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Full text of "Castrioto lusitano;"

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CASTRIOTO 

LUSITANO. 


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PARIZ.— I1IPIIRNS4  HA  VIUVA  ©ONDKY-DUPR^ , 

riia  SahiULouis,  n'  4G,  nn  llarai&. 


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THE  NEW  yOT^K 
PUBLIC  LIBRABV 


A<*0«. 


TIUD 


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tot.   /fe7<^     yy\    K'-U    _ 

CASTRIOTO 

LUSITANO 

ou  y 

HISTORIA  DA  GIMRA  ECTRE  0  BRAZIL  E  A  HOllANDA , 

DVBANTE  OS  ANNOS  »E  10*4  A  iS64, 

TEaMlNADA  ^BLA  6L0A10SA  RBSTAURACAO  DB  PEBNAMBUCO  E  DAS  CAPITA NUS 
CONFINANTBS; 

Obra  em  que  se  descrerem  os  heroicos  feitos  do  illustre 
JOAO  FERMAin^BS  VIBZRA, 

o  rios  valerosos  capitaes  que  com  elleconquistarao .  a  independencia  nacional, 

For  Fb.  JRAPHA£L  DE  JESUS.     ^ 

]lfto!«6E  BENEDICTINO.  -       ' 

KOVA   EDI^aO  SECniDO  A  DE   1679,  IMPRESSA  EM  LI8B0A ,  FOR  CRAE8BBECK, 

DBDICADA  A  SUA  MAGESTADE  IMPERIAL 

O  SENHOR  DOM  PEDRO  11, 

IMPBRADOR  DO  BRAZIL; 

Ornada  com  o  rcirato  dc  loio  FemandeA  TIeIra 

e  duas  estampas  historicas. 


'  ^    . 


PARiZ, 

PIIBLICADA  PORJ.P.   AlKLAUD, 


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,  PUBLIC  LIBRARY 

TIUOEH  FOUNDATION*       I 


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^enm 


o?) 


/i&?*ioao  /do  ort^anh  e  awncdo  como 
o  aae  aJirekf^^ilou^  o  uOrce^zu  a^ca/iao 
uc€^i4^  co/^i.  od  rarcod  cotojd^ed  cut 
^6o/uifnaa    /in  /^^   cAocnfO;:  t/e  diKt 

Oj  auoj /e^^p  G^A^f^^ 


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7/ior€mec /ordo  cu^?tay  e  Ae^nenle  ccm^ 

dua^  awrt€i,  e  od  i^^^^ed  aedceTuie9iied 
aciauewed  Ae^oed,  ao  9/ieuwr  li/u/o  ae 
dua  novreza. 

ty€  An^nei^a  etucdo  cio     (oaM:^4rtolo 

/w    (lecucaaa    a    (of  ^ec  o  h/e^ioT 

^o/n    crecm)  ae    ^ar^u^^,    aiiand^o 

cufcenae^t/e     ae       uo^d^     Ovwaaed^fvae 

t%/^erta^;j:a    re€^?Ar^^^MO  T/iem^raaa 

\/:  ^.,  ^>'  '/V.* 
cu^nc,  : '^eJ^iJ^'VA^^^^^^^^^^  d^^  COUO-' 


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nom6naae/7i^  aae  red/iedodo  e  rei^erenle 
t^     l/o^co  9ym^cia6cyla€/e  t'^77f/i&ncU, 


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ADVERTENCIA  DO  EDITOR. 


A  edi^ao  que  ora  damos  a  iuz  do  Gasirioto 
Lusitano^  e  uma  copia  fiet  da  de*1679  pelo  qiie 
pertence  a  parte  historica ,  geographica  e  des- 
criptiva;  mas  nao  assim  em  quanto  ao  mais. 
EscrevSra  o  autor  na  epocha  da  decadencia  da 
boa  lingoagem  pdrtugueza;  e  dominado  pelo 
gosto  do  seculo,  em  que  vivia,  espalhou  com  mao 
larga  por  toda  a  obra  os  deffeitos  de  que  sao 
ootados  OS  seiscentistas.  Digressoes  diffiisas^  e 
pouco  pertencentes  ao  assumpto;  reflexoes  e  con- 
ceitos  frequentes^  e  algumas  vezes  pouco  judicio-; 
SOS;  antitheses  buscadas  com  excesso  e  sem 
gosto,  e  em  fim  decidida  affei^ao  ao  maravilhoso, 
sao  OS  defeitos  de  Fr.  Raphael  de  Jesus.  Aeon- 
selhados  por  pessoas  intendidas»  e  ajudados  de 
sua  coopera^ao  emprehendemos  expurgar  este 
livro  de  seus  defeitos  em  quanto  a  forma ,  sem 
aiterar  em  nada  a  materia ;  e  eis  aqui  como  nos 
houvemos.  Simplificamos  as  digressoes  a  fim  de 
fazer  melhor  sobresair  o  assumpto  principal; 
supprimimos  muitas  reflex5es  e  conceitos ,  que 
por  sua  frequencia  mais  service  de'^empecer  o 
discurso  que  de  illustrara'nkrracjaoTresumimos 
algumas  iallas  e  alloc^ucoes  ^  qut)*6a£itor  mal 


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X  ADVERTENCIA  DO  EDITOR. 

exerceo  sua  rhetorica^  e  que  nao  erao  ponto  histo- 
rico,  pois  diz  pareceyfoifamaqMommfallaraetc. ; 
femes  muite  circumspectos  em  tude  que  diz 
respeite  a  credulidade  d'aquelles  tempos ;  em  fim 
corrigimes  e  estilo  sempre  que  fei  pessivel  faz^l- 
e  sem  destruir*o  cunho  de  sea  autor.  Assim  que, 
as  altera^^oes  que  nesta  edifSo  se  netSe  antes  se 
devem  chamar  melhoramentos  que  mudangas. 
Fei  per  isso  que  demos  as  materias  nova  distri- 
buifao»  fazende  .doze  livros  de  dez  que  erSo ,  e 
pende  no  ceme^o  de  cada  urn  d'elles  urn  sum- 
marie  com  remissoes  numericas  de  que  nelle  se 
trata  para  cemmedidade  de  leitor.  Genservames 
textualmente  as  dedicaterias  e  prologe  de  auter 
per  serem  impertantes  para  a  histeria  litteraria 
d  aquelle  tempo.  Esperames  peis  que  os  lei  tores 
relevarae  tedas  as  imperfei(5es  que  nella  encen- 
trarem ,  levande-nes  em  centa  e  deseje  que  ti- 
yemes  de  vulgarizar  um  livre  que  tanto  henra 
OS  antiges  Brazileires ,  e  de  centribuir  per  este 
mode  a  fazer  mais  publica  a  gloria  que  com  tao 
juste  titule  cabe  ae  Imperie  Brazileire  peles  it- 
lustres  feitos  que  nelle  se  centum. 


0  Editor. 

Pariz  28  (iV^P^'cbe  18^^. 


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AO  SERENlSSUiO 

PRINCIPE  DOM  PEDRO, 

RBGBNTE  DA  HONARCULV  LUSITANA. 


SENHOR, 

Ao  sol»  quelhes  preside,  devem  os  astros  todo 
o  ser  de  seu  lusimento ;  a  Yossa  AUeza,  que  nos 
governa,  se  hao  de  attribuir  todos  os  progressos 
de  seifs  vassallos.  Com  esta  divida  offere^o  a 
seus  reaes  pes  a  memoria  do  que  em  seu  servi^o 
obrou  minha  possibilidade,  para  que  se  restituao 
OS  effeitos  a  quern  se  devem  os  influxos.  Aquellas 
aguas  que  os  rios  levao  ao  mar  nao  ^  servifo,  e 
restituifao.  Bern  sei  que  no  tempo  do  Senhor 
Oom  JoaOy  dignissimo  progenitor  de  Yossa  Real 
Alteza,  se  intentou  e  se  conseguio  a  restaura^ao 
d'esta  e  das  mais  capitanias ,  que  neste  Estado 
do  Brazil  tinha  usurpado  a  violencia  inimiga ; 
mas  tambem  considero  que  os  astros  em  que  o 
sol  substitue  sua  ausencia ,  tomao  corpo  d'uma 
mesma  materia,  euma  mesma  luz  os  informa. 
Porvao  do  corpo  do  pai  e  o  corpo  do  filbo  pela 
gera^ao ,  e  pela  educa^ao  urn  reflexo  de  seu  es- 
pirito :  razao ,  que  agora  me  representa  outro 
tempo,  por^m  nao  outro  Principe.  Yossa  Alteza 


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nasceo  para  o  ser  da  paz,  depoisi  de  vinie  e  oito 
annos  gastados  em  viva  guerra,  e  os  successes 
d  ella  so  a  Yossa  Alieza  se  hao  de  dedicar.  Aquel- 
les  materiaes,  que  t)avid  congregou  no  tempo  da 
guerra  para  o  tempto ,  nao  quiz  Deos  que  na 
forma  d*elle  se  ihe  dedicassem^  senao  em  tempo 
de  seu  filbo  Salomao ,  por  s6r  rei  pacifico.  Nao 
faltara  acceita^ao  ao  ofierecimento ,  que  este 
acerto  apadrinha,  e  que  faz  o  desejo  de  um  vas- 
snllo,  que,  faito  de  occasioes  para  servir,  diverte 
sua  magoa  com  as  memorias  do  que  tem  servido 
a  Vossa  Alteza,  cuja  vida  e  estado  augmeate  o  ceo 
por  felizes  e  diiatados  annos,  para  gloria  d'esta 
monarchia,  e  bem  de  seus  vassailos. 


Fidelissimo  criado  de  V.  A.  R. 


JOAO  FeRNAND£S  VlElttA* 


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JOAO  FERNANDES  VIEIRA, 

FIDALCO  DA  CASA  DB  SUA  ALTEZA,  E  DO  SEO  C0N8BLH0  DB  GUBRRA , 
ALCAIDE  MOa  DA  VILLA  DE  PINHEL,  COMMENDADOR  DAS  COMMENDAS  DA 
ORDRM  DB  CHRISTO,  SAO  PEDRO  DE  TORRADAS  ,  B  SANTA  EUGBfllA  DE 
AULA ,  SCIPBRINTBNDBNTE ,  PBLO  MBSMO  SBNHOR  ,  DAS  FORTinCACOBS 
DK  PBRNAMBUCO,  E  DE  TODAS  AS  UAIS  DO  ESTADO  DO  BRAZIL  PARA  O 
NORTE,  B  PRIMBIRO  ACCLAMADOR  DA  L1BBRDADR  B  RBSTllTRACAO  DB 
PBRNAMBUCO. 


Escreveo  Atheneo  as  proezas  de  Lucullo,  vale- 
roso  e  esclarecido  Romano,  e  acabada  a  historia, 
a  remetteo  ao  mesmo  Lucullo  (ja  retirado  da 
guerra)  para  que  nella  visse,  como  em  um  retrato 
de  suas  obras,  se  a  narra^ao  se  aiTastava  em  al- 
guma  cousa  da  verdade,  e  com  a  sua  appro va^ao 
ficasse  o  referido  sem  duvida.  Sabia  que  se  nao 
da  inteira  fe  aos  treslados ,  que  nao  sao  confe- 
ridos  com  sens  originaes.  Tudo  quanto  cont^m 
este  livro,  em  seu  principal  assumpto ,  sao  obras 
de  Vossa  Senhoria,  por  filhas  ou  de  seu  brago, 
ou  de  seu  conselho,  ou  de  sua  disposi<;ao.  A  no- 
ticia  dos  successos,  das  pessoas,  dos  tempos  e 
das  partes ,  recebi  de  sujeitos  fidedignos  pelos 


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XIV 

postos  que  occuparao,  pela  continua^ao  com  que 
servirao,  e  pela  honra  com  que  proced^rao,  aos 
quaes  como  a  testemimhas  de  vista  manda  o  di- 
reito  dar  inteiro  credito.  Muitos  autores  escre- 
v^rao  OS  progressos  de  Alexandre  Magno ,  e  na 
opiniao  de  Yolaterrano  a  nenhum  se  deve  tanta 
fe  como  a  Aristobulo  judeu^  porque  os  referio  de 
vista,  assistindo-lhe  a  tudo,  e  em  todo  o  discurso 
de  suas  conquistas.  Aristobulus  Judem  res  gestas 
Alexandri  Magni  conscripsitj  comesque  ipnus  peregrin 
nationis  fait.  E  supposto  que  esta  razao  me  obriga 
a  crer  o  verdadeiro  das  noticias,  deixara  de  o 
ser  o  argumento  d'esta  narra^o  se  na  menor 
parte  d'ella  faltar  a  verdade.  No  mundo  nao  sao 
menos  os  ambiciosos  da  fama»  que  os  da  fazenda, 
e  com  mais  cuidado  se  esconde  a  infamia  que  a 
pobreza.  Os  olhos  de  Yossa  Senboria  busca  neste 
volume  meu  escrupulo ;  nelle  achara  espelho  em 
que  se  veja  retratado,  e  todos  neste  espelho  po- 
derao  ver  o  retrato  de  Yossa  Senhoria,  se  em 
tudo  se  conformar  a  imagem  com  o  original. 
Basta  a  dissimilhan^a  d'uma  c6r  para  destruir  o 
parecer  d'uma  imagem ;  e  porque  nesta  nao  falle 
o  menor  accidente,  o  remetto  ao  exame  de  Yossa 
Senboria,  para  que  com  sua  emenda»  ou  com  sua 
approvacao  fique  a  certeza  sem  duvida ,  e  se  leia 
esta  historia  sem  escrupulo,  certo  o  leitor  que  v6 
o  que  Yossa  Senboria  e  na  verdadeira  represen- 


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XY 

ta(^o  do  que  tern  side.  Ainda  que  pe^o,  nao 
adulo.  Intento  em  que  nao  cabe  iuteresse  nao 
tern  parte  a  lisonja ,  nem  se  obriga  com  a  ver- 
dade  a  quem  nao  gosta  da  mentira ;  quem  nas 
occasioes  se  naoalterou  com  os  vivas  dos  applau- 
sos  nao  se  pode  esvaecer  com  as  repeti^Ses  dos 
progressos.  Esperomeu  desengano,  e  os  de  todos 
nadefini^ao  do  certo,  e  com  ella  ficara  meu  tra- 
balho  mais  luzido ,  e  este  volume  mais  digno  de 
se  dar  a  estampa,  uma  vez  por  verdadeiro,  e 
muitas  por  Vossa  Senhoria  ser  sen  assumpio  e 
sen  autor.  A  pessoa  de  Vossa  Senhoria  guarde 
Deo&  por  dilatados  annos,  para  que  neltes  viva 
a  seguran^a  d'esse  Estado,  e  o  castigo  da  emula- 
^ao. — Braga  e  Outubro  22  de  1676.—  Capellao 
de  Vossa  Senhoria.  0  pregador  e  procurador 
geral  da  ordem  de  S.  Bento  nesta  curia  de  Braga. 

Fn.  Raphael  de  Jesus. 


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PROLOGO. 


Dos  prologos  faziao  os  escriptores  humilde  rogo ; 
permittia-o  a  singeleza  de  algum  tempo.  Na  pre- 
sente  idade,  prevenidas  adverlencias  devem  $er  o 
argumenlo  dos  prologos ;  neeessita  d'ellas  a  mar 
licia.  0  que  menos  sabe  he  o  que  mais  presume; 
razao,  por  que  a  tudo  se  atreve  o  que  menos  sabe. 
No  maior  p^o  correm  os  rios  com  menos  es- 
trondo;  os  juizos^  quanto  mais  tem  de  fundo,  mais 
tern  de  capacidade*  0  curioso  I^;  o  noticioso  ob* 
serva;  o  limitado  grita;  julga  de  si  que  p6de  cen- 
surar  sem  reparo  o  que  se  escreveo  com  estudo.  0 
certo  nao  tem  pressas ;  e  se  algum  a  teve ,  foi  dita 
da  occasiao,  e  nao  effeito  do  repente.  Porque  ha  de 
ter  animo  para  censurar  o  que  os  outros  escrevem 
quem  nao  teve  brio,  nem  ainda  applicacao  para 
escrever?  Nenhum  esta  tao  longe  de  si  como  o  es- 
vaecido;  nenhum  tanto  em  si  como  o  considerado. 
0  sol  tem  de  planeta  mais  luzido  o  expor  sens 
raios  &  nota,  cobrindo  com  seu  resplandor  a  falta 
de  todos  OS  mais  astros.  Se  queres  aproveitar,  nao 
leias  para  escurecer;  leras  para  saber,  se  leres 
com  OS  claros  de  teu  juizo.  Se  o  queres  formar 
desta  obra,  nella  te  offereco  processada  a  causa; 
julga  pelo  mericimento  do  processo ,  para  que  a 


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XVIII  PROLOGO. 

paixao  te  nao  faf4  fiarle^  ^uatido  te  constitues 
juiz. 

Com  razao  dcsejaris  saber  a  que  live  para  me 
occupar  em  argumento,  a  teu  parecer,  tao  alheio 
de  meu  estado,  quanto  6  o  estrondo  da  guerra  do 
socego  religioso?  No  motivo  do  reparo  tens  a  sa- 
tisfa^ao  da  dtivida.  0  echo  em  uma  parte  se  fdrma, 
em  outra  se  causa ;  nelle  ouves  o  golpe ,  sem  ver 
a  ferida.  Os  conflictos  escrevem-se  na  campanha 
com  sangue^  na  historia  com  tinta.  Nas  iroagens 
Tes  boca  para  fa  liar,  mas  nao  Ihe  verds  nunca 
abrir  a  boca.  Tal  i  a  relacao  dos  successos,  ima- 
gem  sem  yoz,  echo  sem  golpe,  ferida  sem  sangue. 

Nao  te  pareca  o  clausiro  lao  diverso  da  cam- 
panha, que  imagines  se  nao  milita  em  uma  e  ou- 
tra parte.  Nao  basta  a  differen^a  das  armas  para 
tirar  o  ser  aos  conflictos.  Os  inimigos,  por  serem 
d'outra  na^ao,  nao  deixao  de  ser  contrarios  :  os 
mais  ardilosos  sao  os  mais  nocivos.  Para  todos  os 
mortaes  i  todo  o  lugar  campanha ;  e  nao  sera  sol* 
dado  senao  quem  deixar  de  ser  homem.  Militia  est 
vita  hominis  super  terram  (Job.  I,  7).  Na  institui- 
cao  das  ordens  militares  achards  praticados^  como 
equivocos,  campanha  e  choro,  breviario  e  lan9a, 
religiao  e  milicia.  Os  filhos  de  Sao  Bento  ar- 
mados  cantavao  os  officios  divinos;  o  mesmo  sino 
que  Ihes  tocava  a  rebate,  os  chamava  a  reza ;  ob- 
servou-o  ElReiDomSancho  de  Gastella,  e  disse  ao 
abbade  dom  Raimundo :  «  Admira-me,  padre,  o  ver 


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nmjoGo.  xn 

»  qu6  n  «stei  yoM08  subditos  fiiz  urn  mesmo  sine 
»  leoes  e  cordeiros.  » 

Ja  se  Tfrao  militar  as  estreHas^  sem  que  a 
guerra  Ihes  relaxasse^  nem  o  curso  da  virtude^ 
nem  a  observancia  da  ordem  :  Stetim  nument^^  in 
ordine  mo  et  in  curm  iuo  pugMverunl  emir tf  5f  so- 
ram  (Judic.  v,  20).  E  estao  tao  apartadas  do 
mundo,  como  o  esta  o  ceo  da  terra.  0  que  a  pro- 
fissao  faz  proprio^  que  razao  o  p6de  fazer  alheio? 
0  mais  religtoso  i  o  melhor  soldado^  e  seri  melhor 
soldado  0  que  for  mais  religioso.  Nacasade  David 
e  no  tabemaculo  esteve  a  espada  com  que  truncou 
0  gigante;  a  decencia  do  deposito  equiroc^u  os  lu» 
gares,  pelo  religioso,  e  pelo  soldado. 

Pelas  occupacoes  se  distingue  o  reformado  do 
destrabido :  bonesta^  decorosa  e  util  i  aquella  que 
serve  as  melboras  do  particular  e  do  commum. 
Os  livros  aproveitao  ao  commum  em  quanto  oc-* 
cupao,  e  ao  particular  em  quanto  ensinao.  Grande 
servifo  faz  4  patria  o  que  a  illustra  com  obras 
dignas  de  se  escreverem;  maior  o  que  a  enno^ 
brece  escrevendo  feitos  dignos  de  se  imitarem.  A 
proeza  executada  p6de  fazer  um  heroe^  por^m 
Uda,  muitos.  A  gloria,  e  nao  o  perigo,  i  que  ao*- 
cende  a  emula9ao  :  melbor  persuade  o  exemplo 
que  o  espanto.  A  fa^anba  que  o  golpe  da  espada 
fez  transitoria,  faz  a  escritura  permanente.  Quan- 
tas  obras  beroicas  sepult^ra  p  braco ,  se  a  penna 
as  nao  livrara  do  tumulo !  A  poucos  aproveita  o 


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XX  PROLOGO* 

que  a  uma  idade  se  limita  :  Paueis  natus  est,  qui 
papulum  cHatis  suw  cogitat  (Senec.  Epist.  80).  Es-^ 
creveo  Diccearco  as  proezas  dos  Esparlanos;  e  or* 
denou  aquella  republica  que  todos  os  annos  se 
lessem  em  uma  praca  publica ,  para  que  sempre 
repetidas  as  etemizasse  a  lembrauca,  e  vivessem  a 
beneficio  da  historia ,  o  que  nao  fora  possivel  a 
golpes  da  espada. 

Nao  deve  nada  a  America  a  gloria  que  a  na^ao 
portugueza  adquirio  na  Africa,  na  Asia,  na  Eu- 
ropa.  Nas  mais  paries  ajudava-se  o  valor  da  opi* 
niao,  e  deduziao-se  umas  de  outras  as  victorias ; 
portoi  no  Estado  do  Brazil,  perdida  a  fazeuda^  su*^ 
jeita  a  liberdade ,  sepultada  a  opiniao,  enterrado 
0  brio  nas  mesmas  cinzas  do  estrago  (dominante  a 
nacao  mais  bellicosa ,  e  mais  bem  affortunada  de 
todas  quantas  naquella  idade  applaudio  a  fama) 
resuscitar,  e  sobresair  o  valor  portuguez  com  tao 
agigantado  vulto,  que  nao  sd  se  restituio  no  p^- 
dido,  senao  que  de  um  golpe  vio  o  poder  d'aquella 
gente  a  sens  p^  rendido  e  prostrado  y  tanto  mais 
se  adianta  na  gloria,  quanto  menos  o  imaginou  a 
esperanca.  Nao  espanta  o  triumpho  depois  da 
victoria^  porque  6  consequencia ;  admira  o  viv^ 
depois  da  morte ,  porque  i  maravilha.  Na  res- 
tauracao  de  Pernambuco  te  nao  deve  parecer  enca- 
recimento  a  maior  exagera9ao,  vistos  e  considera- 
dos  ossuccessos,  que  te  offereco  neste  volume, 
porque  forao  tao  estranhos  e  heroicos,  que  nao  so 


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PROLOGC.  XXI 

6  necessario  contestarem-no  muitas  escripturas 
para  Ihes  facilitarem  a  credulidade ,  senao  que 
tambem  se  bouverao  de  esculpir  em  bronze,  para 
que  Dunca  o  tempo  os  podesse  tirar  da  memoria 
humana. 

Com  esta  razao  me  desculparis  a  coufianca  com 
que  escrevo  argumento,  que  tantas  e  tao  illuslres 
pennas  escrev^rao.  Se  me  nao  achares  igual  no  ea- 
tilo,  nao  me  notards  desigual  na  verdade^  e  quando 
nella  nao  tenhas  licao,  nao  te  faltara  entreteni- 
mento.  A  diversidade  dos  lavores  se  nao  faz  a 
t^la  mais  rica ,  nao  deixa  de  a  fazer  mais  vistosa. 
Alguns  dos  que  escreverao  este  assumpto^  o  tece- 
riaa  com  melhor  fio^  por^.m  nenhum  com  fio  tao 
continuado.  Em  o  valoroso  Lucideno  acharas  o 
prindpio  sem  fim ;  em  outras  relacoes  veras  o  fim 
sem  OS  principios;  4quelle  atalhou  a  morte,  a  eates 
escusou  a  eleicao  :  de  todos  me  aproyeitei.  Nao 
ensina  menos  o  que  atalba  que  o  que  guia.  Se  no- 
tares  differenca  na  repeticao  de  alguns  nomes  es» 
trangeiros,  nao  imagines  que  foi  desatencao^  ou 
falta  de  noticia.  Escrevo  para  os  naturaes^  e  quero 
que  se  oucao  agora,  como  entao  entre  elles  se  pro- 
nunciavao,  para  que  assim  como  entao  pelos  no- 
mes se  conheciao  as  pessoas^  assim  agora  as  re- 
presentem  a  memoria ;  a  disimilbanca  dos  ncmies 
nao  faca  parecer  que  sao  d'outras  pessoas. 

Se  fizeres  reparo  no  titulo  d'este  lirro ,  bas  dc 
notar  (como  discreto)  que  nelle  altribuo  a  um  a 


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XXU  PR0L060. 

obra  em  que  trabalharao  niuitos.  Muitos  rios  rece- 
be  o  mar  debaixo  do  nome  de  urn ,  porque  aioda 
que  08  mais  Ihe  engrossao  a  corrente,  deve-se  aata 
&  sua  primeira  fonte.  Muitos  siio  os  astros  que  as^ 
sistem  ao  dia,  e  a  nenhum  deixa  luzir  o  sol.  Todas 
as  espheras  se  movemi  e  ao  primeiro  movel  se  at- 
tribue  o  movimento  de  todas.  Foi  Joao  Fernandes 
Vieira  o  que  com  o  zelo,  com  a  industria,  com  a 
&zeoda»  com  o  braco>  e  com  a  assisteocia  inten- 
tou,  dispoz,  seguio  e  feneceo  aquella  guerra ,  e 
como  o  maior  planeta,  mais  caudaloso  rio,  e  pri- 
meiro move!  se  Ihe  devem  attribuir  as  opera^oes 
de  todos  seus  inferiores* 

Com  este  fuodameato  fiz  de  sua  pessoa  e  de 

suas  obraso  principal  assumpto  d'esta  historia. 

No  appellido  de  Castrioto  leras  todo  o  ai^umeato 

d'este  livro,  e  todas  as  prendas  do  sujeito;  e  no 

titulo ,  cifrada  toda  a  materia  d'este  argumeato  : 

coudi^oes,  que  uos  titulos  dos  lirros  ha  de  buscar 

a  escolha  para  oao  serem  espurios.  0  parecido  das 

ac^oes  Ihe  deo  o  nome  de  Castrioto,  e  a  aa^ao  a 

difieren^a  de  Lusitano,  para  distiuc^ao  do  Ca»- 

irioto  Epirense.  Com  esta  mesma  razao  deo  a  an- 

tiguidade  a  Sicinio  Dentato  o  nome  de  Achiles 

romano ,  para  que  suas  obras  o  nao  oonfundis- 

•Ma  com  o  Achiles  grego  :  Stctmni  DMiatus  oh 

ingentem  fotiUudwem  Achiles  rmnaimi  appellalus  €H 

(Plin.  1.  VII,  c.  38.  GeU.  1.  H,  c.  U).  Tio  umas 

forio  as  prendas,  as  valentias  e  as  fortunas  d'um 


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e  outro  sujeito^  que  as  destinguuio  as  patrias, 
porque  nellas  se  nao  confuodiSsem  as  passoas. 
Nao  se  estranba  o  usual.  A  sunilbauca  da  virtude 
ou  do  vicio  idemtilica  em  muitos  um  mesmo 
nome.  A  liberalidade  deo  a  muitos  o  Qoii>e  do 
Alexandre;  a  fortuua  o  de  Cesar;  a  valentia  o  de 
Hercules;  a  industria  o  de  Ulysses;  a  raping  q  de 
Gaoo^  elc. 

Gotejem^se  as  obras,  o  valor  e  a  fortuna  de 
Joao  Feniandes  Yieira  com  as  de  Castrioto  alba** 
uense  ^  e  achar-ae-ha  peste  livroi  e  nos  que  es^ 
creveo  Marinho  Barlecio  d*esle  argumentoi  que  a 
todas  as  formou  um^  molde*  Como  Castrioto  eutre 
06  Turcos  iusolentes,  se  houve  Joao  Feraaudes 
Yieira  eutre  os  berejes  domiuautes.  Com  auimo 
catholico  soffrSrao  muitos  auuos  a  oppressao  da 
tyrannia  por  uao  perderem  a  possibilidade  de  fa- 
Torecer  aos  fieis.  Deo  o  tempo  aviso  a  Joao  Fer^ 
naudes  Yieira  de  que  sua  ^timacao  o  fazia  suspei- 
toso  ao  Hollandez^  como  deo  ao  Epireuse,  de  que 
seu  valor  o  fazia  suspeitoso  ao  Turco.  A  um  e  ou- 
tro servio  o  perigo  de  opportuuidade  para  se  de- 
dararem  coutrarios  ao  imperio  que  os  domiuava; 
e  persuadirem  aos  naturaes  mais  coufideutes  a  que 
pegassem  nas  armas  em  beueficio  de  sua  liberdade. 
Os  mesmos  officioS|  e  com  o  mesmo  effeito  de  que 
se  valeoo  Turco  para  reduzir  a  seu  servi^  o  Cas- 
trioto Epir^ose,  fez  o  Flamejjgo  com  Joao  Fer- 
oaodes  Yieira  p^a  o  tnuer  a  sua  obediencia. 


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XXIT  PBOLOGO. 

Aquelle  com  poucos  venceo  batalbas,  prendendo 
e  matando  generaes  das  armas  othomanas;  es(e 
com  menbft  matou  e  prendeo  generaes,  voicendo 
em  di?ersas  batalhas  as  armas  hollandezas.  Nao 
houve  conflicto  em  que  o  Lusitano  nao  pelejasse 
com  OS  inimigos  a  cara  descoberta;  como  tambem 
nao  houve  occasiao  em  que  o  Albanense  nao  con- 
tendesse  com  seus  adversarios  a  braco  partido. 
Nem  um  nem  outro  quiz  nunca  para  si  das  bata- 
Ibas  mas  despojo  que  o  applauso  das  victorias^ 
deixando  para  seus  soldados  toda  a  riqueza  das 
Campanhas.  Das  maos  dos  Turcos  tirou  o  Alba- 
nense todas  as  pracas  usurpadas,  at^  os  acurralar 
lia  cidade  d'Esfetigrado ;  tirou  Joao  Fernandes  das 
maos  dos  HoUandezes  todas  as  pracas  que  domi- 
navao  pelos  contornos  de  Pemambuco  at£  os  cer- 
car  dentro  no  Arrecife.  Trahido  de  amigos,  pa- 
rentes  e  obrigados  se  vio  Joao  Fernandes  Vieira, 
que  promettdrao  ao  Fiamengo  entregar^lh'o  morto 
ou  vivo.  Com  similbante  trai^ao  promettlrao  ao 
Turco  entregar-lhe  a  Gastrioto^  ou  vivo  ou  morto, 
seu  sobrinho  Amessa,  e  Moyses  sen  mais  obrigado. 
Como  Castrioto  ao  Turco  consummio  Joao  Fer- 
nandes Vieira  em  repetidas  batalhas  e  encontros  a 
paciencia  e  o  poder  hollandez.  Ao  Albanense  nao 
deixou  seu  generoso  coracao  lograr  com  descanco 
a  gloria  de  tanto  triumpho,  buscando  fiira  de  sua 
patria  occasioes  para  exercitar  as  armas,  como  o 
fez  em  obsequio  d'El  Rei  Dom  Fernando,  a  quern 


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PBOLOGO.  XXV 

08  Francezes  tinhao  despojado  do  reino  de  Napoles. 
Mao  soube  Joao  Femandes  V  ieira  lograr  com  socego 
o  fnicto  de  tantos  servicos;  por  mandado  do  Se- 
nhorReide  Portugal  Dom  Joao  Quarto  foi  govemar 
OS  reinos  de  Angola^  e  nelles  se  exercitou  nas  ar- 
masy  obrigado  de  sua  prompta  obediencia  a  esti- 
mar  mais  o  servir  que  o  descancar.  Ao  Castrioto 
albanense  attribue  Barlecio  toda  a  gloria  dos  suc- 
cesses d'Epiro ;  com  a  mesma  razao  se  devem  at- 
tribuir  ao  Castrioto  Lusitano  todos  os  progressos 
que  as  armas  portuguezas  obrarao  na  restauracao 
de  Pemambuco* 

Na  similhanca  das  obras  acharas  a  similhanca 
dos  costumes,  dos  intentos  e  dos  animos.  A  toda 
Europa  6  notorio,  que  o  zelo  do  servico  de  Deos 
e  do  bem  publico  foi  a  causa  e  o  fim  de  Joao  Fer- 
nandes  Vieira  tomar  as  armas  contra  os  Hollan- 
dezes>  e  que  a  elle  sedeve  como  a  principio  e  meio 
a  felicidade  daquella  empreza.  Por  sua  intelligen- 
cia  se  sublev^rao  os  moradores  d'aquellas  capita- 
nias ;  com  sua  fazenda  se  sustentou  muito  tempo 
aquella  guerra ;  de  sua  constancia  forao  resulta 
gloriosa  aquellas  victorias.  Com  desoito  annos 
d'idade  o  animava  um  coracao  tao  varonil  que  ap- 
petecia  os  perigos  que  todos  receavao.  Fez-se  o 
Flamengo  senhor  do  Arrecife^  quiz  ganhar  as 
fortalezas  daBarra,  uma  d'ellas  desempararao  mui- 
tos;  e  offereceo-se  Joao  Femandes  Vieira  para  se 
metter  nella  kvando  comsigo  alguns  homens  per- 


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UVI  PBOiOOO* 

suadidos  de  seu  exemplo.  CapituUiio  03  cabos  a 
eotrega,  e  so  elle  teve  a  advertencia  e  animo  para 
salvar  as  insignias  d'alguus  cabos,  e  as  baadeiras 
d'El  Rei^  saindo  com  ellas  eoroladas  em  si  mesmo, 
com  manifesto  perigo  de  sua  vida.  No  arraial  de 
Pernam  Morim  o  tinha  feito  Matliias  d' Albuquer- 
que capitao  de  descoorir  o  campo,  quando  o  Fla- 
mengo  sitiou  e  rendeo  aquella  for^a;  d'ella  saio 
como  captivo,  resgatando-se  a  $i,  e  a  dous  cria- 
dos  seua  por  quiabentas  patacas,  sem  dar  ouvidos 
as  bom*as  e  promessas  que  0  inimigo  ibe  fascia : 
nao  sabia  seu  cora9ao  antepor  a  coavenieoeia  ^ 
fidelidadet  Ganbou  o  Hollandez  a  campauba  eom 
todas  as  fortifica9oes  d'ella,  e  seguindo  Joao  Fer- 
uandes  Vieira  a  fortuna  de  todos,  se  deixou  ficar 
eutre  os  inimigos,  com  aquelle  intento,  que  depois 
publiearao  suas  obras. 

A  beneBcios  comprou  a  estimacao  do  vulgo;  a 
respeitos,  a  dos  priucipaes;  a  dadivas,  a  dos  aii- 
nistrosy  tendo  tanta  eutrada  com  os  do  governo^ 
que  para  com  elles  erao  auas  peticoes  decretos. 
Seu  maior  empenbo  era  alcancar  do  hereje  liber- 
dade  para  que  os  catholicos  frequentassem  os  sa- 
cramentos  e  as  igrejas,  e  que  nellas  se  celebra^ 
sem  OS  officios  divinos  com  aquella  solemnidade  e 
pompacom  que  se  faziao  antes  do  captiveiro,  tendo 
particular  cuidado  de  reedificar  os  templos,  que  o 
inimigo  destruiai  e  de  Ibes  restituir  os  paramentos 
sagrados  que  d^eUes  rouhava;  e  pwra  auatentar  a 


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HQWOO'  XXYH 

devo^ik)  do  povo  se  fazia  mordomo  de  todaa  as 
oonfrarias.  Com  yigiiante  zelo  acudia  as  necessi- 
da(^  particulares  9  proporcionando  a  mezinha 
com  a  chaga,  de  &orte  que  nao  yacillassem  os  que 
deemaiavao  eom  a  oppressao.  Porque  a  pureza  da 
religiao  se  uao  mauchasse,  tinha  particular  cui- 
dado  de  fayorecer  os  presos  e  roubados^  dando  a 
UDs  saida,  e  a  outros  remedio.  Ao  sexo  mais  fraco 
acudia  mais  solicito,  procurando  que  nao  resva* 
Jasse  a  virtude  nqs  tropecos  da  necessidade.  Aos 
peraeguidos  e  desamparados  desviava  o  laoo,  a  que 
oi  podia  levar  a  desespera^,  ou  com  a  exborta- 
cao  ou  com  o  soccorro.  For  sua  diligencia  se  con- 
vertteio  e  bapUzarao  ciuco  judeos,  e  se  reduzirao 
ao  gremio  da  Igreja  dous  herejes  e  umapostata; 
de  (odoB  foi  padrinho  e  amparo.  Tao  fervoroso  foi 
aempre  seu  zelo,  que  uao  s6  trabalhou  per  couser^ 
var,  senao  tambem  por  adquirir ,  despresaudo  o 
desabrimento  com  que  o  sofiriao  os  do  goverao. 
Com  dispeudio  e  iudustjria  tinba  gaubado  em  todos 
OS  tribunaas  mioistros  coufidentes  que  o  avisassem 
de  todas  as  materias,  que  nelle  se  couferiao,  e  de 
todas  as  resolu^oes  que  n  elle  se  tomavao:  dili^u- 
cia  tao  uecessaria  para  a  couserva^ao  do  particu- 
lar e  do  commum,  que  uella  acbou  o  Estado  de- 
£eusa,  os  principaes  cautella,  e  o  vulgo  reparo. 

£stimulado  das  tyraunias,  coudoido  das  mise- 
rias^  e  ^scaodalizado  das  injustii^asi  rompeo  pelo 
aoffritneTOOi  resoluto  em  deitar  dos  hombroa  de 


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jxna  PROLOGa 

todos  o  insoftrivel  jugo  :  empreza  que  a  qualquer 
cot^acao  parec^ra  mais  desatino  que  lemeridade. 
Com  este  intento  (com  peria  de  morte  tinba  of  la- 
mengo  prohibido  aos  moradores  todo  o  genero 
d'armas  assim  offensivas  como  defensivas)  mandou 
fazer^  por  officiaes  peritos  e  coufidentes^  nas  matas 
e  fazendas,  que  tinha  pe|o  certao^  armas,  mani- 
as, vestidos,  mantimentos,  e  tudo  o  mais  que  Ihe 
pareceo  necessario  e  preciso  para  conduzir  e  guarr 
necer  um  exercito,  correndo  todo  o  dispendio  por 
sua  con ta.  Avizado  das  espias,  que  tinha  no  Arre- 
cife,  conheceo  que  inimigos  e  emulos  o  tiohao 
malsinado,  e  descomposto  com  os  superiores  d'a* 
quelle  governo,  noticia  que  o  obrigou  a  sair  a  pu- 
blico com  seu  designio  antes  do  tempo  determi- 
nadoy  at^  aquella  hora  impedido  por  falta  de 
occasiao.  Ag^regou  a  si  os  praticos,  persuadio  aos 
leaes,  animou  aos  timidos,  constrangeo  aos  dis- 
tantes,  libertou  a  duzentos  escravos  sens,  e  posto 
em  campo  se  vio  em  poucos  dias  assistido  de  dous 
mil  e  quinheutos  moradores^  todos  homens  no 
animo,  e  poucos  soldados,  porque  faltos  d'armas 
e  disciplina.  Adiantou-o  a  fidelidade  de  sorte,  que 
primeiro  satisfez  a  obediencia  que  ao  valor ^  nao 
faltando  as  obrigacoes  de  fiel  christao ,  e  de  fiel 
vassalloy  certo,  pela  causa  de  que  acharia  sua  re- 
solucao  em  Deos  favor,  nos  superiores  desculpa, 
nos  iguaes  assistencia,  e  nos  inferiores  agrado. 
Nao  podera  dizer  a  verdade,  que  sua  convenien- 


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PRQLOGO*  IXIX 

cia  o  moveo  a  emprehender  tamanho  e  tao  arris- 
cado  n^ocio,  sabendo  o  mundo  o  que  nelle  perdeo, 
e  q  que  gastou.  Quando  saio  a  campo  era  casado 
de  um  anuo;  mais  que  nenhum  outro  estimado 
do  ^lamengo,  e  respeitado  dos  naturaes ;  servido 
de  mil  e  quinhentos  escravos  e  criados ;  aeompa- 
nhado  de  cento  e  cincoenta  homens  de  sua  casa  e 
guarda.  Na  sua  eslrebaria  sustentava  vinte  e  dous 
cavallos,  e  outros  tantos  mouros  para  curarem 
d'elles.  Tinha  capella  de  musica  com  varies  instru* 
mentos  e  diversos  ternos  de  charamellas.  Dava 
crescidos  salaries  a  mestres  d'artes  liberaes,  e  mais 
avantajados  aos  que  ensinavao  a  arte  da  milicia , 
assim  para  o  que  intentava,  come  tambem  para 
escusar  nos  moradores  a  barbaridade  com  que  o 
Flamengo  pretendia  amortalhar-Ihes  o  brio,  e  in- 
troduzir-lhes  a  sujei9ao.  Sen  trato  em  tudo  mos- 
trava  o  tamanho  de  seu  animo,  e  sen  cabedal,  o  de 
seu  cora^ao ;  por  uma  e  outra  causa  avaliado  de 
todo  pelo  miaio  da  ventura. 

Nao  olhaTa  para  a  conveniencia  propria  quern 
deixava  tanta  commodidade  e  regalo  pelo  rigor  da 
guerra,  e  pelos  trabalhos  da  campanha.  Pelo  ser- 
vice de  Deos,  de  seu  Principe  e  de  seu  proximo 
deixou  duas  casas,  uma  no  Arrecife,  e  outra  no 
campo  omadas  com  primor  e  riqueza,  cujo  recheio 
valia  muitos  cruzados,  sem  d  elles  tirar  a  menor 
alfaia  pelo  risco  de  ser  arguido,  e  malsinado.  Gas- 
tou na  conduccao  da  gente,  arroas,  municoes^  pa- 


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gas  e  sustento  dos  soldados  seis  centos  mil  ctiiztdos 
em  dinheiro ,  e  o  procedido  de  toda  sua  prata  la- 
vrada  e  joias,  que  valiao  muitos.  Em  generos,  ciir- 
raes,  matas,  eugenhos  e  fabricas,  que  o  inimigo 
Ihe  roubou  e  destruio,  perdeo  mais  de  quatro*  cen- 
tos mil  cruzados.  Pouco  se  lembrava  de  adquirir 
quern  tanfo  sabia  perder.  A  mercancia  enriquece 
a  quern  poupa^  e  nao  a  quern  gasta ;  idoUtra  na 
cobica  aquelle  que  desconhece  a  largueza.  A  bonra 
6  a  que  meihor  ensina  a  desprezar  a  fazenda. 

A  Santidade  do  Papa  Innocencio  X ,  por  bre?e 
expedido  no  ultimo  anno  de  seu  pontificado,  deo 
a  Joao  Fernandes  Vieira  o  titulo  do  re^taurador 
da  Igreja  naquella  parte  da  America,  commu- 
tando-lhe  o  servi90  que  Ihe  fez  no  Brazil  em  servi- 
cos  de  Africa.  A  toz  de  todos  Ihe  deo  o  titulo  de 
restaurador  de  Pernambuco.  Por  acclamacao  dos 
tres  estados  d'aquella  e  das  capitanias  confinantes 
foi  acclamado  governador  da  liberdade,  e  general 
das  armas.  Por  novos  servicos  Ihe  confirmou  Sua 
Majestade  o  titulo  de  general  com  a  merc6  que  Ihe 
fez  dandoJhe  o  govemo  dos  reinos  de  Angola. 

Que  razao  Ihe  ptfde  negar  o  que  a  justica  Ihe 
deo?  Porque  nao  ha  de  ser  o  Gastrioto  d'esta  his- 
toria,  se  foi  o  Achiles  d'esta  guerra?  Quem  mais  o 
encontra,  mais  o  affirma :  verdade  que  poddrao  tes- 
timunhar  os  encontros  d*esta  historia,  pois  a  su- 
birao  4quella  alteza,  onde  nunca  presumio  chegar. 
Por  seu  mandado  foi  seu  revedor  dom  Diogo  de 


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PAUOGO.  XXXI 

Lima 9  Bisconde  de  Villa  Noya  de  Serveira,  conse- 
Iheiro  d'Estado  de  Sua  AUeza»  varao  excellente  a 
todas  as  luzes  pelas  lettras,  pelas  armas,  pelo  san- 
gue,  pela  casa,  e  pelos  poslos  que  occupou.  Effeito 
foi  da  politica  melhor  advertida,  e  pode  ser  causa 
da  emulacao  mais  justa.  A  inveja,  sendo  um  afecto 
vil,  sempre  faz  presa  no  melhor.  A  todos  honra  o 
generoso,  porque  em  sua  estimacao  nada  Ihe  falta. 
As  sombras  dos  valles  uao  sao  effeito  da  aiteza  do 
sol,  seDao  de  baixeza  dos  montes.  Falle  a  verdade, 
e  dira  que  o  Brazil  deixara  de  ser,  se  Joao  Fernan- 
des  Vieira  nao  fora,  como  de  Chrysipo  disse  Car- 
neadas  df  pois  que  leo  suas  obras  :  Nisi  Chrysippus 
nmesset,  egononessem. 


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CASTWOTO 

LUSITANO. 

LIVRO  PRIMEIRO. 


SUMHAEIO. 

I.  DescobrimeRtoda  ilba  da  Madeira,  patria  de  Joao  Fernandet  Vieira. 
—  2.  Sua  erUfioM  pnerieia.  —  8.  Descobriinento  e  altara  do  Bratil. 
-—  4.  Capitanias  em  que  o  Estado  esU  dividido.  —  5.  £1  Rei 
D.  Joao  111  da  a  eoDquiata  a  differentes  yassaWos.  —  6.  A  Duarie 
Coelho  coube  a  coDquista  dePernambuco ;  a  onde  dii  principio  a  villa 
de  Oliiida,  —  7.  DMcripsio  do  maritimo  e  terreno  de  PeroambuGO. 
-»  8.  Keforma  El  Rei  os  governos  do  Braiil.— 9.Manda  por  gorer- 
nador  do  Estado  a  Thom^  de  Sousa.  —  10.  Fundacao  da  cidade  de 
Sao  Salvador  da  Batata.  ~  11.  Morte  d'Bl  Rei  de  Portagal  D.  Henrique. 
^12 .  Toraa  posse  do  reino  Philippe  H  deCasldla.  —13.  Tregoas  enire 
Hespanba  e  Hollanda.  — 14.  Principio  da  Coinpanhia  occidental  em 
Hollanda.— 15.  Interpresa  da  Bahia  pelos  Hollandeze8.->16.  Trata- 
se  na  corte  de  Gastella  da  restauracio  da  Bahia.  —  17.  Como  e 
quando  se  restaura.  —  18.  Intentao  os  HoUandeies  cobrar-se  no 
perdido.  —  19.  As  delidas  afemioao  os  animos  dos  Pernambuea- 
no0.  —  30.  Sai  a  aimada  de  Hollanda  em  direitora  a  Femambaco. 


A  RBSTAURA^AO  de  PerDftmbnco ,  em  que  as 
armasportuguezas  tritiinph^rao  do  poder  e  da  for- 
tuna,  estayencidadaconstancia,  aquelia  do  valor, 
escreve  minha  penna  mais  para  admiracao  que  para 
memoria;  mais  para  veneer  a  incredulidade  das 
uacSes  estrangeiras,  que  para  animar  com  o  exempio 
a  propria.  0  valor  dos  Portuguezes  obra  na  occasiao 
sem  necessitar  de  estimulos.^Em  todas  as  accoes 
humanas  iosnao  os  principios  o  SQr  do  fim  :  as  que 
I.  i 


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2  C^TRIOTO  LUSITA90. 

escrevo  o  nao  parectm,  porque  tiellas  nao  teve 
mais  ser  o  tim  que  aquelle  que  Ihe  deo  o  pria- 
cipio ;  um  e  otitro  dcve  Portugal  a  Joao  Femttides 
Yieira,  a  quem  e$te  volume  chmna  Caitrioto  Lu- 
sitano  :  as  obras  Ihe  derao  o  nome ,  e  bem  ponde- 
radas  p^sao  mais  para  a  parte  do  excesso ,  que  para 
a  da  imita9ao.  Para  que  o  parecesse  em  tudo  vere- 
mos  que ,  se  uma  conquista  Ihe  deo  o  nome ,  ou- 
tra  conquista  Ihe  deo  o  ser* 

I.  Pelos  annos  de  1420  descobrio  o  perito  nave- 
gador  Joao  Gon9alves  Zarco  a  ilba  da  Madeira , 
primeira  joia  da  coroa  portugueza  no  mar  Atlan-> 
tico.  Animado  peloiliustre  Infante  Dom  Henrique, 
chefe  e  director  de  todos  os  descobrimentos,  e 
agraciado  por  Et  Rei  com  a  capitania  da  terra,  se 
embarcou  no  veraode  1423,  levando  comsigo  toda 
sua  casa  e  familia  ,  e  muitas  outras  pessoas  conri- 
dadas  dos  parlidos  que  Ihes  fazia  o  capilao,  e  das 
coQveniencias  que  Ihes  promettiaa  terra.  Surgindo 
no  porto  ja  per  elle  descoberto ,  desceo  pacitica- 
mente  em  terra  com  toda  sua  comitiva ,  e  no  mais 
acommodado  della  deo  principio  a  primeira  povoa- 
9ao  de  toda  a  ilha ,  fundando  a  cidade  do  Fun- 
chaly  com  tanta  fortuna  que  em  poucos  annos  veio  a 
ser  abundantissima  de  tudo  o  que  i  necessario  part 
a  vida  humana ,  dando  para  outras  terras  exceUoo^ 
tea  generos  por  commuia^ao  e  por  venda,  com  que 
adquirio  o  lustroso  e  rico  de  que  hoje  esti  povoada. 
Eata  foi  a  ditosa  patria  de  Joao  Fernandea  Vieira, 
a  quern  elle  tanto  illustrou  com  sen  nome  e  altoa 
feitos,  restaurando  para  Portugal  a  mdhor  pelade 
sua  coroa. 


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CAamOTO  LOnTAlRK  t 

II.  Em  a  cidade  do  Funchal  (quando  ja  nao  ad 
pelo  tornpo  e  pelo  toreno,  aenao  peioa  edificioa, 
pela  foriificacao,  pela  grandesa,  pelo  porto,  ptlo 
commercio ,  e  pela  cathedral ,  era  digna  cabe9a  da« 
quelle  goTomo)  naceo  Joao  Femandes  Vieira  no 
anno  de  1613.  Sua  creacao  qualificou  aau  naaci« 
menio »  e  aeua  generoaoa  procedimentos  o  claro  de 
aua  ascendencia.  £)  o  aangue  (omento  Tital  doe  ea» 
piritoa)  eo  generoao  oa  produz  generoaoa.  Paasou 
o  tempo  da  puericia  na  patria ,  que  nelle  obaervou 
yiTer  maispara  a  raaao  que  para  a  idade ;  em  todal 
auaa  acooes  se  adiani4ra  o  animo  ao  corpo,  tao 
disciplinado  da  modestia  y  que  j  aem  dar  ocoaaiao 
a  queixa»  a  deo  muitaa  vezea  ao  exemplo.  Oa  brioai 
que  na  mocidade  aliimentao  anobreia^  aem  eatudo 
aao  oppoaioa  &  baixeza  doa  vicioa.  Era  de  onxe 
annoa,  e  como  aeu  cora^ao  ja  entao  Ihe  nao  cabta 
no  peito,  parecia-lhe  eatreita  priaao  a  limitada 
aphera  de  sua  patria.  Um  coracao  grande  nao  cabe 
em  pequeno  lugar  :  nao  cabia  o  de  Alexandre  no 
mundo,  e  deaejava  maia  mundos  para  ae  dilatar. 
Reaolveo-ae  a  pasaar  ^a  partes  do  Brazil  ^  por^ao 
grande  da  America ;  e  aeria  todo  o  motiYO  da  elei^ao 
o  ter  entendido ,  que  i  a  America  a  maior  entre  aa 
quatro  partea  do  mundo.  Sem  dilacao,  nem  em^ 
baraco  executou  o  que  reaolveo.  Nao  aoffrem  dila^ao 
oa  impulaoa  do  valor  :  toda  a  oppoaicao  atropellM, 
porque  com  a  deaeatimacao  sabem  veneer  aa  dil&* 
culdadea.  Foz-ae  a  ocoaaiao  da  parte  do  deaejo^  e 
ae  embarcou  no  anno  de  1624,  levando  em  ai 
meamo  o  melbor  de  aeu  oabedal.  Sao  aa  prendaa 
propriaa  o  cabedal  maia  precioao  e  maia  aeguro. 


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4  CASTRIOTO  LUSITANO. 

porque  nascem  isentas  do  poder  e  da  fortuna. 
Com  prospera  viagem  chegou  i  villa  de  Pernam- 
bnco  f  cabe^  de  uma  das  principaes  capitanias  do 
Brazil;  e  porque  ha  de  ser  o  theatro  de  meu  as- 
sumplo  f  i  forca  descrever  aquelle  antes  que  d£ 
razaod'este. 

IlL  £  o  Brazil  aquella  parte  oriental  da  Americai 
a  qual  descobrio  Pedro  Alvares  Gabral  no  anno 
de  1 500  em  24  d'Abril,  na  altura  de  45«  da  parte 
do  sul,  e  2"  da  linha  equinocial  (debaixo  da  qual 
fica  o  rio  das  Amazonas),  constrangido  da  vio« 
lencia  dos  mares ,  que  o  desviou  da  carreira  da 
India ,  para  onde  navegava,  dando-lhe  o  nome  de 
terra  de  Sancta  Cruz,  por  haver  arvorado  uma  cruz 
mui  grande  no  mais  alto  lugar  d'  uiiia  arvore,  ao  p^ 
da  qual  se  celebrou  missa ,  e  da  qual  tomou  posse 
em  nome  d*El  Rei  de  Portugal,  elevando  um  padrao 
com  as  armas  reaes  do  reino.  A  razao  que  tiverao 
OS  homens  para  Ihe  mudarem  o  nome  de  terra  de 
Sancta  Cruz  em  terra  do  Brazil  tem  pouco  que  des- 
cutir.  0  nome  de  Sancta  Cruz  i  o  nome  da  arvore 
de  nossa  redempcao ;  o  nome  do  Brazil  6  nome  de 
umas  arvores  que  produz  a  terra,  de  cuja  madeira 
se  fez  o  primeiro  commercio  :  e  claro  esta  que 
entre  os  mortaes  havia  de  prevalecer  o  titulo  de  seus 
interesses,  e  nao  o  despertadordesuasalvacao.Tem 
esta  parte  da  America,  que  se  chama  Brazil,  pek 
costa  maritima  1800  legoas  (no  mais  apurado  com- 
pute ),  que  terminao  e  devidem  da  conquista  de 
Castella  dous  caudalosos  rios;  da  parte  do  norte  o 
das  AmazonaS;  debaixo  da  linha;  da  parte  do  sul  o 
no  da  Praia,  em  35*  para  o  mesmo  sul.  G<Hnputada 


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CA8TBI0T0  LDSITAnO.  5 

eaia  distancia  pelo  recto  dos  graos  tern  muito  menos 
legoas :  uns  Ihe  dao  1 500,  outros  1 022. 

IV.  Repartio  a  desaten^ao  dos  Principes  e  a  am- 
bicao  dos  vassallos  toda  esta  distancia  de  terra  em 
quatorze  capi tanias^  na  forma  seguinte.  A 1  *  domina 
1 60  l^oas,  que  corre  do  grao  Para  at^  o  Maranhao. 
A  2*  oorre  do  Maranhao  at^  ao  Geara  por  distancia 
de  135  legoas.  A  3*,  que  se  terminano  rioGrande, 
tern  1 60  legoas  de  demarcacao.  A  4'  continna  por 
espaco  de  45  legoas  at£  a  Paiaiba;  da  Paraiba  at^ 
a  ilba  de  Itamaraca  25  legoas  de  caminho  que  de- 
marcao  a  5*  capitania.  £  a  6''  a  que  chamao  de  Ita- 
maraca de  7  legoas  de  costa.  A  7%  que  i  a  capitania 
dePernambuco,  indue  65  legoas  de  costa,  que  ter- 
minao,  pela  parte  do  norte,  o  rio  de  Sancta  Cruz, 
e  pela  do  $ul,  o  rio  de  Sao  Francisco;  e  de  Per- 
nambuco  a  Sergipe  sao  1 30  legoas.  A  8*  tern  por 
termo  a  que  toma  o  nome  da  cidade  da  Bahia;  tern 
de  costa  50  legoas.  Desta  at^  os  Uh^os  sao  30  legoas 
de  costa,  que  formao  a  9*  capitania.  A 1 0*  corre  at^ 
a  do  Porto  Seguro,  por  distancia  de  30  legoas.  Desta 
do  Porto  Seguro  at^  o  Espirito  Santo  corre  a  1 1  ^,  e 
occupa  61  legoas  de  costa.  A  12*  termina  no  Rio 
de  Janeiro ,  e  tem  dc  costa  35  legoas.  A  1 3'  corre 
do  Rio  de  Janeiro  at^  Sao  Vicente  por  distancia  de 
65  legoas.  A  ultima  corre  atd  o  porlo  de  Santos,  e 
delle  ate  o  rio  da  Praia,  por  costa  de  grande  nu- 
mero  de  legoas. 

y.  Destas  quatorze  capitanias  erao  oito  d'El  Rei, 
porque  as  conquistou  a  coroa;  seis  de  particulares 
senbores,  porque  particulares  vassallos  as  conquia- 
tarao.Por  este  titulo  foi  muitosannos  a  capitania  de 


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Pernamboco  do^  Albuquerqnes ,  porque  Duarte 
Coelhod' Albuquerque,  a  que  a  deoElRei  D.  Joao  III 
por  sua  qnalidade,  e  peloa  8em90S  que  fisera  na  In- 
dia, a  conquistou.  Direi  o  como,  e  o  porque.  Occu- 
pado  El  Rei  nas  eonquistas  da  Asia,  nao  attendeo  k 
importaDcia  da  America ,  ou  porque  Ihe  pareceo  mais 
£ral,  ou  porque  a  julgou  menos  util ;  ou  mais  que 
tudoy  porque  a  opposicao  dos  Principes  da  India 
Ihe  arrebatava  toda  a  applicacao.  Deseoberta  a  terra 
do  Brazil  por  Pedro  AfyaresCabral  no  annodel  500, 
oomotenho  dilo,  pedirao  alguns  capitaes  a  El  Rei 
IX  ManoeU  e  a  seu  filhoEl  Rei  D.  Jbio,  a  conquista 
do  diFersas  partes  d'aquelle  Estado,  oflerecendo-se 
cpoToaUas,  com  tanto,  que  haviao  de  ficar  com  o 
j»nhoriod'eIlas,  etodaaalcada,eUes  e  sens  dedcen- 
denies :  o  que  os  Reis  naquelles  principios  outor- 
girao  liberalmente  sem  mais  encargo  que  o  da  con- 
"MTsao  do  gentio,  querendo  que  as  povoacoes  fossem 
•eminarios  de  pr^adores  evangelicos,  e  presidios 
de  soldadosvalerososy  que  domassem  e  insiruissem 
OS  Indios ;  este  fei  o  intento  que  teve  a  liberalidade 
dos  Principes,  desejosos  de  premiar  o  merecimento 
dos  Tassallos.  Tinha  vindo  da  India  Duarte  Coelho 
d'Albuquerqu^,  a  onde  servira  El  Rei  D.  Manoel 
com  Utmlo,  braco,  e  valor,  capitao,  embaixador, 
soUado.  Pedio  a  El  Rei  D.  Ill  a  conquista  de 
Pemambuco,  que  facilmente  Ihe  concedro  pelos 
annos  de  1530.  lllustravao-se  os  servicos  d'este 
Tassallo  com  as  relevantes  prendas  do  sangue,  do 
mIo  e  do  Talor;  qualidades  que  adiantava  muito 
o  eabedal  e  lusimento  com  que  ei^tao  cobria  o 
^bmiiQ  da  incouTenientes  futuros.  0  maior  danmo 


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CAiniMO  UMTAHO.  7 

dasMoaarohtas  i  resulta  dageiieroMda<}e  doft  Prio- 
cipesquando  senao  acompanha  de  pmdencia ;  por- 
que  obra  d«  preaente  sem  attender  ao  futuro.  A  th- 
xinhanca  do  Prinoipe  influe  respeito  noa  yasaaUog; 
ooma£alta  d'esta  saaniina  a liberdade  dos  stdnlUos* 
A  onde  menoa  se  lemem  os  casdgos^  brotao  com 
maiafertilidade  oa  atreTimentos.  Coosidaracao  que 
devem  fazer  os  Principea^  qimndo  dao  os  governos^ 
para  que  a  qoarciacao  dos  poderes  peMe  a  liceo9a 
doa  goveraadores;  pois  i  certo  que  adia  facil  Iran- 
sito  o  Ijvre  para  tjnnoj  e  o  tyrauo  para  rebelde. 
VI.  Preparado  dt  tudo  o  que  podia  ser  neces- 
sario  para  invadir  e  povoar,  saio  Duarte  Coelha  de 
Lisboa^  e  depoia  de  prospera  viagem  a^iatou  terra 
em  27  de  Sef^mbro,  e  entrando  pelo  rio  de  Saneta 
Cru29  viouma  povoacao^  e  fora  della  grande  multidao 
de  gemio^  que ,  com  mats  tumulto  que  disciplina, 
tratava  de  Ihe  defender  o  saltar  em  terra;  o  que  o 
▼aleroso  capitao  fez ,  apezar  de  toda  a  resistencia 
idimigay  d^baratando  e  poudoem  fugida  aquellea 
barbaroa,  ferindo  e  matando  muitos  no  lugar  onde 
agora  est4  aituada  a  villa  de  Igarassu,  tomando  o 
nome  que  naquelia  occasiao  the  deo  a  admiracao  dos 
naturaes,  vendo  a  grandeza  de  nossas  embarcacoes ; 
aeudo  o  mesmo  em  sen  Idioma  Igarass^  que  n4o 
grande  em  portuguez.  Attribuirao  os  nossos  a  vie* 
toria  aos  inditos  martyres  8ao  Cosme  e  SaoDamiao^ 
em  eujo  dia  a  alcancarao ;  e  em  reconbecimento 
do  beneficio  levantArao  alii  um  templo,  que  consa- 
grarao  ao  nome  dos  gloriosos  sanctos,  a  onde  suas 
oontinuadas  maravilhas  attestao  o  quanto  Ihes  f6ra 
grato  este  aervico.  Com  adevo^o  dos  novos  povoado- 


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8  CA8TB10I0  LO&ITAIIO. 

res  cresceo  de  sorte  a  nova  villa  que  absorreo  em  si, 
peio  tempo  adiaate,  outra  villa  que  chamarao  dos 
Marcos  y  postos  naquella  parte  para  demarca^ao 
do  districto  ^  e  da  terra  que  £1  Rei  havia  dado  a 
Duarte  Coelho  d' Albuquerque. — Neste  lugar  ae 
deteve  o  capitao  todo  o  tempo  necessario  para  o 
povoar  e  guarnecer  em  forma  que  servisse  para  a 
defensa  e  s^ricultura  da  terra;  depois  de  tudo  hem 
dispostOy  parlio  com  o  grosso  de  sua  gente  em  boa 
ordeiian9a9  para  evitar  os  repentinos  assaltos  dos 
ludios  (ordinario  modo  depelejar  entre  todos  estes 
barbaros),  de  que  4inha  sido  advertido^  e  foi  cor- 
remio  a  terra  para  a  parte  do  sul,  sempre  a  vista  do 
mar^  descgoso  de  achar  sitio  conveniente  para  edi« 
ficar  uma  poyoa9aOy  em  que  se  achassem  todos  os 
requisitos ,  assim  maritimos  como  terrenos,  que  a 
fizessem  capaz  de  ser  cabe^a  d'aquella  capitania. 
Cbegou  a  avistar  um  ameno  e  aprazivel  outeiro 
descoberto,  e  vizinho  ao  mar  (habita^  d'alguns 
gentios)  em  altura  de  8*  da  equinocial  para  d 
polio  austral;  e  namorado  do  sitio  pelas  qualidades 
d'elle,  disse  para  os  seus : «  0  que  linda  situacao  para 
se  fundar  uma  villa! »  Approvarao  todos  o  voto  do 
capitao ;  e  porque  a  verdade  nao  ficasse  livre  da 
adula^ao,  poz^rao  a  villa  o  nome  de  Olinda,  porque 
ouvirao  dizer  ao  superior  :  0  que  linda  situafao 
para  se  fundar  uma  villa.  Anda  a  lisonjataoavincu- 
lada  a  dependencia  ,  que  nao  ha  verdade  que  na 
boca  da  dependencia  nao  pare^a  adulacao. 

Yll.  Como  foi  um  o  parecer  de  todos ,  pos^rao 
todos  uiao  a  obra  com  tanto  calor,  que  publicava  no 
que  crecia  que  a  obra  era  particular  eki9ao  decada 


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CASTUOtO  LQSIIAm.  9 

um.  Em  breve  tempo  se  achou  a  villa  com  700  vi- 
zinhos.  A  lerra  foi  correspoDdendo  com  os  fructos 
a  esperan^a  com  que  a  benefeciavao  os  moradores; 
o  commercio  foi  engrossando  ao  passo  que  crescia 
a  noticia  das  muitas  e  utilissimas  drogas,  que  havia 
Delia :  facilitava  a  saca,  e  commuta^ao  das  fazendas, 
a  grande  commodidade  do  porto,  que  allifaz  o  mar^ 
abrindo  a  natureza  em  uma  dilatada  corda  de  ser* 
rania,  ou  rochedo^  que  metlido  pelo  mar  ciuge 
muita  distancia  de  terra ,  uoia  aberCura,  a  qual  os 
naturaes  chamao  PerDambuco,  que  em  sua  lingua 
6  o  mesmo  que  pedra  furada ,  ou  buraco,  que  fez 
o  mar,  de  que  se  forma  a  garganta  da  barra,  com 
fundo  capaz  para  entrarem  e  sairem  por  ella  difle^ 
rentes  navios,  que ,  abrigados  da  mesma  serrania, 
se  amparao  dentro  do  porto  das  tempestades  do 
mar.  A  esta  corda  de  rochedo  cbamao  Arrecife;  e 
da  nome  a  uma  povoacao,  que  pelo  tempo  adianle 
fez  a  mercaucia  em  uma  ponta  de  terra  y  que  tera 
de  largo  vinte  bracas,  cortada  dos  rios  Beberibe  e 
Capiberibe ,  que  juntos  quebrao  sua  corrente  no 
mesmo  Arrecife  y  recebendo  o  mar  suas  aguas  pdia 
dita  abertura.  Desta  mesma  sorte,  provida  a  natur 
reza  abrio  na  dilatada  corda  d'aquelle  muro,  ou 
arrecife,  differentes  portas  em  diversas  partes  para 
dar  entrada  no  mar  a  diversos  rios,  que  per  aquella 
costa  fazem  desiguaes  portos. 

YIII.  Ao  passo  que  pela  grangearia  e  pelo  com- 
mercio crescia  a  opulenciados  subditos,  creacia  a 
licenca  e  a  demazia  dos  governadores ,  tao  abso- 
lutos,  que  nao  havia  honra,  vida,  nem  fazenda  que 
nao  estivesse  a  disposi9ao  de  seu  goato.  0  respeito 


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to  GiililOW  ftOMffAK^ 

as  leis  e  o  temor  do  Principe  tinha  sepuUado  n 
▼iolencia;  originando-se  maior  damno  do  exemplo 
que  da  tyrania,  porque  a  religiao  e  o  zelo  fahava 
nog  poder06O8,  e  gemia  o  povo  com  oppressao.  Re-- 
for^ou^ae  o  grito  de  sorte  que  chegou  a  Lisboa  a 
£1  Rei  D.  Joao  III^  Principe  naturalmente  affavel  e 
piedoso;  condoeo-se  elle  dos  miseraveis  vassallos,  e 
rendo  que  todos  se  perdtao  (os  pequenos  por  oppri- 
midosy  OS  grandes  por  absolutos),  com  catfaolica 
resolucao  mandou  aprestar  tres  naos,  duas  cara- 
▼ellas  e  urn  bargantim,  e  fazendo  escoiha  d'um 
fidalgo ,  em  quern  concorriao  requizitos  para 
maiores  empregos,  o  nomeou  governador  geral  de 
todo  0  Estado  do  Brazil,  e  capitao  maior  dos  ditos 
vasoe,  em  que  levava  comsigo  ministrose  soldados : 
estes,  para  fomentarem  a  obediencia ;  aquelles  para 
extinguirem  adissolucao;  e  todos  para  reprirairem 
com  o  conselho,  e  com  a  execucao,  o  orgulho  do 
gentio,  que  farorecido  da  emula^ao  estrangeira  e 
da  fortuna  propria  se  tinha  animado  a  assaltar  e 
destruir  muiias  poToacoes  de  Portuguezes,  matando 
e  roubaodo  com  favoravel  successo. 

IX.  0  fidalgo,  a  quern  El  Rei  confiou  esta  dif- 
ficil  maa  honrosa  missao^  foiThom^deSousa;  varao 
nao  menos  illustre  por  sua  linhagem  que  por  sens 
merecimentos ;  e  para  que  se  conseguisse  cabahnente 
odesejado  fim  para  que  era  enviado,  nao  so  o  acom- 
panhoude  magistrados  e  tropas,  como  dito  i,  mas 
revestio-o  de  toda  a  alcada,  tirando-a  a  todos  os 
govemadores  particulares,aquemcollocou  debaixo 
da  sua  inspeccao  j  estabellecendo  d'esta  arte  a  uni- 
dMh  de  govemo  naqueUe  nascente  £stado;  e  para 


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cmtioM  imif  AWK  if 

que  nio  fahasse  nooa  metropole  a  tao  rieas  provin- 
ciasy  ordenou*lhe  que  na  Bafaia  de  todos  os  Santos 
ediGcaase  uma  cidade,  4  qtial  pozease  o  nome  de 
Sao  Salvador^  no  sitio  que  melhor  Ihe  pareoesse, 
porque  servisse  de  assento  e  de  fortificaeao  a  todos 
OS  goYernadores  futures  d'aquella  proTincia. 

X.  Partio  Thom^  de  Sousa  do  porto  de  Lisboa 
DO  primeiro  dia  de  Fevereiro  do  anno  de  1549. 
Em  8  de  Marqo  do  mesmo  anno  ehegou  &  Bahia^ 
onde  ja  se  tinha  diTulgado  sua  ida  j  sens  poderes, 
com  Codas  as  ordensque  levava  deseu  Rei.  Desem^ 
barcou^  e  com  a  gente  formada  em  esquadiio  ser* 
rado  (poique  o  temor  faeilitasse  a  sujekao)  cami- 
nhou  para  o  lugar,  precedendo-lhe  uma  devota 
proeisiao,  queorden^rao  os  retigiosos  e  clerigosque 
levava  do  reino  para  a  refbrmacao  do  espiritual. 
Foi  recebido  com  alegria  de  muitos,  e  com  obedien* 
cia  de  todos ,  rendidos  os  animos  tanto  ao  temor 
ooiacH)  A  compmncao.  Escolbeo-se  sitio,  ajunt^rao-se 
materiaes,  concorrferao  obreiros,  deo-se  forma  A  nova 
cidade,  e  com  tai  efficacia  se  obrava,  que  no  pri- 
meiro dia  d' Abrii  do  mesmo  anno  se  vio  a  fortaleza^ 
e  a  cireumTalaoao  oapaz  de  agazalhar  e  defender 
OS  moradores.  Consignou  o  govemador  alojamento 
para  os  soldados,  tribunaes  para  os  ministros^  si- 
tioB  para  os  retigiosos,  com  tao  boa  disposicao, 
que  bastou  a  fama  para  domar  os  Indios,  e  para  re- 
frear  os  Portuguezes,  faltandoa  todos  a  confianca, 
com  que  uhs  e  outros  se  atreviao. 

XL  Com  a  nova  forma  de  govemo  se  augmentou 
de  maneira  o  Estado,  assira  no  espiritual  como  no 
temp<Hrttl,  que  se  deseonhem  a  si  mesmo.  Penetr^r 


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tt      '  GAitUOlO  LIWIAIIO. 

rao  08  obreiros  da  (i  muitas  legoas  de  sertao,  coor 
verteudo  innumeravel  g^itio.  As  religioes  do 
grande  patriarcha  SaoBento,  da  Gompanhia,  de 
Sao  Francisco,  e  do  Carmo  forao  urn  singular  bene- 
ficio  para  as  almas  d'aquelle  Estado.  Obrigados  por 
este  meio  tratavao  os  homens  de  viver  do  propriO| 
e  se  davao  a  plantar  com  tanto  cuidado ,  e  com  tao 
boa  sorte,  que  em  settenta  annos  se  achou  o  recon- 
cavo  da  Bahia  com  perto  de  200  engenhos,  que  em 
cada  um  annp  acudiao  com  70,000  arrobas  d'assu- 
car  macho;  e  a  capitania  de Pernambuco  com  1 50> 
que  em  cada  ^afra ,  um  anno  por  outro ,  davao 
50,000  arrobas.  Avaliadas  as  destas  duaspartidas 
pelo  pre^o  ordinario  fazem  somma  de  seis  milhoes 
de  cruzados,  nao  fallando  em  outra  grande  quanti- 
dade  de  dinheiro,  que  se  tirava  de  muitos  e  varios 
generos,  como  p^os  de  tintas,  madeiras  incorrup*- 
tiyeis,  coucos,  tabacos ,  etc. ,  que  nossas  embarca- 
foes  conduziao  a  Portugal,  e  d'elle  per  commercio 
a  todas  as  nacoes  estrangeiras,  com  grosso  avanco 
das  rendas  reaes.  —  Assim  prosperava  o  Brazil 
fomecendo  a  Portugal  os  principaes  elementos  de 
sua  grandeza,  quando  este  imperio,  subido  a  maior 
miigestade  na  reputafao,  no  poderio  e  nas  rique- 
zas,  declinou  por  decreto  da  fortuna,  e  veio  a  cair 
opprimido  de  sua  mesma  grandeza.  Esta  chorou 
Portugal,  sepultada  em  os  campos  d' Africa  por  um 
Principe  mais  bellicoso  que  advertido;  em  o  pa* 
lacio  d' Almeirim ,  por  outro  menos  aconselhado 
que  remisso  :  este  foi  o  cardeal  D.  Henrique,  que 
tomou  a  coroa  mais  para  a  le?ar  a  sepultura,  que 
para  a  subir  ao  throno,  AlcancouH)  a  morte  em  o 


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GASTEIOtO  LUSITANO.  IS 

ulUmo  de  Janeiro  de  1 580  com  settenta  et  otto  an- 
nos  de  idade,  anno  e  meio  depois  da  perda  de 
D.  Sebastiao  em  Africa;  acabando  a  gloria  de  Por- 
tugal entre  o  caduco  e  florido  d'uma  e  outra  idade; 
fechadas  m  portas  com  estes  extremos  para  o  re* 
gresso  e  para  a  esperanca. 

XII.  Apoderou-se  do  reino  D.  Philippe  II  de 
Castella,  chamadoprimeiro  dePoriugal,  iao  fayo- 
recido  sen  poder  do  tempo  e  da  fortuna,  como  des- 
emparado  da  juslica  e  da  razao.  D'esCa  sorle  unido 
o  reino  de  Portugal  a  coroa  de  Castella,  ficou  su- 
jeito  ao  odio  com  que  todas  as  nacoes  da  Europa 
se  oppunhaoagrandeza'da  monarchia  hespanhola, 
tanto  mais  aborrecida,  quanto  mais  dilatada. 

XIII.  Ardia  neste  tempo  a  guerra,  nos  Estados 
de  Fiandes,  entre  Hollandezes  eHespanhoes ;  aquel- 
ks ,  por  defenderem  a  rebeidia  ;  estes ,  por  casti- 
garem  a  rebelliao  y  sendo  a  religiao  o  pretexto  e  a 
causa.  Cresceo  o  odio  com  a  prefia,  e  com  a  prefia 
o  maior  damno  daHespanha,  nao  so  pelo  que  nesta 
guerra  consummio  de  gente  e  de  cabedal ,  senao 
tambem  porque  com  o  exercicio  das  armas  fez 
guerreiros  os  que  so  sabiao  ser  tratantes.  Empu* 
nhou  o  sceptro  d'Hespanha  Philippe  III  de  Casteila 
e  II  de  Portugal;  e  aconselhado,  tanto  da  ommis- 
sao  como  da  recessidade^  abracou  a  suspencao  das 
armas  por  dez  annos,  que  se  assentou  nas  tregoas 
conclnidas  no  de  1 609  com  menos  decorosas  con- 
dicoes  que  o  mundo  esperava,  e  com  a  desattencao 
(se  ja  nao  foi  impiedade)  de  deixar  fora  d'ellas  as 
pra^as  de  nossas  conquistas^  expostas  a  toda  a  fu« 
ria  do  odio  e  da  vingan^  d'esta  nagao ,  nao  por- 


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ik  Ci9ffU9fO  MMffAlOw 

que  no6  julg«Bie  complioes  em  seat  ckmatei  aenlo 
porque  nos  considerava  sujeitos  ao  contrario  do- 
minio.  0  exercicio  das  armas,  como  da  navegacao 
tinhao  feito  aoa  HoUandezes  lao  aenhoreft  do  mut^ 
que  pelo  commercio  e  pelo  roubo  traziao  a  aeu» 
portos  o  miihor  das  riquezas  da  Europa ,  devendo 
sua  boa  fortuna  mais  ao  descuido  alheio  que  a  po- 
tencia  propria,  poit  fiando  mais  da  diia  que  do  va- 
lor ,  sempre  triumphavao  com  a  industria,  e  me- 
nos  com  a  for^a. 

XIV.  For  este  tempo  florecia  naquelles  Estadot 
em  cabedal  e  baas  successos  a  companhia,  ou  hot 
9a,  que  intitulavao  da  India  Oriental.  Yiao-se  em 
Hollandacom  os  olhos  da  inveja^  e  da  emulacao  de 
muitos  f  crecer  os  avan^os  com  que  st  enriqueciao 
todos  OS  principaes  na  dita  companhia,  e  o  poda: 
d'aquellas  Provincias  Unidas ;  o  que  considerado 
por  Jans  Andres  Moerthecan ,  HoUandez  de  capa- 
cidade  e  esperteza ,  assentou  comsigo  que  fazia 
para  si  um  graude  negocio>  e  para  sua  republica 
nao  pequeno  servi9o,  propondo  aos  Elstados  que  se 
formasse  uma  nova  companhia »  ou  bol^a ,  que  se 
inlitulasse  das  Indias  Occidentaes,  a  qual  se  conce* 
desse  a  conquista  da  dilatada  provincia  do  Brazil^ 
tao  facil  de  adquerir  peio  remisso  da  defensa*  co^ 
mo  de  se  conservar  pelo  util  do  commercioi  sendo 
este  naquellas  pra9aa  a  causa  da  frouxidao  e  de 
ocio.  Yia-se  a  verdade  da  proposta ;  palpaTa-se, 
pela  facilidade  da  navega^ao,  quanto  menos  custoso 
seria  conduzir  do  Brazil  a  HoUanda  o  precioso 
d  elle  do  que  d'uma  e  outra  India;  e  sem  replica 
se  approYou  o  dictame,  que  logo  poserao  em  pra« 


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MiMumo  wmatims  II 

ika ;  e  em  brevefi  dias  form^rao  o  corpo  d'ttta  noTt 
companhia  noventa  partes  interesaadad. 

XV.  Achava-se  a  nqva  companhia  com  eabedal 
e  forcas  para  iiitentar  qualquer  imporlante  fac^ao^ 
6  eomo  a  primeira  ha^ia  de  facilitar  as  mais ,  de« 
terminarao  que  se  empregasse  no  melhor;  asseo- 
Uado  que  invadissem  a  cidade  da  Bahia,  como  ca? 
be^a  de  todo  aquelle  Estado  que  pretendiao  domi- 
nar;  tendo-se  por  certa  consequenQia  a  $ijjei9ao  de 
todo  o  corpo,  scDhoreada  uma  rez  a  cabeca.  Prepa- 
rou-6e  umaesquadra  de  vinte  e  seis  vasos,  parte  doa 
EatadoQ,  parte  dos  mercadores,  guaroecida  de  trea 
mil  soldados,  couseguindo-se  assim  a  observancia 
do  segredo  e  a  brevidade  da  execu^ao.  Sa'k)  a  armada 
de  Holhnda,  em  8  de  Maio  1 624 ;  appareceo  sobre 
a  cidade  da  Bahia ,  que  por  entrepresa  oocupou 
quasi  sem  resisteucia,  entregaudo  a  terra  primeiro 
o  descuido  de  uosaa  coafianca  que  a  presteza  de  sua 
diiigencia.  Quern  uao  sabe  iemer  nao  se  sabe  pre-- 
Teoir;  e  no  repeate  dos  assaltos  obra  mais  a  ooAr 
fttsao  dos  inyadidos,  que  o  Talor  e  for^a  dos  iura** 
sores. 

XVI.  Cbegou  a  noticia  do  sucoesso  a  Lisboa^ 
onde  fez  grande  impressao;  de  la  passou  a  Madrid^ 
onde  pelo  costume  se  faziao  menos  sensiveis  as  des* 
gra9as;  e  como  esta  era  tao  propria  do  reino  de 
Portugal  foi  olhada  peloa  ministros  como  alhea  da 
Goroa  de  Castella.  Come^ava  Philippe  IV  de  Gas-> 
tella  e  UI  de  Portugal  a  governar  a  monarchia  de 
Hespanha,  de  que  tomou  posse  em  Mar90  de  1 621 « 
Importunados  os  maiores  ministros  das  quotidia«* 
MS  instancias  do  omselho  de  Portugal ,  propose 


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16  GASTBIOrO  LU8IT41IO. 

no  e  persuadirao  a  El  Rei  a  importancia  do  nego* 
cio,  tanto  pelas  premissas  como  pelas  conseqiien- 
cias ,  de  que  pela  vizinhanca  do  Brazil  com  as  In- 
dias  de  Gastella  ameacavao  a  ultima  invasao  de  toda 
a  America.  Estava  o  zelo  da  reputacao  do  Principe 
com  a  viveza ,  com  que  se  acha  em  os  principios 
de  lodos  OS  governos ;  e  com  efficacia  mandou  pre- 
parar  armadas,  em  uns  e  outros  reinos,  consignan- 
do-se  todos  os  meios  necessarios  pera  se  executa- 
rem  as  ordens.  De  sua  propria  miM>  escrcTco  El  Rei 
a  todos  OS  grandes  de  Portugal ,  com  o  que  muitos 
d'elles  se  derao  por  tao  obrigados ,  que  servlrao 
nesta  occasiao  nao  so  com  as  fazendas,  senao  tarn- 
bem  com  as  pessoas. 

XVII  •  Saio  de  Lisboa  D.  Manoel  deMenezes,  ge- 
neral da  armada  portugueza,  com  vinte  et  seis  vasos, 
e  quatro  mil  homens  de  mar  e  guerra ;  tomou  a  ilha 
de  Cabo  Verde,  onde  esperou  ati  ao  fim  de  Feve- 
reiro  pela  armada  castelhana ,  que  se  compunha 
de  dobrado  poder,  de  que  era  general  e  superior  a 
todos  D.  Fradique  de  Toledo ;  e  unidas  em  um 
corpo  navegarao  as  duas  armadas  com  favoravel 
fortuna,  e  com  animoso  alvoro^o  entrarao  pela  en- 
seada  da  Bahiaem  sesta  feira  santa,  28  de  Marco 
de  1625 ,  cuja  vista  fez  nos  animos  tao  differentes 
impressoes ,  quanto  differentes  erao  os  affectos  : 
nos  da  esperanca  causou  excessiva  alegria ,  nos 
do  temor  medrosa  desconfianca.  Desembarcou  a 
nossa  infanteria,  saio  em  terra,  escolheo  sitio,  for- 
mou  quarteis ,  levantou  trincheiras,  dispoz  plata- 
formas,  acommodou  arti Iberia,  bateo  asfortifica« 
foea  do  inimigo  vigilante  em  se  defender ,  at^  que 


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GA&rmi(m)  ltjsitai^o.  17 

desenganado  e  opprimido  entregou  a  cidade^  sai- 
gas as  yidas,  e  saio  em  20  de  Abril  corrido  e  casti* 
gado  o  mesmo  orguiho  que  no  Junho  antecedente 
tinha  entrado  triumphante  e  atrevido,  deixando^ 
nos  a  cidade  tao  abastecida  e  municiaday  como  se 
so  nella  entrara  para  a  deixar  fortalecida. 

XVIII.  Mui  sensivel  foi  este  golpe  para  a  nova 
companhia,  e  supposta  que  o  tolerou  sem  desmaio, 
teve  aberia  muitos  aunos  a  ferida  (sopprindo  o  ani- 
mo  a  falla-das  forcas).  Nao  se  rendeo  ao  primeiro 
golpe  da  fortuna.;  continuou  a  infeslar  aquelies 
mares  alguns  annos  sem  maiseffeito  que  o  desojo 
da  Tinganca;  outros,  com  o  de  alguns  roubos  e  pre- 
sas,  com  que  foi  criando  aquelle  corpo  novo  san- 
gue  e  mais  alenlados  espiritos;  e  vendo^se  os  in- 
teressados  senhores  de  muita  parle  da  prata ,  que 
para  Castella  conduzia  das  Indias  D.  Joao  de  Be*- 
navides  na  frota  de  anno  de  1630,  resolutos  e 
animados  intentarao  seguoda  vez  a  conquisla  do 
Brazil ,  esperando  da  fortuna  melhor  semblante. 
Depois  de  largas  conferencias  concluirao  que  nao 
convinha  eiperimentar  a  sorle  na  Bahia  y  a  onde 
presumirao  certa  a  resistencia.  Nesta  occasiao  che*- 
garao  a  Hollanda  algumas  presas^  que  se  haviao  feiio 
em  navios  de  Pernambuco^  e  com  ellas  a  informa** 
cao  do  recbeio ,  e  descuido  da  (erra ,  tao  opolenta 
de  riquezas  como  pobre  de  forcas.  Servio  o  aviso 
de  confirmar  o  desejo,  e  assen(arao  que  fosse  Per- 
nambuGo  o  alvo  d'aquelle  segundo  tiro.  Repetidos 
avisos  dos  cossarios  que  corriao  aquelies  mares  con- 
firmarao  os  intentos  do  HoUandez ,  e  animarao  a 
diligencia  com  que  se  preparavao  os  navios,  de  ma- 
L  2 


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IB  GAflTltUm)  tUtlTAHa 

nw*a  que  em  hrevM  diaa  poz  no  map  uma  armaiUi 
de  oujo  porte  fiava  todo  o  bom  successo, 

XIX.  Se  08  crimes  e  peccados  doa  horoeus  pro«- 
▼ocao  alguma  vez  08  castigoB  do  ceo,  podamoa  sup- 
por  que  aa  calamidades  que  aobrevi^riio  a  capita* 
nia  de  Pemambuoo  maia  aao  devidas  aos  conaeUioa 
da  Providencia  que  48  astucias  da  politica.  Alimen- 
tadasdo8  deleites  brotarao  de  sorte  as  demaziaseQ-o 
ire  OS  moradores  de  Peraambuco ,  que  suQbcavao 
a  razao,  e  desconheciao  o  pejo  :  nao  havia  para  ca- 
da  qual  mais  lei  que  seu  proprio  gosto.  A  continua- 
cao  sepultou  as  memorias  da  censura;  eanimada  do 
lucro  y  da  abundancia  e  da  riqueza,  desprezara  a 
nola,  correndo  a  maliciataodeseufreada  pela  sutis- 
facao  dos  apetites,  que  chegavao  com  as  obras  onde 
chegavao  com  os  desejos.  As  lascivias^  os  fauslos^ 
OS  regalos,  as  vaidades,  as  usuras,  os  roubos,  as 
emulacoes ,  as  vingancas,  os  odios  ^  as  aleivozias, 
e  as  liberdades,  de  nenhum  sa  estranhayao,  por* 
que  era  exercicio  de  todos  os  que  podiao.  A  vida  que 
se  sustenta  do  vicio  sempre  conduzpara  a  iujuria, 
e  nunca  para  a  bonra,  sendo  natural  effeito  das  de*- 
mazias  afeminar  os  animos,  desatender  os  castigos, 
e  nao  imaginar  nos  futuros.  Vio-^se  na  desatencao 
com  que  todos  yiviao,  que  servindo  de  reclamo 
para  a  invasao,  foi  o  lotal  desvio  para  a  defensa, 
sendo  a  mesma  mao  do  peccado  a  que  pegou  do 
acoute  para  executar  o  castigo,  permittindo  Deos 
que  com  a  mesma  diligehcia,  com  quese  tractava 
da  conservacaOy  se  execntasse  a  ruina. 

XX.  Individuahnente  se  sabiao  em  Hollanda 
todas  as  disposicoes  que  levavao  a  villa  d'OUnda 


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CASTBIOTO  LUSTTAIIO.  10 

a  sua  ultima  perdicao;  nao  faltando  mais  para  cair 
que  encostar-lhe  a  mio  ao  peso  que  a  fazia  decli- 
nar.  Em  29  de  Junho  de  1 629  poz  a  Companhia 
occidental  de  verga  d'alto  cincoenla  e  quatix)  vasos 
sorteadosy  e  guarnecidos  de  7,280  homens^  entre 
mareantes  esoidados,  munieiadoseforoectdospara 
tedo  o  successo  da  dilacao,  da  resistencia  e  da  con- 
quista.  Navegarao  divididos  emdireilura  a  ilha  de 
Sao  Vicente,  ou  deCabo  Verde ,  a  onde  enoorponi- 
doft  sairao  a  26  de  Dezembro  do  dito  anno,  huscando 
a  altura  do  Brazil.  Era  general  da  armada  Henri- 
que Lone;  almirante,  Pddro  Adrian;  80ta*almi- 
rante,  JustoTraper;  coronel  de  guerra,  Frederlco 
ou  Theodoro  Wandemburg.  A  todos  vai  eaperar 
esta  historic  a  villa  de  Olinda^  no  seguinte  IWro. 


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LIVRO  II. 


SUMMARIO. 


1.  Tern  El  Rei  ayiso  dot  intentos  do  Hollandez;  atisa  a  Diogo  Luix 
d'Oliveira,  governador  do  Brazil.  —  2.  Toma  porto  em  Pernaia- 
buco  Mathias  d' Albuquerque.  —  3.  Chcga  a  Pernambuco  um 
patacho  de  aviso;  convoca  Malhias  d* Albuquerque  o  conselho.— 

4.  A  armada  bollandeza  avUla  o  cabo  de  Santo  Agostinho.  — 

5.  Reparte  o  governador  a  gente  com  que  se  acha.  —  6.  Apparece  t 
armada  *obre  Pernambuco.  —  7.  £mbaiiada  do  general  bollan- 
dei ;  resposla  dos  nossos.  —  8.  DA  o  inimigo  uma  profiada  ba- 
teria  U  forcat  da  barra;  rettra-se  do  combate ;  delta  gente  no  Pao 
Amarello.  —  9.  DA-se  rebate  na  villa  de  Olinda;  coifUsao  dot 
nossos.  —10.  Passa  o  inimigo  o  rio  Doce  ;  acode  Mathias  d'AIbu- 
qaerque,  mas  6  obrigado  a  retirar-se.  —  11.  Entra  o  inimigo  na 
villa  d'Olioda;  estragos  que  abi  commette.  —  12.  Fez-ie  senhor 
do  Arrecife ;  animosa  resolugao  de  Andr^  Pereira  Temudo.  — 
13.  Desbumanidades  executadas  pelos  berejes,  e  pclos  proprios 
naturaes;  Matbias  d'Albuquerque  manda  pdr  fogo  a  mullos  navioa 
nossos.  —  14.  Saquea  o  inimigo  a  villa  e  Arreeife ;  nelle  se  for- 
tifica.  —  15.  Joao  Fernandes  Vieira  se  mette  na  fortaleza  da 
terra ,  que  o  inimigo  intenta  tomar  por  entrepreza ;  da  qual  se 
retire  castigado.  —  16.  Commette  o  inimigo  seguoda  vei  a  for- 

laieza. 17.  Valerosa  rcsistencia  dos  uossos,  que  se  rendem  a 

partido ;  Joao  Fernandes  Vieira  faz  com  que  nao  padecao  nossas 
armas.  —  18.  Segunda  embaixada  do  inimigo  a  fortaleza  do 
mar ;  votao  os  do  presidio  que  se  entreguem,  contra  o  parecer  do 
tenente.  —  19*  Desaforos  executados  pelo  hereje. 


I.  A  demaziada  diligencia  de  encobrir  as  cousas 
6  o  pregao  d'ellas  :  a  necessidade  de  as  communicar 
6  a  que  as  leva  &  praca.  Em  di versos  portos  do  Es- 
tado  da  Hollanda  mandou  a  Gompanhia  occidental 
preparar  e  fornecer  os  vasos ,  que  determinava  em* 
pregar  naconquista  do  Brazil,  para  que  nao  fazendo 
em  parte  alguma  rumor  o  excesso,  em  todas  se  ti- 


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CASTWOTO  LUSITANO.  21 

rasse  o  motivo  &  curiosidade,  e  As  intelligencias. 
Esla  cauta  disposicao ,  com  que  se  disfarcava  o  de- 
SJgnio,  deo  occasiao  a  que  se  penetrasse  o  intento , 
primeiro  inferido  da  suspeita,  depois  alcancado 
danegociacao.  Governava  por  este  tempo  os  Esfados 
de  Flandes ,  pela  coroa  de  Castella  y  a  infanta  D.  Iza- 
bel  Clara  Eugenia  (  viuva  do  archiduque  Alberto, 
e  filha  do  segundo  matrimonio  d'El  Rei  Philippe , 
que  cham4rao  o  Prudente) ,  cuja  vigilancia  descobrio 
o  que  encobria  a  cautella ,  comprando  at^  as  mais 
escondidas  deferminacoes  do  inimigo.  Com  toda  a 
brevidade  despachou  um  correio  a  Madrid ,  dando 
inteiras  noticias  a  El  Rei  Philippe  o  IV  de  tudo 
quanto  o  Hollandez  intentava.  —  Conhecendo  elle 
o  damno  da  dilacao ,  fez  logo  aviso  a  Diogo  Luiz  de 
Oliveira ,  governador  do  Rrazil ,  em  como  o  Fla- 
mengo  armava  contra  aquelle  Estado ,  com  deter- 
minacao  de  ir  sobre  Pernambuco ;  porim  que  adver- 
tisse,  que  de  ordinario  punhao  os  invasores  a  mira 
em  uma  parte ,  para  darem  em  outra  mais  a  seu 
salvo  o  tiro.  Recebeo  Diogo  Luiz  o  aviso,  e  com  a 
pressa  possivel  acudio  a  reparar  e  fornecer  a  Bahia, 
que  condemnava  a  suspeira ;  e  a  Pernambuco,  que 
ameacava  a  fama.  Para  este  Gm  mandou  a  Pedro 
Correa  (pessoa  experta  que  tinha  medianas  noticias 
da  fortificacao )  que  fosse  a  Pernambuco  reparar  a 
villa  e  o  Arrecife  de  tudo  o  que  Ihe  parecesse  ac- 
€ommodado  i  defensa  e  &  bi^vidade.  Chegou  Pedro 
Correa,  e  com  as  ordens  que  levava  certificou  a 
prtftica,  que  corria,  de  que  o  Hollandez  intentava 
a  conquista  d'aquella  praca.  Ati  entao  nao  achava  a  ' 
nova  mais  credilo  que  de  fama  vaga;  d*alli  por 


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9>  camoto  ujUTAMa 

diM^t^  achava  em  algous  creduUdad^,  em  outeoa 

^^pffm.  Deo  Pedro  Ck)rrea  principio  4  fortifica^ 

^^^ou  cercar  a  villa  de  irincheiraa,  e  a  povoa^^o 

do  Arrecife  de  palicadas  de  p4o  a  pique  j  Q  auppoBto 

fl^^   ^  muitoa  assaltou  o  receo ,  a  muUo  poucos 

^*^^ou   o  desengano,    acudiudo    os    moradoret 

^^^^■^  taula  fpouxidao  aos  reparos,  que  mais  Iraba- 

Ih^vio  para  o  efpauto  que  para  a  defensa,  satufa* 

^*^^o  i  brevidade  do  tempo,  e  uao  A  segurau^a  do 

P^^igo. 

*!•  Engplfado  andava  Pedro  Correa  uesta  obrw 
«f^iia,  quaodo  se  divulgou  na  Tilla  que  Matbias 
d'iVlbuquerque  entrcva  pela  barra  com  duas  embar* 
c^^oea,  das  quaes  viuhao  por  capitiea  Joao  Alvarea 
Barbuda,  e  Gil  Correa  de  Caetello  Brauco;  foi  re- 
cebido  com  alvoroco ,  e  logo  depois  com  eapanto , 
aat^eodo-seque  era  mandado  por  ElRei  com  soldadoa 
e  ix»wii9oe&  para  prover  e  guamecer  a  terra  ^  i  qual 
ordenava  que  em  tudo  obedecesse  As  ordens  que 
trazia  de  capiiao  maior  ,  e  governador  das  armas , 
poor  quanto  sabia  de  certo  que  o  Hollander  com  uma 
poderosa  armada  vinha  sobre  a  villa  e  seu  porto. 
Apreseutou  Mathiaa  d'Albuquerquea&ordeaa;  por 
elbs  foi  obedecido,  por^m  nao  festejado*  Reudeodo 
poalade  capitao  maior  a  Audr^  Dia&  Ferreira,  qut 
9  occupava ;  via  e  approvou  quauto  Pedro  Correa 
tioba  obrado  em  ordem  A  fortiCca^ao ;  e  conCormes 
BO  porecer  derao  principio  ao  reduto  pegado  A  Cortar 
leu  da  tejrra,  fiaodo  ao  zelo  d«  Diogo  Paes  a  luzi« 
iM»nto  da  fabrica.  Qbra  sem  fructo ,  porque  vim 
love  im ,  nem  cbegau  a  ter  prestimo. 
UI.  Gh^)ou  enu*etaato  a  armada  hoUafldeu,  i 


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CASXaiOTO  LUSITA^a  33 

ilha  de  Cabo  Verde ,  onde  era  governador  Jodo  Pe* 

reiraCorte  Real.  Observou  este  a  cautella  e  o  poder 

da  frota^  que  escondia  o  designio  ao  mesmo  tempo 

que  fazia  06tenta9ao  da  for^a  (ardil  que  dava  a  en-* 

tender  a  ofiensa);  fez  diligencias  por  se  assegurar 

na  sospeita ;  e  depois  que  pela  derrota  conheceo 

que  buscava  aallura  do  Brazil,  se  informou  d'ai- 

guns  homens^que  o  inimigo  por  varios  accidentes 

deix&ra  em  terra ,  e  como  todos  const  an  temente 

affirmassem  que  o  HoUandez  ^  com  aquella  armada 

ia  sobre  a  villa  de  Olinda  e  seu  porto ,  para  ga- 

nkar  porto  e  yilla  por  entrepreza;  eotendidaa  via- 

gem  despachou  com  toda  a  pressa  um  patacho  a 

PernambucOy  fazendo  por  elle  aviso  aos  moradores 

do  amea^o ,  para  que  prevenidos  rebatessem  o  golpe. 

Festejavao  estes  com  grande  regozijo  o  nascimento 

do  principe  Balthazar  Carlos  Domingos ,  herdeiro 

de  tantas  coroas  j  quando  chegou  a  trisle  nova  do 

perigo  que  os  amea<;ava.  On  fosse  por  descuido, 

pn  fosse  por  razao  d'estado,  Mathias  d' Albuquerque 

mo  deixou  de  continuar  no  festejo,  que  a  occasiao 

faaia  parecer  feiti9o.Nao  faltou  quern  acouselbasse 

o  successocom  afirmar  o  desvio^  dizendo  que  se  a 

armada  do  Ftamengo  viera  em  direitura  a  Pemam- 

buco,  cheg^ra  muito  antes  que  o  patacho  d  aviso 

(  partindo  este  tantos  dias  depois  della) ,  que  indu- 

bitavelmente  havia  tornado  ouiro  rumo,  pois  o 

patacho  a  nao  avist^  na  costa. — Entre  a  seguranga 

e  o  receio  fluctuava  o  pareeer  de  todos  :  a  indiffe*- 

renqa  nao  deixava  acudir  &  importancia.  Conti- 

nuavao-se  as  fortiGca96i''S  com  braqo  remisso,  que 

obrava  mais  para  saiisfazer  ao  engano  que  para 


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24  CASTRIOrO  LUSITANa 

dispor  o  remedio ;  julgando-se  cada  qual  tao  longe 
do  damno  como  se  imaginava  do  perigo.  Chamando 
€9tava  o  tempo  pelaresoIucao,quandoMathiasd'Al- 
buquerque  convocou  a  conselho  aquellas  pessoas 
que  nielhor  poderiao  volar  na  disposicao  da  de- 
ft^nsa  por  interessados,  ou  no  credito ,  ou  na  fazenda. 
Assentou-se  que  nenhum  morador  lirasse  da  villa, 
nem  pessoa  que  fosse  de  sua  familia ,  nem  cousa 
que  pertencesse  a  sua  fazenda.  Suppunhao  que 
sendo  igualmente  de  todos  o  interesse ,  seria  de 
todos  igualmente  a  defensa.  Muitos  ( cujo  animo 
servia  mais  &  desconGanca  que  &  resistenciay  forao 
de  contrario  parecer,  dizendo  que  cada  qual  po- 
sesse  em  cobro  o  mais  precioso  e  o  mais  estimado 
de  sua  familia  e  iazenda ,  para  que  na  occasiao  in- 

diviso  o  cuidado  assist isse  todo  o  coracao  ao  braco : 

*  * 

tomavao  por  fundamento  0  aberto  da  praca ,  e  a 
contingencia  do  successo ,  que  sendo  favoravel  ao 
inimigo  havia  de  medir  a  victoria  pela  riqueza  do 
despojo ,  e  nao  pelo  formidavel  da  batalha ,  e  ali- 
mcntaria  os  insentivos  da  cobi9a  com  a  riqueza  do 
saco.  MostrarA  esta  historia  quanto  neste  voto  dis- 
tava  o  conselho  do  animo. 

IV.  Chegou  o  dra  de  quinta  feira  1 3  deFevereiro 
do  anno  de  l630  (oito  dias  depois  que  entrou  o 
patacho  d'aviso),  e  nelle  avistou  a  armada  hollandeza 
o  cabode  Santo  Agostinho,  tonK)u  o  panno,  e  fa- 
zendo-se  conselho  na  capitania,  nelle  se  decretou 
o  lugar,  o  tempo  e  a  f6rma  em  que  se  havia  de 
investir  com  nossas  fortificacoes ,  ordenando  ao  co- 
ronel  Theodoro  Wandemburg,  que  com  dezeseis 
fragatas,  2/200  infantes  e  700  marinl^eiros  se  apar- 


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GA8TRI0TO  LU8ITA1I0.  25 

tasse  do  corpo  da  armada,  quando  menos  o  deixasse 
advertir  o  conflicto,  e  deitasse  a  gente  na  paragem 
do  Pio  Amarello ,  tres  legoas  apartado  de  Pernam- 
buco  para  a  parte  do  norte ,  que  acharia  sem 
opposicao,  acudindo  no  mesmo  tempo  b  grosso  da 
nossa  gente  a  onde  o  cham^ra  o  engano ,  ignorante 
da  parte  em  que  a  pedia  a  necessidade.  Sabia  o 
Flamengo  que  o  *bom  successo  das  empreias  pede 
acertadas  disposiqoes,  e  que  as  mais  ditosas  sao 
aquellas  que  nao  deixao  interpolacao  de  tempo  entre 
over  e  o  investiry  dandolugar  ao  inimigo  a  que  sinta 
descarregar  o  golpe ,  por^m  nao  a  que  veja  o  braco. 
V.  Logo  que  do  Cabo  de  Santo  Agostinho  se  des- 
cobrio  a  armada  inimiga  com  settenta  e  sette  velas, 
86  deo  rebate  em  Pernambuco.  0  governador  das 
armas  M athias  d' Albuquerque ,  achando  em  todos 
prompta  obediencia  ,  repartio  os  capitaes  pelos 
postos,  consignou  gente  para  as  esiancias ,  medindo 
o  numero  pela  capacidade ,  e  a  escoiha  pela  impor- 
taocia  y  para  que  chegada  a  occasiao  se  visse  cada 
qual  obrigadoa  guarnecer  o  lugar  predefinido. 
A  guarila  de  Joao  d'Albuquerque  ( era  um  reduto 
situado  no  caminho  da  praia,  que  faz  transito  da 
villa  para  o  Arrecife)encarregou  ao  capitao  MartiiA 
Ferreira  com  uma  companbia  paga ;  com  outra 
companhia,  de  que  era  capiiao  Francisco  Tavares , 
guarneceo  outro  reduto  que  esf  ava  entre  a  Tilla  eSao 
Francisco  y  na  rereda  que  guia  para  o  rio  Tapado  e 
rio  Doce.  A  infantaria  da  ordenanca ,  tanlo  da  villa 
como  do  termo  (da  qual  erao  coroneis  A  mbrosio  Ma- 
ehado  de  Carvalho,  e  Pedro  da  Cunba  de  Andrada) 
dividio  por  diversos  lugares  na  f(>rma  seguinte. 


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M  GamOTO  UISITAIiO. 

Para  a  guarnic«M>  dis  triacheiras  da  villa  nom^ou  <m 
capitaes  Roque  de  Barron  Rego,  e  Salvador  de 
Azevedo,  com  as  suas  companhias.  Affonso  d'Al** 
buquerque^  capitao  da  noln^za  (debaixo  de  cuja 
faandeira  se  alistira  Joao  Feraandes  Vieira  com 
poucos  annosy  muUo  valor  e  muila  estima^ao),  e 
Manod  da  Costa  Galheiros  (assim  mesino  capitao 
doft  nobres)  tomirao  por  sua  conta  a  defensado  Ar* 
recife,  cajo  presidio  engrossou  o  governador  com 
um  troco  de  geote  ordinaria,  que  capitaneavaFraor 
cisco  MoBteiro^  e  outro  de  soldados  bisonhos  lo- 
vanlados  no  reino^  seu  capitao  Andr^  Pereira  Te- 
mudo.  A  defensa  do  rio  Tapado  deixou  a  cargo  do 
capitao  Francisco  de  Freitas«  As  for^as  de  mar  e 
terra,  que  deiendiao  a  barra,  fiou  ao  valor  dos  ca- 
pitaes  Antouio  de  Lima ,  e  Manoel  Pacbeco  com 
sua  gente.  Da  palicada  do  Arrecife  fez  entrega  ao 
capitao  Bento  de  Fieitas^  assistido  da  gente  da 
mesma  povoa^ao^  e  de  alguoias  mangas  de  mora* 
dores  da  villa«  Por  cabo  de  tx>da  a  infantaria  no^ 
meou  Matbias  d' Albuquerque  a  Andrd  Dias  da 
Franca  f  e  por  sargento  maior  a  Rai  Dias  Borges 
(em  feilta  de  Manot^l  de  Sou2a ,  que  o  era  de  pro* 
[^riedade).  Para  governar  algumas  tropas  de  ca- 
vallaria  da  terra  ficou  Matbias  d' Albuquerque , 
correado  por  conta  de  seu  cuidado  acudir  to  partes 
oode  a  neeesaidade  mais  o  pedisse. 

Yi.  Formidavel  e  aprazivel  appareceo  aos  ojhos 
dos  mroradores  a  armada  inimiga  em  4  5  de  Feve- 
reiroi  que  de  mar  em  fora  com  todo  o  panno  nave- 
gava  buscando  a  terra ,  assim  povoada  de  bandei*- 
n%p  flamulasr  e  galbardeies  de  tantaa  e  tao  div«rsas 


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CASTB20T0  UIglTAIia  37 

coreSy  concedidas  e  negadas  a  beneficio  do  veatO| 
que  as  viao  tremulas  os  olhos ,  e  coofusamente  le- 
merosas  os  juizos.  A  mnltidao  dos  clarios,  repetida 
dos  ecbos^  euxia  os  ouvidos  de  bellicosa  harmooia) 
e  OS  coracoes  de  formidaveis  consequencias.  0  te^ 
mor  e  a  esperanca,  que  occupava  osaniinos,  diver- 
sificava  os  obj^tos;  razao  por  que  a  mesoia  armada 
produzia  em  uns  coracoes  effeiios  tristes ,  e  em 
outros  alegres ;  estes  recebidos  da  esperanca,  aquel- 
les  do  temor,  enlao  dis^imuladoa  do  artificiOy  de- 
pois  acusados  do  successo ,  achatulo  ix)  Hollandez 
agasalho  uns,  persegol^ao  outros.  Arribando  aobre 
o  rio  Tapado  deo  mostias  o  inimigo  de  querer  por 
aquella  parte  £azer  a  envestida  :  era  o  iutento  ca- 
pear  um  eugano  com  oulro  engano,  para  que^  oc- 
cupada  a  atten9ao  dos  mcH^adores  uas  partes  donde 
a  chamava  a  fic^ao,  Ihes  ficasse  seotido  para  reparar 
a  iodustria,  com  que  por  lugar  ditTerente  os  com*- 
mettia  a  verdade*  Aqui  se  apartou  o  Wandemburg 
com  sua  esquadra ,  coberto  do  fumo  e  da  terra,  e 
favorecido  do  eogaoo  da  armada  (que  represen- 
tava  no  maior  numero  dos  vasos  o  maior  poder  do 
inimigo)  com  que  veio  caindo  sobre  Pernambuco^ 
certificando  o  assalto ,  sem  individuar  a  parte  do 
conflicto. 

VU.  Surg^>  toda  a  armada  a  tiro  dc  canfaao  das 
Qossaa  fortalezas^  era  todo  o  intento  do  inimigp 
lograr  a  industria  com  procurar  a  dtversao ;  e  por 
occultar  os  desejos  de  entreter  se  valeo  das  apparen- 
daa  de  conquisiar,  pava  que  sc  d^sse  tempo  a  que 
o  coroaelWandemburgy  on  como  Ihe  chama  o  vut- 
gp  Thwdoro  Wandembuiy,  deitaase  bo  Pao  Amar 


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jg  CA8TBH)T0  WSITANO. 

reUo  a  gente  que  levava,  sem  opposidiO  que  a  des- 
TompoJesse.  Da  capitania  despedio  um  batel ,  e 
neZum  tambor,  pSo  qual  mandou  di.er  aos  pr^ 
sWios  das  for<^  da  bam  e  Arrecife,  que  e\»e  v.nha 
comaquella  armada  a  senborear  a  lerra,  com  or- 
dens  dosEstados,  para  a  dominar,  e  nao  para  a  de^ 
truir,  que  \b'a  entregassem ,  e  a  t«dos  faria  ami- 
gaveis  partidos,  favorecendo  a  obedienc.a ;  porque 
havia  de  castigar  a  fogo  e  a  ferro  a  rebeldia ;  e  que 
se  nao  fiassem  em  forcas  deslituidas  de  soccorro, 
porque  se  cbegassem  a  medir  as  espadas ,  occupa- 
dos  OS  animos  de  seus  soldados  do  furor  se  escu- 
sariao  de  loda  a  piedade;  que  acceitassem  os  offe- 
recimentos  da  clemeocia,  antes  de  os  obrigarem  os 
destrocos  da  ira,  a  qual  se  podiao  adiantar,  toman- 
do  o  conselho  que  Ibes  dava  o  excesso  do  poder ;  e 
advertindo-lbes  que  a  desproporcao  da  defensa  ta- 
ria  infallivel  a  ruina.  -  A  voga  arrancada  i?mha 
o  mensageiro  em  direitura  a  fortalexa  do  mar  ;  e 
a  seguranca  foi  para  os  nossos  informaeao  do  de- 
signio,  e  com  uma  carga  de  mosqnetana  adianta- 
rao  a  respbsta  a  embaxada ,  firmando  a  resolucao 
com  OS  testemunbos  do  desprezo,  para  que  enten- 
desse  o  inimigo  que  tinha  muito  que  veneer  a  onde 
esperava  a  prevencao  e  o  valor. 

VIIF.  Indignado  o  Flamengo  com  semelhantp 

acolhimenio,  que   reputou  provocacao  de  sua  co- 

iera,  mandou  baler  a  tudo  que  podia  alcancar  sua 

artelharia    com   tanta  obstinacao  e  furia ,  que  em 

sette  horas   de  combaie  metteo  dentro  do  Arrecife 

dnas  mil  balas.  Nao  faliarao  os  nossos  k  devidaco^ 

'^poadenciB  »  «  com  tao  ditoso  effeito,  que  sentio 


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QASTUOTO  voeiTAm.  29 

o  inimigo  a  pumtualidade  da  retorno^  arriscado  a 
chorar  maior  a  perda^  com  o  perigo  em  que  vio 
uma  de  suas  fragaUs/  a  qual  no  maior  fervor  de 
suabateria  tocou  nos  arrectfes,  tao  perdida,  que 
para  a  salvar  se  empenhou  a  iodustria,  a  forca  e  a 
diligencia. — A'  escuta  noite,  que  adiantoua  fuma- 
ca  do  conflicto^  succedeoa  do  tempo;  fez-seo  inimigo 
na  voUa  do  mar,  e  livres  os  nossos  tiverao  occasiao 
para  adveriir  o  pouco  damno  que  havia  causado  a 
bateria.  Na  povoa^ao  do  Arrecife  nenhum  outro 
fizerao  as  balas  mais  que  passar  as  paredes  dos  edi*- 
ficios,  sem  prejuizodo8^soldado$.  Na  fortaleza  do 
mai*  iic^rao  qualro  mortos  e  sette  feridos^  haTendo- 
se  nelle  o  Tcnente  Pedro  Barboza  commuito  valor  e 
acordo.  Confuso  se  achou  o  Hollandez,  mostrando- 
Ihe  a  experiencia  o  erro  da  opiniao  :  persuadia-lhe 
a  presumpcao  que  sua  armada  primeiro  havia  de 
veneer  com  o  temor  que  com  a  forca ;  sem  razao 
discurria ;  com  muila  descursava ,  se  fazia  funda* 
mentp  em  promessas  alheias  (aillrma-se  que  se  uns 
o  rebatiao  y  outros  o  chamavao  ].  Abaieo  as  vc^ias  da 
armada  e  da  soberba  y  e  em  arvore  secca  esperou  a 
fortuna  do  Wandemburg  no  assalto  fortivo  que  ia 
executar  na  paragem  do  ?&o  Amarello ,  de  cujo 
successo  esperava  toda  a  melboria  de  sua  sorte.  — 
Navegavaentretan to  Wandemburg  cum  asdezeseis 
n^os,  levando  nellas  mais  infantaria  da  que  temos 
dito ;  che^ou  no  mesmo  dia  y  a  lao  boas  boras  ^  ao 
Pdo  Amarello  y  que  favorecido  da  occasiao  e  do 
tempo  poz  em  terra  gente ,  muai96es ,  artilbaria, 
e  manlimentos  sem  contradiccao  que  o  impedisse  y 
ou  detivesse ;  formou-se  em,  quatjo  batalhoes ,  e 


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guarnecco-9e  com  siifficientes  trincheiras.  0  prr- 
meiro  esquadrao  constaTa  de  algumas  mangas  de 
escolhidos  mosqueteiros,  que  na  vanguarda  aerTia- 
sem  de  descobrir  ^  e  assegurar  o  campo  das  embo5- 
cadas  que  lemia  por  junto  da  praia.  0  segundo  se 
formava  de  934  soldados  y  que  goTemaya  Estienca- 
lui,  ou  Esiiencol,  tenente  coronel.  0  terceiro 
govemava  o  coronel  Stens  Calolt ,  ou  como  ouiros 
deziin  ,  Elestz,  com  1040  soldados.  0  quarto  cons* 
lava  de  966  infantes  As  ordens  do  coronel  Juleo 
Henechio ,  tenente  do  sar^ento  maior.  Compunha- 
se  este  todo  de  trinta  e  seis  b:!ndeiras ;  lerava  quatro 
pecas  de  campanha ;  e  nesta  fdrma  passou  o  iminigo 
toda  a  noite  com  as  armas  na  mao,  presumindo  que 
nosso  descuido  era  ardiloso  cuidado  :  discurso  mui 
de  hoinem  e  de  soldado. 

IX.  Com  algumas  boras  d'escuro  se  diviilgou 
na  povoacao  de  Olinda  que  o  inimigo  tinba  deitado 
em  terra ,  no  Pto  Amarello  y  muita  geiite ,  com 
a  qual  vinha  marcbando  para  a  villa.  A  distancia 
era  de  tres  para  quatro  legoas  ;  a  nova  f6ra  de  toda 
a  suspeita ;  o  tempo  coberlo  de  sombras ;  causas 
para  se  augmentar  a  confusao ,  que  nasceo  do  re- 
bate. —  A  todos  tirou  o  sobresalto  da  memoria  a 
defensa;  a  muitos  facilitou  a  vontade  da  fugida ;  e 
a  mui  to  poucos  deixou  acordo  para  a  resistencia. 
0  molberio,  dando  credito  is  persuasoes  de  fragi- 
lidade ,  despi'ezava  as  da  razao.  As  lagrimas  y  e 
gritos  pubHcavao  a  dor  das  feridas ,  antes  de  verem 
as  espadas ;  pintando-lbes  o  medo  primeiro  o  es- 
trago  que  o  conflicto ;  obrigando  com  a  lastima 
WB  maridos,  irmaos  e  parentes  a  faltarem  ms 


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cuniaio  tuuTAvo.  ll 

briosdebonni  por  nao  desmeQiirem  os  impulsos  do 
iangue.  A  pressa  em  todos  era  tanta,  que  se  tro*- 
pessava  naa  mesmas  diligBncias ;  o  desacordo  ta- 
manho,  que  de  qualquer  inovimentD  fazia  batalha, 
de  qualquer  vista  formava  coQtrariofi.  Com  esta 
corifusao  Ba'irao  muitas  familiaQ  da  villa  para  o 
mato ,  ensinando-lhes  o  amor  da  vida  a  desprezar 
o  maia  precioso  da  fazenda.  Os  escraros  servirao 
i^sta  occasiao  de  serem  senhores  de  seus  senhores; 
moatrando  bera  que  os  tinha  feito  servos  a  violencia, 
a  nao  a  obri^a^ao ;  fallando  ao  servi90 ,  quando  os 
ehamava  a  liberdade.  Todos  caminhavao,  nenhum 
sabia  para  oude ,  nem  para  que ;  todos  fabrieavao 
em  sua  prapria  diligencia  sua  perdicao ,  uns  na  r^ 
tirada  ^  outros  no  roubo.  Maihias  d'Albuquerque  y 
a  quern  uesta  confusao  desconhecia  a  obediencia  j 
via-ae  destituido  de  poder  para  sair  ao  encontro  do 
inimigo ;  acompanhava-o  a  honra  d*alguns  valentes 
e  animosos  moradores ,  mas  para  a  presente  ocea* 
siao  faziao  tao  pouco  numero,  que  dravao  a  con^ 
fianqa  &  temeridade,  quanto  mais  ao  atrevimento. 

X.  No  dia  seguinte  16  de  Fevereiro  se  pos^rao 
era  marcba,  levaudo  o  coronal  Wandemburg^  a  van- 
guarda  de  seus  esquadroes ,  cujo  centro  formava  o 
trem  de  sua  artilharia,  dilatandoa  circumferencia 
at^  as  praias  do  mar^  pelo  qusl  Ihe  faziao  compa^ 
nhia  todas  suas  lanehas^  varejando  al6  oude  cfursavao 
as  balas.  Nao  deixou  de  ser  perseguido  o  Hollandez 
por  algnmas  mangas  nossas  que  formavao  animosos 
mancebos  chamados  do  primeiro  rebate,  cauaando- 
Ibe  nao  menos  receiocjue  estrago^porque  cobertos  dos 
matos  erao  tao  certos  seus  tiros  como  desconhecido 


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33  CASTRIOTO  LUSITAIia 

seu  numero.  Chegou  ao  rio  Doce,  cuja  passagem 
achou  empedida  com  trincheiras ,  e  presidios  de 
gente  da  ordenanca  y  que  governavao  os  capilaes 
Francisco  Tavares,  e  Martim  Ferreira,  mais  para 
temer  pelo  vulio  que  pela  disciplina.  A  falta  d'esU 
conheceo  o  inimigo  pelo  mat  cerrado  das  cai^gas ;  e 
nao  temendo  aos  que  sem  ordem  Ihe  haviao  de  I'e- 
sistir»  cocQiuetleo  a  passagem  com  todo  o  poder, 
avancando  as  tiincheiras ,  que  os  nossos  desampa* 
r^o  com  aquella  desordem,  que  faz  parecer  a  re- 
tirada  fugida ;  sendo  lao  poucos  os  que  leve  cons- 
tantes  o  valor  que  podeiao  servirpara niostrar  a  dif- 
feren^a  ,  por^m  nao  para  sustenlar  a  opposicao ;  o 
que  fizerao  por  algum  tempo  com  damno  de  mor- 
t08  e  feridos  de  uma  e  outra  parte.  —  Ouvindo  os 
ultimos  golpes  do  conflicto  chegou  a  avistar  aquelle 
sitio  Mathias  d'Albuquerque  acompanhado  de  gente 
de  p^  e  de  cavalio  com  um  Iroco  que,  contado  pelo 
numero,  era  de  760  homeus ,  mas  pela  disciplina 
constava  demui  poucos  soldados,  e  lodos  animosos, 
por^m  sem  exercicio  da  milicia.  Vio  o  govemador 
OS  defensores  da  passagem  depois  de  desbaratados, 
descompostoSySem  arte  que  os  composesse  (primeiro 
vencidos  da  propria  impericia  que  da  alheia  ror9a)^ 
Irabalhou  por  os  recollter  ao  seu  esquadrao  y  em 
que  conheceo  a  mesma falta;  escusou-s6  ao  encontro 
com  a  certeza  de  pei  der  a  batalha,  e  se  foi  retirando 
com  o  intento  de  esperar  o  Flamengo  na  passagem 
do  rio  Tapado ,  que  havia  vadear  com  agua  pela 
cinta,  mas  a  poucos  passes,  achando-se  desamparado 
do  maior  numero  da  companhia,  e  s6  assisiido  dos 
capitaes  eoiBciaes  com  poucos  soldados,  vio-seobri- 


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GASTRIOTO  UmiTAlfO.  33 

gado  a  obedecer  a  necessidade  retirando-se  para  a 
villa. 

XI.  Fayorecido  de  nossas  omissoes  proseguio  o 
inimigo  sua  niarcha  aerviado-Uie  de  guia,  na  reti- 
rada,  os  que  nao  servirao  i  defensa.  Corria  com  os 
paaaos  de  sua  fortuoa,  e  para  voar  Ihe  dec  azas 
nossa  deagra^ ,  porque  urn  homem  nosso  se  Ihe  of- 
fereoeo  para  os  guiar  para  a  villa  por  caminho  mais 
seguro  e  de  menos  rodeio.  (Por  infamar  os  mora- 
dores  escrevem  alguns  que  foi  um  d'elles  ^  por^m  a 
iorormacao  da  verdade  diz  que  foi  um  mulato  de 
pouca  sorte. )  Avistou  o  inimigo  a  povoacao,  e  divi* 
dido  o  poder  em  trocos,  avancou  por  diflferentes 
partes ;  nas  quaes ,  se  achava  homens  y  nao  achava 
inimigos.  Com  o  grosso  do  poder  subio  a  apoderar- 
se  do  alio  da  villa,  achando  eoLO  coUegio  da  Com- 
panhia  alojamento,  sem  encontro.  A  um  tropel,  que 
guiou  por  detraz  da  cerca  de  Sao  Francisco,  deteve 
o  capitao  Salvador  d^Azevedo  com  vinte  dous  solda- 
dos  y  que  favorecidos  do  sitio  sairao  de  cara  a  cara 
a  rebater  o  Holiandez,  mostrando  sen  valor  a  todos, 
o  que  iodos  deviao  fazer.  Era  o  passo  estreito  y  o 
animo  dos  nossos  destemido,  razao  por  que  o  en- 
contro  foi  porfiado ;  e  nao  forao  os  nossos  vencidos 
se  a  virtude  se  nao  vira  opprimida  da  multidao, 
que  A  custa  de  muitosofficiaesesoldados  franqueou 
a  marcha,  com  deixar  a  todos  os  nossos  ou  mortos 
ou  feridos.  — Chegou  o  Flamengo  &  igreja  de  Jesus, 
onde  muitos  dos  nossos  se  tinhao  fortificado,  e  ar- 
rebalado  de  diabolico  furor  contra  o  sagrado  deitou 
por  terra  as  portas  do  templo,  ferindo  sem  pie- 
dade  os  que  nelle  se  acolherao.  Um  grande  tmpel 
I.  3 


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envestio  o  reduto  que  firava  A  «ntrada  da  rillk  tsbm 
tumulto  e  ousadia;  mas  nelle  achdrao  profiada 
resistcncia  da  parte  do3  derensores,  que  com  oargas 
d'artilfaark  e  mosquetaria  detiv^rao  algum  tempo 
a  corrente  do  orgulho  conlrario ,  e  talvez  os  teriao 
rebatido  se  nao  fosse  a  trai^ao  de  dons  Flamengos, 
que  estayao  entre  os  nossos  >  chamado  urn  Adriao 
Franco,  outro  Cornelio  Joao,  os  quaes  temendo  os 
efFeitos  de  nossa  resolucao,  com  traidoras  intelli- 
gencias  derao  edtrada  aos  seus ,  e  se  deixdrao  ficar 
com  elles  no  reduto ;  do  qual  salrao  rendidos  os 
nossos.  Pelo  tempo  adiante  pag&rao  os  dous  Fla- 
mengos  esta  traicao  com  outra,  que  no  Arrecife  os 
levou  ao  supplicio  por  servirem  d'espias  dobles , 
infieis  a  proprios  e  a  estranhos. 

XII.  Apoderado  o  inimigo  da  villa  e  de  suas  fiwrti- 
ficacoes  (um  sabbado  pela  tarde,  16  de  Fevereiro 
de  1630)  continuou  Mathias  d* Albuquerque  em 
obrar  o  possivel ,  com  trabalho  inutil.  Como  por 
destine  o  levavao  as  retiradas  a  guiar  o  inimigo  para 
as  investidas.  Nao  ha  erro  que  se  nao  encadte  com 
outro  erro.  0  nao  ter  comsigo  gente  com  que  de- 
fender a  villa  o  tirou  para  o  Arrecife  :  era  de  menos 
ambito  a  povoacao,  e  bastava-lhe  menos  gente 
para  a  defender ;  por6m  na  retirada  desamparou-o 
tanta ,  que  se  vio  com  mends  do  que  era  necessario 
para  guamecer  sufficientemente  a  palicada»  Quiz  re- 
mediar  com  a  induslria  a  falta  do  poder,  e  mandou 
aos  capitaes  Joao  Paes  Barboza,  Martim  Ferreira , 
Francisco  Tavares,  que  com  a  gente  que  tinhao  cor- 
tassem  com  uma  trincheira  o  caminho  da  villa 
para  o  Arrecife,  a  onde  as  avancadas  do  inimigo 


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fliSnWTO  UaTAMu  W 

qudbrasaett  a  in^imdra  filria,  e  detivdSMili  a  coi^ 
rente  de  tanta  victoria ;  preveneao  que  o  Hollimdes 
deixou  fruglada  ^  guiado  d'outra  vereda ,  que  Ihe 
deixou  livre  a  envestida  e  aos  nosaos  franoa  a  reti- 
rada ,  em  que  jd  obedeciao  ao  cuatume  ( nao  sei  se 
permittido  de  mais  que  humana  proTidencia)* 
O  restante  d'aquelle  infau^to  dia  gastou  o  Flamengo 
em  extor^oes,  violencias  e  roubos,  atropellaodo 
com  a  tyrannia  as  leis  da  humanidade.  — Nao  pode 
o  valor  e  soffrimento  de  Andr^  Pereira  Temudo 
coiB  as  exorbitantes  demazias  do  sacrilego  hereje, 
e  levado  d'um  catholico  zelo  envestio,  junto  i  igreja 
da  Misericordia,  com  uma  tropa  de  Flamengos^ 
abrindo  com  a  espada  camioho  para  a  morte  e  para 
a  vingan9a»  &  custa  de  sua  vida^  e  da  de  muitoa 
contrarios. 

XIII.  Referir  a  calamitosa  tribulacao  dos  aSlic* 
tos  moradores  fora  mais  representar  uma  tragedia, 
que  eacrever  uma  historia ;  basta  dizer  que  o  vie- 
torioso  era  Hollaodezy  hereje  sobre  inimigo^  e  cos- 
sario  sobre  hereje.  Para  augmentar  o  estrago  se 
valeo  a  fuiia  de  proprios  e  contrarios.  Os  facino- 
rosos  que  a  justi^a  depositava  nos  cai  ceres ,  rom- 
pidasasprisoeS)  sa'irao  com  impetuosa  correntea 
continuar  os  deUctos,  roubando  sem  medo,  ferindo 
sem  causa ,  matando  sem  colera ;  pagando  a  inno- 
cencia  a  prisao,  de  que  fez  injuria  a  malicia.  A 
mesma  diligencia,  com  que  os  tristes  moradores  bus- 
cavao  o  remedio^  os  levava  i  ruina.  As  mulheres 
de  todo  o  estado  ^  e  as  criancas  de  urn  e  outro  sexo^ 
que  anticipadamente  fortavao  o  corpo  i  violencia , 
a  padec^rao  menos  soflrivel,  porque  mais  insup- 


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S6  GAsnnyio  lusitaiio. 

portavel  se  fazia  executada  pelos  proprio6  que  pelos 
contrarios,  despojando-as  do  que  pod^o  salvar  de 
seus  rooveis  para  o  servico  de  seu  adomo  ou  de  sua 
necessidade.  Forao  estes  aquelles ,  aos  quaes  nem  a 
honra  obrigou  a  defensa,  nem  a  humanidade  a  com- 
paixao.  Pelo  excesso  os  distinguia  dos  herejes  o  es- 
candalo ;  porque  com  maior  insolencia  nao  sabiao 
fazer  differenca  de  pessoa  a  pessoa,  de  lugar  alugar, 
de  edificio  a  edificio.  Vio-se  a  fatalidade  da  perdicao 
em  se  intentar  a  reserva  "por  meio  do  estrago.  — 
Ao  mesmo  tempo  que  o  furor  dos  inimigos 
consummia  e  abrazava  na  villa  honras,  vidas  e 
fazendas,  ardiao  no  mare  no  Arrecife  trinta  na- 
vios ,  e  lodos  os  armazens ,  a  que  Mathias  d' Albu- 
querque mandou  p6r  fogo;  e  nelle,  al^m  d'outras 
muitas  drogas,  ard^rao  mais  de  duas  mil  caixas 
d'assucar,  em  que  as  chamas  consumirao  a  posse 
e  a  esperanca  da  riqueza  e  da  cobica.  Espectaculo 
que  OS  estraugeiros  viao  com  espanto,  os  naturaes 
com  lastima.  Fez  o  successo  parecer  profecia  o  que 
antes  havia  sido  comminacao  evangelica. 

XlV.Vendo  o  Holiandez  que  os  nossos  abando- 
navao  as  chamas  aquillo  que  uao  podiao  guardar 
nem  defender,  Ucenciou  aos  soldados  o  Arrecife  e  a 
villa,  condemnando  todas  as  casas  dos  moradores  ao 
saco.Engolfou-seoroubono  permiltido  enovedado, 
igualando  a  cobica  a  hostilidade  e  o  estrago ,  sem 
perdoar  aos  mesmos  editicios.  Entre  as  logeas  (que 
achou  com  muito  recheio  de  fazendas,  e  nellas  tudo 
o  que  podia  servir  ao  decoro  e  a  vaidade )  havia  al- 
gumas  bem  providas  de  tudo  quanto  a  natureza  e  a 
arte  podem  offerecer  a  gula;  nestas  se  engolfou  a  in- 


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GASTBIOrO  LUSITANO.  37 

fame  dos  Flamengos ,  satisfazendo  a  sede  e  ao  cus- 
tume  com  preciosos  yinhos,  e  com  tanto  excesso^ 
que  privados  do  juizo  e  dos  sentidos,  ou  o  somno 
OS  deixava  insensiveis,  ou  a  carga  os  fazia  immoveis. 
Os  escravoSy  vendo  derrotados  tao  yilmente  aos  que 
respeitavao  victoriosos,  como  senhores  do  campo  se 
fizerao  arbitros  da  presa ,  roubando  aos  cossarios  o 
mais  precioso  dos  despojos.  Alguns  houve,  a  quern 
o  roubo  nao  fez  esquecer  a  fidelidade ,  que  forao 
dar  conta  a  Matbias  d'Albuquerque,  afirmando- 
Ihe  que,  se  queria  aproveitar-se  da  opportunidade 
passaria  o  inimigo  a  espada ,  certo  de  que  no  pre- 
sente  estado  nao  ia  a  buscar  homens,  seuao  odres. 
OfFereceo-se  um  paizano,  com  alguns  companheiros, 
para  o  assalto ;  mas  desprezou-se  a  offerta ,  porque 
a  calumniou  de  infiel  a  suspeita. —  Findo  o  saco 
atlendeo  o  Flamengo  a  fortificacao  da  villa  e  do  Ar*- 
recife ;  nao  porque  temesse  o  assalto  dos  nossos , 
senao  por  ter  sojeitos  e  disciplinados  os  seus. 

Xy.  Davao  cuidado  ao  inimigo  as  forcas  que  de- 
fendiao  a  barra  (erao  duas,  a  do  mar  e  a  da  terra) : 
queria  franquear  o  porto  a  armada  queesta  va  no  mar, 
e  reduzir  a  communicacao  dos  seus  a  menor  distau- 
cia.  Preparourse  para  ganhar  por  entrepreza  a  forca 
da  terra,  prevenindo  todos  os  petrecbos  necessarios 
para  o  assaho,  e  todas  as  cantellas  para  o  segredo. 
0  capitao  Antonio  de  Lima,  govemador'da  for^a, 
nao  perdia  tempo  em  se  fortificar  e  guamecer  de 
tudo  o  que  era  necessario  para  a  defensa ;  mas  nao 
era  em  todos  os  seus  igual  o  valor  e  a  constancia : 
pois  o  abandonarao  todos ,  roenos  sete  soldados  tao 
destimidos ,  que  desprez^rao  o  exemplo  dos  com- 


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18  GiSTUOlO  LVSITAlia 

panheiros  pw  imitar  a  vakutia  do  capilao.  Deo 
parte  a  Mathias  d' Albuquerque  do  que  se  passava, 
em  occasiao  que  estava  presente  Joao  Fernandes 
Yieira,  yarao  a  quern  o  valor  e  a  fortuna  fiaerao  a 
todas  as  luzes  grande^  cujo  animo  esperava  ocoa- 
sioes  para  se  adianiar  ao  numero  dos  annoa  :  achou 
fiesta  o  que  desejava ,  e  sem  dila^ao  se  offereceo  a 
morrer  em  defensa  da  forca  (como  oytro  Marco 
Gurcio  em  beneficio  da  patria) ;  gentileza  que  imi- 
tarao  at^  vinte  moradores,  ou  persuadidos  da  emo- 
la^o^  ou  obrtgados  do  exemplo.  Agradeceo  Ma* 
tbias  d' Albuquerque  o  servi^o  y  e  Antonio  de  Lima 
o  ofazequio,  conhecendo  que,  guarnecida  a  fortaleza 
de  animoa  tao  valerosoa ,  acbaria  o  inimigo  nella 
mais  causa  para  o  deayio  que  para  o  assalto.  Do  va- 
lor mais  conhecido  fiou  o  capilao  o  posto  mais  ap- 
riscado :  enoommendou  a  Joao  Fernandes  Vieira 
que  no  mais  perigoso  estivesse  de  sentinella ;  o  que 
fez  sem  interpolacao  tres  dias  e  tres  noitee  conti^ 
nuos,  sairindo-se  seu  animo  do  ck6vek>  como  o  po- 
d^ra  fazer  do  descanco.  —  Passados  cineo  dias  em 
descan^o ,  di^xn-se  o  inimigo  a  atacar  a  fortaleza, 
em  que  se  achava  Joao  Fernandez  Vieira ;  no  mais 
escuro  da  noite  saio  da  villa  com  dezeseis  escadaa, 
e  mn  numeroso  tro^o  de  combatentes  escolhidoa ) 
e  a  passo  lenlo  cbegou  a  subir  pelas  escadas ,  pri-« 
meiro  qu%  fosse  sentido  das  sentinellas,  que  nao  ti- 
verao  mais  lugar  que  de  aoordar  os  companheiros 
com  OS  golpes ,  com  que  rebat^o  os  inimigoa» 
deitaado  das  muralhas  furiosamenle  os  que  as 
tinhao  avancado ;  e  a  todos  os  que  ousados  os  ser 
guiao  opprimirao  com  golpes^  pedras  e  travea^  que 


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C^STRiOTO  LuaiTANa  *  59 

sobre  eUes  l^itcavao,  com  tal  de^tpo^o  que  do$  mea- 
inos  peda^oi^  das  escadas  fez  o  estrago  infttrumea-^ 
toa  para  a  ruinat  Para  a  minorar  (com  divertir  e 
ofiEender  os  cereados)  Ihe  deiiou  o  Hollandez  dentro 
da  fbrtaleza  successivas  nuveos  de  granada$,  e 
alcanziaa  de  fogo ;  por^  achou  Qelles  tanto  acordo 
este  diabolico  artiQcio,  queapenas  dava  na  forta- 
leza  o  golpe,  quando  a  vigiUacia  dos  nossos  o  coo** 
duzia  pelos  ares  a  executar  o  incendio  entre  06  ini- 
luigos.  —  Crecia  o  damno  i  sem  cessar  o  combate : 
a  resiatencia  accepdia  o  furor  de  uns  $  a  porfia  aug- 
lO^taya  o  yalor  de  oulros ,  al^  que  o  iuimigo  cor-> 
tado  f  taato  da  parda  oomo  do  deaeiigauo^  ie  redrou 
do  oonflicto  deixaiKio  150  mortos,  e  muito  maior 
numero  de  fer  idos » enlre  quantidade  d  armas  e  mu« 
ui^oaa;  que  aoa  aoasoe  servirao  para  o daapojo ,  e 
para  o  triompbo  com  que  solemnizarao  a  victoria; 
aqual  uao  p6de  diminuir  a  perda  de  quatro  mortos 
e  se^  feiidod;  tao  mereoedorea  de  etornos  elogios 
que  06  eograndeeia  a  iaveja ,  sem  dar  lugar  a  que 
oa  eboraaae  a  dor. 

XVf.  Deaenganado  o  Hollandez  que  nao  podia 
por  eutreptesa  tomar  a  fortaleza ,  a  qual  tinhao 
eorrido  uovoa  oombatantes  com  a  noiicia  da  Tieto* 
ria  alcaBcada,  dispoz-ae  a  atacal-a  em  f6nna  regular, 
huaoaudo  modo  wm  que  podeaae  offender  sem  aer 
offimdido^  Maudou  diaote  660  gaatadores,  que 
abriaaeai  pela  areia  uma  estrada  encoberta  e  tor^ 
eida ,  eortando  a  ponta  da  reatinga ,  que  divide  a 
terra  do  mar^  peb  qual  deaemboeasae  a  por  aitio  a 
fortaUza,  que  logo  cercarao  de  cava  e  triucheiraa 
i^om |»M>pQffeiouadaa  pUtaformaa^  em  que  aaaeutarao 


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40  CA8TU0T0  LU81TA190. 

muitas  pe^as  de  bater,  e  entre  ellas  urn  grosdo  ca- 
nhfto  que  comecou  a  desmantellar  a  fortaleza  com  a 
furia  e  braveza  que  alimenta  o  odio  e  a  Tinganca. 
Era  o  edi6cio,  alem  de  limitado,  fabrica  sem  arte 
( consummido  do  tempo  e  do  descuido),  levantado 
para  intimidar  a  singeleza,  e  nao  para  resistir  a  pro- 
fia  ajustada  da.  arte ;  mas  por  isso  mesmo  6  mais  glo- 
riosa  a  defensa  que  os  nossos  nelle  fizerao. 

XVII.  Demantellados  os  muros,  descavalgadas 
as  pecas,  mais  era  um  monte  de  ruinas  que  obra 
de  forti6cacao  aquella  fortaleza,  em  que  Joao  Fer- 
nandes  Vieira  levantava  o  primeiro  padrao  a  sua 
gloria.  Animados  por  elle,  oflTendiao  e  se  defendiao 
OS  cercados,  em  quanto  houve  paredes,  que  susten- 
tassem  o  impeto  dos  assaltados.  Por  fim  pelejavao 
]&  OS  nossos  a  peito  descuberio  y  arrasados  os  de- 
fensivos  da  forca,  abertos  os  muros,  caidos  os  re- 
paros.  Nao  ousava  com  tudo  o  inimigo  dar  o  ultimo 
asealto ,  temendo  que  dos  mesmos  fragmentos  fa- 
bricasse  a  fortuna  para  os  seus  sepulcro ,  e  para  os 
nossos  theatro ;  e  assim  determinava  veneer  sem 
invcslir.— Ja  a  este  tempo  se  via  o  valor  dos  Portu- 
gueses rendido  ao  trabalho  e  ao  destro^o ;  inteiros 
no  animo,  porim  destituidos  das  forcas.  Sabiao  que 
o  soccorro  era  impossivel ,  a  resistencia  inutil ,  o 
risco  irrefragavel,osuccessoconlingente,e  tomando 
melhor  acordo  entrarao  em  conselho,  conferindo 
entre  si  quanto  melhor  acerto  seria  livrar  as  vidas 
de  uma  morte  inutil,  para  as  aproveitar  em  uma 
occasiao  dilosa  que  entregal-as  a  espada  inimiga 
com  gloria  sem  fructo  :  resolv£rao-se  na  entr^a, 
consultando  entre  si  os  partidos.  Um  estrangeiro^ 


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CASTBIOTO  LUSTTANO.  &1 

que  era  oondestavel  da  artilharia  y  percebendo  esta 

resolu^ao  adiantou-se  a  levantar  a  bandeira  branca^ 

ftzendo  com  ella  chamada  para  a  entrega.  Acodio 

o  inimigo  alrorocado  y  passdrao-se  refens  de  parte 

a  parte ,  saio  da  fortaleza  o  capitao  Gil  Correa  de 

Castello  Branco  a  ajustar  as  condicoes  da  entrega , 

que  se  conced^o  como  da  nossa  parte  se  pedirao. 

Com  annas  e  moveis,  trazendo  corda  accesa,  e 

bala  em  boca,  sairao  os  Portnguezes,  e  com  Kber- 

dade  para  disporem  como  quizessem  de  suas  pes- 

seas.  —  Digna  de  gloriosa  memoria  (comoac^ao 

propria  de  Joao  FernandesVieira)  foi  uma  gene- 

rosa  adverteucia^  quenesta  occasiao  teye.  Nao  se  lem- 

brarao  os  rendidos  da  reputacao  que  perdiao  nossas 

armas ,  deixando  as  bandeiras  d'El  Rei  e  insignias 

dos  cabos  da  milicia  expostas  ao  desprezo  inimigo; 

porimaquellecoracao,  animado  sempre  de  gene- 

rosos  espiritoSy  menos  ambicioso  da  vida  que  da 

honra ,  teve  cuidado  de  mandar  a  um  moco  seu 

que  recolhesse  a  prata  da  gineta  e  enrolasse  em  si 

a  bandeira  do  capitao  Afonso  d' Albuquerque,  que 

era  um  dos  rendidos,  e  cingindo  comsigo  mesmo 

outra,  as  salvou  ambas  do  oprobrio.  Lembran^a 

verdadeiramente  toda  do  valor,  e  nada  da  com* 

modidade,  devendo  a  sua  memoria  o  serrico  que 

(azia  y  e  nao  o  risco  a  que  se  expunha.  Gloria  foi  de 

Lucilio  ser  nesta  gentileza  o  priraeiro ;  por^m  mais 

se  deve  gloriar  de  ser  nella  Joao  Fernandes  Yieira 

o  segundo. 

XVIII.  *Queria  o  Hollandez  que  os  nossos  juras- 
sem  de  nao  tomar  armas  contra  os  Estados  por  tempo 
de  seis  mexes ;  por^  como  era  contra  o  pactuado 


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Mt  c4pit\ila9ao  reciuavaohse  firmemente,  preferiudo 
antes  p^ioso  carcere,  a  queos  condemnou  a  perQdia 
ioimiga^  que  liberdade  afrontoaa.  Apellou  a  pacieor 
da  para  os  heneficios  do  tempo,  e  depois  de  paasa- 
dos  alguQs  diaa  alcan^ou  o  que  nao  pode  cou^eguir 
a  razao.  Nestas  djligencias  e  outras  meaos  decorosag 
gastou  o  iniiqigo  todo  o  mez  de  Fevereiro,  Entrou 
0  prioieiro  de  Mar^Oj  e  ao  segundo  dia  fez  embaixadt 
a  nossa  forlelezado  mar  que  ae  entregaase,  elhe  dar 
ria  bom  qu^rtel,  porque  se  esperasse  a  que  a  reu- 
desse  por  arma^,  sem  distinc^ao  de  pe$soa  os  havia 
de  passar  todos  a  espada.  0  capitao  Manoel  Pacheco^ 
que  goveniaya  a  forca,  cousultou  com  os  seus  sol-r 
dados  a  resposta ;  e  saio  decreUKlo  que  se  entregasse, 
pois  se  yiao  faUos  de  meios  para  a  defender,  e  sen^ 
esperan^  de  soccorro,  para  que  i  presente  ne^ 
cessidade  podesse  apellar,  —  Oppdz*«  &  resolu9ao 
o  tenente  Pedro  Barbosa  com  differente  parecer, 
dizendo  que  Matbias  d'Albuquerque  Ihes  tUra 
aquella  fortal^ia  para  a  defenderem  como  anio^sos, 
^  nao  para  a  entregarem  como  cobardes ;  que  em 
o  fazerem  primeiro  incorriao  a  infamia  de  desleaes 
que  de  medrosos;  que  faltava  a  essencia  de  varao 
e  de  yassaUo,  quem  entregava  ao  amea^o  o  que 
devia  defender  a  golpes ;  que  a  bonra  dos  homens 
briosos  era  re^ulta  do  soffrimento,  e  nao  da  deses- 
peracao.  c<  Que  dira  de  ncis  o  Hollandez,  dizia  elle, 
i)  veodo  que  nos  veqce  com  palavras,  senao  que  nos 
»  entrega  o  medo  e  nao  a  necessidade  ?  Esia  forta^ 
>  leza  nao  mudou  o  ser  depois  que  nosobrigamos 
JO  a  sustental-a ;  pois  logo  com  que  apparencia  de 
JD  deiKulpa  a  hayemos  de  entregar  sem  cooeJMte  ao 


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j^  ii^liKHgo  ?  Quern  vio  a  valeros^  resisteacia  ^n  ^pie 
»  a  no^oa  olhoa  se  defei^deo  a  fortaleza  da  terra , 
ji>  que  ha  de  dizer,  sepao  que  pode  m^us  coomoaop 
»  a  oobardia  que  o  exemplo  ?  £»peremos  o  aitio ; 
^  proyemosas  forgas  com  o  iuijuigo,  e  quando  qos 
M  olhe  de  rev^  a  fortuoa,  lugar  uos  fica  para  pa^ 
A)  tuara  intrega,  sendo  certo  que  milhore^  parti-r 
»  dos  bavemos  de  tirar  com  a  espada  uua  que  coqi 
»  ell^  embainhada.  »  £&te  parecer  foi  ouvido ,  cqqi 
maistumuUoqueatten9ao;  vianseperplexo  o  c^pjtaoy 
e  Janfoq  mac  d'um  meio  que  podia  escusal-o  da  dea- 
honra  :  repoudeo  ao  enviado,  que  se  Ibe  concedea* 
sem  tre$  dias  para  eonwltar  ueUea  ao  s^u  general 
lyfothias  d' Albuquerq^e,  ou  para  que  o  soccorresse^ 
9u  para  quese  iu^regaase  passado  este  termo*  Colheo 
o  ioimigOy  pela  modeatia  da  respoata>  a^diapoai* 
(oes  dos  auimos ;  e  certo.  de  que  sem  desembainh^r 
aeapada  bairia  de  g^nUar  a^  fortale^,  toruou  logo 
a  en^iar  o  meuaageiro  com  segundo  recado,  que  nao 
ooDoediatreadias^oem  tresborasparaadeUbera^ao; 
que  fie  logo  logo  se  Ihe  uao  fizesae  a  eutrega ,  09 
coadepmava  a  todos  os  ^cesaos  da  ira.  Nao  espe- 
rou  mais  Manoel  Pacheco  para  se  eatregar^  porqu? 
aeu  desejo  aao  esperava  mais  para  o  fazer ;  e  assim 
deixou  nas  maos  do  inimigo  a  fortaleza  municiada 
e  inteira ,  de  aorte  que  se  podia  presumir  entrara 
nella  para  Ih'a  guardar,  e.  nao  para  Ih'a  defender. 
XIX.  Com  o  mesmo  cabedal,  e  com  a  mesma 
fortuna  se  fez  o  Flameugo  senhor  do  Arrecife,  sem 
inimigo  que  temesse,  nem  temendoque  o  assaltasse. 
Mathias  d' Albuquerque  com  alguns  poucos  que 
o  seguiao  ^e  bavia  retirado  aos  matos ,  buscando 


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&&  GA8TRI0T0  LU8ITA1I0. 

nelles  amparo  para  a  defeDsa ,  e  nao  auxilio  para 
a  opposicao.  Celebrou  o  inimigo  o  gosto  da  vio 
toria  com  repetir  os  motivos  do  escandalo,  entre- 
gando-se  mais  licenciosamente  aos  sacrilegios ,  aos 
roubos  e  as  ^iolencias  com  tao  publico  ludibrio 
da  nacao ,  e  da  religiao,  que  saiao  dos  templos  ves- 
tidos  DOS  parameiitos  sagrados,  e  nas  becas  das 
confrarias,  representando  sua  alegria  com  nossa  in- 
juria ;  e  assim  corriao  as  mas ,  e  entravao  nas  casas 
destinadas  para  tribunaes  de  justica  e  do  govemo, 
e  com  desprezo  e  farsa  insultavaoo  sagrado  e  o  pro^ 
fano.  Tinhao-se  recolhido  para  o  porto  todos  as 
naos  da  armada,  todos  os  marinheiros  tinhao  sal- 
tado  em  terra,  e  tanto  crec^rao  os  inimigos  em  nu- 
mero  quanto  crec^rao  os  iosultos  no  excesso;  e  para 
que  em  nenhuma  parte  fosse  difTerente  nossa  for- 
tuna  ordenarao  que  uma  esquadra  de  suas  fragatas 
corresse  os  mares  d'aquella  costa,  para  que  Ihe  cais- 
sem  nas  maos  todos  os  navios  de  Portugal,  que  igno- 
rantes  do  successo  buscassem  os  portos  d'aquelle 
Estado.  Nao  forao  poucos  os  que,  entre  a  seguran^a 
e  a  noticia ,  experiment^rao  uma  mesma  sorie  em 
tao  diversos  elementos. 


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LIVRO  m. 


SUMMARIO. 

.  Chama  Mathlas  d*AIbiiqaerque  ot  moradoref  a  eonsdllo;  reiolacaa 
que  nelle  te  toma.  —  2.  Edificao  oi  nossos  nma  fortaleia.  ^ 
3.  loteDta  0  inimigo  ganhdi-a ;  foge  detbaratado ;  yalerosa  ou- 
sadia  de  Manoel  Diat  da  Franca.  — 4.  Joao  Fernandes  Yieira  ea- 
pitao  d'assegurar  o  campo.  —  5.  Fortifiea-«e  o  inimigo  em  lodat 
af  partes;  d^  principio  a  uma  trincheira,  em  que  6  atacado  pelot 
noMos ;  0  general  hoUandex  foge  a  unhas  de  cavallo.  —  5.  Diapo- 
•icao  com  que  cercamos  o  inimigo  ao  largo.  —  7.  Valerosa  refolu* 
Cao  dos  nosaoa.— 8.  Aiaalta-se  a  povoaceo  de  Sao  Antonio:  com  que 
aucceaao.  *  9.  Ganbou  o  HoUandex  o  perdido ;  aeautella-fe  para 
o  futuro.  —10.  Sai  com  todo  poder  a  ganhar  uma  trincbeira ;  de- 
fende-a  o  capitao  Luix  Barbalho.— 11.  Intenta  o  Flamengo  matar- 
Dos  a  gente  :  o  que  Ibe  auccede.  — 12.  Sai  o  inimigo  contra  a 
estancia  do  rio  Doee :  o  que  Ihe  snccede.  — 13.  Intenta  ganbar 
uma  trincbeira ,  donde  ae  retira  castigado ;  acbou  em  outraa  em- 
prezaa  a  mesma  aorte.  — 14.  Cbegao  a  Lisboa  e  a  Madrid  aa  novaa 
da  entrepreza  de  Pernambuco  ;  trata-se  a  restauracao ;  numero  e 
qualidade  do  soccorro  que  se  mandon.  — 15.  Sai  o  inimigo  a  malar 
a  fome  :  o  que  Ibe  succede.  — 16.  Levanta  o  inimigo  uma  trin- 
cbeira no  sitio  que  cbamao  a  Seca ,  que  os  nouos  pretendem  im- 
pedir  inutilmente.  —  17.  Prepara-se  o  inimigo  para  inradir  a  ilba 
de  Itamaraca  :  o  que  Ibe  succede.— 18.  Fortificao  os  nosaos  a  villa 
de  Iguaracd.  —  19.  Resolve-se  o  inimigo  a  larger  a  rilla ;  em- 
baiiada  que  manda  aos  nossos  ;  sua  reaposta. — 20.  Manda  pdr  Togo 
i  villa,  e  0  que  Ihe  succede.— 21.  Batalba  naval  entre  Hollandezea 
e  Hespanhoes;  accao  memoravel  do  capitao  Cosme  de  Couto; 
perda  da  capitanea  bollandeia,  e  morte  de  seu  general ;  victoria 
da  armada  bespanbola.  —  22.  Bom  Antonio  de  Oquendo  deita 
soccorro  no  rio  Grande ;  causa  da  desuniao  entre  os  nossos ;  della 
se  aproveila  o  inimigo  para  noa  destruir ;  a  trai^ao  d'um  Mameluco 
fez  exemi'lo  a  muitos.  —  23.  luteota  Sigismundo  ganbar  a  fortaleza 
da  Paralba  ;  em  que  acba  dura  resistencia.  —  24.  Assalta  o  ini- 
migo a  estancia  dos  Portugueses ;  com  que  successo.  —  35.  £spera 
aebar  melhor  sorie  na  fortaleza  de  Nazareth ;  retira-se  destro^do 
easualmente.— 20.  Persuadido  de  traidores  assalta  e  assola  a  villa 
de  Iguara^ii ;  €  assaltado  na  retirada  pelos  moradores,  que  eobrao 
parte  do  roubo.  —  27.  0  conde  de  Bauhollo  intenta  ganbar  a 
forUleza  de  Orange ;  com  leve  acordo.  —  28.  Ganbou  o  inimigo 
por  asaalto  a  nosaa  eftaneia  doa  Afogadoa ;  depoia  a  de  Muno  de 


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&6  GASTRIOIO  LU8ITAN0. 

Mello ;  e  com  perda  de  genu  e  de  repuUcio  nosst  a  do  MoidoBCt. 
—  29.  Determina  tomar  per  assalto  a  Dossa  forUleza  do  Arraial; 
retira-se  desordenado ,  e  com  perda ;  valor  de  Jao  Fernandes  Vieira. 
30.  0  Hollandez  assalta  e  aasola  diversas  povoa^es  e  engenhos ; 
ganha  a  ilfaa  de  Uamaraci.  —  31.  Empenha-«e  em  ganhar  a  noaaa 
forialeza  do  Arraial;  os  nossos  Ihe  cortao  o  paaso;  o  que  faz  Ma^ 
thias  d' Albuquerque.  —  32.  Manda  o  general  hollandez  saquear  4 
fregueziade  Saoimaro ,  como  nossos  capitaes  os  cortao  e  desbaratao. 
33.  Chega  toccurro  do  reino ,  que  o  inimigo  destroe.  —  34.  Sal  o 
inimigo  com  poder  sobre  a  fortaleza  do  rio  Grande,  que  6e  Ibe 
entrega  por  irai^ao.  —  35.  Intentou  o  Qollandez  a  conquista  do 
ponial  de  Nazareth ;  entra  no  porto  com  perda  de  duas  fragaUs ; 
OS  nossos  entregao  ao  fogo  os  navios  que  nelle  tinhao ;  o  que 
obrao  em  damno  do  inimigo ;  perde-se  a  victoria  p6r  desgra^a.  — 
36.  Imagina  levar  pur  entrepreza  a  nossa  fortaleza  do  Arraial; 
sao  OS  nossos  advertidos;  retira-se  com  industrla.  —  37.  Manda 
Mathias  d' Albuquerque  investir  o  reduto  do  Ponial :  como  Ihe 
succede.— 38.  Arraza  o  inimigo  a  povoagao  de  Cunhad. —  39.  Che- 
gou  aos  nossi^  um  soccorro  da  Bahia.  —  40.  Salo  o  Flamengo  a 
roubar  a  campanha ;  6  desbaratado  pelos  nossos ;  a  mesina  sorte 
teve  no  porto  do  Calvo.  —  41.  Sai  de  Hollanda  uma  grossa  armada, 
que  se  dirige  sobre  a  Paralba ;  entrega-se  a  fortaleza  e  o  forte  de 
Sao  Antonio.  —  42.  Mathias  d' Albuquerque  manda  soccorro  i.  Pa- 
ralba ;  0  que  ahi  succede.  —  43.  Rouba  o  inimigo  os  contornos  da 
cidade;  marcha  Sigismundo  a  ganhar  a  campaiiba;  Mathias  d' Al- 
buquerque Ihe  manda  coriar  o  passo ;  o  que  succede  au  Rebellinho 
nesia  expedicao.  —  44.  Apresta-se  Sigismundo  para  continuar  a 
conquista  ;  os  nossos  &e  prepiiirao  para  a  re&i«tencia.  —  45.  Manda 
0  inimigo  recouhccer  a  fortaleza  do  Arraial ;  assalta,  e  ganha  a 
Moribeca ;  eitorsoes  que  execuu.  —  46.  Luiz  Barbalho  e  Dom 
Fernando  buscao  o  inimigo ;  com  o  qual  pelejao  e  perdem  a  victoria; 
.  0  que  succede  ^quelle.  —  47.  Largao  os  nossos  ao  inimigo  a  po- 
voa^  de  Sao  Louren^o ;  cala|pidades  com  que  a  todos  igualou  a 
serte.  —  48.  Luiz  Barbalho  assalta  o  inimigo  com  bom  succesfio ; 
retira-ae  Mathias  d' Albuquerque  para  Sirinhaem.  —  48.  Sai  o  ini- 
migo a  sitiar  a  fortaleza  do  Arraial;  prepara-se  o  governador  para 
a  defensa ;  Joao  Fernandes  Vieira  capitao  dos  aventureiros.  — 
50.  De  que  modo  dispoe  o  cerco  o  Holfandez ;  dao  os  siiiados  va- 
ries atsaltos;  profia  o  inimigo  no  cerco,  e  os  nossos  na  defensa. 
ttU  Entrega-se  a  fortaleza  a  partido;  vil  perfidia  do  inimigo; 
Joao  Fernandas  Vieira  se  resgata  e  a  dous  criados  seus. 


L  Gafihada  pdo  Hollander  a  villa  de  Oliada  e  a 


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pcm»ww  do  Arrecifc,  mbedas  daqurile  diMri^tt  ^ 
com  todas  suas  foriiftcacoes ,  logo  »e  vio  decUnar  o 
corpo  de  toda  a  capitania.  Mathias  d' Albuquerque 
achava^seretiradO)  e  a&sistido  doft  moradot^^  acotft^ 
panhando-o  na  fuga  quem  o  desemparAra  na  resis- 
tencia.  A  calamidade,  quelhes  fazia  conhecero  erro, 
Ihes  faria  desejar  a  emeiida.  Yeiido  estas  boas  dis- 
posicoeS)  e  satisfazendo  ^s  importuuacoes  com  que 
sua  gente  o  persuadia  a  tomar  as  armas ,  cbamou 
Matbias  d' Albuquerque  a  conselho ,  e  propondo  a 
todos  o  quanto  convinha  descolrir  a  cara  ao  inimigo, 
consta  que  Ifaes  fajlara  na  forma  seguiute :  «  0 
M  Holiandez  uao  se  empenhou  no  exce^sivo  gasto 
»  d'esta  armada  pela  reputacao  de  suas  lirmas, 
»  senao  pelo  inleresse  de  nossas  drogas.  Esta  tia^ 
»  como  tern  mostrado  a  experiencia,  etn  tanCo  exer^ 
»  cita  a  milicia  em  quanto  the  abre  caminho  para 
»  a  ambigao ;  disfarcao  o  habito  com  o  de  soldadoe) 
»  nem  se  arriscao  pela  victoria^  senao  pek  riquezat 

>  Ajudada  sua  forca  de  nossa  desgraca  se  fez  senhor 

>  de  nossas  casas  e  fazendas ;  se  viera  a  saquear, 
})  conseguido  o  roubo  largdra  a  terra.  Fortifica*-se 
»  nella ;  quem  duvida  que  i  com  designio  d^  no$ 
»  desfrutar  os  campos?  Se  acharopposicao  mudard 
T>  de  intento ;  pois  i  certo  que  para  Ihe  colher  o* 
}}  fructos,  OB  ha  de  cultirar  ou  nossa  sujei^ao^  on 
»  sua  industrial  e  para  o  nao  conseguir^  basta 
»  que  o  nao  favoreca  nem  o  soffrimento  nem  tk 
».omi6sao;  o  que  fio  de  animos  que  sabem  estimar 
»  a  honra,  e  sentir  a  perda.  Dous  meios  nos  podem 
»  conduzir  a  este  fim ;  ou  o  da  conquisU .  casli* 
»  gando  a  injuria^  ou  a  da  defensa  nao  permitiindo 


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A8  GAsniaio  lusiTAMa 

>  a iii¥Mao;  qual  d'estes  ae  deva  escolher  por  mais 
»  seguroy  diii  o  parecer  de  tantos  zelosoe  e  inte- 
n  ressados  quantos  se  achao  neste  congresso.  »  — 
Sem  controversia  se  resolveo  a  guerra  defeosiya  j 
porque  com  ella  se  escusava  o  dispendio  e  ao  ini- 
migo  se  fazia  maior  damno. 

U.  GoDCordes  neste  parecer,  saio  Mathias  d'Al- 
buquerque  acompanhado  de  todos ,  a  buscar  sitio 
regular  e  conyeniente  para  nelle  fazer  uma  forta- 
leza,  que  servisse  ao  iDtento.  Por  eleicao  dos  mais 
intelligentes  foi  escolhido  um  outeiro,  que  se- 
nhoreava  toda  a  circumferencia,  posto  que  pela  na- 
tureza  em  tao  proporcionada  distancia  da  villa  e  do 
Arrecife,  que  de  uma  e  outra  povoa9ao  ficava  uma 
grande  legoa.  Deseuhou-se  a  forca ,  p6z-se  mao  & 
obra,  e  ao  passo  que  crecia  o  edificio,  creciao  os 
soldados  e  moradores  (at^  entao  dispersos) ;  estes 
para  viverero  &  sombra  da  fortificacaO|  aquelles  para 
serrirem  a  obra ;  dando-se  uns  e  outros  tal  pressa, 
que  pondo-lhe  a  primeira  mao  muitos  dias  andados 
de  Fevereiro,  Ihe  derao  a  ultima  antes  de  acabado 
Marco.  A  esta  fortaleza ,  que  era  ao  mesmo  tempo 
poToa^aOy  derao  o  uome  de  Arraial. 

IILSoberbo  com  a.  victoria,  e  confiado  em  sua 
fortuna  olhava  o  Hollandez  com  desprezo  aquelles 
a  quem  venc^ra ;  mas  desde  que  Ihe  constou  que  se 
achavao  reunidos,  e  que  levantavao  uma  fortaleza, 
dispoz-se  a  imped(l-a ,  mas  nao  o  fez  tanto  a  tempo 
que  nao  a  encoutrasse  capaz  de  nos  defender.  £s- 
colheo  entre  os  sens  800  soldados^  e  eml4  de  niarco 
sairao  da  villa  de  Olinda  com  deliberacao  de  nos 
ganharem  por  assalto  a  povoacao,  e  a  fortaleza  do 


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CASTRIOTO  LUSITAMO.  49 

Arraial,  que  neste  tempo  nao  havia  chegado  a  sua 
uUima  perfeicao ;  por^m  mais  defensavel  do  que 
imaginaTa.  Tinha  assentado  comsigo  que  os  Portu- 
guezes  emhebidos  na  obra ,  primeiro  conheceriao  o 
assalto  pelos  golpes  que  pelos  avisos.  Fundava  este 
discurso  ua  promessa  d'um  Flameugo^  chamado 
Adriao  Franco^  pratico  nos  caminhos  (deque^a 
{alUinos)queseoffereceo  a  guiar  os  HoUandezes  por 
veredas  occultas  e  faltas  de  saitinellas.  —  S^uindo 
OS  passos  do  sobrediio  guia  se  poz  o  inimigo  em 
mnrcha  muito  antes  de  romper  a  manha;  mas 
forao  taes  os  rodeios  que  fez,  que  gast^rao  muitas 
horas  em  Jornada  para  a  qual  bastava  uma,  dando 
largo  tempo  ao  conselho,  e  &  prevencao  dos  nossos. 
Matbias  d' Albuquerque,  que  avisado  das  senti- 
nellas  via  o  informe  da  povoacao,  a  imperfeicao  da 
forCaleza,  e  o  poder  com  que  o  HoUandez  o  buscava, 
ordenou  aos  capitaes  Joao  de  Amorim,  Luiz  Bar- 
balhoy  Marlim  Fermra,  Pedro  Manoel  Pavao,  e 
ou(roS)  que  com  os  soldados  de  suas  companhias 
saissem  a  ter  encontro  ao  inimigo;  o  que  Gzerao 
com  taota  destreza ,  ppfidencia  e  valor,  que  o  Fla- 
mengo  (que  se  acliava  formado  em  esquadrao  no  sitio 
chamado  Agua  Fria)  se  vio  a^  mesmo  tempo  inves^ 
lido  e  destro^ado,  nao  Ihe  deixando  o  furor  mais 
remedio  que  o  da  fugida. — Seguirao  os  Portuguezes 
0  alcance,  por^m  como  sao  mais  ligeiras  as  azas  do 
medo  que  as  da  ira,  so  Manoel  Dias  da  Franoa,  mon- 
tado  em  um  ginete  seu  o  foi  seguindo ,  ferindo  e 
matando,  sem  haver  Flamengo  que  ousasse  virar 
a  cara  para  ver  que  era  nm  s6  o  que  os  picava ;  att^ 
que  o  investio  um  tropel  de  muitos  ,  a  tempo  que 
I.  A 


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^^  OASmOTO  UIStlAMa 

se  rompeo  a  cilha,  e  com  a  sella  caiodo  cavallo  entre 
elles.  Nao  desanimou  o  Taloroso  mancebo  com  este 
auccesso,  antes  cobrando  novo  esforqo  se  deaemba- 
racou  do8  inimigoa  com  tanta  geniileaa,  que  nem 
recebeo  ferida  nem  perdeo  honra,  ajudando-lhe  nesta 
occaaiao  a  ganharmuiia  ummulato  sea,  que  oom 
uma  espada  e  uma  rodela  obrou  maravilhas.  Qua- 
renta  mortos  deixou  o  inimigo  no  campo,  alguns 
no  caminho.levando  muitos  feridos.  Recolh^rao^e 
OS  nossos  a  oelebrar  a  victoria,  que  de  todos  foi 
aclaraada  com  excessive  gosto.  Foi  o  primeiro  dia 
de  bonanca  que  depois  de  lao  continuada  tormenta 
DOS  concedeo  a  fortuna ,  e  no  descustume  trouxe 
a  estimacao. 

IV.  Logo  que  Mathias  d' Albuquerque  vio  a  foi^ 
taleta  posta  em  sua  ultima  perfeicao  (com  plata- 
formas,  terrapleuos,  parapeilos,  contra-escarpas, 
cava,  penles,  trincbeiras,  e  estacadas  que  cingiao 
a  forca  e  a  povoacao)  a  guarneceo  de  refor^ada  ar- 
tilharia  de  bronze  e  ferro,  e  de  sufficiente  presidio; 
consignou  os  poslos  a  particulares  cabos ;  e  para 
novos  empregos  criou  novos  capilaes.  Entre  ellea 
nomeou  a  Joao  Fernandes  Vieira  por  capitao  dos 
batedores,  que  de  noite  e  de  dia  haviao  de  assegu- 
rar  o  campo  ;  achou  na  pessoa  todos  os  requisitos 
que  pedia  o  cargo ;  foi  sua  escolha  pronostico  de 
que  o  valor,  a  que  enlao  fiavao  os  moradores  o  se- 
guro,  despois  Ihe  havia  de  metter  em  casa  a  liber- 
dade.  Obrigado  d'esta  mesma  razao  deo  Mathias 
d'Albuquerqne  a  Henrique  Bias  a  gineta  de  capi- 
tao e  cabo  de  muitos  minasecreoulos,  que  com 
animo   intrepido   e  fiel   se  alistirao  para  servir 


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GA8T1I0TO  UmiTAllO*  91 

na  guerra*  Pareoe  que  com  estes  inaignes  capittot 
nod  oontrapesou  o  tempo  insigaes  perdas;  e  bem 
se  pdde  affirmair  que  com  elles  nos  deo  mais  repa* 
taoao  do  que  nos  tirou  de  imperio* 

y.  Vendo  Theodoro  Wadderoburg^  govdmadoir 
das  armas  hoUandezas^  que  nao  pod^ra  tomar  fw 
entrepresa  a  nossa  fortaleza  do  Arraial  i  e  para  im^ 
pedir  que  a  desordem  em  que  Tieiio  seus  soldados 
fosse  em  augmento,  e  acarretasse  maior  dasrentura^ 
tratou  de  se  fortifiear^  nao  sd  por  8eguraii9a^  mas 
para  oocupar  os  soldados,  e  inspirar^lhes  mais  con* 
fian<^«  —  Leyantou  uma  grossa  iriiicheira  por 
fdra  da  poroa^ao  de  Sancto  Antonio  eutre  os  dous 
rios  e  o  mar  com  insupporiavel  trabalho  dos  seus^ 
pela  Haiureia  do  terreno^  Godi  o  me^mo  cuidado 
fortificou  a  villa,  nao  se  dando  por  s^uro  de  nossa 
ousadia^  nem  ainda  onde  seus  feparos  o  tinhao 
mais  guardado.  Infc»*mado  MathiAs  d'Albuquerqua 
dos  movimentos  do  inimigo,  e  de  que  levantaya 
uma  trincheira  n'um  aitio  fronceiro  ao  nosso  Ar-» 
raial,  que  chamao  a  ilha  de  Marcos  Andr^  deoiro 
da  campina  do  Taborda,  ehamou  logo  os  oapitaesi 
deo'lhes  as  ordens,  encareodo^lhes  a  importanoia , 
e  em  18  de  Marco  saio  do  Arraial  Antonio  Ribeiro 
de  Lacarda  com  700  sddados  entre  Portuguezes  ^ 
Minas,  e  Indios  a  desalojio*  o  Flamengo,  e  des« 
fazar  a  trincheira.  EmbuscoU  a  gente,  emandou 
ao  capilao  Francisco  Rebello  (illustre  pelp  diminu** 
iiTO  de  RebeUinho ,  a  quern  as  prensas  fizerao  maior 
que  seu  appellido)  que  com  tinte  soldados  fosse 
provocar  ao  Hollamlez^  a  que  saisse  a  pelejar.  Deo«* 
se  o  Flamengo  por  afrontado  do  atreyimenio,  saio 


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53  GASTRIOTO  LUSlTAlVa 

a  castigar  a  demasia  fiado  nas  vantagens  de  seu 
partido.  Nao  virirao  os  nossos  a  cara  ao  encontro, 
antes  dissimulando  o  intento  ^  se  forao  retiraodo, 
em  ordem  a  metter  o  oontrario  na  emboscada ,  que 
o  inimigo  suspeitou  sobejamente  cauto ,  e  fez  alto 
com  a  sua  gente.  0  Rebellinho ,  que  penetrou  a 
causa ,  correo  a  avancdl-o ,  lao  destemido ,  que  o 
Flamengo ,  cego  da  colera ,  perdeo  da  vista  o  receio; 
e  o  carregou  assim  furioso  que  se  metteo  no  cora- 
cao  do  perigo,  conhecendo  o  erro  a  tempo  que  Ihe 
fffltaya  o  remedio.  Sem  resistencia  se  pos^rao  os 
inimigos  em  fugida,  bastando  aquella  detencai  de 
que  necessitou  a  escoiha  ,  para  deixar  cincoenta 
mortos  no  lugar  da  batalha ,  nao  entrando  neste 
numero  os  que  perdeo  no  alcance,  pers^^uido  dos 
nossos  por  algum  espaco^  e  at^  a  sua  trincheira  de 
oito  mancebos  de  cavallo ,  alanoeando  a  todos  os 
que  alcancavao.  Nao  dizem  nossas  relacoes  em  que 
poder  fic4ra  a  trincheira;  affirmao  que  nos  recolhe- 
roos  com  vinte  seis  feridos,  sem  que  da  nossa  parte 
houvesse  morto. — Nao  era  senhor  o  HoUandez  de 
passar  a  distancia,  que  se  interpoe  entre  a  villa  e  o 
Arrecife,  sem  companhias  de  guarda ;  e  nem  assim 
se  deferideode  nossas  embuscadas.  Em  26  de  Marco 
fizerao  as  sentinellas  aviso  que  o  general  das  armas 
hollandezas ,  acompanhado  d'um  seu  coronel ,  se 
dispunha  a  passar  do  Arrecife  para  a  villa  com 
600  soldados  de  guarda  (ou  por  dec6ro,  ou  por 
medo);  o  que  entendido  por  Mathias  d' Albuquerque 
nomeou  por  cabo  d'algumas  companhias  a  Pascoal 
Pereira  (soldado  de  opiniao) ;  deo-lhe  por  ordem 
que  d  emboscada  esperasse  o  inimigo.  0  successo 


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GASTRIOTO  LUUTAMO.  53 

acreditou  a  escolha.  Sairao  os  nossos  de  emboscada 
com  tanta  disciplina,  e  tanto  a  tempo,  que  desoi^ 
denado  e  roto  o  HoUandez  deo  as  costas  6&  balas; 
uao  bouye  algum.a  quem  se  vissea  cara.  Oprimeiro 
que  no  conflicto  servio  ao  exempio  foi  o  seu  gene- 
ral, eandou  tao  venturoso  que  encarando  neile  o 
capitao  Luiz  Barbalho  uma  clavina,  o  nao  derribou 
o  tiro,  porque  nao  Ibe  tomou  fogo ;  a  unha  de  cavalio 
se  pcz  em  seguro,  levemente  cortado  do  nosso  ferro 
por  um  bombro ,  por&m  muito  roais  cfe  medo, 
debiando  os  seus  no  perigo,  a  que  nao  pod^rao  fugir 
quarenta  e  nove,  que  ficarao  mortos  na  campanha, 
e  muitos  outros  que  perec^ao  no  alcance*  Sem 
conta  foiio  os  que  matirao  os  Indios^  e  as  ondas ; 
por  escaparem  ao  ferro  se  deitirao  &  agua ,  e  nella 
Tiao  que  a  morte  com  dobradas  armas  Ibe  tiraya  a 
?ida.  Recolberao-se  os  nossos  sem  mortonem  ferido, 
com  que  a  victoria  se  applaudio  sem  sangue  ^  e 
sem  enterro  o  triumpho ,  para  cuja  pompa  nao  fal« 
tavao  captivos. 

YL  Desde  esta  occasiao  por  nenbuma  parte  saia 
de  suas  fortificacoes  que  se  naoenredasse  no  la^o  que 
OS  nossos  por  todas  Ibe  tinbao  armado.  Direia  fdrma 
da  situaqao  denossasestancias,  para  que  se  entenda 
como  nossas  armas  o  tinbao  cingido.  Gorrendo  da 
parte  do  norte  para  o  sul,  em  uma  bermida  de 
Sancto  Amaro,  se  aquartellava  Matbias  d' Albu- 
querque Maranbao  com  gente  da  Paraiba ,  que  aco- 
dio  a  servir  na  guerra*  Seguiase  a  estancia  do 
Padre  Manoel  de  Moraes^  que  guarnecia  com  In- 
dios  de  seu  partido  igualmente  disciplinados  na 
religiao  e  nas  armas.  Logo  a  do  Gamarao  com  os  In- 


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6*  CAftTRIOTO  LWStinO. 

dios  de  teu  governo ,  que  erao  todos  aquelles,  com 
que  uestes  priqcipios  se  veio  offerecer  para  servir. 
Pouco  dislante  (icava  a  que  defendia  o  capitao  Es- 
levao  Alvares.  Junto  ao  Buraco  de  San  Tiago  tinha 
ftitu^cio  a  seguinte,  que  presidiava  o  capitao  Luiz 
Barbalho  (era  a  mais  arriscada,  e  fiou-se  ao  capitao 
mais  deatemido).  A  este  modo  continuavao  os  quar- 
teia  peloa  aitios  de  Bd)eribe  e  Seca  encommendados 
a  diversoa  eapitaes ;  dando-se  as  maos  una  aos  ou- 
troa  de  aorle  que  com  facilidade  se  podiao  soccorrer. 
ConsignAraorse  tro^s  de  gente  escolhida  a  dide- 
rentes  cabos  que  por  turno  rondassem  e  descobris- 
•em  as  distancias,  que  se  entrepunhao  entre  uns 
e  outros  quarteis.  Desta  maneira  nao  podiao  deixar 
de  ser  quotidianos  os  assaltos^  que  nao  particular!- 
eamos  pela  semelhanca  dos  suceessos ;  e  sdmente 
faremos  mencao  d'aquelles  encontros,  que  var^ao 
em  algumas  cfrcumstancias. 

VH.  Na  villa  de  Olinda  fez  o  inimigo^  em  16  de 
Manjo,  paga  g^ral  a  todaagenteda  milicia.  Ao  tempo 
que  em  turmas  voltavao  com  o  soldo  que  tinhao 
recebido,  andavao  sessenta  Indios  nossos^  deque 
era  cabo  Joao  Mendes  Fiores,  trabalhando  em  uma 
trincheira  no  sitio  do  Buraco  de  San  Tiago,  Dous 
soMados  Mamelucos,  que  estavao  de  posta  ao  lai^, 
fizerao  aviso  aos  Indios  da  boa  occasiao  com  que 
06  rogava  a  fortuna;  e  animados  com  a  esperanca 
da  presa  derao  sobre  os  Flamengos  com  um  repen- 
tino  assalto  de  vozes  e  cargas,  matando  a  muitos, 
eatordindo  a  todos,  detal  maneira  que,  occupados 
do  pasmo,  nao  tinhao  liberdade  para  a  fugida, 
nem  animo  para  a  defensa.  Oitenta  degolou  o  ferro ; 


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j^auitQS  mais  os  que  atou  o  grilho.  Aproveit^rao-se 
OB  ladios  de  armas,  vestidos,  e  soldo  de  todos, 
{JTSizepdo  diante  de  si  os  captives,  que  seryiiio  de 
crpdito  ^  grandeza  da  victoria,  e  a  fama  do  despojo, 
VIII.  Nao  satisfeitos  os  nossos  de  inquietarem 
oontiauamente  o  inimigo  por  todas  as  paries,  re^ 
solv^rao  a  bufiedLo  deatio  de  suas  fortifica^oes. 
Ceroa va  uma  grossa  trincheira  a  povoa^o  de  Sancto 
Antonio  (a que  chao)i&rao  cidade  de  Mauricda), 
a  qual,  assim  pda  fdnna  como  pela  gaamicao,  era 
o  fiador  de  toda  a  confiauca  inimiga.  Esta  determi* 
Dir^o  OS  nossos  investir  e  ganhar ;  e  arraaada  con- 
duzar-lhe  a  artelharia ,  que  era  muita  e  grossa, 
para  o  nosso  ArraiaL  Fiou  o  general  a  empresa  a 
Antonio  Ribeiro  de  Lacerda,  o  qual  aoompaabado 
d  outros  eapitaes  e  mil  soldados,  entre  Porluguesep 
p  Indios,  saio  do  Arraial  em  25  de  Maroo,  pela 
meia  noite.  Marchou  a  gente  sem  rumor  at^  perto 
da  trindieira,  onde  a  repartio  em  tres  tro^os  para 
inveslir  a  um  mesmo  tempo  por  tres  paries.  Dado 
signal  avancou  Luiz  Barbalho  i  trinchetra  pela 
frente ,  que  ganhou  com  leve  resistencia ;  entrou 
na  povoacao ,  onde  nao  fikx>u  oasa  forte  que  nao  in- 
Tesdsse ,  nem  topou  contrario  que  nao  rendesse. 
0  oapitao  Manoel  da  Franca,  que  com  um  segundo 
terco  commetteo  a  trincheira  por  um  lado,  a  subio, 
e  rompeo  a  defensa  com  facilidade.  Nao  houve 
inimigo  que  o  parecesse,  nem  que  esperasse  golpe; 
todos  fugiao  ao  perigo ,  tao  desatinados  que  nelle 
buscavao  o  rem^o ;  entregavao  as  vidas  ao  pego , 
onde  juntamente  achavao  a  morte  e  o  sepulcro. 
Era  c  terceiro  esquadrao  o  mais  grosso  :  com  elle 


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56  GA8TBI0T0  LUSITAHO. 

passou  Antonio  Ribeiro  de  Lacerda  o  rio^  e  por 
fbra  da  trincheira  comroetteo  a  povoacao ,  na  qual 
Ires  batalhas  form^rao  urn  conflicto.  Nao  achava 
para  onde  fugir  a  vida ,  porque  em  toda  a  parte 
encontrava  um  mesmo  ferro ;  o  escuro  da  noite 
nao  deixava  distinguir  amigos  de  contrarios,  nem 
o  furor  oppostos  de  rendidos.  A  nenhum  sexo  nem 
idade  perdoa^a  a  espada ;  a  muitos  matavao  junta- 
mente  a  espada  e  o  chumbo ;  ja  nao  achava  o  nosso 
pulso  a  quem  veneer,  senao  a  quern  ferir.  A  bra^os 
veio  um  capitao  hoUandez  com  o  Rebellinho,  e  es«* 
pirou  apertado  de  seus  bracos  o  HoUandez.  Nas 
casaS|  e  nas  ruas  achavao  os  miseraveis  rendidos 
uma  mesma  fortuna ;  era  tanta  a  confusao,  ajudada 
do  estrondo  das  armas,  das  vozes^  e  da  aflliccao, 
que  se  tinha  por  bem  afortunado  o  que  podia  com 
a  vida  dar  fim  ao  medo.  A  artelharia  da  trincheira^ 
asssesiada  pelos  nossos  com  pontaria  para  as  casas 
da  povoacao ,  foi  sen  maior  estrago.  Achavao  os 
nossos  na  presenca  dos  aggressores  vivas  as  memo- 
rias  da  perda  e  da  injuria ;  e  o  desejo  da  vinganca 
OS  nao  deixava  lembrar  da  clemencia* 

IX.  Tudo  is  to  se  passou  antes  de  ser  manha,  e 
que  foi  de  grande  embaraco  para  os  nossos,  porque 
nao  podiao  distinguir  amigos  de  inimigos ,  como 
aconteceo  aos  capitaes  Rebellinho  e  Luiz  Barbalho , 
que  achando-s^  cada  um  d'elles  na  extremidade  d'u- 
ma  mesma  rua,  e  caminhando  a  topar-se,  presu- 
mirao  que  era  soccorro  que  viuha  ao  Hollandez,  e 
esfriirao  no  ataque  temendo-se  um  ao  outro.  Meste 
ponto  deo-se  rebate  do  assalto  no  Arrecife,  e  assim 
d'elle  como  d'algumas  n^os  ^  que  estavao  no  porto^ 


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GA8T110T0  UJSITAlfa  57 

86  *disparou  muita  artelharia  sobre  a  povoa^ao,  com 
que  a  nossa  genie  se  confirmou  no  errado  conceito 
que  6zera.  D'uma  e  outra  parte  se  appellidou  a 
gritos  a  retirada  y  fugindo  todos  d'umas  mesmas 
armas,  com  aquella  confusao  e  desordem  que  se  vA 
em  quem  foge  de  sua  propria  sombra.  Cobrou-se  o 
Flamengo  da  trincheira ;  e  as  bakis  de  sua  artelharia 
nos  forao  perseguindo  ate  o  ultimo  alcance.  Nelle 
perdeo  a  vida  o  tenente  general  Pedro  Femandes 
Ferrete ;  e  uma  perna  o  cabo  d'esta  empresa  Anto- 
nio Ribeiro  de  Lacerda ;  goipe  de  que  morreo  ao 
outro  dia.  Deix^mos  no  campo  onze  mortos ,  oito 
PortuguezeSy  e  tres  Indios ,  e  nos  recolhemos  com 
dez  feridos.  -—  Escarmentado  o  HoUandez  com 
este  successo,  tratou  de  acautelkr^se  para  o  fu- 
turo :  engrossou  os  presidios,  dobrou  as  sentinellas, 
mandou  com  graves  penas ,  que  da  villa  para  o 
Arrecife,  nem  do  Arrecife  para  a  villa,  nao  saTsse 
pessoa  alguma»  senao  nas  occasioes  que  podesse 
ser  defendida  das  companhias  que  entravao  e  saiao 
de  guarda ;  e  que  as  taes  pessoas  passassem  encor- 
poradas  nas  fileidas  dos  soldados.  Ordenou  que  as 
ditas  companhias  se  nao  movessem  de  um  lugar 
para  outro,  sem  primeiro  fezerem  algum  signal  ^s 
fortalezas  para  que  tivessem  a  artelharia  prompta 
a  favorecer  os  sens  em  toda  a  oecasiao  e  tempo. 
Util  era  a  preven^ao ,  se  a  dor  se  sujeit^ra  ^s  leis 
da  cautella. 

X.  De  uma  trincheira  nossa^  que  escondiao  as 
matasy  fazia  o  capitaoLuiz  Barbalhaconsideravel 
damno  ao  inimigo ;  o  qual,  vindo  no  conhecimento 
da  causa,  acceso  em  ira  saio  em  diade  SaoLouren^o, 


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^t  GAiTBiQTO  lUaiTAHa 

10  d'Agostoy  com  todo  o  poder,  e  det^rmiaado  a 
arra^ar  a  trlQcheira,  e  degolar  o  presidio  sem  dar 
quart^l  a  vivente.  Paasou  o  rio  na  vasante  da  mar^, 
antes  de  romper  a  manha  marchou  sem  rumor,  e 
deo  sobi^e  a  triBcheira,  onde  Luiz  Barbalho,  avisado 
da9  Sfuatinellas ,  o  esperou  com  doze  companheiros 
(  succedeo  nao  ter  mais  soldados  eomsigo  )  com 
tanto  depenfado^  como  te  tivera  igual  parddo. 
])eoe  recebeo  cargas,  oppondo^se  a  desigualdade 
ila  sorte  &  do  numero.  -**  Temeo  Luiz  Barbalho  j 
2^0  o  combate,  senao  adura9ao  do  conflicto;  man- 
dou  pedir  soecorro  ao  Arraial ,  e  foi-se  retirando 
cpm  oa  ^eus  para  outra  trineheira,  que  tinha  Hiais 
pelo  ipteHor  do  mato ;  mas  com  tal  arte  e  disci- 
ciplina,  que  nao  deo  lugar  a  que  o  Fiamengo  visse 
0  Umitado  poder  que  tinha  ^  nem  que  a  largava. 
Vendo  o  inimigo  desamparada  a  trineheira,  sobio 
t  ^HjfL  y  e  a  arrazou  sem  demora ;  e  como  receasse 
qil9  o  soecorro  nao  podia  faltar  aos  nossos,  fez-se 
de  volta  para  a  outra  parte  do  rio ,  a  onde  coberto 
doscumuios  de  area,  que  por  aili  faz  a  praia,  deo  al- 
gumas  eargas  A  notsa  gente  y  que  j^  entao  vinha 
fm  seu  alcance^  e  ^s  quaes  respondeo  a  peito  des- 
coberto,  Fazia  a  distancia  inutil  a  opposieao,  e  pa- 
receo  a  todos  coaveaiente  a  retirada. 

XI,  Apertado  da  necessidade  determinou  o  ini- 
migo armar-nos  uma  cilada ,  na  qual  perecesse  a 
nossa  gente.  Embuscou  a  maior  parte  dos  seus; 
e  oom  o  restante  saio  a  uma  campina  que  cingiao 
algumas  estancias  nossas ;  derao  as  sentinellas  re- 
bate nas  trincheiras  e  no  Arraial ,  donde  Mathias 
d' Albuquerque  despedio  com  incrivel  presteza  os 


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rapitim  Stnctos  da  Costa,  Roque  de  Barron  Rego, 
Miguel  d'Ahreu,  e  outros  em  aoceorro  daa  A066as 
efitancias.  Marchlrao  as  companhias  a  atiatar  o 
inimiflo,  que  astuto  ti>eou  a  retirar,  para  que  aeu 
•apparente  receio  noB  leyaase  de  corrida  ao  laca 
Conhec^rao  08  Doaaos  o  ardil ;  mas  coaio  quiieaaem 
moatrar  sua  ousadia  adiantirao^ae  dous  eapiiaett 
naia  do  que  deviao ;  uni  doa  quaes  (Barros)  ferido 
d'uma  bala  n'uma  coixa  dec  n  um  lamteal  oade 
caio ,  e  a6  deveo  a  Tida  ao  valor  da  a^u  alferea ,  e 
d'uitt  eabo  d'esquadra  da  sua  eompauhia ;  ^  o  outro 
(Sanoloa  da  Ckiata)  accoDnpauhado  de  aeu  alferes 
fbrao  entrogar  as  vidaa  a  duas  bakis,  oem  mais 
▼alentia  que  prudancia  ^  e  aem  niais  outro  fim  que 
a  Yaidade  de  perd^kta.  Nao  hou?e  da  aeasa  parte 
outra  perda ;  eou  muila  de  morios  e  fcaridos  sa  re- 
eolheo  o  iaimigo. 

XII.  Pensou  o  Hollander  que  mudando  de  sitio 
melfaoraria  de  for  tuna.  £m  "16  de  Outubro  deitou 
SAn  MO  inftmtes  e  quatone  batedopea  de  eatallo,  na 
iuten^  de  gankar-noa  a  trincheira  do  rio  Doee, 
o  que  Ihe  parecia  facil  por  nos  fioar  longe  do  soo- 
eorro.  Estava  n  dla  por  eapitao  Simao  de  Figuei- 
redo  (  que  depoia  se  ordenou  de  saeerdote,  e  fez 
grandias  6aryi9oa  &  igreja  e^i  ootoa ,  usando  coai 
igual  destresa  d'um  e  d'outro  bra^o);  saio  da  triu- 
eheira^  ao  rebate  das  seotmdifais,  oom  quarenta  sol- 
dados,  OS  quaes  forao  bastantas  para  repellir  o  Fla- 
mengo ;  o  qual  vendo-sa  ingauadoem  sua  esperanca, 
virou  as  coatas  sem  resiatir,  e  foi  perseguido  pelos 
Boasos  aC^  entrar  na  vilk  com  grande  perda  de 
mortoa  e  feridos* 


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•0  €A8TBKm>  LUSITANa 

XIII •  Em  21  do  mesmo  mez  sale  o  inimigo  do 
Arrecife  com  muita  copia  de  soldados ;  passou  o 
rio  de  baixamar,  e  marckou  sem  ser  sentido  at^ 
um  lugar^  em  que  alguns  capitaes  nossos  assisliao 
i  fabrica  d'uma  Irincheira.  Retirou-os  da  obra  o 
repentinoassalto.  Approveitou-seoFlamengo  d*esUi 
cii*cum$tancia,  e  comecou  a  toda  a  pressa  a  arrazar 
a  irincheira ;  mas  acudindo  logo  os  nossos,  refor- 
cados  pek)  capitao  Luiz  Barbalho,  o  ferirao  tao  for*- 
temente ,  que  o  obrig^rao  a  fugir  sem  outro  acordo 
mais ,  que  o  de  levar  a  rastro  grande  nuraero  de 
eorpos  mortos. — Ceusas  em  tudo  simiUiantesoccu- 
pAiio  umas  e  outras  armas  todo  o  restante  d'este 
anno  de  1 630.  Em  quasi  todos  osdias  havia  pelejas, 
cujos  successos  em  pouco  diversiiic^rao ,  achando- 
nos  o  inimigo  sempre  promptos  para  a  defensa  e 
para  a  vinganca.  Mao  houve  occasiao  em  que  nos 
provocasse  atrevido ,  de  que  nao  saisse  castigado. 

