIA   1>  •    AE 

TENSÃO 
ANNO    1779 

Leitura  :  —  Padre  Nosso,  Ave  Maria  por  a  intensao.  Anno  de 

1779- 

Um  pouco  acima,  no  logar  da  Arcella,  houve  junto  da  capella 

de  Santo  António  uma  Gafaria. 

Oratório  de  Santo  António.  —A  poucos  passos  da  egreja  dos 
Capuchos,   no  muro  da  cerca  dos  extinctos  frades  d'aquella  Or 
dem,  que  o  fundaram.  Fica  lhe  em  frente  um  cruzeiro  lavrado. 

Oratório  do  Senhor  da  Esperança  da  boa  sentença.  —  Na  rua 
de   Villa-Flôr.   A   esculptura   do  Christo   é  bastante  correcta.  Na 


—  264  — 

base  da   cruz  de  granito,  pintada  a  azul,  tem  esta  inscripção  em 
caracteres  doirados  : 

SR  DA 

ESPERA 

NSA    DA  B 

OMA  SE 

NTJENSA 

ANNO    I754 

A  inscripção  indica  a  invocação  da  imagem,  differente  da  que 
lhe  attribue  o  saudoso  padre  Caldas. 

Oratório  do  Senhor  do  Bom  Fim.  —  No  logar  da  Cruz  de  Pe- 
dra, extremidade  da  rua  da  Alegria,  está  este  oratório  aberto 
numa   das   casas  d'aquella  rua  com  frente  para  a  Meia  Laranja. 

Oratório  do  Senhor  Bom  Jesus.  —  Na  rua  da  Caldeirôa  junto 
de  uma  fonte. 

E'  tradição  que  na  casa  de  onde  sáe  a  agua  nasceu  o  Papa 
S.  Damazo. 

Oratório  do  Senhor  dos  Desamparados.  —  Na  rua  Nova  do 
Commercio.  Tem  exteriormente  esta  inscripção : 

ESTA  •    UEVAÇÃO  •    MANDARÃO  •    FAZER  •    OS   MORADORES  • 
DESTA  •    RVA •    ANNO  •    DE  •     I 7 I 2  • 

Oratório  do  Senhor  da  Liberação.  —  No  alto  da  rua  de  Ca- 
mões. E'  uma  imagem  de  Christo  na  cruz  bem  esculpturada  em 
madeira. 

Oratório  do  Senhor  da  Piedade.  —  Na  rua  de  Villa  Verde. 
Foi  seu  fundador  em  1866  Christovão  José  Fernandes  da  Silva  (o 
Cidade). 

Oratório  do  Senhor  da  Piedade.  —  A'  margem  esquerda  da 
nova  estrada  da  Costa.  Antes  da  abertura  d'esta  estrada  estava 
ao  lado  opposto  num  recanto  do  caminho  velho.  As  imagens  de 
Christo,  da  Virgem  e  de  S.  João  são  de  esculptura  rasoavel. 

Oratório  do  Senhor  dos  Remédios.  —  No  largo  do  Trovador. 
Foi  construído  de  pedra  em  187o  e  substituídas  por  esculpturas 
as  pinturas  de  Christo,  da  Virgem  e  de  S.  João. 

No  muro  que  lhe  fica  superior  esteve  o  antigo  Pelourinho. 


—  265  — 

Oratório  do  Senhor  dos  Passos.  —  Próximo  da  capella  de  Santa 
Luzia,  entrada  da  travessa  do  Picoto,  venera-se  em  oratório  de 
pedra  envidraçado,  a  imagem  de  Christo  com  a  cruz  ás  costas. 

Oratório  de  Nossa  Senhora  de  Bethlem.  —  Numa  janella  da 
antiga  egreja  de  Santa  Roza,  hoje  sede  da  parochia  de  S.  Sebas- 
tião. Tem  caixilho  de  ferro  envidraçado  e  luz  de  azeite  perma- 
nente. 

Esta  formosa  imagem,  que  conta  numerosas  afilhadas,  foi  por 
uma  d'ellas  (D.  Leonor  Lucinda  d^liveira  Cardoso)  aproveitada 
da  extincta  egreja  de  S.  Sebastião  e  exposta,  a  expensas  suas, 
onde  agora  se  venera. 

A  irmandade  dos  Santos  Passos  mandou  construir  os  sete 
oratórios  da  Via-Sacra  que  se  acham  distribuídos  pela  cidade.  O 
figurado  é  todo  de  madeira  em  tamanho  natural. 


EM    BRAGA 

Oratório  do  Senhor  da  Boa  Morte.  —  Está  situado  a  meio  da 
rua  de  Payo  Manta  (vulgo  Pae  Amante).  E'  de  madeira  envidra- 
çado. A  imagem  de  Christo  na  cruz,  que  alli  é  venerada,  recom- 
menda-se  pela  correcção  csculptural. 

Oratório  do  Senhor  dos  Desamparados.  —  No  largo  das  Lati- 
nhas, próximo  á  nascente  d'aguas  sulphurosas  denominadas  dos 
Gallos,  existe  um  oratório  envidraçado  em  que  se  venera  uma 
pintura  de  Christo  em  madeira  sob  a  invocação  do  Senhor  dos 
Desamparados. 

Oratório  do  Senhor. do  Bom  Principio.  —  Quasi  a  meio  da  rua 
dos  Pellames,  venera-se  esta  imagem  em  oratório  envidraçado. 

Oratório  do  Senhor  da  Guia.  —  Na  freguezia  de  S.  Pedro  de 
Maximinos,  um  pouco  abaixo  da  fabrica  do  gaz,  ha  um  oratório 
envidraçado  em  que  se  venera  uma  formosa  imagem  do  Senhor 
da  Guia. 

Oratório  do  Senhor  do  Bom  Fim.  —  Está  situado  ao  lado  es- 
querdo da  antiga  estrada  de  Guimarães,  um  pouco  áquem  da  ca- 
pella de  Santo  Adrião  da  Corrica.  A  imagem  é  de  madeira.  Foi 
collocada  alli  no  dia  3  de  julho  de  1 888. 

Oratório  do  Senhor  da  Afflicção. —  Está  encostado  ao  lado  di- 


—266  — 

reito  da  egreja  parochial  de  S.  Lazaro,  com  uma  vidraça  na  frente. 
Venera-se  alli  uma  pintura  de  Christo  em  madeira  sob  o  titulo 
de  Senhor  da  Afflicção. 

Oratório  de  Nossa  Senhora  de  Na^areth.  —  No  alto  do  arco  da 
Porta  Nova,  sobre  que  assenta  a  estatua  de  Braga,  ha  um  oratório 
envidraçado  em  que  se  venera  a  imagem  de  Nossa  Senhora  de 
Nazarcth,  também  de  granito  mas  pintada.  E'  muito  festejada  a 
expensas  dos  moradores  da  rua  Nova  de  Souza,  no  dia  8  de  se- 
tembro de  cada  anno. 

O  referido  arco  da  Porta  Nova  foi  construido  no  anno  de  17 16, 
dispendendo-se  com  esta  obra  um  conto  de  réis.  Para  este  fim  a 
Camará  obteve  de  el-rei  o  subsidio  de  1 6:000  cruzados,  das  sobras 
do  rendimento  das  cizas. 

Oratório  da  rua  de  Nossa  Senhora  do  Leite.  —  Na  esquina  da 
casa  n.°  1,  que  defronta  com  o  rocio  detraz  da  Sé,  ha  uma  cruz 
de  madeira  com  um  quadro  representando  o  Rosto  do  Senhor, 
habilmente  pintado  em  dezembro  de  1870  pelo  pintor-esculptor 
hespanhol  Luiz  Vermell,  que  viveu  durante  algum  tempo  em  Bra- 
ga. Ao  lado  esquerdo  do  quadro  tem  estes  dizeres  em  cursivo:  — 
Braga  —  Dezembro —  1870:,  e  ao  lado  direito:  —  Original  de  Luiz 
Vermell  (o  peregrino  Espanol).  O  trabalho  revela  a  competência 
do  auctor.  O  olhar  de  Christo  acompanha  quem  o  fitar  de  frente 
ou  de  qualquer  dos  lados  com  egual  doçura  de  expressão. 

Os  visinhos  construiram-lhe  um  oratório  de  madeira  e  todas 
as  noites  lhe  põem  luz  de  azeite. 

O  quadro  tem  sido  distribuído  em  pequenas  photographias 
pelos  devotos  que  são  muitos. 

Antes  d'esta  pintura  do  Rosto  do  Senhor  havia  outra  menos 
correcta  que  foi  d'alli  retirada. 

