Castrioto Lusitano : parte I. Entrepresa, e restauraçaõ de Pernambuco; & das capitanías confinantes. Varios, e bellicos sucçessos entre portuguezes, e belgas. Acontecidos pello discurso de vinte e quatro annos, e tirados de noticias, relaços, & memorias certas.

''/

ir:

I

STRI

LVSI

PARTE I.

ENTREPRESA, E RESTAVRACAÔ

de Pernambuco j& das Capitanias Confinantes.

yARIOS, E B E LLI C o S SVGGESSOS

ENTRE PORTUGUEZES, E BELGAS.

'ACONTECIDOS FELLO DISCURSO DE FINTE E ^ATRO ANNOS , E
tirados d^ noticias^ reUcoês , éf memorias certas.

COMPOSTOS EM FORMA DE HISTORIA

pilo Mujto Referendo Pftdr^ Préjfídor Geral Fr, R^-
-^hnddcIeswsNííturí^l dí^mPijto Nohre , (Srfcmfre
EeãlVilh de Guimavaís,

RELIGIOSO DAORDEMDO PRÍNCIPE DOS PATRIARCHAS

S

7>7(OFESSO NA SL\ %EF0^JDJ COKG%BGAC,AM DE
Portugal, ^ ndla T>, Ahbade âu Infigne Moft^yro de S.Stnto de Lnboa eíte

prefenteamode 1679.
^ OFEERECIDOS

AIOAO FERNANDES VIEIRA

CASTRIOTO LVSITANO

E POR ELLE DEDICADOS AO SERENÍSSIMO PRÍNCIPE

DPEDRO NOSSO SENH

REGENTE DA LUSITANA MONARCHIA.

' LISBOA.

Com as lice^as necejfartas.
Na ímpreíTaõ de António Craesbeeck de Mello Imprefíbr de Sua Alteza

Ann% 161 Q,

LÍCENC,AS.
Padre M. Fr.Kíanocl de Santiago Qualificador doS.
_ OfBcio veja efíe livro,& informe cõ feu parecer . Lis-
boa primeiro de Fevereiro de 1678.

M anoel de Magalhães de Meneses. Manoel Pimentel de Sou/a»
Manoel de Moura ManoeL
Cenfura do ^eVerendiffimo I^.M.Fr. Manoel de Santiago.

VI efte iivro intitulado Cajlnoto Lufitano compofto pel-
lo M.R.P. Fr. Raphael de Jesv Religiofo da Ordem
do Patriarcha S.Bento Pregador Geral ,& Dom Abbade do
leuMofteyro de Lisboa ,& naò fó achey nelle coufa algtía
contraria a noíTa San6i:a FéjOU bons coftumes; mas moftra o
íeu Author^ que he taó curiofo na hiftoria,como conhecido
na predica . Defcobre muytas coufas não fabidas daquella
guerra, & de grande reputação para as Armas dano0aMo-
iiafchia,dando noticias de muy tos valerofos Portugue2es,q
podem fervir nos alétadosexemplo5& nos fracos deeftimu-
Ío:Por onde me parece efta obra taó digna das memorias co-
mo das eftarapas. Lisboa em S. Francifco da Cidade era 26.
^qM^rçodiç ^é^S. Ft.MânoeJdeSMÚago/

O Padre M.Fr.Gregorio de jesvs Qualificador do Sãíèo
Officio veja efte li vro,§^ informe com feuiparecer.Lis-
boa29.deMarçode678. 9-;: /r '^ - >':' ■'■■:'
Man&flde Magalhães de Meneses. Manoel 'Pimentel de Soufa^
: Manoelde M^ottraManmL FrJ^alerÍQdeS,^ymmdó', '■
■ ' Cenfura do ^aVerenditffimo ?. M. Fr. Gregoriv de Jesvs.
OR mandada dos Senhores do Concelho Geral do Sá-
,_^ do O fficio 1 1, com grande atenção , & mayor gofto o
Caflnoto Lufttam(]i\e compòs o M. R.P. Pregador Geral Fr.
Raphael dé Jesvs,Abbade meritifíiino do feu Mofteiro de S.
Bento ncfta Cidade de Lisboa,não prejudica eííi coufa algúa
a pureza de nofFa S.Fé, ou bons coftumes^ antes pode incitar
àos prefentes, & vindouros para feu melhoramento, & exal-
tação, com os muy tos èxemplGs,que traz de vistorias contra
íícregesjpois como fed iz na Efchola das Verdades , verdade ^^^^^^^ ^^ ^^^;
19. ^.11. naó havendo manejado armas Luculo foy Capi 4^^^^ verdade
ta6,quedefarmouaMítridates fócom aliçaódahiftojia.A i9.§.ii.
matéria defte li v ro , pelio que tem de gloriofa , bem moftra

* 2 fer

/ LÍCENC,AS;

fer eleição de fcu Autlior5& obra taó fua na elegância do ef-
tilo,c|ue fe quanto he mayor a inteligência dos Anjos,tanto
faó n)ais comprehenfivos os feus conceitos, como Anjo no
^ nome cóprehêdeo miíhor as noticias/eu talento, para fer na
relação todo angelicoj & fe no púlpito para remédio das al-
mas té moftrado, & moftra o fignificado do feu nome em fer
medicina de Deos, que aíTimfe interpreta Ptaphael.flJtí^WÍ
l7Def^^^^^^' wj^cí/cma D^ijNefta hiíioria, para que não chegue a enfermar
a mayor gloria Portugueza com o mal do efqueciméto, tam-
o p. Garau nas bem lhe aplica a medicina , que também he medicina a hiílo-
fuoí Maxtmas ria, como diz o Padre Garau nas fuás Maximas,Maxima 24.
Máxima 24. ». 1)47. donde refere aquelle celebre ca fo de AfFonfo Rey de
^'^- Aragaójquc na hiftoria de Alexandre, que efcreveo Curcioj

, achou a faude,que naó achou na medicina^ & por iíTo defpe-

ill^llJ^ '^^^' dindo os Médicos lhes diíTe. Faleat JvicennafValeat Hippocra-
tes & alij Med'tci,& ViVat (uYtiuSyrejlttutor janttaíis ( como relata
a Polyanthea verbo,hiftoria ex Panormitano de rebus geftis
Alphonfi)Fes Curcio por Hiftoriador , o q naó fizeraõ muy-
tos por Médicos: A medicina defte Hifioriador tem tanto de
divina,que para naõ morrerem na memoria os noíTos Martes
Portuguezes , os faz ímmortaes na fama , eternizando-lhes a
Solariam emhk' g]Qjjji ^^ Çç^ Valor com efta hiftoriaj& por iíTo o Soíarzano
'*^" "'^ nos feus Emblemas, Emblema 8o.n.8. refere de JacoboBoif.

fardo , que pintou de hiia parte hum Capitão com muytos
defpojos militares, & da outra humrEfcriptor com a pena na
mão, como quem lhe efcrevia as façanhas, com efta letrz.Quf
fcriptorum monumentts mmdantur j <íterm redduntur, Sc com eftes
veríbs. -

E^rí^ljifiuffía ifrtusfe helltca geflis
infaty^^ ad laudes nititur ire fuás,
2^ijcrif>tís \mlgíita ejus fu fama per mhem^
&fiatyadíjs clariorhiHorííe* •
Cõ o quc,fe alguém quizer fer difcipulo de táo grandes Meí^
três, & quizer faber,quem fó com a efpada na mão pôde fo-í
geitaromundo,neílefó livro tem compridos feus defejos,
como lá diíTe das armas, 8í lettas o Solorzano, Emblema 2 6»
n.15.

wa. S0.;7.S.

Solorzmo em-
hlema 26.fi., 15

Eh'

l .í

LICENC,AS,

Enftferam ípectate manum, qu^ Cômprmt Orbem,

attamm in folo nltltur tila Itbro.
Enfe Valetfophi(t,(^ fophia protegit mfes,
híferiunt^úlos íBafertre docet.
Só falta ao livro a luz da eftanipa, de que o julgo dignVffima
para gloria da Naçaó Portugueza, por Ter para todas as mais,
humaffombro.Carmo 14.de Abril de 1678.

02)outorFr.ÇregoríodelesVf,

VIftasasenformaçoês podefe imprimir efte livro, cujo
titulo he Canmto Lu fitam Author o P. Fr. Raphaelde
Jesvs, & impreffo tornará para fe conferir , & fe dar licença
para correr , & fem ella não correrá. Lisboa. 1 9. de Abril de
1678.

Mamei de Magalhães de Meneses, Manoel ementei de Soufa,
■ Manoel de Moura Manoeh Fr, Valem de S.^jimmdo.

Podefe imprimir. Lisboa.26.de Abril de 1 678,

... ....'v

':n£ni34 g»o?

p» #-« f

AO sereníssimo príncipe D.PEDRO

Regente da Monarchia Luficana.

S E N H Ô'.l^»

O Sotaque lhes prefide^ ãeVem os aílros toda
ofer de/eu lu^imento.a V.A^que rnsgoVer-i^
na^Je haÕ de atftbutr todos os pyogrejfos de
[eus Vajfalks, Chefia divida ojfereco a [eus
^aesph a memoriando q emfeuferVtco obrou
minha poffibílidade , para que [e YffttuaÕ os
ejfeytos^a quemfe deVem osinfluxos.Jquellas
ágoâSy que os nos leVaÕaomar, não h ferViçOyhe reJiiluicaÕSem/cy]
quem tempo do Senhor ^y tí.loa'oDtgniÍfimo frogenitor de V. %.
A,fe intenlQUi^ fe confeguio a rejiauraçaõdejla, íS» das mais Qapt-
tanlis^que nejie Eflado dó 'Brafil tinha ujurpadoa violência tnimigaz
Mas também confidero^que os ãftros^em que o Sol fuílituejua aufen-
cia^ tomai) corpo de hua mefma mater ia^^ hm mefma lu\ os informa,
^OYíaÕ da corpo dopaj/y he o corpo do filho pella getdíao^ &t peita edU'
caçdÕhum reflexo defeu efptritO',re\aÕ^ que agora me reprefinta cutro
tempo ^ porem não outro 'Principe V.A. naceo para o fer da pa^^ def»
pois de 'Vmte & ojito annos ga fiados em ViVa guerra , & osfiicçejjos
delia fi a V.A.fehaÕde dedicar. Aquelles matertaes^que 'DàVtd cÕ"
gregou no tempo da guerra par a o templo y não qui^ Decs^que nafi)rma
dellefe lhe dedicaJJemJenaÕ emte.mpo\leJeufilho Salamaõ^ porque
(^ey pacífico. T^ao faltará aceitação a ofierecmento.que t^fle acerto <í-
padrinhafê quefa^^ o defejo de hum Vajfallo^ que falto de occa^toes
para ferVtr , diverte jua magoa com as memorias ^do que rem.jsrVtdo a
V.A , cuja Vidafê eílado aumente o ceo por/elltces^^ dilatados an-
nos jpar a gloria defla Monarchia^^ hemdèfeusFajJallos,

Fidelíf/tmo Criado dey.%J.

Joaõ Fernandes Vieira.

AJOAO FERNANDES VIEIRA FIDALGO

da Caza de Sua Alteza , & do feu Concelho de Guerra, Al-
cayde Mayor da Villa de Pinhel, Comendador das comen-
das da Ordem de Chrifto Saõ Pedro de Torradas , ScSanda
Eugenia de Aula,fuperentendente,[pellomermo Senhor]
das fortificações de Pernambuco , & de todas as mais
do Eftado do Brafil para o Norte, & primeiro
Acclamador da Iiberdade,& refl^Uraçaõ
deP^^níimbuco.

\r- ^

- - - '

^SC^EFSO Jth^neo as proezas deLucuU.
loFúlènfof^ efciarecído ^manOy^ acaba*
I da a hífioria-i a remetéo ao mefmo Lucullo (_/"<«
retirado dagmna) para quemlU 'vtjfe^ como
em hum retrato de fuás obras ^fe a narração fe
afaflaVa em algua cotiza da Verdade j ^ tom
[fuaaprtíVacaõficajfe o referido fem duVida»
Sabia , quefe não dâ inteira fé aos trejlados^
que naÕfáo conferidos com [eus origmaes JTudo^quanto contem efle li'
Vroy em feu principal afjumptOy faõ obras de V. Senhoria , por filhas,
ou de feu braco^ ou dejeu confelho^ou de fua difpofi^aÕ. A noticia dos
fuczeffosydàs pejfoas, dos tempos , 5S> das partes , recebj defogeitos
fidedignos pellos pojlos^ que occupáraÕ^ pelU continuação ycom quefer-
virão, Sf pella honra^com que por ceder aÕ^ aos quaes , como a teílimu'
nhãs de Vifta manda o dereitiò dar inteiro credito. Muytos Authores
efcrevèraÕos progrejfos de Alexan dre Magno^ & na opinião de Fo-
latervano a nenhum fe deVe tanta fé como a Anflohulo ludeu , porque
os referia de Vifla^ affiflindo-lhe a tudOy & em todo o difcurfo de fuás
conquiflas . Ariftobulas Judeus refgeftas Alexandri Magni yoiater.
confcripfit,comefque ipíius peregrinationisfuit.J5/ô/?í)^(?,
que efla re^aÕ me obriga a crer o Verdadeiro das nottciáSy deixara de
ojer o argumento defla narração fe na menor parte delia faltar a Ver*
dade. No mundo nao/ãÕ menos os ambicio/os dafama^ que os dafa*
^enda , ^ com maiscuidido fe efconde a infâmia^ que a pobreza. Os
olhos de V. Senhoria bu/cay nefle Volume^meu efcrupulo:Nelle acha^
rà efpelhoy em que fe Veja retratado , & todos nefle efpelhõ poderáÕ
Ver o retrato de K Senhoria Je em tudofe conformar a imagem com
ooríginal. 'Biflaadef^melhanca de hm cor, para deflrutr o parecer

:íf 4 de

'^t Ui imagem 'j ^ por^m neUa naofslteomnoraccidente^ o re-
meto ao exame deV> Senhoria para que amfua enmenân , ou com
fua aprov^icãofique a certeza fem duVtda^ & je lea efta InHoria [em
efcrupulo^ certo o Leytor^jue Vé^o que V.Senhoria he , }ia Verdadeira
repre/entacaÕ do que tem fido, jiinda que peco, naÕ adulo.lntento^em
que não cabe inter efe^não tê parte a lífi)nja , nemfe obriga com a Ver^
dadey a quem naogoBa da mentirã-^quem nas ccca^ioês fem o alterou
com os VtVas dos aplausos ^nãofe pode efvaecer com aí repetições dos
progreJfos.Ejpero meu dejengano^^ os de todos ^ na diffíniçaÔdo cer'
ío^& com ella ficara meu trabalho mats luzido ^ & efte Volume mais
digno defedar â epampa^hm Vf^ por Verdadeiro , ^ muytds por V.
Senhoria fer feu affumpto^ &/eu Author. J peffoade V. Senhom
guarde 2)eos por dilatados annos ypara que nelles viVa afeguranct
dejfe Eíladoy ^ ocafligo da emulação . íBraga^ ^ Outubro 22. de
1 6y 6. Capelão de ^Senhoria. O T regador ^(S frocurador Céral da

fr.RaphaddeJesys,

5KL'i '-.a..

v-^

OLOG

OS Prólogos fazjaó os Efcritores hu-
milde rogo ^ permitia-o aííngeleza de
algum terapo.Na prefente idade,preve^
nidas advertências devem fer o argumê-
to dos Prólogos; neceííita delias a mali^
cia : O que menos fabe, he, o que mais
prefume, rezaõ, porque a tudo fe atre-
ve, o que menos fabe. Nomayor pego correm os rios cora
menos ePtrondo: Os juizos, quanto mais tem de fundo , mais
tem de capacidade . O curiofo lé ; o noticiofo obfervaj o li*
mitado grita; julga de fi, que pode cenfurar fem reparo , o q
fe efcreveo com eíludo.O acerto não tem preíTaSjSc fe algum
a teve, foy dita da cccaziaô, & não eíFeyto do repente , Por-
que há de ter animo para céfurar, o que os outros efcrevem,
quem naó teve bno,nem ainda aplicação, para efcre ver? Ne-
nhum eftá taõ longe de íi, como o efvaecido; nenhum tanto
cm íí, como o coníiderado. O Sol,tem de planeta mais luzi-
do o expor feus rayos á nota,cobrindo com fcu refplandor a
falta de todos os mais aftros. Se queres aproveitar, nãoleas
para efcurecer; lerás para faber, fe leres com os claros de teu
)aizo:Se o queres formar defta obra,nella te oítereço pròcef*
fada a cauza,iulga pello uj^ericimento do proceíTo^para que a
paixaô te naõ faça parte, i^juando te cônííitucs juiz*

Com rêzaó defejarás faber , a que tive para me occupâf
em argumento, a teu parecer, taó alheo de meu eftado, quã-
to o he o eílrondo da guerra,do focçego religiofo ? No mo-
ti v o do reparo tcs a fatisfaçaõ da duvida. O eco, em húa par-
te fe forma,em outra fe cauza; nelle ouves o golpe , fem ver a
ferida. Os conflitos , efcrevefem na campanha com fangue,
na h iftoria com tinta . Nas imagens ves boca para falar , mas
não lhe verás nuca abrir a boca. Tal he a relação dos fucçef-
fos, imagem fem vos, eco fem golpe,ferida fem fangue.

Naõ te pareça oclauftro taõ diverfo da campanha, que
imagines fenaõ milita em húa,& outra parte.Naõ bafta a dif-
ferença das armas para tirar o fer aos confli(^os , Os inimi-

20S*

mm

^:ài

mmm

PROLOGO.

gòsif or ferem de outra naçaõ, naó deixaõ de fer cotitrarios:
Os mais ardilozosjfaó os mais nocivos.Para todos os mortaes
he todo o lugar cãpanhaj & não íerá foldado/enão qué dei-

loh 7 I. ^3^ ^^ ^^^ homhMdttu eft Vtta hommsfuper íerr<jM.Na inftitui-

çaó das Ordens Militares acharás praticados, como equivo-
cos, campanha,& choroj breviario,& lança; religião, Sc mili-
cia.Os filhos de SaóBento,armados canta vaó osofficios Di-
vinos; o mefmo fino, que4he5 tocava a rebate , os chamava á
reza; obfervoao eIRey Dom Sancho de Caftella, & diíTe ao
AbbadeS.Raymundo: Admirame padre o ver, queaeíles-
V oíTos fubditos faz hum mefmo fino leoés,& cordeiros.

Já fe viraó militar as eftrellas , fem que a guerra lhes rela-»
xaíre,nem o curfo da virtude, nem a obfervancia da ordem?

ludic. 5. 20. SídU manentes inorclinefuo^& in cmfufuopugmmmt contra fixa--
ram: E eftaó taõ apartadas do mundo , como o eftá o eco dâ
terra. O que a profiíTaó faz propri o , que rezaõ o pode fazep
alheoí' O mais religiofo, he o melhor foldado, & fera melhor
foldado , o que formais religiofo . Na caza de David , & na

j.Reg.iyj^^ér Tabernáculo efteve a efpada com que truncou o Gigante;^

^^■9' decência do depofito equivocou os lugares, pello religiofoi

&pello foldado. 5

Peilas occupaçoês fe diftitigue o reformado, do deftraidot
Horçefta^decQroza,& utilhe aquella , que ferve ás melhoras
do,particular,& do comum. Os livros aproveitaõ ao comum,
em quanto oçcupaó,& ao particular,em quátò eníínaõ. Grã-*
d-e ferviçQfaíí á patria,o que á iluíir^ com obras dignas de fe
efcreverem',mayor,o que a ennobreceefcrevendo feitos dig-
nos de fé imitarem. A proeza executada,póde fazer hum he»?
roy, porém lida, muytos. A gloria ,& não o perigo he a que a-»
cende a emulaçaó-.Melhor períiiade o exempIo,que o efpan*
to. A façanha,que o golpe da efpada fes tranfitoria , faz a eA
critura permanente.Quantap obras heroycas fepultára o bra-»

Senec.Ufift. 80.

Carol.Steph.
Verb.Vicaur.

ço, fe a pçría as não livrara do tumulo r* À poucos aproveita^
o que a hua idade fe Xwnitz.Tmcis nq.tus efl^ quipopulu^iítatisfití/^
rcg/íí7/.Efcreveo Dicaearco as proezas dos Efpartanos ; & orJ>
denou aquella Republica,q todos os annos felefítm em húa
praça publica,para que fempre repetidas as eternizaíTe a <é-
brança;& viveíTem a beneficio da hiftoria , o q não fora pof-
íi vel a golpes da eípada. Naò

PROLOGO.

Naõ deve fiada a America á gloria, que a naçaõ Português
2a adquiriona Africa, na Afia, & na Europa . Nas mais par-
tes a)udava-fe o valor da opinião, & deduziaõ-fe húas de oii»
trás as viâorias: Porém noEftadodo Brafil perdida a^fazcn-?
da, fogeita a liberdade, fepultada a opinia5,enterrado o brio
nas mcímas cinzas do eftrago [ dominante a naçaó mais belt
licofa,& mais bem afortunada de todas,quantas naquella ida?
de aplaudio a fama] refucitar, &fobre-fahir ovalorPortu*
guez com taó agigãtado vuIto,que naõ fó fe reftituio no perr
dido, fenaõ que de hum golpe vio o poder daquella gente a
feus pés rendido, & proftrado , tanto mais fe adianta na glo-
ria,quanto menos o imaginou a efperança . Não efpanta o
triumpbo defpois da viâoria, porque he confequencia; ad*
mira o viver defpois da morte, porque he maravilha . Na ref-
tauração de Pernambuco te não deve parecer encarecimento
a mayor exageração, vifl:os,& confiderados os fucçeíToSjque
te ofFereço nefte volume,porque foraó taó eftranhos , & he-
roycos, que nâo fó he neceíTario conteftarem-no muytas es-
crituras para lhes facilitarem a credulidade,fenaõ, que també
fe ou veraó de efculpir em bronze , para que nunca o tempo
os podefíe tirar da memoria humana.
, Com efta rezáo me defculparás a confiança , com que eí^
crevo argumento, que tantas , Be taó illuftres penas efcrevé-
raò.Se me não achares igual noeftilo,não me notarás defi-
gual na verdade,& quando nella não tenhas liçaô,naó te fal-
tará entretenimento: A diverfidade dos lavores , fenão faz a
tela mais rica, não deixa de a fazer mais viftofa . Alguns, dos
que efcrevéraó efte aíTumpto,© teceriaõ com melhor fio,po-
rém nenhum com fio taó continuado . Em o valerofo Luci-
deno acharás o principio íem o fim: Em outras relações , v e-
rás o fim íem os principios: A aquelle atalhou a morte ; a eftes
«fcufou a eleição: De todos me aproveitei . Naõ enfina me-
nos, o que atalha, que o que guia,Se notares diíFerença na re^ s
petição de alguns nomes efi:rangeiros, não imagines que foy
€lefatençaõ,ou falta de noticia . Efcrevo para osnaturaes,&
quero,que fe oução agora, como cntaó entre elles fe pronú-
eiavão , para q affi como então pellos nomes fe conheciaõ as
pefíbasjaífi agora as reprcfentem á memoriai& a defemelhan-

$a

ã

Pli». l. 7. c.
CelLzx.ii,

PROLOGO.

çados nomes não faça pareccr,que faó de outras peíToas.

Se fizeres reparo no titulo defte livro, has de notar [ com^
difcretolque nelle atribuo a hum a obra,€m que trabalharão
as mãos de muy tos.Muytos rios recebe o mar debaixo do no*
me de humjporque ainda que os mais lhe engroíiaó a corrê^
te,deve-fe efta á fua primeira fonte.Muy tos íàó os aílros,que
aíTiftem ao dia, & a nenhum deixa luzir o Sol . Todas as eft
pheras fe movem,&: ao primeiro movei fe atribue o movimé^
to de todas.Foy João Fernandes Vieira,© que com o zelo,c5
a induftria,com a fazenda, com o braço , & com a aíFiílencia
jntentou,difpos,feguio, &: feneceo aquella guerra,& como a
niayor planeta, mais caudalofo rio, & primeiro movei fe lhe
devem atribuir as operações de todos feus inferiores.

Com efte fundamento fis de fua peíroa,& de fuás obras o
principal aíTumpto defta hiíloria. No apelido de Caftrioto
lerás todo o argumento defte livro,& todas as prendas do fo-
geitOi& no titulo , cifrada toda a matéria deíle argumento:
Condiçoés5que nos titulos dos livros hádebufcar aefcolha
para não ferem efpurios.O parecido das acções lhe deu o no^
me de Gaftrioto,& a naçãoa diíFerença de Lufitano,para di-
ílinção do Caftrioto Epirenfe:Com efta mefma rezão deu a
antiguidade a Sicinio Dentato o nome de Achiles Romano,
para que fuás obras o não cortfundiíTcm com o Achiles Gre-»
go: Sícinius 7)entaíus ob ingentímfortítudmem ^chiles ^manm
3 *• apellatHseft, Tio húas foraó as prei>das, as valentias^, & as for-
tunas de hú,& outro fogeito, que asdiftinguiráo as pátrias^
porque nellas fe não confundiflem as pefíbas . Náo fe eftra-
nha o uzual. A femelhança da virtude,ou do vicio identifi-ca
em muy tos hum mefmo nome : A liberalidade deu a muyíos
o nome de Alexandre j a fortuna o de Cezar j a valentia o
de Herculesja induftria o de Uly íTesja rapina o de Caco,&c.
Cotejen-fe as .obras, o valor,& a fortuna de João Fernan*'
des Vieira c5 as de Caftrioto Albanenfe,& acharfe-há neftc
livro,& nos que eícreveo Marinho Barlecio defte argumen-
to,que a todas as formou hum molde. Como Caftrioto entre
os Turcos infolentes , fe ouve João Fernandes Vieira entre
os herejes dominantes: Com animo catholico fofrcraõ muy-
tos anãos a opreíTaó da tyrania por não perderem apoíTibili^

dade

PROLOGO.

da3e ãc favorecer aos fíeis. Deii 'ô tém^ò ávizó à Joáo Fer-
nandes Vieira, de que fiia eftimaçaõ o fazia fofpeytoíb ao
Olandèsjcomo deu ao Epirenfe, de que feu valor o fazia fof-
peiíofo ao Turco . A hum, & outro fervio o perigo de opor-
tunidade para fe declararem contrários ao império , que os
domina vaj&: períuadirem aos naturaes mais coníidentesj a q
pegaffem nas arnias em beneficio de fua liberdade. Os mef-
mos officios,& com o mefmo effeyto,de que fe valeo o Tur-^
CO para reduzir a feu ferviço a Caftrioto Epirenfcjfes o Fra-
fnengo com Joaó Fernandes Vieira para o trazer á fua obe-
diência; Aquelle com poucos venceo bátaílhãs , prendendo,
& matando Generaes das armas Othomaiiasj efte com menos
matou, & prendeo Generaes, vencendo em diverfas batalhasí
as armas Olandefas. Naõ ouve confliâ:o , em que o Lufitano i
não pelejaffe com os inimigos a cara déícuberta 3 como tam-
bém não ouve occaziaõ em que o Albanenfe não contendef-
iè com feus adverfarios abraço partido.Nem humjnem outro
quiz nunca para fiadas batalhas, mais defpojo , qiíe o aplaufo í
das viâ:orias,deixandopára feus foldados toda a riqueza das f
campanhas . Das mãos dos Turcos tirou o Albánetífe todas
as Praças ufu rpadas,atè os aciírraíarná' Cidade de Esfetigra-
do: Tirou João Fernandes Vieira das mâòsdosOlandefes
todasasPraças,quedomínavãopellos contornos dePerriam-
'í>uco,até'iDs cercar dentro oio Arrecife . Trahido deamigo?,
parentes, & obrigados íè^yió J oad È^ôrnaíldes Vieira , <^^e
prometerão ao Frameíígaentregaf^liiS mòirto,ou vivo:Com
iemelhãte tray ção prometerão áo Tj^r^cso bntregar-lhe a Caf-=
trÍoto,ou V i vo,ou morto , féU' fobrinhô Amélia , & Moy fes
feu mais obrigado ; Como Gaílrijõt© aô Turco yCónfumia^
Joâ>o Fernandes Vieira ^mi*epetidáS%taíteas , & encontros a
paciêricia)& ò poder Cíiaridès. Ao A%aHcnfe náo?deixo« fea
gensfôfo cora^áôloèfâriê^m defcâiiío^ gloria de tanto triã-'
phò, bqfçandoTõr^de (uarptftia p.c^àlíibês para exercitar asf>
armas, como o fes em obfequio delRey3E)iPernândota qiieiílf
osFrai^èe2estinhâ6d€fpb7ado'do.Re|^0!Oi de^^^^^^^ ,. ,.

foube JiaãdFernandesVie íVa losrâf>eoMífocces[d bífuirco de •'^^^T' ]^f/ê.^^'
tantos teiviçoí ; poríitiaíidado d'o 35íiflí)t Rey- ae iiiO'pcw;«ál uUo.a..Lz±.c.%1
DomJoáÕQ Quartof©yLgovernar osjleynosdèlàogòlávfe
••íí '^* nelles

m^^^

PROLOGO.

íielles fe exercitou Ms armas, obrigado de fua promptà obé-^
diencia a eítitnar mais o fervír,que o deícanfar. Ao Caftrioto
Albanenfe atribue Barlecio toda a gloria dosfucçeíTos de
Epiro : Com a mefma rezaó fe devem atribuir ao Caftrioto
Lufitano todos os progreffos, que as armas Portuguezas
obráraó na restauração de Pernambuco.

Na femelhança das obras acharás a femelhançá dos cofíu-
mes, dos intentos,& dos ânimos. A toda Europa he notório,;
que o zelo do Terviço de Deos, & do bem publico foy a cau>i
2a,& o fim de Joaõ Fernandes Vieira tomar as armas contra
Qs Olandefes,& que a elle fe deve como a princjpio,& mcy a
a felicidade daquella emprefa.Por fua intelíigencia fe folevá-
faô os moradores daquellas Capitanías^j com fua fazenda fe
fuftentou muyto tempo aquella guerrâ;de fua confíancia fo-
raó refultagloríofaaqtíellas viâ:orias * Comdezoyto annos
de idade o animava hum coração taõ varonií,que apetecia o$
perigos,que todos redeavão.FeíTe o Framêgo fenhor do Ar^
recife,quiz ganhar as Fortalezas da barra , hua delias defain-
paráraó múy tosi& ofFereceò-fe Joaõ Fernandes Vieira para
fe meter nella levando coníigo alguns homens perfuadidos
de feu exemplo.GapituIaraõ os Gabos a entrega,& fó elle te-!
ve advertência , Sc animo para falv ar as iníigíiias de alguns
Cabos, & as baiideiras dclRey ^ fahindo com ellas enroladas
em íi mefmo,com mánifefto perigj» de fua vida. No Arrayal
de PernamrMorim pitinhzt! feito Máthias de Albuquerque
Gapitaõ de defcubrir o campo , quando r.o Framengo fitiouí
Sc rendeo aquella Forçaidella fahto,como cativo, rèfgatãdo^
íè à íi,& a dous criados feus por quinhentas patacas v fem dar
ouvidos às honras, & promeflas,que o Inimigo lhe fazia;Na5
fabia feu coração antçpiíc a conveniência i fidelidade . Ga-
nhou o Olandès a campanha com todas as fortificações del-f
la,& feguindo João Fernandes Vieira a fortuna de todos , fe
deixou ficar entre os inimigos,comaqueUe intento, que def*
pois publicarão fua? oJDrask h r. ;p ildo a- .

K beneficios,comprou a eftima:çãò do vnlgo, a refpey tos^

a dos principaes; a dadivas, a dos Minifiros , tendo tanta en-!-

"liada com os do governo , que para com elles eraó fuás peti^

joésj decretos. Seu may or empenha eira alcançar láo Herejc

Jíl ''^ ' li*

PROLOGO.

liberdade, para que os Catholicos frcqnentaíícm os Sacra-
mentos, & as Igrejas ,& que nellas recelebraíTem osofficios
Divinos có aquella folenidâde,& pompa^ com que k faziaõ
antes do cativeiro, tendo particular cuidado de reedificar os
Templos,que o Inimigo deftruia, & de lhes reftiruir os para-
mentos Sagrados,que delles roubava ; & para fuftentar a de-
vaçáo do povo fe fazia mordomo de todas as confrarias . C5
vigilante zelo acudia ás neceffidades particulares,proporcio^
nando a mezinha com a chaga,de forte,que náo vacilaíTem os
que defmayavaó có a opreíTaó. Porque a pureza da Religião
fenaó manchaíTe , tinha particular cuidado de favorecer os
prefos,& roubadosjdando a huns fahida,& a outros remédio,
Aofexo mais fraco acudia mais folicito, procurando , que
não refvalaíTe a virtude nos tropeças da neceffidade* Aos pef «■
íeguidos, & defamparados defvrava o laço,a que os podia le-
var a defefperaçâojou com a exortação , ou com o focorro.:
Por fua diligencia fe cõvertéraõii& bautizáraó cinco Judeos,
& fe reduzirão ao grémio da Igreja dous Herejes, & hum A*
poftata; de todos foy padrinho ^& amparo. Taófervorofo
íby fempre feu zelo, que não fó trabalhou por confervar, fe-
ri áo também poí:adquerir,defprefando o defabrimento , com
que o fofriaó os do governo. Com difpendio ^ & induftria ti-
nha ganhado em todos os tribunaes Miniftros confidentes,q

0 avifaíTem de todas as míiterias,que nelle fe conferiaô, & de
■todas as refoluçoés que nçlle fe tomavão i diligencia ta5 ne*
ceíraria,para a conferyaçaõ do particular, & do comam, que
nella achou o Ell:ado,defenfa30s principaes, cautelai& o vul*
go,reparo. íi Eb aJiíis òi:'/íiiuiPi':)3Up r*.;; ?,c

1 Eítimulado das tirájfi-iaSjCondoíáo das miferías,& efcanda*'
lizado das injuftiças rompeo pello fofrimento refoluto em
deitar dos hombtosde todos o infòfrivel jugo:Einprefa, que
a qualquer coração parecera mais defatinojque temeridadet
Com efte intento (com pena de morte tinha o Framengo
prohibido aos moradores todo o género de armas afliofFenr
íivas,cõmo defeníivas) mandou fazer [ por ofíiciaes peritos,
ác confidentes] nas matas,&fazendas^que tinha pello certaõ,
íícmas^muniçoés,veftido9^ mantimentos, & tudo o mais , que
lhe pareceo nec^íTariOj & precifo para conduzir ) & guarne-

m^i^im

PROLOGO.

ccríiumexetcítOjCorrendotodoo difpenJio por fua conta.
Avizado das efpias,qiie tinha no Arrecife, conhcceo quii-
níigos,& emulos o tinhaó inalfinado,& defcoiiipofto com os
fnperíores daquelle governo, noticia, que o obrigou a fahir
a publico com feu defignío antes do tempo determinado,até
aquclla hora impedido por falta de occaziaõ. Agregou a ú os
práticos, perfuadio aos ieaes, animou aos tímidos, conftran-
geo aos diftantes, libertou a duzentos efcravos feus, & pofto
èm campo fe vio em poucos dias affiftido de dous mil,& qui-
nhentos moradores, todos homens no animo , & poucos [oh
dados, porque faltos de armas, &difciplina,Adiantou-o a fi-
delidade de forte, que primeiro fatisfes a obediência , que ^q
valor, naó faltando ás obrigações de fiel Chriílaõ , & de fie!
VaíTaílo, certo, pella cauza, de que acharia fua refoluçaó em
Deo5 favor, nos fuperioiesdefculpa,nos iguaes aíriftencia,&:
nos inferiores agrado.

Naó poderádizer a verdade, que fua conveniência o mo-
veo a emprender tamanho , & taò arrifcado negocio y faben-
áo o mundo, o que nelleperdeo , & o que gaftou . Quando
fahio a campo era cazadb de hum anno, mais que nenhum
outro eftimado do Fraraengo , & refpeytado dosnaturaes:
Servido de mil, & quinhentos efcravos , & criados ; acompa-
ànhado de cento & fincoenta homens de fua caza,& guarda;
Na fuá eftrebaria fufiientava vintq & douscavallos, Sc outros
-tantos Mouros para curarem delles. Tinha Capella de muíl-
ca com vários inftromentos, & diverfos ternos decharamel»-
las.Dava crecidos falarios a Meftres das artes liberaes,& mais
avantejados aos que enfinavaó a arte da milicia , aíTi para o
que intentava , como taihbem para efciifar nos moradores a
fcarbaridade, com que ò Framengo pretendia amortalhar-
Ihes o briojSc introduzir-Ihes a fogeiçao . Seu trato em tudo
niofl:rava o tamanho de feu animo ; & feu cabedal, o de fea
coração^ por hua, & outraxauza avaliado de todo pello mi-
mo da ventura!.! ■> j3 sDioDEiofo eoE obidiiioiq^
í. 1' Naó olhava para a conveniência própria, quem deixava
tanta comodidade, & regalo pello rigor da guerra , 8c peílos
trabalhos da campanha. Pello ferviço de Deos,de feu Frinctí*
pcj Sc de feu próximo. deixou duasííazasjhúajio Arrecife, SI

s:^»^

cutra

PROLOGa

outra nõ campo ornadas com primor , & riqueza , cujò re»
cbeyo valia mu y tos cruzados, fem delles tirar a menor AU
feya pello riícò de fer arguido, & malfmado: Gaftou na con^
duçaó da gente, armas, munições, pagas ^ & fuftento dos foi-*
dados feis cétos mil cruzados em dinlieiro,& o procedido de
toda fua prata lavrada, &joyas,que valiaó muytos.Em géne-
ros, curraes, matas,Engenhos, "& fabricas , que o Inimigo lhe
roubou, & deftruío,perdeo mais de quatro centos mil cruza-
dos. Pouco fe lembrava de adquirir, quem tanto fabia per-
der . A mercancia enriquece a quem poupa, & não a quenv
gafta. Idolatra na cobiça aquelle, que deíconhete a lar-
gueza, A honra he, a que melhor enfinaa defprezar a fazen-
da.

A fantidade do Papa Inocêncio Decimo, por breve expe-
dido no ultimo annq de feu pontificado, deu a João Fernan-
des Vieira o titulo de reftaurador da Igreja naquella parte da
Am.erica, comutando-lhe o rervíço,que lhe fes no Brafil em
fervi ços de Africa . A voz de todos lhe deu o titulo de Ref-
taurador de Pernambuco. Por acclamaçaõ dos trezEftados
daquella,& das Capitanias confinantes foy aclamado Go-
vernador da liberdade, & general das armas. Por novos
íer viços lhe confirmou Sua Mageftade o titulo de Gene-
ral com a mercê , que lhe fes dando-lhe o governo dos Rey-
nos de Angola. ,

Que rezaó lhe pode negar, o que a juftiça lhe deui' Por-
que naó há de fer o Caftrioto defta hiftoria, fe foy o Achi-
les defta guerra ? Quem mais o encontra,mais o affirma. Ver-
idade , que podéraõ teftimunhar os encontros defta hiftoria^
pois a íbbiraô áquella Alteza, aonde nunca prefumio che-
gar: Por feu mandado foy feu revedor Dom Diogo de Li-
ma Bifconde de Villa-Nova de Serveira Confelheiro de
Eftado de Sua Alteza, Varaóexcellente a todas luzes pellas
letras , pellas armas , pello fangue, pella caza , Sc pellos póf-
íos,que occupou.Effeyto foy da politica melhor advertida,
&póde fer cauza da emulação mais jufta. Aenveja-, fen-
do hum affcclio vil,fempre faz prefa no melhor . A todos
honra o generofo, porque em fuaeftimaçaõ nada lhe fal-
ta. As fombras dos valles íiaõ faó efFeyto da alteza do Sol,

*** fenaõ

Carol. Ejleph,
'Veríf. Chrjijíp.

PROLOGO.

íènaõ da baixe2à dos montes. Fale a verdade, & dira^
que o Braíil deixara defer,feJoaó Fernandes Vieira naó
fora, como deChryfípo diíTe Carncadai defpois , que lea
íuas obras : Ntf {Jjtyfipus non ^fiet, ego mn ejfem^ / ,

M\>i*'íiVufci»

FARTEI^ LIVRO I.

RESTAURARAM de Pemámbuco cift
que as Armas Portuguezas tfiumpháf
íãQ dõ pòcief 5 6c da fortiina, eftâ veil^
cida da eoiíílaiicia, aquelle do valor,
efcreve minha peiitia (digno empret
go de todas as que formaô as a?as da
^i:'0^'^yo^^^^^^ fama) mais para a admiraçaójque pã»
ra a memoria; Cnaõ fe íèpúítaõ as lembranças nos teatros das
vitorias ) mais para vencer a incredulidade das iiaçoens ef-
trangeiras,que para animar com o eicemplo a propia. (Na re-
prezentaçaó dos impoíílveis^perdc créditos a verdade:)o va^
lordos Portuguezes obra na ocaziaó íem necefitar de efti-
mulos. Em todas as acçoens humanas tomaó os princípios o
fer do fim: As que efcrevo o naõ parecem, porque nellas naq
iteve mais fer o fim,que aquelle que Ihedcu o principioihum,
&c outro deve Portugal a Joaõ Fernandes Vieira a qUem eíle
<voUime chama Cafírioto Lufitanot As obras lhe deraó o no-
me, & bem ponderadas pezaó mais para a parte do exceíTo,
que para â da imitação : Para que o pareceíTe em tudo vere-
mos, que Te hua conquiíia lhe deu o nome ^ outra conquifta
liie deu o íer.
h.iu ~ A â Entre

'£

t CASr(^OTO LUSITMO "^mou

^- Q Entre as conquiftas de Portugal nao'Hè a ÍÍHa da Ma-

: deira a de menor eftimaçaõ .Situou a natureza efta Ilha entre

as agoas do mar Oceano 5 lua altura em 6 . gràos da parte do

Norte; i «^ o. legoas da mayor Cidade de Europa a Corte de

Lisboa: Primeiro foi defcoberta. pell o cazo que pella deter-

^ minaçaÓ.Impellido dos mares, -a emproou Machim, Ingres

r • ' '2j- <3e naçaò: prezumio em fcus portos o remédio , & tomando ^.

S/^^terra;temeoo%ulchro,pareceolhe, que deí^mWrcando

da Madeira. na Eha, fe afegurava dos perigos do mar , & enlmoulhe a ex-
perienciã,que mais certos os tiníia na terra,Deixou aterra^Sc
por menores, fe entregou fecunda ves aos perigos do mar.
Naó deixa efcolha a defeíf era^aô . A fortuna mais efpanta
com a vezinhança dos males, qUe com a certeza delles.Furio-
20S os mares com favorável naufrágio deitarão a Machim m.%
prayas de Argel, a onde em húa maíiiiorra viveo para dilatar
a morte, arrependido de fogir | morte,qúe na IlHa IHe podè-
j-a darTim a taó funeíla vida. Xli íliè deu grande numero de ^
companheiros a igualdade da forte : Entre todos fefes feu
mayor familiar Joaó de Moraes de naçaó Caíklhano,oupoc.
deítreza, ou por influenciá.GõmmunicavaõíTe jrepetio cada-
qual os fuceffos de fua vida, com que hum, & outro declarou
os meyos, pellos quais chegara a taò calamitofo eftado . Ti-
nha Joaó de Moraes fufficientes noticias da navegação, com
algúa intelligencia da Comofgraphia , & acautelado nos de-
fignios, com pretexto de amizade inquino com induftria,tu^
do quanto lhe era neceíTario para demarcar a altura da nova
terra, que tinha defcuberto Machim. -■

3 Vivia por efte tempo [era o anno 1 4 1 8 .]o Infante D*
Henrique,V. filho de ElRey D. Joaó o Primeiro [ a que nol-
fas faudades deraódefpois de fua morte o nome deD.Joaõ
de Boa memoria ] cm a Villa de Sagres povoação do Rey nó
do Algarve , Principe em quem âqueila idade admirou em
igual balança valor para as armas , & aplicação para as letras^
fendo aconquifta da Cidade de Ceita a que melhor vio o
dcftemido de feu animo j& a Villa de Sagres, a que primeiro

T>ã D ir^fante D. loorou os frutos de feus eftudos . Era o Infante Comofgra-

iriqueprinct - pj^Q.g^ ajudada a inclinação do poder[foi Duque de
^^^■^'ud ^^ ^ Mcftre da Ordem de Chrifto j fe empregava todo

fio

^e Poriugd.

Vizeu,
em ar-
par

<?^<.,.'^t> -^

\li^ 't^K-:

i.AUs^V, S\)i

#418 i^^^TK 1. LIV^ 1. f

tflà? riavlõ^' , Sc mandar dcfcubrií terras por navegaçoens âtê
aqiielle tempo de todo ignoradas ^ & eícondidas as noticias
das gentes, enílnando aos Portuguezes o uzo da Agulha, inf-
tromento, com que alcançarão a gloria de conquiftadoreâ
das quatro partes do Mundo. Humdos principaes Cabos,
que o Infante tinha efcolhido para continuar com efta em-
jprezá era Joaó Gonçalves Zarco de cujo valor , & fortuna
fiava elReynefta occaziaó a Capitania mor de alguns vazos
de armada, com que corria as coftas defte Reyno , em oppo-
7içaó das armas Caftelhanas, fempre vencidas^ & nunca de-
fenganadas . Deíeorrendo Joaõ Gonçalves pello eftreito de
' Gibalíar, rendeo hum nayio Caftelhano , qite de Africa vi-
nha em direitura a Tarifa carregado de cativos, jâ entaõ ref- ,
gatados a beneficio de hum legado,que para efte fim deixou
ém feu teftamento o Infante D. Sancho Meftre de Calàtra-
va, & ultimo filho de elRey Dom Peruando de Aragão.
* 4 Por Autor , & defcubridor das novas terras , & Con-
quiftas de Portugal fe fazia celebrar, Sc conhecer pello Mun-
do todo, o nome do noífo Infante D. Henrique , & o Piloto
Joaó de Mòraes(queera hum dos refgatados,em que fes pre-
ia Joaó Gonçalves Zarco) a quem aviaó chegado éflâs noti-
cias tendo entendido , que com os maÍ5 prizioneiros vinha ^'''f^ àe Moraes
àportugaljdeíilelogo ijutétou fabricar fua particular fortu- ^^^°^'^ CafielhA'
na, fobre o fundamento da geral defgraça: Era fagaz, & com
tal cautella fe foube incukar aoCapitaó Portnguez,por peri-
to na arte da navegação, & por Autor do defcubrimento da
nova Ilha,(fazendo próprio o íuceífo alheO)& tirando com á
experiência toda a duvida, que podia deixar a relação; ) que
•o Capitaó Portuguez naó fó lhe deu inteira fé , fenaó tam-
bém feguras eíperanças de melhorar de fortuna,fazendofelhe
eternas as horas,qUe lhe dilatavaó o tomar porto,& aprezen-
tar a S. A. o Piloto Caftelhano. Sabia , que faó para com os
Príncipes de mayor valia os fer viços que aceita o gofto , que
os que aprova a rezaó 5 porque naó fe obriga tanto o poder,
dos fcrviços, que authorizaõ, como dos que dcleitaó.

*5 Tomou terra Joaó Gonçalves, &fem detença intro-
'duzio a Joaó de Moraes com o Infante, que naÓ tardou mais
cm fer bem vifto^do que tardou em fer com a tençaó ouvido*
mUi A 3 Re*

Mefohejfe o Iri'
fãnte em mandar
tomar fojfe da
Ilha, da. Madei-

failoao Gonçal'
njcs em deman-
da, da ilha.

Toma, pojfe deli a,
felU Coroa de
Fortugal.

Volta a. Corte de
Lisboa.

4 CAsr^om lvsitãkò 141S

Relatou com tal arte,o q tiulia obfervadoj q o Principe Por^
tuguez crço,q de fa£i:o o tinha defcubertoroffereceore a levaç
â nova tcrrâ oá nav ios de S. A.para tomaré poííe delia: Açeí-y
toulhe fetn replica o ofFerecimeht03& comunicando com elt
Rey Teu pay a cmpreza, (primeiro por terceiras pefíbas q q
encontravão emulos , deípois por fi próprio desfazendo to^
das as contra\iiçoens j fereíòlyeoem mandar fornecer duas
embarcâçoensjcom as quais fahio João Gonçalves Zarco em
o principio do ânno dç 1420. em demanda da Ilha, levando
configo a João de Moraes por guia,&: fiador do defcubrimé-
to delia. Tomou primeiroterra na Ilha do Eípirito Santo, q
tinha defcuberto no anno de 141 8. Alli ouvio da boca do$
moradores,como para aquella parte àõàt o Piloto Caílelha-?
no demarcava aterra, q prometia fe devizava todos os dias
hú globo de névoa tão ferrado, & efcuro, q não só repremiíi
o exame com o temor fenão,qamedrentava de tal íbrtecó 3
vifta5q occazionou em todos,deícurfos pavorozos, & infauf-
tos.Não fabia João Gonçalves defconfiar,nem temer , que|^
não fer aííi , nem defprezara a informação de todo hum po-»
vo, nem fe fiara de hum Caftelhano por e)le cativo. , |

6 Difcretaméte animozo,levou anchora,largou pano^SÍ
podo a proa na cauza do medo, rõpeo ao meímo tépo pellasj
ondas do mar,& pellos requirimétos da terra atè moftrar ao^
feus(tomãdo porto na Ilha,q bufcava cm o principio de A-
gofto do mefmo anno) fabuloza a opinião do vulgo . Def-
pois de examinar tudo, o que avia neíla, virou a proa para o
Rey no,a onde có profpera viagê chegou no fim do dito mes.
Foi recebido do povo c5 efpãto,da Corte có alvoroço j & de
elRey,&do Infãte cò alegria,q cada inftãte fe aumentava cã
as noticias,q João Góçalves,& os feus repetião,fendo os que
mais louvavão a empreza os meímos, q antes do fuceíTo mais
contradizião o intento.Tem o vicio da emulação a natureza
dos vapores jfobem com intento de efcurecer, & convencidos
da aâiividade do fogo cahem ájudandoo a luzir.

7 Pvelatava a todos,o experto capita5,o difcurfo da viagê,
as praticas do medo,as fabulas da ignorãcia,as cõtradiçoésdos
feus,as carraças da Ilha, o qbrar dos mares,os ameaços do por;»
tOjO defpovoado da terrado agigãtado dos trócosj o baíkcido

das

14 IO -^J^TELLIF^OL ^

das matas , a eftranheza dos brutos, a variedade das aves, o
afpero das ferras, o impinado das rochas,o incalto dos vales,
a abundância das agoas,a benignidade do climâ,& a bondade
dos ares, tudo mais para acreditar a diligencia.que para enca-
recer o íervico^moftrando a todos muitas couzas , que trazia
da ílha,com 'q deixava fem duvida o infalível defua verdade^
& o muito arvoredo da terra,lhe deu logo o nome, q coníer-
va agora de Ilha da Madeira:Mandou elRey,q fe povGaae,& ^^^^,^ ^^^
para o fazer efcolheo ajoaõ Gonçalves Zarco.a que tes mer^ ^^^^ ^ ^^^^^
ceda capitania da terra, dandolhe noferviço de a povoar o
premio de a defcubrir^q elle aceitou fatisfeito,& zelozo.Pre^
paroufe de tudo, o q lhe era neceííàrio , & no veraó do anno
feguinte,qfoiode i42 3.feembarcou,levando cÓfigotodà
fua caza,& familia,q acÒpanhavaÓ diverfos cazaes,& differe-
tcs peíibas cÓvidadas dos partidos, q lhes fazia o Capitão, &
das conveniécias,q lhes prometia a terral no mais accomoda-
do delia deu principio a primeira povoação de toda a ilha,
fundando a Cidade do Funchal cÓ tanta fortuna , q em pou-
cos annos vey o a fer abundãtiffima de tudo,o q he neceflario
para a vida humana,dando para outras terras excelle ntes gé-
neros , por comutação, & porvenda, com que adquirio o luí-
trozo,& rico de que ho)e eftá povoada.

. 8 Como tenho dito,acrecétou Joaõ Gôçalves Zarco a Ilha ^^^^ ^^ ^
da Madeira ao Rey no de Portugal , & efta a João Fernanaes
Vieira,para o reftaurar na melhor peça de fua coroa.Deu o q
recebeo/enão no mefmo fer,c5 o meíino nome:Efta Ilha deu
fer illuftre ao nome deJoãoGÓçalves,q a defcubrio:Eíla Ilha
deu nobre naciméto a João Fernãdes Vieira,q cÒ feu nome à
illuftrou.FoiDemofthenes,nacido emafamojza Cidade de ^^^^; ^^ ^^^^
Athenas,varaó tão grade, q affirmava Aezio,q mais tinha de pemandes Fiei'
G fe gloriar Athenas por fer pátria de Demofthenes,do q po- r4.
dia ter Demofthenes por fer patricio de Achenas.Ser o me-
lhor da pátria he vir tude,ter a melhor pátria he fortuna . De
Lyfimacho o diííe Trogo:H/f illuftri quiàê mceionUkcQ m-
tus illtãimr fuit. Excedendofe tanto cfta ilha, pello q deu, a fi
mefma,pello que recebeo quanto fc adianta o beneficio co-
mum á conveniência particular. ^
/ g Em a Cidade do Funchal [quando )à não sp pello tepo,
" - A^ ^

■P

6.; C^ST^WTO LUSITJKO 1624

^ &pcllò terreno/eiião pellos edificios,pelIa fortificação pella

grandeza, pello porto,pello comercio, & pella cathedral, era
digna cabeça de aqlle governo)naceoJoaó Fernandes Vieira
Sua maç/iõ, é- ^^^ ^^"^o de 1 6 1 3 .íua criação cali ficou íeu nacimento,& feus
juericU. generozos procidimentos , o claro de fiia afcendencia . He o

iàriguefométo vital dos eípintos,&o generozo os produz í^e-*
nerozos. PaíTou o tempo da puericia na pátria, que nelle ob^
fervou viver mais para a rezaó , que para a idade : Em todas
luas acçoens fe adiantava o animo ao corpo , taõ diciplinado
da modeftia, que fem dar occaziaõ a queixa a deu muytas ve-
zes ao exemplo : Os brios, que na mocidade alimentaõ a no-
breza, fem eftudo faó oppoítos a baixeza dos vicios.

10 Era de onze annos, &: como leu coração jà entaõ lhe
naõ cabia no peito, parecialhe eftreita prizaõ a limitada eí^
phera de íiia pátria . Hum coração grande naõ cabe em pe-
queno lugar:Naõ cabia o de Alexandre no mundo,& dezeja-
va mais mundos para fe dilatar. Refol veoíTe em paíTar ás pari->
tes do Brazil, por çaó grande de America^ & feria todo o mo^
Eivo da eleiçáó,o ter entendido , q he a America a may or en-
tre as quatro partes do mundo. Sem dilaçâ5 , nem embaraço
executou,o que refoIveo.Naó fofrem dilação os impulfos do.
valor: Toda a oppozição atropellâo , porque com a defeftf^
mação fabem vencer as dificuldades.PoíTe a occazião da par-

d-^^/r./£T^^ ^^ ^"^ "^^^^^"^^ ^ ^^ embarcou no A^no de 1 6 2 4. levando em>
cy^/^^yyw^ ao Br a.- ç^ j^^f^^Q ^ melhor de feu cabedal: Saõ as prendas próprias o

Cabedal mais preciozo, & mais feguro porque nacem izentas
do poder, & da fortuna : Com profpera viagem chegou à
Villa de Pernam.buco cabeça dehúa das principais Capita-
nias do Brazil; & porque há de fer o teatro de meu aíTump-;
to, he força defcrever aquelle,antes que demos rezão defte.
. II He o eílado do Brazil , aquella parte Oriental da A^
merica, a qual Pedro Alvres Cabral defcubrio no anno de
1 5 00. em 2 4 . de Abril, na altura de quarenta, & íinco grá ok
da parte do fui, & 2 . da linha equinocial ( debaxo da qual fiX
ca o rio das Amafonas ) conftrangido da violência dos ma-
tes, que o defviou da carreira da índia , para onde navegava
(pondolhe o nome de terra, deSanda Cruz por humpa-
ciráo,que nella mandou leyantar cõ as armas defte Rey no^ A

\

sjL

rezao

t6 24: • fÁi(rE 1. Lii\o i?a:^ f

rezão que tíverão os homens para lhe mudarem o nome da

terra de San£i:a Cruz em terra do Bra2il tem pouco , que deí^

cutir. O nome de San6i:a Cruz, he o nome da arvore de noíTa 7 {7^ ^^^^^ 0^

redempçaoj o nome do Brazii, he nome de huas arvores, que ^tl.

produz a terra,de cuja madeira fe fes o primeiro comercio: &

claro eftá,que entre as mortais avia de prevalecer o titul o de

feus intereces,&:não o defpertador de fua falvação.Tem eíla

parte da America, q he da coroa de Portugal,pella coíla ma-

ritima 1 800. legoas (no mais apurado computo,) que termi^

não , & dividem da Conquifta de Caftella dous caudalozos

Manoel de Rios ^ da parte do Norte o das Amazonas debaxo da linha;

^^^s hfíl " ^^ P^i*^^ ^o Sul o Rio da prata em q «; . gráos para o mermo
' Sul. Computada efta diftancia pello re61:o dos gráos tem
muito menos legoas, huns lhe dão 1 5 00. outros 1022.

I 2 Rcpartio a deíatenção dos Principcs , & a ambição ^^^ Capitanm
dos VaíTallos toda efta diftancia de terra em i A.capitanias na ^^T^ <> ^^àa
rormalegumte. A primeira domma 160. legoas , que corre "*
do grão Pará até o Maranhão. Afegunda corre do Mara-
nhão até o Ceará por diftancia de 135. legoas . A terceira,
q fe termina no Pvio grande té 1 60. legoas de demarcação. A
quartaCâpitania continua por eípaço de 45 .legoas até a Pa-
raíba: da Paraíba atè a Ilha de Itamaracá 25, legoas de cami-
nho q demarcam a quinta Capitania. He a fexta Capitania a
q chamão de Itamaracá de 7. legoas decofta. A Capitania de
Pernambuco inclue 6 5 . legoas de coft:^, que terminão pellá
parte do Norte, o Rio de San£l:a Cruz,& pella do Sul, o Rio
de São Francifco; & de Pernambuco a Sergipe vão 130 . le^
goas. A oidava Capitania tem por termo a que toma o no-
me da Cidade da Bahia, tem de cofta 5 o. legoas: Defta até os
ilheos, formão 30. legoas de cofta, a nona Capitania. A deci^-
ína corre até â do Porto Seguro, por diftancia de 30. legoas.
Defta do Porto Seguro atè o Eíprito Santo corre a undécima
Capitania, & occupa 6 1 . legoas de cofta. A duodécima ter-
mina no Rio de Janeiro,& tem de cofta 3 5 . legoas. A decima
tercia corre do Rio de Janeiro até São Vicente por diftancia
de 6 5 . legoas. A ultima corte atè o Porto de Santos , & de-
lle atè o Rio dâ prata por cofta de grande numero de legoas.
i. - 1 J^- > ; tfe toda efta terá de benigno clima,& a mayor parte
3^^"^' A 4. delia

■P

■I

r'

8 CASTIIOTO LUSlTJl^O

ciimadaurrado delia de temperamento quente,& hnmido,com q a natureza
^^'5'/- a dilpoz para produzir,& fertilizar có tanta abundância, co-

mo muy tos té efcrito,& como todos expirimentao.Osnatu-,
rais, que Pedro Alvres Cabral achou bárbaros, & rimples,tes»
o tempo. & ^ communicação maliciozos, & ferinos , em tan-
to extremo, como fe vera nefta hiftoriai quizerão dizer os
que affirmão, que na lingoa defte gentio fenão achao três le-
tras de noíTo Abecedario como são o F, o L, & o K.Qque ie
deve entender politica, & não literalmente) porque não ti-
nhão, nem fé, nem ley, nem Rey ; não falo nos coílumes def-
tes índios, nem na de verfidade dos rios, plantas, ammais,&
aves defte terreno, porque não he minha empreza,& porque
o tem fido de muy tos.

1 4 . Deftas 1 4.Capitamas erSo oyto de eIRey,porqne as
conquiítou a Coroa j féis de particulares fenhores , porque
particulares VaíTallos as conquiftárão . Por cfte titulo foi
muytos annos a Capitania de Pernambuco dos Mbuquer-
Da elRey accn- ques,porque Duarte CoelhodeAlbuquerque(aquem a deu
^Hifla adifferen- ^ij^^y Y) João O III. por fua calidade, & pellos ferviços que
fizera na índia ) a conquiftou . Direi o como , & o porque.
Occupado elRey nas conquiftas da Afia, não attendeo a im-
portância da America, ou porque lhe pareceo mais fácil, ou
porque a julgou menos util j ou mais que tudo, porque a op-
poziçãodos Principes da índia lhe arrebatava toda a aplica-
ção . O valor tem de rayo a condição de fe aplicar à mayor
refiftencia . Defcuberta a terra do Brazil pqi: Pedro^ Alvres
Cabral o anno de 1 500. (como tenhodito ) pedirão alguns
Capitaens a elRey D. Manoel, & a feu filho elRey D. Joaó a
conquifta de diverfas partes de aquelle eftado,oíferecendofe
íi povoallas, com tanto , queaviaó de ficar com o fenhorio
delias, & toda a alçada, elles , & feus decendentes j o que os
Reys naquelles principios outorgarão liberalmente fem mai9
encargo, que o da convcrfaó do gentio, querendo que as po-
voaçoens foíTem feminarios de Pregadores Evangélicos , &
prczidiosdefoldadosvalerozos, quedomafíem, & inftruil-
lemosIndios:eftefoiointento, que teve a liberalidade dos
Príncipes dezejozos de premiar o merecimento dos vafikllos.
Tinha vindo da ludia Duarte Cpçlho de Albuquerque, a.

onde

tes va

íjjaílos.

1^24 ^À^j:Ei.Mr^oi. ) .^

onde fervíra a eiRey D.Mãnòeí dom taleiíto,braç05Sc válofji .

Capitão, embaixador , & Toldado. Pedio a elRey D. Joaò ò

terceiro a conquifta de Pernambuco, que facilmente lhe con-

cedeo,peIlos annos de 1 5 3 o . IlluflravâóíTe os fer viços deíie^

vaffallo com as televantes prendas do fangue , do zelo, Zc do

Vâlor^ calidades, que adiantava muito o cabedal , & lnzimen?^

to, com que eataQ(caliíicada a rezaó da prezente mercè)co^'

briaodano de inconvenientes futuros. Omayor danodaà

Monarchiashereíultada generofidade dosPrincipes quatti->;

do fenão acompanha da prudínciai porque obra de prezen-

te, fem. attender ao futuro. Avezinhança do Príncipe influe

refpey to nos vaffallos^com a falta defta ft anima a liberdade

dos fubditos: A onde menos fe temem os caftigos, brotaõ cõ

mais fertilidade os atrevimentos : Gonfideração j.que deveiíl

fazer os Príncipes, quando dáo os governos,para qtfe a coa^q .^j,-^^^ ^j^\^ ç.v^-i K

taçáo dos poderes refreeálicíença dos Governadores ; pois ,v^ sAVn «^ <í"íV'»

}iecerto,que acha fácil tranzito O livre pára tirano, & o tira^ . -^-^--^

jio para rebelde. »móD'c;€Í.bqoÍ7 í ../nomEn j^

15 Preparado de tudo, o qvie podia fer neceíTarío parai
invadir , & povoar, fahio Buárte Coelho de Lisboa : Com
profpera viagem a viílou terra em 27 . de Setembro, &eaH
trandopello Rio de Sanátà Cruz vio hua povoação , & fora
(delia grande multidão de Gentio,que com mais tumulto,que
difciplina tratava de lhe defender o faltar nella ; o que o va-
Icrozo Capitão fes,a pezar de toda a rcziftencia enimiga,def- ^^^^^^^' ^^^^^^
baratando, & pondo em,fugida aquelles bárbaros , ferit^^io, 'J^^^fg^ç^
Sc matando muytos no lugar a onde agora eftafituada a Viila ^^ ^^ peynmh"^
de IgaraíKi, tomando o nome, que naquella occaziaó lhe 4eu co.
a admiração dos naturaes,véndo a grandeza de noíTas embar-
caçoês^fendo o mefmo em feu idioma Igaraírú,que nao gran-
de em Portuguez . Atribuirão os noííbs a viâ:oria aos Íncli-
tos martyres Saó Cofine , & São Damiaó , em cujo dia , a at
cançáraó j& em reconhecimento do beneficio levantarão allí
hum templo, queconfagráraó ao nome dos gloriofos fantos,
a onde íuas continuadas maravilhas publicarão o quanto lhe
fora grato efte ferviço: Com a devaçaó dos novos povoado-
res creceo de forte a nova Villa,q abforveo em íi, pello tem-^
po adiante, outra Villa que chamarão dos Marcos,poftos na--

■1

OST(!(J0T0 LVSITAKÕ 1624

quella parte para demarcação do deftrí61:o, Sc da terra,que eln
Rey avia dado a Duarte Coelho de Albuquerque : Condi-
ção da natureza, & da fortunaj deixarem húas couzas de fec
para ferem outras. ■ :o

16 Nefte lugar fe deteve o Capitão todo áquelle tem-
po, que preeizamente lhe foi neceflàrio , para o povoar , Sa'
guarnecer em forma queferviíle paraadefenfa,&agricul>í
tura da terra^ delia partio comogroíTo de íua gente forma4
doj & advertido dos repentinos aflàltos dos índios, (ordina4
rio modo de pelejar,entre todos eftes barbaros,^& foi corre-*
do a terra para a parte do Sul, fempre â vifta do mar, defejo4
fo de achar fítio conveniente para edificar híía povoação,em
que Í€ achaíTem todos os requizitos , affi marítimos, como
terrenos, que a fizeífem capaiz de fer cabeça de aquella Ca-*
■^ o'^^e dá prln- pitanía. Chegou a aviftar hum ameno , & aprazivel outeyrò
^^^U I^ ^^^^^ <^e defcuberto,& vizinho ao mar[habitação de alguns Gentios]
em altura de S.gráos da Equinocial para opollo Auílralj
5c namorado do fitio pellas comodidades dellc diíTe para os
íeus: O que linda íituação para fe fundar húa Villa! Aprova-
rão todos o voto do Capitão,& porque a verdade não ficaíTe
Jivre da aduIação,pozeraõ à Villà onome de 01inda,porque
ouvirão dizer ao fuperior: O que linda íituação para fe fun-
dar hua Villa. Anda a lizonja tão avinculada à dependcncia,
que não hà verdade, que na boca da dependência naó pare-
ça adulação.

^ 1 7 Como foi hum o parecer de todos , pozerao todos
mão i obra com tanto calor, que publicava, no que crécia, q
€ra a obra particular eleição de cada hum . Em breve tempo
fe achou a Villa com 700. vezinhos. Aterra foi correípon- '
dendocomosfruitos, àefperança com que abeneficiavaõ
os moradorestO comercio foi engroífando ao paíro,que cré-
cia a notícia das muitas,& utilliíTimas drogas, que avia nella:
Facilitava a faca, & comutação das fazendas,a grande como-
didade do Porto, que alli fas o mar , abrindo a natureza, em
hua dilatada corda de ferranía,ou rochedo,que metido pello
mar cinge muita diftancia de terra, húa abertura á qual os
naturais chamão Pernambuco,que em fua lingoa he o mefmo
J^uc, pedra furada, ou buraco, que fçs omar, de que fe forma

agar-

.£'yv\í.1.

a garganta da baf ra, com fundo cãpáz paia entf af cm, & íahi-
rem por cila difFerentes navios^ que abrigados da mefnía fcr^
Taniâfeampáraõ dentro do Porto das tempeftâdcs domar. ^

-A efta corda de rochedo, chamão Arrèúíe;8c dá nome a húa ^^-^^C'/!-
povoação, que pello tempo adiante fes a mercancia em húa ^^^^^/^^ WrJá*
<p onta da terra, q terá de largo 20. braças , cortada dos Rios ^^^ í,,
Beberibèj&Capiberibc, que juntos quebraõ fua corrente
Bo meírno Arrecife, recebendo o mar fuás agoas pella dita a-
abertura. Defta mefma forte, próvida a natureza abrio na di^
íatada corda de aquelle muro, ou arrecife diíFerentes portas,
•em diveríTas partes para dar entrada no mat a diveríTos rios^
^ue por aquella cofta fazem deíiguais portos . Gom a brevi^
dade poíTivel tenho dito o como, & quando fe defcobrio, Si.
povoou o eftado do Brazil, & nelle a Villa de Olinda cabeça
da Capitania de Pernambuco: Agora comamefma brevida-
de,direi a grânde2â,& opuléciaa que chegou efta Villa^ cor-
rendo os annos até o de 1 6 30. Em que as armas Olandezas
ainvadiraõ",8<: fehhôrearãò , fatisfaácndocom aprezidiar , 3.
íède que tmhão de aquelle dominioi& com opprimir os mo-:
radores , ao ódio com que os deixou feu pjimeiro infortu-

18 TTcili ó domínio â condição (íos rios, do cabedal daâ
agoas tomão oimpetupára cauzar asruinas, quanto mais
crecidò o cabedal, mais furiozo, & arrebatado o cu rfo, prm^
cipalmente por onde fe áclíão fuperiotes ao terrenO; A o pa^ i\h« - -
íTo, que pella grangearia, & pello comércio crecia a opulen^^ ^ ■ ^ v.^ '
cia dos fubditos, crecia a licença, & a demaziá dos Governa^

dores, tão abfolutos, que não avia honra, vida, nem fazenda,
que não eftiveíTe â difpofiçaõ de feu gofto t O refpeito , às
leys, & O temor do Principe, tinha fepultado a violencià;õri- ^^yr^^^^ etkê^ òè
ginandofe mayor dano do exemplo, que da tirániâjporque a go'úernos do Bfâ^
Religião, 8c o zelo faltava nos poderozos, & gemia ò povo z^iL
com a oppreífaó. ReforçouíTe o grito de forte, que chegou a
Lisboa a elRey D. João o IIL ( Principe naturalmente affa- ,
vel, & piedozo) condoeuííe dos mizcraveis VaíTalloSjSi: vem
do que todos feperdião( 09 pequenos por opprimidos, as
grandes por abfolutos:)Com catholica refoluçáo mandou a*
preílar três naos,<iuascargvela% & humbârgaiitim ^ fazendo

eleição

tm

11

CaST!(!OTO lusitano .;?534

eleição de Thomé de Soufa( fidalgo em quem coíieomão rç-
quizitospara mayores empregos) o nomeou Governador
Geral de todo o eftado do Brazil, & Capitão Mayor dos di-
tos vazos, em que levava çonfigo Miniftros, & íoldados ^ çf>
\ %\i u ^^^5 P^'^'^ fomentarem a obediência^ aquelles , para extingui-
.Q-^,. rem a diíToluçãOj & todos para reprimirem com o confclho,
& com a execução o orgulho do Gentio,, que favorecido da
emulação eftrangeira,& da fortuna íe tinha animado a aííàlr
tar,& deftruir muitas pavoaçoens de PortuguezeSjmatando,
& roubando com favorável fucefíb: E para que húa, & outra
couza fe confeguiíTe tildou toda a alçada a todos os Governa>>-
Manda por Co- dores particulares , & a deu fobre todos ao Governador do
7/d7%Í° ^'d ^^^^^' ^ ^^^^ mandou, q na Bahia de todos òs Santos edi^
Souía ^^^ ^ ficaíTe húa Cidade(á qual pozelTe o nome de S. Salvador)no
fitio, que melhor lhe pareceíTejporque ferviíTe de aíTento, &
de fortificação a todos os Governadores futuros de aquella,
Provincia. :;.n.^, . ..^n,<i.

1 9 Partio Thomè de Souía do porto de Lisboa no pri-
meiro dia de Fevereiro doanno de 1 5 49. Em oyto de Mar-
ço chegou à Bahia a ondejâfe tinha divulgado fua ida, feus
poderesjcom todas as ordens,que levava de feu Rey.Dezem-
barcou, & com a gente formada em efqUadrão ferrado(porq
o temor facilitaíTe a fogeição ) Caminhou para o lugar, pre-
cedendolhe húa devota prociíFaó, que ordenarão os Reli-
Equenelleedifi' giozos,& clérigos que levava doReynopara a reformação
7-^slhídfrt ^"^ E^pintual . Foi recebido com alegria de muitos , &com
j o'^^ediencia de todos, rendidos os ânimos tanto ao temor, co-
mo a compunção. Efcolheofe fitio, ajuntarófe materiais,c5-.
correrão obreiros, deufe forma á nova Cidade, & com tal ef-
ficacia fe obrava,q no primeiro dia de Abril do mefmo annó
fe vio a fortaleza , & a circumvalação capaz de agazalhar, &
defender aos moradores, Confinou o Governador alojamen-
tos para os foldados j tribunais para os Miniftros ; fitios para
os Religiozos com tão boa difpozição,quebaftou a fama pa-
ra domar aos índios, & para refrear os Portuguezes, faltando
a todos a confiança, com que huns, & outros fe atreviaõ .

20 Com a nova forma do governo , fe augmentou de
maneira o Eftado afli no efpiritualjcomo no temporaI,que fe

def-

s

Bahia,

defconhecia a íimefmo. Penetrarão os obreiros dá fé muitas.
kgoas de fertáo, convertendo innumeravel Gentio. As Reli-
a^ioens do Grande Patriarcha S. Bento, da Companhia, de S,
Franciíco, & do Carmo, (com edificarem tanto com a refor-
mação da vida, como cõ os Mofteiros , q fe faziaó por todas
as Capitão ias^otaó h(\ fingular beneficio para as almas de a-
quelle Eftado. Obrigados por efte meyo , tratavao os homes ^ '^^'^ ^^ ^^f
de viver do próprio , & íe davao a plantar com tanto cuida--'^^^^^ - ^ -
Hog. Lop . Jq^ 3^ com taõ boa forte, que çm 7 o.annos fe achou o recon-
(m.ca^. 3 j. ^^^^ j^ Bahia com perto de 200. Engenhos, que em cada hu
anno acudiáo com fetenta mil arrobas de açúcar macho^ & a
Capitania de Pernambuco com 1 5 o, que em cada çafra,hmn
anno por outro , davaó íincoenta mjl arrobas. Avaliadas , as
deftas duas partidas pello preço ordinario,fazemfoma de íeis
milhões de cruzados, não falando em outra grande cantida-
de de dinheiro, que fe tirava de muitos, & vários generos,co-
mo páos de tintas, madeiras incorruptíveis , couros , tabaco,
&c. que nofías embarcaçoens conduziaó a Portugal, & delle

por comercio, a todas as iiaçoeníS Etengeiíias, com groílb a-
vanço das rendas Reaes/ -• 'ívíív- r-,r> 7/

- 1: -Q í ViaíTe o Keyno fubido ámâyor mageftade na repu-
tação, no império, Sc nas riquezas , avia de declinar por de*
creto da fortuna,& veyo a cahir oprimido de íiia mefina grár-
dezaíEfia chorou Portugal, fepultada em crs campos de Afri-
< ca por hum Principe mais bellicozq, que advertido j em o Pa-
lácio de Almeirim , por outro menos aconíelhadò , que re-
mifíb: Efte foi o Cardeal D. Henriquéj que tomou a Coroa,
nlais para a levar á fepuhura, queparaa fobir ao trono . Al-
cançou-o a morte em o ultimo de Janeiro de 1 580. com 78.
annos de idade j acabando a gloria de Portugal entre o cadu-
co.j.Sc florido de húa,&, outra idade^fechadas as portas com ^^ pormd vom
eítes extremos para o regreífo, & para a efperança. Hum aii- Hem^ae.
íio,& meyo teve de Reyno. Aquellacabjeça,que merecia por
coroa a ty arajlevou á íèpultuta a coroa pofta fobre á purpu-
ra do capello de Cardeal cu^ja vi veza advertia , que fe o tu-
iíiulo para D. Henrique era fepulcro, para a Coroa do Rey-
110 fora depozito, moftrando o tempoj que fe eiitaó a niorte
-a£ii:â;ya com vipleacia da cabé$.a-de.liii R.ey Portuguez pslra a

B dar .

Moyfe de elRey

c

■P

"i J.k Rfàal

'■:-i'í."

»^ CaST^ÍOTD LUSITJKO 1624

dáf â htiirt Moiiíifchâ CaMliáttcy 5 defpõis á tif 011 com juíH-

ça da cabeça dê hum R^y CaftelàaiíOi, para dafa hum Mo«

Thdffo^l^de narchg Poítuguez. ÁpõderoufledõReyitoD, Phelipe Il.de

Crf/?ív7á por Rey Cáftella, châfífâdo pf kiíéi rd de Portugal ^ taõ favorecido feii

^^ PortugaL foÁ^i do tempo, & da fofttíná^^Gomo de^emparado da jiifti-

çâ, & da re2áo:Défta forte uíiido oReynode Portugal á

Cítíroa de Cafteliá, .ficou fogeito ao ódio com que todas as

""\)^', .Siàçoeíis da Europa fe o à grandeza da Monarchia

Eípàíihola^ tanto Mais aborréí^idáj quanto mais dilatada.

' 2í í^fdiâ iiefe temp<iagaerra,nos Eíiados de Flandesy

éiltre Òiáíídezes, S.:- Êfpâíihoe% aqúelles , por defenderem a

rebeldia^ eto^por eáftigarçm a rebelião [fendo à Religião o

píGtJgxtí), Stâ GãUzâ:~| CreceOí) ódio có a prefía , & cô a pre^

êá ò tôáy©!' dâtiô d<5 Èfpanha, não íó pello q nefta guerra có-

ftíôiio dègénte,& de càbedaI,íenáo tambc, porq có o exerci-

TregoAs entreBf- cio dâs armas fez guerreiros àos que fó fabiaõ ler tratantes.

Z^^^^»^^'^^'''^^' íínpimhou o Ceptro de^fpãfíha Phelipe III;deC^^

lí . de Poírugal,ls âconíèJhâdo tanto da omiííàõ,Gomo da ne-^
•ceffidâide abraçou a fufpetí^o das armas, por dez annos5qu^
fe aíTentou nas tregoas concluidas no de 1609 .com menos
•díícoroz aS <iotidiçoen95'do 4 o Miindo ei^eravà^ & com a de-
'Mtenção ( fe ja nâo foi.impiedade ) de deixar fora delias as
prâçras denoílàsboiiquiiftas ,expoftasa todaafuria do ódio,
'Sc da ^iiíg^nça deílanaf ao, nãopòrqiie nos ^ulgaíTe compli-
• tês em feus danos/enãp parque nos conílderava íbgèitos ao
êontrario iiofflij;iio.O exercicio das annas^&uzo da navega^
.'|úõ tinhâo frito aos Olandeiés tâo fenhores do mar, q pello
-tomerdo, & pellotôubotrazião a feus portos, o melhor das
•riquezas da Europa , devendo fua boa fortuna, mais ao def*
cuido alhêo, que a potencia própria , pois fiando mais da di^
tá, que d'0 vabr^ f€iiipiietriumphâváox;õ aindafl:ria,Sc nani-
ca comáíbrça. . ':y:'r- '■■■.'^llP. .^^O.v: •; ■ • - :•';.■.■.■ pam ,> .; ^ ■ ^ "■■

5Tg Por.dle tépoiflereGia ttâ-quelles Eftados eín cabedál,&
boíiá foceíTos a companhiai,ou bolçà^que iniitulâvão da índia
Oí-ientalf he efte méoo título^cõ 4'infefíão os mares de húa^
•&: outra índia,&OGcapa©'^^oá portos q â conceíiàó dos Pótifi-
x^es,& o díffeito das aiitías íes das coroas de Portugal , & Caf-
tella^Sc íè;ritainbe'tòdo xiftiiidãflaento para ferbtf eve adiirar

\

"iVív-

v\>>i.i ,!..

1Í.ÍJ

^.^

caa

'í6i'^ 'fAtccBiLir^on, f^

ção de fua fortiinâ)Impenos,q não funda a juílíça nao os fu-
fienta a providécia.Viaóíè em OJanda c5 os olhos da envcja,
'& da emul açaõ de muy tos, crecer os avãços , cõ q fe cnriqui-
ciaó todos os prjncipaes na dita cõpanhia,& o poder daquel- " ..
las Províncias uiiidasjo q cófiderado por Jans Andres Moer-
thecan, Olandês de Capacidade , & efperteza , aíTentou con- .
figo, que fazia para fi hum grande negocio, & para fua repu-
bLca naó pequeno ferviço , propondo aos Eftados , que fe
formaíle hua nova companhia,ou bolça que fe intitulaíTe das
Índias Occidentais, à qual fecoSdeíIè a conquiftâ da dilata-'
da Provincia do Brazil, taõfacil de aquirir pello remiflb da^^^- ♦ -^ ^^^^^
defenfa, como de fe confervar,pello útil do comercio , fendo fanhia. Qcciden'
efte naquellas praças a cauza da frouxidã"o3& do occio. Viaí- ulemolanda,
fe a verdade da propofta : Palpavaííe, pella facilidade da na-
vegação quanto menos cuftozo feria conduzir do Brazil à
OlandâjO preciozo delle,do que de húa,& outra India,&fem
replica fe aprovou o di£t:amen,que logo pozeraõ em pratica^
& em breves dias formarão o corpo deíla nova companhia
^ o.partes interefíadas.

24. AchâvaíTeâ nova cômpaiihiacom cabedal, & forças *

para intentar qualquer importante facçaó,& como a primei- interpyefa d^ns
ra avia de facilitar as mais , detriminarâô ^ que fe empregaíTe ^^^p^^^o oUndh^
Tiomelhof3 aífentando , que invadiíTem a Cidade dàBahia^-
como cabeça de todo aquellêEftado , que pertendiâõ domi-'
nar^ tendoíle por certa confequencia a fogeiçaõ de todo o
Corpo, fenhoreada húa vez a cabeça . Preparouífe hua efqua-
dra de 26. vazos (parte doâ Eftados , & parte dos metcado-
fès) guarnecida de três mil foldados(confeguindoíre aíTi a
obfervancia do fegredo, & a brevidade da èxecUçaõ. ) Sahio
a armada de Olanda, em 8 .de May o de 1 6 2 4. apparecéo fo^
brc a Cidade da Bahia,q por entre preza occupou quafi,fcm
refiftencia , entregando a terra, primeiro o defcuido de noíTa
cófiança, q a prefteza de fua diligécia : Quê naó fábe temera
íiáo fe fabe prevenir y & no repente dos aíTaltos obra mais a
c^nfuzão dos invadidos, que o valor,& força dos invazores.
~ 2 í^ Chegou a noticia do fuceffo a Lisboâ^medio o dano
pella perda,& fentio c5 exceffo a novatOuvioíTe en Madrid,
aonde peílo coftume íe fazião menos fcnííveis as defgraças
. ..^ Bs (fs

m

1$ CAST^oro LVSlTAtíO ^1624

(fe jà naõ era disfarce dos Miniftros com que diíTimuIavaó ^
culpa, & a perda:) E como eíla era taõ própria do Reyno de
Portugal, a fazia fua opinião alhea da coroa de Caftella. Co-
meçava Phelipe IV. de Caftella, & III . de Portugal a gover-
Trat^jfenaCorte nar a Mouarchia deEfpanha de que tomou poffeemMar-
JamlãodaBã' Çode 162 1. Importunados os may ores miniftros dasquoti-
'hia. ''' dianas inftancias do concelho de Portugal , propozeraó , &

perfuadiraò a eíRey a importância do negocio , tanto pellas
premidas, como pellas cófequencias, de que pella vezinhãça
do Brazil, c5 as índias de Caftella, ameaçavaó a ultima inva-
zão de toda a America : Eftava o zelo da reputação no Prín-
cipe có a vi veza,com que fe acha em os princípios de todos os
governos j& cõ efficacia mandou preparar armadas, em huns,
& outros ReynoSjCÓíígnandoíTe todos os meyos neceíTarios,
para fe executaré as ordens. De fua própria mão efcreveo el-
Rey a todos os grandes de Portugal , com o q muytos delles
fe derão por tão obrigados, q fer virão nefta occaziaO) não fd
com as fazendas, fenão também com as peíToas.

2 6 Sahio de Lisboa D.Manoel de Menezes General da
armada Portugueza, com 2 6 . vazos,& quatro mil homens de
Como, áqumdo j^^r^ ^^guefra-tomou allha de Cabo- Verde, aonde efperou
ferejíaura. ^^jj^ aiTuada Caftelhana (que fe compunha de dobrado po-
derj feu General, & fuperior a todos D. Fradique de Tole-
do) atè o fim de Fevereiro \ & unidas em hum corpo , nave-
garão as duas armadas com favorável fortuna j & com animo-
20 alvoroço entrarão pella eníèada da Bahia em fefta feira
fanta 28 . de Março de 1 6 2 5 . cuja vifta fes nos ânimos taõ?
diflerentes imprefíbens , quanto difFerentes eraõ os aíFeflos:
Nos da efperança , cauzou exceíílva alegria , nos do temor,
^ medroza defconfiança. Dezembarcou a noíTa Infantaria ^ fa-
bio em terra, efcolheo fitio, formou quartéis, levantou trin^
cheiras, difpoz plataformas, accomodou artelharia, bateo
as fortificaçoens do inimigo vigilante em íe defender , atè
que defenganado,& opprimido entregou a Cidade(íalvas as
vi(ias) & fahio em 2 o.de Abril, corrido, & caftigado o meí-
mo Orgu]ho,que no Junho antecedéte tinha entrado trium-
phante, & atrevido, deixandonos a Cidade taõ baftecida , &
municion^4a?..ÇQuiQ fe fô entrara nçlla para ^ deixar fortale-

i:.ida.

27 Muy

141^ ^J'Í(TE l.LIF^OL ,.. r,7

„ ' iy Muy fênfivel Foi efte golpe para a iio-fa^compatihia;
i^ws> . »^^-\ ^ fuppofto que o tollcrou fem deímayo, teve aberta muvtos

^ <i«'iW\5.v\:. annos a renda Qíiiprindo o animo a lalta das íorças» j Nao le

': rendeo ao primeiro golpe da íbrtuna.Continuou em infeftar

i '^X^^ aquelles mares algunsamios,femmais eíFeytOjque odezejo

Aj « ^V^ ^a vingança, outros,com. o de alguns roubos, & prezas , com

'^ '' ^ que foi criando,aquelIe corpo novo langue , &mais alenta-
dos efpiritos j & vendoílè os iiitereíTados, fenhores de muy ta
pa rte da prata,que para Caftella conduzia de índias D. Joaõ
de Benavides na frota do anno de 1 6 3o.Refolutos,& anima- intentao os otanl
dos intétáraó fegnnda ves aconquifta do Brazil, eíperando da «^í-^^^ fwár/^w
fortuna melhor lemblante: Deípois de largas conferencias Z'^''^^^'^-
coílcluirãpjque não convinha expirimentar a íbrte nã Bahia,
a onde prezumiraõ certa a reziftencia: ( condição de piratas
mercadores, não faberem fazer commutaçaõ de bailas, como
a fazem de drogas.)Nefía occaziao chegarão a Oláda algCias
prezas, que fe aviaó feito em navios de Pernambuco ,& com
ellas a informação do recheyo, & defcuido da terra, tão opu-*
lenta de riquezas , como pobre deforças. Sérvio o avizo de
confirmar o defejo, & aíTentàraõjque foíTe Pernambuco o al-
vo.de aquellefegundo tiro.

28 Repetidos avizos dos coírarios,que corriaõ aquellea
mares,coníirmáraó os intentos do 01andès,& animarão a di-
ligencia, com que fe preparavaõ navios ( publicando a fof-
peyta,& a verdade o fim para que fe fazia a armada,& a parte
a onde avia de dar o rayo)o que foi occaziao, para que algus
mercadores de Pernambuco folicitaílem a perdição de todos
com fe afegurarem a íl mefinos; ( fundando fempre os defta
calidadeíuas melhoras em noííàsruinas:Infametrato,porèm 5^
de todos,porque herdado com o infe6i:odo íangue. ) Apro-
veitouíTe o inimigo dos eftimulos , com que O deípertava o
tempo, a occaziaò,& a fortuna^& em breves dias poz no mar

húa armada de cujo porte fiava todo o bom íiiceííb . Porém
porque efte teve mais de caftigo do Ceo, que de impulfo da
terra,ferá precizo dar rezão da cauza, para que fique fem du-
. vida a do cazo.

29 CançaõíTe noílbs hiftoriadores em pcríuadir com
difcuríTos predicáveis (mais aceitos aos olhos de liia prezun-

■■■HVP

i>Í!Ji

-,8 C^ST^lõTaWSlTA2iO Um^

res.

guns ^^^^/W.- {^i|^ç,;ia, como da occamó )qa:ieospeccados, & vícios doà cllà/mL
moradores de Pernambuco grítáraó com voz taõ reforçada, x^^^^v^^^^ ^,
que chegando ao €eô ^obrigarão a divina juftiça , a decrçr 20.
tarlhe © caíHgo . Aprender nos fuceíTos os difcui-ílòs, tem í>^''^<' ^^/"-^
maisile desengano , que de engenho ; dariíie as catizas-, que. ZÍiLTaT
-íendo penetrar os fegíedos da providencia, accuza a temeria ^^^ ^ ''^'
dade, ainda na defculpa da limistaçaõ. A prv)videticía divina "
governa o mundo deixando «e^bíar de nmrí€Ír.a as cauzas fe-^
.u\'i^^\ giiàdas,que por milagre atalha o curFo delias . Avaliar tu.»
do por milagres, heigiiorancia; negallos de todojheretica
protervia: faber diftiiiguir osjdècreCos , das psrmifíbens , he
periciá de quem entende adifíereiíi^a, que hà entre potencia
abfoluta, &' ordinária, &èomõiàódiveríros os milagres, que
fas parecer taes, a contingência do tempo ^ & os que obra íb-
bre as leys da naturezaa Omnipotência de DeosiCom o cer-
to deífedoutána,náo fais duvida,que o açoute, que cahio fo-r
bre a Gap itaní a de Pernambuco de maneira foi caftigo de
peccados,queprimÊÍro for ordinária confequencia , & natu-i

ralefíèito dos vícios. ii'Jíjp,õí'*í'-- i-tioi:

30 Ahmentadaâ dos deleites brotarão de íbrte as de^
mázias entre os moradores de Pernambuco , que fofocavaó a
rezaõ, Sc defconhecião o pep: não avia para cada qual mais
ley , que feu próprio gofto * A continuação fepultou as me-
Js delícUí afe- 1'í'iorias da cenfiira j & animada do lucro, da abundância, & da
niincieos ammos rique7a,defpre2ava a notajCorrendb amalicia tão defenfrea-í
aos ícrnamhti' da,pella fatisfaçaó dos apetites , que chegavaó com as obras,
aonde chegavaó com os dezejos. As làíCivias,os fauftos, os re-
galos, as vaidades, as uzuras,os roubos, as emulaçoens,as vin-
ganças, os ódios, as aleivozias. St as liberdades, de nenhum fe
eílranhavaõ, porque era exercicio de todos os que podíaò.
A vida que fe fuftenta do vicio fempre conduz para a inju-
ria, & nunca para a honfa,íèndo natural efFeito das demazias
a feminar os ânimos, dezatender os caíligos, &não imaginar
Bos futuros. VioíTe na defatençaõ, com que todos viviaó,que
fervindo de reclamo para a invazão, foi o total defvio para a
defcnfa j fendo a mefma mão do pcccado, a que pegou do a-
çoute para executar o caftigo, permitindo Deosj que com a

mefma

canos.

tSà^

^j'!(r£ i Liy(^o L

*T^

memia ádligmcia f ccwn que íe tratava da coiiíervaçaô^j le

e a ruma.

IX

execu

gi Individualmente fe fabiao em Olanda todasasdif-
pofiçoês, quekvavâo a Villa de Olinda, á fua ultima pef4i-
èáoi náo ditando miatá para càliif , (pc eiiGóftarlhe a mão ao
yezo,que a íkzia declinar^ Em^^.dejunhode léaç.poza ^^^^ ^ ^^^^^^
Cornpanhia Occidental de verga de alto cmcoenta & quatro ^^ ^/^^^^^ ^.^^ ^/.
vazosrorteadGS,-&'gii'amecidoi8 de&te<mil,dazentos^&oy-m/«?-/í a ■?<?«':
tenta homeíiSi,ej^»emare^mte6j& foldados^municionados, & nambuco,
fornecidos para todo o fucceíTo da dilação , da refiftencia, &
ffâcònquiáa' .- Navegarão divididos em direitura â IM de
São Vicente, oíu íié Cabo-Vetde, aonde encorporados fahi-
tio^' 2 6.deDezembfododitoãnno,burcandoaalturado.^^^^^ oWt>í\
Brazil. Era General <ia Armada HemiqueLonc; Almirante .^-^<^i^^ -chC&A^
Pedro AdriâUj Sota Almirante JúftoTraper; Coronel de
guerra Frederico, õu Theodoro Vvandenburg. A todos vay
^rpetâr eftâ hiíibria à Viliade Olinda , no feguinte Livro.

1 1 ; .^

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CASTRÍOTO

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20

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O íe^redo he ai-

mu das emfre"
\as.

■ '■ " '. ' '"' ■■ ■ • oro-* • ■

LM A das empregas he o regredo^em
tanto vivem para a eíperança , em
quanto nas diípoziçoens vive a cau-
tela j mas he taõ frágil o coração hu-
mano j a capacidade humana taõ Hmi-
tada, q ou o recato o rompe , porque
"B^^^yi^^^^^yi^^. revéj ou as prevençoens o divulgaó,
porque redundaj&de ordinario,porque a coníiança,& a pre-
venção o revela. A demaziada diligencia de encobrir as cou-
2as, he o pregão delias: A neceíTidade de as comunicar,he a q
as leva á praça. Intentava o nofíb primeiro Rey D. Affònfo
tomar aos Mouros a Villa de Santaremjpor entrepreza-.Che-
gada a occaziaó, fe vio neceíitado de a comunicar a léus con-
felheiros:Para que entte todos fe confervaíTe o fegredo,fahio
com elles da Cidade de Coimbra,& no campo lhes deu parte
de fua refohiçaõ,aonde queria fe conferilTe o modo,com que
fe avia de acometer a empreza. Voltando todos para a Cida-
de achou violado o fegredo , q imaginou deixava enterrado
no cipo. A demaziada cautella o advirtio â curiozidade^en-
trou a fazer juizo fobre o recato, & inferio a matéria.

1 Emdiverfos portos do Eftado de Olanda, mandou
a Companhia Occidental preparar,& fornecer os vazos,quc
detriminava empregar na conquifta do Brazil, para que naó
fazendo em parte algua rumor jO exceíTo , em todas fe tiraífe
o motivo à curiozidade, & ás intelligencias:Efta cauta difpo-
ziçaó, com que fe disfarçava o defígnio, deu occazião , a que
fcpcnctraífc o intento, primeiro inferido da fofpey ta, def-
pois alcançado da negoceaçáo . Governava por eíle tempo

os

J '

osEílados de Flandes, pella Coroa de Caílclla, a Infanta
Dona Ifabel Clara Eugenia, [viuva do Archeduque Alber- ^f tf27'7o
to, & filha doíegundo matrimonio de elRey Phelipe,que oUndes.
chamarão o Prudente ] cuja vigilância defcobrio , o que en-
cobria a cautella,comprando atè as mais efcondidas determi*
naçoens do inimigo. Com toda a brevidade deípachou hum
correyo a Madrid, dando inteiras noticias a elRey Phelipe o
, IV.de tudo quanto o Olandès intenta va.Conhccendo elle o
dano da dilação , fes logo avizo a Diogo Luis de Oliveira
Governador do Brazil,em como o Framengo armava contra
«aquelle Eftado , com determinação de hir fobre Pernambu-
^co; porèm,que advertiííe, que de ordinário punhaõ os inva-
zores a mira em liiia parte, para darem em outra mais a feu
falvo, otiro.

9 Recebeo Diogo Luis o avizo, & coma preíía poí^
<fivel acudío a reparar, & fornecer a Bahia , que condenava a
ibfpeytaj& a Pernambuco, que ameaçava afama: Para efte f '^.^'^^ "^ P^°^^
lini mandou a Pedro Corrêa | peíloa experta , que por elpe- y^^ Governador
<<:ulaça6,& pratica tinha medianas noticias daíortiBcaçaó] do Brasil.
que foííè a Pernambuco reparar a Villa , & o Arrecife de tu-
do, bqiie lhe pareceíTe accomodado â defeník , & â brevida- "*
(de. Chegou Pedro Corrêa, & com as ordens, que levava cer-
tificou a pratica , que corria , de que o Olandés intentava a < -
conquiíla daquella praça. Áíté então naó achava a nova mais
preditd,que de fama vaga^dalli por diante achava em alguns
credulidade, em outros defprezo. Naó dà alTenfo o juizo, ao
que recuza a vontade j&r quafi com hum mefmo termo fe ex-
plica o querer, & o crér.Deu Pedro Corrêa principio à forti-
£cação, mandando cercar a Villa de trincheiras, & a povoa-
Çio do Arrecife de paliçadas de páo a pique; & fuppoílo , q
amuytos aíTaltouoreceo amuyto poucoschegou odefen-
gano, acudindo os moradores com tanta frouxidão aos repa^
ros,que mais trabalhaváo para o eípanto,que para a defenfa,
fatisiazendo à brevidade do tempo, & não à fegurança do
perigo.

. 4 Engolfado andava Pedro Corrêa nefta obrigação,
quando fe divulgou na Villa, que Mathias de Albuquerque f.^^JZ^^j^Z
entrava pella barra có duas embarcaçoens, das quaes vinhaó ^y^^ ^^ ^ly^,

por quer^ue.

aa C^ST^WTO LUS2TJN0 ^61^

por Capitães JoaÓ Alveres Barbuda, & Gil Corrêa de Caf^
telb-Brancoj recebe-os o alvoroço, em quanta os não ouvio
' o eípanto , de que elRey mandava a Mathias de Albuquer-

que com foldados, & muniçoens para prover, & guarnecer a
terra, á qual ordenava, que em tudo obedeceíle ás ordens,
que trazia de Capitão Mayor, &Governador das armas,por
-quanto fabia de certo, que o Olandés, com hiia poderoza ar-
mada vinha fobre a Villa, & feu Porto. Aprezentou Mathias
de Albuquerque as ordensj por ellas foi obedecido , porém,
não feftejado. Rendeo do pofto de Capitão Mayor a André
Dias Ferreira,que o oçcup^va:Vio , Sc aprovou , quanto Pe-
<3ro Cortea tinha obrado em ordem a fortificação,& confor-
mes no parecer deraó principio a hum reduto pegado a for-
taleza da terra,fiando ao zelo de Diogo Paez o luzimento da
fabrica.Obra fem fruto^ porque nem teve fim, nem chegou a
ter preílimo.Inutilmente fe mo ve o braço , quando primeiro
fere o golpe, queodefvieoreparo: A prevenção não tem
efpera: tudo tem feu próprio tempo, parem todo o tempo

Jie limitado para a prevenção jquem lhe efpera o precizo,tira-

Ihe o neceíTario.
• - 5 Tinhaõ os partos da Raynha Dona Ifabel de Borbon
mulher de Phelipe IV. apurada a efperança daMonarchia^
Telínaffe o nacu iograndofe tão brcve tempo o fruto delles , que faindo a luz
9neto do Princife com tres Infantas, todas nacera^Poucefas j nenhúa chegou
BaUhezar Car- com vida 2. Ver o nacimento da outra^ cortando os VaíTallos^
los Dcmingos. ^^^^fj ^ y^^^ mefmo tempo , as galas para feftejar o nacmien-
to, & os lutos para chorar o enterro. Servia a todos a fecun-
didade da Raynha mais para a efperança , que para a fatisfa-
ção; cauza porque o nacimento do Príncipe Balthezar Car^
los Domingos foi neíla occazião feftejado com tanta alegria,
que não ouve parte aonde chegaíTe o dominio,que não pro-
cura ÍTe adiantar as demonftraçoens dogofto. Com Mathias
de Albuquerque chegou a Pernambuco a nova , & o princi-
pio das feftas. O Povo engolfado no entretenimento,perdeo
a memoria dos receyos, & toda a applicação dos reparos. Fa-
tal parece a perdi ção,quando todos os accidentes conduzem
paraaruyna.
6 Governava a Ilha de Cabo- Verde Joaó Pcreyra Corte-

Rcal:

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'.'*:?

.\U'iV.i«

Real: Obfèfj;^íM*ãGiâte-ííà , -^^úfúúm: á% amada Otodefà,
^itó€ÍGOíKltà o dêfigáiô ao fíiêfifiò têmpo,qtíe fâíia õftetitã-
^âo da força^fai-dil, €[itê éavdá eíiíiêíidèr a èíFêHía.) Fes dill-
gências íx]M: fe aCêgM^àí nâ íôípèytâj&defpoisjqu-e péila dx^-
#0tâ Go?iÍíe€^&) que btíÍGa*'â tâtera da ^àzil , fe í nfôrmou
"d^ aígtifts líófflèíis, (qSiê ó ihiíálg^â póf Vàf iôs {jccidíriíes dei-
•xám em t^rrâ;, ) &confíarí1^íiíéíífê aíiirmàí^âo tõdôs , que d
"Òlândès cotti àqiielk ariíiâdià hiít- (:óhtc â Vilíá de Oifflda, & chega a pernam'
ífea parto^ pata ganhar pdftío^ §i£ yilla por Gntrèpreía * En- ^«co ^«/^ /'4/4-
fendida a vkgei», deípâGlióu Goíti tõdâ à preíTá híàítt pâtaxô ^° ^^ ^^^^^'
"ã Péf naitibitcô fazeiídó pordktózó aositiaràd^rêSjdô a^
•meaç-GT, papa que prê veiiid<>s rebíítáiem o goípè . Noinày óí^
iei^Vóf das feftâs fe récebeò a rtòv^ í P<>de â v^ziíihâriça , 8c â
fcertezâ alteM:^ dgtxí^o, pbrélii pôde rtiais a dezeftkiiâ^aô) pá-
íPá fénio deitai' ofeílêjo . -Oâ põdefòZòs veílidos dâ« cores
tio G tivei^iíador , dêfpre zúyáô o fòíriiidavel, coítt aparências
do iíiíeníivel^ (cdMõ íè âlgúa rèzá^ de eftádo ettfiíiára a deA
■pi^e^aí ú iíiiMígo, ')-03 átóeíTos da^armas prifíieiío os dá a
dilpo^i^áo,^^ forluM .- E)*asOfiiifrôêíis fogéâ dita:Mô déíi
tnây a rios i*épetttf ê , queíti atttíCípàdameritè fe exéí^ita nòs
temoíêsi A tefokicájo fíítóè dê à^õs encofitrados ; Naò dei-'
■5toit Mathiás de Albuqii^fqúêcle Goíitiniiàt no feítejo, queà
t^ccaziaó fazia parecer fêitiçó.Náo fòltáVa, queíii acõrelhaíTe
fe íocegô com affifiilar o defvio, tiráVáõ íáoíftálâ cOnfequeri-»
cia dâs preiíiiffâs , qoe das ve^nbân^as do peíigó inferião ò
fi^-iiro.Dezião^qiieíe a armada doFramengo vièfa èm di-
reitura a Fenlâitíbaco chegara muyto antes ^ qtie chêgaíib o
pàtaxo^ de avizo ( partindo^fte tmtòs dias déípois delia) q
ííidiibitãvíekTíeíTite avia tomado çm^o rumo y pois o pataxo
â nlo aviMra fia Goftâ. De hum meíítio ttíodo eteaõ as coíi-
tas^a c^?ivèniefícía, & a eonfiáíi^a. Impòfíívèl hé^que depar-
tíduserradâíâ^íeíií-eíbmãcettà^irj^^-í^^^^ "^ o.^u'.,.; .^ uo.,;.
o ..i^.-L> -EMi^êi^ fegiiratif a /& ô féèeyò '^rfuávâ-ô^àfecef
áè t?^dò"s : Á^kvdíiéfeíiçá nâodeiXâVâ acudífà importância:
Ctíntinivi^anlè â^forôétítl^oêHs èOín braço tâõ reniiffo , que
obrava mâls paia fátísfâ7;er áo éngáno ^ que para diípof o re-
Me4ío]jaig§iídofè^âdaqttál táo longe do danoyGomo fe ima-
ginava do perigo . Chamando eíiava -ótémpõ' pélk fefolii-

^\ ít\^ í»V.

i^ «'iviVl V. * ii.

A-^, ^ L

OgUwt

cao

«p

CÕvoca Mathias

SC

24 C-^STVOTO LVSlTJnÕ I é 3 p

ção quando Mathias de Albuquerque convocou à concelho
aqueílas peffoas , que melhor poderião votar na difpozição
QçoncdU^'^^^ da defenía por íntereçados , ou no credito , ou na fazenda:
' ' * Afíentoufe, que nenhum morador tiraíTe da Villa , nem peí^
foa, que folie de fua famiHa;nem cou7.a,que pertenceíTe a fua
fazenda. Suppunhão, que fendo igualmente de todos o inte-
reíTe, feria de todos igualmente a defenfa. Muy tos (cujo ani-
mo ferviamais à defconfiança, que à reílftencia) forão de cõ-
trario parecer dizendo, que cadaqualppzeífe em cobro o
mais preciozo, &: o mais eftimado de fua familia ,& fazenda,
para que na occaziáo indivizo o cuidado affiftifle todo o co-
ração ao braço: Toma vão por fundamento o aberto da pra-
ça, & a contingência do fuceíío , que fendo faypravel ao ini-
migo avia de medir a Vidoria pella riqueza dodeípojo,&
iião pello formidável da batalha,& alimentaria os iníèntivos
da cobiça com a riqueza do faco.Moftrarâ eílahiftoriajquâr
to nefte voto diftava o concelho, do animo. ! ii

ji 81, ,; Chegou o dia de quinta feira 13.de Fevereiro do an-
no de i63o.(oytodiasdefpois que entrou opataxo dea-
qoas dercrnam' 'vizo,) &neI]eayiftou aarmada01andeza,o cabo de Santo
buço Para o Nor- Agoftinho, f celebre por fazer alli a terra hum dqs três angu^
te. los de que fe forma aquella gtande parte da America chama-

da Perir.) Tomou opano,&fazendoííè concelho na Capita-
nea com os principaes cabos da milícia , nelle fe decretou , o
lugar, o tèmpõj& a forma^ em que fe avia de enveftir có noA
Armada oUnàe-- fas fortiíicáçoens, ordenando ao Coronel Theodorp Wan-
5! ^^ J^ V, 'V demburg, que com 1 6. fragatas, 2 200. infantes , & 700. ma-
mineiros, íe apartalle do corpo da armada (quando menos o
deixa ííe advertir o conflito,) & deitaífe a gente na paragem
do Pào Amarelo,tres legoas apartado de Pernambuco para a
parte do Nortc,quc acharia fem opoziçaõ,acudindo no mef-
mo, tempo o grofíb da noífa gente, aonde a chamava o enga-
no, ignorante da parte, em que a pedia a neceíTidade. Sabia o
Framengo, queobomfuGefíbdas emprezas pede acertadas
difpoziçoens, & que as mais ditozasíaó aqueílas, que naã
deixaó interpolação de tempo entre o ver,& o enveftir,dan-
do lugar ao inimigp, a que finta defcarregar o golpe,porèm
não a que veja p braço. ,, : ^ ^ ^^ ^,^^:
»j/.> o Logo

sitiado fcie le-

i

L L;

•1630 • ^A^Èl.TlV^O Ih ' 1^

9 Logo que do Cabo de Santo Agoftinho fe defcobrio
a armada inimiga com fetenta , & fete velas/e deu rebate em
Pernamb Lico, fazendo íahir pelíos eíFeitos osaffeâios a cara
de cada hum dos moradores j viaíTe nos femblantes , como em
efpelho,o valor,& omedo-^eftindofe tão diverías cores,que
as diftinguia avifta apezar das mais arteficiofas defimula-
Çoens . O Governador das armas Mathi as de Albuquerque
iacliando em todos prompta obediência, repartio os Capi-
tães pellos poftos^coníignou gente para as eftancias-, medin- Reparte MdthiãB
do o numero pella capacidade , & a efcollia pella importan- "^^ ^Ibc-querque
cia, para queehegada a occafiáó fe viílè cadaqual obrigado a ^^2"" "'^ ^'^^
guarnecer o lugar predefinido. Aguarita de João de Albu- ^'^^ "^^
querque [era hum reduto fituado no caminho da praya, que
fas traníito da Villa para o Arrecife] encarregou ao Capitão
Martim Ferreyra com hua companhia paga^ com outra com^
panhia , de que era Capitão Francifco Tavares , guarneceo
outro reduto, que eftava entre a Villa , & Saõ Francifco na-
vereda que guia para o Rio Tapado, & Rio Doce. A Infan-
taria da ordenança, tanto da Villa, como do termo ( da qual
eraõ Coronéis Ambrozio Machado de Carvalho , & Pedra
da Cunha de AndradaJ devidio por diveríTos lugares na for-
ma feguinte . Para a guarnição das trincheiras da Vilia no-
meou aos Capitaens Roque de Barros Rego, & Salvador de
Azeyedo,com as fuás companhias. Afíbnfo de Albuquerque
Capitão da nobreza [debaxo de cuja bandeira fe alliftava
Joaõ Fernandes Vieira com poucos annos, muyto valor, &
mu yta eftimação,] & Manoel da Cofta Calheiros ( affi mef-
mo Capitão dos nobres)tomâra5 por fua conta a defcnça do
Arrecife, cujo prezidio engroífou o Governador com hum
troço de gente ordinária, que capitaneava Francifco Mon-
teiro , & outro de foldados bifonhos levantados no Fveyno,
feu Capitão André Pereira Temudo . Adefença do Rio Ta-
pado deixou a cargo do Capitão Francifco de Freitas . As
forças de mar, & terra , que defendião a barra fiou ao valor
dos Capitães António de Lima, & Manoel Pacheco com
íua gente. Da paliçada do Arrecife fes entrega ao Capitão
Bento de Fre!tas,affiíl:ido da gente da mefma povoação,& de
alguas mangas de moradores da Villa.Por Cabo de toda a In-
^^ ' C fantariâ

i6 C4ST^0Tp LmiTÃno ' 1550

fantaria nomeou Mathias de Albuquerque a André Dias da
Franca, & por Sargento May or a Ruy Dias Borges (em fair
ta de Manoel de Souza, que o era de proprieda4e.)Para Got
V ernar aigúas tropas de cavalkria da terra, ficou Mathias d^
Albuquerque,correndo por conta de feu cuidado gcudirâ^
partes donde a neceâldadeniais o pediílè. '

Formidável, & aprazível apareceo aos olhos dos

10

Jparece a arma- morâdores a armada inimiga eni 1 5 . de Fevereiro , que d§
da oUnàífafohre mar eflj fóra com todo o pgíio navegava bufeando a terra jaíS
Pernambuco. poyoada de bandeiras, flâmulas, & galhardetes de tantas, &
tão diveríTas cores, conêedidas,& negadas a beneficio jdo y ^-7
to, que as vj|p trenjulas os olhos , & confu/àiínente temef o-;
fas os juízos. A multidão dos clarins,repitida dos ejcos enchia
os ouvidos de bellicoza ârmoni%& os coraçoens de formídât
veis confequencías. O temor, & a eíperança , que occupava
os ânimos, di verfificava os objedps, rezão , p orque a meíiiia
armada produzia em huns çpraçoens effeitos tríte , & em
outros alegres; eftes recebidos da eíperança; aquelles do te-
mor , então diííimulados do artificio, defpois accuzados do
íucçeííb , achando no Olandès ágazalho huns, períeguiçaõ
outros. Arribando fobre o Rio Tapado deu moílras oini-
migode querer por aquella parte fazer a enveftida: Era o
intento capear hum engano com outro engano,para que oe-
cupada a atenção dos moradores nas partes donde a chama-
va aficção,lhes não ficaíTe fentidppara reparar na induftria,
com que por lugar difFerente os cometia a verdade . Aqui
le apartou o Wandemburg com fua efquadra , coberto do
fumo, & da terra, & favorecido do engano da armada ( que
reprefentava no mayor numerp dos vazos omayor podet
do niimigo)com que veyp cahindp fobre Pernambuco, cer-
tificando o aííàjtp, fem individuar a parte do confiiao.
^ 1 1 Surgio toda a armada atiro de canhão das noíTas
íortalezas; era todo o intento do inimigo lograr a induftria
com procurar a diverfaó; & por occultar os defejos de enter-
ter, íe valeo das apparencias de conquiftar para que fe ét^z
tempo, a que o Coronel Wandemburg , ou como lhe cha-
ma o vulgo Theodoro Wandemburg deitaíTc no Pão Ama-
teilo a gente,q levava/em oppoziçáo que a defcompozeíle.

Da

IH

I égo fA^TB L LlV%0 U. 17

Da Capitanea defpedio hum batel,& nelle hum tambor pel-
Io qual mandou dizer aos prezidios das forças da barra , & J^' ^^f^Qj-^',^
Arrecife, que elle vinha cora aquella armada a fenhorear a
terra,com ordens dos Eftados, para a dominar, & não para a
deftruir,que lha entregaírem,& a todos faria amigáveis par^
tid os , fav orecendo a obediência j porque avia de caiiigar a
fogo, & a ferro a rebeldia^& q fenáo fiaíTem em forças defti-
tiiidas de focorro, porq fe chegaííem a medir asefpadas oc-
cupados os ânimos de feus foldados do furor fe efquecerião
de toda a piedade^ queaceitaífem os ofFerecimentos da cle-
mência, antes de os obrigarem os deftroços da ira^ à qual fe-
podião adiantar , tomando o concelho, que lhes dava o ex-
ceíTo do poder;&advertindoIhes,que a deíproporçaó da de-
fenfa , faria infalivel a ruína. Abaga arrancada vinha o men- Refp^fza, àosnof
fageiro em direitura a fortaleza do mar j& a feguraça foy pa- j°^'
ra os noíTos informação do deíignio,& có hua carga de mof-
quetaria adiantarão a repoiíla á embaxada , firmando a refo-
kiçáo com os teftemunhos do defprezo, para que entendei^
f&o inimigo, que tinha muy to,que vencer, aonde o eíperava
a prevençáo,& o valor.

: 12 Naó imaginou afoberba doFramèngo^ que fòíTe ^

com tal deliberação a repulfa , que o efcandalizaííb a igno-^^
miniaj fes reputação da cólera ,& neceíTidade da vingança,
prefumindo , que lhe abriria porta , por onde lhe entraffe a
dita, & a tudo, o que podia alcançar fua artelharia , mandou
bater com tanta obftináção, & fúria (igualandoíTe o rigor á
profia) que em fete horas de combate meteo dentro do Ar- ^ . .

recife duas mil bailas : Nãofaltáraó os noíTos â devida cor- a lamp

r y - a - v rr - ^ . . . . porfiada, bateriA

relpondencia , & com tao ditozo eíieito , que íentio o mimi- ^ ^ r^,^ ^^ ^^ ^^^^

go a pontualidade do retorno , arrifcado a chorar mayor a f^,
perda , com o perigo em que vio húa de íiias fragatas , a qual
no mayor fervor de fua bataria tocou nos ArrecifeSjtão per-
dida que para a fal var fe em penhou a induftria , a força, & a ■
;di}ígencia.Aaefcuranoiteque adiantou a fumaça do con-*
■fiióto, fucedeo a do tempo j feífe o inimigo na volta do mar,
Sc livres os noíTos tivera o occaziãoparã advertir o pouco
dano, que avia cruzado a bataria . Na povoação do Arreci-
fe nenhum outro íizçráo as balias , mais que paíTar as pare-
ofíio:> C 3 des

baíe.

1% QASr^oro OJSITANO i^3í>

dcs dos edifícios, fem perjnizo dos foldados, (metidos
em covas, & reparados com trincheiras de área conheciáo
a bataria pello eftrondo, & não pello dano.) Na fortale-
za do mar ficarão quatro mortos , & fete feridos, avendof-
fe nella o Tenente Pedro Barboza , commuyto valor, & a-
cordo : Com os olhos da enveja ovio a pátria, & comos
da admiração o mimigo . [ Não obftante , o acharfe fem
Capitão, cuja falta não pode defculpar o animo de feus fol-
dados.]

1 3 Confufo fe achou o Olandés, moílrandolhe a ex-
periência o erro da opinião; perfuadialhe a prezunção,
Retirajftdocom- quefuâ armada primeiro avia de vencer com o terror , que
com a força; fem rezão defcorria ; com muyta defcuríTava
fe fazia fundamento em promeííàs alheas ( affirmaífe , que fe
huns o rebatião , outros o chamavão. ) Abateo as vellas da
armada , & da foberba, & a arvore feca efperou a fortuna do
Wandemburg, no aííàlto furtivo , que hia executar na para-
gem do Pào Amarello, de cujo fucçeíTo efperava toda a me-
lhoria defua forte. Muyto de outra maneira o julgavão os
nofíbs preparandoílè de tudo,o que lhes pareceo convenien-
te, para reíiftir, & oííènder ao inimigo; tendo por certo, que
eom a primeira luz da menhãa daria principio a fegunda ba-
taria. ■;
. 1 4 Em^ quanto a huns , & outros occupavão taõ difíê-
rentes cuidados navegava Wandemburg com as íó.nàos,
levando nellas mais infantaria, da que temos dito:Chegou no
mefmo dia , a tão boas horas , ao Páo Amarelo , que favo-
recido da occazião,& do tempo poz em terra gente , mii-
niçoens , artelharia , & mantimentos fem contradição, que
o empediífe, ou detiveílè : Tal foi o de íèmparo , que o
temeo acordo; & com efía fofpeyta fe formou em quatro
batalhoens; &fe guarneceocomfufficientes trincheiras : O
primeiro cfquadraõ confiava de algúas mangas de efco-
Ihidos mofqueteiros , que na vanguarda ferviífem de def-
cobrir, Scaílcgurar o campo,das embofcadas , que temia por
junto dapraya. Ofegundoefquadraõ fe formava de 934.
ioldados,que governava Eftiencalui , ou Eftiencol Tenente
CoroneLO terceiro governava o Coronel Stens Calfelt, ou

como

T>eita aentê nt
f AO Amarelo.

11

o

J

como outros, Eleftz, com mil, & quarenta foi dados. O IV,
conftava de novecentos, & feíTeiita , &: finco infantes ás or-
dens do Coronel Fulco Henechio Tenente do Sargento
Mayor . Compunhaífe efte todo de trinta , & féis bandei-
ras j levava quatro peças de campanha: E nefta forma paf-
fou o inimigo toda a noite com as armas na mão, prezu-
mindo , que noífo defcuido, era ardilozo cuidado j aííe-
gurandolhe o campo de dia para o aífaltarem de noite com
a ventagem , & parti4o , que tem os que a palmos fabem
o terreno j porpondolhe o feguro , para o não acautel-
larem do perigo . ( Difçurfo muy de homem , & folda-
do : ) Avia de prezumir o inimigo , que húa , nem ou-
tra couza ílibiam fer os noíTos , nacidos em Portugal , &
fuás conquiftas ? Se o foraõ, tiveraó arte, & avertenci^ Perfuadep^que
para reparar, que lé . fragatas que fe apartavaõ do cor- 'llfji'/"^^''^^'
po da armada inimiga na força do combate , não era pa-
ra diminuir feu poder , fenão para melhorar feu parti-
doi& feguidas da vigilância, a pouco rifco os deftruira qual-
quer refiftencia , fahindo de fuás embarcaçoens com agoa
pellos peytos , como fahiraõ fem fe poderem ajudar da
força, & menos da arte. Com efte diâ:amen fenão podia
perfuadir o Olandès , que a falta da oppofição era defazo,
fenão ardil i recey o, que o teve toda a noite fobrefaltado, &

avertido.

15' Com algúas horas de efcuro fe devulgou na po-
voação de OHnda , que o inimigo tinha deitado emter^
ra ( no Páo Amarelo ) muyta gente com a qual vinha
marchando paraaVilla. A diftancia era de três para qua-
tro legoas: A nova fora de toda a fofpey ta : O teiupo co-
berto de fombras ; cauzas para fe aumentar a confuzaõ ,
que naceo do rebate : A todos tirou o fobrefalto da me- ,.

moria a defenfa ; a muy tos facilitou a vontade da fugi-
da, & a muy to poucos deixou acordo para a refiftencia. 'Dap rebate m
O molherio, dando credito ás perfuaçoens da fragilida- riikjicOlmda,
de , defprezava as da rezaó : As lagrimas , & gritos publi-
cavaó a dor das feridas , antes de verem as efpadasjpintan-
dolhe o medo primeiro o eftrago, que o conflito 5 obrigando
cora a Mima aos maridos , irmãos, & parentes a faltarem

C3 nos

50 C^ST^IOTO LUS2TJK0 1630

nos brios da honra^por não defmentirem os impulfos do fan-
ConfuT^o âosmo- ^^^^ ^ ^^^^ ^^^ ^^j^^ ^^^ ^^^^^ ^ ç^ tropefíàva nas mef-

mas diligencias: O defacordo tamanho,que de qualquer mo-
vimento fazia batalha jde qualquer viíla formava contrários:
Com efta confuzaó fahirão muy tas familias da Villa , para o
mato,enfinandolhesoamordavida adeíprezar omaispre-
ciozo da fazenda, tanto,que aquellas joyas de ouro, & prata,
de que pegou a avertencia, ( ou por demenos vulto, ou por
demenos jpezo) deixou cahir das mãos o receyo , como noci-
vo embaraço para o caminho. Os efcravos fervirão, nefla oc-
cazião, de ferem fenhores de feus fenhores^ moftrando bem,
que os tinha feito fervps a violência, & não a obrigação; fal-
tando ao ferviço, quando os chamava a liberdade. Todos ca-
minhavão, nenhum fabia para onde,nem para que; vileza do
pafmo, que porpoem o feguro, em fe fogir do perigo,para o
perigo : todos fabricavão em fua própria dihgencia fua
perdição, huns na retirada, outros no roubo.Mathias de Al-
buquerque, a quem nefta confuzão defconhecia a obediên-
cia, v iaífe deftituido de poder,para fahir ao encontro do inir
migo ; acompanha va-o a honra de alguns valentes, &: animo-
zos moradores,mas para a prezente oocazião fazião taó pou-
co numero , que tiravão a confiança â temeridade , quanto
mais ao atrivimento.

16 O feguinte dia, que foi hum fabado 1 6. de Feverei-
ro, fahio a luz a defterrar as fombras dos orizontes , &í dos
coraçoensolandezes, que livres do temor , refpiràrão nafe-
gurança . Sem detença fe pozeraõ em marcha, levando o Co-
ronel Theodoro Wándemburg a vanguarda de feus efqua-
droens, cu;o centro formava o treym defuaartelharia, dila-
%■'■ tando a circunferência até as prayas do mar , pello qual lhe
paffa o inimigo o fafiaó companhia todas fuás lanchas , varejando a terra , atè
Rio Doce. onde curí^àvaó as bailas: As de algúas mangas nofíàs,que forr

màraó animozos mancebos chamados do primeiro rebate,co-
meçaráo a perfeguir o Glandes com repetidas cargas, que
nelleempregavaó cobertos dos matos, aonde efcondido o
numero occazionavãoomedo, & faziaó tolerar com impa-
ciência o dano. (Para o inimigo,o defvio era mais nocivo,que
o golpe, porque ou fe avia dç dçfcompor , ou fe avia de de-

y~

y*

ter;

1630 'PAXTB 1. LimiO 11, 3 1

ter; temia , que qualquer deíles âccidentes o poderião deí^
truir.) Chegou ao Rio Doce, cuja pafíàjem achou empedi-
da com trincheiras, & prezidios de gente da ordenança, que
governaváo os Capitaens Francifco Tavares,& Martim Fer-
reyra, mais para temer pello vulto , que pella diíciplina . A
falta defta conheceo o inimigo, pello mal cerrado das cargas;
$C não temeado , aos que fem ordem lhe avião de reíiftir, co-
rneteo a paffagem com todo o poder, avançando as trinchei-
ras, que os nofíbs defemparárão com aquella defordem, que
fas parecer a retirada, fugida; fendo tão poucos, os que teve
conftantes o valor, que poderão fervir para moftrar a difíè-
rença, porém não para fuftentar a oppoziçaó; oquefizeraõ
por algum tempo com dano de iriortos,& feridos dehúa,&
outra parte. •

17 Ouvindo os últimos golpes do conflito chegou a
aviílar aquelle íitio Mathias de Albuquerque, acompanhado
de gente de pè, & de cavallo cõ hum troço,que contado pel-
lo numero era de 700. homens, mas pella difciplina confta-
va de muy poucos foldados , & todos animozos , porém fem
exercicio da milicia. Vio o Governador os defenfores da paf-
fagem, defpois de desbaratados, defcompoftos, fem arte,que "f ^"^^f ^^ ^,^'
os compozeíTe r primeiro vencidos da própria impericia, q ^^^ • fe reti'
da alhea força] trabalhou pellos recojher ao feu efquadrão, ra^,
§m que conhece^ meíma falta; efcuzoufe ao encótro com a
certeza de perder a batalha(em igual fitio,& com menor nu-
mero,) & fe foi retirando com intento de efperar ao Framen-
go na pafíagem do Rio Tapado ( que o Olandès avia de va-
dear com agoa pella finta ) aonde aforzoça defcompozição
^©contrario poderia melhorar noífo partido. A poucos paí-
{m o arguio do erro a melma eleição do remédio ; achouííe
defemparado do mayor numero da companhia , & fó aífifti-
do dos Capitaens , & officiaes com poucos foldados, eftes
tanto menos quantos mais eraó, os que lhe requiriaó , que fe
j-etiraífem para a Villa aonde tinhaõ o coração , que lhes fal-
tava na campanha :( Logo veremos como perdido o cora-
ção na campanha, o naõ achàraó na Villa: Poslhes a fortuna
nas maòs a efcolha, porém naó a melhoria da forte. ) Obede-
ceo Mathias de Albuquerque a neçeífidade, faltandolhe po-
der para a eleição. C4 18 Fa-

^"

rv 1

inerua»

^i QASr^OTO LUSITMO 16^0

18 Favorecido denoíTas omiíToens fe cobrou o Olan-
:Emrii o inimigo ^^^ Jetoda a duvida, prometendoíTc infalível a vi£i:ona, íem
* r///^ de ohnda. ^Qj^^ingçi^^ia ^^ batalha: Gom a retirada,lhe ferviraò de guia

os meíiiios, que não ferviraò â defença : E affi marchou com
^ a prcíTa, que lhe dava a confiança, de que fem vencer avia de
triumphar: Corria com os paíTos de fua fortuna, & para voar
lhe deu azas noíTa defgraça,porque hum homem noíTo fe lhe
offereceo para os guiar para a Villa por caminho mais fegu-
ro,& de menos rodeo. (Por infamar os moradores efcreveni
alguns,quefoi hum dellesjporém a informação da verdade
^ diz, que foi hum mulato de pouca forte. ) Aviftou o inimigo ^^ ; ^^^^^^
a povoação,& dividido o poder em troços, avançou por dif- caUdo no/cu
ferentes partes; nas quaes íe achava homens, não achava ini- Luudcno.
migos: Com o groíTo do poder fubio a apoderarfe do alto da
Villa achando em o Collegio da companhia alojamento,fem
encontro. A hum tropcl,que guiou por detrás da cerca de S. ^^.^^ ^^^^ -^
Francifco, deteve o Capitão Salvador de Azevedo com 2 2 . ^-^ ^^'^^ * -
foldados,que favorecidos do fitio fahirao de cara a cara a re-
bater o Olandès , moftrando feu valor a todos ( com repro-
var, o que fiz eraõ) o que todos de viaó fazer . Era o paíTo eA
treito, o animo dos noífos deftimido, rezaó porque o encon-
tro foi perfiado; & não foraõ os noíTos vencidos fe a virtude
fenão vira opprimida da multidão,que à cufta de muytos of-
ficiaes, & foldados franqueou a marchaj com deixar a todos
os noífos,ou mortos,ou feridos.

1 9 Chegou o Framengo a Igreja dejes v S5lugar efn que
muytos nofíòs fe tinhaó fortificado (a mayor parte da com-
panhia do Capitão Salvador de Azevedo) aonde, quando
menosjpoderiáo tirar algum partido; a que não deu lugar a
infolencia do Framengo, que arrebatado de diabólico furor
contra o fagrado,deitou por terra as portas do Templo; cor-

Conefuifia aosre' tou(fem fazcr diftinção de contrarios,& rendidos , medindo
tirados quefetí^ p^j. ]^^^^ igualdade O profano , & o divino ^ com efpada de
nhao fortificado, i r \ ilj n- i ^tt

^ ■' dous tios, hum que lhe dava a v ictoria,outro a herezia. Hum

grande tropel enveftio o reduto que ficava à entrada da Vil-
la com tumulto,& ouzadia: Julgava feu defprezo, que feria
fobrada a difciplina em occaziaó , em que os chamava noflà
defordem 3 efta defcobrio o ^ninio dos defenfores, no inimi-

■ ■ > ■ ^ goj

m.

i6^ú ^):(pAtrBi.Lir<^ Ih 35

go, que com cargas de artelharia , & morqiietaria , detiveraô
a corrente do orgulho contrario , fazendolhe entender , que
íènaõ vence húa confuzaó com outraiErpiritos bem nacidos,
porém mal logrados pella traição de dousFramengos, que
eftavaó entre os noíibs, hum chamado Adriaó Franco,outro c^/:
Corneho Joaó, os quaes temendo os eíFeitos de noíTa reíbla-
çaó, com traydoras intelligencias deraó entrada aos feus , &
fe deixarão ficar com elles no reduto; do qual fahiraó rendi-
dos os noíibs: Pello tempo adiante pagàraõ eftes dous Fra-
mengos efta traição com outra, que no Arrecife os levou ao
fuplicio por fervirem de eípias dobles, infiéis a proprios,& a ^^

eftranhos.

ao Apoderado o inimigo da Villa ,& de fuás fortifica-

çoens (hum fabado pella tarde lé. de Fevereiro doannode
1 6 5o.)continuou Mathias de Albuquerque eih obrar o pof-
fivel, com trabalho inútil. Como por deftino o levavaó as re-
tiradas a guiar oinimigo para as enveftidas .Naó há erro , de
que fenaó encadee outro erro. O naò ter configo gente com
que defender a Villa o tirou para o Arrecife 3 era de menos
âmbito a povoação, & baftavalhe menos gente para a defen-
fa , porém na retirada, que fes da Villa para o Arrecife, o de- ^^^^ ^ inimigo
femparou tanta , que fe vip com menos da que era neceíTaria fenhor do Arre-
para guarnecer com. fufficiencia apaliçada . Quiz remediar cife.
com a induílria a falta do poder ,& mandou aos Capitaens
Joaó Paez Barbofa, Martim Ferreyra , & Francifco Tavares,
que com a gente que tiiihaó cortaíTem com húa trincheira o
caminho da Villa para o Arrecife, aonde as avançadas do
inimigo quebraíTem a primeira fúria , & detiveílém a corren-
te de tanta v idoria; prevençáo,que o Olandés deixou fruf-
trada, guiado de outra vereda, que lhe deixou livre a envef-^
tida ; & aos noííos franca aretirada , em que ]i obedeciaó ao
coftume (não fey fe premitido de mais que humana provi-
dencia.) O reitante daquelle infauílo d:.-', ga^^^u o Framen-
go em extroçoens, v iolencias , & roubos atropelando com a
tirania as leys da humanidade.Naó pode o .valor,&íofri men-
to de André Pereyra Temudo com as exorbitantes demazias Animozarefolu-'
do facrilego hereje , & levado de hum catholico zelo envef- ãotkJnârePe-
tio, jmito^á Igreja da Mizericordia , com húa tropa de Fra- '"7^^ ^^^^^'^•
i:.. :a mengos

54 c^sr^^ioro lusitano 16^0

mengos abrindo com á efpada caminho para a morte, & para
a V ingança^ à cufta de fua v ida, & de muy tos contrários.