XIV.  Oocupado  Pernambuco  pdo  Hollandez  em 
16  de  Fevereiro,  logo  no  meiado  de  Marco  se  es- 
palhou  um  rumor  vago,  que.o  dizia  amedo,  al^ 
que  no  principio  d*Abril  se  confirmou  a  nova ;  e 
para  crescer  a  magoa  se  recebeo  a  noticia  da  mao 
de  quem  tinhamos  recebido  o  aggravo.  A  todos  las* 
timava  o  successo,  porque  a  naihum  deixou  de 
ferir  o  golpe.  Os  bomens  de  negocio  s^itiao  a  que- 
bra  do  commercio ;  os  do  governo,  a  da  reputa9ao; 
OS  do  poYO,  a  do  socego ;  os  da  guerra,  a  do  ocio ; 
e  todos,  a  do  Estado. — Tratou-se  do  remedlo; 
consult^rao^^se  os  tribunaes;  e  tomou-se  por  ex- 
pediente  que  uma  guerra  lenta  era  o  unico  meio 
possivel  de  restaurar  aquelie  Estado,  visto  acbar-se 


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OAflTUOTO  LUMTAMa  01 

a  monarchia  exhausta  de  tudo  o  necessario  para 
intentar  outro  genero  de  guerra.  Esta  resolucao 
mais  se  confirmou  quando  se  soube  da  opposicao 
que  OS  naturaes  come^avao  a  fazer  ao  Hollandez. 
—  Nao  fez  tanta  impressao  em  Madrid  a  nova 
como  (izera  em  Lisboa ,  porque  nao  era  tao  grande 
o  interesse  que  tinhao  os  Castelhanos  na  conser- 
vacao  d'um  Estado,  que  86  era  seu  para  o  util,  nao 
para  o  glorioso.  Todavia  nao  pod^rao  esquivar-se 
a  anuir  ao8  pareceres  que  vinhao  de  Lisboa  acorn- 
panhados  de  queixas  de  clamores.  Tinha  El  Rei 
Philippe  nomeado  oalmirantc  real  D.  Antonio  de 
Oquendo ,  para  conduzir  &$  Indias  a  frota  de  gaU 
lioes ;  e  se  Ihe  ordenou  qne  de  caminho  tomasse  a 
altnra  da  Bahia,  oilde  acharia  noticias  certas  do 
esiado  em  qne  seachavao  as  cousas  de  Pemambuco, 
para  que  confbrmando-se  com  elle^  deilasse  no 
porto  mais  seguro  o  mestre  de  campo  Joao  Vicen- 
cio  Sao  Pheliche  com  o  seu  tereo  ilaliano,  ]e  algu- 
mas  oompanhias  de  Portuguezes ,  e  aqnellas  armas 
e  muni^oes  que  parecessem  necessarias  para  a  con- 
tinuacao  dos  progressos,  que  promettiao  os  ielizes 
principios  d'aquella  gnerra.  Tambem  se  mandou, 
que  na  mesma  conserva  fosse  Duarte  d'Albu- 
querque,  govemador  e  senhor  donatario  d'aquella 
eapitania ;  soccorro  de  que  se  e speravao  grandes 
effeitos ,  porque  se  entendia ,  que  com  elle  se  aug- 
menlava  nossa  genie  em  animo ,  e  em  numero ; 
mas  succedeo  bem  ao  contrario  y  e  ao  diante  se  ver^ 
como  nelle  diegou  a  Pemambuco  nossa  total  ruina. 
XV.  Em  quanto  em  Portugal  e  Hespanha  se  pre- 
parava  lenCamente  o  soooorro  destinado  a  Pernam- 


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•1  GAimom  UMTAM. 

bttco;  continutTa  oHcdlahdez  suafcexcursoestinto 
mais  repetidas  quanto  mais  creacia  em  seu  campo 
a  fome.  A  uma  legoa  da  villa  de  Olinda  €8ta  aquelk 
$ilio  a  que  chaoiao  as  Olarias  ^  terreno  abundante 
d'unaa  fruta  conhecida  entre  o8  naturaes  pelonooae 
de  cajus.  Apertados  da  fome  resoW^rao  algiina  sair 
da  villa  furtivamente  a  colher  algumaa  vezes  da  ao^ 
bredita  fruta  ^  por  remedio  e  por  refreacOi  A  boa 
sorte  dos  primeiros  augmenlou  o  numero  doa  se- 
gimdos  ^  e  estes  facilitarao  aos  terceiroa.  Nao  ae 
pode  encobrir  a  coatinua^ao  i  yigilaneia  de  ndaaaa 
aentinellas,  de  que  logo  fizerao  aviso  a  Maihias  d'Al*- 
buquerque^  pedindo-lhe  genie  para  tomar  ^a  maoa 
o  iuimigo  f  sem  que  algum  Ihe  fugisse  d'ellas*  l^o 
dia  7  de  Janeiro  de  1G31  despedio  o  general  300 
Portugueses  e  80  Indies  oom  seus  capitaes,  e  por 
cabo  o  capitao  Pedro  Teixeira ,  e  todos  as  ordens  de 
Mathias  d'Albuquerque  Maranhao ;  o  qqal  em  lu« 
gares  convenientes  as  mandou  embuscar  antea 
d'aoianbecer*  Pelas  oito  boras  do  dia  chegarao  300 
HollaAdezes  em  duas  tropas;  largarao  as  armas 
para  colberem  a  fruia ,  com  aquella  deaatten^ao  a 
que  OS  obrigava  a  fome ;  romp6rao  os  nossos  das 
emboscadasy  derao  sobre  elles  sem  piedade  nem  re^ 
sistencia  :  nao  ibea  deijtou  o  assalto ,  nem  cora^ao 
para  a  defensa  ^  nem  acordo  para  a  fuga.  Ficarao 
no  campo  morios  1 48 ;  muitos  dos  feridos  busca- 
rao  no  mato  a  vida  y  e  ^6  aobarao  a  sepultura.  Aos 
remanecentesi  que  era  bem  pequeno  numero^  to* 
rao  seguindo  e  matando,  at^  as  portas  da  villa,  qua* 
tro  nossoi  de  cavalb,  a  onde  chegarao  tao  poucos  que 
OS  vioo  inimigo  como  correioa  e  nao  como  soldados. 


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QAfTuero  UBnmk  M 

>  XVI*  Vendo  o  inimigo  a  cmtadia  e  o  bom  sim^ 
ce86o  dps  noaeoB^  tetneroso  de  que  nossas  armaa  ftw 
8ein  um  dia  bater  as  porlas-  de  suas  fortiGaacoes  ^ 
oao  se  contentou  em  cercar  ao  largo  suas  jnra^s  ^ 
^{uarteis  e  trincheiras  de  robustas  eslaoadas  de  p6o 
a  pique^  mas  resolveo-se  a  levantar  umagrossa  trin^ 
eheira  a'uma  reatinga  d'areia,  que  ebamao  a  Seca 
por  onde  temia  aer  assallado  do8  notsos.  Em  3  de 
Fevereiro  saio  com  todo  o  cabedal  de  official,  sol- 
dados  ,  engenheiros,  e  gastadores  oarregadoa  d'arte^ 
Iharia^  muDicoes^  fachiuas^  madeiras,  eiDstramen^ 
tosservk;  pozmao  a  obra^  e  cresoeo  de  maneira 
que  primeiro  servio  aos  seus  de  defeosa  que  ao9 
IIOS808  de  rebate^  Ao  toque  d'este  satrao  os  oapitaea 
das  estancias  yizinhas^  e  depois  os  soldados  do  Aru 
raial  com  Mathias  d' Albuquerque :  era  seu  iutenld 
investir  denodadamente  o  inimigo;  mas  vendo  o 
general  quao  arriscada  era  a  impresapela  qualidadd 
alagadi^a  do  (erreno,  mandou  ao  capitao  Francisco 
M onteiro  Bezerra  que  com  60  soldados  Ihe  tomasse 
0  pulso.  Avan9ou  esle  yalorosamente  at^  chegar 
^s  alagadi^os ,  mas  reconbeoendo  por  expeiiencia 
a  temeridade  da  empress  j  desistio  d'ella  soffir^ndo 
alguma  perda  de  mortos  e  feridos^  entrando  em  o 
numero  d'estes  o  capitao  Monteiro  em  um  braco , 
e  o  tenente  de  Luiz  Barbalho  em  uma  verilba^  Re- 
tirados  os  nos9os>  continuou  -o  inimigo  com  a  obra^ 
e  naquelle  sitio  fabricou  depois  uma  das  melhores 
for9as  de  sua  circumvalla^aot 

XYII.  Gonvenoido  o  Hollandez  que  nao  podia 
pOr  terra  esiender  o  seu  dominio^  tentou  fazAt-o 
por  mar^  e  foi  seu  alvo  a  ilha  de  Itamarac4  ^  em 


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M  GASTAlOf 0  LfJSTTAlfO. 

cuja  oonquista  pondeniva  que  Ihe  nao  poderia  a 
fortuna  tirar  das  loaos  o  roubo ,  quando  Ihe  nao 
d^sae  o  senhorio,  Dispoz  todos  os  nieios ,  que  en« 
teudeo  o  podiao  conduzir  a  este  fim ;  saio  do  Arre- 
cife  em  22  d'Abril  com  todos  os  soldados,  que  podi^ 
escusar  nos  presidios;  e  embarcados  em  grande 
numero  de  y^las ,  descobrio  seu  intenio  mandando 
emproar  a  iiha  de  Itamaraca^  a  qual  cercou  com  to- 
das  suas  embarcacoes ;  para  que  d'ellas  a  um  meamo 
tempo  saltasse  g^ite  em  terra  por  diversas  partes. 
Govemava  a  ilha  o  capitao  Salvador  Pinheiro^  sol-> 
dado  valoroso  e  pratico,  que  com  sua  gente  soube 
rebater  de  sorte  o  Flamengo ,  que  por  naihuma 
parte  buscou  alojamento  que  nao  achasse  sepulcro. 
Retirou-se  o  Hollandez,  sem  que  da  ilha  adquirisse 
nem  saco  nem  dominio.  Satisfez-se  com  fabricar 
na  barra  uma  forea,  a  que  chamou  de  Orange^ 
d'onde  os  seus  nao  sairao  vez  alguma  a  inquietar  os 
maradores  que  nao  voltassem  castigados  e  arrepen- 
didos. 

XVIII.  Ficava  de  fronte  d'esta  fortaleza  ^  e  pouco 
distante  (na  terra  firme)  a  nossa  villa  de  Iguaracu, 
igualmente  falta  de  viziiihos  e  de  defimsa,  e  porque 
a  facilidade  da  entrepresa  nao  d^sse  occasiao  a  con- 
fianca  do  inimigo  vizinho  e  pirata  se  mandou  for- 
liGcar  no  modo  possivel ,  e  guamecer  d'algumas 
companhias,  com  ordem  aos  capitaes  que  a  defen- 
dessem ,  e  cortassem  o  passo  ao  inimigo ,  em  caso 
que  intentasse  penetrar  o  certao  da  terra  firme. 

XIX.  Via  o  inimigo  diminuirem-se  todos  os 
dias  suas  forcas ,  cortadas  do  nosso  ferro ;  conhecia 
a  difficuklade  de  receber  soccorro ,  tinha  aviso  que 


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GAfiTMOIO  VnBKOMCk  M 

D.  AjKtofiio  de  Oquendo  era  passado  com  armada 
para  a  fiahia,  e  a  cada  hora  o  imagioaya  no  porCo ; 
e  conaiderando  em  fim  que  quanto  mais  eapaUiada 
tivesse  ma  gente,  mais  facii  seria  aos:  noaaoe  vtsa^ 
4^I-a,  deliberou«-se  em  largar  a  villa ,  e  incorporar  o 
poder  deatro  das  fortificacoes  do  Arrecife.  —  Gomo 
sagaz  desejavacapear  a  necessidadecom  o  des{Nrezo, 
e  a  fraqueza  com  a  negocia^.  Mandou  um  e(i^ 
yimIo  a  Mathias  d' Albuquerque,  iuatruido  no  que 
havia  de  faa^r  e  dizer  :  signiGcou  com  destresa  a 
barbaridade  do$  soldados  que  tumultuosos  reque«» 
riao  ao  general  boUandez  Ibea  permittisde  por  fogo 
a  villa  y  e  nao  deixar  nella  pedra  sobre  pedra ; 
cousa  que  elle  general  por  nenhun^  via  pod^ra 
disuadir,  obrigado  a  estorvar  aceao  tao  Ceia,  e  a 
lastimar-se  dever  entregar  ao  fogo  tao  nobres  e  an-- 
tigas  fabrica&  de  t^nplos  e  casas,  como  tinha  le- 
vantado  a  reUgiao  e  a  grandeza ;  e  que  Ihe  affirm 
mava  desejava  ter  cabedal  para  comprar  a  salva«* 
9ao  de  lugar  iao  lustroso;  que  se  sua  senboria  o 
quizesse  resgatar  do  incendio,  fizesse  aos  amoiina- 
dos  um  donativo  de  caixas  d'assucar,  que  elle  se 
obrigava  a  roubal-as,  e  a  entregar-lhe  pm  este  meio 
a  povoa^ao  inteira  pella  escusar  de  tao  lastimosa 
ruina.  —  Ouvio-se  a  embaixada,  e  assim  como  sen 
dila9ao  se  penetrou  o  artificio,  assim  sem  detensa  se 
respondeo  a  tencao.  Foi  dito  que  Mathias  d' Albu- 
querque Ibe  fallara  nesta  forma  :  «  Os  Portuguezes 
»  com  as  armas  na  mao  nao  comprao,  conquistao ; 
»  sabem  dar  cargas  de  balas,  a  nao  de  caixas;  as 
«>  marciaes  os  alvoroqao ,  desprezao  as  que  os  em^ 
)»  bara^ao.  As  ehagas  que  nelles  abre  o  aggravo  nao 
I.  5 


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I)  66  curio  com  aMucar,  seiiao  com  polToraj  com 
D  ininiigos  em  que  falta  a  f^  sao  estavcia  os  cotttr%- 
u  toi  que  finna  o  aaogue :  e  de  ncnhuma  firmeza 
M  oa  que  affianca  a  palavra.  Aconselbaria  eu 
»>  aoa^hor  general  Theodora  Wandemburg,  que 
»  aao  gastaase  a  roagoa  em  se  doer  do  eatrago  de 
i)  noaaos  ediBoios,  porque  aei  que  toda  Ihe  sera  ue* 
»  cesaaria  para  se  laatimar  do  destroco  de  sous  soU 
a  dadoB ;  e  quando  o  medo  oa  adiante  a  queimar 
»  a  villa,  animo  e  cabedal  tem  os  moradores  pwra 
»  a  reedificarem  com  tantas  ventagens,  que  as  me^ 
D  Ikoraa  os  enainem  a  julgar  por  beneficio  a  ruina^ 
p  porque  deaejao  deixar  na  cabe^a  d'eata  capitauia 
n  uma  memoria  em  que  apezar  do  tempo  leao  as 
a  idades  oa  caatigoa  de  HoUanda,  e  os  triumphos  de 
»  Portugal.  )} 

XX.  Nao  achou  o  enviado  a  reapoata  tao  dooe 
eomo  imaginava;  voltou  com  preateza,  e  com  a 
mesma  mandou  o  general  hollandez  p6r  fogo  4  villa. 
Considerava  na  presen9a  do  ameaco  a  vizinhan^a 
do  golpe.  Ordenou  ao  presidio ,  que  ateado  o  fogo 
ae  retiraase  para  o  Arredfe,  porque  o  rebate  do  in- 
eendio  Ihes  n&o  pravenisae  o  castigo  do  damno. 
Pordm  nao  bastou  a  promptidao  da  obediencia  para 
OB  livrar  da  noesa  vigilancia.  De  uma  embuscada 
oa  aasaltirao  nossaa  armas  tatito  mais  formidaveis, 
quanto  a  occasiao  Ih'as  representava  maiscolericas; 
muita  gente  Ihes  matou  e  ferio  o  avanco  eo  alcance; 
e  muita  mais  perec^ra,  se  a  maior  parte  dos  nossos 
nao  acudira  a  apagar  o  fogo ,  que  apoderado  dos 
materiaes  que  achou  dispostos^  pela  industria  e 
pelo  tempo^  servio  a  lastima^  sem  dar  lugar  i  diiigen- 


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CAStHlorro  ttBltATO.  t1 

cia.  Ardeo  em  breve  espaco  aquella  povoacio  tad 
celdbrada  pelo  commercio  como  ennobrecida  pelos 
edificios,  sem  que  de  todm  se  isentasse  das  ichatiiad 
mais  que  uma  easa  ten  ea ,  que  rcserrou  a  totle 
para  memoria  da  penda  :  succedeo  em  25  de  No- 
▼embro  de  1631.  Nao  andavao  menos  accesas  ad 
hostilidades  no  mar  que  Da  terra ;  em  uma  e  xy\x^ 
tra  parte  ardia  o  furor  e  a  vinganca. 

XXI.  Saira  da  Bahia  D.  Antonio  Oqutendo  Com 
a  frota  deCastella^  que  conduzia  para  as  Indian ,  ^ 
nella  encorporado  o  soccorro  que  bavia  de  enea-^- 
minhar  a  Pernambuco,  em  cuja  altura  o  achou  o 
-  Septembro  d'este  mesmo  anno ,  de  tiagem  para  a 
Bahia*  Nao  dormia  o  Flamengo  sobre  os  avisoA 
(multiplicadod  e  certos)  que  linha  de  tudo  quantd 
em  Hespanha  se  detenhinara.  Apresdou  sua  ar- 
mada com  o  maior  numero  de  r^las ,  sdldados  e 
artelharia  que  Ihe  foi  possirel ;  fiou  o  gOTcrno  e 
succeaso  d*eUa  a  um  pmtico  e  valente  eabo  por 
nomtd  Adriao  Patres^  a  quem  as  victorias  ganh6ra6 
opiniao  de  bem  afortunado.  Acreditou  a  escolha 
com  a  promesBa  de  morrer  ou  veneer,  Chegou  a  oo- 
casiaOy  investirao  as  armadas  comigual  l\iror,apro- 
veitando-se  de  tudo  quanto  podia  a  forca ,  e  alcan- 
cava  a  industria.  Em  breve  espaco  vestirao  os  ele^ 
mentds  as  cores  do  conflicto,  de  sorte  que  com  o 
estrondoda  artelharia  estremeceo  o  pego;  no  fumo 
da  polvora  se  amortalhou  o  ar;  nao  descancava  de 
fiisillar  o  fogo ;  e  de  uma  e  outra  vista  bebia  hor- 
rores  aterra.  Particularidades  houve  nesta  batalha 
dignas  de  se  perpetuarem  na  voz  do  applauso,  que 
por  restitiiicao  aquella  idade  deve  litrar  minha 


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$g  CASTRIOTO  WJftlTAlW). 

penna  do  esquecimento.  —  Atracou  a  capitania 
hespanhola  a  hoUandeza ;  era  esU  mais  alterosa,  e 
com  esta  vantagem  pelejava  com  melhor  partido. 
No  mais  vivo  do  combale  se  vio  aquella  conheci- 
damente  arriscada,  porque  a  abordou  pelo  outro 
lado  outra  nao  flamenga.  Conheceo  o  perigo  Cosme 
do  Couto,  Portuguez  de  na^ao,  e  capitao  de  mar  e 
guerra  d'um  navio  de  pequena  sorte  entre  todos  os 
da  esquadra  hespanhola ,  buscou  a  capitania  con- 
traria,e  Ihe  lancou  dentro  toda  a  gente  que  tinha, 
sem  reparar  no  perigo  de  seu  navio ,  que  sujeito 
as  proas  das  duas  capitanias  o  mettftrao  a  pique. 
Salvou-se  o  valeroso  Portuguez  a  nado  com  im- 
mortal gloria  de  intentar  e  conseguir  o  que  de 
nenhum  outro  podera  cantar  a  fama.  Esta  proeza 
Ihe  alcancou  o  posto  d'almirante,  e  tima  com- 
menda  de  pequeno  lote.— Livre  a  nossa  capitania 
da  oppressao,  ditosamente  castigou  o  atrevimento ; 
com  uma  bala  desarvorou  a  capitania  hoUandeza ; 
com  outra  Ihe  metteo  um  panno  breado  por  aquella 
parte  do  costado  que  correspondia  ao  paiol  da  pol- 
vora ;  deo  signal  o  fumo  do  lugar  onde  se  ateava  o 
fogo ;'  conheceo  o  Patres  a  certeza  do  perigo,  en- 
volveo-se  no  estandarte  general  dos  Eslados ,  e 
amortalhado  na  honra  se  sepultou  vivo  nas  ondas. 
—  Abrazou-se  a  capitania  hoUandeza ,  e  com  eUa 
quasi  toda  a  guarnicao  que  trazia.Aalgunsque  se 
pod^rao  deitar  k  agua  recolhferao  os  nossos  com 
vida  e  liberdade.  ik  neste  tempo  tinha  o  Flamengo 
perdido  tres  fragatas,  que  a  nossa  artelharia  Ihe 
metteo  a  pique ;  as  restantes ,  al6m  de  desMrocadas 
^  coin  muita  gente  morta  e  ferida^  buscarao  to- 


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GA8TR10T0  LUSITANO. 


(ias  o  amparo  do  Arrecife,  como  Ihes  foi  possivel. 
XXII.  Grande  foi  a  victoria ,  e  grande  o  custo  : 
duas  naos  de  Hespanha ,  uma  d'ellas  a  almirante  ^ 
consumio  o  fogo  e  o  mar;  muitas  desapparelharao 
as  balas;  os  feridos  forao  muitos,  e  os  mortos  nao 
poucos ;  entre  elles  se  fez  senlida  a  perda  do  ca- 
pitao  Yalencilha ,  conhecido  de  todos  pelo  nome  e 
pelas  occasioes  dos  Gastelhanos.  Para  reparar  a  ar- 
mada tomou  D.  Antonio  de  Oquendo  o  porto  que 
chamao  da  Bahia  da  Traicao ,  a  onde  se  refez  de 
tudo  o  necessario  em  breve  (empo^  e  continuou 
Bua  derroia  para  as  Indias  de  Castella,  como  trazia 
por  regimen  to.  Com  festiyas  cargas  d'artelharia  ce« 
kbrarao  os  nossos  capitaes  a  victoria;  com  diffe- 
rente  motivo  as  deo  o  Flamengo.  Ao  tempo  que  as 
duas  armadas  entrarao  no  conflicto  se  desencor- 
poro^  da  nossa  o  soccorro  destinado  para  Pemam- 
buco,  com  ordem  que  tomasse  o  porto  mais  conye- 
niente  e  mais  seguro  d'aquella  capitania.  Uma  e 
outra  condi^ao  acb^rao  na  barra  do  Rio  Grande^  a 
onde  desembardirao  Duarte  d'Albuquerque  e  o 
conde  de  BanhoUo  com  toda  a  infamtaria  italiana  e 
portugueza,  armas,  muni9oes,  artelharia,  manti- 
mentos ,  e  fazendas  que  levavao  de  Portugal  por 
conta  d'El  Rei  e  de  particulares ;  o  que  tudo  se  com- 
boiou  logo  para  o  nosso  Arraial ,  a  onde  os  cabos 
forao  recdindos  com  agasalho  de  auxiliares,  e  res- 
peitos  de  superiores.  —  Alojou-se  o  conde  de  Ba- 
nhoUo em  quartel  apartado  com  a  gente  de  sen  terco ; 
Duarte  d' Albuquerque  ^  com  sen  irmao  Matbias 
d' Albuquerque.  Separa^ao  que  involveo  em  si  a 
doB  aiiimos,  e  apartou  de  nds  toda  a  felicidade  dos 


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70  GAsma?o  irarrAiia 

siicce880$.  Favorecia  cada  qual  a  geDte  de  ana  oooi* 
paahia»  lem  fazerem  caso  dos  aolclados  mora- 
^orea^  que  com  tanto  valor  e  risco  linhao  servido } 
o  que  Ihes  iospiraya  graude  deacontentamealo  e  de6-< 
Qonfiau9a,  e  causou  graude  damno  aoa  B^soaoa  ca-i 
pjitaes.  Viao  desprezada  sua  fidelidade,  eacurecido 
aeu  valor^  eaqu€cidas  suaa  empresaa ;  e  que  aois 
bjisonlioa  e  esti>aahos  se  davao  os  preoaios  de  seua 
servi^os ;  uao  podiao  ver  como  amigos  am  que  ae 
Ihea  adiaatavao  enmloa ;  e  suppo&to  que  seiE{tf<e  a 
obediwcia  os  oouaervou  juntos ,  nunca  a  occasiao 
OS  vio  coaformea.  D'eate  principio  nasc^ao  tantas 
de^gra^as  e  uifortuuios,  quaatos  baslarao  para  per* 
der  a  saelhor  parte  d'aquelleEstado.^Chegara  por 
^te  tempo  com  copioao  socoorro  ao  Arrecife  Sisgta- 
ix^uudo  Vauscop  ^  a  quern  a  oompanhia  occidental 
havia  dado  o  bastao  de  general  de  mar  e  \erra,  e 
em  que  tinba  grande  eonfian^a  pek>  seu  valor,  pra* 
tica  e  induatiua.  Tinha  este  general  aprendido  naa 
escolas  da  Europa  que  nas  oonquistaa  ohra  maia  a 
aagacidade  que  a  foj^Qa  ^  principalmenle  naquellas 
empresas  em  que  a  resiateneia  6  maior  que  o  poder 
d^  cwquifiAa;  e  oei:to  n'eata  ma&ijiia  applkou  todie 
fieu  puidado  a  gai^har  animos,  que  Ihe  mostrasseoi 
breckaya  para  esealar  praxes.  FaTotecido  da  oocs^ 
1^  achou  entrada  para  fomentar  a  desuniao  dos 
nos30s^  e  para  ooxiirahir  amizade  e  corre^iondeiicia 
com  0  coiauk  de  Banholk).  Com  o  pretexto  de  eiii*> 
baixadaa^  scriplos  emimoa^  se  facilitou  a  commuai- 
^)a9ao  enlre  uma  e  outra  ge&te.  — MiUtava  entre  ee 
possoa  um  soldado  mameluco.,  cbaoiado  Domingos 
F^ruaudea  Calabar^  oAiaado,  e  livre  com 


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devia  a  justicft ;  temeo  o  castigo,  e  por  fogir  a  prisao 
ae  paasoti  ao  Hdiandez.  A  ooonnnnicacao  )he  e&^ 
siBou  algunaa  palarras  flamengaa,  e  loda  a  mBde* 
lidade  das  ofaras.  Fm  recebido  de  todos  com  indna* 
Iriofio  agasalho ;  deoejosos  que  o  »enip)o  pcrsoa^ 
disse  a  rnnitos  a  intita^  do  delido.  Nao  foi  a 
sagmidade  inCntctifera,  poitfoe  a  rauicos  eartAfm 
0  ardit^  que  deapob  senrirao  a^  ininrig^  d'anxilMH 
MS  e  guiaa  para  os  aaaakot,  torn  que  desirairao  6' 
eonquiBlariio  a  terra ;  a  d'edaa  oer  mars  nocitot 
aqaelies,  que  entren^  Tiriao  maia  dessimBtadm , 
porque  ckmbo  ermo  amliiiettas  de  dentro,  mo  haffia 
moTioaeBlo  de  que  mm  fizessem  aviso. 

XXIII.  InforflMdo  SisgiaaniMio  do  tftdo  quavto 
»tre  nto  sepassara ,  e  eevto  de  qoe  06  Doseos  $a^ 
davae  qoaixeeoe  e  dcstgosladosda  povea  estnMieacy 
que  acbavM  no  concfe  de  BoBbcdke^  e  em  Doarte 
d'AU>iiqifieFqiie,dieieraumm  expenmenti^se  na  oe* 
caa&o  ebrrespoBdiw  os  effeitoa  a  causa ,  jalganda 
por  inapoaaifvel  nao  at  aeompanhar  a  queoa  ckr 
ocEo  e  da  vingaii^ :  luma  de  ser  a^ima  enprera 
a  pedra  de  toqjEBe  deate&affiseloe^  Heaekeo  com  ^eiwm 
cabtB  que  (bsee  a  eowfubta  da  PavaSha ,  para  oade 
OS  mais  s^itados  se  ttofaao  reCiradov  Eadpenhixi  o 
resio  doseu  poder ;  eom  ette  navegaa  a  smr  armada 
ai^  avislar  a  nmsa  fiortaleKa  q«e  chamao  do  Cab^ 
delioy  sttoacb  oabarra.  DeikMi*  genle^  artdharia  e 
miuMcoes  em  terra  y  com  toda»  a»  demoastra^oes 
de  sitiar  a  Corca.  Sra  eapitao  maior  da  viUa:,  e  §»»• 
vemador  da  capHania,  Aatonio'  d^AUmquecqiie^  a 
qnemo  primeira  rdiateporiia  camfpanha  eom  todos 
OS  laradbresy  que  a  bruiWhakdii  teoapoeo-tepatite 


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7Z  GASTRIOTO  LU8ITAN0. 

do  assalto  Ihe  deixou  conduzir.  Conservou-se  o  ca- 
pitao  maior  em  observacao  com  a  sua  genie  i  sombra 
da  fortaleza  e  it  vista  do  inimigo,  em  quanto  man- 
dou  aviso  ao  Arraial  para  que  Ihe  acudissem  com  o 
soccorro  necessario*  Mao  se  atreveo  o  Flamengo  a 
investir  os  nossos^  admirado  de  encontrar  resoluta 
resiatencia  onde  esperava  achar  cobarde  traicao. 
Nao  tinha  conhecido  os  primores  dos  animos  por- 
tuguezes.  0  valor  natural  quando  se  anima  de  fide- 
lidade  obra  sem  vileza.  Em  todo  o  tempo  que  da- 
rarao  as  goerras  de  Pernambuco  obrirao  os  mora- 
dores  com  esta  fidalguia  :  sempre  offendidos  na 
falta  do  premio  e  do  favor ;  sempre  genorosos  na 
pontualidade  da  obriga^ao  e  do  servico.  Todos  os 
dias  vinhao  is  maos  Flamengos  e  Portuguezes ,  e 
sempre  os  nossos  levavao  a  melhor.  Em  um  d'estes 
encontros  (em  que  sempre  havia  d'uma  e  outra 
parte  mortos  e  feridos  )  oortou  uma  bala  contraria 
a  caridade  e  a  vida  do  P.  Fr.  Manoel  da  Piedade , 
religioso  de  Sao  Francisco  y  que  sem  medo  dos  pe^ 
louros  andava  entre  os  nossos  exercitando  a  obri- 
gacao  de  confessor  e  o  oiBcio  de  soldado. 

XXIV-  Chegou  neste  meio  tempo  D.  Aleixo, 
Gastelhano  de  na^ao,  com  algumas  companhias  de 
Gastelhanos  e  Portuguezes  em  soccorro  dos  nossos; 
o  qual  servio  de  augmentar  o  numero,  por^m  nao  o 
animo  dos  combatentes.  Nunca  a  companhia  d'esta 
na9ao  nos servio  a  victoria^  sempre  &  perda.  Aquelia 
providencia ,  que  separou  os  dominios  j  os  definio 
emulos,  e  nao  companheiros.  Alojados  no  posto 
eacolhido  guardavao  a  mesma  fortaleza  j  que  os  de- 
fendia.  Seguiao  as  escaramucai  o  curso  dos  dias. 


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GASTUOTO  LVStTAIia  7S 

sem  mudanca  de  sorte ,  at^  que  o  inimigo  se  de- 
cidio  a  assaltar  a  nossa  ^tancia ;  o  que  fez  com 
tao  boa.  fortuna^  que  nao  foi  sentido  senao  jd  quando 
primeiro  se  enconiravao  os  bra^os  que  os  olhos^  de 
sorte  que  a  batalha  parecia  luta ,  ferindo-se  tao  de 
perto  que  as  armas  serviao  mais  ao  embaraco  que 
ao  golpe.  Largo  espaco  durou  o  conflicto  e  a  con- 
fusao  y  com  que  os  nossos  mal  despertos  tocarao  a 
reiirar  para  se  conhecerem ,  e  distinguirem  dos 
inimigos.  Quarenta  mortos  nos  custou  a  confianca; 
e  entre  elles  acabou  o  capitao  D.  Aleixo.  Mnitos 
dias  chorou  o  ioimigo  a  victoria  j  que  cousistia 
em  ficar  na  campanha.  Mas  uao  se  gozou  d'ella , 
porque  tendo  aviso  que  do  nosso  Arrial  saira  o  conde 
de  BanhoUo  Qom  o  seu  terco  em  soccorro  da  nossa 
geute,  levantou  o  cerco,  recolheo  a  artelharia,  ar-* 
razou  OS  quarteis ;  e  embarcada  a  gente ,  largou 
panno ;  e  mais  corrido  que  invejado  entrou  no  Ar* 
recife,  olhado  dos  emulos  com  desprezo,  e  dos 
apalxonados  com  applauso.  Festejou-se  da  nossa 
parte  o  successo  como  victoria ;  dos  soldados  porque 
defend^rao  a  fortaleza;  e  dos-moradores,  porque 
conbec^ao  que  em  quanto  quizessem  re»stir, 
nenhum  poder  os  havia  de  domiuar. 

XXV.  Com  a  entrada  do  novo  anno  quiz  o  gene* 
ral  boUandez  intentar  algunm  emjMrezaem  que  suas 
armas  ganhassem  credits  e  proveito  a  sua  na9ao. 
f  oz  o  fito  na  fortaleza  da  Nazaretb^  sette  legoas  dis- 
tante  do  An*ecife  para  a  parle  do  norte ,  para  que 
setahoreando  a  barra  podesse  alii  estabelecer  empo- 
rio  de  commercio  e  centro  de  dominacao«  Saio  do 
Arrecife  on  14  de  Mar^o  com  mil  quinhentos  in-^ 


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3&  GASMWit  immMu 

(aaleft^  e  eopiDta  ehama  de  maretnto^  emburca^CMT 
am  vinU  e  eualro  immm,  e  g^rwn^  mnltklao  4e  kifi-^ 
cba9»  coia  odk«luK>  de  loniar  por  entreprcia,  e  tal« 
17€Z  SMa  resi&tencia  a  fortaleza  da  Naztfe&.  l^m 
g^vejTBador  da  fortakM  Befilo  Maciel  (capitao  igual^ 
vnente  oap^rto  e  pratico),  o  qual,  apoiar  de  nacy 
ter  €OKiaigeinaiade$esMfita  sokbdosi  nao  ae  ame^ 
dreniou  com  a  ferca  que  o  inimigo  09ile«tava,  e 
aMtendeado  o  sen  desenbo^  iMUKfou  guarnecer  d<$ 
H)08queleiroti»  uma  trinddeira ,  que  defendia  um 
ktgar  acoMamodado  para  ae  deitar  gente  em  tora ; 
o  qw  vBto  pelo  HoUajadez ,  mudou  de  iotefita ,  e 
foft  coateandM>  a  terra  na  distancia  de  meia  tegua 
eom  leacao  de  deaeiMbareaF  em  vmn  esteiro,  ou  ca-^' 
Vbala  cpue  idli  &a  o  Hiar,  entraudo  algumespaco 
pek  tonra  AemlnK  "^  Sem  neticia  alguma  de  tat 
atmada^  neoi.  dos  ittte»los  d'eila,  Ymhao  carnal^ 
ittenta  por  terra  ^linze  mosqiiieteires  nosses  guar- 
dasde  uma  grande  pntida  de  dinheiro^  que  merca- 
dores  da  Bahk  remetliao  a  sens  correspondenees^ 
para  se  empregarem  aasiiear.  Tanto  que  yirao  a  ar- 
mada, emboae^urao^^eeno  mato^  para  observarem  a 
derreteque  leva^o  aa  kinchas.  Advertirao  que, 
carregadas  de  infontaria  buseavao  a  terra,  tomando 
a  calhela^  pek  q«al  oa  trazia  sua  fortuua  a  metter- 
senas  bocas  dos  mosqiietes ;  levarao-nos  os  quinze 
soldados  a  c^pa,  ederao  has  primeiras  lanchas  uma 
e  muilas  cargas  tao  hem  sortidas,  que  nao  perdi&rao 
tko*  Cortado  o  Flamengo  do  repentino  assalto^  e 
do  inopinado  da»lroco,  voltou  as  proas  &s  lanchas,  e 
a  nda  e  a  i^mo  busco«  o  corpo  da  armada ,  mats 
Yencido  <fo*modoque  do  Humero.  Ifeste  successo 


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uie^>^rado  tirou  por  (M)iMC|C|uwQi<i  o  goaor^  que  e 
gOYeraador  ^  fioriaks»  «  bayia  de^g^ar^ecido  pftr^i 
pr^parar  ^ta  embuscaita^  e  qw  camdo  de  rqtaite 
$abre  (i  iipsaa  iriiieheira  a  ppderia  iomar  sem 
gr^pda  reaUteao^iii.  Blw^u  is  hw^M&  q^  ^iAim-' 
i^fia  ao  primeiro  destioo^  e  rt^eomefasseiB  o  ataque^ 
Cheg^iio  a  Uro  de  maequ^te ;  deo  a  nosaa  lrin-i 
ol^eura  solnre  a  infacitana,  qiie  cara  aauiu  e  apiub^, 
Miieeea^a&earga^,eoiDpoataria  Uw^eeHaqfied'ivm 
i^e^ma  bala  i^ataya  dou$  e  (9^.  CveMao  o  id^ 
COB  o  eHngpf  e  aam  quealgoioa*!  afareveiM  ii  #inr* 
pro^  a  terra^  Y(4t4i)^  tedas  m  Im^a  de  ve^fn 
lyrrai^eada  a  uwF-ae»  eem  a  Ifoia,  que  arai  oaaia 
deten^a  lavgou  pannp  ^  e  ae  fez  de  y^ia*  De  ea** 
Hiuih0  poz  fogo  a  trea  eiftkarwfeaa  noaani,  que 
•ehou  aurtaft  no  rie  FenuoM  :  pequena  viagiBtfi^ 
piura  a  lee^ida  oSeu^a^ 

XXYI.  loduzido,  e  guiadcioFlameQ^o.daft  trait 
doires  que  trauua  cea»c;a  (eraos^  oaaier  parte  llalia-r 
uoe)  aaku  do  Arrecife  pek  vaeiaBoite  ^  aUfavesaeuai 
ruinas  da  viUa  de  Qlinda,  prosegfuie  a  MMoroha  pdtti 
veredas  maia  oecuUaSi  e  aeai  acr  aeulido^  dee  mA»t^ 
a  villa  de  Iguaracu  o  primeiro  dia  de  Maio  ^  a  tempo 
que  OS  moradorea  aawistiao  ua  i|pre^  aoa  divmos 
ofBeioa,  pela  solemiudade  da  fcata  doa  apoatoka 
Sao  Philippe  e  San  Thiago.  Como  paamadoa  ea 
deixott  o  repentino  aaaateoy  e  e  katiDotoao  tomuko 
do  mulheiioL  Alguna^  que  a  eaao  ae  achirao  eom 
amnea.aeoppuai^o  &  (uria  doFianaeago ;  mas  ceno 
Ihea  MU)ua  oofapanbiae  orden,  atry^rao  ad  deaaij^ 
mantar  o  nuiuere  dos  movtoa*  V^eaQaHoUandas 
aeaa  oppo(Bii9ao;!  aaqueou  aeaa  iNMayniiiade;  daer* 


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H  CASTRIOTO  LUSITANO. 

truio  sem  respeito.  Nao  perdoou  nem  a  idade ,  nem 
a  sexo;  nao  respeitou  a  modestia  nem  o  decoro, 
despojando  as  mulheres  de  suas  roupas,  arran- 
oando-lhe8  com  crueldade  doa  dedos  os  anneis, 
das  orelhas  ospendentesd  ouro.  Roubou  e  destruio 
o  sagrado  por  odio ,  o  porfano  por  vinganca.  0  que 
eseapou  do  roubo  foi  coDdemnado  &s  chamas.  — 
Pouco  mais  d'uma  hora  gaatarao  neate  cruel  exer* 
cicio ,  e  carregando  qnatrooentos  uegros,  que  para 
estefim  traziao  comsigo,  do  que  pod^rao  levar, 
marchArao  com  preasa  de  criminoaos,  levando  com- 
aigo  dous  religiosoa  de  Sao  Francisco  por  odio,  e  o 
coadjutor  assim  revestido  como  saio  do  altar  por 
d^rezo.  Fizerao  alguns  moradores  acordo  para 
oa  aeguir  e  picar  na  retaguarda,  obrigando*oa  com 
mortoa  e  feridos  a  lai^ar.  parte  do  roubo;  e  por 
certo  teriao  recuperado  tudo,  e  feito  n'ellea  grande 
matanca ,  ae  a  marcha  f6ra  mais  comprida ;  mas 
tinhao  perto  o  mar,  e  nelle  as  lanchas  que  os  espe- 
ravao ,  pos^rao  terra  em  meio ,  navegando  para  o 
Arrecife  com  salvas  de  artelharia  e  vozes,  que  ser- 
virao  a  sua  dita  de  applause,  e  ao  nosso  infortunio 
de  matraca. 

XXVU.  At^  ao  fkn  de  Septembro  nada  se  inteo- 
tau  de  parte  a  parte,  conservando-se  suspensas  as 
armas ;  da  nossa  parte  por  frouxidao  e  descuido,  e 
da  do  inimigo  por  artificio  e  malicia.  Dos  cabos  se 
ateou  a  todos  os  nossos  soldadoso  ocio,  em  lal  f6rma 
que  este  e  o  ardil  do  inimigo  forao  as  duas  maos 
que  mais  trabalharao  em  nossa  ruina.  0  conde  de 
Banhollo  (que  pareoe  levou  a  fatalidade  aquelle 
£atado  para  perdicao  d'elie),  ou  fosse  perauadido, 


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CA9TR10T0  EimiTAIIO.  17 

CHI  enganadu,  dizia  a  todos  cfue  a  eautdtta  do  ini** 
migo  era  medo ;  e  com  e$ta  malicia  ou  singeleza 
mandou  fazer  aprestos  para  ir  sitiar  a  fortaleza  de 
Orange^  que  o  Flameogo  fabrieou  (como  (ica  dito) 
oa  barra  da  ilha  de  Itamaradi.  Saio  do  Arraial  com 
apparato  e  poder  de  soldados,  arteiharia,  mmii^oea 
e  mantimentos;  arialou  a  fortaleza,  escolheo  sitio, 
planlou  a  bateria ,  ooniinuou  as  cartas  sem  outro 
effieito  mais  que  o  de  gastar  tempo  sem  fruto ;  que 
tinha  o  inimigo  a  praca  tao  beu  fortifieada  de  trin- 
cheiras,  estacadas  e  reparos,  que  nao  padeceo  a 
for^a  o  menos  damuo*  -^-^  0  conde^  que  em  (odas 
suas  resolucoes  era  leve ,  voltou  para  o  Arraial 
deixando  na  iiha  aspens  de  bater^  quehavia  tu*ado 
da  uossa  fortaleza,  por  despojo  ao  inimigo.  D'este 
lote  erao  todas  as  accoes  d'aquelle  cabo ;  por  ellas 
se  p<kle  entender  qual  era  o  animo  d'aqueUa  bo« 
mem,  ea  razao  com  que  os  entendidos  e  zelosoa 
tinbaopara  si,  que  peccava  mais  de  combanido,  que 
defraeo. 

XXVIII*  Sendo  o  principal  inteoto  do  HoUandez 
assenborear^se  da  campaoba ,  julgou  (e  nao  ae  en*- 
ganava)  que  se  levantasse  uma  fortaleza  no  sitio 
que  cbamao  dos  Afogados  ( porque  naquella  parte 
sobem  as  aguas  do  rio,  ajudadas  da  mar^^  com  tM 
arrebatada  furia  que  afog^  os  que  colhem  na  pas* 
sagem),  com  ella  cortarta  por  todos  o$  caminbos  a 
invasao  e  assalios  de  nossas  armas;  razao  porque  os 
nossos  o  guarneciato  de  trincbeiras  e  soldados.  £m 
1 8  de  Marco  de  1 633  saio  do  Arrecife  no  quarto 
da  alva  com  oiioceotos  infantes  escolbidos  y  pas- 
sou  o  rio  de  baxaroar,  investio  as  trincbeiras 


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7i  G&SrAlOTO  VBfSftiM^ 

skuadasnasttidrgeti^d'elle,  eA  opportutiidadeiim 
BelkA  aofaoh  poucos  e  descuidados  defemores  j  t 
apoderou*^9e  d'ellas  sem  resistencia.  Qulzerao  os 
noBSod  necuperar  o  perdido,  ma«  de  balde ;  porque 
OB  inimigod  mais  fortes  em  numero  os  opprimirM 
de  maneira  que  se  virao  obrigadoft  a  retirar  para 
uma  den^a  mala  ^  que  06  livrou  de  (beerem  com^ 
panhiaa  Tinie  mortod,  que  deix&rao  no  campo; 
entre  elles  o  oapitao  Franciaoo  Monteiro  Bezetra , 
que  pagou  com  a  morte  o  descuido.*— Nao  des^ 
prezou  oinimigo  o  favor  da  fortuna,  antes  oseguio. 
Guameceo  as  trincheiras  y  e  marchando  pelas  ola* 
rias^  avisado  e  condnzido  por  um  traidor,  assaltou 
a  que  chamavfto  de  Nuno  de  Mello ,  o  qual  nena 
oecasiao  esiava  ausente,  e  seus  soldados  com  menoa 
Tigilancia  do  que  deviao.  Suprio  o  valor  a  falta  dts 
rebate  •  primeiro  Ihc  cobrirao  de  sangue  e  de  luto 
a  victoria  que  Ihe  largassem  a  trincheira.  -^  Occu-^ 
pava-ee  o  Hoilandee  em  fortifiear  as  esiancias  ga^^ 
nhadas ,  quando  o  certificarao  da  opportunldade  j 
que  Ihe  offei^cia  o  desciiido  y  e  a  confianca  cbm  que 
na  estancia  do  Mendonca  estava  o  presidio  que  a 
guarnecia  y  aproveiton  a  opportuntdade ;  furtado 
as  sentineltos  invostio  a  trincheira^  e  tal  era  o  des^ 
cuido  do8  nossoB  que  primeiro  sentlrao  as  cutillfr* 
das  do  inimigo  que  vissem  os  bracos  que  as  des^ 
carregavao.  Perd*rao  atS  a  vida  os  capitaes  Brai 
Soares,  senhor  da  ilha  de  Santa  Maria  y  Manoel  de 
Sa )  cavalleiro  do  habilo  de  Christo,  com  perto  de 
trinta  soldados,  entre  elles  D.  Manoel  Deca,  a 
quemdegolWrao  depois  de  se  entregar  a  bora  quarld. 
A  D»  Atlionio  Ortit  derao  a  vida,  porque  Ihc  co- 


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nheotew)  a  Uagaa  (era  Itidiaao)  ( kvaWkv^tio  com  o 
seu  alfares,  e  outros  presioneirost  Para  perseguirem 
oa  Bosaos  soklados^  que  btisca  vao  a  Balvacao  noa  ala* 
gadicoS)  tratiao  comstgo  caes  de  fib  >  que  Ihes  Ian*- 
^trao.  Muito  perdemM  nae  diias  eetandaa  doa 
Afogados  e  de  Nunc  de  Mello>  pela  importancia  do8 
iiUos ;  pordm  nesia  do  Mendonca  muito  mais  pela 
quebra  da  reputa^. 

XXIX.  Yendo-fte  o  general  Sisgismundo  assim 
favorecido  da  fortuna^  com  deliberada  oUsadia^ 
^  reaolveo  em  envasdr  a  tiosna  fortaleia  do  At* 
raial  ^  que  distava  do  Arrecife  uma  legoa  de  ca-^ 
minho.  Biapoz  os  requisitos  necessarios  para  o  in*', 
teuto  com  disaimukcao  e  preeieza;  e  salo  em  24 
de  Mar^o  com  todo  seu  poder.Gom  mil  qutnheiaU>a 
infauies  marchou  pelos  ingeuhoB  de  Francieoo  de 
Britoede  AmbroBio  Mach«ido^  at^  passar  o  rio  Ga>^ 
Uperibe^  onde  fez  aho )  dividio  sua  gente  en^  tres  e»* 
quadroea^  aoa  qUaea  ordenou  que  a  um  tempo 
avancasBem  por  tres  partes  :  o  primeiro  pela  do 
engenho  de  JeronioK)  Pies;  o  segundo  pelas  coa^ 
las  da  f greja  da  Misericordia ;  o  terc^iro  pc^  um 
pequeno  riochamado  PemamMorim;  este  ch^ 
gott  primeiro^  e  sem  ser  seutido  iuvestio  a  povoa* 
9ao  i  e  chegou  aM  as  p(tf  tas  da  fortaleia.  Estava 
toda  a  genie  reoolbida  ua  igreja,  porque  era  n'uma 
quinta  feira  sancta*  Achou  o  inimigo  lancada  aponte 
levadi^)  por  culpa  doe  Italiauos,  aosquaeaooubea 
guarda  d'ella  naquelle  dia*  Em  defeusa  da  ponte^ 
que  atrayessava  o  fosso  da  circumferencia  do 
Arraial  estava  um  reduto  ^  e  nelle  de  guamicao 
dezesette  Italianos ;  a  todos  degolou  o  Iniraigo. 


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go  GASTtieiO  UISITiJU). 

Pedirao  bom  qwrtel,  por^  o  Flamengo  adiou 
que  o  nao  mereciao  pela  vileza  da  eotrega^  ou  a 
causa  fosse  deacuido ,  ou  trai^ao,  —  Ja  a  este  tem- 
po o  segundo  e  terceiro  esquadrao  do  Hollandez  se 
tinhao  mettido  debaixo  da  nossa  artelharia;  portm 
recolhida  toda  a  gente  da  povoa^ao  dentro  da  forta- 
leza,  come^^rao  os  nossos  com  seus  mosquetes  a 
dar  tao  repetidas  e  acerladas  cargas  nos  ioimigos, 
que  em  breve  tempo  virao  as  fraldas  do  Arraial 
juncada3  de  corpos  morlos.  Crescia  o  estrago  com 
a  proiia,  e  o horror  do  inimigo  com  a  deteo^a.  Tanta 
pressa  se  davao  os  nossos  em  ferir  e  matar ,  que 
cada  um  dos  Flamengos  desesperava  de  Ihe  ficar 
tempo  para  fugir ;  at^  que  desprezada  a  obediencia, 
perdeo  seu  impa^io  a  contumacia  dos  cabos,  e  forao 
todos  largando  o  intento  e  o  campo.  De  sorte  car- 
reg4rao  os  nossos  ao  Flamengo  na  retirada,  que  a 
poucos  passost  o  pos^rao  em  miseravel  fugida,  dei- 
xandQ  mais  de  quatrocentos  mortos  na  campanha^ 
e  maior  numero  de  feridos ,  e  quarenta  e*  tantos 
presioneiros';  eatre  estes  quatro  capitaes  mtal  feri- 
dos, eoutros  officiaes  menores.  Perdemos  vinte  e 
cinco  soldados,  a  saber  os  dezesete  Italianos 
sobreditos^  e  oito  Portuguezes;  maior  numero 
de  feridos,  entre  elles  o  capitao  Joao  Yazques, 
atrayessado  d'uma  bala,  que  morreo  ao  terceiro 
dia  com  lastima  igual  ^*perda;  Henrique  Dias, 
governador  dos  Minas,  que  neste  dia  se  excedeo  a 
si  mesmo,  levemente  ferido;  e  outros  de  menor 
conta ,  assim  na  qualidade  como  na  lesao.  —  Joao 
Fernandas  Vieira ,  que  apenas  tinha  vinte  annos  de 
idade,  era  capilao  de  descobrir  o  campo,  como 


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GA6TRI0T0  LUSITANO.  81 

fica  dito  e  neste  conflicto  foi  um  dos  primeiros  que 
com  seus  sbldados  deo  sobre  os  inimigos,  igualan- 
do-se  no  valor  e  disciplina  aos  cabos  mais  assigna- 
hdos.  Para  obedecer ,  nenhum  mais  prompto;  para 
mandar,  nenhmn  mais  acertado.  Era  pequena  sua 
idade,  mais  grande  sua  prudencia,  e  maior  seu 
valor.  Todas  as  idades  teve  de  varao;  nao  houve 
nolle  accao,  que  buscasse  desculpa  na  mocidade. 
Griou-o  a  Providencia  para  homem  grande,  e  em 
nenhum  tempo  quiz  que  parecesse  pequeno. 

XXX.  Com  a  fortaleza  que  o  inimigo  levantou 
no  sitio  dos  Afogados  Ihe  ficou  livre  o  passo  para 
sair  pelo  sertao  a  seu  gosio,  dando  repeddos  assaltos 
em  varias  aldeas,  muito  a  seu  salvo.  Em  1 3  de  Abril 
de  1 633,  no  quarto  da  alva,  derao  quatrocentos  Hol- 
landezes,  acompanhados  de  muitos  negros,  mula- 
tos  e  Indios,  sobre  a  povoacao  daMoribeca,  que  sem 
resislencia  saque&rao  e  destruirao,  profanando  os 
templos ,  e  despedacando  as  imagens.  Igual  sorte 
teve  uma  aldea  que  chamavao  do  engenho  de 
D.  Catharina  de  Albuberque ,  a  (mde  com  um 
mesmo  incendio  arddrao  edifieios  e  fazendas.  Em 
26  de  Maio  assaltarao  duzentos  Flamengos  ino^ 
pinad^hoiente  os  engenhos  dos  Gararapes  :  para 
carregar  assucar  iao  todos  providos  de  mocbillas, 
que  ench^rao  &  sua  vontade,  mais  saio-lhe 
amargoso  o  gosto;  porque  o  capitao  Domingos 
Dias  com  vinle  soldados,  e  alguns  mancebos  da 
terra,  Ihes  seguio  o  alcance,  matou  vinte  e  cinco, 
e  ferio  dobrado  numero,  captivou  um  sargento 
com  mais  alguns  soldados ;  recolheo  quanlidade 
de  mochillas ,  que  aos  victoriosos  servlrao  de  re- 
I.  6 


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fresco  e  d«  triumphoi  e  aos  HoUandeMft  o  deiwl* 
M  de  ctesembara^o  e  de  remedio.  Com  pouca  dif^ 
feren^a  fet  outrag  muiUyi  ^rtidaa,  qua  pela  ai-« 
milbaDf a  ae  podam  ver  ttas  passadat.  ^  Dapoia  dt 
todoa  aatea  extragoai  diapo^rao^aa  oa  HoUaDdeftap 
a  maior  ampreia  a  maia  piagua  deapojoy  poodo  o 
fito  na  ilha  da  ItanaracA.  Em  graode  multidao 
de  kndifts  aoibaroarao  toda  a  sua  iuikutaria^  a 
oingirao  a  ilha  por  mar{  deilarao  gaote  em  terra 
por  tantaa  partea  que  per  todas  fez  a  inyasao  um  aa-* 
aalto  contiuuado.  0  capitao  Salvador  Pinheiro  que 
a  goveroava ,  intentou  valeroaameute  deTendSi-a  j 
porem  oomo  o  corpo  de  aua  gmite  nao  podia  en* 
cher  o  vao  do  cinto,  o[^rimido  do  cerco  eeron^ 
dec  k  multidao.  Fortificou  o  Flameugo  a  ilha  com 
o  roubo  d'ella. 

XXXI.  Um  freio  era  para  o  inimigo  a  noaaa 
fortalaaa  do  Arraial^  porque  odetinba  no  desejo  da 
oorrei*  livre  pda  campanha ,  e  todoa  os  meioa  bm^ 
cava  para  deitar  fdra  o  bocado  que  o  reprimia. 
£aperou  queaporfiayenceaae  a-reaisteucia,  e  em  4 
d'Agoato  deiiou  fora  mil  iufiaui^s,  com  o  deatiao 
de  aucarem  a  noasa  fartaleza«  Marcbarao  at^  ao 
engenho  de  Frauciaco  de  Brito,  oude  fuerao  alt0| 
dando  coataa  aum  tro^o  doa  aeus,  que  deixarao 
oceupados  em  levantar  uma  trincheira,  e  guarne* 
cer  umaa  oaaas  que  ach4rao  devolutaa  oa  paaaa* 
gem  do  rio  Capebiribe;  e  a  outro  que  com  a  mea^ 
ma  preveGtf^ao  deixarao  naa  caaaa  de  Francisco 
Monteiro  Bezerra.  —  Derao  as  seatinellaa  rebate 
no  Arraial,  mandou  Maihiai^  d' Albuquerque  sair 
fdra  aquellas  compaubiaa^  que  o  repoite  aehoo 


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mats  prontu;  as  quaes,  guiadas  das  sentinellasi 
derao  sobre  os  que  estavao  aquartellados  nas  casas 
da  passagem  do  rio^  que  volerosaineate  desalojarao* 
e  oonstrang^rao  a  buscar  a  salva^o  no  pego.  Em 
seguimento  dos  primeiros  mandou  o  nosso  genial 
outras  companhiaS)  que  levadas  por  differente  ca« 
minhoavancarao  as  trincheiras  e  casas  do  Bezerrai 
ferindo  e  matando  com  furor  tao  viyo ,  que  p  Hot* 
landea  com  as  maos  leyautadas  pedia  bom  quarteK 
A  todos  fi^ra  Yoar  o  fogo ,  se  entre  os  nossos  $e 
acbAra  urn  barrii  de  polvora/  Buscava  a  ira  por 
onde  entrasse  a  espada  |  quando  o  esquadrao  qu^ 
ficara  de  posta  chegara  a  soccorrer  as  seus,  dos 
quaes  achou  ja  mais  de  quareota  mortos,  e 
autre  elles  muiios  ofiiciaes  de  guerra.  Obedeceo 
o  furor  a  razao,  e  esta  a  fbr<;a;  retirarao-se  os 
Bossos  levando  comsigo  muitos  iuimigosi  que  de-- 
rio  aretirada  o  nooie  de  victoria.  0  Flameugo  re- 
parado  de  suas  fortifica^oes  contiauou  com  as  trin- 
cbeiraS)  e  com  el  las  deo  principio  ao  cerco,  que 
intentava  por  ao  largo  a  nossa  forlaleza  do  Ar^ 
ratal.  —  Goujecturou  Mathias  d'Albuquerque  a 
teii^ao  do  inimigo,  e  como  bom  capitao  tratou  de 
Ihe  obstar  por  todos  os  meios  possiveis.  Maudou 
por  iQp>  aos  canayeaes  por  aquella  parte  por  oude 
Ihe  podiao  sevir  de  impedimento  a  yista)  em  op* 
posi9ao  do  quartel  do  inimigo  mandou  levantar 
uma  trincbeira  de  grossas  vigas,  que  logo  guar* 
neceo  de  gente  e  d'artelbaria;  mandou  sair  da  for- 
taleza  do  Arraial  toda  a  gente  ioutil  para  tomar 
armas ;  e  ao  conde  de  liahhollo,  que  assist ia  a 
obra  d'uma  fortaleza  que  no  pontal  de  Nazareth 


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8&  CASTRIOrO  LUSITANO. 

se  fabricava ,  deo  ordem  que  se  recolhesse  ao  Ar* 
raial  com  o  seu  ter^o  de  infantaria,  eo  mesmo  aviso 
fez  a  todos  os  moradores  da  circumferencia,  para 
que  o  inimigo  achasse  em  toda  a  parte  prevenida  a 
defensa  e  cortada  a  esperan9a.  Quaudo  andava 
nestas  diligencias,  recebeo  aviso  dequepelo  rio  de 
Capebiribe  subiao  a  voga  siu*da  cinco  lanchas  em 
companhiad'um  patacho ;  e  que  o  Hollaudez  man- 
dava  aos  sens  soccorro  de  geute,  artelharia,  muni- 
coes,  armas,  mantimentos,  e  retrescos ,  com  or* 
dem  que ,  descarregadas  as  embarcacoes,  mettes- 
sem  nellas  os  generos  que  tivesse  adquirido  o 
roubo,  para  que  se  conduzissem  ao  Arrecife  sem 
dispendio  e  com  seguranca.  Guardou  o  general 
para  si  a  noticia;  chamou  ao  governador  dos  In- 
dios  D,  Antonio  Philippe  Camarao,  communicou- 
Ihe  o  segredo ,  ordenando-lhe  que  com  seu  terco 
se  fosse  embuscar  em  sitio  sobranceiro  ao  rio  ^  que 
cliamao  o  Guardez,  com  sentinellas  ao  largo  que 
vigiassem  a  navegacao ;  a  outros  capitaes  ordenou 
que  com  oitocentos  infantes  se  formassem  no  sitio 
de  Pernam-Morim ,  para  todo  o  successo.  Erao 
ISd'Agosto  quando  pelas  duas  boras  da  meia 
noite  derao  fi  as  sentinellas  do  Camarao  das  em- 
barcacoes  do  inimigo ;  prevenirao-se  os  embusca- 
dos,  e  tanto  que  surdirao  a  emparelhar  com  o 
sitio,  empregarao  nellas  successivas  cargas ;  cairao 
muitos ,  e  o  medo  obrigou  a  outros  a  que  se  deitas- 
sem  a  agua,  adiantado-se  a  perder  a  vida.  Ao 
estrondo  da  mosquetaria  acudio  o  esquadrao  que 
08  nossos  formarao  em  Pernam-Morim,  e  chegan- 
do  a  tiro  derao  sobre  as  embarcacoes  uma  carga 


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CASTRIOTO  LUSITANO.  85 

scrrada.  Temeo-se  o  Flainengo  submergido,  de- 
samparou  os  vasos;  dos  quaes  os  nossos  se  apode* 
rarao  e  de  todo  o  soccorro  ,  que  constava  de  seis 
pecas  d'artelharia  e  bfX)Dze,  oito  roqueiras,  inuita 
quantidade  de  polvora  e  balas,  abundancia  de 
refresco  e  de  viveres  de  todo  o  genero ,  que  logo 
conduzirao  para  o  Arraial  com  algumas  bandeiras 
inimigas ,  que  (izerao  mais  plausi^el  a  Yictoria, 
deixando  as  embarcacoes  consumidas  do  fogo. 
Cento  e  tantos  Flameugos  perderao  nesta  occasiao 
a  vida ;  dos  que  escaparao  das  balas  e  das  ondas 
forao  poucos  illesos ;  os  que  trabalhavao  nas  trin- 
cheiras ,  informados  do  successo ,  e  induzidos  do 
medo,  largarao  a  obra  com  os  instrumentos  d'ella, 
(ugindo  tao  desatinados  como  se  levarao  a  nossa 
espada  sobre  sua  cabe^a.  Deixarao  arvoradas  as 
bandeiras  y  ou  por  testemunho  de  sua  cobardia,  ou 
per  disfarce  de  suaretirada,  que  conhecida  de 
Mathias  d' Albuquerque  oa  mandou  seguir ;  mas 
sua  ligeireza  frustrou  nossa  diligencia.  Achou-se 
nesta  occasiao  uma  carta  do  general  hollandez 
para  os  sens  cabos,  em  que  Ihes  ordenava  que  re- 
cebido  o  socorro  passassem  o  rio,  e  a  todo  o  risco 
investissem  a  escala  a  nossa  fortaleza  do  Arraial ; 
e  que  entrada,  a  nenhum  vivente  se  d^sse  vida, 
Trocou  o  Gko  as  maos  a  espada;  e  recebeo  a  ferida 
quern  havia  de  dar  o  golpe. 

XXXII.  Mais  obrigado  da  fama  que  moyido 
d'ardor  militar  deitou  fora  o  Hollandez  quatro- 
centos  infantes  no  dia  21  d'Outubro,  com  ordem 
d'assaltarem  a  fregnesia  de  Saulo  Amaro. 
Distanle   d'esta  freguesia  havia  uma  irincbeira, 


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86  GASTRIOtO  LUSITAMO. 

imico  reparo  dos  moradores,  na  qual  se  achava  o 
capiiao  Estevao  de  Tavora  com  doze  soldadod. 
Encontrando  o  inimigo  resistencia  que  nao  egpc* 
raTa,  e  vendo-se  descoberto  pelos  nossoa^  que  8up» 
poz  era  maiornumero,  guiado  d'um  negro,  mudou 
de  vereda,  e  encaminhou-8e  para  o  engenho  dc 
Jeronimo  Luiz.  Foi  em  seu  alcance  o  capiiao 
Estevao  de  Tavora  com  os  seus  doze  soldados,  e 
alguns  moradores  que  sc  Ihe  aggrcgarao;  ,ma8 
quando  chegou  ao  engenho  j4  estava  enlregue  ^8 
chamas.  Informado  que  o  Hollandez  com  o  roubo 
de  assucar,  gados  e  moveis  marchava  para  o  en* 
genho  de  Maria  Barboza ,  o  seguio  a  passo  largo, 
e  o  avistou  a  tempo  que  nao  pdde  o  inimigo  fazcft* 
mais  que  p6r-lhe  o  fogo ,  e  marchar  carregado  de 
pelouros  com  que  os  nosso*  o  serviao  sem  intcr- 
rupcao.  —  Nesta  hora  chegou  casualmente  iquelle 
lugar  0  capitao  Antonio  Andr6  com  quarentt 
mosqueteiros ,  e  cortou-lhe  o  pas»o«  Vio-se  o  Hol- 
landez por  uma  parte  atalhado,  e  por  ontra  perse* 
guido,  e  com  desesperado  medo  determinou  rom- 
per por  uma  densa  mata ,  a  onde  embaracado  das 
armaa  nem  podia  marchar  com  ordem ,  nem  re^ 
sistir  com  Fdrma.  Rompeo  o  maio  ate  sair  i  cam«- 
pina  de  Tigipio ,  ondc  deo  de  rosto  com  Liiiz  Bar- 
balho ,  que  o  recebeo  com  uma  carga  de  qnarenta 
mosqueteiros ,  tao  destros  na  pontaria  que  derri* 
b4rao  trinta  Flamengos;  desacordadoa  os  mais 
forao  largando  a  presa  e  aa  armas,  attentos  a 
conservar  as  vidas,  que  miiitos  perd^rao  norio 
d'um  rio,  e  outros  o  passirao  com  agua  pelos 
peitos;  correndo  todos  a  emparar-se  do  engenho 


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CA8TU0T0  LqUTAMO.  87 

de  AntoDio  FertiUndes  Pesaoa,  otide ,  em  vez  de 
abrigo,  acbarao  eairago.  Acaso  cheg4ra  aquelk 
paragtm  o  aargento  maior  do  Estado  Pedro  Gor^ 
rea  da  GAma  com  dusentos  motqueteiros ;  deo 
•obro  ot  ininiigosi  tnatou  quarenU  etaatos.  Qui* 
lerao  os  caboa  inimigos  fazer  alto  ^  para  eyitarem  a 
desordem  em  que  Tiohao ;  por^  oomo  o  medo 
i  inoapaz  de  diadplma ,  faliou  em  todos  a  obe* 
diencia^  fugindo  oada  qual  per  onde  o  guiava  a 
•orte;  e  te^e  tao  pouca  sua  efei^ao,  que  os  maia 
d'eilea  oairio  oaa  mios  doe  Indioa  do  Gamarao , 
tao  afflictos  que  Dao  reaiatiao  aoi  golpea,  tendo  por 
melhor  fortuna  o  morrer  que  o  fogir.  De  quatro* 
centos  nao  escapou  o  diiimo  da  motte  oti  da  pri- 
eao«  Dos  nossoa  ^  em  todoa  ob  encoiitroa  f  morrirao 
einoo ;  um  d'ellea  aargento  de  Luiz  Barbalho;  t 
ficmrio  alguns  fOTidoa^ 

XXXIII.  Neste  ineio  tempo  partio  de  LiaboA 
Fvanciaco  de  Yasoouaellos  pbt  cabo  de  duas  tiaos 
e  algumas  Caravelks^  que  eonduziao  urn  socoorro 
ami  oemsidemTel  aMathias  d' Albuquerque;  maa6 
Hollaiidez^  que  tinba  aviso  de  Uido  que  no  reino 
ie  pasaava^  nuyKloubordejar  sua  armada  na  altura 
da  Fariiba^  e  em  Novembro  d'eale  anuo  Ihe  vi^rao 
cair  Has  maoa  ot  Darios  do  a(>ficonro.  A  deaigual« 
dade  do  poder ,  que  oos  tirou  o  partido ,  fioa  aeon-* 
selbmi  o  rtnmiio;  derao  as  caravellaa  a  ooata  i  as 
duas  uaos  sorgirw  na  babia  da  Trai^o.  Franoiaeo 
de  VlMeomdloi  saltou  em  terra ,  a  kttuou  o  cami- 
nba  do  Arraial  ^  imaginando  que  deiaava  Seguro  o 
soCGorro  que  ae  p6de  sal?ar;  mas  engatiou^ae  cul-^ 
ty  povque  a  faka  do  €ak>  tave  forca  de 


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88  GASTJilOTO  LUSITANO. 

exemplo.  Abandonarao  as  naos  d'El  Rei  ^  que  pro- 
melt^rao  defender^  desprezando  vergonhosamenle 
08  clamores  dos  marinheiros,  que  os  reprehendiao 
com  Yozes,  e  envergonhdrao  conn  as  obras.  To- 
mArao  estes  as  armas,  e  com  ellas  nas  mao6  espera* 
rao  o  inimigo,  e  se  defend^o  como  valorosos  em 
quanto  os  nao  opprimio  a  multidao  dos  coutrarios, 
que  OS  euTestio,  rompeo,  e  saqueou  todo  t)  cabe- 
dal  que  Ihe  servio.  Com  estrondosa  festa  celebrouo 
inimigo  sua  victoria  e  nossa  injuria  ,  e  ounca  com 
mais  f undamento ,  porque  nunca  nossas  armas  na- 
quella  terra  padec&rao  nem  maior  quebra  nem 
maior  perda. 

XXXIV.  A  fraqueza  e  a  infidelidade  se  unirao 
nestes  dias  para  nos  magoar.  Saio  o  inimigo  no 
mez  de  Dezembro,  e  com  grande  poder  de  gente  e 
de  navios^  sobre  a  nossa  fortaleza  de  Kio  Grande. 
A  n^ociacao  tinha  comprado  a  contingencia  da 
batalha.  Rendeo-a  o  Flamengo  com  a  vista.  Suposto 
que  o  capitao  Pedro  Mendes,  ferido  d'uma  bala, 
deo  a  vida  pela  defensa.  Com  pretexto  de  cobiarde 
a  entregou  o  tenente  govemador  ,  que  era  um 
sargento  :  pareceo^lhe  a  fraqueza  menos  feia  que  a 
Iraicao;  facilmente  cae  na  villeza  quem  se  delibera 
a  viver  da  infamia.  0  primeiro  que  entrou  napraca 
foi  o  Callabar  (aquelle  mullato  de  quem  fizemos 
men^ao  em  n*»XXII),  ou  para  asegurar  o  concerto, 
ou  para  se  conhecer  o  autor  do  contrato.  Com 
quarenta  soldados  que  a  forga  tinha  de  presidio  (os 
mais  tinha  licenceado  o  capitao  )  levou  o  inimigo 
preso  ao  cabo  para  o  Arrecife,  Murmurou-se  entao 
que  com  esta  apparenda  quizerao  os  inimigos  en* 


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GASmOTO  LUSlTANa  89 

oobrir  a  trai^ao  da  entrega  :  engaao  mais  segiiro, 
porto  menos  apparente.  Com  toda  a  artelharia 
de  todas  suas  fortalezas  coroadas  de  luminarias 
publicou  o  inimigo  oseffeitos  d'uma  traicao,  ser- 
vindo  um  mesmo  estrondo  a  sua  alegria  e  a  nossa 
magoa;  o  que  nos  ratificou,  a  cara  descoberta, 
remettendo  para  o  nosso  Arraial  o  autorda  entre- 
ga livre ,  favorecido  e  medrado ;  o  qual  mandou 
logo  Mathias  d' Albuquerque  prender  com  griihoes, 
e  confiscar-lbe  os  bens ,  processado  o  crime  pela 
confissao  do  nio.  Nenhuma  perda  foi  para  nosmais 
sensirel ,  porque  nenhum  successo  foi  dos  nossos 
imaginado.  Deo  este  infausto  golpe  fim  aos  suc- 
cessos  do  anno  de  1633. 

XXXY .  Gonvidado  o  Hollandez  da  boa  for  tuna 
com  que  o  anno  passado  se  fezsenhor  da  ilhadelta- 
maFacA*e  do  Rio  Grande ,  se  animou  a  emprehen- 
deraconquista  do  pontal  de  Nazareth,  naoso  pela 
vizinhanqa ,  senaopelasconsequeneias  :  era  a  porta 
por  onde  nos  entravao  os  soccorros^  e  saiao  os 
generos.  Preparou  os  vasos  de  sua  armada ;  saio 
do  Arrecife  em  5  de  Fevereiro;  eparamelhor 
esconder  seu  intento ,  mandou  a  toda  a  frota  que 
emproasse  aaltura  daParaiba.  Avistou  a  fortaleza 
doGabeddlo,  queguardava  a  melhor  barrad'aquella 
eapitania,  e  da  outra  parte  deilou  quatrocentos 
homens  em  terra  ^  com  ordem  que  ameaoassem  e 
nao  acommetteas^m  a  forca  de  Santo  Antonio  que 
alii  estava  situada;  o  que  Bzeraocom  vagarosas  ap- 
parencias,  dando  occasiao  e  tempo  para  que  a  yoz 
do  rdbate  tirasse  a  gente  d'onde  a  temiao,  para  a 
parte .  a  onde  o  enganavao.  Persuadido   Mathias 


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90  QAanioTO  imaMMO. 

d' Albuquerque  oom  a  viyeu  das  ipparancias^  det« 
(ttdiodoArraialduzontOB  aoldados  em  quatrooom* 
pauhiaa  que  foMem  toccorrer  a  Paraiba,  a  tempo 
que  o  Hollaudei  acautellado  e  furiiro  ^  recolhida  a 
gente  que  tioha  deitado  em  terra ,  Tinha  j&  arri^ 
baudo  iobre  o  poutal  de  Nazareth*  -^  Por  um  m^ 
teiro  deitoa  um  goipe  de  grate  em  terra,  que  e 
•argeuto  maior  Pedro  Gorrea  da  Gama ,  governa* 
dor  d'aquella  praca^  maadou  rebater  oom  maii 
acordo  que  effeito.  Em  quanto  durava  o  conflicto 
buscaya  a  armada  inimiga  a  barra,  a  qual  entrov, 
mas  nao  tanto  a  salyo  oomo  eeperaya  ^  porque  um 
reduto  nosao  dirigio  tao  bemseus  tiros  que  Ihe  me^ 
tec  a  pique  duas  fragatas ,  que  o  mar  tragou 
promptameute  em  quaato  as  outrat  davao  fuudo 
uo  porlOi  a  onde  em  uma  poata  d'areia  fabricou 
o  HoUandez  um  fortim,  que  as  abrigaVa*  -^  Os 
nofisoa  que  yirio  o  inimigo  ienhor  do  porto  ^  a  onde 
eelavao  muitaa  ntos  a  oarga ,  e  para  ella  alguna 
akmiseas  cheioa  de  faieuda,  a  uma  e  a  outra  causa 
poe^rao  o  fogo ;  e  em  pouco  tempo  (xmsummio  o 
iooeiMiio  generos  de  muito  valor  ^  mas  nao  inteira^ 
mente^  porque  'a  diligencia  do  inimigo  p6dc  ate^ 
Ibaki  a  tempo  queaindasalvou  daa  cbamas  cabedal 
quemerecee  a  estimacao  d'uma  boa  presa,  --^Ded« 
•e  rebate  no  Arraial ;  Mathias  d' Albuquerque  e  o 
conde  Banhollo  marcharao  immediatamente  para 
Nazareth  ^  fizerao  alto  sobre  o  oabo  de  8anto  Agoa» 
tinho,  queficasobranoeiroA  barmi  f(nrtifidMo-^ee 
com  trincheiras^  assenUrao  algumas  pecas  d'al^ 
canoe  ^  e  com  os  pellouros  d'elb^  oome^^rao  a  ser* 
vir  OS  embaroa^oea  itriaiig^g  com  pofttaria  lie 


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QASmOtO  LOMTAKOU  91 

certa  que  largou  o  porto  e  as  ancorasi  e  turgirao  na 
enseada  fora  do  alcance  da  arteUiaria.  Vetido  oitao 
tm  nos$M  que  o  reduto^  que  o  Hollandet  fabrica- 
va ,  ja  nao  era  protegido  de  luat  iiios^  na  manha 
dodia  7  de  Marco  deac6rao  do  moute  seKenia  sol- 
dados  escolhidose  resoluioS)  e  com  tal  ralor  oiiiTes- 
tirao  que  immediatameiite  o  entrarao,  e  detalojario 
o  inimigo.  -^  Mao  noa  foi  d'utilidade  ctia  victoria , 
porque  ao  tempo  que  Mathiat  d'AUmquerquede»- 
cia  t!om  trezentot  soldadoapara  conaervar  o  gaohi- 
do^  entre  osappkusos  da  yictoria  so  tevantou  uma 
iroz  (  que  se  aifirma  ter  aaido  de  peito  traidor)  que 
OMiitat  Teaes  repetio  Tir  sobre  eUea  o  ioimigo  com 
todoopodW)  e  fez  tal  impressaonosanimoadoTul- 
go  que  Ihes  nao  deixou  tempo  para  a  reflexao  ^  e  a 
confusao  seguindoi*se  a  deac^ediencia  todoa  fugirao 
•em  qoealgum  Tiete  de  quem.  Protocado  0  inimi- 
go de  nosia  deBordem^  vditou  animoeo^  e  recupe- 
itm  o  perdido«  CuatotMnoe  este  deaaaire  vinte  mor- 
toi,  e  luuitoa  nais  feridoa I  uaosendpoMnorado 
porto  9  que  era  por  onde  recebiamoi  ot  aoocorroi • 
XXXVL  Animado  com  eete  aucceeao  imagiiKHi  o 
HoUandea  que  poderia  ofater  outro  maior.  Eu30  de 
Mar^  despedio  do  Arveoife  quinhentoa  toldados 
eacolhidos^  e  grande  multidao  de  ^asiadoree^  em 
uma  copiMa  chusaia  de  lanehas  j  que  favoreeidaB 
da  eacuridade  da  noite  aofairao  pek)  rio  Capiberibe 
a  cima  at^  junto  de  Pemam-Morim,  a  onde  deeem- 
barc&reo  eem  serem  aeiitideS)  e  onde  letanlarao  uma 
trincheira  que  guaniee^rao  de  geate  e  artelharia 
com  tat  prompiidao  que  primeiro  noe  aviwrao  as 
Uroa  que  oa  olkoa.  -^  Adfvertidoa  oeaoBioa  eome^a- 


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92  GASTRIOTO  LUSITANO. 

rao  nao  so  a  corresponder  ao  inimigo  com  os  tiros  de 
nossa  artelhria,  mas  a  provocal-ocom  alguns  solda- 
dos  que  deitarao  fora  ^  trayassando-se  repetidas  es- 
caramucas  que  sempre  acabavaoa  favor  dos  nossos. 
—  Vendoo  HoUandez  fnistradasuaesperanca  e  sua 
ruina  eminente  j  resoWeo-se  a  levantar  o  sitio ,  e 
para  melbor  encobrir  seu  projecto ,  maudou  urn 
tambor  com  embaixada  pedindo  a  entrega  da  for- 
taleza  com  promecas  e  ameacas.  Foi  o  messageiro 
despedido  com  o  desprezo  que  merecia;  mas  de 
que  0  inimigo  nao  fez  caso,  porque  so  queria  ga- 
nhar  tempo  e  nao  obter  resposta.  Embarcou  n*este 
meio  tempo  em  suas  lanchas  feridos ,  mortos,  ar- 
telharia  e  bagagem;  e  se  relirou  a  vela  e  aremo, 
evitando  com  este  ardil  o  destroco  que  temia  mais 
certo  na  fogida  que  na  assaltada. 

XXXVII.  Mathias  d'Albuquerque,  que  assistia 
com  o  grossoda  gente  em  Nazareth ,  sabendoo  que 
passava  no  Arratal ,  se  Ihe  re{H?esentou  occasiao 
opportuna  para  desalojar  o  inimigo  do  reduto,  que 
tinha  fabricado  no  pontal ,  e  Ihe  mandou  dar  «e- 
gundo  assalto;  mas  como  a  resistencia  estava  pre- 
venida ,  depois  d'uma  luta  proGosa ,  sem  que  a 
victoria  se  inclinasse  para  alguma  das  partes,  se 
aparlarao  ambas  as  nac5es  do  conflicto ,  deixando 
OS  nossos  sette  mortos,  e  levaudo  maior  numero  de 
feridos,  e  tendo  os  inimigos  muitos  mais  d'uns 
e  outros. 

XXXVIIL  Deixarao  estes  dous  successos  suspen- 
sas  umas  e  outras  armas  por  alguns  dias ,  no  des- 
trito  de  Pemambuco ;  tempo  de  que  o  Hollandez 
se  approveitou  para  dar  urn  do  a  sua  espada  na 


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CASTBIOTO  tUSITAHO.  93 

capitania  doRio  Grande.  Tinha-se4he  offerecklo  o 
genlio  da  terra  por  auxiliar,  que  i  naturalmente 
maligno  e  inconstante  j  com  nativa  propensao  para 
o  roubo  e  para  a  vinganca.PerauadioaoHoUandez 
a  entrepreza  da  povoacao  de  Cunhau^  com  a  riqueza 
do  saco ,  e  a  indefensa  do  lugar.  Saio  da  fortaleza 
governando  ao  mesmo  gentio  que  o  conduzia ,  de- 
rao  sobre  os  incautos  raoradores  tao  inopinada- 
mente ,  que  a  confiisao  cortou  ao8  misera^eis  ve- 
zinhos  o  caminho  da  resistencia  e  da  fogida.  Hor- 
rendas  e  execraveis  crueldades  exercitou  aqui  a 
barbaridade  e  o  odio ,  apostados  a  excederem-se  o 
herege,  e  o  gentio.  Nao  perdoou  a  espada  nem 
a  sexo,  nem  a  idade;  nao  respeilou  a  rapacidade 
osagrado,  nem  o  profano;  e  o  que  nao  pode  met- 
ier a  saccO)  condemnou  as  chamas.  A  ferro  e  a  fogo 
perderao  a  yida  perto  de  cincoenta  pessoas^  sendo 
d'este  numero  um  religioso  do  Carmo,  e  o  capi- 
tao  Fragoso,  a  quern  as  injurias  tornarao  mui  cruel 
a  morte. 

XXXIX.  Sem  movimento,  de  que  se  faca  lem- 
branca,  esteve  em  calma  a  hostilidade  at^  o  mez  de 
Septembro :  parecia  descanso,  e  era  mina,  que  arre- 
bentou  com  a  violencia  que  logo  se  vio.  Em  o  mez 
deMaio  chegou  asalvamentoum  soccorrodeduzen- 
tos  homens,  deque  eracabo  D.  Fradique,  com  mu- 
nicoes  e  mantimentos ,  que  da  Bahia  mandou  Diogo 
Luiz  d'Oliveira,  governador  g^ral  do  Estado; 
tomou  porto  em  Nav.areth ;  e  no  mesmo  lugar  deo 
Mathias  d'Albuberque  alojamen(o  aos  soldados  do 
soccorro.  Era  aquelle  posto  o  de  maior  importan- 
cia;  e  jielle  assistia  o  maior  poder.  Poueo  tempo 


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despoit  cbagaifto  ao  immigo  algumti  uio%  d«  Hoi* 
laoda  com  novos  caboi  e  miaittros;  e  com  ellei 
novas  ordent  i  ci\io  roaultado  ao  diante  veremoa* 
XL.  Para  ob»arvar  a  fortaleza  dog  Aflbgar 
dos,  qua  o  inimigo  tinba  por  mui  aegura,  tinba 
Luiz  Barbalho  ( ja  eatao  noDdeado  mestra  d^  campo 
d'um  t(9if  0  por  Matbiaa  d'Albuberque  )  aacolhido 
o  governador  doa  negroa  Honrique  Dias  o  qual, 
embuacaado  os  aeus  nagrog  oas  matag ,  pelos  lamar 
9afia  alcancava  quanto^  passos  elle  dava*  Succedeo 
que  em  12deSepteiubrosaiaoquatrocentosI1ollaa« 
dezes^  e  marcharao  pela  vargea  do  rio  Capiberibe 
eomodestiuo  de  aasaltarem  o  engeoho  de  Antouio 
Cavalcantiy  a  opde  o  gentio  seu  parcial  Ihe  promettia 
grande  preaa  (  e  para  asaegarar  a  retirada  deixou 
o  Flamengo  uma  eroboscada  no  engeuho  de  Fraiv- 
ciftco  de  Brilo,  Tudo  eutead^ao  e  observarao  o$ 
soldados  de  Henrique  Dias ,  que  sem  dilacao  tbz 
ayiao  ao  otestrede  campo  Luiz  Barbalbo«  — *  Ouvio, 
neste  meio  tempo ,  o  Hollandez  o  rebate  que  se 
deoLO  Arraial  i  suspeitou  que  era  sentido;  temeo- 
ge  cortado  }  maa  quando  se  poz  em  retirada ,  dec 
de  rosto  com  o  oapitao  Antonio  Andr^,  que  com 
cem  soldadoa  se  achava  na  campina  do  Figueiredo 
para  o  asaaltar  de  cillada.  Deo  sobre  o  inimigo 
com  desigualdade  de  numero^  maa  com  superiorida*- 
dadejvalor  ;  foi  d  uma  e  outra  gente  igual  a  resia^ 
tencia  e  o  damno.  Acmboscada  do  inimigo  ouvindo 
0  egtrondo  do  conflicto ,  largou  o  posto  para  acudir 
aos  seug ,  maa  achou-se  atalhada  por  outros  cem 
homens  nossos ,  que  Luis  Barbalho  despedio  do 
Arraial  para  esperarem  o  Flamengo  na  passagem 


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d'Amluroiio  Mtcbado)  e  ussim  earc^ido  pelos 
ttoaaos,  queTalorouoMnite  o  feriao ,  buacou  o  r^ 
rfaadionafugidai  porim^qiimdojaUie  pareeia 
aar  eacapado  do  maior  perigo ,  deo  na  embuioada 
do  Heoriqua  Dias,  quede  todo  o  darrotou,  ma« 
tando-lha  e  ferindo-lhe  muita  gente,  —  Quasi  ao 
OManH)  teiDpo  eiperimentou  igual  fortuna  no 
poito  do  CaWo,  E^va  alii  ancorada  uma  fragata 
iaimiga ;  aajo  a  tripola^^o  a  rovbar  pelpeertao  j 
d&o  ^bre  ellea  o  gratio  guiado  por  alguna  Portu^ 
goeeoa ,  e  fioi  tal  o  furor  com  que  oa  assaltarao, 
que  OS  que  esoaparao  de  mortos  ou  feridos ,  forao 
presaoB*  Dazoito  rendidot  apregentarao  os  vioto^ 
rioaoa  a  Maihias  d'Abuquevquet 

XI^L  Erao  oa  HoUapdezea  mais  solUciloa  em 
iModar  reform  do  que  o  governo  d'Hegpanha 
em  acoudir  com  aoocorro.  Apreatarao  quarenia  e 
geia  fragaUade  g^erracom  armaa,  muDi^oea,  e 
mantimentoa  em  abundaucia  t  guamecidaa  de 
geote  eacolbida,  e  chamada  de  varias  oacoeg;  para 
quetodas  as  pracas  do  nosao  £a(ado  fossem  toma* 
daa  definitivamente  pelas  armaa  da  companhia 
oecidentaK  Lafgou  vela  a  frota  nos  primeiros  diaa 
de  Dei&embro,  e  fayorecida  do  tempo  appareceo 
com  curta  viagem  sobre  o  porto  da  cidade  de  Fa«* 
raiba.  Tomou  paono ,  deitou  ferro  pouco  distante 
da  fortaleMdabarrai  que  cbamao  do  Gabedello,  e 
semimpedimento  deitou  em  terra  mil  oirocentos  in-* 
faatea* — Sitiouoinimigoa  fortaleza  por  terra  e  por 
mar  9  sem  que  a  uoasa  geote  Ibe  podesse  imped ir, 
levantou  triocheiras,  abrip  foaaoSi  plaatou  arteilia^ 
ria  ^  e  bateo  a  for^a  com  toda  aquella  divergidade 


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M  CASTBIOTO  uniTAifa 

de  tiros^  que  para  os  assedios  inyentou  a  arte  e  o 
furor.  Tinhao  ob  nossos  levanUdo  uma  trincheira 
a  tiro  de  pe^a  da  fortaleza  para  seguranca  da  praia ; 
ordenou  Sisgismundo  a  um  tro90  de  sua  gente  que 
a  escala  a  envestisse  e  ganhasse.  Avan^ou  com  Ta- 
lor;  foi  rebatidocomvalentia.  Grecia  o  furor  com 
a  perfia ,  de  sorte  que  ja  a  peleja  era  mais  vin- 
ganca  que  combate;  at^  que  morta  a  maior  parte 
dos  defensores  a  entrou  o  inimigo ,  franqueatido- 
Ihe  a  invasao  os  corpos  mortos  dos  seus ,  em  tanto 
numero  que  sobrepostos  uns  aos  outros  igualavao 
o  alto  da  trincheira.  Nao  teve  o  HoUandez  para  o 
triumpho  mais  que  a  prisao  do  cabo  que  era  o  ca- 
pitao  Ferreira ;  porqu^  os  soldados ,  que  erao  ape- 
nas  quatorze,  primeiro  derao  a  vida  que  largassem 
a  victoria.  —  Dura  resistencia  achava  o  Hollandez 
na  fortaleza ;  com  reciproco  damno  continuava  a 
bateria ,  sendo  maior  o  dos  cercados ,  porque  alim 
dos  pelouros,  granadas,  e  outros  artificios  de 
fogO)  ja  as  minas  tinhao  feito  voar  alguns  baluar- 
tes,  servindo  as  ruinas  a  muitos  de  sepultura.  A 
guarnicao  constava  apenas  de  trezentos  soldados, 
cujo  umero  tinha  consideravelmente  diminuido 
com  oprofiadoassedio  de  quatorze  dias.  As  municoes 
estavao  exhaustas ,  os  mantimentos  consummidos, 
o  perigo  certo,  o  soccorroduvidoso;  oque  hem  cott- 
siderado  pelos  capitaes,  com  prudente  accordo  ca- 
pitularao  a  entrega;  e  deixarao  a  pra9a,  samdo  os 
cap!  laes  e  officiaes  da  milicia  com  as  custumadas  hon- 
ras  militares;  e  em  sua  companha  todos  os  morado^ 
res  com  suas  armas,  ihoveis,  e  Uberdade,  para 
tomarem  o  caminho  que  ihes  parecesse ,  e  que  os 


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CASTRIOTO  LUSTTAHa  97 

soldados  pagos  ficassem  prisiondr os  at^  se  Ihes  dar 
passagem  para  fora  do  Estado.  G>in  as  rnesmas 
coQdicdeSi  e  muito  menos  defensa  se  rendeo  a 
ibrca  de  Sao  AnConio,  sabendo  que  a  fertakza 
estava  entre^. 

XUl.  Logo  que  Mathias  d'Alboquerque  reee- 
beo  o  aviso  de  que  o  Flamengo  sitkiTa  a  fS^rta* 
leza  do  Cal^edello,  despedio  ao  eonde  de  Banholk) 
com  o  seu  terco  de  Itaiianos ,  e  D,  Fernando  de 
Riba  Aguero  com  algumas  companhias  de  Caste-* 
Ifaanos  que  fossemsoccorrer  a  praca  com  a  diligen-* 
eia  que  pedia  a  importancia ,  e  que.  a  todo  o  risco 
Ihe  mettessem  soccoiro,  qiiaodo  nao  podessem  de- 
salojar  o  inimigo.  Erao  Castellianos  uns^eltalianos 
ontros  y  e  jornaldros  todos.  Doze  dias  gastarao  ua 
marcha ,  que  de  volta  fizerao  em  tres,  so  a  flm  de 
ch^rem  a  tempo  que  a  perda  6s  escusasse  da  ba- 
talba.  — Esperayao  os  habitantes  afflictosdacidade 
que  o  eonde  saisse  a  campo  a  fazer  opposicao  ao 
Flamengo ,  que  com  insolencia  saqueava  o  con- 
torno  9  ou  que  ao  menos  os  fortifioasse  e  defen- 
desse ,  mas  acbou-se  enganado  ^  e  vio-se  assoUado 
pbr  queraseimaginava  defendido.  Fermittioaos  sens 
o  saco  da  miserayel  cidade^  que  se  executou  com 
estranha  exorbitancia  :  golpe,  para  os  naturaes 
lanto  mais  sensivel  quanto  menos  esperado.  Assim 
ficou  a  atribulada  povoacao  sem  cabedal  e  sem  de- 
fensa,  exposta  ao  ultimo  da  calamidade  e  da  extor- 
cao.  Sem  resistencia  se  apdderou  d'ella  o  Hollan- 
der ;  nao  deixando  a  fortuna  aos  tristes  moradores 
mais  que  a  escolha  da  tribulacao  na  sorte  de  cap* 
'  lives  ou  declterrados.  Uma  parte  ^  e  foi  a  maior, 
I.  1 


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91  QAwmmQ  imrkMo. 

dfimwft^rw^  nm  ftmtiw  n-  9e^o  o  oumfnho  dot 
lUlJMiQff  qm  Ih9  levavao  ai  fazanikis,  outra 
part#t  «iiq^«cid«4ai^f^aiida8,  ae  d^iiou  eatar  em 
suMcrMW  com  mala*  ooraciio  pam  aoQrar  ioimigfoi 
declarados^  que  para  seguir  auxiliaPM  folf^M  i  t 
eatoaidjQj^  fjaiinngo  paaaapoptoa  da  vatiallos^ 
cofii.{roipaaaaa4e o»  awtentap  en  aeui  Ibroa >  e  no 
Urn.  fmroi^ia  da  raligiao  ditlioUQa  nomana. 
(MQ4aro«aa  ile  hosptdat  que  lago  rompeoa  tyra** 
nia  d4  i«phor» )  Gvaadaa  fwfto  oa  trabalhoa  doa 
cpm  aeguiraa  oa  ItaUaqoa  i  fiorque  una  tiraoM  m« 
UurAipante  deapojadoa  por  oq^M^Ua  om  qu^m  ^pe- 
ravao  A<»bar  ppotaecao ;  a  outroa ,  aaguindo  a  vepeda 
4q  Arriiftlf  YJ^o^^a^  aaaaltadoa  da  fome  e  da  mn 
saria,  pRdaceocb  liittmoaoa  piwaroa  na  cpuduQao 
de  soaa  familiaa  i  que  a  urn  maamp  tempo  vjaq 
rampm*  a  wato  wm  q  torBneotOi  a  o  cap  com  garni- 
doa.  Vm  taptA  affllio^Ao  9  xlaaamparo  Ihes  era  a 
coDsarvJi  d»  Antonio  d'Albuqq^rqua ,  a  de  muitos 
senhoraa  d'an§[anhoa»  triate  aiUvio,  poisaem  po« 
deimm  sarvirf3oma  socoorroi  aarviao  ad  com  o 
ewmpk)  I  a  todoa  igualiYa  a  aorta  no  infortunio, 
XLUi  Tftnto  qya  Siagiamiwdo  ae  vio  sanhor 
dft  eidftd^  9  foptalaia  e  barra  de  Paraiba ,  re^ 
partio  aw  ganta  em  mangaa  da  pequano  numero 
com  prdam  d#  aaqnearam  oa  angenhoa,  aldeaa 
e  donoAoilioa  da  todo  o  diatrioto ,  aam  dirtiacao  de 
alUadoa  a  p^baldw  j  o  que  ae  ei^^ecutou  com  inaaa^ 
siaval  qobiija ,  racolbendo  0  Flamengo  uma  grossa 
preaa.  -rr- Jntprmado  peloa  aeua  de  que  na  cam** 
panha  nao  bavja  sombraa  d'oppoaicao  nem  rebai^ 
dia,  4mxou  a  cidade  oom  limitada  guariu^aQ)  ^  Qom 


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CA9VRI0T0  UmiMO,  99 

o  groB90  de  aeu  pod«r  sq  foi  apodenmda  dt  terra ; 
marchou  At^  a  Goyana  i  em  cuja  mareba  te  Ibe 
aggregoQ  todo  o  gentio.  eustumado  a  i^eguira  me^ 
Ibor  fortuna ,  e  de  que  elle  ae  $ervio  para  a$  auai 
exp^i^oaa. —« Mathiaa  d' Albuquerque »  que  via 
nao  sem  receio  o  engrandecimeiitq  dp  iuimigo, 
cujo  yerdadeifo  inteuto  era  de  tomar  0  uoaio  Ar- 
raial ,  para  a$&im  firmar  o  aeu  dominio  ^  fn  logo 
aviso  ao  reiuo  do  que  era  succedidoi  pedindo 
com  grande  instaacia  soccorro  para  ooutrabalan^ar 
oa  reforgoa  que  elle  havia  recebido.  NaQ  oonvii^ia 
poi^m  estar  ocioaoi  e  para  obatar  d'algum  modo 
aos  progresaoa  do  Hollander  >  ordeuou  ao  oapitao 
Rebelliobo,  que  com  algumaa  companhias ,  tiradaa 
da  Nazaretb  e  do  Arraial  aaisse  a  cortar-lbe  o 
passo;  e  quando  a  opposicao  nao  baatasse  para  o 
deter  y  nao  deacausasae  de  o  picar.  -^  SutreUuto 
que  na  fortaleza  ae  CaEiao  todos  ob  preparativoa 
para  esperar  e  repeUir  o  inimigo,  chegou  o  oapitao 
Rebellinho  com  suas  compaubias,  e  as  de  alguna 
moradores  que  ae  Ibe  aggreg^rao,  a  uma  ^Jdea 
cbamada  SaoMigueldeMozupe^  a  oudefez  alto; 
mas  tendo  aviso  qiie  Sisgismuudo  marcbava  com 
todo  o  poder  em  direitura  ao  mesmo  lugar^  bus* 
cou  outro  mais  commodo  para  r^Uzar  o  seu 
ardil,  deitando  fogo  a  aldea,  Fassou  o  iuimigo 
$em  deter  a  marcha  dirigiado*$e  a  Mazurepe,  eo- 
gieubo  dos  religiosos  de  Sao  fiento^  a  onde  fez  alto 
sem  a<^ar  impedimento ,  porque  religiosos  e  se^ 
cularea  0  haviao  abaudooado.  Estava  o  Rebellinbo 
embuBcado  na  mala  de  Joao  Leite;  assaltou  o  ini- 
migo  com  noventa  soldados  com  tanta  fortuna  que 


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100  CASTMOTO  LUSTTAIia 

o  ftez  retirar  duas  vezes  em  grtnde  confasao  :  mu- 
dou  de  sitio  para  segundar  o  assalto ;  por^m  sendo 
descoberto  par  infidelidade ,  foi  acommettido  por 
todo  o  poder  de  Sisgismundo ,  e  depois  de  se  de-* 
fender  valerosamente ,  e  senda  elle  meamo  atra^ 
vessado  com  duas  balas. 

XLIV.  Nao  descancou   Sisgimmndo  nos  bra- 
cos  da  victoria;  antes  aproveitando  o  favor  da 
fortuna  dispos-se  a  continiiar  a  conquista  do  re- 
concavo :  o  que  conhecido  pelos  nossos,  comecarao 
a  preparar-se  para  a  defensa.  —  Os  dous  Albu- 
querques,  com  o  conde  de  Banhollo ,  que  aseistiao 
em  o  monte  de  Nazareth ,  deixarao  a  fortaleza  en- 
tregue  a  Pedro  Gorrea  da  Gama,  sargento  maior 
do  EstadOy   bem  guamecida  do  necessario  para 
sustentar  um  lai^  cerco ;  e  com  um  grosso  de 
geiite  se  aquartellarao  na  povoacao  de  Santo  Anto- 
nio ,  sitio  vantajoso  d'onde  podiao  soccon^r  as 
pracas  vizinha^.  Luiz  Barbalho ,  que  assistta  na 
povoacao  de  Sao  Lourenco  com  o  seu  (erco,  dei- 
xoua,  pela  mesma  razao ,  fortificada  o  melhor  que 
pode ,  e  com  duzentos  soldados  de  guarnicao ;  com 
a  maisgente  .se  passou  para  o  sitio,  qu^  chamao 
OS  Curraes  de  Santa  Anna^  e  de  U  despedio  duas 
companhiasparaos  Guararapes,e  outras  duas  para 
a  Jangada ,  que  assisddas  dos  moradores  pod^rao 
rebater  o  primeiro  impeto  do  inimigo,  e  dar  tempo 
a  retirada  dos  vizinhos.  Deixou  Luiz  Barbalho  cem 
homens  comsigo ,  destros  e  valentes    para   soc- 
correr  a  parte  donde  6  chamasse  a  necessidade. 

XLV.  Dispostas  as  cousas  nesta  ffSrma^  deitou 
oHollandez  ftJra  do  Arrecife  trezentos  soldados  com 


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GASniOTO  LDSiTAMO.  lOi 

ordem  que  foesem  reconheeer  a  noeea  fbrtaleza  do 
Arraial,  e  obBervar  a  situacio  d'ella,  e  os  postos 
mais  covenientes  para  os  quarCeb  e  batarias,  com 
que  a  determmava  cercar  e  oombater ;  deligencia 
que  Ihes  nao  deixou  conseguir  o  goyemador  d'ella 
Andr^  Marim ,  detidos  da  artelhana  lao  longe  da 
fojr9a)  quanto  alcancavao  as  balas,  at^  que  viradas 
as  cosias  se  relirarao  por  aquella  parte ,  que  o  Ar- 
raial  olhava  para  o  rio,  que  se  achava  deshabitada 
do8  moradores^  que  nella  se  nao  davao  por  seguros 
e  se  ibayiao  recolhido  aos  matos.  —  Sisgismuudo^ 
que  ardia  em  desejos  de  ganhar  a  pra^a,  assentou 
com  OS  seus  que  serkt  de  grande  consequencia  fazer- 
se  senhor  de  M oribeca ,  para  meibor  gaobar  a  for- 
taleza  e  a  campanha.  Saio  por  ianio  a  15  deFeve- 
reiro  ao  romper  damanbaa  commilquinhentos  sol* 
dadoseduzentoslndios,  s^s  confederados;  maodou 
marcbar  pela  estrada  que  guia  para  os  Gararapes ; 
e  depcHs  de  ter  fprmado  a  gente  no  moinbo  novo, 
com  caixas,  clarins,  e  baodeiras  tendidis,  deo 
sobre  a  povoacao ,  de  wrie  que  a  um  mesmo  tempp 
conhec^arao  os  moradores  o  assalto  e  o  rebate ,  os 
-quaes ,  yencidos  jMimeiro  da  confusao  que  das  ar- 
mas,  deixarito  a  poyoa9ao  liyre  ao  inimigo,  que 
ganbou  sem  golpe  o  que  nao  imaginou  leyar  sem 
cuslo.  — Depois  de  se  fortificar  na  Matriz,  sa- 
qoeou  o  lugar  e  a  eampanba  j  que  acbou  com  todo 
o  recbeo.  As  violencias ,  for^as  e  extor^oes^  que 
nesla  occasiao  padec^ao  os  miserayeis  yizinhos, 
forao  tantab  e  taonovas,<]ue  excedem  toda  expres- 
sao  f  ayanlajaiido«se  muito  a  crueldade  dos  Indi#s 
i  doaHoUandezes. 


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lOS  GASTiioio  unnAna 

XLYL  LogD  q«e  Luis  Barbftlho  tcvt  wiMo 
do  jMiccesso,  mdrchofU  com  cem  homctis  que  oom^- 
ngo  tinha  ^  e  algum  moradores  que  $e  Ihe  aggre^ 
g^rao;  unio-ee  a  tWe  no  caimiiho  D*  Fernando  de 
Riba  AgUero  ,  que  Mathias  d' Albuquerque  Ihe 
mandava  com  duzentos  homenSi  com  ordem  que 
encorporados  dessem  bataiha  ao  inimigo^  como  e 
qoando  melhor  occasiao  iivessem.  Fizerao  con-^ 
selho  OS  Talerosos  capitaes;  e  vendo  que  mo  tinhao 
foreas  sufficientes  para  atacar  o  inimigo  aberta-^ 
mente,  march^rao  para  aquella  parte  que  chamao 
a  eerra  da  Agoa,  a  onde  s^biao  andava  urn  terco , 
que  Siogumuudo  mand^ra  a  saquear  os  morado^ 
rea«  ->»Embo8carao-se  os  nossos  num  sitio,  por  onde 
havia  de  passar  o  inimigo.  Dio  sobre  elle  com 
grande  ardor  i  e  j&  o  levatao  de  vencida ,  quando 
Sisgismundo,  arisado  do  perigo  pelo  estrondo  da 
bataiha^  en?iou  um  esquadrao  de  socoorro  j  o  qual 
fez  mudar  a  sorte  das  annas,  sendo  os  nossos  obri^' 
gados  a  tomar  a  fiigida  por  remedio,  tomando  ca^ 
da  qual  a  vcn^eda  que  Ihe  pareoeo  mats  segura.  *-^ 
Luiz  Barbalhoi  acompanhado  d'alguns  Indios, 
.seguio  o  caminho  de  Supup^na ;  mas  quando  me« 
noe  o  esperaTa ,  deo  de  roato  com  uma  partida  d^ 
Hollande<es>  queacaso  marcbava  por  aqwUa  pttte  t 
aem  detenca  o  cerc4rao ,  dando4be  Yo^es  que  se 
rendessea  bMn  quartel ;  por^  o  femoso  capicao^ 
fiando  menus  das  palavras  do  inknigo  que  d'um 
fraco  cavallo  em  que  ia  montadO|  chegou-lhe  as 
esporas  a  tempo  que  se  romp^rao  as  eilhas^  e  Tcto 
ao  cbao  com  a  sella.  Nao  perdeo  o  animo  o  brioso 
capitao ,  antes  empunhando  a  espada  com  graudt 


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GAanmro  urmiMi  lOft 

d6Bead]tira9o  abria  lar^  caminho  por-entre  Oft 
Flaineagos;  e  rontpeDcb  o  ra»lo  veio  dalrM  lagir 
de  Gorjaru,  ondc  as  momdoroft  Ihederao  noto  coi^ 
Tailo  para  se  ir  a  Nazareth ,  e  d'ahi  oode  Mathiaft 
d'AlbuqverqiMi  aBaiBtia;  e  o  meBmo  fiterio  a 
D4  Fernando  e  tos  luais  capilaes. 

XLVIL  A  guarnicao  de  Sao  Loarenco ,  d»  qm 
en  cabo  Afibnsod'Albuqaenque,  sabido  o  des- 
troco da  notaa  genie,  lai'g&rao  a  potoa^o;  a  qtMl 
foi  logo  occupada  pelo  coronal  Chriaiotad'Attchei^ 
loAa,  qfne  goTeroara  aa  armasr  contrarias  tio  quanel 
de  Maciape.  ~  Aproveitando^e  Sisgiifiitiiido  do 
fiavor  da  fortuna ,  deipachou  logo  varied  parddaa  a 
ronbar  oa  moradore^das  aldeas  viiinbas ;  09  quaoii 
depcria  de  roubades ,  tiverao  que  soffrer  o  jugo  inU 
inigOy  OB  perdendo  cases  e  fa«etidas»  a  bweat 
patria  no  d^terro^  onde  vterito  por  fia  a  experi^ 
mentar  igtial  sorte« 

KliVlU*  Mardbava  Sisgimrando  00m  o  restance 
de  sua  gtnte  9m  aleance  dos  pobres  (ugltivof ^  f ou^ 
bando.e  apreuonando  ludo  que  eiicontra?ai 
carragado  de  groisa  presa  de  owoi  praia  e  rou^ 
pes^  seguia  sua  marcha  encaminhotido-ee  para  a. 
povoacao  de  Sanlo  Antonio  do  Gabo ;  mas  quande 
elle  meaos  o  eiperava  caio  nttma  emboscada ,  qw 
1am  Batbalfao  Ibe  linba  amado,  na  qiial  perdeo 
tanta  geoie^  que  se  m^  aU*efeo  a  passer  adtame 
sem  mandar  irir  do  Arracife  quinhentos  booMnsi 
Refor^ado  ee«  estes-proseguioseu  lUt^nto^  e  c«h 
segiiio  apoderar*ee  da  pof oa^  seiti  re9iilenGia««M» 
Ganhada a  powa^ deSaaUi  Aotoaae 0  occnpou 
SisgiioiUDdei  tedoseu  euididoeaa  cortarto^veredas 


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1«&  cmnjoTO  LoanAMa 

que  guiavfto  part  a  nosaa  fortaleaa  de  Nattretli, 
com  iQleojU)  de  a  privar  de  todo  o  aoocorro.  €o- 
nbeceo  Malhias  d*AUmquerque  o  deeignio;  lemeo 
o  oerco,  wpmb  pek  fome  que  pdo  ferro ,  eantes  que 
o  obrigasse  o  perigo ,  ae  relirou  para  Sirinhaem, 
debando  a  fortaleza  bem  provida  de  soldados, 
armas,  muiii9oe8  e  viveres, 

XLIX.  Tinha  o  HoUandez  reunido  toda  a  forga 
doaeu  poder  napoYoai^ao  de  SaoLouren^o,  £Bizendo 
d*aquelle  lu{;ar  frooLeira  a  nossa  fortaleza  do  Ar- 
iraiai;aUifezaeuftcoii8elho8y  decidindo-senellesque 
a  urn  meamo  tempo  ae  deviao  aiiiar  aa  fortakzaa  de 
Nazareth  e  do  Anraial,  a  fim  de  que  obrigadoa  oa 
noaaos  a  di  vidlr  aa  forfas  nao  jx>deaaem  fazer  gran«- 
de  reaiatencia.  En  3  de  Mar^o  aaio  de  Sao  Lou- 
ren^o  o  inimigo  com  todo  o  poder ,  e  eocaminhou 
a  marcha  para  a  varzea  de  Capebiribe.  Oa  mora- 
dorea  aviaadoa  do  rebate  ae  retirarao  \  deixando  o 
mdhor  de  aeua  moveis,  abuscar  com  auaa  familias 
o  abrigo  do  Arraial;  mas^  tendo-M  o  Flamengo 
adiautado  a  cortar-lhe  aa  eatradaa,adiarao  o  infor- 
tunio  oadie  eaperavao  eooontrar  o  aailo.  —  Andr6 
Marim^  goveraadcNr  da  fortaleza  y  certo  noa  inteu- 
toe  do  iuimigo »  ae  preveaio  para  a  defenaa  como 
pr^tico  e  Taleroso  aoldado  :  mandou  deepejar  a 
pra^a  de  loda  a  gente  iautil  para  tomar  aa  armaa; 
advertio  que  ae  recolheaaem  aqueUea  generoa  e  • 
matenaea  que  podiao  aenrir  ao  auatento  e  aoa  repa- 
roa ;  ciugio  a  forlaleaca  de  cayaa  e  trindietraa,  dei- 
undo  entre  a  fortifica^ao  externa  e  oa  muroa  da 
for^a  capacidade  para  ae  empartrem  oa  moradoreai 
e  ae  reccdhcrem  oa  gadoa  da  eafflfMiDba;  ordaM>u 


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GASriiOTO  tmiTAlK).       '  105 

aos  capilaes  Antonio  Aadr^  ^  Henrique  Dias ,  e 
Joito  F^nandes  Yieira ,  que  ja  commandava  uma 
comfNinhia  de  aventureiros^  todos  mancebos  alen- 
.tados  e  nobres,  que  ficassemf^ii'apara  descobrirein 
o  campo;  e  d'esta  maneirase  pfeparava  para  uma 
vigorosa  resistencia. 

L.  Gbegou  o  exercito  ininiigo  a  avktar  a  forta- 
leza;  escolheo  sitios  para  as  baterias,  edeo  prin- 
cipio  a  circumvallacao.  Acavalleirodapra^aestava 
uma  eminencia ,  a  onde ,  por  esta  razao ,  tinha  o 
conde  BanboUo  principiado  um  reduto  y  que  sua 
frouxidao  ou  seu  disignio  o  deixou  lao  informe  que 
vierao  muitos  a  dizer  fizera  nelle ,  para  a  conve- 
niencia  do  inimigo  o  que  bastava,  e  para  a  de- 
fensa  da  fortaleza  o  que  nao  servia.  Aproveitou-se 
o  Hcdlandez  do  posto,  e  nelle  plantou  a  mais 
grossa  de  "Sua  artelharia ,  que  fortificou  de  boas 
trincheiras.  Fez  outra  bateria  naa  easas  de  Jero- 
nimo  Faes ;  e  em  ouiros  sitios  diyertas  plataformas, 
com  pecas  refor^adas  e  sufBcientes  guaroi^ees ;  e 
nas  partes  onde  sabia  que  podiao  laborar  ccHn  mais 
eifeito  J  assentou  alguns  trabucos  e  morteiros.  Foi 
o  inimigo  fechando  as  dislancias^  entre  bateria  e 
bateria  y  de  profundas  cavas  e  grossas  trincheiras, 
em  quesem  distin^ao  trabalbavao  gastadores  e  sol- 
dados.  De  tudo  u^cessitava  a  occupa^o ,  porqu6 
OS  continuos  asssjtoados  sitiados  os  constrangiao  a 
defenderem  com  um  bra9o  0  que  obravao  com  o 
ouiro.  —  En  23  de  Marco  sairao  os  Portu-^ 
gueses  da  fortaleza,  em  bora  tao  bem  escolhida, 
que  i^udada  sua  determinacao  do  descuido  do  Hol- 
landez  y  o  poserao  em  contingeneia  de  se  perder  ; 


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106  ^  Qknumo  hvuBumo. 

maUrao,  feriiioi  sacfudtoao  o  quaitel ,  •  ToltaiM 
inuito  a  Beu  salvo  para  a  fortaleau^  antes  que  o  inir 
migo  ie  cobraase  do  terror  em  qua  o  poi^rio*  £m 
o  primeira  d' Abril  ( que  entao  foi  um  domiogo  ^ 
Ra«ioa )  derao  oa  nodsea  aefjunda  asaaltada  ^  qtmai 
com  o  mesmo  successo;  e  assim  coutinuirao  varas 
veaea  ai^  aoa  priocipuNide  Jiiiiho.-**-yia  o  Hollau- 
d€z  veucida  aua  contumacia  de  no88a  reatateDda, 
e  deaconfiado  daa  promessaa  de  aua  eBperan9a, 
determinou  empefthar  na  empreza  o  ultima  tte 
aeu  poder  e  de  suainduatria*  Biandou  couduzirdo 
Arreoife  mais  arleUiariay  e  de  maior  ealibre^  con 
que  refoTQou  suaa  bateriaa ;  ordenou  que  de  noke 
e  de  dia  ae  laboraate  sem  interpolacao  de  tempo  em 
todaa  as  eaUncias^  para  que  ot  oercados  nao  tivaa^ 
aem  bora  de  deacan^o  nem  de  aeguro ;  cboriao  efle^ 
tivamenta  aa  bombaa  e  as  granadaa  deritro  da  for«- 
taleaa ;  ^a  quaea  attarao  oa  oosaos  tao  acuatumadoa^ 
que  com  couroa  molbldoa  aa  eaperavao  ^  e  Ih'oi 
deitavao  em  cima  taolo  que  calao  ^  dos  quaea  aba^ 
fiidas  ae  apagavao  aem  surtirem  eflefto.  Redobra- 
▼ao  OS  Dosaoa  de  Talor  e  de  constaucia  k  proprocao 
que  o  eslrago  craacia^  cauaando  no  inimigo  grande 
perda;  porque  oa  artilheiro^  bornenyao  com  tania 
deatreza  aa  pecas^que  aonde  punliao  a  mirayahife^ 
ria  a  bala;  e  oa  moaqueteiroa  aiiravao  com  poAta* 
ria  tao  eeria^  que  nao  perdiaa  tiro.  Confuso  0 
Flamengo  de  yer  a  nosaa  ooustanoia  e  am  eatrago^ 
reaolveo  a  levar  por  assedio  o  que  nao  podia  con* 
aeguir  por  asaalto«  Cortou-^noa  todos  oa  eaminbos 
do  retnadio;  pfirOu»noa  de  Mdaa  M  oommunioa* 
9dea^  e  oonAemootMios  a  uma  penuria  lal  que 


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GAmiOVO  ftOOIlIttk  107 

OMiB  pareciao  ^atntuaa  que  e6r|>o«  tiiiiMido»  os  d^ 
fenacHres  d'onui  fortaleza  em  que,  9lim  dos  horro^ 
res  da  guerra,  tado  faltara ,  encepto  q  aDimo  e  o 
valor. 

LL  Trea  mezea  se  passarao  nesta  profiada  luta^ 
9tm  que  oa  cercados  liTeaaem  a  manor  sombra  dc 
lerem  soGoorridos.  A  muitoa  pareceoest6  deaam«- 
paro  artilicio  da  infiddidade ;  outros  queriao  que 
fosse  frouxidao  do  desaso  ,  por^m  o  c^to  i  que  a 
ei&caoia  deaemparou  o  valor.  Yendo^se  pois  oe  ai**- 
tiadoa  destituidoa  de  todb  o  humaoo  auxilio,  e  ex^ 
poaioa  a  furia  da  invaaao  por  fatta  de  muniooea^ 
auatento  e  vigor  (esladode  que  o  ioimigo  tiBha 
todoa  OS  dias  aviso  )^  com  maduro  comelbo  se  re^ 
aolvdrao  a  enlregar  a  praca ,  que  nao  podiao  Uvrar 
com  perderem  as  vidas.  Capitularao  aentrega  com 
as  seguintea  coudicoes  :  1^*  Que  todoa  os  caboa  a 
soklados  pagos  sairiao  com  auas  anoas  at^  o  Aire*- 
cife^  oiuie  ae  Ihe  daria  embarca9ao  para  as  Indiaa 
deGasialki.2^«  Que  deiaariao^  em  ceCeos  das  em^ 
barca^oes  que  os  levasaem,  dous  capilaes  quaes 
elks  eacolhessem.  3S  Que  o  aprcsto  e  forueci**- 
mento  doa  navios  eon^ria  por  conia  da  Cotnpa*' 
nhiaoccideaial^-^Estacapilulac^ao  foi  feita  com  a 
aaeisteucia^i  genetal  Siagksmundo  VauScop;  da 
qual  se  servirao  para  esoond^  sues  vis  inten9dea 
k  cerca  dos  moradi^raa  da  fortaleza.  EmpenharacMW 
08  noasoe  capilulaules  etn  tirar  para  os  moradorea^ 
que  estavao  recolhidos  na*  fortaleza ,  os  partidos 
mais  favoraveis  que  ser  p()desse ,  e  seni  esta  con- 
dicao  recusavao  a  entrega.  Com  fingido  seutimento 
se  derao  os  HoUandezes  por  offendidos ,  dizeado 


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108  QABtmno  LosiTAno. 

que  OS  mortdores  pela  entrega  da  forca ,  passavao 
dt  inimigos  a  vassallos ,  e  como  laes  deireriao  ser 
iratadoB;  e  que  nao  ha  via  razao  |)ara  que  aos  ami- 
gos  se  tratassem  nas  capitulacoes  como  a  contra- 
rios ,  pois  como  a  subditos  deviao  defend^l-os ,  e 
^nao  oprmil-OB  como  escravos.  Tomirao  posse  da 
forialeza  em  10  de  Junho  de  4635.  —  Seguros 
na  promesa  (  que  apadrinhava  a  razao  e  a  po- 
litica )  quizerao  sair  os  moradoi*es  da  for- 
taleza  y  quando  os  embargou  uma  ordem  dos 
governadores  das  armas  hollandezas ;  e  logo  nm 
decreto  passado  em  nome  do  Principe  de  Orange, 
pelo  qual  os  condemnaya  |)or  traidores  a  perder^n 
as  vidas.  Viao-se  os  afllictos  moradores  captivos 
sem  causa,  e  oondemnados  sem  culpa.  A  confianca 
e  a  innocencia  Ihes  faziao  insoffrivd  o  golpe  :  bus- 
carao  a  intercessao  e  o  favor  na  lastima,  e  s<5  o 
ach^rao  na  peita,  e  depois  na  compra,  remindo 
as  vidas  a  excessivo  preco.  —  Joao  Femandes  Y iei- 
ra  se  resgatou,  e  a  dous  mocos  seus^  pelo  preco 
em  que  o  Hollandez  o  estimou  ;  o  mesmo  aconte- 
ceo  a  lodos  os  mais  capitaes,  sendo  alguns  d'elles 
eondemnados  a  tratos.  Uitimamente  nenhum  de 
quantos  recolheo  a  fortaleza  deixou  de  se  resgatar 
com  maior  rigor  do  que  se  fora  captiM^  em  Argel. 
Pbr  tralo  lao  infame  adquirio  o  inimigo  vinte  e 
oito  mil  cruzados;  que  tantos  dizia  haviagastado 
no  sitio  y  como  se  o  roubo  se  jostificara  com  a 
Urania. 


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LIVRO  IV. 

SUMMAMO. 


1.  iBlcMStigtoimiBdto  aiMllir  ft  tHta  d€MriiilMm;rade^afo 
leza  de  Ifaiareth.--S.Mftllif«f  d'Albuqierque  retira-te  pan  a  La^oa; 
manda  o  Flanengo  uma  etquadra  tohrt  o  porto  do  Cairo ;  ftz-Vha 
opposHao  o  condo  BaBliolto;  torpe  ae^fto  que  pratica.  —  3.  Matbiai 
d'AIbiiqii«rqiie,  infonnado  do  soecesso ,  resolTe«te  a  desalojat  o 
inimigo;  ^  qval  fbge  desbaraiado,  e  perde  a  prime  ra  e  logonda 
fortifieacao  ;  mom  Calabar  corademnado  A  fbrea ;  Maibias  d'Alba- 
qnerque  prosegne  sua  marcha  para  a  Lagoa.  -«4.  Chej^a  Sbgia- 
mundo  ao  porto  do  Caho,  e  o  que  neUe  faz;  edifiea  uma  fortaleia 
na  Parapoeira,  e  om  redato  no  rio  Caroaragibe.  —  6.  Chega  ao 
Brazil  D.  FraDCueo  de  Roxat  com  am  loeeorro ;  reaolucao  doi  mo- 
radorea.  —  6.  0  Rebellinho  desaloja  SisgUmuDdo,  entra  na  po- 
voacao  do  porto  do  Calvo;  sai  a  reoeber  D.  Luiz  de  Roxag ;  encon- 
Ira-ie*  com  o  coronet  Chrlitovao  Arehitofls.  »  7.  Ayistao-se  ot 
eoiereitoa,  e  anlma  D.  Lvlz  oa  iew;  tnta-so  a  pele|a;  imia  bak 
uraidora  maUa  D.  Luiz  de  Rous;  perdem  ob  Portuguezei  a  vic- 
toria. —  8.  Yalerota  accao  de  Manuel  Dias  de  Andrada ;  cobardia 
dot  estrangeirof ;  dA-ie  tepultnra  ao  eorpo  de  D.  Luiz.  ~  9.  0 
eoode  Bafibolio  luccede  a  JD.  Luiz ;  ditpoMfoea  que  toma.  «-10.  0 
Rebellinho  peleja  com  o  Flamengo,  eretira-se  rencido;  Yinganca  e 
craezas  que  o  Hollandez  executa  nos  moradores.  ^11.  Estrago 
que  fez  o.  Camario  na  eampanlia  de  Goyaoa;  aeode  o  Hollandei 
a  rebater-lhe  a  furia ,  e  elle  o  deseompoe  at^  ae  retirar  vietorioao. 
—  12.  0  capitio  Rebellinho  talla  a  campanhadaParalba;  encontra- 
ae  com  o  inimigo,  e  soccorrido  por  Henrique  Diaa  retira-ae  maia 
veneedor  que  Yencido ;  faiem-se  outras  eicunoea.  —  13.  A  Gampa- 
nbia  occidental  maoda  de  Hollanda  novos  cabos  ao  Brazil ;  toma 
terra  o  conde  de  Nassau,  e  rai  sobre  o  porto  do  Calvo ;  o  conde  Ba- 
nbollo  traU  da  ftigir.  —  fl.  Chega  o  conde  Naif au  A  vista  do  por- 
lo  do  Calvo ;  aaem  oi  nosaos  a  receb61-o ;  rompe  oi  efquadroas.  ^ 
15.  Segunda  batalha  ;  valerosa  accao  de  Henrique  Dias,  e  do 
cainlio  Barbalho.  — 16.  Bagnollo  detempara  os  sous,  e  elles  o 

.  posto  e  a  povoacao ;  Nassau  pde  cerco  A  fortaleta ,  que  ae  antrega 
a .  partido*  —  17.  Intenla  Nassau  levar  a  cidade  da  Bahia  por 
entrepreza;  retira-se  casdgado;  fortifica-se  para  bater  a  cidade; 
manda  uma  embaixada  aoa  oercados ;  mui  resposta :  continua  a 


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410  CASTRIOTO  LUSlTAWa 

bateria;  mas  tifaludo  peloi  nouot,  foge  comgrande  parda.^lS. 
RMolve-»e  em  Madrid  a  rettaura^io  do-EsUdo ;  nomea-ie  para  a 
empresa  o  condc  da  Torre,  fluja  aolicia  chega  ao  BrazU.  —19. 
Sai  a  armada  de  LUboa,  chega  4  cosla  de  Pernambuco,  e  dobra 
0  eabo  de  Santo  Agostinho;  o  conde  da  Torre  dispoe  ositjo  do 
Arrecifepor  terra;  chega  a  armada  A  fiita  de  Peroambuco;  derroU 
para  as  Indias.  —  ^.  Deitou  no  porlo  do  Tonro  a  Luiz  Barbalho  ; 
pratica  que  elle  faz  A  sua  gente;  d&  principfo  4  marcha  :  o  que 
.  M«  9uocada.^dl«  DAiit  mm  t%  liUft  fiiecli^ «»  Mm^  e«pii4ea. 
qu^  Q  «#oda  dA  T4)rr«  fHAitdav  A  cM>pii»ht  de  Pen»«mlw«Q,  os 
quaes  »a  aneorporao  com  Luiz  9arbAUiop  ^  7X  Umi$  a  «^4a  de 
Naiiaa  uma  aroN^da  a  d^truir  o  recoopafo  iM  Bato.  ^S(3.  Chega 
4  Pabia  o  marquei  de  Blonulvao  por  YU^M;  mAnda  infieaur  a 
campanha  de  Pernambuoa.^24.  I^aiHU  nAiula  embniuda  ao 
YiiooRei,  0  qual  Iha  reaponda  com  dis«iipuIa«ao«^  2t(.  Heviqua 
piai  e  Paulo  da  Cunha  chegao  ao  raeopoiiTo  d#  Paroambuco  ;  o 
qua  iiellaobra*^  ^  30.  Morte  d«  Joao  inu»Ui|  iniM  da  conda  de 
Naasau. 


I.  Depois  que  o  HoUandeaj  3e  acbou  seahor  da 
notfsa  foFtalesa  do  Apraial  apertou  o  oerco  a  da  Na- 
zareth ,  engrossando  o  poder  de  um  sitio  com  a 
geute  que  deaocupou  o  outro.  Detxou  a  fortaleza 
guarnecida  com  seiscentos  soldadoB  escolhidos  e 
dnxenlos  Indios  aUiados,  e  marchou  Sisgismundo 
para  Nazareth ;  e  Gado  na  fortuna  de  suas  armas, 
intentou  levar  de  caminho  por  entrepresa  a  villa 
de  Sirinhaem.  Mathias  d' Albuquerque  ,  que  se 
havia  retirado  para  esta  villa,  como  dissemos  no 
livro  precedentep  posto  que  havia  destacado  o  con- 
de de  Banholho  com  o  aeu  terco  para  o  sitio  da 
Lagoa  (^  uma  povoacaocom  rio  que  faz  barraqua- 
reota  e  ciuco  legoas  do  Arreoif*^  para  o  sul ) ,  para 
qlie  nelle  0e  fortificaaso  e  segurasse  a  retirada  y  em 
caso  de  necessidade,  informado  do  desenbo  do 
iuimigo  y  maiidou*o  receber  com  parte  da  gente 


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que  aUi  tinbti  e  com  tao  bo«  fortiioa  o  fiserao^ 
qo^  Q  fhmwgo  veodo-^e  atalbad^  e  iat 0itido  i 
^pada^  depois  derqahido  coiobftte,  yoltou  a$  wb^ 
tMf  9  desistio  da  empreza*  Fe]Mi#fi¥H»  nasie  mi^ 
CQutro  o  capitao  Autonio  Aodr^^  oujll  morto  foi 
9Wtida  de  tQdoa;  oatr^Mi  douft  cfipitie*  Qdim  pra* 
^ion^iros  p^la  demaxia  com  que  9^  empeaharao ;  e 
Uvcpno$  outro»  mortoa  e  feridpa »  nao  aeodo  meaor 
a  perda  do  mimi^*  -*^  Apertou  Siagiarouodo  09 
ataqtu^  &  fortalfiza  de  Nazareth^  de  aorte  que  ji 
ueJla  erao  mais^  aa  ruinaa  qu^  oii^^mroa ;  augmea« 
tava  a  fome,  diminuiao  aa  muniode^  e  os  defeo-' 
9ore9;  de  soccoiro  uao  havia  uotieia;  at^  que  reU" 
dida  a  couataneia  aos  p^  da  impoaaibilidade , 
capitularao  a  entreat  seguiodo  o  examplo  da 
fortaleza  do  ArraiaL  uas  coudi^a  e  noa  mativoa. 
Eutrou  nella  0  Flameuga  em  o  1*  de  Julho 
d'eate  mno  de  1635. 1?esta  maneira  ae  per<r 
ddrao  duas  pra^s,  que  tanto  trabalho,  disi** 
peudio  e  aangue  custarao.  A  de  Nazareth  con^ 
servou  o  iuimtgo;  a  do  Arrail  mandou  arpuzar, 
porque  talvez  a  reputava  inutil  ao  aeu  deaignio. 
II,  M athias  d' Albuquerque  vendo  as  nossaa  duaa 
forlale%aa  em  poder  do  inimigOy  e  conhecendd 
quanto  ae  acbava  arriacado  na  villa  de  Sarinhaem, 
safe  d'ella  com  toda  a  gente,  e  marohou  para  a 
Lagoa.  Chamou  a  si  todosoa  moradores  que  ae 
qui»erao  retirar  ^  0  que  flzerao  muitos  00m  suaa 
familiaii  e  moveia;  para  tudo  deo  oarruagens, 
e  para  todoa  provisao  ,  senao  como  o  pedia  a 
neceasidadf ,  como  o  permittia  0  tempo.  Buioava  o 
general  conaolar  a  todos ,  e  auimaWoa  com  a  oertesa 


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115  GASTRIOTO  tUSlTAHO. 

do  soccorro  esperado  em  uma  armada ,  que  dizta 
ser  partida  do  reino  em  sen  favor;  mas  ponco  ef- 
feito  (aziao  suas  promessas,  e  s<i  em  sua  companhia 
achava  o  afflicto  povo  alguma  consdacao. —  Entre- 
tanro  que  Mathias  d'Albuqerque  fez  a  sua  retirada, 
apprestou  Sisgismundo  uma  armada  de  doze  fra* 
gatasy  a  qual ,  navejjando  trinta  e  quatro  legoas  do 
Arrecife  para  o  sul ,  foi  sobre  o  porto  do  CbWo 
guiada  pelb  rebelado  Domingos  Pprnandes  Cala- 
bar, a  cuja  persuasao  fora  preparada.  Tomou  por- 
to na  barra  grande  ,  cinco  legoas  do  porto  do 
Calvo;  deitou  aquella  gente  em  terra  que  julgou 
bastante  para  seuintento,  nao  fazendo  caso  das 
fracas  trincheiras  que  os  moradores  alii  haviao 
feito.  —  Chegou  logo  ao  porCo  do  Calvo  a  noticia, 
ao  mesmo  tempo  que  alii  tambem  chegava  .o  eonde 
de  BanhoUo  com  o  seu  ter^o  de  Italianos,  e  o  mestre 
de  campo  D.  Fernando  de  Riba  Aguero  com  parte 
de  Castelhanos  e  Portuguezes,  de  que  se  formava 
o  seu  terco ,  os  quaes  marchavao  em  um  corpo  para 
a  Lagoa  :  era  aquelle  seu  direito  caminho.  Pareceo 
aos  moradores  milagroso  o  succeso  ;  com  toda  a 
submissao  e  efiicacia  pedirao  ao  conde  nao  perdesse 
occasiao  de  tantoservico  de  Deos,  de  seu  Rei,  ede 
tanta  gloria  sua.  Nao  pode  o  conde  escusar-se ; 
concedeo  o  soccorro  com  animo  sem  duvida  de 
fezer  irremediavel  a  perdicao.  Mandou  que  a  car- 
niagem  seguisse  a  marcha  para  a  Lagoa ,  com  suf- 
Sciente  guarda,  e  metteo-se  na  povoacao  com  toda 
a  gente  que  tinha  de  guerra.  Gastou  aquelle  dia 
em  oercar  a  igreja  matriz  de  estacadas ,  para  reco- 
Ihimento  do  povo  e  reparo  da  sua-  gente.  No  dia 


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CASTB1OT0  LUSTTANO*  118 

seguinte  se  virao  desenroladas  as  bandeiras  inimi- 
gas  no  outeiro  quechamao  de  Amador  Dias^  de- 
J>aixo  das  quaes  marchaTao  settecenioe  HoUahdezea, 
corlados  jd  d'um  assalto ,  qae  alguns  inancebos  na^- 
turaes  da  terra  Ihe  tinhao  dado ,  com  per^  cour 
siderayel.  DivisArao  a  nossa  gente,  e  fiserao  ako 
timidos  pelo  dan^ino  recebido/  e  espantados  do  qu^ 
nao  tinhao  imaginado ,  vendo  a  forma  e  o  numero 
do  esquadriio,  que  os  esperava.  0  general  inimigo 
fez  uma  faUa  aos  seus  soldados ,  animando-os  i 
peleja ,  e  mostrando-lhes  quanto  seria  perigoso 
reenar  diante  da  empresa  come^a;  a  qual  fee 
n'elles  tal  impressao,  que  pompendo  a  [Mradca  mar- 
ch^rao  a  buscar  a  balaiha ,  que  o  nosso  esquadrao 
Ihes  offerecia  immqyei. —  Com  igual  Marte  se  d^ 
rao  e  reoeb^ao.asprimeiras  cargas,  pordm  com 
desigual  valentia  ter^ou  a  espada  D.  Fernando 
de  Ril>a  Agnero ,  a  quern  seguirao  cincoenla  sol* 
dados  portuguezes  e  caslelhanos ,  que  rompendo 
pelo  esquadrao  hoHandez  j  odesGompos^raoeabrf* 
rao  com  estrago  e  espanto  do  inimigo ,  querotose 
julgou  deslMiratado ;  e  de  todo  ficiira  perdido^  se  o 
conde  de  BanhoUo  com  os  seus  Ualianosseguirttao 
efficaz  exemplo;  mas  este,  ou  por  eobarde  ou  por 
traidor ,  em  vez  de  entrar  na  batatha  para  vaicer 
o  plei to  ^  deixou  os  valorosos  e  fieis  soldados  com 
seu  capitao  nas  garras  do  Flamengo,  das  quaes  se 
li?rArao  industriosos  e  valentes  :  D.  Fernando  y^l^ 
leo-se  d'um  alagadico  que  Ihe  servio  de  reparo^ 
para  escapar  i  morte  e  A  prisao.  Ficou  o  HoUan-* 
dez  senhor  do  campo,  da  povoa9ao,  e  dos  nora- 
dores  desemparados  de  todo  o  faror  humano. 
L  8 


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.  |1{«  M^r^^vrt  Malhia4^  d*Albiiquenqu§  nn  forma 
-WferWji  J  a^iwJo  Qt  paftw»  do  <?qnd§  B^pboJlo,  e 

x}i)$  JtiAi#op9t  Com*  <»i4toO  frudeat^  ^  eipepim^a.- 
.litfto  «a9(iBo<>^«^  do  podep  f)  9^\qjaintnto  do  ini^ 
wigQf  dfli|n4io  »  c«»rwg#fa  ^r  Ter^»  d«su* 
M4«ft  I  6  «Qni  o»  soldfidos  d^tfo'minou  bu3^r  o 
JHQlbnide^  HWk  saus  alojaipi^toa*  For  ord^m  i^ua  sa 
(dimtArto^  capiue^  Fraiiaisco  R^hello  e  As$ei|so 
dfi  SiWa  2|  fi^pevav  o  iQimi9>  d^  am)>o&cada ,  «ntr9 
%  pQvfWicio  e,  o  outeiro  d^  Amador  Alvares.  —  H 
^«»te  t0iap#  tinim  o  capitao  SquIo  parsuadido  ao 
Mrs^nta  JQaiop  da»  armas  hoUanda^ua*  chamftdo 
Fkar )  aaiiie  a  eortar  o  pasao  a  Mathia^  d'Albu- 
quarqiuB,  qye  marcbavft  pwa  ft  LagM  com  oa  morav 
dbniida  F^bafiEkbuoooaiTe^osdomaia  precioao 
daaeua  Hio?«is>  aiaeguraado4hex>iqittashna  presa^ 
eioayt^  a  vi<^0riai  poU  ia  combataroom  urn  cabo 
daiarmado  e^saobcMkoido.  Damou^aa  o  HolUndas 
hiTar  da  ctobttgay  a  aonfiado  na  aapitao  Souto,  que 
ae  oflpsmoeo  pava  0  acompanhari  aaio  a  exacuiar  0 
pro^oatoi  Vipao  apeniia  ims  yiote  ioldadoa  poiau-t 
gMf aaa  a  iadioa  que  os  doui  oapitaaa  emboscadoa 
iinbao  daap^didQ  a  provocar  o  Flameago ,  a  mais 
aa  coofitadinrao  ao  dito^  ouidando  qua  eiio  foragi^ 
doa  qu^  andajaf)  rQubaudo.  *«-Piear  lavava  f6  duas 
companbiaa,  tando  deixado  traa  da  guamigaa  em 
fen  alogameuto ;  s^fuio  a  Sabastiao  do  Souto ,  qua 
Um  aerTia  da  guia,  o  qual  carragaudo  oa  vinte  9(A^ 
dadoa  o  entranhou  na  emboaaada,  e  $a  paaaau  aos 
nossoa^  ipia  furoiuptoa  a  diacipliuadoa  daiio  uma 


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r^oq  4^s)iar«tad9  m  diffigo  do  m^^io  <)e  mt 
forti|i<!a^(^  m^  nal^  o  p^  fai«w  t^BtQ  a  t^mpo  qii^ 

j^dQ  e$t^>  tw4o  4^pa4«,  weno*  Pwar ,  <«e  qp» 
dez  coinpai^it^  \mfi  acordo  para  afliaBtar  a  fu**- 

dfsfeu^a  (jue  de^foapai^iraa  na  priRi^inr  M^Uuai 

d'Albuquerq^i  cpia  do  ouieifQ  de  ApamWi'  Alvarez 

yio  Ipgmdp  o  ardU  4a  eiint¥)6€«dai  eganliado  o 

pript^a  <^»rtPjL  deiiwo  CQm  a  »m  «wtt  a  eoaarti' 

porarrtft^  pf  19  4  dQ«o»flicto,  qiie  ja  se  apfvYeitaya 

4a  $qrt^U»m  do  inimigo  cwtra  w^  fortiAc^oao,  a 

qual  vw  ppd§  fter  UHpada  d^  pHH^fira  ay^Qqada 

por  e«tar  cing^a  d'\uaa  e^cada  de  pi^os  a  pique 

jn^i  fprt^«  Fa^^ou*^  a  Q«i^  em  de^truir n  est^pada 

4  $0|ii4]ira  d^  hala«  d Vt^^Nria  e  mosqaetopia  que 

^^Uftiio  gpandit^mpa^tragq  np^  e^iftcip^  e  p^8oas 

da  ifilD^igo]  e  ao  aiPftub^cer  vendo  aate  a  ou^dia 

torn  que  um  oapitao  e  alguoa  soldado^  tiubju)  af^lb 

c»dp  48  casas  oude  ^c;  df fpndiao  muiia  ^pia  de 

leuha  para  Ibe  d^r^ni  fogo,  repdeor^a  a  partido, 

9^m  dar  ouvidps  a^  impprtuuaa  iusuupia^  coqi 

q^ie  p  CaUhar  repuguava  a  ^wtrega.  -t«  P^p^ttio- 

^e  ^  4;abq»  e  ^d^do^  que   e^i^ip  com  £W*ma»  e 

inwgi^um^  e^peptap  Calatar,  que  havia  4«  ^c^ 

pfeyq^  e  wtregu^  4  jwU§«^f  NpQ  fw  o  Flajpepgo 

gir^odadiUgmcia  por  def!e9d«r  0  M^aidpri  ao^qual 

jiilgou  a  justifa  que  morre^ii^  eu^r^ado^  e  que 

8i^a  cabe^  ^  seu^  qutrtoi  f^sieDi  pQ^toa  up^  luga- 

f^  mm  pul^IicoB.  ^  ^ecutada  a  eeqtan^a,  mau- 


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Hi  cASTRKyro  lositako. 

dou  Mathias  d* Albuquerque  inTentariar  tudo  que 
perteucia  A  fiizenda  d'El  Ret,  e  nao  podendo  trans^ 
portara  artelharia,  amandou  esconderem  lugares 
occultoa  J  e  com  os  despojos  de  menos  embaraco 
marchou  para  a  Liagoa  acompanhado  e  seguido  de 
muitos  moradores ,  que  com  suas  familias  e  bens 
fogiao  i  tyrania ,  e  &  obediencia  do  Hollandez. 

IV.  Tres  dias  depois  de  partido  Mathias  d'AU 
buquerque,  chegou  Sisgismundo  ao  porto  do 
Calvo;  entroti  na  povoacao ,  que  acfaou  herma ,  e 
s6  asslstido  dos  quartos  do  Calabar ,  cuja  vista  o 
aUeroti  de  sorte^  que  cego  da  colera  mandou  dei- 
tar  bando  j  que  todos  os  moradores  fossem  pas^ 
sados  &  espada ,  sem  excepcao  de  pessoa  nem  de 
idade ;  para  cuja  execu9ao  fez  de  seus  soldados  m  uitas 
partidas ,  que  saissem  a  comprir  o  decreto.  Grande 
foi  a  affliccao  e  o  desalento  dos  naturaes  quando 
soub^rao  d'este  barliaro  decreto ;  e  nao  podendo 
resistir-lhe  pela  forca,  recorrfirao  a  supplica.  Vivia 
nos  contomos  urn  religioso  da  ordem  de  Sao  Paulo 
'primeiro  hermitao ,  por  nome  Fr.  Manoel  do  Sal- 
vadoi\  lettrado,  zeloso  e  bem  procedido,  a  quern 
buscarao  os  tristes  aflKgidos  para  remedio  e  ultima 
consolacaio.  Derao-lhe  conta  do  caso ,  ficou  igual- 
mente  pasmado  e  compadecido ;  e  sem  reparar  no 
risco  a  que  se  expunha^  tomou  por  sua  conta  ser 
o  procurador  de  todos  :  ftl-o  com  tanta  dili- 
gencia,  liberdade  e  efficacia,  que  convenceo  e  re- 
duzio  Sisgismundo  a  razao,  mitigando  o  primeiro 
decreto  com  mandar  passar  segundo,  pelo  qual 
condemnava  it  morte  a  todos  e  a  qualquer  dos  mo- 
radores, que  dentro  de  tempo  determinado  nao 


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CA&TAIQXO  tUSJiJANa  117 

viesse  comsuaramiUa  e  moveispata  caietye  |>edisse 
passaporte  para  »ua  seguranca*  —  Depois  de  se 
demorar  doze  dias  no  porto  do  Galvo^  em  que 
▼endeo  aos  moradores  o  captiveiro  por  sobido 
preco ,  saio  Sbgismundo  a  campo  espalhaodo  Tozes 
que  ia  em  seguimento  de  Maihias  d'Albuquerque, 
e  que  nao  bavia  de  descancar  em  quauto  o  oao 
eolhesse  i&  mao8;  08  excessos  fizeraocreroB  ditos, 
mas  erao  outros  seus  intentos.  Em  um  Lugar  cha- 
mado  ParopQeira^  entxe  aLagoae  Santo  Automo, 
levantou  uma  forca  capaz  d'alojar  seiaceutos  ho- 
mei)s,  que  nella  deixou  de  guami^^  e  por  seu 
goveraador  o  corooel  Christov  jk>  Archetofls ;.  leyan* 
tou  outra  de  medaor  fabrica  na«  margeua  do  no 
Gamaragibe ,  presidiada  de  cento  e  vinte  soldadoa, 
9eu  cabo  Jacob  Estacour ;  corU>u  todoa  o»  cami- 
nhos  e  veredas  que  poderiao  aervir  a  conunuBiea* 
9ao  dos  rendidos  com  os  da  Lagoa  ( m^^  nao  pode 
impedir  upa  via  occulta  que  os  noasoa  abrirao 
fflo  mato^  pela  qual  se  communicayao) ;  e  assim 
dispostas  as  cousas  se  redrou  para  o  Arrecife, 
publicando  que  se  ia  prevenir  paravcdtar  sobre 
Mathias  d'Alburquerque. 

,  V.  Cinco  mezes  ba^ia  queMatbias  df  Albuquer- 
que se  tinha  retirado  para  a  Lagoa  com  as  reli- 
ijpiiaa  dos  ^ol^bdos  e  moradores  que.ae  poddrao 
JUvrar.  da  insolencia  inimiga ,  quando  a  25  de 
Novembro  appareceo  nos  mares .  de  Peraam- 
buco  um  gro|so  soccorro  do  reino  j  que  oon- 
duzia  D.  Luiz  deRoxas  e  Borja.  0  numero^  e  gran« 
deza  dos  vasos  fez  parecer  ao  Hollander:  formida- 
vel  o  pode^y  e  ja  se  preparava  para  a  resistencia 


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quando  o  aHyioii  a  reptsntina  volta  que  fez  k  frotl 
dirigindcMHie    para  o  CAbo  de  Santo  Agostinho) 
aotideos  no^sds  recebftrao  noticias  do  edtado  d'u^ 
mat  e  oiitrasliniiaa.  No  sitio  que  chatnab  a  Geroa- 
ga  salcArao  em  term  dous  mil  homens,  entre  Por^* 
tugiiezes  e  Castelhanos  j  desembardiraoartelharia, 
muQi^oett  e  mantimetito^  j  e  a  afmada  se  fez  a  vela 
para  a  Bahia  j  recebendo  primeiro  a  Mathias  d' Al- 
buquerque ,  a  quera  Sua  Mage^tade  mandava  vir 
para  o  reiao  ^  per  ordens  que  D.  Luti  Ihe  remet'^* 
t«o  logo.  Nao  se  pagao  os  principes  de  quern  serve 
com  acerto,  nenao  de  quern  obra  com  dlta.  —Com 
a  nova  do  soccorro  comecArto  os  Flamengos  a 
apresiar^se  para  a  defeusa ,  e  os  Portugueses  pat^  * 
a  restauracao.  D.  Luiz  deteve  viute  dias  a  marcha 
para  dar  tempo  a  que  se  abrisse  urn  caminho  nov6 
peioeor^eao  do  mato  para  cooducicio  do  trcm,  etc. 
EntreiatitoChtistovao  Arehitofh,  que  govcmava 
o  forto  do  Pampoeira ,  mandou  com  pena  dc  morte 
a  todot  OS  vizinhos  do  poi'to  do  Calvo  que  deUtf* 
de  dea  dias  se  reiinrssem  com  suas  famitias^  gados, 
e  moveis  para  o  districto  4e  Sirinhaem^  cabo  dt 
Santo  Agostinho,  IpojucA^  Moribeea,  e  outroS* 
Foi  p  bdiido  obiidecido  de  muitos,  e  desprezado 
de  nao  poueoa  {  eetei  ee  retidtfao  para  <>s  matos 
com  iatento  de  servifem  &  convMieacia  e  4  vtii^ 
^nca ,  a  qfial  logo  prindpiarao  algu ns  maucebos 
aventureiros,  que  ae  achavao  oom  atmaa  ^  fogo^ 
matando  em  dWersas  emboacadas  bom  numer^ 
de  HoUandezes. 

VL  Logo   que  Sisgiammido  Van  Seopk  teve 
noii^ia  do  desembarque  do  soccoiro  que  ehegira 


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ao8  noMOS^  mIo  eom  toda  a  f^resteza  do  Arrecife,. 
acompaohado  dosiiokiados  qte  achdu  mais  prompt 
tod,  coiD  6  dcdigtiio  4e  sair  ao  ^ttcontro  de  Luia 
de  Roxa^,  e  enp^tmar  o  pod«r  tid  porto  46  Calvo^ 
Marefaava  e&tmtantd  sobre  ^te  mesmo  Ingar  d 
capitao  RetelKiiho,  o  qttal,  a  meia  Itgoa  da  po^ 
voaeao,  fe^  alto  i  e  ae  embudwu  Mi  quanto  proeu*^ 
raya  teir  infot*macees  do  que  hdta  sa  paBdava.  Yeio 
ealr^lh^  M^  macd  6  t^ecrefari^  de  Si^mundo 
com  seis  soldadod;  «dte^  perd^o  a  yida,  a^eH« 
a  propria  liberdade.  ftla  eoiifidMD  d'^$t<  aloaii^ 
^oti  o  ftdbtfllifibo  a  ^hegada  ^  m  immiM  do  gCM^^ 
ral  holkndez^  e  eomo  por  ordem  Hta  ibra  dar 
aTisk)"ao  cofonel  Chriseovio  ArehitoflBy  que  «em 
delen^  se  vie^M  iiH^rporar  ooiti  a  sua  fffiHe  para 
faEeroppo9teaoaopddSr  edillrai'iot  Daa-^  ririMA 
na  praca  eom  a  notida  da  ^mb^oada^  (^moa' 
Sisgidmundo  a  sua  g^nM,  i  daio  a  campo  parare^ 
bat^r  ot  no^aOd;  iiMia  tiao  aficofttMddo  niagucim,  e 
reeeodo  d'alguma  tiota  emboftaada^  ¥oliott  «9f&> 
tan  to  medo  que  sem  dilacao  largQu  o  atojartittito/ 
e  p6f  fei^aa  occmltad  ^  i^tegou  &  fiarm  Gpitide, 
onde  thiba  Ma  aftnada ,  e  ttelia  $a  entbarcou  «oiii 
M  ^srad;  na¥^(m  fam  o  Arfacife,  d^iaanda  fla  poM 
iroacao  quantidad^  Aft  pcrtvora,  bala,  <»rdat  duitn* 
ko  e  AatitimentoS,^  ^  que  w  aprotcit^rM  m  aol^ 
dados  de  RebclliMi  qd*  Mlk  ekttkiM  da  Aotia^ 
deiitri^d  ^^tidattaa  Ab  \a»^.  «^  A^  Aift  aaguktci 
appai'eee^ao'lai^go  Dt  Ltite  de  Roitas  'wm  todo  at 
eterdlo ,  <U(tido.  de  rt  luMtoia  ta^^t^  y  diA#  lO'tte^^ 
beUbho  a  in^b^<^  aeK  ^rferal>  a  queai  iko  coaM 
do  atKJoedidd^  €^  md  quaiii  eonoartott-auiodk  d» 


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120  GASTRiOTO  LUSlTAliO. 

resisiir  ao  coronel  Architofls  no  caso  que  elle  se 
eoeaminhasse  para  aquelle  sitio.  —  Com  effeito 
aquelle  coronel  hoUandez,  informado  da  marcha 
de  D.  Luiz  je  do  pouco  poder  com  que  se  achava 
Sisgisiiuindo  oo  porto  do  Calvo  ( ignorando  a  re- 
tirada)^  saio  de  8ua  fortificacao  da  Paropoeira  com 
mil  quinbentos  infantes  em  seguimento  do  nosso 
exercitOi  para  spccorrer  os  sens  em  todo  o  con- 
flicto*  CertiGcado  D.  Luiz  da  marcha  do  HoUandez, 
saio  do  porto  do  Calvo  com  mil  duzentos  homens, 
deixando  em  guarda  da  povoacao,  bagagem,  e 
muiii96es  a  Manoel  Dia$  de  Andrada  com  trezentos 
cincoenta  soldados ,  com  intento  de  Ibe  cortar  o 
passo  no  sitio  que  chamao  Mata  Redonda.  0  iui- 
migOy  que  de  qualquer  movimento  nosso  tinha 
avisos  I  o  mandou  buscar  com  uma  embuscada, 
em  a  qual  nos  mat&rao  o  capitao  D.  Pedro  Mari- 
nho  e  cinco  soldados;  por^m  saio-lhe  t|io  cara  a 
sortida  que  daxou  no  campo  cincoenta  morlos ,  e 
OS  mais  s6  escaplrao  largando  armas  e  moxillas,  e 
valendoHse  dos  p^. 

VII.  Em  a  manha  seguinte  avistou  J).  Luiz  de 
Rous  o  exercito  inimigo,  que  achou  formado  e 
immovel;  loandou  ao  Rebcllinho  e  ao  Camarao 
que  o  picassem  por  um  e  outro  lado ;  o  que  logo 
executarao  com  damno  conhecido  do  contrario, 
mas  sempre  (ao  fecbado  que  parecia  insensivel. 
D.  Luiz,  que  nao  temia  a  for^a,  desprezou  a  arte; 
a  um  mesmo  tempo  mandou  locar  a  iuvestir;  e 
animaiMio  os  sens  com  energicas  palavras ,  termi- 
sou  dizendo-lbes  :  «  A  elles^  valorosos  soldados, 
«  que  a  victoria^  dequem  a  busca,  e  nao  de  quern 


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CAsnuyro  us^taeo.  121 

a  a  espera.  r^  —  loTestirao  os  iu>8sos.oom  gi*aiKle 
valor ;  nao  resisliao  os  Uollandezes  com  inenos 
firmeza,  conaarvando-ae  immoveia  na  mesma 
forniatara,  sem  i]ue  o  numero  doa  que  caiao 
alterasae  a  ordem  doa  que  ficavao.  Repetiao-ae 
aa  cargaa^  dizimaTao  as  balas  o  numero  doa  com- 
batentes,  e  nao  ^  yia  que  para  nenhuma  daa 
partes  se  incUnaase  a  balan^a;  at^  que  roto  o 
eaquadrao  inimigo,  Ihe  comecqu  a  faltar  a  d>edien- 
oia ;  e  apezar  do  eafor^o  de  seus  caboa,  foioinimi- 
go  largando  o  poaU>.  —  Fareceo  aoa  Portu^fiezes 
aer  o  dia  aeu^  e  em  obsequio  da  eaperan^a  accia* 
marao  a  victoria ,  que  a  forluna  Ihea  tiroa  daa 
maos  pelo  meip  maia  aensivel  que  aer  podia,  por- 
que  negando-Ihes  a  gloria  de  veneer,  Ibea  eacon- 
deo  juntamente  a  deaculpa  de  Gcarem  vencidoa. 
Andava  D.  Luiz  entre  os  aeus  di^pcmdo  tudo  como 
destro  general  e  como  valoroso  soldado,  a  tempo 
que  uma  bala  com  pontaria  traidora  o  paaaou  daa 
costaa  ao  peito.  Impellido  da  bala  caio  o  corpo  por 
terra,  por^  o  corafao^  maior  que  ocorpp,  o  le- 
vantou  em  p^y  moatrando  a  grandeza  de  seu  eapi^ 
rito  nos  ultimos  alentos  de  seu  peito ,  com  que 
formiou  estaa-palavras  :  «  Nao  i  nada;  avaute,  va- 
«  lerosos  soldados,  queqinimigovaivencido;  com 
((  o  fim  da  batalha  se  coroa  a  victoria.  »  Pedio 
que  Ihe  ch^;assem  o  cavallo,  e  ao  por  o  p^  no 
estribo  caio  mprto. — Com  pre^sa  e  cauteUa  se 
retirou  o  corpo  mprto.  da  batalba,  mas  conoo  a 
falta  da  pesaoa  era  maior  que  toda  a  diligencia, 
em  breve  tempo  se  espaUb^ou  a  aoticia ,  e  aaaim 
de^maiou  a  todoa  a  nova,  que  trocoi^.aa.maoa  & 


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fortUM.  Nio  Arfia¥a  eadu  urn  dos  nossos  no  peito 
mais  eomcao,  qne  paw  fugif  com  «i  vida  a  otide 
podes^e  qhoraf  a  perdA.  Os  cabos,  que  virao  des- 
prewar  a  ordem ,  ttao  tiverao  mafa  remedio  qu^ 
«!gair  a  ftiga*  S6  os  intenciveid  capitals  Rebdli- 
nho  e  CamarSo  ^itiiO  formndos ,  dOd  postoa  ond« 
pelejatAo  J  A  oecitipaP  0  tlmo  de  urn  pequctio 
motite)  Awdeo  qilal  tompasso  vagoroso  march*- 
rao  prira  a  povoacao,  fa«eiido  alto  algtimas  rwiw, 
e  virando  a  cara  outras  a  rebate^  a  algtiM  poucoa 
inimi^^  quf-  solios  os  picavao  nA  i*etaguaHa* 
Deixou  o  itiimigo  no  campo  duientos  moftos,  e 
se  retifOU  com  toais  de  qtiatrocentos  feridos  para 
a  sua  tot^a  da  Pahtpodra.  A  perda,  que  houve 
de  noaaa  parte ,  nao  se  sabe  ao  certo,  mas  sabe-st 
qm  tare  aquella  disparidade  que  se  acha  eull^  od 
que  fewm  e  OS  que  se  repafao.  Alguem  houve 
qtie  aecttsoti  D.  hmt  d^  RoJcat*  de  iuconsiderado  e 
de  temerario;  mas  quatido  uio  bastassem  os  teste- 
munhos  doi  que  forSo  s^us  companheiros  d'ai*mas, 
assas  titgado  flcou  seu  nome  pela  honra  que  Ihe 
tributMi  SiftU  pi^ptiti  mimlgo.  O  conde  de  PCassau 
CollodOtt  o  retfato  de  D.  L\nt  dt  Ro5tas  (que 
achou^dbt^  seu*  ossos )  no  salao  de  seu  palacio 
eittre  OS  dos  femosot  capitSes  do  mundo }  vencendd 
as  palxdes  de  inlmigo  com  os  argumentos  de  dis- 
creto. 

Vni.  Manoel  Bias  de  Afidt*ada,  a  quern  D.  Lulz 
de  Roxfiis  deix*rsi  em  guarda  da  povoadSio  e  da 
bflgagem ,  vendo  etitrar  a  nossa  gente  desordcuada 
detete-A  oom  poUc^  e  di^cretas  rsctb^ ;  e  tal  ^ul- 
ma  hispifou  &os  sohlados  que  voluntaf iameute  o 


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aoompai^Mrao  a  b  &ier  fnenfe  M  iiiifl|i^i^E§t« 
eiempio  aao  foipdrtm  Mguido  tte  Mfc!»co  Afll<wiJo, 
filho  do  conde  de  BanMIo^  oom  lodosMm  lulta^ 
Uaooi,  que  sem  mats  consdiho  qil«  o  (;m  cUitHfM 
Aigio  t>ara  «  Lagoa )  o  miMftto  izerao  digtind  on]^ 
taea  castelhanoa^  mi  t«qil«cido9  dk  Mu  pwprio  ii# 
tural,  ott  lembradoft  d«  ndisa  amiga  atttitmia.  Vlo^ 
ee  Matioal  Dias  atalhado;  «  sojeioii  ^  vator  4  pro^ 
demna,  oetn  que  atiape^iko  a  eiii^ima«  -^  A4>  <»M> 
iro  dia  da  bata&a  tie  cmlenM  ao  padr«  Fr.  Maflod 
do  Salnular  e  a  Hairk|tie  Teltei  d^  Multo ,  qtte 
hairiao  ratiraob  do  txmflicio  «  (smotidtdo  e^ire  ^ 
mato  o  (M>rpo  da  D«  Lutt^  que  lh#  foMMi  dar  Mm 
pultun;  o  que  fitarao  com  aentidas  lagrkuasi 
Amonalhlrao  o  torpo  eom  a  daceMia  t^s^i^al^  t 
fiado  a  um  loaeo  caixao  6  ^fiic^^^o  no^  mno^ 
tima  lagoado  pdn0  do  Calvoi  ( pequeno  a^curo 
lunralo  para  oinxas  deTarlo  t&o  ^iida  a  ^^aT«^ 
ddo  I  )aia6  aa  a  tet*i^  flii»  tobt^io  aau  nbus^,  nif» 
eobfiif^  sua  mamoria  a  da^  uma  irateao  laa  feia 
aomo  A  qua  Iha  liMU  a  iriia.  • 

IX.  Pda  mafta  d«  D.  Lufeda  Rouata^iia 
o  goremo  ( saguudd  aa  ^rdaog  d'K  Rai )  oiMi'ta* 
leroao  GaMelbatto ^  qua ua LagiNt eftta^^gritam^u^ 
ta  anferoiOy  cdjo  ttotna  uoa  aaooudea  a  fUorM,  po^ 
qcia  u^  maMio  dia  etA  qua  o  cbatnou  o  |»Mt(»  Ilia 
tirou  a  rida;  paa^ou  pm*  c<9Usaguihta  a€»  teroahN) 
nofneado ,  qua  era^  d  isohdt  da  Batili<4(e :  deiarml^ 
ua^  iufauMft  qua  aci^ratdu  a  tftiimamiiia  d'a^- 
qualla  pra^vintiia.  MtitiwA  Diaa  d'Audrada  da»pa^ 
chou  logo  UM  cattekf  ao  eouda  dettaiiboMoy  qua 
aatata  ua  Lagoa,  paid  qualHie  MMaiMa^aa^nrdaua 


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t34  cmaMom  imisMm. 

e  a  patenle  jpot  qua  £1  Rei  Ihe  di?ao  bitttao»  com 
pa^iua^dea  e  proteelos  que  sem  defeoca  marchasse 
com  toda  a  geute  a  encorporar^se  com  a  que  ti- 
uba  no  porio  do  Calvo,  para  que  antes  que  o 
inimigo  se  visse desassombrado  se  achassetodo  o 
ooBiO  poder  unkjb.  Nenhum  aballo  fiserao  eaias 
dili|;encifts  no  conde.  Parece  que  nio  dera  a  na- 
tureza  a  eate  homem  nem  sentimento  para  a  injur 
lia,  nem  estimulos  para  a  honra.  —  Quatro  mezes 
ae  {)as8irao  sem  que  elke  tomasse  alguma  deliberar 
9ao  y  uem  mandasse  algum  socoorro  a  Manuel  Dias 
d'Andrada,  at^  que  finalmente  saio  da  Lagoa,  roan- 
dando  diante  seu  filho  com  abuodancia  de  muni* 
coes,  e  naquelle  sitto  fez  Jevantar  uma  fortakza 
capaz  e  vislosa ,  que  em  brevissimo  tempo  se  aper- 
fek^Ui  tao  h^m  artelhada  e  guamecida  que  nao 
so  pareceo  seguro  para  os  proprios ,  senao  ainda 
terror  para  os  oonirarios.  —  A  {Ncimeira  expedicao 
que  fez  o  conde  foi  mandar  a  Manoel  Dias  d'An- 
drada  com  trezeutos  sokiados  para  que  se  alojasse 
na  poYoacaode  Sao  Louren9o  da  Una ,  e  empedisse 
ao  inimigo  as  ordiaaitas  correrias  com  que  talava 
e  destjruia  a  campanha.  Este  valeroso  e  habil  capi- 
tho  soube  desempenhar  tao  hem  e$ta  oommissao, 
que  nao  so  resistio  a  mil  quinhentos  HoUandezes 
commandados  por  Si^smundo  em  pessoa;  mas 
uaando  de  ardil  os  desalojou^  obrigando*-os  a  reti- 
rar-ae  predpitadameiite  para  SirinJba^m^  e  elle 
voltou  victorioeo  para  o  porto  do  Calvo.  Despedio 
neste  mesmo  tempo  o  capitoo  Souto  a  oorrer  a 
campanba  a  £avor  dps  moradores.  Kao  foi  aste  tao 
feliz  em  suaexicursao,  porque  sens  sddados  nao 


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guardaiio  ft  disciplMia  que  comphrift ,  tratando  com 
dema2ta(h  lieenca  os  proprio§  que  iao  defender. 

X.  0  capitfto  Rebellinho  foi  nesta  mesma  occa- 
siao  nomeado  pelo  eonde  para  que  com  trezentos 
homerts  saisse  a  campo  a  cortar  por  vi das  e  fiizen^ 
das  de  HoUandezes  e  rebeldes  ^  at^  onde  podesse 
alcancar  o  braco.  Saio  em  Abril  d'este  anno  j  ag- 
gregirao*-se-lhe  muHos  moradores,  ou  pelo  inte- 
resse  do  roubo  ,  ou  pelo  gosto  da  vinganca.  Che*- 
gou  a  povoacao  de  Sto'Loutenco,  onde  se  aquar- 
tellou;  neHa  o  bnscoa  o  iniihigo  com  avanfajado 
poder.  Resistio  corajoso ;  com  gente  de  reft^sco 
foi  cerrando  o  combate,  at*  que  vendoquenao  po- 
dia competir  com  as  for^as  nmt  superiorts  do  im« 
migo  J  se  retirou  com  boa  fortuna  e  toda  a  sua 
gente ,  e  rompendo  pelo  ma  to  ehegou  ao  porto  do 
Calvo  com  novo  credito  de  soldado.  —  Indignado 
Sisgismundo  com-  este  atretimento  do  Rebellinbo 
determinou  tomar  excess! va  Tingan^a,  Saio  deSi-*- 
rinhaem  em  2  de  Maio  com  mil  soldados  e  maioi^ 
numero  de  Indies  Petyguaros  e  Tapuy6s,  mortaes 
inimigos  dos  Portuguezesj  encaminhou  a  mardia 
por  aquellas  povoacoes  e  fazendss ,  por  onde  and^-^ 
ra  o  Rebellinho,  e  declarando  traidores  a  todos  os 
moradores,  por  terem  agasalhado  o  sobredito  capi- 
f  ao ,  e  influido  nas  perdas  e  damuos  dos  confede- 
rados,  levou  tudo  a  ferro  e  a  ft>go,  cetando  sua 
colera  na  inveiicao  de  tormentos  novos  que  faziao 
gemer  a  humauidade  em  longa  e  cruel  morte.  No 
distrito  de  Sirinhaem  mandou  prender  a  Jerontmo 
d' Albuquerque,  Francisco  Rodrigues  Porto,  ea 
tim  filho  sen  ( homens  n6brcs ,  c  dos  prindpaes  do 


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moil  4  nwllpw  i  J«iuu)tMk^  qu(!  fie  eMUmm  wm 
04H>A(lfl4l^vQii«|MUq.  for  filtl^M  HAbiW  e»  C9rne 

tonB«pto  pMe<i^o  imqvellas  p«rt«8 ,  qu«  o  attu^ 

ax«it«  «4.p^i  de  :  t<N)<W  (  d^poU  d^  «»  qql»r4|)g»  <!• 
tap  ;f(5for«»d«>  %«Q«tit»,  que  q»  dwpiri>Q  da  p^lle )  a 
qii4  le  fte^io  pii^roiVk^iQ^  com  alcatriio  fprvente ; 
a^Q)  .quQ  o«  la»tiiwi«M  genidos  «  horriyei^  vu^po 
gfni$  d«ft  i9i9«vav«)»  IHu|e(s^^t^  moUvMMm  a  w^ 
aor  ^q^mpaiJiao  pos  forinos  v^rdvigoii  aotesjwais 
a8ip»hadQ«  d4  mo  largar«m  9*  vida»  im  mm  do9 
t9f>fD(«taA.  p» .  enf^rc^rao,  pqrque  »«  dilAt«««Q  % 
WiEPf|l40«Acia  PM  «Kten46««.  da  poUfiia-  jguae^ 
oriMMftf  «  ppr  vdntur*  m^\*  bar)»i^ ,  praticow  o 
^l^ddM  nos  l«g»»r««4p  Ipqi^ca,  «at)o  d«SantQ 
AfiwUabp,  |ilorilMfi4>  Qorjau,  A^piap^  e  Sao 
I,pur8Q9o,  cIiagaDd^.  4  (al  popt^  m^  f^rocidade, 
qM«  arrai)q4v«o  dos  t>ra60»  .d«l»  ii>ai<  ipopAfplavei* 
fi^  t^nros  filboat  e  QS  entr^ga^ap  aw  splvagww  Ta- 
pwyas.  quf^QS  «ppMlt4vao  vivo$  «uaq«s  eqUanb^s; 
fi^f^ndo  a  Ut  poqlp  a  deahupi^oidado  dos  Indies, 
que  coui  iua«l«adinha9  abriao  peja$  oostaa  03  '\a(e^ 
l\^^  pad«««ntes  para  Ibes  coin@r«D»  as  entcanbas : 
e  <»  i'lM^ngps  oelebravao  wpi  ffi8(^Q  nojo^  tao 
^riv^^  qu«  a4  defiCQDbecia  a  natur^za !  Para 
^f^iummar  t»Q  Defauda  roaldad«  pubUoQu  Sisgis- 
WundQ  ediiaes,  em  qw  crdenava  quCi  »ob  p^ia  d? 
jnv«lpifSiv|!l.pf)f>dicaQ  de  fa»^adas  e  vidas,  ospbum 
PQrt.ug««9  ttsawe  nem  tive#fq  ein  seu  podw  aW 
gMQigfnwQ  d«  ariu^s*  Alsvq»  as  ^otregdrfto ,  ou- 


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mimmo  mwmw.  41? 

ajfiqw^  dmf  qm  tinfca  arma*  mmiUsii,  qm 

Ca|?Q ,  ^  4e  tAlm^tpair^  imtkiio  a  fl^n^  4q  oo<^q 
d^  ^anhoUp  nne  ord^iH>u  a  P*  Ai^tpniQ  PtUlippi) 
Cafparao^  q^9  iqipn  ttw  growQ  de  Portpgiiezw  # 
iBdiM  wi^sjB  t  talar  a  qawpaal»a»  ^  wtr^we  a 
Qspada  e  ^  oh^na  (qdo  qu^nk)  pode^s^  doiyiiMu^  9 
mwi» e Q  fo^oy  8^0  pipdad^  qw)  cobifa  de  mu«a 
qMQ  perle«()e««p  aqg^tio  r^h»ld#4  io4iepa«ap  bem 
«fep^ida  a  melbiar  ejiefiuted^,    $lala  o  Caipw^Q, 
entrado  ja  o  mM  4e  JiiJhPf  p^notrcHi  p  ?erUP,  ^ 
dpQ  «)bre  ofttfwbaldw  cte  Qpyaw;  foi  rop^ntinp 
^  go^P^ »  a  tPdo^  1^  jL  tudo  ^Iq^qqpi}  p  I^fp^Q-  I^ap 
ficdj  i?ida  qm  p  fo^^-p  nap  cqriawp  t  mw  ^rfificip 
4IIP.0  fpgo  uap  ppDsu0m4wfu  Txyf^n  \^m  vedu(p 
g3ia?»e€idp  d^  floUfrndews  >  qw  *eryia  a  s§g»rau'* 
c|i  p  ^  ijafepsa  4P  goptip;  sitipu-^  ^efp  dilaj^ ;  e 
dupoi^fdp  #e  appderjir  d'wtt  wcpprroqup  Ibp,  vinha 
dp  iiu^tiiiMma^i  ai'ma^  e  mwvSPP^f  wvesUo-rp 
pppi  fqypr,  p  (Jpstruio  ludo  ^i»  pUdadpr  —^  Che-^ 

gpu  ao  \fv^^  a  i»ptiaia  dpa  e^tragp^  q^^  f^zia  p 
Qiipamo,  pgpfi  jpl^tar  4pa  qua^  salo  Ipgp  Gbiistoo 

vao  Architofls  pom  pitpceplos  l}Qll^ndp*fi4,  0  in-?! 
tl^do  (lasMrap  pap  d^i^nip^pu  ppp[i  Q^tik  n9ticia, 
jW^ap  dipipca  a  Pi4?Prar  o  jpjjnigo  fortiQqapdo-sp 
na  Goyaoa,  M^itpa  p  wo^fwap  pappcofttrps  qpp 
iiwrap  ^fl^jMf  a  puti;^  ftrnwfc  a  wrdadau-amen^ 


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138  cAsnxctro  lusirAMa 

dtgnoft  de  particular  relacao  nesta  historia ;  por^m 
como  me  chama  a  snstancia  do  aaeumpto ,  ^  forca 
passar  de  corrida  por  estes  prelvdioB  do  argmnen- 
to;  baBta  saber-se  qtie  se  o  Flamengo  excedia  no 
poder,  o  Camatao  o  avantejava  no  valor  e  na  in- 
dustria.  Hoifve  dia ,  em  que  nossa  espada  file  de- 
golou  cincoenta  Hollandezes;  tao  i^eceosos  dos 
assaltos  com  que  em  toda  a  parte,  e  a  toda  a  hora 
08  envestia,  ji  em  campo  raso ,  ja  em  carros  pon- 
tateis ,  com  que  igualava  as  suas  fortificaeoes ,  que 
desatSnado  o  inimigo  dizia  assombrado,  que  s<i  urn 
Indio  tivera  poder  para  Ihe  cortar  a  forcuna  e 
confundir  a  opiniao.  0  Gamarao ,  que  dos  faTores 
da  sorte  nao  desconfiava  menos  que  da  profia  do 
tempo,  considerada  a  distancia  entre  aqtielle 
sitk)  e  o  porfo  do  Calvo  para  se  ajudar  do  soccorro, 
se  se  ykse  em  aperto ,  e  a  imposibilidade  do  reme- 
dio  y  se  Ihe  fiiltasse  o  sustento ,  se  resolveo  em  co- 
roar  as  yictorias  com  a  retirada.  Recolheo  a  si  os 
moradores  que  o  quiz^rao  segnir ,  que  com  sna0 
familias  (izerao  numero  de  mil  seiscentas  pessoas, 
muitas  das  quaes  ficarao  pelos  matos ;  abrio  cami- 
nho  pelo  sertao  em  distancia  de  quarenta  legoas, 
caminho  seguro  para  a  marcha,  mas  falto  de  todo 
o  necessario  para  a  vida;  e  reio  entrar  no  porto 
do  Calvo,  onde  foi  recebtdo  pelo  conde  e  pelo 
presidio  com  palmas  e  vivas  ,  iguahnente  devidos 
ao  que  destruio  e  ao  que  conservou. 

XII.  Suspensas  estiverao  umas  e  outras  armas 
at^  o  mez  de  Dezembro ,  em  que  o  conde  ordenou 
ao  capitao  Rebellinho,  que  com  a  gente  que  es- 
colhessc  assaltasse  a  campanha  da  Paralba,  e  nella 


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CASTBIOTO  LU81TAN0.  129 

adsoUasse  tudo  o  que  fosse  de  oontrarios  e  re* 
beldes.  Com  seu  cnstumado  valor  e  diligencia 
executon  o  Taloroso  cabo  as  ordens  e  os  desejos. 
Nifiquelle  districtoadquirio  tanto  degloria  oomo  de 
riqueza ,  deixando  ao  inimigo  a  magoa  da  niais  la- 
meniavel  perda.  —  Aquartelhou-se  ires  legoas  da 
cidade  em  um  sitio  chamado  Tibiri  ^  onde  o  veio 
busear  o  goTemador  da  praca  que  dominava  o 
Hollandez  com  todo  o  poder  d'amigos  e  eonfede- 
rados.  Nao  se  negou  o  Rebellinho  &  batalha ;  ainda 
que  com  muito  m^nos  poder.  Envestirao-se  os 
esqaadroes  ;  largo  tempo  se  sustentou  o  con«- 
fficio  em  iguai  balan^a ,  achara  a  multidao  resis«- 
tencia  no  valor ,  por^m  como  era  grande  o  ex- 
ceMo  do  nmnerO)  cedeo  a  virtude  a  forca ;  e  (icoQ 
0  immigo  com  a  rictoria  j  mais  custosa  pela  perda, 
que  a  reiirada  dosnossos  pela  diia  de  chegar  neste 
ponto  Henrkf ne  Dias  a  rebater  o  inimigo  para  que 
nao  seguisse  o  alcance ,  e  a  dar  lugar  a  que  se 
forraassem  os  nossos;  encorpm*ado  com  os  quaes 
se  redrou  para  o  porCo  do  €alvo ,  abra^ando  o  (er- 
reno  da  marcba,  e  de  caminho  as  povoacoes  de 
Goyana ,  de  Ipojuca ,  Sirinhaem  e  outras ;  das 
qnaes  recolb^o  uma  gix>ssa  e  rica  presa;  com 
mais  circnnstancias  de  victoriosos  que  de  vencidos; 
— r  Ontras  muitas  vezes  mandou  o  conde  diversos 
eapities  a  slmilhanles  fac^oes>  que  o  Hollandez 
vingava  com  igual  ruina ;  nao  servindo  a  hosiili* 
dade  mais  que  de  assolar  os  subditos  de  um  e  de 
outro  dominio,  como  se  cadaqual  aspir^ra  a  ser 
senhor  de  um  imperio  d^erto ;  o  que  bem  adver- 
tido  se  p($de  dizer  do  conde  de  Banhollo ,  que  em 
I.  9 


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ifto  4Mfmmo  irarAif. 

lodo  o  tempo  de  »eu  goyernoestudoucoBio  Iwrii 
,di«  <le$truir  aquaUe  E6tado# 

XIII.  Nao  M  de»cuida?a  a  CoBip«iiliia  ooaideiital 
4e  Quindar  soecorros  pai^a  con^Udar  o  8m  podar 
no  BrazU«  No  fim  d'esto  anno  nomeou  noyoa  ctpi^ 
taesi  e  apre^tou  noyaa  frotas.  Nomeou  por  gme- 
ral  ao  conde  Nassau  Jao  Mauricio,  e  para  seu  ta- 
oenle  Henrique  Vancol,  urn  do»  primeiros  mioii^ 
troa  da  dita  companbia.  Sairao  da  Hollanda  com 
uma  poderosa  armada  dividida  em  duaa  eaqua* 
draa,  que  govemayao  os  doua  caboa.  £m4  de  Janei- 
xo  de  4637  tomou  porto  no  Arrecife  a  esquadra 
de  Vancol)  ou  por  mais  Ugeira>  ou  por  melhor 
Jiavegada ;  poueos  dias  depots  a  do  conde  de  Nas* 
aau.  —  Com  a  chegada  d'este  general  ae  alterou  o 
eatado  das  oousaa.  0  coronel  Architofla  arraaou  a 
fortaleza  da  Parapoeira ,  e  ccnn  a  gente  do  8eu  pr^ 
ttdio  se  retirou  para  o  Arrecife.  Naiaau  i  depoia  de 
tomar  conhecimento  de  tudo^  8e  poz  brevemenle 
em  campo  com  um  exercilo  de  quinhentoa  homfins^ 
aendo  grande  parte  d'elle  Indioa ;  mandou  fomeoer 
todas  as  lanchas  e  embarca9des  de  remo  que  se  po* 
ddrao  ^unlar^  ordenando  ao  cabo  que  as  commM^ 
dava  que  posaeae  a  proa  no  porto  do  Galvo,  e  elle 
marcbou  por  terra  para  o  meamo  lugar ,  reaoluto 
em  ganhar  a  fortaleza  e  desalojar  da  poyoa^ao  o 
conde  de  BanboUo,  •^Chegou  esta  noticia  ao  por- 
to do  Calvo  I  e  causou  em  os  nossos  granda  assom** 
bro*  0  conde  de  Banhollo^  que  na  seguran9a  de 
9ua  pessoa  e  bens  tinha  mais  inleresst;  quo  na  do 
Esiado ,  mandou  deitar  bando,  com  pena  de  mor-» 
te  e  confiscacao  de  bens,  que  nenhum  morador  se 


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oMsruxno  LunxAro.  isi 

fetimse  neni  pesioa  idguma  de  sua  faniiUa^  ou  fa- 
Mnda  de  sua  oasa ;  mas  elle  poE  em  salvo  a  projma^ 
aiandando*a  condnzir  para  a  Lagoa  cscoUada  por 
Italianos  do  seu  ler^o;  prevenio  eseondidamente  a 
retirada  por  uma  vereda  enodberta ,  e  mais  por 
fermalidade  que  por  outra  cousa  obamou  a  oon- 
selho  todos  os  oabos  6  officiaes  experimentados. 
Forao  varioa  os  pareceres;  conoordarao  em  fim  na  * 
defensa »  ainda  que  disoordarao  nos  meios  e  no 
modo,  O  oonde ,  escondendo  o  mado  e  suas  mas 
ten^oes^  assenCou  com  razoes  apparentes  que  se 
asperaase  o  inimigo  dentro  das  fordficacoes  oom 
todo  o  corpo  do  poder^  dispondo  assim  a  fuga  nas 
apparenoiaa  da  defensa.  Com  len^aode  a  desempa* 
rar  guaroeoeo  a  fortaleaa,  como  se  a  qiiizsrade^ 
fender  f  nella  metleo  trezentossoldadosesoolbidos, 
com  OS  melhorea  caboe>  armas ,  muni^oes  e  man- 
umentos  para  trea  mazes :  nada  Uie  faliata  para  a 
dAffansa ,  exeepio  antmo  e  atenoao. 

XIV»  Chegou  entretanio  a  visla  da  povoacao  o 
oonde  de  Nassau ,  e  com  a  sua  apparkao  se  accendeo 
no  coracao  dos  Portuguezes  aquelle  animo  ati  alU 
Qunca  desmeniido.  Quasi  como  por  insiinto  sairao 
muitos  a  eaperal-^  govamados  pelo  lenente  gene* 
ral  D.  AfiToDSo  Ximenes,  asistido  dos  capitaes 
JFrancjsco  Rdiello,  Joao  Lopes  Barbalbo,  Asseriso 
da  Silra,  Manoel  de  Souza  d'Abreu,  e  outros  que 
com  a  gente  de  suas  companbias  >  e  muitos  natu* 
raes  da  terra ,  faziao  um  bastante  esquadrao ,  que 
subiria  a  quatrocentos ,  entrando  neste  numero  os 
Indies;  em  companbia  dos  quas  sa'io  o  seu  gover* 
nador  g&nl  D.  Antonio  Philippe  Camarao ;  a  seu 


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132  GASTBKm)  umiTAifa 

lado  sak)  (ambem  sua  mulher  Dona  Clam,  monta- 
da  em  um  cayallo ,  e  tao  clara  nesta  gentileza  qat 
deixou  escuredda  a  memoria  das  Zenobias  e  Siini* 
ramiS)  com  quetanto  se  illustrou  a  antiguidade. 
Nao  ficou  atraz  dos  que  mais  se  adiantarao  o  go- 
vernador  dos  crioulos  Henrique  Dias ,  porque  tao 
valente  como  zeloto  f(H  do3  primeiros  que  saio  a 
investir  o  inimigo  com  seu  teiTio  y  sempre  preto 
na  sorte;  edt  admiracao  e  enveja  sempre  alvo.  0 
conde  de  BaahoHo^  que  estudava  na  perdicao  e 
ruina  dosnaturaes,  depois  de  lancar  fogo  a  poToa- 
cao  y  recolheo-se  a  um  reduto,  que  havia  manda- 
do  levantar  para  segurar  a  sua  retirada ,  e  levou 
comsigo  constraugidos  a  Duarte  d'Albuquerque  e 
a  Manoel  Dias  d'Andrada.  —  Sohre  o  alco  d  um 
monte  se  tinha  formado  o  inimigo ;  d'elle  vio  a 
resolucao  com  que  os  nossos  o  buscavao ;  desceo  a 
receb£l-os  na  ladeira,  onde  se  investio  nma  e  outra 
gente  com  igual  coragem.  A  ouzadia  e  o  furor  do 
combate  juDcou  em  breve  tempo  o  campo  do  con- 
fliclo  de  corpos  mortos  e  feridos.  Largo  tempo  se 
sustentou  em  equilibrio  a  batalha,  at^  que  os 
nossos  vencidos  do  cansanco  se  retirarao  do  cob^ 
flicto  em  boa  ordem  acolhendo-se  debaixo  da  ar^ 
telharia  da  fortaleza. 

XV.  Na  passagem  do  rio  Comendoituba  se  tra- 
vou  segunda  ^  por^m  mais  cruel  balalha ,  em  que 
OS  nossos  obrarao  prodigios  de  valor.  Merecem  es- 
])ecial  mencao  os  seguinles.  Maaoel  Dias  d'Andra- 
da,  desprezada  a  obediencia  ao  conde  de  Banholio 
per  acudir  ondeo  chamava  a  necessidade,  rom- 
|)eo  por  entre  os  esquadroes  inimigos ,  fazendo-se 


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QAanmmo  uiSDrANo.  133 

cainiaho  com  a  espada,  que  em  sua  mao  teve  este 
dia,  mais  de  raio  que  de  ferro,  Antonio  Coutinho 
imitou  a  ousadia,  e  por  enire  o  esquadrao  contra* 
rio  abrio  larga  estrada,  poi*^  nao  tao  feliz  como 
aquelle,  porque  encontrou  a  morCe,  mais  depois  de 
a  ter  dado  a  muitos  Hollandezes.  —  Ao  governa- 
dor  dos  crioulos  Henrique  Dias  ferio  uma  bala  o 
coilo  da  mao  esquerda;  suspeitou  hervado  o  chum-* 
bo,  e  por  fazer  a  cura  mais  breye,  e  menos  perigosa, 
a  mandou  cortar,  dizendo,  «  que  na  direita  Ibe 
»  ficavao  muitas  para  servir  a  seu  Decs  e  a  seu 
»  Rei,  e  que  para  a  vinganca  saberia  £sizer  seu  de« 
u  sejo  de  cada  um  dos  dedos  uma  mao.  »  Atraves- 
sado  de  uma  bala^  conlinuou  na  peleja  o  capilao 
Joao  Lopes  Barbalho,  escondendo  a  ferida  aos 
seus,  por  Ihes  moslrar  como  as  dava  nos  inimi- 
gos;  retirou-se  com  os  mais^  atravessouo  mato, 
chegou  a  Lagoa^  e  convaleceo  da  ferida.  Outras 
proezas  succederao  mui  dignas  de  se  encommenda<- 
rem  a  memoria ;  mas  a  escaceza  da  rela9ao  as 
n^;ou  a  esta  escriptura. 

X^Yl.  Com  ardente  cuidado  se  formdrao  e  dis- 
puxihao  ambas  as  partes  para  repetirem  a  batalha 
no  dia  seguinte,  e  cada  uma  esperava  ganhar  a 
victoria,  sendo  para  os  nossos  mais  provavei,  por* 
que  haviao  de  ser  commetlidos  pelo  rio ,  que  Ihes 
servia  de  trincheira.  Tudo  descoropoz  a  cobarde 
resolucao  do  conde  deBanholio^que  no  mais  escuro 
da  noite  fugio  do  reduto  para  a  Lagoa,  levando 
comsigo  a  Duarte  d'Albuquerque  ,  e  uma  compa- 
nhia  de  soldados.  Logo  que  esta  nolicia  se  espalhou 
entre  os  soldados ,  comeearao  esles  a  retirar-se  em 


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<ksordem ,  e  com  elles  os  moradores  e  raas  femi- 
liaS)  a  quern  o%  cabos  nao  pod^rao  oonler^  aendo 
obrigados  a  seguir  inyoluntariamente  a  vergonho- 
aa  fuga  de  sen  general.  0  tenente  general  D*  A\^ 
lonso  Xiroenes  formou  de  aeus  soldadoB  urn  pe» 
queno   eequadrao,   que  aos  miseraveis   vizinhos 
senrio  de  relaguarda  pelo  oaminho  da  praca,  que 
era  o  mais  arriacadO)  e  por  isso  mais  neceditara  de 
aer  protegido.  Os  trabalhos^  fomes,  e  discommodo 
que  pasaArao  uns  e  outros  forao  tantos ,  que  se 
tinha  por  venUiroso  o  que  mais  depressa  os  ata- 
Ihava  com  a  morte.  —  Achou^-se  pela  manba  o 
eonde  de  Nassau  sem  inimigos  a  quern  combater ; 
passou  o  rio  sem  o  menor  impedimento ,  pos  o  si- 
tio  a  fortaleza ,  que  atacou  com  dnco  batarias ,  e 
desmantelou  em  espaco  de  tres  semanas  com  innu* 
merayeis  tiros ,  recebendo  nao  96  igual  mas  avante^ 
jado  reiomo  dos  cercados.  Ja  em  (oda  a  forea  nao 
havia  reparo  por  arraaar  nem  baluarte  por  abrir : 
seryiao  a  defensa  mais  os  animos  que  as  paredes. 
Nesle  estado ,  combat  idos  os  defensores  da  deses*^ 
peracao  do  soccorro  e  dos  temorea  do  assalto,  fixe- 
rao  chamada^  e  capilularao  a  enirega  com  honroaos 
pariidos.  Sairaocom  auasarmasemoveis,  mecha 
acesa ,  bala  em  boca ,  e  bandeiras  tendidas.  Entrou 
o  conde  de  Nassau  na  fortaleza ,  guameceo-a,  po»- 
Ihe  por  govemador  o  capitao  Vanduerve ,  e  sem 
deten^a  foi  no  alcance  de  BanhoUo ;  o  qual  aviaa- 
do  da  marcha  e  do  intento  do  inimigo,  antes  de 
Ihe  ver  a  cara  deix6u  a  Lagoa ,  e  nao  parou  senao 
no  rio  de  Sao  Francisco,  deixando  os  moradores  e 
siias  familias  entregues  a  espada  hollandeza.  Neata 


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GASmOTO  LI7ilTA]|<K  155 

tribuUi^  Ibes  valeo  o  c^foroo  e  generosicUKlo  de* 
Manod  Dias  d'Andrada  ^  offerecendo  aoa  maU  ani- 
moaoi  oompanhia,  eaoa  desmaiados  comelho.  A 
et tea  dim  que  se  ddxasaem  ficar  j  e  do  mate  pe** 
diseeiD  pasiaportes  para  se  Toltarem  para  suas  C9l* 
na  e  fioendas  y  t  que  ae  imio  expoieaa^xi  a  pevecer 
!!•  meio  doa  matoa  de  miseria  a  de  priva^oea,  ou  a 
aodarem  errant^  como  aa  fSaras.  Muitos  segofanio 
eate  parecer ;  algutis  poncoa  at^tirao  sen  amparo^ 
e  o  Mguirao  at^  a  Bahia. 

XYII*  Naaaaa  aegtiio  o  conde  de  BanhoHo  atd 
aaiio  de Sm Franciaoo,  sem  tiuiiGa  opodereneon* 
tnir;  aquarteihou-ae  d'aquem  do  rio  namaitio  que 
duHMo  oP^iedo;  mandou  ahi  levantar  uma  for-^ 
talesa  y  que  dentro  de  dous  mezea  eatara  aperfei^ 
9oada ;  entregou  o  govemo  della  a  Siagismundo 
Van  Scaph  ^  oom  ordem  que  passasse  o  rio  e  deea- 
lo)aaae  o  coudede  Baahollo ,  que  estaTa  po^do  em 
Sergiped'El  R«  ^  o  que  (aeilmente  cousiguio^  re- 
oolkendo-se  eale  para  a  Bahia ;  e  tendo  tudo  aasim 
diaposto  voltou  para  o  Arrecife.  Animado  com  to- 
doe  eatea  suoceaaoa,  e  ambidaao  de  dominar  todo 
o  Brazil)  intantou  Nassau  atacar  a  cidade  da  Bahk, 
qoe  die  eaperava  kvar  por  entrepreza  :  wa  a  ca* 
bo^a  do  Eatado,  e  eutaidia que  ao  golpe  da  cabeQa 
eairfa  todo  o  eorpo  a  seud  p^  rendido.  Saio  do 
Arrecife  em  21  de  Mar^o  de  1638,  com  trinta  e 
inaa  ndoa  de  guetra ,  e  outra  multidao  de  embar-> 
cafaea  de  reoao^  tree  mil  solikdosy  copioso  numero 
de  IndioS)  petreehoS)  muni^oea,  e  bastimentos 
proporciooadoa  k  empreaa ;  e  com  prospera  via- 
geiti  chafM  aoa  mares  da  BaUa.  Era  gofemador 


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136  GASTftlOTO  LUSITANO. 

g^ral  do  Estado  Pedro  da  Silva^  por  alcunha  o 
Mole ;  o  qual ,  primeiro  que  Ihe  ch^gasse  a  noticia 
do  intento^  vio  sobre  a  cidade  o  poderdo  inimigo; 
taBto  mais  formidavel ,  quanto  menos  imaginado. 
Entrou  a  armada  pela  barra,  arribou  sobre  a  parte 
da  Piraja,  buscando  a  praia  que  hoje  chamao  d<« 
Meninos,  deitou  em  terra  gente,  artelharia  e  mu- 
nicoes,  e  sem  deten^a  se  poz  em  marcha  para  a; 
cidade,  que  distava  meia  legoa  d'aquelle  sitio.  — 
Sairao  os  nossos  a  esperar  o  inimigo ;  e  com  tal 
denodo  derao  sobre  elle ,  e  o  carregirao  de  tao  pe- 
sados  golpes  que  o  fizerao  retirar  confuso.  Esta 
prompta  resolu^ao,  e  seu  glorioso  resultado  deveo- 
se  ao  yalor,  pratica  e  viveza  do  governador  doEs- 
tado ,  ao  tenente  g^ral  Pedro  Gorrea  da  Gama,  e 
a  todos  08  capitaes  que  nao  desmintirao  de  s^is 
conhecidos  brios,  nao  cedendo  aalgum  d'dles  o 
conde  de  Banbollo,  e  tauto,  que  parecia  outro 
homem.  —  Apezar   d'este  revejt  nao  diaistio  Nas- 
sau de  seu  projecto,  propondo-se  a  levar  por  forca 
o  que  nao  pud^ra  conseguir  por  eotrepreza.  Nas 
costal  do  convento  do  Carmo  maudou  levantar 
iriucheiras,  fazer   plataformas^  assentar  baterias 
para  pombater  a  cidade.  Nao  estiverao  os  nosaos 
ociosos ,  antes  acommettendo  os  gastadores ,  e  as- 
saltando  seus  quarteis  por  varias  partes  e  em  di- 
versos  tempos ,  fizerao  lastimoso  estrago  nos  mise- 
raveis  Hollandezes ,  e  com  tanto  assombro  do$  seus 
cabos^  que  nem  ao  conde  ficava  acordo  para  man- 
dar,  nem   aos  seus  para  obedecer.   Com  grande 
difficuldade,  e  com  maior  perda  de  sua  gente  con- 
seguiopor  fim  o  conde  de  Nassau  assentar  sua  arle- 


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CASTBIOTO  LimiTAl«0.  157 

Jharia,  e  logo  mandou  romper  o  fogo  sdbre  a  cidade 
nao  dtf  pela  parte  de  terra,  senao  pela  do  mar  com 
toda  a  artelharia  da  armada  ^  recebendo  por  uma  e 
oufn  parte  mais  perda  do  que  a  que  causaya.  — 
Tres  dias  com  suas  uoites  porfiou  a  bataria ;  no 
maior  luror  d'elk  mandou  Nassau  um  tambor  por 
terra  y  e  um  trombeta  por  mar  y  com  embaixada 
ao  govemador  geral  do  Estado ,  na  qual  com  es« 
mdadas  razoes  Ihe  aconsdhaTa  entregasse  a  praca, 
senao  queria  experimentar  no  assalto  toda  a  impie- 
dade  da  ira,  e  todo  o  estrago  do  odio.  Conselho  e 
amea^o  a  que  o  govemador  respondeo  (dizem  que 
nesta  forma ) .  «  As  pra9as  d'£l  Rei  meu  senhor, 
»  sem  armas ,  e  so  com  a  reputacao  se  defendem  ; 
»  e  aquellas  que  se  animao  com  espiritos  portu- 
M  guezes,  primeiro  suas  ruini^  as  sepultao  que 
»  sens  inimigos  as  dominem ,  porque  seu  natural 
»  valor  OS  eosina  a  morrer  honrados,  antes  que  a 
»  viver  reodidos;  verdade  de  que  os  senhores  Hol- 
»  bndezes  sao  as  mais  certas  e  mais  fresca3  teste- 
»  munhas;  e  posso  eu  s61-o  de  que  nesta  occasiao 
))  me  custa  menos  o  animar ,  que  o  reprimir  mens 
»  soldados ,  impacientes  de  sofirer  amea^s ,  quan- 
>/  do  podem  castigar  atrevimentos  ( apurada  sua 
»  paciencia  com  a  loucura  desta  embaixada  y  cujos 
»  ministros  devem  as  vidas  ao  respeito  mais  que 
»  a  cortezia^  pois  o  que  se  me  tem  os  deteve, )  Ao 
n  Conde  aconselbara  eu  que  se  aproveitasse  do 
»  tempo  para  se  recolher  a  sua  armada  y  e  nella  ao 
»  porto  d'onde  saio  :  temo  que  sua  presistencia  d6 
»  taes  fios  &  colera  destes  mens  soldados  y  que 
n  corte  por  todos  os  respeitos^  e  mc  nao  valhao 


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1S8  GAanvno  imnAMo. 

n  minhasdeligeiioias;  e  dizei*Uie  da  minha  parlSi 
M  pelo  que  teuho  de  aeu  Mnridor,  que  ja  pod^ 
a  ter  enCendido,  que  em  nenhama  occasiao  o  ha 
M  de  temer  colerico  quern  agora  o  nao  sefire  con* 
M  fiado«  Ji  A  esta  reaposta  se  seguio  a  de  uma  car* 
ga  de  moaqnelaria)  earn  que  ae  cortou  a  replica  ^  e 
cooseguio  a  retirada  doe  enviadoa  com  a  ligeireza 
que  Ihes  empreatou  o  temor.  —  Com  a  indigua^ao 
que  despertou  o  aggraro  se  continuou  a  bateria  de 
maior  calibre,  com  tal  horror  que  eatremecia  a 
terra ,  e  genua  o  mar.  No  mais  acceso  da  confu* 
iao  deitou  o  govemador  g^l  do  Estado  pela  porta 
da  cidade^  que  guia  para  o  convento  de  Sao  Bento, 
alguna  capitiea  oom  suae  companhias,  e  ord«n 
que  por  aqueUa  parte  desiem  uma  asaaltada  ao  ini^ 
^i$Pt  a  quern  o  rdiate  ciicheo  de  assombrot  na 
oooakkra^ao  de  nossa  gente  busear  o  oonflieto 
quando  a  imaginaTa  cortada  do  espanto.  Greaeeo 
o  pasmo  com  a  perda ,  veudo  que  todoa  os  aeus 
&igiao  ao  golpe  •  Na  terceira  noite  de  combate  re* 
oolheo-ae  Nassau  As  embarca^oes  que  tinha  no  mar, 
deixando  toda  a  sua  artelharia,  muniQoes^  armasy 
e.bastimentoB;  com  tanto  numero  de  corpoemortos 
que  cobriao  a  temu  Ciom  innumeraveis  feridos 
dea  i  vela  a  armada,  e  fokou  ao  porio  do  Arre-» 
cife. 