A  cruz  collocou-se  naquelle  sitio  para^implorar  as  orações  dos 
fieis  em  favor  das  numerosas  victimas  do  encontro  que  alli  se  deu 
entre  a  divisão  cabralista  commandada  pelo  general  José  de  Bar- 
ros e  Abreu  Sousa  Alvim  (i.°  Barão  e  depois  Conde  do  Casal) 
e  as  forças  legitimistas,  commandadas  pelo  general  Macdonell,  ao 
meio  dia  de  20  de  dezembro  de  1846.  Pelos  chapéus  de  palha 
com  fitas  vermelhas  que  os  guerrilheiros  miguelistas  usavam,  no- 
tou-se  que  eram  d'estes  quasi  todos  os  cadáveres  que  juncavam 
a  rua.  O  meu  informador  sr.  António  da  Graça  Faria,  curioso 
de  antiguidades  que  assistiu  a  essas  tristes  scenas,  diz-me  que  se 
lembra  de  vêr  correr  o  sangue  das  victimas  de  mistura  com  a 
chuva  miudinha.  Os  fieis  que  saiam  da  missa  do  meio  dia  fugiam 
para  suas  casas  horrorisados,  e  muitos  foram  assassinados  no 
Campo   dos  Remédios   quando  saiam  da  egreja  de  Santa  Cruz. 


207 


Era  o  desforço  desenfreado  da  cavallaria  e  infanteria  cabralista 
que  haviam  sido  heroicamente  dizimadas  e  vencidas  quando  por 
vezes  tentaram  entrar  pela  rua  dos  Pellames. 

Oratório  do  Senhor  Jesus  das  Almas. — Está  encostado  á  egreja 
da  Ordem  Franciscana,  com  frente  para  a  rua  dos  Capellistas,  e 
é  todo  de  pedra  vedado  por  uma  grade  de  ferro.  A  imagem  do 
Senhor  Jesus  das  Almas,  em  tamanho  quasi  natural,  é  de  primo- 
rosa esculptura  e  pintura.  Os  visinhos  promovem-lhe  annualmente 
uma  esplendida  festividade.  Do  lado  de  dentro,  á  esquerda,  tem 
embebida  na  parede  uma  lapide  com  esta  im.cripção: 

CAPELLA    DO    SENHOR 

JESUS   DAS  ALMAS,    QUE   MAX 

DOU    FAZER   MANOhL  AN 

T°  FERRf  NEGO'lv  DESTA 

CID  f  XO  ANNO   DE    I  83  I   • 

Oratório  do  Senhor  do  Bom  fim.  —  E'  de  madeira  envidraçado 
e  âcha-se  encostado  á  casa  n."  32  da  rua  de  Santa  Cruz.  Tem 
dentro  uma  cruz  de  madeira  com  pintura  de  Christo. 

Oratório  do  Senhor  da  Boa  I  'ista.  —  Está  situado  no  alto  da 
rua  de  S.  Sebastião,  próximo  da  capella  das  Carvalheiras,  e  ve- 
nera-se  n^lle  uma  formosa  imagem  de  Christo  Agonisante.  Os 
visinhos    devotos  promovem-lhe   annualmente   luzida  festividade. 

Oratório  do  Senhor  das  Injurias.  —  Ao  fundo  da  rua  das  Pa- 
lhotas ha  um  oratório  envidraçado  onde  se  venera  uma  tormosa 
imagem  de  Christo  na  cruz  sob  a  invocação  de  Senhor  das  Inju- 
rias, muito  festejada  em  certo  dia  do  anno. 


■268 


NICHOS 


KM    BRAGA 

Nicho  aberto  na  frontaria  da  casa  n.os  57  a  59,  da  rua  das 
Aguas.  Tem  uma  esculptura  de  S.  João  e  na  parte  inferior: 

anno  —  s.  joÃo  —  1702 

Na  frontaria  da  casa  n.°  56  da  rua  da  Cruz  de  Pedra,  a  ima- 
gem de  S.  Bento,  pintura  em  madeira. 

Nicho  aberto  na  frontaria  da  casa  n.os  12  a  14,  da  referida  rua. 

Na  rua  de  S.  Sebastião,  frontaria  da  casa  n.°  3o,  uma  pintura 
representando  Nossa  Senhora  do  Rosário. 

Na  rua  de  S.  António  das  Travessas,  frontaria  da  casa  de 
D.  Henriqueta  Barbosa,  duas  imagens  do  thaumaturgo  portuguez. 

No  largo  de  S.  Paulo,  esquina  da  casa  n.°  19,  uma  bella  esta- 
tua de  granito  representando  S.  Miguel  o  Anjo.  Tem  a  servir-lhe 
de  docel  uma  grande  concha  egualmente  de  granito. 

Na  rua  de  S.  Marcos,  frontaria  da  casa  n.os  34  e  36,  uma  ima- 
gem de  Santo  António. 

Na  rua  das  Aguas,  esquina  do  convento  dos  Remédios,  um 
quadro  com  o  Rosto  do  Senhor,  muito  da  veneração  dos  visinhos. 

Na  mesma  rua,  frontaria  da  casa  n.os  166  a  168,  uma  pequena 
imagem  da  Virgem  da  Piedade. 

Ao  lado  da  porta  do  Sol,  da  Sé,  uma  cruz  de  madeira  com 
pintura  de  Christo,  sob  a  invocação  do  Senhor  da  Felicidade. 

Esta  cruz  esteve  na  mesma  parede,  um  pouco  mais  acima, 
onde  ainda  existem  os  ganchos  que  a  prendiam. 

Na  rua  de  S.  Marcos,  frontaria  da  casa  n."s  94  e  96,  um  qua- 
dro representando  a  imagem  da  Virgem  com  o  menino  Jesus. 


-  26ç»  — 

Na  mesma  rua,  esquina  do  convento  dos  Remédios,  um  qua- 
dro com  o  Rosto  do  Senhor. 

Na  rua  de  S.  Domingos,  frontaria  da  casa  n.°  43,  uma  cruz 
com  pintura  representando  Christo. 

Na  rua  do  Raio,  írontaria  da  casa  n.°  9,  uma  pintura  da  Vir- 
gem, com  luz  de  azeite  permanente. 

Na  rua  de  S.  Barnabé,  frontaria  da  casa  n.°  2,  uma  pequena 
imagem  do  Santo  de  que  a  rua  tomou  o  nome. 

A  mais  de  meio  da  rua  da  Boa-Vista,  lado  sul,  ha  uma  fonte 
com  um  grande  nicho  e  a  imagem  de  S.  Thiago  dentro  d'elle.  Os 
visinhos  promovem-lhe  annualmente  uma  grande  festa. 

A  fonte,  e  provavelmente  a  imagem,  devem-se  á  generosidade 
do  Arcebispo  D.  Diogo  de  Sousa,  segundo  se  deprehende  do  let- 
treiro  que  esta  gravado  sob  o  nicho: 

■ 

D  •   SOVSA  ARCHIEP 
ANNO   SALVTIS    I  53  I 

Na  rua  do  Anjo,  frontaria  da  casa  n.os  82  a  84,  dois  nichos 
bem  lavrados. 

Na  rua  de  S.  Marcos,  frontaria  da  casa  n.°  1,  um  nicho  com 
peanha  saliente  na  qual  se  lê : 

ANNO — S-   PEDRO — 1642 

No  largo  de  Infias,  frontaria  da  casa  n.°  10,  um  nicho  bem 
lavrado. 

Na  rua  de  S.  Victor,  frontaria  da  casa  n.°  65,  um  nicho. 

Na  rua  Nova  de  Sousa,  frontaria  da  casa  n.°  109,  um  nicho 
com  communicação  interior. 

No  campo  de  Sant'Anna,  frontaria  da  casa  n.os  19  e  21,  um 
nicho  bem  lavrado. 


270    - 


CRUZEIROS 


Já  no  tempo  dos  egypcios,  carthaginezes,  assyrios,  persas,  he- 
breus e  gregos,  a  cruz  era  applicada  aos  supplicios  de  malfeito- 
res, introduzindo-a  Tarquinio  Soberbo  em  Roma  para  a  execução 
das  sentenças  de  pena  ultima;  e  subsistiu  este  costume  até  que 
o   imperador    Constantino  Magno,  em   attençao   ao   supplicio  de 


—  271  — 

Christo,  a  fez  venerar  como  symbolo  que  é  da  redempção  huma- 
na '.  Desde  então  o  lábaro  santo  principiou  a  apparecer  hasteado, 
como  pregão  de  paz  e  amor,  perdão,  conforto  e  esperança,  na 
cúspide  dos  montes,  nas  povoações  sertanejas  e  nas  cidades  e 
villas,  sobre  a  coroa  dos  monarchas,  junto  das  encruzilhadas  e 
sobre  as  pontes,  como  na  villa  de  Ponte  do  Lima  e  n'outra  loca- 
lidade portugueza,  onde  ainda  se  vê,  levantada  sobre  o  talha-mar, 
uma  cruz  elegante  com  esta  inscripçao  que,  por  interessante,  de- 
corei : 

CRVX  IN   PONTE      QVIT  EST?   AMBO   SVNT  • 

CREDITE   PONTES  : 
rSTA  VIAM  CCELI  •    FLVMINTS    ILLÉ   PARAT • 


«Uma  cruz  numa  ponte  que  quer  dizer?  Podeis  crer  que  são 
duas  pontes:  por  uma  se  vae  ao  céo,  por  outra  se  passa  o  rio». 