Referir a calamitoza tribulação dos afliâ:osmorado-

2 I

. , , tes fora mais reprezentar húa tragedia, que efcrever húa hií^
Vejhmmtàães ,^^^^ ^ ^ ^ iaoriozo era Olandès,hereje fobrç

elfce ditadas pehos ^ ^ ^ \^ ^ , , • ^^ n

hercjes nos ven. i uimigo j & coíTario fobre here;e . Para augmentar o eltrago

ios.

fe V aleo a fúria de próprios , & contrários . Os facinorozos,
que a juíliça depozitava nos cárceres , rompidas as prizoens
fahiraò com impetuofa corrente a continuar os delíâos,rou-
bandofemmedo, ferindo femcauza, matando fem cólera.*
Pagando a inocência a prízão , de que fes in;uria a malicia. A
mefma diligencia, com queostriftes moradores bufcavaóo
remediojos levava à ruina. As mulheres de todo o eflado,&as
crianças de hum,& outro fexo,que anticipadamente furtarão
o corpo a violencia,a padecerão menos íufriveljporque mais
E fellos pofrios í nfoportavel fe faz ia , executada pellos próprios , que peílos
naíuraes, contrarios,defpojandoas, do que poderão falvar de feus mo-

veis, para o ferv iço de feu adorno, ou de fua neceffidaderFo-
raó eftes, aquelles aos quaes nem a honra obrigou a defenfa,
' nem a humanidade à compaixão; Pello exceífo,os deílinguia
dos herejes, o efcandaloj porque com mayor infolencia naõ
fabiaó fazer differença de peílba a peíToa, de lugar a lugar,de
edifício a edifício. Viofe a fatalidade da perdição em fe in-
tentar a referva por meyo do eftrago. A o mefmo tempo,que
o furor dos inimigos confumia,& abrazava naVilla honras,
vidas, & fazendas, ardiáo no mar, & no Arrecife trinta na-
'vios,& todos osalmazens^aqueMathias de Albuquerque
mandou pór fogo, & nelle, além de outras muy tas drogas,ar-
déraõ mais de duas mi) caixas de açúcar, em que as chamas
confumiraó a poffe , & a efperança da riqueza , & da cobiça:
Efpeâ:aculo , que os Eftrangeiros viaó com eípanto , os na^
turaes com laftima : Fcs o fucçeífo parecer prophecia, o que
antes avia fido comminação Evangélica . Da refoluçaó com
' queMathias de Albuquerque mandou entregar ao fogo as
Matinas de Jl- fazendas dos moradores (avaliava por menor dano, fer virem
férfogoan>uytos']!:^^l^''^ ao fogo , que de delpop ao mimigojmfinoo
mvm nojjos. Olandes a dezefperação dadcfenfa; deduzindo deílaspre-
miíías,por legitima confequenciajque naõ podia intentar co-

braríè

'1^5

luea o inimf

forarfe mo perdido, que fe viadefíitiiido de cabedal para de-
feider o guardado: Com eftafegurança licenceoiá aos folda-
'dos o Arrecife,^ a Vsiia , -oondeiiaíKio todas ascazas dos
«íoradores ao fãeo.Engolfoufe o roubo no pemíitido5& no ^^^ ^,^^^^
^ edado, igualando â cobiça a hoíiilidade , & o eftrago , íem ^rreafe. '
perdoar aos frwifmos edifícios . Entre as logeas ( que achou
commuy to reclieyo de fazendas, 4: nellas tudo, o que podia
íèrvir ao decoro , & â vaidade ) avia algiias bem prov idas de
tudo quanto a natureza, & arte pddc offerecer à gula; neftas
<e engolfou a infame demazia dos Framengos , fatisfaz^endo á
fede,à: ao coftume com precioios v ifihos, & com tanto ex-
ce íTo, que privados do ;ui?o , & dos fen tidos y óU o fono os ^

deixava infenfiveis, ou á<:arga os fazia immoveis . Os efcra- 'J^-. '
vos vendo derrotados taó vilmente, aos que refpeytaváo
V iâor í ofos , como íènhores do caMpo fe fizeraõ árbitros da
preza, roubando aos coíTarios o mais preciozo dos defpojos.
Alguns houve, aos quaes a lealdade âvertio a occaziaõ, obri-
gando-os a dar conta a Malhias de Albuquerque, a quem af-
firmavaõ, que íè queria aproveitarfe da oportunidade paílk-
tia o inimigo à efpada, certo j de que no prezente eftado na5
hia a bufcar homens, fenaõ odres . OfFereceofe hum payza-
lio, com alguns companheiros, para o aííalto: Defprezoufe a
offerta, porq a caluniou de infiel a fofpey ta : Julgoufe por a-
eerto, o que foi defatino , em tempo,que femelhante compa-
nhia perjudicava mais coma retenção; do que podia empe- *
cer com a licença. Deu fim ao faco,o tempo da permiíTaó; &
atendeo o Framengo, à fortificação da Villa, & do Arrecife j
naó porque temeíTe o afíàlto dos noílbs, fenao por ter fogei-
tos, & difciplinados aos feus: Davaólhe cuidado as forças q
defendiaó a barra (eraó duas, a do mar, & a da terra,) queria
franquear o porto a armada, que eíl:ava no mar, & reduzir a
comunicação dos feus a menor diftancia: Preparou fe para ^^,^^^ fe forM»
ganhar por entrepreza a força da terra, prevenindo todos os ^-

petrechos neceííarios para o aíralto,& todas as cautellas para
o fegredo . O Capitão António de Lima, Governador da
força certo do combate, incerto do tempo, o naõ perdia em
fe fortificar, & guarnecer de tudo , o que era precifo para a
defenfa; naó era em todos o§ feus igual o valor j & foi muy to
. . 1 defigual

CA.

i!

loAQ Tefnandes
Vieira fe mete
na Fortaleza da
terra.

Que o íntmigo
intenta tomar
for entrcfre\a.

Da qual Je retí'
ra cajiigaào.

36 C'^sr(^orõ LUSITMO a 6^0

deíigual a conílancia : Perfuadidos da conveniência ,& da
deíconfiança, o defemparáraó todos, menos fete foldados
taõ deftimidos, que defprezaváo o exemplo dos companhei-
ros, por imitar a valentia do Capitão : Deu parte a Mathias
de Albuquerque do que fe paíTava, em occazíaõ, que eftava
prezente João Fernandes Vieira, varão a quem o valor , & a
fortuna fizerão a todas as luzes grande, cujo animo eíperava
occazioens para íe adiantar ao numero dos amios: Achou ne-
íla, o que dezejava , & fem dilação fe offereceo a morrer em
defenfa da força, (como outro Marco Curcio em beneficio
da pátria^) gentileza, que imitarão até vinte moradores , ou
perfuadidos da emulação, ou obrigados do exemplo , Agra-
deceo Mathias de Albuquerque o íerviço,%: António de Li-
ma o obfequio, conhecendo , que guarnecida a Fortaleza de
ânimos taó valerofos acharia o inimigo nella mais cauza para
o defvio, que para o aíTalto . Do valor mais conhecido fiou
o Capitão, o pofto mais arrifcado: Encomendou a Joaó Fer-
nandes Vieira, que no mais perigofo eíliveííe de íintinellaj o
que fes fem interpolação ) três dias , & três noites continuo»
fervindofefeuanimo dodefvelo 5 como o poderá fazer do
defcanço. - ;

24 Sinco dias fufpendeo o inimigo o meneo das armas,
faltando(ardilozamente) á máxima de feguir a vitoria quã-
do guia com ditozos progreíTos a fortuna, ou por dar tregoas
ao braço, ou por fazer mais dilatado o roubo; ou mais que
tudo,por lhe prometer o defejo , que o tempo lhe entregaria
fem cuílo, o que a diligencia lhe naõ avia de aquirir fem per-
da; faltavalhe com as promeífas a eíperança,bufcou-as na in-
duftria, & no mais denfoefcuro de húa noite, ajudada adif-
fimulação do fiíencio, fahio da Villa com 1 6. efcadas , & há
numerofo troço de combatentes efcolhidos; & a paíTo lento
(furtado juntamente aos ouvidos,& aos olhos ) chegou a fu-
bit pellas efcadas, primeiro,que foífe fentido das fmtinellas,
que não tiveraõ mais lugar,que de acordar aos companheiros
com os golpes , com que rebaterão os inimigos, deitando das
muralhas, furiofamente, aos que as tinhaò avançado; & a to-
dos os que oufados osfeguião opprimiraõ com golpes, pe-
drasjSc traves,que fobre elles lançavão^com tal deftroço,quc

dos

1630 ci^J^ElUmplL 37

dos mefmos pedaços das efcadas fes o eftrago inílromentoâ
para a ruina. Para a minorar [com divertir, & ofFender aos
cercados ] lhe deitou o Olaiidès dentro da Fortaleza fucef-
fivas nuvens de granadas, & alcanzías de fogo; porém achou
nelles tanto acordo , efte diabólico arteficio , que apenas
dava na Fortaleza o golpe, quando pellos ares ( a vigilân-
cia dos nofíbs ) os conduzia a executar o incêndio entre os
inimigos . Crecia o dano , fem ceíTar o combate : A refií^
tencia , acendia a furor de huns ; a perfia , augmentava o 1
valor de outros, atè que o inimigo cortado , tanto da
perda , como do defengatio, íe retirou do confli£i:o, deixan-
do a força, com aquella preíTa , que leva quem foge de íl
mefmo, obrigado do horror,que lhe caufavão os feus, ven-
do ao pé delia i$o. mortos, &muytomayor numero defe-
ridos, entre quantidade de armas,&muniçoens^ que aos nof-
fos ferviraó para odefpojo, & para o triumpho , com que
folenizaraõ a vi6toria j a qual naõ pode diminuir a perda
de 4. mortos, & féis feridosj tão merecedores de eternos elo-
gios que os engrandecia a enveja, fem dar lugar a que os cho-
raíieadòr»

■ 2^ Amuytos, quéâviâãpaftádo oliorror dabatalha,
chamou com rizonho femblante a alegria da viâ:oria. Todos
<juerem ter parte na honrâ,muy to poucos no perigo. Algun»
•Capitaés,q trazia retirados a defconfiança, meteo dentro da
força o arrependimento j com elles fe augmentou o numero
dos defenfores,porém não a gloria dos'triumphantes porque
«emleu braço tinhaó fua fortuna. Eftranhou o Framengo os Comete 0 inimigo
levezes delia: Teve motivo nefía occaziaõ, pois nella lhe vi- j^^^'^^^ "^^^ ^
rou as coftas a meínia,que em todas as pafíadas lhe não virou - -

a cara.Com medrozo difcuríb avaliava a defígualdade do ya-
lor,pella defígualdade do poderi&começou a temer aos mef-
mos, q cuílumava defprezar;receavâ de bufcar aos noíTos de
rofto a rofto, avertido, de q vençiaó,fe pelejavaó a cafa deP
-coberta-.fahio fegunda vez a fitiar a Fortaleza, confiado mais
no arteíicio,que na força:bufcou modo com que podeíTe of*
fender,fem fer oíFendido: mandou diãte 6 óo.gaftadof es,q a--
briffem pella área húa eftrada encobertaj&: torcida,cortando
a póta da refl:inga,q divide a terra do mar,pella qual defem-^

D bocaíTe

li

3^ C^ST^HIOTO LUSITJNO 1650

bocaíTe a por íitio á Fortaleza, que logo cercarão de cava, &
trincheiras com proporcionadas plataformas , em que afíen-
• táraó mu}'tas peças debater, & entre ellasimm groffo ca-
nhão, que começou a defmantelar a Fortaleza com a fúria, Sc
braveza, que alimenta o ódio ,& a vingança . Era o edifí-
cio, além de limitado , fabrica lem artef confumido do tem-
po, & do defcuido ] levantado para intimidar a Ongilefa, &
não para refiílir a períia : Com a das balias arruinou, & ca-
hio por tantas partes, que fedava melhor a conhecer pel^
la memoria, que pella vifta , reduzida a forma a hum mon-
te de confufa matéria. A ferro, & a fogo offendiaõ , & íc
Ca/o que^areceo defendião os cercados, em quanto Ouve paredes, que fuf-
míla^^re. tentaíTem a artelharia , que o inimigo trabalhou por defca-

valgar,pelIo feníivel dano, que delia recebia . Pella par-
te, aonde eftava guardada a noíTa pólvora abrio hum pe-
louro húa larga brecha, com mil agre taõ patente, que paf-
fou pella matéria a baila , fem íe atear o fogo na matéria;
parece , que permitio Deos, que naó tiveíTe efFey to nefta
occaíião o incêndio , para que confundido o hereje en-
^ tendeíTe , que o morrer queimado era caftigo, que a ley de-

cretou a perfídia, de que o ceo.cuftuma izentar a fídeli-
dadc.

26 Jà osnoíTos pelejavaõ apeyto defcu ber to ^ a traí-
dos os defenfivos da força, abertos os muros,cahidos os repa-
ros. Perfiava o inimigo óbftinado, tanto à fua cuíla, que átÇ-
prezando a viâ:oria , bufcava a fatisfação na vingança . Aos
noíTos, lhe mofí:ravão as ruinas , enterrados ; poréni á defen-
fa taõ vivos, que receava cometellos por aíTalto , porque de
Valer ofa refifit, huns mefmos fragmentos temia,que a fortuna fabrica íTe para
CIA dos nojos. os feus,fepulcro, & para os noAbs^teatro; & affi determinava
vencer fem inveftir: Já a efte tempo fe via o valor dos Portu-
guezes rendido ao trabalho,&ao defí:roço;inteiros no animo,
poré defí:ituidos das forças: Sabiáoque o focorro era impoíi-
vel,a refiílécia inutil,orifco irrefragavel, o fucçeíTo còtingen-
te;& tomado melhor acordo entrarão em cõçelho cóferindo
entre íi, quanto melhor acerto feria, livrar as vidas de húa
morte inútil, para as aproveitar em húaoccafiaõ ditofa,quc
cntregala a eípada inimiga com gloria fem fruto : refolve-

raófe

tucilio C.

1630 fpJIlTE 1. L1V(^0 Ih 39

mofe na entrega , confultando entre fi os partidos. Enten-
de-o hum Eftrangeiro (c]iie entre os nofíbs era Condeftavel
da artelharia ) cuja fociedade parecia )à,fatal oppofiçaò 4o3 •
progrefíbs de noíTas armas j & adiantandofe fiia diligencia á
noíla reíbluçaõ levantou húa bandeira branca , fafendo com
ella chamada para a entrega. Acodio o inimigo ai voroçadoj
paííarãofc reféns de parte a parte,íahio da Fortaleza o Capi-
tão Gil Correya de Caftello-Branco a ajuftar as condiçoens
da entrega, q fe concederão, como da noíTa parte fe pedirão.
27 Com armas, & moveis,trazendo corda ace2a,&
baila em boca íahiraõ os Portuguezes, & com liberdade pa-
ra dií porem como quifeíTem de fuás peíToas . Digna de glo-
riofa memoria ( como acção própria de Joaó Fernandes ^^^fc rendem a
Vieira ) foi húa generofa avertencia , que nefta occafiáo te- ^^^ ^ °''
ve. Não fe lembrarão os rendidos da reputação ,, que per-
dião nofías armas, deixando as bandeiras delRey, &iníig-
nias dos Cabos da milicia expoftâs ao defprezo inimigo. Po-
rém aquelle coração animado fempre de generofos efpiri-
tos , menos ambiciofo da vida, que da honra, teve cuidado
demandar a hum moço feu, que recolheífe a prata da gi-
neta, & a enrolaíTe em fia bandeira do Capitão Affonfo de ^^W«-í\:.-
Albuquerque, que era hum dos rendidos; & cingindo confi-
go meíino outra, as falvou ambas do opróbrio : Lembran- j^^^ Fermnâes
ça verdadeiramente toda do valor, & nada á^comoáiàir ruiy afãs com q
de, devendo á fua memoria o ferviço que fazia , & não o rif- nhpadeão nof-
CO, a que fe expunha . Gloria foi de Lucilio fer nefta genti-/^^ ^t^^'^^-.
lefa o primeiro^porèmmais fe deve gloriar5deXer nella Joaõ
Fernandes Vieira o fegundo. . . .

28 Com admiração olhava o Framengo para os Portu-
guezes, quando ao entregar das armas numerou as peílbass
Exceffivo numero lhe dava o dano j mais que limitado o a-
chava a conta ; via inumeráveis contrários , em tão poucos
rendidos 3 & corrido de fafer eftimação de tão reprehenfi- -
V el V iftoria, tratou de cobrir a falta da reputação com a da
fé : mandou aos rendidos , que juraífem de não tomar ar- ,
mas contra os Eftados, por tempo de féis mezes: Era contra o
paftoado nas códiçoens da cntrega,& o recufarão, vencendo
em todo o eílado â fua própria fortuna . Não eftima o Olan-

D 3 déâ

w

iii

<

mi

4Õ C^^T1(Í0W iXmTAlSlO xé^o

dès os foros da milicia, porque fe^rezamãis deeoffarro, que

debriozo . Faltava âús rendidos a liberdade para a eícuíà,-

porèm não lhes fakou pafâ á efco^lba, & fi&rãõ eleição, antes

,. . de padecer, que de delinquirytendópormenos perdera vi-

^^ da , que encorrer na mmmia. V íngoute ã 1 1 okneia , da eoni-í

^* íancia com' a éondenar a penofo cárcere: AppelloiT a pacienr»

cia para os beneficios de» tempo, & deípois de pafkdõs algos

dias alcançou, o que náó pode eonfègujr â reiaÒ; . itlegávaã

por áia pârtê^ que quân^do oi ju-ramento Í€ devefíe o avkõ d/e;

fazer oGàpitão , & o Tène^ite , & nãô os íbldados . Menos

o podéraõ acabar com os dous , quíí com todos contos. C o¥-?

ridos dbpotteo, que obrava a importunação, & o rágorde-

raõ liberdade ato dôs,mas com t^nto pena, que ncUaacháíaã

o caftigo dé íua Gúlpíju . .íj3:j";:' \<'?\C ■ -7

~::i=^- Néftas diligencias, doutras menos diecoroíàs ga^

tóu o iíiimigatodô o mes de Fevereiro : Entrou o pnmeiro

de Março, & ao fegíindõ dia fes emèaxada a noííà Fortaleza

do fifiífr, que íé entrega-iè, & lhe daria bom quartel ; porque

fe efpefaífem, a que a rendefíèpór armas , fem: diftinção de

peííba, a peffoa os avia de paffar todos á eípada . O Capitão

IZ^lEaFml ^^^^^^^ Pacheco, que governava a força, conlultou com os

kzldomar, ^^^^ foldados â repoftâj& fahro decretado, que fe entregafíè,

pois fe viaó fafltos de meyosp^ra a defender , & fem efperan-

ça de focorrOypara q a prezéte necefíidade podeífe appellan

V Oppoífe à refòluçáo oTenente Pedro Barbofa com differen-

te parecer, dizendo, que Matbias de Albuquerque lhes fiará

âquella Fortaleza para a defenderem com o animofos,& naó

para a entregarem como cobardesjque em o faferem,primei-

Tb encorriaó na infâmia de deíleaes , que de medrofos 3 que

faltava à eflencia de varaó, & de vaífa]lo,quem entregava ao

ameaço, o que devia de defender a golpes j que a honra dos

homens brioíbs era reíiilta do fofrimcnto , & naó da átM~

V peraçaó.Qiíe dirá de nós o Olandès (dizia elle ) vendo, que

55 nos vence com palavras fenão , que nos enttega o medo , &

Fotãooí dopre^. nâo a nCceííidade ? Efta Fortaleza naó mudou o fer àeC-

dio, ^'^^^''^^^^- pois,quenosobrÍ8;amosa fnílentala; pois logo com que

nUirm contra, pn- ^ • y ^ r ^ t ^ ^^ ^

recer do Tencn- ^P^^^^^c^a de dclciilpa aavcmos de entregar Icm combate

te. „ ao inimigo ? Quem vio a valerofa refillencia , cem que a

n noílbs

noffos olhos fe defendeo a Fortaleza da terra , que hade di- ,5
, 2er íenaõ , que pode mais cònoíco a cobardia , que o exem- ,^
pio 5" Efperemos oíitio^ provemos as forças com o iniml- ,,
go, & quando nos olhe de revés a fortuna, lugar nos fica pa- ,^
ra paâ:uar a entrega, fendo certo, que milhores partidos ave- ,,
mos de tirar com a efpada niia, que com ella embay nhada. ^^ -
: 3O' Ouviofe o parecer do Tenente com mais tumultOy
que a tenção^ & não obrou mais , do que obra a prefuaçaõ
em ânimos obftinados . Viafe perplexo o Capitão entre os
votos da comodidade, & da honra,não fabendo efcolher por
mais feguro, nem o afrontofo, ainda que era de muy tos, nem
o deftimido, porque era de poucos. Nefta ambiguidade dei-
tou maó de hum meyo, que o efcuzava da efcolha, em quan^
to fe dilataííe o tempo da refoluçaó ^ refpondeo ao enviado,
que fe lhe cojicedeííem três dias, para confultar nelles ao feu
General Mathias de Albuquerque,ou para que o focorteífe^
ou para que fe entregafíe paífado efte termo . Colheo o ini-
migo, pella modeftia da repofta.as diípoziçoens dos ânimos^
& certo de que fem defembay nhar a efpada , avia de ganhar
a força, toí nou logo a enviar o menfageyro com fegundo re-
cado, que não concedia três dias, nem três horas para a dili^
beraçaõ^ que fe logo, logo fe fe lhe naõ fizeífe a entrega , os
cõdenava, a todos,aos exceífos da ira.Naó efperou mais Ma-
noel Pacheco para fe entregar , porque feu defejo naõ eípe-
rava mais para o fazer : E aíri,deixou nas mãos do inimigo a
Fortaleza municionada-, & inteira, de forte, que fe podia
prefumir entrara nella para lha guardar, &naó para lha de-
fender.

31 ComomeíiTiò cabedal, & com a mefma fortuna fe
fes o Framengo fenhor do Arrecife, fem inimigo, que temcf-
fe , nem temor, que o afíàltaííè. Mathias de Albuquerque
com als^uns poucos, que o feguia5 fe avia retirado aos matos
bufcando nelles amparo para a defenfa , & não auxilio para
a oppoíiçaó. Celebrou o inimigo o goílo da viâioria com re- Vezaforos exf^
petir os motivos do efcandalo,entrcgandofe mais licenciofa- '^^[^dos pdo he^
mente aos facrilegios, aos roubos , & as violências , com táo ''^^^'-
publico ludibrio da naçaõ, & da Rehgiaõ , q fahiaó dos Té-
plo3 veílidos nos paramentos fagrados, Sc nas becas das con-

D 3 frariasj ....sí^'

m

42 C^ST^IOTO LUS2TJN0 1630

. frarias, reprefentando fna alegria com noíTa injuria . En tra-
vão nas cazas deftinadas para tribunaes da juftiça , & do go-
verno, & com defprezo, & farça davaõ a beber aos morado-
res a dor , mais fenfivel pelJa amargara da afronta y que pello
ingrediente da perda. Crecèraõ nefta occaziaõ as exorbitân-
cias ao paíTo , que creceo o numero dos agreííbres ; tinhaóíe
recolhido para o porto todas as náos da armada , & todos os
marinheyros tinhaõ faltado em terra: E tanto quanto crecè*
raõ os inimigos em numero , tanto crecèraõ os iníiiítos no
exceíío; & para que em nenhúa parte foíTe diíFerente nofla
fortuna ordenarão , que húa efquadra de fuás fragatas cor-
reíTe os mares daquella cofta, para que lhe cahifem nas mãos
todos os navios de Portugal, que ignorantes do íiicçeíTo buA
caíTem os portos daquelle eftado: Naó foraó poucos , os que
entre a fegurança , & a noticia , experimentarão hua mefina
forte em taó diveríbs elementos.

*i ., , .- -

I

PARTE I. LIVRO III

O D O S os corpos fublunarcs fo-
bem com violência, & deçem por na-
tural apetite, que tem a buícar o cen-
tro: A gravidade da matéria, que lhe
empede o fubir , lhe facilita o deçer.
Aos corpos naturaes imitaó os artifi-
cioíbs . O edifício quanto mais tem
de corpo, tanto mais tem de pefo: Na tardança de lua eleva-
ção fabrica o mayor precipio de fuaruina: Condição infe-
paravel dos artefad;os da politica. De hum mefmo principio
naçe a declinação dos eftados, & dos ediíiciosj fua conferva-
çaó confifte no redo de fua fabrica, porque não acha mey o
entre o declinar, & o cahir. O remédio da oppoíiçaó, he trif.
te remédio; quanto mais detém a cahida, tanto mayor fas a
queda.Poftrado húa vez o edifício ainda,que os matérias for-
mem altos montes de fragmentos naó infundem eftimaçaõ j As monarquias
rezaó, porque todos fe atrevem a paífear fobre o cahido. Fa- cahem com o fe-
bricou Roma feu Império com a efpada do valor, & da iufti- ^ ^<^ fa^ gran^
ça 3 conter vou-o com o reipey to , que as naçoens ti verão a
fua grandeza 3 declinou de íèu eftado, & apenas teve o Mun-
do naçaÕ, que não paíTeâíTe a Roma. Algúas vezes fe empe-
nhou aquella Monarquia no reparo, porém como fe forma-
da das porçoens do eftrago,ferviraó os remédios de apreílàr a
ruína; falta valhe o arrimo da eftimação,& femdifículdadc
acalcou o defprezo. As muralhas não fe temem pella matéria,
fenáo pella forma . A própria experiência he a melhor dou-
trina, porque informa de mais perto.

2 Ganhada pello Olandés a Villa de Olinda , &: a po-
'"^ T) ^ voação

mp

44- C^ST^I OTO LUSITANO 1630

voaçaõ do Arrecife cabeças daquelle diftritq, com todas
. , fuás fortificàçoens, logo fe vio declinar o corpo de toda a
j cap^uma de q -^^^'^^^ ^'àh parte fuperior começou a ruina, & naÕ
ode fuA defatm- o^-^ve parte,aonde íenao temefíe a opreíiao, virao o edihcio
cmÍ abalado do golpe, & fugirão do ameaço . Achavafe Ma-

thias de Albuquerque retirado , & aíTiftido dos moradores.
('Os mefmos , que o def emparàraó na refiftencia , o fegui-
raõ na fuga .) He niuy povoado o feguro, muy folitario o
perigo.Tratavaó do fucçeíTo^todos fe confrangiaó, nenhum
le culpava. A calamidade , que lhes fafia conhecer o erro,
Ihesfafia defejar a emenda. Perfuadiaõ ao General a op-
poziçaó, que a feu tempo lhes não pode perfuadir o Gene-
ral. A nada diferia , para que na tribulação eíludaífem o
valor. A fortuna he o efpelho aonde melhor fevé o animo.
Grécia em todos a aflição com os dias , & no General a con-
fiança, de que o infortúnio reftituiria aos feus o fer de ho-
__ mens, fenáo difciplinados, deftimidos : com efta efperança
lhes dificultava a empreza, para que na intenção do defe-
co, fe fomentafíe a oufadia:Induftria , de que ;à fe valeo Jú-
lio Cefar nos campos de FarfaHa.

3 Satisfey to Mathias de Albuquerque da importufta-
ção,com que fua gente operfuadia a tomar as armas, cha-
mou a concelho j dos foldados os mais práticos , dos mora-

, , , f • dores, os mais ricos: a eftes para os obrigar, aquelles para os
chama líathíâs . ' _. , ' . . ^ 8 3 ^ r

de Albuquerque OMvw: . 1 mha entendido o pouco, que importa tudo , o que

os moradores a nos concelhos fe refolve , fe falta cabedal com que fe exe- '

concelho, .cute . Propoz a huns, & a outros o quanto convinha a todos

defcubrir a cara ao inimigo j & foi dito , que falara na for-

->•) ma feguinte . O Olandés naõ fe empenhou no exceffivo

- 57 gafto defta armada pella reputação de íuas armas , fenaõ

53 pello intereífe de noíTas drogas : Efta naçaó , como tem mo-

37 ftrado a experiência , em tanto exercita a milicia , em quan-

53 to lhe abre caminho paraaambiçaò j disfarçaõ o habito de

33 piratas , com o de foldados ; naó fe arrifcaó pella viéloria,

35 fenaõ pella riqueza. Ajudada fua força de noíTa defgraça

Propõem a guer- fe fes feiíhor de noíías cazas,&fazendas^fe vieraafaquear,

^^' 77 confeguido o roubo largara a terra : Fortificaffe nclla j que

33 duvida 3 que he com deíignio de nos desfrutar os campos.^

i ■ ' 'Se

i: li

Se achar oppoMçaõ mudara d-e intento j pois heeerto, que ^r
para liie colher os fi-utos, os hà de cultivar , ou nofíà íogei- 57
ção, ou fua induftria ^ & para o não coníeguir , bafta, que o •>•>
Raó favoreça, nem ofofrimento, nemaomiflàó, o que fio 55
de ânimos , que íabem. eRimar a honra , & íentir a perda. ?>
Dous meyos nos podem couduf ir a efte fim ; ou o da çon- 5?
quifta cafiiigando a injuria, ou; da defenla , não permitindo a ■>•>
itivazão : qual defiies >íè deu a efcolher por mais feguro dirá o 7?
parecer de tantos zelofos 5 &interefíados quantos feachãojj
neíle congreffo. ?>

- ^4:: Semcontroverfiaferefolveof a guerra defenfiva, por-
que com ella feefcuzavao difpendio, & ao inimigo fefafia ^^"^^ os farecc
may or dano; Dizião, que a guerra oienfiva de nenhúa for- ''"'
te poderia fer, nem bem procefílida, nem bem fuccedida, ef-
tando o inimigo fimhor do mar,aonde tinha â mão os íocor-
rosj rezão , porque aconquifíallo por cerco feria inútil ^ &
irapoíTivel por aíFalto, fortificado ^Scvidorjofo, principal-
mente quando o afíàlto , & o cerco fe avia de exercitar por
aquellesmefmos braços, que o inimigo experimentara tão
remiíTos-.E dado ca2o,que recebeífem da confideração o ani-
mo, que lhes roubou o fobrefalto, como fe poder iaõ efque-
cer do temor,que lhes infundiria o lugar do confl iâ:o? Quem
vio femreceyo a parte, aonde lhe fuccedeo a defgraça?
Qiiem vio o contrario,de quem recebeo a ferida,que lhe não
kmbraíTe o golpe? O medo recebe os exceíTos mais da coiv
fideração, que do perigo. Com a guerra defenfiva (difíão to-
dos) fe porão da noíTa parte as ventagens do contrario,por- Refilucao , que
que apartandofe de fuás forças para nos bufcar, nem o mar q netlefe toma.
pode focorrer , nem fuás fortificaçoens lhe podem fervir^
nem o terreno o pode ajudar.

^ Concordes nefta parecer , íahio Mathias de Albu-
querque acompanhado de todos, a bufcar fitio regular, &
conveniente, para nelle fe fazer húa Fortaleza , que ferviíTe
ao intento. Por eleicaó dos mais intelligentes foi efcolhido
hum outeyro, que fenhoreava toda a circunferência , pofto
pella naturefa em tão proporcionada diílancia da Villa,&
do Arrecife, que de húa, & outra povoação ficava húa gran- ^a-fiao os mffos
de legoa. Dezenhoufe a força, poífe mão á obra, & ao paífo^ híu Fortaleza,

que

4^

CAsr(^oToLUSirjno i-égo

' que crecia o edifício creciaõ os Toldados , & moradores ( atè;

entáo difperfos ) eftes para viverem à Ibmbra da fortifica--

ção, aqueiles para fervirem a obra^ dandofe huns , & outros

í tal preílà , que pondolhe a primeira mão miiytos diasanda^

<-ídos de Fevereiro, lhe derão a ultima antes de acabado Mar-

' ço. A hum mefrao tempo fe v io húa Fortaleza fabricada ao

moderno , & ao valente j & húa povoação eregida da fegu-

- ranca,& da comodidade^cu/â união deu âFortalezaj& àpo-»

voaçaõ o nome de ArrayaL

6 Com os olhos de fua foberba, via o inimigo noíía deí^i
graça , & animado de fua fortuna defcanfava nos feguros de
fua confiança; fe bem^que muy tas vezes aíTaltado da ifenção
Intenta oinimi- dos moradores, cuja liberdade imaginava oíFerecida aospès
gogmhaU. ^^ feu dominiojcomo rendida ao primeiro golpe. Enganado
defta prefunçaó , deu lugar feu defcuido, a que fem impedi-
mentofelograííe noíTa occupação,chegandolhe as noticias
da nova fortificação tão fora de tempo para a empedir , que
a vio )i quando eftava capaz de nos defender : Aconfelhoufe
fua opinião com o defprefo, & parecendolhe , que fe adian^
tava muy to feu defignio fe lograíTe o fruto de noíTo traba-
lho, deu por bem affortunado feu defcuido. Efcolheo entre
■ os feus,oy tocentos foldados 5 & em catorze de Março fahi-
rão da Villa de Olinda com deliberação de nos ganharem
por aíTaltp a povoação,& a Fortaleza do Arrayal , que nefte
tempo ainda não avia chegado a fua ultima perfeição ^ po-
rém mais defenfavel, do que a imaginava . Tinha affentado
confígo, que os Portuguezes embebidos na obra,prímeiro
conhecerião o aíTalto pellos golpes , que pellos avizos. Fun-
dava efte difcurfo napromeíTa de hum Framengo chamado
Adrião Franco pratico nos caminhos da terra ( )à fica dito
como vivendo entre os noíTos fe paíTou ao inimigo , quando
ganhou a Villa ) que fe ofíereceo a guiar os Olandezes , por
veredas occultas, & faltas de fintinellas.

-7 Seguindo os paíTos do fobredito guia fe poz o inimi-
go em marcha muy to antes de romper a manhãa ^ & naó fey
íe a ignorância, fe a malicia o levou por taó dilatados rodeos,
quegaftàraõ muy tas horas em jornada para a qual bafiava
húajdando largo tempo ao confelho3& á prevenção dos nof-

fos.

Manda Mathias

erque

■16^0 ^À^EI.LIV^ m. 47

ío^. Mathias de Albuquerque,que avizado das fintinellas via
o informe da povoação, a imperfeição da Fortaleza, & o po- -^"^^^J^ ^^
der com que o Olandès o bufcava ( com militar acordo ) or- cortarlhe o plffo,
denou aos Capitães Joaò de Amorim, Luis Barbalho, Mar-
tim Ferreyra,^ Pedro Manoel Pavaõ , ' & outros ^ que com os
Coldados de fuás companhias fahifFem a ter o encontro o ini-
migo; o que fizeraô com tanta deftreíà, prudência, & valor
(eftava oFramengo emefquadraõformado nofitiochama-
•do Agoa Fria ) que hum mefino tempo lhes fervio de ver, ^'"^^ desUrata"
•enveftir,& deftro^ar o Framengo; naó lhe deixando o fiiror ^^'
mais remédio, que o da fugida; dequefevaleo comtalcon-
'fiifaõ,& defordem como dirá o fucçeíTo. Seguirão os Portu-^
guezes o alcance, porém comofaõ mais ligeiras as azas do
iiiedo, que as da ira,fó Manoel Dias da Franca(peíroa até en-
tão por fua calidade bem conhecida , & defpois muyto mais
•eftimada por íeu vaIor")montado em hum ginete feu o foy fe- ., , ^ ^j.
guindo,termGo,&matando,íem aver tramengo,que o iiíaííe ^^ Manoel vias
^irar a cara para ver,que era hum fó o que os picava ; até que da Franca,
o enveftío hum tropel de muy tos, atempo, quefelherom-
peo a cilha,& com a Êíla cahío do cavallo entre eHes: Julga-
rão a deígraça alhea por dita propria^viaó que muy a feu fal-
vo o podiaò matar , & tratarão de o fazer; mas o valerofo
mancebo fe defendeo, & defembaraçou de todos com tanta
gentileza que nem recebeo ferida , nem perdeo honra , aju-
dando-lhe nefta occaííaò a ganhar muyta hum mulato feu, q
com húa efpada, & húa rodela obrou maravilhas . No tempo
do conflito matou Luis Barbalho hum Frameogo de hum
tiro,& julgoufe a forte por valentia,porque ás galas do mor-
to deraó eftimaçaó à forte; naõ a tiverão outros muy tos,que
obrarão com femelhante fucçeíro,porque naó achou,em que
fe fevaíTe o aplauíb. De contado pagou o Olandès as cuftas:
Qiiarenta mortos deixou no capo, alguns no camínho;os fe-
ridos (que foraó muy tos) fal vou a vezinhança da Villa. Re-
colheraòfe os noííbs a celebrara vi£i:oria,que de todos foy a-
clamada com exceffivo gofto: Foy o primeiro diadebonan- ^ n -^ . . rr,
ça, que deípois de tao continuada tromenta, nos concedeo a ^^a^ ^lãona a
•fortuna, & no defcuftume trouxe a eftimaçaó. fer primeira.

S Obrado defte fucg^eíTo augmentou de forte o nume-
ro*

QASr%l0ro LUSITJKO

1630

ro, & animo dos Portuguezcs, & índios, que Huns, & outros
fe davaó por feguros das armas contrarias ,& em muy tos re-
fucitou a efperança de fe cobrarem no perdido . Aconfelha-
vaó a guerra os melmosjque fogiraó dos rebates,reíblutos,ou
?xaballa,ou morrer nella.Determinoure,que íenaó perdoaíTe
a hoftilidade, que podeíTe fer em dano do inimigo j & lè lhe
Com eHa to??íâo moÚYãííh com evidencia o engano de fuás eíperanças , em
forma mjfas ar* quanto à tenção de fojugar a campanha 3 fafendolhe enten-
^^\ der,que primeiro os avia de achar fepultados , que obedien-

tes.Mathias de Albuquerquc,que media a efperança dos fuc-
çeíTos pella demonftraçaõ dos ânimos , não temia , defejava
occaíioens para as viâ:orias. Vio a Fortaleza pofta em fua ul-
tima perfeição (com.plata formas, terraplenos, parape)/ tos,
contra efcarpias,cava, pentes, trincheiras , & eftacadas , que
cingiaõ a força, & a povoação) a guarneceo de reforçada ar-
telharia de bronze,&ferro,& de fufficiente prcfidioiConíig-
nou os poftos a particulares Cabosj & para novos empregos
criou novos Capitaés,(aíri agora,como pello tempo adiante
nenhum fobio ao poílo, q não foífe pello mereciméto de feu
braçojentre elles nomeou a Joaó Fernandes Vieira por Ca-
pitão dos batedores, que de noite, & de dia aviaó de aflègu-
loto Fernandes rar o campo; achou na peífoa todos os requifitos , que pedia
Fieira Capíaoje q cargo j foi fua efcolha pronoílicojde que o valor, a que en-
Wí^^rar o capo. ^^- ^^^^ - ^^ moradores o feguro , defpois lhe avia de meter
em caza a liberdade. Hum coração grande revê eni todas as
idades,& por todos os fentidos.Obrigado deíla mefma rezaó
deuMathias de Albuquerque a Henrique Dias a gineta de
Capita5,& Cabo de muyíos negros minas , & crioulos, que
com animo intrépido, & fiel fe alliftãraó,para fervir na guer-
ra.Parece que com eftes iníignes Capitães, nos contrapcfou
o tempo infignes perdas: E bem fe pode affirmar, que cora
elles nos deu mais de reputação , do que nos tirou de impé-
rio.

9 Via TheoderoWamdemburg Governador das armas

Olandefas, a confufa defordem,com que os feus foldados fu-
girão de noífos golpes, antes de aviílarem a Fortaleza do Ar-
rayal; ponderou as circunftancias, & tiroulhe asconfequen-
cias: Era foldado , fabia a impreíiàó , que faz nos coraçoens

dos

I é50 fAVjE I. Lir\0 111. 49

dos homens o medo, & concluio 3 que mal fe podia efpemr a

conqoiíla, de gente que com tanta vileza fugia á refiítencia: ^^''^#V^ J' ^^■^-
_^ rrrii 11 ri miip em toda4 as

Começou a temeiie aíialtado, aquelie melmo homem , que ^^^^^^^

de todos fe preftimia obedicido . Affí proílou hum revés da
fortuna a mais levantada fabrica da dita. Entrou em tão dif-
ferentes cuidados,que efquecido de bofcar meyos para ferir,
excogitava m.odos para fe reparar. Occupou os foldados:Sa-
cou húa groílà trincheira por fora da povoação de Sando
António entre os dous Ptios, & o mar com info portável tra-
balho dos {éã.?,^ pella natureza do terrcno.Com o meíiiio cui-
dado fortificou a Viíla, naõ íè dando por feguro de noílk ou-
fadia,nem ainda, aonde íeus reparos o tinhaõ mais guardado.
IO Por horas tinha Maíhias de Albuquerque avizo de
todos os movimentos do contrario: deraõ-lho , de que o ini-
migo levantava húa trincheira em hum fitio fronteiro ao nof-
fo Arrayal , que chamavaó a Ilha de Marcos André, dentro
da Campina do Taborda: (fabrica,que fazia crecer fem tépo
a multidão, &apreíía.) Naõ permitia o negocio detença j
chamou os Capitães, deulhes as ordens , encareceolhes a im-
portancia,& em 1 8. de Março íahio do Arrayal António Ri-
beiro de Lacerda com 700. folda<3os entre Portuguezes, Mi-
nas, & índios a defalojar o Framengo, & desfazer a trinchei- Da pinàpo â
ra. Embofcou a gente, & mandou ao Capitão Franciíco Re- hm trinchara.
bello Qiluílre pello diminutivo de Rebellinho a quem as pré-
fas fizeraò mayor, que feu apelido,) que com vinte foídados
foíTe provocar ao Olandés , aquefahiffeapelejar. Deufeo
Framengo por afrontado do atrivimento , fahio a caítigar a
demafia fiado nas ventagens^ de feu partido . Naõ viràraó os
noíTos a cara ao encontro , antes diíTimulando o intento , fe
foraó retirando, em ordem a meter o contrario na embofca-
da , que o inimigo fofpeitou fobejamente cauto, &fesalto
com fiia gente. O RebeIlinho,que penetrou a caufa,correo a
avançallo, taõ deftimido , que o Framengo , cego da cólera,
perdeo de v ifta o recey o , & o carregou , affi furiofo , que fe
meteo no coração do perigo, conhecendo o erro a tempo, q ^

lhe fritava o remedio.Sem refiftencia fe pozeraõ os inimigos
em fugida, baftando aquella detença, de que ReceíTitou a eí^
colha, para deixarem cincoenta mortos n o lugar da batalha;

E naõ

t^a C^ST^IOTO LUSITANO 1650

naó entrarão ncfte numero os que perdeo no alcance, perie-

- guido dos nofíbs por algum efpaíoi& atè a foa trincheirajde

Pagaacmfiança. ^^^^ mancebos de cavallo, alanceando a todos, os que alcan-
çaváoj fucçedeo a hum dos oyto levar debaixo da lança a há
Olandés taó animofo, que com o mofquete defv iou o golpe,
& o defcarregou tão defatinado no Cavallciro , que cahio
em terra aturdido: Foy fobre elle para o matar , porém husi
dos companheiros (de 1 8 . annos) o li vrou,tírando a v ida ao,
Framengo. Nefta occaíiaõ fes hum Olandés tiro ao Capitão
Rebelínhocom húa machadinha , que o ferio pella fuperfi-
cie do nariz. Adivinhava, que naquelle Capitão tinha Olan-
dés tantos Gontratios, quantos eraó os fentidos: Para efcapar
de fuás mãos não aproveitava ao Framengo furtarfe-lhe à vií-
ta, porque o defcobria pello olfato . Naó difem noffas rela-
çoens em que poder ficou a trincheira^ affirmão , que nos re-
colhemos com 2 6. feridos, fem que da noíTa parte ouveffe
morto. Quis a fortu na, que o goíío foíTe íèm lut o.

II Com fe trocarem as fprtes,trocàraó cores os ânimos.
O inimigo occupado do medo perdeo todo o orgulho , que
o faíia atrevido: os noíTos animados dos íiicçeíTos , bufcavaõ
occaíioens, que os deixaíTem vingados :Favorecidos do clima

^ j^he quente , & humedo , & em pouco tempo produz o ter-

reno crecidos arvoredos, & pellos alagadiços, denfa mata de
mangues 1 fe foraõ melhorando nos poftos cobertos das ra-f
mas, donde fahiaõ a fafer continuos aíTaltos , com grande da-*
no do inimigo . Naó era fenhor o Framengo de paffar a dif-
tancia,que fe intrepoem entre a Villa,& o Arrecife fem com-
panhias de guarda j & nem aííi fe defendia de noíFas embof-
cadas. Em 2 6 . de Março fizeraó as íintellas avizo, que o Ge-
neral das armas Olandefas acompanhado de hum feu Coro-
nel,fe difpunha a paílkr do Arrecife para a Villa comfeifcen-,
tos foldados de guarda, (ou por decoro,ou por medo)o que,
entendido por Mathias de Albuquerque , nomeou por Ca-
bo de algúas com p^nhias a Pafcoal Pereira, (foídado de opi-
nião) deu-lhe por ordem , que de embofcada efperaUe o ini-

o €enerdoUn- ^■^, q fueçeíTo acreditou a efcolha : Sahiraó os noíTos da

des /i faltado dos ir-i a- r • t- o i

mífosfcfeaunha emboícada com tanta diíciphna,ò^ tanto a tempo, que de-
íordeji^do,&: roto o Olandès,dcu as coílas às bailas juaó ou-

di; tavdlo.

VC

I é^o fJ^TE L LIF^O IIL 51

.veal^um,aqiiemreviíreacara:Oprraieiro,que no conílic-
to fervio ao exemplo, foy o feu General, & andou tão ven-
turoíb, que encarando nelle o Capitão Luís Barbalho hua
clavina, o. não derribou o tiro, porque não lhe tomou fogo:
A unha de cavallo fe poz em feguro , levemente cortado do
noffo ferro porhum hombro, porém muyto mais do me-i
do, deixando os íeus no perigo, a que não podéraõ fugir
49 . que ficàraó mortos na campanha , & muy tos outros,
que perecerão no alcance: Sem conta foraó,osque mata-
rão os índios, 8c as ondas ; por efcaparem ao ferro, fe deita-
vaõáagoa,&nella viaó, que a morte com dobradas armas
lhe tiravaavida.Recolheraõfe osnoíTos fcm morto, nem
ferido, com que a viâ;oriafeaplaudio fem fangue, & fem
enterro o triumpho , para cuja pompa não faltarão Ca-
tivos.

Defta occaziaõ por diante foraõ todos os dias favo-

12

raveis a noíTas armas: Não podia o inimigo fugir à nofía for-
tu na , affi porque a v ezinhança o provocava, como porque
a neceffidade o conftrangia . Por nenhúa parte fahia de fuás
fortificações , que fenão enredaíTe no laço,que os noíTos por x)ífpoziçao com
todas lhe tinhaó araiado. Direi a forma da fituaçaó de noíTas que cercamos o
Eftancias, para que fe entenda o como noíTas armas o tinhaó '''^i^fgo aoUrgo,
cingido : Correndo da parte do Norte para o Sul em húa
Hermida de Santo Amaro , fe aquartelava Mathias de Al-
buquerque Maranhão com gente da Paraiba, que acudia
a fervir na guerra. SeguiaíTe a Eftancia do Padre Manoel
de Moraes, que guarnecia com índios de feu partido igual-
mente difciplinados na religiaÕ,& nas armas.Logo a do Ca-
marão có os índios de feu governo, que eraó todos aquelles,
com que ncftes principios fe veyo ofFerecer,para fervir.Pou-
CO diftante ficava,a que defendia o CapitaóEftevaõ Alvres:
Junto ao Buraco de San- Tiago tinha íituaçaõ a feguinte,
que prezidiava o Capitão Luis Barbalho (Era amais ar-
rifcada , & íioufe ao Capitão mais deftimido) A efte modo
continuaó os quartéis pellos fitios de Beberibe , & Seca en-
comendados a diverfos Capitães; dandofe as mãos huns
aos outros de forte , que com facilidade fe podião fo-
correr . Conflgnaraófe troços de gente efcolhida a diferen-

X Ea tes •

:l);i.

I . , .;.

-55 CAST(!(J0TO LVSlTAno 1630

tes Cabos, que por turno rondaíTem, & dercubriíTem as
áiítancias, que fe entrepunhaõ entre huns , & outros quar-
téis . Defta maneira naõ podiaó deixar de fer quotidia-
nos os ãíTaltOs j que naõ particularizamos pella femelhan-
ça dos fucçeíTostEftesnão osdiverílficaõosdiasyfenãoos
eafos j & tanto emfaftia oquemuytas vezes felé, como o
que muy tas v ezes íe ou ve: Ainda aííl náo faltaremos em re*.
firir aquelles encontros ^ que variáoemalgúas circunftan-
cias.

13 Na Viíla de Olinda fez o inimigo , em 1 6 . de Mar-
ço paga gèral a toda a gente da milicia : Ao tempo que em

rderofa refolu* ítifíii^s V oitavão Com O foldojquetitthaõ recebido, anda vaõ
^M dos mjfos, 60. índios nofíbs ( de que era Cabo Joaõ Mendes Flores)
trabalhando em húa trincheira no íitio do Buraco de San-
Tiágo: Dous íbldados Mamakicos, que eftavaõ de pofta ao
largo fizeraó avifo aos índios da boa occaziaõ , com que os
rogava a fortuna : E animados com a eíperança da preza
deraõ fobre os Framefígos com hum repentino aíTalto de
vozes, & cargas j matáraó amuytos , & atordiraó a todos , de
tal maneira, que occupados dopaímo[reprezentavalhe a
imaginação , que todo o noíTo poder os enveftía ] que nem
lhes deixou liberdade para a fugida , nem animo para a de-
fenía . Oy tenta degollou o ferro ; muy tos mais os que atou
o grilho : Aprovei tàraõfe os índios de armas , veftidos,
& foldo de todos, trazendo diante de íi os cativos, que
ferviraõ de credito a grandeza da vidoría, &: a fama do deí^
pojo.

14 Já neíle tempo tinha o General Oíandés perdida ^
lembrança da conquifta; naõ fahia feu cuidado fora dos ter-
mos da defenfa: os fucçeíTos, lhe repitião os avizos^as perdas,
osdefenganosimediaoreceyopello dano j & naõ fabia feu
cuidado achar dcfcanfo, nem ainda nas promeííàs d o àt£t]o.
Com individuais noticias, do que dentro no Arrecife fe te-
mia , & fe obrava ordenou Mathias de Albuquerque a

Jphãffe a po- todas as Eílancias , que a toda a hora o inquietaííèm com
Toaçao eS.An- ^^^X^^ por todas as partes, para que o temor do perigo

f#.

avertiíTe ao Olandés, que no íitio que occupava,nema-
via de perfeverar fem fangue ^ nem avia de viver fem
^j V . guerra^

i^3í> ^âXTB l L1V\0 HL ^5

guerra j & porque naõ imaginàíTc, que noíTa efpadalhe na5
poderia chegar por curta, íe reíolvèraó osnofíbs abufcalo
dentro de fuás fortificações . Cercava húa groífa trincheira a
povoação de Santo Antonio,(a q defpois chamarão Cidade
de Mauriçèa ) a qual aíTi pella forma, como pella guarnição
era o fiador de toda a confiança inimiga: Efta determinarão
os noíTos enveftir , & ganhar ; & arrazada conduzirlhe a ar-
íelharm (que era muyta,& groífa Jpara o noífo Array al.Fiou
o General a empreza a António Ribeiro de Lacerda, o qual
(acompanhado de outros muytos Capitães, & mil foldados,
entre Portuguezes, & índios ) fahio do Array ai emí^í^ . de
Março, pella meya noite í Marchou a gente fem rumor atè
perto da trincheira, aonde a repartio em três troços para en-
veftir a hum meímo tempo por três partes. Dado íinal avan-
çou Luís Barbalho à trincheira pella frente,que ganhou com ^ntomo Miheiro
leve refiftencia : entrou na povoação , aonde não ficou caza / ^^^'^'^^ cdo
forte, que nao enveltiíie, nem topou contrario, que nao ren-
deíie.Deíprezava o dano,que dos altos recebia, porque logo ^^^^^ ^^^ ^^^^
le pagava:Poucos forão os que para o tiro defcubriraõ o bra- hdho a trincha-
do^ que não perdeííem a vidajcom hum mefmo golpe fe exe- ra.
cutava a vi£i:oria,& a vingança.

- 1 5 O Capitão Manoel da Franca , que com o fegundo
troco cometeo a trincheira por hum lado, a fubio:& rompeo ^°^ °"^/f f^^^^
a derenía com facilidade: Nao ouve inimigo , que o parecei- ^^^
iè, nem que efperafle golpe,de que teílemunhaíre:Todos fu-
gião ao perigo , tão^defatinados, que nelle bufcavão o remé-
dio: Entregavão as vidas ao pego , aonde juntamente acha-
vão a morte, & o fepulcro . Era o terceiro efquadrão o mais
groífo; com elle paffou António Ribeiro de Lacerda O rio, pgn^ tereeira
& por fora da trincheira cometeo a povoação, WiG^ú^tvcs António Ribeiro
batalhas formarão hum conflito: Não achava para onde fu- de Lacerda.^
gira vida, porque em toda aparte encontrava hum meímo
ferro: O eícuro da noite não deixava deítinguir amigos de
contrariosjuem o furor, oppoftos de rendidos* A nenhum fe-
xo, nem idade perdoava a efpada j a muytos matava o junta-
mente a efpada , & o chumbo : J á não achava o noífo pulfo
a quem vencer, fenaó a quem ferir. A braços veyo hum Ca-
pitão Glandes com oRebellinho, 8c efpirou apertado de

E^ feus

Pii!

■p

' 'i

,M> iv

Ça^hm o Olãâès
■e perdido.

54 CJST^TôTO WSITJ'NO iró^o.

feus braços, o Olandés. Nas cazás, & nas ruas acliavão os mn
íeraveis rendidos húa meíma fortuna: Era tanta a confuzáo^^
ajudada do eftrondo das armas, das vozes, & da aflição , que,
fe tinha por bem afortunado,o que podia com a vida dar fint
ao medo. A artelharia da trinGheira,aíFeftada pellos noffos cõ,
pontaria para ascazas da povoação foyíèumayor eftrago:^
Gom miferavel forte experimétavão os moradores,opprimi-j,
dos das ruinas, que na vivenda fabricarão o íepulcro.As vo-.
2es da lafiima,que avião de fuípender a ira,provocavão o fu:^
ror, folicitando o golpe^ com a pertenção do defviò . Acha-
vãoosnofíbs naprefença dos agreíTores vivas as memorias >
da perda, & da injuriaj^ o defejo da vingançaos não deixa-
va lembrai: da clemência. ;
- i6 Airidaaeftetemponãoamanhecia,&emh«asmeAr
masfombras achou o inimigo a chaga , & a mezinha. Def-
truindo tudo, o que topavão, corrião os noíTos pellas ruas da
povoação: focedeo ençontrarenfe ao meímo tempo , pelío
principio 5 & fim de húa , os Capitães RebeUinhp , & Luis,
Barbalho caminhando ainbos a toparíè ^ prezumirãoíe con-
trários, os que erão amigos , tendo cada hum para fi, que a
gente do outro era focorro, que vinha em favor do 0]andés:>
Enganados defta imaginação, em que os confirmou não aver
de nenhua parte inimigo, que fe retiraíTe, fe começarão a te-;;
mer hum do outro. Nefte ponto^fe deu rebate do aíTalto no;
Arrecife, & affi delle, como de algúas náos,q eftavão no por-
to fe deíparou muy ta artelharia fobre a povoação,com o que
anoíTagente fe confirmou no, errado conceito, que fizera:^.
De húa,& outra parte fe appellidou a gritos a retirada , fu-^
gindo todos de húas meíjnas armas,com aquella confuzão, &
defordem-jque fe vè, em quem fogedefua própria fombra.
Não foy menos o dano,que o defacordo, nem o perigo , que
a injuria.Cobrouflb o Framengo da trincheira j & as bailas de
íua artelharia nosforão perfeguindo atè o ultimo alcance.
Nelleperdeo a vida o Tenente General Pedro Fernandes,
Ferrete j& húa perna,o Gabo defta empreza António Ribeif
ro de L,acerdaj golpe de que morreo ao outro dia. Deixamos
no campo onze mortos, oyto Portuguezes, & três índios, &
nos recolhemos com dez feridos. Taõ pequeno accidentc

como

i^3o t^A^B 1. L!F(^0 TIL 5^5

como o de hua imaginação nos arrebatou das mãos a mais ^
gloriofa empreza.
n 17 Moílrou a luz da menhãa aos olhos do inimigo a
V i6i:oria5Com deftroço em tão defigual balança, qu€ o av izo
da laftima fez parecer liyiandade o grito da alegria . O fan- f^ ^^agoa o

_ . S, r r 1 V r • o i ^^ft^^^co chora, o

gue, & a cinza lhe reprclentava o eltrago dos edihcios , & da irnmtqp a, dita, da
gente, & fem poder enxugar as lagrimas, avaliava por [Qmvíãona.
comparação mayor a perda, que a dita: Confideraya , que o
fucçefíb em quanto favorável , não fora data de ília fortuna,
fenão de noíTo engano,& queíè efte nos não cortara o fio da
ventura fer vira fem duvida omeíino Arrecife de matéria á
ruina, & de teatro a v iâioria. ViaíTe íènhor do que tinha per-,
dido , & ao mefmo tempo chorava perdido tudo , o do que
era fenhor j& fufocado o goftona magoa, ò levava a confide-
raçaó a inferir mayores infortúnios, que os preíentes . Pró vi-
do nos futuros engroíTou os preíidios, dobrou as íintinellas, jcautef/afe pars
mandou com graves penas,que da villa para o Arrecife, nem o futuro.
do Arrecife para a Vill a naõ fahiíTe peííoa algúa, fenáonas
Qceazioens, que pudeíTe fer defendida das companhias , que
entravão, & fahiaò de guardaj& que as taes pefíbas paíTaífem
incorporadas nas fileiras dos foldados. Ordenou , que as di-
tas companhias fenaó moveífem de hum lugar paraoutro fem
primeiro fazerem algum final ás Fortalezas,para que tiveíTem
a artelharia prompta a favorecer os feus em toda a occaziaõ,
& tempo.Util era a prevençaõ,fe a dor fe fogeitára às le}- s da '

çautella. De húa trincheira noílà,qu€ efcondiaó as matas,fa^
zia o Capitão Luis Barbalho confideravel dano ao inimigo:
Veyo em çonhecimêto da cauza,& acezo em ira fahio em dia
de Saõ Lourenço [dez de Agofi:o] com todo o poder, & de-
terminação de arrazar a trincheira,& degolar o prezidio fem
dar quartel a vivente: PaíTou o rio na vazante da maré, antes
de romper a menhãa marchou fem rumor,& deu fobre a trin- ^^^^ ^^^ ^^^^ ,
cheira aonde Luis Barbalho avizado das fintinellas o efperou.^o^^r a ganhar.
çom doze companheiros(fuccedeo naõ ter mais foldados có- hm trinchar*.
figo ) com tanto defenfado , como fe tivera igual partido.,
Peu,&recebeo cargas,oppondofíe adefigualdade da íbrte,à
do numero.lnnumeraveis bailas inimigas chegarão a ferir hú
foldado noíTo iContadas foráo as noffas , & fem conto os ini-

migos,

wm

Cast^ioto lusitano

migos,quematâraõ,&ferira5:MiIagro7ofez parecer ocazo,^
adiíparidadedonumeroj&dodano. Bebia oOlandès em
feii mefmo fanguCjO medo de eícalar a trincheira , medindo
noíTa força, por fua perda; & continuava na bataria. Temeo
Luís Barbai ho, não o combate , fenão a duração do conflic-
to. (porque a dilação do tempo podia cançar as forças de-
feus foldados , ainda que a peleja lhes acendia os brios^Man-!
dou pedir focorro ao Arrayal, & foyfe retirando com os feus^
o Capitão Luís P^^^ outra trincheira, que tinha mais pello interior do matoj
Barhalhoa deft- mas com tal arte, & difciplina, q não deu lugar, a que o Fra-
àe: Com quefuc- mengo viíTe o limitado poder,que tinha,nem q a largava.Fal-
^^11°' tou as íiias bailas o retorno da noíTa parte, & conheceo o ini-

migo defemparada a trincheira, que logo arrazou com a pre-»^
^ fLeza,quelhedava o temor do focorro, que a feu entender^
(chamado do combate ) não podia tardar , o qual chegou a
tempo,que )i o Olandés marchava de v ol ta para a outra par-
te do rio,aonde coberto dos cúmulos de area,que por alli faz
a praya, deu algúas cargas à noífa gente , que a pey to defcu-
berto refpondeo com as mefmas . Fazia a diftancia, inútil a
oppozição, & pareceo a todos conveniente a retirada,

18 Dentro de fuás fortificações fe via o Framengo
prefo de fua mefma conveniencia:piffimuIava a in;uria,mas
nãopodia diííimular amiferia:Eriinfofrivel âfuafome o

jnten ^JJ' j^-q fj-gQ da noífa circunvalação . Apertado da neceífidade

menqp matamos . - 5 1^ ,, ,

aqente. ~ determinou romper as leys da cautela , & do receyo:Emboí-

cou a mayor parte de íiia gente j& com o reftante fahio a húa
campina, que cingiaó algúas Eftancias coifas \ derão as finti*
nellas rebate nas trincheiras,& no Array aí,donde Mathias de
Albuquerque defpidio , com increhivel prefteza aos Capi-
tães Sanâ:os da Cofta,Roque de Barros Rego, Miguel de A-
breu, & outros em focorro das noílas Eftancias : Achou a or-
dem tão prompta a obediência, que fem detença algúa mar-
charão as companhias a aviftar o inimigo;que aíluto tocou a
retirar , para que feu apparente receyo nos levaííè de corrida
ao laço. A defordem do ardil nos avizou do engano , porque
G medo, que os foldados inimigos tinhão às noíías armas deu
ao fingimento apparencia de verdade:Como fe o fora,feaui-
ráo os Capitães Martim Ferreyra, & Roque de Barros dous

trocos

troços do inimigo/taõ embebidos no alcance, que o Barros,
;à ferido de húa baila pella coixa, deu em hum lamaçal aon-
de cahioj& livrou ajudado do valor de feu Alferes , Sc de hu
Cabo de Efquadra da fua companhia . Com menos pruden- o §lhefuceede.
ciaj& igual oufadia inveílio o Capitão Sanftos da Cofta ou-
tro troço inimigo, que feguio menos avertido, queperfia^
do:Seus foldados,que viáo o empenho,& fofpeitaváo o perb
go, lhe deraó vozes , que fe retiraíTe, & íenáo metefle na em-^
bofcadajrefpondeo (com temerária valentia) que não tinha
ordem para fe retirar , fenão para enviílir j & acompanhado
de feu Alferes foraó entregar as vidas a duas bailas ; fem mais
outro fim, que a vaidade de perdellas . Perde a vida , quem a
naó fabe dar, ou pella viítoria, ou pella vingança: Não ouve
da noíía parte outra perdatÇom muyta de inortGs, Sc feridos
fe recolheo o Framengo.

! 9 Pareceolhe ao Olandés , que mudando de íitio me-
lhoraria de fortuna. Em 1 6, de Outubro deftemefmo anna
deitou fora 400. infantes , & 1 4. batedores de cavallo: Era
feu intento ganhamos a trincheira do Rio Doce ; fácil a feu
difcurfo por nos ficar longe do focorro: Eftava nella por Ca-
bo o Capitão Simão de Figueiredo (que defpois fe ordenou
de Sacerdote , Sc fez grandes ferviços á Igreja , & á Coroa,
uzando com igual deílreia de hum, Sc outro braço) fahio da
trincheira, ao rebate das ílntinellas, com quarenta foldados.
O Framengo,que fundava íua efperança em noíTo defcuido,
nem teve animo para avançâr,nem para reíiftir jaós primeiros Sahe o inimigo
golpes virarão ascofl:asosdecavallo,&logoairifantaria,fu-^'^^^^'* * -^
gindo todos fem faberé de que. Nâó lhes deixou o temor có- '"
tra pezar o partido. Atè os meter dentro da Villa naó defcan-
faraó os Portuguezes de matar,& ferir inimigos,fepi aver en-
tre eJles algum,que fe atrevefíb aparecer contrario.

Em 2 > . do mefmo (por noticia que devia ter) fahio

cia do Rio Doce o
que lhe fuc cede.

ao

o inimigo do Arrecife com muyta copia de foldados; paílbu
o Rio de Baixamar,&: marchou, fem fer fentido , atè hum lu^
gar, em que alguns Capitães noíTos aííiftião à fabrica de húa
trincheira. Retirou-os da obra o repentino aflàlto : Aprovei-
toafe o Framengo do tempo,& a toda apreífa começou a ar-
tafar a trincheira, mas ainda aífi , tardou mais na oçcupaçaó

m^m

■Jntentà ganhai
hua trincheira.

Jletirajfe cajligá-
do.

Achou em outras
emprefas amef-
maforie.

^ CÂsr^oro Lvsirjno i6^o

do que os noíTos na volta que fizeraõ íobre elle , obrigan-

''. do-o a largar a trincheira que tinha ganhadoja tempo^que os

Capitães António de Madureira,& António de Arau;6,que

os vinhaó render do pofto, chegaváo áquelle íitio j & encor-

-porado com elles o Gapitão Luis Barbaiho [ que de íua Ef-

. tancia acudia de focorro , & outros que trazia o mefino fim];

carregarão o inimigo ( jà então mais occupado na retirada q=

, na defenfa) coiti tao pezados goípes,que o obrigarão a fugir

fem outro acordo mais,que o de levar arrafto grande numero

de corpos mortos.(por nos efconderem os motivos dogofto,

que nos dava a viftoria) Sorte,de que livrou a todos o alcan-

,çe da fua artelharia,com que todas fuás forças nos detiyeraõ

-opaíío.

2.1- ^ Cazos em tudo femelhantes, occupáraõ húas, & ou-
tras armas todo o reftante defte anno de 1 6 30. Em quafi to-
dos os dias avia pelejas, que diverfiíicavão as occazioés, po-
rém não os fucçeíTos: A hum mefmo tempo nos achava o ini-
migo promptos para a defenfa 3 & para a vingança : Em fua
períia, fe alimentava fua perdição: Não ouve occazião,em
que nos provocaíTe atrevido , de que não fahiíTe caftigado:
EíFeito he da defefperação o perder,& o perfiar:Eni quanto
fua obfti nação nos conta^pellos encontros, as viéiorias , (ma-
jores fempre em feu dano,que em rioíTa eftimaçaó ) diremos
como em Madrid,& em Lisboa fe tomou a nova da entrepre-
fa de Pernambuco pellas armas Olandefas.

Occupado Pernambuco pello Olandés em i é . de

11

chegto a Liihoa,
^ a Madrid as
nonjíis da. entre-
frefa de Terna,-
buço.

Fevereiro, logomeyado o feguinte mez de Março fe eípa-
Ihou em a Cidade de Lisboa hum rumor vago , que o dizia a
medo: (Bervidade de tempo , em que o podia publicar, ou a
códíça5 da defgraça,ou a da inferécia,& da fofpey ta^Coma
infalivel o publicava a queixa; como incerto o defprezava a
confiança \ ate que no fim do mefmo , & principio de Abril
chegou a nova certificada por tantas vias,que tirou toda a re-
zaò de duvida j& para crecer a magoa,fe recebeo a noticia da
mão, de que tinhamos recebido o agravo. A todos laftimava
o fucçeíTojporque a nenhum deixou de ferir o golpe. Os ho-
mens de ncgociojfentião a quebra do comercio^os do gover-
no, a da reputação^ os do Pqvo, a do foeçego, os da guerra,a
. . ** do

1P\

163a TJ^TEl: LIVI^ Illr 59

do ocioi& todos a do eftado.Tratoufe do remédio j Ribio a
matéria aos tribunais para feconíultarmeyo j tomoiiíepor
expediente, que o de húa guerra lenta, era o que convinha:
(Dizíáo, que baftava, para gaftar,& coníumir , o inimigo , o
não colher da terra mais,que bailas, &golpesj& que por eí-
te preço não feria poífivelqijerer foftentar o gaílo , que avia
de fazer com armadas, fotdados ,& munições. ) Pareceo cn- rrataffe da ref-
tão acertado efte concelho , que indiílintamsnte aprovou a taura^ão.
dependência,^ a rezáo. Subio aMiniftros mayores â refolu-
çaó,& delles recebeo authoridade o diâ:amxen3 & aprovação
da noticia,que avia chegado dos fucçefíbs , nefte terceiro li-
vro referidos, (tendofe por fellice aufpicio , para fe confe-
guirofim dezejado, adiantarfe a provincia em executar o
mefmo, q no Reyno refolviaó os conlelheiros. ) AíTentoufe
a forma j defpidiraõfe decretos,& com a fleima ordinária ca-
minhavaó as ordens a fua execução , exhaufta a Monarchia
de meyosjcom que fe efcuzavaõ, ou fe detinhaõ os miniftros,
por cujas mãos aviaò de paíTar os difpendios: Multiplica vaó-
fc os decretos, & naó fe viaó os effeitos , porque morriaó na
cauza^ Gonfiftia na falta do cabedalp^: não fabião os miniílros
como remedeaífem a falta.

23 Com induftria fe remediou, em parte , a debilidade
do poder.TinhaelReyPhilipe nomeado ao Almirante Real
Dom António de Oquendo , para conduzir a índias a Frota
de Gallioés j & fe lhe ordenou, que de caminho tomaíTe a al-
tura da Bahia, aonde acharia noticias certas do eftado, em q
feachavaó ascouzas de Pernambuco, para que conforman-
dofe com elle, deitaífe no porto mais feguro , ao Meftre de -
Campo J oaÓ Vicencio SaÕ Pheliche com o feu terço , Itália- ^"J^/ljZnZí
nOjSc algúas companhias de Portuguezcs j & aquellas armas, r ^-^^^ ^ p^\^
&:muniçoés,quepareceífemneceílarias,para a continuação nmhuco.
dos progreífos,que promitiaó, os fellices principios daquella
guerra: Também fe mandou , que namefma conferva foíTe
Duarte de Albuquerque Governador, & fenhor Donatário
daquella Capitanía:Socorro de que feefperavão grandes ef-
feitos , porque fe entendia,que com elle fe augmentava noífa
gente em animo (com a prefença do próprio fenhor, ) & em
numero, com a dos foldados^de que confiava o focorro.Tan-

to '

. r

Sãhe o inirmqo
mata'/ a fome.

6a C^ST^IOTO LUSITJNO 1630

to como ifto fe enganão osTibWéHV com os fiomens , & com
feus difcurfos.Dirà efta hiftoria, como nefte focorro chegou
a Pernambuco noíTa total raina : Em quanto não íalie de Eí^
panha nos chamão os facçeílbs do Brazil, a que noíia obriga-
ção deve bufcar o fio.

2 4 Entrou o anno de 51 . St^com elle o fetimo de Janei-
ro,dia que a forte tinha deftinado a hiia boa proçáo de Olan-
deíes para memoria de feu caftigo,& epitaphio de feu fepul-
cro.Húa legoa da Viila de OHnda eftà aquelle íitio a que cha-
mão as OlariaS) fterreno abundante de húa fruita conhecida
^^ entre os naturaes pello nome de Cajus .) Era grande a fome^'
qUe fe padecia entre os Framèng03,& fuppofto que em toda^
a parte o efperava o ferro,pode mais com elles a neceííldade,^
que o perigo. Refolveraõfe emfahirdaVina( furtivos aos-
feus) & chegarem [efcondidos aos noífos]acolher algiías ve-
zes da fobrediía fruita, por remédio, & por refrefco . A boa
forte dos primeiros augmentou o numero dos fegundos, &
eíles afacilitáraó aos terceiros.Não fe pode encobrir a conti-
nuação á vigilância de nofías íintinellas, de que logo fi2era6
avizo a Mathias de Albuquerque Maranhão^r^^quartelavaíTe
3ia Eftancia de Santo Amaro , & era a mais próxima à Villa]
& efte ao General, pedindolhe gente para tomar âs mãos ao
inimigo, fem. que algum lhe fugifíè delias. Affi traziaó os noft
fos prompías as armas,como os dcfejos de as exercitar^rezão,
porque nas occazioés fenãoentrepunha tempo, entreaor-
dem,& a execução . Trezentos Portuguezes , & oytenta ín-
dios defpidio o General com feus Capitães , & por Cabo ao
Capitão Pedro Teixeira j & todos às ordens de Mathias de
Albuquerque Maranhão.Em lugares convenientes os man-
dou embolcar antes de amanhecer . Pellas oyto horas do dia
chegarão 300. Olandefes em duas tropas; largarão as armas
para colherem a fruita, com aquella defatenção,a que os obri-
gava a fome : Rõperaõ os nofíbs das embofcadas,derão fobre
os Olandefes, cortando pellos miferaveis, fem piedade , nem
reíifi:encia:Não lhes deixou o afíàlío, nem coração para a de-
fenfa,nem acordo para a fuga.Cento & quarenta & oyto vio
no campo eftirados,noí]"a efpada: Muytos dos feridos bufcà-
raõnomato a vida, & fó acharão afepukura. Aosremane-

centcs.

Mátá a, Gfíají iO".
na.

16^0 fpA^Bl.LW(^0 III. 61

centes,que era bem pequeno numero, foráo feguinílo,& ma-
tando, atè as portas da Villa, quatro noíTos de cavallo,aonde
chegarão tão poucos , que os vio o inimigo, como correyos,
& não como foldados . Muy feníivel foy eíle golpe para o ^?^^^ ^T'r'
framengoiNao porque O ti veíle por truta nova, íenao pella
nova careftia da fruita.

2 O inimigo, quepezava noíTa juílíçâ, com nofía fortu-
na^tinha nos remorlbs da conciencia hum vivo receo de íiia
perdição. Confiderava a oufadia,com qUe noíTas armas cada
hora batião às portas de fuas fortificações, & temia, que húa Levamn o Immi-'
lhas rompeíTe o furor:Excogitava modos para as dei viar,fal- go hUa trimhei"
to de poder para as deftruir. Todas fuas praças , quartéis^ & '^^^° f^^° í ^^^!
trincheiras, mandou cercar ao largo de robufias eftacadas de ^^'^ ^ '^^^'*-
páo a pique. Temiaííb de húareííinga de área , que chamaõ
a Seca, aíTi pella vezinhança, como pella difpoílçaói & fe re-
íbl veo era a occupar, levantando nella hua groíTa trincheira,
que guarnecida de artelharia , & foldados ferviffe ao noíTo
defvio, & á fua conveniência. Em 9. de Fevereiro fahio com
todo o cabedal de officiaes, foldados, engenheiros , & gaíla-
dores carregados de artelharia, munições, fachinas,madeiras,
& inftromentos fervís . Pos mão á obra , em que trabalharão
fem diftinçaó de peíToajcrececíde maneira,pella promptidão
dos materiaes , & numero dos trabalhadores , que primeiro
íervio aos feus de defenía , que aos noíTos de rebate: A o to-
que defte fahiraõ os Capitães das Eftancias vezinhas , & def-
pois os foldados do Arrayal com Mathias de Albuquerque.
Feytos em hum corpo os levava o impetu a invcílir : Aver^
tio a prudência o defatino do furor; propoz o perigo infa-
livel, pella natureza do terreno j impoffivel o avaiiço , pella
poderoza oppoíiçaó do contrario^Sc fufpendeoíTe a marcha:
Cenfuráraó o parecer, aquelles cuja temeridade fechava os
ouvidos à rezaõ: Para as confundir , mandou Maíhias de Al-
buquerque ao Capitão Franciíco Monteiro Bezerra , que c5
60. foldados tomaííe o pulfo a em preza rValerofamente mof'
tráraó a cara ao inimigo,dando, & recebendo cargas com di-
ferente emprego, porque huns as recebião a peyío defcuber- f
to, outros reparados. Embebidos no avanço fe forão os nof*
fos metendo nos alagadiços , até que o dano lhes fes aver-

F tir

■

! If

Ex^erimentao os

noffòsjèr impof'

Jiveloimpediiia.

Trepar afe o ini-
migo pura inva'
âir a. ilha de Ita

mar MÁ.

CJST^OTo LUSITJKO 160,0

trr o erro, mas a tempo,qtie nem podião ftirdir avante , nem
voltar atrás com tanta ligeireza, que a artelharia , & mofque-
taria do inimigo, com pontaria certa, naõ defpedaçafíe Ms,
& defcompoíefíè outros, & ferifíè muytos j em efte numero
éíltràraõ o Capitão Monteiro em hiim braço , & o Tenente
de Luís Barbalho em hõa verilha . Sérvio ofueçeffo de abo-
nar o Confelho , & arguir a fúria. Cuftoíà expiriencia he., a
que fe faz em cabeça própria j& doutrina de necios arrifcar o» ,
obediente,para convencer o obftinado*

a 6 Continu-ou o inimigo com a obra, & naquelle fitio
fabricou defpois húa da:s melhores forças de fua circun valía-
çáo, fe já nãofoy a melhor pelío terreno, pella capacidade^
p^lla vezinhança, pello fítio , & pella Fortaleza jtaí, q cõ elía
fe dava por feguro de noíTos affaítos em todos feus alojamen-
tos; Três elettientos a guardavãoj&opoder,&induftria a
defendiáo.Com mais livre difcurfo entrou o Framengo a có-
íiderar o grande medo, que os feus tinha o cobrado ao noíTa
ferro, temor, que de antemão os levava vencidos a qualquer
emprefa.Pareceolhe,que fe empregaííe fuás forças em partes
diíiantes de noífa efpada, confeguiria feus intentos , porque
fe lhe reprefentava,que a ellas, ou naõ chegaria por curta,ou
não offenderia por remiífa.Dáiberoufe em conquiftar a Ilha
de ítamaracà, em cuja conq uifta ponderava, que lhe não po^>
o qlhefuccede. deria a fortuna tirar das mãos a roubo, quando lhe não deííe:
o fenhorio. Difpos todos os meyos , que entendeo o podiaõ
conduzir a efte fim, com efficacia,&: cautela : Sahio do Arre-?
cife em 22 . de Abril com todos os foldados , que pode eíctr*»
2ar nos prezidiosj& embarcados em grande numero deve-*
ks, defcobriofeu intento, mandando emproar a ilha de íta-
maracà, a qual cercou toda com íiias embarcações , para que
delias, a hiim mefmo tempo , faltaíTe gente em terra por di-
verfas partes. Governava a Ilha o Capitão Salvador Pinhei-
ro, foldado valerofo, & pratico , que com a ília gente foube
rebater de forte, ao Framengo,que por nenhúa parte bufcou
alojamento,que não achaffe íepulchro.Retiroufe o Olandés,
fem que da Ilha aquiriíTe, nem faço, nem dominio : SatisfeíTe
com fabricar na barra hua força , a que chamou de Orangej
donde os feus não fahirão vez algúa a inquietar os morado-

«ij

res.

i(53o fJl(T£ I. L1P%0 HL ^3

res,que nâo voltaffem caftigados , & arrependidos . Fica- ^^/^cho^n t-
valhe defronte, &: pouco diíbnte (naterra íirme,) anof-y-^^ j ^-,^7/^
fa Villa de Iguaracii igualmente falta de veziohos , & Aq i^uíltacIí,
defenra,& porque a facilidade da cntrepre2a oãodefíèoc-
eaziâo à confiança do inimigo vezinho, & pirata, fe rnandoí^, ,
fortificar no modo poffivel j & guarnecer de algõas compa-
nhias, com ordem aos Capitaés,que a defendeíTem^ & cortaA
femo paffo ao inimigo 5 em cafo, que intenta fie penetrar o

eertão da terra firme.

27 Tinha a guerra confumido muyta gente ao inimigo;

não lhe fazia a foma pellas partidas dos mortos , fenáo pello
numero dos vivos, taò poucos , que nâo chegavaõ à guarni-
ção das Praças,que occupava(em todas as occazioés eraõ os
Framengos os que pagavaó o adveríbjSc o profpero dos íuc-
çeílbs.) Via os focorros tão diftantes , que era neceiíarioen- Rcfihsp c ru-
treporíè hum anno.de temp05entre a neceíTidade, & o reme- ^^^-J^ "^''^*'^
dio;nenhum outro lhe dava o coníelho, fenão o que lhe ofFe-
recia a experiência, de q feparados por tantos presídios fer-
viaó á ruina,& não á confervaçaó-Coníiderava, q em fuftcn*
tar a Villa de Olinda tão apartada do Arrecife,defuma o po-
der,quc naõ baftava para fe reparar; & que nella o aberto era
reclamo da invazáo;& o facort*o[q de força avia de paííar fo-
geito ás noílas embofcadas ] o feria dos aíTaltos. Tinha avizo
de q D. António de Oquendo era paílado c6 armada para a .
Bahia,&cada hora o imaginava no porto:DeIiberoufe em lar-
gar aVilla,& eíicorporar o poder dentro das fortificações do
Arrecife . Como fagaz defejava capear a neceíTidade còm o
defprezo.& a fraquefa có a negociação. Mandou hú Enviado
a Mathias de Albuquerque , ínfiruido no q avia de fazer , & ^

propor: Significou cõdeftrefa a barbaridade dos foldadbs,^
tumultuofos requiriaó ao General Glãdès lhes permitiffe por
fogo àVilla,e não deixar nella pedra fobre pedra:{ Acção ain-
da q indecorofa à milicia;,grata â vingâça-,)porq deíèjavão, q
foíTe igual ao dano,q tinhaó recebido dos moradores;8i:q afíl^
nas cinzas dos edifícios ficaria a memoria das cfFenfas , & da$
injurias:Gouza,q elle General por nenhua via poderá defua-
dir, obrigado a eftro var acçaó taõ fea, & a laftimarfe de ver
entregar ao fogo. tão nobre,&-antiguasiabj:içaidc.Têplos,&;
-^^. F2 " ' cafasj

t;

6^ C^ST^IOTO LUSITJNU 1630

' cafaSjComo tinha levátado a Religião, & a grandeza j& q lhe
âfíírmava defejara ter cabedal,para comprar a falvaçaó de lu-
gar taõ luftroío : Que fe fua fenhoria, o quizefíe refga-
tar do incêndio fizeffe aos amotinados hum donativo de
caixas de açúcar , que elle fe obrigava a foçegalos, & a cw^
tregarlhe por eftemeyo á povoação inteira pella efcuzar de
tão laftimoía ruina*

28 Ouviofe a embaixada ,& affi como íem dilação íe

penetrou o artificio, affi fem detença, fc reípondeo âteii-*

çaõ . Foy dito y que Mathias de Albuquerque lhe faiou ne-

?? fta forma ., Os Portuguezes com as armas na maó, naó com-i

5? praò , conquíftaõ y fabem dar cargas de bailas, & não de cai'^

, T x2LS-y as mafciaes os alvoraçaõ, deíprezãoas que os em^

3? baração . As chagas , que nelles abre o agravo não fe curáo

3> com açúcar, íenâo com pólvora: Com inimigos %m que.

n falta a fé faõ eftataveis os contratos, que firma o fangue;

35 & de nenhúa firmeza, os que afiança a palavra . Aconíe-

53 Iharia , eu ao Senhor General Theodoro Wandemburg^

33 que não gaftaííè a magoa era fe doer do eftrago de noííos edi-

35 ficios, porque fey , que toda lhe íèrâ neceíTaria para fe lafti-

3? mar do deftroço de feus foídados; & quando o medo os adiá-

33 te a queimar a Villa,animo, &T:abedal tem os moradores pa^

37 ra a reedificarem com tantas ventagens , que as melhoras oá;

35 énfinem a julgar por beneficio- a ruina , porque defejão dei*

' 33 xarna cabeça defta Capitania húa memoria em que ape7ar

37 do tempo, leaó as idades os caíligos de Olanda,& os trium^

Ferdea âilígen- pj^Qg (j^ Portugal. Não achou oEnviadoarepoftatãodo%

çe como imaginava : Voltou com prefíeza , & com a meA

ma mandou o General Olandès por fogo â Villa. Confi^^

Ad nd d' f derava na prefença do ameaço a vezinhança do golpe . Orí*

h mia i&L^e ^enou ao prezidio, que ateado o fogo fe retiraíTe para o Ar^

recife, porque o rebate do incêndio, lhes não preveni ííe o

caftigo do dano. Porém não baftou a promptidão da obedié-

cia para os livrar da noííã vigilância . De húa embofcada

os aífaltáraõ noífas armas tanto mais formidáveis, quanto a

occaziâo lhas reprefentava mais colcricas:Muyta gente lhes

matou,& ferio o avanço,& o alcãçe,& muy ta mais perecera,

fe amayorpartedosnoíToí não accudira a apagar o fogo,

>; ;• ■" í que

fuccede.

ié3o '^AÍ(TBLLir(]^ m. 65

que apoderado dos matenaes,que achou difpoílos , pelia in-
duílria, & pello tempo fervio á laftima, fem dar lugar à dili-
gencia. Ardeo em breve efpaço aquella povoação taõ cele-
brada pello comercio , como ennobrecida pellos ediíicioS;,
fem que de toda, fe ifentaíTe das chamas, mais que hiia caza
terrea,que reíervou a forte para memoria da perdarSuccedeo
em 2 5 . de Novembro de 1 6 3 1 . Naó andavaó menos acezas
as hoftilidades no mar,que na terra^em húa, & outra parte ar-
dia o furor,& a vingança.

2 9 Sahira da Bahia Dom António de Oquendo com a
frota de Caftella,que conduzia para as Indias,& nella encor-
porado o focorro,que avia de encaminhar a Pernambuco,em-
cuja altura o achou o Setembro defte mefmoanno, de via-
gem para a Bahia. Não dormia o Framengofobre os avizos ^^^^^^^ ^^^^^
(multiplicados,& certos ) que tinha de tudo quanto em Ef- ^f^^yg Efpanhes^
panha íe determinava. Nem as noticias do poder de noíía ar- é" oUrdefes,
mada,& fortuna do noíTo General eraó almofadas, em que
podeíTe defcançar feu cuidado : Tinha4he enfmado a expe-
riência o pouco,que na campanha valia, contra noffo braço,
fuainduftria,& que delia fe poderia aproveitar melhor fua
diligencia no mar,que na terra. Apreftou fua armada como
mayor numero de velas , foldados, & artelharia , que lhe foy
poíTivel j fiou o governo, & fucçeífo delia a hum pratico , &
valente Cabo por nome Adrião Patres, a quem as vidorias
ganharão opinião de bem afortunado . Acreditou a efcolha
com a oromeíTa demorrer,ou vencer.Chegou a occaziaó,in-
veftiraõfe as armadas com igual fiiror, aproveitandoffe de
tudo quanto podia a força,& alcançava a ioduftria. Em bre- ,
•v e efpaço veftiraõ os elementos as cores do coníl ido, de for-
te, que eom o eftrondo da artelharia eftremeceo O pego ; no
fumo da pólvora fe amortalhou o ar; não defcançava de fu-
zillar o fogo, & de húa,& outra v ifta bebia horrores a terra.
Particularidades ouvenefta batalla dignas de fe perpetuarc
na voz do aplaufo,que por reftituiçaó áquella idade,deve li-
vrar minha pena,do efquecimento: Ainda que fey , que mais
íUuftre noticia , com mais delgado rafgo as entregou a lem-
brança.

30 Atracou a Capitanea Efpanhola à Olandefaj era cf-

F3 ta

L

wícfãa memora-
'vel do Capitão
Cofme do Cottto,

Ferda da Capita-
nea Olandefa, ^
morte defeu Ge*
neraL

J^ttíoria da ar-
mada Effanhola.

6& C^Sr(IllOTÕ LUSITJNQ lê^o

tã maisalterofa , & com cfta ventajem pelejava com melhor
parti do.No mais vivo do combate íè vioaquella conhecida-
mente arrifcada, porque a abordou pello outro lado outra
líáo Framenga.Coiiheceo o perigo Gofme do Couto:Portu-
guez de Nação,& Capitão de Mar,&: Guerra de hum navio
de pequena forte^entre todos os da eíquadra EípanhoIa,buí^
cou a Capítanea contraria, & lhe lançou dentro toda a gen-
te, que tinha fem reparar no perigo de íeu navio quefc^ei-
to às proas das duas Capitaneas o meterão a pique : Salvouíe
o valerofo Portuguez a nado com immortal gloria de inten-
tar, & coníèguir,o que de nenhum outro poderá cantar a fa-
ma. Eftâ proeza lhe alcãçou o pofto de AImirante,& húa co-
menda de pequeno lote. Livre a nofía Capitanea da oppref-
faõ, ditoíamente caftigou o atrevimento j com húa baila de-
farvorou a Capitanea Olandefa; com outra lhe meteo hum
pano breado por aquella parte da coíladr», que correípondia
ao payol da pólvora j deu final o fumo do lugar, aonde íea-
tcava o fbgoj conheceo o Patres a certeíà do perigo , envol-
veofe no eftandarte General dos Eíiados, & amortalhado na
honra,fe fepultou vivo nas ondas jou porque o trago da mor-
te 1 he pareceo menos amargofo bebido nas agoas , que dada
nas chamas jOU porque íè entendeííè, que podia mais fua re-
foliiçaójquefua fortuna, pois quando efta o condenava ao
incêndio, cícolhia ella o naufrágio . Abrafouííè a Capitanea
Olandeíà,& com ella quafi toda a guarnição,que trafia [ duas
vezes condenada ao fogo, pella herefía, & pella hoftilidade.]
A alguns que íe poderão deitar à agoa, recolherão os noíTos
com vida, Sc fem liberdade. Já nefte tempo tinha o Framen-
go perdido três fragatas, que noíTa artelharia lhe meteo a pi-
que; as reftantes (além de deílroçadas, com tanta gente mor-
ta, & ferida,que apenas lhe deixou o dano acordo para a re^
tirada) bufcàráo todas o amparo do Arrecife, como lhes foy
poffivel. ^ nv^-o

3 1 Grande foy a vi(5l:oria,& grande o cufto : Duas nàos
de Efpanha, húa delias a Almirante , coníumio o fogo , & o
inar.Muy tas defaparelharão as bailas ; os feridos forão muy*
tos,& os mortos não poucos j entre elles íe fes fentida a per-
da do Capitão Valencilha conhecido de todos pello nome,
i- ^ , Sc

Sc pellas occaiioês dos Gaftelhanos . Ainda aíTi , foy tanto

^ 1 . 1 ^ 1 • j ^ • Dom António de

ma y ora gloria, que a perda, que entre as alegrias dotriuiiv ^ ^^^^^^

pho naó avultou o fcntimento.Para reparar a armada tomou ^r^^ armada.
Dom António de Oquendo o porto , que chamaõ da Bahia
da Traiçaõ,aonde fe refez de tudo, o que lhe foy neeeíTario,
em breve tempo^& continuou fua derrota para índias de Ca-
ftella, como trazia por regimento.Com feftivas cargas de ar-
telharia celebrarão os noflbs Capitães a viâ:oria j com diíFe-
rente motivo as deu o Framengo.

-^ "2, 2 Ao tempo, que as duas armadas entrarão no confli-
to fe defencorporou da noíTa o focorro deftinado para Per-
nambuco, com ordem que tomaffe o porto mais convenien- 'Deita focorro m
te , & mais feguro daquella Capitania. Húa , & outra condi- ^^° Grande.
çáo acháraõ na barra do Rio Grande , aonde defembarcàraõ
Duarte de Albuquerque, & o Conde de BanhoUo com toda
a Infantaria Italiana, & Portugueza, armas , munições , arte-
Iharia,mantimentosj & fazendas, que levavaõ de Portugal
por conta delRey , & de particulares:Tudo fe comboyou lo-
go para o noíTo Array ai, aonde os Cabos forão receb idos cõ
agafalho de auxiliares,& refpeitos de fuperiores. Alojoufe o
Conde de Banhollo em quartel apartado com a gente de feu
terço. Duarte de Albuquerque, com feu Irmão Mathias de
Albuquerque. Separação, que envolveo em íi a dos ânimos;

Bi apartou de nós toda a felicidade dos fucçeíTos . Favorecia ^ i , r
/ , , p \ ' r r L j Cau^A da delU'

cadaqual agente de lua companhia , lemrazerem cazo dos f^i^og^fy^os^of.
ibldados mOíadores,que com tanto valor,& rifco tinhão fer-y^^,
•vido. Os íliperiores devem medir o trato dos íiiditos pella
Jvara dà rezáo,& naó pella da vontade, porque íàó juizes dos
merecimentos de cada hum. A deíigualdade do trato fofreA
fe, aonde fe vé deíigual o mérecimentoj efcandeliza, quando
fó he paâ:o do favor. Naó fc pagão as obrigações particula-
res, com o cabedal dos pojftos, porque he próprio do officio,
& naó da peíToa: O da benevolência , em quem governa co-
mo íenão acaba no que fe comunica, deve repartiríTe por to-
dos com liberalidade^porque he demonftraçaó do animo , &
fenão paga, obriga; fazendo crer , que a falta do premio , hc
do p oder, & não da v ontade. Na guerra não há de fazer a íii-
perioridade diftinçaó eatre amigos,& foldados,para que nas

F4 oc-

CJSt^lOTOLUS2tJm

1631

occa2Íoês' experimente a todos os Toldados amigos'^ -O exer-
cito he hum corpo myftico, cujas partes então íe unem a de-
fender a cabeça quando a cabeça igualmente as anima: A par-
te baldada, como não recebe, naó íe move . Corpo truncado
he, hum arrayal dividido; apartados huns ânimos dos outros,
pella diftancia, com que íè aparta o defconfiado do prefumi-
do. Defenganenfe os CaboSjque em nenhúa occaziaõ haõ de
achar coníigo aquelles, que em todas apartaò de íi. Com iaí-
timofo dano o experimentarão Duarte de Albuquerque , &
o Conde de Banhollo, na deíigualdade do trato com que a- "
partârão de fi os moradores defconfiados, dando com feu fa-
vor occaziaõ , aos que leváraõ do Reyno , a que osdefeíli-
maíTemaltivos. Viãodefprezadaíiiaíidilidade, cfciirecido
feu valor, eíquecidas fuás emprefas j & que aos bizonhos,
& eftranhos fe davaõ os prémios de feus ferviçosj & não po-
dião ver como amigos, aos que fe lhes adiantavão emulos; &
fopofto, que fempre a obediência os confervou juntos, nun-
ca a occazião os vio conformes.Defte principio nacèraõ tan-
tas defgraças, & infortúnios, quantas baftárão para perder a
melhor parte daquelle eftado. Bem fey, que naõ fofre digref-
foés a hiftoria3porèm também fey,que efta leva a defculpa na
fcauza.

^ 33 Chegarão a Olanda as rlovas do eftado , em que no
Brazilfe achavaóhúas, & outras armas, relatadas ,& repeti^
das da fogeição,& da queixa. Vio acompanhia occidental, q
aneceífídadepediapromptó,&efficaz remédio, mandou a-
preftar hum copioíb íbcorro ; deu o baftão de General de
mar,& terra a Siígiímundo Vanfcop , foldado digno de toda
a confiança pella pratica, pello valor,& pella induftria.Sahio»
de Olanda, & tomou porto no Arrecife por efte tempo , em-
. penhado em dar fatisfação às eíperanças de melhorar feu
ta oinimo vÂ- P^^^^ido, que nelle fundava a companhia. Tomou o pulfo ad
YA nos dejlruir. eftado das couzas, ferviofe dos fucçeífos,para a informação;
& aííèntou coníigo , que a guerra não toma a differença do
curfo dos dias, fenão do difcurfo dos homens,& que as armas
Olandefas não podião melhorar de fortuna , fe os Cabos não
mudaífem de eftillo . Tinha aprendido nas efcollas de Euro-
pa, que nas conquiftas obra mais a fagacidade , que a força,

prm-

,631 TJIlTEl.Uríipm. 6^

principalmente naquellas emprefas , em que a refiftencia he
mayor, que o poder da conquiftaj & certo neíla máxima , a-
plicou todo feu cuidado a ganhar animos,que lhe moílrafíèm

brechas , para efcalar praças. Favorecido da occazião ( ofFe-

recida no defprezo, com que nofíbs Cabos defeftimavãoef-

ta pratica) achou entrada, para fomentar a defuniáo dos nof- j^yi^^ip^i^aufa

fos, & para contrahir amizade , Sc correfpondencia com o ^e/ie dano.

Conde de BanhoUo: Não falta quem da fua parte defculpe o

trato, có a fmgileza, poré não lhe podèraó efcóder a cobiça,

pois fe affirma, que o trato fefuftentava,por húa parte da in-

duílria,pella outra da conveniência , concorrendo ambas a

com praniaquelle homem a omiíraó,& o defvio.

34 Com pretexto de embaxadas, efcritos 5 & mimos fe
facilitou a comunicação entre húa , & outra gente : Encare-
cialhe , da parte do Framengo, a afabilidade do trato , a cor-
refpondencia do premio,& a eftimação do valor^ com o que
em algús ânimos de baixa forte fe foy corrompendo a fideli-
dade; brecha por onde o inimigo abrio caminho a noíío ma-
yor dano . Militava entre os npllbs hum foldado mamaluco,
chamado Domingos Fernandes Calabar,oufado,& livre com ^

demafia; devia á juftiça ; temeo o caftigo , & por fugir a pri-
faó , fe paíTou ao Olandès : ( Ao menos com efte^temor^ dis-
farçou a trai ção.) A comunicação lhe enfmou alguas pala-
vras Framengas, & toda a infidilidade das obras. Foy recebi-
-do dos fuper iores com favor ; dos iguaes com eílimaçãoi dos ^ ^^^.^a^ ^^ ^„
menores com refpey to, & de todos com induílriofo agafa- mamaluco fis e-
lho; rdezejofos, que o exemplo perfuadiífe amujitosa vaxi- xemploamuytos,
taçãõ do deliíèo. j Não foy a fagacidade infurtifera, porque
a muy tos enre dou o ardil , que defpois fervirão ao inimigo
de auxiliares, Seguias para osaíraltos,comque deftruiráo,
&: conquiíHrão a terra ; & deftes os mais nocivos , aquelles,
qíie entre nós vivião mais deíTimulados , porque como erão
fintinellasdedentro, não avia movimento , de que não fizef-
/íemaviíb. •>::•' ; --rv.: .

-'35 Enformado Sifgifmundo de tudo quanto entre nós
paíTava, & certo, de que os noíTos andayão queixofos,& def^
goftados da pouca eftimação, que achavão no Conde de Ba-
.nhollo,& em Duarte de Albuquerque [vendofe foldados de

ícii

wm

tencía.

70 CMT^J^orOLUSlTMO lé^^R

feu deíprezo, quando os q conduzirão , o erão de íeu mimo"}
determinou experimétar fe na occa? iaó correípondiaó os eí^
mwàogtíhía ^^^^^^ ^ ^^^^^^' julgando por impoffivd naó fe acompanharia-
kroale^a da Fa- queixa , do odio,& da vingança: Avia de fer algua emprefa a
raíha. pedra de toque deftes aíFedos : Refol veo cõ íeus Cab os, que.

foíTeaconquiftada Paraiba ( para onde os mais fentidos íb
tinhaõ retirado.) Empenhou o reílo de feu poder; com elle;
navegou a fua armada até aviftar a noíTa Fortaleza, que cha-
mão do Cabcdello, íituada na barra . Deitou gente , aríelha-
ria,& munições em terra, com todas as demonriraçoés de íi-
tiar a força : Era Capitão Mayor da Villa,& Governador âa.
Capitania António de Albuquerque, a quem o primeiro re^
bate posna campanha , com todos os moradores , que abre--
V idade do tempo, & o repente do aíTalto lhe deixou conduií*^
ZinAconfelhado do valorhia a rebater o inimigo; embarga-
'Jda dura.reff^ ^q ^^ prudência deteve o paíTo : para que, não intentaífe en-
treprelar, nem arortalezajnem a ViIlarEra grande a defpro*
porção de hum, & outro poder; & temendo, que o valor fi-
caífe opprimido da multidãofes avizo ao Arrayal , para quq
lhe acudiíTem com o focorro necçeíTario: Com marcha defti-
midã fe alojou, & guarneceo o Capitão Mayor com fua gen-
te à fombra da Fortaleza , &a vifta do contrario , que íèm íe
mover olhava com tamanho efpanto para a ou2adia,que a a-
valiava por defatino;& a fi meímo por enganado na imagina-
rão, de que acharia remifíbs, como deígofiados , os morado-
res de todo aqu elle partido. Não tinha conhecido os primo-
res dos ânimos Portuguezes. O valor natural, quando fe aniií
ma da fidelidade obra fem vileza; O generozo não vinga o a-
gravo, com faltar à obrigação. Em todo o tempo , que dura-
rão as guerras de Pernambuco obrarão os moradores com cf-
ta fidalguia: Sempre oíFendidos na falta do premio , & do fa-
'Vor; fempregenerozos napontíialidade da obrigação , & do
íerviço : Em feus procedimentos refplandeeia , o que erão,
porque efcondião a falta na obrigação, ganhando na opinião
das gentes^iiamortal fama pello efclarecido nome de Vaííal-
íos fieis, fem baxa; & de foldados valentes, fem nota: Húa, &
outracoufa experimentou, o inimigo ; neíla occazião con-
fundido,porquedefenganado.: Todos os dias vinhão as mãos
■■•■■■- Fra-

1631 <PJ^T£LLIF^OIIh yv

Framengos, & Portnguezcs, & fempre as levavão na cabeça
os Framengos. Em hum defces encontros ( em todos avia de
hu3,& outra parte mortos, & feridos) cortou hua baila con^
traria a caridade , & a vida do Padre Frey Manoel daPieda*
de, Religiofo de Saõ Franciíco, que lem medo dos pelouros
andava entre os noíTos exercitando a obrigação de confeílbr,
& o officio de foldado.

' 3 6 Pella diligencia do Capitão Mayor António de Al-
buquerque chegou com prefteía o avizo ao Arrayal , do po^
der, Sc determinação do inimigo ; & com a mefma à Paraíba
Dom Aleixo com diverfas companhias de Caftelhanos , & Bom Aleixo che^
Portuguezes ás fuás ordens ( era de nação Caftelhano ) che- g^em /ocorro da,
e^ou com efte focorro aaugmentar o numero, porém não o^^^^'^ ^^^^^» J*^^
animo dos noíios.Nunca a companhia deita nação nos íervio
á viáoria, fempre à perda. Aquella providencia, que fepa-
rou os dominios , os definio eniulos , & não companheiros*
Alojados no pofto efcolhido giiardavão a mefma Fortaleza/
que os defendja. Seguião as efcaramuças o curfo dos dias , &
em nenhum foy de lemelhante a fortuna: Irritado da perda,
prefiffiaoinimigonoíitio, efpetando alcançar a beneficio
do tempo, o que lhe não podia dar a força.Deixou paffar al^
guns dias, fem peniiitir, que os feus (nem ainda quando mais ^^^^^^ ^ .^.^.^
provocadosJfahiíTem das trincheiras, para que nas apparen- ^^ ^ Bjimci^ dos
eias do medo, fe fevaíTe noíTa confiança, até que ella lhe dei- Tonuguez.es com
íeoccazião paraaílaltar a noífa eftancia j oquefez comtão2«^>ff#.
boa forte, que não foy fentido,fenão jà, quando primeiro fe
encontravão os braços^ que os olhos, de fo4:te , que a batalha
perecia luta/erindoíTe tão de perto,qiie as armas ferviaõ mais
ao embaraço,que ao golpeiLargo efpaço durou o conílido^
& a confuzaó, com que os noíTos mal deípertos tocàraó a re-
tirar, para fe conhecerem,&: diftinguirem dos inimigos. Qiiar-
renta mortos nos cuftou a confiança ^ & entre el les acabou o
Capitão Dom Aleixo. Muy tos dias chorou o inimigo a vic-
toria,queconríftio em ficar na campanha. ^nrrfj''

37 DefeumayoreftragotomouSifgiíiiiundonovomo*
tivo, para contmuar na perfia : Era a vez primeira , que de-
fembainhâra a efpada, & como delia aviaó de receber opi-
nião íuas armas, naó podia fofrer vellas defpre2adas.,£fpera^

~K^-'->

va

72 C^Sr(^Oro LVSITAKO 16^1

v a ganhar importuno, o qlie na5 podia foldado , tendo para
íi, que íe melhorariaj ou com noííb defcuido , ou com noíTo
enfado. Errado lhe fahio o conceito, porque a nofla gente a-»
conçelhada do fucçeíTo , não perdeo da memoria a vigilan-»
cia: Muyta punha Siígilinundo emiaber os movimentos (do
Tetfnríote "«^o ^rray ai (tinha comprado dentro dellecuidadofas ef-

com o í eu terço em focorro da noíTa gente : Médio o tempo
da marcha, conheceo o perigo, levantou o cerco , recolheo 3b
artelharia, arrazou os quartéis j & embarcada a gente largou-
panoj&mais corrido,que envejado entrou no Arrecife,olha-
do dos emules com deíprezo,& dos apaixonados com aplau-»
jfo. Feftejoufe da noílk parte o íiicçefíb , como vitoria j do^
foldados,porque defenderão a Fortaleza^ & dos moradores^
porque conhecerão, que em quanto quifefíem refiftir juenhu
poder os avia de dominar. OuveíTe na defenfa da Fortaleza
o Governador delia Simaõ de Mello com ííngular valor, &
difciplina: & merecerão muy to nefta occazião, elle^ & o Ca-
pitão May or António de Albuquerque*

38 Entrou o anno de 163 2: Computa va-íhe o inimigo
©s dias a dous annos de conquifl:a,& achavafe alcançadiííimo
cm contas: Numerava os fucçefíbs , & fomando as partidas
V ia , que nada tinha ganhado em comparação , do que tinha
perdido. Appellava para a preíiílencia,efperando, que a for-
í/J^r^ aeW «?ff ^""'^ ^^ obrigaíTe deliia conftancia . Sete legoas diílantedo
Ihor forte na.For. Arrecife para a parte do Norte íituou a natureza o Cabo de
tdez.A deNa^a- Santo Agoftinho, & perto delleo Pontal, q chamão de Na-
Síareth, celebre pella comodidade do porto , que he de barra
íufficientcj celeberrimo por hua nobre hermida dainvoca-
ição de Nazareth, que deu nome à barra , a qual coroa a emi^
nencia do monte, a que chamão Pontal : Santuário aííiftida
de perpetua romagem, tanto pellos milagres, que a Senhora
obra por aquella Sagrada Imagem,quanto pella eipaçofa dií-
tancia de mar, & terra, que delle deícobre a viíla; & celebra-
diííimo (defpois, que naquella Capitan ia entrou o Olandès)
pella conveniência de dar entrada, & íahida aos focorros, &
âs fazendas dos moradores. Para empedir hiia,& outra coufa
ferefolveo o inimigo em fazer o poííivel por ganhar aFor-

taleza.

ireíh.

tíM

com mten-
r para.

i6p rTÂ^ELLlV(^nL 75

taleza, & fcnhorear a barra . Saliio do Arrecife, em 1 4 . de,
Março, com mil, & quinhentos Infantes , & copiofa chufma
de mareantes , embarcados em 24. náos, & grande multidão ^^ y^31-
de lanchas, para que avaliado o poder pello vulto fe imagi- aganlur,
naíTe muy to may or , que a força ; & deímay aíTe á reíiílencia.
Era Bento Maciel (Capitão igualmente efperto , & pratico)
G overnador da Fortaleza^ & tudo pareceo pouco aos olhos
de feu valor, eftimando mais 70. foldados, que coníigo tinha
para a defenfa , que toda a oftentação contraria para a con-
quifta. Affi como vio, & entendeo o dezenho da anilada ini-
miga,mandou guarnecer demofqueteiros húa trincheira,que
defendia hum liigar acomodado para fe deitar gente em ter-
ra. Pareceo-lhe ao Olandès fácil de vencer o empedimento,,
& conveniente a parte para nella defembarcar fuagentej& •^^'^^'''^C/í/^^'^^^'.
ao querer arroílalla vio tal refoluçãonos defeníbres,que cõ-,
je£turou do defenfado, o perigoj & mudou de intento : Buf-
cou o feguro no defvio j apartoufe meyalegoa cofteandoa
terra com tenção de defembarcar em hum efl:eyro,ou calheta
que alli ía;^ o vím^ .entrando algum efpaço pejlat tçrra den-

tro/:-— •; '- '•-•:""-' ■_^^^ ..... ' ...- ,

:^ 9 Não ha meyo, que não concorra com fuavidade pa-
fâ feu íim.Sem noticia algúa da tal armada, nem dos intentos
delia vinhão (cazualmente) por terra i ^ * mofqueteiros noA
íbs guardando húa grande partida de dinheiro , que merca-
dores da Bahia remetião a feus correfpondentes , para fe em-!
pregar em açúcar . Tanto que virão a armada embofcâraõíç
no iilato, para obíervarem a derrota, que levavão as lanchas.
Avertirão, que carregadas de Infantaria bufcavão a terra,
tomando a calheta, pella qual Os trazia íiia fortuna a meterfe
lias bocas dos mofquetes; leváraò-nos,os 1 6. foldados â cara,
& derão nas primeiras lanchas húa,& muy tas cargas também Retirafe defiro-
fortidas,que não perderão tiro: Cortado o Framengo do re- f^^*' cAT^udmen*
pentino aííalto,& do inopinado deftroço voltou as proas as ^^^
lanchas fazendo-lhe crer, o medo,que«o eíperava alli o poder
do Mundo. Vil effey to da cobardia he o eípantojtudo pinta,
com exceíTos. A vela , & remo bufcâraó as lanchas o corpo
xla armada, como fe pello mar os feguira o infortúnio da ter-
ia. O General menos atónito >& mais defçuríivo tirou por

G con-

confequencia do íiíeçefíb, & do fegredo , com que difpos a
emprefa,que a gente , de que as fuás lanchas fugirão era fem
du vida mandada da noíTa praça j& fendo tanta^como os fe us
encar eciaõ forçofamcnte avia de fer muy to pouca, a qu e de*
fendia a Fortaleza, & a trincheira. Sem dilaçaò que defle lu-
gar, a que podefíe fer focorrida da gente da embofcada , a
mandou avançar com as mefmas lanchas; Ghegáraó a tiro de
ínofquete j deu fobre alnfantariâ,que era muy ta,& apinhadas j
fUcçeífivas cargas, a trincheira , com pontaria prop orciona*
da,& certa de forte , que húa mefma baila matava dous , &
tresiCreceo o medo cò o eftrago,&fem q algúa fe atreveíTe a
emproar a terra, voltarão todas as lanchas de boga arrancadas
a unirfe com a frota , que fem mais detença largou pano , Sc
fe fes à vela. De caminho pos fogo a 3 .embarcações noíTas^
que achou furtas no Rio Fermoío [ pequena vingança para
a recebida ofFenfa.] Os q bem ponderarão as circunftancias
do fucçefíb lhe derão titulo de milagre: E piedofamente fe
pode crer pello lugar, (q a Senhora de Nazareth authorizoa
còiii fua protecçáo,& feu nome:)No Hereje tinha fua Sagra-
da Imagem, certos os deíàcatos, de que fe livrou com antici^á
pados caftigos. '

40 Andavâo entre os Olandefes alguns Italianos fugí-^
dos, levados da conveniência, & da infidelidade^tratou de os
reduzir a feu terço o Conde de Banholló & com fua ordiná-
ria defatençâo fes embaxada ao Arrecife,cu)a fuílancia fe re4
íiimia,em que houveíTe entrega daquelles fugitivos, por ou*
tros tantos Olandefes prifioneiros : Sem darem audiência ao
Enviado,© deti verão os do concelho alguns dias:Da tardan"
Ç2. inferirão os noíTos a malicia: Soípey táráo a cauía , & man*
dàràó avizo a todas as partes, que fe vigiaíTem , porque o ini*
migo fe preparava para fazer algúa entreprefa ; & avertiráo
primeiro a Nazareth, Sirinhaem , & Iguaraçu como primei-
ro condenadas á in vazão, pella vizinhança, do mar , & pella
diftancia do focorro . A dilação do avizo fes inútil a diligen-
cia, chegando o Corrcyo a tempo, q a tardança do remédio
r, r jj j ò fes teílemunha do eílrago. Induzido, & guiado o Framen*
ir ay dores ajfal- go dos traydores,que trazia coníigo[aconlelhavao-lhe a vm-
ta,'&affoU CL vil' gança,por não parecer^que os alegrava a perda] fahio do Ar-

U de Iguaraçu. .- içcif©

7^

1^52 fj\rE r. Lip\o iiL

recife pella mcya noitejatraveíTou as minas dá Villa dê Olin^
da, profeguio a marcha pellas veredas mais occultas , & fem
íèr fentido deu fobre a Villa de íguaraçu o primeiro dia de
Mayo a tempo, que os moradores affiftiáo na Igreja aos di-
vinos ofEcios, pella folenidade da fefta dos ApoílolosSam
Píielipe, & San-Tiago . Como pafmados os deixou o repen-
tino aíralto,& o laftimoíb tumulto do mulherio. Alguns^que
ácazo fe acháraó com armas,fe oppoferaó a fúria do Framen^
gojmas como lhes faltou a companhia ,& ordem ferviráoró
deaugmentar o numero dos mortos : Para o Olandés nefta
occaziáo matar, 8c ferir fem piedade, nem diftinção,era a fal-
ta da reílftencia culpa,& o pedir quartel deliâ:o. Venceo fem
oppoíição j faqueou fem humanidade i deftruio íemreípey^
to. Com barbara crueldade cortava o ferro por húa, & outra
idade, por hum,& outro fexo; confundia o deshumano gol-
pe as diftinçoés da natureza, Sc do culto.Náo valia às mulhe-
res a natural interceção da modeftia,& do pejo, para lhe dei-
xarem as roupas, que as cobriaòj nem a fragilidade do fexo^
Sc o decoro do eítado, para mitigar a ferocidade, có que lhes
rompiáo asorelhas,& cortavãos os dedos , que ornaváo com
aneis,& pendentes de ouroj enfeite de que a crueldade , & a
cobiça fizeráo roubo,8c martírio j húa meírna acção , Sc hum
mefmo tempo os vio piratas, & verdugos. Roubarão, & def-
truiraó o fagrado por ódio , q porfano por vingança . Com
exacravel rapina, Sc furor perderão de v iíla a eftimação, & o
defprezo, porque nenhua coufa efcapou do roubo , Sc do in-
cêndio.

4 í Pouco mais de húa hora gaíláraô nefte cruel exercí-
cio, & carregando 400. negros, que para efte fim trazião cõ-
íigõ, do que podèraó levar , marcharão com preíTa de crimi-
iiofos, levando coníigo dous Religiofos de S. Fíancifco, por
ódio j & o Coadjutor aíTi reveftido como fahio do altar, por ôí niofãdereí é
defprczo. Tiverão alguns motadores acordo , para os fegiiir, ajjaltão na reti*
8c picar na retaguarda. Obrigando-os com mortes, & feridas ^^^'^ » à" cohraa
a largar o roubo, & a fugir do caftigo 3 com tal medo, Sc de- ^^^^^ °^'^^ ^-
fordem, que efta os entregara todos a efpada, fe a marcha fo-
ra mais comprida; mas tinhaõ perto o mar , & nelle lanchas,
que os eíperavão3 poferãô terra em meyojnayegando para o

Qi Arrecife

mm

j6 C^ST^WTO LUSITJKO 1632

Arrecifè com falvas de artelharia , 8c vozes, que ferviraõ
á fua dita de aplaufo , & ao noíTo infortúnio de matraca.
A o outro dia chegou aonoíTo Arrayal o correyo , que le-
vava a Iguaracii o avizo, com as laftimofas novas do eftrago;
& quafi ao mefmo tempo o Enviado (que o Conde deBa-
nhollo tinha mandado ao Arrecife )com as do roubo, de
que fes oftentaçaõ o inimigo j & com as do defprezo y que
. intimou ao Conde, a quem mandou dizer o Coronel Ma- ■
j>^r muym vf^^ thias VancoI,que naÓ podia difFerira fua propofta por che-

cheg-ou a nova O' r» t i . t -r % r» t_ r t " p^

ronale^a do Ar" g^r cânfado da viagem de Iguaracu . ReGebeoie por hua, õc

fayd. outra via à noticia do fucçeíTo: ( Baftava fer nova de pena,

para lhe naõ faltarem correyos.) Muy to mago-ou aos nof-
fos Cabos a defgraça, & miiy to mais a defpejâda repofta do
Framengo.

42 C oníiderou o íníniigò, quê rio bòifh ííicçefíb de ígnâ-
raçii tivera mais parte noíío defcuido, que fua induftria; &
que para nos vencer lhe era neceíTario achamos , ou fem
mãos, ou fem fentidos . Via, que o furtarfe a noífa v igilanciá
não era cautela para cada dia ( porque hum deícúido cafti-
gado em húa parte, em todas deíperta o cuidado, & qu e efte
vella em quanto o receyo dura ) determinou fufpender 2l
o Conde de Ba- continuação dos aíTaltos para que na defiftencia , nos defcu-
fthcUo inteta gA. ^j^ff^ ^ confiança : De fotte , que da noíía parte a froxidáò^í
nhitr a F cr tale- ^^ ç^^ ^ arteficio ti verão fuipenfas as armas até o fim dê
za. de orange. g^^^jj^j^j-Q. j^^g Cabos, fe ateou a todos os nofíbs foldados^
o ócio, em tal forma, que efte, & o ardil do inimigo foraõ
as duas mãos, que mais trabalharão em noíTa ruína. O Con*
de de Banhollo ( que parece levou a fatalidade aquelle ef-
tado , para perdição delle ) ou foíTe perfuadido, ou enga--
nado dizia a todos , que a cautela do inimigo era medo j &
com efta malícia, ou fingiíeza mandou fazer apreftos pa-
ra hir fitiar a Fortaleza de Orange, que o Framengo fa-
bricou ( como fica dito ) na barra da Ilha de Itamaracà. 0>
eftron do da prevenção publicou a gritos o para q era javizó^
& certefa , de que fe foube aproveitar o inimigo, para dif-
por muy to atempo a reíiftencia. Sahio O Conde de Banhollo
do Arrayal com aparato,&poder de foldados,artelharia,mu-
niçoésj &mantimentos i aviílou a Fortaleza 5 efcolheo fitio,

plantou

I

plantou a bataria^continiiou as cargas fem outro eíTèíto maia

que o de gaftar tempo fem frui to ( tinha o inimigo a praça

tão bem fortificada de trincheiras^eítacadas, & reparos , que

não padeceo a força o menor dano. O Conde, que em todas

íiias refoluçoês era leve, voltou para o Arrayal, deixando na *^ í^^^^fí'^ «^^

Ilha as peças de bater, que avia tirado da noífa Fortalcza,porj

defpojo ao inimigo . Defte lote eraõ todas as acções daquel-

le Cabo jpor ellas fe pode entender qual era o animo daquel-

le homem , & a reza5 com que os entendidos, Sczclofosti-

nhão para íi, que pecava mais de combanido, que de fraco.

43 Não defcanfava o Olandès de ex cogitar meyos pa-
ra fe farer fenhor da campanha, mais incitado da reputação,
que da cobiça: Eftava certo naquella máxima , que eníina a
não arrifcar o próprio na conquiíla do alheo, & determinou
fortificar o Arrecife de forte , que na íegurãça fenão rcceaíTc
o perigo, nem ainda quando para a conquiíla levaíTe parte
da guarniçaõ.Julgou (& nâo fe enganava,) que fe levantaíTe ..;

húa Fortaleza em o íitio, que chamão dos Affogados , (por^
naquella parte fobem as agoasdo Rio,ajudadas damaré,coní
tão arrebata fúria, que aíFogão aos que colhem nâ paffagem)
com a qual cortava por todos os caminhos a invazão,& aílàl-
tos de noíTas armas: rezão, porque os noífos o guarneciaô de
trincheiras, & foldados. Em 1 8.de Março de 1 63 3 .íahio da
Arrecife no quarto da Alva com 800 . Infantes eícolhidos;
paífou o Rio de baxamar^ invefiiio as trincheiras fituadas nas
margens delíe,em oportunidade que nellas achou poucos , Sc
defcuidados defenfores:Com morte dos que não podéraõ fu^
gir (nenhum íe foube defender)fe fes fenhor das trincheiras;
Corridos da fraque2a,& cobrados do medo voltarão os nof^
fos fobre o Framengo, que os efpcrou com avantejado parti-
do de pelejar coberto dos mefmos reparos , que nos tinha
ganhado,&do exceffivo numero de feus foídados.Durou cm
osFortuguezeso valor,emqnantoonão opprimio amulti- ^^f^^o^^IZT.
dão; foráofe retirando para húa denfa mata,que os livrou de ^ffaiaa dos Jf-
fazerem companhia a 20. mortos , que deixarão no camp03 fogados,
entie elles o Capitão Franciíco Monteiro Bezerra , que pa-
gou com a morte o defcuidoj& com a de muytos Olandefes,
aqiúrío toda a opinião, que na fiigida perdeo.Com igual va-

G 3 Jor,

wm^^fm

■ Ill

78 CJST!(IOTO LUSITJKO ^655

lor, & melhor forte fahio o Capitão Franciíco Díiarte feri-
do em hum braço j mas foy defpois de tirar com elle a vida a
miiy tos inimigos : Trinta lhes cufiou o fucçeífo , & xaxiy tos
mais os que fangrou o nofío ferro.

4 zj. Não deíprezou o inimigo o favor da fortuna , antes
o fegui o. Guameceo as trincheiras, & marchando pellas Ola-*
rias avizado, & conduzido por hutntraydor aíikitou a que
chamaváo de Nuno de Mellof governava a gente,que a guar-
dava,) o qual neíla occaziaò eftava aufente , Sc léus foldados
commenos vigilância, do que deviào. Supria o valor afalta
do rebatcj primeiro lhe cobrirão de íangue , & de luto a vic-
toria, que lhe largaíièm a trincheira . Em defenía delia moí-
trou o Padre Frey Belchior Religiofo da Terceira Ordem de
^ají cõasmef- São Francifco, o quanto importara, que os foldados foraó
^"í,;^ j;f j"^ religiofos , pello muyto, que a virtude anima, & guarda. Ca
de Num de Mel- ^^^"^ dardo nas mãos matou a quantos ferio j & ferio a quan-
lo. tos alcançou, íem que baila, nem ferro inimigo lhe oífendef-

fe o menor pello do habito. Avultou tanto diante da Mage-
flade delRey Domjoaó o Quarto de Portugal, o muyto que
( fervio á Igreja,& à Coroa , que o nomeou, alguns annos def-

pois, em hum Bifpado ultramarino. Caro comprou o inimi-
go a viâ:oria , & o pofto ; porém como para fua guarda era
cha ve,&: porta para noílà perda julgou,que era menor o cuí^
to, que avalia.;, .i- - ^

45 OfavoraVcldeílcsíucçeíTos fazia crecer íèm medi»
da aefperança , que Sifgifmundo tinha de dominar a campa-
nha: Viafíè fenhor de muytos corações tray dores , que entre
nós fe deííimulavão^& julgava, ( com bom difcurfo ) que fa-
zendofe fenhor dos animos,pouco tinhão fuás armas,que cò-
quiftar na terra ;& muyto menos recebendo cada inftante no-
ricias taõ miúdas de todos osnofíbs movimentos, que nunca
podia errar, nem perder as occazioés de feus progreííos . Gc"
cupavaííè em fortificar as Eftancias ganhadas, quando o cer-
^ tificaraó da opportunidade, que lhe offerecia o defcuido, &

a confiança, com que na Eftancia do Mendoça eílava o pre-
zidio, que a guarnecia,engro(íàdo entaõ,por diligencia de
rjoílbs Cabos, de extraordinários Capitães , & foldados parai
cortarem o paíib ao Framengo em cazo, que animadoras vi-

âiorias

,535 ': fAt^EhLir\OIIh 79

áioríasprofeguifleaconquifta. Apujançanosdirposamina: ^^^ ^^

O poder he alimento da confia!iça,& do defcuido. Sem rece- J^^^^X ^npuu-
yòs de inimigo,os achou o Olandés , que furtado às fintinel- ç^o „op ^--i^-

I

aiwou

ías,o3 defens^anou às cutiladas, r de hú mefmo achaque motr otmmigo d Esta,-
rem confiados ^& necios.] PerdèraÓ alliavida osCapitaens f'i^àoMenào^^.
Braz Soares í enhor da Ilha de Santa Maria -.Manoel de Sá Ca-
V aleiro do habito de Chrifto, com perto de trinta foldados,
entre elles D. Manoel Deça, que degolou defpois de fe en-
tregar a bom quartel . A Dom António Ortiz derão a vida,
porque lhe conhecerão a lingoa fera Italiano,& diziaíie,que
deviaó á nação efte reípey to de boa correfpondencia , logo
veremos o fundamento da fofpeyta.) Lev àraó ao dito Capi-
tão com feu Alferes , & outros prefioneiros . Para perfegui-
í-emaosnoírosfoldados,quebufcavão afalvaçáo nos alaga-
diços, traziáo configo caés de fila , que lhes lançavão : Não
vinha a fegurança da vi£l:oria menos prevenida para o def-
troço do alcance. Muyto perdemos nas duas Eftancias dos
Affogados,&de Nuno de Mello pella importância dos fitios,
porem nefta do Mendoça V muyto mais pella quebra da re-
putação. O erro que com facilidada fe comete, ou íe emenda
com difficuldade, ou fe paga com demafia. '

46 Tem a ambição a natureza do fogo, crece pella me-
dida dos materiaes, em que fe ceva. Jà a chama da cobiça não
cabia no pey to de Sifgifmundo, ateada nos profperos fucçef-
íbs de fuás armas, fem Ihedeixar olhos para verjque a labare-
da em feus próprios exceíTos fe amortalha . Com deliberada
ouzadia (aífõprada de avizos traydores, que de entte os nof-
fosfahiáo)ferefolveo em enveftir a noífa Fortaleza do Kt-.Determmatowar

faval que diftava do Arrecife húa legoa de caminho . Difpos f^^ffo a mjf^
*'^y'^ 1 rc- ■ ■ • J/ri- Q. Fortaíezado Jr^

OS requifitos neceífanos para o mtento com diílimulaçao, ò^ ^ . ^

preftezaj &fahio em 24. de Março com todo feu podenDi^
cfcolhido para feu defignio, por fua perfidia,& por noílà ve-
neração, [era o de qumta; feira mayordaquelle anuo] tendo
concebido o Here;e, que em noíia Religião , & feudefacato
levavacertaa viâ:oria. Com 15 00. Infantes marchou pellos ^

engenhos de Francifcò de Brito , & de Ambrofio machado,
até pafíàr o Rio Capiberibe, aonde fes âlto:DíVÍdio fua gen-
te em três efquadroés, aos quaes ordenou,que a hum tempo

G4. avan-

Jlli.i

avançaíTem por três partes , o primeiro pella do engenho de
Jerónimo Paes j o fegundo pellas coftas da Igreja da Miíeri-
Arrojujfe a ejca» mordia: o terceiro por hum pequeno Rio chamado Pernam-
ar a forca, jvforim 5 eftechegou primeiro , & fem íer íèntido inveftio a
po voaçãOjSi: chegou atè ás portas da Fortaleza. ( eftava to-
da a gente recolhida na Igreja occupa da em receber os lacra-
mentos da penitencia , & da Euchariftia ) Achou o inimiga
lançada a ponte levadiça, por culpa dos Italianos , aos quae»
coube a guarda delia naquelle dia: (fe foy defcuido , ou foy
paci:o definio a occa2Íaó:)Em defenfa da ponte, que atravet
fava o foço da circunferência do Arrayal, eftava hum redu^
£l:o, &nelle de guarnição^ 17 . Italianos^ a todos degolou o
inimigo. Pedirão bom quartel, porém o Framengo achoii
que o naó mereciaó pella vileza da entrega j ou a cauza foíTe
defcuido, ou trayçaó.

47 Jà a efte tempo o fegundo ,&: o terceiro efquadraõ
do Olandès fe tinhaó metido debaixo da noíTa artelharia(re-
colhida toda a gente da povoação dentro da Fortaleza) po-
Tadece miferíi- j-èm fehúas bailas os não podiaó ofFender por altas, as dos
yd eJtrAgo. tnofquetes lhes abaixarão de maneira o orgulho, qu© em bre-
ve tempo vira5 as fraldas do Array ai jucadas de corpos mor-
tos. Donde receberão irreparável dano foy das fucçeíTivas
cargas, que nelles empregarão as companhias de mofquetei-
ros dos Capitães Manoel Rebello da Franca, Miguel à^
Abreu,Francifco de Figueiroa3& outros,que fahiraó da For-
taleza, aos quaes fe agregarão muy tos aventureiros , que an-
da vaõ de fora: Crecia o eftrago com a períia , & o horror do
inimigo com a detença . Tanta preíla fe davaó os noífos em
ferir, & matar, que cada hum dos Framengos defeíperava de
lhe ficar tempo para fugir: Ate que defprezada a obediência,
lojCedeforãenít' perdeo feu império a contumácia dos Cabos , & foraõ todos
do. largando o intcnto,& o campo. Os dous Irmãos Mathias, &

Duarte de Albuquerque com efpiritu incançavel aííiftiaõ
cm toda a parte, & difpunhaõ com todo o acerto . O Conde
de BanhoUo ( a quem efta occazião achou emfermo de gota)
fe mandou levar em húa cadeira de mãos à porta da Fortale-
za Cainda agora fenão fabe fe para utilidade noíra,fe c|o Olá-
dès:)De forte carregarão os noíTos ao Framengona retirada,
' que

que a poucos páffos o pozeraõ em miferavel fugida : Come-
tiaò os Portugueses a porta para o confumir no alcançe,a ne-
nhum o permitiõ o C onde ^ & com efte embargo deu a vida
aos que efcapâraõ da noíTa efpada. Não parou o inimigo, fe-
náo paíTado o Rio Capeberibe , aonde efperou grande nu^.
mero dos feus, que perdidos pellos matos bufcavaó o feguro
na perdiçaõ-.nelks os bufcou a morte como a brutos, naõ co-
mo a foldados. Por fima de 400. mortos deixou o Framengo
m campanha: muyto mayor numero o dos feridos^entre elles
alguns Cabos,homens de conta (o principaljfeu General Lo-
renço Rimbao)cujos nomes tirou da memoria o alvoroço de
noíTo triumpho,& o trágico de feu efl:rago.Quaréta,& tantos

cativos deixou em noíTô poder a vi6l:oria,entre elles 4.Capi- .

1^-1 « rr ' T) j ^\- tórios que det-

táes mal feridos ; & outros ofRciâes menores . Perdemos 25.^^^ ^^ ^j^^^y^

Ibldados, a faber os 1 7. Italianos fobre-ditos, & S.Portugue-
2es: Mayor numero deferidos; entre elles o Capitão Joaò
Vafques atf aveífado de húa ballá , (morre o ao terceiro dia,
com laftima igual â perda-J Henrique Dias Governador dos
Minas, que nefte dia fe exeedeo a fi mefino, levemente feri-^
do;& outros de menos conta,aírí ha calidade,Gomo na lezão*^
Muy tos dias andarão os íioíTos índios pellos matos à caça de
Oland€fes,&fião perderão o tempoi muytos achàraó mor-
tos das primeiras feridas; mais os què perecerão defte fegun^>
do golpe. ~ "' ''■ ',

48 Tem fiià idade as forças , não affi o valor s obra fem
tempo, porque he virtude do animo. Muyto na flor da ida-: ^^^.^ ^^^^^^^^^
de feguio Joàó Fernandes Vieira a milícia; o exercício das ar- ^.^ .^^ ^^^^^ ^^
nias lhe adiantou as forças; em nada era de femelhante o pui- ^^^^ ^ ^^^^^.
fo, do coração. Em muytàs occazioés paíTadas, lhe tinha vif-^;
to a prova quem na preíente,quando a guerra eftava mais vi^
và, lhe fiou a fegurança da Campanha, com viíite annos de
Íáade:Era Capitão de defcubrir o Campo,&: no confliâ:o re-
latado , foy hiím dos primeiros , que com feus foldados deu
fobre os inimigos, igualandofe no valor,& difciplina,aos Ca-
pitães mais aíTinalados. Para obedecer nenhum mais promp-
to; para mandar nenhum mais acertado. Em todas asconful-
tas achou aprovação feu voto ; em todos os encontros ref-
plandeceo feu acordo: Todas às idades teve de varão,porque

não

li" i:fr

^3 Cjsr^oro LVBiTAno t^a^

não ouve nelle acção, que buícaffe defculpa fia mocidade,.
Cnou-o a providencia para homem grande , & em nenhurab»
tempo quiz, que pareceffe pequeno. As particularidades cõ
que nefta batalha obrou feu esforço ti veraõ a fortuna dos
maisj parece,que as tirou da memoria o muj^to, que então es-
pantarão ao juizo.

49 Gom a Fortaleza 5 que o inimigo levantou no íitio
dos AfFogados, j^igual á importância na grandeza J lhe ficou
c olanãs ajfaU livre O paffo para fahir pello certão a feu gofto,dando repen-
ta^ & ajfola âi- tinos aÔàltos em varias aldeãs, muy to a feu falvo.Efcondia o
i'fr^ ^ovonçQ. tejjjpo^ 3^ a eleição do lugar; & a incertefa do golpe atalha-j
^"^' ^^ * va a prevenção do reparo. Em 1 3 .de Abril (no quarto da ai-.
va)derão40o. Olandefes, acompanhados de muytos ne-
gros, mulatos, & Índios fobre a povoação da Moribeca , que
íem reííftencia faqueárão , & deftruirão : ( defamparada pri-r
meiro da deíatenção , que do fobrefalto ) No íiiror dorou^^
bo,&do incêndio o experimétou cruel inimigoino defacato,
com que profanou os Templos,&deípedaçou as imagens, o,
vio refinadiffimo Hereje. Por forte [ em tudo femelhante ]
paíTou húa aldeã , que chamavão do engenho de Dona Ca-,
therina de Albuquerque , aonde com hum meíino incêndio
arderão edifícios , & fazendas . Carregarão a prefa , & mais
carregados dos moradores, que os efperavão de volta , forâo.
largando tudo o que não poderão levar fugindo.

5 o Em a 5 . de Mayo aííàltárão 1 oo.Framengos, inopi-
nadamente, os engenhos dos GatarapesrPara carregar açuca^
liião todos providos de mochillas,que encherão á íiia vonta-.
de,masfahio-lheamargofoaogofto. O Capitão Domingos,
Dias com 20. foldados , & alguns mancebos da terra lhes fe-r
guio o alcance, & matou 2 y . ferio dobrado numero j cativou
hum Sargento com mais alguns foldados j recolheo quantida-
de de mochilas, que aos vi&oriofos fervirão de refrefco,& de
tnumpho;& aos Olandefes o deixalas, de deferabaraco,& de
remédio. Com pouca difíèrença fes outras muy tas fortidas,
que pella femelhança fe podem ver nas paíTadas. Faltava-lhc»
jà por aquella circunferência, em que empregar a cobiça : O
medo do noílb Arrayal os não deixava atrever a mais longas
diftancias. Sem câe receyoj & com aquclle interecc fe deter-

çnináraã

ivl

minarão em levar de hu afíalto o roubo, & o domínio da liha
de Itamaracá : Em grande multidão de lanchas embarcarão Gmhff. a ilha. de
toda a ília infantaria 5 & cingirão a Ilha por mar: Deitarão ^^^-^^^'^<^^',
isente em terra por tantas partes , que por todas fes a invazaó
hum aíTalto continuado. O Capitão Salvador Pinheiro^ que
a governava, fe oppos valeroíamente á defenfa; porém como
o corpo da fua gente não podia encher o vão do cinto,oppri-
mido do cerco íe rendeo à multidão. Vio-fe cercado do mar,
Sc dos inimigos , a retirada impofíível , a perdição certa, &
neftes termos , fora obftinaçaõ aperfia . Aoufadia acompa-
nhada da prudência fabe medir a efpada pella occaziaó. A ar-
ma rendida confervaíTe inteira j quebrada na5 tem ferventia.
Loucura da vaidade he,morrer fem efperança ; realce do va-
Ior,pairar a tormenta , Fortificou oFramengo a Ilha como
roubo delia. Hum negro lhe defcubrio,entre o mais dcnío da
mata hua caza com o recheyo de dez mil cruzados de ouro^
& prata, que alli tinha efcondido,quem acautelado entregou
o dep oíito com a diligencia de efconder o thezouro.