XYUI.  Chegarao  entretanto  a  lisboa  as  nodcias 
dos  progressoa  do  inimigo  e  das  miserias  do  Esta- 
do; levantarao^ee  clamores  e  queixas  que  fiaerao 
echo  em  Madrid.  Depots  de  repetidaa  confereneias 
do  conselho  de  Portugal,  assaatou^se  mandar^^e 
uma  armada  real  tao  uumeroaa  e  pujaote,  que 


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Gonmo  uwuM.  139 

d'dla  se  cooeebease  moral  oertaza  da  rcataurt^ao 
de  todo  o  £atado  do  BraziU  —  0  omde  da  Torre 
D.  FernaDdo  Blascareobas,  ctfiitao  de  granda  valor 
e  pratka,  6  noa^eado  para  dirigir  e^ta  grande 
empreza.  For  todas  as  partes  d'Hespaaha  ae  iiome&- 
rao  ministros ,  e  applicarao  meioa  para  oa  aprea- 
tos  da  aroaada,  ecooduoQao  doa  vasos  ao  porto  de 
Liafaoa.  Divulgou^se  logo  com  a  prepara^ao  o  iatenb- 
lento;  voou  a  nova  ao  Brazil^  a  onde  da  Flaaftep^ 
gos  e  Poriugueaet  so  ouvio  com  naior  astrondo 
qua  am  Fdrtugal^  causaado  tao  diversos  affaitoa , 
como  sao  a  esperan^a  e  o  reono. 

XIX*  Saira  de  Liaboa  noa  fina  d'Ootubro  a  ar^ 
mada  mui  Mumeroaa  am  gaieoes  do  Eaiadoi  fragar* 
taa  de  guana y  naoa  groeaas,  oapia  grande  de  em^ 
baroaooca  ddinariaa^  ebem  pcoiridaa  d'inatrumeii* 
toa  farilicoa,  artelharia^  mimiQoea,  petrechos  e 
mantimantoa  or^adoapdo  numero  doa  eombatenlea 
e  pela  satisfii^o  doa  cabos.  Bra  a  froU  maia  pod^ 
roaa  que  atd  aquella  taaapo  auloou  oa  mares 
d'Amarica.  Em  10  de  Janeiro  se  aviatou  do  km* 
eife  eom  ummbro  doa  inimigos,  e  aW^rof^  doa 
naturaaa.  Grande  fai  o  temor  doa  Hollaodezaa  i 
Tista  de  tao  grande  for^  naval  e  do  pouco  qua 
ealavao  pravenidoa  para  a  raceber^  tendo  wa$ 
forlaleaaadesmantdladasy  aua  gente  e^lhada^  sem 
proviaao  de  mantimetttoa  e  munifoea  preciaa  para 
amteoiar  urn  eerco ,  e  naa  tendo  no  mar  aenao 
etneo  naoa,  que  eaUTM a  carga;  pelo  que  Piaaaau 
aaa^itava  comaigo  aer  dic^gado  o  &a  do  imperio 
Hollander  em  aquella  porcao  da  America.  Por^ 
aaua  temorea  ae  dtaupirao  em  breve^  porque  a  ar^ 


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140  CASTRIOIO  SJOUTAm. 

mada  em  vez  de  arribar  sobre  Pemambuco,  seguio 
sua  derrota  para  o  sul ,  dobrou  o  cabo  de  Santo 
Agostinbo^  e  foi  deitar  ferro  na  Bahia.  Pareceo 
entao  inexplicavel  este  procedimento  do  conde  da 
Torre,  e  todos  o  condemnavao ;  mas  depois  se 
publioou  que  irazia  ordem  expressa  de  seu  Rei  para 
nao  commetter  a  empresa  sem  primeiro  tomar  a 
Bahia.  Foi  este  um  grave  erro  de  que  resultarao 
tristes  consequendas.  Um  anno  se  deteve  a  armada 
na  Babia ,  tempo  mais  necessario  para  se  fortificar 
e  guarnecer  um  inimigo  menos  vigilante  e  indus- 
trioso  que  o  Hollandez.  —  Com  acerta(k>  conselho 
sedeteminouo  conde  da  Torre  em  preyeniroscapi- 
f aes  mais  d^tros  nos  caminhos  e  veredas  do  recon- 
cavode  Pernambuco,  queserviao  na  Bahia ,  para 
que  com  a  sua  gente  penetrassem  os  matos,  e 
d'elles  assaltassem  com  subitas  armas  os  quarteis 
e  habitacoes  hoUandezes ;  deo-lhe  ao  mesmo  tem- 
po por  instrucao  secreta ,  que  a  certo  tempo  se 
chegassem  a  vista  do  mar,  para  que  vendonavegar 
a  frota  aseguissem  pela  costa  al^aparagem  aonde 
tomasse  porto ,  e  nelle  se  incorporassem  com  a 
gente  que  deitasse  em  terra ,  a  fim  de  sitiar  o  Ar- 
recife  por  uma  e  outra  parte  com  todo  o  poder.  0 
conde  de  Nassau ,  que  era  informado  secretamente 
de  todas  estas  disposicoes ,  guameceo  aquelles  sur- 
gidouros ,  de  soldados  escolhidos  e  cabos  de  con- 
fianca ,  com  ordem  que  acudissem  a  aquella  parte 
que  a  armada  buscasse  para  deitar  gente  em  terra^ 
e  que  lh*o  impedissem  a  todo  risco  e  a  cara  desco- 
berta.  —  Determinada  nesta  forma  a  invasao  e  a 
resistencia,  saio  o  conde  da  Torre  da  Bahia  no  Cm 


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GAsmoTo  tunriiia  141 

do  anno  1639  com  a  frota  e  flor  da  milicia,  que 
enlao  se  achiiva  em  todo  o  Esiado;  e  d'este  esco- 
Iheo  dois  mil  homens,  destinados  para  salta- 
rem  em  terra,  com  os  quaes  se  haviao  de  incor- 
porar  os  ea{Htaes  que  nelia  andavao  esperando 
esta  occasiaOy  comodeixamosreferido;  poder  mais 
que  sobejo  para  romper  por  toda  a  opposi^ao  con- 
traria ,  e  para  acnrralar  o  inimigo  dentro  de  suas 
fortificacoes.  Com  vento  em  poppa  navegou  a  ar- 
mada at^  avislar  aBarra  Grande;  mas  quando  die- 
gou  a  vista  de  Tamandar^,  dezesete  legoas  do  Ar- 
recife,  come^ou  a  expwimentar  a  vebem^ioia 
com  que  corriao  as  aguas,  que  ajudadas  da  furia 
dos  T^Qtos  fizeraojnuiil  todo  o  goremo  do  leme 
e  do  panno;  aasim  arrebatayao  os  vasos  que  nem 
pod^rao  pairar,  nem  d^tar  aneora.  0  inimigo^ 
que  conn  destreza  se  sabia  afMroveitar  das  occasioes, 
mandou  largar  o  panno  a  vinte  fragatas  e  alguns 
patachos ,  que  para  este  fim  tinha  prevenidos,  que 
sairao  do  porto  com  a  yantagem  de  navegarem  a 
barlaTento  dos  nossos;  tres  fragatas  tirerao  a  ou« 
sadia  de  quererem  abalroar  a  capitanea,  mas  forao 
bem  caatigadasy  porque  uma  foi  logo  mettida  a 
pique,  e  as  duas  se  retirarao  desarvoradas.  Abo* 
nancou  o  vento  por  e8pa90  de  tres  horas  >  tempo 
em  que  os  nossos  se  pod^rao  ordeoar  para  a  bata« 
Iha ,  que  o  contrario  evitou  desviando-se;  porim 
levantou*se  logo  em  tao  furiosa  tempestade  j  que 
a  uns  e  a  outros  nao  deixou  mais  salvacao  que  a 
de  obedecer  aos  mares*  —  Levada  das  ondas  des-* 
garrou  a  frota  portugueza  para  as  Indias  de  Cas- 
tella ,  a  onde  priraeiro  alevou  o  destino  que  a  or- 


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143 

dan  qpe  d'Bl  Rei  tinha  o  comb  da  Torre  pata 
qua  oMdttida  a  emprcsa  de  Panambooo  looiaaae 
aa  Indiaa^  e  oomboiaase  os  ^aleoea  da  prata  a  Sio 
Lucas.  Ab  naot  hoUandezas^  favorecidas  do  rento, 
ytMkfio  para  o  Arreeife  :  vinha  a  capitauea  am«- 
bandeirada  do  negro  pelo  gmnde  nupaero  da  moiv 
%oa^  e  entreellas  seu  generah  0  conde  de  Naaaau, 
mal  aatisfeilo  do  auoceaso ,  mandou  degolar  o  tau 
almirante,  com  estiloa  de  fraco  e  de  falso;  e  a 
ciiieo  capitaes  mandou  enforcar  por  remistos;  e  a 
dous  pilotoa  por  Tagarososy  e  a  todos  com  a  igno^ 
mink  de  verem  £aixer  em  pedaoos  anas  armas, 
com  o  pr^o  da  culpa  e  do  suplicio. 

XX.  Nao  quiz  a  fortuna  que  nem  um  so  ao^ 
oiNnro  enviado  porCaatdila  foiseproveitoao  ao  EsCar 
do  do  Brazil.  Este  que  era  o  mais  poderoso,  e  que 
era  destinado  a  restam^alH)  em  sua  integridade, 
maiogrou«M  desgracadamente,  deixando  mais  amaa- 
fada  a  sua  s«guranoa  ^  e  mormaqte  a  cidada  da 
Bahia »  em  que  o  Hollandec  nao  deixara  da  raalisar 
suas  vistas  amlnciosas,  se  a  tempo  nao  fora  secoor*- 
rido*  D'este  cuidado  iao  preooupadoa  os  nossos 
caboS)  quando  se  viao  arrebatados  pela  tormenla  : 
propos^rao  ao  general  da  armada  a  necessidade  do 
soccorro  oom  requerimento  que  os  deixasae  em 
terra  cm  qualquer  porto  d'aquella  costa ,  d'onde 
podasiem  marchar  pelo  certao  para  a  Bahia.  Ins* 
tava  a  iroportancia  ,  e  no  porto  do  Touro ,  catorze 
leguas  do  Rio  Grande  para  o  norte  ^  deixou  a  ar- 
mada ao  mestre  de  campo  Luiz  Barbalho  com  mil 
trezentos  infantes ,  e  ao  Gamarao  e  Henrique  Dias 
com  a  sua  gente.  Havia  de  ser  a  msrcha  pelo  in- 


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tttrioi*  da  mate,  e  mn  parMi  por  eatre  a  barbaric 
dade  doa  Indiot  topando  egn  muitas  com  aa  armaa 
doa  ooAlimrios;  e  em  todas  aam  provisiMD,  neoi 
Mpwanfa  de  loocorro  humano;  a  diatancia  de 
ireseniaa  legoaa  :  difficuldadea  qua  pareoaiiao 
impoaiiveis  ao  maia  otisado  oora^o;  e  ad  caboa 
iao  deatemidos  pod^raointentar  e  yenoar  empreaa, 
que  ainda  depoia  de  couaeguida  ae  fez  duvidoaa.  -« 
Parle  d'um  deaerto  era  o  porto  <mde  a  armada  dei^ 
Um  a  Luis  Barbalho  com  a  sua  ^atite,  $6m  maia 
viFeras  que  oa  que  cada  suldado  podia  trazar  era 
aua  mochiUa  :  eircumataooia  e$la  capaz  de  fazer 
deaajumar  aoamaia  daaiemidoa  oora^oea.  Luia  Baiw 
IniUeo  beaa  conhecia  quanto  era  ftameraria »  senao 
louca^  uma  ainulhaute  empraaa;  mat,  auaten** 
taudo  atmpre  aquelle  Yak>r  que  deapraza  a  vida 
paca  acudir  a  patria  afflieta,  kunQou^ae  noa  brafoa 
da  Frovidttteia;  e  para  ui^[urar  em  seqa  soldadoa 
oa  acDliaMotoa  de  que  estaTii  peasoido ,  foi  fama 
Ikw  fallara  d'eata  maueira :  (c  O  motivo  que  aoa 
»  tirQu  da  Bahia^  noa  deitou  agora  neata  praia; 
»  d'ella  noa  tirou  a  conquiala ,  a  elk  noa  leva  a 
M  defeuaa;  detarmiMcao^  uma  o  ouira ^  Cao  filha 
>»  de  ammoa  pprtu^uezea  ^  que  Uvre  de  achar  noa 
M  estranboi  competeocia ,  buaoa  em  ai  meama  o 
m  exoesao,  tauto  maior  em  conaervar  o  peaauido, 
N  que  em  reeuperaro  eatragadoi  quauto  maior  6 
»  o  perigo  da  oonduzir  eate  aeooorro  que  o  de 
n  perder  aqueUa  armada  :  em  aeu  mio  auocesao  ti* 
>i  verao  parte  oa  elemeutos  ^  e  oao  oa  inimigoa ;  em 
»  eaia  viagem  bavemoa  de  pelejar  com  os  inimigoa 
n  e  com  oa  elementoa;  eatea  armadoa  dos  rigorea 


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U4  cAimwo  umtuf(^ 

»  do  tempo  f  aquelles  tbs  coleras  do  odio.  Tudo 
H  veacoremoSySesoestribadosiia  causa  alentarmos 
))  a  confianca,  pon  i  certoquc  nao  falta  Deoaoom 
M  auxiliot  a  quern  Ihe  dedka  obsequios :  a  fiivores 
»  do  oeo  se  nutre  o  valor  dos  homens.  Imoa  a  aoe* 
n  correr  e  a  livrara  patria  das  leis  da  infiddidade  € 
»  das  extorcoes  da  tyrannia,  e  a  influir  nas  espe- 
»  rancas  doe  parentes  e  dos  naturaes,  que  em  Pier- 
»  nambuco  Tivem  opprimidos  do  jugo  hoUandeE  y 
M  com  libertarmos  a  Bahia  de  seu  imperio.  Poddn^ 
»  nos  acobardar  a  falta  de  mantimentos,  se  nao 
»  cuslumarao  suprir  os  frutos  agrestce  dos  matos; 
>  nelles  mais  certos  e  menos  custosos  que  nos 
M  quarteis  do  inimigo.  A  experiencia  nos  lem  en*- 
n  sinado  que  mais  fiicilmente  se  yence  a  felta  que 
»  a  resistencia ;  mas  se  a  onde  se  contrasta  a  maior 
»  gloria^  sou  de  parecer  que  nesta  marcha  busque- 
a  mos  opoToado,  no  quel  poderemoe  conseguir 
M  reoiedio  para  a  forca  e  argumento  para  a  fama^ 
»  mais  grata  a  quem  venee  homens  que  a  quern 
»  mata  feras.Por  esia  yereda  oaminharemos  a  dous 
M  fins  :  amatar  a  fome,  e  a  refrear  a  forca;  pois  i 
»  certo  que  oeinimigoSy  que  agora  deixanossobra^ 
»  destruidos,  nos  bao  de  faltar  depois  contrarios. 
»  £  quando  o  HoUandez  irritado  nos  bi>sque  po^ 
»  deroso ,  em  nossa  mao  esta  a  retirada ,  porque 
•  Ihe  fazemos  tanta  yantagem  no  conhecimento 
n  do  certao  ^  quanta  elle  nos  p6de  (daer  no  nume- 
»  ro  dos  soldados.  »  —  Depois  de  concluida  a  ex-* 
horta^ao,  que  por  todos  foi  igualmente  applaudida, 
formou  o  general  a  sua  gente  j  comecou  a  marcha  ^ 
leyando   diante  de  seu  esquadrao  descobridores 


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para  as  ciUadas  ^  e  guias  para  as^eredat  ^  omu  or* 
dam  que  todba  oa  cavallos  e  bcHa  que  deaoabriiaem 
Oft  reeolhessem  para  o  anstettto  e  para  o  Mrvi^« 
Pro6eg;uio  sua  marcha  buaeaada  senpre  as  paToa* 
foes;  nas  que  erao  amigas  acbava  bcm  aooUii<» 
BueutD,  e  sens  moradores  darao  TofaHrtariameBte 
aos  soldados  o  sustento  neoessaria;  naa  iniwwpi s 
entra^a  com  Tiolenda ,  tomava  o  preoiso  e  qiseip^ 
raava  o  reslo.  Chegou  a  Yilla  de  Groyana^  a  oode  o 
FUoneBgo  tinha  quinkenlos  e  trinta  bomeKS  dq 
presidio;  envealioo  quartel,  passoutudoaespada^ 
estregando  i»  chamas  o  que  oao  pod^ra  des^rvir; 
e  assim  foi  fezendo  em  outras  amitas  povoacoes^ 
queiodastiverao  igual  sorte.  Cbegou  entretanlo 
ao  Arrecife  a  uoticia  do  esirago  e  da  marcha 
de  Luiz  Barbalho,  com  o  que  impacieDte  o  ini- 
nigo  saio  a  campo  com  ires  mil  soidados ,  em  tres 
Iroi^s ,  a  fim  de  o  perseguir  e  destruir  eomple* 
tamaile;  mas  a  este  tempo  }i  eUe  deixava  atrAs  o 
districto  de  Pemambuco ,  e  penetrando  pelo  atiais 
espe^o  do  mato,  nao  lendo  outro  suslento  que  al-* 
gum  pouco  milhoy  passou  o  rio  de  Sao  Fraociacoy 
e  da  parte  do  sul  fez  alto  para  dar  desoanco  e  alivio 
i  sua  g^oUe  de  tao  dilalada  e  peuosaviagem;  k  sua 
vista  parou  o  inimigo,  que  o  seguia,  taaseodo  na 
passagem  o  destroy.  Goutinuou  a  marcha^  pas«- 
sados  algpns  dias,  com  menos  oppressao^  e  mais 
commodidkle;  at^que  entrou  na  Bahia,  termo  de 
sua  Jornada ,  que  cheia  de  espanto  nao  cessou  em 
muitos  dias  de  eucarecer  o  que  Luiz  Barbalho  nes- 
ta  fac^o  ganbou  de  gloria  e  adquirio  de  fama.  0 
esquadrao  hollandez,  assim  como  tIo  o  escape 
I.  to 


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Mt  GiMMom  EMrrAiia 

da  prawe  ft  inposMfattidhde  do  ftlcftMo,  rokoo  a 
mwtlia  pftn  a  Ameife^  e  a  ooteia  cmira  oi  po* 
bnmmand(MPm  maUMdoedastraiiidb  tudoqiMUK 
tetapop  aid  ParMnboGo. 

XXU  DuiiBM  dko  am  o  n^  XIX  d'eala  Urm 
o  intaKtft  oasi  qua  o  oonde  da  Terra  maiidoiL 
ilgilin  caaapankias  de  aoldadoa  a  eampanlia  da 
Penwnli^uea^  deatroa  no  terraso  e  nas  veradas 
(fo  aaatfu  fra  cabo  da  lodas  Andrd  Vidal  de  Nd>» 
ffmivM^  o  qual  oom  tanta  induatria  e  valor  fez  ana 
obrigteaa  que  se  jtilgou  o  HoUandaz  deatruido  sem 
remadio.  Diridida  a  noasa  ^ente  «m  pequanoa 
trocoa  aaaaltao  a  um  mesmo  tempo  diversos  iu(^- 
rea  aan  tanta  ligeireza ,  que  diaraado  o  inimigo 
dos  tabataa  j  sdencontrava  o  sangue  e  o  incendio 
semver  a  espada  nam  o  aggre&sor.  Nao  baatou  a 
enlBrposicao  do  mar  para  dedviar  o  rate  :  feitoa  oa 
noi^oa  em  um  oorpo  (  aproveitaiido-ae  da  preaa 
qua  fiterao  em  trea  barcos),  paaaarao  4  ilha  de  Ita- 
raaraci;  em  uma  iioite  a  ganh&rao,  sacpiearao  e* 
deatruirao,  oom  morte  de  dous  capitiea  hoUand^ 
zea  J  e  bom  numero  de  aoldadoa  e  Indies^  com  ta| 
preateza  que  p6de  a  manha  descobrir  o  estrago^ 
poi^m  nao  oa  agentea.  AsBim  continuaTao  oa  noasos 
em  auaa  bem  suocedidaa  exoursoes ,  quando  avia^ 
tarao  ^  armada  que  navegava  da  Bahia  para  Far* 
nambuco,  e  com  alvoroco  de  terem  &  vista  o  fim 
deae}ado ,  derao  comprimento  &s  ordensque  doge*- 
neral  tinbao  reeebido ;  desc^rao  48  praias  j  e  por 
terra  seguk^o  o  curse  que  as  embarcacoes  levavao 
por  mar,  com  a  esperanca  de  se  unirem  com  a 
gente  que  d'eilas  havia  de  salr ;  a  qual  perd^rao 


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wade  t|m  <te  miur  cm  fdft  a  ofliihiim  fpoito  «mr 

avLtea  a«eaUi^  win  fti  qQQ  it  d^iao  cqnlwillf 
o»  a^^Qfty  ntd  €iot«a  per  Qti«JitiMi4»  e  ^esficiii 
for  rmn^io  i  fi^trai^  que  a  tqrto  alirtM«  c^wr 
nbo  4  retinda^  ofMrto^  no  moo  4f^  mw^taficiiif 
^ocedM  ohfgap  Luis  BsyrhaUbe  4  ^u^  destrkto  t 
cwreo  a  fama  <mn  o  ciiiroQdo  que  euatmpa  gnter 
o  espanto ;  coDiFeaeiiQ-Mi  a«  nosaas  partidai^  a  foir 
tjts  Q'lim  eorpoy  aa  u»irae  oem  a  aua.g^nt»^ «  jun* 
to3  f»x)9eipiirao  a  marcha  para  a  Babia.  qft  IMm 
que  temoa  referido. 

XXII*  iogo  que  e  Inimigo  ae  ^rUficou  de  qu? 
a  armada  pm^tuguesa  eeg-ujra  e  nuno  dfta  lediaai 
mandou  aair  a  sua  eacpiadra  de  naea  de  guerra^ 
entraigue  a  Carlos  Tarlom ,  oom  erdem  que  palp 
maritimo  da  Bahia  ficeasp  a  danme  peaaivel ,  usasr 
do  mais  vi^ro  rigor  da  hostilidade«  Com  prea^ 
pera  viagem  ohegou  a  auseada  ^  que  tem  Ires  \effm 
de  ooita,  deitou  gente  am  tirra.  Oa  moraderea, 
que  primeiro  sentirao  o  far ro  que  yittem  q  bra^^^ 
nao  tiwr&o  mail  lugar  que  de  salrar  as  vidaa ,  da{^ 
xando  nas  maos  dos  inimigos  as  casas  e  faaendas* 
Saqueou  todoa  os  engeBbos ,  que  por  rioa  nayegar- 
veis  Ihe  fioayao  debaixo  da  espada ,  enlregandQ  iS 
chamai  o  que  nao  podiao  melter  a  saoco,  Peade 
que  na  Bahia  se  ouvio  o  grito  do  estragO|  mfindpu 
o  goyemacbr  um  grosso  de  inlantaria  oom  ea  vud^ 
Ihores  oabos  do  presidiq  para  rdMttarttn  o  immigp. 
Mardiirao  accesot  no  desejo  da  vingan^a  ;  pordm 
forao  detidoi  das  vollas  do  eaminho  j  e  das  passar- 
gens  dos  rioa.  0  Hollandez,  avisado  do  nesso  ar- 


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146  CASTilOM  VmfiMk 

rebfttido  movimento,  Msim  medio  o  tempo  com 
o  perigo,  que  uma  mesma  hora  wrvio  k  nossa 
^iiegada  e  6  roa  fuga .  Lamentavel  perda  fez  o  ini- 
raigo  em  seis  dia§  <(«e  durou  a  insolencia  e  o  rou- 
bo  :  detxou  muHoe  engenhoB  destniidos,  mnitoa 
desaparelhadoft ;  levou  nmitacopia  d'asaucar ,  bob, 
canafi,  Tasos,  roupaa,  e  tudo  o  mais  que  teve 
valor  e  preaiimo,  sem  deixar  cousa  de  utilidade. 
Item  pafa  o  reparo  nem  para  o  aerv^. 

XXIII.  Ainda  se  ouviao  as  queixas  c  corriao  as 
bgrimaa  dos  moradores,  quando  o  marquez  de 
Montalvao  Dom  Jorge  Mascarenhas  tomou  terra 
na  Bahia  com  o  titulo  de  Viso-Rei,  e  cargo  de 
govemador  gAral  de  todo  o  Estado  do  BrazU,  B- 
dalgo  de   relevantes  prendas  e  verdadeiramente 
digno  da  confianca  que  El  Rei  Philippe  fiizia  de 
sen  talento  para  sarar  as  quebras  de  nossas  armas^ 
e  rebateras  for9a8  hollandezas-  Parece  que  nesta 
eacolha  sc  prognosticou  a  ultima  labaredadaquellc 
govemo ,  e  a  toUl  mudan^a  do  Estado,  Era  o  mar- 
quez  varao  de  grandes  espiritos ,  noticioao  da  mi- 
licia ,  e  destro  na  sagacidade ;  doAo-se  do  eatrago 
e  da  injuria ,  que  o  chamavao  a  yinganca  com  a 
Toz  da  lastima ,  e  quiz  mostrar  ao  inimigo  que  seu 
coracao ,  nem  salna  perdoar  nem  podia  so&er ;  e 
que  para  a  satisfa^ao  dos  aggravos  Ihe  sobejava  es- 
pada,  e  para  a  recompensa  das  cautellas  Ibe  nao 
foltava  astucia.  —  Em  breve  tempo  se  fez  capaz  de 
tudo  o  que  era  necessario  para  acertar  nas  empre- 
sas o  mode,  e  nos  sujeitos  a  escolha.  Ghamou  a  si 
o  capitao  Paulo  da  Gunha ,  a  quern  fiou  o  peito  e 
o  segredo ;  ordenou-lhe  que  escolhesae  os  soldados 


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GASTiioTo  umrtino.  149 

^ue  sua  opiaiao  aproTaase  ^  e  com  ^es,  como  a 
furto  ^  marchasae  para  a  campanha  de  Pernambu* 
CO,  e  qadmaase  sem  diatiofao  CDgenhos,  cana^ 
veaes ,  rocas ,  arvorea ,  e  tudo  o  mais  de  que  o 
inimigo  se  podia  a{nt)yeitar ,  para  que  deseoga* 
uado  de  que  os  interesses  nao  haviao  de  chegar  aos 
gastoSy  desamparasse  o  que  sustentaira  pelos  aTan* 
fos ,  e  nao  pela  reputa^ao.  Partido  o  capilao  a  des- 
filada ,  o  seguio  com  as  mesmas  ordois  o  govema- 
dor  dos  Indios  Heurique  Dias  com  o  aeu  terco. 
Feita  esta  expedicao,  despachou  o  marquez  um 
prc^rio  ao  ccmde  de  Nassau  com  carta,  pcJa  qual  o 
avisara  em  como  alguiis  soldados  portuguezes  mal 
disciplmados  se  haviao  remontado  temeroeos  do 
castigo ;  que  sospeitava  se  passariao  a  Portugal; 
inteuto  que  sem  duvida  os  kvaria  a  buscar  o  fa- 
vor de  Sua  ExoeUencia,  para  que  Ihes  conoedesse 
emJMirca^ao,  ou  para  o  reino  ou  para  os  Estados; 
e  ae  acaso  os  levasse  sua  demasia  a  roubar  o  recou* 
cavo,  Ihe pedia  que  nem  sua  generosidade  os  des- 
eulpasse,  nem  sua  dmiencia  se  comp^decesse,  pois 
para  a  Uberdade  havia  griUbos,  e  para  o  delito  for- 
cas.  Fuudavarse  a  confian^a  do  marquez  em  que 
nunca  a  diligeacia  do  inimigo  havia  de  alcancar 
a  destreza  e  a  perieta  dos  sens.  Licita  e  discreCa- 
menf  e  se  desfor^ou  por  este  modo  o  Viso^Rei  das 
perdas  e  enganos  com  que  o  conde  dos  &zia  a 
pKrra. 

XXIV  •  Neste  tempo  tiuha  o  conde  de  Nassau 
mandado  dar  ao  marquez  os  parabens  da  viagem 
e  da  chegada  por  Mauoel  Code ,  um  dos  tres  de  seu 
Qonselho  supremo^  e  por  seereiario  da  embai** 


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IM  GAfnmro  umrtAiia 

xa<k  a  Abnkam  Tra^  (mteHigeAte  tm  lingot  por^ 

tuguera  )  com  urn  prawnte  de  finimos  aasim  da 

tern  como  de  Hn,  A  smunda  da  embfti?(ada  j 

depoiB  das  eongratula^oes  da  pessoa  y  era ,  com  as 

eavilkcoes  do  officio,  pedir  suspetifeao  d'aitiaa^, 

aponlando  as  convenienciaa  de  uma  trdgoa  entre  06 

dom  goYemoB ,  coin  a  dobrez  d'amigo  e  con^ario. 

Com  esdma^ao  e  agasalho  recebeo  o  Yiao-Rei  06 

eoviados  e  as  offiertas ,  acompanhando  a  gratidao 

GOBI  a  magestade^  coai  que  os  tratou  os  ditis  qne 

sa  detiyeriio;  al^  que  os  despedio  satisfeitos  e  obii^ 

gados«  Eat  breve  lempo  correspondeo  ao  cofide  de 

Massau ,  e  aoa  do  supremo  cooselho  y  com  vatita*^ 

jteo  recorno ;  e  cdm  as  mesmas  artes  dUferio  istre^ 

goaa  pedid»;  negocio  que  fi^u  ao  tenente  Martim 

ferreira^  e  ao  sai^ento  ifitior  Pedro  de  Arena^ 

OQBi  canldosas  ioifruccoespara  assisdretna  propo- 

rem  os  tapitukM  d'eUasi  porque  vm  engano  se  r^ 

batesse  oom  outro.  Chegarao  «d  Arrecife ;  com 

fiesiiTas  demonstncoes  forao  reeebidos  do  povo  e 

do  govomoy  e  eom  paniculares  bourne  do  conde 

de  Nassau^   Goacluido  o  liegocio  se  voitarao  os 

nossoe  para  a  Bahia,  satisfeites  HMds  da  corteaU 

que  da  verdade  bollaudeaa ;  a  oude  M^irao  o  Y iso- 

JRei  embebido  no  caidado  de  reforfinar  as  fortified 

9fes  aiRrukiadas)  que  brevemente  pots  em  sua  ui^ 

tinia  perMcao}  e  em  deiur  ao  mar  duas  galeaias 

bem  obradas  j  mostrando-se  ao  inimigo  com  uma 

mioaa  paz  outra  na  espada^  com  o  que  a  urn  mes^ 

mo  tempo  sefeda  temido  e  respettadi» de amigose 

eontrfflrios. 

XXV.  EmqiHuito  passava  o  refeiido  (iverio 


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ajnunmo  umsumo.  161 

iempD  06  €ft|iitttei  Paulo  dt  Cvm^  «  HcMrkpa^  Diti 
pua  e»eultMni  as  ordoM  da  Viio*Aoi«  Ck^f^Mio 
•adeitficto  de  Pernambuco  com  tm  de  forogidUn^ 
<|iio  fle  fes  crer  ptla  pritteira  100900^  e  digpas^rio 
omodo  maiB aegfuro  e  meUbor  €Mft«iinhlKlo  M  fim 
freCeadido;  dividkioae  em  paqucsoa  tro^os  dr. 
dea  e  ijuinae  toMados;  a  oida  urn  se  consignou  o 
lugar  <  a  hora  pan  a  iavaaaO|  €  para  o  retirtK 
Desta  iorte  eapalhados  peha  ft^eguesias  portrio 
iofp  a  iudo  que  podia  eet  materia  para  o  iactndio^ 
com  o  que,  sem  tempo  nen  distiA^^  ae  Tiaoan- 
4er  Qi  engrahos  e  edificaos^  ea  eampoa  e  o^  Inttos 
^m  uiM  lAesma  rhaia,  Todoa  olhaWb  o aabra^t; 
AQDhuaa  atuMima  com  a  eauaa.  IWtiigueaea  a  Fk«- 
Mangas  ^faonmo  a  pei>dai  aem  qua  a  algom  aobev- 
jaaae  magaa  para,  o  daamo  all^.  Em  aodas  afc 
fMTlBi  ardia  tndo  aquifio  em  que  ae  podia  «ef)tf  a 
interesse  e  a esperanca;  aa  generoa  da  meDcaooia e 
do  sustento  confundirao  as  cinzas ;  e  nao  menos 
OS  discursos,  que  embaracados  com  a  igualdade 
da  perda ,  nao  sabiao  atinar  com  0  principio  do 
damno.  Com  diligencia  inutil  acodiao  todos  ao  re- 
medio;  porque  os  nossos  soldados  assim  fugiao  do 
fogo  que  punhao,  que  era  o  mesmo  buscAl-os  com 
a  luz  das  chamas  j  que  perd^l-os  escoudidos  entre 
as  sombras  do  mato «  sem  que  novos  incendios  Ihes 
dessem  tempo  para  ponderarem  as  cinzas  dos  pas- 
sados  :  achava  o  fogo  os  materiaes  tao  dispostos 
que  o  mesmo  era  correr  a  atalhal-o  y  que  chegar  a 
ver  tudo  consummido.  Nao  deixou  d'obrar  em  al- 
gumas  partes  mais  o  interesse  que  a  obediencia; 
pordm  forao  tao  poucas ,  que  nao  fizerao  numero 


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453  Cksamto  umrrina 

em  tamaaiu  ioiiima.  Duron  por  muitoe  diasa 
causa  e  o  espanto  :  na  duracao  dos  estragoe  viao  os 
HoUandezes  sua  perdicao,  reoolhendo  igual  damuo 
da  perda  e  da  yiugan^a*  Os  moradores  e  naturaes 
recebiao  d*uma  mesma  mac  a  miseria  e  a  eqporan-- 
ca  J  porque  so  achavao  em  sua  calamidade  a  de 
sua  redemp^ao.  E  sem  duvida  f6ra  este  o  meio 
para  que o  inuiiigo  desamparasse  a  terra,  se  fatal- 
mente  o  nao  atdhAra  aquella  Providenctai  que 
cx>m  a  omissao  castiga ,  deixaudo  ohmr  os  homeos 
pdos  didames  da  cegneira. 

XXVI.  Nada  mais  se  passou  de  notavd  at^  ao 
fim d*esCe  anno,  a  nao  ser  a  morle  de  Joao  Ames- 
te,  irmao  do  conde  de  Nasssau,  que  assistia  em 
PemamlNioo  chamado  da  oonTenienda  e  da  oo- 
bi^a;  cujo  funeral  celd)rou  o  irmao  com  grande 
solenmidade  e  magnificencia  segundo  auso  de  sua 
terra  e  rito  de  raa  religiao. 


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UVRO  V. 


SUMMARIO. 

I.  Preseguicao  que  08  HolUndezes  fiierao  A  religiao  e  a  seus  minis- 
tros  durtDte  o  seu  dominio  em  Peraambaco.  —  2.  Permite  o 
exereicio  das  stDigogas ,  e  maodou  pr^ar  u  teitu  heretieat^ 
mas  sem  fructo;  caso  que  o  prova*  —  3.  Conselhos  e  iribunaes 
que  fonnou ;  procedimentos  Injustos  e  anibiciosos  de  seus  minis- 
iros;  exempk  que  o  prora.  —  4.  Cases  em  queo  HoUaudei  obron 
■em  (6  e  sem  Yerdade.  —  5.  Casos  particulares  que  mostrao  como 
o  HoIIandes  fazia  das  leis  redes  de  que  poucos  escapavao.  — 
6.  Suecesso  rolsterioso  que  o  qualifica.  -*  7.  Maldade  que  o  enca- 
rece;  indistioecao  que  o  eugera.  —  8.  Deshumanas  cnieldato 
que  execuUrao  os  HoUandezes ;  novos  tormentos  que  inyenUrao. 
—  9.  Caso  estraubo.  —  10.  AbomioaYeii  torpczas  que  usavao.  — 
il»  Inueiatel  eobi^a  eieeotada  eom  o  braco  do  goTerno ;  easo 
,  que  0  Terifiea.  —  12.  Desaforados  em  todo  geiiero  de  vidos.  — 
*  13.  Pond^ao-se  os  eicesos  da  oppAssao  e  do  tuffrimento ;  prodi- 
gioia  iddidade  dos  Portugueies  part  eom  Deoi.  —  14.  Disposi- 
foei  d«  ditiBt  Prondeneia. 


Interromperemos  per  urn  pouco  o  fio  da  iiossa 
historia  em  quanto  se  prepirao  em  Portugal  os 
grandes  acontecimentos,  cujo  ^o  deyia  de  inEla* 
mar  o  patriotico  coraqao  do  nosso  heroe  Joao  Fer- 
nandes  Vieira,  para  nos  occuparmos  em  relatar 
neste  V  livro  os  attentados  e  crimes  de  todo  o 
genero  que  os  HoUandezes  praticarao ,  durante  a 
sua  domina^ao  em  Fernambuco ,  contra  a  religiao^ 
contra  a  justi^a  e  contra  a  verdade  :  qual  sua  cobi- 
ca  J  quaes  suas  crueldades  ,  quaes  seus  desaforos  ; 
e  qual  a  constancia  e  soffrimento  dos  Portuguezes 
no  meio  de  (anlos  trabalhos  e  persegui^oes. 


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15A  GASTRIOTO  UJSITANO. 

L  Quando  o  FlameDgo  entroujoa  villa  deOlinda 
nao  so  permittio  a  os  seus  o  sacco  e  a  extor^ao  em 
toda  a  demazia  de  victoriosos ,  mas ,  para  mostrar 
seu  aborrecimento  a  religiao  catholica  romana, 
Ihes  aplaudio  os  horrendos  desacatos  com  ,que 
profan^rao  o  sagrado  dos  templos  e  das  santas  ima- 
gens;  tao  insolenles  que,  acompanhada  a  exorbi- 
lancia  do  <ksprcB0  y  fiierao  em  pedacos  ^  e  pisaiio 
aos  p&  tudo  0  que  servia  e  representava  o  divino 
€ulto«  Aqueltes  yasos  e  parameatos  que  a  (6  turiu 
dedicado  A  catholica  veneracao ,  depots  de  serem 
materia  ao  roubo ,  o  forao  a  irrisao.  Com  o  mesmo 
exoBBO  e  eecandalo  se  bouve  na  villa  de  Gunhau, 
<}ue  ganhou  por  entrepreza,  deixando  aos  mo- 
radores  fanio  que  seatir  nos  desacatos  feitos  a 
Deos  e  a  sens  santos  ^  que  Ihes  faltarao  lagrimas 
para  cborar  as  injurias  e  perdas  tempora6&«  Nao 
de  outra  sorte  se  houv^rao  o  anae  de  1634^  quando 
encarregArao  aos  Gentios  Pytiguares  e  Tapuyas 
a  execucao  das  cruezas ,  por  tomarem  a  sua  conta 
a  4o6  sacrilegioB*  Ob  mesoios  imultoi  Vbio  (  nao 
com  ^Uios  enxutoe )  m  morador^  de  Paraiba  t  txjm 
fok  a  dor  mais  intensa ,  porque  fm  o  desacato 
oais  horritel*  Era  umdomingo  6  deOcCubfo,  dia 
q«ie  a  devbcao  dedieara  a  solemnidade  do  Rosam. 
A  OMcvrrenoia  era  de  todos ;  e  nao  isentou  o  golpe 
a  netthum ,  porque  o  repentino  assalto  tAn^  Sao 
lu^ar  k  defenaa  nem  A  vi^anca,  (asend^a  dese^ 
jada  a oegueira  com ^e  o$  herejes  conveit^aoem 
despreso  de  culto  o  pomposo  da  festa.  Na  oecatiao 
em  t{«Be  o  caade  de  Banbollo ,  fajg^o  de  sua  tties^ 
ma  sombra  ^  ddsou  naa  garraa  do  mimigo  a  fcH^ 


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QAamOTO  UISITILIK>«  156 

ialeza  e  poiFoabao  do  potato  do  Gtthro ,   ficamo  06 

TiBinfaos  8ujeitos  a  lodo  o  rigor  das  arniM,  e  da 

tyrannia  hereiica.   Faltara^lbeo  o  eoflriiiMttIo  e  a 

paciencia  para  o  escandalo  ^  com  que  o  inimigo 

f»ro£MMm   o  sagrado  €  o  honorifico  ^  m  Ih^s  nao 

animara  a  tokrancia  o  P.  M ^  Fr.  Manoal  do  Sat- 

▼ador  (  Vcja-8e  n^  IV  do  livro  IV )  »  religioso  da 

ordem  de  Sao  Paulo  y  a  quem  este  mno  e  aqueUe 

Eatado  ^  deyedor  de  grandes  serri^oS)  que  Ihes 

preaiou  expondo-ae  mtiitas  yeses   e   em  mukas 

partes  5  a  grandes  perigoa  pelo  servi^  de  Deoe  e 

dai*epuUioa»  Nao  contente  de  tantos  desacliloa  e 

profanacoes ,  prohibio  o  HoUandei  y  denlro  da  Oh- 

dade  Maurioea  e  Arrecife ,  o  uso  dos  sacrameiiioa 

oon   peoa  capital  a  quem  viokssc  tao  ex^craval 

decrelo^  Estendeo-ae  a  prohibi<;ao  por  todo  o  ro- 

concavoi   aao  porque  o  bando  o  compreiidesde, 

seMo  p<HH|ue  a  insolescia  o  executava  f  passando  a 

obscrvancia  do  yedado  os  termoa  do  probibido;  e 

foi  laiiia  a  demazia  dos  berejes  ^  que  opprimkU^ 

06  moradores  da  exacoao  abrirao  oavas  debaiKO  da 

terra  ^  para  esoondermi  a  maligoidade  oa  exeroi- 

cios  da  virtude.  Nao  foi  menor  o  furor  com  que 

perseguio  os  saoerdolea  e  raligioBoa»  A  uns  des- 

terrou  y  a  outroa  preitdeo  y  a  muiloa  destruio  y  nao 

aendo  poucot  oa  que  acabon  com  Calsas  culpas  e 

afrootesaa  mortet.  A  dous  religiosos  d'esta  reli- 

pK>  eradendirao  a  forca^   porque  junlamente 

padteetaemoEalado  e  as  peasoaa*  Na  volta  que  fez 

da  Bafak  o  cende  de  Nassau  (ooino  deixamos  rel^ 

tado)  tomou  os  religiosoa  pot*  objecto  da  vingaat^, 

cpK  nia  pAdeiBxecutar  woaaoMadaa*  Mandoudeilar 


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156  CA8T1I0T0  LUSITAna 

bandoy  que  todo6  dentro  d*um  mezdeiKassem  a  ter- 
ra, com  pena  de  que  a  desobediencia  se  s^airia 
a  morte ,  ordenando  a  todos  que  se  passassem  i 
iiha  de  Itamaraca;  eporque  os  religiosoe  do  pt- 
triarcha  Sao  Bento  se  nao  isentassem ,  por  monges, 
do  numero  dos  frades ,  escreveo  particularmaite, 
e  por  sua  mao,  ao  seu  prelado,  dizendo«lhe,  com 
simulada  perfidia  j  que  se  retirasse  com  seus  sub- 
ditos  &  mesma  ilha  y  a  onde  com  os  mab  religiosos 
viveriao  livres  do  eslrondo  das  armas,  desassoce- 
gos  do  commercio,  e  atrevimento  dos  soldados. 
Depois  de  enirados  na  iiha  os  mandou  pr^ider  a 
todos  (  despojados  de  seus  habitos,  e  de  todo  des- 
pidoS|  para  que  a  um  mesmo  tempo  os  atormen- 
tasse  o  pejo  e  a  fiaiUa  ).  Foi  fama  que  a  determi* 
oacao  do  hereje  era  pass^l-os  a  espada  sem  deixar 
algum  com  vida.  Devia  parecer  i  sua  cruddade 
breve  o  martyrio,  e  para  que  se  dilatasse  com  o 
tempo  OS  mandou  embarcar  j  e  deitar  em  varios 
desertos  das  Indias  de  Castella,  nds,  feridos,  e 
separados ;  o  que  tiv^rao  por  milhor  sorte  :  que  6 
menos  sensivel  servir  de  pasto  is  feras,  que  de  9a- 
fra  a  OS  tyrannos. 

II.  Ao  mesmo  tempo  que  prosereviao  o  culto 
catholico^equenemainda  nos  mais  secretos  retiros 
Boffriao  o  uso  de  seus  sacramentos,  permittiao 
na  cidade  Mauricea  e  no  Arrecife  as  synago- 
gas  I  em  que  os  Judeos  com  publicidade  exercita- 
vao  seus  condemnados  ritos.  Querendo  substituir 
a  verdadeira  religiao  denossos  pais  as  falsas  doutri- 
nas  de  Luthero  e  Galvino,  inanddrao  a  seus  predi- 
cantesque  annunciassemao  povo  suasheresias;  mas 


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GASTBIOTO  LUSITAIIO.  157 

forao  firustrados  seus  esfor905,  porque  os  Terdadei-* 
ro6  caAdicosolhavao  com  desprezo  para  similhantes 
ministros ,  fugiao  de  suas  pregacoes^  e  preferiao 
as  presegui^oes  e  o  exierminio  ao  arrenegarem  dc 
sua  fe.  Atrihuiao  os  herejes  esta  constancia  dos  ca* 
tholicosao  alheio  imptdso,  tendo  para  si  que  ainda 
influia  em  seus  espiritos  o  poder  de  ministros 
superiores,  por  meio  d'alguns  sacerdotes  ou  dis- 
farcadoSy  ou  escondidos,  e  para  de  todo  Ihes  tirar  o 
respeito  com  jurisdic^ao  prohibio  a  todos  os  mora- 
dores  de  qualquer  qualidade  que  fossem,  que  nao 
podessem  recorrer,  nem  ao  bispo  da  Babia  nem  ao 
Goleitor  de  Portugal,  nem  &  curia  romana^  senao 
por  via  de  Hollanda ;  confiados  em  que  o  desvio  e 
a  dila^ao  reduziria  a  cinzas  a  viveza  d'aquellas  bra- 
zas.  Golpe  foi  este  que  penetrou  o  mais  intimo  da 
alma  aquelles  fieis;  porim  nao  pode  ferir  a  cons«- 
tancia  de  sua  fidelidade.  Com  razao  se  pode  glo- 
riar  aqueUa  parte  da  America  de  que  servia  a  igre- 
ja  com  (6  tao  viva,  que  se  apuraya  no  maior  fogo 
da  persegui^o »  pois  nem  a  licenca ,  nem  o  vicio, 
nem  o  ferro,  nem  a  conveniencia  os  pode  desviar 
de  sua  firmeza.  Referiremos  um  caso  que  bem  o 
prova.— A  trez  mancebos,  soldados  e  portuguezes^ 
condemnou  o  Hollandez  a  morle  de  forca ,  por  leve 
culpa  ;  forao-lhes  intimar  a  sentenca  a  prisao  y  e  com 
OS  ministros  entrou  um  predicante^  parecendo4he 
que  a  proBssao  de  soldados,  o  amor  da  vida ,  e  o 
medo  da  morte  os  ajudaria  a  preverter.  Nestes  va- 
SOS  Ihe  quiz  dar  a  beber  a  infernal  doutrina  de  Lu- 
thero  e  Calvino ;  ao  que  um  se  adiantou  a  os  mais, 
e  respondeo  ( direi  as  palavras,  que  mostrao  bem 


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158  GAMMQvo  imRim. 

a  iateircM ,  e  desenfadado  animo  de  todos ) :  a  Va^ 
>  86  d'ahi  miniatra  infenali  predioaote  de  haiTa«« 
H  ohos;  fm  ^eitaa  do  bebadoapodera  h^Terquen 
n  n'eata  vida  beba »  maa  iiao  quern  para  a  outim 
n  vi?a  :  Tiva  a  (6  catkolioa  romana ,  que  pro(eaaa« 
>i  moa,  e  em  que  morreremoa,  e  love  o  diabo  tanto 
H  hereje  com  seu  I^uthero  e  Calvino.  >j  Deixou  a 
fiel  constanoia  asaim  cortadot  e  corridas  a  todos 
OS  eircumitaQteSy  que  furiosos  appellarao  do  dea* 
preao  para  a  vinganca,  tirando  a  yida  aos  trea 
fieis  mancebos  oom  varios  tormentos ;  e  padecmdo- 
OS  maiores  os  herejes  na  firmeca  com  que  at^  o 
ultimo  alento  os  ouvirao  prdgar  a  lei  evangelioa 
como  a  CDSina  a  igreja  romana. 

III.  Nao  com  o  desejo  sincero  de  administrar 
justica,  mas  com  o  fim  de  melhor  esconder  sua 
rapacidade  e  cobica,  estabelecSrao  oa  Hollandotes 
alguns  tribunaes  e  conselhos  de  que  cumpre  dar 
noticia,  bem  como  dos  prooedimentos  de  sous  offi- 
ciaes.  Formirao  um  oonselho  que  cbamavao  su-- 
premo ,  ao  qual  subiao  as  causas  por  appeliaclio  e 
aggravo ;  oulro  que  se  dizia  politico ,  e  conhecia 
de  causas  crimes;  o  terceiro  tinha  por  officio  jul- 
gar  as  causas  civeis ,  composto  em  forma  de  ca* 
mara;  os  ministros  d'este,  que  cbamavao  esoabi* 
nos ,  erao  seis  Hollandezes  e  quatro  Portugueses  | 
assegurando  no  excesso  dos  votos  o  absolute  dat 
resolucoes.  Em  todos  estes  tribunaes  se  nao  admit* 
tia  peli^ao  que  nao  fosse  em  lingua  flamenga,  para 
que  o  escrivao  e  o  interprete  fossem  hollandeies,  e 
se  pagasse  nao  so  com  excesso  senao  tambem  em 
dobro.  Para  ser  apresentada  e  recebida  d'um  eou«> 


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cAflniOTO  trmtimk  ISf 

tto  hariio  OS  Ihig^ntes  de  offreeer  mela  patMt  y  e 
a  Mte  prindf^o  correepondiao  oe  meioe  e  08  fias^ 
ac^biiMlo  de  scHPte  as  custas  que  para  um  acredor 
afroeadar  viiite^  gastava  quareiila;  e  se  e  rio  dava 
aeia  de  peita,  e  absoWiao^  de  mais  ^urigando  o 
aslor  a  pagar  as  oustas^  e  a  perder  a  dlvida.  Se 
OB  quatro  juiEes  pc^uguezes  Tota^ao  ajustados  por 
ntenos  ^  fica^ao  vencidos;  e  nas  senten^s  empor^ 
tava  pouco  que  assignassem  ou  nao  os  juizes  por^ 
tuguezes.  F6ra  d'estes  tribunaes  y  eujos  officiaes 
erao  aem  nummx),  crearao  dous  ministros,  um  a 
que  ehamavao  escoleto^  e  oufro  fiscal ,  que  erao 
oomo  executores  das  prematieas  e  baados ,  que 
saiao  dos  conselhos ,  com  jurisdic^ao  pleuaria  para 
condemnarem  a  seu  arbilrio ,  sem  appellacao  nem 
aggravo;  com  pacto  de  que  a  melade  das  condem- 
na^oesseria  para  osconselheiros,  e  outrametade 
para  os  ditos  ministros ;  e  assim  erao  as  condem-> 
nacoes  sem  causa  >  sem  termo,  e  sem  distinccao. 
—  Vejamos  agora  a  justi^a  de  seus  ministros.  Se 
algum  queria  ferir  ou  furtar ,  concertava-se  pri- 
meirocom  um  official  de  justica,  e  pago  d'entemao 
o  delito,   o  commetia  com  seguro;  e  se  o  dcli- 
quenle  concertava  que  havia  de  furtar  dez  ,  e  ftir- 
tava  vinte,  o  executavao  por  outro  tanto  dinheirO| 
quanto  no  roubo  excedeo  ao  concerto.  Da  mesma 
maneira,  se  o  que  havia  concertado  dar  uma  cuii- 
lada  dava  duas,  pagava  o  excesso;  e  uao  de  outra 
sorte^  se  por  menos  se  fahava  ao  proiaetido,  se 
pagava  a  falta ;  e  se  acaso  o  roubado ,  ou  ferido 
qnerelava ,  o  arguiao  por  violador  das  leis ,  e  como 
tal  o  condemnavao  &  prisao ,  d'onde  nao  safa  sem 


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160  CASTMOTO  LCSITANO. 

primeiro  pagar  com  excesso  a  injuria  e  a  injustu^ 
que  padecia.  Saiao  o  esooletee  o  fiscal  pelo  re* 
Goncavo,  quando  o  interesse  os  chama?a  (que  o 
zelo  nunca  os  movia)  a  deva9ar  dos  concubinarioSy 
que  condemnavao  em  subida  quantia  de  dinheiro^ 
exactamente  cobrado;  e  para  que  o  castigo  nao 
servisse  a  emenda  Ihes   vendiao  consentimento , 
pelo  pre^o  em  que  se  concertavao ,  convidaudo^os 
assim  a  perseverar  no  mao  estado.  De  uma  mesmt 
sorte  processavao  a  culpa  pela  suspeita,  e  peh 
possibilidade ;  pagava  o  mancebo  j  so  porque  podia 
peccar;  pagava  o  velhoy  porque  em  sua  mocidade 
peccou ;  e  a  nenhum  livrava  a  malicia  de  culpado, 
porque  igualmenie  pagavao  os  tristes  moradores 
o  facto  e  o  possivel.  De  nenhuma  outra  gente  se 
vio  a  juslica  mais  affroniada.  Pronunciavao^  pdo 
dictame  de  sua  malicia  j  as  mulheres  casadas ,  &xk 
que  vivia  mais  clara  a  honeslidade ,  e  com  mais  ad- 
vertencia  o  recato.  Com  fingido  respeito  buscaya 
um  d'estes  ministros  sua  casa ,  quando  d'ella  fal- 
tava  o  marido^  e  Ihe  mostrava  na  devassa  provado 
o  delicto  com  testimunhos  suppostos ;  vendia-lhes 
o  zelo  de  seu  credito ,  para  que  nao  perecesse  sua 
&ma.  As  inocentes  matronas  d^maiadas  e  afflic- 
tas  de  verem  posta  sua  opiniao  em  maos  tao  infa- 
mes  y  compravao  a  reputacao  a  peso  de  ouro^  sem 
reparar  no  custo,  com  tan  to  que  se  conservasse  o 
credito ,  e  se  nao  divulgasse  a  impostura ,  ficando 
sua  honra  exposta  a  cortezia  dos  tyrannos.  For 
estes  mesmos  fios  passava  a  maldade  a  roubar  e  a 
destruir  o  estado  sacerdotal  :   aos  clerigos  de  me- 
Ihor  reputacao  e  de  mais  annos  envestiao  com  a 


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cAsmsxyto  lustaho.  I6f 

mestna  estocada ;  erao  reformados ,  e  a  todo  o 
pt^  compravao  sua  estimacao.  —  Quero  referir 
um  caso,  enelle  se  verao  estampados  todos.  Tinha 
mandado  o  seu  conselho  supremo ,  que  cada  um 
dbs  Tizinhos  plantasse  em  sua  fazenda ,  quando 
meuos^  mil  covas  de  mandioea  ( ordinario  sustento 
d'aquellas  partes  )  ;  vierao  os  executores  do  bando 
k  porta  d'um  pobre  morador,  que  nao  tinha  mais 
familia  que  um  so  negro,  e por  elle  havia  mandado 
barrer  o  camtnho  e  o  terreiro  da  casa  ,  por  tirar 
tiido  o  que  podesse  ser  tropeco  &  malicia  d'aquelles 
ministros.  ChegSrao;  recebeo-os  o  pobre  homeii 
com  a  boca  cheia  de  riso,  e  Ihes  disse:  a  Vossas  mer- 
»  cfis  nao  tem  em  que  pegar,  porque  tenho  plantado 
»nao  so  as  mil  covas,  a  que  me  obriga  a  prema- 
>^tica»  senao  de  mais  a  mais  quinhentas.  »  Aqui 
levantarao  os  infemaes  ministros  as  vbzes  :  «  Trai- 
»dor,  traidor,  seja  logo  preso  por  violador  dos 
»  supremos  decretos,  excedendo  o  numero  da  pre- 
»matica.  »  Vio-se  o  miseravel  pasmado  com  a  es- 
tranheza  da  malignidade,  e  por  remir  sua  vexa- 
cao  e  liberdade  pagou  dez  mil  reis  :  furto  a  que 
derao  nome  de  pena. 

rV.  Este erao  estillo  d'aquelles  ministros,  este 
o  estado  d'aquella  justica  ;  nella  se  funda  a  dura- 
cao  dos  imperios ,  sem  ella  se  trabalha  a  ruina  dos 
Estados.  Nao  com  menos  pressa  corriao  os  Fla- 
mengos  a  sua  perdicao  pela  vereda  da  perfidia, 
faltando.  descaradamente  &  verdade,.sem  que  nel- 
les  se  achasse  palavra  certa  ,  nem  contracto  segu- 
ro ;  de  maneira  que  se  p<$de  dizer  que  trabalhou 
mais  em  sua  ruina  sua  perfidia  que  nosso  poder. 
L  11 


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16S  cMssxufio  vonxao. 

Citaremo9  alguns  casos  que  o  oomprovao^;  Capitar 
lario  tregoas  com  o  marquez  de  Montalvao;  o  a 
pezar  distO|  e  das  pazesqueo  SenhorReiDom  Joao 
rV  tinha  assentado  com  06  Eatadoa  de  HoUaiMU^ 
e  que  se  confirmarao  com  reciproco  consentimento 
entre  o  Arrecife  e  a  Bahia^  armarao  quatro  naoa 
no  Arrecife  com  muni9oe8  e  soldadoa^  suffioieii^ 
tes  para  o  intento ;  entrarao  no  porto  de  Sergipe 
d'El  Rek ,  comcerteza  de  que  nossa  aeguran^a  nao 
acodiria  a  defensa;  ganh^rao  por  entrepreza  a  cir 
dade  de  Sao  Ghristovao,  e  no  porto  £abricarao 
uma  grande  fortaleza.  Com  similhante  mascara  fo- 
lio conquistar  o  reino  d^Angola^  de  que  se  fizerao 
senhoreS)  aleiyosos  e  fementidos.  Com  mortal  odio 
saquearao  e  destruirao  tudo  quanto  enoontr^rao. 
Com  bandeiras  de  paze  aalvas  de  amigos  entrarao 
com  seis  n&os  de  guerra  na  costa  do  Maranhao,  e 
chegarao  a  barra;  pedirao  licenca  para  entrarem 
com  pretexto  de  se  proverem  de  mantimentos,  de 
que  se  fingiao  faltos.  £sc<mdia-«e  o  fogo  da  traicao 
dentro  das  apparencias  da  amizade;  descobrio-M 
acfura  do  engano^  quando  jA  faltaya  tempo  e  modo 
para  a  opposicao  :  sem  ella  se  fizerao  senhores  da 
cidade  e  da  fortaleza^  perdendo  os  moradores  a  (a* 
zenda  e  a  liberdade ;  e  muitos  aS  honras  e  as  vidas. 
Com  tao  infames  artes,  comoas  referidas,  sein^ 
troduzirao  na  ilha  de  Sao  Thom^,  e  na  fortaleza 
de  Sao  Jorge  da  Mina.  Outros  muitos  casos  pode* 
riamos  apontar ,  em  que  sua  traicao  e  perfidia  ex^ 
cedeo  todos  oslimites  da  credulidade;  mas  omitti- 
mo-las^  para  fallar  d'outros  em  que  se  publidurao 
infamemente  perjuros  e  perversos. 


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V.  Trts  vtees  por  editaes,  bandos,  e  fifm^dos  de 
•etis  magifltrados  tomarao  as  armas  os  moradores 
Mm  juramento  At  que  assim  convinha  &  sua  con* 
servacao ;  e  cutrtis  tre^  vezes  Ih'as  fizMo  cdmprar, 
com  pretexto  de  que  assim  era  necessario  para  sua 
defensa,  compena  de  morte  a  entrega^  com  pena 
de  morte  o  recibo.  Cada  dia  ( muitas  vezes  cada 
hora  )  se  fixavao  editaes ,  e  se  deitavao  bandos  en- 
contrados ,  que  com  seguro  real  promettiao  e  Uega- 
vab  aos  moradores  a  mesma  cousa  ^  para  que  jun- 
tamente  peccasse  o  pontual  e  o  remisso.  Fromet* 
tiao  em  nome  dos  Estados  proteccao  e  defensa  dd 
ridaB,  is  honras  e  ^s  fazetidas  dos  retirados^ 
para  qtie  deixando  o  mato ,  m  viedsem  com  suaft 
fomilias  povoar  suas  casas  e  engenbos ;  e  tanto 
que  OS  tinhao  dentro  da  rede  j  trazidos  de  sua 
singela  credulidade,  os  despojavao  de  tudo.  Nao 
siugalarizo  as  pessoas ,  os  lugares  e  occasioes,  em 
que  exercltarao  tao  execravel  perfidia,  porque 
apenas  houte  pessoa^  occasiao  e  lugar  que  a  nao 
experimentasse.  De  um  successo  faremos  espelho 
em  que  se  representem  todos.  Com  grande  nu- 
mero  de  Indios  ^elvagens  (  mortaes  itiimigos  dos 
Portuguezes  )  chegou  Jacobo  ( um  Hollandez ,  a 
quern  a  similhanca  dos  costumes  fez  superior  d'a- 
quelles  bari)aro8  )  &  povoacao  de  Cunbad  um  sab- 
bado  de  tarde.  Nao  foi  a  vinda  uem  o  intento  es- 
colha,  senao  obediencia.  Tinbao-lhe  remettido  do 
Arrecife  os  do  govemo  as  ordens  e  instruccoes  de 
tudo  o  que  havia  de  obrar,  quaudo  e  como.  Fo- 
rao  arisados  os  moradores  da  marcha  e  do  po- 
der;  a  experiencia  os  ensinou  a  sospeitar  mal  de 


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IM  CASTUOTO  LUSITANa 

tudo  :  poserao-se  em  cobro.  Entrou  na  poroacao 
o  inimigo  com  simulada  paz ;  mandou  deitar  bando, 
e  fixar  nas  portas  da  igreja  um  edital  assignado 
pelos  do  conselho  supremo ,  e  jurado  pelo  dito 
Jacobo ,  ordenando  aos  vizinhos  do  lugar  que  de- 
baixo  de  seguro  se  achassem  na  igreja  ao  outro 
dia,  que  era  domingo,  para  que  depois  da  missa 
conferissem  certo  negocio  ^  que  os  senhores  Esta- 
dos  Ihes  mandavao  communicar ,  desenganando- 
os  de  que  a  pessoa  alguma  se  faria  o  mafior  ag- 
gravo.  Obedeo&rao  os  moradores ,  chamados  a  um 
mesmo  tempo  do  preceito  da  igreja »  e  do  bando  do 
hereje ;  ou  porque  nao  duvid^rao  do  seguro,  ou 
pprque  nao  tem^o  o  perigo.  A  maior  parte  en- 
trou para  a  igreja;  outra  menos  confiada  se  deixou 
ficar  nas  casas  do  engenho.  Os  que  entrarao  no 
templo  encostarao  as  paredes  do  portico  os  bordoes 
que  levavao  (armas  que  Ihes  permilia  o  gOYerno 
hoUandez  )  •  Vestio-se  o  sacerdote ,  poz-«e  no  al- 
tar,  comecou  a  missa,  e  ao  tempo,  em  que  che- 
gou  a  levantar  a  Deos  se  fizerao  os  Indios  senhores 
da  porta  do  templo ;  o  que  advertido  dos  morado- 
res conhec^rao  o  erro  e  o  perigo  a  tempo  que  se 
val^rao  do  ultimo  remedio,  que  foi  pedirem 
ao  ceo  perdao  de  sens  peccados,  tao  faltos  de 
tempo,  que  se  encontrava  nas  garganlas  de  todos 
a  oragao  e  a  espada,  sem  que  a  dos  barbaros  dei- 
xasse  pessoa  com  vida.  Pela  mesma  sorte  passarao 
OS  que  se  recolh^o  nas  casas  do  engenho ,  senao 
que  irriiados  do  sacrilegio  e  da  perfidia ,  com  as 
maos  e  com  os  dentes  avancarao  ao  gentio,  e  bus- 
cando  a  vinganca  se  mettiao  pelas  armas,  a  onde 


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CASTBI0TO  LUSITANO.  165 

juntamente  achavao  a  morte  e  a  satisfacao ,  porque 
abracados  com  os  ininfiigos  matavao  e  morriao* 

YL  Relatarei  o  que  d'esta  occasiao  acho  escrip- 
to  por  pessoa  autorizada  e  fidedigna.  Nao  approvo 
mUagreSy  mas  refiro  estranhezas,  que  o  parecem. 
Era  osacerdoteque  celebravahomemdenoventaan- 
Bos,  varaode  vida  exemplar.  Temeo  que  a  cruel- 
dade  8e  seguisse  o  desacato ,  e  virado  para  o  gen- 
tio  Ihe  disse  na  sua  lingua,  em  que  era  peri  to, 
que  toda  a  pessoa  que  nelle  tocasse^  ou  nas  imagens 
eparamentos  do  altar,  Iheficaria  tolhida  a  parte 
com  que  o  fizesse.  Temfirao  os  Indios  Tapuyas^ 
e  se  retirarao  reverentes;  outra  especie  d'clles,  a 
que  chainao  Pytiguarfe ,  ou  mais  assanhados ,  ou 
menos  respeitosos ,  com  crueldade  e  desprezo  Ihe 
tirarao  a  vida.  Caso  marvilhoso !  todas  aquellas 
partes  de  seus  corpos ,  que  servirao  ao  sacrilegio, 
Uies  ficarao  pasmadas  e  insensiveis ,  e  todos  em 
brevissimo  tempo  morrSrao  despedacados  de  seus 
proprios  dentes ;  e  para  que  se  nao  duvidasse  da 
causa  do  castigo,  permittio  Deos ,  que  na  dureza 
das  portas  da  igreja,  como  em  branda  cera ,  ficas- 
sem  impressas  asmaos  do  sacerdote,  buscando  com 
dlas  arriino  nos  ultimos  alentos  da  vida.  Verifi- 
cou-se  0  prodigio,  com  se  ver  naquella  igreja , 
muitos  mezes  depois ,  o  sangue  dos  padecentes  tao 
vivo  e  fresco,  como  se  na  mesma  bora  fora  derrar 
mado.  £  bem  pode  suspeitar  a  piedade,  que  no  li- 
quido  d'aquelle  sangue  comecou  a  resvalar  a  vio- 
lencia  d'aquelle  imperio ,  pois  n*elle  se  conservarao 
vivos  OS  sinaes  da  ft,  e  mortos  os  da  perfidia. 

yU,  Assim  aborreciao  a  verdade  que  faziao  ne- 


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godo  publico  da  mentira^  buscaodo  uelU  o  aiig«- 
mento  do  cabedal ,  $em  fazerem  reparo  na  opiniao 
da  honra,  Viao  passar  por  »uas  portas  um  roorador 
bem  tratado  y  retiravao-se ,  e  deziao  as  auas  mu** 
Iheres  que  o  chamassem  a  titulo  de  negocio  ou  da 
cortezia»  e  que  tanto  que  o  tivessem  dentro  da  casa 
gritassem  que  as  solicitavao ,  pegando  d'elles ,  ati 
que  as  vozes  acodisse  o  marido  e  a  vizinhan^at  Aa 
testemuuhas  que  ja  estav^o  preveuidas ,  juravaoi  q 
encareciao  todas  a  culpa  para  levantarem  a  peaa; 
e  uao  se  livrava  o  innocente  ( quando  os  achava 
luais  compadecidos )  com  menos  de  cincoenta,  aea« 
aenta,  cem  dobroes;  e  se  tinha  por  bem  afortu-* 
oado  aquelle  que  a  todo  o  custo  comprava  a  U* 
yraQ9a  sem  prisao ,  e  sem  processo.  Succedeo  esto 
aleive  a  um  homem  honrado  e  de  idade,  chamado 
Thomaz  IMi  t  ao  padre  Belchior  Manoel  GarridO| 
vigario  da  reguezia  de  Santo  Antonioy  e  a  outro^ 
d'este  lote »  porque  nao  reparava  a  malicia  iwi  ob« 
jeccoeada  verddde,  com  tauto  que  pagasse  a  aubido 
pre^p  o  eugauo.  Audava  tao  valido  este  falsificado 
tratOi  que  ja  nao  havia  morador  que  se  atrevesse 
a  eutrar  em  logea,  tenda^  ou  officioa,  senao  em 
tempo  que  uella  se  acbasse  muito  concurso  de  geoi* 
te.  Outro  caso  nos  mostrara  todo  o  eucarecimeato 
d'esta  materia*  Deviao  os  Hollaodezes  aoa  Judeos^ 
que  assistiao  em  Fernambuco ,  a  maior  parte  de 
9ua  fortuua^  porque  uelles  acharao  sempre  ajuda, 
avisos  e  conselhos  coatra  os  Fortuguezes ;  £aziaa 
d'elles  a  maior  confiao9a  j  certos  do  odio  que  ti^ 
nhao  a  lei  evangelica^  respeito  que  sempre  osfe; 
coufideates  e  gratos  ao?  berejeSi  achawlo  neUes 


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CMMfrUMO  LOfttTAHO.  167 

prestimo  e  eitima^.  Ghamados  pok  e  amstidos 
do  faror,  multipUcaiio  de  maneira  em  numero  e 
em  cabedal ,  qoe  nao  hayia  negocio  de  justica^  nem 
<k  fazenda  j  que  nao  corresse  por  suas  maos  j  fi- 
Mndo  nellaa  sempre  o  melhor  do  interesse;  com 
o  que  ingroasarao  de  sorte,  que  os  nao  soffria  a 
iaveja  e  a  cobica;  e  determinou  a  perfidia  hollan- 
deza  quebpar-lhes  o  seguro  e  os  foros ,  com  que 
Ihea  permittio  a  compra  de  engenhos ,  curraes, 
terras  e  officios ;  e  confiscar-lhes  tudo  quanto  ti- 
nhao  adquirido.  Achou  logo  pretexto^  urdio  tra- 
pa^as ,  poz-se  o  negocio  em  pleito  :  erao  as  mes- 
mas  partes  OS  juizes,  haviaode  sentenciar  eomo 
Hiteressados  na  causa ;  nao  tiyeiio  os  miseraveis 
Judeoe  outro  remedio  mais  que  remirem  as  fa- 
feendas  a  dinhdbro«  Successe  com  que  justificamos 
o  preeente  argumento ,  de  que  nao  tinhao  os  Fhn 
mengpos  naquelle  dominio  lealdade,  yerdadcy  (i, 
nem  palavra  com  amigos  e  inimigos,  eom  proprios 
e  estranhoB^  com  ^andes  e  pequenhos ;  em  todo 
e  tempo,  em  toda  a  parte,  e  em  toda  a  materia. 

Vni.  Jk  fallamos  em  o  preeedente  livro  d'algu*^ 
mas  erueldades  praticadas  pelos  HoUandezes;  dir 
lemos  ainda  outras  para  opprobrio  de  sua  barbari- 
dade.  Os  meios  de  que  se  aproveitava  o  interesse 
e  o  gosto  d'aquella  gente  erao  a  destrui^ao,  a  morte 
ea  injuria;  e  para  que  a  crueldade  servisse  mais 
ae  deleite ,  inyentarao  novos  modos  de  affix>ntas,  e 
exquisitos  generos  de  tormentos.  Condemnavao  a 
aeoutes;  exeeutava-se  a  pena  por  taes  bra^os^  e 
com  taes  instrumaitos ,  que  nao  se  dava  golpe^ 
qne  nao  diirisse  lerida.  Sentenciavao  i  morte; 


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166  CASTEIOTO  LDSITAMa 

cumpria-se  a  sentenga  com  taes  esoameos  e  mar- 
tyrios ,  que,  se  fazia  duvidar  qnal  primeiro  acar 
Jbava  a  vida  do  padeceote ,  se  o  ferro ,  se  o  pejo.  — 
Fazia  credito  a  deshumanidade  de  sair  com  estra- 
nhas  inventivas  de  matar.  Estendiao  os  corpos  dos 
pacientes  sobre  umas  rodas  com  tal  artificio ,  que 
c^m  o  movimento  Ihes  moiao  os  ossos;  e  sea  vida 
sobejava  ao  tormento  Ihedavao  fim  com  uma  ma^a 
de  ferro  >  que  Ihes  abatia  os  peitos.  Aos  homens 
que  tinbao  em  opiniao  de  ricos ,  e  nao  appareciao 
com  o  dinheiroy  cbamavao  os  ministros  a  suas  ca- 
sas  e  em  cavaletes  de  pio  os  atormentayao  atd  que 
feueciao  ou  o  eutregavao.  A  outros  peaduravao  ^  e 
uogiao  com  azeite  para  que  a  fogo  lento  acabassem 
as  tristes  vidas.  A  muitos  imprensavao  eatre  duas 
taboas  repassadas  de  agudos  pr^os,  que  juntar 
mente  os  traspassavao  e  moIao,  e  por  recreio  pa&- 
seayao  sobre  elles.  A  nao  poucos  amarravao  pela 
cintura,  e  r^virados  os  leyantavao  em  alto  com  os 
p^  atados^  atravessando  entre  um  e  outro  um  grosso 
madeiro;  e  por  entretenimentocavalgavaoemuma 
eoutraponta,  e  se  balanceavao;  festejando  com 
gritos  e  risadas  as  sentidis  vozes,  que  causa- 
vao  aos  pacientes  as  terriveis  dores.  Nos  assaltos, 
nas  entrepresas,  e  nos  saccos  era  maior  a .  deshu- 
manidade»  porque  ^a  de  muitos  a  fereza.  As  mo« 
Iheres  de  qualquer  estado  e  qualidade  cortavao  as 
maos ,  rompiao  as  orelbas ,  e  feriao  as  gai^antas, 
porque  a  detenca  do  tempo  os  nao  atrazasse  no  rou* 
bo  dos  anneis ,  dos  pendentes ,  e  das  gargantilhas 
(servindo  aomartyrio  os  instrumentos  do  adorno); 
como  se  em  sua  forma^ao  ^rrasse  a  natureza,  ou 


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GASTiaOIO  LUSITAIKK  169 

em  sua  ctpacidade  faltasse  a  noticia  do  sexo.  Ordi- 
nariamente  sucedia  levarem  em  sua  companhia  os 
Indios  selvagens  Tapuyas  e  Pytiguar^  y  conheci^- 
dospelo  nome  de  Gabocolos,  de  cujas  garrasnao 
podia  fogir  nem  o  retiro  ^  nem  o  recato ,  porque 
pelo  faro  oe  descobriao  e  matavao;  tao  temidos  ^rao 
estee  selvagens  dos  moradores  que  os  nao  espan*- 
tava  menos  uma  companhia  de  Cabocolos  que  uma 
manada  de  tigres ;  e  com  muita  causa ,  porque  f»- 
ziibo  desenfado  de  executar  as  mais  horriyeis  barlja- 
ridades.  Esga^vao  as  crian^s  vivas ,  e  com  as 
maos  as  faziao  em  dnas  partes.  A  outras  estretavao 
Has  pedras^  e  nos  troncos ,  ou  de  tiro  ou  de  golpe, 
competindo-se  na  execu9ao  a  destreza  e  a  forca. 
Os  oorpos  adnltos  abriao ,  ou  pelos  peitos ,  ou  pe- 
hs  costas,  e  Ihes  tiravao  o  coracao  e  os  ^gados, 
que  a  vista  de  todos  comiao;  e  com  o  humano  san- 
gue  satisfaziao  a  sMe  :  ferocidade  que  via  o  hor- 
ror com  olhos  do  pasmo. 

IX.  Forao  tantos  e  tao  parecidos  os  casos  que 
para  os  especiGcar  falta  a  escolha ,  e  confunde  a 
simklhan^a ;  mas  sera  for^a  que  algum  sirva  d  ori- 
ginal a  tanta  copia.  Na  occasiao  em  que  D.  Anto^ 
nio  Philippe  Gamarao  se  retirou  de  Goyana  com  os 
moradores  que  o  quizerao  seguir  (  que  foi  no  anno 
de  1636)  deo  sobre  os  que  ficarao  um  diabolico 
verdugochamadoHypoemy  governadordaParaiba, 
com  uma  numerosa  partida  de  Cabocolos ,  em  os 
quaes  executou  tao  inauditas  crueldades,  que  pa- 
rece  os  desconhecia  a  mesma  atrocidade.  Succedeo 
que  d'uma  casa  em  que  o  mortal  estrago  deixava 
despeda^adaa  vutte  e  tres  pessoas^  p6de  fugir  uma 


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130  QHmiffiO  tlWCiMCu 

Biulher  casada^  pan  se  eaocuider  no  mato^  com 
duascrianfas,  unut  dftpeito,  e  outra  da  petiea 
maia  idade ;  andados  alguna  passos  se  deteve  (  dea- 
maiada  da  propria  fragilidade  e  do  filial  eator«- 
yo)  junto  4  eatrada,  servindo-lhe  o  ayuliado  troii- 
00  d'uma  arvore  da  a  ancohrir  aoa  caminhantea. 
Pouco  Ihe  durou  o  descanso.  Em  breve  tempo  oor 
vio  um  tropel  de  Gabooolos ,  que  vinhao  no  alcanee 
dos  fugidos,  e  foi  tal  o  temor ,  que  Ihe  occupoa  o 
coia9ao ,  com  a  lembran^a  daa  crueldades  que  ybnay 
que  receo^a  de  que  oa  filhiuhos  ae  descohrisaem 
pdb  cboro,  e  os  alarvea  Ihoa  comeaaem^  os  a£3^ 
gou  com  auas  proprias  maos,  pelos  nao  ver  paaaur 
a  alheias  entraahas ,  eacolhemlo  a  triate  mai  para 
si  e  para  aeua  filhos  por  melhor  sorte  uma  morte 
certai  qu^  uma  crualdade  imaginada;  e  «mtM>ay» 
cida  contra  si  meama  rompeo  pelo  mato  quatone 
legoaa;  chagou  i  Paraiba,  e  viveo  alguna  annofi 
depois  absorta  no  espanto  e  na  pena ,  com  qua  a 
martyrisava  a  memoria  do  golpe  a  do  medo. 

X.  Aquelle  natural  pudor  oom  qua  a  provida 
naturaza  refrea  noa  mortaes  aa  obscenas  torpesafi 
dos  brutoa ,  rompeo  a  bestial  Ucan^  d'aqudles 
abortivoa  monstros.  Andava  a  rasao  tao  prostra^ 
da  a  yiata  do  apetite,  que  igualmeate  daapreuya  a 
pejo  e  0  escandalo.  Valia-ae  a  lascivia  da  for^a  e  do 
dominio ,  e  ae  executava  o  delito  apezar  da  rqmg- 
nancia ,  em  que  achava  sou  bestial  gosto  no?o  in^ 
aentivo  para  cometter  o  estupro,  o  adulterio^  a 
inceatOy  etodas as mais  especieade bestial luxuria, 
aeryindo  a  yiolencia  de  unir  em  um  masmo  acto  a 
ftcffpeaa^a  vingan<ga>  Forao  tantaa  etap  AMaaas 


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iteniaftiaii ,  co»  giie  ae  oomnifttU  tste  viojo ,  qm^ 
disioiula  a  peuna,  porque  seqao  refrenque  o  esoan- 
dalo.  Os  magistradoft)  qu^  pela  razao  de  eeu  cargo  hap 
viao  d^  atalhar  o  de$aforO|  com  &eu  exemplo  anima- 
vao  o  atrevimento.  Viao,  ou  tinhao  notic^ia  dalguma 
mulher  bem  parecida  9  com  o  desengano  de  hon-i- 
rada ,  logo  com  fi»gido  pretexto  maodavao  pren-f 
der  aa  pessoas  que  a  podiao  guardar,  e  com  des^ 
carada  lasciTia  Ihe  entravao  em  casai  sem  que 
baata^^m  para  a  defender  as  lagrima^  e  guspiros, 
de  que  sua  castidade  se  armava;  antes  como  era 
de  brutos  a  for9a,  crescia  a  violeucia  com  a  de«> 
feosa ,  ceyaudo^se  o  apetite  uos  mesmos  desyiof 
da  luxuria,  Ouye  muitas  que  com  «uas  propria! 
maos  se  matarao^  e  outras  que  is  dos  dggressorea 
morr^rao,  assim  por  nao  mfamar  a  yida,  como 
tambeip  por  nao  offender  0  sangue« 

XI*  Pjao  era  mcnos  a  insaciayel  cobi^a  d'estes 
monstros,  £m  todo  o  tempo  que  durou  naquella 
parte  d'America  o  imper^o  e  p  govemo  hoUande;( 
nao  houye  pessoa  que  possui^se  bens  de  fortuna, 
seoao  a  merce  da  tyrannia.  0  mesmo  ^ra  ter, 
que  ter  o  inimigo  que  roubar ;  a  joia,  a  gala,  0 
mime  em  tanto  era  de  seu  damno^  em  quanto  que-- 
ria  o  Flamengo*  Nao  se  contentou  com  furtar^  sem 
que  o  roubo  se  executasse  por  lei ,  e  fosse  juntas 
mente  furto  do  alheio^  e  prohibi9ao  do  proprio, 
Adyirta-se  como  neste  paiticular  andou  a  malicia 
delgada.  Saio  decretado  de  sens  conselhos  sob  gra* 
yes  penas  que  nenhum  morador  podesse  yender, 
nem  matar  ( nem  ainda  para  comer  em  sua  casa ) 
alg^^|  genero  de  res  9  s^  \xomf^  particular,  e  s^ 


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172  GASTBIOIO  LUSETAlfO. 

a  occasiao  o  obrigava  a  pedil-a|  havia  de  pagar 
por  cada  cabeca  de  cameiro  ou  de  porco  um  cur- 
zado ,  e  de  gado  vaccum  dez  lostoes ;  e  que  se  se- 
guia  a  esta  prematica  ?  Comprarem  os  HoIIandezes 
OS  gados  e  rezes  em  p^  por  muito  baixo  preco  ,  e 
depoi8  venderemHias  aos  arrateis  aos  mesmos  ven* 
dedores  pelo  preco  mais  alto  que  queriao.  Oulras 
muitas  extorcdes  e  vexames  pratidirao,  executadas 
com  o  bra^o  do  govemo,  que  deixo  em  silencio, 
para  s6  fallar  d'uma  mais  escandalosa.  Os  negros 
que  (ugiao  a  seus  senhoreS|  se  Ihes  nao  restituiao, 
se  de  novo  os  nao  compravao;  como  para  este  fim 
OS  recolbiao  com  boa  cara ,  poucos  erao  os  que  nao 
fugiaOy  dando  com  este  latrocinio  occasiao  a  que 
os  tristes  moradores  fossem  escravos  de  seus  es- 
cravos.  Foi  tao  apertada  a  oppressao  dos  amos 
neste  particular,  que  nao  tinhao  mais  vida  nem 
mais  fazenda  que  aquella  que  o  seucaptivo  queria; 
porque ,  se  com  alguma  palavra  o  escandalizavaoi 
acusavao-nos  deque  tinhao  armasescondidas;  e 
sem  mais  prova  nem  exame  erao  condemnados 
por  traidores.  —  Chegou  a  tamanho  excesso  o  uso 
d'este  modo  de  roubar ,  que  ja  nao  havia  escravos 
que  o  nao  abominassem.  Por^m  esta  falta  suprio 
aquella  maliciosa  cobiga  :  compravao  os  meios  do 
vicio,  e  OS  dispunhao  para  o  furto,  ou  com  pro- 
messas,  ou  com  ameacas.  A  um  crioulo  escravo  de 
um  morador  authorizado  convidarao  com  a  liber- 
dade ,  e  com  o  interesse  se  quizesse  accusar  a  seu 
senhor  de  que  tinha  armas  escondidas  :  para  este 
jfim  mettftrao  em  um  lugarocculto  dous  mosquetes 
e  duaa  epadas^  &  vista  do  negro  |  porque  infor^ 


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GASTRKyiO  LUSITAIia  173 

made  do  lugar  e  das  armas  se  animasse  a  delatar  o 
crime ,  seguro  na  eerteza  com  que  podia  fazer  a 
accusacao.  Corrido  o  escravo  de  que  o  fizessem 
complice  de  tao  iuorme  falsidade ,  e  autor  de  trai- 
cao  tao  vil ,  descobrio  a  seu  senhor  toda  a  impos*- 
tura.  Acudio  atribulado  ao  remedio  do  eminente 
perigo ;  buscou  um  religioso  aceito  ao  conde  de 
Nassau,  que  o  informoudo  caso.  Nao  se  espantou 
o  conde  do  infame  iiitento  senao  da  fidelidade  do 
escravo  ;  roandou  fazer  exame,  saio  provado  o 
trato  y  e  nao  sei  como,  esta  vez  forao  condemnados 
06  aggressores  a  morte  !  Devia  obrar  n'este  caso 
mais  o  respeito  do  conde  queo  pejo  dos  ministros, 
complices  em  outros  casos  similhantes,  por  elles 
approTados,  e  quando  menos  consenlidos. 

XJI.  Digamos  tudo  por  maior,  que  por  extenso 
sera  impossivel.  Trabalhavao  quanto  podiao  os 
Hollandezes  naquelle  Estado,  por  se  inculcarem 
senhores  intrusos  e  legitimos  tyrannos ,  dando-se 
a  conhecer  pelo  veneno  mais  que  pelo  dominio,  co- 
mo  dos  Psyllos  (  povos  que  habitavao  no  interior 
da  Libya) 9  escreve  Plutarco  :  conheciao  aosfilhos, 
nao  pelo  parto,  senao  pelo  pestifero  da  compleixao, 
de  cujo  Teneno  fugiao  as  mesmas  serpentes.  Taes 
e  lantosy  como  tenlxo  dito,  forao  os  sacrilegios,  as 
injusti^s^  as  perfidias,  os  roubos ,  as  crueldades, 
as  injurias,  e  as.insolencias  com  que  qs  HoUande-* 
zes  opprimirao  os  miseraveis  vassallos ,  que  nas 
partes  do  Brazil  dominarao ,  sem  respeito  algum 
ao  temor  de  Deos  y  nem  ao  pejo  dos  homens ,  fe- 
cbados  OS  olhos  e  os  ouvidos  a  doutrina  e  ao  escan- 
dalo  y  com  que  alguns  dos  seus  gritavao  nos  audi- 


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torioft  puUicos^  que  nem  Deod  poderia  diMimti- 
lar  y  nem  oi  homens  Bofftet  tao  abominareis 
proceditnentos.  De  um  pulpito  ( em  occasiao  que 
todoB  ouviao )  os  desenganou  tim  predicante  sen 
com  livre  reprehensao ,  que  nao  havia  de  faltar 
0  castigo  merecido  a  procedimentos  tao  estragados, 
e  que  estivessem  certos  que  aos  moradores  op^ 
primidos  havia  de  tomar  a  justii^a  ditina  por  ins- 
trumento  do  caatigo  que  mereciao  aeus  peccados, 
aftsim  como  para  castigar  aos  moradores  mettAra 
0  acdute  nas  maos  d'elles  Hollandezes.  Recebeo^s^ 
tao  mal  a  doutrina  ^  pelo  que  tere  de  ameaco  e  de 
prognostico,  que  nunca  mais  appareceo  o  predi^ 
cante.Omesmo  succedeo  aumrabino,  quepr^ando 
na  sinagoga  do  Arrecife ,  estranhou  os  escandalo*' 
SOS  excesBoa  d'aquelle  gotemo ,  ^e  que  inferio  sua 
breve  duracfto;  espantando^M  de  como  dominio 
tao  violento  durava  tanto  :  cOnsumio-6  a  ditigen- 
cia  ;  porque  nunca  mais  foi  visto.  Imaginava  a  ce- 
gueira  hollandeza  que  com  atalhar  o  pr^o  es^ 
condia  o delito,  e  desviava  o  acoute.  Parecia-lhe k 
devassidao ,  que  tapando  a  boca  aos  homens ,  a  nao 
deixava  aberta  is  sepulturas ,  As  cinzas ,  &s  pedras, 
e  aos  troncos ,  que  com  muda  rhetorica  a  publi- 
cavao,  e  Ihes  pediao  o  castigo  que  nao  tardou, 
como  diremos  em  as  seguintes  relacoes. 

XIII-  Por*m  antes  que  entremos  em  o  VI  livro 
d'esta  historia ,  se  me  ha  de  permittir  uma  digrea* 
sao,  a  que  se  nao  sabe  negar  men  dlscurso.  Ponde* 
radas  as  insolencias  dos  Flamengos  e  a  paciencia 
dos  Portuguezes,  nao  sei  definir  qualdeva  menos 
ao  espanto ,  se  a  constancia  do  soflrimento ,  se  a 


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QMnWnO  LWDTMOi  ITS 

profia  do  aggravo  ?  Esta  accusata  ao  Holllmdefe  de 
iiracional,  aquella  ao  Portuguez  de  inaenaiYel;  e 
neiu  a  fiiria  do  bruto  quebrava  na  dureza  da  pe- 
drat  9P^  laslima;  nem  a  dureza  da  pedra  obedecia 
a  oontinua9ao  dos  golpes  que  a  quebrao ;  e  ge  me 
represeata  mysterio  escondido  em  um  e  outro  w- 
tremo,  parecendo-me  que  o  soffrimento  se  anima- 
va  da  esperan9ay  que  Ihe  promettia  a  pouca  duracao 
da  violencia  ;  e  a  obstina^ao  do  esquecimento,  que 
Ihe  tirava  da  lembraufa  o  merecimento  do  castigo: 
demonatracoes ,  com  que  o  ceo  enainava  a  uma  e 
ouira  geute  que  a  constancia  de  uma  outra  fortuna 
6  puramente  negocia9ao  dos  mortaes ;  e  ser  oondi^ao 
do6  Estados  do  muudo  descer  o  que  uao  pode  maid 
subir;  eeubiro  que  nao  pode  maisdesceri  a  beneficio 
da  instabilidade  das  cousas  d'elle.  —  Com  luz  maia 
dara  que  a  darazao  o  viao  os  olhos  da  (i^  que  nunca 
pkie  escurecer  adiligencia  da  herezia.  Seja  motivo 
do  maior  assombro  durar  entre  os  opprimidosPer-* 
nambucauos  a  peste^  sem  que  ateasse  o  contagio. 
Nao  houve  Portuguez  que  pelo  discurso  de  vinte  e 
quatro  annos  preyaricassena  (6,  assim  divina  como 
bumana ;  e  se  algum  houve ,  primeiro  foi  descarte 
da  uacao  que  membro  da  infidelidade.  A  neuhum 
Portuguez  virao  os  Hollandezes  contaminado,  senao 
depois  de  expellido.  Quandoparecia  que  a  persegui* 
cao  OS  tinha  reduzido  a  cinza ,  entao  estavao  em 
seus  peitos  mais  vivas  as  brasas  da  fe  para  com  Deos, 
e  para  com  seu  Rei.  Olhava-os  eutao  com  espanto 
a  America,  comoEuropa  os  viocom  assombro  o  an- 
uo  de  1 640  na  acclama^ao  de  seu  ligitimo  priu- 
cipe  o  Senhor  Rei  Dom  Joao   VI. 


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170  CASniOIO  LUUTAlfa 

XIV.  A  onde  o  humaiio  discurso  abate  maU  as 
azas  i  na  consideracao  da  impenetravel  Providen- 
cia  do  AltisBimo,  pois  d'aquelles  meios,  de  que  os 
homens  se  aproveitavao  para  sacudir  o  jugo ,  seva- 
lia  a  Providencia  para  apertar  o  grilho.  Que  soc- 
corros  despedio  o  reinoem  favor  dos  afflictos  Bra- 
zilienses  ?  0  que  levou  Dom  Antonio  de  Oquendo; 
o  que  conduzio  Francisco  de  Vasconcellos  ;  o  que 
se  deo  a  Dom  Luiz  de  Roxas ;  o  que  entregou  Dom 
Rodrigo  Lobo ;  e  ultimamente  y  o  que  a  todos  ex- 
cedeoy  governado  pelo  conde  da  Torre  (naquella 
armada  tao  memoravel  pelo  poder  como  pela  des- 
graca) ;  que  efFeito  surtirao  ?  0  de  despertar  no 
Hollandez  a  colera ,  e  influir  nas  tribula^oes  dos 
moradores;  sem  que  jamais  deixassem  de  receb^ 
maior  danmo  das  annas  auxiliares ,  que  das  ini- 
migas.  Parece  verdadeiramente ,  que  com  desvios 
Ihes  despunha  o  ceo  a  coroa  dos  trabalhos ,  guar- 
dando  a  empresade  sua  liberdade  para  sen  valor, 
porque  fosse  sua  toda  a  gloria,  e  so  seu  o  [uremio  de 
accao  tao  esclarecida. 


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LIVRO  VI. 


SUMMARK). 


.  Coma  le  Ibrmoa  loao  Fernandes  Yieira  na  escola  da  adrenidada 
e  da  thrivde  durante  o  dominio  bollandez  M  i  acclamacao  d*fil 
Rci  D.  Xoao  lY.  —  2.  Breve  noticia  d'este  glorioso  icontecimente* 

—  3.  Chega  0  aYito  i  Bahia;  dispde-se  a  acclamacao,  que  €  feste- 
jada  eom  grande  alyoroco ;  cuja  nova  manda  o  marqaez  ao  conde 
tfe  Ifassaa.  —  4.  A  camara  da  Bahia  prira  o  marquei  do  goterno, 
e  remeite-o  prcao  para  o  refno.  —  tH,  Alyoroco  com  que  a  nova 
foi  recebida  no  Arrecife;  e  festcjo  com  que  o  celebreu  o  conde  de 
Nassau;  o  qaal  maoda  embafxada  A  Bahia ,  e com  queinterito.  — 
0.  Geldnrao-«e  as  tregoas  entre  am  e  outro  govemo.  —  7.  A'  fom- 
bra  da  paz  nos  fai  o  inimigo  a  maior  gue^ra;  com  traicao  nos 
ganhoQ  a  cidade  de  Sao  Christovao.  —  8.  Chega  d  Bahia  Antonio 
Tdies  da  Silva ,  para  govemador  do  Estado ;  queiias  do  povo  con- 
tra 0  Hollandez ,  comprovadas  com  o  que  succedeo  a  uraa  hAo 
portugueza.  —  9.  Intima  o  govemador  ao  Hollandez  o  aggravo ; 
que  se  desculpa  da  traicaO  com  frivolas  escusas ;  o  que  faz  o  go- 
Tenudor.— IQ.  Chega  d  Bahia  um  enviado  do  conde  de  Nassau;  a 
a  Pernambuco  ordem  para  tirar  do  governo  ao  conde  de  Nassaa. 
11.  Tona  porto  no  Arrecife  uma  ndo  hollandeza  de  volta  d' An- 
gola ,  que  di  noticia  da  akivosia  com  que  o  Hollandez  se  fez 
aenbor  d'aquella  parte,  e  das  hostilidades  que  alii  commetta ; 
motivos  para  Joao  Fernandes  Yieira  apressar  sua  determinacao. 

—  13.  Apresta-se  o  conde  Nassau  para  passar  a  HoUanda.  — • 

13.  Primeira  retolucao  de  Joao  Fernandes  Yieira ;  que  eUe  com- 
munica  aos  sens  maiores  amigos,  e  ao  govemador  do  Estado. — 

14.  Pede  soccorro  a  Henrique  Dias  e  ao  Camarao ;  recebe  do  go- 
vemador resposta  e  sessenta  soldadoi;  ed'aquelles  dous  capitaes 
iavbem  reoeba  raspoata.  —  IK.  Chega  a  Pernambuco  Antonio  Dim 
Cardoso,  e  por  ordam  do  Joao  Parnaiides  Yiefra  se  aloja  «  oecnlta* 

—  id.  Assentao  entre  si  revellar  o  segredo  a  alguns  confidantes; 
loao  Fernandes  faz  a  todos  uma  proposta.  —  17.  Entrevista  que 
tern  eom  AnUMiki  Cardozo;  o  ^pial  desfit  a»  difficnldades  qua  oi 
embargavao.  —  18.  Descobre  Joao  Fernandes  Yieira  o  Calso  trato 
d'alguns;  de  tddo  dd  conta  a  Antonio  Gardolo;  resposta  d*este 

aoa  iraidores.--19.  Confere  eom  Joao  Fernandas  Yieira  o  qua  se 
L  12 


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178  GA8TEI0T0  LUSITANO. 

dere  fazer;  ctrta  ardilatt  ^^a  eoDfimdir  of  iraidom ;  qve  Jooo 
Fernandes  Yieira  Ihei  deo  a  ler,  e  com  que  frustrou  seu  intento. 
—  90.  Cbega  a  resposta  dp  governador  do  Estado.  —  21.  Manda 
0  Hpllandet  embaixadorei  A  Bahia;  resposta  do  goTeraador.  -^ 
23.  Tbeodoiio  Eitratet  se  offrece  ao  goYernador,  que  Ihe  agradece 
o  offerecimeDto  com  cautella.  —  23.  Despacha  o  goTeroadorosen- 
Tiadof  de  Joao  Feroandes  Viakv,  que  chegao  a  Pernambuco  com 
alguDS  foldadof  aventureiros.  —  24.  Joao  Feroandei  Vielra  le  re- 
solve a  sair  a  campo ;  nomea  capitaes. — 25.  Ardil  com  que  inten- 
ta  acabar  a  domioio  hoUaodez,  ^26.  ProTOoa  os  moradorea  a  qua 
l^uem  OM  annaii  pr^tica  que  fez  a  todoi»  a  que  foi  appmrada 
com  applause.  -^  27. .  De  tudo  teve  o  inimigo  inlelra  noUcIa; 
procura  prender  a  Joao  Fernandes  Yieira,  o  que  naaooasegue*  — 
2&  As  novas  da  vioda  do  Camarao  e  Henrique  Bias  alegrao  os 
noasos.— 29.  Hous  traidores  reveUao  aos  HoUandeses  a  ooospi- 
ra^ao ;  com  forca  descobarta  maoda  o  HoUaodez  aualur  .as  casas 
da  Joao  Fernaodes  Yieira;  o  que  resutia do  assallo. -*.30»  Joao 
Fernandes  Yieira  6  avisado,  muda  de  sitio,  a  alaja-u  em  Caaa- 
ragibe.  ^  Si.  Cresce  o  temor  do  inimigo  >  manda  embaiiadores  i 
))abia,  faz  ariso  aos  seus  darebelliaoi  e  commette  pariidos  a 
Joao  Fernandes  Yi9ira,—3f.  PremaUca  que  manda  publkar  no 
Arrecife ;  effeitos  que  causou.  —  33*  Estilo  traidor  de  daus  Porta- 
guezes.  ^34.  Jo2io  Fernandes  Yieira  faz  um  edital  que.manda  fi- 
xar  nos  lugares  publicos  do  Arrecife;  o  HolJandez  promette  4,000 
florins  a  quern'  o  mate ,  e  Joao  Fernandes  Yieira  dobrado  preco  a 
quem  o  vingue.~35.  0  que  si^ccede  neste  tempo  em  Ipojucat  ^ 
quern  foi  Domingos  Fagundesi  eoque  obrou.  — 36.  Retira-seJoao 
Famandes  Yieira  para  4  mata  de  Yaico  Pires,  e  de  U  para  Hai- 
cassej  capitaes  e  gente  que  0  seguemi  e  putra  que  se  Ibe  reuoe.  — 
37.  Maoda  0  Hollandez  embaixada.  ^  Bahia ,  reiposta  do  gOTecna- 
dor.  —  38.  Tbeodozio  Estrates  ratifica  a  palavra  de  servlr  a  £1 
Beit  -»  89^  Cbegao  ao  Arrecife  os  embaizadorei. 


I.  Ainda  que  Joao  Fernandes  Yieira  nascSra.  em 
^  ilha  da  Madeira  >  comQ  deuaaK>6  dito  em  o  lAw.  I^ 
eUe  estinava  a  tem  de  Pemambneo  eomo  sua  pa- 
triai  e  tomava  lanlo  interesse  em  sua  liberdade  w- 
BftO  OS  que  netla  haYiao  Mscido.  Na  ctoola  da  adr 
▼ersidade^  e  no  meio  das  calamidades  que  aflfligiao 
tua  f»uia  adopUvai  %q  formou  aquetie  gmode 


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QAsnioxo  umxAKa  470 

contfiOf  que  clepoisha?ia  de  qoebrar  m  ferros  que 
a  agrilboavao*  Haviarie  die  distinguido  na  prima- 
vera  deaetis  annot  ^  como  temos  dito ,  praikandb 
futfw  d^annas  dignot  d'um  experimentado  eapiiao, 
e  difipuidia^ee  a  proseguir  a  encetada  carreira; 
ms  eonbecendo  que  a  resktencta  66  aema  paipa 
dar  aleittos  ao  inimigo  para  a  conquisia ,  largou  aa 
armaai  edbedecee  afortaDa,  julgando  diBcrete 
que  mttt  aprxyveitaria  aoe  naturaea  com  a  negMia* 
QMcpieeoai  obra^e,  Vako-aedaindattria,  ecom 
pmdente  sagackkde  ee  iatrodmio  com  08  Holkm'^ 
de^es  de  aorte  que  aeadiaatou  a  tod<»6  na  estima*- 
if$Oy  0a  eottfianga  e  na  oppulencia,  haTciido«>se 
com  aattteia  taevettgeobosa^  que  era  aenhor  (lai 
mm  recatadaa  Boticiaa  ^  a  no  segura  d'ellaa  <)brafa 
oauto  e  ditoso.  Su^  ganeroaidade  oreacia  i  prapoi^ 
^  qiae  ee  aogmeiitarao  aa  iBtamaa  dea  meradoreav 
A'  emsUk  de  gnaadea  diapeftdios  iMHseorreo  ftoipre 
oan^ceaaitadmi  eBuaitaa  Ttaea  Ubea  tomptmx  o  per^ 
dao  e  0  favor ;  eamm  oomeatei  raligioeda  auniioa 
feigwrtaya  a  £&d«  mukoa  ^  ttrando-'lfaea  com  o  soc^ 
cptro  a  deadolpft  da  ueoBaaidada  e  da  p«^  Com 
viyaB  rawea  e  ooBtbliiM  dadivas  ^aUre   a  hare» 
tka.  furiai  qua  Emilia  "vaaea  tomon  fat  expedieiila 
aaudw^i  >Da  eooaarrai^  deaterrar  da  aeu  do4- 
vmm  Wdaa  ae  pei^Qas  eodraaMkaa  i  ncgocia^ 
que  aarFia4aairimaa  fraqoe:^  da  nHtttoa,  qua 
vaeiUrvM  Mieonatancia  da  fidrilidadfu  Repavoapor 
eate  mei^  quebraaiiahoiira ,  oodeayimdo  a  iom^ 
on  deaoieiiluido  a  mjtim^  e  oudlaa  yenes  «Beoiw> 
Umdo  a  enrfragai  faaattdo  o  Mmedio  tttiio  nuda 
vigfunosoi  qiMttto  eia  oiaia  fiaesl  oafU^Caaava  to» 


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189  CA8TUOT0  LDUTiKa 

dos  OS  annos  muiias  orfis ;  em  todas  regniava  o 
dote  pelo  desamparo,  e  a  precedencia  pelo  perigo: 
qualquer  infoKunio  \he  doia  oomo  proprio.  Em 
todo  o  tempo X)  aehava  oom  igual  compaixao  o  grato 
e  o  queixo90/o  isento  e  o  agradecid^.  Sendo  eor* 
tre  todosos  moradores  o  que  mais  possuia ,  e  o  qtw 
m^lhor  se  tratava ,  nem  achou  olhos  na  inveja, 
nem  desconfianca  na  pobreza.  Assim  c(»itrapexa?a 
a  gravidade  com  a  benevolencia ,  qae  a  eslimacao 
inimiga  o  senria  com  respeito ,  e  a  dos  naturaes  oom 
agrado ;  e  sendo  tudo  mats  venda  qne  dadiva ,  en 
tan  to  maU  o  que  adquiria  que  o  que  gastara,  que 
elaramente  se  deixava  ver  <fair  o  do  cento  por  um 
a  quem  despende  em  8em90  de  Deos  e  do  proxi- 
mo.  No  xek)  do  calto  divino  foi  tao  exacto  que  se 
excedia  a  si  mesmo.  Reformava,  4  cusia  de  ana  fa- 
zttida^y  todas  as  igrejas  «  hermidas  que  o  hereje 
roohaya  edcatnaa;  a«  todas  melborava  noa  para- 
mentoseaparatossagrados,  desejando  que  em  to- 
das as  partes  fossa  Deos  servido  com  decencia ;  adian- 
tou  o  fervor  das  confrarias ,  servindo  em  todas  com 
a  faienda  e  com  a  pessoa.  Por  aua  diligencia  e  zelo 
se  cottvert^rao  a  y«dadeira  (i  cmco  jud^os ;  deca- 
da  um  foi  padrmho ,  e  de  todos  j^eanedio.  O  mes- 
mo  J  e  com  o  mesmo  zelo  e  dispendio ,  Ihe  succ^eo 
com  dous  herejes«  Para  que  os  officios  divines  se 
eelebrassem  com  pompa  ^  e  se  frequentassem  os 
sacramentos  com  liberdade,  comprava  ao  hereje 
as  permissoes ,  e  sustentava  em  sua  casa  capella  de 
musioos  escolhidos,  e  diversos  temos  de  chara- 
meHas.  Animava  os  parochos^  para  que  se  esme- 
rasscm  no  comju^imento  de  sua  obriga9ao9  com  o 


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GASniOTO  LDSITAlia.  48t 

paftroemio  e  com  o  exenplo.  Nao  Tiio  tens  oihos 
oeoefetUbde  em  que  a  preesa  de  aoccorro  ae  nao 
adUantaaie  a  anpplieadamiseria.  Sua  ckarkk^e  nao 
ae  eaiendia so  aoamoradores,  aenao aos ealranhos. 
Ch^no  ao  Arrectfe  muitoa  aecalarea  e  eccieaiasti* 
cos  que  o  Flamengo  trouxera  de  Angola  como  ea- 
cravQS;  Joao  Feraandes  Vieiniy  vendo  que  erao 
PorCuguezes  e  desvalidoa,  aoconrreo  a  todoa;  ao$ 
■lais  distinetoa  levou  para  sua  casa,  a  oudeoaboa- 
pedou  ^com  grandeza  ;  aos  deoiais  mandou  vestir 
e  susCentar  a  ousta  de  sua  fazenda ;  e  a  todos,  ao 
tempo  dese  emlMircarem  e  daspedirefn,  forneceo  de 
veatidoB  e  manttoieotos,  nao  ao  para  a  Tiagem, 
senao  tambem  para  sairem  em  terra  quMdo  a  to- 
maaaaod.  Quatro  mil  crazadoa  gaslou  nesta  c^ra 
de  piedade ;  e  por  aqui  se  p6de  considarar  o  que 
despenderia  em  tantas  !  Aasim  vivia  no  meiodos 
inicnigos  de  sua  nai^  este  novo  Mois^  ^  conser- 
vando  ilibada  a suaf!^^  animando  e soecorrendo  os 
seus  cximpalriotas,  e  meditando  os  meios  de  um 
Urn  Ihes  reslitnir  a  roubada  liba^ade.  Sem  fiar  seu 
iatento  mais  que  de  si  proprio ,  foi  chamando  a  seu 
servico  aquelles  homeus  qiie  erao  intelligentes  naa 
artes  mecaiiicas ;  e  repartidos  por  suas  {azendas  os 
ocoipava  em  seus  officios.  Para  as  malas,  que 
tinha  muitas  e  mui  dilatadas,  mandava,  adesfi* 
lada^  armas,  municoes,  farinhaa  e  outros  gene- 
roe  ,  que  se  reodihiao  em  lugares  seguros  ^  fazendo 
en  tender  aos  miuistros  d'estas  conduc^oes,  que  se 
prevenia  para  as  occasioes  da  falta.  Aos  homena  de 
bam  assistia  com  beneficios^  para  que  na  opportu- 
mdade  Ihes  correspondessem  gratos;  aos  popularea 


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ttS  QMmero  twriaa 

obHgaTa  eoflt  laTorts^  para  m  ter  obedientei;  Aof 
ioIdado9  9  offioiam  da  milicia  poitufuezaioeoorm 
com  libwaUdadk^  para  os  adiar  ofarigadbs;  aba 
jybUao^Msa  aervia  e  aaCimaTa,  para  ob  oottservar 
sSoCM  I  e  algfuia  d'eUea  oomprara  com  exceaaito 
itiapQndiOi  para  ob  diapor  confidentas,  e  reoebar 
d'ellea  oa  aviaoa  loais  uteis ,  e  oa  segrados  maia  im<* 
pwtaniea.  Em  o.maior  ferror  d^astaa  ouidadoa 
oaiOucom  Dooa  Maria  Cesar,  aenhorado  meihor 
aaogue  do  roconeavo ,  com  muita  fem>9iira  e  pou* 
fios  aDoas ;  «por  rata  meia  ae  aparentou  com  o 
iBaia  eaUmado  a  maia  lustroio  d'aquella  capitania^ 
Naoapagau  nelleo  tbalamo  o  iooeiidb  bellioo;  wtt^ 
taapidMAdocom  maia  yirexaera  aan  peito  o  deiejo 
da  iavar  ao  aabo  a  impnaa  madilada  da  resUmracM 
da  Parnambyoo,  proaegoia  oom  afiaca  a  aonataacia 
am  aau  projecto,  quando  a  noaicia  da  aeclamaeao 
do  Senhpr  Ret  D*  Joao  IV  Taio  decidiWo  em  fim 
a  maUep  inaoa  k  obra,  a  a  axtoular  em  publico  a 
que  em  pardcular  ha  mmto  preparava.  Daremoa 
uma  curta  notioia  d'aquella  faccao^  para  voUarmoa 
brayemanta  ao  nosao  Joao  Fernande^  Yieira ,  qua 
d  o  AchiUea  d'esta  argumento. 

II.  fiem  aabida  6  da  todaa  a  parfida  politica  com 
que  Caatella  pretandia  aniquilar  Portugal  para 
meihor  o  dominar;  a  como  prirando-o  pouco  a 
pouco  deaaua  f6roa  a  liberdadas,  promatidaa  a  jii» 
radaa  ^  praparava  o  ultimo  golpe  reduxindo  o  retno 
a  provincia.  Nao  podiao  oa  Fortuguezes  soffrer  tao 
gramie  affironta;  meditavao  em  aeua  nobrea  oora«* 
edas  o  modo  de  aocudir  um  jugo  que  jk  pesara 
aobe  ailea  havia  aeaaeuta  annoa ;  e  to  eaperafao  o 


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ii\Qme]>l<>  favorarel  de  levar  a  offe^to  SMt  limxifi^ 
resoli^o.  Oppfimidos  de  igufiee  if^psii^^i^  sqbl^ 
v^rao^  OS.  Catalaes; «  os  Pprtugue^^^  que  j4 
d'antemao  linbao .  inleligdndas  seor^t^s  com  o  $p^ 
rwissimo  Duqpe  de  Bi^ogiMa^,  en  um  sabl;>ada 
1*"  de  Dezembro  de  1640,  peU&  noye  boras  da  m^ 
nhif  pos^iao  inifiSt  &  obra^  e  acqlamirao  no  termro 
do  paco  de  Lisboa  o  Senhor  Rei  D.  Joao  lY  •  Qua^ 
r^ta  fidalgOB  resolutos.  e^ceeutajrao  e»ie  grands 
feijto  co^i  Unio^  denodo  e  pi^e^teza,  qpe  q^aIK(<3( 
^ao  dez  boras  estava  a  lacf^  coos^uida;  Migi^el 
de  y^poofello^  sem  vida^  a  duquezarpgenta  sam 
mando;  q  sg^o  r^atituidQ  ao  novo  IW  acclama^ 
do^  e  a  cprte  qpi^a  e  saUslaita.  Bastou  a  voas  do 
succqsso  p^ra  ^er  ioiitado  em  tpdo  o  reiao^  sem 
fielle  fiQfu*  povoa^iio  i^nx  aldea,.  em  que  se  nao 
yjsM  obedecido>  com  admiravel  coucardia  e  alvo^ 
TifqQ  dos  aoin^os;  mostrando^  eq^  tudo  que  su?^ 
penpr  JD^puldo  o$  mcftia-  Em.  quanta  a  .magostado 
doSefibor  Aei,  D.  Joao  $e  dilatou  no  Alevatejo>  que 
foraa  poucos  dias^  elegeo  a  nobreza  per  governar 
dor  aa  Arcebispo  de  Lisboa,  D«  Rodrigo  da  Gunbai 
que  logo  despedio  porreios  a  toda^  as  cidades  e 
v^las  do  reino  oom  a  alegre  nova  de  sua  Uberdade« 
Em  6  de  Dezembro  recebeo  Sua  Magestade  a  co^ 
roa  e  a  obediencia  y  e  sem  dilacao  a  mandou  dar 
jfcoPapa  Urbano  VUI,  que  governava  a  Igre^a, 
pelo  Bispode  Lamego^  P.  Miguel  de  Portugal. 

IIL  Nas  custumadas  bosUlidades  (quedeix^mos  r^ 
feridas  noLivro  lY)  se  passou  todo  o  anno  de  1 640^ 
sem  nelle  baver  cousa  digna  dememoria;  entrou 
0  novo  anno,  e  com  elle  a  felu  nova 4a  acclama- 


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186  CASTRtOm  lUBITAlfa 

6bio  gtoiriosa  que  em  Lisboa  se  fizAra  do  Senhor 
Rei  D.  5o&o  IV.  Nos  fins  de  Janeiro  de  1641  to- 
mou  porto  na  Bahia  o  P.  Francisco  de  Vithena, 
reKgioso  da  companhia  de  Jesus,  que  de  Lisboa 
saira  em  uma  embarcacao  ligeira ,  com  carta  d'El 
Rei  para  o  marquez  de  Monte  Alvao,  Viso-Rei  do 
Esiado,  eordens  secretas  para  toda  acontingencia. 
Era  o  marquez  feitura  de  Gastella ,  e  teve-^se  reedo 
de  que  podessecom  elle  mais  a  gratidao  que  o  nas- 
cimento.  Entregou  as  cartas  na  mao  do  marquez 
com  o  defido  segredo ;  com  portugucz  alvoroco  leo 
este  a  nova,  beijou  a  (irma,  e  deiloti  de  si  toda  a 
duvida ;  deteve  conrsigo  o  padre ,  mandou  chamar 
ao  Dom  Abbadede  Sao  Bento,  ao  prior  do  Garmo, 
gnardiao  de  Sao  Francisco ,  e  ao  refior  da  Com- 
}>anhia ;  da  nobreza  os  principaes ;  da  miKcia  os 
maiores  cabos ,  e  os  vereadores  da  camara.  Fedia- 
dos  todos  em  um  salao  do  Paco  leo  a  ciarta ;  man- 
dou que  faltasse  o  padre  Vilhena.  Suspendeo  a  tOr 
dos  a  estranheza  da  novidade.  Rompeo  o  marquez 
osilencio,  dizendo  que  a  gravidade  da  materia 
pedia  o  parecer  de  todos,  e  assim  que Ihes  rogava 
votassem  nella  por  escripto,  assignandorse  cada 
qual  ao  p^  do  seu  voto.  Fallirao  alguns,  dizendo 
que  a  resolucao  de  tamanho  negocio  nao  era  para 
repentes ;  que  se  d^sse  tempo  &  considerpacao,  ara 
queo  didcurso  escoihesseo  mais  acertado.  Atalhoa 
o  marquez  a  dila^ao,  com  advertir  a  importancia 
do  segredo;  e  descnganou  a  todos  que  primeiro  se 
haviao  de  resolver  que  snissem  d  aquetie  lugar. 
Le?antou-se  entao  Joanne  MendesdcVasconceUos, 
e  Crmando  com  uma  mao  o  chapeo ,  e  com  a  ontra 


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oMmiMo  amthm.  185 

a  espada ,  djase  estaa  palabras :  «  Cmnprio  o  c^  a 
»  Portugal  ifto  dilatada  promessa ;  chegdmos  a  vei^ 
n  o  fimde  tao  penoea  esperanca ;  temos  o  que  de- 
»  aejaaos;  e  ha  quern  remisso  duride  de  acceitar 
»  too  grande  rnerc^  de  Deos  ?  Viva  El  Rei  Dom  Joao 
»  o  Quarto  noaso  8enhor;  e  nao  haja  qnemo  con- 
»  tradiga,  se  i  verdadeiro  Portuguet.  »  Repetio- 
se  pelo  marquez ,  e  por  todos  os  do  cooselho ,  a 
lima  yoz  a  acelamacao  dos  vivas.  Nao  9e  permiltio 
que  do^ao  saisse  nem  pessoa,  nem  notieia,  at^ 
que  86  nao  dnpozesse  o  modo  com  que  se  baria  de 
acclamar  na  cidade.  Ordenou-se  que  saisae  (oda  a 
gente  da  milicia  em  suas  companhias  (quasi  einco 
mil  fttfantes  tinha  a  cidade  de  presidio)  com  aviso 
aos  tenentes  de  mestres  de  campo  que  marchassem 
a  fcntnar-se  na  pra^  dos  Guf ndastes ;  e  que  dos 
ler^oa^  um  de  Gastelhanos ,  e  de  Italianos  outro^ 
levassem  a  vanguarda ,  e  assim  como  fossem  pas^ 
sando  os  mais  se  Qies  mandassem  arrimar  as  ar- 
mas.  De^pedida  esta  ordem ,  maiularao  todos  bus« 
oar  as  roelhores  galas,  que  tinbao  em  sua  casa, 
sem  dizer  a  seus  criados  para  que  :  com  a  mesma 
cauiella  s^  mandou  vir  a  bandeira  da  cidade:  0 
povo,  que  vio  ficar  a  embarcacao  ao  pego,  ao 
P.  Vilhena  mudo,  aos  maiores  da  cidade  con^ 
gregados,  a  infantaria  fbrmada,  a?  galas  pedidas, 
o  segredo  observado ,  sem  atinar  a  causa  concorria 
em  nmnero  a  esperar  a  nova.  Vestido  de  festa  com 
o  mai&  precioso  de  suas  joias  saio  o  marquez  acom- 
panhade  do»  congregados  e  da  camara,  com  a 
bandeira  da  cidade ,  levando  diante  um  rei  d'ar- 
mas;  tocarao^eascaixas,  clarins  e  pifonos;  e  feito 


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signal  pan  xiue  ye  pofiegfe^  fiai^  %o  estroEdp  ^  kvmr 
i(OU-«Q  0  rei  d'arpias,  e  em  voz  aita  proniwdom 
eslaspalavraft :  «.Ouyi,  ouvi,  ouvi^  eetUi  aUentoft.  • 
£  loga  0  marqnez  rcfoi^DdQ  o  grita^  disse  aa  pahi- 
ynui  propriaa  de  siniilhAaie  acto  i  «  B^al  ^  real, 
li  real|:por.  o  S^nhor  Dom  Jooo  a  Quarto ,  Rei  da 
a  ;P<u*tu^.  j^  Com  minca  vUto.alvoro^o  e  alegria 
as  r^tjo  0  povo, setfidescao9ar.por  muito  eBpfL^ 
de  taMHuliuar  vivaa*  AugmentoiHse  o  hrado  eom 
as  ropetidas  cargasi^que  davao  oa  ter^oa^  a  qua 
rt^pood^rao  os  fortalezaa  e.naoa  cofu  toda  a  arte- 
Iharia^  em  quaoto  o  inarqufez  com  a  referida  con^ 
panhia,  cabidO|  coouBuaidadea,  derezia  e  po¥o 
caminbavao  para  a  S£  a  dar  a  Hfm  gra^s  de  tar 
iB^oha  fnerc^;  e  nos  aeguinte^  diaa  ae  festejou  can 
KmM  a  vari^dade  d$  featas,  qm  na  cidade  ae  po* 
d^raoordeaar.  i—  Daspachoulogoo  laarquez  a  aeu 
iilbo  n\uxa  paU<{ho  a  dar  a  seu  Rei  o  parabem  da 
coroa»  a  <>bedi^Qia  de  vassaUo;  oom  a  meama 
proipptidao  avisou,  porcorreioa,  a  todoaos  lugarea 
da  8ua  juri$dlcQaq  para  que  imitaaseoi  o  que  na  ci- 
dade se  havia  pratioado;  com  o  meamo  alvorooo 
despedio  um  barco ,  e  nelle  o  pUoto  da  Barra  Joao 
Lopes^com  cartas  para  o  coode  de  Naaaau,  a  quern 
dava  conta  da  acckma^ao ,  e  das  circumatanciaa 
d'ella.  Pedia  congratulacoes  da  felicidade  do  rei- 
UD)  e  dava  parabeos  das  cony euieacias  dos  Esla- 
dos;  tudo  redultas  d'um  animo  verdadeiram^Qte 
poriuguez.     . 

(V.  Ordenava  Sua  Magestade  a  camara  da  Bahia 
qve,  no  caso  que  o  marquez  peccasae  em  desobe- 
dioQPia  pu  tib^^,  q  privassem  do^ver uo,  e  para 


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cUt  ^nolMira.  to  fiif^  Bosi  £e4K>  da  fiiiritM 
vomtee de  miii|M>  Lute  Bwbulbt,  e  t  Lourtth^o  4e 

mimir^fti  e  ji«9Ufi^iuremaa<x)iidii;de9,  se  executou 

6  pci^Qu^ao  o  Qiegoeio  Aa  babm^  da  m^roAAeuii 
samclue  a  &OMe  f>eader  a  dkfioomposi^ao  d0  Mm 
tamanbo  xainifttrou  Com  auimo  ^oeegiKk)  rec^o  # 
iwrqnez  a  offepda ,  porque  o  mo  ^Ifeivaa  camia<i 
d^eDienfio  aqueUe  reoeio*quQ  (uppuijia  p  coi>)oi<a^4 
pao  r«eo3ou  o  aggravo  de  o  maodarem  proso  pan 
o  reiao ,  p#k  d^^encia  oom  qv^  o  r«me4tka<}| 
eerto  de  qoe  em  F^i^l  ee  hayia  de  vemilfu*:  a 
^uAa  ooiB;  diflereDte  juito,  p^ue  nao  ha  via  tri* 
Umal  em  qw  j»nep4diase  a  p>i»o«  Ch^gou  a,Li^ 
boa ,  aobou  en  seu  R^^estimaqaa  «  agrado ;  e  110$ 
post06  que  oeQOpeu.a  premio  de  aeus  ^rvico^  i»e  a 
maior  Yiiig|u[i9ade.teuS(emulos;  aiiida  que  aioor^ 
teeida  f>ela  rebelliao  de  aeua  filbos. 

y ;  Chegpu  enti^etaato  iw^  Lope^  ao  ArrecUej 
deiteu  aocora  de  fro«te  do  pa^  do  conde  de  Na&^ 
8Wy  e  Bern  e&perar  consetttimento^  saltou  em  terra 
com  ageatede  sua*  eompaohia  lufitr^^samente  yeir 
tida;  dirigk>-se  ao  pa^o,  entxegou  a  carta  do  maxr 
quez  aoeoude;  o  qual »  a  pwas  a  leo,  Ibe.^ 
d'alvi^aifaa  uma  rioa  joia.  DtyulgoUrse  logo  ajao\a» 
qu0  o  povo  featf  jou  com  tauto  alvor09O  e  j^epeti- 
9ao  de  y'wMp  quasto  ae  podift  espepar  da  maia 
iiel  poYoa^o  de  Portuguezea;  €Spalbou^3e  por 
todo  o  reconc^vo^  e  com  igualjuUlo  Coi  applau*- 
dkla.  Fa^iao-lbea  eompanbia  os  estraogeiroa ,  ip 
bem  q¥e  oomdWersojuifco;  popque  .0  HoJlanda? 


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(W  CASTUOTO  HMTMa 

<>  formtvade  ettabeleeer,  por  esle  otmittbo ,  mo 
imperio;  e  ot  PortagueeeSi  de  DeoBifaes  moMrar 
o  Diodo  como  hamo  de  sacadir  de  seas  faombros 
o  jugo.  — Mandou  o  coade  fixar  qitattel  de  featas 
{K>r  todas  as  pi*a^8  de  seu  domink),  para  o  segnliK» 
te  met  d'Abril ,  cotividaiido  com  premios  arm  a^eo- 
tnreiros,  e  com  rogos  anobreza  principal  de  ea* 
trangeiros  e  naluraes ,  sem  que  faltasaecsn  eaorei^er 
aes  bomens  de  milhor  presttmo,  com  aviso  de  que 
ae  preparassem  de  caTallos  e  galas ,  porque  nao 
faltassem  ao  festejo  o  luzido  e  o  decoroao.  Mandou 
fezer  i  sua  vista  urn  largo  terreiro  eeroado  de  pa- 
lanques,  omados  e  capazes  para  a  quaiidade  e  para 
a  multidao  :  chegon  o-  dia  dealinado  j  e  enirarao 
na  praca  duas  qQadrillas,  a  compeieneia  lustroeaa, 
uma  d'estrangdros  que  gulava  o  conde,  ouira  de 
Portuguezes ,  que  seguia  a  Pedro  Marinho  Falcao ; 
c(Hrr6rao  parelhas;  juglrao  canas  e  alcanzias;  de 
tarde  houvc  sortilha ,  e  nella  se  julgirao  quasi  to- 
dos  OS  precos  aos  Portuguezes;  muitos Ihes  deo  a 
justica;  muitos  mais  o  favor,  porque  as  damas 
estrangeiras,  com  sua  natural  coofianca  e  galhar- 
dia,  tir&vao  ou  das  ifiaosou  do  peito  esta  ou  aquelia 
joia,  e  as  offerecifto  ao  cavalleiro  que  mais  Ihe  le- 
vava  OS  olhos  :  gentilleza  enti^  elks  usada^  e  nas 
cortes  applaudida.  Em  o  segundo  dia  foi  todo  o 
festejo  &  flamenga  :  deo  o  cotide  um  magnifico  jan« 
tar  a  todas  as  damas  e  cavalleiros,  com  tal  condi- 
c&o  que  na  ordem  dos  brindes  fosse  o  mesmo  er- 
ral-os  que  repeiil-M  :  jogo,  em  que  as  mulheres 
do  norte  estimao  ser  vistas,  porque  se  presao  de 
destras.  Em  o  terceiro  dia  se  continuirao^  featas 


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GAsnmto  unRAM.  189 

de  cavaUo  ^  que  se  rratatfrto  em  umsi  frawa  e  e»» 
plendkla  ceia,  e  ndla  se  dec  o  ulthno  brinde  i 
che^ada  de  una  oaa  de  Hollanda ,  pda  c[ttal  06 
aenhores  Ealados  a^iaavao  ao  ooode  da  acdamaf* 
qio  do  Senhor  Ret  Dom  Joao  lY,  e  das  pazea  i»* 
sentadas  com  a  coroa  de  Portugal  por  dec  anaos. 
~Logo  que  se  acab4rao  as  festas,  mandou  o  conde 
de  Nassau  preparar  uma  fragaia  para  a  Bdiia,  na 
qual  euiFiou  a  Henrique  Code ,  e  por  seu  seerelario 
Abraham  Trapes.  Era  o  primeiro  otgeeto  da  em<- 
baixada  felieitar  os  novos  goveruadores ;  o  segm^do 
(  e  ^te  o  mais  principal )  representir-Uies  a  grande 
utilidade  de  uma  tregoa  uaquelia  parte  da  Ame^ 
rioa  entre  Flamengos  e  Poriuguezes^  a  sombra  das 
pazesqueos  Estados  tiuhaooelebrado  com  o  reino* 
Forao  recebidos  ccmi  alvoro^,  providos  com  lar* 
gueea^  e  agasalhados  com  todo  o  respeito. 

VI.  Assent^raoHse  os  priliminares  das  tregoas^ 
com  a  prdmessa  de  que  os  noesos  goVeruadores 
matidariao  relirar  da  campanha  de  Pernatmlmco  ao 
capitao  Paulo  da  Cunba  e  ao  goTemador  dos  Mi- 
nas  Henrique  Dias;  o  que  logo  se,oom{»rio»  e  os 
endMixadores  hollatideies  se  retirirao.  Passados 
alguas  dias  mandarao  os  tiossos  govemadores  ao 
tenenle  general  Pedro  Correa  da  Gama,  e  ao  hceoh 
dado  Kmao  Alral^^  da  Penba,  para  que  com  suas 
lettras  asdstisse  to  capitulacoes  das  trfgoas>  por 
quanto  para  sua  Talidade  era  necessario  o  serem 
conformes  ao  dereito.  0  Flamengo^  que  com  a 
reiirada  do&sobreditos  capitaes  se  achou  livre  do 
que  maisoinquietava,  com  frivolas  escusas  negou 
todaa  aqueUaa  condifoes  que  podnio  favorecer  no$- 


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ItD  cuaaoiouMia». 

iQ  pUEtidb*  Vkio  m  wm»  tnitkdoi  o  animo  do«* 
brido  d'a<|cieUa;g€ntef  voltirfro.  para  a  BaUa,  pit>- 
fios^iBO  aoa  govcmadorea  4^  ^ue  tinhao  enlmdiclo^ 
^^aaielDgo  fioiriolodoa  ocmhaceado  aa  aiattUijMi 
4o  BoUamka^  .que  hid  tatdou  a  deaaMtcanr-M 
MMo  vamoa  a  "viar* 

VU.  Mao  crao  auda  pasaadoi  muiloa  diaaquaa- 
do  ohagouA  Bahia  aviio  oertaqiia  oUoUandaa 
dospadkA  do  Aimoife  rariaa  etquadraa  fo^ 
muniitoca  e  ^enta  para leTarem  porantrepreaa  8er- 
{^le,  Angola ^  MaraBbao^  6w  Thaaui  e  a  Mina; 
oqiM  facilinMtacooaa|;uirao.  ^m  iiulividuareinos 
oa  BQooasaos,  porque  acontao^raft  longe  do  teitna 
de  ttoasa  faittoriai  •<>  a  entarpreaa  de  8^pe  iioa 
obriga  anla^  por  aar  parte  da  America,  a «air 
aa  ^pbeia  da  nosao  atailsipto.  -^  Sail  aituada  a 
cidade  de  Sao  Cbridtovao  em  a  oi|»laaia  do  &ar- 
giped'JEL Rei|  wafinai^te pela parte doaul  com  a 
fiahia#  ^  pelo  ttona^om  o  rio  de  am  FraneiMo  e 
com  a  bafA  (ania  4e  Peraand^uco  ^  de  qti  e  diaia  aele 
legoi#t  porQa9a(a  Umitada,  pordm  de  t^neoo  ferv 
til  ^e  porta  capa?^  Tanio  que  o  ii^itmgo  ae  vio  dea- 
aaMoaahrado  d«a  tropaaporiygtiasaa^qoecxirriao 
e  awdU^YJift  todoodeatriotodo.PerjiaiilMicop  for- 
Dooeo  quatro  oiM.do  tvdo  o  ipj^  the  pareoao  m^ 
joea^ario para  aconqidMUt  e  para  a  reteii9»o«  JEttr 
tra^ao  no  poriia  com  haj^leiraa  de  paa^  derao  aobre 
a  cidade  cqa»eatr^ii»do  de  guerM;  aaquearaoEvrf»> 
fizerao-se  aeahores  ^  aem  que  algttm  doa  morado^ 
rea  e  viziAboa  Iho  podesse  ifttpodir ,  porqw  oa 
obrigftva  a  ratiiiar  a  aoguraoQae  o  pnooeUo;  m  bom 
qua  ^oijiiaoiM  iM  ttorbtiaitiba  tMiiiao^MO^ 


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fiAamoTD  uflBTMia  Ml 

nio  criao.  Para padiio  da infamia kvantoo aHok 
Uondei  nafiarra  uma  notavel  fonli&ca^ao. 

VIIL  Tinha  aportado  na  Bahia  AntoDH>  Tdlei 
da  Silva,  mandado  por  El  Rei  D.  Joao  IV  paf« 
govemar  aqaelfe  l&tado.  Coiu^iTiao  iieste  fidalgo 
nuitaa  e  nnii  solidas  qoalidades,  com  as  quaea 
ra&plaadeoia  em  sua  peaaoa  y  com  excesso  j  o  illtia* 
Ire  sangfue  que  herdira.  EncarregaraJhe  £1  Rei 
com  Unto  aperto  a  obaenraacia  daa  tregoas  com  oa 
JttoUandeaea^  que  encontrando^se  a  ooaaemi^ao  ib 
Batado  com  a  observanda  da  paz,  Ihe  ordinira 
quehrasse  pelotloniinioy  e  nao  peta  amizade.  Aofaou 
Antoaio  Tdles  frescas  as  feridas  j  vivaa  as  qottixas) 
e  acccao  oescatKlalo,  com  que  o  povo  seiastimava 
do  aleivoap  praccdcr  do  inimigo ;  resolveo-ae  em  to«- 
IMF  um  eipediente  pelo  qnal  o  inimigD  enleii*' 
deiae  y  que  hobm  aoffrimento  era  praceito  e  oao 
deaanaio,  fiuendo-lhe  conbeoer  a  causa  de  nossa 
impadaneia ,  ea  vileaade  sea  utrtfimeiito.  ^  Deo^ 
Ihe  occasiao  para  ^xaeutar  o  entrar  na  Babk  uma 
oao  portugaeul^  que  d'etta  saira  carr^gada  de  as-^ 
ancar  em  direitura  para  o  reino;  a  eata  enoonifott! 
DO  mar  uma  fraipta  hoUandeza ,  que  viflba  d' Aii^ 
gda  pata  o  Airecife  ^o  seguroda  pas adescaidoui 
e  aaleiyozk  cslraiigeira  a  Tc^eo.  Tirou  d'ella  o 
piloloy  e  parte  da  maruja,  e  pan  que  a  noareassBm 
Ihe  raetteo  quime  HoUaodcaea.  Contentes  com  ^ 
prasa  navegsrao  para  o  Arrectfe,  quando  os  Por^ 
tBguazes  quo  fio^rao  em  a  nio  rendida  derao  sobre 
oe  Flamengos  ^  ea  qeaea^  cortadoa  do  fenroe  do  aae^ 
do^  se  deiaariio  mvnttar^  pediado  bom  quar Ce) ;  vKt 
rareo  oanotao^  apma^eem.poucoa.diaseotdirao 


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193  CASTBIOn)  UJ81TAN0. 

na  Bahit ;  oontarao  ao  goTemador  o  case;  de  cpie 
elle  mandou  fazer  um  proceasa^  em  que  tesCemu- 
Bhiirao  bs  mesmos  Hollandezea  prisioheiros  e  cul- 
pados. 

IX.  Pelo  licenciado  Simao  Alvares  de  la  Penha 
Biandoa  o  govemador  do  Estado  a  inquiri^ao  ao 
conde  de  INastau,  e  aos  do  consdiho  supremo  com 
luna  carta,  na qual  j  depois  de ae  queixar  amar-> 
gamente  do  injusto  e  atraiooado  procedimento  dos 
Hollandezes^  ooncluia,  dizeodo : «  £m  esse  processo 
»  vai  proTada  a  Terdade  e  a  razao  da  mioha  quei- 
})  xa  pelos  mesmos  aggressores  da  maldade.  JUko^ 
»  repito  o  sucoesso ,  porque  me  corro  de  dar  duas 
M  y^es  em  rosto  com  proeeder  tao  fiemeotido.  £s- 
»  p^roa  restiiui9ao  do  roubo  j  eo  caitigo  dos cul- 
»  pados ;  e  quando  fahe  a  satisfacqiio  da  parte,  que 
»  6  obrigada  a  dal-a ,  tenho  cabedal  e  valor  para 
»  por  em  execuqao  o  eastigo  e  a  vingan^a^  ainda 
>»  que  saiba  qoe  a  de9(^>ediencia  me  p6de  arriscar 
n  a  cabe^.  »  — ^  Partio  o  enviado ,  chegou  ao  Ar« 
recife,  deo  ao  oonde  a  carta  e  a  embaixada.  Esca- 
sourse  este  e  os  do  oonselfao  com  a  fiugida  ignoran* 
ck;  e  para  se  nao  moitrarem  comfdioes,  disserao 
quenas  tmi^oas  usadas  nao  tiyera  parte  seu  con- 
seutimento  ^  nem  agora  o  podia  ter  sen  limitado 
imperio  para  a  restkni^ao;  mas  que  informariao 
aos  senhones  Estados  da  injusta  retencao  das  pra- 
9as  e  fazehdas ,  dando  odnta  dos  aggressores,  paiia 
que  estes  fossem  castigados ,  e  aquellas  restituidas ; 
e  com  demostracoes  magoadas  despachiirao  e  des- 
pedirao  o  enviado.  Nao  esperava  o  governador  nem 
outra  resposta,  nem  outra  satisfao^;  mas  quix 


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GASIRIOIO  LUaiTAKa  19S 

justificar  com  estadiligencia  o  que  delerminava  fa- 
zer  sua  yingan^a.  —  Despcdio  para  Angola  uma 
carayella  carregada  de  municoes  e  mautimentoS) 
que  aos  afflictos  despojados  foi  i*en^dio  e  vida, 
MaDdou  a  D.  Antonio  Philippe  Gamarao  que 
com  o  sea  terco  de  Indios  passasse  a  Sergipe^  e  se 
alojasse  &  vista  da  cidade  e  da  fortaleza,  e  de  ne- 
nhum  modo  permittisse  que  o  ininiigo  disfructasse 
a  terra ;  com  expressa  ordem  que  saindo  alguns, 
a  primeira  e  segunda  Tez  os  despojasse  do  roubo 
edas  armasy  e  os  largasse,  ayisados  que  &  terceir 
ra  vez  haviao  de  pagar  o  aCrevimento  com  as  vidas. 
Observou  o  Gamarao  pontualniente  a  ordem;  e 
d'ahi  per  diante  nao  houve  inimigo  que  ousasse 
sair  de  suas  foriificacoes ;  uem  a  ellas  chegou  outro 
sustento  mais  que  aquelle  que  do  Arreclfe  Ihe  en- 
trava  pela  barra« 

X.  Em  quanto  o  governador  do  Estado  fez  estas 
expedi^oes^  se  occupava  o  conde  de  Nassau  em  des* 
pachar  um  enviado  para  a  Bahia ,  a  onde  cbegou 
com  brevidade.  A  sustancia  de  sua  embaixada  se 
resumia  em  dar  o  parabem  ao  goveniador  da  via**- 
gem»  e  do  lugar,  com  os  offerecimeutos  da  pessoa^ 
oongratulando-se  da  vizinhanca ;  a  que  o  goverr 
nador.  respondeo  com  a  polidez  que  pedia  o  seu 
cargo  e  nascimenlo.  —  Nestas  e  u'outras  cousas^ 
mais  importunas  que  importantes,  se  gastou  o  aauo 
de  1641,  e  parte  do  de  1642^  quaudo  tomou  por- 
to  no  Arrecife  uma  .nao  de  Hollanda,  com  or- 
dem aos  do  governo ,  para  que  ao  conde  de  Nas« 
sau  ^  Joao  Mauricio,  se  Ibe  nao  d^sse  mais  que  a 
n^tade  do  seu  ordeuado,  com  car(a  para  o  mesmo 
L  13 


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(9^  CASTBIOTO  LtrafTANO. 

conde,  em  que  os  da  Gompanhia  occidental  se 
desculpavao  com  a  pobreta  da  bolca.  Pela  mesma 
nto  recebeo  o  conde  aviso  secreto  de  que  os  da 
companhia  determinavao  tirar-ihe  o  govemo,  mal 
Bfttisfeitos  dc  seus  procedimentos ,  capitulados  por 
algUQS  falsos  amigos,  que  o  accusavao  de  frouxo, 
absoiuto  eambicioso  :  culpas  que  formava  o  ciume 
c  a  inveja.  Conheceo  logo  o  conde  os  autores  da 
intriga ,  e  para  Ihes  nio  dar  o  gosto  de  o  verem 
priTMlo  do  governo ,  resolveo-de  em  se  anticipar 
na  renuncia  do  cargo ;  e  para  esle  fim  dispo2  de 
aeus  moveis,  ou  por  venda  ou  por  dadiva ,  reaer- 
Tando-^se  aquelles  que  podiao  ter  pre90  eem  ftiier 
YulW)  para  os  levar  comsigo. 

XL  Chegira  neste  tempo  uma  fragala  hollan- 
deta ,  que  Tinha  d' Angola  carregada  de  (azaftda, 
em  ella  varios  religiosos,  clerigos  e  moradores  (fue 
o  HoUandez  arranc4ra  de  suas  habitacoes.  Por  elles 
«e  soube  u  perfidia  de  que  us&ra  o  hereje  para  com 
elles  y  e  como  oommett^ra  as  mtis  crueldades  n'a^ 
quella  terra.  Depois  que  o  Hollander  se  apossara 
da  cidade  de  Loanda ,  Pedro  Cezar ,  que  era  o  go- 
vemador  d'aquelle  reino ,  se  tinha  retirado ,  por 
ordem  d'El  Rei,  a4im  sitio  junto  do  mar,  onde  se 
nquartellou^com  a,  sua  gente,  e  onde  nao  ofFendia 
o  inimigo.  Gorria  fama  entre  os  Hollandeies  que 
den^ro  da  nossa  fortificacao  ee  depositatao  muitas 
nquezas ;  e  com  o  fim  de  as  espoliar  de  tudo  at- 
sentirao  amiga^el  commercio  com  os  nossos,  e  se 
trafavao  nao  como  inimigos  mas  como  alliados. 
Foi  urn  dia  o  govemador  boUandez  com  alguns  ca» 
fittaes  sens  i  nossa  povoa^o  ( mais  para  eipitr 


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<iue  para  yer],  onde  (brao  reoebidoa  com  agrado, 
agavalhados  com  magnificcacia ,  e  aervidos  com 
magestoBo  apparato  e  adorao.  Occupados  oa  oUioe 
na  cobica  j  perd^rao  de  vista  a  gratidao ;  e  $empre 
aleivoso  o  HoUandez  determmoU)  com  infame 
traiQao,  malar  os  posauidores^  para  Ihes  roubar  oa 
moveia.  Coavidou  o  govemador  Pedro  Gezar  ca- 
pitaes  e  nobreza  para  um  banquete  na  cidade  de 
Loanda,  com  intencao  de  que  a  meza  do  convite 
aeryiaaedetbeatro  a  morte.Naoacceitaraooanoasos 
o  (^Qferecimento,  ou  impedidoa,  ou  presagos*  loQ- 
pacieQte  o  inimigo  de  se  yer  atalbado  Da  traicao 
qiie  intentaya ,  nao  desiatio  da  maldade ,  buacaodo 
camiDhoa  por  onde  podease  eonaeguir  o  iotento* 
Gonaiderou  aos  Portoguezes  dormindo  aobre  o  se- 
giiro  da  escuaa ,  e  em  a  noite  do  dia  apontado  para 
o  banquete^  deo  adbre  eUea,  no  quarto  da  alya^ 
com  todo  o  poder;  aem  reaiateucia  prendeo  e  rou- 
bou  a  todos.  Despojados  da  liberdade  e  da  fazea4a 
com  tanto  rigor  e  crueldade ,  que  aem  Ibe  4^]xa- 
rem  OS  uauaea  yeatidoa^  os  embarcarao  para  o 
Arredfe,  oode  chegKirao  sem  parecer  de  homeus, 
pelo  barbaro  trato  da  viagem ,  havendo  nella  dias 
em  qi^ienao  achou  sua  fomee a^mais  queaagua 
salgada  do  mar.  Assim  yierao  en.traQ4o  ^ucceaaiya- 
mente  as  noticias  de  aimilbantes  inyasoes,  mrdidas 
com  a  meama  fallaciai  por^m  nao  kjgradas  com  a 
mesma  fortuna.  No  Maranbao  cairao  no  hqo  que 
arm&rao;  porque  engolfados  no  roubo  derao  occa- 
siao  a  que  os  moradores  yoltassem  sobre  elles ,  e 
cobrassem  o  perdido,  i  cusla  da  yida  de  muitos  e 
do  medo  de  todos,  ^ue   fugindo  ao  hosso  ferro 


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196  GAsmoio  umiTAifa 

busdirao  no  mar  o  ^guro.  Em  Sao  Thom^  os  cas- 
tigou  o  clima ,  de  maneira  que  a  muitos  deo  a 
terra  sepulcro,  e  a  poucos  aviso  para  fiigirem  a 
morte.  Em  todas  as  mais  partes  perd^o  por  for- 
ca  tudo  quanto  adquirirao  por  engano.  —  Todas 
estas  calamidades  que  pesavaosobre  os  opprimidos 
habitantes  da  America  e  da  Africa  faziao  profunda 
impressao  no  grande  cora9ao  de  Joao  Fernandes 
Vieira,  e  noite  e  dia  andava  absorto  em  graves 
consideracoes  sobre  a  sorte  de  tantos  infelizes. 
Considerava  que  com  a  ausencia  do  conde  ficava  a 
miseria  de  todos  sem  arrimo,  e  a  tyrannia  sem  freio ; 
ponderava  desterrados  os  sacerdotes ,  os  herejes 
com  senborio,  as  ovelbas  sem  pastores,  e  (emia  que 
OS  lobos  destruissem  o  rebanbo  da  igreja,  tragan- 
do  OS  innocentes  cordeiros »  expostos  4  voraddade 
da  herezia  j  e  aos  venenosos  denies  d'aquellas  in- 
domitas  feras ;  e  receava  que  a  corrupcao  das  con- 
demnadas  seitas  inficionasse  a  pureza  do  paste 
espiritual,  e  despovoasse  os  curraes  do  verdadeiro 
pastor ;  via  que  da  tardanca  do  remedio  se  alimen- 
tava  a  ruina ,  e  que  nas  doencas  agudas  se  apro- 
veitao  os  medicos  de  medicinas  violentas,  e  pro^ 
punba  em  seu  peito  nao  esperar  mais  tempo  para 
atalbar  o  perigo. 

XU.  Entrou  o  anno  de  1 643 ,  tempo  em  que  o 
conde  se  achaya  muito  adiante  nos  aprestos  de  sua 
viagem;  e  quando  cbegou  a  occasiao  de  se  embar- 
car  deo  um  banquete  a  todas  as  damas,  e  taver- 
neiras  do  lugar,  no  qual  se  brindou  at^  faltar  a 
todos  o  juizo.  Partio-se  no  seguinte  dia ,  que  era 
o  1  **  de  Maio ,   acompanbado  de  muitos  Portu- 


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CA8TRI0T0  LUSITAlia  197 

guezes  at^  a  Paraiba ,  a  onde  se  embarcou  ddixando 
a  lodes  saadades»  nao  pelo  que  deviao,  senao 
pelo  que  reoeavao.  Tal  era  aquelle  govemo,  que 
Belle  achaTao  s6  a  diflerenca ,  que  Ihes  represeu-> 
tava  a  ccmparacao  d'um  para  muitos  tyranuos. 

Xni.  Cresceo  j  com  a  partida  do  coude  de  Nas- 
sau ,  a  miseria  dos  habiiantes  a  tal  ponto  que  che- 
garao  a  aborrecer  a  Tida.  Gemia  a  affliccao  com 
medrosas  queixas,  e  todos  os  instantes  faUavao  ao 
coracao  de  Joao  Femaudes  Yieira ,  persuadindo- 
Ihe  o  remedio  com  as  vozes  da  lastima  e  do  tempo. 
Obedeceo  a  paixao,  e  deliberado  em  desembainhar 
a  espada^  dispoz  o  goipe,  adiantando  o  intento  a 
opportuDidade.  Com  vigilancia  e  diligencia  mau- 
dou  engrossar  o  numero  de  seus  gados  por  todos 
OS  curraes;  recolheo  a  si  todo  o  genero  de  armas 
e  muDifoes  que  a  cautella  Ihe  p6debuscar ;  todos 
OS  mantimentos  que  pode  haver,  comprou;  ere- 
mettia  tudo  a  seus  criados ,  fazendo  dqtosito  nas 
matas  e  nos  eugenhos.  Disfarcavao  que  podia; 
e  o  que  nao  era  possivel  deixava  a  cortezia  da  sus- 
peita,  nao  fazendo  sua  resolucao  escrupulo  nem 
daxMilpa,  nem  da  calumnia;  antes  com  disoreta 
manha  eoganava  a  todos  com  a  mesma  verdade, 
aconselhando-lhesaimita^o.  Abominava  nas  pra- 
ticas  a  sujeicao  e  o  soffrimento  y  chorando  a  igno- 
minia  com  que  via  no  Brazil  sepultada  a  reputa- 
cao  e  a  valeniia  porlugueza,  tanto  pelo  uso ,  como 
pela  memoria.  Dizia  muitas  vezes  que  a  peior 
sorle  da  miseria  era  sujeitar  o  valor  i  cobar- 
dia )  porqoe  nao  tinha  saida  senao  para  a  infamia  : 
industria  de  que  se  valia  para  accender  os  animoS| 


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ids  CASTBKyVO  tvtsnAMO. 

e  para  oa  deftpertar  do  somno,  wm  revelar  o  se-* 

gredo;  com  mab  resulta  de  gloria  nos  impnkos 

qua  agora  dissimulou ,  que  no8  ob&tacuk>8  que 

depois  Tenceo.  A  todos  fallava  ;  e  aos  mais  atnigo^ 

com  mais  receio ,  porque  primeiro  os  via  com  oa 

olhos  da  desconGanca ,  que  com  oa  da  alkeia  con- 

Yasiencia.  —  Assim  procedia  cauteloso  Joao  Fer- 

nandes  Vieira ,  at6  que  recorrendo  um  dia  a  Deos 

n*uma  fervorosaoracao,  recebeo  uma  especie  d'ina- 

pira^ao  que  o  incheo  dc  novo  espirito,  e  determi- 

nou  a  entrar  na  empreza  mais  livremente.  Para 

se  asaenhorear  dos  aoimos ,  come^ou  por  dar  em 

sua  casa  muitos   e  repetidos  convites;  e  sobre 

meza  se  praticava  no  procedimento  do  HoUandez 

seifapre  tyranno  ,  da  oppressao  em  que  viviao  os 

Portuguezes,   alargando-se   com  industfia  Joao 

Fernandes  Vieira  sobre  os  desejos  da  liberdade; 

ohegava*se  a  discorrer  sobre  os  meios  necessarios; 

e  apalpada  a  penuria,  acabava  em  desmaios  a 

prdtica :  sagacidade  com  que  o  discrelo  varao,  com 

a  falia  do  necessario  (que  simulava),  accendia  em 

todos  o  desejo  do  remedio ;  e  assim  se  alegrava  de 

confaecer  que  tendo  da  sua  parte  as  vontades,  o(}e- 

recendo-lhes  cabedal  e  armas^    acharia  comsigo 

OS  bracos  de  todos.  Desembarcdra  no  Arrecife  em 

SeUembro  de  1644  o  tenente  gaieral  Andr^  Vidal 

de  Negreiros,  em  companhia  do  P.  Me«tre  Fp. 

Ignacioy  religioso  de  Sao  Beuto,  que  vi^rao  a  Ba- 

hia  a  visitar  sens  parentes  que  ahi  tinhao«  Ck)m 

este  pretexto,  que  nao  era  suspeito  ao  HoUandez, 

obliverao  licenca  para  irem  visitar  Joao  Fernandes 

VJeira  »o  seu  engenho )  forao  reccbidog  com  tftnta 


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GAiTUOlO  lORUMK  199 

atogfia  e  magttificeiicia  cono  ae  forao  espei^adoi* 
Abri<>-0e  com  eUes,  nio  boi  se  por  oonfiatiqa »  le 
pw  obedieocia;  ^  que  da  secreta  commimica^iia 
reaultou  tomarem  oa  dous  hotpedes  o  pulse  aa 
«atado  da  terra^  notando  com  diaiimula^o  e  das* 
tre$a  o  poder,  a»  forlifica^oes,  a  disdpliua  e  o 
nuiMTo  da  gento  que  o  ioimigo  tinba ;  08  quaei 
acharao  as  fortifica^oes  dennanteladas ,  a  discipliua 
esquecida^  o  uumero  dos  soldados  dumuuto,  e  a 
vigUfiucia  adormecida;  occastouado  tudoda  ausen- 
cia  do  conde,  da  sujetcao  dos  moradores ,  da  so« 
berba  dos  domioaiites,  e  dos  favores  da  fortuna. 
YoUaiio  para  a  Paraiba  o  teneuta  e  o  religioso ,  e 
por  elles  escreyeo  Joao  Feraandes  Yieira  ao  gQ« 
veruador  do  Estado  Antonio  Telles  da  Silva,  dan«> 
do«lhe  eonta  das  oausas  de  sua  resoluqao ,  e  doa 
motivos  que  o  movlao  a  conuneter  uma  eiiiprea% 
que  na  estima9ao  de  todos  parecia  too  didicU  ^  mas 
que  eUe  julgava  possiyeli  uma  vez  que  eUe  govei^-* 
nador  Ihe  nao  Cultasse  com  o  socoorro;  proleatava 
dianie  de  Deos  e4os  bomens  invocar  o  auxilio  exp 
tranhoy  se  tbe  faltasse  o  proprio ;  e  dava  fira  i  oarta j 
pedindo  com  brevidade  a  resposta,  para  que  a  Uiw 
dan^  nao  fizesse  inutil  a  diligencia. 

XIV.  Meste  tempo  se  aquartellava  P,  Antouia 
Philippe  Gamarao  com  os  seus  Indies  na  eampa- 
nha  de  Sergipe  d'El  Rei  ( como  deixamo*  dito), « 
quern  Joao  Fernandes  Yieira  f  por  carta  sua,  pe^ 
dia  o  socoorresse^  pois  o  custumava  faxer  Quelle* 
moradores  em  todas  suas  afflicfoes;  e  nas  que  oa 
amea9avao  o  devia  executarcom  mais  zelo,  porque 
de  seu  auxilio  pendia  o  remedio,  eu  a  perdi^ao 


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90a  GABTRIOTO  ttnTANO. 

de  todm,  A  mesma  negocia^o  tez  com  o  gotw-* 
nador  doa  Minas  iknrique  Dias;  que  naquelle 
tempo  assisiia  no  sertao  com  sen  terco  a  castigar 
uma  rd)eliao  do  gentio.  Nao  se  e9queeeo  de  dar 
conta  de  sua  valorosa  determinacao ,  e  das  razoes 
d'ella  a  seu  Rei  e  senhor  D.  Joao  IV,  manifes- 
tando-lhe  por  extenso  a  necessidade  que  o  obri- 
gava  tao  Tiva  e  tao  apertada ,  que  ainda  a  mesma 
calumnia  Ihe  poderia  escurecer  a  justi^a,  nem  re- 
provar  a  deliberacao :  e  que  nao  podia  haver  lei 
que  rompendo  os  foros  da  natureza  y  obrigasse  a 
elle  governador  do  Estado  as  observancias  da  obe- 
di^icia.  —  Recebeo  o  governador  do  Estado  a 
carta  de  Joao  Femandes  Vieira ,  e  com  a  leitura 
d'ella  ficou  indeciso  entre  a  obediencia  e  a  impor- 
tancia;  entre  a  justica  e  a  difficuldade;  supposto 
que  se  Ihe  representavao  maiores  empresas,  que 
muitas  vezes  venc^a  a  desespera^ao,  e  que  a  vio* 
lenda  da  oppressao  arma  contra  si  mesma  o  irrepa- 
ravel  impeto  da  liberdade.  Se  consultava  o  negocio 
com  o  seu  valor ,  saia  decretado  o  soccorro ;  se  com 
as  ordens  que  tinha  de  seu  Rei ,  saia  definida  a  es- 
cusa.  Nesta  incerteza  the  propoz  o  discnrso  um 
meio  honesto  para  a  observancia^  e  util  para  a 
contingencia ;  o  uso  doqual  o  absolvia  da  obedien- 
cia e  da  impiedade.  Mandou  escolher  duas  iropas 
de  soldados ,  de  trinta  homens  cada  uma ,  cujo 
valor  e  disciplina  os  tiraria  a  salvo  de  quakpier 
fbrtuna.  A  cada  partida  nomeouseu  capitao  :  estes 
forao  Paulo  Velozo,  e  Antonio  Gomes  Taborda,  e 
por  cabo  de  ambos  Antonio  Diits  Cardozo^  a  quern 
instruio  no  que  devia  obrar,  regulqndo-ihe  as  or« 


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d«M  pelo^€8(ado  dag  cousts;  e  com  prMeko  qoe  se 
nao  podesse  disuadir  a  empreia »  seguiMe  a  obftii* 
Bt^o;  em  tudo  sabordinado  ao  dictame  de  Joaa 
.Fefnandes  Yieira ,  a  quern  mandou  dizer  de  pala* 
vra^  que  na  balanca  do  conseUio  peaasse  sua  de- 
termina^ao,  para  que  na  execu^ao  se  nao  faltasse 
ao  serri^o  de  I>eos  e  d'El  Rei ,  certo  de  que  s6 
neste  caso  o  acharia  prompto  para  faTorecer  os  mo- 
radores.  —  Neste  mesmo  tempo  respondeo  D.  An« 
tonio  Philippe  Gamarao  a  Joao  Feraandes  Yieira, 
dizendo-lhe  que  s^n  dilacao  se  puoha  a  camiuho 
eom  o  sell  (erco ,  primeiro  a  obedecer  ao  gosto  que 
aempre  tivera  de  o  servir;  e  logo  ao  interesse  que 
alcan^ava  em  o  ajudar  em  tao  gloriosa  empreza ; 
e  desde  alii  Ihe  r^idia  as  gracas  da  parte  que  aella 
Ihe  queria  dar.  Quasi  nos  mesmos  termos  respon- 
deo o  governador  dos  Minas  Henrique  Dias,  e  logo 
se  poz  em  marcha. 

XY.  No  mez  de  Dezembro  d'este  anno  chegou 
Antonio  Dias  Cardozo  ao  reeoncavo  de  Pemain-« 
bucoi  com  ditosa  riagem ,  porque  nem  foi  sentido, 
nem  Ihe  faltou  soldado.  Fez  logo  aTiso  a  Joao  Fer- 
nandes  Yieira,  o  qual  o  festejou  com  alegre  alvo- 
roco  eprudente  eautella;  com  estadeterminoudia 
e  sitto  para  se  avisiarem ,  furtados  a  quaesquer 
outros  oihos.  Conferirao  com  breridade  o  peso  do 
negocio,  a  importancia  do  segredo,  a  ulilidade  da 
prevencao^  em  obzequio  da  qual  mandou  Joao 
Femandes  Yieira  aposentar,  e  prover  de  todo  o 
necessario  a  Antonio  Dias  Cardozo ,  com  os  capi-- 
lies  e  soldados  de  sua  obedieneia,  num  lugar  se- 
guro  e  bem  aprovisi(Hiado»  ContinuArao  as  entre- 


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209L  GAflnmO  WKUMK 

vistaflf  e  cooriiirio  ambos  em  que  se  maadMient 
quatro  9oldado8  igualmente  animosos  e  ocmGdenlea 
ao  govemador  do  Estado^  para  que  da  sua  parte 
o  ioformasaem  de  tudo,  pedindo-Ihe  ao  oiesmo 
tempo  que  com  toda  a  brevidade  os  provesae  d'ar* 
maa  e  muni^oes,  para  estaremprevenidoapara  todo 
o  acontecixnento.  Acreditarao  o  recado  com  carta 
simulada  e  auccinta. 

XYI.  Estimulado  Joao  Feruaades  Vieira  do  de- 
sejo  de  ver  lifres  aqu^Ues  poros  do  imperio  hol- 
laadeZ)  e  conhecendo  que  era  neeessario  commu- 
nicar  o  segredo  a  alguns  confidentes  para  dar 
come9o  &  empreza ,  mandou  chamar  Antonio  Dias 
Cardozo  para  urn  iugar  occulio,  perto  de  seu  en* 
genbo  de  Sao  Joao  Baptista ,  e  conferio  com  ello 
spbre  o  modo  de  o  fazer ,  e  se  separArao  preveni- 
do8  para  qualquer  incidente  que  aobrcviesae*  — 
Como  Joao  Femandes  Vieira  castumava,  como 
havemos  dito,  convidar  muitas  vezes  ajuntar 
graade  numero  de  seus  amigoa  j  aproTeitou  este 
expedieate  para  Ihes  communicar  a  sua  reaolucao. 
Sentarao*se  &  meta  oa  convidados  j  bem  alheios  do 
prato  que  os  esperava,  e  por  ultima  iguaria  se 
abrio  oom  todos  descobrindo-lhes  seu  intento »  e 
o  que  de  sua  nobreza  e  de  seus  espiritos  queria» 
com  similhantes  razoes  :  «  0  vinculo  do  sangue  e 
»  a  oonQanQa  da  amizade  noa  ajuntou  aqui  todoa 
»  OS  queestamos  presentes;  duplicadas  razoes  para 
»  me  nao  enganar  em  meu  conceito  :  justificado 
n  para  nao  desconfiar  do  segredo  ( quando  nap  bas« 
»  tira  ser  a  importancia  de  todos))  nao  o  faz  aUieio 
»  (juem  ao  seu  wasmo  sangue  o  tia;  new  o  H^ 


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»  iercairo  quern  o  communica  ao  aoftifo j  e  teaho 

»  por  certo  me  nao  sai  do  peito  tendo  nelk  parte 

»  pfMoaa  taato  de  raeu  cora^o ;  nelle  arde  o  fogo 

»  do  bem  commum,  desde  o  primeiro  dia  qua  o 

ii  inimigo  ae  fez  eeohor  de  nossaa  fazendas  j  e  de 

»  ttossas  liberdade^;  cresceo  o  inceiidio  com  as 

»  oppresaoesy  cevando-ae  o  fogo  na  continua^o 

»  das  tyraunias,  e  no  exces$o  das  iojurias  feitaa,  nao 

»  96  aos  bomeos ,  aenao  tambem  a  Deoi  y  de  ma- 

D  neira  que  nao  pod^ra  reprimir  tauto  tempo  as 

»  labaredas  se  uao  miti^ra  a  esperan^a  de  se  tro« 

»  car  a  fortUDa;  nap  perdendo  de  vista  as  promes^ 

»  sas  que  me  faziao  tantoa  soccorros  e  armadas, 

y>  quantas  malogrou  nossa  desgrafa,  mostrando^ 

»  nos  a  experiencia,  o  alimentar-se  a  ruina  das 

»  esperan^as  do  remedio ;  consideraqao  que  me  fa<« 

»  zia  en  tender  I  obrar  mais  em  nosso  damno  a 

»  propria  culpa,  que  a  alheifi  forca^  pois  via  que 

»  OS  mesmos  elemeotoa  se  punbao  da  parte  dos 

»  contrarios.  Agora  t}ue  ja  o  custume  da  sujei^ao 

»  nos  tem  esquecidos  do  que  somos ,  que  nao  es« 

>i  tranhamos  a  miseria  de  captivos ,  e  que  o  Fla- 

*  men^o  nos  domina  com  desprezo  (  on  porque 

»  nos  Julga  mortos  para  o  sentimento  y  ou  porque 

>»  nos  avalia  inhabeis  para  a  vinganca ) ;  agora  qfie 

»  funda  0  seguro  de  seu  imperio  no  descuido  de 

»  nossa  liberdade^  nao  desaUento  a  conservacao  de 

»  suas  forQasy  que  presume  sobejas  as  armas,  inu« 

>)  teisos  presidioa,  superfluos  os  soldados;  infe- 

»  rindo  de  nojsso  abatimento  a  estabiUdade  de  aeu 

»  doounio  J  agora  digo  que  j4  nao  posso  dissimu- 

D  Iftr  mais  tempo  cow  ^  cbama  <^e  mc  {ibr^W  9 


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20&  CAsmoTo  umiTAifa 

»  rtcao  ha  tentos  annos  ( digo  que  nao  hateii 
»  animo  portugez  a  onde  por  tantas  razoes  nao 
n  considere  retratado  o  mesmo  desassocego).  Bus- 
»  quemos  nas  armas  as  domonstraeoes  dos  animos, 
»  se  i  que  cadaum  deseja  deitar  de  seu  pescoco  <ao 
»  infame  jago ;  cobremo-nos  da  afironta  com  a  re- 
»  solucao ;  saiba  o  mundo  que  o  soffrimento  em 
»  n68  foi  ardil,  e  nao  vileza.  A  paciencia  volun- 
»  taria  6  lustrosa  virtude;   fbrcada  6  escraTidao 
»  senril.  Nunca  nos  podera  condemnar  abatidos 
»  quern  souber  que  csperamos  tempo  opportund 
J)  para  bos  desforcar  vingados.Com  lastimoso  grito 
n  chama  por  nosso  bra^o  a  dor  de  tantos  insult os, 
»  affinontas  e  injusti9as ,  como  temos  padecido ; 
n  nao  damos  passo  que  nao  ponhamos  os  pfe  sobre 
»  o  sangue  das  feridas ,  sobre  as  cinzas  dos  incen- 
»  dios,  sobre  as  sepuUuras  dos  mortos,  sobre  as 
»  pedras  das  minas ,  e  sobre  as  brasas  das  inj  arias, 
»  com  queainsolenletyrannia  d'estes  verdugosnos 
»  tem  quasi  consummidos.  Nao  havera  parte  em 
))  que  nossos  olhos  nao  vejao  vivos  os  siguaes  dos 
»  aggravos;  e  nao  ha  vera  hora ,  em  que  deixem  de 
»  nos  refrescar  a  memoria  das  offensas.  Nao  ha 
n  entre  n6s  algum  que  se  possa  gabar  que  a  for- 
»  tuna  o  isentou  da  sorte  de  todos.  Qual  houve  tao 
»  singular  na  dila,  que  nao  ou^a  em  sua  casa  os 
»  gemidos  da  magoa ,  ou  ferido  na  honra  ,  ou  las- 
»  timado  na  fazenda  ?  E  qual  podera  haver ,  que 
»  naodeseje  destruiros  ag^ressores  de  seu  damno? 
>  Quem  a  tanta  adverteneia  se  nao  der  por  enlen- 
»  dido  passara  de  racional  a  bruto ,  e  de  sensitive 
»  a  insensivel;  reduzido  por  sua  mesma  pusilani* 


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GA8T1I0T0  LUSlXAIia  305 

»  midade  ao  ultimo  esCado  da  miseria?  Que  fado 
»  nos  acobarda  ?  que  sombras  nos  atemorlzao?  que 
»  discursos  nos  alheiao  7  Uma  vil  canalba  alimen- 
»  lada  de  sua  mesma  perfidia,  cuja  espada  uao 
»  corta  senao  com  os  Cos  da  traicao  ?  Pois  que  re- 
»  ceamos  perder  a  fazenda  ?  £  qual  de  nos  deixara 
i»  de  a  perder ,  se  com  o  sen  braco  a  nao  libertar  ? 
»  Nao  fica  mais  ganhada,  perdida  pela  honra^  que 
9  dada  pela  infamia  ?  Que  nos  ata  as  maos  ?  0 
«  amor  da  familia  ?  Nao  estara  mais  segur  a  avida 
»  dos  parentes  em  uma  morte  fiel,  que  em  uma 
»  companbia  herelica.  Abramos  os  olhos,  e  da- 
D  ramente  veremos  quanto  melbor  nos  esCa  o  mor- 
9)  rer  pela  liberdade  da  paM^ia,  que  o  viver  na  pa- 
i>  tria  sem  liberdade.  A  restauracao  do  reino  nos 
»  provoca  com  oexemplo ;  a  doMaranhao  nos  avisa 
»  com  o  sucoesso,  a  onde  tao  poucos  olH^arao  tanto 
n  que  sopeArao  a  tyrannia  de  muitos ,  e  que  sem 
»  prevengoes  arrisco,  quero  que  teuhao  vossas 
»  mercte  entendido  o  que  aobre  a  maleria  t&aho 
»  cd)rado.  Dei  conta  da  minha  determina^o  i 
»  Bahia»  a  Henrique  Dias,  e  a  D.  Antonio  Pbi- 
H  lippe  CamaraOi  e  entendo  que  a  todos  acharei- 
»  mos  favoraveis;  e  ji  eutre  nos  esta  o  eapitao 
»  Antonio  Dias  C^rdozo  com  sessenta  soldados  os 
9  mats  d  elles  ofiGk^iaes  reformados,  tao  destros  e 
»  tao  Talorosos ,  que  podem  ser  cabos  de  gnindes 
»  eaercitos,  e  alegrem-se  vosas  merc^,  que  nao 
»  pode  haver  cousaconcernaite  &  ezpedl^ao  da  em* 
^  preza  que  nao  tenba  prevenido  meu  cuidado, 
»  porque  ha  muitos  annos  que  estudo  na  direc^o 
n  d'este  negocioy  sem  outro  motiTO  mak  que  o  do 


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i06  €A8TRIdT0  tOSITANO. 

»  bem  commum;  o  que  nao  podera  duvidar  quern 
M  sabe  o  que  a  dita  me  favorece ,  e  quanto  o  ini- 
>f  migo  me  respeita ;  e  que  pelas  leis  da  uatureza 
»  e  da  fortuna  tenho  mais  resoes  para  estimar  a 
H  vida  que  todos  quantos  a  estimao  jnais.  » 

XVII.  OuTirao  todos  eom  muita  attencao  as  ra- 
Eoes  de  Jao  Fernandes  Vieira,  mas  em  cada  urn 
d'elles  produzicao  differenles  efifeitos,  segundo  que 
cada  um  estava  mais  ou  menos  disposto  para  tao 
arriscada  «mprezii;  e  concluirao  em  que  queriao 
ver  e  fallar  com  o  capitao  Antonio  Dias  Cardoso ; 
em  quanto  porim  ao  segredo  todos  o  promett^rao 
e  jur4rao;  e  a  elles  Joeo  Fernandes  Vieira  o  com- 
primento  do  desejo*  assentando  com  lodoa  que 
ao  outro  dia  se  achassem  em  o  sen  curral  de  Igi- 
pto  k%  nove  para  as  dez  horas  da  manha;  mas  com 
advertencia  que  fossem  separados  por  nao  darem 
mottvo  a  discursos  cttriosos^  nem  occasiao  a  sus- 
peitas  malcTolas  de  quern  os  Tiase  ir  de  conserva 
para  aqudla  parte.  Dedpedfrao-se  cada  qual  para 
sua  casa  •  e  Joao  Fernamdes  Vieira  dedpedio  um  pro- 
prio  a  Antonio  Dias  Gardozo^  .com  aviso  de  que 
em  oerto  lugar  se  vissem,  porque  tinbao  quecon- 
ferir.  Deo^lhe  a  vista  meuda  conta  do  que  se  hflvk 
passado^  e  do  que  tinha  entendido ;  informou-o  do 
iugar  e  da  bora  em  que  o  bamo  de  husdir  ao  ou- 
tro dia ;  e  instroido  de  como  se  havia  de  portar,  se 
aparlarao,  cada  qaal  para  oseu  domietlio.  Ao  ou- 
tro dia  nao  falt&riio  os  convtdados  com  animoa  tao 
diflerentes  como  erao  as  pessoas.  Cbegouo  capitao 
Antonio  Dias  Cardozo ,  ao  qual  receMrao  cortezes 
^artliiiirodMr  Logo  Ibe  pedirio  que  eom  toda  a  Ter* 


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CASTWnO  UJtRAHO.  307 

dade  e  com  toda  a  confiail^  deolaraise  a  causa, 
que  o  ha  via  traztdo  a  Bahia,  a  taa  distante  lugar, 
e  com  segredo  tao  estranho.  Anionio  Dias  Cardozo, 
qua  sobre  entendido  estava  indmtriado ,  Ihes  re»- 
pondeo  seguro  e  discrete ,  que  o  motivo  que  o  alii 
truxera  era  o  servico  de  Decs  e  dos  moradores 
d'aquellacapitania;  que  a  causa  que  o  detinhaera 
obediencia  que  devia  as  oixiens  de  seu  superior 
Antonio  TeUes  da  Silva ,  govemador  do  Estado ,  e 
o  gosto  de  servir  a  Joao  Fernandes  Vieirai  a  quein 
Ibe  ordenara  de  aBsistir  na  empresa  que  intentava ; 
exhortou-oseuergicamenCe  a  que  se  unissem  iiquelle 
grande  varao  part  expulsarem  o  ioimigo  que  os 
opprimiai  e  ooncluio  dizendo  :  «  DesembiiolM^ 
»  mos  a  espada,  advertindo  que  defender  as  hon- 
»  ras  e  as  yidas  deairo  de  nossa  mesma  t^^a  6 
n  pdejar  oom  armas  dobradas;  que  6  proprio  dp 
o  valor  medir  as  for9as  pelas  causas.  h  —  Suspen- 
80B  e  arrebatados  de  dirersos  peosamentos  ouvirao 
todos  ao  capitao  Antonio  Dias  Cardozo ;  e  alguns 
por  mais  temerosos  ou  por  menos  fieii  come^rao 
de  ponderer  as  difficuklades  que  se  apresentavao 
para  execufao  de  iio  grande  eaq>reca,  insistindo 
pftncipaloiente  sobre  os  luccessos  passa^os,  e  os 
poucoe  Qieios  que  tinhao  para  sustenlar  a  luta^  qu^ 
Uiesparecia  temeraria  e  por  venturalouca*  Cortou- 
Ibes  Antonio  Dias  Cardozo  o  discurso,  dizendo-lhes 
q[ue a  fortuna  tern  suas  idades^  e  que  tambeoi  che- 
ga  a  ser  vdha :  ponderou-^lhes  o  estado  de  abondono 
era  que  se  adMvao  as  fortifiea^oes  dos  HoUande* 
aes;  oook)  sm  HuUcia  bavia  perdido  a  dtsciplina, 
a  WBHQ  ocoopados  de  meroaocia  nao  curavao  da 


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SOS  GASmOlO  LUSTTAKa 

defimsa ;  mostrou-lhes  os  meios  que  tinhao  para 
executar  a  empreza,  dizendo-ihes  :  «  0  que  agora 
»  importa  para  conseguirmos  este  desejado  fim  i 
»  dar8e4he  logo  principio  j  escolh^ido  e  nomeando 
]>  d'eiitre  luis  pessoa  que  nos  goverae,  e  caboe  que 
»  nos  ajudem  a  prevenir  a  gente,  e  tudo  o  mais 
»  necessario  para  a  faccao.  Para  vossas  mercte  e 
»  para  os  moradores  i  toda  a  coDveniencia  do  ne- 
»  godo;  e  para  todos  nos  importante  a  observancia 
»  do  segredo  :  com  elie  asseguramos  a  empreza; 
n  sem  elie  nos  ^tregaremos  a  ruina;  eu,  e  mens 
}}  soldados  com  menosreceio,  vossas  merc^  com 
»  maior  perigo.  »  Applaudirao  todos  a  disposi^o; 
com  alvoroco  approvarao  o  conselho;  e  como  se 
todos  no  interior  estiverao  conformes  como  no 
exterior  y  em  uma  voz  unidos  adamarao  a  Joao 
Femanded  Vieira  por  govertiador  e  gaieral  da  em- 
preza,  jurando-lhe  obediencia,  (6  e  segredo;  mui- 
tos  com  animo  sincero^  nao  poucos  com  traidor 
cora^ao. 

XYIII.  Ainda  nao  erao  pa3Sftdos  tres  dias  depois 
d'esta  entrevista,  quando  leaes  e  perjuros  em  urn 
corpo  e  com  o  mesmo  semblanteconcorr^rao  a  casa 
deJoaoFemandesVieira,dizendo-lhecorao  o  Hol- 
landez  estava  informado  de  tudo  quanto  no  mato 
se  tratira,  e  das  pessoas  que  se  ach&rao  presentes. 
AccusaTao  a  perfidia  do  traidor ,  dando-se  o  mais 
culpado  por  mais  offendido ;  sendo  o  excesso  da 
queixa  a  que  melhor  descubria  a  cara  ao  antor  da 
traicao.  Nao  se  alterou  com  successo  tao  novo  o 
discrelo  e  animoso  varao,  tanto  porque  o  tinha 
previsto,  como  porque  nenhum  caso  o  sobresal- 


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CASTRIOTO  LUSITANO.  209 

tava.  Dissimulou  Joao  Fernandes  Vieira ,  f^u  a 
todos  com  animo  firme  e  resoluto,  dissuadiodo-os 
do  m^o  qneaflectavao;  e  aos  que  se  ofFereciao  para 
n^ociar  com  o  conselho  supremo  urn  passapbrte, 
para  que  Antonio  Dias  Gardozo  saisse  da  campa- 
nha  com  toda  sua  gente,  respondeo  :  «  0  capitao 
Antonio  Dias  Gardozo  6  tao  destemido,  e  lao  bem 
disciplinado,  que  primeiro  perdera  mil  vidas  que 
chegue  a  faltar  no  menor  ponlo  de  sua  honra  ; 
nao   mando,  aconselbo;  desistao  vossas   merces 
do  intento,  ou  fa?a  cada  um  o  que  melhor  Ihe 
estiver.  »  Despedio-os  isento,  e  recolheo-se  con- 
fuso,  mas  nao  atalhado.  — No  dia  seguinte  Antonio 
Fernandes  Vieira  fez  aviso  ao  capitao  Gardozo  de 
tudo  que  se  pass^ra  na  conferencia;  e  do  que  pre- 
sumia  d'alguns,  para  que  a  noticia  o  acauteUasse. 
Quasi  ao  mesmo  tempo  recei3eo  o  capitao  Gardozo 
um  correio  dos  traidores ,   pelo  qual ,  com  dissi- 
mulada  perfidia,  o  certtficavao  que  o  Hollandez^ 
tendo  noticia  de  sua  vinda,  despedia  do  Arrecife 
numerosas  partidas  de  soldados  a  buscal-p^  com 
ordem  de  baterem  todo  o  mato  do  destricto,  e  de 
se  nao  recolherem  sem  a  entrega  de  sua  pessoa;  e 
Ihes  parecia  impossivel  o  escapar  de  tantas  maos; 
que  elles  por  o  livrarem  de  perigo  tao  certo,  se  of- 
fereciao  a  pedir-lhe  passaporte,  e  segura  passagem 
para  Hollands ,  com  todo  o  necessarid  para  a  via- 
gem;  e  Ihe  rogavao  o  quizesse  acceitar,  pelo  que 
a  todos  convinha.  —  Antonio  Dias  Gardozo  rejei- 
tou  heroicamentesimilhantespropostas^  dizendo 
ao  mensageiro  :  «  Dizei  aos  traidores  que  a  sua 
sdeivosia    os   publica    cobardes ;  que  nao  temo 


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310  GASTilOtO  LUHTAlia 

damno  que  nasce  do  medo ;  e  que  roaior  aggravo 
me  faiem  pela  parte  do  offerecimento  que  pek  da 
trai^o;  porque  com   esla  me  julgao  temido,  i 
com  aquelle  me  suppoem  horiradoj  que  similhan*- 
tea  paaaaportea  podiao  swrTir  k  vilexa  de  seas  ani- 
moi,  e  nao  a  mim,  que  tenho  eepada  para  me 
defender  de  traidores  e  d'inimigos;  que  a  dos 
Hollandezes  custuma  cortar  melhor  com  o  amea^o 
quecomoferro;  e  que  com  igual  facilidade  me 
hei  de  livrar  da  fotca  de  una  e  da  infamria  de  ou- 
tros,  dando-uoa  o  tempo  occaaiao  para  que  as 
obras  definao  o  ser  das  pessoas.  »  Instou  o  m«i-» 
sigriro  com  desculpas  e  razoes  fundadas  no  medo; 
mas  o  fiel  eapitao  a  nada  cedeo  :  quiz  ainda  re* 
plicar  com  amea^as ;  mas  o  eapitao  insofrido^  e 
comaespada  na  mao,  avan^ou  contra  elle  colerico  j 
vendo  o  que  o  mensageiro ,  aproTeitou-4^  dos  pto, 
e  nao  parou  sgmo  k  yista  dos  aut(M^ea  do  recado ; 
aos  quaes  referio  o  que  no  oapitM  achara ,  e  o 
perigo  etn  que  ae  vira.  Querlaoelles  rcfieCir  a  dili« 
geacta;  porim  o  enriado  o  nao  quiz  faz^  a  todo  o 
pre90,  escusando-ie  com  acertezadeqoe  da  espada 
havia  de  ser  a  resposta. 

XIX.  Conferfarao  osdous  amigos  entre  si  o  estado 
das  cousas^  e  o  renedio  d'ettas;  e  assenlarao  que 
o  mal  nao  bavia  de  obedecer  a  medicamentos  Umi^ 
tivos  J  que  s6  os  yioleutos  poderiao  ter  efficaok, 
para  nao  lavrar  mais  o  "v^eneno.  Convierao  em  que 
seria  aoerto  escrever  Antonio  Dias  Gardozo  a  Joao 
Femandes  Vieira  tima  carta ,  que  podesse  mostrar 
aos  HoUandeEes ,  com  as  seguintes  razoes.  «  Os 
moradores  d*esta  capitania  me  oonrtrang^rao  com 


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CA8TBI0T0  LCSITANO.  211 

imporlunacoes  a  que  tiesse  ajudil-08  na  rebeHiao, 
em  qut  eataTao  conjurados  donira  os  HoUandezes. 
Fiei-ne  em  anas  palaTras  e  fimias,  e  rim  com  tanto 
diaeommodo ,  como  Deos  e  os  meus  soldadoa  sa* 
bem ;  acbei  que  alguna  d'elles,  ou  por  cobardes,  ou 
por  tnddores  aos  seus,  hariao  revelado  ao  HdlaD- 
dez  a  se(;redo,  de  que  se  tinhao  accusado,  e 
trrependido;  sueCesao  pretiato  de  minha  advertent 
da,,  eonsiderando  a  cautelk  com  que  se  g«iai%lft« 
▼«o  de  voasa  niepc^^  pois  sendo  quraci  6  nem  Ibo 
eommunielrao  o  designio,  uem  me  consciHirao.oa 
tearmos  da  cortezia,  e  execucao  do  gosto  com  (pne 
devo  buacar  a  vosaa.mercd,  e  ser^il^-o ;  qne  agora 
Bao  fit99  por  Ibea  mo  dar  occasiao  a  loTantarem 
algum  teslemunho  a  sua  fidelidade,  &  qual  de* 
▼em  06  Eatadoa  tania  fineoa.  Fa9o  esta  carta  para 
reliEcar  i  Tosaa  mereS  sken  amigo^  e  .dap4ha 
couta  em  como  me  voko  para  a  Bahta  com  toda 
a  preaaa,  perqtie  nao  me  eBtreguem  ao  mimig^ 
oe  mesmea  que  o  deterflunarao  entregar  i  minha 
eapada;  e  ae  eata  me  nao  poder  Inrar  de  Iraidoreay 
direi  a  gritoa  os  que  sao,  e  appelarei  de  mmha  de&* 
gra^  para  o  faror  de  Tossa  mercd  ^  qi»  em  todd 
e  temp^  tsti  Hmrecendo  a  quem  Ihe  dere,  com  a 
kaklade  do  trato,  o  maior  reapeitoi  e  por  toda  a 
parte  pvUicarei  o  quanto  tern  de  disereto  quern 
aabe  b»  gralo.  Seos  guarde  a  yossa  raerc6.  v  Joao 
Feratandea  Yieira  depois  de  reeeber  eala  carta,  e 
depoia  de  dar  todas  as  providencias  para  cpie  o 
eapilao  Cardoso  nao  fosse  surprebendido,  teandou 
ebamar  os  eompreh^ididos  na  traicao,  deo*lkes  a 
ler  a  eana^  ooaid  se  cativera  alheio  do  aucccdldo^ 


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212  CASTRIOTO  LUSITANO. 

e  como  espantado  da  novidade^  perguntou  que 
causa  tivera  o  capitao  Cardozo  para  tao  estranho  e 
repentino  acordo,  como  era  o  partir^e  para  a  Ba- 
hiasem  se  despedir  d*elie.  Emmudec^rao  confusos, 
e  dc  todo  OS  deixou  frios  verem-se  arguidos  de 
culpados^  dizendo-lhes  Joao  Fernandes  Vieira  que 
OS  lacos  que  ordtao  a  si  mesmos  03  armavao,  pois 
sabiao  que  mais  credito  havia  de  dar  o  Hollandez  a 
qaalquer  palavraque  elle  Ihe  dissesse ,  que  a  quan- 
tas  elles  jurassem ,  porque  tioha  cabedal  e  animo 
para  gaslar  mais  em  uma  hora ,  que  todos  dies  em 
toda  sua  vida,  contente  de  que  sua  ingratidao  d^ssc 
por  fruto  a  todos  o  desengano  de  sua  rileza ,  pois 
tinhao  tao  abatido  coracao  ^  que  nem  obenefieio  os 
reduzia,  nem  a  honra  os  obrigava.  £  piara  os  des- 
pedir ^  sobre  aflrontados  temerosos^  Ihes  leo  elle 
mesmo  a  carta,  affirmando  que  a  guardava,  para 
que  d'eila  constasse  aos  Hollandezes  quern  os  ag- 
gravava ,  e  quern  os  swvia.  Frustrados  ficarao  os 
mteutos  dos  traidores  com  esta  energica  declara- 
9ao  de  Joao  Fernandes  Vieira  j  que  nao  ousArao 
elles  proseguir  seus  maos  desejos.  Nao  fallarao  tam- 
bem  alguns  do  govemo ,  ou  seguros ,  ou  apaixo«- 
nadoSy  que  hesta  oceasiao  o  avisarao^  tinha  nelle 
muiios  amigos^  enos  moradores  muitos  contrarios 
que  o  calumniavao^  mas  sem  fruto,  porque  nunca 
prevaleceriao  contra  a  opiniao  de  sua  leaUlade.  Nao 
se  namorou  Joko  Fernandes  Vieira  tanto  do  £avor 
que  se  esquecesse  da  cautella ,  porque  experimen- 
tado  e  discreto  fiava  menos  da  sua  fbrtunaque  de 
sua  vigilancia;  «  assim  desde  a  hora  em  que  en* 
tendeo  se  poderia  presumir  sua  determinacao ,  vi- 


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CASTftlOTO  LUS1TA190.  2« 

veo  iao  oirotinspecto ,  que  todas  as  nohes  se  reti^ 
rava  aomato;  assistindo  os  dias  em  sua  casa,  com 
(ieis  seatinellas  ao  largo,  com  cavallo  seUado,  e 
S6US  (^iadoft  prevenidos,  para  que  em  qualquer 
asaalto  servissem  a  resistencia  e  4  fuga.  Se  do  Ar- 
recife  o  budcavao^  com  pretexto  de  amizade^  on 
denegocio,  ou  fallava,  ou  se  fingia  auseute,  s^- 
gondo  as  pessoas  que  erao.  Se  os  do  govemo  o 
mandavao  chamar ,  se  escusara ,  com  promessa  de 
outro  dia,  ou  coma  occupa^ao  de  muitos^  e  nunca 
as  esciisas  faltarao  as  cortezias;  alojando  i^qudfe 
peito  tamanhas  causas  d'afflicdkoy  que  poddra  a 
menor  d'ellas  sufibcar  qualquer  outro  cora^ae. 

XX.  Admirarel  foi  neste  varao  a  prudeucia; 
nunca  alterada  pela  variedade  dos  suceessos :  nio 
menor  o  valor  e  a  dissimulaeao  com  que  tudo  pi«- 
▼k;  mas  sens  receios  comecavao  a  crecer  com  a 
tardanca  do  Camarao  e  Henrique  Kas.  Neste  co^ 
menos  chegarao  os  quatro  soldados  de  volla  da 
Bahia,  que  no  Janeiro  proximo  partirao  de  Feiv- 
nambuco ,  mostrando  na  pontualidade  da  negocia- 
eao  a  causa  da  detenea ;  porque  o  goyernador  do 
Estado  OS  onvio ,  e  despachou  como  se  podia  dese« 
jar;  retificando  sen  animo  na  resposta  das  cartaa, 
que  Joao  Femandes  Vieira  e  Antonio  Dias  Cai^- 
dozo  Ihe  tinhao  escripto;  e  dando«>lhe  escusaa 
detenea  com  a  assistencia  que  na  Bahia  faziao  ao 
propria  tempo  os  embaixadores  flollandezes;  dos 
quaes  daremos  razao  na  seguinte  escriptura* 

XXI.  Comeqarao  os  Hollandezes  a  desconfiar 
que  alguma  eousa  se  tramava  contra  elles ;  em 
cuja  desconfian^a  se  confirmai^o  com  as  decUra- 


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4jM$  qoe  fiiaiio  o$  traidores  da  Miuitflocf  a  de  Anio- 
JHO  E^a  Cardoso  e  doB  iateatoa  de  Joao  Feraandes 
Viuni;  eoofeHrao  eoire  ai  o  eamitibo  por  omde 
ae  poderia  yir  oo  eoBbectmeota  da  c^rteseti  t  aa*- 
Miitafao  em  mandar  ^mbaiimdoFea  a  Babiat  que 
jaam  daiti«sa  e»peculaaaem  o  que  ae  di^;  e  regi- 
iiieDto^  e  para  que  ae  bouv^sem  de  maueira  que  a 
aodOftbra  da  queixa  sobreaaiase  a  lux  da  ?erdade» 
Com  esle  fim  nomearoM)  a  Guilberme  Waodrevol, 
um  do8  coDselheiroa  politkos ,  e  a  Tbeodozio  'E^ 
trater,   comqiendor    da   fortakza  de  Nauretb^ 
com  carta  do  supremo  para  o  governador  Antonio 
Tellea  da  Silva,  cuja  sustancia  se  rewmia  em  ae^ 
xitsar  a  rebetdia  dos  moradores ,  fom^oftada  (  como 
je  affirmava  )  com  o  faTor  de  ana  senboria ;  o  qm 
Huo  podiao  crer  d'um  vaeaallo  d'Ei  Rei  de  Fortu^ 
gaL  -1-0  governador ,  que  tiuha  freacas  noticiaa 
do  que  ae  passavai  respoudeo  que  »e  oa  moradoi^ 
res  se  inquieta  vao^  era  porque  o  trato  da  tyranuia 
oa  aconselhava  ^  e  que  dado  case  que  oa  favors 
ceaae ,  fizera  )  que  devia  ao  fienri^  de  Deos  e  de 
aeu  Rei  I  D  que,  violentado  daobediencia,  uao  faaia. 
O  que  so  Ibei  advertia  era  que  ^  ae  nao  mudavao 
d'estilo,  ataihando  m  exceaaoa,  com  que  apura^ 
ipao  a  pacieacia  doa  naturaeg,  os  havia  de  favoreoer, 
al^  onde  chegaase  a  poasibilidade  de  seu  bra^o, 
perase  libertareat  de  tao  insoffrivel  domiuio;  ainda 
que  soubeaie  que  o  auKilio  Ibe  poderia  eustar  a 
cabe^a.  Ouvida  esla  resposta  ae  despedirao  do  go«- 
▼ernador;  e  depots  d'alguns  dies,  que  tomiraopara 
o  eiiame  da  verdade  ^  sa  voltarao  para  o  Atrecife. 
XXll,  0  tempo  cjue  oa  embaixadorea  ae  detire- 


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GAfiTOOtso  imirAva  915 

rao  iia  Babk  d^ieva  tambem  o  governador  o$  qn*- 
tro  WYiados  de  Joao  Forodndeft  Vieira,  como  fica 
ditoy  a  onde  TheodoEio  Estrater  eapreitou  occaiiao 
opportuoa  para  ^eoreU  audieneidi  que  o  govafw 
nador  Ihe  deo ,  na  qual  Ihe  disse  que  era  catboUeo 
romano,  e  eomo  tal  aborrecia  os  Hollandezea,  que 
oa  servia  por  ueeessidade,  que  o  seu  desejo  fora  aem- 
pre  de  servtr  um  priucipe,  que  para  nenbum  tiuha 
tauta  mcliiia9ao  como  para  o  senhor  Rei  de  Portu- 
gal Dom  Joao  lY ;  e  concluio  por  dizer  que  ae  elle 
gaveruador  determinava  a  recupcara^o  dePeraaov- 
bucoy  que  Ib'o  declaraaae,  porque  sendo  este  aeu 
disiguio,  elle  abriria  a  melbor  porta  para  a  res^ 
.taura9ao.  Eotre  perauadido  e  deicoufiado  ouvio  o 
govemador  a  Tbeodosio  Eatrater,  eutendendo  que 
sua  proposta  igualmeute  podia  aer  ardil  da  mali^ 
cia^  e  efimto  da  deliberacao;  e  por  uao  perigar  nos 
estremoa,  redpoodeo  que  eUe  da  sua  parte  estimava 
a  boiura  que  fazia  a  na^ao ,  e  que  a  sua  Magestade 
informaria  o  quauto  devia  a  seu  desejo ;  mas  que 
de  preaeute  uem  teuQao,  uem  ordem  alguma  tiuha 
para  fazer  guerra  ao$  vassalloa  de  Hcdlandai  antea 
preceito  de  conservar  a  paz;  por^m  que  se  por 
algum  aceidente  $e  alterasae  o  estado  das  cousat, 
Ihe  faria  aviso,  eseaproveitariadetaobomamme. 
De$pedk)-<fie  contente,  e  navegarao  satisfeilos  ;  um 
porcpie  se  tiuha  declarado ;  outco  pelo  que  tinha 
entendido;  ambos  cbegaraa  ao  Arrecife,  e  uelle 
desimagioirao  aoa  goveniadorea  e  poYo  doe  receioa 
que  tinbao  da  guerra. 

XXIII.  Neate  tempo  despachou  o  govemador  oa 
enviados  de  Joao  Fernaudes  Vieirai  dos  quaes  ea- 


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Vi6  CASTRIOTO  LCSlTAieO. 