A  cruz  também  se  ergue  á  cabeceira  da  campa  e  nos  logares 
onde  alguém  perde  a  vida. 

No  norte  de  Portugal  é  ainda  frequente  a  pratica  dos  mon- 
tinhos de  pedras  junto  de  uma  cruz  no  local  onde  o  individuo 
morreu  de  desastre  ou  violência.  Formam-se  resando,  por  cada 
pedrinha  que  se  colloca  junto  da  cruz,  um  padre-nosso,  e  chama- 
lhes  o  povo  Fieis  de  Deus. 

Próximo  da  capella  da  Madre  de  Deus  de  fora,  sobre  a  pa- 
rede da  margem  direita  do  caminho  que  vae  da  capella  da  Con- 
ceição e  egreja  de  Azurey  (subúrbios  de  Guimarães)  ergue-se  uma 
pequena  cruz  de  ferro  com  os  seguintes  dizeres:  —  Francisco  Joa- 
quim CARDOSO  P     N  •  A  •  M  • 

O  infeliz  Francisco  morreu  alli  sob  um  carro  de  matto  que  se 
voltou.  Em  torno  á  cruz  amontoam- se  numerosas  pedrinhas  que 
os  fieis  vão  collocando,  quando  passam,  resando  então,  por  alma 
do  finado,  o  padre  nosso  e  a  ave  Maria  que  a  cruz  implora. 

Os  povos  celtas  sepultavam  nas  mamo  as  (montículos  de  terra 
isolados)  os  seus  homens  mais  notáveis;  e  formavam  estes  montí- 
culos com  pedras  miúdas  sobre  a  sepultura  dos  indivíduos  pobres. 

Os  romanos  também  dedicavam  a  Mercúrio  estes  montículos 


1  Um  dos  instrumentos  do  deicidio,  o  rotulo  de  madeira  que  se  collocou  no 
alto  da  cruz,  media  10  polegadas  de  comprido  por  6  de  largo. 

Escreveram  n'elle,  da  direita  para  a  esquerda,  como  usavam  os  judeus,  em 
hebraico,  grego  e  latim,  esta  inscripçao:  mvro&dvi  xek  svnerazan  svsei. 

A  forma  da  cruz  de  Christo,  deis  paus  atravessados  em  angulo  recto,  é 
egypcia.  O  vocábulo,  derivado  do  latim  crus,  significa  tronco  de  arvore  abaixo 
da  bifurcação;  assim  as  primeiras  cruzes  a  que  os  condemnados  eram  presos 
como  o  foi  S.  Sebastião. 


— 272  — 

(montes  gaudios)  nas  encruzilhadas,  com  umas  estatuas  de  pedra 
(Mercuriaes)  que  apenas  tinham  cabeça.  Consideravam  Mercúrio 
deus  dos  caminhos  e  acreditavam  que  as  almas  dos  mortos  eram 
por  elle  levadas  aos  infernos  e  de  lá  trazidas  quando  lhe  appete- 
cesse.  Por  isso  os  gregos  o  denominavam  psuxagogos  (conduetor 
das  almas)  e  nekropompos  (acompanhador  dos  mortos). 

Em  todas  as  povoações  se  erguia,  n'outros  tempos,  a  cruz, 
mais  ou  menos  rica  de  arte,  a  avivar  a  origem  da  religião  christã 
e  o  martyrio  de  Jesus  no  Golgotha! 

Hoje  as  vereações  portuguezas  pensam  na  remoção  dos  cruzei- 
ros como  quem  procura  prover  a  uma  necessidade  urgente.  Não 
lhes  aproveita,  como  catholicos,  a  liçção  dos  inglezes  protestantes 
que  respeitam  os  seus  antigos  cruzeiros  como  o  de  Salisbury,  de 
Winchester  e  outros  a  que  dão  o  nome  de  Marketcrosses  por  se 
acharem  nos  locaes  das  feiras!  Essa  guerra  de  extermínio,  entre 
nós,  por  principio  algum  se  justifica.  Dos  poucos  cruzeiros  que 
havia  em  Guimarães,  se  exceptuarmos  os  dos  padrões  de  Nossa 
Senhora  da  Victoria  e  de  D.  João  I,  foram-se  os  melhores  como 
o  da  irmandade  do  rosário  (cruzeiro  do  Fiado),  do  anno  de  i65o, 
cuja  columna  fragmentada  existe  no  museu  da  Sociedade  Martins 
Sarmento,  e  o  do  largo  de  S.  Paio,  que  foi  apeado  a  18  de  feve- 
reiro de  1879. 

Existem  ainda: 

Cruzeiro  de  Santa  Cru\,  no  largo  fronteiro  á  capella  da  mes- 
ma invocação.  Foi  mandado  fazer  em  1O40  pelo  cónego  Arro- 
chella. 

Cruzeiro  do  Campo  da  Feira.  —  E'  uma  simples  cruz  de  pedra 
com  uma  pintura  de  Christo  a  óleo.  Tem  mais  duas  dos  lados  e 
trez  na  frente. 

Cruzeiro  dos  Capuchos.  —  E'  uma  grande  cruz  sem  columna, 
com  seus  lavores,  que  se  ergue  em  frente  á  egreja  dos  extinctos 
frades  Capuchos. 

Cruzeiro  das  Capuchinhas.  —  Fica   em  frente  á  egreja   d'este 
pequeno  convento  e  tem  a  data  de  177o. 

Cruzeiro  da  crn\  de  pedra.  —  Fica  no  alto  da  rua  da  Alegria 
sob  uma  cobertura  sustentada  por  quatro  grossas  columnas.  A 
cruz  é  de  pedra,  e  o  Christo,  na  agonia,  pintado  em  madeira. 
Provirá  d'esta  cruz  o  nome  do  local? 

Cruzeiro  da  Senhora  da  Guia.  —  E'   dedicado  á  Virgem  da 


2?3  - 


Piedade.  Esteve  primitivamente  junto  da  casa  onde  nasceu  Mar- 
tins Sarmento.  D^lli  foi  removido  para  próximo  do  Passo,  onde 
se  acha  encostado.  Na  frente  da  cruz  está  a  Virgem  com  o  Christo 
morto  nos  braços,  e  outras  figuras  em  volta,  dizendo-se  que  repre- 
senta um  frade  a  que  se  apresenta  de  joelhos  com  as  costas  para 
a  rua. 

Creou  se  a  este  respeito  uma  lenda  engraçadissima  que  o 
sr.  conde  de  Margaride  descreve  com  extraordinária  elegância  a 
pag.  28.  e  segg.  do  numero  especial  da  Revista  de  Guimarães, 
publicado  em  honra  de  Martins  Sarmento. 

Cruzeiro  de  S.  Francisco.  —  A  columna  pertence  á  ordem 
compósita.  Foi  mandado  íazer  no  século  xvi  pelo  padre  mestre 
fr.  António  Fernandes,  collocando-se  então  á  entrada  do  largo 
das  Carvalhas  a  demarcar  a  jurisdição  da  Ordem.  A  camará  re- 
moveu-o  em  maio  do  anno  corrente  encostando-o  á  parede  da 
egreja ! 

EM    BRAGA 


Cruzeiro  do  campo  de  Santa  Anna.  —  Sobre  a  elegante  co- 
lumna bem  lavrada,  pertencente  á  ordem  compósita,  eleva-se  a 
cruz  primacial.  Essa  columna,  com  pedestal  ornamentado,  assenta 
em  7  degraus  ao  nascente  do  campo  de  Santa  Anna  onde  foi  col- 
locada  por  ordem  do  Arcebispo  D.  Diogo  de  Sousa,  no  primeiro 
quartel  do  século  xvi. 

Cruzeiro  da  praça  do  conde  de  S.  Joaquim.  —  E'  egual  ao  do 
campo  de  Santa  Anna  e  foi  mandado  fazer  pelo  Arcebispo  D. 
AfFonso  Furtado  de  Mendonça  no  anno  de  162 1.  (Vide  gr  av.  a 
pag.  2-4). 

A  casa  próxima,  pertencente  á  illustre  familia  Brandão  Pereira, 
occupa  o  espaço  da  habitação  de  Lúcio  Caio  Atilio,  governador  da 
Lusitânia  e  Galliza,  no  tempo  dos  romanos,  e  sua  mulher  Calcia, 
na  qual  nasceram  as  suas  nove  filhas  gémeas  e  santas,  Liberata, 
Quitéria,  Martinha,  Eufemia,  Genebra,  Germana,  Basilissa,  Victo- 
ria  e  Marciana. 

Cruzeiro  da  rua  dos  Pellames.  — Ao  fundo  d'esta  rua,  que  o 
cardeal-infante  D.  Henrique  mandou  abrir  sendo  Arcebispo  de 
Braga,  existe  um  cruzeiro  que  primitivamente  esteve  entre  as  ruas 
do  Anjo  e  de  S.  Marcos,  dando  origem  á  egreja  de  Santa  Cruz. 

Foi  mandado  fazer  por  D.  Diogo  de  Sousa. 