15 1 Hum freyo era para o inimigo a noíTa Fortaleza do
Arrayal, porq o detinha no defejo de correr livre pella cam-
panha, & todos os meyos bufcava para deitar fórao bocado, Empenhafe em
queoreprimia. Efperou, queapetfia venee^ a refíílencia. ^^^ ^^ ^ f"-']'^
Sc em quatro de Agoíto deitou tora mu inrantes : Encareceo ^^ ^^ ^ — ^
a confiança,que delles fazia 5 manifeftou o intento , com que
os mandava; deixou em fua eleição os meyos,para que delles
iifaíIèm,eníinados da occazião, & do tempo. Marcharão até
o engenho de Franciíco de Brito, aonde fizerão alto , dando
icoftas a hum troço dos feus, que deixarão occupados em le-
vantar húa trincheira, & guarnecer huas cazas , que acharão
devolutas na paílàgem do Rio Capebiribe; & a outro, que
com a mefma prevenção deixarão nas cazas de FrancifcQ
Monteyro Bezerra: Deraõ as íintincllas rebate no Arrayal,
mandou Mathias de Albuquerque fahir fora aquellas com-
panhias,que o repente achou mais promptas^guiadas das íin-
tinellas deraõ fobre os que eftavaõ aquartellados nas cazas da
paíTagem do Rio,que valeroíamente deíalojàraó, &conftrã-
gerão a bufcar a falvaçaó no pego . Em íeguimento das pri*
meiras mandou o noíTo General outras companhias, que le^

vadas*

m

S4 QASr(^orO' LUSÍTMO 1633

V adas por diíFerente caminho avançarão as trincheiras , Sc
cazas do Bezerra, ferindo, & matando com furor tam vi vo,
que o Olandès com as mãos levantadas pedia bom quartel;
A todos voara o fogo fe entre os noíTos fe achara hum barril
de pólvora. Bufcava a ira porta por onde entraííè a efpada,
Oí nofoslhe fí^^-q fiando O efquadrão, que ficara de poíla ches^ava a focorrer
^ •''' os íeus, dos quaes achou ;a, mais de 40. mortos^ís: entre elíes

muy tos officiaes de guerra.Obedeceo o furor à rezáo , & efta
à força;retirâQfe os noíTos levando configo muytos inimigos
prifioneiros, que derão à retirada nome lie viâoria . O Fra-
menpfo reparado de fuás fortificações continuou com as trin-
cheiras , & com ellas deu principio ao cerco , que intentava
por ao largo, à noffa Fortaleza do Arrayal.

^2 Conjecturou Mathias de Albuquerque atenção do
inimigo , & logo entendeo as prejudiciaes confequencias de-
ftas premiíTas (porque na vezinhança coníifte o mayor rece«
yo dos afíaltos,quando os pedem avizos de tray dores) não íe
dà tempo à prevenção, aonde o não tem a marcha:De que a-t
proveita o rebate,quando o dà o golpe? Antevio o General
Uo largo lhe em - efte dano,& para o atalhar, mandou por fogo aos canaveaes,
fedem o cerco, poraquella parte por onde lhe podiáo fervir de impedimen-
to à vifta . Em oppoíiçaõ do quartel do inimigo ( fituado da
outra parte do Rio)mandou levantar húa trincheira de grof'
fas vigas, que logo guarnecerão algúas companhias , de mof*
queteiros a cuja fombra fe plantou nella a artelharia,que pof
deífe fazer dano confideravel ao Framengo . Mandou fahir
da Fortaleza do Arrayal toda a gente inútil para tomar ar^

mas. Ao Conde de Baiihollo ( aíTifiuia á obra de húa Fortale-
^^a , que no Pontal de Nazareth fe fabricava ) que logo fe re-
còlhefíè ao Arrayal com o feu terço de Infantaria : O mefmo
àvizo fes a todos os moradores da circunferência^ acudindo a
tudo, o que importava à confervação do comum,& do parti-
cular, (como valente, & pratico foldado,) para que o inimi-
go achaífe em toda a parte prevenida a defenfa , & cortada a
efperança. Occupado neíla diligencia o achou hum aVizo,de
que pello Rio de Capebiribe fubião a boga furda cinco lan-
0 'ffi^ Mathíof chás cm companhia de hum pataxo j & que o Olandès man-
de Jlki^íienjuc. dava aos feus focorro de gente, artelharia, munições , armas,

man-

;i^33

^À^E h LF/í^O 111.

§5

corro do tmmigo.

mantimentos, & refrefcos com ordem , que deícarregadas as
embarcações, meteirem nellas os géneros, que ti veílè aqui ri-
do o roubo,para que fe conduziflèm ao Arrecife Tem diípen-
dio,& com feguro.

53 Guardou o General para fia noticia: Chamou ao
Governador dos índios Dom António Phelipe Camaraõ^co-
mun icoulhe o avizo, ^ o fegredo, ordenando-lhe , que com
o feu terço fe foífe embofcar em hú fitio fobranceiro ao Rio,
que chamâo o Guardez,com fintinellas ao largo , que vigiaf-
fem a navegação. Aos Capitães Luis Barbalho , Manoel Re- -^"^ Avix.owm*
bello da Franca, Miguel de Abreu, & outros, ordenou , que
com 8oo. infantes da ordenança,que de partes di verias aviaô
acudido, fe formaffem no íitio de Pernam-Morim,para todo
o fucçeííb (podia fer ardil o avizo,& fatifez affi , á certefa^ &
âdefconfiança, para que nem o engano o achaífe defaperci-
bido,nem a verdade defconfiado.)Erão 1 8 .de Agoílo,quan-
do pellas duas horas da meya noite derão fé as fintinellas do
Camaráo,das embarcaçoens do inimigo j previniráoíe os em-
bofcados,& tanto que fur dirão a emparelhar com o fitio,
empregarão nellas fucçeffivas cargas ^ cahirão muytós j &o
medo obrigou a outros, a que fe deitaífem â agoa , adiantan-
dofe a perder a vida ('como fe a efcolha fizera a morte menos
certa, porquea bufcavaò.)A o efi:ro)ido da mofquetaria acu-
dio o efquadrão,que os noflbs formarão em Pernam-Morim,
promptos na obediência, indiferentes na cauza. Chegarão a
tiro, derão fobre as embarcações húa carga ferrada: Temeof-
íè o Framengo fiimergido , defemparou os vazos 3 dos quaes
os noífos fe apoderarão,& de todo o focorro,que confiava de
féis peças de artelharia ^ & bronze ; oy to roqueiras , muyta
quantidade de pólvora, & ballasj abundância de resfrefco, &
(de viveres de todo o genero,que logo conduzirão para o Ar-
rayal, com algúas bandeiras inimigas , que fizerão mais plau-
zivel a vicioria, deixando as embarcações confumidas do fo-
go. Cento, & tantos Framengos perderão nefta occaziãoa
V ida: Dos que efcapàrâo das bailas , & das ondas forão pou-
cos illezos : Os que trabalhava© nas trincheiras enformados
do íucçefíb,& induzidos do medo largarão a obra com os in-
ílroinentos delia, fiigindo tão defatinados, como fe levarão a

H nollà

Hí

r

S6 CASr^oro LUSITAKO 1633

noííâ efpada Tobre fua cabeça . Deixarão arvoradas as ban-
deiras, ou por teftemunha de fua cobardia , ou por disfarce
^^^^^^^/]^^^rde fua retirada, que corihecida de Mathias de Albuquerque
& \m0ltrff9ge os mãdou feguir a tempo,que fua ligeireza fruftrou noíTa di-
do ume aço. ligencia. Muyta ventajem faz na velocidade, o que foge fem
tino, ao que voa com tento. Achoufe nefta occaziâo hua car-
ta do General Glandes, para os léus Cabos ^ que prezidião à
fabrica das trincheiras, pella qual ordenava , que recibido o
focorro paíTaíTem o Rio, & a todo o rifco inveíliíTem â efca-
la íi noííà Fortaleza do Arrayal; & que entrada, a nenhú vi-
vente fe defíç vida. Trocou o çeo as mãos à eípada j & rece-
beo a ferida, quem ayia de dar o golpe. Os homens diípoem^
Deos determina.

: 54 Propriedade he dos Herejes o ferem perfíados . Prc-
íiftem em fuás opiniões por teima, & não por rezão:Confun-
di-os efte íiicçefíb, porém não os convenceo . Çom fagacida-
de, diíTimtilàrão a quebra do poder,& da reputação:Sufpen-
dèrão as occazioes, que podião dar motivo a noífas vistorias,
porque aos feus efqueceífe o medo , Sc aos noíTos o orgulho.
Entrou o mez de Outubro, conheceo rios foldados crecido o
defejo de roubar,& tam viv o,que de todo lhes tirava da me-
moria o receo de morrer : Fiou o fucçeífo ao alvoroço , Sc
em 2 1 .do dito, dia das onze mil Virgens,dcitou fora 4oo.in*
fantes com ordem que aíTalt^iífem a fregueíia de Santo Ama-
mUa o Generd ro: (feguro nó avizo, dç que nella não acharião reíiftencia.)
oUnd}s faquear Em húa trincheira, que era todo o reparo dos moradores,af*
afreguesa, de s. ç^r^^^ ^^ qccazião O Capitã O Eftevão deTavora com 1 2 .foi-
"^^^°' dados, defviado húa legoa da povoação . Deu de rofto húa

fmtinella do inimigo com duas noífas j hum tiro a deixou fem
V ida, S>c aos feus com rebateiConfiderarãofe defcobertos,te-
inerãofe aíFaltados, prefumirão-nos focorridos de ou tra trin-
cheira, que nos ficava mais vezinha em guarda da paíTajem
dos Pvios Una,Sc Juboatam,Sc guiados de hum negro, que fa-
bia a terra tomarão outra vereda, que os defviava do perigo,
o que Caccede ao Sc encaminhava para o engenho de Jeronymo Luis. Em feu
Capitão Ejlevão alcance foy o Capitão Eftevão de Távora com os feus doze

deT.vorafahtn- foldadQs,Sc alguns moradores, que fe lhe agregarão. Chegou

do ao encontro dos ,. P ^^\ ^ 1 j-

ao dito engenho a tempo que pellas chamas çonneceo os edi-
:. .. ficios,

tniínigos.

1633 ■ fJ^TE L Lmp^O IIL S;

ficios. Enformado de que o Olandés com o roubo de açúcar^
pados, & moveis marchava para o engenho de Maria Barbo-
2a o íeguio a paíTo largo, Sc o aviftoii a tempo, que não pode
o inimigo fazer mais,que porlhe o fogo, & marchar carrega-
do de pelouros , com que os nofíbs os ferviaó fem enterrup-
çaó. Nefta hora chegou,cazualmente , a aquelle kigar o Ca-
pitão António André com 40. mofqueteiros j coríoulheo
paíTo.Vio-fe o Olandés por húa parte atalhado, por outra
períeguido , & com defefperado medo determinou romper
por hiia denfa mata, aonde embaraçado das armas , nem po-
dia marchar com ordem, nemrefiftir com forma. Atribula-
ção lhe abrio caminho à menor perda, mas não à melhor for-
tuna. Rompeo a mata, com a dita de não fer extenfa , até fa-
hir a campina de Tigipió, aonde deu de rofto com Luis Bar-
balbo , que o recebeo com húa carga de 40 . mofqueteiros
(todos moradores da várzea J tãodeftros na pontaria, que
derribarão 30. Framengos: Deíacordados os mais, forão lar-
gando a prefa,& as armas, atentos aconfervarem as vidasy
que mu y tos perderão no vão de hum rÍ0,&outros o paílaraó
com agoapellospeytosj correndo todos aempararfe do en-
genho de António Fernandes Pefíba : Aonde imaginarão o
abrigo, achiraó o eftragoj affi fe encadeavaó aos miferaveis,
os infortúnios. Acazo chegarão a aquella parajem o Sargen-
to Mayor do eftado Fedro Corrêa da Gama com 200 . mof-
queteiros j deu fobre os inimigos, f que entre tantas defgra-
çastiverão adita de chegarem defordenados^ matou qua-
renta, & tantos. Os Cabos, que na mayor defordem imagi-
narão o mayor perigo, intentarão fazer alto 3 porém como o
medo he incapaz de difeiplina , faltou em todos a obediên-
cia, fugindo cada-qual por onde o guiava a forte, & teve taó
pouca íua eleiçaõ,que os mais delies cahiraõ nas mãos dos ín-
dios do Camarão, taó afíidos , que defatinados de tantos re-
vezes efperavão os golpesj tendo por melhor fortuna o mor-
rer, que o fogir. De 400. não elcapou o dizimo da morte, &
<3a prifaó.Dos noiros(em todos os encontros^ morrerão cin-
co j hum delies Sargento de Luís Barbalho 3 & ficàraó alguns
feridos.

5j Gala fesfempre afortuna da inconfíancia : chama

-■• H2 com

o Capitão AntO'
nio A»dre^QS coYf
ta,.

Luis Barbalho os
rom^c.

Feiro Corrêa da.
GAmA os cafregiS,

O Camarão cí
desbarata de tO"

«s

C^sr^oro lusitj-no

1^33

Çhèga focorro do
Reyno, que o mi'
wigoàejiroe.

com os favores, para empregar os revezes. Para affiftir a Ma-
thias de Albuquerque no governo das armas tinha parti-
do do Reyno Francifco de Vafconçellos( Fidalgo naòmeír
nos illuftre, que foldado) por Cabo deduasnâosportaii-^
tes, & algúas Caravelas , que conduziaõ hum focorro muy to
coníideravel : Com anticipados avizos oefperava o Olaii-
dés.(ordinario achaque de noíTos intentos^Sc de que ordina-^
riamente morrem as emprezas primeiro manifèftas ^ que dif»
poftas ) Na altura da Paraiba andava aos bordos a armada
Framenga j tinha medido o tempo da viagem pello avizo, &
em Novembro defte annolhe vieraócahir nas mãos os na-
vios do íbcorro . A deíigualdade do poder , que nos tirou o
partido , nos aconfelhou o remédio; deraó as Caravelas â
Cofta y as duas nàos furgiraó na Bahia da trayçaó . Fran-
cifco de Vaíconçellos faltou era terra , & tomou o canM-
nho do Arrayal, imaginando ^ que deixava íeguro o fo-*
corro , que íè pode falvar . Hâ fucçeífos tam deígraçados,
& infortúnios com taes circunftaucias , que lhes naÕ fabe
achar efcuza arezaõ, nem ainda , quando a verdade gri-?
t^ a defculpa . A falta do Cabo , ( que a occaziaõ fes pa-
decer culpa ) teve força de exemplo , que feguiraó os íol-
dados fem pejo porque a imitação os eícufava, ( deixara-os
o Cabo em defenía das embarcações) a nenhum poderão
deter os gritos dos homens ^o mar, que juntamente os
chamavaó com as vozes, & com as armas para acudirem as
aiáos delRey, que prometerão guardar, & defender. Ultimar
mente osmarinheiros,que os reprehendiaõ com as vozesjconi
as obras os envergonhavaõ : Tomàra5 as armas , & com ellas
nas mãos eíperaraó o inimigo,& fe defenderão como valero-
2 os,em quanto osnaó oprimioa multidão dos contrários,^
os enveílio,rompeo;& íàqueou todo o cabedal,q lhe fervio:

, , Entregou os vazos a hum vivo incendio,quebreviííímamen-

Comperda.de Y€' o, ,^p. irv-ii a ^

putaçao & filie' ^^ ^^ conlumio,menos nua letia, que derendida da vaza, ík de

da. alguns homens do mar íe livrou do fogo,& do ferro.Com eí^

trondofa fefta celebrou o inimigo íua viâ:oria, & noíTa inju-
ria,& nunca com mais fundamento , porque nunca nofías ar-
mas naquclla guerra padecèraójnem mayor quebrajUem ma-
yor perda,

Ç6 Tem

o tmmtqo

t<5^5 . TAÍITE r. LIFXO TIL ^ $^>

: «^ 6 Tem os males de cobardes o cometerem de tropel.
A fraqueza , & a in fidelidade fe unirão neftes dias para nos
magoar: Sahio o inimigo em.o mez de Dezembro,com gran-:
de poder de gente , & de navios fobre a noíTa Fortaleza do
Rio Grande.rainda que o efperava a poíTc, & naó a conquif- compoderfohréa
ta."] A negociação tinha comprado a contingência da bata- fortaleza do Rio
lha. Rende-oa o Framengo com a vifta. Suppoílo que o Ca- Grande.
pitão Pedro Mendes ferido de hõa balia deu a vida pella de-,
fenfa. Com pretexto de cobarde a entregou o Tenente Go-
Y ernador, que era hum S argento: Pareceo-lhe a fraqueza me-
nos fea, que a trayção:Facilmente cahe na vileza,quem fe de^
libera a viver da infamia.O primeiro que entrou na praça foy
o Callabar ( aquelie mullato de que fizemos menção em o
numero trinta, & três defte livro, ) ou para aíFegurar o con-
certo, ou para fe conhecer o author do contraio . Com qua-
renta foldados, que a força tinha de prezidio ( os mais tinha
licenceado o Capitão ) levou o inimigo prefo ao Cabo para
o Arrecife. Murmuroufe então, q com efta apparencia qui-
zerão os inimigos encobrir a trayçaó da entrega : Engano
mais feguro, porém menos apparente: Temerão, que o de íl-
tiar a Fortaleza para diffimular a trayçáo de0e tempo, a que
algum focorro impedifíè o contrato(como ouvera de fucçe-*
der, porque o Capitão Mayor da Paraíba António de Albu-
querque o conduzio com tanta prefteza, que lhe augmentou ^^^ >« ^y ^^;
a m.agoa50 intépeftivo da perda.Com toda a artelharia de to- trega. tor trav-
ais fuás Fortalezas coroadas de luminarias,publicou o inimi- f^c
go os effey tos de húa trayçãoj fervindo hum mefmo eftrõdo
a íiia alegria, & a noffa magoa; o que nos ratificou,a cara deí^
cuberta, remetendo para o noíTo Arrayal o Author da entre^
ga, livre, favorecido,& medrado: Que o prendeíTera com gri->
* Ihoés, & lhe confifcaíTem os bens , mandou logo Mathias de
Albuquerque, proceffado o crime pella confiíTaó do P».eo:
Quem fecha os olhos à enormidade não repara nos indicios
do del!â:o. Nenhua perda foy para nós mais fenfivel, porque
nenhum íiicçeíib foy dos noííbs menos imaginado . Deu eíle
infaufto golpe fim aos fucçefíbs doanno de mil & feifceníos
-& trinta & três.

57 Nas mãos dos hiftoriadores perdem as pennas o na- jptsrAfe a ^er^

03 tWtdX déde da hijlori^^

90 C^Sr^Oro LUSITANO t6^^

tiiral movimento , com que nas a2as fervem ao voo , porque
as deícompoem a ignorancia,8c a malicia^que induzem o anir
mo5a queasmovamaíslivre,quandQtomãoatintadas infor-
mações, porque nellas obra a paixão íèm medo da ceníura.
A nota dos erros efcritos,, cahe fobre quem efcreveo , & naõ
fobre quem informou ^ faltas em que mais livremente cahe o
fíncero, que o defconfíado. He o computo do tempo a almai
da hiftoria; errallo na meírna idade dos fucçeíTos^he mais de-fe ^
fatençaó^ que engano: Seja efta, ou aquella a cauza,. affèaífe a
hiftoriacom feeícreverem nella ascouzasfóra de feu tem-
po, & fora de feu I ugar.Em hum Iivro,que em Lisboa fe im^
primio , intitulado Tnww/^/jo da Liberdade^ affirmaíèu Au- ^^^ «^ ^^
thor íènhorearíe o Olandés primeiro da Paraiba, que do Pò-
tal de Nazarethj& íè enganou em oy to mezes de tempOjpor-
que o Framengo conquiftou a Fortaleza do Pontal em Mar-
ço de 1 6 3 4 . & a Paraiba em Dezembro do meímo anno. Sua
ílngeleza lhe defculpa a credulidade j porçm noíTa obrigação
apurando a verdade fatisfaz com efta avertencia , a quem re«
parar na diíferente ordem, q levaó os fucçeíTos de húa meíina
hiftoria. Nella achará o leytor , emalgúas occazioés emmen-
dados femelhantes defcuidos, bebidos naagoa envolta das
relações , que nos recebemos na pureza da fonte guiados, de
J quem com a penna , & com a efpada, preíente a todos os a-
contecimentos defta hiftoria,obrava,&: eícrivia,

5 8 Convidado o Olandés da boa fortuna , com que o
anno pafíàdo de 6 3 3 . fe fes íenhor da Ilha de Itamaracà , &
intentou o oUn- do Rio Grande,fe animou a emprender a conquifta do Pon-
àa a, conquijía do tal de Nazareth j naó fó pella v ezinhança,fenaõ também pel-
Pontd de Naz^a- j^g confequencias: Era a porta por onde nos entravaõ os fo-
eorros, &: fahiaõ os géneros . Via de longe noíía conveniên-
cia, & de perto fua importância . Tenteados os fins , diípos
os meyos empenhado, & ardilozo. Preparou os vazos de fua
armada com a pratica de ir fobre a Paraiba : Fes crer a fama
com a derrota , divulgandofe a empreza com as vozes do fe* -g,^
gredo; induftria,com que logrou o engano.Sahio do Arreçi*'^'^"
fe em cinco de Fevereiro com ordem a toda a frota , que em-
proaffe a altura da Paraiba . Aviílou a Fortaleza do Cabe-
^ . delloj que guardava a melhor barra daquella Capitania , &

da

1^34 ' ^ A'^^ ^- L1V(^ 111. s>«

da outra parte deitou 4oo.homens em terra com ordem,que

ameaçaíTem , & naõ cometeíTem a força de Santo António,

que aíli eftava fituada^o que fizeraó com vagaroías apparen^

cias, dando occaziaó , & tempo para que a voz do rebate ti-

rafíè a gente donde a temião , para a parte , aonde a engana-

y áo. Perfuadido Mathias de Albuquerque com a viveza das

apparencias, defpidio do Arrayal 200. foldados em quatro

companhias^, que foíTem focorrer a Paraiba , a tempo , que o

Olandès acautelado, & furtivo [recolhida a gente, que tinha

deitado em terra j vinha jâ arribando fobre o Pontal de Na-

2areth. Por hum efteyro deitou hum golpe de gente em terr-

ra, que o Sargento Mayor Pedro Corrêa da Gama Governa- Entra no Porto

dor daquellà praça mandou rebater com mais acordo,que ef- ^^ Z*^^^^ ^^ ^^^^

fey to: Durava o còfl ito,& a armada inimiga bufcava a barra, ■' ^"^^"^ ^' ,

a qual entrou com perda de duas fragatas , que tragou o mar

pella diligencia de hum reduto noííb, que as meteo a pique:

Deraó fundo,as que entrarão dentro do porto,aonde em húa

ponta de área fabricou o Olandès hum fortim , que as abri-?

gava. Os noíTos, que viraó o inimigo fenhor do porto , aon-i

de eftavaó muy tas náos à carga, & para ella alguns almazens

cheos de fazenda, a húa,& outra couzá poferaõ o fogo: Con*?:

fumio o incêndio géneros de muy to valor , que todos viaõ

arder com igual fentimento^ os noíTos, pello que perdiáo; os

inimigos, pello que não aproveitavaójfervindo húas meíina»

chamas à magoa de naõ roubar o alheo , & à dor de naõ con-

fervar o próprio. Pode tanto a diligencia do contrario, que

atalhou o fogo, & livrou das chamas cabedal , que mereceo i ^°''°^ entre ^

n- - 1 I - 1 r > - r» g^o ao foqo os nn'

cítiraaçao de hua boa preza j com o que iicarao os rortugue- ^i^^ quenelleti-
2es duas vezes magoados, húa pella perda, que chora vaõ,ou- nhao,
tra pello dano,em que fua meíiTia fazenda influía.

5 9 Deuíe rebate no Arrayal j & o efpanto acendeo em
todos a corajem : Corridos de enganados partirão fem dila-
ção, com a melhor gente delle, Mathias de Albuquerque, &
o Conde de Banhollo , fiando a praça ao governo dos Capi-
tães Luís Barbai ho,& Francifco Serrano,& naõ ao de Andrc
'Marim, como erradamente diz o Author do triumpho da li-
berdade em o feu Luzideno: Marcharão os noíTos Governa»!
dores para Nazareth , & íizeraõ alto fobre o chamado Caba

H4 de

"l

^1 c^sr(^ioro Lusirjno 1634

de Saníío Agoílinho j pofto fobranceiro á barra , formada
pella natureza em tal proporção, & diftancia , q com a affif-
tencia de noffas armas fe cortava por aquelía parte a gargan-
ta da entrada de forte , que a armada contraria ficava fem fa-
hida para o mar largo. Com reforçadas trincheiras fe fortifi-
cou a noíTa gente: Aílèntàraó nas explanadas aigúas peças de
alcance, & com os pelouros delias começarão a íervir as em*
barcaçoés inimigas com pontaria tam certa , que largarão o
pofto, & as anchoras, (perda menos importante ,que o rece-
bido das bailas) & furgiráo na^nfeada tanto avante , quanto
não podia curfar a aríelharia ♦ Virão os noíTos o reduto,que
ofohrão em da- O Olandés fabricava , defabrigado de fua armada j & na me-^
m- do inimigo. lihã de fete de Março décéraõ do monte 7 o . foldados cfco-
Jhidos, & rezolutos: Com tal valor o inveftiraò , que fem in-
terpolação de tempo o cometerão, fubirão, & defalojàraõ o
inimigo , que efquecido da difciplina bufcava na defordem,
á falvaçaó do perigo, & nos matos vezinhos o feguro. Forão
os primeiros, que fubirão a trincheira à efcala os Capitães
Domingos Dias , Miguel de Abreu , Eftevão de Távora , &
António André, .

60 Maíhias de Albuquerque . (chamado primeiro das
■vozes do confliâo, & logo dos gritos da vidoria) Decco do
írionte com 300. foldados pára confervar o ganhado, & para
rebater o-Olandès, fe intentaííe cobrar o perdido ( focorro,
de que a defgraça íe váleo para a ruina.)^Entre os aplauzos dã
vióioria fe levantou húavozf de peytotraydor fe affirma,
Terâcffe n ■vicio- que fahio]qu€ muy tas vezes repetio vir fobre elles o inimigo
ri A ^or àefgrACA: com todo o poder,& fes tal impreííà5 nos ânimos do vulgo,
que lhes não deixou, nem fentido livre para verem ,& ouvi-
rem o defengáno, nem difcurfo claro para íe armarem contra
o perigo concebido. A a confuzaó fe feguio a defobediencia,
fugindo todos, fem qu e algum viiTe de quem . Taó pequeno
àccidente baftou para nos trocar a forte. Provocado o inimi-
go da noíTa defordem (crccia com o eftrondo de fua artelha*
ria) voltou animofo, & fe rcftituio no perdido , gíoriofo de
Yer augmentado feii triumpho com nofíb deílroço . Vinte
corpos mortos , com fangue de muy tos mais feridos , lhe dei-
xamos por deípojo, entrando em hum j doutro numero os

1634 ^J^B7.Lir(^0!lL ^i

Capitães Domingos DiaSjMiguel de Abreil,Eíleva5 de Ta^
vora, António de Freytas5Domingos Bezerra, Fernaó da Syl|
va, hum feu Irmaõ , & outros cujo valor adiantou nefta oc-
caziaó fua fama, à nofía perda:Sendo grande á daquelle Por-
to, que o era para os focorros. '

61 Serv 10 eftefucçeíTo de acender a cólera nos Portu-
guezes, & de augmentar a defcon fiança nos Framengosjcftes
femendo , que toda íiia armada feguiffe a forte de húa nào^
que a noíTa artelharia fes dar á coíla^aquelles, efperando,que
todas alli ficaírem,ou perfeguidas da artelharia, ou atalhadas
da oppoziçaõ; porém a neceffidade he mais induftrioza, qu@
a cólera: Tal manha fe deu o inimigo , [_ ajudado de lanchas Livra o inimigo
que para efte fim lhe entearão por húa barreta , de focorro] afuíi armada do
que por ella fahio ao mar largo toda fua armada comefpan- i^ayor perigo » &
to, de quem com a v ifta, & com a ponderação media a capa-
cidade do lugar pello corpo dos vazos, tendo enfinado a ex-
periência a todos , que não podia entrar barco fem perigo,
por onde as nãos Olandezas íàhirão muy to a feu falvo : Ãííí
como fe viraõ livres do laço faqúearaõ de caminho o enge-j
nho de Cofme Dias ; roubo que lhe fervio ao gofto , ainda
que não a vingança, nem à reputação.

6 2 Naó avia occaziaó, que aos olhos do inimigo fe re?
prefentaíTe utíl, que a naó antevife favorável. A cobiça, & %
ambição lhe facilitarão as emprezas mais árduas , doutrinan?
do a memoria ao dezejo com o vjilgar adajo , que a diligen-t
cia, hemãy da boa fortuna . Chegop a armada Olandefa ao
Arrecife,aonde foy vifi:a como refucitada, (taó perdida a vio
o conceito de todos , ) & a olhavaó como yiâ:oriofa de huru
impoíTivel: Opinião, que acreditavão os Cabos, & foldados
.della,referindo o aperto em que fe viraó. Sabia o inimigo ret
Jpartir, fomar, & diminuir,& por fuás contas achava, q quan-
to mais o numero de noíTa gente fe aumentava em Naza-
.reth,maisfediminuiaemo Arrayal,&em trinta de Março
ídefpedio do Arrecife quinhentos foldados efcolhidos , & ^^^''g^^''^ i^-^^r
grande multidão de galhdores , em húa copiofa chufma de ^^^^^ jf^'^^'^^^^
lanchas, que favorecidas da efcuridade da noite fobiraõ pello do Arrayal.
Rio Capiberibe affima atè junto de Pernam-Morim , aonde
defembareàraó fem ferem fentidos ; Levantarão húa trin^

cheira

n C^ST(^l OTO LUSITANO _ 1634

cheira em correfpoiídencia da caza da Mifericordia , q guar-
necerão de pente, peças, & morteiros de bronze , com tal li-
geireza, & íilencio , que primeiro nos avizâraõ os tiros , que
•K<^j^^'^#^'^^^ os olhos irecebeo o inimigo igual reípofta daartelharia da
àdíí ajjfdtar. fQ^-i^Xtig^^com deíigual eíFeyto. Poucas das íuas bailas paflà-*
rão da noffa cava, muytas das noíTas lhes desfaziaõ a fua trin-
cheira. Luis Barbalho;, & Francifco Serrâno,que governavad
a força do Arrayal fizeraõ recolher para dentro toda a gente,
(com mantimentos,& fazendas) aonde fe achavaõ com 5 oo#
foldados para a defeníà, quefocorridos de outros fizeráo em
poucas horas numero de 8 00.

óg Para fe alcançar o poder,&dezenho do inimigo dei-»

táraõ os nofíbs fora 8 o. foldados , à obediência do Capitão

Villa Gomes:Por entre huns matos fe moftràraó ao Olandés,

"Enformao-fe w que logo lhes fahio de fua fortificação com 100. foldados:

:i!'

mps do poder, Xravoufe a pendência, durou a perfia, atè que os noíTos com
édeT^enhoãomt^^^^^ç^^^Y^^^ fe foraó retirando com intento de meterem o
migo^ ore a . -pj-^^^Yiengo na boca da artelharia , porém vendo, que os naõ
podia favorecer fem igual dano ( traziaos revoltos a peleja ^
voltarão fobre o inimigo com valor tão defiizado , que lhe
fizeraó largar o cãpo,& a viâioria , enfinandolhes a occaziaõ^
& a perda o defengano , de que os Portuguezes, fe devem ef^
timar mais pello valor, que pello numero. Contino-oti algiis
dias de húa,& outra parte a bataria, metendo o Olandès al-
gúas bailas de trabucou dentro da Fortaleza com pouco, ou
nenhum dano : De húa qpe cahio junto ao almazem da pol^
vora livrou Deos a força : com defigual perda via o inimigo
o eftrago , que as noffas bailas faziaõ nos feus: Falta va-lhe a
efperança ao mefmo paflb, que crecia a ruina ; & por fogir a
ultima perdição fe refolveo em levantar o fitio ,( retirada ;à
entaõ naó menos difficultoza, que a continuação do cerco:]
Com inâuHrlafe Fiou à induftria a livrança do perigo: Mandou hnm tambor
retirh os oIaw qò embaixada:Naó o deixou chegar a foípey ta de efpia: Vol-
tou fegunda vez , foy ouvido ; pedia a entrega da Fortaleza
com promeiras,& ameaços.Defpidiofe com defprezo,de que
o inimigo naó fes cazo, porq procurava da diligencia, o tem-
po, & não a refpofta. Deu-lho a induftria para embarcar em
fuás lanchas feridos, mortos, aitdhariaj & bagajem, com que
. . " fe

defes.

1634 ^J^£ 1, LIF^O IIL 95

fe retirou a vela , & remo. Ardil , que lhe valeo para que na
foa;itia naó padeceíTe mayor deílroço, do que temia na aíTal-
tada.

64 Em igual balança contrapesava a fortuna neíles
dias, as fortes de húa, & outra gente: Eraó trinta de Março,
quando o Olandès fe retirou caftigado , & abatido . Em os
trinta & hum pafíàrão os noíTos o mefmo infortúnio em dif-
ferente lugar. Mathias de Albuquerque , que aíFiftia com o
groííb da gente em Nazareth, fabendo, o que pafíàva no Ar-
rayalfe lhe reprefentou occaziáo opportuna, para defalo-
;ar o inimigo do reduto, que tinha fabricado no Pontal, &^4;^^^;j^^//,/^
lhe mandou dar fegundoaífal to: Achou a envefiida promp-^í Albuquerque
ta a reííftencia, & por largo efpaço íuftentou *a períia , o va- envefiiro reduto

lor da efcala, & da defenfa,em igual batalha . Sem fe inclinar ff ^f^^^J' ^'"^^

, - , ' a • r ' - 1 ^ , lhe luccede.

a algua das partes a victoria, le apartarão ambas as nações do •'

confliâ:o. (De vidio o combate,o canfaço,& naó o exceíib.)
Retiraraõ-fe os invazores com perda de fete mortos , entre
elles hum Alferes j & de muytos feridos,que levàraó coníigo»
Ficou o Olandès na poíie de íèu reduto com mayor numero
de feridos,& mortos.

6 5 Deixarão eftes dous fucçeíTos ííiípeníàs húas, & ou#
trás armas por alguns dias,no deííriíto de Pernambuco^tem**
po, de que o Olandès fe aprovey tou para dar hum fio a íua
efpada, na Capitania do Rio Grande : Tinhafe-lhe oíFereci- jrraza omlmi*
do o Gentio da terra por auxiliar , ( naturalmente maligno, go afavoa^h de
Sc inconftante,com nativa propençaõ ao roubo,& à vingan- Cunhâk
ça:) Avaliava por ofTenfa o aver fervido j & excogitava me-
yos para fe ver fenhor. Perfuadio ao Olandès a entrepreza da
povoação de Cunhaii, com a riqueza do faço , & a indefenfa
do lugar, (fobeja negaça para feu ódio , & fua cobiça ) fahío
da Fortaleza, governando aomefmo Gentio, que o condu-
zia; deraõ fobre os incautos moradores da povoação , & feu
deftri£l:o taó inopinadamente, que a confuzão cortou aos mi-
neráveis vezinhos o caminho da reíiftencia,& da fogida.Hor-
rendas, & exacraveis crueldades exercitou aqui aBarbarida-
de,& o odio,apoftados a excederemíe o Hereje, & o Gentio.
Sem díílinçáo de fexo, nem idade cortava a efpada; o roubo^
&o incédio naó diílinguiaõ a cobiça, do facrilegio^húa mef-

ma

pé C^ST^IOTO LUSITJNO 1634

ma chama abrafava as cazas,& os Templos condenados a ar-
der pella femelhança da forma: A ferrOj&fogo perderão a vi-
da perto de cincoenta peífoas, tirandoa o ódio com mais fu-
ror, aonde havia menos cauía, A hum Rei igiofo do Carmo a
tirou com tormentos odefprezo do martírio . Ao Capitão
Fragozo(que aíliftia a fabrica de húa trincheira,que fe levan-
tava para defenfa do higar) matàraó com injurias, & golpes.
Ufano com a preza , & como eflrago fe recolheo o inimigo,
deixando a terra, horrenda à vifta, íaftimofa à memoria, para
fer infaufto theatro de futuras calamidades.

6 6 Sem movimento , de que fe faça lembrança efteve

em calma a hoftilidade atè o me2 de Setembro : Parecia def-

canfo, & era mina, que arrebatou com a violência , que logo

chegou aos nojfos ç^ ^^q £jjj q ^^^^ j^ May o chegou a falvamento hum focor-

bMa'^^'^ "* ^^ ^^ dozentos homens, feu Cabo Dom Fradique , com mu-
nições, & mantimentos , que da Bahia mandou Diogo Luis
de Oh veira Governador Geral do Eftado-.Tomou porto em
Nazareth, & no meímo lugar deu Mathias de Albuquerque
alojamento aos foldados do focorro. Era aquelle pofto o de
mayor importância , & nelle aíTiftia o mayor poder . Pouco
tempo defpois chegarão ao inimigo aigúasnáos deOlandí^
com novos Cabos, & Miniílros, para o governo marcial, &
politico.Bem fe entendeo,que não vinhão novos Cabos,fem
novas ordens, mas como o fegredo as occultou , defcanfou a
foípey ta na tibeza da cautela, & pode o inimigo prevenirfe
para mayores progreíTos, furtado às noticias da noíTa gente.

6^ Porta franca,8c fegura tinha o Framengo na fua For-
taleza dos AfFogados para fahir a correr , & a aííaltar a cam-
panha todas as vezes, que a occazião o chamaífe ; Impoííivel
o teremos naquelle íitio prompta fempre a refiílencia , fácil
o confervar nelle as íintinellas, que nos deíTem avizo dos mo-
vimentos contrários, para o que tinha Luis Barbalho (já nef-
te tempo nomeado por Meftre de Campo de hum terço por
Mathias de Albuquerque) encomendado o pofto ao Gover-
SãUooTYâmen^ iiador dos Negros Henrique Dias, que embofcados pellos
go âYouoâT aíA' nqatos, & metidos pellos lamaçaesalcançavão quantos paíTos

fíLnh.

O inimigo dava.Succedeo, que em doze de Setembro fahirão
400. Olandefes, & marcharão pella vargea do Rio Capibe-

ribc

i6^

fAXTB I. LW%p 111

97

ribe guiados por veredas defuzadas para aílkitafcm o enge-
nho de António Cavalcanti,aonde o Gentio íèu parcíal^lhes
prometia grofía preía; para aíTegnrar a retirada deixou o,
Framengo hua embofcada no engenho de Franciíco de Bri-
to.Tudo entendéra55& obrervàraõ os foldados de Henrique;
Dias, que fem dilação fes avizo ao Meftre de Campo Luís
Barbalho, com avertencia , que elle com a ília gente elpera-,
va o inimigo de volta, que fem duvida lhe avia de cahir nas
mãos. Profeguia o Olandés fua marchaj ouvio o rebate, quC;
no Arrayal deu o avizo, fuípendeo o paffo : Sofpey tou, que, .
era fentido j temeo-fe cortado , & pofto em retirada deu de
rofto com o Capitão António André acompanhado de i oo»-
íbldados, na campina do Figueyredo , que para o aíTaltar de

cilladaobufcava: Nãopermittpaoccaziaõ detençaentre o
ver , & inveftir, fiados os Cabos ^ hum , na defigualdade do

numero, outro na diíFerença do valor.O pulfo de húa parte,

igualou o exceíTo da outra,& foy de húa, & outra géte igual A nojfa gente o

a reííftencia, & o dano. Guvio-fe o eftrondo do con^ic-^^i^^^^raía.

to na emboícada do inimigo , & avaliou por mais útil o fo-

eorro , que a efperajlargou o pofto para focorrer aos feus na

batalha a tempo, que o atalharão outros i oo . homens nofs

fos, que Luis Barbalho defpediQ do Arrayal para efperarem '

o Framengo na paragem de Arabroz ioMachado.Ou veraõ-fe

os Portuguezes em hum,& outio lugar taó valerofamente, q,

nao valeo ao inimigo a defenfa j & bufcou o remédio na fo-

gida: Quando jà lhe parecia ter livrado do mayor perigo deu. j poucos perdo»

na embofcada de Henrique Dias , que detocjo o àtuotoMcuoefir^go,

matando, & ferindo em tanto numero,que os feus no Arreei- ,

fc 09 contarão, mais pella falta, que pellaprefença.

68 Qiiaíi no meíino tempo experimentou o Olandés a
mefma fortuna no Porto do Calvo. Eftava nelle fobre ferro
hija fragata inimiga,fahio a gente delia a roubar pello certaÕ: ^'^^ ^^^P^^fi^"
a cobiça, & arrogância lhes fes defprezar a difciplina; convi- jortodo Caho.
dado de fua defordem deu fobre elles o Gentio de al^uas al-
deãs movido, & guiado por alguns Portuguezes, & foy tal o
furor com que os aíTaltàraò, que alcançou aquaíi todos o ef- ,
trago. Nenhum efcapou de morto, ferido, & prefo. Dezoy-
to rendidos aprezentàraõ os vidoriofos a Mathias de Albu-
querque. , I é^ Acha-

li

:i Ml

^8 c^sr(^oro lusitmo i6^^

6q Achavafíe em Olanda a Companhia Occidental c5
taocrecidos intereffes dasprefas, roubos ,& comutação de
géneros , que excediaõ os avanços, outro tanto mais aos dií^
pendios, que fazião com as armadas, & prezidios que fuften-
tava5 no BraziL Orçavaó o todo pelk parte , & faziaó juizo
certo 5 de que feria a riquefa fem conto , fe ao roubo, & mer-
cancia acreceffe o domínio , & a tão limitada parte fe uniíTe
otododoeftadojporq áfombr a do império cbegariaoutií^
aonde chegaíTe o defe;o: Com efte fundamento (favorecida^
da tibeza, com que Caftella tratava de noíTa reftauraçaó ) fe
empenharão na conquifta das Praças de todo aquelle gover-
no. Sabiáo, que o noíTo poder, fobre fer hmitado, caminha-
va a fer confumido,cada dia enfraquecido,& gaftado dos en-
sahe de oUnda contros,dasmarchas,&dasvigias. Con^eauràraõ aosmora-^
huagroparma. dores ca nfados,& aborrecidos da guerra, que osprivava da
^a- comercio,& da agricultura de forte, que a falta dos frutos, &

da faca delles os códuzia ao ultimo da miferia, & que por na5
viverem nella fe comporiaõ có qualquer fortiina, como me-

Ihoraflem de eftado:Sobre eftes difcurfos aíTentàraó os inten-
tos, a que logo deraó principio levantando gente , efcoíhen-
do Cabos de cujo valor, &difciplinafe podeíFefiar obom
fucçeíTo da emprefa. Para General das armas nomearão a Sif-
gjfmundo Van-Scop,a quem a pratica,& a fortuna tinhaó da-
do baftante nome . Para Coronéis efcolhèrão a Chriftoval
Architofls,JacobEftacurt,&: Gervafio Carpenter j todos
occupa vaó os principaes lugares da Companhia,ou em Olan-
da,ou em Pernambucoimenos expertos nas regras da milicia,
que intereííados nos reditos da Bolça, eftimulos, a que fiavaõ
os mais bem afortunados progreíTos da conquifta. Aífentado
o modo,q fe avia de feguir na emprefa , lhe aplicarão aquel-
les meyos, que em fua opinião parecerão mais convenientes
ao fim defejado . Apreftáraó quaréta & féis fragatas de guer-
ra, com armas, munições , & mantimentos em abundância,
guarnecidas de gente efcolhida,&chamada de varias nações.
A dííTimulaçaò, & fegredo com que obrara^, foy taó recata-
do, que primeiro o defcubrio a viagem , que o entendeíTe o

porto donde fahiraó.

70 Largou vela a frota em os primeiros dias de Dezem-
bro

■1

bro.de mil &reircentos & trinta & quatro, aíH favorecida
do tempo ,quc.em poucos dias, a vio íbbre íeu porto a Ci- '^^J fi^^^ ^ ^^'
dade da Paraíba. Tomou pano, & deitou ferro pouco diftaiv * •
te da Fortaleza da barra,que chamão do Cabedello^ em Qujo
areal faltarão, mil & oytocentos Infantes, que fem empedi-
méto tomàraõ terra. António de Albuquerque Gapitão Ma-
yordaquelle deferido, (a quem a hum mefmo tempo cha-
mou o aviz o, & o rebate) íeachava aíTiftido dos Gapitaés Je-
rónimo Pereyra & Arriaga com íuas companhías^(que o Go-
vernador da Fortaleza do Array ai Luís Earbalho tinha man-
dado ) por dar à o teffipo,o que lhe podia gaftar; a noticia, fe .^ ;\\í,^'>
pos em marcha com a gente,que tinha coníigo,fuííiciente pa- \^o\ o'^(X.:sV\ «.A
ra a V igia,mas náo para a batalha.Adiantoufe o valor a obri- .«<i\«K.^ Víí
gaçaó, & fem cabedal para a oppoílçaõ íervio a temeridade
com que eoveílio,& ao acordo com que fe retirou [obrigado
da difparidade.do poder] c5 rifco,& fem fruto .Sitiou o ini-
migo a Fortaleza por terra, & por mar, íèm que à noíla gente
lho podeíTe empedír:Levanton trincheiras,abrio foços,plan-
ton artelharia,& bateo a força com toda aquella diverfidade
de tiros,q para os affedios in vetou a arte, & o furor. A tiro de
peça da Fortaleza tinhaõ os noíTosfeytohúa trincheira para
fegurança da praya,que mais fervia ao efpanto , que a defen-
fa,da qual o inimigo recebia algum dano:Ordenou Sif?ifrau-j
do a hum troço de ília gente, que á efcala a enveíliíTe, & ga-
nhaíTe.iVvançou com valor^foy rebatido com yalétia: Grécia
o furor com a perfia de fortCjque jà a peleja era mais vingan-
ça,que combate : Mortaamayor parte dos defenfores a en-
trou o inimigo,franqueando-lhe a invazão os corpos mortos
dos feus, em tanto numero, que fobre póílos huns fobre ou-
tros iguaíavaó o alto da trincheira.Náo teve o Oládés para o
tnumpho,mais que a priíàõ do Gabo,que era o Gapitão Fer-
reyra.Os mais foldados, que eraõ 1 4. primeiro derão ávida,
que largaíTem a viâoria . António de Albuquerque , que co-
mo fica dito fe tinha retirado, vendofe fem poder para o íb-
corro fe occupou em cortar o paffo ao dano: Forti íicoufe em
pofto acomodado para empedir as correrias do inimigo- &
conveniente para recolher os feus,& o focorro,q efperava de ^
Mathias de Albuquerque^a quem pella poíla o tinha pedido.

I2 71

cioo ÇAST^lOrO LVSirAKO /i6^4

71 Dura refiftcncia achava oFramengo na Fortaler

<:-i. íi in^v \. ^^ . Q^j^ reciproco dano continuava a bataria j may or fera

comoaraçaõ, o que recebiaõ os cercados, pella multidão de

pelouros de pedra, bombãs,granadas, & outros arteficios de

fogo,com que o inimigo combatia, que por elevação cahiaõ

détro na Fortaleza: Naócó menos effey to obravaõ as minas,

•com q voarão aigús baluartes, fervindo as ruinasa muy tos de

• morte,& de fepultura . Achava5-íè dentro os Capitães Ma^

' noel de Mello, João de Matos, Jerónimo Perey ra, D. Jacyn-

jll . to,D.Gaípar,& outros com 300. íbldados, que as hoftilida/-

Bntregaffe a For- des de 1 4. dias tinhão deminuido,& imp oíTibilitado có doe-

uleza.à' o Forte ças,& feridas, (exauftas as moniçoés, os mantimentos coníii-

: de s. António. . midos pellds muytos moradores,q com fuás famílias fe aviaõ

retirado à Fortaleza, os reparos delia v oados, próximo a aí^
falto, remoto o focorro, o perigo certo, o morrer fem fruto)
<& com prudente acordo capitularão a entrega^Sc deixarão a
Praça,fahihdo os Capitães, & officiaes da milicia có as coílu-?
madas honras militares; & em fua cópanhia os moradores cq
todas fuás armas,moveis , & liberdade para tomarem o cami-
nho,q lhes pareceífej&que os foldados pagos ficaífem prifío-»
neiros atè fe lhes dar paffagé para fora do Eftado. Có as mef-
mas condiçoês,& muy to mçnos defenfa fe rendeo a força de
Santo António, fabendo que a Fortaleza eftava entregue.

72 O Capitão Mayor /^ntonio de Albuquerque , que

pellos dias do avizo conhecia a falta do focorro, flutuava en-t

tre as encontradas ondas da dilação,& da cfperança. Via ren^

didas as forças da barra ; o inimigo fem refiftencia parafe

fazer fenhor da Campanha j fuftentava os feus, & animava os

moradores da Paraíba com tíbias efperanças,de que chegan^

do qualquer focorro os poderia defender do poder cótrario.

Não lhe correfpondeo o fucçeíro,ao difcurfo. AíTi comoMa-

thias de Albuquerque recebeo o avizo,de q o Framégo fitia*

va a Fortaleza do Cabedello,defpedio ao Códe de Banhollo

com o feu terço de Italianos,& D.Fernando de Riba-Aguer

Mãthm de Jl- j-q , com algúas companhias de Caftelhanos, que foífem fo-

buqucrque man. correr a Praça com a diliaécia,que pedia a imporrancia; & q

dA (ocorro a Pd' . -r" ^^ rr r -J - J /r«,rv, ^«

raia ^ ^^^^ ^ ^^^^'^ ^^^^ meteíTem íocorro,quado nao podeílem de-

falojar o mimigo. Erão Caftelhanos hiís, Sc Italianos outros.

lOI

A ff

,634 íPJ^TELLlp%oni.

& jornaleiros todos : f fobeja rezaõ, para que o negocio os a-

chaííe alheos,& remiíTos: jDoze dias gaftàraõ na marcha,que

de volta fizeraó em três, fó a fim de chegarem a tempo, aue a

perda os efcozaffe da batalha. Naó falta quem diga, que fe a- ^^ ,, 1

diantou Dom Fernando cõ os feus Caftelhanos, & que chc- conde de Banhol^

gando a tempo, que ainda a Fortaleza naó era rendida , dera lo.gmhaaForíâ''

com os feus hum aíTalto às trincheiras do inimigo , que os re- ^^i^*

bateo com dano conílderavel; porém não fey como vindo ás

ordens do Conde de Banhoio, o deixaria apartar para feme-

Ihante fortida, quando elle fendo feu fuperior ( com todo o

groíTo do poder) fe empenhava em naõ chegar, ou de receo-

i-b, ou de combanido . O certo , he o que temos relatado , &

que todo o focorro chegou á Paraíba deípois , que o inimigo

fe fez fenhor da campanha.

73 Chegou o Conde á Cidade, ouvio a perda das For-
talezas da barra, que diftava cinco legoas^ a liberdade , & in-
folencia com que o Framêgo devidido em troços faqueava o
contorno. ('Eíperava o afligido povo, que o Conde fahiíTe a ^^*^» & [emfoU
fazer-lhe oppoziçaó, & que ao menos os fortificaíTe , & de- c^l'/'^""'^' ""
fendeíTe, & vioííè aífolado , de quem íè imaginava defendi-
do.) Permitio aos feus o faço da miferavel cidadcj que fe exe-
cutou com eftranha exorbitância 3 golpe, para os naturaes
tanto mais fenfivel , quanto menos efperado. Tomou a mal-
dade o pretexto de remediar <^ próprios , com o que fe tira-
V a das guarras contrarias: A atrocídade,com que fe adiantou
a prefía à cobiça foy tanta, que por fenaó deterem entrega-
rão ao fogo quatro navios de açucar,em que ardéraó três mil
cai xas, & copia grande de páo Brazil ; & disfarçando o paâidí
com o medo, voltarão para Nazareth fem terem mais conta,
que com o latrocinio,& com a retirada . Então fe obfervouy'
que caíligo taó inopinado tivera mais de merecido , que de
contingente; parecendo mais providencia, que ca2o,fervirfe
o golpe, do inílromento do reparo.

7 4 Ficou a atribulada povoação fem cabedal,& fem de-
fenfa expofta ao ultimo da callamidade , & da extroçaõ.Sem
refiftencia fe apoderou delia o Olandès; não deixando a for- ^^' miferAVèli7n&
tuna aos triftes moradores mais , queaefcolha da tribulação ^^'^°^^^ ff'^^^<^f
na forre de cativos , ou deílerrados : A hum, & outro eftado '^c^uJ-Jlde!

o
o

os

IG2 QAST^OTO LUSITAKO J634

os reduzio a todos o infortnnio. Húa parte ( & foy a mayor)
derempai/ou íuas ca2as,& feguio o caminho dos Italianos,qee
íhe levavaó as fazendas j outra parte, erquecida das fazendas,
fe deix ou eftar em fnascazas com mais coração para fofre-
rem inimigos declarados, que para feguirem auxiliares fingi-y
dos: A eftes deu o Framengo pafía-portes de Vaffallos , com
-';. promeííàs de os foftentar em feus foros, & no livre exercício
da Religião Catholica Romana, [Moderação dehofpede,q
logorompeo a tirania de fenhor] Aaquelles accabáraõ de
defpojar os foldadosy da fazenda, & do íofrimento i rouban^
do-os pellos caminhos , os meímos , que íua fidelidade efco-?
Ihéra para confolaçaõ de fua magoa j muy tos dos quaes eníl-
nados à fua çufta conhecerão o erro de íiia eleição j & do ca-
minho fe voItàraõ a buícar remédio no amparo domeíinct
inimigo, de que fbgiaó: Os outros, ou de perfíados,ou de al-
tivos feguiraõ a vereda do Arrayal com inauditos trabalhos,
Muytosfepajfaõ fomes , &miferias, padecendo laftimofos pezares na condu-
pra a-.ãpmha. - j^ ç^^^ familias, que a hum mefmo tempo viaõ romper o
' mato com tormento , & o ceo com gemidos. Em tanta aflic*
ção, & defamparo lhes era a conferva de António de Albu-
querque, & de muy tos feiíhores de engenhos, trifte alivio,,
poisfem poderem fervircom o focorro, ferviaó fó com a
exemplo: A todos igualava a forte no infortúnio. ,t

.75 Tanto que SiígifmMndo íèvio íènhor daCidade^
Fortalezas, & Barra da Paraiba,repartio fua gente em mangas
Rouba o inimigo de pequeno numero (naõ lhe ficava pello recôncavo couza,
os contornos da que podeííe temer) com ordem defaquearem os engenhos.
Cidade. aldeas,& domecilios de todo o defi:riâ;o, fem diftinçaó de al-^

liados,& rebeldes j o que íe executou com infaíiavel cobiça,
recolhendo o Framengo húa groífa preza^porque o imagina-»
' do perigo,em que pos aos moradores o ódio dos contrários,

& a crueldade dos próprios lhes não deixou, nem mais acor-
do , nem mais tempo , que para tratarem de porem em íàlvo
as peílbas,& çonfervarem as v idas . Por enformaçaõ dos fcus
fe confirmou o inimigo em que naó avia na campanha fom-í
liras de oppofiçaõ, nem rebeldia, (obediente o recôncavo ás
leys de fuás armas.) Deixou a Cidade com limitada guarni-
ção, & com o groíib de feu poder fefoy apoderando da terra

c

cora

1(534 ^J^E 1, LIV^ im 102

com mais império, que receo, efcondendo o defagrado de eí^

tranlio na oílentaçaó de fiiperior. Marchou atè a Goyana có / ■

hum exercito de mayor vulto , que fuftancia. Agregou íè~lhe ^^'^f^ ^'^?'
j . J '^. ^ ^ ^ , mundo com alua,

todo o oentio cuitumado a leguir a melhor rortuna, grande çj,„te a^mhar a
numero de gaftadores, que carregava a bagajem, & tréy, em campanha.
que entravaõ algúas peças de campanha j& duas tropas de ca-
vallo3,que aos moradores fe tomàraõ^cada hiia de trinta^com
que íua induftria arguio,& cenfurou noííb deíazo,pois íe va-
leo para o dano, do que noíTa incúria fenão aproveitou para
adefenfa.

. 76 Certificado Mathias de Albuquerque de tanta per-
da,& da marcha do inimigo, temeo fua fortuna mais, que feu
poder: Inferio de íeu caminho fua determinação , & foípey4
tou que fem duvida trazia intentos de fitiar a Fortaleza do
noíTo Arrayal . Fes logo avizo ao Reyno , do que fucçedeo,
& do que inferio , para que a neceffidade perfuadiíTe cõ mais Mathias de aU
efficacia a prefteza do focorro. Ordenou ao Capitão Rebel- buquerque lhe
linho, que com alguas companhias , tiradas de Nazareth , & ^^"^^^ cortar o
do Arrayal, fahiíie a cortar o paíío ao Framengo ; & quando ^^^'''
a oppoíiçaó naò baftaífe para o deter j, não defcanfaíTe de o
picar. Com o pofto de fargento Mayor da Infantaria de Por-
tugal, fahio (era 27.de Janeiro do anno de 63 5) Luis Barba-
Iho do Arrayal com a meíina ordem , & para o mefmo fim,
jentregando o governo da Fortaleza a André Marim(contra
o parecer de muytos,que o temião CafteIhano.)Com animo
.verdadeiramente Portuguez proveo a Fortaleza de manti-
raentimentosidentro delia defcobrio agoa, & fes tudo o que
podia fervir à confervaçaõ , & à ofFenfa. Abrio no v os focos,
alteou as antigas cavas , levantou, & reparou as trincheiras,
reformou os reparos, recolheo as pontes, guarneceo ospof-
tos, repartio as fintinellas, & fes tudo o qu e devia como íiel^
& pratico foJdado j& como quem efperava receber,& hofpe-
dar a tal inimigo.

r 77 Chegou o Capitão Rebellinho com fuás compa-
nhias, & as de alguns moradores, quefe lhe agregarão a húa
aldeã chamada SaÓ Miguel de Mozupe, aonde fes^alto, & te- o que fuccede ao
y e avizo,que Sifgifmundo cõ todo o poder marchava em de- Rebellmho mH a.
reitura ao mefmo lugar . Por muyto inferior no poder, para expedifãcf.

Í4. lhe

li

104 C^ST^IOTO LUSlTJno . 1^34

lhe fazer rofio fe ajudou do ardil, & para o lograr fe retirou
a outro fitio acomodado para feu intento 5 deixando abrafa-
do o que largava , & nelle confumido do fogo tudo, quanto
podia íervir ao inimigo de cómodo , & utilidade ^ o qual vi-
nha tão perto,que o fumo do incêndio lhe moftrou o aíTen-
to do lugar. Sem deter a marcha paíTou adiante, encaminha-
do por guias deftras nas veredas, atè Mazurepe, engenho de
Religiofos do Patriarcha Saõ Bento, aonde fes alto fem achar
impedimento, porque os Religiofos,& Seculares o defampat-^
' ràraó com todo o recheyo delle,em que o inimigo achou op-
portuno focorro para a fome3& para o roubo5& foy dita dos
jioíTos Capitães, não fe verem cortados do inimigo , porque
fes a marcha furtado às noticias das fmtinellas : Nella o aííal-
tou o Rebelhnho de húa embofcada, com noventa foldados,
aonde chamão a mata de João Ley te , & deu-lhe em que en-
tender, porque duas vezes o fes retirar com dano taó conhe-
cido , que Sifgifmundo fe yio atribulado.Para fegundo aífal-
to mu dou o RebeUinho de fitio, porém a infidelidade,q def-
cobrio ao Framengo a embofcada lhe tirou das mãos a me-
lhor fortuna : Cercados de Sifgifmundo por todas as partes,
os inveftio com todo o poder^ de que os noífos fe defenderão
com admirável valor , em quanto os ajudarão os braços ; até
que desfalecidos ospulfos,fe valerão dos matos, deixando
no lugar do confliâ:o alguns mortos ; & por entre o bofque
não poucos feridos j & perdidos muytos : O valerofo Capi*
taó RebeUinho fahio da batalha atraveífado com duas bailas:
Nella experimentou Sifgifmundo, o que pode o valor aífifti-
do da defefperaçaò.

78 Aquartellado Sifgifmundo no engenho de Macia-

pe pos à fua obediência todos aquelles contornos , dando áos

moradores paííaportes de fegurança , defpois de os defpojar

luuBarvalfío iaf ^^i fazenda^& em quanto o roubo fe eftendia pella circunfe-

caaomimgo,jem j-^^^^j^^ ç^ fortificava o inimigo em Maciape. Luis Earbalho,a

quemdefvelava odefejodecaftigaraarrogancia,&atirania

Framenga, o efperou entre a povoação de Saõ Lourenço,&

Maciape, com hum groífo de quinhentos homens,imaginan-

do , que o Olandès continuafle na conquifta da campanh?.

Porém Sifgifmundo, ou por cófelho, ou por fortuna, fenaõ

aballou

m

1^3^ 'fJIlTEI. LmiO 111. toj ■

jaballou, fem primeiro mandar defcobrir o campo por alguns
cavallos^ deráo nas embofcadas,& viràraó as coftas tocando a
rebate jmenos alguns,que ficarão mortos j&prifioneiros dons
cavallos mõtados.Proftrada lhe deixou a confiança,a noticia
de íeus batedores , Sc muy to mais o avizo, q lhe fizerão tray-
dores infames, de que Mathias de Albuquerque, ( ainda que
enfermo,)com a viveza de feu animo,vencerido a debilitaçaõ
<lo corpo convocava toda a gente aííi paga como auxiliar,
paralhedar batalha, feintentaíTe ganhar a povoação de São . ,
■Lourenço. Aconfelhado do recco temeo SiígiíiTiundo a con-
•tingencia,&quaíi a, furto fepaíTou para o Arrecife , atra vef-
íando as Campinas de Pataribe. (Deixou bem fortificado, & . r ;

guarnecido o fitio de Maciape: ) Foy recebido dos feus com
muy tas demonftraçoés de triiimpho,& alegria.
í 79 Não defcanfou Sifgifmundo nos braços da vistoria,
|>orquê grato ao favor da fortuna feguio o caminho , que lhe jpre/afe sifgif-
inoftra va j que não perdeo de v ifta mais, que em quanto fe a^ mundo para con*
preftava de armada , & exercito para continuar na conquifta ^^"^^^ ^ Cot^mf'
do recôncavo. Ouvio-fe obrado do aprefto emNazareth, ^^"
•& no Array ali& a certeza do golpe,&: incerteza da parte nos
fazia impoííivel a defenfa, porque a contingência , fem con-
denar a algúa, ameaçava a todas.Duarte de Albuquerque,&
íeu Irmão Mathias de Albuquerque, com o Conde de Ba-
nhollo, que aíriftião em oMpnte deNazareth deixarão a
Fortaleza ás ordens de Pedro Corrêa da Gama SargeníoMa-
•yor do Eftado, bem guarnecida de tudo o que era neceíTario
para fuftentar hum largo cerco; & com hum groíTo de gente
Ic aquartellàraó na povoação de Santo Antonio,não fó para
a defenfa do lugar, fenaó também pella conveniência do íitio
çpara que delle íe podeffem focorrer outras Praças , que a cir-
cunferência tinha em igual diftancia. Luis Barbalho, que atè
(OS treze defte Fevereiro aííiftia na povoação de Saó Louren- Os nojfos fe prc'
^o com o feu terço, obrigado da meíma rezaó a deixou for- p^^'^''p^^^ ^ re-
tificada na melhor forma, que lhe foy poffivel , & com 200. ^^-^ ^^''^'^'
ibldados de guarnição: Com a mais gente fe paííbu para o íl-^
tio, que chamavão os Currais de Santa- Anna (pofto , donde
podia focorrer com igual mão as povoações da Moribeca, S.
António, Arra);al,&: Nazareth,^ & delle deípedio duas com-
/« panhias

Manâá t)inimi

,1

10^ CJSTfllTOTõLUSlTJNO lé-j

panbias para osGararapes, & outras duas para a Jangada,
que affiílidas dos moradores poderião rebater o primeiro
ímpeto do inimigo, & dar tempo á retirada dos vczinhoSi
Deixou Luís Barbalho i oo. homens configo deftros , & va-
lentes, para focorrer a parte donde o chamaffe a neceA
fidade. • ^'■*

8 o Dirpoílas as coufas nefta forma, deitou o Olandés
fora do Arrecife 300. foldados com ordem , que fofíèmreco^
nhecer a nofla Fortaleza doArrayal, &obíervar afitoaçao
„„ reconhecer a della,& OS poftos mais convenientes para os quartéis , & ba-
^rtahza do Ar- tarias, com que a determinava cercar, & combater : Diligen^
rsyãL cia, que lhes não deixou confeguir o Governador delia An-

dré Marim, detidos daaríelharia taó longe da força , quanto
alcançavaõ a bailas, atè que viradas as coftas fe retirarão por
aquella parte, que o Arrayal olhava para o Rio, ( defabitada
dos moradores,que nella ienaò davão por feguros,& fe aviaò
-recolhido aos matos.) Sifgifmundo, que ardia nos dei ejos de
ganhar a Praça, (enfinado da enformação, & da experiência,
, que a empreza tinha mais de contingência, que de certeza, )
excogitava meyos, q lha fizeíTem menos diíBcultofa . AíTen^
tou com os feus , que feria de grandes confequencias fazerfe
feuhor da Moribeca, para os intentos de ganhar a Fortaleza^
& a campanha. Em húa quinta feira,quinze de Fevereiro,far
bio com í 500. foldados, &/200. índios feus confederados,
ao romper da manhã: Mandou m^khar pellaeílrada, que
guia para os Gararapes,& tanto avante como ao moinho no-
vo formou a pente : Com caixas /clarins, & bandeiras tendi-
das, deu fobre a povoação de forte,que a hum mefrao tempo
conhecerão os moradores oaífalto, & orebate(defcuido
digno de exemplar caftigo : Nos braços do perigo não fabe
dormir, fenão o infenfito) o fobrefalto, & a confuzão de to-
dos,deixou a povoação livre ao inimigo: Ganhou fem golpe,
'j(falta^&gmhâ o que não imaginou levar fem cufto . Fortificoufe na matriz,
faque-ou o lugar, & a campanha , que achou com todo o re-
cheo. Nenhum fe temia , porque a todos defcanfava a falta
ilo avizo , & do rebate. As violências , forças , _& extroçoés,
que nefta occazião padecerão os miferaveis vezinhos , forão
tantas,&: tão novas, que fe experimenta vão , & não fe crião.

A

AMoriheca.

IÓ35 ^J^£l.LlF<l(pilL 107

A crueldade dos índios excedeo tanto à dos Olandefes^quá-
to hum ódio excedia a outro odio^porque fe o do Framengo ^J ^^P^^ ? ^^^'
era de Herejes, o dos índios era de Bárbaros, & na mayor co-
bardia achava a ingratidão os motivos da mayor exorbitân-
cia. Náo deixou deftinguir a fereza húa idade , de outra ida-
de, nem hum fexo, de outro fexo. A as molheres de todos os
eftados igualou a forte,porque fe a algúa perdoava a ira,a ne-
nhúa perdoava a injuria: Em tudo fe pareceo o eílrago, com
o inimigo.

8 1 Chegou a Luís Barbalho avizo do fucçefíb , & com
os 1 00. homens, que coníigo tinha,& alguns moradores,que
fe lhe adregarão , íahio dos Curais de Santa- Anna , aonde íe
aquartelava^ marchou com toda a preftefa até a caza , que fe Luis Sarhalh,

dizia de Domingos Dias, em que fes alto, para faber a deter- ^ VomFeman^
- 1 • • • xT- 1 • 1 1 do bulcão ao mi'

mmaçao do mimigo: Nao deixou a cólera pervalecer o con- •'

fel ho do v alor^feguio a marcha, & na povoação de Sato An-
tónio teve avizo, que Siígifmundo fe fortificava na Moribe-
ca,& que Mathias de Albuquerque lhe mandava 20o.homés
governados por Dom Fernando de Riba- Aguero com ordé,
que encorporados deíTem batalha ao inimigo, como,& quan-
do melhor occaziáo tiveíTem . Confultàraó os v alerofos Ca-
pitaés,o que fe devia fazcr^confideráraó a defproporção,que
tinha a ordem có a poíribilidade,& refolvéraó, que para fer-
vir ao intento deviaó feguir o confelho da rezão , & não a te-
meridade da ordem; & que de mais utilidade era para os mo-
radores coníervar-lhe o amparo, que deftruirlhe o focorro:
Com efte parecer marcharão *p3ra aquella parte a que cha-
mão a Serra da Agoa , aonde fabiaó andava hum terço , que
Siígiímundo mandara a faquear os moradores : Erão compa-
nheiros nefta marcha Guilherme Barbalho filho de Luis Bar-
balho, António Moreyra, António André, António Bezer-
ra,& outros cujos nomes efcondeo a brevidade, de quem não
cícre veo a hiftoria mais,que para fe lèr o fucçeíTo.

8 2 Chamados da occaziáo fe embofcàraó os nofíbs em
parte, por onde de força avia de paíTar o inimigo , que não
tardou em fç vir enredar no laço, o qual fentio, jà quan-
do o magoava o ferro: Defcompofl:o das cargas , & acoífado . t^ >jj' f *
j \ r r • 1 • j rrj- j. jao, & perdem â

Qos golpes íe loy retirando mais que depalio,aeixanao atraz ,víãorU.

mor-

I»

io8 C^ST^IOTO LUSlTJnâ 1635

moríos,& feridos: Sorte de que fem duvida eícaparião pou-
cos, íe no mayor perigo lhe náo chegara hum cfquadraó de
focorro, com que Sifgiímundo os favoreceo , avizado do el-
trondo da batalha : A defigualdade do poder nos tirou todo
o partido, deixando-Dos fó a fugida por remédio: Tomou
cada-qual a vereda, que fc lhe reprefeiitou mais fegura : Luis
Barbai ho, que acompanhado de alguns índios fe vio nas gar-
ras do infortúnio, feguio o caminho de Supupéna j& quando
fe imaginou livre de hum rifco , íè achou atalhado de outro
mayor: Deu de rofto com outra partida de Olandefes, que
acazo marchava por aqueílaparte : Sem detença o cercarão,
dando-lhe vozes, os que o conhecião, que fe rendeíTe a bom
quartel; porém o animofo Capitão , fiando menos das pala-
vras do inimigo, q de hum fraco cavallo em que andava mon--
tando, lhe chegou as eíporasa tempo, que fe romperão as cí-*
lhas, &veyo aochaõcom a fella: Faltou-lhe nefte aperto a

Valor com ^ luís^^^^^o^^^^^^^^^^^^^^ o animo , com que empunhando a

Bârbalho fe li- cfpada, fes largo caminho por entre os Framengos3& rompei

•vra do mayor f 6' dõ O mato v eyo fahir ao lugar de Gorpíi, aonde os morado-

^^^°' res lhe derão cavallo para íe ir a Nazareth , & dahy aonde

Mathias de Albuquerque affiftia^ o que também fizeraõ a D.

Fernando com todos os mais Capitães, & foldados, que efca-

pàraó das mãos inimigas ^ as quaes nefta occazião nos derão

menos que chorar, do que Ihç deixamos, que fentir:Mais lhe

cuftou ao Olandés a dita, que aos noíTos a deígraça.

83 Aífoníb de Albuquerque com aquelleá Capitães,

que diffemos eftavão de guarnição em Saõ Lourenço,fabido

o deftroço da noffa gente largarão a povoa ção,& com os foi-

LAvgh os nojfos dados, que tinhão fe retirarão antes, que o rifco os obrigaíTe

ao inimigo a po-^ ^ morrer fem utilidade. Aproveitoufe o Coronel Chriftovão

^.'oaçao e ao ^j-^hitoíls, que governava as armas contrarias no quartel de

Maciape, da occaziaõ , & fem empedimento fe fes fenhor da

povoação de São Lourenço.Sifgifmundo Van-Scoph valen--

dofe da fagacidade efcõdeo o luto,& a perda,que lhe cauzoii

a fobredita viftoria, entre os aplauzos do triumpho : Defpa-»

chou logo varias partidas a roubar os moradores de Santo

Am.iro,Sua2una, Gorjaú, & outras aldeãs, ( A todas deixou

o noílo retiro expoftas ao corte de fua efpada. ) Com guias

da

Lourenço,

da terra, para bufcarem pellos matos , aos que a elles fe reti-
raffem. Não valeo a morador algum a diligencia, & o recatOj
porque a todos alcançou, fem diííerença, a calamidade.Pou-
cos foraó, os que o roubo deixou com fazenda, raro, o que a
tirania deixou com liberdade . Recebiaó as leys da meíina
mãojque lhes tirava os bens: Conftrangiaos a violência de hii
mefmo império à pobreza, & ao cativeiro de forte , que cati-
vos na patria,& prefos na liberdadejcultivàraõ o proprio,co-
mo alheo. '

8 4 Pellô contrario, todos os qUe nâo quizerâo experi-
mentar taó dura fogeição bufcáraõ a pátria no defterrorDei- CaUmiããães co
xando cazas,& fazendas fepoferão a caminho ( com fuás fa- que atados iguA-
milias, & o melhor de feus moveis ) para a campanha de Per- '''^'"^ ^j°ríe.
nambuco, com tão curta fortuna, que nel^e os aílaltou o ca-
tiveiro, que temião na pátria. Não tiveraõ mais dita , os que
no mato bufcàraó o feguro, porque a huns, & outros igualou
a forte.Sifgifmundo , que com oreílante defua gente mar-
chava em feu alcance, roubou , & entreprendeo a todos , li*
cando-lhe na mão húa groíTa preza de ouro, prata, & roupas j
obrigando a todos a cominação, a que fe voltaíTem a cul-
tivar fuás terras,mais como eícravos,quecomo fenhores.Sem
empedimento feguio Sifgiímundo a marcha , encaminhada á
povoação de Santo António do Cabo j & cahio em húa em- ■^^■■

bofcada, com que o efperava Luis Earbalho,de que livrou cò
perda tão fenfivel , que fenão atreveo a paííar avante , fem
mandar vir do Arrecife 5 00. homens , para íè refazer da fal-
ta: Com eíle focorro feguio,& confeguio íeu iníento,fenho- LuuBarhãlho af-
rcandofe da povoação fem refíftencia. Com defígual partido filta o inimigo co
contendem, a efpada que fere,& o broquel que repara, porq '^('^^ /(^cçejlo.
eíle na5 pode cobrir o corpo todo ,& aquella tem aeícolha
da parte aonde há de dar o golpe . Naó fabia Mathias de Al-
buquerque, em que parte avia o inimigo de ferir, & repara-
vafe em todas (dividido o poder ) fem que cm nenhúa fe pow
deííe reíiftir ao golpe , que o inimigo determinava dar com
todas fuás forças unidas.

Sí^ Ganhada a povoação de Santo António, occup ou „ . r-,,.)-
oilgiímudo todo leu cuidado em cortar as veredas, que guia- ^^ Albumerque
vão para a noíía Fortaleza de NazarethjCom intento de a pri-^^r^ sirinhaem.

íC var

XIO

M

CJST^/OTO LUSITANO 1635

var de todo o focorro. Conheceo Mathías de Albuquerque
o deíignio, temeo o cerco , mais pella fome , que pello ferro,
& antes que o obrigaíTe o perigo , fe retirou para Sirinhaem
deixando a Fortaleza bem provida de foidados, armas^muni-
çoés,& viveres. Cercado y ficava com as mãos atadas para a
focorrer^& fora do íitio, podia dar à Fortaleza íbcorro, & ao
inimigo receyo:0 may or, que tinha o noíTo General, diziáo,
era o Conde de BanhoIIo, com evidentes indicios depbuco
fiel^ levou-o coníigo,porlhe tirar a occazião de o vendenPa-
recia-Ihe, que naõ apartado de íi o tray dor íè livrava da tray-
ção j& que a infidelidade obra menos atre vidajaonde íe teme
cafiigada^Sc tanto com mais dano , quanto a occazião té mais
de perigo. Do ameaço maís certo fe livrou o Generaí^com fe
aquartelar em parte, donde melhor podefíè cortar o fio à má
tençaõ do companheíro,&: aos intentos do contrario.

86 AfficomopOlandèsfefenhoreou da povoação de
Saó Lourenço (pella retirada de AfFonfo de Albuquerque)
paíTou para ella todo o poder y que tinha em Maciape , com
Refolve o inimi' 'ixitç^nto á^ fazer daquelle lugar fronteira à noífa Fortale-
mejmoVm ^oZ ^^ ^^ Array ai. Ali í fe fizerão em hú corpo os Coronéis Chri-
7or7aV^^dem ^^^^^ Architofls, Jacob Eftacourt , & Gervazio Carpenter
^areth^&doAr' comtoda a fua gente [ todos tres de concelho chamado íu-
rayaí. prerao.3 Entre fi tinhão conferido,& aífentado , que o mey o

mais feguro para os progreíTos de íiias armas era dividimos o
poder, que fíippofi:o o coníideravaõ inferior em numero , o
temiaó muy to avantejado no valor. Com efta máxima ,íc de-
terminarão, em que a hum meímo tempo fitiafíem as Forta-
lezas de Nazareth, & do Array ai , & defta forte trabalharia
noíTo cuidado mais em refolver o focorro , que em atalhar o
dano^ pois era certo,que impaciente o valor na confideraçaõ
de perder húa, fi.ia irrefoluçaõ as perderia ambas. Os precei-
tos da milicia, entaó conduzem para o fim pertendido, quan-
do nas empreías fe confulta primeiro o Génio do contrario,
que o poder próprio. A pedra naò íe lavra com os inftromen-
tos,com que fe lavra a madeira juem o medicamento aprovei-
ta fe fenaó aplica medido pella complexaõ do enfermo.

87 Em tres de Março,que era o dia definidojfahiraô de
Saó Lourenço os inimigos com todo o poder : Encaminhou-

ITI

o tntmiio a.

i^3^ ^J^^B l LIF^õ IIK

fe a marcíia para a várzea de Capebiribe: Os moradores avi-
sados do rebate, fe retirarão, (deixando o melhor de feiís .f.
moveis ) a buícar com luas ramilias o abrigo do Arraya),ima- ^^ ^^ Arrayd. ^
ginando-o íeguro , donde fe lhes defpunha o perigo : Tinha-
fe adiantado o Framengo a cortarihes as eft radas , & fer-
vio a miiytos a diligencia de os levar mais depreíla ao in-
fortúnio . André Marim Governador da Fortaleza do Ar-
rayal 5 certo nos intentos do inimigo, fe prevenio para z o Governador da
defenfa , como pratico , & valerofo foldado : Mandou def- Foríale^afepre'
pejar a Praça de toda agente inútil , para tomar armas t ^^f^râ ura a de*
vertio, que fe recolheffem aquelles géneros ,& materiaisj-' ^ -^ '
que podiaô fervir ao íuftento , & aos reparos. Cingio a For-
taleza de cavas , & trincheiras , em húas partes por refor-
mação j & em outras por dezenho ; deixando entre a for-
tificação externa , & os muros da força , capacidade para
fe empararem os moradores , & fe recolherem os gados da
campanha . Ordenou aos Capitães António Andie , Hen- loaõ Femmdes
rique Dias, Sc Joaõ Fernandes Vieira, ( que jk o era de Fuira ^ capitão
hua companhia de aventureiros ) todos mancebos alenta- ^'^^ a^^^mraros.
dos , & nobres , que ficaíTem fora para defcubrirem o cam-
po: Succedeo , que os batedores do inimigo chegarão a reco^
nhecer o terreno, & a avertir os poftos convenientes, aonde
fe formaíTem quarteis,& fe afíentaíTem as baterias, a tempo,
que aigúas cabeças de gado fe tecolhiaõ para a povoação do
Arrayal, que eftava deíabitada, foraò a ellas de corrida, fahi-
raõ-lhes ao encõtro os três Capitães referidos, de cujas mãos
poucos efcapàraó de mortos , & malferidos . Neiíle fucçeíTo
moftrou Joaó Fernandes Vieira, de vinte & dous annos,que
o valor,nem perde occaziaó nem eípera tempo,

88. Chegou o exercito inimigo a aviftar a Fortaleza^ ef-
colheo íitios para as baterias, &deu principio à circunval-
laçaõ. A cavalleiro da Praça ejftava húa eminência , aonde
por efta rezão, tinha o Conde de Banhoílo principiado hum
reduto j que fua frouxidão , ou feu deíignio o deixou taõ in-
forme, que vieraò a dizer muytos fizera nelle, para a conver*
niencia do inimigo, o q baftava^ & para adefenfa da Fortale- ^^ msmododir*
7a,o'quena5 fervia. Aproveitoufe o Olandés ào\>o^xo ^^ p-è o cerco ^oOÍU
nelle plantou a mais groíTa de fua artelharia, que fortificou às.

K2 de

112

CASr<^oro LUSITJKO a 63 5

de boas trincheiras : Fes outra bataria nas cazas de Jerónimo
Paesj & em outros íitios, diverfas plataformas, com peças re-
forçadas,& fufficientes guarniçoens:Nas partes,aonde fabia,
que poderiaó laborar com mais eíFey to, aíTentou alguns tra^
buços, & morteiros. Digo,que fabia, porque entaó foy di-
to , que de dentro da Fortaleza recebia o Framengo avizos,
que o encaminhavaó ao fim , que pertendia j & não ha du-
vida , que obrou mais na perda daquclla força , a trayção
dos próprios, que todo o poder, & toda a induftria dos
contrários . Foy o inimigo fechando as diílancias , entre ba-
taria ,& bataria, depormndas cavas, Sc groíTas trincheiras,
em que femdiílinçaõ trabalha vaõ, gaftadores ,& foldados:
DetudoneceíTitava a occupaçaó , porque os contínuos af-
faltos dos íitiados os conftrangiaó a defenderem comi hun>
braço , o que obravão com o outro : Delíes referiremos al-
guns por mais notáveis; que todos os fucçeíTos do cerco^he
ímpoffivel,à ligeireza com que a pena voa por eíles tempos.
8 9 Em V inte & três de Março fahiráo os Por tuguezes
da Fortaleza , em hora taó bem efcolhida, que ajudada fua
determinação do defcuido Olandés, o pozeraò em contin-
gência de fe perder . A confuzão do inimigo foy tanta, no
primeiro ímpeto , que todos trata vaó da fugida , nenhum da
reíiftencia : Cortava o ferro, pellos que alcançava, como por
infeníi V eis, & os que efcapàraõ de mortos,&: feridos aííi ficâ-
j)ao os piados raó defcorçoados , que primeiro osnoíTos Ihesfaquearaó o
'vartos ajfaltos quartel,muyto a feu falvo, & fe voltarão para a Fortaleza , q
aos inimigos. ç^ inimigo fe cobraífe do tcrror,em que o poferaõ:Nella foraõ
recebidos com aquelles apIaufos,que merecia a vidoria j & o
focorro peiía abundância de refrefcos , que faquearaõ . Em
o primeiro de Abril ( que então foy em Domingo de Ra-
mos) derão os noíTos fegunda aíTaltada , quaíi com o mefmo

fucçeííb . Neíla occaziáo aconteceo a hum foldado nollb
Cazo exemplar, i ' j- j • n -i t ^

^ num cazo digno de memoria , pello que tem de exemplo , &

: doutrina . Encontroufe hum mofqueteiro com o Coronel

Chriftováo Architofls, que andava montado em hum ca*

vallo, levou a arma à cara, para o matar^era certo o tiro,conr

tingente o emprego; gritou o Coronel, que fe dava por

rendido : Fiado em fua palavra , o deixou o foldado ficar

mon-

;il;'

ir^

montado, & guarnecido das armas , qoe trazia . ( Generoía
cortezia, porém fobeja confiança . ) O difcreto naó íe fia das
palavras do inimigo, & menos das promeííàs^que faz a neceí^
íidade. Trazia o Coronel hú martelio ponte agudo 5,em húa
aíle larga, que lhe fervia de inílgnia , & arma \ advertio em a
pouca cautela, & necia fegu rança , com que o foldado o le-
vava peilas rédeas do cavallo, & a hum meímo tempo o ferio
com o martelio, & apertou as pernas ao cavallo, deixando ao
pobre foldado , que curar no golpe , & que chorar no erro.
Em os conflidos obra a força , & não a corte2ia3 & a palavra
conftrangida , como tem por fiador a violência, allí fe que-?
bra, aonde efte falta. Do prifioneiro de mayor lote ha de fiaç
menos a cautela, porque he, o que na liberdade perde mais^
& com todo o cuidado íe guarda, o que mais fe eftima, prin-
cipalmente, quando confeguida a livrança não deixa appelr
laçáo a injuftiça, porque fe o eftilo a nota, a conveniência a
defculpa. Para com nenhúa ou tra gente tão juftificada adefi-
dencia, como para com a nação Olandefa , cujo trato íe fun-
da em faltará fé divina, & humana. Outros mu y tos encon-
tros fuccedèraó nefte cerco,em que fe virão fingulares proe-i
2as nas armas, que naó referimos, por ferem menos próprios
do aíTumpto, que prometemos. ^

90 Via o Olandès vencida fua contumácia, de noíTa re-
íiftencia, & deíconfiado das promeíTas de íiia efperança, de- ...

terminou empenhar na emprefa o ultimo de feu poder,& de ^^^^^ " ^^^^^g^
íiia induftria.Mandou conduzir do Arrecife mais artelharia,
Zc de mayor calibre, com que reforçou as batarias: Ordenou,
que de noite, & de dia fe laboraíTe fem interpolação de tem-*
po cm todas as Eftancias , para que os cercados não íiveífem
hora de defcanfo, nem de feguro; a fim,de que o trabalho, &
o perigo os fizeíTe render ; ou acabaífe de os conílimir . Por
inftanteschoviaó bombas, & granadas dentro da Fortaleza,
que no principio temeo o efpanto,& logo deíprezou o uzo,
Sc o reparo. Com couros molhados as eíperavaó, & lhos dei-
tavão emcima, tanto que cahião, dosquaes abafadas fe apa-
ga vão fem furtirem efFeyto: O que em feus quartéis cauzava
a nofía artelharia, experimentavão todas as horas com dano^ »
Sc vião com magoa, porque os noíTos artelheiros , com tanta

K3 def-

J

11

1

1 14 c^sr^oro lusitano hó^^

deftreza bomeavão as peças , que aonde punhaõ a mira ahy
feria a balla.Os mofqiieteiros atiravão com pontaria taó cer-
ta, que não perdia o tiro. Creeia da parte do inimigo a perda,
£ os cercados m ^^^^ ^ deftroço, que nelle fazia a efpada todas as vezes , qiic
efe^ja. ^^ noííos fahião a enveftillos . Confiizo o Framengo de ver

noffa conftancia , & feu eftrago , prefiftia obftinado em feu
thema,pelejando mais pella vingança, quê pella viâ:oria.Re-
folutoemlevarporaíTediojOquenaó podia confeguirpoi?
aíÍàlto,fe occupou todo em nos cortar os caminhos do rcmen
dio^diligencia, com q pos os cercados em tanta penuria,quc
comiáo por regalo, o que na abundância olhavão com aíco,
& abarrecião como veneno.Mais animados da \ív cza dos ef-
piritôs , que da força dos corpos fe defendião ; atè que a mi-
feria , Si a defeíperaçáo de focorro lhes deu o parecer dé
eftátuas. Ém três mezes de cerco não viraõ, nem ainda a me-
nor íbmbra de ferem focorridos: A muy tos pareceo efte de-
famparo arteficio da infidelidade ^ outros querião que foíTc
frouxidão do dezafo. Porém o certo he, q a efficacia deíèm-
parou ao valor : Quando Deos quer caftigar , não concorre
com ojuizodos homens, para que os homens não atinem
com a rezão das couzas.

91 Viraõ-fe osíitiados deílituidós detodo o humano
auxilio, &expofl:osá fúria da: invazão, por falta de reparos,
munições, íuftento,& vigor (eftado, de que o inimigo tinha
todos os dias avizo.) Com maduro confdho fcrefolvèrâoa
entregar a Praça, que náó podiaõ livrar com perderem as vi-
das. Capitularão a entrega com as íeguintes condiçoensrPri^
Entrerrafe a For- meira, quetodos os Cabos, & foldados pagos fahirião com
takt^a a partido, fuas armas, atè o Arrecife,aonde fe lhe daria embarcação pa-
ra índias de Caftella . Segunda,que deixariaõ em reféns das
embarcaçoés,que os levaflèm, dous Capitães , quaes elles ef-
colheííèm. Terceira,que o apreftò , & fornecimento dos na-
vios correria por conta da companhia Occidental. Para con-*
cluirem eftas capitulações, mandarão v ir ao General Sifgif-
mundo Van-Scop^ ordindo com fua aííiftencia a vileza mais
fea, que podia inventar a cobiça : Empenhàraô-fe os noííos
capitulantes em tirar para os moradores,que eftavaó recolhi-
dos na FortalezajOs partidos mais favoraveis^que fer podeíTe,

&

<ii

ié35 ^J^B 1. LIF<10 IIL ri ^

& fem eíla condição recuzavaõ a entrega . Com fingido feri-
timento fe deraõ os Olandefes por offendidos , dizendo, que
os moradores, pella entrega da força, paíTavaó de inimigos
a Vaírallos,& que era arguillos,a elles dominantes de tiranos,
pedirem-lhes que os tratadèm como taes, pois o fazello dar
quelle dia por diante , era obrigação de feu domínio , & for
borno para a obediência de todos j&naó avia rezão,para que
aos amigos fe trataíTem nas capitulações como a contrários,
pois como afubditos deviaõ defendellos , & não opprimilr
los.Tomàraó poíTe da Fortaleza em dez de Junho do anno

de 1 6 3 5 .

91 Seguros na promefía, (que apadrinhava arezaõ,&

à politica) quizeraõ fahir os moradores da Fortaleza , quan-
do os embargou húa ordé dos Governadores das armas Olã- ri/ perfidia do
defasj& logo hum decreto paíTado em nome do Príncipe de inmfgo.
Ors^nge, pello qual os condenava por traydores a perderem
âs vidas. Infolente he o poder, quando fegue os diítamens da
vingança, porem mais íem comparação , fe lhe dá ley s a co-
biça, porque eftraga fem cólera. Viaó-fe os afli£los morado-
res cativos fem caufa, & condenados fem culpa: A confiança,
& a inocência lhes faziáo infofrivel o goIpe:Bufcáraó a inter-
ceçaó,& O favor na laftima ; & fó o acháraõ na pey ta j 8c def-
pois na compra , remindo as vidas a exceffivo preço. Ao Co-
ronel Pedro dâ Cunha de Andrada condenarão a tratos , pa-
ra que o medo aos cordéis do tormento , lhe fizeíTe defatar os
da bolça: Cinco mil cruzados lhe cuftou a vida: A menos co-
tia a determinava refgatar António de Frey tas da Sy lva,& fa- ^^^- Fernandes
hio-lhe tanto mais cara, que a tormentos o defcon;untàraõj vieira, fe refga'
•Gom pretexto taó futil,que os meímosMiniílros abominarão ta^&a dom ma-
^crueldade. Joaó Fernandes Vieira fe refgatou , & a dous ^^-f/^^-
moços feus pello preço em que o Olandès o cortou . Ultima-
mente nenhum de quantos recolheo a Fortaleza deixou de fc
refgatar com mayor rigor , do que fefora cativo em Argel:
Por trato taõ infame aquirio o inimigo vinte & oy to mil cru-
zados; que tantos dizia avia gaílado no fitio , como fe o rou-
bo fe juíti ficara com a tyrania.

93 Chegou a nova a Mathias de Albuquerquc,& o dei-
xou abforto a confideraçaó da preíra5Com que a fortuna cor-

K4. ria

&

¥'

riaafepiiltar a domínio Portogiiez naquella parte do Efia-

,:i|

liou ao Conde de BanholIo,que com o feu terço de Italianos
marchaíie logo para o fitio, a qae chamáo a Lagoa, ( he kia
povoação com rio, que faz barra 4$ . legoas do Arrecife para
o Sul) & nelle fe fortificaíre,prc venindo affi o remédio para
a occazião do retiro,que antevia fua determinação. (Naó té
animo de efperar o perigo , quem fe occupa nas prevenções

do feguro) com a mais gente fe deixou ficar na Villa de Siri-
iihaem, a titulo de animar com a vczinhança, ;á que naõ po^
diafocorrer com apoíFibilidade aos cercados na Fortaleza
de Nazareth . Mal podem animar, as difpoíiçoens de fugir?
Quem duvidava do focorro porque o via limitado , como o
poderia efperar vendeo-o mais diminuido ? Os cercados náa
fe animaó com a viíia, fenaó com a efperança.

94 Rendida a Fortaleza do Array al,apertou o inimiga
o cerco á de Nazareth, engroííando o poder de hum fitio, c5
agcnte,quedefocupouooutro. A Fortaleza ganhada dei-

Intenta Stfgtf- xou Siígifmundo guarnecida com 600. foldados efcolhidos,

77rdÊrmZj ^ ^^'^' ^^^^""^ aIliados,q apartou de toda a mais gente.Mam
chava,para Nazareth,&fiado na profperidade de fuás armas,
intentou levar de caminho a Villa de Sirinhaem por entre-
prefa jparecendo-lhe boa occàziaõ, a em q huas,& outras cré-
tes fe achavaõ difpoftas a fomentar fua dita: Os Portuí^uezes
deíiTiayados coma perda ; os Framengos deftimidos com a

vitoria, informado Mathias de Albuquerque do caminhoj
K & dezenho,com que o inimigo marchava o mandou receber

'^' : ; ' \ com parte da gente , que alli tinha. Vio-fe o Framengo ata-

- ív . •;-. ]hado,& enveftido à eípadaj pelejou animoíb j porém a ver-
tindo, o que lhe cuftava a reíiftencia , voltou as coílas à em-
prefa.Perdemos neíle encontro ao Capitão António Andrc
(morte,que a todos mago-ou) outros dous Capitães ficáraõ
prifioneiros pella demafia , com que fe empenháraõj não fal-
tando da noíla parte outros mortos,& feridosjmas aíTi vin<>a-
do3, que Sifgifmundo amortalhou no luto defta perda toda a
alegria d aquellavidoria.

95 Apertou Sifgifmundo os ataques à Fortaleza âc

Na-

-i^*

1 6 3 ç fJ^TB l LlV%0 111. 117

Nazareth de forte, que jà nella eraó mais as rainas, que os re-
parosj a fome fe augmentava com os dias ; as munições fe re-

eiftavaópellaneceífidadeiosdefenfores fedemimiiaó com , ^ ^^

& r^ , ' , ,. j n_ • Rende fe a Fort a- >/

as mortes , & com as doenças , ate que rendida a conltancia ^^^^ ^^ ^^^^^

aos pès da impoífibilidade, capitularão a entrega, feguindo yeth.
o exemplo da Fortaleza do Arra} ai nas condiçoens, & nos
motivos: Entrou nella o Framengo em o primeiro de Ju-
lho defte anno de ^^.Defta maneira fe perderão duas Pra-
ças, que tanto trabalho, difpendio,& fangue cuftáraó: A
de Nazareth confervou o inimigoj a do Arrayal mandou .
arrazar, não fey fe por inútil a feu defignio , fe por formidá-
vel a feu receyo . Cazualmente ( defpois de entrada ) ca-
hio húa cortina de muro fobre os feus Olandefes,que a muy-
tos fervio de fepultura,& parecia-lhe, que não eftava feguro
o dominio, aonde as mefmas pedras oprimiaó, & fepultavaó
aos dominantes.

96 Com exceíTivas demonftraçoês de alegria feílejon
o Olãdès húa,& outra vidoria^por muytos dias fe viraó fuás
Praças coroadas de luminárias , & todos noífos valles cheos
do ecco de fua artelharia . Com eftes profperos fucçeíTos fe
julgava fenhor de todo o eftado^ porque fe eftas duas Forta- Mathias de AU
lezas, em quanto noíTas eraó toda aoppoíiçaõ de feu à.ç£i^^-huqueriue fere-
nio^em quanto fuás, feriam toda a fiança de feu intento. Do ^^"^^ í^^^ ^ ^'^*
fundamento, de que fe valia a efperança contraria , fe apro- ^''^'
veitou o difcurfo de Mathias de Albuquerque , para perder
a que tinha:Deixou a Villa de Sirinhacm,& com toda a gen-
te marchou, para a Lagoa.Chamou a íi todos os moradores,
que fe quiferaó retirar^ o que fiferaó muytos , com íuas fami-
lias, & moveis. Para tudo deu carruagens, & para todos pro-
vizão fenaó como o pedia a neceffidade , como o permitia o
tempo: Com a gente de guerra fervio de efcolta à do povo
diíTimulando, quanto lhe era poífivel, a magoa doinfortu^
4110, por animar o deíinayo da companhia, caufado da fragi-
lidade, ^ da miferia,com qne hum,& outro fexo gemia,ven-
dofe condenado da occaziáo ao perigo,& ao defterro. A hús,
&: outros prometia o General melhor fortuna com a certeza o General anim^
,do focorro efperado em húa armada,que dizia fer partida do ^°^ mor adores.
Reyno em feu favor: Trifte remédio he para o afligido, a

prO'

Fr'

'r

K,

ir

f I S C^ST^WTO LUSlTJm 1^3;

promeíTa de melhorar de eftado: A dor da ferida iilo fe cura
com a efperança da íàude . Mayor confolação dava , aos atri-
bulados moradores a companhia^queo General lhes fazia em
feus trabalhos , que todas as efperanças, que lhes dava . Nas
occazioés aproveita o que fe poírue,& não o que fe efpera.

97 Entre as gratulaçoés da vidoria fe defpunha Sifgif-
mundo para nova batalha: O tempo , que avia de dar ao def-
canfo, occupou no aprefto de húa armada de doze fragatas^
frrS'.jí7-í?^^'^^,f ".^^^'^'^ do Arrecife com tanta brevidade, que

r/íego fobre o Por
to do Calvo,

fua artelhariafervio ás falvas das viftorias , & da viagem as
ordens do General do mar João Cornelim, ou Corneles.
Navegou trinta & quatro legoas do Arrecife para o Sul a
frota^ao Porto do Càlvo guiada do rebelado Domingos Fer-
nandes Calabar, a cuja perfuaçaõ fe preparou a armada: To-
mou porto na Barra Grande (cinco legoas do Porto do Cal-
vo)aonde os moradores tinhão feyto algúas trincheiras [for-
tificação fofrivel para a diftancia doperigo, fútil para a vezí-
iihança do dano.] Por informação conheceo o Framengo q
todos os reparos que avia, efpantavaó, & naõ defendiaó ( de
' tudo avizáraõ homens promptos a fabricar feus particulares,
fobre as ruinas do comum : Nome de tray dores lhes deu en-
tão a queixa,& deípois a juftiça.) Deitou o inimigo aquella
gente em terra,que julgou baítantepara feu intento . Vo-ou
a nova com as azas do medo ao Porto do Calvo, aonde che-»
goii, quando á fua vifta chegava também o Conde de Ba-
nhollo com o feu terço de Italianos , & o Meftre de Campo
Dom Fernando de Riba-Aguero com parte de Caftelhanos,
Fa^'lheoi}pofição^ Portuguezes , de que o feu terço fe formava, quemar-
oCodedeBmhol- chavão em hum corpo, para a Lagoa: Era aquelle feu direy-
^"r to caminho. Pareceo-lhe aos moradores milagrofo o fucçef-

fo:Com toda a fomiíra5,&efficacia pedirão ao Conde não
perdeffe occazião de tãto ferviço de feu Deos,& de feu Rey;
Sc de tanta gloria fua.Não achou o Conde efcuza,que darão
requirimento^concedeoofocorro com animo, fem duvida,
de fazer irremediável a perdição. Mandou, que a carruagem
feguiíTe a marcha para a Lagoa, com fufficicnte guarda, & fe
met eo na povoação com toda a gente , que tinha de guerra.
GaftQU aquelle dia cm cercar a Igreja Matriz de eíiacadas,

para

i^Yy TÀ^ELLIV^OUL 119

para recolhimento do povo , & reparo da íiia gente . No dia ^ ^^
leguinte feviraó defenroladas as bandeiras inimigas noou-^^^^^ ef^anu \
teyro, que chamão de Amador Dias,debaixo das qiiaes mar- ifíimgo.
chavão 700. Olandefes, cortados jk de hum aííalto , que al-
guns mancebos naturaes da terra lhe tinhaó dado, com perda
coníideravel.Divizáraó a noíTa gente^Sc fizerão alto tímidos,
pello dano recebido, & efpantados , do que não tinhão ima-
ginado, vendo a forma,&: o numero do efquadraó,que os ef-

perava.

98 Avertio o General contrario nos feus o medo, Sc a

cauza: obrigado primeiro do receo, que do animo,falou affi Pratu;a<^uefiso
^'.o^A .,-, ^ i--n«. General aos feus.

aos foldados. A occaziao,& o tempo nos conduzirão a eitr e-
mo, que fó a deferperaçaõ nos poderá livrar do perigo . Te- "
mos á vifta o poder contrario,& em diftancia tão pequena, q '*
nos atalha todo o remédio : Bufcallo na retirada íerà nofía ''
mayor ruina. Todos fe animão a perfeguir , ao que foge. O '*
mefmo furor, a que provoca a retirada , reprime a enveftida. "
Eftamos tão longe de noíía armada, que fera loucura imagi- '^
nar algum de nós, que o poderá falvar a ligeireza da corrida, "
femque primeiro lhe tire a vida, ou o alcance do golpe,ou a"
falta do alento. Fiar dos matos a melhoria da forte ( em ter- "
reno eftranho) não fó nos tira a gloria de acabaremos como "
foldados, fenão, que també nos condenara á injuria de morr ^'
reremos como feras : Naõ demos matéria à fefta de húa mon- "
taria^ ponhamos em contingência a de húa viítoria : Adule- "
mos a fortuna com a temeridade, que ijão dá menos viâ:orias "
o braço defefperado, que o melhor partido j & o valor então ''
obra com juizo , quando na indifferençabufca a forte pella "
parte da gloria, & naõ pella da vida^Sc efta não he fruito dos "
pès, fenão dos pulfos.

. 9 9 Pendentes eftavaõ todos os foldados das palavras de
feu General bebendo em cada húa novo efpirito,& ouzadia; ^^y^^^^^- ^^ ^y;
como fe o coração lhes não coubera no pey to , romperão a ^^adroes,
pratica marchando abufcar a batalha, que o noífo efquadraó
Jhe oíFerecia immovel: Com igual Marte fe deraó, & recebe-
rão as primeiras cargas^porém com defigual v alentia terçou
a efpada Dom Fernando de Riba-Aguero, a quem feguiraó
cincoenta foldados Portuguezes , & Caftelhanos , que rom-
pendo

pendo pello efqiiadra5 Olaiidés , o defcompoferaõ , & abri-
rão, com eftrago, & com efpanto do inimigo, que roto fe jiil-
' ^ goudesbaratado;& de todo ficara opprimidojíè o Conde de

cide deBanhol.^^'^'^^^^^^^^^^'^^^^^^^^ Italianos fegu ira tão efficaz exemplo^
Iq^ mas como he condição do traydor,& do cobarde amar o feo,

aborrece as occazioés, em que pode parecer fermofo. Quan-
do fó falta va,que o Conde entraíTe na batalha para fe v encer
o pleyío,enta5 com todos os feus virou as cofias, & fugio do
cõfli6i:o,deixádo aos valerofos, & fieis foldados,com feu Ca-
bo nas garras do Framengo, das quaes fe livrarão induftrio-
fçSjSí valentes: Dom Fernando valeo-fe de hum alagadiço^
que lhe fervio de reparo , para efcapar à morte , & á prifaõ»
Ficou o Olandés fenhor do campo ^ da povoação, & dos mo-
radores^defemparados de todo o favor humano.
^ 100 Marchava Mathias de Albuquerque na forma re-

, . . ferida,feeuindo os paíTos do Conde de Banhollo,& duas ior-

Cherra a noticia j ?ji h^jí-^i i

âelta A Mathias "''^^^^s ^^^^^^ ^^ chegar ao Porto do Calvo o tomou a nova da

âe Albuquerque, perda do lugar,& da torpe fuga dos Italianos . Parece, que fe
apoftavão os infortúnios a contraftar o animo deíle grande
Capitão, (íèmprdmayor 5 que todas as defgraças, ) porque
húas o feguião, outras o eíperavaó . Certificoufe do poder,
& alojamento do inimigo , (por indufíria do Capitão Sebaf^
tiaó do Souto, foi dado, a qu&m a capacidade dava eftimaçaã
de confidente entre amigos, fe contrários . ) Defpedio a car-
I ruagem por veredas defuzadas , para que continuaíTe a mar-'
cha húa Icgoa afaftada do Porto do Calvo ^ & com os folda-
dos determinou bufcar o Olandés em feus alojamentos . Por
ordem fua fe adiantarão os Capitães Francifco Rebello , &
AíTeníò da Sylva a efperar o inimigo de embofcada , entre a
povoação,& outeyrode Amador Alveres. Jà nefte tempo o
Capitão Souto tinha perfuadido ao Sargento Mayor das ar-
mas Olandefas, chamado Picar, fahiííè a cortar OpaíTo a Ma-»
thias de Albuquerque,que marchava para a Lagoa cô os mo-
radores de Pernambuco carregados do mais preciofo de feus
mo veis-aíTegurando-lhe requiffima a prefa, & certa a vi6i:o-
Kcfolvcfc em de- ria,pois hia a contender com hum Cabo defarmado , & defo-
fdojxr o immi' bedecido: Achou o confelhodiípofição na cobiça do Picar,
SP' & fegurança no oíferçcimcnto , que o Capitão Sou to lhe fes

de

1635 . ..,fJ!(TBLLlJ^M'^ 121

de acompan}iar5& conduzir: Nefte tempo viraõ Ima compa-
nhia de até vinte foldados Portuguczes,&índios,qi!e os dous
Capitães embofcados tinhaó deípcdido a provocar o Framé-
go, o qual crédulo em tudo , o que lhe dizia o Capitão Sou-
to teve para íi, que eraó foragidos,& andavaó roubando; Sa-
hio de fua fortificação com duas companhias, deixando trez
de guarnição cm feu alojamento. Delle naó quiz fahir o Ca-
labar^ou timido,ou acautelado.

loi Seguio o Ohndés a Sebaftiaõ do SoutOjO qual car-
regando os vinte Toldados o entranhou na embofcada, & fe
paffou aos noíTos^que promptos,& diftiplinados deraõhua, ^y^^^jj"^^ ^^-f'^
carga ferrada, muytas vezes repetida, fobre a gente do Picar:
Cortado do engano, & do ferro fe retirou desbaratado ao a-
brigo do primeiro reduto de fua fortificaçaõjdeixando nas
mortes, & feridas dos feus caftigada a confiança , que fenáo
foubécontrapezar com adefidencia.De torpel entrarão o re-
duto viâ:oriofos,& vencidos, aonde todos os contrários paf-
faraó pello fio de noíTa efpaxia ; menos o Picar , que com dez
companheiros tiveráó acordo para adiantar a fugida , à efca^
laj bufcando na fegunda fortificação a defenfa 5 que defem-
paràraõ na primeira. Mathias de Albuquerque , que do ou- :Eperãéaprímã
teyro de Amador Al veres vio logrado o ardil da embofcada, ra fortificação.
& ganhado o primeiro reduto , deceo acompanhado de fua
gente, a encorporarfe com a do confli6i:o , que jà fe aproveiíj
.ta vaõ da artelharia do inimigo contra o inimigo, acedendo o
" calor da fegunda avançada,que os noíTos derão a fortificação
fegunda, cingida de húa eftacada de pâo apiquc tão forte , q
foy bafiante adeter,& empedir a diligencia,& furor com que
o enveíliráo.Recebiaó os noíTos dano íem remedio3 & acon-
felhados da perda de dous mortos,& alguns feridos fe retira^
raó do afialtOjporém náò do ataque,que continuarão por to-
das as partes,em quanto durou a noite, com notório eftrago
doFramengo,aquemasballas dos mofquetes não deixarão
peíiba fcgura, nem as da artelharia edifício inteyro. Amanhe-
ceo o dia, para o Olandèsmais horrivcl,que a noite^fazia-lhe
verodefiroço dos reparos, & dos defenfores 3 & ao meímo
íempoaouzada diligencia, com que hum Capitaõ,& alguns

foldados tinhaó aplicado às cazas donde fe defendiaô,muyía 1^^^.% Vf^^^^^
.,*- ' _ •' -^ . fortificação.

\. ■^x^■^^•■.^'

^^.

Cu

copia-

ii!

Eende apartido a
paunda.

Morre o Calabar
condenado â for-
ca.

Mdihias de Al-
buquerque^rofe-
gue a marchava'
ra a Lagoa.

chega Sifgtfmu'
do ao Vorto do Cal
'vo, é" o quenelle

f^i CJ^T^iiTíb LVSfrAKG 1635

copia de lenha, para lhe darem íbgo. Cedeo a obílitiaçaó ao
perigo- fes o inimigo chamada, fem dar ouvidos as importu-
nas iníi:ancias,com que o Calabar repugnava a entrega.Deú-v
fe apartido3permitiofe-lhes a Cabos, & a foldados,que fahiA
fem com armas, & iníignias, excepto o Calabar , que avia de
ficar prefo,& entregue as leys de noíTo juizo. Naõ fes grande
diligencia o Framengo por defender ao Calabar: O traydor
ferve com a conveniência, & agrava com a perfídia : Poucos
lhes pagaó a trayçãoj todos lhe abominaó o deliftoj porque
igualmente eícandali2a ao que entrega,& aO que ferve.

102 , Ao Calabar julgou a juftiça,que morreíTe enforcâ*7
do,& que fua cabeça, & feus quartos foííbm póílos nos luga^^
res mais públicos. Executoufe a fentença , & ao prègaõ de
fua culpa fepoferaó as ditas porções defeu corpo naspon^
tas mais altas da eftacada.Naõ era taõ grave o crime de outro,
comprehendido na mefma culpa , que fervia no Arrecife de
Almoxarife,& fó o condenarão á forca: A hum , & outro fo-
bio mais alto a pena , que o delidí:o . Executados eftes fopli-»
cios,mandouMathias de Albuquerque inventariar tudo , o
que pertencia à fazenda delRey , & que a artelharia fe efcoií-A
deífe em lugares occultòs, f pella impoíTibihdade de le com-
boyar na prefenteoccazião, até que a deífe o tempo , para íè
conduzir com fegurança ) & com os defpojosi de menos em^*
baraço marchou para a Lagoa acompanhado , & feguido de
muy tos moradores,que com fuás familiasj&bens fogião à ty-
rania, & á obediência do Olandés : Em poucos dias a expe-*
rimcntàraô outros,que menos avertidos íè deixarão ficar em
fuás cazas:Naó tem a confiança a viíta taó aguda,como a foí^
pey ta.Cego olhava para o futuro,quem fe imaginava gratifi-
cado de hum poderofo oífendido.

103 Três dias defpois de partido Mathias de Albu-
querque chegou Silgifmundo ao Porto do Calvo , primeiro
chamado da vidoria , que do eftrago dos feus : Com todo o
poder de mar, & terra entrou na povoação , que achou her-
ma5& fó aííifiida dos quartos do Calabar,& corpo do Almo-»
xarife, cuja viíi;a o alterou de forte, que cego da cólera marí^
dou deitar bando, que todos os moradores fe paífaííèm â eí^
pada, fem exceiçâo de peíToajnem de idade^para cuja execu-
*. .■- • "-'- çáo

t é 3 "> fAXTE l Lir^jy HL 1 23

' ção fes de feiís Toldados muytas parti das,qye íahiíTem a com-
prir o decreto, para que a brevidade do golpe correfpon-
deffe ao arrebatado da ira. Sem alento deixou a barbara re-
folução, aos miferaveis naturaes, conOderando, que a mefma
confiança, que os defviàra da fuga, os entregava à eípada, &
que fua defgraça era, a que dava contra elles a fentença j& q
(infalível o trago)nem podeíícm appellar da injufi:iça,né re-
correr por cIemencia,fenão para o tribunal do odio,&da ira.
Vivia nos cótornos hú Religiofo da ordé de S. Paulo primei-
ro Hermitaó(que em Portugal chamaõ da Serra de OíTa^por
nome Fr.Manoel do Salvador letrado, zellozo , & bê proce-
dido a quê bufcáraó os triftes afligidos,para remédio, &ulti-
ma córolaçaó:Deraõ-llie cota do cazo; ficou igualmente paf-
mado,& còpadecido:Sé reparar no rifco a q fe expunha, ('ía-
bia o entranha vel odio,q os Herejes té aos Sacerdotes,&mais
aos Regulares)tomou porliia conta o fer procurador de to-
dos,& avogado de fua innocêcia em tão piadofa caufa: Fello
cõ tanta diligencia,liberdade,& efficacia, q convenceo, &: re-
duzio a Siígiímúdo á rezão,mitigãdo o primeiro decreto , cõ
mandar paíTar fegúdo,pello qual condenava â morte a todos,
Sc a qualquer dos moradores , que dentro de tempo determi-
nado naõ vieífe com fua familia , & moveis para íiia caza ; &
pediífe paflàporte para fua legurança.

104 Doze dias fe deteve Siígifmúdo no Porto do Calvo
vendendo o cativeiro aos moradores por fobido preço. ( era
€xceírívo,o q levava por cada hú dos paíraportes.)Deitou fa- ^^^'^'^ 'hunTor*
ma, q fe apreftava, para ir em feguimento de Mathias de Al- ^dA^lrapleirT^'
buquerque,& o não avia de deixar,atè o defalojar da Lagoa,
& colher ás mãos:Cõ efta voz fahio có todo o poder: (Os ex-
ceíTos fizeraõ crer os ditosjcraõ outros os intêtos) Em hú lu-^
gar chamado Paropoeira,entre a Lagoa,& Santo Antonio,}e-
vantou húa força capaz de alojar 600. homens,que nella dei-
xou de guarniçaõ,& por feu Governador ao Coronel Chrif-
tovão Architofls:Levantou outra de menos fabrica nas mar-
gês do Rio Camaragibe, prezidiada, de cento & vinte folda- E hum rUmo m
dos, feu Cabo Jacob Eftacour.Cortou todos os caminhos, & ^^^ Cmaragik.^
V eredas,q podiaó fer vir à comunicação dos rendidos cõ os da
Lagoa (Mas não pode empedk húa via occuka, q os noífos

L % abrirão

f2 2|, C^STIiWTO LUSITJNÕ 1635

abrirão pell o mato , pella qual feguros, & deftimiclos íè co-
municarão ) Dilpoftas as couzas nefta forma , fe retirou Sif-
gifmundo , para o Arrecife , publicando que fe hia prevenir
para voltar íbbre Mathias de Albu querque.

í Ofy Mortaes faó os achaques , que com os remédios íè
íntenfaó , porque fe iíèntaó do remédio; Veremos caminliar .
a Capitania de Pernambuco á fua ultima perdição fomenta-
da pella aplicação dos reparos : Deíles fenão defcuidava a
Monarchia de Eípanha y porém , ou porque os ingredientes
peccavão de remiíTos, ou porque fe aplica vão fe.m tempo,,
fervi ão mais á doença, que à convalecencia . Cinco mezes a-*
via, que Mathias de Albuquerque fe tinha retirado para o fí-^
tio da Lagoa, aonde feaquartellava comasreliquiasdosfol-
dados,&: mora dores, que fe podèraÕ livrar da infolencia ini-
cheç-a ao SrazU ittiga? quando em dia de Santa Catherína, 2 5 . de Novembro»
Dom Frãcífcode de ló^^. appareceo nos mares de Pernambuco humgroíT»
Moxas com hum focorro do Reyno,que conduzia D.Luis de Roxas,& Borja;
bomfocorra. ^^^ Tenente Manoel Dias de Andrade^q com D. Alonfo Xi-
menes Almiron aviaó de fervir ao General de affiílentes , &
confelheiros , em todas as refoluçoés da guerra. O numero,
& a grandeza dos vazos fes parecer ao Olandès formidável
ó poder: Temeo a enveftida , & com todo o cuidado íe pre-
parou, para a refiPcencia, de que o aliviou a repentina v olta,
que a frota fes, para o Cabo de Santo Agoftinho ; aonde os
noffos receberão inteiras noticias do eílado de huas,& ou-
tras armas: Sem darem à laílima o tempo , que fe devia ao fo^
corro faltarão em terra dous mil homens, entre Portuguezes,
& Caftelhanos, ( deíembarcàraó no íltio , que chamão a Ge-
f oága) foldados práticos alguns, os mais,bizonhos: Affi como
tiráraó das embarcações, artelharia, muniçoés,& mantimen-
tos fefes a armada à vela para a Bahia, aonde fua derrota
tinha a defcarga , recebendo primeiro â Mathias de Albu-
querque, a quem Sua Mageílade mandava vir para oRey--
no, por ordens, que Dom Luis lhe remeteo logo. Naó fe pa-»
ga5 os Principes de quem ferve com acerto , fenaõ de quem
obra com dita.
6 auefa.^oolm' I O 6 A nova do focorro alterou a todos,com a differêça
ãs com a mvA de efpcradoj&detemido.Apreftaraõfe osFramengosparaa
delle. de-

^^^^1

oUtÇM

iores, ■

iíW»

1635 TJ^E 1. LW<Èp llh 125

defenra,& os Portugnezes para a reftanraçao , efperança com
quemuytos dos moradores fe agregarão logo a Dom Luís,
ao qual deteve vinte dias a marcha, por dar tempo a hum no-
vo caminho , que fe abrio pello coração do mato/neceíTarip
para a fegurança,& para a condução de treym, & foldados.)'^
Chriftovaõ Architofls, Coronel Olandés , que governava o
Forte da Paropoeira, com mil & quinhentos homens de pre-
sidio, fuppondo, como foldado velho 5 que no focorrodo§
moradores confiftia o alento de feus contraríos,mandou coni
pena de morte, a todos os vezinhos do Porto do Calvo , que
dentro de dez dias fe retiraíTem com fuás familias , gados, &
moveis para o deílricto de Sirinhaem,Cabo de Santo Agoíli-
nho, Ipojuca, Moribeca,& outros,acomodados pella diftan-
cia a leu provimento , & a noíía falta . Foy o bando obedeci- ^^
do de muy tos,& defprezado de naó poucos jeftes fe retirarão.'''^ '
para os matos com intento de fervirem â conveniência , & á
Vingança,aqual logo principiarão alguns niancebos aventu-
reiros,que fe achava o com armas de fogo,matando em diver*
fas embofcadas bom numero de Olandefes . Alteróufe o ini-
migo, V endofe por húa parte aíTaltado , & por outra defobe-
decido: Rompeo em deíatinado furor, executando cruelda-
des verdadeiramente filhas de taó vil aíFedio como he o te-
mor, Licenceou os foldados,que fem diftinção roubaííem, St
ofFendeíTem: Exercicio em que os achou o Capitão Rebel-^
linho , chegando ao Porto do Calvo húa jornada diante de
Dom Luís, que o feguia com o groflb do exercit05& o tinha
mandado defcubrir o campo,& efpiar o inimigo.

1 07 Não dormia S ifgifmundoVan-Scoph fobre a cama
do avizo,& do receo: Com toda a prefteza fahio do Arrecife
acompanhado daquelles foldados,que achou mais promptos,
com o deíignio de fahir ao encontro de Dom Luís de Ro-
xas, & engroffar o poder no Porto do Calvo,aônde yi efcava,
quando a eíle chegou o Rebelíinho,que furtado ás fmtinellas ^ (^aúão Rehel-
do inimigo fes alto meya legoa da po voaçaó,aonde embofca- n^^ho fai rojio a
do, procurou faber, o quenella paíTava.Éncarregou a diíigê- sifgifmunâo , &
cia a Dom Francifco de Souza , que com dez Soldados [ por <? dejaloja.
veredas occultasjchegou de hum alto a efpiar a povoação,&
a defcubrir^ o que nella fe fazia, a tempo, que lhe veyo câhir
. , . L3 íias

, ^ CASr(^10rO LV$JTMO j6^y

nas mãos o Secretario de Sifgifmiindó com feisToldadoSj & (>
roííbo de algiias refes , que deixou em noíTo poder ; & as vi-»
das de cinco companheiros , com a própria liberdade . Hum
Olandés3& hum índio podéraó fugir à morte,& à priíaõ.Pel-
la confiíTaõ do Secretario alcançou o Rebelhnho a chegada,
& os intentos de Sifgifmundo , & como por ordem fua fora
dar avizo ao Coronel Chriftovaó Architoíls,que fem deten-
ça fe vieíTe encorporar cõ a fua gente, trazendo a de feu preè-:
zidio, para que unidos fizeíTem oppoíiçaó ao poder contra-
íio: Com o rebate , que na povoação deraó o Olandès, & o
Indio,queefcapáraõdasmãosdeD. Frandfco de Souza, fe
p os Sifgifmundo em arma^ & formada fua gente fahio a buf-
car a D.Francifco,que jà fe tinha retirado,& unido a feu Ca-
pitão (eíperavaõ ter o encontro a todo o poder inimigo)po-
rém elle avertido da fofpey ta , & receofo de algua embofca--
da,voltou com tanto medo, q fem dilação largou o alojamê-
to, & por veredas ocultas , chegou á Barra Grande, aonde ti^
nha fua armada; na qual embarcado com os feus navegou pa-
í^í/rá^íí^^owá-i^a o Arrecife, deixando na povoação quantidade de polvo-*
caõ do Porto í/o ra, balia, corda, chumbo, & mantimentos, de que fe aprovei-*
tàraó os foldados do Rebelhnho, que nella entrarão de noir*
te, com fintinellas ao largo,C verdugos entaõ de muy tos OJã^
defes,que a confiança trazia difperfos,& feguros na imagina-
da aííiftencia de feu General, ignorantes de fua retirada.)

i©8 Ao feguinte dia apareceo ao largo Dom Luisde
Roxas com todo o exercito,dando de íi luztrofa moftra : Sa-
hio o Rebelhnho a receber o feu General, a quem deu conta
do fuccedido, & do que poderá fucceder, fe o adiantarfe naõ
fervira ao inimigo de avizo , & de rebate para fe por em co^
bro: Hum, & outro fentiraõ as promeílàs do difcurfo , como
fe tiveraõ certezas do fucçeíTo.O Coronel Olandès Chrifto-
vaó Architofls enformado da marcha deDomLuis, &do
pouco poder com que fe achava Sifgifmundo no Porto do
Calvo (alheo da retirada) fahio de fua fortificação da Paro-
poeira com mil & quinhétos infantes em feguimento do nof-
fo exercito, para focorrer os feus em todo o confliéio. Certi-
ficado Dom Luis da marcha,& do eftrago , com que o Olan-
dès por Camaragibe vinha aíTolando a ferro^Sc fogo quanto

encon-

Caliío.

Sahe a recebera
D. Luis de Roxas.

ifé3^

7>J1lTE 1. LIF^O 111.

fày

encontravaj fahio do Porto do Galvo"- còm mil & duzentos
homens (deixando em guarda da povoaçaÕ5bagagem,& mu- ^'°^ ich'7 !
niçoés, a Manoel Dias de Andrade com trezétos & cincoen- ^^^ Architofis.
ta íoldados) com intento de lhe cortar o paíTo, no íitio , que
chamaõ Mata Redonda. O inimigo, que de qualquer movi-
mento noíTo tinha avizos,o mandou efperar com húa emboí^
eada, em a qual nos matâraó ao Capitão Dom Pedro Mari-
nho, & cinco foldadosj porém fahio-11^ taõ cara a fortida, q
deixou no campo cincoenta mortos :Os que efcapáraõ com
vida, foy,porque largando as armadas máos, fe valèraõ dos
pès, deixando em noíTo poder muchillas,muniçoés,& armas;
& nada baftàra para os livrar do trago , íe a noite lhe naó eí?
condèra o perigo.

109 Em a manhã feguinte aviftou Dom Luis de Roxas
o exercito inimigo,que achou formado,& immoyehMandou
ao Rebelhnho , & ao Camarão, que o picafíem por hum , & AviflâYâo-Ce os
por outro lado; o que logo executarão com dano conhecido exercitos;& mi'
do contrario, mas fempre tão fechado, que parecia infeníi- ma. d. luU aos
vel. D om Luis, que não temia a força, defprezou a arte ; & a fi^\
hum mefmo tempo mandou tocar a enveftir , & animou feus
foldados com femelhantes palavras . Aquelle efquadraõ iní- '>
migo,que com obftinaçaõ permanece cerrado, fenão peccára '>
na matéria, naó fe v alera da forma: Sua conftancia nos aviza '>
de fua fraqueza; occupado do medo, ó ajunta a cobardia do "
ánimo^mais fechado eftava o no Gordiano , & cortou-o fem "
rcfiftencia a efpada de Alexandre:Tal deve íer hoje a de cada >>
hum de nós;& experimentara o contrario, que tem de ray o o "
desfazer o mais unido;& que o valor naõ fe vence de apparé- J'
cias, nem as armas Portuguezas de argumentos fophifticos: "
Que occaziaõ mais favorável nos podia dar a fortuna, que ef- "
ta , em que nos offerece a batalha,poupando-nos os golpes? '>
De hum podemos matar muytos , & de outra forma levara-"
nos muytos cada hum. A elles valerofos foldados , que a vic- "
toriahedequemabufca,&na5dequemaeípera. "

1 1 o A a opinião do General correfpondeo a prompta
en veftida dos foldados, q a defefperada conftancia dos Olan- ]f^f' '' ''''''
defes recebeo firme; fem que os mortos, que cahiaó défcom-
pofeíTem a forma dos que ficavaó : Com igual Marte fe da-

L ^ vaõ,

CJsr^VoTo LusiTjm

1635

N :

víiõ,&: recebião,as ballas,&Gs golpeSj& não fe via q para ne-
nbiia das partes Te inclinaíTe a balança, aíè que roto o efqua--
drão inimigo lhe começou a faltar a obediência pella coníer-
vação da vida,& da faude, tanto , que apezar de feus Cabos
foy o inimigo largando o pofto. Pareceoíhc aos Portuguezes
fer o dia feu,& em obfequio da eíperança acclamáraó a viéèo-;
ria,que a fortuna lhes tirou das mãos , pello meyo mais fen-»
ílvel, que fer podia, porque negandolhes a gloria de vencer,
Jhes efcondeo juntaiíí^e a deículpa de ficarem vencidos. En-

Ferdeterrâoim- tre a fua gente andava ©om Luis enchendo os olhos de to-

^^^^°' dos de admiraçoês,& envejas, com o que deípunha, & com o

que cortava,como deftro General,& como valerofo foldado,
a tépo que húa balia com pontaria tray dora o paíTou das coi-
tas ao pey to: Do centro do feguro fahio o perigo , quando o
valerofo Capitão bufcava no perigo o mayor feguro. Impel-
lido^^a baila cahio o corpo por terra, porem o coração , ma-
yor (ftte o corpo, o levantou em pè,mDfirando a grandeza de
féuefpirito nos últimos alentos de feu pey to , com que for-
mou eítas palavras: Naõ he nada, avante v alerofos foídados,
que o inimigo vay vencido ^ com o fim da batalha íe coroa a
^ viâ:oria. Pedio, qiie lhe chegaífem o cavallo , & ao por o pè

M a A ray^ ^^ eftribo cahio morto: Naõ quiz a fama, que varaõ taó cla-

Luis de Roxaí. ^^ amortalhaíle a vida entre o turno de nua baila , quiz que a
morte fe publicaíTe com os grito^ de feu valor jcauza da laíli-
ma naõ fer toda de próprios , & contrários , pello terror de
huns,& pella enveja de outros: Tamanha opinião concebe-
rão (naquelle breve tempo ) de feu talentOjêc de feu braço,
que julgarão íiia morte, eíFey to de íuperior providencia , &
não cazo ordinário da fortuna.

III Com preíra,& cautela fe retirou o corpo morto da
batalha, mas como a falta da pefí ba era mayor, que toda a di-
ligencia, em breve tempo fe efpalhou a noticia,& aífi defma-

Terdem os Por- y qu a todos a nova, que trocou as mãos á fortuna: Não acha-
•J va cada hum dos nonos no pey to mais coração, que para tu-

gir com a vida, aonde podeífe chorar a perda. Os Cabos,que
virão defprezar a ordem não tiverão mais remédio , que fe-
guir a fuga: Muy tas vezes5por fe atalhar a ruina, fe paíTaó os
homens à parte do medo. Sò os invencíveis Capitães Rebel-

linho,

linho, & Camarão fahiraó formados dos póílos aonde pele^
^àraó, a occupar o cimo de hú pequeno monte , defde o qual
com paíTo vagarofo marcharão para a povoação, fazendo al-
to algúas vezes , & virando a cara outras a rebater a alguns
poucos inimigos,que foltos os picavão na retaguarda:0 grof-
fo do exercito Framengo, com feu Cabo,entregue ao pafmo,
avaliava por fonho a hvrança do perigo, pois fem fe cobrar
do medo, não teve efpiritos para dar hum paíTo em noíTo fe-
guimento; antes mortal pello horror, qírè bebia na prefença
de 200. mortos, fe retirou com mais de 400. feridos para a
fua forçada Parapoeira. A perda,que ouve da noíTa parte,fe- portos ,& feri-

- m r^ r A 11 JT -J J aos de hua^o^ott'

nao fabe ao certo, mas fabefe , que teve aqueila diiparidade, ^^^ ^^^^ "^ -
que fe acha entre os que ferem, & os que fe reparão.Bem fey,
que com diíFerente noticia fe efcreveoefte fucçeífo acufan^
do nelle de temerário a Dom Luis de Roxas: Não feria male-
volo o affefèo, mas feria cavillofa a informação . De hiia, &
outra parte era igual o poder , contrapezandofe os exéiubs
do numero, & da difcipHna : Em femelhante cazo , com que
fundamento fe acufa a temeridade ? O rafgo da pena he mais
leve, que o da efpada3&: quem no conflido não ferio com ef-
ta, na relação não deve laftimar com aqueltà . Diz que eíle
varão pagou a temeridade com a vidajque diífera fe com ella
pagara a cobardia ? Se fe julgão as temeridades pellos íucçef-
fos, não há no Mundo vencido, que não foífe temerário. A
fortuna nunca foy juiz do valor. Quem nada ficou devendo à
difciphna, como podia morrer por inconíiderado .^ Ainda^
preíumíndo a trayção, não devia faltar às obrigações de fol-
dado,quanto mais as de General , em tempo , que lhe não fi-
cava mais efcolha,que a do avanço , ou a da perdição . Entre
os males, primeiro fe foge ao certo,que ao duvidoíb.Lafi:ima
grande he, que deva a memoria defte Capitão mais a eítima'-
ção de hum eftranho, que a relação de hum natural. O Con- ^^,^ ^^ ■^^f"
de deNaíTaíi collocou o retrato de Dom Luis de Roxas(que ^^^Jg J^"^ ° Luís
achou fobre feus oííbs ) no falão de feu palácio entre os dos ^^^^^ ^^ capitães
famofos Capitães do Mundoj vencendo as paixões de inimi^ da fama.
go, com os argumentos de dífcreto.

112 Manoel Dias de Andrada, a quem Dom Luis de
Roxas deixou em guarda da pavoação, Sc bagagem , vendo:

entrar

! I

i^o c^sr^oro LusiTAUo lé^j

entrar por elle a noíTa gente tão deíatinadamente clefordcna-
da, que em nenhum lagar fe dava por fegura, adetevecom
poQcas,& diícreías rezoés ( tirando-lhe aquelle terror , que

^IZt 'T f t^"^^^ concebido com a falta de feu Cabo) íhes dizia, que o
Manoel D lai de 11-1^ ii r n- 1 Á ^

Andrada. perder ima batalha era íorte,& nao culpa. O morrer o Gene-

ral, para a occaziáo era falta, para o remédio não era fim , &
menos, quando entre os Portugueses avia foídados tãopra-
ticos,& valerofos, que podião governar muy tos exércitos^ §
feo defmayofeavíá de medir pella perda, demelhor condi-
ção efta vão, que o initíiigo , poisefte perdera a flor defua
gente, que não poderia recuperar, & elles hum homem , que
outro podia fubílituir . Com o femblante aííègurava a inte-
gridade do animo , & tanto infíuio nos foídados , que os vio
refolutos a voltar em demanda áo inimigo.Provèos de tudo,
o que entendeo útil para a emprefa,& ordenou duas embof-
cadas em hum razo, por onde forçofamente entendeo , avia
depaíTar o Olandés. Neíla refolução acompanharão a Ma-
noel Dias de Andrada todos os PortuguezesjO qne não quiz
CohardU do tC- ^^^^^ ^arco António filho do Conde de Banhoílo , com to-
tlm<ienos lomf' ^^^ ^^^^ ítalianos,que fem mais confelho,que o de feu cuftu-
fo exercito , que ^'^^•> fogío para a Lagoa, para onde o chamava o exemplo do
militíivh <?«•/?•(? Pay, que emfemelhante acção o não podia negar de filho:
^^•^- ■ímmitàraõ-no alguns Capitães Caftelhanos , ou efquecidos

de feu próprio natural, ou lembrados de noíía antiga antipa-
tia. Viofe Manoel Dias atalhado j & fogeitou o valor àpru-
dencia, com que fuípendeo a emprefa .

1 1 3 Ao outro dia da batalha fe ordenou ao Padre Frey
Manoel do Salvador,& a Henrique Telles de Mello, [ que a-
viaõ retirado do cõfliíto, & efcondido entre o mato o corpcv
de Dom Luis j que lhe foíTem dar fepultura^ o que fizeraõ cõ
íèntidas lagrimas^ (próprias exéquias dos códoídos.) Amor-r
T>ã(fe fepultura talharão o corpo com a decência poííivel, & fiado a hum tof-
ao corpo de Dom CO caixão,o enterrarão no mato, húa legoa do Porto do Cal-
Luis. vo^ (pequeno, & efcuro tumulo , para cinzas de varaó tão

grande, & taó efclarecido) mas fe a terra não cobrio feu no-
me, não cobrirá fua memoria a de htia trayçaõ tão fea, como
a q lhe tirou a vida . Laftimados os Portuguezes de infortú-
nio tão callamitofoj na confideração do palfado^ tratarão de
1 -^ pre-

i635 TA^TEl. Lírico HL j i^Jt

prevenir o futuro. Abriraó-fe as ordens delRey , & rtellãs fe
achou nomeado (por morte de D.Luis de Roxas) no pofto
de Meftre de Campo Generaljhum valerofo Caftelhano,que ,

na Lagoa eftava gravemente emfermo,cu)o nome nos efcon-
deo a morte, porque no mefmo dia em que o chamou o pof-
to, lhe tirou a vida j bufcando a fortuna noíTa ruína (por me-
■ yos taó defufados) na peíToa do Conde de BanhoUo nomea-
do na fucceíTaó do cargo em terceiro lugar: Determinação Succede-lhe no
infaufta,& ordem prefcripta , para o ultimo alento daquella cargo oConde de,.
provincia, que acabarão de todo os ingredientes defuacon- ■^^'^^^ "'^
fervação. Avia de fer, & naó ouve difpofição, que não con-

correíTe para efte fim.