<a^?eino8  ja  a  chegada  a  Pernamkico,  a  que  foi 
em  10  de  Maio  de  1645.  Pelos  ditos  enviadosman- 
dau  o  govemador  dizer  de  palavra  a  Joao  Fernaiv- 
dee  Vieira  e  Antonio  Dias  Cardozo,  que  eslivessCTii 
certos  de  que  Ihes  havia  de  assistir ,  e  a  todos  os 
moradores^  com  animo  e  forcas,  em  case  que  os 
Hollandeies  persistissera  em  oa  affligir  e  tyrannizar  ; 
e  de  secreto  escreveo  a  um  e  outro.  O  que  as  cartas 
continhao  me  nao  veio  a  noticia ;  e  nos  referimos, 
e  nao  advinhamos.  Com  os  enviados  se  partirao  al- 
gumas  tropas  d'aventureiros,  que  voluntariamente 
OS  quizerao  seguir  ,  no  que  o  govemador  se  liouve 
neutral  j  so  mandou  vir  diante  de  sios  cabos  d'elles, 
e  Ihes  encarregou  o  bom  trato  e  disciplina  dos  sol- 
dados,  que  levavao  furtivos,  como  genie  do  Es* 
lado ;  e  dissessem  da  sua  parte  a  Joao  Femandes 
Vieira  que   quando  nao  pudesse  soffrer  o  daro 
jugo  dos  Flamengos  ,  levasse  a  diante  o  intento  da 
liberdade,  e  o  disposesse  com  o  valor  c  prudencia, 
que  d'elle  esperava;  e  que  brevemcnte  acharia 
comsigo  o  soGCorro ,  que  Ihe  tinha  pedido.  Com 
estes  recados  Ihe  chegon  tambem  aviso  cerlo  em 
como  Henrique  Dias  e  o  Camarao  se  tinhao  partido 
em  soccorro  dos  moradores,  havia  jA  muitos  dias, 
e  que  o  nao  terem  chegado  era  culpa  do  tempo ,  e 
da  marcha ,  que  por  causa  do  dominio  hoUandez 
forao  obrigados  a  fazer  pelo  interior  do  mato,  a 
fim  de  se  esconderem  as  noticias  doinimigo.  Ale- 
gres  deixdrao  a  todos  os  confidentes  as  boas  novas, 
e  a  vinda  dos  soldados  aventureiros ,  que  chegArao 
neste  Maio ,  e  forao  alojados  na  mata  de  Joao  Fer- 
nandes  A  leira,  cam   segredo  e  ordem  que  eslives- 


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CASTRIOTO  LUSlTAm.  117 

sem  it  ^bediAeift  <te  Antonio  Dias  Cardozo,  a  qu^n 
apertadamente  encarregou  a  Tigilancia  e  a  cautela ; 
em  quanto  elle  Joao  Femandes  Vieira  tomaTa  por 
sua  conta  os  avisos  de  todos  os  nio?imentos  do 
HoUandez. 

XXIV.  Informado  Joao  Femandes  Vieira  das 
disposicoes  que  tomava  o  Hollandez  para  mandar 
degoHaros  mancebos  de  quinze  atrinta  e  cinco  an- 
nos,  se  determinon  em  nao  esperar  mais  tempo 
para  se  p6r  em  campo.  Conferio  a  resolucao  e  os 
nieios  com  aquelles  amigos  que  podiao  dar  volo  na 
materia;  e  assentarao  que  snppostas  as  ordens  do 
governador,  se  nomeassem  capitaes  por  todas  as 
freguezias  sujeitas  ao  dominiohollandez,  para  que 
desde  logo  livessem  a  gente  allistada  e  prompfa. 
Fez-se  memoria  dos  homens  nobres ,  fieis  e  deste- 
midos  de  cada  uma  das  parroebias ,  e  d*elles  esco- 
Iheo  Joao  Fernandes  para  capitaes  os  que  parecdrao 
melbor,  temettendo-lbes  patentes  e  ordens  do 
que  haviao  de  obrar.  —  Em  Ipojuca ,  criou  capi- 
taes a  Amador  de  Araujo^  e  a  Thom^  Teixeira ;  no 
cabo  de  Santo  Agostinhoa  Antonio  de  Castro,  Joao 
Paes  Cabra))  e  Joao  Gomes  de  Mello ;  na  Moribeca, 
a  Joao  Scares*  d' Albuquerque,  e  a  sen  irmao  Joao 
Leitao  d* Albuquerque;  em  Iguaracu,  a  Joao  Lou* 
renco  Francez,  e  a  Manoel  Pereira  Corte  Real ;  em 
Sirinhaem,  a  Alvaro  Fragoso  d'Albuquerque;  na 
Goyana  ,*  a  Goncalo  Cabral ,  e  a  Estevao  Feman- 
des ;  na  Paraiba ,  a  Francisco  Gomes  Muniz ,  e  a 
Lopo  Curado  Garro  ,•  em  Sao  Laurence ,  a  Manoel 
Scares  Robles,  a  Cosme  do  Rego,  a  Joao  Nunes 
da  Mata ,  e  ao  l\  Simao  de  Figueiredo^  qtie  de** 


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3$8  C^mOftQ  UnUTAVO. 

ppi«  de  mititar  omitoft  annos  ^  ondeaou ;  na  Yai^ 
^a,  a  Fraaoisco.Bereqguer  de  Andrada^  a  Antonio 
Bez^rra  p  a  Joao  Nune3  Victoria  ^  a  Antonio  Bor*- 
f^y  e  a  Antonio  da  Silva  por  capitao  de  cavaUoe; 
e  supposto  que  na  dita  Varzea  nomeou  outros  ca- 
pitae«  (todos  neceasarios  pra  o  numero  da  gente) 
fazemos  inemoria  doa  fieis  qua  a  vilaia  do.traidor 
jgualmente  priva  do  nome  e  da  honra«  Na  fregua- 
zia  de  Santo  Amaro  nomeou  a  Tbom^  da  Costa; 
na  do  Porto  do  Calvo,  a  Chriatovao  Linos;  na  do 
Rocio  de  Sao  Francisco,  a  Valentim  da  Rocha.  A 
.  todos^  e  a  cada  um  em  particular  mandou  instruct 
eoes  do  quehaviao  de  fozer  j  assimem  alistar  gente, 
como  no  tempo  e  no  modo,  que  elles  observirao 
com  zelo  e  acordo,  Dentro  do  Arrecife  adquirio  e 
conservou  tres  homena^  a  poder  de  dadivas^  que 
Ihe  davao  aviso  de  tudo  o  que  determinava  o  Hol- 
landei;  podendo  com  ellas  mais  o  interease  que  o 
.  perigo. 

XXV.  Com  estas  preven^oes  ae  £8kcilitira  o  ne- 
gocio  ( f undada  toda  a  esperan^^a  no  secreto  intento 
de  Joao  Femandes  Vieira),  se  o  rigor  daa  invenuH 
das  com  adila^ao  do  tempo  nao  destruira  os  meios 
que  tinha  escolhido  a  industria ,  e  approvado  a 
confianca ;  erao  aquelles  dependentes  d*uma  occa- 
aiao  apparente  e  konesta,  que  obrigasse  a  convi- 
dar  OS  principaes  Hollandezes  para  um  banqueie, 
em  sua  casa,  no  qual  a  abundancia  das  iguarias  e 
dos  brindesy  e  a  pi  even^ao  de  occultar  armas  oo- 
ca$ionasse  ou  a  morle  ou  a  prisao  de  todos ;  e  con- 
seguindo-se  este  priacipio,  ficava  sem  estorvo  o 
fim ,  que  era  senboreai^se  do  Arrecife;  e  em  todas 


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GAfTBiOlO  UanAli«»  119 

o  cmmio  dog«ossoft  aei  proprioa  do  wimiff>).  Este 
ardtl  oaa  c}u^u  a  pdr^^  em|MraUoa,  porque  o  Hol- 
knte  foi  ayisado^  6  Joao  FerMadaa  Yieira  ^mou 
Hm  axpedienta.  imn  cavalheiro  e  mais  ^ffiMz, 

XXVL  Com  aecreta  ntgocia^o  foi  iaduzindo  a 
lodoe  oamanoeboB  da  Yanea  a  qua  deftenterras^em 
e  preTeoisMin  as  armas  com  o  recato  que  Uiis 
^adrertia  o  perigo,  para  que  os  acbasae  armados 
uma  occasiao  t  muito  da  bonra  de  todos,  que  eUe 
a  8611  tempo  lhe$  mauifestaria.  Ckimo  eutemUrao 
que  era  Joio  FerMudes  Ykira  o  einpeobado  ^  nao 
bouve  algfum  que  6e  uao  preparasnei  alvoro^ado  e 
solieito  9  de^jaudo  eada  quel  obrigar  com  o  ^rvi^o 
a  quern  oae  sabtafaltar  com  respeito*  Poz  o  mesmo 
euidadoem  trasier  a  ma  amizade  aquellea  bomens, 
eom  C9  quaes  se  uao  corria  ^  o  que  com  facUidade 
4>  ooneeguio.  Medio  o  tempo  de  suaesperant^a  pe- 
las  promesaas  e  pelas  noUcias,  e  pareoeodo-lbe 
que  nao  podiao  (altar  em  qualquer  doa  dias  sc^ain- 
tes  Henrique  Dias  e  o  Gamarao ;  e  que  adisutava  o 
negocio  eom  anticipar  a  preveo^ao  a  chegada,  de- 
termiuou  deelarar<*se  a  todos ,  para  o  que  os  cha- 
mau  a  sua  caia ,  e  Ibes  deo  inteira  noticia  de  seu 
inlento;  o  que  fez  na  forma  seguiute.  «  At^ora 
n  nao  dei  coata  a  todos  de  meu  designio,  seudo 
»  que  forma  a  importancia  de  cada  urn,  nao  por- 
»  que  lemesse  quebra  no  segredo  (  porque  como 
n  a  conveniencia  ^  de  todos ,  de  todos  deve  ser  a 
»  observancia),  senao  porque  a  dila^ao  poderia  es- 
»  friar  aquelle  fervor,  que  nos  assegura  o  successo. 
a  Mao  ^  desigual  a  conGanca  quaudo  o  nao  ^  a  es« 


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320  ckffmmo  LwnAM. 

»  timticao,  e  supposto  qi^  a  a%uns  pariieahres 
»  communiquei  meu  intento,  nao  adkntei  as 
»  pessoas^  ainda  que  adiantei  as  noticias^  porqne 
»  a  todos  p^  em  igual  Italanca :  nas  emptesas 
»  primeiro  obrao  os  minislros  das  conduo^oes, 
»  que  08  bracos  dos  soldados.  Agora  que  o  tempo 
»  chama  para  a  necessidade  e  para  a  execncaoi 
»  a  dou  a  todos;  porque  Ihe  (ique  mats  honrosa  a 
»  vihganca ,  tomando  por  mao  propria  a  satisfa-^ 
»  cao  das  offensas.  As  injusticas  j  roubos,  forcas^ 
»  injunas,  e  desprezos  que  temos  soffndo  a  esta 
»  torpe  canatha^  foi  sempre  tolerancta  de  nossa 
»  impossibilidade ,  porim  nao  obediencia  de  nosso 
»  alvedrio ;  pois  i  certo  que  cada  um  de  nos ,  se 
»  deixou  de  vmgar  o  aggravo  ( todas  quantas  vo* 
J)  zes  padecto  a  olfensa ),  foi  porque  cousideravm 
»  que  sua  espada  primeiro  Ihe  bavia  de  serrir  de 
»  verdugo,  que  aos  outros  de  exemplo;  experi- 
»  mentando  que  se  convocasse  companheiros ,  os 
Y>  bavia  de  soffrer  inimigos ;  consinado  da  baixeza 
»  com  que  muitos ,  por  indignas  conveniencias,  sao 
»  mais  estraugeiros  que  natures.  Estes  receios  atro- 
»  pell^rao  minha  resolucao  alguns  annos ;  nao 
))  que  me  atalhasse  o  risco  de  mhiha  pessoa,  senao 
»  que  me  atava  as  maos  a  contingencia  de  arris** 
»  car  as  de  vossas  merc6s  d'esie  risco,  com  as  or- 
»  dens,  e  com  os  auxilios  ,  que  tenho  convocado 
D  e  pedido  contra  estes  mortaes  inimigos.  Temos 
»  em  nosso  favor  a  justica  da  causa,  e  nao  durido 
»  que  acbaremos  propicio  todo  o  Es<ado  giral ;  e 
»  a  vinda  dos  governadores  de  Indios  e  M inas  com 
«  sens  tercos,  que ja  espero cadfi  bora,  a  presenca 


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CASTRI0IO  LUSHAKa  221 

»  dos  capitaes  Antonio  Dias  Gardozo,  Paulo  Vel-* 

»  lozOy  e  Antonio  Gomes  com  sessenta  soldados  e 

»  quarenta  aventureiros ,  que  4a  Bahia  vi^aopor 

>^  aeu  gostOy  os  mais  d'elles  reformados  e  todos 

»  valerosos.  Em  todas  as  freguezias  nomeei  cai»<- 

^  laeSy  pessoas  que  na  occasiao  bavemos  deachar 

»  prevenidos  com  (odoa  os  moradores  de  seu  dis- 

»  trito,  que  ja  esperao  men  aviso  para  executarem 

»  nosso  intenlo ;  este  pende  da  occasiao  que  tra- 

y»  zemos  eiitre  maos,  que  6  o  dia  das  yodsts  que 

i>  66  esperao.  Nellas  se  haade  acbar  osprincipaes 

»  Flamengos  do  Arrecife  y  rogados  para  autorizar 

»  a  mesa;  e  sei  eu  que  o  vinho  os  ha  de  entr^ar 

M  primeiro  a  Tingan^a  que  a  resislencia;  porque 

»  tenbo  prevenidos  mancebos^  que  secretamente 

M  armados  os  bao  de  matar  ^  todos ;  com  deier- 

1^  minacao  de  se  tomarem  os  eaminbos  para  a  Ar- 

»  recife  (a^  onde  primeiro  ba  de  cbiegar  npssa  es- 

»  pada  que  a  nova  de  seu  casiigo),  que  £EU2ihBente 

n  senborearemos  destituido  de  cabe^as  e  armas 

i>  (albeos  os  Hollandezes  de  defensa  pdo  somno 

»  e  pelo  descuido).  No  mesmodia  e  bora^ba 

»  de  obrar  o  mesmoem  todas  as  partes,  a  onde  o 

»  inimigo  liver  fortifica^o  e  gente;  e  quando  suo- 

}>  ceda  nao  ser  a  conquista  por.  entrepresa  ,  sera 

M  por  cerco ;  para  o  que  tenbo  almazens  providos 

}}  de  muni^oes^  armas  e  mantimentos^  a  custa  de 

»  minba  induslria  e  da  minba  fazenda ;  porque 

II  sempre  me  pareceo  infaliivel  o  acbar  em  vossas 

»  mercte  valor  e  promptidao  para  empreza  de 

»  tanta  utilidade,  como  gloria  para  cada.um  de 

»  nds;^nao  so  pelas  vidas^  senao  tambem  polo  Rei 


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»  MturM,  a  quern  8«nrimo8,  epda  rdigiao  que 
n  defeiidemos.  >  Itoiwcieftteg  dUiROU  aos  ouvinles 
eirta  protengada  pritica ,  porque  nao  podiao  wpri- 
mir  o  alvoroco,  com  que  no  &m  d'ella  gritarM  m 
uma  voz  t  «  Siva  El  Rei  Dom  Joao  o  Quarto  nosso 
»  senhof !  viva  a  f^  calholica  romana  que  profiw* 
w  sadios !  e  viva  Joao  Fernandes  Vieira,  a  qnem 
»  todos  acclamamos  por  noBdO  capitao  e  noBso  go* 
t  vernadof  neata  empreBa  de  nossa  liberdade!  » 
CSom  tanta  sattsfaijao  os  dcAxou  a  disposicao,  animo 
e  getiefOMdade  do  novo  governador,  que  logo  Ihe 
jurarao  obediencia,  fidelidade  e  segredo* 

XXVIl.  Difficil  coudae  conservar-»e  o  wgredo 
entre  muitos,  mtfrmente  quando  enira  eWca  ha  al- 
guns  stiapeitos  ^  traicao.  Come^ou-se  a  espattiar 
o  nttnor  eiitre  oi  Hollairfe«68  de  que  oa  Portogue* 
zea  8C  queriao  revoltar;  art*  oonfirroava-ae  todoe 
OS  dias  com  as  iSariM  anonimaa  que  os  traidores 
escretiao  ao)  do  conselho,  fias  quaes  relatavao  todo 
o  que  8C  tinha  determinado^  e  rtqoeriao  que  se 
nao  fiassem  de  Joao  FernandaB  Yieira ,  porque, 
traidof  aos  Bstados,  etmspirava  oom  ontroe  muitos 
contra  esirangeiros  e  naturaea  :  que  se  acudisse 
com  tempo  a  emniekicia  do  darnno^  poia  o  mmor 
o  propunha  tio  vizhiho.  0»  judeos,  por  natnreza 
timktos ,  gfiiavflfo  sem  descanso  ,•  e  por  sem  diivida 
affirmavao  qtre  oaPortuguezaa  andavao  kvntados, 
e  tinhio  armas  e  muniooes  eaoondidas ,  com  dia 
cerfo  para  darem  no  Arreetfe^  e  paasarem  4  €»pada 
quanto  achassem  com  vida ;  sendo  Joao  Fernandes 
Yieira  a  cabeca  que  os  governova,  sMbidbso  das  fa- 
iendaa^  todoa;  que  secaMig^iacopi  toda  a  pr«8a 


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GA9IBICmi  LIKITAIIO.  23t 

e  rigor  a  trti9aOy  antes  (pieo  golpe  Impossibililasae 
o  reparo ;  e  premiassem  com  franqueia  os  leaes,  que 
tinhao  reTelado  a  contpiracao  (mo  esi^s  deE  kii 
doze  )•  Que  despertaasein  ao  brado  do  Maranhao^ 
sobejo  para  oe  acordar  do  inais  pesado  somno. — 
Nao  derao  ao  prmcipio  oe  Hollandezes  grande  im-- 
portancia  a  eates  rumores;  mas  porfim,  vendo 
que  a  queixa  6e  augmentaTa  e  se  tornava  tumul* 
tuoaa^  comecarao  a  conceber  receio ;  oonferirao  eiH 
ire  81  o  remedio,  esaio  decretado,  com  discrete 
politica  y  que  se  disaiumk^fte  o  reoeio ,  porque  se 
Dao  atreyesse  o  povo ;  e  com  cauteloda  destresa  doi-* 
tavao  08  do  goTerno  o^  motivos  de  queixa  as  eos^ 
tas  da  inveja,  qae  todoa  os  moradores  tinhao  a 
Joao  Femandes  Vieira^  e  nao  a  causas  que  tive98e 
dado  parase  crer  a  rdielliao  dos  naturaes«  D^baixo^ 
desta  8imulada  confianca  msmdarao  oa  do  conacH- 
Ibo  rogar  a  Joao  Femandes  Yieira  que  foase  •er*' 
vido  achar-ae  ao  outro  dia  no  Ari^cife  para  assi^ 
gnar  alguna  papeia  iooportantes  a  Coioipanhia. 
Deichou«se  adiar  do  porlador;  £iUott->Uie  alegre; 
reapondeo  cortczao,  que  se  nao  fosse  ao  ontro  dia 
por  ocbupacao  preeiia ,  que  trazia  entre  inaos^  se 
nao  perderia  o  negocio;  e  quando  a  materia  nao 
permittisse  dilagao  ^  nulndaria  seu  basiante  proou- 
rador^qoe  em  tudo  que  fosse  senri9o  de  suas  setiho- 
rias  e  da  Gdmpanhia  suppriria  intetramentea  falta 
de  sna  peasoa  (d'uma  e  outra  parte  sa  vesCia  a 
cauteUa  da  mesma  cor).  Apertou  o  menaageiro^ 
que  era  necessaria  sua  mesma  presen^a ,  e  que  sem 
dia  nada  se  poderia  concluir  ;  e  porfiou  com  tel 
aperto  que  deo  por  terra  com  toda  a  dissimola^io 


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21ft  GASTBIOTO  LDSITANa 

da  eflcusa.  Joao  Femandes  Vieira  pelo  hileirar  que 
penetrava  o  intento ,  e  que  pelos  mesmos  fios  Ihe 
cortava  o  U50,  Ihe  disse  que  se  nao  cancasse  em 
o  persuadir ,  porque  sabia  mui  bem  os  ioimigos 
que  tinha  no  Arrecife;  e  nao  ignoraya  o  que  ma- 
quiuavao  contra  sua  pessoa;  e  que  da  sua  parte 
dissesse  aos  senhores  do  govemo  nao  perdessem 
tempo  em  Ihe   mandarem   seguro  real,  porque 
mais  real  seguro  era  o  da  sua  casa.  Nao  se  derao 
OS  Hollandezes  por  entcndidos  de  resposla  tao  re- 
soluta ,  appellando  para  o  tempo ,  certos  de  que 
Ihes  metteria  nas  maos  a  Joao  Fernandes  Vieira, 
ou  por  entrega  de  sua  confianca ,  ou  por  descargo 
de  sens  alliados.  Passados  poucos  dias  chegou  um 
barco  de  aviso,  que  mandava  o  commendor  da 
Lagoa,  pelo  qual  certificava  aos  do  conselho  serem 
passados   para  a   campanfaa  de  Pernambuco   o 
goremador  de  lodios  e  Minas  D.  Antonio  Phi- 
lippe Gamarao  e  Henrique  Dias  com  os  sens  ter* 
90s ;  o  que  soub^ra  por  pessoas  confidentes ,  que 
falUrao  com  alguns  dos  sobreditos  soldados^  e  pelo 
trilho  da  marcha ,  que  elle  mesmo  vira,  muito  pelo 
interior  do  sertao;  e  que  de  marcharem  furti'vos  se 
colhia  intentarem  algum  novo  damno.  Com  indi- 
cios  tao  evidentes  e  prova  tao  certa  se  resolveo  o 
HoUandez  em  fazer  toda  a  diligencia  por  haver  as 
maos  a  Joao  Fernandes  Vieira;  mas  este^  avisado 
do  que  se  maquinava  contra  elle,  poiemcobro 
todo  o  precioso  de  sua  casa ;  fei  aviso  a  todos  os 
capitaes,  que  havia  nomeado  nas  fireguezias,  de 
tudo  que  era  passado ;  escreveo  uma  carta  g^ral, 
emqoe  referia  os  successos  passados,  o  estadopre- 


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4  GASTBIOTO  LUSITANO.  225 

senle,  ea  deterininacao  futura;  concluindo  a  rela- 
cao  com  justificar  seu  zelo  ^  e  a  Decessidade  que 
o  constraog^ra  a  acceitar  a  obiigacao  e  o  posto  de 
governador  das  armas ,  e  cabeca  da  sublevacao, 
da  mao  dos  opprimidosy  que  uniformes  o  acclama- 
rao  libertador  da  patria  j  nao  porque  a  ambi^ao  o 
cegasse^  senao  porque  o  maior  servico  de  Deos  e 
de  sua  patria  se  conseguisse.  Assignou  a  carta 
por  todos  OS  confideates,  e  a  remetteo  ao  gover- 
nador do  Estado  Antonio  Telles  da  Silva^  a  quern 
jurava  obediencia  e  fidelidade.  D'este  dia  por  diante 
andou  Joao  Fernandes  Vieira  de  mata  em  mata, 
sem  voltar  a  sua  casa,  nem  a  alguma  de  suas  fazen- 
das  :  nao  houve  parte  a  onde  o  achasse  assistente 
segunda  noite^  porque  mudava  de  sitio  cada  dia. 
Acompanhavao-no  seu  sogro  Francisco  Berenger 
de  Andrada ,  que  nunca  se  appartou  de  seu  lado, 
alguns  moradores  mais  confidentes,  e  sens  fieis  es- 
cravos,  que  Ihe  serviao  de  companbia  e  de  defensa. 
XXVIII.  Em  7  de  Junho  do  presente  anno  teve 
Joao  Fernandes  Vieira  nova  carta  de  que  os  go* 
vernadores  de  Indios  e  Minas  com  os  sens  soldados 
tinbao  passado  o  rio  de  Sao  Francisco.  Estas  car- 
tas ,  com  outras  de  pessoas  confidentes  y  commu- 
nicou  Joao  Fernandes  Yieira  aos  leaes  para  os 
animar>  e  aos  traidores  para  os  confundir*  Com 
ellas  mandou  ao  vigario  da  Varzea  Francisco  da 
Costa  Falcao,  finissimo  Portuguez,  que  da  sua 
parte  dissesse  aos  moradores  d'ella  se  declarassem, 
para  saber  se  os  bavia  dc  tratar  como  a  fieis ,  se 
como  a  inimigos ,  para  que  na  occasiao  conhecesse 
seu  braco  a  quern  havia  de  amparar,  e  a  quem  devia 
U  15 


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336  GAaraioTO  LUSiTAMa 

perseguir.  Respond^rao  todos  que  erao  verdadeiros 
Portuguezes,  e  como  taes  os  acharia  proinptos 
com  fazendas  e  vidas  para  ofFerecerem  pelo  8«rvico 
d'El  Rei  e  fidelidade  da  patria. 

XXIX.  Dons  traidores,  nao  podendo  por  mais 
tempo  conservar  occulta  sua  perfidia,  tomarao  o 
caminho  do  Arrecife,  suUrao  a  salla  do  conselho, 
e  delatarao  Joao  Fernandes  Vieira  como  fautor  da 
rebelliao  que  se  preparava  contra  os  Eslados,  di- 
sendo  que  o  golpe  estava  immineate,  e  que  era  ne- 
oesaario  evitil^o  quanto  antes.  Para  cumulo  de 
sua  perversidade  d^rao  os  nomes  e  as  moradas  dos 
conspirados  para  se  tomarem  por  iista ;  nella  se 
mett&rao  os  que  deo  a  verdade,  os  que  entregou 
o  odio  J  e  os  que  propoz  a  suspeita ,  e  muitos  que 
naquella  occassiao  advertio  a  cobi^a.  —  Nao  se 
descuidou  o  Fiamengo  em  applioar  ddensivos  ao 
mal ,  que  ]i  temia.  Mandou  reparar  todas  suas  for- 
tificacoes,  e  oonduzir  lodas  suas  armas,  publiean- 
do  o  apresto  sem  descubrir  o  motivo«  Ghegou  a 
noiteda  vespera  de  Santo  Antonio  12  de  Junho^ 
escura,  desabrida  e  tempestuo^a;  no  principio 
d'ella  sairao  do  Arrecife  diversas  mangas  de  solda- 
dos ,  de  vinte  at^  trinta  homens  cada  uma,  com 
ordens  secretas,  que  por  differentes  veredas  tomas- 
aem  todos  os  caminboa  que  guiasaem  para  as  ca- 
sas  de  Joao  Fernandes  Vieira ,  de  sorte  que  a  um 
mesmo  tempo  chegassem  a  ellas ,  e  as  cercassem, 
tendo  por  sem  duvida  que  o  seguro  do  tempo  e  a 
impossibilidade  da  fuga  o  entregariao ,  ou  &  mor- 
te,  ouaprisao.  Enganou-os  o  desejo ,  porque  se 
tinha  adiantado  o  desvio  ao  golpe,  Entrarao  uas 


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CASTRIOTO  LUSITANO.  227 

casasy  vjrao  e  revolverao  lodos  os  aposentos  e  re- 
treles,  sem  acharem  indicios  do  que  buscavao; 
quebrarao  a  furia  em  roubar  e  destruir  tudo 
quanto  podia  servir  a  cobica  e  a  vinganca.  Para  se 
Tazerem  temer  assentarao  corpo  d'armas  naquelle 
lugar,  donde  como  de  centro  despedirao  partidas 
de  soldados  a  toda  a  circumferencia;  pela  qual  en- 
trarao  nas  casas  d'alguna  moradores,  mas  Dao 
acharao  nellas  viva  pessoa ;  prevenidos  do  aviso  se 
tinhao  retirado  as  matas^  e  canaveaes,  onde  dor* 
mirao.  Tambem  d^rao  sobre  as  casas  dos  traido- 
res  f  como  elles  mesmos  tinbao  pedido  para  milbor 
cobrir  sua  perfidia,  um  dos  quaes  prend^rao,  por- 
que  Ihe  convioha  deixar-se  achar^  e  o  levarao 
para  o  ArreeifC)  mas  com  tal  familiaridade,  que  o 
modo  destruio  o  artificio,  e  a  falta  de  companhia 
publicou  a  industria.  — No  dia  seguinte,  dedicado 
a  Santo  Antonio,  se  havia  de  ce(ebrar  sua  festa  na 
capella  de  um  engenho  de  Joao  Fernandes  Vieira; 
pordm  o  ossalto  do  inimigo,  e  o  estrondo  das  armas 
converteo  em  bellica  a  manha,  que  havia  de  ser 
festiva.  Todos  os  moradores  do  contorno  tratavao 
das  armasy  nenhum  da  festa ;  assentarao  que  se 
guardasse  esta  para  outra  occasiao,  e  se  mudasse 
para  a  igreja  da  Varzea,  a  onde  poderia  assistir  a  ella 
o  governador  da  liberdade,  como  depois  assistio ; 
e  se  f ez  a  festa  com  toda  a  solemnidade  e  seguro, 
por  razao  das  sentinellas  que  estavao  ao  largo. 
XXX.  A'  mata,  onde  Joao  Fernandes  Vieira 
tinha  passado  aquella  noite,  cheg^rao ,  ao  romper 
da  alva^  alguns  escravos,  seus  conGdentes,  com 
as  noticias  da  assaltadai  qve  o  Flamengo  dera  em 


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228  GASTRIOTO  LUSITANO. 

sua  casa ,  desejoso  de  o  niatar  ou  prender ;  e  da 
viblencia  com  que  se  roubira  e  destruira  tudo  o 
que  tinha  valor  eprestimo. Logo  que  acclarou  o  dia, 
mandou  descobrir  o  campo,  e  certo  na  seg^uranca 
d'elle »  se  foi  com  os  de  sua  companhia  ao  engenho 
de  Luiz  Braz  Bezerra,  homem  principal,  capaz 
c  fiel ,  para  consuUar  com  elle  o  que,  conforme  ao 
estado  das  cousas,  se  devia  obrar.  Acbarao-se 
nesta  conferencia  Francisco  Bei^enguer  de  Andra- 
da ,  Cbistovao  Berenguer,  Aatonio  Bezerra,  o  ca- 
pitao  Antonio  Borges  Uchoa ,  Francisco  de  Faria, 
Antonio  da  Silva,  capitao  dos  cavalleiros^  o  capitao 
Antonio  Carneiro  Falcao,  Bernardim  de  Carvalho, 
Cosme  de  Castro  Pessoa,  Manoel  Gavalcanti,  An- 
tonio Cavalcanti  ( com  dous  filhos  ) ,  o  capitao 
Joao  Nunes  Vitoria  ^  com  alguma  gente  d'armas  de 
fogo,  JoaoCordeiro  deMendanha,  AlvaroTeixeira, 
Amaro  Copes  Madureira  j  que  depois  veio  a  ser 
capitao.  Propoz  a  todos  o  que  desejava ;  e  quando 
esperava  o  voto  de  cada  um ,  responderao  confor- 
mes,  que  elles  o  tinhao  feito  e  acclamado  governa- 
dor  das  armas;  e  como  tal  devia  ordenar,  e  elles 
obedecer;  e  declarado  sen  parecer,  estavao  promp- 
tos  para  o  seguir.  Mostrou  o  governador  o  muilo 
que  convinha  fazer  p^  de  exercito,  e  marcharem 
formados  e  unidos  a  buscar  alojamento  convenien- 
te.  Seguindo  este  parecer ,  deixirao  o  engenho  de 
Luiz  Bezerra,  e  se  forao  aquartelar  em  um  outeiro 
situado  no  interior  da  mata,  que  Ihes  servia  de 
atalaia  e  alojamento.  Neste  se  detiverao  tres  dias, 
e  nelles  se  Ihes  aggi'egou  toda  a  gente  que  se 
occupava  no  servico  das  fazendas ,  a  quem  Joao 


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CASTBIOTO  LUSITANO,  229 

Fernandes  Vieira  promelleo  premio,  se  nesta 
guerra  servissem  de  sorte  que  o  merecesem.  Nes- 
tes  tres  dias  dispoz  o  governador  os  apprestos  ne^^ 
cessarios  para  a  conduccao  da  genie  e  dos  viveres; 
fez  rezenha  da  sua  gente ,  e  se  contarao  cento  e 
trinta  homenSy  todos  soldados  noanimo,  muitos 
Taltos  d'armas ,  todos  de  pratica.  Com  esta  compa- 
nhia  marchou  para  outro  posto ,  e  fez  alto  meia 
legoa  da  Varzea,  em  um  lugar  que  a  naturcza  cer- 
cou  de  alagadicos  y  chamado  Camaragibe ,  accom- 
modado  para  a  faeilidade  das  inteligencias  e  da 
defensa.  Fez  aviso  a  lodas  as  partes  da  publicacao 
da  guerra ,  para  que  em  todas  se  pegasse  em  ar- 
mns,  e  o  seguissem.  Mandou  deitar  bando  por  as 
freguezias  que  os  escravos  Angolas,  Minas,  Ardas 
e  mulatos ,  que  quisessem  servir  ^  e  allistar«$e  para 
esta  guerra  debaixo  de  suas  bandeiras,  se  Ihes 
daria  paga  como  a  soldados,  e  gosariao  de  todos 
OS  foros  da  milicia,  conseguindo  liberdade,  e  Ihes 
promettia,  confiado  no  favor  do  ceo,  resgat^l-os, 
e  dar  por  cada  um  a  seu  senhor  o  pre^o ,  em  que 
se  avaliasse  j  de  sua  propria  fazenda.  Mandou  pu« 
blicar  por  todas  as  partes ,  que  o  Flamengo  tinha 
decretado  passar  a  espada  a  todos  os  mancebos  de 
quinze  at(^  trinta  annos :  industria  que  apadri- 
nhada  pela  prisao ,  que  se  fez  de  um ,  obrigou  a 
muitos  a  buscarem  as  bandeiras  da  liberdade. 

XXXI.  Por  todo  0  contorno  do  Arrecife  se  to- 
cavaa  rebate;  ouvia-se  o  estrondo  da  guerra  com 
a  formidavel  voz  do  temor  e  do  tumulto,  accre- 
centado  com  o  grilo  do  espanto  e  da  sospeitn,  cor- 
rendo  lao  agitadas  (($  nQticjas^  (jue  nada  se  ipedi^ 


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230  GASTBIOTO  LUSITANO. 

pela  verdade,  tudo  pelo  receio  e  pela  causa;  a 
onde  a  confusao  mats  avultava  era  dentro  no  Ar- 
recife  :  viao  os  moradores  d'elle  entre  a  culpa,  e 
inferiao  que  alii  se  haviao  de  experimentar  mais 
rigorosos  os  castigos.  Os  superiores,  accusados  da 
propria  consciencia,  escondiao  o  medo,  e  mostra- 
vao  nas  apparencias  que  nao  havia  para  que  lemer 
a  conjuracao  dos  tumultuosos  f altos  de  tudo; 
por^m  nenhum  deixava  de  julgar  que  a  conspira- 
cao  tinha  alicerces  profundos  ;  procurarao  com 
diligencias  occullas  descobril-os ;  e  para  socegar 
a  inquietacao  do  receio  popular  mandarao  salr 
uma  embarcacao  ligeira ,  e  nella  a  Theodozio  Es- 
trater,  e  a  Guilherme  Wandrevot  (intelligentes  na 
lingua  portugueza ,  e  exercitados  em  similhantes 
negocios )  com  ordem  secrela  que  tomassem  porto 
na  Bahia,  e  espiasseni  se  nella  havia  ntos  de 
guerra,  ou  levas  de  gente,  em  numero  que  sepo- 
desse  presumir  bastante  para  fomentar  a  conspira- 
cao  dos  levantados ;  e  com  regimento  publico,  que 
em  nome  dos  Estados  acusassem ,  diante  do  go- 
t'ernador  Antonio  Telles  da  Silva,  a  rebelliao  dos 
naturaes,  e  o  favor  que  Ihes  davao  os  foragidos  da 
Bahia.  Com  estas  instruccoes  sairao  do  Arrecife 
em  OS  primeiros  dias  do  mez  de  Julho  d'este  anno 
de  1645.  Com  a  mesma  cautella  despach^rao 
correios  secretos  a  todos  os  commendores  c  capi- 
taes  das  pracase  quarteis  ,  que  tinhao  nas  terras 
de  seu  dominio ,  com  aviso  do  que  temiao ,  e  ordem 
que  se  fortificassem,  e  recolhessem  todos  os  sol- 
dados  a  sens  presidios,  empregando  todo  cuidado 
em  tomarem  os  caminhos ,  para  que  a  nova  do 


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GMITIIOVO  tmiTANO.  361 

leTantemento  nao  lavrasBe,  alterando  os  animos 
dos  obedientes.  For  Jorge  Homem  Pinto  (morador 
poderoao  da  Paraiba,  entao  asdistenteno  Arredfe) 
e  Anlonio  de  Oliveira,  provedor  e  ouvidor  da  ilha 
de  Ilamaraca,  maodarao  oQerecer  a  Joao  Femandea. 
Yieira  duzentos  mil  cruzados ,  pagos  a  onde  elle 
quizesse ,  e  com  as  segurancas  que  apontasse,  por- 
que  desiatisse  do  intento  comecado,  e  deixasse  a 
capitania  em  seu  antigo  socego  :  proposta ,  a  que 
0  magnanimo  Tarao  (  depois  de  indifferentes  res- 
postas,  necessarias  para  dilaCar  o  tempo)  respond 
dec  que  nao  vendia  a  honra  de  castigar  tyrannos 
por  tao  baixo  pre^o.  Com  diligencia  publica  man- 
darao  reformar  a  fortifica^ao  de  iodas  as  forlalezas 
do  Arrecifey  mettendo  nellas  dobradas  guarni^oes, 
muni96e8^  armas  e  mantimentos,  tudo  obrado 
com  a  industria  ^  de  que  nao  era  seu  temor  a  causa^ 
senao  o  mal  fundado  receio  do  vulgo. 

XXXII.  Yendo  os  do  conselho  que  nao  podiao 
ganhar  com  promessas  Joao  Fernandes  Yieira, 
manddrao  prender  todoa  os  moradores  que  julga* 
rao  fiuspeitos^  para  assim  diminuirem  o  numero 
dos  revoltosos.  Tinhao  publicado  dias  antes  um 
edital,  que  mandava  atodas  as  pessoas  dequalquer 
qualidade  e  estado  que  fossem^  que  do  Arrecife, 
nem  por  si ,  nem  por  oulrem  ,  podeSsem  tirar  fa- 
zenda^  sustento,  ou  genero  algum  por  contractor 
venda ,  commutacao  ou  emprestimo,  sem  expressa 
licen^a  dos  superiores  do  governo,  com  a  luesma 
pena  a  reos  e  authores.  Pareciapolitica ,  em  ordem 
ao  provimento  da  praca  ,  e  foi  ardil  do  lalrocinio; 
QopiK)  tambem  o  foi  oiitro  decreto  que  se  pubji- 


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3S2  GA8TR10T0  LUSTTAMO. 

cou  em  o  nm  de  Junho  d'este  anno,  por  todas  as 
partes  de  sua  jurisdiccao,  na  seguinte  forma.  <(  Os 
»  muito  nobres  senhores  do  supremo  conselhodas 
»  capitanias  sujeitas  aos  mui  altos  e  poderosos 
»  Estados  de  Hollanda,  pela  illustrissima  Compa* 
»  nhia  das  Indias  Occidentaes,  etc.  Por  qoanto 
»  informados  e  condoidos  d'algims  moradores  de 
»  nossa  obediencia  ( movidos  d'um  falso  rumor, 
»  divulgado  por  traidores,.  que  aifirmarao  que 
»  nossos  soldados ,  com  ordem  nossa ,  haviao  de 
»  sair  da  campanha  a  malar  e  a  roubar  a  (odos  os 
»  naturaes  que  vivem  fdra  de  nossas  fortiGcacoes) 
»  que  seausentavao  para  os  matos  ,  deixando  suas 
B  casas  e  fazendas ,  com  nolavel  detrimento  de 
»  suas  pessoase  famiiias;  por  este  decreto  Ihes 
»  fazemos  saber  que  nossa  tencao  i  defender  e 
»  conservar  a  todos  nossos  subditos  em  sens  foros 
»  e  isensoes ,  com  real  seguro  de  seus  bens  e  suas 
»  pessoas.  Em  execucao  do  qual  requeremos  a 
»  todos,  da  parte  de  Deos  e  da  nossa,  que  sem  re- 
»  ceio  algum  setomem  as  suas  vivendas,  ainda 
»  que  andem  ausentes  por  crimes,  dos  quaes  desde 
»  logo  Ihes  danios  plenaria  absolvicao;  nao  isen- 
»  tando  de  nosso  perdao  aos  que  houverem  en- 
»  corrido  em  delito  de  traicao,  com  tanto  que 
D  nao  sejao  cabecas  da  rebeldia ,  e  que  dentro  de 
T»  nove  dias  se  venhao  appresentar  ante  nds, 
»  para  fazerem  novo  termo  de  Gdelidade,  e  rece- 
»  berem  novos  passaportes  de  seguranca.  E  decla- 
»  ramos  que  a  todos  os  que  faltarem  a  esia  nossa 
»  ordem ,  os  havemos  por  rebeldes ,  e  procedere- 
))  mos  contra  elle?,  como  pontra  jqimi^os  decla- 


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CASTBIOTO  LDSlTAIfO.  233 

»  rados,  sem  piedade,  nem  remissao  alguma. 
>  Dado  no  supremo  conselho  em  1 8  dias  do  mei 
»  de  Julho  de  1645;  sellado  com  o  sello  maiorde 
M  nosso  cargo.  Joao  Bolestrate.  Henrique  Manoel. 
»  Pedro  Bakte.  Joao  Balbeques.  »  —  Publicado 
este  cavilloso  decreto,  acudirao  ao  conselho  aquel- 
les  moradores  que  nao  tinhao  podido  sair  de  suas 
casas ,  e  outros  que  nao  tinhao  lido  noticia  do  Ic- 
vantamento;  fizerao  todos  novo  juramento,  rece- 
b^rao  novos  passaportes ,  e  deixarao  por  cada  um 
dous  dobroes^  que  era  o  iim  destas  prematicas, 
sempre  promettidas  nunca  guardadas.  Muitas  ou- 
tras  vei^acoes  pralicarao  os  HoUandezes  contra  os 
moradores^  que  seria  longo  de  referir ,  e  que  em 
tudo  se  ])arec]ao  com  outras  muitas  de  que  temos 
dado  noticia. 

XXXIII.  Nao  podemos  deixar  de  referir  (  para 
dareza  da  historia )  como  entre  os  presos  estaya 
no  Arrecife  o  traidor,  de  que  a  cima  dissemos  : 
negoceava  este  com  os  HoUandezes  que  simulada- 
mente  o  igualassem  na  sorte  com  os  malsinados, 
para  que  se  nao  entendesse  fora  o  autor  da  trai- 
eaQ.  Este  ( nao  merece  mais  nome  quem  vive  da 
infamia),  falso  em  todo  o  estilo,  deixou  manifesto, 
no  do  Arrecife ,  o  da  perfida.  Sua  prisao  era  a  casa 
do  governador  das  armas  hollandezas ;  com  liber- 
dade  para  faliar  com  todos  j  e  nao  o  comprehender 
nenhuma  pragmatica ;  tinha  porta  franca  para 
mandar  do  Arrecife ,  e  receber  de  fora  tudo  o  que 
queria ,  e  para  que  sua  mulher  Ihe  fosse  assistir  o 
tempo  que  elle  ordenava.  Todos  os  superiores  do 
govemo  0  visitavciQ  com  assistencias  o  mimos;  com 


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2S&  GA8TBI0T0  LtSITAIia 

inais  continuacao  o  coronel  Mathias  Beke,  e  os  ju- 
deos  mais  conhecidos  ;  dos  Portuguezes/ nenhum 
fiel ;  so  outro  traidor  (  homem  de  (ao  baixa  sorte, 
que  o  delicto  Ihe  nao  affrontava  o  nome)  a  simi- 
Ihanca  influia  na  correspondencia.  Occupava-se 
este  segundo  em  recolher  tudo  quanto  se  pas8ava 
entre  os  nossos ,  para  o  referir  no  Arrecife  ao  ou- 
tro ,  o  qual  o  communicava  aos  Hollandezes ;  com 
o  que  y  nao  ha  via  cousa  que  se  passasse  entre  n6s, 
de  que  o  inimigo  nao  tivesse  inteira  noticia.  E 
d'esta  maneira  viviao  estes  dous  homens,  um  da 
traicao  do  outro. 

XXXIV.  Joao  Fernandes  Vieira,  a  quern  nada 
se  escondia,  informado  dos  desprezos  com  que 
estes  dous  traidores  o  tratavao  diante  dos  Hollan- 
dezes e  judeosy  desfazendo  em  sua  pessoa ,  seu 
poder  e  seu  intento;  e  senlido  dosaggravos  que 
padeciao  muitos  homens  de  bem  por  seu  respeito^ 
determinou  com  um  golpe  ferir  a  todos,  e  mandou 
fixar  em  todos  os  lugares  publicos,  dentro  e  f6ra, 
do  Arrecife,  este  edital.  «  Joao  Fernandes  Vieira, 
>i  primeiroacclamador  da  liberdade,  e  governador 
>»  das  armas  na  restauracao  e  restituicao  de  Per^ 
»  nambuco  a  seu  legitimo  senhor,  faco  saber  a 
»  toda  a  pessoa  de  qualquerestado,  qualidade  e  na- 
»  ^ao,  que  quizer  tomar  armas  contra  a  lyrannia 
»  e  injusta  ocoupacao  do  Holla  ndez^  inimigo  com- 
»  mum  J  para  o  bem  de  todas  estas  capitanias,  e 
»  dos  opprimidos  moradores  d'ellas,  assente  prafa 
»  dentro  de  quatro  dias  depois  da  noticia  d'este 
D  nosso  edital^  sob  pena  de  o  havermos  por  rebelde^ 
i)  e  procedermos  contra  elle  copio  contra  inimigQ 


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GASTBIOTO  LUSITAHa  235 

»  da  patria ;  e  sendo  estrangeiro  ou  judeo ,  que 
»  queira  (icar  em  sua  casa  j  e  culliyar  suas  fa« 
»  zendas  debaixo  de  nosso  amparo ,  o  defendere- 
»  remos  como  a  fiel  vassallo  da  coroa  de  Portugal, 
»  e  Ihe  daremos  todo  o  favor  necessario  para  co* 

•  brar  todas  e  quaesquer  dividas,  que  com  justifi* 
»  cado  titulo  Ihe  pertencerem ;  al^m  do  que  se 
H  Ihe  darA  satisfacao  ao  soldo  que  constar  Ihe  fica 
>}  devendo  a  Companhia  de  Hollanda;  e  em  caso 
I)  que  queira  passar  desla  para  qualquer  outra 
»  provineia,  porrazoes  que  tenha  para  uao  mili* 
>i  tar  debaixo  de  nossas  bandeiras ,  Ihe  daremos 
w  livre  passagem ;  advertindo  e  requerendo  a 
D  todos  que  se  nao  deixem  enganar  das  appa- 
»  rentes  confiancas,  e  falsas  promessas  do  femen- 

•  tido  Hollandez.  Dado  desta  nossa  carnpanha  de 
>}  Pernambucoem  24deJulhode  1645  annos.  0 
»  govemador,  Joao  FbrnandesVieira.  >  Doidos 
do  golpe ,  e  irritados  da  injuria,  mandarao  os  Hol- 
landezes  deitar  bando  por  todas  as  pracas  e  forta- 
lezas  do  Arrecife ,  pelo  qual  promettiao  quatro  mil 
florins  a  quem  matasse  ou  prendesse  a  Joao  Fer- 
nandes  Vieira ;  e  que  sendo  o  matador  escravo 
receberia  o  dinheiro ,  e  ficaria  livre ;  da  mesma 
sorte  se  estivesse  comprehendido  em  qualquer 
crime.  Por  outro  bando  e  publicos  editaes  pro- 
metteo  Joao  Fernandes  Vieira  oito  mil  florins  a 
qualquer  pessoa  que  Ihe  apresentasse  a  cabe9a 
de  cada  um  dos  do  conselho  supremo;  aos  quaes 
escreveo  uma  carta,  cuja  sustancia  era  arguil-os 
de  femenlidos,  herejes  e  horriveis  tyrannos,  com 
maos  so  para  o  roubo^  e  linguas  so  para  injuria*  e 


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236  CASTRIOTO  LUSITANO. 

para  a  blasfemia.  Que  ouvia  dizer  publicavao 
buscal-o ;  que  se  nao  cancassem  em  especular  ca- 
minhos  infames,  que  elle  a  cara  descoberta  os  iria 
visitar  ao  Arrecife,  para  o  que  tinha  quatorze  mil 
soldados  brancos ,  e  yinte  e  quatro  mil  moradores 
indios ,  que  nesia  faccao  da  liberdade  o  seguiao  : 
numero ,  que  primeiro  Ihe  aggregou  o  desejo  da 
vinganca ,  que  o  braco  de  sua  diligencia.  Grande 
pezar  e  cuidado  causou  esta  carta  ao  Flamengo, 
porque  conhecia  o  caracter  de  Joao  Fernandes 
Vieira ,  e  pelo  lerreno  de  seu  dominio  Ihe  nao  pa- 
recia  exagerado  o  numero  de  combatentes  de  que 
elle  Ihe  fallava.  Escondeo  quanto  pode  o  receio, 
occultando-o  debaixo  de  apparente  desprezo  por 
nao  allerar  os  parciaes. 

XXXV.  Em  quanto  estas  cousas  se  passavao  em 
Pcrnambuco ,  succed^rao  outras  em  Ipojuca,  que 
mereeem  ser  referidas.  Havia  naquella  terra  um 
mancebo  valoroso,  chamado  Domingos  Fagundes, 
natural  da  villa  de  Viana  do  Lima,  o  qual  pelos 
sens  alenlados  espiritos  fora  nomeado  capitao  d'u- 
ma  companhia  paga  (com  a  obrigacao  de  a  levan- 
tar).  Ja  se  tinha  destinguido  varias  vezes  este 
mancebo  por  varios  feitos ,  que  Ihe  tinhao  gran- 
geado  grande  reputaoao  entre  os  moradores ,  e  so 
espcrava  a  primeira  occasiao  favoravel  para  se  por 
em  campo.  Aconleceo  que  em  dias  de  Junho  d'este 
anno  succedeo  matar  um  morador  a  um  judeo  ca- 
sualmentc.  (  Era  contratador,  e  dos  ricos  do  Ar- 
recife. )  Acudirao  valedores  por  uma  e  outra  parte; 
c  na  pcndencia  ficarao  mortos ,  pelas  custas,  ou- 
tros  dous  tra (antes,  tambem  judeo$,  Foi  a  revolw- 


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CASTWOTO  LUSITAKO.  237 

cao  do  lugar  tal  que  o  cabo  do  presidio  hollandcz  se 
imaginou  perdido.  Saio  a  prender  os  deliDquenles, 
mas  nao  o  conseguio,  porque  ja  se  tinhao  posto  a 
salvo.  0  capitao  Fagundes ,   que  a  este  tempo  se 
achava  com  dezeseis  soldados  de  sua  compaDhia, 
persuadido  da  confusao   que   causai»ao   aquellas 
mortes,  deo  sobre  algumas  casas  de  Hollandezes, 
e  nellas  nao  deixou  vida  o  ferro,  nem  fazenda  o 
fogo,  que  nao  consummisse ;  e  nao  fic^ra  naquella 
parte  Flamengo,  nem  cousa  sua,  se  Ibe  nao  ataraas 
maos  a  falta  d  arraas  de  fogo.  Determinou  buscal- 
as  a  ousadia  a  onde  as  guardava  o  perigo  :  assaltou 
uma  casa  forte,  na  qual  se  aquartellava  uma  com- 
panhia  de  soldados  hollandezes;  com  morte  de 
tresy  e  fugida  dos  mais  a  ganhou,  e  com  as  armas 
emunicoes  dos  despojos  guaraeceo  aseus  soldados. 
Ja  ao  valente  capitao  pareciao  pequeno  emprego 
para  sen  animo  os  assaltos  fortivos  :  a  cara  desco- 
berla  investio  tr^s  barcos ,  que  ( no   chamado 
Porto  Salgado )  estavao  a  carga,  com  boa  quanti- 
dade  de  assucares  e  farinhas ;  e  os  rendeo ,  a  pezar 
da  guarda  hoUaudeza   qlie    os   defendia.    Neste 
tempo  chegou  a  nova  de  que  eslava  Joao  Fernan- 
des  Vieira  posto  em  campo,  com  sufficiente  pe 
d'exercito,  e  Amador  Araujo,  que  era  o  principal 
capitao  d'aquelle  distrito,  com  todos  os  mais  capi- 
taes,  soldados  e  moradores  se  declarirao  por  par- 
ciaes  na  sublevacao,  supprindo  a  falla  das  armas 
com  a  grandeza  dos  animos,  que  os  animava  a 
lancar  mao  de  cbucos ,  dardos ,  facas  de  monte,  e 
paos  tostados.  Fez  grande  impressao  no  Arrecife 
esla  nova  J  causou  espanlo  a  todos,  especialmenle 


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358  CASTRIOTO  LUSITANa 

ao8  judeos^  os  quaes  sairao  pelas  ruas  appelli-^ 
dando  justica,  e  persuadindo  vinganca;  tal  foi  a 
Tozeariajque  Bzerao  elles  e  niais  habitantes  as  porta$ 
dos  conselhos  e  dos  ministros,  que  estes  se  virao 
obrigados  a  chamar  o  general  das  annas  Henrique^ 
dando-Ihe  ordemque  comseiscentos  homens  mar- 
chasse  a  Ipojuca  casiigar  a  rebelliao.Em  24  de  Ju- 
nho  saio  elle  com  effeito  da  cidade  Mauricea,  es* 
condido  com  as  sombras  da  noite ,  e  com  os  recatos 
do  silencio.  Em  quanto  faz  a  viagem  daremos  razao 
do  que  succedeo  na  campanha ,  onde  deixamos 
ao  governador  da  liberdade  (  neste  mesmo  dia ) 
occupado  em  manifestar  a  empresa  por  editaes 
publicos,  dando  por  suas  ordens  o  primeiro  im- 
pulso  a  restauracao  de  Pernambuco. 

XXXVL  Nao  dava  o  governador  da  liberdade 
um  passo  de  que  o  HoUandez  nao  tivesse  noticia  ; 
effeito  da  Tigilanda  com  que  os  traidores ,  que 
assistiao  entre  nos,  o  inqueriao  e  delatavao.  Ten- 
cionava  elle  dar  uma  poderosa  assaltada  no  lugar 
em  que  se  achava  Joao  Feroandes  Vieira ;  mas 
este^  que  tambem  tinha  boas  espias^  retirou-se 
para  a  mata,  que  chamao  de  Vasco  Pires  Borralho ; 
d'alli  mandou  chamar  o  capitao  Antonio  DiasCar- 
dozoy  que  com  a  sua  gente  se  viesse  incorpoi*ar 
com  elle ;  o  que  logo  fez,  seguido  dos  soldados  de 
sua  companhia.  Assim  como  chcgou,  Ihe  deo  Joao 
Femandes  Vieira  pa tente  de  sargento  maior  e  pree- 
minencias  de  tenente  general,  ordenando  que 
todos  Ihe  obedecessem  como  a  sua  propria  pessoa. 
Ghamou  a  conselho  os  homens  que  o  podiao  dar^ 
e  nelle  ge  resolveo  que  nao  convinha  esperar  alli  o 


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GA8TEI0T0  iUSlTANO.  239 

inimigo  com  gente  bizonlm,  falta  d  armas  e  de 
pratica,  e  em  tao  pequeno  numero.  Approvado  esle 
parecer,   se  escolheo  por  lugar  mais  conveniente 
Q  sitio  de  Maciape,  quatro  legoas  distaote  y  e  por 
importante  abrir-se  novo  caminho  pela  mala,  para 
86  encobrir  a  marcha,  furtada  a  espias  e   traido- 
res.  —  Executou-se  o  conselho  com  promptidao; 
abrio-se  o  caminho ,  marchou  o  pequeno  exercitd 
( constava  de  duzentos  cincoenta  homens  e  trinta 
segrosroinas);  fizerao  alto  em  Maciape,  onde  se 
Ihe   aggregarao  os  capitaes  Francisco  Ramos,  e 
Braz  de  Barros,  com  quarenta  homens  hem  arma- 
dos ;  e  Joao  Barboza,  Sebastiao  Ferreira,  Domingos 
da  Costa,  Joao  Nunes  da  Mota,  e  Domingos  Rai- 
mundo,  com  a  gente  quepod^rao  trazer  comsigo. 
OrdeDou  o  governador  da  liberdade  ao  ajudante 
Amaro  Cordeiro  e  a  outros  officiaes  da  milicia 
(cabode  todos  o  P.  Simao  de  Figueiredo)  que 
foasem  pelas  ribeiras  de  Gapebiribe,  at6  a  mata  do 
Brazil,  intimar  a  todos  os  moradores,  que  com 
suas  armas  e  escravos  se  yiessem  logo  para  aquelle 
lugar;  alias  os  teria  por  rebeldes,  e  como  taes  se 
procederia  contra  elles.  Estavao  os  animos  tao  hem 
dispostos,  e  era  tal  a  coolianca  que  todos  linhao 
em  Joao  Fernandes  Vieira,  que  em  cinco  dias  que 
^le  se  deteve  em  Maciape  se  Ihe  aggregarao  oito- 
centos  homens )  os  mais  d  elles  praticos  na  guerra, 
por  haverem  militado  nas  occasioes  passadas ;  po- 
r6m  so  com  trinta  armas  de  fogo,  poucas  para  a 
gente  que  era,  muitas  para  o  rigor  com  que  o  ini- 
migo as  prohibia.  Para  supprir  esta  falta  mandou 
0  governador  alimpar  bom  numero  de  espingardas^ 


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2^0  CA8TRI0T0  LUSITAIia 

que  para  esle  fim  tinha  escondidas ;  aos  mais  fet 
armas  de  chucos  e  paos  tostados^  que  suppriaoa 
falfa  de  picas.  A  esta  heroica  resolucao  dos  mora- 
dores  juntou-se  a  disciplina ;  e  em  pouco  tempo 
comecarao  os  nossos  a  ser  temidos  do  inimigo  peio 
numero  e  pelo  denodo,  que  todos  os  dias  crescia, 
e  que  Joao  Fernandes  alimentava  com  o  exemplo 
e  com  a  fazenda,  pois  por  tempo  de  ires  mezes  cor- 
reo  por  sua  conla  toda  a  dezpeza  do  exercito  na 
campanha.  Em  quanto  o  exercito  oao  muda  de  alo- 
jamento,  daremos  razao  do  que  passarao  os  dous 
embaixadores  j  que  o  Flamengo  maudou  &  Bahia, 
por  nao  tirarmos  aos  successos  seu  proprio  tempo. 
XXXVIL  Em  o  numero  XXI  dc  este  sexto  li vro 
referimos  como  em  os  primeiros  dias  de  Julho 
d  este  anno  mandarao  os  do  conselho  supremo  em- 
baixadores a  Bahia,  com  ordens  que  com  toda  a 
diligencia  descubrissem  o  animo  do  govemador 
do  Estado  Antonio  Telles  da  Silva,  e  sondassem  o 
fundo  que  tinha  a  sublevacao^  e  intento  de  Joao 
Fernandes  Vieira.  Com  ventoem  poppachegaraoa 
Baliia ,  tomarao  terra  e  toda  a  infbrmacao  concer- 
nente  a  seu  intento.  Procurdrao  audiencia  do  go- 
vernador,  e  nella  Ihe  expuserao  as  queixas  dos 
seuhores  do  conselho  supremo  contra  Joao  Fer- 
nandes Vieira ,  e  as  suspeitas  contra  elle  governa- 
dor  de  ter  coadjuvado  aquella  rebelliao ;  e  conclui- 
rao  por  proteslar  contra  similhante  procedimento, 
fazendo-o  responsavcl  pelas  perdas  e  damnos  que 
se  seguissem,  pois  os  Estados  haviao  de  tomar  vin- 
ganca  d'uma  tao  grande  offensa.  —  Ouvio  o  gover- 
nador  com  attencao  os  embaixadores^  e  com  pru- 


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CASTllOTO  LU51TAM0.  2Ui 

dencia  Ibes  respondro  que  Joao  Feraandes  Vieira , 
po&lo  que  Portugue^  pelo  naacimeiito,  era  HoUaa- 
des  peio  domkilio ;  que  elk  habitava  em  domiDios 
do  supremo  conselho ;  que  usassem  para  com  eUe 
como  enteodesdem  ;  que  die  nada  tiuba  com  isso 
assim  como  nada  tinha  oontribuido  j>ara  a  suble- 
vacao;  que  em  quanto  As  ameacas^  elle  nada  re* 
ceava,  porque  Portugal,  que  pod^ra  reaisUr"  a  lodas 
as  fcNTcas  de  CasteHa,  reconquistandoa  sua  liberdade, 
tambem  saberia  eastigar  as  bol^as  de  Uolla&da.  Manr 
don  logo  yir  diante  d'dles  todos  oe  ^bos,  que  diziao 
tiahao  pasaado  o  rio  de  Sao  Fi^andsco  em  iavor  de 
Joao  Femandes  Vieira^  os  quaes  reconhecidos  pelos 
dotfs  embaixadores  j  Uies  disse  o  goveroador  :  • 
(V  Digao  aos  seidiores  do  ccmeelho,  que  sobre leatd 
»  desengano  lhe3  quero  agora  mandar  esies  capi- 
>taes  com  poddrea  e  gente,  para  que  me  tragao 
»  preso  a  Joao  Fernandes  Vieira  (se  i  certo  que 
))  tern  tao  pequeno  soquito  j  como  dizem  ) ,  e  Ihes 
D  ordenarei  que  Cacao  todo  o  poasivel  por  deixarem 
»  OS  moradores  em  sen  antigo  socego )  e  deverao  o 
n  seguro  a  causa  de  sen  receio.  »  Confinos  e  ocm- 
4eiites  se  despedirao  Oa  embaixadores  do  goyer« 
nador. 

XXXVIU.  Tbeodoxio  Estrdler,  que  era  o  prin^ 
cipal  embaixador^  nosdias  que  alii  esieve,  proou* 
rou  audiencia  particular  do  goveraadcH*  do  Esiado; 
nella  Ihe  ratificou  o  animo  que  tinba  de  sehrir  a 
£1  Rei  de  Portugal ,  e  daramente  cenfesson  a  Ton- 
tade  de  entregar  aos  Portugueses  a  fof^fialeza  de 
Nazareth,  de  que  era  commendor;  senrico,  que 
merecia  estknacao  grande ,  pela  importanda  do 
L  16 


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>'. 


U%  GASTtlOTO  LOStTiMO. 

porlo,  pela  ulilidtde  do  eommercio,  <  pdas  coa- 
MqiieocUitdo'etieaipk) :  deter minano  que  ^  tinha 
praticado  a  Jeaa  Feinandet  Vieira  por  equivocaa 
inteUtgencias ,  reeeoM  de  que  nao  livesse  effieito 
seu  intenio ;  mat  que  agora  que  o  Tia  poato  em 
campo  5  tendo  por  si  a  ju6ti9a  e  o  aequile,  se  de*- 
clarava  com  sua  Excellencia,  e  o  disporia  com  Joio 
Fertiandeft  Vieira;  nao  deacjando  da  Majealade 
d'E)  Rei  de  Portugal  maia  premio  queoservitot 
n^m  de  a«a  Exoelieacia  mak  fovor  que  e  ialetrilHO 
d'eata  Terdade.  Graioe  diacreto  Uia  respoodeo  An- 
tonio Telfea  da  Silve  ^  aeooiiando  o  ofieracimeatay 
e  km^Bdo  a  delermiuacao ;  que  bem  moslraTa  aer 
parlo  d'ttfit  animo  geaoroao  e  juatifindo ;  proi^tr 
tettdo-^lhe  da  parte  d'£i  Sim  sou  aenh#r  eqtiivalaiite 
pnemid  a  tao  x^devante  a^rTt^. 

XXXiX.  Eaibamrao  oi  embaixaibM,  cW^a 
riq  a  Bihia^  velatArio  o  que  virto  aa  eidaRk,  e 
quanto  com  o  ^veraador  pafwi  m»  ettgrandkeoeado 
aeo  vidor,  aqa  fidalguia  e  sua  eapacidaik;  afiir^ 
marao  <]Qeo  aeu  cora^ao  eca  altivo,  ^akale  e eii« 
aade,  e  que  eidveasem  oertoa  que  o  mo  haria  de 
aobar  aefrido  o  mioimD  a{^mTO,  »em  uagrato  a 
mais  pequeno  obsequio ;  assim  Iho  fnandava  mgw- 
fioaiv  aQM6elbaQdoK>6  trataaeem  os  aobditos  com 
juati^a  e  clraaencia  pan  aa  oao  tereaa  reheUadm ; 
e  qua  pronieUia  maii^ar  brevemante  •cafMti^a  e 
aoMadoi ,  que  jreduaissem  e  aquietaasesa  aea  inora- 
derea  (para  o  que,  ellea  eaviadoa^,  Ibe haTtto  pro- 
HBKKido  paaao  fraooo  em  nome  doa  fistadoa) ;  maia 
dmerao  que  do  porto  da  fiabia  nao  esiavao  embar- 
oa^oeadegiterrai  foradogailtao  de  Salvador  CotTea, 


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CASTRIOTO  LUSITANO.  '2/43 

que  de  verga  d'alto  esperava  tempo  para  comboiar 
a  Portugal  uma  frota  de  navios  mercantes ;  e  com 
seus  mesmos  olhos  Tirao  assistentes  na  Bahia  tqdos 
aquelles  cabos^  que  se  dizia  terem  passado  o  rio  de 
Sao  Francisco^  em  soccorro  dos  rebeldes.  Coii> 
estas  novas  respirou  o  temor  do$  HolLaodcges^  e  se 
eonfiraiartto  ftqnelles  animos  indomitos  e  periklos 
em  nao  desistirem  das  tyrannias,  e  augmentar^m  as 
semnzQBft  e  aggravos  em  toda  a  parte  e  em  iodo 
o  tempo.  Imaginavao-se  vingados  por  nossa^  mes- 
mas»  e  pela3  suas  senhores  de  (odo  o£sUfcdo  do 
BrazU ;  porq«6  w  deliberaWio  em  malar  por  ti«k€o 
a  todos  OS  que  o  governador  Antonio  Telles  dai  Silva 
mandate  em  aeu  Mixilie ;  e  uiitriAO  que  a  falta 
d'eUea  (he  entregaria  a  Bahia  a  maos  laradas.  Para 
tudo  o  que  )he  propuaha  9u%  aleivosia  se  comeQ^-* 
no  a  |>reparw  eom  loda  a  praaaa.  Em  tudo  at  tn- 
ganou  sua  maHcia.  como  se  veri  em  o  seguinte  livro. 
Q^^  di»  seua  ii&actoa  nao  ftabom  os  bQipaM  adwr- 
ttr  o  wrado  4e  mm  Asenrsos.  Nao  ha  eonian^  «ao 
nescia  como  a  daquelles  que  piotao  os  futuro^  das 
eoresAiaeuadMejoay  aao  podaraada  qiia  nas  maos 
doB  homens  estao  os  inttntos^  e  nas  da  DeoR  os  suc^ 
C^saos;  e  queoconseguU-os^  ou  favoraveis,  ou  ad- 
vaMOi  paia  aala  an  para  aqmAla  6m  y  96  o  maamo 
fhos  op6de  saber,  que  oao  espera  tempo  para  veros 


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Livfio  \n. 


SUIULUUO. 

.  Mandt  o  Flamengo  tsstltar  os  nossos  pelo  mu  strgento  maior 
Joao  Mtr;  pM*  avito  (Turn  Iraidor  suspende  t  marcba—^.  Chega 
^ifif«e  Dim  #  Ipojvea;  o  ^iMihiacoAltce;  ntrcte  t  eocMilrar- 
•e  com  Joio  Blar.  —  3.  Joao  Fernaodea  Vieirt  imn  aTiao  de  tudo; 
leraDta-M  de  Sao  Loureoco,  passa  o  rio  Tapicura  4  vista  de  Joao 
Bkr.  -^  4.  louteu  doi  lrald«rei;  perlgo  em  que  poi  a  emprtM, 
▼eacido  pela  pnidencit  do  governador.  —  ft,  Pe/lioacia  dot  trai- 
dorei*  alalhada  pela  coosUDcia  do  governador.  »6.  Volia  Henri' 
que  Has  de  Ipojuca ,  e  o  qae  faz.  —  7.  Cbegao  ao  alojamento  do 
Cofw  dgmtflAdiM  4o  Cuurm.  —  8.  Derrtlo  com  que  tafo  o 
bereje  do  Arteeife;  eflfeitos  que  ctuta.  ~  9.  Ardil  de  que  uia  Joio 
Fernaodes  Yieira  em  favor  dos  moradoros  da  Tanea ;  chega-lhe 
Modeia  da  deaira^aode  Cuohai;  m«da  de  aloiaroeiito  para  o 
nrante  &$m  Tabocaa;  descripc«>  d'eete  monte.  —  io.  Alojamento 
do  noMO  exercito ;  reduz  o  governador  a  um  apostate  hereje*  — 
11.  Ot  traidores  persuadem  a  que  le  mate  A  cara  descoberta  o  go- 
▼eriador.  *  19.  0  ioimtgo  marclu  para  o  eigeftho  do  Covai ;  dA* 
ae  rebate  nas  Taboeu.  —  IS.  Falla  que  fes  o  governador  A  sua 
gente.  -—  14.  A  vizinbanca  do  ioimigo  Ibe  corU  o  fio ;  fortificao- 
•e  oa  DOatoi ;  o  capitao  Fagundea  deicobre  o  inimlgo  na  passagen 
4o  rio  Ta^ieurA,  e  vai-ae  reclraodo  M  u  aoafM  emboteadai.  — 
15*  Retire- ae  o  Hollandez  sangrado  do  noaao  ferro;  industriacon 
que  entre  os  nofsos  se  esconde  a  falta  das  municoes.  — 16.  Zelo 
d'alguM  rdlgioaos  e  aaeardotes,  q«e  detem  o  governador  quando 
arriscava  aaa  pesaoa.  —  17.  Ardil  do  ioimigo  atalbado;  reiira-ae 
yencido;  toma  a  ayancar^  e  torna  a  ser  repellido.  ~  18.  Forma- 
se  de  novo ,  e  acomette  o  Tabocal ;  o  governador  anima  a  resis- 
taaeia;  ftea  o  HoUandei  deaCnildo.  — 1».  Feeieiao  o»  Portogveies 
a  victoria,  e  ae  prepfrao  para  novo  combate;  queoenganode 
nossaa  espies  Ibe  fes  recear.  —  20.  Foge  o  ioimigo  do  campo,  e 
ae  aproveitooos  nosaos  doa  despojos;  dao  gracaa  a  Deoa  pela  mer- 
e4.  —  21.  Perda  do  ioimigo,  e  nossa;  eapitaes  e  peasoas  de  qua- 
lidade  que  se  acli&rao  no  conQicto.  —  22.  0  que  faz  o  Flamengo 
em  Ipojuca;  cbega  A  Yarzea,  eitorsoes  que  ahi  maoda  fazer;  bar- 
bare  decreto  que  manda  publicar.  —  23.  Chega  ao  governador 
a  nova  do  aoceorro  que  aportara  em  Tamandar^;  delibera-ae  em 
soceorrer  algumas  povoacoes.  —  24.  $ai  da  Babia  Salvador  Gor- 
rea  de  Si  por  general  da  frota;  mette  soceorro  em  Tamandartf; 


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GAsmooTo  LracTAna  245 

accUma-se  a  liberdade  em  Siriahatia.  —  2tt.  loa*  d'Albaqvarftta 
pede  soccorro  aos  Mestres  de  campo  que  tiobao  tiodo  da  Babit  j 
coraelle  eereat  fortaleia  do  inimigo,  que  le  rende  t  parlldo! 
-*30.  Maroka  Mo  Feraandes  Yieira  a  ae^rar  oa  Maalres  deetai. 
po,  a  queixi  manda  dar  as  boas  yiodas;  os  quaes  Ihe  saem  ao  en* 
contro;  alojao-se,  e  mandao  soccorro  ao  Mestre  de  campo  Mar- 
tkn  Soarea  qua  ccreava  a  fSorUlbaa  da  VazafoUi.  —  97.  Manda  • 
gOTernador  marchar  o  eiescilo  para  Moribeca,^  de  U  para  o  rk 
de  Tigipi6.  ~  28.  Decrela  o  geDeral  HoUandez  a  prisao  de  todai 
as  muiberes  da  Varzea ;  determina  passar  a  espada  todos  os  mora- 
dores ;  arkado  do  q«e  o  goTornador,  raar^  a  iflq»edir  aex0M^. 
—29.  Pasa  o  rio  Capeberibe ;  avisia  o  governador  e  ui?este  oa  eequa- 
drocshollandczes;  chegao  Meslre  de  campo  Andr^Vidala  reforcar 
o  combate.  —  90.  Alenroso  eogano  de  que  se  yaleo  o  ioimigo ;  re- 
aolvem-se  os  nossos  em  Ihd  pte  fogo;  pede  o  inianigo  fuartal; 
concedem-se-lbes  as  Tides,  exceptos  os  Indios^  que  se  mandao  pas- 
ser d  espada.  —  31.  0  que  passa  Henrique  Hus  na  presenca  do 
gofemadot.  -^  33.  Alexia  que  oaosou  a  todos  a  liberdade  daa 
matroaas ;  despojos  da  batalha ;  morios  e  fericks  d'uma  e  ootra 
parte.  —  33.  Quem  era  o  P.  Fr.  Joao  da  Resurreicao.  —  34.  Vic- 
torloso  e  triumpbanle  mareba  para  •  Yarzea  Joao  Femandes  Yiei- 
ra; remettemse  ot  readld^  a  Bahia;  morte  de  Joao  Biar.  — 
35.  Cbega  Salvador  Correa  eom  a  froU  4  vista  do  Arrecife;  man- 
da  embaixador  ao  Arrecife  •  com  que  effeito ;  obrigado  do  tempo 
levou  aneora,  e  se  fez  «>  mar.  ^  ^.  Manda  o  HaUandez  qveiauff 
OS  navfos  que  estayao  surtos  em  Taaaandar^;  e  o  qua  miia  m»- 
ccdeo.  —  37.  Primeiras  accoes  do  capitao  Manoel  Barboza.  — 
38.  'Martlm  Soares  Moreno  aperta  o  sitio  a  fortaleza  da  Nazareth ; 
bnaea  o  eommendor  eaipinlios  para  fiicilitar  a  antrega*  —  99*  To* 
mao  OS  nossos  uma  lancba,  e  com  que  occasiao;  protestao  de  to- 
mara  fortaleza  a  escala;  proposta  que  faz  o  eommendor  aos  sens. 
—  40.  Refolvemaentrega  dafbrtaleza;  eapitnlao-se  u  00B4if5ei; 
faz*se  aviso  a  Joao  Fernandez  Yieira ,  o  quai  manda  o  dinbeiro 
para  os  rendidos ;  tomao  os  nossos  posse  da  fortaleza ,  e  d'uin 
barco  que  Ihe  vinha  de  soccorro. 


I.  Confiado  e  altivo  desprezaYa  o  Fiamengo  o  le« 
vantamento  doft  iiK>radores;  aYaliaYa  Joao  Fer- 
nandes  Vieira  pw  cabe^a  send  esfMritos,  porqiie 
sem  autoridade,  sem  valor  e  sem  disciplina.  Viao 
9e<]uito  em  pequeno  munero;  imaginava  o  violenio 


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M5  GAftTwm)  wmM&. 

on  engttfnid^ai,  sein  fftmas,  sem  ttiulii^s,  sent  cabos 
e  sem  pritica ;  e  como  sem  alma  ie  lb#  repreten- 
tava  o  o9rpo  da  rebdliao.  Erroth4fae  a  medida , 
e  sdlo-lhe  curto  o  remedio.  Mandou  ao  sargenio 
maior  Joao  Blar,  que  com  traieoioa  soldackM,  ar- 
madas de  clavinas,  saidse  do  Airecife  (cobefto 
com  OS  sombras  da  noite)  e  d^se  sobre  a  mala  de 
Vaato  Pires  Borralbo^  a  onde  per  ayisot  oerlos  sabia 
que  se  alojavsl  a  nossa  gente ,  com  ordem  que  a 
Jmo  Fernaudes  Yieira  e  a  todos  08  que  o  teguiao 
matai8«,  ou  prendes^ ;  e  que  o  nao  seguisse  sem 
engrossar  o  poder  com  a  genie  do  governador  das 
armas  hollandezas,  Henricpie  Hus,  que  da  vdiade 
Ipojuca  se  haria  encorporar  com  elle  em  o  mestno 
lugar;  ao  qual  tinbao  ordena4o  que  nao  deixasse 
rebelde  com  vida.  Marchou  Joao  Blar  aui  chegar  ao 
sitio  que  chamao  o  Arfaial  Velbo,  a  onde  fez  alto , 
avisado  d'um  traidor  nosso  que  asaialia  a  Joao 
Tet^natidef  Vielra  :  advertia-lhe  que  se  nao  mo- 
veise  at^  segundo  aviso ,  por  quanto  a  nossa  gente 
tinha  mudado  de  alojamento^  e  ainda  nao  tinha 
tomadb  {>osto.  Obedeceo  o  Blar,  em  quanto  a  sus- 
pensao  da  marcba ,  porim  nao  em  quanto  i  sus- 
petisao  das  armas,  porque  com  diversas  mangas 
lomou  (odos  OS  caminbos  da  mata^  que  guiao  para 
OS  rios  Patebiribe  e  Ju£;aribey  e  seguio  o  caminho 
de  Iguara^u,  executando  em  toda  a  distancia  desta 
marcha  taes  ef  tao  crueis  desacatos  e  demaxias»  que 
ainda  agora  os  olha  a  memoria  com  espanio*  Com 
a  mesfna  yioleitcia  rerapia  pelo  religiose  e  peto 
profano  f  despedacata  as  sagi  adas  imagens  com  tn- 
jtim*  t  as  honestas  <lonzo|las  com  irrisAo;  sem 


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dMtiMfio.certava  pela  idade  mais  Torde,  e  pela 
mais  cadociy  nao  fiuendo  disiinc^ao  de  sexo  a  sexo, 
nam  d'eaUiid  a  eatado ;  coln^ia  o  estrago  do  ferro 
com  u  Ginzas  do  fogo ,  e  coon  oa  golpea  da  morte 
aialhava  oa  griloa  da  dor.  Nao.  indivtduo  as  atro* 
cidadasi  porque  deamaui  a  penna  com  o  horror 
d'ellaa,  S46  direi,  que  Ibe  estraobou  Henrique  Hui 
a  ferocidade  |  ou  porque  nelle  se  Tia  exceder,  ou 
porque  a  uao  podia  imitar ;  seado  elle  um^jf  uellis- 
siBio  espaolo  da  natureza  humaua. 

U*  Emouumero  XXXV  do  livro  precedeute  ae 
disse  ooroo  em  24  de  Juuho  aaira  do  Arrecifi^  Hen- 
rique Hu8  com  aeicento^  soldados  a  castigar  0  moUm 
de  Ipojuca  ^  agpora  diremos  eomo ,  por  esconder  o 
castigo  k  eulpa^  marchirao  furtiyos  at^  a  uiala  de 
Tabatioga  (uma  leguadistiinte  de  Ipojuca) ,  a  onde 
ou  o  aviao ,  ou  o  acaso  tioha  emboi^cado  ao  capi- 
iao  Fagundea  com  vinle  aoldadoa  de  sua  compa* 
nhia.  Approveitou-se  da  occasiao ,  e  deo  ao  Flar- 
mengo  uma  carga,  que  o  deizou  eonfuso,  mais 
pek>  sobresalto  que  pela  perda,  que  nao  passou  de 
tres  mortoa  e  alguna  feridos,  Temeo  o  Fagundea 
qua  0  ioimigo  o  cercasse ,  e  muito  com  tempo  se 
reiirou  a  buscar  o  siiio,  onde  ae  alojava  o  capiCao 
maior  Amador  de  Araujo.  0  general  boUandex 
apreasou  a  marcha  f  por  nao  diminuir  a  presa  j  e 
deo  sdbrea  povoacao,  que  achou  sero  resistencia  e 
aem  riqueaa ,  porque  os  moradores  a  tinbap  quasi 
desemparada ,  igualmente  temerosos  xlos  judeos 
oQendidos,  ,e  dos  Hollandezes  escandalizadoa;  nao 
tiverao  os  invasores  em  que  cevar  nem  a  cobi^ai 
nem  a  Tingan9a.  Mandou  0  general  holiaades 


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2A8  GAantlOTO  UTSTANO. 

deitar  bando  qne  assegnrava  as  vidas  e  as  Isr^endas 
aquelles  que  dentro  eni  tres  dits  se  recolhessem  a 
suas  casas ;  do  que  se  aproTei(4rM  algutis  Tiei- 
nhos  por  escaparem  a  morrer  de  feme  no  inierior 
dos  tnatos.  Nesie  higar  mandon  o  ioimigo  enforcar 
a  Francisco  Godinho  por  se  dizer  era  urn  dosicom^ 
plites  iKi  consptraoao  da  liberdade.^^Henrique  Hus, 
sabendo  que  Amndor  de  Araujo.caminhava  com 
algama  gente  a  untr-se  com  Joao  Fernandee  Vieira» 
marchou  a  toda  a  pressa  em  seuseguimenio^  deo- 
)he  alcance,  onde  chamao  a  Ponderama,  meia  legoa 
antes  da  povoacao.  Era  desigual  o  partido,  e  ficou 
Amador  de  Araujo  destrocado ;  raleo-se  da  fuga , 
fovorecido  da  ma  (a  y  def  xando  cinco  raortos ,  e  le- 
vando  comsigo  os  fieridos,  se  fbi  unir  com  Joao  Fer- 
nandes  Vieira ,  que  j^  neste  tempo  se  atojara  nas 
casas  de  Balthazar  Rodrigufs  Govas.  Nao  ficou  o 
Holiandez  sem  recompensa,  que  mortose  feridoe 
)he  custou  o  eneontro.  Henrique  Hus,  com  as  or« 
dens  qne  tinha  recebido  no  Arrecife,  marchon 
adiante  a  incorporar*se  com  seu  sargento  maior 
Jyao  Blar;  mas  com  tanto  medo  das  emboscadas, 
que  o  movimento  def  qualqner  ramao  sabresaltaTa. 
Com  esta  iitiaginacao  mandou  matar  o  hermilao  de 
Santa  Luzia  (capellao  do  engenho  de  Tabatinga), 
porque  ouvio  tanger  o  sino  da  capella,  parecendo- 
Ihe  que  tocava  a  rebate.  Proseguio  a  marcha  re- 
colhendo  os  Fiamengos  que  se  alojavao  nos  des- 
trictos  de  Santo  Antonio  do  Cabo  e  da  Moribeca, 
sem  deixar  cousa  dc  moradores  que  nao  roubasse  e 
consummisse.  Dez  dias  o  delcve  esta  diligencia,  e  a 
cresceqle  dos  fios,  ajudnda  de  sens  recejos, 


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GA9TIIT0TO  LimiTAlfO.  2&9 

HI.  O  go^emi^r  da  libfvddde,  qfie  a  esie  tempo 
M  alo|t?ft  M  poTOdcM  de  Sio  Loureiico,  oceu^MMlo 
em  fM'ei'eiiir  todo  o  qm  podia  set  ittit  a  empresa  ^ 
toi  avisado  de  dentro  do  Arrecife  da^  ordens  com 
que  HeiBpiqiie  Hm  e  Joao  Blar  tinliao  saldo  d*elle , 
e  que  se  aeautellasac,  porque  unidos  o  haviao  deeii- 
Tesiir  em  quatquer  sitio  que  occa passe ;  a  que  sem 
d«vida  fariao  com  sobejo  pod^r,  porque  se  haviao 
de  aproveilar  da  gente  dos  presidios,  que  se  aquar- 
telb^a  peles  contomos.  En^re  os  confidentes  se 
leo  o  aviso^  e  resukou  da  conferencia,  que  de  ne« 
Tihoma  sorte  se  esperasse  o  inimigo  naquelle  posCo, 
por  irregular  para  a  defeza  e  favorarel  para  a  in- 
vasao ;  que  logo  se  levantassem  d*aqudle  sitio,  e 
fte  escoIhesBe  outro,  em  que  eooeurressem  as  con- 
venienciQS  necessartas.  — Executou-se  a  resolueao ; 
passirao  o  rio  Capeberibe ,  que  ia  de  monte  a  monte 
com  mais  trabalho  que  perrgo ,  pelas  balsas  e  jan«- 
gadas  que  se  fizerao.  Pela  margem  do  rio  contina* 
Tao  a  marcha  at^  qvie  chegarao  ao  engenho  de  Sao 
Joao,  que  se  dizia  de  Arnau  de  HoHanda  Barreto, 
o  qual  agasathou  a  todos  (em  fres  dias  que  alii 
cstivcrao)  com  benerolenciae  abundancia  ;  e  com 
dous  filhos  se  aggregou  e  seguio  a  Joao  Fernandes 
Vieira.  Pareceo  bem  a  todos  que  se  eontinuasse  a 
marcha^  dehcando  naquelle  sitio  ao  capitao  Cosme 
do  Rego  com  cincoenta  soldados,  eomo  sentlneRa 
para  descobrlr  a  campanha ,  e  dar  ao  exercito  os 
avisos  necessaries.  Sobre  este  seguro  caminhou  a 
nossa  gente  com  batedores  ao  largo,  levando  diante 
ao  P.  Simao  de  Figueiredo  com  qnatorze  ho- 
meiis  ligeiros,  para  guiar  e  desempedir  a  vereda 


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ott  4ez  horoens  de oada  vet,  piisoii  todo QfaMcito 
o  rio  Tapicura,  i  viaU  de  JoioBUr,  quedftoalni 
ptrie  M  <)ceukava  eiiire  oa  matot  i  eipcMiHlo  a 
cbtgada  de  Hearlque  Hua ,  que  drde»M  afe  md 
aoveaae  d'aquelle  lugari  e  se  akjou  oaa  cataa  de 
Manoel  Fernandes  Crua,  oade  ae  deteve  s6  a  noila 
aeguinte,  e  d'alli  o  le?ou  comaigo  o  govemaidor  da 
liberdade,  para  o  aitio  de  Bdchior  Rodriguea  Cevaa» 
oode  a  noasa  gente  fea  alto ,  e  se  aquarteUou  oom 
ioiento  d'esperar  e  reoeber  alii  o  inimigo,  ae  neUe 
o  buacaaie.  Joao  Blar,  que  vio  parlido  o  nosao  exer^ 
citO|  e  por  urn  mulalo  traidor  enteodeo  que  ne  eugd- 
nho  de  Arnau  de  HoUauda  ficaya  Goame  do  Rego, 
com  cineoenta  booMnsdeo  aobre  eUea  no  maia  idle 
da  Boitei  e  facilmente  oa  desbaratoui  porque  dea* 
cuidados  dormiao  aobre  o  fteguro  de  sua  coniiaiiQa* 
?Iap  deo  o  asaalto  lugar  i  defeosa ;  porim  oaa  o  li-^ 
rou  a  fugida.  Sabiao  o»  noaaos  as  vereda» ,  e  fieitos 
n'um  corpo  rompirao  peio  malo,  e  ae  forao  eacor- 
porar  com  o  governadpr  da  liberdade 

4.  Ja  por  vezes  temoa  dito  que  a  traicao  pre- 
tendeo  deade  o  principio  oaalograr  a  glorioaa  em* 
presa  come^ada  por  Joao  Fernaodea  Yieira ;  agora 
diremoft  que,  quauto  maia  eata  ae  conaoUdava, 
maia  aqueUa  escogitava  meioa  de  a  dealruir«  Veodo 
oa  traidorea  que  accanpauhavao  Joao  Fernandas 
Vieira  mo  para  Ibe  imiiarem  os  impulaoa,  sense 
para  ibe  contai*ein  os  pasaoa  ^  que  a  sua  genie  cres^ 
cia  em  numero  e  em  animo  ^  e  que  o  pod^r  iaria 
inutets  os  eaforcoa  da  trakao,  usiirao  d'um  diaho- 
l|co  ardil,  que  cbegou  a  por  em  contingen^ia  o  pro- 


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§rm»  dm  enqpraMU  Chimirio  a  ii  os  homeiis  que 
ft  piirihBtmidaitoc  a  tidK)rdina^  tinhao  mais  dia* 
.poaioa  para  a  creduHdailey  e  com  racoeaappareiitoa 
oaperwtfKUrao  qne  o  urtcMo  de  Joao  FemaBdea 
VSeini  oao  era  do  oa  liberUr^  aemo  de  oa  dealruir^ 
tmndo^os  d^  atias  caaaa  com  a  vox  da  IHierdade 
para  os  destarrar  da  pairia ;  e  a  melbor  livrar^  leTaU 
oa  cQRisigo  para  a  ftihia,  porque  eotre  os  Hollan* 
dezea  nao  tinha  quartel.  Fiaerao4het  uma  pralica, 
com  que  oa  quixerao  disauadir  de  aeguir  um  ambi* 
«iMO  que  ad  qoeria  gaohar  noma  a  caala  de  auaa 
▼idas  e  fazeiidaay  e  ooaclnirao  diaeada  :  «  Dizemoa 
»  Q  que  palpaflMM  «  quern  ae  qaiaer  perder,  deixe*- 
M  ae  enganar ;  quem  tiv^r  juiao,  aaberi  teaaer  ^  que 
n  iM>  p6de  haver  maior  demencia  que  ler  aoa  olkoa 
n  o  praotpieio ,  e  deapeohar-ae  por  goftio,  m  -^  Foi 
de  aoao  em  imao  a  praiiea ;  impiimio^^se  oom  ella  a 
deanoiifiinfia  ^n  mukas  aninooa  meuaa  firiuea  na 
raaolufaa,  de  aorle  que  dtvklido  a  exercito  em 
buidos  eaminhaTa  a  um  motiin  iiretoediaveK  Po*- 
rim  OS  capitaea  mais  valeroaM,  aobrea  e  fieis  uoi* 
no-m  ao  govenMidori  ooDtendo  oa  soldados ;  e  este 
uaando  de  sua  eoaiumada  prudeacia  f  mandou  dar 
om  rebate  falao,  com  voi  que  apparecia  o  Fla- 
ineogo ;  oid^aou  ao  sargenio  maior  que  repartisse 
a  gente  pelos  postos^  e  emboscadas  mais  (^nvor 
Biotas,  divkUndopor  U>das<]«amoUuados#^  A  obe- 
diedcia  de^Mm  sem  diaourso  a  maUciai  e  a  repeptie 
Mtt%  iembrao^ a  duTida,  ch^arao  as uossassenti*- 
-oellal,  e  disaerao  que  o  campo  estava  aem  iuimiga. 
Foi  ordem  a  eada  um  dos  ^pilaes  que  deixaa^c^ 
-OS  poaloS)  e  se  reootbessem  com  a  gaute,  e  cadar- 


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952  cASTBioiD  unmiia 

qntl  com  a  de  sua  <K>m{Minbia  pasMiie  par  oiideie 
a^java  o  govemador  dt  libenbde.  Eriio  trtnU  • 
quatro  o$  capittes ,  e  assimcomo  cada  nan  prepaa* 
tara ,  o  goveroador  »grattdecia  a  obedimcia,  valor 
e  preBteza,  com  que  hayia  aaido  a  defcta  da  sua  li*- 
b«rdade,  mostrando  bem  o  aangae  portuguex  que 
herdara,  e  os  brios  que  tinha ;  e  que  se  algum  aol- 
dad0|  por  Falta  de  animo  ou  de  zek>y  se  nao  atrevia 
a  eontinuar  a  guerra,  desde  logo  o  havia  deapedido^ 
porque  nat  occasioee  senria  a  quididade^  e  uao  o 
numero;  e  que  aa  balalhaa  se  v^ueiao  por  auimoaos 
e  nao  por  cobardes.  A  diversos  raacfaos,  que  fica*- 
vao  desviadoa ,  mandou  a  goTemador  fiu^er,  pelo 
P.  Simao  de  Figueiredo,  a  meema  pratica,  Obroh 
o  remedio  com  tauta  elBcacia,  que  ae  outio  em 
todos  o  brado  daaaude,  porque  a  gritosproaieUiao 
obediencta  e  fidelidade  a  aeu  governador  Joao  Fer- 
nandea  Vieira ;  q  qual  com  a  espada  deae»faamhada 
na  m&o,  e  em  tok  alta ,  disee  que  eatava* prompio 
a  dar  por  todos  a  &zenda  e  a  vida ;  e  que  a  qual- 
quer  que  fosse  tao  inftime  e  ousado ,  q«e  se  atre* 
vesse  a  deariar  ou  persoadir  k  menor  pesaoa  d'a- 
quelle  exercito  a  nao  pros^^ir  na  pretensao  de 
sua  liberdade,  o  hatia  de  mandar  enforcar  por 
traidor,  sem  dislmccao  de  pesaoa ,  nem  quebra  de 
palavra. 

y .  Nao  pod^rao  oa  traidorea  destruir  a  Joao  Fer- 
nandas Vieira  por  meio  da  divisao  que  pretend^rao 
introduzir  na  sua  gente ;  mas  nem  por  isso  deats-- 
<lrao  de  suas  mis  intensoes ,  que  tratarao  de  Ibe 
tirar  a  vida  de  palavra  e  por  escrtto.  Nao  se  per- 
suadio  que  bou vesse  homeue  tao  desam  parados  da 


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CA8TBI0T0  LI^SITAIfO.  253 

eottsciencia  e  do  juixo  que  lal  inlentassein ;  mas 
isomo  imfMseoi  oe  atiso^,  com  sinaes  cerlos  das 
pewoas  etks  dtligeticias,  individuando  as  chrcums- 
Uoda^,  tratoo  d'atalhar  o  receio  e[o  damno  pelo 
modo  roais  seguroe  menoaescandaloso ,  matidando 
p6r  diias  aentinellas  a  porta  da  cozinha  j  mo  dei- 
xando  entrar  nelia  mais  que  um  fiel  escravo  que 
Ihe  faita  de  t^omer,  e  nomeando  nma  guarda,  que 
de  dta  e  de  noite  acompanbasse  sua  pessoa;  e 
d'eale  modo  eonftindio  o  odiocom  mostrar  que  des- 
presava  a  trakao. 

VI*  Malogrados  por  esie  modo  os  mtenfos  da 
traicao ,  proseguio  Joao  Femandes  Vieira  na  he- 
roica  enpr^sa  que  haria  comecado  com  igual  zelo 
e  niiO  meiior  inleUigeiicia.  Tinha  elie  ja  nomeado 
capilio  maior  a  Joao  Soares  d' Albuquerque  j  com 
ordem  que  lenoitasse  geote  na  freguezia  da  Marfr- 
bett  o&m  diffiflMitacao  e  segredo,  para  a  acbar 
promj)ta  na  occasiao ;  do  alojamenio  do  Govas  Ihe 
eacTeveo,  ordenando-lheque  aeclamasse  a  liberdade 
e  togo  marehai^e-  com  a  genie  a  unir-te  com 
eUe.  Em  2  de  Julho  foi  entregue  a  carta  :  com 
prompta  obediencia  se  executou  a  ordem.  Saio  do 
sea  ^figenho  acompauhado  de  sen  irmao  Joao  Lei- 
tea  (poi^  eMe  elleito  capitao)  6  de  Tinte  homens 
de  sua  casa ,  mandando  a  todos  os  mancebos  que 
pagasaem  em  armas ,  e  o  seguissem  sob  pena  de  os 
castigar  severamente  como  rebeldes  e  remissos. 
Nao  houve  algum  que  o  fosse ;  antes  com  tumul- 
tuoso  alYoroco  sairao  no  UtmB.  do  bando,  sem  sa- 
berem  os  fundam^ntos  que  tinba  a  sublevacao, 
porque  sd  se  mandata  que  tomassem  as  armas 


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2M  CUXMOfO  uwir AM. 

contra  a  iyratum  bolltttdeza*  Em  qtia&io  Mm  wt 
preparavao  d^fiie  aobre  o  M^entio  iqtiwbatiloa  Fla- 
mengofif  com  numeroia  partida  de  badtoa^  i|fia 
Tiofaao  de  Ip<3jttca ,  (ao  inopioadaoiettle ,  que  taCit 
o  rebaia  a  o  aaaalto  le  nao  entrepox  maia  tanipa  ipK 
o  neoMaario  para  a  nooaa  gente  ae  rattrar  a  im 
moote,  oMia  furti^oa  ao  poder  do  irtimigo  ae  Uae 
a^[|(itc;araa  iodoa  oa  chanados*  Uiudoa  n  um  coFpa 
tomiraa  a  derrou  da  Goi^au ,  raoolhcaido  de  c^ 
mmho  o§  moradorea  da  fra|[uam  de  Saato  Anaonio 
do  Gabo.  Marchaiio  todoa  debaixodaalMiadeiffaade 
Joao  Soara«  d'Albuqueaque;  a  poueaa  jorriadaa  eo- 
cootraracHM  com  AiMdor  de  Araiija  eaaa  ^aBie^ 
que  a^yiiao  a  laii^t  ywada;  e  fattoa  em  tii  oaape 
d^  quatrooemoi  hoiMos  obegina  ao  ilijam—ta 
do  Covaa ,  oade  foiio  iveabidoa  dotpHraraader  a 
jMia  oajboa  wm  aqurlla  alegiia  i^aie  a  Mdaa  daa 
oaoocorro^^vese  feaiaesUiaar  pate  qwdidade  n  pale 
nomero^ 

VXI-  Creacap  o  al^ora^o  que  tiwiiia  oa 
com  a  cbegada  da  aeUe  lodioa  ^  amajee  de 
quetes  biacamln^  {antra  eUea  ttiu  daraai  qua 
oa  publicava )  iodoada  lefoo  da  P,.An>naaa  Plii«* 
lifjpe  Caioaiio,  do  qiial  aArnaa^,  vuiha  eaa  mm 
^uiioeoi0camo9O?6rmder  doa  MiaiM  HwriqMe 
JDias^  e  oao  podw>  tacdfu*  selte  oia  oilo  diaa>  A  mm 
seutioeUa  oeasa^  que  aa  admUMi  a  pedir  aMferaa^ 
deo  o  govemador  doua  eaeravoa« 

yiU.  Te?e  o  goato  d'eata  mra  o  (k^ms^  ^yue 
tern  u>doa  os  d'eata  vjda.  Cb^gav  aviao  ao  geeer^ 
nador  da  lil>erdade|  qua  o  Fla»ieay  publkaia  mm 
decratoi  peb  quaiobr^ara^  tadaa  aa  mHlhematdia 


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9tu  dMalnio,  dc  qualqser  cfualkbde  e  Mtado  que 
foiveoif  que  tivitMMa  nnrtdos,  filhos,  ettnhados  ou 
trmicM  BO  eMtdlto  de  Joao  Femtndks  Vleira ,  o% 
fei»em  icemptalur  em  termo  dt  cinoo  diss ,  sob 
peaa  de  fiMrCe  e  eoofiieacao  de  faMndas ;  que  er- 
ronim^mettle  ae  execuiarm  em  todas  as  que  de- 
pots do  4onipo  consignado  foesem  aehadas.  — Sood 
tio  iBol  essa  bairbaro  riffjir  noa  ouridos  de  todos^ 
ffm  nao  Eoou  ptasaa  4i  quem  mo  dt>Hiaa9Be  a  ira,  e 
odaafjoda  Tingaaca ;  mae  soaa  qoehtas  krio  irapo^ 
taimv  porque  o  4e8liumaBO  hereje  era  inexoratel* 
Sobra  tudo  foi  na  Yarat-a  em  que  o  quadro  era  maia 
1.  Uma  relagao,  queeataoeliegou  ao  noaso 
ipaoMBlo,  dwa  que  en  todaa  ti^pe9ava  o 
oaa  pn%Ms6ea  do  eoaaaMvo,  fiiBiido  asobri-* 
gpoata  4b  «tado  aa  que  smia  llie  impomMtitaTao 
e  ioaiidio.  AqueUaa^  ^  quaei  a  notmma  fifiN« 
aempre  noethkka,  o  enalttiDe  4^  grfttio  Ikea  im^ 
podia  a  fiaga.  Aa  q^a  a^  riao  rodeadas  de  ittioa^  de- 
ydas  do  amor, «  jMMngadaa  da  rmmt^,  nao  tifihao 
aaeollMipwa ft|(ir  ou  para  padeecr.  Aa  donzaUas, 
1^  perdereea  a  siaia  pnoioaa  joia ,  nao  sa<^ 
^dhebar  a  can,  ou^m  buaear 
>  e  aa  caaa  ae  Ibe  wypcsaa-^ 
pori^o^  Em  tedaa  gemia  a  aflieoao 
kmaeia,  wm  oaitea  <eofiaolaoaD  mais, 

» a  ique  danM  lioiaa  iagiiaaaa  a  oalraa  lagritt^ 

eoccorao,  «pia  o  da  mis  aMpireaa  ou* 

fiiirmdn  apue  neukmtt  ihea  podia 

o  4eaejo  da  fUU,  4fm  aa  wm  Ummmt  a 

A%umaa  hmawe  que  iMmeairao  o  malo , 

piW|M  ae  Ihaa  MpnaauAava  m  moria  aaeima  Ma^ 


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256  GASraiOTO  USITiMO. 

c^QAsideraodo  que  nas  £era8  tiobfto  o  loroieDto 
G6r to,  BOS.  bercjes  o  tormeolo  e  a  iofuria  com  igual 
iinpiedade.  OatriA^  com  eaperanoa  duvidosa,  bua- 
cavao  dila^ao  a  peQa  na  extensao  do  leanpo  :  por 
as  casas  dos  coofidentes  soUciUrao  a  magoa  cam 
qua  as  ^acoodiao,  e  o  martyrio  a  que  se  coiidem- 
luivaot  dormiiMlo  peloa  p^  das  arvorea,  com  o  so- 
braialto  de  m  buacar  a  espida  a  toda  a  liofa,  e  de 
esteader  o  caaiigo  a  quem  Ihes  permiuiaoamparo ; 
e  lodas ,  deaconfiadaa  da  yida,  traUTaa  das  coiitas 
que  baviao  de  dar  a  Deoa ,  a  qaem  offereciao  Ia- 
manhas  iribulacoes.  Sxoeasivo  foi  o  peaar,  que 
eau  rek^  causou  a  iodo  o  exercilo  ^  lasUmaodo 
a  UM  por  mteresaadoa,  e  a  oulroa  por  coiHbidoa; 
porfim  mais  que  esoeasivo  o  que  penelrou  o  cora^ 
cao  de  Joao  Feroaiidea  Vieirai  ao  qual  (eriaQ  juAtoa 
Oft  aeolimeiitos  de  eada  um«  Era  dewdor  a  iMiima 
de  lodoa  y  oomo  causa ,  e  aoouaelhado  cava  a  divida 
mlindou  fixar  por  todaa  as  partes  publicaa  do  Ar^ 
recife  outro  edilal  do  iheor  aeguiaie. 

iX.  «  JoIk)  Faraaades  Yietra,  govaraador  das 
A)  armas  na  emprasa  da  Uberdade  doa  movadores 
»  da  PeraambuQO ,  e  das  mais  capttaniaa  atymtas 
K  as  armas  hotlaadeaes :  Por  quanto  nos  veia  i 
n  noCicia  o  barbani  e  crudi  decrelOy  que  a  lyraiuiia 
»  hoUaiideaa  fukninou  contra  aa  kis  da  iwUiCMa 
^  e  da  politica  doa  homens ,  eondemBando  ao  riQor 
»  de  anas  anMs  aqualle  acm  que  a  eoricaia  das 
»  gailea  respeita ,  e  a  natural  li«gittdade  escuaa 
H  da  kxk  a  boaiilidade  edeaacato,  com  mandar  as 
»  mulheres  de  aossa  obrigacao  que^  sob  peoade 
»  mono  /  ae  desterrem  de  suaa  ^casaa  (  por  motive 


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CASTRKm)  LUaiTANO.  8ST 

»  em  que  nao  padiao  ter  parte)  violando  aifuelle  na^ 
»  ttiral  foro,  que  as  isenta  de  (odos  os  impulsos  da 
)»  ira  eda  vingaa^a ,  coDtra  o  qual  s6  cobardespode* 
>  riao  delinqtur.  Mandamos  a  todas  e  a  qualquer 
D  mulher  de  qualques  qualidade  e  estado  y  que  de* 
»  baixo  de  nosso  seguro  se  deixe  estar  em  sua  casa 
»  (coBdo  desohrigada  de  obedecer  a  preceito  lao  bar^ 
»  baro),  tomando  per  nossa  conta  a  vinganca  do  me* 
»  nor  aggraYo  que  o  Uollandez  Ihe  fizer ;  e  juramo9 
»  tomar  delle  tao  exacla  satisfacao ,  que  com  ella  se 
»  eternize  na  memoria  das  gen  tes  o  crime  e  o  cdstigo, 
h  e  servira  a  exaccao  do  estrago  de  gritar  em  todas 
»  as  idades  a  horribilidade  do  delicto.  Dado  nesta 
M  campanha  da  liberdade  rai  1 5  de  Julbo  de  1645. 
n  JoAO  Fbrnanpes  ViBiRA. »  0  Flam«[)go,  que  leo, 
e  y\o  este  edital  fixado  nas  portas  de  snas  mesmas 
(brtificacoes,  ficou  tao  atormentado,  quesuspendeo 
por  entao  a  execucao  do  bando.  —  Poucos  dias  de^ 
pois  cfaegou  nova  ao  nosso  alojamento  da  execrarel 
atrocidade  que  o  rnimigo  execulou  no  lugar  de  Gu^ 
nbauy  em  a  manha  de  um  domingo  16  de  Julho, 
como  fica  referido  por  extenso  em  numero  V  do 
lirro  V  desta  historia.  Fez  esta  nova  grande  aballo 
nos  coraooes  dos  combatentes»  e  accendeo  em  todos 
o  fogo  da  coragem  animado  com  o  desejo  da  vin- 
ganca. Todos  se  dispunhao  a  rebater  denodada-^ 
mente  o  inimigo,  mas  sendo  informado  o  governa^ 
dor  da  liberdade  que  era  grande  o  poder  com  que 
vinha  atacal-o ,  e  conhecendo  que  o  sitio  nao  era 
favoravel  para  a  defesa ,  chamou  a  conselbo  ^  e  de- 
pois  de  ponderadas  as  inconveniencias  do  (orreno  j 
se  assentou  que  seria  ruina  de  todos  esperar-se  o 
L  17 


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kumiga  AtqueUe  lugar;  e  que  logo  Be  fauscasse 
outro,  em  que  concorreieein  os  reqmdUoB  que 
pedui  apratenle  ocotsiao.  Pdos  soldadoB  vma  intel- 
ligeatet  mandou  o  sargento  maior  &zer  esta  diii* 
gencia*  BreTemente  voltmo,  feita  escolha  d'um 
■onte  que  chamaviio  das  Tabocas  ^  que  Antonio 
Diaa  Cardoco  aq)provou,  pdo  conbacimento  que 
tindba  d'elle ,  como  Tersado  no  terreno  que  sabia  a 
palmot.  Logo  mandou  o  govemador  marcbar  o 
e^emto  para  aquelle  sitio,  e  ae  alojou  no  mail  alto 
do  outeiro.  Deixou  o  akjamento  do  Govas  (onde  es- 
teve  vkate  e  doua  diaa)  em  o  ultimo  de  Juttio^ord^ 
naado  ao  capitao  Antonio  Gomes. Taborda  fease 
preeocupar  o  angenho  de  Balthazar  Gon^alvea  lio- 
xeoD  (l^oa  e  mek  distante  do  m(mte  daa  Taboeas), 
part  que  d'alli  previsie  todas  aa  entradas  que  po- 
diao  guiar  para  o  posto  etoolhido;  e  ordem  que, 
ae  o  inimigo  tomaase  alguma  daa  yeredas,  o  reoe- 
beaae  com  a  primeira  carga^  e  nao  deaiatiaae  de  o 
entreter  na  retirada ,  faz€»do4be  avttoa  de  tudo  o 
que  Ihe  pareoeaae  neceasario.  —  Tabocaa  ^  o  meamo 
que  un^  especie  de  cannas  bravaa ,  mats  groaaaa 
que  4u9  de  Portugal^  rodeadaa  de  puas  tao  agudaa  e 
aolidas,qiieaanao  deaponta  qualquw  of^ioaigao. 
Produa  a  natureaa  aaqueUas  partes  estea  cana^eaea 
tao  denaoa  e  compUcadoa  que  oa  nao  pode  romper 
a  for^a ,  senao  com  os  yagares  da  arte.  Pela  muita 
copia  d'eatus  cannaa,  de  que  aecingia  aquellemonte, 
U^  chamaTao  os  naturaes  o  monle  dasTabocaa.  Si- 
toou  a  natureza  este  monte  nove  fegoaa  do  Airecife 
para  a  parte  do  poente,  pela  qual  o  cinge  um  rio  ao 
largo,  chamado  Tapkura^  pohre  pela  fonte,  e  ao- 


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CAfiTRlOTO  liCSlTAIfO,  859 

berbo  no  inverno  pflas  agua^  vertcntes ,  que  en-- 
gfdssao  Ma  C6#itente.  Entre  o  no  e  o  monte  ^ 
tttottra  trrtra  cstmpiina  quie'elha  para  o  snl;  ter4 
«eiaqtiatto  de  legoa  de  freilte,  corfendo  atd  o 
Tabbcal ,  tjue  cirige  o  monte  por  aqnella  parte,  c6m 
ciiicoehta  p^  de  groteo  em  todo  o  precihto.  Dentro 
d'eaile  taboeal  esla  ontra  planicie  de  menor  extensBo 
qne  a  primeira ,  kdeada  tatiabem  de  6utr6  6iiito  de 
tabocal  de  ihenos  grosrara ,  que  ao  modo  de  trin- 
cheira  corre  vlU  ao  alto  do  monte,  O  dmo  d'ellesi^ 
T*  cercado^  pela  parte db  sul,  d^uma  mata  de  grossaS 
e  empinadas  arv<W^  sissitn  bastas  que  compunhao 
nm  forte  muro,  por  aquella  parte'  orlada  d^un^ 
fao^a  de  tabocal.  Pelalsi  costas  do  monte  para  o  Nas- 
cente  e^tara  um  caminho  antigo,  que  senrfra  &  coh- 
duccno  dorpio  do^Braxil,  que  se  tfrava  d'aquelte$  ma* 
tos,  detodosesquecidopelo  deraso.Dmd'legoa  e  tneM 
d'este  moAte^  para  o  norte,  existla  uma  hermida 
dedicada  a  Santa  Antao  abbade,  de  cojo  fevor  e^- 
peravao' OS  Moment  a  seguranca  de  seus'garfos'^ 
pehs  mtiilaj^  feras  qiie  p(rodu2  o  lerteno;  e  al^- 
liMw  casas  terreas ;  que  diamatfio  cMarde  do  Btaga-! 
Tiome  que  Hie  deo  o  appelKdo  d^  sett  lundadoi^. 
€omf  eafi  descripcao  do  lugar,  em  que  se  deb  a 
fmtfllha^  fiterao  claros  ao  lehor  t>s  incidentes  do 
tjonflicto. 

X.  Ghegou  a  noesa  gente  ao  Tabocal ,  e  dentro 
d'elle  se  alojou  em  modo  d'arraial.  No  mais  alto 
do  monte  se  consignou  estancia  ao  governador ;  e 
pelas  ladeiras  se  armarSo  tendas ,  e  se  levant^hrao 
barracas  para  os  niais  ofiitiacs  e  soldado*  se  recc/* 
-therem^ em rataa das^ chutas ,  por  ser no-tcmp6do 


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340  CiSTBIOXO  tOftlTAKa 

iiivecDO ;  guarnecdrao-se  as  eniradaa  e  po»tos  ne-- 
cesaarios  dos  soldados  de  nelboir  opinio ;  deitarao- 
se  aenlineUas  ao  largo,  e  forlifi^u-^  o  arraial  no 
Diodo  que  o  permiitio  o  iugar  e  o  tempo«-*-NesU 
occasiao  e.neate  silio  inostroul^em  o  governador 
Joao  Feraande3  Vieira  que  era  seu  zelo  igual  a  seu 
valor.  Teve  ceria  iuforma^ao  de  que  naquelle  des- 
tricto  vivia  o  P.  Manoel  de  Moraes,  apostata  da 
fe  e  de  seu  Eslado^  rePinado  hereje  por  obediencia 
e  por  observaucia,  segiiiudo,  pr^gando  e  defen- 
dendo  os  erros  de  JLuUiero  e  de  Calvino  :  nao  ardia 
uo  peilo  dp  goyernador  meuos  o  ^o  da  religiao , 
que.  o  fervor  da  gueiTa.  Mandou  bu^car  preso  o 
apostate;  chegou  este  aseus pis  banhado  em  la- 
grimas;  protesiou  emeoda^  e  com  religioso  pejo 
pedio  ao  governador  fosse  ser  vido  dirigU-o^  para  que 
o  tribunal  a  que  perlencia  o  casligQ  se  houvesse 
com  eUe  com  a  custumada  brandura  e  piedade. 
Abjurou  logo  a  communicaj^ao  dos  herejes ;  pro- 
melteo  a  uniao  dos  catholicos^  e  nesta  occasiao  nao 
deiiou  o  lado  do  goveroador^  .animaudo  os  solda- 
dos com  qm  crucifixo  uaB  maos«  Por  feliz  aonuncio 
d'umagloripsa  victoria  teve  o  governador  esia  coo- 
yersao^  esperando  da  piedade  diviua  que  assim 
como  llie  dera  for9as  para  tirar  urn  arrependido 
d'entre  os  obstinados,  Ihe  assistiria  poderoso  para 
castigar  aabstina9ao  de  tantos  precitos,  premiando 
seu  zelo  com  os  triumphos  de  sua  fc. 

XI.  Nao  se  corregirao  os  traidores  com  as  sa- 
bias  e  geaerosas  disposicoes  que  tomara  o  gover- 
nador; autes  devorados  d'emula9ao  crimiaosa  bus- 
carao  todos  os  meios  para  o  destruir.  PubUcarao 


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CASTBIOTO  LCSITAKO.  Ml 

que  ludo  quanto  o  govemador  dizia  da  vinda  dos 
governadores  de  Indios  e  Mioas  era  fingimento  c 
engano  :  com  a  tardartca  persuadiao  a  descon- 
fianea^  assegurando  o  perigo  na  falta  do  soccorro, 
e  d  remedio  na  morte  de  Joao  Femandes  Vieira. 
Diziao  que  a  salvacao  de  todos  consistia  em  malar 
k  cara  descoberia  a  qiiem  os  arriscara,  e  em  se  en- 
tregarem  todos  ao  Hollandez  y  desculpada  a  rebel- 
litto  com  o  supplicio  da  cabeca,  Avisarao  o  gover- 
nador  da  praiica  dos  autores  da  perfidia,  e  dos  in- 
teniod  d'ella^  e  foi  admiraTel  a  prudencia  com  que 
o  magnanhno  varao  acudio  com  medicamentos 
lenitivos  a  atalhar  o  mat,  curando  a  ferida  sem 
escandalizar  a  chaga.  Dobrou  as  guardas  de  sua 
pessoa,  affastando  de  si^  com  apparentes  causas, 
aos  snspeitos  ;  ordenou  ao  sargento  maior,  que  se 
alojasse  junto  &  sua  estancia  ;  despedio  quarenta 
soldados  que  fossem  esperar  o  Gamarao  e  Henrique 
Dias,  e  os  conduzissem  para  aquelle  sitio  (dando 
assim  a  entender  que  sabia  nao  estarem  muito 
distantes);  mandou  guamecer  os  postos  mais  ar- 
riscados ;  e  ao  ^rgento  maior  que  os  repartisse 
pelos  cabos  e  soldados  mais  confidentes.  TRio  des- 
apaixanado  acudia  a  ludo  o  que  era  necessario 
para  a  resislencia  e  para  a  defensa,  como  se  o  nao 
occupara  outro  cuidado :  cobria  as  causas  do  receio 
particular  com  a  applicacao  do  bem  commum,  sem 
que  sua  vigilancia  fattasse  nem  a  prudencia  de  go- 
vemador, nem  a  obrigacao  de  soldado. 

Xn.  Ja  neste  tempo  marchava  o  Hollandez  com 
disciplina ,  formado  lodo  n^um  corpo ;  a  que  se 
reunirao  os  tei'cos  de  Henrique  Hus  e  de  Joao  Blar, 


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aft2  GASTEIOIQ  M«Tiaa 

9  a  {]fei)jl)&  tiy^(]a  das  pre^ios ,  o  que  tudo  fittia 
q  n^V^xero  de  mil  e  quinhentos  s«ldado$  praUeos  e 
^8coUudo$,  bem  anjoado^a  gi^acnecidos^  mos*^ 
qv^l^  e  chLviaas  reforcadas,  Avultava  p  ex^rcUo 
mats  que  outro  laito  com  a  gpapd^  luultidao  de  la* 
dio$,  a  maior  parde  lAio^qwt/eiros ;  frecbeiroa  of 
oiUro3,  e  exercUado$  pa  milicia^  Com  eaie  exercito 
a^sim  avultado  em  for^a^  a?ira  Hemique^  Um  di9 
povoa^o  de  Sao  Louren^o  tao  seguro  da  victoria 
que  Ibe  qao  dava  cuidado  a  bataiha  :  a  esperaaca 
do$  de$po|09  apre$3ava  a  n^rcba  doa  soldados  p  de 
lorte  que  vexicia  o  tempo.  Tom^rao  a  vereda  que 
guiava  para  o  eugeubo  do  Covas,  ooda  oa  cbamava 
o  aviso  (ainda  uao  sabiao  que  a  m>3sa  gente  tiuba 
melborado  de  aU)^meuto)»  CbegaraO|  e  quando 
virao  tudo  desemparado ,  quebrirao  a  furia  em 
qaafidar  p6r  fogo  aos  cdiGcios ,  xjue  erao  de  uobre 
fabrica,  ^^  D'uma  emiueocia  yao  uma  #entinella 
no$sa  o  fumo  da9  chama^  e  com  preateza  d/eo  couta 
ao  governador  da  Uberdade  da  parte  oode  ardia  o 
fogo.  Sem  d^i^cao  maudou  o  sargento  maior  o  ca** 
pitao  Joao  ISunes  da  Mata  com  viate  $oldadoa  a  des* 
cobrir  o  campo,  e  ordem  do  que  baviao  de  fazer  se 
aTistassem  o  inimigo.  Neste  tempo  cbegou  um  soU 
dado  do  capilao  Ai^tonio  Gomes  TaU)rda  (que  por 
ordepi  do  governador  ficara  no  engenho  de  Bal- 
thazar Gcm^alve^  Moreno)  com  aviso  da  mar<^a  do 
immigo ,  e  d'um  encontro  que  tivcra  com  a  sua  re- 
taguarda ,  que  oonstava  de  quatro  centos  Hollan* 
dezes,  e  ^m  eoquadrao  de  Indios,  aprovcitando-se 
dos  matos  para  esQonder  a  dcsigualdade  do  numeroj 
(eraoo$no8so8  du^entoa  e  <juarenu)ecoineinbosca- 


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cbt  e  mtestidos  o  yinka  en&dftiido>  e  cntreteiido  e 
Ihe  tinlu  morto  catone  HoUaiideies^  smn  qoe  o 
Flamei^  deixasse  a  marcha^  nem  a  nossa  gente  a 
opposi^o  ai6  ordem  de  ma  senhork.  Mandovi  o 
govemador  ao  sc^dado ,  que  Toltaase,  e  disseMe  ao 
seu  capitaoy  se  retiraase  em  boa  ordenanca  para 
aqBetle  sitio ,  porque  nelle  se  ha  via  de  esperar  o 
inimige. 

XUL  A  certexa  e  viainhanca  do  conflicto,  como 
BO¥a  cauaa ,  loflammou  novo  zelo  e  alvoro^o  no 
animo  do  governador  Joao  Feraandes  V ieira ,  de 
sorte  que  com  p  logro  de  seu  desejo  galaateava  a 
moleatia  de  seu  cuidado;  o  gosto  Ihe  vesda  o  sem- 
Mante  das  corea  do  peito.  Mandou  fbrmar  o  exer- 
cilo,  e  se  poano  coracao  deUe»  com  (ao  alegre  rosto 
que  parecia  communicava  a  toda  a  circumferencia 
a  viyeza  dos  espiritos ,  de  que  se  alimentava  seu 
animo,  e  com  similhanies  palavras  o  mostrou. 
«  Chegou^  senhores  naturaes,  companheiros  e 
»  amigos  y  para  todos  a  melhor  hora ;  pois  certo 
A  que  melhor  hora  ^  a  da  satisfacao  que  a  do  de« 
>»  aejo.  Nao  sei  eu  que  melhor  hora  podia  desejar 
m  nossa  vingan^a  que  a  de  tomar  cada  qual  de  nos 
»  intetra satisfacao  de  tanta  injuria,  quanto  nao 
»  podera  especificar  nosaa  memoria.  Ategora  viao 
»  nossos  olhos  disperses  os  aggressores  de  nossos 
»  damnoa  com  a  impossihilidade  de  nao  poder  o 
H  goipe  castigar  a  um  j  sem  ficar  sujeito  A  espada 
»  de  todos.  Hoje  os  trai  aqui  juntos  sua  culpa  e 
»  nossa  dila ,  oflferecendo-nos  a  gloria  de  ser  cada 
»  um  de  nos  o  restaurador  de  sua  honra ,  e  o  re- 
>>  demptor  de  seu  oantiveiro.  PiHra  tap  bri09O8  afw- 


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SM  CASmOTO  UJSITANO* 

ji  mos,  cBcusadas  sio  exhortacoes,  pois  sobcga  em 
n  cada  um  com  o  sangae  portu{;uez  o  esiimi^o  de 
w  sua  obriga^o ;  e  nao  dira  o  mundo  que  degenera 
»  Ha  America  aqueUe  valor  que  assombrou  toda  a 
>y  Aaia  J  e  que  se  a  foma  nao  divulgou  iguaes  proezas 
M  d'um  e  outro  clima ,  foi  porque  as  occasioes  da 
»  Asia  faltarao  na  America,  Nao  gasto  tempo  em 
)»  dispor  o  braco ,  que  em  toda  a  parte  e  em  tx)da 
»  a  ocoasiao  acbarao  os  casos  disportos,  porque  me 
>  6  necessario  para  representar  a  todoB  a  pedra 
»  de  nosso  escandalo  :  afiadas  nella  nossas  espadas 
i)  feinrao  com  melbor  corte.  Entrou  o  HolUndez 
x>  com  armas  e  industrias  a  faz^r-se  senbor  de 
»  nossas  fazendas,  de  nossas  vidas,  e  de  nossa  U- 
n  berdade,  e  em  poucos  dias  experimeotamos  na 
»  sujeicao  nossa  total  ruina,  tratando  nos  subditos 
»  como  a  escravos  veiididos.  Na  maior  miseria  pa* 
»  decemos  a  maior  aflronta,  dominados  d'um  poder 
»  que  conbece  o  mundo  nao  pdo  valor,  senao 
1^  pelo  engano ;  espantando  seus  progressos  a  Eu- 
»  ropa  mais  pelas  traicoes  que  pelas  conqutstas : 
>»  aquellas,  e  nao  estas,  nos  tirarao  da  mao  a  es- 
»  pada  que  nos  primeiros  annos  corlarao  o  fio  a  sua 
»  fortuna.  Ao  passo  de  nossa  desgraca  creaceo  sua 
»  iudolencia,  feriudo-nos  sua  tyrannia  com  tao 
»  deshumano  bra^o,  que  nao  pod^o  as  feridas 
»  acbar  cura,  nem  na  paciencia,  nem  na  queixa. 
I)  Quentes  estao  as  cinzas  das  fazendas  abrazadas , 
»  aberlas  as  cbagas  das  injurias  padecidas,  frescas 
n  as  lagrimas  das  pessoas  atribuladas,  e  sempre 
i)  levautado  o  ferro  desles  iulmigos  para  coiHinuar 
i>  OS  golps,  sem  nos  d^ij^ar  a  menor  espera^^a  de 


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CASTRIOTO  LUSITAHa  M5 

»  Tennos  abaikk  sua  exorbitanie  soberba  que,  se 
n  para  a  vilesa  i  kldb^  para  a  honra  como  deixari 
)»  de  ser  escatidalo  ?  P6de  sua  industria  fai6r<^iio8^ 
»  SBJeiios ;  maa  nao  pod^o  nunca  seuB  procedv* 
»  meotos  fazerHKis  amigos.  Alguna  o  mostrao  ger 
>)  que  me  oovem ,  e  sei  eu  que  a  bastardia  de  seus 
»  animos  produz  eetes  effeitos ;  porque  ha  naturaes 
»  lao  malevolos  j  que  se  veem  arder  no  fogo  que 
»  ateiao,  e  se  deixArao  eonsummir^  porque  sua  in- 
»  veja  nao  deixe  de  os  abraxar ;  govemao-se  pelos 
»  diclames  da  malicia ,  e  tropecao  nos  erros  da 
»  paixao.  IMzem  que  nos  peiNdemos  y  porque  nao 

>  nos  desviamoSy  pesando  na  desigualdade  do  poder 
»  a  certeza  do  perigo ;  e  nao  sabem  igualar  a  ba- 
»  lanca  com  o  peso  da  razao,  nem  advertir  o  poder 
j»  da  juslica.  Sao  as  maos  da  escolha  as  que  tecem 
»  a  eor6a  do  triumpho :  e  em  veneer  o  maior  risco 
n  consiste  a  maiorldade  da  victoria.  C!om  a  falta 
»  do$  soccorros  persuadem  as  ruinas ;  e  nao  aten- 

>  tao  que  poderia  ser  esta  todo  o  bem  de  nossa  for- 
»  luna ;  e  que  sua  lardanca  seri  disposicao  da  di- 
M  vina  ProTidenc^.  Quantos  menos  entrarmos  na 
»  batalha ,  tanto  mais  honra  ganbaranos  no  con- 

>  flicio  :  repartida  peios  que  assisiem  a  poreao  dos 
»  que  faliao^  e  forea  que  tenlia  cada  qual  de  n6s 
D  maior  parte  na  victoria ;  della  nao  p<ide  duvidar 
»  quern  tern  a  Deos  em  seu  favor ;  e  n<(s  sabemos 
»  que  pelejamos  com  gente,  que  faz  gala  de  oifen- 
»  der  a  Deos*  Os  pedacos  das  imagens  sagradas , 
»  as  pedras  dos  tempios  destruidos,  os  corposdos 
D  catholicos  despedacados,  os  aggravos  dos  sacer* 
n  dotes  escamecidos,  que  sao  senao  armas^  que  o 


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»  ceo  Boa  d4  pt»  (tetmir  e8tes  hcwjes  ?  Pura^ 
H: imbU  viBS^^a  catio  60  ascandalosos  sacriW^  t 
M  exwnte-ie  iwwo  hn^o  com  aqndle  vigor  que 
jjk  hm  tconselha  noasa  {*•  Ncste  cncontro  eonaisla 
i»  iioaea  tihewlwte  e  uoasa  stlvi^;  porqoe  at  a 
>i  despreziottoa,  paaaamoa  da  fortuiia  dc  captivoa  A 
H  nj^ria  de  apoatataa ;  que  nio  deixari  o  inimigo 
j»  de  introduzir  a  hjer«zia  cm  animos  que  sujeita  a 
j>  vileaa ;  c  ficarao  nosaoa  filhoa  herdeiroa  de  noasa 
»  condeama^  e  de  nossamiaeria.  » 

XIV.  Aqui  chegava  a  fervoroaa  pratica  do  go- 
.vernador,  quando  Ihe  cortou  p  fio  o  estrondozo 
rumor  d'umaicar^  de  moaquetaria,.cfaido  e  rece- 
Jido  do3  vime  aoWadoa  com  que  o  capitao  Joao 
Nunes  da  Mata  fwa  deacobrir  o  campo ,  seguiido 
aa  ordena  que  recebira  do  governador.  Chegario 
0$  deaoobridores  is  Tabocaa,  dissmK)  o  que  virto, 
e  coim)  o  HoUandex  ae  yinha  chegando  para  a  paa- 
si^cm  do  rio  Tapicura.  —.  Nao  se  perdeo  tempo 
entre  a  notidae  a  dispoaicao.  Guarneceo  p  aargmito 
maior  tres  emboacadaa  que  tinha  maudado  abrir 
iw>s  Tabooaea  da  campina,  em  fdrroa  que  umas  se 
cobriao  a  outr«»,  com  a  suffici^icia  de  aolckdos  que 
pedia  o  intaito  e  o  lugar;  e  comordem  a  todos  que 
de  noihuma  sorte  largassem  o  posto,  aprovritando' 
se  do  giro  para  a  coiitinuacao  daa  cargas.  A  pri- 
meira  emboscada  eatregou  o  sargeuto  maior  aos 
capilaes  Joao  Paes  Cabral ,  e  Joao  Peasoa ;  a  segnuda 
ao  capitao  Paulo  Yelozo;  a  terceira  ao  capitao  An- 
lonio  Borges  Ochoa.  Os  outroa  capitaes  repariio 
com  prudente  e  militar  aitencao  pelos  mais  poatos, 
m^diodo  a  aufficiencia  pela  importancia  ck  ciid(| 


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cAaxuioro  iJwixAiia,  Sfti 

urn*  0  goveraador  JoaoEemaudes  Vi^irtj  oobi  um 
^rosiM)  l)a(albao  occupou  o  xnais  alto  dp  lugar,  paia 
delle  ver  ^  acudir  cgm  soocorro  as  partes  a  cmde  o 
pedisfie  0  confliclo.  Ao  capitao  Doxoingos  Faguude^ 
ordeoiFao,  que  com  aua  companhia  fosse  receber  o 
inimigo  jia  passagem  dp  rto  Tapicura,  para  o  ea* 
treler,  e  guiar  para  as  emboscadas.— *£in  3  d'A* 
goato  cb^gou  0  Flameogo  ao  rio^  e  lemendo  qw 
por  eatre  o^  deosos  arvoredos  de  suas  margens  o 
esperassem  algumas  emboscadas^  maodou  empre^ 
gar  oelles  luna  cai^  serrada  de  toda  sua  mosque- 
taria,  acomponbada  d'uma  coafusa  grita  do  geniioi 
ciijo  echo  eucbeo  todas  as  coneavidades  do  coa-- 
torao.  Debaixo  da  auvem  que  cau$ou  o  fumo  da 
polvora^  epmmeiteo  a  passagem  com  animo  dester 
mido  f  que  o  capitao  Fagimdes  repr^mio  j  e  sobre* 
saltou com  valentia edeatreza^dandp luaa e  muitas 
cargas  ao  iaimi^o  de  cara  a  cara ,  sem  quaca  a 
virar  aa  re^rada,  com  que  guiava  o  Flameago 
para  as  emboscadas  :  iacorporou-se  com  a  aossa 
geate  da  primeira  com  tal  arte^  que  presumio  p 
Hollaadez  ser  medo^  o  que  era  ordem*  Tinba  che- 
gado  aquelle  posto  o  sargeato  maior»  chamado  do 
estroado  das  cargas  ^  das  algazarras  do  geatio; 
vio  que  o  iuimigo,  em  esquadrao  fechado,  costeava 
o  Tabocal,  e  ordeaou  a  primeira  emboscada  d4-se 
a  primeira  carga ;  o  que  fez  com  tao  bom  emprego 
que  aao  perdeo  tiro,  Eatre  os  mortos,  o  ficoud'uma 
balla  um  Flameago  >  aa  oppiaiao  dos  sens  o  aiais 
valeatC)  e  como  tal  escolhido  para  capitao  dos 
a¥eatureiros.  Coatiauou  o  iaimigo  a  avaa^ar  sem 
£azer  caso  da  perda ;  mfis  deteve  a  furia  com  a  carga 


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S68  GASTRIOTO  LUSITANO. 

da  s^unda  etnboscada ,  que  com  maior  damtio  o 
descompoz  de  sorte  que,  embaracada  do  estrago, 
deo  lugar  a  que  com  a  cfaegada  do  segundo  esqua- 
drao  se  engroasasse  o  primeiro ,  e  recebesse  com 
mator  damno  a  carga  da  terceira  emboscada :  no 
mais  crescido  nurmero  fei  tanto  maior  impressao  ^ 
que  virou  o  Flamengo  a  cara  ao  perigo,  dando 
muitos  passos  atfaz^  na  marcha  e  no  orgulho. 
Quiz  entao  o  governador ,  que  estava  impacienle 
de  nao  entrar  no  conflicto,  avancar  6l  espada  como 
soldado  valenlc  sobrc  o  inimigo;  mas  o  sargcmo 
maior  e  todos  o  detiverao,  fazendo-lhe  ver  que 
elle  era  a  cabeca  daquelle  corpo,  a  quern  pertencta 
o  disp6r,  e  nao  o  avancar ;  que  obedecessem  aos 
preceitos  da  miKcia  os  impulsos  do  animo,  pois 
sabia  que  a  seguranca  de  todos  consistia  na  sua,  e 
que  mais  servia  &  victoria  com  mandar  soccorros  i 
necessidade  que  com  exemplo  de  sua  valentia; 
porque  arriscando  a  pessoa  >  pelejava  com  um  braco, 
e  govemando  a  todos ,  pelejava  com  muitos.  Obe- 
deceo  4  razao,  fazendo  mais  em  se  venoer  a  si  mesmo 
que  cm  querer  investir  com  todo  um  exercito. 

XV.  Advertio  neste  tempo  o  sargento  maior  que 
o  inimigo  fazia  da  retirada  conveniencia,  formando- 
se  por  diverso  estilo,  e  que  devidia  do  corpo  de 
seu  exercito  um  grosso  para  rebater  os  nossos  capi- 
taes  Antonio  Gomez  Taborda,  e  Joao  Paes  Cabral, 
que  com  suas  companhias  Ihe  descompunhao  os 
esquadroes  pelos  lados ,  e  para  prevenir  o  nao  ser 
acommettido  pela  rataguarda  no  tempo  do  combate: 
com  todo  0  mais  poder  avancava  a  romper  o  Tabocal 
para  nos  ganhar  o  posto,  onde  estava  formadaa 


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GASTBIOTO  LUSITANO.  S69 

noesa  (^ente.  Sem  turbacao,  nem  tardanca  acudio  o 
sargiento  tnaior  .&  resUtencia ,  medindo  a  defensa 
pelo  modo  da  invasao.  Formoo  tres  esquadroes, 
para  se  opporem  a  for^a  por  todas  aquellas  tr^ 
paries  que  o  inimigo  no8  buscava.  *—  As  poucas 
arma8  de  foga,  com  a  falta  de  polvora  e  balk ,  que 
se  comecava  a  senlir,  era  o  que  Ihedaya  major  cui- 
dado.  Cobrio  a  falla  com  a  industria,  dizendo  aos 
soldados  que  aquelle  que  nao  tivesse  municoes  se 
Cosse  a  tenda  do  govemador  prover  com  teR)po , 
porqueocooflic(oonao  achasse  falto;  exortando 
a  todos  com  animo  tao  pacato  j  que  infhiia  nelles 
noTos  alfntos.  Continuavao  os  nossofi  a  rebater 
oom  repetidas  cargas.  quando  uma  balla  conlraria 
Serio  o  capilao  da  prinoeira  emboscada  Joao  Faes 
Gabral ;  aao  quiz  este  que  o  retirassem  do  eon-^ 
fficto^  aates  se  eotranbou  na  maior  profia  da  ba* 
talba,  ale  que  segunda  balla  Ihe  tirou  a  vida ,  que 
bem  cara  yendia  em  prol  da  liberdade«  Igual  sorle 
teve  o  alfiares  Joao  de  Matos  ^  que  uma  baila  Ihe 
deo  pelos  olhos,  e  com  a  vista  Ihe  levou  (ambem  a 
vida. 

XVL  Muito  louvavel  foi  o  zelo  com  que  alguus 
reli^oeos  e  sacerdoCes  desc^rao  do  monte  ao  lugar 
da  batalha,  nao  (emendoas  ballas,  para  darem  conr 
forio  aos  que  pelejavao ,  e  absolvi^ao  aos  que  ago^ 
uizavao.Os  que  mais  se  distinguirao  foraoos  Padres 
Fr«  Joao  de  Rasurreicao ,  Simao  de.Figueiredo  e 
Joao  de  Araujo ;  os  quaes  uao  so  se  occuparao  so^ 
Uciios  em  seu  piedoso  exercicio,  mas  acudirao  a 
deter  o  goveruador,  que  segunda  vez  queria  preci* 
{Nita^-se  sobre  o  inimigo.  0  P.  Simao  de  Figueiredo^ 


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S7d  GASTRlOtd  L091TAIfO. 

que  stibia  pela  lad^ira  no  momento  que  o  gover- 
nadof  ia  descer,  Jhc  r^preh«ideo  Ma  fViriosa  deter- 
miodcftOy  a(ictisando-a  de  temeraria,  e  o  (teK  obc* 
decer  aod  prcceitos  da  milicia.  Nunca  maift  se  apar^ 
tou  de  sua  iifaarga ,  porque  bem  conhecia  qvMt 
erko  OS  pengos  a  que  se  expunha  a  vida  do  goTer- 
nador^  e  nao  menos  o  bom  exito  da  lota.  Com  esta 
advertencia  ofez  occupar  o  po^toque  Ihe  convtnha 
donde  rio  como  o  inhnigo  chegado  a  porta  do  Ta- 
bocal  profiaTa  em  romper  a  resistdneia ,  qne  Ihe 
impedia  a  inyasao,  e  foi  soceorrendo  a  defensa  ^ 
despedindo  manga»  de  sold^os  a  ter  o  endontro  do 
Flamengo  por  aquelles  partes,  que  mostrava  me- 
Ih6rar-se  ganhandio  terra. 

XVII.  Entre  umas  e  outras  armaB  andava  o  sar>- 
gento  lilaior  Antonio  DiaB  Cardoro  dispondo  tudo 
com  admiravel  talento  e  valor,  quando  descobrio 
que  o  inhnigo  carregata  com  mttior  poder  por  uma 
parte,  ondeos  nossosnlal  !he  podiao  resi^tir ;  man* 
dou  logo  soccorr«l*o6'pelo  P.  Simao  de  Figueiredo 
cotn  algtimas  mangas  de  soldados.  — -Dtirou  ocom^ 
bale  por  mais  de  uma  bora  com  igual  constanefa> 
ainda  que  nao  com  ignal  numero,  at*  que  vendo  o 
Flamengo  que  n^da  podia  obter  peltf  forda,  st 
valeo  da  industria^  lancahdo  pelas  ilhargaB  do  Tin 
bocal  algumas  companhias  ^  com  ordem  que  fize9* 
sem  o  possivel  por  ferirem  as  castas  do»  Portu* 
guezes ;  por^m  a  vigilancia  do  govea^ilador  o  en* 
tendeOy  e  despedio  de  sua  estancia  dous  trocos  de 
i£o  talerosos  soldados ,  que  em  JH^ve  tempo  rebft^ 
teraoasmangascontrarias,  easdestrulraOy  segnhKhv 
lh€  0  aleanee  b\A  se  recolherem  aos  eaquadMei 


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doade  bayiao  saido,  mas  com  tamanho  desaUno 
que  o  HoUandez  aflfrowxou  o  combate,  poracudir 
ao  degbarato  dos  seus,  que  vio  postos  em  verge- 
nboBafugida.Fea&aindanovoa  esforgos  para  ganhar 
terra ;  maa  vendq  que  a  alegria  creacia  em  os  nossoa 
8oldados ,  e  nos  aeus  a  triateBa  e  o  desalento^  de- 
poia  de  dua9  boras  e  meia  de  proGada  luta ,  tocou 
a  retirar  e  deixou  o  combate  com  grande  perda  de 
aua  ^enCe*  Carregou  o  capitao  Jeronymo  da  Silva 
Gooa  96  viute  aoMadoa,  mas  com  lanta  gentille^a, 
que  Ibe  yeodeo  a  fortuna  a  gloria  deate  dia  per 
duas  pelouradaa  mortaes.  Mao  menos  barato  coib« 
prou  o  capitao  M  atfaeua  Ricardo  o  eaelarecido  itome 
queganbou  oeste  conflicto.  Oulros  miutos  sdkkdos 
fioaaos  derao  neale  dia  a  yida  peU  liberdade  da  pa* 
tria,  qua  mereciao  agora  ser  coobeeidos  pdo  nome 
como  entao  o  ibrao  pek>  bra^o ;  mas  aeryio*lhe  sea 
humilde  nascimeuto  de  desculpa  it  iogratidao  doa 
yivos.— ^Nao  desisUo  ainda  o  inimigo ;  antes  pondo 
em  odrdem  auaa  fileiras^  ae  diapiiolia  a  ioveatir  de 
aovo^  quando  um  vatente  Flamengo,  obainado  Ya- 
lot>  sargenlo  maior  do  terco  de  Joao  Blar,  aaio  6^a 
d'ella  para  tot  a  noasa  diq)oaicao ,  e  tentar  a  parte 
per  onde  melbor  aoa  poderia  inveatir ;  como  moti-* 
tava  em  um  cayalbo»  o  ptecou  facilmeate  uma  baUa^ 
tirada  com  pontaria  tao  certa ,  que  perdeo  junta* 
oiBBnte  a  sella  e  a  viday  e  pelas  aucas  do  cavallo  veio 
ao  cbao.  Com  nao  menos  magpa  que  perigo  o  reti- 
i^irao  OS  seus.  Cb^va  o  dia  4i  quatro  boraa  da 
tarde^  e  como  Henrique  Bus  adverlisse  que.  as  nos- 
laa  cargaa  erao  mais  remissas  ,  imaginou  que  era 
faUa  da  aoimoi  0  que  foi  necessidade  de  poupar  a 


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37S  CASTRIOTO  LXJSITAlia 

polvora ;  fez  da  suspeita  motivo  para  animar  os  seus^ 
e  investio  pela  quarta  vez  a  entrada  do  Tabocal, 
com  aquelle  furor  que  alimenta  a  desespera^ao. 
Aqui  se  vio  a  nossa  gente  em  conheddo  aperto , 
porque  cansados  dc  malar  e  ferir  sustentavao  o 
po&to  sem  poderem  morer  o  bra9o.  Nao  assim  o 
Flamengo ,  que  com  gente  de  refreseo  repartia  as 
horas  do  trabalho  por  muitos,  e  tinha  sobeja  gente 
para  tudo.  Com  esta  vantagem  nos  cansou  de  sorte 
a  profui  do  combate,  que  a  muilos  retirou  a  falta 
do  alento ,  com  que  nao  podia  respirar  o  animo. 
Foi  o  inimigo  ganbando  as  embo8cadas  at^  arros- 
tar  com  a  segunda  campina ,  levando  diante  de  si 
a  nossa  gente,  que  se  ia  pondo  em  conhecida  reti-« 
nda.  0  P.  Manoel  de  Moraes,  que  cooi  fenro- 
rosa  deprecacao  chamou  os  olhos  de  todos  a  uma 
devota  imagem  de  Christo  crucificado ,  que  trazta 
aryorada,  assim  animou  os  fids,  e  confundio  os 
herejes,  que  bastou  a  venara^ao  de  uns  e  o  pavor 
de  outros,  para  que  a  foriuna  se  desconhecesse  a  si 
mesma.  Em  vergonhosa  retipada  forao  os  nossos 
pondo  o  inimigo.  0  governador  Joao  Fernandes 
Vieira ,  vendo  que  a  occasiao  o  chamava ,  disse  aos 
soldados  que  o  aceompanhayao  que  prometlessem 
a  Mai  de  Deoe  um  templo  dedicado  ao  seu  desterro 
se  Ihes  concedesse  a  victoria  dos  inimigos  da  patria ; 
e  descendo  do  monte  carregou  o  Hollandez  de  tao 
pesados  golpes,  que,  corlado  do  ferro  e  do  medo, 
perdeo  a  terra  ganhada ,  e  se  retirou  de  todo  dc^ 
composto  ao  batalhao ,  que  na  primeira  campina 
teve  sempre  formado.  Incitados  do  furor  seguiao 
OS  nossos  0  alcance  do  inimigo  vencido  ^  quando  o 


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CA3TU0T0  luutaho.  ^ 

governador  mandou  tocara  recolher.  Sahia  e  pru'* 
dente  resolucao,  porque  na  campanha  nao  era  igual 
a  npssa  vantagem^  e  concentrados  do  Tabocal  iguo* 
rava  o  FlameDgo  o  numero^  e  com  o  brado  da  ale« 
gria  que  ahi  se  mamfestou  concebia  maior  terror^  e 
parecia-lhe  maia  formidavel  seu  estrago.  Este  con- 
flicto  cusiou  caro  aos  HollandezeS|  que  deixarao 
o  campo  juncado  de  mortos^  e  alagada  a  terra  no 
sangue  dos  feridos;  naoassim  aos  Portuguezes,  que 
s6  tiverao  tres  morlos  e  nove  escalavrados :  suo 
cesso  que  a  todos  causou  a$sombrO;  e  a  muitos 
pareceo  milagre* 

XVIII.  Apezar  da  graude  perda  que  tiverao  08 
Hollandezes  ainda  j^e  nao  derao  por  vencidos  de 
todo^  antes  yendo  que  os  nossos  se  recolhiao  ao  Ta- 
bocal, timao  de  nossa  suspensao  motivo  para  nova 
ousadia^  e  cpmo  desatinados  avancirao  outra  ves 
ao  Tabocal ;  mas  ach4rao  tao  viva  opposi^ao  dos 
Portuguezes,  que  Ihes  pareceo  augmentarem-se  as 
forcas  dos  moradores  com  a  continua9ao  do  traba.-<» 
Iho*  Ji  a  nenbuma  das  paries  lembrava  a  viotoria^ 
porque  uns  e  outros  pelejavao  por  defender  a  vida. 
Embebibosnabatalha,  nao  ficava  sentido  livre,  nem 
para  ouvir  as  vozes  dos  moribundos,  a6  os  p^s  davao 
fe  dos  mortos,  que  conheciao  pielo  embara^Oi  nao 
pelo  vullo.  Nao  se  distinguiao  inimigos  de  amigos 
pelos  semblantes,  senao  pelos  golpes,  com  tao  hor- 
renda  confusao  que  se  davao  as  feridas  com  os  ins^ 
trumentos  do  reparo;  por^  como  o  Flamengo 
nos  fazia  tantas  vantagens  no  crescido  numero  dos^ 
soldados,  que  aos  feridos,  cansados  c  mortos  sue- 
cediao  outros  descancados  e  saos ,  forao  os  nosso* 
I.  *  *8 


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i7ft  GAamniro  litsraiio. 

perdendo  terra ,  sem  que  o  fuiVnr  tteixhsde  ftdteflir 
({udes  a  perdiao,  e  quaes  a  ganhavao.  —  O  goter- 
nador  Joao  FemandeiVieira,  que,  fora  do  con- 
flicto,  ficou  com  os  olhos  livres  para  ver  a  que  parte 
ie  inclinata  a  victoria ,  e  que  para  o  maior  aperto 
guardara  o  melhor  soccorro ,  pondo  bs  olhos  ua 
^agrada  imageU),  queo  P.  Manoet  d^  Moraes  trazm 
arvorada^ebuscando  a  intercessao  onde  esperava  o 
fevor,  disse  em  voz  alta  para  o^  seas  : « Seuhores, 
»  rezemos  de  joelhos  uma  Sahe  Regina  i  Mai  de 
n  Deo^,  certos  de  que  ^ua  piedade  nao  fklta  em 
»  buvir  a  quem  a  chama.  »  Tal  confianca  influio 
em  aeu  auimo  esta  deTota  diligencia ,  que  a  todos 
assegurou  a  dita,  e  persuadio  a  investida.  De  cor- 
rida com  OS  $eus  se  metteo  no  mais  forioso  do  com- 
bate,  matando  e  ferindo  inimigos  com  golpes  tao 
desusados,  que  a  espada  em  sua  mao  tihha  menos 
de  ferro  que  de  raio ;  sem  differenca  cwtava  ao 
Tfeinho  com  o  fio,  e  ao  dislaute  com  o  medo^  Ser- 
Tio  o  exemplo  4  imita^,   com  que  os   Portu- 
guezes  arraudlrao  do  campo  ao  iuimigo  descom- 
posto  e  temido ;  e  sempre  carregado  die  noasos 
golpes  ate  o  Bm  da  campina ,  a  onde  o  rio,  que 
buscava  para  o  tranzito  y  Ibe  advertio  o  pertgo ,  se 
nao  esperasse  o  favor  da  noite.  •^  Deixou  o  Iiol«- 
landei  no  campo  todas  as  municoes,  e  grande  parte 
ditt  armas,  que  na  precipftada  fogtda  mais  Ihe 
serviao  d'embara^o  que  de  defensa.  Na  prhneira 
tigiliada  noite,  em  que  a  escuridao,  a  tempMtade 
e  a  creccnte  do  rio  pod^iio  embargar  a  rcsohicao 
mais  arrojada,  o  vadeou  o  floilandez  cbm  determi* 
na^  entendtda.  Pareceo4he  que  se  o  dia  segmnte 


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CASTMOTO  lUatTAIfO.  275 

o  achasse  tiaqudle  sHio,  os  seus  deminutos  e  afflio- 
tos\  OS  nossos  descahcados  e  briosos,  mo  flcaria 
pessoa  em  sen  exercito  que  nao  perecesse,  ou  na 
batalha^  ou  no  alcance ;  e  que  meuos  arriscava  em 
valvar  atguns  que  em  perdertodos.  Em  toda  aquellii 
uoite  nao  descancou  de  camiuhar  por  veredas  in- 
<iulta8,  matas,  lamacaes  e  asperezas,  que  a  tempes- 
tade  do  vento ,  e  inundacao  das  aguas  fazia  pare- 
cer  mais  insoffriveis,  com  tanta  pressa,  que  em 
poucas  horas  andou  cinco  leguas  de  terra, 

XIX.  Em  quanlo  o  Hollandez,  ajtldado  do  si- 
fencio  e  escuridade  da  noite ,  caminhaya  dcscoili- 
posto ,  tot*I>ado  e  vencido ,  festejavao  os  nossos  as 
repetidas  rictorias,  que  Deos  Ihes  dira  neste  dia , 
e  a  esperanca  de  que  com  sen  favor  as  multiplioa^ 
riao  no  seguinte  com  aquelle  gosto ,  que  i^esulta 
do  seguro  da  bonanca,  quando  se  segile  ao  maiGt 
rigor  da  tormenta.  Agrande  alegria  os  nad  des- 
cuidoii  da  gratidao  e  da  vigflancia.  Mandou  o  go- 
Temador  que  todos  rendessem  as  gracas  ao  su^ 
premo  Senhor  das  Victorias,  e  que  se  preparas^em 
para  cntrar  em  nora  batalha,  que  sem  duvida  se 
daria  ao  pfrimciro  romper  da  manha,  ou  porque  o 
ittimigo  a  kavia  de  csperar,  ou  porque  noB  hayia 
de  acommetter.  6uamecArao-se  todos  os  postos  de 
«eritinrillaS,  para  prevenir  qualquer  assalto  repen- 
tino ;  no  Tabocal  de  chna ,  que  orlara  o  alto  do 
monte,  se  mandou  rocar  aqueHa  terra  que  bastava 
para  ndlase  emboscar  uma  partida  da  nossa  geule ; 
e  na  distancia  que  se  entrepunha^ntre  um  e  ottiro 
Tabocai  se  levantirao  trincheiras  qfue  corlavfiocin 
tres  partes  a  ktdeira  do  nwmte.  E\vl  quanto  m  tm- 


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276  CASTAIOTO  LUSlTAlia 

balhava  nellas^  mandou  o  govemador  retirar  toda 
a  gente  para  a  sua  estancia ,  oonui  para  lugar  maift 
seguro  e  mais  defeiisavaj  ^  a  onde  o  inimigo  nao 
podia  chegar  senao  deslruido  e  cansiado  pelas  op* 
po&i^oes  que  ja^imeiro  havia  de  veneer.  —  Tinha 
vi8to  0  governador  a  valeoiia  com  que  nos  cofnbates 
pelejarao  as  coiupanhias  dos  Minas  e  Qriouloe ;  e 
certo  de  sua  fidelidade  os  mandou  descobrir  o 
campo ,  com  ordem  que  passassem  o  rio,  e  da  outra 
parte  picassem  a  retaguarda  dos  itiimigas,  ohri* 
gando-os  a  que  em  toda  a  uoite  nao  largaasem  as 
armas  das  maos.  Chegarao  ao  alojamento  do  Fla- 
mengOi  que  virao  desamparado,  e  ainda  alcan9^U^ 
a  sua  retaguarda  que  ia  i)assando  o  rio.  Com  mul- 
tiplicadas  cargas  e  consideravel  damno  o  pers^gui* 
rao,  e  acobardarao  de  modo,  que  imagiDando^se 
cojFtados  y  se  emboscirao  pelas  matas  deixando  de 
seguir  o  caminho  dos  seus ;  aos  quaes  nao  seguiriio 
OS  nossos  o  alcance ,  por  nao  excederem  as  ordens 
que  iinhao  recebido.  Voltarao,  e  derao  conta  ao 
govemador  do  que  virao^  e  do  que  obririio.  Com 
e$te  aviso  ordenou  Joao  Fernandes  Vieira  ao  sar* 
gento  maipr  que  mandasse  correr  a  campanba, 
duas  legoas  ao  largo,  por  soldados  praticos.  No 
termo  d'ellas  ach^rao  os  nossos  cincoenta  Hollan- 
dezes  que  davao  guaida  a  mais  de  quotrooenlos 
feridos,  que,  desmaiados  pela  falta  do  sangue  e 
pelo  urabalho  da  marcha,  nao  poddrao  passar  avante 
na  conserva  dos  seus.  Forao  os  nossos  vistos  das 
sentinellas  inimigas ,  tocarao  a  rebate ,  fogirao  os 
que  poderao ;  e  os  nossos  virdrao  as  costas,  enga^ 
nados  do  vulto  e  do  rebate^  e  o  derao  em  1101SS9 


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CA8IR10T0  wsnao.  m 

alqjaiBeolo,  dizendo  que  o  liollanclez  se  rrfazia, 
efentiava  para  nos  tornar  a  ^nyestir.  Nqq  £u5cm 
M  soinlMns  menos  impressao  nos  animos^  quapdo  a 
kiiaginacao  as  pinta  com  as  cores  do  medo^PasBoiu 
atMNisagente,  enganada  do  aviso ,  todas  as  horas 
da  noite  com  as  armas  na  mao :  molesiia  excessiva 
por  succeder  em  uma  noite  desabrida^  depois  d'nm 
dia  gastado  em  eondnuada  batalba ,  sem  que  neile 
d^sse  lugar  a  pel^  a  se  refazerem  as  foroas^  nem 
ccnn  o  descan^^  nem  com  o  susCento. 

XX.  Rompeo  a  Itiz  da  manha  pelas  sombras  da 
noite  e  da  imagina^o,  iguaes  no  horror ,  e  simir 
Hiantes  nos  eff^  tos.  Offereeeo--se  o  capicao  Francisco 
Ramos  adescobrir  o  campoe  a  Terdade,  evokou  com 
a  cert^za  de  que  em*  todo  elle  nao  havia  mais  que 
despojos  do  iminigo;  com  esta  daridade,  e  com  a  do 
dUasaio  a  nossa  gente  a  ter  nos  instrumentos  da 
batalba  os  grAos  da  victoria  j  e  os  pregoes  dp  trium* 
pfao.  Todo  o  campo  estava  semeado  de  oorpos  moi^ 
tos  y  de  armas  sem  conto ,  de  munieoesi  como  pc^ 
vora,  balla,  corda,  arcose  frecbas  sem  nuoiero, 
que  em  muitas  partes  da  campina  nadavao  no 
aangne  de  sens  proprios  donos.  Alguns  manti-> 
mentos  assim  para  a  necessidade  anno  para  o  re^ 
galo,  que  igualmente  servirao  a  festa  e  a  folta.  Nao 
houve  soldado  qtie  se  nao  armasse  com  escolba ; 
nem  Indio  que  se  nao  vestisse  com  vaidade.  Sue- 
cedendo  ^  repeticao  da  alegria  a  das  cargas  com 
que  se  acdamava  a  victoria.  Pelas  nove  boras  da 
manha  chegou  um  morador  d'aquelle  contomo 
com  as  novas  oertas  do  caminho  que  tomara  o  Hoi- 
landezy  o  do  grande  medo  com  que  marchava, 


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STC 

deixando  pelob.iiiatM  oa  oanftdot  d  (^n^M^  que 
a  iiM  podiao  fitguir,  RepetK)  a  caott  cpie,  tmn 
a  engano  cbM  MiBts  aoinm  nferido ,  e  queo  g0<« 
Mml  Henrique  Hub  maadaya  dizer  por  eUa  ao  g(H 
yemador  Joao  Femandes  Yieira  d^sse  quartet 
aqudles  feudoB  que ,  qnw  moribuadosi  mandaya 
l^r  em  carroft  para  o  Arreeife,  oomo  a  todos  o 
eteiuayao  os  preceitoa  da  imliciai  qua  nao  permitfa 
matar  a  sangue  £rio ;  porque  d'outra  parte  aeria 
maior  a  vingan^a  que  a  oiTenaa,  e  nao  deixaria  sua 
eipada  morador  com  yida^  pastaudo  pdk>s  fios  della 
a  grandes  e  pequenoa  de  um  e  outro  seKo*  Com 
esla  rela^ao  Be  ratificou  a  ceiteza  da  yictoria^  qua 
outra  vee  repetirao  oi  gritoa.  0  gayeruadw ,  qua 
quasi  se nao  achava  a  si  oi^mo.  entre  os  excessoa 
do  gostD,  se  uao  di^souidou  uas  demoiistrafoes  d# 
grato^com  que  desajava  que  todos d^easem^a  Dew 
gra^aa  pbr  iaoianho  beoeficio*  Com  seu  e^cemplo 
obrtgQu  a  que.  lodoft  f  poacoa  de  joelhoa  f  com  a9 
ndaos  leyantadas  ao  ceo>  cooCessaftsem  que  a  eUe 
deyiao  a  mero^  ( fazendo  tampio  do  aiesmoivgar  do 
oonflicto)»  Aoabou  este  acto  d'agradecimeuto  com 
gtiiar  toda  oexercito  em  uma  yoz  :  ((  Viya  a  f ^ 
»  cathdica  romasa !  rtya  a  liberdadel  yiya  El  Rei 
»  Dom  Joao !  yiva,  Viya  I » £  logo ogoyemador  com 
benevolo  e  alegre  seaitblautey  e  o  chapeo  ua  mao , 
ioi  abrft^juulo  a  cada  um  do8  oapitaes^  c^eiaea  « 
0oldados«  engrandecendo  o  procedimanto  de  todoe 
com  tanta  afiabilidade,  que  os  puoha  tohre  a  ca- 
beca  I  quando  oom  os  bra^os  os  recolhia  no  peito^ 
Erao  reciprocas  as  congratuiacdes  da  diMi »  e  por- 
que fossem  eommuus  as  oonfiancas  da  liberdade 


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( ja  entio  maia  possuida  que  esperada  )  a  deo  Joao 
Feraaudes  Vieira  a  cincoeiUa  eacuvos  seu3  coia 
a  boma  d^  jsoldadosy  mereckia  de  aeu  yalor  e  Qde-. 
Ud^e  naquella  occasiaa;  ^  Ihes  {&  xn^rc&  de  q^ 
podegsero  ^seniar  piai^,  e  venjoer  soldo  em  quanta 
durasse  a  guorra^  escolheudo  d'eatre  elles  dous  c9r. 
pitaes,  para  duas  compauhiaa,  em  que  os  repartiOf. 
de  viute  e  qji^tro  soldadot  cada  uwa* 

XX4*  Perdea  o  UoUaodez  neata  oecaaiao  aa  trea 
partes  de  sua  gente :  f6ra  do9  mortos  que  retirou 
e  escoudeo  a  correAte  do  rjo ,  se  ach^rao  uo  campa 
treKeii  tos  e  aetenia  loortos ;  uao  numeramos  os  que 
na  retirada  morr^ao  daa  feridas  peloa  matos»  peloa 
camiuboa,  e  uo  Arjiecife ;  autre  eates  os  mai$  doa 
caho^  e  offipiaea  da  guerra,  cujas  insiguias  Ihes  fe^ 
deixar  a  morta  u^  campo  e  uaa  est?adaa*  Nao.  fpl 
meoior^a  mortan^ade  dos  IinUoar  ^»uu  parciaf^ 
coQio  auxiliarea,  qpe  aegmao  oe^ercito  para  te^eu^ 
par4e.»oa  despojoa*  Cpuata^ra  o  todo  da  nossa  geute 
de  luil  e  tre^eutos  homeua,  a  Mfaer,  uiil  e  duxentoi^ 
Poriugueaes  eatre  sol^iro^  a  easados  ( todos  sol*' 
didoa  no  yalori  poueos  na  pratica)  e  quasi  oem 
uaturaeSf  autre  epcravos  e  ludioa*  As  armas  de  fogo 
uao  pasaavao  da  duzeutas  eipiugardaa,  ieitasmaiit 
para  a  ca^a  que  para  a  pelcja  i  alguiuas  espadas  que 
a  porhibi^ao  tiuha  escoudidas,  e  coju  a  ferrugepn 
tao  gastadat  que  podiao  magoar,  mas  uao  ferir.  Af 
mais  anuas  erao  cutellos  do  moota,  e  paos  tostados; 
as  muuiijoes  tao  eseassaa  que  as  uegava  a  peuuria  9 
aiuda  a  maior  iiecessidade ;  a/i  boras  do  combated 
urn.  dia  todo*  As  dos  cereados  uao  sa  ooniao  pelos 
^peSfSeuao  pelos  tiit)s.O  uumero  dos  uossos  mpr- 


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}8<^  CASTM0T6  LUSltANa 

tos  nao  passon  de  vinle  oito,  enlre  dies  os  capitaes 
rektados ;  os  feridos  forao  trinta  e  sette,  aos  quaes 
o  cuidado  da  charidade  apressou  a  convalecenca. 
Dos  escravos^mortos  e  feridos  nao  fazem  mencao  as 
relacoes  (devia  ser  esquecimento  >  c  nao  desprezo, 
que  o  nao  merec6rao  negros  que  tao  esclarecida- 
mente  obrarao.)— Nomeareinos  aqui,  segundo  a  or- 
dem  do  alphabeto,  e  nao  do  merecimento,  os  capitaes 
e  pessoas  dequalidade  que  se  achirao  no  cpnflicto, 
para  qne  seus  nomes  passem  a  posleridade.  Os  ca- 
pitaes foriio,  Amador  de  Araujo,  Antonio  de  Crasto, 
Antonio  Gomes Taborda,  Amaro  Cordeiro,  Anto- 
nio Borges  Uchoa ,  Bartholomeo  Soares  Ganha  , 
Braz  de  Barros,  Cosme  do  Rego,  Bomihgos  Fagua- 
des,  Bomingos  da  Costa,  Francisco  de  Lisboa,  Fran- 
cisco Gomes,  Faustino  Pereira ,  Francisco  Ramos, 
Firancisco  de  Figueiredo  da  SiWa,  Francisco  Gomes 
ik  Sllva ,  Jeronymo  da  Silva  (  noforreo  na  batalha 
com  mais  iliustre  nome),  Joao  Soares  d' Albuquer- 
que I  Joao  Leitao  d' Albuquerque  seu  irmao ,  Joao 
Nunes  Victoria ,  Jeronymo  da  Cuiiha  do  Amaral  ^ 
Ignacio  Mendes,  Joao  Barboza,  JoSo  Pessba  Bezerra , 
Joao  Nunes  da  Mata ,  Joao  Gomes  de  Mello ,  Joao 
Paes  Gabral,  que  nesta  batalha,  como  outro  Sansao 
coroou  as  proezas  da  vida  com  se  exceder  a  si 
mesmo  na  morte;  Maihias  Ricardo,  que  no  combate 
deo  a  vida  pela  patria ;  Manoel  de  Araujo  de  Mi- 
randa, fllho  de  Amador  de  Araujo ;  Manoel  Soares 
Robles ,  Marcos  Pires ,  Paulo  Velloso ,  Pedro  Ma- 
rinlio  Falcao,  Pedro  Correa,  o  P.  Simao  de  Fi- 
gueiredo, s^cerdotee  capitao,  igual  no  zelo  de  en- 
caminhar  as  almas  ao  valor  de  esgrimir  as  annas; 


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CASTWOTO  lUSlTANO.  J81 

Sebastrao  Pereira  y  Simao  Metides  ,  e  Thom^  Dias 
da  Costa.  As  pessoa's  particulares^  a  que  a  tiobreza 
deo  nome,  e  esta  occasfto  fama,  forao  as  seguintes. 
Arriao  de  riollanda ,  com  doos  ftlhbs ;  Antonio 
Bczeira,  Antonio  Carakanti;  c6m  dods  filho^; 
Atnao  Lopes  da  Madeira^  Antonio  da  Silva^  no- 
meado  capitao  de  cavallos,  Antonio  da  Costa ,  A!- 
Taro  Teixeira  d^  Mesquita,  Antonio  Coelho  Serpa, 
Antonio  Carneiro  Falcato,  Antonio  Gomes,  Anto- 
nio de  Magalhaes  de  Mello,  que  montado  em  nm 
cavallo ,  a  todos  os  combates  animava  tanto  com  a 
e)thortacao  como  com  a  espada ;  Antonio  da  Silva, 
AhtonioTftTares,  Antonio  da  Costa/ Bernardino  de 
Carvalho,  Balthazar  d'Azevedo,  Cosme  Soares  d'A- 
ranjo,  ChristoTao  Berariguer,  cunhado  do  gover- 
nad6r  da  liberdade;  Diogo  da  Siha.  tambem  de 
sua  casa ;  Domiif gos  Barboza ,  &€u  aifcires ;  fVata^ 
ciMo  Berengner  de  Andrada,  sea  sobrhihb;  FVan*- 
cisco  Rodrignes  Tavares,  Francisco  ^rretd,  Joao 
Lourenoo  Francez,  com  dons'  filhos;  Jerbnymo  de 
OliVeira  Cardo^^  da  casa  do  m^mo  governador ; 
Joao  Dias  Leite,  c6m  dous  filhos;  Joao  Cordeiro^ 
Mandanba,  Luiz  da  Costa  Sepulveda,  Lourenco 
d'Abreu,  com  nm  filbo;  Manoel  Garaleami  d'Al- 
buqaerque ,  Manoel  Alvares  de  Cai*va)ho ,  Manoel 
Fernandes^  Croz^  com  dous  fiihos;  Manoel  Barreto, 
Simao  Velho  Barreto,  com  d6its  Glhos;  Thomaz  da 
Costa;  e  ontros  d*igaal  esforco  e  fidelidade ,  cujo* 
nomes  escreveo  entao  com  melhov  tinta  sua  espada, 
ainda  que  agora  se  nao  estampem  nesta  historia 
pornoesa  penna.  Os  sacerdotes,  que  so  ach^rao 
nesta  oc^a&iao,  de  que  nos  informou  a  noiicia,  fo* 


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;S3  cj^sxwf^  ufm^»^ 

i:aaoP.  Simao  de  F^^ueiredoy  ja  repetido  enlre 
03  capitaea  y  e  agora  nomeado ,  porque  o  fizeria 
diias  vezes  conhecido  a  digaidade  e  o  poato ;  o 
P.  Joao  BapUsta  Lobato,  natural  de  Usboii^:;  • 
P.  Joao  de  Araujo^  natural  de  Poate  de  Umai 
e  0  P,  Fr*  Joao  da  Resunei^ao,  de  quern  adiantis 
faremos  particular  memorial  devida  aos  aingudarea 
s€rvi<;o$  que  no  dUcurso  d'e&ta  guerra  fox  a  DeoSt 
a  patria  e  ao  reiao* 

XXII.  Depois  de  passar  o  rio,  como  liavemoa 
dito ,  marehou  o  HoUandez  toda  a  noite  com  graude 
trabalho;  na  manha  do  dux  seguinte,  4  d'Agoato, 
ch^u  apoyoa^  de  Sap  Louren^o,  seUa  l^poas  dp 
moute  das  Tabocas,  d'oude  fogira  vei^cido;  whouo 
luga^  de3habitado,  cujosmoradores  ae  retirarao  aoa 
matos  iucertos  do  suecesso  j  deteve-^e  neste  sitio 
e^erfndo  peloa/eridoa^,  e  logo  ayi90u  ao  ArreciCe 
dfuidQ  conta  ao$  govemadores  do  suceedidoi  e  pe-> 
diudo  mautimentps^  mun^^o^a  e  soldados ;  chegou- 
Ihe  o  aooccuTO  ueafie  meamo  dia^  e  depois  de  inyiap 
OS  feieidoay  e  reoolher  oa  diaperaoa  ae  mudou 
para  oa  Apupucos^  onde  os  moradores  o  receb^ 
rao  como  alliados  :  uao  ae  tem^rfto  offendidos^  com  o 
seguno  dos  paaaaportea.  No  terreiro  da  igreja  (ez 
altO|  e  logo  reseuba  dageute  que  tiiiha,  e  adiou  que 
de  mil  e  quinh^ntoa  aoldados^  com  que^ntrou  ooe 
combatea  das  Tat^ocas^  perdSra  mil  e  cam,  com 
a  flor  doa  ofiiciaea  daguerra  que  o  acompaubirao* 
Da  perda  fez  Henrique  Hus  motivo  para  a  perfidia, 
Pagou  aoa  triatea  moradorea  o  agaaalho  e  benevo« 
Iqiicia ,  com  que  o  receb^rao^  eutregando  a  povoa*- 
^ap  e  oa  coutoruoa  ao  aacco  doa  aeua^  que  oa  aol- 


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if^ ,  jndws^  e  Ind44>8  e?iecistmyQ  biia  comQ  bo* 
mensj  satti^  como  ,£(^«.Tim1o  o  qme  podia  A^nir  i 
cohica  e  a, viogaoi^  destruioo  odio  a o  vouboi  a 
crueldade  venceo  as  op{)06i<;Qes  da  natitrwi  q  d| 
razjip]  acbando  iio$  mQtivoa  da  compfuicao  i)Si  Iat 
ceiitivos  da  ira,  Frostestarao  de  bruto^  na  demaaia 
com  que  a  torpeza  offemdia  a  modestia;  e  na  Mjjvria 
w^  que  atropellava  a  reti$teiicia*  G^niria  a  nm^ 
sagradp  se  irr^tat a  ma^^  seu  odio^  e  i^Oy^ra  p  iMIti 
relig^oR^ 94U  poder.  D^steuirao,  e  coatamioaraooa 
t^mplo$ ;  fizeraa  em.p^da^oi^.aft  Muti^  imagwsy.a^) 
P.  Joao  Dias,  sacendo^e  da  noveaU  apuos,  fiaii* 
xao  a  golpas  e  affiroQtas  :  aua  yirtudo  foi  para  cb  de^ 
pravado^  herf^  ^m  jnaior  deliqlOy  e  seu  dinbeir^ 
a^u  luaior  verdugQ;  peadurado  ^  urn  bra^o  acar 
bara  ja  y'ld^,  se  anao  remiraa  peso  d'auro«  Nao  se 
estoadi^o  a  mais a  crueldade,  poFquiQ.to4os  os  qu^ 
pod^ao  ajaticipdrpQ  a  fuga  ao  aggravv).  ~  Pela  t^rd^ 
mandou  Henrique  Hus  ooptiauar  a  saarcha;  fe;^ 
alto  na  Yarzea^  e  se  al^jou  uo  eug^enho  de,Do^ 
Aufi^  Pfes  ( pma  legpa  do  Arrecife) ;  ao, outro  din 
piartiQ  a  ver-se  com  os  do  suprwao  cousel^xo ;.  oqn* 
ferirao-entre  si  o  que  mais  convioha  ao  estadp  daf 
cpus;^  pi?esentes$  tompu  asseuto  no  que  se  devia 
faxer ;  e  despedi4o  covn  as  ordens  que  M^  de  se- 
guir  se  v9.Itou  para  ps  seus  no  mesmo  dia»  Mandon 
saquear  o  Arraial  yelho^  com  as  mesnias  extor^peSj 
e  coip  toda  a  s^de  da  crueldade  e  da  cpbi^a ;  nao  ficotf 
paredcy.  telhado,  neqn  ^otao  que  nao  tenteassem  com 
espetos,  suspeitando  acbar  rjquezas  ent^radas^ou 
escoudidas ;  na  igreja  do  lugar  com  mais  exorbi- 
tancia^  porque  com  mais  indecencia»  No  engenbo 


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lU  GJIfiTUOlt)  LUflrtAMO. 

cte-t^rancisM  Monteiro  Bezerra  execuUm  inauditos 
desaforos.  A  senbores  e  escravos  media  a  crueMade 
par  Hill  mesmo  lamanho;  com  urn  inesmo  fio  cor* 
tava  o  Terro  e  a  injuria  peta  matrona  e  pela  don- 
zc4la.  A  Dona  Brazia^  mulherdocapitaoFedroCa- 
%iilcanti  d^ Albuquerque,  e  a  sua  mai  Maiia  Pcssoa, 
arraitirao  como  a  vis  eecravas,  porque  despre- 
zando  a  perda  da  ftrz^nda ,  nao  consentirao  nem 
ainda  na  mab  leva  mancha  da  honra.  A  poucos 
excusou  a  diaboHca  perfidia  da  espada  e  da  aSrontai 
e  aod  que  perdoava  sua  eolera  guardava  para  maior 
castigo  sua  meilicia.  Tinha  determinado  entregar 
a  todos  a  maiores  tori^nentos.  Deeret&ra  seu  desa- 
tinado  conselho  que  aquelle  flamengo,  diamado 
Jteobo  (que  acima  dissemos  vivia  entre  os  selva- 
gens),  deixasse  o  sertao,  e  desceBSedosmontescom 
todbs  OS  Indios  de  sen  partido  a  correr  a  campanha 
&o  no  de  Sao  Francisco,  onde  oesparavao  cento  e 
sessenta  HoHandezes ,  com  ordem  que  mettessem 
tudo  a  Ferro  e  ai'fogo,  descendo  por  Goyana  at^  A 
Varzea,  onde  esperava  Henrique  Hus.  Horrivel 
f5ra  o  estragOy  se  a  divina  ProTidencia  o  nao  ata-» 
ihdra  9  confundindo  a  malicia  oom  o  seu  mesmo 
decreto,  como  veremos  no  decurso  d'esla  historia. 
XXIIL  Deixamos  ao  governador  Joao  Femandes 
Vieira  no  sitib  das  Tabocas,  onde  se  deo  a  batalha, 
dando  e  re^bendo  as  eongratulacoes  da  Victoria  ; 
d'aqui  por  dianteo  veremos  (sacrificado  um  eou«- 
tro  hombro  ao  peso  do  governo )  cnlrar  em  lanto 
m^'or  cuidado ,  quiemto  mais  se  estendia  sua  obri- 
gacaOt  Nao  achava  em  si  todo  o  gosto  e  triumpho 
em  quanlo  os  moradores  ausentes  nao  gozavao  de 


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CASTUOTO  IWIXAlia  965 

toda  a  liberd^cie,  partidpa^o  de  aua  mftwia  fofw 
tuna.Muiias  freguezia^  tmbpto  seguido  o  seurtxein^ 
ploy  e  algumas  pediao  o  seu  auxilie  (as  quenuiis 
insiavao  erao  Iguai^ii  e  Goyana);  diBpuftha^ 
eUe  cm  mandar-lbes  $occorrO|  qutodo  the  chegou 
a  nova  de  que  os  mestres  de  campo  An4H  Vidal 
de  Negreiros^  e  Martim.  Scares  More&o  UdJ^ao  to- 
rnado terra  em  Tamandar^  com  oiloeeaCo»  in* 
fantes^  maQdados  da  Bahia  pelogQveraador  do  £•*- 
tado,  para  que  faTorecessem  a  loais  ju^ta  eauaa; 
esperava  aUm  disso  cada  hora  os  goveiwidoi^es  de 
Indios  e  Minas  Henrique  Dlas  e  o  CaHMtiao;  fiado 
nestas  esperancas  se  determioou  em  luandar  logo 
soccorrp  a  Iguara^ue  a  Goyaua.  —  Um  iamlo  ia* 
conGdente,  que  teve  noticia  d'esta  deUbeirai^t 
metteo  valias  a  Joao  Fernandea  Vieira  para  que  • 
nomeasse  cabo  d'esta  expedicao;  coaaKleo-*llie  o 
go.xernador  a  Jornada  e  o  posto ,  fazendo  coaSau^ 
do  traidor  para  o  reduzir  a  fiel ;  e  pprque  affasr 
tando  de  si  o  falso  o  nao  fizesse  alguma  occasiao  vef  <- 
dadeiro.  Entregou-lhe  cento  e  cincoenla  bomeiis, 
com  ordem  que  ae  incorporasse  com  a  gente  para 
melhor  se  defender  do  ioimigo,  e  o  despedioalgmis 
dias  antes  do  engenho  de  Gorjau ,  onde  Qq(4P  te 
alojava  a  nossa  genie*  Chegou  p  dito  cal)Q  a  villa 
de  Iguara^Uy  onde  se  deteve  algum  tempo  ;  pasaou 
depois  a  Goyana ,  onde  uma  pont^da  the  tirou  z 
yida,  porque  morresse  da  malignidade  d^  que  a 
iraicao  se  alimentava  em  seu  peito :  sucoesao  qoe 
adiantamos  ao  tempo  ^  por  nao  d^ixarinoa  a  potUa 
d'este  fio  sem  no. 
XXIV-  Tinha  saido  da  Bahia  Salvador  Correa 


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6tSkff»  gM«*«it  d'uAMi  frota  de  trhkta  e  sette  na- 
irimMCKaxitM)  que  faria  tiagem  para  o  reind,  e 
em  Btift  e<mserva  mandtra  o  gOTemador  do  Estado 
Amoiiio  Telles  da  Silva  dous  ter^os  d'infantaria 
(eeits  iMfttres  de  campo  Andrd  Vidal  de  Negreiros, 
e  Martim  Soarte  Moreno)  em  oito  embarcacoes ,  e 
-por  cabo  d'ellas  Jeronymo  Serrao  dePaiva  (homem 
valoroio  e  pratico  no  exercicio  militar  de  mar  e 
lerrt)  em  «ati$fac&o  de  promessa  que  fizera  aos 
embikadoi^s  do  govemo  holUndez,  com  ordem 
ipie  at  idiura  de  Tamandard  tomassetn  este  porto , 
e  ndte  ^rdadeira  informacao  das  cansas  da  suble- 
racfto  doa  naturaes  -  e  se  nao  fossem  jiistas,  bs  cas- 
tifjasSMi  como  a  rebeldes,  e  composessem  as  cousas 
ckr  eon^qne  ficasse  a  terra  em  paz;  porAm  se  en- 
tendesaem)  que  de  tyrannizados  e  perseguidos  da 
temfe'uao  e  insolencta  do  domihio  hoUandez,  toma- 
Tfto  M  annas  (como  se  dizia)  em  defensa  de  ^as 
ridaa ,  honras  e  fazendas ,  os  favorecessem  e  aju- 
dwsdtti ,  eomo  erao  obrigados  por  lei  natural  e  di- 
vma*  Navegou  Salvador  Corrca  ali  aquella  altura  ; 
deivou  a  Jeronymo  Serrao  de  Paiva  com  os  oito  na- 
tmno  porto  del^mandar6^  o  continuou  a  viagem 
•o  reinO)  tomando  alguns  rcfrescos  no  Arrecife, 
eomo  adlaate  se  dira.  —  Jeronymo  Serrao  deixou 
a  gMte  d«  guerra  em  Tamandar^,  e  com  a  do  mar 
•&4i«iMou  ficar  nas  embarcacoes,  debaixo  daqtlelle 
•qjtttt)  que  the  promettia  a  K  do  contraclo  rrferido. 
Wsm  «uccedido  divulgar-se  da  villa  de  Sirinhaem 
*  wja^ttmento  de  3oao  Femandcs  Vieira  com  a 
yoz  de  lUberdade,  e  temendo  o  Holtendez  a  imitacao 
t  *>  exemplo,  mtodAra  ddtar  bando  que  todoa 


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08  Pbrtuguezes  d'aquelle  dMrietof  em  tefin6  de 
tk*ed  diag  naturaed  leva^sem  i  (brtaleza  todas  as  ar- 
mas  ofiefisivas  e  deft^sivas  que  tiTeesem,  sob  pena 
de  jnorte  irrimissivel.  Atemorizados  os  moradores 
obedecirao  uns ,  e  disputihao-se  outros  a  obedecer, 
quando  Joao  d'Atbuqiierqtie  (fkomem  de  bem,  ze- 
Joso  e  valente)  ^onhecendo  o^  perfidos  ihtentos  do 
IfoHandez,  que  erao  desarmAl-os  para  os  matar  iu- 
defeaos ,  declarou  a  todos  o  fihi  do  bando,  e  per- 
dufitdw)8  k  reaisttoci^.  R^nio  uns  quarenta  e 
nove  manoebos,  e  com  dies  se  adiantou  a  idmar  ad 
annas  ^os'  vizinkos,  pa»a  que  as  nao  tomassemaos 
setw  verdu^s;  com  a  mesma  ddiberacao  melteo  a 
pique  tres  barcos  que  o  iftimigo  tiuha  catregados 
de  dWersos  geueros  para  o  Arrecife ;  e  appellidando 
ISieitfeKfe  fez  todo  0  mai  (foe  p6de  aos  Hottan- 
dezes. 

XXV.  Neste  tempo  diegou  k  Shinbaem  a'nova 
da  geute  que  tomdra  terra  em  Tamandar^.  Alvoro- 
gado  Jotto  d'Albuquerqtoe  eom  a  esperanca  do  soc- 
corro ,  atalkm  por  milagrosa  a  oppurtunidade  do 
auxilio ;  saio  ao  encontro  da  uossa  gente,  Mhu 
emt  OS  mestrea  de  campo/  e  da  parte  de'Deos  e 
d'Ei  Rei  VticB  requcreo  tis  Ubertassem  da  oppressao 
e  agouia  em  que  estatik),  de  ttovo  condemnados  i 
siorfe  f^h  tyraunia  hoHiuddeza ;  pedio  que  farrore- 
eessem  os  morsNkrres^  que  torn  pequeua  ajuda  se 
Ihes  eutregaria  a  lortaleza  que  naqueile  lugar  tinba 
o  inimigo  desapercebida.  O  tnesmo  requefimeuto 
fiterao  os  moradofes,  que  a  Vigflancia  eontraria  tra- 
sia  desterrados  pelos  mates.  —  Era  justtficada  a 
pcti^^  e  muho  toufbhtie as  oi*deiis  que  traziao; 


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2M  CASXWXEO  UKUXAHa 

pd9  que  seiQ  detf  n^  marcbarao  para  a  for^leu 
OS  capiiaes  V^^\o  da  Cunha  e  Christovao  de  Barir?^ 
com.  %x^  cooipaDhias^  cpm  jxromessa  dos  mestres 
de  caiDpo  que  os  seguiriao  cpm  os  seus  tercos. 
Uaidos  OS  soldados  com  os  moradores  cercarao.  a 
fortaleza  ao  largo ;  tomarao  a  agua ,  e  com  ella  as 
portas  e  todas  suas  ^peran^as ;  e  logo  o  capitao 
Paulo  da  Cunha  mandou.yoi  bolalim,  que  dissesse 
da  sua  parte  aos  cercados  que  o  goveroador  g&al 
Antonio  Telles  du  Silva  os  enviara  Aquella  capitania 
em  ordem  a  soccgar  os  iQoradores  por  um  de  dous 
meios  :  ou  castig^udo  os  que  se  haviao  leyantado, 
se  o  tivessem  feito  sem  justa  causa ;  ou  &vorecenda- 
os^  se  o  dominio  holiandez  Iha  houvesse  dado 
sem  legitimos  fundamentos;  e  que  examinados  (m$ 
e  outros  procedimentos ,  linhao  alcancado  q«e 
elles  dominantes  tratavao  os  moradores,  nao  como 
a  yassallos,  seoao  como  a  captivos ;  pois  temorosos 
de  sua^  crueldades^  roubos  e  injusticas  se  condem-r 
navao  a  viver  enlre  as  feras  dos  matos ,  por  fogi- 
rem  a  tyrannia  de  seu  imperio ;  e  que,  coma  a  indi- 
gno$  de  serem  obedecidos,  os  queriao  lan^ar  de  suas 
terras^  pelo  ([ue  sem  dila9ao  entregassem  aquella 
fortaleza  a  bom  parlido ,  quando  nao  a  tomariao  i 
escaldi  sem  deixarem  pessoa  com  vida.  Tomou  esta 
embaixada  ao  Flamengo  falto  de  tudo  o  que  Jhe 
podia  servir  a  conservacao  e  a  defensa.  Considerou 
o  perigo  certo,  o  soccorro  contingente;  e  se  entrp- 
gou  com  honrosas  condicoes,  que  pontualmente  se 
Ihe  guarddrao.  Sairao  da  fortaleza  sessenta  e  dpus 
Hollandezes  reudidoSy  e  quarenta  enoyelndios;  estes 
forao  condemnados  a  forca  pelo  auditor  g^ral  Fran- 


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GASTRIOTO  LUSITANO.  289 

Cisco  Bravo,  cuja  seotenca  se  execulou  logo  (foi  o 
lugar  do  crime  o  que  servio  ao  supplicio ) ;  a  todos 
colgarao  pelos  muros  da  fortiGcacao.  A  suas  mu* 
Iberes  e  fiihos  repartirao  pela  povoacao,  nao  como 
escravos  senao  por  modo  de  administracao.  Para 
esta  faccao  eoncurreo  com  valor  e  zelo  urn  nobre 
morador  chamado  Hypolito  Alonso  de  Vercosa,  es- 
trangeiro  por  nascimento,  mas  natural  por  affecto. 
Assistirao  i  entrega  os  dous  mestres  de  campo,  ainda 
que  cheg^rao  depois  de  rendida  a  forlaleza,  e  nor 
mearao  para  capitao,  e  da  gente  da  terra,  a  Alvaro 
Fragoso  d 'Albuquerque,  digno  de  toda  a  coofiaD9a; 
e  a  Francisco  de  la  Frauz^  Fran9ez  de  na^ao,  e  ca- 
sado  com  mulher  portugueza ,  fizerao  capitao  dos 
estrangeiros  rendidos  ( assent^rao  praca  os  mais 
d'elles);  o  qual,  por  satisfazer  a  sua  obrigacao, 
ddxou  casa ,  mulher  e  filhos ,  e  seguio  a  marcha 
dos  nossos ,  que  o  mestre  de  campo  Andr^  Vidal 
de  Negreiros  encaminhou  para  onde  estava  Joao 
Femandes  Vieira;  Marlim  Soares  Moreno,  com  o 
seu  terco  e  com  mais  fleima ,  tomou  o  caminho  de 
Nazareth,  e  cabo  de  Santo  Agostinho  :  um  e  outro 
alegres  com  a  nova ,  que  nesle  sitio  receb^rao  da 
victoria  das  Tabocas. 

XXVI.  Sette  dias  deo  Joao  Fernandes  Vieira  ao 
enterro  dos  mortos  e  cura  dos  feridoSi  depois  da 
batalha,  e  tambem  ao  descanco  dos  seus;  no  ultimo 
Ihe  chegou  a  nova  do  soccorro,  que  a  favor  dos 
opprimidos  moradores  mandava  da  Bahia  o  gover- 
nador  do  Estado,  e  que  os  mestres  de  campo  vinhao 
em  sua  demanda.  Logo  se  dispoz  a  sair-lhes  ao  en- 
coatro;  ao  outro  dia  a  passo  lento  chegou  ao  en- 
1.  19 


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190  CASTRIOTO  LCSITANO. 

genho  de  Balthazar  Goncalves  Moreno ;  no  dia  se- 
guinte  ao  lugar  de  Gorjacu,  e  se  alojou  no  engenho 
dc  Antonio  Nunes  Ximenes.  iya(|ui  despedio  An- 
tonio Cavalcanti  com  o  soccorro,  que  mandava 
aos  moradores  de  Goyana  e  de  Ignaracu.  Nesta 
marcfaa  se  desencontrarao  o  governador  da  Hber- 
dade,  c  os  de  Minas  e  Indios  que  a  ligeira  o  busca- 
vao,  deixando  algumas  jornadas  atraz  os  sens  tcrcos. 
Das  Tabocas ,  onde  nao  achirao  o  governador,  o 
vierao  seguindoat^  b  alojamentode  Gorjacu.  Com 
alegres  parabens  se  recebfirao,  devidos  A  diegada  e 
ii  victoria  ;  mas  nao  foi  longa  a  entrevista,  porque 
cbegou  ao  governador  o  aviso* deque  se  alojavao 
tia  povoacao  de  Santo  Agostinho  do  Cabo  cento 
c  oitenta  HoUandezes;  mandou  o  governador 
Upressar  a  marcha  ao  exercito,  mas  nao  p6de 
apanbar  &s  roaos  os  Flamengos,  porque  advertidos 
por  traicao  relirirao-se  ligeiramente  it  fortificacao 
de  Nazareth.  Com  o  dissabor  de  Ihe  fugir  a  caca 
mandou  o  governador  fazer  alto  naquelle  lugar , 
6ude  teve  novas  que  os  mestres  de  campo  Andr6 
Vidal  de  Negreiros  e  Martim  Soares  Moreno,  com 
a  gente  de  sens  tercos  e  muitos  dos  moradores  de 
terra  tinhao  chegado  a  lpojuc4,  e  estavao  com  de- 
terminacao  de  buscar  Joao  Fernandes  Vieira  em 
^alqiier  sitio  em  que  se  alojasse.  Escreveo-lhes  o 
governador  nma  carta ,  em  que  Ihes  dizia  que  era 
excessivo  o  gosto,  com  que  estava,  de  saber  que  os 
tinha  vizinbos  (ha via  entre  as  duas  pDvoacoes  tres 
legoas  de  disfancia)  sem  Ihe  alterarem  o  alvoroco, 
com  que  logo  os  ia  buscar,  as  praticas  que  ouvia 
acerca  do  fim  a  que  vinhao ;  porque  sabia  de  certo 


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GASTRIOTO  LUSITANO.  Ml 

ser  o  qii€  os  (razia,  soeegara  terra »  favorrcer  op- 
primidos,  e  destruir  tyrannos ;  e  que  se  um  megino 
fim  OS  UQift  nas  teneoes,  nenhuma  cousa  os  pode- 
ria  separar  nos  alojatnentos ;  que  elle  se  ficava 
dispondo  para  Ihcs  ir  dar  os  parabens  da  vinda,  e 
offerecer  a  pessoa  a  seu  servico,  ainda  que  a  muitos 
parecesse  a  obrigaigao  eneoutro.  —  Lerao  os  mes- 
tres  de  campo  a  carta  do  governo ,  e  yendo  por 
ella  que  a  forca  da  cortezia  dominava  a  da  supe- 
rioridade,  se  dividirao;  Martim  Soares  Moreno  ficou 
no  sitio  que  chamao  Algodoaes  (uma  tegoa  do 
pontal  de  Nazareth  ) ,  e  Andr^  Vidal  marchou  ao 
lugar  onde  se  alojava  a  ffovernador.  Avist^rao-se 
OS  dous  cabos  (postos  seus  soldados  em  ala,  e  pre^ 
sente  innumerayel  multidao  de  povo  de  toda  a  con- 
dicaoy  sexo  e  idade,  que  no  amparo  de  nossas  ar- 
mas  Tictoriosas  buscavao  o  seguro  da  crueldade 
inimiga ,  tanto  mais  ferina,  quantomais  irritada); 
chegirao  a  falla,  e  disse  Andr^  Vidal  de  Negrdros^ 
em  voz  que  todos  podiao  perceber  :  «  0  goveraadar 
»  g^ral  do  Estado,  Antonio  Telles  da  Silya,  me 
»  manda  prender  a  vossa  merc6 ,  por  queixas  que 
»  tern  feito  os  govemadores  do  Arrecife,  e  eattigar 
»  OS  cabecas  da  rebelliao ,  que  tern  amotinado  este 
j>  povo. »  Ao  que  respondeo  Joao  Fernandes  Vicirt : 
a  O  governador  g^ral  do  Estado  assim  como  ouvio 
»  a  voz  da  queixa ,  i  forca  que  ouvisse  o  grito  da 
»  oppressao.  Eu  sei  que  vossa  merc6  traz  ordeiis 
»  condicionaes,  paraas  executar pelos  mericimeatos 
»  das  partes,  e  dar  a  cada  um  o  castigo,  ou  o  favor 
n  mereeido ;  c  tambem  sei  xjue  chega  vossa  mercfe 
»  a  tempo  em  quov*  com  aens  olhoa  a  uuseravel 


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92  CASTRIOTO  LCSITANO. 

»  escravidao,  em  que  a  fortuna  tern  po8(a  esta  ca- 
»  pitauiai  cujos  inoradores  desgarrados  e  afHictos 
M  andao  deslerrados  de  8uas  proprias  casas  e  fazea- 
»  das  pelos  matos  de  sua  mesma  pairia  y  Irazidos 
»  de  sua  miseria  a  buscar  o  favor  de  nosso  zelo , 
M  que  sem  reparar  no  risco  se  arroja  a  liberUl-os 
»  da  lyrannia  j  que  os  sujei(a  a  padecer  (ribulacoes 
»  que  nao  pode  referir  a  dar,  e  injurias  que  nao 
»  sabe  relatar  o  pejo,  e  so  se  deixao  entender  com 
»  a  certeza  de  que  na  companhia  das  feras  se  me- 
»  Ihorao  do  que  Ihes  fazem  os  homens;  e  se  nesle 
»  caso  a  jusii9a  nao  explicar  o  preceito ,  nao  achar^ 
»  Yossa  mercS  o  da  obediencia ,  antes  provocara 
»  conlra  si  o  desacato,  livre  da  culpa,  de  que  ab- 
»  solve  a  todos  a  natural  defensa,  permittindo  aos 
»  morlaes  todos  os  meios  para  a  conservacao  da 
D  vida  e  da  houra.  »  Ao  ^chod'estas  palavras  se  se- 
guio  um  tumuUuoso  grito  de  soldados  e  morado*- 
res ;  o  qual  socegado,  tomou  a  mao  um  dos  solda- 
dos  de  Andr^  Yidal,  que  em  nome  dos  que  vinbao 
da  Bahia  fallou  nesta  forma  :  c  A  iujusCa  guerra 
»  com  que  o  pertido  Hollandez  ha  tantos  annos 
»  (yranni^a  csta  capitania  nos  traz  a  lodos  des- 
»  terradoB  de  nossas  casas ;  a  uns,  porque  fogem  o 
»  aggravo ;  a  outros ,  porque  buscao  a  vinganca ; 
»  e  a  lodos ,  porque  a  todos  cobre  o  luto  de  paren- 
»  tes,  amigos  e  naturaes,  mortos  pela  crueldade 
»  flamenga ,  que  com  lasdraosa  memoria  nos  esta 
»  fallando  ao  cora^ao  todas  as  boras,  chamando- 
»  nos  para  o  desaggravo.  Temos  a  occasiao  na  mao, 
»  o  exemplo  a  vista,  a  fortuna  da  nossa  parte; 
')  e  a  censura  certa  se  nao  seguirmos  a  persuasao. 