■ 


-274 


Cruzeiro  da  praça  do  conde  de  S.  Joaquim 

Cruzeiro  de  S.  Lazaro.  —  Está  quasi  contíguo  á  egreja  d'esta 
invocação  e  foi  feito  em  1 635. 

Tem  uma  imagem  de  Christo  morto,  e  a  columna  é  dividida 
em  gomos  salientes  que  se  desenvolvem  bastante  na  parte  inferior 
como  se  pôde  ver  da  gravura  que  abre  este  capitulo. 

Na  base  lê-se  esta  inscripção : 


SENHOR 

DAS   NESSE 

CIDADES 

PEFORMADO  a' 

CVSTA   DOS   DEVOTOS 

NO  ANNO  DE 


1884 

Inteiramente   egual  a  este,  e  quiçá  do  mesmo  auctor,  existiu 
outro  no  largo  fronteiro  á  egreja  de  S.  Paio  da  cidade  de  Guima- 


—  270   - 

rães.  A  camará,  porém,  desconhecendo  o  valor  d'elle,  vendeu-o  e 
acha-se  agora  na  freguezia  suburbana  de  Polvoreira. 

Cru-eiro  do  Senhor  da  Saúde.  —  Mandou-o  fazer  o  Arcebispo, 
D.  Diogo  de  Sousa  collocando-se  por  sua  ordem  junto  da  porta 
da  Sé.  Mais  tarde  removeu-se  para  as  proximidades  da  capella  de 
S.  Miguel  o  Anjo,  hoje  também  removida,  e  d'alli  para  o  campo  das 
Carvalheiras,  applicando-se-lhe  uma  cobertura  metálica  suspensa 
por  quatro  columnas.  A  invocação  provém  do  oratório  onde  esteve, 
na  casa  de  saúde  construída  de  madeira  no  local  de  S.  João  da 
Ponte,  por  ordem  de  D.  fr.  Bartholomeu  dos  Martyres,  para  tra- 
tamento de  empestados  no  anno  de  1670. 

No  capitel  da  preciosa  columna  tem,  ao  lado  do  escudo  de  D. 
Diogo  de  Sousa  as  lettras  lohi.  • 

Ainda  hoje  se  vê  na  extremidade  sul  da  ponte  velha  outro  cru- 
zeiro mais  simples,  feito  a  expensas  da  camará  em  memoria  dos 
serviços  prestados  por  D.  fr.  Bartholomeu  dos  Martyres.  Na  base 
tem,  quasi  de  todo  apagada,  a  inscripção  seguinte  : 

SENDO  ARCEBPO  DF! 

BRAGA  DO.    F.   BERTOLA 

MEV  DOS   MÁRTIRES 

OVVE   PESTE  NESTACI 

DADE   O  ANO   DE    ibjO  E 

OS    EMPEDIDOS  FORA  TR 

AZIDOS   A  ESTA  DE VEZ A 

Cruzeiro  do  Senhor  das  Anciãs,  em  Inflas,  um  pouco  afastado 
da  egreja  de  S.  Vicente.  Foi  para  alli  removido  do  local  onde  as 
ruas  dos  Chãos  e  do  Carvalhal  se  communicam. 

A  cobertura  descança  sobre  três  columnas  corinthias. 

Cru\eiro  do  Senhor  da  Boa  Lm\.  —  E'  uma  cruz  tosca  que  se 
venera  próximo  do  palacete  Cunha  Reis,  entrada  da  rua  da  Cruz 
de  Pedra.  Na  frente  é  vestida  de  madeira  com  uma  pintura  de 
Christo  crucificado.  Esta  cruz  assenta  sobre  um  grande  capitel  co- 
rinthio,  cuja  proveniência  se  ignora,  e  tem  luz  de  azeite  perma- 
nente.  Terá  origem  nesta  cmrx  de  pedra  o  velho  nome  da  rua  ? 

Cruzeiro  das  Palhotas.  —  Ao  centro  da  rua  d'este  nome  er- 
gue-se  um  cruzeiro  com  uma  imagem  de  Christo  agonisante  muito 
venerada  e  festejada  annualmente  pelos  moradores  d'aquellessitios. 

Tem  uma  cobertura  que  descança  sobre  quatro  columnas  jó- 
nicas. 


—  2y6  — 

Em  14  de  setembro  de  1868  foi  apeado  o  elegante  cruzeiro  do 
largo  de  S.  Francisco. 

Dos  campos  da  Vinha  e  de  Santa  Anna  foram  rtmovidas  em 
julho  de  ibb-j  as  14  cruzes  da  Via-Sacra  que  estavam  levantadas 
ao  longo  d'aquelles  largos,  obtendo  a  Camará  consentimento  da 
Confraria  de  Nossa  Senhora  a  Branca  para  serem  collocadas  no 
adro  da  sua  egreja.  Os  visinhos  distribuíram  entre  si  a  veneração 
das  referidas  cruzes  para  cada  um  as  illuminar  e  enfeitar  de  flores 
no  dia  3  de  maio  em  que  a  egreja  celebra  a  festa  da  Invenção  da 
Santa  Cruz,  por  ser  n'este  dia  descoberta  por  Santa  Helena,  mãe 
do  imperador  Constantino,  junto  do  monte  Calvário  onde  estava 
soterrada  com  duas  mais,  provavelmente  as  do  bom  e  mau  ladrão, 
sendo  necessário  para  a  estremar,  diz  Theodoreto,  reclamar  a  in- 
tervenção do  milagre.  Collocado  um  cadáver  sobre  cada  uma  das 
três,  foi  a  de  Jesus  reconhecida  porque  immediatamente  o  morto 
resuscitou  quando  o  extenderam  sobre  ella. 

A  festa  da  Exaltação  da  Santa  Cruz  data  do  anno  de  642  em 
que  o  imperador  Heraclius  conduziu  aos  hombros,  até  ao  monte 
Calvário,  a  verdadeira  cruz  do  Redemptor,  a  qual  quatorze  annos 
antes  fora  d'alli  retirada  pelo  rei  da  Pérsia  Khosroés  II,  vencedor 
de  Jerusalém  durante  o  império  de  Phocas. 


Além  das  numerosas  imagens  de  Santo  António  que  particu- 
larmente se  veneram  nos  estabelecimentos  commerciaes  e  indus- 
triaes,  com  especialidade  nas  mercearias  e  nas  tabernas,  para  que 
os  donos  sejam  felizes  nos  seus  negócios,  ha  por  quasi  todas  as 
ruas  das  cidades  e  pelos  caminhos  públicos  das  freguezias  ruraes 
umas  alminhas,  espécie  de  nichos  cavados  em  pedras  que  se  en- 
costam ás  paredes  e  que  teem  dentro  uma  pintura  representando 
o  Purgatório.  N'essa  pintura  quasi  sempre  apparece  um  Pontífice, 
um  Bispo  e  um  Monarcha  de  mistura  com  a  gente  do  povo,  allu- 
são  á  fragilidade  humana  e  á  rectidão  da  Divina  Justiça.  E'  o  tes- 
temunho mais  frisante  da  crença  na  bemaventurança,  destino  das 
almas  purificadas,  e  no  Inferno,  cuja  eternidade  de  penas  Orige- 
nes  foi  o  primeiro  a  negar. 


—  277— 


ORAGOS  DAS  FREGUEZIAS  DE  GUIMARÃES 


Santa  Maria  de 


O  Salvador  de 


S.  JoÁo  de. 


S.  Pedro  de. 
S.  Thiago  de  . 

S.  Migull  de. 


S.  Martinho  de 


Oliveira  (cidade) 

Airão 

Arosa 

Athaes  (afanes) 

Corvite 

Gémeos 
( Guardizella 
IV."  N.»  das  Infantas 

Inhas 

Mathamá 

v.a  N.a  de  Sande 

Silvares 

Souto 

IBalazar 
Briteiros 
Donim 
•  Gandarella 
Pinheiro 
Tagilde 

'  Mosteiros  do  Souto 
.Airão 
[Brito 
jCaldas 
<Castellões 
JGondar 
I  Pencello 
'  Ponte 

ÍAzurem 
Gominhães 
Polvoreira 
: Gandoso 
Lordello 
(Ronfe 

,  Castello  (cidade) 
t  Caldas 

jCerzedo  (^ersedo) 
Creix-mil  (crexe- 

mirj 
Gonça 
Paraizo 
Landoso 
Conde 


[Gondomar 
S.  Martinho  de. . . 'Leitões 
| Sande 
Figueiredo 
Cidade 

S.  Pai  j  de I,  Vizella 

Moreira  de   Cóne- 
gos (moraria) 

S.  Sebastião -Cidade 

(Calvos 
S.  L  ■'urenc  j  de  . .   Sande 
(Selho 

ÍFermentões 
Nespereira  (ncspe- 
rana) 
entieiros 

S.  Mamei  e  de  .  . . .   ôldão., 
I  Vermu 

S.  Chkutovâo  de  |cbitÇã° 
I  Selho 

Santo  Estevão  de    PTriteiros 
|  Urgezes 

S.  V.cente  de....!^ascotellos 
(Oleiros 

S.THOMEde \£Dffi? 