114. PreíTaj&deftreza pedia o reparo das perdas;de tu-
do fe V aleo Manoel Dias de Andrada: Defpachou hum cor-
reyo ao Conde de Banhollo , ( eftàva na Lagoa ) pello qual
lhe remeteo as ordens,& a patente, porque elRey lhe dava o
baftaó , com perfuaçoés, & proteftos , que fem detença mar^
chaíTe com toda a gente a encorporarfe com a que tinha no
Porto do Calvo, para que antes , que o inimigo fe viíTe defaf-

fombrado,fe achaíTe todo o noíTo poder unido.Nenhúaballo,

^ ^ , . . >--. 1 -r\ - j Aceita O toito^KT

fizeraó eftas ddigencias no Conde.Parece, que nao dera a na- ^^rn^JJ^^^ ^

tureza a efte homem, nem fentimento para a injuria, nem eí- ohrigafão.
timulos para a honra. Quatro mezes fe deixou eftar no mef-
mo fitio,tempo fobrado para o inimigo nos confumir,fe a pe-
ricia, valor, & zelo de Manoel Dias de Andrada não podèra
mais para nos confervar , que toda' a defatençaó do Conde
para nos deftruir.Favoreceo , & governou a infantaria com
prudência de Capitão, & com brandura de companheiro,
trazendo a fi, naõ fó os foldados, fenão também os morado-
res;& de forte guarneceo,&fortificou o lugar,que o Framen-
go fenão atreveo a inveftillo em todo o tempo, que o Conde
o naó focorreo. A muy tos difcurfos deu motivo efta fleimaj /

alguns queriao,que foíTe cobardiai& não eraõ poucos os que
a definião tray çãoi& na v erdade bem coníideradas as difpo-
fiçoés defte homem, mais parece, que influia nellas a malicia,
que o deíazo: Já no fim dos quatro inezes mandou diante a ^^^ ^ lagoda
feu filho Marco António com abundância àc munições^ 8c ^azer h/ía for ía^^
parte da infantaria, & com a outra parte o feguio (acompa- /^^^.
, nhado

li"

U^>i

^•'íg2 'C^ST(!(/OTO LVSITJNO 1^635-

nliado de Duarte deÂlbuqaerque)coí5i o que naquelle íitio
fe alojou toda agente de guerra ,qne Portugal tiolia ema-
quellas partes. Mandou o Conde lavrar hua Fortaleza capaz,
& viílofa, queem breviffimo tempo fe aperfeiçoou [ induza
nella a Igreja Matriz do lugar J também artilhada , & guarne-
cida, que não fó pareceo féguro para os próprios , íenão ain-
da terror para os contrários.

115 A primeira expedição qucfes o Conde foyman-
^^'; Mar a Manoel Dias de Andrada por Cabo de trezentos fol-
ordenaaMm^el ^^^""^ ' com ordem^-^ê íè alojaflfe na povoação de S. Lou-
Dias de Anira- J^^oço de Una , de forte , que o Rio lhe ferviíe de trincheira
dã^q corte o pajfo ^2X2i apartedoSul, ScempediíTe ao inimigo as ordinárias
Ás correrias do correrias com que talava, & deftruia a campanha. Obedeceo
mmtgo, Manoel Dias como foldado velho , & obrou como experta

Capitão . Em todos os lugares 5 por onde o Rio fe podia va-r
dear levantou trincheiras , que ^uarneceo de íintinellas , &
prezidio. Não feefcondeoà vigilância do inimigo adiligen-
eia3& intentos dos nofíbs . Entendeo , como em femeihantes
cazosjobra tanto a prefteza,como a força^Sí fem detença(en-
-BmotrA'0 o íz;f- corporados Sifgifmundo, & o Architofls com 1500. Olan^
mmgo, defes,& grande multidão de índios) vierão fobre os noflbs q

cercarão ao largo, ou receofos,ou acautelados da nociva v e-
zinhança, que íèmpre acha vão nelles : Porém Manoel Dias
de Andrada com diíFerente Conceito julgou, que erainduí^
tria, com que o Frameiígo o queria vencer à fome : Deípa-
éhou hum avizo ao Conde de Banhollo com enformação, do
que avia,& do que fofpeitava, para que focorreíTe a hum , &
outro cazojo que logo fes o G®nde mandando-lhe loo.mof-
queteiros ás ordens do Ajudante Pedro Marinho Dèça,&
mais 5 o. em feu fegu imento, que a marcha, & diftancia detir
V erão ma-is, do que convinha . Avizado o Olandés das eípe-
ranças do focorro, fe adiantou a enveftir os nofíbs , que def-
tros,& animofos fe defenderão com v alor^& caftigárão a fo^
berba inimiga com tão boa fortuna,que o horror de feus pró-
prios mortos,o retirou do aíTalto defcompofto,& arrependi-
neúrãCe àefcom' ^^ ^^ intentar com perda,o que podéra confeguir fem rifco.
■pofio^ & Ceforti" í^i^íão aconfelhado do fucçeííb, quiz emendar o erro,& tra-
fca. '■. tou de fe fortificar na igreja de Saõ Gongalo, para confumir

por

por aííèdio, o que naó podia render por aííalto.

116 Conheceo Manoel Dias de Andrada o intento, &

para atalhar o perigo, na falta do íbcorro , fe aproveitou do ^^* ^^^^^ odefio
árdil. Mandou ajuntar todos os moradores daquelle deftric- °^^'
to com molherGs,Tdhos,& efcravos ( cobertos â vifta do ini-
migo de hum monte vezinho,) que armados de varias àfteas
reprefentavaó ao longe mofquetes5& picas , para que fe moí^
trâííèm em forma de focorro, marchando para a Eílancia dos
íioííbs.Logroufe o engano a beneficio da aparência. O Olâ-
dès, que prezumio o focorro,eípantado, & cortado da vezi-
nhança do perigo,largou a fortificaça6,&: levantou o íitio CO
tal defacordo,que fe veftio a retirada das cores defugida,fem
lhe ficar animo para virar a cara ao medo atè Sirinhaem, aon-
de fe deu por feguro. Avaliou a piedade dos noíTos o fucçef-
íb, por milagre, que attribuio ao Síndo , que patrocinava o
fitio j a quem gratos, & devotos renderão graças, & oíFertas.
Reftauráraó a Igreja de todos os danos, que nella tinha fey to
o Hereje,cujos defacatos obráraó mais em íeu cafi:igo,que to- Retirafe vi^o'
da a noíTa induftria.Manoel Dias de Andrada, que verdadei- ^'V^ /'^^^ <' ^<^^'
ramente creo fuperior o auxilio, que o livrara da oppreíTaó, ^^^^ cdvo.^
& aos moradores do eftrago,com que os ameaçava o contra-
rio, os quiz tambê aliviar da moleftia, que recebiaõ dos pró-
prios, retirandofe com toda a gente de guerra , para o Porto
do Cal vo. Sabia, que em íemelhântes occazioés,fenaó deílin-
guem as hoftil idades, que padecem os moradores de amigos,
& inimigos pelía realidade, íenão pella eftimaçaõ.

1 1 7 Em o mefmo tempo,que o C onde deípedio a Ma-
noel Dias de Andrada , para Saó Gonçalo de Una , mandou
também ao Capifão Souto correr a cãpànha a favor dos mo-
radores^que feusfoídados com demafíada licença tratarão ^ ^^p^^^^ ^°^f<^
comoaOlandefes. A difciplina confervafe na guerra com o 'P^°^^''^Py
terror, & nao com o d^íprezo. Orefpeyto he refulta,do que amigos^ámimi^
hum General obra j o que dà occaziaó à cenfura,tambem a dá gos.

â defeftimação; Nunca o Author da culpa, o foy do caftigo.
Kecolhido Manoel Dias de Andrada, ordenou o Conde ao
Capitão Rebellinho,que fahiíTe com trezentos homés a cor-
tar por vidas,& fazendas de Olandefes,& rebeldes, até onde
podeíTe alcançar o braço.Sahio em Abril defte anno; agregâ-
í^'^yi M raõfe-lhç

Co a melhey àif-
ciplina ofes o Cá
fiiao Rebellinhoi

Peleja. cÕ o Fra-"
mengo^ (^ Jere-
tira, vencido.

Sarbard vingl'
ça. que o Olandeí
executa nos mo->
radares»

134 c^sT^oroLvsirjm) 163^

raõfe-lhe muytos moradores, ou pello intereíTedo roubp,ou
pello gofto da vingança.Não pii ve vida de inimigo, que não
cortafíè a eípada, ou não çingifíe a obediência :0 melhor das
fazendas fervio ao roubo, o menos util,ao incêndio. Chegou
à povoação de São Lourenço, aonde feaquactellòu j nellaq
bufcou Q inimigo com avantejado poder: Enganou-o o nu^
meroj ouvera de contrapezar acalhdade. Enveftio ouzado^
continuou perfiofo, venceo conftrangido da perda,& da ira.
Aos golpes da defenfa vio cahir muytos mortos j&retiraç
muytos feridos:Coni ge;nte de refrefco foy cevando o com-i
bate, certo na efperaaçá deaffoixar, o que não podia ron>
per : Çorreípõdeo o fijcçeíTo à prefurição,porque desfaleci-
dos os braços Portuguezes , não teve o valor inftromentos,
com que obrar , & foy remédio largar a viâ:oria, para dcmi-
nuir a perda.Com boa fortuna fe retirou o Rebellinhoj&to-
da fua gente; entre ella muytos moradores , que remirão a li-
berdade com o defprej^o dás fazendas.Largàraó a povoação,
deixando nella os que riiatou a defenfa, que não foraõ pou^
C0S5& ao inimigo , que a fortificou , & guarneceo^ & com o,
reftante da fua gente fe voltou para o Arrecife. ORebel-
linho,rpmpendo pello mato chegou ao Porto do Calvo com.
novo credito de foldado . O vencer inimigos he fortuna, q
triumphar da fortuna he magnimidade.

118 Nçnhum aífeâ:o nuais impaciente, que a ira; ardia-
no peyto dos Cabos Olandeíes,eom a lembrança do eftrago,
& da perd^, que fua naç Jo recebera do Capitão Rebellinho;
carregando o deíejo da vingança fobre os triftes moradores
toda a culpa: Pretcxto-inaliciofo, de que fe valeo o odio,& a
cobiça, para lhes por às coftas toda a pena . Em dous de Ma-s
yo fe pos em campo Sifgifiíiundo Van-Scoph acompanhado
dos Coronéis Chriftova5 Architofls,& Guilhelmo Scoto c5
hum groífo de mil foldados, & mayor numero de índios Pe-
tyguares, &Tapuyas(mortaes inimigos dos Portuguezes,
mais por malicia,que por rezaó.) Para defculpar cruezas,fin-
gio o Olandés deliâos.Sahio de Sirinhaem fazendo a marcha
por aquellas povoações, & fazendas , por onde a tinha feyto
oRebeilinbo. A todos os moradores julgou por traydores
imputando-lhes a culpa de receberem, agafalharem , & fervi-

í£

tem

rem a gente do fobredito Capitão , influindo nas perdas, &
danos dos confederados ; encarecião o pretexto da culpa,
por eftenderem o dominio da crueldade , & da cobiça . Do
roubo, fenaõ ifentou algum j do martyrio poucos . Inventou
a deshumanidade novos tromentos, fazendo deley te do mef-
mo, que às feras podia fervir de comiferaçaó . Naómatavaõ
de hum golpe , porque o trago da morte duraíTe muyíos
dias . Em o deftriíto de Sirinhaem mandou prender a Jeró-
nimo de Albuquerque, Francifco Rodrigues Porto, & a
lium filho feu (homens nobres,& dos principaes do lugar )
fem mais culpa, que aquella, que lhes formou a malicia, le-
vantando, que fe carteavaõ com o Conde de Banhollo»
Por entre as unhas , & a carne lhes metéraõ agulhas de fer-
ro ardendo j o meímo tromento padecerão naquellas par-
tes , que o natural pejo fazia mais feníliveis j logo fregi-
raÔ em azeite os pès de todos ^ ( deípois de os cobrirem
de tam reforçados açoutes , que os deípiraõ da pelcj ) a
que fe feguio pingarem-nos com alcatrão fervente 5 fem
que os laftimofos gemidos, & horriveis, vizagens dos mife-
raveis padecentes motivaíTem a menor compaixão nos feri-
nos verdugos, antes mais aíTánhados , de naõ largarem as vi-
das nas mãos dos tormentos, os enforcarão , porque fe dila-
taíTe a complacência nas extençoês da noticia . Referimos, o
que bafta, para explicar as cruezas , porque naõ hepoífivel
numerar os condenados.

119 Nos lugares de Ipojuca, Cabo de Sáto Agoftinho,
Moribecdj&Gorjaii fe vio excedida a mefma crueldade,com
taó di verfos géneros de martyrios , que agitada do horror, &
da eftranheza treme a pena ao efcrevellos . Para que as vidas
padeceíTem repetidas mortes as davaó a beber no fangue dos
íilhos,& dos confortes, aos Pays, & maridos, que atormenta-
vaóàfuavifta^&nelles executa vaõ deípois omefmo, ain-
da que com diíFerente golpe . A as laftimadas mãys , que „ ,
fe abraçavaõ com a inocência dos filhos, faziaõ tragar de húa ^^^
V ez o horror da mortej&r do fepulcro, porque entregavaó as
crianças aos fal vagens Tapuyas , que os fepultavaó vivos
era fuás barbaras entranhas . Muytas vezes cançava o braço
de ferirj& matar, & achava deftníàdo a ferocidade Olande-
;í^. Ma fa

rmif-

QASf^orO LUSITANO

1635

Sedes do odh.

las em ver como os desHiimanos índios matavaô, & feriaõ as
peffoas,que para efte fim lhes entregavaõ:Com machadinhas
as abrião pellas coftas , para lhes comerem as entranhas,[ ce-
lebrando os Framengos com feftejo acções taõ horriveis,q as
defconhecia a natureza.] Apoftavaõ ventagés^o fofrimento,
& a conftancia dos pacientes, com o furor dos verdugos^para
os quaesera omefmo ouvir implorar o favor de Deos , dos
Santos , & o pedir Sacramentos y que abrafaremfe em fogo
do inferno , vomitando blasfémias contra o ceo, a diabó-
lica defefperaçaõ emqueardiaò; & como demónios íe vin-
ga vão nas Sagradas Imagens , que deípedaçavaó com inau-
ditos deíprezos j como íe noíacrilegio achara deíàfogos a
vingança : Efte era o golpe mais íèníivel , que padecerão
aqaelles fieis ^ ardil, quefoube achar a perfidia,para osa-
tormentar juntamente nos corpos, Sc nas Almas (alheo,
o pertinaz Hereje, das Coroas, que tece o Ceo, aos que
em feu obfequio padecem tormentos na terra) tam fequio-
fodo fangue, & dano dos fieis, que bebia a fede na inun-
daçaói crecendo nelle a crueldade, com os motivos da laf-
tíma. '

120 Chegou o furor a Maciape, & a Saõ Lourenço,
aonde executou o ultimo da impiedade : Naõ ouve honra,
nem fazenda, que naõ meteíTe aíaco , & naõ entregaífe ao
incêndio : Aquelle fexo. St aquella idade que a natureza
defiinou , para mitigar a ira, & fobornar a brandura , fer-
via de intenfar a cólera à ferocidade Olandefa . A força
corta pella refiftencia , a fraqueza pella fogeiçaõ ; na ma-
téria mais débil íe atea o fogo com mais violência. Atrez
moços bem nacidos , dos quaes nenhum paíTava de deza-
feis annos , martyrizáraó com tormentos tam exquifitos , &
tantos , que a noticia igualmente os admira excogitados, &
fofridos. A todos arrancarão as unhas, & os dentes. A golpes,
& açoutes os desfigurarão, deforganizando-lhes a armonia
dos oííòs, de tal forte , que cm cada hum dos corpos ficavaõ
todas as partes vivas para a dor, nenhúa para o movimen-
to.Com diverfos materiaes derretidos,& acefos os pingarão^
& fizeraó parecer de outra materia,& de outra cor j& porque
efte martyrio os defendia de novos tormentos achàraõ hú, q
* . .. podeíTe

,635 '!?J^ELL1V(]^UL 157

podeííé penetrar, o que o golpe não podia ferir: Entre duas
taboas repaffadas de largos,& agudos pregos , deitarão a ca-
da hum dos corpos, & por deleytofo defenfado paíTeavaõ fo-
bre elles os circunftantes, bebendo o rifo nos laftimofos ge-
midos dos pacientes^ & o defprezo nas fentidas vozes com q
imploravaó o auxilio de noííb Redemptor, de fua Sãâiiffima
Máy,& dos Santos do ceo . Vencia a conftancia , toda a for-
ça,& induftria da tirania5& impaciente a crueldade , atalhou
de hum gol pe os muy tos, que o hereje recebia da firmeza dos
fieis: Amarrarão húa corda a cada húa das gargantas dos mar-
tyrízados,& arraftados delias por largo efpafo os colgâraõ â
y ifta da multidão, que com afrontas, & golpes os reguia,para
que o efpetàculo ferviíTe de feílejo a protervia, & de efpantq
a piedade.

121 Eíle era o modo, com que procedia o Q%ct^o'^ mas
não era efte o mayor, com que fe fatisfazia o odio,porque no
eftrago fe avivava mais o defejo da extroçaõ . Náo particula-
rifo os cazos, pornão repetir muy tas vezes os motivos ao ef*
candalo,& a compaixão . Em o tiro de hum mofquete fe ou-
vem todos, ainda que fejaò difFerentes os alvos: Em a viRa de
húa roza reprefenta a confideraçaõ a forma de todas . Sò di-
rev, que intercedendo pellos afli6i:os moradores , muytas ve- , , . ,.
2es,o reipeyto,& o rogo, lo o mtereile alcaçava o delpacho: ^^^^ - '

fEntre eftas feras Sctentrionaess, acha mais obediência o ou-
ro, que a rezão . 'j Com a natural cobiça de fobir o preço ao
perdaõ, lhes deííimulava o laço : Concedeo o perdão Sifgif-
mundo, & armou o tropeço no perdão , publicando editais,
que fobpena de irremiífivel perdição de fazendas , & vidas,
jienhum Portuguez uzaííe, nem tiveíTe em feu poder algum
género de armas.Obedecèraõ muy tosj&foraó em grande co-
pia,as que fe ajuntarão no Arrecife. Alguns ou ve,que as que-
brarão, & desfizeraõ \ outros mais confiderados as efcondé-
raõ, ou pellos matos, ou pellos riosj affi por não augmentaré
o dano, como por efperarem no futuro, podia viroccazião,
em que o preílimo foíTe mais útil, do que agora era nocivo o
rifco. Defta cavillação Framenga fe originarão grandes ma-
les aos moradores, porque baftava o dito de hum eícravo,pa-
ra condenarem a innocencia de hum fenhor^ fendo o mefino

M3 dizer

h

i

CAsr(^oro lusitano 1635

âizer que tinha armas efcondidasj que ficar elle fem vida , 8c
feus filhos fem fazenda.

Avultarão em o Porto do Goivo eílas noticias com

122

Elírago quefes o
Camarão na cã-
^anhadeGoyana.

Toma. humfocot'
TO, & arrazíihíí
reduto.

Acode o OUndès
a rebater a fúria.

do CAmAYAO.

aquelle corpo^que recebem nas difi:ancias3& tanto,que as de-
niafias irritarão a fíeima do Gonde de Banhollo deforte,quc
ordenou a Dom António Phelipe Gamarão, que com hum
groíTo de Portuguezes , 8c índios fahiíTe atallar a campanha,
& entregaíTe à efpada,& à chama tudo quanto podeíTe domi-
nar a morte,& o fogo , íèm piedade, nem cobiça de coufa,q
pertenceíTe ao gentio rebelde : Indignação bem merecida,
& melhor executada: Sahio o Gamarão (entrado jáomez
de Julho) penetrou o certão , & deu fobre os arrabaldes de
Coyana j foy repentino o golpe, a todos, & a tudo alcançou
o braço. Naó ficou vida , que o ferro naõ cortaíTe ^ naó ouve
edificio,que o fogo naõ confumiííè.As fazendas,& os frutos,
que naõ lerviaó ao íaco, fervirao ao incêndio , defcon heci-
da a difi:inça5 dos íexos,& das idades, não eftremou a cólera
o vil, do preciofo. As mefinas aldeãs dos índios , que entaõ
foraó os teatros de fuás mortes , foraõ juntamente osepi*
taphios de fuás culpas, porq reduzidas a cinzas fe lia nellas o
proceíTo, & a fentença fó com os olhos da memoria : Gomo
rayo corria , & abrafava o caftigo. Topou hum reduto guar-
necido de Olandefes, que fervia à fegurança , & à defenfa do
Gentio.Sem dilação o íitiaraõ os noíTos a tépo, que lhe veyo
cahir nas mãos hum bom focorro de mantimentos,muniçoés,
& armas, com que o inimigo,em aigúas lanchas, vinha favore-
cer os cercados, que naõ podendo refifi;ir à fúria dos aífaltos,
foraõ entradosj&deftruidos: Pouco fervío ao roubo , menos
ao defe;o; tudo á vingançaiO preciofo,& útil, que pello pe-
2o, ou pello vulto cauzava ettibaraço, fe entregava à chama;
porque naõ ferviíTeao dano, o que naõ deixava o faço.

123 Gom as azas da queixa, voou a nova doeílrago:
Ghegou ao Arrecife, donde em trez de Agofi:o fahio Ghrif-
tovaõ Architofls, (que allí fe achava^ com 800. Olandefes:
O intento era de atalhar o deílroço,quando naõ podeíTe def-
truir os agreíTores^Sc cobrar a opinião perdida nas ventagês
da perda. Ghegou-lhe ao Gamarão a nova da vinda, & do
poder do inimigo,&o eíperou fortificado na Goyana.Muy-
'^'- • [ ■■■'. tos.

j6y

TA^TEL Lir^O IIL

I3P

tos, & vários foraõ os encontros, que tiveraó luias , & outras
armas; & verdadeiramente dignos de particular relaçcó ncí-
ta hiftoriaj porém como me chama a fuftancia do aíTumpto,
he força paíTar de corrida por eftes prelúdios do argumento;
baíta faberfe, que fe o Framengo excedia no poder,o Cama-
rão o aventajava no valor, & na induílria: Ouve dia, em que
noffa efpada lhe degolou cincoenta Olandefes ; taó receofos
dos aíTaltos, com que em toda a parte,& a toda a hora os en-
veftia, ;á em capo rafo , jà em carros portáteis, com que igua-
lava as fuás fortificações , que defatinado o inimigo dizia af- ^ ^l^^ j defcom'
fombrado, que fó hum índio tivera poder para lhe coxt^x zP^^fr/X^ar
fortuna,& confundir a opinião. O Camarão, que dos favores ^i^oriofi.
da forte não defconfiavâ menos, que da perfia do tempo; c5-
fideradaadiftanciaentre aquelle fitio , & o Porto do Calvo
para fc ajudar do focorro,fe fe viífe em aperto;&: a impoíTibi-
lidade do remédio fe lhe faltaíTe o fuftento , fe refolveo em
coroar as vií^orias com a retirada : Recolheo a fi os morado-
res , que o quizeraõ feguir, (com a gente de fuás familias fi-
zeraõ numero de mil & feifcentas peíToas , das quaes ficàraó
muy tas pellos matos em diftancia de quarenta legoas de ca^
minho,que pello fertão fe abrio, feguro para a marcha , falto
de todo o neceífario, para a vida.) Foy recebido o Camarão
do Conde , & do prezidio da povoação do Porto do Calvo
com palmasj&vivas igualmente devidas ao que deílruio3& ao
que coníèrvou.

11 \ Sufpenfas eftiveraõ huaSjS^: outras armas ate o mez
de Dezembro,em que o Conde ordenou ao Capitão Rebel- oCapiãú Rehel-
!inho,que com a gente, que efcolheíTe aíTaltaíTe a campanha Unho talU a ã-
da Paraiba,& nella aíTolalTe tudo , o que foífe de contrários, /'«^'^^ ^'í íayau
& rebeldes.Com feu cuftumado valor,&: diligencia executou ^'**
o valerofo Cabo as ordens,& os deíejos: Naquelle deftrido,
aquirio tanto de gloria , como de riqueza ; deixando ao ini-
migo a magoa da mais lamentable perda. Aquartelloule trez
kgoas da Cidade em hum íitio chamadoTíbiri,aonde o veyo
bufcar o Governador da Praça,que dominava oOlandès,c6
todo o poder de amigos , & confederados. Não fe negou o
Rebellinho à batalha , ainda que com muy to menos poder:
Enveítiraó-fe os efquadroés j largo tempo fe fuftentou o c5-

M4 flido

I40 CASr^OrOLUSlTJKÓ 16^6

fiíâo em igual balançaj achava a multidão reíiílencia 110 v a-
lor, porèiT) como era grande oexceíTo do numero, cedeoa
virtude á forçaj& ficou o inimigo com a viâ:oria, mais cufto-
£1 pella perda , que a retirada dos noíTos, pella dita de chegar
Hefte ponto Henrique Dias a rebater o inimigo para que naõ
feguiffe o alcance; & a dar lugar , a que fe formafíèm os noí^
fos; encorporado com os quaes, fe retirou para o Porto do
Calvo, abrafando o terreno da marcha , & de caminho as po-
voações de Goyana,& de Ipojuca, Sirinhaem, & outras ; das
quaes recolherão húa groíra,& rica prefa , com mais circunf-
^ tancias de vi6i:orioros,que de vencidos. Sabe o valor fazer vé-
jteufaje mais ve ^^^^.^ç^^ ^g defgraças,& a difciplina, fazerfe horrivel ao inimi-

^ , go em todo o eílado.Outras muy tas v ezes mandou o Conde

diverfos Capitães a femelhantes facçoês,que o Olandès v in-
gava com igual ruina; náo fervindo a hoftilidade mais,que de
allblar os fubditos, de hum,& outro dominio , como fe cada
qual aípirara a fer fenhor de hum império deferto; o que bc
averíido fe pode dizer do Conde de Banhollo, que em todo
o tempo de feu governo eíludou como avia de deftruir a-
quelleEftado.

11^ Ouviafe em Olanda obrado dos íucçeíTos , com a-
quella confuzaò,que forma o eccoj& o intereífe, fempre me-
A cowpanhia Ge- (5rofo,conírapeza va a neceíTidade com o receo; (anciã com q
de oLmda novos ^ companhia fe defvelava em aífcgurar a efperança , com o
Cãípos ao Braiíl. mais opportuíio remedioj)parecia-lhe, que em feus infortú-
nios obrava mais a omiflaò dos feus, que o valor dos noíTos.
Nomeou por General ao Conde de Naífaíi Joaõ Maurício,
& para feu Tenente a Henrique Vancol, hum dos primeiros
Miniftros da dita companhia : Sahiraõ de Olanda com húa
poderofa armada dividida em duas efquadras, que governa-
vaó os dous Cabos.(Naõ fabem os defejos do fruito fofrer os
vagares c5 q creçé as arvores. ) Qiieriaó os Olandefes adian-
tar os interefíès ao tempo, & que fem elle correfpondeífcm,
naquella conquifta,os reditos aos gaftos.Em quatro de Janei-
ro de 1.6 3 7. tomou porto no Arrecife a efquadra de Henri-
que Vancol , ou por mais ligeira, ou por melhor navegadas
Poucos dias defpois a db Conde de NaíTau. Com o novo go-
verno, fe alterou o eílado das couzas j principalmente na-

;/i " quclias

,636 (PJ^E l Lm\0 111. i4t

qnellas partes,aonde o domínio vio a cara à fogeiçaõ.O Go^
ronel Chriftováo Architofls arrafou a Fortaleza da Para-
poei ra, & com a gente de feu prezidio fe retirou para o Ar-
recife. O de Naffati mais entregue a obrigação , que ao def- Toma terrao Co-
canío, fe occupou em tomar conhecimento de tudo, o que o de de Naffau,&
podia encaminhar,& conduzir ao fim , que defejava ; & para '^^y£^^'^ ^ ^^rto
o lograr fe pos brevemente em campo com hum exercito de/
cinco mil Oládefes, menos formidável pello numero dos foi-
dados , que pella multidão dos índios , que erão fem conto.
Infmuou o alvo, aonde encaminhava o tiro,com mandar for-
necer todas as lanchas , & embarcações de remo , que fe po-
dérão ajuntar^ ordenando ao Cabo, que as governava,pofef-
fe a proa no Porto do Calvo, para onde marchou por terra;
refoluto em ganhar a Fortaleza,& defalojar da povoação ao
Conde de Banhollo. ^

126 Adiantoufe a noticia à marcha , Be cheg ou a no va >;»*•, '^%iv^.,v; . :.
ao Porto do Calvo com tamanho corpo, q aífombroú,aonde f-'^''-^' >Í''V,.»^» 'v
menos fe temeo. O Conde de Banhollo,que na fegurança de ^^^^^^^^ oèÈ^'-'
fuapeíroa,& bens livrava todo o util,&decorofo do Eíbdo, ^^ j^^nho/h, &
a hum mefino tempo mandou deitar bando, cõ pena de mor- ^^^^^ ^^ ^^^;>^
te,& confifcação de bens , que nenhum morador fe retiraíTe,
nem peíToa algiia de fua familia, ou fazéda de fua cazaj& pos
em falyo a própria, códuzindoa para a Lagoa diverfas man-
gas de Italianos;& a fi mefmo franqueou a fuga com hum re-
duto, que mandou fazer pouco diftante da povoação, & dei-
le para o Rio Mangoaba húa vereda encoberta , pella qual
podeífe fugir, como, & quando lhe pareceífe. Pouca tenção
tinha de efperar o perigo,quem com tanto cuidado prevenia
o feguro.Chamou a concelho todos os homens de experien-
cia,& foldados de pofto, para que votafíem na difpofição da
defenfa: Forão vários os pareceres, & nelles fe vio retratado
o animo de cada lium,& em nenhum o do Conde , pella def-
femelhança de todos.Concordàraõ na defenfa,ainda,que dif-
cordárão nos mey os, & no modo.Os mais praticos,& averti-
dos votàrão,que fe fahiíTe ao encontro do inimigo,& por to^
da a diftancia da marcha o perfeguiífem com embofcadas, &
aíraltos,em que tinhão as ventagens de efcolher pôftos,& fa-
ber os caminhos, como experimentados nos matos : Diligen-*

cia

142 c^sr<^oro LvsirAKo \6'-^6

cia para nos regiira,& para o inimigo arrifcada, porque delia
avia de receber coníideraveldano^&aqiiellerecco, qiiebaf-
tafíè para o deixar menos orgulhoro,& confiado, & aos noí^
fos, deftros, & deftimidos : Porém o Conde , que occupado
' . f:f l^S' i"" ^^^^' fe defejava mais acompanhado, por nao apartar de
dadefenja. íiominimofoldado,engeitouomelhorconfelhoj Sccoffire-
zoésaparentesaflèntou, que feeíperaíTe o inimigo dentro
das fortificações com todo o corpo do poder (difpunha a fu-
ga nas aparências da defenfajpara que a confuzaó do conflic-
to lhe fizeíTe coftas no tempo do efcape: ) Com tenção de a
defemparar guarneceo a Fortaleza, como fe a quizera defé-
der: Nella meteo trezentos foldados efcolhidos , com os me-
lhores Cabos,armas,muniçoês3& mantimentos para trez me-
zesj com tanta pratica, & acordo prevenio o neceíTario , que
nada lhe faltara, para grande, fe acompanhara o juizo com a
r/^^^H*^*'*' vontade i & tudo lhe faltou para homem , em lhe faltar oa-
y^éJ^jt^'^^/ nimo.

'*^^^p^^' 127 Marchava neíle tempo o Conde de NaíTau , cora

chgA o Conde de feu exercito , por jornadas certas : O verfe livre de empedi-
Naffau â vifia do mentos,lhe augmentava cada dia mais o orgulho, & a cófian-
lorto da Calvo, ^g . inferindo a falta da noíTa força,& da noíTa difciplina , dos
íeguros de fua marcha. Aviftou a povoação á qual a vezinhã-
ça,& a vifta encheo de efpanto^mais formidável ao fexo mais
frágil, & a idade mais débil: Aííe6io,que fe ateou com o fan-
gue aos corações varonis daquelles, que por vínculo da natu-
reza deixavaõ de fer o que devião , por ferem o que amavaõ.
Naõ affi outros, que transformados na opinião da honra, em
tudo fe efquecéraõ das leys da natureza. Muj tos foraõ, os q
foldados com os foldados fahirão ao encontro do inimigo,
governados pello Tenente General Dom Allonfo Ximenes,
aíTiftido dos Capitães Francifco Rebello, Joaõ Lopes Barba-
Iho, AíTenfo da SyIva,Manoel de Souza de Abreu,& outros,
que com a gente de fuás companhias, &muytosnaturaesda
terra,faziaõ humbaftante efquadraõ,que engroíTarão muyto
os índios. Todos não chega vaõ afafer o numero de quatro
mil: Qiie tátos eraó lo os Portnguezes affirma, erradamente,
y^- Galpar Barleo.Efcreveo,& pintou,& pintou em tudo o q ef-
creveo. Em companhia dos índios fahio o feu Governador

Geral

Geral Dom António Phèlipe Camarão (titulo,& pofto,que

nefte mefmo tempo, lhe deu elRey com o habito em premio

de feus ferviços, tamanhos agora , & tanto mayores defpois,

que deQuziraÓ a mercè,& impoffibilitáraÕ a paga ) A feu la- ^ ^ J

do fahm-tambem fua molher Dona Clara montada em hum ^^J/^^^^ -^

€avallo,& taó clara neíla gentileza , que deixou efcurecida a

memoria das Zenobias, & Simiramis com que tanto feilluí-

trou a antiguidade.Naó ficou atraz ;, dos que mais fe adiantai

mó, o Governador dos Crioulos Henrique Dias, porque taõ

valente, como zelozo,foy dos primeiros, que lahiraóaen-

veftir o contrario com o feu terço, fempre preto na forte j &

da admiraçãjo,& enveja fempre o alvo. Os mais Cabos com o

refto da gente ficàraó de retém mpaffajem doRioComen*

daituba,para aíTegurarem opafíb aos noffos,&: o cortarem ao

inimigo. yí

► :-i28 O Conde de Banhollo ,:( que eftudava naperdn
çaõ, & naruinados naturaes) tanto que vio próximo o con-
fli£i:o mandou pòr fogo á povoação, para que â luz do ince-
dio fe viíTe melhor a tenção dé feu animopo mefmo ponto fç . .
retirouparaoreduto,levando conOgo aDuarte de Albu-
querque,& a Manoel Dias de Andrada j aquelle conftrangi-
do, eíle defefperado de não poder deíTimular com a eviden-
cia dodano. Antevia o fim da retirada, & nellaã melhor oc-^^^^^ osefqua-
caziáo perdida.Sobre o alto de hum monte fe tinha formado ^y^^^^
© inimigo; delle vio a refoluçaó, com que os noíTos o bufca-
váó; deceo a recebellos na ladeira, aonde fe enveftio húa ,v&
outra gente com igual coragem: A ouzadia, & furor do com-
bate juncou em breve tempo o campo do conflido de corpos^
mortos, & feridos. Todos defeftimavão a vida , pella repu-
tação em que tinhão a honra.Os inftromentos da batalha en-
chião o ar de horror,& eftrondo.De húas mefmas armas fahia
a morte naballa,& o luto no fumo: Por toda a parte fe com-
batia, por nenhúafe avançava: Era igual o valor da invazão,
& o da refiftenciaf rezão, porque algúas horas fe vio recipro-
eamé te rebatida a cólera. A a multidão dos inimigos,refreava
a oppoílçaõ dos nofíbs, em cujo braço achava mais virtude,o
mayor numero: Contava a difparidade(o Conde de NaíTau)
com efpanto, porque experimentava, o que não cria;confef-

fando

)h

m
Hl'

id

r4f ' C-^ST^IOTOLUSITJKO

t6^6

fando nefta occazião, qne em nenhúa outra virá , nem tanta

deíigaaldade no valor, nem tanto exceíTo na multidão : Qiie

os Portuguezes, entre as outras gentes fe avião de contar por^

Osnofjos fe rett- ^ifras^Sc não por unidades , porque o valor de cada liú igua-»
yaocom boAorae. , i l o v- /- i

lava o vulto de muytos, & que nunca podiao ler poiacos ho-v

mens, aquelles, que alenta vaó tantos efpiritos. Largo tempos
fefuftentou emequilibrioabataíha,atè'queosnoíibs ven-;
eidos do caníàço fe retirarão do confliâioj&como a falta era»
do braço, & náo do coração com defenfadado acordo,& gê-:
til difciplina forão largando terra ao inimigo , que acautela-!'
do os feguia,com aquella ordem,& forma, que iioíTa inteyre-
7a lhe aconfelhava j atè que a artelharia da noíTa Fortaleza os*
obrigou a fazer alto. r

129 Não ouve nefta retirada Portiiguez, nem índio
noíro,aquemoinimigo viíTeascoftas; a todos temeo pellzt
cara, que lhe moftràraó encorporados , com aquelles, que ef-
tavaò de retém na paíTagem do Rio Comendaituba : Allí fe
começou fegunda, porém mais cruel batalha,mofl:randofeao
Framengo mayor o furor da peleja na multidão dos íeus,que
poftrava a morte, & que efcondia o fanguejconfliítojque fes
mais efpantofo o cftrago, com que Manoel DiasdeAndra-
da (defprezada a obediência , cóm que feguia ao de Banhol-
It)^ por acudir aonde o chamava a neceíTidade ) rompeo por
entre os efquadroés inimigos , fazendofe caminho com a cf^
pada, que em fua mão teve efte dia mais de rayo, que de fer-
ro. O exemplo fervio de deículpa à temeridade com que D.
António Coutinho imitou aouzadia: Larga eftrada abrio
pello efquadrão contrario matando,& ferindo Olãdefcs,feniÍ
que a iienhum valeíTe a reíiftencia,porque fó os livrava a dif-»
tancia. Em fua efpada temeo a morte, fem duvida, ufurpado
feu imperio,& por fe reftituir nelle , lhe tirou a vida, porém
nunca lhe poderá defraudar a gloria, que nefta occaziaõ me-í
receo.O de NaíTau temendo mais o exemplo,que o deftroço,
& coníiderando,que o tempo,que dava à imitação,o dava tã-
bem ao eftrago , mandou tocar a recolher, afíbmbrado dos
mortos , que cobriaò o campo de outro fer5& do fanguc,que
V eftia o Rio de outra còr.

130 A a vifta hum do outro ficàraõ os deus exércitos,

inter-

Segudahatalha.

interpondofe o Rio Comendaituba^que devidia^Sc naÕ apar-
tava . Em curar feridos , & enterrar mortos íe occupavaó os
vivos j pellacalidade, & numero fe orçava odano^mayor pí-^^^^^^^^^^
fem comparação, o que recebeo o Olandés [ fupofto que da ontra parte,
Boffa parte foy grande a perda."] Ao Governador dos Criou- .
los Henrique Dias ferio húa baila o collo da máo eíquerda,
íofpeytou hervado o chumboj& por fazer a cura mais breve,
& menos perigofa a mandou cortar dizendo , que na direita;^^^^^^^^^
UieficavaómuytasparafervirafeuDeos,&afeuRey;&que ^^^^^^^^
para a vingança,faberia fazer feu defejo de cada hum dos de-
dos hua mão. Jà a antiguidade fe acha vencida nos encareci-í
mentos,com que celebra o dar o feu Romano húa máo ao fo- ^,^^^^,y^ ^^ ^^,
jntsMn' pfopellapatriajporqueoexcedeonacauzajCÕqueefteCapi-^^y^^ joão Lopes
taõ a deu ao ferro pella opinião . Atra veíTado de húa balia i'4r^^//?c.
cõtinuou na peleja o Capitão Joa5 Lopes Barbalho, efcon-
dendo a ferida aos feus , por lhes moílrar como as dava nos
inimigos^ retiroufe com os mais, atraveíTou o mato , chegou
á Lagoa, & convaleceo da ferida : Milagre pareceo a con va-
lécia,&: fe o não foy, pello efFeyto da mediei na,quiz parecei-
lo pella fmgularidade do valor . Outr^as proezas fuccedéraõ
muy dignas de fe encomendarem a memoria j mas a efcacezai
da relação as negou a efta efcriptura . Neftes dous encontros,
ficàraõ cativos os Capitães Manoel de Souza de Abreu , Sç
Balthezar daRocha Pita:Metcos a ouzadia no grilho:Outros
muy tos foldados ficàraõ feridos, que em breve tempo fe reiS

tauràraÕ na faude.

131 Cò ardente cuidado feformavaõ,&difpunha5 am-
bas as partes para repetirê a batalha, que os nofíbs efperavaõ /• /,« ^
firmes, & o inimigo determinava romper intrépido ; execu- ^^^^^^ pira ter"
çaõ que atalhou a noite, a huns, & a outros grata, pello que caro confiião,. ^
íi todos trazia de defcanfo, ainda, que a mútua vezinhança
dos cótrarios os teve até pelía manhã com as armas nas mãos.
Cada qual fe animava com a efperança da viítoria, ou fiados
no braço, ou na induftria ; formando-lhes os defejos favora^
veis osdifcurfos^ os dos Portuguezes mais bem fundados,
porque aviaó de fer cometidos pello rio , que lhes fervia de
trincheira. Tudo defcompos a cobarde refolução do Conde
4eBanholIo,quenomais efcuro da noite fugio do reduto

H para

s

■^'■-^

DefemparaoCo'
de ãeBanhollo os
fem ; é" cães o
fofiú^é' â povoa-
ção.

Toem o Conde âe
JSlajfau cerco à
Fortale^a^ quefe
lhe entrega, a-
partido.

146 CASr(^oro LUSITAKO TÓ^Ôr

para a Lagoa 5 levando configo a Duarte de Albuquerque,
& húá companhia de Toldados, (^não fey fe por tertemunhas
de íiiã fraqueza , fe por augmentar a cauza da noíTa ruína:)
Parece que produzio a natureza o tal homem para efcurecer
o efclarecido,& o valerofo de íiia nação j& para fatal inftro-
aiento de noíTas defgraças . Aquelle, que por obrigação do
pofto, & do titulo avia de animar os feus com aprefença,
entrada a noite os defamparou com a fugida : Ouviofe entre
elles a fuga,& como fe aquelle corpo o defemparàra a alma,
aífiperdeo o vigor, &a forma,que em pouco cípaço fe vio a
terra deftituida de foldados, & a povoação de moradores, q
cò fuás famílias, & fazédas íe retirarão, feguindo a marcha do
Códe por aquellas partes!,q lhes reprefentavão a vereda mais
fegura,& mais brevcj fazêdo a todos efçolta os Cabos, que os
não podèraò deter , para q o inimigo tiveífe menos occazião
de os fegtiir.O Tenente General D. Allõfo Ximenes formou
de feus foldados hú pequeno efquadrão,q aos miferaveis vezi
nhos fervio de retaguarda pello caminho da praya(era o mais
arrÍfcado,& neceffitavão de niayor feguro.)Os trabalhos, fo^
mes,& difcomodos,quepaíráráo huns,& outros,forão tantos,,
que fe tinha por venturoíb , o que maisdepreíTa os atalhava^
com a mortej & por mal afortunado aquelle, que com a vida.
os dilata va^queixofos mais de fua cabeça,que de fua fortunaj^
porque efta, era efFeyt03& aquellajcauza.

132 Amanheceo o dia, para o Conde de NaíTau o maisi;
alegre, porque o vio fem inimigos : A falta da eíperança lhe
fes mayor a dita. PaíTou o Rio a gofto,& fem o menor empe-
dimento , pos de fitio a Fortaleza , que atacou cò cinco bata-
rias, & defmantelou em eípafo de trez fomanas có innumera-
veis tiros, recebendo,não fó igual, fenão avantejado retorno
dos cercados. Já em toda a Força não avia reparo por arrafar,
nem baluarte por. abrir :Servião à defcnfa mais os animos,que
as paredes . Nefte eílado , combatidos os defenfores da de-»
fefperaçáo do focorro5& dos temores do aíTalto íizerão cha-
mada , & capitularão a entrega com honrofos partidos.Sahi-
râo com fuás armas, & moveis,mecha aceza,balla em boca,&
bandeiras tendidas.Entrou o Conde de NaíTau na Fortaleza
cófundindofe o triumpko cõ o roubo.Deixou-a reformada^

•\

t6í6 ^J^B1.L1P(RP lli: 't47 ^

& guarncciíla,& lhe pos ao Capitão Pedro Vãdiierve porCo»-
médor (aíTi chama o Olandès aos Governadores das Praças)'
defejava de expulfar da terra as relíquias dos cõtrarios jnáo fò
lhe efcondeo a occaziáo,nê a ventagé de feguir,a que fogetSô
detença foy no alcance do de BanhoUo^com todo o poder do
mar,& terrado qual avizado da marcha, & do intéto, aíTi obe-
deceo pótual ao defej o inimigo,q antes de lhe ver a cara dei-
xou a Lagoaj& não parou fenão no Rio de S.Francifcoi fem
reparar ^q ficavão todos os moradores, cõ fuás familias, entre-^
guês a efpada Olãdefa, Si a laftima defolicitarê o cativeiro cõ
as diligencias de configuiaê a liberdade.Nefta tribulação lhes
valeo o esforçOjSc a generoíidade de Manoel Dias de Andra-
da,offerecendo aos mais animofos cõpanhia , & aos deímaya*
dos cõfelho: A eftes diziajq Te deixaíièm ficar, & do mato pe-*
diffem paíTaportes para fe voltarê para fuás cazas, &fazendasj
q feria erro indefculpavel bufcaré nos matos húa morte cer-
ta,por fugirem a húa calamidade duvidofa;que na melhor ef- MàflrA querei
colha cõfiltia a melhor fortuna,& a de viver nos matos,como feguir o dcmcê
ferasjcra de muy to peor condiçào,q a de fofrerem o jugo ini- ^°^ ^#^-
migo como homens,principalméte quando affi não fó fazião,
o que importava a confervação das peíToas, fenão também , a ^^ . ^^^ cheia-
doEftadojpois fedefpunhão para o focorrer na oportuni- ^ Bahia fem pfri'
dade com as v idas, & com as fazendas. Muy tos feguirão efte go,
parecer^alguns poucosjaceitàrãafeu amparo,' & q feguirão a-
tè a Bahia. ■ ! ._ .

, 133 Marchava o Conde de NaíTaii no alcance do de 6a-
nhollo tão deftro em fugir,que nenhúa ligeireza o pode alcã-
çariPaífou o Rio de S. Francifco, & fes alto em Sergipe dei-
Rey^não para efperar, fenão para ver fe o inimigo o pafíàva
em feu fcguimento^o que fizera o de NaíTau , fenão entende- o Conâeâe Naf^
ra,que perdia a diligencia:Com melhor confelho fe aquartel-/^^/^^ ^^^^ "'^^^
lou daquem do Rio em hum íitio , que chamão o Penedo, & ^ ' ^ j '■ ^
nelle deu principio a húa bóa Fortaleza , que dentro de dous
mezes aperfeiço-ou, & guarneceo , como Praça , que avia de
fer a fronteyra de feu domínio: Entregou o governo delia a
Sífgifmundo Van-Scoph5Com ordem,que paíTafe o rioj&de-
falojaíTe ao Códe deBanhollodoIugaremqueeftava íitua-
do3 o qual andou tão cortezão, q ao menor aííèno deixou o
:..j.i N2 pofto

148 C^ST^IOTO LUSITANO 16^7

poílo,& íè recolheo para a Bahia. VoIton'ò deNafíau para
o Arrecife^ & logo todos os moradores do Porto do Calvo,
& de õiitrás partes acudirão a pedir paíTaportes , que elle c5-
cedeo liberalmente (impulfo todo de fua conv€niencia,nadíi
de fua bénegnidadejporque íèmelhante fraqueja o enreque-
GÍa,& confcrvava.)Neftemeyo tempo teve lugar Siígifmun-
do, para dilatar féu domínio j pafíbu o Rio de Saõ Franciíco,
fenhoreou a campanha até o Rio Real , aonde edificou húa
Fortaleza com tal dirpoíição^& em tal íitio , quecom ella aí^
fegurou o império do Gonquifta doj& a eíperahga de cõquif-
taraBahia^i, ^"' .■.,.;,.::;.' 1;.:: •..■_.. ..;..\^',^ ..j. ^,;:; ::.,.... .,.-?;;'

1 54 Éómento dós érrósfó5 as proTpef idades. Imagina
o ditofd, que em tudo ha defer félice,& tropeçade ignoran-
' te, pois defconhece as vezes do Mundo; diícretamente íabio
Intenta levar a diícorréra, Te na poíTeda dita efp erara o infortúnio. Com os
ciàíiàe da Bahia boDs fucçeíros,que temos referido fe cfvaeceo de forte o Cô^
for entreprefa, à^ ò.c'H2S-àVLj que prefumio eftar à íiia obediência o movi-
mento das eípheras. PareciaõJhe os progrefíbs de ílias armas
dividos à peíroa,& não datas da fortuna:Com efta vaidade fe
fonhava conquiftador de todo o Brazil , tendo para íi, que
em tanto lhe tardava o domínio , em quanto a Cidade da Bar»
hia fenaõ humilhava a feu império: Era a cabeça do Eftado ^
.& entendia, que ao golpe da cabeça cahiriatodo o corpo a
íèus pés rendido.Sahio do A<rrecife,em v inte & hum de Mar-
ço de mil & feifcentos & trinta & oy to , com trinta & cinca
nàos de guerra, & outra multidão de embarcações deremoj
trez mil foldados 3 copiofo numero de Indiosjpetrechosjmu-»
niçoés , & baftimentos proporcionados à empreíà. ( Seis mil
homens aíErma, que levou,oChoronifta da liberdade: De-
via fazer o computo ás peíToas, nos o fazemos aos foldados.)
Gafpar Barleo diz que em 8. de Abril, & com 2 2 , nàos, & q
no mar fe lhe agregarão 9 . Aííi das nàos como dos foldados
deminue o numero: Author apaixonadojSc q em todas as oc- ^ ^'
cazioés falta à verdade por não faltar â opinião dos feus. Có fecunda.
profpera viagem chegou aos mares da Bahia; afago,com que
a fortuna lhe aíTegurou o revés. Era Governador Geraldo
^ Eibdo Pedro da Sylva por alcunha o Mole ( refulta, não léy
fe da fleima,fe da capacidade.) Primeiro q lhe chcgaíTe a nôr

'i

^i>

ticia

1638 ^AXrBl.LW^OIlt 149

ticia do intentOjvio fobre a Cidade o poder do mimlgojían-.
to mais formidável, quanto menos imaginado. Entrou a fro-
ta Olandefa com tantas circunftancias de triumpho , que an-
tes da batalha publicava a v idoria : E dera a confuzaó , que
cauzou nos moradores,motivo a mayor deígraça,íe neite te- ^/^^^^^ ,-.^^^ ^^
po faltara na Cidade a preíença do Governador.Entrou a ar- terra.
mída pella barra, viftofa pella copia das bandeiras ; horrível
pella multida5 dos tiros 3 agradável, peíla diverfidade dos
clarins, arribando fobre a parte, que chamáo da Pirajà , buf-
cou a praya (dita agoa de Meninos,) deitou em terra gente,
artelharia,& muniçoés,& fem detença fe pos em marcha para .
a Cidade, que diftava meya legoa daquelle fítio.

1315 Adifpoílçaó conaque oinimigo defembarcoUja
preftezacom que â marcha fe refolveo j o defembaraço com
que o treym fe conduzio^ a difciplina com que fe formou^ o
alvoroço com que partio , lhe influio húa confiança taõ cer- Manha para a
ta, que alheo da temeridade fe confirmou na opinião de con- <^iàaàe.
íeguir a emprefa,porém achou o caftigo taõ vezinho à culpa,
que primeiro o cortou o revés, que o defengano . Sahiraõ os
nofíbs á defenfa, menos efpantados do poder, que do repen-
t-e^ porque efte os não deixou adiantar,& aqu elle fenaó fazia
temer i infi uia a cólera em todos novo v alor,& carregarão aa . .^

inimigo de taõ pezados golpes,que o fizeraó retirar confufo:
Naõ faltou aos noíTos animo,& pulfopara o feguirem,&def-
baratarem, porém o repente foy tal , que naõ fó não deu lu-
gar a prevençaõ,fenaõ, que tirou o tempo neceíTario a credu-
lidade: Mas o valor, a pratica , a viveza , & a promptidão do Retlrafe capgaZ
Governador do Eílado, do Tenente General Pedro Corrêa ííí?.
da Gama, dos Capitães André Vidal de Negreiros , Aíiénfo ,
da Sylva, Rebellinho, Souto, Dom António Phelipe Cama-
rão Governador dos índios, & dos Crioulos Henrique Dias,
fuprio a falta do tempo,& da prevenção. Não cedeo a algum
outro, o Conde de Banhollo,affi na diligencia, como na exe-,
cuçaõ,& tanto, que parecia outro homem,& feria (fe he cer-
to) que mudaó a incli nação dos homens,© exemplo, o lugar,
&a idade. Os no^ties de outros muy tos Capitães nos roubou
o defcuido5& as ^rticularidades defta occazião,o defprezo:
LQiie a maó dos Portuguczes naõ fabe largar a efpada , pella

1'

H3

pen

a;

mm

i^d C^STTiJOTOLUSlTJKO i6^S

penai efcaça fempre emeícrever, o que obra, naôaííl em
obrar, o que todos podem cícrev€r."]

196 Reprimida, & caftigada a confiança Olandefa , c6
á reíiftencia que achou, & com a perda que recebeo, naó de-
^ . - ^ íiftio do intento, a que ;à o levava mais a teima, que a cõfian-

íaíera Cidade. Ç^ ^° Conde: Nas coftas do Convento do Carmo [fitio com
algiia eminência á Cidadej& acomodado para nelle fe aquar-
tellar] mandou levantar trincheiras,fazer plata-formas^aíTen-
tar batarias, para a combater : Refoluçaõ em que teve mais
parte a altiveza, que a rezão;íe difcorréra livre, antevira, que
a reíiftencia,que não venceo o repente , mal fe venceria aju-
dada da prevenção:0 colérico não tira cófequencia dos íiic-
çèíTos, fenáo dos empenhos . Primeiro íe occupou em plan-
tar artelharia para offender , que reparos para fe guardar:Níi
mayor aplicação de feus^ gaftadores os aíTaltàraò os Capitães:
* ' André Vidal, AíTenfo da Sylva, Sebaftiaõ do Souto ,& Re-;

bellinho com íuas companhias , & os Governadores dos In-^
dios,& Crioulos Dom António Phelipe Camaraõ,& Henri-
que Dias com os feus foIdados,por varias partes,& cm díver-
os poYtumezes ^^^ tempos, com laftimoío eftrago dos miferaveÍ5 Olandefes;
lhe affaltão os & com tanto aíTombro dos feus Cabos,que nem ao Conde fi-
cava acordo para mandar,nem aos feus animo para obedecer.
Não avia entre os Olandefes mais tempo , que para enterrar
mortos,& curar feridbsj chcíravaõ o efirago, temião a perdi-
gão , & acufavãono Conde a obftinação , com que perfiava
em fua total ruina^pois dado cazo, que efiiivera certo em ga-
nhar a Praça, feria íèm comparação mayor a perda da con-
quiftâ, que a utilidade da viáoriaiCom maduro confelho lhe
perfuadiaõ a retirada,que elle defprezou,parecendo-lhe me-^
nos tollera vel cortar pella opinião,que pello dano. >

(. í 37-''-: Serviafe o Conde de Nafíàu das avertencias para a::
éppoílçãò,& não para o fequito . Aflentadas as peças, ( que
erão,entre outras, oy to canhões reforçados ) mandou bater af
Cidade, pella parte da terra , & da mefma forte pella do mar
com toda a artelharia da armada : Por háa , & outra recebia
da htiA embaixa- mayor perda, que a que dava ; fem que o defentendido baft
da aos cercadosi taíTe a dimiuuirlhe o laftimado . Trez dias com fuás noites
é-o Gowrmdor perfiouabatariainomavorfuror della^mandou o de Naífau
Iherefionde, ■, ,, ,• ^ma

e^uarteis.

O de ISlajfauma-

1^3^ fA'^E L LIF^O 111. i^ i

hum tambor por terra , & hum trombeta por mar , com em-
baixada ao Governador Geral do Eftado, na qual com efm-
dádas rezoés, lhe aconfclhava entregaíTe a Praça, fenão que-
ria experimentar no afíalto toda a impiedade da ira,& todo o
eftrago do ódio . Confelho,& ameaço , a que o Governador
refpondeo (dizem, que nefta forma . ) As praças delRey de
Efpanha meu fenhor,fem armas,& fó com a reputação fe de-í ' '''^
fèndeiTíj&aquellas, quefeanimáo comerpiritos Portugue-i "^^
2es,prímeiro fuás ruinas os fepultaó,que feus inimigos as do-
minem, porque feu natural valor os enfina a morrer honrai
dos antes, que a viver rendidos j verdade, de que os fenhores
Olandefes faó as mais certas , & ás mais^frefcas teftemuuhasj
& poífo eu fello, de que nefta occazião me cufta menos o a-
nimar,que o reprimir meus foldados, impacientes de fofreré
ameaços, quando podem caftigar atrevimentos5(apurada ília
paciência cõ à loucura defta embaixada, cujos Miniftros de-
vem as vidas ao refpeyto mais , que a cortezia, pois o que fe
me tem os deteve.) Ao Conde aconfelhàra eu que fe aprovci-
tàffe do tempo, para fe recolher a fua armada,& nella ao por-
to donde fahio : Temo que fua prefiftencia dé taes fios a co-
lt!ra deftes meus foldados, que corte por todos os refpey tos,
& me não valhâo minhas diligencias 5 &dizei-lhe da minha
parte , pello que tenho de feu fervidor, que jà podèra ter en-
tendido , que cm nenhúa occazião o ha de temer colérico,
quem agora o não fofre confiado.

- 138 A efta reípofta fe feguio a de húa carga de mofque-
taria,com que fe cortou a replica,& confeguio a retirada dos
Enviados com a ligeireza, que lhes empreitou o temor:Com ., .
a indinação, que defpêrtou o agravo fe continuou a bataria \';sx
de may or calibre, com tal horror , que eftremecia a terra, 8é .^ v ; v^ -
gemia o mar . No mais acefo da confuzão deitou o Governa-
dor Geral do Eftado pella porta da Cidade , que guia para o
Mofteyro do Patriarcha São Bento , alguns Capitães com ^ ^.^^ j j 1^ r,
gente de fuás companhias , & ordem , que por aquella parte y-^^ 7õtlnm a L-
deflem húa aíTaltada ao inimigo ; a quem o rebate encheo de tafia,
âíTombro na confideração,da noíTa gente bufcar o conflido,
guando a imaginava cortada do elpanto : Creceo o paíiuo cõ
â perda, veiído , que todos os feus fugião ao golpe . Os Go-.
t--'^ •• '2 N4 vernadores

7>

5>

5)

?>

5)

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?)

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53

OíTortuguezeso
ãefcompoem com
huaajfdííida.

Favorecido d^t
noite foge, o olan-
àès com

1^1 CAsr(^oro LvsiTjisio f^as

vernadores dos Indios,& Minas Dom António Phelipe Ca-
maraõ,& Henrique Dias obrarão de forte , que baftoii o def-
t€ dia, para fazer illuftre feu nome em muy tas idades^Os Ca-
bos , & foldados affi da Bahia , como de Pernambuco fc nas
proefas defta occaziaõ fepodiao competir , naó fe podèraõ
exceder.O Governador do Eftado affiftido do Conde de Ba-
nholl o não fó aíTombra va valente, fenão , que fazia valentes
com foa fombraj moftrando a hum mefmo tempo, o ultima
do valor,& da induftria , a cujo império oíFerecia o Olandès
fua ruina,&noíra vicioriaj dando-lhefeu próprio deftroço
a beber a morte, & o fangue dos feus por hú mefmo vazojtáo
amar^ozo o trago, que fora para todos mortal o golpe,fenão
difpeiara com muy tos a vezinháça da noite, terceira na ordé,
do combate,& no tribunal da fortuna, para que todos não a-
cabaffem ao fio da noífa efpada; pois deu lugar ao de Nafíaii
para fe acolher às embarcações, que tinha no mar , deixando
em feus quartéis toda fua artelharia,muniçoés,armas,&: baíli-
mentosj com tanto numero de corpos mortos , que cubrião a
terra,limitada para os cubrir:Com innumeraveis feridos deu
à vela, a armada Olandefa certa na conta dos vazos , incerta
na das peífoas. Tomou porto no Arrecife (tão fúnebre a en-
trada, pello luto, como fora alegre a fahida pella efperança:)
Em quanto nelle fe enxugão as lagrimas , diremos os eííey-
tos,que no Reyno cauzavão eftas novas.

\^<^ Chegarão a Lisboa as noticias dos progreíTos do
inimigOj&dasmiferiasdoEftado, que a defconfiança Por-
tugueza antevia de todo perdido . Acuzavão a remiífaò dos
Miniftros, porque lhes parecia arteíicio jchegava a Madrid o
eco das murmurações com o corpo , & com a liberdade, que
lhes dava a antipatia da nação Gaftelhana : Carregava todo o
motivo fobre o cõçelho de Portugal , com aquelles longes de
trayção, que formava a queixa do governoj & como eráo ef-
timulos de cada dia,erão também de cada dia o fubirem con-
fultas daquelle tribunal, para o concelho de Eftado , quepe-
diáo,& infmuavão a elRey a reftauração do Brazil, apontan-
do os meyos,pellos quaes fe podia efperar. Avertiafe o defa-
certo dosfocorros, que fem utilidade, tin hão confumidoa
Monarchia:re2áo com que ceníiirava o v ulgo os djdamés do

.^yi governo,

,'\íiW^'.

.< liiiiÃ-^S»'

1638 ^^TÂ^ELLir^^Ollh 155

governo, atento fempre aos fiicçefíbs , 8c nunca ás difpofí-
çoés. Defpois de repitidas conferencias íeaííentou fer im-
portante à reputação,& ao remédio, mandarfe hãa Armada
Real tão numerofa,& pujante, que delia fe concebeííe moral
certeza da reftauração de todo o Eftado do BrazibDefejava-
fe hum Cabo proporcionado à emprefa, & à efperança.Che-
gàra nefte tempo á Corte de Madrid a nova de ter defembar-
cado no Reyno o Conde de Linhares , que voltara da índia
Oriental 5 aonde, com o titulo de Vizo-Rey , fubira a ellima-
ção da peíToa com os aplaufos do governo ; & fendo feu no-
me tambein ouvido, todos efcolhèrâo a peíToa para eíle em-
prego. Foy chamado para o pofto, porem foube deitar a car-
ga dos hombros, negociando a efcuza , cora a obediencia.Pe-
dio com tanto exceííb, que nelle propôs a repulfa. " " •

1 40 - Não le pezava em defigual balança a callidade , ó *
Valor, & a pratica do Conde daTorre Dom Fernando MaA
carenhasj o qual , pella moderação, lefes eícolhido, deípois;^ ^
de chamado. A vontade de fervir aos Principes acha ha oc-^;^y,;.^/^ o conde
cazião o premio; Tirar condições he próprio de coração pe-^4 Tone.
queno, ou de ambição grande. I^or todos os portos de Eípa-v
nha fe nomearão Mmiííros,& aplicarão mey os,para os apre->
ítos da armada , & condução dos vazos ao porto de Lisboa.;
Di vulgoufe logo com a preparação, o intento ; voou a nova^
ao Brazil, aonde de Framengos,& Portuguezesfe ouvio cora
mayor eftrondo,que em Portugal, cauzando tão diverfos af-
feâos, como o faó a efperança,& o receo; efte cada dia aug-
mentava em huns o deímayo,aquella em outros o furonEfte, ^^^g^ ^ ^^"^^ '^^
corria animofo â vingança5Íahindo os noíTospello terreno ^^^^ '
inimigo a fazer todo o dano , que podião. Aquelle a preven^;
ção, defterrando osOlandefesdefeudorainio todos os Re-
ligiofos,& Sacerdotes , de cujas pcrfuaçoés fe temião tanto,
com o de noíTas may ores forças. lafluia na diligencia o entra-
nhavel ódio à Religião,& a nenhú defterrou a violencia,que
não laftimaíTe o defprezo ,& não afligiíTe o perigo . Matéria
porque agora voa a pena ,& que nofeguinte livro terá feu
próprio lugar na hiftoria.

141 Sahira de Lisboa nos últimos de Outubro deíle
anno a arraada,aíri numerofa nos vazosjcomo crecida no por-

. . tantc

I

É

■bI

, ' 1 ' • . I

«54 C^Sr^IOTO LUSITJm 1638

tante dos navios, galeões de Eftado, fragatas de guerra, náos
saheaarmaâade gj-^flas^ copia grande de embarcações ordinárias: ínftromen-
^tí^deíltoa ^''^' tosbellicos, artelharia,muniçoés,petrechos,& mantimentos
orçados, pello numero dos com.batentes , & pella fatisfação
dos Cabos. Era a frota mais poderofa,qiie atè aquelle tempo
furcoo os mares da America. Em dez de Janeiro, dia do Glo-
riofo Padre São Gonçalo fe aviftou do Arrecife com aíTom-
bro dos inimigos, & alvoroço dos naturaes j aos quaes o dia
pello Santo, & o poder pello vulto ^ encherão de difcreta có-
íiança.Com erro indefculpavel efcreveo o Author da Liber-»
dade chegara à vifta de Pernambuco o Conde da Torre no
Janeiro de feifcentos & trinta & íinco , fendo que foy no de /y^^ Mâ;
mil & feifcentos & trinta & nove j avendo entre o tempo do CaUdML
Chega k cofia âe fucçeíro,& da relação tão poucos annos , que pudera apren- ^^?- 5- §•
fermmhuco. ^^^_^ noticia,de qualquer memoria, [certo de que nella fe im- í^^'^'^''
prime vivamente o tempo dos accidentes calamitofos. J O i

Olandès fobre-faltado olhava para, o que temia , 8c para o q
neceíTitava^parecendolhcjque o defengano do golpe lhe che-
gara fem tempo para o reparo. Via fuás Praças defmantela-
das, fuás fortificações cabidas, & fuftentadas fó na confiança
da paz, & na lembrança das viâ:orias . Confideravafe fitiado
no Arrecife, fem aquella provifaõ de mantimentos, & muni-
ções preciza,para fuftentar hum cerco. Os foldados tam pou-
cos, por fuás fortificações , que reconduzidos do certão , &
chamados das Fortalezas não fazião corpo , que pudefe avul-
tar á vifta do noíTo poderiOlhava para o que tinha no mar, &
O cladh a ieme. fó le achava com cinco nãos , que eftavão a carga 5 cote;a va
feu eftado,&"noíra injuria, & não v ia em que podefiè fundar
a menor confiança, para fe oppor a refiftéciaj & aífentava cò-
figo, fer chegado o fim do império Olandés em aquella por-
ção da America.

142 He o juizo dos mortaes de tão limitada efphera,

que-o cinge qualquer aíFefto humano:Quando o de Naífau fe

rè£ dohra o Ca- ^Qf^^ç^ava perdido, fe vio refpirar defabafado á vifta da mef-

Inho & leípira. ^"^^^ cauza,que fez parecer diverfa hum leve movimento:Sem

tomar pano foy navegando a armada até dobrar o Cabo de

Santo Agoftinho ; na efteira da qual mandou o Conde de

Naílau duas embarcações ligeiras có ordem, que a feguiífcm

atè

tm

i6^9

(^A^E-h LIV^O Ilh

m

atè a paragiem, aonde deitaíTe ferro . Em breve tempo volta-
rão com avizo certo , de que ficava anchorada na enceada da
Bahia (& bem podèra affirmar , que a melhor occazião per-
dida para a emprefa deftinada. ) Temos referido o ílicçeíTo,
agora diremos a variedade de juizos, que fe formarão fobrç
defvio tão infaufto.Todos condenava o ao Conde da Torre
íèm mais proceíTo, que aquelle, que formava fua paixão. Da-*
vafe a fentença fem vifta da cauza : Acções ha tão alheas da
occaziaó, & do ufo, que as não íabe efcuzar o JUÍ2O3& menos
no prefente cazo, em que a callidade, o valor, & a diíciplina

do Conde fazião menos tolleravel o parecido erro:Como {ç,-, Y^^^n 'vmosfo.

■if 1 f j- ^ - !• r 1 ' hr et ít A derrota,.

iiao poderá peccar de obediente, quem o nao podia lazer de -^

remiíTo: Deípois fe publicou , que trazia ordem exprefía de
íèu Rey, para não cometer a empreía , fem primeiro tomar a
Bahi a j fe foy acerto dilohá o fucçeíTo , ainda que nelle teve
mais parte a deígraça , que a difpoíição . Não vè a occazião,
quem eftà fora dellajhe húa contingência, em que tem domi-
iiio o tempo,& não o difcurfoj bufcafe,&: naó fe fopoem.Por
conta dos Miniftros mayores corre a eícolha de hú bom Ge-
neral j por conta do General o faberfe aproveitar das occa-
zioêsj quem lhe dá o pofto não lhe pode dar os fucçeíTos , &
menos medir-lhe as contingências: As da guerra pendem de
qualquer accidente, & bafta o menorjpara lhe trocar a fortu-
na. De não fe fiarem os acertos, de quem fe fiaõ as armas, nar
eem tantos , & taó graves danos, quaíitos fem remédio prof?
traõ as Monarchias. i . ^^h^:_ . . ;::

' 149 Hum annofe deteve a Armada ho porto da Bahia;
fobe;o tempo para íe fortificar, & guarnecer inimigo menos
vigilante,&indufi:riozo,queo OJandésj & em Pernambuco, ^''«J^^^f^^^-
aonde o conhecimento do perigo o enfinou a aplicar mediei- "Jf^eunca "au7a,
nas proporcionadas à convalecençia , & defeníivos eficafes à jrmada fes ná
recahida. Tinha o Conde de Naílàu comprado efpias em a- Bahia,^
quella Praça(além dos Chriftãos novos,que nella habitavaó,
que o faó em todas) por cuja negociação fabia o menor inté-
to de no íTa gente j alem de que todos os aviz os, que fazião ao '
Pr incipe, cahiaõ nas mãos de muytas fragatas Glandefas, que
çurfavão aquell es mares , & delles colhião teftemunhas para
^uílificar a cauza, có que a ferro, & a fogo confumiàõ os mo^

radores

5#

-^

Ih

ijé QAsr^oro wsiTMo 16^,9

/ taáòres fieis, ou porque feus nomes FeexpreíTavaõ , ou porq

fuás mefraas cartas o perfuadião.Não era menos o danô , que;
porefte meyo executou nos Sacerdotes o ódio á Religião^
FeíTe fenhor dos proceíros,& cartas infamatorias, que a calu-
nia publicava contra os procedimentos do Biípo Dom Pedro

da Sylya de Sam-payo,que a perfídia herética exageravacom
ludribrio,& repetia com intento de trazer a fi, ou apartar de
HÒs tudo quanto entendia fer útil a fua confervaçaõ , & de*
fraudo a nofíb defignio. Naõ efpecificamos particularidades

neftas matérias, porque fe haò de repetir defpois as que cala-
mos agora;& porque nos chama o infortúnio da armada,pa^;
ra cujo deároço concorrerão a natureza , & a defgraça, ou
por caftigo,ou por cazo. . aj | ^

1 44. Com acertado confelho , íe determinou o Gohde
da Torre, em prevenir os Capitães mais deftros noscami-
phos,& veredas do recôncavo de Pernambuco , que fcrviáo
O Conde ãa Torre na Bahia para que com a gente de fua difciplina penetrafíem
Mfpoem o pio do bs matos, & delles aíTaltaífem com fubitas armas os quartéis.
Arrecife fer ter' ^ habitações Olandefas,cortando fem diftinção por vidas,&:
fazendas, & fervindo pontualmente ao amparo, & avizo dos
iiaturaes, para que na occaziaõ achafíè nelles aneccíTidade
comp^nhia,& focorro.Deulhes por inftrucção fecreta, que a
certo tempo fe chegafíbm â vifta do mar, para que vendo na-
vegar a frota, afeguiíTem pellacofta atè aparagem,aondQ
tomaíTe porto , & nelle fe encorpOraífem com a gente, q dei-*
taíTe em terra, a fim de fitiar o Arrecife por húa,& outra par-
te com todo poder. Não fecfcondia aoFraniengo arefolu-
ção^Sí o perigo^ como nem o modo do reparo : Guarneceo
aouelles furgidouros,aífi da parte do Norte , como do Sul, a-
onde lhe parecco , que a armada poderia deitar gente em ter-.
ra,de foldados efcolhidos , em que ocupou dous mil homcs,
& aquelles Cabos,que a confiança,8í a pratica tinha fubido á
melhor opiniSò, repartidos pella obediência de Carlos Tor-
lon Secretario do Conde de Naífau^Sc do Coronel, & Sargé-
toMayorMarsfelt com ordem, que avizados das fintinellas
fe favoreceíTem, & acudiífem àquella parte q a Armada buf-
caíTe para deitar gente^ o que lhe empediíTem a todo o rifco,
& a cara defcoberta.Determinada nefta formada invazão5& a

ra

■•^-..'y

*.«Í.VWv

re-

chega a vi/lã cie
Pernambuco.

•1^39 fJIlTE r. LirfJlO Hl í-57

reíiftencia, fahio o Gonde da Torre da Bahia em o fim defte

anno de md & feifcentos & trinta & nove com a frota, & flor

da milícia, q então fe achava em todo o Eftado j& defta efco-

Iheo dous mil homens, deftinados para faltarem em terra,có ^^y^ Armada

os quaes fe avião de cncoíporar os Capitães, que nella anda- portugueí{a daBu

vão efperando efta occazião (^como deixamos referido:)Po- hia.

der não fó baílante, mas fobejo, para romper por toda a op-

pozição contraria,& para acurralar o inimigo dentro de fuás

fortificações.

145 Com vento em popa navegou a Armada de Portu-
gal até avifiar a barra grande(diftante de Pernambuco para a.
parte do Sul, vinte & cinco legoas. ) Avertiofe a conveniên-
cia do porto, para a execução do intento ^ não fe admitio o
confciho pella diftancia. A avifta de Tamandarè , defafete le-
goas do Arrecife, fe fes o mefmo requirimento, & foy repro-
vado ; não Çqj fe por acordo, fe por defprezo . Já nefta altura
experimentava a frota a vehemencia,cõ que corriaó as agoas,
^ue ajudadas da fúria dos ventos,fizerão inútil todo o gover- -
no do leme, & do pano ; aíTi arrebatavão os vazos , que nem
podéraó pairar,nem deitar anchora. O inimigo,que com Ác^-
treza fefabia aproveitar das occazioés, que lhe ofFerecia a
fortuna mandou largar o pano a vinte fragatas , & alguns pa-
taxos, (jà de antes prevenidos, para efte fim,) que íàhirão do
porto CO a ventagé de navegaré a barlavento dos noífos: Ca-
hirão fobre a Capitanea cõ ouzada refolução trez fragatas^
intenta ndo abalroalla : Brevemente fahirão da emprefa, a liu
meíino té po eaíl:igadas,& arrependidas: A primeira tragarão
as ondas defpedaçada: As duas defarvoradas, & desfey tas de
forte,q a pezar da memoria as defconheciaa vifta: Abonãçoil Derrota ^ir a In>
o V ento, por efpaço de trez horas , tempo , em que os noíTos dias,
navios fe poderão ordenar para a batalha ; temeoa o contra-
rio,& V aleo-fe do defvio , fervido da fúria com que fe repi-
tio a tempeíladcj que a huns , & outros não dpxou mais iaí-
vação, que a de obedecer aos mares. Levada das ondas def-
garrou a frota Portugueza para índias de CaíleIla,aonde pri-
meiro a levou o deftino , que a ordem , que delRey tinha o
Conde da Torre, para que concluída a empreía de Pernam-
buco tomaíTe as índias , & cpmboyaííè os galeões da prata a

O Saõ

II

ijS C^Sr^loro LVSITAKO 1^39

Saõ Locar. As nãos Olandeías favorecidas do vento , volta-
rão para o Arrecife , Embandeirada de negro entrou a fua
Capitanea jluto em que íe amortalhou toda a alegria da ven-
tura,táo cuftoíà pella perda, como pella magoajcom que del-^
la fe tirarão os corpos dos mortos,& entre elles o de leu Ge^
. .í VÁneral, cujo nome calarão noffos Efcritores, ou por minorar a
defgraça,ou por eícondcr o defazo.O Gonde de NaíTau mal
fatisfcy to do fucçefíb acudío ao funeral com os ritos de íua
herética vaidade,& fepultados os mortos, entrou a devaffai:;
dos culpados, (Tinha entendido, que a culpa de alguns Ca-
bos, obrara mais em íeu deftroço, que noíFo braço. ) Ao feu
Almirante mandou degolar , com eftiios de fraco,& de falfo j
o Conde de Naf' períuadido da floxidãof Com queprocedeo, que tivera me-,
fau caftigei os uos de cobardc, que de.tray dor . A cinco Gapitaés mandou,
fem Cabos. enforcar por remiílbs j & a dous Pilotos por vagaroíbs ; & a
todos có a ignominia deverem fazer em pedaços fuás armas,
,com o pregão da culpa, & do foplicio . (He efta ceremonia a
'^ia mayor afronta entre aquelle gente.) Exacção, com que íe
cóferva a reputação das armas , & a opinião das Monarchias,
que fempre declinão, fe igualmente as não fuílentão os eixos
éQ caftigo, & do premio.

- ' 1 46 De infortúnio tão alheo da imaginação [ a hua , &
outra gente] fizerão os herejes vários juizos j q fupofto noA
fa obrigação feja dar contados fucçeíros,& não dos difcuríbs
giremos os argumentos deftes, para que cntendão,os que go-
Pareceres que os vernão,fer condição do mando fobordinarfe igualmente aos
homes dão aoin- juizos,& aos cazos, có aquelk íèm-rezão , com que a fofpey-
fortuntQ, ta,& a paixão proceflaõ as caufas , fafendoíe juifes as partes^

fem terem parte no ;uifo com que os fuperiores obram.Calu4
niavão ao General de abíbluto,porqueíèguindo íeu di£i:amé^
naõ quiz deitar gente em terra , quando o aconíeihava a ex-
periência. Outros de ambiciofo, que por naõ repartir a glo-
ria, que o efperava , perdera aquella parte, & toda a que lhe
cabia. Alguns queriaó , que peccaíTe de altivo prcfumíndoa
fortuna,& os tempos obedientes a fuás diípoíiçoés : Muytos
diícurfavão, naõ com o )uizo , fenaó com o defejo, & pugna-
vaó que a cauza foíTe culpa certa , para que naó foíTe incer-
to o caíligo; Naõ faltarão alguns j que com bem intenciona-,

das

1^39 -^H^TElLimpIlL 1^9

<3as obfervaçoês afíirmavâõ, quea caiua de reiíão confeguir
a emprefa fora aquella parte queCaftella teve nefta Arma-
áã; porque fupoíto, que violentada dos mares, & dos ventos
correo á v ontade dos mares, poderá o groíTo delia voitar pa^
ra a Bahia,com o mefmo tempo,com que voltarão alguns na-
VÍ0S5& dallí bufcarem em fegunda viagem melhor fortuna,a-
prendendo no fucçeíib a prevenir os errosj que para os acer-
tos das acçoés,os cazos faó os melhores avizos : Mas não quiz
a Nação Caiielhana,que ouveíTe exemplo em idade algua,de
queleconheceíTe, deixavão feusfocorros de cauzar noíTas

ruínas.

147 NafombradaArmadafiindavâoEftadofuamâyor

fegurança : O apartaíTe da Bahia lhe deminuia mais o receo^
porq avahava as armas contrarias íubjugadas, ou entertidas:

Nefta confiança fe deixou defpir de toda a guarnição . Não
correfpondeo o fucçeíTo ao difcurfo . Fello mais certo o de

NaíTaUja cu^a figilancia nada fe efcondia: Soube o Eílado em
q ficava a Cidade da Bahia,& fem duvida intétàra a enterpre-
fajfacil agora a prefuaçoés da vingança. Não dava menos cui-
dado aosnoíTos Cabosjderrotados do têpo, efte perigo: Pro-
poíerão ao General daArmada a neceffidade do íbcorro,com
requirimento, q os deixafíe em terra em qualquer porto da-
quella cofta, dóde podeíTem marchar pello certão , para a Ba-
hia.Inftava a importância, & no porto do Touro, 1 4. legoas
do Rio Grande para o Norte,deixou a Armada ao Meftrede jsio^m&dâTóU'
Capo Luis Barbalho com 1 30o.Infantes;& aos Governado- ro deitou a noffâ
res de índios, & Crioulos D. António Phelipe Camarão , & Armíida, â Luis
Henrique Dias, com a fua gente. Avia de fer a marcha pelio ^^^^^^^^ i ^
interiordomato,&em partes por entre a barbaridade dos
Índios , topando em muytas com as armas dos contrarios^Sc
em todas fem provifaõ , nem efperança de focorro humanot ^

A Diftancia, de quafi trezentas legoas: Difficuldades ^ que /

paíTavão a parecer impoffiveis ao mais ouzado coração^ Sc fó
03 de Cabos tão deílimidos podèraõ intentar, & vencer em-
prefa, que ainda defpois de confeguida fe fes du vidofa. Na
relação defta viagem peccão dous Efcritores nolTos, hum de
encarecido , outro de mal informado ; efte, erra em muytas
legoas o porto aonde faltarão em terra:EfGrevej q-íoy na Ba-

O

bia.

ni

160 C^SrilWTO LUSITJNO 1639

hia, que chamão da trayção: Aquelle o computo das legoas,
e/cm o ^ ^7- 2ffíj.jjjando, que marcharão quatrocentas de caminho: & de "^'^■?' í^'
toda a lorte íe pode amrmar toy elta expedição a mais nota- ^ ^^^^
vel de todas, quantas exagera a fama: Nellavenceo 2l Nz^2lo Evanapt
Portugueza a todas as do Mundo na dehberação , na valen- trium^h
tia, na paciencia,& na conftancia j da qual faremos hua breve
memoria, porque ITrva ao exemplo, & à perpetuidade.

148 Parte de hum deíèrto era o porto,aonde a Armada
deitou a Luís Barbaího com a fua gente, fem mais víveres, q
os que cada hú dos foldados pode tirar em fua mochíUa; Fal-
ta, q coníiderada em femelhante lugar, eftava acufando a de-?
terminação, não fò de temerária, fenão de louca, fiando a li-
vrança dos perigos a contingência demiíagres 5 poré aquelle
Pratica que LuU valor fefflpre íguaí nos defprezos da vida , & nas melhoras da
Sarbalha fes 'k patria,poftos nella os olhos,nada mais lhe deixava verj&porq
fua gente. delle fe veftiíTe o animo de feus foldados,foy fama lhes fallára

defta maneira.O motivo,qíie nos tirou da Bahia nos deitou a-
gora nefta praya jdella nos tirou a conquifta,a ella nos leva a-
defenfaideterminação,hua, & oiitra tão filha de ânimos Por-
tuguezes , q livre de achar nos eftranhos competência, buíca
em íi meíma o exceííb , tanto mayor emconíervar opoíTui*
do, que em recuperar o eftragadojquanto mayor he o perigo
de conduzir efte focorro, q o de perder aquella Armada: Em
feu mào fucçeíTo tiverão palt-te os elementos, & não os inimi-
gos:Em efta viagé ayemos de pelejar com os inimigos,& com
os Elementos ; eítes armados dos rigores ào tempo,aquelIes
das cóleras do ódio : Tudo venceremos íè fo eftribados na
cauza alentaremos a confiança pois he certo, que naó fal-
ta Dcos com auxilios, a quem lhe dedica obfequios : A fa*
:vores do Ceo fe nutre o valor dos homens . Imos a focori
ter, & a livrar a Pátria das leys da infidilidade, & das cx-r
troçoens da tirania ; & a influir nas efperanças dos paren-
tes, & dos naturaes , que em Pernambuco vivem opprími'»'
dos do jugo Olandés, com libertaremos a Bahia de feu im"
perío . Podéranos acobardar a falta dos mantimentos, íe a
não coílumàraó fuprir as fruitas agreftes dos matos; nel-
Ics mais cerros,& menos cuílofos, que nos quartéis do inimi-
go: A experiência nos tem enfinado, que mais facilmente

fe

i539 '^J^B 1. L1F<^Õ 211. í6i

fe vence a falta, que a reriftenda: Mas fe aonde íe contrafta n
o may or perigo, fe alcança a may or gloria , fou de parecer, n
que neíla marcha buíquemos o povoado^no qual poderemos 5?
confeguir remédio para a fome , & argumento para a fama, 55
mais grata, a quem v ence homés,que a quem mata feras:Por >>
cfta vereda caminharemos a dous fins ja matar a fome,& a re- 1»
frear a força jpois hc certo,que os inimigos, que agora deixar "
noíTo braço deftruidos, nos hão de faltar defpois,contrarios: »
E quando o Olandès irritado nos bufque poderofo,em nofía "
mão eftà a retirada, porque lhe fazemos tanta ventagem no "
conhecimento do certão, quanta elle nos pode fazer no nu- '>
mero dos foldados. ??

149 Paraarefoluçaõ dos ouvintes fobejou tudo, o que ^^^^^^ agentel
a pratica teve de exortação^ fó para a obediência fervio a ef- ^ ^i^ principio Á
colha do Cabo, cujo voto aplaudio hum animo , húa voz, & jfiarcha,^
hum movimento, a que correfpondeo a promptidão , c5 que
vLuis Barbalho formou a gente , & começou a marcha, levan-
do diante de feu efquadraò descobridores para as cilladas, &
guias para as veredas com ordem, que todos osca vallos, Sc
bois que defcobriffem, os recolheíTem para o fuftento,& pa-
ra o ferviço. Com faudofa magoa perderão de vifta os últi-
mos vazos da armada, que navegava arrafada em popa , dei-
xando os olhos de todos arrafados em agoa, que de novo hu-
mediciaó as povoações dos moradores , que encontravaó af-
^iàos poritamanha defgraça, & defefperados de mé.hoT O^uclhefuccede
fortuna: Deftes recebiaõ os foldados ofuftento , que volun- ^^^^'.
tariamente davão,compadecidos de fua neceíTidade jpois me-
nos livres, que efcravos , nem a violência lhes deixou armas
para defenderem a v ida; nem a tirania inftromeníos para fe
aproveitarem dos matos. Das fazendas do inimigo mandava
Luís Barbalho tomar o neceírario>&: queimar o reítante , fem
que deixaífe a efpada vida , que podeíTe chorar a perda. No
deftriâo do Pvio Grande achou ao feu Governador chamado
Gafraan, que levou cativo atè a Bahia [com alguns Framen-
gos5& índios que o acõpanhavaó] donde o embarcarão para
Fortugal-.Paffou a Olanda , & dellà voltou ao Brazil , com o
mefmo pofto, como diremos adiante.Chegou á Villa de Go-
^rana, aonde o Framengo tinha quinhentos 8c trintíi homens

O3 de

i62 CAST<!(10ro LVSITAKO t6^^

de prezidio; enveftio o quartel, Sc fem elle os paíToii todos á
eípada, fervindo as chamas, em que ardeo o lugar, de reduzir
a cinzas indiftintas os corpos, de Teus defenfores , & os mate-
riaesdefua defenfa. Em outras muytas partes encontrarão
inimigos em defigual numero, que em todas deftruiraó com
igual Ibrte: Em íiada era des-femelhante a dos índios rebel-
lados , em os quaes a identidade da culpa , não deixava v er
a diftinção da natureza.

1 5 o Chegou ao Arrecife, primeiro a noticia da perda,
que a nova da marcha, & impaciente o inimigo , fahio à vin>
gãça com trez mil foldados em trez terços, & inftrucção,que
a todo o rifco feguiírem,& perfeguiíTem a Luis Barbalho atè
o inimigo lhe mt O deftruirem; o qual a efte tempo, jà deixava atraz o dçftric-
dafeguíroalcan- ío de Pernambuco ,& delle tinha agregado afinão poucos
^^' «ioi'adorescomfuasfamiIias,tâoreceoros da vingança, que

em fua innocécia a via de executar a tirania, que os obrigava
a trocar o cativeiro da pátria, pella liberdade do defterro:
Certo, o valerofo Cabo, do poder , com que o feguía o Fra-
mengo lhe efeondeo o trilho:Marchou muytos dias pello in-
terior do mato, com tanta moleftia , que à força do braço fe
hia abrindo o caminhoi& c5 tanta penuria,que algum pouco
milho grande era todo o fuíl:ento,& todo o regalo 5 mas com
íal ordem, & vigilancia,que não pode o inimigo,nem a fome
, -defraudar deíua gente a mpor peíToa. Paflbu o Rio de São

Francifco,& da parte do Sul fes alto para defcanfo,& para a-

livio de tão dilatada viagem; a fua vifta parou o inimigo, q

o feguia,temendo na paíTagem o deílroço. Continuou a mar-

o que fucceàe a cha (paflados alguns dias ) com menos oppreíFaó, & mais co-

hum,& outros, modidade j atè que entrou na Bahia , termo de fua jornada, q

chea de eípanto nãó ceifou cm muytos dias de encarecer, o

que Luis Barbalho nefta facção ganhou de gloria,& adquirio

í^e fama: O efquadráo Olãdès aífi como vio o efcape da pre-

fa,& a impoííibilidade do alcance , voltou a marcha para o

Arrecife, & a cólera contra os pobres moradores , matando,

& deftruindo tudo quanto topou até Pernambuco.

1 5 1 Deixamos dito em o numero cento & quarenta &
quatro defte terceiro livro , o intento , com que o Conde da
Torre, (féis mezes antes de fahir a ^rmda da Bahia, ; man-
dou

1^39 (PJÍ^TE L LlF(!{p HL .163'

dou algiias companhias de Toldados á campanha de Pernam- ^^^^ ^^^^^ ^^ ,
buço, deftros no terreno, & nas veredas do mato, às ordens ^^^^^- ^^ '^^j/^
do Capitão Paulo da Cunha , & outros cujo nome calou o capitães , que o
defeBcuido,& por Cabo de todos André Vidal de Negrei- c^»^^ da. Torre
ros: Com tanta induftria,& valor fizerão fua obrigação, que ^ j^^^^^^"^
íe julgou o Olandès deftruido fem remédio, porque a nenhú ^^^^
golpe defviou o reparo , inútil de todo , o ardil , & o poder.
Dividida a noíTa gente em pequenos troços affaltavaõ a hum
ínermo tempo divcrfos lugares, com tanta ligeireza, que cha-
mado o inimigo dos rebates , não fó o deixava confuzo a in-
deliberação da parte, a que avia de remeter o focorro , fenão
também defefperado,vendo em todas o rangue,& o incêndio
fem ver a eípada, nem o agreflbr : Eftilo , & fucçeíTo , que íe
tepetio por féis mezes, fem que nelles o Framengo,tivefe em
todo o deftriâio palmo de terra feguro dos aíraltos,nem izen-
to do ferro, & do fogo . Não baftou a entrepofíção do mar,
para defviar o rayo: Fey tos os nofíbs em hum corpo, ( apro-
vei tandofe da preíà , que fizerão em trez barcos ) paíTárão a
ilha de Itamaracá:Em húa noite a ganhàrão,faqueáraõ,&def"
truirão, com morte de dous Capitães Olandefes , & bom nu-
snero de foldados, & Indios,com tal prefteza, que pode a me-
nhã dcfcubrir o eftrago, porém não os agentes.Deíatinado o
inimigo com a magoa das perdas ^ & com a repetição dos da-
nos (fem lhe aproveitar a prefteza dos focorros) fe lhe fazia a
dor tanto mais fenílvel, quanto mais difícil fe lhe reprefenta-
-va o remédio.

-- 152 Chegara o tempo, em que as nofíàsíintinellas def-
cubrirão a armada, que navegava da Bahia para Pernambu-
co, & com o alvoroço deterem â viftao fim defejado,derão Q^^^^g^ paíTacla,
comprimento às ordés, que do General tinhão recebido :De- ^ Armada feen^
cèrão às prayas, & por terra íèguirão o curíb , que as embar- cor f orar aõ com
caçoes levavão por mar, com a eíperança de receberemj& fe LhU Barbalh(K
unirem com a gente, que delia avia de fahir^ a qual perderão,
^endo, quede mar em fora a nenhum porto arribava. Pare^
cialhe a violência novo acordo, & ler forçofo dar às ordens;
que tinhão, diverfo fentido. Profeguirão a marcha, atè que a
navegação lhes mofirou o defvio,qUe logo confirmarão com
perderem de vifta todos os vazps defcahidos da altura do Ar-

O/^ recife

I <^4 C^ST<^10T0 LUSITANO

i6^p

recife para o Norte, levados das correntes. Podéra defmayar
acçidentetão novo, a corações menos grandes^ nenhum ma-
yor, que o que não degenera na peyor fortuna. Conferidojo
íiicçeíro,& o reparo,fe aíibntoii na continuação dos aíTaltos,
ate então por obediência, defpois por remédio 3 eíjDerando,
que a forte abriíTe caminho à retirada,certos no rifco da affif-
tencia.Succedeo chegar LuisBarbalho áquelle deftriâiojcor-
reo a fama com o efi:rondo,que coíluma gritar o eípantorCõ-
vocâraõ-íe as noíTas partidas, & fey tas em hum corpo fe uni-^
rão com a fua gente , & juntos profeguirão a marcha para a
Bahia na forma,que temos referido.

153 Servidoo inimigo da fortuna, (na Armada, que o
* tempo derrotou, & nas tropas , que a neceííidade recondu-

ílo) avertio, foldado, & vigilante ( com a máxima de trazer
leu exercito occupado ) que em nenhúa parte faria o golpe
mayor dano, que naquella , em que o corpo eftava mais deP
pido: Mandou íahir húa efquadra de nàos de guerra entre-
gue a Carlos Torlom, com ordem,que pello maritimo da Ba-
Mmâjiodemf' hia fizcfeo dano poííivel , uzando do mais vivo rigor da hof-
fauhiia ;^^'»^'^'« tilidade. Com proípera viagem chegou àenfeada, que tem
tavo d7 Bahia"' ^^^^ lagoas de cofta, deitou gente em terra. Os moradores, q
primeiro fentirão o ferro , que viíTem o braço , não tiverão
mais lugar, que de falvarem as vidas, deixando nas mãos dos
Inimigos as cazas,& as fazendAs.Saqueou todoc os engenhosj
que por rios navegáveis lhe ficavão debaxo da efpada,(ven-?
do os fenhores delles nubar , & arder os moveis , &os edifí-
cios, fem poderem atalhar a perda:) O fubito dosaflaltos, &
a prefteza das retiradas,fcnáodavão lugar à oppoííção, o da-
vão a dor , com q a hum meímo tempo fe chorava o deíjpojo,
Sc o incêndio .Com o grito do dano fe ouvio na Babia o re-
bate do eftrago . Acudio o Governador á refiftencia: Promp-
to,& colérico deípedio hum grofíb de infantaria com os me-
lhores Cabos do prezidio . Marcharão acezos no dezejo da
vingança^porém forão detidos das voltas do caminho^ & das
paíTagensdosriosrOOlandèsavizado do noffo arrebatado
movimento, affi médio o tempo com o perigo, que húa meC-
ma hora fervio à noíTa chegada,& a fua fuga: Lamétavel per-
da fes o inimigo em féis dias, que durou a infolenciaj& o rou-

r

í639 <B^^ELLimpUL t^

bo. Deixou mny tos engenhos deftruidos j muytos deíapare-
Ihados j levou muyta copia de açúcar, bois, canas, vazos, rou-
pas, & tudo o mais , que teve valor , & preftimo , fem deixar
Gouza de utilidade, nem para o reparo, nem para o ferviço.

154 Ainda fe oUvião as queixas , & corrião as lagrimas
dos moradores , quando o Marquez de Monte- Al vaó Dom
Jorge Maícarenhas tomou terra iia Bahia, com o titulo de
Vizo-Rey, & cargo de Governador Geral de todo o Eftado ckgd à BahU o
do BrazihFidalgo de relevantes prendâs,&: verdadeiramente Mar^ueideMõ'
digno da confiança , que elRey Phelipe fazia de feu talento *''J^^'2%ado
para Tarar as quebra^de noííàs armas,& rebater as forças Olá- ^^ J J
defas. Parece que nefta efcolhá fe pronofiicou a ultima laba-
reda daquelle governo,& a total mudança do Eílado. Era o
Marquez varão de grandes efpiritos , noticiofo da milicia, &
deílro na fagacidáde:Doeofe do eftrago, Sc da in)uriâ, que ú
chamavão à v ingança com â voz da laftima ^ & quiz moftrar
ao inimigo,que feu coração, nem fábia perdoar ^ nem podia
fofreri & que para a fatisfaçâò dos agravos , lhe fobejava eA
pada j& para a recomperiça das cautellas, lhe não faltava as-
túcia. Em breve tempo fe fes capaz de tudo, o que era necef-
fario,para acertar nas empreías o modo, & nos fogeitos a ef*
colha: Chamou a íi o Capitão Paulo da Cunha , aquém fiou
o pey to, & o fegredo: Ordenou4he, que efcolhefíc os folda-

dos, que fua opinião aprovaífe ,^ & com elles , como a furto* ^ ^ .

/ rr- ^ 1 j n i_ O • íT r Com mê aftmiâ,

marchaíie para a campanha de Pernambuco,&queimaíle,lem ^^^^^ infefíarA

diftinção,engenhos,canaveais,roças, arvores, & tudo ornais, cãpanha de per*
de que o inimigo fe podia aproveitar, para que defengâna- nambuco,
do,de que os intereflies não avião de chegar aos gafi:os,defam- /

psraííe, o que fuftentava pellos avanços, & não pella reputa-
ção. Partido efi:e Capitão á desfilada , o feguio com as mef-
mas ordens o Governador dos Minas Henrique Dias com o
feu terço.Feytaefi:a expedição, defpachou o Marquez hum
próprio ao Conde de Naífau, & ao leu concelho fupremo c6
carta, pella qual os avizava em como alguns foldados Portu-
guezes mal difciplinados,& procedidos , fe avião remontado
temerofos do caftigojque fofpey tava fe paíTarião a Portugal^
intènto,que fem duvida os levaria a bufcar o favor de íua Ex-
celência 5 para q lhe concedeífe embarcação , ou para o Rey-

no,

li;'"

ri'

léé C^ST^IOTOLUSITJKO r^^y

no^ ou para os Eftados j & fe acaííd, eomo atrevidos, os íevaí^
fe íiia demaíia a roubar o recôncavo lhe pedia , que nem fua
^ genorizidade os defculpaíTe, nem fua clemência fe compade-
*^ ceíTe, pois para a liberdade avia grilhoSjSc para o delido for-
cas. Fundavafe a confiança do Marquez, em que nunca a di-
ligencia do inimigo avia de alcançar a deftreza , & a pericia
dos feus. Licita,& diícretamente fe desforçou por efte modo
o Vizo-Rey,das perdaSjSc enganoSjCom que o Conde nos fa-
2Ía a guerra.

155 Neíle tempo, tinha o Conde de NaíTau ( príncipe
nas cortezias) mandando dar ao Marquez os parabés da vía-
0 deNaífauint- gem,& da chegada, por Manoel Code , hum dos trez de feu
■ ' embaíxadaao concelho íupremo , & por íècretario da embaixada à Abra-
/i^o-Rey, hamTràper (inteligente na lingoa Portugueza) com hum

prefente de mimos forteados aííi da terra, como de fora. A
luftancia da embaixada, deípois das congratulações da pef-
fõa, era, com as cavilaçoês do officio, pedir fuípenção de ar-
mas,apontando as conveniências de húa tregoa entre os dous
governos,com a dobrez de amigo, & contrario . Náò faltou
difcurfo, que ou por facil,oup0r efvaecido, quizeífe perfua-
dir ao Mundo, que debaixo defta publicidade avia fecretas
negoceaçoês de húa,& outra parte.Com eftimação, & agafa-
Iho recebeo o Vizo-Rey aos Enviados , & as oíFertas , acom-
panhando a gratidão com a mageftade, com que os tratou os
dias, q fe deti verão; até que os defpedio faíisfeytos, & obri-
gados-:Em breve tempo correfpondeo ao de Naírau,& aos do
Íupremo concelho com ventajofo retorno j& com as mefmas
artes diferio às tregoas pedidasj negocio que fiou ao Tenen-
o qual lhe reífo- tc Martim Ferreira, & ao Sargento May or Pedro de Arenas,
de coma mefma com cautelofas inftruçoês paraaíííftirem,& proporem os ca-
diJfimuU^ão. pitulos dellas3(fecreta a deficencia , & aparente ã confiãça )
porque hum engano fc rebateíTe com outro. Chegarão ao
Arrecife: Cófeftivasdemonftraçoêsforão i'ecebidos do Po-
vo, & do governo j & com particulares honras do Conde de
NaíTau. Concluido o negocio , fe v oltàrão osnoíTos para a,
Bahia fatisfeitos,mais da-€ortezia,que da verdade Olandeía;
aonde acharão ao Vi?b-Rey embebido no cuidado de refor-
mar as fortificações arruinadas j que brevemente pos em fua

ultima

me Dtof^

1^39 vrj^El.LlF^Hp 111. f^7

ultima perfeiçãoi& em deitar ao mar duas galleotas bê obrar
dasj moftrandofe ao inimigo com húa mão na paz ^ outra na
eípada j có o que a hum mefitto tempo fe fazia temido, & ref-
pcy tado de amigos, & cqntrarios.

:' 156 Em quanto paffava o referido ) ti veraõ tempo os
Capitães Paulo da Cunha, & Henrique Dias , para executa-r
rem as ordés do Vizo-Rey .Chegarão ao deftri£i:o de Pernam"
buço com voz de foragidos, que fe fes crer pella primeira té- j^^^yi^.^
ção, vendoíè o miúdo das partidas . Em partes certas fe uni- ^ p^^io d^ cu--
i!ão^& diípozerão o modo mais feguro,& melhor encaminha^ nha chegao ao re<
do ao fim pertendido:Devidiraó-fe em pequenos troços de a £<f^i^avo de Per-
dez, §c quinze foldados: A cada hum fe confignou o lugar,&:/^^^^^'^'''
a;hora,parã a in vazão , & para o retiro : Deíla forte efpalha^
dos pellas freguefias (com termo,não vago, íenão certo) po-
zerão o fogo a tudo,o que podia fer matéria para o incêndio,
com o que fem tempo, nem diftinção, fe vião arder os enge-
nhos,& edifícios j os campos , & as matas em húa mefma cha^
nia . Todos olhavão o eftrago,nenhum atinava com a cauza* •
Portuguezes,& Framengos choravão a perda,fem.que a algíí
fobejaíFe magoa para o dano alhed.Em todas as partes ardia
tudo aquillo, em que fe podia fevar o intereífe, & a eíperan*?
ça; os géneros da mercancia , & do fuftento, confund irão aâ qf^cfteue o&raa
cinzas;& não menos os diícurfos , que embaraçados com a
igualdade da perda,não fabião aunar com o principio do da-,
no. Com diligencia inútil acodião todos ao remédio j porque
os noíTos foldados affi fugião do fogo, que punhão,que era o
mefmo bufcallos com a luz das chamas , que perdellos efcon-
didos entre as fombras do mato,fem que novos incédios, lhes ' »
deíTem tempo , para Ponderarem as cinzas dos paíTados : A-
çhava o fogo os materiaes tão difpoftos,que o mefmoera cor-
rer a atalhallo,que chegara ver tudo coníiimido.Não deixou
de obrar em algúas partes rflais o interefle, que a obediência^
porém forão tão poucas, que não fizerão numero em tama--
nha foma. Durou por muy tos dias a cauza, & o efpanto : Ns^
duração dos eftragos , vião os Olandefes íua perdição reco-
lhendo igual dano da perda,& da vingança. Osmoradores,&
^aturaes recebião de húa mefiiia mão a miíeria , Sç a efperan-
Ç^Y ]pQí:%m ÍQ achavão çni fua calamidade , a de fua reden-

' ffUum.

mão do Conde de

t6% C^sr^IOTO mSlTJNO 1639

ção. E íem duvida, fora efte o meyo pafaque" ô inimigo de-
í amparaílè a terra, fe fatalmente o não atalhara aqiiella pro-
vi dencia,que com a omiíTao caftiga, deixando obrar os ho-i
mens pellos diâ:amens da cegueira.

■'' 157 Deu fim efte anno de mil , & feiícentos & trinta & .
nove,& o dera efte terceiro livro, com alguns íucçeíTos deri-
V ados da matéria fobredita, porém de tão pouco tomo , que
naó tem lugar na brevidade defta hiíloria.Sò faremos relação
^yoru, & ^'•^í'- dehumfuneral,queaoLeytornaQferáímportuno,pelloque
l«/^í do Conde ^gj^ ^g rediculo,nem alheo defte argumento , pello que teve
' depronoftico, fer vindo a fiipreftiçaò de hum enterro, como-
devatecinio ao fepuícro de hum ,& outro imperioj ao de
Caftella por intruzo^ ao de Olanda por tirano 3 efte porque
começou a declinar,aquelle porque acabou de cahir.Chama-
do da conveniência 5 &da cobiça affiftia em Pernambuco
Joaõ Arnefte Irmaó de Joaó Mauricio, ambos ditos Condes
de NâíTau, naò porque entre elles fe partifte o Eftado, fenaò
porque a hum,& outro, fe eftendia o titulo , & o intento de
roubarem o MundotEfte era o eftudo dos Irmâos,Joaõ Nlau^
ticio na terra, Joaõ Arnefte no mar,o qual infeftava aquellas
coftas com quatro fragatas , exercitando o officio de coifaria
comas preheminenciasdefenhorrNellalhedeuhíia afque^
rofa,& grave doença,de q veyò a morrer. Cobrira5-fe as nãos
de luto , & bufcaraó a terraí para nella fe depofitar o corpo
liiorto: Entregoufe a feu Irmaó, que logo o mandou embai-
famar,& compor dentro de hum apofento com tal recato , q
íizera fofpeytar aos homens, que o eftimava por relíquia, fe-
tiàò def prefára as dos Santos, como refinado here)e. Em fuás
mcíiTias contradições tropeça a cegueira herética : Negaó o
Purgatorio,affirmando,que para entrar na gloria bafta o crer,
fem obrar3& naó fabe fua protcrvia tirar defta errada premif*
fa porconfequencia, a veneração dos corpos mortos , como
corpos (ainda dos feus,em fua opinião errada ) de almas bem
aventuradas: Antes em cada hum dos feus ritos grita a verda-
de feus erros: Aííí fepultaó os corpos dos feus defuntos como
fe com ellcs acabarão as almas-. " ' ■ ^ " ' - • ' • ■ ■

158 ' A primeira diligencia,que fefes,paraas exéquias,
foy armaremfe diverfas mezas em o falaõ de PaIacio,fem toa-
lhas,

i659 ' TA^EtLlV(l(p HL t^

IhaSjtnas providas de todo o género de carnes'differenteniété
guiíadasjpello meímo modo, peixe de varias caftas \ queyjos^
iiianteigas,& paõ^tudo dividido em pequenas porçoés^grãde
multidão de frafcos c5 toda a diveríidade de bebidas: Có eftâ
preparação mandou o Cõde rogar a todos os homês de bé, q
moravaó pella vezinhâça, & aos foldados , q tinhão pofto na
milicia,có hora cerfa,para a aííiftêcia. Obedecerão todos, co-
mo fubditos:Os Portuguezes veftidos de negro, por luto; os
Eftrãgeiros com as iníignias de feus cargos por authoridadcí
De huns, & outros eícolheo o Cõde para a fua meza os mais
dignos,& os mais gratos ; os reftãtes fe acomodarão pellas de
mais.Comeraó,& beberão todos a paíl:o,& a goftojobíervan-
do tão rigurofo ÍIlencio,q íò c5 os brindes íe permitia violary
fazédo-os cada hú pellas leys de íua própria vótade.Nefte be-
ftial exercicio gaftàraõ algúas horas: A as duas defpois do me-
yo dia(póto em q muytos bateis eftaváo prevenidos nas cor-
rentes dos Rios Beberibe,& Capiberibe, q dividem a Cidade
Mauriçea do Arrecife Jcomeçou a pajOTar muyta copia de po-
vo chamado da novidade, & da lifonja. Mãdou tirar o corpo
do apofento, aonde fora embalíemado , o qual em híi ataúde
pafíaraõ abada do Arrecife,eíperãdo nelle os concelhos fu-'^
premo, & politico,com todos os moradores, em cuja prefen-
^a defcãçou o féretro no meyo do areal por algúas horas,&
dalli o levarão à fepultura na forma feguinte.

159 A hú,& outro lado fe ordenava a gête ém duas filct
ras,por entre as quaes o Mayordomo do Conde, (feguido àt
dous pagéscò dous aparadores,em q vinhão luvás,& pedaços
de fitas negras)foy dado a cada peíToa húas luvas cõ hú peda^
ço de fita,q atavão no braço efquerdo,[rmal de luto entre os
daquella naçaó J logo oy to officiaes da caza fe chegarão ão et
quife,q efta va coberto de veludo rafo,& negro,bordàdas nel-
le as armas dos Cõdes de NaíTau^Sctomádo-o aoshóbros fo-*
raò feguindo a hú page veftido de preto;(Levava gravadas a#
armas da caza de Oráge em hú efcudo) ao qual precedia hum
çavallo coberto de baeta negra. Ao primeiro movimento da
tuba levantou hú progoeyro a voZj&começou a nomear,por
húa lifca,as peíToas q aviáo de formar o acópanhamento,dan-
do-lhe có o nome, o lugar. Atraz do efquife hia o Conde de

P NaíTaa

P

ÉliÉ

. 170 • CAST^í^OTO LUSITAKO 1659

NaíTaii veftidò de veludo negro ao cortezãOjCÕ Invas3& plu-
mas brancasjladeado de fiiaguarda.Em feguimento do Códe
caminhâvãó os Miniftros do cõçelhoíupreiii05& politico cõ
todos íeiTs oiSiciacsiSiguiaos oTribunal da Camara:Deípoisj
os q tinhão poftos na miliciaj& a eítes os homcs de negocio;
Sc no ultimo higai-jOs foldados aífi Olandefesjcomo Brazilia-
nos em íbra de guerra fúnebre. Rematavafe o acompanha-?
mento em húaconfuza multidão de vulgo,trazida do ocio,&
da curiofídade. j .

160 . Nefta ordem caminharão com vagaroíb paííb , &
profundo íiIencio,dando volta às ruas do Arrecife j chegarão
à porta de humTempIo q íèrvíra aos Catholicos de Igreja cò
o titulo do Efpirito-Santo, & então fervia às pregações das
abomináveis ceitas de Lutero5& Calvino, & nelle enterrarão
o maldito corpo, lugar diípofto , para femelhande depoíito.
Em toda efta fúnebre pompa,íe não vio húa luz p tal he a he-
^reticacegueira/^Naõíè ouvio hum fuípiro.(Tão obftinada
he fua dureza.) Não íè diííè húa oração. [Tãto tem de impía
foa obfervancia.] Não lhe faltou porém hum medonho eí-
tí ondo, refulta de toda a artelharia,& moíquetaria de Forta-
lezas,& companhias , que deíparáraó juntamente , reprefen-r
tando no fuzilar dos tiros, no efcurecer do fumo , & no hor-
ror do eftrondo as condições do lugar , que poíTuya a Alma^
& efpprava o corpo daquéile deíaventurado Hereje.Deuíe
fim ao aâ:ocom ©acompanhamento , que todos fizeraõ ao
Conde, atè fora das portas do Arrecife, aonde com o chapeo'
na ni^o, & profundas inclinações fe defpedio de todos; me-
nos oè criados de fua caza , que para ella o forão íeguindo.
Coníidere o difcreto,& coteje o politico a cauza,& a morte,
de que enformou,&: morreo;& as circunftancias , com que íe-
enterrou efte Principe,& achará ante vifta, na malignidadcja
cauza do achaque de que adoeceo o império dos Olandefes
nefta parte da America;&: do repente , com que fe acabou o
dominio de Caftella na melhor porção da Europa:Em quan-^
to nòs referimos em o quarto Livro os peíliferos humores^
de que enfermarão, hum5& outro governo.

CASTRIOTO

FARTEI. LIVRO IV.

ESTESE a mentira das aparências
I ,!^^\>^Wé'/iyp da verdade, & faz parecer corpo dá

jaftiça aquelle vulto, que forma a
violência : Com cfte fundamento le-
vanta gritos a demafiá , qua ndo in-
tenta ^uftificar a queixa ^ para que
embaraçada a efpeculaçaó, d o artifo
cio? não pofla examinar a realidade das couzas.Gran de foy o:
brado,' que deu por toda Europa a folevaçáo dos moradores
de Pernambuco, facudindo de feus hombros opezadiffimo
jugo do império Belgico. Muyto mayor o eftrondo com que
aquellesEftados pretenderão certificar aos Principes Catho-*
licos,que a rebeldia ,& a trayçaõ os tinhadefapoííados do
jiifto dominio. Deufe credito à voz da queixa, aonde íe:
ignorava a cauza. Naó aííi nas partes , em que íe praticavaõ
©s verdadeiros motivos: E fupofto,que as acções juftificadas ^eixafe oUn'
íàó o melhor teftemunho de fimefmas, queremos manifeftar/^^ ^^ /ír«!fy c
a verdadeira rezaó do faâ:o , para que fe confunda a duvida, ■^'''^^^ '
aonde naõ chegarão as noticias da certeza . Naõ fe pôde ne-
gar, que a natureza a todos comua, foy primeiro authora da ,-\.
liberdade, do que a violência o foíTe da fogeiçaõ: Sobre efte
fundamento hâ de aífentar a máxima de noíTo argumento,&
delle fe colligiràò (affi pello que temos referido , como pello.
que nefte quarto Livro avemos de efcrever ) os meyos, por
©nde Olanda adquirio,& perdeo o império daquella porção
da America, que dominou ;& a juftificada rezaó com que-
Joaõ Fernandes Vieira . [ Nefta hiftoria intitulado CaUrioto
Lufítano i a quem a Pátria, & fama de vem fua mayor gloria ^
'-:.'■... ^ " P3 " íe

I|fc ■■ I tm»

i 7 2 c^sr(!{joro lusitj^o

fe opôs ao intrufo doríiinio da tirania,& fabeirá o Fey tòr a cau-
2a, que tivemos em referir tantos fucçeíTos , em que ao pare-
cer naó teve parte efte éfclarecido varaó , íendo que na ver-
dade foraõ o todo para fe refol ver a glor^ofa eiBprefa5quc in-
tentou j& confeguio.

2 A fentença,&: a herança juílifícão as poíTes. A mjufta,
nenhum direito adquire.Ao intrufo poderá fuftentar a vio-
iKJu/a pojfe do lencia,porèm naó a juftiç^. O Oládès naó teve nunca direito
Glandes, hçreditario às terras do Brazil, Todo o Mundo fabe^que fem

embargo algum, Portugal as defcubrio, Portugal as conquif-
toUjPortugal as converteo, Portugal aspoírayo5& q a Igreja
lhe legitimou o titulo delias, & por coníeguinte, a Religião^
a cultura,& o çomercio.Supofto, que hà direito,que chamaõ
direito, de armas. Falta efte fe fenaó funda na revendicaçaõ,
ou do roubo, ou da injuria, quando entre os Príncipes não
deixa o poder outro meyo mais, que a força . Occupar a ter-
ra alhea fem doaçaó , ou confentimento do jufto poíTuidor,
força fe chama no direito civil.Reftaurarfe nella feu legitima
fenhor,por efte,ou por aquelle meyo,ainda que feja por vio-
lência, he defagravo , naó he injuftiça ; he cobrança , naó he
roubo. Diganos o Olandès, que injuria, ou que força lhe fes
o Reyno de Portugal ? Selhefervio de pretexto odominio
intrufo dos Reys de Caftella, naó fes mais, que refreícarnos a
memoria da exorbitante rebeldia, com que lhe uíurpouos
Eftados, que por direito hereditário lhe deu a natureza, a
poíTe^Sí o uzo.Aquella cópanhia de mercadores, a que a Iro-
nia chamou illuftre, pòdefe-lhe conceder o comercio, mas
naó o latrocinio pell as leys da natureza,& abominado, ainda
ne^oêsqueoprõ- entre as mais barbaras nações do Mundo . Oppoftos faóos
'vãfi. exercicios de comutar generos,& de conquiftar terras ; & do

oppofto não fe tira confequencia.Julgue agora o direito das
gentes, fe a ufurpaçaó dos Eftados do Brazil pello Olandès,
intentado por hiia companhia de Mercantes,confeguido por
hua Armada de Piratas, reteíido , por húa força defcuberta,
como, ou quando lhe podia legitimar o titulo, paraaoccu-*
paçaó,& retenção delles .^ E fe a paixão ainda perturba algu
juizo, V eja nefte Livro o tirano uzo da poííb , & conhecerá,
que dos gritos da culpa, fe formou o brado da queixa.

3 Avcr-

!PJ^ELLiy(!{plP'/ 173

3 Avertiremos,& daremos a rezãojporque guardamos,
para argumento deite quarto Livro o cruel , & infoportavel

•^ eftilo do Framengo no uzo, do que com violência , & fraude
ConquiftounoBrazilj&nasmaiscoftas do cetro Portu^ucz.
Por alguns andáo relatados os exceíTos defta gente ^ difiTufos^
8c não encarecidos, porém taes, que mais puxão pcllo credi-
to,que pella laftima. Confuza, & dilatadamente os eícreve o
pezar de aver padecido, cõfundindo a hiftoria,com a magoa^ Referidas nefie
por não apartarem a dor, da queixa. Nós com diftinta pena í^'^^^'' Livro.
os avemos de referir, fem faltar ao concifo, nem ao verdadei-
ro, livrando aliiftoria das entrecadencias , quelhecortãoo
fioj& recopilando os exemplos, de forte, que nem a calami-
dade fe ignore, nem o tormento fe dilate. O edifício da hif-
toria não recebe forma de materiaes diígregados , fenáo de
pedras unidasj cortarlhe o fio, he defíruirlhe a forma : O das
guerras he , o argumento, que feguimos: O das queixas he, o
que iiefte quarto Livro efcreVemos, particularifendo os mo-
tivos, que a cilas deu o Olandés oppoílo à Religião , à Jufti-
^a, á Verdade , & a todas as mais virtudes j em que fe firmão
os impérios»

4 He a Religião aquelie íagrado,de que fe vala coníèr*
vação do refpey to : Cõ a venerar o Príncipe aíTegura a obe-
diencia,&fogeiçaõ dos povos :][ndomitos os folicita odef-
prezo dos Templos, dos Ritos, & da obfervancia delles : Ve-
nerar, ( ou feja com animo, ou com arteficio ) fua religioíà
obfervancia ffeja, ou naó feja verdadeiro, ou luperíliciofo ó
culto J he arte para ter os homens fogeitos . Sofrem os homés

as injurias feitas aos homens , com que vivem \ naó fofrem os AReligãúfuJle^
defprezos feitos a Deos, de quem dependem:&: a rezaó hc, q ^'^ ^^ m^erm,
aquelle domínio, que lhe tira a liberdade, a fazenda , & a vi-
da naó lhe pode tirar a cíperançaj porém o que lhe quer pro-
hibir o uzo de lua Religião, também lhe corta a eíperança, q
os fuftenta obedientes ; & a defconfiança os leva à rebelião.
Innumeraveis faó os exemplos, que trazem os annaes do Mu-
do; entre todos faó os de caza,os que melhor nos enfinaó.Em
Efpanha fe confervou o império dos Godos , porque fendo
Herejes Arrianos foraõ tão politicos , que nunca prohibiraó
aos Catholicos , feus Gonciliosj fcus Templosj& feus Ritos,

F3 Não ,

iim

174 CAST<^10r0 LUSITAKO

Não aíC no Brazil os Olandefes , Herejes Luteranos , & Cal-
viniftas, que barbaramente foberbos quizeraõ de hum golpe
cortâri& deftruir o Sagrado^ & o profano , & dar leys ao hu-.
mâno,& Divino, fem pezarem a fiel conftancia, com que a
Nação Portugueza faz ventagem atodas as do Mundo na
obfervancia da Religião Catholica Romana,& na obedidien-
cia a feus legitimos Principesj& que por húa, & outra couza,
naó fabem reparar em perder a fazenda , & a vida . Elpecifi-?
' quemos os cazos, para que falem os fucçeíTos.

5 Entrou o Framengo na Villa de 01inda,permítio aos
feus o facOj& extroçaõ com toda a demaíia de viíioriofos j&
ô abortecimento á Religião Catholica Romana lhes aplau-

^re T ^^ ^t doo í^io OS horrendos defaCâtos ^ com que profanarão o Sagrado
Imar ^ & occa- ^^^ Templos, & das Sandas Imagens j taó infolentes , que a-
íííão. Compànhada a exorbitância do defprezo fiíeraõ empeaaços,

(& pifarão aos pès tudo, o que fervia, & repreíentava o Divi-
no culto. Aquelles vazos,& paramentos, que a fé tinha dedi^.
cado à catholica veneração,defpois de ferem matéria ao rou*
bo, o foraó à irrizão. Com o meínio exceíTo , & efcandalo íe
ouve na Villa de Cunhau, que ganhou por entreprefa,deixã-
do aos moradores , tanto quefentir nos defacatos feytos a
JDéos, & a feus Santos,que lhes faltarão lagrimas para chorar
ás in;urias,& as perdas temporaes. Não de outra forte fe ou-ç
veraó o anno de feifcentos & trinta & quatro, quando encar*
regàrâó aos Gentios Pytiguares, & Tapuyas a execução da^
cruezas, por tomarem à fua conta a dos facrilegios . Osmeí«
mos infultos v irão('não com olhos enxutos Jos moradores da
Paraiba: Aqui foy a dor mais intenía, porque aqui foy ode-
facato mais horrivel. Era hum Domingo oy to de Outubro,
dia, que a devaçaõ dedicava: áfolemnidade doRozario. A.
concurrencia era de todGSj& não ifentou o golpe a nenhum,
porque o repentino afíalto, não deu lugar â defenfa , nem à
V ingança,fazendo-a defejada a cegueira, com que os Herejes
converterão em defprezo do culto, o pompofo da fefta.

6 Na occazião, em que o Conde de Banhollo, fugindo
de fua meíina fombra, deixou nas garras do inimigo a Forta-
leza, & povoação do Porto do Calvo,ficàraõos vezinhosfo-
geitos a todoo rigor das armas, & da tirania heretica.Faltara-

Ihes

^J^TE 1. LIF^O ir. 175

lhes o fofnmento,& a paciência para o efcandalo, com que o
inimigo profanou o Sagrado,& o honorifico le lhes não ani-
mara a tolerância o P. M. Frey Manoel do Salvador Religio- J2vadoT7e oL
fo da ordem de Saó Paulo, a quem efte Rey no, & aquelle Ef- ^^^^ ^^ defpre^
tado devem os perigos, a q muy tas vezes ; & em muy tas par- herético.
tes, fe expôs pello íetviço de Deos,& da republica. ( a Divi-
na Providencia, parece, o levou âquelles lugares para efteâ
fins j nelle fala efta hiftoria obrigada, do que obrou,& do que
efcreveo) Nefta occazião lhes fervio de efcudo contra o fu-
ror,& demafia Olandefa, que reprimio com tal induftria , &
inteirefa de coração,(deípois de fer recebido com afáveis de-
monftraçoés) que o Framengo com politico arteficio lhe có-
cedeo todas as liberdades , & favores, que pedio para os na-
turaes (melhor prometidos,que obfervados.)Fiz efta digref-
faõ, para que fe veja,que o mayor empenho da conveniência
não baftou a refrear,por breve tempo, o grande aborrecimé-
to, que o inimigo moftrava à Religião Catholica Romana.
Convidou a comer alguns moradores com o dito Padre, Sc
para os brindar mandou vir hum Êalix Sagrado, porque be-
beo. Sacrilégio, & deíprezo , que não pode tolerar a paciên-
cia Catholica,ainda nà mais vil fortuna,&: aífi o reprehen deo
afperamente, o fobredito Padre; o que oHereje disfarçou
cubrindo o deliâ:o com a ignorancia^porém não pode efcon-
der, que guardava a forma na matéria, para fatisfazer primei-
ro ao odio,que a cobiça.

7 PaíTou a diabólica fede a bufcar meyos , com que de
todo fepultaíTe os fieis exercicios da Religião . O primeiro q
executou foy afear a pureza dos Templos: Ordenou-, que fer- Prohibe o Hereje
viíTem a fujas,&torpes occupaçoês, para que o afquerofo do ° exercido do$
lugar communicaíTe aborrecimento à ley. Dentro da Cidade ^^'^^^1^^^^°^^
Mauriçea3& Arrecife prohibio o uzo dos Sacramentos com
pena capital, a quem v iolaííè tão exacravel decreto : Eften-
deofe a prohibição por todo o recôncavo, não porque o bã-
do o comprehendeUe, fenão porque a infolencia o executa-
va, paíTando a obfervancia do vedado os termos do prohibi-
do;& foy tãta a demaíia dos Herejes,que opprimidos os mo-
radores da exacçâo abrirão covas debaxo da terra, para efcó-
derem à malignidade, os exercícios da v irtude. Merece pon-
i, . P4 deração

IIH

16! f

ir

176 C^ST^ÍOTO LUSITJKO

deração a infernal cegueira deftcs precitos. Na Cidade Mau-
^ riçea, Sc no Arrecife permitiaó fy nagogas^em que os Judeos
com publicidade exercitavão feus condenados ritos j & não
fofrião o uzo da Religião Catholica Romana, nem ainda nos
mais fecretos retiros. Ciúme com que a gritos fe condena íèu
erro. Foy a ley efcrita fombra jluz he á da graça,& para olhos
Permíè oâo^ff debilitados he a luz offenfa, & a fombra lifonja: Não fe teme
nagogoi, da fombra, quem aborrece a luz . Os erros heréticos aborrece

a luz, que os manifefta^ não fe ofifcndem da fombra,que os ef-
conde.Foge a efcuridade da noite, da claridade do dia, & não
ferve a oppoííção da fombra de outra couza mais , que de re-
petir os triumphos da luz . As perfeguiçoés da Igreja illuf-
traó,&não efcurecem aquella conftancia, com que perma-
nece vi£i:oriofa; Muyto afcu pezar o experimentou fempre
a herezia.

8 Tiradas aquellas pedras, que fuftentão o edifício fe
arruina toda a fabrica.Colunas da Religião faô os Miniílros
delia; rezão porque os Sacerdotes forão fempre as meninas
dos olhos da Republica: Entre as íupreftiçoés mais barbaras
os refpeytou a veneração ( ainda, quando a fé dos Príncipes
difcordava na crença ) porque unem os ânimos em hum mef-
mo culto.Có efte fim fe vaíião de ília protecção os dominã-
tes,que defejavão fomentar a obediência dos Vaírallos,fobre
que aíTenta a duração dos Cetros . Naó fey como Olanda (a-
creditada na Europa de politica ) perdeo de vifta efta maxi-
TrAtâ de coní ' "^^ ^^^^ partes da America? Empenhada em deftruir a verda-
mir o Eftado clc ^Ç^^*^ ^^ ^^^ ^"^ perfeguir os Sacerdotes,& Religiofos , infu-
í'/í;á;/,c^ií^//gií>. recida contra oajuíladodas vidas, & muyto mais contra as
í"' virtudes; que condenavão íeus vicios,certo , de que fe eftes

fechos faltaífem a conftancia dos moradores cahiria por terra
o mais finne de fua fé: A huns defterrou, a outros prendeo, a
mu V tos dcftruio, não fendo poucos , os que acabou com fal-
fas culpas, &afrontofas mortes . Adous Religiofos de certa
Religião condenarão à forca , porque juntamente padecef-
fem o eftado, & as peíToas. Na volta,que fes da Bahia o Con-
de de NaíTau caftigado, & corrido ( como deixamos relata-
do,) tomou os Religiofos por objeéio da vingança , que naõ
pode executar nos foldados ; Mandou deitar bando, que to-
dos

dos dentro de hum mez deípejaffcm a terra coni péna^de qiie
a deíobediencia fe feguiria a morte , ordenando a todos que
íe paííaíem à Ilha de Itamaracá, (logo diremos com que intê-
to j & porque os Rehgiofos do Patriarcha Sáo Bento fenaõ
ifentaflem, porMon;es, do numero dos Frades, efcrevea
particularmente, & por fua mão ao feu Prelado difendo-lhe
(com íimulada perfídia) que íe retiraíTe com feus fubditos á
itieíiiia Ilha, aonde com os mais Religiofos viviriáo livres do
eílrondo das armas, defafocegos do comercio , & atrevimen-
to dos Toldados. Defpois de entrados na Ilha os mandou pré-
der a todos (defpojados de feus hábitos, & de todo defpií'os,
pára que a hum meímo tempo os atromentaíTe o pejo,& a fal-
tai) Foy fama, que a determinação do Hereje era páííàllos a
eípada fem deixar a algum com vida. Devia parecer á fua
crueldade breve o martirio,& para que fedilataíTe comotê-
po os mandou embarcar,& deitar em vários defertos das ín-
dias de Caftella, íius, feridos,& feparados; o que ti verão por
melhor forte: Que he menos fenfivelfervir depafto ás feras,
que de çafra aos tiranos.

:^^ Pouco fabe, quem não eíluda nos fucçeíTos alheos;&
muy to menos,quem naõ acha lição nos proprios.Nos annaes
de Olanda podèra lèr o Framengo o muy to có que [ nas ma-
tierias de fè] fe corrobora a reíiftencia com a oppozição . Pa-
receo-lhe (pouco advertido ) que jà feus Predicantes não ti-
nhão, quem lhes defendeííe a torpe doutrina de fuás feytas;
& nafalta de Sacerdotes achou foldados, que na mais adver-
íà fortuna o confundirão, como logo efpecifiquaremos. Naõ ;j^|^^ py}^aras
ouve morador naquelle infelice eftado,em que todos fe víaõ, ceiíaí heréticas.
que quizefe ouvir a herética doutrina: G mais abatido , lan-
çava de fi com defprezo ao Predicante mais authorizado:Pu-
xou muytas vezes o vexame pello furor, que o inimigo naõ
poucas temeo^& fingio atrivimento, o que era permiííàõ , &
como fe via complice no crime, eftranhava a culpa , mas naõ
prohibia o deliéèoj antes o efcuzava com o zelo de feus Mi-
niftros. Atribuia o valor dos fieis a alheo impulfo, tendo para
íi, que ainda influiaó em feUs efpiritos o poder de Miniftros
fuperiores, por meyo de algús Sacerdotes, ou disfarçados,ou
efcondidosj Separa de todo lhes tirar o re^ey to com a jurif-
^'- ' dição

,i

178 ÇJSTf^lOTõWSlTJKO

dição prohibio a todos os moradores de qualquer calidade,
que foíTem, que não podeíFem recorrer, nem ao Bifpo da Ba-
liia5nem ao Coleytor de Portugal nem a Cúria de Roma , íè-
náo por v ia de Olandajcon fiado, em que o defvio , & a dila-
ção reduziria a cinzas a viveza daquellas braías . Golpe foy
efte, que penetrou o mais intimo da alma, àquelles fieis j po-
rem nio pode ferir a conftancia de fua fidelidade . Com re-
Záo fe pode gloriar aquella parteda America , de que fervio
^rohihe o recur^ a Iprreia com fé tâo viva, quefe apurava no mayor fogo dí^i
J ^"^ j'r períeguiçaojpois nem a licença,nem o viciOjnem o rerrojnemr
a conveniência os pode defviarde fua firmeza., ; ..

10 A trez mancebos foldados,&Portuguezcs conde- ;
nou o Olandès â morte de forca, por leve cauza : Foraõ-lhçs ;
intimar a fentcnça á prifaÕ, & com os miniftros entrou hum^
Predicante, parecendo41ie , que a profifTaó de foldados , o a-i.
mor da vida,& o medo da morte ós ajudaria a preverter.NeP-
tes vazos lhe quiz dar a beber a infernal doutrina de Lutero^,
^ de Câlvinoj ao que hum fe adiantou aos mais , & refpon-»-
deo: (direi as palavras,que moftraó bem a inteir€za,& defenf>
fadado animo de todos. )Vafe:dahyMiniftro infernal Pre-
dicante de Borrachos; em fey tas de bêbados poderá aver,qué;
VefconheciaoFra ^efiia vida beba , mas não quem para a outra viva: Viva a Fé
^^T^^^ ^^^^^"^ Caiholica Romana, que profeíramos,& em que morremosiSc
^^' ' kve o Diabo tanto Hereje,comfeuLutero,&Calvino. Dei-

xou afiei conftancia affi cortados, ^ corridos a todos os cir-
euniliantesjque furiofos appelláraõ do defprezo , paraavin^,
. gança, tirando a vida aos trez fieis Mancebos com vários tor-»

mcntos;& padeceíido-os mayores, os Herc;es na firmeza, c5
que atè o ultimo alento os ouvirão pregar a ley Evangélica,
^ eomo a enfina a Igreja Romana;& piedofamête fe pôde crer,,
que fuás Almas fubiriaõ ao ceo por veredas tão certas: Sofri-
dos os achou o tormento, impacientes a perfuaçaò , porque
cfta lhes defyiava a viâ:oria, aquella tecialhe a diadema.Naó
accumulo exemplosr em prova do argumento , porque bafta
faberfe, que em tanta continuação de annos , & diligencias
,^ não ouve naquellas partes fiel, que tiveíTe comunicação com
J\ mulher Hereje, nem por matrimonio, nem por lacivia , abo-
minando o err0j& as peíToas, que o profeííavaó, ■:,
I II Forma

1 1 Forma das v irtudes he a juftiça : Sy mbolifada a v e-
mos na balança, porque pecca na defigualdade: Aqnella par-
te que deçe o pezo, faz com que fubá a falta , O pezo das in-
^uftiças a hum mefmo tempo deu por terra com o domínio
Olandésj Sc folevou a obediência dos moradores , & os indu- ^^r^^f^"^ °
2Ío ao levantamento, com que íahiráo. A nenhúa peíToa da-- ^^ mfHçít,
y a aquelle governo , o que era feu : Com o braço da juftiça
íè roubava o alheo. Igualmente fe pagava a innocencia , & a
eulpa, efta porque o dinheiro a remia , aquella porque a co-*
bica a cõdenava.Em todos os Tribunaes prezidia a ambição,
em nenhum o juizo: Todos erão da moeda,porque efta era, a
que corria em todos. Não avia outra ley para condenar , mais
que o dezejo de adquirir . Nos afligidos moradores era culpa
© ter,& irremiííivel o pagar;& não acaba vão de pagar, fenão
quando deixavão de ter.Não avia Miniftro,que fe govcrnaf-^
fe pellasleys do derey to , todos fí, pello torcido da tençâoj
Não tinha melhor pleito em íeu juizo a obediência, que a re-
beldía.Pezavafe em igual balança a queixa do oíTendido, & a
culpa do agreíTor. Quando parecia,que não era poííivelfer o
governo mais injufto, o foube fazer o Framengo , creando
novos Miniftros da injuftiça. Bem pode dizer Olanda , que

nas partes da America foy a perdição de feu eftadojtoda em-
prefa de feu eftudo.