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CASTRIOTO  LUSITANa  395 

»  qutndo  no8  estimula  a  piedade  e  a  inveja^  como 
»  patricios,  e  como  Portuguezes ;  e  assim  queremos 
»  offerecer  as  vidas  por  servico  de  Deos  e  bem  de 
»  nossos  naturaes ;  e  se  algum  nao  for  d'este  pare* 
»  eer  pide-se  vol  tar  para  a  Bahia.  »  0  mestre  de 
campo ,  que  enfendeo  a  justa  delibera^io  de  seus 
soldados,  cor(ez  e  discreto  se  poz  da  parte  da  razao, 
dizendo,  que  bem  sabia,  pela  experiencia  de  muitos 
annos,  at6  onde  chegavao  soffrimento  dos  mora- 
dores,  e  a  insolencia  dos  es(rangeiros ;  e  uma  vez 
que  na  renitencia  de  seus  soldados  tinha  a  escusa 
de  nao  executar  as  ordens  de  seu  superior,  elle  o 
deixava  de  ser,  e  ficava  no  andar  de  cada  um  d  elles 
obrigadoaseguirseu  intento,  com  ogosto  de  mili(ar 
debaixo  da  bandeira  d'um  governador  tao  valeroso 
e  Cao  amigo  como  o  era  elle  Joao  Fernandes  Vieira , 
a  cujas  ordens  ficava  subordinado.  Derao-se  od 
bracos ;  fizerao-se  todos  em  um  corpo ,  unidos  no 
esquadraoe  noanimby  com  plausiveis  vivas  de  todos 
OS  presentes.  —  Camaradas  uns  dos  outros  se  aIo« 
jArao  OS  soldados;  e  d'alli  por  diante  o  ficou  sendo 
Andr^  Vidal  do  governador  Joao  Fernandes  Vieira. 
Gonferirao  o  eslado  das  cousas^  e  assentarao  em 
mandar  uma  partida  de  soldados  com  cabos  esco- 
Ihidos  ^s  ordens  do  capitao  Amador  de  Araujo^  a 
dar  principio  ao  cerco  da  fortaleza  do  ponial  de 
Nazareth  (empresa  determinada  primeiro  pela  ne- 
goeiacao  que  pela  forca)  j^  sitiada  ao  largo  pelos 
moradores,  assislidos  da  maior  parte  dos  soldados 
do  ter^o  de  Martim  Soares  Moreno;  o  qual,  ensi- 
nado  de  sua  genie  (mais  prompta  para  a  vinganca 
que  para  a  obediencia),  se  accommodou  com  a  razao 


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3M  amsmom  imcimo. 

de  sua  jUsUeli  r  ^  Mgaiiido  o  que  iiio  podic  < 
trtr,  fei  saber  a  Joao  Fernandes  Vieira,  ene  coma 
estava  aujeito  a  aoaa<>rdeii9  em  tudo  o  que  d  elk  e 
da aeu  lerco  quizesee  di&por;  e  que  D^ia  fornaa  se 
ia  incorporar  com  o  grosao  da  genie  que  sidava  a 
fortaleia  de  Nazareth  < 

XXVII.  DepuU  de  de«pedir  o  aocoorro  para  o 
cerco  de  Nazareth  mandou  o  govemador.da  libef^ 
dade  marchar  o  exercito  para  a  povo(a§ao  da  M<hi- 
beoa ;  a  sua  gente  forroava  a  tauguarda ,  e  a  de 
Andr^  Vidal  a  retaguarda.  Nesta  forma  chegarao 
i  povoa^ao  em  16  de  Agosto,  onde  fizerao  aUo,  e 
depois  d'algumas  boras  de  repouso,  se  encamioba- 
rao  na  direc^ao  do  rio  Tigipio,  oode  chegarao  pelaa 
aeis  horas  da  tarde,  o  mestre  de  campo  na  vau^ 
guarda ;  e  na  retaguarda  o  goyernador^  que  sem 
dar  lugar  a  que  o  exercito  arrimasse  as  armas^  e  se 
alojasse,  mandou  lomari  com  gente  de  guarda, 
todas  as  estradas  e  veredasi  que  saiao  daquelle  sitio 
para  cortar  a  diligencia  dos  traidores ,  e  a  noticia 
que  por  aviso  seu  podia  ter  o  inimigo  do  nosso  alo^ 
jamento. 

XXVIIL  0  general  das  armas  hollandezas  Hea<» 
rique  HuS|  que  deixamos  aquartellado  noeogenho 
de  Dona  AnnaPaes,  em  execucao  das  ordens,  que 
tinha  recebido  dos  do  governo^  mandou  neste  mesmo 
dia  1 6  de  Agosto  ao  seu  sargelito  maior  Joao  Blar, 
que  com  duas  companhias  de  Flamengos  e  alguna 
Indies  d^sse  sobre  as  moradas  da  Varzea,  sem 
deixar  cousa  que  nao  registasse ;  e  nellas  prendes- 
sem  todas  as  mulheres  d'aquelles  homens  nobres 
que  seguiao  a  Joao  Fernandes  Yieira ,  nao  so  por 


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motivo  de  viugaii9ay  senao  como  e<pecie  de  r^Ceii^ 
para  qudquer  s^cces$o  future.  Prendeo  Joao  Biar 
a  Dona  Antooia  Bezerra»  mulber  de  FraucUoo  Be-^ 
renguer  de  Andrada^a  Dona  Isabel  de  Goes,  mulber 
d^  Antonio  Bezerra>  aLuiza  deOUveira,  mulher. 
de  Amaro  Lopes^  cijija  nobreza  daya  privilegias  dc 
couto  a  cada  uma  de  suas  casas ,  por&m  d  ellaa  a 
tirou  a  violencia  para  as  casas  de  Dona  Anna  Paesi 
onde  se  deposilarao  para  se  levarem  ao  Arrecife« 
A  Dona  Maria  Ge^tar,  esposa  do  govemador  Joao 
Feraaudes  Vieira,  primeiro  fim  desta  diligenciti 
nap  pode  descobrir  o  inimigo  ^  porque  maior  oui* 
dado  a  tinha  escondida  e  retirada  em  bosqu^  oc- 
culto  a  toda  a  noticia;  com  if  ma  mulata  de  seu  Ser- 
vian, fiado  seu  sustento  a  cautella  de  um  fiel 
criado  do  governadori  sempre  bem  afortunadO| 
porque  sempre  prevenido,  Nao  salisfeito  o  HoUan- 
dez  com  este  procedimento  barbaro ,  formou  pro- 
jecto  de  passar  &  espada  todos  os  moi^dores ,  para 
cuja  execu^ao  os  mandava  reunir  na  Yai^ea ;  mas 
avisados  estes  por  um  Hollandez  catholjco  escaparao 
ao  perigo  emboscando-se  pelos  matos  com  suas  fa-» 
miliaSy  d^ixando  de  suas  casas  s(5  a$  paredes. — As- 
sistia  na  Varzea  o  Ucenciado  Malheus  de  Souza 
Uchoa,  capellao  que  entao  era  do  governador; 
soube  que  com  seu  exercito  tinha  chegado  ao  rio 
TigipiiJ^-  e  pela  posta,  em  companhia  de  Joao  Al^ 
vares  da  Guarda,  Ihe  veio  dar  aviso  de  tudo  o  que 
temos  referido;  e  que  sabia  parlicularmente  que  o 
Hollandez,  na  seguinte  manha,  delerminava  por 
em  seguro  a  presa  assim  das  pessoas ,  como  das 
fazendas  que  tiuba  roubado,  conduzindo  tudo  para 


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396  CA8TBIOT0  LtJSITANa 

o  Arrecife.  Oavidas  eslas  novas  j  deo-se  o  gover- 
nador  pressa  em  acodir  com  prompto  remedto  a 
tamanho  mal.  Tocou-se  arma,  receb^o^se  as  or* 
dens,  formou-se  a  gente,  marchou  o  exereito  com 
a<{uelle  passo  que  aconsdhava  o  perigo ;  toniou  o 
governador  a  vanguarda,  e  o  mestre  de  campo  com 
a  gente  da  Bahia  o  seguio  na  retaguarda.  Adianta- 
Tao-se,  como  descobridores  do  campo,  os  capitaes 
Ramos  e  Fagundes,  03  quaes,  vencida  uma  parte 
do  caminho,  derao  com  duas  sentinellas ,  que  o  ini- 
migo  tinha  deitado  ao  largo ;  tomadas  as  maos  con* 
fess^rao  o  que  sabiao,  e  pagarao  com  a  vida  o  exer- 
cicio  em  que  andavao.  Passarao  avante,  e  Gzerio 
pausa  a  vista  do  engenho  de  Pedro  da  Cunha 
Andrada,  detidos  do  rumor  que  faziao  algumas 
mangas  de  Flamengos ,  que  andavao  espalhados  a 
roubar.  Neste  engano  as  confirmarao  os  nossos  ca- 
pilaes,  que  sem  movimento  esperirao  que  com  a 
presa  se  fossem  para  o  alojamento  dos  seus,  ante-* 
vendo  que,  se  dessem  sobre  elles,  poderia  escapar 
algum,  cujo  rebate  levantaria  ao  Hollandez  do  sitio 
de  Dona  Anna  Paes ;  e  fogido  para  o  Arrecife  noa 
deixaria  a  dor  de  nao  remir  as  presas,  c  de  nao  co-- 
brar  os  roubos. 

XXIX.  A'  meia  noite  acabou  de  chegar  toda  a 
nossa  gente  aquelle  sitio  molestadissima  do  escuro, 
das  chuvas,  dos  lamagaes,  e  da  aspereza  dos  ca- 
minhos.  M  andou-se  fazeraltono  sobredito  engenho, 
e  tomadas  fres  horas  de  descanco ,  se  continuou 
a  marcha  na  mesma  forma  e  ordem  que  at£  alli 
trazia.  Chegarao  os  batedorcs  ao  engenho  chamado 
do  Meio  ( urn  dos  que  o  governador  possuia  na 


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GASniiaiO  LVStTARa  i91 

Vai'EM),  ottde  prend^o  sets  Hollan<!ezes  e  Ires  In* 

diM  que  andaTao  roubando,  as  quaes  largirao  as 

presas  com  as  vidas ;  o  mesmo  succedeo  a  dous 

Indios  e  um  Flamengo ,  que  no  engenho  de  Santo 

Animiio  se  occupavao  no  mesmo  exercicio.  Rom^- 

pia  no  horisonte  a  primeira  luz  da  manha,  quando 

a  noasa  vangnarda  chegava  As  margens  do  rio  Ca- 

peberibe,  tao  crescido  cofiti  a  innundacao  das  aguas 

que  por  todas  as  partes  tlegaTa  \ko  k  passagem,  e 

poT  nenhuma  se  descobria  barco^  canoa,  ou  jan-* 

gada  f  em  que  se  podesse  passar  a  outra  banda. 

Acendia-se  no  discurso  de  todos  o  desejo  da  pressa 

com  o  estorvo  da  marcha ;  fazendo  mais  sensivel  a 

detencaavizinhancadoalojamentocontrariojaquasi 

aTista.  0  governador,  que  vio  a  suspensao ,  com  o 

ankno  de  Alexandre  dcterminou  cortar  o  impedi- 

mentOy  que  nao  podia  veneer.  Seguindo  a  um  mu« 

lato  seu ,  grande  nadador^  apertou  as  pemas  ao 

cavallo,  avancou  ao  rio ,  e  com  agua  pelo  arcao  da 

sella  ^  passou  &  outra  banda.  Foi  tao  poderoso  seu 

exemplo  que  o  imit^rao  sens  soldados,  lancando-se 

ao  rio  pegados  uns  aos  outros  para  resistirem  ao 

rapido  da  corrente  (postas  as  armas  de  fogo  sobre 

as  cabecas) ;  e  em  brevissimo  tempo  se  virao  todos 

da  outra  banda.  —  Caminhou  a  nossa  gente  at6 

descobrir  as  casas  de  Dona  Anna  Paes;  e  suspen- 

dendo  eniao  o  passo ,  mandou  o  governador  seis 

soldados  praticos  e  ligeiros,  que  por  entre  as  ramas 

do  mato  fossem  cortar  as  sentinellas  do  inimigo« 

A  poucos  passos  torodrao  duas  as  maos,  por  enjo  de- 

poimento  entendeo  o  governador,  que  o  Holiandez 

estava  no  terreiro  das  casas,  formado  em  dous  es- 


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3M,  GASCUOXO  umxAiKw 

quidrdtg,  e  piMado  ordem  que  jum  pda  YiH»  d'0« 
linda,  outro  pela  Varzea  mo  deixasse  cousa  iswto 
de  fogo  e  do  ferro ;  e  que  o§  caboe  estoviko  depiro 
das  casas  pdstoT  a  masa  para  comereHi^  e  marcba* 
rem,  leyaodo  comsigQ  a$  laatronas  que  tiohaa 
presas.  Coatiauaiio  os  uossos  soldados  a  desoobrir 
o  campo  com  o  mewio  zelo  e  cauteUa;  tomarao  as 
niao»  mais  duaa  sentin^livi,,^  sem  swem  seniido* 
se  apro2um4rao  do  eagei^^«  Vendo  o  governador 
que  a  occasiao  se  Ihe  apresentava  favoravel  march^ii 
com  a  vsCnguarda  a  sordioa  at^  &  eutrada  do  paf  o  do 
engenho,  levando  diante  um  lro?o  de  soldados  es- 
colhidos  (o8  mai^  d'eJles  capitaes  vivos  e  reforma- 
dos )  com  ordem ,  que  dada  a  primeira  e  seguuda 
carga,  seiovestisse  i  espada.  Tinha  mandado  ao 
Camarao,  que  com  os  Indios  do  seu  ter^o  se  adiau* 
tasse  incoberto  a  occupar  todos  os  caminhos  qua. 
guiavao  para  o  Arrecife,  para  que  ueuhum  Fla- 
mengo  podesse  fugir.  Nas  primeiras  iileiras  da 
vanguarda  poa^  os  capitaes  Joao  d' Albuquerque  , 
Antonio  Borges  Uchoa,  Sebastiao  Ferrrira,  Anto- 
nio Gomes  Taborda ,  e  Francisco  de  Lisboa ,  com 
outros  d'igual  valor  e  opioiao ;  e  como  guias  de 
todoS|  OS  ajudantes  Amaro  Gordeiro ,  e  Francisco 
Gardozo.  Tanto  que  a  nossa  gente  se  descobrio  aos 
esquadroes  inimigos,  tocarao  arma  com  tambores, 
darinsy  gritos  e  cargas,  cujo  estrondo  fez  levantar 
da  mesa  os  cabos  hoUandezes  com  tanta  turbaqao 
e  desatino ,  que  derao  por  t^rra  com  as  iguarias, 
frascoSy  copos,  e  tudo  o  mais  que  estava  em  cima 
das  niesas^  nao  Ihes  deixando  o  repenle  tempo  para 
pegar  nas  armas.  Forao  os  aossos  capitaes  avail- 


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GAaniaio  uistrma  S9ft 

fando  aoft  eaqnadroes  inimigos;  cpie  sein  perderem 
a  ftSrma  nao  pnusarao  ot  tiros ,  at^  que  os  nossos 
Ihes  derao  a  primeira  e  segui^da  carga.  0  gover- 
nador,  que  tudo  tinha  disposto  (deixando  a  reta- 
guarda  ao  capilao  Paulo  da  Cunba,  e  a  muitos  ca* 
pitaes'  volantes  para  inve^tirein  por  oude  primei  ro  os 
chamasse  a  occasiao  e  a  necessidade)  acompanbado 
de  Henrique  Dias^  com  os  seus  soldados,  ia  na 
Tanguarda  montado  em  um  formoso  ginete,  e  con^ 
um  clarim  diante,  desembamhou  a  espada,  e  disse 
em  Yoz  alta  :  «  Viva  a  f<^  e  a  liberdade ;  i  espada^ 
})  soldados.  »  F^ao  forao  duas^  senao  uma  roesma 
cousa  o  preceito  e  o  ayan90|  com  deliberagao  tao 
Talente,  que  nao  ha  via  armas  que  o  nosso  fogo  nao 
cortasse^  nem  resistencia  inimiga  que  o  nosso  braco 
nao  rompesse.  —  No  maior  furor  do  conflicto  che- 
gou  o  meslre  de  campo  Andr^  Yidal ,  assistido  doa 
capitaes  Assensoda  Silva,  e  Antonio  GonsalvesTi^ao 
com  as  suas  companhias,  os  quaes  mettidos  na  ba- 
talba  coriavao  com  igual  pulso,  e  nao  com  desigual 
effeiu^.  0  inimigo,  primeiro  descomposto  das  car- 
gas,  e  depois  sangrado  dos  golpes,  yiroii  as  costas 
ao  damnoy  buscando  nas  casas  do  engenho ,  senao 
seguro ,  desvio ;  estavao  guarnecidas  e  em  parte 
forlificadas ;  e  serviao  os  altos  ao  reparo  dos  Fla- 
mengos^  e  ao  de  seus  Indios  auxiliares  as  paredes 
d'uma  espacosa  casa  tei^rea. 

XXX.  Gorr^rao  em  desordem  os  inimigos  &% 
casas 9  e  sobre  elles  os  nossos,  que  logo  Ihes  ga- 
nhirao  uma  hermida,  e  um  grande  cumulo  de 
lenha,  ealli  se  travou  proGada  luta.  Vendo-se  elles 
por  toda  a  parte  perseguidos  de  aossas  baliaS|  que 


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300  GASTEIOTO  LtrSITANO. 

saindo  de  reforcados  moequetes  biscainhos  rompiao 
portas  e  paredes,  usarao  de  urn  estratagema  para 
suspenderem  o  combate.  Mandarao  por  as  janellas 
das  casas  aquellas  matronas  portuguezas,  que  dis« 
semos  aprision^rito  na  Varzea.  Pareceo  a  diligencia 
de  DOS  destruirem  demonstracao  de  os  inimigos  se 
renderem ;  e  assentou  o  mestre  de  campo  com  o 
govemador  se  mandasse  urn  (ambor  que  requeresse 
a  entrega,  eofferecessebom  quart  el^  com  desengano 
de  que  entrados  por  assalto  se  nao  daria  vida  a 
pessoa  alguma.  Fundado  no  direito  das  geotes , 
saio  o  nosso  enviadb  com  uma  bandeira  branca  na 
mao.  Ouvio  o  Flamengo  a  embaixada;  avaliou  a 
diligencia  por  fraqueza ;  e  perfido  por  arte ,  res- 
pondeo  com  uma  horrivel  carga  de  mosquetaria , 
saindo  lodos  repentinamente  as  janellas  e  barandas 
das  casas,  das  quaees  dada  a  cai^  se  retirarao  para 
dentro,  deixando  mor(o  d'uma  ballaao  nosso  men* 
sageiro.  —  Levantou-sc  entre  os  nossos  uma  voz  : 
«  Traicao,  traicao;  morrao  os  perGdos  herejes,  w 
Como  nova  causa  accendeo  o  grlto  em  todos  novo 
furor,  de  sorte  que  com  os  tiros  nao  deixarao  appa- 
recer  o  inimigo,  em  quanto  muitos  dos  nossos  car- 
regavao  lenha^  e  com  ella  enchiao  os  baixos,  e  cer- 
cavao  (odas  as  paredes  d  ellas;  em  pouco  tempo  se 
fizerao  os  soldados  senhores  do  ambito,  e  baixo  das 
casas;  adianCou-seentretanto  o  capitao  Joao  Soares 
d*Albuquerque  a  impedir  ao  inimigo  a  serventia 
da  escada,  para  todo  o  incidente  ,•  seguirao  sua  v<i- 
lerosa  determinacao  outros  muitos  capitaes  e  sol- 
dados  ;  todos  pediao  fogo ;  o  qual  applicado  aos 
materiaes  se  comecava  a  alear  com  pavorosa  vora^ 


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GASTRIOTO  LUSITANO.  SOI 

cidade.  —  Crescia  a  lavareda ;  en  Ire  nuvens  de 
fumo  entrava  ja  pelas  janellas  a  chama  em  com- 
panhia  de  innumeraveis  ballas^  que  a  aiumaTao. 
Ci^scia  com  as  chamas  a  raiva;  entregava-se  o 
hereje  ao  ferro  para  escapar  ao  fogo,  e  parecia 
querer  ser  victima  da  desesperacao  antes  que  en- 
tregar-se  a  parlido ;  mas  por  fim  vendo  que  dons 
soldudos  nossos  carregavao  dous  barris  de  polvora 
por  ordem  do  governador,  para  fazerem  voar  as 
casas  ( sem  embargo  de  que  no  mesmo  incendio 
ha  viae  de  acabar  innocentes  e  culpados),  Ibe  cairao 
as  armas  das  maos,  e  esperancas  do  animo,  pedindo 
a  gritos  bom  quarlel.  0  seu  general  Henrique  Hus 
mandou  arvorar  uma  bandeira  branca,  e  com  duas 
pistolas ,  viradas  as  bocas  para  baixo ,  e  o  chapeo 
na  mao^  se  mostrou  rendido  a  lodos  os  nossos.  — 
Acudio-se  a  apagar  o  fogo  com  diligencia;  permit* 
tio-se  ao  general  Hus  e  ao  sargento  maior  Blar  o 
sairem  com  suas  armas  e  insignias  at^  a  presenca 
do  governador;  a  mesma  honra  se  permitlio  ao 
governador  dos  Indios,  sens  auxiliares,  e  que  todos 
OS  mais  ofliciaes  e  soldados  sairiao  das  casas  desar- 
mados,  e  a  merc^  dos  cabos  sobrcditos.  Recebidas 
nesta  forma  as  condicoes  da  entrega  saio  Henrique 
Hus ,  e  em  seu  seguimento  os  ofliciaes  maiores ;  e 
logo  lodos  OS  mais  cabos  e  soldados^  que  os  nossos 
forao  desarmando  assim  como  iao  saindo.  Plejteava- 
se  sobre  se  haverem  de  entender,  ou  jiao,  as  con- 
dicoes capituladas  com  os  Indios  rebeldes;  quando 
elles  mesmos  decidirao  a  diivida  contra  si  proprios, 
porque  depois  de  rendidos^  com  animo  traidor,  se 
rebellarao,  e  d'alguns  tiros  matirao  um  alferes,  e 


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302  GASTRIOTO  LUSITANO. 

um  soldado,  e  ferirao  gravemente  o  capitao  Anto- 
nio Gomes  Taborda  :  })drbaridade  que  nos  obrigou 
a  passal-os  a  espada. 

XXXI.  Tinfaa  o  sargento  maior  formada  toda  a 
nossa  infantaria  em  circulo ,  que  pelo  raeio  aira- 
vesfavao  duas  alas  de  mosqueteiros ,  por  entre  os 
quaes  forao  passando  os  rendidos  ate  a  presenca 
dos  nossos  cabos  maiores.  Vio  Joao  Femandes 
Vieira  diante  de  si  a  Henrique  Hus  com  as  submis- 
soes  de  rendido,  e  Ibe  disse  estas  palavras,  modesto 
sobre  victorioso  :  «  Mai  discursa  quern  fabrica  fu- 
»  Uiros  sobre  as  ineonstaneias  da  fortuna ;  e  muito 
))  peior  quern  nos  favores  della  acha  molivos  para 
»  desprezar  a  razao  e  para  atropellar  a  justica. 
))  Quem  dissera  (ha  muito  poucos  dias)  que  a  so- 
V  berba  bollandeza ,  animada  de  nossa  desgraca , 
»  se  desvelava  em  Fabricar  sua  ruina  1  Vezes  sao 
»  do  mundo ;  e  nao  se  desenganao  os  mortaes  de 
»  que  so  o  imperio  da  razao  i  o  que  dura,  e  o  da 
»  tyrannia  o  que  mais  de  pressa  acaba.  A  maior 
»  injuria  de  um  governo  6  governar  com  injuria ; 
»  e  o  pronostico  mais  certo  d^  sua  queda  i  o  in- 
»  sassiavel  de  sua  cobica,  pois  por  satisfazer  a  sMe 
»  nao  repara  em  secar  a  fonte  :  nao  dissimula  Deos 
»  com  aquelles  delictos,  de  que  faz  gala  a  malicia 
*  c  pregho  o  escandalo.  Como  bavia  de  fardar  o 
1^  castigo  a  culpas  que  decretava  o  poder  7  A  Deos 
»  nosso  senhor,  de  quem  esperava  nossa  fe  o  re- 
>)  medio,  obriga  o  sofTrimento  dos  abatidos  tanto, 
»  como  0  offendem  as  demazias  dos  soberbos.  A 
»  V0884  merc6  nao  o  posirao  nesle  estado  nossas 
»  armas,  senao  suas  insolencias^  de  que  eu  como 


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CASmOTO  LUSITANO.  309 

»  mais  ofTendido  soil  o  mais  queixoso ;  «  tinda 

»  assim  me  compadeco  de  «ua  forinna,  c  confesso 

»  nie  occupa  todo  o  cora^ao  a  piedade  dc  ana  mi- 

V  seria^  esquecidos  dos  ameacos  de  sua  arrogancia 

»  que  promettiao  prcnder  a  quern  o  tern  preso,  e 

»  dcslmir  a  qnem  agoi^  o  determina  favoreccr  :  a 

»  conlingencia  dos  fuluros  acautella  sesudos,  e 

M  descompoe  itidiscretos.  »  A  loda  esta  pratica  nao 

rtepondeo  Henrique  Hus  mais  que  estas  determi- 

nadas .  razoes.  «Pois  Tossa  senhoria  me  renceo, 

»  e  me  tern  prisoneiro,  pode  fazer  o  que  for  ser- 

I)  vido ;  e  Ihe  posso  assegurar,  qne  para  render  o 

»  Arrecife  Ihe  nao  falla  mais  que  caminhar  e  tomar 

y>  posse  jle  suas  fortalezas;  porque  a  flor  de  sens 

»  fioldados  e  defensores  tern  Tossa  senhoria  morta 

»  e  rendida  nestas  dtias  batalfaas.  »  Foi  o  gover- 

nador  correndo  com  os  olhos  todas  as  pessoas  Pen- 

£das/  edisse  para  o  mestre  de  campo  Andr*  Vidal 

de  Negreiros  :  «  0  que  Tejo  me  assegura  na  Terdade 

T^  do  que  ouco.  »  Tornou  Henrique  Htis :  tr  Pois 

n  Tossms  senhorias  tern  Tenctdo  ludo  a  qoe  ae  podia 

»  temer,  nao  pei>cfto  a  oecasiao ,  que  wma  tw  per^ 

»  dida  taide  se  rccupera.  » 

XXXH.  A  primeira  diHgencia,  a  que  se  dedicou 
o  goveraador  depois-  da  victoria ,  foi  a  liberdade 
^qtieilas  matronas  que  o  tnimigo  iinka  prisioiKi- 
ras,  cuj4  redempcao  e  Tista  augmenlou  a  gtoria  do 
triumplK),  e  a  toz  do  apptanso^  com  que  o  cMrcito 
acclamava  a  ipictoria  ao  som  de  cakas,  dariM  j  e 
tkaiamethm,  augmenladocom  o  esirepkodM  kmt^ 
%aro8  Tttstrmnenioa  de  Minas  e  Iftdioe,  que^  acoM* 
tMoolkado  de  aena  eonfosos  gritoe^  ae  (am  aoa  ti- 


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504  CASmOTO  LUSITANO. 

toriosos  grato»e  aos  yencidos  importuno. — Lai^oo- 
se  a  casa  de  Dona  Anna  Paes  aos  soldados  comtoda 
sua  bagagem ,  reservando  para  £1  Rei  ludo  o  que 
erao  armas  c  muni^oes,  que  se  entreg^rao  ao  pro- 
vedoi*  do  exercilo.  Entre  mosqueles  e  claviuas  fo- 
rao  seis  cenlas  armas  as  que  perdeo  o  inimigo ,  e 
pass^rao  de  mil  e  quinhentas  as  que  nos  deixou 
uesla  e  na  occasiao  das  Tabocas ;  de  todo  o  mais 
genero  d'armas  offensivas  e  defensivas  foi  grande 
a  copia  que  se  arrecadou.  A  abuodancia  dos  mau- 
timenlos  foi  (anta  que  servio  a  necessidade  dos  sol- 
dados  f  e  ao  suslenlo  dfi  mui(o  povo ,  que  de  lodas 
as  partes  concorreo.  Aqui  se  proverao  os  nossos 
officiaes  de  muilos  e  bons  cavallosi  com  apparelbos 
e  jaezes  para  a  vaidade  e  para  o  servi^o,  parece  que 
quiz  o  C^o  que  not  armassem  para  a  liberdade  os 
mesmos  tyrannos  que  nos  armarao  de  razao  para 
recusar  o  jugo.  £m  quanto  os  nossos  se  occupavao 
em  aproveitar  o  util ,  se  desvellava  o  governador 
Joao  Feroandes  Vieira  em  enlerrar  mortos,  e  curar 
feridos,  em  cujo  exercicio  tomarao  grande  parte  os 
moradores  da  Varzea  e  dos  Apupucos,  uns  daado 
sepuUura  aos  defuntos^  outros  casas  e  medicamen- 
tos  aos  enfermos,  como  devedores  a  uns  e  a  oulros 
de  se  verem  restituidos  a  suas  moradas,  das  qua^ 
aadavao  desterrados^  havia  muilos  dias.  -^  Deixou 
o  HoHandez  no  campo  da  batalha  quatrocenlos 
morios  e  duaeutos  prisioneiros ;  e  dos  que  poddrao 
fugir,  raros  forao  os  que  deixarao  de  morrer.  Du- 
zentos  Indios  degoUou,  logo  alli,  nosso  ferro,  e 
depots  anossa  diligenciaacabouosdemais.  Da  ooasa 
gente  morr^rao  dezoito  peasoas,  e  sairao  triaU  e 


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CASTKIOTO  LUSITANO.  305 

cmco  feridos :  cousa  que  pai^ece  incriveli  e  que  s6  se 
explica  por  uma  proteccao  manifesta  do  ceo.  Qua$i 
todos  Qossos  feridos  convalecerao  promptamente, 
servindo-lhes  depois  os  signaes  dos  golpes  taoto,  a 
honra  das  pessoas  como  ao  conliogente  da  halalha 
e  formosura  da  yictoria. 

XXXUI.  Nesta  guerra  de  liberdade  e  indepen* 
dencia  nao  s6  liverao,  parte  os  inoradores,  seoao 
muitos  padres  e  religiosos,  como  ja  temos  visU)'; 
uxa  d'elles  mui  distinto,  e  que  merece  especial 
lembran9ay  foi  o  P.  Fr.  Joao  da  Resurreicao,  reli- 
gioso  benedictino  natural  do  Brazil.  Este  religioa> 
foi  «sc(^ido  pelo  seu  provincial ,  que  residia  oa 
Bahia^  para  ir  assistir,  junto  com  outro  reli- 
giosoy  ao  abbade  do  engenho  de  Mazuresse^  em 
Pernambuco,  Fr.  Anselmo  da  Trindade,  que  por 
sua  muita  velhice  e  grande  virtude  fora  respei* 
lado  pelo  Hollandez.  Forao  os  dous  religiosos 
em  companhia  dos  embaixadores  flamengos  que 
Toltavao  para  Pernambuco ;  desembarcarao  no 
Arrecife  conGados  no  favor  d'estes ;  apresenta- 
rao-se  aos  do  governo,  a  quern  esposerao  lisamente 
0  fim  de  sua  viagem ;  mas  como  chegassem  justa- 
mente  no  tempo  em  que  comecavao  a  espalhar-se 
OS  romores  da  sublevacao,  forao  tidos  por  suspeitos 
e  at^  como  espias;  detiverao-os  dentro  do  Arrecife 
com  a  cautela  da  deseon(ian9a  at^  que  houvesse 
embarcaqao  que  os  levasse  para  fora  da  terra.  T^r- 
don  a  execu^ao  ;  e  o  tempo  Ihes  abrio  caminho  a 
comprar  a  licenQa  para  sairem  do  Arrecife  para  o 
teu  iegenhOy  por  quatro  caixas  d'assucar.  Succedeo 
entretanto  a  sublevaQao  de  Joao  Fernandes  Vieira; 
I.  20 


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106  CASTRIOTO  LU81TAN0. 

retirarao-se  os  religiosod  do  engenho ,  que  bem  de 
pressa  foi  saqueado  por  Joao  Blar,  e  forao  fogindo 
de  mate  em  mato  at^  se  encorporarem  com  o  nosdo 
fex^rcito  ;  onde  Joao  Fernandes  Vieira  os  recebeo 
com  agrado  e  tratou  com  respefto  :  favor  que  o 
P.  Fr.  Joao  da  Resurreicao  Ihe  soube  merecer  com 
o  acompanhar  al^  o  ultimo  periodo  da  gucrra.  Na 
primeira  occasiao  d  ella ,  que  foi  na  das  Tabocas  y 
diasemos  por  maioro  valor  e  zelo  com  que  obrou. 
Neata  segunda,  que  acabamos  de  referir,  obrou  de 
BortB  que,  confessor  e  soldado  despertou  a  emulacao 
de  todos,  e  a  inveja  de  niuitos ;  com  persuasoes  e 
^xemplos  ensinava  a  despre^utr  os  perigos  de  uma  e 
outra  vida  com  a  applicacao  do  sacrameuto  e  com  o 
¥lgoroso  do  braco ;  e  apezar  de  ser  ferido  de  duas 
ballas  fi'uma  pema  e  n'um  p^>  nao  se  retirou 
do  campo  da  batalha,  antes  com  mais  ardor  e  zelo 
continuou  no  exercicio  do  seu  ministerio  rdigioso 
e  patriocico ,  at^  que  a  victoria  foi  proclamada  pe- 
lo6  nosso^. 

XXXI V.  Em  17  de  Agosto  de  1645  se  alcancou 
esta  victoria.  Pedia  o  discommodo  de  tantos  dias 
e  0  trabalho  de  tantas  marchas  ( com  o  de  duas 
batalhas  campaes)  descanco  e  alivio  para  os  sol- 
dados  ;  o  que  Ihes  solici(ou ,  mandando  abalar  o 
exerdlo  parai  o  seu  engenho  de  Sao  Joao  Baptista , 
rito  na  Varzca ,  para  onde  marchou  em  f6rma  de 
triumpfao.  Precediao  clarins  e  charamellas  com 
todos  OS  instrumentos  bellicos ;  seguiao-se  os  Hol- 
lahdetes  rendidos ,  entre  elles  o  seu  general  Hen- 
rique Hus ,  montado  em  um  ginete ,  privado  das 
insignias  militares  e  armas  bellicas;  logo  a  nossa 


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CAOTUOTO  L08ITAlfa  907 

gente  formada  em  eaquddroe^^  aos  quaes  seguia  o 
goTernador  com  o  mestre  de  campo,  acompa- 
nhando  aqiieUas  matronas  que  o  inimigo  tinha  pre- 
sas:  dona  Anna  Bezerra ,  dona  Izabel  de  Goas,  e 
Luiza  de  Oliveira,  as  quaes  $eus  maridos  levavao 
d'ancas  j  segiiidos  da  multidao  popular,  que  nao 
descancava  de  louvar  a  Deos,  e  abend  iqoar  os  liber- 
tadores  de  sua  escravidao.  Chegados  ao  engenho, 
forao  recebidos  com  excessiva  alegria,  e  hospedados 
com  generosa  grandeza.  — D'este  lugar  se  remet* 
tArao  para  a  Bahia  os  rendidos,  a  saber,  Henrique 
Hus,  Joao  Blar,  com  lodos  os  ma  is  que  nao  quiz^ 
rao  assentar  pra^  debaixo  de  nossas  bandeiras , 
para  servirem  a  coroa  nesta  guerra ;  e  porque  o 
dar  Ihes  guarda  de  soldados  seria  defraudar  o  exer- 
cito,  e  gasto  gem  fructo,  orden&rao  os  dous  gover- 
nadores  Joao  Fernandes  Vieira  e  Andr^  Vidal  que 
de  povoacao  em  povoa^ao  os  fossem  guardando  e 
conduzindo  os  moradores  de  uma  at^  outra ;  e  que 
nesta  forma  se  entregassem  ao  govemador  do  Es- 
tado  Antonio  Telles  da  Silva ,  para  que  d'elles  dis- 
posesse  como  bem  Ihe  parecesse.  — Em  um  dos 
povos  por  que  passarao,  matirab  os  vizinhos  a  Joao 
Blar  dc  um  tiro,  tirando  d'este  modo  justa  vinganca 
de  um  inimigo,  que  nao  respeitava  o  sagrado  nem 
o  profano,  e  que  naquelles  sitios  espalhara  o  tet^ 
ror  e  a  morte. 

XXXV,  Em  0  numero  XXIV  d'estelivro  d^mos 
conta  de  como  o  general  da  frota ,  que  da  Babia 
parlira  para  o  reino,  melt^ra  no  porto  de  Taman- 
dar^  as  oito  embarcacoes  em  que  o  governador  do 
Eitado  mandira  oa  mestres  de  campo  Andri  Vidal 


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308  CA&TRIOTO  LOaiTANO. 

e  Mai  iim  Soares  com  seus  tercos  para  socegai^em 
OS  tumultos  do8  moradores  de  PeruambuGO^  de  que 
SCI  haviao  queixado  os  do  governo  hoUaiukiz;  refe- 
rimos  o  que  succedeo  na  marcha  a  estes  cabos; 
agora  relataremos  o  que  Salvador  Correa  passou  ua 
viagera,  al^  ^quellaaltura  que  perteince  aos  termos 
d'esla  historia.  Em  1 2  de  Agosto  amanheceo  a  frola 
ancorada  a  vista  do  Arrecife :  constava  de  trinta 
e  sette  v^ias  sorteadas ;  sua  capitanea ,  um  forte  e 
magesloso  galeao  obrado  no  Brazil ,  pela  industria 
do  general  da  frota.  0  Hollandez  Qcou  de  tal  mode 
perturbado  com  esta  apparicao,  que  suppondo-a 
hostil  pela  coincidencia  com  o  successo  das  Tabo- 
cas  J  nao  Ihe  restou  mais  acordo  que  para  tratar  da 
entrega.  Nenhuma  occasiao  se  perdeo  com  mais 
desculpa*  nem  com  maior  desgra^a.^— Mandou 
Salvador  Correa  dous  enviados  a  terra  para  que 
saudassem  os  do  supremo  governo ,  represenlando- 
Ihes  que  o  fim  que  alii  os  trazia  nao  era  outro  que 
dar-lhes  a  nova  de  como  deixava  em  Tamandard 
oito  embarcacoes  com  dous  tercos  d'infantaria  em 
complemento  da  promessa  que  o  governador  geral 
do  Estado  Ihes  havia  feito;  que  com  brevidade 
mandaria  socegar  os  animos  dos  moradores,  e  pren- 
der  as  cabers  dos  conspirados  para  os  castigar 
pelos  merecimentos  das  culpas,  o  que  tambem 
fazia  por  obedecer  as  ordens  que  tinha  do  senhor 
Rei  Dom  Joao  o  Quarto,  pelas  quaes  Ihe  mandava 
apertadamente  que  com  os  HoUandezes  se  conser- 
vasse  em  todo  a  boa  amizade  e  correspondencia ; 
e  que  elle  Salvador  Correa  se  ofierecia  com  todos 
OS  Portuguezes  daquelk  frota  para  tudo  o  em  que 


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GASTEIOTO  LUSITANO.  809 

OS  podesse  servir;  e  com  aqnelle  galeao,  em  que 
ievava  toda  sua  casa  para  o  reino^  comboiando 
aqufilles  navios  mercanteSi  Ihes  pediao  Hcenca  pa- 
ra se  Ihcs  Tender  algum  refresco  da  terra,  e  para  os 
poderem  visitar  osquetiTessem  gosto  de  o  fazer;  em 
9^;uranca  do  que  poderao  ficar  em  refens  aqueiles 
seus  enviados.  Desembarcarao  entre  muita  gente  do 
povo  que  os  esperava  para  o  misterio  que  poderia 
ter  a  confiahca  de  tomarem  ferra  sem  licen^ ;  acom- 
panbados  de  alguns  e  seguidos  de  todos,  subfrao  ao 
conselhO)  onde  foi  ouvida  sua  embaixada  y  e  orde« 
nado  que  os  aposentassem  na  fdrma  devida.  Este 
Hecado ,  f odo  de  paz ,  tranqutllizou  os  animos  dos 
do  coDselho,  ainda  que  sempre  Uies  restava  alguma 
desconflanca ;  pelo  que  mandafao  no  mesmo  dia 
duas  lanchas  de  refresco,  e  aos  remeiros  derao  or- 
dem  que  examinassem  o  porte,  a  carga  e  a  gente, 
assim  da  eapitanea  como  de  todos  os  mais  navios; 
o  que  fiz^rao  i  sua  vontade  pela  franqueza  com 
que  o  Dosso  general  Ihes  permittto  o  exame.  Desen- 
ganados  os  do  governo  que  nada  tinhao  a  recear , 
largarao  nb  dia  seguinte  os  nossos  enriados ,  que 
voltArao  para  bordo  com  um  barco  de  refresco  que 
haviao  comprado.  —  No  dia  seguinte  rompeo  o 
tempo  em  tao  furiosa  tempestade  que  tem^rao  os 
pilotos  trincassem  as  amarras,  e  dessem  a  eosta  os 
navios ;  levirao  ancoras,  largArao  algum  panno ,  e 
forao  correndo  a  vontade  dos  ventos ,  fa^endo  al*- 
gumas  Toltas  a  terra ,  mas  sempre  engolfados  no 
mar.  Seis  dias  os  trouxe  a  tormenta  n'eetes  bordos 
lutando  com  as  ondas,  at^  que  tornando-se  o  vento 
mais  largo  pod^rao  seguir  sua  derroia  para  o  reino. 


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310  GAimUOTO  LUSITAMO* 

XXXVL  Tanto  qye  o  HoIlaiideiE  «e  vio  Uvro 
do  temor  que  a  a^sombrava  tratou  logo  de  p6r  em 
esiecu^ao  o  desejo  em  que  ardia ;  e  diapoz  a  mait 
lofame  traicao  que  um  peiio  humano  podia  &bri-f 
oar.  Mandou  aprestar  nove  fragatas ,  que  tinba  bo 
Arreoife  e  ua  Paraiba  y  e  bem  guarneddas  as  en« 
tregou  ao  seu  general  do  mar  Joao  Lectart,  com 
axpreaaas  ordenaque  fos^Q  ao  porlo  de  Tamaodar^i 
a  nelle  obra^aase  e  mettease  a  pique  os  oito  oaFio) 
portugueze^  que  alU  ae  acbavaoi  8em  que  a  pessoa 
viva  se  d^sse  quariel<  — ^  Nao  tinhao  os  nossos  iia<< 
Tios  mais  guarnicao  que  os  homens  do  mar  e  du«« 
zei:ito8  aoldados  bi$oainhos  \  pw^m  uao  bastou  o 
repente  e  a  perfidia  para  deixarem  de  rebater  o  pri** 
meiro  aa^alto  com  auimo  portuguez ;  porque  ha«* 
vendo  Unto  eiMi^easo  entre  poder  e  poder,  igualou 
a  valeotia  do9  poucoa  com  o  aumero  dos  muito^y 
e  £6i  a  poleja  tao  aanguinolenta  e  porfiada ,  que  es- 
tere  por  largo  cspaoo  itidecisa  a  vigtoria.  Assiatia 
o  oapilao  maior  Jeror^iipo  Serrao  d^  Paiva  d^ntro 
da  capitanea ,  e  delJla  infundia  valor  e  forQaa  em 
todoa  OS  seu«y  fazendo  cada  um  o  possivel  por  imi« 
tar  seu  exemplo.  Daa  primeiras  cargas  perdeo  o  ini- 
migo  a  melbpr  fragata  ^  que  passada  por  ambos  os 
costados  fui  mettida  a  pique,  Umnavio  nosso,  quq 
auapeitout  a  irai^ao  com  que  a  armada  inimiga  hn^ 
cava  0  porto ,  deixou  a  euseada ,  e  no  roar  largo 
brigoU  com  muitod  dos  Hollandeze^  com  lal  va-. 
lentia  que  Ibe  desarvorou  duaa  fragaUs;  e  desem^ 
baraQado  de  todas ,  com  a  mesma  gentileza  se  fez 
navolta  daBahia.  Com  nao  menos  valor,  ,depoi3 
de  larga  reaistencia,  varirao  dous  navios  nossoa  em 


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GAnuoxo  umxAHa  Itt 

taira,  e  salUindo  aella  os  homenft  do  mn$  w  d^ 
fi^Sfio  d^  sorte  que  nuoca  txxlo  o  pod^r  qontra^ 
ru^  Oft  p6de  randier  uem  queimar.  A  outroi  dgni 
navios^  quq  nao  poddrap  abalroar^lhea  d^Ura^  ci 
iogOy  e  ard^ao.  Susteatava  a  nao  capilaoea  toda  o 
peso  do  corobale,  defeqdida  da  opiiuao  e  do  brafa 
do  capitao  maior,  ai^  que  eutrada  por  tres  partM#. 
detendop  capiiao  a  victoria  com  a  pr^^eoi^  e  coA 
a  espada,  cai<>  np  copv^  cortado  d^  muitaa  feridait 
Q  rendido  ao  trabalbo  eao  deaaleuto^  com  tauto  ea« 
Vr^Qo  do  FlamepgOf  que  1^^  ^ervio  a  pr^sa  da  nao  ^ 
do  qapitao  maid  de  affronta  que  de  triuiopha.  Fer^ 
demo9  ne^ta  occa^iao  quasi  ceia  pesfoaai  eotrandoi 
aeate  aumero  oa  que  morr^rao  uapeleja,  eicOS  qu^ 
afogarao  as  oudas  com  todos  aqueiles  que  depoia 
BMioii  o  Hollander  a  sav^ue  frio.  A  muitoa  feridoft 
laoQou  ao  mar  amarr^dP^  dou#  a  dpus ;  a  o^troa 
deapachou ,  por  Ihes  abrir  e  reuovar  aa  feridaa  coo^ 
a€|g^odo3  golpea*  Pa  parte  coptraria  forao  tai^toa 
oa  mortos  e  feridps,  qi(e  se  diviilgou  09  Ajrr^^.fi^ 
Bova  da  yictona.Qom  lagrimaa  e  lutoa ;  e  \^  w^ 
tao  Q^ra  que  de  bqa  vontade  a  d^ra  o  Flamengo  pela 

CU$tD«    . 

XXXMI<  A*  tyramaias  e  crueldadea  dpa  Holt 
laudei^^  assim  como  per^eguiao  ci  atormeatavfk^ 
coutiuuamente  os  pohre^  moradoresi  tambem  901:^ 
corrAiao.a  formar  valences  capitaes^,  qup  un\g 
coutribuirao  a  recouquistar  a  liberdade  da  patria^ 
Deste  num^arp  d  o  capitao  Mam>el  ^Parboza*  Vivi4 
este  morador  retirado  po  mato^  e  ^m  sua  ca9a,  qu^ 
era  a  uma  legaa  da  cidade  Mauricea;  deixara  mti^ 
tres  irmas,  couGado  que  a  fragiUdade  do  sexo  in»r 


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313  OACTRIOTO  LUSITANO. 

pirasse  respeito  ao  Flamengo;  mas  nao  suocedeo 
assitny  f^orqiie'  n'uma  noite  foi  a  casa  assaltada  por 
defeeseis'Hollandezes  armados,  que  tratavao  de  ar- 
rombar  as  portas.  Appellidirao  ellas  favor  contra 
kdroes ,  qne  as  quf rSo  matar ;  succedeo  ourir  o 
irinao  os  golpes  da  violencia  e  os  gritos  da  afHic- 
cao  (esUva  elle  h'um  mate  vizinho  com  outros 
cinco  moi^os  amigos  seus^  todos  de  dezoito  at^ 
▼inte  annos);  animou  os  conipanheiros  a  que  o 
ajudassem  a  salvar  suas  irmas;  nao  hatia  mats 
armas  que  duas  espingardas^  duas  espadas,  uma 
fouce  de  rocar  e  um  bordao  ferrado.  Derao  sobne 
OS  dezeseis  Hollnndezes  com  animo  tao  destemido, 
qut  mat^rao  a  maior  parte,  e  feHrao  a  muiios  dos 
que  escapak^ao,  ficando-lhes  nas  maos  as  armas  de 
todos,  que  erao  mosquetes,  clavmas,  pistolas.  Cres- 
ceb  com  as  ai^mas  o  brio  nos  seis ,  e  nos  outros  o 
df  sejo  de  se  Ihes  aggregarem ;  formou-ee  uma  com- 
panbia  de  vinte  mancebos ,  de  que  foi  acclamado 
capitao  Mahoel  Barboza ,  com  os  quaes,  como  filho 
de  Perrtambucd ,  vingou  os  agg;raTos  de  sua  patria 
em  quanto  Ihes  foi  possivel,  saqueando,  fe^itido  e 
matando  Hollandezes  com  emboscadas  e  assaltos. 
Proveo  com  as  armas  os  mais  companheiros  que  ja 
chegavao  a  trinta,  e  se  foi  metier  na  villa  de  Oiinda 
na  tarde  de  17  de  Agoslo,  dia  em  que  os  nossos 
alcian^drao  a  Victoria  das  casas  de  dona  Anna  Paes ; 
por  espaco  de  quarenta  dias  defendeo  os  moradores 
da  villa  assim  dos  Hollandezes  que  nelia  se  aquar- 
tellavao,  como  dos  que  guameciao  a  guarita  de  Joio 
d' Albuquerque  (um  reduto,  ou  fortaleza  vizinha 
da  povoacao),  Avaliou-se  sen  valor  e  sen  zelo  no 


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GASTBIOIO  LDfinma  SIS 

grio  ^e  mereda  ^  e  o  governador  Joao  Feraaadtas 
Vieira  iba  doo  paftente  de  oapitao  de  maior  nnaicro 
de  aoldidofl. 

XXXYIQ.  A  fortalesa  de  Nazareth ,  que  depo» 
do  Arreeife  era  a  meUior  que  tinba  o  Hotlandes^ 
^ti^ye  eereada  peloa  moradores »  eonb  a  cima  dis^ 
8M)ot  9  e  para  refor^c  o  oecco  .tbha  ttapchado 
MariiiaSottFto  Moreao^qyando  se  separou  do  nica- 
tre  4e.  campo  Andiii  Vidal  de  Ncgrebor.  Qiegapdo 
a  Peitnir^e  ao  oq)itao  Amador  de  Araujo,  achoo 
que  o  cereo  eBlavft  em  boa  diapoei^o ;  fol^  aper* 
tando  cada  ves  maia  atd  que  n'uma  ndle  leranton 
uma  trincfaeira  donde  a  nossa  masquetaria  iMre* 
jaaae  os  aleoa  da  ftirialesa^  de  sorte  que  d'ellea  aao 
podeaaeion  o$  eercadoa  fnerponiaria  eerta para  os 
da  fora.  £fa  a>mmendor  da  forleleza  um  valecoto 
soldadoy  €bamadoTheodoiio£atrater»  de  quean  )a 
fiaemos  memoria  enk  al|;umaa  partes  deMa  narra^. 
Vio  aoamaobeoer  a  UnDcheira,^  pela  obra  oonheceo 
que  asaiatiiio  aoscercadores  eaixB  inteUigentes  e 
prataoos  jsa  milicia.  Quaudo  se  oecupaTa'  neslaa  om- 
sideracotey  chegou  urn  mensageiro  4a  parte  dbica*^ 
pilao  Moreno ,  que  Ihe  dhia  enlregasse  a  forlaleBa 
e  naoesperasae  o  astalto,  porque  se  nao  dat'ia  boas 
quariet  a  niuguem.  Despedio^  o  oommendor  cam 
publicaaarrogaRcias,  e  em  segredo  Ibe  disaeqtae  ea- 
tava  prompto  para  cumprir  opromeitido^  maa  que 
importa'vd  mandar  reeado  aomeaire  de  eampo  An- 
dr^  Vidal  de  Megreiros  para  que  com  seu  tefc  en^ 
gnossaase  o  poder,  e  tauto  que  diegasse  Ihe  fi  esse 
segunda  embaixada ,  a  qual  re&pooderia  em  Ibrma 
qjiie  nem  faltasse  a  sua  palavra^  nam  ao  seu  cre^ 


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tu  cMmano  unttAm. 

dit&^''^MmoicKH§e  avita  a  AndrA  Vidal  da  Het 
gftmmf  que  ta  aehava  com  o  goveraador  na  Varaea; 
p6z-«e  elle  logo  a  caminlio,  chegoa  ao  campo,  e  fioi 
raaahldo  com  as  saWaa  da  superior,  indmcriosa- 
weote  repetidas,  que  reniat4rao  em  mandar  se^ 
gonda  enbaixada  aos  cercados,  a  qua)  te  reaamia 
etn  que  logo  eDtiregassem  a  foKakva  a  bom  parlido 
aaleB  qnaoassalto  fechasaeapoiiaatodooeone^rto. 
0  pnaaeiro  enviado  nao  era  homtin  eovhecado, 
pelo  qua  nao  tore  rasultado  a  mtsMo^  porque  o 
eommendor  nao  quia  aceeitar  uenhuma  propoata 
que  nao  fosse  feita  por  bomem  que  tivesse  poito 
na  BOfilicia*  Foi  eolao  esoolbido  o  capitao  FhjlIo  rfa 
Cunha,  que  era  j4  conhecido  do  oeaamaidor.  -** 
Recebeo-ooom  todasas  oortexias^  eerftnoniaaniili^ 
taresieonridou-oaoomer^e  diante  desMS  soldadoa 
o  ouvio.  Com  sagax  desenfado  respondea  que  e)le^ 
oomo  Hieodotio  Eatrater,  itm  sempre  ial  amigo 
dos  Port uguetas ;  mas  que  em  quanto  eomaticaidor 
daquella  praca  tinha  s4  por  amigo  o  seu  crodito, 
que  todo4X>nst8tta  em  hzer  boa  a  opiniao  que  d'eU« 
tinha  quern  Iba  entregira  i  e  que  nao  dizia  elle 
raorrar  lia  defensa,  senao  dar  mil  vidas  pels  menor 
pedra  de  sua  foriificacao ;  e  lerantando-se  da  m^a 
tomou  a  Paulo  da  Gunha  pela  mao ,  e  o  veio  acorn* 
panfaando  at6  4  porta,  a  onde  com  dissimulacao 
ttie  disse,  que  da  sua  parte  aTisas^e  ao  mesCre  de 
eampo  Andrd  Vidai  que  l6go  mandassedar  um  as* 
salto  A  Ibptaleaa  da  &inra ,  ponqae  elle  a  tinha  em 
fi^rma que sem  difficuldade a  renderia;  e  quecom 
todara  prestezaa  rortiGcasse,  e  guarnecesse  de  ma- 
neira  que  vissem  os  seus  soldados  feehada  a  porta 


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ummmo  vsnnao.  MS 

a  todo  o  soceorro  que  podeiteiii  etperar  do  Aitra^ 
ctfo  I  e  que  com  a  mesma  Ibe  impedisse  a  foiHe  da 
quo  befa^^  porque  a  faita  d'agoa,  e  dts  esptrancib 
d*elki  08  reduzirta  a  aeu  inteoto ;  e  tm  fimque  ni* 
eBlranhassem  as  dila^oea,  porque  todas  se  enoami-* 
nhtvao  ao  dervi^o  d'El  Rei  de  Portugal ,  cuja  en  a 
fortalaza,  e  de  quern  elle  era  fiel  Yasaallo. 

XXXIX.  Executou*^  o  oHiselho ;  e  e  ofieito 
mosirou  que  era  nasctdo  de  animo  fiel  e  verdadeiro« 
Sobre  este  seguro  asseotou  a  confian^  oom  que 
Andri  Vidal  eficrereo  a  Theodozio  Estrater  eobra 
a  materiiiy  a  quam  respondeo  verificaiido  a  pro^ 
meaea  com  i^ua  mesoaa  firma.  Como  experiipentado 
capitao  comefou  logo  a  usar  d'aquellea  ardift  que 
aao  ordinarioa  em  taes  ca#Q^)  in^piraudo  terror  uoe 
9euSy  augm^o^taudo  o  njumepo  e  valor  doa  iioaiPft| 
e  eni:ar^cendo  as  difficuldadee  e  penuria  ^,  qua  $e 
yeriao  em  breye  eoud^oomadoa*  Succedeo  ueMe 
eomenoa  tom^rem  oa.nossos  uma  laucha  d'un  ricQ 
Hollander  Escoleto,  dodestricto  de  Santo.Aatomo '^ 
que  qom  muita  fa^nda  sua  e  graude  ^u(nero.  de 
pessoa/s^  isaira  pela  barreta  para  o  Arreqife,  £lra  este 
bomem  odiado  do%  moradores  pelas  muitas  vexa* 
90^  que  fazia,  pelo  que  foi  paasado  a  espad^  pelog 
uo^^s ;  o  mesmo  ^uccedeo  aos  maia  Hollandezeg 
que  ^Gompanbavao ;  por^m  a  todas  as  mulbjerea  se 
deo  qu^rte^,  e  deppif  liberdade,  ficando  nas.mao^ 
dos  ^Idados  o  barco  com  todo  0  rechep,  e  foi  cqu^ 
sideravel  presa.  £ste  acouleqimeuto  iuesperado  cou^ 


1  Bm  0  mtm^rt  III  do  lino  ?  iltwmoi  ifidtra  •  JutUdlecao 


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SM  cAsmioTo  umiTANa 

tribuio  miritD  a  aogmebtar  os  temores  dos  cer- 
oadM,  e  a  reBoIiicio  dos  sitiantee.  —  No  comeco 
de  S«ttembro  mandoii  o  mestre  de  (»mpo  o  capilao 
Panto  da  Cunfaa,  acoMpanhado  do  auditor  g^ral 
Franoisco  Bravo  e  do  capitao  Joao  Gomes  de  Meilo, 
com  dotemne  embaixada  aos  sitiados,  dizendo4hes 
que  se  nao  ge  rendessem ,  dar-se-hia  o  asdalto,  e 
todos  seriao  passados  4  espada,  se  a  fortaleza  fosse 
ganhada  por  aritias.  A  esta  resolucao  tap  apertada 
respondeo  o  commendor  que  nada  podia  concluir 
naquelle  dia,  por  quaMo  Ihe  era  necessario  fazSl-o 
com  o  conselho  de  seus  oiBciaes;  e  em  segredo 
avisoU  que  se  Ihe  nao  esperasse  nem  uma  s6  hora 
de  tempo.  Paulo  da  Cunha  repetio  com  grande  dea- 
eftgano  que,  se  logo  logo  se  nao  rendessem^  se  pre- 
parassem  para  a  defensa,  certos  de  que  a  nenhum 
perdoaria  a  espada.j— No  breve  tempo  que  o  ca- 
fikaO  Paulo  da  Cunha  gastou  em  ir  com  a  resposta 
e  vbltar  com  a  ttistancia,  chamou  o  Estrater  todos 
OS  seus  officiaes  da  milicia ,  e  com  destreza  Ihes 
fallou  desta  maneira  :  «  Todas  as  respostas  que 
»  det  as  efnbahcadas  daentrega^  fornoiau  o  artificio, 
»  nenhnma  a  intelligencia.  A  onde  a  podia  fundar 
i»  meu  discurso ,  quando  todos  sabemos  que  em 
D  duas  batalhas  se  perdeo  aquelle  poder  em  que 
»  estribava  nosso  soccorro  ?  E  cjuando  no  Arrecife 
»  se  empenhasse  o  ultimo  esforco  em  nos  soccor- 
»  rer,  por  onde  nos  havia  d'entrar,  se  por  mar  e 
}y  por  terra  nos  tem  o  inimigo  tomadas  as  vias?  A 
»  omissao  on  a  impossibilidade  dos  nossos  gover- 
»  nadoires  nos  reduzio  a  tal  ex(remo,  que  6  maior 
»  o  damno  da  falta  do  que  o  perigo  da  forca.  Por 


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GASTRIOTO  LUSIXAKO*  317 

»  este  caminho  d  certa  a  fome,  e  mfaUifel  a  sUbj 
r>  tendo-nos  o  inimigo  tomada  a  agoa ;  o  cohrM-a 
»  por  annas  6  impossivel ;  o  busc^a  a  fuiio  sera 
»  comprar  uma  gota  tl'ella  por  muitas  de  sangue ; 
»  fioeza  tao  mal  merecida  de  qnem  bos  causou 
)»  esta  penuria  que  oitendo  faz  mais  edtima^ao  de 
»  seus  interesses  que  de  nossas  vidas.  Se  per  mer* 
»  cadores  as  arriscarmos  e  perdermos,  a  que  pre- 
»  mios,  ou  a  que  honras  subimos?  Genie  <|ue  paga 
»  mal  services  como  ha  de  saiisfazer  finezas  ?  E  se 
»  a  retencao  do  roobo  e  crime  e  infamia,  que  hom*a 
i>  ganhamos  em  defender  a  usurpacao  d^esta  forta-^ 
»  leza  a  seu  proprio  seuhor,  quando  com  todo  o 
D  direilo  da  justica  e  das  armas  se  empenha  em  a 
>)  recuperar  ?  Tenho  dito  o  que  sinto,  e  com  tudo 
n  estou  prompto  para  seguir  a  resokicao  d'este 
»  conselho.  » 

XL.  Decidio^se  o  negocio  com  votos  enconira* 
dm;  a  maior  parte  determinou  a  entrega.  Sem  di- 
lacao  mandou  o  eommendor  a  Gasgar  Vandrelei, 
capilao  dos  cavalleiros ,  com  outro  official  da  mi- 
Ucia,  que  saissem  a  capitular  a  entrega  da  fortaleza^ 
cujas  condicoes,  estendidas  em  papel,  forao  as  se- 
guiiites:  Que  os  cabos  sairiao  com  todas  as  honras 
militares^  que  se  custumao  conceder  em  aimilbames 
casoSy  e  com  todos  seus  moveis;  que  a  cabos  e  sol* 
dados  se  pagariao  todos  os  soldos  que  a  Companfaia 
Ibes  cstiTesse  devendo;  que  todas  as  muoicoeQ, 
armas  e  artilharia  ficariao  para  £1  &ei ;  que  a  Uydsos 
OS  que  quizessem  militar  debaiov)  das.bandeiras 
da  liberdade  se  Ihes  assentaria  praQa,  e  daria  soldo 
como  o  (odbs  os  mais  do  exercito ;  que  aqudles 


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S18  GASTUOTO  LUSRAlia 

que  quitetsem  servir  nas  guerras  do  reino  se  Ihes 
daria  embaroa^o ,  e  que  o  mesmo  ae  gnardaria 
com  aquellea  que  quizessem  passar  a  raaa  terras. 
Finuadas  as  oondicoes  referidas  d'uma  e  outra 
parte^  mandou  dizer  o  commendor,  que  die  e  a  for- 
taleia^  e  todos  os  seus  estavao  as  ordens  de  auas 
senhorias,  para  que  d'uma  e  outra  consa  dispozes- 
eem  como  fosaem  servidoa.  —  Fez-se  logo  aviso  por 
am  proprioao  govcmador  Joao  Fcrnandes  Vieira, 
nao  s6  a  buscar  o  seu  beoeplacito,  senao  tambem  a 
pedir^lhe  dinheiro  para  satisfazerem  ao  segundo 
eapitulo  das  C0Ddi96es  relatadas.  Era  o  dia  8  de 
Settembro,  em  que  Joao  Fernandes  Vieira  festejava 
com  grande  aokmuidade  a  Natividade  de  Nosaa 
Seuhom ,  quando  recebeo  o  correio  que  Ihe  trazia 
a  Dova  da  #ntrega  da  fortaleza  de  Nazareth.  Yio 
pela  plana  dos  soldados  o  que  a  Gompanhia  devia 
aos  rendidos,  e  achou  que  erao  necessarios  nove 
mil  cruzados,  que  logo  remetteo  pelo  meamo  pro<* 
prio.*~Ghegara  o  tempo  definido  para  a  entrega 
da  fortaleza,  e  formada  a  nossa  infantaria^  a  entre- 
gouTheodozio  Estrater,  dando  as  chaTcs  ao  mestre 
d«  oampo  Audr^  Yidal  de  Negreiros,  com  os  para*^ 
beos  de  posse.  Sairao  os  reudidos^  que  erao  duaentos 
setteala  e  cinco  (nao  eutraudo  nesia  couta  um 
oumero  grande  de  gente  yaga  que  nella  se  tiuha  re- 
^3oUudo))  e  eatrarao  os  nossos  a  guarnecM-a.  Se*- 
guio^ae  a  esta  funcao  mandar  o  nosso  mestre  de 
campo  armar  uma  mesa,  deilar-se  iiella|o  dinheiro, 
e  dar^se a cada uoiados  reudidos des crazados*  Acs 
ctffidaea  se  pagou  conforme  4  divida  e  ao  posto ; 
com  0  que  lodos  se  derao  por  satisfeiios.  A'quetteB 


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GASTEIOTO  LUSITANO.  319 

que  se  offerec^rao  a  servir  com  os  nossos  se  Ihes 
assentou  pra9a  com  pagamentos  pontuaes ,  e  ajus- 
tados  a  seus  postoa.^Com^s  outros  se  guardiiio  as 
capitulacoes  inteiramente.  Entao  se  derao  univer- 
saes  e  repetidos  vivas :  a  pureza  da  f(^^  a  liberdade 
da  patria^  e  ao  alcance  da  victoria,  com  aquella 
alegria  que  causava  a  todos  o  desejado  fim  que  pro- 
metiiao  principios  l&o  ditosos.  Para  coroar  a  gloria 
d^este  dia  tom4rao  os  noMOs  um  btrco  que  vinha 
carregado  de  mantimentos ,  mandado  do  Arrecife 
em  soccorro  dos  cercadqs.  Acharao-$e  naquella 
praca  dez  pecas  de  bronze,  lodas  de  alcanee,  mos- 
quetes  de  sobejo,  polvora,  balla,  corda  em  quan- 
lidade ;  e  nao  pequeoa  copia  <le  manUoEieaCos.  Foi 
cste  8Uc<iesso  de  utilissimas  consequencias  para 
nossos  intentos,  porquenosdeo  porta  oapaz  para 
a  entrada  daa  fazetidks  e  do9  soi^corros ,  e  para  a 
sacca  dos  genero^,  com  uma  fortaleza  a  ciija  som- 
bra  podlao  os  navios  do  commercio  eatar  seguros 
no  porto ;  peh  mesma  razao  de  grande  quebra  para 
as  esperaD9as  do  inimigo.  Cinco  dias  se  demorou  o 
mestre  de  campo  Andr^  Vidal  de  Negreiros,  os 
que  impregou  em  compor  a  forteleza,  e  prover  do 
necesaario ;  e  depois  de  ordenadaa  todas  as  eousas 
se  poz  em  marcha  para  a  Varzea,  levando  encorpo- 
rados  no  exercito  osrendidps,  cjTheodoiioEstrater 
eom  o  goTemo  de  todos  6s  que  nesta  occasiao  ass^-* 
t4rao  praca  para  servirem  entre  nds. 


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LIVRO  VIIL 


SUMMARIO. 


.  0  que  se  passou  na  capilauia  de  Paralba  antes  dafubleracoo;  oc 
de  Gojaaa  appellidirao  primeiro  a  liberdade.  —  2.  Diisimula  o 
PluMBgo  ai  akoracoai  4a  Paraltk;  trau  de  enganar  ot  inondo- 
re$i  OS  quaes  buscao  armas  para  se  defeaderem ;  alter«o-«e  cob  a 
prisio  de  Antonio  Barbalho.—  8.  Dimlga-«e  entre  os  Porlagueies 
a  ▼iftoria  de  Joio  Pernandes  Yteira.  —  4.  Concede  o  Hollaiides 
aoi  motadores  armas  eonira  o  semio ;  ttnem-se,  •  fortiftcio«fe  mi 
sitios  mais  defeniaveis  -,  o  inimigo  os  teme,  e  se  retira  da  etdade. 
—  STMareha  o  gentio  para  Goyana;  o  que  Ibe  succede.  ^t.  Man- 
d&o.  OS  anseos  govemadorts  soceorro  *  Paralba ;  nome&o  para  • 
govemo  da  capitania  tres  moradores ;  acdaua-ie  a  liberdade  ea 
toda  ella.  —  7.  Preparao-se  e  armdo-se  para  a  defense ;  mudao^de 
alojamento.  -«8.  Manda  o  Hollandei  commetter  a  cidade  e  o  nosso 
alq)aBie«to ;  selira-se  vencido ;  perda  i«a  e  noast.—  9.  Par  fella 
de  segredo  se  nao  entregou  a  fortalf za  do  inimigo.  — 10.  Cansa  e 
Aodo  que  teve  a  subleracao  no  porto  do  CaWo;  ChristOTao  Luix 
M  0  ptimalro  qte  appelttdoii  a  liberdade;  poi  eereo  A  fortaleia 
do  porto  do  Cdvo.  — 11.  0  conunendor  persoade  aos  sens  a  ea- 
trega  da  praca,  e  pede  que  venba  um  capitio  pago  para  Ih'a  eQ< 
Iregar;  o  gOTemador  mandov  o  capitSo  Lourenco  Carnelro  tomar 
entrega  i%  forldesa;  repartitao  de  dinbeiro  polos  i<endidoa;  ar- 
rasa-se  a  fortaleza.  — 13.  Acelama-se  a  liberdade  no  Rio  de  Sao 
Francisco.— 13.  Cercao  os  nossos  a  fortaleza,  e  pedem  soceorro  ao 
gatemtdar  glrtl  do  Sstado ;  tomio  ao  inimigo  um  etraVelao  e 
uma  lancha  de  muni^es  e  mantimentos.  -^  14.  Cbegt  o  capiiao 
NicoUo  Aranha  com  o  soceorro;  elhe  desTia  outros.  —  15  Far 
lem  OS  nossos  embaiiada  requerendo  a  entrega ;  Henrique  Hus 
Ibe  persuade  a  ei^tr^ga.  ^  16.  Capittilao-se  u  eoadicoes  da  tm^ 
trega ;  consequenoias  que  fiierio  grande  a  Tictoria.  —  17.  Edifice 
Joao  Pernandes  Vieira  uma  casa  de  misericordia  na  Vanea ;  cbe- 
gao  a  ella  Andr#  Vidal  e  Martim  Soares  de  volu  de  Nazaretb ;  dao 
0  posto  de  mestre  de  campo  dos  estrangeiros  a  Tbeodozio  Estrar 
ter.  — 18.  Ganba-se  o  forte  de  Sanu  Cruz.  — 19.  Manda  o  Hol- 
landei embaixada  ao  mestre  de  campo  Andrtf  Vidal ;  resposU  por 
escrito.  *  20.  Conferem  os  nossos  cabos  o  modo  de  oontinuar  a 


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GASTBIOIO  UttlTAMa  SH 

gnem ;  ptreotr  do  goyernador  da  Uberdade;  o  q«al  te  eieeuU*^ 
21.  Escolbe-se  o  sitio  para  uma  fortaleza,  e  se  poe  mao  ik  obra; 
primeiros  nrndamentos  da  povoacao  do  Arraial  dovo.  —  S3.  Joa6 
Femaiidea  Viefara  intanu  ganliar  a  ferulai*  du  Cioeo  Pontaa; 
Tbeodozio  Ea trater  o  diiuade ,  propondo  que  se  ataqae  a  ilha  de 
Itamarac^.  —  25.  Executou-se  o  seu  parecer;  chega  o  nosso  exer- 
dto  a  Ignara^Q ,  passa  o  no,  ^  commette  a  empresa.  —  2#.  Ast*^ 
Dio  Diat  Cardoso  gaoha  a  priroeira  fortifieacao;  ao  meiiBO  iMipo 
a  rompe  o  gOTernador  pela  oi^lra  parte;  chega  Estraler,  e  o  ini- 
migo  se  reiira  a  fbrlaleza  —  25.  Combatem  os  nossos  o  forte,  que 
Dtto  podem  tomar ;  retirao-se  com  iodustria,  e  marebao  para  a  ilftift 
de  Iguaracuonde  fazem  alto.  —  26.  Di-se  coota  d'algamas  partis 
eularidades  d'este  suecesso.  —  27.  Doen^a  g^ral  de  todas  as  capi- 
tanias.  —  28.  Dl-se  conta  d'vina  Informa^o  jnridica  que  os  natu* 
raes  maDd&rao  a  £1  Rei  Dom  loao  IV.  ^  29.  Razoas  que  adia^tao 
08  acoDtecimeotos  do  Rio  Grande;  quero  Hollandez  prirar  os  ha- 
bitantes  das  annas,  os  quaes  penetrao  o  intento,  e  se  fortifleao.— 
ao.  Sao  assaHados  peloinlmfgo,  o  qua(  se  retira  yeneido  e  con** 
Also;  volta  sobre  os  Portuguezes  flngiodo-se  auxiliar;  osPortub- 
guezes  entendem  o  engano  e  orebatem.  —  31  Declara-se  o  inimigo, 
eoteombateoom  poder  e  industrta;  reodem^seos  nossos  a  partido^ 
eom  as  condi^s  que  logo  quebra  o  HoUaadei*,  e  os  enirega  aos 
seWagens;  paeiencia  comquesoffrem  o  martyrio.  —  32.  Igualsorte 
tWerao  OS  que  flcArao  dentro  do  cerco ;  inauditos  tormentos  que 
padeceo  Aoionio  Baracbo;  piedade  com  que  deo  a  Tida  Matbans 
Moreira.  —  33.  Valerosa  consuucia  de  oito  maoceboanurtjfrizados 
pela  K  e  pela  patria.  —  34.  Horrendas  cruezas  que  usa  o  hereje 
para  com  os  Teneidos.  —  85.  Mandou  o  goremador  um  soccorro 
que  Dao  ebegou  a  tempo.  — 36.  A^olao  os  nossos  a  cafflpaoba^  e 
sendo  atacados  pelos  Hollandeies  saem  Tictoriosos;  coDtinuao  as 
bottilidades  at^  i  chegada  do  Camarao. 


L  Deixamos  escripto  em  os  livros  precedenlea 
eomo  Joao  Femandes  Vieira  se  resolveo  a  por  por 
obra  a  empresa  da  liberdadej  como  deo  noiicia  a 
diversas  pc^ssoas  e  a  differeates  jiartes  do  seu  in- 
tento, e  do  que  haviao  de  executar  com  o  sea  aviso ; 
ja  dissemos  como  o  grito  da  liberdac^e  se  espalhou 
Ba  campanha  de  Pemambuco :  agora  diremos  o  que 
succedeo  na  Faraiba^  em  Itamaraca,  no  Rio  Grande 

21 


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mtA  outiw  pOToacow  sujeitas  ao  Flamcngo.  Vendo 
OB  Hollandezes  o  que  tiaha  succedido  na  vespera 
d«  Sanio  Antoaio^  e  como  todoa  o6  moradMrea  es- 
tav&o  dispoStos  a  saeudir  o  tyranno  jugo  que  os 
oppruBia,  passarao  ordeiis  rigorosas  para  que  todos 
flmem  desarmados ,  e  nomeirw  novos  governa- 
dores  para  execuiarem  as  novas  disposicoes  do  go- 
vernor Paulo  de  Unge^  aiembro  do  conaelbo  poli- 
tico, !bi  mandado  como  governador  de  Paraiba  e 
aeu  deatricto  com  alguma  infantaria  em  guarda  de 
aua  pes9oa .  Chfgou  i  Paraiba,  alojou-se  noconveeto 
de  Sao  Francisco,  melhorou  todas  as  fortifica^oes, 
e  com  boaa  patavras  e  com  disaimuladoB  obsequtos 
quiz  fiizer  pfersuadir  aos  habitatites  que  cstava  de- 
ierminajdo  a  obrar  mais  com  afogo  que  comcaatigo ; 
nms  no  m«smo  tempo,  com  uefenck  periidia>  dee- 
p4chou  um  proprio  com  aviso  ^  Pero  Poty,  gover- 
Bftdor  e  cabe^a  dos  Indios  que  viviap  no  ceriao, 

Sara  que  com  toda  a  gente  de  seu  dominio  descesse 
08  montes  para  a  cidade,  para  ahi  commetierem 
aa  mesaiaa  barbarirtades  que  n'oulroa  destrieios 
tinhao  praticado.  —  3&  dissemos  o  que  succedera 
em  Goyana  e  Cunhaii,  e  como  o  Flamengo  alii  usara 
de  todas  as  crueldad^S  iinaginaveis  para  impedir 
a  wbleva^o  doa  moradores  contra  o  seu  tyranno 
yasgp  c  ^igom  atecresoeDiaremoa  que  lap^b^M*  de  aeoa 
oafoi^os  foi  prodamada  a  liberdade  oom  grande 
yalor  «  resoiii^m.  Tinha  o  Flamengo  mtudado 
imnder  OS  doos  capitnea  nomeados  por  Joao  FVer^ 
wandea  Vieifa^  e  mais  alguna  Bortuguezes  inflnentea^ 
•  j«l9(m  por  «le  modo  auffsoor  a  aubferagefO ;  mas 
atteprOoeAiiMnio  tanrto  de  rebate  aoa  Tizkibn  da 


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GAftTUOTO  UniTAHO.  825 

Goyatna  que  06  acautelkm  para  o  tempo  do  perigo. 
Eiegdrao  d'entre  ai  capitaea  e  olliciaes  que  os  go^ 
vernaaaemy  recolh^K)  todas  as  armas  que  pod^rao 
baver,  e  na  occasiao  mais  opporUina  ae  6zerao  8d- 
nhorea  da  povoacao  appellidando  a  -liberdade ;  e  le 
deflfeiuMrao  Taronilmente  a  Uxloe  os  incoraoa  do 
inimigo  pela  di8po8i9ao  e  induatria  de  Diogo  Gar^ 
TalhO)  PaBchoal  de  Fratas,  e  Martim  Frai^zo  ;  at^ 
que  per  mandado  do  goTemador  Joao  Feraandes 
Vieira  os  rend^rao  dos  poatoa  oa  capitaea  FrauciscD 
Lopes  de  Arosco,  e  Diogo  Vieira  Tenrete. 

II.  Chegou  a  nova  da  rebelliao  a  Paraibaj  ou*- 
▼io^  o  goTeruador  coiu  apparoite  deaprezo,  maa 
com  interior  sobresalto.  Difsimulou  com  as  priaoes 
e  com  a  prematica  daa  armas ,  e  mou  de  meios 
brandos ;  maudou  fixar  editaea  em  que ,  da  jwrte 
dos  Eetadosy  concedia  p^tlao  a  todo  o  genero  de 
peeaoa  que  por  algum  modo  tivesse  encorrido  uo 
erime  da  rebelliao ,  com  taato  que ,  apartidoa.  da 
aedicao  seguisaem  o  auligo  e  pacified  estilo  de.  sua 
obedieuoia ,  em  qae  coosiatia  o  seguro  de  auas 
vidaa  e  ftuoendas;  e  particulaitnente  pedio  a  eada 
um  dos  priucipaes  ddadaos ,  que  serTisaem  oom 
seu  exemplo  ao  sooego  da  repubiica^  e  que  elk  to- 
mava  por  sua  conta  o  cuidado  de  as  livrar  da  toda 
a  vexacao  e  hostilidadey  assim  doa  soldados  eomo 
dos  Indtos,  para  que  elles  moradorea  »e  podetoem 
euts*egar  ao  governo  de  auas  berdades  e  familiaa. 
— Tinha  o  falso  goveruador  mandado  Tir,  eomo 
aeima  dissemos,  o  Indio  Pero  Poty ;  nao  podia  es- 
eonder  a  sua  viuda  nem  o  fim  para  que,  e  para 
eigaoar  os  moradores  publicou  que  o  maiKUra  vir 


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y^h  GAsmoTo  lumtano. 

com  OS  Indios  de  8ua  jurisdiccao  para  os  ier  com 
8uas  iniilberei  e  filhos  dentro  da  cidade  como  em 
custodia,  para  qae  mo  tiTesseoi  occasiao  de  vexar 
OS  moradoreft.  —  Bern  conhec^rao  os  moradores 
qual  era  a  maKcia  do  Flamengo^  e  para  logo  teriao 
levantado  o  grito  da  liberdade  se  nao  esperasaem 
receber  um  soccorro  de  Joao  Femandes  Vieira, 
com  o  qual  podessem  resistir  ao  poder  do  inimigo. 
Espalhou-se  entretanto  a  noticia  das  crueldades  pra- 
ticadas  em  Cunhau  por  aquelle  HoUandez  Jacobo, 
de  que  j^  d^mos  noticia,  a  qual  foi  saudavel  aviso 
aos  moradores,  e  manifestacao  clara  das  barbaras 
hiteocoes  do  governador  Linge.   Reunidos  todos 
n'um  corpo  tratao  de  buscar  armas  com  cautelia , 
preparao-se  para  a  resisteacia,  queixao-se  unani- 
memente  do  procedimeuto  do  go verno,  e  manifestao 
a  sua  ncsDhiima  coofiaoca  nas  pramessas  do  gover- 
nador. *^  Quiz  elle  appladd*os,  dizendo  que  o  que 
succed^ra  em  Cunhau  fora  causado  pela  violencia 
de  Jacobo  e  nao  ordenado  pelo  governo,  e  que  elle 
daria  todas  as  provideneias  para  que  similbaote 
cousa  nao  acontecesse  na  Paraiba;  e  para  melhor 
tranquillizar  os  moradores  saio  do  sen  quarlel  com 
gente  de  guerra  a  correr  o  destricto ,  assegurando 
a  todos  do  receio  que  tinhao ;  mas  como,  apezar  de 
todas  esus  promessas  mandasse  prender  Antonio 
Bapbalho^  come9Arao  os  moradores  a  alterar-se,  e 
manifestar  seu,  descontentamento^  e  a  preparai^-se 
para  a  empresa  que  haviao  meditado* 

liL  Passados  poucos  dias  depois  que  o  Linge 
voUou  para  a  cidade  divulgou-se  a  grande  victoria 
que  Joao  Fernandes  Yieira  alcan9ara  nas  Tabocas 


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GiSTUOTO  LOSTTAMO*  S35 

dasarmas  hollandezasy  e  da  chegada  dos  mestres  de 
campo  Aodr^  Vtdal  e  Marilm  Soares  com  dous 
tercM  d'iDfantaria ,  em  soccorro  dos  moradorea, 
com  OS  quaes  fi'cavao  ja  incorp^rados.  Aatevio  o 
Liiige  que  o  succesao  havia  de  aer  para  todos  ex/&ah 
plo ;  e  a  causa  j  que  era  urea  mesma  em  toda  a 
parte,  em  todas  as  partes  havia  de  prodimr  oa 
mesmos  efFeitos;  certo  da  efficacia  com  que  oa  di^ 
loses  persuadem  &  imitacao,  roandou  logo  retirar  a 
todos  OS  Hollandezes  e  Indios  auxiliarescom  suas 
familias  e  moveis  para  a  fortateza ,  que  chamao  do 
Cabedello^  situadana  barra,  cinco  legoas  da  cidade, 
preveuindo^-se  para  tudo  o  que  podia  succeder. 
Assim  como  o  tempo  multiplicava  os  dias  d' Agoato^ 
assim  yinha  correndo  a  nova  de  que  duzeatos 
Hollandezes  clavineiros,  acorapanhados  dos  Ta- 
puyas  que  conduzia  o  referido  Jacobo  (asdolado 
Cunhad),marchavao  a  destruir  a  Goyana^  e  a  pro- 
seguir  na  execugao  do  decreto  que  06  obrigava  a 
nao  deixarem  pessoa  viva  em  toda  aquella  ctpi- 
tania. 

ly.  Como  o  governador  hoUandez  havia  dito 
aos  moradores  que  os  soldados  e  Indios  comman- 
dados  por  Jacobo  erao  rebeldes  e  levantados ,  de 
que  elle  era  o  chefe,  com  boa  industria  Ihe  propo- 
s^o  a  yizinhanca  do  perigo  e  a  elei^o  do  remedio. 
IKziao  que  o  esqiiadrao  dos  rebeldes  marchava 
para  a  villa  de  Guiana,  e  que  de  forca  havia  de 
atravessar  pelos  confins  da  Paraiba,  e  Ihe  ficarao  os 
moradores  e  engonhos  debaixo  da  espada,  indefen- 
SOS  porque  sem  armas ;  que  as  permittisse  a  todos, 
em  quanto  nao  passava  a  necessidade,  para  que 


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326  CASmOTO  tOflTAMO; 

^rmados  podessem  resistir  aM  assaltos ;  favor  qne 
Ihea  nso  podia  negar  como  bomem  e  como  gorer** 
nador^  pois  a  natnreta  e  a  politica  as  concedia  a 
toda  k  defensa  do  rides  e  honras.  Ajimtarao  a  peti« 
cao  urn  donati  Yo,  e  alcan^oii-se  despaoho  e  oonselho } 
ditendo-ihea  que  so  aproTeitassem  das  annas  qua 
tiTessem  (com  tanto  que  nao  usaaaem  das  de  fogo), 
e  se  OB  HoUaiidezes  rebellados  e  Tapuyaa  insolentea 
OS  inyestissem ,  que  se  defendessem.  —  Com  esta 
pertnissao  fizerao  os  morador^  seus  quartets ;  e  o 
governador  hollaadez,  com  parte  de  aeus  soldados^ 
se  retirou  da  cidadt  para  a  sua  fortaleza  do  Cabe-* 
dello.  Un(rao-se  os  moradores  do  certao  com  os  da 
ctdade,  fortificirao  os  sltio$  que  Ihes  parecArao  mats 
defonsaveis,  e  capaaes  para  nelles  recolfaerem  suaa 
iamiltasy  e  o  melhor  de  seua  moveis ,  com  todo  o 
mautimento  necessario;  proT^ao-se  d'armas  de 
toda  a  sorie ,  e  oflferecidos  a  toda  a  contingencia 
esperirao  o  fim  que  a  sorte  Ihes  tiveese  destinado. 
— i4  se  aiQrmava  que  o  esquadrao  dos  HoUandezea 
e  Tapuyas  marchava  pelo  destricto  da  Paraiba  fa* 
zendo  todo  o  damno  que  podia ;  duzentos  dos  nos- 
SOS  bem  resolutos  quizerao  ir  sair  ao  contro  do 
inimigo,  mas  fbrao  disuadidos  de  seu  proposilo 
por  Francisco  Cancello,  homiem  prudente  que 
sabia  modificar  a  temeridade  com  a  esperanca,  e  a 
furia  com  a  oppo'rtunidade.  Dispunhao«>9e  os  Hoi- 
landezes  que  guarneciao  o  quariel  da  povoacao  a 
uma  retirada  total,  mad  saqueando  a  cidadepordes- 
pedida;  pordm  como  entretantochegassea  noticia 
de  que  Joao  Fernandes  Vieira  mandava  um  soc-- 
corro  a  Paraiba,  nao  se  atrev^rao  a  fez^i«o,  antea 


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CASnieM  ilWTAlO.  Ill 

torn  lodlos  08  aoasMM  da  cortezia  $e  opeFOv  a  f^t^t 
rada  lam  a  mtfier  desordan. 

V.  Fbrao  marchando  oa  ^uzenloa  HollandfMI  A 
Tapnyaa  4|ue  traiiao  em  sua  eompanhia  pak  pamn 
panha  da  Paraiba,  destnimdo  e  mataodo  ^UMIta 
\bm  oaia  aas  maos^  sao  se  atre?eadQ  a  eomn^Mcw 
as  caaiis  fortes  oode  oq  nosaos  estavao  pravenidos ) 
fii^rao  em  peda^os  alguns  maiicdHM  pcMoa  (  AM 
ehcgArao  a  dei )  que  com  meooB  juizo  que  ^drguUn) 
inveslirio  com  o  numeroso  eaquadrao,  mais  pafft 
perdenm  a  vida  qu^  para  strviraoi  a  palna.  Mttitoi 
Pqrmgutzes  com  mulherea,  fiihoa,  eser|¥es  a  mon 
veiaae  reoolb^o  a  urn  engenho  chamado  Inbahim^ 
do  qual  era  aenhor  um  Flameugo  por  Qpmf}  Aeainit 
que.  a  todos  recol^eo  e  amparou  eom  animo  &il  d 
generoso.  Chegou  o  esquadrao  dos  bartaroa  im 
engenho  da  outro  estraognro  ,  oode  cetiv^ao  4 
doua  faomens  uobsos,  a  um  do^  quaes  malariio  depots 
a  aangue  frio.  Peloa  contomos  da  Guyanai  Qude  su^ 
mareha  caminhava  eiQ  direitura  >  roub4rio  tuda 
quaulo  08  naturaes  nao  pod^o  retirar.  —  Cbe^ 
%ino  a  vista  da  povoacao,  que  estava  da  outra  parte 
dfr  um  no ;  eommett^rao  a  passagem  ao  eutrar  da 
noite  para  fazerem  mats  horrivel  o  a»alto,  e  meaoa 
acautelada  a  defensa  e  a  fuga  dos  afflictos  moran 
dores,  quando  d'entre  08  raeymos  barbfivoa  9e  le- 
vantou  uma  voz^  que  viuba  sobre  elles  lodo  0  noasa 
exerdtou  Foi  tal  o  medo  que  Deos  iafupdiQ  nan 
quelles  deshumanos  cor^c6eSy  que  Ihea  r^rensea^r 
tou  um  e  muitos  esquadroes  formados  da  eutra 
parte  do  rio^  faaendo  o  temer  pa^[;ecer  a  todos  que 
ouTiao  rumor  de  vozes  proporciouado  00m  a  mulr 


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SS9  CASmOTO  LIMTAliO. 

tniao  <U  gente,  que  via  siu  imagtna^io.  Tornados 
de  medo  yaltarao  as  costas ,  trope9ando  em  sua 
mesma  fentasia ;  e  fogiodo  de  soas  mesmas  som*- 
biHfl^  deHcarao  o  caminho  semeado  d'armas  e  fa« 
t/tnitApy  que  hayiao  ronbado ,  para  correrem  mais 
M^geiros.  Atemorizados  chegarao  ao  rio  Goramamei 
tres  kgoas  da  Paraiba;  e  parecendo4hes  que  na 
deten^a  da  passagem  os  poderia  alcancar  nossa  es- 
plrda,  deixarao  os  Tapuyas  a  conserva  dos  HoUaa^ 
deses/  e  a  lodo  o  correr  fogirao  para  o  certao,  nao 
te  dahdo  per  seguros  saiao  depots  que  peuetrarao 
muiias  l^oas  de  mato.  Virao-se  os  Fiameng^ 
desemparados  dos  Indios ,  e  oomo  de  nova  causa 
#g  invadio  novo  medo ;  guiados  de  seu  desatino , 
Sem  saberem  per  onde,  para  que,  nem  porque, 
fok^ao  dar  nos  engenhos  de  Franoisco  Camello ,  de 
Jeronimo  Cadeua  e  d'outros  moradores,  que  aeka- 
yao  com  mao  armada^  e  com  uao  meuos  temordo 
que  dies  levavao  >  causado  da  escuridade  da  noite, 
e  da  subdita  chegada ;  imaginaudo-se  estar  assal- 
tados  dos  Tapuyas,  e  aquelles  perseguidos  dos 
Portuguezes ,  pass^rao  toda  a  noite  ,  una  fiaudo  a 
salva^ao  a  ligeireza  dos  p^,  sem  pararem  senao  ua 
sua  fortaleza  do  Cabedelb;  outros ,  com  as  armas 
na  mao  at^  que  a  luz  da  manba  os  liyrou  de  sobre- 
sako.  No  caminho  que  os  Flamengos  fizerao  para 
ft  fortaleza  ob  aasaltarao  alguns  mancebos  da  cidade 
que,  depois  de  Ihes  fazerem  deixar  modullas  e 
armas,  os  despojarao  dos  proprios  yestidos* 
•  Vi.  Os  nossas  govemadores,  que  deiximos  alo- 
jados  na  Varzea,  depois  da  segunda  victoria  nao 
laborarao  meoos  com  o  cuidado  no  descan^o,  do 


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GiSTuno  awtJMk  m 

que  com  09>  brakes  nos  conflictos.  Sabiio  por  CQC- 
temo  tado  o  que  se  passava  na  Paraiba  e  em  66a 
eoatornO)  e  por  imo  fkltarem  a'neces»dade  doe 
desmaiados^  nem  &s  esperancas  dos  aniniMei'^^ 
terminarao  a  mis  e  a  ootros  soceorro  opportuno  e 
propcnrcioaado.  Nomearao  por  capitaeedaleva  An* 
lonio  Rodngittft  Vidal  (sobrinho  deAndif.  Vidal; 
naturaed  da  Paralba),  Simao  Soares /Cosine  da  Ro^ 
eba^  e  Francisco  Leiiao,  coin  alguns  i^pitaes  e  of^ 
fidaes  para  no^ie  •companhias  que  haviao  de  faeH» 
vanlar  naquella  capitania.  Do  ter9o  do  Canlarao 
Bomeiirao  o  capitao  Ckwcito ,  com  al^ms  }ndio8 , 
para  que  como  nataraes  daqueUe  ceriao  persua-^ 
disscim ,  e  chanassem  a  si  os  Indios  auxiliares  do 
inimigo,  ofifereoendo-4he8  nossa  amizade,  e  van^ 
tajosos  pariidoBquerendo  militar  debaixo  de  nossaa 
biindeir2«.  Com  o  metmo  intento  mandarao  a  um 
soldado  do  ter^o  de  Henrique  I>ias,  por  nonne  Hen« 
rique^e  Meodonoa,  para  capitaoilos  Afinaae  crioo- 
loa,  suppondo  que  muiio3SehaTiao.de  alisiar;~* 
Bern  providos  de  munieoes  e  arHiaa  os  deapacbai* 
rao  em  08  ultimos  dias  d'AgostOy  remetlendo  por 
dies  paientes  de  goremadores  d'aqueUa  capitania 
a  Lcpo  Curado  Garra,  a  Jerommo  de  Gadena,  e  a 
Franciaco  Gomez  Mauiz.  Mais  Ihes  ordenar&o  que 
ao  passar  por  Goyana  tomasaem  alguma  gen6e  da 
pdvoa9ao  j  es€olh»do  doe  moradotes  aquettes  que 
tiyeaeem  por  si  a  meUior  ofMDiao.  Executirao  com 
cuidado  e  deligenda  as  inslruccoea  que  Moeb^rao ; 
ehamarao  primeiramente  os  tre^  govemadores ,  e 
depoia  de  Ihes  communicarem  as  ordens  que  tra-- 
ztao ,  conferirao  entre  si  o  modo  de  dar  comedo  i 


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IM  ciffuora  umriM. 

oQ^NfMt  iMrqitetadt.  *-nMo  «Ua  aegidntey  que  te^ 
mnttfftD  2  de  Settemhra,  po^-M  por  obm  o  pljuMi 
ootictttAilo^  e  a  libenlftdfi  ibi  aeclamiida  em  toda  • 

.  VIL  Foi  ooiiaa  maravilhosa  a  brovidade  eciM  ma» 
Be  convdcario,  ronnirM  e  araiarao  todoa  oa  menb* 
donea;  ponque  o  d«efo  de  eada  urn  aaaiaa  pagan 
daa  arautt  qua  tmha  praTanidaa^  qua  %&ak  tempo  m 
vimo  aa  compaBfaiaa  fanuadaa  e  guanaecidas  de 
aapingardaa,  ehucos^  aapadaa,  foueoa»  paoa  toatados 
e  eutelloa  da  monte.  Aqui  ac  vie  camo  o  goate  i  e 
melher  mattre.  Asaim  acfaeu  a  todoa  discipiinadoa 
a  ordem ,  que  pareda  lereai  mukoa  anoos  de  mi^ 
licia.  Ja  nae  havta  quern  visse  a  oava  ao  medo )  o 
que  antes  ae  notava^de  deamaiado  era  o  que  ae  inn 
anlcava  maia  de^lemido  :  na  alegria  do  rostro  ae 
Tia  o  alTorocD  do  oora^o  de  todoa.  Os  principaaa 
oa  eatimacae  o  forao  no  zelo  com  que  chaHniirito  a 
at  oa  manodios  de  melbor  arte,  tomaudo  oa  poatoa 
de  capitaaSy  primeiro  da  iMo  do  favor  que  da  elei* 
eio ;  onjoa  nomea  Be  irao  partioularizando  pelo  dian 
eupso  deata  hioioria.  No  dia  3  de  Sattembro  Ca-> 
lio  saiiido  as  oompanhias  com  seus  oapttaea  doa 
lugans  dude  ae  fermarao ,  e  oom  ordem  militav 
mfirchafaoii  appeaentar*ee  a  aeus  governadorea^  qua 
no  logtti*  da  Tibiri  as  esparavao.-^Befopmamo^aa 
algumas  companhiaa,  para  se  dar  numero  suffix 
oiente  Aa  demais,  Qeando  todna  4  asoolha  doa  eapi* 
taas  que  vinbao  nomeados  peloa  noaaos  govema* 
dores*  Deitou-se  pelos  moradores  de  toda  a 
oapttania  nma  contribuicao  g^ral  para  o  auatento 
da  guerra.  f  Udrao^-se  editaes  na  cidade  e  seu  ooa*» 


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cAtfnamo  usmMtk  Ml 

torno  pAoft  qmm  o  goveraaddr  da  UberMIe  coikm^ 
dia  a  todos  00  €»trangerres  /  que  qniieiMfm  fiMr 
entM  116^9  a  posse  e  livre  tiso  de  suas  fazemlas,  nd 
fiH*o  em  que  as  gozarae ;  e  que  aos  que  qnteessMi 
assentar  praca  se  Ihes  Aipiio  es  paganientoe  con^ 
forme  os  postos  que  deixassem  :  muitos  se  asseu-* 
t4rio.  Gondemnou-se  o  alojameuto  de  Tibiri  por 
aberto  e  irregular,  approvando-se  o  sitk>  do  eitk^ 
genko  de  Santo  Andr^  (era  de  Jorge  Homem  Pinto), 
o  qual  se  fbrtificou  ffeatro  de  oito  dtas,  em  f6nM 
que  mereceo  0  nome  d'Arratal. 

Vm.  Em  um  mesmo  dfa  se  acclamou  a  HlHT^r 
dade  na  cidade  e  lugares  circumTtziuhos  de  toda  a 
capicania ;  e  netle  o  sotibe  0  goTemador  hollande^ 
Paulo  de  Linge,  o  qual  logo  se  dlsper  a  mandar 
atacar  o  nosso  alojamento.  Formou  um  esquadrfto 
de  trezentos  Hollandezes,  e  dobrado  numero  de 
Indios;  estes  cohduzidos  por  seu  maioral  Fero 
Poty,  aquelles  govemados  por  um  cabo  eaeolbtdoi 
Sairao  do  Cabedello  em  demanda  do  Arraial,  a  tempb 
que  pdo  rio  da  Paraiba  mandou  seu  goi^isruador 
subir  um  sufticiente  numero  de  lanchas,  eom  ap« 
parencia  de  irem  eommelter  a  cidade.  —  Persua- 
didos  OS  nossos  cabos  que  por  mar  e  terra  vinha  0 
inimigo  buscar  a  eidade,  a  soccorrArao  com  tode  # 
poder ;  mas  bem  de  pressa  conhee^rao  queo  alaque 
se  dirigia  todo  cohtra  o  Arraial ,  e  que  as  lanohaa 
subiao  ardilosam^nte  com  voga  escassa  para  nos 
divertir.  Tinha  ficado  no  Arraial  pouca  gente,  que 
apenas  bastava  para  as  guardas  quanto  mais  para 
a  deFensa,  o  que  causou  grande  cuidado  aos  homos, 
que  nao  podiao  acudir-lhe  com  soccorro ;  maa  o  oil 


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lit  CASJMMO  LOmANO. 

fiim  FrMtfMCQ  Gomect,  que  alii  ficifa,  soiibe  des- 
¥iar  o  pan^<)ii6  o  amcA^vft.  S«k>  oomoUmitado 
podeir  que  iinhia  a  Loscar  o  ioimigo,  que  enconirou 
nt.eampina  46  lahabim;  m?esiiFaa-se  os  esqua^ 
droes ,  iguaes  no  valor,  desiguaes  no  numero ,  e 
muiio  oiais  nas  armas;  as  do  inimigo  todas  de 
Sofpf  as  dos  Poriuguezes  nem  iodas  do  ferro.  Deo 
o  FiadieQgo  a  (Nrimeira  carga ,  quaodo  o  ceo  nos 
favoreeeo  0001  uma  paocada  d'agpa  f  com  que  ani- 
naadoB  os  oossos  iavestirao  a  espada,  cooi  valor  tao 
destemido  e  braco  tao  robusto,  que  desaiinado  dos 
g^pes  nao  sabta  o  contrario  vadvertir  o  pequeno 
numero  dos  ptessoas  :  nao  falUm  ao  eoeontro  aquella 
(HTDfiaquesasf^ta  a  igualdade  da  forca.  Foi  re- 
v3lAA»  0  ooiftbaie>  mas  oao  longo,  porque  o  HoUandez 
veijdk>^  campo  eoberto  de  mortos^  os  nossos  com 
valop  e  di^ciplinA  9  e  receaodo  que  nos  chegasse 
aocooiiro  9  df^  m  costas  ao  combate  tao  medrosa-* 
mt^V^  desprdeoildo ,  qye  os  aeus  despbedientes  a 
Sumuiy  S6guira0  oa  preceitps  dp  temor,  sem  para« 
rem  Flwiengos  e  Tapuyas  senao  deotro  de  sua 
foiHaleza  do  CabedeUo.  — Cinco  sddados  nos  ma- 
tariio»  oitre  elles  o  capitao  FraacisQo  Iiieiiao :  morte 
sintida  pela  occasiao  e  pela  falta*  Os  feridos  nao 
IbflM)  miiitos,  e  oa  fei  parecer  meoos  a  breve  con- 
valescen^a  de  todos.  Recolhidoa  os  despojos,  se 
¥ottarao  os  nossos.  paira  o  Arraial,  dando*se  uns  a 
outros  as  eongraiuU^oes  do  sucoesso ,  e  a  Deos  as 
gra^aa  de  tao  inopinada  victoria. 
;  IX.  Ainda  corria.  o  aaogue  das  feridas,  que  o 
kiittigo  recebeo  nesta  occasiao ,  quando  o  gover^ 
jMidor  boUaadez  mandou  enforcer  dentro  da  sua 


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fortaleza  a  nm  honrado  movador  da  Paralba^  por 
Bome  Fernao  Rodrigues  deButhoes,  enviado  ( como 
escolhido  para  o  negocio ,  por  se  fiarem  nelle  as 
partes)  a  concluir  com  o  Linge  a  cntr^  da  Sot^ 
taleza  j  que  sua  diligencia  tinha  muito  adiantada , 
e  que  descompoz  de  todo  a  falla  do  segr^do.  Al^ 
caaeou-o,  ou  por  communicacao,  ou  por  mferen- 
cia,  um  sacerdote ,  fez  ariso  do  negocio  a  una  pre^- 
dicante  do  inimigo.  Deseoberto  o  trato,  e  ciilpado 
o  gOTernador,  Ihe  foi  necessario  salvar  a  pe^flioa,  a 
opiniao,  e  o  cargo  com  se  mostrar  intenCo  da  ca- 
linrniia,  e  ficarseguro  do  complice;  o  que  conse* 
guio  com  malar  o  interlocutor.  Deade  o  presente 
tempo  at^  o  fim  de  Outubro  nao  dedctmcifao  os 
nossos  cb  molestar  o  inimigo  com  toda  a  hostiti^ 
dade-  poasivel ,  valendo-ae  d'emboseadas ,  rebates  , 
assahos  sempre  faem  succedidos^  e  ccmu  prisoes  e 
mortes  de  HoUandezes  e  Indios,  <fue  nao  especifi^ 
caraoa  por  similhantes  e  continuos.  ' 

Xi  rObriga-no8  a  bisloria  a  buscar  o  tempo  em 
que  ae  acotamou  a  liberdade  no  poKo  do  GaJro, 
queixoso  da  detensa  que  fizemoa  na  rriacao  dob 
aconteidimentos  da  Paraiba«  Entre  os  homens  de 
qualidade ,  que  a  violencia  sojeitaTa  nff  oircumfte- 
rencia  de  seu  domimo,<era  um  d -dies 'GhrisCovao 
LinSy  nao  menos  nohre  pelo  sangue  qwi^peios  pro^  • 
cedimcntOB.  A  es^  tal  mandoo  Joao  Fe^nandes 
Vieira  patente  de  capitao  de  todo  aquelle  d^ttieto 
do  p4H*to  do  CalTO ,  onde  tioha  smt  momda>  com 
aviso  e  ondem  que,  eauto  e  preveoido,  esperasse  o 
dia  em  que  se  ha  via  de  aociamara  liberdade  em 
todas  as  partes  sujeitas  ao  Hollandez.  -^  Esperava 


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jCbrittovio  Lins  o  iMmento  propiek)  pari  dmr 
eMCU^ao  48  ordens  que  receb^,  quaodo ,  TandD 
que  o  HoUandf  z  mandaya  prender  todas  aa  pewoM 
ile  qualidadd  como^aodo  pelo  commeodor  Rodrigo 
de  Barroa  Pimepteiy  e  teudo  noticia  que  Joao  Fep- 
QgDdea  Vieira  ae  pos^ra  em  campo  a  favor  da  liber- 
4adey  fiez  do  succeeao  ayiao»  e  sc^indo  o  odomUu) 
xfua  Ihe  dava  a  occasiao  ao  cai|;o,  com  OS  Biocadorea 
que  o  quizeroo  seguir  appellidoa  a  Uherdade,  e  ae 
poz  em.  campo  com  as  poucaa  armaa  que  pod^M 
livrar  da  prohibit  holiandeza.  Informado  o  oooa- 
meudor  dia  fortaleza  do  sucoeMO  y  e  quereudo  apa-- 
§ar  o  £ogo  antes  que  crescease  o  ioceodiot  deikm 
ivra  mna  <pariida  de  aoldados  com  ordem  que  aaMl- 
taaeem  as  rebelados,  e  a  todos  prendeasem  oa  ma* 
tasaam*  Mao  ae  etooodeo  a  GhiiaioTao  Laos*  e  a 
aeua  oourederados  a  riuda  e  o  intento  do  iaimidO) 
e  o  eiperott  d'emboaoada ;  e  com  liuo  boa  fortuna, 
que  nella  perdteao  (ados  aa  yidaS)  e  deixarao  as 
armast  cam  as  quaes  ficarao  os  uoaeos  aytis  ooaa- 
doS|  porque  me^bor  guamecidos.  —  Tm  dm  esit- 
l^drao  em  suspauaao  as  armas  d'uma  e  d'outra 
parte  I  maa  oomo  acooleeesse  terem  oa  Bosaoa  avno 
da  que  peb  rio  de  Maugoaba  subia  um  baroa,  que 
vinba  emaocowiDodosuiimi^^  edaadoaotnvuUe 
i>4qniaatym.oam  ouirle  de  mote  HoUaudeass^  e  ae 
*poderas«emde  asuilas  araus  de  fogo,  mwiiooea  e 
iMiiUflteukNi^  reouperayao  auyo  aoifliu);  e  rafop^ 
dos  par  gnwade  oumero  tb  moradones  que  ae  ea«* 
Jbreubayao  pek»<aialm^  alojatao-ae  earn  um  quartet 
4e|eMay#l^  e  esteiideiido«*ae  em  doua  im^os  eiU'- 
giria  a  fortaku  ao  largo  oade  oa  qm  afeaoftta  a 


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mmumTn  iiiBimii)  it6 

wtiUMOM  df'eUi.  AnimeMi  com  a  in«hMio  %  ocMl 
«  anBdft>  nMid4rio  anyi  embiiiLada  am  cercaikM, 
^pie  n  entl^aiseat  t  bomi  pQr(id([>  ^  4sertm  do  qM 
ihes  f^iianlamp  as  bdndicoes  lotiaid  fkvMreit ,'  q«i« 
nao  de8t)reftaBSem  o  ofiereciineBlov  porqu^  et9L  re-> 
aolu^ia  de  solckdos^  e  tambein  eonselbo  d'AmigM, 
pois  Ihes  proponhao  os  meios  mais  yf^s  para  a  cofi'- 
aerva^ao  iki  himra,  daTidbai  t  da  fazenda ;  <)tTe  tudo 
ka^iao  de  peixter  Be  esperme^m  b  aiaalt)^.  Ou¥fa>  <^ 
cooMipeiMior  a  ^embaixada  ^  e  deapedio  <)  enviado 
aem  Mspoaia. 

XL  Vemfe  o  o^mme&dor  da  foneteea  qut  M 
namimmtoa  iao  faltemdd,  e  t^ne  o^  Msaoa  cr^sdib 
tti  iiuiim*o,  t  apenavM  tada  vcfi^inaia  o  ^serco,  pet^ 
auadb  aoa  <9M»  tmn  boas  ra^oea  qvi^  ae  deria  en- 
Iragar  a  foraatefca.  Cottvi^frao  todos  no  parei^  do 
oomnyeitdory  o  quat  matidon  nm  enriado  a  C3im^ 
tffym  Lem  (tinhfta  sidoamigos)^  dizendo  por  elle 
TpBte  wA^  OS  of&eiaea  e  soldados  vinbao  na  lentirega  * 
porttn  que  era  necessario  tnandar  vir  um  oapitao 
fMgado  drarkO)  qtie  tiuiAttoaem  PenMimbl#cO( 
para  cMa  die  asaentar  aa  oa{Mtiilaeoea;  o  t|iie^AM 
luiTia  de  faeer  com  algtm  Am  aiomKtorea ,  porqiia 
se  nao  tttaaeBae  que  capitulaTU  omu  oaanMitoa  com 
q«e  tiTOim  aacuaade )  e  cpie  no  entiretant^  o  acMV* 
eorresse  eoin  algum  refhasoo.  HeeebM  €hriM(n4k> 
Lids  a  eaabaixada ,  matMloii  o  rafneaco  pedMe,  e 
panicipou  immediaUineDte  ao  goreraador  Joao 
Femsndea  VMtra  as  {mipostaa  do  cofMnendor,  pe^ 
dindb^lM  mMBdaawt  lo^  qnam  oapitadasfia  tonovt* 
dioeea  da  ^ntmga.  ^^ConaittDiooii  o  gpv^rnadwaf 
impa  «  a  aupi^Ma  aoa  saua  mestrea  de«iiapo ;  toM« 


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IM  Gi«Tii0io  umaAao4 

iuirio  ealirc  si  sabre  a  pessoaque  hayiao  de  maA- 
dar,  e  fixemocscoihadocapilaoLouran^Garii^^ 
de  Acaujo,  cavalleiro  do  habilo  de  Ghristo,  que 
aaaistia  jm  pdoltl  de  Nazareth ,  o  qaal  |iaitto  loge 
a  executar  a  ordem ;  chegou  ao  porta  do  Cahro,  e 
asaentou  com  Christovao  Lins  que  logo  se  noUfi^ 
casse  sua  vioda  a  Aram  Florins  (este  era  o  noiae 
do  couunendor  da  fortaleia).  Capitulou-ee  a  ea^ 
trega  na  fticma  seguinte :  Que  sairia.  o  inimigo  oom 
seus  officiaa^  e  soldados  tocaudo  caixa,  bandeiras 
tendidas,  mecha  calada,  balla  em  boca,  e  todasua 
bagagem  Ate  o  lugar  destinado  para  os  desarmarem ; 
que  a  todos  se  daria  embanca9ao  para  ae  irem  oode 
quizesssAi^  que  a  todos  que  tivesseW; voAiade.de 
servir  o  nosso  exerdto,  se  Ihes  asseotana  pra9a  oa 
forofMi  dQ  e^lilo ,  fosse  sokjado  ou  morador ;  que  a 
una  e  a  /outros  se  coui^edia  a  posse  e  cultura  de  suss 
fai^udas,  e  lodos  os  foros  com  que  at^  aqueU^ 
tempp  as.posseeiao.  Com  estas  partidas  se  apossa- 
rao  OS  nossos  da  fortaleza  em  47  de  Setlembro  de 
1 645, — Repartirao^B^pelos  soldadoa  readidos  sette 
omtos  mil  reis ;  guardsoioise^hes  pontualmeme 
as  coodicoes  pactuadas,  sem  que  se  desse  oooasiao  a 
menor  queixa»  muita  por^m,  is  admira^oes  dos  es- 
traugeiros.  Os  officiaes  e  soldados  reodidos  faziao 
uumero  de  ceoto  dncoenta  e  seis«  — Deixou-nos 
o  Fiameu^o  a  fortaleza  inteira  y  com  oik)  pecas  de 
bronze,  qualrode  vinie  e  quatro,  duas  de  dezar- 
selte ,  e  duas  de  ciuco ;  armas  e  municoes^  nao  U 
baslauiesi  ^as  sabejas  para  sustittlar.  um  lar^ 
sitjo*  Nao  quizerao  os  moradores  que  ua  fortaleza 
iicasse  molivo  de  soflrerem  de  porem  novo  sitio , 


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GASTiaOTO  LUSITAIU).  M7 

pelo  que  arrazarao  as  muralhas,  e  o  capitao  com- 
boiou  por  terra  toda  a  artilharia  para  a  Yarzea , 
onde  cbe^u  a  avistar  os  nossos  govemadores  com 
applauso  de  yivas,  e  despojos  da  yictoria. 

XII  •  Em  quanto  estas  cousas  passavao  no  porto 
do  Calvo  outras  similhantes  succediao  no  lUo  de 
Sao  Francisco,  cuja  fortaleza  em  19  do  mesmo  mez 
se  entregou  aos  nossos.  Valenlim  da  Rocha  Pita, 
nobre  econfidente  morador  naquella  parte ,  rece* 
b&ra  paiente  de  capiiao  de  todo  aquelle  destricto, 
na  forma  que  se  tinhao  dado  a  outros  deque  temos 
fallado ;  fora  elle  advertido  pelo  govemador  da  li^ 
berdade  do  decreto  publicado  pelo  Hollaodez,  e  da 
trai^ao  fue  preparava  aos  moradores ;  communicou 
tudo  aos  homens  conhecidos  para  que  o  Flamengo 
OS  nao  achasse  desacauteiados ;  os  quaes  todoa  se 
disposei*ao  para  aproveitarem  o  primeiro  momento 
favoravel  para  proclamarem  a  liberdade^oqualnao 
tardou.  Mandou  o  HoUandez  prender  um  morador 
principal  que  residia  duas  legoas  da  fortaleza ;  pu-> 
blicou*se  o  mandado,  e  com  elle  o  alvoraco  dos  i^* 
zioboSy  que  saindo  ao  encontro  do  preso  e  dos 
ministros,  matarao  a  estes,  que  erafo  um  sargento 
com  dez  soldados ,  e  pos^rao  em  sua  liberdade  q 
preso;  Cbegou  a  nova  ao  commendor,  o  qual  man- 
dou logo  um  capitao  com  settenta  soldados,  que 
d^sse  sobre  os  aggressores,  e  que  a  elles  e  a  toda  a 
cousa  yiva  abrazassem  e  consummissem ;  mas  nao 
succedeo  como  elle  determinava,  porque  os  nossos 
pondo-se  d'emboscada,  esperarao  os  settenta,  e  os 
castjgarao  com  tao  boa  mao,  que  nenhum  pode 
escapar  da  morte  para  levar  a  nova  do  castigo.  For 


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tn  cASTMOTO  Ltrsrr  Alfa  ^ 

terceiras  Yias  chegtni  a  noticia  do  cstrago  ao  com*- 
mendor  que,  magoado  da  perda,  se  arrepcndeo  da 
colera. 

XIII.  Em  todas  as  idades  foi  sempre  maior  o  se- 
quito  da  fortuna  que  o  da  razao.  A  muitos  viti- 
nhos  conduzio  a  tomar  as  armas  o  desejo  da  Hber- 
dade,  por6m  a  muitos  mais  a  nova  d'csles  successoa. 
Ja  0  orgulho  da  muUidao  julgava  peqnena  a  op- 
posicao  do  Flaraengo ,  e  Ihes  parecia  affmnta  de 
sen  braco  o  fazerem-se  senhores  da  campanha  sem 
ganharem  a  fortaleza.  Antevio  o  inimigo  a  pratica, 
e  temeroso  da  ousadia  se  rec  Iheo  com  todos  os 
sens  dentro  da  fortaleza,  nao  Ihe  restando  mais  es- 
pcranca  que  a  dos  soccorros,  que  Ihe  promctlia. 
1]tonsider)iiio  os  nossos  que  a  dilacao  do  cerco  daria 
tempo  a  disposicao  dos  soccorros ,  e  se  resolvferao 
«n  mandar  dous  correios  A  Bahia ,  expondo  ao  go- 
Tenrador  gdral  do  Est  ado  o  curso  dos  snccessos ,  e 
0  motfvo  dos  receios,  pedindo-lhe  que  Ihes  man- 
dasse  algum  soccorro*  —  No  entretanto  se  occupa- 
rao  em  conduzir  armas,  municoes  e  mantimentos, 
que  a  pouco  custo  Ihe  ofFereceo  a  Tentura  em  um 
caravellao ,  que  o  inimigo  mandava  de  soccorro  4 
fortaleza  :  vinha  subindo  pelo  rio,  e  assaltado  dos 
Hossos  o  largarao  os  Flamengos  comas  vidas.  A 
mesma  sorte  teve  uma  lancha  que  navegava  com 
onze  Flamengos ,  is  ordens  d'um  ajudante  :  oiio 
mancebos  Poriuguezes  a  envesiirao  em  uma  canoa ; 
tnatarao  da  primeira  carga  seis  Hollandezes ;  os  ou- 
trosacabdrao  pelo  ferro;  e  a  lancha  servio  aos 
nossos  de  triumphoede  soccorro.  Entreos  C5erca- 
ttores  «  08  sitiados  erao  tantos  os  encoutros  como 


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CASTBIOro  UJSITAIIO*  fM 

erao  as  occaeioes,  e  as  occasioes  como  erao^s  diaa, 
ftcando  as  ih>sqoa  sempre  vencedoreg ;  e  por  aer^m 

05  successos  todos  os  mesmos  os  nao  referimos. 
XIV.  Logo  que  o  governador  do  Estado  reccbeo 

06  correios  com  a  participacao  do  que  era  passad^ 
no  Rio  de  Sao  Francisco,  expedio  as  ordens  ao  ca** 
pilao  NIcolao  Aranha,  que  se  alojava  no  Rio  Real, 
para  que  com  a  sua  companhia  partisse  com  06 
douscorreiosem  soccorro  dos  moradores  do  Rio  de 
Sao  Francisco ,  o  que  executou  promptamenle  che- 
gando  a  avistar  os  nossos  em  40  d'Agosto  d'este 
mesrno  anno;  e  para  informar  o  inimigo  da  svm. 
ehegada  mandou  por  o  fbgo  a  algumas  lancbat  que 
tinha  amparadas  deba»xo  de  sua  artilharia,  o  que 
eom  bom  successo  se  executou.  —  Ao  outro  dia  da 
sua  ehegada  mandou  Nicolao  Aranha  apertar  o 
eerco  com  a  sua  gente  (erao  cento  oitenta  ho^ 
mens  *bem  armados,  entre  Portuguezes  e  Indios); 
passou  o  rio,  e  se  fortificou  da  parte  do  norte ,  na 
qual  a  fortaleza  estava  situada ,  com  o  que  (ran- 
queou  a  passagem  a  um  grosso  de  nossa  iofantaria, 
e  com  eHa  cingio  a  fortiGcacao  hollandeza ;  no  dia 
seguinte  mandou  occupar  todas  as  entradas  e  saidas 
dapracacom  emboscadas  e  mangas  volanCes,  que 
servissem  &  Tigia  e  a  occasiao ;  ordenou  que  -algii- 
mas  companhias  por  iugares  diversos  picassem  jO 
inimigo,  no  caso  que  saisse  da  fortaleza,  oqUe  se 
nao  atreveo  a  fazer.  —  Foi-se  apertando  o  ceroo 
cada  vez  mais  at^  que  as  nossas  ballas  ja  dhegavio  a 
fazer  estrago  nas  casas ,  e  com  o  aperlo  do  cerco  se 
Ihe  forao  tomando  todos  os  soccorros  que  yinhao 
pelo  rio ,  e  eyitando  por  meio  de  lanchas  armadas  e 


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560  GASTEIOTO  LUSITANa 

guamecidas  de  genie  rcdolula  que  oulros  man- 
dados  pelo  Arrecife  podessem  apprpximar-se  da 
fortaleza. 

XV  •  Yendo  o  commendor da  fortaleza  o  aperto  em 
que  se  achava  deitou  fcSra  um  bolatim,  e  porellc 
mandou  dizer  ao  capitao  Nicolao  Aranha,  maiscom 
manha  que  com  franqueza,  que  Ihe  bjcijava  as  maos, 
e  estimava  muito  sua  yizinhan^a,  e  muito  mais 
estimaria  o  servir-se  d'elle,  pois  sabia  como  tao 
grande  soldado  que  as  leis  das  armas  faziao  con*- 
trarios,  por^m  nao  inimigos.  Respondeo-lhe  o  dis- 
creto  capitao  que,  obrigado  de  sua  cortezia;  Ihe 
aconselhaya  entregasse  a  fortaleza ,  antes  que  a  oc- 
casiao  Ihe  fizesse  inimigos  todos  os  que  via  contra- 
rios.  Nao  cessarao  as  hostiiidades^  e  continuarao  os 
recados  de  ambas  as  partes ;  se  hem  que  de  uma 
as  formava  a  desespera^ao  e  da  outra  o  desprezo. 
No  dia  13  de  Settembro  ^  em  que  as  armas  anda- 
yao  mais  quentes,  mandou  Nicolao  Aranha  um 
tambor  e  um  official  com  embaixada  ao  commendor, 
que  sens  soldados  o  importunavao ,  enfadados  de 
tanta  dila9aOy  por  licen9a  para  levarem  a  fortaleza 
a  escala,  o  que  Ihes  nao  poderia  negar  se  logo  a 
lULO  entregasse  a  partidO|  para  o  qiial  o  achariao 
favorayel ;  que  Ihe  advertia  serem  mui  poucas  as 
palayras  onde  ha  via  muitas  e  boas  maos.  Queria  o 
commendor  ganhar  tempo ,  esperando  que  entre- 
tanto  Ihe  chegasse  algum  soccorro ,  e  sem  rejeitar 
iuteiramente  a  nossa  proposta,  respondeo  que  pe- 
dia  tres  dias  de  tregoas  para  conferir  com  os  mais 
eabos ,  e  assentar  o  que  se  deyia  fazer.  Succedeo 
nesta  mesma  bora  chegar  ao  Rio  de  Sao  Francisco 


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GASTRIOTO  LusirAno.  9fti 

Henrique  Hus  (com  aquelle8  rendidosnas  casas 
de  dona  Anna  Faes  ^  que  os  nossos  govemadoresf 
mandavao  pri^ioueiros  para  a  Bahia),  o  qual,  infoiv 
mado  da  embaixada  e  da  resposta,  se  entrepoz  por 
laedianeiro  do  negocio  a  beaeficio  dos  cercados* 
Escreveo  ao  conunendor  com  licenca  nossa,  expoz^ 
Ihe  a  desgra^a  que  Ihe  linha  aconlecido,  a  perda  de 
duas  batalhas  campaes  por  parte  da  cQmpanhia , 
a  impossibilidade  de  receber  soccorro  do  Arredfe, 
e  Ihe  aconselhava  que  entregasse  a  fortaleza,  e  que 
nao  esperasse  o  assalto.  Estas  razoes  ditascomau-* 
toridade ,  e  ouvidas  com  respeilo  poderao  tanto , 
que  logo  o  commendor,  com  iodos  os  seus^  trata- 
no  de  entregar  a  fortaleza. 

XVI.  Feitas  as  capitula^oes  ^  e  assignadas  pelos 
cabos  maiores  sairao  da  fortaleza,  na  forma  d'ellas 
(em  1 9  de  Settembro)  duzentos  sessenta  e  seis  Hoi- 
landezes  e  Francezes,  cinco  Indios,  yinte  e  qujUro 
mulheres,  dezoito  meninos  e  outros  tantos  escra- 
vos;  OS  officiaes  com  suas  insignias»  os  soldados 
em  f6rma  de  guerra,  at^  certos  passos  onde  forao 
desarmados.  Deixarao  na  fortaleza  dez  pecas  de 
bronze,  grande  somma  de  pelouros  sorteados,  suf- 
ficiente  polvora  e  murrao,  e  abundancia  de  manti- 
mentos.  Aos  enfermos,  mulheres  e  meninos  se  deo 
embarcacao  para  passarem  a  Bahia  com  seus  mo- 
veis ;  alguns  soldados  se  alisiarao  debaixo  de  nos- 
sas  bandeiras ;  e  os  mais  se  passarao  a  outra  parte 
do  rio  para  marcharem  para  a  Bahia  como  rendi- 
dos.  —  Foi  a  restaura^ao  desta  fortaleza  utilissima 
para  os  progresses  de  nossas  armas ;  como  foi  de 
pemicic^issimas  coniequencias  para  o  Fiamengo. 


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363  CAwnxno  ummMOi 

Era  frontelra^  e  chave  d'ama  e  ontrt  catupmbt, 
porque  abria  e  fechava  o  transito  de  Peraamboco 
para  a  Bahia,  e  ao  contrario ;  deposito  do  principal 
dustento  para  os  exercilos,  porque  destaa  partes  se 
condiiziao  os  gadoa,  de  que  abunda  aquelle  refreno; 
e  sem  dominar  aquelle  posio  nin^em  se  podia  ser- 
tir  das  rezes  quealimeniavao  aquellespastos.  A  uti^ 
lidade  foi  a  lodas  as  luzes  grande,  ou  se  tome  pela 
parte  da  defensa  ou  peta  da  cooquista.  Nenhuma 
Tictoria  tnereceo  tanto  applauso,  porque  nenhuma 
se  alcan^ou  com  menos  cusio.  Os  moradores,  fiadoa 
na  forca  de  seus  bra^os,  pediao  ao  csapitao  Artnhn 
qtie  Ihes  manda.^se  arrasar  a  Fortaieza,  para  que  ao 
inimigo  se  coriasse  a  esperan^a,  e  aos  vizinhos  o 
recek).  £xecutou-se  como  se  pedia;  As  del  pe9as 
de  bronze  se  depositarao  em  iugar  seguro  para  se 
passarem  a  Pernambuco  com  mais  commodidade. 
Ordenado  tudo  o  que  podia  servir  A  convenicncia 
dos  rooradores ,  marchou  NicoUo  Aranba  eom  a 
sua  gente  para  a  Vartea  a  dar  conta  aos  nossos  g<H 
veroadores  do  successo,  e  do  desejo  qtie  tinha  de 
servir  a  liberdade. 

XVII.  Em  quanfo  o  braco  dos  moradores  das 
sobreditas  capitanias  trabalhava  na  restauracin)  da 
sua  liberdade ,  acudia  Joao  Femandes  k  da  sau^ 
de  todos.  Para  soccorro  e  alivio  das  feridas^  doen« 
cas  e  miserias  que  sito  consequencias  cercissimas 
das  guerras  e  das  campanhas,  levaniou  uma  casa 
da  Misericordia  k  iifiitaeao  das  do  reino^  e  das  qua 
havia  antes  do  Hollandez  se  fazer  senhor  da  terra 
(de  nenhuma  deixou  o  inimigo  merooria  em  todas 
aquellaa  capitanias)^  na  qual  se  eiercitasse  a  pie* 


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didechtigta  por  diveorsas  pe$soas  addkUs  a  diffie- 
xeates  e0i|uregO6*  Consignou  ordeoado  para  um  ca* 
pellaoy  que  todos  os  dioa  dissesse  miasa  ao6  en* 
£^m0s»  e  Ihes  administras^  os  sacramentos,  com 
c^igpa^  de  assistir  aos  euterros  dos  mortos ;  que 
logo  proveo  em  pessoa  beaemerita.  Determinou. 
por^ao  para  medico,  sirurgiao»  botica  e  servos  que 
assislissem  &&  necessidades  e  limpeza  dos  enfermoa* 
&epariio  os  gastos  pelos  moradores ,  como  o  per- 
m^tia  a  possibilidade  de  cada  um,  e  nomeou  para 
provedor  e  roais  impregados  os  homens  mais  ca« 
paae$  e  zdosos  da  terra^  —  No  maior  fenror  desta, 
OQcupa^aQ  chegarao  a  Varzea  os  mestres  de  campo. 
Avidri  Vidal  de  Negreiros  e  Martim  Soares  Morena 
da  Tolta  da  empresa  de  Nazareth  y  com  todos  os. 
estrangeiros  rendidos.  Consult^rao  com  o  governa* 
dor  o  premio  qua  poderia  merecer  o  servi^o  d^ 
Theodozio  Estrater,  em  quanto  a  majestade  d'El 
Rei  de  Portugal  Ihe  aao  fazia  merc& ;  e  atteudendo 
aa  desejo  que  tiuha  de  servir  ao  dito  senbor  na 
ampresa  da  liberdade ,  Ihe  d^rao  o  posto  de  mestre 
de  campo  de  duzentos  e  cincoenta  estr^ngeiros  (que 
rendidos  oas  occasioes  referidas  asseuUraa  pra9a 
4e  soldadps )  com  promessa  de  que  se  Ihe  aggre* 
gariao  a  s^u  terco  lodos  os  mais  que  pelo  tempo 
s^dianie  quizess^fn  servir  em  o  uosso  exercilo.  No- 
me^rao-lhe  por  sargento  maior  um  Francez,  cha** 
mado  Francisco  de  la  Tour,  e  deixarao  k  sua  es- 
colba  a  devisao  das  companhias,  e  nomea^o  doa 
of&ciaes  d'ellas* 

XVUK  Susteutava  o  iniroigo  (a  liro  de  mosquete 
da  villa  de  Olioda )  uma  pequena  for^a  chamada  de 


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Shh  CASTBIOTO  LtSITAHO. 

Santa  Cruz ;  limitada  no  ambito,  grande  pelo  sMo ; 
e  inexcusayel  transito  para  a  communicacao  e  aer- 
vico  do  Arrecife  para  a  villa,  e  della  para  o  cerlao ; 
j4  neste  tempo  cortada  pela  nossa  opposi^o  desde 
a  occasiao  em  que  o  capiliio  Barboza  com  os  triota 
soldados  de  sua  companhia  a  occupou.  Yendo  pois 
osnossoscabos  quanto  era  importante  aquelle  ponto 
para  o  progresso  de  nossas  armas,  resolv^o  que 
se  levasse  por  entrepresa.  Asdentarao  o  tempo  e  o 
modo;  e  com  uniForme  parecer  mandarao  algumas 
companhias  que  se  passassem  da  outra  parte  do  rto 
por  aquelle  sitio  que  chamao  o  Buraco  de  Santiago, 
e  de  emboscada  cortassem  todo  o  soccorro,  que  do 
Arrecife  se  podesse  intentar  pelo  yao,  que  debaixa- 
mar  da  o  rio  naqueUa  parte.  Posta  por  obra  esta 
diligencia,  sairao  os  mestres  de  campo  Andr^  Vidal 
e  Theodozio  Estrater  com  o  grosso  de  sens  tercos, 
resolutos  em  levar  o  forte  a  escala.  Adiantou-se  o 
Estrater,  pelo  coohecimento  que  tinha  com  o  com- 
mendor  HoUandez,  a  persuadir-lhe  a  certeza  de  se 
perder^  e  a  conveniencia  da  entrega,  antes  que 
contra  elle  se  desembainhasse  a  espada.  Convenceo* 
se  o  Flamengo  com  as  razoes  de  Estrater^  e  se  en- 
tregou  a  partido^  que  se  Ihe  fez  com  aVaniajados 
favores.  Entregou  o  forte  com  seis  pecas  d  artilha* 
ria,  subejas  muni^oes,  e  sufficientes  mantimentos, 
necessario  tudo  para  os  soldados  portuguezes^  que 
nella  ficarao  de  guami9ao.  0  cabo  r^idido  com 
todos  OS  sens  assentarao  pra^a  no  ter^o  de  Estrater, 
primeiro  convidados  de  nossa  fortuna  que  de  sua 
affeicao.  Guarnecida  a  forca  com  uma  companhia 
de  soldados,  para  rebaterem  o  inimigo ,  se  inten- 


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cjmwmo  umtuno.  us 

t  recitperii*a^  se  voh^o  os  noseoB  para  o  sen 
akjamento. 

XIX.  Os  govemadores  hollandezes^  que  asnstiao 
BO  Arreeife,  cortados  de  taatos  golpes  quaniaa 
trio  as  perdas  e  damnos  recebidos,  oonsiderayao  a 
pressa  com  que  as  nossas  armas  caminhayao  i  ul-* 
lima  ruina  de  seu  imperio ;  mandarao  unia  em- 
tiaixada  ao  mestre  de  campo  Andre  Vidai  tie  Ne- 
greiros,  euja  substancia  em  protesios  e  jusiificacoes, 
oom  que  arguiao  e  coodemnavao  os  progressos  de 
nossoB  empresos,  a  rebel  liao  de  seus  subdilos,  a 
perda  de  sens  exercitos,  as  mortes  e  prisoes  de 
seus  cabos,  os  damnos  de  sens  comaaeraos ,  ^9 
roubos  de'BuasfazmidaSy  a  quebra  de  sua  reputa- 
fao,  a  injuria  dos  iilustrissimos  Estados;  que  a 
•lie  mesUre  de  campo  se  imputava  toda  a  culpa , 
como  total  causa  de  todo»  os  males,  pois  quando 
o  posto,  o  preceito  e  a  razao  o  obrigava  a  solicitar 
a  paz,  ea  socegar  os  tumultos  dos  moradores  le- 
yantados,  influia  na  guerra,  fomentava  a  rebeUiao> 
era  parcial  nos  insultos,  e  capilaodos  ag^pressores ; 
e  que  ja  que  syas  obras  o  declaravao  mortal  ini« 
migOy  nao  se  negasse  is  obriga^oes  de  soldado  na 
commuta^ao  dos  prisioneiros,  mandando-4he  o  seu 
general  Henrique  Hua  com  os  principaes  cabos  que 
Ihe  tinha  retido,  em  recompensa  do  capilao  maior 
Jeronimo  de  Silva,  que  tinhao  preso  no  Arrecife* 
*— Andr^  Vidal,  que  com  esta  resposta  ficara  mais 
colerico  que  corrido,  nao  quiz  Gar  a  resposta  &  me« 
moria  ^  e  &  cortezia  do  enviado  y  e  tomou  por  se* 
guro  expediente  o  fskz^l-a  por  escrito;  para  que 
nem  a  adulacao^  i^m  o  pqo  podesse  viciar  o  que 


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itiMeM  a  pafdi ;  BO  qual  le  OQQjiiahM  M  t 
razoes,  como  eniao  se  dizia.  «  Se  o  espMto  nia 
»  fdrt  reaulta  da  estranh^za,  todos  nos  admiramcis  : 
»  vossaa  mercte  da  miahas  rasdu^oes,  e  eu  de  seiM 
»  iratDB;  oias  como  esies  em  yoasaa  mercte  aao 
»  faltos  por  uso ,  e  aquellas  em  mim  jitstificadas 
»  por  outtume ,  nenhum  fuDdaoiento  poderi  ter 
»  nem  em  mim  o  espanto,  nem  em  Tosaas  merote 
»  a  admira^ao.  Mandou-me  o  senhor  Antonio  Tel* 
n  ks  da  Silvai  govemador  do  Eatado ,  que  Tiesse  a 
»  esia  eapiianta  soeegar  os  tumultoa  da  rebelliao 
N  por  Tossaa  mencfts  Ibo  pedir^m ;  dei  anas  ordena 
>i  a  ezeca^ao ;  diegnei  a  ertes  In^ares,  nos  quaes 
»  nao  aohet  desobedienteSy  ackei  desfiDr^doa ;  nao 
V  adiei  rebeldes  que  castigar,  achtt  opprimidos 
n  que  fayorecer.  A  d)ediencia  que  se  deve  ao 
Ji  senhor  nao  9e  deve  ao  tyranno ;  at  leia  da  po*' 
>i  litica  ciyil  obrigio  a  obedecer  ao  principe  natural^ 
»  e  naoao  intruto.  Vosaaa  mffl*cte  malao  pat  olBoioi 
»  roubio  por  conveniencia  ^  injuriao  por  goalo« 
»  Dtgaorme :  aao  principes,  ou  piratas?  Sao  senho- 
»  rtSj  ou  lyrannos?  A  obediencia  em  tamo  i  l(*gal 
»  em  quanto  serve  ao  superior  legitimo ,  nao  em 
a  quanto  adula  o  senbor  intriiso.  Em  vosaaa  mar- 
a  cto  uao  s6  ^  falso  o  dbminio,  senao  o  iraio*  Que 
»  heran^a ,  ou  que  direito  Uies  deo  este  imperio  ? 
a  Que  engano  nao  intentao  em  todas  suas  accoes? 
9  Pois  <k>mo  jiilgao  que  a  um  governo  false  devem 
w  OS  homens  uma  fidelidade  verdadeira  ?  A  traicao 
»  mais  vil  i  a  que  resulta  da  ingratldao,  porque  se 
)»  fabrica  com  as  maos  do  beneficio.  A  necessidado 
a  obrigou  a  vosaas  mercte  a  que  pedisaem  ao  go«* 


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»  Ttraador  geral  do  Estado  favor  pan  apazigua- 
)»  rem  os  Portuguezes  de  seu  dominlo.  Vieinos  em 
M  sea  soccorroy  eu  e  os  soldados  que  me  assistem, 
n  e  descobrimos  o  iraidor  intento  d'esta  peticao, 
j»  sendo  todo  o  fim  d'ella  introdnzir*-iios  oesta  capn 
;»  pilania ,  para  que  nella  cercados  de  «uas  armas 
»  no9  consummisse  o  ferro,  a  fome  e  o  descerro; 
n  traicao  que  todo  o  mundo  vio  h  luz  das  chamasi 
n  em  que  no  porto  de  Tamandard  ard^rao  os  vasos 
>»  que  DOS  c^nduzirao  por  ordem  e  mandado  de 
»  sua  cavilla^aoy  que  temerusa  de  que  logo  desco- 
»  brissemos  o  engano^  nos  lirou  os  meios  para  o. 
»  regresso;  e  seudo  eu  neste  particular  o  luais 
1^  queixosoy  oie  querem  persuadir  o  mais  culpado« 
9  Muiio  cega  a  malicia ;  a  cegueira  da  natureza 
H  nao  deixa  yer  aos  ouiros ;  por^m  a  da  malicia  ^ 
n  Bern  aos  ouiros,  uem  a  si  mesmos;  aquellacqra- 
»  se  com  OS  remedios,  esta  augmenla^se  com  as 
»  prosperidades.  Ponderem  vpssas  mercte  de  que 
»  parte  faUa  a  verdade,  e  dessa  acharao  a  traicao. 
n  A  majestade  d*El  Rei  meu  senhor  Dom  Joao  o 
n  Quarto  nos  ordena  que  em  tudo  conserremos  a 
))  paz^  a  amizade  e  a  correspondencia  com  os  Hoi- 
»  landezes,  porque  suppoe  iguaidadeno  trato;  poi^ 
»  r^m  se  nelle  i  tanta  a  difleren^a  como  a  distancia 
».entre  um  animo  real  e  um  coracao  mercantile 
jtf  como  p6de  ser  que  se  nao  d6  por  offendidoi  me^ 
M  dindo-se  o  aggravo  pelo  excesao  dos  extremos? 
»  Maior  servi^o  Ihe  fa^o  em  me  oppor  a  injuria , 
i)  que  em  obedecer  ao  mandato ;  porque  sei  que 
da  falta  das  nocicias  nasce  a  difibrmidade  dos 


» 


»  preceitos*  £  quando^  levado  d'este  dictamen,  pe- 


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8M  GASTUOTO  tUSITANO. 

T»  que  na  interpreta9ao  de  suas  ordens^  pagarei  com 
»  a  cabeca  a  falta  da  obediencia,  por^m  ficarei  cmn 
»  a  gloria  de  a  saber  dar,  por  ganhar  o  perdido  na 
»  reputacao  d*um  Rei  que  com  fidelidade  sirro ;  e 
»  no  cullo  d'um  Deos  que  fidelissimo  adoro.  Stf 
H  morrerei  com  a  inveja  de  nao  ser  eu  o  primeiro 
9  que  desembainhei  a  espada  para  yingar  uns  e 
M  outros  aggravos ;  mas  tambem  com  a  dita  de  ser 
»  o  segundo  a  respeito  d*um  varao,  que  nao  tem 
»  primeiro.  Em  quanlo  ao  requerimento  de  tro- 
»  car  prisioneiros ,  facil  f6ra  o  despacho ,  sendo 
»  todo  o  interesse  nosso,  pois  nos  pedem  quatro 
»  cabos  a  troco  d*um  capitao ,  quatro  Flamengos 
D  por  um  Portuguezy  dando  a  uns  e  outros  sen 
)»  inirinseco  valor ;  por^m  o  general  Henrique  Hus 
A  com  todos  OS  mais  rendidos  ha  dias  que  forao 
»  remettidos  A  Bahia  &  disposi9ao  do  govemador 
»  g^ral  do  Estado ,  onde  chegou^  menos  o  sargento 
M  maior  Joao  Blar,  aquem  os  moradores  d'um  lu- 
»  gar  matarao  com  quatro  ballas^  porque  ihes  de- 
»  via  mais  que  uma  vida ;  e  ja  que  os  prisioneiros 
n  reFeridos  se  nao  remettem  (por  sujeitos*  a  outra 
»  jurisdiccao)  aconselharei  que  yossas  mercds  os 
1  mandem  pedir  a  Bahia ,  que  com  facilidade  se 
»  darao  a  todo  o  barato,  por  nao  ser  fazenda  da  lei. 
>}  Os  que  estao  em  nosso  poder  nao  tem  gosto  de 
»  yoltar,  porque  militao  entre  nos  mais  por  sua 
n  conveniencia  que  por  nossa  necessidade;  que 
»  nao  necessita  de  rendidos  quern  os  p6de  render.  » 
Com  esta  resposta  despachou  Andr6  Vidal  o  en- 
yiado. 
XX.  Por  algum  tempo  esteve  suspenso  o  exer-* 


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GASTBIOXO  LUSITAKa  ftM 

cicio  das  annas  eutre  os  nossos ;  porem  os  gover- 
nadores  d'ellas  sem  interrupcao  de  tempo  laboravao 
na  disposicao  de  seus  progresses  e  intentos.  Consi- 
d^ravao  o  quaitto  importava  para  o  fim  da  empresa 
nao  desistir  da  continua9ao  da  guerra ;  chamarao  a 
eonselho  os  priocipaes  cabos  do  exercito ;  propo- 
serao  o  negocio,  e  como  os  votos  erao  resulta  de 
varios  affectos,  forao  diversos  os  pareceres,  aioda 
que  ditados  pelo  valor,  pela  prdtica,  pela  industria^ 
e  pelo  zelo  todos.  Muitos  conviSrao  que  se  refor- 
masse  o  Arraial  velho,  e  que  fortificada  neUe  a  uossa 
gente  saisse  a  iufestar  e  reprimir  o  ioimigo,  apro- 
yeitando  as  occasioes  que  Ibe  d^sse  o  tempo.  Alguns 
approTarao  a  voto ,  e  reprovarao  o  sitio ;  outros 
tiiihao  para  si  que  o  mesmo  lugar,  onde  de  pre- 
sente  se  alojavao,  era  o  mais  conveniente  para  o  fim 
que  se  pretendia ;  e  todos  autorizavao  suas  opinioes 
com  OS  fundamentos  de  seus  dictames.  —  0  gover- 
nador  Joao  Fernandes  Vieira  com  melhor  escoiha, 
I)orque  com  mais  advertencia>  disse,  que  nao  con- 
vinha  acurralar  o  poder  na  circumvalacao  d'um 
arraial ,  porque  incluso  nelle  serviria  a  defensa  e 
nao  a  conquista,  e  seria  obrar  contra  a  teucao  de 
invadir  levantar  paredes  para  guardar ;  e  cortar  o 
fio  as  victorias  com .  a  mesma  espada  com  que  se 
venc^rao  as  batalhas^  dando  a  en  tender  ao  Fia- 
mengo,  ou  que  nossa  ofiensa  se  satisfazia  com  tao 
pequena  vingan^a,  ou  que  o  nosso  valor,  temeroso 
da  vizinhanca  de  suas  pracas,  fazia  p^  atraz  na  cor- 
rente  de  seus  progressos.  Que  seu  parecer  era,  que 
o  nosso  poder  cingisse  todas  as  forcas  inimigas  em 
quarteis  tao  vizinhos  que  se  nao  perdessem  de  vista 


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3S0  CA8TEI0T0  UTSTTAlia 

nem  os  inimigos,  nem  os  parciaes,  e  que  na  mesma 
divisao  ficasse  o  poder  unido ;  que  para  guarda 
d'armas,  municoes  e  mantimentos  se  edificasse  uma 
fortaleza ,  debaixo  de  cuja  vista  e  amparo  ficasse 
toda  a  cirumrerenciai  da  qual,  como  do  coracao,  se 
communicassem  espiritos  a  todo  o  precinclo  do 
cerco.  Este  voto  tiverao  (ambem  o  Camai aq  e  Heur 
rique  Dias ,  e  logo  o  seguirao  (odos  os  mais  cabos. 
—  Conformes  nesle  parecer  se  applicirao  os  nossos 
cabos  a  execuqao  dVUe.  ReparU'rao-se  os  sitioSi 
que  escolheo  a  arte,  pelos  capitaes  que  tioliao  es- 
colhido  a  opiniao  na  fdrma  seguinte.  A  paragemi 
chamada  deSebasliao  deCarvaiho,  se  deo  ao  Cama- 
lio  para  quartet  do  seu  ter^o  por  ser  entre  lodas  a 
mais  arriscada ;  a  que  se  chamava  de  Joao  Velho 
Barreto,e  ficava  a  tiro  de  peca  da  cidade  Mauricea, 
se  entregou  a  Henrique  Dias  :  servia-lhe  de  irmr 
cheira  pela  frente  o  rio  Gapeberibe .  que  por  aquetle 
sitio  se  vadea  de  baixamar;  uos  sitios  das  Salinas, 
carreira  dos  Mazembos  e  villa  de  Olinda,  se  consi- 
gnarao  tres  estancias,  nas  quaes  se  haviao  de  forlifi- 
car  OS  capitaes  da  terra  e  os  da  Buhia,  para  que  uns 
industriassem  os  outros  no  terreno  e  nas  veredi^s 
d'elle.  Mais  se  mandarao  guarnecer  as  estancias  da 
villa  ^t^  o  rio  Doce,  por  cujos  arrabaldes  e  pela 
praia  do  marse  ordenou  andassem  sempre  as  tropas 
de  cavallo  que  havia  com  algumas  companhias  vo- 
lantes,  que  ^ervissem  de  guarnicao^  e  sentiuellas 
nas  disiancias  que  nao  permittiao  quarceis.  Do  re- 
manecente  de  ofBciaes  e  soldados  se  formou  um 
grossOy  que  assistisse  aos  nossos  governadores  pa- 
ra darem  soccorro  a  todas  as  partes,  onde  o  pediase 


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a  OMeMdade  €  a  oocasiao,  ^iiiados  em  poMo  ^fmre^ 
niente  at^  que  tiTessem  alojamento  cerio  na  (wUt- 
ieza  que  8e  ha  via  de  fazer. 

XXI.  Sobre  a  escolha  do  lugar  para  a  situacao 
da  fortaleza  houre  a  mesma  diTersidade  de  pare- 
ceres ;  mas  seguioae  igualmente  o  voto  de  Joao 
Fernandes  Vieira ,  e  foi  esco(bida  uma  emiiraicia 
que  a  naiureza  levani^a  pegada  ao  engenho  j  que 
86  dizia  do  Bribao,  umakgoa  do  Arrecife,  a  qual 
tinha  lodos  os  requisites  para  asseuto  da  fortaleza^ 
cuja  escoiha  nao  podia  ser  suffpeita  por  parte  do 
nosso  govemador,  porque  destruia  fertiUMonos 
canaveaes  de  tres  engenhos  seus.  Um  estnmgeirOi 
perito  na  arte  da  fbrtinea^ao,  deliuiMi  a  plania  do 
ediBcio  com  a  grandeeae  a  capacidade  que  ttie  pior- 
tou  o  desejo;  e  no  fin  deSeiiemhro  se  Ihe  poe  a 
primeira  mao.-^Para  trabaihar  na  obra  concorroo 
o  govemador  com  todos  seus  cscravos;  e  k  sua 
imita^ao  os  moradores  com  todos  os  que  tiobio, 
que  ajudados  das  companhias  por  giro  d^rao  pi<m- 
cipio  e  fim  i  obra  em  tres  meces,  tempo  em  que  pe 
fez,  c  se  aperfeicoou  com  reparos,  plata-formas, 
esplanadas,  coritra-escarpas,  pontes,  cavas,  trinp- 
eheiras,  palicadas,  e  tudo  o  mais  concerrienie  e 
proporcionado  com  a  majestade  da  pra^;  e  tao 
bem  acabada  que  a  oihava  a  arte  com  admira9ao, 
e  o  odio  com  receio.  Oilo  pecas  de  bronze,  que  o 
inimigo  nos  deixou  no  porio  do  Calvo,  se  poadrao 
Bella ;  com  as  t]uaes  se  deo  a  primmra  salva  eifl 
dia daCircamcizao  do  anno  de  1646,  festejando o 
tnysterio  que  Ihe  deo  o  nome  de  fortaleza  de  Bom 
Jesus;  a  euja  sombra  os  moradores edifio&iio  uma 


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353  CA8TRI0T0  tU61TAN0« 

povoa^to,  para  a  qual  coocorr^rao  de  muiUs  partes 
of&ciaes  meoanicos  de  todas  as  artes  de  que  neces- 
sitava  o  servi^o  publico ;  e  formarao  em  pequeno 
campo  um  Tistoso  lugar,  ao  qual  d^rao  nome  de 
Arraial  novo,  a  differeo^a  do  antigo. 

XXII.  Via  Joao  Fernandes  Vieira  ociosas  as 
armas  de  seus  soldados,  e  desajava  achar  em  que 
as  empregar;  discorria  comsigo  mesmo  sobrc 
qual  das  fortificagoes  inimigas  poderia  cair  com 
melhor  succeso  o  assalto  de  nossas  armas ;  medio 
sua  memoria  a  cada  uma  das  fortalezas  do  Arrecife 
oomo  versada  em  todas ;  cotejour-lhe  os  sitios,  a  ar- 
iilharia  e  os  presidios  ^  e  assentou  comsigo  que  a 
fortaleza  chamada  das  Cinco  Poutas,  situada  na 
praia  do  mar  sobre  a  barreta ,  um  tiro  de  mosqu^ 
da  cidade  Maurioea,  era  a  que  com  menos  risco  se 
podia  ganhar,  se  pelo  escuro  d'uma  noite  se  ia- 
vestisse  a  escala.  Com  esta  8upposi9ao  mandou  fazer 
OS  apprestos  necessarios  com  tat  s^^redo,  que  nia- 
guem  desconGou  para  que  fim  erao.  Posta  a  geote, 
que  Ihe  pareceo  necessaria ,  junto  ao  rio  Capebe- 
ribe^  chamou  aos  mestres  de  campo,  e  Ihes  com- 
municou  sen  designio,  para  o  qual  nao  pedia  con- 
selho,  senao  para  o  modo  com  que  se  havia  de 
obrar,  desculpando  o  recato  com  o  receio  de  que 
se  adiantasse  aigum  aviso  traidor  a  prevenir  o  ini- 
migo. — Era  TbeodozioEstratero  maismoderno,  e 
faliou  primeiro ;  com  razoes  mui  solidas  e  coriezes 
reprovou  o  projecto  do  governador,  dizendo  que  elle 
melhor  que  ninguem  conbecia  o  estado  da  forta- 
leza^  as  tropas  que  a  guarneciao,  e  o  animo  com  que 
estavao  para  a  defenderem ;  ponderou  que  nao  era' 


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GASTliOTO  LimiTAlK).  S5B 

impossiTel  tom&r^se,  mas  que  haviamos  de  perder 
trezentos  ou  quatrocentos  homens,  e  entre  elles 
lalvez  alguns  cabos,  cuja  falta  seria  irreparavel; 
que  depots  d'elta  tomada  nao  teriamos  maiiicdes 
nem  mantimentos  para  a  conservar^  nem  exercito 
ou  esquadra  para  a  proteger,  e  concluio,  dizendo  : 
<K  Advirto  a  vossas  senhorias  que  o  Flamengo  a 
»  esta  hora  nao  possue  em  toda  esta  costa  mais 
»  queaspracas  do  Arrecife,  cidade  Mauricea,  rio 
»  de  Sao  Francisco,  Paraiba  e  Rio  Grande,  e  que 
»  todo  o  basttmento  d'ellas  sai  da  ilha  d'ltamaraci 
*>  de  que  estao  senhores ;  nenhum  goipe  Ihe  cor- 
»  tara  mais  depressa  a  vida  que  o  que  mais  Ibe  eu- 
»  f  rar  pela  garganta ,  e  assim  sou  de  parecer  que, 
»  sem  largarmos  as  armas,  aproveitemos  o  movi- 
»  mento,  e  trocando-lhe  os  6ns  ^  demos  sobre  a 
»  ilha  dltamaraca,  que  sem  duvida  ac^aremos  tao 
7}  falta  de  resistencia  como  alheia  de  nossa  reso- 
»  lucao. » 

XXin.  0  parecer  de  Estrater  foi  approrrado  por 
todos  OS  cabos ;  e  logo  se  coroecou  a  p6r  em  pratica. 
Depois  d'entregar  a  Henrique  Dias  a  defensa  do 
sitio  9  e  dlspostas  todas  as  cousas  como  convinha , 
marchou  o  govemador  com  os  mestres  de  campo 
Andr^  Vidal,  Theodosio  Estrater,  e  Dom  Antdnio 
Camarao  em  direccao  &  ilha  de  Itamaraca.  —  Em 
14  de  Settembro  chegoii  a  nossa  gente  a  Tilla  d'l- . 
guaracii,  onde  nossos  governadores  mandarao  ape- 
nar  todos  os  barcos,  lanchas,  canoas  e  jangadas, 
para  que  a  certa  hora  estivessem  prestes  na  barra 
do  rio  Catuama ;  e  sem  detenca  march^rao  por  terra 
a  buscar  a  ilha  pela  banda  que  olha  para  o  norte^ 
J.  23 


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sfift  ciimaivo  mwmm. 

E$*an  por  aipieUa  parte  (lifepdida  a  pr^^mgnin  4^ 
rio^  que  divide  a  Uba  da  terra  firim»  oom  uma  Aao 
flamenga  bem  artiUiada,  e  melbor  guarowida  de 
HoUaiideza»  e  lodiog;  e  aeio  a  nio  ae  randar  pao 
ae  podia  a  paasagwi  franquear.  Para  aate  effaito 
jaandarlK)  apr^atar  urn  barco  graoda  a  wn  batel 
com  earn  homeaa  de  guamicao  aa  ordeos  do  capitao 
Siomd  Meaie$f  eom  praceito  de  veacer  ou  inon*er 
na  demanda*  De  boga  arraocada  inveatirao  e  abal- 
roarao  a  vAop  na  qual  acbarao  tao  dura  resigtaacia, 
que  rebatidos  d'ella  vgltarao  alraz^  nao  para  deixa- 
rem  aempresai  ^oao  para  reforcaremo  iinpeto* 
InTeitlrao-na  ^unda  yez  com  dobrado  animo,  e 
resoltt^  tao  firme  que  a  entr^rao  e  read^o  a 
^uata  de  nuiito  aaogue  bollaudez  e  aigum  uosso. 
Deixou  a  entrepreia  da  nao  a  paaaagem  franca  da 
terra  para  a  ilhai  a  qual  pa^a^rao  os  nossos »  nos 
vaaos  que  eatavao  prevenidost  coin  trabalho  nao  so 
por  causa  do  numero  de  gente  senao  pela  largura 
do  no,  qu«  era  de  quaai  meia  legoai  e  ser  aiada  ne- 
oeaaario  eaperar  a  conjupcao  da  mar^t 

XXIV.  Fassada  tpda  a  gf nte  a  outra  parte,  e  for- 
mada  ua  ilba  aem  ruipor  naiaa  tiro ,  aoonteceo  dar 
naa  maoa  de  uoa^as  senUnellas  uma  Flamenga,  que 
vinba  fugida,  a  qual  ae  offereceo  aos  nossot  gorer- 
nadorea  para  guiar  os  uoasos  aoldados.  Confiado  na 
guia  mandou  o  goveroador  da  liberdade  picar  a 
marcha,  daudo  a  yanguarda  a  Tbeodozio  Estrater, 
0  qual  foi  aeguindo  a  Hollandeza ;  ia  a  pos  elle  o 
aargento  maior  Antonio  Dias  Cardozo  com  urn  ba* 
talhao  de  moradpres;  e  na  relaguarda  Joao  Feiw 
nandes  Vieira,  e  o  mestre  de  campo  Andrd  Vidal 


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(usniOTO  uniTiLM.  M6 

wm  o  Tt9tMii/t  da  gaote.  Havia^^se  il'atraveaaar  a 
iiha  por  trea  kt^Ma  de  dtitanoia  de  aorte  a  aid  para 
ie  buaoar  a  yilki  onde  o  inimigo  Unha  a  aua  forta^ 
IfiM  6  o  0eu  alojameato.  ResolyAraoHie  que  mediasa 
a  marcba  pelaa  boras  da  noite^  e  pela  <Ustaiicia  da 
terra ,  de  sorte  que  aobre  a  madrugada  te  chagMia 
a  ayistar  a  |)OYoe9aa.  A  Flamenga  que  guiava  o  Sa^ 
trater,  ou  por  ignorancia  ou  por  malicia,  o  leyou 
por  caminho  assim  iorddo  e  desviado,  que  era 
nianha  olara ,  e  nao  via  a  que  parte  ficara  o  lugar. 
O  sargento  maior,  mail  pratico  no  terreno  e  meiioa 
confiado  nas  promeasas  da  esiraDgeira^  deavioutad 
do  &tro^  com  deixar  de  aeguir  o  deario^  e  ao  ram** 
per  da  manha  ae  aohou  junto  in  trincbeintt  do 
contrario,  sem  ter  Tiata  ou  noticia  nem  de  sua  vann 
guarda  nem  do  esquadrao  da  retaguarda  em  qua 
vinhao  Andr^  Vidal  e  o  govemador ;  fez  oonta  da 
gente  oom  que  ae  achara^  e  di8p61-a  em  forma  pro^ 
longada  para  dngir  a  pra^  por  aquelia  parte.  6uo« 
oedeo  naquella  hora  salram  da  villa  algumaa  Indiaa, 
umas  a  mareiacar,  outraa  a  busear  agoa^  e  darem 
de  roato  com  a  noasa  gente ;  voltirao  todas  de  oar^ 
reira  para  dentro  da  fortifica^o  dando  grandea 
griioa.  Osnossoa  que  ae  virao  deacubertoa  saguifao 
as  Indias ,  augmentando  a  toz  do  rebate  com  o  ea^ 
trcmdo  da  invaaao,  que  aervio  de  oortar  o  somtib,  e' 
mtroduEir  o  sobressito  noa  ytainhoa  e  aoldadoa  do 
presidio.  -*-  Aquelle  mesmo  tumuiio  que  chamou  o 
inimigo  para  a  defenaa  ebamou  tambem  para  o 
avanco  o  govemador  e  ao  meatre  de  campo  que 
com  o  esquadrao  da  retaguarda  chegavao  pela  outra 
parte  as  trincbeiras  da  povoa^o ,  e  preaumindo  a 


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356  G4STBI0T0  LUHTANa 

causa  do  reforido  alvoroco  tocarao  a  inyeatir^  e  sem 
resistencia  a  ganharao,  com  os  almazens  das  muni- 
coese  mantimentos  do  inimigOy  que  por  acudira 
parte,  onde  o  chamava  o  brado^  desemparou  o  lugar 
onde  com  mais  damno  o  feria  o  golpe.  0  sargento 
maior,  que  com  08  seua  soldados  fora  em  segui-  - 
mento  das  Indias  pelas  portas  das  trincheiras,  que 
esUvao  abertas,  os  repartio  em  mangas  com  ordem 
que  patsassem  a  espada  a  todos  os  Indios  que  se 
alojassem  por  aquella  parte ,  o  que  se  obrou  com  o 
estrago  que  permittio  o  repente  e  o  indefeso«  •* 
Chamados  do  estrondo  das  armas  j  e  da  voz  do  es- 
panto  yierao  acudindo  estrangeiros  e  naturaes  a 
tomar  as  bocas  das  ruas,  porque  o  destro^o  nao  pe- 
netrasse  o  interior  da  villa.  Com  a  opposicao  se 
augmeutou  o  furor ;  e  se  augment ^rao  os  golpes 
com  a  chegada  de  Theodozio  Estrater,  a  quem  a 
desconfianca  da  detenca  obrigava  a  mostrar,  que 
HBO  tivera  parte  nella  nem  o  descuido  nem  a  ma- 
licia.  Carregado  o  inimigo  do  temor  e  dos  golpes 
se  foi  retirando  para  a  sombra  da  fortaieza,  bus- 
eando  o  amparo  de  sua  artilharia,  com  a  qual  nos 
fez  oonsideravel  damno  ^  porque  os  nossos  embe- 
Udos  no  goBto  da  victoria  desprezavao  o  perigo  das 
balas. 

XXV.  Ganhada  a  primeira  fortifica^ao,  se  man- 
dou  fortelecer  o  interior  d'ella,  porque  o  inimigo 
perdesse  a  esperauQa  de  a  recuperar ;  o  que  o  sar- 
gento  maior  executou  com  toda  a  presteza  e  arte, 
de  sorte  que,  fazendo  o  Hollandez  algumas  inves^ 
tidas  para  a  cobrar,  foi  sempre  rebatido,  e  casti- 
gado  tao  rjgorosamente,  que  aconselhado  da  perda 


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GASIEIOTO  LUSITAMO.  357 

desistio  da  porfia.  Nao  desistirao  os  nossos  de  con- 
tinuar  a  empresa,  proseguiodo  no  ataque  da  forta- 
leza^  que  estava  cingida  de  repetidas  estacadas^  e 
dilatado  fosso.  Durou  o  combate  desd'a  primeira 
bora  da  manha  at6  ^s  cineo  da  tarde.  Com  incaa- 
savel  bra^o  romp^rao  os  nossos  por  todas  as  oppo- 
siloes  da  resistencia  ate  porem  as  maos  na  porta  da 
fortaleza^  a  tempo  que  muitos  d'elles,  metidos  nas 
casas,  procurarao  sublr  e  ganhar  os  baluartes ;  o 
que  veudo  o  ioimigo ,  e  ignorando  o  damno  que 
sua  artilharia  nos  havia  feito^  fez  signaes  de  reudido 
pedindo  bom  quartet.  Festejarao  os  nossos  a  cba- 
mada  com  o  pregao  da  victoria,  e  como  se  a  desoiv 
dem  nao  cbam^ra  pela  ruina ,  se  derao  a  roubar^ 
perdendo  com  o  desmancho  aquelle  valor  que  Ihes 
dava  a  f6rma.  Forao  os  soldados  da  Bahia  os  pri« 
meiros  que  a  desobediencia  levou  ao  sacco ;  e  a 
maior  parte  dos  outros,  que  persuadio  o  exemplo, 
at^  as  proprias  armas  largarao  para  se  applicarem 
com  todas  as  maos  ao  roubo^  dando  occasiao  a  que 
obrassea  cobi^a  o  que  nao  pud^ra  a  maior  desgra^a. 
Os  Indies,  desenganados  de  que  a  nenhum  se  havia 
de  dar  q\iartel,  e  desejando  morrer  vingados^  ani- 
m^rao  com  a  desordem  dos  nossos  a  froxidao  dos 
Flamengos  a  nao  perderem  a  occasiao  que  Ihes  diva 
0  tempo  para  melhorarem  de  fortuna.  Sairao  de 
tropel ,  derao  sobre  os  desgarrados  com  tal  furor  e 
animo  que  foi  necessario  aos  officiaes  portuguezes 
todo  o  coracao  e  todo  o  bra90  para  Ihe  sustentarem 
o  impeto;  e  seria  irreparavel  o  damno,  se  o  gover- 
nador  Joao  Fernandes  Vieira  nao  tivesse  ordenado 
ao  sarg^ito  maior  que  com  algumas  companhias 


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de^ntcrco  guarnecesse  as  trincheirts  ganhachs 
prfa  parte  externa  para  rebater  qtialquer  soccorro 
que  podesse  Yir  ao  inimigo,  M  qmm  servirao  de 
remedio  para  nao  ftigirem  os  itossos.  —  Aquelta 
mesma  opposfcao  que  deteve  a  fiigida  dos  Portu- 
guezes,  corfou  o  fio  4  victoria  dos  Ftamengoaj 
porque  julgando  ardil  o  que  era  necessiikde ,  e  te« 
mendo  que  os  nossos  commettessem  segunda  Tec  a 
escala,  se  rctirou  4  fortaieza.  ConhecSrao  os  nossos 
govemadores  pek>  effeito  a  causa,  e  confirmarao  o 
inimtgo  qa  suspeitii  com  tanto  artificio,  que  o  sar- 
gento  maior^  seguindo  as  ordens  recebi^s ,  se  ibi 
retirando  na  retaguarda  do  exeircito  coin  pasao  tao 
vagaroso,  que  fexfa  crer  ao  kiimigo  nao  se  deixar  a 
einpreaa,  se  nao  mudar^se  a  (6rm9L  a  investida.  Para 
melhor  assegurar  a  retirada,  mandouo  goremador 
duas  coMpanKias  que  tomassem  a  passagem  do  rio, 
e  iiTessem  fH^les  todos  os  barcos  para  que  naquelkt 
noite  se  posesse  toda  a  genie  da  outra  parte ,  o  que 
se  executou  sem  nenhum  inconretiiente.  Dqiois 
d*a!gumas  boras  de  descatieo  e  refei^  Hiardiarao 
OS  nossos  para  Igoaracu ,  levando  comsigo  os  dcs- 
pojos  que  tirjrao  da  villa  e  sens  conlornOB,  os  fo- 
ridos,  queerao  settenta,  velame,  mantimaitos  e 
artittiaria  que  tirAreo  da  nao  que  veiidArao  (erao 
quatro  pecas)  deixsmdo  o  casco  eonsummido  do 
fogo.  Em  IguaracA  flzerao  aho,  e  resenha  da  gente, 
e  pefas  listas  vfrao  que  na  batalha  fie4i*o  settenta 
ttortos,  sendo  trinta  e  quatro  estrangetros  do  terco 
de  Estrater,  cuja  inatencao  e  custume  de  roubar  nos 
tirou  a  victona  dasmaos,  com  a  desordem,  ecom 
«  «MD^plo.  Perdeo  o  inknigo  neste  ooeaaU^  pw 


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cimt  de  dasentos  eDldadot  entre  Holltndezes  e 
iiidiot  J  ^endo  muito  maior  o  numero  de  faridos. 

XXVI.  Poftto  que  a  victoria  neata  oocatiao  noi 
▼iraase  as  coataa,  nam  por  isao  mereoem  maiioa 
dogio  OS  eabos  e  soldadoa  que  entrirao  nesta  eiii»- 
preza ,  oa  quaes  eom  o  despreao  do  perigo  acredi* 
iAno  o  snbido  do  valor.  Ao  goYemador  Joao  Fer^ 
nandM  Yieira  buacon  o  peito  uma  bala^  qiae  aem  o 
oflfender  caio  a  seus  p^ ;  outra  Ihe  lavou  uma  ma- 
deijui  de  cafaelloa,  sem  Ihe  offender  o  roalo«  Ao 
meatre  de  eampo  Andr^  Vidal  deo  um  peburo  noa 
feeboa  da  piatola ;  eomo  ae  forao  sobejaa  as  armaa 
onde  erao  tantaa  as  forcas.  Ficou  ferido  o  govov 
nador  dos  Indioa ;  eamollando^^e  com  aau  sangue 
o  fino  onto  de  sea  valor.  Duas  baUs  ferirao  o  ca^ 
pitao  Assenso  da  SiWa ;  temeroso  do  braqo  o  bus<- 
cava  de  eompanhia  o  perigo*  0  sargento  maior  Caiv- 
dozo  foi  naste  stiocesso  o  al  vo  da  JDveja  e  do  espanto 
d'uma  e  ootra  gente  :  por  eotre  dmveiros  de  balas 
andou  todo  o  tempo  <k  batalha  no  mats  ariscado 
d'dla^  com  tamanho  coracao  e  presfeeza^  que  n&- 
ahQBQa  o  p6de  ferir^  porqiie  uenhuma  o  pods  asae^ 
gurar  com  ponlaria  cerCa/Oa  mats cabos  e  officiaas 
com  a  genomlidade  daa  proexaa  impadirao  as  parw 
ticttiaridades  da  kmbran^. 

XXVU.  Detave-M  a  nossa  gente  em  Ignara^u 
aquelle  tempo  que  foi  neoessario  para  foriiiiear  e 
gnameoar  a  povoacao  e  os  camidios  que  podiao 
aerrir  as  correrias  do  inimigo,  quando  intentasse 
aair  da  ilha  a  inieslar  a  terra  firme.  Pastas  as  cou- 
ass  na  mdhor  forma  que  foi  possivel^  po^^se  o 
►  eouicalD  am  marcha>  e  cbqppu  ao  afejattciilo 


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560  cAimKm)  LOiixAiia 

da  Varzea^  onde  a  presenca  dos  goveroadores  com- 
municou  novo  alento  aos  soldados  que  guameciao 
as  eslancias ,  para  sairem  victorioaos  dos  rebates , 
asaaltos  e  encontros ,  em  que  cada  hora  se.  viao  a 
bracos  com  o  inimigo,  que  acurralado  nas  fbrlalezas 
do  Arrecife  padecia  as  condicoes  de  yeaddo^  e  as 
ffescommodidades  de  cercado.  Com  favoraveis  suc- 
cessos  nos  encaminhavao  as  armas  ao  fim  desejado, 
mas  para  que  os  homens  se  nao  es?aecessem  com 
as  prosperidades ,  permittio  o  ceo  que  oa  cidade 
da  Paraiba  desse  um  mal  cootagioso  que  pelos  ef- 
feitospareceoramo  de  peste  :  ateaya-sesem  reparo, 
crescia  sem  tempo  i  e  matava  sem  remedio.  Come- 
9ava  em  cerra9ao  do  peito,  e  logo  a  defluxao  se  ma- 
uifestava  em  pontadas ,  e  com  dores  de  jdeuriz ;  a 
alguns  matava  de  r^fimte;  a  outros  em  poucas 
horas ;  aos  que  menos  apertava  nao  passavao  de  tres 
dias.  Os  medicos,  que  nao  conheciao  a  causa  do 
mal,  nao  Ihe  sabiao  applicar  remedio ,  assentando 
entre  si  o  ser  ar  inficionado  e  corrupto ;  e  com 
mais  certeza,  quando  virao  a  pressa  com  quefoi 
contaminando  uma  e  outra  vizinhan^a  at£  chegar 
ao  nosso  alojamento  de  Pernambuco.  Morr^rao  em 
todas  as  partes  innumeraveispessoas  semdistinoqao 
de  Portuguezes,  Flamengos,  Indies  e  escravos ;  e 
08  que  nao  morr^rao  viviao  em  grande  afflicfao  e 
tristeza,  parecendo  a  todos  que  era  chegado  o  ul- 
timo fim  dos  mortaes.  Teve  este  mal  principio  em 
OS  ultimos  de  Settembro,  e  durou  at^  os  primeiros 
de  Dezembro ;  foi  perdendo  a  forca  com  a  durafso 
'  e  com  a  experiencia  dos  remedies  sendo  um  efficaz 
a  mais  copiosa  sangria,  com  o  qual  muitos  se  sal- 


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CASTIUOTO  LDStTAMa  361 

virao.  Muito  sentirao  o&  nossos  governadores  o 
golpe,  que  este  mal  deo  no  exercito,  que  levou  a 
muitos^  cuja  falta  a  saude  sentio »  como  de  compa- 
nheiros^  e  a  occasiao  como  de  soldados. 

XXVIIL  Por  este  tempo  fizerao  os  moradores  um 
manifesto  ou  instrumento  juridico  por  todos  assi- 
gnado  para  enviarem  &  majestade  de  seu  Rei ,  des- 
culpando*$e  de  faltarem  a  obediencia,  que  deviao  a 
seus  reaes  decrelos,  com  as  tyrannias  com  que  os 
Uollandezes  os  obrig^rao  a  tomar  as  armas,  e  com 
as  razoes  que  tiverao  para  acclamarem  a  Joao  Fer- 
nandes  Vieira  por  geu  governador ;  o  muito  que 
Ihe  devia  a  liberdade  do  Estado,  e  a  reputacao  do 
reino ;  o  valor,  a  fidelidade ,  a  prudencia  e  a  in- 
dustria  com  que  sublevados  os  povos  d'aquellas 
capitanias  da  tyranna  sujeicao ,  em  que  as  tinha 
posto  o  HoUandez ;  a  fazenda  que  tinha  despendido 
no  sustento  dos  exercitos ;  os  riscos  a  que  expps^ra 
a  yida  nas  batalhas ,  devendo-se  &  sua  constancia  e  a 
sua  fazenda  as  victorias,  por  meio  das  quaes  se 
viao  aquelles  povos,  no  estado  presente,  com  liber- 
dade para  o  exercicio  da  religiao ,  e  para  as  utili- 
dades  da  coroa ;  e  fechavao  o  discurso ,  manifes- 
tando  a  confian^a  em  que  viviao  de  que  sua  real 
clemencia  e  magnanimidade  os  nao  ha!via  de  des- 
emparar,  quando  de  sua  grandeza  esperavao  os 
soccorros  necessarios  para  levarem  ao  fim  uma  em- 
presa  de  tanto  servico  para  Deos,  como  gloria  para 
a  nacao,  em  que  mais  os  empenhava  o  zelo  da  (i 
que  a  conservacao  das  fazendas.  0  que  todos  jurarao 
ser  assim ;  e  tomavao  a  Deos  pos  testemunha  de  que 
em.  tudo  diziao  verdade ,  e  o  firmarao  de  suas  let- 


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SM  CABTMOtO  LOSITANa 

(ras  c  signaes,  Fez-se  esfc  paipel,  c  se  assignoti  aos 
7  de  Outubro  de  i  645  ( o  governador  e  os  tre« 
mestres  de  campo  nao  assignirao) ;  e  depois  de  re- 
conhecidas  as  firmas  por  um  tabcH&o  publico,  se 
remetteo  ao  govemudor  g^ral  do  Estado  Antonio 
Telles  da  Silva ,  para  que  o  enviasse  a  Portugal, 
se  Ihe  parecesse.  Se  a  curiosidade  do  leitor  desejar 
Ter  OS  nomes  de  todos  os  que  assign&rao,  e  a  mate- 
ria do  manifesto  mais  i)or  exlenso,  tudo  achar4  no 
autor  do  yaloroso  Luzideno ,  folhas  247,  que  n6s 
deix&mos,  por  carta  de  nomes. 

XXIX.  Temos  fallado  de  todas  as  capitanias  de 
Pernambuco  onde  se  appellidou  a  liberdade,  resta- 
ttos  porim  ainda  a  dar  noticia  do  que  succedeo  no 
Rio  Grande,  em  cuja  rela^ao  tera  mais  parte  o  sen- 
timento  que  o  jubilo.  Settenta  legoas  do  Arrecife 
para  o  iiorte  desagua  no  mar  o  Rio  Grande,  ficando- 
Ihe  a  cidade  da  Paraiba  quarenta  e  cinco  fegoas 
para  o  sul.  0  cabedat  da  corrente  Ibe  deo  o  nome ; 
e  o  tomou  de  sua  vizinhanca  uma  povoacao  de  Por- 
tugnezes  que  alii  ediBcou  a  conveniencia  da  barra 
e  a  fertilidade da  terra.  Nella  fabricou o Hollander 
uma  fortaleza  quando  se  fez  senbor  de  toda  a  ca- 
pitania ;  tanto  mais  custosa  quanto  mais  longe  dos 
soccorros  pela  distancia  do  Arrecife;  razao  que  o 
fazia  absoluto  e  insolente  no  trato  e  no  imperio  ao 
governador  d'ella,  por  appellidoGosmao^  ao  qual 
suas  tyrannias  fizerao  bem  conhecido,  porque  sabia 
que  em  igual  distancia  iicava  aos  miseraveis  sub* 
ditos  a  Bahia  para  o  remedio,  fe  o  Arrecife  para  «i 
queixa.  A  todas  as  mais  partes  do  imperio  hoUan- 
def.  chegou  a  notteia  da  subleva^o,  on  guiada  da 


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diligenda  do  avitk),  ou  dd  br ftdo  da6  victorias ;  p<v 
r^  ao  Rio  Grande  por  nenhuma  via  eh«gou,  fanto 
porque  impedida  da  distancia^  quattto  porque  con 
tada  da  cautela.  Nao  delinqtiirao  aqtleUes  mora^ 
doted  conti^a  osdominantes  nem  com  a  iinaginai;ao, 
porque  a  ignorancia  m  escti^va  da  milicia ;  mas 
que  importa^  se  para  o  tyranno  tanto  val  a  culpa 
como  a  iunocencia !  Viviao  aquelles  moradores  so* 
cegados  :  o  custume  da  snjeicao  os  linha  esqae* 
ddoa  da  liberdade,  e  como  nao  conhecArao  diffe* 
renea  na  ftfrma^  j4  naoeslratihaf  fto  a  de  opprimidos. 
*—  Succedeo  em  1 6  de  Junho  o  tragico  golpe  de 
Gonhaid,  que  ja  referimos ;  ouvlo-se  bo  Rio  Grande 
ami  espanCo  a  craeldade  do  suceesso ,  e  lodos  os 
moi^adwes  forao  efitrados  de  8U»to  e  despanio ;  es*- 
foroavao^se  os  Hollandeftes  por  os  eat  mar,  dizendo 
que  erao  homens  rebellados,  e  que  09  senhorcs  do 
govemo  fari&o  diligencia  para  os  prenderem  e  en- 
forcarem  todos ;  mas  os  habitantes  nao  derSo  on- 
▼idos  a  estas  vozes,  pela  experiencia  que  tinhao 
das  promessas  flamengas,  e  sew  receio  subio  de 
ponto  quando  se  espaihou  a  voz  de  que  os  mesmos 
HoUaiklezes  e  Tapuyas  que  tii!ib&o  assoladoGunha& 
vinhao  marchacido  para  o  Rio  Grande ,  e  tinhao 
escalado  uma  casa  forte  do  engenho  de  Joao  Leitao, 
onde  sonberao  que  estavao  recolhidos  alguns  Por- 
tnguezes,  aos  quaes  matirao  com  barbara  cruel- 
dade.  Virao  que  os  mesmos  que  accusavao  o  crime 
cooperatao  no  delicto,  e  conhecendo  claramente 
a  ficcao ,  tiveriio  por  sem  duvida  o  perigo ,  e  para 
a  eonfiasao  do  engano  pedirao  ao  eommendoi'  Ihes 
desse  aoeeorro  eentra  oi  iMfamdecea  e  l>ipiiyas 


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3M  caTUOIO  iUSITAIiiO. 

levanUdos.  Descaradaiuente  sairao  escusos.  Con- 
sullarao  entre  si  o  remedio^  e  resolv^o  fortificar- 
se  do  modo  possivel.  Determinarao  sitio ,  e  nelle 
fizerao  um  cerco  de  paos  a  pique  capaz  de  os  re- 
colher  com  familias  e  escravos  (erao  os  Portu- 
guezes  settenta);  prov6rao-se  de  mantimentos , 
principalmente  de  faiinha  e  agoa.  As  armas  nao 
passavao  de  dezesette  espingardas,  algumas  espadas, 
poucos  chu^os,  e  copia  grande  de  pios  tostados; 
polvora,  murrao  e  pelouro,  em  tao  pequena  quan- 
lidade  que  servia  mais  a  opiniao  que  a  defensa. 

XXX.  Aquelle  HoUaudez  cbamado  Jaoobo ,  que 
com  OS  Tapuyas  de  sua  fac^ao  regou  de  ianocente 
sangue  a  povoa^ao  de  Gunhau,  como  ji  dissemos , 
agora  desceo  noTamente  do  certao,  onde  se  tiuha 
emboscadOi  com  muito  maior  copia  d' Alarves  para 
executar  nos  vizinhos  da  terra  o  que  nao  pod^ra 
conseguir  no  destricto  da  Paraiba ,  assistindo-lhe 
uma  partida  de  Hollandezes ,  mandados  para  este 
fim  pelo  gowmador  da  fortaleza.  A'  sua  chegada 
se  adiant^o  os  moradores ,  forti(icando-se  no  so- 
bredito  posto^  que  se  chamava  do  Potogi,  na  forma 
referida.  Jacobo  com  os  Hollandezes  de  sua  con- 
serva  aproximourse  dos  nossos  em  som  d'amizade 
mas  com  o  fim  de  sondar-lbes  o  animo  e  yer  o  es- 
tado  de  sua  fortificacao  e  sens  recursos  em  armas 
e  muni9oes ;  approvou  a  sua  resolucao,  assegurou- 
Ibes  que  dos  Hollandezes  levantados  nao  tivessem 
receio ;  e  em  fim  que  elle  ia  para  a  fortaleza  e  delle 
OS  proveria  de  muni^oes  e  armas  para  se  defender 
rem ;  ^  despedindo^se ,  marcbou  para  a  fortaleza , 
que  deatava  seis  i^oas  pelo  correate  do  rio.  Dos 


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CASTHIOTO  LTOITANO.  365 

nossos  honve  alguns  que  derko  credito  a  esta  pro- 
messa;  a  maior  parte  por6m  teve-a  por  fementida, 
e  todos  se  desenganarao  quando  virao  o  mesmo  Ja- 
cobo  capitaneando  um  grosso  de  Hollandezes,  Ta- 
puyas,  Pytiguaras,  que  investindo  a  palissada  com 
bellico  furor,  fez  todo  o  possivel  pola  romper.  Ima- 
ginou  que  o  repente  e  o  poder  a  levasse  sem  resis- 
tencia ;  por^m  achou  nos  cercados  tao  prompta  e 
valerosa  defensa,  que  se  rerirou  destrocado  e  ven- 
cido.  Aconselhou-se  o  inimigo  com  a  obstinacao  e 
com  a  perda;  pedio  a  for^ja  soccorros ,  a  arte  in- 
dustria,  e  fabricou  sobre  carros  alguns  castelios 
de  madeira,  dos  quaes  haviao  de  atirar,  com  seguro 
e  pontaria  certa,  os  mosquefeiros  com  que  os  guarr 
neceo ;  a  cuja  sombra  podessem  os  machados  rom- 
per as  estacadas.  Nao  tirou  o  inimigo  d'este  militar 
ariificio  outra  cousa  mais  que  a  dor  com  que  vio 
tudo  deslruido  (mortos  e  feridos  muitos  dos  sens) 
e  o  applauso,  com  que  os  cercados  celebr^rao  a 
victoria;  a  qual  fez  mais  alegre  o  nao  ficar  algum 
nem  ainda  com  a  mais  leve  ferida.  —  Ao  outro  dia 
appareceo  o  aleivoso  Jacobo  sobre  os  sitiados  com 
todos  OS  sens  (vestidos  os  intentos  da  guerra  com 
festivas  demonstracoes  de  paz),  e  como  se  com 
aquelle  soccorro  Ihes  vidra  a  dar  os  parabens  da 
victoria,  se  foi  chegando  k  estacada  com  pensa- 
mento  de  se  introduzir  dentrodella,  confiado  nas 
apparencias  de  amigo.  Os  Portuguezes ,  que  nao 
temiao  a  forca,  Ihe  castigarao  a  manha  :  com  armas 
de  fogo  e  de  arremeco  o  fizerao  de(er,  e  aflastar  da 
circumvalacao ;  porque  como  a  tal  amigo  o  queriao 
de  longe.  —  Nao  desistio  o  Hollandez  do  artificio , 


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366  (;i9T«io?o  mmwo^ 

a^tes  deitou  qoyo  Gaidar  4  cavila^o  ;  maiidou  di^er 
ao6  cercados ,  que  ^e  admirava  de  como  os  tinba 
cegos  o  Qxedo,  poi^  o  nao  conheciao  por  auxiliar  e 
amigo;  que  elle  por  comprir  su^  palavra  (ouvinda 
dizer  na  fortaleza  que  e^tavao  4  bataria  com  o$ 
Alarves )  pedira  ao  commeudor  aquelle  esquadrlo 
para  09  yir  soccorrer  com  toda  a  pressa,  e  o  deuava 
su^peaso  a  uovidade  de  experimentar  iuimigos  ao$ 
mesmos  que  0  deviao  receber  gratoa ;  e  se  o  recdo 
OS  tinha  cegos^  que  abria^em  os  olho6  da  cooGao^a 
e  recebessem  0  soccorro  antes  que  seus  soldadoa 
presumissem  do  engano  que  ?ra  rebdliao ;  porqua 
D^tes  termos  oa  mandaria  ayau9ai*i  e  publicaria  o 
damno,  a  uns  sem  culpa ,  e  a  outros  aem  queixa.  Os 
cercados,  que  enteud&rao  a  ficqao  e  o  inteuto,  Ibe 
i^spQuderap  ;  Que  nenhuma  maacara  podia  cobrir 
nem  esconder  trai^ao  too  doscarada ;  que  elle  era 
0  mesmo  que  uos  dias  pps^ados  oa  quizera  euganar 
com  fingida^  promessas ;  e  que  no^  seguint^s  os 
pretendera  destrqir   com  repetidos  comba(e$|   ©. 
assim  mesmo  o  que  gpoduzia  os  T^puyas  para  ^ 
eippresaf  e  que  ae  di^^pg^uas^  que  nao  ha  via  de^ 
repre^ntar  no  Rio  jGrande  a  cruel  tragedia  que  re- 
presentara  en)  Cunbau,  porque  advertidos  e  ma- 
goados  estavao  resolutos^m  nao  largarcm  as  annas 
sem  primeiro  perderem  a^  vidas,  qufe  queria  tirar  a 
todos  para  Ihes  ix)ubar  as  fazendas. 

XXXI.  Acabou  de  en  tender  o  inimigo  que  nada 
havia  de  conseguir  a  cautela,  e  remetteo  o  pcito  a 
batalha ;  investio  a  estacada  com  repetidos  c  por* 
Bados  combates^  em  quauto  Ihe  nao  cbegava  a  ar*- 
tilharia  que  tinba  mand^do  vir  da  fortaleza.  Che-- 


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gou  e^i  e  prqtamda  pan  jo^ar  ei  4istniir  m 
mifieraveid  oercados^  Ihee  fes  lupa  embaixada^ 
diz^do )  que  a  yiata  oa  da^enganava  da  cerieaa  de 
ana  ruina ;  que  se  eutregaasemi  aob-peua  ds  qua  a 
todoa  OB  que  toiBas^e  com  vida,  odun  malherea» 
filbos  e  eacraroa  eQiregaria  aoa  selvagena  para  que 
06  deapeda^ssem  e  comeasem  vivoa ;  e  que  ae  des» 
coofiavao  deque  entregaudo*se  oa  tiao  trataria  eomo 
a  amigosvcapitulasiem  a  fiirma  em  que  ae  queriae 
auU^figar,  e  que  em  penbor  de  aua  palarra  Ihea 
daria  o$  refena  que  ellea  pedii^em.  ^  (k  Porta- 
guezea,  que  se  viao  sem  meioa  para  a  defeoaa ,  sem 
auatento  para  a  porfiat  e  aem  esperau^  de  soecorro 
appelUrao  da  iucertega  do  remedio  para  a  contin*** 
geuoia  do  perjg^.  Eatregarao-ae  a  piartido,  debaixo 
de  aeguroa  pasaaportes,  porque  dadoa  em  uome  do 
priucipe  de  Orauge  e  doa  JUtadoa  de  Holbnda^ 
jurados  e  (irmadoa  de  todoa  09  olBciaea  da  milicia 
com  promeasa  de  oa  defeuderem  a  oomervarem 
nos  furoa  em  que  sempre  viy^o ;  e  para  que  pare- 
<^sem  mais  firmea  Ibea  veudeo  o  iuimigo  aa  ooadU 
^8  mais  caras :  a  peso  de  euro  thea  deo  depois  09 
pasaaportes,  e  os  obrigou  a  que  desaen  refens  de 
^mprirem  iuteirameute  0  capitulado,  pediDdo4hes 
a  Estevao  Macbado  de  Miranda  ^  Frauciaco  MeiMies 
Pereira,  Simao  Correia,  Joao  de  Sitveira,  e  Vi- 
cente de  Souza  Fereira;  aoa  quaei  levou  logo  o 
inimigo  para  a  aua  forUleza,  como  em  penbiM'  de 
seu  diiubeiro.  Aoa  Hollandezea,  que  dizia  d^ixap 
em  refeuai  deixou  por  guardas  e  espiaa  doa  raqdi** 
dos.  Quaii  trea  mezes  ae  alqiarao  aquelles  mora« 
dorea  dentTQ  da  cerea  referida  aem  que  a  perfidia 


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568  GA9I1II0TO  LimiTAIIO. 

hollandezA  Ihes  comprisse  os  artigos  da  capitulaciio. 
Chegou  entre  tanto  &  fortaleza  Joao  Bolastrater, 
um  dos  ires  do  conselho  supremo ,  para  £azer  exe- 
cutar  no  Rio  Grande,  como  ministro,  o  que  no  At- 
recife  decreUra  com  juiz,  isto  i  :  que  todos  os 
Portuguezes  de  seite  annos  para  cima  se  passassenTi 
a  espada  sem  excepcao  de  pessoa.  Para  dar  comeco 
a  esta  inaudita  crueldade  mandou  vir  i  sua  pre- 
sent todos  08  principaes  que  se  achaTao  aicerrados 
comorefens,  elhesdisse,  que  a  campanha  estava 
lirre  doe  Indios  selvagens ,  e  nella  presidio  para 
aeguranca  de  todos  os  moradores ;  que  fosaem  tra- 
tar  de  suas  fazendas,  visto  estar  aquella  pra^  falta 
de  mantimentos ;  e  para  que  o  executassem  com 
mais  animo,  mandava  uma  companhia  de  soldados 
em  sua  guarda ;  e  que  para  commodidade  de  todos 
Ihe  pareceo  bem  que  fossem  pelo  rio  ao  outro  dia 
(  que  se  contaTao  3  d'Outubro ) ,  e  nelle  achariao 
barcos  prerenidos  de  todo  necessario  para  a  viagem. 
—  Mandirao  entretanto  os  Hollandezes  emboscar 
duzoitos  Indios  Alarves  nas  mataa  yizinhas  do 
porto  cbamado  Riomeracu ,  meia  legoa  distante 
do  cerco  onde  assistiao  os  rendidos,  os  quaes  erao 
commandados  pelo  seu  maioral  Paroupava ,  esti- 
mado  do  Flaroengo  no  grao,  em  qne  estimava  a 
Pero  Poty.  No  dia  e  f6rma  relatada  se  embarcarao 
todos  OS  moradores,  naveg4rao  at6  b  porto  de  Hio- 
mara^d,  onde  os  deit4rao  em  terra,  rodeadbs  da 
companhia  hollandeza ,  cujo  capitao  os  mandou 
despir  a  todos,  e  que  se  pozessem  de  joelhos.  Sem 
repugnancia  obedecfirao  todos ,  postos  os  olhos  no 
ceo ,  ao  qual  se  oifereciao  em  sacrificio ,  certos  de 


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GASTBiOlt)  LOSITAlia  369 

ser  chegada  a  sua  uttima  hora.  IMrao  os  barbaroa 
Hollande^es  signal  aos  selvagensemboscados ;  salrao 
eates  dos  matos  com  gestos  e  gritos  tao  medkmhos 
que  causariao  espanio  ao  insenstvel ,  quapio  maia 
ao6  liuiiiauoa ,  destmadoa  a  serem  apresad'aqadUes 
tigres.  Mandou  entio  o  hereje  a  urn  predicaiite 
de  suas  dkbalicas  seitas  queentrasse  a  pr^ivlhea 
promettendo  certezas  de  gloria  e  esperan^as  de  yida 
aos  que,  convertidos  a  seus  erros,  apoBtatassem  da 
verdadeira  religiao ;  por^m  os  soldados  de  GbristO) 
com  novo  espirito  veuc^rao  a  noTa  balailia^  e  com 
palavras  e  accoes  abominirao  a  c^geira  heredoa^ 
confessando  a  gritos  que  morriao  na  pureui  da  U 
catholica^  que  cr£  e  ensina  a  santa  igrc^  de  Roma; 
e  que  de  todo  o  coracao  detestaiFao  todos  os  arti* 
culos  que  se  desriavao  de  seus  deeretos  y  pela  oIk 
seryancia  dos  quaes  estavao  preetos  a  dar  uma  € 
mil  yidas ,  se  as  iiverao.  —  YenCido  e  despreiadip 
o  hereje  da  religiosa  constauda,  tomou  per  omla 
o  desaggraTO  da  seita,  e  a  yinganca  das  injunas,  e 
comecou  a  atormentar  com  as  maos  cfe  todos  aquelica 
fieis  seryos  de  Decs  com  tai  deshumanidade ,  qne  a 
cada  um  desejaya  jHrolongar  a  yida  para  prolongar 
o  martyrio.  De  cancado  desfalleeeo  o  Inrago  da  he* 
retica  crueza ,  por6m  n«o  o  yaior  da  cathoUca  pa* 
ciencia.  Retirarao-M  os  HoUandeKes,  e  cj^raraode 
refresco  os  Alaryes,  e  nio  achando  naquellca  wt^ 
pos  parte  que  de  noyo  podessem  atormentar^  os 
foiio  cortando  e  diyidindo  por  todas  as  juntas, 
at^  que  neste  martyrio  d^raoas  afanasaieu  criador^ 
euyoltas  nas  confissoes  da  ii  e  nas  galas  da  csf* 
paranja.  Horri^ia  a  sua  yista  deixou  a  crueldade 
L  24 


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I  JO  CA6TB10T0  LOSiTAKO* 

aqudles  corpos,  laDto  que  oein  ainda  liobao  forma 
de  troncoB  :  a  muiios  abriiio,  pai*a  Ihes  tirtrem  as 
eutranhas,  depois  de  Ihes  cortarem  as  cabecas^  as 
peroas  e  os  braQos ;  as  cabe^as  lirarao  as  paries 
que  Ihes  dao  a  f^rma,  como  olhos,  lingua,  narizes 
e  orelhas ;  aos  bra^os,  as  maos ;  as  maos,  os  dedos ; 
e  porque  tivesse  a  crueldade  de  lodos  parte  no  todo, 
nao  fioou  geatio  que  nao  cortaase  a  sua  parte. 