(Caldellas 

S.  Cláudio  de. . .  .-Barco 

S.ta  Ghkistina  de|Cerzedello 

(Longos 
Santa  Marimia  da-Costa 

S.CosMEda jLobeira    (lupa- 

I     ria) 
c    n>~..-~  a~  iMezão-Frio 

S.   KOMAO  de r,         ,     c     /  j    f^i 

(Rendufe  (randulfi) 
Santa  Eufemia  de-Prazins 
S^nto   i  hyrso    de-Prazins 
S.  Clemente  de  ..-Sande 

S.  Jorge  de -Selho 

S.  Cyp/xiano  de. .  .-Taboadello 
S.  Torquato 

S.  FawSTjno  de. .  .-Vizella 
S\nta  l  iO-adia  de-Briteiros 


Abação  :  (ave^ani) 
gnalado. 


Abi  e  cam  significa  em  Árabe  Pae  assi 

>  Cs 


Airão  :  —  Dava-se  antigamente  este  nome  aos  ramos  de  pedras 
preciosas  com  que  as  mulheres  enfeitavam  o  cabello  e  ao  penacho 
dos  chapéus  ou  capacetes  dos  homens. 


— ,7«- 


AldÃo  :  (aldiani)  —  Nasceu  nesta  freguezia  o  notável  juriscon- 
sulto D.  Agostinho  Barbosa  que  falleceu  Bispo  de  Ughento. 

Azurei:  —  Ha  uma  planta  rosácea  chamada  A\ereiro,  (cerasus 
lusitamca)  e  outra  gramínea  Azevém,  para  forragem.  Ha  próximo 
d^sta  egreja  parochial  o  velho  solar  dos  Peixotos  com  uma  torre 
de  aprimorada  construcção. 

Balazar:  — Pinho  Leal  quer  que  seja  corrupção  de  Valle  d'A- 
\ar. 

.Brito:  —  D.  Soeiro  de  Brito  fundou  alli,  no  reinado  de  D.  Af- 
fonso  V,  um  mosteiro  da  Ordem  de  S.  Bento. 

Briteiros:  (villa  britteiros)  —  Consta  que  a  egreja  de  Santa 
Leocadia  de  Briteiros  foi  cathedral  dos  Bispos  d'aquella  Diocese, 
extincta  por  effeito  da  invazão  dos  Árabes.  Fora  da  porta  ainda  se 
vê  um  tumulo  que  dizem  ser  de  Wamba,  religioso  benedictino 
pertencente  á  família  do  celebre  rei  Godo  successor  de  Flávio 
Recesvindo. 

Fermentóes  :  —  Fóra-montãos  ou  Fóra-montÕes. 

Sande  :  —  (S.  Martinho)  Foi  mosteiro  benedictino  que  teve  por 
Abbade  Receswinto,  poeta  e  orador,  fallecido  no  dia  3  de  março 
de  668.  Em  66o  assistiu  com  o  seu  collega  Wamba,  de  Briteiros, 
ao  X.°  Concilio  de  Toledo. 

Em  maio  de  1748  appareceu  aqui  sob  um  penedo  uma  talha 
contendo  36o  moedas  de  prata  de  D.  João  I. 

A  egreja  de  Santa  Maria  de  Villa  Nova  de  Sande  teve  mosteiro 
de  cónegos  Regrantes. 


'Owo  *vv-t>1 


Paraizo  :  —  Denominou-se  de  5-  Miguel  do  Inferno,  até  que 
D.  fr.  Bartholomeu  dos  Martyres  lhe  mudou  o  nome.  Ainda  hoje 
alli  ha  o  logar  do  Inferno. 

Santa  Maria  de  Silvares  e  Santa  Maria  de  Athães,  freguezias 
celebres  pela  grande  derrota  que  numa  e  n'outra  soffreram  os 
castelhanos. 

Villa  Nova  das  Infantas  deveria  antes  chamar-se  dos  Infantes, 
pois  foi  dada  em  1253  ao  mosteiro  de  Santo  Thyrso,  por  D.  Mar- 
tinho e  D.  Urraca,  filhos  de  D.  Sancho  I. 

Souto  :  —  (S™  Maria)  D.  Gomes  de  Maceira  fundou-lhe  em 
1200  um  mosteiro  de  cónegos  Regrantes. 


~279  - 

Souto:  —  (S.  Salvador).  D.  Paio  Guterres  da  Cunha  fundou- 
lhe  em  1080  um  mosteiro  de  frades  Gruzios. 

Tagilde:  (atanagildi)  —  Foi  fundada  em  56o  por  Atanagildo, 
rei  Godo.  No  casal  do  Paço,  d'esta  freguezia,  nasceu  em  1200 
S.  Gonçalo  da  Amarante. 

Caldas  :  —  (S.  Miguel)  D.  Affonso  V  de  Leão  e  sua  mãe  a  rai- 
nha Geloira  estiveram  aqui  no  anno  de  10 14,  confirmando  as  es- 
cripturas  e  privilégios  que  os  frades  do  mosteiro  de  D.  Mumadona 
levaram  áquella  freguezia.  (Vid.  Estaco). 

Longos:  —  (STA  Christina).  Sob  uma  lage  appareceram  aqui, 
em  maio  de  1738,  duas  talhas  cheias  de  moedas  romanas  dos  im- 
peradores Diocleciano,  Maximiano,  Maximino,  Constantino,  Cons- 
tâncio e  outros.  Adquiriu-as  o  illustre  vimaranense  Thadeu  Luiz 
António  Lopes  de  Carvalho. 


28o 


0RAG0S  DAS  FREGUEZIAS  DE  BRAGA 


Santa  M»ria  de 


O  Salvador  de 


S.  José  de  

S.  JoÁo  de  

Santa  Anna  de. 

S.  Pedro  de. . . . 
S.  Thiago  de  . . 


/Sé  (cidade) 

Adaufe  (ataulfu) 
i  Avelleda 
I  Ferreiros 

Lamaçães 

Lamas 

Mire  de  Tibães 
IPalmeira 
[Panoias 

Sequeira 
\Sobreposta 
í  Arentim 
iFigueirêdo 
'Nogueiró 
'  jPedralva 

Tebosa 
I  Trandeiras 
.-S.  Lazaro  (cidade) 
í  Souto  (cidade) 
.  ]  Nogueira 
(Semelhe 
.-Vimieiro 

IMaximinos  (cidade) 
Escudeiros 
E'ste 
'  jLomar 
/Merelim. 
I  Oliveira 

(Cividade  (cidade) 
'  |  Esporões 


S.  Thiago  de 


S.  Miguel  de. 


S.  Martinho  de. 


S.  Paio  de. 


S.  VlC  fOR 

S.  Loureisço  de  . 

Santa  Eulália  de 

S.  Mamede  de  .  . . 
Santo  André  de. . 
Santo  Adrião  de.. 

S.  Julião  de 

Santo  Este  ao  de 
S.  Vicente  de. . 
S.  Jerowmo  de. . . 
Santa  Licrecia 
S.  Bariholomeu  de 
Santa  Cicuia  de.  ■ 


P>aião 

Priscos 
I  Cabreiros 
l Cunha 
'Frossos 
'■Gualtar 
/Guizande 
1  Morreira 
l  Espinho 
{Dume 

Arcos 

Merelim 

Pouzada 

Parada 

Ruilhe 
-Cidade 
\Celleirós 
(Navarra 
(Crespos 
{Tenões 
-Este 

-Gondizalves 
-Padim  da  Graça 
-Passos 
-Penso 
-Penso 
-Real 

-Tadim  e  Fradellos 
Villaça 


Adaufe: — Nuno  Odoris  e  sua  mulher  Adozinda  Viscoi  funda- 
ram-lhe  em  1070  um  mosteiro  benedictino. 

Avelleda:  —  No  tempo  de  Vespasiano  havia  na  Germânia  uma 
prophetiza  e  druidiza  celebre  chamada  Velleda. 

Dume  :  —  Em  566  fundou  aqui  Theodomiro,  rei  Suevo,  um 
convento  benedictino,  que  S.  Martinho  dirigiu  até  58o  em  que  fal- 
leceu. 

Na  actual  egreja,  construída  em  1737,  conserva-se  o  tumulo  de 
mármore  em  que  S.  Martinho  esteve  até  que  no  anno  de  1606 
trasladaram  os  venerandos  restos  para  a  Cathedral  de  Braga. 

N'esta  freguezia  viveram  os  romanos.  Nas  ruinas  da  antiga 
egreja  appareceram  lapides  votivas  e  funerárias  d'aquelle  grande 
povo,  e  ainda  hoje  por  aquelles  sitios  abunda  a  telha  de  rebordo  e 
os  fragmentos  de  columnas  e  capiteis  antigos. 