- 12 Formára5 hum concelho , que chama vão íupremo,
ao qual fubião as cauzas porappelIação,& agravo . Outro q coçelhos, Trihu»
íe dizia politico , conhecia das cauzas crimes . O terceiro ti- naes c^ue formou.
nha por officio julgar as cauzas eiveis , compofto em forma
de Camará; os Miniftros defte,que chamavão Efcabinos,eraó
féis Olandefes,& quatro PortuguezesjaíTegurando no excef-
fo dos votos o abfoluto das refoluçoês. Em todos eftes Tri-
bunaes fenão admitia petição , que não fofle em lingoa Fra-
menga, para que o Efcrivão, & o interprete foíTem Olande-
fes , & fe pagaíTe não fó com exceíTo , fenão também em do^
bro. Para aprefentada,& recebida de hum , & outro avião os
letigantes de offerecer meya pataca , & a efte principio cor-
refpondião os meyos,&: os fins, fubindo de forte as cuftas , q
para hum acredor arrecadar vinte , gaftava quarenta; & fe o procedimento de
Reo dava féis de pey ta , o abfolvião do mais 3 obrigando diofem officiaes.

Author

f

i

Author a pagar as cuftas , & a perder a divida . Seós quatro
juizes Portuguezes votaváo ajuftados, por menos , fica vão
V encidos j& nas fentenças importava pouco, que affinaffem,
ou náo os juizes Portuguezcs. Fora deftes Tribunaes , cujos
officiaes eráo fem numeroicreàraó dous Miniftros hum,a que
chamavão Eícoleto, outro Fifcal , que erão como executores
das prematicas,& bandos, que íahião dos concelhos, com jn-
1'isdiçáo plenaria,para condenarem a feu arbitrio,rem appel-
lação,nem agravo j com pacto, de que ametade das condena-
ções feria para os confelheiros,& outra ametade para os ditos
Miniftros^& aífi eraõ as condenações remcauza , fem termo,
&íemdiftinça5. r,

13 Vejamos agora a ;uftiça dos Miniftros delia: Se al->
gum queria ferir, ou furtar concerta vafe primeiro combum-
officialdejuftiça,&pago deante-maõ o delido , o cometia.

* com feguro5& fe o delinquente concertava , que avia de fur-

tar dez, & furtava v inte , o exeeutavão por outro tanto di-
liheiro,quanto no roubo excedeo ao concerto . Da meíma
maneira, fe o que avia cõcertado d*ir bua cutilada,dava duas,
pagava o exceíTo j & não de outra forte , fe por menos fe fal-
tava ao prometido, fe pagava a falta 3 & fe acazo o roubado,
Cobiça de 7^^ ou ferido querelava, oarguiaõ por viola dor das leys,& co-
Miíujtros. j^^Q ^.^j ^ condenava© à prifaõ, donde não fahia fem primeiro
pagar eó exceíTo a injuria,& a injuftiça, que padecia.Sahiaõ,
o Efcoleto,& o Fifcal,pello reconcavo,quando o intereílè os
chamava (que o zelo nunca os movia ) a devaçar dos concu*
binários^ que condenaváo em fubida contia de dinheiro,exa-
â:amente cobrado; & para que o caftigo não ferviííè a emen-
da lhe vendião o confentimento pello preço , em que fe con*
certavão,convidando-os aííi a perfevef ar no mào eftado . Dé
húa mefma forte proceíTavaó a culpa pella foípeyta , & pellá
póíribilida.de; pagava o mancebo , fò porque podia peccarj

5 pagava o velho,porque em fua mocidade peccou, & a nenhii
livrava a malícia de culpado,porque igualmente pagavão os
triftes moradores, o faâ:o,& o poíTivel.

1 4 De nenhúa outra gente fe vio a juftiça mais afronta-
• da. Pronunciavão, pello diítamé de fua malicia, as mulheres

VefxforadQèJiilo cazadas, em que vivia majs clara a honcílidade , & com mais
de todos. \ adver-

j^

advertência o recatoiCom fingido refpey to bufcava hum de-
ftes Miniílros fua caza, quando delia faltava o marido, & lhe
moftrava na devaíTa provado o dehâio com teftemunhas fo- ' •
poftas; vendia-lhes o zelo de feu credito, para que não pere-
ceíTe fua fama. As innocentes Matronas defmayadas, & aflic-
tas de verem pofta Tua opinião em mãos tão infames,compra-

V ão a reputação a pez o de ouro , fem reparar no cuílo , com
tanto, que fe confervaíTe o credito, & fenão divulgaíTe a em-
poftura,ficando fua honra expofta â cortezia dos tiranos.Por
éftes meíínos fios paífava a maldade a roubar , & a deílruir o
eílado facerdotal: Aos Clérigos de melhor reputação , & de
mais annos (para que lhes cuííaíTe mais o reparo da opinião)
enveftiáo com a mefma eítocada: Eraõ reformados,& a todo
o preço compravão fua eílín^açaó . Qiiero referir hum cazo^

Sc nelle fe veraõ eftampados todos . Tinha mandado o feu ^ ^ , ^

concelho fupremo,que cada hum dos vezinhos plantaíTe em ^^^^f ^ ^^ ^^

fua fazenda,quando menos, mil covas de Mandioca,(ordina-

rio fuftento daquellas partes) vicraõ os executores do bando

á porta de hum pobre morador , que não tinha mais familia,

que hum fò negro,&: por elle avia mãdado barrer o caminho^

& o terreyro da caza, por tirar tudo , o q podeíTe fer tropeço

à malicia daquelles Miniílros : Chegarão , recebeos o pobre

homem com a boca chey a de rifo, & lhes diíTe: V. mercês naõ

tem em que pegar , porque tenho plantado não fò as mil co-

V as,a q me obriga a prematica,fenão de mais amais,quinhen-
tas. Aqui levantarão oslnfernaes Miniftrosas vozes : Tray-
d or,Traydor,feja logo prefo por v iolador dos fupremos de-
cretos, excedendo o numero da prematica : Vio-fe o mifera-
vel pafmado com a eftranheza da malignidade , & por remir
fua vexação, & liberdade pagou dez mil reis^ flirto,a que de-
raõ nome de pena.

1 5 Eíle era o eftillo daquelles Miniílros , eíle o eftadó
daquella juftiçaj nella fe funda a duraça5 dos impérios , fem
cila fe trabalha na ruina dos Eítados . Não com menos preíTa ^^ ^ ^^^^^«^^ ^
corriaõ os Framengos à fua perdição pella vereda da perfi- j^^ ^^ ref^a^
dia, faltando deícaradamente â verdade, fem que nelles íe a- blicas.
chaíle palavra certa , nem contrato feguro . He a verdade a-
^uella amarrajq fuílenta firme a náo do império^ ainda quan-

Q. do

#

Bè a 'Verdade a

dade.

iSa CÃsr(!{ioro Lusirjno

do enveftida dás mais encreípadas ondas , & furioías adveríi-
dades: Aquelle nervofo vinculojqtie ata o império com a fer-
vidáo, & os naturaes com os cílranhos: Aquelle cabedal
inexauílo, que nem com o uzo fe gafta, nem com as callami-
dades fe deminiie: Aquelle preciofo Thezouro fobre o qual
fe fia a vida5a fazenda5& a hora: Aquella rica joya, que igual- Froverh.
mente orna os peytos dos Principes,& dos Magiflrados : Re- ^^•
gra he da politica divina^ máxima foy dos impérios mais ref- ^°^' ^ '
peytados: Odos Thebanos fubio mais com a verdade , que
com o valor. Dos Olandefes íepóde affirmar^que trabalhou
mais em ília ruina fua perfídia, que noíTo poder.

1 6 Capitularão tregoas com o Marquez de Monte- Al-
vão Dom Jorge MaícarenhasVízo-Rey do Eftado, & debai-
xo defte feguro lograrão hum5&muytos enganos. AíTentou
Oí olãdefes fem defpois O Senhor Rey Dom Joaó o Quarto de Portugal pa-
'Í/^t' ^^^' ^^^ ^^"^ °^ Eftados de Olanda,por meyo de íèu Embaixador
Triftão de Mendoça:0 reciproco confentimcnto de hua, Sc
outra gente as confirmou entre o Arrecife ,& a Bahia, para q
noíTa confiança, aílèntada fobre a fé das gentes , ajudaííe fua
cavilloza fimulaçáo igualmente repetida,& abominada.Dor-<
miáo os Portuguezes fobre a fiança das pazes j vigiava o Fra-
mengo como avia de violar efte feguro das gentes. Armou
quatro nãos no Arrecife com muniçoés,& foldados íiifíicien-
tes, para o intento: Sahirão delle , entrarão no porto de Ser-
gipe de ElRey, có certefa ãç ^ noíTa fegurãça não acudiria à
defenfa. Ganhou por enterpreía a Cidade de S. Chriftovão,
&: no porto fabricou hua grande Fortaleza . Víaó os morado-
res a in vazão , & como alheos da maldade , não acabavão de
crer, o que viaó, experimentando contrários, aos que rece-
bião amigos . Com femelhante mafcara foraõ conquiftar o
Rey no de Angolia, de que fe fizeraõ fenhores , aley voíbs , &
fementidos: Com mortal ódio faquearão , & deftruiraó, fem
que deíTc lugar à reíiílencia o pafmo, com que os moradores
olhavaõ o deftroço,increduÍos ainda de tão falfificado trato.
Com bandeiras de paZj&falvas de amigos entrarão com féis
nàos de guerra na cofta do Maranhão chegarão á barra,pcdi-
rão licença para entrarem, com pretexto de fe proverem de
mantimentos, de que fe fingirão faltos.Efcondiafe o fogo da

tray-

Cãz.os em c[ue
Tnoltràrao,

of;

trayção dentro das aparências da amizadcj défcubrio-fe a ca-
ra do engano, quando ;á faltava tempo , & modo para a op-
pozição: Sem ella fe fizerão fenhores da Cidade,& da Forta-
leza, perdendo os moradores a fazenda , &'a liberdade ^ &
miiy tos as honras, & as vidas. Com tão infames artes , comtí
as referidas fe introduzirão na Ilha de São-Tbome5& na For-
taleza de Saõ Jorge da Mina. -- .■* r . "^
- 17 Parareclamo,quechamaíreaolaço,íi2eraôosOlan«
defes com os hoflbs Governadores do Eftado o referido c5-
trato das pazes. (Negado pelíos Eftados da linha, para o Sul,
mas admitido por concordata dos Governadores de hum, &
outro império) Afíento 5 que fizerão divulgar em todas as
partes do Reyno,pâra que enganados do feguro,lhes {o'Sç.m outros em quê ú^
dar nas mãos todas as nàos do comercio Portuguéz. Logrou- de:^ejàrao mofi^
fe a perfidiâ,em quanto a não divulgou a fama:DezOy to nàos f^^^^t
lhe cahirão na mão dentro de hum anno , fendo rara , a que
delia efcapou. Bem pôde affirmar Portugal, que mayor dano
lhe fes Olanda com a perfídia da paz , que com a verdade da
guerraj& acabe de conhecer o Mundo,que as bolças de Olã*
da,mais as encherão as garras do engano , que os deípojos da
conquifta.Efcrevo parte, do que fua falácia obrou^não refi-
ro, o que feu engano defejou obrar. A petição fua, apadri-
jihada com a rezaó das pazes , mandou António Telles da
Sy Iva [no tempo em que efteve íia Bahia]] dous Meftres de
Campo com muy tos foldados, em aigúas embarcações , para
qu e foífem recolher,&fizeírem retirar todos os foldados Por-
tuguezes, que andavaó no recôncavo de Pernambnco,ou fo-
ragidos, ou licenceados, de cu;os aflaltos padcciaõ os habita-
dores indiílintashoftilidades. Tomarão porto emTaman-
darèatempo, que a maldade Olandefa prevenida dosavi-
2os, aíTaltou os navios fobre anchora, [fiados na gratificação
do beneficio]& receberão por hoípedajem, incendios,& por
eorrefpondencia,golpes,& mortes. Muytos Portuguezes ar-
derão, & fe muytos efcapáraó, foy da eípada , porém naõ do
defejoj determinava oFramengo com efi:a trayçaó paíTar a
ferro os terços, que pedirão para auxilio ; & logo as compa-
nhias, que no certaõ lhes deraò motivo à perfidia; para que
falta a Bahia da principal parte do prezi dio, ficaífe fogeita a

Qj? ^^^^

CJST(!{IOTO LVSirJKO

fes aríTias. Ultimamente experimentamos no fementido a-
fiimo defta gente , que .íiia davilláção excedeo os termos da
eredulidade nas obra s,& os do pbflivel , nos dezejos. .

y^ 1 8 Temos referido di verfos cazos em partes di ver-
iís ; agora diremos, como em húá mefma parte , & com húa
mefma gente íe publicarão ínfamemente perjuros , &per-
verfos. Trez v ezes por editaes,& bandos firmados de íeusi
fflagiftradòs tomàraó as armas aosmoradores com juramen-
to, de que afli convinha à fua confervaçaô ;& outras trez
vezes lhas fízerâo comprar com pretexto, de que aííi era
Fajtao àat leys fleceíTario para fua defenfa ; com^ pena de morte âentregaví

rede s^de que poH* ^* ..-'._*-. o '

cos efcaj^ai/Ão.

Com pena demorte o recibo. O fim da entrega era ociu'-.
me da tirania^ o pretexto da venda era a defenfa dos ladroes:
A V erdade .^ Naõ quererem os ladroes, que para roubarem
os moradores ouveíTe modo de defenfa. Gada dia (muytaá:
vezes cada hora ) fe fixa vão editaes, &fedeitavaõ bandosi
encontrados, que com fegUro real prometião,& negavaõ aos
perfegu idos moradores hm. mefma couza, para que junta-
mente peccaíTe o pontual, & o remiífo. Prometiaó em nome
dos Eftados protecção, Sc defenfa às vidas, às honras, & às fa-
zendas dos retirados , para que- deixado o mato , fe vieíTeni
com fuás familías povoar fuás cazas , Sc engenhos ; & tanto,
que os tinhão dentro da rede, trazidos de fua fingela creduli-
' dade, os defpojaváo de tudb : Nâo fingularifo as peíToas, os

}ugares,& occazioés,em que exercitarão taó exacravel perfí-
dia, porque apenas ouve peíToa^ occaziãOj& Iugar,que a não
experimentaffe.

19 De hum fucçeíTo faremos eípelho, emquefere-
prefentem todos . Com grande numero de índios falva-
gens ( mortaes contrários dos Portuguezes ) chegou Jaco-
ca^os f articula- ^^ C^um Olandès, a quem a femelhança dos coftumes fes fu-
resqueomojlrao. perior daquelles bárbaros j nâo feyfepclloexceífojfepel-
lo enfino: ~j á povoação de Gunhaíi, hum fabado de tarde
quinze de Julho (não vinte &nove de Junho, como enga-
nado efcreve certo Author.) Naó foy a vinda, nem o inten-
to efcolha,fenão obediécia.Tinhaó-lhe remetido do Arreci-
fe,os do governo, as ordés,& inftrucçoés de tudo, o que avia
4e obrar,quando, & como. Foraõ avifados os moradores da

mar-

^'■■í-l

màrclia5& do poderj& a experiência oseiiíinoua fofpeytar
mal detudo:Poreraõ-feem cobro. Entrou na povoação o
inimigo com fimiilada paz : Mandou deitar bando , & fixaC
nas portas da Igreja hum edital affinado pellos do conce-
lho íupremo5& jurado pello dito Jacobo, ordenando aos ve-
zinhos do lugar, que debaixo de feguro fe achaíTem na Igre-
ja ao outro dia, que era Domingo, para que defpois da Mif-
faconferiííèm certo negocio, que osfenhores Eftados lhes
mandavaó communicar, deíenganando-os de que a pefíba
algúaíe faria o menor agravo . Obedecerão os moradores,
chamados a hum mefmo tempo do precey to da Igreja , ^ do
ban do do Hereje ; ou porque naõ duvidarão do feguro , ou
porque naó temerão o perigo. A mayor parte entrou para a
Igreja; outra menos confiada fe deixou ficar nas cazas do en-
g^nho.Os que entrarão no Templo encoílâraõ às paredes do
pórtico os bordões, que levavaõ:(armas, que fó lhe permitia
o governo Olandés) Veftío-fe o Sacerdote, pof-fe no altar,
começou a Miíià, & ao tempo, em que chegou a levantar a
Deos fe fizerão os índios fenhorcs da porta do Templo ^ o
que advertido dos moradores conhecerão o erro, & o perigo

a tempo, que fe V alèraô do ultimo remedio,que foy pedirem
ao ceo perdão de feus peccados, taõ faltos de tempo , que fe
encontrava nas gargantas de todos a oração, & a eíjpada, fem
que a dos bárbaros deixaíTe peíTòa com vida.Pella mefma for-
te paífáraõ os que fe recolherão nas cazas do engenho, fenaõ
que irritados do facrilegio,& da períidia,com as mãos,&com
os dentes avançavão ao Gentio ,& bufcando a vingança fe
metiaó pellas armas, aonde juntamente achavão a morte, & a
fatisfação , porque abraçados com os inimigos matavão , Sc

morriaõ.

20 Relatarey, õ que áeíia occaziaõ acho efcritopoE

peíToa authorizada,& fide digna. Não aprovo milagres, mas
refiro eftranhefas , que o parecem. Éra ô Sacerdote,que ceie- sueçeffomtfimo*
brava homem de noventa annos,vara5 devida exemplar, yô q^ne o edifica,^
Temeo,que à crueldade fe feguiíTe o defacato,& virado para
o Gentio lhe diçe na fua lingoa, em que era perito, que todct
a peíroa,que nelle tocaíTe, ou nas imagens , & paramentos do
altar, lhe ficaria tolhida a parte com que o fizeíTe. Temerão

ÇL3 0%

21

86

CylST(ÍlÍOfO LUSITANO

os índios, Tápuyas,& fe retirarão reverentes, outra eípecie
delles, a que chamão Pytiguarés, ou mais aííànhados, ou me-
nos refpey toíbs, com crueldade , & defprefo lhe tirarão a vi-
da. Cazo maravilhoforTodas aquellas partes de feus corpos,
que íervirão ao facrilegio lhes ficarão paímadas , 8c infeníi-
■veis,& todos em breviílimo tempo morrerão deípedaçados
de feus próprios dentesj & para que fenão du vidaffe a cauza
do caftigo permitioDeos,que na dureza das portas da Igreja,
èomo em brandeçera , ficaíTem impreflas as mãos do Sacer-
dote, bufcando com ellas arrimo nos últimos alentos da v i-
da. Verificouíè o prodígio, com íe v er naquella Igreja ('muy-
tos mezes defpois)o íangue dos padecentes tão vivo, & freí^
CO, como íè na meíma hora fora derramado.E bem pode fof-
peytar apicdade, que no liquido daquelle fangue começou
a refvalar a violência daquelle imperio,pois nelle fe confer-
varão vivos os íinaes da fè,& mortos os da perfídia.

Afli aborrecião a verdade , que fazião negocio pu-

blico da mentira, buícando nella o aumento do cabedal, fem
fazerem reparo na opinião da honra . Viaó paíTar por fuás
portas hum morador bem tratado , retiravaó-íe , & dizião as
cíiias mulheres, que o chamaflem a titulo de negocio , ou de
trortezià,& que tanto, q o tiveífem dentro de caza gritaífem,
o que as folicitavão, pegando delles, atè que às v ozes acudiíTe
o marido, & a vezinhança : As teftemunhas , que jà eítavaã
prevenidas, jura vão, & encareciaõ todas a culpa, para levan-
tarem a pena^Sc não livrava o innocente [ quando os achava
mais compadecidos] com menos de cincoenta, feíTenta, cem
dobroési& fe tinha por bem afortunado aquelle , que a todo
o cufto comprava a livrança,fcm prifaô,&: fem proceíTo.Suc-
cedeo efte aleive a hum homem honrado,& de idade chama-
ndo Thomàs Luis; ao P. Belchior Manoel Garrido Vigairo
da Fregueíia de Santo Antonio,& a outros defte lote , porq
não reparava a malicia nas objeçoés da verdade, com tanto,
que pagafle afubido preço o engano. Andava tão valido eí*
te falfificado trato, que jâ não avia morador, que fe atrevef-
Te a entrar em logea, tenda, ou officina, fenão em tempo,que
nella feachaíTemuy to concurfo de gente. Outro cazo nos
moftrarà todo o encarecimento defta matéria. Devião os

Olau-

exA

igera.

fAXTBI. LlJ\Oir. 187

Olandefes aos Judeos,queaííiílião em Pernambuco húa par-
te grande, fenão foy o todo de fua fortuna , porque nelles ar
chàraófempre ajuda, avizos, & confelhos contra osPortu*
guezesj faziáo delles a may or confiança, certos do ódio , que
tinhaó à ley Evangelica,& à pureza com que em Portugal fe
obíerva, a beneficio do vigilante Tribunal da Inquifiçáo,
reípey to, que Tempre os fes confidentes, & gratos aos Here- "
jes, achando nelles prefi:imo5& eíHmação. Chamados pois,&
affiílidos do favor, multiplicarão de maneira em numero, & ^

em cabedal, que não avia negocio de juftiça , nem de fazen- ^._ ^'/^f^'' í^^^
da, que não correfíe por fuás mãos, ficando nellas fempre o
melhor do intereíTei com o que engroíTàraõ de forte, que os
não fofria a enveja,& a Cobiça; & determinou a perfídia Olã-
defa quebrar-lhes o feguro , & os foros , com que lhes permi-
tio a compra de engenhos,curraes,terras,& oíEcios j&: confiíí-
carlhes tudo quanto tinhão adquirido . Achou logo pretex-
tos, urdio trapaças,poíre o negocio em pleito^erão as meímas
partes os juizes,aviaó de íèntenciar como intereíTados na cau-
^a:Naó ti verão os miferaveisjudeos outro remédio mais,que
femirem as fazendas a dinheiro. SucçeíTo, com que juílifica-
«nos o prefente argumento,de quenaõ tinhaó os Framengos,
inaquelle dominioj lealdade, verdade,fé, nem palavra, com a-'
migos,& inimigos, com próprios, & cftranhos, com grandes^
&-pequenos3 em todootempo,femtodaapartej&emtoda'f
matéria. ■ \ ^ ? . ,

Alimentafe a clemência aos peytos dagenerofidade:

11

Naçe a crueldade das entranhas da v ileza: Uzada para doutri-
na tal-vez fera virtude; para a vingança, & para o roubo níb-
ca pode deixar de fer o mais deteftavel vicio; & defcarado, a*-
Onde a malicia faz gala do peccado . Não fabem as feras dif-
Simular a crueza; fabem os homens fingir os afFeâ:os,com que
nacem;porém fomentados do poder,& da indinação correm , , ^^'^^^ ^^^
■demireyo ao prece picio.Criarao-le aos peytos do império, cutavao osolm'
-&da ferocidade Olãdefa tão horriveis deshumanidades(exe- defes.
•cutadas nas partes do Brazil) que as teme a confíderação, ao .
icferilias a pena,&ao divulgallas amodeftia;tanto pello que
^acuzáo a nação, quanto pello que a viyaó o eícandalo , &
mais que tudo pello pouco,que hão de achar de eredulidade.

CL4 Não

i88 C^ST^IOTO LUSlTJm

Não íe haõ de perfuadir facilmente as gentes^que ou veiTe ra-
cionaes, em que coubefíèm femelhantes inclemências. Gs
meyos, de que fe aproveitava o intereíTejSí: o gofto daquella
gente, erão a deftruição, a morte , Sc a injuria , & para que a
crueldade ferviíTe mais aodelevte inventarão novos modos
(de afrontas, Sc exquifitos géneros de tormentos : Condena-
vão a açoutes,excutavafe a pena por taes braços, & com taes
inftrumentos, que naô íe dava golpe, que naõ abriííe ferida.
Sentenceavaó à morte , compriafe a fentença com taes t£-i
carneos,& martyrioSjque fe fazia duvidar,qual primeiro aca-^
bava a vida do padecente, fe o ferro,fe o pejo.Fazia credito a
deshumanidade defahircom eftranhas invedivas de matar,
líovos tormentos Eftendiaó os corpos dos pacientes fobre húas rodas obradas
que inventárM. com tal arteficio, que com o moviméto lhes mohiaõ os oíTosj
& fe a v ida fobeja va ao tormento,! he dava5 fim com húa ma-
ça de ferro , que lhes abatia os pey tos . Aos homens , que ti-
aihaó em opinião de ricos , & naõ apareciaõ com o dinheiro^^
chama vão os Miniílros a fuás cazas , & em cavalletes de páo
os atormenta vaó, ate que feneciaõ , ou entregavaõ. A outros
penduravaõ,& ungiaõ com azeite para que a fogo lento aca-
baíTem as triftes vidas . A muytos imprenfavaõ entre duas ta-
boas repafíadas de agudos prègos,que juntamente os trefpaf-
ííàvaõ,& mohião, & por recreo paílèa^;aò fobre ellas. A naõ
poucos amarra vaó pella cirítura , & revirados os levanta vão
em alto com os pès atados, atraveíTando entre hum, & outra
hum groífo madeiro ,& por entretinimento cavalgavão em
húa, & outra ponta, & fe balançeavaó jfeftejando com gritas,
& rifadas as fentidas vozes,que cauzavaó aos pacientes,as ter-
ribeis dores. Coníiderefe,quanto atraz ficàraó aquelles mon-
ftros da crueldade, de que fazem memoria os annaes do tem-
po;& fe ouve na gentilidade feras mais feras,nem tiranos mais
tiranos.

' 23- . Nos aíTaltos, nas entreprcfas,&: nos facos era mayor
a deshumanidade,porque era de muytos a fereza. A as mulhc:-
res de qualquer eftado , & callidade corta vão as mãos , rom-
piaó as orelhas , & feriaõ as gargantas , porque a detença do
tempo os não atrazaíTe no roubo dos anéis, dos pendentes, &
das gargantilhas, C fervindo aomartyrio osinftromentos do

ador-

adorno ) como fe em fua formação erraíre a natureza, ou em ^ ,

r . i 1 r 1 /v • • 1 r -r^ V • Of^odo com que

lua capacidade laltaíie a noticia dolexo. Ordinariamente^- r^^ cmelda-

fucçedia [porque fobejaíTem mãos a crueldade lie varem era desfeexcedtão.
fua companhia os índios fal vagens Tapuyas', & PytiguareSj.
conhecidos pello nome de Cabocolos (indómitos partos da-
quellas matas agreftes, enfinados a feras, dacria^aõ , & com-
panhia delias para que íua crueza excedeffe, aonde a dos
Olandefes não chegafíe Qde cu;as garras não podia fogxr,nemí
õ retiro, nem o recato, porque pello faro os defcobriao, 8ç
matavão, ( não lhes faltou a natureza com efta propriedade
de caés) tão temidos eraõ eftes falvagens,dos moradores^que
os não eípantaVa menos, húa companhia de Cabocolos, que
húa manada de Tygresj& com muy ta cauza, porque faziãcs
defenfado de executar o mais horriveLEfgaçavão as crianças
vivasj&comasmãosasfaziaõ em duas partes , A outras ef-
trelavão nas pedras, & nos troncos , ou de tiro , ou de golpe
çompetindofe na execução a deikeza, & a força. Oscorpos
adultos abrião, ou pellos pey tos, ou pellas coftas,& lhes tira-
vão o coração,& os fígados, que à vifta de todos comiáo j &
com o humano Tangue fatisfazião a íède." Ferocidade que via
o horror com os olhos do pafmo.

24 Forão tantos,& tão parecidos os cazos ^ que para os
cfpecificar falta a efcolha,& confunde a femelliança,mas fera
força, que algum firva de original a tanta copia. Na occazião ;
cm que Dom António Phelipe Camarão fe retirou de Go- - , .

yana com os moradores , que o quizerao leguir [ que roy no ^ -^
anno de mil & feifcentos & trinta & feis"]deu fobreos quefi-
eàraõ hum diabólico v erdugo chamado Hypoem,Governa-
dor, que era da Paraiba,com hua numerofa partida de Cabo-
colos, em os quaes executou tão inauditas crueldades , que
parece as dcfconhecia a meíma atrocidade. Sucçedeo que de
húa caza,aonde o mortal eftrago deixava defpedaçadas vinte
& trezpeíToas, pode fugir hua mulher cazada para fe efcon-
der no mato, com duas crianças, húa depey to,outra de pou-
ca mais idade jandados alguns paíTos fe deteve [defmayada da
própria fragilidade, & do filial eftorvo ] junto a eftrada, fer-
V indolhe o avultado tronco de húa arvore de a encobrir aos
caminhantes. Pouco lhe durou o defcanço: Em breve tempo
' ouvio

■1 ,—

^^1 iHUlHHn

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H . 'IIM^'i

^1' jHH

H

^1

190 C^STailOTO LUSITANO

ouvio hum tropel de Cabocolos, que vinhão no alcaiiçe dós
fug!dos5& foy tal o temor , que lhe ocupou o coração, com ai
lembrança das crueldadeSjque vira, que receofa, de que os fi-r
Ihinhos fe defcubriffem pèlIo.choro,& os alarves lhos comef-í
fem, os afogou com fuás próprias mãos,pellos não ver paíTar
:3a alheas entranhas, eícolhendo a trifte mãy para íi, & para
feus filhos, por melhor íbrtCjhúa morte certa,que húa cruel^
dade imaginada; & embravecida contra íimefina rompeo
pello mato catorze legoas: Chegou à Paraiba,& vivco alguns
annos defpois,abíbrta no efpanto,& na pena,com que a mar^
tyrizava a memoria do golpe,& do medo. íí r;>3 » >

215 Aqnelle natural pudor, com que a próvida natureza*
f efrea nos mortaes as obfcenas torpezas dos brutos , rompeo'
a beftial licença daquelles obortivos monftros. Andava a re-<
Jhommaveísícy ^^^ tãoproftrada à vifta do apetite, que igualmente defpre-
/ i^ iiu^avao. ^^^^ ^ ^^}o^ 8c O efcandalo. Valia-fe a lacivia da força, & do
domínio , & fe executava o delido a pezar da repugnância,
em que achava íeubeftialgofto,novoinfentivo para come-
ter o eft upro, o adultério, o incefto, & todas as mais efpecies
da beftial luxuriaj/ervindoa violencia,de unir em hum me A
mo ãdio a torpeza,& a vingança.Forão tantas,& tão novas as
demafias, com que fe cometia efte vicio , q ue as diíTimula a
pena,porque fenão refrefque o efcandalo.Mas porque fe co-?
nh eça a di verfidade de caminhos, que tomou a fortuna, para
afl i gir os infelices móradores,relataremos alguns cazos parti-
culares, com que fem offender a modeftia, firvão á laftima,&
não ao vicio: Pello eftilo das Fortalezas fe cometiaó as For-
ças, porque fe unia a violência de muytos a efcalar húa Pra-*.
ça.Valiafe o deleyte,da crueldade para acender a lacivia; &
para que fenão apartaíTe o martyrio, da infamia,bufca vão tef-^
timunhas, que viíTem a torpeza,& a força. Atavão os Irmãos,
os Pays, & os Maridos, de modo, q fó lhe ficaíTem os olhos li-
vres, & a elles fatisfazião os beftiaes defejos obrigãdoos a be-í
ber de hum trago, a dor,& a infâmia : He a querefulta defta
cauza tão feníivel, para a circunípecção Portugueza , como
fabe o Mundo, pois nelle fenão acha nação, que mais eftime
a honra,& que menos fofra a mais pequena mancha^caftigan-
do como deliâiOjO menor penfamento,& o mais leve indicio:

E

TJIlTEl.Lir^OlKV 191

E fendo tão de chriílal fua opinia5,quenaõ eíles inimigos a-
char fogeiçaó, &fofrimento em húa gente, que nefta maté-
ria naó fabe dar pafíagem ao menor efcrupiilo, nem defvio a
menor fofpeyta, dando-lhe nos olhos com os agravos . Naó
ufa do difcurfo,quem obra fem rezão. Vivas eftaó as lembra-
Ças das afrontasjâ: efcandalozos gritos dasfreguefias delpo-
juca,& Santo António do Cabo, lugares, aonde a cara defeo-
berta roubava! força as mulheres, fem diftinção de eftado,né
de callidade, facilitando as violências com matarem , defter-
rarem,& prenderem anticipadamentc, aquelles homens , que
ou por obrigação, ou por brio podiaõ defender o rapto , &
caftigar o infulto. Naõ individuamos peíroas,porque naõ en- convidados doe^

fovalhe a menor fombra da injuria nomes,que por outros ca- ^^^flo^é do^A-
. , .,, n r 1 1 íT troctmo dos ma.'

mmhos illuítrou a fama^como também calagios os agreilores, ^^^^^^^

nefta relação,que não merece memoría,quem a bufca nas de-
maGas. Os magiftrados, que pella rezaõ de feu cargo , aviaõ
de atalhar o defaforo, com feu exemplo animavaõ o atrevi-
mento. Viaõ, ou tinhaô noticia de algúa mulher bem pareci-
da, com o defengano de honrada , logo com fingido pretex- ' "
to manda va5 prender as peíToas , que a podiaó guardar , Sc
com defcarada lacivia, lhe entra vaõ ém caza, fem que baftaf-
fem para a defender as lagrimas, & fuípiros , de que fua cafti-
dade fe armava jantes como era de brutos a força,crecia a vi o-
Icnciacomadefenfa, cevandofe^o apetite nos mefmos def-
vios da luxuria:Ouve muytas,que com fuás próprias mãos fc
matàraô,& outras , que às dos agreíTores morrerão , affi por
naó infamar ávida, como também por naó ofFender ofan-
gue. Naó fe ja6i:e Roma de aver dado ao Mundo hua Lucré-
cia, que foube morrer, para a afronta,& naõ para a vingança,
quando Pernambuco as deu fem numero (nefta,&: em outras
occazioés ) que vivas para a vingança, as achou a ylolencia
mortas para as afrontas.

ij Em a viagem do Conde da Torre, quando à vifta de
fua Armada fe )ulgavaó os Olandefes perdidos ; vendofe lo-
go, pella força do tempo, livres, & defabafados, o agradece- Excedido doscõ*^
raó a dita, com fe demafiarem nos infultos. Efcolhèráo entre Ç^^l^os.
fi o homem mais deshumano , q vio o Mundo chamado Joaó
Blar, ao qual deraõ trezentos foldados Olandefes , & dobra-
dos

lASr^oro LUSITJKÕ

dos índios com ordem, que não ouveíTe crueldade , que não
executaííè,& injuria, que não permitiíTe a feus foldados. En-
trou pella freguefia de São Lourenço j tudo cortou o ferro,
tudo confumio o fogo^ aíTaltaváo as Cazas,& defpois de ator-
mentar aos triftes moradores com todo o género de tormen-
tos, mãdavaó violar as eípo2as,as filhas,& as irmãs â vifta dos
parentes, repetindofe a força por Olandefes , & Brafilianos,
para que a hum mefmo tempo atormenta ílem a liú , & outro
íèxo, com a dor, com a magoa, com a morte,& com a injnriaj
com a impoffibilidade da força , Sc com a falta da paciência.
Pella povoação de São Lourenço começou a torpe deshu-
nianidadej não a demenuío a continuação dos mais lugaresj
antes affi crecia, que bebia a brutalidade íèdes na execução,
& lhe fervia de brindes a fartura^

28 Por impoífivel tenho exagerar a infaciavel cobiça
daquellas gentes, porque fobio feu exceíTo fobre todo o en-
carecimento;& verdadeiramente affirmo, que corre por efta
Jnfacmvd cok" j^jiteria conftranfgida a pena,parccendo-me menor inconve-
niente efconder os teftemunhos de noíTa jufl:iça5querefreícar
as memorias de nofla laftima: Mas he força, que veja o Mun-
do nas cauzas daíblevaçâo dos Pernambucanos , exceder o
fafto a toda a imaginação do poííivel. Em todo o tempo,que
durou naquella parte da America , o império , &: o governo
Olandès , não ouve peíToa ^que polTuifTe bens da fortuna, fe-
não à nlercè da tirania . O mefmo era ter, que ter o inimigo
que roubar: A joya, a gala,o mimo em tanto era de feu dono,
em quanto queria o framengo.Não fe contentou com furtar,
fem que o roubo feexecutaíTeporley, & foíTe juntamente
furto do alheo, & prohibiçâo do próprio . Advirtafe com a-
tenção,como nefte particular andou a malicia delgada.Sahio
decretado de feus concelhos fob graves penas , que nenhum
morador podeíTe vender, nê matar, (nem ainda para comer
em fua caza) algum género de rez, fem licença particular, &
fe a occazião o obrigava a pedilla, avia de pagar por cada ca-
beça de carneiro, ou de porco hum cruzado, & de gado vaca
dez toíloés j& que fe feguia defta prematica ? Comprarem os
Ola/ndefes os gados,& rezes em pè por muyto baixo preço,
&deípoisvenderenasaos arrateisj aos mefinos vendedores,

pello

pello preço mais alto , que qiieriaõ.

29 Falta vaõ com as pagas aos foldados , reqneriaõpor
ellas, Selhas coníignavaõ nas fazendas dos moradores , para
cuja arrecadação lhe paíTavão boletos, do que aviaó de rece-
ber j& nâo avia mais remédio, que pagar,naó fò o decretado, , ^
fenaó o appeticido . Naò de outra forte o uzavaó ascompa- ^^^^^ ào qpvçT<
nhias,que íè aquartellavaÓ pello certa6,& fe avião em cobrar no. '
com tal demaíia, que não contentes com ficarem pagos , fur-
ta vão atè fe verem ricos;& muytas vezes cõ mortes , golpes,
& injurias dos moradores, nos quaes a queixa era delido , o
fofrimento deftruiçâo . Entravâo, os que fervião na milicia,
de rancho com outros camaradas,nas tavernas,( hermidas de
fua mayor devaçâo) comiaò a pafto, bebião a gofto, & para
pagarem o cufto, lança vaõ mão do primeiro homem de bem,
que paíla va pella rua, &fe logo não íàtisfaOa, o maltratavaó,
& deípiaõ^ atè que irremiífivelméte pagava. Succedeo a muy-
tos3& ao Padre Belchior Manoel fizerão pagar naõ fò, o que
avião gaftado, fenão também, o que determinava© gaftar^ %c
importou-lhe o lanço de quarenta mil reis para cima: Muy to ^^^^ ^ àexà^on
pouco menos con tia tiràraó da bolça a hum morador honra- ^^ permiJfM.
do por nome Marcos Alveres. Pafíb em íilencio outros , que
fò poderão fervir de embaraço á hiftoria não fendo neceííà-
rios para a juftificação da verdade. Os negros , que fugião a
feusfenhores, fe lhes não reílituiãcií, fede novo osnãocom-
pravãoj como para efte fim os recolhião com boa cara , pou-^
coserão, os que não fugião, dando com efte latrocinio oc-
cazião, a que os triftes moradores foífem efcravos de feus ef-
cravos. Foy tão apertada a oppreífaõ dos amos , nefte parti-
cular, que não tinhaõ mais vida , nem mais fazenda , que a^
quella que o feu cativo queriaj porque,fe comalgúa palavra
o efcandalizavaõ, acuzavaó-nos,de q tinhaõ armas eícõdidas,
& fem mais prova,nê exame eraõ condenados por tray dores.
30 Chegou a tamanho exceífo ouzo deftemodode
roubar, que jà não avia efcravos, que o não abominaíTem.
Porém efta falta, fuprio aquella malicioía cobiça : Compra-
vão os meyos do v icio, & os difpunhaõ para o furto, ou c5
promeíTas, ou com ameaços. A hum Crioulo efcravo de hum cazo qus g èsn^
morador authorizado convidarão com a liberdade, & com o fica,

R inte-

A

194 C^STIÍJOTO LUSITJNO

íntereílè, fe quizeíTe acuzar a feii fcnkor, de que tinha armas
efcondidâs: Para eíle fim metèraõ em hú lugar occulto dous
morquetes,& dnas eípadas , à vifta do negro , porque infor-
mado do ]ugar,& das armas fe animaíTe a dektar o crime, íe-
guro na certeza, com que podia fazer a acuzação . Corrido o
efcravo, de que o fizeííèm complice de tão iiiorme falíidade,
. & author de trayção tão vil , defcubrio a feu fenhor toda a
impoftura : Acudio atribulado ao remédio do eminente perin
go: BufcouliúReligiofo aceito ao Conde de NaíTau , que o
inforaiou docazo. Nãofeelpantou o Conde do infame in-
tento, íènáo da fidelidade do efcravo. Maadou fazer exame^
.1 fahio provado o trato,& não fey como eíla v ez forão conde-
" nados os agrefíbres à morte ? Devia obrar neíie caz o mais o

jrefpey to do Conde, que o pe;o dos Miniftros, complices em
outros cazos femelhaatesjpor clles apro vados,&: quando me-
nos confentídos.

3 1 Digamos tudo por jBay or,que por extenfo fera im-
poffivel. Trabalha vão quanto podiáo os Olandefes, naquelle
Eftado, por fe inculcarem íènhores intruzos, & legitimos ti-
ranos, darídofe a conhecer pello veneno mais, que pello do-
minio,como dos Píyllos, [povos, que habitavão no interior
da libya ~} cfcreve Plutarco : Conhcciaó os filhos , naò pello
Defaforados em P^^to, fenaó pello peftifero da complexaó , de cujo veneno
todo o género de fugiáoasmeltBasferpentiQ6.Taes,&:tantos,como tenho dito, plut. ;
foraó os íàcrilegios , as injuftiças , as perfidias, os roubos , as Catom
crueldades, as in;urias,& as iufolencias, com que os Olande-
fesopprimiraóaosmiferaveis VaíTallos, q nas partes do Bra-
zH dominarão, fem reípey to algum ao temor de Deos , nem
ao pejo dos homens, fechados os olhos, & os ouvidos à dou^
trina, & ao efcandalo, com que alguns dos feus grita vaõ nos
auditórios publicos,que nem Deos poderia deffimular , nem
os homens Ibfrer taõ abomináveis procedimentos . De hum
púlpito (em occaziaó, que todos ouviaó) os defenganou \m
predicante fcu com livre reprehençaõ, que naõ avia de faltar
o caíligo merecido a procedimentos taó eílragados , & que
eíliveííèm certos, que aos moradores opprimidos avia de to-
mar a juftiça Divina por inílromento do eaftigo , que mere-
ciaó feus peccados, afficomo para caftigar aos moradores

me-

njícios.

metera o açoute nas mãos, delles Olandefes . Recebeo-fe taõ
mal a doutrina, pcllo que teve de ameaço , & de pronoftico,
que nunca mais apareceo o predicante . O melmo íuccedeo a ''

hum Rabino, que pregando na Synagoga do Arrecife, eftra-
nhou os eícandaloíbs exceíTos daquelle governo , de que in-
ferio a breve duração de feu império, erpantandofe,de como
dominio tão violento durava tanto: Gonfumio-o a diligen-
cia,porque nunca mais foy vifto.Imaginava a cegueira Olan- ^

dela, qne com atalhar o pregão,efcondia o deliâ:o, & defvia- aviZdosl&er--
Ya o açoute.Perto eftá da morte o enfenno , que aborrecido tranhos^ & pro-
das medicinas maltrata ao medico.Sem remifíaõ vay a cahir, prios.
quem fe ofiíende dos gritos , que o defejão deíviar do preci-
pício. Parecia-lhe á devaffidão, q tapando a boca aos homés,
a não deixava aberta às fepulíurasjàs cinzas, às pedras , & aos
troncos, que com muda rethorica a pubhcaváo,& lhes pe- .

diaõ o caftigo, que não tardoujcomo diremos, em as feguin-
tes relações.

«' 3 2 Porem antes, que entremos em o quinto Livro âtC-
ta hiftoria , le me hà de permitir húa digreíTaò , a que fenaõ
fabe negar meu difcurfo. Ponderadas as infolencias dos Fra-
mengos, & a paciência dos Portuguezes, não fey definir,qual
deva menos ao efpanto , fe a conftancia do fofrimento , fe a
perfia do agravo ? Efta acuzava ao Olandès de irracional, a-
quella aoPortuguez deinfeníTivdj&nem a fúria do bruto
quebrava na dureza da pedra , que laftíma j nem a dureza da
pedra obedecia à continuação dos golpes, que a quebrão; &
íe me reprefenta myfterio efcondido em hum,& outro eftre-
mo, parecendome, que o fofrimento íe animava da efperan-
ça, que lhe prometía,a pouca duração da violência , & a ob- p-^^^^^./^^^^v^
ílinação do efquecimento,que lhe tirava da lembrança o me- ^ç/pj^ ^^ oppref^
recimento do caftigo; demonftraçoés,com que o ceo enflna-yá?, & do fofri"
V a a hLia,& outra gente,que a conftancia de húa,&: outra for- mento.
tuna he puramente negociação dos mortaes; & fer condição
dos Eftados do mundo, decer , o que não pode mais fubir; &
fubir,oquenãopodemaisdecer, a beneficio da inftabilida-
de das couzas delle.

- 3 3 Com luz mais clara,que a da rezão o vião os olhos da
fé,que nunca pode èfcurecer a diligencia da Herezia:Se;a

R2 mo-

niotivo domayor aífombro, dnrar entre osopprimidos Per-
nambucanos a pefte, fem que íe lhes ateaíTe o contagio . Na5
ouve Portuguez, que pelladiÍGurfo de vinte & quatro an-
Hos prevaricâffe na fé, affi divina , como humana : E fe algum
ouve, primeiro foy defcarte da naçaó , que membro da iíifi-
delidadcO mar não confeiite em íi os corpos mortosjfôra os
Frodhiorafideli- ^^"Ç^>ant^s que a corrupçaó os toque. A nenhum Portuguez;
"wao os Olandeíes CQtaminado,fenão defpois de expelido.

Portu-

^es.pAm com Opandopaf écJÉâ que áperíeguição50s tinha reduzidos acin*».
2a)éntão efta vã o em feUs pey tos mais vivas as brafas da fé pa-
ra com DeoSj& para com feu Rey. Olhava-os entaó com eJp-
panto a America^como a Europa os vio cõ afíbmbro oanno
de mil & feifcentos & quarenta^ na acciamação de íèu legiti-
mo Princepe o Senhor Rey D. Joaó o Quarto. Pode em húa,
& outra parte a períeguiçáo de impérios intruíos,a delgaçar-
lhes o ÇiQy porem nunca rompcllo. Como pedras de amolat
eraó as extroçoés dos Herejes, que fem poderem ferir davaã
fios à eípada êa fé para cortar feus erros. Não ouve penhafco
tão firme às pérfiadas ondasj como em todo o tépo os experi-
mentou,© mais embravecido das perfiguiçoés.Foy a conftan-
èia da féj para com Deos,& para com feU Rey exemplo claro
para á iraitação-.Foy atolerancia deVaíTalloSjafíumpto illuft
tre para Q afíbmbfo. ' r

54 Aonde o humanei difcurfo abate mais as azas he,naf
confíderação da impenetrável providencia do AltiíTimOjpois
daqueJles meyçxsjde que os homens, fe aprovei tavão para fa-
cudircm o ;ugo, fe valia a providencia para apertar o grilho:

DifpoJIcGes daBl^^^^^^^^^^^^^^^^^^^ O Reyno cmfavor dos afli£i:osBra-
.proiJiMia. zilJenfès .^OquelevouDom António deOquendo, o que
conduzio Francifco de Vafconcellos 5 o que fe deu a Dom
Luis de R oxas; o que entregou Dom Rodrigo Lobo j & ul^
timamente, o que a todos excedeo governado pello Conde
da Torre, (naquella Armada taõ memorável pello poder,co-^
mo pella defgraça) que eííèyto furtírãoPO de defpertar nos
Olarldefes a cólera , & influir nas tribulações dos mora^
dores^femque jamais deixaíTem de receber mayordano das
armas auxiliares , que das inimigas. Parece verdadeira-
mente , que com defvios lhes defpunha o ceo a coroa dos

.. .. tra-

^J^E 1. LlF<!iO IK 197

trabalhos, guardando a cmprefa de fua liberdade para feii va*
lor,porq foíTe fua toda a gloria 5 & fò feu, o premio de acção
táo eíclarecida: E fua memoria íerà em todos os feciilos, á fa-
ma grata , á Coroa dívida, ao Reyno palma , á Nação gloria,
& às gentes pafmo. _^

3 1; Sobre fundamentos trémulos , nâo pode aver edifí-
cios fegurOs: Os politicós brevemente cabeiíij fe no temor fe
fundáo.Queriâo os Olandefes fundar,na America,a duração
de feu império no fervilaffe£fcodomedo.No filial do amor o
ouveraõ de fundar. Se dicerem,que o do Turco lhe fervio de ff ^1?^^
exemplo, direy, que lhe nao fouberao tomar o pulío pella ^^^^ ubeA^e.
parte da íbgeiçaõ , conio lho tomàraò pella parte do domi-
nio. Aquellas gentes que nacem,& fe criaõ com efpiritoá feri
vís,facilmente as domina o temor, não aííi aquelles ânimos,
em que o clima, o natural valor,& o cuílume infundem efpi-
ritos generofos. Corações mayores que toda afortuna deií
fempre Portugal a feus naturaes j nunca os fogeif oU a v iolen-
cia, fempre os reduzio a brandura , & a eftimaçaõ. Naó he o
mefmo achallos a oppreífaõ fofridos , que vellos proftrados.
Sabem diílimular a injuria, mas naó fabem efquecer o agra-
vo, porque o nativo valor lhes lifonjea a paciência, com a ef-
perança; & quanto mais os opprime a ofFenfa , mais fe alentsi
o defejo da v ingança. As agoas dos rios caudalofos,na may or
oppofiçaò mais fe encreípaò.Se Qlanda qulzera dar ouvidos
aos brados das armas Portuguezas em as occazioês de Carta-
go, de Roma,de Caftella, & do Oriente, naó aprendera eftã
verdade tanto à fua cufta , & confeííària , convencida , que
com a mão do cetro fe fabricou o fepulcro 5 & que fora im^
poílivel deixar de romper furiofo, valor, que fe augmentava
com a oppofiçaò j& que naó he a Naçaó Portugueza de a-
quellas, que correfpondem com beneficios,a quem as cultiva
com agravos; & menos fabe render obediências, a quem as
trata com injurias; & acabe de entender, quem lhe ouve
a queixa, que fua foy a culpa, informado das rezoês,que juf=
tificaõ noííb procedimento neftc quarto Livro referidas.

R3

CASTRIOTO

As callamidades
fão a efcola^ me
melhor enjina.

RTII. LIVRO V.

^^ ARA enfínár,ra5 ás callaiiiidades os
precéytòs iíiaís certos . Omenoi- iii-
fortíiriiÒ ènfiiia mais, que o melhot
fabio: Mais aproveitado fahio Nabu-
chodoríoidr dò camípoí , que da efcò-
la de Daniel . Os ttabálhòs perfil a-
dèm còrn á jpfáticâ^ a dòiitrina, com a
efpèculaçaõ : E melhor fe impriíiiè na memoria , o qtfé maia
fe fénte , que o qiie rnèlhor fe dita. Nas opprefíbés da tifariiâ
efíiidàvá Roma os meyos dè fúa libeídade j experimentod-o
TaTqiiíiilo,& conhèceÒ NéròiNo téníipò, em que às felicida-
des áprovàõ ò dominib^vivéni os fubditos focegacíos; apren-
dem á obedecer íiB lògrò dás eorii^èniencíás : Nao aíTi no íb-?
frimeíitb dás calláiiíidadèsj^ni ò q[nal os infortunios,& perfe-'
guiçoés faó corifellieiioSj qíiè Viva, & efficaiinente lhes per-^
fuadem á fôíèváçao . Cbm eftà càu7á , à tddbs còmúa , era .
uni veffál eiil tòdbs bs moradores do Brazil fbgeitos ao impé^' -
rio dcÒláíidá, ód^fe;òdè fé libèrtái-èm , deitando de fid^
]^eíibfo;ugb,(juèbsópW A penalidade lhes cníiiiàvá

os meyos, poi: briáé àviaS dé cbriftguir à ifençâo. Grécia o
éftudbna còiitindá^áô dbírábáHiÒ: kfefíá cfcola, S^ com èf-
ta rezáõ fe fès Joaõ Fernandes ViéiVa táô peíito , como noà
mbftrarà ò eífej/to. Éfa o níiáis riiágbado , & foy o mais èftu^
diofo j& porque táAbieiíi ndõ ieftudâi^a fò pára íi, fenaô pára
todós,mais cUidadófo íJá liberdade da Patríá,{por tal effiníá^
va a terra de Pernambuco) que das conveniências da peífoa.
Em o principio da guerra naõ faltou com a aíiftencia âsop-
pofiçoés da forg:á3 porem tantb^ <jue conheceo , que na refif-

tencia

i6^o ^A^TÊLLir^O r. 199'

tencía bebia o inimigo alentos paia a cOnquiftá, largou ds àf-
mas,& obedeceo à fortuna, julgando dircreto,que mais apío-
\ citaria aos naturaes com a negociação , que com ó braço.
Valeo-íe da induftria , & com prudehte íagacidade fc intro-
du2Ío com o Olandés de forte^que fe adiantou â tòdos na ef-
timaçaõ, nâconíiança,& na opulência^ áVendofecohl aftucia
taó engenhofa, que era fenhor das riiais recatadas iioticiâSi&:
iio feguro delias obrava cauto,&: ditòfo.

2 Defde o principio da guerra, fe aconfelhòti feu gene-
rozo coração com a queixa dáquellè eftádo . Acudia com -j . \

promptidao ás neceíTidade^ que podia reítifediaí áfázertdá^ ^^'^^^
& aíTentava cònfigo de naõ faltar á feu telUpo^em e^pbr â vi- ^
dá a todo o trançè das armasjà fávòr da liberdade. Pèhfánien-
íòs nácidos^i & alimentados em hum peyto, qUé todo era cõ-
raçáò.Diremos por máyor ò qiiántó éfte cuidado ò defvela-
va , para que fe veja j que fó para efte íini eta a fazenda que
adquiria,& a vida que guardava. A a euftá d'e|tâildes difpeti-
dios focorreo fempre â itiifeiriá dos néfeeíFitádos y& á defcon-
foláçaó dos afligidos ^ ãfíi pellb <\iVé gáftává èiil oâ Ibcorrer, •
como pell o que dèftr ibUíâ etíi òrderrí á cbnfêgoirlhes o per-
dáo5& ò fòvòr. Com éftés rèlígidíbé àUxilids fomentou a fe f^^^"^' ^fi'^"
de mu y tos, tiraiido-lhes com o fbcorfo à defculpa da necef-
íidáde,& do pejo . Gbm vivas rezbés - & continuas dadivas
deteve a herética furiá, que muvtàs vétes,tbmbU por expe-
diente faudá vel a fua confer VaçáOi deftêrrar de ífeu doiiiihib^
tbdáS as péílbas Ecclefiafticás : Negbfciaçaó que fervio de ar-
rimo á fraqUézá de itiUy tos^que vacila Váb nà cbnftância dâ fi-
delidade . Reparou pbr eft&s méybs ^^ quebras na libnrá , ou
defviandb a força, ou derméntindò â injuria ; &muytaá ve-
ies encontrando a entrega* fazendo b remédio táutbm^is vi- ^^ ^ . ^

„ o ' . _ 1 , , , Co rer'vir aT>eos

guroío,quanto era mais trágil o texb:t>azávà tbdbs os annos ^\q próximo.

ínuytasorfans^ em todas regulava b dbte pellb défampárOjSc
á precedência péllb perigb: Qualquer iufortunio lhe dbia co-
mo proprio.Em todo b tempo b achava cbm igual cbmpai-
xâó ò grato,& o queixbfoj b ifentb, & o agradeci db : Sendo
entre todos os moradores , b que liiais pbíTuia^ & b qUe me-
lhor fe tratava,nem achbu olhos na inveja, nem defconfiança^
ria pobrefâ. Aífi cbntrapezává a gravidade ebm â benev-olen-'
i R4.

cia.

aoo

CàST<1(10T0 LUSITJNO 1 640

cia,que a eftimaçâo inimiga o fervia com o refpey tOj& a dos
naturacs có o agrado 3 Sc fenào tudo5mais venda,que dadiva,
era tanto mais, o que adquiria, que o que gaftava , que clara-^
mente fe deixava v erjdar o ceo cento por hum, a quem def-
pende em fcrviço de Deos,& do próximo/

3 No zelo do culto Divino foy tão exaâio, que fe exce-
dia a íi mefmo. Reformava, a cufta de fua fazenda , todas as
Igrejas, & Hermidas,que o Hereje roubava,& deílruia, A to^
das melhorava nos paramentos,& aparatos fagrados,defejan-
do,que em todas as partes foíTe Deos íèrvido com decência:
Adiantou o fervor das confrarias , fervindo em todas as do
> Deos no s^elo de Senhor,& da Senhora, com a fazenda,& com a peíToa. Alcan-
feu culto, cava bulas dos Summos Pontifices com graças,& indultos cõ-

cedidos aos que aífiftiíTem à celebridade dos San61:os em feus
dias, pagando à fua cufta o deípendio : Ainda, no tempo em
que efcrcvemos efta hiftoria, mandou vir dous breves de Ro-
nia,para que em aquella Capitania , foíTe deprcceyto o dia
da Senhora dos Prazeres, com Jubileo de quarentas horas^ &
outro,para que com poderes fupremos fe abfolveíTem as ter^
ras,& os mares infrutiferos,pellos corpos dos Herejes, que os
tinhão excomungados:Em feu nome fe fes a íiiplica , por mi-
nha mão paíTou o deípedila.Chegâraõ os breves,em parte di-
minntos,por culpa do Banqueiro,naõ por falta do neceííario<
Por fua diligencia,& zelo, fç converterão â verdadeira fè cin-
co Judeps, de cada hum foy padrinho , & de todos remédio.
O mefmo,& com o meíino 2elo,& defpendio lhe fuccedeo cõ
dous Herejes . Para que os officios Divinos fe celebraírem,&:
frequentaíTem os Sacramentos com liberdade,& com pompa,
comprava ao Hereje as penniíToês, & fuftentava cm fua caza,
capela de Muíicos efcolhidos , & diverfos ternos de chara-
melas. Animava aos Parrochos , para que fe eíineraíTem no
comprimento de fua obrigação, com o patrocinio, & com o
exéplo . Não vião feus olhos neceííidade,em que a preíík do
focorro fenão adiantaíTe á fuplica da miíèria.

4 Com fua ordinária perfídia fe fes o inimigo fenhor
dos Reynos de Angola3 fem diftinçaõ roubou o Sagrado,& o
profano^ fem diferença prende-os Seculares, Sc Ecleíiafticos,
Sc os embarcoUj como cativos , Sc efcravos . Chegarão ao Ar-

recifej

aoi

1640 ^AXrniLivf^ r.

recife^defembarcáraó Icm femelhança de homens^ affi 00 tra-
to, como nas figuras: Imagens da morte pareciáo todos, (tal
foy adeícomodidade, que na viagem padecerão.) Aa voz ^^ ^^^^.^^ ^-^
do efpanto,& da miferia acudio João Fernandes Vieira,com- genernfidade de
púgido o deixou o efpedaculo.Védo Portugue2es àtí^tci^- feu animo,
dos,& defpidos como fe forão negros , os recebeo cò laftima,
& os focorreo cõ magnificécia. As peíToas graves,Capitaés3&
officiaes d<lRey mandou conduzir para fuacaza,[proven-
do-os a todos de cavalgaduras] aonde os hofpedou com cari-
dade, & grandeza todo o tempo, que íedetiveraõ emPer-
nambuco^ & delia fahiraõ cobrados nas feições, & na faude a
beneficio dos medicamentos, & dos regalos. Aos de mais mã^
dou veftir , & fuftentar a cufta de Tua fazenda ; & a todos , ao
tempo de fe embarcarem , & defpedirem, forneceo de v efti-
dos , & mantimentos , naõ fò para a viagem, fenão também
para fahirem em terra, quando a tomaíTem. AíTi abrangia fua
larguefa a remediar o padecido, & oeípcrado > adiantandofc
com o focorro à neceífidade.

. 5 Vinha entre os miferaveis rendidos hum Piloto natu-
ral do Reyno (homem conhecido por feu cabedal, & proce-
dimento) o qual deixava nas mãos do Framengo húa náo fua
carregada de fazendas ^ que lhe tomàraô íia coftá de Ango- pyova fmguhr
la:Efte tal, ou por imaginar, que fe adiantava na dita , ou por dejlaverdade.
querer moftrar , que ainda a fortuna lhe deixava efcolha, fe
chegou a hum poderofo ( homem de naçaó; ) manifefíoulhe
feu eftado,& fua perda, & as condições de fua peffoa com a
humildade de quem roga,com a rethorica de quem pede , &
com a generalidade de quem naõ efcolhe * Naõ tirou de fua
diligencia mais, que o defengano de que era Chriftão, o que
padecia,& refinado Judeo , o que negava . Queixofo do mi-
íeravel cftado,em que fe via, & da curta fortuna , a que che- ^

gàra, o encontrou hum Religiozo,que o levou para fua caza,
& lhe aííiftio com fua pobreza ;& com animo taõ piedofo, q
aonde não chegava o cabedal,fupria o confelho.Perfuadi-o a
quepediíleajoaò Fernandes Vieira ofocorreíTe em tama-
nho defemparo: Affi o executou o miferavel homem ^ &foy
em occaziaó , que achou nelle o defe;o impoffibilitado , para
a promptidaõ do. remédio, efcufandofe naquella hora, com

fem-

20 i C^STIllOTõ LUSITMW içao

femblante pezarofo : Adverfi-o o neceíTítado , 8c mais que
confiifo voltou ao Religiofo, a quem deu queixas de mal a-
confelhado, com moftras de arrependido'. Ainda continuava
a pratica , & já á fua porta eílava hum eícravo de Joaó Fer-
nandes Vieira com o feu mefmo cavallo,& ordem,que nélle o
levaíTe a fua caza, na qual o recebeo, agafalhou, ruíl:entou5&
veflio como tinha feyto a todos.Quatro mil cruzados gafiou
neíla obra de piedade, confiderefe, o que deípenderia em tã-'
tas. Parece que anda vaõ os fucçeííbs moftrando neftes cazos
" a generoíidade daquelle animo, dando a entender, que era
capaz a grandefa daquelle peyto, para recolher, & fahir com
a empreía,que deípois intentou5& confeguio. f

6 Foy. feu coração tamanho , que emprendeo , profe-
guio, & acabou a reílauraçaó de Pernambuco j facçaó, que fe
julgava, para as forças da Éuropa^incertajpara as de húa Mo^
narchia, deficil^Sc para as de hum Reyno , impoífiveí . Nego--
cio, que nunca emprendéra, fe para ellefenaó aconfelhâra fó
configo. Mu y tos annos continuou nefte propofiío , fem fiar
feuintento, mais que de íi próprio. Foy difpondo ascouzas
com diíTimuIaçaó taò cauta,que nenhua fofpey ta o alcançoUj
porque fe algum indicio o advertia, a opinião o encontrava.
He certo, que nenhum defcurfo humano faz aprehençaó do
impoíTível.Foy chamando a feu ferviço aquelles homés, que
eraó inteligentes nas artes macanicas , & repartidos por fuás
fazendas, os occupava em feus officios [davalhes a entender,
que obravaõ para o neceílario provimento de feus fervos, Sc
efcravos3 o que fazia crer a multidão , & a diftancia. 1 Para as
Cauteloft p-è' ^^^^^Sj ^"^ trilha muytas, & muy dilatadas, mandava,á dcsfi-
nençaoâefcuin' Iada,armas,muniçoés, farinhas , & outros géneros , que fe re*
tenu, colhiaò em lugares feguros das noticias,&: dos tempos,fazen*

do entender aos miniftros deitas conduções, que fe prevenia
para as occazioés da falta . Aos homens debemaífiAia, com
beheficívOs,para que na oportunidade lhes correípondeífem"
gratos;, aos populares obrigava com favores, para os ter obe-^
dientes ; aos foldados, & offíciaes da milicia Portugueza fo-
corria com liberalidade, para os achar obrigados: Aos Olan-
defes fervia, & eftimava, para os confervar affcdos; & alguns
delíes comprava com exceífivo difpendio j para os dífpór

con-

i6â,o TA<!(rE 1. Lir^O V, 205

eonfidentes,& receber delles os avizos mais utís , & os fegre-

dos maÍ5 importantes.

7 Em o mayor fervor deftes cuidados cazou com Dona

Maria Cezar, fenhora do melhor fangue do recôncavo , com ^

muy ta fermozura,& poucos annos ; achandofe em hum, &
outro extremo íuavemente complicada a virtude, & a pru-
dência^ o valor,& a modefíiai a piedade , & a fortaleza Por ^ .^^^ ^^^^^^^ .^
efte mey o fe aparentou com o mais eltimado, & mais luitrolo defeufro^ofito .
daquella Capitania: E quando parece que o thalamo apaga-
ria nelle o incêndio bellico, entaó pulíava com mais viveza
emfeupeyto odefejo da emprefa, vendofe emfeu coração
praticado, aquelle repetido impoffivel, de não caber no hu-
mano a contradição de Vénus, & Marte . Os thezouros, que
acquiria,deporita va nas mãos dos pobres, certo, de que nellas Crendo que Veos
tinha a melhor fegurança , & o mayor ganho , porque como ".J^^fj^'' ^'^^
Deos era o obrigado, avia de cobrar de Deos o procedido j o
que )à experimentava com tanta evidencia, que viacrecer a
olho o cabedal de feus bensi&daqui infeiia, que Deos o aju-
dava, para a emprefa que difpunha . Em os annos preceden-
tes caminhava fua diligencia a paflb lento , porque fe lhe re-
prefentava remoto o parto do intento, que tinha concebido.
Defpois do anno de quarenta voou fua deliberação com as
azas do mais adequado exemplo. Succedco no Reyno a feli-
ce acclamaçaó do Senhor Rey Dom Joaó o Quarto, com a
qual feconfeguio a liberdade defejada à Monarquia de Por-
tugal. A femelhança dos motivos,& a dos cazos lhe reprefen-
tava, a igualdade dos fucçeíTos, & nefta fegurança corria a e-
xecutar feus defejos. Temos dado refpofta a tudo, o que nos
podia preguntar o efcrupulo, obrigado a reparar , em q fen-
do Joaó Fernandes Vieira o Achillis defte argumento, fenaõ Em mja. execu»
fes menção delle em quafi todo o proceíTo dâla hiftoria? Ao Ç^Õ fe occupava^
que fatisfazemos com mofiráremos , que fe nelle naõ obrou
fempre com o braço, nunca deixou de obrar com o difcurfo.
Enfayavafe para fahir a luz com a mayor façanha ,& como
na execução avia de fazer a primeira figura, neceffitava de
largo eftudo , para ficar fenhor do papel , que avia de repre-
fentar.

8 Demos fim ao anno de mil Sc feifcentos & trinta &

nove

\

^^

204 C^ST<^10T0 LUSITJKO i(<4o

£m quanto os Cd- "^^^ ^^^ ^ fenfivel dano, que o Olandès recebera dos repe-
ptacs PortHgue- ^i^os, & irremediáveis aífaltos, com qoe o períeguiraõ o Ca-
^es apíkvãoore pitaõ Paulo da Cunha , o Governador dos Crioulos Henri-
cncâvo. que Dias,& outros, aííiftidos de Teus foldados. Atè o anno de

quarenta & hum continuou a noffa hoftilidade, & a impacié-
cia do inimigo, porque nem podia vingar a offenfa, nem evi-
tar a ruína : Naó fofria, que lhe faltaíTem os moradores com
òs cuftumadõs interefíes,(as lavouras deftruidas,os canaveaes
abrafados, os curraes vazios, as madeiras confumidas , os en>->
genhos impoffibilitados por falta de negros, bois,&inftro-
mentos.) Satisfaziaíe não da perda, fenaó da vingança op-*-
primindo , & agravando aos afíiítos moradores , como fe fua
deígraça foraicrime. A todos intimou ordens , que fobpena
capital fe proveííem de armas ,& fizeíTem oppozição ás dos
íbbre-ditos Capitães, para quematandofe huns a outros, pe-
feceíTcíu todos. Viraó-fe os homens indeterminados, entre a
comminação da pena,& as leys da pátria ; & remiflbs na obe^
diencia fogirão, quanto lhes foy poffivel, á infidelidade : E
defta forte rebaterão o intento do inimigo , qne era fomen-
ta r,& acender o ódio entre huns, & outros Portuguezes . Po-*
rèm, defconfiado das advertências do perigo , lhes prohibio
Jogo as armas, receofo de os ver com ellas primeiro unidos,
que encontrados.

9 Neftas hoftihdades Í€ paíTou todo o aníio de quaren-
' ta, fem ndle aver couza digna de memoria [refreado o Glan-

des da induftriofa guerra,que na maneira fobre-d ita,lhe faíia
o Governador do Eftado D. Jorge Mafcarenhas Marquez
de Monte- Al vão3 fe jà naó era , que mais alta providencia ti-
nha fufpenfo o mundo com negocio de tanto mayor impor-
Em que cofmuâ- . • r ri- i-joi tV-r^-f-

rao dtè o amío de ^^"^^^' *^^^""^ ^^J ^ ^^^^^^ acciamaçao do Senhor Rey D. João
quarenta. o Qgarto,que em portugal,efte anno de quarenta, fe tratou,

&feconfeguiocomaquellafuavidade, com que concorrem
os meyos para os fins deftinados . ] Foy efte anno tão defeja-
do da efperança , como fempre fera repetido da admiração:
Memorável o fizeraó os fucçeííòs,& particular os yaticinios;
mayor pello que nelle fuccedeo , que pello tempo que cur-
fou. Naó recebem os annos mayoridade da natureza , fenaõ
<da fortuna; Os mayores cazos , que nelles fuccedem , faõ os

que

1640 !?^^T£ 1. Lim^O V. '5oç~

que os faiem may ores. Com breve mão daremos tezãodas
cauzas,paraqne a iodos femanifefte ajuftiça, comqueo's
Portuguezes lè desforçarão da injufta fogeiçaò.

Com a perda delRey Dom Sebaftiao chorou Por-

10

n^gal moribunda fua coroa.Opprimido o Reynoda perda,& ^^^^. ^^ ^^^
da força, vio atropelado o dereito da herança pella v lolen- ^^^^ ^ ^^^^J^^^ ^^;
cia da conquifta j & em breviíTimo tempo náo fò fe v io em ^^^^^^ de C^JlsUa.
i-naó alhea, fenaó também eftranha. Experimentarão muytos
ocaftigonaculpaj&todosaoppozição na poíTe ; caiiza de
fe avivarem as faudades , em aquelles , que lamentavaó a dif-
ferença. Naó pellas fuas,fenáo pellas mãos de feus Miniftros
trabalharão os três Monarchas de EfpanhaPhelipe o Prudê-
té, Phelipe o bom, Phelipe o piedofo (Príncipes verdadeira-
mente Catholicos) na jufta folevação dos Portuguezes , com
a diligencia de os privar de feus foros , & liberdades , não fò
permitidas, fenaó promítidas, & juradas : Chegou o exceífo
a parecer mais ódio ã naçaó, que refpey to á neceífidade, [no
defprezo, fe achava tranfito, para a injuría. J Creceo a dema-
2ia ao pafíb, que corriaõ os annos, fem que a clemência tive-
fe ouvido livre para a queixa, com que os clamores paravao
no meímo ^r, que feriaõ. Chegarão os últimos dias do anno
de mil & téifceritos & trinta & quatro,& nelles chegou a Lis-
boa a Infanta Margarida,Duqueza de Mantua, & Monferra-
to Cdefpojada de feu eftado por legitimo , ou por injufto de-
rey to à fucçeíTaó delle,que primeiro )ulgàraó as armas,que as
leys) com poderes,para governar eftes Reynos, loco tenente
dei Rey Phelipe o Terceiro de Portugal feu primo cõ Irmão.
Princefa fatalmente deftinada a experimentar as repulfas da
fortuna nos Eftados que regia.

1 1 Não tomava pé aquelk dominio , na fuílituiçaõ ào
governo. Era fantaftico o dereyto ^ variava nas peíToas , no
numero, no titulo, & nos eftados:Muytas vezes o governava
a mão de humVizo-Rey j muy tas a direcção de três Governa- ^J^^
dores^húas vezes erão Eclefiafticos,Seculares outras, até que
variarão também os fexos,entrando a governar hiiamolher.
Por afronta o avaliarão os briofos; por dita os efpeculativos,
parecendo-lhes mifterio, o que aos demais fe fes crer defpre-
203& não foVj fe não politica efcolha,dos may ores Miniftros

S de

'otí de vários
Governadores.

io6 ■ iMT^Sjoro LUSITAKO 1:640

de Caftella , qne bufcayaõ ioftromento adequada ao jnten-,

to, que tinháo concebido^ de reduzirem oReyno a Provin-

ciaj para o que era neceííkrio énfráquecello com os tributos,

& defanimálló com os agravos , rolicitandolbe cabeça fem

prudência para advertir, nem va>lor para recufar . Por Secret

tario de Eftado lhe derãõ a Miguel de Varconçellos, falto de

callidade, para não refpeytar aos nobres^cruel de gcnio,para

perfeguir aos populares 5 deíamparado da piedade, para não

venerar aos Ecleíiafticos. Difpoíiçoês, com que a infolencia

determinava fechar os portos ao remédio da tormenta , em q

fe avia de vero Reynojcombatido dos tributos, &dosdeí^

Verao-lhe a Mi- -terrosjporque na Duqueza Regente,& em feus Miniftros ti-

gud de VAfcon- «haõ fegwra a obediência, & a execução^ a qual detiveraõ alr-

'urio ^°^ '^^'''^^' guas povoações do Alentejo,convidadas da Cidade de Evo-

' ra,que amotinada,as provocara com o exemplo.

1 12 Opprimidos c5 femelhante pezo gemiaõ os Catha-
laés: Era infoportavcl a carga. Tumultuou a defcfperaçâo a-
téa deitar dos hombrosj&preíiftio,quaíi toda Catalunha,
cm não receber o ;ugo:Com as armas na mão implorou opa-
trocinio de França. Fizeraó-fe levas de gente,por toda Efpar
iihai(alguns terços fe levantarão em Portugal) & có pretex-
to defta guerra , foraó chamados a Madrid os títulos defte
ThZêf' ^'' ^^ ^^y^^^ & os mais dos Fidalgos delle. Affirmavafe , que avia
ordens nas mãos de alguns Miniftros confidentes a Caftella,
para que falta Lisboa doseípiritos da nobreza, Sctemerofa
da prefença de húa Armada , q avia de anchorar em feu por-
to, defmayaíTe ,& obedeceífe ao decreta, que lhe tirava os
foros de Reyno, dando-lhe fò os de Provincia, fogeita,como
as m3Ís,a húa ley, & a hum governo . Tinha fuccedido ( em
ordem ao pretexto, que Caftella tomou para defcompôro
SereniíTimo Duque de Bargança Dom Joaõ ) obrigarem-no
. á, que com o titulo de Governador das Armas,deceíre, a aíTiA
tir á Duqueza Regente. Apofentoufe em Almada , Villa fi-
tuada defronte de Lisboa , â qual paíTou hum dia, para fe a-,
. viftar com a Duqueza. Foy tamanho o alvoroço do Po-
fimo Duque de^^'^ ^ a concurrencia dos Fidalgos, que o acompanha-
Bãrrrança, k Al'^^^'-> ^íTi defcocadosos vivas da multidão, &confuzoés da
jnada. Paço, qu€ fe temeo o ujtimo fim daquelle império. Acçaõ,

cm

j6/[o TAXrnLLir^ k 207

cm que Caílella vio reprefentado hum enfayo da realidade,
& nelle húa fatal diligencia , primeiro deftinada a dcípertar
noíTas faudades, que a defcompòr noíTas eíperanças , porque
a vifta do Seriniííimo Duque acendeo nos ânimos de todos
o defejo da liberdade, & da reftituiçáoi cauza dos ciúmes, c6
que logo íe mandou "retirar á fua corte de Villa Viçoza : E
com rezaò, porque á Villa de Almada fora5 alguns íenhores
Portuguezes advertir-lhe aoccaziáo , & prometer-lhe affif-
tencia de fazendas, & peíToas, para fe cobrar no ufurpado^ao
que refpondeo, que não era chegado o tempo.

1 3 Náo defconfiou a repofta, aos enviados , porque a
fíiefma rezão, que os convencia os animava: Conhecerão pel-
lo femblante a difpofiçaó do animoj&pellas palavras a defor-
midade do tempo, que não era oportuno para tirar a coroa
da cabeça, aquelle, em que o Duque delia recebia a coníían- offerefem-lhe os
ÇSL das armas 5 que fe defiriíTe a emprefa para occazião,em que ^ortugueus aco^
nella fe não v iíTe efta nota. Alentáraõ-lè os do congreífo có ^°'^'-
a fatisfação do avizo: Creceo o numero dos confidentes, fem
fe violar o fegredo, & cobrou tantas forças a refolução, que
com o beneplácito do Seriniííimo Duque feaíTentou o dia,
&:omodo de fua reftituiçaô. Em hum fabado primeiro de ^ ^ ,..^^
Dezembro de mu & fciícentos & quarenta , pellasnove no- ^^ afilcvacao^ '
ras da manhã fe pos mão á obra da Felice Acclamaçâo. Aííen-
toufe, que o modo foíTe fahir cada hum dos confpiradoscom
armas occultas,a occupar aquelles póftos do Terreiro,& Pa-
|:o, aonde menos os podeíTe eftranhara vifta. Deu o relógio
da Sè as oy to ^f ponto deftinado para fe defcubrir a cara ao in*
tento"! com as armas na mão acudio cada-qual á parte deter-
minada j & affi obràraó todos valerofos , & ouzados, que ás
dez horas cftava a facção confeguida jMiguel de Vafconçel-
los fem vida5a Duqueza Regente fem mando , o Cetro refti-
túido ao novo Rey acclamado ; & a Corte quieta . Eaftou a
voz do fucçeíTo para fer imitado em todo o Reyno, fem nel-
le ficar povoação, nem aldea,em que fenão viííe obedecido,
com admirável concordia,& alvoroço dos ânimos \ moftran-
dofe em tudo, que fuperior impulfo os movia . Em quanto a
Mageftade do Senhor Rey Dom Joa5 fe dilatou no Alente-
jo (que foraõ poucos dias ^elegeo a nobreza por Governa-

S.2 dor

i.

2o8 C^ST^IOTO LUSlTjno 1640

dor ao Arcebifpo de Lisboa D. Rodrigo da Cunha , que lo-
go defpedio correy os a todas as Cidades,& Villas do Reyna
com a alegre nova de fua liberdade . Em féis de Dezembro
^/ áMcZt '^f''^^'' ^" ^ Mageftade a coroa, & a obediência , & fem dila-
te, Ção a mandou dar ao Papa Urbano oytavo, que governa-

va a Igreja, pello Biípo de Lamego D.Miguel de Portugak

14 Sahira de Lisboa em húa embarcação ligeira o Pa-
dre Francifco de Vilhena Religiozo da Companhia de Jesvs,
cora carta delRey para o Marquez Dom Jorge Mafcare-
nhas Vizo-Rey do Eftado, & ordés fecretas para toda a con-
tingência . Era o Marquez feitura de Caftella , & té vefe re-
ceo,de que podeíTe com elle mais a gratidão, que o nacimen-
Mãdafe avisto ao to. Tomou porto na Bahia o Padre Francifco de Vilhena, em
Fi7io-Rey da Ba- os últimos dejaneiro de mil &feifcentos& quarenta &hum,
^^^' com viagem taó breve, quepareceo aver navegado com as.

velas do deze;o:Entregou as cartas na mão do Marquez com
o devido fegredo: Com Portuguez alvoroço leo a nova, bei-
jou a firma, & deitou de íi toda a duvida: Deteve configo ao
Padre, man dou chamar ao Dom Abbade de SaÓ Bento , ao
Prior do Carmo, ao Guardião de São Frãcifco, & ao Reytor
da Companhia^ da nobreza os principaes, da milicia aos ma-
y ores Cabos,& aos Vereadores da Camará . Fechados todos
em hum falaó do Paço leo a carta; mandou que falaíTe o Pa-
dre Vilhena : Sufpendeo a todos a eítranheza da novidade:
Rompeo o Marquez o fílcncio dizendp, que a gravidade da
matéria pedia o parecpr de todos,& affi,que lhes rogava, vo-v
taíFem nella por efcrito, affinandofe cada-qual ao pé do feii
voto. Falàraó alguns,dizendo, que a refolução de tamanho
negocio, não era para repentes; que fe deíTe tempo á con^
íideração , para que o difcurfo efcolheíTe o mais acertado.*
Atalhou o Marquez a dilação, com advertir a importân-
cia do fegredo ; & defenganou a todos , que primeiro fe
avião de re foi ver , que fahiíTem daquelle lugar : Levantou-
fe Joãne Mendes de Vafconçellos , & firmando com húa
mão o chapeo , & com outra a efpada, diíTe eftas palavras:
Comprio o eco a Portugal tão dilatada promeíTa ; chega-
mos a ver o fimdetao penofa cfperança; temos o que de-
fecamos , & há quem remiíTo duvide de aceitar tão grande

mercc

1 6 4 1 fAXTB I. LlP\0 r. ao 9

mcrcè de Dcos ^ Viva eiRey Dom Joaõ o Qoarto noíTo Se-
Fihorj & náo haja quem o contradiga/e he verdadeiro Por-
tupuez: Repetío-fe pello Marquez , &por todos os do con-
greffo,a húa v oz,a aclamação dos vivas. Não fe permitío,qiie
do Salão fahiiTe, nem peíToa, nem noticia , atè que fe não dií^
pofcíTe o modo, com que fe avia de acclamar na Cidade. Or-
denoufe, que fahiíTe toda a gente da milicia em íiias compa-
nhias (quafi cinco mil infantes tinha a Cidade de prezidio ) ^^^^ nelkfe dif'
com avizo aosTenentes de Meftres de Campo,que marchai^ ^í>j a accUmação.
fcm a formarfe na Praça dos Guindaftes; & que dous terços,
hum de Caftelhanos , & de Italianos outro , levafíem a van-
guarda,& affim como foíTem pafíando os ríiais, fe lhes mãdaf-
fcm arrimar a§ armas . Defpedida efta ordem , mandarão to-
dos bufcar as melhores galas, quetinhão em fuás cazas,fem
dizerem a íeus criados, para que : Com a mefina cautela fe
mandou vir a bandeira da Cidade. O Povo, que vio ficar a
embarcação ao pego, ao Padre Vilhena mudo , aos mayores
da Cidade congregados, a infantaria formada , as galas pedi-
das,& o fegredo obfervado,fem atinar a cauza concorria fem
numero, a efperar a nova.

1 5 Veftido de fefta com o mais preciofo de fuás pyas,
fâhio o Marquez acompanhado dos congregados , & da Ca-*
mara com a bandeira da Cidade, levando diante hum Rey de
Armas : Tocàraó-fe as caixas, clarins,& pifanosjfefíe ílnal pa-
ra que fe pofeíTe fim ao eftrondo . O vulgo pendente de feu
defejo offereceo fummo filencio. Levantouíe o Rey de Ar-
nias,& em voz alta pronunciou eftas palavras.Ouvi,ouvi,ou-
\'i, & eíVai atento; & k)gp o Marquez reforçando o grito dif-
feas palavras próprias defemclhante aâ:o:Real, Real, Real, ^e a miltckl
por o Senhor Dom Joaõ o Quarto , Rey de Portugal. Com & o povo fep'
nunca v ifto alvoroço, & alegria as repetio o povo , fem def--^^^'^'' "^ '*^'^''"
cançar por muy to eípaíTo de tumultuar vivas : AugmeqtoU' ^ *
fe o brado com as repetidas cargas, que davão os terços,a que
refpondérão as Fortalezas, & nàos com toda a artelharia, em
quanto o Marquez com a referida companhia , Cabido, Co-
munidades , Clerezia , & Povo caminhavão para a Sè a dar a
Deos as graças de tamanha mercc;& nos feguintes dias fe fef-
tejou, com toda a variedade de feílas , que na Cidade fe po-

83 dèraõ

±

210

Manda o

CJST^iiwro LusirjTsio i 6 a i.

áèraõ ordenar: Ou acautellado, ou afFeâ:uoro derpaclioa lo-
go a feu filho o Marichal em hum pataxo a dar aíeuRey o
parabém da Coroa,&: a obediência deVaíTallo.Com a mefma
promptidáo avizou^ por correyos,a todos os lugares de fua
Jurisdíça5,com plena noticia dos íucçeíros,& das ordens que
tinha j pedindo^& mandando, que foffem teftimunhas do a-
nimo^as denionílfaçoés do feftejo t Com o mcímo alvoroço
defpedio hum barco, & nelle ao Piloto da barra Joaó Lopes
^^t"- Gom cartas para o Conde de NaíTau^Sc para os deputados do
Conde de Naífau Cortçelho Supremo: A todos, & a cada hú em particular da-
va conta da AcGlamaçaõ,& das circunftancias della.Pedia có-
gratulaçoés da fellicidade do Reyno , & dava parabéns das
conveniências dos Eftados; tudo refultas de hum animo ver-
dadeiramente Portuguez . Não obra a cavilíaçaò com a lha-
nefa, com que obra a fidelidade. Húa tençaõ dobrada em íi
meíma tropeça. Pellos exteriores Te inferem os ânimos: Que-
rer penetrar as tenções , & definir os interiores de outra for-
te, he impulfo da malicia , & da ignorância: Com efta rezaó
culparão muy tos ao Padre Vilhena , de que fem nenhúa , en-
tregou á Camará da Cidade as ordens fecrctas,que trazia cõ-
tra a forma da inftrucçaó, que fe lhe dera , faltando as legali-
dades de Religiozo, &deMinifi:ro . Nós efcrevemos ofuc-
çeííò,& não definimos as tenções, refervadas a Deos.

1 6 Ordenava fua Mageílade á Camará da Bahia , que
em cazo, que o Marquez peccaíTe em defobediencia , ou ti-
JCamâU aBa- 1^^^^ ^ privaíTem do governo,& para elle nomeava ao Biípo
auLàozp^verno, E)^!^^ Pedro da Syl va,ao Meftre de Campo Luis Barbalho,&
a Lourenço de Brito Corrêa. Abriraõ-fe as ordens,( não fey
com que fundamento) & fem fe examinarem, & juftificarem
as condi çoés/e executou o decreto jpode mais a negociação,
que o cônfelho;&: pezoufe o negocio na balança da mercan-
cia, fem que a fizeífe pender a defcompofiçaó, de hum tama-
nho Miniftro.Com animo focegado recebeo o Marquez a of-
fenfa,porque o não culpava a cauza : Defmentio aquelle re-
t prefo o remete ^^^ 5 4"^ fopunha o conloyo juão recuzou o agravo de o mã-
^0 Reyno. darem prefo, para o Reyno, pella diligencia , com que o re-

meterão, certo,de que cm Portugal fe avia de ventilar a cau-
2a com differentejuizoj porque não avia tribunal, em que

pre-

211

1^4 r ^fA^El.Lir^O V.

prezidiíTe apaixaó. Chegou a Lisboa, achou em feu Rey
eftimaçáo, & agrado; & nos póftos que occupou/, o premio
de feus ferviços, & a mayor vingança de feus emulos j auida
que amortecida pella rebelião de feus filhos.

1 7 Favorecido dos ventos tomou terra Joa5 Lopes no
Arrecife, aonde o olhavaó todos com efpanto, pella confian-
ça,com que tomou porto, &pello embandeirado do barco. ^/^^^^^^ ^-
Deitou anchora defronte do Paço do. Conde Joaõ Mauri- amvafoy recebi-
cio, & fem efperar confentimento,faltou em terra, com agen- da m Arrecife.
te de fua companhia luftrofamente veílida: Chamado da no-
vidade,o efperava grande multidão de Povo, que fufpenfo ô
acompanhou até a primeira fala do Conde, cuja guarda com
trabalho reprimio oconcurfo. Deu ao Conde a carta do
Marquez, que apenas leo, quando de alviçaras recebeo delle
húa rica;oya. Entregou, as que vinhaó para os Deputados,
que lerão com admiração,& alegria. Divulgoufe a nova,que
© povo feftejou com tanto alvoroço , & repetição de vivas,
quanto fe podia efperar da mais fiel povoação de Portugue-
zes: Pellos que moravaó no recôncavo , fe efpalhou logo a
noticia: Ouvirão nella o anuncio de fua liberdade , refucita-
das as efperanças de todos pello exemplo,& pella certeza,de
que tinhão Princípe natural para a compaixaó,& Portuguez
para a cobrança : Motivos com que huns, & outros fe davão
os mais alegres parabéns, & as congratulações mais rifonhas,
paífando as demonftraçoés do gofto muyto além de feu cala-
mitofo eftado: Faziaó-lhe companhia os Eftrangeiros , fe bé
que com diverfo juizo, porque o Olandés o formava de eftâ-
belecer,por eíle caminho, feu imperíoj& os Portuguezes, de
Deos lhes moftrar o modo , como avião de facudir de feus
hombros o jugo.

: 1 8 Mandou o Conde fixar quartel de feftas , por todas
as Praças de feu dominio, para o feguinte mez de Abril, con- ^ /-^p-^ ^^^ ^^
yidando com prémios aos aventureiros , & com rogos a no- a celebrou o con'
breza principal de eftrangeiros, & naturaes , fem que faltaífe de deNajfatt.
em efcrever aos homens de melhor preftimo , com avizo, de
que fe preparaíTem de cavâllos,& galas,porque não faltaífem
ao feftejo, o luzido, & o decorofo.Mandou fazer á fua vifta
hum largo terreiro cercado de palanques , ornados j & capa-

S4 zes

21a

CJST^WTÔ LUSITJNO 1 6^ v

zes para a callidade, & para a multidão : Chegou o dia âeM-
nado, entrarão na Praça duas quadril has^á competência luC-
trofas, húa de Eftrangeiros 5 que guiava o Conde, outra de
Portuguezes, que feguia a Pedro Marinho Falcão: Correrão
parelhas,jogàraó canas, &alcanzias; de tarde ouve fortilha,
&nella fe julgarão quaíi todos os preços aos Portuguezes:,
Muytos lhesdeuajuftiça,mujtos mais o favor; porque as
Damas Eftrangeiras, com fua natural confiança, & galhardia
tira vaó, ou das mãos , ou do peyío , efta, ou aquella joya , &•
as oírereciaõ ao Cayalleiro , que mais lhes levava os olhosj^
gentileza entre ellas U2ada,&nas Cortes aplaudida;& aíTi foy
nefta occazião vifta dos Eftrangeiros com os olhos da enyeja,
Sc não com os da queixa , porque não formavão agravo , da
qu e era eftilo cortezão . Em o feguado dia foy todo o fefte-
jo á Framenga: Deu o Conde hum magnifico Jantar a todas
as Damas,& Cavalleiros , com tal condição, que na ordenj
dos brindes, fofíe o meíino errallos, que repetillos; jogo, em
que as mulheres do Norte eftimão ferem viílas, porque fe
prezáo de deftras. Em o terceiro dia fe continuarão as feftas
de cavallo,que fe rematarão em húa francaj&r efplendida cea>
Sc nella fedeu o ultimo brindes á chegada de húa não de
Olanda, pella qual os fenhores Eftados avizavaó ao Conde
da Acclamaçaõ do Senhor Rey Dom Joaó o Quarto, & das
pazes aíTentadas com a Coroa de Portugal por dez annos.

19 Logo, que fepaíTáraóaquelles dias de fefta, manda-
rão os do governo preparar húa fragata para a Bahia, ema
qual enviarão a Henrique Code , hum dos três do Supremo,
o ^mimada em- ç^^^ Secretario a AbrahamTraper cÓ embaixada ao Mar- '
com me mento, ^"^^j^ ^^s novos Governadores; (mteirados ;a do que na
privação do Marquez fe tinha paíFado . ) A inftrucçaó do
enviado era, que àt& ao Marquez o pezame da aufencia , &
aos três Governadores o para-bem do pofto , & a todos a re-
lação do muy to , q os fubditos dos Eftados, em toda a parte,
feftejáraõ a recuperação do cetro, & da liberdade , com que ^
fe viaõ os Portuguezes. Em fegundo lugar , ( & eíle era o in- '
tento primario)lhes reprefentaííè a grande utilidade,& pro-
Yeitofa politica para a confervaçaó de todos , q fe eftava v ê-*
dojcmfe aííeiltarétregoas, 6c amizades naquella parte da

America

Cv. -

1641 ^ÀtjELLlV^OV. 215

America entre FramengoSj & Portuguezes [á fombra das pa-
zes, que os Eftados tinhão celebrado com oReyno. jForaÓ Ecomíttemmo.
recebidos com ai voroço,pro vidos com Iargueza,& agazalha-
dòs com todo o refpeyto. Aceitou o Marquez o pezame, &
á defpedida grato,& inteiro correfpondeo ao Conde com of-
ferecimentos,& ao enviado com liberalidade. Os Governa-
dores fe derâo por obrigados do parabém , & que em quanto
ás tregoas, mandariáo com brevidade peíToas efcolhidas,com
poder, para que no Arrecife feajuftaíTem com as condições,
que melhor aíTeguraíTem a íirmeza,& a conveniencia.Propo- ,

íeráo logo os Enviados, que pois fuás fenhorias eftavão con-
formes no parecer das tregoas, mandaíTem retirar da campa-
nha de Pernambuco ao Capitão Paulo da Cunha , &ao Go-
vernador dos Minas Henrique Dias, com fcus foldados, que
aírolavâo,&deftruiáocomhúa mefma hoftilidade, anatu-
raes, & eftranhosj pois era certo, que durando efta guerra , f^
não poderia confeguir a paz : Cotn promeíTa dos noíTos Go-
vernadores, que logo os mandariaõ retirar , fe deípediraõ os
Embaixadores Olandefes. <i .« j : .
-i 2u PaíTados alguns dias, matidâraõ òs tres Governado-
tès ao Tenente General Pedro Corrêa da Gama,& ao Lecé-
ciado Simão Al veres de la Penha,para que com fuás letras af-
íiftiíTe ás Capitulações das tregoas , por quanto para fua va- Celehrao-fe as tre
lidade era neceíTariOjO ferem cófòrmes ao dereito. O Framé- goas entre hu, df
go, que com a retirada dos fobre-ditos Capitães fe achou li- ^^^^^ê?'^^^^"-
vre do que mais o inquietava,com frivolas efcuzas negou to-
das aquellas condições, que nas tregoas podião favorecer
noíTo partidòiDiíTe que íem ordem expreíTa dos Eftados,não
podia conceder , nem franquear o comercio , mas que po*
deria vir, em que fe abriífe o contrato, com limitação, que os
noíTos avião de comprar, & vender a ell es Deputados do Su-
premo,& do Politico,& não a outra peífoa algúa. Meyo,quc
tomava a perfídia herética , para vender pello preço mais al-
to,& para comprar pello mais baixo preço. Nefta condição
virão os noíTos Enviados o animo dobrado daquella gente.
Peílas rimulas da íagacidade revê fempre a malicia.Voltàraó-
fe para a Bahia com menos íatisfação,que receoiPropozerão
aos Governadores, o que tinhão paífado, & o que avião en-
tendido.

i.

2 1 4 c^sr^oro wsirjno 1 64 1

tendido, advertindo cautelofa vigilância , porque das ílmu-
laçoés do Olandès tinhão colhido, que não procurava a paz
para embainhar a eípada 5 fe não para occazionar odefcui-
do. Pareceo então o avizo refulta da dcrcoiifiança,porém lo-,
go fe vio fer confelho da prudência. Nos homens, feu pró-
prio dcfejo, hc feu mayor engano: Ordinariamente fe acon-?
felhão com a vontade, raras vezes com o juízo,

O que aos três Governadores pareceo refulta da

21

malicia,fe verificou logo fer eíFey to da inteiligencia.Sem que
fe paíTaíTem muy tos dias chegou á Bahia avizo certo,de que a
Olandès defpedira do Arrecife varias efquadras com ordens,
muniçoês,& gente,para levarem por entreprefa Sergipe, An-í
A afombra da gola, Maranháo,Sáo-Thome, & a Mina ; o que confeguirão
faunos faz, o ini' fácil mente, aííi porque o engano obrou fobre o feguro,como
migo a mayor gue também, porque o tempo, que fer vio a in vazão , não deu lu-
^^^' gar,a que fe adiantaífem os avizos. Não individuamos os fuc-

g ÇeíTos, porque acontecerão longe do termo de noíTahiftoria.

Só a entreprefa de Sergipe nos obriga a relação , por íèr par-
te da America,& cahir na efphera de noíTo afíumpto.Eftá íi-
tuada a Cidade de Sao Chriftovão em a Capitania de Sergi-
pe delRey, confinante pella parte do Sul, com a da Bahia , &
pella do Norte com o Rio de Saó Franciíco , & com a Capi-
tania de Pernambuco, de que difta fetenta Iegoas,doze gràos
além da Equinocial, para o Âuftroj povoação limitada , po-
rém de terreno fertil,& porto capaz. TantOjQue o inimigo íe
V io defaíTombrado das tro pas Portuguczas , que corrião , &
aíTaltavão todo o deftndo de Pernambuco 5 ( feguro, que a
confiança da paz nos teria facudidasas armas das mãos, ) for-
necco quatro nàos de tudo, o que lhe pareceo neceíTario pa-
ra a conquifta, & para a retenção j^fobejo poder, ajudado de
feu fegtedo , & de noflb defcuido.] Entrarão no porto com
bandeiras de paz; derão Ibbre a Cidade cõ eftrondo de guer-
ra. Saquearão livres, fizerão-fe fenhores, fem que algum dos
moradores,& vezinhos lho podeíTe impedir, porque os obri-»
gava a retirar a fegurança, & o preceito 5 fe bem que fuípen-

^ M fos na exorbitante trayção, que olhavão,& não criào, [não

Com trayçao nos ^ „ ,, , rr ^ x>rj -1 i_ -

ganhou a Cidade ^^ perfuadindo, que ouveíTe gente no Mundo tao barbara , q

de s. chrijiovão. fem pezar o agravo , perdeíTc de vifta a injuria , que contra-

hia

âl^

hia na ville^a.'] Para padrão da infâmia fes o Glandes na bar-
ra hiia notável fortificação.

Tinha aportado na Baliia António Telles da Sylva,

11

mandado pella Mageftadc delRey Dom Joaô o Quarto para

governar aquelk Eftado. Concorrião nefte Fidalgo muy tas, ^i"^^ . Í. ,f ^!^

o r 1- 1 11- 1 1 i- 1 , . ^ ^ Antomo Telles da.

& muy lolidas calhdades , com as quaes reíplandeçia emfua sylva.para Go^
peíToa , com exceíTo,.© illuftre fangne , que herdava . Encar- vemador do Ef-
regára-Ihe elRey , com tanto aperto, a obfervancía das tre- ^^^^r
goas com os Olandefes, que encontrandofe a confervaçaõ do
Eftado , com a obfervancía da paz , lhe ordenara, quebraíTe
pellodominio5& não pella amizadci Principe realmente gra-
de: A reputação Real coníiâe naais na firmeza da palavra,
que na extenção do império. Achou António Telles ^^^^- ^chaopovoofe-
cas as feridas, vivas as queixaSj& açezo o efcandalo, cô que o dído, & queixo-
Povo fe lafi:imava do aícivofo proceder do inimigo(para ília -s?.
obediência tolera veis,paf a feu valor infofriveis:) Acomoda- ^.
yafe feu animo com a perda, porém não com a injiiria , pare-
fcndolhe,que com a diífimulação dava v igor ao derprezo,& , .
forças ao agravo . Refolveo-fe ein tomar hum expediente, J
pello qual o inimigo entendeíTe, que noííb fofrimento era !!
preceyto, & não defmayoi, fazendo-lhe conhecer acauzade
noíTa impaciência, & a vileza de feu atrevimento . Deu-lhe
occaziáo para executar o defejo, o entrar n^ Bahia húa nào f|f "" f '^ ^ ,
l^ortugueza, que delia fahira carregada de açúcar , an derei- gueiíji, ^; verifica,
tura para o Reyno : A efta tal encontrou no mar húa fragata a re^o da ^uei"
piandefa, que vinha de Angola , para o Arrecife ; o feguro ^5
da paz a defcuidou,& a aleivozia Eftrâgeira a rendeo, Tirou
delia o Piloto, & parte dos homens do mar, & para que a ma-
reaííem lhe meteo quinze Olandefes: Contentes com a prefa
navega vão para o Arrecife, quando os Portuguez-es, que fi-
carão em a nào rendida,deraõ fobre os quinze Framengos,os
quaes cortados do ferro,& do medo fc deixarão maniatar,pe-
dindo bom quartel : Virarão ;os noíTos a proa , & em poucos
dias entrarão na Bahia: Contarão ao Governador o cazo ; de
que elle mandou fazer hum proceíTo, em que teftimunhàraò
ps mefmos Olandefes prifioneiros,&- culpados.

2 3 Pello Lecenciado Simão Alvçres de la Penha man-
dou o Governador do Eftado a inquirição ao Conde àq.,
* , Naífau,

M

..(j X

i.

dl 6 c^^r^^ioro LusiTJNo 1 64 1

NaíTau, & aos do Concelho Supremo, com hãa carta, de que

dor o agravo aos
oUndifes.

57
3?

53

3)

3?

3)

33

33

A

For urtãfuA in- j-eferji-emos a foftancia, ( ainda que não a forma . A Mageíia-
thna o Governa- ^^ j^}]^^^ j^q^^ Jq^5 ^ Qyarto meu fenhor me entregou o

governo defte Eílado ; & que nelleprocuraíTe com todo o

3, defvelo a obfervancia das pazes celebradas comos Senhores

5, Eftados, & as tregoas aíTentadas entre eftes dous governos.

(Fora de imaginar , que ouveíTe no mundo gente, que com

a tinta da perfídia érmaíTe os pados da amizade j & muyto

menos, que podeíTem encorrer em nota tão vil, os Miniftros,

& os VaíTallos de húa Republica, cuja politica pode enGnar

preceytos a toda a Europa : ) Impoffivel parece ao pontual,

que haja quem contra a fé publica fe manifefte perjuroj qtiã-

to mais aver,qué folicite a amizade para executar a trayçãoj

^, com animo taó baixo, que antepõem o intereíTe á reputação,

5) violando o dereito das gentes, por confeguir o roubo,a tray-

5, ça5,&: a infâmia. Eftilo entre as nafoês politicas increhivel,

5, & entre as barbaras abominável. A bãdeiras defpregadas , & a

„ pregoes da paz tem feyto Olãda a Portugal a mais crua guer-

„ ra i tomou-lhe o Reyno de Angola, a Ilha de Saó-Thomé, o

„ Eftado do Maranhão, & aqui a noíTos olhos a Cidade de Saõ

5, Chriftovão,& o porto de Sergipe levantando nelle húa for-

3, t^leza, para que a publicidade de dominantes,lhes cobriffe a

3, nota de ladroes. Naó fey^ que ou veíTe idade, nem gente,eni

5, que fe uzaíTe trato tão falfo, & com tanta folturaj nem tenho

3, ouvido , que deíTem os tempos nação ao mundo , que fizeíTc

3, da tray çaó rezão de Eftado: Porém o brado da noíTa injuria,

3, o fará crer a todos,porqivc não há retenção no poderofo,que

3, apermiíTaó não acuze. Então deixará de fe crer o furto,quã-

3, dó fe reftitua o alheo ; & fe defmintirá o confentimento,

3' quando fe caftigue o delido . Em eífe proceíTo vay provada

3, a verdade, & a rezaó de minha queixa pellosmefmos agref-

3, fores da maldade. Naó repito o fucçeíTo , porque me corro

3, de dar duas vezes em rofto com proceder taó fementido. Ef-

3, pêro areftituiçaõ do roubo, & ocaftigo dos culpados j &

„ quando falte aYatisfaçaó da parte , que he obrigada a dalla,

„ tenho cabedal, & valor, para por em execução o caftigo, &a

3, vingança, ainda que faiba, que a defobediencia me pode ar-

3j rifcar a cabeça.

24 Par-

w.&«-«<í ti, %

a 4. Partio o Enviadoj chegou ao Arrecifejdeu ao Con- ,

de, & aos do Governo, a carta,& a embaixada, de que não íi- r â r ? '^

càraó contentes: não de corridos, fe não de cortados.Naó te- 7^ /^ T^ ^''*

, . . . ^ P . , . r- j '^'^ íraj/fao com

ve lua malícia mais eíctiza , que a tingida ignorância [_ de ne- ffi^gi^ efcu^ai»

nhiia forte admitida, por contrarias evidencias. "] Valèraõ-fe
de outro mey o, para fe náo moftrarcm complices, dizendo,
ú^t nas trayçoés uzadas, não tivera parte feii confentimen-
to, nem aporá o podia ter feu limitado império para arefti-
tuiçáoj mas que informarião aos Senhores EftadoSjdainjufta ^
retenção de Praças,& fazendas, dando conta dos agrcíTores^
para que eftes foíTem caftigados , & aquellas reílituidas^ & cõ
demonftraçoés magoadas defpachàraõ , & defpediraõ ao En-
viado. Naó efperava o Governador do Eftado,nem outra re^
pofta , nem outra fatisfaçaój mas quiz juftificar com efta dili-
gencia, o que determinava fazer fua vingança.Defpedio para
Angola hua caravella carregada de munições, & mantimen-
tos, que aos aflidos defpojados foy remédio, & vida. Maii*-
dou a Dom António Phelipe Gamarão, qiie com o feu terço
de índios paífaíle a Sergipe,& fe alojaííb á vifta dá Cidade,&
da Fortaleza,& de nenhum modo permitiíTe , que o inimigo
desfrutaffe a terra j com expreíTa ordem, que fahindo aigús, a
primeira, & fegunda vez os defpo^afle do roubo, & das ^^' fjadoTdo^s/hd &>
mas, & os largaíTe, avizados, que á terceira vez , aviaó de pa-
gar o atrevimento com as vidas. Obfer vou o Camarão pon^
tualmente a ordem;& dahy pordiante náo ouve inimigo,que
ouzaíTe fahir de fuás fortificaçoêsj nem a ellas chegou outro
fuftento mais, que aquellcjque do Arrecife lhe entrava pella
barra. '■ ■ > ■■*::.■'• '>^v •:-■•--; o/..

2 5 Em quanto o Goveffiádor do Eílado fes eílas expe-
dições, fe occupava o Conde de NaíTau em defpachar hum
Enviado para a Bahia, aonde chegou com brevidade . A fuf-
tancia de fua embaixada íe refumia em dar opara-bem ao chega âBahUhU
Governador da viagem, & do lugar, comos offerccimentos Enwado do Co»^
da peíToa, congratuíandofe da vezinhança . Foy então dito, ^^ deNa^m^^
que por confelho de hum homem de nação , muyto valido
do de NaíTau, tratou a AntonioTelles da Sylva por Senhoria
na carta,defpois de lhe aver dado cm outra o titulo de Exce-
lencia3 & aífi devia fer,porque conftpu que o Framengo feu-
i: T tia

Ã'

^fa:^ o Govef'

±

2i8 C^r^^oro LUSITANO ,64^

tio grandemente o erro, de que o arguio a repoíla ; a qual a-

lém de prudente, grave, Sc concifa , naó levava regra, em que
lhe náo intimaíTe hiia fenhoria; o que o naó magoara, Te a fal-
ta fora da cortezia , & naõ doconfelho.Neftas, & em outras
couzas, mais importunas, que importantes, íc gaitou o annçfr
de quarenta & hum,& parte do de quarenta & dous , quan-
do tomou porto no Arrecife bua nào de Olanda, com ordena
aos do governo, para queao Gonde de Nafíau,Joaõ Maurk
cio, fe lhe não deíTe mais, que ametade do feu ordenado,coni
cartados dezanove da companhia Occidental,para o mefma
Conde, pella qual fedeículpavaõ com a pobreza dabolçay
exaufta pellos gr oíTós difpejpdios, & delgados recibosj & im*^
poíribilitada para a continuação dos gaftos. Em a mefma nào
í a Vernamhuco chegouavizo fccretoao Gonde, que osda companhia deter-
ZoaZnmao^cL '^^"^vaó tirar-Ihe o governo^mal fatisfeitos de feus procedi-í
de de NAJfau, mentos, capitulados por alguns falfos amigos , que o acuza-
vão de froixo, abfoluto,&ambieiofo3 culpas que formava o
ciúme, &: aenveja: Gonheceo logo o Conde os Authores da
çalúnia,& còm fagacidade lhes foy diípondo a paga, atalha»-;
do-lhesogoftodeovercm privado do governo , com ferc^
foi ver em fe ánticipar na renuncia do cargo.Para cfte fim dií*
pos de íèus moveis , ou por venda , ou por dadiva , refervan-
do fó aquelles,que pódiaó ter preço, fem fazer vulto, para os
levar coníígo. J

1 6 Chegara nefte tempo hua fragata Olandeíà, que vk
nha de Angola carregada de fazenda , & muyto mais de per*'
fidia, porque vinháo nella osReligioíbs , Clérigos , & mora-
Toma porto no dores, que não podèraó colher em o primeiro laço, para que
Arreafe huanao x\2iO faltafleni teftimunhas, que convencefíem de aleivofía
oUndefa de vol- tão folta, & tão efcandaloza, condenada nãofódocazo, íè
tA e Angola. ^^^ ^^^ confequencias: Por cauzas occultas tinha ordenado
elRey Dom Joaó,a Pedro Cezar Governador daquelle Rey-
r»o, (defpois do inimigo fenhorear a Cidade de Loanda lhe
fazia Pedro Cezar oppoziçaõ, para que naó penetraífc o in-
terior do terreno) que fe retiraíTe a parte , aonde confervan-
do a fua gente, náo oíFendeíTe á do inimigo : Com fal vo con-
duto do Olandès fe retirou Pedro Cezar, para hum fitio ;un-
to do mar, algiias legoas diftante da Cidade, aonde fe aquart
^ tellou,

1645

^WA^El,Lir(^ V.

íâlp

Bh'noticiai da ã"
com ^uã

tellou, & recolheo com os moradores^ que ficâf aõ á íiia obe-
diência.Corria fama entre os Olandefes, que dentro de noíía f ^ ^T''
íortihcaçao,íe depoíitavao muytas riquezas , que a àúi~ ooUndês fe feti
gencia eícondèra ao facoj & para o fim , que logo direi, 2Í--fenhor âaqudU
fentàr-aò amigável comercio com os noíTos, & fe tratavão/*^''^^*
iiâo como inimigos, íe naõ como alliados: (Que mal faí
quem fe fia do traydor ^ Mas deícuípemos a Pedro Cezar^
que o obrigava a obediência , & não a fegurança . ) Suc-
^edeo ( não foy cazo , fc nâo confelho ) ir o Governador
Olandès com alguns Capitães feus á noílà povoação, \ mais
a efpiar, que a ver"] aonde foraõ recebidos com agrado^
agazalhados com magnificência , & fervidos com magef-
tofo aparato,, &: adorno. Occupados os olhos na cobiça^
perderão de vifta a gratidão i& fempre alcivofo o Olan*
dès determinou, com infame trayçaõ , matar os poííiiido-
res , para lhes roubar os moveis . Convidou ao Governa-
dor Pedro Cezar , capitães , & nobreza para hum ban-
quete, aííinando-Ihes lugar, & dia j ( efte avia de fer o
de Domingo , aquelle , a Cidade de Loanda ) com inten-
to , de que a meza do convite ferviíTe de teatro á morte*
Naõ aceitarão os noíTos o oíFerecimcnto, ou empedidos, oa
prefágos. - •• — - - :;?

27 Impaciente ò inimigo de fèver atalhado natray-
^aõ, que intentava, naõ defeííio da maldade, bufcando ca-
minhos, por onde podefíè configuir o intento . Confide- ^àe emoprede^^
rou aos Portuguezes dormindo fobre o feguro da efcuza^, ^ ^°^^^ deivo^
& em a noite do dia apontado para o banquete, deu fobre •^^'''''''','' ^'"^'^
cíles,no quarto da alva,co todo o podertSem refiftencia pre-
deo,& roubou a todos, porque os achou dormindo na cama
de fua fmgelefa,fiados na amigável correfpondenciaj & paci-
fico trato de fua comunicação, fem lhe vir ao penfamento a
alei vofia, que não achara receo, nem ainda no mais defcon-
fiado juizo. Defpojados da liberdade, Scdafazenda^ com
tanto rigor,& crueldade,que fem lhe deixarem os uzuaes vef>
tidos , os embarcarão para o Arrecife,(mais cortados da inju-
ria, que da perda,) aonde chegarão fem parecer de homens,
pello bárbaro trato da viagem, avendo nelladias,em que
não achou fua fome, Sc fede mais, que aagoa falgada do
V Ta marí

Lu

^co o mefmo ef-
tilo fa:i^ o mefmo
em àeferêtesfar-
tes.

Motivos faro.
loão Fernãdes Vi
eira aprejfarfua
determinação.

í^20 C^ST^IOTO LUSITJKO 1^42

mar: Aííi vicráo entrando fucceííi vãmente as noticias defe-
melhantes in vazões, urdidas com a mefma falácia, porém naó
logradas com a mefma fortuna . No Maranhão cahiraó no
laço , que armàraò ; porque engolfados no roubo deraó
occaziaó ;, a que os moradores v oltaíTem fobre elles, & co-
braíTem o perdido, á cufta das vidasdemuytos,&dome-!
do de todos , que fugindo ao noíTo ferro bufcàraó no mar
o feguro. Em Saõ-Thomé os caftigou o clima de maneira
que a muy tos deu a terra fepulcro, & a poucos avizo,para fu-
girem á morte . Em todas as mais partes perderão por força
tudo, quanto adquirirão por engano.

28 AíTicomo oFramengo crecia no império pellas
entreprefas, & no cabedal pellos facos, aíTi fe demafiava
na tirania, com que tratava aos rendidos, & conquiftadosj
osquaes faltos de géneros ,& de moeda , com queremiíTem
a efcravidaó,& agravo, bebiaõ a defefperaçaõ navivez^ da
dor. Joaó Fernandes Vieira movido dos exceíTos da callami-
dâde,& dos impulfos da commiferaçáo , ardia nos defejos do
reparo:Crecia tanto a chama, reprimida dos obftaculos, que
fe não redundava o incêndio, não deixava de acreditar a
grande capacidade de feu coração j & na verdade , que mais
luzio o valor defte grande varaõ no tempo , que o reprimio^.
que na occaziáo, em que o manifeftou:Confiderava,que cora
a auzencia do Conde ficavi^a miferia de todos fem arrimo, Sc
a tirania fem freyo j porque o ódio, & a foltura,(em parte re-?
prefada doniedo , & refpeyto á peíToa ) fem eíle pequeno
bocado, avia de romper furiofa com mayor violência, &
defenvoltura . No Conde tinha a vexação, fenão remé-
dio , alivio, porque fe achava preço para o refgafte, & com-»-
pravafe a hum fó . Naó aífi nos dos governo , que peila vi-^
leza do nacimento,&pella multiplicação do numero acu-
dião á fede da cobiça, cõ a exorbitância do defejo, & do ex-
ceíTo jperfeguiaó para roubar,&não roubavão fem perfeguir.
Códição infeparavel era,de qualquer negocio, o cóprarfe,ou
remirfecóexceííivocufto. Ponderava defterrados osSacer-
dotesj os Herejes com fenhorio ; as ovelhas fem paílores, &
temia, que os lobos deftruiíTem o rebanho da Igreja, tra-
gando aos inocentes cordeiros, expoftos á vcrocidade da he-

rezia,

i542 fAXTBLLir^OF. 221 '

rezia, Scaosvenenofos dentes de aquellas indómitas feras;
& receava, que a corrupção das condenadas feytasjiníicio-
naííe a pureza do pafto eípiritual , & deípovoaííe os curraes
do verdadeiro Paftor. Via, que da tardança doremedio/e a-
limentava a ruina,& que nas doenças agudas fe aproveitaó os
médicos de medicinas violentas, & propunha em feupey to,
não eíperar mais tempo para atalhar o perigo.

29 Entrou oanno de mil &: feifcentos & quarenta &
três, tempo em que o Conde de NaíTau, fe achava muy to a- Afreflufe a Con*
diante, nos apreftos de fua viagem ; & por não ficar atraz na de de Nafau pa-
íàtisfação de fua cobiça, fahio feu eíludo com húa daquellas ^^f^ff^r a oUí^
inveóti vas, de que íe valem os eftrangeiros, para enganar ^ Sc '^
adquirir. Avia tempos, que tinha mandado fabricar húa ma-
geftofa ponte no Rio Capeberibe, que franqueava a paíTagé,
para o Arrecife, á cufta dos moradores^ aos quaes determina-
va V ender a ferventia, taxando a cada peíToa, Sc carga o tri-
buto, a feu arbitrio: O que faltava delia, mandou acabar com
madeiras; & prohibio, com graves penas,os barcos, para que
IhecahííTe nas mãos todo o lucro. Ouçaífe agora, o que po«
de o interefe com aqúella nação , nunca atenta á vileza dos
meyos por confeguir feus ordinários fins : [achaque j que em
todos, iguala o nacimento , & o fangue ] Mandou publicar
por todo o recôncavo , que fe queria defpedir de todos, (aí^
finando dia certo ) & imprimir fi^ lembrança nas memorias
de hum, & outro fexo , com a vifta de hum prodígio nunca
imaginado, o qual avia de fer, verem feus olhos voar hum boy
pellos ares, como voa hum paíTaro. Concorreo innumeravel
gente. A a viftade todos mandou por hum boy vivo,& man-
fo em húa das janellas de fua galaria,& dentro tinha efcondi-
do hum couro femelhante cheo de palha: Chegou a hora;
com arteficíofa futileza trocou os brutos, voou por húa cor-
da o de palha, Sc ficou efcondidoo outro. Corridos da farça
íicàraõ os circunftantes; Sc mais afrontados da força,com que
lhes fi.zerão pagara todos a paífagem da ponte , de ida, & de
volta: Por íima de dous mil florins cobrou o Conde por cila
vW traça . Tramoya uzada defta gente em todas as idade*
fòy, roubarem a fu ftancia,có a mão das aparências. Ao outro
dia deu a ultima defpedida afua aíTiftencia , & a feu go vernp
^^'^ T3 còm

'||!Ste,r,ii,

I

L

22 i CA^T^bl:Ò LUSITMO Í643

com dar iliim bãriqiíete a tòdâS^^ás Damas , & taverneyras do
lugar, no qual fe brindou até faltar a todos o juizo . Partio-fe
no íegainte dia, que era hum dós de Mayo de mil & fcifcen-
tos & quarenta & três, acompanhado de muy tos Portugue-
zes, até a Paraíba, aonde fe embarcou, deixando a todos laur-
dadès^ não pello que devião , fenão pello que receavão. Tal
era aquelle governo, que ríelle achavão os moradores fó a
difFerença, que lhes repréfentava a comparação de hum, para
.: " inuytos tiranos. ' ' -^ '

'•^ 50 Mal tinha o Conde dado á vela, quando OS Gover-

'^ nadoresOlandefes largarão todas as dó intereíre,& da perfí-

dia: Naõ fe dávão mãos a tiranizar os moradores,alcânçando-
Excedida dos O- fè huns, aos outros,os exceffos da injuria , & da rapina. Che-
hndefes em fua gàrão os hòmens a aborrecer a vida, porque fuftentava nelles
aufencia. a duração da miferiai & fe não imitavão,na defefperaçãojaos

Abydenos era porque o Bâptifmó os livrou de Gentios, que
a nâo eílarem firmes íia fé,Vira Olafida no Brazil, o que vio
Roma emNumancia. Gemia á aflição cõmedrofas queixas,
inadíi de ç^^^^ çf^g ali vio fe pértíiitiá á dor) & todos os inftantes fala-
Fermndes ^^^^ ^^ coração de Jdaô Fernandes Vieira, peífuadindo-lhe
6 remédio com as vozes dálâftima, &: dó tempo . Obedeceo
á compaixão , & deliberado èm defembainhar a efpada dif-
pos o golpe, adiantando òintento á opportunidade . Com
vigilância,^ diligencia inèndou engròíTar o numero de feus
gados pòt todos oscurraes: Récolheo aíitodo o género de
armas, &de munições, qile a cáútela lhe pode bufcar ; todos
os mantimentos , que pode àVêf, comprou y& remetia tudo a
feus criados, fazendo depofito nas matas , Sinos engenhos.
Disfarçava, õ que podia^ &:0'que não era poffivel, deixava á
cortezia da fofpey ta, não faíêndo fuarefolução efcrupulo,
nem daculpaVnem dacàlumnta^ antes com difcreta manha
enganava a todos com a mefmá verdade^, aconfelhandolhesa
imitação. Abominava nâs praticas, a fogeiçâo,& o fofrimen*
to, chorando a ignoininiâ^ (COin que via no Brazil fepultada
a reputação, & a ValeiltiáPortUgueza, tanto pello uzo,como
pelía mem<>ná. Dizia fnuy tas vezes , que a peor forte da mi-
fcriá, era fogêitaf o valor á cobardia, piorque não tinha fahi*
da, fe não para á infâmia: Indafíriaj de que fe valia para acen*

i der

Abominada,

João

Fieira.

C

ié45 ^fJ^ELLlF^K^j a-^

derosammos,& para defpertar do íono^fem tevelar ofe-^^ elUperím^
gredo^cÓ maisrefulca de gloria ftos impulíos, que agora dei- ^^ ^ ^odol afde*
fimnlon,quenosobftaculos, quedefpois venceo. A todos ^^^^^^
falava j & aos mais amigos com mais receo , porque primeiro
os V ia com os olhos da própria defconíianp , que com os da
ialhça conveniência.

w-i jL^ i Hum dia,que mais vivamente o combatião eftes cui-
«dados, batalhando em feu peyto os defeps, Síasdifíiculda- •
'des, ferecolheo a hum Oratório de fua caza, em que fobre ^^i^^^^^^^i
liumbofete, que lhe fervia de altar, eftava háaMa|6m de j;^^^^^ .^J^^^
•Chrifto Crucificado, a que femà de éfpaldar bum retábolo,

5 fi?/» jDf ".y.

>S

^ nelle copiada,dc boa mão,húa pintura da Sãaiffima Trin-
dade j aonde fechado, compungido , & coiii os joelhos em >
terra falou defta maneira com feu Deos, rcprefentàdo nas fo-
-bre-ditas Imagens. Senhor,a cuja vifta fé não pôde occultar ò '*
■coração mais retirado , nem opehfamento mais efcondido, ''
■manifeftos vos faó os cuidadosi,com que luto , & òâ intentos, "
*om que ando. Vós fabeis,que nao teme arrifcar a vida;>quem "
€Tde no zelo de voíTa honra: Em eíTás Sagradas Iiiíâgens Vós "''^^'A.^ ^''"•'^
■feufca hum còraça5, piadoio, que néllâs vos não fofrè òffen- '*
^ido: Refplandeça a vingança,«à itiêfma parte,aondefe cho- "
Ta a injuria^ para que vos eòíihéça pello caftigo , queM vos
^efpreza pello fofrimento. Voílo fèrViço mè íiiove , & fó o
xelo de voíTa honra me animajqné á nã^ fer aíTi, ínalpodèra
fer minha , refulução taó árdua, fe os impulfos na5 foráõ Vof-
•fòs . Bem fey eu , Senhor^ qae a fragilidade de kiíii coração
-liumano, não chegara a emprender,o que por defficil fe mof- " , .^
tra impoffi vel, fe voíTo íftisfilio nlo dera â maoa minha con-
■iiança,&àmeudiícurfo». Asforças deftê inimigo aíOcomo ^j^uemmmife-
Tftos opprimem,Võs agravaõ, porque fe nos maltrataô por c-^^-jia o motivo, & a
tigo, a vós vos oiendem por oprobrió;pois aomefmo paiTo, confimça,^
-^ue deftroem nòífâs càZ^s,'abraíâó vbfíbs teihplos j defpeda- j?
içando, femdifkiíição,ós:corpos de vofíbs fieis, ^ as imagens 75
■âevoííbs fer vos. Para a vingança nie eílimulam a dor , &: o 55
2elo5& fe bém , que o que fóu me acobarda , o que vos devo n
-ine animá^ cóíihêcendo, como iiel<, quê quando quereis favo- ??
-lecer, com mofquitos venGeÍs,& com fombrastriumphaes.O ??
4ntent0 defta eitíprefa mais me parece preceito voíTo , que ?>
r T4 ina-

33

±

#

^^24 C^STfJOTO LUSITJKÓ 164^

ij impulíb meu^pois ndla confidero,qiie para iiiftromeatos do
55favor,&docaíligo tiraO:esaSaiigardoCampo,aGedeaõdo ^^^^^'-B-
), lagar, a Devora do eftrado , & a David do monte 3 & que a f^f/,^'.
5/ eauza he tanto voíla como minha, pois com hnm mefoio bra- i.Je^^cà

5,çòmeIaíl-ima,&vosofFendeatirania,&oodio,comqiieef- " ^

5, tes pérfidos herejes tratão de confiimir a fé de nofíb pey to,

„ & os miniftros de voíTo culto , cortando com hii mefmo âcí:-

„ prezo o profano, & o fagrado 3 ponderação que me faz crer,

„ que noflà juftiça,& voíla piedade me hão de affiftir 3 bebeu-

5, do eu a confiança na íingileza,poisfabeis,que nem a vaidade

5, me aconfelha^ nem o intereíTe me move j & fe para favorece-

5, res ao voíTopovo efpèraftes,para decer á terra, aquelle tem-

5, po, em q a virtude eftava mais opprimida, & a malicia obra-

5, va mais desbocada, chegada he, Senhor , a hora de acudires

R 5) com o remédio a efte povo afligido, para que a falta do fofri-

„ mento, nos exceíTos da tirania, o não leve ao ultimo da de-

„ fefperaçãoj&refpIandecerávoíTa omnipotência, em toma-

Efpermdodefua res por inftromênto de caftigar infolentes, hila tão vil crea-

^^edad, c favor. tura,como eu fou: Saberá também a herética perfidia,que fe

53 contra nós p r evalece, porque irado o permitis ; prevalecere-

53 mos contra ella, porque piedofo nos favoreceis. Voífa fé me

3? a]enta,& fundado nella , me prometo hei de ter em meu fa-

" vora guia, que oíFereceis a quem vos bufcaj os alentos, que

55 dais a quem vos chama, & as forças, que concedeis a quem

> ^> vos ferve.

32 Levantou-fedaoraçãocomnovoefpirito^ tãoou-
E dos homens a ^'!' ^"^ 1^'^ f^^ q^^fem a nuvem do receo foy dando expe-
diente a todos os mgredientes do n^ocio : Para fe fenhorear
vvr. \ ^^^ ânimos, & meter a mão nospey tos dos homens , de que
neceííítava o porfe em campo, deu em fua caza muy tos,& re-
.■ i^^u\«-i^ petidos convites, acomodando os lugares ácall idade, & á ef-
timação das peffoas: Sobre meza fe praticava no procedimê-
to do Olandès fempre tirano,& fempre bem fnccedido 5 na
jnjufta obediencia,& fogeiçãp dos moradores , nunca rebel-
àcs.Sc fempre defprezados, fem qne nos ofFendidos faltaíTc
fofrimento, que toleraíTe a defigualdade dos efireipos. Tal-
, vez fe alarga va,com induftria, Joaó Fernandes Vieira, a affo-
prarosdefejos da liberdade :Chegavafe adifcorrer fobreos
" -"^ i meyos

mey os neceírariosi& apalpada a penúria, acabava em deíína-
yos a pratica. Sagacidade, com que odifcreto varaõ, com a
falta do neceíTario, (que fimulavaj acendia em todos o defe-
jo do remédio, porque foíTe o impoííivel imaginado, na oc-
caziáo da emprera,com a mefma facilidade v encido,com que
fe manifeftaíTe remediado. Alegravafe de conhecer, que ten-
do da fua parte as vontades, offerecendo-lhes cabedal , & ar-
mas, acharia coníigo os braços de todos.

33 Chegou o Setembro de mil & feifcentos & quaren-
ta & quatro, & nos primeiros dias do mes, o Tenente Gene-
ral André Vidal de Negreiros,em companhia do Padre Mef-
tre Frey Ignacio, Religiozo da Familia Eenedidina, a quem
deve aquelle eftado, não pequenas diligencias , & deíèjos de Ahnnàofe comos
fua reftauraçaó. Defembarcàrao no Arrecife, a titulo de vi- '^''^'''' ^'^'•S''*
rem da Cidade da Bahia, a vifitarfeus parentes. Pay, &Mãy :

tinha o Tenente na Paraiba:E pello recôncavo parentes,&: a-
migos, o Religiozo. Com efte pretexto, (também diíTimula-
do, que não ficou fofpey tofo aos Olandefes) lhes derâo licé-
ça, para fahirem a viíitar a João Fernandes Vieira ao feu en-
genho. Forão recebidos com tanta alegria, & magnificência,
Gomo fe forão efperados. Abrio-fe com elles , não fey fe por
confiança, fe por obediencia,fey, que da fecreta communicar
ção refultou, tomarem os dous hofpedes o pulfo ao eftado da
terra j notando com diíTimulação, & deftreza o poder, as for-
tificações, a difciplina, & o numero da gente, que o inimigo
tinha, & ou foíTe para informar,ou para perfuadir,(q não po-
deremos efpeci ficar, fe nefta diligencia obrava o preceito,ou
a efperança)fabemos,que achàraó as fortificações defmante-
ladasj a difciplina efquecida, o numero dos foldados dimi-
nuto,& a vigilância adormecida ; occazionado tudo da au-
fencia do Conde, da fogeição dos moradoresjda foberba dos
dominantes, & dos favores da fortuna.

9 4 Para a Paraiba fe v oltàrão, o Tenente, & o Religio-
zo, & por elles efcreveo João Fernandes Vieira ao Governa-
dor do Eftado António Telles da Sylva,dando-Ihe meiída
conta das cauzas de fua refolução, & dos motivos, que o per- ^ ^'^^^° conuàe
fuadiãò a cometer húa emprefa,na eftimação de todos, taó ^^' !^1^^^J '^n^v^t
fficil, que pareciajtinha mais de tcmeridadcjque de confelho: ^^ ^^^^.

Ad-

Q2

6'

QASr^oro LUSITJISÍO

K544,

Advertia-lhe,que já o dado tinha deitado a forte, êc que naó
deixava porta aberta para outro recurfo mais, que para o do
focorro^ ao qual náo podia faltar hum Governador , a quem
fe íiára a confervaçáo do Eílado: Pr oteílava diante de Deos^
Sc dos horaês invocar o auxilio eftranho,fe lhe faltaííc o pró-
prio, não por inconfidência, fenão por extrema neceffidade.;
Deu íim á carta, pedindo com brevidade a repofia , para que
a tardança náo fizeíTe inútil a diligencia . Nefte tempo fe a-:
quartella va Dom António Phelipe Camaraó,com os feus ín-
^ dios, na campanha de Sergipe delRey,(como deixamos dirí_
to) a quem Joaó Fernandes Vieira, por carta fua, pedia o fo-^;
M pedindo focono correífê, pois o cuílumava fazer áquelles moradores , em to-
a Henrique vias^ j^g [^^^ afíiçoésj & nas que OS ameaçavão, o devia executar
& ao Amarão. ^^^^ ^^^.^ ^^j^^ porque de íeu auxilio pendia o remédio., ou
a perdição de todos. A mefma negoceação fes com o Gover-í
nador dos Minas Henrique Dias,que naquelle tempo aíTiftia
no certão com feu terço, a caftigar húa rebelião do Gentio.
Não fe efqueceo de dar conta de fua valerofa determinação,
Sc das rezoés della,ao feu Rey,& Senhor Dom João o Qiiar-
to,manifeftando-lhe por extenfo a neceííidade,que o obriga-^
va, tâó viva, & tão apertada, que nem ainda a mefma calum^
nia, lhe poderia efcurecer a juftiça, nem reprovar a dclibera-
ça63& que não podia aver Iey,que rompendo os foros da na-»
turezajobrigaíTe, a elle Goyernador do Eftado, ás obfcrvan^
cias da obediência. <

35 Chcgado^s que forão á Bahia 5 André Vidal de Ne-
greiros, & o Padre Frey Ignacio, os ouvio o Governador do
Eftado, alterado, & conípadecidoj porque o informarão das
tiranias, que os Pernambucanos foportavão , & da deliberai
ção de Joaó Fernandes Vieira,a quem todos aviaò de feguir,
ainda que de certo entendeíTem , fe aviaõ de perder^ quanto
mais, que os animava o eftado , em que o inimigo fe via j o
qual miudamente lhe referirão^ & que no tocante ás trcgoas,
todos fe achavão defobrigados de as obfervarem pello defa-
foro, com que os Olandefes as v iolavão, não fó em parte, fc
não em todo. Derão a carta, que ©Governador Ico atribu-
^arta de íoaõFer lado, vendo-fe indecifo,entre a obediencia,& a importância j
nandes Vieira . entre a juftiça, & a difficuldade j fupoftojque fe llie reprefen-

tavaõ

Jlecehe o Govev
nador do E/lado a

1^44 fA^ELLir^pr. 227

tavaó mayores emprefas, que muy tas vezes vencera a defer- '
peraçãoj& que a violência da oppreíTaõ, arma,contra íi meí^
ma, o irreparável impetu da liberdade. Se coníultava o nego-
cio com feu valor,fahia decretado o focorro jfe com as ordés, ^ ^ ^^^ / . ^
que tinha de feu Rey,fahia definida a efcuza.Nefia ambigui-^^^^/^^^ ^ '
dade lhe propôs o difcurfo hum mey o honefto, para a obler-^o/?^.
vancia, & útil para a contingência j o uio do qual o abfol via
da obediencia,& da impiedade . Mandou cfcolher duas tro-
pas de foldados , de trinta homens cada húa, cujo valor , &
difciplina os tiraria a falvo de qualquer fortuna: A cada par-
tida nomeou feu Capitão j eftes foraõ Paulo Velozo ,& An-
tónio Gomes Taborda5& por Cabo de ambos António Dias
Cardozo, a quem inílruío no que avia de obrar j regulando-
lhe as ordens pello eftado das couzasj & com precey to , que
íe não podeíTe defuadir a empreía , feguiíTc a obftinaçãoj em?
tudo fubordifíado ao di6tamen de Jóaó Fernandes Vieira , a
quem mandou dizer de palavra, que na balança do confelho
pezaífe fua determinaçãó,para q na execução, fe não faltaíTe
ao ferviço de Deos, & delRey, certo, de que fó nefte cazo o
acharia prompto para favorecer aos moradores.