XXXIl.  £m  quanto  a  indomita  ferocidade  d'a- 
quelles  barbaros  se  dekilava  na  vista  do  estrtgo , 
(orko  OS  Hollaudezes  buscar  nova  materia  para  doyo 
sacrificio.  Chegarao  a  cerca  onde  tinhao  redusos 
OS  settenta  Portuguezes,  e  seguindo  seu  aleivoso 
trato,  Ihes  disserao  da  parte  do  governador  da  for- 
taleza  que  tinhao  ordem  da  Compauhia  para  se 
ftizer  uma  eoneordata  necessaria  para  o  bem  com- 
mum  y  em  a  qual  se  haviao  de  assignar  as  partes  ; 
para  o  que  conviuha  que  com  toda  a  brevidade 
chegaseem  &  fortaleza ,  e  com  elles  Hollaudezes  se 
fbssem  embarcar  ao  porta  de  Hiomara^ii,  oude 
tinhao  barcos  prestes  para  fazerem  o  camiuho  com 
menos  molestia.  Bem  presentirao  estes  infelizes 
qual  era  a  sorte  que  os  esperava ;  mas  com  grande 
resignacao  e  copiosas  lagrimas  se  apartirao  de  suas 
raulheres  e  filhosi  e  se  entregirao  is  maos  de  seus 
Terdugos.  Ghegirao  ao  lugar  que  para  a  navega^ao 
era  porio,  e  para  o  martyrio  theatro ;  serviudo-lhes 
o  espanto  do  que  viao  de  Ihes  pintar  as  circum- 
stancias  do  supplicio  que  esperavao.  Em  voz  alta 
fizerao  todos  a  [w^testacao  da  ft,  com  a  moBma 
firmeza  que  a  haviao  feito  as  primeirasvictimas;  e 
foi  entao  que  se  unirao  h(^ejes  e  geatioa  a  ferir,  e 


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GASTRIOTO  LUSriANO.  371 

cortar  pelos  fieis  servos  de  Deos  com  lauta  ira  c 
deshumaDidade,  que  se  encoDtravao  muitos  ferros 
a  abrir  uma  mesma  ferida.  Assanhados  da  confis- 
sao  da  (6  que  ouviao,  se  apressavao  a  lirar  as  Tidas 
e  JiDguas  que  a  pronunciavao,  e  abriao  tantas  mais 
bocas  que  a  repetiao,  quantos  erao  os  golpes  j  pelos 
quaes  o  fiel  sangue  a  gritava ;  em  que  continuit*ao 
at^  que  de  todo  os  desamparou  o  sangue,  e  os 
deixou  a  \ida.  —  A  um  mancebo  casado,  por 
nome  Autonio  Baracho,  ao  qual  a  natureza  e  a  for- 
tuna  enriquec^rao  de  aposta ,  amarrarao  a  um 
tronco,  e  depois  de  cruelmente  atormentado  e  es^ 
carnecidoy  Ihe  cortarao  a  lingua  e  a  parte  virih 
trocando  a  infame  deshumanidade  a  cada  uma  das 
partes  o  lugar  que  Ihes  dera  a  natureza.  Ja  seu 
corpo  f  pela  materia ,  nao  tinha  parte  sem  ferida, 
e  ainda  assim  se  armou  a  atrocidade  contra  a  bar- 
monia  da  figura,  denegrindo-lbe  todo  o  corpo  com 
ferros  abrazados,  e  tirando-lbe  o  cora^ao  pelas 
costaS)  desejosos  sem  duvida  de  verem  o  tamanbo 
d'um  cora^ao  em  que  coube  o  soffrimento  de  tantos 
martyrios.  —  Com  Maibeus  Moreira  usarao  a 
mesma  tyrannia;  porque  se  deleitavao  nas  repe- 
ticoes  da  maior  crueza ,  at^  que  deo  os  ultimos 
alentos  na  pronunciaqao  destas  palavras  :  «  Bem- 
»  dito  e  louvado  seja  o  santissimo  sacramento.  )» 
E  seria  permissao  divina;  para  que  a  um  mesmo 
tempo  visse  o  bereje ,  para  sua  confusao ,  este  di- 
vino  mysterio  no  coracao  que  tirava  e  na  boca  por 
onde  saia.  Os  tormentos  e  injurias  com  que  tirarao 
a  vida  ao  padre  vigario  d'aquella  freguezia ,  Am- 
brosio  Francisco  Ferros,  forao  com  tan  to  mais  ex- 


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S72  ^  CASTRIOTO  LUSITANO. 

cesso  quanto  maior  era  o  odio  que  tinhao  aos  sa- 
cerdotes,  e  o  desprezo  com  que  olhavao  para  os 
miuistros  dos  sacramentos^  que  nega  sua  pertmaz 
ceguetra.  Ainda  que  a  piedade  quizera  particula- 
rixar  08  tormentos  que  padeceo ,  o  pejo  nao  deixa 
dizer  as  injurias  com  que  a  perfidta  o  atormentou. 

XXXin.  Ou  de  cancados  ou  de  conftindtdos 

» 

pediiio  08  verdugos  ao  capitao  holhndez  d^sse  a 
vida  a  oito  mancebos^,  admirados  da  fortaleza  com 
que  triumphavao  de  affW)ntas  e  martyrios ;  conce- 
deo  o  capitao  o  que  se  Ihe  pedia ,  por^m  com  pro- 
testo  de  que  a  nenhum  tempo  tomariao  armas  con- 
tra Hollauda ,  seuao  contra  Portugal.  Ouvida  a 
condicao  d^aquelles  invenciveis  espiritos,  respon- 
d^rao  que  Ihed  rendiao  as  gra9as  da  nova  occasiao 
em  que  os  punhao  pata  accrescentarem  uma  coroa 
a  outra  coroa ,  sendo  para  sua  estimacao  a  maior 
dita  0  morrerem  por  seryir  a  Deos,  a  sua  patria  e 
a  sen  Rei.  Vio-se  a  diligencia  desprezada,  a  inters 
cessao  corrida ;  e  estimulado  o  furor  inventou  novos 
martyrios,  com  que,  aos  olhos  uns  dos outros ,  foi 
despedacando  os  corpos  que  animava  a  invencivel 
coDstancia,  at^  os  deixarem  sem  figura  e  sem  vida. 
A  um  dos  oito  mancebos,  chamado  Jofto  MarUns , 
a  euja  vista  martyritarao  os  sette,  persuadiao  qat 
conservasse  a  vida  a  troco  da  promessa  de  assentar 
pra^a  em  service  da  Hollanda.  Com  alegre  e  desen- 
ganado  semblante  respondeo  que  se  nao  rendia  a 
lidelidade  d'um  Portuguez  catholico  romano  a  tao 
vil  partido ,  quando  victorioso  de  suas  instancias 
esperava  etemizar,  com  sua  morte ,  a  gloria  de  sen 
nome^  conGado  na  misericordia  divina,  que  levaria 


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cksmatQ  imam}.  375 

sua  alma  ao  }ogro  da  vida  etema.  Aqni  ae  a(;ceiideo 
ixiaia  a  ira^  porque  aqui  se  vio  aiais  offeadida  a 
induatria«  Martyrizava  o  odio,  a  colera  e  a  Tin- 
gaii9a ;  e  nao  ficou  tormento  que  nao  executaase  a 
tyrauuia ,  passando  al^m  da  morte  a  crueldade  | 
com  que  Ihe  fizerao  em  miuda3  paries  o  corpo. 

XXXiy.  Depois  do  referido ,  andaiio  aquelles 
deshumanos  verdugos  fazeudo  riso  do  eslrago,  que 
as  mesm^s  feras  causara  horror.  A  uma  mulher 
gasada ,  que  levada  do  amor  conjugal  acompanhara 
seu  marido,  e  o  cborava  despeda9ado«  cortarao  os 
p^  e  as  maos ,  porque  se  nao  podesse  apartar  da 
oausa  de  sua  magoa,  e  entre  os  corpos  desanimados 
bebesse  a  morte  no  sangue  das  feridas  e  no  horror 
da  companhia :  martyrio  em  que  durou  ires  dias  |^ 
atii  dar  a  alma  a  Deos.  A  uma  menina  de  dous 
annos  tirarao  dos  bra^os  da  mai »  e  cop^  apostado 
tiro  a  estrelarao  no  tronco  de  uma  arvore«  A  outra 
criaufa  parUrao  em  duas  partes  d'alto  a  baixo  com 
o  golpe  d'um  alfange,  A  uma  donzella  de  gentU 
fornfia  vaid^rao  a  um  Indio  por  um  cao  de  ca9a. 
Nao  aobando  j^  o  bra^o  cousa  em  que  ferir  largi- 
rao  ao8  Indios  os  despojos^  que  erao  as  ultimas  cor- 
tinas  da  honestidade,  e  com  estarem  hem  cortados 
dos  golpes  y  deixarao  muito  mais  cortados  a  todoa 
os  presentes,  quando  ao  tiral*as  virao  rodeados  de 
asperos  cilicios  e  de  duras  cadeias  aquelles  ditosos 
corpos ;  dispondo-os  a  virtude  da  penitencia  para 
a  padencia  do  martyrio  que  tao  heroicamente  sof- 
fr^o.  Coroado  o  execrando  acto  com  este  glorioso 
fim^  caminb^rao  os  Hollandezes  e  Tapuyas  com 
espantoso  tumulto  para  o  lugar  onde  estavao  as 


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37/1  CA5TR10T0  LUSlTANa 

mulhei^es,  fiihas  e  parentas  dos  mortos  (recolhidas 
dentro  da  estacada,  luctando  com  as  incertezas  da 
esperam^a  e  com  a  vehemencia  da  suspeiia  )  yiva- 
mente  afflictas  com  o  receio  de  sua  perda  e  de  seu 
desamparo.  Virao  o  esquadrao  inimigo ,  e  de  sua 
desordem  inferirao  o  que  logo  experimentirao , 
porque  de  Ihes  intimarem,  na  morte  dos  sens ,  a 
falta  da  defensa,  as  invadirao  juntamente  brutos  e 
crueis ;  porque  com  accao  indistincta  satisfiz^rao  a 
colera  e  a  torpeza^  dando  a  beber  a  iodas  de  urn  so 
trago  a  dor  e  a  injuria ,  sem  que  a  for^a  reparasse 
na  resistencia,  nem  a  briitalidade  no  estado  ;  ser- 
vindo-se  das  queixas  e  das  lagrimas  como  de  in* 
sentivos  para  a  violencia.  Nunca  a  demazia  andou 
tao  desenfreada ,  porque  nunca  se  vio  mais  livre  o 
desaforo  com  que  a  lascivia  rompeo  pelas  ki$  do 
pejo  e  da  lasiima.  Roubada  d'esta  maneira  a  honra 
e  a  estima^ao  do  fragil  sexo,  Ihe  nao  deix^rao  que 
sentir  na  perda  da  fazenda,  que  Ihes  levarao  com 
tanta  vileza,  que  nem  com  que  podessem  cobrir  as 
partes  que  a  mesma  natureza  csconde,  Ihes  deixd- 
rao.  Com  lagrimas  inuteis  choravao  o  desam- 
paro e  a  deshonra ;  e  corridas  de  si  mesmas  in- 
vejavao  o  estado  dos  mortos.  Pediiio  licenca  para 
Ihes  da  rem  scpultura;  o  que  nao  pod^rao  alcancar 
senao  depois  de  passados  quinze  dias  ;  para  que  a 
corrupeao  nao  d^e  lugar  4  piedade ,  e  as  feras  o 
tivessem  de  Ihes  darem  em  suas  enlranhas  horrivel 
sepulcro.  Mas  o  ceo,  que  dos  estorvos  fez  auxilios, 
e  dos  desvios  estradas,\no8trou  nesta  occasiao  que 
para  favorecer  a  rerdade  e  Vublicar  a  victoria  de 
seus  servos  permiitio  os  meios  que  para  a  esconder 


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CASTWOTO  LCSITANa  375 

o  destruir  buscavao  seus  inimigos ;  pois  os  corpos, 
ainda  que  dirididos ,  se  achdrao  intactos ,  nao  se 
atrevendoatocal-os  nem  a  cormpcao  nem  osbichos^ 
e  exhalando  suave  fragancia.  Mararilha  foi  esta  que 
nos  catholicos  causou  grande  compuncao ,  e  nos 
herejes  grande  assombro,  nao  se  atrevendo  a  negal-a 
por  ser  observada  por  tanta  genie. 

XXXV.  Ja  dissemos  neste  livro  como  tendo  os 

govemadores  noticia  do  aperto  em  que  estavao  os 

moradores  do  Rio  Grande  (no  mesmo  tempo  em 

que  despedf  rao  um  soccorro  para  a  Paralba  )  en- 

commenddrao  aos  cabos  d'elle,  principalmente  aos 

capitae^  Joao  Barboza  Pinto,  e  dom  Diogo  Pinbeiro 

Camarao,  como  mais  praticos   naquelle  terreno, 

que  da  Paraiba  passassem  ao  Rio  Grande ,  para 

eximirem  os  moradores  da  affliccao  e  risco  em  que 

estavao  ;  e  unidos  com  elles  fizessem  ao  ioimigd 

toda  a  hostilidade  possivel,  conduzindo  osgstdos 

de  (oda  a  campanha  para  sustento  do  exercito  de 

Pernambuco.  Com  genie  da  Paraiba  engrossdrao  o 

soccorro ,  e  com  elle  partirao  depois  dos  1 5  d'Ou- 

tubro ,  e  pela  difficuldade  da  marcha  chegdrao  a 

campanha  do  Rio  Grande  em  os  primeiros  dias  de 

Novembro,  um  mez  depois  do  estrago  que  deixamos 

referido  ;  e  supposto  qu6  nos  adiantamos  no  tempo 

por  nao  quebrar  a  ponta  d'este  fio ,  diremos  aqui 

em  summa  o  que  obrarao,  e  ficaremos  livres  d'este 

desvio,  para  caminharmos  sem  elle  pela  estrada  da 

historia. 

XXXVl.Oirvio  a  nossa  gente  a  lastimosa  relacao 
do  successo,  a  crueldade  dos  Hollandezes  e  Indios, 
0  aleivoso  tralo  d'uns  e  outros,  e  irados  contra  si 


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376  GASTRIOTO  LUaiTAKO. 

mesmos  pela  lardaa^^  e  contra  os  ininiigos  pela 
offensa,  perdiao  a  paciencia  em  eonsiderarem  que 
Ihes  faltara  tempo  para  a  vinganyaj  e  Ihes  aobejava 
para  a  injuria;  nao  podendo  aproveitar  o  soocorro 
pant  o  remedioy  senao  para  o  su^ragio.  Fizeraoalto 
oa  poToa^ao  daCunliau,;  fbrtifidirao-se  no  engenho 
do  lugar>  porque  saisse  o  castigo  do  mesmo  lugar 
onde  se  executou  o  aggravo  :  todas  as  boras  o  lem- 
brava  o  siiio,  e  uao  deixava  a  magoa  desean^  a 
ira,  com  que  os  nossos  talavao  e  abrazavao  tudo  o 
que  por  aguellas  partes  tocava  aosHollandezes  e  In- 
dioSy  nao  bavendo  dia  em  que  a  fortaleza  do  inimigo 
nao  chegassem  correios  da  sua  perda ,  e  de  nossa 
vingan^a ;  com  que  irritado,  se  aprestava  com  todo 
o  poder  para  assaltar  os  nossos,  certo  de  que  a  for- 
tifica^ao  do  alojamento  os  nao  poderia  defender. 
Succedeo  que  uma  noite  ouvirao  as  sentinellas,  que 
OS  nossos  tinbao  ao  largo^  grande  (ropel  e  rumor, 
como  de  gente  que  marcbava  furtiva ;  d^rao  rebate* 
preparou-se  a  gente  para  rebater  o  assalto^  e  nesta 
forma  estiverao  at^  que  amanbeceo ;  descobrio-se 
0  campo ,  e  nao  se  acbou  nem  indicio  nem  rasto  de 
inimigo.  Na  nolte^seguinte  succedeo  o  mesmo ;  con- 
cluirao  d'aqui  os  nossos  que  era  aviso  do  ceo  para 
que  mudassem  de  alojamento,  e  tomassem  um  mais 
seguro  f  escolb^rao  por  tanto  um  posto  regulado,  e 
medido  para  a  defensa,  onde  se  fecharao  com  for- 
tificadacircumferencia,  Mai  tinbao  acabadoquando 
o  inimigo  com  todo  o  poder  de  estrangeiros,  naiu- 
raes  e  Tapuyas  deo  sobre  o  engenbo  de  Cunhaii, 
que  acbou  desoccupado ;  e  entendido  o  lugar  onde 
os  nossos  se  alojavao,  os  buscou  e  investio  com  o 


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GASTBIOTO  LUSITANO.  S77 

orgulho  que  recebeo  da  presump^aode  que  o  temor 
de  suas  armas  nos  desolajaria  com  facilidade; 
por^m  em  breve  tempo  se  desenganou  muito  a  sua 
custa ;  porque  vencida  a  ousadia  da  iuvasao,  do  va- 
lor e  da  resistencia  j  perdeo  o  assalto  e  a  flor  da 
SUA  gente,  deixaudo-nos  naa  maos  uma  esobreeida 
victoria ,  que  fez  mais  gloriosa  o  medo  com  que 
desbaratado  fogio,  e  foi  tauto  que,  sem  attender  a 
ordem  nem  a  honra,  entrou  em  aua  fortificacao  96m 
muita  parte  dos  soldados ,  e  sem  a  maior  parte  das 
armas.  Senhores  da  campanha<x)Dtinuario  09  dos- 
809  na  vinganca,  at^  0  tempo  em  que  chegou  4  Fa- 
raiba  dom  Antonio  Philippe  Camarao,  mandado 
pdo8  n08B09  govemadores,  movido9  da  reto^  re- 
ferida  e  de  novas  razoes^  como  escreveremos  a  seu 
tempo  em  o  seguinte  livro. 


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LIVRO  IX. 


SUMHARIO. 

.  Oi  BMMifoverMdonf  tptrtto  o  careo  to  iolmlgd,  qa%  fti  duu 
sortidu,  e  eotra  casUgado ;  por  douf  negros  qua  Mem  do  kirteih 
le  sabem  os  intentof  dos  Flamengos ,  e  sao  rebatidoi  com  perda. 
~  S.  Ootrot  fticcesfos  em  que  o  inhnlgo  i  tencido ;  em  nenhuma 
parle  vhrk  fegnro;  temor  com  que  muiioi  ae  paisario  4 noma 
parte.~3.6  iaimigo  detconfiado  dopoderiequarTaler  da  tndcao; 
como  intanta  exeeuUl-a,  e  como  nao  teve  effeito ;  sae  com  todo 
o  podar,  a  a  DOtM  gaota  a  tar-lba  o  encontro,  e  Ihe  fav  grande 
attrago.  ->  4.  Partieuiaridadet  d'etta  oocasUo  ;  mortoi  a  feridof 
d*uma  a  outra  parte.—  5.  Os  estrangeiroi  tratao  de  fugir  reeeosos 
de  ae  manifetiar  o  delicto ;  o  seu  mettre  de  campo,  que  o  luspelta 
ae  aoautda ;  Ibgem  duas  companhias  para  o  Arradilft.— (L  Publiea> 
le  a  traicao ;  coromettem  a  Theodozio  Estrater  e  o  castigo  e  o  re- 
medio ;  o  qual  le  execute  com  moderacao.  ^  7.  lotenta  o  inimigo 
ioccorrer  a  forUleza  doa  Afogadoi,  e  perde  o  aocoorro.  —  6.  Caio 
eitranho.  —  9.  Chega  a  Bahia  uma  carav^la  do  reioo »  que  o  go- 
vemador  manda  de  soccorro  a  Pernambuco ;  nella  escrcTerem  os 
Hollandezei  randidos  aoa  do  lupremo  conialho.  —  10.  Pelo  aju- 
dante  Cardoio  ae  mandarao  as  cartas ;  o  qua  Ihe  suceede  oo  Arra- 
cife.  —11.  Dous  soldados  nossos  pdem  fogo  as  naos  flamengas  : 
com  que  effeito.  —  IS.  Mandao  os  nossos  governadores  soccorro 
ao  Camarao  ;  com  etle  entra  na  campanba  da  Paralba ;  o  qua  Ihe 
Sttccade.  — 13.  Fortifica-se  em  seu  alojamento ;  o  inimigo  o  busca; 
e  se  perde.  — 14.  Circumstancias  que  fizerao  grande  a  victoria  ; 
fame  que  o  Camarao  mereceo  neste  dia.  —  15.  Retir»o-se  os  bos- 
sos  para  a  Paralba ;  por  via  do  Arrecife  chegou  aos  nossoa  a  nova 
da  victoria.  —16.  Joao  FernandesVieira  manda  dous  enviados  ao 
reino.  — 17.  Manda  o  governador  g^ral  do  Estado  cortar  os  cana- 
veaes  da  campanba,  sem  ponderer  os  incanvenientes,  que  a  obe- 
diencia  venceo  com  o  exeraplo  de  Joao  Femandes  Vieira.  —  18.  No 
primeiro  dia  do  anno  deo  a  nova  fortaleza  a  primeira  salva.  — 
19.  Partem  os  nossos  governadores  para  o  pontal  de  Nazareth; 
quer  o  Uollandez  levantar  um  reduto;  mu  jHeBrique  Diaso 
impede  e  desbara^a;  voltao  os  governadores  ao  Arraial.  —  20.  Fax 
0  inimigo  o  reduto  em  uma  noite;  Joao  Femandes  Vieira  chega 
com  soeaorro»  e  desbarata  o  inimigo. —21.  Calamidades  que 
soffre  o  inimigo ;  dissencoes  no  Arrecife,  e  passagem  de  rauitos 
para  o  nosso  arraial,  pelos  quaes  tivemos  a  primeira  nova  da  vie* 


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CASTBIOTO  LUSITANO.  S79 

torU  do  Rio  Grande.  ^  22.  Chega  lo  Arrtial  o  etplOo  loSo  da 
Magol^ai  a  ffdb  tocoorro  para  o  Rio  Grande,  o  foal  lera  Ajh 
tonio  Vidal  de  Negreiros.  —  83.  Joao  Fernaodes  Vieira  deiato 
iocega  o  inimigo  ;  Henrique  Dies  escala  inn  reduto  qne  Itxera  o 
ininlgo ;  o  eaplt&o  Domlngoo  Ferraira  o  desaUna  eaa  ofluinfai* 
fora.  — >24.  Henrique  Diai  ioteota  ganhar  o  reduto  fobredito; 
communica  a  empresa  a  Joao  Femandes  Vieira  e  aos  cabos  do  sea 
terco ,  que  o  approvio  com  alroro^o ;  Paulo  Diat  Sao  Phellcbe 
pasaa  e  rio,  e  ganba  o  reduto.  —-25.  For  toda  a  parte  se  toca  arna 
ao  inimigo;  accao  destemida  do  capitao  Sebaitiao  Ferreira. -~ 
25.  lotenta  o  governador  hollandex  ganhar  a  Paralba;  cliega 
Andf«  Ytdal»  e  traU  de  caatigar  o  atreYimento.  —  27.  Sai  o  Hol- 
landex a  campo ;  damoo  que  recebe  das  nossas  emboscadas.  — 
28.  Salta  o  inimigo  em  Tejucupapo ;  o  que  Ihe  luccede.  —  29.  Per- 
tinacia  e  caitigo  dos  judeos  do  Arrecif^.  —  30.  Faltao  em  o  noiso 
arraial  maotiiDentos  e  soldades)  Joao  Femandes  Vieira  acode  k 
falta.  —  31.  Ardil  com  que  o  inimigo  nos  queria  desanimar;  co« 
nbecem  os  nossos  a  chimera.—  32.  Carta  de  Henrique  Dias  para  os 
Hollandexes.— 33.  0  Gamarto  assola  a  campanhado  Rio  Gniide; 
totrao  mantimentos  no  nosso  arraial.  —  34:  Apertado  da  fome  sai 
0  inimigo  a  buscar  mantimentos ;  ardil  com  que  nos  engana ; 
desembarca  em  Tejucupapo;  Agostlnho  Nnnet  Ihe  pox  reststenda. 

—  35.  Valor  das  nuHheres  partvignevae ;  foge  o  itinigo  desatinado. 

—  36.  Joao  Fernandas  Vieira  sai  do  Arraial  a  buscar  mantimentos ; 
dA  principio  a  fortalexa  de  Tamandar^,  e  depois  de  guarnecida 
folta  para  o  Arraial.  -^  91.  Chagao  ao  Arraial  dous  padres  dat 
Companhia  eom  ordens  d'El  Rei  para  se  deixar  a  campanha ;  re» 
plica  As  ordens  Joao  Femandes  Vieira;  neutralidade  dos  mais 
pareceraa.  —  3^.  Com  tret  nAoa  defende  o  inimigo  as  passagens 
da  iiha  de  ItaaMraca;  os  nossos  goTemadprea  inteotlk)  ^mhM-as; 
vote  de  Joao  Femandes  Vieira.  —  39.  Com  que  gente  se  dispoe  e 
intenta  a  empresa ;  cinco  Portoguezes  rendem  a  primeira  ndio ;  os 
Hoilaodcns  desampixdo  a  aegunda  e  a  lefealra ,  e  se  ralirao  ^ 
ilha.  —  40.  Ganhada  a  ilha  se  recolhem  os  nossos  deixando«a 
assolada ;  um  maioral  dos  Indies  se  passa  com  quarenta  &  nossa 
parte.  ~  41.  Bntra  um  soccorro  do  reino  em  Raxareth ;  mandao-se 
relirar  os  moradofes  da  Paralba  e  Goyana ;  o  capitao  FrantiNo 
Lopes  Estrella  rende  uma  lancba  do  inimigo ;  os  soldados  de  Hen- 
rique Dias  tomao  um  comboi  do  Flamengo.  —  42.  Assalta  o  ini- 
naigo  a  aslaoeia  dea  Narcos ,  e  fofe  castlgado.  —  43.  ConjoracSo 
contra  Joao  Fernandes  Vieira,  de  que  foi  avisado.  —44.  AUrao  a 
espingarda  ao  gOYcrnador;  alteracoo  que  o  successo  causou  no 
Arraial.  —  45.  Castigo  que  da  aos  traidores.  —  46.  Motives  da 
tralfao. 


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3t0  CASTRIQTO  mSITABa 

h  Em  quanto  aos  nosaos  go?enuidore$  iiao  die* 
gtta  a  noticia  do  que  era  passado  no  Rio  Grande, 
e  que  deixamos  escrito  no  precedente  livro,  se  oc- 
oupavao  em  hostilixar  o  inimigo  o  mais  que  podiao 
apcrtando  de  tal  modo  o  cerco,  que  tinhao  posto 
as  fortificacoes  do  Arrecife,  que  jA  nao  tinba  modo 
de  aendir  k  fome  e  i  sAde  que  o  apertava.  Saccedeo 
que  no  primeiro  domingo  de  Outubro,  em  que  a 
igreja  aolemnica  a  fesia  do  RoEario,  a  celehrou 
Henrique  Dias  e  os  negros  de  seu  ter^o  com  as 
dmnomtraqoes  poasivei^;  acabada  a  soleouudade  se 
reiirou  Henrique  Dias  da  vilia  de  OKnda^  onde  se 
festejou  o  dia,  para  o  seu  quartel ;  e,  ou  que  fosse 
por  aviso,  ou  por  inferencia,  advertio  aoa  capitaes 
das  estancias  vizinhas  que  estivessem  com  vigilan- 
cia,  porque  sem  duvida  sairia  aquella  noite  o  Hol- 
lander a  dar  alguma  assaltada,  como  de  facto  salo, 
ajudado  da  escuridade  da  noite,  por  entre  as  mar* 
gens  do  rto  Beberibe.  Dividio  o  poder  em  doos 
tro^os,  e  com  os  dous  esquadroes,  commelteo  as 
estancias  d'aquella  paragem  por  duas  partes,  adian- 
tando^e  a  iuTestida  os  clarins  encontmdos ,  e  as 
cargas  vagas,  para  que  primeiro  confundissem  do 
cpie  commettesaem*  Nao  foi  pequena  a  desordem 
que  causou  em  os  nossos  o  rumor  encontrado,  e  o 
rebate  indiffer^ita,  porque  sem  disoiplina  se  forao 
retirando  at*  o  posto  de  Joao  Soares  tf  Albuquerque , 
onde,  cobrados  da  confusao ,  tomarao  melhor  con- 
aelbo,  e  voitarao  sobre  o  inimigo  a  tempo  que  mar- 
chavao  em  seu  soccorro  trinta  Indies  do  terco  do 
Camarao,  que  chamados  do  estrondo  publicavaoo 
auxilio  com  um  clarim  que  seguiao,  cujo  ^bo 


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CASTjaOTO  LUSriANO.  581 

bastou  para  espalhar  os  Hollandezes  pelo  mato ,  e 
pararetiraros  nossos  doconflicto,  imaginando  todos 
contranos  aos  que  s6  para  o  HoIIandez  o  erao, 
mas  para  os  nossos,  amigos ;  os  quaes  feitos  em  um 
corpo,  se  forao  esperar  o  inimigo  de  emboscada 
debaixo  de  suas  mesmas  fortalezas ,  donde  os  assal- 
tarao,  ao  tempo  que  se  retiravao,  com  damno  seu 
e  perlgo  nosso ;  este  por  razao  da  artilharia^  aquelle 
pelos  mortos  e  feridos  que  deixiirao  e  recortiferiio. 
Igual  sorte  teve  o  inimigo  n'outra  saida  que  fez  a 
buscar  agoa  de  noite  ao  rio  Beberibe.  Esperarao- 
no  de  emboscada  os  capitaes  Ramos  e  Soares  Com 
suas  companhias,  d^rao  sobre  elle  com  tanto  vigor 
que  deixou  no  campo  oito  mortos,  e  nove  escravos 
dos  que  trazia  para  carregarem  agoa.  No  alcance 
perdeo  mais  que  na  peleja ;  e  se  recolheo  com  tantos 
feridos,  que  se  nao  entrarao  carregados  d'agoa^ 
forao  bem  cobertos  de  sangue. — Em  1 5  d'Outubro 
safrao  do  Arrecife  dous  negros,  os  quaes  sendo 
apresentados  ao  governador  diss^rao  que  oFlamen- 
go  determinava  salr  a  noite  seguinte  com  poder  de 
soldados  e  gastadores  a  fazer  lenba  na  paragem  das 
Salinas,  com  tencao  de  nella  fabricarem  um  forte 
com  boa  guarnicao  e  artilharia  para  proteger  suas 
correrias.  Ouvida  a  informacao  mandirao  osgover- 
nadores  cbamar  os  principaes  capitaes.  e  depois  de 
concertarem  entre  si  o  modo  da  opposi^ao,  os  des- 
pedirao  com  as  ordens  necessarias ,  que  com  pott- 
tualidade  executirao.  Descoberto  o  campo ,  e  dis- 
posta  a  ge&te  em  emboscada,  passarao  toda  a  noite 
com  dobradas  sentinellas,  at^  que  ao  primeiro  rom- 
per d'alva  derao  os  nossos  descobridores  aviso  de 


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M2  cAsmmo  vosumsuu 

que  nas  casas  de  Francisco  do  Rego  eslava  uma 
grande  partida  de  Hollandezes  e  negros  fonnados 
em  duas  alas^eque  seis  batedores  de  cavallo,  arma- 
dos  de  clavinas  e  pislolas,  vinhao  descobrindo  a 
campanha  pela  parte  chamada  a  carreira  dos  Ma- 
zambos.  Nao  perd^o  os  nossos  a  occasiao  e  o 
tempo ;  d^rao  sobre  os  seis  de  cavallo,  cairao  morlos 
doiis,  fogirao  os  quatro  &  redea  solta  a  dar  rebate 
aos  seus.  Sem  detenca  investio  o  inimigo  por  duas 
partes,  e  sem  o  esperar  se  acbou  mettido  nas  em- 
boscadas ;  travou-se  um  combate  renhido,  que  du- 
rou  mais  de  duas  boras;  mandarao  entaoos nossos 
capilaes  investir  a  espada,  o  que  os  nossos  soldados 
execularao  com  tanta  rapidez  e  valor,  que  so  co- 
nbeceo  o  inimigo  pela  fogida  y  mas  nao  pela  resis- 
teiicia.  Seguirao  os  nossos  o  alcance  do  inimigo  at^ 
as  portas  de  suas  fortalezas,  matando-lhe  vinte  ho- 
mensy  e  fazendo-^lbe  prisioneiros  trinta  e  dous 
escravos ;  tambem  Ihe  tomarao  algumas  armas  c 
instrumentos  que  tinhao  prestimo  para  a  roca  e 
para  a  fabrica,  que  aos  nossos  servirao  de  despojo 
e  de  testemunba,  com  que  se  apresentarao  aos  go- 
vemadores  sem  perda  e  com  muita  reputacao. 

II.  Nao  intentava  o  inimigo  sortida  que  Ihe  nao 
saisse  cara ;  por^m  a  necessidadeo  obrigava  a  fazer 
todos  OS  dias  novos  esforcos.  Com  uma  partida  de 
soldados  bollandezes  e  Indies  buscou  um  dia  as 
casas  de  Sebastiao  de  Garvalho,  onde  os  nossos  ti- 
nhao uma  trincheira  de  presidio,  e  so  assistida  de 
duas  sentioellas ,  as  quaes  em  vcndo  o  Flamengo 
tocdrao  arma  e  se  retirarao.  Ouvio  o  rebate  o  capi- 
laoGosme  do  R^o,  que  era  o  que  ficava  mais  perto; 


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CASTRIOTO  LUSITANO.  I8S 

e  com  a  gente  que  achou  prompta  saio  ao  eocon(ro 
do  iaimigo,  que  valorosamenle  entreleve  ale  que 
de  suas  eslancias  chegarao  os  capitaes  Jerouimo  da 
Cunha  do  Amaral,  e  Sebastiao  Ferreira  com  a  gente 
de  suas  companhias ,  que  unidas  com  os  que  pe- 
lejavao,  carregarao  de  (al  sorle  o  Flamengo,  que 
por  fugir  aos  golpes  largou  a  trincheira  e  buscou 
o  amparo  de  suas  forlalezas.  Perdeo  o  inimigo 
quatro  mortos,  e  nos  tivemos  tres  soldados  feridos 
levemente.  —  Outros  successos  e  encontros  simi- 
Ihantes  se  viao  cada  dia,  que  deixamos  de  refe- 
rir,  nao  por  de  menos  conta,  senao  porque  forao 
sem  cpnto.  Andavao  os  Porluguezes  (ao  senhores 
da  fortuna  que  faziao  do  perigo  desenfado  e  da  te- 
meridade  credito.  Por  muitas  vezes  Ihes  forao  rou- 
bar  os  gados  e  cayallos  que  apascentavao  debaixo 
da  artilharia  das  Cinco  Ponlas.Os  servos  e  escravos 
que  saiao  das  fortalezas  a  fazer  qualquer  servi^ 
logo  mudavao  de  senhor ,  porque  os  soldados  de 
Henrique  Dias  os  capUvaTao ,  bebendo  o  inimigo  o 
espanto  na  temeridade ,  e  o  lemor  no  desprezo^  de 
tal  modo  que  em  nenhum  lugar  se  achava  seguro. 
—  A  todos  se  communicava  o  temor;  o  qual  se 
augmentava  todos  os  dias  entre  os  de  mais  baixa 
sorte  com  a  fome  e  a  s6de  que  padeciao;  e  com 
esta  razao  fogiao  muitos  escravos  do  Arrecife,  per- 
suadidos  que  nao  poderiao  escapar  das  maos  dos 
Portuguezes,  ou  por  entrega  da  penuria*  ou  por 
conquista  da  espada.  Muitos  soldados  se  -apresen- 
tavao  aos  nossos  governadores  trazidos  do  mcsmo 
motivo,  OS  quaes  repartiao  pelos  nossos  tercos. 
Pelo  conforme  depoimento  d'estes,  e  d'outros  mui* 


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38&  GiATRIOTO  LUSTTANO. 

to8  de  toda  a  sorte^  se  inteirarao  os  nossos  do  mi- 
seravel  estado  em  que  se  achava  o  Flamengo  den- 
tro  das  pracas  do  Arrecife ,  apertado  da  fome ,  da 
s4de«  do  temor  em  que  o  punha  sua  desconfianca. 
III.  Desenganado  o  inimigo,  pela  continuacao 
dos  successos ,  de  que  sua  forca  nao  bastava  a  de- 
fend^l-o  de  nossa  ousadia,  apellou  para  as  artes  de 
sua  malicia,  e  urdio  uma  trai^ao  de  ta)  qualidade, 
que  o  mesmo  fora  v61-a  lograda,que  deixar-nosdes- 
truidos.  Temos  dito  como  os  nossos  govemadores 
d^rao  a  Theodozio  Estrater  o  posto  de  mestre  de 
campo  dos  estrangeiros ,  que  formavao  um  ter^o 
de  duzentos  oitenta  homens  de  nacoes  diversas, 
mas  todas  do  norte;  sobre  este  fundamento  es- 
tribou  a  confianca ,  com  que  o  Flamengo  intentou 
corrompM-os  :  conhecia  a  natural  inconstancia  da 
gente  d'aquelle  clima,  e  a  propencao  que  tern  a  fal- 
tar  a  fe,  por  qualquer  pequeno  accidente.  Formoii 
o  seu  conselho  supremo  um  alvard  de  perdao  e 
promessas,  em  nome  dos  Estados,  em  que  per- 
doavao  todos  os  crimes  commettidos  contra  a  Com- 
panhia,  e  promettiaorecompensnse  melhoramenCos 
a  todos  que,  militando  deb^ixo  de  nossas  bandei- 
ras,  se  passassem  as  suas  fortalezas,  e  obrassem 
algum  feito  em  utilidade  de  suas  armas  e  damno 
dos  rebelde^.  — Espathirao-se  entrc  os  nossos  mui- 
tas  copias  do  akadi  do  conselho,  de  que  logo  tive- 
rao  nossos  governadore^,  mas  nao  pod6rao  impedir 
que  ellas  chegassem  tambem  Ss  maos  dos  cabos  c 
officiaes  estrangeiros.  Nao  forao  estes  surdos  as 
vozes  da  trai^ao;  oomme^4rao  logo  a  corromper 
com  fecilidade  muitos  dos  soldados ;  pos^rao-se  em 


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GlSTUiyiO  LUStTAVO.  365 

relaoao  com  os  principaes  cabos  do  Arrecife,  cbe- 
gando  sua  perfidia  ao  exc^sso  de  passarem  algumas 
vezes  ao  Arrecife  para  raelhor  concertar  o  preco 
da  venda  e  da  entrega.  A^entarao  que  nos  encon- 
tros  em  que  se  achassem  ( anies  da  occasiao  dese* 
j«da )  OS  do  Arrecife  nao  fariao  tiro  com  pontaria^ 
nem  os  que  entre  n6s  militavao  com  balla,  dando-se 
a  conhecer  por  urn  papel  dobrado,  que  trariao 
nas  trancas  dos  chapes,  na  £firma  em  que  os  liti- 
games  OS  trazem  no  cinto,  em  quanto  nao  sncre- 
desse  a  bataiha,  em  que  os  estrangeiros  que  mili- 
tavao entre  nos  levassem  a  vanguarda ;  e  unidos 
com  a  do  inimigo  vira$6em  incorporados  sobre  os 
noesos. — Aquella  natural  inclinacao,  se  ja  nao  A 
altiva  vaidade ,-  que  os  Portuguezes  tern  a  seguir 
qualquer  novidade  no  trajar,  fez  com  que  todes 
OS  nossos  soldados  imitassem  os  Hollandezes,  attri* 
bnindo  a  contra-senha  &  galanteria,  pondo  todos 
no  chapto  similhantes  papetinhos^  com  o  que  con- 
fundida  a  malicia  nao  pode  distinguir  os  livres  dos 
coiKiemnados^  e  por  este  mcio  quiz  o  ceo  atalhar 
aquelle  damno,  o  qual  o  governador  Joao  Fernan- 
des  Vieira  ia  enfraqueceudo  ^  aconselbado  da  sus- 
p^la^  mas  com  tal  eautela,  que  nao  pod^rao  os 
estrangeiros  inferir  a  menor  desconfianca.  Gorton- 
Ike  parte  da  for^a ,  mandando  uma  companhia  de 
Hollandezes  no  soccorro  que  deo  a  Paraiba,  outra 
para  o  presidio  de  TejucujKipo ;  e  certo  na  rebeldia^ 
e  mcerto  na  oceasiao,  mandou  que  em  nenbum  ea- 
contro  pelejasseterco  unido^senao  disperso  e  entre- 
meiado  com  os  Portuguezes »  em  fdrma  que  nunca 
ttvassem  occasiao,  nem  para  a  fogida,  nem  para  a 
L  25 


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9M  CMDMIO  UWUML 

offimsa.  -*-T-  Confiada  o  inicu^  bo  paoto  da  traiiiio 
aaio  do  Ajrraeife  wi  9  4»  Nevmbpo,  pda  parages 
do6  Afogadoe^  a  ajudaido  da^^  senliaeHaa  infieia,  w 
ewbo^ecw  de  noiM  jnoA^  ao  c^geaho  de  AAlooiii 
Feraandea  P^soa  ^  afirQV]MlaflKlo*«e  das  caaas  dm* 
eng^Aho,.  ^uj8  eala«aoi  eroMs  depo&  de  moitaa 
tempos ,  para  sair  a  biiscaMios  b^'  dia  aeguiBtew 
dte?a  per  fronteiro  naqmelle  siiio  Pedro  Gavakattli 
d*AllMiq«rrqiie,  o  quail  albeio  da  pemicaosa  vizni.** 
han^a  ^  mandpu  a  doiis  aaldadoa  Gom  urn  alferea^ 
que  ao  romper  da  al^a  saiaaam  a  descobrkr  o  campai: 
o  que  fizerao  diiigaDles,  sem  enconirarem  yesugia^ 
de  iaimigo;  n^s  passando  pdas  casas  do  diio 
geiiikO)  forao  aaaaUadoa  doa^  HoUandexea,  ^{ue 
y$m  dAfsearga  matarao  o  alfefts  e  uoi  doa  soldadas; 
Diaa  o  outro  pdde  fugir  e  tooar  a  rebate ,  ao  qual 
aendirao  logo  oa  capitaea  das  eateneias  viziakaa 
oam  sBas  eooipanhias,,  e  se  oppaa^o  valoroaa* 
mtente  ao  esquadrio  inimigo,  que,  coaifiado  ma  pe^ 
d^r  o  no  pacto,  avan^ira  fturioso.  Ouvio-se  no  Aiv 
raiai  a  moaquetaria ;  earrerao  os  goyernadapes  ooaa 
a  soccorro ;  a  foi  antao  que  o-  aai^nto  maior  Car^ 
dofto,  veftde  que  aa  companhias  dos  HoUaodeaes 
aa  fotmovao  en.  corpo  aeparado,  e  ^mpn^ya^  aa 
cargas  nos  Portuguezea^  mapdott  iflOttedialaQieafee 
i?e4irar  os  UoUaBdezes  para  traz,  e  aasiuitse  ataihou 
ai  traicao  naquella  hora ;  a  qa^  da  todo  se  eyitoat 
COM  a  chegada  do  capitao  Antooio  da  Sttva  y  que 
com  sua  tropa  e  a  de  oulroa  moradoras  conoeiv- 
v^o  J  chamados  do  rebate  j  cobrirad  d«  manaiffa 
oa  traidores ,  que  y  sem  manifesio  risoo  de  aaram 
diegokdoa^  nao  podiao  bzer  a  meiior  aocao  de  iai* 


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OAISI  MOll)  LUSflJUNO*  SSI 

tBff^rm.  Vendo  o  Flanwngo  que  o  phwo  da  traicao 
iiniiu  Mh^Nl^,  e  seirtindo-se  san^ado  db  nosso 
fciPrO)  ^  ret?iroti,  largamto  o  campo  com  basfante 
perda ,  porque  m  nossos  o  lerario  i  espada  aif 
d«iirtre  das  casfla  da  fbrtaleza. 

IV .  FfM  e»(ar  oecasiao  a  mai^  arriscada  ,  e  a  wxy 
Hior  BoeoedMft  de  toda»  quantae  tfe  atpefla  gtieira, 
porque' eras  pequew^  c«8lo  sc  atalhou  irreparavcl 
damno.  Setle  homeiis  nos  matfirao,  e  ferirao  a 
tnrniat  eckico;  mna  baila  de  peca  roeoo  a  copa  do 
eliap^  ao  mettre  de  campo  Andrd  Vidal,  sem  mais 
daatio  qub  urn  leve  aasombraraento  dos  oHios ;  o 
govemador  Joao  Femattdes  Vierra  e  o  sargento 
mtttor  Antonio  Dias  Gardozo  sairao  sem  lezao  ape- 
tarde  andareiB  poreBtrenuvens  de  ballas  dispondo 
eomo  capilaes,  e  termdo<Kymo  addados  em  todo  o 
tempo  do  eonflioto ;  foi  -em  todos  igiial  o  Talor,  e 
aimilhanle  a  gKn4» :  per  isso  ignat  elogto  a  todos  ^ 
derida.  — Derxow  o  inmrigo  no  eampo  trinta  mor- 
toa,  que  nao  p6de  retirar;  oa  ferrdos  forao  aem  n»- 
vaero.  Na  retfrada  for  maibr  a  perd»,  porque  erao 
08  golpes  dift  espada  maia  certoa  que  o  do9  petouros ; 
cemdellea  e  grande  copia  de  feridosr  aepassarao  para 
0  Arrecife,  omia  morrlrtpo  tantos  das  cnraa  como 
das  fcrida^.  Na'pasaagem  da  fortateza  dos  Afogadoa 
para  o  Arrecife  os  e«perou  Htenrique  Dias  de  em- 
maeada,  e  com  oa  sens  aoldacbs  os  sangr^m  de  ma- 
tteira,  que  tev^rao  «si»to  qac  ehorar  na  despedida 
eomo  M  pel^ja.  Aaaim  pagou  o  NoHatidez  a  traicao 
que  ordio :  (Wuto  bem  merecido  de  sua  insolente 
pOnMlia* 

V.  ©a  estraogeiros  complieea  Ba  ttaicw)  receavao 


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388  CA97MOTP  umX4MK 

ser  descobertos,  e  por  b3o  buscarao  meio  de  enc^ 
brir  o  delicto  commeltendo  novo  crime,  ou  con- 
summando  o  ja  come9ad0«  0  capitao  Micotao,  que 
era  o  mais  comprometlido  aa  traicao,  e  outro  do 
niesmo  tei  co  propos^rao  ao  goveraador  que  os  sol* 
dados  de  suas  compai^biasy  corridos  de  que  os  ti- 
vessem  arguido  de  fracos,  os  perseguiao  e  impor- 
tuDavao  a  que  Ihes  procuras^em  uma  oceasiao  tal , 
que  na  opiniao  de  todos  os  restaurasse  na  hoora 
perdida ,  e  que  se  uao  deyia  perder  a  que  o  teiopo 
Ibe  dava ,  porqne  sabiao  de  cerio  que  o  inimigo 
havia  de  sair  a  prover-se  d  agoa  doce ,  e  deleroii- 
nava  esperal-o  d'emboscada,  e  uao  deixar  HolJaa<- 
dez  com  vida  y  ou  perderem-na  todos  oa  pcK^asiao , 
para  o  que  mo  queriao  de  sua8  s^ohorias  mais  que 
a  licenca.  Os  ovestresde  campo  com  a  credulidade 
Ihes  conced^rao  a  supplica,  ainda  que  contra  a  von* 
tade  do  governador.  < —  Suppunha  o  Esirater  que, 
se  no  ter^o  bouvesse  algnns  combanidos ,  os  mais 
nao  deixariao  de  ser  fieis,  e  que  iazendo  elie  a  es* 
coiha  dos  que  haviao  de  levar  ^  dous  capiiaes, 
Ihes  cortava  os  intentos.  Mandou  formar  o  ter^o, 
e  aberto  em  duas  alas  o  esqpadrao,  noiando  os  ho- 
n^ns  que  os  dous  capitaes  apontavaOy  a  todos  escu- 
sou,  e  Ibes  permittio  sessenta  e  tres  esUrangeiros 
sorteados,  que  de  todas  as  companhias^scolbao, 
crendo  que  d'esta  sorte  Ihes  dava  soldados  fieis  para 
a  ^npreaa ,  e  nao  coi;npanbeiros  para  a  trai^ao; 
mas  foi  a  supposifao  falsa,  coiia0  adfante  ae  vera. 
—  Pedirao  um  ajudante  portitigoez  que  Ihes  fraii- 
queasse  o  transito  pelos  presidios  de  nossaa  eatan- 
cias ;  e  marcharao  tomando  o  cuimifiiho  do  buraco 


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de  Santiago,  no  qua)  o  nosso  sgiidante  os  deixou, 
come  levava  por  ordem ,  e  se  veto  dar  coma  do 
qoe  patsava  a  seus  supepiores.  EmboBcArao-se 
06  Iraidores  entre  os  maiigueg  ^  6q>eraiido  pelo 
baixa-mary  para  que  netla  d^e  o  rio  Beberibe 
vao  &  passageiD ;  e  tanto  que  <chegou  a  bora  se  po- 
Siftrao  todos  da  outra  banda,  e  ferao  marchando  por 
entre  as  fortalezas  do  inimigOj,  tocatido  caixa,  e 
dando  saWas/at^  its  portas  do  Arrecife,  saindo 
-d'elle  OS  do  supremo  consetho  a  receb6l*o8,  para 
que  o  exempio  da  honra  convidasse  a  imitacao  da 
perfidia.    • 

VI.  Assim  que  o  governador  da  Kberdade  rece- 
beo  esta  nolicia^  fez  as  diligiencias  possireis  para  se 
certificar  nella ;  e  logo  que  teve  certeza  do  facto 
eofumunioou  o  successo  com  o^  mestres  de  eampo 
Andr^  Vidal  e  Martim  Soares ,  e  concordarao  em 
que  se  declarasse  ao  mestre  de  campo  Tbeodozio 
Estrater.  Incredulo  o  aehou  a  nova.  Gotitra  a  ver- 
dade  da  notkia  instavao  os  argumentos  da  razao,  e 
parecia-lbe  impossivel  que  se  passassem  ao  inimigo 
homens  que  de  proposito  ^colb^ra  a  cautela,  com 
a  fiancadospenhores,  deixaudo  entre  nosmulberes, 
filhos,  escraTDs  e  fazendas  condemnados  a  satisfacao 
da  divida.  —  Certificarao-no  do  facto  e  da  opi- 
niao  errada,  dizendo-lhe  que  o  nao  chamavao  como 
a  r^,  senao  como  a  juiz ,  a  quern  pertenda  casfi- 
gar  o  delicto ;  e  Ihes  pediao  sentenceasse  a  causa 
pek>  merecimenlo  do  proeesso ,  e  quando  a  piedade 
nao  p^mittisse  castigo  adquaido,  ao  menos  se  Ihe 
d^ase  remedio  opportunp.  Ao  que  wspondeo  Eetra- 
itv  confiado  6  confuso^  eomo  fiel  e  oarrtdo :  <r  ]&  tao 


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3M  Qunmn 

»  abottiiaaveia  Ctttpa,  ^mt^  tauiwidade  devosaas 
ii  sealwriaa  a  pode  faaer  crhffA  j  e  a  dovkUirw  aa 
»  oUMk^4MMltt<quandoaykM.maisailmAM..Fei«a 
4  >eoai|rfie€a  aaaseMa  «  4ms  9n\4mim ,  que  caaollH 
i>  com  vidaatriaaaAre  m  decinwe^wfoatiimjio 
%  hmsu  regiadtttoy  io&Uivel  i  laga  Baa  iui 
j»  que  ic|a  .fiel.  A$  laia  ila  ntlicia  cone 
»  06  daItiM|iiAates  a  aoiAe  irraaNBaivei,  am  ^o»- 
A  ^^pie  S€^  fm^  baataaHe,  feaaa  por<|iia  leaadkia 
»  ainda  c|ua  aao  aaiiifa^ ;.  e  aaawi  julgo  qiie  lo*- 
»  doa  asorrao  |^  ^^kae  ^  pois  a  iodaa  eaU  pa- 
»  vado  o  delicto^  e  que  nao  isente  a  espada  miidMi 
4»  fu'opia  ptfiBoa^  pois  accaitet  aer  cabo  de  ul 
a  genie,  m  -Cveiceo  ^a  Irisileza  earn  a  pai^Oy  e  a4ai- 
U^ada  o  diacttrso  ae  reoolheo  para  sua  caaa  eoaa  o 
sett  aangeBto  aiator  FraBckeo  dela  Taur,  lao  ooca- 
pado  do  peaar  <}ue  ae  viv^ffao  para  o  aenlimeDta, 
Aao  viviio  para  a  coBumuiica^aa.  —  Sem  dtla^ 
maiMloii  Joao  FarAandea  Vietra  fomiar  os  tercoa  de 
nossa  aailicia,  e  deoatro  d  elles  o  dos  estraBgetros,  a 
todoB  08  quaes  se  tomarao  as  armas ;  dando-ae  mo 
£aesmo  teoapo  escHitiiuH)  a  snaa  caaas ,  em  as  quaes 
seacbaiao  nao  «6  claros  ladiciMt  aanao  evideoies 
pvovasde<}ue  todM^erao  complices  oa  irs^aa*  Fve- 
raQ-se  aidsos  a  Paraiha,  e  ouiras  paries  onde  hafia 
CQiiipaiibiaa de  es4raD§eiros,  paira  que  cohi  elloaae 
eateouiasae  0  iaewaia ,  e  se-ffemeitesaeBi  as  armas -e 
soldadoa  aa  ihmao Aiwwiial;  «s  quaes. birefteaiaBle 
cbeg^te^  e  eoBi  oiuiJbeiiea  e  iilboa  ae  iwiAirao 
para  aSahia  a  diific#te«Dida,ga^ef3iA4(Mir|^al4lo 
Cstada^  iO.«aalra  de  oampo  ThecMloaio  £airateRy>e 
seu  sargoBla  Bsaicr  iFraAnsQa  de  k  Xoup^  passados 


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•Igniift  liiae  ^  aloan^^rfe  iioea^a  para  9e'|)ftSBateiB  t 
mr vir  na  fiaMa ,  ond«  o  goveimador  g^al  o&  r^^be^ 
€0»  a^anUio^  6  aocoaiibodoa  ocfm  !h<mi%  xkts  imb-^ 
fiiw  |Nlstt>8,  em  qnt  imbio  sn^rrido,  datidb4b66  uitt 

Ylii  Gom  urn  wosmo  cuidado  ae  «ta«t6lava  « 
descobrto  o  inimigo ;  fKMittii  a  oosadik  dos  P<irtih» 
guetes  nompta  pek  diffiouldad«,  taoto  tjue  Ibe  mos- 
tMrra  a  ococifsiao.  Pei%ii«dido&  per  Henrkfiv^  Diaa?  9Pi 
detepmmSo  M  nos^A  gotetnadore^  e<fti  'ferir  o  HoV 
laridke;  iwi  parte  maid  'sensiTeL  Curtuitla^a  sair  da 
fiMriaieis*  dos  Afogados  a  reeeber  e  <K>mb«ia^  cm 
9occorto^  y  que  do  Arrecife  ttie  maudavio  Codbs  os 
sabbados,  para  o  sustento  de  foda  a  semana.  Mani^ 
cUirio^se  pre¥67]ir>a^  nodsas  estancia^  de  gente  e  de 
vigilatickiy  para  que  por  qfualqiter  parte  (Spue  o  ini^ 
migo  detet^tninasseo  soccoi^ro  lb*o  oortaase  a'cspadai, 
Disposto  j4  o  assalto  se  teve  coatax^om  a  fogida^  a 
para  coHar  esta  $e  eiBt>08dKra6  m  mesmo^  goferna^ 
dores  jtffMo  k  fortaleEa,  com  kitMtos  de  a  entrkrem 
d'envolta  com  os  Hoilande^es,  na  occasilo  qua  ee 
recothessem  de$trocados«  per^oidos.  Amaiitieoed 
o  sabbado  eseolhido,  e  o  Flamingo  nS^  siio  no 
tempo  ea&tymado^  ou  porqfiie  cotheid  algum  indkiei 
ou  po9^ue  algum  outromcftdeMe  Riealtaraua  ham 
aeuio  cote  du»  tioras  de  sol,  a  miA'  auificiaBia 
66colta.  Deo  uaa  emliosoadas  de  Ifeimque  Dios  ? 
p«^eo  a  ttiaior  parta  dos  viteras ;  deixou  dMe 
mortote  ti^  6apdvoa$  tfdaaaro^ado^cMm  leVermat*' 
t^ficia  fogk>.  Mio  M  8eg»ido  pe(a  amiMidio  daa 
ballad^  que^todaaad  fertariittaa  iatotigavcrutavtao 
0^f.  \(Aim  Hani^qoe  Maa  para  a  SM'eMincia, 


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MS  GASXilOI^  LOSITinQU 

a  onde  no  mesmo  tempo  chegario  o$  govemadorcs 
com  a  sua  gente ;  os  quaes,  veodo  que  o  inimige 
com  a  f  iiga  se  desviiira  do  la^o,  deixarao  as  eml)05* 
cadasy  e  por  eutre  o  mato  sairao  ao  lugar  do  coa- 
flicto ,  desejosos  de  desembainhai^m  as  espadas ; 
diligenck  que^  se  nio  chegou  a  coiicurreDcia  do 
combate,  servio  a  congratula^ao  da  victoria. 

VIII«  Ha  8uecesso8  Lio  e^tranbos,  que  nSo  sabe 
o  juizo  humano  deixar  de  os  atiender  como  prodi- 
giosos.  Muitas  vezes  se  pepetio  nesta  hisCoria  o 
nome  de  Sebastiao  de  Carvalho,  que  escond^ramos, 
se  £5ra  possivel;  mas  como  ?  As  imprensas  o  tern 
divulgado,  e  outras  pennas  primeiro  que  a  uossa  o 
descobrirao;  e  no  que  escrevemos  seguimos  memo- 
rias,  e  iiao  fabricamos  successos.  Nao  se  fez  menos 
lembrado  o  autor  da  ruina  que  o  da  restauracao : 
a  fama  igiialmeate  voa  com  aaazas  dageaerosidade 
e  da  vileza.  Foi  este  bomem  o  que  revelou  aos  Hoi- 
landezes  a  primeira  determina^ao  da  liberdade; 
foi  o  inimigo  da  patria  mais  peruicioso  que  todos 
OS  inimigos  d'ella ,  porque  o  inimigo  conquista ,  o 
traidor  entrega.  Deixou  o  sobredito  bomem  umas 
casas  feitas  denovo,  espacosas  e  bemobradas,  de 
pedra,  tijolo  e  oal  as  paredes  e  pilars  dellas ;  es- 
cadifi  e  porUes  de  pedra  lavrada;  oi  alicerces  soU- 
dos,  OS  madeiramentos  firmes;  o  que  fazia  beliouo 
ecUficto,  em  qae.{>er0ianecia  a  meiotpria  de  seu 
aatOFf  que  se  cbamavao  casas  de  Sebastiao  de  Car- 
vaUio.  Mo  tempof.em  que  succedeo  o  que  esere^e- 
moB ,  se  apoaenlsva  nellas  o  capitao Paulo  da  Cunha, 
o'qual,  na  ocoasjao  que.acabamos  de  referir,  qu- 
viado  o  estrondodas  cargas;^  artiH^aria,  parlio 


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QlimMOTO  UlSlTiLMO.  MS 

com  a  geote  daseo  preaidio  para  a  parte  onde  o 
chaoiava  o  combaici;  a.  di^taocia  do  caminho  Ihe 
oao  d€o  t^mpo  a  ehegar  ao  da  peleja;  e  oonteute 
com  a  rela9ao  do  sueeesso  $e  voltou  logo  para  o  sea 
quartel.  Tres  kovd^s  de  tempo  Ihe  poderia  gastar  a 
deten^a  ;  bufKX>u  as  casaa  pom  os  olhos^  e  so  as  vio 
com  a  memorial  reduzidos  os  materiaes  a  um  cu- 
mulo  de  carvao  e  <iuiM,  tudo  consummido  tao  sem 
tempo  I  que  a  estar  a  materia  disposta^  e  natural- 
mente  sujeita  ao  fogo  nao  pod^ra  conaummir  o  iiv- 
ceadio  em  tr^^  dias  o  que  gastou  em  (res  horas. 
Eatrou  a  coosidera^ao .  a  iazer  juizo  do  caso  y  e 
todos  o  ayali^rao  por  oastigo  do  oeo ,  porque  se 
nao  deixou  ver  o  castigp:  senao  pelo  estrago  :  mos- 
trando  este  que  aqueUe  se  offende  taJDdo  d'uma 
traicao  iugrata^  coma  d'uma  torpeza  infame. 

IX.  Neste  tempo  chegou  a  Bahia  uma  caravella 
de  soccorrO)  e  ueila  uma  companhia  de  soldados , 
que  trazia  do  reiup  para  guarni^ao  da  mesmi^  pra^a ; 
seu  capilao  de  mar  e  guerra  Mauoel  Ribeiro«  Para 
que  da  Babia  fizesse  yiagem  a  Pernambuco  a  pro- 
Teo  com  abuudancia ,  e.  despachou  com  iHrevidade 
Qgoveruador  g^ral  do  Estado  Aatonio  TeUes  da 
Silva ,  com  expressa  ordem  que,  nao  podendo  to- 
mar  oporto  deN^zareth^  arribasse  a  Bahia.  Largou 
panno  o  capitaQ  Manoel  Ribciro^  naTegando  na 
direitura  do  postp  comignado ,  a^istou  tres  naos 
flamengas,  que  Ih^  d4rao  ea^a  tras  xlias,  oo-fim 
dos  quaes  se  aqhw  Ba  altiyra  do  poi[te>  do  Gai^vo ; 
arribou  a  eUe,  topiou  faUa  dps^movadores*;  e  co* 
nhecida  app|9[^]^l4Wid«de4a'Sa9eom>»  ae  deUberou 
em  faltar  ao  preceito  por  jiao  faltar  a  nocessidade. 


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Entrou  a&  barra  gran^,  ^Aeo  reterte  de  mmi  diegMda 
com  tmwi  oarga  <le  mosquetlnria ;  acudirao  m  mor** 
dbrcB  tfaqueie  <iestrict« ,  qm  jimtoe  cmn  <»  sd^ 
dadee  e  com  a  gen«8  do  mar,  dekarao  em  teita  tiMit 
a  earga,  e  o  c»piiiK!^  c  s^adiw  yiara  a  comboiarem 
al<  o  Aniiiai.  BespaclKm  a  cmbareft^  ua  segukite 
fiofee  para  a  BaMa,  onde  chegou  a  sailvamen to, 
oonio  «afliiiem  ao  Arraial  o6  meMimenios,  nrnm^ 
coes  e  rofipaa  da  soc»ito  ;  em  mna  «  oatra  ]^rte 
foi  tetwiada  a  PcsohicAo. — Enttcgoo  d  capitao  Ma- 
nuel Hibeiro  o  soocairo  aos  nossos  govemadows , 
c  c€wi  «Ue  diwrsas  cartas  A)S  IfoWandfews  prisio^ 
Aeiro»  que  eataveo  na  Bahia,  escrites  e  efiFiadaa 
com  beneptecito  4o  go^?«rnador  do  Estado.  Entre 
eUas  vifuMto  outras  reme^idas  a^^  conaelho  so^ 
premo  do  Airecife^  mMi  d«as  quaes  era  de  Hem'ique 
HisB ,  Mtra  do  capitao  mayor  des  Indios ,  e  outra 
de  aeu  sargento  maior.  (I-embrado  dere  estart)- 
leilor  que  forao  estors  as  principaed  pessoas  que  st 
pend^o  na  occasiao  de  doM  Anna  Paes. ) 

X.  Descjava  Joao  Femandes  Vieira  sabei*  o  que 
no  Arrecife  ae  pffsaa'va ,  e  aprm^ettou  esta  oecasiao 
como  mais  pmpicia.  Maadcm  preparar  e  ajudante 
Cardoao^  sujeito  em  que  se  achaA^ao  09  requesiios 
necesaarioa  para  o  Aegocto  -e  para  e  pwtexto; 
Chegoa  aa  Airrecife,  foi  bcft  recebido ,  ainda  qnt 
torn  a  eautete  de«nfrar  ^»^m  olhos  cobertos ;  entre- 
gou  as  oatM^,  e  f^edio  Itcenca  para  entrcgar  a  Ro- 
diHg^  de  BaitMia^  q^e  alH  ae  teoYiAfk  prisioneitt) ,  o 
8O0c<9Prre  e  rafiKMo  qtie  sua  mulher  Ihe  mandaTa". 
Foi  MMiito  Ibemliwpedadb  pw  ordei&  dos  do  eon-^ 
aclbo  maippmib  f  M  viaitkdo  pbr  todaa  as  mYitfaered 


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do8  pn^oneirM,  de  euja  Ul}erdacle  ee  tratma  nm 
oaart«i;'6  foi  enltB'  ifiie  Matrgvita  Maleanaes, 
amlher  flk  HBoriqiie  Hbs  ,  disse  qoe  eslava  tMi 
gwaaAm  obrigaoow  ao  ^ttroader  g^al  «k>  Sslado 
•pdad  DauiiaB  iMvces  e  £enFei«ea  cpie  aeu  BMnddD 
«l'elle  irecebk^  «Beareouido  o  fmcroao'eililo  com 
({«ie.tMtarva;a  todos^oa  pnatvnetrosi,  o  ipe  era  dsro 
f<ytniMiiiho*de  saaf^raodesa  d'aniiao  e  d»aKi  iUue- 
Ire  ftaBohnenlOk ^'^  Lidas  aa  carua-«fla  cohisclla^^  e 
QOMsferada  a  mai^m  d'eilaa,  aebanio  qiietiao  am- 
vioba  tufonitt  a  eUas  por  enlao ;  e  *wm  am 
aoordo  BMndaraa  d&zar  ao  eniriadii  quea  icOflfdi- 
ea^ao  vie  nfgocies,  com  4|iie  de  preaeaile  se  adMMo, 
impcdia  a  brevidade  de  eeu  despaeho ;  n>aa  <|ue  w 
aa  CMidesB  que  trasta  Ifae  permetliiio  a  deoeiMai  de 
Irea  diu ,  esperaase^  e  as  fevma ;  <piaiodo  nao ,  ae 
poderia  veltar^  por  nao  <(xceder  oa  Icrmostda  Koeii^, 
oepio  de  que  elles^  ao  tempo  apostado,  mm  fakai^ 
riao  -com  a  pontualidade  da  resposla*  iauigiiiavaD 
€8  do  ooBseUio  auprenae  que  o  ajadaate  rinksk  por 
aapia,  e  por  iafio  uaarao  desta  malksia  para  ae  aaaa^ 
gutavem  da  suapeila;  maaaajwiante,  qneconheoeo 
aea  inftenio^  Ihes  reapondeo  que  oa  soldadoa  nao 
serviao  como  queriao,  senao  como  Ihes  ordeMiWio>; 
qua  iraaia  o  pnoo  fao  eoiMo,  que  aao  paasava  d'um 
dfaiy  e  qaeaosiai  Uiea  pedia  licen^a  parase  vchatCj 
e  jimtamealtf  para  poder  camprar  umaa  ptuau»  de 
caHwabo,  por  raaau  qse  deseja^^a  aruilo  qoaamm 
aeahoriaa  o  oeabecraaem  por  seu  obrigadD'  aaa-'oa*- 
jtaanea  ^iie  d^aae  o  tempo.  DiaaimuUi]JM>oa  io^^ 
vefuoa  intelUgencia  earn  oa  apfiteaMadamiaadia, 
e4teiKAraopaniroa)udMCle;'0  <faal  eamprafli  Oa 


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396  G49TIIHyiO  LUBITAna 

•pluBias^  e  oom  ellas  no  chapeo  saio  do  Arrecife. 
Poucos  passoB  fora  da  trinchetra  vio  no  caminho 
uma  carta  oom  o  sobrescrito  em.flanieDgo;  des- 
conheceo  a  lingua  e  a  letCra ,  mas  nao  duvidou  que 
para  ser  achada  a  fieerao  perdida.  Cfaegoa  ao  Ar- 
iftial ,  conUm  o  que  Ihe  hayia  ^oocedido,  e  o  que 
tmha  d^servado ;  entregou  a  carta,  a  qoal  ae  ah^o 
publicamente^  e  nella  se  achirao  duaa  gaselas  em 
liog^  Aamenga,  e  uma  carta  para  o  meatre  de 
campo  Theodozio  Estrater,  que  eUe  leoem  toz  aha ; 
cojo  argumento  se  resumia  em  o  afiBrontarem  com 
appellidos  ignominiosos,  dando-lbe  em  rosto  com  a 
efitr^a  da  fortaleza  de  Nazareth,  e  oom  ser  traidor 
ao8  Estados  e  a  Companhia,  servindo  sem  pejoaos 
aiiaugos  d'ella,  e  outras  cousas  d'eale  lote ;  por^m 
escrito  tudo  em  frase  tao  barbara,  que  igualmente 
fenfasfiou  com  o  estilo  e  com  o  assumpio.  Queria  o 
-Estraler  deapicar^-se ,  como  sentido ,  mas  os  nossos 
Ibe  :aoonselharao  que  ae  yiDgasse  como  discrelo. 
For  Alberto  Gerardo,  que  servia  de  lingua,  se  man- 
dirao  ler  as  gazetas ;  na  parte  d' ellas,  que  nos  to- 
cava,  erao  tao  evideotes  as  mentiras,  que  se  julgoii 
.oompoai^o  da  ignorancia  todo  aquelfe  artificio  da 
malioia. 

XL  Mo  porto  do  Arrecife  estavao  surtas  nesta 
occasiao  muitas  n^s  hollandezas.  Dous  soldados 
nosaoa^  filhos  de  Pernambuco,  se.  o(Eereceiio  ao  go- 
yemador.  para  as  queimarem,  o  que  Ihediss^rao 
aer4hes  muito  faciL  E  sem  communicarem  a  nin- 
fj^em  o  segredo^  se  aparelhMo  oom  loda  cautela 
.que  o  oaao  pedia  e  que  a  licen^arecommandaTa.  £m- 
barearaa*«e  n'uipa  jangada,  que  tom^ao  na  bar-- 


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attmsKfto  unMTAno.  397 

reta ,  oom  todos  06  materiaes  necessarios,  e  fayore* 
cidos  do  escuro  da  noite,  e  do  surdo  do  remo^  sem 
serem  sentidos  se  acharao  entre  as  ntos  mimigas ; 
escolh^rao  entre  todas  as  doas  mais  alterosas,  em 
cada  qua  I  pegaiio  um  artifieioso  composto  dos  male- 
riaes  mais  obedienies  ao  fogo^  que  ateado  nellas,  co- 
me^arao  a  arder  com  tamanhas  labarcdas  que  as  Tia* 
o  espanto  Ciim  os  olhos  da  perda^  primeiro  que  se 
lembrasse  do  remedio  que  pedia  o  perigo  dos  mats 
navios.  Foi  grandea  confusao  dos  inimigos  asrim 
no  mar  como  na  terra.  Innumeraveis  barcas  sairao 
a  atalfaar  o  damno,  que  fora  irreparavel  se  hou-* 
vera  qualquer  venlo  que  soprasse  o  Togo.  A  muttas 
Baos  se  cort^rao  as  amarras  deixando-as  a  vontade 
dos  mares,  appellando  da  voracidade  d'um  elemento' 
para  a  eolera  do  outro ;  os  que  virao  de  terra  o  in- 
cendio  tem^raoque  das  niospassasse  aos  edificios, 
e  fogirao  para  a  cidade  Mauricea  :  nenhum  se  lem- 
brava'de  fazenda,  cada  qual  attendia  a  eomtrvac^ 
da  vida.  Siicced^ra  o  que  se  receava,  se  a  viveza  da 
diiigeneia  nao  venc^ra  a  do  fogo,  que  no  esirago 
d'uma  s6  nao  se  consummio ,  e  na  menor  parte 
d^ourtra  se  atalhou.  Os  nossos  soldados,  amparados 
da  confusao ,  yararao  na  praia  a  jangada ,  entre  a 
porta  do  Arredfe  e  o  forte  de  Diogo  Paes ;  sairao 
em  terra,  e  earregarado-a  as  costas  a  passarao  da 
outra  parte  da  restinga  d'areia ;  lancada  outra  yez 
ao  rio  Beberibe,  yogarao  para  aestancia  das  salir 
nas ;  mat  como  as  sentinellas  nao  estavao  perveni- 
das  9  e  uma  d'ellas  era  soldado  btsonho ,  apezar 
d'eHes  gritatem  que  erao  amigos  Portuguezes,  dis-* 
patou  0  mosquete^  e  quebrou  uma  pema  a  um  dos 


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98M«4oB  9  de  cttja  feridai  ostore  hem  prostmo  4e 
OMprer,  mas  em  fim  etcapoii  oom  ¥idb.  O  govra^ 
mdor  JoM  Fomaades  Vieimoe  recebm  nos  bnicoB, 
mbiwAB^  nao  |HMkr  ehegar  com  a  joreono  oodr 
dN^va  a  eafimacao  do  servico.  Uapn  a  fbrtinHi 
con  «N^s  doua  soMadoa  o  qii«  cuBtmntt  c<mr  tados 
a»  que  ofcrao  por  offidrta,  porque  nao  so  Hies  ntgou 
a  satiifadio  senao  que  turftbem  Hies  escewko  o 


Xli.  Chegiraa  nestai  eoeastao  avisos  de  Cunhai, 
petos  quaes  entendtrao  os  nossos  gorvemaderes  q«e 
o-  HoIIandez,  ajiidado  de  Pero  Poty^  recolh^*a  a  si 
todo  o  gado  que  pastava  na  campenha ,  para  aewh- 
dir  com  elle  4  fome  do  Arreeife ;  e  que  andava  d» 
senhor  do  campo  que  ronbava  e  destraia  todb  a 
am  vostade,  sem  que  teinesse  a  menor  resbteaeia  ; 
paasando  sua  coofianca  a  aineaear  urn  so  as  poroa* 
^ees  do  Rio  Grandev  senao  as  da  Paraiba.  Refi^escou 
eMi  noTHa dos  da  passadaohaga,  «pelo  nao  ahrir 
oom  nova  fertda^  despacharau  (no  principio  de  De- 
Maoibro)  a  dont  Antonto  PbHippe  Canaraa  com  o 
sen  terco^  e  eom  duz^n^oa  Tapvyas  auadtiares,  oam 
ordem  que  pdos  destrictos^dfe  €unkad  e  Rb  Graarfe 
oastigassem  a  fierre  e  a  fo^  ifoUandezes  e  Imtios 
seus  pareiaeSy  e  com  cxaetadtUgenda  procurassaot 
seeolher  todo  o  gado ,  assim  rcnsontada  como  de** 
mestioo^  e  o  concbizissetn  para  o  Anraial. — Parian 
sem  drniona  a  nossa  gente,  chegpu  a  V^mShetj  e 
depots  de  ajostadaa  cotn  o  goremador  aa  coava*- 
niancias  da  defensa  e  da  mrpedi^^  oontinnou  a 
HMFcba ,  lerando  cooMigo  ciaoaenta  konena  ex- 
pwtoa  e  pratkos  nas  Toredaa  do  terveno,  guiadoa 


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dos  quaes  cheg«F«K>  a  eampaQha  do  Rio  Gnonk. 
^ia  houve  vida  a  que  perdoasae  a  eapada,  nem  fii«> 
aeaad^  a  qi4e  aao  eiMiaiMwiiaait  o  fa^,  reoeband^w 
nmersLYem  paciente$  a  uia  »efine>  tempo  a  m^/im  e 
o  golpe.  Oovio-se  o  golpe  do  eastigo  dettiro  d»  Smh' 
tilezA  do  cofHram,  Kstreoieceo  ao  prwMiro  grtte^ 
eeobrad^  do  medov  dfet^roainou  satisfezer  4q«eixa 
oam  raider  inaolimcia  que*  a  do  aggravo.:  pedio 
auxilio  4  fortaleza  da  Paraiba,  que  aggregftda  » 
Qm^  ^qtiie  tinha  feeu  xtm  grosso  de  oilo  ceniM  min 
i§if>$  :  poder  wm  que  90  iiDaginava  aenbior  da  vic^ 
tmifiiy,  porque  suppiwha  debil  a  peaisleocia  do  re-* 
pnw.  Tomou  O'pulaa  as  for^as  peb  bpa^  d&  T«jUo^. 
^,MK>  pttle  do  valor ;  e  pagou  a  condewaa^  q^B 
\L0  dederminoii  aeirra. 

XIII.  ResuAiia'-se  o  uumero  de  iK>86a  gmte  e^a 
$ai»  cantos  hoqoeQ^,  duaeoioa  ctacoenta  Poitutn 
guMaa  6  tr^azaoto^  eifieo^nta  Indio^,  obedieatoa 
WIS  9  ottlros  ao  govevm^^r  dom  Anioaio  Philippe 
GftBiarao*  Oc(9iipa*ao  para  quArlsl  o  ouieiro  de  uimi 
ctmpiua  quet  atrawefisava  uaa  pequ^no  ria;  qiM 
pela  froiMe  Iba  aarviacfe  cavn^  eo»  baa^nta/i»nda», 
e  pi^  parte  coQtram  um  deiia»  iaboeal.  ^m  Urmsh 
de  triiMslwiira  ;  deniro  da  labocaJL  e  ckkcio  se  alojava 
ai^^ssa  gwi(Q  eoiaecilrada  e  saida  para  o  none  a» 
parft  a  sid.  Cevtiiticado  o  Camavao  da  restiMufao. ,, 
QpBa  que  o  ioknigo  se  ppeparsiva  para  o  lais^^ar,, 
gmuTttoeeo^  o  amaiMoio  oa  forma  segiiiAie  :.  etla 
com  o&'oapUaes  Jom  Barbozo  Piolo  e  Joao  de  Ma«* 
g^lhae&  com  as  suas  QOiiip0iihiaiS  e  ^aria  de  seua 
lodios  tMaarao  a  ^ua  coala  a  defeoaa  da  ejutrada 
ptto  .parte  da  wt,  oo«io  loaia  pvoiLiiua  a  iave&uda. 


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400  CASTftlOTO  LtrstTAna 

do  iaimigo ;  e  ^  dn  parte  do  mnrle  deo  ao  capitao 
Jacome  Bezerra  ^  com  aua  companhia  e  a  dos  mo- 
radores  que  ae  (he  tinhao  aggrcgado ;  a  frente,  que 
defendia  o  rio ,  gnarneeeo  de  Indios  y  como  tarn* 
bem  o  (abocal  que  Ihes  defendia  as  costas. — Mar* 
chou  o  inimigo  contra  a  nosaar  fortificacao,  avanrou 
k  trincheira  que  defendia  a  entrada  pela  parte  do 
nu\j  oobrindo  com  cerradas  cargas  de  mosquetaria 
as  fileiras  de  machados  e  alfangea  desiinados  para 
romperero  a  eetacadada  irincheirQ,  e  franqwearem 
a  entrada  a  sua  gente ;  por^  ferao  repellidos  ]  ehs 
repetidas  cargas  de  nossos  soldados  depots  de  am 
oonflicto  que  durou  por  espacb  de  tres  horas* 
Apezar  de  que  o  iaimigo  perd^ra  grande  numero 
de  mortos  e  feridos,  nao  desistio  com  tudo  da  em- 
preza ;  fez  p^  atraz,  e  formou^se  em  trea  balalhoes ; 
com  urn  amtentott  o  combate,  com  osegundonos 
mandou  cortar  pelo  lado  direito,  por  onde  nos  de* 
fendia  o  rio^  e  com  o  tereeif  o  nos  pretendta  aCacar 
pelo  tabocal,  que  formava  a  noasa  r^taguarda.  Nao 
cons^uio  o  seu  intento,  porque,  em  quanto  os 
Bossos  rebatiao  os  ataquea  do  primeiro^  rec^bia  o 
aegundo  conaideravel  damno  dod  Indios  frechetroe, 
que  estavao  preTcnidos  para  a  defensa^  e  o  terceiro 
c&io  era  duas  emboscadaa,  que  o  esperavao ;  e  dea- 
composto  de  duas  cai^as  cerradas  e  bem  succedidas 
ftigio  desordenado.  Magoado  6  Flameugo  de  tantos 
goipes  ix)cou  a  retirar,  e  achon  bem  poucos  dos 
«feu8  que  o  podessein  seguir;  o  que  visto  pdos  nos- 
sos Indios  levantarao  um  barbaro  e  conftiso  grifo , 
locando  juntamente  sens  bellicos  instrumentos  que 
«tre  dies  i  signal  de  inveatir;  enletideo  o  Hoi- 


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landez  qua  ne  disppnhaa  a  aair  do  alojameoto  e  emy 
regalH),  e  se  poz  em  desordenada  fuga,  oa  qua} 
todofi  obedec^ao  ao  medo ,  uenhum  advartio  a  fak 
sidadeda  causa,  que  nao  conhac^rao  aenao  dentrq 
de  aua  fortalata ;  a  on^  o  aegui*o  Ibea  deixou. virat 
a  cara  para  verem  o  engano.  Gento  e  quio^  mortoa 
deixou  o  Flaatengo  w>  oampo^  e  levou  quioheotot 
&ridQs  { da  nos^a  parte  oao  houve  morte^  nem  fe« 
rida  de  consideracao. 

XIV.  Foi  eata  viotoria^  em  sou  taato^i  nao  so 
digna  de  applause  ^  senao  tambem  de  noo^,  peU 
deaigualdade  do  niunero  ^  pela  duraiQaa  do  cooQictOi 
pela  qualidade  do  despojo,  e  pelo  esirago  do  v&tkr 
cido»  Erao  08  inimigos  a  ter^a  parte  mais  que  os 
vencedorea^  guarnecidos  de  mais  e  melhoreaarmasi 
poupadofi,  e  no  terreno  de  seu  dominio ;  a  porfia  do 
con]A>ate,  demuitas  boras ;  o  exoesso  da  perda^  taato 
quanto  vai  de  tudo  a  nada ;  os  despojos  toda  a  di& 
feren^a  de  armas  e  muni9oes ,  e  toda  a  bagagam  e 
roupas  que  trazia  o  contrario/;  o  valor  doa  vjeto^ 
rbsoB  tao  advei^UdO|  que  depoisde  featejarem  a  Yto- 
loria  ae  deixarao  estar  quatro  dias  no  campo  do 
combate;  os  ef&itos  de  tanta  utUidade  que  bumi*- 
Ihom  toda  a.  soberba  do  inimigOy  e  assegurou  os  mo^ 
radorea  de  todo  o  receio.  —  Em  todas  as  occasioes 
pasaadas  se  tinha  moatrado  Dom  Antonio  Philippe 
Gamarao  digoo  de  sua  fama  i  por^m  nesta  exoedeo 
tseu  merecimento  a  toda  a  fama  de  seu'nome.  Em 
iodos  OS  enoontros  resplaudeceo  aeu  yabr ;  neste 
seu  valiM'  e  sua  virtude,  porque,  segundo  todos 
m  notsoa  oonfessarao,  foi  a  victoria  mais  resuba  de 
ana  oracao  que  de  nosso  braco.  Primeiro,  retirado, 
\.  26 


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gjrtiou  timitJtsv  horas  com  Deos,  que  saissc  a  pelejar 
com  OS  inimigos ;  e  como  se  da  ora^ao  trouxera 
oertezas  da  victoria ,  Ihe  l^rao  os  seus  no  sembhnte 
o  soccesso  do  conflicto.  Dispos  como  experto  ca- 
pitao,  e  pelejoQ  como  valcDte  soldado ;  assim  lou-* 
vou  e  agradeceo  a  todos  os  soldados  e  officiaes  o 
bem  que  haviao  obrado ,  como  se  na  occasiao  nao 
a  tivera  merecido ;  a  cada  itm  em  particular  attri- 
buio  a  gloria  d'aquelle  diaj  e  vetxkdeiramente , 
que  se  houverao  todos  neste  combate  com  tanta 
geniileza ,  qi>e  nao  fioou  soldado  que  podesse  in- 
vejar  os  louTores  que  vira  merecer  aos  compa- 
nheiros. 

XV.  Retirarao-se  os  nossos  para  a  Paraiba, 
c^igados  da  falta  de  municoes ;  onde  os  deixou,  e 
a  sua  companhia ,  o  capitao  Joao  de  Magalbaes , 
que  mnito  a  ligeira  se  partio  para  o  nosso  arraial 
de  Pernambuco,  a  leyar  a  nova  da  ^ieloria,  e  du*- 
zentas  cabecas  de  gado  ;  e  em  primeiro  lugar  a 
pedir  municoes  para  voltarem  sobre  a  fortaleza  do 
Rio  Grandly  onde  o  inimigo^  corlado  do  ferro  e  do 
temor,  fez  a  mesma  diligencia ,  inferindo  de  seu 
estado  a  nossa  resolucao.  — Embarcou  para  o  Ar* 
recife  os  feridos  de  mais  conia ,  para  testemunho 
do  estado  e  do  perigo  em  que  licava  a  forca ,  des- 
tituida  de  presidio^  d'armas  e  de  municoes,  exposia 
a  cortezia  dos  Portuguezes  victoriosos ,  vingativos 
e  senhores  da  campanha.  Esta  noticiase  transmiltio 
confusa  aos  nossos ,  por  meio  d'alguns  negros  que 
se  passirao,  antes  que  chegasse o  capitao  Magalbaes ; 
OS  quaes,  sem  saberem  especificar  outra  cousa  mais, 
di?«erao  terem  vistoentrar  ires  baroos  carregados 


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GAfiTmOIO  LVSlTAIia.  &0S 

de  feridos  que  vinhao  do  Rio  Grande,  e  davao  por 
novas  que  em  uma  batalba  forao  mortas  tantas^ 
pessoas  y  que  era  geral  o  pranlo  na  povoaQao.  Da 
chegada  do  capilao  Magalhaes^  e  do  que  d'ella  re* 
sultou,  daremos  conla  a  seu  tempo »  que  foi  no 
Fcvereiro  do  seguinle  anno  de  1 646 ;  porque  nos 
i  necessario  relatar  o  que  nes(e  meio  tempo  succe^ 
dee  nas  outras  partes. 

XVI.  Partido  Dom  Antonio  Philippe  Camaraa 
com  o  soccorro  referido ,  assentarao  os  jiossos  go- 
vemadores,  que  se  alojavao  na  Varzea,  representar 
a  majestade  d'El  Rei  Dom  Joao  o  Quarto  o  estado 
em  que  de  presente  se  achaya  aquelia  e  as  demais 
capitanias  da  costa ,  com  miuda  relacao  dos  suc- 
oessos  e  das  finezas,  com  que  vassallos  tao  zelosos  de 
seu  seryico  Ihe  mereciao  proteccao  e  auxilio.  Para 
negocio  de  tamanba  importancia  eleg^rao  dous  su- 
jeitos,  em  os  quaes  concorriao  os  requisites  neces- 
saries para  similhante  emprego  :  forao  estes  Fran*- 
cisco  Gomes  de  Abreu ,  e  Francisco  Berenguer  de 
Andrada;  para  cuja  viagem  se  mandarao  apprestar 
duascaravellas,  em  que,dLvididos,  partirao  do  porte 
de  Nazareth  meadoDezembrod'esteanno.  Andava 
o  inimigo  senhor  do  mar,  e  a  traicao  (ao  vigilante 
na  terra^  que  nao  pode  a  dissimulacao  e  o  recato  es- 
cusar  o  aviso  que  se  deo  aes  Hollandezes.  Ainda  as 
duas  caravellas  nao  tinhao  perdido  a  terra  de  vista^ 
quando  a  tiverao  de  duas  naos  inimigas,  que  arri-- 
bando  sobre  ellas  Ihes  davao  caca ;  a  de  Francisco 
Gomes  de  Abreu ,  melhor  navegada  escapou ,  e 
d^gou  a  Lisboa  a  salvamento ;  a  de  Francisco  Be- 
renguer de  Andrada  vio-se  laoacocada,  que  foi 


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fta/i  CASthfOtb  I.TJWTAlfO. 

obrigada  a  varar  em  terra  no  porto  de  Tamaadai^, 
onde  se  salvou  a  gente ,  e  oa  papeis  de  maior 
importancia.  Per  falta  de  soccorro  e  amparo  se 
perdeo  o  vaso;  o  que  sertio  de  nos  advertir  da  im* 
portancia  e  utilidade  que  se  seguiria  de  haver  bo 
porto  de  Tamandar^  uma  fortaleza  y  para  remedio 
de  similhantes  casos,  e  o  muito  que  convinha  for* 
tificar-se^a  Nazareth,  e  intupir*-se  o  fundo  da  Bar- 
reta.  Tudo  se  obrou  em  bneve  tempo,  como  em 
seu  lugar  se  dira. 

XVIL  Em  03  ultimos  dias  d  este  anno  chegou 
ao  nosso  Arraial  uma  apertada  ordem  do  goyemador 
g(h*al  do  Estado  Antonio  Telles  da  Silva,  pela  qual 
ordenava  aos  mestres  de  campo  Andr^  Vidal  de 
Negreiros  e  Martim  Soares  Moreno  que  obrigasaem 
OS  moradores  a  cortar  todos  os  canaveaes  do  recon- 
cavo ;  e  Se  alguns  recusassem ,  Ih'os  mandassem 
tallar  por  seus  soldados^  sem  excep9ao  de  fazenda, 
nem  de  pessoa.  Esta  resolucao  que  pareceo  provi- 
dencia,  foi  desatino  :  assim  errao  os  homens  em 
seus  discursos.  Fundou-se  o  decreto  em  prejudicar 
ao  mimigo,  tirando-lhe  com  a  materia  a  esperanca 
do  lucro,  que  o  sustentava  na  terra,  e  por  este  meio 
obrigado  a  desemparal-a ;  e  aproveitar  aos  mora- 
dores, encorporando-se  com  a  nossa  gente  de  guerra 
tres  mil  sette  centos  e  cincoenta  homens  ,  que  se 
occupavao  na  moenda  de  cento  e  cincoenta  en- 
genhos  que  tinha  a  capitania  de  Pernambuco ;  e 
com  0  grande  numero  de  bois,  que  ficavao  livres 
para  servirem  ao  sustento  do  exercito  •  por^m  o  con- 
selho  nao  comprehendeo  quanto  maior  era  o  damno 
que  a  utilidade,  que  se  nos  segnia.  Para  destruir 


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GiSTAIOTQ  U^WTANO.  405 

OS  iuimigos  era  incerto  o  meio^  porque  ficava  con- 
tingente  o  deixarem  ou  nao  deixarem  a  terra; 
para  os  Portugaezes  era  infallivel  a  perda,  porque 
destruidos  os  geoeros  perdiao  todo  o  cabedal,  para 
sustentar  a  vida,  e  para  coutiniiar  a  guerra.  Com 
outro  maior  perigo  pod^a  por  em  balajQ9a  a  fideli- 
dade  dos  moradores ,  levando-os  a  desespera^ao  a 
buscar  00  inimigo  a  conserTa9ao  de  que  os  prlvava 
o  preceilo ;  por^m  experimentou  nesta  occasiao  q 
maudatOy  sem  excusa  e  sem  replica  ^  a  obedieocia 
d'aquelles  fidelissimos  vassaUos  :  nao  houve  algum 
que  esperassq  a  for^a,  seudo  eutre  todos  o  primeiro 
que  medio  os  incoavenientes  do  commum ,  e  des^ 
presou  as  ooAvenieiicias  do  particular^  o  goverua- 
dor  da  liberdade,  cujo  exemplo  animou  o  decreto 
e  desarmou  o  reparo ;  tanta  opiuiao  tinhao  aquelles 
moradores  d'este  homem,  que  uao  dizia^  nem 
obrava  oousa  a  que  faltassem  j  n#m  com  a  obe- 
dienciai  uem  com  a  imilacao. 

XyiU.  Eatrou  o  aauo  de  4646  para  os  fieis 
ajkigre^  t  para  os  berejes^  iafausto.  Tinha  ch^ado  a 
nossa  fortaleza  a  sua  ultima  perfeicao,  sem  que  em 
todo  o  tempo  da  obra  tivesse  o  Flameogo  a  menor 
DOtieia;  o  pd[*imeiro  dia  do  aono  e  do  mez,  que  com 
o  mysterio  Ihe  deo  o  nome  de  fortaleza  do  Bom 
Jesus,  f^tejirao  os  nossos  com  saWas  de  toda  a ar- 
tilbaria  de  que  esiava  guarnecida.  Das  mesmas 
causas  de  que  os  Portuguezes  tirarao  a  razao  da 
akgria,  tirou  o  HoUandez  o  motivo  do  espaato, 
fohresaltedo  e  coaf uso  de  ouvir  tanto  na  Tizinhanga 
do  Arrecife»  ariiUiaria  tao  grossa ;  d'oode  llie  nas- 
i^  gTMde  receioi  preveoido  quaes  sqriao  as  coo- 


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406  CASTRIOTO  LUSrrARO. 

sequencias.  Para  a  nova  fortaleza  se  passou  o  nosso 
Arraial,  deixando  o  alojamento da  Varzea ;  e  muitos 
particulares  levantarao  casas,  concurrendo  toda  a 
diversidade  de  gente,  de  que  se  serve  a  republica, 
tanto  da  mecanica  como  da  mercancia ,  de  sorle 
que  em  poucos  dias  se  vio  no  circulo  da  fortaleza 
uma  nnmerosa  povoacao  cingida  de  cavas ,  trin- 
cheiras  o  estacadas ,  que  Ihes  serviao  de  mures  para 
a  deFensa,  e  de  termo  para  a  extensao. 

XIX.  No  mais  ferveroso  da  obra  chegou  nova 
ao  governador  da  liberdade  de  como  em  o  porto 
de  Nazareth  deit^rao  ferro  uma  caravella  de  mer- 
cantes,  com  algumas  municoes  e  gente  que  man- 
dava  e  governador  giral  do  Kstado,  e  um  barco  seu 
que  voltava  da  Bahia ,  a  onde  o  mandara  carregado 
de  assucar,  com  ordem  que  todo  o  procedido  se  em- 
pregasse  cm  roupas  para  cobrir  os  soldados,  que 
andavao  despidos.  Partio  logo  em  companhia  de 
Andr<i  Vidal  para  a  Nazareth,  deixando  a  fortaleza 
do  Arraial  e  o  governo  das  annas  entregue  ao  mes- 
tre  de  campo  Martim  Soares  Moreno.  —  Aprovri- 
tou-se  o  inimigo  d*esta  ausencia  dos  nossos  gover- 
nadores,  e  intentou  levantar  um  reduto  entre  as 
suas  fortalezas  dos  Aflbgados  e  das  Ginco  Pontas  , 
em  frente  da  estancia  de  Henrique  Dias ,  onde  sen>- 
pre  achava  castigo  para  o  atrevimento.  Saio  do 
Arrecife  com  um  grosso  d'infanlaria,  e  outro  de  gas- 
tadores ,  com  todas  as  armas  e  apprestos  necessa- 
rios  para  faciiitar  a  obra.  A  esperteza  e  promptidjk) 
das  sentinellas  deo  rebate  a  Henrique  Dias ,  e  este 
a  Martim  Soares  Moreno,  communicando-lhe  pes- 
soalmente  o  inlento  do  Hollandez^  c  pediiKlo-*lhe 


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GA6TEI0T0  LUSlTAHa  407 

soccorro  ao  primeiro  signal  do  combate ,  porqud 
com  OS  seus  soldados  ia  investir  o  Flamengo  ;  para 
o  que  levou  do  Arraial  as  municoes  necessarias. 
Chegou  Henrique  Dias  a  sua  estaneia ;  vio  que  pos* 
tos  em  armas  o  esperavao  os  seus  soidados^  passou^ 
se  com  elles  i  outra  parte  do  rio ,  e  por  Teredas 
desusadas ,  que  o  mato  escondia  as  fortaleias  ini-* 
migasy  chegou  a  avistar  o  contrario  sem  ser  sen-r 
tido;  o  qual  (inha  formado  a  infantaria  em  esqua4> 
drao  cerrado^  com  o  qual  cobria  os  gastadores, 
occupados  em  cortar  fachina,  acarrelar  maieriaes 
e  abrir  sanjas  para  o  reduto,  que  inCentava  £abri-* 
car.  Dividio  Henrique  Dias  a  sua  gente  em  ires 
partidasv  para  que  a  urn  mesmo  tempo  e  por  di- 
versas  partes  dessem  sobre  o  esquadrao  hdJandez 
tres  cargas  cerradas.  0  nao  saber  o  Flamengo  a 
que  parte  havia  de  fazer  rosto ,  com  o  desatino  da 
▼fzinhanca  e  do  repente  j  fez  a  industria  tao  beni 
sortida ,  que  breremente  vio  descompostos  os  sol-* 
dados  com  as  ballas,  e  os  gastadopes  como  estrondo: 
de  sorte  que  uns  e  outros  comecarao  a  deixar  o 
campo,  que  de  todo  Ihes  fez  largar  a  segunda  carga, 
fogindo  da  terceira  para  o  abrigo  de  suas  fortalezas, 
as. quaes  despedirao  de  si  um  chureiix)  de  ballas, 
de  que  OS  nossos  se  livrarao  com  virar  as  costas  ao 
perigOy  satisfeitos  de  conseguirem  o  intenlo,  e  de 
levarem  comsigo  a  maior  parte  dos  instrumentos^ 
que  o  inimigo  troux^a  para  a  f^brica.  A  perda 
contraria,  s6  quern  a  padeceo  a  soiibe ;  os  nossos  de 
nenbuma  se  queixarao^  porque  a  nao  tiverao.  Com 
toda  a  presteza  remelteo  IVkirtim  Scares  o  soccorro 
pedido ;  poi^m  desnecessario^  porque  chegou  i  es^ 


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AM  GABTium  Lusiiiaa 

ttncia  de  Udnrique  Dias,  quaiido  elle  com  sent 
soMados  descansavao  do  trabalho,  referindo  as  pai^ 
ttculaiidades  do  aucoesso. — Ghegou  o  aviso  ace 
Bossoa  goveraadores  ^  qtiando  estavao  em  Nazareth 
eompraudo  e  commulando  generoa  para  o  benefiek> 
da  guerra  e  dos  aoldados,  tudo  a  ouata  da  fatenda 
de  Joao  Feraandea  Vietra ;  os  quaes  ^  dada  brevi»* 
sima  expedkao  ao  negooio  da  fazenda^  acudirao  ao 
da  guerra;  cheg^rao  ao  Arraial  em  43  dc  Janeiro 
pek  meU  noite ;  e  aem  $e  apaarem ,  forito  &  es« 
UDcia  de  Henrique  Diaa  j  do  qual  ae  informarao  do 
referido  encontro  e  do  bom  auncesso  da  noaaaa 
armaa^ 

XX«  Nao  desisdo  o  inimigo  da  sua  prefeni^ 
de  levaatar  uin  reduto ,  e  aproreilatido-ee  da  eaca* 
ridade  4bb  noitos^  em  duaa  le^aaitou  o  prelendido 
reduto  >  um  tiro  de  mosquete  da  sua  fortakza  das 
GinCo  Poniat^-escondendo  o  rumor  dos  gastadores 
dftbaixo  do  eslro&do  da  arliUiaria  de  auas  pra^pas^ 
que  aem  iifelerpolAQao  fez  jogar  as  ditai  noiles^  vare* 
jando  a  ciroumfenwcia  do  sitio  oada  setoabattiava« 
Em  22  de  Janeiro  mio  o  HoUandez  com  um  groaao 
esquadrao  de  aoldados,  e  grande  nunero  de  gaa*^ 
tadorea  a  oortar  o  wMo,  que  pek  iMiMidao  nao 
deiaaya  livre  o  laborar  da  artilham^  nem  pelaa 
emboscadaa  aegura  a  serventia  do  reduto.  Mai 
tinhao  pegado  aa  ofara,  quando  Henrique  Dias^ 
atiaado  deauas  sentineUas^  pogou  das  armi»,  e  aer- 
Tio  de  muitas  e  ooBtinuas  cargas  de  mosquet^ia  o 
esquadrao  inimigo.  —  O  ^cho  doe  tiros  deo  rebate 
ao  Arraial;  Joao  Fernandas  Vieira,  em  quanto  ae 
preparavaa  otttra  gente  aaio  com  a  sua  companhky 


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41000090  uniTAiia  461 

mmtio  ao  cmflioto  na  umfo  em  que  andava  mats 
aoo^so,  6  qne^a  ftkhade  polTora  e  balla  ia  ^ixando 
fias  maos  do  iiii0iig<^  ^  victoria ;  com  sua  pfettn^a 
m8)^rou  iiOYx>  valor  nos  aoldados,  o6  qua«a  crao 
igtialmepie  ankMdlos  pelo  P.  Fr.  Joao  da  Ae» 
earreit^O)  c  oonaeguto  tonter  o  mimigo  atdcpia 
ohegasae  o  «argeiito  aoaior  Anloiiio  Dias  Cardoso 
'COm  trea  coavpanfaiBa;  Reeobn|rao  «atao  todoa  oa 
i»osM&ttovoa  lileDtoa,  a  dapoia  de  qaatro  hoi«t  ^ 
naiMenok  arrandirao  ^o  iauMig^  do  cai»po ,  a  o 
perseguiraa  atd  xlabaixo  da  aitilharia  de  aitaa  forta^ 
lezas.  Mandou  entao  o  goyernador  iocar  a  retirar; 
reoolb^raoxae  tddoa  a  aaoa  poalot,  eaii  ti^attoa  trea 
lAorlM  a  qvMtM  f^idM.  0  eirtn(|o  do  mim%o  fm 
^ratide)  portor  a  cnatnmada  debgeooia  de  eaeoadar 
sMa  xaorlos  e  faridoa  npa  impadia^nuaieriiroa. 

XXi<  A  miaeraTd  estado  aa  via  radotidao  Hal^ 
landez.  Dentro  e  ttra  do  Arraetfil  wperimentaTk 
tuna  meMttta  forttfia ;  %n  do  Arreeife  aiMtilrava 
o  htrop  4eMrord*elle  o  persegda  a  fome*  Valia  mat 
akfuaiMtle  fiarinha  da  terra)  que  b6s  obattAmoa  de 
p^^  e  08  naluraes  maiidioca,  deteaeis  loatoeai  um 
pote  <l'agua  doee^  um  loalfto  i  iittia  hraiijay  tMte 
tinletti;  e  Vaix>  o  maia  «e  aishata  tao  earo^  V^ 
para  OS  ricos ^era  diffidl  o  MslMitO)  e  impoariiFd 
para  oa  pobrea.  Aa  wiaada  neceaaidade  persnadiio 
ti^nlrega ;  oa  do  gotpemo  falloa  do  remadio  temiao 
a  rebeiliao  j  a tadM  setn  duTida eseolbMK^  anteao 
capth^M  qoe  o  fti^nlot^ ;  per^  os  judeoe^  em 
tuao  perthiazes,  aconaalhatio  a  eoEs^ncia  ^  teme^ 
roaoa  d6  eaaiigo  que  iMredn  itta  peridia ;  offeree 
eirao'^  a  auatuattf  o  povo  e  a  guerMj  i^tiria 


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eatre  si  um  grosso  dooalivo^  qiie.lo^Q  enlf«^giiio 
aos  do  supremo  conselho ;  mas  nada  se  reooediou , 
porque  servio  a  cohi^a  de  [iouco»,  e  nao  sadsfez  a 
Tome  de  algum.  — Da  peuuria  reaultou  a  disaeosao 
eatre  as  iia96es  de  que  se  IbrmavaaqueUe  presidio* 
£iitre  a  confueao  e  o  medo  tiveno  alguos  ocoaaiao 
para  se  passareai  a  nossa  parle;,d'esles  forao  os 
primeiros  einoo  negros  miiias^  que  eiu29  de  Janeiro 
fbgirao  do  Arrecife ,  e  derao  por  jeiiooso  as  novas 
da  victoria  queoCsaiarao  alcao^otLdos  HoUandexes 
Qo  Rio  Grande;,  de  que  acima  faUanios. 

XXII.  Cbegoii  nesle  tempo  ao  Arraial  o  eapitao 
Joao  de  Magalbaes  com  a  nova  e  oircumstane'ias  do 
sUQMsao  do  Rio  Grande;  £oi  bem  recebtdo  e  hos- 
pedado  doe  cahos  maionespela  pessoa,  e  applau- 
dido  dos  soldados  pelo  aocoorro  das  duzentas  ca- 
begas  de  gado.  Gerlificadob  o^Dossos  ^vernadores 
do  soooovro  que  o  inimigo  tioba  mandado ,  e  do 
ealado  em  que  ficavao  oa  moradores  d'aqnella  capi- 
tania,  asaenlarao  que  se  Ihes  devia  acudir  oom  iudo 
o  que  fosse  neoesaario  para  snstentar  a  liberdade 
dos  moradores  e  a  reputa^o  das  armas.  Offereoeo- 
ae  o  mesire  de  campo  Andr^  Yidai  de  Negreiros 
para  ir  elie  mesmo  om  pesaoa ;  i^os  o  do  con- 
•gresso  conbecerao  que  nao.  podja  a  empresa  ^^i^* 
^tregue  a  melhores  maos.  Appresiado  em  brevis- 
simo  tempo,  se  pariio  do  Arraial  em  24  de  Feve- 
reiro^  levando  comaigo  qnaUo  comfMuibias  do 
twoo  de  Joao  Fernandes  Vieira,  e  do  ter?o  de  Hen- 
rique Dias  nma  leampdnbia  de  minaa,  e  outra  de 
€i'toul()i9.  Da  mardia  de  todo^  nos.havemos   de 


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CAftTBlOTO  LD51TAK0.  611 

apartar  agora  para  dannos  razaa  do  que  eDtreUiQto 
succedeo  em  Pernambuco* 

XXIIL  A  um  meamo  tempo  saio  do  Arraial  o 
scccorro  para  o  Rio  Grande ,.  e  para  o  Arrecife  o 
aviso  de  um  traidor  j  pelo  qual  inrormava  o  im^ 
migo  daqiialidade  e  numero  das  pessoas,  do  in- 
tento  da  Jornada,  da  bora  da  parlida ,  e  de  iodas  as 
circumslancias  necessarias  para  inculcar  a  falta 
em  que  ficava  o  Arraial.  Certo  Joao  Fernandd$ 
Vieira  na  traicao^  e  incerto  no  traidor  (supposto 
que  todos  o  apontavao  com  o  dedo),  nao  pode  deixar 
de  se  doer  pela  continuacao  do  mal,  vendo  que  nao 
passava  occasiao  em  que  a  perfidia  nao  andaase  tao 
pix)mpta  eomo  a  leaidade.  Importava  entander  o 
Flamengo  que  nao  sentiamos  a  falta  do  soceorro* 
Pes8oalmente  visitou  todas  os  estancias,  preve-* 
nindo-aa  de  muni^oes,  armaa  e  exorta^oea^  com 
99  ordens  necessarias  para  todo  o  acoQtecimento. 
Aos  capitaes  dos  presidios  ordenou  quese  uao  d^sse 
uma  bora  de  sooego  to  fortaleaas  inimigas,  picaudor 
as  por  turno  todas  as  noites ;  ganhou  com  dadivas 
algumas  espias,  que  o  forao  muiios  tempos,  com 
estipendio  de  doze  patacas  cada  mez ;  £oi  por  euire 
OS  mates  ver  com  seus  olbos  as  fortalezas  do  ini* 
migo,  observando  as  partes  e  os  poslos,  d*oode  e 
por  onde  melhor  se  poderiao  assaltar.  A  primeira 
noite  se  picou  o  ioimigo  com  tal  viveza  que  nio 
houve  praca  sua ,  que  por  todas  as  partes  se  nao 
imagiuasse  assaltada ;  foi  tamanbo  o  tumuUo  e  o 
receio  no  Arrecife  que  se  ouviao  entre  os  posaos 
OS  gritos  do  temor  e  do  espanto ;  e  assim  se  couii- 
UQOu  MB  seguiates  noites.  — *  Foi  a  segunda  a  que 


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Mt  Qunsmo  vomtAao. 

mis  M  aisombrou^  porque  investio  tfemique  Dits 
com  OS  soldados  do  sen  terco  o  noro  reduto,  que  w 
oobria  oom  a  artilharia  da  fcrtaleza  das  Cinco  Pon- 
iBty  goamecidode  soldados  ede  quatro  pe^as,  que 
^nhou  sem  resktencia,  porque  osdefensores  o  lar^ 
girao  tnuiio  antes  que  os  obrigasae  o  ferro.  Conio 
na  empresa  se  procurava  o  espanto ,  despresou^sa 
a  victoria  e  o  despojo,  largando  o  reduto  e  a  arti- 
Iharia.  ^  Em  um  sitio  que  ficava  como  oentro  das 
tfes  fortalezas,  Afibgados,  Seca,  e  SaKnas ,  Ihe  fes  o 
eapitao  Domingos  Ferreira  uma  pesada  lraiF«8sura. 
Em  OS  tronoos  das  arvores^  que  ficavao  mais  des-> 
cobertos,  mandou  atar  murroes  accesos,  e  logo  dar 
uma  earga  eerrada ,  com  ordem  a  seus  sokkMlos 
que  dada  ella  se  retirassem  a  um  lado.  0  inimigo, 
diamado  dos  tiros ,  divison  as  mtehssy  e  persnadio- 
se  que  esCaviio  nas  maos  das  mosqueteiros ;  apoD* 
tou  para  aquella  parte  toda  a  artilharia  das  tres 
fortalezas,  is  quaes  aoompanhirao  logo  a  do  Ifoam, 
a  dos  Perrexis^  e  a  plata-forma  das  portae  do  Ar^ 
reeife,  nao  descancando  de  repetir  os  tiros  ^  que  oa 
ttOSSossoldadoBdes^ados  do  perigo  Ihes  foziao  de^ 
parar  com  mais  eui^lado,  continuando  nas  cargas 
de  sells  mosquetes.  Desatinava  o  Hollandei  da  cona- 
tancia  que  via,  porque  nao  suspeitava  a  cansa, 
adisttdo  fundamento  para  temer  a  esoala  na  ir* 
m«La  com  que  apeear  de  toda  sua  artilharia  perse* 
veraTa  a  fiSrma.  Foi  tal  a  impressao  que  fez  o  en- 
gatto,  que  se  onria  em  todas  as  partes  o  grito  da 
pertnrbacao  e  do  rumor  com  que  se  dispunha  a 
reatstencia.  Com  a  claridade  do  dia  conheceo  o  ioi* 
»igo  aeo  enganoy  e  Hie  fez  coofeesar  o  capitao  Do* 


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CASTKHnO  LUSITAm.  411 

noitngos  Ferreira  que  com  valor  e  eng^iho  pelejava 
com  ariuastlobpadas. 

XXIV.  Eotrou  o  Mar^  de  1646|  com  die 
Henrique  Dias  em  pen8auieiito&  de  gaohar  e  ap*- 
rasar  o  reduto  que  o  inimigo  fabricara  a  000^ 
bra  da  fortalesa  das  Giuco  Poutag^  o  qual  depoia 
que  OS  nossos  o  abaodonarao  tinha  o  inimigo  forU^ 
lecido  em  nova  fdrma.  Gommunicou  o  intento  ao 
governador  Joao  Fernandes  Vieira  >  duendcnlbei 
que  nao  queria  parecer,  senao  favor,  polvcMTt^ 
balla,  uma  duzia  de  madiados,  e  peroiasao  pavf 
que  s6  os  negros  de  sua  obediencia  Uvessem  parte 
na  empresa  (confian^  bem  merecida*  po»que  gar 
nhada  a  for^a  da  experieucia  )•  Era  tanta  a  opiniao 
que  e  govemador  tinha  da  capacidade,  valor,  e 
priiica  de  £bnrique  Dias^  que  com  um  mesm^ 
con(»ito  ouTio  a  determiua^ ,  e  suppoz  0  facto  f 
clespedio«*o  logo  com  alegre  rosto  e  liberal  despa- 
eho ;  ordenou  a  todas  as  esCancias,  que  a  hora  de*- 
tinada  tocassam  atma  ao  inimigo  por  todas  as 
partes ;  safo  do  Arraial  com  quatro  oompanhkis.a 
esperar  o  successo  da  emboscada ,  e  participar 
d'uma  e  outra  fortuna.  Cbamou  Henrique  I)ias 
sens  officiaes  a  conselbo ,  propoz-lhes  a  empresa ; 
todos  a  approvarao  com  lauvor,  mas  conoordarao 
que  nao  convinha  de  nenhuma  sor te  enlrar  na  fiiccao 
a  pessoa  de  seu  governador,  contradizendo-lhe  as 
iDStancias  com  tao  vivas  razoes,  que  veiiceo  o  juizo 
as  repugnancias  da  vontade.  Obedeceo  Henrique 
Dias  aoa  seus  :  nao  tern  razao  para  mandar  quern 
nao  sabe  obedecer  &  razao. *-*-Deseobrio-se  o  campo, 
e  certo  de  que  nelle  nao  apparecia  inimigo^  esco^ 


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ftt4  cAfimioro  LmitAiiow 

Iheo  Henrique  Dias  de  todo  seu  tcrco  quatro  com- 
panhias,  as  quaes  enlrcgou  ao  commando  de  seu 
sargento  maior  Paulo  Dias  Sao  Pheliche.  Entrou 
a  noite^  passou  o  rio  com  a  sua  gente,  e  coberio 
do  escuro  e  da  bastidao  do  mato  a  levou  al^  a  vista 
do  reduto,  onde  chegou  pelas  onze  horas ;  divisou- 
se  o  vuUo  de  duas  sentinellas  inimigas  perto  da 
estacada,  as  quaes  logo  todirao  arma.  Ghamados  do 
rebate  sad'ao  os  defensores  a  receber  duas  cargas 
cierradas ,  e  o  espanto  da  faciiidade  com  que  os 
uossos  saldirao  a  cava ,  e  d^rao  por  terra  com  um 
laneo  da  estacada ,  abrindo  caminho  ao  furor  com 
que  OS  degol^rao  4  espada.  Sem  perder  tempo  avaa- 
carao  &  segunda  fortificacao ;  e  ganhada  a  trindieira 
Investirao  a  casa  forte ,  onde  os  vinte  e  cinco  de 
*seu  presidio  se  linbao  recoihido ;  os  quaes  entrados 
pelo  lelfaado  e  pela  porta ,  apezar  de  toda  sua  re* 
sistencia,  forao  mortos  a  excepcao  de  quatro.  Esta 
victoria  custoo-nos  oito  soldados  mortos  e  vinte  e 
quatix>  feridosy  dos  quaes  alguns  morr^o,  sendo 
d'este  numero  tres  capitaes  e  um  alferes.  Virao-se 
OS  soldados  sem  capitaes  que  os  governassem  j  o 
pleito  vencido ,  a  detenca  inutile  o  damno  certo 
(porque  as  fortalezas  cobriao  o  redulo  de  ballas  ) 
carregArao  as  costas  os  mortos  e  feridos,  e  aigum 
despojo  d'armas,  vestidos  e  alfaias,  e  se  retirarao 
para  a  sua  estancia.  0  governador  da  liberdade , 
que  esperava  a  contingencia  do  suceesao,  saio  a  re- 
ceber OS  valorosos  soldados ,  tevando  a  cada  um 
nos  bracos  com  os  devidos  louvores"^  aos  feridoe 
recolheo ,  e  mandou  curar  com  vigilantissimo  cui- 
dado. 


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•  XXV.  Os  capitaes das  estancias ,  euvimba ar^ 
tUhaiia  4I0  ioimigo  por  todas  as  partes,  picarao  o 
HoUaadez  com  arma  tao  quente  que  llie  pa^ecoo 
aaaalla  o  que  era  diveraao.  Ao  capitao  Sebasiiao 
Ferreira,  morador  na  frQg;iiezta  de  Sio  Louren^o^ 
coube  em  sorte  locar  arma  ao  inimigo  pek>  forte  do 
Perrexil ;  com  trinta  soldados  escolhidos  se  metieo 
debaixo  da  artilharia  d'elie,  dando  ao  Flamengo 
tantas  e  tao  bem  sortidas  cargas,  que  com  um 
noesfoojuizo  8e  lepieo  assaltadoe  readido.-^Vkido 
a  Jioticia  do  gaT^mador  da  liberdade  que  a  inimigo 
apaseealava  algtuuaa  cabe^  de.gado  o  alguns  ca- 
vallos  debaixo  da  artilharia  de  suas  fortalezaa^  clia- 
mon  o  capitao  Ferreira,  cojnmunicou'*-lbe  o  desejo 
que  tinha  de  qoe^o  inimigo  fosse  privado  d'aquelles 
recursos.  0  capkao ,  cpie  nao  aabia  recusar  neim 
temer^obediente  eafog^  sedispOi^  paraa,empresa» 
Eeperou  a  iioite;^e  aoompanhado  de  ^eu  animo  e 
tlas  aombras  d'ella,  Coi  reoonhecer  o  sitio.  Aohou.o 
gado  recolhido,  e  eeroado  d'uma  truMhcira  de 
pAo  a  pique,  wexa  mais  eiMrada  que  uma  porta 
unida  a  da  fdrtaleza  ;  yoUou  a  dar  coata  a  seus  sol* 
dados  J  e  ioftindio  em  (odos  o  animo  destenido  de 
que  era  dotado.  Entrarao  nd  currdi  ^  deitirao  sogas 
ao  gado,  e  cortarao  as  que  tinbao  presos  alguns  oa^ 
vallos ;  e  fpiando  ja  buscavao  a  porta  para  a  saida  ^ 
forao  sentidos^  e  se  deitarao  por  terra  entre  o  gado, 
onde  escaparao  de  muitas  cargas,  que  o  presidio 
da  fortkleut  atirou  a  vulto^  e  muito  ao  largo.  De^ 
pois  de  algum  espaeo  se  tornou  a  socegar  o  Fia^ 
menga,  tendo  para  si  que  se  inquietara  sem  fun-* 
dainento.  Nao.$emovAi»ao  os  nossos  senao  depots 


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tfoe  intefuMrao  do  aiteiioio  que  a  todos  o8  da  (brta- 
feza  oecopaya  o  deaoanso.  AbHrao  a  porta  do  oerto, 
montarao  em  sette  oav^oa  ^  tracendo  diante  de  A 
Tmta  e  oito  boia  (qae  crao  todaa  as  cabe^as  ijam 
alii  pattavao),  eBtrArao-palo  mato,  •  €om4rea  car** 
gas  desper tarao  o  inimigo,  que  adv^ertido  do  roubo 
aoabeu  de  eutender  que  nao  podia  6ar  de  seo  se* 
guro  aanio  o  que  \he  permittiaae  o  noaao  atreFi* 
mento. 

XXVL  Aquelles  dias,  em  q«e  na  campanha 
de  Pemambuco  sueoadeo  orefeiido,  gaatou  Andi^ 
Vidal  de  Negmros  ua  mareba  pam  6  Rio  Gnade; 
sein  aoonteeimento  i)Ota?el  ob^u  a  Paraiba^  oude 
acbou  o Camarao  oom^o  aeu  ter^o  dc  Indios,  red* 
rado  por  falia  de  munii^a^  como*  (ka  referido* 
Chegira  pouoo  antes  a  iartalesa  do  GabadeUo  o 
80CC0IT0 ,  que  o  Hollasdez  maiuUra  do  Arraoife 
para  o  Bio  Grande*  Jirigando  o  Flamengo  aer  a  oo- 
oaaiao  favoravel,  com  preflieia  e  oautela  ambaraou 
em  lancbas  todo  o  poder ;  aobio  o  rio ,  com  in- 
iento  de  levar  a  cidade  por  entrapreaa  :  sem  aer 
aentido  a  ayistou ;  por^aa  daacoberto  de  duaa  aentir 
liellaa  nossat  fei  atalbado  pela  geote  que  acudio  ao 
rd)ate«  Nao  lardou  o  Camarao  em  foriaar  emboa* 
oadaa  para  o  de^truir  ao  detembarcar ;  porte  eUe, 
ou  temido,  ou  aoonselhado  virou  as  proas  aa  lan^^ 
ohaa  tauto  que  ae  vio  sentidO)  e  wo  parau  senao 
dentro  de  sua  fortalesa  do  Cabedeik>««*<-Aehou  A0- 
dr^  Vidal  fresca  a  pratica  d'ette  aucoesao^  e  ao  Ca- 
mirao  seutido  do  Flamengo  nao  voltar  castigado ; 
conbeceo  elle  em  Andr^  Vidal  a  propria  n^agoa,  e 
kvados  d'um  meamo  mottvoy  convidrao  em  um 


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CASTRTOTO  LUSITAKO.  M7 

mesmo  pensamento ,  que ,  por  causa  de  (raicoes , 
conservarao  em  segredo.  Escolherao  uma  porcao 
de  gente  bem  resoluta,  a  que  mandarao  marchar 
para  o  certao;  andado  caminho  de  nove  legoas 
mandarao  fazer  alto,  e  d'alli  voltarao  a  marcha 
para  o  mar,  tao  medida  pelo  tempo  que  chegArao 
de  noite  a  um  sitio  perto  da  hermida  de  Nossa  Se- 
nhora  da  Guia,  e  pouco  distante  das  fortalezas  do 
inimigo,  Santo  Antonio  e  Gabedelio ;  alii  formarao 
tres  emboscadas,  ecomecarao  a  provocar  o  inimigo 
para  o  atrahir  ao  laco  que  Ihe  tinhao  armado. 

XXVII,  Vendo-se  o  Flamengo  insultado  pop 
um  tao  pequeno  numero  de  Portuguezes,  dispoz-se 
a  sair  a  campo^  contando  ganhar  completa  victoria. 
Saio  da  fortaieza  de  Santo  Antonio  com  sessenta 
Hollandezes  e  cento  e  sessenta  Indios,  desembarcou 
no  Arraial,  d'onde  os  nossos  o  tinhao  provocado,  e 
segurodasua  forca  descuidou-se  da  f6rma.  Marchava 
diantedos  Indios  uma  feiticeira  braziliana  ^  que 
brandindo  um  alfange ,  dizia  :  c  Deixai-me  chegar 
>»  com  estas  unhas  a  esses  caes  portuguezes,  que 
»  para  Ihes  romper  os  coracoes  sou  tigre ;  ligeira 
»  onca  para  Ihes  dar  alcance ;  e  sequiosa  fera  para 
»  Ihes  beber  o  sangue  e  despedacar  as  carnes.  » 
Ghamavac-lhe  osnaturaes  Pag^,  que  em  sua  lingua 
9oa  prophetiza,  e  Anhaguiari,  que  6  o  mesmo  que 
senhora  dos  demonios ;  em  cujo  auxilio  punha  a 
superstitiosa  gentilidade  daquelles  barbaros  toda 
sua  confianca. —  Com  estudado  desprezo  esperarao 
OS  nossos  o  inimigo,  at6  que,  chegando  a  tiro  de 
mosquete,  o  receb^rao  com  duas  cargas;  fingirao- 
se  enganados  de  sua  imaginacao,  no  excesso  do 
I.  27 


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U\^  CA9TU0T0  LUUTAIiO. 

numero  que  os  commettia ,  e  porno  perlurbadoe  ae 
pos^rao  em  desordenado  retiro.  Ao  tempo  as8en«» 
tado  virarao  as  costas  com  arrebaiada  fugida,  para 
que  o  alvoroco  da  victoria  e  da  cobi^a  nao  deixasae 
ver  ao  Flamengo  o  perigo  do  alcanoe  ;  levarao  oa 
sessenta  Iloliaiidezea  a  vanguarda ;  e  como,  se  ga^ 
nhada  a  victoria  forao  so  a  recolher  os  despojos , 
se  mettirao  no  coraeao  das  emboscadas ,  das  quaes 
recebSrao  duas  cargas  de  mosquetaria  tanto  a 
tempOi  e  tao  bem  empregadas  que  cairao  em  terra 
mortos  cincoenta  e  oito  HoUandeEes^  e  alguns  In^ 
dioSy  de  cujo  numero  foi  a  Teiticeira,  que  ficou  esten- 
dida  no  campo,  passada  com  duas  ballas  pelos  peitos. 
Os  outros^  cortados  do  espanto,  e  certos  da  morte, 
buscavao  nasaguasdo  mar  o  sepulchro,  onde  quasi 
todos  perecSrao  feridos  de  nossa  espada.  Perdeo  o 
Flamengo  nesta  occasiao  03  sessenta  Hollandezes 
com  que  saio  ^  e  todas  as  armas  ^  e  as  lanchas  em 
que  se  embarcou ;  dos  Indios  nao  se  pode  con  tar  o 
numero  dos  mortos ;  so  quinze  nos  moatrou  o 
campo ;  quasi  todos  os  mais  escondeo  o  mar ;  rare 
foi  o  que  salvou  a  fuga ,  porque  a  opposiqao  do 
bra^o  e  do  terreno  Ihe  nao  deixou  aberto  outro 
caminhosenao  o  da  praia.  Da  nossa  parte  nao  houve 
ferido,  supppsio  que  nos  enlutou  a  victoria  a  morte 
do  sargcnto  maior  Francisco  Cardozo. 

XXVllI.  Applaudida  a  victoria  com  grandes 
demonstracoes  de  gosto,  e  recolhidos  os  despojoSi 
se  voltarao  os  nossos  a  Paraiba »  onde  forao  rece«» 
bidos  com  alegres  vivas ;  sem  descancar  no  triumpiio 
despedio  em  brevissimo  tempo  o  mestre  de  campo 
Andrd  Vidal  para  o  Rio  Grande  o  govemador  dos 


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G/ISTBK>70  LUSRANO.  419 

In4ios  eom  a  sen  teroo,  aasialido  d'algung  autros 
capitaea ;  e  depois  partio  elle  mesmo  pan  a  oam-r 
panhs^  da  Feraambuco,  assistido  do  capitao  Antor 
nio  Gonial  ve$  Ti^ao  com  agente  de  sua  companhia. 
Nos  dias  que  gastou  a  marcba  y  aairao  da  ittia  de 
Itamaraca  oitenta  soldados  inimigos,  em  lanchas, 
que  elleg  desejavao  carregar  de  mandioca  das  rocas 
de  Tejucypapo,  ferteis  d'este  genero,  e  aocommo* 
dadas,  pela  vi^inhaQ9a^  para  a  facilidade  do  rouho 
e  do  remedio.  —  Desembarc^rao  os  inimigos  a 
furto ;  com  presteza  comee^rao  a  executar  seu  de^ 
sejo^  que  Ihes  atalhou  Zenobio  Achioli,  eabo  da 
nulicia  d'aquelle  destricto.  Com  triuta  soldados  oa 
assaltou ;  e  com  tao  boa  fortuna ,  que  nao  deixou 
40S  Qontrarios  mais  acordo ,  que  o  de  fugirem  para 
as  lancbasy  e  nellas  para  a  ilha;  levarao  vinte  fe« 
ridos,  e  deixarao  no  campo  trinta  mortos,  com 
todos  OS  instrumentos  e  toda  a  mandioca  que 
tinhao  arrancado,  Apertados  da  fome  tent^rao  os 
HoUandezes  segunda  expedicao,  que  dirigfrao  a 
uma  ilheta  cbamada  Tapessoca ;  mas  nao  forao  me^ 
Uiorsuccedidos,  porque  Agostinho  Nunes,  sargento 
maior  do  destricto ,  acudio  com  duas  companhias, 
e  o^  poz  em  fugida^  deixando  no  campo  oitenla 
mortos»  grande  numero  de  armas  e  municoes,  e  le^ 
vando  muito^  feridos,  Terceira  vez  inten^ou  o  inii- 
migo  levar  a  effeito  sens  projectos,  envidando  todo 
o  seu  resito.  Ordenarao  os  do  conselbo  ao  sen  ge- 
neral do  mar  Joao  Cornelim  (ou  Cornelizenl  Chic^ 
tart)  que  com  cento  e  cincoenta  soldados  saisse  do 
Arreeife,  e  levasse  da  ilba  de  Itamaraca  toda  a 
gi^nte,  que  podessem  escusar  ob  po^esidios,  e  com 


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430  CASTRIOTO  LCSITANO. 

este  poder  saltasse  em  Tejucupapo,  para  que  d'um 
mesiDo  goipe  vingasse  nos  moradores  a  injuria ,  e 
carregasse  as  lanchas  de  mantimentos  para  acudir 
a  miseria.  Executada  a  ordem,  tomou  o  Flamengo 
terra  em  uma  parte  onde  alguns  moradores  traziao 
escravos  arrancando  mandioca  de  suas  rocas ,  oa 
quaes  y  vendo  a  multidao  das  lanchas,  corrSrao  a 
dar  aviso  ao  mestre  de  campo  Andr^  Vidal ;  despe- 
dio  elle  logo  o  capitao  Goncalves  Ticao,  para  que 
com  a  sua  companhia  entretesse  o  inimigo  em 
quanto  elle  nao  vinha  pessoalmente ;  ma$  nao  po- 
dirio  OS  nossos  cabos  acudir  tanio  a  tempo  que  o 
inimigo  nao  executasse  o  seu  projecto,  pois  quando 
chegon  o  capitao  Ticao  ja  navegava  de  mar  em  fiSra 
com  as  lanchas  carregadas  de  mandioca,  e  de  fruta 
de  espinho  em  que  abunda  aquelle  terreno.  Uma 
d*ellas  p(»^m,  apartando-se  da  conserva  das  outras 
e  costeando  a  terra,  a  vista  do  Pao  Amarello,  foi 
descoberta  d'alguns  pescadores  nossos  que  andavao 
em  suas  jangadas  deitando  as  redes  ao  mar;  trocarao 
08  lancos  a  pesca,  e  deixadas  as  redes  envcstirao  a 
lancha,  que  logo  rend^rao  com  a  morte  de  tres 
HoUandezes,  que  se  deitirao  ao  mar,  e  com  darem 
qnartel  a  dous  e  a  um  mulato  e  um  negro  que  nella 
ficarao  captivos.  Aproveitarao-se  do  refresco  e  da 
lancha,  que  depois  Ihes  servid  para  maiores  em- 
pregos. 

XXIX.  Gontinuava  entre  os  HoUandezes  a  feme 
e  a  passagem  dos  soldados  e  genie  vulgar  do  Ar- 
recifepara  o  nosso  Arraial,  e  pela  mesma  razaoas 
testemunhas  da  falta  dos  mantimentos,  que  crescia 
com  o  tempo ;  e  juntamente  a  impaciencia  com  que 


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CASTRIOTO  LUSITANO.  431 

0  vulgo  e  geoie  miliiar  dizia  a  cara  deseoberta,  que 
se  largasse  a  praca  quando  tinhao  na  inao  a  conve- 
nieocia  de  se  adiantarem  nos  partidos,  antes  que 
sem  elles  os  enlregasse  o  rigor  da  fome  e  o  das  ar- 
mas.  Opiuiao  e  praiiea  que  os  judeos  impuguavao, 
cerlos  de  que  os  nao  esperava  menos  casligo  na 
entrega  que  na  escala  :  viviao  sobrados,  e  a  mise-' 
ria  OS  desconhecia  compassivos.  Forao  accusados 
de  que  tinhao  recolhido  em  si  todos  os  mantimen- 
toS;  e  que  faziao  mercancia  da  tenacidade.  D^rao 
em  todas  suas  casas  os  do  governo  em  uma  mesraa  ^ 
hora ;  acharao  abundancia  de  tudo ;  depositou-se 
em  maos  particulares  para  soecorro  da  necessidade 
coi^mum ,  e  a  todos  os  obrigarao  a  comprar  pelo 
preco  que  vendiao.  Tratarao  os  judeos  de  baixo 
de  mao  de  amotiuar  o  povo,  inclinado  sempre  a 
mover-se  com  qualquer  novidade ;  mas  levant^rao 
contra  si  as  pedras.  D^rao  sobre  elles  os  soldados, 
matarao  selte,  e  forao  tantos  os  feridos  que  a  occu- 
pacao  da  cura  Ihes  tirou  da  memoria  a  da  vin- 
ganga. 

XXX.  0  mestre  de  campo  Andr^  Vidal  de  Ne- 
greiroSy  depois  que  enlendeo  nao  sei*  d'utilidade 
sua  assistencia  emGoyana,  separtiopara  o  Arraial, 
onde  chegou  em  os  principios  d'Abril ;  tempo  em 
qne  nelie  secomecava  o  sentir  a  falla  de  mantimen- 
tos  e  de  sojdados.  Os  naturaes  e  moradores  andavao 
ja  quasi  remontados ;  e  alguns  dos  soldados,  con- 
duzidos  da  JBahia,  se  tinhao  ido  para  aquella  praca. 
Conferirao-se  os  meios  para  remedear  uma  e  outra 
falta,  e  se  defenio  por  mais  etilcaz  a  auioridade  e 
agrado  do  governador  Joao  Fernandes  Yieira,  cuja 


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&12  GAtmiOtO  WUTAm* 

pcssoa  era  «|uem  so  podia  oonduir  este  negooio. 
Acceilou  a  ditigencia^  prometiendo  correr  as  prin- 
cipaes  povoa^oes  do  reconcavo,  como  erao^  cabo  de 
Santo  Agostinbo,  Ipojuca,  Siriahaem,  Una,  Porto 
do  CalTO ,  e  outros ,  em  quanto  &  oonduc^ao  dos 
mantineBtos.  Re6ol?6rao-se  em  queixar-^e  ao  go- 
venaador  g^ral  do  Estado  dos  soldados  que  a  furto 
96  tinhao  vdtado,  o  qual  deo  energicas  providen*- 
daa  para  eviiar  este  mat.  Com  sagacidade  mandou 
tomar  a  rol  os  deliqoentes^  e  lodos  preaos^  castigou 
08  prhicipaes  com  forcas  e  desierros  ^  e  oe  menos 
cttlpados  mandou  voltar  logo  para  a  campattha  de 
Peroamfonco.  A  todos  os  ne^gros^  que  achou  aerem 
dos  moradores  daquelle  capitania,  mandou  prendter 
e  depositar  para  se  entregarem  a  sew  senhores,  ou 
a  quern  tiyesse  pnocuracoes  suas  :  ^pedieme  fd 
eate  de  cotisequencias  utitidsimas  >  poixpie  para  os 
escravos  foi  ^Iho,  e  para  os  aoldados  fireio. 

XXXI •  Apre8tou-«e  o  governador  Joao  Fwnaii* 
deB  Vieira  para  a  joriiada»  e  para  de  oaminho  eve- 
cutar  o  desejo  que  tinha  de  assegurar  o  porto  de 
Tamandar^  com  «ma  sufliciente  forea ,  que  ignal- 
mente  aervisse  i  defensa  da  terra  e  ^  da  barra ;  e 
partio  do  Arraial  em  10  de  Abril.  Em  esies  poucos 
dias  quese  deteve  saio  oinimigo  com  um  ardil  inal 
urdido>  e  peor  l^grado.  Deitou  fama  que  de  Hoi* 
lafnda  Ibe  ckeg^ra  aviso  em  como  ficava  pwa  fazcr 
aTiagem  uma  grossa  armada ,  que  a  compankia 
mandava  para  sujeitar  os  rebeldes^  e  conquislar 
OS  fivres.  Na  crcdulidade  desla  ttova  fimdArtio  toda 
a  quimera.  Fingirao  duas  carus ;  uma  d'El  Rei  Dom 
Jo&o  IV^  escrila  a  Francisco  de  Souca  GontiBiio , 


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GAftTAIOTO  Jm«lT4M0.  Ml 

^itio  reeideote  em  Uollanda,  e  inclusa  neila  outra^ 
que  dizia  6er  do  governador  do  Estado  Antonio 
Telles  da  Silva ,  escrita  ao  mesmo  senhor,  em  a^ 
qual  repetia  por  nova  a  acclama9ao  da  liberdade 
do  Brazil^  com  todas  as  circumsiancias  do  Ssbeio^ 
e  junUmeote  o  traslado  das  ordens ,  que  o  mesmo 
Rei  despedio  logo  ao  dilo  governador  geral^  que  nao 
iavorecesse  a  sublevacao,  para  que  sen  residente  a« 
apresenUsse  aos  Estados^  e  por  ellas  se  entendeese 
que  nmm  coosentira ,  nem  favorec^ra  a  dita  sukle-* 
¥acao»  Public^rao  f stas  cartas  no  Arreeifie,  e  copia-* 
das  em  muitos  treslados  as  mandarao  dettar  em 
partes  que  facilmente  caissem  oas  maos  das  nossas 
sentin^llas ,  e  d  ellas  passassem  is  do  goTernador 
Jofto  Fernandes  Vieira. — L^o*se  as  cartas,  e  pelos 
erros  do  estilo  e  impossibilidade  do  tempo,  se  co* 
nheeeo  o  engano^  e  o  intento  da  fic^to,  que  era  qu&- 
brar^nos  o  animo ,  e  aguarnios  o  calor  com  que 
nosiaa  annae  o  opprimiao.  Communioou  o  goyer^ 
nador  da  liberdade  as  cartas  aos  mestres  de  campo 
e  gOYeroadores  de  Minas  e  Indios ;  e  assentarao  que 
9A  sepullasae  o  desprezo.  Pai:*eceo^lhe  a  Henrique 
Bias  discreto  o  castigo,  porem  intoleravel  o  silencio^ 
pedio  licen^  para  responds  aos  desatinos  da  in<*- 
vencao  do  HoUandez ;  concedeo^ee^lhe  que  o  fieease^ 
e  eacreveo  uma  carta  com  as  raroes  segukites. 

XXXU.  a  Sao  tao  conbecidos  os  artiflcios,  oom 
»  que  a  HoUanda  sustenta  a  reputai9ao  de  suas  ai^ 


» 


masy  que  s^jl  engano  nao  enreda  seaao  a  quem 
I)  o  fehrioa.  Aquelle  brado  die  sua  potencia,  que  no 
»  priftctpio  persuadio  a  aiogelesa^  despreza  ^  boje 

a  experleMcia.  Estea  papeia  ccon  qu^  vosaas  mer^ 


^ 


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4S4  CASTBIOTO  LCSITANa 

»  cte  uos  querem  intimidar,  nas  faUas  do  discurso 
»  mostrao  que  sao  partos  da  malicia^  e  nao  da  ver- 
»  dade.  0  primciro  pregao ,  que  publicou  a  em- 
>i  presa  da  liberdade,  foi  o  grilo  que  deo  a  batalha 
1)  das  TabocaSy  pela  victoria  que  nella  alcancarao  os 
»  moradores  desta  capitaniai ,  e  que  a  HoUanda  es- 
»  creveo  com  a  tinta  de  seu  saugue  em  3  d'Agosto 
»  de  1645 ;  e  a  data  da  carta  supposta,  que  dizem 
»  escreveo  £1  Rei  de  Portugal  ao  seu  assistente 
»  Francisco  de  Souza  Coutinho ,  mostra  ser  de 
»  5  de  Oulubro  do  mesmo  anno ;  intervalo  de 
»  tempo  que  nao  passade  sessenta  e  tres  dias,  tao 
»  iimitado  para  um  correio  levar  a  nova  de  Per- 
»  nambuco  a  Bahia ,  e  um  navio  da  Bahia  a  For- 
»  tugal^  que  escassamente  o  pod^ra  veneer  o  voo, 
»  quanto  mais  as  voltas  da  navegacao  e  da  jomada  : 
w  com  mais  certeza  se  ajustao  entre  vossas  mercte 
»  as  partidas  da  fazenda,  que  os  computos  do 
»  tempo.  Os  papeis,  que  assigna  a  mao  real,  6 
»  com  a  firma  de  Key,  e  nao,  Sua  Real  Majestade, 
»  como  vossas  merc^s  Grmao  estes  papeis.  Erro  6 
»  este  muito  proprio  de  quern  nao  tem  lei ,  nem 
»  rei.  Se  os  fios  de  sua  espada  cortao  tao  mal  como 
»  OS  de  seu  juizo,  pouco  nos  fica  que  temer;  c 
»  muito  menos  vendo,  que  a  mao  que  ha  de  dar 
»  o  goipe  erra  movendo  a  penna.  Nesta  advertencia 
•  entendo  eu  que  vossas  mercte  me  hao  de  avaliar 
»  amigo ,  ainda  que  pelas  obras  me  experimentem 
»  contrario.  Em  falso  fabricao  se  tem  para  si  que 
3»  com  embustes  se  melhorao ;  em  algum  tempo 
M  08  fez  dissimular  a  forca ;  por^  ja  agora  mal  os 
»  poder^  soffrer  a  independencia.  Kesulta  d'dles 


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GA5XR10T0  LUSITAMO.  425 

»  forao  OS  aggravos  e  tyraiiuias  que  aiiimarao  o 
»  gemido^  com  que  os  Pernanibucanos  nos  persua- 
»  dirao  i  vinganca  ^  a  mim  e  ao  goveruador  dos 
»  Indios  Dom  Antouio  Philippe  Camarao.  Faltamos 
»  a  obediencia  que  nos  occupava  no  serlao  da 
»  Balua,  por  nao  faharmos  a&  obrigacoes  da  pa- 
»  Iria,  respeiiando  primeiro  as  leis  da  natureza 
JD  que  as  do  imperio.  Achamos  aos  opprimidos  vio 
«  toriosos  e  desforcados  com  as  annas  nas  maos, 
»  tao  corlados  da  tyrannia,  que  abominavao  as 
9  memorias  da  sujeicao.  Valia-se  a  razao  da  lem- 
»  branca  com  que  repetia  as  injurias;  e  os  olhos 
>  das  ruiuas  em  que  permaueciao  os  eslragos^ 
»  e  colli  facilidade  levaiao  o  soffrimenlo  &  ultima 
»  desesperacao.  Aquelle  molivo,  que  nos  fez  par- 
»  ciaes  no  aggravo  nos  fez  tambem  auxiliares  no 
»  castigOy  com  resolucao  lao  deliberada^  que  pri- 
»  metro  nos  ha  de  fahar  a  vida  ,  que  nos  caia  da 
»  mac  a  espada ;  mal  dJscursao,  se  imaginao  bave- 
»  mos  de  crer  que  nosso  Rei  e  senbor  ha  de  ouTir 
»  melhor  a  inimigos  insolenles^  que  a  vas^allos 
»  queixosos.  Em  quanto  a  justica  Ibe  n«o  restituio 
j>  a  coroa  pod^ra-nos  aasistir  s6  com  a  magoa; 
»  agora  que  Be  y&  restaurado  no  trono  nao  p<ide 
»  deixar  de  nos  assistir  com  o  braco  :  facao  esle 
»  coDceito,  e  discorrao  polilicos.  A  onde  tropecarao 
»  mais  c^os^  foi  em  nos  quererem  persuadir 
»  que  o  govemo  de  HoUanda ,  tao  cosido  com  as 
»  razoesd'estado^andasse  tao  atrevido,  que  amean 
»  ^asse  com  o  poder  a  um  Rei  de  lamanho  cora- 
»  9ao  y  que  desprezou  o  da  maior  mooarchia  da 
»  Europa ;  pinUHlhe  a  imaginacao  que  Portugal 


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4M  GA6TRI010  LUSITAKO. 

M  66  arma  contra  a  acclamacao  de  nosta  liberdade? 
n  Como  pikle  desagradar  iniita^o  tao  generosa  a 
D  quern  nos  deo  o  mais  justificado  exemplo  ?  Mai 
M  pinta  o  retrato  quem  se  desvia  das  cores  do  ori- 
»  ginal  :  quem  para  se  sustentar  se  arrima  ao  en- 
»  gano  cat  com  o  arrimo.  Tenhao  por  oerto  que 
n  d'esse  Arrecife,  onde  nossas  armas  ob  tem  accnr- 
»  ralados,  Ihes  nao  fica  mais  saida  que  para  Hol- 
»  latida  ;  e  se  atirao  a  outro  alvo  y  faasiao  os  meus 
»  negros  para  Ihes  fazerem  errar ;  e  dado  caso  que 
»  pretendao  yencer  nossa  coustancia  com  sua  por- 
»  6sij  Ihes  poremos  a  terra  em  estado^  que  Ihes  nao 
»  po«sa  dar  mais  que  a  sepullura ;  porque  sabe^ 
»  remos  queimar-lhe  em  uma  noite  tudo  quanto 
»  plan^rem  em  um  aimo ;  e  para  que  nao  duvi* 
%  dem  d*esta  Terdade  tenhao  entendido  que  i  Hen- 
»  rique  Kas  o  que  escreve,  pegando  na  peona  com 
»  a  mesma  mao  cem  que  pega  na  espada  •  n  Mandou 
km^ar  esta  carta  em  parte  ,  onde  logo  foi  acbada, 
e  entregue  nas  maos  dos  govemadores  do  Aire* 
cjfe ,  que ,  corridos  dos  erros  da  ficcao  e  ^sortados 
dodesprem  da  reposta^  se  apailarao  de  stmiihantes 
diiigencias,  applioando-ae  a  outros  y  de  que  se  per-^ 
s^adiao  lirar  mais  fruto^  ainda  que  ibsse  com  mais 
risco. 

KXXIH.  Nesta  occasiao  chegou  ao  Arrecjfe  um 
barco  do  Rio  Grande,  pelo  qual  os  Hotlandeees 
q«e  presfdiavao  aquella  fortakea  pedifio  sooecwrro 
de  mantimentos ,  referindo  como  o  Camarfk)  en«> 
tr&ra  segimda  vez  na  campauAia,  e  talira  de  ma- 
tieiiia  a  ¥fn%  de  tode  o  reeon^aro  ^  que  nao 
deixira   eidifieio  que  ttio  cMeiiMMisae  o  fogo, 


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petaoa  que  nSo  degoltsse  <o  fetro  >  g»do  «ie  que 
se  nio  nproreitasse  o  raubo,  manlimeiiio  que 
nfo  destruiste  o  bni^ ;  e  detttro  dai  nyeema  foria^ 
kna  coraoio  qi^  nio  mtiinida^fte  a  ira ;  posta  em 
afmto  tM  tnanifefllOy  que  igiiaknente  temia  o  ferro 
e  a  fone^  Ghc^u  eeta  n^icia  to  bobso  Arratal , 
petos  rewlidoa  que  cada  hora  ae  passatao ;  e  de« 
pois  por  correios  noasos  se  cerlifieou  a  nova ,  aenl 
particttkridade  que  mereca  outra  memoria.  —  Aui 
^  Faraiba  coaduzkrao  os  capilaes  q«ie  forao  debaixo 
das  ordcos  de  CaEMiio  o  gado>  de  volta  do  Rio 
Graacte^  d'ondeamaiidmiopara^  Arraial^  a  tempo 
que  oelle  tiofaa  entrado  mm  lotie  ife  dufeenias  ca- 
be^»  tiindas  do  destricto  do  Ri6  «!he  ^Sao  Fran* 
eiaco.  Com  esies  peqnenoa  8oeeon*os  se  anitnou  a 
Aoasa  gettle  a  eaperar  oom  botti  cora^  aeu  maior 
rewedio^  deque  se  encarregira o  govemador  Joao 
Feraandea  Vaeira,  cuja  opioiie  tiidia  ganbado  ta* 
naako  credito  entre  w  aotdades^  qtte  nao  bavia  na 
eatiaiacao  de  todos  xlvliBrenca  etttre  a  promessa  e  a 
cobrama ^  ae  nw  era  aqoelle  iBlterTrilo  4e  tempo, 
preoiaameote  neoeasam,  pMti  igiMtar  e  repartir : 
afiyto  da  yerdade  cam  qoe  os  tralava  y  e  do  amor 
aoAi  q«e  os  favorecia. 

XXXIV.  A  tttia  fib  ItaiMiracA,  qtire^era  o  ^Mro 
donde  te  fitma  de  manlknentos  o  Arrecife ,  dbegott 
a  €8iar  tao  eidftama  que  fedh  remedio  a  quern 
ocraiuflaaiiia'dar  soedorra :  abvaogia  a  todos  ^  ttete^*- 
mlade^^  todas  se  confarmavao em  ifmgcAr  a  vMa 
pela  aalwr  da  iaam.  SeStho  com  doze  lam^bas  do 
Al'TOoife  levaado  afiroa  naatha  dellamap*ca;  A6^ 
Tmxdu^iDo.kvmMf  emaa^mAle  as 


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diizentas  cabecas  de  gado ,  que  do  Rio  Grande  con- 
duziao  OS  capiiaes  Paulo  da  Cunha  e  Francisco  Lo- 
pes, cnlrarao  os  mestres  de  campo  em  suspeita  de 
que  o  inimigo,  informado  da  marcha,  saia  a  cortar- 
Ihe  o  caminho,  e  a  fazer  preza  no  gado.  Despedirao 
correios  a  Tejucu{>apo  e  a  Goyana  para  prevenir  os 
dous  capitaes  do  acoutecido;  mas  a  esle  tempo  ja  o 
gado  tinha  parlido  para  o  Arraial  com  boasguiase 
suflficienle  escolta ;  deixando-se  os  capitaes  Rear 
na  povoagao  de  Iguaracu ,  a  titulo  de  se  refrescarem 
da  fadiga  da  marcha.  —  Tomarao  porto  na  ilha  as 
doze  lancbas,  onde  as  esperava  outra  esquadrilha 
d'ellas,  ja  prevenida  para  este  fim;  e  por  lodas  fize- 
lio  numjsro  de  vinte  sette,  com  seis  centos  solda- 
dos.  Mandou  o  commandante  velejar  para  uma 
paragem  que  os  naturaes  chamao  porto  de  Maria 
Farinha ;  e  um  tiro  de  mosquete  ao  mar  ,  passou 
ordem  que  ancorassem ,  dando  a  entender  que  na- 
quelic  sitio  queria  desembarcar;  tocimo  as  nossas 
sentinellas  a  i^ebate;  ouvio-se  em  Iguaracu,  onde 
d^scan^avao  os  dous  capitaes  e  as  suas  companbias, 
com  as  quaes  marcbarao  a  esperar  de  emboscada  o 
inimigo,  que  sem  movimento  esperou  a  noite,  e 
fortado  aos  olbr>s  de  (odos  se  fez  a  v^.  Com  a  luz 
da  manha  se  vio  o  mar  sem  embarcaoao  algnma ;  e 
OS  no^os  capitaes  leyantarao  a  emboscada,  e  toma- 
rao o  caminho  do  Arraial ,  imaginando  que  o  ini- 
migo  avisado  se  voUara  para  a  ilha ;  e  todos  se  en- 
ganarao ;  porque  o  Flamengo  durante  a  noite  se 
dirigio  sobre  o  porto  de  Tejucupapo,  deitongente 
em  terra,  com  o  designio  de  entrar  a  poToacao  de 
Sao  Loiu^neo,  e  passar  a  espadaos  tiabdios^d'ella. 


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GASmiOtO  LUSITAT90.  419 

p»a  ficar  senhor  do  campo ,  e  carregar  <te  manti* 
menyys. — Avisados  08  moradores  de  S«d  Lourenco 
por  duas  vigias  que  vJrao  desembarcar  o  HoUandez, 
reoolh^iio-se  com  soas  famiiias  em  urn  meio  reduto 
eeroadod'umagrossa  palissada  com  lodas  as  arroas, 
fieizendas  e  mantimentos  que  a  limitaeao  do  tempo 
Ihes  permittio.  Era  sargento  maior  da  gente  mill- 
eiana  Agostinho  Nunes,  soldado  animoso  e  pratico^ 
a  qiiem  esta  occasiao  subio  muiio  no  ci^edilo.  Or- 
denou  a  um  valente  mancebo  chamado  Matheus 
Fernandesy  que  com  outros  irinla  deseu  lole,  des- 
trosnas  veredas,  earmados  d'espingardaa,  iicaseem 
de  ftira  da  eslacada  ,  para  que,  como  soldados  vo- 
kintes,  picassem  o  inimigo^  oobertos  do  ma(o,  per- 
seguindo-o  com  incessaveis  cargas.   Mandou  urat 
correio  de  cavallo  dar  aviso  ao  Arraial ;  ordenou 
iudo  quaDto  podia  servir  a  defeza,  e  esperou  o  as-* 
salto  com  animo  rcsoluto.  Marchava  entre  tanio 
o  inimigo  formado  em  um  so  baialhao,  guiado  por 
rnn  valent^  Hcdiandez,  que  tinha  o  posto  de  sargento 
maior  de  batalha,  o  qual,  rendo  dous  Pm*luguezes 
que  com  accellerado  passo  iao  a  meUer^se  no  re- 
dulo,  com  o  chapeo  na  mao  Ihes  disse  a  vozes :  «  Ha, 
»  senhores  Portuguexes,  nao  fujao  que  todos  somos 
»  amigos;  como  de  inimigos  fogem  ?  Pois  entendao^ 
»  que  antes  de  duas  boras  os  havemos  de  fazer  a 
»  todos  em  pedacos.  »  Uma  das  nossas  sentinetlas, 
que  por  entrc  o  mato  nao  deixou  nunea  a  ilbai^  dd 
esquadrao  inimigo^  ouvindo  estas  palavras ,  enea- 
rou  o  mosquete,  e  passou  com  duas  balas o  sargento 
bollandez  pelos  peitos^  de  que  caio  mo^rto.  Conti-^' 
niK)u  o  inimigo  a  marcha  sem  Bt  dH^r^  apejjar  de 


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$$v  in^^ommocMo  continuameiile  pdas  car^  que 
o§  BOMQS  emboieaclos  Ihe  <fai?ao;  aproxifncm-M  ilo 
l^tttQy  deo  iL  priiaeirt  our^a,  dbhaixo  de  oujia 
btlat  avancario  os  i^atadorea  oom  machados  a 
carter  a  eataoada^  que  os  nosaoa,  apexar  de  infe- 
rier^eQi  numero,  rebal6rio  oom  vabr  e  intrepidei. 
Rotiron-se  o  inimigo  do  primciro  asaalto  deixando 
graiide  numero  de  mortos  e  feridoa^  e  loda  a  gloria 
aosnoaaoa. 

XXXY .  Nao  defliatio  por6m  inieiramaite,  antes 
intentou  de  novo  ganhar  ajpaliasada,  maa  eneoa-* 
Irou  aempre  maior  resietencia,  a  qual  se  aag^ 
mentou  com  o  valor  que  as  molheres  portuguezaa 
moatrario  neata  oecasiao.  Huma  d'ellaa  oom  a  ima^* 
gem  de  Christo  cnioificado  naa  maoa  andava  ani^ 
aaando  oa  aoMados  em  todo  o  tempo  do  eonQicto; 
fiada  ua  cauaa  da  peleja  promeitia  o  Senbor,  oom 
que  animava  y  aoa  aeua  favoravel ,  aos  herejea  ten* 
rivel;  oom  tauio  ^e^>reao  daa  balaa,  que  pareoia 
beber  aeu  espi|*ito  ua  oonfiauca  da  protee^ao,  ou 
diverse  naturesia,  ou  certissima  victoria.  Debaixo 
de  bandeira  tao  aagrada  adpiiuiatravao  lodas  aa 
mals  aos  soldados  as  muni9des  e  aa  armas,  faiendo*- 
se  parciaes  nos  golpes,  que  se  davao ,  como  o  sao 
o  inatrumento  e  o  braQO.  As  que  etcusava  o  lugar 
do  cpmbate,  iguaes  uo  auimo,  pelajavao  oom  sn^ 
periores  aroias ,  porque  com  os  ooraeoes  pekrjavao. 
Experimtntou  o  inimigo  o  quanto  eicediao  aa  for- 
9as  da  resisteucia  &%  da  oonquista,  no  horror  oom 
que  vio  a  circumvallacao  da  estaeada  oom  segunda 
uincheira  de  eorpos  mortos,  seado  tantos  os  doe 
sma  que  alii  aoabarao  ^  que  nem  oa  olhes  nem  a 


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comidcncao  09  podiito  conUr  sem  espuato ;  e  00m 
elle  deixou  o  combate;  mas  nao  de  todo,  porque 
Mdpenhando  todas  as  suas  forcas,  rcuaio  a  ana 
geaid  n'uju  ^squadrao  oerrado^  inyeatio  lerceira  vaa 
i  estacada,  a  qual  cheg^rao  a  romper ,  e  que  sem 
duvida  entrarao^  se  aquellas  malronaa  com  animo 
invencivel  se  nao  opposerao  k  for^a  contraria,  que 
com  varonil  pulso  rebat^ao,  meneaudo  as  armaa 
com  braco  e  animo  tao  robusto  e  deslemido  >  que 
nao  sabia  o  Flamengo  determinar  se  o  traje  dea^ 
mentia  o  sexo ,  x)u  se  a  natureza  errara  a  forma }  e 
de  nenhuma  sorie  aceriava  a  causa ,  que  era  uni-< 
remise  em  urn  coracao  portuguez  o  valor  do  sangue 
e  a  viveza  da  {6  contra  a  perfidia  hollandeza.  Nao 
p6de  o  inimigo  resistir  por  muiio  tempo  a  tanto 
▼alor  e  denodo.  e  de  tal  sorte  se  deixou  tomar  dm 
medo/que  largou  o  combate,  as  muuicoes  e  as 
armas;  e  esquecido  de  toda  a  disciplina^  obedeceo 
a  desordem,  tomou  as  lancbas,  fez<-se  ao  largo ,  e 
ainda  se  nao  dava  por  seguro.  Appellid^o  os  nos-» 
SOS  a  victoria^  sairao  no  alcance  dos  venddos,  que 
chegarao  a  ver  quando  j&  navegavao  de  mar  em 
ftfra  ;  voltarao  ao  reduto^  recoibendo  os  despojosi 
que  servirao  ao  applauso^  com  que  forao  reoebidoa 
de  suas  familias. 

XXXVL  Deixamos  posto  a  camiuho  o  govern 
nador  Joao  Femandes  Vieira ,  levando  eomsigo  a 
companhia  de  sua  guarda,  com  a  vagarosa  marcfaai 
a  que  o  obrigava  o  ir  pelo  certao  de  engenho  em  eii-r 
genhO)  e  pelas  povoacoes  de  porta  em  porta ,  pe^ 
dindo )  cobrando  e  conduzindo  mantimentos  para 
o  Arraial,  at^  que  chegou  ao  porlo  deTaroandard^ 


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ni  ciistBnyro  lusitano. 

mkle  o  inimigo  havia  commettido  varios  estragos, 
cuja  lembranca  excitou  o  vivodcsejo,  em  JoaoFer- 
nandes  Vieira,  de  (abricar  nelle  uma  forca,  em  que 
as  Dossas  embarca^oes  achassem  abrigo,  e  as  conira- 
rias  receioy  que  nenhuma  outra  cousa  Ihe  oecupava 
mais  o  cuidado. —  Deliberado  em  por  por  obra  esie 
pensamentOy  mandou  notificar  e  pedir  a  lodos  os 
moradores  do  contoruo  que  com  os  carros  e  genie 
de  servioo  que  tinbao  acudissem  a  dar  ajuda  aos 
sokUdos  que  haviao  de  trabalhar  na  fabrica;  o  que 
fizerao  com  tanta  promptidao  e  boa  vontade,  que 
dentro  d'um  mcz  se  Ihe  deo  a  primeira  e  ultima 
mao.  Guarnecida  d'artilharia,  muoicoes  e  presidio 
mais  que  sufficieate ,  se  voltou  o  governador  da 
liberdade  para  o  Arraial  j  onde  foi  recebido  como 
abmento  e  coracao  d'aquelle  corpo,  pelo  que  a  todos 
Gommunicava  de  espiritos  e  mantimeDtos. 

XXXVII.  Chegarao  por  este  tempo  ao  Arraial 
dous  padres  de  companhia,  Manoel  da  Costa  e  Joao 
Femaiides,  enviados  da  Babia  pelo  governador  do 
Estado  Antonio  Telles  da  Silva,  com  apertadas 
ordens  de  sua  Majestade  pelas  quaes  ordenava  aos 
mestres  de  campo  Negreiros  e  Moreno,  que  sem 
diiacaose  partissem  com  os  ter^os  de  sen  regimento 
para  a  Babia ,  alargassem  a  campanba  de  Pernam- 
buco  aos  Hollandezes,  porque  nao  convinba  a  sua 
reputacao  que  o  mundo  suspeitasse  que  viola va  , 
peia  sua  parte,  a  paz  e  amizade  assenlada  eatre  sua 
coroa  caqtielles  Eslados.  — Lidas  as  ordens,  nao 
hoiive  coracao,  que  o  pasmo  nao  deixasse  indiOe- 
renle  entre  a  obediencia  e  a  i8en9ao.  Joao  Fernandes 
yi<»ira,  respeitando  muito  as  determinacoes  de  sua 


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GA8TRI0T0  LUSITANO.  A3S 

Majedtade,  disse  que  elle  estava  convencido  que 
EI  Rei  nao  estava  bem  informado  dos  progressoe 
que  nossas  armas  haviao  feito ;  que  era  impossivel 
que  elle  abandonasseaerueldade  e  tyrannia  de  seus 
inimigos  tantos  milhares  de  vassallos;  ponderon 
que  ha  via  easos,  em  que  os  decretos  das  reis  erao 
condicionaes  9  e  concluio  dizendo  :  «  Assim  que, 
»  me  parece  repliquemos  a  sua  Majestade,  com  a 
»  informacao  do  estado  das  cousas ,  e  dos  inconve- 
w  nientes  que  traz  comsigo  esta  resolucao ,  conti- 
»  nuando  com  a  guerra  na  forma  presente  ati 
y>  nova  ordem  sua.  E  dado  caso  que  confirme  seu 
»  dictame ,  digo  que  nao  hei  de  largar  empresa  , 
»  tanto  do  servico  de  Deos ,  e  d'um  principe  tao 
»  catholico  ,  como  i  libertar  milhares  e  milhares 
»  d'almas  da  morle  temporal  e  eterna,  certas  ,  na 
»  sujeicao  ao  dominio  da  herezia  e  do  aborr^- 
»  mento.  Este  i  o  meu  voto,  e  meu  parecer ;  cada 
»  qual  siga  o  que  Ihe  dictar  sua  razao ,  e  nao  sua 
»  conveniencia.  »  0  mestre  de  campo  Andre  Vidal 
de  Negreiros  foi  do  mesmo  parecer;  mas  Martim 
Soares  Moreno  mostrou-se  indeciso ;  com  tudo  fez- 
se  a  replica  com  os  fundamentos  referidos,  a  qual 
se  remetteo  a  Bahia«  para  que  lerasse  a  approvacao 
do  governador  g^ral  do  Estado;  por^m  elle,  ou 
fosse  persuadido  de  superior  impulso,  ou  obrigado 
de  obediente  respeito,  respondeo  que  as  ordens  de 
sua  Majestade  se  guardassem.  Entao,  clara  e  des-* 
cobertamente  disse  Soares  Moreno  que  se  devia 
largar  a  caropanha  ,  e  retirar-se  a  gente  :  parecer 
que  nao  admittio  Joao  Fernandes  Vieira  e  Andri 
Vidal  de  Negreiros.  Retirou-se  aquelle  para  o  reino 
L  28 


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k^  GABTBiOTO  UmiTAXO. 

deixaii4o  o  posto^  e  estes  continuarao  firmed  no  sea 
projficto  recebeodo  os  applausos  de  todo  aqueUe 
povo  que  os  ooosiderava  coodo  seus  libertadores. 
XXXVUl.  Ne6te  Dieio  tempo  forao  avisados  os 
doiia  govemadorea  que  o  inimigo ,  receoso  de 
noaaa  ousadia,  tioha  novameute  fortificado  aa  paa- 
sagens  do  rio  por  aquella  parte  que  cerca  a  ilba 
d'ltamaraca,  para  que  se  nao  podesse  atrayessar  nas 
parageus,  em  que  o  permitte  a  baixamar  eiu  occa- 
siio  d'aguas  vivas*  Levarao  a  cada  qual  uma  Ddo 
(queausteutavao  immovel  algumas  aucoras)  todas 
guaraecidaa  de  soldados ,  e  municiadas  de  pe^as  e 
mosqueteSy  com  que  ficaya  aos  aeus  franca  a  saida, 
e  aoa  nossos  empedida  a  entrada. —  Recebida  a  no- 
ticia  f  conferirao  entre  si  os  governadores  sobre  o 
que  deveria  fazer-^se.  Martim'Soares Barreto,  cujo 
posto  Ibe  dava  a  primazia  no  oonselho,  foi  de  pare- 
cer  que  se  devia  abandonar  um  tal  intento,  ponde- 
rando  razoes  tiradas  da  esporienciai  pois ja  naquelle 
mesmo  sitio  tinhao  o$  nossos  encontrado  a  fortuna 
ad  versa )  e  concluindo  que  nao  era  conselho  da  pru*- 
dencia  buscar  a  dita  no  lugar  do  infortunio.  — Com 
animo  pacato  ouvio  Joao  Fernandes  Vieira  os  fun- 
damentos  da  opiniao  contraria,  e  conhecendo  a 
vontade  qua  se  escondia  no  discurso^  respondeo  as 
palavras  que  ouvia,  eao  animo  que  fallava,  n'eates 
termos.  (t  A  intrepreza ,  que  na  occasiao  passada  se 
•  intentou,  foi  contra  o  meu  parecer^  porque  ante- 
»  via  OS  successos,  nas  inconsidera^oes  da  occasiao; 
p  e  aqueUe  mesmo  juizo^  que  entao  fiz  para  se  nao 
1)  comelter  a  ilba,  fa^o  agora  para  se  intentar  a  em- 
«>  presa ;  porque  o  esiado ,  o  tempo  e  o  modo  me 


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M  enwiaiio  a  que  aoomdhe  ag^ra  o  que  diasuadia 
»  entaO|  lyucfeda  meu  parecer  da  differenca  dos  mo- 
n  tiyOB ;  que  m>  mui  diversoa  oa  que  conyidao  a 
»  liberdade  de  adquerir^  daquelled  que  propoe  a 
n  ueceaMdade  de  couaervar*  0^  lugarea  das  baudhas 
>i  nao  sac  ceos  d'eslreUas  para  influirem  valor  om 
»  cobaitiia«  O  mesmo  baluarte,  que  muitas  yesea 
»  repreaentou  o  valor  da  reatsteucia)  se  chora  ulti^ 
»  mamente  rendido  ao  estrago  da  conquista.  Que 
»  victoria  se  alcanc^ra^  ou  que  praca  se  rend^ra,  de 
)>  OS  exercitos  ao  primeiro  revez  da  fortuna  se  re*- 
M  tirarao  dos  campos  onde  o  recebSrao  ?  Se  a  dou«- 
»  trina^  que  dao  oa  aucces60s  6  a  millior  douiriiui, 
»  quasi  todos  os  da  gu^rra  nos  acooselhao  a  pre»> 
»  sente  delibera^ao.  Impraticaveia  forao  os  cou'^ 
M  flictos )  se  uma  empresa  mal  succedida  servira  a 
»  desespera^o  da  todas.  A  representacao  da  ofiensa 
n  intimada  ao  aggressor  acoeude  o  furor  do  aggra*- 
»  vado«  A  guerra  toma  as  importancias  das  coute^ 
n  queacias,  como  toma  a  justifica^io  das  causas*  0 
»  inimigo  96  fortifioa  na  ilha  ^  para  assegurar  de 
II  nossas  annas  os  mantittientoa>  que  elia  produz; 
»  e  para  poder  a  seu  salvo  sair  a  roubar  os  do  cer^ 
n  tao.  Se  da  mia  parte  creaceo  a  resistencia  com  a 
»  preveii9ao,  da  uossa  aQgQ)ent»«ie  o  eiupenho  com 
»  a  importancia ;  esta  oos  chama  ao  perigo ;  e  se 
M  algum  o  teme,  fuja^lbe  com  o  corpo ,  sem  querer 
»  desculpar  sua  commodidade  com  nossa  dtversao, 
»  pois  sabe  que  o  romper  difficuldades  nao  6  para 
»  todos  :  sabe-as  veneer  quern  tern  animo  para  as 
>}  oorlar,  e  juizo  para  as  advertir.  n 
XXXIX.  AchArao  eslaa  razoes  saUsfacao  nos 


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U6  cAsnioio  ivsnAMO. 

compatiheiros,  e  desabrimento  nos  oppoMos,  que 
pek>  nao  pareoerem  se  derao  por  vencidos  do  arga- 
mento ;  e  conformes  no  voio  poserao  nas  inaos  do 
govemador  a  dtspoaicao  da  empreaa^  que  s6  fiou  do 
mestrede  campo  Andr^  Vidal  de  Negreiros,  em 
quern  reconhecia  talento  para  o  n^;ocio ,  e  capa- 
cidade  para  o  segredo.  Em  13  de  Janho  sak)  Joao 
FernandesYieira  do  Arraial  com  o  mestre  de  campo 
Negreiros,  e  quinh^ilos  soldados  escolhidos,  com 
duas  pecas  d'artilhariade  calibre  18  ;  efavorecidos 
da  noite^  que  era  escura  e  chuvosa,  chegarao  a  vista 
do  no  sem  serem  sentidos ,  em  uma  paragem  cha- 
jnada  o  porto  dos  Marcos,  onde  o  inimigo  guar- 
daya  o  transito  com  uma  nio  guarnecida  de  soldados 
e.ariilheiros.  —  Fizerao  os  nossos  alto ,  cobertos 
dos  crescidos  mangues  que  alii  produz  a  natureza ; 
fizerao  promptamente  uma  triucheira  e  plataforma 
em  que  cavalgarao  as  duas  pe^s  d'artilharia ;  for- 
m^rao  ao  mesmo  tempo  dous  botes  e  duas  jangadas, 
e  logo  guamecerao  com  doze  homens  cada  um  dos 
botes,  que  maia  nao  podia  conter.  A  um  alferes 
reformado,  por  nome  Affonso  d' Albuquerque,  «i- 
tregou  o  governador  o  primeiro ;  e  o  segundo  a 
Francisco  Martins  Cachadas,  sargento  reformado. 
Recommendou-^lbes  o  bom  desempenho  d'aquella 
faccao,  e  deo*lhes  por  ordem  que  envestissem  e 
abordassem  a  nao  com  deliberacao  de  a  ganharem 
ou  morrerem  na  demanda ;  e  que  mandava  na  es- 
teira  dos  botes  as  duas  jangadas ,  para  soccorro  de 
qualquer  incidente ;  e  que  fossem  certos  que  na 
terra  os  acompanhava  sen  cuidado ,  para  os  faro- 
recer  com  a  artilharia  no  conflicto,  e  como  premio 


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CA8TBI0TO  LUftlTAIia  ftS7 

na  victoria.  Favorecidos  com  o  escuro  da  noite  se 
forao  08  botes  chegando  a  nao  a  voga  surda.  Nao 
dormiao  as  sentinellas ;  descobrirao  os  yultos ,  e 
pedirao  noma.  Com  o  de  amigos  Ihes  respondeo  em 
sua  lingua  urn  soldado  nosso ,  de  nascimento  Al- 
lemao.  Entendre  que  erao  Hollandezes,  e  respon- 
deo que  vogassem  ao  largo.  Aperlarao  os  nossos 
0  remo  buscando  a  nao  com  repetidas  cargas ,  a 
qual  desenganada  do  erro,  e  temerosa  do  perigo^ 
borneou  as  pecas ,  e  com  o  tiro  d'uma  fez  em  pci- 
daco6  o  bote  do  Albuquerque,  que  se  tinha  adian- 
tado ;  salvou-se  por^  a  gente  em  um^  das  janga- 
das,  sem  mais  damno  que  d'um  soldado  ferido.  Ji 
neste  tempo  abordava  a  gente  do  seguado  bote  a 
nao  pelo  outro  lado ;  cinco  soldados  com  o  seu  ca- 
pitao  aobirao  pelas  taboas  do  costado  e  pelas  cor- 
daSy  e  a  for^a  de  braco  se  fizerao  senhores  do  cas- 
tello  de  proa.  Um  so  soldado  nosso  pereceo  n'este 
atsalto;  ferido  d'um  golpe  d'alfange  na  cabe^a, 
caio  ao  mar,  quando  ia  a  saltar  a  bordo.  Os  sette 
que  ficarao  no  bote,  attentos  a  soccorrer  os  corn* 
panheiros,  nao  advertirao  na  corrente  das  aguas,  e 
forao  apartados  da  nao  e  do  intento.  Neste  tempo 
disparou  a  nossa  artilharia  de  terra ;  recolheo-se  o 
Flamengo  sobresaltado  ao  castello  de  poppa ;  erao 
08  inimigos  trinta,  e  vendo-se  atacados  somente  por 
cinco  J  quizerao  fazer  p6  atraz ;  mas  os  nossos,  re- 
cobrando  animo ,  avan^arao  aos  HoUandezes  a  es- 
pada,  com  tal  furor,  que  matdrao  sette,  prisiona- 
rao  qninze,  e  obrig^rao  a  que  oito  se  deitassem  ao 
nar,  onde  encontrarao  o  ferro ,  e  o  grilho  de  que 
ibgiao»  Asaixi  ganb^o  aquelles  cinco  Portuguezes 


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a  nao  pela  maneira  dita^  e  a  dila  por  valor  inandito. 
—  Vendo  os  Flamengoe  no  dia  aeguinte  rendida  a 
nao  9  e  receiando  que  o  mesmo  acontocesM  aos 
dous  outros  navios ,  posdrao  fogo  ao  que  guardava 
a  paaeagmn ,  chamada  de  Tap«aauma ,  e  fc^rao  a 
nado  para  terra ;  o  que  riato  dos  noaaoa  govema- 
dorfSy  ineti6rao«M  no  baiel  da  nao  rendida,  com 
oito  mosqueleiros,  e  a  Toga  arrancada  passlrao  a 
envestir  o  teroeiro  navio  ^  que  eatava  em  guarda 
do  vao  J  que  se  die  d'mitre  dous  rioa  ^  o  qual  ran 
ddrao  com  a  vista ,  porque  oa  Flamengos  que  o 
guameciao  nao  esperarao  aer  ataoadoa  para  o  ahan«* 
dooarem  y  salndo  em  terra  com  tal  medo  que  por 
toda  a  iiha  forao  tocando  a  rebate >  e  amotinando 
OS  moradoree.  Ganhadas  as  duas  naos  com  tao  pouoo 
cuato  mandarao  oa  noaioa  govemadorea  Urar-Uiea 
o  velame,  enxama^  artilharia^  maalros,  munigoes 
e  mantimentos ;  e  para  que  o  inimigo  se  nao  apro- 
veitaase  dos  vasoa,  os  eQtr^;arao  ao  fogo,  que  em 
breve  espaco  oa  consummia. 

XL.  Oocupava  o  ininiigo  a  fortaleia  dhi  villa  j 
temeo-se  assaltado ,  e  nao  ouaou  ataoar  oa  noaaos^ 
que  espalliando^ae  peta  ilha,  reoDlh^nb  o  que  t'mba 
preatimo,  quetmirao  o  que  nao  tinha  servifo,  e 
deixarao  aaaobdoa  oa  alojamentoa,  e  akiriaados 
Indioa,  e  tudo  o  que  podia  west  de  utilidadaao  ini* 
migo.  Mandou  ogoveraador  Joao  Feraaadea  Vieira 
tocar  a  recolheri  passou*M  a  nossa  gente  a  terra 
firme,  e  com  os  despojoe  daa  u&oa,  e  da  iUu  mar* 
ch4rao  todos  para  o  Arraial  ^  deixando  ordem  e 
geute  para  qoe  ni  praia  que  ehamao  o§  Marcos  aft 
levantaase  tima  for^a  que  fiaeease  opf)osioao*  ad  kga^ 


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migo.  Tendo  porim  noticia  que  o  Flamengo  tinha 
desemparado  a  fortal^a  da  yilta ,  a  qual  tambetn 
a  fora  dos  babitante$  ^  mimdarao  ordem  os  goter-^ 
nadores  para  que,  retirada  a  anilharia  da  fortaleza 
a  desmanteUa^in  pela  impossibilidade  de  se  con- 
servar  9em  grande  dispendio,  e  grande  risco;  o  que 
assim  se  executou.  —  Esta  faccao  teve  tnuito  ran- 
tajosas  consequencias  para  as  nossas  armas ,  sendo 
uma  d'ellas  o  paasar^'-se  para  o  nosso  Arraial  um 
maioral  dos  Brazilianoe ,  com  quarenta  Indios  de 
sua  jftrisdiceao,  que  os  nossoa  goveraadores  remet- 
tdrao  a  D<  Antonio  PbiKppe  Gamario,  com  recom- 
ificsida^  que  09  tratasse  bein^  e  Dies  d^sse  aloja* 
mento  em  parte  <mde  podessem  grangear  a  Tida, 
sem  sobresako  daa  armas  hoUandezas. 

XLI.  Tmhao    os  Hollandezea  celebrado  com 
salvas  d'artilharia  a  chegada  de  tres  natios  em  que 
a  Gompai^ia  Ibes  maudava  soccorro  de  soldados  e 
muni^oes,  e  promeasa  d'rnna  forte  armada  que  de^ 
veria  resaarcir  todas  as  perdas.  Nao  se  aher^rao  os 
I10S909  com  esfas  notas,  autea  recobrirao  novo 
animo^  porque  neste  mesmo  tempo  entroti  no  porto 
de  Tamandar^  uma  fragata  nossa  com  cento  e  qua- 
renta soldados  portugueies ;  no  pontal  de  Nazareth 
entr4rao  trez  caratellas^  com  mfantaria,  armts,  e 
gmeros  queiao  para  a  Bahia,  e  um  nario  carrcgado 
de  Tinbos  que  ia  para  o  Rio  de  Janeiro.  Todas  estas 
embarca^oes  ae  defend^rao  A>9  Holtandezes>  qtie 
no  mar  Ibe  derao  caca :  ctreumstancia,  que  com  a 
do  tempo  inspirou  maior  alento  aos  nossos.— Erao 
08  nossos  goTemadores  mui  precatados ;  e  reccosoa 
da  cbcgada  da  es^dra  inimiga,  depots  de  ourir  0 


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IM  CASTRIOrO  LUftUAIia 

conselbo  de  pessoas  enteodidas,  resolv&rao  mandar 
retirar  os  moradores  da  Paraiba  e  da  Goyana  para 
a  vizinban^a  do  Arraial,  porque  estando  unidos, 
perderia  o  iDiroigo  a  esperanca  de  os  veneer  separar 
do8«  —  Em  quanto  esta  ordeni  se  executava,  teve 
aviso  o  capitao  Francisco  Lopes  Estrella,  que  guar- 
necia  com  sua  gente  a  estancia  que  cbamavao  da 
Barreta,  que  duas  lanchas  inimigas  i  v^la  e  aremo 
sobiao  pella  corrente  dos  rios  Tigipid  e  Giguia, 
perto  da  paragem  onde  se  ajuntao  para  entrar  no 
mar.  Adiantou-se  o  capitao  com  o  melhor  de  sua 
compax^iia  a  esperal-as  d'emboscada;  Ic^oque  teve 
vista  da  primeira  saltou  &  agua  com  trinta  soldados; 
deo-lbe  duas  cargas ,  abordou-a  y  e  com  morle  de 
oito  soldados  boUandezes  a  rendeo;  e  com  elles, 
e  com  toda  a  carga  (que  Qra  de  mantimentos)  a  ma- 
reou  por  entre  os  arrecifes,  a  despeito  da  artiUia- 
ria  inimiga,  at^  lan9ar  ferro  na  Barreta.  A  a^unda 
lancba,  assim  que-  vio  a  sorte  da  primeira,  a  v^la 
e  a  remo  fogio  para  o  Arrecife,  donde  tinha  saido. 
—  Vinbao  estas  lancbas  com  soecorro  para  a  forta- 
leza  dos  Affogados ,  que  estava  em  grande  aperto, 
e  como  este  se  baldasse  j  despacbarao  outro  por 
terra  as  costas  de  negros,  mas  nao  forao  mais  feli- 
zes,  porque  os  soldados  de  Henrique  Dias  os  espe- 
rarao,  emboscados  entre  os  mangues  d'um  lamacal, 
d'onde  com  repentinas  cargas  os  ferirao,  e  sobre- 
saltearao  de  maneira  que  escravos  e  soecorro  tudo 
ficou  nas  maos  dos  nossos. 

XLII.  Com  successos  pouco  desemelhantes 
se  foi  continuando  o  exercicio  d'umas  e  outras 
armas  at^  aos  20  de  Julbo,  em  que  o  inimigOi  fa- 


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GA8T1I10T0  IDSlTiJIO.  4&1 

vorecido  do  escuro  da  noite  ^  saio  com  iodo  o  poder 
para  atacar  a  nossa  estaocia  que  cbamavao  dos 
Marcos,  com  determina^ao  de  a  ganhar ;  mas  saio- 
Ihe  a  conta  errada ,  porque  os  nossos,  advertidos 
com  o  rebate  das  sentinellas  se  prevenirao  para  a 
defesa  ,  e  receb^rao  o  inimigo  com  duas  cargas  de 
mosquetaria.  A  promptidao  da  resistencia,  e  o  ino^ 
pinado  da  vigiiancia  quebrou  de  sorte  o  animo  do 
Flamengo  y  que  descomposto  Tirou  as  costas>  e  nao 
parou  senao  junto  de  sua  artilbaria ,  at^  onde  o 
perseguirao  os  nossos^  com  tao  boa  foriuua,  que 
fazendo  no  inimigo  grande  estrago ,  se  recolhSrao 
com  um  s6  soldado  ferido. 

XLIII.  Era,  Joao  Fernandes  Vieira  o  (error 
dos  inimigos  por  seu  valor  e  vigiiancia ;  crescia 
seu  credito  e  reputa^ao  y  mas  crescia  tambem  a  in-% 
veja  contra  elle.  Houverao  Amnios  (  e  chegarao  ao 
uumero  de  dezanove)  que  nao  contentes  de  pagar 
com  ingratidoes  os  beneficios  que  d'elle  tinbao  re- 
cebido  conspirarao  entre  si  para  tirap-lhe  a  vida* 
Esta  negra  trai^o  foi  por  vezes  annundada  por 
escrito  ao  governador,  e  at^  houve  pessoa  que  o 
avisou  de  palavra,  indicando-lbe  os  nomes  doa 
conspiradores;  mas  elle  nunca  quiz  dar  credito, 
atribuindo  a  malqueren^a  o  que  era  dela^ao  verda^ 
deira  de  crime  premeditado.  Informado  o  m^tre  de 
campo  Negreiros  do  que  se  passava ,  buscou  o  go- 
vemador,  expoz-lhe  o  perigo  a  que  se  expunha, 
e  instou  com  elle  para  que  mandasse  prender  e  pro&» 
sessar  os  eonjurados ,  cujos  nomes  erao  ja  conbe- 
cidos ;  mas  Joao  Fernandes  Vieira^  dq>ois  de  ouvir 
attento  o  mestre  de  campo ,  mais  espantado  qu» 


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oreddo,  rcspoadeo  que  tndo  quanto  naquella  mt- 
leria  Ihe  tinhao  dito,  era  invencao  da  malicia ,  que 
a  titnlo  de  Mguranca  solicitava  a  descomposicao  de 
tantos  homens  nobres^  como  erao  oa  calamniados. 
Todos  oa  nome<m,  e  concluio  diiendo  :  Que  ae 
aquelles,  sendo  homens  de  qualidacle,  parentes,  e 
obrigadoa  the  desejavao  a  morte ,  de  quern  haTia 
de  fiar  a  vida  ?  Que  o  apurar  verdade  de  tanto  peso 
nao  podia  ser  sem  injuria ,  e  que  seria  intoleravel 
desaoerto  criar  inimigoa  com  oa  arguir  d'infieis. 
Fez  o  roeatre  de  canpo  ootras  muitas  diligencias 
para  convencer  Joao  Feraandes  Vieira  do  perigo 
que  o  ameacava ,  mas  sempre  de  balde  :  agradeda 
aem|Mre  o  cui<fado,  julgando  superflua  a  diligencia; 
mas  em  breres  dias  oonbeceo,  mnito  i  sua  custa , 
de  que  parte  eaUta  o  erro« 

XLiy.  Saira  um  dk  Joao  Fernandea  Vietra  do 
aeu  engeobo  ^  e  eomo  se  adiantasae  dgnm  tanto  da 
guarda  que  o  acompanbara^  ao  entrar  n'um  baalo 
canavealy  trea  Mameluoos  Ihe  encararao  aos  pei(o& 
trei  espingfuardas  ,  com  tanta  dita  do  go?ernador 
que  so  uma  pegou  fogo,  cujas  belas  Ihc  pasairao  um 
hombiy>de  parte  a  parte.  Metteo  o  governador  mao 
a  eapada,  avancou  o  caTallo  do  cerco,  que  por  ne- 
Bbuma  parte  p6de  Teacer.  Acudirao  logooaaolda* 
doa  ohamadoa  do  tiro,  e  informadoa  do  caso  saka*- 
rao  a  oerca,  alcanoarao  o  aggressor,  que  aan  deiDora 
fizerao  em  pedaQOs ;  poserao  fogo  ao  cama^eal,  para 
que  morressem  queimados  os  outroa  doua  Mame- 
ktooe;  per^  ellea  pod^ao  sair  p<M*  outra  parte 
antea  qeie  o  fogo  ateasse.  ~  Vohou  o  governtdDr 
para  ana  oasa^  qoe  diatava  jneia  legoa  do  Airaial, 


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QA^mimQ  iivaixMia  &43 

para  se  owar  da  fejri<la;  ibsouIoq  retinr  todos  o$ 
barcos  que  serviio  4  paBsagem  do  rio,  que  entre  o 
Arraial  e  aua  caaa  ae  anCr^uoha ,  atevendo  o  que 
depois  succedeo.  £gpaIhou-se  a  nova  no  Arraial ,  e 
com  ella  tal  alleraQao^  que  despresada  a  obedienoia 
oorr^o  officiae^  e  soldado^  a  casa  do  govemador 
pediodo  com  tumulto  o  noma  dos  traidorea  para  oa 
queimarcni.  Foi  merc^  do  ceo  nao  se  lerem  divui^ 
gado  09  nofiiea  doa  deaanove  da  ooi\)uracao ,  que  a 
mQ  aer  aaaim » fora  o  caatigo  maia  eacandoloso  que 
a  culpa.  Nao  meoor,  o  per  Teutura  maia  perigoso 
ibi  o  alvorooo  que  a  aM>U€aa  eauaou  uaa  eatanciaa , 
porque  ocoupadoa  do  aeBtimeiiU)  e  da  eokra  es* 
queoiao  o  iuimigo.  Ck>rriao  todoa  para  casa  de  aeu 
govemador  eoio  um  meamoaDimo,  £stava  eUe  aaur 
grado  e  de  eama;  maa  teudo  uotioiadQ  queae  paa* 
aava,  aallou  fora  da  caBaa,  bdouIou  a  cavallo,  e  fbi 
ao  eaooutro  doa  aoldadoa  que  acbou  ua  pasaagem 
do  rk)  9  delidoB  pela  faUa  de  bareoa.  Com  roato 
alegre  minoroa  a  opiniao  y  e  ai^io  o  arrebatado  * 
daaaUuo  de  deoaram  aaua  poatoa  arriscadoa  a  in- 
vaaao  do  imm%o.  Com  corlesia  e  brandura  os  t^ 
dutio  a  obediWia  e  a  diicifdina ;  e  com  a  pro* 
meaaa  de  que  o  delicto  aeria  punido  com  ledo  o 
rigor,  fiearao  aaliafeitoa^  e  vollarao  a  aeua  poatoa 
e  eatanciaay  dando  provaa  que  ae  amavao  o  aeu  go* 
vc^nador  como  a  pai  tambem  aabiao  obedeeer^lhe 
Qomo  a  attperior. 

XLY.  Socegado  o  tunuUo^  vc^lou  o  goveraador 
para  lua  caaa  a  coatiauar  a  cura ;  logo  que  ae 
achon  reaUd)elecido»  owmWu  obaouur  aeua  inimigoa 
(fe  qiMm  qwm  a  eaaaoda^  «  na^  a  ruiiia*  Nao  re^ 


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hkh  GASnUfOTO  LUSTTAlia 

sarao  elles  vir,  certos  na  clemencia ;  e  ouvirao  com 
submissao  o  que  o  govemador  Ihes  disse.  Com  as- 
pereza  Ihes  afeou  a  culpa^  accasou  a  infamia  com 
a  recorda^ao  dos  beneficios ;  exagerou  a  maldade 
com  o  vinculo  do  parentesco);  provou-lhes  a  per- 
fidia  e  a  villeza  d'uma  similhante  traicao ,  e  por 
ultimo  Ihes  disse,  que  supposto  que  como  seu  go- 
vernador,  por  elles  mesmos  acclamado,  tinha  bra^o 
para  os  punir^  o  como  Joao  Fernandes  Yieira, 
espada  para  os  castigar,  nem  d'uma  nem  d'outra 
cousa  se  queria  valer,  para  que  conhecesse  o  mundo 
a  differenca  que  vai  d'um  cora^ao  yil  a  um  amigo 
generoso ;  e  que  nunca  permittisse  o  ceo  que  seu 
valor  se  manchasse  com  a  opiuiao  de  vingativo , 
nem  que  por  sua  causa  se  derramasse  sangue  de 
Portuguezes.  Emmudecidos  da  culpa  e  do  pejo , 
sairao  conftindidos  da  preeenca  do  govemador,  mas 
nao  sairao  outros^  como  depois  mostrou  o  tempo. 
Condi^ao  propria  i  do  ingrato  augmentar  os  ag- 
gravos  com  a  present  dos  beneficios. 

XL VI.  A  causa  que  tiverao  os  dezanove  conju- 
rados  para  incorrerem  em  similhantes  delictos, 
perguntarao  os  curiosos  ?  E  responder^  a  verdade, 
que  nenhuma  outra  mais  que  o  verem-se  prece- 
didos  na  prosperidade  que  os  sustentava  na  opiniao 
de  honrados.  Desejara  saber  o  leitor  que  conve- 
niencia ,  ou  que  premio  esperavao  os  traidores , 
que  OS  podesse  obrigar  a  resolucao  tao  feia.  Entao 
se  escondeo ,  agora  a  diremos,  porque  depois  de  a 
encobrir  a  politica  a  puMicou  o  escandalo.  Prati- 
cava-se  que  tinhao  assentado  com  os  governadores 
do  Arrecife  entregar^lhe  a  terra  ^  tirando  a  vida  a 


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CASniOIO  LDSITAlia  hU 

Joao  Femandes  Yieira,  que  Ih'a  defendia  :  verdade 
que  sedescobrio  com  sediYulgarem  algumas  cartas, 
que  OS  nossos  cabos  maiores  tomarao  a  uma  mu- 
Iher,  que  foi  a  terceira  de  tratos  tao  infames ;  os 
quaes  remett^rao  ao  governador  g^ral  do  Estado 
Antonio  Telles  da  Silva ,  como  a  juiz  competente 
de  similbante  causa.  O  que  d'esta  dilig^ficia  se 
seguio  nao  pod^mos  n6s  alcancar,  ou  porque  a 
jrazao  d'estado  o  dissimulou,  ou  porque  alguma 
diligencia  o  escondeo ;  para  claro  manifesto  de  que 
foi  Joao  Fernandes  Vieira  varao  tao  grande  que 
venceo  os  mais  poderosos  inimigos  e  os  mais  refi- 
nados  traidores,  porque  Ihe  nao  faltasse  entre  os 
capitaes  da  fama  o  ser  temidoe  invejado ;  e  porque 
OS  excedesse  em  sair  victorioso  da  inveja  dos  pro- 
prioSy  e  do  poder  dos  contrarios. 


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UVRO  X. 


SUMMARIO. 


1.  Tonid*  porto  no  Afrtdfe  botw  e^>of,  eoMimit  potooM  i 
^  %  Aprestao-M  ot  noifos  part  t  resiitencit ;  mandtto  retirar  00 
moradores  da  Paralba  e  Goyana.^S.  Sai  SisgismuDdo  do  Anecire 
para  ganhar  a  Til  la  d'Otindt ;  r«iiri-fe  doseotnpotto.  -^  4.  Ilaiida 
Sifgifmondo  aaiaUar  a  villa  eom  dobrtdo  podor;  fuectdo-lha  o 
meiiDO.  —  5.  Inteota  ganhar  a  estaocia  do  Aguiar ;  of  nossos  go- 
vernadores  Ihe  fazem  virar  ai  costaa .  ~  6.  Porfia  Siigisnidndo  em 
tua  demandt ;  conaogtie  aaquaar  0  eDganlio  da  Sio  Barchtlomaa,  e 
a  pofoafao  da  Jangada.  —7.  0  Camarao  poo  0  inimigo  em  mise- 
ravel  fogida  ;  Siigismundo  se  imaginott  captiYO.  —  8.  Manda 
saquear  0  Rto  de  Sdo  Francisco ;  6  destrocado  pelo  Rebellittho.  -^ 
9.  Intenta  Siagia niindo  fonifioar-te  junto  a  IgnarafCi.  — 10.  An- 
dr^  Tidal  marcha  para  a  Paratba  -,  inteota  assaltar  a  Barreta ;  o 
inimigo  soccorre  os  seus  sem  effeito ;  levantdo  as  nossos  0  ceroo 
e  se  retirao.  — 11.  0  Holiandez  sai  do  Arrecife  com  toda  sua  ar- 
mada, toma  0  Rio  de  Sao  Francisco ;  deita  gente  em  terra  e  se  for- 
tiGca.  —  12.  Resohe-se  0  govemador  em  desalojar  0  Flamengo. 
— 13.  Morre  0  RebeUinho ;  perda  dos  nossos.  — 14.  Nomeia  El  Rei 
0  conde  de  Villa-Ponca  por  general  d'uma  armada  que  manda  ao 
Brazil;  Sisgismondo  larga  0  sitio,  e  se  retira  a Peroambuco.  — 
15.  Antonio  Dias  Cardozo  vai  a  Paratba,  e  0  que  resulla  d*e8ta 
yiagem.  — 16.  Sente-se  a  falta  de  mantimentos  entre  os  nossos,  e 
como  se  remedea.  — 17.  Parte  Andr6  Vidal  para  0  Ceard  Morim  ; 
aproveita-se  0  inimigo  de  sua  ausencia;  mas  Joao  Fernandes 
Vieira  Ihe  refreia  os  intentos.  ^  18.  Chega  a  Pemambuco  a  noya 
da  armada  portugueia.  — 19.  Fazem  os  nossos  a  fortaleza  da  ba- 
taria,  sem  que  os  inttnigos  os  sintao  ;  os  quaes  atemorizados  man- 
dao  recolher  0  seu  general  Sisgismundo.  —  20.  Os  nossos  assaltao 
e  saqueao  0  paco  do  conde  de  Nassau.  —  21.  Eotra  Sisgismundo 
no  Arrecife  com  a  sua  armada ;  layanta  uma  fortaleza  em  opposi- 
Cao  da  nossa  bataria.  —  22.  Diyulga-se  em  Pernambuco  ser  che- 
gada  4  Bahia  a   armada  portugueza.  —  23.   Marcha   Henrique 
Dias  para  0  Rio  Grande ;  ganha  a  fortiOcacao  das  Guarairas.  — 
24.  Em  Cunhaa  Ihe  entregao  os  HoUaodezes  oulra;  Tolta  para  0 
Arraial  Yictorioso  e  com  despojos.  —  25.  Nomeiou  El  Rei  a  Fran- 
cisco Barreto  de  Meneses  por  meitre  de  campo  da  nossa  campanha ; 


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Qijsmmo  una  Am.  Ml 

lit  TUgeiB  0  captivao  of  HolUndezets  mag  eonMgue  fagir  do 
Arrecife  para  o  Arraial.  —  26.  Prepdrao-se  os  dosios  goTeniadores 
para  mistira  rnna  grande  annada  qut  aalra  de  Hollaiida;  a  qaal, 
dapoM  df  aavegar  cotn  diveria  fortuaav  chaga  «o  Arrecife.  — 
27.  Admiravel  fidelidade ,  valor  e  constaocia  dos  Pernambacanog. 
—  28.  Oi  nosBos  goyemadores  mandao  rctirar  os  moradores  cir- 
eomtttliihoi  para  t  Amial.  —  H^.  PubUeio  ot  do  govetoo  oa 
perdao  g^al ,  e  esererem  a  og  noafot  goTernadoreg ;  por  am  en- 
viado  remettem  as  cartas  ao  Arrecife. 