-28l- 

Esporóes  : — Asperões.  Em  frente  á  nova  escadaria  da  egreja 
conserva-se  a  Capella  da  Caridade,  feita  em  1 638,  a  expensas  de 
dois  beneméritos  que  lambem  á  distancia  de  quatro  metros  para 
a  frente  fizeram  construir  uma  pequena  casa  em  que  fundaram  um 
celleiro  com  o  fim  altamente  sympathico  de  emprestarem  aos  la- 
vradores d'aquel!es  sitios  o  milho  para  as  sementeiras,  ficando  es- 
tes obrigados  a  entregal-o  no  S.  Miguel  com  mais  um  quarto  em 
cada  alqueire. 

Na  padieira  da  porta  d'este  pequeno  edifício  ainda  se  lê : 


AQVI   SE  RECOLHERA 

O    PÃO    DA  CHARíDADE 

Q   ENTANTO   DVRARA' 

QT0   DVRAR  AVERDAUE. 

A    POBRES    O    EMPRESTARÃO 

P.    FAZER  OS    SERVIÇOS. 

NO    S.    MIGEL   O   TRARÃO 

LIMPO    SECO   E   SEM  VÍCIOS 


A    VIRGEM   LHES   FAZ  A  GRAÇA 

TERNA    MAI  DE   PECADORES. 

E  QVE  NÃO  AJA.    TRAPAÇA 

DESSES    FIEIS  LAVRADORES. 

E   SE  AVERDADE  FALTOV 

O   QVE   SE  VE   CLARAMETE 

A    CHARIDADE    PASSOV 


A  capella  tem  na  frente  um  alpendre  sobre  duas  columnas  tos- 
canas,  e  no  alto  da  porta  estes  dizeres : 


ET  VNDE   HOC  Mi  Hl  VT  VENIAT 
MATER   DNI   MEI   ADME   Lvo    I .°   C. 


LOVVADO  SEIA   O   SANCTISSIMO 
SACRAMENTO   DO  ALTAR  E   TAMBE 
A  1MMACVLADA  CONCEIÇÃO  DA   VIR 

> 

GEM    NOSSA   SRA  CONCEBIDA 
SEM  PECCADO   ORIGINAL  AVE  M.a 

FraiÃo: — Entr£  os  Godos  era  nome  próprio  de  homem. 

Lomar  :  — Também  nome  próprio  entre  os  Árabes — Al-Omar. 

Palmeira  : — O  couto  de  Palmeira  foi  dado  aos  Arcebispos  de 
Braga  em  troca  da  rua  Nova  que  possuíam  em  Lisboa  (Pinho 
Leal,  Dicc.) 

Pedralva: — Por  estes  sitios  a  pedra  é  bastante  branca.  O  nome 
da  freguezia  virá  de  Pedra  alva?  Em  26  de  novembro  de  1238, 
el-rei  D.  Sancho  II  deu  este  couto  ao  Arcebispo  D.  Silvestre  Go- 
dinho. 


—  282  — 

Civídade  :  — Próximo  d'esta  egreja  parochial  urbana  apparece- 
ram,  em  julho  de  1744,  quasi  3oo  moedas  de  ouro,  romanas,  de 
Nero,  Galba,  Vitelio,  Vespasiano,  Tito,  Domiciano,  Nerva,  Tra- 
jano,  Hadriano,  Antonino  Pio,  Marco  Aurélio,  Lúcio  Vero,  Faus- 
tina  e  Plautino.  Um  inglez  comprou  200,  e  as  restantes  levaram 
descaminho. 

Appareceram  mais,  em  i3  de  julho  de  1892,  duas  talhas  cheias 
d'estas  moedas  romanas  soterradas  na  antiga  rua  do  Coelho,  que 
então  desappareceu  com  a  abertura  da  rua  Nova  d'el-Rei. 

Num  desaterro  da  rua  de  S.  Thiago,  próximo  da  torre  da 
egreja,  poz-se  a  descoberto  em  agosto  findo  um  curioso  mosaico 
romano  bastante  extenso  de  que  reuni  alguns  fragmentos  no  meu 
pequeno  museu. 


FINIS 

PRID1É   KALENDAS  .TANVARil 

ANNO    Á  NATIVITATF   DOMINI 

MILÉSIMO    NONGHNTESIMO 


ÍNDICE 


DAS  MATÉRIAS  CONTIDAS  N'ESTE  VOLUME 


Pag. 

Advertência vh 

Antiguidade  da  crença  na  vida  futura i 

Varias  opiniões  acerca  do  nascimento  de  Christo 4 

Fundação  da  egreja  christã. — Copia  da  sentença  de  Pilatos  i'ondemnando 
Jesus  á  morte.  — Tradição  do  adorno  das  casas  com  ramos  e  flores 

no  i.°  de  maio 5 

Perseguições  contra  a  egreja 6 

Repressões  rigorosas 7 

O  tribunal  da  Inquisição  —  Emblema  do  Santo  Officio 8 

Opposição  dos  Concílios  ás  praticas  supersticiosas  que  os  bárbaros  con- 
versos introduziram  na  egreja g 

Extirpação  dos  feitiços  —  Contra  o  roubo  de  objectos  sagrados 10 

Theoria  dos  dias-periodos  —  A  sciencia  e  a  fé  — A  Bibha  mal  interpre- 
tada—  Protecção   da   egreja    ás   sciencias    naturaes  —  O    transfor- 

mismo  applicavel  ao  homem 11 

Synchronismos  do  século  I \  3 

Virgens  canónicas  —  Virgens  claustraes  —  Emparedadas 1  4 

Synchronismos  do  século  II  —  Progressos  da  religião—  Uso  da  agua 

benta  —  Missa  da  meia  noite i5 

Synchronismos  do  século  III  —  Baptismo  dos  innocentes  —  Suffragios 

pelos  defunctos  —  Pr  imicias 1 5 

Synchronismos   do   século  IV  -Constantino  restitue  a  paz  e  a  liber- 
dade á  egreja  —  Lapide  com  inscripção 16 

A  alleluia   durante   o  anno — O  credo  —  A  confissão  peral  na  missa  — 

S.  Damazo  natural  de  Guimarães — Guimarães  cidade  no  século  XIV  17 
Sagração  das  egrejas —  /- s  primeiras  imagens  nas  egrejas  —  Ódio  dos 
Judeus  aos  Ídolos  —  Proscripção  da  idolatria  —  Concessão  de  Basí- 
licas aos  Bispos  por  Constantino  —  Sacerdotes  de  Isis  e  de  Serâpis  18 
Prohibição  de  serviços  ao  domingo  e  do  culto  das  pedras  —  Contra  as 
pintura-,  e  esculpturas  de  Christo  —  Ordena -se  que  as  imagens  se- 
jam portáteis  para  se  poderem  enterrar  e  esconder  nas  grutas »9 

Origem  das  romarias  e  procissões 20 

Synchronismos  do  século  V  —  O  Jejum  e  as  ladainhas -ío 


284 


Ladarios  —  Antiguidade  da  peste  bubonica  — Termina  a  confissão  publica 

—  Defeza   do  celibato  dos  padres  —  Bispos  coadjutores  —  Cónegos 
regrantes  na  Sé  de  Braça 21 

Synchronismos  do  século  VI  —  Observância  do  domingo  —  Diaconi- 
sas—  Conversão  dos  Suevos  —  Os  sacerdotes  obrigados  ao  uso  de 
hervas  cosidas  com  carne  —  Prohibição  de  enterramentos  nas  egre- 
jas  —  Dízimos  como  esmola 22 

Profissão  de  fé  dos  Godos  —  O  celibato — Sejam  de  mármore  os  alta- 
res— Dominus  tecum  —  Origem  do  Palio  e  sua  descripção 2 3 

Synchronismos  do  século  IX  —  Leis  de  ódio  de  Abderrame  H  contra 
os  christãos  —  Forcas  em  Córdova  —  O  Papa  Formoso  conde mnado 
a  torturas  depois  de  morto 41 

O  Hispo  dos  meninos  —  Mascaradas  nas  egrejas 42 

Synchronismos  dos  séculos  XI  e  XII  —  Suspensão  das  armas  —  Coroa 

do  Papa  —  A  tiara  des  ie  a  sua  origem   1 38 

Substiti  ição  do  rito  gothico  pelo  romano  —  Relíquias  nos  Concílios  para 

obstar  a  irreverências >  .        1 3o, 

Os  cenobitas  —  Procurador  do  Mosteiro  de  Guimarães  —  Vida  claustral 

dos  cónegos 140 

Antiguidade   da  commemoração  dos  fieis  defunctos  —  Descoberta   das 

linhas  da  musica — Canonisação  dos  santos  —  Esmola  da  missa 141 

Mortificações  voluntárias  —  Proveniência  da  lepra  —  Penitencias  impos- 
tas aos  peccadores  —  Formas  do  matrimonio  —  Lei  de  D.  Manuel 
sobre  o  assumpto 142 

O  dinheiro  de  S  Pedro—  As  sangrias  —  Protecção  dum  Concilio  á  agri- 
cultura —  Privilegio  de  cunhar  moeda 144 