36 Nada ficou devendo António Dias Cardozo á con-
fiança, que dellefes o Governador do Eftado, pella pontua-
lidade, com que obedeceo; pello fegredo que guardou^pella jj^ António Vhe^
brevidade com que partio; pella vereda que efcolheoj& pel- Upe Camarão lhe-
la fortuna com que marchou. Com feu cuftumado v alor, & refponde.
2elo refpondeo Dom António Phelipe Camarão á carta de
João Fernandes Vieira, dizendo-lhe nella , que fem dilação
fe punha a caminho com o feu terço, primeiro a obedecer ao
gOilo, que fempre tivera de o fervirj & logo ao intereííè,que
alcança va,em o ajudar em taõ glorioza emprefa j & quedeA
de alli lhe rendia as graças da parte , que nella lhe queria dar.
O Governador dos Minas Henrique Dias, recebeo acarta
com extraordinário alvoroço, avaliando por fingular dita , a
occazião, que lhe dava o tempo, para fe moftrar grato aos fa-
vores , que tinha recebido dejoaõ Fernandes Vieira, a quem
refpondeo, que logo fe punha em marcha, com o pezar , de q ^^^'f"^fi^ ^^'
a diftancia lhe retardaria a preífa do defejo , & de fe achar o ^'

feu terço com pouco numero de foldados^ mas que eíTes taõ

obri-

2a'

QASr^oro LUSITJNO 1 64^

obrigados a ciarem a vida por íeu ferviço, que cada Iiii obra-
ria por muy tos j & todos, fem recear o rigor do inverno^nem
as aíperezas do caminho, fe punhaõ a elle,alegres, moftrando
em atropelar obftaculos a promp.tidão,com que íabião fervir
a feus fenhores.Tão extenfa, como ifto,tinha fido a compre-
hençâo de hum mancebo , que tão diftantc , & taõ de longe
foube carearapiigos, para. os achar nefta occaziáo fieis ,&

gratos.

37 Em o mez de Dezembro de mil & feifcentos & qu a-
renta & quatro annos, chegou António Dias Cardozo ao rçk"
chèmaTernm' concavo de Pernambuco, có ditofa viagem, porque nemfof:
bucoAntonipDias fentido, nem lhe faltou foldado (fem memoria dos difcomo-
Cardo^o. ^qs do tempo, & do caminho, que avia padecido , á v ifta de

ter logrado feu intento , o q julgava por felice aufpicio de íè
concluir o negocio, a que vinha.,J Fes logo avizo a João Fer-
nandes Vieiraj o qual o feftejou com alegre alvoroço,& pru-
dente cautela: Com efta,determinou dia,& fitio, para fe avif-
tarem, furtados a quaefquer outros olhos . Conferirão com
brevidade opezo do negocio , a importância dofegredo,a
utilidade da prevenção, em obfequio da qual mandou Joaõ
Fernandes Vieira apofentar, & prover de todo onec^íTario a
Tor orde de loto António Dias Cardozo, com os Capitães, & foldados de fua
jFernUes Vmra. of^e^^iencia, em hum lugar, fecreto pello retiro , abundante
A .,.:. j. oci:ul' ^^ij^ cuidado , & feguro pella confiança , que fazia de hum
criado feu chamado Miguel Fernandes , aprovado de fiel a
multiplicadas experiências , & de zelozo em tudo , o que lhe
ordenava de feu ferviço. Continuarão as viftas fem diminui-
rão da cauteja,& pouco a pouco fe fes António Dias Cardo-
zo capaz doEftado das couzas, tanto pella parte da refiften-
cia, como da conquifta. Convierão ambos, em que primeiro
fe trataíTe do mais prccizo^ que era a prevenção, para qual-
quer cazo: A eíle fim defpedirão quatro foldados,igualmen-
te animofos, & confidentes, ao Governador do Eftado An-
tónio Telles da Sylva , para que de fua parte oinformaflèm
detudo,oqueaneceífidadepedia, &arefolução difpunha,
pedindo, que com toda a brevidade, os proveííe de armas, &
munições, porque não fuccedeíTe affaltallos o repete^ & àt£'
tmillos primeiro a falta, que a força. Acreditarão o recado

com

Jèaloja,

com carta ríimilada5& fiiccinta . Partirão de Pernambuco em

Fãtem âvl^ dâ

Manoel j^^wávo de mil & feifcentos & quarenta & cinco. Enganoií-íe. ^e/ad7dZc7r4 7ú
^^ -^^^ o Author,q diz, fora a e% negocio o mefmo António DÍMiGovenudor de

^;:C-l1

Cardozo em peííba. ■■■'■ ■-''' ''■ '-"-yí^í'"-»-^ >^;./k->^— ^"^^ ^Ejlado^

'38 Eftimulado João Fernandes Vieira dcrdefejo ^ [ v i-
vãmente ardia emieiípeyto] de ver livres aqneíles povos
(.pòrtantas rezoés cativos ^ do império 01andèsy&" adverti-* '
ÒQj queno fegredo coníiftia a melhor direcção dá emprefa;
Sc que efte fe desfiava có as difpoflçoés dos meyos , [mais ar-
lifcadò nas partes mais remotásycomò o ficava fendo a Bahia
a.refpeyto de Pernambuco , aonde a diftancia da communi-
cação com o Framengo poderia enganar o recato, & induzir
a algum traydor a fazer avizos ao Olandès avendo tantos de
Naçaó, que fe correípondiáo com elle] tratou de fe aprovei"!
tar do tempo contra o cazo, Sc de fe adiantar á trayção, com '"'
a-diligenciadosapreftos. Mandou chamar a António Dias '"'-
Cardozo, para hum lugar occulto, perto do feu engenho àc jjfentto mtféfi
Saó Joaó Baptifta. Comunicou o receo , moftrando como SL-^^ofegreãúfé re-
dilação dos negócios traz coníigo a infelicidade d os íucçef- "^y^ ^ ^igum ce^
íbs. Propôs o remédio dizendo, como eftava refoluto em-'^ ^ ^^-
defcobrir logo feu intento a aquelles homens , que por vezi-
nhos, parentes, & amigos tinha por mais confidentes, & que
porfuacallidade, nãofaltarião ás obrigações de feu fangue:^
nem ás importâncias de feu cómodo j pois era certo, que ■
quanto mais fe detinha, nlais íe arrifcavâ * Guvi-o António -
Dias Cardozo com atenção j & reípondeo, que tanto pellas -
ordens, que trazia , como pello que defejava , não podia fa- '
2er,nem afpirar a outra cou^a mais, que ao que ellejoão Fer*
Bandes Vieira difpoíeíTe , & ordenaíre,como primeiro movei ^
de taó glorioía emprefa , ficando4he fó a liberdade , de lhe >■
render as graças, no que lhe tocava , pella parte, que adqui-- '
ria em facção tão alentada, que fó-ointentalla baftâva para ^
illtifcrar feu nome. Conferirão o modo da communicação,&
dos avizos, &fe apartarão prevenidos , para qualquer inci-
, dente, que fobre VI eífe. ..ía..í.

3 9 Para 1 ograr a occazião (tirando-a á fofpey ta) cuílu-

mava João Fernandes Vieira, muytas vezes , mandar ro^ar ^^^^ ° qual Iom
^ara a fua niezajaqaelIes.homens,que ou por vinculpjon por ^^ roupárâ ame

ami- íii.

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230 C^ST!(IOT0 LUSITJNO 1645

amizade íe julga vão merecedores delia j & não poucas , aos q
a nobreza, fazia parecer cortezia, o rogo. Para o dia feguinte
mandou rogar a todos, & medir as iguarias pell o numero dos
convidados,porquefatisfeitos da abundancia,lhe delTèm gra-
ta audiência: Sentàraó-fe àmcza, (bem alheos do prato , que
os eíperava) & por ultima iguaria, fe abrio com todos deícu-
brindo-lhesa reíulução deíeu intento, & nella, o que de íua
nobreza , Sc de feus eípiritos queria , com femelhantes re*:>
zoens. S

40 O vinculo do fangue, Sc a confiança da amizade nos
^ " aiu ntou aq ui a todos , os que eftamos prefentes : Du plicadas
t d s rezoes, para me nao enganarem meu conceito : J ultihcadot'

motivo, para não defconfiar do íegredo (quando naó baftâ-^
' ra Ter a importância de todos:) Náo o faz ajheo, quem ao feu
*' mefmo fangue o fia j nem o fia a terceiro , quem o comunica
" ao amigo: E tenho por certo, que me não fahe do peyto^ té-
*' do nelle parte peíToas tanto do meu coração : Nellearde o
" zelo do bem comum, defde o primeiro dia, que o inimigo fe
" fes fenhor de rioíTas fazédas,& de noflas liberdades:Creceo o
" incêndio com as oppreíToés, cevando-fe o fogo na continua-
" çaò das tiranias,& no exceíTo das injurias fe) tas, naó fó aos
" homens, íè náo também a Deos , de maneira, que não podè-
" ra reprimir tanto tempo as Jabaredas , fe as não mitigara a eA
" perança de fe trocara fortuna; não perdendo de v ifta as pro-
" meíTas, que me fazião tantos focorros , & armadas , quantas
" malogrou nofla defgraça,moíl:rando-nos a experiência, o ali-
" mentar-íea ruina, das efperanças do remedio.Confideraçaõ,
'' que me fazia entender, obrar mais em noíTo dano a própria
" culpa, que a alhea força; pois via, que os mefmos elementos
" fe punhão da parte dos contrários . Agora, que já o cuftumc
" da fogeição nos tem tão efquecidos , do que fomos , que não
'' eftranhamos a miferia de cativos, Sc que o Framengo nos do-
'' mina com defprezo(ou porque nos julga n^iortos, para o íen-
»> timento,ou porque nos avalia inhabeis, para a vingança:) A-
>» gora,que funda o feguro de feu império no defcuido de nof-
« fa liberdade, tão defa tento á confervação de fuás forças, que
5> prefume fobejas as armas , inutis os prezidios, íu perfluos os
» foIdados3 inferindo de noíTo abatimento a eftabelidade de

feu

n

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'PJ^B l LlV^Õ Kl 231

n

55

feu domínio; agora digo,que jí não poíTo diiTmiitlar mais té- ,5
po,comachama,quemeabraza o coraçáo,há tantos annos, ,5
(digo que não averá animo Por tugiicz, aonde, por tantas f e- ,5
zoes, iiáo confidere retratado o mefmo defaílbcego. )Bur- „
quemos nas armas as demonftraçoés dos ânimos , fe he, que „
cada humdeleja deitar de feu pefcoço tão infame jugo ^co- jj
bremo-nos da afronta co a refoluçáo; faiba o mundo , que o „
íbfrimento em nós, foy ardil, & não vileza . A paciência vo-
luntária, heluftrofa virtude j forçada , he efcravidáo fervil.
Nunca nos poderá condenar abatidos, quem fouber, que eí- „
peramostcpoopportuno para nos desforçar vtngados.Com ,^
laftimofo grito chama por noíTo braço a dor de tantos inful- ,,
tos,afrontas,&injuftiças, como temos padecido: Não damos ,^
paíTo, que não ponhamos ospèsfobreo fangue das feridasy^^
íbbre as cinzas dos incêndios, fobre as fepulturas dos mortos, ^^■
fobre as pedras das ruinas, & fobre as brafas das injurias,com ^J
que a infolente tirania deftes verdugos nos tem quaíi confu- ^^
midos.Naó averá pârte,em que nofíbs olhos não vejáo vivos, ^^
osfmaesdosagravosj&não averá hora, emque deixem de ^^
nos refrefcar a memoria dasoffenfas.Naó há entre nós algum, ^^
que fe poffa gabar, qoe a fortuna o ifentou da forte de todos. ^
Qual ouve tão ftngular na dita, que não ouça em fua caza os
gemidos da magoa, ou ferido na honra, ou laílimado na fazé
àd? E qual poderá aver, que não ackjc deftruir , os agreíío-
res de feu dano?Quem a tanta advertência fe não der por en
tendido, paíTará de racional a bruto,& de feníitivo a infeníi
vel, reduzido por fua mefma puíilanimidade, ao ultimo efta- "
ão da miferia. Que fado nos acobarda.^ Qiie fombras nos ate- ,
morizão? Que deícurfos nos alheaó?Húa vil canalha alimen-' „
ta da de fua mefma perfidia,cu)a efpada naó corta,fe naõ com »
os fios da trayçaó ? Pois que, receamos perder a fazenda ? E
qual de nòs deixará de a perder,fc com feu braço â não liber-
tar? Não fica mais ganhada , perdida pella honra , que dada ^
pella infâmia.^ Que nos ata as mãos? O amor da famiiia ? Naó «
eftará mais fegura a vida dos parentes em hua morte fiel, que "
em hua companhia herética.^ Abramos os olho3,& claramente "
%cremos,quanto melhor nos eílá 0 morrer pella liberdade da "
Pátria, que o viver na Pátria [cm liberdade. A rcftaur açaó do „
... y a Rejoo 53

IS

5)

Í5

.e

^

^

232 C^ST^WTO LUSITJKO 1^4$

jjReyno nos provoca com o exemplo: A do Maranhão nos
" aviza com o fiicçeíTo, aonde taó poucos obràraò tanto , que
" lopeàraõ a tirania de muytos, & porque naó pareça, que per-
" fuado com leve fundamento, & que fem prevenções arriíco;
„ quero, que tenhaõ V V.mercès entédido, o que íbbre a mare-
aria tenho obrado . Dei conta de minha determmação á Ba^
" hia , a Henrique Dias, & a Dom António Phelipe Camarão,
" & entendo, que a todos acharemos fa voraveisj & já entre nòs
„ efta o Capitão António Dias Cardozocom feílenta folda-
9» dos , os mais delles officiaes reformados , taó deftros , & taó
" valerofos, que podem fer Cabos de grandes exerçitosj& ale-

jj

greníe VV. mercês, que não pode aver couza concernente á
" expedição da emprefa, que não tenha prevenido meu cuida-

* *

„ do, porque há muytos annos que eftudo na direcção defte

9» negocio, fem outro motivo mais, que .0 do bem comum : O

" que naó poderá duvidar, quem fabe, o que a dita me favore^

" ce, & quanto o inimjgo me refpey ta; & que pellas leys da na-

„ tureza,& da fortuna, tenho mais rezoés para eílimar a vida,

»> que todos quantos a eftimaó mais.

4 1 Naó formaó os rayos do Sol no reflexo das nuvens

mais difFerença de cores,do que as rezoés de Joaó Fernandes

jiffeytosque cau' Yiéíz cauzàraó nos ânimos dos ouvintes. A pufilanimidade

zanos ouvintes, > r r i i

^ OU vio com efpantoi a eíperança com alvoroço ; o valor com

inteireza; adefconfiança com receo; a amizade com agra-
do; a enveja com oppozição; ajaótancia com defprezo^a
dependência com aplauzo ; a magoa com defafogo ; & Q;
zelo com prazer; & cada-qual calou , ou refpondeo con-?
forme lhe diâ:ava o afFeâ:o; concluindo todos , em que que*
riaó ver,& falar com o Capitão António Dias Cardozoj
huns, porque defeja vaó o útil , outros , porque não crião o
poflivel: Era a fatisfação fácil, em quanto anãodifficultava
o rifco do fegredo ; todos o prometerão, & juràraó;&a elles
Joaó Fernandes Vieira, o comprimento do defejo, aíTentan-
do com todos, que a outro dia, fe achafièm em o feu curral
de Tigipió ás nove para as d cz horas da manham ; mas com
advertência, que foíTem fep arados, por não darem mo-
tivo a difcurfos curiofos , nem occaziaó a fofpeytas malé-
volas, de quem os viffe hir de conferva, para aquella par«

te.

.i?

te. Deípediraõ-fe, cada-qnal para fua caza 5 & Joaõ Fernan-
des Vieira, hnm próprio a António Dias Cardozo , com avi-
20, de que em certo lugar fc viíTem, porque tinhão que con-
ferir. Deu-Ihe, á vifta, meuda conta, do que fe avia paffado,
& do que tinha entendido, enformou-o do lugar, & da hora,
em que o aviaó de bufcar ao outro dia; & inftruido de como
íèavia de portar, íè apartarão cada-qual , para íeu domi-
cilio. - .í-o./-.: . .

42 Ao outro dia nãó faltlíáõ os convidados no íitio ad-
vertido, nem na hora deftinada, com ânimos tão difFerentes,

como o eráo as pefíbas. Chegou o Capitão António Dias ^^ ^^'^^^ '"^^■>&
^, f, ,v^^ 0 1-1T ouvem A Antonto

Cardozoj ao qual receberão cortezes , & admirados . Logo p^^ cardoico

ihe pediraõ,que com toda a verdade, & com toda aconfian-
ç2i declaraílè a cauza, que oayia trazido da Bahia, a tão diJP- ^

tante lugar, & com fegredo tão eftranho. António Dias Car-
dozo, que fobre entendido eftava induftriado, lhes refpon- ^
deo feguro, & difcretò, nefta forma . O zelo do ferviço de "
Deos, & dos moradores defta Capitailía, heò motivo^ que a 5>
efte lugar me conduzioj poderofo para me não deixar torcer »> .
o rofto a tantas difficuldades, como venci nefta cornada, ten- '>
do contra mim o defabrido do tempo, o agrefte do mato, & à >»
vigilância do inimigo. A cauza, que me detém , he a obedié- «
cia, que devo ás ordens de meu fuperior António Telles da »
Sylva,Governador do Eftado,& o gofto de fervir a João Fer- n
nandes V^ieira, a quem me ordena, áffifta,na emprefa, que in- s»
tenta, (fobordinado a fuás difpoíiçoés) fogeito, que primei- í>
TO nos ou vera de obrigar com o beneficio, que com o reípey- «
to. Ver fua peíToa, fem ver nella noíTâ obrigação , fe não for »
cobardia, não pode deixar de fer ingratidão, A peor ceguei- j>
ra he, a do que naÓ quer ver. Náó me perfuado , que no def- j?
vio tenha parte a enveja, porque não ouço gritar a emulação j»
(fupofto que não creo, que em tão nobres pey tos ache nu- ?>
trimento a vileza daquelles envejofos, que lem quererem lu- ?»
7Ír, feoccupaõ emefcurecer, por fe negarem á imitação do 5>
exemplo:) O que nos dá ogenerozo , & deftimido coração j>
defte grande varão, nos obriga a pegar nas armas, para deita- u
remos de noífas terras, a tão prejudicial inimigo, cdeio o que »>
nos opprime. Defembainhemos a eípada, advertindo , que o j/
. V3 defen-

"ivr

"V

1,, I

234 c^sr^oro Lusirj-HO 1645

5, defender as honras, & as vidas dentro de nofía mefma terra,
5, he pelejar com armas dobradas: Que he próprio do valor
55 medu" as forças, pellas cauzas.

43 SnfpenÍos,& arrebatados de diverfos peníàmcntos,

ou virão todos ao Capitão António Dias Cardozo , & com

HuvUofos em defmay o [ou v erdadeiro , ou fingido ] falàraó alguns dizen-?

fuás fJ°F^^^^^' ^Q^ç^Q os fucçeíTos paíTados osenfinavão a inferir os futu-

jo u^oes. ^^^ Com que confiança avião de contender [com poder tão

limitado,] com aqnelle, que tantos , & tão poderofos focor-

ros tinha deftruidoi^ Como poderião deter o braço de gente,

que vencia fó com a voz de feu nome. ^ Que fegurança lhes

'^ >\ podia dar da vi6i:oria,quando o Olandès as cuftumava alcan-

^ çar fem batalha;' Que matéria taõ árdua , pedia maduro con-

felho, & não feria acção de valor condenarem-fe, có o verde

de hiia temeridade5ao maduro caftigo de húa loucura . Cor-

tou-lhes António Dias Cardozo o fophiftico das rezoés

tf com o feguinte diícurfo. ? , .

*' ;: L 44. >;,Soponhamos,que os bons fucçeíTos do inimigo,lho9
liuvens que An- deraó as armas,& naó a dita(o que na verdade foy ao re vez.)
tomo Dm Cardo- Quem não fabe, que tem fua idade a fortuna , & que em ne-
s^o Ihesdesfa^. nhum eflado chegou ao de velha ? Aonde mais fe empenha,
95 menos durapnferir, que há de favorecer, porque tem favo-
5) recido, he conceito errado;& concluzão certa o crer, que há
95 de aífiftir, a quem naõ tem aíTiftido, pois em fua inconílancia
5, tem a diffiniçaõ de feu fer. Quanto mais, que a natureza nos
5, enfina, que o violento,no que fobe,enfraquecei veíTe na pe-?
,5 dra, que fubida de alheo pulfo cahe,obrigada do próprio pe-
55 zo. Doutrina,que tem reduzido a pratica o mefmo Olandès,
5, na tibeza de fua vigilância , na defatençaó de fuás fortifica-
„ çoés, no defcuido de fua difciplina, na falta de fcus foldados^
5, & no ócio de feus auxiliaresjdefprezado,entre todos,o exer-
„ cicio das armas, Sc fó valido o da mercancia, fem advertir, q
„ os impérios, com as artes da conquifta íè confervaõ . Se noífo
5, limitado poder fe acompanhar da conformidade,& do fegre-
5, do,fobe;aõ-nos forças,ajudados da induftriofa determinação
„ de nolTo Achilles Joaó Fernandes Vieira j porqpe em chegai
„ d^ os dons Governadores, de índios , & Minas Dom Antor
55 nio Phelipe Camaraó,& Henrique Dias ( que já hoje eftaráá

r , muyto

muyto adiantados na marcha ) temos affentado , que fe alo- ,5
)em por eílas matas; o que podem fazer, fem ferem fentidos, „
nem paííarem neceífidades [ para tudo eftamos prevenidos ] „
Sc confultados os homens de mayor confiança,& v alor de to- „
das as freguefias, crealos Capitães , para que tenhao a gente „
preftes,& com ella em hum mefmo dia,& hora daremos fobre „
os quartéis, & fortificações inimigas,(que o repente,& o de- „
fatinonos deixarão nas mãos , em todas as partes ) Sc toma- „
dos os caminhos, para que oavizo não chegue ao Arrecife, „
nos poderemos fazer fenhores delle com a mefma facihdade, ,)
Sc com a mefma induftria: O que agora importa, para confe- „
guiremos efte defejado fim he, darfe4he logo principio , ef- „
colhendo,& nomeando de entre nòs peíToa , que nos gover- „
ne, Sc Cabos, que nos ajudem a prevenir a gente ^ Sc tudo o „
mais neceflario, para a facçaõ. Para V.mercès, & para os mo- „
radores he, toda a conveniência do negocio ; Sc para todos „
nòs importante, a obícrvancia do fegredo : Com elle afíegu- »
ramos a empreíà; fem elle nos entregaremos á ruína , eu, Sc »
meus foldados com menos receo, V. mercês com mayor pe- "
rigo.

4 «5 Aplaudirão todos a difpoíiçaõ ; Sc com alvoroço a*
provàra5 o confelho j& como, fe todos no interior eíliveraõ
conformes,como no exterior, em húa voz unidos acclamàraó De cujas re!(oes
a Joaó Fernandes Vieira por Governador, & General da em- mcftrkrdõ ficar
prefa, jurando-lhe obediência , fé, & fegredo ; muytos coxwfi^^fi^^os.
animo finceroj naó poucos com traydor coração. Desfeííè o
congreííb, tomando cada-qual difFerente vereda.Naó fe paf-
faraó três dias, quando leaes , & perjuros em hum corpo , &
com o mcfino femblante concorrerão á caza de Joaó Fernan- .^

des Vieira,dizendo-lhe , como o Olandès eftava enformado
de tudo, quanto no mato fe tratara, & das peíToas , que fe a- ^,
charaó prefentes. Acuíàvaó a perfídia do traydor, dando-íè
o mais culpado, por mais oíFendidoj fendo o exceíTo da quei-
xa, a que melhor defcubria a cara ao Author da trayçaó.Naó
fabe a diííimulaçaó do deliâio moderar a queixa ; com os ef-
tremos da cautela noticia a culpa. Naófe alterou com fuc-
çeíTo t\õ novo, o difcreto,& animofo varaó, tanto porque o
tinha previfto, como porque nenhum cazo o fobre-faltava.

V4 Sq-

230^ CAsr^oro LvsiTAno 164^

Sõpos, qiiandodeclarou fen intento, quefeoflrereciaacon-

&com atravcao d(

Bejco reiuo ^^ ^-^j^ j^r eom o ódio dos inimigos, &:com atrayçao dospro-
falfo trato de d- p^^^^- UniitTiuiou, o que entendia , & com prudente coníe-
Ihomoftrou , qiíe cm fcmelhante cazo, não podia peccar a
lealdade, fe não á malícia do Framengo, fazendo dafofpey-
ta íiencia. Falou a todos animado , defuadindo-lhes o medo,
com tomar por fiia conta definentir a opinião do Oíandès,oii
foíTe nacida da imaginação, ou da entrega; o que confeguiria
com facilidãdej porque para com os Magiftrados, mais peza-
' va a fua mentira, que a verdade de muytos . Repugnarão al-
; guns o remédio , naõ pella parte da duvida , fe naó pello te-
; mor da confequencia,que era ficarem deícobertos, tendo por
; . certo, que com a mefma diligencia de deíinentir o fa£i:o, fe a-
. Viaô de defcobrir os delatores ^ & feria força pagar em dous
tribunaes hum mefmo crimej nos dos Eftrangeiros,condena-
li dos por falfos; no dos naturaes, por infames j & por fe defvia-
<ft rem de hum,& outro golpe, fe ofíereciaó a negociar com os
" do Concelho Supremo mandaíTem ofiferecer a António Dias
Cardozo paíTa^porte, para que fem perigo fe manifeftaffe, &
fem receo fahiíTe da campanha com toda fua gente. Nas pa-
lavras de cada-qual vio Joaó Fernandes Vieira, como em ef-
peiho, o animo de todos; & conhecendo, que o ofFerecimen-
to era concordata, &naó^contingeiicia os.convenceo com
» feu próprio argumento. Naó tem bom partido [ lhes diíTe ]
" quem comete concerto: ('Naõ o digo por VV.mercès,fe naõ
" pello Framengo,& por quem faz fuás partes) E aífi entendo,
j, que o concerto não terá efFeyto, porque fey, que o Capitão
5> António Dias Cardozo ,he taõ deftimido , & também difci-
plinado , que primeiro perderá mil vidas,que chegue a faltar
no menor ponto de fua honra: Naõ mando, aconíelho : De-
íiftaó V V. mercês do intento,ou faça cada hii, o que melhor
lhe eftiver. Defpedi-os ifento , & recolhco-fe confuíb , mas
não atalhado.

4Ó Em o dia feguinte fes avizo ao Capitão António
Dias Cardozo de tudo,quanto paílára com os da conferécia,
& também, do que prefumia de alguns ; para que a noticia o
acautelaífe. A confideraçaõ do fucçeíTojlhe deu baftante ma-
téria para o efpanto, nenliua para o receo . Abominando de
H.: ,. . . íi,

5>

5>

5J

3)

95

De tudo dá conta
a António Cardo'

i64^ ^JÍ(rEl,LW(^OV. 237

íí, para íi a infâmia, o achou hum correyo dos traydores,pel-
lo qual, com diffimulada perfidia,o certi6cavaò, que o Olan-
dés, noticiofo de íua vinda,alojamento,& intentos, deípedi a
do Arrecife copiofas partidas de foldados a bufcallo,com or-
dem de baterem toda a mata do deftriâ:o j & de fe naõ reco?
Iherem fem a entrega de fua peíToa ; & lhes parecia impof-
fivel o efcapar de tantas máos jque elles pello livrarem de pe-
rigo taó certo, fe ofFereciaó a pedir-lhe pafíà -porte, & fegura
paíTagem para Olanda,com todo o neceíTario para a viagem j
&lhe rogavaó p quizefle aceitar , pello que a todos convi-
nha.

47 DizeyaosTraydoresrrerpondeoo valerofo Capi- " . .
tao j que lua aleivoíia os pubhca cobardes; quenao temo da- ^ reíponàe ao
no, qne nace do medo ; & que mayor agravo me fazem pella çorreyo dos tray-
parte do ofFerecimento, que pella da trayçaó , ( certo de que dons.
íó elles me podiaó defcobrir ao Framengo) porque com efta „
me julgaó temido j& com aquelle me fopoem honrado j que „
femelhantes paíía-portes podiaó fervir á vileza de léus ani- „
mos, & naó amim , que tenho efpada para me defender de „
t ray dores, & inimigos 5 que a dos Olandefescuftuma cortar „ *
melhor com o ameaço, que com o ferro,'~a eíla naó teme,qué „
a bufca ^ & que com igual facilidade me hei de livrar da for- ,,
ça de huns, & da infâmia de outros , dando-nos o tempo oc- „
caziaó, para que as obras diffinaó o íer das pejffoas . Inftou o „
menfageyro com defculpas,& rezoés fundadas no medo , & „
no perigo de fe defcubrirem os complicesmalfinados, íèaca-
zo o Olandès o pretideíTe, pois neftes termos fieariaó de peor
partido , os leaes, que os tray dorcs.Naó por certo , ( tornou
António Dias Cardozo ) que vay huní mundo de diftancia „
entre o viver infame, & morrer honrado j& a tad vil canalha ,>
(toda numero,& nada callidade) nacido^, para iurados , naõ „
podia alcançar a minima parte de taó glorioza emprefa: Se a „
minh?i defgraça for tamanha , que fua perfídia me entregue „
aos Olandefes, creaó fem duvida , que fem tormento hey de „
condenar a todos por authores da rebelião intentada , & hey „ -jj^
de affirmar,que fó por elles fuy chamadQ,& trazido a efte lu- „
gar,fem de mim faber Joaó Fernandes Vieira , de quem fe „
guardáo, como xle Vaíallo fiel aos Eftados , cujo temor os „
^ici \JÁx ,. obri-

I

i-

05^ QAsr^oro LvsirMo 1^45

ívobrigou a ferem primeiro , em Te acuzar , do que elle o foíTé
3> em os defcobrir. Quis o portador replicar com ameaços;& o
Capitão infofrido,& com a efpada na mão o avançou coleri-
/^ CO, porém elle aproveitandofe dos pés, não parou, fe não á
'^ ^ vifta dos authores do recado; aos quaes referio,o que no Ca-
pitão achàra5& o perigo em que fe vira:Queriaõ elles repetir
adiligencia,porèmoEnviadoanão quiz fazer a todo o pre-
ço, efcufandofe com a certeza, de que da eípada avia de ler a
repofta.

48 Conferirão os dous amigos entre íi o efiado dás

couzas,& o remédio delias; & aíTentàraó, que o mal não avia

Confere com loAo àç^ ohtàtcQt 2i medicamentos lenitivos , que fó os violentos

Fernandes viei- poderião ter efficacia, para não lavrar mais o veneno . Con-

rrf, oí^uefe deve yieraó, em que feria acerto efcrever António Dias Cardozo

orar. a João Fernandes Vieira hiia carta, que podeíTe moftrar aos

/^ Glandeíes, com as feguintes rezoés. Os moradores defta Ca-

'' pitanía me conftrangèraó, com importunações, a queí vieíTe

" ajudallos na rebelião, em que eftavão conjurados , contra os

^ ^ " Olandefes: Fieime em fuás palavras, & firmas, & vim com tã-

^ " to difcomodo , como Deos , & os meus foldados fabem : A-

. ,., ^" chey , que alguns delles, ou por cobardes , ou por travdores

CartA ardílofa, y^ .? , , ' Ai j^ r j *^ j r ■

faraconfundíros ^^^ ^^"^J ^^lao revelado ao Glandes o fegredo , de que fe ti-

traydores. „ nhaõ acuzado, & arrependido ; fucçefíb previfto de minha

3, advertência, confiderando a cautela , com que fe guardavão

,, de V.M. pois fendo quem he, nem lhe comunicarão o defig^

5, nio, nem me confintiraó os termos da cortezia , & execução

,, do gofto, com que devo bufcar a V. M. & fervillo ; o que a-

5, gora não faço por lhes não dar occazião a levantarem algum

^, teftimunho á íiia fidelidade,á qual deve os Eftados tanta fine-

,, za.Faço efta carta para retificar a V.M. meu animo,& darlhc

3, conta, em como me volto para a Bahia, com toda a preíTa,

j, porque me não entreguem ao inimigo, os mefmos, que o de-

5, termina vão entregar á minha efpada: E fe efta me não poder

« defender de tray dores, direy a gritos, os que os fa5;& appel-

v^ " larey de minha deígraça para o favor de V. M. que em todo

o tempo eftá merecendo,a quem lhe deve, com a lealdade do

trato, o may or refpeyto ; & por toda a parte publicarey, o

3» quanto tem de difcreto , quem fabe fer grato. Deos guarde a

«'V.M. 49 Ef-

3)
5>

5>
5>

4 9 Efcrita a carta nefta forma, avizou Joaõ Fernandes
Vieira ao Capitão, que fe pafíafíe para a mata , chamada do
Brazil, conflgnando-lhe nella parte, aonde poderia eftaroc^
culto; & a hum fideliífimo criado feu para o neceíTario, com
que lhe avia de affiftir, atè que o tempo lhe deíTe occaziáo,
para fahir a campoj & que no entretanto vivefíe íeguro,pois
corria por conta de feu cuidado, ofazer-lhe avizo todas as
vezes, que do Arrecife fahiíTem quaef-quer partidas de foi- ^ , ^ ^ ^
caaos,a correr o matoso qucle lhe nao podia eíconder, pellas J^ vieirA lhes
intelligencias , que tinha com alguns do Governo . líto afíÀdeualèr.
difpofío, mandou Joaó Fernandes Vieira chamar aquellcs
moradores comprehendidos na tra}'çaó;a cada-qual deu a ler
a carta, como fe eftivera alhco dofuccedido; & como efpan-
tado da novidade,preguntou,quc cauza ti veta o Capitão An*
tonio Dias Cardozo,para taó efí:ranho,& repentino acordo,
como o era partir-fe para a Bahia sé fe defpedir dellef Emmu- v

decèraó confuzos , & de todo os deixou frios , v erem-fe ar*
guir de cuIpados,dizendo lhes Joaó Fernandes Vieira,que os
laços que ordiaó a íi mefmos os armavaô , pois fàbião, q mais
credito avia de dar o Olandès a qualquer palavra , que elle
lhe diíTeíTe, que a quantas elles lhe ;uraírem,porque tinha ca-
bedal,& animo, para gaftar mais em húa hora,que todos elles
em toda íua vida, contente, de que fua ingratidão deíTe por
fruito , a todos, o defengano de fua v ileza,pois tinhaó taõ a-
batido coração, que nem o beneficio os reduzia , nem a hon-
ra os obriga va : E para os deípedir, íbbre afrontados, temero*»
fos, lhes leo o mefmo Joaó Fernandes Vieira a carta, affirmá^ '

do, que a guardava, para que delia conílàíTe aos Olandefes,
quem os agravava, & quem os fervia. Naó damos a conhecer
os traydores, por feus nomes, (foraó a menor parte dos cha-
mados) porque naó intentamos infamar peíToas , fe não refe-
rir verdades.

lyO Baldadas foraõ as diligencias, que os Olandefes fize-
rão,por averem ás mãos ao Capitão António Dias Cardozoj
& forão ellas taes,& tantas, que quaíi fe perfuadiraó , fer en-
gano, quanto nefte particular lhes diíferaó , Avalia vão por
mais ^cil, mentir a enformação, que o não íè defcubrir o de-
nunciado. Nefte parecer os confirmavajoaó Fernandes Viei-

ra,

i^

fspíi intentos.

r^íi ■<«■•!'

vS

'f4ê C^W^roTÔ LUSÍTJNO ré4^

taj nãò alteraado' em cou7â algiia as demonftfáçoês da con-

fiança5& correfpondencia , com que os eafíumava tratar;^

to ^ue fruftou p-Qj-q^g da igualdade do eftilo, inferiíTem a do aiiimo3 & naai

CeuA intentos^ ^ i /-r- • i- r r • i< - -vt- r s ^ ^

podèíie tirar diverías coníequencias, a malícia . INao xaitaraoi
alguns do governo, ou feguros , ou apaixonados , que nefta)
occaziaõ o avizáraó, tinha neilemuytos amigos; & nosmora-r
dores muy tos contrários, que o caluniniavão, mas fem fmito,,) '
porque nunca prevaíeceriaõ contra a opinião defua lealdav
de. Nâo íe namorou Joáo Fernandes Vieira tanto do favor js
que fe erqueceífe da cautela, porque experimentado , & diP:
creto, fiava menos de fua fortuna , que de fua vigilância ; &
ãíTi défde a hora , que entendeo fe poderia prefumir fua de-:
terminação, viveo taõ circunfpefto, que todas as noites fe re-^^
tirava ao mato; affiflindo os dias em fua caza , com fieis finti-}
nelas ao largo, hum cavallofellado, &feus criados preveni-^
dos, para que em qualquer aífalto ferviííem á reíiftencia,& á'
fuga. Se do Arrecife o bufcavão, com pretexto de amizade,
OU de neíyocio,ou falava,ou fe fingia aufentCjfegundo as peQ
foas eráo. Se os do governo o mandavão chamar,fe efcuzava^^
com promeíTa de outro dia, ou com a occupação de muytos,
& nunca ás efcuzas faltarão as cortezias^alojando-fe naquelle
peyto tamanhas cauzas de aílição,que podèra a menor delias
fuffocarqual-quer outro coração:Nunca o tropel defies cui-
dados lhe deminue no Teu, a intenfaõ, com que fe aplicavaõ,:
ao que convinha para o fim intentado; deixádo-nos em queP
tão, fe foy em feu animo mayor a fortaleza,com que venceo:
eftorvos, feavehemencia, com que difpos osmejospara a
émprefa.

": 5 1 Admirável foy nefte varaô a prudência ; nunca a de-
minuio à promptidão-.Sobejava ao valor, a diffimulaçaó,com
que prevenia tudo, o que podia fer útil a hum exercito, já no
alojamento,jánoconfli6l:o; & fempre a cautela fenhoreava
o fervor, porque nem o tempo dava lugar atibezas,nem a
falta,a publicidadcs;Chegava-fe o dia da promeífa, & era for-
ça começar o da campanha: PaíTava a Pafchoa, & não chega-
Vão com feus terços de Minas,& índios. Dom António Phe-
lipe Camarão, & Henrique Dias: Tardança, que fem dar for-
ças á duvida, as dava ao cuidado. Neíle comenos chegarão os
,ç«2 quatro

M^

:rA^E 1. ur(^o v.

24 r

nuatro fòldaáos de volta dà Bahia, que no Taneiro próximo , ,
partirão de PernambncOjmoítrando na pontualidade dane-^^^^^^^ comre^
goceaçaó a cauza da detença; porque ©Governador doEf-^^^^^^^^^^^y^^^
tado os ouvio , & defpachou ^ como fe podia defejar ^ rc tifi- dor do ijtííà\
cando íeu animo na repoíla das cartas, que Joaõ Ferrandes
Vieira, & António Dias Cardozo, lhe tinhaó cfcrito^Sc dan-
do efcuza i detença, cõ a aíTiftencia , que na Bahia faziaÓ5ao
próprio tempo, os Embaixadores dos Olandefes 3 dos quaes .
daremos rezaó na feguinte efcritura.
, 5 1 Com as noticias,que os tray dores deraõ aos Framê^
*yos da aíTiftencia de António Dias Cardozo, & dos intentos
de Joaõ Fernandes Vieira , começarão os Judeos do Arreci-
fe, por tímidos, os Mini ftros, poriintereírados,a difcorrer fo-*
bre a poíTibilidade ^ & fundamento da que chamavaò rebe-
lião j & recorrendo a darlhe principio, o advertia a fofpeyta) ^
naquella vinda, que a Pernambuco , (como atras referimos)
fizeraó André Vidal de Negreiros , & o Padre Meftre Frey
ígnacio Rei igiozo do Patriarcha Saó Bento : & deraó , em af-*
firmar fingida a cauza, que entaò publicàraõ;& verdadeira, â
que agora prezumiaó. O vulgo, empenhado , como femprcj
em comunicar o que ouve, com mais vuIto,do que o recebe,
fe alvoroçou com a pratica, de forte , que influio nos do go- x

=verno muyta parte de feu temor.Conferiraó o caminho por
onde fe poderia vir no conhecimento da certeza , & aíTentà- ManâddútaHdes
raò em mandar Embaixadores á Bahia, que com deftreza ^^-^^y^'^'^''''
peculaíTem,© que fe dizia;& regimento,para que fe ouveífem
de maneira5que a fombra da queixa fobrefahiífe a \\xt da ver-^ •
dade.Com efte fim nomearão a GuilhermeWandrevot,hum
dos confelheiros politicos,& a Theodozio Eftráter comedor
da fortaleza de Nazareth,com carta do Supremo, para o Go-
vernador António Telles da Sylva,cuja fuftancia fe rezumia
em acufar a rebeldia dos moradores, fomentada ( como fe af-
firmava) com o favor de fua fenhoriaj o que naó podiaó crer
de hum VaíTallo delRey de Portugal. O Governador, que ti-
nha frefcas noticias, do que fe paflava, [^ aííi por cnformaçaó
de Joaó Fernandes Vieira, & António Dias Cardozo^ como
por depoimento dos quatro fold3dos,que aílíma referimos,"]
lefpondeoj que fe os moradores fe inquietavaõ, era porque
orr. X otra-

Úqúé lhes refpo"
de o Governador
do Ejiado.

Theodoi^io Bjira

CJST<!(rõrú LUSITANO

o trato da tirania os aconfelÍiava5& que dado cazo^que os fas^
voreceíTe^ fizera oquedevia aoferviço deDeos, &o'eíèu
Rey;(levado também de feu didamen/em que lhes deííè oOr
cazião, para fe defculparem de violar as tregoas tantas vezes
rotas, pellas demazias,^ infolencias do governo Olandés/);Qi
que, violentado da obediência, naõ fafia : Mas , que era pj^õ^-
prio do agrefíbr cobrira culpa com a queixa;&a que davaó,
recebia a forma , donde guardava a matéria ; & que nas proí
prias conciencias lhe achariaó a cauza . O que fó lhes adveíií
tia, era, que fenão mudaváo de efíilo,atalhando os excefíbs,
com que apuravaó a paciência 'dos naturaes, os avia de favo-
recer ,('até onde chegaíTe a poíTibilidade de feu braço)para íe
libertarem de tão infofrivel domínio, ainda, que foubeíTe , q
o auxilio lhe poderia cuftar a cabeça. Ouvida efta repoftaíè
deípedirão do Governador, & defpois de alguns dias,que to4
màrão para o exame da verdade, fe voltarão para o Arrer

55 O tempo, que os Embaixadores fe detiveraõ na Ba-
hia, deteve também o Governador aos quatro Enviados de

Governador.

ter^fe oferece ao João Fernandes Vieira,rcomo fica dito] aonde , Theodozio
Eftrater efpreitou occaziáo opportuna, para fecreta audiên-
cia, que o Governador lhe deu^a quem falou defta forte.Ex-*
" cellentilfimo Senhor:Eu me chamo Theodozio Eftrater ,tão
" conhecido pellonome, como pellopoftodeComendorda
„ Fortaleza de Nazareth.Os Senhores do Concelho Supre mo
5> me efcolhèraó para efte negocio, ou por intelligente, ou por
" intereífado, inferindo o preftimo pello ferviço ; ignorantes
" de meu animo, que agora fó a V.Exeellencia declaro.Defde
" o berço fou Catholico Romano ; & affi avia de fer , para fer
9, bem nacido.Sempre aborreci efta canalha, unida com o vin-
" culo da mercancia, fem mais alma, que a de húa bolça. Sirvo
neceffitado,porém não com animo abatido,porque fe o exer-
cício he de mercenário, o dcfejo, como de nobre, foy fempre
de fervir a hum Príncipe, que honra, & paga . Levame toda a
inclinação o Senhor Rey de Portugal Dom João o Quarto,
pella peíroa,& pella nação j efta, por mais valeroza, aquella,
por mais refoluta: Quizera entrar em feu ferviço , juftifican-
'' do meu animo3& aífi peço a V.Exeellencia da parte do mef-

, mo

5>

J>
?>

5>
5'

mo Senhor, me declare, íe determina a recuperação de Per- '>
iiambuco, porque fendo eíte íeu defignio , lhe abrirey a me- "
Ihor porta, para a reftauraçáo. Entre períuadido , & defcon- "

fiado 011 vío o Governador a Theodozio Eftrater,entenden-

^e lhe airaàs'^

do, que fua propoll:a,igualmétc podia fer ardil da maiicia,& íTõ opruimen"
effeyto da deliberação j & por náo perigamos eftremos,ref- to^comcmuU.
pondeo, que elle da fua parte eílimava a honra, que fazia á
Nação;& que a fua Mageftade enformaria, o quanto devia a
feu defejoj mas, que de prefente nem tençáo,nem ordem ai- \p
gúa tinha,para fazer guerra aos VaíTallos de Olanda; antes
preceyto de confervar a paz:Porém,que fe por algufíiaccidê-
te fe alteraífe o eílado das couzas, lhe faria avizo ,& íè apro-
veitaria de tão bom animo.Defpedio-fe contente,& navega*
ráo fatisfeitos, hum, porque íe tinha declarado; outro, pello
que tinha entendido, ambos chegarão ao Arrecife. Neíle de-^
íimaginàráo aos Governadores , & povo dos receos , que ti-
nhão da guerra. Neíle tempo defpachou o Governador os
Enviados de João Fernandes Vieira, dosquaes eícrevemps
já a chegada a Pernambuco j que foy em dez de May o de çdil
& íeifcentos & quarenta & finco . Agora repitircmos,com
que dei pacho, para que fe não duvide dos poderes , com que
João Fernandes Vieira obrava.

' 54 Por os ditos Enviados, mandou o Governador di-
xer, de palavra, a João Fernandes Vieira,& a António Dias
Cardozo, que eíliveífem certos , de que lhes avia de aííiíiir,
& a todos os moradores, com animo, & forças, em cazo, que
os Olandefes perfííliífem em os afligir , & tiranizar : E de fe-
creto efcreveo a hum, & outro : O que as cartas contmhão,
me não veyo á noticia;& nós referimos,& não adevinhamos.
Com os Enviados fe partirão algúas tropas de aventureiros,
que V oluntariamente os quizerào leguir,no que o Governa-
dor fe ouve neutral ; fó mandou vir diante deíí os Cabos ^(í'^^^^ " (^oi
delias, & lhes encarregou, o bom trato, U diíciplina íJos foi- '^^[^''t^Envtfío

dado3,que levavãofurtivos,como gente do Eítado;& diílef- j^ ,'- j:„f l
rir T - r 1 \- ' 1 - ce lona termn'»

icm da lua parte a João v ernarides Vieira , que quando nao àa Vtàra^

podeíle íbfrer o duro jugo dos Framengos , levafle adiante o
intento da liberdade, & o difpozeíTe com o valor, & prudên-
cia, que delle cíperava^Sc que brevemente acharia coníigo o

X 2 focorroj

iNwnii

,u

reiros.

244 C^ST^O^O LUSirjKO 1^4^

focorro,que lhe tinha pedido: Com eftes recados lhe chegou
também avizo certo,ém como Henrique Dias,& o Camarão,
fetinhaó partido em focorf o dps moradores, avia jámuytos
d ias j& que o não terem chegado era culpa do tempo, Sc da
marcha, que por cauza do domínio Olandès aviaõ de fazer
pello interior do mato, a refpey to dé íè efconderem ás noti^
, ^ ^ cias do inimigo . Alegres deixarão a todos os confidentes as

buço com akuns '^^ novas, ôc a vmda dos loldados aventureiros, que ehega^r
foldados aventu' ^^^ ^^^^ Mayo, & forão ajcjados nalnata de João, Fernan-
des Vieira, com fegredo, & ordem, qu^âiveílèm á obediên-
cia de António Di,as Cardozo , a quení apertadamente en-
carregou ^ vigilância, & a cautela ; que ellejoaõ Fernan-
des Vieira tomava por fua conta os avizos de todos os mo-
vimentos do Olandès: F^fuccedendo fahirem partidas de
gente inimiga ; o mandaria dizer com femelhante contra-
Tenha : Vai húa tropa a correr o certaõ, já fabers, que os Tol-
dados faõ livres por vicio 5 veja-ie, nao me queime o páo
Çrazil J&: tenh^-fe cuidado com as rezesjnâo as achem defgar-
radas.

5^ Em obfervanc ia da condição, com que o Governa^
dor dq Eftado prometia q focorro, lançou mão Joaõ Fer-s
nandes Vieira,da forçoza,& nova ocçazião,com que o Olan-
dès provocava contra fia intentada guerra: Com diabóli-
ca refoliição ordenara a hum cruel Framengo chamado Ja-
cobo , çazadò, & morador no certão da Paraíba, (bárbaro,
Sc fera por trato, & habitação) que conduzi fíe a todos os In^
dios fal vagens, que podeíTe, Sc com elles aíTaltaíTe as povoa-
ções dos Portuguezes , que avia por aquelle deftri£i:o,Sc os
pâflaíTe todos á efpada: Aííi mais, teve avizo, que no Conce-
lho Supremo fe decretara , que em todas as terras de íeu do-í'
minio fe degolaflem os mancebos,de quinze atè trinta Sc cin-
co annos. Obra a tirania çom tanta cegueira, que bufca a con-
fervação pellos caminhos daruina. Certo em tão cruéis de-
iMo F&rmndes ^^^^^h^^ determinou João Fernandes Vieira,em não efperar
Fieira fi ré filve ^^^^ tempo, para fe por em campo,conhecendo bem , 4 per-í
emfahír acam- dido o do reparo, fe experimenta o do golpe; Sc pella diftan-
f' cia q vai,entre rebater a e.ípada,Sc curar a ferida.Cóferio a re«i

foluçãojSc os me)? os, com aquelle$ aiHigos,q[ podião dar voto

iC

V

na

na matéria j ^ aíTentàrao , que fopoftas as ordens do Gover-
nador, Te nomeaíTem Capitães, por todas as frcguefias fogei- ^^^'^ qitaes
tas ao domínio Olandès, para que defde logo ti veílèm a gen-
te allirtada,& prompta, (vifta a preíTa, cõ que o inimigo pro-
pôs a neceííldade.) FeíTe memoria dos homens nobres , fieis,
■& deftimidos, de cada hiia das Parrochias , & delles efcolheo
Joaó Fernandes Vieira , para Capitães os que lhe parecerão
melhor, remetendo-lhes patentes, &: ordens,do que avião dè
obrar.»' . '.' . .

56 Em Ipo^uicaÇtfeou CapitãeSjâ Amador de Araújo,
& a Thomé Teixeira. No Cabo de Santo Agoftinho, a An^ ^«^^j é'c\uítos
tonio de Caftrb, João Paes Cabral, &Joaó Gomes de Mel- /^/-^o os mmu"
lo. Na Moribeca, a João Soares de Albuquerque,& a feu Ir- dos.
mão João Lejíifão de Albuquerque.Em íguaraçu, a João
Lourenço F|ançés,& a Manoel Péreyra Corte -ReaLEm Si-
ri nhaem a ÀlVaro Fragozo de Albuquerque. Na Goy ana , à
Gonçalo Cabral, & a Eftevâo Fernandes* Na Paraiba, a Frã-
cifco Gomes Moniz,& a Lopo Curado Garro.Em Saó Lou-
renço, a Manoel Soares Robles , a Coíhie do Rego , a João
Nunes da Mata^ Sc ao Padre Simão de Figueiredo , que deí^
pois de militar muytos annos, fe ordenou. Na várzea, a Fran-
ciíco Berenguer de Andrada,a António Bezerra, a Joaó Nu-
nes vi£i:oria , a António Borges j & a António da S) Iva por
Capitão de cavallos: E fopofto, que na dita várzea nomeou
outros Capitães, ( todos neceílàrios , para o numero da gen-
tej fazemos memoria dos fieisjque a vileza do traydor igual-
mente priva do nome,& da honra. Na fregueíia de Santo A-
maro nomeou a Thomé da Cofta . Na do Porto do Calvo , a
Chriftovaõ Lins. Na do Rio de Saó Francilco , a Valentim
da Rocha. A todos, & a cada hum em particular mandou inf»
trucçoés, do que aviaó de fazer, afli em aliftar a gente, como
no tempo,& no modoj que elles obfervàraó com zelo, & a--
<:ordo. Dentro do Arrecife adquirio, &confervou três ho-
mens,a poder de dadivas,que lhedavãoaúzodetudo,oque
determinava o Olandésj podendo com elles mais o interefíè,
^ue o perigo.

«; 7 Com eftas pre vençocs fe facilitara o negocio, ( fun-
dada toda a eíperan^a no íçcreto intento de J oaó Fernandes
'-■'. ■ =< X3 Vieira

^

' mif

«p

m

246

CAsr^toro lvsitjno

j6^^

zer.

Vieira ^ do qual diremos logo] fe o rigor das invernadas com

^ _\ adilaçáodotempo, não deftruíra os meyos, que tinha efco-

Jr í ^M«^ ^j^^llii^jó a induítria,& aprovado a confiança: eráo aqutllesde-'

teta acabar o do' , j 1 - ^ - v, , 01.

mmioGUnttes. petidentes oe hua occaziao aparente , & honeíía, que obri-
gaffe a convidar os priilcipaes Olandefes para hii banquete,
emruacaza,noqual â abundância das iguanas ,& dos brin-
des, & a prevenção de occultâs armas occazionaíre,ou a mor-
te, ou a prizáo de todosj&confeguindo-fe cfte principio, fi-
ca va fem eflorvo o fim, que era fenhorear-fe do Arrecife j Sc
cm todas as mais paítes, das íuas Fortalezas (adiantando-íe o
correyo dos nofíbs, aos próprios do inimigo.) Succedeo dar
a fortuna a João Fernandes Vieira húa occaziáo para o que
intentava, como lha podia pintar o defejo . Vivia naquellç
termo hum morador, (emulo petfíado de fua eíiimaçaó, po-
rém não de íèus merecimentos) envejoíb , por cuftumej po-
bre, por caftigo; diffimulado, por remédio; ingrato , por vi-
Forma em que o cio; & inconfidente, por gofto. Tinha efte tal hum filho , &
determinavafa- húa filha capazes de tomar eftado, pella idade,poréni embar-*
gados pel la fortuna ; pois nem íeu pay tinha cabedal para os
cazar, por dote , nem condição para os acomodar, por dita,
Confíderou Joaõ Fernandes Vieira , que os beneficios, & a
fanguefaóosingredieíiiites,qmelhor curaó as inimizades , &
mandou ofFérecer a efte tal homem cazamento por troca , cõ
hum filho, & húa filha d€ feu fogro Francifco Berenguer de
Andradajobrigando-fe a por de fua fazenda caza,a cada hum
dos noivosj & dar-Ihes, o queJhes baftaííè para fe fufi:entarq
á ley de íua nobreza . Confundio-fe o ódio , aíTombrado da
g€nerozidade)& muyto mais da benevolência , que o rogava,
Poftrou-fe,aquelle coração, aos pés do emulo , arrependido^
& grato. Divulgou-íe o tratado por todas as partes , & con-
Gorriáo os vezinhos, & parentes a dar a João Fernandes?
Vieira as gratulaçoés da boa obra , & os parabéns da amiza-
de; que elle aceitava com dobrado gofi:o pella occazião , que
as vodas lhe ofFerecião para o que intentava , tão própria,
que a cortava o tempo pella medida da tenção. Para o dia do
4 recebimento rogou os parentes, & os amigos;&; a huns,& ou-
tros pedlOjConvidaíTei^ os fuperiores do governo , & da mi-
liciaj com a rezaõ de honrrarem a Joaõ Feioaiiid-ejs. Vieira, em

occaziaò

^m
«

Provoca os mora»

Gccaziaõ tafito fua. Porem a nenhum fe declarou o dia inten-
tado, porque na incerteza delle eftrivava toda a fabrica do
arte faâo.

£5 8 Com fecreta negoceâçaô fby induzindo a todos os
mancebos da várzea , a que derenterrâílbm ^ & preveniíTem
as armas, com o recato, que lhes advertia o perigo , para que
os achaíle armados húa occaziáo , muy to da honrra de todos,
que elle a feu tempo lhes manifeftaria . Como entenderão, q
erajoaó Fernandes Vieira o empenhado , não ouve algum, ^dlres'^! a, peaue
que fe não preparaíle, alvoraçado, & folicito , defecando ca- nàs armas.
da-qual obrigar com o ferviço, a quem não fabia faltar com
o reff ey to. Pos o mefmo cuidado em trazer a fua amizade a-
quelles homens, com os quaes íe não corria ; com facilidade
o confeguiOjda fua parte a cortezia, da parte dos moradores,
a dependência. Medio o tempo de fua efperança pellas pro-
meííàs, & pellas noticias , & parecendo-lhe , que não podiáo
faltar em qualquer dos dias feguintes Henrique Dias , &"D.
António Phelipe Camarão, Sc que adiantava o negocio, com
anticipar a prevenção á chegada, (entendeõ, que o rumor de
dous terços, fe não poderia encubrir muy to tempo às diligé-
cias do inimigo) determinou dèclarar-fe a todos , para o que
es chamou a fua caza ( fem diftinção de peííoa , nem de ida-
de J & lhes deu inteira noticia de feu intento 3 o que fes na
forma feguinte.

59 Até agora naõ dei conta a todos de meu defignio, ''
fendo, que o forma a importância de cada hum , naõ porque "
temeíTe quebra no fegredo (porque como a conveniência he "
de todos, de todos deve fer a obfcrvancia,) fe não , porque a "
dilação poderia esfriar aquelle fervor, que nos affegura o '> ,
fucçeíTo: Naõ he dcíigual a confiança , quando o naõ he a ef- ''
timaçaõ , & fopofto , que a alguns particulares comuniquei f^^r^^'^^^"^^^ "*
meu intento, naõ adiantei as peíToas , ainda que adiantei as
noticias, porc^uc a todos pèzo em igual balança : Nas empre-
fas primeiro obraõ os Miniftros das conduções , que os bra-
ços dos foldados . Agora, que o tempo chama para a necef-
íidade, & para a execução , a dou a todos j porque lhe fique
mais honrrofa a vingança, tomando por maõ própria a fatis-
f açaõ das oíFenfas. As injuftiças , roubos , forças, injurias , &

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248 C^STílWTO WSITJNO 1^45

defprezos, que temos fofrido a eíla torpe canalha , foy fem-
pre tolerância de noíTa impoffibilidade, porém naõ obediên-
cia de noíTo alvedrio, pois he certo, que cada hum de nós, fe
deixou de vingar o agravo ( todas quantas vezes padeceo a
ofFenía) foy, porque coníiderava, quefua efpada , primeiro
lhe avia de fervir de verdugo,que aos outros de exemplo^ex-
perimentando^que feconvocaíTe companheiros, os avia de
íbfrer inimigos j confinado da baixeza, com que muy tos,por
indignas conveniências, faó mais eftrangeiros, que naturaes:
Eíles receos atropellàrão minha refolução alguns annosjnao
que me atalhafíe, o rifco de minha pefíba, fe não que me ata-
va as mãos, a contingência de arifcar as de VV.mercès . Hoje
me vejo livre deftes obftaculos,& aV V.mercès defte rifco,có
as ordens,& com os auxílios, que tenho convocado, & pedi-
do contra eftes mortaes inimigos. Temos em noífo favor a ja-
íliça da cauza, & não duvido que acharemos propicio todo
oEftadoGèralj & a vinda dos Governadores de índios ,&
Minas com feus terços, que;áefpero cada hora, aprefença
dos Capitães António Dias Cardozo,Paulo Vello2o,& An-
tónio Gomes, com feíTenta foldados, & quarenta aventurei-
ros, que da Bahia vierão por feugofto; os mais delles refor-
mados j & todos práticos , & valerofos . Em todas as fregue-
ílas nome-ei Capitães,peíroas,que na occazião avemos de a-
char prevenidos com todos os moradores de feu deftriâ:o,que
já efperaõ meu avizo para executarem noíTo intentoj efte pé-^
de da occaziaó , que trazemos entre mãos , que he o dia das
vodas, que fe efperão . Nellasfehaõ de achar osprincipaes
Framengos do Arrecife , rogados para authorizar a meza j &
fey eu que o vinho os há de entregar primeiro á vingança, q
á refiiiencia ; porque tenho prevenidos mancebos, que fecre-
tamente armados os hão de matar a todos;com determinação
de fe tomarem os caminhos, para o Arrecife, (aonde primei-
ro há de chegar noíTa efpada, que a nova de feu caftigo ) que
facilmente fenhorearemos deftituido de cabeças,& armas ! a-
Iheos os Olandefes da dcfenfa,pello fono,& pello dcfcuido.]
No mefmo dia , Sc hora, fe há de obrar o meíino em todas as
partes , aonde o inimigo tiver fortiíicaçaõ,& gente j & quan-
do fucceda não fer a conquifta por entreprefa , fera por cer-

co:

i54Ç fA^^Br.Lir^OF. 249

coj para o que tenho almazens providos de muniçoês,armas, 77
& mantimentos, á cufta de minha induftria , & de minha fa- 57
zenda j porque íèmpre me pareceo infalível o achar em VV. 5?
mercês valor,& promptidáo, para emprefa de tanta utilida- 5)
de, como gloria para cada hum de nósj nâo fó pellas vidas,fe ?5
não também pello Rey natural, a quem fervimos,& pella re- 3)
ligião,que defendemos. ■ ?>

6 o Impacientes deixou aos ouvintes a prolongada pra^
tica; porque não podião reprimir o alvoroço, com que no
fim delia gritarão a húa voz: Viva elRey Dom João o Quar- ^
to noíFo íenhor; viva a Fé Catholica Romana, que profeíía-
mos:E viva, viva João Fernandes Vieira a quem todos accla-
mamos por noíTo Capitão , &hoíro Governador nefta em-
prefa de noíTa liberdade: Com tanta fatisfação os àúyio\i2i ouvida com a te^
difpoíição, animo,& generozidade do novo Governador, q P", c^ aprovada
' logo lhe jurarão obediência , fidelidade , & fegredo : He eiie '^"^ ^/^^í^'*^-
como a gala, que com o uzo fe rompe^comunicado a muyto^s,
na recomendação fe divulga:IgUalmente falta no que c pede,
& no que o revela. Com efta defatenção correo a prevenção
de todos, fendo em cada hum 0 mefino , bufcar armas , que
obrigar-fe a dizer o para que;Àffi fe comprava húa falta cora
ourra, que veyo a fer publico ^ o que fe obrava em fegredo:
A voz commua o levou aos ouvidos dos Framengos ; a que
naó deraõ mais credito,que aquelle que merece húa fam a v a-
ga,defprezando por cuftume,quanto avaliavaõ por novida-
de. Os tray dores , que individualmente os tinhaó informa-
dos atè do menor accidente,julgavaó a defatenção por feiti-
çoj [não imaginando, quepodeíTe fer arteíicio, o que pare-
cia defprezo, & não rezaò de Eftado) deitavão todos os dias
no Concelho diverfas cartas fem firma, nas quaes relatavão
meudamente tudojO que fe tinha determinadoi& requeriaó,
que fe não fiaflcm de João Fernandes Vieira , porque , tray-
dor aos Eftados, confpirava com outros muytos , contra ef-
trangeiros,& naturaes: Que fe acudiíFe com tempo á eminé-
cia do dano, pois orumor o propunha tão vezinho^ Os Ju-
deos,por natureza tímidos, gritavão sé defcãfoj-& por sé du-^^ ^^^^^ \^'^^ *
vidaaffirmavaó, que os Portuguezes andavaó levantados , & '2711 '''^'''''
tinhão armaSySc muni çoés efcondidasjcom dia certo para da-
rem

, í ' f ff ■■ ■ "v

n

o^o CJST^^WTÕ LUSITJf^O 1645

rem no Arrecife,& paíTarem á eípada, quanto achaffem com
vidaj fendo Joaó Fernandes Viqira a cabeça , que os gover-
nava, ambiciofo das fazendas de todos^ que fe caftigaíle com
toda a preífa, & rigor a trayçaójantes que o golpe impoíTibi-
V litaííb o reparo j & premiaíTem com franquefa aosleaes , que
te tinhaó revelado a confpiraçaó. ( Eraó eftes dez, até doze. )
'. : C^e defpertaíTem ao brado do Maranhão , fobejo para os a-
cordar do mais pezado fono. Aballo grande fes nos Olande-
fes o livre, & tumultuofo defta queixa : Conferirão o reme-
dio,& fahio decretado, com difcreta politica, que fe diífimu-
laíTe o receo, porque fe naõ atreveíTe o povo.O vulgo,fe foi-
pey ta o fuperior medrofo, precipitaíTe defenfreado; em tan-
to o refpeyta, em quanto não fabe, que teme.Com cautelofa
deftreza deita vao os do governo os motivos da queixa , ás
coftas da envejà , que todos os moradores tinhaò a João Fer-s
nandes Vieira, & não a cauzas, que tiveíTe dado, para fe crer
a rebelião dos naturaes.

( 61 Debaixo defta fimulada confiança mandarão os do
(Concelho rogar a Joaó Fernandes Vieira , que fofíe fervido
achar-fc ao outro dia no Arrecife, para aíTinar alguns papei*
importantes á companhia: Déixou-fe achar do portador jfa-
lou-lhe alegre: refpondeo cortezão^que fe não foííe ao outro
cano frender a dia por occupaçaõ precifa,que trazia entre mãos,fenaóper-
loao Fmundes deria o negocio3& quando a matéria naópermitifíe dilação.
Vieira. mandaria feu baftante procurador, que em tudo , o que foíTe

' ferviço de fuás Senhorias; & da companhia fupriria inteira^

tnente a falta de fua peííoa. [de hiía,& outra parte fe veftía a
cautela da mefma cor. j Apertou o méfageyro, que era necef-
faria fua mefma prefença, & que fem ella nada fe poderia có-
cluir^&perfiou com tal aperto, que deu por terra com toda
a diíFímulaçaó da efcuza. Joaó Fernandes Vieira pello intei-
rar, que penetrava o intento , & que pellos mefmos fios lhe
cortava o laço, lhe diíTe, que fe não canfaçe, em o perfuadir,
porque fabia muy bem os inimigos, que tinha no Arrecife^Sc
não ignorava , o que machinavão contra fua peííoa ^ & que
' ' ^*** **^^ da fua parte diíTeíTe aos Senhores do governo, não perdeíTem
^ . tempo, em lhe mandarem feguro Real , porque mais real fe-
•" ' guro era o da fua caza.Não fe deráoos Olaadefes por enten-
r- r didos

TrocurA com en-

didos de repofta táo refoluta, appellando para ó tempo , cer-
toSjde que elle lhes meteria nas mãosa Joaó Fernandes Viei- ^^ ^^^^ emenm
ra, ou por entrega de fua confiança , ou por defcargo de Teus ^""^j^ "'^^'*'
alliados. A poucos dias andados , chegou hum barco de avi-
Bo, que mandava òComendor da Lagoa , pello qual certifi-
cava aos do Concelho, íerem paíTadospara acampanhade 7
Pernambuco os Governadores de Indios,& Minas Dom An-
tónio Phelipe Camarão , & Henrique Dias com os Teus ter-
ços^ o que foubera por peflbas confidentes , que falàraõ com
alguns dos fobre-ditos foldados, (confrangidos da falta,a en- *^^^ ^^^'^^ ^
irarem na povoação a comprar mantimentos5)& pello trilho
da marcha, que elle mefmo vira,muyto pello interior do cer-
tão, & que de marcharem fiirti vos fe colhia , intentarem jp^l"
gum novo dano. tW"^^ í;t

- 61 Comindicios tão evidentes, &pfova tão certa, fé
refolveo oOlandès em fazer toda a diligencia, por aver ás
mãos a Joaõ Fernandes Vieira \ o qu ai pos logo em cobro to-
do o preciozo de fua caza. Como ^oya de fua mayor eftima-
ção, mandou a fua efpofa Dona Maria Cezar , quç andava Determina o olã.
«prenhada de alguns mezes, para caza de António ^zrhoi^L^d^esprêdefío a ca-
muy to feu parente , receofo também , de que algum fobre- ^^ ^^/('oberta,
falto lhe occazionaffe terceiro liiotivo . Fes avizo a todos os
Capitães, que avia nomeado pellas freguefias, do que avia
faccedido , & do que tinha determinado : Encomendou-lhes
a vigilancia,&oaprefto; para que prevenidos fepodefíèín
livrar da falácia, & do poder inimigo^que inteyrado da conf-
piraçaõ,os avia de bufcar, para os prender, & deftruir. Ao cõ-
ceito da fofpeyta correfpondeo o avizo, que do Arrecife lhe
íizeraõ alguns amigos.Sem detença deixou o perigo da caza^
& fe valeo do feguro do mato. Confiderou-fe pofto em cam-
po, & que de fua cauza avião de fer as armas, o proceíTo, & a
íentença . Efcre veo húa carta geral, em que referia os fucçef-
fos paífados, o eftado prefente, & a determinação futura-có-
cluindo a relação com juílificar feu zelo,& a neceíridade,que
o coiiftrangera a aceitar a obrigação ,& o pofto de Governa-
dor das armas, & cabeça da folevação , da mão dos opprimi-
dos, que uniformes o acclamàraó libertador da pátria 5 não
porque a ambição o cegaífe, fe naó, porque o mayor ferviço
"^ ^ de

■^

i.~^\S:4* /^"SL.

€ia

de Deos, & de fiía pátria fe confeguiíTe . Affinoii a carta po%
todos os confidentes, & a remeteo ao Governador doEfta*
do António Telles da Sylvaja quem jurava obediência, & fi^
delidade.

6 3 Defte dia pordiante andou Joaõ Fernandes Vieira

de mata, em mata, fém v oltar a ftia caza, nem a algúa de fuás

fazendas: Naõ ouve parte, aonde o achaíTe aíTiftente fegun-

da noite, porque mudava fitio cada dia. Acompanhavaó-

no feu fogro Francifco Berenguer de Andrada, que nunca

^!r&a'dmfn' F^^^^ ^^^ ^^^^j ^^^"^ moradores mais confidentes , & feus
gue jua í igen- £^-jg ^^^^.^^^5 ^ ^^^ j^^ ferviáo de companliia , & de defenfa.

Notavelmente fe enganou o Author da liberdade em efcrcí- -p ^
ver,que Luis da Coftà Sepúlveda andara fempre á ilharga de calUib.
Toâo Fernandes Vieira , parcial em todas fuás tribulações;
lendo affi, que conhecida fua i.nconftancia,em nenhum tem-
po fe admitio fua affiftencia . Qiiem naó terá para íi, que a
tão duros golpes da trayçaó, & da fortuna , fe renderia hum
coração humano ? Com muyto menos cauza vimos proftra-
dos,os de muyto grandes Varões. De quãtos lemos,que per-
feguidos do poder fe entregarão á própria efpada, por teme-
.v.\ i-i^^-i\}W fc'^ ^^^ ^g golpes da alhea ? Naó aíTi efte Heroe , cujo animo c5
os mayores receos íe confolidava : Então mais fe animava,
quando tinha mayores oppofiçoés, que vencer. Ao rofto de
alguns, qUe o acompanhaváo , fahiaó a cores do defmayo 5 a
que elle acudia com rezoés geraes, dizendo-lhes que a gloria
do triumpho , nacia do mayor aperto do confliíto , & pello
tamanho dabatalha,fe media o corpo da viftoria ^quenaã
era grande, quem não fuperava a fortuna. Dava-lhes as pró-
prias defconfianças, por fiadores de fuás promeíTas , & dezia,
que a melhor triaga era,a que fe fazia do mais refinado v ene-
noj& que fó pella vereda da pena, fe caminha para a gloria,
Confortaçoes, que acompanhava com o rofi:o tão alegre , &
tão fereno, que nelle bebia alentos o coração mais defanima-
do. Naó desfalecem os membros , em quanto a cabeça lhes
manda vitaes os efpiritos.

64 Em fete de Junho deíle prefente anno,teve João
Fernandes Vieira nova certa, de que os Governadores de
índios, & Minas com os feus foldados tinhaõpaíTado o Rio

de

t.\n<5'

i^Ci r^U

ié4í <^jí(rEhLiv^r. 25^ .

de Saõ Fraficifco: (Tempos avia, em que no Arrecife anda-
va publica efta fama j mas aquella mefma cauza , que detinha
a marcha dos Governadores, deteve também a chegada dei-
te próprio: J Eftas cartas,com outras de pefíbas confidentes,
communicoujoão Fernandes Vieira aos leaes , para osani-
mar,& aos traydores, para os confundir: Com ellas mandou
ao Vigayro da várzea Franciíco da Cofta Falcão , finiffimo
Portuguez, que da fua parte diíTeíTe aos moradores delia, fe
declaraíTem, para faber,íe os avia de tratar como a fieis,fe co-
mo a inimigos, para que na occazião conheceíTe feu braço , a
qúé avia de amparar, & a quem devia períeguir . Refpondè-
ráo todos, que eráo verdadeiros Portuguezes , & como taes
os acharia promptos com fazendas,&: vidas para ofFerecerem
pello ferviço delRey , & fidelidade da pátria . Logo os tray-
dores feytos em hum corpo (eraó dous, que fe deixaó de no-
mear, para que os publique o numero, & não o nome) toma-
rão o caminho do Arrecife, fubirão á íàlla do Concelho, &
com o difcurfo , que tinhão bem decorado no delifto de fua
trayçáojfalàraó defta forte: Repetidas ve2es,&por differen-
tes meyos, Uluftres Senhores, temos avizado a Voífas Senho-
rias como verdadeiros amigos,&: fieis VaíTallos, da trayção,
que João Fernandes Vieira, &feus alhadostem fulminada
contra a Cópanhia , & contra os Eftados,fem que para tama-
nha maldade, ou veífe demonftração algua dedefconfiança,
ou de caftigo. Animou-fe a ouzadia , com a diffimulação do
atrevimento j & eftá tão adiantada a conjuração, que falta
muyto pouco,para rebentar a mina.Quem não caftiga a tray-
ção, quer defanimar a fidelidade . Que eftimaçãopóde ter o
íèrviço,aonde fe não caftiga a oíFenfa?'Quer augmentar o nu-
mero dos rebeldes, o fuperior, que peza em igual balança, o
obfequio,& o agravo^ & verfe deíprefado dos VaíTallos, que
deixa crecer o perigo dos fubditos : Defconfia da defenfa,
quem vè defprefar os meyos dafegurança. No dominante, a
falta do caftigo , não parece diffimulação do poder , fenão
fraqueza do braço j & todos íè atrevem contra o fraco . Emi-
nente eftà o perigo j & o mayor fera dilatar-Ihe o reparo . A-
cuda-fe com o remédio antes,que o impoíibilite a ruina, para
que a detença não faça mortal o golpe. Sabemos de certo,

Y que

As novas da f /»
dadoCamarão, e
Herique D/>f 4-
legrãoaos nojfos.

■uimi I

OuHi I

jnnn 1

Reboes com quS
dom íraydores o
revellhaos ÇlÃ-
defes.

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2^4 C^ST^lotú LUSITJNO

^4S

tSsiíXiSSS

5j que em hum dos dias , ou de Santo António , ou de Saó Joaõ
5) le há de ver defembainhada a efpada dos conípirados, em to-
5J dos os lugares defta Capitania^ determinação eneaminhada;
5) a cortar de hum golpe a cabeça ,&" os braços a efte domínio.
)> Naõfe guarde o defvioy para o cair do rayo, porque acudir
V a pegar na efpada, quando corta^ não fervirá de mais, que de
^. '^multiplicar as feridas. o^^honíi ^ v> ■ ivr;:^ ; on

65 Ouvira:ó os Olandefes a pratica,com vulto carrega*
IJW7Í. ' do j aceitarão o cOnfelho^ grato pello avizo , aborrecido pel-
la trayçãoj mandarão aos Delatores, que declaraíTem os no-
Dado-lhepor lif. Hies, & as moradas dos confpiradòs , pa-a fé tomarem por Iií>
ta os cõfpirados. taj nella fè meterão os qUè deu a verdade , os que entregou
o odia,& os que propôs a fofpeyta j & muytos que naquella
occaziãò avertio a cobiça v Na trayção fe vè retratado o
traydor.Pàra fi mefmo he fingido aquelle, que para os outros
1 he falfo. Pedirão eftes dõustraydores[ com encarecimento]
aos Olandefes , que os não defcubrifíem , porque não terião
c^ra para aparecer diante dos Portuguezcs , que o foubeíTem;
Infame cara deve fer â dò tray dor, pois trata de a efconder,aó
adulado, & ao ofFendídô . Defculpàráó-fe com o Framengo,
dizendo, que á fé de leaês Vaífallos os obrigara a entregar os
naturaes. Abomina váõ a nota)& não abominavão a culpa, &
para disfarçar efta , & continuar naquella , pedirão , que na
occaziáó das prifoés, os prendeífem também a elles,para que^
não os fófpéy tafíe traydores, quem os não viíTeculpados^co^
mo fe a mafcara ouveífe de mudar as feições do rofto. ' ^
66 Não fe defcuidou o Framengo em aplicar defeníí-:
^ros ao mal, que já temia. Mandou reparar todas fuás fortifi-
caçíoés , & conduzir todas fuás armas , publicando o aprefto,
fem defcubrir o motivo. Chegou a noite da vefpora de San-
to António 12 . de Junho, efcura,defabrida,& tempeftuofaj
em o principio delia fahirão do Arrecife diverfas mangas de
Com força defcu' foldados,de vinte até trinta homens cada húa,com ordens fe-
herta mmàA " cretas, que por differentes veredas tomaífem todos os cami-
" í1^.nhos,queguiaírem paraascazas dejoão Fernandes Vieira,
Fernlàes Vieira, de forte, que a hum mefmo tempo chegaflem a ellas,& as cer-
caíTem, tendo por fem duvida , que o feguro do tempo , & a
impoífibihdade da fuga, o entregariáo, ou á morte , ou á pri^

faó.

1645 fJllT£ L L1J%0 K 255

faõ. Enganou-os, o defejo, porque fe tinha adiantado o def-
vio, ao golpe. Entrarão nas cazas , virão , & revolverão to-
dos os apofentos , & retretes , fem acharem indícios do que
bufcavão:Quebràrão a fúria em roubar,& deftruir tudo,quã-'
to podia fervir á cobiça,& á viiigança.Para Te fazerem temet)
aíTentàrão corpo de armas naquelle lugar, donde como de
centro defpedirão partidas de foldados a toda a circunferên-
cia j pclla qual entrarão nas cazas de alguns moradores , mas
não achàraó nellas v i va peíToa: ( prevenidos do avizo fe ti-
nhão retirado ás matas,& canaveaes,aonde dormirâo.)Tam-
bem derão fobre as cuzas dos traydores, como o tinhão pedi-
do, hum dos quaes prenderão, porque lhe convinha deixar-
fe achar, & o levàraó para o Arrecife , mas com tal familiari-
dade, que o modo deftruio o arteficio j & a falta de compa-
nhia publicou a induftria. No dia feguinte (dedicado ao me-
lhor PortuguezJ fe avia de celebrar fua fefta na capela de híi
Engenho de João Fernandes Vieira 3 porém o aífalto do ini- ru i

migo, & o eftrondo das armas converteo em bellica,a manhã, JJ^^^ ^^^^ ^ ^-
que avia de fer feftiva. Todos os moradores do contorno tra-
tavão das armas, nenhum da fefta . Exemplo parece, que Ihes^
deu o Sanfto, fempre Sando , & nefte dia , mais que Saníio^
Portuguez. Direy o como, para que fe veja a rezão, que tive^
rão os homens, para fe maravilharem dos cazos : A piedade
dos fieis os aplaudio milagres; nós os referiremos fucçeíTos.

6y Trinta dias, antes do dia,de San6i:o António (em
que fe avia de fazer a fua fefta no Engenho de João Fernan-
des Vieira^ fuccedeo fechar hum homem de fua caza as por-
tas da Capela5(eftava a íèu cargo o ornato, & cuidado delia)
recolheo-fe á noite para fua caza, comas chaves na algibei-
ra: Ao outro dia de manhã vio as portas abertas,& perfuadio-
fe, que as fechara em falfo. Cora particular advertência as fe-
chou a fegunda noite, & teve as chaves a bom recado.Nafe- _. .,; ^ :
gunda manha vio as portas abertas, como na primeira . Uei- wTo,ammido a
tou vários juizos fobre o cazo ; Sc o achar tudo, o que fe po- Sa/íka Amónio,
dia furtar,& nada bolido,lhos fes reprovar; ( Ainda duvida-
va fe feria a culpa fua:) Continuou em fechar,& efpiar don-
de nacia a novidade; & não confeguio mais , que o defenga-
no de fe abrirem as portas, fem humana diligencia. Efpanta-
i.i.. Y 2 do

Itil

imL

1^6 C^ST^IOTO LWITANO 1645

do da maravilha , deu conta a algúas peíToas particulares,
/ como Sacerdotes , & homens de refpey to : x\tribu!raõ o
fucçeííb a traveíTura de algum vezinho, que com outra
chave dava aquelles motivos de fobre-falto , ao Porteiro.
Vigiarão , & nada colherão. Certos , de que tantos olhos , le
naó podiaó enganar, creraõ , que era obra do Sanâ:o , De-
raõ conta a Joaó Fernandes Vieira , como fenhor da Ca-
pela, & refolvèraõ, que em prefença de todos fe fechai^
fem as portas , & felIaíTe o orificio da fechadura , com o
feu finetC) &eftcrepofeíre aonde nenhúa peíToa opodef-^
fe tirar. Aífi fe fez,& vindo juntos ao outro dia achàraò
as portas abertas, &intaâ:o o fello: Admirados, & com-
pungidos confeíTáraó ao Sanâ:o por Author da eáranheza:
Explicado cõfd' Ajuizarão fobre o fucçeíToQque todos atribuirão a favor"]
2j^w^ /f^^- diíTeraõ huns,queoSanao os avizava, que fahiíTem a cam-
po, & ás abertas , & publicadas deífem principio á empre^
fa da liberdade : Outros, que a todos franqueava feu auxi-
lio , & que para feu focorro o acharião fcmpre, com a por-
ta aberta : Alguns , que os eníinava a deixarem fuás cazas
de par , empar ,& retirar, a parte f^ura , fuás peíToas, mo-
veis, & famílias. O fegundo cazo deu credito a cfte pa-
recer.

68 Na manham defte dia defpois, que fe tocou
o íino a convocar a gente ( antes de entrar á miífa ) efta-
vaó algúas peíToas na Igreja , decente, & devotamente or-
nada,^ quando de repente, hum modo de docel,que ef*
\ tavâ armado fobre a cabeça da Imagem , fe defarmou por

íi mefmo , & dobrado , ficou no altar a feus pés . Admi-
rados deixou aos prefentes prodígio taõ novo; & muy-
E parece i que â^Q i^2i^^^ â univoca explicação delle; porque uniformes
r ovados pello sã ^^^^^^^^ todos , que O Sanfto os avizava por aquelle mo-
do , que ajuntaflem o fadto , & fe pofeíTem em cobro,
porque avia entre elles , alguns ânimos dobrados , que á
fombrada fefta osquerião entregar á eípada inimiga; que
logo lhe defarmaíTem a Capella , & fe retiraíTem , que naõ
deíTem motivo a prefumir o Hereje , que o Sanâo , de
quem efpera vão o remédio, lhes occazionava o perigo; &
que aíTi, como todos os dias podiaõ fer dias de feu favor,

affi

aíTí em qualquer delIes,o podia feftejar fua devaçao.Efte io"^
D difcurfo de todos, & todos o aceitarão, como avho.Afíen- ,
tàraó, que a fefta fe guardafle para outra occaziâo ; & fe mu-
daíTe para a Igreja da Várzea , aonde poderia affiftir a ella,o
Governador da liberdade , como defpois aíTiftio , &: íe fes a
fefta com toda a folenidade 5 &fegurOj porrezão dasfinti-
nellas, que eftavão ao largo.

69 A a mata,aonde o Governador João Fernandes Viei-
ra fe tinha pafíàdo aquella noite,chegàrão3aò romper da alva, ^^/^.-^ ^ j^-^
alguns eícravos, feus confidentes, cOm as noticias da aíTálta- Fernandes FieU
da, que o Framengo dera em fua caza,defe)oíb de o matar,ou ra^decomoemfra
prender j & da v iolencia com que fe roubara , & deftruira tu- ^^^^^ . " ^"'fi^^ <»
do, o que tinha valor, & preftimo . Logo , que aclarou o dia ^^^^^í°\
mandou defcobrir o campo, & certo nafegurança delle,fe
foy com os de fua companhia , ao engenho de Luis Braz Be-
zerra, homem principal, capaz, & fiel, para confultar com el-
le,o que conforme ao eftado das couzas,fe devia obrar. Achà-
rão-fe nefta conferencia, Francifco Berenguer de Andrada,
Chriftovão Berenguer, António Bezerra , o Capitão Anto- '^
iiio Borges Uchoa, Francifco de Faria, António da Sylva Ca-
pitão dos Cavalleiros, o Capitão António Carneiro Falcão,
Bernardim de Carvalho , Cofme de Crafi;o Fefíba , Manoel
Cavalcanti, António Cavalcanti, [com dous filhos j o Capi-
tão João Nunes Viâioria, com algúa gente de armas de fogo,
João Cordeiro de Mendanha, Álvaro Teixeira, Amaro Lo-
pes Madureira, que defpois veyo a fer Capitão : Pofto bem
merecido de feu valor, & fidelidade,porque levado de hum,
& outro impulfo, hia, & v inha a efpiar , & a dar conta de tu- ,
do, quanto fe paífava no Arrecife , fem que fe lhe efeondeífe
o mais pequeno movimento , de que dava imporíantiííimos
avizos , ao Governador João Fernandes Vieira, de quem era
patricio; como também Diogo da Sylva,íeu S€cretario,man-
cebo de não menos valor,& confiança.Propos a todos,o que
defejava;& quando efpcrava o voto de cada hum, reípondè-
rão conformes , que elles o tinhão feyto , & acclamado Go-
vernador das Armas, & como tal, de via ordenar,& elles obe-
decer; & declarado feu parecer, cftavão promptos para o fe-
guir. Moílrou o Governador, o muy to que convinha fazer

Y3 pé

2^8 C^ST<^10T0 LUSITJ^O 1645

pé de exercit05& marcharem formados, & unidos a bufcar a-
lojamento conveniente : Seguindo efíe parecer , deixarão o
cowo^que, muda ^^g^^ho de Luis Braz Bezerra , & fe forâo aquartellar em hu
outeyro íituado no mterior da mata , ( pellas trez horas da
tarde) que lhes fervia de atalaya,& alojamento . Nefte fe de-
ti verão trez dias, & nelles fe lhes agregou toda a gente,que fe
occupava no ferviço das fazendas,delleJoão Fernandes Viei-
ra, & entre ella,alguns eícravos Minas,& Angolas,todos com
fuás armas, aos quaes promcteo liberdade , & premiojfe nefta
guerra fervifíem de íbrte, que o mereceííèm.

70 Nos trez dias j que fe detiverão nefte fítio diípos ó
Governador, aquelles apreftos,que parecerão neceíTarios pa-
ra a condução da gente , & dos viveres: Fes rezenha,da com
que fe achava,& íè contarão, cento, 8c trinta homens , todos
foldados no animo, muytos faltos de armas, & de pratica.Có
efta companhia marchou para outro pofto , & fes alto meya
legoa da Várzea, em hum lugar , que a natureza cercou de a-
lagadiços, chamado Camaragibe,acomodado para a facilida-
de das inteliigécias ,& da defenfa. Fes avizo a todas as partes,
da publicação da guerra, para que em todas fe pegaíTe nas ar-
mas, & o feguiífem. Mandou deitar bando porasfregueíias,
que todos os efcravos Angolas , Minas , Ardas , & Mulatos,
ntaraSbeJáJkx que quizeíTem fervir,&alliftar-fe,para eftaguerra,debaixo de
nefie lugar. ,íuas bandeiras, fe lhes daria paga , como a foldados , & goza-
rião de todos os foros da milícia , confeguindo liberdade ^ &
lhes prometia, confiado no favor do Ceo reígatallos , & dar
por cada hum a feu fenhor,o preço,em que fe avaliaíre,de fua
própria fazenda. Mandou publicar por todas as partes , qiíe
o Framengo tinha decretado paíFar á eípada a todos os man^
cebos de quinze até trinta & finco annos:Induftria , que apa-
drinhada pella prifaó, que fe fes de hum, obrigou a muytos, a
bufcarem as bandeiras da liberdade . A muytos fuccedeo có-
vocarem-fe, & darem de noite fobre as cazas dos Olandefes,
& Judeos, matando, & roubando ; fazendo experiência do
vigor do braço, & fios da efpada, para tomarem o pulfo a feu
„ , ^^ preftimo, antes de aífentar praça ; o que experimentado , íc
. £ ■ j A^i hiaoencorporarcom a nona gente ( primeiro com certidão
herados. "c lerviços, que com paga de loldados. j Oentiicza roy eita,

que

AloJA-fe em Ca-

que fouberãò imitar mu ytos cazados , affi feíverofos , que
não repararão em deixar as familias,& as fazendas expoftas á
cólera inimiga . Outros fazendo da neceffidade virtude, íe
deixarão ficar em fuás cazas, atalhados da falta , & da preíTa,
pclla impoffibilidade dos meyos,para acomodarem fuás fami-
lias. Não forão poucos, os que deíconíiados , & cegos, tive-
ra o por mais feguro , o faltar á obrigação , por aífiftir á co*
modidade; fieis ao Olandèsj deíleaes á pátria.

71 Por todo o contorno do Arrecife,fe tocava a rebate:
Ouvia-fe o eftrondo da guerra, com a formidável voz do te-
mor, & do tumulto, acrecentada com o grito do efpanto , &
da fofpeytaj correndo tão agigantadas as noticias , que nada ^^^'^^ " ^^^°^ ^^
fe media pella verdade , tudo íi, pello receo , & pella caufa: '"j'?^^" ' "^'f"*
Aonde a conrulao mais avultava , era dentro no Arrecire: ^^^-,
Vião os moradores delle entre íi a culpa^ & inferião , que alli
fe avião de experimentar mais rigurofos os caftigos . Os fu-
periores, acufados da própria conciencia,efcondião o medo,
Sc moftravão nas aparências , que não avia para que temer a
conjuração dos tumultuofos,faltos de tudo, o que podia fuf-
tentar o atrevimento, porém ncnhuni deixava de julgar não
íer poffivel, que fem alicerces, fubiíTe tanto o edifício da cóf-
piração, queeípantaíTe a todos : Com diligencias occultas fi-
zerão todo o poffivel, por lhe deíçubrir o fundo : E para fo-
cegar a inquietação do receo popular, mandarão fahir húa
embarcação ligeira, & nella a Theodozio Eftater , & a Gui-
Ihelme Wandrevot, (intelligentes na lingoa Portugueza , &
exercitados em femelhantes negócios ) com ordem fecreta,
que tomaíTem porto na Bahia , & efpiaírem,fe nella avia nàos
de guerra, ou levas de gente, em numero, que fe podeíTe pre- ^anda £mhaU
fumir baftante, para fomentar a confpiração dos levantados j xadores k Bahia,
Sc com regimento publico , que em nome dos Eftados acu- ^ 5«^M
faíTem, diante o Governador António Telles da Sylva , a re-
belião dos naturaes, & o favor, que lhe da vão os foragidos da
Bahia. Com eftas inftrucçoés fahirão do Arrecife em os pri-
meiros dias do mez de Julho,defte anno de 45 »

72 Comamefma cautela deípachàrão correyos fecre-
tos, a todos os Comendores, & Capitães das praças, & quar- ,
teis, que tinhão nas terras de feii dominio, com avizo^do que

Y^ te-

Fa:{ âvi^ a io-
dos osfeus da rs'
helião dos mora"
dores^ éf comete
^ãrtíd,oS a João
Fernandes Viei»
ra. '

.S

C<?»2 cràem que
trenàao a todos os
rebelados.

260 c^sr^oro lusitjno i 6 45

temiaõ; & ordem , que fe foitifiGafíem , & recolíieírem todos
os foldâdos a feus prezidios,empregando todo o cuidado em
tomarem os caminhos, para quea nova do levantamento náo
lavraíTe, alterando os ânimos dos obedientes . Por Jorge Ho-
mem Pinto, (morador poderoío da Paraíba , então affiílente
no Arrecife,)& António de Oly veira,Provedor, & Ouvidor
da Ilha de Itamaracá , mandarão ofFerecer a Joaô Fernandes
Vieira duzentos mil cruzados, pagos aonde ellequizeíTe, &
com as feguranças, que apontaílè, porque defiftiílè do inten-
to começado , & deixaíTe a Capitania em feu antigo focego:
Propofta, a que o magnânimo Varaó ( deípois de indifferen-
tes refpoftas, neceíTarias , para dilatar o tempo ) refpondeO,
què naõ vendia a honra decaftigar tiranos, por taó baixo
preío. Com diligencia publica mandarão reformar a fortifi-
cação de todas as Fortalezas do Arrecife, metendo nellas do-
bradas guarnições, munições, armas , & mantimentos j tudo
obrado com a induftria, de q naò era feu temor a cauza,fena6
o mal fundado receo do v ulgo.

73 Por peíToas confidentes, mandarão a lifta dos mora-
dores, que tinha malfinado a culpa, a paixaó, &a cobiça, a
feus miniftros,para que em todas as partes foíTem prefos,em
hum mefmo dia, & remeti dos ao Arrecife, com fegurança.
Em o mais crecido numero dos culpados, fimdava o latrocí-
nio a may or quantidade dos paíTa-portes,( intentavaõ com a
veda delles,encher as bolças,)& naó advertiaó em ferem ver-
dadeiras, ou falfas as culpasifem que a ambição lhes deixaífe
ver, queporefte meyo minoravaó feu partido,© qualde-
frauda,quem dos parciaes faz contrários, afaftando com a in-
juria, a quem aviaõ de atrahir com o afago . Caufou efta de-
fatençaó, o virem prefos do Porto do Calvo, Rodrigo de
Barros Pimentel^ de Una,o Padre Joaó Gomes de Aguiar^ de
Sirinhaem,Sebail^iáo de Guimarães^, & Simaõ Vieira ^ do Ca-
bo de Sanáo Agoftinho , António Mendez de Azevedo ^ de
Gorjaú, António Nunes Ximenesj de Sanâ:o Amaro, Antó-
nio de Bulhões; de S.Lourenço, Gafpar Pereyra , & feu filho
Salvador Pereyra; da Paraiba , António Barbalho . A todos
mandou prender, mais a efperança do lucro , que a fofpey ta
do delifloj fem reparar aquelle governo, que acendia a laba-
reda

reda com a diligencia de apagar o fogo . Miiyto mayor nu-
mero foy o dos pronunciados, que o dos prefosj porém efca-
pâraõ da prifaó ^ ou por mais ditofos , ou por mais ligeiros,
fugindo, parte para o alojamento de João Fernandes Vieira,
& parte para os matos , & muy tos delles , primeiro inimigos
do Olandès, pello efcandalo,que pello zelo.

74 Tinha fahido do feu Concelho Supremo, alguns
dias antes, hum edital, que mandava a todas as peíToas de feu
domínio de qualquer callidade, & eftado que foíTem , que do
Arrecife, nem por fi, nem por outrem podeíTem tirar fazen' prematica , que
da, fuftento, ou género algum por contrato, venda y commu- manda publicar
tacão, ou em preftimo , fem expreíTa licença dos fuperiores^'' Arrecife.
do governo (com a meima pena a reos, & authores.) Parecia
politica, em ordem ao provimento da praça , & foy ardil do
latrocinio: Como também o foy , outro decreto , que fe pu-
blicou, em o fim de Junho defte anno, por todas as partes de
fua jurisdição, na feguinte forma. Os muyto Nobres Senho- »
res do Supremo Concelho das Capitanias fogeitas, aos muy- »
to Altos,& Poderofos Eftados de Olanda ^ pella lUuítriíTima '»
companhia das índias Occidentaes , &c. Por quanto , infor- »
mados, & condoídos de alguns moradores de nofíà obedien- »»
cia, (movidos de hum falfo rumor, divulgado por tray dores, "
que affirmavão, que noflbs foldados, com ordem noíTa, avlaó »
de fahir pella campanha a matar , & roubar a todos os natu- 5»
raes, que vivem fora de noífas fortificações )que fe auzenta- "
vão, para os matos, deixando fuás cazas, & fâzendas,com no- n
tavel detrimento de fuás peíToas, & familias^por eíle decreto )»
lhe fazemos faber, que noíTa tenção , he defender , & confer- »>
var a todos noíTos fubditos, em feus foros , & ifençoês, com 5»
real feguro de feus bens, &íuas peíToas. Em execução dou
qual, requeremos a todos da parte de Deos , & da noíTa , que «
fem receo algum fe tornem ás fuás vivendas , ainda que ande n
aufentes por crimes,dos quaes defde logo lhe damos plenária u
abfolviçãoj não ifentando de noíTo perdão,aos que ou verem j?
encorrido emdeliáto detrayção, con;i tanto , que naó fejáo »
cabeças da rebeldia j & que dentro de nove dias fe venha o a- »
prefentar ante nós, para fazerem novo termo de fidelidade, «
& receberem novos paíTa-portes de feguranp.E declaramos »

que

262

QAsr^j^oro Lusirj^NO

1^45

55 que 3 todos, os que faltarem a efta noíTa ordem 5 os averemos
55 por rebeldes, & procederemos contra elles, como contra ini-
5) migos declarados,fem piedade, nem remiíTaó algiia. Dada na
57 Supremo Concelho cm defoyto dias do mez de Julho de
5) mil & feifceníos & quarenta 8c finco,fellada com o lello ma-
55 yordenoffocargo.JoãoBoleftrate.Henrique Hamel.Pedro
53 BaKes. Joaó Balbeques.

75 Publicado efte cavillozo decreto, acudirão neftes^
dias ao Concelho, aquelles moradores , que por falta de me-
y os fe naó tinhaó fahido de íuas cazas , eíperando opportii-

Efeytos,que cau' cidade para o fazerem j (detidos agora do natural aííeào , cõ
z,arao '^fif f^^' Q^Qyp^^^^P^i^Qçmç^nio acomodar íuas famílias ")& a muy tos,
^^^ ' ' aos quaes naõ avia chegado noticia certa do levantamento.

Fizeraó todos novo juramento; receberão novos paíTa-por-
.^ tes,& deixarão por cada hum dous dobrões, que era o fim
- deftas prematicas, fempre prometidas,nunca guardadas.Não

parou aqui a fede do roubo: Com nova traça bufcàraõ nova
occazião, para o executarem . Defpachárão diverfos folda-
dos, com ordem, que foíTem pellas cazas dos moradores , &
com pretexto de amizade os avizaírem,que não tiveíTem re-
tirados, nem efcondidos feus moveis , porque fabião decer-
to, que os do governo manda váo os Cabocolos, penetrar, &
correr os matos, com poderes para tomarem tudo, o que nel-
les achaíTem, & para matarem as peíToas , queeftiveíTem em
guarda dos moveis retirados. Naó poucos moradores aconfe-
Ihados da experiência, [fem fazerem cazo de femelhantes a-
vizos, & promeífas ] tomàraó o caminho mais feguro , & fe
foraõ encorporar comjoão Fernandes Vieira,deixando fuás
^ mulheres,& filhos pellas cazas dos parentes,& vezinhos, que
tinhão paíTa-portes; naô por imaginarem , que debaixo da fé
Olandefa ficava o guardados, fe não, porque efperavão , que
a dilação do tempo lhes abriria caminho , para os porem em
falvo.Tinhaõ entendido que todas as fobre-ditas premati-
cas, & diligencias fe encaminha vaó a multiplicar agravos, in-
jurias, & roubos.

76 Ainda, que fios adiantemos no tempo , diremos co-
mo o fado correfpondeo ao conceito. Alguns dias defpois,
que na prifaó do Arrecife tiveraó os moradoresp que manda-
rão

i^4'>

TAIlTE L LÍF^O K

263

raó prefos, os Miniftros do recôncavo^ os foltàraõ, obrigan-
do a cada hiim,a que recebeílè novo iuraniento,&: pafia-por- f q^f^ py t^^^^^
tfe,dando por elle dous dobroês/em proceíTo, nem diRinçaó, ^^^ morado-
entre innocentes,& culpados - fó os differençava a modera- res.
çáo, òu exceíTo dopreço, porque lhes vendião a liberdade:
Pérdeo-a com a v ida António Mendes de Azevedo , por íc
dizer, que hum filho , & hum genro feu feguião a João Fer-
nandes Vieira, Prolongarão a prifaõ a Gafpar Pereyra , & a
íeu filho Sal vadorPereyra; ao pay, para déípois o foi tarem, .-r^

por inútil, ao filho,para moftrarem,q o não era,para fe livrar uóv p,^ « xu ^
ardilozo. A Rodrigo de Barros Pimentel pozeraó a tormen- '

to, não pella culpa, que não tínhá,fenáo pello dinheiro,que
não dava. Naõ^tfáè com mayor fogo 6 veneno de húa fera
àíTanhada, que a nada íabe perdoar, dó que ardião os peço-
nhentos corações, daquelles tiranos em mortal ódio , contra
tòdos'os moradores, porque Os íbípey ta vaó mais inclinados
á liberdade acclamada, que as niiíérias padecidas» - - -áoíjí-^ví
T'?"? Nao podemos de? xar de referir (para clai*eíá da hif-
tòrlà^ como entre os fobr^ditos prefòs, eftava no Arrecife, o
traydor, de que aííima diffismos: Nèe^océava com os Olande- „.„ , ,
les, que íimuladamente o i^ualaílem na l0rte,Gom os mal ima- ^Qi^pommexes
dos,para que fe naõ entenáefíè,fôra o Author da trayçaó:EÍ^
te, (não merece mais rtOtDf , qiiem v ive da infâmia ) falfo em
todo o eílilo, deixou manifeito , no do Arrecife , o da per-
fídia. Sua prifaó,era a caza do Governador das Armas Olan-
defas^ com liberdades para falar com todos, & não o compre-
hendernenhuapremàtíc^: Tinha porta franca para mandar
do Arrecife, & receber M fora tudo, o que queria 3 &: para q
fua mulher lhe foífè affiiiir o tempo, que elle ordenava: To-
dos os Superiores do governo ovizitavão com affiften cias,
& mimosjcõ mais cótinuação o Coronel Mathias BeKe,& os
Judeos mais cOnhecidos:Dos Portuguezes, nenhú fiel j fó oM-
tro tray dor^ [homem de tão baixa forte , que o deliâo , lhe
íião afrontava o nome ] afemelhança influia na correfpon-
dencia. Occupava-fe efte fegundo em recolher tudo, quanto
fe paífava entre os noífos,para o referir no Arrecife ao outro,
o qual o comunicava aos Òlandefesjcom o que naó avia cou-
fa que fe paffafíe entre nós , de que o inimigo naó tiveífe in-
teira

2 ê4r QJSr^oro LUSITJ KO

164^

fi'

teira notícia: E defta forte viviaó eftes dous homenSjlium da
trayçaó do outro. ;,

7 8 Joaó Fernandes Vieiraja quem nada fe eícondia, en-
formado dos defprezos, com que eftes dous tray dores o tra-
ta vaó diante dosOlandefes,&Judeos, desfazendo em fua
peíToa, feu poder, & feu intento ,& fentido dos agravos , que
padcciaó muytos homens de bem por feu refpey to, determi-
nou com hum golpe ferir a todos, & mandou fixar em todos
João Ternanâes ^^ puhhcos dentro,& fora do Arrecife efte edital . Joaó Fer-
Fieira fa^ hU e- nandes Vieira primeiro acclamador da liberdade , & Gover^
àitd que mm- nador das Armas, na reftauraçaó , & reftituição de Pernam-
da. fixar nos /?«- buco a feu legitimo Senhor Faço faber a, toda a peíToa de
tcos do Arrect^ qualquer eftado, callidade,& naçaõ,que quizer tomar armas
" contra a tirania , & injufta occupaçaó do Olandès inimigo
" comum, para o bem de todas eftas Capitanias , & dos oppri-
" midos moradores delias, aífente praça dentro de quatro dias
" defpoís da noticia defte noflb edital , fobpena de o avermos
" por rebelde, & procedermos contra ellecomo contra inimi-
" go da Patriaj & fendo Eftrangeiro , ou Judeo , que queira fi-
'' car em fua caza ,& cultivar fuás fazendas debaixo de noífo
?' amparo, o defenderemos como a fiel VaíTallo da Coroa de
'' Portugal^Sc lhe daremos todo o favor necelTario, para cobrar
" todas, & quaefquer divida^, que comjuftificado titulo lhe
" pertencerem;além do que,fe lhe dará íatisfaçaò ao foldo que
" confiar , lhe fica devendo a companhia de Olanda ; & em ca-*
"zo, que queira paíTardefiia, para qualquer outra Provincia,
*' por rezoés, que tenha para naõ mihtar debaixo de noflfas bá-
" deiras, lhe daremos livre paflTagem: Advertindo,& requeren-
" do a todos,que fe não deixem enganar das aparentes cófiã^
" ças, & falfas promeífas do fementido Olandès . Dada nefi:a
'»;nofla campanha de Pernambuco em 24. de Julho de 1645.
" annos. O Governador Joaõ Fernandes Vieira.

79 Doidos do golpe, & irritados da injuria , mandarão
os Olandefes deitar bando, por todas as Praças,& Fortalezas
do Arrecife,pello qual prometiaõ quatro mil fíorins.a quem
mataíTe, ou prendeíTe a Joaó Fernandes Vieira5& que fendo
o matador efcravo, receberia o dinheiro, & ficaria livre j da
mefma forte fe efi:iveíre comprehendido em qualquer crime.

Por

i64í ^À^TELLIV^OV. 16^

Por ontro bando, & públicos editaes prometeo Joaô Fernã-

des Vieira oyto mil florins, a qualquer peíToa, que lhe apre- ^,^;^^;^' f J/T

fentaíTe a cabeça de cada hum dos do Concelho Supremo; rinsa^ueo?n^-

aos quaes efcreveo húa carta,cuja fuftancia era , arguillos de te.

fementidos, Herejes,& horriveis tiranos, com máos , fó para

o roubo,& lingoas, fó para a injuria,& para a blasfémia. Que

ouvia dizer,publicavão bufcallo^quc fe não cançaíTem em ef-

pecular caminhos infames, que elle a cara defcoberta os iria

villtar ao Arrecife, para o que tinha catorze mil foldados

brancoSjSc v inte quatro mil moradores, & índios , que nefta

facçaó da liberdade o feguiaó, numero , que primeiro lhe a-

gregou o defejo da vingança , que o braço de fua diligencia.

Pezar, & cuidado grande, cauzou ao Framengo efta carta, E loao Fermdes

(cortado igualmente da cenfura, & do ameaço.^ Por fuás lif- ^''"^'^ dobrado

^pi.^ , r n ir preço^ a quem o

tas labia o numero da gente, que lultentava o terreno de leu ^jL^te ; ^ /^^
dominío, & lhe não parecia impoffiveI,o que a carta referia, efireve com de--
Naó íahio a publico com efte receo, efcõdendo-o debaixo de finfado,
aparente deíprezo por não alterar os parciaes. Em quãto fuc-
cedeo em Pernambuco, o relatado, acontecerão outras cou-
2as, em diverfas partes, pertencentes á hiftoria , de que dare*
mos conta, por não alterar o tempo delias , nem confundir a
intelligencia da narração.

80 Em o numero 5 5 . deíie qlimto Livro, dei^taitios di-
to, como Joaô Fernandes Vieira, nomeara diverfos Capitães,
por todas as freguefias, prevenindo feu cuidado as contingé-
cias do futuro; & que no lugar de Ipojuca , dera a gineta de
Capitão May or a Amador de Araújo , & poderes para crear o quefucceâene^
os Capitães ordinários de feu deílriâ:o,da forte,que os i^tM- fte tempo emlp-
fe o numero da gente.Com efta ordem,fes Amad or de Arau- i^^f
Jo Capitão de húa companhia paga ( com obrigação de ale-
vantar,) a hum valerofo mancebo chamado Domingos Fa-
gundesjde tão alentados eípiritos,que adiantou a fama de feu
nome, ao numero de feus annos;fazendo-fe conhecer por feu
braço, entre naturaes , & eftranhos . E já que fuás obras nos
dão matéria, para a hiftoria, não fera bem , que a hiftoria lhe <^f^fiy ^ C^"
negue a memoria divida a fuás obras. Foy o Capitão i^o-^F^JtindeT&f^"
mingos Fagundes natural da Villa de Viana do Lima: No té- obrou, ' °^
po,em que o Marquez de Monte-Alva5 governou o Eftado,

,Z ofes

2^6 C^ST(p^IOTO LUSITJNO 1^45

o fes Cabo de vinte foldados, na expedição de outros Capi-
tães, que mandou a tallar a campanha de Pernambucorcoma
fica dito: jSobfe-pujou o valor aos annos,& fe fes temido dos
. OlandefeSj pelíos que matou, &: deílruio, & amado dos mo-
radores, pellâ modeília, & refpeyto, com que os tratou : Co-
mo todos os afíaltos eraõ de poucos,& a furto,fuccedeo,que
hum dia mandou bufcar decomer, por hum homem,de quem
fe fiava , o qual faltando, ao que devia , tratou com os Olan-
defes de lhes entregar a Domingos Fâgundes,& aos feus,pro-
metendo guiallos ao lagar, aonde fe aloja vaõ.Executou-fe a
trayçaó*. Guiou otrâydor húa partida de foldados Olande-
fes, pello eícuro da noite , &pello inculto do mato íDeraã
fobre o Capitão Fagundes , & feus vinte foldados , a tempo,
que fiados no ícguro do íitio , & da hora , dormiáo, arrima-
das ás armas,que o repentino aflàlto lhes fes deixar,fem íiiais
lembrança, que a de Salvar cada hum a vidst.Áchou-fe o Ca-
pitão aífiftido de quatro foldados , que tiveraõ acordo pára
pegar nas armas, & com elles íè foy retirando , & defenden-
do do poder inimigo, até fe embrenhar no mato 3 guardando
a V ingança, para occaziaõ mais opportuna.

8 1 Pello tempo adiante fepaíTou o Capitão Fagundes?
âo Porto do Calvo, aonde aííiftia , quando lhe diíTeraõ , que
humOlandès,chamadoMçfl;reJoão,repitira emalgúaspar-
tes,(d iante de teftimunhas authorizadas) que o Capitão Fa-
gundes matava,porém não a cara deícoberta.Encontrâraõ-íe
em húa eftrada, o queixozo,& o culpado, efte acompanhado
de outro Olãdès,armados de clavinas,& piftolas.Pof-fe dian-
te de ambos o Capitão Fagundes , & dizendo quem era ,&
porque o matava,lhe meteo duas balas no pey to, ao culpado.'
Ao companheiro, que fugia fem tino,chamou,& deteve, di-
zendo-lhe, que não temcííe, porque não caftigava fe não o a-
trevimento, de quem em fua aufencia o dcfcompunha. Derão
noticia do cazo ao Conde de Naífaujchamou a fi ao Capitão
Fagundes,& fes grande eftimação delle,lou vando muy to feu
o Codê de Ndffau ^^i^ío defenfado : Có feguro Real andava no Arrecife. Ou-
ó fa'voreceo , ér veoccazião,emque humfoldado á vifta de outro, oagra-
porque, vou,comhum pezadodefprezo. Achou-ofofrido aimpoA

fibilidade de vingar a ofFenfa.Não tardou o tempo com a qc--
' caziaò,

r64=

fAI^VE L L1J%0 K 1

-m

caziaõ jde fe encontrarem em o caminho da Moribeca , o '
foldado Olandès com húa clavina , o Fagundes com a fua
efpada: Avançou-o ; & com tal deftreza o ferio , que primei-
ro o Framengo fe vio atraveíTado , que lhe podeííe fazer tiro.
Defpojou-o o Valerofo Portuguez das armas, & no próprio
lugar lhe deu fepultura, para que tambem,a tiveíTe o delido:
Daquelle lugar fe paíTou á povoação de Ipojuca, aonde vi-
veo até o tempo , em que Joaõ Fernandes Vieira nomeou a
Amador de Araújo, por Capitão Mayor daquelle defl:riâ:oj
Sc como conhecia o pulfo, & valor de Domingos Fagundes,
lhe deu patente de Capitão, com obrigação de levantar a fua ^^^^^ ^^ deuxar
companhia:Com a mefma condição a deu também a Etvtho-^^,^^^,//^ ''^
lameu Soares Canhaj dignos, por feu valor , de mayores era- j^^^.
pregos.

82 Andados alguns dias de Junho , fuccedeo na po-
voação de Ipojuca matar hum morador a hum Judeo, ca-
zualmente. (^Era contratador,& dos ricos do Arrecife J Acu-
dirão valedores, por húa, & outra parte ; & na pendência fi-
carão mortos, pellascuftas, outros dous tratantes, também
Judeos. Foy tal a revolução do lugar , que o Cabo do prezi-
dio Olandès fe imaginou perdido. (Tinha noticias certas do Nomeado Capi'
levantamento dejoaó Fernandes Vieira, feguido dos mora- '^^» perfegue m
dores, Sctemeo fermotim,o tumulto.) Com melhor enfor- '^^'^^^'^^''*
mação íahio a prender os delinquentes, o que não confeguio
porque ]i fe tinhão pofto em falvo . O Capitão Fagundes,
que a efte tempo fe achava com 1 6 . foldados de fua compa-
iihia,perfuadido da confuzãOjque cauzàraõ aquellas mortes,
deu fobre algúas cazas de Olandeíès, & nellas não deixou vi-
da, o ferro,nem fazenda,o fogo, que não confumiíTè ; & não
ficara naquella parte Framengo , nem couza fua, fe lhe na5
atara as mãos a falta de armas de fogo. Determinou bufcallas
a ouzadia,aonde as guardava o perigo: AíTaltou hiíá caza for-
te, na qual fe aquartellava húa companhia de foldados Olan-
defesj com morte de trez,& fugida dos mais a ganhou ,& com
as armas, & munições dos defpojos, guarnece© a feus folda-
dos. Já ao valente Capitão, pareciaó pequeno emprego, pa-
ra feu animo, osaífaltos fortivos : A cara defcuberta enveA
tio trez barcosj que (no chamado Porto do Salgado ) efta-

Z 2 va5

m

i6S CJSr^oro LVSITAKO 164$

vaô a carga , com boa quantidade de açucares , & farinhasj.
& os rendeo a pezar da guarda Olandeza , que os defendia.
Nefte tempo chegou a nova ^ de que eftavajoaó Fernandes
Vieira pofto em campo, com fufficiente pé de exercito, ( em
beneficio da liberdade ) & Amador de Araújo com todos os
Capitães, Toldados, & moradores le declararão por parciaes
na folevaçaójfuprindo a falta das armas com a grandefa dos
ânimos, que os eníinava a lançar mão de chuços , dardos, fa-
cas de monte, & páos toftados.

83 Chegou ao Arrecife à nova da rebelião delpo-
Jucâ , com tamanho brado , que efpantou ouvida, & muyto
mais, augmentada com os gritos, & prantos , que os Judeos
^e e/ies madão €iiet3LÒ pella morte dos feus : Sahirão pellas ruas apeli-
'uingar por Hen- dando juftiça, & perfuadindo vingança. A as portas dos
rniue Eus. Concelhos , & dos Miniftros crecião as vozes, com que re-
queriaõ o caftigo, oíFerecendo-fe a todo o difpendio . Os
do Governo incitados da cobiça , pella occazião, fizeraõ do
intereíTe reputação . Chamarão ao feu General das Armas
Henrique Hus j encareceraó-lhe a importância , & utili-
dade do negocio , & concluirão , que com preíTa , & íè-
gredo , efcolhefle feifcentos homens , & marchaííe a Ipoju-
ca j o que fes fahindo da Cidade Mauriçea, em vinte &
quatro de Junho , efcondido com as fombras da noite, &
com os recatos dofilencio. Em quanto faz a viagem dare-
mos rezaó do que fuccedeo na campanha , aonde deixamos
ao Governa or da liberdade ( nefte mefmo dia ) occupado,
em manifeftar a emprefa, por editaes públicos; & os poderes
de General, com mandar dizer aos moradores das ribeiras
de Capeberibe, & da freguefia de Saõ Lourenço , que fem
dilação algúa, fe lhe agregaíTem com fuás armas, & elcravos;
o que fizeraó muy tos j como verdadeiros Portuguezes. Na5
chegou mais diftante a noticia do decreto , porque a dili-
gencia Olandefa tinha preoccupadas as veredas da comuni*
cação.

84 Não dava o Governador da liberdade paflb, de que
o Glandes, nãotiveíTe noticia; eíFeyto da vigilância, com
que os traydores , que aííiftiaò entre nós , o mqueriaò , &
delata vão. O fementido ordinariamente faz thema da pérfia;

por

p'(5r parecer verdadeiro a hua das partes. Foy logo avizado a

G o vernador Joaó Fernandes Vieira, em como o Framéngo, ^

enformado do lugar, aonde refidia, djípiínha dar-llíe hiia po- ^

deroía'íiíra]tada. Confiderou duvidoía a refiftencia , & reíbl-

veo furtar o corpo á occaziãojcom mndar de alojamento.Re-

tirou-reparaamata, quechamão de Vafco Pires Borralho, R(^^^^r<^<^<^-^^^'

dirpoíta pello titio, & pella forma para guardar,& para eíco- ^^^^ rafco Pires.

der. Defta paragem mandou chamar ao Capitão António

Dias Cardozo,que com a fua gente,re v ieffe encorporar com

elle^ o que logo fes,feguido dos foldados de íiia companhia.

AíTi como chegou, lhe deu João Fernandes Vieira patente

de Sargento Mayor,&preheminencias de Tenente General, chama, fará Ji

ordenando, que todos lhe obedeceffem , como a fua própria António Dias Car

peíToa. Chamou a concelho aos homens, que o podiaò dar, 7^^ » ^ ^ J"^^
o u p r\ - -ur 11-- ' Sargento May or,

& neile le reíolveo, que nao convmha eíperar alh ao inimi- ^ "^ -

go, com gente bizonha,falta de armas,& de pratica^Sc em taõ
pequeno numero: Dizião, que o valor naó tinha parentefco
com a temeridade, & que faltariaõ aos confelhos da prudên-
cia, íè defprezaífem o feguro,por efperar o perigo; que o ef-
cuzar a batalha, por aíTegurar a vidoria, era confelho do va-
lor, & não influxo da cobardia ; & que não tinha fombra de
fogida, a cautela da retirada. Com argumentos ta5 certos, &
com a vezinhança dosfocorros efperados , conhecerão to-
dos, o quanto importava mudar de fitio , para defmentirem
os avizos da trayção , & engroíTarem o poder da fidelidadej
vendo claramente, que a empre.ía,que tinhão entre mãos,não
poderia ter fim ditofo , fe começaífe por hum principio erra-
doiporque o brado do primeiro infortúnio defviava aos neu*
traes,& acobardava aos fieis. Na5 affi a primeira vi£i:oria,que
atrahe com a efperança das mais j & de ordinário medem os
homens os fegundosfucçeífosjpella fortuna dos primeiros.

8 5 Aprovado efte parecer, fe efcolheo, por lugar mais
conveniente, o íitio de Maciape, quatro legoas diílante ; &
por importante, abrirfe novo caminho pella mata , para fe
encubrir a marcha, furtada a efpias,& tray dores . Executou-
fe o confelho com promptida5jabrio-fe o caminho,marchou
o pequeno exercito,(conftava de duzentos,& cincoenta ho- p^^ -^ parecer
mens,& trinta Negros Minas) fizeraõ alto em MaciapCjaon-y^^^^^^^-^^^^;

---•;■ Z3 de ciape.

Hl

i

270 C^ST(^10T0 LUSlTJnO 1645

de fe lhe agregarão os Capitães Franciíco Ramos , & Braz de
Barrosjcom quaréta homens bem armados j & Joaó Barboza^
Sebaftião Ferreira,Domingos da Coftajoaó Nunes da mata^
& Domingos Raymundo, com agente,quepodèraõ trazer
cófigo.Ordenoii o Governador da hberdade ao Ajudátc A-
maro Cordeiro,& a outros officiaes da milicia,( Cabo de to-
dos o Padre Simão de Figueiredo^ que foíTem pellas ribeiras
do Capebiribe, até a mata do Braziljintimar a todos os mora-
dores, que com fuás armas, & efcravos, fe vieíTem logo, para
aquelle lugar ; aliás os averia por rebeldes , Sc como taes fe
procederia contra elles. Eftavaó as vontades difpoftas , & a-
chou o bando promptas obediências, com tal alvoroço, que
huns aos outros fedava5 os parabéns do comprimento de
feus defejos,aIegres,fobre modo,de faberem , que João Fer-
Capítães^&geme nandes Vieira eftava pofto em campo^com tamanha confian-
que ofeguem. ^^ j^ ç^^ valor,& zelo, que perdiaó de vifta todas as dificul-
dades da empreía.Em cinco dias,que o Governador da liber-
dade fe deteve em Maciapefe lhe agregarão oytocentos ho-
mens, os mais delles práticos na guerra, por averem militado
nas occazioês paíTadasi porém fó com trinta armas de fogo,
poucas para a gente, que era, muy tas para o rigor, com que o
inimigo as prohibia. Para fuprir em parte efta falta , mandou
o Governador alimpar bom numero de efpinguardas , que
para efte fim tinha efcondidasj aos mais,fes armar de chuços, .
& pâos toftados, que fuprião a falta das picas.

86 AíTombrame a deliberação , com que eftes homens
íe entregarão ás defcomodidades da campanha , & aos peri-
gos da guerra, deixando o mimo de íli as cazas , a companhia
de fuás efpofas, filhos, parentes, & amigos , fiada fua confer*;
vaçaó, a remédio taõ incerto; ('como feviveíTem eíqueci-
dos dos V inculos do fangue , & do amor, ) & não ley, de que
mais me efpante, fedo fervor, com que defprezàrão os peri-
gos da guerra, fe da refoluçaó,com que romperão os laços da
natureza. Dará hum mortal a fazenda , por confervar a vida.
Naó repararão os homens em arrifcar a vida pello que amaó.
Mas determinarfe cada-qual por hum meíino ado , a perder
a fazenda, que poíTucj a deixar as prendas, que ama , & arrife
car a vidajqueeílima , pello amor do Principe, &:da Pátria

:■ V que

Heróica refoluçao
dos moradores.

K

f54í ^fpJ7(rELLlF^0 F. 271

que fervejfo nos Portuguezes da America,re vio a fedilidade
com tão delgado fioj& tão difficil de rompei\qne o não que-
brou a falta do premio,& da eíperança delle. Tenho por lem
duvida, que a falta da remuneração, não he do Principe,que
a deve, fe não do ferviço,que o empenha; que muy tas vezes,
por exceíTi vo, lhe impoífibilita a paga: Gloria do merecimé-
to he, impoílibilitar a fatisfação; porque efta acaba,& ofFen-
de,no que limitaj& aquelle, dura fem ofFenía:0 dos Pernam-
bucanos, não moftrará nunca a remuneração fatisfeyto,porq
o mayor premio lhe ficará deminuto.
' 87 Já os noíTos foldados infundião temor no inimigo,
fahindo alguas cõpanhias com difciplina, & orgulho a correr
a campanha,& a buícar nas occazioés honra,mantimentos, &
armas, de que neceffitava a opinião, & o intento . ( Não fal-
tavão á máxima , de fazerem a guerra ao inimigo á cufta do
inimigo) A húa partida de cincoenta foldados Olandefes,& p^i/g numero, &-
índios desbaratarão os Capitães Paulo Velozo5Francirco de âtjciplma. os te-
Lisboa, & Mathias Ricardo com itiQtte de treze Framengos, ^e o olmãa,
Sc oyto Brazilianos, que vinhão a dar efcolta a hum comboy
de farinhas, conduzidas deSaõ Lourenço para o Arrecife.
Nas mãos dos noíTos as deixarão, com baílante numero de
munições , & armas. Prefa, que a neceííidade , 8i o tempo fes
eftimar em mais, do que valia. í^aíTados cinco dias , marchou
o Governador,com toda a fua gente, para Sa5 Lourenço,dõ-
de íahiraõ foldados ,& moradores a rccebello com vivas , &
acciamaçqési que fazião mais feftivas os repiques dos finos:
Todos jurarão fidelidade, companhia,& obediência, a Joaõ
Fernandes Vieira, como a feu legitimo Governador . Era no
coração do inverno ^ aquelle mais rigurozo , que os outros,
pella inundação das agoas: Tempo incapaz para o exercicio
das armas, porém não para o concerto , & preparação delias;
8c condução dos mantimentos : Para húa , & outra couza fe
deftinâraó officiaes; & deu o Governador , de fua caza , o di-
nheiro neceíTario, correndo por fua conta o difpendio , que
fes o exercito na Campanha, por tempo de trez mezesifendo
ihnumeravel a multidão da gente inútil , que em fua compa-
nhia, bufca va fuftento, & feguro . Em quanto o noíTo exer-
cito , não muda de aIo;ameiit03 daremos rezão^ do quepaíTã-

Z4 raõ

If l'

'<:«;

Manda £mhai'

272 C^ST<^IõTO LUSITJNO 1645"^

raõ os dons Embaixadores , que o Framengo mandou á Ba*
hia, por não tiraremos aos focçefíbs feu próprio tempo.

8 8 Em o numero 7 1 . defte quinto Livro referimos, co-
mo em os primeiros dias deJalho,defte anno, mandarão os
do Concelho Supremo Embaixadores á Bahia, com ordens,
que com toda a diligencia defcubriffem o animo do Gover-
nador do Eftado António Telles daSylva, &fondaírem o
tlTores^ZZl f"í"ií^o? que tií^ha a folevação,& intento de João Fernandes,
Vieira.Com vento em popa chegarão á Bahia5tomàraó terra,
& toda a informação concernente a feu intento . Procurarão
audiência do Governador do Eftado , & poftos em fua prc-
' fença foyentaó fama,que lhe falàraõ defta maneira . Os Se- .
nhores do Supremo Concelho pella Illuílriííima companhia
das índias OccidentaiSjOQs mandão reprefentar a Voílà Ex-
cellencia o exorbitante atrevimento de Toaó Fernandes Viei-
ra, que com louca ouzadig, rompendo as leys de Vaflallo, fe
tem publicado rebelde fobre ingrato, amotinando o povo,
' com a voz da liberdade, a que negue a obediência, tantas ve-
" zes jurada, aos muyto Altos Eftados de Olanda j com oíFenfa
' da Coroa de Portugal,em defcredito dos Miniftros Reaes,&
com notório dano dos miferaveis moradores . [ Sopoftas as
" tregoas,& pazes aíTentadas entre huns , & outros:] Publica-
" mente fe affirma, que Voíía^ Excelência influe na rebcliáoi&
'* affi o faz crer o pouco fundamento, que fe coníídera em hum
" homem particular, falto de fequito , de armas , munições , &
" de pratica, para fe oppor ao poder,que húa vez conquiftou a .
" terra, & muy tas,opprimio foccoros,& desfes exercitos,& ar-
'^ madas com o eftrago , que ainda hoje chora a memoria . He
'' voz, & fama, que em feu focorro, tempaíTado o Rio deSaõ
^' Francifco, o Tenente General André Vidal de Negreiros,c5
" os Capitães Paulo da Cunha, Pedro Cavalcanti , Lourenço
" Carneiro , António Gonçalves Tição, AíTenfo da Syl va , &
" outros muy tos, com grande numero de foldados : O que por
" outra parte fe faz increhivel, confiderada a obediência , que
'' deve a feu Rey hum Governador taó fiel , & tão advertido,
" como Vofla Excellencia^ fabendo o quanto o dito Senhor té
'* tomado por fua conta a confervação da amizade, & obfervã-
" cia das pazes aíTentadas com os Eftados de Olanda . Mas em
*' cazoj

ié4$ 'PJ^TEl LIV^ V. 273

cazo, qiiefe verefique, o queaffirma o vulgo , proteftão os „
Nobres Senhores do Concelho Supremo,Governadores de „
Pernambuco, por todas as perdas, & danos de hum, & outro „
domínio, & que lhe naó fera imputado o mal, que fucceder, „
porque fera força mandarem v ir húa tal armada , que não fó „
caftigue rebeldias, mas que também peça cota de permiíToés^ „
& recompenfe hum dano, com outro may or, fem perdoar á „
mais diílante praça da Coroa de Portugal j cobrindo com o „
fangue,& cinzas de todas, o atrevimento de alguas, para que „
veja o mundo,que fabem aquelles Eftados medir a vingança, „
pella oíFenfa.

8 9 Em nenhúa occazião fe vio o valor ta5 fofrido, nem
o poder taó modefto,como iíefta,em que o Governador An-
tónio Telles da Sylva venceò^com a prudência , a fantaftica o Governador do
propofta dos Embaixadores.Hum coração grade faberá dif- Eftadoos ouve^é
íimular o golpe, porém não faberá fofrer o ameaço . Apro- ^^ M^^^*^\
veitou-fe nefta occazião o Governador de toda fua capaci-
dadeiCótrapezou a temperança, com a licença,& refpondeo
nefta forma . Os Miniftros de Pernambuco moftrão nefta "
Embaixada, que feu concelho naó he de Miniftros, fe não de ^^
mercantes: As rezoês deEftado, não fe aprendem nos livros „
da rezão, aonde tem feu eftudo os mercadores^nem a politica »
fe acha entre a medida,& o pezo do contrato:Efta Embaixa- "
da primeiro a formou a culpa, que a queixa , influindo nella "
os remorfos da conciencia,& não os eftimulos do agravo:Sof- „
pey ta-fe agravado aquelle, que tem oíFendido j fuppoem o q »»
merece, ainda que não íaiba 5 oquepaíTa. OsOlandefes de"
Pernambuco, pello que obraô, julgaõ: Sua tirania lhes mete "
em caza o medo da rebelião . Se Joaõ Fernandes Vieira a fo-
menta, que faz Olanda,que o não caftiga.^Faz a queixa,a quê
não pertence conhecer do deliâ:o ? Que poder tenho eu íb- »>
bre os VaíTallos alheos? Bem fey, que o nacimento osfes da
minha jurisdição, mas também fey, que a fortuna os ifentou
delia, & fó o dominio he, o que pode dar preceitos . Se os do „
Concelho podem,o que blazonão,caftíguem, & não fe quei- »»
xem; que o queixume he de quem mais não pode .Se os mo- '•
f adores fe podem,ou não podem levantar dillohá o fucçeíToj "
mas que fua refoluçaõ feja influencia minha^ nunca o podia „

dizer

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»' dizer a verdade, de incapaz feactiía,qncm não peza, o que
diz. Os ameaços de armadas, & ruinas^, com que- fe intimida
o vulgo, achaõ deíprezo na callidade: Nenhúas poderá man-?
dar Olan da(nefte tempo^que não caftiguePortugaLAs for^
'» tunas paíTadas, não foraó effey tos do poder, que nos conqui-
" fta va, fe não do jugo, que nos opprimiaj& quem de prefente
" naõ teme a Monarchia de Caftella , menos temerá as bolças
„ de OlandajSc para que a evidencia acufe a fofpey ta , Sc a fra-
?> queza,quero,que voíTas mercês vejaõ com feus olhos o falíb
. de fua imaginação . Mandou logo o Governador vir diante
deIles,todos os Cabos, que diziaõ,tinha5 paíTado o Rio de S,
Ff ancifco em favor de Joaó Fernandes Vieira,os quaes reco-
nhecidos, pellos dous Embaixadores,tornou o Governador;
" Digaõ aos Senhores do Concelho, que fobre efte defengana
" lhes quero agora mandar eftes Capitães com poderes,& gen-
3, te, para que me tragaõ prefo a Joaó Fernandes Vieira, (fe he
55 certo, que tem taõ pequeno fequito, como me dizê, ) & lhes
" ordenarei, que façaó todo o poflivel por deixarem os mora-
" dores em íeu antigo focego ; & deverão o feguro á cauza de
„ feu receo. Confuzos,& contentes fe deipidiraõ os Embaix^r,
9, dores, do Governador. ;. ,

90 Theodozio Eftrater j que era o principal Embaixa-^
_ dor, (nos dias, que alli fe deteve) procurou audiência parti-
cular , do Governador do Eftado . Nella lhe ratificou o ani-
Theodo^h spa^ ^^^^ "P^ ^^"^^ ^^ ^^^^^ir a elRey de Portugal ; & claramente
tcrratificíiapa' confeíTou a vontade de entregar aos Portuguezes aFortale-
Uvra. áefervir za de Nazareth, de que era Gomendor^ ferviço, que merecia
a elRey. eftimaçaõ grande, pella importância do Porto, pella utilida^

, dedocomercio, &pellas coníèquencias do exemplo j de-
*' terminação, que ;á tinha praticado a João Fernandes Vieira
por equivocas intelligencias, receofo , de que não tiveífe ef?
" fey to feu intento:Mas, que agora , que o via pofto em cam*
po, tendo por fi a juftiça, & o fequito , fe declarava com fua
Excellencia j & o difporía com João Fernandes Vieira ; naõ
defejando da Mageftade delRey de Portugal mais premio, ^
o fervillo, nem de fua Excellencia mais favor , que o inteirai-
lo defta verdade. Grato, & difcreto lhe refpondeo António
Telles da Sy Iva , aceitando o ofFerecimento , & louvando a
i deter-

^e-

1

determinação ; que bem moftrava fer parto dé hum ani-
mo generozoy&juftiíicado: Prométendo-Ihejdapartedel-
Rey feu Senhor^ equivalente premioj a taò relevante fer--
viço*

çi Embarcados ôs Êmbaixádoféâ d eráõáveláicom
tempo feyto , tomâraó porto no Arrecife, & foraõ rece-
bidos com o alvoroço deefperadoá. Relatarão, o que na cheção ao Jrre^
Cidade viraõ, & tudo , quanto com o Governador pafía- «/^./^ííí Bmbé'^
íaó , engrandecendo feu valor , fuâ fidalguia j & fuã Capa- dadores.
cidade: Affirmàraó , que feu coraçàó era altivo, valente^
& ouzado ,& que eftiveíTem certos , que o naô avia de a-
char fofrido o minimo agravo , nem ingrato o mais peque-
no obfequio j aííi lho mandava íignificaf aconfelhàndo-oá)
trataíTem os fubditos com juftiça , & clemência , para os
não temerem rebelados ; & que prometia mandar breve-
mente capitães, & foldados,quereduziírem, & áquietaf-
fem aos moradores, ( para o que, elles Enviados^ lhe aviaò
prometido paflb franco em nome dos Eftâaos:) Mais dif-
fcraó , que no porto da Bahia não eftavão embãrcaçoêá
de guerra, fora do Galleaõ de Salvador Corrêa , que de
verga-dalto efperava tempo, para comboyar a Portugal
húa frota de navios mercantes ;& com fèus meíinos olhos
viraó aífiiientes na Bahia a todos aquelles Cabos , que fe di-
zia, terem paífado o Rio de Saó Francifco , em focorro dos
rebeldes . Com eítas novas refpirou o temor dos Olande-
fes , & fe confirmarão aquelles ânimos indómitos j & pérfi-
dos em naõ defiitirem das tiranias ; Be augmentarém as ícm
rezoés , & agravos em toda a parte , & em todo o tempo.
Imagina vaó-fe vingados , por noíTas mefmas armas j & pel-
las fuás, fenhores de todo oEftado do Brazil; porque fe
deliberavão em matar por trayção a todos ^ os que o Go-
vernador António Telles da Sylvâ mandafíè em íeu au-
xilio j & inferiaó , que a falta delíes, lhe entregaria â Ba-
hia a mãos lavadas. Para tudo, o que lhe propunha fuaa-
leivozia, fe começarão a preparar com toda apreífa* Em
tudo os ensjanou fua maliciâ , como fe verá em o feguin-
te Livro. Cegos de feus afíeâ:osnão íàbem os homens a-
vertir o errado de feus difcurfos . Naó há confiança taó

necia^

IN

\\\\\

27^ C^ST^IOTO LUSITANO 164^

necia, como a daquelles, qne pintaó os futuros das cores de

feus defe;os, não ponderando , que nas mãos dos homens ejP-

tão os intentos , & nas de Deos os fucçeíTos ; & que o confe-

guillos, ou favoráveis, ou adverfos para efte, ou para a-

quelle fim,fó o mefmo Deos o pode faber, que naõ

eljpera tempo para ver os effejf tos -

das cauzas.