L  Um  anno  I  menos  poucos  dias,  se  tinba  pasr 
sado  despois  da  batalha  das  Tabocas^  em  que  o  ini- 
noigo  come^ou  a  perder  terra  e  dominio  ;  quando 
em  20  de  Julho  de  1 646  aporlou  na  barra  do  Ar- 
recife o  general  Sisgismundo  Vanescoph  com  uma 
poderoaa  armada^  e  nella  quatro  mil  infantes,  que 
conduzia  Jacob  Estacourt ,  um  dos  principaes  da 
companhia  occidental «  de  que  ]a  temo9  fallado  no 
terceiro  livro  d'esta  historian  Deitarao  ferro  com 
multipUcadas  salvas,  desembarcarao  com  muitos 
vivaS|  forao  recebidos  com  festivo  alvoroco  :  effeitog 
nascidos  da  confianca  que  a  todos  prometlia  a  res^ 
tauracao  do  seu  imperio.  Sisgismundo  depois  de 
reunir  todos  os  cabos,  e  todos  que  tinbao  posto  no 
governO)  dis8e«4bes  em  ar  de  refurehensaoy  que  se 
admirava  de  qtie  taes  e  tantos  soldados  se  deixas- 
sem  cercar  e  opprimir  de  quatro  bizonbos,  que 
nunca  yirao  guerra ;  tao  fracos  d'animo  que  s6  a 
voz  de  seu  nome  os  punha  em  fugida  para  os^ma- 
losi  com  menos  temor  das  feras  que  de  suas  armas* 
Todos  ouviraoi  e  callaraOi  esperando  castigada  sua 
jaotancia  pelo  mesmo  engano  de  seu  desprezo* 
ilouve  com  tudo  um  dos  presentes,  menos  sofirido, 
que  the  censurou  ademazia,  dizendo  a  Sisgismundo 


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us  cAflmMno  LtmrrAiia 

que  nao  pesava  bem  os  successes  quern  nao  fazia 
differeu^a  dos  tempos ;  que  o  presente  Ihe  faria 
entender  que  aquelles  xnesmos  homens  que  no  pas- 
sado  fugiao  timidos^  ouvindo  seu  nome^  no  pre- 
sente, vendo  sua  pessoa,  a  haviao  d'envestir  a  es- 
pada  com  desusado  valor ;  e  assim  aconteceo  como 
adiante  veremos. 

IL  Inteirados  os  nossos  governadores  do  poder 
e  desenhos  do  Flamengo^  e  que  Sisgismundo  como 
tao  experlo  soldado  havia  de  por  todos  os  meios 
para  os  levar  a  efleito,  trat^rao  de  emendar  as  des- 
ordens  passadas,  como  causa  dos  passados  infortu* 
nios.  Despacharao  ordem  a  D.  Antonio  Phelippe 
Camarao,  que  assistia  na  Paraiba,  e  a  todos  as 
cabos  que  fizessem  retirar  todos  os  moradores,  que 
por  froxidao  se  nao  tinhao  retirado  da  Paraiba , 
Goyana  e  sens  destrictos  com  todas  suas  familias, 
bens^  gados  e  roantimentos^  aos  quaes  comboiassem 
at^  OS  p6rem  em  seguro  entre  o  Arraial  e  a  villa 
d'lgaaracu^  que  destinavao  por  fronteira,  para  que 
assim  reunidos  se  tomassem  mais  fortes.  Prov^o 
aquellas  estancias  que  circumvalavao  as  fortificacoes 
do  Arrecife  de  tudo  o  que  Ihes  pareceo  necessario 
para  a  resistencia,  medindo  os  aprestos  pelo  perigo 
e  a  deligencia  pela  importancia ,  fazendo-se  ver  na 
boa  disposicao  de  suas  ordens  a  inteireza  de  sens 
animos.  —  Notificados  os  moradores,  obedec6rao 
pontuaes  as  ordens,  certos  de  que  na  execu^ao 
d'ellas  consistia  seu  remedio.  Com  prompta  dili- 
gencia  largarao  engenhos,  casas  e  fazendas^  carre- 
gando  tudo  que  podiao  trazer,  e  escondendo  pelos 
matos  0  que  for^osamente  haviao  de  deixar.  Pos^- 


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lio^de  em.  mavdia  amstklQft  de  todia  a  gefite  de 
g^terra ,  e  apeear  (fe  gerem  piur  ella  protegidos , 
nao  tiverao  pboco  a  spffrer  nas  trinta  fegoas  que 
Uyfriko  que  alravessar,  veodcvse  obrigados  a  en* 
Wiraf  e  a  esoonder  no  maio  suas  allaias  e  roupas, 
porqiie  mmlos  doa  escravos,  aproveitando  esta  oe-^ 
caaiao  a  fai^or  da  noite,  fogiiiao  abandoiiaiido  seiii> 
senhores,  deixattdo  pela  eatmda  os  bens  jque  tra* 
ziao.  Cbegipao  a  villa  de  Iguara^^^  por  eujo  des- 
tiioU)  se  ddx4rao  ficar  algimsy  abrigadoa  daquefie 
presidio ;  outro6  se  accomixKKUirao  pehi  Varzea  j  t 
sombra  do  nosso  arraial ;  os  remaaeoentea  padsarao 
a  Timer  nos  €ontm*ii08  da  fortateza  do  pontal  de 
Nazareth. 

III.  Aos  5  de  Agosto  saioSisgiamuiidodo  Arreeife 
com  mil  dnzentois  homena ,  e  com  penaamento  de 
gattiiar  Olinda  por  entrepreza.  Fez  a  marcha  pela 
praie^  servindo-lhe  o  rio  de  trmcheira.  0  capitao 
AntoDio  da  Hocha  Daibas^  apezar  de  nao  ter  senao 
trinta  aoldados ,  com  que  esCava  de  guarnioaio  n'uma 
trmcheira^  saio  a  receber  o  inii^fiigo ;  foi  logo  imi«- 
tado  pelo  capitao  Braz  Soares ;  nao  tardou  tambem 
a  vir  em  sooeorpo  d'estea  o  capitao  Soares  d' Albu« 
querqiie  0001  a  gente  da  Moribeca ;  os  quaes  todos 
«iirao  a  praia^  inveatfrao  o  inimtgo  com  cargaa  tao 
repetidas  e  tao  firme  deuodo,  que  o  doscomposerao 
e  conhmdirao  de  sorte,  q«e  nem  a  muhidao  dos 
Flamengos,  nem  a  dtligem^  doa  eabos,  nem  o  res* 
peito  de  Siagiamnodo  podArao  eaeuaar  a  deaordem, 
com  que  vir4rao  ae  ooataa ^  correndo  a  buacar  o 
ampajx>  da:  artilhaiia-'de  auas '  forlakzaa.  -^  Rece- 
beo  entretairto  Siagnmqndo  um  gcosso  aoceorro  do 
L  29 


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eiCjjWMk^nggitiileBlQttiWipBr  o»WiW|w»;  nMis#t 
balde,  pon|ti0  iriM^ao  potto  dii  fdifi,  arecefc^iM 
ceift  a  pmn^ra^^i^ft^  e  tego  4  eef«da  o  ipreidvM 
e  raQftpdrio^  AMdo^abconlMKstr  «»  geanral  S«g|i»^ 

■oveM  i  deiigMkkde  dos  got(iM.  Ditpiinkft-M  o 
iMOii^o  faam  reMwr  tCMeivo  tlMpi^,  qaaod^eh^- 
gQ«i  JoMFemodMVMifd,  vind^Mle  AnMw)>  cTond^ 
adra  i  prkntigM  lom  db  r«ba«e.  Gmmb  sot  Tizi^ 
nh^nct  tamftc^aalterimiOBmlidilMulcwSyqueas- 
cpHcJApa  jk  fiiiripliM  e  da  vwiyaha  fagfefco  pwa  » 
Arrccife,  ^eiiftra  db  ^pial  OS  nan^le8«n^ 

IV.  Nao  se  deo  Sisgismundo  por  vencida;  anteft 
pmadt)a  oilii  dnft  car4n«ti.  a  saw  cabos  qae  com 
4i>)rado  poikr  c<MWiette»aii  a  intterfurfaa  da  Tilla ; 
d  que  fisaiM  aaiAdo  d»  Arractfe  en^  f  2  da  Agottba^ 
■Mmcoafiadaa^  ptin^fM  cMi  9»ca  anwera.  -^  Os 
ci^itlaet  doi  pMsidia^  acitta  noneadasii.  que  imo 
aabHo  pavdar  oooaaiao  de  kMura,  a  a  finiae  da  a 
b«sonr  desiroB  t  prMnptoa,.  c«ne  aasMadoa  no 
(dkoque  pasiwto^  aaiirao  ao  cftoaKtm  de  iMOHgo 
eom  tattte  mbr  e  fuma  €|fua  16a  npnedcaa  o  ar«^ 
IjuUm^^^  <y>Haraoia  paiao,  <k  sarta  qua  em  sua 
aapeaa  IbadoqaoateMiMaiatelriMoa^  poccppe  hoava 
leaapa.  ima/ifribe-o  aiocpfvoy  qitf 

kiMs  saio  am  nataa  hrtm,  gooyasadaainhaenadast 
eaaa  qwoEhuaaagndntrjwuMWiaaiB^ptfdiy^.a  fiatsBt 
caaiinhfit  d'iMna  para  anlia  ^vklaaia^  ohfietndD  o 
Hottaadiez,  a  ifM viaasaa  aa(  ooflia%  «  om  chipiaiao 
aaanpo  aaukoi  i  «i»  diala,  aaaaapttidabiaaMak 

V.  Va9db.^«i«iMmdo.qiaii|^  caftt 


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tra  a  vHift ,  imi^oii  de  projeeto,  e  tnancbu  aracar 
a  noM!  tmmtma,  ^e  chtfndT&a  de  Joao  de  Agtriar, 
mas  nio  livmo  Melhor  fortuna  que  na  precedmte 
tentaiita.  Ao  romped  do  dia  acenMo  a  passar  por 
aqndlB  paHe  os  noiUm  deseobridores  do  canrpo ; 
aemitao  aa  emtKMcadas  do  inknigo,  todirao  anria ; 
eavH>«9e  na  eBtatitia  o  rebate;  a  effle  f^rfrao  com 
incrivel  presteza  os  capitaes  Antonio  Boi^^tJdioa, 
e  Francisco  d'Abreu  Lisbon  com  as  9tfas  compa- 
iifaias ;  poucos  em  numero  j  mas  tantos  mats  no 
animo,  que  de  cara  a  cara  envesftirao  o  1!olland«^z, 
e  the  deliverlio  a  marcha  md  qiie  se  incorporoti 
com  eHes  o  Camarao  com^  a  g^ente  de  stta  estancja, 
ekasMKla  Ciqut4. —  Ja  neste  tempo  se  appKcaTa  o 
Flamengo  nwria  ao^  reparo  qne  k  offcnua ,  por6m 
sustentaTa  o  peso  ^  batatha  com  valor  e  ftirma. 
€hegarao  outroa  capitaes,  qae  comecfatro  a  ptcar  o 
eaqnadrao  ittHnigo  de  tado,  e  Ihe  mandarao  tocar 
arma  pela  retagnatida ,  com  que  desatinado  o  Hol^ 
landez,  perdco  animo,  e  comeemr  a  retirar-se  em 
e<rdem;  forao  os  noswos  segnindo-o,  fizerao  alio 
onde  podiao  chcgar  a6  bales.  Chegon  entrelanfo 
Joao  Fernandes  Vieira  com  os  ma  is  goreniadores , 
e  nao  po<Aeiido  soflrer  qiie  os  Holhindf  res ,  prote- 
gfdos  peki  sna  artiUiana,  mjuriassem  os  rms^os 
como  com  efifeito  faziao,  disse,  que  a  artilharia  do 
itiimigi^  em  eapanta^elhacos,  e  valhat^omo  de  ti- 
nddos;  qnesecasttgaBae  a  fantasdca  conlianca  d^a^ 
qfiettetl  Ftameogos  aCreridos.  Mandon  que  se  avan- 
caase  de  corrida,  ana  forma  prolongada,  porque  as 
ialas  d&  nao  podessem  tmiscar  eem  pontam  certa; 
dMo«siiQM06«}»*tmeiraearga9  ecom  a^spada 


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k9i  GASTftlOTO  MBWWH 

qa  mao  iuveslirao  o  mimigo,  o  qnal  priBMiro  £»- 
rido  do  espanto  fpi^  do  ferro,  com  iumullo  e  des* 
ordem  se  lao^ou  a  cava  dt  sua  fortal^Eia,  sem  (|ue 
o  coofuso  tropel  da  Tuga  reparaaae  nos  muitos  que 
na  agya  da  cava  bebiao  a  morte.  Vifw  o$  Aoasos 
que  nada  mais  podiao  obiisr^  toliirao  espalhados  e 
de  corrida,  sen  dano  algum,  deiiaodo  os  HoUan- 
dezes  no  aasombro.  v 

Yl.  Coaveocido  Sisgismundo  que  nada  podia  con* 
seguir  pela  forca,  determinou  mudar  de  meios  em- 
pegrando  a  arie.  Em  15  de  Agosto  aaio  pela  meia 
noiie  do  Arrecife  com  toda  a  gente  que  tiulia,  pas- 
sou  o  vao  dos  AfTogados,  e  fez  alto  no  pa^o  que 
chamao  de  Francisco  Bairreiros ,  a  meia  legoa  da 
nossa  estancia  da  Barreta,  em  que  aaaistia  por  fron* 
teiro  o  capitao  Francisco  Lopes.  Foriificou-se  o 
inimigo^  cobrio*se»  plantou  artilharia,  com  deter-* 
minacao  de  sustentar  o  posto.  Logo  qOe  nossas  sen* 
tinellas  o  avisUrao^  derao  rebate,  e  se  recolbdrao  a 
casa  forte  da  estancia.  Amanheceo  o  dia ,  e  nao 
appareceo  o  inimi^ ,  que  se  tinha  escondido  em 
diversas  emboscadas  para  melhor  surprehder  os 
nossos.  Conheceo  o  noaso  capi4ao  o  esiratag^ma  : 
mandou  trinta  soldados  a  descobrircampo;  o  que 
fizerao  ouzada  e  ditosamente,  porqueconsc^uirao 
confaear  a  forca  e  intento  do  inimigo  seoo  pcrigo* 
Com  as  noticias  que  derao  maudou  o  qapitao  aviso 
ao  Arraialy  d6nde  Ibe  msvud^o  sem  daten^a  qua* 
troceutos  soldados  de  soccorro.  Cbego^  este  a  nossa 
estancia,  onde  en^anado  da  cautella  do  iftimigo 
se  voltou  para  o  Arraial ;  tendo  para  si  o  cabo 
(cujo  name  nao  soubemos)  qu^  aua  tencao  wo  pas* 


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CJUraOTO  LUSITABO.  &53 

sava  da  fortlficaoio  que  se  levantava.  Vendo  isto  o 
Hollatidez,  imandcm  dous  mil  sotdados  com  duas  pe* 
cas  de  caDi{ianhay  quefosscfm  a^altar  a  casa  forte  de 
nossa  estancia,  certo  na  victoria  que  Ibe  assegurava 
6  poder;  portot* adiarao  os  Flamengos  tao  dura 
ifesistencia ,  em  tao  desigual  partido ,  que  se  apar- 
Uvno  do  combate  com  manifesto  damno. — Reti- 
rtrao-^Se  pela  praia  at^  junto  ao  mar,  onde  forma- 
dos  estiverao  toda  a  noite  com  demonstracao  de 
^gunda enrestida,  para encobrirem com  similhante 
apparencia  nova  e  diversa  faccao.  Tinhao  mandado 
uma  companhia  ao  engenho  de  Sao  Bertholomeo  a 
saquear,  e  tdmar  fifigua ;  tudo  oons^uirao,  e  trouxe* 
rao  presos  o  senhor  do  engenho,  Femao  do  Valle, 
e  Francisco  Bezerra,  que  se  hospedava  em  sua  casa, 
e  que  depots  no  Arrecife  primeiro  o  buscou  a  morte 
que  a  liberdade.  Vendo  os  nossos  governadores 
quanto  estava  exposta  a  estancia  da  Barreta,  derao 
ordem  para  que  se  abandonasse,  e  que  a  genie  se 
h*tira«sc  para  os  Guararapes,  onde  levantassem 
uma  forlificacao,  qi:e  servisse  de  ^eguro  aos  nossos 
e  de  freio  aos  inimigos.  ConHado  o  Hoflandez  pelo 
^uccesso  que  alcancdra,  ?aio  do  Arrecife  eiti  t1  de 
Setcmbro,  e  pela  praia  do  mar  tomou  o  caminho 
da  Jangada,  qualro  legoas  da  Ifarteta.  Ao  romper 
da  man  ha  deo  sobre  a  povoacao,  que  estava  des- 
aperccbida  por  descuido  ou  ma  vontade  de  sen  ca- 
pitao  Francisco  Lopes;  saqueou  o  que  quiz,  des- 
truio  o  que  aelioii,  e  so  Ihe  fugfrao  das  maos 
alguns  soldados  de  cavallo,  que  ^esmontados  se 
galvdrao  n'Um  batel^  ainda  que  perseguidos  das 
bala^  aleao  u)iim6  aldanco. 


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yiL  DecHse  e^tretaiilo  rebate  00  AnriMl^  amcticH^ 
capiiap  FraocisQO  Lopes,  laa^ja  tajrile^|pfrii«Kiirache^ 
gpQ  .0  Caipaiao,  0  c^ual  deounMi  ou^  no  ioittiga 
Uiuto  a  tem^  q[ue  cairao  ^norto&  quatora^  MoUanr 
df z?s.  Foi  aii^entapdo  o  e9tr«go^  ^  com  o  oUraga 
a  p^xda  do  inimigo,  0  qual  coftcdbeo^tal  reoeio^  qw 
busCf  ndo  a  aalvacao  m  fuga,  b>i  larg9iido  a$  annas, 
e  o  royW  per  aligeirar  o  paa^o*  r-  Quqif  inab  qiM 
iQdos  se  iulgou  pel  dido  foi  0  seu  ||paeral  Siagisr 
muodo.  Gomo  soldado  media  o  tempo  pela  di&Uj»cia 
do  Arraial^  %  tMiia  que  o  alc;au9asse  o  soccorrog 
certo  que  do^t  seus  ^ao  ficaria  p^asoa  com  vida, 
Pronietieo  grandes  pramios  a  queiu  possesse  em 
salvo^ua  pessoa,  porqjde  Ihe  ftlUva  a  agilidade  com 
^ue  09  seus  sem  prdem  alguma  corriw  a  m^U^iHS^ 
^  Ikrretat  ^ii  que  deniro  de  sua  forliiicacfio  se 
yio  Cc>ra  de  risco ,  mas  pSo  do  medo.  Aaiim  que 
ealrou  aa  for^alaza^  sol>io  ao  filto  della,  e  olbaodo 
para  0  Uigar  do.  conflicio,  vio  que  o  mestre  de 
campo  Aadr<i  Yidal  Ube  viuha  do  eucalce  com  uai4 
gposs^.  parlida  de  soldados^  ^  disse  para  os  seus  ; 
«  De  boa  escapamos.  » 

\UI,  Vendo  Sisgismundo  que  por  terra  nao  era 
feUz^.  ^ui%  tentar  fortuna  por.  mar.  Ordeno^i  aoseo 
sargcDto  jBiiaior^  que  se  cbamava  Andrezon ,  que 
cojna  uum  esquadra  de  p^osde.guerra.,  e  muita  e 
bo9  infa^laria^  fosse  sobre  a  povoa^ao  do  Rio  de 
Sao  Frapcisco ,  e  nella  e  todo  seu  destricto  assolesie 
t^do  0  que  vi$se  com  vida  e  com  prestiipo,  reco-» 
ll^exidp  tgdos  os  mantimeqtqs  do  roubo,  e  cha-* 
mipdo  a  si  todos  os  gados  da  campaoha^  Saio  An- 
drezon  do  Arrecife;  tomou  a  Barraemos  primeirq^ 


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^reiirirag  iodq«(^  ittoq»4or«6,ogf^4ii4o^ue:pfNUr 

e^Jciita^  dp.ier«[K>  da  Shi^j  v^Md^op^Xt  ph- 
yeriM^  g4r4Jl  dp  £&ia(d9  Aai^iftua  TeUoa  da  ^IvA. 
^  |i9doa  f ^Ui^  e  j^a^ll^€4i ;  e  feip  aua  ^tSfmm 

4.'<9}idb.^4u^  4^si^  cgm  aiai#  iniiitf|>livo  n^  fm- 

4tta4dau  oonduair  para  a  (wi#v^  da  Babia^ 

tou  Sifigjrawttdo  tfm&  vftna  vea  ^  s^rxe  4a&  «raiM. 
DiliunA  Boiie  eacuna  d€  QuiulM^o  aajc^  omu  .iodo  e^u 
^o4^i  e  jQoip  dQH8RH>  de  ^;j4^i4>ar .«  fo^rlfkUcfM:  Uifi 
^pMk)  ^nUe  a.viUa  dc  ]ff|iara^u d  a  ilba  dJs  Ita«Nif- 
:raca  (aiiio  U]a|>ui  Ual^  ^ara/ai>i:|ir  e  aasc^j^ar  o  ea(- 
a^^lv^.por  s>«d^  dcysfj^va^ajr  a.pgawu^ffir^^Mir 
fant^a).  f  <^  ,aentida.,ds|a  posaaa  yigijE^T^M^Btiip 
i^jde  temg^  queo  ach^/orti^ado  iq  i^cd^^rtp, 

.fi  oiatrM  ^^mdiiio  ao  rebate  i  com  a  g^nfa  de  $iwi 
olK3d^^(i9«  Na  des^guaM^dc  do  jpartjhdaae  vio  a  dp 
^EaJ^mva  q}jie  os.ncmQa  jay^aliraii^  4  pfpittotd^aeq^ 
.4(^10,  OfGom  oa  Uxiaiigoa  &e  defead^iio  wHrin^iMtf- 
.radoa^  e,  fovormdo^  d*al^uiitf^  artUbarM  i^iie  ^ 
4l^fho  assestada.^  A  inH(iIi4ftdi^4a:p?^i^  s^9|»mr 
4flo  D cbodiut^  cai]^ ig^jialpei^d^,  4iMj^fi4Kvei  f9a»/o 
tt(iq[iigQ,  peb  iolere^ae  dp  £tci|r  com  q  pq§to^i^U|- 
tqsa.p^u^  <^  Bo^QSy.  9brj|;ad9^  ^.fy^r-^j^flfOr 


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X.  Cmtk  o  sueoesso  reftrido  se  appUcou  S^it- 
nMmdo  ao  ajNresto  <ie  sua  armada ;  d%o  estavao 
ealretanlo  iiuHivos  m  ntmoB  gavemador^.  No 
V  de  NoveMbro  marchou  o  mestre  de  campo  An- 
dre Vidai  de  Negreiros  para  a  campanlia  da  ParaiKa  • 
A  razao  de  nossas  annas  bmcarem  iiesta  parte  sen 
Mipr^  «ra  pela  graiide  copia  de  gados  que  o 
inimigo  apaaoentava  naqnelle  destricto ,  deaempit** 
rado  do8  moraderes;  e  pela  noticia  de  que  a  aom* 
bra  de  auat  fortaletts  ae  alojayap  mais  de  trezentos 
indios,  seua  auiciliares.  Chegou  o  mestre  de  eampo 
com  delibera^ao  de  assaUar  os  Indtos ,  antes  que  a 
noUoia  de  sua  Tinda  os  acauleliasse ;  portm  vio-se 
eneontrado  do  parecer  dos  sens ;  e  posto  que  ao 
depois  ecncordassem  na  determinacao^  ji  nao  pdde 
p6i>4e  &Kk  obra,  porque  os  Indios  se  recolh^rao  is 
|ira^s  do  inimigo  com  todos  os  gados  que  pod^o 
tefar.  Mandou  Andr^  Vidal  fazer  o  damno  posstvel 
6«i  loda  a  capitania ;  e  mais  queixoso  dos  seus  que 
dos  oontiaipios ,  se  rettrou  para  o  Arraial  com  aW 
guftacaplivos  j  unico  fructo  d^e^la  jomada.  —  De^ 
«ejando  o  mesire  de  campo  restam^r  o  credUo  que 
oria  algum  tanto  perdtdo,  assentou  comsigo  com^ 
ttoUer  a  forca  que  o  HoHandez  tinha  ua  Barreta. 
-dommunie^u  o  pensamento  a  Joao  Vemand^ 
Vittra,  o  qual  ao  princtpio  o  teve  por  arduo;  mas 
•depots  eonveto  neJle,  e  zti  deo  a  piano  para  b 
^ataque.  Bm  2  de  Janeiro  de  1647  safe  AndrS 
Tidal  de  Bfegreiros  do  nosso  Arraial  oom  mil  in*- 
HiMytes,  doas  pe^s  d^artilhnria,  cestoes,  pas^  e  mars 
perireehos  necessarios  para  asr  cavalg^tr ;  o  tjue  fez 
nas  ruinas  da  casa  forte,  que  os  nossos  arra)iiio 


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.^pia«do  se  fitrtirJK)  idft^uflla  cslaneia  p«ra  osGua- 
r^jnpet.  A'fgiuain  4m  da  MaslM  se  coimqou  a 
baAai!ia  da.aosta  parte ,  a  ifue  a  arlilhaffia:do  mi^ 
niga^  aio  resprndoo  $nm  m  dez  boras  da  manha^ 
for  .etiar  iteaaaontach;  povdmi  a^ndo  de  maiar 
calibre  e  maps  baaii  aenrida  (fae  a  m>9aa,  mo  thoibao 
«  MNWoa  lugar  segwo  senao  nas  catas.  0  Gamarao 
Mm  sua  QBoAe  IrdbalhaTa  por  lerar  a  cava  a  daa- 
anbaear  aa  porta  da  farlaleaa)  maa  niio  o  pdde 
caaaegmr  por  eactrntrar  tinsta  agua  qae  cobria  os 
joflhos  dot  8oldado8«-*«  Assm  oomo  a  general  hoi- 
laadaa  tete rebate  da  perigo  eai  qae  e&tavao  oa^eua, 
4a^>a<tto  aoo^Drro  aws'  apreaaado  que  opportuao, 
laMgiaando  iq«e  ae  poderia  kUroduzir  aa  foHalesta 
pda ilhala  do Gbeira Dinheiro,  a  aode aefaftm  a  opi- 
posicao  que  AadreVidal  Ibe  litiha  prevraido ,  e 
com  o  aviso  engrottado ,  de  «orte  que  o  Flamnago 
njk)  so  teve  coatra  si  a  resistencia ,  staao  taiab^ 
aeavesUda,  quae  fez  retirar  e  fugir,  a  buscar 
^alno  caniiviho*  fatentoa  rnetter  o  soocorro  por 
auav  mandaadiftdobrado  podpreni  laachas;  pordm 
Mo  Hie  nicoedeo  eomo  imaginiva ,  porqae  a  aoasa 
Artiiiiaria  os  fez  aportar  da  fortaleza*  Poi^n  no 
baiaamar  desembareirao  a  genie  nos  arrecifes; 
apoar  de  qae  os  nossos  oa  aiacarao  com  repetidas 
earj^tSy  e  fiaerao  n'elles  bastante  eslraga,  ceaaoi- 
-gaiiw  com  lado  aco)faen*se  aos  imiros  da  fWtakai^, 
e-de  14  forao  sabidoa  por  cordas  com  a  brevidade 
que  &es  fa^ii«w  o  wiSdo  e  o  perigo.  —  Pentad  o 
Flaiiievigo  em  tnandi(r  novo<«occorro>n&  scad  eai 
'doaa^piaaxog.  fkirjK^esii^^aeoaBadasrdeaossa  artf- 
Hkariay  4%ixHm  gModea  ai^arias  vnaris  fi>Hio|refitfK 


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fRdUv  »ieiiii«itedamtoqrro^«iaMHidhraii4l»^i]»i^ 
•oiilro  dia  eUe  scwa  ImjAhii  twwwia  yir  tatq^ , « 
dolibapoii^ein.ratirar  a  iqBipoiff»^'agit>»aiMto  Aie 

ganha  naa  pedradas  faem  sutcedMn^,  A'  fjtiMnim 
notta  Iretiroii  lodo  •tMnai'd'wtilkaiia^  w^iniw 
<»  ptilTOGbod;  emm  ttMrikai^odttBb  pefotao  niaai- 
.lial  <ie  oeroo,  deixoai  o gttb^.M^j^aiaJu aiMjFohaale 
jwi  genie  com  tal  aocoffli  »awie«y  yw-o  aio  Bb#^ 
goQ  a  auapeitar  o  jkuniigo;  jjiMtiwiiofe  o^ittUntt) 
H^tire  BMtlas  6  niite  q«rtK>  feruba  c  peifi^^ 
em^M«»|iar«cao  ik  qde  facabeo onrfiniig^. 

XL  Kd  H«,da  Fwet>eiro  aaio  o  i^neral  hottio- 
ijegprifthagrt  do  Arracifia  oom  itMbaua  vrmada^  le 
Molia  toda  a  fldr  «le  a«a  mfaitarMUf  mwiUbmmDM^y 
mmmicoa  e  petrecfaoa^  wo  a^fbra  Aaaalarga^iM^ 
goaaaenao  tmibefm  pan  UttaidttatfMia'^MipaHte. 
Alaadou  vn^r  paca  o  Aio  db£ao>Ei«MNeovii  osdb 
tamou  p6rt0  a  vi^laa,  aem  aaiif.a  ti^m.  AiofatM  dhe 
¥er^  d'alto  foramdaae  )Hri^pap«daa  ibdaa  aaoids 
lie  gn^rra  4'«qiiaUa  eaqpindirav  <x>aft  cpa^xM  AOTeofe 
airfaa  o  Aiidn»on>  eooi  d  nadttMr  de  a«i  mSmtmimj 
^uaaawJdaa  4a  Awfo  o  aaoriMno.  Sim«6«Qatfl». 
^Mli:  a  Htoihar  parlfao  de  |ua  Mteada^  «  #  Hl^oa 
pptMaa  AhqueUa.  porta  o  ilMwr  taprtdftldballu  i«i- 
lenlar,  pai^ua  aa  saira  do  Ahnrnfe  aoaa  V^yoAb* 
JMkiay  por  4Jlia  Aa  bavaa^  auapaMar  m  tm^tm^^  a 
--wrifd.  BodiA  dMHir  mmjIo  a  ^'^^'^'iimimi  id^  nfllifiiH. 


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Saio  daq,u^lle  rio^  ipoaiula^  ifp^  se  eip^roa^e  % 
alUira  da  Bahia ;  viagem  que  havemos  de  s^ffow^ 
por  Qao  cortara^os  duas  yez^  a  |io  da  hntovi^,  e 
no  fim  da  joriuid^  ^  dara  coi^daqiy  /mop^def 
eai  Pernainbuco  o  tepofio  que  dmrou  aquel^a  «xu^ 
presa.  —  0  Gm  que  Sisgyisinuudo  levara  w&^Si  ex- 
pedii^o  era  lomar  a  prasa,  ou  pelo  ip^os.  divcrtir. 
OS  soccorros  que  da  Bahia  podiao  vir  aPen^^tmbueo« 
Avistoii  a  Bahia,  entjgaudo^ua  fM^madapda^^soseadq 
d'ella  ipta  forq^da^el  uio^tra  ide  ^u  pqderi  ttal « 
gpe  ench^  OS  olhos  d'espantq  e  os  ouvidos  depa,*- 
vor^  com  as  armas  pin(adas  pas  l)andeu'2a,.e.€aia 
0  estrondo  das  salvas ;  mas  t^mbqm  epm  alyorpSA 
dps  soldadosy  que  confiados  na  £ortifica^o^.j;vt>pre^ 
sidlo  da  cidade,  q  na  eeperanfa  da  victoria  d^rf^ 
zavao  o  poder,  Ou  por  aviso ^jou,. por  i^fj^epci^ 
conheceo  o  Hollandez  a  disposlqao  dos  nosso^  ^  a 
nao  se  atrevendo  a  atacar  a  cidacje,  ,^omou  terra  a 
tres  legoas  de  distaneia^  nUim  sitio  ehsiof^do  Tapa* 
rica,  convidado  d'um  posto^a  onde  levaAtQU  uma 
forca,  capaz  de  alojamen(,o  para  os  ^dados^.^  d^ 
muita  e  boa  artilharia  para  a  d^ei^a.  Em  circula 
do  forte  fabricou  quatro  reductos  «m  tal  forma  qu^ 
occupavao  as  eminenciasj|  d'onde  a  £ortaleza,po4iii 
receber  damno ;  e  dos  vasos  de  aiaa  .axTpada  iea^ 
urn  cordao  pela  parte  do  mar^  que  Ibe  se^ia  d^ 
muro.  Nao  deixou  o  Inimigo  em  todo  o  cjoutof  nqcBij 
genho^  nem  fazenda  qi^e  nao  roubasse  a  deji^twiwej^ 
nempor  toda  a  costa  embaJCcai^Q.queD^o  §^^n 
^uisse>  ou  tomasse,  com  o. que,  ao.pass^ quen^ 
cidade  crescia  o  numoro  dos  r€;tira4o3y  .p;esci|L 
t^mbema  fal^  dos.  mantimentos;  e  coqbecimeat^ 


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Ai  desattencio ,  que  deo  causa  a  tao  pemiciosos 
dacitoSa 

Xiff.  O  goremador  g^ral  do  EsCado  Antonio 
TcMm  da  SSta,  em  cujo  animo  leria  algoma  vez 
parte  a  temeridade ,  porim  nnnca  o  medo ,  insti- 
gado  agora  da  repatacao  e  da  magoa,  se  determinou 
em  desalojar  a  todo  o  ridco  o  Flamengo,  insoflfrifel 
pela  Tizmhanca ,  pela  deienca  e  pelas  insolencias. 
Para  jnstifioar  sen  inlenfo  mandou  chamar  os  mes- 
trcs  de  campo  Francisco  Kebello,  Joao  de  Araojo, 
Theodozio  Estrater^  ^  ao  sargento  maior  Assensoda 
Silra^  aos  quaes  dectatou  a  resoluoao  em  que  estava, 
poderando-lhes  com  energiaf  e  nobres  sentimentos 
as  razoes  que  o  determinaAao  a  assim  obrar.  O 
mesire  de  campo  Francisco  Rebello ,  faltando  como 
eonselheiro  prudenfe  e  como  soldado  experimen- 
tado,  foi  deparecer  di verso  do  governador,  e  allegou 
fortes  razoes  para  confirmnr  o  seu  dito.  Ouvio  o 
governador  o  discurso  do  Rebellinho,  e  conside- 
rando  que  os  mats  cabos  haviao  de  seguir  seu  pa* 
recer#  atalhou  a  conferencia,  eonfirmando-se  em 
aeu  primeiro  inlenlOy  do  qual  se  seguirao  iri^epa- 
raireis  damnos.  Poz  o  governador  os  olhos  no  Re- 
bellittho,  a  quern  encamhihava  a  piaiica,  e  disse 
qnese  haquelle  congresso  bavia  qurm  buscara 
desvios  para  fiigir  ao  cboque ,  que  ^  flcasse  em 
casa ,  t  nao  qntzesse  desviar  a  enipreza ;  que  as 
mats  dlllicuHosas  erao  as  que  apeleclao  os  corj»coc5 
grandeSi  iquestf  em  fencer  os  inconvefiipnlescon- 
aistia  0  veneer ;  e  porque  conhecia  bem  os  hninjos 
dos  que  tmha  presenlcs,  Ihes  hao  queiia  dilatir  a 
6ecasi&o  da  viclorra ;  que  ao  outro  dia  se  bavia  de 


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dar  o  assaUo ;  e  que  se  a  fortakxa  se  ynh^ie  ^ 
seria  de  iodoa  a  gloria,  e  qoando-se  nao  coqm^ 
guisse,  s6  a  cUe  se  havia  de  p6r  a  culpa.  ProineUeo 
a  que^  Ih^  a^preseotasse  a  cabeca  de  3iqgi$iaiimlo 
premio  da  £g&enda  real^  egratifica^aoda  sua.  £n« 
tendeudo  o  nieslre  de  campo  Francisco  Rebello  de 
que  sobre  seu  parecer  caia  a  ceusura ,  respondeo 
que  uujna  tem^ra  Hollandezes quern cooio  eUe  con- 
lava  as  victorias  pelas  occasioes;  porim  que  apon- 
tava  OS  inconvenientes  da  impreza^  e  as  cpnse- 
quencias  d'uma  e  d'outra  fortuna ;  para  que  sua 
senhoria  escoliiesse ,  se  couvinha  mais  ao  Estado 
veocer  sem  perda^  ou  perder  sem  fructo.  Ma$ 
supposio  que  seu  zeb  e  sua  experiencia  se  avaiia^ 
vao  por  fraqueza,  saberia  mostrar  que  nao  poupava 
a  Tida  quem  nao  temia  a  morte^  e  que  o  successo 
diria  o  como  sabia  morrer  por  saber  aconselliar. 

XllL  InQ^mniado  no&  eslimulos  da  honra^  e 
cerlo  nos  perlgos  da  vida^  saio  o  Rebellinbo  da 
junta  y  e  sem  demora  pariio  para  a  fronteira  com 
OS  mais  cabos^  qua  se  achavao  na  confereucia^  r^ 
solulos  todos  em  servirem  &  temeridade  por  nao 
faitarem  a  obediencia.  Escolii^ao  mil  e  duzentot 
soldados,  e  com  elles  ao  romper  da  manba  seguinte 
ayan9arao  a  fortaloza  inimiga,  que  os  recebeo  com 
nuvens  de  balas ,  por  entjre  as  quaes  romperao  a$ 
p^iasadas^,  e  subirao  as  triocheiras;  buscando  o$ 
golpes  do  ferro  dentro  dos  inoendios  do  fogo,  tao 
alvorocados  e  dest^ondps*  que, a  Fiamengo  oocu- 
pado  do  aasambro ,  desconheceo  ob  affectos  da  in-r 
veja,  Nao  erit  metftpr  o  .valor  com  que  o  ioimigo  9^ 
deifeudiai,  ajudaudo^e  da  forc« ,  da  iudu^tna .  e  da 


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lit  MSIUOID  VnrtMSKK 

ikMspcracMw  A  temcko  do  ftimo,  a  c^trondb  A>s 
thros,  <y  ^ca  das  golpes,  o  assohfer  das  balas,  o 
gffiMT  dos  fcridos,  o  Iradar  dos  cabos,  o  agdnizar 
do9  moribundoSy  enchmo  de  horror  ocombate,  coni , 
fgiial  lastima ,  porqne  com  igtra!  pcrda.  Os  nossos 
soldados  mats  cegos,  como  mars  empietihados ,  nao 
sabfto  adTerfir  sen&o  em  romo  se  ksrriao  de  adian- 
tar ;  porim  a  fortnna  j  on  invejosa  do  esfbrco ,  ou 
lastimada  do  esftago  encaminhoa  trni  pelouro  aos 
pritos  do  mestre  de  campo  RebelKnho,  que  ffie 
tirou  a  rida ,  e  deo  fim  a  batalha ,  porqne  a  um 
mesmo  tempo  cato  sen  corpo  desanhnado,  e  ficou 
o  da  nossa  gente  vencido.  Os  mesmoe  que  no  com- 
bate  o  naoperdwk)  de  vista,  bebendo  em  sen  exem- 
plo  esptritos  para  a  hnitacao ,  rendo-o  defancto  , 
enlrc  outra  multidao  de  corpos  mortos,  recebArao 
conselho  para  a  retirada,  que  pos^o  em  execucao 
com  tamanha  d6r  como  risco  j  era  este  d^innmne- 
raveis  balas  que  os  segtrrao  ;  era  aquella  por  ser 
terror  dos  mimtgos  o  cabo  que  deixavao  morto. — 
Perdemos  neste  assalto  quinhento6  para  seiscentos 
homens  :  damno  que  servio  de  medida  ao  desatino. 
Nao  bastott  que  sua  fama  os  coroasse  de  humana  glo- 
ria,  para  que  sua  faka  dvixasse  de  cafosar  a  todos  in- 
tensa  pena.  Oseompaiilietros  os  ^horarao  saudosos, 
OS  do  povo  timido0,  o  govemador  conftiso,  e  todos 
arrependidoS)  ainda  que  nao  todos  eufpordos.  Para 
fttter  a  perda  tameiifavel  sobcffaTS  a  th  mestra  dc 
campo  Francisco  Reb^o ,  cojo  none  vmn  a  dimt- 
rmiito  de  Rebellhiho,  foi  cm  todo  tempo  merece* 
dor  ^  ma  Anna  eiitem^^lbor  forfmlr.  Bra  spra  valor 
fgtial  II 9QII  indwtriii ,  e  stta  drseiptffiai  iBtior  qtre 


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\m>  m^«^iiMofi'wumj  e.eM  sua mfiOali^a ;  d^ 

%4Wics  fHNT^Vie  9e  i»it«uo«  a^MirUa  id^  e^m  dw 
iWMh  S4A  ftei^iiil^  A  inwto  de  Ajfitaok^jGigo^ah^ 

sensivel  Q;4ami^t  e  agwa  a  2Q#gM.  ^  se  eseoynder 
T^if^  ^em.  H09^^  detoUo  <l;i  terra,  que  cobria  svus 
cq^pf^,  S^o  fofida  o  sapgenU)  iBa^>p  Assenso  da 
Silva^t  9cn  qutJCQ»  nwikia  oiikiaes  e  soldidoB^  m^^ 
Q)dl>aDte$  na  gloria,  dis^meibaDie&  oa  sorte, 

XIV.  Ch€g^a  a^i&a  a  Portugal  do  aperto  eiq 
que  ae  ai^ava  4  Babia,  ap  oi^aio  temfx)  qu/e  de. 
U^Uaada  Si^  ^^cjrevia  pj^r parar-^e  nova  &o4a  parase 
ittandaK  ao^Bcazil.  Froo^pto  eiaapplkar  re0>edioa 
taq  gpaadf  mal  n^iftw^  o  3euhor  Bom  Joao  IV  para 
g^A^al  de  wtr  aa  conde  de  Villa  PcMjyca  Ajatoma 
T^U^  da  SUva ;  cQasig<¥>u-4be  cabo&,  gente^  mun^ 
gime  vafOA,  de  que  sfi.Q(>Q>poa  utta  grossa  armada 
par^  ir  de$aU)jar  a  Siagismiiudo-.— Vooaa  xkova 
aa  Arr«ci£a;  auspeitarao  es  do  gayemo;  em  sua  ca-^ 
be^aa  gptpQ  «  a  i«ais.  i^rtog  uo  temor  que  i^a  espe* 
iim%9k  dcspacbMto  mn  eorreio  a  Babia^  ordfisaandQ 
a  SisgUimuido.  l^vaase  terra  e  ««ieg^si^  para  Per* 
uwibuiQO,.  porqua  a  divisap  do  podt^r  Aao  oceanic- 
uaMe  a.  pifH^di^  de  todoa.  Con£6rp^u-3e  o  aviso 
QQKt  Qt  desiji^  d^vgaueval  bolUodiea^i  e«  sem  dib^ao 
tlilbacew]ra,wtilbM*ia,  pc^  fogo  ;^  quarteis.,  r&- 
caU^ea  a^irvU^r  l^^^W^  P4)^i9i<^»  e.tomou  a  derrota 
4e  Pe;(aVttbapQt*i^<><^  c^begcoi  i\o  lau  doaoiao  de 
^^7^  t^fiPfifijdA  «fimQ  ji'elle  saira,uiana  Em.  $eti 


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retebiffieniD  Ptte  mais  parte  o  faiio  qae  o  alToreco, 
porque  8e  recebiao  os  Titos  que  ehfgavao  com  as 
lagrioias  com  que  os  ollioa  choravio  09  niortos  que 
nao  Tiao.  Eate  foi  (bretcmente  rehlado)  o  soccesfo 
da  Jornada  que  Sisgiamundo  fez  a  Bahia  (corao 
alheio  do  nosso  assumpto  ) ;  agora  diremoe  o  que 
pasaou  na  campanha  de  Pemambuco  o  tempo  que 
d*eUa  nos  apartou  a  vtagem,  estada  e  Tolta. 

XV.  Entrefanto  que  Sisgismundo  ia  com  a  sua 
armada  sobre  a  Bahia,  chegou  da  Paraiba  anso  de 
que  o  Hollandez  se  occupava  em  grangear  e  plantar 
canna,  cultiYando  aquelles  cannaveaes  que  impe- 
didos  da  chuva  nao  acabou  de  consummir  o  fogo , 
quando  os  moradores  se  retirarao;  e  que  a  gran- 
gearia  ia  em  augmento  muito  consideravel ,  e  que 
estarao  em  vesperas  de  lancar  a  mo^r  o  engenho 
de  CunhaA  (dezoito  legoas  da  Paraiba  ).  Conviiiha 
a  perseverenca  e  reputacao  de  hossas  armas  cortar 
de  urn  goipe  a  posse  ea  esperan^a  do  inimigo ;  para 
o  que  saio  de  nosso  Arraial  em  16  de  Maio  o  sar- 
gpiito  maior  Antonio  Dias  Cardozo  com  (rezentos 
trinta  e  sete  homens.  Assim  como  entrou  na- 
quella  capitania  despedio  ao  capilao  Cosme  do 
Rego  Barros  com  cento  e  sessenf  a  soldados,  e  ordem 
que  assaltasse  e  destruisse  o  engenho  de  Gunhau , 
e  (odo  seu  destricto.  O  inimigo,  que  ae  tinha  forti* 
ficado,  fez  porfiada  resisteneia  aos  nossos  que  pre- 
tendiao  tomar  o  engenho;  mas  isto  nao  impedio 
que  Ihe  largassem  fogo,  o  qual  abraz<yu  o  engenho 
com  todos  OS  materiaes  da  fabrica  e  do  lucro ;  tal-- 
l&rao  a  campanha ;  e  com  duzentos  bbis  e  maitos 
^cravos  se  voltdrao ,  para  ondc  os  eqpertTa  0  seu 


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GAamOVO  LUSFTAIIO.  665 

cabo  o  tempo  que  pelas  outras  partes  tinha  ja  tudo 
coDsammido  o  ferro  e  o  foga  com  similhante  es- 
trago.  Encorporados  derao  Tolta  para  o  Arraial , 
em  o  qual  entrirao  com  duzentos  prisioneiros  y  a 
maior  parte  escravos  foragidos,  e  algumas  mnlheres 
estragadaa,  que  vi  viao  entre  os  Hollandezes  e  Indios ; 
e  por  cima  de  trezentas  cabecas  de  gado  vaccum  : 
soccorro  para  todos  opportuno,  e  para  os  soldadog 
grato. 

XVI.  Era  o  Rio  de  Sao  Francisco  o  ci^rral  d'onde 
se  conduziao  as  carnes  para  sustentacao  do  nosso 
Arraial ;  e  por  isso  logo  que  elle  foi  senhoneado  pelo 
inimigo  comecou  a  sentir-se  falta,  assim  pelo  gado 
que  recolhia  para  si  e  para  o  Arrecife,  como  tam- 
bem  pelo  que  os  moradores  retiravao  para  a  parte 
da  Bahia.  0  governador  Joao  Femandes  Vieira, 
sobre  cujos  hombros  carregava  a  falta  e  a  queixa^ 
acudio  a  remedear  a  fome ,  com  mandar  vir  todos 
OS  gados,  que' tinha  pelas  matas  de^uas  fazendas, 
de  que  se  foi  dando  racao  aos  soldados.  A  seu 
eicempio  acudirao  todos  os  moradores  do  reconcavo 
com  OS  soccorros  que  podiao,  com  o  que  cessou  a 
queixa,  por^m  nao  a  feme,  pelo  que  preciso  foi  re- 
correr  a  outro  expediente.  Conferirao  os  govema- 
dores  Joao  Fernandes  Vieira,  e  Andre  Vidal  de  Ne- 
greiros  como  se  poderia  acudir  a  fome;  de  sorte que 
Ihes  nao  faltasse  a  brevidade  do  remedio ;  e  assen- 
tirao  que  se  buscasse  no  mar,  em  quanto  faltasse 
na  terra.  Passdrao  ordem  que  todos  os  pescadores 
se  obrigassem  a  pescar  naquelles  mares  que  se- 
nhorcavao  nossas  fortalezas,  com  o  seguro  de  os 
guardaremefavorecerem  nossas  armas.  Executou* 
I.  SO 


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AM  r.AarnDro  lositahoi 

se  a88im ;  daTa^fie  a  infantaria  ra^  de  peixe,  que 
satisfez,  em  quanto  o  mestre  de  campo  Aiidr6 
Yidal  de  Negreiros  nao  punha  em  execu^o  a  pro- 
messa  de  conduzir  gados,  a  todo  o  risoo ,  para  o 
sustento  do  exerdto. 

XVII.  Ayisoii-se  que  no  Geari  Morim^  lugar 
situado  muito  acima  do  Rio  Grande  para  o  norte, 
pastava  copiosa  multidao  de  gados.  Resolveo-se  o 
meslre  de  campo  Andr6  Vidal  de  Negreiros  em  of- 
ferecer  sua  pessoa  para  viagem  e  conduc^ao  tao 
difficultosa.  Aprestado  de  tudo  o  que  Ihe  pareoeo 
necessario  para  a  Jornada ,  partio  do  Arraial  em 
24  de  Agosto  com  oito  centos  infantes  e  noventa 
cavallos.  Vencidas  as  difficuldades  do  caminho  e 
do  tempo ,  entrou  na  capitania  do  Rio  Grande , 
tallando  e  destruindo  tudo  o  que  p6de  aleanqar  o 
ferro  e  o  fogo ,  em  quanto  nao  vollava  do  Ceara 
Morim  o  capitao  Joao  Barboza  Pinto  ^  que  por  seu 
mandado  fora  conduzir  os  gados  d'aquella  parte. 
Chegou  com  os  que  pode  ajuntar^  e  encorporadas 
as  partidas  e  o  poder  marchou  o  mestre  de  campo 
para  o  Arraial  com  setenta  cabecas  ^  muitas  mu- 
Iheres,  que  libertou  da  forca  e  da  injuria,  e  nao 
poucos  moradores  que  buscarao  o  abrigo  de  nossas 
armas,  para  fugirem  a  seu  salvo  da  tyrannia  hol^ 
landeza.  —  Nao  se  descuidou  o  Flamengo  de  apro- 
veitar  a  occasiao  que  Ihe  dava  o  tempo.  Teve  aviso 
da  Jornada  do  mestre  de  campo;  considerou  nossa 
resistencia  enfraquecida ,  e  por  conseguinte  seu 
partido  avantajado ;  provou  a  sorte  em  algumas 
assaltadas,  que  fez  a  ditferentes  estancias  noasas; 
e  de  todas  voltou  castigado.  Nao  deixava  com  tudo 


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GAntmro  LusiTAifa  M7 

de  DOS  custar  mortos  e  feridos  a  resistencia ;  e  por 
impedir  a  continoa^ao  do  damno,  ordenou  o  goveiw 
nador  Joao  Femandes  Vieira  que  todas  as  noitea 
se  tocasse  arma  pelas  fortalezas  do  inimigo ;  o  que 
86  executou  com  (al  ardor,  que  pelas  horas  coutavt 
OS  rebates ,  com  que  se  via  obrigado  a  passdUaa 
todas  com  as  armas  na  mao.  Em  quanto  durava 
0  dia  OS  trazia  nao  menos  inquietos,  mandando* 
Ihes  armar  cilladas,  em  que  ordinariamente  caiao, 
ou  perdendo  a  yida  ou  a  liberdade,  e  juntamente 
a  lembranca  e  o  atrevimento  de  virem  atacar  noa^ 
sas  estancias. 

XVIII.  Era  pratica  corrente  entre  amigos  e  ini« 
migos  que  no  porto  de  Liiboa  estava  uma  armada 
para  fazer  viagem  ao  Brazil  em  soccorro  de  Per- 
nambuco  :  nova  que  d'uma  e  d'outra  parte  fazia 
crer  o  desejo  do  remedio,  e  o  temor  do  castigo.  Os 
nossos  govemadores,  como  mais  empenhados,  erao 
OS  mais  credulos ;  ftmdavao  a  oerteia  na  justica  e 
na  razao  com  que  deviao  ser  soccorridos  de^  um 
principe,  a  quem  serviao  desinteressados  e  fieis ; 
obrigado  por  conveniencia  a  estimar  a  vida  dos  sul>« 
ditos,  que  por  seu  servico  as  arriscavao  constantes, 
atropellando  pelo  defraudo  de  familias  e  fazendas  y 
por  restituirem  a  seu  legitimo  senhor  o  dominio 
e  as  terras  usurpadas.  A  alegria  com  que  se  ouviao 
e  davao  as  novas  Ihes  tiravao  toda  a  duvida,  e  as^ 
sim  era  tamanho  o  alvoroco  em  toda  a  nossa  gente, 
que  discorriao,  e  dispunhao  ocerco^  o  assalto,  a 
victoria  e  o  iriumpho ;  conferiiido  as  convenien- 
cias  de  se  combater  primeiro  esta  ou  aquella  forca, 
esperando  na  reparticao  dos  despojos  nao  a  sorte^ 


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A68  GASTEioTO  LuarrAiia 

senao  a  esoolha.  Com  di verso  paisamento  enlravio 
08  nossos  governadores  em  negocio  lao  importante; 
parecia-lhes  que  em  breve  tempo  chegaria  a  froU 
esperada  a  combater  o  Arrecife  pela  parte  do  mar, 
e  que  necessariamente  se  havia  de  fazer  o  mesmo 
pela  de  terra,  e  desejavaa  que  as  prevencoes  se 
adianlassem  aoccasiao. 

XIX.  Vizinho  da  povoacao  de  Santo  Antonio , 
ou  cidade  Mauricea  (como  Ihe  deo  por  nome  a  vai* 
dade  e  a  lisonja )  ha  um  sitio,  a  que  os  naturaes 
chamaoaSeca;  a  este  tal  divide  da  campanha  um 
Tio,  nao  muito  largo,  nem  muito  fundo :  a  bala  d'um 
mosquete  o  passa  de  ribeira  a  ribeira ,  e  na  baixa* 
mar  se  passa  com  agoa  pelo  joelho.  No  dito  posCo 
tinha  o  inimigo  a  Fortaleza  que ,  tomando  o  nome 
do  sitio,  se  dizia  Seca.  Com  elia  defendia  de  nossa 
opposi^ao  nao  s6  a  cidade,  senao  tambem  o  Arrecife, 
por  ficarem  descobertas  uma  e  outra  povoacao  a 
qualquer  bataria ,  que  da  nossa  parte  se  Ihe  qui^ 
zesse  por  :  razoes  que  persuadirao  aos  nossos  mes- 
tres  de  campo  Joao  Fernandes  e  Andr^  Vidal  a  en- 
trarem  em  pensamento  de  levantarem  uma  forca, 
d'onde  varejassem  a  sobredita  fortaleza ,  e  pracas 
do  inimigo.  Resolutos  no  intento,  conferirao  entrc 
si  o  tempo,  o  modo  e  a  parte ;  e  preparados  os 
materiaes  e  inslrumentos  necessarios,  sairao  do 
Arraial  no  1^  d'Outubro,  deixando  nelleacompe- 
tente  guarni^ao  as  ordens  do  capitao  Albuquerque; 
marchirao  com  a  gente  a  estancia  de  Henrique 
Dias,  commuuicarAo-lhe  a  tencao;  approvou  o 
intento.  Escolhida  a  paragem ,  derao  principio  a 
obra ,  e  OS  governadores  ao  exemplo,  sendo  os  pri- 


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GASTRIOTO  LUSITAMO.  669 

meiros  que  pegirao  nas  enxadas;  a  cuja  imitacao 
o  fizerao  todos  os  oiBciaes  e  soldados  tao  sofregos 
do  trabalho,  que  de  nenhuma  sorte  quizerao  ad- 
mittir  a  companhia  dos  escravos,  que  os  morado- 
res  offereciao  para  ajndarem  no  que  fosse  necessa- 
rio.  0  silencio  com  que  se  obrava  era  tao  observado, 
que  nera  voz,  nem  goipe  ouvio  o  inimigo,  em  todo 
o  tempo  que  durou  o  trabalho ;  e  para  que  o  Fla- 
mengo  nao  podesse  ver  o  edificio^  que  sobresaia 
por  cima  do  arvoredo ,  o  cobriao  os  nossos  todas 
as  manhas  de  ramos  frescos  :  artiGcio  com  que  des- 
mentirao  os  olhos  mais  attentos ,  de  sorte  que  por 
nenhum  dos  sentldos  p6de  o  Hollandez  formar  a 
menor  suspeita  da  fabrica ,  sendo  tanta  sua  vizi- 
nhanca^  que  entre  os  nossos  se  percebiao  as  prdti- 
cas  de  suas  vigias.  Em  30  de  Outubro  estava  a  for- 
(aleza  posta  em  sua  ultima  perfeicao^  com  todos 
OS  reparos,  cava  espa^osa  e  funda,  que  enchia 
d'agoa  o  mesmo  rio  que  se  interpunha^  e  apartava 
a  nossa  da  contraria ;  estacadas,  trincheiras^  plata- 
formas,  em  que  jogavao  muitas  e  boas  pefas  d'ar- 
tilharia,  e  tudo  em  tal  fdrma  j  que  se  podia  defen- 
der a  toda  a  invasao  do  inimigo  por  qualquer  parte 
que  o  quizesse  enveslir.  —  Na  madrugada  de  6  de 
Novembro  mandirao  os  nossos  governadores  quei- 
mar  um  patacho,  que  o  Hollandez  tinha  no  rio 
como  atalaia  de  nossos  movimentos.  Pegou  o  fogo^ 
e  as  labaredas  do  incendio  servirao  de  luminarias  & 
marcial  alvorada,  com  que  a  nova  fortaleza  ao 
som  de  caixas,  trombetas  e  charamellas  deo  os 
bons  dias  ao  Flamengo  com  (res  cargas  cerradas 
d'artilharia  e  moaquelaria^  que  faziao  mais  horri- 


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670  GASTRIOTO  LCSlTAlia 

veil  at  vaias  que  o  confuso  grito  dos  soldados  daTa 
ao8  moradores  da  cidade  e  do  Arrecife ,  que  desa- 
tinados  do  estrondo  e  do  sobresallo  buscarao  abrigo 
contra  nosaas  balas.  Foi  tal  o  temor  que  este  iin<» 
previsto  successo  causou  nao  s(S  no  povo»  mas  noa 
mesmoa  governadores  e  principaes  cabos  hollan-* 
dezeS)  que  assentarao  por  ultima  resolu^ao  despa- 
char  uma  sumaca  ao  general  Sisgismundo,  piolan- 
do-lhe  o  estado  em  que  ficayao,  e  a  perdicao  que 
temiao ;  com  ordem  que  a  toda  a  pressa  naT&-> 
gasse  em  seu  soccorro,  antes  que  chegasse  a  ar* 
mada  portugueza^  que  por  boras  se  esperava,  e  que 
o  successo  referido  os  advertia  j  que  nao  tardariao 
mais  tempo  em  se  renderem  aos  combates  da  terra 
do  que  tardassem  os  Pcurtuguezes  em  os  cercar 
por  mar.  Gonfessavao  e  arguiao  o  desatinado  erro 
de  arriscarem  o  oerto ,  por  ganharem  o  condn- 
gente. 

XX.  Depots  que  a  nossa  fortaleza  foi  construida, 
nao  deixavao  os  nossos  de  inquietar  o  inimigo  com 
continuos  assaltos ,  que  se  tomavao  todos  os  dias 
mais  atrevidos.  Uma  noite  mandirao  os  nossos  go* 
vernadores  a  dous  cabos  que  com  cem  infantes 
escolhidos  fossem  assaltar  o  paco,  em  que  vivira  o 
conde  de  Nassau  Joao  Mauricio^  situado  na  en- 
trada  da  cidade  Mauricea,  edificio  Tistoso  e  de  cus- 
tola  fabrica.  Tinha  de  guarnicao  duas  companhias 
de  HoUandezes  dentro  de  boas  trincheiras ;  seguro 
em  que  descancava  sua  confian9a.  Com  destemido 
braco  as  rorap^rao  e  ganhirao  os  nossos,  e  com 
leve  resistencia  do  presidio,  que  aos  primeiros 
golpes  fogio  com  seus  capiiaes  a  metter*s6  dentro 


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GASIBJOIO  UJSIXAm.  471 

na  cidade.  Saquearao  os  nossos  o  pace  ^  e  com  os 
despojos  e  insignias  do8  oiBciaes,  que  nelle  deixa- 
rao  OS  do  presidio,  se  retir^ao  a  nova  fortaleza, 
sem  receberem  o  menor  damno  das  balas  com  que 
todas  as  fortalezas  coutrarias  os  buscavao.  Forao 
recebidos  de  todos  com  festivo  alvoro^,  que  fazia 
mais  applaudido  a  tumultuosa  coufusao  e  grita  em 
que  o  medo  tiaha  posto  aos  moradores  da  cidade  e 
do  Arrecife :  tao  certos  ^m  sua  ultima  ruina ,  que 
a  presumirao  como  se  a  experimeutarao. 

XXI.  Coutiauarao  da  nossa  parte  os  assaltos 
com  a  mesma  fortuoa,  e  a  bataria  da  noya  fortaleza 
com  o  mesmo  effeilo^  at^  os  ultimos  dias  de  Do- 
iembro  d'este  presente  anuo^  quaudo  Sisgismundo 
oom  toda  a  sua  geute  e  armada  tomou  porto  uo 
Arrecife.  Ouvio  da  boca  de  todos  nossos  progressos 
e  aeus  infortuuios^  yio  com  espanto  a  nossa  forta- 
hxA,  e  considerou  com  atten^ao  o  como  seuhoreava 
e  descobria  tudo  quanto  suas  fortifica^oes  guardar 
vao.  Prouiietteo  ^sgismuudo  aos  do  oouselbo  su- 
preoio  que  dentro  em  tres  dias  havia  de  castigar 
-OS  Portugueses  com  suas  aiesmas  armas,  pwque 
ganhada  a  fortakza^  abriria  porto  seguro  e  franco 
para  Ibes  conquistar  a  campanba.  «—  Cada  dia 
veapwava  a  nossa  forca  que  Sisgismun^  com  todo 
sea  poder  a  envestisse,  ou  por  sitio,  ou  por  assalto. 
Era  noloria  a  todos  a  promessa,  e  a  todos  enganou 
a  esperaD^#  Nao  se  regulou  sua  altiveza  pelos 
preceilos  da  experiencia :  em  nenhuma  parte  nos 
buscou  a  espada  ^  que  o  cortasse  ou  o  ferro  ou  o 
medo.  Ma  margem  do  rio,  que  se  oppunba  a  no^a 
fiu>tal^Ka>  numdou  levantar  uma  triocbeira,  oboa 


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kli  CASTRIOTO  LUMTANO. 

com  que  saio  iima  noiCe  ajudado  do  escuro  e  dc 
innumeraveis  gasC adores ;  fjuameceo-a  de  gro6sa 
at  tilharia ,  e  dos  melhores  soldados ,  com  pensa- 
mento  de  nos  destrair  sem  se  arriscar.  Mandoii 
assestar  alguns  trabucos  com  que  nos  lan9ava  bom- 
bas  e  gpranadas,  e  nao  des^presou  meio  naihum 
para  nos  desalojar ;  mas  forao  inuteis  sens  esfor9oSy 
porque  nao  s6  conservimos  a  forialeza;  mas 
delxando^lheum  bom  presidio,  se  retirarao  muito 
a  sen  salvo  para  o  Arraialos  nossos  ler^os,  deixando 
ordem  que  se  regulassem  os  tiros  pela  falta  de 
polvora^  mas  com  tal  artificio  que  o  Flamengo  nao 
inferisse  a  falta  pela  suspensao ,  fazendo-lhe  en- 
tender,  com  as  ordinarias  cargas  ao  melter  e  tirar 
as  companhias  de  guarda ,  que  o  nao  atirar  mais 
era  escolba  e  nao  preceito. 

XXII.  Em  aquelles  dias,  levados  da  esperan^a 
e  do  desejo,  sobiao  os  soldados  e  os  moradores  ^s 
coroas  dos  montes ,  d'onde  melhor  descobriao  os 
mares,  para  occuparem  os  olhos  em  buscar  a  ar- 
mada que  vinha  do  reino ,  persuadidos  do  tempo 
edo  aviso,  que  ou  seria  chegada  ou  estaria  vi- 
zinha.  Gada  qual  queria  ser  o  annuncio  de  nova 
tao  grata,  e  todos  os  primeiros  na  dita  de  v^i^m 
com  sens  olhos  o  soccorro ,  a  que  fiavao  sua  re- 
dempcao.  Entroa  o  anno  de  1648,  e  com  elle  o 
desengano  de  que  nao  era  ch^ado  o  fim  de  seus 
trabalhos,  com  a  nova  que  logo  se  divulgou,  de 
haver  chegado  a  Bahia  a  frota  esperada,  com  na- 
vega^ao  tao  alheia  de  sua  esperanca  como  aparUda 
de  seus  olhos,  porque,  nem  do  Arrecife,  nem  das 
espias ,  que  o  inimigo  trazit  pelo  mar  para  ^este 


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oAsniono  LwiiiHa  673 

fim  f  foi  descoberta.  Pela  derrola  inferirao  todos 
que  aquelle  poder  era  mandado  a  soccorrer  a 
Bahia,  e  nao  a  remir  a  Pernambuco.  Golpe  foi  este 
que  a  todos  08  soldados  e  moradores  d'aquellas 
capitanias  pehetrou  o  intimo  do  ooracao ;  e  po* 
d^ra  acabar  com  o  animo  e  fidelidade  de  todos , 
vendo  cada  um  o  pouco  caso  que  no  reino  se  fazia 
de  servi^os  que  mereciao  estar  yIyos  na  memoria 
e  na  esUma^ao  de  todos.  Por^m  aquelle  valor,  a 
aquella  constancia  apurada  a  golpes  de  ioforluniot 
e  desprezosy  tao  fora  esteve  de  fraquear  na  lealdade, 
que  d'esta  oonsideracao  tomou  motivo  para  se  em- 
pregar  com  mais  feryor  nos  servicos  que  so  para 
seus  bra^os  guardava  o  ceo  o  fim  de  tao  profiada 
guerra,  e  para  sua  cabe^aja  ooroa  de  tamaoha  vic^ 
toria ,  como  aquella  com  que  depois  derao  fim  i 
empresa. 

XXill.  Tinha  partido  do  Arraial  para  a  cam- 
panba  do  Rio  Grande^  em  23  de  Novembro  de 
1 647,  o  goyernador  dos  Minas  Henrique  Dias  com 
seu  t^o  e  algumas  companhias  do  terco  do  Ca- 
marao  ;  e  porque  no  principio  de  Janeiro  de  1 648 
entrou  naquella  capitania,  guardamos  para  este 
lugar  a  narra^ao  d'esta  expedi^ao,  como  para 
seu  proprio  tempo.  Partio  pois  Henrique  Dias 
no  tempo  referido,  com  a  gente  em  que  no  Arraial 
se  reparava  menos^  para  que  escondida  a  falta  se 
nao  divulgasse  o  intento,  e  entrasse  naquella  cam- 
panba  com  o  partido  de  ser  primeiro  descoberto 
pelo  damno  que  pelas  noticias. —  Correo  Henrique 
Dias  o  destricto  do  Rio  Grande  metlendo  tudo  a 
fierro  e  a  fogo.  A^lslou  um  sitio ,  que  chamao  as 


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A14  GAffniOlO  LOUfAm. 

Guarairas ,  oade  o  inimigo  sustentaya  uaia  casa 
foiie  no  oentro  d^uma  lagoa  larga  e  fuiida»  dentro 
da  qual,  oomo  em  ilha,  se  alojavao  todos  06  indios 
e  escravos  que  o  HoUandez  occupava  nas  rogas  e 
lavouras  daqudle  lerreno ;  e  se  reooUiiao  os  fmo 
(OS  e  OS  roubos  de  queae  sustentairao^  guardadoee 
defendidof  de  quarenia  HollandeTCs^  que  com  ou« 
tros  soldados  indios  guarneciao  a  foriificacao  :  cons* 
tava  d'esta  de  casa  forte  cercada  de  duas  tiincheiras 
bem  obradaa«  Depois  de  exhortar  seus  soldados 
com  palavras  de  confianca  e  rosio  socegado,  diase* 
\hes  o  oaminho  e  o  modo  oomo  haviao  de  avao^ar 
e  ganhar  a  foriificacao;  e  nao  Ihes  interpondo  da^ 
▼ida  entre  o  invefltir  e  Tencer^  os  meUeo  no  assallo. 
Lancarao-se  a  a^a»  e  com  ella  pela  canta  acoom- 
metterao  a  escala.  Defciidteao-se  osHoUan^zescom 
ardor  fa vorecidos  da  vantagem  do  sitio;  mas  nao 
poddrao  impedir  que  o6  nossos  tomassem  terra,  e 
ganhassem  a  primeira  trineheira.  Entre  esta  e  a 
aegunda  se  travou  reohido  combate;  mas  o  furor 
dos  nossos  levou  o  inimigo  de  yencida ,  e  bem  de 
pressa  caio  a  segunda  trineheira  em  suas  maos. 
0  cabo  hollandez,  vendo  perdida  toda  a  esperanca, 
se  m^teo  com  cinco  oompanheiros  n'uma  canoa, 
furtado  ace  <Jhos  dos  seus,  para  salrar  as  vidas. 
Escalarao  os  nossos  a  casa  forte  com  tibia  rssM* 
tencia ,  e  levirao  tudo  a  ponta  da  espada  nao  p«^- 
doando  a  sexo  nem  a  idade.  Durou  o  conflicto 
desde  a  prima  noite  at^  pela  manfaa;  e  foi  com  a 
claridade  do  dia  que  se  pode  conheoer  o  estrsgo. 
Morr^riM)  n'esta  occasiao  todos  qoantos  HoUaiih- 
dexes^  Indios  e  negros  kaviasia  fortifioa^  eseepto 


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GASTRIOIO  LUSITAlia  675 

OS  cinco  que  fugirao.  Dos  nossos  perd^rao  a  vida 
ires  soldados,  e  ficarao  muitos  feridos.  Gastou-se 
o  dia,  que  foi  o  de  6  de  Janeiro  del  648,  em  recolher 
OS  despojos,  curar  os  feridos,  enterrar  os  morios, 
e  tomar  refei^ao  do  trabalbo  entre  as  cougratulacoes 
da  victoria* 

XXIV.  Em  7  do  mesmo  met  marchou  o  gover* 
nador  Henrique  Dias  para  o  engenbo  de  Cunhau , 
onde  achou  o  Hollandez  bem  fortificado ,  com 
muila  genie  de  presidio,  e  nao  menos  soberbo  peia 
ditosa  resislencia  com  quese  haviadefendidodo  mes* 
tre  de  campo  Andr^  Yidal,  nos  dias  paasados.  F^ 
alto  em  frente  do  inimigo,  e  &  cara  descoberta  man* 
dou  por  um  tr<MEnbe(a  umaembaixada  ao  Flamengo, 
dizendo'lhe  que  sem  dik^ao  se  rendesse,  e  se  Ihe 
faria  bom  partido,  antes  que  os  seus  chegassem  a 
desembainhar  a  espada,  porque  com  ella  na  mao, 
nem  a  obediencia  os  obrigava,  nem  a  commisera^ao 
OS  detinba ;  que  acbava  iestemunha  d'esta  verdade 
no  successo  do  dia  antecedente,  acontecido  nas 
Guarairas  :  exemplo  com  que  desenganadamente 
se  poderia  aconselhar  sua  deliberafao ;  que  se  apro- 
veitasse  com  prudencia  da  escolha  que  em  sua  mao 
punba  a  fortuna.  Ferplexo  ficou  o  Fiamengo  com 
um  tal  proposto ;  com  palavras  equivocas  respon* 
deo  ao  enviado ,  pensando  ganbar  tempo  com  sa-« 
gftcidade ;  porim  Henrique  Dias ,  que  conheceo  o 
ardil,  mandou  segunda  embaixada  ainda  mais  ter- 
minante ;  e  como  tardasse  a  resposta,  sem  gastar 
mais  palavras ,  mandou  a  seus  soldados  que  toda 
a  leifba,  que  estava  junta  para  o  servico  do  en* 
genho,  diegassem  a  icotifica^ao  iaimig^em  eirculo» 


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k16  GASniOTO  LUSITARa 

Executou-se  a  ordem  com  eslranha  presleza;  e 
8em  duvida  que  tudo  ard^ra,  se  ao  tempo  de  se  Ihe 
por  o  fogo  nao  saira  de  dentro  uma  mulher  portu- 
gncza^  casada  com  Flamengo,  pedindo  a  Henrique 
Dias  quartel  para  os  cercados.  Concedeo-lhe  as 
vidas^  e  Ihe  abrfrao  as  portas.  Saquearao  os  nossos 
as  fazendas^  mimi^oes  e  armas;  arrasarao  a  for- 
tiGcacao  e  o  engenho ;  levarao  prisioneiros  a  todos 
os  rcndidos ;  e  assolada  a  campanha ,  voltarao 
para  o  Arraial ,  onde  chegarao  com  prospero  sue- 
cesso,  e  fiterao  entrega  aos  governadores  dos  cap- 
tivos  e  das  armas ,  (icando-se  com  os  mais  des- 
pojos. 

XXV.  Tinha  succedido  que  o  senhor  Rei  Dom 
Joao  IV^  se  deliberara  em  mandar  ao  Brazil  uma 
pessoa  que  com  prudencia,  valor  e.  arte  conser- 
vasse  06  moradores  (naquella  nobre  porcao  da 
America  que  continha  em  si  as  capitanias  suble- 
vadas)  sem  desamparar  os  naturaes,  nem  offender 
OS  f lollandezes ,  obrigado  de  reaes  estimulos  para 
nao  faUar  A  amizade  dos  aliados,  nem  a  conserva- 
^ao  dos  subditos.  Concorriao  na  pessoa  de  Fran- 
cisco Barreto  da  Menezes  todos  os  requisitos,  que 
podia  desejar  a  escolba ,  e  que  havia  mister  a  im- 
portancia  do  negocio.  Deo-lhe  EI  Rei  titulo  de 
mestre  de  campo  general  com  subordinacao  ao  go- 
vernador  g^ral  do  Estado  (que  jaentao«ra  Antonio 
Telles  da  Siiva),  e  por  sen  tenente  Ihe  nomeou 
Philippe  Bandeira  de  Melio.  Saio  Francisco  Bar- 
reto de  Menezes  da  barra  de  Lisboa  com  trezentos 
soldados^  muni^oes^  armas ,  e  tudo  o  mais  que 
pareceo  conveniente  para  o  fim  pretendido.  Nave- 


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GASTUOTO  LUSITAIIO.  &71 

gou  Bt6  a  altura  da  Paraiba  com  viagem  favoravel, 
onde  deo  nas  maos  d'uma  armada  hollandeza^  que 
com  avisos  certos  o  aguardava.  Nao  foi  a  presa  sem 
batalha,  nem  a  batalha  sem  sangue  d'uma  e  outra 
parte.  Ficou  Francisco  Barreto  ferido ,  e  assim  o 
levarao  os  HoUandezes  para  o  Arrecife,  onde  o  tra- 
tarao  com  o  respeito  devido  a  sua  qualidode,  a  sua 
opiniao  e  ao  seu  posto,  e  com  o  resguardo  que  Ihes 
ensinava  a  importancia  da  pessoa  y  e  a  esperan^a 
do  resgate.  —  Do  grilho  soube  Francisco  Barreto 
fabricar  a  liberdade  :  em.24de  Janeiro  d'este  anno 
fogio  do  Arrecife  para  o  nosso  Arraial  j  ajudado 
d'um  Flamengo^  que  de  guarda  se  fez  medianeiro. 
Foi  recebido  de  todos  com  notoria  alegria ,  e  dos 
mestres  de  campo  Joao  Femandes  Vieira,  e  Andr^ 
Vidal  de  Negreiros  com  tanlo  goslo  e  respeito^  que 
o  agasalharaOy  hospedarao  e  servirao,  como  se  devia 
&  sua  pessoa,  e  nao  &  sua  fortuna ;  o  que  elle  soube 
estimar  com  tal  fidalguiaque^  sem  lembrancas  de 
superior,  os  tratava  como  companheiros. 

XXVI.  Corria  havia  tempos  entre  HoUandezes 
e  Portuguezes  a  nova  de  t|ue  nos  portos  de  Hol- 
landa  se  preparava  uma  grossa  armada  para  ir  ao 
Brazil;  a  qual  se  confirmou  por  uma  caravella  d*a^ 
viso,  mandada  de  Lisboa,  que  tomou  porto  no 
pontal  de  Nazaretli,  sem  com  tudo  se  saber  a  que 
ponto  fazia  tiro.  Com  bom  juizo  intend^rao  os 
nossos  governadores  que  a  armada  yinba  em  direi- 
tura  a  Pemambuco;  e  com  incansavel  cuidado  e 
presteza  se  applicaraa  a  prevenir  e  dispor  tudo  o 
que  pareceo  necessarlo  e  conveniente  a  opposicao  e 
a  defensa.  Virao  o  muito  que  seryiria  a  seu  intento 


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479  GASmcra  tOSITARO. 

kdear  a  fortaleza  da  bataria  de  duas  plataformas 
Gontra  o  Arrecife ;  por^m  nao  tendo  artilharia  nem 
municoes,  despacharao  em  <  3  de  Fevereiro  para  a 
Bahia  o  capitao  Paulo  da  Gunha  com  requerimento 
e  suppKca  ao  general  da  armada  portugueza  ( que 
estava  surta  na  enseada  da  Bahia  )  Autonio  Telles 
conde  de  Villa-* Pouca  j  para  que  Ihe  acudisse  com 
prompto  auxilio.  Foi  Paulo  da  Gunha  recebido 
com  honra ,  ouvido  com  piedade ,  por^m  despa- 
chado  com  esperancas.  Fez  os  mesmos  officios  com 
o  senado  da  Gamara;  mas  nem  ao  menos  obteve 
boas  palavras ;  e  partio  sem  alcancar  outra  cousa 
mais  que  patente  de  sargento  maior  do  lerco  de 
Andr^  Vidal,  como  se  no  titulo  d'um  posto  levara 
o  soccorro  de  todos.  — Em  quanto  Paulo  da  Gunha 
se  occupava  n'esta  missao,  navegou  a  armada  hoi- 
landeza  pelos  mares  do  Brazil ;  e  o  tinha  feito  pelos 
do  norte  com  diversa  fortuna  :  saira  com  oiten(a 
e  tantas  embarcacoes,  e  nellas  nove  mil  homens  de 
guerra.  Na  passagem  do  canal  foi  assaltada  d'uma 
tempesfade  que  Ihe  lancou  i  costa  alguns  navios, 
e  outros  desgarrados  tomarao  diversos  portos  pelas 
costas  de  Franca  e  de  Portugal ;  os  que  livrtrao 
melhor  se  encorporarao  com  a  sua  capitanea,  aca- 
bada  a  tempestade,  e  seguirao  sua  viagem  at^  a  al- 
tura  de  Pernambuco,  d'onde  se  descobnrao  no 
principio  de  Feyereiro,  Tomirao  porto  no  Arrecife 
com  sessenta  ndos,  seis  mil  infantes,  e  ires  mil 
homens  do  mar,  Vinha  por  general  da  armada  um 
Flamengo  chamado  Vangoch ,  presidente  no  su- 
premo da  Companhia  ;  o  qual ,  tan  to  que  desem- 
barcou^  fez  entrega  do  bastao  de  general  das  annas 


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CASmOTO  LUSITAliOii  AW 

a  Siigisnundo  Vaneschop,  peeRoa  muitas  vezeft 
r^rida  no  discurso  d'esta  hiatoria  ^  como  figurt 
principal  d'esta  tragedia.  For  muitos  dias  festejott 
o  inimigo  a  grandeza  do  soccorro,  julgando-se 
livre  da  oppressao  em  que  estara,  e  senhor  do  im*^ 
perio  que  perdfira ;  em  quanto  os  nossoe  sem  outra 
e8peran9a  que  a  da  protec^ao  divina,  continuayao 
firmes  em  sua  constancia^  esperando  na  razao  e  jus^ 
tiea  de  sua  causa  achar  o  premio  de  sua  fidelidade. 
XXVII.  Nao  sei  eu  quando  a  fidelidade  portu- 
gueza  se  vio  mais  apurada,  nem  quando  a  pacien**- 
cia  militar  mais  soffrida ;  nunca  o  valor  dos  ho-^ 
mens  sobresaio  mais  esclarecido  que  nesta  occasiao. 
Tudo  quanto  a  antiguidade  n'esta  materia  nos 
deixou  escripto  para  assombro  chegara,  quando 
mais,  a  ser  somln^a  do  que  escrevemos.  Que  vas- 
sallos  houve  no  mundo,  que  em  razao  de  vassallos 
se  possao  comparar  com  os  moradores  de  Pernam« 
buco,  que  no  maior  desfavor  dos  principes^  na 
mais  dilatada  perfia  das  tribula^oes^  perdessem  fa- 
zendas,  desestimassem  patrias,  e  offerecessem  yidas 
par  nao  faltarem  &  fidelidade  de  seu  monarcha ; 
avaliando  por  menos  sensivel  a  perpetuidade  do 
perigOy  e  a  continua^ao  da  perda  que  a  observancia 
da  iealdade?  Digao-me  os  noticiosos  em  que  idade 
tiverao  os  principes  similhantes  servos?  A  que 
gente  nao  alterouoanimo,  nem  a  falta  do  soccorro^ 
nem  o  desprezo  do  servi^o,  nem  a  desesperacao  do 
premio  para  abrir  em  seu  peito  a  menor  brecha , 
por  onde  podesse  entrar  o  minimo  pensamenlo  de 
infidelidade  ?  Que  coracoes  achou  a  experiencia  sem- 
pre  firmes  do  servico  de  sua  patria  y  quando  por 


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iSO  GAsnioio  umTAMa 

espaco  de  vinie  e  qualro  annos;  umas  vezes  sujeilos 
a  tyrannia^  outras  i  necessidade,  constantes  nos 
inrortunios ,  vigorosos  nos  trabalhos ,  incaocayeis 
na  tolerancia,  desprezados,  famiotos  e  despidos; 
rogados  da  abundancia  e  da  commodidade,  sem 
que  por  imaginacao  claudicassem  na  firmeza  de 
leaes,  mais  promptos  em  dar  a  vida  que  em  resol- 
ver  a  trai^ao?  Resolutos  em  tomar  as  armas  a  benefi- 
cio  de  sua  liberdade,  sem  imperio  que  os  obrigasse ; 
sem  esperanca  que  os  persuadisse ;  e  sem  premio 
que  08  atrahisse,  continuarao  um  e  muitos  annos, 
de  noite  e  de  dia  com  as  armas  as  costas,  sem  recu- 
sarem  as  marchas,  sem  fugtrem  is  expedicoes,  sem 
Cemer^n  os  perigos;  vencendo  as  opposicoes  do 
tempo  e  da  fortuna ;  iias  diias  comedidos,  nas  des- 
gra$as  animados,  nas  ordens  obedientes,  nos  tra- 
balhos alegres,  nos  castigos  reportados,  na  disci - 
plina  observanteSy  nas  occasioes  valentes;  nunca 
vencidos  do  medo ,  sempre  vencedores  do  perigo  ; 
nos  encontros  mais  arriscados,  sem  (erem  confa 
com  o  numero,  a  tinhao  s<i  com  a  honra,  avaliando 
o  poder  inimigo  por  contrario,  mas  nao  por  desi- 
gual;  olbavao  o  excesso  para  o  veneer,  nunca  para 
o  recear.  Que  valor  foi  similhante  a  seu  valor  ? 
Julgava  sua  ousadia,  que  nem  as  balas  dos  inimigos 
feriao,  nem  suas  espadas  cortavao;  tao  senhoresdo 
proprio  perigo  e  do  poder  alheio,  que  nunca  a  des- 
graca  os  achou  sem  animo ,  nem  o  infortunio  sem 
ordem.  Em  dm  que  em  todas  as  idades,  e  a  (odas 
as  nacoes  do  mundo  podem  servir  os  Pernambu- 
canos  de  exemplo  na  fidelidade,  no  valor,  na  cons* 
tancia ,  na  disciplina  e  no  soffrimento ;  que  nao 


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GASmOTO  LUSTTAliO.  k%\ 

importa  que  os  antigos  fossem  primeipos  no  tempo, 
como  fiquem  excedidos  da  vantagem  ^  poia  6  certo 
que  nao  adiauta  a  idade  seuao  o  mereGimento. 

XXVIII .  Vendo-se  os  uossos  governadores  deseoH 
parados  de  soccorro ,  tratiirao  de  aproveitar  todos 
OS  noeios  possiveis  para  tornar  a  defeza  mais  efficaz. 
Assentdrao  primeiramente  que  as  forcas  reuuidas 
erao  mais  fortes,  e  para  esse  fim  mandarao  arrasar 
todas  as  estancias,  e  tirar  d'ellas  todos  os  presidios; 
eassim  mais  a  infantaria  que  se  aquartelava  em 
Iguaracu ,  Pao-Amarello ,  Juguaribe ,  Paratibi ,  e 
villa  de  Oliada.  Decretarao  que  nenhum  morador 
passasse  os  termos  da  villa  de  Sirinhaem »  e  que 
eutre  ella  e  a  Moribeca  se  fizesse  o  alojamento  mais 
distante.  Mandarao  que  se  conservasse  a  fortaleza 
do  Arraial  e  ada  Bataria,  tirando  d'esta  a  artilharia 
de  bronze  para  a  fortaleza  do  pontal  de  Nazareth , 
que  necessitava  d'ella.  Da  Yarzea  mandarao  retirar 
todos  OS  moradores  com  sens  gados  e  alfaias,  os 
quaes  unidos  ao  corpo  do  exercito  dos  differentes 
presidios  se  recolherao  ao  Arraial  deixando  arrasa- 
das  as  outras  estancias.  Despedirao  os  governadores 
varios  ofliciaes  da  milicia,  com  apertadas  ordens, 
para  reconduzirem  todos  os  soldados,  que  pela 
campanha  andavao  licenciados  e  fogidos;  e  para 
fazerem  recolher  ao  Arraial  todos  os  moradores  do 
reconcavo,  que  podessem  tomar  armas,  com  bandos 
publicos  de  perdao  geral  para  os  homiziados,  e 
gravissimas  penas  para  os  remissos  e  reheldes.  Exe- 
cutarao  estes  ministros  o  mandato  com  tanta  saga- 
cidade  epromptidao,  que  nos  primeiros  dias  d'Abril 
se  fez  no  Arraial  mostra  de  toda  a  nossa  gente,  e 
L  31 


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we  acbirio  tres  mil  dinentos  bome&s  de  pd^. 

XXIX.  OeeuptvA-se  entranto  o  Hollandes  em 
discrplintPftenssoldados,  ea  exercitik>»nas  annas; 
fsia  era  toda  a  occupacao  de  Sisgismando  e  de  aeus 
eabos,  pafa  augmeafarem  sua  polencia ;  a  dos  coik» 
selheiroa  do  supremo ,  por  outra  vereda  busetva  o 
mesmo  Am  :  excogitavao  enganos,  arteficios^  e  apa- 
rencias  com  que  defraudar  a  dos  Portuguezes.  8a jreo 
com  um  ardil ,  proveitoso  em  outro  tempo,  porim 
no  presente  despr^sado  com  a  experienoia  de  cavil- 
loso.  Form4rao  um  amplissimo  perdao,  que  copiado 
innumerareis  vezes  mand4rao  espalhar  por  todas 
as  paries,  pelo  qual  promettiao  esqueeimeoto  de 
culpas  e  lembranca  de  premios  para  todos  aquelles 
que,  reduzidos,  fossem  ao  Arrecife  em  termo  de 
dez  dias  tomar  passa-portes  de  alliados ,  e  jura- 
mento  de  fieis.  Entendiao  que  o  temor  de  sua  po- 
tencia  faria  obrar  o  ardil  com  efficacia  :  passou  o 
tempo,  e  virao  nao  ser  d'effeito  algum  a  diligencia. 
Tiverao  para  si  que  fdra  desconfian^a ,  e  nao  des- 
prezo,  porque  se  flzera  geral  a  promessa,  e  nao  fol- 
lava  com  pessoas  delerminadas.  Mudarao-Ihe  a 
f6rma,  e  dentro  em  cartas,  que  mand&rao  a  particu- 
lares  superiores,  remett^rao  o  perdao,  e  em  termo 
cerfo  pedirao  asrespostas.  Transcreveremos  aqui, 
traduzida  do  flamengo  em  portuguez ,  a  que  man- 
ddrao ,  por  modo  d'embaixada ,  aos  nossos  gover- 
nadores  Joao  Fernandes  Vieira,  e  Andr^  Vidal  dc 
Negreiros  :  conttnha  cstas  formaes  palarras. 

«  Por  ordem  particular  que  tlvemos  man- 
»  dada  a  nds  pelos  poderosos  Estados  geraes,  Sua 
D  Alteza  0  principe  d'Orange,  e  a  geral  oufrogada 


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OMnmo  umnao.  Ml 

M  poderjichegiclo«eoutro<{uee8l«nnta|Mmnd<i 
j»  para  prooeder  oon<ra  os  que  se  examrM  do 
M  Dosso  domkiio,  oonforme  a  dita  ordem  (ja  dutra 
»  Fez  a  todos  intimada}^  em  que  inandio  oe  ditot 
a  senhorea  que  a  qualqoer  peasoa  de  qnalqser 
M  n^ao,  ( 6tado  e  condicao  que  aeja^  outrogu^mos 
»  em  aeu  nome  perdao  geral  de  rdieiiiao,  desobe^t- 
M  diencia^  conspiracao ,  e  qualquer  outro  delicto, 
)•  ainda  que  seja  uma  e  muitas  tezcs  cotnmeCtido. 
i)  Em  comprimento  do  que,  o  temos  aaeini  coiice«> 
)>  dido  e  pubiicado ;  e  o  uotictamos  a  Yoaaas  Se^ 
»  nhorias  com  infallivel  cfrteza  de  que  ludo  da 
))  nossa  parte  sera  <  omprido  exactamente;  e  sobre 
»  esta  declaracao  esperatnos  sets  dias  pela  respoeta 
)i  de  YossasSenhorias. — Feita  em  o  nosso  conselho 
>»  do  Arrecife  em  dous  de  Abril  de  mil  e  seiscentoa 
D  e  quarenta  e  oito.  w  —  Joao  Bolertratbr.  — *  , 
Hbnriqob  Hamel.  —  Pbdro  Bokrs.  —  Ptlo  secret 
im'io  :  Joao  Balbbkbs. 

XXX.  Virao  os  nossos  goveroadores  a  oaria  e 
o  edital  do  perdao ,  cuja  copia  Ihes  remetiiao  in- 
cluBa;  communidirRo  com  Francisco  Barreto  de 
Menezes  o  que  ae  devia  fazer,  e  assentoo^se  que 
deasem  conta  ao  sargento  maior  Antonio  Diaa 
Gardozo ,  e  aos  governadores  de  Minas  e  Indio) 
D.  Antonio-Philippe  Camarao  e  Henrique  Dias;  e 
discutida  a  materia,  se  determinou  que  Joao  Fer^* 
nandea  Vieira,  e  Andr^  Vidal  de  Negreiroa,  como 
cabecas  do  exercito  e  dos  morodores,  reepondesatm 
i  carta.  Tomarao  tempo,  e  respond^rao  nesta  r6rma. 

«  As  artes  de  que  Vossas  Seuhorias  se  val6rao 


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kSk  GASTUOTO  LU8ITAN0. 

»  sempre  sao  as  de  que  usao  agora,  com  a  differenca 
I)  que  no  tempo  passado  serviao  ao  engano ,  e  no 
*)  presente  ao  aviso,  porque  aquella  confianca  que 
»  acfaavao  na  singeleza  destruio  ja  a  caviUacao  de 
»  sua  malicia.  Ao  mais  bruto  animal  ensina  a  na- 
»  tureza  a  conhecer  o  laoo ,  que  alguma  vez  Ihe 
»  tirou  a  liberdade,  abominando  o  cibo,  com  que 
I)  o  deseja  persuadir  a  astucia  do  cacador.  0  pi- 
»  lolo  menos  experto  sabe  fugir  do  baixo ,  a  onde 
»  uma  yez  tocou ,  por  mais  que  o  escondao  as 
»  agoas.  Com  esta  adyertencia  se  responde  a  esta 
»  embaixada ,  e  nelia  nos  conbecerao  Vossas  Se- 
»  nhorias  ensinados  de  sua  mesma  diligencia.  O 
»  ultimo  ponto  de  seu  decreto  sera  o  primeiro  de 
)»  nosso  reparo,  e  o  verdugo  de  sens  enganos.  Bern 
»  mostra  a  pouca  i6  que  tern  com  Deos,  quern  se 
»  vale  de  Deos  para  faltar  a  f<^.  Que  credito  esperao 
»  dem  a  suas  palavras  aquelles  mesmos  homens 
»  aos  quaes  nunca  guarddrao  palavra,  nem  satisfi- 
»  zerao  promessa  ?  Mai  negocea  quem  imagina  que 
»  com  a  lembranca  das  offensas  obriga.  Quem 
»  nunca  tratou  verdade,  como  ha  de  persuadir 
»  que  nao  foi  sempre  mendroso  ?  Se  todo  o  muudo 
»  sabe  o  falsi  ficado  de  seu  trato,  como  esperao  que 
»  o  mundo  os  testemunhe  verdadeiros  ?  Em  que 
»  parte  d'elle  deixou  de  ser  cavilioso  seu  estilo? 
»  Em  que  tempo  comprirao  o  que  jurarao  ?  Di- 
»  zendo  as  gentes  a  gritos,  de  escandalizadas  :  Nes- 
»  tas  capiianias  com  mais  crescido  brado ,  porque 
»  nellas  com  mais  despejado  excesso.  Com  lagri- 
M  mas  de  sangue  chorao  Cunhaii,  Rio  Grande,  Var- 
»  zea,  Ipojuca  ,  e  quasi  todas  as  povoacoes  d  este 


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GASTRIOTO  LUSITAMO.  l^»b 

»  reconcavo,  a  singeleza  com  que  cr^o  snas  pro- 
»  messas ,  e  o  rigor  com  que  pag^rao  sua  incauta 
»  credulidade ;  e  quern  a  todas  as  horas  ouve  o  las- 
»  timoso  gemido  que  aecusa,  nao  p6de  em  alguma 
»  dar  assenso  ao  afago  que  eugana.  Se  seus  de- 
»  sejos  Ihe  persuadem  outra  cousa ,  6  sem  duvida 
»  que  assim  como  nos  querem  destruir  a  liberdade, 
>  nos  querem  tambem  tirar  o  juizo ;  e  so  tirando*- 
»  DOS  o  juizo,  nos  mudarao  a  yontade.  Tern  para 
»  si  que  os  moradores  d'esta  capitania  sao  troncos 
»  sem  sentimento  para  as  chagas,  sem  juizo  para 
»  as  curas?  Nao  se  curao  jis  feridas  com  o  mesmo 
»  ferro  que  as  abre.  Porque  nao  podem  executar 
h  a  vinganfa,  escondem  a  espada  debaixo  do  per- 
»  dao ;  e  para  que  nos  custe  mais  a  pena ,  nos 
querem  vender  passa-portes  do  tormenJo.  Se 


» 


y>  nos  desejao  beber  o  sangue ,  a  que  fim  nos  pro- 
»  mettem  conservar  a  vida  ?  Se  nos  querem  rou- 
3»  bar  as  fazendas,  como  se  oflerecem  a  guardar^ 
»  nos  OS  bens  ?  Chamao-nos  para  a  injuria  com  a 
»  voz  da  honra?  Glemencia  cbamao  a  impiedade? 
»  Nunca  mais  cega  sua  paixao.  Que  clemencia  ou 
x>  que  favor  ha  de  esperar  a  oOensa,  se  experi- 
»  mentou  no  servi^o  exorbitances  tyrannias?  Quem 
)»  nos  maUratava  sujeitos ,  como  nos  ha  de  estimar 
»  rebellados?  Muito  ha  que  passou  o  tempo  em 
»  que  o  artificio  hoUandez  conquistava  com  pala- 
>>  vras,  porque  ha  muito  que  passou  o  tempo,  em 
»  que  a  candideza  cathohca  se  iiava  dos  herejes, 
»  imagidando  homens  aos  mesmos  que  a  igreja 
»  em  todo  tempo  intitulou  feras. 

»  Nao  achamos  meuos  disformidades  nas  amea- 


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n  €o»  que  M»  pTMieMM^  R«co«litttB»e»  o  iFsAor  € 

)i  seevk^  p«lft  #»  merfor  opmM0.  CerlM  'e9lBiii06 
»  na  polenm  4e  Mas*  aramdsi ;  e  mo  x  mm  esH 
»  com4c  a  do*  8oecorr<»  cpe  eoaditzio  s  (fne  i^n 
)»  e»Ur  surla  na  knpra  4'«96e  Arreerfep ;  e  con  tacfo 
»  rotai»r»o  tM  loAge*  ^  a  femer^  qur  ehordmoB 
»  oefB:  ignaV  haslma  o  infortnnio  q«ie  119  caosl  a 
>»  defraudon,  petia  gloFiaquen^dimiMrfo.  Espe^ 
»•  pm}enl*ado  tern  os  senhores  Hoikmc^e^  que  a 
»  espadb  peHugneza  mo  nece$s^  de  9e  medir 
»  para  cortar;  e  qae  e  kpaco  d*e9te»  Hioradores 
»^  » fHTicte  Rao  ehe^  com  a  forca>,  eh^a  00m  e  de^ 
»*  sejo^;  yerdlade  rektada  9  e  ouf  ida-  per  IMtas  k>^ 
»  cas,  qnantas-'^dao  aa  fernhis  de  9eu9  eanlrariea;  e 
»  q«a»did  em  alg«Hiaa  feke  jf[  a  ¥oz  dio  meiigue 
;^  para  a  dk^efeBi ,  aao  ha^era  peucaa  ^oeo  digito 
n-  pop  sinaas.  QuaBto  meri&,  €fue  reduzidt)  neeso 
D'  pudev  a*  um-  corpo  (eomo  e»li  hoje)  igmdaiMs  a 
*  Vossea  Seahoria^  eni  omimero  da  gpenfe,  e  os 
»  exeedlsrao»  miiito  era  qvalidade,  vsthv  e  pratiica; 
>^  com  aquefiadSsparkMle,  que  se  aeha  em  defen*- 
»  d^p 0  ppopiw,  ou eonquisl!ar oaHieio;  em  scrvir 
>  por  paga-,  ou  pdbjar  perhofirra*  em  ctefender  a 
»  vidfe-,  on  em*  veneer  o  soldo^.  No  provimento  das 
»'  mimboes',  eom*  terBfioB  menos,  estamos-mara  so^ 
»*  fcnados-,  porcpie  usamos  maifr  espadtaia  qtie  mos>- 
»  queiea ,-  e-em*  Bossas*  maos  obra  mais*  o  ferro  que 
»  achumiio. 

».  Em  qiianto  ao»  auxiliares  de  que*  Yt)ssa5C  S^ 
»  nhorias  fazem  tatito  cabedal  j  dte  methor  pattidb 
»  estamos  com*  09  poucos  que  temos>  db  que  Tossas 


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»  Setihoriag  ood  wuitos  que  contao;  porque  a  mul- 
»  tidao  do%  l3ruiO0  (bx  maior  carrua^m,  mas  om 
»  fiu  loaior  eMrcko  i  buteaiio  as  oocaaioea  pan 
M  o  de6po|o ,  mae  mo  para  a  halaiha  i  e  bem  m 
^  fide  descartar  d'eUes  quern  «f t4  tao  loii^  da 
»  ykloria.  Esta  uoa  proaeUe  um  Deos,  a  queoi 
»  aervimos^  cuja  ki  guafdatnos  tern  erros ;  cuja 
«»  honra  de£endemo6  com  zelo ;  cujos  a^grayoa  et^ 
»  peramos  castigar^  cqbio  minisiroe  de  sua  jiuiica( 
»  a  qual  tera  em  seu  favor  quern  defende  o  proprio; 
»  e  contra  si  quern  tern  roubado  e  quer  roubar  o 
»  alheio.  Frivolo  i  o  pretexto  de  querer  cobrar  o 
»  devido.  Se Vossas  Senhorias  disserem,  que  alguns 
»  particulares  Ihes  devem  algumas  quantias  de  di- 
»  nheiro,  ponha-se  a  causa  em  juizo^  e  se  Ihes  pa- 
»  gara  o  julgado.  Nunca  as  armas  derao  boa  razao 
»  do  direito  :  fugir  a  senlenca  da  lei  para  a  esperar 
»  das  armas,  6  extorcao  da  violencia,  nao  6  estilo 
»  da  justi^a.  Se  Vossas  Senhorias  quizerem  liligar 
»  o  pleito,  neste  tribunal  nos  acharao  conformes, 
»  e  f6ra  d'elle,  tao  enconlrados,  que  desde  este 
)»  ponto  OS  esperamos  em  campanha  com  forcas  e 
»  animo  para  darmos  uma  e  muitas  batalhas,  e 
»  nellas  as  vidas  pela  causa ;  e  se  nos  faltar  a  vic- 
»  toria,  nao  nos  ha  de  faltar  terra  para  as  sepultu- 
»  ras^  nem  honorificos  epitafios  para  a  memoria ; 
»  que  sabem  as  idades  eternizar  o  nome  de  quem 
»  sabe  morrer  em  defensa  da  patria.  —  Arraial  em 
»  sete  de  Abril  de  mil  seiscentos  e  quarenta  e 
»  oito.  » — Os  mestres  de  campo,  governadores 
da  acclamacao  da  liberdade.  —  Joao  Fernandes 
ViBiRA.— Andre  Vidal  de  Nbgrbiros. 


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IhHH  CASTRIOTO  LU81TAN0. 

Nesta  mesma  substancia,  posto  que  por  diflerea- 
tes  palavraSy  escrev^rao  D.  Antonio  Philippe  Cama- 
rao  govemador  dos  Indios,  e  Henrique  Dias  gover- 
nador  dos  Negros;  e  todas  estas  respostas  foiio 
remetddas  ao  Arrecife  por  um  enviado,  que  as  en- 
tregou  nas  maos  dos  superiores  d'aquelle  govemo. 
Estiverao  alguns  dias  indecisos,  atj4  que  se  resolve- 
rao  a  sair  a  canipo  a  dar  oomeco  a  canipanha^  cujos 
i^esultados  veremos  no  segoinle  livro. 


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CHAPITRE  XL 


SUMMARIO. 


1.  Manda  El  Rei  entregar  o  governo  das  araias  a  Francisco  Barreto 
de  Menezes;  em  que  estado  o  recebeo.  — 2.  Sai  o  Hollandez  do 
Arrecife,  e  com  que  poder  ;  raarcha  para  os  Affogados.—  3.  Dd-se 
rebate  no  Arraial ;  o  mestre  de  campo  general  cbama  a  conselho  : 
o  que  nelle  se  assenta.  —  4.  Manda  o  inimigo  picar  a  estancia  do 
Barreto ;  a  qua!  se  perde.  —  5.  Marcba  o  nosso  exercito  contra  o 

~  inimigo ,  e  em  que  f6rma.— 6.  Descripcao  dos  monies  Guararapes ; 
do  sitio  do  nosso  alojamento ,  e  tambem  da  Moribeca.— 7.  Aloja-se 
a  nossa  gente ;  o  inimigo  a  avista,  e  furma  a  sua.  —  8.  Disposicoes 
para  a  batalha ;  tocao  os  exercitos  a  envestir;  os  Portuguezes  rom- 
pem  A  espada  pelos  esquadroes  contrarios.— 9.  Os  inimigos  des- 
tro^ados  largao  os  montes ;  perdem  o  estandarte  real.  —  10.  Os 
Negros  e  Indios  nos  arriicao  a  victoria.  — 11.  Com  a  gente  de 
reserva  se  cobra  o  Flamengo  no  perdido.  — 12.  Sisgismundo  Tai 
ganfaando  terra;  os  nossos  mestres  de  campo  o  recebem  e  rebatem; 
profia  do  combate.  —  13.  Casos  particulares  d'este  encontro.  — 
14.  Francisco  Barreto  manda  cortar  o  passo  a  Henrique  Hus ;  re- 
tira-0e  Sisgismundo ,  e  depots  de  cinco  boras  de  combate  largao 
OS  inimigos  o  campo  em  desordenadt  fiigidi.  —15.  Tomao  of 
nossos  refei^ao  e  descanco ;  foge  Sisgismundo  para  a  Barreta.  — 
16.  Celebrao  os  nossos  a  victoria.  — 17.  Perda  do  inimigo,  e 
nossa.  —  18.  Capitaes  que  se  acbdrao  no  conflicto.  — 19.  Cfaega  a 
notida  i  Babia.— 20.  £ntra  Sisgismundo  no  Arrecife,  manda 
ganbar  a  villa  de  Olinda ;  occupa  a  nossa  fortaleza  da  Bataria.  — 
21.  Reeoperao  os  nossos  a  villa  de  Olinda  ;  o  capitao  Barros  de- 
saloja  0  inimigo ,  e  Ibe  segue  o  alcance.  —  22.  Sirgismundo  pede 
OS  seus  prisioneiros ;  cbega  ao  Arrecife  um  soccorro  de  HoUanda. 
—  93.  Os  negros  de  Henrique  Dias  csstigao  o  inimigo ,  que  se 
retira  eonfnso.  —  24.  Manda  Sisgismundo  dous  mil  bomens  sobre 
a  estaocia  de  Henrique  Dias,  que  se  retirao  bem  castigados ;  entra 
em  nosso  Arraial  soccorro  de  gados  e  gente.  —  25.  Doenca  e 
morte  do  Camarao;  suas  quaKdades  e  virtudes.  >-26.  Faltao  os 
mantimentos  no  Arraial  e  do  Arrecife ;  d'elle  sai  Sisgismundo  com 
a  armada,  e  vai  destruir  os  contornos  da  Babia.  —  27.  Forma-se 
a  nova  eompanbia  do  commercio  geral.  —  28.  Entra  o  inimigo  em 
1IOTO0  peBMBi«iit«0  de  oonqoUtar  a  camptnba;  aprestoi  que  Cu 


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490  CASTRIOTO  LUSITAIfO. 

para  ella.  —90.  Preparao-se  os  nossof  para  a  resistencia.—ao.  Sai 
o  ioimigo  do  Arrecife;  con  que  gentc,  e  em  que  fdrma.—  31.  De- 
termina-se  a  bataiha ,  com  parcecer  de  Joao  Fernandes  Vieira.  * 
32.  Manda  Pranrisco  Barreto  recoohecer  o  sitio  e  fbrma  do  iDimigo. 
—  33.  Joao  Fernandes  Vieira  chega  primeiro  As  maos  com  o  inimigo 
que  desbarata;  sua  yaloroaa  coofian^a.  — 34.  Andre  Vidal  rompe 
0  inimigo,  omesmofazem  os  autros  capitaes,  e  o  poem  em  fugida; 
Joao  Fernandes  Vieira  ganha  a  artilharia  do  monte.  —  35.  Andn$ 
Vidal  se  ?^  alalhado  d'um  esquadrao  inimigo,  por^m  resiste-Jhe ; 
e  0  p(>e  em  i'ugida.  —  36.  Joao  Fernandes  Vieira  assenhorca-se  da 
artilharia  do  inimigo  fazendo-lbe  grande  estrago,  em  que  morreo  o 
general  das  armas,  e  o  almirante  do  mar;  com  a  sua  presen^a  se 
dill  firo  a  balaiha,  e  consuma  a  victoria.  —  37.  Francisco  Barreto 
abraca  e  honra  todos  us  cabos  e  soldados ;  festeja-se  a  Yictoria,  e 
dao-fse  gracas  a  Decs.  —  38.  Perda  d*uma  e  outra  parte  ;  pritio- 
neiros  e  despojos  que  deiiou  o  Flamengo.  —  39.  Cabos  que  se 
ach^rao  n'esta  occa.<iiuo.  —  40.  Volta  a  nossa  gente  para  o  Arraial ; 
d^-se  licenca  ao  Hollandez  para  enterrar  os  mortos ;  ?ai  o  capi- 
iao  bollandei  ver  o  nosso  Arraial ;  como,  e  para  que-  —  41.  Sos— 
peiisao  d'umas  e  outras  armas;  sai  do  reino  a  primeira  firota  da 
Companhia  geral.—  4^.  Sisgismundo  manda  assallar  a  ettanck  do 
Mendonca,  a  do  Aguiar  e  a  das  Salinas,  e  em  todas  €  mal  succedido ; 
manda  uma  esquadra  ao  rio  de  Suo  Francisco.  —  43.  Na  estancia 
do  Mendonga  perde  o  inimigo  reputa^do  e  gente;  no  Rio  Grande 
0  casUga  Joao  Barboza  Pinto. ~44.  Manda  Franciiico  Barrelo  provo* 
car  0  inimigo;  com  que  successo.  —  45.  Antonio  Dias  Cardozo  vai 
ao  Ria  Grande;  o  que  nelle  faz.  —  46.  Suspensao  das  arraas  inl- 
migas«  e  por  que  causa ;  torna  o  inimigo  a  sair ;  enconka  a  estancia 
do  Aguiar  com  dobrada  guarnicao ;  retira-se  destrocado.— 47.MMida 
Sisi^smundo  uma  ^squadra  ao  Rio  de  Sao  Francisco ;  o  que  Ihe 
succede.  —  48.  losiste  em  ro^r  a  estancia  do  Aguiar,  e  sempre 
paga  af  custas. 


I.  No  mmh  vivo  emprego  das  prerettcoes  com 
tjue  o  inimigo  se  dispunha  para  a  conquista,  e  os 
iioMosparaa  defensa^  oonio  deixamos  dito  no  livro 
|)Te'ccdiente,  chegou  ao  Arraial  de  Pernainbuco  (ctm- 
tavao^se  1 5  de  Abril  de  1 648)  um  caireio  mandado 
^iteMaf)de'gciMfFerlda«w«^  ¥€«t<0mMhe<de¥ifia- 


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BmniNro  de  IMMMdeiV  ^  lh»  trbokifceiiftff  gomo  a  sen 
wtiitit  dr  eaflH^frtMrnll^  tkommrim  #  |mtkb'  pc^ 
Sm»Mag«sladli»^  diwMk^qve  iiipfiMld*^  a<ieid«iiteK 
Hie  Mi9p€»46rao  o  m%vdmor^  Ma*  Hk^  derrogarao  a 
Uttered  Cpe  o  cKlo  seohor  Air  tmb«  fi^a^vaMhr^ 
tti^nidecf  9erm  aquette'twgQ^^  Era*  para  receiar  (fM 
eMii*  esta  mot^^a  <!^  c^fe  doffretsM  a  catrai^  (i»  t»- 
btfdade,  e  ate  se  efcegapao  *  temer  sedfcoes ;  mm  a 
prmfeneia  e  wodesviar  cte  n«^€^  Hfie^ti^e  cte  campe 
gM^ra)  e  »  SlAn]4sstt<^  dtos  amtig^  eemeifiarao  de  tal 
modb  an-  eovme-  qfu«  liarveMlb  AMNksHieap  nas  peasoaa 
iHmea  a  hou^e*  ii#  gat^no*.  €omo  potem  $e  faz 
rtwiiew  da*  e«ti»egap  do>  biteCHio  a^Ao^c*  govenwwtoif 
dka^  arme9,  ewmpf^  qwe*  dfemos  coAta  rfeste  hig» 
^  estado  em  qwe  ella*  se  atebaPw^.  —  Tonxm  Joat) 
FeriaKtes*Vif?iwi'Sdbfe  ^tKj  hombros  a  emprtfza  d^ 
liberdade,  quando  ella  se  ju^;«rra'cfe  t^wfcy  pefdida ; 
|M>E-9eemcam^  miHt9  todtr  ao|l^ifitiae*,  rs^assisrido 
dot  eonfiaficaqiue  tit^'em  Beo»v  do^^o  dfeereligiSd 
e  dfo  bemcKeepatriia.  Sem  aMia^  ^  sidldadoir  vettcee 
e  mimige  queo  budcava  eom  9eldado»  e  arrmffs  M. 
bfrtaMia  dasTabocas.  Depots  unid'o  com-  o  mescre  dt 
cafmpe  Andi*  Vidai*  dc  NegveiW)* ,  ganfiairato'  a  vio 
ttem>  qtte  perdeo  o  Flaroengo  no  engenho  de  JBkma 
Anna  Paca;  e  nove  florfadezaB,  com  outras  redutos 
c  casafs  fortes;  pertb  de  ohentSti  peeasr  d'anilham 
dfe^  diversion  calibnes^  ap  maior  parte  dfe  bronzte ;  ar* 
mas ,  munieoes ,  e-  peti^Kos  de  gtterra  em'  tant^ 
quantidkdk,  quaitfa  basttm  para'stisftntara  gtierra 
TiT^em-eiwe*  amrfos'CAiAmibs.  ife*dliw:tttwd'cltefe 


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yn  CASTUOTO  LOSlTANa 

libertirao  da  siyei^ao  hollandeia  oento  e  oilenU 
legoas  de  campanha  que  se  contao  do  Seara  M orim 
at<S  o  rio  de  SJio  Francisco  com  morte  e  prisao  de 
dezoito  para  dezanove  mil  contrarios.  Dos  morado- 
resfizerao  soldados  tao  animosos  e  destros,  que  a 
8i  mesmos  se  desconheciao.  Nao  foi  menos  a  diffe- 
renca  que  se  vio  no  recibo  e  na  entrega  :  para  sus- 
tento  do  exercito  entreg^rao  mantimentos  para 
dous  mezes ;  para  pagas  dos  soldados  vinte  quatro 
contos  em  ser,  dezoito  mil  cruzados  em  eOeitos,  e 
em  dividas  com  facil  e  certa  cobran^a.  A  gente  dis- 
ciplinada,  o  inimigo  reprimido,  os  moradores  tra- 
tados  com  cortezia,  prudencia  e  af&bilidade.  Ulti- 
mamente  p<ide-se  dizer  que  derao  a  coroa  terras 
e  yassallos  que  podesse  governar,  e  sem  dispendio 
da  fazenda  real ;  e  a  seu  principe  derao  a  gloria  de 
de  o  ser  de  vassallos  tao  obedientes  e  leaes ,  que 
podem  ser  para  todos  os  subditos  doutrina,  e  para 
todas  as  idades  modelo. 

II.  Em  quanto  os  nossos  se  preparavao  para  a 
resistencia  y  preparava-se  o  inimigo  para  o  ataque. 
Achava-6e  Sisgismundo  general  d'um  exercito  nu- 
qieroso  e  luzido;  cabos  peritos  e  valerosos,  officiaes 
praticos  e  destemidos ;  soldados  de  varias  na^oes, 
por^m  exercitados  em  uma  mesma  discipUna ;  co- 
nhecedor  de  nossos  cabos,  de  nossos  recursos,  e  do 
terreno  que  pisava ;  isto  nao  obstante  differio  por 
bastante  tempo  o  por-se  em  campanba  :  o  que  ja 
excitava  murmurios  na  plebe,  e  accusa^oes  da  parte 
do  governo;  al6  que  picado  d'estes  estimultos  saio 
do  Arrecife  pela  uma  bora  depois  da  meia  noite 
17  d'Abril  de  1648^  com  sete  mil  quatro  centos 


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GASTBIOTO  LUSlTANOb  69S 

eombatentes ,  deixando  de  reserva  o  ooronel  Hen^ 
rique  Hus  ( ja  livre  de  nosso  poder  )  com  mil  in- 
fantes^  e  ordem  que  em  tempo  certo  se  fosse  iocor- 
porar  com  o  exercito  nos  montes  Guararapes,  como 
depois  fez.  Soldados  auxiliares  entre  Negros  e  In* 
dios  mil  e  quatrocentos,  e  sete  centos  gastadores; 
e  para  que  Henrique  Hus  nao  perdesse  tempo ,  Ihe 
deixou  ordem  secrela,  que  com  seu  terco  fosse  sa- 
quear  e  passar  a  espada  toda  a  gente  da  Varzea ; 
mas  foi  errado  seu  projecto,  e  inutil  a  ordem,  por* 
que  toda  a  gente  se  tinha  retirado  como  ja  disse- 
mos.  Levava  seis  pecas  d'arliiharia  com  municoes, 
armas  e  mantimentos  de  sobre-selente,  e  muita 
quantidade  d'algemas,  grilhos,  cadeas,  e  cordas 
para  prender  e  maneatar  os  captivos.  —  Com  bel- 
licosa  ostentacao  de  caixas ,  clarins ,  salvas  e  vozes 
se  formou,  e  poz  em  marcha  para  a  sua  fortaleza  dos 
AfTogados,  meia  legoa  para  o  certao,  para  o  poente, 
onde  fez  aito ;  foi  recebido  da  forlaleza  com  tantas 
salvas  e  vivas,  que  parecia  adiantar-6e  o  triumpho 
a  batalha. 

III.  Naquelle  lugar  declardu  Sisgismundo  a  sens 
caboso  seu  intento,  que  era  occupar  a  Moribeca, 
povoaqao  situada  quasi  nas  fraidas  dos  montes  Gua- 
rarapes,  cinco  legoas  da  Nazaretb,  e  tres  do  nosso 
Arraial;  para  d'alli  continuar  as  suasoperacoes.  De- 
rao  as  nossas  sintinellas  noticia  do  inimigo ;  tocou- 
se  arma  no  Arraiai,  pegou  a  nossa  gente  em  armas ; 
e  formada  esperou  as  ordens  que  havi^  de  seguir. 
Com  a  claridade  do  dia ,  se  descobrio  um  grosso 
esquadrao  interposto  entre  a  nossa  gente  e  o  sitio 
em  que  se  alojava  o  capitao  Antonio  Borges  Uchoa, 


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t  qoem  ftna  fvente  com  deoMNKtMcao  At 
kiveiCir  aquella  esUneit :  indiMtrift,  de  qoe  fe  vaiM 
para  eneobrar  a  passagem  de  mu  exerctU  pan  a 
outra  parte  do  no ,  pelo  v4o  doa  Afibgadoa;  o  que 
eonseguio  fartado  aoa  notaoa  olhoa,  cnja  rista  not 
cegara  o  vulto  com  que  o  fittgimeoto  noa  desviava 
oa  olhoa  e  a  auspeiu.  '^  0  meslre  de  campo  gene* 
ral  Francisco  Barreto  dc  Meaezea  chamou  a  oon«* 
selho  OS  caboa  maiorea,  e  em  sua  determinaeao 
deixou  o  que  se  havia  de  aeguir  na  occaaiao  pr&* 
sente.  Nao  erao  mukos  os  votos^  e  ainda  asaim  dia^ 
cordarao  noa  parecerea.  A  menor  parte  foi  de  opi- 
niao  que  ae  nao  devia  fiar  a  aalvacao  de  iodoa  i 
fortuna  d'uma  batalha ;  que  o  maia  prudence  seria 
recirar-se  para  o  cabo  de  Santo  Agostinho,  terrene 
em  que^  favorecidos  doa  mates  e  do  tempo  poderia- 
mos  oonsumir  o  HoUandez.  Nao  foi  d'esta  opiniao 
Joao  Fernandea  Vieira  :  antee  sustentou  que  se 
deTia  eaperar  o  inimigo  a  p^  firme  j  porque  execu- 
tad^  a  retirada,  era  forcoao  deixar  nas  roaoa  do 
inimigo  as  fortalezas,  as  familias,  e  as  fazendas, 
unico  soccorro  das  vidas  (  que  na  batalha ,  ou  se 
havia  de  alcancar  a  victoria  j  ou  perder  a  Tida ;  e 
em  caso  que  a  fortuna  adveraa  nos  tirasse  a  sorte 
de  veneer  justificados,  nao  poderia  tirar-nos  a  gloria 
de  morrer  valorosoa,  como  fieis  a  Deos,  obrigadoa 
i  nacao ,  devedores  4  patria ,  e  leaes  ao  principe. 
Conformou-se  o  niestre  de  campo  general  como  pa- 
recer  de  Joao  Fernandas  Vieira,  que  tambem  foi  de 
Andr^  Vidal,  e  etitregou  a  aeu  cuidado  a  disposicao 
da  guerra  e  a  fdrma  da  batalha ,  redervando  para 
ai  o  dominio de  ftizer exeeular  asordens.  Foi  a  pri- 


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npiQira  qw  se  dm  aos  esquadroefi ,  qu«  ^ib$gn^  m 
QQnllicU>»  dada  a  primeira  carga  se  m^tt^s^e  mho  a 
espada,  e  se  inveBtisse  o  inimigo,  Despediiio  o  sarw 
gento  inaior  Cardozo  para  a  froQteira,  para  e^piar 
Q  de$cobrir  amarcba  do  inimigo,  Eotretanto  oo 
ouparaO'-se  nos^s  cabas  em  exortar  06  soldados 
com  razoes  yivas  e  efficazes,  refrescandQ-lhefi  a  lem« 
branca  das  muitas  vezes  que  tiobao  vencido  of 
m^$moft  HoUandezes  qua  agora  os  buscavao.  Che-«- 
gou  neate  tempo  o  sargento  maior  Cardozo ,  eiu^ 
formou  que  o  iuimigo  ia  marcbando  para  a  Barreta^ 
Com  eata  nova  se  mandou  reeolher  toda  a  nosaa 
geute  para  o  Arraiala  descancar  e  a  tomar  a  refeicao 
quotidiaua  em  quanto  nao  cheg^va  aviso  do  capiteo 
Canha  do  guccedido  na  Barreta. 

IV.  Chegou  a  vanguarda  do  exercito  inimigo 
a  picar  a  Barreta,  e  o  capitao  d'ella  Barthobmeo 
Soares  Canlia ,  enganado  da  imaginacao,  que  Ibc 
pintou  ser  commettimento  de  duzeolos  Hollaadezes, 
que  de  ordinario  o  inquietavao,  com  desejos  de  o$ 
easiigar  saio  a  bu8c&l-*os  fdra  da  fortifica^o  com 
quarenta  e  seis  soldados,  deiKando  ordem  aos  doua 
idferea  seua,  que  com  o  restante  da  gente  se  nao 
movessem  do  posto  que  defendiao»  aem  expresaa 
ordem  sua ;  e  conftado  nas  sentinellas,  que  deixira 
ao  largo,  de  que  o  inimigo  ihe  nao  poderia  cortar 
a  retirada,  ae  empenbou  com  tanta  demazia,  que  o 
arrepeudimento  o  nao  pode  livrar  do  perigo.  Pri- 
meiro  se  vio  cortado  que  investido.  Nao  teve  o  ca^ 
pitao  Canba  tempo  sonao  para  metter  mao  a  espada 
^  animar  os  sens  com  o  exemplo  ;  com  ella  na  mao 
m  m^teo  pdo  esquadrao  do  inimigo  com  tal  ya** 


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&96  GASTRIOTO  LUSITAMO. 

laitia  e  destreza,  que  se  deo  a  conhecer  a  si  pelo 
estrago  e  aos  seus  pela  imitacao*  Nao  houve  entre 
elles  quein  nao  vendesse  uma  vida  por  muitas,  de 
sorte  que  primeiro  08  vio  o  Hollandez  mortos  que 
rendidos.  0  valoroso  capilao ,  cercado  de  Indios  e 
Tapuyas « os  fazia  afastar,  ou  cair  com  os  golpes  de 
sua  espada,  at^  que  os  rompeo,  com  espantodos 
Hollandezes  e  assombro  dos  barbaros  :  o  que  me- 
receo  dar-se-lhe  quartel ,  contra  o  parecer  de  mui- 
tos.  Os  que  forao  investidos  ns^estancia  sustentarao 
o  combate  com  admiravel  constancia,  at^  que  yen- 
cidos  do  excesso  se  saWdrao  nos  matos,  nao  sem  perda 
d'alguns  mortos  e  feridos.  Formado,  e  com  as  ar- 
mas  na  mao  passou  o  Hollandez  naquelle  sitio  o  res- 
tante  do  dia  e  toda  a  seguinte  noite;  mandou  Sis- 
gismundo  vir  do  Arrecife  a  Henrique  Hus  com  o 
seu  terco,  e  proseguio  a  inarcha  pelo  caminho  da 
Moribeca. 

V.  Erao  duas  horas  da  tarde  (tempo  em  que  a 
noftsa  gente  recolhida  ao  Arraial  come9ava  a  tomar 
racao  para  acudir  a  fome  ),  quando  chegou  aviso  do 
que  era  passado  na  Barreta.  Nao  houve  soldado 
nosso  que  se  nao  alvoro^asse  ;  e  sem  fazerem  caso 
da  comida  tom^rao  as  armas,  e  formados  marcba- 
rao  com  todo  o  poder,  o  qual  constava  de  dous 
mil  e  quinhenlos  Portuguezes ,  negros  e  Indios. 
Commandava  a  vanguardaomestrede  campo  Andr^ 
Vidal ,  e  nclla  ia  incorporado  o  mestre  de  campo 
general  Francisco  Barreto  de  Menezes ;  a  retaguarda 
foi  confiada  a  Joao  Fernandes  Vieira.  Ghegarao  a 
um  lugar  em  que  havia  dous  caminhos,  e  duvidou- 
se  por  qual  d'elles  se  havia  de  marchar  ;  houve  pa- 


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GASTRIOTO  LUSITANO.  697 

reoeres  encontrados ;  mandou  o  mestre  de  catnpo 
general  fazer  aho ,  at^  que  chegasse  Joao  Fernan- 
dez Vieira ;  ouvio-se  o  seu  parecer,  o  qual ,  sendo 
conforme  com  o  do  sargento  maior  Antonio  IHas 
Cardozo,  foi  approyadoe  mandadoseguirpelo  mes- 
tre de  campo  general.  Depois  de  cortada  a  ponte 
que  podia  dar  passagem  ao  inimigo,  marchou  o 
nosso  exercito  para  os  montes  Guararapes^  onde  se 
experimentarao  todas  as  utilidades  do  conselho, 
sem  que  se  achasse  o  menor  defraudo  entre  a 
promessa  e  a  livranca. 

VI.   Situou  a  natureza  os  montes  Guararapes 

tres  para  quatro  legoas  do  Arrecife ,  caminhando 

de  norle  a  sul ;  tres  do  nosso  Arraial ,  quasi  para 

o  poente ;  da  Barreta  duas ,  correndo  do  norje  ao 

poente.  Do  monte  j  onde  se  come^  a  empinar  a 

terra  at^  o  mar,  harera  distancia  de  tres  quartos 

de  legoa  de  leste  a  oeste,  campina  rasa,  de  muitos 

loda^aes  e  alagadicos.  Dos  montes  para  o  certao 

vao  continuando  as  serranias  com  mais  ou  menos 

altura;  e  digo  serranias,  porque  mais  o  parecem 

que  montes,  pelo  subido,  agreste  e  aspero  d*elles. 

Alguns  formao  tamanho  corpo  que  parece  levantao 

a  cabeca  sobre  as  nuvens,  e  pela  maior  parte  sao 

de  cadencias  que  espantao  a  yista,  e  a  consideracao 

com  o  despenho  e  com  o  profundo;  tanto   qu6 

suas  cavidades  querem  persuadir  que  nao  parao 

senao  no  centro  da  terra.  Das  eminencias  d'elles  se 

descobrem  dilatadas  e  ferteis  campinas  por  grande 

distancia  de  cerlao,  que  igualmente  suspendem  e 

recreiao ;  e  olbando  para  aparte  do  mar,  se  vtem 

muitas  legoas  de  eosta  e  golfo,  em  fdrma,  que  pri- 

t  32 


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meiro  se  acaba  a  mU  que  o  abj««tQ,  0  Vmmi 
<l'esie$  moQleSy  em  partes  6  saibro.  «m  part«  terra 
aolu,  como  area ;  em  muitas,  pedras  desuDulas  tM 
pcmderQ$a$  e  maciwaft,  que  pela  cor  e  peso  querma 
parecer  fenro,  rauo  por  que  aa  agma  da^  iayamadaa 
tem  feiio  oellea  quebradaa,  grutas,  e  barranoM  am 
tanto  Qumero  e  allura,  que  se  nao  olbao  sem  medo 
e  sem  perigo;  o  de  caminhar  por  elles  de  cavallo 
6  temeridade ;  de  pi  atrevimento*  Todos  sao  escal-* 
yados,  e  o  natural  d  elles  tao  escasso,  que  se  criao 
alguma  arrore,  i  infructifera  e  agreste.  As  fraldaa 
d'eslas  serranias  se  cultivso,  e  acodem  com  os  fnic- 
tos,  ajudadas  da  bumidade  qqe  reoebem  das  montes. 
-p-  GuararapeSf  na  liogua  do  geutio  i  i  o  aieamo 
que  estrondo,  ou  estrepito,  que  causae  os  iostru^ 
mentos  de  golpe^  oomo  siuo,  lambor,  atabale,  e  ou* 
tros ;  e  o  rumor  que  faiem  as  aguaa  pelas  roturaa 
e  eoDcavidades  d  elles  Ihes  deo  o  uome  de  Guara* 
rapes.  0  ultimo  d*estes  mantes^  saiudo  d'elles  pan 
o  mar^  asseuta  o  pi  sobre  um  meio  circulo  de  terra 
cba  pela  parte  do  sul,  que  tambem  o  eerca  pela  do 
mar  (pela  terra  Qca  unido  a  outros  mcntes)!  oin** 
gido  pela  parte  da  eampina  d'um  clilaudo  alaga-* 
difo,  oausado  d'uma  lagoa  que  Ihe  da  prineipio^ 
formando^e  uma  faxa  de  terra  aolida,  que  teni  de 
lai^gura  poueo  mais  df  oem  passos,  entre  o  alaga<* 
di9o  e  o  monte  ;  para  a  qual  se  entra  por  um  bo* 
queirao,  que  formou  a  naiureza  entre  a  lagoa  e 
uma  lingua  de  mato,  que  desce  do  dito  moiite* 
Pela  dita  boca  enlrou  a  nossa  genie,  e  se  alojou 
naquella  faxa  de  terra  oom  as  eommodidades  e  for*- 
tifica^oes,  que  Ihes  da^a  e  sitio^  mko  aeado  a  ineftar 


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qAinawQ  lusitaiio.  4W 

0  ficar  Qscondida  aoa  olhoa  do  Flamengo,  porque 
ra  do9  monte^  nqs  podia  deioobrip.  Fa^a  o  leitor 
ipemoria  das  particularidados  referidaa  part  en- 
tender  com  mais  clareza  a$  cireumstanciai  da  ba*- 
talba  <{iie  logo  havemof  de  relatar •  A  povoagao  da 
Aloribeca  ( que  o  iniinigo  intentava  poatuir,  oomo 
.  fundameoto  de  seu  designio)  fica  uma  l^goa  dos 
moQtoa  Guararapes  (  pequena  pelo  numt^ro  daa 
casas  que  a  formao,  grande  pelo  dot  vizinhot  que 
a  cercao  em  particulares  vivenda«).  0  terreno  fei^- 
tiliaaimo  pela  abundancia  e  bondade  dog  rruetot  e 
daa  criaa ;  retalbado  de  pequenoa  rios,  eujaa  aguas 
l^va  ao  mar^  o  que  chamao  da  Moribeca>  que  banha 
e  da  Home  &  povoacao.  Tudo  requisitos  de  grande 
convenieacia  para  o  intend  o  de  Sisgitmundo. 

Yll*  A  18  de  Abril  de  1648  arrostarao  os  nossos 
oa  monies  Guararape^  j  e  seguindo  a  direo^o  de 
Joao  Fernandes  Vieira»  entr4rao  pelo  boqueiiio,  e 
ae  alojou  a  gente  em  fdrma  prolongada.  Tom&rao- 
ae  todaa  as  precau^oea  em  taea  casoa  neeeasarias^ 
poaerao-se  sentinellas^  mandou^se  Antonio  Dias 
Cardozo  para  observar  o  inimigo ;  quando  nesfe 
mesmo  tempo  cbegou  o  capi(ao  Bartholomeu  Soarqs 
Ganba,  o  qual  pod^ra  escapar^i^e  da  Barreta;  re- 
ferio  o  poder  e  o  pensamento  do  Hollandea  com 
tudo  0  que  at6  aquella  bora  tinba  auceedido  (  ii)i 
ouvido  com  aegredo  e  avizado  com  preoeito  que 
nenhuma  couaa  dissesse  diante  dot  aoldadoa  no  to- 
oante  ao  exeesao  que  o  exe reito  inimigo  noa  fbala 
cm  numero.  Oa  nossos  governadorea  mandarao  ae- 
gunda  vea  o  capitao  Cardoto  com  sessenta  homens 
para  &zer  frente  ao  inimigo ;  os  quaea  o  reoebArto 


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5M  CASniOIO  CDSTTAlia 

com  uma  carga,  e  o  forao  conduzindo,  sem  yira- 
rem  a  cara  nem  perderem  a  ordem,  at^  o  boqueiiio, 
no  qual  recolhidos ,  deixon  o  Flamengo  de  os  se- 
guir.  Ja  nesta  hora  occupava  a  nossa  infantaria 
toda  a  ladeira  do  monle  em  forma  de  peleja.  Pela 
frente^  que  £ma  rosto  ao  inimigo ,  se  deixaya  ver 
de  seus  esquadroes  a  resolucao  e  a  forma ,  que  Sis- 
gismimdo  olhava ,  confundido  de  seu  mesmo  en- 
gano.  Julgava  que  vinha  a  yencer  sem  peleja,  e  a 
triumphar  sem  batalha,  mas  yendo  a  resolucao  dos 
nossoSy  mudou  de  conceito,  e  vendo  que  muitos  de 
seus  soldados  perdiao  as  cores  j  correo  os  esqua- 
droes animando-os  4  batalha  com  a  exhortacao  e 
com  a  ordem. 

YIU.  Em  nove  esquadroes  formou  o  mimigo  sua 
gente,  a  qual  se  compunha  de  Francezes,  Allemaes, 
Ungaros^  Polacos,  Inglezes,  Suecos  e  outras  nacoes 
da  Europa ,  nao  sendo  a  menor  por^ao  a  dos  Hoi- 
landezes.  A  vanguarda  compunha-se  de  dous  re- 
gimentoSy  um  de  nove  centos^  outro  de  oito  centos 
soldados  praticos ,  yalerosos  e  confidentes  ;  os  mais 
UmIos  erao  veteranos  tirados  dos  presidios  de  suas 
pracas,  supprindo  a  falta  coia  os  bizonhos,  que 
naquelle  anno  conduzira  do  norte  a  sua  frota.  Os 
Indios,  que  nao  tinha  disciplinado  a  arte,  como  Ta- 
puyas  e  Pytiguares  deixou  em  tro90S  soltos  e  vo- 
lantes,  para  que  melhor  podessem  s^uir  seu  estilo 
de  pelejar;  entre  os  quaes  se  ouviao  innumeraveis 
bozinas  e  atabaques,  que  acompanhavao  barbaros 
gritos.  A  nossa  gente  era  menos  em  numero ,  mas 
de  maior  conta  pelas  qualidades  de  ser  toda  pratica, 
valerosa  e  portugueza ,  ^ou  por  nascimento  ou  por 


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GASTRIOTO  LUSITANO.  501 

trato ;  e  armada  da  justica  da  sua  causa ,  era  me- 
Ihor  armada.  —  A  nossa  vanguarda  era  comman- 
dada  pelo  mestre  de  campo  Andr^  Yidal ,  o  qual 
teve  ordem  que  com  o  seu  ter9o  e  parte  do  de  Joao 
Femandes  Vieira  commettessem  o  inimigo  pelo 
raso,  que  era  o  lado  esquerdo,  e  pelo  contra  lado 
D.  Antonio  Philippe  Camarao  com  seu  terco  de 
Indios.  Joao  Femandes  Vieira  foi  encarregado  de 
buscar  o  inimigo  pelo  alto  dos  monies,  e  por  seu 
contra  lado  Henrique  Dias  com  a  sua  gente.  0  ca- 
pitao  de  cavallos  Antonio  da  Silva  teve  ordem  d'a- 
cudir  onde  a  sua  assistencia  fosse  mais  necessaria. 
0  mestre  de  campo  general ,  depois  de  tudo  assim 
disposto,  ordenou  que  ao  primeiro  signal  se  avan- 
casse  ao  inimigo  por  entre  as  balas  de  sua  primeira 
carga,  at^  que  ao  segundo  se  disparassem  os  mos- 
quetes  da  nossa  parte  em  distancia  assim  propor- 
cionada^  que  se  nao  perdesse  tiro.  Tocou-se  a  in- 
vestir ;  mov6rao-se  uns  e  outros  esquadroes ;  com 
mais  ligeireza  os  Portuguezes,  porque  com  menos 
corpo  e  mais  espirito.  Recebeo-os  o  inimigo  com 
valor  e  disciplina ;  mas  nao  Ihes  retardou  o  passo, 
com  toda  a  resistencia,  nem  com  duas  cargas  d'ar- 
tilharia  e  mosquetaria  que  nelles  disparou.  Esque- 
cidos  do  perigo ,  attentos  a  invasao ,  rompiao  os 
nossos  por  nuvens  de  fumo  e  balas  que  escureciao 
o  ar^  sem  que  algum  levasse  a  arma  ao  rosto. 
Quando  ouvirao  o  signal  esperado,  que  se  deo  a 
tempo  que  a  proporcao  da  distancia  nao  deixou 
perder  tiro ,  derao  conformes  uma  carga  com  tal 
effeito,  que  a  turba^ao  e  desordem  dos  esquadroes 
contrarios  mostrirao  elaramente  que  pod^ra  mais 


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SOS  GAITtiarO  LDftltAltfAi 

a  pirda  que  a  ordcm*  PassoU'-ie  {>alavra  qtle  imre^^ 
tisaem  &  espada^  e  achou  a  vot  a  obediencia  Mb 
pToropia,  e  a  occasiao  (ao  opportuna^  que  em  brere 
tempo  txmipdrao  oe  esquadroes  itiimigoji ,  fazeudo 
cada  urn  dot  PortogueEM  catninho  tao  htgOj 
quauto  o  media  a  extensao  da  e^pada.  0  gentio 
alUado  oom  o  Flamengo^  vendo  que  nada  podia  re^ 
^iftlirao  furor  do6  nosso^,  roncebeo  tamanho  niedd, 
que  largandUi  ot  posiOB  e  as  arraas  se  pot  em  desa* 
tada  fiigida ;  e  ial  foi  seu  espanto^  que  no  ceulro 
doa  maios  se  uad  dava  por  seguro. 

IX«  Quasi  meia  hoi^a  sustentou  o  iuimtgo  a  re» 
siatenoia  em  duvidosa  bataiha ;  por(^m  aquelle  tempo 
que  sua  discipiina  e  seu  talor  o  teve  firme,  dverao 
oa  nosaos  para  os  cortar  uo  raso  e  no  moute,  oom 
taea  e  tao  pesados  golpe$,  que  primeiro  os  espantou 
o  eatrago  que  o  coudicto.  Yiao  ua  resistencia  a 
mot*te  cerlft)  e  forao  largando  o  campo,  e  dcsem- 
belmcatido  os  moutes  com  reiirada  mal  suecedida, 
porque  a  dis^posicao  das  ladeiras  os  submettia  de* 
baixo  das  espadas^  que  uelles  descari^^rao  com 
tao  alentado  pulso  que  se  oa6  via  distinccao  entre 
fei'ir  e  maiar.  Itlusti^  ^xemplo  davao  os  mestres  dt 
campo  Jofiio  Femandes  Yieira  e  Heurique  Dias  aos 
seus ;  ^  nao  era  menos  illustre  a  imita^ao  que  o  exem^ 
pte.  J4  nesie  tempo  o  Cortaf  nao  era  veneer,  senao 
de^tfuir ;  porque  nao  ha  via  Inimigo  que  o  pafe- 
c«8se,  seuao  na  reiirada. — Nao  anda^o  as  armaa 
menos  qiientes  na  campina,  otide  os  dous  toestres 
de  campo  lio  ganhando  terra  ao  inimigo,  que  die 
perdia,  mas  nao  a  discipliaa  nem  o  animo ;  a  desi* 
guaMade era dos  pufsos;  e  cOme9oa  a  ser  mafor  a 


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n 


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do  nutnefo^  porque  todos  os  FlamMigos ,  que  ven- 

€ido8  ckixavio  ob  tnotiies,  6e  forao  incorporando 

<M>ni  OS  seuB  que  pelejavio  no  mso.  O  inesnre  de 

eatopo  Jok>  FeraMMfed  Vieira,  que  Ifoes  Tinha  ti6 

alcAiice)  sem  nbaixar  a  ^pada ,  corrro  com  os  seus 

9oidados  a  unir-se  com  os  de  Andr^  Vidal  de  Ne- 

greiros,  t  assim  cafregMo  o  Flamengo,  que  co- 

nheceo  t^s  bra^s  pelos  golpes.  Siislbutirao  o  poste 

eofli  a  obstinacJio ,  e  nao  com  a  esperan^a ,  porque 

•e  faziao  roHo  fto  p^igo,  ei&o  tBonstratigidos  das  re^ 

prehenioes  e  amea^os  de  seuB  eabos,  que  os  obriga- 

t&o  com  a  iujutia  e  torn  o  exempio  ;  pdrAm  o  amor 

da  vida  e  o  horror  dos  morios  os  fez  esquecer  da  « 

obriga^o  e  da  ht^iti.  Aos  poucos  que  detinfaa  a 

multidao  (que  b  valor  fienhum)  (et  virar  as  costas 

O  capitao  Antonio  da  Silva,  que  chamado  da  ocCa- 

Biao  atudio  ao  Insar  do  combate^  rpmpendo  pelo 

inimtgo  com  o  Irllho,  e  com  a  laui^a ,  de  sorte  que 

feila  e  alropellaTa  rendidos  aos  que  s6  nas  armas 

pareciao  soldados.  3i  os  nossos  achavao  nos  inimi- 

gos  desvlt)  sem  rcparo,  macando  e  ferindo  sem  dis- 

liucc&o  de  oppostos  a  redendidos.  Cedeo  a  multidao 

ao  valor*  Nao  pod6rao  os  Holfcmdezes  supportar  o 

peso  de  nossas  armas  ;  perd^r&o  de  todo  a  obedieti- 

cia  e  a  discipilna ;  rotdS  e  desbaratados  se  poseiio 

eA  desordenada  fugtda ,  deixando-nos  no  campo  a 

artilbaria^  a  bagagena,  e  seu  estandarte  generals 

0  qual  tirou  das  Ui&os  de  f;eu  alferes  um  sargento 

do  terco  de  Joao  Fernandes  Vieira,  a  quem  o  apre- 

sentou ;  chamava-se  AfFonso  Rodrigues. 

X.  0  prazer  <iom  que  os  nossos  apellidavao  a 
Tlctoiia  foi  a  causa  de  que  o  inimigo  se  cobrasse 


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50/1  GASTRIOTO  LUSTTAMO. 

no  uso  de  sua  artiiharia ;  e  o  houvera  de  ser  de 
nossa  perdi^ao.  A  nenhum  deixou  a  alegiia ,  nem 
para  retirar,  nem  para  guamecer  a  artiiharia ,  de 
que  no8  fez  senhores  a  batalha,  e  muito  menos  para 
acudir  e  atalhar  a  desordem  em  que  os  soldados  de 
Camarao  e  de  Henrique  Dias  se  engolfaiio  em  rou- 
bar ;  e  como  ua  fortifica^ao  da  plata  forma ,  d'onde 
jogavao  as  pe9aSy  estava  o  recheio  do  exercito,  era  o 
roubo  no  mesmo  lugar  onde  se  havia  de  por  a 
guarda ;  e  parecia  guarda  o  que  era  rapina.  Roto, 
como  temos  dito,  p  Flamengo,  fiigiao  os  contrarios 
para  onde  os  levava  o  temor  e  a  esperanca ;  uma 
grande  partida  foi^osteando  o  monte,  aqual  ata- 
Ihadados  nossos.se  deitou  aoalagadico;  pordm  uma 
cargademosquetaria,  que  os  alcan^ou  quasisubmer- 
gidos  fez  com  que  suas  Tidas  fossem  despojo  de  dous 
elementos.  Qs  de  outra  partida,  que  com  as  azas 
do  temor  fogiao  por  aquella  faxa  de  terra^  que  ficava 
entre  o  alagadi^o  e  o  monte,  seguidos^  deixarao  as 
armas^  e  alcancados  as  vidas ,  sem  haver  alguma  a 
que  perdoasse  a  nossa  espada.  Forao  tantos  os  mor- 
tos  em  uma  e  outra  parte,  que  dava  seu  aangue  ou- 
tro  parecer  i  terra,  e  outra  c6r  a  agoa.  Ja  nao 
havia  respiracao  com  alentos  para  seguir ;  ja  nao 
havia  bra^o  com  for9as  para  matar.  £spantou-se 
entao  a  experiencia ,  como  agora  a  consideragao , 
do  trabalho  que  support^ao  os  Portuguezes  neste 
dia;  pois  quando  o  fim  do  conflicto  os  convidava 
com  0  descan^o,  entao  o  rebate  os  mettia  em  nova 
batalha. 

XI.  Escondido  aos  olhos,  e  as  noticias  da  nossa 
genie,  tinha  o  Flamengo  n'um  valie,  que  faziaoas 


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GASTRIOTO  LUSTTANa  505 

fraldas  de  dous  montes,  um  esquadrao  de  reserva, 
composto  de  doze  companhias,  commandado  por 
Henrique  Hus,  mandado  vir  do  Arrecife  para  este 
fim^  como  ja  dissemos;  com  o  qual  se  encorporarao 
todos  quantos  Hollandezes  o  conflicto  deixou  com 
vida.  Seguia-os  o  nosso  alcance;  Henrique  Hus, 
que  vio  em  uns  e  outros  igual  desordem,  nao  per- 
deo  a  accasiao  que  Ihe  offerecia  a  fortuna.  Saio  a 
encontrar  e  a  rebater  o  impeto  do  alcance ;  sobio 
o  monte,  cobrou  a  artilharia  perdida^  e  favorecido 
d'ella  foi  carregando  de  pesados  golpes  />  ter^o  de 
Henrique  Dias,  que  Ihe  fazia  rosto  com  militar  re- 
tirada ;  foi  soccorrido  d'algumas  companhias  y  que 
a  caso  o  pod^rao  fazer^  por^m  nao  era  bastante  tao 
pequena  opposi^ao  para  tamanho  poder ;  supposto 
que  Ihe  detinhao  o  curso  (  com  que  jd  descia  pelo 
monte,  dando  e  recebendo  cargas^  com  disciplina  e 
acordo)  nao  Ihe  cortavao  o  passo. 

XII.  Os  nossos  mestres  de  campo^  que  no  baixo 
ouvirao  o  estrondo  dos  tiros ,  levantarao  os  olhos , 
virao  a  peleja^  mas  nao  pod^rao  conhecer  (pela  dis- 
tancia)  de  que  armas  era  o  melhor  partido ;  antes 
que  entendessem  que  os  sens  erao  os  que  necessita- 
vao  de  soccorro,  osavancou  pelo  raso  Sisgismundo, 
com  toda  sua  gente  novamente  formada,  e  com 
nova  furia  j  que  brevemente  Ihes  fez  quebrar  a  va- 
lentia  com  que  os  nossos  o  forao  receber,  e  foi  tal  a 
opposi9ao  que  presumio  Sisgismundo  que^  ou  a 
nossa  gente  beb^ra  novos  alentos  no  trabalho  de 
todo  aquelle  dia,  ou  se  havia  poupado  s6  para 
aquella  bora.  —  Aos  estunulos  da  occasiao  sobe- 
javao  os  do  exemplo  com  que  Joao  Fernandes  Vieira, 


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509  CASnKftO  LUSIt  AN6. 

Andri  Vidal  de  Ncgrelr6s,  e  os  soldados  de  seufe 
tercos  avanc&rao  ao  Flanjengo,  buscando  os  poslos 
tnais  arriscados.  Na  competencia  da  ousadia  6e  mos- 
trava  a  do  valor;  ^  todos  exortava  a  visu,  a  poucos 
a  inveja,  porque  nao  houve  soldado  que  nao  des- 
prezasse  6  perigo.  Os  Uollandezes  resolulos  etn 
morrer  on  vemer  deseslimavao  a  vida :  nas  pontes 
de  nossas  espadas  os  mettla  a  coIerA  ;  por  ellas  bus- 
cavao  a  vinganca,  e  nellas  achavao  o  castigo.  Caiao 
OS  primeiros,  e  logo  os  segundos  substituiao  o  lugar. 
SisgismurTdo  impaciente  dese  verbaiido,  presagO 
de  sua  desgraca ,  accusava  a  fort  una »  fnas  nao 
abiii^ava  a  e.^pada;  com  ella  na  mao  feria  e  exor- 
tava,  animando  os  seus  com  ^  lembtanca  da  honra 
e  da  injuria ;  estremos  com  que  os  persuadio  a  que 
n*esta  occaslao  obrassem  como  valentes ;  e  certo , 
que  nenhum  dia  mereceo  &  Tama  mais  esclarecido 
pregao  de  general  e  de  soldado.  —  Perfiava  o  cun- 
flicto,  desprezando-se  o  espanto  que  causava  a  lodos 
o  confuso  eslrondo  dos  insCrumentos  marciaes.  0 
retumbar  das  pecas,  o  fiizilar  dos  tiros,  6  retinir 
dos  golpes,  OS  gritos  dos  cabos  (sem  o  gemer  dos 
feridos  e  dos  agonizantes ) ,  causava  uma  pavorosa 
disonancla.  0  fumo  da  polvora ,  o  p6  da  terra  nao 
deixava  distinguir  amigos  de  inimigos,  porque  ti- 
ravao  a  jurisdiccao  aos  olhos.  Umas  com  outras  se 
moslravao  as  armas,  porque  s6  com  a  luz  dos  tiros 
se  deixavao  ver  as  espadas ;  era  tamanha  a  conFusJio 
que  pelos  golpes  e  pelos  pulsos  se  conheciao  os 
bracos,  e  nao  pelas  pessoas.  A  iienhum  deixava  a 
vizinhan^a  a  escolha,  e  cada  qual  se  valia  da  arma 
que  Ihe  permittia  a  sua  distancia  ^  e  talvez  inuteis 


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cMfOjan  umiMOk  597 

aindt  tt  inais  curtos ,  se  tinhto  A  b#a^9 ;  apromt-^ 
taado-Be  o  desaiino  d'unhai  e  dfntest  A  tnuUidao 
dos  corpoB  morlos  (que  para  UM era  cdikkulO)  para 
outroa  yallo)  a  todoi  irritata,  a  nenhutn  compdn- 
gia.  0  menos  numero  dos  PorttigueM$  Ihes  tAo 
deixuva  cair  os  bracoa,  porque  animados  do  invent 
civeis  espiritoB  se  mooCravao  inoanaatelSi 

XIU.  Aoe  doua  Hercutet  portuguetes  Joao  Fer^ 
nandes  Vieira^  e  Andrti  Vidal  de  Negreiroa  mo 
pode  chegar  entao^  nem  a  emulacaO  fiem  a  itiveja: 
suaa  proesas  callou  haqu^li«  dia  a  admirA^o,  para 
agora  aa  ouvir  a  incredulidade;  pof6m  dissimula-as 
a.peiinay  porque  a  Hmila^  do  vdo  njto  chega  a  t6o 
alio  assutnpto.  Quanto  obrirao  e  quanto  merec^o 
si  pen*  infereneiaB  se  po4er4  alcan^r  t  cotii^id<ire>se 
a  duracao  do  perigo ,  e  logo  «e  ver4  0  muito  que 
obrou  o  eaforco.  Ao  m«aire  de  eampo  Joio  Femati^ 
dea  Yieira  chegou  Urn  talente  Hollatidet  a  p^ar 
com  a  mao  eaquerda  naa  redeas  do  cavalto,  e  le** 
vantatido  o  braco  direito  para  o  matar  de  urn  golpe, 
antes  que  deaae  a  (vrida  recebeo  Uttift  ctnilada,  que 
juntamenle  o  partio  e  o  apartou.  Era  maid  fbr^so 
o  bra^o,  foi  mak  ligeiro  o  movimento.  Assim  o 
achou  lodo  o  tempo  do  coitflicto  entre  as  espadad 
eaa  balas^  aem  quealgum  d'estes  maieriae^  o  feri^ae 
<[iie  ae  o  nao  temiao ,  parece  que  o  rcspeitavao.  Dm 
pelouro  Ihe  furou  a  orelha  do  cavallo,  nao  pelo 
ferir,  senao  pelo  galautear.  Etn  nada  disimilhante 
vio  a  occasiao  ao  me^fe  de  campo  Andr6  Vidal  de 
NegreiroB.  Ferio-lhe  tim*  bala  o  cavallo,  em  que 
nKmtava,  passou-se  a  outro ,  e  deixou  o  ferido  para 
o  var  deapedii^do  d'otttm  bala^  t  nelle  o  quMitD 


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SOS  GAfiTUOIO  UJSIXAlia 

orespeitava  a  fortuna.  A  um  e  outro  acertarao 
muitos  pelouros,  que  pararao  nos  vestidos.  Unia- 
08  a  amizade,  e  nao  os  sabia  distinguir  a  sorie. 
•  XIV.  0  mestre  de  campo  general,  que  pelejava 
com  OS  bra^os  de  todos ,  e  a  todos  assistia  com  os 
soccorros  e  com  as  ordens ,  vio  que  no  mais  tra- 
vado  da  pendencia  vinha  Henrique  Hus  carregando 
a  Henrique  Dias  pela  ladeira  do  monte ;  conheceo  que 
o  pensamento  do  Hollandez  era  lancar-nos  fora  do 
boqueiraOy  onde pelejava  a  maior  forcados  exercitos; 
fez  advertencia  a  Antonio  Dias  Cardozo  do  intento 
e  do  perigo ;  o  qual  o  atalhou  com  tal  disposicao, 
que  bem  de  pressa  reprimioaconfian^a  hollandeza. 
—  Sisgismundo,  que  a  ludo  attendia,  vendo  que 
pela  vaniagem  do  sitio  nao  podia  veneer  pela  forga^ 
determinou  empregar  a  arte.  Fez  pe  atraz,  tocando 
a  retirar;  formou  de  novo  os  sens,  c  mandou  en- 
vestir  o  boqueirao.  Travou-se  de  novo  a  luta,  e  tao 
encarni9ada  de  parte  a  parte ,  que  mais  pareciao 
feras  que  bomens  os  que  defendiao  e  os  que  ataca- 
vao.  Em  ganbar  e  defender  o  boqueirao  consistia  a 
victoria  d'uma  e  outra  gente ;  ambas  desprezavao 
o  perigo  por  conseguir  o  intento.  Cinco  boras  bavia 
que  durava  a  batalba ,  e  nellas  se  virao  os  nossos 
algumas  vezes  tao  apertados ,  que  se  temSrao  per- 
didos ;  por^m  aquelles  beroes  invenciveis  Joao  Fer- 
nandes  Vieira  e  Andr^  Vidal  de  Negreiros ,  com  a 
propriedade  de  raios ,  buscavao  a  resistencia  mais 
dura  para  romperem  mais  viofentos;  por  tudo  rom- 
piao  sem  perderem  tempo  nem  golpe ,  e  aos  seus 
inspiravao  novos  alentos ,  causando  aos  inimigos 
terror  o  espanto.  Ja  o  inimigo,  cortado  do  ferro  e 


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GASTRIOrO  LUSITANO.  509 

do  medo,  com  tibieza  tinha  perdido  a  obediencia ; 
nem  a  gritos,  nem  a  golpes  podiao  Sisgismundo 
e  seus  cabos  faz^l-os  entrar  no  conflicto.  Sem 
tocar  a  retirar,  o  fizerao  todos  os  seus  a  tempo , 
que  andavao  as  annas  e  os  mosquetes  tao  esquen- 
tados ,  que  nem  as  maos  os  podiao  soffrer,  nem  os 
bracos  os  podiao  sustentar.  Com  muita  difficuldade 
pode  atalhar  o  general  hoUandez  a  fuga  dos  seus. 
A  proximidade  da  noite  Ihe  foi  favoravel  para  for- 
mar  um  batalhao  de  saos  e  feridos;  e  o  cancasso 
em  que  se  achavao  os  nossos  Ihe  deo  occasiao  para 
nao  ser  de  todo  destruido  no  alcance. 

XV.  A  nova  forma  que  Sisgismundo  daya  aos 
seus  fazia  crer  aos  nossos  que  ainda  tinhao  inimigos 
que  veneer ;  para  o  que ,  sem  largarem  as  armas 
nem  os  postos ,  esperavao  o  combate.  Era  no  fim 
da  tarde^  e  a  continuacao  do  trabalho  e  falta  de 
refeicao  os  tinha  quebrantados  e  desfallecidos  nas 
for^as  I  ainda  que  inteiros  no  animos.  Acudio-se  a 
cada  um  com  uma  pequena  quantidade  de  assucar 
desfeito  em  agoa^  soccorro  mais  para  refrescar  que 
para  refazer;  fraco,  mas  sufBciente  remedio  para 
corpos  que  se  alimentavao  de  tamanhos  espiritos. 
—  Em  trocos  os  tinha  partidos  a  ordem  dos  mes- 
tres  de  campo,  com  prematica^  que  dada  a  primeira 
carga ,  se  rompesse  &  espada.  Acabava-se  o  dia  e  a 
paciencia  dos  nossos ;  com  militares  desafios  pro- 
vocarao  ao  inimigo  uma  e  muitas  ve^es  a  acceitar 
bataiha ;  por^m  alheio  de  similhante  pensamento , 
como  se  fora  iusensivel ,  se  conservava  immovel , 
poitjue  furtado  a  nossos  olhos  cobria  com  o  corpo 
de  sua  gente  a  diligencia  de  retirar  os  feridos  mais 


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110  QOTUOIO  iOUTAIIO. 

p«ri({OiM  para  *  Barrett ;  e  forio  tantos  qw  oarro- 
girno  einoo  barcaa  em  repetida»  viagen^  da£arr«ta 
para  o  Arreoife,  Entrou  a  noite  com  tamanha  lem- 
pealade  de  agoa ,  trovow  ©  veoto ,  qw  parecU 
repetir-ae  epire  oa  elemeQioa  o  paatado  coaflicto. 
Nao  per<Jko  tempo  Si^giamuDdoi  maodou  mil  aol- 
dadoa  qu^  ae  adiantaasem  a  guarneoer  o  caminho 
de  emboscadas,  para  dafender^m  a  marcba,  em 
oaao  que  oa  oosaQS  Ibe  des^em  aloance ;  eoberio  do 
eacuro  $  e  acompaohado  do  silencio  ae  po«  em  fu- 
gida  pela  meia  noite.  A  caso  o  piclrao  yinte  90U 
dados  pela  retaguarda  (que  para  o  oapiar  no  poato 
aairao  de  noaao  alojamento);  aoguinio^lbeo  trillion  e 
imagtuando  que  luaiior  poder  o  oarreg^va^  fogiocom 
tal  deaatixu>9  que  deijLou  muitos  feridoa,  9  as  pou- 
oas  armaa  que  levava,  para  camiohar  mais  ligeiro. 
XVI.  Com  a  iuK  da  manha  aairao  0$  moatres  de 
campo  Joao  Fernandas  Yifiira  e  Andre  Vidal  de  Ne- 
greiroa  a  eerufioar^o,  ou  da  fuga.  ou  da  Fdrma  do 
inimigo.  Aehirao  a  campanha  coberCa  de  despojos 
ifim  mimigQs^  e deata  vea  a  victoria  sem batalha, 
Q  gosto  aem  reo^iQ,  0  tnumpho  sem  contrario.  Cor- 
r^rao  a  congratular«ae  eom  0  meatre  de  oampo  ge- 
neral Franciaoo  Barreto  da  Mene^ea,  a  quern  se 
deviao  oa  primeiros  vivaS)  pelo  que  nesta  occaaiao 
obrara  sen  valor  e  aua  eomprehensao.  Aeclamou*ae 
par  todo  o  al(\jamento  a  victoria ,  com  todaa  aa  dfh 
menalra^oea  de  alegria,  a  de  gratiOcacao  a  Deos, 
ooafeaaando  Fecfbdl**a  da  mao  do  Aliiasimo.  Correo 
a,1[iova  por  todo  aquelle  deatricto,  e  o  mesmo  aWo- 
rooQ  que  a  oria  a  duvidava  (coodi^ao,  que  trascom- 
lige  a  peaae  do  que  nuito  ae  deaeja  quando  maia  ae 


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duYida),  AqiieUes  inoradorea,  qw  poucas  hora^ 
antes  W  consideravao  coudemnado^  &  morle  e  ao 
^rilho,  vendo-se  com  Ubefdade  certa,  eqgrandeciao 
a  mis^ricordia  divipa,  qoncqrrendo  para  wmas  raes- 
inas  lagriipas  a  compunc^aQ  e  a  alegria,  Desceiio 
do$  inato3  os  mais  vizinhos  a  dar  e  a  receber  para^ 
bem  de  tamapha  dita,  que  Ibes  augiDentava  a  vista 
do  perigo  na  horribilidade  do  estrago.  Nao  se  via 
pelo  campo  da  batalba  outra  cousa  inais  que  armas 
destrofadas,  e  corpos  mortos  e  digfonn^s,  ^avoltos 
em  aeu  mesmo  sangue,  empo^ado  em  muitas  part^s^ 
o  qual  a  terra  ja  nao  bebia  por  congelado  ;  espec- 
taeulo  tao  borreadO|  qm  o  via  a  lastima  e$queclda 
da  offensa. 

XVII.  PeixQU  o  inimigo  no  campo  mil  e  du- 
zentos  morlos,  enlre  elles  dous  coronei^  (H\i§  e 
Vanelles);  cento  e  oitenta  ofliciaes^  sew  entrarem 
p'e^ta  conta  os  que  e^ond^rao  os  matos.  que  forao 
muitos ,  e  muitos  aquelles  que  nor  fajta  de  ^ura 
morr^o  na  Barreta  e  no  Arrepife,  JJao  so  d4  pu- 
naero  aos  feridos,  porque  a  caufella  05  nao  deij^oi) 
contar  j  o§  de  maior  posto  forao  o  general  Sisgis- 
mundq  por  urn  artelho ,  q  cpronei  Autbim  pelo 
pe§co90,  e  owtros  olficiaes  menqres.  Dos  soldadog, 
a  poucos  deixou  de  assignalar  Q.  no§§o  ferro,  0§ 
desp<]yos  nao  parecerao  de  exercito  gqerreirp,  senao 
de  cidade  pacifica,  Quantidade  de  ouro  e  prata  em 
moeda  e  pecas ;  cavallos  ajaezadqs  com  riqueza  e 
primor;  vestidosdeguerra  e  gala;  seda3  d'arlifiqiQ 
e  valor ;  cbapeo^  e  plumas  d'estima;  sedas  e  olan- 
das  em  roupa  e  em  pe9a|  niuita  copia;  muitos  ea- 
paduxii  peito»,  eapaldare$>  e  eapacetes  de  ]^fii^^  pela 


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512  GASTRIOTO  LUSITAlta 

tempera  e  pelas  guamicoes :  doas  pecas  de  bronze, 
com  annas  de  fogo  e  ferro  em  grande  quantidade; 
muni9oe8  de  toda  a  sorte,  em  numero  crescido; 
mantimentos  para  o  sustento  e  para  o  regalo  em 
muita  abundancia*;  uma  botica  de  toda  a  abmi- 
dancia  de  medicamentos ;  ultimamente  uma  somma 
grande  de  varias  prisoes  para  maniatar  captivos  y 
que  em  sua  determinacao  haviao  de  ser  os  soldados 
e  moradores^  a  que  sua  vontade  concedesse  a  vida 
(^mais  alta  Providencia  trocou  as  sortes).  Entre  os 
prisioneiros  foi  o  seu  coronel  Kever  o  principal. 
Gustou-nos  a  victoria  oitenta  e  quatro  mortos,  sendo 
d'este  numero  os  capitaes  Joao  Rodrigues,  eDomin- 
gos  da  Costa,  e  o  alferes  Manoel  Ferreira  de  Lemos, 
que  viera  da-Bahia  com  um  soccorro  de  polrora. 
Os  feridos  pass^rao  de  quatro  centos,  sendo  a  maior 
parte  do  terco  de  Joao  Femandes  Vieira.  Concedeo- 
nos  o  ceo  esta  victoria  em  o  Domingo  da  Pascoella 
19de  Abrilde1648. 

XYIII.  Os  mestres  de  campo,  officiaes,  soldados 
e  moradores,  que  se  acharao  na  batalha,  derao 
novos  empregos  a  fama ;  a  todos  deve  a  patria  gra- 
tas  memorias ,  e  a  monarchia  incorruptiveis  esta- 
tuas.  0  mestre  de  campo  general  Francisco  Barreto 
de  Menezes  nada  iicou  devendo  nem  a  seu  sangue , 
nem  a  nossa  esperanca.  Joao  Femandes  Vieira ,  e 
Andr^  Vidal  de  Negreiros  venc^rao  nesta  oecasiao 
o  impossivel ,  de  fazerem  maiores  seus  nomes.  Os 
governadores  de  Indios  e  Negros,  D.  Antonio 
Philippe  Camaraoy  e  Henrique  Dias  fizerao  co- 
nhecer  ao  mundo  que  o  valor  nao  6  heran^a  senao 
excellencia.  0  sargento  maior  Antonio  Dias  Car- 


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CASTRIOTO  iDSITiMO.  51S 

iJoqoimmDrteUzoa  nesta  occa»aosua  capaeidade  a 
aeu  bia^«  Os  tenentes  generaes  Antonio  de  Freita^ 
da  Silva  e  Philippe  Bandeira  de  Mello  mostxiiio 
quanto  seu  merecimeuto  se  adiantava  a  sua  opiniaot 
Os  capitees  e  officiaes  menores  ensinarao  a  todoi 
como  em  uma  mesma  mao  cahiao  as  armas  e  as  in-^ 
signias.  Os  nomes  d'algvins  deixou  entao  de  public 
car  o  descuido  y  e  agora  o  tempo ;  retiremos  os  que 
nomeou  a  lembran^a*  Do  ter^o  de  Joao  Fernandez 
Vieira  forao  os  capitaes  Antonio  de  Castro,  Amaro 
Cordeiroi  Antonio  de  Roeba  Damas,  Antonio  Bor-^ 
ges  Ochoa,  Affonso  d' Albuquerque^  Antonio  Ro^ 
drigues  Yidal,  Bertholomeu  Soares  Ganba,  Braz  da 
Kocha  y  Braz  de  Barros  Teixeira^  Cosme  do  Rego^ 
DomingosFerreira^  Francisco  Berenguer,  Francisco 
de  Lisboa,  Francisco  Barreiros,  Gregorio  Fragozo^ 
Joao  Soares  d' Albuquerque^  Joao  de  Pontes,  Manoel 
Moniz,  Manoel  d'Abreu,  Manoel  Lopes,  Paulo 
Teixeira^  Philippe  Ferreira^  Sebasliao  Ferreira  ^ 
Vicente  Curado ;  e  Domingos  da  Costa  e  Joao  Ro« 
drigues,  que  morr^rao  na  batalha.  Do  ter9o  de  An* 
drd  Vidal  fqrao  os  capitaes  Antonio  Curado  Vidal , 
Antonio  Rodrigues  Franca,  Antonio  daSilva^  Ama* 
dor  Rodrigoes,  Antonio  Dias  Santiago,  Francisco 
daRocha,  Joao  Barboza  Pinto,  Joao  Lopes,  Lou- 
renco  Carneiro,  Manoel  de  Aguiar,  Pedro  Caval*- 
canti  d'Albuquerque ;  capitaes  de  cavallos  Antonio 
da  Silva,  e  seu  tenente  Domingos  Gomes  de  Brito . 
XIX.  Pelas  maos  da  incredulidade  se  derao  e  re* 
ceb^ao  as  novas  da  victM^ia  na  Bahia ;  como  sonho 
as  avaliava  quern  com  maisatten^ao  asouvia,  at^  que 
com  certeza  as  divulgou  o  conde  de  Villa-Pouca, 
h  33 


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Sift  •  OAdTRlOM  LtmitAllO. 

que  entio  gowamava  o  Estiuh),  per  cot^isio  quetev^ 
de  Zenobio  Achioli ,  a  quern  asmn  a  orden^ra  o 
mestre  dd  campo  general  Frandsco  Barreto  de  Me-- 
nezes,  remettendo^lhe  por  esta  via^  com  algumaa 
handehras  hoUandezas,  od  tnais  certos  testemimhos 
da  vefdade.  F6ra  6  auccesso  Uk>  aiheiodaesperan^a 
de  todod,  e  do  conceito  de  Antonio  Telles,  que  in- 
formado  na  desigualdade  do  poder  d'umas  e  outras 
armas,  tinha  assentado  comsigo,  como  por  impoa* 
sivel  deixar  de  yencer  o  Flamengo ,  e  tao  firme 
estaya  nesta  opiniao^  que  mandAra  ao  cafAtao  Pe^ 
dro  de  Miranda  com  duzentos  soldados,  em  cinoo 
companhias,  que  fosse  assegurar  a  passagem  do 
Rio  de  Sao  Franoidco  j  para  que  estivesse  franca  a 
gente  que  podesse  escapar  das  maos  do  Flamengo, 
e  Tiesse  f ogindo  para  a  Bahia.  Quanto  mais  inopi«- 
nada  foi  a  victoria,  tanto  maid  festejadafoi  do  conde 
general  de  toda  a  armada,  soldados,  e  povo;  en- 
chendo  os  ares  de  vivas,  as  rnns  de  festas,  e  os 
templos  d^  lagritnas,  com  que  gostosos  e  compun*- 
gidos  tribute vao  a  Deos  graicas  de  tamanho  bene- 
ficio.  0  mesmo  eflfeito  causou  a  nova  em  todas  as 
povoaeoes  do  Estado. 

XX.  Depois  de  se  p6r  ^n  arrecadacao  tudo  que 
do  despojo  perlencia  ao  ftsco ,  e  depois  de  enterra- 
dos  OS  mortos  e  curados  do  modo  possivel  os  fori- 
doi,  tudo  ordenado  do  melhor  modo  possivel ,  e  a 
gente  refrescada,  marchou  o  nosso  exercilo  para  o 
EngenboNovo,  sittiado  dosmontesGuararapespara 
o  none ,  no  caminbo  do  Arraial^  onde  fizerao  alio. 
Em  20  de  Abril  entrou  Sisgismundo  no  Arredfe, 
onde  se  vio  livre,  mas  nao  desassombrado  de  nos* 


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^5  Ttrrtii^  e  de  stia  pttd^  j  l^tt^  Ihe  dofa^bti  t  wiaA^ 
menito  cotii-os  pratitos,  que  caus6rao  as  to6rtes  e 
ferrdas  nSKjuelle  poi^o,  a  onde  nio  houvc  pe^oa  a 
qtienl  tnho  alcancasse  a  magoa  t  tji  Idto.  Para  levio^ 
tar  ds  animo^  abatidos  e  qud!tt)sos  fntefitmi  Si^a^ 
mundo,  d«  accordo  com  seus  cabos,  ibniaratllhi 
de  Olhida;  o  qu6  ccmsegatrao  facilmtote,  porqti6  oa 
habitantes  a  havi&o  abandcnado ,  e  os  p6ueo8  8ol«* 
dados  que  guarueoiao  o  reduto,  que  cb^tnavao  a  gua-^ 
rita  de  JoJo  d* Albuquerque,  vendo  a  desigualdade 
das  forcas,  ae  retirarao.  —  Logb  que  esia  notidii 
chegou  ao  Etigenho  Novo,  mandou  o  mcstre  tf* 
campo  general  tocar  arma ,  e  n6  mesmo  dia  tnfcir- 
chou  0  exercito  para  o  Arraial ;  mas  ahl  enoontroti 
outra  nova  nJo  menos  desagradavel  que  a  da  pefdA 
de  Ollnda.  Aquella  novaforca,  ehamadk  da  B^taria, 
em  que  se  fuudava  toda  a  esperanca  de  se  ganhar  o 
ArreCife,  pelo  damno  irreparavel  que  d'ella  receUtl 
tbdas  as  boras,  achirao  os  nossos  perdida,  e  oceu^ 
pada  do  inlmigo,  seirt,  ai^  aqiieTla bora,  se  alcancar 
o  como,  nem  o  quanda,  nem  saberem  atiuaf,  se  o 
cbam^ra  o  aviso,  se  o  desemparo.  Soube-se  d^is 
que  o  capit&o ,  aquem  se  fidra  a  resistencia,  e  que 
tinba  gente  bastante  para  reslstir  ao  ataque,  se  re-' 
tirira  sem  combater.  Foi  por  tanto  mettldo  em 
conselbo  de  gucrra,  e  alndi  que  absolvjdo  ha  sen-" 
tenca,  mmea  ficou  sua  culpa  bem  timada  na  opi- 
niito  do  vnlgo. 

XXI.  Magoados  os  nossos  eabos  maiores  d^  tantd 
maisinfelice,  quanto  menos  esperadoacontecittieiiU), 
tratarao  de  empenbar  o  resto  para  Ihe  cor  tar  as  es- 
perancas  da  dha  ;  assent4riiaentre  si  que  a  villa  (to 


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Olinda  deyia  de  ser  reganluda  qaaato  antes.  Com 
e0eito  em  22  d' Abril  «aio  do  Arrraial  o  capitao  Bras 
de.  Barrot  com  trezenlos  soldados,  com  ordemde 
ganhar  a  pra^aao  inimigo  do  melhor  modoque  po- 
desae.  Marcharao  os  nossot  f urtiYamente,  e  chegarao 
j4  de  aoite  a  um  sitio,  meialegoa  da  villa,  que  cfaa- 
maYM  de  Antonio  de  Sa  da  Maia ;  com  boas  senli- 
nellas  e  praticos  descobridores  do  campo  $e  aloj^ 
xho  neUe.  Em  a  seguinte  madrugada  amanhec^iio 
08  noasos  sobre  a  yilla.  Mandou  o  capitao  Barros  a 
dous  soldados  destros  nas.  ruas  que  explorassem  o 
que  na  povoafao  havia ;  suocedeo  que  na  rua  de 
Sao  Pedro  derao  de  rosto  com  as  sentinellas  con- 
trarias;  as  quaes  vendo-se  assaltadas,  tocarao  a  re- 
bate com  tiros  e  vozes,  e  de  corrida  tomarao  a  fc- 
reda  que  guia  para  a  igreja  de  Sao  Bento,  seguidos 
de  nossas  espias  at^  a  fortifica^ao  de  Joao  d' Albu- 
querque, onde  se  alojava  o  capitao  NicoUs  com  seis 
centos  homeos.  —  Ouvio  'Bras  de  Barros  os  tiros 
e  vozes  do  rebate  y  suspeitou  o  empenho  das  sen- 
tinellas, apressou  a  marcha,  chegou  a  vista  do  ini^ 
migo,  e  de  passo  Ihe  deo  algumas  cargas;  metteose 
debaixo  desua  artilaria,  cometteoo  assalto,  dizen- 
do  aos  sens  :  «  Avanca  I  avan^a !  a  espada,  filhos.  m 
Vozes  forao  estas  que  assim  corlarao  o  inimigo 
comb  se  fora  o  mesmo  ferro.  Os  que  se  alojavao 
fora  da  fortifica^ao  fugirao  com  desordem ;  os  que 
dentro  a  guarne9iao,  com  desatino ;  deixando-nos 
na  mao  o  reduto  e  a  trincheira,  como  se  para  este 
^  a  gqardarao.  Entrarao  os  nossos ,  e  voltarao 
sobre  os  HoUandezes  a  artilharia  do  forte,  e  com 
as  balas  os  buscarao  e  seguirao  at^  onde  cursavao 


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CASTRIOTO  LUSTTAMa  511 

as  pecas.  Foi  em  seu  alcance  urn  troco  de  soldados 
nosdosy  e  tantos  matava  o  furor  quantos  akan^ava 
o  braco ;  nao  houve  inimigo  que  se  lembrasse  da 
resistencia^  nem  do  reparo  ;  assim  recebiao  o  golpe 
como  se  estiverao  obrigados  a  nao  defender  a  vida; 
todos  pareciao  Hollandezes;  sem  algum  mostrar  que 
era  inimigo.  Goniinuou  o  estrago  a(^  onde-chegou 
o  alento;  fahos  d'elle  fizerao  os  nossos  alto  no  meio 
da  praia,  nao  s6  para  descan^o^  senao  tambem  para 
desafio.  Sairao  do  Arrecife  duas  partidas  de  sol- 
dados  para  soccorrer  o  Hollandez^  mas  nao  se  atre- 
T^rao  a  provar  a  mao  com  os  nossos,  e  se  content 
tarao  em  recolher  os  corpos  mortos  dos  seus>  que 
cafrao  mais  perto  da  fortaleza.  Cento  e  sessenta  Fla^ 
mengos  deixou  estirados  no  campo  o  chumbo  e  o 
ferro ;  e  a  este  respeito  se  podem  or9ar  os  feridos. 
Custou*nos  este  desejado  successo  sette  feridos;  o 
de  mais  conta  e  de  mais  perigo  foi  o  capitao  Ma^ 
theus  Fagundes,  passado  d'uma  bala  pelosjoelhos. 
Deixou*nos  o  Flamengo  quasi  todas  as  annas ;  de 
muni^oes,  mantimentos  e  moveis  nao  levou  cousa 
alguma;  nao  porque  o  cegasse  a  ira,  senao  porque 
o  aconselhou  o  medo*  -^ 

XXII.  Em  28  do  Abril  mandou  Sisgismimdo 
pela  estancia  das  Salinas  um  bolatim  e  carta,  em 
que  pedia  os  prisioneiros ,  deixando  em  nossa 
eleicao  os  partidos ;  com  advertenda  que  as  mes^ 
mas  condicoes  se  acbariao  da  sua  parte,  quando  se 
trocdsse  a  fortuna.  Ordenou-se  ao  bolatim  que  en- 
tregasse  a  carta,  sem  Ihe  permiltirem  que  entrasse 
na  estancia,  e  disserao-lhe  de  piahivra  que  a  sen 
tempo  86  re^Hmderia.  0  coronel  Kever,  que  era  o 


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5I§  oaiaiOTO  UMTiJiO. 

r$tfi  a(4  que  t;^>uve  om^buiq  di  w  ren>^er  a  Bahift) 
edapoU para  o  mw>.  0  nais  que  o  UoUaod^  Ihe 
pdd^  aloan^,  por  aataOf  foi  lioQU^a  para  que  urn 
gmtilhomew  da  wa  oa&a  o  sQrvisie  ua  prisao.  £ra 
o  coronal  pessoa  de  qualidade,  a  do  eadiWiQao  autre 
OS  saii9.-^£atre  aa  uaoa  da  armada  hpUaadezai  que 
ae  dervotarao  oa  canal,  tom^rao  alguiMs  differeutes 
ponoii  M4a  aa  rapararao^  e  d€|>oift  salrao  em  de- 
xxumdA  do  Bvaiil.  £m  uiw  d'ellaanaYi^a^a  um  c6- 
ropel  ^  homem  da  grandii  4)pituao  por  dotes  da 
jiatur^exa  e  da  fortuoa  (o  desc^ido  e  o  tempo  iios 
roubpu  o  name  }^  Com  a,lguBia9  dw  ombarca^oea 
de^rradas  qua  reoolheo  aportou  ua  barra  do  Ar^ 
Recife  palon  idtimos  di^s  de  Abril  d'aste  pre$eiite 
anno*  Foi  recabido  com  meaos  alvoro^o  que  das^ 
maid*  Iqlbrpaou^e  da  cauia ,  e  esquecido  da  com*- 
paixao  $  caosurov  a  fraqueza  de  todos  com  e$cs»- 
dalaia  arroganoia*  Chagou  a  vi^  deSi$giwiuAdO| 
gastou  poucas  palavraa  de  comprimfeuto ,  e  pa^iou 
logo  aa  da  altive^a  j  dueodo  qua  nunca  imaginara 
c&peral^  maior  ^rmqnta  up  porto  que  oa  viagem« 
Com  modera^ao  de  entendido  Iha  respondeo  Sisgis-^ 
Auudo  J  a  depow  de  Ihe  panderar  as  ciraumstaucias 
que  tiubaa  prodwudo  aqualla  deea$trat  diase4lie 
que  ae  qu^ria  conhecer  oa  «aldadas  qua  tiolia  a  omh- 
hfttar,  qua^^n  a  chpcar  com  os  jf^groa  deBBa* 
riqua  Jim,  daq^udog  e  descalfos  como  oa  imagiuava 
que  dapoii  o»  eslimasse  pelo  que  mwacasigem;  e  do 
qua  Ihe  raccedef^  iuferissei  pelos  oagros^  qua  h^ 
mana  aeriao  oa  braacos  t  daaengano  para  qua  Uie 
^QiKiadia  b,  aicottia  a  <^  mumei^  d<»  loldadoa  ^9» 


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GA3TBJ01O  UmXAMO.  519 

quueBse  levar;  mafi  que  ^  guardasse  nao  viesa? 
iQ9m  83  mao«  amarradaa,  levando-as  soltas. 

XXIU.  Ouvio  o  coronel  com  desprezo  a  Siagia^ 
mnodo;  aecaitou  o  offioreoiiOfmto  com  altiyeza,  e$^ 
colhoo  OS  BoMadoB  de  que  tinba  maia  aaiisfa^ao; 
gaatou  alguaa  <Uaa  em  os  ^x^reitar  naa  aruias,  e 
afMrealado  de  tudo  o  que  the  pareoeo  naoesaario  ^ 
aaio  do  Arreeife  com  dous  nul  ixifaBtes  em  24  de 
Maioy  e  niarcbou  paraa  eitaocia  dettmrique  Diaa. 
A  poucoa  pasaoa  dep  com  aa  aeotuieUaa^  eas  aeguio 
at^  se  recollusreMi4eiitro  das  triochairaa,  que  achou 
guaraecidaa  com  lal  for^a  e  arte,  qual  nao  imagi^ 
nava.  Foi  rec^ulo  d'uma  e  auiitaa  cargas  de  moa- 
qiietea  biacainhoa^  cuja  pootaria  derribou  xmo  poo- 
COB.  Ml  a  esta  bora  o  coronal  bollandez  estava 
menoa  quentef  e  ficou  de  todo  frio  qqaodo  vio  que 
Hemrique  IKa9  saia  daa  trincheiras  com  todos  oa 
aeuaa  imreatik)  na  caiopaaha.  Furiosa  (oi  a  pdeja, 
e  contumaz  a  porfia,  sem  que  nenhuma  daa  partea 
perdesse  pabao  de  terra.  Aeudimo  entretanlo  os 
capitaea  daa  estaneias  vkiahaa;  cairegurao  o  iui- 
migo  pdoa  ladoi,  e  Henrique  Biaa  pela  vauguaida 
eom  tao  pesado  f erro,  que  Ibe  fizerao  krgar  o  campo^ 
m  Tirat  as^08tas»  sem  que  a  pressa  Ihe desae  lugar 
a  Detirar  oa  mortos.  Fngio  aayevgoidMlo  o  corouel 
paraa  Barrata^  oode  Feocido  e  obaiioado  eaooadia  o 
nsdo  proprioy  coudemaaudo  a  firaqueaa  e  pouca 
diaetplina  doa  seua.  Logo  que  fie  achou  ccdiarto  oom 
a  artiUiaria  dafortaleza,  deouova  f^nna  aos  seust  c 
depob  de  os  cstimukr  ao  oombate ,  maudou  tocar 
a  eufestir*  Hcurr iyd  foi  o  combate  pelo  eatrago  e 
pab  taundide.  A  cootiuuacao  daa  cavgaa^  a  urn 


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529  GASniOlO  iMrTAAO. 

menno  tempo  abria  e  condmsara  os  ares  com  (iimo, 
e  com  o  estrondo.  Sisgismundo  ^  que  estava  na 
cama,  inferio  o  resultado  do  socoesso  pdbi  duncao ; 
mandou  cMrdem  ao  coronel  que  logo  se  r^irasse,  e 
passasse  i  outra  banda  do  rio  p^  ponte  que  Ihe 
mandava  lancar.  Ajustou-se  o  [Hneoeito  do  general 
com  o  desejo  do  coronel ;  com  obedkncia  cobruM) 
o  t^mor,  e  sem  detenoa  se  poz  em  salvo.  Chegou 
n'este  meio  tempo  Joao  Femandes  Vidra;  mas  seu 
auxilio  sobejou  a  yictoria ,  porque  ji  no  campo  se 
nao  via  mais  que  o  destroy  da  batalha ,  e  os  ap- 
plausos  do  triumphoy  com  que  se  reeebeo  o  soc- 
corro.  Grandesdiligencias  fez  Joao FerBandesVieira 
para  que  o  inimigo,  que  ja  tinha  passado  o  rio, 
tomasse  a  campanha ;  por^m  elle  se  nao  deo  por 
entendido.  Passado  d'uma  bala  pela  gai^ganta  o 
carreg4rao  os  seus  maneaCado.  Foi  castigo  do 
easo ;  e  pareceo  cumprimento  do  ameaco  de  Sisgis- 
mundo. 

XXIV.  Como  a  estancia  de  Henrique  Dias  era 
a  mais  incommoda  para  o  inimigo  j  resolyeo  Sisgts- 
mundo  em  ir  atacal-a  elle  mesmo.  Em  1 8  de  Agosto 
assaltou  a  sobredita  estancia  com  dous  mil  soldados, 
que  a  envestirao  com  desatada  furia.  Defendeo-se 
Henrique  Dias  com  o  desenfedo  que  causa  o  pelejar 
por  regalo,  e  o  veneer  por  custume.  No  maior  em- 
penbo  do  combate  cb^^rao  os  soccorros  das  estan- 
cias  vizinhas;  deixon  o  Flamengoa  expugna^aO; 
deixando  mortos  no  campo  cincoenta  soWados,  c 
retirando^se  com  grande  numero  de  feridos.  Da 
nossa  parte  foi  a  perda  tao  pequena  que  a  nao  es- 
timou  a  lembranca*  Oulras  muitas  vexes  iotenlou  o 


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OASTMOrO  LimiTANO.  521 

HoUandee  omeBDio^  massempre  com  igual  successo. 
Adveriknos  que  em  os  mezes  de  Junho  e  Julho  nao 
houve  successo,  mais  que  o  referido,  que  merecesse 
particular  lembran^.  — -  Nao  tinha  acabado  o  mez 
de  Julho  ^  quaudo  chegarao  ao  nosso  Arraial  qui- 
afaentas  cabecas  de  gado,  tiradasde  Sergiped'El  Rei ; 
e  logo  em  24  de  Agosto,  o  mestre  de  campo  Fran* 
Cisco  de  Figueiroa  com  um  ter^o  de  quatrocentos 
in&ntes ,  firucto  das  diligencias  do  mestre  de  campo 
geoeral  Francisoo  Barreto  de  Menezes^  e  soccorro 
€)ue  mandava  o  conde  gtfieral  Antonio  Telles.  Che- 
gArao  estes  novos  combatenCes,  lodos  soldados  do 
reino^  ao  Arraial  a  tempo  de  receber  as  boas  vindas^ 
e  dar  os  parabens  da  victoria  aos  do  conflicto^  que 
vencido  o  Hollaudez,  se  tinhao  retirado. 

XXV*  Enfermou  ncstes  dias  o  goTemador  dos 
Indios  D*  Antonio  Philippe  Camarao,  varao  grande 
em  na^ao  humilde*  Gorreio  da  morte  foi  a  doen9a, 
e  por  ella  conheceo  o  fim  de  sua  vida  que  soube 
immortalizar  como  o  sen  nome.  Nasceo  Indio ,  po- 
r^m  entre  os  Indios  o  mais  nobre.  0  nascimento 
Ihe  deo  o  nome  de  Foty^  que  na  lingua  do  gentio 
6  o  mesmo  que  Camarao ;  o  baptismo  Ihe  deo  o  de 
Antonio.  No  tempo  de  Mathias  d' Albuquerque  era 
ji  respeitado  entre  os  sens  por  maioral  de  muitos ; 
e  com  muitos  auxiliares  o  veio  soccorrer,  e  servir  a 
na^o  quando  o  nosso  poder  se  alojava  no  Arraial 
velhoy  chamado  de  Pemam-Morim :  illustre  prova 
de  fidelidade  e  amor^  com  que  servia  a  na^io  e  o 
prindpe ,  offerecer-lhe  a  espada  qqando  os  perse- 
guia  a  fortuna.  A  mesma  adversidade ,  de  que  o 
mais  gentio  fez  causa  para  a  rdiekUa^  fez  o  Camarao 


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SIS  cAvmwm  uMiiM. 

moUyo  pam  a  \im^.  Eiaservir  a  ignga  e  a  coroa 
^Mih<m  luzido  Gffedito  de  8oIdado>6  de  religiMo;  e 
too  obMiTante  de  was  €hnffk(joe^  qua  nunea  o  tio 
di«Uahido«}uem>aaproo  veoerottioldado.  Todoe 
09  diad  ouvia  mi^sa,  e  resava  o  ofi&cio  da  Nossa 
Seahoraf  modoMa  .e  devoto.  Gastava  muitaa  horns 
en  craQM^  a  que  m  appUoava  aioda  enlre  06 
maiocea  ^ilrondosdaguen^a.  Para  sair  aoa  rebates , 
«  pS4pa  wirar  nas  l>atalbas»  pruneiro  ae  fortakcia 
com  0§  sacraofeeotos  que  com  as  armaa.  Has  oeca* 
aioea  «iias  arriacadas  reoorria  ao  £ayor4iTiDD^  pa^ 
4indo  auxilio  a  duas  imagrgis>  do  Saahor  e  da  So- 
jabora^  qua  eotre  as  roupis  Inua  de  oanliiiuo  sohre 
p  pei(o»  £m  quaoto  soldado ,  nao  baure  capitao 
mais  amadot  oam  mais  d^ecido,  porque  tmo 
houve  oapiteo  que  adbiasse  mais  imperio  na  afiabi- 
lidada  qiK  no  doaainio^do  que  aa(«  ratoroso  capi*- 
.taQ«  Aa  amprasaa  o  eaperavao  seoipraoom  as  victo- 
rlast  ^  gaD^u  4aatas,  quautaa  iorao  as  occasioas 
an  que  pelejou.  Para  siiu  ^eiiio^  era  o  acio  nartf- 
riop  a  o  tralNdbo  descaoi^o.  Avaliora  a  pmaUdade 
pardekite^  a  m  ocoaaioes  per  dita»  Ben  00100^ 
coBia  memorial  do  saas  proaaas^  le  ouvia  aalre  oa 
noBsaa  aom  reapeho^  e  eotre  oa  iniou^s  oona  ci- 
panto;  edilatoi»K)  deaoneaiiQia,  quache^aaaaa 
lOuvidos  did  sauRai  lao  distante^  quanlooapaftavaa 
OS  dihtados  mares  que  dhridaoi  a  Aaaariaa  da  £i]h 
ropi^;  flam  peti^o  o  despadbou  seu  nsereoiaunito. 
Deo4iie£liWPhilippeohabitodeC;hrisa^  otilula 
de  Dom ,  e  o  posto  de  goyemador  e  capilao  f/M 
da  todaa  os  Indios  da  America*  Zakm  a  dcooKO  j 
apia  aa  diRnai  ao  poato  cpiie  oopupava  oom  tada  a  di^ 


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m  pesfipMgirtoded » eetnanfaaa  e  de  tespeico  Mayt 
aempre  por  iiiterprete  (tiiuU  que  sabift.  a  lingua 
porUigUEQica)^  porqua  emteiMlia  aw  a  imprc^iedade 
e  inculto  dfta  Yozes  fiscal  do  animo  e  disos^ito  da 
pe0ioa»  ISa  arte  da  miUcia  foi  inai^e^  oa  do  goyetmo 
daro.  Com  oa  aeus  era  facil  no  trato ;  con  oa  au*- 
perioraa^  ^rave  oa  coavca^sa^ao^  ooia  oa  estranho3, 
^ard  no  agaaalbo;  iaa»  tao  medido  com  todos^ 
que^obrigttva  a  amor  a  ra^ereocia^  Em  todo  o  tempo 
alugat  o  aohou  q  aarvi^o  de  Df  oa  prom^itQ  e  o  calto 
das  $2mU>a  liberal.  Gomo  diaaveto  viveo^  porque 
ao«bo  yivw  para  J>e«6  e  patu  os  iiiomras ;  morreo 
coiBio  dbriataOi  pca;^ua  le  9ouim  l^fifoveitar  de  iodos 
08  ramedio$  que  ^judao  a  salta^ao*  Na  vida  ad*- 
quifio  ^orioio  ciomei  oa  m^te  mosirou  que 
p«a$am  4  etaraa  vida  (como  piadoaameute  ae  p^ 
orer  d'um  christao  qua  morre  <om  moati^as  dW<- 
repeftdido  e  sacrameatado  )»  Intmio  quaai  do 
idiumbo  e  do  ferro  sab  da  iouumeravais  oambataa 
;a  batalbaa,  e  entragou  o  eSfHriio  a  $euCraador^ 
poMcoa  maaea  dapoia.da  doa  Cruararapa»>  am  aua 
propria  cama ;  para  que  K^m  laltaate  a  sua  mca^ 
o  pareeer  somoow  De(va6*4be  aapultum  iia  Jgreja 
d<>  Arraaal^  com  a  fuoaral  pompa  qua  custawiaw 
a  jpiadade  a  a  milicia^  e  com  aquaUe  coiieiirao  * 
que  obrigava  o  amor  e.o  reapeito* 

XXVL  Graude  £aika  4a  maatimeiitoa  se  corner 
9a[va.a  aamir  antra  os  iKMisQ6«  Tinba^ae  aoabado  o 
que  vi^ra  da  Sargipa ;  faltavao  as  £ftriubas,  polHfue 
OS  moradores  nao  podiao  plantaip  a  maudioca*  Nao 
'Wt  aabaiv^  o  HoAUndmiiiCTwa  femiflHtp  en^waa  (utt 


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53ft  GAMBiOXO  LDMTAWOi 

talezas ;  mas  remediaya^ee  com  mtis  ficilidade  e 
menos  custo.  Com  as  embarca^oes  do  reino ,  que 
por  aquelles  mares  tomarao  as  smas  fVagatas  previa 
OS  celeiros  e  augmentava  os  thesouros.  Applicava- 
se  a  esta  guerra  como  de  mais  proveito  e  menos 
pcrigo.  — O  general  Sisgismundo,  desejando  recu- 
perar  sua  repiiiacao ,  tentou  uma  enlrepreza  sobre 
a  Bahia.  Ajuntou  suas  nAos,  forneceo-as  de  manti- 
menlQS  e  municoes  para  muitos  dias^  e  com  boa  guar- 
nioao  de  infontaria  se  embarcou^  e  navegou  para  a 
Bahia.  Com  tempo  favoravel  entrou  naquella  en-* 
seiada»  deitou  gente  em  terra^  e  com  fortuna  de  pi- 
rata  e  destreza  de  soldado ;  deo' sobre  os  engenhos 
e  casas  dos  moradores  que  ficarao  mais  perto  d'a* 
gua.  (0  repente  da  invasao  os  tinha  indefensos. ) 
Encheo  as  nAos  de  despojos  y  sem  batalha ;  deo  4 
T<(la  sem  detenoa^  e  navegou  sem  contraste.  Deixou 
tudo  o  que  pdde  alcan^r  o  bra^o,  porque  foi  sem 
comparacao  maior  a  perda  que  o  roubo  ( vinte  e 
dous  engenhos  ficarao  do  todo  arruinados. )  Entrou 
pela  barra  do  Arrecife  com  algomas  embarca^oes 
que  Ihe  cafreo  nas  maos ;  foi  recebido  com  applau«- 
sos  de  victorioso  e  hem  aforlunado. 