Synchronismos  dos  séculos  XIII  e  XIV — Contra  os  Albigenses 1 57 

Determina-se  que  o  barrete  e  vestes  dos  Cardeaes  tenham  a  côr  verme- 
lha—  O  sacramento  da  Confirmação  ás  creanças  -  Termina  o  ban- 
quete dos  curas  aos  parochianos  —  A  eleição  dos  Papas  —  Origem 
da  festa  do  SS.  Sacramento 1  58 

Instituição  do  Jubileu  do  Anno  Santo  —  A  festa  da  Conceição  —  Provín- 
cia Dominicana  —  Órgãos  nas  egrejas  —  Sepultura  do  Papa  João  XXI 

—  Invenção  das  armas  de  fogo  —  Os  clérigos  principiam  a  ser  bar- 
beados     1 5g 

O  Arcebispo  D.  Martinho  ordena  que  se  pague  dizimo  do  «parimento 
das  ovelhas»;  do  pam,  do  vinho,  etc.  —  As  excommunhões — Absti- 
nência dos  sabbados  —  Carta  de  Santo  António 160 

Certidões  de  casamentos 161 

Synchronismos  do  século  XV  — A  architectur>>  e  a  esculptura 164 

Instituição  das  Misericórdias  —  Os  Judeus  em  Portugal  —  Clérigos  pre- 
guiçosos...        1 65 

Cortes  em  Braga  por  D  João  1  —  Dia  de  pão  por  Deus  —  Procissões  de 

Compus  Christi 1  bô 

Synchronismos  do  século  XVI  —  Fundação  da  egreja  protestante  ....        177 
Agua  no  cálice —  Pregões  matrimoniaes  —  Registo  de  baptismos  e  d    ma- 
trimónios—  Origem  dos  padrinhos  —  Bulia  da  Santa  Cruzada 1 78 

Adoração  a  Deus — Veneração  aos  Santos  —  Como  devemos  soccorrer 

os  necessitados 1 79 

RESPEITANTE  A  BRAGA 

Inscripção  Wisigothica  —  Inhumação  e  incineração  dos  cadáveres  — 
Primeiras  egrejas  e  primeiros  cemitérios  —  Mausolo  e  Artemísia  —  As 
catacumbas  de  Roma  —  A  mais  antiga  inscripção  christã  da  Penin- 


—  285  — 

Pag. 
sula  —  Emblemas  das  sepulturas — Tumulo  de  Lgas  Moniz  —  Cos- 
tume de  tosquiar  a  cabeça  e  a  barba  aos  defunctos  —  Principiam  os 

cemitérios  públicos  —  Decretos  para  a  sua  creação 25 

S.  Salvador  de  Montelios  —  El-rei  Cinthilla  promove  que  os  reis  antes 
de  occuparem  o  throno  promettam  conservara  fé  catholica  —  Onde 
morre  o  rei  ahi  se  elege  o  successor —  Keprehendem-se  em  publico 
os  peccadores — Missas  celebradas  com  leite  —  Iguarias  nos  vasos 
sagrados  —  Bispado  de  Briteiros  —  Origem  da  fest  i  de  todos  os  San- 
tos—  Presentes  de  Bonifácio  V  ao  rei  e  á  rainha  de  Northumbia  — 
Os  títulos  de  Soberano  Pontífice  e  de  Vigário  de  Christo  —Costume 
de  beijar  os  pès  ao  Papa  —  Sagração  —  Servos  dos  quatro  dinheiros 

—  Servos  da  gleba  —  Institue-se  a  festa  da  Annunciação  —  Beberetes 
nas  Cathedraes,  Collegiadas  e  Mosteiros —  Decreto  contra  as  ima- 
gens—  O  habito  talar  —  Origem  da  palavra  pagão  —  Pena  de  morte 
contra  o  uso  oe  vinho,  ovos  e  leite  na  quaresma  —  Resposta  de 
Erasmo  —  Instituição  da  quaresma 3,4 

O  sino  de  S.  Geraldo  —  Conservação  de  egrejas  pelos  Árabes  —  Bispos 

e  Arcebispos  de  Braga r 5 

Egreja  Cathedral  de  Braga  —  Contesta-se  a  vinda  de  S.  Thiago  á  Pe- 
nínsula e  crê-se  na  vinda  de  S.  Paulo  —  Templo  de  Isis  —  O  deus 
do  mercado  —  Invasão  Árabe  —  Porta  lateral  da  Sé  —  Nave  central 

—  Lapide  de  Augusto  —  Tumulo  de  cobre  dourado  —  Pia  baptismal 
— Pesca  no  rio  Este  —  Preciosidades  do  thesouro  —  Cálice  de  S.  Ge- 
raldo—  Frontal  do  altar  do  Sacramento  —  Exterior  da  capella-mór 

—  O  altar-mór  antigo  —  Corpo  incorrupto  de  D.  Lourenço —  Sepul- 
tura de  Martim  de  Freitas — Capella  de  Nossa  Senhora  da  Gloria  — 
Tumulo  de  D.  Gonçalo  Pereira  —  Vidro  antigo  com  pintura 63 

Egreja  de  S.  Pedro  de  Rates 128 

Egreja  e  Hospital  de  S.  Marcos  —  Convento  dos  Templários  em  Braga 
— D.  Gualdim  Paes  —  Capella  de  S.  Bento — Ovos  que  offerecem  ao 

Santo i33 

Egreja  da  Misericórdia 161 

Capella  da  Conceição  ou  Senhor  Morto  e  Egreja  de  S.  João  do  Sou- 
to—  Grupo  do  enterro  —  Palacete  dos  Coimbrãs 167 

Egreja  dos  Remédios  —  Architecto  vimaranense  —  Lapides   romanas 

da  Palmatória    171 

Egreja  do  Seminário  Conciliar 173 

Egreja  do  Populo  —  Quartel  militar —  Rua  das  Conegas 180 

Egreja  do  Salvador L. 181 

Egreja  do  Carmo  —  Relicário iS3 

Egreja  parcchial  de  S.  Victor 1 88 

Egreja  dos  Congregados  —  Bibliotheca  e  Lyceu tis» 

Egreja  de  S  Francisco     '. iqo 

Egreja  de  S.  Vicente , .  191 

Egreja  de  Santa  Cruz 192 

Egreja  da  Penha  de  França — Estatua  de  D.  Pedro  V— O  celebre  ra- 
becão —  Púlpito —  Asylo  de  infância  Desvalida 19} 

Egreja  parochial  de  Maximinos iõ5 

Egreja  e  Recolhimento  da  Tamanca 198 

Egreja  da  Conceição  —  Collegio  de  Regeneração  —  Muralhas  romanas  198 
Egreja  parochial  de  S.  Lazaro  —  ídolo  dos  Granjinhos  —  Asylo  de  en- 
trevados   202 

Egreja  de  Nossa  Senhora  da  Lapa  —  A  arcada  — Estatua  de  Braga  — 

Pelourinho — Theatro  de  S.  Geraldo 207 

Egreja  e  Convento  de  Santa  Thereza 208 


—    28'J  — 

Pag. 

Egreja  de  Nossa  Senhora  a  Branca 210 

Sanctuario  do  Bom  Jesus  do  Monte  —  A  inauguração  do  elevador  — 

Escadaria  dos  Cinco  Sentidos 212 

Egreja  parochial  da  Cividade 217 

Egreja  de  Nossa  Senhora  do  Sàmeiro 218 

Egreja  e  Convento  de  Montariol 219 

Egreja  e  Convento  de  Tibães  —  Quadro   de  merecimento  —  Curiosa 

inscripção  da  ponte  de  Prado 23 1 

CAPELLAS 

Capella  de  S.  Lourenço  da  Ordem 23  7 

Capella  de  Santa  Martha  das  Cortiças  —  Castro  Luso-Romano 237 

Capella  de  Santa  Maria  Magdalena 23í5 

Capella  e  Convento  do  Varatojo 2  >8 

Capella  de  Santo  Adrião  da  Corrica 2*9 

Capella  de  S.  João  da  Ponte  —  Festejos  baptistinos  —  Festa  do  Can- 

deleiro  —  Imagem  de  S.  Christovão  —  Pinheiro  da  Gregoria 241 

Capella  de  Santa  Justa 244 

Capella  de  Santo  António 244 

Capella  de  Nossa  Senhora  da  Consolação 245 

Capella  de  Guadelupe 24a 

Capella  do  Cemitério 248 

Capella  de  Santa  Tecla 249 

Capella  do  Senhor  das  Anciãs 249 

Capella  de  Nossa  Senhora  do  Pilar 25o 

Capella  de  Nossa  Senhora  da  Abbadia 25 1 

Capella  de  S.  Gonçalo  —  Recolhimento  das  Convertidas 25 1 

Capella  e  Recolhimento  da  Caridade 253 

Capella  do  Paço  Archiepiscopal —  O  chafariz 25  5 

Capella  de  Nossa  Senhora  da  Torre 254 

Capella  das  Almas 255 

Capella  de  S.  Victor  Velho 255 

Capella  de  S  Sebastião  —  Monumentos  romanos  .  . , 257 

Capella  dos  Orphâos  de  S.  Caetano 259 

Capella  de  S.  Miguel  o  Archanjo 259 

Oratorio3 265 

Nichos 268 

Cruzeiros 270 

Oragos  das  freguezias  de  Braga 280 

RESPEITANTE  A  GUIMARÃES 

Egreja  de  S.  Miguel  do  Castello  —Decreto  elevando  Guimarães  a  ci- 
dade—Lapide da  consagração  á  Virgem —  Dogma  da  Conceição  — 
Prohibição  do  nome  de  Maria  —  Divergências  acerca  do  nascimento 
de  D.  Affonso  nenriques  —  Padrão  das  Teigas  —  Castello  de  Guima- 
rães     Paço  dos  Duques  de  Bragança  —  Pórtico  e  Janellas  —  Benção 

dos  sinos 43 

Collegiada  de  Guimarães  — A  primitiva  imagem  da  Virgem  -  Brazão 
dos  D  Priores  —  Sacrário  e  frontal  de  prata  —  Verdadeiro  retrato 
da  Virgem —Preciosidades  do  thesouro  (Museu)—  Triptyco  —  Cruz 
processional  grande — Cruz  gothica — Custodia  de  prata  dourada  — 
Cálice  das  campainhas  —  Cálice  de  S.  Torquato  —  Cofre  de  relíquias 