10.

<

^■.i

■

PARTE I. LIVRO VI.

p^ ARTO de duas mãys he o defprezo:
A foberba o concebe , a confiança o
alimenta; vicio que nace com as con-
dições da vibora, que deílroe o meí^
mo fer, que a nutre. A informação,
que os Embaixadores deraó, no con-
çelho,do focego com que eftava a Ba-
hia, (o porto fem armada; a pratica da miiicia , fem memoria,
nem eíperança delia, o Governador mais prompto, para caf-
tigar, que para favorecer a rebeldia; os Cabos tão longe de a
focorrer , que alheos da marcha , lhos moftrou a aíliftencia) /^^J^/^"
cauzou no Olandès tamanha confiança, quedefprezou o
inefmo, que de antes temia;& com taõ infernal foberba, que
fe Julgava fenhor abfoluto de todo o Eftado do Brazil : So-
nha va-fe vingado, rico, & dominante,& a eíle paíTo, todos os
obftaculos tinha em pouco . Muyto erra,quem dá credito a -
fonhos; & mu}*to mais, quem fe aconfelha com a paixão , &
com o defejo,que nunca deixaó de votar errados:E que fará,
quem fe guia pelía confíança,& pella foberba ? Aquelles Im-
perios,que não pode deftruir, nem a força, nem a arte alhea^
arruinou a foberba,& a confiança própria.
' 2 Confiado,& altivo defprezava o Framengo o levan-
tamento dos moradores. Avaliava a Joaò Fernandes Vieira
por cabeça fem efpiritos ; porque fem authoridade , fem va-
]or,& femdifciplina.Via o fequito em pequeno numero;ima-
gmava-o violento, ou enganado, fem armas , fem munições,
lem Cabos,& fem pratica;& como fem alma, fe lhe reprefen-
tava o corpo da rebelião. Errou-lhe a medida , Sc fahio-lhe

Aa curto

"^y^

CJST<!(10TO LVSITJKO

■ié45

curto o remédio. Mandou ao feu Sargento Mayor João Blar,
^oTno(ro?'teío ^"^ '^'"'^ trezentos íoldados,guarnecidos de clavinas, fahiíTe
feu sligcto Ma^ ^° Arrccife,(coberto das fombras da noyte) & deffe fobre a
yorioãoBlar. niata de Vafco Pires Borralho5aonde,por avizos certos/abia,
que fe alojava a noíTa gente,com ordem , que a João Fernan-
V des Vieira,& a todos,os que o íeguião mataííc,ou prendeíícj
& que o não feguifle fem engroffar o poder , com a gente do
Governador das Armas OlandefaSjHérique Hus, que da vol-
ta de Ipojuca fe avia de encorporfir com elle em o meíiuo lu-
gar; ao qual tinhão ordenado,que não deixaíTe rebelde com
vida. Marchou João Blar até chegar ao íltio , que chamão o
Arrayal velho, aonde fes aIto,avizado de hum traydor nofíb,
que affiftia a João Fernandes Vieira: Avertia-lhe,que fe não
moveííe até fegundo avizo , por quanto a noíTa gente tinha
mudado de alojamento , & ainda não tinha tomado pofto.
Obedeceo o Blar, em quanto á fufpenfaó da marcha , porém
não em quanto á fufpenfaó das armas ; porque com diverfas
mangas tomou todos os caminhos da mata, que guiaó para os
Rios Patebiribe , & Jugaribe , & feguio o caminho de Igna-
ra çu, executando em toda a diftancia defta marcha , taes , &
tão cruéis defacatos, &demafias, que ainda agora os olha a
memoria com efpanto. (Aborto do inferno parecia efte ver-
dugo.)Com a mefma violécia rompia pello religiofo , & pel-
lo profano: Deípedaçava as Sagradas Imagens com injuria,&
as honeftas donzellas com irrifaõ: Sem diftinçaó cortava pel-
la idade mais verde,& pella mais caduca, não fazendo diftin-
ção de fexo, a fexo, nem de Eftado, a Eftado:Cubria o eftra*
^e for avízo go do ferro, com as cinzas do fogo; & com os golpes da mor-
de hum traydor te, atalhava OS gritos da dor . Não individíi-o as atrocidades,
fufpende armr^ porque defmaya a pena com o horror dellas.Só direi,que lhe
cha. eftranhou Henrique Hus a ferocidadcjOu porque nella fe viíi

€xceder,ou porque a naó podia imitar;fendo elle hum cruel-
li ífimo efpanto da natureza humana.

3 Em o numero 8 3 . do quinto Livro , fe diíTe como em
24.de Junho,fahira do Arrecife Henrique Hus com feifcen-
tos foldados,a caftigar o motim de Ipojuca; agora diremos
como por efconder o caftigo á culpa, marcharão furtivos até
a mata de Tabatinga,Chiia legoa diftante de Ipojuca ) aonde,

ou

ou o âvrzOjOU o cazo tinha embofcado ao Caplíâó Fagundes , r^,r.rh^,.
com vinte íoldados de lua companhia.Apfoveirou-ieda oc- Bmai/o/^ca.
cazião, & deu ao Framengo húa carga , que o deixou confu-
zojuiais pello fobre-falto^que pella perda, que não paffou de
trez mortosj&c alguns feridos.Temeo o Fagundes , que o ini-
migo o cercaíTe, & muy to com tempo fe retirou a buícar o
íitio^aondc fe alojava o Capitão Mayor Amador de Araújo.
O General Olandès apreílou a marcha 5 por náodeminuira
prefa, & deu fobre a povoação, que achou Tem refiftencia, &
iem riqueza,porque os moradores a tinhão quaíi defempara"
do,igualmente temerofos dosjudeos offendidos,& dos Olan-
deíes efcandalizados:Naõ tiveraõ os invazores, em que cevar^
nem a cobiça, nem a vingança.Do Padre Frey Luis Car n eiró
Religiofo de Saõ Francifco , que achâraó na povoação , naõ
fescazo, nem a ira, nem a cobiça. Mandou o General Glan-
des deitar bando , que aíTegurava as vidas, & as fazendas de
todos aquelles , que em termo de trez dias fe recolheílem a
fuás cazasj do que fe aproveitarão alguns vezinhos táomife-
raveis, que os condenava a morrer nos matos, a impoíTibiIida- „- .
de de fe não poderem defender dos eftrangeiros , nem feguir ^Z'^^'^'' ^^^
aos naturaes.Neíle lugar, mandou o in i migo enforcar a Fran-
cifco Godinho, por fe dizer,era hum dos complices na conf*
piração da liberdade* v -

4 Ouvira dizer Henrique Htis,que Amador de Arati jó^
com algúa gente caminhava a unirfe com João Fernandes
Vieira,&atoda apreíTa marchou em feú feguimenfo,[fervio-
lhe o trilho, & a trayção de guia"] & lhe deu alcance , aonde
chamão a Ponderama, meya legoa antes da povoação .• Era
defigual o partido,& ficou Amador de Araújo deilrúçado;
valeo-fedafuga, favorecido da mata, deixando no campo
cinco mortos;& levando coníigo òs feridos , fe foy unir com
João Fernandes Vieira, que já nefte tempo fe alojava nas ca-
zas de Balthezar Rodrigues Covas.Náo ficou o Glandes fem
recompençajmortos,& feridos lhe cuftou o encontro * Hen-
rique Hus có as ordens, que tinha recebido no Arrecife,mar-
chou adiante a encorporar-fe com feu Sargento Mayor Joaõ
Blar^mas com tanto medo das embofcadas , que o movimen- Marcha, a cneor^
to de qualquer rama o fobre-faltava . Comeílã imaginação ?""''*^'i^ ^'^ ^"^'^^

Aa2 man-

28o C^ST(1(I0T0 LUSITJNO 1645

mandou matar ao Hermitaõ de Sancta Luzia, ( Capelão do
Engenho de Tabatinga ) porque ou vio tanger o fino da ca-
peIa,parecendo-lhe, que tocava a rebate. Profeguio a mar-
cha, recolhendo a fi todos os Framengos, que fe aloja vaó , &
viviaó por os deftridos de Sanâo António do Cabo , & da
Moribeca,rem deixar couza dos moradores,que não roubaf-
fe,& confumiffe .Dez dias o deteve efta diligencia , & acre-
cente dos Rios,ajudada de feus receos.

5 O Governador da liberdade , que até efte tempo fe a-
lojava na povoação de Saó Lourenço,occupado em prevenir
tudo, o que podia fèr útil á emprefa, foy avizado, de dentro
do Arrecife,das ordens, com que Henrique Hus,& Joaó Blar
o Governador tinhão fahido delle, & que fe acautellaíTe , porque unidos, o
lonõ Fernandes avião de enveftir em qualquer íitio,que occupaffeiO que fera
%7udo ^' ""^^^^ ^u^ida farião com fobejo poder,porque fe avião de aprovei-
^^^^' tar da gente dos prezidios,que fe aquartellava pellos contor-

nos. Entre os confidentes fe leo o avizo , & refultou da con-
ferencia, que de nenhua forte fe efperafíe o inimigo naquel-
le pofto, por irrigular para a defenfa, & favorável, para a in-
vazãOj que logo fe levantaíTem daquelle fitio, & fe efcolheíTe
outro, em que concorrefiem as conveniências neceíTarias. E-
xecutou-fe a refoluçaõj paíTáraõ o Rio Capcberibe , que hia
de monte a monte, com mqiis trabalho, que perigo,pellas bal^
fas,& jangadas,que fe fizeraõ.Pella margem do rio continua-
rão a marcha, até que chegarão ao Engenho de Saó Joaô,que
Levam afe de S, ^^ ^^^^^ ^^ Arnau de Olanda Barreto, o qual agazalhou a to-
Lourenço. ^^^ (^"1 t^ez dias, que allí efi:iveraõ) com benevolenc,ia,& a-

bundancia ^ & com dons filhos fe agregou , & feguio a João
Fernandes Vieira . Fareceo bem a todos, que fe continuaíTe
a marcha , deixando naquelle fitio ao Capitão Cofme do
Rego com cincoenta foldados , como defintinella para def-
cubrir a campanha, & dar ao exercito os avizos neceíTarios:
Sobre efte feguro caminhou a nofla,gente combatedores ao
largo , levando diante ao Padre Simão de Figueiredo com
catorze homens ligeiros, para guiar, & defempedir a ve-
n reda da marcha. Em húa jangada, capaz de levar oy to,ou dez

P#.i^/.r./^i.^Tf"'^^^/t^^^P^^^"^^^« oexercito oRioTapicu-
cura. ir\A vilta dej oão Blatjque da outra parte fc ocultava entre

os

os matos,crpcrando a chegada de Henrique Hns, que lhe or-
denara, fe náo moveíle, daquelle lugar)& íe alojou rsas cazas
de Manoel Fernandes Cruz, aonde fe deteve ío a noite fe-
guinte,&da}líoíevou configo ©Governador da liberdade,
para o íitio de Belchior Rodrigues Covas^aonde a noffa gen-
te fes alto, & le aquartelíou, com intento de efperar , & rece-
ber alli ao inimigo, íe nelle o bufcafíb.

6 O Sargento Mayor João Blar tanto, que vio partido
o noffo exercito, & por hum mulato trayidor entendeo , que
no engenho de Arnau de Olanda ficava Cofme do Rego, c6
cincoenta homens,deu fobre elles no mais alto da noite,& fa-
cilmente os desbaratou: (Eráomuytasas ventagens do ini-
migo, que fizerão may ores, o repente , & o defcuydo JDor- -à vifia
miao lobre o feguro de Tua confiança, fempre necia, quando ^^^^'
hum Capitão imagina,que pode a ver Iugar,ou tempo,de que

fe não aproveitea induftria,&a trayção . Naó deu o aílàlto
lugar á dcfenfa, porém não o tirou a fogida. Sabiaó os noífos
as veredas,& fey tos em hum corpo romperão pello mato, &
fe foraó encorporar com o Governador da liberdade.

7 Empenha-íe o traydor,em que fe logre a trayçaô,por-
que fabe, que na occaziaõ perdida,fe perde de remate o tray-
dor : Naó lhe fica para onde apellarj em cada húa das par- ,
tes há de achar a repulíà da ofFenfa,, & do defprezo. Aquelles
inconfidentes, que com a maícara de amizade acompanha vaò

a Joaó Fernandes Vieira j ( Naó para lhe imitarem os impul*
fo3, íb não para lhe contarem os paíTosJvendo^que a fua gen-
te, aíTi como crecia em numero , crecia em animo , & que o_
poder faria inuíis os avizos da trayçaó , uzarão de hum dia-
bólico ardil, que chegou aporem contingência opfogreíTo
da emprefa: Chamarão a íi aos homens, que a puíilanimida--
de,& a fobordi nação tinhaó mais diípoil:os,para a credulida-
de, & com rezoés aparentes os perfuadiraó, que o intento de
Joaó Fernandes Vieira , náo era de os libertar , íe não de os
deílruu*, tirando-os de fuás cazas com a voz da liberdade,pa- pf^fi^^
ra os defierrar da pátria; & a melhor livrar , levallos configo ^ão.
para a Bahia , porque entre os Olandefes náo tinha quartel:
DifcUrfava fua maliciadefta maneira: Se atenção de Joaó 5,
Fernandes Vieira fora de pelejar, & naó de fogir , viera pro- „

Aa^ vido

É

ãe loh

dos trã^\

da iray

2^2

CAST(^oro LusiTjno

1^45

Perigc
a empre

" vido de armas, munições, mantimentos, Surgiaõ , & botica,
" poishe certo, que as batalhas, naó dão fe não golpes, & feri-
" das; & nellas fe não entra lem mofquetes , efpadas , pólvora,
-*' & ballas:Bufcára íitios,aonde com eftabiíidade fe fortificara,
" & não andara como figano de mato, em mato,& de outey ro,
" em outeyro,(fabendon6$5que o inimigo obufca comdous
" exércitos de foldadospraticos,&viâ:oriofos) expondo-nos
" ao eftrago, fem atender aoremedio;& dado cazo, que íiia té-
" ção fe;a de pelejar, aonde, ou como o hà de fazer ? Com que
"*' fortificações/ Os focorros, que diz efpera, faõ artefaâos de
" fua invenção, íèmpre prometidos, & nunca chegados . Ave-
" mos de crer, o que vemos,&:não,oque ouvimos da boca de
" quem nos quer deftruir, ou enganado de fua vaidade , ou ef-
'» vaecido de noíTa obediência. Efte homem(ambiciofo de go-
'' vernar)traz aplicado o fentido ás adoraçoés,com que a ígno-
" rancia,& adulação o venera ; & não repara em noíTa ^ & fua
" perdição. Veífe na fuperioridadc,que apetecia ;& cíquece-»
'» fe dos cuidadosjcom q noífa fal vaçaó o defejava, fem avertir,
»» nem em fua ruína, nem em noíTo perigo . Ta5 cego, como if-
" to,o traz o gofto do mando,& não fera o primeiro, que quei-
»' ra comprar com a vida,hiãa hora de governo , pois ouve no
" mundo tantos,que fabendo, tinhaõ no trono o fepulcro,qui^
»' 2eraõ antes morrer coroa4os,que viver fogeitosrDizemos, o
'^ que palpamos: Quem fe quizerperder,deixeíè enganar; que
» tiver juizo,faberá temer; que não pode avermayordemen-
» eia,que ter aos olhos o precipicio,&: deípenhar-fe por gofto.
Foy de mão em mão a pratica: Imprimio-fe com ella a defcó-
fiança em muytos ânimos, difpoftos, ou da tibeza, ou da in-
em q fos ç.Q^ç^^Yiádi^ de forte, que devidido o exercito em bandos, ca-
minhava a hum motim irremediável. Muytos Capitães vale-
rofos, nobres,& fieis moftràraò nefta occazião, que era igual
íua fidelidade a fua nobreza, feu valor a feu juizo , unindo-fe
á peíToa de feu Governador, para guarda, & para confelho:
Authorizou muy to,a parcialidade dos confidentes , a conftã-
cia dos Ecclefiafticos principaes, que erão o Padre Frey João
da Refurreiçaò Religiozo doPatriarcha Saõ Bento. Qs Pa-
dres Simão de Figuey redo,& João de Araújo , & outros, cu-
jas peíToas v io defpois a guerra obferyantes3&: valentes. -

. - ' 8 Avi-

1^4^ ^J^TEI.Lir(^0 Fl.

8 Avizâdo o Governadotjda violência, com que íc a-
teava o fogo da fediçaó, com toda a pfeíraj& valor , fe oppos
á voracidade do incêndio, valendo-fe da gravidade,& da pru-
dência, que fempre acompanharão feu animo . Tratou em'
|)rimeiro lugar de apagar a chama , cortando-íhe ã matéria.
Mandou dar hum rebate falfo, com voz que aparecia o Fra-
mengo:Ordenou ao Sargento Mayor^que repartiíTe agente
pellos poftos, & emboícadas mais convenientes, dividindo
por todas,aos amotinados. A obediencia,deixou fem difcur- ^^^Uo peãa pm
ío á malicia , & o repente,fem lembrança a duvida . Com o denaa de Gover
defvio da lenha ficou taó amortecido o fogo , que não deraõ mder.
âs cinzas mais calor, que para o movimento das armas. Che-
garão as noíTas ííntinellas,& diíTeraõjque o campo eftava fem
inimigo. Foy ordem a cada hum dos Capitâes,que deixaíTem
ospoRoSj&ferecolheíTemcom a gente, & cada-qualcom
a de fua companhia paíTaíTe, por onde íè alojava o Governa-
dor da liberdade . Eraó trinta & quatro os Capitães , & aííi
como cada hú prepaíTavá, o Governador engrandecia a obe-
diência, valor, & prefteza, com que avia fahido á defenfa de
fua liberdade, moftrando bem o fangue PortUgUez, que her^
áava,$c os brios,que tinha^Sc que fe algum foldado, por falta
de animo,ou de zel o,fe não atrevia a continuar a guerra,def- i

de logo o avia por defpedido , porque nas occazioés,fervia a
callidade,& não o numero^ & que as batalhas fe venciaõ por
ânimofos, & não por cobardes. A di verfos ranchos,que fica-
V ão defviados, mandou o Governador fazer, por o Padre Si-
mão de Figueyredo,a mefma pratica. Obrou o remédio Com
tanta efficacia, que fe ouvio em todos o brado da faude,por-
que a gritos prometiaó obediência , Sc fidelidade , a feu Go-
vernador Joaó Fernandes Vieira. O qual com a efpada de-
fembainhada namão,& em vo2 alta,diíre,que eftava promp-
to a dar por todos a fazen da,& a vida^St que,a qualquer que
foífe taó infame , & ouzado , que fe atreveíTe a defv iar ^ ou
perfuadir á menor peíToa daquelle exercito,â nao profeguir
na pretençaó de fua liberdade ^ o avia de mandar enforcar
por traydor , fem diftinçaó de peíToa , nem quebra de pa-
lavra. *-j^

9 Naõ v i Ve de fingelo hum animo dobrado j nem pode

Aa4 ter

■libllIlDl, I

■p

CABT^njOrO LUSITANO

.6^^

psrtwAch dos
tra^doíes.

ter emmenda:,o que pecca de fairo,porque fao roturas da ma-
lícia, que nunca deixa confolidar a contumácia . Corrutos a-
quelles ânimos traydoreg, o eraõ de muytos modos . Naó po-
derão deftruir a Joaó Fernandes Vieira^com a divifaó inten-
tada, & tratarão tirar-lhe a vida com veneno . O zelo deícu-
brio o deliâ:o:Foy o Governador avizado por palavra,& por
cfcritos:Náo feperíuadiOjqueouveíTe homens taódefam-
parados da cone len cia, & do juÍ2o,qae tal intentaffenr.íníla-
rão os avizos, com finaes certos das peííoas,& das diligencias,
individuando as circunftancias. Atalhou-fe o receo,& o dano
pello modo mais feguro, & menos eícandalozo. Dous Tolda-
dos de pofta,guardàraó dalli por diáte a porta da cozinha do
Governador, não deixando entrar nella mais , que hum fiel
efcravo, que lhe fazia decomer . Formou-fe guarda , que de
dia, & de noite acompanhafíe fua peffoa. Naó quiz caíligar o
crime, diííimulando com os delinquentes , por não publicar
o atrevimento. Confundio o ódio com moftrar, que defpre-
zava a trayçaó. Não há de entender o fubdito , que o fupe-
rior o temei porque a cobardia do poder anima,a ouzadia do
agreffor. O caftigo do vicio em pefíbas grandes , menos ate-
moriza para a emmenda , do que perfuade para a imitação.
Há delidos taó enormes, que os não há de publicar a penna,
porque não provoque com o ex€mplo:0 mais eílranho , em
rezáodeculpa, heodatrayçaô. '

IO Naó podèraõ as perfuaçoês do receo deminuir no
Governador as vivezas do cuidado. A tudo atendia com ex-
tenfa comprehençaój em todas as partes difpunha, o que pa-
ia a occaziaó convinha: Antes de fe por em campo, mandara
patente de Capitão Mayor a João Soares de Albuquerque,
eom ordem, que kvantaíTe gente nafreguefia da Moribeca,
Gom diífimulação, & fegredo, para a achar prompta na occa-
ziaó: (Confiança, que deípois a provou a experiência ) Do
'Atalhada ^f^-* alojamento do Covas lhe ercreveojoaõ Fernandes Vieira,
ZrÍ7d7. ordenando4he, que acclamaffe a liberdade,^ logo marchaíTe

com a ^ente a unirfe com ellc. Em dous de Julho lhe fiay da-
da a carta:Com prompta obediência executou a ordem . Sá-
bio do feu Engenho acompanhado de feu Irmaó Joaó Ley-
táo,(por elie eleito Capitão) & de vinte home^s de ília caza,

man-

r-?

I é^4^ fA^E 1, L1V%0 VL 285

mandando a todos os moradores, que pegaíTem nas armas, &
o regQÍírem,fobpena de caftigar feveramente a rebeldes,& re-
miííos. Naõ ouve algum, que o foíTe, antes,com multuoío ai-
V oroço fahirão na forma do bando , fem Taberem os fuiidat
mentos que tinha a folevação,porque fó fe mandava,qiie to- ^

maflem armas contra a tirania Òlandefa . Poucas horas pedi- ^^ ,, * ,,

r> .f.^, . K n Volta, Henrique

rao, para le prepararem ^notmcados as onze, prometerão, eí- /^^ ^^ ipoima

tarem preftes ás trez defpois do mey o dia jhora em que deraò & o que fax>.
fobre o Engenho de João Soares,quinhentos Framengos,c5
numerofa partida de Indios,que vinhaò de Ipojuca , tão ino-
pinadamente,que entre o rebate,& o aíTalto íe não entre-pos
mais tempo, que o necefíàrio, para a noíTa gente fe retirar a
hum monte, aonde furtivos ao poder do inimigo, fe lhe agre-
garão todos os chamados.Unidos em hum corpo tomarão a
derrota de Gorjau, recolhendo de caminho os moradores da
fregueíia de Sanâio António do Cabo^(que fopofío os tinha
avizado o Governador, por o Capitão António Gomes Ta-
borda, tibios, de incrédulos, não fe deliberava© ao feguir j &:
tinhão defculpa, fopofto que frivola , na aufencia dos Capi-
tães António de Caftro,& João Paes Cabral, porque fabião,
qne o inimigo os tinha pronunciados , por Capitães eleitos
por João Fernandes Vieira , para a emprefa da liberdade . )
Marcharão todos debaixo das baldeiras de João Soares de
Albuquerque: A poucas jornadas encontrarão com Amador
de Arau;o,& fua gente, que fegiiião a mefma vereda; &c fey-
tos em hum corpo de quatrocentos homens,chegâraó ao alo-
jamento do Covas,aonde forão recebidos do Governador,&
mais Cabos,com aquella alegria,que a todos deu,focorro,que
fe fazia eiíimar pella callidade5&pello numero.

II Com efte auxilio fe aumentou tanto a fidelidade,
como fe confundio a inconfidência; creceo lium,& outro af- chegh ao aloja^
feâio com o alvoroço, que cauzou a chegada de fete índios, f^ento do covas
armados de mofquetes bifcaynhos [ entre elles hum clarim, ^h^^^ /»^w A9
que os publicava] todos do terço de Dom António Phelipe ^'^^'^^'^°'
Camarão, do qual affirmavão,vinha em feu feguimento,com
o Governador dos Minas Henrique Dias, & não podiaõ tar-
dar fete, ou oy to dias. A hua íintinella noíra,que fe adiantou
a pedir as ai viçaras,deu o Governador dous efcravos. A eftes

In-

;í;:':'

Decreto^ com que
fahio o Hereje m
Arrecife.

CJST(11I0T0 LVSITMO

1645

índios, errou onumerOjO AuthordoValerofo Lucideno,
Affirma, que foraó catorze , & fó foraó fete . Teve o gofto ^^'J^/f'
defta nova ò dcíconto, que tem todos os defta vida. Chegou ^"
avizo ao Governador da liberdade,( do Arrecife fe lhe fes)
que o FramengOjCom defatinado furor,mandâra publ içar híi
decreto, pello qual obrigava a todas as mulheres de fcu do-
mínio, (de qualquer callidâde, & eílado, que foííem) que ti-
veíTem maridos, filhos, cunhados, ou irmãos no exercito de
João Fernandes Vieira, os foííèm acompanhar, com fuás fa-
milias, em termo de cinco dias , fobpena de morte,& confií^ ^
cação de fazendas ; que irremiíTivelmente fe executaria era
todas, as que defpois do tempo coníignado foíTem achadas.
So-ou taõ mal, efte bárbaro rigor,nos ouvidos de todos, que
não ficou peíToa, a quem não abrafaíTe a ira , & o defejo da
vingança^ mais acefo com a noticia da infolencia, com que
os do governo defcompoferaõ a muytos homens authoriza-
dos,& moradores na Várzea, q apadrinhados do Padre Mef-
tre ÍFrey Manoel do Salvador,[peíroa, de que muy tas vezes
fes, & fará menção efta hiftoria , que por fuás prendas, &
virtudes, tinha adquirido fingular cftimaçaó , entre os Fra-
mengoslporque com rezoés de humanidade, & politica pre-
tenderão mitigar a exorbitância do bárbaro decreto^ diligê-
cia, que fervio de aíTanharmais aquellas indómitas feras ; de
cujas garras fugio o dito Religiofo para o lugar , aquecha-
mão dos Apupucos; aonde efteve efcondido algum tempo,
& defpois apofentado,até o anno de 1 646. em que fe embar-
cou, para o Reyno.

1 1 Naó baftou para minorar a feníibilidade defte gol-
pc,o chegar nefte tempo ao noíTo exercito hú Surgião Fran-
cês com fua botica,(morava na povoação de Sanâco Amaro,
aonde o Governador da liberdade, o mandou bnfcar, por al-
guns foldados, com os quaes veyo de bõa vontade ) porque
ao mefmo tempo chegara húa relação, que efpecificava os
fentidos extremos, que as mulheres da Várzea faziáo pcllos
Mestos LcAuu. iT^ales,a que fe yiaõ condenadas: Aumentava-fe,na confidera-
^ão de todos, o rigor da crueza , com a reprefentaçaó da fra-
gilidade do fexoj^ naquella occaziaó falto de todo o ampa-
ro,& arrimo] ^ a telapo pintou cõ toda a viveza da dor:Di-

zia.

II

1^4? fPJ^ELLlF^O FL'^ -%%

2ia,que em todas,tropeírava o temor nas perfuaçoés do con-
felho, fendo as obrigações do eftado, as que mais lhe impof-
íibilitaváo o remédio. Aquellas, ásquaes a nobreza tivera ^

fempre recolhidas, o cuftume do grilho lhes empedia a fuga.
As que fe viaõ rodeadas de filhos, detidas do amor, & amea-
çadas da morte, não tinhaô efcolha para fugir,ou para pade-
cer: As dõzellas,receofas de perderé a mais preciofa joya,não
fabiaó determinar-fe em deixara caza , ou em bufcar o mato,
porque no mato,& na caza fe lhe reprefentava o mefmo peri- ,
go . Em todas gemia a aflição com lagrimas inutis, fem outra
confolaçaõ mais, que as que davaõ húas lagrimas, a outras la-
grimas^ nem mais focorro , que o de huns íufpiros , a outros
luípiros,fabendo,que nenhum lhes podia moftrar o defejo da
vida, que as naó levaíTe a morte. Algúas ouve , que bufcàraó
o mato, porque fe lhe reprefentava a morte, menos fea, con-
íiderando, que nas feras tinhaó m tormento certo j nos Here-
jes, o tormento, & a injuria,com igual impiedade. Outras, c6
-efperança duvidofa,bufcavaó dilação á pena,na extençaó do
tempoi por as cazas dos confidentes folicitàraó a magoa,com
que as efcondião j& o martirio, a que fe condenaváo dormin-
do pellos pés das arvores, com o fobre-falto de as bufcar a ef-
pada a toda hora,& de fe eftendcr o caftigo,a quem lhes per-
metia o amparo^ & todas defconfiadas da vida , tratavão das
contas, que avião de dar a Deos, a quem ofFereciaõ tamanhas
tribulações. Exceílivo foy õ pezar, que efta relação cauzou
a todo o exercito,laftimando a huns por interefados, & a ou^
tros por condoídos; porém mais,que exceílivo 5 o que pene-
trou o coração de Joaó Fernandes Vieira,ao qual feriaó jun-
tos, os fentmientos de cada hum. Era devedor álaftimade
todos, como cauza, & aconfelhado com a divida, mandou fi-
xar por todas as partes publicas do Arrecife outro edital do
teor leguinte. , '

13 Joaó Fernandes Vieira Governador das Armas, na
cmprefa da liberdade dos moradores de Pernambuco , & das ^^{^^ ^^ queu&A
mais Capitanias fogeitas ás Armas Olãdefas: Por quanto nos ^"f. ^''""f^''
veyo a noticia o bárbaro, & cruel decreto,que attrania Ola- dos moradores d^
defa fulminou contra as leys da natureza , & da politica dos Farua.
hómensjcondenando ao rigor de fuás armas^aquelle fexo,que „

'; acor-5> ""■

' íiSs CÀsr^ioro lusitjno 1^4^

^, a cortezia das gentes refpeyta, & a natural fragilidade efcuza
, de toda a hoftilidade,& deracato,com mandar ás mulheres de
jjnoffaobrigaçaòjqueíbbpena de morte fedefterrem de fuás
„ ca2as,(por motivo, em que naó podiaó ter parte ) violando
„ aquelle natural foro , que as ifenta de todos os impulfos da
, ira, & da vingança , contra o qual fó cobardes podenaó de-
„ linquir. Mandamos a todas, & a qualquer mulher de qual-
quer callidade, & eftado,que debaixo de noíTo feguro fe dei-
„ xe eftar em fua caza,( como def obrigada de obedecer a pre-
,^ ceito taó bárbaro J tomando por noífa conta a vingança do
„ menor agravo,que o Olandès lhe fizer: E juramos tomar del-
,' le tão exaâ:a fatisfaçaõ, que com ella fe eternize na memoria
das gentes o crime,& o caftigo, & fervirá a exacçaó do eftra-
go, de gritar, em todas as idades , a horribilidade do delido.
'' Dada nefta cãpanha da liberdade em i $ . de Julho de i ój^^y.
j Joaõ Fernandes Vieira. O Bramengo, que leo , & vio efte e-
' ditai fixado nas portas de fuás mefmas fortificaçoés,ficou tão
atormentado, que fufpendeo,por então,a execução do ban-
do.

1 4 Poucos dias defpois chegou nova ao noíTo alojamé-
to da exacravel atrocidade,que o inimigo executou no lugar j.^^^ ^
chegalhf nothU de Cunhau,em a manhã de hum domingo 1 6 .de Julho como CãlUdo)
da deíiruição de fica referido por extenfo em o numero 1 9 . do quarto Livro hiprid .
^""''^ deftahiftoria(& advertido, oengano com que o Author í^»''^^^'^-

do ValerofoLuzideno5fe defviou da verdade, em dar outro
tlia ao fucçeíTo.) Agora o relataremos por may or , para que
da cauza fe infira, a crueldade dos efFeytos. Vivia no interior
da mata hum Olandès cazado com húa Tapuya. O tempo,&
a comunicação lhe deraó a beber os bárbaros cuftumes da-
quelles falvagens de maneira , que lhe obedeciaõ como a fu-
perior, & como a meftre: A efte tal mandarão os do governo
' Olandès, que com alguns foldados,& os feus índios foíTe á
povoação de Cunhau,&caftigaíre a todos os comprehendi-
dos no levantamento , & parciaes na folevaçaõ de Joaó Fer-
nandes Vieira, ou por paâo, ou por confentimento . Fes o
bárbaro Olandès (chamado Jacobo ) hum groífo de Tapu-
yas,&Pitiguares,& com elles entrou na povoaçaõ,que achou
defamparada dos moradores. ( Era velpera de hum domin-

^r

1!

1645 ^A^TELLIV^^ VL 299

go,) & mandou deitar bando,que todos os vezinlios v ieíTem
ao outro dia áMiíTa, porque acabada ella, íè avia de confe-
rir com todos ell es hum negocio de fua utilidade, ^doTer-
viço dos Eftados ; que naó reparaíTam na multidão dos ín-
dios, porque elle em nome do Príncipe de Orange lhe dava
íèguro Real, de que a nenhúa peíToa fe faria o minimo agra-
vo. Naó ouve morador,a quem a defconfiança não derviafíe
da trayçaó^mas como a nenhum acufava a conciencia,fem fa-
zer cazo do que lhes aconfelhava a foípey ta, acudirão muy-
tos com fuás familias a ouvir MiíTa.Nefte devoto aâ:o os paP
fou o bárbaro á efpada, fem que o ferro, perdoaíTe , nem a fe- (/^
xo, nem a idade. SeíTenta & nove peíFoas acabarão alli para o
mundo: Sòtrez homens efcapàraò do golpeadas mulheres
muytas , porque aquelle Gentio occupado em defpojar os
mortos, lhes deu tempo para feefconderem por lugares in-
decentes, donde deípois foraõ tiradas porpefíbas cliaritati-
vas,que as poferaõ em íeguro.

15 Fes efta nova tamanho aballo nos corações do exer*>
cito, que o fogo da corajem gaftou em todos as fezes da tibe*-
za3& muyto mais, quando o Governador lhe fes argumento Mudaãé alojam^
do fucçeíTo , para fe confirmarem na deliberação de fe exi- f^ para o mmte
mirem de tam cruel, & pérfido domínio : Por áiCpofiç^LÕ ^^ ^^^"^^í
de mais alta providencia avaliou,© chegar-lhe naquella hora
avizo, que o inimigo com todo o poder o vinha aííaltar na-
quelle pofto, aonde o alojamento lhe negava a fegurança da
vií^oriajpella ventagem,que o íitio dava ao Framengo.Cha'
m ou a concelho,& ponderadas nelle as inconveniências do
terreno , fe aíTentou, íèriaruina de todos eíperar-fe o inimigo
naquellc lugar jSc que logo fe bufcaíTe outrOjCm que concor^
reíTemos requifitos, que pedia aprefente occaziaõ. Pellos
foldados mais intelligentes mandou o Sargento Mayor fazer
efta diligencia : Brevemente voltarão, feita cícolha de hum
monte, que chamava5 das Tabocas, que António Dias Car- - -%

dozo aprovou, pello conhecimento , que tinha delle , como
verfado no terreno,que fabia a palmosXogo mandou o Go-
vernador marchar o exercito, para áquelle íitio, & fe alojou
no mais alto do outeyro. Deixou o alojamento do Covas (a-
onde efteve vinte & dous dias ) em o ultimo de Julho , orde-

Bb nando

t

2 9© CAsr(^oro LusirAKo ^1645

nando ao Capitão António Gomes Taborda , foíTe preoc--
cupar o Engenho de Balthezar Gonçalves Moreno ( legoa,
& meya diftante do monte das Tabocas ) para que dalli pre-
viíTe todas as entradas, que podiaõ guiar para opofto efco-
lhido;& ordem, que íe ó inimigo tomaffealgáa das veredas,
o recebeíTe com á primeira carga, & não deíifti fle de o entre-
ter na retirada,fazendo-lhe avizos de tudo,o que lhe parecef-
íe neceíTario* ?

1 6 Tabocas, he o meímo que húa eípecie de canas bra-
vas, mais groíTas, que as de Portugal, rodeadas de puas ta5 a-
gudas, & folidas, que as naõdefponta qualquer oppoíiçaók.
Produz a natureza naquellas partes eftes canaveaes tão den^
Dtfcripçao defiê fos^ & complicados, que os naó pode romper a força , íe naõ
com os vagares da arte.Pella muy ta copia deftas canas,de que
fe cingia aquelle monte, lhe chamavão osnaturaes o monte
das Tabocas ( de poucos conhe<:ido pellas condições da na-
tureza,de todos celebrado pellos voos da fama agitados com
o grito da viâ:oria,que nelle nos deu a fortuna.) Situou a na-
tureza efte monte nove legoas do Arrecife para a parte do
Poente,pella qual o cinge hum rio,ao largo, chamado Tapi-
curá,pobrepella fonte, &foberbo no inverno , pellas agoas
vertentes, que engroíTaõ ília corrente.Entre o rio,& o mon-
te femoftrahúa campina que olha para o Sul ;( terá meyo
quarto de legoa de frente, correndo até o Tabocal , que cim;
ge o monte por aquella parte, com cincoenta pés de grofíb
em todo o precinto. ) Dentro defte Tabocal eftá outra pla-^
nicia de menor exteníàõ, que a primeirajladeada também de
outro cinto de tabocal de menos groírura,q ao modo de trin?f
cheira corre até o alto do monte. O cimo delle íe vé cercado
pella parte do Sul,de húa mata de groíTas, & empinadas arvoH
res aííi baftas, que compunhaó hum forte muro , por aquella
parte, orlada de húa faxa de Tabocal: Pellas coílas do monte
para o Nacente , eílava hum caminho antigo , que íèrvíra á
condução do páo Brazil, que íe tirava daquelles matos,de to-»»
dos efquecido pello deí^uzo. Húa legoa, & meya deite mon^
te, para o Norte, exiília húa hermida dedicada a Sanâ:o An-
tão Abbade de cujo favor efperavão os homens a íegurança,
de feus gados^ pellas muy tas feras, que produz o terreno ^ &

algúas

'-'<

:*^-

Alojaments de
nojfo exercito.

1^45 '^¥J^TB 1. LlV\0 VL 29*

aigúas caías térreas , que chamavaõ Cidade do Braga ; nome,
tíiíe lhe deu o apelido de feu fundador . Com efta àifcrípçaÒ
tio lugar, em que fe deu a batalha ficarão claros ao. ley íor , os
incidentes do conflifto. jfíjvorí.-

t' í 7 Chegou a nofíà gente ao Tabocal , & dentro delle
fe alojou em modo de Arrayal: No mais alto do monte fe c5-
íignou eftancia ao Governador ; & pellas ladeiras íe arriíàraõ
tendas,& fe levantarão barra cas para os mais officiaes,&fol-
dados fe recolherem,em rezão das chuvas , por fer no tempo 5.4^\^\rQO o ^\f.>^
do inverno: Guarneceraó-fe as èntradas,&: poftos neceffários
dosfoldados de melhor opinião: Deitàraõ-íe íintineJIas ao
Jargo, & fortificou-fe o Arrayal, no modo que o pçrmitio o
lugar, & o tempo. Nefta occazião,& nefte íltio moftrou bem
o Governador Joaò Fernandes Vieira,que era feu zelo igual
a feu valor. Teve certa informação^. que naquélle deftriâ:»
Tivia o Padre Manoel de Moraes, Apoftata da Eèy & dé feu
Eftado, refinado Here;e por obediência , & por obíèrAíancia,
fegu í ndo, pregando, & defendendo , os erros de Lutçro , Sc
de Calvino:Não ardia no peyto do Governador menos o. ze-
lo da Religião, que o fervor da guerra. Mandou bufcar prefo 1
ao Apoftata; chegou á fua prefença, comaquella confuzão^
que refulta de húa depravada conciencia , & eícandalofa vi-
da; proftrou-fe a feus pès, banhado em lagrimas , que vertia
mais o arrependimento da culpa, que o medo dapena; indi-
cio certo, de que em fua apoílafia tivera mais parteoyiciò^
que o difcurfo.Proteftou emmenda;&: com religiofo pejo pe-
dio ao Governador, foíTe fervido dirigillo , para que o tribii- ^eduni o Gover*
iial, a que pretencia o caftigo, fe ouveflè com ellecom a cuf- ^"^^"^ ^ ^^^ '*'
tumada brandura , & piedade . Abjurou logo açommunica*^'^'^^'' ^^^^^^'
ção dos Herejes: Prometeo a uniaõ dos Catholicos ;& nefta
occazião não deixou o lado do Governador , obrando tanto
mais, que os foldados,(com hum crucifixo nas mãos) quanto
mayor era o auxilio, com que animava, que o braço , que fe-
ria. Por felice anuncio de húa gloriofa viífcoria , teve o Go-
vernador efta converçaó , eíperando da piedade divina , que
o efcolheo por inftromento para tirar hum arrependido de
entre os obftinados,que lhe avia de aíliftir poderofo,para ca-
íligar a obílinaçáo de tantos precitos 5 premiando feu zelo,
- ^ Bb2 com

OsTraydoresfer'
Jiiadema que fe
meite o Governa'
dor a cara defco-

ÍÍ92 c^sr^oTo Lusirmo

^ ^^lr<r.'^ ç.

O inimigo mar
cha,para o Enge
vho do Covas.

tomos tritimphos de íuàíe.nm?i{[\ ..i^yn

'Cl 8 Nâõ fe notifica! hum coração grande pello queventr
cc deftimido, íe nâo pello que fofre acautellado Apura alpâ?
ciência ao valor, aíTi como o fogo purifica ao ouro. Nao Taba
vencery quem nâo fafaé i diffimular . Naó; ceírava- á emulação
de bufcar meyos, para deftroir a João Fernandes Vieira ;;no$
defvios fe ateavao os defeps ;fublicáraõ os traidores j que
tudo quanto o GoveTnador dizia dá vinda dos Govejnadof
res, de Indioái, & Minffsl,^€rá fiíigimeoto;^: &ehgano: Com a
tardança 'perfuadíáõádefidenciasaffegurarido o perigo^
fta falta dofocorro^&óremedio, na morte de Joaõ Fei?í
fiandes Vieira . Diziaõ que a falvaçaó de todos confiíliaj
em matar a cara defcoberta , a quem os arrifcava j &_em íú
entregarem todos ao Glandes , defculpada a Rebelião cona
o foplicio da cabeça .Avizàraõ ao Governador, da pratis
ca dos áuthbres da perfídia , & dos intentos delia, & foy
admirável a* prudência , com que o magnânimo varaó acu4
dio com medicamentos lenitivos aatalhar o ma], curando
a ferida fem efcandalizàr á chaga: Dobrou as guardas de
fua peíToa, afaftando defi,;;com aparentes cauzas, aos ho?
mens de fofpey ta . Grdenoti ao Sargento May or , que fe
alojaíTé junto á fua eftancia . Defpedio quarenta foldados.
que fofíem efperarao Ga^iiaraõ, & a Henrique Dias , i&: os
coi^duziíTem ^para áquelle fitiò f dando afll a entender, que
fabia i não eftarem muyto diftantes ) mandou guarnecer os
poftos mais arrifcados ; & ao Sargento Mayor, que os repar-s
tiíTe pelios Cabos,8£ foldados mais confidentes. Taó defapai->
xonado acudia a tudo, o que éraneceíTario para a rcfiftencia,
& para a defenfa , como fe o não occupàra outro cuidado:
Cobria as cauzas do receo particular,com a aplicação do bem
comum, fem que fua vigilância faltaíTe , nem á prudência de
Governador, nem á obrigação de foldado.

19 Já nefte tempo marchava o Olandès com difci-;
J>linajformado , & todo o poder unido em hum corpo,(en-
groíTadós os terços de Henrique Hus,& de Joaò Blar,com a

- géte,que tiràraõ dos preíidios ordinários, ) & faziaó numero

- de mil & quinhentos foldados práticos , & efcolhidosj bê ar-
itiados, & guarnecidos de mofquetes5& clayifias reforçadas.

Ayul-

Avultava o exercito mais que outro tanto, com a grade mul-
tidão de índios, a mayor parte mofqueteiros ^ frecheiros os
Gutros,&: exercitados na milícia : Os gafíadores, ( não eraò
poucos) trazia a providencia armados,para que feupreítimo
íerviffe a hum,&: outro emprego. Juntas eftas partidas faziáo
hum corpo de exercito, aííi avultado,que a nenhiia viíla dei-
xava de íe reprefentar formidável : Sahira Henrique Hus da
povoação de Saó Lourenço com tantos feguros da viâoria,
que lhe não dava cuidado a batalha: A efperança dos defpo-
jos apre flava a marcha dos foldados , de forte , que vencia o
tempo. Tomàraò a vereda, que guiava para o Engenho do
Covas, donde os chamava o avizo. [ainda não fabião, que a
nbíía gente tinha melhorado de alojamento] Chegarão, &
quando vira5 tudo defamparado, quebrarão a fúria em man-
dar por fogo aos edifícios, que eraõ de nobre fabrica , igual-
mente ardia nos materiaes o fogo, & nos coraçoés,a ira, afíb-
prada da imaginação, que lhes reprefentava a fuga daprefa.
De húa eminência viohúaíintinelIanoíTa o fumo das cha- ^^# reWaenas
mas, & com prefteza deu conta ao Governador da liberdade ^ °'^^'
da parte, aonde ardia o fogo: Sem dilação mandou o Sargen-
to May jr ao Capitão João Nunes da mata com v inte folda-
dos a defcobrir o campo, & ordem, do que avião de fazer, fe
aviftaflem o inimigo. Neíle tempo chegou hum foldado do
Capitão António Gomes Taborda, [ por ordem do Gover-
nador ficara no Engenho de Balthezar Gonçalves Moreno]
com avizo da marcha do inimigo , & de hum encontro , que
tivera com a fua retaguarda , que conftaya de quatrocentos
Olandefes,& hum efquadrão de Indios,aproveitando-fe dos
matos para efcóder a deíigualdade do numero: [Erão os nol*
fos duzentos, & quarenta] & com embofcadas , & enveílidas
o vinha enfadando, & entretendo, & lhe tinha morto ca-
torze Olandefes^ fem que o Framengo deixafle a marcha, né
a nofía gente a oppofição até ordem de fua fenhoria . Man-
dou o Governador ao foldado,que v oltaffe, & difíeíTe ao feii
Capitão, fe retiraíTe em boa ordenança, para áquelle íitio,
porque nelle fe avia de efperar o inimigo.

A certeza, & vezinhança do confliílo , como nova

20

cauza, inflamou novo 2eIoj& alvoroço, no animo do Gover-

Bb^ nadòr

2p4

CAST(^oro Lusirjno

1645

nador João Fernandes Vieira, de forte , que com o logro de

feu deíejo galanteava a moleftia de feu cuidado ; o goíi:o lhe

Falia, qfei o Go- veftia o femblãte das cores áo peyto.Mandou formar o exer-

'vernador h fua. cíto, & íe pos no coração deIle,com tão alegre rofto,que pa-

genu. lecia comunicava a toda a circunferência a viveza dos efpiri-

tos, de que fe alimentava feu animo, & c5 femelhantes pala-

3j v ras o moftrou:Chegou (Senhores naturaes, cópanheiros,&

» amigos)para todos a melhor hora^pois he certo , que melhor

35 hora he a da fatisfacão,q a do defejo . Não {ç^y eu que melhor

j) hora podia defejar noíla vingança,q a de tomar cada-qual de

5> nós inteyra fatisfação de tanta injuria,quanta não poderá ef-

» pecificar noíTa memoria, Atè agora vião noíTos olhos diíper-

•i) fos aos agreífores de nõíTos danos com a impoffibilidade de

97 não p oder o golpe caíligar a hú , sé ficar fogeito á efpada de

j) todos. Hoje os traz aqui juntos fua culpa, & noíTa dita, ofFe-«

5) recendonos a gloria de fer cada hum de nós o reftaurador de

5) fua honra, & o redemptor de feu cativeiro . Para tão briofos

3, animos,efcuzadas faó exortações, pois fobeja em cada hú có

n o fangue Portuguez, o eftimulo de fua obrigação 5 &não

j> dirá o mundo, que degenera na America, aquelle valor, que

}j aíTombrou toda a Aíiaj & que fè a fama não divulgou iguaes

5} proezas de hum,& outro clima foy, porque as occazioés d»

„ Afia,faltàraõ na America. Não gafto tempo em difpor o bra-

jt ço, que em toda a parte,& em toda a occaziâo achàraõ os ca-

9) 20S difpoílo, porque me he neceílàrio, para reprefentar a to-

í, dos a pedra de noíTo efcandalo: Afiadas nella noíTas efpadas

5) ferirão com melhor corte. Entrou o Olandès com armas , &

„ induftrias a fazer-fe fenhor de noífas fazendas , de noííàs vi-

„ das,& de noíla liberdade,& em poucos dias experimentamos

5, na fogeiça5,noíra total ruina , tratando-nos fubditos, como a

5, efcravos vendidos. Na mayor miferia padecemos a mayor a-

5, fronta,dominados de^um poder,que conhece o mundo,não

,5 pello valor, fe não pello engano; efpantando feus progreíTos

3, a Europa, mais pellas trayçoés,que pellas conquiftas; Aquel-

jj las, & não eftas, nos tiràraó da mão a efpada,que nos primei-

„ ros annos cortarão o fio a fua fortuna. Ao paífó de noífa def-

„ graça creceo fua infolencia , ferindo-nos fua tirania com tão

„ deshumano braço,que não podèraõ as feridas achar cura , né

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5)

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na paciência, nem na queixa. QuentCvS eftâo as cinzas das fa-
zendas abrafadas j abertas as chagas das injurias padecidasj
frefcas as lagrimas das peíToas atribuladas, &fempre levan-
tado o ferro deftes inimigos , para continuar os golpes , fem
nos deixar a menor eíperança , de v cremos abatida fua exor-
bitante foberba, que fe para a vileza he idolo, para a honra,
como deixará de fer efcandalo? Pode fua induííria fazer-nos
íbgeitosj mas não poderão nunca feus procedimentos fazer-
nos amigos. Alguns o moftraõ íèr, que me ouvem , & fey eu,
que a baftardia de feus ânimos produz eftes eífeytos j porque
há naturaes tão malévolos, que fe vem arder no fogo que a-
teaõ, & fe deixarão confumir, porque íua enveja não deixe
de os abraíar j governaó-íe pellos didamês da malicia, & tro-
peção nos erros da paixão. Dizem, que nos perdemos, porq '
não nos defviamos, pezando na defígualdade do poder a cer-
teza do perigOj& não fabem igualar a balança com o pezo da
rezão, nem advertir opoderdajuftiça. Saò as mãos da efco-
Iha as que tecem a coroa do triumphoj & em vencer o mayor
rifco coníifte a mayoridade davidoria. Com a falta dosfo-
corros perfuadem as ruinasj Sc não atentão , que poderia fer
efta todo o bê de noíTa fortuna; & q ília tardãça fera difpoíi-
ção da divina providécia.Quantos menos entrarmos na bata-
lha, tãto mais hora ganharemos no cóflí6i:o: Repartida pellos
que aíTiílem, a porção dos que faltão, he força,que tenha ca-
da-qual de nós mayor parte na viíèoria: Delia não pode du-
vidar, quem tem a Deos em feu favor , & nos fabemos , que
pelejamos com gente, que faz gala de offender a Deos . Os
pedaços das Imagens Sagradas, as pedras dos Têplos deftrui-
dos, os corpos dos Catholicos delpedaçados , os agravos dos
Sacerdotes efcarnecidos,que faó,fe não armas,que o Ceo nos
dá, para deftruir eftes Herejesi* Puxando pella vingança , ef-
tão tão efcandalofos íacrilegiosj execute-a noíTo braço, com
aquclle vigor,que nos aconfelha noíTa fé.Nefte encontro có-
fifte noíTa liberdade , & noíTa falvaçaõ ; porque fe a defpre-
zamos , paíTamos da fortuna de cativos , á miferia de apofta-
tas; que não deixará o inimigo de introduzir a hereíia em a-
nimos, que fogeita a vileza j& ficaràõ noíTos filhos herdeyros
de noíia condenação, & de noíTa miferia.

hh^ 21 Aqui

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CJSTifÕTo LUSlTJm

21 Aqui chegava a fervo rofa pratica do Governador,

quando lhe cortou o íio,o eftrondoío rumor de hiía carga de

moíquetaria dada, & recebida dos vinte foldados, com que o

Capitão Joaó Nunes da Mata fora defcobrir o campojobfer-

J 've&inhaça do y^^^^Q ^g ordens,de fe vir retirando na melhor forma,que lhe

mimko lhe corta r rr /t-ij -j jo lj--

^j^^ loíie poíiiveJ^a dar avizo do poder, & marcha do inuTugo j o

" qualposaosnoíTos defcubridores, emdefcompoftafogida,

que fes mais hgeira a neceffidade doavizo , que o receo das
cargas. Chegados ás Tabocas diíTerão , o que viráoj & como
Ò Olandès fe vinha chegando, para a paíTagem do Rio Tapi-»
curá. Não fe perdeo tempo entre a noticia , & a difpoíiçãoi
Guarn eceo o Sargento May or trez cmbofcadas , que tinha
mandado abrir nos Tabocais da campina,em formajque húas
fe cubrião a outras, com a fufficiencia de foldados, que pedia
o intento, & o lugar j & com ordem a todos , que de nenhiía
forte largaíTem o pofto, apro veitando-fe do giro para a con^
Fortificão'fe os tinuação das cargas. Que forão quatro as embofcadas, que fe
nojfosy érfe apa- abrirão, efcreveo o Author do Valerofo Luzideno:Em húa
relhão fará a de- q enganou a informação,como também em o Capitão,& foi- p^^^ ^
Pv^i dados, com que a imaginação a guarneceo.X hum Alferes dá calUáo

afegunda embofcada ,& fua devia fer a fabrica do engano, 199.
queria ter lugar aonde lho não deu a verdade, & não repa-
rou no erro , com tanto qu,e lho át^Q a hiftoria. A primeira
embofcada entregou o Sargento Mayor aos Capitães Joaó
Paes Cabral , & João PeíToa : A fegunda ao Capitão Paulo
Vellozo: A terceira ao Capitão António Borges Uchoa. Os
outros Capitães repartio com prudente, & militar atenção
pellos mais poftos, medindo a fufficiencia pella importância
de cada hum.O Governador Joaó Fernandes Vieira, com hú
groíTo batalha5,occupou o mais alto do lugar, para àúlçi ver,
& acudir com focorro ás partes, aonde o pediíTe o confliâio.
Ao Capitão Domingos Fagundes ordenarão , que com a fua
companhia fera de valerofos, & práticos foldados ) foíTe re-
ceber o inimigo na paíTagem do Rio Tapicurá, para o entre-
ter,& guiar para as emboícadas.

11 Emtrez de Agofto chegouoFramengoaoRio, &
o Capitão FagU'^ temendo, que por entre os denfos arvoredos de fuás margens
migo ncí pajfage ® efperaffem alguas emboícadas , mandou empregar nelles

âo Rm Taficurk. ' ■ • l^^^»^

i6\4 ^^!^J!(TEhLimp VL} S97

hua carga feriada de toda ruaniofqú etária , acompanhada de
hua confuza gritado Gentio, cujo eco encheo todas as; con*
cavidades do contorno. Dsbairxo da nu vem , qtie cauzoii o
fumo da çolvoraiCometeó:a;páiragem com animo deftimido,
cjiie o Capitão Fagundes repn mio, &:fobre-faltou com V a-
Jentia^Scdeílreza, dando àúa,, & muy tas cargas ao inimigo netirafe ate h
de cara a. cara, fém nunca a v irari, na retirada,com que guiava mjfas emhofcA'>^
ao Frameng o para as embòfcadas:Ençorporou-fe com a nof- àas»
ia gente da primeira, com: tal atte , que prefumio o Olandès
íermedò, o que era prdem.TÍEíha chegado aaquellepoflo o
Sargento Mayor, chamado do eftrondo das cargas , & das al-
gazaras do Gentio j vio, queo inimigo (em eíquadraò fecha-
do) cofteava o Tabocal ^ & ordenou á primeira embofeada,
jdele a primeira carga; o. que fes com tão bom emprego , que
não perdeo tiro: Entre os mortos , o ficou de húa baila hum

Framengo, na opinião dos léus 5 o mais v alente, & como tal,
pfcolhidoparaCapitãodos aventureiros. Vencia o inimigo

por cullume, & não reparouna perda , que avaliada por in-
juria, o fesavançar com máyor cólera : Dete ve-lhe a fúria, a
carga da fegunda emboXcada, que có mayor dano o delcom-
pos de forte , que embaraçado do eítrago deu lugar , a que
com achegada do fegundo efquadraô le engrofíaíTe o pri-
meiro, & recebeííe com may or dano a carga da terceira em-
bofcada:No mais crecido numero fes tanto mayor impreflaõ,
que virou o Framengo a cará ao perigo , dando muy tos paf-
los atraz, na marcha, &: no orgulho.O Governador ímpacié-
te de o fer á vifta da occaziáo, com os impulíbs de foldado le-
vantou a voz dizendo 5 para os foldados do eíquadraò , que
tinha conílgo: A efpada,á éfpada valcrofos Portuguezes,que EosnoffosaoGo^
Deos he com nofco. Os Capitães, que vira5 o intcmpeftivo vemador, que fe
da refoluçaõ j advertiraó-no ao Sargento Mayor ; & todos o hia. meter m cõm
detiverão com a poderofa rezão de fe conílderar cabeça ási-P^^^i
quelle corpo, a quem pertencia o diípor, & não o avançar jq
obedeceíTem aos preceitos da milícia, os impulfos do animo,
pois fabia, que a legurança de todos , confiftia na fua , & que
mais fervia á vi£i:oria,com mandar focorros á neceffidade,que
com o exemplo de fua valentia j porque arrifcando a peíToa,
pelejava com hum bra^Oj & governando a todos^pelejava c5

aiuytos»

o qudfe retira,
jangrado do mjfo
ferro.

•298

C^ST^IOTÕ LUSITJ^Ô

^^4^

jnduUria^com ^
entre os mjfosfe
" efconde a falta
das munições.

7i4orte do Capi'
ião JoaÕPaes Ca'
irai, é' do Alfe-
res loao de Ma-
íos.

imiytos. Obedeçcoárezâo, fazendo mais em fe vencer afí
meíinOj que em querer enveftir com todo hum exercito, i
2 3 Advertio^nefte tempo,o Sargento Mayor,que o ini-
migo da retirada fazia conveniência, formando-fepor diver-^
fo eftilo, (com a efperança de melhorar de fortuna,em variar
de modo) & q devidia do corpo do feu exercito hum groííbi
para rebater aos noífos Capitães António Gomes Taborda^
& João Paes Cabral , que c6 os foldados de íiias companhias
lhe dcfcompunhão os efquadroés pellos lados, ( apeyto deír
coberto, & com dano coníideravel)& para prevenir, o não
fer acometido pella retaguarda no tempo xlo combate: Com
todo o mais poder avançava a romper o Tabocal , para nos
ganhar o pofio, aonde eftava formada a noíTa gente.Sem tur^
baçâo, nem tardançaacudio o Sargento Mayor á reíiftenciaj
medindo a defenfa pello modo da invazão . Formou trez eí^
quadroês, para fe opporem á força , por todas aquel las trez
partes, que o inimigo nos bufcava. As poucas armas de fogo,
com a falta de pólvora , & bailas , que fe começava a fentir^
era, o que lhe dava mayor cuidado. Gobrio a falta com a ivw
duftria, dizendo aos foldados , que aquelle, que não tiveíTe
munições, fe foíTe á tenda do Governador prover com tem»
po, porque o confliâ:o o não achaíTe falto j exortando a to-
idos com animo tão pacato, que influia nelles novos alentos.
Vinha ;á o inimigo cofteando,fegunda vez,o Tabocal , don-^
de os noíTos [das meímas emboícadas] não menos animofos,
& mais deftros, lhe derão tantas , & tão bem íiirtidas cargas,
^ue embaraçado na perda,detivera o paíTo, fe a ira o não efti-
mulara a bufcar mais a vingança, que a viáoriaj defeíperado
de contar os tiros pello dano fem ver, quem defcarregava os
tiros, a montão mandava varejar o Tabocal, com a fua mof-
quetaria. De húa baila contraria cahio ferido o Capitão da
primeira embofcada Joaõ Paes Cabral , fuprindo á debilida*
de do corpo, com o vigor do animo j & fem confentir , que o
retiraíTem do confliâ:o, fe meteo na mayor períia da batalha,
aonde com fegunda ballaobufcou a morte, como fe o va-
lor lhe dera fegunda vida. Naõ a perde, quem a emprega em
obfequio da Fé, & da Pátria porque lha eterniza a memoria.
Igual na forte , &: no íitio lhe foy o Alferes João de Matos j

^V' pellos

i54^ ^^A^TE 1. Lívido VL 299

pellos olhos o paíTou hua baila j juntamente perdeo a viría,&
a vida,por náo ter a pena,ou de ficar íem força com olhos pa-
ra a falta, ou de ficar fem olhos com força para a luta.

2 4 Náo era menos nos ReligiofoSj&Sacerdotes a valen-

y

progreffos, & Simáo de Figueyredo tantas vezes nomeado;'
& Joáo de Araujoobfervante5& defi:imido5deçeraõ do mon-
te, aonde afíiftião ao Governador , ao lugar da batalha,[ dif-
tante hum tiro de Arcabuz.] Sem repararem nas bailas , que
chovião, acudirão a confeíTar, aos que agonizavão , fazendo
a hum mefmo tempo o ofíicio de confeíTores , & foldados ^ a
força de braço defendião , aos que confeílavaõ , ferindo aos
Herejes, & abfolvendo aos fieis: Interrompeo-lhes o piadofo
exercicio a obrigação de guardarem a vida do Governador,
(que a feu cuidado, a tinha entregue a efcolha ) o qual, leva-
do fegunda vez do ardor, & do zelo, que em feu coração ace-
dia a occazião, & o exemplo dos feus, defpedio de corrida a
meter-fe no mais v ivo da batalha: Parecia4he a feu animo fer
impoíTivel o Governar, fem ferir ; porém o Padre Simão de
Figueyredo, que fubia pella ladeira , lhe deteve o avanço, a-
aifando de temeridade, a demaíiada valentia^ & reprehendé- ^^^^'^^o Govef

doafuriofa determinação, o fes obedecer aos preceitos da j^ ^M^^y^^»«-

•1- • M • r ^ j r Ml da. vez. arrifca."

milícia. Nunca mais ie apartou de lua ilharga; porque conhe^ ^ua. apejfoa. ^

eeo , que não faõ menos arrojados os ferneíís da cólera , que
os do febre ; & também , que fe o Governador fe meteíTe ná
confuzão do combate , o bufcaíTem as bailas dos traydores,
com pontaria mais certa , que as dos inimigos . Com efia ad-
vertência o fes occupar o pofto,que lhe covinha, donde vio,
como o inimigo chegado á porta do Tabocal perfíava em ró-
per a refiftencia, que lhe empedia a in vazão, Sc foy focorren-
do a defenla, deípedindo mangas de foldados a ter o encon-
tro do Framengo, por aquellas partes , quemoílrava melho-
rar-fe ganhando terra.

' 2 5 Entre húas,& outras armas andava o Sargento Ma-
yor António Dias Cardozo difpondo,& cortando com igual
braço,& acordo; & com admiração, & enveja dos olhos, que
o viaó. Alcançou, que o inimigo carregava com mayor po-
der

/i

■PWP

ifl

300 C^ST^IilOTO LUSITJNO 164^^

der por liúa parte, aonde os nofíbs inal lhe podião refiftir, &
logo os mandou focorrer pello Padre Simão de Figneyrcdo,
com algiias mangas de foldados: Durou o combate, por mais
■Ardil do inimigo^ de hvialiora, com igual conftancia, ainda que não com igual
aia ad&. numero, nem comigualfuror,porqueaos foldados inimigos

fuftentava-os na batalha a violência, & a importância aos
nofíbs, cujo ferro cortou de maneira ao Framengo , que àcf-
confiado da força, fc valeoda induftria, com que lançou pel-
las ilhargas do Tabocal algúas companhias, com ordem , que
íizefíem o poífivel por ferirem as cofias dos Portuguezes^po^
rèm a vigiligancia do Governador , o eiitendeo , & defpedia
de fuaEftanciadous troços detaò valerofos foldados, que
em breve tempo rebaterão as mangas contrarias,&as deftruit '
raó, feguindo-lhe o alcãçe,até fe recolherem aos efquadroês^
donde aviaõ fahido j mas com tamanho defatino,que o Olan-^
dès afroxou o combate, por acudir ao desbarato dos feus , q
vio poftos em vergonhofa fogida: Tanto , que os encorpo-
tou coníígo,continuou o intento de nos ganhar o pofto(cre-
cia nelle a coragem com a perda . ) Queria ganhar terra , Sc
não defcobria íe não corpos cabidos, olhando com horrível
efpanto, como dos feus foldados fazião os nofíbs trincheira
"'' para fe defenderem, & os feus efcada para enveftirem : Com

íer tãto o numero dos mortos, mais o defanimava o olhar pa-?
ra os femblantes dos v ivosj nos Portuguezes via a alegria de
viâ:oriofosi nos dos feus foldados a trifteza de vencidos:Defi
pois de duas horas & meya tocou a retirar, & deixou o com-
bate , carregando-o 6 Capitão Jeronymo da Sylva, com fó
vinte foldados , mas com tanta gentileza , que lhe vendco a
fortuna a gloria defte dia, por duas pelouradas mortaes. Naô
T^t-Íl^rado *^^"^' ^^'^^^^ comprou o Capitão Matheus Ricardo o efcla-
ímJfosZlpes!' tecido nome, que ganhou nefí:e conflito . Outros muytos
foldados nofíbs , femelhantes no mento , de femelhantes na
dita,dera6 nefta occaziaõ ávida pella liberdade da pátria j q
mereciaõ agora fer conhecidos pello nome, comoentaõ o
foraó pello braço; mas fervio-lhe feu humilde nacimento,de
defculpar a ingratidão dos vivos. .

26 Occupado em formar os feus andava o General Olá-
dès: Punha cm ordem as fileiras ,hum valente Framengo,
'>.:'.■ cha-

,645 ^J^TEl. LlV^OFl. 30 í

chamadoValot,Sargento May or do terço de JoaÕ Blar,fahio ^^^ ^.^.fi,^^
fora delias, para ver a noíTa difporiçaõ,& tentear a parte por jr^^ ^ ^uaríaav^
onde melhor nos poderia enveftir j como montava em hum cada,
cavallo, o pefcou facilmente hua baila , tirada com pontaria
taó certa, que perdeo juntamente, a fella, & a vida , & pellas
ancas do cavallo v ey o ao chaó. Com não menos magoa , que
perigo o retirarão os feus . Chegava o dia ás quatro da tarde,
& como não ceffava a correfpondencia dos tiros , pella ve-
zinhança das partes ; advertio Henrique Hus , que danoíTa
eraõ as cargas mais remiíTas j imaginou, que era falta dos âni-
mos, o que foy neceffidade de poupar a pólvora ^ fes da fof-
pey ta motivo para animar aos feus jcn veftio quarta v ez a en- f

trada do Tabocal, com aquelle furor , que alimenta a deíef-
peração. Aquife vio anoíTa gente em conhecido aperto,
porque canfados de matar, & de ferir fuílentavão o poílo,
fem poderem mover o braço. Não aíli o Framengo, que com
gente de refrefco repartia as horas do trabalho por muy tos,
Sc tinha fobeja gente para tudo. Com efta ventagem nos cã-
foude forte a perfia do combate , que a muytos retirou a
falta do alento, com que não podia refpirar o animo . Foy o
inimigo ganhando as embofcadas atè arroftar com a fegunda
campina, levando diante a noífa gente , que fe hia pondo em f .

conhecida retirada . O Padre Manoel de Moraes , que com
fervorofa deprecaçaò chamou os olhos de todos a húa devo- ^,A
ta Imagem de Chrifto Crucificado, que trazia arvorada , aífi
animou aos fieis, & confundi© aos Herejes , que baftou a ve-
neração de huns, & o pavor de outros , para que a fortuna fe
defconheceíTe a íi mefma . Envergonhofa retirada,forão os
noíTos pondo , ao inimigo. O Governador Joaó Fernandes ^oão Perm?ídes
Vieira, v endo que a occazião o chamava, difle aos foldados, Fmrafe mete m
que o acompanhavão,que prometeíTem áMãy de Deos hum f^onfitãs.
templo dedicado aó feu defterro, fe lhes concedeíTe a vito-
ria dos inimigos da patriaj & deçendo do monte carregou o
Olandès de tão pezados golpes, que cortado do ferro , & do
medo perdeo a terra ganhada, & fe retirou, de todo defcom^
pofi:o,ao batalhãojque na primeira campina teve fempre for-
mado.

27 Incitados do furor, feguiaõ os noíTos o alcançejquá-

Ce do

'í ;

M

302 C^STIIIOTO LUSITJKO 1645

do o Governador mandou tocar a recolher . Defobediente a
colerajdefprezava o final j que fizeraõ refpey tar os Cabos,te.-
mendo, que o inimigo norazo da campanha nos eílimaííè
Retira fe o imrni pello numef o, & não pello vaíorj o que naõ podia ver,fican-
go vencido. j^ ^„ noílos recolhidos dentro do Tabocal j aonde o brado
da alegria, fes parecer ao Frameiigo mais formidável íeu eí^
trago. Juncada de corpos mortos^ & alagada a terra no íàn-*
gue dos feridos, moftra vâ ao Oíandès,qUe era quafi todo feu
o recibo,& o diípendió. Dos Portiíguezes, neftâ quarta âvã-
cada, fó nove ficàraõ eícaíavrados, & trez mortos ^ ( perda, q
náo V io entaõ o gofto da v iâ:orÍ3)& fucçeílb que nunca per-
S dera de vifta, o aíTombro. Com parado hum poder com outro

poder, naò poderá a piedade deixar, de o atribuir a milagre
da divina Omnipotenciai que á força dos homens , como po-
de fer?0 inimigo guarnecido de mu) tas, & reforçadas armas,
mais, íèm comparaçaó,em numero; pratico na milicia,& com
fobejas munições^ ajudado do cufiume de vencer , & domi-
nar, contumaz em repetir os combates; & em quatro afíàltos
ficar ve ncido de poucos bizonhos , & defarmadcs , íèm pól-
vora, fem defcanfo ,& fem focorro; podia íèr fem muy to par-
ticular auxilio do Ceo? Tire-fe a coníequencia ás permiílàs,
& fera efta a concluzaõ. Immortaes efiatuas,& eternas memo-
rias devia a naçaõ a Francifco da Cofta Capitão da Fregue-
ziado Cabo,MartimMachado,&Jeronymo da Sylva da Cu-
nha, pella valentia có que neíle combate trocarão a vida pel-
Ia fama; mas em falta defi:a fatisfaçaó lèrvirá,nefie fitio, a vií^
ta de fuás fepulturas de recordação , & de epitáfio contra as
injurias do tempo, fem lhes defraudar a gloria , aquella poli-
tica diligencia, com que o Framengo, com retirar os corpos
de feus mortos , nos quiz encubrir a perda , furtando-nos as
teftimunhas do dano; a v ifi:a do qual o perfuadia, a deixar a
contenda, & íèguir a fogida, o que fem duvida fizera , fe naò
temera mayor eftrago na fuga, que na confi:ancia.

28 Indecifo na efcolha eftava o FramengorDeíèjava que

o cobriíTem as fombras da noite , detidas dealguas horas do

Outra ve^fe for- dia: Sofpey tava , que na indeliberaçaõ achariaó defmayos os

rlbotl '^'^^^^ ^ ^^^^' ^ cófiança os noífos para os enveftirem,&defiTOçarem:

Aconíèlhou-fe com a deíèíperaçãoj exortou os íèus a novo

CQIU-

1(54^

TA^E L LiriiP PI,

303

combate, fazendo de noíTa rufpeiiçaó , rezaô para fua ouza»
dia j& de Tua fúria, efcuza de fua perdiçaõ:Deftimidos,con50
dcfatinados, avançarão outra vez o Tabocal , em que acha-
rão a oppoíiçaõ dos Portuguezes taó viva, que lhe pareceo
ao inimigo , aumentarem-íè as forças dos moradores com a
continuação do trabalho. Já a nenhúa das partes lembrava a

V iâioria , porque huns , & outros peleja vaó por defender a

V ida.Embebidos na batalha jnaõ ficava fentido li vre,nem pa-
ra ver o fangue dos feridos, nem para ouvir as vozes dos mo-
ribundos, fó os pès daváo fé dos mortos, que conheciáo pel- ocovermdor a^
lo embaraço, & não pello vulto.Não fe dííHnguiaõ inimigos ^^^^^ refifima.
deamigospellosfemblantes, fenão pellos golpes j comtaó

horrenda confuzào, quefe daváo as feridas com os inílromé-
tos do reparojporém como o Framengo nos fazia tantas ven-
tagens no crecido numero dos foldados, que a feridos, canfa*
dos, & mortos fuccediâo outros deícançados, & faós , foraõ
os noíTos perdendo terra, fem que o furor deixaíTe advertir,
quaesa perdiaõ, & quaes a ganhavão . O Governador Joaó
Fernandes Vieira, que fora do confli6to, ficou com olhos li-
vres para ver , a que parte fe inclinava a vi6i:oria, & que para
o mayor aperto guardava o melhor focorro , pondo os olhos
na Sagrada Imagem , que o Padre Manoel de Mof-aes trazia
arvorada, & bufcando a interceíTaõ, donde efperaya o fa vor^
diffe em voz alta, para os feus: Senhores , refemos de joelhos '^

húa Salve-Regina á Mãy de Deos, certos, de que fua pieda-
de não falta em ouvir, a quem a chama:TaI confiança influio
em feu animo efta devota diligencia, que a todos afíbgurou a
dita, & perfuadio a en veftida. De Gorrida,com os feus, fe me*
teo no mais furiofo do combate, matando , & ferindo inimi-
gos com golpes taõ def-uzados, que a efpada em fua mão ti-
nha menos de ferro que de rayo j -fem diíFerença cortava ao
vezinho com o fio, & ao diftante com o medo: Sérvio o exé-
ploá imitação, com que os Portuguezes arrancarão do ca-
po ao inimigo defcompofto,& tímido j & fempre carregado
de noíTos golpes, até o fim da campina, aonde o rio, que buf-
cavaparaotranzitOjlheadvertiooperigo, fenâo efperaíTe
o favor da noite. Com os olhos na paíTagem, deixou o Glan-
des no campo todas as munições^ & grande parte das armas;

Cc3 A

304 C^ST^loro WSITJNO 164^

A muytos parecerão eftorvo para a fogida ; a nenhum

inftromento para a defenía, porque ávifta doeftrago fer-

^ viaõ fó aqnelles ardis , que lhes aconfelhava o medo : Foy

Fuou o oiandes j^j^n delles anticipar a eícuridade da noite com o fumo
dejtrmdo. , r 1 i 1 r

de trez cargas lerradas , que mandou dar aos léus , para

perfuadir aos noflbs, (que eftavão recolhidos denrro de
feus alojamentos,) que não defamparava o poílo , nem
deixava o intento j o que já tinha dado a entender , com
íè formar de novo. Na primeira vigilia da noite, em que
a efcuridaõ, a tempeílade , & a crecente do Rio pode-
rão embargar a refoluçaó mais arrojada, o vadeou o Olaur
dès, com determinação entendida . Parecia-lhe, que fe o
dia feguinte o achaífe naquelle íitio , os íèus diminutos ,
&: afli£i:os, os noíTos deícanfados., & briofos , não ficaria
pefíba em feu exercito , ique não pereceíTe , ou na bata-
lha , ou no alcance 3 & que menos arrifcava em falvar al-
guns, que em perder todos. Em toda aquella noite naõ
defcanfou de caminhar por veredas incultas , matas, la-
maçaes , & afperezas , que a tempeftade do vento , & inun-
dação das agoas fazia parecer mais infofriveis , com tan-
ta preíTa, que em poucas horas andou cinco legoas de ter-
ra. Naó dá o medo azas menos ligeiras j nem odefejo de
confervar a v ida, menos ;corapo para atropellar difficulda-
des.

29 Em quanto o Olandès, ajudado do íilencio,& da
efcnridade, caminhava defcompofto , turbado , & vencido,
fcftejavão os nofíbs as repetidas vidorias, que Deos lhe de-
ra nefte dia,& a efperança de que com feu favor as multipli-'
cariaó no feguinte [ignorantes da fuga do contrario! com a-
quellegofl[0,querefuIta dofeguro da bonança , quando íe
fegue ao may or rigor da tormenta . A grande alegria, os não
^, .^ ^ defcuidou da ma tidão, & da vigilância. Mandou o Go-

Festeiao os Voy . ^jirr^ o

/«^«^Vi^^ic^o-^^^^^^or , que todos rendeíTem as graças ao Supremo
rh^& feprepa- Senhor das vidorias , & que fe preparaíTem para entrarem
raõ para novo cõ' em nova batalha j que fem duvida fe daria ao primeiro
^^^^' romper da manhã, ou porque o inimigo a avia de efpe-

rar , ou porque nos avia de cometer . Não faltou o Sargen-
to Ma^or ao cuidado de guarnecer os poftos de íintinellas,
ah &

i645 l^À^BLLlV^Opn, .305

& Toldados, como aquelle que prefumia vezioho ^taó ar^*
dilozo inimigo j achou, que em todos fobejava o animo
para o futuro conflióto , mas que a todos faltava pólvora,
para fuftcntar o combate, efia falta remedeou o Gover-^
nador, mandando ao Sargento Mayor toda a que tinha^
advertindo-lhe , que nenhúa mais lhe ficava. Perguntou o
Sargento Mayor ao Governador, que conceito fa2Ía do
Framengoí' A que refpondeo: Supollo de noite formado,
& pella manhã combatente , Sérvio a refpofta de avizoy
para que logo fe prevenifíem os reparos, & fe defpofeíTem
os meyos neceíTanos , para a refiftencia . No Tabocal de
fima, que orlava o alto do monte , fe mandou logo roçar
aquella terra, que baftava paranella fe embofcar húapar-^
tida da noíTa gente ; & na diftancia , que fe entrepunha en^
tre hum , & outro Tabocal fe levantarão trincheiras, quê
eortavão em trez partes a ladeira do monte : Em quanto
fe trabalhava nellas, mandou o Governador retirar toda a
gente, para a fua Eftancia,como para lugar mais feguro,&
mais defenfavel , aonde o inimigo não poderia chegar, fe
naó deftruydo , & canfado pellas oppofiçoés, que primeiro
avia de vencer. ^

30 Tinha vifto o Governadora valentia , com que nos
combates pelejarão as companhias dos Minas,& Crioulosi&
certo de fua fidelidade os mãdou defcubrir o campo,com or-^*
dem, q paíTaíTem o rio, & da outra parte picaflem a retaguar-
da dos inimigos,obrigando-os,a que em toda a noite não lar-
gaíTem as anuas das mãos . Chegarão ao alojamento do Fra-'
mengOjque vira5 defamparado,& ainda alcançiraóa fua re-
taguarda, que hia paífando o rio : Com multiplicadas cârgas^^
Si confideravel dano o perfeguiraõ,& acobardarão de modo,
^ imaginando-fe cortados,fe embofcáraó pellas matas,deixã-
dodefeguir o caminho dos feus j aos quaes naó feguiraõ os ^ÉbêngmòM
noíTos o alGãçe,por não excederé as ordés,que tinhaó recebi- ^p^ ^ff^"" ^
das. Voltarao,& dcrao cota ao Governádor,do q virao, & do-'
q obráraó.Có efte avizo ordenou Joaó Fernandes Vieira ao
Sargento May or, q mandaíTe correr a câpanha duas legoas ao
}argo,por foldados praticos:No termo dellas,acháraõ os nof~
fos, 5 o.Olandefes, que davaó guarda a mais de quatrocentos

Ce 3 fe-

/"N

50^ CAsr^oro LvsiTj'no 1645

feridos, que defmayados, pella falta do fangue , Si pcllo tra-
balho da marcha, não poderão paíTar avante na coníerva dos
feus. Foraó os noíTos viftos das íintinellas inimigas , tocàraõ
a rebate, fogiraõ os que podéraõi& os nofíbs viràraó as cof-
tas, enganados do vulto, & do rebate, & o derão em nofíb a-
lojamento, dizendo,que o Olandès fe refazia, & forma va,pa-
ra nos tornar a en veftir.Não fazem as fombras menos impref'
faó nos ânimos, quando a imaginação as pinta com as cores
do medo, PaíTou a nofíà gente^ enganada do avizo , todas as
horas da noite com as armas na mão . Moleftia exceífiva por
fucceder em húa noite defabrida,defpois de hum dia gaílado
em continuada batalha,fem que nelle deíTe lugar a peleja a fe
refazerem as forças > nem com odefcanfo ^nem com o fuf-
tento..

31 Rompeo a luz da manhã pellas fombras da iinagína-
ção , & da noite,(iguaes no horror,& femelhantes nos efFey-
tos.) GfFereceo-fe o Gapitaó Francifco Ramos a defcobrir o
Foge o inimigo do campo, & a verdade,& voltou com a certeza , de que em to-
campo^&fe afro- do elle não avia mais , que defpojos do inimigo : Com efta
losZf 'o-oT^'' claridade,&com^ do dia fahio a noíTa gente a v er nos í nftro-
JrP^' mentos da batalha,os gráos da vistoria, & os pregoes do triú-
pho. Todo o campo eftava femeado de corpos mortos,de ar^^
mas fem conto^ de munições, como pólvora, baila, corda,ar-
eos, & frechas fem numero j que em muy tas partes da campi»
na nada vão no fangue de feus próprios donos. Alguns manti-
mentos affi para á neceíítdade como para o regalo,que igual-
/v mete fervíraó á fefta,& á falta.Não ouve foldado, quefe não
armaíTe com efcolha; nem índio, que fe não veftiíTe com vai-
dade.Succedendo á repetição da alegria,a das cargas,com que
cõnpva certa da feacclamavaa vi61:oria .Pellas nove horas da manhã chegou
f^Jf/rada do wí- hum morador daquellecontornocom as novas certas do ca-
minho, que tomara o Olandès, & do grande medo com que
marchava, deixando peílos matos os cançados,& feridos,que
o não podião feguir. Repetio a cauza , que tivera o engano
dos Minas j(aírima referido^ & que o General Henrique Hus
mandava dizer por elle ao Governador João Fernãdes Viei-
ra, deffe quartel aaquelles feridos, que quafi moribundos
mandava levar em carros, para o Arrecife^conjo a todos o en^

finavaõ

pugo.

1^45 TJÍITE /. LIF^O Fl, 507

íinavaõ os preceitos da milícia, qiie não permite matar a fati-
gue frioj porque de outra forte feria may or a v ingança , que
aoííenfa; & não deixaria fua efpada morador com vida,paf-
íatidopellos fios delia a grandes, & pequenos de hum^ & ou-
tro fexo. Com efta relação fe ratificou a certeza da v iáèoria,
que outra vez repetirão os gritos. O Governador , que quaíi
fe não achava a fi mefmo entre os exceííos do gofto , fe não
defcuidou nas demonftraçoés de grato^com que defejava , q
todos deífem a Deos graças,por tamanho beneficio*Com feu
exemplo obrigou a que todos poftos de ;oelhos,com as mãos ^^^ Craçaí ^
levantadas ao ceo confeífaíTem, que a elle devião a mercéífa- ^"^^^ amerce.
7endo Templo do mefmo lugar do conflido. 3 Acabou efit
adio de agradecimento , com gritar todo o exercito em húâ
voz: Viva a Fè Catholica Romana ; viva a liberdade : Viva
elRcy Dom Joaó; vi va5viva;& logo o Governador com be-
nevolo,& alegre femblante,& o chapeo na mão,foy abraçan-
do a cada hum dos capitães, officiaes, & foldados , engrande-
cendo o procedimento de todos, com tanta afabilidade , que
os punha fobre a cabeça, quando com os braços os recolhia
no pey to. Eraó reciprocas as congratulações da dita, & por-
que foflem comuas as confianças da liberdade ( ;á então mais
poífuida, que efperada ) a deu Joaó Fernandes Vieira a cin-
coenta efcra vos feus com a honra de foldados , merecida de
feu v alor, & fidelidade naquella occazião ; Be lhes fes mercê
de que podeífem aíTentar praça , & vencer foi do , em quanto
duraíTe a guerra,efcolhendo de entre elles dous Capitães,pa-
ra duas companhias , em que p& repartio , de vinte & quatro
íbldados cada húa. "'tnr— rA .-n

3 2 Individuar os caios particulares defta occazia5,pârâ
hum Anjo fora fácil, para a limitada comprehenção de hum
mortal fera impoíTivel. As proezas j que os Cabos,& foldados
obráraõ, com fiia multidão, efcuzão noíTo filencio : Aquella
defâtenção, que lhes efcondeo o num€ro,lhes negou também
â callidadcj porém na defproporçaó do poder , na perfia dos Re^oes.que ema"
combates, na defígualdade das armas j na falta , & fobra das recemasproe^^,
munições, no ex ceifo dos mortos , tia multidão dos teria os, •'
nos deixou campo aberto, para que o difcurfo poííà inferir,
o que a limitarão naõ pode relatar . Confiava o poder con-

. Ce 4 ' trario

r

■g''

308 c^sr^ioro LusiTJNo 1^45

trario de mil & quinhentos Olandefes efcolhidos, oy to-cen-
tos índios todos foldados^ hua copia grande de gaftadores,&
eícravos, q ferviraó as armas como os demais.O mefmo pref^
timo tinha húa grande multidão de Tapuyas, & Py tiguarcs,
quefeguião o exercito, para entrarem aparte nosdelpojos»
(Certos na vi6i:oria.) Perto de duas mil armas de fogo entre
mofquetes,& clavinas traziaó os contrários. Pólvora, bailas,
corda, & todo o mais género de munições em tanta abun-
dância, que íervio a cinco horas de combate , & fobejou tan-
to , que nos proveo para muytos dias: Perdeo nefta occazião
as três partes de fua gente, (fora dos mortos, que retirou , &
efcondeo a corrente do rio, íe acháraó no campo trezentos,
& fetenta mortos.) Não numeramos,os que iia retirada mor-
Térda do mimi' rèraó das feridas pellos matos,pellos caminhos,& no Arreci-
fe, aos quaes a retenção da cura, fes inutis os remédios; Entre
cftes, os mais dos Cabos ,& officiaes da guerra, cujas infignias
lhe fes deixar a morte no campo,& nas eftradas. Não foy me-»
nor a mortandade dos índios , afli parciaes , como auxiliares
(entre elles fe achou húa Tapuya com hua criança nos bran-
cos, paífados ambos de húa baila.)

53 Confiava o todo da noíTa gente de mil, & trezentos
homens,a faber,mil & duzentos Portuguezes entre folteiros,
& cazados (todos foldados ,no valor , poucos na pratica ) &
'Jrmas,gete, mor quaíi cem naturaes,entre efcravos,& índios , As armas de fo-
Tc}u^^^^°^ ^^ ^^ ^^^^ paíTavãó de duzentas efpingardas , feitas mais para a
■'•' ^ ^ caça, que para a peleja. Algúasefpadas, que a prohibiçãotb
nha efcondidas, & com a ferrugem taõ gaftadas , que podiaó:
magoar, mas não ferir. As mais armas eraõ cutelos do monte,
&páostoftados: As munições tão efcaíTas , que as negava a
penúria, ainda á mayor neceíTidade. As horas do combate hu
dia todo. As dos cercados não fecontão pellos golpes,fe não
pellos tiros. O numero dos nofíbs mortos,não pafíbu de vin-
te & oy to, entre elles os Capitães relatados. Os feridos foraá
trinta & fete, aos quaes o cuidado da caridade apreflbu a có-.
valecenciã .Dos efcravos mortos , & feridos não fazem me-
moria noíTas relações (devia fer efquecimento,&: não defpre-*
zo, que o naó merecerão Negros, que tão efclarecidamente
obràraó.) Coteje agora o confiderado hum poder com ou-

X

■j^

tro.

1645 ^A1^ELLIV(^ FL^ 509

troj hiias com outras armas, hum numero de mortos , & feri^
dos com outro numero , em igual íiíio , & com igual tempo;
& refol va^fe fera crehivel, deixar cada hú dos noflbs de obrar
maravilhas ? E logo condene a injuria , que fes a feu valor a
omiííaó,que lhes efcureceo a fama,com lhes callar os nomes, ^

& efconder as proezas ; & não deixe de avaliar por dita , as
que a memoria livrou do efquecimentoiO pofto5& a callida-
den^o deixou perder de viftaamuytos,aosquaes nomea-
remos, fegundo a ordem do Alphabeto, & não a dos mereci-
mentos.

34 Os Capitães que fe acháraõ no coníli£l:o , foraõ A-
mador de Araújo, António de Crafto , António Gomes Ta-
borda, Amaro Cordeiro (agora AjudantCjdefpois Capitão,)
António Borges Uchoa, Bcrtholameu Soares Canha,Braz de ^/f ^^f J'';/^'
Barros, Cofme do Rego, Domingos Fagundes,Domingos da v^^
Cofta, Francifco de Lisboa, Francifco Gomes , Fauflino Pe-
reyra, Francifco Ramos, Franciíco deFigueyredo daSvlva,
Francifco Gomes da Sy Iva , Jeronymo da Sylva (morreo na
batalha com mais illuftre nome .) João Soares de Albuquer-
que, JoaóLeytáode Albuquerque feu irmão, Joaó Nunes
Viâ:oria, Jeronymo da Cunha de Amaral , Ignacio Mendes,
Joaó Barboza, João PeíToa Bezerra^ ]o2iõ Nunes da Mata,
Joaõ Gomes de Mello, Joa6 Paes Cabral,que nefta batalha,
como outro Samfaó , coro-ou as proezas da vida com fe ex^
cedera 11 mefmo na morte. Mathias Ricardo , que no comba-
te deu a vida pella pátria. Manoel de Araújo de Miranda , fi- X.
lho d' Amador de AraujojManoel Soares Robles,Marcos Pi-
res, Paulo Vellozo, Pedro Marinho Falcáo,Pcdro Corrêa, o
Padre Simão de Figueyredo Sacerdote, & Capitão , igual no
2elodeencaminharas almas, ao valor de efgrimir as armasj
Sebafíião Pereyra,Simão Mendes,Thomè Dias da Cofta.

3 5 As peíToas particulares, a que a nobreza deu nome,
& efta occazião fama, foraõ as feguintes . Arnao de Olanda
com dous filhos j António Bezerra, António Cavalcanti com peffoas de caUí-
' dous filhos, Arnao Lopes da Madeira,Antonio da Sylva no-^^^^ ^^ue entra*
meado Capitão de Cavallos, António da Cofta, Álvaro Tei- raõ mbatdha,
xeira de Mefquita, António Coelho Serpa, António Carnei-
ro Falcato, António Gomes, António de Magalhães de Mel-
lo,

31^ C^ST^IOTO LUSlTjnO 1645

lo, que montado em hum cavallo , a todos os combates ani-
mava tanto com a exortação, como comaefpada; António
da Sylva, António Tavares, António da Cofta , Bernardino
de Carvalho, Balchezar de Azevedo,Coíliie Soares de Arau-
^ joj Chriftovaó Berenguer cunhado do Governador da liber-

dade, Diogo da Sylva, também de fua caza , Domingos Bar-
boza feu Alferes j Francifco Berenguer de Andrada , feu fo-
^^'^ gro Francifco Rodrigues Tavares, Francifco Barreto, João
Lourenço Francês com dous filhos, Jeronymo de Oly veira
Cardozo,da caza do mefmo Governador, João Dias Ley te
cõm dous filhos, João Cordeiro de Mondanha,Lu is da Cof-
ta Sepúlveda, Lourenço de Abreu com hum filho, Manoel
Cavalcanti de Albuquerque, Manoel Alveres de Carvalho,
Manoel Fernandes Cruz com dous filhos j Manoel Barre-
to, Simão Velho Barreto com dous filhos,Thomás da Coftaj
Sc outros de igual esforço , Sc fidelidade , cujos nomes efcre^
veo então com melhor tinta fuaefpada, ainda que agora fe
não eftampem nefta hiftoria por noífa pena. Os Sacerdotes,
que fe achàraõ nefta occazião , de que nos informou a n oti-'
cia, forão o Padre Simão de Figueyredo,já repetido entre os
Capitães,& agora nomeado,porque o fizerão duas vezes co-
nhecido a dignidade,& o pcfto. O Padre João Bauptifta Lo-
bato natural de Lisboa.O í*adre João de Araújo natural de
Ponte de Lima,& o Padre Frey João da Refarreição,de que
adiante faremos particular memoria , divida aos íingulares
fer viços, que no difcurfo deita guerra fes a Deos, a Patna,&
aoReyno.

3 6 Perder da memoria o beneficio,he a ingratidão mais
fea: Generofamente o recompenfa, quem a vozes o confeíTa,
porque fe moftra agradecido, fem ficar defobrigado . Foraõ
nefta occazião taõ claros os favores do ceo , que fó a impie-.
dade os poderá negar . Seja o primeiro ar2;umento defta ma-
teria,o encontrado das cauzasj jufta a dos Portuguezes,porq
pelejavaó pella Fè,& pella Patria:Contra juftiça , a dos Fra-
.^ mengos Herejes, Sc Tiranos. A fegunda , obrirgar-fe o ceo a
^ZTISltí f. deftruir foberbos,&:a favorecer humildes: A mais forcofa,to-
t;or comqueoceo^^^^^^^ por mltromentos deíua vmgançaas teitmiunlias
nos af/ijlio. de fuás oíFenfas. Por efpaço de cinco horas continuadas ati-
rou

1^4^ ^AXrÉlLlV\OVl. 311

Tou cada hua de noíías eípingardas mais de cincoenta cars;as,
(taó efqiientado o ferro , que o não fofria a maó ) & nenhua
fe rompeo . Davaó as bailas inimigas (todas de mofqueteSjSc
clavinas reforçadas) em os noíTos Toldados , & muytas faziaõ
íinaes nas roupas, & nos corpos, fem chegarem a ferir3& as q
feriáo, não podéraó matar, fendo palanquetas , & hervadas.
Nos últimos combates deraõ os noíTos Eípingardeiros mais
de mil tiros, fó com as ballas,que íe fizeraõ de dous pratos de
eftanho, & a todos fobeja'raõ bailas . Com duas livras de pól-
vora cevarão as efpinguardas,as vezes referidas, & ficáraõ cõ
pólvora, para mais cargas . ConfeíTe noíTa piedade a maravi-
lha, pois o obftinadoHereje anão pode negar, affirmando
muytos Olandefes , que viraõ no mayor fervor doconfliâ:o
hua refplandecente Senhora veftida de azul, & branco , com
hum fermofo Menino nos braços , acompanhada de hum va-
rão authorizado, repartindo pellos noíTos pólvora , ^ baila;
o refplandor dos quaes aííi deíànimára os íeus , que lhes naó
deixara mais tino, que para virarem as coílas , & largarem as
armas:0 que bem confiderado parece,que íe ajuftou o focor-
ro, com a deprecação . Prometerão todos , ('como fica dito)
que fe a Senhora os favor eceíTe na batalha, lhe edificariaõ hu
Templo, aonde fe veneraíTe o Sagrado Myfterio de feu Def-
terro3& medio-fe o defpacho pello voto , moftrando a Mãy
de Deos na companhia,as circunftancias de deílerradajcomo
a pinta o Myfterio.

57 Deixou o eftrago, ao Framengo, mais Irritado , que

convencido. Tulpava a vidoria por afronta,& na fosida, buf- ^^'^°^. ," ^l^^^^^
*^o- jA/f a- • 'vencido. & irn»

cou a vmgança , & nao a emmenda . AÍIi como paliou o no, ^^^^ '

marchou toda a noite com infoportavel trabalho, que lhe fa-
cilitou o temor: Na manhã do dia feguinte ( quatro de Agof-
to) chegou á povoação de São Lourenço. (Sete legoas do
monte das Tabocas, donde fogio vencido. ) Achou o lugar
defabitado, com a aufencia dos moradores, retirados aos ma-
tos, pella incerteza do fucçeíTo. Nefte íitio fe deteve,eíperã-
do pellos remontados, & feridos,& logo avizou ao Arrecife,
dando cota aos Governadores do fuccedido, & da neceííida'
de, que tinha de mantimentos, munições, & foldados. Foy a
nova taò encontrada áefperança de todos , quedefpois de

ouvida.

gi2

CAsr%Joro LusiTjKo i ^45

ouvida, ainda fe duvidava. Já os do Concelho temião aquel-
]a mefma gente,que defprezavão,& com toda a preíleza pre-
pararão, & remeterão o focorro, que chegou a Saó Louren-
ço no meímo dia, em que Henrique Hus o pedio:Paííados al-
^m guns, que gaftou em mandar feridos, 8c recolher foldados, fe

mudou para os Apupucos^ aonde os moradores o receberão
como alliados; náo fetemèraõ offendidos , com o feguro dos
pafla-portes. No terreiro da Igreja fes alto j Sc logo rezenha
o ^ue fai cm S. da gente, que tinha, & achou , que de mil & quinhentos fol-
Lounnpde Jfo- dados, com que entrou nos combates das Tabocas , perdera
jucá. mil & cem, com a flor dos oííicíaes da guerra, que o acompa-

nharão . Errou o Author do Valerofo Luzideno as partidas, jpygy ^
& a foma defta conta, fella por relação taó deminuta , como Calkào
em o feu livro fe pode ver . Da perda fes Henrique Hus mo- ^6.
tivo para a períidia. Pagou aos triftes moradores o agafalho,
.& benevolência, com que o receberão, entregando a povoa-
ção, & os contornos ao faço dos feu s , que osfoldados, Ju-
deos, & índios, executarão não como homens , fe náo como
^ feras: Tudo, o que podia fervir a' cobiça , & à vingança , def-

truio o ódio, & o roubo: A crueldade venceo as oppoíiçoés
da natureza , & da rezáo , achando nos motivos da compai-
xão, os incentivos da ira. Proteftáraó de brutos na demafia,
com que a torpeza offend^a a modeftiai&na injuria com que
atorpellava a renitência : Contra o mais fagrado , fe irritava
mais feu odioj & contra o mais religiofo, feu poder. Deftrui-
. ra5,& contaminarão os Téplos: f izerão em pedaços as San-
itas Imagens. Ao Padre João Dias,Sacerdote de noventa ân-
uos , feriraó [^ fem duvida, fó pello ferj a golpes, & afrontas;
fua virtude foy para os depravados Herejes feu mayor delic-
to^Sc feu dinheiro feu mayor verdugo : Pendurado de hum
braço acabara a v ida, fe a não remira a pezo de ouro . Naó fe
eftendeo a mais a crueldade, porque todos , os que ppdèraõ,
anticipáraó a fuga, ao agravo.

%^ Pella tarde mandou Henrique Hus continuar amar-

, cha: Fes alto na Várzea , & fe alojou no Engenho de Dona

Anna Paes,(húa legoado Arrecife) aonde a vezinhança,&a

Cr^ega. /? Vav^eâ^ fortificação o perfuadio feguro. Ao outro dia partio aforra-

T-nienho de Do- ^^i ^ Ycr-fe com OS do Suprcmo ConçeIho:Gonferiraó entre

na Annn Faes. i^

"n!

.164^ r -fÂ^E l LlF'Hp VL g 15

íi, o qtie mais convinha ao Eftado das couzaspfefedtestTo-
mou fe aíTcnto , no q fe devia fazer, Sc defpedido com as or-
dens,que avia de leguir,fe voltou para os íeus,no mefmo dia:
Mandou faquear o Array ai Velho,com as mefmasextroçoés,
& com toda a fede da crueldade, & da cobiça: Naõ ficou pa-
rede, telhado, nem fotaõ,quenãotenteaflem comefpetos^
fofpeytando achar riquezas enterradas , ou efcondidas. Na
Igreja do lugar com mais exorbitância , porque com raayor
indecencia. Queixàraó-fe os moradores, offendidos , de que
os trataíTem como inimigos , quando os tinha cmfuacazaa
confiança de confederados ; & fahio fua laftima defpachada
com ameaços de mayor ruina. A todos em comum , & a cada
hum em particular, dizia o tirano Hereje , que Joaó Fernan-
des Vieira lhes cortara a divida, & que v iíTem, o quanto lhe$
faltava para ajudarem a paga. Em toda a parte creceo nos
Portuguezes o temor da crueldade , porque em toda a parte
creceo nos Olandefes o defejo da vingança ; fendo fuás de^
maíiaSjasquelhesordirãoocaftigodefeusexceíTos. r

39 C^iz o inimigo ,que o exemplo deífe forças á cruel- |

dade, & no Engenho de Francifco Monteyro Bezerra execu-
tou inauditos defaforos, fer vindo feus paíía-portes de entre-
gar os miferaveis alliados nas mãos da atrocidade, & da crue-
za: x\ fenhores, & efcravos media a crueldade por hum mef-
mo tamanho; com hum mefmo fio cortava o ferro , & a inju-
ria pella Matrona, & pellaDonzella.A Dona Brazia mulher
do Capitão Pedro Cavalcanti de Albuquerque,& a fua Máy
Maria Peíroa,arraftára5 como a v is efcravas, porque defpre- ^ ^

zando a perda da fazenda, não confentirão , nem amdana ff^^^Zm^Yar-^
mais leve mancha da honra.(Muyta ganha na injuria,quem a -^^^^ ^
fofre atroco de confervar fua limpeza.) A poucos efcuzou a
diabólica perfidia da efpada,& da afrOnta,& aos que perdoa-
va fua cólera, guardava para mayor caftigo fua malicia. Tif
nha determinado entregar a todos a mayores tormentos. De-
cretara feu defatinado confelho) que aquelle Framengo cha-
mado Jacobo (jà diíTemos que vivia entre os íal vagens , eníl-
nado a fer cruel da companhia das feras ^ ao qual experimen-
tarão os moradores de Cunhau mais Tigre, que os Tigres)
deixaíTe o certáo, & deceíTe dos montes com todos os índios

Dd de

M'!

■M

de feu partido a còírer a campanha do riò de Saõ Francifco,
aonde o éfperavão cento, & íeííenta Olanderes com ordem.
Bárbaro decreto, ^^^ ^ nenhum V iveiitè éícuraíTe a erpada,& a nenhõa matéria
que ma a fi4 í- ^ incêndio, & fem perdoar ao eílrago , decefícm por Goy a-
na até á Varzea,aonde o efperava Henrique Hus [_ no Enge-
nho de Dona Anna Paes] para entregarem ao ferro,& ao fo-
go tudo, o que pello contorno tiveíTe corpo , & vida. Horrí-
vel fora o eftrago, fe a divina Omnipotência o não atalhara,
confundindo a malicia com íètí meíhio decreto . Os morado-
res ignorantes do mandato, Sc âvi:^ados dos e xceíTos, defem-
* paráraõ os povoados, feguros, de que nos montes acharião o
perigo menos certo. Sahira-lhe o difcuríb errado,íe a mão de
Deos os não íbcorrèra,fazendo da ruina,tfaníito para o mais
faudavel remédio, como hirá mofttando a hiftona.

4^ Oeistámoá ao Governador Joaõ Fernandes Vieira
no fitio das Tabocas, aonde íè deu a batalha, dando , & recc-r
bendo as congratulações da viâ:oria; daqui por diante o ve-
remosf facrificado hum)& outro hombro ao pezo do Gover-
no) entrar em tanto may or cuidado, quanto mais fe eftendia
chega aò Gover- fuâ obrigação. Não achava em íi todo o gofto do triumpho,
naàor âaliberàa- cmquantoosmoradotes aufentes não gozavão de toda ah-
âe a nova do fo- t^erdade, participando de fuamefma fortuna . Tinhaómuy-

ra emTamanda' 9 & ^ %,' \- r n • ^i •

y}^ que ate então os nao poderá hvraro locorro,peila impouibi-

lidade do tempo, & da diftancia j fendo que algúas otinhão
pedido; (eraó Iguaracu,& Goyàna, as que mais inftavão ) &
deliberou -fe em as favorecer a todo o riícoí Com efta refolu-
çaó entre mãos, 1 he chegou nova, como os Meftres de Cam-
po André Vida! de Negreiros, & Martim Soares Moreno ti^
nhaõ tomado terra em Tamandarc, com oy to centos Infan-
tes, [man-dados da Bahia pelío Governador do Eftado , para
favorecerem a mais jufta cauza. j Cada hora efperava pellos
'Deliherafeemfi. Governadores de índios ^ & Minas Henrique Dias, & Dom
correr alguasf O' Antônio Phelipc Camarão,certo,que avia deter por fi o au-
maçoes. xilio,pois lho concedia a rezão,&: o dereito. Fiado neftas es-

peranças fe determinou em mandar logo o íbcorro pedido a
Iguaraçia, & a Goyana. Entende-o hum emulo inconfidente,
& met€0 valias a João Fernandes Vieira,para que o nomeaf-

fe

fe Cabo deíla expedição. (Vivia acofado de fua niefma coh-
ciência á vifta do oíFendido , & fempre confiizo , como reo.
Além, de que arraftado da enveja , não podia ver , o que cre-
cía a cauza da emuIaçaõ.)Concedeo-lhe o Governador a jor*
nada, & o pofto, fazendo confiança do traydor, para o redii-
íir a fiel j& porque afaftando de íi ao falfo,o não fizeíTe algúa
occazião verdadeiro :Entregou-lhe cento &cincoenta ho-
mensjcom ordem, que íe encorporaííè com a gente da terra^
para melhor le defender do inimigo j & o defpedio ( alguns
dias adiante) do Engenho de Gorjau,aonde entã o fe alojava
a noíTa gente . Chegou o dito Cabo á Villa de Iguaracíi , cu-*^
^os moradores achou cxpoftos ao dano , com que os ameaça-
va a v ezinhança da Ilha de Itamaracá ; rezão , que o deteve
naquelle lugar algum tempojdefpois do qual fe paíTou a Go^
yana, aonde húa pontada lhe tirou a vida , porque morreíTe
da malignidade , de que a trayção fe alimentava em Cca pey-
to.SucçeíTo, que adiantamos ao tempo , por não deixarmos
a ponta defte fio fem nó.

41 Tinha fahido da Bahia Salvador Corrêa de Sá por
General de hvia frota de trinta & fete navios mercantes , que
fazia viagem para oReyno, & em fua conferva mandara o ^"^^^ ^^ ^^^^^

Governador do Eftado AntonioTelles da Syl va dous terços fj'^fllj^''''.^
de Infantaria [ feus Meftres de Campo André Vidal de Ne- /^l llfr ^^^^
greiros, & Martim Soares Moreno] em oyto embarcações, &
por Cabo delias a Jeronymo Serraó de Payva ( homem vale-
rofo, & pratico no exercicio militar , de Mar , & Terra) em
fatisfaçaó da promeíTa , que fizera aos Embaixadores do go*
verno 01andès,com ordem, que na altura de Tamandarè.tot»
maííemefteporto,&nelle, verdadeira informação das. cau-
2as da folevaçaõ dos naturaesj & fenão foífem juílas, os caífi-
gallèm como a rebeldes, SícompofeíTem ascouzas de forte,
que fica ífe a terra em paz: Porém íe entendeíTem, que de tira*
nifados, & perfeguídos da fem rezão, & infolencia do domi^
nio Olandès, tomáraõ as armas ( como fe dizia ) em defenfa
de fuás vidas, honras, & fazendas, os favoreceííem, & ajudaf»
lèm, como eraõ obrigados por ley natural, & divina . Nave-
gou Salvador Correa"até aquella altura j deixou a Jeronymo ^^f^ofocorron&
Serraó de Payva com os oyto navios no porto de Tanoanda-^'^^^' ' ^'''^^'*'^'
■ -C Dd2 ■ ré, "

j4cclama'f°e ali
herdade em Si-
rinhaem,

r.

lono deAlhuquer
que pede focorVo
aos Meftres de
Campo , que ti'
nhao njindo da
Bahia.

^16 C^ST^TOTOLVSITJKO ^^^45

rè, & continuou a viagem do Reyno,tomando alguns refreí?
cos no Arrecife, como adiante fe dirá. Jeronymo Serraó dei*
tou a gente de guerra em Tamandarè, & com a do mar íe deit^
xou ficar nas embarcaçoens, debaixo daquelle feguro,.que
lhe prometia a fé do contrato referido . Tinha íuecedido
divulgar-fe na Villa deSirinhaem o levantamento de João
Fernandes Vieira com a voz da hberdade , & temendo o
Glandes a imitação, á vifta do exemplo, mandara deitar
bando , que todos os Portuguezes daquelle deftrido em ter*
mo de trez dias naturaes levaíTcm á Fortaleza todas as atr
mas oíFenfivas, &: defeníivas , que tiveíTem , fobpena de mor-r
te irrcmiffivel . O exceíTo do medo,amuytos, náo deixou
confiderar o dano ; & promptos na obediência, foraó entre*
gando todas as armas, que tinhaõ, fem refervarem, nem ain-
da os inftromentos da roça,& da meza. Vivia na povoação hii
Joaó de Albuquerque (homem de bem, zeJozo, & valente,)
8c vendo como os affliftos moradores fe degolavão ( fabia, q .
os Olandefes os queriáo defarmados , para os matar indefen-
fos)declarou a todos o fim do bando, & os perfuadio ao re-
paro.Fes hú agregado de 49ymancebos,&: com elles fe adian*
tou a tomar ás armas a todos os vezinhos , para que as não
entregaíTem a feus verdugosiCó a mefma deliberação meteò
apique trez barcos,queo inimigo tinha carregados de diver^
fos generos,para o Arrecife;& apelidando liberdade fes todo
o mâl,que pode aos Olandefes. A outra pefloa,& com outro Frey .
nome, atribue hum Efcriptor efta facçaó , ou efquecido , ou ^^^'^/
enganado j opinião que reprovamós,porque efcre vemos por ^•^"
relação de vifta,& de Authoridade.

4íi Nefie tempo chegou a Sirinhaem a nova da gen-
te, que tomara terra em Tamandarè : Alvoraçado Joaõ
de Albuquerque, com a efperança do focorro, avaliou por
milagrofa a opportunidade do auxilio :Sahio ao encontro
da noíFa gente , falou com os Meftres de Campo , & da
parte de Deos, & delRey lhe requereo os libertaíTem da
oppreíraõ,& agonia em que eftavão , de novo condenados
á morte pella tirania Olandefaf pedio, que favoreceíícm aos
moradores, que com pequena ajuda fe lhes entregaria a For-
taleza,q naquelle lugar tinha a inimigo defapercebida, porq

-'■'■■ defcui-

rf

I ^45 fJ^TE 1, LIV^O VL 3 1 7

defcuidado de femelhante intento (certo, de que fem refiftê-
cia a largaria: ) O mefino requirimcnto fizeraó os mo4*ado-
res, que a violência contraria traria defrerrados pellas matas:
Era juftificada a petição, & muy to conformes,ao requirimêr
to as ordens, que trazião, pello que fem detença marcharão
para a Fortaleza os Capitães Paulo da Cunha, & Chrifto-
vão de Barros , com fuás companhias,com promeíTa dos Mefi
três de Capo , que os íeguiriaó com os feus terços.Unidos os
foldados com os moradores cercarão a Fortaleza ao largo^to-? ^
mára5-Ihe a âgoa, & com ella as portas, a todas fuás efperan-
çasi& logo o Capitão Paulo da Cunha mandou hum Bola-;
tim, que diíTeíTe da fua parte aos Cercados , que o Governa- ccm elk cerca. &
dor Geral António Telles da Sylva^os enviara aquella Q^i^i- Fortaleza do ini'
tanía,emordemafocegar aos moradores^ porhumdedous ^^^^^
meyosi ou caíligando, aos que fe avião levantado , fe o tiveí^
íèm feit o fem jufta cauza 3 ou favorecendo-os , fe o domínio
Olandès lha ou veíTe dado,íem legitimos fundamentosj&que
examinados huns, & outros procedimentos, tinhão alcança??
do, que elles dominantes trata vão aos moradores, não como
aVaírallos,fenãocomo a cativos j pois temerofos de fuás
erueldades,roubos, & injuftiças fe condenavão a viver entre
as feras dos matos, por fogirem a tirania de íeu império j & q
como a indignos de ferem obedecidos , os querião lançar de
fuás terras, pello que fem dilação entregafíèm aquella Forta-
leza a bom partido, quando não a tomariáo a efcala,fem dei-,
xarempeíToa com vida. *

43 Tomou efta embaixada ao Framengo,falto de tudà
o que lhe podia fervir á confervação , & á defenfa: Coníide-
íou o perigo certo, o focorro contingente; & fe entregou cõ
honrrofas condiçoés,que pontualmente fe lhe guardáraó.Sa-
hiraó da Fortaleza feíTenta & dous Olandefes rendidos , &
quarenta & nove índios; eftes foraõ condenados á forca,pel-
lo Auditor Geral Francifco Bravo , cuja fentença fe execu-
tou [foy o lugar do crime, o que fervio ao fuplicio ] a todos
colgàraó pellos muros da fortificação. A fuás mulheres,& fi-
lhos repartirão pella povoação, não como efcravos , fenaã
por modo de adminiftração.Para efta facção concorreo com
valor, & zelo hum nobre morador chamado Hypolito Alon-

Dd3 fa

Apàife rende
afurtído.

!

5í8 CÀsr(^orõ LvsiTjno

fo de Verçofa eftrangeiro por nacimento mas natural por af-;.
fe6toí A efta entrega, aflíftiraó os dous Meftres de Campo,
Sentenceaâos os (^chegarão defpois de capitulada ,& rendida a Fortaleza) &
mdíos, â forca, ^^^^ Capitão delia , & da gente da terra, nomearão a Alvará
Fragozo de Albuquerque, digno de toda aconfiança; &a
Francifco de la Trouz, Francês de naçáo,& cazado com mu-
lher Portugueza,fizeraó Capitão dos Eftrangeiros rendidos,
Caffentàraó praça osmais delles)oqual,porfatisfazer alua
obrigaçaó,deixou caza, mulher, & filhos , & feguio a marcha
dos noíFoSjque o Meftre de Campo André Vidal de Negrei-
ros encaminhou , para onde eftava João Fernandes Vieira:
Martim Soares Moreno,com o feu terço,& com mais fleima,
tomou o caminho de Nazareth ,& Cabo de Saneio Agofti"
nho. Hum,& outro alegres com a nova , que nefte íitio rece-;
béraõ, da V i£i:oria das Tabocas.

44. Sete dias deu Joaõ Fernandes Vieira ao enterro dos
mortosj&cura dos feridos, defpois da batalha, & também ao
defcanço dos íèus; no ultimo lhe chegou a nova dofocorro,
que a favor dos oprimidos moradores mandava da Bahia o
Marcha loaoFer Governador do Eftado •& que os Meftres de Campo v inhaã
mndes Fteira a ^^ ç^^ demanda. Logo fe difpos (não menos cortezão, que
^ImdeCarnpo!' Valente) a fahir-lhcs ao encontro j &a outro dia a paíTo len-
to,[por comodidade dos foldados, & defcomod idade do ter-
reno '] chegou aó Engenho de Balthezar Gonçalves More-
no: No dia feguinte ao lugar de Gorjaii, & fealo^ou no En-
genho de António Nunes Ximenes. (Daqui defpedio a An-
Tiefpede focorro tOíiio Cavalcanti com O focorro, que mandava aos morado-
fará Goyana^ & res de Goyana, Si de íguaracú. ) Nefta marcha fe defencon^?»
chega-lh& o de tj-àraó, O Governador da liberdade, & os de Minas,& índios,
^^'''^^^^; Dom António Phelipe Camarão ,& Henrique Dias, que á
noí^ , çiue ejj) a j.^^^j^^ ^ bufcavão,(chamados do brado da vifloriaj para lhe

darem a congratulação delia, deixando alguas jornadas atraz
os feus terços, com aquella gente menos,que a fome,& o frio
lhes confumio na dilatada marcha. Das Tabocas , aonde não
acháraó ao Governador,o vieraó feguindo até o alojamento
de Gorjaii.Com alegres parabês fe receberão, divídos a che-
gada, & a vi6ioria, celebrando o logro da efperança,& da vé-
tura, em que todos fe viaõ, que fazião maj/or , os meyos por

i i. j. onde

té45 ^rJí(r£r.Lip%ori.^ gip

onde fe alcançára;& porque á converfaçaõ não faltáíTe nada^
para fabroza, a fes a fortuna breve, por chegar avizoajoaõ
Fernandes Vieira, em como na povoação de Sando António •
do Cabo fe alojavão cento, & oy tenta Olandefes ( feu Cabo
Gafpar Vandreley, foldado de opinião) em guarnição de hu :^-

reduto, que llies fervia de agafalíio,& de defenfa.No mefmo -
ponto mandou o Governador da liberdade marchar ©exer-
cito a pafíb largo, defejofo de tomar ás^mãos os Olandefes:.
Medio-fe a preíTa pella diftancia, & ao romper da ai va , fe vi-
rão os noííbs fobre a povoação , diligencia , a que a trayção ^ ^£^^ ; ''^'^^
privou do fruito, por hum avÍ2o, que fez ao inimigo , adian- ^^ fa^ alto.
tando-lhe o remédio ao dano; que de todo efcuzou com a li-
geireza, comquefe valeo da íua fortificação deNazareth:
Seguio-lhes o trilho o Capitão Domingos Fagúdes,& fó en-:
çontrou hú cavallo, & cincoenta cabeças de gado, que o ini-
migo deixara, ou por ardil, ou por embaraço ; porém no re-
duto, que defemparou , achàraó os noíTos foldados tudo aí-
quillo, que cuftuma efquecer ao deíatino , que cauza , a evi-
dencia do perigo.

415 Com o difabor de lhe fogir á caça,mãdou JoaÔ Fer-
nandes Vieira fazer alto naquelle lugar , aonde teve novas, â
que os Meftres de Campo André Vidal de Negreiros,&Mar- ,
tim Soares Moreno, cõ a gente de feus terços, & muy tos dos
moradores da terra. [ Já todos , os que recufavão obedecer á ,
peíroa,obedeciaó á fortuna doGovernador3Tinhaó,os ditos ;

Meftres de Cãpo,chegado a Ipoiucá , & eftavao có determi- f ^""^^^ f""' ^'

11 r " T - T- - 1 T r- < 1 n • f^"^ Vindas aos

nação de buícare a João rernades Vieira em qualquer íitio, jidefiresde cam-

em q fe alojaíTe.-Defie de San£i:o Antonio,lhe efcreveo Joaó^<? André ndaly

Fernandes Vieira o exceffivo gofto, com que eftava,de faber & Martim Soa

que os tinha tão vezinhos,(avia entre as duas povoações trez

kgoas de diftancia ) fem lhe alterarem o alvoroço , com que

logo os hia bufcar, as praticas, que ouvia,acerca do fim a que

yinhaò; porque íàbia de certo fcr o que os trazia , focegar a

terra,favorecer opprimidos,&deftruir tiranosj& que fe hum

mefmo fim os unia nas tenções , nenhúa couza os poderia

ieparar nos alojamentos; q elle fe ficava difpondo , para lhes .

hir dar os parabéns da vinda; & oíFerecer a feu ferviço a pef-

íoa, ainda que a muy tos parecelTe a obrigação, encontro. Le-

: _ Dd4 raõ

res.

3^0 C^ST^IOTO LUSITJKO ^^45

raõ os Mcílres de Campo a carta do Governador , & vendo
por ella, que a força da cortezia dominava a da íu periorida-
de, le devidiraó. Martim Soares Moreno ficou no íítio , que
chamão Algodoaes ( húa legoa do Pontal de Nazaretlt ; ) &
De/cuido doAu' André Vidal marchou ao lugar, aonde íè alojava o Governa-
^L^^d ^^^'^^"^^ dor Joaó Fernandes Vieira. Aqui cometeo outro defcuido o
Author do Valerofo Luzideno.Náo fe perfuadia fua rcligio^
fa íingileza , que poderia fobornar a vaidade, como foborna
a ambiçaó,fendo que não he menos cega a da honra,que a da
fazenda. Efcreveo, que neftas primeiras viílas bufcáraó os
dous Meftres de Campo a Joaó Fernandes Vieira , como re^
fere na pagina 217. col.i. §.i. & na pagina 236. col. v.%,i. Frey Mi
diz o que temos referido. As occupaçoés do púlpito o diver- C/í/i'.
tiraó da legalidade da hiftoria.

46 Aviitaraó-fe os dous Cabos (poftosfeusfoldados em

ala, & prefente innumeravel multidão de povo de toda a có-

diçáo , fexo, & idade, que no amparo de noíTas armas vido-

riofasjbufcaváo o feguro da crueldade inimiga,tanto mais fe*

Os ^uaes Ihefa- ^-^^^^ quanto mais irritada J Chegarão á falia , & diíTe André

em ao encontro, y-^^| ^^ Negreiros, en voz, que todos podiaó perceber . O

C^ comofe recC'
bem.

»

55

5?

5)
33

Governador Gèral do Eftado António Telles da Sylvame
manda prender a voíTa mercè,por queixas, que lhe tem feito
os Governadores do Arrecife^& calligar as cabeças da rebe-
riáo,que tem amotinado efte povo. Ao que refpondeo Joaó
Fernandes Vieira: O Governado Gèral do Eftado affi como
,, ouvio a voz da queixa , he força , que ouviíTe o grito da op-^
„ preíTaó. Eu fey, que V.M, traz as ordens condicionaes, para
3, as executar pellos mericimentos das partes,& dar a cada hum
3, o caftigo , ou o favor merecidoi& também íèy, que chega V.
5, M. a tempo, em que vè com feus olhos a miferavel efcravi-
„ dáo, em que a fortuna tem pofta efta Capitania, cujos mo-
3, radores deígarrados , & affli£i:os andáo defterrados de fuasr
j, próprias cazas,& fazendas pellos matos de fua mefma pátria,
^, trazidos de fua miferia,abufcar o favor de noííb zelo, que
3, fem reparar no rifco, íè arroja a libertallos da tirania , que os
„ fogeita a padecer tribulaçoés,que não pode referir a dor^ &
„ injurias,que não fabe relatar o pejo,& fó fe deixão entender,
j, com a certeza^de que na companhia das feras fe m€lhoraó,da

que

5>

55

que lhes fazem os homens ; & fe nefte cazo a juftiça não ex- '>
plicar o preceito, não achará V. M. o da obediência , antes 5)
provocará contra íi o defacato, livre da culpa , de que abfol- 5)
ve a todos a natural defenfa, permitindo aos mortaes todos ?)
os nieyos para a cófervação da vida,& da honra. Ao eco def-
tas palavras fe feguio hum tumultuoíb grito de foldados , &
moradores j o qual focegado, tomou a mão hum dos foldados
de André Vidal, que em nome dos que vinhaó da Bahia fal-
tou nefta forma: A injufta guerra , com que o pérfido Olan
dès, há tantos annos, tiraniza efta Capitania , nos traz a to
dos defterrados de noífas cazas , a huns, porque fogem ao a» „
gravo, a outros,porquehufcão a vingança^& a todos,porque „
a todos cobre o luto de parentes, amigos,& naturaes,mortos „
pella crueldade Framenga, que com laftimofa memoria , nos „
eftá falando ao coração todas as horas, chamando-nos para o „
defagravo: Temos a occazião na mão , ©exemplo ávifta, a „
fortuna de noífa parte j & a cenlura certa , fe não feguiremos „
a perfuaçaó,quando nos eftimula a piedade,& a enveja,como „
patrícios, & como Portuguezes^ & aííi queremos offerecer as „
V idas por ferviço de Deos,& bem de noíTos naturaes j& fe ai- „
^ú não for defte parecer podeíTe voltar para a Bahia. O Mef-
tre de Campo, que entendeo a ^ufta de liberação de feus fol-
dados, cortéz,& difcreto fe pos d^ parte da rezão,dizendo, q ,
bem fabia, pella experiência de muytos annos , até onde che-
gava o fofrimento dos moradores , & a infolencia dos eftran-
geiros; & húa vez, que na renitência de feus foldados tinha a
efcuza, de não executar as ordens de feu íuperior, elle o dei-
xava de fer, & ficava no andar de cada hum delles,obrigado a
feguir feu intento, com o gofto de militar debaixo da badei-
radehum Governadortaõvalerofo, & taó amigo como o
era elle Joaó Fernandes Vieira , a cujas ordens ficava lubor-
dinado . Deraó-fe os braços; fizeraõ'fe todos em hum corpo,
unidos no efquadraõ , & no animo , com plauílveis vivas de
todos os prefentes.

47 Camaradas huns de outros, íè alojarão os foldados;
& dal li pordiante o ficou fendo André Vidal do Governador
Joaó Fernandes Vieira. Conferirão o eftado dascouzas,&
afíbntáraõ , o que então pareceo mais fervido de Deos, do

Rcyno,

9^2

CJST^IOTO LUSITMO

i^X'^

Mojao-p confor-
meSy& amigos.

Mdnâto focorro
ao Mcfire de Cã'
fo Martim Soa-
res^que cercava a
Fortaleza de Na-
^areík

Jidandao Gover-
nador marchar o
exercito fora a
Moribcca.

"Edeíie Im ar pa-
ra o Rio de ligt'

no.

Reyno, &mayor conveniência dos moradores : A primeira^
em que íe pos amão,foy em mandar húa partida de loldados,
com Cabos eícolhidos, ás ordens do Capitáo Amador de A-
raiip,a dar principio ao cerco da Fortaleza do Pontal de Na-
2areth , (emprefa determinada , primeiro pella negoceaçaõ^
que pella força) que naquellaoccazião adiantava a copioía
multidão de moradores eftrangeiros , que a ella íe tinhaó re^f
colhido5& ferviria o íirio,de refrear o atrevimento, com que
fahiaõ a roubar;& de aumentar aefperança da Fortaleza fa
render, já íitiada ao largo, pellos moradoreSjaíTulidos da ma-
yor parte dos foldados do terço de Martim Soares Moreno;
o qual eníinado de fua gente [mais prompta para a vingança^
que para a obediécia] fe acomodou com a rezão de fua juíti-í
ça^& feguindo o que não podia encontrar,fes fabedor a Joa5
Fernandes Vieira, em como eftava fogeito a fuás ordens, em
tudo,o que delle,& do feu terço quizeffe difporj& que neil:a
forma fe hia encorpofar com o grojGfo da gente, que íitiava a
Fortaleza de Nazareth.

48 O Governador da liberdade mãdou marchar o e"5Cer-»
cito para a povoação da Moribeca, levando a fua gente a vã-
guarda; & a retaguarda, a do Meítre de Campo André Vi-
dal. Nefta forma chegarão á povoaçaó,cm dezaf^is de Agof-
to.Queria o Governador cpn tinuar a marcha,fem fazer alto;
porémoMeftre de Campo lhe advertio a grande moleítia
dos foldados, & dos moradores, que osacompanhavão com
fuás familias, enfadados da mundaçaó das agoas , rios, & la^
maçais dos caminhos, que tinháo andado com infoportavei
trabalho j& que feria impiedade não tomarem algum defcan-í
fo, & refeyção naquelle fitio. Obedeceo o defejo á rezãoj &
alentados todos com algum fuftento , & fono, & novo fervor
dos efpiritos, paíladas algúas horas , fe levantarão daquelle
lugar, fegumdo o caminho do Rio Tygipió,aonde chegàraá
pellas feis horas da tarde, o Meftre de Campo na vanguarda,
& na retaguarda o Governador , que fem dar lugar, a que o
exercito arrimaffe as armas, &iè alojaífe , mandou tomar , c5
gente de guarda, todas as eftradas, & veredas, que fahiaó da-
quelle líitio, para cortar a diligencia dos tray dores . & a noti-
cia^que por avizo feu podia ter o iiiimigojdo noííb alojamen-
to r

ai^w..

i545 fJ^TB 1. LIV^O VI. 325

to: (Occupava efte grande diftancia de terra, pella multidão
de gente, affi Portugnezes como índios, & Efcravos , que fu-
gindo á efpada Olandefa deixavão as povoações defertas, fa-
zendo parecer os defertos povoações , nefte tempo com ma-
yor concurfo, porque com mayor cauza.)

49 O General das armas Olandefas Henrique Hus, que
deixamos aquartellado no Engenho de Dona Anna Pae3,em
execução das ordens , que tinha recebido dos do Governo,
ffiandou,nefte mefmo dia dezaíeis de Agofto, ao íèu Sargen-
to Mayor Toaó Blar,que com duas companhias de Framen- ^^'^^f^'* f ^^^*.'
gos,& alguas de Índios deíle íobre as moradas da Varzea,lem - ^^ ^^^^_J ^^
deixar couza, que não regiftaíTe, & nellas prendefíem todãs ff^^lheres da Far^
as mulheres daquelles homens nobres , q feguião a Joaõ Fer- :^ea.

nandes Vieira; não fò em ordem á vingança , fenão também
á conveniência: Incertos os Olandefes do fucçefíb , tratavão
de fe prevenir, para todo o cazo, & parecia-lhes,que com te-
rem em feu poder penhores de tanta eftima^ podcriaó remir,
em todo o tempo, o eftado de feu mayor infortúnio^ & fahír
com ventajofos partidos, de feusmay ores apertos. Prendeo
Joaó Blar a Dona Antónia Bezerra mulher de Francifco Be-
renguer de Andrada; a Dona Izabel de Góes mulher de An-
tónio Bezerra^a Luiza deOly veira mulher de Amaro Lopes,
cuja nobreza dava privilegies de cputo a cada hua de fuás ca-
2as,porém delias as tirou a violência , para ascazas de Dona
Anna Paes, aonde fedepoíitàraõ, para fé levarem ao Arreci-
fe. A Dona Maria Cezar,efpofa do Governador Joaô Fer- ,,
nandes Vieira,primeiro fim defta diligencia,rião pode defcu-
brir o inimigo, porque mayòr cuidado a tinha efcondida, & Em ^uaes^é^quã'
retirada em hú bofque, occulto atoda a noticia,com húa mu- tasfe executou a
lata de feu ferviço , fiado feu fuftento a cautela de hum fiel ordem.
criado do Governador, fempre bem aíFortunado ^ porque
fempre prevenido.