XXYU.  Com  o  principio  do  anno  de  1 649  o  teve 
a  nova  companhia  g^ral  do  comtnercio  do  Brazil, 
Havia  muito  que  entre  mercadores  corria  a  pralica 
de  se  formar  uma  companhia  portugueta  para  pro* 
teg^  o  commercio ,  e  oppor-se  4s  phratarias  com 
que  08  Holiandezes  nos  tomavao  a  maior  parfe  dos 
navios.  Communioou-se  o  projecto  ao  principe^ 
com  a  esperanca  das  consequencias ,  tanto  para  o 
reino  eomo  para  as  conquiatas ;  dispuiou«se  a  ttt»- 


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l^ria  €^  repetidbs  coqgresios  de  ministros  ^  con- 
lracta<lores;.levou  a  approva^ao  4e  todos  o  meio 
aponlado.  Entrarao  a  dar^he  f^rma,  e  vencida^  as 
dUfiouldades  se  reduzio  a  e$pecula^  a  pralica ;  e 
nesle  mez  de  Janeiro  se  vio  formada  a  companhia 
g^ral  do  commercio  do  Brazil  com  toda$  as  eon- 
dicoes  e  preceitos  que  pedi^o  a  administra9ao  dos 
cabedaes  e  o  apresto  doseomboios,  tendo  por  (lador 
de  sua  verdade  e  conserva^ao  a  proteccao  do  prin- 
cipe^  o  foyor  dos  grandes  e  os  interesses  do  povo. 
Fez  rapidos  progressos,  como  veremos  no  deeurso 
d'esta  narracao,  a  qual  nos  chama  a  fallar  dos  mo- 
Yimentos  de  Pemambuco. 

XXVIII.  Chegado  que  foi  Si^gismundo  da  via-- 
gem  da  Bahia,  deo  causa  com  sua  boa  sorte  a  que 
OS  do  govemo  se  imaginassem  restituidos  a  suas 
antigasprosperidades^  das  quaes  os  successes  proxi** 
mo6  0$  tinhao  privado.  Aceeo4co-se  entre  os  parti- 
culares  o  desejo  de  intentarem  segunda  ycz  a 
sujeicao  da  campauba  de  Peraambuco ,  e  das  ca* 
pitanias  confinantes;  e  quern  mais  fomentou  este 
des^o  foi  o  corcmd  Brine.  (Era  taaente  general,  e 
governava  a$  armas  pelo  impediment  de  Sisgis-* 
mundo  •  que  o  nao  dei^ava  andar  sem  arrimo.  ) 
Fundava  o  coronel  a  confian^  de  melbor  successo 
na  presumpcao  de  emendar  os  erros  que  o  general 
Sisgismundo  commett^ra  na  occasiao  passada,  e  nao 
cessava  de  exagerar  a  opportunidade,  condemnando 
o  ocio  em  que  tanto  numero  de  soldados  bollan-* 
dezes  passavao  osdias  com  gasto  e  sem  utilidade. 
Os  do  goyemo,  namorados  das  razoes  e  da  viyeza 
do  coronel^  Ihe  derao  poder  para  que  disposesse  o 


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que  dkia  e  iiitentava.  Fy>g09o  e  attivo  6  etmmd 
Brine ,  con  se  ter  ttb9<4ato  na  doperioridade  do 
mando,  ae  a¥a(iava  senhor  da  mesma  fortima. 
PasaoQ  ordem  que  recc^esaem  todos  os  naTtos  que 
andairio  a  obrcoy  para  ne  aprotvitar  da  melfaor 
gente.  Mandou  fiuier  grande  nnmero  de  pratazatiaa 
e  chucoB  do  ponta  e  cdrte,  com  que  diria  se  haviSo 
de  rebater  as  nosaas  espadas ;  e  todaa  as  horas  do 
dia  gaatara  em  exercitar  os  mais  robustos  aoldmlos 
no  menM  d'eilas.  Antes  de  stir  a  campo ,  fosse  por 
eort^zia,  fosse  obrigacao,  deo  conta  de  sen  intentoao 
general  Sisgismutido  (que  ja  sabia  asnegociaooes  e 
designios  do  coronel).  Ottvio-o  este  com  dissimth- 
kcao,  ponderou^^lhe  as  difficuldades  da  empreza , 
disiPuadkK)  d'ella,  e  conduio  dfeendo :  <v  Leva  V •  M, 
n  08  mesmoa  soldados  que  jA  Ibrao  v^eidos  a  oou^ 
»  tender  com  bs  mesm^s  homens  que  ficirao  vl^ 
»  toriosos^  e  espera  methor  sorte?  Jnlgo  ser  pro* 
»  nostico  de  nossa  perdicao  bnscdr  V.  M.  para  a 
J9  melhor  sorte  o  theatre  otidea  fortutia  represan* 
n  tou  nossa  maior  desgr«ica ;  e  tenho  por  infalKvel 
n  qUBf  refireacada  a  lembranca  do  suecesso  com 
n  a  ^sta  do  lugar  do  eonflieto,  influtra  em  una  e 
I)  outroa  oB  mesmos  espiritbs.  0  cuato  nos  enaina 
»  a  guerrear  com  uma  nacao  que  toda  a  Asia  pre- 
»  sumio  inv$nci¥el,  que  i  <»nsummll'a,  ajudadoa 
A  do  tempo  e  nao  fiados  no  braeo;  e  V.  M,  se 
a  desengane  que  nao  ha  de  tracer  a  capa  donde 
»  Sisgiamundo  a  deixon.  »  Porftm  o  cooronel,  arras* 
tado  de  seu  empenho  ede  sua  ambieiosa  pretencao^ 
nao  convencido  senao  protervo ,  impugnou  todo  o 
discurso  de  SisgismundOy  e  reaotreo  a  ex^^ucao  de 


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GAimiOW  LtSITAMO.  577 

«ea  dktamen;  ao  que  o  sagaz  general  nfo  repHcou, 
p(nrqo€  se  Ihe  nao  imputasse  a  fraqiieza  ou  a  enveja. 
86  se  affirnm  que  passou  o  desengano  a  tomar 
ftrma  de  galanteo,  apostando  dinheiro  consider 
laTel,  sobre  qua!  dos  pareceres  sairia  mais  cerlo.  ' 
XXIX.  Logo  que  entrc  os  uossos  se  espalhou  a 
uotida  doe  novos  intentos  do  Flamengo  j  mandou  o 
general  Francisco  Barreto  de  Menezes  deitar  bando 
por  todas  as  partes  do  reconcavo  que  qualquer  sol- 
dado  ou  official  que  tivesse  assentado  praca  acu- 
dis8e4  bandeira  debaixo  de  que  militava^  em  tempo 
determinado.  Obedientes  e  alvorocados  concorrfirao 
todos  com  notavel  promptidao.  Nad  contenles  os 
1K)8S6»  generaes  com  os^  preparativos  humahos ,  re- 
eorrfeario  tio  bera  aos  divinos.  Pedii^o  a  todos  os 
parochos  que  nas  suas  igrejas  fizessem  rogativas 
ao  ceo  pelo  bom  successo  de  nossas  armas ;  a  todos 
OS  soldados  persuadirao  que  se  chegassem  a  Decs 
por  meio  do  sacramento  da  penitencia,  e  se  forta- 
lecessem  com  o  da  communtiao.  Ao'Vigario  g^ral 
Domingos  Vieira  de  Lima  pedfrao  mandasse  expor 
o  santissimo  sacramento  em  todas  as  matrizes  por 
trez  dlas,  para  que  se  desse  honra  a  Decs  naquelle 
myaterio  em  que  elle  se  via  oflfendido  pela  pravi- 
dade  heretica.  Nao  se  descuiddrao  entretanto  os 
nossos  governadores  de  tudo  que  pertencia  4s  dis- 
poslcoes  da  guerra.  Informados  de  que  o  Flamengo 
se  determinava  em  buscar  o  mesmo  sitio  dos  Gua- 
rarapes ,  mandarao  fortificar  e  guamecer  as  trin- 
cheiras  por  onde  forcosamente  havia  de  marchar, 
e  com  particular  attencao  os  que  chamavao  dos  Ba- 
rachos  e  do  Moinbo  Novo }  orden&rao  aos  mora- 


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up  ciifTBiQ^  uwr Ana 

dorcs  drcumTeziahos  assistisscm  aos  presidios  owi 
pessoas  e  maniimeotos;  e  nos  Guararapes  engro^ 
$arao  os  presidios  e  as  muni^oes  para  a  defensa  de 
qualquer  invasao  ou  incideate.  Passarao  ordem  ao 
capitao  da  Moribeca  que  mandasse  guarnecer  a 
ponte  de  Sao  Bartholomeo  de  presidio  e  seotineUas^ 
e  que  a  qualquer  rebate  tocasse  arma,  com  tres 
peqas  d'artilharia ,  que  tinha  na  poyoacao,  para 
que  sem  deten9a  acudissem  os  moradores  ^inhos 
com  annas  e  bastimentos.  Em  fim  nao  ficou  cousa 
a  que  nossos  cabos  nao  acudissem  com  diligencia  e 

acerto. 

XXX.  Em  1 8  de  Fevereiro  de  1 649  saio  do  Ai^ 
recife  o  coronel  Brine  com  cinco  mil  homeos  de 
guerra,  todos  soldados  escolhidos  por  valorosos  e 
praticos ,  altendendo  mais  a  qualidade  que  a  mul- 
tidao;  carregavao  a  bagagem  seUecentosgastadores, 
entre  ella  algumas  tendas  de  campanha  para  os  co- 
roneis  e  cabos  maiores.  Desprezou  a  turba  dos  In- 
diosy  levou  s6  duzeutos  escolhidos  pelo  seu  maioral 
Pero  Poty ;  dos  homens  do  mar  fbrmou  um  ter^o 
de  trezentos  soldados,  commandados  por  seu  almi- 
rante;  e  duas  companhias  de  negros,  homens  de 
confianca.  Reduzio  toda  esta  gente  a  doze  esqua- 
droeSy  que  diyersificavao  doze  bandeiras*  A  sua 
vanguarda  constava  dos  homens  mais  corpolentoS| 
robustos  e  destros,  armados  de  pratazanas,  alabar- 
das  e  chu^os,  para  descomporem  e  rebaterem 
OS  golpes  de  nossas  espadas ;  e  de  similhanle 
gente  compoz  as  frentes  de  todos  os  esquadroes. 
Deixou  suas  pra^as  guarnecidas  com  os  homens  de 
menos  conta ;  nao  Ihe  esquec^rao  seis  pecas  d'arti- 


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GASTRIOTO  LU8ITAN0.  529 

Iharia  de  bronze^  cuja  conduccao  entregou  ao  almi- 
ranle  com  sua  gente  do  mar.  Nesta  f6rma,  e  no  dia 
referido  pela  manha,  saio  do  Arrecife,  dada  ordem 
a  sua  vanguarda  que  marchasse  para  a  Barreta;  o 
que  fez  com  todo  o  exercilo  com  marcial  estrondo 
de  clarinSy  trombetas  e  tambores. 

XXXI.  Pelas  dez  boras  do  dia  18  de  Fevereiro 
chegou  aviso  ao  Arraial  da  marcha  do  inimigo. 
Tocou-se  logo  arma ;  acudirao  os  soldados  a  suas 
bandeiras ;  cbamou  o  general  a  conselho  y  e  nelle  se 
resolveo  sem  controversia  que  se  seguisse  o  iuimigo 
at^  Ihe  dar  batalha.  Gonstava  o  nosso  poder  de  dous 
mil  e  seiscentos  homens  entre  Portuguezes,  Minas 
e  Indios ;  os  quaes  se  pos^rao  logo  em  marcha  com 
ligeiro  passo  pelo  caminbo  dos  monies  Guararapes. 
Pelas  quatro  boras  da  tarde  do  mesmo  dia  cbegou  a 
nossa  gente  ao  primeiro  monte^  cbamado  Utizeiro^ 
a  tempo  que  o  inimigo  ja  tinba  occupado  os  monies 
vizinbos  e  as  fraldas  delles  por  aquelia  parte  que 
£azia  frente  ao  boqueirao,  onde  na  occasiao  passada 
carregou  a  maior  for^a  da  batalba.  Estaya  fortifi- 
cado  e  situado  com  escolba ;  e  ordenada  sua  gente 
em  nove  esquadroes^  guarnecidos  de  muitas  em- 
boscadas ,  que  a  arte  e  a  conveniencia  repartio 
pek>s  lugares  necessarios.  Logo  que  a  nossa  yan- 
guarda  cbegou  ao  dito  monle^  e  descobrio  a  disposi- 
cao  e  forma  do  inimigo^  mandou  o  mestre  de  campo 
general  fazer  alto,  para  que  entre  os  cabos  se  defi« 
nisse  por  que  parte ,  como ,  e  quando  se  bavia  de 
envestir  o  Flamengo.  Forao  os  pareceres  di versos; 
mas  todos  se  reduzirao  ao  voto  dos  mestres  de  campo 
Andr<5  Vidal  e  Francisco  de  Figueiroa,  que  era  bus- 
I.  34 


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530  GASTRIOTO  LUfTTAIia 

car-sc  o  mimigo  pela  frentew  CommuniooiJkHie  t  re* 
9olu9fto  com  Joao  Femandes  Yidra »  que  cheg&rft 
naquelle  tetnpOi  e  fbi  de  contrario  *par«oer,  dando 
boas  raaoefi  com  que  mostrou  que  se  devia  ataoar  o 
inimigo  pela  retaguarda.  Houve  quern  fieesae  al« 
guma  opposicao  a  este  pareoer)  mas  pdr  fim  todos 
concordiirao  nelle^  e  o  mestre  de  campo  getieral  em 
sua  exeou^ao  virou  o  exercito  para  oEngeuho  Noto  ; 
entre  elle  e  o  doa  Guararapea  ae  alojou  a  noaaa 
gente  aquella  nolle  com  as  oommodkladi»  que  o 
sitio  permettia.  Dadas  as  prorideucias  necessarias 
conferio  o  mestre  de  campo  general  como  e  a  que 
hora  se  havia  de  envesttr  o  Flamebgo^  e  reaolreo- 
se  que  a  occasiao  diria  o  quando^  e  que  o  modo 
hayia  de  sei*  a  peito  descoberto. 

XXXII*  Amanbeceo  o  dia  19  de  Ferereiro,  e 
mandou  Friuiciseo  Barreto  que  os  mestrea  de  campo 
com  seus  sargentos  maiores  saissem  a  reoonhecer  a 
fdrma  e  situa^ao  do  inimigo.  Subfrao  a  urn  monte 
fronteiro)  e  d'elle  virao  tudo  o  que  desejavao.  De^ 
pois  de  tudo  bem  uotado^  Tolt^rao^  e  referiiio  ao 
mestre  de  campo  general  que  o  Hollander  perseve- 
rata  no  sitio  e  na  fdrma  que  tinha  o  dia  antes  ^  e 
que  o  poder^  pelo  que  parecia^  era  por  cima  de 
cinco  mil  homens^  al^m  dos  Indios,  negros  e  gas^ 
tadores;  seis  pecas  d'artilharia  ^  algumas  tendaa 
armadas  em  varias  partes,  e  um  esquadrao  separado, 
que  guardava  a  agoa,  de  que  bebia  o  exercito.  Con- 
ferio-se  o  que  se  devia  obrar  j  e  resolveo-se  que  nao 
convinha^  rista  a  situacao  e  poder  contrario^  inreih 
tlUo,  e  muito  menos  expor-lhe  aos  olhos  a  inferior 
ridade  de  nosso  exercito,  escondido  a  sua  rista 


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GASTRiOXO  LUSITAlia  5S1 

pda  interposi^ao  dos  caoateaes  que  o  cohriao ,  que 
so  em  caso  que  se  movesse,  ou  para  ir  adiante,  ou 
para  voltar  atraz  ( o  que  forcosamente  havia  de 
fazer) ,  se  devia  envestir ;  e  que  no  entretanto  im«- 
portava^  da  nossa  parte  ^  a  Yigilancia^  para  que  a 
negligencia  nao  fo88^  molivo  de  perdermos  a  occa- 
siaOi  Pelas  oito  horas  da  manha  se  ordenou  ao  ca- 
pitao  Antonio  Rodrigues  Franca  que  com  quatro 
companhias  fosse  picar  o  inimigo^  que  sem  duvida 
se  moTcria  provocado  de  Ihe  tocarem  arma,  e  as^ 
aim  succedeo  levado  do  primeiro  impeto ;  mas  tor* 
nando  sobre  si^  conheceo  a  perten^ao  da  industrial 
e  voltou  com  presteza  a  occupar  os  mesmos  postos. 
Nao  desistio  o  capitao  Franca  de  sua  missao ,  at^ 
que  o  Flamengo,  impaciente  de  nossa  fleima^  pela 
uma  bora  depois  de  meio  dia,  foi  desoccupando  o 
alto  dos  montes,  e  descendo  ao  baixo  para  se  for- 
mar  em  esquadrao  serrado*  0  capitao  Franca  y  as- 
sim  como  vio  aballar  o  HoUandez,  deo  aviso  ao 
mestre  de  campo  general;  o  qual  aproveitando  a 
impatiencia  e  ardor  de  nossos  soldados  mandou 
tocar  a  envestir ,  sinal  a  que  obedec^rao  mais  de 
y6o  que  de  passo.  ~  Nao  teve  o  inimigo  noticia  de 
nossa  resolu^aO)  senao  quando  Iha  deo  a  vista  ^  des- 
cobrindo  o  avan^o  a  tempo  que  a  envestida  o  bus* 
cava  pelas  partes  definidas.  Desejou  voltar  aos 
postos  que  deixdra  ^  por^m  atalhado  de  nossa  diii-* 
gencia ,  Ihe  servio  o  arrependimento  de  castigo , 
por^m  nao  de  emenda. 

XXXIII.  Foi  Joao  Fernandes  Vieira  o  primeiro 
que  chegou  a  medir  o  bra^o  com  o  Flamengo,  aju- 
dado  da  maior  presteza  e  da  menor  distancia.  Avan* 


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532  GA9TRI0T0  LUSITANO. 

cou  ao  boqueirao  que  achou  defendido  e  fortificado 
com  seite  balalhoes  ^  duas  pe9as  d'artilharia  por 
frente  no  raso,  e  quatro  por  lado  no  raonte.  Orgu- 
Ihoso  e  destemido  o  saio  a  receber  o  HoUandez , 
imaginando  deter-Ihe  o  passo  com  a  violencia  das 
cargas,  que  os  nossos  foiio  recebendo  com  igual 
marcha^  desprecando  as  balas^  como  se  desprezArao 
as  yidas.  0  general  contrario ,  vendo  a  resolucao 
dos  nossos,  maadoii  mais  um  batalhao  para  engros- 
sar  OS  sette  que  defendiao  o  boqueirao ;  aqui  car- 
regou  o  raaior  peso  da  batalha ,  porque  na  posse 
d'este  sitio  consistia  toda  a  esperanca  da  vicloria. 
£m  igual  balanca  sustenlava  o  combate  de  uma 
parte  o  valor,  da  outra  o  numero.  0  sangue  de 
uma  e  outra  gente  mostrava  o  furor  de  todos ,  de 
nenhum  a  yantagem,  esperando  a  victoria,  os  ini- 
migosy  pela  constancia,  os  nossos,  pelo  custume. 
0  mestre  de  campo  Joao  FernandesYieira)  posto 
diante  de  sens  soldados ,  Ihes  servia  de  admira^ao 
e  d'exemplo.  0  inimigo  animoso  e  disciplinado  pe- 
leijava  a  p^  quedo,  mostrando  bem  no  valor  e  cons- 
tancia  da  resistencia,  que  o  alentava  a  lembranca 
da  honra  e  a  defensa  da  vida.  No  mais  travado  da 
pendencia  topou  uma  bala  com  o  nosso  mestre  de 
campo,  com  damno  tao  leve,  que  fez  sinal,  mas  nao 
ferida ,  para  que  certificasse  a  nodoa  o  intento  da 
bala.  Gonheceo  no  avan9o  a  fortuna,  e  na  detenca 
o  perigo,  levantou  a  voz,  e  mandou  envestir  &  es- 
pada.  Nao  parte  mais  furioso  o  penhasco  desatado 
do  monte,  do  que  partirao  os  nossos  a  ferir  o  ini- 
migo, assombrado  da  facilidade  com  que  se  vio  roto. 
Aquelles  chucos  e  pratazanas,  de  que  os  batalhoes 


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GASTRIOTO  JLUSlTANa  555 

contraries  se  armavao  para  apartarem  de  si  o  nosso 
ferroy  rendidos  &  destreza  de  nossa  espada^  abrirao 
caminho  largo  para  seu  destroco,  porque  rebatidos 
ou  desviados  os  primeiros  golpes,  nao  Ihes  deixa- 
yao  lugar  nem  tempo  para  os  segundos.  Muito 
sangue  e  vidas  custava  ao  Flamengo  a  contumacia 
e  muito  mais  a  pressa  com  que  se  vio  desbaratado 
e  roto,  e  o  boqueirao  ganhado,  e  occupado  o  posto 
da  nossa  gente,  senhoreada  do  sitio  e  da  artilharia 
que  o  inimigo  nos  deixou ;  por^m  nao  de  todo  a 
pendencia  ja  entao  inuiil  para  a  reputa^ao  e  para  a 
esperan^a.  *-*Gom  a  for^a  e  com  a  industria  bus- 
cava  Joao  Fernandes  Yieira  nesta  occasiao  onde 
melhor  empregasse  a  espada  e  a  vista.  Advertio 
que  picando  o  inimigo  pela  retaguarda ,  ficaria  de 
menor  partido ;  apartou  do  corpo  de  batalha  dous 
tro^os  de  soldados,  para  que  um  pela  retaguarda , 
outro  por  um  lado  Ihe  tocassem  arma  ;  o  que  fize- 
rao  com  promptidao  e  fortuna.  Occupado  nesta 
fac^ao  se  Ihe  metteo  o  cavallo  em  o  olho  d'um  la- 
macal ,  de  sorte  que  quasi  submergido  se  nao  pode 
arrancar  d'elle }  soltou  da  sella ,  e  como  se  nada 
faltara  a  sua  pessoa  e  a  seu  cargo ,  tendo  comsigo 
sua  espada  e  seu  bra^o ,  coberto  d  uma  rodella  y 
tomou  a  buscar  seu  primeiro  posto  na  frente  do 
poder  contrario,  que  ja  o  achava  menos.  Aqui 
montado  em  outro  cavallo,  tercando  a  espada>  le- 
vantou  a  voz  e  disse  para  os  inimigos  :  (c  Ah!  Fla- 
»  mengos,  rendei-vos  a  espada  de  Joao  Fernandes 
»  Vieira,  que  nasceo  para  vosso  a^oule*  »  Chama- 
dos  do  grito,  e  advertidos  da  pessoa ,  fizerao  pon- 
taria  n'elle  vinte  clavinas;  desviou  a  for  tuna  as 


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5S4  GiATaiOTO  LUSITAHa 

balas ;  parece  que  obrigada  da  estranha  ousadia. 
Delia  tomou  piincipio  nossa  victoria  ^  e  o  Hollan^- 
dez  oceasiao  para  depoit  publicar  no  Arrecife  que 
Joao  Fernande8  Yieira  ficara  morto  na  campanhaf 
nova,  com  que  oa  do  govemo  contrapeBavao  a 
magoa  de  sua  perda.  Foi  de  iodo  um  exeroito,  e  se 
equiparava  com  a  de  varao  tao  grande. 

XXXIV.  Pop  outra  parte,  com  a  mesma  sorte, 
avancou  Andr^  Vidal  contra  o  inimigo.  Pelo  alio 
da  meia  ladeira,  em  que  estava  formado,  o  aivestio, 
e  o  HoUandez  o  esperou  com  tal  determinacao,  que 
Ihe  deteve  o  pasao ;  perseverou  na  eonstancia  em 
quanto  nao  experimentou  os  fioa  de  nossa  eepada , 
que  a  um  mesmo  tempo  o  ferio ,  e  rompoo  pela 
frente,  apezar  das  armas  que  julgou  encontrastaveis. 
Da  mesma  sorte  o  eort^rao  pelo  lado  esquerdo  oa  ca- 
pitaes  Francisco  Berenguer,  Antonio  Borges  Uchoa, 
Matheus  Fagundes  e  Estevao  Femandes,  governa* 
dores  pelo  sargento  maior  Antonio  Dias  Cardofo , 
a  tempo  que  pelo  lado  direito  o  envestio  Antonio 
da  Silva  com  as  duas  tropaa  de  cavallos  j  que  valo- 
rosamente  com  as  langaa  e  tropel  romp^rao  por  ap- 
mas  e  defensores.  0  mestre  de  campo  Francisco  de 
Figueiroa,  com  a  gente  do  seu  terco,  fez  nesta  oo- 
casiao  entender  ao  inimigo  que  a  espada  portugueza 
corta  pelo  reparo  e  pelo  perigo.  Em  todos  se  via  a 
emulacao,  em  nenhum  a  inveja ;  porque  em  todas 
as  partes  andava  igual  a  valentia^  imitando  o  co- 
racao  e  o  braco  de  scus  eabos,  que  igualmenle  dis- 
punhao  e  cortavao.  Ja  o  inimigo ,  roto  por  muitas 
partes,  nos  olhava  com  medo,  e  se  resolvia  confuso, 
bebendo  o  desalento  na  vista  do  estrago ;  e  perdida 


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QUITBI0ID  LUaiTAHO.  5SS 

a  di3ciplina  dos  aeus ,  largirao  o  posto ,  e  virario 
43  costaSf  toftndo  sobre  ellas  os  pezados  golpes  de 
noaso  ferro,  ao  qual  at  sujeitava  o  terreno,  que  era 
por  um  monte  abaixo,  caminho  por  onde  os  corpes 
de  geus  mortos  Ihes  embara^avao  os  p^s  e  entorpe* 
^iao  o  lino  9  perigo  do  qual  neuhum  podia  fugir, 
apertado  do  alcaoce,  sem  queo  desvio  o  fizesse  dea^ 
p^nbar  pelas  quebras^  f ragas  e  roturas  do  mopte  que 
ou  o  detinbao  a  esperar  o  golpe,  ou  o  guiarao  a 
morrer  da  queda. — Em  quanto  succedia  o  referido, 
pela  parte  do  monte  ganhara  e  guamec^ra  o  mea^ 
tre  de  campo  Joiio  Fernandes  Vieira  o  boqueirao,  e 
ataegur^ra  a  defensa  com  duas  pe^  d'artilharia 
do  inimiga,  que  fic^rao  em  nosao  poder.  Subio  o 
montei  onde  o  Flameugo  tinba  a  bataria  das  quatro 
pe^aS)  e  um  grosso  d'ipfantaria,  eom  seus  reparos, 
que  ipyestio  com  alentoa  d'esfor^ado  e  rictorioso. 

XXXV.  Veudiao  os  HoUandews  caras  asvidas^  e 
caaio  tiobao  0  brago  poupado  prpmettiao  vigorosa 
reeiatenda*  Viuha  ideate  meio  tempo  Andr^  Vidal 
de  Negreiros  no  alqance  dos  Hollandezea  vencidos  e 
desbaratados  y  e  daaeobrio  no  valle  lun  esquadrao 
ittimigOi  formadp  daa  reHqiiias  de  sen  destro^o^ 
haqu£»|doa  os  soldados  d'elle,  por  nao  serem  vistos^ 
eaperando  nosso  descuido  para  executarem  sua 
ten9ao ,  que  era  oarregar  sobre  Joao  Fernandes 
Vieira.  Andre  Vidal^  em  eujo  ariimo  ardeo  sempre 
n  valor  sem  fumoa  de  receio  ^  eom  um  mesmo  im^ 
pete  empuTibou  a  espada,  e  levantou  a  voz  dizendo 
aos  poucps  que  achava  con^sigo  (toda  a  sua  gente 
vinha  espalhada  ^  sem  mais  tino  que  o  de  matar  e 
£mr) ;  (( A!  eapada^  soldadoa ;  »  e  para  o  capitao  de 


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556  CASTRIOTO  LVSITARa 

carallos  Antonio  da  Silva  :  «  Avance  V.  M.  a'o  ini- 
»  migo«  e  nao  se  de  quartel  a  quern  vencido  o  des- 
»  preza.  »  Duvidou  o  tenente  Manoel  de  Araujo  o 
avancOy  pela  disparidade  do  numero,  da  forma 
e  do  tempo ;  considerou  que  aos  montados  haviao 
de  busear  todos  os  pelouros,  e  receoso  da  certeza 
do  perigo^  olhou  para  o  sen  capitao ,  o  qual  o  en- 
tendeo,  e  o  obrigou^  dizendo  que  na  guerra  em 
nao  temer  o  perigo  se  verificava  o  nascer  honrado ; 
e  apertando  as  pemas  ao  cavallo,  seguido  de  todos 
OS  seuS)  envestio  o  esquadrao  contrario,  que  abrio 
a  for9a  de  bra^o.  Andr^  Vidal,  com  aquelles  sol* 
dados  que  Ihe  deo  o  repente  j  recebida  a  primeira 
carga  do  Flamengo,  sem  Ihe  dar  tempo  a  que  d^sse 
segunda ,  o  envestio ,  e  oortou  com  tao  for^osos 
golpes  y  que  por  onde  nao  partiao ,  destroncavao. 
Vinha  mais  distante  Antonio  Dias  Cardozo,  sup- 
prio  a  tardan^a  com 'a  intelligencia ;  cortou  pela 
fralda  do  mcmte,  que  Ihe  offerecia  caminho  mais 
curto,  e  de  lado  deo  uma  carga  cerrada  no  esqua- 
drao inimigo  com  tao  bom  emprego  que  Ihe  fez 
virar  as  costas  pela  ladeira  do  monte  contrario.  A 
no8sa[cavallaria^  que  por  aquella  parte  fazia  frente, 
sem  poder  voltar ^  porque  Ih'o  empedia  uma  grande 
quebrada  do  monte,  esperdu^  sem  movimento,  uma 
carga  do  Hollandez  com  tamanho  damno,  que  d'elle 
cairao  mortos  o  sen  tenente  Manoel  d'Araujo,  qua- 
tro  soldados^  seis  cavallos  e  alguns  feridos ;  porim 
OS  mais^  seguindo  o  alcance  aos  Flamengos,  fizerao 
tal  estrago ,  que  sobej^o  mortos  a  yingan9a.  No 
tempo  que  este  combate  andava  mais  travado,  yinha 
um  batalhao  do  inimigo  em  &vor  doa  sens ,  bus* 


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GA8TRI0T0  LU8ITA!K>.  587 

cando-no6  p6r  um  lado ,  e  sem  duvida  nos  dera 
muito  trabalho ,  sc  os  outros  capitaes ,  com  suas 
companhias  em  um  corpo,  se  nao  adiantarao  a  re- 
ceb^l-o  com  tao  furioso  encontro,  que  o  fizerao 
voltar  e  fugir.  Tinha  ainda  o  Hollandez  um  esqua- 
drao  de  reserva,  o  qual,  Tigilante  em  nosso  damno, 
esperou  a  occasiao  mais  opportuna.  No  mais  ba- 
ralhado  do  conflicto  corria  por  um  monte  a  cortar- 
DOS  pela  retaguarda  j  o  que  sendo  advertido  pelo 
mestre  de  campo  Francisco  de  Figueiroa^  subio  ao 
monte,  recebeo  na  ladeira  d'elle  com  uma  carga  de 
mosquetaria ,  assim  lograda,  que  sem  defensa  o  fez 
mudar  d'intento.  Fugio  desordenado  e  medroso, 
primeiro  de  nossa  espada  que  de  sua  perda ;  seguio- 
Ihe  o  alcance  com  uma  turma  de  moradores ,  que 
sem  consideracao  cortavao  por  sujeitos  e  rebeldes. 
£m  todas  as  partes  achava  o  Flamengo  uma  mesma 
fortuna ,  porque  em  todas  se  consumava  a  victoria 
com  uma  mesma  crueza .  « 

XXXYI.  Joao  Fernandes  Yieira,  quedeizamos 
no  monte  pelejando  a  peito  descuberto  contra  o 
esquadrao  inimigo ,  que  guardava  a  artilharia,  as*- 
sistido  dos  seus  obrava  de  maneira  que  os  nao  sabia 
ver  o  inimigo  sem  pasmo.  Longo  e  encami^ado  foi 
o  combate,  at^  que,  vencida  a  multidao  pelo  valor, 
foi  rota  e  ganhada  a  fortificacao  e  a  gente  contraria, 
e  se  fizerao  os  Portugueses  senhores  da  bagagem  e 
da  artilbaria  inimiga,  com  morte  do  coronel  Brine, 
general  do  Hollandez  nesta  empreza  :  andando 
montado  compondo  e  ordenando  os  seus,  como  va* 
loroso  capitao  e  destro  soldado,  quando  uma  bala 
o  matou,  e  logooutra  o  cavallo.  Ao  seu  almirante 


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i1»  Qwvmo  mffAiKK 

4o  niar  t\po\x  a  vida  outra  bala,  bem  junto  do  sua 
artUbaria.  Pero  Potyt  maioral  do8  Indioa,  com  sorte 
niaii  fa  vera  vd,  ficou  priaiopeiro.  Ganhada  a  artH* 
UiarU ,  e  posta  am  sua  guarda  a  gepte  nacessariat 
foi  Joao  Fernandas  Vieira  aeguindp  a  victoria,  oom 
t^nto  estrago  do  inimigo ,  que  o  nao  aabia  ver  a 
vingan^a  aem  Ustima.  Engolfado  no  alcance  o  vio 
perto  d«  ai  um  batalbao  de  HoUandezas^  a  sem  al^ 
gum  deaembainbar  a  eapada,  ?a  Ibe^rend^rap  todoSf 
pedindo  bom  quartel,  que  a  gi^eroaa  valentia  da 
Joao  Fernandea  Vieira  Ibea  conoedeo.  Nao  tinba 
fio«  sua  espada  para  cortar  fracos,  nem  readidoa ; 
obstinadoa  e  rebeldas,  sim.  -r^  Ainda  a  esta  bora 
durava  o  conflicto  naa  fraldas  doa  montes.  Com  a 
pspada  na  mao  faziao  maravillaa  oa  mestres  da  oampo 
finiri  Vidal  de  INagreiros,  Francisco  de  Figueiroa, 
e  0  aarganto  maior  Antc^uo  Dias  Cardoao»  aem  que 
dfvaiaa  ns^  a  9au  axemplo  a  imitaQao  do»  $aldadoa. 
Joao  Fernandes  Vieira  (com  a  propriedade  do  raioy 
que  sem  dascaoQar  mtn  e  mi  pelaa  parades  d'um 
^teio)  r^mpmdch^  0das,  aa  foi  nnir  com  oa 
ditQs  cabo»f  a  t^mpo  que  oinimigOy  afrouxando  no 
oombate  nos  ia  deUando  a  victoria  i  opprimido  da 
npsaa  yiolanaa^  largou  o  campo^  e  virou  aa  coataa , 
Qom  o  que  em  todaa  aa  partes  se  via  estrago  sem 
batalba.  Nim  bavia  oontrario  que  o  qui^ease  parei- 
cer ;  aa  armaa,  que  oa  aoousavao  inimigoa ,  deitavao 
longe  de  ai|  para  que  oa  nao  ^vertissem  oppostos. 
Os  ean^ados  a  feridos,  vestidoa  da  submisaao,  £ar 
siao  da  uaceasidade  virtude;  os  fliais,  deaadnados 
e  peiaeguidoa  do  borror,  da  eatragQ,  e  4a  sombra 
do  hnOf  aoffriaa  a  pnoipiiarrBe  pai^  qi^ehmdaa  e 


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CASmmO  VBfOtAJK^  5SQ 

grutas  doa  montei ,  nas  quaes  ^meiro  aefaayao  ft 
sepultura  que  a  morte.  IXestes  poucos  fovio  m 
que  aoertarao  ¥ereda»  gem  perigo ,  deixando  as  art- 
mas  J  que  o  desejo  da  vida  Ibes  fazia  largar,  oomo 
embara^  da  fuga.  Os  uossos,  que  por  toda  a  parte 
aeguiao  o  alcance ,  ja  captivavao  com  desprezo,  j4 
nmtavao  sem  colera.  A  cavallaria^  seguida  dos  mo«- 
radores  que  se  achavao  mootados ,  os  perseguirao 
eom  for^as  poupadas,  at6  is  portas  de  sua  fortalesa 
da  Barreta^  onde  o  cabo  conheoeo  os  seus,  para  os 
recolber,  pela  lingua^  mas  nao  pelas  oaras,  afeadas 
e  difformes  do  sangue  e  das  feridai.  Nos  Indios  e 
uegroa  do  Camarao  e  de  Henrique  Diaa  experiqaen* 
lanio  OS  tristes  vencidos  mais  viva  a  perseg^i9a0  e 
a  crueza,  porque  a  simgue  frio  matarao  (  naquelle 
e  nos  dias  seguintes)  muitos  HoUapd^Mss^  que  os 
matos  esoonderao ,  e  livraiip  do  primeiro  ferro. 
Pareoe  que  nao  virao  os  plhoa  e^mpo  de  batalbfL 
em  que  ( em  seu  tanto )  se  consideriiase  tamanho 
estrago. 

XXXVU.  Francisco  Barreto  de  Menazea,  a  quern 
ae  deveo  em  grande  parte  o  bom  aucoesso  d'este 
dia  J  moitrou  nesta  ocoasiao  o  juizo  e  a  destreaa 
com  que  usara  do  bastao  e  da  espada.  A  presraoa 
o  fez  testemunba  fiel  do  valor  de  aeua  eabos ,  e  da 
valentia  de  todos ;  e  a  eada  \m  em  particulw  fftur 
tificava  o  service  com  os  LjuYoras  e  com  oa  brai^, 
magoado  de  poder  nao  mediri-lhes  os  premioe  peloe 
m^recimmios.  Ao  menor  soldadp  honraya  e  en*- 
grandeoia  oom  o  favor  e  com  o  gabo ,  fazendo^'lhe 
entender  que  o  metiia  no  cora^.  Iguaes  todos  no 
goato,  oomo  o  foriftno  perigO|  ae  davio  recipDooos 


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5ft0  GASTBIOnO  LUSITAlia 

parabeDS  da  Tictoria.  — Durou  a  batalha  das  duas 
at^  is  oito  horas  da  noite  ;  tempo  em  que  os  nossos 
soldados  se  recolh^rao  a  seu  alojamento,  onde  sem 
lemhran^a  do  trabalho  festejarao  a  victoria  com 
universal  confissao  de  que  s6  a  Deos  se  deviao  as 
gracas  de  tamanho  beneficio.  Toda  a  noite  se  pas- 
sou  com  desvello  que  causa  a  desmaziada  alegria. 
A  relacao  do  perigo  afugentava  o  somno ;  a  me- 
moria  do  trabalho  nao  deixava  lembrar  o  repouso, 
e  muito  menos  as  vozes  e  estrondo  dos  instrumentos 
bellicos^.que  em  toda  a  noite  nao  deixarao  de  pu- 
blicar  o  triumpho.  Por  ordem  do  provisor  e  viga- 
rio  geral  se  fizerao  accoes  de  gracas  a  Deos  no  do- 
mingo  seguinte^  comgrande  solemnidadeeregozijo, 
assistindo  as  cummunidades  religiosas  e  grande 
concarso  de  povo. 

XXXVIII.  Com  o  preco  da  victoria  nao  teve  com- 
paracao  o  custo^  ainda  que  fosse  muito  consideravel 
a  perda.  Quarenta  e  sette  mortos  d^mos  A  terra, 
entre  elles  o  sargento  maior  Paulo  da  Cunha,  o  ca- 
pitao  tenente  de  cavallos  Manoel  d'Araujo ;  capi- 
taes  feridos^  Gosme  do  Rego,  que  morreo  em  breves 
diasy  Manoel  d'Abreu,  Paulo  Teixeira,  Joao  Soares 
d' Albuquerque ,  Jeronimo  da  Gunha  do  Amaral^ 
Estevao  Fernandes,  Manoel  Antonio  de  Carvalbo, 
Joao  Lopes,  Henrique  Dias;  estes  com  os  mais  fe- 
ridos  chegirao  a  fozer  numero  de  duzentos  e  sette: 
raro  foi  o  que  morreo  das  feridas  pelo  diligente 
cuidado  que  se  poz  em  sua  cura.  — Deixou  o  Fla- 
mengo  por  cima  de  dous  mil  homens  mortos ;  entre 
elles  o  general  Brine ,  e  o  almirante  do  mar.  Os 
feridos  se  nao  forao  todos^  ficarao  muito  poncos 


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CAsmuyto  lusitano.  5M 

por  assinaUr.  Nao  houve  quern  desse  numero  certo 
aos  prisioneiros ;  seria  porque  so  de  Pedro  Poty, 
maioral  dos  Indios^  fez  caso  a  vinganca.  Dous 
annos  e  meio  viveo  preso  em  duros  ferros,  depois 
dos  quaes  o  embarcdrao  para  o  reino  ;  viagem  que 
nao  acabou  atalhado  da  morte.  Entre  todos  os  des« 
pojos  forao  dez  bandeiras ,  o  de  maior  estima^ao  e 
0  de  maior  preco  o  estandarte  general  ^  que  ficou 
em  poder  de  Joao  Femandes  Y ieira ;  os  de  mais 
utilidade  seis  pecas  d'artilharia  de  bronze ;  armas 
de  toda  a  sorte,  sem  numero ;  municoes  de  todo  o 
generoy  mais  que  muitas ;  mantimentos  em  grande 
copia.  Os  demais  gosto,  a  copiosa  multidao  de  pra- 
tasanas,  chucos  e  alabardas^  em  que  os  nossos  viao 
destro9ada,  e  rendida  a  sens  p^  toda  a  confian^a 
inimiga. 

XXXIX.  Acharao-se  nesta  occasiao  o  mestre  de 
campo  general  Francisco  Barreto  de  Menezes ,  os 
mestres  de  campo  Joao  Femandes  Yieira^  Andr^ 
Yidal  de  Negreiros ,  e  Francisco  de  Figueiroa ;  o 
tenente  general  Philippe  Bandeira  de  Mella;  os  sar- 
gentos  maiores  Antonio  Dias  Cardozo^  Paulo  da 
Gunha ,  Jeronimo  de  Inojoza ;  os  governadores  de 
Indios  e  Minas,  D.  Diogo  Pinheiro  Camarao^.  e 
Henrique  Dias ;  o  capitao  de  cavalios  Antonio  da 
Silvae  Manoel  d'Araujo;  capitaes  d'infantaria  Joao 
Fradique,  Francisco  Berenguer ,  Joao  Soares  d'Al- 
buquerque,  Antonio  de  Castro ,  Jeronimo  da  Gunha 
do  Amaral,  AfFonsod' Albuquerque,  Gosme  do  Rego 
Barros,  Francisco  de  Lisboa,  Bertholomeu  Soares 
Canha,  Francisco  Barreiros,  Antonio  Borges  Uchoa, 
Joao  d' Albuquerque ,  Antonio  Rodrigues  Yidal , 


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Ml  Giiflaon  iniiMM. 

Mbmoel  Monii,  Yioente  Curtdo  Montinho^  Braz  de 
BiiTOB  Teixtira  ^  Domingos  de  Si  Barbosa ,  Paulo 
Teixeira,  Goncalo  Pereira  Fidalgo^  Brax  da  Rooha> 
Manoel  d'Akureu,  Francisco  Ramoe,  Manoel  Lopes, 
Amaro  Gordeiro^  Domingos  Ferreira,  Gregorio  de 
Galdas>  Simio  Metides,  Philippe  Ferreira,  Estevio 
Feinattdes,  Oregorio  Fragoso  d'Albaquerque^  Se^ 
bastilo  Ferreira^  Amonlo  da  Rocha  Damas,  Joao 
Barboza ,  Antonio  Curado  Vidal ,  Antonio  Rodri- 
gues  Franca ,  Joao  Lopes  i  Manoel  d'Aguiar^  Ma- 
noel Antonio  de  Garvalho,  Antonio  da  8iWa>  Ama- 
dor Rodrigues,  Fratidsco  da  Rocha,  Antonio 
Rodrigues  Santiago ,  Pedro  de  Miranda ,  Feraao 
de  Mello  d'Albuqtierctue  ^  D.  Joao  de  Souxa^ 
Amaro  Yclho  Gerqueira,  Frandsoo  Goutitihoi  Mi^ 
guel  Fernandes,  Clemen te  da  Rocha ,  Jacintho  da 
Grue )  e  Joao  Luit.  Fah&rio  nas  listas  os  nomes 
d'alguns  capitaes,  ou  porque  o  aWorofo  os  nao 
adTertioy  ou  porque  a  fragilidade  das  memcn^ias  os 
esqueceo* 

XL.  No  dia  20  de  Ferereiro^  depois  d'enterrados 
OS  mortos^  acommodados  os  feridosi  e  recolhido 
todo  o  despojo  do  campo  inimigo,  marchou  o  nosso 
exeroito  para  a  fortaleza  do  Arraial^  onde  foi  rece- 
hide  com  salvas  dos  presidios,  e  com  tumultuosa 
acclama^ao  de  vivas ,  que  sem  descan9o  davao  os 
moradoreSi  que  seguros  na  confian^a  da  victoria 
tinhao  jk  deixado  os  matos  e  esperavao  os  restaura- 
dores  de  sua  liberdade  para  os  acclamar  por  ta^. 
--^No  seguinte  dia  mandoU  o  Hollandez  embaixada, 
em  quepedia  suspensao  d'armas  para  dar  sepul* 
tura  aos  corpos  de  seus  mortos^  que  ficarao  sobre  a 


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terra  no  campo  da  batalha.  Goncedeo'^e^lhM  a  li-^ 
oeti^a  pcdidiBi^  e  o  sargento  maior  Antonio  Diaa  Gar-* 
dolo  foi  eiicarregado  de  assisiir  oom  a  infanlaria 
neoeaaaria  aos  ministros  hollandezes,  em  quanto 
durasae  o  enterro  segUndo  o  eatilo  da  guerra.  «-• 
0  capitao  hoUandez^  que  foi  encarregado  d'esta 
diligencia^  Tinha  acompanhado  d'um  judeo  muito 
conhecido  dos  nossos^  que  Ihe  servia  d'interprete. 
Pedirao  amboa  licen^a  para  yer  o  noaso  Arraial  i 
oonhecerem  e  abracarem  tao  deatinotoi  capitaes  ^ 
maa  outro  era  o  seu  fim.  Depois  de  conoedida  a 
licencat  foi  conduzido  o  oapitao  hollandez  a  preaen^a 
de  Francisco  Barreto  de  Menezes,  que  com  oa  cabos 
maiores  o  esperava  em  uma  sala  alia.  Subio^  e  com 
qeremoniaa  de  aubmiasao  o  aaudou  e  aos  mais,  e 
proaeguio  com  animo  doln^ado  dando  a  todoa  oa 
petamea  da  morte  do  sargento  maior  Paulo  da 
Gunha  i  e  de  Joao  Fernandas  Yieira ,  a  qual  elle 
muito  sentia  como  aoldado,  posto  que  no  Arrecife 
a  tiverao  por  tamanha  dita  que  oa  do  goyerno  se 
davao  una  a  outros  os  parabens.  Era  o  fim  da  yinda 
do  capitao  hoUandez  e  do  judeo  certificar'^se  da 
morte  de  noaso  governador  da  liberdade,  a  qual  ae 
espalharaentre  os  inimigos^  comoacima  dissemoa; 
por  issO)  Francisco  Barreto,  depois  de  Ihes  assegu* 
rar  que  Joao  Fernandes  Yieira  nem  ao  menos  fidira 
feridoy  o  mandou  chamar  ao  seU  engenho  de  Sao 
Joao  (nao  muito  distante).  Chegou  Joao  Fernandea 
Yieira,  e  depois  de  ouvir  o  que  a  seu  respeilo  disse 
o  capitao  e  o  judeo,  Ihes  respondeo  :  a  Se  os  se-> 
9  nhores  hoUandezes  dizem  que  dei  a  vida  pela 
»  victoria  y  fallao  pela  boca  do  seu  desejo;  se  o 


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5Uk  CA8II1090  LOSTAMw 

»  crem ,  i  negocia^ao  de  sens  delictos ,  porque  se 
»  persuadem  que  acabaria  seu  castigo  com  minha 
»  yida ;  mas  desenganem-se ,  que  se  a%6  agora  fiii 
n  seu  a^oute,  yivo,  d'aqui  por  diante  o  serei  como 
M  resuscitado;  porque  sabe  Deos  resuscitar  mortos 
»  para  castigar  soberbos.  i>  Passou  depois  a  (n^tica 
a  materias  jooosas,  com  que  os  nossos  cabos  os  en- 
iretiverao ;  agasalharao  -  nos  com  abundancia  e 
honra ,  ati  que  no  outro  dia  voltarao  para  o  Ar- 
recife ,  onde  o  desengano  fez  tanta  impreasao  bos 
do  goTemo,  que  foi  maior  a  tristeza  que  causou  a 
▼erdade,  que  toda  a  alegria  que  tinha  introduzido 
a  suspeita^  porque  a  causa  do  pezar  era  carta ,  e  a 
do  gosto  duvidosa. 

XLI.  Passarao-se  alguns  mezes  em  que  as  arma^ 
esti^^rao  suspensas  d'uma  e  d'outra  parte ,  occu- 
pando*se  ambas  em  rq)arar  suas  perdas,  disdpli- 
nar  seus  soldados,  e  aprestar-se  para  nova  luta. — 
Em  quanto  em  Pernambuco  succedia  o  referido, 
caminhava  no  reino  &  sua  execu^ao  o  assento  de  que 
08  navios  mercantes  navegassem  em  frotas ,  com- 
boiados  por  conta  da  nova  companhia  g^ral.  £m 
4  de  Novembro  de  i  649  saio  de  Lisboa  a  primeira 
froia,  seu  general  o  conde  de  Castellomelhor  Joao 
Rodrigues  de  Vasconcelhos  (a  quem  £1  Rei  Dom 
Joao  IV  mandava  governar  aquelle  estado) ,  e  por 
seu  almirante  Pedro  Jaques  de  Magalhaes,  cabos  ja 
entao  de  fama ,  e  que  depois  occupirao  os  maiores 
postos  de'  guerra.  Com  prospera  viagem  os  virao 
naquelles  mares  naturaes  e  estrangeiros ,  colhendo 
uns  as  premissas  de  suas  esperancas  n<5  seguro  do 
commercio ,  outros  confirmando  os  receios  de  que 


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CASTRIOTO  LUSITANa  546 

buscavao  seus  portos  com  segunda  tencao.  Este 
cuidado  servio  ao  Hollandez  de  freio  para  que  nao 
ousasse  levantar  o  braco  os  mezes  que  a  frota  tar- 
dou  em  voltar  para  o  reino. 

XLII.  Vio-se  Sisgismundo  livre  da  causa  que 
Ihe  tomava  a  respiracao,  e  quiz  experimentar  o 
estado  de  sua  fortuna.  Em  25  d'Agosto  mandou  um 
grosso  d'infantaria,  que  pela  estancia  do  Mendonca 
tomasse  o  pulso  a  nossa  vigilancia.  Saio  pela  forla 
leza  dos  Affogados,  como  a  maisproxima,  epresu- 
mia  remissao  em  nosso  cuidado  pela  continuacao 
do  ocio ;  mas  achou  as  vigias  despertas,  e  as  armas 
promptas.  Com  ellas  na  mao  saio  a  recebM-o  o  ca- 
pitao  Uchoa  com  a  gente  do  presidio,  a  qual,  como 
innundacao  reprimida,  rompeo  pelo  inimigo  com 
tal  violencia,  que  sem  esperar  segundo  golpe  virou 
as  costas,  deixando  sette  mortos,  que  Ihe  nao  per- 
mittio  retirar  a  pressa  do  alcance ;  e  nos  muitos 
feridos,  com  que  se  recolheo,  levou  a  melhor  cura 
de  seu  engano.  Em  7  d'Outubro  saio  para  atacar  a 
estancia  que  chamavao  do  Aguiar,  mas  nao  teve 
melhor  fortuna,  porque  o  capitao  e  seus  soldados  o 
rebatt^rao  com  grande  perda,  Em  1 5  de  Dezembro 
fez  o  Hollandez  outra  sortida  sobre  a  estancia  das 
Salinas,  embuscando-se  primeiramente  no  mato 
para  melhor  lograr  seu  intento ;  mas  os  nossos  tendo 
d'isto  noticia,  com  valor  o  investirao  ;  e  como  por 
algum  tempo  rebatesse  o  encontro,  larg^rao  os  nios- 
quetes,  e  tanto  que  desembainharao  as  espadas ,  os 
fizerao  virar  as  costas,  perdendomais  gente  na  fuga 
do  que  na  resistencia.  —  Desenganado  Sisgismundo 
que  nada  podia  obter  por  terra,  mandou  unia  pe« 
L  35 


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5i||6  GA5TRI0T0  LUSITANO. 

quena  esquadra  ao  no  de  Sao  Francisco,  escoiw 
dendo  a  necessidade  de  mandar  buscar  mantimen- 
tos ,  de  que  inuito  precizava ,  com  a  yoz  de  que 
mandava  a  destruir  os  moradores.  Em  os  ultimos 
d'este  anno  de  1650  saio  da  barra  do  Arrecife,  e 
deo  a  vda  para  o  seu  destino,  que  elle  julgava 
ignorado  dos  nossos ;  mas  Francisco  Barreto  de 
Menezes  tendo  nolicia  da  tencao  do  Flamengo,  de- 
liberou-se  em  mandar  qiiem  impedisse  sua  pre- 
tencao,  consultou  os  meslres  do  campo,  e  aprovada 
a  cautela,  nomeou-se  o  sargento  maior  Cardozo 
para  a  execucao  d'ella.  Em  5  de  Janeiro  saio  do 
Arraial  com  quinhenlos  soldados,  e  marcha  lao 
ligeira  que  ja  aos  15  cstava  dentro  dos  limites 
daquella  capitania,  da  qual  achou  ja  retirado  o 
Flamengo,  tao  obediente  ao  aviso  que  Ihe  deo, 
que  nada  conseguio  do  que  intentava.  Nao  tendo 
inimigos  que  combater,  abrazou  tudo  quanto  po- 
dia ser  de  prestimo  para  o  inimigo,  recolheo  tudo 
o  que  pareceo  util  para  os  sens,  e  se  voltou  para  o 
Arraial  magoado  de  obrar  so  o  facil. 

XLIII.  Continudrao  OS  nossos  em  sua  vigilancia 
armando  continuas  ciladas  ao  Flamengo^  com  tao 
bom  successo  que  quasi  se  nao  atrevia  a  sair  fora 
de  suas  muralhas,  aid  que  se  resolveo  a  sair  com 
maior  poder  para  nos  atacar  a  estancia  do  Men- 
donca.  Saio  com  etTeilo  em  a  manba  do  dia  7  de 
Abril  dc  1651  com  trezentos  infantes;  forao  logo 
descobcrlos  de  nossas  sentinellas,  derao  rebate, 
saio  o  capitao  da  eslancia  com  a  sua  gente  a  rece- 
ber  0  inimigo  :  por  largo  espaco  esteve  igual  a  pen- 
dcncia ,  al^  que  mettendo  os  nossos  mao  a  espada 


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GASTBIOTO  LUSITAlfO.  bill 

para  logo  se  indinou  a  victoria  a  nossa  parte.  Vi*- 
r^rao  as  costas,  e  deix^rao  quinze  mortos  pela$ 
custas ;  maia  leves  as  no^sas ,  que  nao  pass^rao  de 
seis  feridos.  —  Teve  neste  tempo  noticia  o  mestre 
de  campo  general  que  o  inimigo  andava  senhor  da 
campanha  do  Rio  Grande  como  se  a  elIa[nao  pud^ra 
chegar  a  nossa  espada ;  com  o  volo  dos  mestres  de 
campo  nomebu  o  capitao  Joao  Barboza  Pinto,  valor 
roso  e  pratico,  o  qual  saio  do  Arraial  em  16  de 
Julho  com  trezentos  soldados ,  e  ordem  que  sem 
perder  tempo  marchasse  ao  Rio  Grande,  e  mos«i^ 
trasse  ao  inimigo,  que  a  espada  dos  Portuguezes  a 
toda  a  parte  cbega,  e  por  tudo  corta.  Com  a  noti- 
cia da  yinda  da  nossa  gente,  recolh6rao-se  os  Hoi- 
landezes  e  Indios  a  uma  fortificacao,  que  tinhao  no 
sitio  das  Guarairas ,  onde  presumirao  a  defensa, 
mas  onde  acharao  a  entrega,  porque  investida  e 
ganhada,  perdfirao  todos  a  liberdade,  e  so  alcanca* 
rao  a  merc6  da  vida.  Correo  Joao  Barboza  Pinto  toda 
o  capitania ,  e  como  raio  abrazou  a  terra  de  modo 
que  nella  nao  deixou  homem  rebelde ,  nem  cousa 
util.  Voltou  para  Pernambuco  com  alguns  gados  e 
oitenta  e  tres  captivos  flamengos,  negros  e  indios, 
A  mesma  sorte  teve  o  Flamengo  n'uma  tentativa 
que  fez  contra  a  nossa  estancia  do  Aguiar,  onde  corw 
tado  de  nosso  ferro ,  e  perseguido  de  nossos  golpes 
deixou  precipiiadamente  o  campo,  deixandogrande 
numero  de  mortos,  e  fugio  a  buscar  o  abrigo  de  sua 
artilharia. 

XLIV.  Seis  mezes  deixou  o  HoUandez  descancar 
nossas  armas ;  estavao  os  nossos  soldados  descon- 
tentes  do  ocio,  pois  nao  sabiao  viver  sera  peleiar; 


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548  CASTRIOTO  LUSITANO. 

para  Ihes  satisfazer  a  vontade,  e  para  nao  deixar 
amortecer  o  espirilo  e  ardor  guerreiro ,  mandou  o 
mestre  de  campo  general  ao  sargento  m6r  Cardozo 
que  com  quacrocentos  soldados  se  emboscasse  entre 
as  fortalezas  dos  Afibgados  e  Barreta ,  e  picasse  o 
inimigocoTn  algumas  mangas  de  soldados.  Vio  o  co- 
inendor  da  Barreta  que  a  occasiao  o  convidava  com 
melhor  parlido ;  saio  com  alvoroco,  inveslio  com 
orgulho,  que  os  nossos  reprimirao  com  tanta  gen- 
tileza ,  que  o  comendor  dos  Afibgados  soccorreo  os 
seus  com  promptidao  e  poder ;  sairao  os  nossos  das 
emboscadas ,  e  em  esquadrao  unido  fizerao  frentc 
a  um  e  outro  inimigo ;  travou-se  a  pftleja,  accendeo- 
se  o  furor,  durou  tempo  consideravel  o  choque 
com  indifierente  fortuna:  mais  de  hora  e  meia  pro- 
fiou  a  ira  (tao  quentes  os  animos  como  as  armas). 
Com  a  resistencia  cresceo  o  vigor  da  nossa  gente,  e 
carregou  o  inimigo  de  sorte,  que  obedeceo  o  maior 
numero  ao  melhor  braco.  Roto  c  desordenado  o 
Flamengo,  buscou  na  fugida  o  remedio,  e  nella 
acliou  o  estrago  ;  levava  nas  costas  os  golpes  de 
nossas  espadas :  perdeo  as  armas  e  o  tino ,  e  sem 
saberem  como,  uns  se  deitdrao  ao  rio,  onde  niais 
de  pressa  beberao  a  morte ;  outros  correrao  a  bus- 
car  o  amparo  nas  suas  fortalezas,  deixando  no 
campo  quinze  mortos,  e  pelos  matos  muitos  feri- 
dos,  onde  os  mais  d'elles  perecerao.  Recolherao-se 
OS  Portuguezcs  ao  Arraial  alegrescomo  victoriosos; 
mais  agradecidos  a  occasiao  pelos  metter  no  choque, 
que  por  Ihes  dar  a  victoria. 

XLV.  Tendo  o  mestre  de  campo  general  noticia 
de  que  os  HoUandezes  tinhao  no  Rio  Grande  muito 


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GASTRIOTO  LUSITANO*  5&9 

pao  brazil  para  levarem  ao  norte ,  e  quereformadas 
as  rocas,  crias  e  plantas  colhiao  maQtimentos^  que 
mandavao  para  o  Arrecife,  se  determinou  a  man- 
dar  o  sargento  mdr  Gardozo  com  quinhentos  sol- 
dados  a  recolher  aquelle  genero ,  e  tudo  o  mais 
que  tivesse  prestimo,  e  abrazar  o  que  se  nao  po^ 
desse  conduzir.  Parlio  do  Arraial  em  20  de  Maio^ 
entrou  na  campanha  sem  ser  esperado;  rendeo 
muitos  negros,  dos  ludios  castigou  os  contrarios, 
e  fayoreceo  os  neutraes.  Destruio  as  rocas,  lavou- 
ras,  canaveaes  e  abeguarias;  entregou  ao  fogo  grande 
quantidade  de  pao  brazil ;  e  deixando  no  sangue 
e  nas  cinzas  o  mais  horrivel  pregao  de  nosso  furor 
e  seu  casdgo  voUarao  os  nossos  para  o  Arraial,  sem 
dilacao,  nem  perda,  onde  os  soldados  festejirao  a 
restituicao  e  posse  de  nao  pouparem  inimigos. 

XL VI.  Foi  este  golpe  dos  mais  sensiveis  que  re- 
cebeo  o  Flamengo^  porque  o  ferio  na  garganta  e  na 
bolca  y  e  nao  convaleceo  d'elle  em  todo  um  anno , 
tempo  em  que  em  tudo  se  negou  a  toda  a  occasiao, 
que  podia  dar  materia  e  argumento  a  nossa  historia. 
Tinha  visto  que  todas  as  tentativas  Ihes  falhavao ; 
nao  Ihe  restava  senao  um  meio  para  melhorar  sua 
fortuna ,  e  era  ganhar-nos  a  fortaleza  do  Arraial. 
C!onhecia  Sisgismundo  a  difficuldade  da  empreza ; 
mas  por  satisfazer  ao  desejo  dos  do  governo,  pro- 
poz-se  a  ganhar  primeiro  a  estapcia  do  Aguiar, 
sem  0  que  nada  podia  intentar  com  o  Arraial. — 
Em  1 1  de  Marco  de  1 653  saio  a  campo  com  poder 
proporcionado  ao  intento.  Era  capitao  d'aquella  es- 
tancia  AfTonso  d'Albuquerque ,  herdeiro  d'aquelle 
valor  que  fez  grande  o  nome  e  o  appcllido.  Assim. 


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550  GASTBIOTO  LUSTTANa 

que  descobrio  o  Flamengo,  saio  a  receb^l^o  com  o 
seu  presidio,  com  tal  f6rma  e  Talor,  que  apezar  de 
proBosa  resistencia  o  obrigou  a  largar  o  campo^ 
com  perda  de  nao  pouco8  mortos  e  feridos.  Pouco 
tempo  depots  voltou  o  Flamengo  com  maior  poder, 
bem  decedido  a  rocar  o  mato  que  cobria  a  nossa 
estancia ,  para  que  sua  artilharia  podesse  laborar 
contra  ella ;  mas  como  o  nosso  mestre  de  campo 
general  tivesse  reforcado  por  prevencao  o  presidio 
da  nossa  estancia ,  saio-lhe  o  conceito  errado. — 
Tinhao-se  os  Hollandezes  emboscado ,  e  esperavao 
que  quando  nossa  genie  saisse  para  os  rebater  cairia 
em  suas  maos,  e  logo  com  facilidade  se  apoderariao 
da  estancia ;  mas  o  capitao  Paulo  Teixeira,  que  se 
achava  com  muita  e  boa  gente ,  saio  da  estancia , 
rompeo  as  emboscadas ,  investio  o  esquadrao  ini-^ 
migo,  que  assombrado  de  se  ver  atacado  por  muito 
tnais  gente  do  que  esperava,  esfreou  na  resistencia^ 
e  (bgio  cortado  de  seu  espanto  e  de  nossos  golpes> 
tao  vergonhosamente  ^  que  nao  Ibe  bastou  a  causa 
para  Ihe  diminuir  a  injuria.  Determinou  restaurar^ 
ae  na  honra,  e  pelas  tres  boras  da  tarde  voltou  com 
dobrado  poder  e  arrogante  furia ;  mas  no  mesmo 
posto  encontrou  a  mesma  resistencia.  Sustentou 
o  avan^o  em  quanto  dur^rao  as  cargas;  mas  tanto 
que  sentio  o  corte  de  nossa  espada,  deixou  o  campo 
e  a  victoria,  contente  com  retirar  sens  mortos,  por 
DOS  diminuir  o  triumpho,  coroado  n'este  dia  com 
dobradas  palmas. 

XLVH.  Crescia  entretanto  no  Arredfe  a  fome 
com  a  falta  de  mantimento^ ;  era  a  barra  a  porta 
por  onde  Ihe  podia  entrar  o  sustento ;  acabara^^ae 


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CASTUOXO  LUSlTAMa  551 

0  das  presas ,  o  da  HoUanda  nao  chegata  y  e  havia 
mezes  que  se  nao  tinha  visto  embarcacaa  do  norte. 
For9ado  da  necessidade  aprestou  Sisgismundo  al- 
gumas  embarcacoes  para  mandar  ao  Rio  deSao  Fran- 
cisco, com  gente  de  guerra,  que  a  seu  salvo  condu- 
zisse  OS  gados  d'aquella  campanha  as  embarcacoes, 
e  Delias  ao  Arrecife.  For  ordem  do  mestre  de  campo . 
general  assistia  &  defensa  d'aquelles  moradores  o 
capitao  Francisco  Barreiras  com  a  sua  companhia , 
com  que  refreava  as  correrias  do  inimigo ;  dirao- 
Ihe  rebate  das  que  fazia  o  HoUandez ,  recolhendo 
gados  e  mantimentos ;  buscou-o  nosso  capitao  acom- 
panhado  de  sua  gente  e  d'alguns  moradores ;  avis- 
tarao-se  na  paragem  que  se  diz  Santa  Izabel.  Foi  o 
encontro  profiado ;  porem  como  o  inimigo  vio  que 
a  resistencia  Ihe  augmentava  o  damno ,  deixou  o 
campo  retirando-se  era  ordem,  mas  nao  sem  perda, 
que  Ihe  ficarao  no  campo  trinta  e  sete  soldados. 
Perdemos  nesle  choque  o  nosso  capitao  Barreiras 
e  tres  soldados,  e  tivemos  doze  feridos.  Ghegou  a 
nova  ao  Arraial ;  e  a  morte  do  capitao  enlutou  o 
gosto  da  victoria  :  mereciao  suas  prendas  todo  o 
sentimento  que  causou  sua  falta. 

XL VIII.  Ainda  nao  desenganado  o  Flamengo 
com  tantos  revezes ,  intentou  mais  outra  vez  ro^ar 
0  mato  que  nao  deixava  descobrir  a  nossa  estancia 
do  Aguiar.  Com  trezentos  homens  saio  pela  parte 
dos  AfTogados  a  intentar  o  c6rte  da  mata  entreposta. 
Gmarnecia  a  estancia  o  capitao  Francisco  Pereira 
Guimaraes  com  sessenta  soldados.  0  mesmo  foi  ver 
o  destemido  capitao  o  inimigo^  que  avancal-o,  rom- 
pd-o,  e  destruil-o  com  perda  de  tres  feridos,  um 


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552  CA8TEI0T0  LUSTTAIia 

capilao,  um  alferes  e  um  soldado.  Em  12  de  No- 
vembro  succedeo  o  choque ;  de  que  o  Flamengo 
saio  bem  sangrado,  mas  nada  convalecido.  Em  breves 
dias  voltou  com  o  mesmo  intentOy  e  quinhentos 
soldados.  Saio-lhe  ao  caminho  o  capitao  Manoel 
d'Aguiar;  com  leve  resistencia  o  desbaratoi!,  e  se- 
guio,  matando  e  ferindo,  sem  algum  Ihe  virar  a 
cara,  que  todos  levavao  no  abrigo  de  sua  fortaleza* 
Lastimado  e  confuso  o  deixou  o  caso ,  porem  nao 
arrependido.  A  breve  duracao  de  seu  imperio  mos- 
trou  nesta  contumaciam  que  luctava  j^  com  a  morte; 
deixou  de  profiar,  porque  Ibe  faltou  o  tempo,  e  nao 
porque  cobrasse  juizo ,  que  delirante  o  levava  ao 
ultimo  passo  de  seu  dominio. 


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LIVRO  XII. 


SUMMARIO. 


1.  Razoes  por  que  J.  F.  Vieira  desejava  dar  fim  A  guerra.— 2.  Fran- 
cisco Barreto  poe  a  empreza  em  coDselho.  —  3.  Pareceres  dos  mes- 
tres  de  campo.  --  4.  Chega  &  vista  de  PerDambuco  a  frota  da 
compaDhia  Tinda  de  Lisboa.  ^  5.  Francisco  Barreto  manda  visitar 
o  general  d'ella;  paga  esle  a  vistta  saindo  a  terra;  mas  escusa-se 
a  dar  auiilio  para  a  empreza  pelas  ordens  que  traz.  ^  6.  A  ins- 
tanctas  de  J.  F.  Vieira  ajuntao-se  em  conselho  os  cabos  de  mar  e 
terra  ^  sens  pareceres;  4  approvado  o  de  J.  F.  Vieira.  — 7.  D4-se 
principio  k  empreza  pela  fortaleza  do  Rego ;  dispoe-se  a  conquista 
do  Arrecife  por  mar  e  por  terra.  —  8.  J.  F.  ^eira  reconbece  as 
fortalezas ;  p5e  cerco  &  fortaleza  do  Rego.  —  9.  Formao-se  as  ba- 
tarias  e  se  abrem  as  cavas ;  intenta  o  inimigo  soccorrer  a  sua  for- 
taleza; com  que  successo.— 10.  Gontiniia  Andr^  Vidal  de  Negreiros 
OS  ataques,  e  se  Ihe  entrega  a  fortaleza  a  partido.— 11.  J.  F.  Vieira 
cerca  a  fortaleza  de  Altenar.  — 12.  Manda  Sisgismundo  largar  a 
fortaleza  da  Barreta,  de  que  D.  Dipgo  Pinbeiro  se  apossa.  — 
13.  Larga  o  inimigo  a  fortaleza  do  Boraco  de  Santiago;  mudade 
alojamento  Francisco  Barreto.  —  14.  Continuao  os  ataques  k  for- 
taleza de  Altenar,  e  se  Ihe  impedem  os  soccorros ;  amotinao-se  os 
Hollandezes,  e  a  entregao.  — 15.  Condicdes  com  que  saem  os  ren- 
didos ;  perda  d'uma  e  outra  gente.-*16.  Preparao-se  os  nossos  para 
combater  a  fortaleza  das  Cincopontas.  —  17.  Desamparao  os  Hol- 
landezes a  forlaleia  dos  Affogados.  —  18.  Ganha  Andrd  Yidal  a 
eminencia  do  Mihou ;  Sisgismundo  intenta  recuper&l-a ;  mas  retira- 
ae.  — 19.  Continiia  J.  F.  Vieira  os  aproxes  das  Ginco  Pontas;  per- 
suadem  os  judeos  a  entrega  do  Arrecife.  •—  20.  Pede  Sisgismundo 
suspensao  d'armas  para  tratar  da  entrega  do  Arrecife ;  com  que 
limite  se  Ihe  concede.  —  21.  Pessoas  que  se  nomeao  para  o  aeordo 
das  capitulacoes ;  proposta  do  HoUandez.  —  22.  Gapitula-se  a  en- 
trega do  Arrecife ;  com  que  partidos  e  condicoes.  —  23.  J.  F. 
Vieira  toma  possd  da  fortaleza  das  Cinco  Pontas*  da  cidade  Mau- 
ricea ,  e  de  todas  as  fortificacoes  e  almazens.  —  24.  0  mestre  de 
campo  general  faz  sua  entrada  no  Arrecife.  —  25.  Numero  dos 
rendidos,  da  artilbaria  e  das  annas.—  26.  Fementido  trato  do  Hol- 
landez.  —  27.  Francisco  de  Figueiroa  toma  posse  das  mail  capi- 


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554  CASTRIOTO  LUSITANO. 

UdIas  e  forUlezai.  —  38.  Segae  a  nossa  armada  a  sua  demU 
para  a  Babia  ;  saem  do  Arrecife  dous  avisos  para  o  reino ;  de  que 
S.  M.  recebe  a  nova.  —  29.  Pra^as  que  o  HoUandez  deiiou.  — 
30*  O  que  deve  a  na^o  e  o  reino  a  J.  F.  Vieira. 


I.  Nos  fins  de  Dezembro  de  1653  comecirao  os 
habitantes  a  mostrar-se  enfastiados  de  tanta  de- 
mora,  e  quasi  perdiao  a  esperanca  de  verem  co- 
roados  de  successo  seus  heroicos  esforcos.  Da  des- 
confianca  passavaoa  queixa,  accusando  de  frouxidao 
o  que  era  prudeDcia.  Dizendo  que  se  envestisse 
com  o  Arrecife  a  todo  o  risco ;  que  morrer  por 
morrer,  antes  no  assalto  com  gloria,  que  no  Arraial 
com  miseria ;  que  as  vidasque  consummia  o  tempo 
sem  fructo  melhor  se  empregariao  no  combate  com 
utilidade  e  honra.  Feriao  estas  queixas  o  coracao 
de  Joao  Femandes  Vieira  j  porque  se  considerava 
cabo,  companheiro ,  e  motivo.  Tinha  sido  causa 
para  os  moradores  toraarem  armas,  influindo  em 
todos  com  a  persuasao  e  com  o  exemplo ,  o  desejo 
e  esperanca  da  liberdade  :  razao,  que  o  fazia  autor 
da  pena  e  reo  da  queixa ;  estimulos  que  o  obriga- 
vao  a  envestigar  com  mais  cuidado  os  meios  por 
onde  melhor  se  poderia  conseguir  a  execucao  de 
sua  promessa.  Esta  era  toda  a  occupacao  de  seu 
juizo,  e  de  seu  desejo.  Tinha  assentado  comsigo 
que  para  a  conquista  do  Arrecife  e  suas  pracas 
valia  pouco  toda  a  hostilidade  de  terra ,  faltando 
poder  que  Ihe  impedisse  os  soccorros  do  mar;  e 
como  era  este  o  tempo  em  que  as  frotas  do  reino 
sulcavao  aquelles  mares ,  resolveo-se  a  pedir  o  soc- 
oorro  de  teus  cabos »  os  quaes  como  bons  Portu- 


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GASTRIOTO  LUSITANa  555 

guezes,  experimentados  soldados^  e  convidados 
pela  estimacao  dos  despojos ,  nao  se  recusariao  a 
tomar  parte  em  tao  gloriosa  empreza.  Propoz  ao 
mestre  de  campo  general  este  pensamento,  indicou- 
Ihe  OS  meios  para  este  fim ,  maDifestou-lhe  todas 
as  queixas  dos  moradores,  e  quam  resolutos  esta- 
vao  a  sacriGcar  as  vidas  para  acabar  o  que  haviao 
come^ado  e  proseguido  com  tanCa  gloria;  e  concluio 
dizendo  :  «  Ja  de  hoje  por  diante  poderemos  espe- 
»  rar  que  navegue  por  esta  altura  a  frota  do  reino^ 
»  comboiada  pelas  embarcacoes,  que  a  companhia 
»  do  commercio  geral  Ihe  tern  coiisignado ,  e  que 
D  for^osamente  hao  de  pairar  a  nossa  vista  em 
»  quanto  mettem  e  recolhem  os  navios  mercantes 
»  pertencentes  aos  portos  d'esta  capitania.  SeVossa 
n  Senhoria  com  sua  autoridade ,  e  os  moradores 
»  d'ella  com  sua  afllic^ao  representarem  aos  cabos 
»  da  armada  a  miseria,  a  que  estamos  expostos^  e 
j»  Ihesrequererem  seu  favor,  pedindo-lhes  se  deixem 
»  estar  alguns  dias  a  vista  do  Arrecife,  senao  como 
»  amigos  como  neutraes ;  e  n6s  por  terra  avan^a- 
»  remos  com  as  pra9as  do  Flamengo;  e  entendo  do 
»  presente  estado  das  cousas ,  que  ou  se  render^ 
»  assombrado,  ou  se  defendera  tao  remisso ,  que  a 
)»  pouco  custo  nos  restauraremos  no  dominio  usur^ 
»  pado.  £  nao  faca  duvida  a  Yossa  Senhoria  a  falta 
»  dos  aprestos,  porque  eu  os  quero  tomar  por 
»  minha  conta ,  assistindo-me  Yossa  Senhoria  com 
»  as  ordens  necessarias ;  a  quem  peco ,  considere 
»  n'esta  materia  com  a  atten^ao  que  pede  a  import 
tancia  d'ella ,  crendo  que  me  diz  o  cora9aO)  que 


)) 


»  tern  Deos  guardado  para  Yossa  Senhoria  o  re«- 


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556  GASTRIOTO  LUSITANa 

»  mate  d'esta  empreza ,  e  a  ultima  coroa  d'estas 
M  victorias.  • 

11.  Com  atten^ao  e  alvoroco  ouvio  o  general  ao 
mestre  de  campo ,  mostrando  no  semblante  a  ap- 
provacao  do  intento;  mas  como  prudente  general, 
disse-lhe  que  por  isso  que  a  empreza  era  diflScil, 
era  necessario  consult4l-a  com  os  mais  cabos  que- 
n'ella  deviao  lomar  parte.  Passarao-se  alguns  dias, 
e  como  o  general  nao  tomava  nenhuma  resolucao, 
foi  segunda  vez  Joao  Fernandes  Vieira  com  o  mesmo 
requerimento  ao  mestre  de  campo  general.  Recebeo 
este  com  o  mesmo  agrado,  conferio  com  elle  as  con- 
Iradiccoes ,  que  a  seu  parecer  faziao  a  execucao  im- 
possivel ;  facilitou-lh'as  Joao  Fernandes  Vieira  com 
demonstracoes  tao  claras ,  que  deixdrao  a  empreza 
sem  duvida ;  e  rematou  a  pralica  dizendo  que  alii 
se  achavao  os  tres  mestres  de  campo  com  sua  se- 
nhoria,  que  os  chamasse  a  conselho,  e  proposesse 
o  negocio,  e  se  resolveria  com  o  parecer  dos  mais 
votos.  Era  esta  a  determinacao  do  general;  pelo 
que  assenUrao  lugar  e  dia  conveniente  para  a  im- 
portancia  do  negocio  e  do  segredo.  Algumas  legoas 
distante  de  Nazareth ,  e  sette  do  Arraial ,  estA  uma 
hermida  da  invocacao  de  Sao  Goncalo,  em  sitio 
apartado  de  toda  a  communicacao  pelo  solitario  do 
lugar,  para  a  qual  chamou  Francisco  Barreto  no  dia 
seguinte  aos  tres  mestres  de  campo,  com  pretexto 
de  romaria.  A  titulo  de  passarem  a  sesta,  se  reco- 
Ih^rao  nella ,  apartando  de  si  os  criados  com  appa- 
rentes  motives.  Pedio  silcncio  e  segredo,  propoz  a 
empreza,  conformando-se  com  a  proposta  de  Joao 
fernandes  Vieira,  e  concluio  dizendo  :  «  Na  frota 


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GASTRIOTO  LUSITANO.  557 

»  que  por  horas  esperamos  do  reino  y  temos  quern 
»  corte  por  mar  a  communicacao  aos  HoUandezes ; 
))  e  nos  cabos  que  a  commandao,  quern  nos  favo- 
»  reca  por  terra .  Nesta  supposicao  quero  que  Vossas 
»  Mercys  me  digao  se  Ihe  parece  que  nos  apreste- 
M  mos  para  a  conquista  da  Arrecife  e  das  fortalezas 
))  que  o  guarnecem.  » 

III.  0  primeiro  que  votou  foi  o  mestre  de  campo 
Francisco  de  Figueiroa ,  e  expendeo  varias  razoes 
pelas  quaes  sustentou  que  a  empreza  era  nao  so 
arriscada,  mas  impossivelj  pois  nem  por  sitio,  nem 
por  assalto  se  poderiao  tomar  as  pracas  dos  HoUan- 
dezes y  pela  falta  de  meios  que  tinhamos  para  o 
ataque.  «Que  exereito  temos  para  a  circuravalacao? 
»  disse  elle;  que  artilharia  para  bater  tantas  pracas? 
»  Que  celleiros  para  sustentar  o  assedio  ?  Que  ihe- 
»  zouros  para  pagar  aos  soldados  ?  Que  aprestos 
«  para  os  aproxes?  Que  engenheiro  para  as  minas? 
a  Que  soccorros  para  as  perdas  ?  E  quando  nada 
»  fahara,  com  que  armada  o  havemos  de  cingir  por 
»  mar,  tao  vigilante  e  poderosa ,  que  sirva  de  ca- 
»  deia  para  impedir  os  soccorros,  e  de  freio  para 
»  atalhar  a  opposicao?  n  Seguia-se  o  voto  do  mes- 
tre de  campo  Andre  Vidal  de  Negreiros,  o  qual  foi 
de  parecer  contrario,  dizendo  que  a  empreza  nao 
so  nao  era  impossivel,  mas  menos  difficultosa  do 
que  diziao  ;  e  concluio  :  w  Se  hei  de  dizer  o  que  al- 
}}  canca  meu  juizo ,  posso  aflirmar  que  a  empreza 

tem  menos  de  perigo  que  de  receio  ;  e  quantas 
»  mais  forem  as  difficuldades,  com  que  nos  espera 
»  a  conquista ,  tantas  mais  serao  as  palmas  com 
»  que  nos  chamara  a  victoria.  Se  vota  meu  desejo 


» 


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559  cumioTO  LuairAm. 

i>  digOy  que  ]&  me  quizera  ver  no  assalto  dta  forti* 
»  ficacoes  iniinigas ;  e  que  cada  instante  de  deteuca 
»  ser^  para  mim  de  penosissima  roortiGcacao. 
»  Nao  saberei  o  que  digo,  mas  digo  o  que  aiato. » 
Joao  Fernandes  Vieira  tomou  entao  a  mao,  e  depois 
de  enumerar  as  yictorias  alcan^adas  contra  o  mi-* 
migo,  e  depois  de  ponderar  o  quaato  deviamos  con- 
fiar  na  proteccao  diviaa,  comecou  as  razoes  do  pri- 
meiro  voto^  e  fallou  nestes  termos  :  «  For  veniura 
»  OS  muros  das  fortiiicacoes  inimigas  sao  de  dia«* 
»  roante^  para  que  se  izenlem  do  ferro  e  da  mina? 
D  Sao  immortaes  seus  defensores,  para  que  os  nao 
»  offenda  o  goipe  e  a  bala  ?  Sao  os  contrarios  innu- 
»  meraveisy  para  que  os  nao  diminua  a  morte  e  o 
»  trabalho?  Sao  invenciveis^  para  que  os  nao  renda 
>)  0  perigo  e  o  medo?  Pois  com  que  razao  deixamos 
)»  em  suas  maos  a  escolha  da  occasiao  e  do  tempo 
D  para  Ihe  fezermos  guerra?  Ha  de  estar  em  sen 
»  querer  o  movimento  de  nossas  armas?  A  occa- 
»  siao  nos  persuade  a  que  o  desalojemos  e  destrua^ 
»  mos.  Que  melhor  tempo  que  este ,  em  que  se 
))  acha  falto.de  gente  e  de  soccorros  ?  Que  occasiao 
»  mais  favoravel  que  a  presente ,  em  que  a  frota 
»  de  Portugal ,  que  esperamos ,  nos  pode  dar  soc-* 
»  corro  e  gente  ?  Todos  sabemos  que  as  fragatas 
>)  contrarias,  poucas  e  mal  guarnecidas,  como  inu^ 
D  teis  &  defensa  andao  espancando  os  mares  em 
»  busca  dos  roubos  ;  e  quando  chamadas  da  ne- 
i>  cessidade  avistem  a  nossa  frota,  que  animo  terao 
»  para  a  envestir,  cossarios  que  so  vivem  de  rou- 
»  bar?  Isto  assim,  que  nos  ata  as  maos  ?  A  imagi- 
»  nacao  de  faltarem  aprestos  ?  Essa  nao  i  certa , 


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CASTRIOTO  LUSnANa  5S9 

»  porque  quando  nao  sejao  facets,  nao  aerao  impos^ 
»  diveia.  £u  me  obrigo,  com  averdade  que  sempre 
K  se  achou  em  minhas  promessas,  a  prevenir  todo 
n  o  neceasario  com  abundancia  e  segredo.  Nao  fie^ 
>}  mos  nosso  desejo  ao  tempo ,  que  serA  fial^K)  ao 
»  maior  inimigo  ;  poix}ue  86  elle  sera  poderoso  para 
»  nos  consummir  ;  e  fara  o  que  o  Flamengo  com 
»  todas  8uas  forcas  nao  pode  fazer.  Mostre  a  es^ 
»  pada  portugueza  que  em  nenhum  tempo  perde 
»  o  corte ,  e  que  no  descanco  se  aGa  para  cortar 
»  melhor  na  occasiao.  Demos  o  ultimo  realce  a 
»  nossa  fama ,  e  ficard  duas  vezes  grande  o  nome 
»  portuguez ;  uma  pelo  valor  com  que  vence  ba* 
»  talhas,  outra  com  a  ousadia  com  que  escala  for-* 
»  talezas.  »  Approvou  o  mestre  de  campo  general 
o  parecer  de  Joao  Fernandes  Vieira ;  louvou  seu 
zelo  e  patriotismo ;  prometteo-lhe  toda  a  assisten* 
cia  e  poderes  que  tinha ;  tomou  a  seu  cargo  o  cui- 
dado  de  espiar  a  frota^  e  a  diligencia  de  obngar  ao 
general  d'ella  a  sair  em  terra,  e  pedir*lhe  soccorro 
e  companhia  para  o  tempo  dos  assaltos.  Gonformes 
todos  neste  parecer  se  apartarao  a  prevenir  armas, 
e  a  desmentir  suspeitas. 

IV.  Em  20  de  Dezembro  appareceo  a  vista  de 
Pernambuco  a  frota  da  companhia  gdral  do  com- 
mercio,  que  saira  de  Lisboa  a  4  de  Outubro.  Seu 
general  Pedro  Jaques  de  Magalhaes,  almirante  Fran- 
cisco Brito  Freire.  Ji  Francisco  Barreto  de  Menezes 
estava  prevenido  por  um  aviso  que  receb^ra  em  7  de 
Dezembro ,  mandado  pelo  general  da  frota  da  ilha 
de  Cabo  Verde,  onde  aportara  para  recolher  os  na- 
vios  mercantes  que  alii  se  Ihe  aggregarao.  Com  os 


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560  CASTRIOTO  LOSITANO. 

olhos  do  receio  a  yirao  os  Hollandezes,  e  com  as 
da  esperanca  os  moradores.  Os  cabos  hoUandezes 
(  alheios  de  toda  a  noticia  de  seu  damno ,  e  s6  ac- 
cusados  dos  remorsos  da  propria  consciencia)  or- 
denarao  a  uma  esquadra  que  tinhao  no  mar,  que 
saisse  a  reconhecer  o  numero  de  vasos,  e  a  forca 
d'elles.  Comprirao  as  fragatas  inimigas  as  ordens 
ate  chegarem  a  bataria  com  alguns  navios  de 
guerra,  que  as  fizerao  apartararrependidas  quando 
ja  OS  navios  mercantes  estavao  surtos  na  forma 
conveniente  para  o  seguro  dos  que  haviao  de  en- 
trar  e  sair  dos  portos  daquella  capitania ,  e  para  a 
commutacao  de  generos  e  fazendas  da  companhia  e 
de  particulares. 

V.  Logo  Francisco  Barreto  assentou  com  os  tres 
mestres  de  campo  que  se  devia  fazer  todo  o  possivel 
para  tentear  o  animo  do  general  da  frota,  e  que 
seria  muito  a  proposito  para  o  intento  obrig&l-o  a 
sair  em  terra.  Despedio  o  mestre  de  campo  general 
urn  enviado,  que  da  sua  parte,  e  dos  officiaes,  exer- 
cilo  e  povo  Ihe  desse  os  parabens  da  viagem,  e  Ihe 
pedisse  licenca  pat*a  satisfazer  a  esta  obrigacao  pes- 
soalmente.  0  general  da  frola,  grato  e  officioso  se 
metteo  com  o  seu  almirante  n'um  esquife ,  e  nave- 
gou  para  terra ,  mandando  vogar  para  o  rio  Doce, 
onde  o  forao  receber  Francisco  Barreto  de  Menezes, 
Joao  Fernandes  Vieira,  Andr^Vidal  de  Negreiros 
e  Francisco  de  Figueiroa.  —  Deo-se  o  primeiro 
tempo  aos  abracos,  e  ^s  saudacoes ;  e  logo  se  passou 
a  pratica  do  negocio.  Fropoz  Francisco  Barreto  a 
resolucao  que  se  tinha  tomado ,  os  fundamentos 
sobre  que  estribava  a  confianca,  com  que  todos  es- 


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CASTRIOTO  LUSITANO.  561 

rayao  o  favor  e  ajuda  de  sua  senhoria,  pois  o  assis- 
til-os  naquella  empreza  era  service  de  Deos,  utili- 
dade  do  reino  y  interesse  da  companhia ,  e  unico 
remedio  dos  PerDambiieanos.  Que  negal-o  sem 
risco,  e  sem  dispendio,  na  presente  occasiao,  seria 
perdel-a ,  com  a  reputacao  das  armas  portuguezas, 
e  o  credito  de  cabos  de  Ian  to  nome ;  pois  quem  os 
nao  visse,  na  presente  miseria,  lastimados  e  com- 
padecidos  os  nao  havia  de  crer  valerosos ;  e  per- 
dida  a  restauracao  de  captiveiro  tao  duro,  por  culpa 
de  sua  senhoria,  Ihe  nao  ficava  razao  para  se  dis- 
culpar,  nem  para  com  Deos,  nem  para  com  os  ho- 
mens.  0  general  da  armada ,  indeciso  entre  a  com- 
ipiseracao  e  a  homenagem,  mostrou  que  a  obediencia 
Ihe  atava  as  maos  a  piedade ,  e  disse  que  elle  nao 
trazia  ordem  de  seu  Rei  para  a  minima  hostilidade, 
nem  da  companhia  geral  para  o  menor  desvio  d'a- 
quella  frota,  obrigado  por  juramento  a  conservacao 
e  breve  despacho  d'ella;  que  de  fazer  o  contrario 
se  poderia  seguir  exasperar-se  o  inimigo,  e  alterar 
as  pazes  com  o  reino,  e  pagar  elle  com  a  cabeca  a 
desobediencia  e  o  damno,  porque  senao  havia  de 
julgar  por  leve  culpa ,  a  que  commettesse  em 
oflPensa  de  nacao  tao  bellicosa. 

VI.  Insistirao  os  mestres  de  campo^  e  entre  elles 
com  mais  efficacia  Joao  Fernandes  Vieira,  allegando 
tao  fortes  razoes  que  o  general  e  almirante ,  cru- 
zando  as  maos,  se  rendfirao  ao  seu  parecer,  e  de 
companhia  forao  todos  para  a  villa  de  Olinda,  onde 
convierao  em  que  ao  outro  dia  se  chamassem  a  con- 
selho  todos  os  ofTiciaes  da  primeira  plana ,  como 
mestres  de  campo ,  tenentes  generaes  e  sargentos 
I.  36 


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5M  GASTRIOIO  LOfflTANa 

maiores,  ptra  que  multiplicados  os  requa*iment08 
achasse  sua  desobediencia  desculpa  na  instaucia. 
Em  25  de  Dezembro  acudirao  os  chamados,  e  foiio 
OS  do  congresso  o  general  e  almiranie  da  frota,  o 
mestre  de  campo  general  Francisco  Barreto  de  Me- 
nezes,  os  mestres  de  campo  Joao  Fernandes  Yieira, 
Andr^  Vidal  de  Negreiros,  Francisco  de  Figueiroa; 
0  tenente  general  Philippe  Bandeira  de  Mello;  e 
os  sargenlos  maiores  Antonio  Dias  Cardozo ,  An- 
tonio Jacome  Bezerra,  e  Jeronimo  de  Inojosa. — 
Quando  da  conferencia  se  esperava  a  determinacao 
applaudida,  se  desentranharao  em  dilficuldades  os 
primeiros  volos,  ou  porque  a  emulacao  os  produ- 
zia,  ou  porque  a  desconiian^a  os  formava.  Com  o 
parecer  dos  mestres  de  campo  Andr6  Vidal  e  Fran- 
cisco de  Figueiroa  Gcou  o  negocio  vencido,  e  Fran- 
cisco Barreto  com  lagar  para  esperar  a. determi- 
nacao do  general  e  almirante  da  frota  ;  por^m  elles 
disserao  que  nao  haviao  de  resolver  cousa  alguma 
sem  primeiro  ouvirem  o  parecer  de  Joao  Fernandes 
Vieira ,  em  cujo  peito  nascera  e  se  alimentara  o 
processo  daquella  causa.  Fedio-lhe  o  mestre  de 
campo  general  que  desse  o  sen  parecer,  o  que  fez 
da  maneira  seguinte.  \<  Teinos  neste  couselho  os 
»  ministros  maiores,  e  do  maior  poder  que  nossa 
»  liberdade  poderia  desejar ;  e  quando  imaginei 
»  que  a  razao  vencia  toda  a  duvida,  vejo  fallar  na 
»  materia  com  tanta  variedade,  que  me  persuado 
»  se  desconhece  a  substancia  e  as  circumstancias 
»  da  empreza.  A  expugnacao  das  pracas  hollan- 
»  dezas  podia  ser  volontaria  em  quanto  este  con- 
»  gresso  a  nao  publicou  forcosa,  Nelle  se  divulgou 


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ja  a  intento }  e  publica  a  conferencia ,  queip  ni\p 
»  y^  que  necessariam^nte  se  ha  de  executar  a 
Jt)  delermina^o?  Em  se  recusar  cousiste  nossa  xj- 
]»  tima  perdi^ao.  Qu^  conceito  ha  de  fazer  de  i^os- 
»  sas  arinas  o  ipimigo^  s^  alcancar  que  se  Ihe  n^o 
>  atreve  o  nosso  in2\ior  pocjer  ?  Desprezara  o  que 
JD  teme,  conservara  q  que  possue,  e  conquislara  o 
jt)  que  deseja.  At^  agora  nos  atou  as  inaos  a  im- 
»  possibilidade  de  o  cingirera  por  ipar  ,•  agora  que 
n;  nossa  fortuna  nos  oflerece  o  qvie  desejavamos 
»  desppezamos  a  dita  ?  Co^)Oy  ou  quando  espera- 
»  mos  cobrar  semelhante  ocpasjao  ?  Entendia  eu 
»  que  para  o  que  se  l^a  de  o^rar  forcosamente , 
>^  nao  se  votava  se  ha  ou  nao  ha  de  ser,  senaq  por 
^  que  meios  se  ha  d^  consegujr*  Dei^os  caso  que 
))  seja  tania  nossa  desgra^a  que  nao  ganhemos  q 
M  Arrecife ;  ganharemos  algunjas  de  suas  fortalezas 
»  e  ficara  nosso  p^rtido  melhorado,  o  podf^r  ini- 
»  migo  enfraqueeido,  e  o  mundo  certo  qi^e  6  nosso 
»  valor  maior  que  nossa  for(una ;  e  quando  menos 
»  ficara  este  povo  com  a  esperanca  de  que  o  ini- 
»  migo  aiormentado  de  nossos  golpes  vira  facil- 
»  mepte  em  alguma  congruencia  util.  r^ 

VII.  Concord^rao  todos  na  conquista  das  pracas 
inimigas,  e  passarao  os  generaes  a  tratar  do  modq 
e  da  parte  em  quQ  se  bavia  de  empregar  o  primeiro 
golpe,  com  moral  cerleza  de  que  ferisse  e  nao  res- 
valasse.  Vot^rap  neste  particular  por  sua  ordem, 
e  forao  tao  diversos  os  pareceres,  como  os  votantes. 
Diflerente  de  todos  fallou  Joao  Fernandes  Vieira  : 
disse,  que  para  o  fim  desej^do  se  deviao  arrimar  a 
forlaieza  das  Salipas ,  que  chamavao  de  Francisco 


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564  CASTRIOTO  LUSITANO. 

do  Rego ,  ]K)rque  era  a  de  menor  foroa ,  a  de  me- 
Ihor  terreno,  e  a  de  maiores  eonsequencias;  com 
ella  se  ganhava  a  passagem  do  rio,  se  desempedia 
o  caminho  da  villa,  se  desquartinavao  as  fortalezas 
do  Perrexil,  Brum,  e Buraco  de  Santiago;  e  d ella 
se  podiao  varejar  o  Arrecife  e  a  Barra ;  pela  dis- 
tancia  longe  dos  sdccorros,  e  pelo  sitio  facil  para 
seimpedirem.  Este  parecer  agradou  a  todos,  efoi 
appro vado  como  o  mais  acertado. — Conferio-seo 
modo,  c  se  resolveo  que  a  primeira  diligencia  fosse 
espalharem-se  cartazes  em  tpdas  as  linguas  d^js  na- 
coes  que  militavao  com  o  Flamengo,  pelos  quaes 
se  promettesse  premio  ou  castigo  aos  que  fossem , 
ou  nao  fossem  da  nossa  parcialidade ;  o  que  nao 
deixaria  de  obrar  muito,  a  vista  de  nosso  poder  e 
resolucao.  Ordenou-se  que  lodas  as  faluas  da  ar- 
mada e  barcos  parliculares  fizessem  todos  os  dias 
demonstracao  de  frazerem  gente  da  armada  para 
terra,  em  repetidas  viagens,  de  sorte  que  o  inimigo 
contando  as  parlidas  sommasse  um  excessivo  nu- 
mero  de  combatenles ;  c  que  se  tomassera  a  levar 
da  terra  para  as  naos ,  tanto  que  fosse  noite,  [)ara 
que  no  outro  dia  representassem  a  mesma  ficcao,  e 
que  ullimamente  aquella  infantaria,  queescusasse 
a  guarnicao  da  armada,  ficasse  em  terra  &s  ordens 
do  almirante  Francisco  de  Brito  Freire.  Advertio- 
se  que  os  navios  mercantes  de  menos  tonelladas 
se  mandassem,  com  sufBciente  guarda,  para  os 
portos  do  sul ,  para  onde  era  sua  direita  descarga 
( OS  quaes  todos  aportarao  a  salvamento  ) ;  que  os 
de  maior  vulto  e  alguma  forca ,  com  os  de  guerra 
formassem  um  precinto ,  em  forma  prolongada , 


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GASTRIOTO  LUSITANO.  565 

que  recolhesse  dentro  em  si  a  barra,  e  a  barreta 
do  Arrecife ;  que  no  seio  d'este  meio  circulo  an- 
dassem  alguns  patachos ,  e  embarcacoes  de  remo 
aos  bordos,  naquelles  fundos  em  que  podessem 
boiar ;  que  preparassem  cinco  ou  seis  somacas  ar- 
tilbadas  e  guarnecidas,  que  de  noite  ao  modo  de 
ronda  corressem  aquelle  mar,  que  cingisse  a  cir- 
cumferencia  da  armada;  que  por  seu  turno  se  des- 
tinassem  duas  companhias  de  infantaria ,  para 
guarda  das  praias  do  norte  e  do  sul  do  Arrecife ; 
tudo  a  fim^de  que ,  nem  por  mar  nem  por  terra , 
nem  de  noite,  nem  de  dia,  podesse  entrar  o  menor 
soccorro  ao  Fiamengo. 

VIII.  Pedirao  ao  mestre  de  campo  Joao  Fernan- 
des  Vieira  que  na  noite  seguinte  saisse  com  os  ho- 
mens  que  escolhesse  a  reconhecer  as  pra9as  do 
inimigo,  com  as  fortificacoes  d'ellas,  terreno,  en- 
iradas,  e  saidas  de  cada  uma,  e  tudo  o  mais  neces- 
sario  para  a  intelligencia  de  nossa  disposicao,  Pedio 
dous  engenheiros^  escolheo  alguns  poucossoldados^ 
e  fez  tao  exactamente  a  diligencia,  que  nao  houve 
estacada  de  fortaleza  contraria  que  nao  tocasse  com 
suas  proprias  maos;  de  algumas  foi  seutido,  e  com 
se  deitar  por  terra  com  os  sens  se  livrarao  do  chu- 
veiro  de  balas  que  o  inimigo  disparava  y  e  socegado 
o  alvoroco  continuava  na  diligencia  com  tanto 
desprezo  do  risco ,  que  visto  foi  admiravel ,  e  ou- 
Tido,  incrivel.  Sobre  a  madrugada  se  recolheo,  e 
repetio  ao  mestre  de  campo  general  o  que  exami- 
nou  e  descobrio ;  o  que  elle  agradeceo  e  iouvou 
com  as  honras  e  encarecimentos  que  merecia  ta- 
manho  servico.  Fez^se  aviso  a  todos  os  fronteiros, 


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566  GASTIOOTO  LVSltANO. 

que  sem  descancar  picassem  o  HoUandez  par  todas 
ks  partes,  porqtie  nao  podesse  stispeitar  a  qnal 
d'^llas  se  6tfcaminhava  o  primeiro  golpe  de  no^a 
espadii.  —  Etitroti  o  anno  dt  1654,  e  a  5  <te  Ja- 
neiro comeco*  a  manifesta  e^cpngnac&o  das  ft>rta- 
lezas  iViiinigas.  Ne^te  e  nos  segaii!ites  xKa^s  saira6 
das  ertbarcacoes',  par  muiUs  vezes ,  nao  poucos 
b^rcos  carregados  de  infantam  e  pe(?re<^KJS  d^ 
guerra,  as  bandeiras  tetidtdas,  tocando  caixas,  e 
dando  sirlvas  de  mosquetaria  ;  uns  postos  em  fehra 
voltavao  as  faluas  a  bi!iscar  outros,  seguindo  o  es- 
tratagema  ^as  ordens  dadas.  Os  "navios  da  armada 
formarao  o  circulo,  e  executarao  tudo  o  xpie  fidrra 
orde^ado.  As  dezoito  fragalas  hoHimdezas ,  que 
pefb  forma  'dicta  reconhecerao  a  determittacao , 
postas  ao  la^go  soharao  as  v^las ,  e  se  engoMiir&o 
de  sorte  qae  desapparec^rao.  Segoros  com  a  par- 
tfdd  d'trma  e  ^pi'cisenca  d  outra  armada  sairao'des 
portos  de  Sirinhaem>  Rio  Formcfeo,  Tamandar^, 
eCafmaragibe  as  embarcacoes,  que  'estkvao  apres- 
tadas  para  o  reino,  e  todas  etftr^rrao  lia  barra  de 
Nteardt?h ,  ottde  tambem  servMo  pot  mar  k  con- 
dncc&o  dos  soldados^  petrechos,  'e  generos^reve- 
Blldos  por*aqtiellas  partes,  para  a  occasiao  do  cerco. 
Pas80u-se  orde'tti  aos  fronteiros  que  se  aviirinlias- 
sem  ^om  suas  goafrnicoes  6s  fcfrtalezas  contraa*ias 
de  maneira  que  ficassem  suas  estancias  tre^centas 
bracas  d'ellas  em  sieios  que  as  cc^brissem  os  aivo- 
redos  dos  bosques ,  e  iiesta  fdrma  fizcssem  cosltas 
a  conduccao  da  artilharia  e  materiaes  necessarios 
para  as  plataformas  e  reparos,  com  que  se  haviao 
de  bater  as  fortalezas  do  Rego  e  de  Altenar.  B^esie 


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GASTRIOTO  UJSITANO.  *  567 

dia  at^  o  4  4  se  occupou  a  nossa  gente  em  levar  && 
luaos  nove  pe^as  de  bronze,  sendo  cinco  de  24^  e 
as  mais  de  1 8  e  1 4 ,  sem  que  o  inimigo  tivesse  o 
meoor  indicio  de  zu>sso  trabalho,  nem  da  uosso 
ijQlento.Porfim  veio  a  ter  noticia  de  nosso  projecto, 
e  SisgLsmujado  comecou  a  preparar-se  para  a  de- 
feza.  —  Aos  13  mandou  o  mestre  decampo  ge- 
neral ajuntar  o  exercilo  a  surdina ;  constava  elle 
de  dous  mil  quinhentos  soldados ,  fora  de  mil  iti" 
fanteSy  que  guarneciao  as  fortalezas  do  Arraial, 
villa  deOlinda^  Pao  Amarello,  e  Barreta.  Em  14  de 
Janeiro,  dia  em  que  tocava  a  vanguarda  ao  mestre 
de  campo  Joao  Fernandes  Vieira,  o  chamou  Fran- 
cisco Barreto,  e  Ibe  ordenou  que  fosse  com  seu  terco 
p6r  sitio  e  bataria  &  fortaleza  das  Salinas  y  que  se 
dizia  de  Francisco  do  Rego ,  condemnada  ao  pri- 
meiro  furor  de  nossas  armas,  dizendo^lhe  que  ao 
seu  braco  e  sua  fortuna  fiava  o  logro  de  suas  es- 
peran^as ;  e  que  a  este  fun  escolb^ra  aquelle  dia 
por  conhecer  o  quanlo  importava  tomar  a  victoria 
0  principio  da  quella  mao  da  qual  o  tomara  a 
guerra.  Rendeo-lbe  Joao  Fernandes  Vieira  as  gra- 
cas  da  estima^ao  que  d'elle  fazia ;  deo  conta  a  sens 
soldados  e  ofUciaes  da  ordem  recebida ,  com  tanta 
alegria  e  alvoro9o,  como  se  naquelle  servi9o  lev^a 
o  premiode  todo  seu  merecimento.  Via  conseguido 
o  que  mais  desejava,  e  nao  cabia  em  si  mesmo  com 
o  gosto  que  tinha ;  assim  como  o  sentia  o  manifes- 
tava,  dando  a  todos  o  parabem  de  sua  liberdade,  e 
da  redempcao  de  sua  patria.  Exbortou  a  todos  com 
animo  seguro  da  victoria,  e  ao  anoitecer  se  poz  em 
marcha  com  o  seu  ter^o  em  direiiura  ao  sitio  das 


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568  GASTBIOTO  LDSITAMO. 

Salinas,  seguindo-o  o  mestre  decampo  general  com 
todo  o  exercilo,  que  se  alojou  pelo  reverse  das  ba- 
tarias. 

IX.  Protegidos  pelas  sombras  e  silencio  da  noite 
carregarao  os  gastadores  oito  cesioes  feitos  por 
conta ,  OS  quaes  se  assentarao ,  ench^rao ,  e  terra- 
plen^rao  a  tiro  de  pistola  da  fortaleza  inimiga ,  e 
assim  mesmo  grande  copia  de  saeos,  que  se  ench^ 
rao  de  areia  e  terra  para  reparo  de  quatro  meios 
canhoes  de  24,  com  que  se  havia  de  bater  a  forca, 
todos  levados  &  mao,  distancia  d'um  tiro  de  mos- 
quete  (sem  rumor,  que  o  Flamengo  podesse  sentir) 
com  quinhentos  mosqueteiros  de  guarnicao.  Assen- 
tou-se  a  explanada ,  e  nella  a  artilliaria ,  e  se  deo 
logo  principio  a  cava,  que  saia  dos  lados  da  plata- 
fdrma,  na  qual  se  trabalhou  com  tanto  cuidado,  que 
antes  de  amanecer  a  tinhao  desembocado  no  rio , 
de  sorte  que  ficou  a  fortaleza  cercada  do  ambito 
que  formavao  rio ,  bataria  e  cavas ,  das  quaes  se 
desquartinava  a  porta  da  fortaleza  a  tiro  de  pedra. 
Abrirao-se  estradas  encobertas  para  o  servico  da 
gente  e  commodidade  dos  soldados ;  e  foi  cousa 
incrivel  o  silencio  com  que  trabalhava  a  multidao 
dos  gastadores,  tanto^ue  nao  teve  o  inimigo  indi- 
cio  de  que  podesse  formar  a  menor  suspeita.  Os 
tabooes  e  pranchas  de  que  se  fizerao  as  platas-for- 
mas,  d'onde  haviao  de  jogar  as  pecas,  se  apontarao, 
e  postos  OS  pregos  nos  furos  se  ordenou  que  a 
cada  um  estivesse  um  soldado  com  um  seixo  na 
mao,  e  a  certo  sinal  se  pregas§6m  com  tanta  uni- 
formidade,  que  o  golpe  de  muitas  parecesse  d'uma 
«o  mao.  Rompeo  a  manha  de  45,  e  as  nossassen- 


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GASTRIOTO  LUSITANO.  569 

tinellas,  que  estavao  a  falla  com  as  do  HoUandez, 
Ihe  derao  os  bons  dias,  e  a  nossa  artilharia  a  pri- 
meii^a  salva ,  tudo  tanto  a  um  mesmo  tempo ,  que 
Ihe  pareceo  ao  inimigo  sonho  o  estrepito  que  ouvia. 
Perdia  o  juizo,  quando  vio  e  experimentou  nosso 
Irabalho  e  seu  perigo ;  e  maior  fora  seu  espanto  se 
vira  na  portugueza  devacao  seu  castigo  e'nossa  con- 
fiaD9a.  Com  igual  furor  coutinuava  a  bataria  d'uma 
e  outra  parte ,  se  hem  que  com  desigual  effeito , 
porque  os  nossos  pelouros  se  armavao  das  astilhas 
de  seus  reparos ,  com  que  matavao  e  feriao  gente ; 
nao  assim  as  suas  balas  que  a  terra  e  areia  de  nossa 
fortificacao  recebia  e  sepultava.  Mais  de  seiscentas 
balas  grossas  despararao  as  suas  fortalezas  sobre  a 
nossa  bataria.  Nesta  sua  forca  se  defendiao  cento  e 
tantos  soldados  com  o  seu  capitao  Ugo  Maior,  cabo 
de  opiniao  entre  elles  j  a  qual  augmentou  neste  dia 
com  duas  saidas  animosas,  ainda  que  inuteis.  Nao 
deixava  a  nos$a  mosquetaria  apparecer  nos  altos 
da  sua  fortaleza  homens  que  nao  pescasse.  No  mais 
vivo  da  contenda  intentarao  cinco  Hollandezes  en- 
trar  na  fortaleza  (mandados  sem  duvida'com  algum 
aviso) ;  por^m os  nossos  soldados  o  impedirao  com 
morte  de  quatroe  fugidadeum.-rSisgismundo,  que 
entendia  o  quanto  Ihe  importava  a  conservacao 
d'aquella  praca,  preparou  um  copioso  soccorro 
com  tanta  diligencia  que  pelas  tres  boras  da  tarde 
avis^rao  as  nossas  sentinellas  que  o  Flamengo  por 
mar  e  terra  vinha  a  soccorrer  a  fortaleza.  Joao  Fer- 
nandes  Vieira,  que  nas  occasioes  vira  sempre  repre- 
sentadas  as  viclorias ,  avaliou  aquella  bora  pela  de 
sua  melhor  fortuna.  Vio  que  por  terra  marchava 


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510  GASTBIOTO  LOSITAMa 

um  esquadrao  coberto  da  artilharia  de  todas  suas 
for^asy  para  franquear  a  porta  da  foriakza  siciack, 
ao  soceorro  de  gente^  municoes,  e  mantimaitos  , 
que  em  lanchas  navegava  a  elia.  Ja  vinie  Flamen- 
cos tinhao  saltado  em  terra,  carregados  de  cunbetes 
de  polvora  e  bala,  quando  os  nossos  soldados,  ani- 
mados  do  preceito  e  do  exemplo,  com  a  espada  na 
mao  descobrindo  a  um  mesmo  tempo  o  peito  as 
balas  e  o  braco  aos  golpes^  sairao  de  seus  reparos^ 
e  envestirao  o  soocorro  e  a  escolta  com  valor  tao 
ousado,  que  os  vinte,  largando  a  cai^,  se  acolh^rao 
is  landias  com  agua  pelo  pescoco ;  e  ellas  ao  Arre- 
cife,  €om  deixarem  algumas  encalhadas^  que  pa- 
garao  por  todas.  0  esquadrao  da  terra  ^  como  tinba 
o  caminbo  mats  desembaracado »  assun  teve  mais 
franca  a  fugida.  Desbaratado  d'esta  sorte  o  inteoto 
e  o  soceorro,  se  retirarao  os  nossos  a  seus  aloja- 
luentos,  com  ianto  deseniado,  que  por  baixo  das 
iriucheiras  inimigas  fizerao  seu  caminbo.  Nesta 
occasiao  uos  fedrao  o  capitao  Sebastiao  Ferreira,  e 
o  seu  alferes;  nella  padeceo  o  inimigo  muito  daDmo 
de  mortos  e  feridos ,  -e  tauto  que  nuuca  mais  se 
atreveo  a  comprar  a  opiuiao  pelo  preco. 

X.  Entrou  con)  a  nolle  o  mestre  de  campo  An- 
dr^  Vidal  de  Negreiros^  a  quem  a  vanguarda  cabia 
por  turno.  Gontinuarao-se  os  aproxos,  sem  que 
d'uma  e  outra  parte  afirouxasse  a  bataria.  0  ca- 
pitao inimigo  aconselhado  de  nosso  valor^  e  de  sua 
desconfianca,  nao  quiz  esperar  o  assalto.  Fez  cba- 
mada,  e  se  rendeo  com  honestospartidos.  Entregon 
a  fortaleza  as  tres  boras  da  madrugada  de  16  de 
Janeiro,  da  qual  saio  com  oitenta  e  sette  Hollan- 


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GASTRIOTO  lUUTAHO.  SH 

tlezes,  com  seu  capitao  e  dous  alferes,  una  ajudante 
€  seis  soldados  feridos,  deixando  dentro  qualro 
tnortoft,  quatro  pecars  d'artilbaria,  armas^  muntcoes 
e  fnanlimentos  em  bastante  copia.  Custou-nos  a 
victoria  cinco  moitos  «  quatorze  feridos.  Tratarao 
logo  OS  Bossos  de  reparar  e  guamecer  a  fortaleza , 
e  dispunhao-se  a  surprehtender  o  soccorro  que  pela 
manba  mandara  Sisgismundo;  mas  esle  advertido, 
Tetirou-se  nas  lanchas  sem  desembarcar,  e  s6  foi 
offendido  d'alguns  pelouros,  que  Ibe  matarao  sette 
'soklados.  Com  a  perda  d'esta  forca  ficou  o  inimigo 
4ao  quebrado  de  airimo,  pela  ver  em  tao  breve 
tempo  rendida  e  contraria,  que  ^deaconfiou  de  po- 
•der  conservar  o  Arrecife. 

XI.  <laston-se  o  dia  em  aprestos  para  se  oercar 
ebatera fortaleza,  que  chamavao  de  Altenar,  qua»i 
meio  quarto  de  legua  para  o  sul  da  fortaleza  ren- 
dida,  situada  na  frente  do  Arrecife.  Gabia-lhe  ae 
mestre  de  campo  Joao  Feroandes  Vieira  o  entrar 
•de  guarda ,  e  pelas  dez  boras  da  tarde  marcbou 
com  o  seu  terco  para  aquelle  lugar,  com  ordem  do 
mestre  de  campo  general  que  sitiasse  a  fortaleza 
ipelo  estilo  que  segnira  nos  ataques  da  rendida  em 
qaanto  ao  tempo,  que  no  mais  o  deixava  A  dispo- 
sicao  de  sua  escolba.  Escureceo  a  noite ,  e  carre- 
garao  os  gastadores  cestoes ,  sacos ,  madeiras  e  ar- 
tilbaria ;  e  como  esta  fortaleza  de  Ahenar  tinha  a 
mesma  situacao  na  forma  e  no  terreno  que  a  das 
Salinas,  teve  as  mesmas  circumstancias  no  cerco , 
senao  que  de  mais  a  mais  maudou  Joao  Fernandes 
Yieira  duzentos  mosqueteiros  diante  dos  trabalba- 
doresy  em  razao  que  haviao  de  abrir  o  foaso  em  dea» 


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57i  GASTRIOTO  LUSITAIfa 

coberto  ( tinha  o  iDimigo  rocado  o  mato  duzentos 
passos  em  circulo  da  fortaleza).  Abrio-se  uma  cava 
a  tiro  de  pislola  da  fortificacao  contraria,  capaz  de 
alojar  dous  mil  homens ,  cuja  circumferencia  de- 
sembocava  no  rio  d'uma  e  outra  parte.  Fez-se  uma 
estrada  encoberta«  que  corria  da  cava  para  o  mato, 
onde  fenecia,  com  o  que  ficava  a  fortaleza  cingida , 
e  privada  de  lodo  o  soccorro  por  terra.  Formarao- 
se  as  esplanadas  com  os  reparos  custumados,  ca- 
valgarao-8e  nella  seis  meios  canhoes,  e  sendo  assim 
que  trabalhavao  mais  de  nove  centos  gastadores,  e 
que  o  inimigo ,  avizado  do  sucego  da  fortaleza  do 
Rego,  havia  de  estar  com  vigilaucia  mais  attenta ; 
primeiro  na  manha  o  informou  a  vista  e  o  damno 
do  que  percebesse  algum  leve  indicio  da  occupacao 
de  toda  uma  noite. 

XII.  Ja  pelos  horizon tes  clareava  o  dia,  quando 
ao  Flamengo  Ihe  chegarao  a  dar  a  primeira  alvorada 
asvozes  das  sentinellas,  e  as^balasdaartilharia.Vio- 
se  cercado  antes  de  o  ter  entendido ,  e  ardia  no 
furor  com  que  accusava  nossa  dissimulacao  e  pres- 
teza,  e  sua  desattencao.  No  desejo  da  vinganca 
achava  satisfacao  sua  afronta.  Balas  sem  con  to,  d  esta 
e  de  todas  as  mais  pracas  inimigas  nos  buscarao 
todo  aquelle  dia  nos  alojamentos^  pagando  a  nossa 
bataria  a  uma  o  que  recebia  de  todas.  Mandara  o 
general  HoUandez  largar  a  sua  fortaleza  da.Barreta 
com  ordem  aos  sens  que  entregues  os  quarteis  ao 
fogo ,  se  retirassem  para  o  Arrecife  com  a  artilha- 
ria  e  municoes.  Nao  sabemos  se  por  aviso ,  se  a 
caso  ,  ordenarao  os  nossQs  a  D.  Diogo  Pinbeiro 
Camarao  que  fosse  assaltar,  ou  impedir  a  retirada 


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CASTRIOTO  LUSITANO.  573 

do  inimigo.  Saio  com  trezentos  Indios  do  seu  terco> 
seguio  o  caminho  da  Barreta ,  deo  de  rosto  com 
uma  casa  forle,  que  investio  e  ganhou  sem  difficul- 
dade,  porque  a  gente  que  a  guarnecia,  fogio  para 
a  forca  da  Barreta,  onde  seguido  dos  nossos  foi  de 
novo  avancada ;  era  de  noite,  e  o  estrondo  das  ar- 
mas  e  dos  gritos ,  que  usava  aquelle  gentio ,  porno 
tambem  a  ordem  que  tinhao  para  se  retirarem , 
assim  os  encheo  de  medo,  que  em  qualquersombra 
viao  a  morle;  e  imaginando  que  Ihes  fogia,  a  busca- 
vao  lancando-se  pelas  cortinasda  forca,  para  acaba- 
rem  mais  de  pressa,  uns  estropeados  do  despenho, 
outros  afFogados  no  rio.  Assim  se  ganhou  aquella 
fortaleza,  inteira ,  sem  nos  cuslar  mortenem  ferida. 
XIII .  Sisgismundo,  que  dos  successos  fazia  avisos, 
temendo  o  curso  de  nossos  progressos,  mandou  lar- 
gar  a  fortaleza  que  chamao  do  Buraco  de  Santiago, 
com  ordem  ao  presidio  que,  pegando  fogo  aos  alo- 
jamentos,  se  relirasse  para  o  Arrecife  com  tudo 
que  nella  havia.  Obedecerao  os  sens  com  sobeja 
diligencia ,  porque  a  pressa  Ihes  fez  deixar  a  arti- 
Iharia,  que  erao  seis  pecas  de  ferro  coado.  Nao  des- 
cansavao  as  hostilidades  no  ataque  da  fortaleza  de 
Altenar,  nem  o  commendor  d Vila  Domberguen  de 
,pedir  soccorro ;  o  qual  Ihe  entrou  por  mar  no  dia 
11  de  Janeiro  pela  tarde,  sem  que  toda  nossa  dili- 
gencia Ih'o  podesse  impedir.  Tinha  a  fortaleza  a 
porta  mettida  no  rio,  com  duas  estacadas  de  pio  a 
pique,  que  por  um  e  outro  lado  penetravao  at(5  o 
largo  d  elle ,  e  toda  a  artilharia  e  mosquetaria  do 
forte  da  Boa  Vista,  que  o  guardava ;  e  defendidas 
as  lanchas  por  todas  as  partes ,  ajudadas  do  vento 


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57&  chxswno  ivsm^mK 

e  da  nur6  Ihe  mett^rao  por  vexes  Baquella  tarde 
soccorro  de  gente,  muuicoes  e  refrescc^,  — Cha-< 
mado  d*esta$  noticias  e  da  importancia  de  se  nao  di- 
latar  a  conquista,  roudou  o  mestre  decampo  general 
seu  quartel  para  junto  da  nossa  bataria.  Gon- 
sultou  com  OS  mestres  de  campo  o  mode  que  pode* 
ria  haver  para  que  aquella  communica^ao  se  cor- 
tasse^  e  se  asseniou  que  em  anoitecendo  se  formasse 
uma  plataforma  na  margem  do  rio,  quatroceQto&t 
p^s  da  fortaleza ,  oapaz  de  jogarem  neila  quatro 
pecas  de  arlilharia  de  vinte  e  quatro,  coberta  e  re^ 
parada  com  cestoes  terraplenados ,  tanto  a  respeito 
da  forca  da  Boa  Vista,  como  da  de  Altenar,  e  em 
tal  fdrma  que  servisse  para  cortar  os  soocorroa  e 
para  destruir  os  parapeitos  do  inimigo.  Haviao  de 
trabalhar  os  gastadores  descobertos  as  balas  init* 
migas  ;  e  o  perigo  Ihes  inFundia  tal  receio,  que  li- 
bios  se  applicavao  a  execucao  do  intento.  Joao  Fer- 
nandes  Vieira  e  Andr^  Vidal ,  que  ejitenderao  a 
causa  do  medo,  se  adiantarao  com  muitos  soldados 
a  dar  principio  a  obra  :  exemplo  que  nao  deixou  no 
coracao  dos  gastadores  a  menor  lembranca  do  pe-f 
rigo ,  sendo  assim ,  que  em  toda  a  noite  choverao 
nuvens  de  balas  sobre  a  parte  onde  se  formava  a 
bataria,  com  damno  tao  pequeno  que  o  nao  adver- 
tio  o  cuidado. 

XIV.  Gontinuavao  entre  tanto  os  ataques  da  for-r 
taleza ,  sustentados  principalmente  por  Henrique 
Dias  e  seus  Minas ,  que  incansaveis  trabalhavao  nos 
aproxes,  com  desejo  deque  as  cavasdesembocassem 
na  porta  da  fortaleza,  para  que  se  assallasse  por  eUa 
e  pelas  brcchas,  que  tinha  feitoa  nossa  arUlharia; 


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GASTUorro  lusitaiio.  575 

e  quando  nao  estivessem  capazes  se  abrissem  minas 
para  as  quaes  dava  lugar  o  lerreno,  por  solido  e 
secco.  Continuava  a  hostilidade  por  todos  aqiielles 
meios  e  modos,  de  que  se  podia  valer  a  forca  e  a 
industria  dos  cercadores  e  cercados ;  com  a  resis- 
tencia  crescia  a  contumacia  da  expugnacao  e  da 
defensa.  A  artilharia  e  mosquetaria  de  uma  e  outra 
parte  laborava  sem  descan^o ,  mas  com  desigual 
damno,  porque  com  desigual  tino.  A  portugueza, 
reparada  e  coberta  atirava  com  pontaria ;  de  outra 
maneira  a  contraria  que,  falta  de  reparos,  nem 
acertava  tiro ,  nem  se  podia  guardar  das  balas ;  a 
maior  parte  de  suas  estacadas  e  parapeitos  tinhao 
voado  com  a  nossa  artilbaria ,  e  com  elles  toda  a 
esperanca  que  o  inimigo  podia  ter  de  soccorro ; 
porque  descoberla  a  entrada  aos  pelouros  da  nova 
bataria^  primeiro  as  lanchas  haviao  de  servir  a 
sua  lastima  que  a  seu  remedio.  —  Com  odia  19  de 
Janeiro  amanheceo  o  coracao  do  inimigo  prostrado 
aos  p^s  do  medo.  Combatidos  de  nossas  armas  e  de 
suas  desconfiancas  chegarao  a  amotinar-se  os  sol- 
dados  :  sem  respeilo  hem  obediencia  d  superiori- 
dade  e  &  razao  requeriao  a  entrega.  Tinha  lavrado 
no  animo  de  todos  a  imaginacao  de  que  minada  a 
fortaleza  se  Ihe  havia  de  dar  fogo,  e  fazel-os  voar  a 
todos,  porque  os  negros  de  Henrique  Dias  assim  o 
tinhao  dito  na  noite  antecedente  aos  Indios  auxi- 
liares  que  estavao  na  fortaleza  (gente  por  natureza 
cruel  e  cobarde,  os  quaes  sem  mais  razao  que  seu 
medojSe  tinhao  lancado  todos  ao  rionaquella  noite); 
ateado  a  seus  coracoes  o  temor  com  que  os  sens 
Indios  tinhao  fugido,  de  sorte  cresceo  o  motim, 


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576  CASTRIOTO  LUSITANO. 

que  apezar  dos  cabos  fizerao  chamada ,  pondo  nos 
alios  da  fortaleza  uma  bandeira  branca ,  que  nio 
advertida  dos  nossos  se  repetio  muitas  vezes  e  com 
muitas  vozes. 

XV.  Saio  a  capitular  um  ajudante  chamado  Va- 
naguen,  ao  qual  derao  titulo  de  capitao  para  auto- 
rizarem  a  pessoa.  Foi  levado  ao  quartel  do  meslre 
de  campo  general;  assentou-se  a  entrega,  e  para 
se  capitularem  as  condicoes,  se  mandou  em  refens 
ao  HoUandezocapilao  Alexandre  de  Moura.  Forao 
OS  parlidos  da  entrega,  que  sairiao  da  fortaleza 
com  bandeiras  tendidas,  armas  e  bagagens  ate 
passarem  pelo  nosso  exercito,  aonde  largariao 
as  bandeiras,  e  poderiao  vender  as  armas  ao  pro- 
vedor  da  fazenda  real ,  que  as  pagaria  sem  di- 
lacao,  e  que  se  Ihes  daria  passagem  para  o  reino; 
que  haviao  de  entregar  a  fortaleza  com  toda  a  ar- 
tilharia  e  municoes  que  nella  tinhao.  Pelas  noFC 
boras  da  noite  sairao  o  commendor,  um  sargento 
maior,  quatro  capitaes,  um  ajudante,  quatro  alfe- 
rcs,  o  engenheiro  principal  do  Arrecife,  e  duzentose 
vinte  sette  soldados  :  os  Indios  tinhao  fugido  a  nado. 
Deixarao-nos  a  fortaleza  (que  logo  guarnecemos) 
com  dez  pecas  d'artilharia,  nove  de  bronze,  e  uma 
de  ferro,  municoes  emanlimentosem  grande  copia. 
—  Custou-nos  a  conquista  d'esta  forca ,  que  era 

rniada  de  quatro  meios  baluartes ,  a  vida  de  Ja- 
coim?  Rodrigues,  alferes  do  capitao  Manoel  Lopes, 
com  nfestis  a  de  quatro  soldados,  e  o  sangue  de  de- 
zaseis  feiridos.  Perdeo  o  Flamengo  em  sua  defensa 
trinta  e  Vm  soldados ,  que  d'entro  d'ella  deixou 
mortos,  ^  saio  com  vinte  feridos.  0  melhorde 


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GASTRIOTO  LDSITANO.  .  577 

seus  despojos  forao  cinco  bandeiras ,  das  quaes  era 
uma  da  guarda  do  general  Sisgismundo,  e  duas  do 
ler^o  do  coronel  Aulhim.  Todos  os  rendidos  se 
mand^rao  passar  a  nossa  armada,  e  se  distribuirao 
pelas  embarcacoes  d'ella  com  benevolencia  e  com- 
modidade. 

XVI.  Com  a  perda  d'esta  pra^a  se  accenderao  no 
Arrecife  as  desconfiancas  que  ardiao  entre  o  povo, 
soldados  e  officiaes  da  milicia  e  do  governo.  Havia 
quern  assoprasse  o  fogo,  ou  por  occulta  negocia^ao 
ou  por  declarada  conveniencia.  Dizia-se  que  os  sol- 
dados  no  ultimo  aperto  haviao  de  saquear  o  povo, 
e  entregar  a  pra^a ;  que  o  povo  se  havia  de  levan- 
tar  contra  os  soldados,  e  abrir  as  portas  aos  cerca- 
dores ;  e  que  povo  e  soldados  determinavao  pren- 
der  OS  officiaes  da  milicia ,  e  os  ministros  do 
governo ,  e  despois  de  Ihes  roubarem  as  casas ,  os 
haviao  de  entregar  aos  Portuguezes  ;  tratando  ca- 
da  qual  d'estes  estados  de  buscar  meios  para  me- 
Ihorar  sen  partido :  sedicoes ,  que  naquella  occasiao 
pod^rao  descorcoar  o  animo  mais  destemido ;  tanto 
assim^que  sendo  o  de  Sisgismundo  grande,  receava 
mais  sua  gente  que  nossas  armas.  Occupavao-se 
estas  em  abrir  torneiras  na  fortaleza  de  Altenar, 
para  nella  virarem  toda  a  artilharia  contra  a  das 
Cinco  Pontas,  que  era  o  coracao  onde  se  conserva- 
vao  OS  espiritos,  que  se  difundiao  por  todas  as  mais 
pracas  do  inimigo  ,  por  sua  grandeza ,  e  por  seu 
edificio.  A  este  alvo  se  encaminhavao  os  aprestos 
em  que  toda  a  nossa  gente  trabalhava  para  a  com- 
bater.  Era  situada  duzentas  bracas  do  Arrecife  para 
o  suK 

L  37 


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578  GASTRIOIO  LUUTAia 

XVII.  Em  o  dia  19  de  Janeiro,  depois  do  en* 
trada  a  noite  mandou  o  inimigo  largar  a  sua  foiv 
taleia  dos  Affogados,  ediiicada  um  quarto  de  legoa 
do  Arrecife  para  o  certao.  Retirou  parte  da  artiv 
Iharia;  ard^rao  os  quarteis  e  estacadas,  vendo*«e 
na  luz  daquella  chamma  a  corrupcao  que  tinha 
feito  a  desconfianca  em  todo  aquelle  corpo ,  pois 
chegara  a  ponto ,  que  por  conservar  a  cabeca  en- 
tregava  as  mais  partes  d'elles  ao  ferro  e  ao  fogo. 
Na  tarde  d'este  dia  entriira  4e  guarda  o  mestre  de 
campo  Andr^  Yidal  de  Negreiros,  e  por  sua  coota 
corria  assentar  o  ceroo  i  fortaleza  das  CincoPontas. 
Sobre  ella  estava  uma  eminencia ,  que  em  tempos 
passados  tivera  um  reduto,  a  que  chamavao  o 
Milhou  :  ficava  a  cavalleiro  da  fortaleza ,  e  servia 
de  estorvar  o  damno  que  d'ella  podia  receber; 
agora  para  o  mesmo  fim  o  reedificava  o  general 
Sisgismundo.  Deo-se  aviso  ao  general  Francisco 
Barreto,  e  elle  aos  mestres  de  campo,  e  se  assentou 
que  Andrd  Yidal  de  Negreiros  escolhesse  mil  ho«* 
mens  do  seu  terco,  e  do  de  Joao  Femandes  Vielra, 
e  com  elles  fosse  ganhar  aquelle  posto,  e  desalojar 
d'elle  o  inimigo,  a  todo  o  risco ;  por  ser  para  nossa 
conquista  necessario,  e  para  a  defensa  da  fortaleza 
importante,  em  quanto  no  sitio  da  forca  se  ia  tra-r 
balhando  nas  cavas ,  plataformas  e  mais  ataques. 

XVIII.  Em  a  noite  de  20  para  21  saio  Andr^ 
Yidal  de  Negreiros  com  o  sargento  maior  Antonio 
Dias  Cardozo,  e  a  gente  referida ;  tomou  o  caminho 
da  fortaleza  dos  Affogados  (occupado  ja  de  nossas 
armas)  a  tempo  que  Ih'o  mostrava  o  fogo,  em  que 
ardiao  tres  casas  fortes ,  com  as  quaes  o  Hollandez 


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G4BT|aOTO  f.USITA»a  579 

f  ranqinmv^  s^  serventias  do  Ar]r^cife  p^m  o  v4o  4os 
Affpga4o8,  e  paw  a  ilhe^  do  Cheira-dinh^iro  (q 
m^qio  Hbllande?  4s  iqawdow  queifpar  nacjiiellsj 
nqif^jf  Pelo  sitia  dft  fortfileza  sotrpdita  passofi 
Apdr^  Vidal  dp  Negreirqs  4  cftmpiaa,  qwie  chamao 
do  Taborda ;  e  pela3  nove  bora«  atr^ve^sop  por  baixo 
da  artilharia  de  Cinco  foi^ta^ ,  par?  cair  §ol)rp  o 
reduto  do  Milbou^  que  0  injn^igo  tinha  levantadp 
naquella  di?,  com  os  matppiae^  juntos  para  as  trin- 
cheir?^^  e  pstsicad^s  de  que  0  qu^ria  cerqar.  0  in- 
forme  da  fortificaQao  obrigou  a  Sisgjsmundo  a  qup 
disposesse,  que  dpntro  do  redutq  ficasse  uma  coin- 
panbia  de  guaruicao ;  e  na  distaucia  que  bavia  entrp 
eile  9  as  Cincq  Pontas  yipte  §014^4^3,  dei  boUau- 
de^  e  A^z  iudips ,  cpu)o  ^entiuellas  YQlantes  par? 
darem  aviso  de  qualquer  noyidade.  Esjes  assiiu 
cpWoseutirao?inos§a geut§  tPc4rao aripa, e fugirao 
OS  dejt  Flameugos  para  a  fortale?a,  e  os  dez  Judios 
para  p  reduto,  buscando  ups  e  optros  o  va)hapouto 
que  Ibes  ficaya  piais  perto,  Ipvestiraq  ps  upssos  0 
redptp  ?  peitp  descobei  to,  que  3e  defepdeo  valoro- 
samante ,  ajudado  de  duas  pecas  d'artilbaria ,  que 
da  fprtaleza  varejavap  0  campo  com  puvens  dp 
bala  ipiuda^  Pori^m  cpmo  0  valor  e  a  destreza  dos 
ppsso§  pabos  rpmpia  com  maior  impejp  pe)a  maior 
resistepcia,  em  brevet  boras  3ubirao  e  ganharao  p 
redutp,  Sepbores  d'pUp,  mostrarpio-se  03  nqsso? 
generpsos  para  com  os  vppcido^,  a  quem  concpdfir 
rao  a  vida  que  buQ^ifdemente  ppdirao,  Acharao-^p 
da  parte  do  inimigo  cincp  mortos  e  cinco  feridos. 
Perderoos  no  assalto,  com  dous  soldados,  o  capitao 
J[oao  Barboza  Pip  to  |  que  deo  nesta  pccasiao  com  a 


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580  CASTRIOTO  LtJSITANO. 

vida  o  ultimo  realce  a  todas  as  proezas  d'ella.  — 
SisgismundO;  que  conhecia  a  importancia  d'esta 
posicao,  intentou  desalojar-nos ;  quiz  tentear  nosso 
designio ,  e  mandou  para  este  effeito  um  Indio  re- 
belado ,  por  nome  Antonio  Mendes,  que  nos  picasse 
com  vinte  soldados.  Ghegdrao  a  tiro  de  pistola  da 
fortificacao ,  d'onde  a  mosquetaria  os  fez  voltar  de 
carreira,  deixando  cinco  mortos,  e  recolhendo  nao 
poucos  feridos  obrigados  de-desprezo ,  com  que 
pela  limitacao  do  numero  os  nSo  buscou  a  espada. 
Sisgismundo  sa(o  entao  do  Arrecife  com  todo  o 
poder  para  nos  atacar ;  mas  chegando  a  sua  forta- 
leza  das  Cinco  Pontas,  ou  aconselhado,  ou  arrepen- 
dido  setornou  a  retirar;  era  evidente  seu  destroco, 
e  julgou  discretOy  que  perdido  por  perdido,  antes 
como  prudente ,  que  como  temerario. 

XIX.  Em  23  de  Janeiro,  por  Ihe  caber  a  van- 
guarda,  entrou omestre de  campo  Joao  Femandes 
Vieira  a  continuar  os  aproxes.  Nao  era  o  terreno 
capaz  d'artilharia ;  e  assim  era  necessario  adiant^l- 
08.  Escureceo  a  noiie^  e  mandou  o  mestre  de  campo 
a  cincoenta  espingardeiros,  que  deitados  de  brucos 
fossem  diante  dos  gastadores,  e  Ihes  assegurassem 
o  campo ;  diligencia  com  que  luzio  tauto  o  trabalho 
que  se  adiantarao  as  cavas  duzentos  passos,  e  no 
remate  d'ellas  se  fez  uma  travessa  com  torneiras 
de  saccaria,  capaz  de  alojar  cem  mosque teiros,  que 
logo  a  guarnecerao,  e  com  a  primeira  luz  do  dia 
tirirao  todo  o  meneo  da  artilharia  contraria  ;  por- 
(|ue  ainda  os  artilheiros  nao  chegavao  quando 
deixavao  a  vida  :  ficavao  em  descoberto  as  balas,  e 
nao  se  perdia  tiro.  —  Os  judeos  do  Arrecife,  ido- 


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CASTBIOTO  LUSITANO.  581 

latras  em  toda  a  parte  de  suas  conveniencias  e  fa- 
zendas,  timidos  e  industriosos  avultarao  as  perdas, 
e  encareciao  os  damnos ;  suppunhao  iafalliveis  as 
ruinas^  e  Delias  a  ira  e  a  Tinganca  dos  vencedores. 
Com  estes  discursos  aconselhavao  a  entrega.  Pode 
tanto  sua  persuasao^  que  amotinados  os  soldados  e 
o  povo  a  requeriao  aos  superiores ;  obedec^rao  a 
forca,  desenganados  do  pouco  que  contra  ella  podia 
obrar  a  razao;  e  Gzerao  chamada/ 

XX.  Erao  tres  boras  da  tarde  do  dia  23  quando 
o  [mestre  de  campo  Joao  Femandes  Yieira ,  fez 
aviso  ao  general  Francisco  Barreto  de  Menezes  de 
que  0  inimigo  pedia  suspensao  d'armas  para  man- 
dar  um  enviado.  Na  eminencia  do  Milhou  estava  o 
mestre  de  campo  general,  occupado  em  assentar  a 
batariaafortaleza  dasCincoFontas,  onde  recebeo  o 
capitao  Vouter  VanW  commendor  da  dita  fortaleza, 
mandado  pelo  general  Sisgismundo,  e  pelos  do  go- 
verno,  com  carta  para  Francisco  Barreto,  cuja  sus- 
tencia  se  resumia  em  Ihe  pedirem  d^sse  audiencia 
ao  embaixador  para  Ihe  propor  o  negocio  que  vinba 
a  tratar.  De  p^  o  ouvio  o  mestre  de  campo  general 
em  parte  d'onde  se  deixava  ver  a  diligencia  com 
que  se  continuavao  os  passos  da  conquista :  maxima 
discreta  da  sagacidade  militar ;  insinuar  os  par- 
tidos  da  paz  com  o  estado  da  guerra.  Fallou  o  en- 
viado,  e  dkse  que  sua  senhoria  nomeasse  tres  de- 
putados  para  virem  a  falla  com  outros  que  sairiao 
do  Arredfe  a  proporem  conveniencias  entre  umas 
e  outras  armas,  assinando  dia,  bora  e  sitio,  e  con- 
cedendo  suspensao  de  toda  a  bostilidade  em  todo 
o  tempo  que  durasse  o  negocio.  —  Tudo  concedeo 


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582  GAmUOtO  LttftltARO. 

o  meslre  de  cathpo  getieral  com  KmiUi^io  que  ces* 
dasse  o  tnovlmfento  das  armas  em  todo  o  tempo 
que  diihasse  a  confet^encla,  mas  h§o  tim  tbdaa  parte, 
porque  s6  se  havta  de  entetider  a  fortale^  das  Gln^ 
eo  t^ontas  at^  a  villa  de  Olinda  t  e  que  M  seguintd 
dia  34  de  Janeiro  tiomearia  os  deputadod  e  o  lugar 
das  vistas. 

XXL  Ifo  mesmo  pduto  hi  aviso  a  Pedro  Jaqiles 
de  M agalhaes,  general  da  Armada,  daildo^he  conta 
do  ^uccedidb,  ^  de  que  a  siisp^tisab  d'armas  se  nao 
^Stehdia  ao  mdr,  pelas  tioliciftB  que  tinha  que  o 
Holkndei  mandava  vir  ao  cbronel  Aulhim  com 
ioda  a  getite  que  titiha  no  Rio  Grande  e  P^LTalba^  e 
com  ordem  que  etitrasse  no  Arrecife  a  todo  o  risco ; 
fe  pofque  conhecia  bem  o  caviloso  trtto  dos  Hoi* 
landezes ,  rog^va  muild  A  sua  setilioi^ia  mundasde 
dobhir  A  prev^ubio  e  a  Vigil^ucid  etn  toda  a  armada 
p&\6  muito  que  importav&  cortAr  aquell^  soccorro; 
e  nao  SUccedesse  ao  Flamengo  desriar  com  eng^o 
n  golpe  que  nao  podia  teparar  com  a  forca.  A  Joao 
I^mandes  Yieira  ordenoU  que  parAsse  na  oonti- 
nuac&o  dbs  AtaqUes ;  por^  que  assistisse  com  toda 
a  gente  i  guarntcao  d'elles.  Aquelle  nomeoU  para  o 
congresso  u  mestre  de  edmpo  Negrelros,  o  capitao 
de  cavallos  Affonso  d'AlbU(|uer(}Ue>  e  it>  outidur 
geral  FWincisco  Altares  Moreira,  e  pdr  Secretario 
MancJel  GoUcilves  Corhea  ^  que  o  era  da  milicia  ; 
OS  quae*  no  seguinte  diA,  qufe  erftd  24  d*  Jaueim, 
Torao  pAHi  o  posto  destinado,  onde  j4  os  esperin- 
vao  OS  deputados  do  Hollander  ^  Gisberth  With, 
presidente  do  conselho  politico;  o  cflpitao  oom- 
mendordasCincoPontaBVouter  Vanltf;  o  teaente 


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GAffTBIOZO  iUSITAHO.  58S 

general  Vander  Vant,  e  por  secretario  Brest,  supe- 
rior dos  escabinos.  —  Gongregados  os  oito,  tomou 
a  mao  Gisberth  With ,  e  deo  principio  a  confe- 
rencia,  dizendo  que  os  senhcH^es  do  supremo  con- 
selho  estaTao  certos  em  que  os  muito  poderosos  e 
altos  Estados  Ga^^aes  tinbao  assistentes  na  corte  do 
Senhor  Rei  de  Portugal  Dom  Joao  o  Quarto  para  se 
ajustarem  conyeniencias  sobre  as  pra^as  do  Brazil, 
coiiquistadas  da  linha  para  o  sul ,  que  brevemente 
se  concluiriao ,  e  que  parecia  razao  se  esperasse , 
com  suspensao  d'armas,  aquella  eonclusao  da  qual 
se  poderia  seguir  uma  paz  segura ,  sem  as  extor- 
coes  e  damnos  d'uma  guerra  riya ,  a  todos  eoutin- 
gente  e  nociya.  —  Os  nossos  deputados  cortirao  o 
fio  a  esta  pr&tica  dizendo  que  nao  traziao  com- 
missao  do  seu  general  para  outra  cousa  mais  que 
para  capitutarem  a  entrega  do  Arrecife^  e  das  mais 
pra^as ,  injustamente  usurpadas  j  e  que  so  na  dita 
entrega  se  devia  fallar,  e  concluir  sem  ambages 
nem  desyios.  Respond^o  os  Hollandezes  que  nao 
era  aquelle  negocio  que  se  kayia  de  definir  com 
resolucoes  tao  apressadas,  e  que  o  tom&l*as  em  ma- 
teria tao  ponderosa  nao  s6  pedia  profunda  conside- 
ra^ao  ^  senao  tambem  maduro  conselho ;  al^  de 
que,  nao  podiao  elles  defirir  a  ponto  tao  essencial 
sem  ordem  de  sens  superiores ;  que  yoltariao  a  dar- 
Ihes  conta;  e  na  segunda  feira  seguinte>  dariao  a 
resposta  que  se  Ihes  ordenasse.  Ao  que  disserao  os 
nossos  deputados  que  se  desenganassem,  porque 
na  mesma  bora  se  hayiao  de  resolyer  na  entrega , 
quando  nao,  que  em  tempo  estayao  para  tomarem 
por  for^a  o  que  nao  queria  targv  d  yontade ,  e 


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584  CASniOTO  LDSITAIIO. 

que  Ihes  lembravao  a  perda  e  o  estrago  ^  a  que  se 
expunliao.  Timidos  e  supensos  os  deixou  a  reso- 
lucao.  A  expertencia  Ihes  tinha  ensinado ,  que 
se  uao  entrepunha  tempo  entre  o  ameaco  e  o  golpe 
de  nossas  armas.  Sujeitarao  a  sagacidade  &  conve* 
niencia,  e  obedieiKes  pedirao  horas  para  aTisarem 
ao  seu  governo  a  grande  differen^a ,  que  achavao 
cntre  a  sua  proposta  e  a  nossa  determinacao.  Per- 
milUo-se-lhes  a  dilacao  por  horas  contadas.  Foiio 
o  With  e  o  Brest  com  a  informacao^  e  ficarao  com 
OS  nossos  deputados  o  capitao  Yanld  e  o  tenente 
general  Vander  Vant.  Temiao  o  effeito  que  em 
nossa  impaciencia  poderia  causar  sua  detenca,  e 
com  sua  presenca  deitarao  um  fiador  a  tardanca. 

XXII.  Fouco  mais  d'uma  hora  se  tinha  passado 
quando  chegou  um  gentil-homem ,  que  vinha  do 
Arrecife  com  recado  aos  nossos  que  nao  estranhas- 
sem  a  dilacao,  se  a  houvesse,  porque  a  causava  o 
apontamento  das  capitulacoes,  com  que  se  havia  de 
fazer  a  entrega.  Pelas  tres  horas  da  tarde  chegarao 
com  as  capitula^oes^  e  dous  notarios  publicos  para 
as  traduzirem  de  flamengo  em  portuguez ;  occu- 
pacao  que  durou  al£  as  dez  horas  da  noite,  em  que 
sairao  do  congresso,  uns  para  o  Arrecife ,  outros 
para  o  quartel  do  mestre  de  campo  general,  a  quern 
entregarao  partidos  e  condicoes  que  o£krecia  e 
pedia  o  HoUandez.  Para  se  escolher  e  reprovar  o 
que  d'ellas  nos  convinba ,  ou  nao  convinha ,  cha- 
mou  a  conselho  os  tres  mestres  de  campo  com 
todos  os  officiaes  maiores ;  e  por  involverem  pontos 
tocantes  ao  direito,  e  alguns  artigos  i  consciencia^ 
chamou  taml)em  aquellas  pessoas ,  queaspodiao  de- 


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GASTBIOrO  LDSITANO.  585 

cidir^  e  na  mesma  noite  se  respoadeo  a  todas  as  clau- 
sulas  ofTerecidaSy  definidososartigos  queserecebiao, 
e  OS  que  se  regeitavao  ;  e  nesta  fiSrma  se  entregirao 
no  seguinte  dia  pela  manha  aos  deputados  hollan- 
dezes,  que  com  os  nossos  se  ajuntarao  no  mesmo 
lugar,  em  25  de  Janeiro,  quesuccedeo  ser  domingo. 
Neste  mesmo  dia  escreveo  Sisgismundo  Vanescop, 
general  das  armas  hoUandezas,  uma  carta  a  Fran- 
cisco Barreto  com  advertencias  de  discreto  e  sub-' 
missoes  de  rendido,  pela  qual  Ihe  pedia  licenca 
para  que  um  seu  tenente  coronel  com  a  pessoa  que 
sua  senhoria  nomeasse,  conferissem  e  resolvessem 
as  conveniencias  dos  officiaes,  e  gente  da  milicia  : 
peiicao  que  Francisco  Barreto  despachou  benevolo 
e  cortez,  e  nomeou  da  sua  parte  ao  mestrede  campo 
Andr^  Vidal  de  Negreiros,  para  que  na  mesma 
junta  elle  e  o  tenente  general  Vander  Vant,  no- 
meada  pelo  Sisgismundo ,  tratassem  o  negocio, 
como  deputados  da  conferencia  g^ral,  e  d*esta  par- 
ticular,—  Conferirao  os  capitulos  d'uma  e  outra 
parte,  e  com  negar  e  conceder  de  ambas  se  ajusta- 
rao.  Altercirao-se  os  pontos  de  maior  duvida,  e 
Yencidas  todas,  $e  manddrao  as  condicoes  aos  supe- 
riores ,  para  que  com  sua  approvacao  se  escreves- 
sem  e  disposessem  por  capitulos;  e  resolrendo, 
que  ao  outro  dia  se  assignassem  pelos  generaes  e 
deputados,  se  apartarao  todos  pelas  onze  da  noite; 
e  se  firmarao  aquelles  no  dia  seguinte  26  de  Janeiro 
nesta  fdrma. 


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U6  GAilBiOIO  WmUM. 


ARTI608  POPULARBS. 


1 .  Que  o  saihor  mestre  de  campo  general  Fran- 
cisco Barreto  de  Menezes  da  por  esquecidas  todas 
as  hostilidades  executadas  por  parte  dos  vassaUos 
do6  senhores  Estados  Geraes  das.ProvinciasUnidaSt 
e  da  companhia  occidental,  ou  fossem  por  mar  ou 
por  terra  I  e  contra  a  nacao  portugueza,  as  quaes 
•e  htto  de  reputar  como  se  nunca  fossem  commet^ 
tidas  ;  e  que  neste  acoordo  se  comprebendao  todas 
as  na^d^  de  qual<)uer  estado  e  religiao  que  sejao , 
ainda  que  fossem  rebeldes  a  coroa  de  Portugal ,  ou 
contra  ella  oommettessem  trai^ao  |  e  que  o  mesmo 
entendem  dot  judeos  que  estao  no  Arrecife ,  e  ni 
cidade  Mauriceai  em  quanto  podem. 

2.  Concede  a  todos  os  rassallos  dos  senhores 
Estados  Geraes,  e  mais  pessoas  que  estao  a  sua 
obediencia^  todos  os  bens  moveis  que  actualmente 
esdverem  possuindo. 

3.  Concede  de  todas  as  embarca^oes  ^  que  estao 
d^itro  da  barra  do  Arrectfe^  aquellas  que  esUTe* 
rem  sufficientes  para  passar  a  linha  com  aquella 
arlilharia  que  ao  senhor  mestre  de  campo  g^ieral 
parecer  bastante  para  sua  defensa^  com  tanto  que 
nao  seja  de  bronze  ^  eicepto  a  que  permitte  ao 
senhor  general  Sisgismundo. 

4.  A  todos  08  vassallos  dos  ditos  senhores  Es- 
tados, que  forem  casados  com  mulheres  portu- 
guezas  ou  pernambucanas,  concede  as  possao  levar 


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QMMtWnO  UMTUfO  6t7 

cdffislgo  >  querendo  ella^ ,  e  xp»  aa  tiies  sejao  tnh 
tadds  como  se  forao  eaaadaa  com  Portugueses* 

5.  Concede  a  todos  os  que  quisierem  ficar  na 
terra  9  bbedient^  as  armaa  e  dominio  portdgil^z  , 
que  no  tocante  a  rriigiao  TiTitfto  pelo  estilo  que 
▼iTem  todos  os  estl^angeiros  em  Pbrtugali  no  pre** 
sente  tempo. 

6.  Que  OS  fortes  situados  na  circumferencia  do 
Arrecife  e  cidade  Mauricea  ^  a  saber  o  dad  Cinco 
Pontas,  da  Boa  Vista ,  do  M osteiro  de  Santo  Anto<- 
hio  ^  castello  da  bidade^  for^a  das  Tres  PoAtas  ^  do 
Brum^  e  seu  reduto,  castello  de  Sao  Jorge ,  o  do 
inir>  e  tddas  as  mais  caAas  fortes  e  batarias  sO  en- 
tregtrao  Is  ordens  do  senhor  mestre  de  eampo  ge** 
Heral  Francisco  Barreto  de  Menezes^  tanto  que  por 
uma  e  outra  parte  se  firmarem  estes  capitulos, 
com  toda  a  artilharia  e  municoes  que  nellas  estao ; 
^  da  mesma  sortti  as  pracas  do  Arrecife  e  cidade 
Matu'iceai 

7.  Concede  que  os  yassallos  dos  smhores  Esta* 
dos  GeraeS)  moradores  no  Arrecife  e  cidade  Mau-^ 
ricea^  podeHio  ficar  nas  ditas  pra9as  por  tempo  de 
tres  mezes,  com  tanto  que  enti^egarao  as  armas )  e 
quando  se  quizerem  embarcar  (ainda  que  seja  atites 
dds  tti^s  m^zes)  Ih'as  mandari  entiregar  pala  se 
aproreltarem  d'ellas  na  oceasiao  i  e  se  concede  aos 
ditos  possao  comprar  aos  Portugueses ,  nas  ditas 
pra^as^  todos  os  mantimentos  que  Ihes  forem  nece»- 
sarios  para  seu  sustento^  e  para  a  viagem. 

8«  Em  quanto4salheac5es^  commutacoes^  nego^ 
eeacdes  e  rendas^  que  os  ditos  yassallok  dos  sd^ 
nlMM  Estados  fiawem  tleatro  dos  tres  meaes^ 


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56$  GASTBIOIO  UniTAM. 

declara  o  senhor  mestre  de  campo  genentl  Fran- 
cisco Barreto,  que  w&cio  feilas  na  fiirma  que  apcmta 
*einoartigo  11. 

9.  Que  o  senhw  mestre  de  campo  general  Fran- 
cisco Barrelo  de  Menezes  poderA  assbtir  com  o  seu 
exercito  a  onde  Ihe  parecer  mdhor,  com  tal  condi- 
^o  que  08  vassallos  dos  senhcM^es  Estados  Geraes 
nao  serao  vexados,  nem  molestados  de  nenhuma 
•orte  de  Fortuguez  algum  de  quakpier  ealado, 
postOy  e  qualidade  que  seja. 

1 0.  Concede  o  senhor  mestre  de  campo  general 
a  lodos  OS  vassallos  dos  senhores  Estados  Geraes,  e 
a  todos  OS  que  militao  debaixo  de  suas  bandeiras 
que  possao  levar  comsigo  os  papeis  que  tiverem ,  e 
Ihes  pertencerem  por  qualquer  via  que  seja,  o  que 
se  Ihes  concede  na  f6rma  em  que  Ihes  serao  entre- 
gues  sens  bens  moveis. 

11.  Que  poderao  deixar  os  bens  moveis  e  de 
raizy  que  por  justo  titulo  Ihes  pertencerem,  e  de 
que  estiverem  de  posse  actualmente  (  se  os  nao  po- 
derem*  vender  no  tempo  consignado)  a  ^eus  pro- 
curadores,  que  poderao  constituir,  de  qualquer 
nacao  que  sejao,  dos  quaes  sarao  correspondidos 
na  f6rma  do  estilo. 

12.  Item  Ihes  concede  todos  os  mantimentos 
seccos  e  molhados,  que  de  presente  estao  recolhir 
dos  em  seus  almazens  para  se  servirem  d'elles  na 
terra  e  na  viagem,  larg^do  aos  soldados  os  de  que 
necessitarem  para  seu  sustento  quotidiano,  e  para 
a  navega^o  que  fizerem.  Mas  nao  Ihes  outorga  o 
dito  senhor  mestre  de  campo  o  massame  para  os 
aprestos  dos  navios  de  sua  viagem »  por  quanto  se 


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GASTIIOTO  LCSITAlia  58t 

obriga  a  dar-lh'os  apparelhados^  ao  tempo  de  sua 
partida  para  Hollanda. 

13.  Que  no  tocante  as  dividas  e  preten^oes  da 
fazenda,  que  os  vassallos  dos  senhores  Estados  Ge- 
raes  querem  repetir  aos  moradores  portuguezes, 
Ihes  concede  o  direito  de  os  obrigarem  para  diante 
de  sua  M ajestade  o  Senhor  Rei  Dom  Joao,  em  cujos 
tribunaes  se  poderao  decidir. 

14.  Mais  concede^  que  todas  as  embarca^oes 
pertencentes  aos  ditos  vassallos ,  que  cbegarem  a 
este  porto  do  Arrecife  no  termo  dos  primeiros 
quatro  mezes  depois  d'estas  capitulacoes  ( tempo 
em  que  nao  poderao  ter  noticia  d  eilas)  se  poderao 
voltar^  sem  que  padecao  reten9ao ,  nem  aggravo 
algum. 

15.  Item  concede  o  senhor  mestre  de  campo 
general  aos  ditos  vassallos  dos  senhores  Estados 
Geraes,  que  possao  mandar  chamar  os  sens  navios^ 
que  trazem  pela  costa,  para  que  neste  porto  do  Ar- 
recife possao  embarcar,  e  levar  nelles  suas  pessoas 
e  OS  bens  acima  outorgados. 

16.  Em  quanto  ao  que  os  sobreditos  vassallos 
pedem  sobre  nao  prejudicar  este  contrato  as  con- 
venienciaSy  que  estiverem  ajustadas  entre  o  Senhor 
Rei  de  Portugal,  e  os  senhores  Estados  de  Hollanda 
antes  de  cbegarem  a  sua  noticia  estas  capitulacoes, 
nao  concede  o  mestre  de  campo  general ,  porque  se 
nao  entremete  nos  taes  acordos,  e  tem  exercito  e 
poder  para  conseguir  por  armas  a  restauracao  das 
pracas  que  se  Ihe  entregao  a  partido. 


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soo  coTiian  unurAva 


A|lT|fip$  BflJ-ITARES. 


1 .  Premette  o  senhor  mestre  de  campo  genarftl 
eiquecimento  de  todas  as  offeosas  que  os  Ppriu-r 
guezes  e  Pernambucaaos  hajao  recebido  das  armaa 
hoUandezas  em  qualquer  parte  y  ou  por  qualqiier 
mode  que  fosse. 

2.  Concede  q  mesmo'sdnhor  a  todos  03  aoldadoi 
assistentes  no  Arpecife^  cidadeMaurioea  e  fort|deaui3 
adjacentesy  .<que  possao  sair  d'ellas  com  tod^  a^ 
honras  militares,  que  ae  cuatumao  ooiuseder  ao$ 
rendidos,  como  sao^  mecha  acfiesa,  hah  f^  bo^ai 
bandeiras  tendidas,  etc.  com  a  limitacao ,  que  aQ 
passar  pelo  exercito  poptugufz  apagarao  logo  as 
mechas ,  e  tiraraD  as  pedras  i  espinguarda^  e  cla- 
vinas,  e  entregues  as  avmas^  se  repolherao  (sqa  al* 
mazem  particular,  qi)al  o  senhor  m^^r^  de  caippo 
ordenqr,  tomando  por  cont^  de  seu  ouidado  o  fr^^Uf- 
dar-Ih'a^  entregar,  quando  se  embarparem  ;  e  so 
ficarao  com  suas  armas  todos  os  oQieifies  44  iQiljcia 
de  sargento  para  cima.  E  q|ie  embarcados  um  ^ 
outros  seguirao  sua  direita  yiagem  i(os  poftq;  d^ 
Nantes ,  Arroohella,  ou  a  qualquer  dm  ^tadof  de 
Hoilanda,  sem  tomaren^  porto  algum  do  reino  d^ 
Portugal :  ,para  (irmeza  do  que  deixarao,  eile^  Yai^ 
salloa  dos  senhores  Estados  Geraes,  eni  rpfipQ^,  t^eB 
pessoasy  a  saber,  urn  official  mator  d^  mijipi^,  um 
dos  governadores  do  supremo ,  e  un^  dos  maiorc^ 
homens  do  negocio. 

3,  Que  toda  a  gente  de  guerra,  cabos^  officiaes 


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GAS79I0T0  I.UfilTA«0«  9H 

e  9oldftdo8  66  embarcarao  juntamc^te  ooip  p  aeqbor 
general  Sisgismundo ,  e  farao  viagem  em  sua  coiur 
panhia ,  com  tal  condicao  que  primeiro  deicbarao 
entregues  as  ordeoB  do  senhor  mestre  de  campq 
general  as  pracas  do  Rio  Grande ,  Paraiba ,  IUt 
raaraca,  Ceara  e  ilha  de  Fernao  de  Norooba,  com 
toda  a  artilbaria;  muni^oes  e  petrechos  de  guerra, 
que  tinhao  em  si,  ao  tempo  que  cbegara  Aquella 
costa  a  armada  de  Portugal ,  que  esta  no  porto,  e 
no  cerco ;  e  que  para  flanga  de  tudo  acima  dito 
entregarao  os  refens,  acima  apontados. 

4.  Concede  o  senbor  mestre  de  campo  general 
ao  senhor  general  Sisgismuqdo  Vanescop,  qua 
depois  de  entregues  todas  as  pragas  e  forQa$  acima 
ditas,  com  toda  a  artilbaria ,  que  tinhao  ao  tempo 
referido,  yinte  pecas  d'ella  e  de  bronze  de  quatro 
at^  dezoito  libras  de  balas,  al^m  das  pecas  de  ferrq, 
que  forem  necessarias  para  a  defensa  dos  naviod 
que  levar  em  §ua  companbia,  as  quaes  se  Ibe  darao 
com  as  carretas  e  munigoes  necessarias*  As  demais 
com  todas  as  armas  e  munigoes  que  nellas  se  acba*^ 
rem,  se  entregarao  as  ordens  do  senhor  mestre  de 
campo  general,  como  6ca  dito. 

5.  Que  o  dito  senbor  Ibes  concede  a^  embarea-r 
coes  necessarias ,  na  conformidade  referida. 

6.  Concede  tambem  o  senbor  mestre  de  campo 
general,  para  toda  a  gcnte  da  milicia,  os  manti-r 
mentos  necessarios,  na  fdrma  que  estao  concedidos 
a  todos  08  vassallos  dos  senbores  flstados  Geraes 
em  o  artigo  1 2 ;  e  declara  que  nao  sendo  bastantes, 
promette  dar-lbes  os  sulScientes. 

7.  Concede  mais  ao  senbor  general  Sisgismundo 


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S93  GASTEIOTO  LU8ITA1I0. 

Yaoescop ,  que  possa  ter^  alicnar,  embarcar,  ou 
vender  quaesquer  bens  moveis  ou  de  raiz  que  seus 
forem ;  e  assim  mais  todos  os  eJeravos,  que  possue 
com  juste  titulo.  £  que  do  mesmo  favor  gozarao 
todos  OS  oiBciaes  vivos  da  milicia ;  e  que  elles,  e  o 
senhor  general  Sisgismundo  possao  morar  nas 
casas  em  que  vivem,  at^  i  bora  de  sua  partida. 

8.  Item  concede  a  todos  os  soldados  enfermos  e 
feridos  se  possao  curar  no  bospital,  em  que  de  pre- 
sente  estao,  at^  que  tenhao  saude  para  se  poderem 
embarcar. 

9.  Que  em  quanto  os  soldados  do  senbor  gene- 
ral Sisgismundo  esliverem  em  terra  nao  serao  mo- 
lestados,  nem  offendidos  por  pessoa  y  nem  por  via 
alguma,  de  gente  poftugueza,  nem  da  terra ;  e  em 
caso  que  algum  o  seja  dara  parte  ao  senhor  mestre 
de  campo  general ,  para  mandar  castigar  os  aggres* 
sores. 

10.  No  tocante  a  se  embarcarem  juntos  com  os 
soldados  que  de  presente  estao  no  Arrecife,  oidade 
Mauricea,  e  mais  pra9as  e  forcas  rendidas,  aos  que 
se  rend^rao  antes  d'estas  capitulacoes  nao  concede 
o  senbor  mestre  de  campo,  porque  tem  ja  dado 
comprimento  ao  que  com  elles  capitulou  sobre  a  sua 
entrega. 

11.  Que  o  senbor  mestre  de  campo  general 
concede  perdao  a  todos  os  Indios  rebelados,  assis- 
tentes  no  Arrecife  e  pracas  adjacentes,  especial- 
mente  a  Antonio  Mendes;  e  da  raesma  sorte  aos 
mulatos,  negros  e  mamelucos;  mas  nao  Ibes  con- 
cede a  honra  militar  de  sairem  com  armas. 

12.  Que  tanto  que  forem  assignadas  estascapi- 


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GA8TAI0TO  LOSItAHO.  591 

tulacdes,  se  entregarao  as  ordens  do  senhor  mestre 
de  campo  general  as  pracas  do  Arrecife,  cidade 
Maoricea,  e  mais  fortalezas  e  redutos  d'esta  capi- 
tania  com  toda  sua  artilharia^  muni^oes  e  petre- 
choSy  e  o  dito  senhor  se  obriga  a  dar  guarda  ao 
senhor  general  Sisg^mundo  para  seguranca  de  sua 
pessoa  y  e  dos  mais  cabos  e  ministros  do  governo , 
em  qualquer  alojamento  que  escolherem ,  todo  o 
tempo  concedido  nestas  capitulacoes. 

13.  E  sobre  todos  estos  capitulos  e  condicoes 
acima  referidas  se  obrigao  os  senhores  do  Gonselho 
Supremo,  residences  no  Arrecife,  a  entregar  tarn- 
bem  as  ordens  do  senhor  mestre  de  campo  general 
Francisco  Barreto  de  Menezes  as  pracas  da  iiha  de 
Itamaraca,  da  ilha  de  Femao  de  Noronha ,  Ceara  y 
Rio  Grande  e  Paraiba  com  suas  fortalezas  e  arti- 
Iharia  na  fdrma  dita;  mas  que  o  dito  senhor  mes- 
tre de  campo  general  sera  (^rigado  a  mandar  ao 
Ceara  uma  nto  sufficiente  para  nella  se  embarca- 
rem  os  soldados  e  moraflores^  vassallos  dos  ditos 
senhores  Estados  Geraes,  com  os  bens  permittidos 
no  segundo  artigo  d'estas  capitulacoes.  Mas  declara 
odito  senhor  mestre  de  campo  general ,  que  nao 
sera  obrigado  a  dar  mantimentos  para  a  viagem 
das  ditas  pessoas,  que  se  embarcarem  do  Ceara 
para  Pemambuco. 

14.  Concede  o  dito  senhor  aos  vassallos  dos  se- 
nhores Estados  Geraes  todos  os  navios  e  embarea- 
9oe3  que  tiverem  pelos  portos  do  Rio  Grande ,  Pa- 
raiba e  ilha  de  Itamaraca  para  sua  viagem  e  con- 
duccao  de  seus  bens ,  sendo  capazes  de  passar  a 
linha,  mas  declara  que  nao  levarao  arlilharia  de 

L  38 


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5M  QAVmmo  MWthM^ 

browe»  e  de  ferrp  sq  a  que  pr«Qisameme  far  nraei- 
svia  para  w«i  defe^si,  F^a  esta  ooDocmttla  oa 
campaitha  4o  Tabonk,  aegfunda  feim^  pabtcoue 
da  Qoifei  ^  4a  Jmeire  dk  1654  aimot, 

1.  Fim<:i«eo  lUf^iti)  BE  MfimRSf  mm^^  de  ewxpo  general. 

3.  Affonso  de  Albuquerque  ,  capiUto. 
U,  Manobl  GoRiiRA ,  capitio  seoretario. 
5.  Francisco  Alvaiib  Moum^ ,  oaridor  e  auditor  feral. 

1.  Sisca&amiDQ  VAi!(¥acf r>  (;ei^rat. 

2.  GisbertWit. 

3.  Vander  Vant  ,  tenente  general. 

4.  Yavtir  VAUii,  capitao  e  coMmMder. 

XXOl*  Amaaheoeo  a  terea  feira  37  de  Janeiro 
grata  para  oa  vencedorea,  trUte  para  os  ve&oidos  ^ 
uaa  e  Qutroamadrugaraoaaquette  dia»  eatesporque 
06  affligio  a  Tixinlianoa  da  perda  y  aque)l^  pcNrqne 
06  deapertou  a  alvoroi^o  da  posse.  Tocava  a  Joio 
Feroandes  Vicira  a  vanguarda  naqudle  dia ;  orde* 
noii4he  o  nqeatre  de  oampp  geBeral  que  fosse  Unnar 
posse  da  ibrtaleia  (ktsGinoaPontas,  4t  cidadeMau- 
ricea  e  4o  Arreeife.  'Saio  do  alojamento  earn  mil 
e  quinhentes  homeos  de  seu  terco,  e  marehou 
diante  da  sua  gente  com  uma  pica  ao  homhro.  Ao 
passar  pela  porta  da  fortaleza  da&  CiDCoPantas  re^ 
cebeo  a  eatrega,  deaarsiou  o  presidio,  e  o  guartie- 
ceo  com  duaa  compaBhiaa  do  seu  terco,  e  uma  do6 
soldadotde  Henrique  I>ias.  Deixou  nella  o  iaimigo 
viale  e  duas  peeaa  d'artilbaria^  as  desaseis  de  hronxe 
e  as  seis  de  ferro.  Entrou  n'uma  ]:^nicie  que  fas 
o  terrene  entre  a  fortaleza  das  Cinco  Pentas  e  a 


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GASTitotd  itmif  Ana  IM 

ckhde  Manriceft;  fez  alto^  formou  a  suagaite,  e 
mandou  recado  ao  governador  daqtiella  praca,  que 
SMDdaMe  sair  a  guarni^ao  que  nelk  estava,  para 
aer  desarmada  na  f<6rma  das  capitulicoea ;  (rf)ede« 
o^rao ;  e  ao  entrar  pelo  nosso  eequadrao  os  foi 
deaarmando  a  todos  o  sargento  maior  Antonio 
Dias  Gardozo.  Assim  oomo  entregtrao  as  armas  se 
tcarao  entre  os  Portuguezes  com  trato  tao  amigavel, 
que  nem  pareciao  estranhos  y  nem  inimigos ;  ef^ 
feitos  d'um  bandb  que  o  mestre  de  campo  general 
mandara  lancar  com  graves  penas,  etn  que  encor*- 
reria  qualquer  pessoa  que  fizesse  o  mais  pequeno 
aggravo  ao  menor  estrangeiro.  Peneceo  o  icto  e 
marchou  avante  o  mestre  de  campo  Joao  Fernandes 
Vieira,  a  quern  todos  os  rendidos  oUiavao  com 
admiracao  e  reyerencia ;  passou  a  ponte,  e  mandou 
assegurar  a  entrada  do  Arrecife  pela  parte  de  den*^ 
tro  com  algumas  companhias  da  ordenanca,  e  guar* 
necer  as  ruas  que  |;uiavao  a  praca  maior  da  po- 
Toacao,  com  soldados  pagos,  para  onde  marchou ; 
e  formado  nella  desarmou  o  sargento  maior  toda 
a  infantaria  contraria,  assim  paga  como  auxiliar  e 
miliciana.  AUi  entregarao  settenta  e  tres  chaves,  e 
com  ellas  a  posse  de  todos  os  lugares  fortes,  alma* 
zens  d'armas,  bastimentos,  generos  e  velame^* 
Po2  guamicao  nas  partes  convenientes,  e  guardas 
nas  paragens  que  as  pedlao;  e  retirados  os  rendidos  a 
sens  aposentos^  mandou  aviso  de  tudo  o  que  tinha 
obrado  ao  mestre  de  campo  general  Franoisco  Bar- 
reto  de  Menezes^  pelo  sargento  maior  Antonio  Dias 
Cardosso,  em  tx)mo  sua  senhoria  tinha  tudo  a  sua 
obediencia  socegado  e  pacifico.  Neste  mesmo  tempo, 


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596  QunniOTO  usiTAna 

porordem  do  mestre  de  campo  f;eneral,  traKm 
po3&e  Xodri  Vidal  de  Negreiros  da  foitaleza  de 
Saoto  Antonioy  da  oidade  Maurioea  e  dos  casldlos 
de  mar  e  terra,  onde  metteo  guamicao.  Da  mesma 
sorte  e  ao  mesmo  tempo  marchou  Franeidco  de 
Figueiroa  a  tomar  posse  das  fortalezas  do  Brum,  e 
d'outras  de  menos  porte ,  que  por  aqueUa  Gorda 
tiuha  o  Flamengo^  0  que  tudo  se  fez  com  tao  boa 
ordem,  que  se  nao  deo  occasiao  nem  ao  atrev imeuto 
oem  a  queixa ;  havendo-%  uma  e  outra  gente  com 
tanta  prudencia,  que  p^t^ecia  obrar  o  estudo  e 
nao  o'acaso. 

XXIV.  Quasi  todo  o  dia  de  27  se  gastou 
nestas  occupa^oes  militares;  nas  ultimas  hc»ras 
d'eUe  recebeo  o  mestre  de  campo  general  o  aviso 
de  Joao  Femandes  Vieira;  forcado  do  t^npo 
dilatou  sua  ^itrada  para  o  seguinte  dia,  em  que 
saio  de  sen  quartel  com  a  autoridade  de  general, 
e  com  as  galas  de  soldado ;  e  certo  que  nesta 
occasiao  mostrou  sua  pessoa  que  nella  se  via  o 
bastao  autorizado,  e  a  fortuoa  merecida.  Posto  a 
cavallo,  e  assistido  dos  cabos  e  da  cavallaria  que 
militava,  caminhou  para  o  Arreoife.  Na  entrada 
da  cidade  Mauricea  o  saio  a  receber  o  general  Sis- 
gismundo  Vanescop  a  pe,  como  caido  e  humilhado 
sujeitO)  triste  como  desgracado,  vestindo-se  seu 
semblante  das  cores  de  sua  fortuna.  Apeou-se 
Francisco  Barreto  de  Menezes  ensinado  do  successo 
a  desprezar  soberanias  a  vista  das  miserias,  em  que 
as  converte  o  menor  accidente  do  tempo.  Alii  se 
viao  ambos  os  generaes  em  igual  pAsso,  um  por- 
que  odesmontou  a  cortezia,  outro  porque  o  des* 


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GASTBIOTO  UJSITANO.  597 

montoii  a  fortuna.  A  sua  mao  direita  deo  Francisco 
Barreto  a  Sisgismundo  Vanescop,  e  nesta  forma 
caminbarao  parao  Arrecifepela  ponte  que  o  divide 
da  cidade.  No  meio  d'ella  o  esperavao  os  ministros 
do  conselho  supremo  e  politico ,  que  recebeo  com 
agrado  e  cortezia,  e  os  foi  levando  pelas  portas  de 
suas  casasy  em  que  os  obrigou  a  ficar;  menos  o 
presidente  do  politico,  que  resistindo  ao  favor  o 
acompanhou  at6  o  palacio  principal  da  povoacao 
que  o  esparava  rica  e  vistosamente  adornado.  Em 
todo  o  decurso  da  marcha  nao  descans^rao  as  forta- 
lezas  e  companhias  de  repetir  salvas,  cujo  estrondo 
servio  nesta  occasiao  aquelle  imperio  de  repiques 
,  e  desinaes^  porque  uns  o  acompanhavao  ao  tumulo 
outros  ao  throno.  Alii  Ihe  ofFereceo  Joao  Femandes 
Vieira  as  chaves,  como  instrumentos  da  posse,  com, 
distincta  rela^ao  da  forma  em  que  as  recebera  em 
seu  nome ;  e  foi  correspondido  com  as  gratificacoes 
dividas ;  e  bem  se  p6de  dizer  que  da  mao  de  Joao 
Femandes  Vieira  recebeo  Francisco  Barreto  aquelle 
dominio,  e  a  coroa  de  Portugal  aquelle  imperio. 

XXV,  0  numero  dos  rendidos  que  arrimarao 
as  armas  foi  o  seguinte  :  mil  e  duzentos  soldados 
pagos,  em  dezanove  companhias ,  em  que  entrava6 
oitenta  e  cinco  Indios  e  vinte  e  dous  negros.  Mao 
forao  parte  nesta  conta  mais  de  trezentos  que  se 
rend^rao  na  entrega  das  fortalezas  do  Rego  e  de 
Altenar ;  nem  tao  pouco  oito  centos  cincoenta  e 
dous  Indios,  que  se  haviao  retirado  para  o  Geara, 
como  nem  os  moradores,  nem  os  soldados  e  mora* 
dores  que  depois  se  renddrao  nas  ilhas  e  fortalezas 
que  se  entregarao.  Achirao-se  no  Arrecife  cento 


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51*  CAiniOIO  LlWrAM. 

¥iiite  e  tres  pe^i  d'arlilharia  de  brome ;  de  ferro 
oeato  e  setenta ;  e  para  ellaa  per  oima  de  sets  mil 
balas  de  todo  o  oalilnre,  e  a  eate  reapeito  as  demais 
muni^oea  e  armaa;  grande  divemdade  de  iiistru<* 
mentos  e  petrechos  deguerra^  e  materiaes  para  elles, 
CQixio  ferro,  chumbo^  pregaria^  madetraa,  feehos, 
cronhaS)  etc,  Assim  tambem  para  aprestoa  das  an« 
bai*cac6es  e  da  artilharia,  breu,  enxarcias,  velamei 
mastros,  vergas,  lemeS)  e  tudo  o  mais  que  podia 
ser  neceasario  para  os  exercitos  da  terra  e  anna* 
das  do  mar;  maatimeatoa  de  toda  a  sorte,  para 
mais  d'um  anno,  com  abundancia. 

XXVi.  Os  Hotlandezes  ( perfidoa  por  natureza, 
que  o  sao  em  toda  a  fortuna),  naquelle  mesmo 
ponto  em  que  se  (ko  principio  a  pratiea  da  entr^ 
ordenarao  ( e  quando  menos  consentirao )  que  uttk 
seu  tenenle  coronel  Nicolas,  de  cuja  pessoa  e  tran 
cces  fiieooos  algumas  vezea  memoria  nesta  relaeao, 
saisae  do  Arrecife  (com  titulo  e  apparencias  de  fiiga) 
em  uma  jangada^  que  sem  rumor  nem  Tulto  podiia 
escapar  facilmente  i  vigilancia  de  nossa  armada , 
favorecido  da  escuridade  da  noite ,  aportou  a  ilha 
d'ltamaraca ;  aviaou  o  estado  das  cousas ,  e  p«r- 
suadio  a  muitoa  moradores  e  Indios  que  se  en^>ar- 
cassem  com  todoa  seus  moveis,  e  fugissem  em  duas 
fragatas  que  estavao  no  pcHto ;  o  que  fizerao  levando 
c<Mnsigo  todoa  os  escraros  que  bam  na  ilba.  Foi  i 
Paraiba,  deo  o  mesmo  aviso,  e  aoonselbou  aoa  sol* 
dados  que  obrigassem  com  razoes,  quando  iiao  ecmi 
vioksieia,  ao  ooronel  Authim  govemador  d'aqudk 
capitania  e  fortakza  a  que  fizesse  o  mesmo;  e  se 
embarcarao  com  todo  o  redaeio,  moai^ees  e  armas, 


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que  poddra^  lerrftr.  QtkAsl  eoin  ^iihilhitite  dvlso  ^ 
snoeeMo  ckiixarao  M  Flaiii(^o§  a  ft>rtaleza  do  Rio 
Qrat)d^5  o  que  Be  foz  sem  que  nos  chegasse  a  meaor 
nolieia. 

XXYIL  Em  0  pritn^iro  dia  de  Fer^l^dro  orde- 
nou  Franciico  Barreio  de  Menet^  ao  mestre  de 
campo  Francisco  de  Figtieiroa^  que  com  oitocentoS 
e  cineoenia  sotdados  fosse  tomar  entre^  da  ilhsi 
de  itamat'aea^  Paralba ,  e  Rio  Grande.  Desarmou 
o8  rendidoe  da  ilha^  que  erao  quatrdcentos  soldado^ 
e  Dumero  creseido  de  moradores ;  tomou  entregsl 
das  fortalezas,  com  tritita  e  tr^  pecad  de  artUharia, 
quasi  todaa  de  bronze,  e  oopid  grslnde  de  munieoes, 
armas  e  bastimenios*  Guartiecidas  aqudlas  forcas, 
passou  a  Paralba,  onde  aehou  ^s  duas  fortalezas 
da  Barra  em  poder  de  cincoenta  Portuguezes  que 
o  inimigo  tinha  prosos ,  e  m  soltou  j  fazendo*mes 
entrega  deltas^  e  ^ os  Flumengoa  cdsados  e  herda- 
do6  na  terra  ficarao  nella«  Guartiecidas  as  ditas 
forcas^  marchou  para  o  Hio  Grandey  achou  a  forta- 
leza  desemparada;  e  na  terra  algdtis  poucoa  Hollan- 
dezes  caaados,  e  Po^ugUezes  alguris,  que  a  fugat 
do  Flameugo  fez  de  captiros  livres.  Cain  as  me^- 
mas  cireufiislafiicias  se  tomou  eiltrega  da  iiha  de 
Felnao  de  Koronba.  A'capitank  do  Geara  sef  man- 
doB  a  nao  na  fiSraia  eapitulada,  e  neila  vierao  os 
pendidda  para  o  Arrecife. 

XXVUL  Entreg»e  o  Ajrrecife,  e  aposentado 
Helle  o  BMStre  de  campo  nauera)  Ff*anciseo  Barreto 
de  Mciiezes,  se  deapedirao  o  genera)  da  armada 
Pedro  Jaques  de  Magathaes  e  Francisco  Freire  sen 
atoiranle  oon  os  mais  capitaea  da  frota ,  a  cujo 


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604  cAsmmo  waxtsmk 

aiuilio  deve  Portugal  a  reiat^ra^ao  de  aaa  ooroa, 
naquella  por^ao  de  suaa  ccmquistas,  que  se  bem 
foi  outra  mao  a  que  pr^>arou  e  polio  aquella  pre^- 
ciosa  pedra,  bem  se  p6de  dizer  que  foi  a  daquella 
anoada  a  que  a  engastou.  Recoohecidos  a  esta  yfer^ 
dade  nao  sabiao  Francisco  Barreto,  Joao  Femandes 
Vieira ,  Andr^  Vidal  de  Negreiros  com  todos  os 
maia  cabos  e  moradores  palavras  com  que  gratificar 
tamanho  beneficio.  Deo  a  armada  a  v^a  para  a 
Bahia  seguida  de  bencaos^  e  rogativas  de  todos  os 
soldados  e  vizinhos ;  onde  entrou  com  as  novas  da 
victoria »  e  com  todos  os  vasos  da  frota;  e  deo 
aquella  cidade  o  melhor  dia  que  teve  depois  de  sua 
fundacao.  — Em  3  de  Fevereiro  saio  do  Arrecife 
uma  caravella  d'aviso  para  o  reino  por  ordem  do 
mestre  de  oampo  general,  e  nella  o  mestre  de  campo 
Andre  Yidal  de  Negreiros  com  a  alegre  nova  da  re&- 
tauracao  de  todas  as  capitanias  occupadas  pelo 
Hollandez ;  pessoa  escolhida  para  representar  k  Ma- 
jestade  d'El  Rei  Dom  Joao  o  Quarto  o  successo  e  a 
desculpa>  com  qve  os  moradores  d'ellas  excedendo 
a  permissao  da  defensa  se  movSrao  a  conquista, 
para  que  Sua  Majestade  nao  ouvisse  o  successo 
sem  as  causas,  e  pesasse  mais  a  desobediencia  que 
o  service ;  o  que  nao  seria  chegando  aos  ouvidos 
d'aquelle  principe  a  nova  e  a  causa  da  desculpa ; 
e  como  uma  e  outra  cousa  tinha  passado  pda  mao 
do  dito  mestre  de  campo ,  daria  inteira  razao  dos 
motives  occiiltos  e  manifestos  que  concurrerao 
para  a  determinacao  ,  com  a  fidelidade  de  parte  e 
testemunha.  Saio  na  esteira  de  Andre  Vidal  dc 
Negreiros  outro  vase  menor ,  e  nelle  o  padre  Frei 


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GASTUOtO  UJSITANa  601 

Joao  da  Resurrei^ao,  rdigio8o  de  Sao  Bento,  asais* 
tente  que  havia  sido  a  todo  o  processo  da  guerra 
desde  o  primeiro  movimento  at^  o  ultimo  passo 
d'ella,  mandado  pelo  mestre  de  campo  Joao  Fer- 
nandea  Vieira  ^  interessado  em  que  Sua  Majestade 
premias8e  os  grandes  seiTi9oa  de  tal  religioao,  mui- 
tas  vezes  referidos  no  disourso  d'esta  hiatoria.  — 
Navegarao  €stas  duas  embarca96es  por  differentea 
rumosy  e  tomarao  a  barra  de  Lisboa  em  um  mesmo 
dia,  que  foi  o  de  18  de  Mar^o  d'aquelle  mesmo 
anno;  Andr^  Yidal  pdias  seis  boras  da  tarde,  e  o 
padre  Fr.  Joao  uma  bora  depois.  Mandou  Andr^ 
.  Yidal  deitar  ferro  com  reaolu^o  de  fiear  aquella 
noite  na  carayella  y  e  subir  para  cima  no  dia  se- 
guinte  J  desembarcando  a  boras  que  da  caravelia 
entrasse  no  pa^o ,  e  nelle ,  sem  detenca  nem  com-* 
municacao  alguma  se  apresentasse  a  Sua  Majes* 
fade.  Sem  abaixar  v^la  entrou  o  padre  Fr.  Joao,  e 
subio ;  e  ao  prepassar  conheceo  a  caraTella  do  mes- 
tre de  campOy  que  estava  sobre  ferro;  pareceo^lbe 
que  o  levava  diante,  e  pelo  alcancar  no  pa^o ,  e 
nelle  o  patrocinio  de  seu  negocio,  entrou  pelas  dez 
da  noite,  fallou  com  o  secretario  do  expediente,  e 
nao  acbando  noticias  do  mestre  de  campo  Andr^ 
Yidal  de  Negreiros,  pareceo-lhe  crime  deter  a  nova, 
e  engeitar  a  dita  que  Ibe  oflTerecia  a  fortuna.  Teve 
audiencia  de  Sua  Majestade ,  deo-lbe  a  nova ,  que 
elle  recebeo  como  beneficio  da  mao  de  Deos.  Ao 
ontro  dia  retificou  a  nova  e  a  alegria  o  mestre  de 
campo  Andr6  Yidal  de  Negreiros,  que  logo  se  di- 
vulgou  por  toda  a  corte  com  tanto  alvoroco  que  a 
festejava  o  gosto  de  todos,  e  nao  acabava  de  a  crer 


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•n  Qumixno  uMct apoi 

^  o  fliptnto  de  nttdtos.  Utn  dM  diAft  seg^nMB  fbi  Sitt 
Majeuade  em  prodssao  I  S^  a  dat  as  gfa^  d« 
meroe  tao  granda. 

XXIX.  Etta  di  o  fim  qua  tare  o  itilrMO  impario 
belgioo  Mqudla  parte  da  Ammca ;  iirila  tio  )^H>9^ 
trada  am  pte  da  aspada  portugaesa  8ua  repntacao^ 
seu  podar  a  sua  CDriuna«  Mell^rou  o  FUunengo  o 
qim  no  Braait  adquirioy  e  so  para  o  debar  mdho- 
rado  o  augtiicBlou  :  Urn  sens  esertiputos  a  fortiraa^ 
Muito  foi  o  qud  HoUatida  na  conquisla  do  Bra&il 
adquirio  por  roobo,  e  muito  mais  a  que  deo  por 
ealrt^a*  Paet^rao  da  Tinte  mil  homaii  09  que  Ihe 
aontnmnito  a  defeusa  (  nao  ikUamos  nos  di^pas-*- 
dios  da  oonquUta  que  nao  ti? erao  conta  ) ;  eaa  duaa 
partidas  perdeo  oinoo  oiil^  que  forio  as  dos  Gua- 
rarapes.  ^oceMi^amaule  foi  ezpulsado  da  duzaataa 
legoat  da  oosta ,  que  dcsxou  com  as  forialeaas  qua 
ueUaa  ievaiitott  e  posauio^  Em  uma  tarde  nos  refi-^ 
da«  aa  fertalesiaa  do  Rego,  a  de  Altenar,  a  dos  AA>^ 
gadoa^  a  das  Ciaco  PbuUs,  a  de  Saato  Aatonio ,  a 
da  Boa  Viala,  a  do  Brum;  a  da  Seca^  a  dos  Perrexif , 
a  do  fiUraco  de  Santiago ;  os  caatellos  do  isar  e  da 
terra^  ddada  Maurioea ,  e  o  Arrecifa  com  iodoa  0$ 
fortiM,  pfaitaforma9  e  batarias^de  quo  seguarfieciao; 
e  cortou  tao  kirgo  a  aapada  portugueaa^  qua  junta-^ 
■Mate  FCttdco  uma  forealeaa  no  Rio  Grande ,  chus 
oa  Paraiba  y  couk  m  das  ilhaa  de  Itaraaraca^  Ferino 
da  Nore^ha^  e  a  capttaRia  do  Ceara ;  tendo-ihe  j4 
a  ts^  tempo  aaido  dasr  maoa  as  fortalezas  de  NaMH 
reth,  do  Rk)  de  Sao  Fran€i$cO|»  do  Porto  do  CalTo, 
de  ioao  d' Albuquerque  com  a  viUa  de  Qlinda ;  em 
todaa  ooa  daiatHi maia  de  seiscwiaa  peoaa^  iquasi 


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Gumoto  LmtrAmx.  60S 

todas  do  bronze.  Ai  annas,  muniooes  «  getierod  fb-* 
rao  em  tanta  oopia  que  eiLCedArio  d  nlimero  e  a 
estimate. 

XXX.  Aquella  potencia^  que  o  Tulgo  no  Brazil 
julgava  insupperaTcly  asaistida  dos  progressos,  das 
fortifica^oes ,  daa  armadas ,  do  rottbo  e  do  com- 
roercio,  poz  debaixo  dos  p^s  o  coracao  d'um  ho- 
mem »  porque  a  excedco  a  grandessa  de  seu  animo , 
assisUdo  do  inTencivel  espirito  que  o  movia.  Foi 
e&ie  o  grande  Joao  Fernandas  Vieiro  ^  varao  maior 
que  seu  nome.  Neste  heroe  competMo  a  capaci^ 
dade  e  o  valor,  porque  sua  eabeca  foi  ;i  medida  de 
aeu  braco,  obrando  a  forca  o  qu^  deliniava  o  peti«« 
samento ;  e  seu  cabedal  tudo  quatito  Ihe  propoz  0 
desejo.  Necessilava  de  a  prestos,  pedia^os  i  sua  fa-- 
aenda  ;  faltavao-lhe  soldados,  fiixla-os  sua  praiica  ; 
deseja^a  leoes;  criava^os  seu  exionpto ;  pretendia 
victoria,  dava-lh'as  a  fortuoa*  Saio  it  eampanha 
acompanhado  de  si  mesmo,  e  ftai6  com  o  que  inten- 
tava.  Nao  houre  oocasiao  am  que  o  i^ucesse  o  po^ 
der :  em  lodas  despreeou  o  perigo ;  em  mui(as  soc- 
oorreo  a  faUa;  em  algumas  atalhou  cs  infortunios. 
Mao  houve  conselho  que  nao  devesse  as  resolucoes 
a  seu  parecer ;  nao  houve  destroco ,  em  que  nSo 
inftoisse  seu  braco,  nem  tiyemos  viotoria  que  nao 
ittustrasse,  ou  sua  espada^  ou  sua  disposicao.  0 
principio  daquella  guerra  resuha  foi  de  seu  Im- 
pulso ;  a  continuacao  das  armas,  effeito  foi  de  sua 
constancia  j  o  soccorro,  que  a  frota  dec  para  se  con- 
cluir  a  empreza ,  inven^ao  foi  de  sua  industria  ;  o 
cercar  as  forlalceas  do  ArreeJfe,  eleicao  foi  de  sua 
e^raii^.  Nao  faltou  a  aoa  grandcza  «  emulacao ; 


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664  GASTilMO  LOfirrAm). 

a  8eus  progressos,  a  inveja ;  a  sua  liberdade ,  a  in- 
gratidao  ;  a  sua  cortezia,  o  atrevimenfo  ;  e  a  sua 
fidelidade ,  a  trai^ao.  Yerdadeiramnte  todo ,  e  em 
ludo  um  vivo  retrato  daquelleCastrioto  tao  conhe- 
cido  por  suas  obras,  que  se  foi  primeiro  no  tempo 
teve  em  Joao  Femandes  Vieira  segundo  no  valor 
e  na  fortuna.  A  este  heroe  (apuradas  bem  as  causas, 
6  melhor  as  razoes  com  que  o  Serenissimo  Principe 
Dom  Pedro ,  fallando  neste  varao,  o  nomeia  heroe 
de  nossa  idade,como  algumas  yezes  ihe  ouvi :  con- 
dicao  verdadeiramente  d'um  Principe  perfeilo  nao 
se  lembrar  do  servico  sem  honrar  o  merecimenlo) 
devem  as  idades  a  mais  yiva  lembranca ;  a  nacao 
porlugueza  a  maior  fama;  a  America  toda,  o  me- 
lhor nome;  o  reino  de  PcNrtugal,  o  commercio  mais 
utii;  a  coroa  lusitana,  a  porcao  mais  rica;  as 
armas  portuguezas ,  o  pregao  mais  vivo ;  os  Prin- 
cipes  lusitanos,  o  premio  mais  grato.  Os  quilates 
de  seu  merecimento  relala  fielmente  esta  hisloria , 
que  servira  a  posteridade  de  manifesto,  em  que  se 
veja  a  razao  com  que  a  fama  o  deve  collocar  entre 
sens  capitaes.  Com  Ihe  dar  occasioes  para  o  servico 
o  buscArao  os  premios ;  e  soube  Joao  Femandes 
Vieira  achar  occasioes  para  fozer  dos  premios  os 
maioresservi^os,  como  diremos  na  segunda  parte 
de  sua  historia  que,  sendo  Deosservido,  daremos 
&  estampa  muito  brevemente. 


P'*o,  nem  mesmo  i  certo  se  elle  a  com- 


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GASTRIOTO  LUSITANa  605 

poz ;  o  que  e  para  sentir^  porque  (icatnos  pmados 
cle  mais  um  monumento  que  attestasse  as  grandes 
virludes  e  heroicos  feitos  de  Joao  Fernandes  Vieira. 


FIM. 


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n 


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INDICE. 


Advertencia  do  editor ix 

Ao  sereniflsimo  principe  dom  Pedro xi 

A  Joao  Fernandes  Yieira xiii 

Prologo , XVII 

Livro  I.  •  • , 1 

Uvro  II 20 

LiyroIII 45 

Livro  IV.. 109 

Livro  V 153 

Livro  VI 1T7 

Livro  VII 244 

Livro  VIII '. 320 

Livro  IX 1 378 

Livro  X 44« 

Livro  XI s 489 

Livro  XII ...  tt52 


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