—  Capella  do  capitulo  — O  Padrão  —  O  milagre  —  Alcaçaria 96 


-  287  — 

Pag. 

Egreja  de  Cerzedello 1 29 

Lado  sul  da  mesma  egreja 1 3 1 

Egreja  de  S.  Domingos  — Arcada  do  claustro —Andor  das  candeias.. . .  145 
Egreja  de  S.  Francisco  —  Capella-mor  —  Tumulo  de  D.  Constança  de 
Noronha  —  Capella  do  capitulo  —  Porta  principal  da  egreja   -  Capa 

bordada  a  matiz  e  ouro  —  Monumento  a  D.  Affonso  Henriques 149 

Egreja  da  Misericórdia 162 

Egreja  de  Santa  Clara  —  Organisação  do  Seminário  em  Lyceu 177 

Egreja  de  S.  Damazo 184 

Egreja  dos  Capuchos  —  Provisão  real  concedendo  a  pedra  dos  Paços 
do  Conde  D.  Henrique  —  Recibo  curioso  —  Hospital  da  Mizericor- 

dia i85 

Egreja  e  convento  das  Capuchinhas 187 

Egreja  e  convento  do  Carmo 187 

Egreja  e  convento  de  Santa  Rosa  de  Lima  —  Demolição  da  egreja  de 

S.  Sebastião    íoo 

Basílica  de  S.  "Fedro  —  Deis  qua Jros  de  valor 20: 

Egreja  parochial  de  Santa  Marinha  da  Costa  —  Interior  da  egreja 
—  Fachada  do  convento  —  Cálice  de  D.  Dulce  —  Extincta  Universi- 
dade —  Cálice  do  século  XVI  —  Collegio  de  S.  Damazo 2o3 

Egreja  dos  Santos  Passos .    209 

Egreja  parochial  de  S.  Paio  —  Asylo  de  inválidos 211 

Egreja  de  S  Torquato 221 

Cruz  de  S.  Gonçalo 235 

Cálice  d  9  S.  Salvador  de  Briteiros 236 

.     GAPELLAS 

Capella  de  S.  Lazaro   2:9 

Capella  de  Santa  Luzia 240 

Capella  de  Nossa  Senhora  da  Conceição 240 

Capella  da  Madre  de  Deus 2 40 

Capella  de  Nossa  Senhora  da  Luz 241 

Gruta-Ermida  de  Nossa  Senhora  da  Penha  —  Monumento  a  Pio  IX.  246 

Capella  de  Nossa  Senhora  da  Boa  morte 249 

Capella  do  Senhor  Jesus 25o 

Capella  dos  Terceiros  Dominicos  —  Hospital  da  Ordem 255 

Capella  dos  Terceiros  Franciscanos  —  Uma  esculptura  de  Soares  dos 
Reis  —  Sepultura  de  João  Evangelista  de  Moraes  Sarmento  —  Hos- 
pital da  Ordem 255 

Capella  de  Nossa  Senhora  da  Guia 257 

Capella  do  extincto  Cemitério 27 

Capella  do  Recolhimento  do  Anjo 260 

Capella  de  S.  Chrispim 201 

Capella  do  Cemitério  da  Athouguia 261 

Capella  do  Senhor  de  Campellos 262 

Oratórios »63 

Cruzeiros 273 

Oragos  das  freguezias  de  Guimarães 277 


índice  das  gravuras 


Tas?. 

Templo  de  Diana  (Évora) 3 

Lapide  de  Constantino  (Braga) 16 

Inscripçâo  Wisigothica  (Braga) 25 

Primitiva  Capella  de  S.  Fructuoso  ( t  raga)   : 33 

Interior  da  referida  Capella 35 

Egreja  de  S.  Miguel  do  Castello  (Guimarães) 43 

Pórtico  Joannino  do  Paço  dos  Duques  de  Bragança  (Guimaiães).  ......  52 

Janellas  e  chaminés  do  mesmo  edifício 52 

O  sino  de  S.  Geraldo  (Braga) .  55 

Egreja  Cathedral  de  braga 63 

Porta  lateral  da  referida  egreja 67 

Nave  central  da  referida  egreja 68 

Porta  principal  da  Sé j3 

Tumulo  de  cobre  dourado  (Braga) ...  75 

Pia  baptismal  (Braga) rt6 

Cálice  de  S.  Geraldo  e  o  respectivo  cofre  (Braga) ...    .    79 

Frontal  do  altar  do  Sacramento  (fraga) £2 

Exterior  da  capella-mór  da  Sé 84 

Altar-  mór  antigo S6 

Corpo  incorrupto  do  Arcebispo  D  Lourenço £9 

Capella  de  Nossa  Senhora  da  Gloria  (Braga) gi 

Tumulo  de  D.  Gonçalo  Pereira  (Braga) ...  94 

Collegiada  de  Guimarães 96 

Primitiva  imagem  de  Nossa  Senhora  da  Oliveira  (Guimarães.) 102 

Verdadeiro  retrato  da  Virgem  (Guimarães) 107 

Triptico  ou  oratório  de  prata  dourada  (Guimarães) 109 

Cruz  processional  grande  (Guimarães) 1 1 3 

Cruz  gothica  (Guimarães) 1 15 

Cofre  de  relíquias  (Cuiroarães) 119 

Capella  do  Capitulo  (Guimarães) '  22 

Milagre  do  Padrão  (Guimarães) 125 

Egreja  de  S.  Fedro  de  Rates 128 

Egreja  de  Cerzedello  (Guimarães) 129 

«9 


—  2Q0 

Pag. 

Lado  sul  da  referida  egreja i3i 

Egreja  e  Hospital  de  S.  Marcos  (Braga)  i33 

Egreja  de  S.  Domingos  (Guimarães) 145 

Arcada  do  claustro  de  S.  Domingos  e  andor  das  Candeias  (Guimarães).  148 

Egreja  de  S.  Francisco  (Guimarães) 149 

Capei  a  mor  da  referida  egreja i5i 

Capella  do  Capitulo  dos  frades  1  Guimarães) i53 

Porta  principal  da  egrej a  de  S.  Francisco  (Guimarães) 1 54 

Capa  bordada  a  matiz,  ouro  e  peJras  (Guimarães)  i55 

Capella  de  Nossa  Senhora  da  Conceição  (Braga) 167 

Grupo  do  Enterro  (Braga) 170 

Púlpito  da  egreja  do  Salvador  (Braga) 182 

Egreja  de  Santa  Cruz  (Braga) 193 

Púlpito  da  egreja  de  Penha  de  França  (Braga)  . .    196 

Egreja  parochial  da  Costa  (Guimarães) ío3 

Interior  da  referida  egreja 204 

Fachada  do  Convento  da  Costa 204 

Cálice  de  D.  Dulce  (Guimarães) 20Í 

Cálice  da  Costa  (Guimarães) 206 

Egreja  dos  Santos  Passos  (Guimarães) 200 

Sanctuario  do  Bom  Jesus  do  Monte  (Braga) 212 

Vista  geral  do  Bom  Jesus 21 3 

Escadaria  Antiga  do  Sanctuario 2i5 

Egreja  e  Convento  de  Montar  iol  (Braga) 219 

Egreja  de  S.  Torquato  (Guimarães) 221 

O  tumulo  antigo  do  Santo 223 

Corpo  incorrupto  do  Santo 225 

Parte  interior  da  nave  em  construcção 228 

A  parte  construída  da  egreja 228 

Cruz  de  S.  Gonçalo  (Guimarães) 235 

Cálice  de  Briteiros  (Guimarães) 236 

Gruta-ermida  de  Nossa  Senhora  da  Penha  (Guimarães) 246 

Cruzeiro  de  S.  Lazaro  (Braga) • 27o 

Cruzeiro  da  praça  do  Conde  de  S.  Joaquim  (Braga) 274 


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