50 Feitas as ditas prifoês,& faqueadas todas as cazas dos
moradoresjfe voltou Joaó Blar para o feu General das armas,
fobre a tarde, & de caminho difíe a alguns Portuguezes , que
vio na Igreja Matrizda Vai*zea,quefizeírem avizo aos aufen-?
tes (eraõ quafi todos os vezinhos daquelle deftri6l:o ) que íi
o outro dia eíti veíTem juntos naquelle lugar jpa ra a cóferen-

cia

324 C^ST^lIOTO LUSITANO 1645

cia de hum negocio a todos ntil,& aos Eftados decorozo , &
que fe os chamados faltaíTem a fua obrigação, íicariáo fogei-
tos á pena de tray doresj & todas as peíToas de íuas familias , á
de comphces no delido- Efie era o pretexto, mas o deíep
era de os paffar a todos á efpada. Acertou de íe achar preíen-
te hum morador chamado João Landes intelHgente nalin-
r poa Framenpa, do qual o Olandès fe não guardou,& ouvio a
Zl:Z:Jot hum Capitão, que diíTe aos foldados de fua companhia: Ma-
doresá efpada. tay a eíTe traydorj o que atalhou o Sargéto Mayor João Blar
com eftas palavras: Tá, não o matem; porque não íervirá de
mais fua morte, que de cfpantar a caça,& não poderemos co-
lher os outros j a manhã fará companhia aos demais . A todos
fervio de avizo, a intelligencia do propofito , de que na cer-
teza, fe fundava a fofpeyta. Confirmou a fentença hum Olá-
dès Catholico, revelando a todos , que no dia feguinte [por
decreto do Concelho Supremo] avia de fahir o inimigo em
duas partidas, para que hua pella Villa de Olinda, outra pel-
la Várzea, ao mefmo tempo,degolaílem as mulheres,& filhas
de todos. Livrou-os Deos defemelhante perigo,porque avi-.
zados delle, fe embofcáraô pellos matos , com fuás famílias,
deixando de fuás cazas fó as paredes: Só eífas lhe tinha deixa-
» do o inimigo. 7ÍO.>

15 1 AíTifiia na Várzea o Licenciado Matheus de Sou-
za Uchoa Ca peIlão,que então era do Governador João Fer-
nandes Vieira: Soube, que com feu exercito tinha chegado
Detudoteveavi^ ^^ ^'"^ Tigipió,& pella poíta, em companhia de João Alva-
;co o Go'vernador tes da Guarda, lhe vey o dar avizo de tudo, o que temos rete^
da liberdade. rido^Sc que particularmente fabia,que o Olandès, na feguui-
te manhã,determinava por em feguro a prefa,aíri das peíToas,
como das fazendas,que tinha roubado, conduzindo tudo pa-
ra o Arrecife:Ou vidas eftas novas, não deu o Governador ao
difcurfo o tempo,que era neceífario para o remédio; publi-
cou o avizo, advertio o aperto da neceíridade,& a convenié-
cia da prefíeza. Hum fó f oy em todos, o defejo do focorro,&
da vingança. Tocou-fe arma , receberão -fe as ordens , for-
mou-íe a gente, marchou o exercito, com aquelle paíío, que
a todos acófelhava o perigo , que cada hora avezinhava mais,
o tempo;tomoii o Governador a vanguardaj&: o Meftre de

Campo

Lt

i64? ^J^TELLir^O Fl. I25

Gampo com a gente da Bahía,o feguio na retaguarda. Àdian-
tavão-fe, como defcubridores do Campo, os Capitães Ra-
liios, & Fagundes, os quaes vencida húa parte do caminho,
derão com duas fintinellas, q o inimigo tinha deitado ao lar- ^^ p^^fic^^^nf'
go: Tomadas ás mãos confeflaráo , o que fabião , & pagarão cxaac^ ^^ ^
com a V ida o exercicio, em que andaváo. Paííárão avante, &
fizerão paufa á vifta do Engenho de Pedro da Cunha de An-
drada,detidos do rumor,que faziaó aigúas mangas de Framé-
gos, (eípargidos fe engolfavão em roubar os moradores da-
quelle deíl:ri6i:o , fem que os alteraíTe receo algum das noíTavS
armas.) Nefte engano os confirmarão os noíTos Capitães,que
fem movimento efperáraõ, que com a prefa, fe foífem para o
alojamento dos feus, antevendo , que fe deíTem fobre eJles,
poderia efcapar algum, cujo rebate levantaria ao Olandès do
íitio de Dona Anna Paes5& fogido para o Arrecife, nos dei-
xaria a dor denãoremirosprefos, & de não cobrar osroU'
bos.

52 A a meya noite acabou de chegar toda a noíTa gente
áquelle íitio, moleftadiffima do efcuro, das chuvas, dos lama- pax alto no Eme-
pis,&daafpereza dos caminhos . Mandou-fe fazer alto nonho de Fedro^da
fobre- dito Engenho,& tomadas trez horas de defcanfo,fe c5- Cunha.^
tinuou a marcha, na mefma forma, & ordem, que atè alíi tra-
zia. Chegarão os batedores ao Engenho chamado do Meyo,
(hum, dos que o Governador pofluia na Varzea)ouvirão ru-
mor de gente, entrarão a examinar a cauza , derão com féis
01andefes,& trez Indios,que ándavâo roubando; facilmente
largarão as prefas com as vidasj fucccdendo o meírno a dous
Indi os,& hum Framengo, que no Engenho de San61:o Antó-
nio fe occupavão no mefmo exercicio, fe não,que o Olandès
na refiftencia , multiplicou o numero ás feridas j Sc hum dos
índios, teve lugar para fogir. Rompia no Orizonte a primei-
ra luz da manhã, quando a noíTa vanguarda chegava ás mar-
gens do Rio Capeberibe, tão crecido , com a inundação das P^poRio Cape*
agoas, que por todas as partes negava vao á paífagem^Sc por ^y^' í ^'^1^^
nenhúa fe defcubria barco, canoa, ou jangada, em que fe po-'^^-'^ ^^'^'''-
de{k paíTar a outra banda. Acendia-fe no difcurfo de todos,o
defejo da preíTa, com o eftorvo da marcha j fazendo mais fen-
fivel a detenp , a vezinhanga do alojamento contrario , já

Ee quaíi

iil!!

^26 C^ST^IOTO LUSITJNO 1^45

qnaíi á vifta. O Governador João Fernandes Vieira,que vio
afufpençaói com o animo de Alexandre determinou cortar
o empedimento,que não podia vencenSeguindo a hum Mu-
lato feu, grande nadador, apertou as pernas ao cavallo, avan-
çou ao Rio,& com a agoapello arção da fella, paííbu a outra
banda: Foy taõ poderoíb feu exemplo , que o imitarão Teus
foldados,Iançando-fe ao rio pegados huns de outrosjpara re-
Os feuí foldados fíftirem ao rápido de ília corrente, ( poftas as armas de fogo
o mmo. ç^^^^ ^^ cabeçasXe viraó todos,em breviffimo tempo,da ou-

tra banda. Tudo vence , quem nada teme : E tudo eíperou
vencer o Governador,advertindo difcretOjque foldados,que
venciaó elementos, pouco lhes ficava que vencer nos inimi-
gos*

£!f 9 Com nova forma,& cautela foy caminhando a no0a
gente, até que a vanguarda defcubrio, por entre as arvores,
as cazas de Dona Anna Paes , fem fer fentida : Sufpendeo o
pafíb, por ordem do Governador , que mandou a féis folda-
dos práticos, & ligeiros, que pof entre as ramas do mato fof-
fem cortar as fmtinellas do inimigo: A poucos pafíbs tomá-
Sahe, àaspnú' raó duas ás mãos, por cujo depoimento entende-o oGover-
nellas contrarias^ nador, que o Olandès eftava no terreiro das cazas , formado
o áez,enho do ini- ^^ ^^^^^ efquadroés , & paíTada ordem , que hum pella Villa
^^^'^' de Olinda, outro pella Várzea, não deixafíe couza ifenta

do fogo,& do ferroi & que os Cabos eftavão dentro das ca-
gas poftos á meza, para comerem, & marcharem, levando cõ-
figo as Matronas, que tinhão prefas. Có o mefmo recato fur-
dirão avante,& virão outras duas fmtinellas, que eftavão de-
pofta na entrada do paço do Engenho. Emparado , & cober-
to dos troncos das arvores , fe lhes foy chegando o Capitão
Francifco Ramos, até a diftancia de lhe fazer tiro,de que húa
loao cahio; a outra tocando a rebate fe pos em fogida , mas
foy cortada dos noííbs. Alterarão as refpoftas dosmoíquetes
aos que eftavão á mezaj mas vendo,que nenhúa das fíntinel-
las chegava , fe cobrarão da fufpenção,& forão continuando
com feus brindes. O Governador, que da quietação inferio
o não fer fentido, marchou com a v anguarda á fordina até a
A vifla.é ennje^ entrada do paço do Engenho, levando diante hum troço de

iuLfr í^oldados efcoKiidos (os mais delles Capitães vivos , & refor.
^ ' mados)

-f

■i à;.4'

164^ "rji^Ei. tmíiovu "§27

macios) com ordem,que dada a priraeira,& fegiinda carga Tc
enveíliíTe á efpada. Tinha mandado a Dom António Fheli-
pe Camarão, que com os índios do íea terço fe adiantaffe,
encoberto, a occiípar todos os caminhos,qne guiavão para o
Arrecife, para que nenhum Framengo podeíTe fogir.Nas pri-
meiras fileiras da vanguarda pos aos Capitães Joaõ de Albu-
querque, António Borges Uchoa, Sebaítião Ferreira , Antó-
nio Gomes Taborda,& Franciíco de Lisboa , com outros de
igual valor,& opinião;& como guias de todos , aos Ajudan-
tes Amaro Cordeiro,& Franciíco Cardozo.
. 154 Tanto que a noíTa gente fe deícobrio aos efqua-
droêsinimigos,tocáraõ arma com tambores, clarins,gritos,&
cargas, cujo efirondo fes levantar da meza aos Cabos OldiVi-jioínpc-oíaefpa^
defes com tanta turbaçáo,& defatino, que deraó por terraço da , & os cerca.
as iguarias,frafcos,copos,& tudo o mais, que as mezas tinbaó, ^^ ^'^V^ àeDo"
para fervirem á necefíidade, & ao regalo , não lhes deixando '"''^ ^^^'^ ■^*-
o repente, & o ado pegar nas armas, para a reíiAencia^cuIpá-
do-íè a fi mefmos de feu pouco receo,& vigilância. Foraõ os
liofíbs Capitães avançando os efquadroés inimigos , que íem
perderem a forma não pouparão os tiros, até que os noíTos
lhe derão primeira, & íegunda carga [ recebidas com mayor
dano,porquc com mayor emprego.^ O Governador,que tu-
do tinha d!fpoíl:o,(deixando a retaguarda ao Capitão Paulo
da Cunha , &amuytos Capitães volantes, para cnveílirem,
por onde primeiro os chamaífe a occazião , & a neceílidadey
acompanhado de Henrique Dias , com os feus foldados , hia
Ba vanguarda montado em hum fermofo ginete, & com hum
elarim diante , defembainhou a efpada , & diífe em voz alta:
Viva a Fe, & a liberdade, á efpada foldados. Naó foraó duas,
íè não htia meíina couza o preceíto,& o avanço, com de! ibe-
raçâo tão valente , que não avia armas,que o nofíb ferro não
cortaíle, nem refiftencia inimiga,que o noíTo braço não rorn-»
peííe. No mayor furor do confli6i:o,chegou o Meftre de Ca-
po André Vidal, aíTiiiido dos Capitães AíTenfo da Sylva ^ & chega 9 Meflre
António Gonçalves Tiçaò, com as fuás companhias, (a mais de campo André
gente de feu terço o naó pode feguir, detida da corrente do ^^^^^/^ reforçar
Rio, que fe naó deixou vadear J os quaes metidos na batalha ° ^^^ * ^°
cortavaõ com igual pulfo, & naó com defiguai effej to:0 ini-

Ee 2 íiiigOj

^2S c^sr^ioro wsiTAno 1645

inigo, priffieíro defcompofto das cargas, & defpois fangrada
'dos golpes, virou as coftas ao dano , buícando nas cazas do
engenho, fe não feguro, defvio; efiavào guarnecidas , & em
parte fortificadas j & lèrviaó os altos,ao reparo dos Framen-
gosi & ao de feus índios auxiliares,as paredes de húaefpaço^
ia caza térrea. "> --^ r ; • ? ' .

5 ty Unidos no paíro,deíconfornies no intento correrão
ás cazas os Contrários, feguidos dos noíTos , que logo lhes ga-
nharão húa Hermida , & hum grande cumulo de lenha, que
allí tinha junto o tempo de lançar o engenho a moer, com
Mehozo engam ç^ q^g húa, & outra gente ficava com igual reparo, íe não,
equejeva ia o ^^ contendiáo com deíiguaes armas , Sahiaõas noílàsbal-i
las de reforçados mofquetes bifcainhos, & rompiaó as pa-
tedes do inimigo ^ bufcando-o em toda a parte, fem lhe
valerem os reparos, cauza de fuípenderem da fua parte o
combate j obrigândo-nos ao mefmo, com mandarem por
nas janellas dás cazas, âquellas Matronas Portugoezas, que
diíTemoS aprifionáraõ na Várzea . Pareceo , a diligencia de
nos deftruirem , demonftraçaó de os inimigos fe renderé \ 8c
aíTentou o Meftre de Campo , com o Governador J oaó Fer^
nandes Vieira,fe mandaífe hum tambor , que requerefíè a en-
trega ;& ofFereceíTe bom quartel, com defengano, de que
entrados por aíl'alto,fenaõ daria vida a peíToaalgiia.Fúda^
do no dereito das gentes , fahio o noíTo enviado com húa
, bandeira branca na mão . Ouvip o Framengo a embaixa-
da , avaliou a diligencia por fraqueza ; & pérfido por ar-.
te,refpondeo com húa horrivel carga de mofquetariaí fa-
hindo todos repentinamente ás janellas, & barandas das
cazas] das quaes dada a carga , fe retirarão para dentro,
deixando morto de húa baila ao noíTo menfageyro . Le-
V vantou-fe entre os noíTos (bem defcuidados de femelhan-

I te exorbitância) húa voz, trayção; trayção j morraó os

pérfidos Herejes: Como nova cauza ,acendeo o grito em
todos liovo furor,de forte, que com os tiros não deixarão a-
parecer o inimigo, em quanto muytos dos noíTos carrega-
„ rt ^ r r vão de lenha.&coiTi ella enchiaõ osbaixos dascazas, S^cer-
Cos em lhe por o cavao todas as paredes delias jtendo os Capitães João boares
fogo. de Albuquerque , Domingos Ferreira , &; Domingos de Sá

Bar-

1^45 ' ÊJT(rEiLir(^ n.^ 529

Barboza, òs primeiros , que com feii exemplo abrirão camí^
nho a todos os mais, para femelhante hoftilidade ; por meyo
da qual, fe fizeraõ feiís foldados fenhores do ambito^& baixo
das cazas, adiantando-fe a todos (com militar acordo) o Ca-
pitão Joaó Soares de Albuquerque, a empedir ao inunigo a
fervintia da efcada, para todo o incidente.-Seguiraõ a valero-
fa determrnaçaójoutrosmuytos Capitães,& Tolda dos,iguaes
no vaIor,ainda que fegundos no tempoiTodos pediaó fbgoj
o qual aplicado aos materiaes/e começava a tear, com pavo-
roía voracidade.

- $ 6 Crecia a labareda^ entre mi vens de fumo entrava já
pellas janellas a chama , em companhia de innumeraveis bal-
las,que a animavaõ:Travada a bateria, com que de hua parte
fe desfogava a irajSc da outra a defefperaçaõ , de tal maneira
çmbebiaõ em fí, eftes dous aífeítos, todos os fentidos, que nê
o eftrondo dos tiros eíl:remecia,nem o fumo da pólvora efpã-
tava, nem o fuzilar dos mofquetes deícompunha , nem a ve-
ainhança do fogo apartava, nem o horror das vozes confun-*
dia; fervindo a todos a prefença da morte ( que em huns ge-
mia, em outros agonizava) de acender a cólera , & enfurecer
a vingança. Já o pertinaz Hereje íe entregara ao noíTo ferro,
(coníiderando nelle menos dominio^que no fogo, que o cin-
gia) fe fua defefperaçaõ naó achara o tranzito das cazas para
o campo, empedido,& cortado de noíTas armas.Nefte tempo ^
carrega vaõ dous foldados (foús barris de pólvora, por ordem
do Governador, para v oarem as cazas,£fem embargo de que
no mefmo incêndio aviaõ de acabar innocentes, & culpados j
&: de que o golpe ferindo em húa parte 5 avia de magoar em
outra, fepultando as ruinas , juntamente com os Herejes , as
mulheres dos amigos,& dos parentes fieis, que tinha5 prefas.
(Entendeo o Framengo a refoluça5,& vendo, que fe não fa-
seia cazo das vidas, em que as fuás tinhaõ o melhor reparo,lhe
çahirão as armas das mãos, & as efperanças do animo , pedin?
do a gritos bom quartel. O feu General Henrique Hus man- ^ ,
dou arvorar hua bandeira branca, & com duas piftolas , vira- quartel.
das as bocas para baixo,& o chapeo na mão , fe moílrou ren-
dido, a todos os noíTos. Acudio-fe a apagar o fogo com dili-
gencia,por ordem do Meftrc de Campo André Vidal de Ne-

]Èe3 grçi^osj

mimígo

BntYegaÕ'fe fal
vas as vidas.

Exceptos os Ín-
dios que fe man'
dão pajfar à eÇ-
pada.

Oquepaffaliett*

riqueHuínapre-

fença do Gover-

nadoTi,

5»
9*

Í530 CAsr^oro LvsiTjjsío 5645

greiros, convencendo com re2oés,& preceitos militares ao
Governador Joaõ Fernandes Vieira , que com todos osíeus
foldados inftava, que o Framengo morrefíe queimado, como
Hereje pertinaz, & fementido. Permitio-íe ao General Hen-
rique HUS5& ao feu Sargento Ma)íor João Blar, o íàhirem có
fuás armas,& infígnias,até a prefença do Governador,& Me-
ftre de Campo, diante dos quaesfe avia logo de apreíentar:
A meíiiia honra íè permitio ao Governador dos índios , feus
auxiliares3& que todos os mais pfficiaes, & foldados íahiriaõ
das cazas defarmados, & á mercê dos Cabos fobreditos.

^7 Recebidas nefta forma, as condições da entrega , ia-
h 10 Henrique Hus, & em íeu íeguimentoos officiaes mayo*
res j & logo todos os mais Cabos, & foldados , que os nofíbs
foraó defarmando , aífi como hião fahindo. Pley teava-íe fo-
bré fe averem de entender, ou não, as condições capituladas,
com os índios rebeldesjquando elles mcíinos decidirão a du-
vida, contra íi próprios, porque defpois de rendidos, com a-
nimotraydor,íerebelaráo,& de alguns tiros matáraó a hum
Alferes,& a hum foldado nofíb5& ferirão gravemente ao Ca-
pitão António Gomes Taborda: Barbaridade, que nos obri-
gou apafíallos todos a' efpada : E fervirá de explicar a vil
crueldade deftes Bárbaros , hum cazo novo , íuccedido nefta
occazião. Defpois de mortos,& eftirados no campo feus cor-
pos,fe levantou hum delles , Sc tirando de húa faca , que por
defcuido lhe aviaó deixado, deu trez feridas mortaes em hu
foldado noíTo, Qacazo paíía va, bem alheo de femelhante fuc-
çeíTo^ & tornou a cahir morto j& o foldado defpois de con-
valecido atribuio a vida, mais a milagre,que á cura : Chama-
vão a efte, António Paes. Demonftraçaó evidente, de que o
ódio, que nos tem eftas feras, paífa nelles além da morte.

58 Tinha o Sargento May or formada toda a noííà in-
fantaria em circulo,que pello meyo atraveíTavaõ duas alas de
mofqueteirosjpor entre as quaes foraó paíTando os rendidos,
atè a preíença dos noíTos Cabos mayores. Vio João Fernan-
des Vieira diante de fia Henrique Hus com as fumiçoés de
rendido, & lhe diíTe eftas palavras, modefto fobre viâ:orio-
zo: Mal difcuría,quem fabrica futuros fobre as inconftancias
da fortuna3 ^ mu^^to peor, quem nos favores delbjacha mo-
tivos

tivos para defprefar a rezáo, & para atropellar a juftiça. Quê '»
x3iffera, (há muyto poucos dias)que a foberba Olandefajani- 3>
mada de noíTa defgraça , fe deívelava em fabricar Tua ruína: «
Vezes faó do mundoi& não fe defenganão osmortaes , de q > >
fó o império da rezão , he o que dura , & o da tirania , o que »
mais deprefía acaba: A mayor injuria de hum governo, he go- »
Yernar com injuriaj & o pronoftico mais certo de fua queda, »
he o infaciavel de fua cobiça , pois por fatisfazer á fede , não n
repara em fecar a fonte:Naó diffimula Deos com aquelles de- »
liáos, de que faz gala a malicia5& pregáó o efcandalo. Como «
tivia de tardar o caftigo a culpas, que decretava o poder ? A »
Deos noíTo Senhor , de quem efperava noíTa fé o remédio, »>
obriga o fofrimento dos abatidos tanto, como o ofíèndem as «
demazias dos foberbos . A V. M. naó o poferaó nefte eílado «
noíTas armas, fe não fuás infolencias,de que eu como mais of- »
fendido, fou o mais queixofoi& ainda aífi me compadeço de 5>
fua fortuna, & confeíTo me occupa todo o coração a pieda- »
de de fua miferia, efquecido dos ameaços de fua arrogância, »
tjue prometião prender , a quem o tem prefo , & deílruir , a 5>
quem agora o determina favorecer: A contingência dos futu- «
ros acautella fefudos, & defcompoem indifcretos. A toda ef-
ta pratica não refpondeo Henrique Hus mais, que eílas de-
terminadas rezoésiPois VoíTa Senhoria me venceo,& me tem »
prifioneiro, pode fazer o que for fervido j& lhe poíTo aíTegu- »>
rar,que para render o Arrecife, lhe não falta mais , que cami- )>
nhar, & tomar poííe de fuás Fortalezas; porque a flor de feus „
foldados,& defenflbres, tem VoíTa Senhoria morta , & rendi- „
da neftas duas batalhas. Foy o Governador correndo com os
olhos a todas as peíToas rendidas , & difíe, para o Meílre de
Campo André Vidal de Negreiros:0 q v ejo, me afíegura na ,í ^

A^erdade,do que ouço:Tornou Hérique Hus:Pois Voffas Se- „
nhorias tem vencido tudo, o que íe podia temer, não percaó ,j
a occazião,quehúa vez perdida tarde íe recupera. „

59 A primeira diligencia , que defpois da vistoria fes o
cuidado do Governador,(como principal motor da batalha) Mmda, o Gover*
foy a liberdatie daquellas Matronas, que o inimigo tinha pri- nador enterrar os
íioneiras, cuja redenção, & viftaaugmentou a gloria do triú- mortos ^& curar
pho, & a V 02 do aplaufo , com que o exercito acciamava a "^ -^ ^'^ ''^'-

Ee4 vi-

jyefpojos da hta
lha.

332^ C^STÚlloro LUSITJKO '"' 164^

viâioria, ao fom de caixas, clarins, & charamellas;aumentado
com o eftrepito dos bárbaros inftromentos de Minas , & ín-
dios, que acompanhado de Teus confufos gritos , fe fazia ao?
viftoriofos gratQ,^& aos vencidos importuno.Largou-fe a ca-
2a de Dona Annal*aes(& outras,em que os inimigos tinhaò
recolhido o faço de todos aquelles dias) aos foldados com to-
da íu a bagagem , refervando para elRey tudo, o que eraó ar-
mas,& munições, que fe entregarão ao Provedor doexerci-
to.Entre mofquetes,& clavinas fora5 feifcentas armas,as que
perdeo o inimig05& paíTáraô de mil & quinhentas,as que noâ
deixou nefta, & na occazião das Tabocas j de todo o mais gé-
nero de armas ofFeníivas,& defenfivas, foy grande a copia , q[
fe arrecadou. A abundância dos mantimentos foy tanta , que
fervio áneceííidade dos foldados, & ao fuftento de muy to
povo, que de todâs as partes concorreo. Aqui fe proverão os
noíTos officiaes de muy tos, & bons cavallos , com aparelhos,
& jaezes para a vaidade,& para o ferviço. Parece,que quiz o
ceo, que nos armaííèm para a liberdade, os mefmos tiranos, q
nos armarão de rezão para recufar o jugo:Em quanto os noC»
fos fe occupavão em aproveitar o útil, fe defvelava o Gover*
nador João Fernandes Vieira em enterrar mortos,& curar fe-
ridos, eftes com as comodidades neceífarias, aquelles com as
exéquias poííiveis, exercicio,quetomáraó por fua conta os
moradores da Varzea,& dos Apupucos,huns dando fepultu-
ra aos defuntos,outros cazas,& medicamentos aos enfermos,
como devedores a huns , & outros , de íe verem reftituidos a
fuás moradas, das quacs anda vão deílerrados , avia muy tos
dias.

i 60 No campo da batalha vío o Olândès, ( dos feus fol-
dados) quatrocentos mortos, & duzentos priíioneirosi& dos
que poderão fugir, raros fora5 , os que deixarão de morrer:
Mortõs\é' feri' Naõ teve fua forte mais diflPerença, que a do lugar. No
dos de hm^é" ow mato, ou O rigor do tempo, ou a força da neceffidade os con-
tragar te. fumio, por quanto, fe algum fahia a bufcar remédio , nos fios

de noíTa efpada deixava a vida, com fó a efcolha de abreviar
a pena. Duzentos índios degolou , logo ali í , noíTo ferro , &
' defpois a noíTa diligencia acabou aos demais: Foy de todos a

paga, porque era de todos a divida.Da noífa gente morrerão

dezoyto

i645 fpJ^El.LlF^O Fl. 335

dezoyto peíroas,& fahiraõ trinta & cinco feridos: Computo,
que não acertara a pena, fe lhe não fizera a foma pellas cau-
2as do eftrago, confiderando no do Framengo, tudo caftigo;
& favor tudo, na pouca perda da noíTa gente . Sahio o Capi-
tão Domingos Fagundes atraveíTado pello vêtre de húa bal-
la,& convaleceo. Ao Governador dos Minas Henrique Dias,
ferio outra baila em húa perna , & não fe retirou . Com húa
perigofa ferida ficou o Capitão António GomesTaborda,&
naõ morreo: Com a mefina forte melhorarão quafi todos os
feridos,fervindo-lhes defpois os finaes dos golpes tanto a ho-
ra das peíToas, como ao contingente da batalha, & fermozura
daviâ:oria.

6 1 A proezas de íbgeitos llngulares, dividas fa5 íingu-
lares memorias ;& as deve também minha obrigação afamU
liaridade, com que na Corte de Lisboa tratey muy tos annos
ao Padre Frey Joaó da RefurreiçãoReligiofo do Pátria rcha
Saõ Bento,filho da Província do Brazil, & no tempo , que ef- ^em era o Pa'
crevo digniífimo Provincial delia. Digo que foraó fuás pro- dre frey loão da
proezas íingulares, porque as fez íingulares feu valor , & feu ^^y^^^^^F*?.
eftadoj feu braço, & feu zellojfeu merecimento,& fua fortu-
na. A a terra do Brazil, que lhe deu berço, pagou , com muy- M
tas vezes arrifcar a vida pella ajudar a fahir do cativeiro . Af-
íiftia o Padre Meftre Frey joaó da viâ:oria. Provincial , que
então era da Provincia do Brazil , no Moíteiro de Saó Bento
da Cidade da Bahia, cabeça de todos os daquelle Eftado,
quando advertido da facrilega tirania, com que o Framengo
embarcara para índias a todos os Religiofos da Capitania de
Pernambuco, & entre elles aos de fua obediencia,que defíer-
rados do Mofteiro da Villa de Olinda íe recolhiaó em hum
Engenho íeu, chamado Mazurepe, aonde fó ficara o Dom
Abbade , que então era, Frey Anfelmo da Trindade, por in-
terceíTaõ de fua muyta velhice, & de fua grande virtude, ref-
pey tada, ainda quando mais aborrecida. Com os remorfos da
obrigação defejava o Provincial acudir ao deíemparo do ve-
lho,&da fazenda;deu-lhe o tempo a melhor occaz ião na vol-
ta, que faziaõ da Bahia para Pernambuco dous Embaixado-
res 01andefes;& para o fobre-dito fim mandou ao Padre Fr.
Joaò da Refurreição , fatisfeito de feus procedimentos , & a

outro

334

QAsr^ioro LUSlTjnO

ié45

outro Peeligiofo chamado Fr. António, por feu companhei-
to, para affiftiremao Dom Abbade , & á cultura da fazenda;
(eraõ ambos mancebos.)Dezembarcàraó no Arrecife confia-
dos no favor dos Embaixadores : Aprefentaraó-fe aos preíl-
dentes do governo j lifamente os informarão da viagem , 8c
do fim da fua vinda, foy a tempo, em que os rumores da fole-
vaçaó andavão jí em pratica, cauza , para que o Framengo
viveíTe comciume;& facilmente fofpey taíre,que os dous Re-
ligiofos eraõ efpias, diííimuladas nos hábitos . Detiveraó-nos
dentro do Arrecife com a cautela da defconfiança , até que
ou velTe embarcação , que os levaíTe para fora da terra . Tar-
dou a execuçãoi& o tempo lhes abrio caminho,aos dousRe-
rvi ]igiofos, a comprar licença para fahirem do Arrecife para o
' feu Engenho,por quatro caixas de açúcar. Recebeo-fe o do-
nativo,& quebrou-fe o falvo conduto , mandando-lhcs , que
logo fc recolhcíTem ao Arrecife. Náo faltou , quem os acon-
felhaíre;& deíTc remédio na defefperaçaó delle, dizédo-lhes,
que fe efcondeíTem , porque dentro de poucos dias fe viriaõ
livres da tirania, que os moleftava.Poífe em campo Joáo Fer-
nandes Vieira, & faque-ou Joáo Blar o Engenho de Mazu-
repe, fem deixar nelle mais, que as paredes. Os Religiofos, q
fe virão livres do aíTalto forão fugindo de mato em mato,atè
fe encorporarem com o noíTo exercito; aonde João Fernan-
des Vieira os recebeo cora agrado,& tratou com reípey to;fa-
vor, que o Padre Fr. João da Refurreiçáo lhe foube merecer,
com o acompanhar até o ultimo periodo da guerra . Na pri-
o mtiyto qohrcu meifa occaziáo delia, que foy na das Tabocas diíTemos por
nejla occa^ião. i^^^yor o valor,& zelo com que obrou. Nefta fegunda, que a-
cabamos de referir, obrou de forte, que confeíTor, & foldado
defpertou a emulação de todos, & a enveja demuytos ; com
perfuaçoés,& exemplos eníinava a defprezar os perigos de
hiia, & outra v ida, com a aplicação do facramento, & com o
vigurofo do braço;& feu animo affi intrépido, que eftropea-
do das bailas inimigas, ( húa lhe paííou húa perna , outra o
laílimou em hum pé,enrrando a ferillo por entre a fola do pé,
Sc a palmilha do çapato) fem que hum, & outro impedimen^
to o retiraííe do confliclo, antes mais irritado feu valor , por-
que nos eftorvos bebia os eftimulos.

62 Com

1^4^

fJ^E 1. LIF^O VI.

335

6 1 Com mais arrogância , que rezaõ argnem as naçoês
eftrangeiras a piedade Portuguezâ , de nimiamente crédula:
Dizem,quetudoâtribueamilagres, como fenaó fora virru- .T^ ^/ ' ^^^

\ c \- - '1 • ' - y rx c o t_ ^ ft a atribulo eíU

de,& obrigação atribuir a mao de Ueos os ravores, & betts, q ^t^ona ao favor
delia recebemos. A força,& induftria humana, prompta fem- da Mãy deDeos.
pre a femear peccados , que pode colher fe não caftigos , fe a
benignidade de Deos naó dirpenfarmifericordias ? Preceito
da noíTa fè, que nos eníína, o que fomos, Sc o que a Deos de-
vemos he, que todos os bens da vida lhe atnbuamos,^^: a nós
mefmosj os males,que padecemos. Ayrofu fica a calunia,quá-
do louva,no que nota. No mais travado do confliâ:o chegou
ao campo da batalha hum morador velho , chamado Francif>
CO Frazáo, com húa Imagem de vulto, da Senhora do Socor-
ro, que a perfídia herética tinha desbraçada j & naquella ma- ^
nhã iè vio feu rofto cuberto de gotas de agoa, que húas a ou-
tras fuccediaò,aífi como as enxugavaó^ perfeverou neftâ pro-
digiofa demonftraçaõ , até que a mayor parte da noíík gente
o vio, & examinou; influindo em todos a conflderaçaõ do
defacato, & a vifta do prodígio tamanho zelo, 8c coragem, q
como focorndos de mayor poder, enveíliraó ,& arrancarão
do campo os efquadrocs inimigos5Como fe a Senhora quizeíTe
moil:rar,queparanosfocorrercomobraçodefuâ mifeficor-
dia, importava pouco, que o Hereje , facnlego , lhe cortaíTe
os da fua Imagem.MiIagre o apelidou a voz de todos;& a de-
vaçaó demuytos,que podèraõ chegar a colher,por reliquias,
as gotas dagoa,que a Sagrada Imagê diftillava, como penho-
res de feu focorro.Naó de outra forte, ainda que em difPeren-
te parte, fuccedeo com húa Imagem do Efclarecido Martyr
Saó Sebaftiaó. Ao tempo , que a noíTa gente apreííava a mar-
cha, para fe adiantar á fuga do inimigo,(como deixamos rela-
tado) ficáraó no Engenho de Pedro da Cunha, alguns folda-
dos noíTos empedidos de diverfos accidentes, para naó pode-
rem feguir o exercito. Chegou a hora do combate j ouvirão
(ainda que diftantes) o eftrondo das cargas^inferiraó a bafa-
Iha,& atalhados da diftancia,para naó poderem aífiftlr ao có-
fli^o com o corpo, o quizeraó fazer com o efpirito.Guiados
do Capelão do Engenho entrarão na Hermida , 8c poftrados
por terra pedirão ao Santo Martyr,que aífi como alli o invo-

cavaó

'i

y-

I,

^

«Pi

336 CASr^oro LmiTANO 164^

cavaóMarty r,aííi na batalha o experimentaíTem os fieis com-
panheirOjComo foldado.Cazo maravilhofo: Viraõ todos fuar
a imagem, como fe o gloriofo Martyr andara pelejando na
■^ f' ^'^f^y^ ^- batalha . Admirados , & compungidos enfopáraó os lenços
' hiia, & muytas vezes no maravilhofo licor , que não deixou

de correr, fe não quando os tiros dos mofquetes, fenaó dei-
xarão ouvir . Naõ referimos contos fabulofos , fe naõ verda-
des authorizadas por muytas peíToas graves,& timoratas^que
naò he novidade, moílrar o ceo comíinaes deJPuzados,que
faó feus os favores,& os caftigos.

63 Em dezafete de Agofto de mil & feifcentos & qua-
renta & cinco,fe alcançou efta viâ:oria.Pedia o difcomodo de
tantos dias , & o trabalho de tantas marchas ( com o de duas
batalhas campaes) defcanço,&: alivio para os foldadosjo que
Vt^orlo^o^&triu o Governador João Fernandes Vieira, lhes folicitou,mandã-
fhãte marchada- do aballar O exercito,para o feu Engenho de Saójoão Baup-
ra ã varT^ea^ioao tifta, íito na Varzea, para onde marchou em forma de trium-
ermn es m- ^j^^ Precedião clarins,& charamelas com todos os inftrome-
tòsbellicos: Seguiraõ-fe os Olandefes rendidos, entre elle§ o
feu General Henrique Hus, montado em hum ginete , priva-
do das inOgnias militares,& armas bellicasjlogo a noíTa gente
formada em efquadroês,aos quaes feguia o Governador com
o Meftre de CampOjacompanhando aquellas Matronas, que
o inimigo tinha prcfas , Dona Anna Bezerra,Dona Izabel de
Goes,& Luiza de Olyveir3,as quaes feus maridos levavão de
ancas, feguidos da multidão popular,q naó defcã cava de lou-
' var a Deos, & abendiçoar aos libertadores de fua efcr^vidaõ.
Chegados ao Engenho , forão recebidos com exceíTiva ale-
gria, & hofpedados com generoza grandeza . Defte lugar fe
remeterão para a Bahia os rendidos , a faber Henrique Hus,
Joaõ Blar, com todos os mais, que não quizeraõ aíTentar pra-
ça debaixo de noíTas bandeiras , para fer virem á Coroa nefta
guerra j& porque o dar-lhes guarda de foldados feria defrau-
do do exercito, & gafto fem fruito , ordenarão os dous Go-
vernadores João Fernandes Vieira, & André Vidal de Ne-
greiros, [com efte eftilo os avemos de nomear daqui pordiâ-
Remetem-fe osre tQ^^çoxo^ç. defde efte tempo os apelidarão aífi os foldados,
ddos k Bahia, conhecendo,que aos que unia a vo tade^naó devia feparar o

apelido]

apelido]! que de povoação, eni povoação os foíTem guardan-
do,& conduzindo os moradores de húa,até outra^Sc que nef-
ta forma fe entregaíTem ao Governador do Eíiado António
Telles da Sy 1 va , para que delles difpofefíe , o que lhe pare^
ceííè. Em hum dos povos,porque paffáraó, matáraó os vezi- , ^

nhos a João Blar de hú tiro; quatro bailas lhe tirarão húa vi- ^r^*^ ^ ^°^^
da ; deíèjava, que foííèm mais, quem para a vingança,multi<-
plícava os mPtromentos da morte j muy tas merecia quem de-
baixo do feguro de rendido, não pode livrar a vida,com que
pagava prifioneiro.

- . 64 Os dias , que a noffa gente tomou para o defcanço
nos faó neceííarios todos para a obrigação de ajuílar os fuc-
çeiroscomor€mpo,quecóplicados com os referidos, os dis-
tinguirão os Iugares,& náo os dias.Em o numero quarenta &
hum, deftefexto livro, demos conta de como o General da
frota, que partira da Bahia para o Rey no, metera no porto
de Tamandarè as oy to embarcações, em que o Governador
do Etlado, mandara aos Meftres de Campo André Vidal, &
Martim Soares, com os feus terços para focegarem os tumul-
tos dos moradores de Pernambuco,de que fe aviaó queixado
os do governo Olandès: Referimos, o que fuccedeo na mar-
cha, a eíles Cabos^agora relataremos, o que Salvador Corrêa
paíiou na viagem, até aquella altura, que pertence aos ter-
mos deita hiftoria . Em doze de Agoílo amanheceo a frota
anchorada á v ifta do Arrecife: Confiava de trinta & fete v e-
las forteadasj fua Capitanea,hum forte,& mageftozo Galeão
obrado no Brazil, pella induftria do General da frota . Vio o ^%^ Salvador
Olandès a efquadra com os olhos da perturbação , em que o ^'^^^/y^^^^fr'^'
tinha poflo o fucçeíTo das Tabocas ; & a occaziáo lhe fes pa- ^recife " ^ ^'
recer armada formidável, o que era frota mercantil ;& foy tal
o medo entre osquetinhaõ á fua conta adefenfa, que naõ
ou ve mais acordo,que para fe tratar da entrega . Nenhua oc-
caziaõ fe perdeo com mais defculpa, nem com mayor deígra-
ça: Foy deftino, a húa, & outra gente cuftozo ; fupofto, que
então pareceo favor, o que defpois caftigo.Nem o noíTo Go-
vernador das armas na terra, nem no mar o noífo General fa^
biaó a occazião, que da vão os fucçeíTos , porque a diílancia
entre-poíla , os privava L -3 noticias ; Anchorada affi a frota.

Ff hum

^,

tíii ;:

Aíaâa emhaixd'
da ao Arrecife^

358 CAsr(í{ior O LUSITANO 1645

hum tiro de peça da Barreta (ponzo , que lhe bufcou a cau-
Çomefpanto,& t^la, advertida nos lanços da malicia ) Naó ficou peíToano
ahoroço Aeamt. ^ ^^ dUeoreceo naoIevaíTe ao mais alto das fortifica-
çocsj náo ficou morador na vezinhança^que o alvoroço nao
fubifíe ao mais alto dos montes í EfFey tos do temor , & da ef-
perança, que occupava o difcurfo de huns, & outros, imagi-
nando todos,que o cazo era confelho.

6% Deitou Salvador Corrêa hum batel 30 mar, &nelle
mandou dons enviados , que da fua parte faudaíTem aos do
Supremo,reprefentando-lhes o fim,q o trazia aquelle porto,
que não era outro mais, que dar-lhes a nova de como deixa-
va em Tamandarè oytoembarcaçoés,com dous terços de in-
fantaria ás ordens dos Meftres de Campo André Vidal de
Negreiros, & Martim Soares Moreno, em complemento da
promeíTa, que o Governador Geral do Eftado lhes avia fey4
t03 que com f odá â brevidade mãdaria focegar os ânimos dos
moradores, & prender as cabeças dos confpirados , para os
Câftigar pelíos merecimentos das culpas; o que também fazia
por obedecer ás ordens,que tinha do Senhor Rey Dom Joaõ
o Quarto,pelIas quaes lhe mandava,apertadamente,que com
os Olandefes fe confervafle em toda a boa amizade,&correí^
pondencia; & que elle Salvador Corrêa fe ofFerecia com to^
dos os Portuguezes daquella frota para tudo , o em que os
podefíe fervir ; & com aquelle Galeaõ , em que levava toda
fua caza para o Reyno,comboyando aquelles navios de mer-
cadoresjlhes pediaó licença para fe lhes vender algum refref-
co da terra,& para os poderem vizitàr os que tiveíTém gofto
de o faz er , em fegurança do que poderião ficar em reféns , a-
quelles feus enviados. Defembarcáraó entre muy ta gente do
poVo,qiie os efperava,para faber o mifterio,que poderia ter a
confiança de tomarem terra fem licença : Acompanhados de
alguns, & feguidos de todos fubiraó ao Conçelho,aonde foy
ouvida fua embaixada, & ordenado , que os apofentaíTem na
forma divida.

6 6 Divulgou-fe entre todos a fuftancia do recado , &

refpirou o medo, com a certeza, de que era frota de paz, o q

Com que effeytõ^ Çç_ temia armada de guerra:Porém os do governo medindo a

credulidade pello corpo da per fidia j fe naó davaõ por fegu-

ros:

■

i645 • fpA^BLLmXOVl. 539

ros; Peyto,aonde nunca entrou o fabor da finglleza^tudo lhe
fabe a falácia. No mermo dia mandarão duas lanchas de refref-
co, entre o qual efcondèraó a defconíiançaiTodos os remei-
ros eraó efpias, com a recomendação,de que viffem, & notaf-
fem, o porte, a carga , & a gente, affi da Capitanea , como de
todos os mais navios; o que fizeraó á fua vontade pella fran-
queia, com que o noíTo General lhes permitio o exame. Vol-
tarão obrigados; & deixarão aos feus fatisfeitos , com a rela-
ção de tudo, o que tinhaõ vifto . Debaixo defta certeza lar-
gou o Olandès os noíTos enviados, moftrando-fe obrigado á
pontualidade, & cortezia do feu General, que já os efperava
na Capitanea, para a qual voltarão com hum barco de refreí^
CO, que aviaó comprado ; & lhe deraõ meuda conta, do que
lhes avia fuccedido. No dia feguinte rompeo o tempo em
tão furioíà tempeftade,que temerão os Pilotos trincarem-íe
as amarras,& darem á cofta com os naviosiLevaraõ anchoras^
largarão algum pano, & forão correndo á vontade dos ven-
tos, fazendo algúas voltas á terra mas fempre engolfados ao
mar. Seis dias os trouxe a tormenta neftesbordosjlutandocõ ?., ,
as ondas;no fim dos quaes tomàraõ a derrota de Portugal,te- ^ , £ " '^j ^^*
meroíos, de q a corrente das agoas os levalle a Índias, O Ola- (^fefes ao mar.
dès, que os vio defaparecer,m andou dous pataxos em fua eA
tey ra, que brevemente voltàra5 com a defejada nova,de que
leva vão a proa em direitura ao Rey no: Tanto que o Framen-.
go fe vio livre do temor , que o aíTombrava , tratou logo dei
por em execução o defejo, em que ardia j & difpos a mais in- |
fame trayção, que hum peyto humano podia fabricar,faitan-
do-lhe a efte tempo a deículpa , com que defpois fe podèra
cobrir: Mandou apreftar nove fragatas,que tinha no Arreci-
fe,& na Paraiba;& guarnecidas de gente , mantimentos, mu- Xiifcurfos daper^
iiiçoés,& armas as entregou ( có mais alguns pataxos, & h2LX- fidiaolmdefa^&
cos do alto) ao feu General do Mar , Joaó Li£i:art , com ex- inferecias defuA
preíTas ordens, que foífe ao porto de Tamandaré , & nelle a- ^^^^^^^i
brafaíre,& meteflb apique os oy to navios Portuguezes,que o
Governador António Telles mandara em feu favor jfem que
a peffoa v iva fe delTe quartel . A primeira couza,^ de que fe
não lembra o traydor he,do que fe deve a íi,& a feus bem-fei-
tores, occupada a lembrança no interefe , que lhe promete a

Ff2 ef.

híM

H

340 C^ST<^10T0 LUSlTjm 1645

efpcrança. Julgava o Herejc, que os dons terços, que manda-

V a o Governador para beneficio feu^aviaó de fer de gente el-
Golhida^ & que queimadas as embarcações , fe não poderiaó

V oltarj fe não por terra^Sc fendo aííi, forçofamente, ou a ter-
ra os avia de confumir,ou a marcha os avia de deter tanto,
que tiveíTem fuás armas lugar para aíTaltarem aBahia,&lef
varem-na por entreprefa , a pouco cufto, falta dos melhores

Toldados, que a podiaó defender,

6j Eftavaó os noíTos navios ;untos na eníeada de Ta-i
mandarè, taó longe do perigo, que os bufcava, como certos
no premio, que merecião pello ferviço , que tinhaó feyto
Com me manda ^^ Olandès . Naõ tinhaó mais guarnição , que a dos homens
queimar os nar à.o mar, & duzentos foldados Bifcairihos . Porém não baftoii
nitos que e/avão o repente^ nem a falta, para deixarem de rebater o primei*
furus emTamã» j.q aíTalto, com animo Portuguez \ porque avendo tanto ex-
ceíTo entre poder, & poder, igualou a valentia dos poucos,
como numero dos muytos, &:foy a peleja taó fanguino-
lenta, & perfiada , que efteve por largo elpaíTo indicifa a vi-
â:oria . Aífiftiâ o Capitão Mayor Jeronymo Serraó de Pay-
va dentro da Capitanea, & delia infundia valor, & forças
em todos os feus , fazendo cada hum o poífivel por imi-
tar feu exemplo : Das primeiras cargas perdeo o inimigQ
â melhor fragata , que paíTada por ambos os cofiados, lha
meteo âpiquehúa baila. Hum navio noíTo, que fofpey tou a
tençaó, com que a armada inimiga bufcava o porto, deixou
aenfeada, &:no mar largo brigou com muytos dos Olan-
defes com tal valentia, quelhedefarvorou duas fragatas ; &
defembaraçado de todas, com ameíina gentileza ,& fe fe§
na volta da Bahia. Com não menos valor (defpois de lar-
ga reíiftencia) vararão dous navios noíTos em terra, &íal^
(y> Com quÉ fucçejfo tando nella os homens do mar , os defenderão de forte,
^ dehuâ j & oiftrâ que uunca , todo o poder contrario, os pode render, nem

queimar. A outros dous navios , que não podèraó abalroar
lhes deitarão fogo j & ardéraõ . Suftentava a náo Capita-
nea todo o pezo do combate, defendida da opinião , & do
braço do Capitão Mayor (nefía occaziaó avaliado do ini-
migo, pdlo deftroço de fua armada, em tanto, que o fubio,
fua eftimaçaó, fobre a fama de feu nome ) até que entra-
da

i64^ ''1PJTiT£L LIV^VL \ ui

da a Capitanea por ires partes, detendo o Capitão a vi-
toria com a prefença, &cora aefpada, cahio no conyé^,
cortado de muy tas feridas, & rendido ao trabalho , 3c ac»'
defal ento, com taitto eftrago do Framengo, que lhe fervio a,
preía da náo, & díOi^Oapitão , imis de afronta , que de trium-
pho: Com ella , & com a de hurá pataxo entrarão pello Ar-
recife dando matéria, mais ao efpanto, que ao ai voroço. P^fr
<demos nefta occaziâo,quaíi cem pefíbas,entrando neíle com-
putOjOS que morrerão na peleja,& os q afogarão as ondas^cõ
todos aquelles, que defpois matou o Olandès a fangue frio: ,
A mu vtos feridos láçou ao mar amarrados de dous em dousj
a outros defpachou, por lhes abrir, & renovar as feridas com
fcgundos golpes.Da parte contraria foraõ tantos os mortos,
&feridos,queredevulgou no Arrecife, a nova da viíloria,
comIagrimas,&lutosj&lhesfahiotãocara5quedeboavon- \

tade,a dera o Framengo pello cufi:Q.íí' u
: é8 Não ouve parte aonde chegãíle a nova da trayção^
& do coníliâ:o, que não ardeíTe em defejos de vinígar o agra,-
V o j& nacèraó defie principio tantasperdas, & males^ para o
Framengo,que não acabou de pagar em muytos ánnos , â (Ji-
vida,cni que o pos efte dia: Ouvio-fe ocazo entre a gente do Referem-feos ef-
noffo Array ai com tamanha dor , & efcandalo , que entre úf^^jo^ ^^P i^^r.
exceíTo , & o difcurfo , ficou indiferente a credulidade , por ^'^^*
muyto efpaço , até que vencida a duvida das repitiçòés da
certeza, refpirou a paixão no furor , com que propôs a vin*:
gança. O Governador João Fernandes Vieira,que vio abra*
Mo em ira ao Meftre de Capo André Vidal de Negreiros,
lhe dilTe eftas palavras: Naõ pode julgar os males quem vive "
ifenío delles. Se a fem-rezão de húa crueldade, não achou no "
animo de V.M. fufrimento, como tantas, acharião tolerância
nos corações deites moradores ? A golpes íe apura a paciên-
cia. EftefacçeíTo, quea V.M.efpanta, he o comum ctl:ilo,c5
que o domínio Oíandés nos governa . Digame agora , quem '*
de fora julga: Com que rezão queria , aos aflidos moradores "
obedientes a trayçoés , & crueldades de cada dia , quem não '^
pode fofrer eftes cavilofos inimigos húa fó hora.''Confuzo,& "
convencido o Meftre de Campo, jurou publicamente, que
não avia de perder occazião, em que podeííe deílruirtaó in^
' Ff 3 fame

11

5>

5>

5>

A/'

N*

541 c-^^^oro wsfTjmo ^^4$

famé gente,ainda que por efta cauza feu Rey lhe condenaíTe
a cabeça. O Governador do Eftado António Telles daSyl^
va, que recebeo a nova, priíneíro das lagrimas da Cidade, q
das noticias do fucçefíb , mandou deitar_bando , que nenhúa
peíToa veftiíreluto,por morte de parentê^i amigo, que ouí-
V efíe perdido a v ida no aleivozo cazo de Tamandaré , por
i3Uánto prometia a PeoSj& aos homens de empenhar as For^
ças do Eftado em vingar a todos de tão abominável trayçáo 5
& de informar a Sua Mageftade , o quanto imp orta va ao fetr
viço de Deos, & reputação de fua Coroa , não diffimular c6
òffenfas de gente,que em noflà omiíTaó bebia o atre v imento,

Í>ara òíFender ao ceo com perfídias, & a terra eomefcanda-
OSí

Sg ,No tempo^queõ Governador Joaõ Fernandes Vieí-
f a íe tinha retirado de fua caza para o mato , andavão efcon-
didos pellas brenhas a mayor parte dos fubditos , fugindo á
tirania, & á crueldade dominante,já então mais infolente, &
mais nociva com o pretexto de condenarem a todos os inno-
centes por complices na rebelião, a fim de os deftruirem, &
roubarem j& a toda a parte,aonde os encaminhava a foípey-
ta, chegava a execução. Carregados dos deípojos defta info-
léncia, v inhaó nefta occazião, dezafeis Olandefes pella mar-
ip ' gem do Rio Beberibe, dan^o efcolta, ao largo, a hum mago*
te de Negros feus,que lhes le vavão parte da carga , & cami-
nhavão todos , para o Arrecife . Defviou aos Olandefes do
caminho, que levavaõ, o defejo de aumentar o roubo , & to-
mando a vereda do outeyro do Barboza , húa legoa diftante
da Cidade Mauricea, f Era de noite , & o efcuro , que encu-
bria õ numero, aumétou nos moradores o fobre-falto de for*
te, que todos defemparáraó as cazas , com que em nenhúa a-
chou o aflalto reíiftécia ) chegarão á caza de húa Dona Viu-
Frimeiras dèâoes ^^ chamada Luiza Barboza, que com outras fuás irmãs don^
do Capitão Ma* 2ellas eftavãorecolhidas,pellocll:ado,&pelIacallidade.Com
r/oel Barboz,a. infolertte arrogância tratàráò arrombar-lhes as portas. Apeli-
darão ellas favor contra ladroes, que as queriaó matar: Sue-
^'cedeo ouvir os golpes da violência , & os gritos da aflição,
Manoel Barboza irmão das fobre-ditas mulheres : ( tinha-fe
retirado a hum mato vezinho com outros cinco moços ami*

gos

iá4'5 ^J^B 1. LlV^.m.

gosfeusjtodosdedezoyto até vinte annos.) Animou os c5-
panheiros , a que o ajudaíTem a livrar llias irmãs daquelle pe-
rigo; naó avia entre elles mais armas,q duas erpingardas,duas
efpadas, húa fouce de roçar , & hum bordaó ferrado . Deraó
fobre os dezafeis Olandefes, [imaginando fermiiy to mayor

0 numero] com animo taó deftimido, que matâraó a mayor j^-^^,^ r ^y^ -^
parte,&: ferirão a muy tos dos que efcapáraó,ficando-lhes nas de hua mananàe
mãos as armas de todos, que eraó mofquetes, clavinas, & pif- olmàefes.
tolas. Intento,^.' fucçeíTo v erdadeiramente digno de fe livrar

das mãos do efquecimento . Com as armas creceo nos féis o
brio,& em outros o defejo de fe lhe agregarem : Formou-fe
húa companhia de v inte mancebos^recebèraõ a Manoel Bar-
boza por feu Capitão, com os quaes, como filho de Pernam-
buco, vingou os agravos de fua pátria, em quãto lhe foy pof-
íivel,faqueando,ferindo,& matando OIandefes,comembof- i,

cadas,& aíTaltos. Proveo com as armas dos defpojos aos mais
companheiros,q ;á chegavão a trinta,& fe foy meter na Villa
de Olinda, na tarde de dbzafete de Agofto , dia, em que os ^'°^ '7'^^^ '^^'^'
noílbs alcançarão a vistoriadas cazas de Dona Anna Paes: '^^^lu! tílTl

n r j V 1 r 1 Panhta. defende a,

1 or elpaço de quarenta dias derendeo aos moradores da Vil- yuu de oUnda.
la, affi dos Olandefes , que nella fe aquartelavaó, como dos q
guamecião a guarita de Joaõ de Albuquerque [hum redutOj

ou Fortaleza vezinha da povoaçãp.]Avaliou-fe feu valor, &
feu zelo no gráo, que merecia;& o Governador João Ferná-
des Vieira lhe deu patente de Capitão de mayor numero de
foldados.

70 Em o numero quarenta & cinco deíle fexto livro
deixamos ao Meftre de Campo Martim Soares Moreno no
fitio dos algoadaes,com refoluçáo de marchar para a Forta-
leza do Pontal de Nazareth, a petição dos moradores, que ao Martim Soares
largo a tinhão cercado, affiftidos de muy tos foldados do feu Moreno^comofett
terço,que voluntariamente os quizeraó ajudar. Era a Forta- *^fÇ°y '^?^^ta ofi^
leza de Nazareth a melhor(defpois do Arrecife Jque o inimi- "'^ "* Fortalecia de
go tinha por toda aquella cofta,pella grandeza , pello porto, '^''^^''^^^•
pello fitio, pella guarnição, & pellas conveniências; circuní-
tancias,que lhe davaõ a mayor eftimação,&: aos noíTos mayor
defejo de a conquiftar. Conheceo Martim Soares a rezão; &
em favor dos moradores foy jcom o reftante de fua gente, dar

Ff 4 ca- .

/

344 CASr^orOLUSlTAKO

calor, & forma a emprefa, commovido das opprefíbés,& mi-
ferias,que padeciáo os vezinhos , do prezidio da Fortaleza.
Achou que o Capitão Amador de Araújo , mandado pello
jioíTo Governador, a tinha íitiado com boa forma;& com íua
dirpoíição,&:preíença fe foy apertando o cerco. Avertido da
natureza do terreno, mandou fazer húa trincheira , donde a
n oíTa mofquetaria varejaíTe os altos da Fortaleza , de forte, q
delíes não podeíTem os cercados, fazer pontaria certa para os
de fora; o filencio , & a efcuridade de húa noite deu princi-
pio,Sc fim á obra, fem que a podefíe fofpey tar o inimigo:Era
Comendor da Fortaleza hum valerofo foldado, chamado
Theodozio Eftrater, peíToa, de que já fizemos memoria em^
algúas partes defl:a narração . Vio ao amanhecer a trincheira^
& pella obra conheceo , que aífiftiaó aos cercadores, Cabos
intelligentes, & práticos na milicià .Ainda ooccupava efte
difcurfo, quando o divertio o Capitão Paulo da Cunha com
embaixada da parte do Meftre de Gãpo Martim Soares Mo-
reno, em que lhe dezia entregalfe a^Fortaleza, & não efperaf-
fe o. aíTalto, porque nelle feeícreveriaó as capitulações nas
folhas das efpadas dos fitiantes , com o íàngue dos cercados.
Com publicas arrogâncias defpedio o Comendor , ao enviai
do,& em fcgredo lhe diíTe, que eftava preftes para comprir o
prometido ao Governadoí;" do Eílado , & "a Joaó Fernandes
Vieira^ mas que importava mandar recado ao Meftre de Cã^
po André Vidal de Negreiros, para que com o feu terço en-
groíTaíTe o poder, & tanto , que chegaííe lhe fizeííe fegunda
embaixada, á qual refponderia em fornia , que nem faltaííe á
fua palavra, nem a feu credito. Não repitimos o fundo deftes
myfterios, porque em diverfas partes defta hiftoria ficão de-
claradas as caufas.

7 1 AíTiftia André Vidal de Negreiros com o Governa-
dor Joaõ Fernãdes Vieira no feu Engenho de Saõjoão Baup-
tifta da Várzea 5 ao qual tinha já enformado de todos os íe-
gredos , que avia no cerco da Fortaleza de Nazareth ; pella
Fedem ao Mefire pofta fe lhes fes avizo do muyto,que importava fua prefença
ae Campo André pg^a q bom fucçeíTo daquella empreía, Apreífou-o o Gover-
^^'^'"^'/'^'^'/^^ nador da liberdade, & fem detença fe pos a caminho. Che-
gou3 foy recebido com as falvas defupèrioi*, induftriofamen-

te

fente.

1(545

TÀ^ELLir%0 PJ.

345

te repetidas, que rematarão em mandar íegunda embaixada

aos cercados, a qual fe refumia , em que logo entregaííèm a .

Fortaleza a bom partido, antes que o aíTalto fechaííe a portí^

a todo o concerto j porque aííi aos foldados do aíTedio, como

aos que de refrefco avião entrado no Arrayal com o feu Me- ^^^'^ '^ %^ '^"^ ^

X J Ítt4 t€TCO Cj* Wiâ*

ftre de Campo,& Governador André Vidal de Negreiros,ti- ^^ embJxada ao
nha já impacientes a dilação da eícala. Não era o enviado por inimigo,
quem fe mandou efta embaixada , peíToa conhecida do Co-
inendor, nem de portc,de que fe podeífe fiar:Cpm efte receo
refpondeo : Que não avia de aceitar, nem ouvir pratica fo^
bre femelhante matéria, que foífe mandada por homem , que
não tiveífe pofto na milícia , que vieíTe o Capitão Paulo da
Cunha,& q então defiriria á propofta como convieíle. Che-
gou Paulo da Cunha á Fortaleza, & o Comendor o recebeo
com todas as cortezias,& ceremonias militares . Convidou-o
a comer, & diante de íeus foldados o ouvio . Com fagaz de- o que refponde
íenfado refpondeoj que elle,com o Theodozio Eílrater, fora à embaixada.
fempre fiel amigo dos Portuguczesj mas que em quanto Co-
mendor daquella praça tinhafó por amigo ao feu credito , q
todo confiííia em fazer bóa a opinião, que delle tinha, quen^
lha entregárai& que não dizia elle morrer na defenfa, fe não
dar mil vidas pella menorpedra de fua fortificação^ & levan-
tando-fe da meza tomou a Paulo da Cunha pella mão, Sc o
veyo acompanhando até a porta,aonde có deííimulação lhe
diíTe, que da fua parte avizaífe ao Mtftre de Campo André
Vidal,que logo mandaíTe dar hum aífalto á Fortaleza da Bar* jc
ra, porque elle a tinha em forma que fem diííiculdade a ren-
diriaj& que com toda a prefteza a fortificaíTe, & guarnecef-
fe de maneira,que viífem os feus íbldados fechada a porta a
todo o focorro, que podeíTem efperar do Arrecife; Sc que c5
a mefma lhe empedifle a fonte, de que bebião, porque a falta Bufca o Comen»
da agoa,& das efperanças delia, os reduziria a feu intento, & dor caminhos ^pa-
que não eftranhaíTem as dilações, porque todas feencami-T'*-^'^"^^^'^ ^^'*''
nha vão ao ferviço delRey de Portugal , cuja era a Fortaleza,
de quem elle era fiel Vaífallo.

72 Executoufeoconfelho;&oefFeytomoílrouqucer<i
nacido de animo fiel, & verdadeiro: Sobre efte feguro aíTen-
tou a confiança, com que André Vidal efcreveo a Theodo-?

2ÍO

n

'i !■ 1

iP

§4^ CJSTIiròTO LUSITJVO y i%

2Ío Eftrater fobre a matéria, a quem,refpon(leo verificando
a promeffa com fua mefma firma. Para com os feus , fe veftia
a cautela de admirações, com que lhes moftrava os valles, &
os montes cobertos da noíía gente,& dizia, que não fabia en-
tender donde poderia vir tanto numero de foldados, fe naõ
foíTe, eftando alli junto todo o nofíb poder^Sc logo lhes acó-
fclhava, que era neceíTario defender-re,não fó por conferva-
rem o credito, fe não também por não perderem a vida, o q
feria certo fe deíTemem mãos de homens encarniçados em
matar, nas duas'v iftorias paíTadas : Ardil com que enchia de
pavor os ânimos dos feus. Succedeo, neíle comenos , fahirda
Tomão os noffos Fortaleza hum barco furtivoCem fua opiniaõ)a noíTos olhos
hua lancha^ & cõ carregado de mulheres, com as quaes fazia viagem , do mef-
^ueocca^ião. mo porto para o Arrecife, Alartos Holt Efcoleto do deftric-
to de Sanâo António do Cabo , com muyta fazenda fua j
£em o quarto livro.§.i2.diflbmos a jurisdição defteofficio.^
& como não podia íahir pella barra tomada , & fenhoreada
dos noíTos, intentou a fuga pella Barreta: A imperícia do Ar-
raes, & a turbação da preíTa lhe não deixou tomar a medida
ao fundo , pella embarcação; & enganado das horas da maré,
fe vio encalhado em hum banco de área , quando a infurtf-*
fera avertencia podia fó fervir á laftima : Forcejou por fe li*
vrar do feco, porém quanto a diligencia mais o detinha, tan-
to mais a vazante,com a diIaça6,o deíàmparava,&defcobria,
<íando lugar, a que o Capitão Francifco Barreiros femeteíTe
cm hum barco, com a infantaria,de que era capaz, & arriban»
do fobre o Olan dès o rendeo fem reíiftencia^&fem diftinçaô
paíTou a todos á eípada; foy o Efcoleto , o que levou o pri-
meiro golpe da morte, porque não podia pagar as culpas cõ
húa fó vida. À todas as mulheres fe deu quartel, & defpois li-
berdade, ficando nas mãos dos foldados o barco com todo o
recheo,& foy confideravel a prefa.

73 Entrou Setembro a dar numero aos dias, para que fe
contaíTe o cerco por mezes.No primeiro dia, mandou o Mef-
tre de Campo ao Capitão Paulo da Cunha acompanhado do
Auditor Geral Francifco Bravo,&do Capitão João Gomes
de MelIojCom folemne embaixada aos íitiados,dizcndo-lhe9
iiellaj que naõ fizeífem credito daperdigãoj nem conveniên-
cia

i<545 ^JXTBILW^O Fl. .547

cia da perfia, faltando aos eftilos da guerrajdo que nunca po- •

derião tirarhonraíQuetomaííemodepoiméto afeusolhos, ^^ ,

11 11 1- • - rr N rio ^ Protejtao ac te

Sc que elles lhes diriao, Qlem engano) que para eicalar, òc re- ^^^ ^ Fortaleza

■der a Fortaleza tinha mais numero de gente , do que ella po- ^ efcala,
deria ter de pedras;que fe aproveitaffem da comodidade,que
os rogava, antes, que íintiíTem a renitência, com que a cólera
perdoa j& que fe eraó práticos , a experiência lhes teria aver-
tido, que não tem nada de valentia o morrer fem fruito , aííl
<jue fem detença fe refolveífemjou a fe entregarem como po-
liticos, ou a morrerem como bárbaros. A refolução tão aper-
tada refpondeo o Comendor , que nada podia concluir na-
quelle d!a,por quanto lhe e a neccíTario fazello com o con-
felho de feus officiaes ; & em fegredo avizou , que fe lhe não
efperaíTe nem húa fó hora de tempo: [ Dentro delia v o toa
Paulo da Cunha, com defengano,que fe logo, Iogo,fe não ré-
deífem, fe preparaífem para a defenfa, certos, de que a nenha
perdoaria a efpada , ganhandorfe a Fortaleza põr armas. No
breve tempo,que o Capitão Paulo da Cunha gaftou em ir có Propojía que fm
a refpofta,& voltar com a inftancia,chamou o Eílrater todos o umenâor aos
os feus ofiBciaes da milícia, & có deftreza lhes falou defta ma-/^^*
neira: Todas as refpoftas, que dei ás embaixadas da entrega, '^
formou o artificio, nenhúa a intelligencia: Aonde a podia fú- "
dar meu difcurfo, quando todos fabemos , que em duas bata- »
lhas fe perdeo aquelle poder,em que eftribava noíTo focorfo? '>
E quando no Arrecife fe empenhaífe o ultimo esforço em '>
íios focorrer, por onde nos avia de entrar, fe por mar , & por '>
terra nos tem o inimigo tomadas as v ias? A omiíTaó, ou a im- '>
poffibilidade dos noífos Governadores, nos reduzio a tal ef- '>
tremo, que he mayor o dano da falta,do que o perigo da for- "
Ça: Por efte caminho he certa a fome , & infalivel a ítâiG , ten- '>
donos o inimigo tomada a agoa: O cobrai la por armas he im- "
poífivel^ o bufcalla a furto , fera comprar húa gota delia por "
muytas de fanguej fineza tão mal merecida,de quem nos cau^ '^
zou efta penúria , que entendo faz mais eftimação de feus in- ''
terefes, que de noífas vidas . Se por mercadores as arrifcare- ?>
mos,& perdéremos,a que prémios, ou a que honras fubimos? 5'
Gente, que paga mal ferviços, como há de fatisfazer finefas? '>
E fe a retenção do roubo he crime, & infâmia, que honra ga- ■>-»

nhamos 53

"■PÍ0:

34^ C^ST^WTOLUSITJKO ^1^45

55 nhamos em defender a uíurpação defta Fortaleza a íeu pro-

?> prio íenhor,quando com todo o dereito da juftiça, & das ar-

55 mas fe empenha em a recuperara Tenho difo, o que finto, 8c

com tudo eftou prompto, para feguir a refolução defte coi>

^elho. ^

74 Decidio-íè o negocio com votos encontradósja ma-

yor parte determinou a entrega:Duro fe Ihesfazia5aos de côr

j '^f.^f^i ^^' trario parecer, perderem os intereíTes , que tinhão naquelle
ga da Fortaleza. r o r i-- -i • t i i • i t ^ -

polto; òc elcondiao o util particular, debaixo do zelo comu^

principalmente hum Framengo por nome João Hec, que c5
55 pezado femblante diíTe para os outros: Affi, ás mãos lavadas,
55 avemos de entregar ao inimigo a melhor praça que nefta cof-
5) ta. tem os Eftados? O que fe ganhou com tanto difpendio, &
53 tanto íangue,fe larga por cortezia.^ Náo pello meu voto,que
33 fe venho na entrega, he vencido, mas não convencido . Mal,
fe tinha diíinido efte acordo , quando o Capitão Paulo da
Cunha tinha voltado com a ultima refoluçaõ ,atraz referida:
Sem dilação mandou o Comendor a Gafgar Vandrelei , Ca-
pitão dos Cavalleiros , com outro oíScial da milicia, que fa-r
hiííem a capitular a entrega da FortaIe2a,cujas condiçoés,ef-
tendidas em papel,foraõ as íeguintes: Que os Cabos fahiriaõ
cõ todas as honras militares , que fe cuflumão conceder em
íemelhantes cazos,&com tpdos feus moveis . Que a Cabos,
& foldados fe pagarião todos os foldos,que a Cópanhia lhes
eftiveííe devendo.Que todas as munições armas,& artelharia
íicarião para eIRey . Qiie a todos os que quizeíiem militar
debaixo das bandeiras da liberdade , fe lhes aíTentaria praça,
& daria foi do, como a todos os mais do exercito. Que aquel-
les, que quizeíTem fervir nas guerras do Reyno , fe lhes daria
embarcaçãoj S>c que o mefmo fe guardaria com aquelles que
quizeíiem paffar á fuás terras.Firmadas as códiçoés referidas,
de hua,& outra parte, mandou dizer o Comendor,que elle,a
Fortaleza,& todos os feus eftavão ás ordês de fuás fenhorias;
para que dehúa, & outra couza difpozeíTem comofoíTem
fervidos. Por hum próprio fe fes logo avizo ao Governador
Yoai Urmnàes J^^^ Fernãdes Vieira,não fó a bufcar feu beneplacito,fe nãa
também a pedir-Ihe dinheiro , para íàtisfazerem ao fegundo
capitulo das condições relatadas,

75 ^--

r645 fJ^B 1. LIV^O VI. 54^

71^ O tempo.,que o Meftre de Campo André Vidal ga-
ftoo nefta emprefa, íervio a João Fernandes Vieira para fa-=
zer hum pedido pellos moradores,com que podeííe fufteotar
a continuação da guerra . Contribuirão os mais delles como
podèraó, & náo como defejavão^ tão coníumidos os tinha a
tirania, que fó fe ajuntarão mil & tantos cruzados , que logo
fc arrecadàraõ,& deftribuiraói ( como confiou dos livros áo
recibo, & difpendio j & como conftará deíla hiftoria. ) Não
com menos cuidado, & zelo,íe occupou em render ao ceo as
graças das mercês recebidas,& vidorias alcançadas,com feíli^ '
vas demonílraçoés , & fâgíâdos aplaúíos , ( que a concurren-
cia dos moradores fes mais pompoíos ) a quem fua devaçaõ
atribuio oalcãce dos beneíicios,que erá,a loterceçaó da Virr
gcm Senhora noííà : Chegado o dia de O) to deSetembroj
cm que a Igreja íbleniza lUá Natividade , o feftejoii na Ma- 0 qml ccpUU-
triz da Várzea có MiíTa de trez choros; Pregou o Padre McA cas demofiraçoês
trc Frey Manoel do Salvador, com dilcuríòs eruditos , exor- rendm gradas ^
tativos, & devotos.Rematou-íe ã celebridade có íolene pro^ ''^'^'
ciçaó , em a qual o mefmo Governador levou eai luas mãos
a Sagrada Imagem da Senhora, de novo feita j & colocada no
akar de Saó Sebaftiaõ, da hermida,& do Engenho de fen no-*
me,para perpetua memoria do focorro,& da gratidão* Aloja-* 1
va-fe naquelle fitio o noíTo G5Cercito(náo fofreo a piedoía có*
fiança, que os lugares apartaíTem a neccííidade do remédio^
crendo com viva fé, que da mayor veneração aviadcferre-
foka, o mayor favor: Tendo-le experimentado, que Corta o
ceo o focorro pella medida do culto,)

76 Nefte devoto exercicio o achou o corre vò que lhe
trazia a nova da entrega da Fortaleza de Nazareth.Vio o Go-
vernador Joaó Fernandes Vieira fpella plana dos foldados] ^^^^^^^ mnryeirò

opanhia devia aos rendidos, & achou q erao neceí- ' . aa
farios nove mil cruzadosjque logo remeteo pcllo melmo pró-
prio.Chegara-fe o tempo definido para á entrega da Fortale-»-
za, & formada a nofla infantaria, a entregou Theodozio Ef-
tracer,dando as chaves ao Meftre de Campo André Vidal de v

Negreiros, com os parabéns da poffe. Sàhiraó os rendidos, q
erâo duzentos & fetenta & cinco (náo entrando nefta conta
hum numero grande de gente vaga , que nella fe tinha reco-

/ Gs Ihidol

1!

%n

Ihido) & entrarão osiioírosàguarnecella. Seguio-íe a efta
fançaô mandar o noíTo Meftre de Campo armar húa meza,
deitar-fe nella o dinheiro, & dar-fe a cada hum dos rendidos
dez cruzados: Aos ofEciaesfe pagou conforme ádivida,& ao
poftoj com o que todos fe deraó por fatisfeitos. A aquelles,q
fe ofFerecèraó â fervir com os noíTos , fe lhes afíentou praça
com pagamentos pontuaesj&ajuftados a feus poftos.Com os
outros íe guardarão as capitulações inteiramente .Então fe
derão univerfaes, & repetidos vivas , á pureza da fé ,á liber-
dade da patria5& ao alcance da viâoriajCom aquella alegria,
que cauzava a todos o defejado fim, que prometiaõ princi^'
pios taó ditofos.

j7 No mefmodiajCm que fe tomou poífe da Fortaleza,
chegou á boca da barra hum barco carregado de mantimen-
Tomão os noifos tos,que vinha do Arrecife em focòrro dos cercados . Duvi-
toffe da FortaU' dou a entrada, incerto do eftado das coUzas:Âdverti-o o Ef-
za, írater, & diíTe ao Vidal, que mandaífe levantar,& abater húa

bandeira nos altos da Fortaleza j &logo defparar huapeça,
que era o final, que eíperaváo os do barco, para entrarem c5
íegurançaj o que feito, veyo o barco bufcando a barra a to-
do o panoj fe não que o Capitão delle devifou nas muralhas,
com hum óculo de longe , íbldados com traje Portuguez , &
virando a proa,fe fes na volta do marjporém ;á a efte tempo
lhe hia dando caça o Capitão Franciíco Barreiros , & como
navegava boyante,o abordou brevemcntej & íèm difficulda*
de o rendeo, Screbocou para a Fortaleza 5Comtodos,& com
tudo o q trazia. Acharão -fe naquella praça dez peças de brò^
ze,todas de alcance jmofquetes de fobejo; pólvora, balla,cor-
é'h'jmbãrcojque ^^ ^^^ quantidade^& não pequena copia de mantimétos.Foy
ejo. ^^ fiicreíTo de utiliífimas confequencias , para noifos inten-
tos, porque nos deu porto capaz para a entrada das razendas,
& dos focorros,&: para a faca dos géneros , com hua Fortale-
za, a cuja fombra podião os navios do comercio, eftar feguros
110 porto: Pella mefma rezão, de grande quebra para as efpe-
f ancas do inimigo; & tanto mais fenfivel efte golpe , quanto
mais laftimado o tinhão, os que avia recebido nas duas bata-
lhas antecedentes; agora renovada a dor das chagas, com efta
nova ferida. Cinco dias deu o Meftre de Campo André Vi-
dal

i64Ç (Ê^J^TElLlF^orL' 551

dal de Negreiros á compoííçaó da FortaIeza5& a todo o jprò-
vimento delia .-Ordenadas todas as couzas neceííaria á ília có-
fervaçaó,& á dos moradores vezinhos,&: preparada a carrua-
gem, para a condução dos foldados, fe pos em marcha, para a
Varzea,com o Meftre de Campo Martim Soares Moreno^ le-
vando, encorporados no exercito , aos rendidos, & a Theo-

dozio Eftrater cò o governo de todos, os que neíla occaziaó
aílèntáraõ praça para fervirem entre nós.

78 He a hiftoria como o edifício . Aquelle agregado de
couzas, que a idea forma juntas em hum todo,divide a praxe,

porque não obra fe não em tempos fucceífivos .DiíFerença, Nas póâeahip^
que fe acha entre os fucçeflos,& a relaçao,nao lo porque nos rrj ^^^^ ^^ ^^
fucçeffos obraõ muytas mãos , & na relação húa fó pena, fe ^^^ ^ tmt^o.
não, porque os fucçeíTos, que juntamente fe obraó em muy-
tas partes, não pode repetir a relação em hiía hiftoria, fe naò
íliceííí vãmente. Deixamos efcrito, como no tempo, em
que João Fernandes Vieira fe refolveo a por por obra a em^-
prefa da liberdade, deu noticia a diyerfas peíToas, & a difFeré-
tes partes de feu intéto, & do q^ avião de exccutar5Com feii a-
vizo, (que prometeo fazer em certo tempo, porqu efe a via
de pôr dia determinado , para nelle fe acclamar a liberdade
em todas as partes do d ominio Olandès. ) Adiantou-fe o fuc-
çeíTo á determinação,& correrão as couzas fem ordem , nem
tempo certo, affi como as pedião as occazioês , & os lugares,
fuccedendo muytas cm partes diflfèrentes , no meímo dia^
que acõteceraó as relatadas , na cãpanha de Pernambuco; co-
mo foy no Rio Grande,na Paraiba,na Ilha de Itamaracá,QCa-
pitanías daquelle Eftado) & em outras povoações, & partes
fogeitas ao Framengo. Afll, que iremos referindo os cazo*
como fuccedèraõ , naõ feguindo a ordem dos acõtecimentos
pello grande, ou pequeno , perto , ou apartado dos lugares,
fe não pello que huns , & outros fe adiantarão nos dias ; no
difcurfo de alguns me adiantarei ao tempo , por não truncar
fua hiftoria, fervindo todos a contextura delia, como fervem
á tea os fios,que urdem ; pois he certo , que os que quebraõj
por não ficar tecidos, ficaò desfiados.

79 Deíenganados os Framengos com o íliccedido em a
noite de San^to Antonio(na invazaõ dos feus,& retirada dos

Gg2 *- noíTos)

A diligencia di

^

\

3^2 C^ST^ipXQWSITJKO I

noíTos) & da refolução, com que os moradores tratavão,exi-
tmmtiofoy a á "^'^"^^ ^^ ^^" ^^^^^^^ imperioj com toda a diligencia trabalha-
pnmaroperful ^^^ por atalhar osprogreííos da folevação, da qualtinhaó
dio aaccíamacao viílo, em Joâo Fernandes Vieira, a cabeça ; & a inferência
da Uberdade. de que avia de ter corpo, ainda que a feus olhos efcondido:
Sentia-fe feu refpeytooíFendido,&laftimado defte primei-
ro movimento , & para que a parte inficionada não corom-
peíTe o todo, com húa mão acudirão a tomar o Tangue á feri-
da, & com outra a empedir , que não lavralTe a chaga: A as
partes daquelle corpo politico,que fofpeytou mais vezinhas
á lezáo, acudio primeiro com os perfervativos, que lhe pare-
cerão necefíarios : Defpachou avizos , & ordens a todos os
Cabos de fua obedienGÍa,ás guardas, Sc aos prezidios de fuás
fortificações, que aos moradores tomaíTem todas as armas;
porque defarmado o braço ficaria menos ouzada a força , &
feriaó fem vigor as diligencias do defejo. Tinhão os do feu
côçelho a lifta (afeita pella calumnia,& pello intereíTe )de to-
» dos os que afpiravão á folevação, ou por rczão do pofto, ou

por confelho da oppreíraó,& pafíaraõ ordens a todos os feus
Miniftros,q prcndeíTem os nomeados,&pronunciados nella,
porque ainda, q era incerta a culpa , acobardava-os a fofpey-
13,3 qual recebia mais,ou menos vehcmécia da mayor,ou mct»
nor diftancia, multidão, & cailidade das peíToas . Dentro no
termo de cinco dias [que fe cótáraõ dos treze até dezoyto de
Junho] defpacháraó, & defpediraõ do Arrecife a hum Fra-
mengo do feu concelho Politico por nome Paulo de Lingc,
para Governador da Paraiba,& feu deftriâ:o com algiia infá-j
taria em guarda de fua peflba: Marchou com preífa j chegou
r fem detença, & tomou alojamento no Mofteiro de S. Franr
cifcof até entaó Convento de religiofos, agora quartel de
foldados.]Melhorou todas fuás fortificaçoês,&com diílimu-
kdos obfequios fervio aos moradores,obrigando-os a{íi,a vi-
veremjsntes pacíficos com proveito, que inquietos com rif-
co,dando a entender a todos, que em feu governo determi-
nava obrar mais com o afago, que com o caftigo^ & moftran-
do-lhes , o que fe prefumia de feus procedimentos , retificá-, <
raó todos com juramento fua fidelidade . Ao meímo tem-
po,com nefanda perfidia, deípachou o Hereje hum próprio

com

1!

res.

comavizo a Pêro Poty Governador, & cabeça dosíndioSj p^^^/^ àe Llnge'^
que viviáo no certaõ, para qne com toda a gente de íeu do-- Governador óll"
minio,& dos lugares confederados decefièm dos montes pa- ^^^ ^'^ Parâibdy
ra a Cidade . Logo veremos o fim defta diligencia ( intenta- fiy , ' ^'f, ^^

do,&náoconíegiiido.; ^ ^ ca^itama.

bo Saóas Villas de Goyana,&Cunhaii povoações do \

d€Íl:ri3:o da Capitania da Paraiba . Nellas obrou o defejo da ,
liberdade com menos voz,porque com menos corpo^ porém
ouvio-íeobrado, quedeu alaííima da primeira cmfíi^Qy.t^ Mandou deceí^ &
cutada em Cunhai^i,pella barbaridade do Gentio5& direcção Gentio para de^
Jo Olandès, quando com hum golpe deíejou acabar com to^ ^"^^'^ ^^ morada'
da a nação Portugueza 5 na circunferência defeu dommiot
Naó repito o fucçeílb , por não renovar a magoa , fó perten^
do refrefcar a memoria nos exceíTos da ferina indinaçaó^com
que então obrou o Framengo, & o Gentio. Já diíTe como em
dezafete de Agofto de mil & feiícentos & quarenta & cinco,
íahio o deshumano decreto,!^ parto do ódio, &da cobiça
Olandefa, ] que fentenceava a morte aos moradores de feu
dominio, de toda a condição, idade , & fexo em dia, & hora
determinada; para q em todas as partes fe executaíTe a cruel-
dade, fem que a noticia do golpe dado em hua povoação,po-
dcíle fervir de reparo em outra, nem aconfelhando a fuga,né
difpondoadefenfa. Pella Capitania de Pernambuco fe ata-
lhou a execução do preceito,,com a do caíligo , na favorável
peleja do engenho de Dona Anna Paes. Em Cunhau cahio o
rayo com o eftrago, que já temos dito, antes que podefíe íer
focorrida da gente, que o Governadorjoão Fernandes Viei-
ra lhe mandou , por culpa do Cabo j mal fatisfeita com fua
morte (que a de hum traydor náo he preço equivalente, pa-
ra fatisfazer a de muy tos fieis.) Sobre efta lembráça aíTentará
a clareza, & melhor intelligencia de noíTa hiftoria . Tinha o
inimigo recolhidas as armas,que pode aver,dos vezinhos deí^
tes lugareSjSí nelles prendera aquellas peíroas,que lhe repre- ^^^ afoleíaão.
fentou inconfidentes fua paixão.Em a Villa de Goyana pré-
deo a dous moradoies nobres,aos quaesjoaó Fernandes Viei-
ra tinha mandado patentes de Capitães; porque o tempo, &
a noticia da folevaçaó os tiveííè prevenidos , para õ dia , em
que fe avia de acclamar a liberdade.Eftes foraó Gonçalo Ca*^^

Gg3 bralj

r

\r

CÕ o ^uefêtfuiL<

354 CAST(^oro LVSirjlSlO ;i545

bral, (que âefpois levou ao ruplicio,prímeiro fua ílngileza,
que fua culpa.) Eftevaó Fernandes, ao qual livrou da morte,

f '^T ^''^ ^^ mais a negociação de fua fortuna, que a fagacidade de fua de-
vrender os For- (. ^ ^.. ^ , . r ^ ^ ,° ^ , ^

tmue^es. i^-^^* roy-lhes companheiro na lorte Carlos Colart Francês

de nâçaó, & de coração Portuguez, cazado na terra: (A pai-

xão,que o fes participante no fegredo, o entregou a prifaó: )

Cahio também no laço o meirinho do mar Jacome de Lyra,

que mofreo na prifaó, para não íentir, o mandarem-no arraf-

tar pellas ruas,defpois de morto.De rebate ferviraõ eftas pri-

foensaosmaisdosvezinhosdeGoyana, que osacautellàraõ

para o tempo do perigo . Elegerão de entre íl capitães, & of-

ficiaes, que os governaílem: Recolherão todas as armas, que

Os de Goyana a- poderão aver, ( antes do inimigo as tomar ) & na occaziâo

fetidar ao primei mais opportuna íe fizerão fenhores da povoação apelidando

roa i er a e. li|3ei-(3adej& fe defenderão varonilmente,a todos os incurfos

do inimigo pella diípofíção, & induftria de Diogo Garva-

lho,PafchoaI de Frey tas,& Martim Fragozojaté,que por mã-

dado do Governador Joaõ Fernandes Vieira,os renderão dos

poftos , os Capitães Francifco Lopes de Orofco , & Diogo

Vieira Ferrete.

8 1 Chegou a nova da rebelião á Paraiba,perfuadindoa,
como nova cãuza^ as referidas prifoês dos moradores,& o íe-
crefto das armas ; ouvio-a o novo Governador com aparente
viffitnuUoFrâ* defprezo,mas com interior fobre-falto:[não receava o tumul-
^o^^Fâ^p^ ^^h ^^P^llo ^íi^^ra , fenão pellas coníequencias,queconíigo
' traziai& foube aproveitar-fe da liçãojque lhe dava o fucçef-
fo.]Diííimulou com as prifoens, & coma prematica das ar-
mas, que feus íiiperiores Ihemandavão executar j fogio, por
efta via, de aíToprar o fogo, que ateava o exemplo j & deitou
mão daquelles meyos, que lhe parecerão mais cfficazes para
divertir o povo da queixa , & da imitação . Mandou fixar e-
ditaes por todos os públicos fubordinados a feu governojcm
os quaes, da parte dos Eftados,Goncediá perdão a todo o ge-'
nero de peíToa, que por algum modo tiveíTe encorrido em o
crime da rebelião (ou foíTe influindo , ou aprovando ") com
tanto, que apartados da fediçaõ feguiíTem o antigo,& pacifi-
co efi:ilo de fua obediência^ em que confiftia o feguro de fuás
■vidasj&fazeiídas j & particularmente pedio a cada hum dos

»' • .

Cheffã-lhe anovA
Ta

principaes Cidadoís , que ferviíTem com feu exemplo ao fo-
cego da republica, & que elle tomava por fua conta o cuida-
do de os livrar de toda a vexação, & hoftilidade , affi dos foi- "^^TZ^J^^
dados, como dos índios , para que elles moradores fe podef- y^^^l
fem entregar ao governo de fuás herdades , & familias . Co-
: meçou-fe nefta occaziaó a praticar no levantamento de Joaó
Fernandes Vieira , & no fequito , que achava fua refoluçaõ
para fahir com a emprefa da liberdade j & pello alvoroço do
povo conheceo Paulo de Linge o interior dos ânimos , mas
com tal fagacidade feavia, que quanto melhor o entendia,
mais o diííimulava.

82 Com remorfos da própria conciencia não podia o
falfo Governador focegar; tinha mandado v ir ao índio Pêro
Poty, como já diíTemos, era força publicallo, ou nefte, ou em Trata de enganar
outro lugar, a prefença,& nella manifeftar-fe fua perfidia^có ^os moradores.
o que não poderia fuftentar muy to tempo,feu enganOj& dé-
tro do fegundo,tratou de efconder o primeiro.Publicou,que
tinha mandado vir a Pêro Poty com os índios de fua jurisdi-
ção, para os ter , com fuás mulheres , & filhos, dentro da Ci-
dade, como em cuftodiajporque lhe não ficaíTe porta aberta,
nem aos feus,nem aos índios, (antes por natureza atrevidos,
agora por exemplo infolentes) ppr onde entraíTem avcxar os
moradores. Bem fe deixou entender o veneno,que entranha-
V ão as palavras, & o nocivo fim de convocar os índios , mas
não fe quizeraõ os homens declarar fem aíTiftencia de mayor
poder, fundando a confiança de lhe chegar, na diligencia, cõ
que tinhão pedido focorro a Joaó Fernandes Vieira,para na-
quelle defl:riâ:o apelidarem a liberdade. Chegarão os deza-
feis de Julho,& nelles a Cunhau , aquelle Jacobo , Olandès
por nacimento, falvagem por cuíl:umes,& habitaçaõ,com to-
dos os índios de fua parcialidade , a por em execução o abo-
minável decreto, tantas vezes referido,dando principio por
efta povoação a execução do preceito. Aquella anticipaçaõ
do tempo, que em Cunhau fervio ao eftrago , fervio a todos
os mais lugares de faudavel avizo, porque nefta crueza foy o ^.^ 5'''^^'^» '^°^J^^*

r . . ^. ri 1 r • 1 f> 1 ■ ^^^o " encano buf-

terro inimigo efpada, que cortou o defcuido^ & lingoa , que cão armas parafi
publicou o fegredojcom o que fe manifeftou a todos a detef- defenderem.
íavel ordem. Ou vio-fe na Paraiba o grito do deftroço/orma-

Gg4 do

.ífftvl^^i^^Sll■^•''^P"J«(i^^^i>'Jk^**yjg-»ja»!ijt^»Vgg''

3'té

CASr(!(IOT0 LUSITANO

1645

Alter aÕ'fe com .

do do fangue vertido;& avizados os moradores , da vezinhã-
çjL ào perigo, fe fizerão todos em hum corpo, para a preven-
ção do remédio: Tratarão das armas com cautela ; & abomi-
náraõ a perfídia com publicidade. Unidos na queixa , eftra-
nháraó ao Governador Olandès, a inaudita exorbitácia, def-
culpada com a infolencia de hom governo , que apoftava de ^^
•verdugo.Condenou o Linge (com fingido efpanto) a crue-
za do Gentio, Sc proteftou pella innocencia do governo, af-
firmando, não aver tido parte na extorçaõ cometida j & da-
va por íiadoí da certeza, o caftigo da crueldade, da qual avia
de informar logo ao Arrecife, para que mandaíièm punirjaífi
aos Olandeíes rebelados, como aos índios falvagens.

8 3 Nefta occaziáo teve o Linge impulfos de prender a
todosaquelles moradores, q trazia do Arrecife por rol^viaos
juntos á porta de fua Fortalcza,& coníiderava,que lhos apre-
feníáva a dita^ mas também receou o veilos unidos ; porque
os fofpey tou amotinados pella prifaó,que tinha mandado fa-
^ 2er de AntonioBarbalho,eftranhada de todosjrefolveo-feem
Irifaõ de Anto- guardar o negocio para occaziáo mais opportuna , & menos
nio Burbalho. arrifcada^ ouvio a queixa , & com artificiofas aparências fe
pos muy to da parte dos offendidos,aprovando a rezão,& có-
denando o exceífo.Defpedio a todos, fahindo de feu quartel
com gente de guerra a correr o dieftrido , & aíTegurar os mo-
radores do receo qne tmhaõ, de que os igualaria a forte com
os de Cunhau,cujas,mulheres,& filhos lhe íahiaõ ao encon-
tro pellas eftradas, cobertos de luto , & de lagrimas , pedindo
aos homens vingança, & a Deos juftiça ; queixa, que não ti-
rava mais do Framengo,que fingida laílima,fendo que pode-
rá introduzir nas pedras^verdodeira magoa . Proteftava com
juramentos, o pérfido Hereje , que em tamanha demaíia fora
toda a culpa de Jacobo, que avia muytos annos , que andava
levantado, & defobediente aos Senhores do govtrno, q não
defí|i^aõ mais, que colhello ás mãos,para o caftigarem como
meri&ia. Por efte teor dizia tudo aquillo , que a danada ten-
ção lhe enfinava^engano, em que eíle fó cabia , porque a ne-
nhum fe ocultava o falfo de feu coração, que forçado da ne-
cefíidade reprimia o ferino defejo.Voltou o Linge para a Ci-
dade, aonde em poucos dias fe divulgou a grande viâoria^

que

1^45 fJtjBI.LlV^OFL 5^7

que Joaõ Fernandes Vieira alcançara nas Tabocas , das ar-
mas Olandefas, & da chegada dos Meftres de Campo André
Vidal, & Martim Soares com dous terços de infantaria, a fo-
corro dos moradores, com os quaes ficavaò já encorporados. '^^'^^kv^ ^^^^^

»^-T- r rr • ^ r i -"-^ Portu<mez.es a,

Antevio O Lmge, que o íucçeílo avia de ler para todos ^^^- nji^íori^ àe loaõ
ploj & a cauza, que era húa melma em toda a parte, em todas FemUes vieira.
as partes avia de produzir os mefmos efFeytos j certo da ef-
íicacia, com que os ditofos perfuadem á imitação ( difcurfos,
de que tirava mais receos, que confianças ) mandou logo re-
tirar a todos os Olandeíes,& índios auxiliares com fuás famí-
lias, & moveis, para a Fortaleza, que chamão do Cabedello, /^
íituada na barra, cinco legoas da Cidade, prevenindo-fe, pa-
ra tudo , o que podia fucceder. Aííi como o tempo multipli-
cava os dias de Agofto , affi vinha cundindo a nova , de que
duzentos Olandefes clavineiros,acompanhados dos Tapuyas
que conduzia o referido Jacobo (aíTolado Cunhau) marcha-
váo a deftruir a Goyana , & a profeguir na execução do de-
creto, que os obrigava a não deixarem peíloa viva , em toda
aquella Capitania.

8 4 Mais induftriofos, que indecifos propoferaõ os m o-
radores ao Governador Olandès a vezinhança do perigo, &

a eleição do remedio.Dizião,que o efquadraó dos rebeldes, ^ , ^,- ,.
1*^1 ^ II ! 1 • N 1 ^^.,J Concede oOhães

OU levantados, (como ellepubhcava) marchava para a Villa aos moradores ar^

de Goyana, & que de força avia de atravefíàr pellos confins mascotra o c?m-
da Paraiba, & lhe fica vão os moradores,& engenhos debaixo ^^>.
da efpada, indefenfos porque fem armas; que as permitiffe a
todos; em quanto não paíTava a neceffidade , para qu e arma-
dos, & prevenidos podeífem refiftir aos aíTaltos ; favor , que
lhes naõ poderia negar como homem , &<como Governador;
pois a natureza,& a politica as concedia a toda a defenfa de
vidas, & honras . Ajuntarão á petição hum donativo,&: alcã-
çou-fe defpacho, & confelhoj dizendo-Ihes , que fe aprovei-
taífem das armas, que tiveífem (com tanto, que não uzaíTem
das de fogo) & fe os Olandefes rebelados,&Tapuyas infolê-
tes os enveftiíTem, que fe defendeíTem.Com efta permiífaõ fi-
zeraõ os moradores feus quartéis; & o Governador Olandès,
com parte de feus foldados , fe retirou da Cidade para a fua
Fortaleza do Cabedello. (Chegara-lhe a nova do eftrago, &

pri-

■i'rili»LL">igJlPl^'>.!i|i!LJÍ«€lt»l!

XJnem^fe^é^ for
tificiíÕ-Je nos Ji
tios mais àefen
favcú.

CAsr^oro lvsitmo

priíaó de Henrique Hus, & Teu exercito nas ca2as de Dona
Anna Paes, & imaginando noíía efpada fobre íua câbeça , fe
valeo da fuga, fe bem cohoneflada com differéte pretexto,)
Uniraó-fe os moradores do certáo comos da Cidade j fortifi-
carão os fltios , que lhes parecerão mais defenfaveis, & capa-
zes para nelles recolherem fuás famílias, & o melhor de feus
moveis, com todo o mantimento necefíario . Proveraó-fe de
armas de toda a forte,& offerecidos a toda a contingência, ef*
peráraó o fim, que a forte lhes tiveíTe definido.

§5' Já fe afíirmava , que o efquadráo de Ol andefes, &
Tapuyas marchava pello deftrido da Paraíba, fazendo todo
o dano, que podia', aos incautos, & ronceiros j & que deftesj
os que melhor livravão, remiáo as vidas a dinheiro (para fua
cobiça era mais poderozo o ouro, que para fua obediência o
prece yto.)Saõ as occazioés,as que fazem os homens,& nefta,
não avia morador , que não foííe foldado . Duzentos em nu-
mero fe refolvèraó a fahir ao encontro do inimigo . Gonde-
nou-fe o valor por temeridade , & retirados defte propofita
fe conferváraõ dentro de íiias fortificações, convencidos das
ajuftadasrezoês, que fobre efta matéria lhes deu Francifco
Camello, homem prudente , que fabia modificar a temerida-
de, com a efperançaj&a fúria, com a opportunidade. Entre
adiííimulação,&aintelligencia vacilaváo asrefoluçoés do
Olandés,& dos moradores. Nunca o engano foy para os nof-
fos mais útil , porque deu tempo , a que á Paraíba chegaíle a
Bova, de que o Governador João Fernandes Vieira manda-
va em feu focorro hua parte do exercito . Chegou á noticia
dos 01andefes,que guarnecião o quartel da povoaçaõ,& tra-
, tavão da total retirada; & de faquear a Cidade por delpedi-
--. . da: porém o feu Governador lho não qui2permitir,comma-

me , ^fe reúra "h^i^^ ao mefmo teínpo , efcrevia aos principaes moradores
j.^:y 1 vendendo-lhes a fineza com tantos exceífos de cortezia , que

deu occazião,a fe lhe propor a entrega da Fortaleza com avé-
tejados partidos,^; acrecentamentos, aíTi de honra , como de
fazenda. Affirma-fe,que a revolução dos tempos não deu lu-
gar a fe ajufi:ar o negocio.

8é Parece que nos pregunta o Leytor , que foy dos du-
zentos Olandefes j Sc dos Tapuyas j que traziáo em fua com-
panhia.

da Cidade.

i64Ç ÇAÍ(TELLir<^0 FL 3^9

panhia. Direi: Foraõ marchando pella campanha da Paraíba ^^^ ^^^^ ^ ^^^^^^^
deftroindo, & matando quanto lhes cahia nas mãos , não fe p^y^ coyam.
atrevendo a cometer as cazas fortes, aonde os nofíbs eftavaõ
prevenidos. Fizeraó em pedaços a alguns mancebos noíTos,
(não chegarão a de2 J que com menos juifo^que orgulho,en-
veftiáocom onumerofo efquadraó, mais para perderem a
vida , que para fervirem á pátria. A valentia difcorre; a cóle-
ra cega. Naó ferve á pátria , quem morre na pátria , fe não
quem morre pella pátria j& não morre pella patria,o que fem
utilidade da pátria perde a vida. Eftes mancebos morrerão
para acabar j& porque feu inconfiderado valor os matou fem
fama, morrerão fem nome. MuytosPortuguezes, com mu-
lheres, filhos, eíCravos,& moveis fe recolherão a hum Enge-
nho chamado Inhobim , do qual era fenhor hum Framengo
por nome Rezira,que a todos recolheo,& amparou com ani-
mo fieI,&generozo,(ainda que de nacimentoeftranho:JCo- / Ihè r ccede
mo fe o não fora determinava feguir a voz da liberdade, de q
já tmha noticias, porém o feu Governador Paulo de Lynge,
que por inferências o fofpey tou , com a retenção de dous fi-
lhos, que prendeo na Fortaleza do Cabedello, o conftrangeo
aretirar-feaella. Pagamos-iheaquellavontade com efta me-
moria : Chegou oefquadrào dos bárbaros ao Engenho de
outro eftrangeiro, ( Joaó Vinans era o feu apellido ,& feria
também fiia definição ) aonde cativarão a dous homens nof-
fos, a hum dos quaes matáraò defpois a fangue frio.

87 Pellos contornos deGoyana,aondeíua marcha ca-
minhava em direiturajroubáraó tudo quanto os naturaes não _
podèraõ retirar . Chegarão á vifta da povoação , que eftava
da outra parte de hum rio ; cometerão a paíTagem ao entrar
da noite, para fazerem mais horrivel o aíralto,& menos acau- SunmefmAtmn^
tellada a defenfa,& a fuga dos afli6i:os moradores, (^condena- í^^'^^^° ° v ^°'
dos ao ferro,& ao fogo)quãdo de entre os mefmos Bárbaros, '
fe levantou húa voz,que vinha fobre elles todo o noíTo exer-
cito. Foy tal o medo, que Deos infundio naquelles deshu-
manos corações, que lhes reprefentou hum,&: muy tos efqua-
droés formados da outra parte do rio, fazendo o temor pare-
cer a todos, que ou vião rumor de vozes proporcionado com
a multidão da gente, que via fua imaginaçâo.Tudo eraó en-
ganos

.,ift^"f^! r?-

••■''<■'' 5ii?»»?^J:'-''L^M''L'-.%.l*.^--WatfJ'0J

'' Beixaoa confer-
ia dos oUnàefcs.

\

RouhadoSyé" tlmi
dos fogem fará a
fua Fort aleija.

Mandão os noffos

,Gov€r?udoresfo'

corro h Faraiba.

5^0 C^ST^loro LUSITANO 1645

ganos, que fe reprefentavão aos fentidos , & como fe na rea-
lidade experimentarão os golpes, voltarão as cofias , torpe-
çando em fua mefma fantaíía3& fogindo de fuás mefinas fom-
bras, deixa vão o caminho femeado de armas,& fafendas^ que
aviáoroubado, para correrem mais ligeiros. Atemorizadosj
(como perfeguidos) chegarão ao Rio Goramame^ trez le-
goas da Paraíba i & parecendo-lhes, que na detença da paíTa-
gem os poderia alcançar a noíTa efpada,deixáraó os Tapuyas
a conferva dos Olandefes , & a todo o correr fogiraõ para o
certão, mo fe dando por feguros , fe não defpois , que pene-
trarão mnytas legoas de mato . Viraó-fe os Framengos de-
femparados dos Indiosj& como de nova cauza^os in vadio no-
vo medojguiados de feii defatino,fem faberem por onde, pa-
ra que, nem porque, forão dar nos Engenhos de Francifco
Camello, de Jeronymo Cadenaj& de outros moradore&,qye
acbâraó com mão armada, & com não menos temor , do que
levavão, cauzado da efcuridadeda noite, & da fubita chega-
da^imaginando-feeílesaílàltados dosTapuyas, &aquelles
perfeguidQs dos PortuguezeSjpaíTáraó toda a noite^huns fia-
do a falvação a ligeireza dos pès , fem pararem le não na fua
Fortaleza do CabedelloiOUtros,com as armas na mão até que
a luz da manhã os livrou do fobre-falto . Para Deos deílruic
exércitos bafta hua fombra da noite 5 como ;á fobejou htítis
reflexo do Sol, que fes parecer íàngue zs agoas de hum ribei--
ro. Foy eíle pavor dos inimigos caíligo , & pareceo prophe-
cia, porque dentro em poucos dias nos chegou o focorro, te-
mido, como vaticinado. No camiinho , que os Framengos ft-
zeráo para a fua Fortaleza^ os aíTaltàraõ alguns mancebos da
Cidade, que defpois de lhes fazerem deixar mochillas> & ar-
mas, os defpoja vão dos próprios veftidos.

8 8 Os noíTos Governadores, que deixamos ai ojados na
Várzea, defpois dafegunda vi£i:oria,não laborarão menos
com o cuidado, no defcanfo, do que com os braços noscon-
íliâ:os. Sabião por extenfo tudo,o que íè paíTava na Paraiba,
& em feu cõtorno, & por não faltarem á neceífidade dos def-
mayados, nem ás efperãças dos animoíbs,detcrminàraó a hiis,
& outros focorro oportuno , & proporcionado . Nomearão
por Capitães da leva a António Rodrigues Vidal [ fobrinho

de

1^4^

^Áxrn 1. Liy\o n.

3^1

de André Vidal de Negreiros, naturaes da mcfina Paraíba.)
Simão Soares, Coime da Rocha, &FrancircoLeytáo, com .
alguns Capitães, & officiaes para novas companhias , que a-
vião de levantarnaquella Capitania. Do terço de Dom An-i
tonio Phelipe Camarão, nomearão ao Capitão Couto, com
alguns índios, para que como naturaes daquelle certão per-
fuadiírèm,& chamaífem a fi os índios auxiliares do inimigo,
òfterècendo-lhes noíTa amizade, & vcntajoíbs partidos,que4
rendo militar debaixo de noíTas bandeiras:Com o mefmo iit^
tento mandarão a hum Toldado do terço de Henrique Dias^
por nome Henrique de Mendoça, para Capitão dos Minas^
&: Crioulos, í opondo quemuytos fe avião de aliflar. Ecm
providos de munições, & armas , os deípacháraó em os últi-
mos dias de Agofto, remetendo por os íbbre-ditos Capitães
patentes de Governadores daquella Capitania , a Lopo Cu-
rado Garro, a Jeronymo de Cadena , & a Francífco Gomes
Moniz. Mais lhes ordenarão , que ao paíTar por Goyana to-
maíTem algúa gente dâ povoação,efcoIhendo dos moradores,
áquelles, que tiveílem por fi a melhor opinião. Partirão dili4
gentes, marcharão cuidadofos, executarão pontuaes , & em
bum íabbado, primeiro dia de Setembro defte mefmo anno, EmwehfAYs. o
chegarão a hú lugar trez legoas da Paraiba, chamado Tibiri. governo ànCâfi-
E porque o fegredo facihtaíre,o que poderia difficultar a pu- '^'2nT^ '''''
blicidadcj com prefteza, & cautela mandarão recado aos trez
Governadores nomeados ; aos quaes não deteve mais a obe-
diência, que o breve tempo, que gaftáraõ em chamar algúas
peíToas principaes, q por modo de recreação os acópanhaf'-
fem. Chegarão a faudar-fe , leraó-fe as ordens , & confcrio-fe
o modo, com que fe avia de proceder na acclamação da liber-
dade. Defpois de vários pareceres, fe refolveo, por mais có-
veniente, que em todas as partes da Capitania fe accIamaíTe
a liberdade em hum mefmo dia, & hora : Em fé executar efta
determinação com prefteza, confíftiaoconíiguir-fe comd^i- AccUmA-fe ali*
ta,& afíi fe ordenou,que no dia feguinte,em que fe contavão beràade em toda
dous de Setembro , fe pofeíTe por obra . Repartio-fe, pellos ''^'*-
trez Governadores,o cuidado,& elles entre íi os lugares,aon-
década humavia demandar oavizo comhuamefma forma
de decreto , em que fe dizia, o que , o como , & o quando fe

í\h avia

3^2 ÍASr^oroWSlTAKO 1^45

avia de acclamar a liberdade.

89 O animo dos moradores, a que fó faltava efte avizo
para Tua ultima difpoíiçáo, não tardou em romper o grilho
da violenta paciência. Foy couza maravilhofa a brevidade,
Treparao-fe, & ^om que fe convocarão, fem que para algum fo0e necefíario
armao'je fíira a- pj-g^çj^Q^ ^^ que feármafle, & concorrefle, porque o deíejo
' de cada hum, aííi pegou das armas, que tinha prevenidas, que

fem tempo fe virão as companhias formadas , & guarnecidas
de eípingardas, chuços,efpadas, fouces, páQstoftados,& cu-
telos de monte. Aqui fe vio, como o gofto he o irielhor mef»
tre das artes. Aííi achou a todos difciplinadqs a ordem , que
parecia, terem muy tos annos da milicia .já não avia, querg
viííea cara ao medo; o que antes fe notava defmayado^ era q
que fe inculcava mais deftimido; Na alegria do rofto fe via ô
alvoroço do coração de todos. Os principaes na eftimação,o
forão no 2elo, com que chamarão a fi os mancebos de melhor
art€| tomando os poftos de Capitães, primeiro da mão do fa*
"vor, q da eleição ; cujos nomes fe irão particularifando pel-
Io difcurfo deftahiftoria .Tanto que amanheceo a fegunda
feira , tre2 de Setembro, foraó fahindo as companhias , com
feus Capitães dos lugares, aonde fe formarão ^ & com ordem
militar marcharão a aprefentarfe a feus Governadores , q nõ
lugar deTibiri as efperavãp,aonde chega vão em mais,ou me-
nos tempo, aííi como eráo mais, ou menos diftantes os luga-
res donde fahião. A primeira, que chegou , foy a que fe for-
mou rio Engenho de Jerony mo Cadena,feu Capitão Gafpar
Cadena, filho do fobre-dito . Foraó chegando nefte , & nos
dias feguinteSias^^das partes mais diftantes, de forte , que em
MeformaÕ-fe /«/-poucos fe ajuritou hum luzido , & numerofo efquadrão de
gjas Copankas, gente, que habitava fora di Cidade, que na repartição , que
- ^ g^^^ c^p- ^g trez Governadores fizerão entre íi,ficava ás ordens de Te-
ronimo Cadena,& de Francifco Gomes Moniz, que fe aloja-
vão no Tibiri; que a gente da Cidade fe mandou obedecer a
Lopo Curado Garro , que jáeftava apofentado nella, oc-
cnpado em a fortifica.r , & guarnecer. Reformaraõ-fe algúas
Companhias,para fedâr numero fufficiente ás demais,ficanr
' do todas á efcolha dos Capitães , que vinhaó nomeados pel-
los noííos Governadores , Joaõ Fernandes Vieira , & André

VidaL

íaes.

5^ ?■

Vidal. Dcitou-fc pcllos moradores ò.çi toda a Capitania Inlf
contribuição geral para o íliftcnto da guerra . Fixaraó-fe e-:

ditacs na Cidade, & feu contorno, pellos quaes o Governa-.
dor da liberdade J oào Fernandes Vieira concedia a todos oít
eftrangeiros, que quizeíTem ficar entre nós a poíTe , & livre
iizo de íuas fazendas, no foro em que as gozaváo ; & que aos ^f,^''*"^ ^' ^^''^"^
que quizefíem aíTcntar praça de foldados fe lhes fariaò os pa- ^''''^^°'
gamcnros conforme aos poítos , que deixaílcm : Mu y tos fe
aílèntáraó.Condenou-fe o alojamento de Tibiri por aberto) -
&: irregular, aprovando fe o íitio do engenho de Santo An-
dré, ( era de Jorge Homem Pinto,) o qual fe fortificou , den-
tro de oy to dias, em forma, que raereceo nome de Arrayal.^
90 Em hummcfmodia feacclamou aliberdade naCt
dade,& lugares circunvezinhos de toda a Capitania , & ne.._
o loube o Governador Olandès Paulo de Lynge. Naó o alte-
rou a nova , porque a efperava , certo na folevaçaó , incerto ,
nodia. Náoaííiíèusofficiaes, & foldados, que cortados do
íucçeílb,&:da vmda do focorro, em cujo poder (diziáocí-
\(íi^ lè finidár.1 a rebelião dos moradores , mediaó noífas for- ^ mnrr.. w n
, ^ a vara de leu temor, avaliando pellas vidonas , o po- lãacs âcfeja ani^
der de noífas armas. O feu Governador Paulo de Lynge , o^'mArosjcm.
foífe por melhorar feu partido, (dizia-fe, que perfuadido do;
interefe defejava vender-nos a Fortaleza , ) ou por tirar do/
corações dos feus o medo , determinou por-lhes aos olhos a
cauza do elpanto, [modo com que fe tira o dos Brutos.] Re-
foi vco-fe em os mandar envefi:ir o noíTo Arrayal, & de cami-
nho faborear-lhesonfcocomoroubodascazas,quelhcme^
teflenas mãos o encontro. Formou humefquadraó de tre-
zentos Olandefes, & dobrado numero de índios 3 eftes con-
duzidos por feu mayoral Pêro Poty,aquelles governados por
hum Cabo efcolhido,(cujo nome nosencubrio,ou noíío def-
prczo.ou feu infortúnio.) Sahirão do Cabedello em deman- ;

da do nolfo Arrayal, a tempo,que pello Rio da Paraiba man-
dou feu Governador fubir hú fufficiente numero de lanchas;
com aparência de irem cometer a Cidade. Naó tinha o fim da
navegação defvio, nem o da marcha certeza, & foy fácil en-
ganamos a induftria,para que acodiífemos, aonde nos cha-
mava o ardd^Sc náo a parte, <^ç, neceííltava do focorro. Per-.

Hh 2 fiiadidos

^ag?.'.iu. '. jf?.")!» ir-m.i! 'i. ;iOÊÊP:LimiShÊii/úM^^Êm.iA

Mãâa cometer a
cidade, & o mjfo
alojamento^

564 C^ST(^IOT0 LUSITANO 1645

fu adidos os noffos cabos , que por mar , & terra vinha o ini«
migo bufcar a Cidade, a íbcorrèraó com todo o poder , le-
vando-lhe o fôcorro, omefmo Governador Jeronymo Cade-
íia, fatisfey to de fe encorporar com os feiís moradores antes,
que o inimigo com a marcha chegafíe a ella, ò qual afurto das
noffas fintinellas^a tinha já prepaíTado, levando a cara no Ar*
rayal, em que ficara tam pouca gente,que apenas bàftava pa-
ra as guardas, quanto mais para a defenfa; As lanchas,quear-
ò valor do c^/i- diloramentefubiãocom voga efcaíra, para nos divertir , &
tao Frãtifco c^j* y,^Q p^j-â chegar, ainda vinhão longe de enveftir: Francif-
mes Moniz, i ^,^^co Gomes , que ficou no Arrayal, tanto que teve noticia,
csveme. ^^^^ ^^^^^ ^j^^ ^^j^.^ todo O poder inimigo, com difcreto,

-& valerofo acordo fes da penúria pujança. Sahio com o
limitado poder, que tinha , a bufcar o inimigo , que en^
controu na campina de Inhobim : Enveftiraõ-fe os efqua-
Dehua, & outra droés,iguaes no valor, defiguaes em o numero, & muyto
^artefe retira o mais nas armas ; as do inimigo, todas de fogo, as dosPortu-
olandès vecido. guezes, nem todas de ferro: Deu o Framengo a primeira car-
ga , quando o ceo nos fa voreceo com hua pancada de agoa,
com que animados os noífos, enveftiraõ á efpada , com v alor
tão deftemido, & braço táo robufto, que defatinado dos gol-
j>es, não fabia o contrario advertir o pequeno numero das
peííbasrNáo faltou ao encontro aquella perfia , que fuften-
ta a igualdade da força . A emulação entre os noffos Cabos
do focorro,& os da terra, fem dar lugar,nem ao cxceffo,nem
á enveja, hia gaftando toda a confiança do inimigo .O Capi-
tão António Rodrigues Vidal provou neíla occazião , que
èom o apelido herdara o valor .Rompeo pello efquadraó ini-
migo,abrindd taõ largo caminho, quanto alcançava fua efpa-
da^ cercado da multidão, todos o querião ferir , nenhum bu-
2ava chegar. Os Crioulos de Henrique Dias, & os índios dd
Camarão có feus mofquetes bifcainhos,affi ameudavão ascar
gas,q orçadas pellos tiros, fefazião contar por muyto mayot
numero.O Oládès,q vio o capo coberto de mortos, os noffos
com V alor, & difciplina, cõ tãtas armas de fogo, como imàgi-
nava,(tudo cõtra a pratica,& informação, qtrazià)& que na
detença dava lugar, a q nos chegaffe focorro , deu as coftas ao
cõbate tão medrofamente defordenado,q os feus defobedien^

tes

1^45

^A^TElUr^O VI,

3^5 :

tes á forma/eguiraõ os preceitos do fcmor/cm pararem,Fra-

mengos,&Tapuy as, fc não dentro da fua Fortaleza do Ca- l^J^.tr'''"'^'

bedello. Setenta àrfcte mortos vimos j porque os demayor^^' '^'

conta retirou, com grande numero de feridos . Cinco foída-^ •

dos nosmatáraó, entre elleso Capitão Franciíco Leytáo^

morte Tentida, pella occazião , & pella falta. Qs feridos naõ

foraò mu y tos, & os fes parecer menos a breve convalecencia

de todos. Recolhidos os defpojos, fe voltarão os noíTos para

o Arrayal, dando-fe huns a outros as congratulações do fuc-

Çeílb,& a Deos as graças de tão inopinada vistoria.

9 1 As lanchas, que o inimigo tinha mandado pello ria
fizeraòÍLia figura, em quanto foy neceíTario fuftentar o en-
gano; Viráraó as proas a tempo , que já os feguia o brado do
íiicçeííb. Caftigou o ceo hum ameaço fingido com iuim goI?|
pe verdadeiro.Cófuzo,& cortado deixou efte rcyez ao Lyn-

ge, vendo ô fubido cufto , com que a fortuna lhe vendera o Ejfmto ^ édí/^
defengíinojde que eraõ briofos,&:dirciplinados aquelles mef- '^^''T^^ ^^ olãdes.
inos, que defprezava fracos, & bizonhos. Vio de hum golpe,
vencido todo o feu poder, &todafua induliriaj & inferia
dcílas premiíías, danofiíTimas confequencias,para fua con-
fervaçáo. Pello contrario os Portuguezes , aos qnaes o acon?
tecimento, & as circunftãcias delle não deixaraõ,que temer;
8c com efte feguro mandarão os moradores, que vivião pellos
cõtornos recolher para a Cidade, & para o Arrayal fuás mu-
lheres, filhos, familias,& moveis, que tinhaõ retirado pellos
matos , incertos na contingêcia dos fucçeíTos (faó os da guer-
ra os mais contingentes.) Aconteceo o referido , era onze de
Setembro de mil & feifcentos & quarenta & cinco.

92 AíFirmou-fepormuytaspefíbas fidedignas, que ao
tempo do cõfiifto fe abrirão por íi mefmas as portas da Igre- ^; -
ja dos Sagrados Martyres Saó Cofme,&Saô Damião,íituada ""
na mefma campina da batalhai(como já fuccedeo,na da Vár-
zea á hermida do gloriozo Portuguez Santo António ) mof- ^^'^'^«'^A'^"'^^ £
trando-fe os efclared dos Santos, tutelares de íeus deftriaos, ^^ZllZTI-vl
na emprefa da liberdade j &em todas, não menos obrigados ãom ''^'^''
de Fieis cultos, que offendidos de heréticos defprezos . Ain-
da corria o langue das feridas , que o inimigo recebeo nefta

occazião, quando o Governador Olandès mandou enforcar

Hh3 dentro

^^rr

,i^j.^nM|^i..jiJtUÍI'JV'''g

For falta, de fe-
greào^fe nao en-
tregou a Fort ale
ZA do inirnlgo.

Cmyi^ & modo,
que teve a fole-
njaçãí no For to
do Calvo^

Chriãovlo Lins
foy n primeiro ^
apelidou a, liher'
dade.

3èè C^STiilOro LUSITANO 1645

dentro da fna Fortaleza a hum honrado morador dá Paraibay
por nome Fernaõ RodrigaesDébulhoés enviado ( como eft
colhido para o negocio, por fe fiarem delle as partes J a con-^
cluir com o Ly nge a entrega da Fortaleza, que fua dil igencia
tinha muyto adiantada, & quedefcompos de todo a falta do
fegredo: Alcançou-o, ou por comunicação , ou por inferen^
cia,hum facerdote (que o foy affirmão todos,que naõ he no-i
^ vo no mundo achar-fe o delido no eftado mais íhkão) fes á-
.vizo do negocio a hum Predicante do inimigo .Defcoberta
o trato,& culpado o Governador , lhe foy neceíTario falvar^
■ peíToa, a opinião, & o cargo, com fe moftrar ifento da calu-
nia,& ficar feguro do complicej o que coníeguio com matar
oentre-locutor. Defde o prefente tempo até o fimde Outu^
bro feguinte não defeanfaraò os noíTosde moleftar ao inimi-
go com toda ahoftilidadepoffivel, valendo-fe deembofcài
das, rebates, & aflaltos, fempre bem fuccedidos ^ & com pri-
foés , & mortes de Olandefes, & índios , que não efpêcifica-
mos,porfemelhantes,&continuos. Fes, neftes diastodos ,a-
pertados officios o Capitão Dom Diogo Pinheiro Camaraõj
com o mayoral dos Índios Pêro Poty,para que com os feus fè
paíTaíTe ao íerviço de feu Rey natural ; & nada pode confe-
guir, porque quanto perfuadia a rezâo,defviava a culpa.

9 3 Obriganos a hiftoria a bufcar o tempo,em que fe ac-
clamou a liberdade no Porto do Calvo, queixofo da deteça^
que fizemos na relação dos acontecimentos da Paraiba . En-
tre os homens de callidade, que a violenciaTogeitava na cir-
cunferência de feu dominio,era hum delles Chriftovão Lins,
naó menos nobre pellofangue, que pellos procedimentos: A
efte tal mandou João Fernandes Vieira patente de Capitão
de todo aquelle deftriâ:o do Porto do Calvo,aonde tinha fuá
morada, com avizo, & ordem,que cauto , & prevenido efpé-
raíTe o dia, em que fe avia de acdamar a liberdade em todas a*
partes fogeitas ao Olandès ; que lhe naõ apontava logo , por
não eftar ainda determinado (já deixamos dito os acciden-
tes, de que morreo a certeza defte dia.) Adiantou-fe o Glan-
des a cortar o fio á ordem , que levavão as difpofiçoés, com
mandar prender no Porto do Calvo (como nas outras parteá
o fes) a todos os moradores principaes.Com eíla ordem,pr€-

deo

deò o Comendor a Rodrigo de Barros Pimentel , peffoa de
callidade, & refpeyto entre todas as daquelle deftrido , & a-
parentado com toda a nobreza da terra. A todos os mais pro-
nunciados nas ordens , fervio efta prifaó de rebate , para fe
porem em cobro, & fruftarem as diligencias , que o Framen-
go fes por fuás cazas, para os prender. Chriftovaõ Lms , que
ouvira a refolução , com que Joaó Fernandes Vieira fe pos
em campo a beneficio da liberdade , fes do fucçeíTo avizo^en-
tendendo, que fe lho eftorvou o cazo , lho dava o exemplo j
feguio oTonfelho, que lhe dava a occazião, Zc o cargo, & cõ
os moradores,que o quizeraó feguir apelidou liberdade, & fe
pos em campo com as poucas armas, que podèraó livrar da
prohibiçaõ Olandefa. Com as azas da emulação , & da lifon-
;a voou a nova do fa£ío até chegar ao Comendor da Forta-
leza^ que entendendo, quanto lhe importava apagar o fogo
antes, que tomaíTe mais força o incêndio , deitou fora húa
partida de foldados á obediência de hum Sargento,^ noíTo ef-
quecimento, lhe fepultou o nome, aonde nolTo braço lhe ti-
rou a V ida) com ordem, que aíTaltaíTem os rebelados,& a to-
dos prendeíTem, ou mataíTem . (Ignorava o fundo de noíTa
confiança, & julgava fácil a execução de feu defejo.) Naó fe
efcondeo a Chriftovaõ Lins, & a feus confederados a vinda,
Sc o intento do inimigo, & o efperou de embofcada [ pouco
imaginada de fua confiança : J Dentro nella perderão todos
as vidas, & deixarão as armas , com as quaes ficàraó os noíTos
mais ouzados, porque melhor guarnecidos. Trez dias efti ve-
rão em fufpenção as armas de hija,& outra parte, que os nof-
fos deráo ao gofto do fucçeíTo, Sc os Framengos á confidera-
Çáo do golpe. Mais os confundio, o que logo aconteceo:Ti-
veráoosnoííosavizo,quepelloFâo deMangoaba fubiahií

barco, que vinha de focorro aos inimigos , deraÓ fobre elle, f "^ <^^^'Y f '?
Sc o tomáraó,com morte de nove Olandefes,&muy tas armas, ^^ ^"^^^^
de fogo, munições, & mantimentos. A a voz deftes fucçeíTos
acudi^rào todos os moradores, que fe embrenhaváo pellos
matos j & em forma de exercito fe alojavão em hum quartel
defenfavel, de cujo corpo fahiaó dous braços , que cingiaó a
Fortaleza, tanto ao largo , que os naó alcançava a artelharia
delia. Animofos com a multidão, Sc com as armas, mandarão

Hh4 bua

i

.' Ill

3é8 C^ST^IOTO LUSITJT^O i%

hiia embaixada aos cercados, «jue fe entregaíTem a bom parti-
do, certos, de que lhes guardariaó as condições mais favorá-
veis^ que naó defprezaffem o oíFerecimentOjporque era reíb-
luçaó de Toldados , & também confelho de amigos , pois lhe
propunhaó OS meyos mais utisparaaconfervaçaò dabonra*
da vida, & da fazenda^ que tudo aviaó de perder , fe eíperaA
Icm o afíàlto.Ouvio o Coijieiidor aembaixada,&: deípedio o'
Enviado fem refpofta.

94 Com a dilação do cercojfe foy apertando o coração
do inimigo: Cada dia via crecer o numero da noíTa gente , 5c
faltar na praça o fuftento á fua : O erro da conta lhe antici-
pou a falta: Tinha recolhido todos os cftrangeiros, quecom^
íuas familias,& efcra vos, viviaó fora da fortiíicaçaÕ3& a mul-
tiplicação dos gaíladores, confumio mais depreíTa os manti-
mentos. Via,que em dilatara entrega,fa2ia mayor a perdição,
o Comendor poy não lhe deixando a fortuna, nem htia pequena eíperançade
fuade aosfcm ^ remedio. Rezoés,que comunicadas comosfeus, lhes fazia
entrega, àa frua. parecer menos fea a entrega 3 & para os chegar á refoluçaó,
•>•) lhes dizia o Comendor: Servimos pello foldo para fuílentar
^; 55 a vidaj nenhúa cauza nos obriga a daremos a vida por quem
35 nos paga o foldo. NaõcuílumaaCompafthia fazer paga fe
57 não, a quem a tem vencida j pois com que rezaó nos avemos
35 de adiantar a fervir com a vida,a quem a não paga .^Façamos,
53 o que devemos ás pagas , pois as pagas não chegaó , aos que
55 perdem a vida. Aílentãraõ todos,que fe entregaíTe a Fortale-
za. Mandou o Comendor hum Enviado a Chriílováo Lins,
(tinhaõ fido amigos) dizendo por elle,que todos os officiaes,
& foldados vinhaõ na entrega, porém que era ncceírario,mã-
dar vir hum Capitão pago , do exercito , que tínhamos em
Pernambuco , para com elle aíTentar as capitulações 3 o que
não avia de fazer com algum dos moradores, porque fenão
di íTeíTe, que capitulava com os fubditos, com que tivera ami-
fadcj & que no entre-tanto o focorreíTe com algum refrefcoj
o qual logo fe lhe remeteo.

95 Fella poftadcfpedioChriílovão Lins hum foldado
veàe ue venha ^^ ^^^'^^"^^^^ J^^^ Fernandes Vieira, dando-lhe conta do
hn 'clpiihpaqo ^^'^^^^'ífíoj & q«e a íeu nome querião dever o complemento
f^ra lha ent^i ^'•^ facção,pois animados delle intentarão a emprefa,para cu-

gar. jo

)o fim efpera va, que fiia fenhoria mandaíTe logo , quem capi-
tulafleas condições da entrega.Comunicou o Governador a
iiova,& a petição com os feus Medres de Campo André Vi-
dal,& Martim Soares (fem cu;o voto,nada fua amizade fabia
rerolver.)Conferiraó entre fi Ibbre a peíToa^que aviaó de mâ- ^ g^rvernadordA
dar,& fizeraó efcolha na do Capitão Lourenço Carneiro de uy^rdade madm
Araújo, Cavalleiro do habito de Chrifto , que aíTiftia ho Pó- ao cuptaoLoure-
tal de Nazareth; foldado de valor, & talento , para fe lhe fia- í" Carneiro^ to.
rem ma v ores empregos. Vio a ordem , partio Iopo a dar-lhe ^'^'^ ^fj^^'''
execução ; chegou ao Porto do Calvo , & com Cnriltovao
Lins aílcntou, que logo fe notificaíTe fua v inda a Clram Fio- . / '
rins (^elte era o nome doComendor da Fortaleza: ) CapitU-
lou-fe a entrega na forma feguinte: Que fahiria o inimigo c5
feus officiaes, & foldados tocando caixa, bandeiras tendidas,
mecha calada, baila em boca, & toda fua bagagem até o lugar
deftinado para os defarmarem ( refervando defta ceremonia
ultima, a todos os officiaes vivos . ) Que a todos fe daria ern-
barcação,para fe irem, aonde quizeflTem. Que a todos, os qUe
ti veíTem v ontade de fer vir em o noíTo exercito , fe lhes aíTen*
taria praça na forma do eftilo(ou foíTe foldado,ou morador J
Que a huns , & a outros fe concedia a poffe , %l a cultura de
fuás fazendas,& todos os foros,com que até aquelíe tempo as
poífuiaó. Com eftes partidos fe apoíTáraõ os noíTos da Forta-
leza em dezafete de Setembro de mil & feifcentos & quaren-
ta & cinco.

9é Repartirao-fe pellos foldados rendidos fete centos
mil reis. Naõ foy compra, foy reftituiçaõ, & por eíTa rezão a- A
ju ftado pellas praças, & não pellas peflbas j o que não fora, fe
o repartira a dívida, & não a piedade . Eftimou o Olandès ò Repartição de di.
focorro, como dadiva; & para que fe entendeíTe aífi,o man- nheiro , quefefes
dou o Governador João Fernandes Vieira pello Qgi^itio peUos rendidos.
Lourenço Carneiro de Araújo, com efta avertencia. Aos ré-
didos fe guardarão pontualmente as condições paâiiadas,
fem que fc deííe occazião á menor queixa; muy ta , porém, ás
admirações do^ Eílrangeiros* féfpanta,© quefe haó uza^) Os
cíficiacs & foldados rendidos , fazião numero , de cento , &
cincoenta & fcis . Não tios deixou a relação memoria dos
mortos , & feridos neíle cerco: Se os ouve foy falta^ fe os não

ouve

L^feí^f. J-^'^;-'lF"iJfi\li^L'L^'<'l!U?Jj'!i'.Jj!'J<|j

370 C^ST^IOTO LVSITJNO 3645

ou vemayorliizimento da facção: A mais útil he, a que me-
nos cuftaj& a mais alegre, a que menos magoa j pois he certo,

que a de menos mortes leva fempre mais vi vas.Deixou-nos

o Framengo a Fortaleza inteira 5 com oy to peças de bronze,

quatro de vinte & quatro livras de baila, duas de dezafete^Si:

duas de cinco. Armas, & munições, não fó baftantcsjmas íb-

Jrraíaíe a For- ^^^^^ ^^^^ íuftentar hum largo íitio : Naô quizeraó os mora-

ta[e:^a ,& a ar- ^^^^^ ' 4"^ "''^ Fortaleza ficaíTe motivo,nem para o rofrerem,

telharia, nelU fe nem para O porem, & com íe arrazar fe efcufava hum, & ou-

leva^ara a Vítr- tro:Deixou-a o Capitão Lourenço Carneiro de Araújo pof-

^^^- , ta por terra^ & por ella comboyou toda fua arteíburia para a

Várzea, aonde chegou a aviílar os noffos Governadores coín
aplauzo de vivasj & deípojos da vií^oria.

91 A mayor, ou menos diftancia dos lugares , aou de fe
acclamou a liberdade, foy, a que médio o tempo , [ mais, ou.
menos dilatado] aos fucçeíTos de noíTas armas . Em dezaíete
de Setembro fe entregou a Fortaleza do Porto do CaIvo:Em
dezanove fe entregou a do Rio de Saõ Francifco, aonde os a-
contecimentos, foraõ quafi os meímos , porque tiverão huas
meímascauzas,femaver entre huns,& outros mais diíFeren-
; ça,qadolugar,&adotempo. NaVilla doRiodeSaóFfá-^'
Mchma-fe a li- ciíco tinha recebido Valentim da Rocha Pita (nobre, & con-
heràaàem Rio de fidente morador naquella parte) patete, pella qual o nomea-
s.Francifco. ^^ o Governador dâ liberdade Capitão de todo aquelle def-
trido, na forma, cm que a todos os mais,a quem deu conta de
feu intento ^ & como ao dia da efcolha , fe adiantou em Per-
nambuco o da trayção, fervio a todos a noticia , de fe adian-
tarem ao avizo do tempo determinado: Tanto, que fe devu I-
gou o decreto, porque fe mandava tomar as armas ,& tirar as
vidas aos moradores, & delles, prender, aos que eftavaó pro-
nunciados por rebêldes,fes Joaõ Fernandes Vieira hum pró-
prio ao Rio de Saõ Francifco, para que os côfederados fe po-
íèíTem em cobro antes,que os bufcaífe ogrilhojou em defen-
fa, quando os accomt teííè o aíTalto. Com efta avertencia , &
com os cerfiíicar,que fícava em campanha, declarado por ca-
beça da folevaçáo, lhes dizia tacitamente, o que deviáo fazer
cm ordem a feu reparo j na meíina forma o notificou o Capi-
tão Valentim da Rocha a todos os homens conhecidos , para
' que

',' ' .

1645

l!PJ1^TE 7. L1F<^0 VI.

3V-

queoFramcnsioosnaoachaírederacaiitelIadosidiIisíencias, ^ . .

^ , ^ ^ r -• -n Motivo, n G intra

com qii€ todos naoelperavao mais, (]ueaoccaziao,qiieUies ^^^^^^^ apriGii
naõ íabcria negar o Glandes miiytos dias: AíTi foy , porque de hum morador.
mandou prender a hum principal morador , que refidia duas
legoas da Fortaleza (nenhúa memoria a tevcjdc nos dizer feii
nome.) Publicou-reo mandado , &com clle o alvoroço dos
^íezinhos, que fahindo ao encótro do prero,& dos Miniftros,
matáraó a eftcs, que eraò hum Sargento com àcz Toldados, &
poferaó em íua liberdade ao prefo.Chegou a nova ao Come-
dor, que o deixou tão paruiado , como em fua imaginação o
eftava,alheo de femelhante atreviméto. Era prerumido,(na5
confiderou, fe era, ou não, tempo de vingar o agravo,) maii*
dou hum Capitão com fetenta íoldados,que deííe fobre os a-t
greíTores, & que a elles, & a toda a couza viva, abraraírera,&
coníumiííem^íem que a paixão,& foberba, (dous affedos ce-

posMhe dei xaíTem ver, que gente tinha as mãos livres para' ,_^ .. .
£5 ^^ ^ -" . •• i r 1 Perde o tnimtíi-

deíatrontar aos outros , as nao avia de ter atadas ^ pára le de- /^^^^^^ olãdcíís,

fender a fi: Em húa embofcada, que armáraõ aos fetenta ,0$
caíligàraó com táo boa mão , que nenhum pode efcapar da
morte para levar a nova do caítigo.Por terceiras vias chegou
a noticia do eftrago ao Comendor, que magoado da perda,fe
arrependeo da cólera. Liçaó,que fó faz aprenderão brutoiO
caftigo argue de ignorantes,aõs que não faz fcienteSi

98 Em todas as idades foy fempre mayor o fequito da
fortuna, que o da rezaó. A muy tos v ezinhos conduzio a to-
mar armas o defejo da liberdade, porém a muy tos mais a no- Cercão os noffos â
va deites fucçeíTos. Já o orgulho da multidão julgava peque- Fortde\^ &pe'
na a oppoíiçaò do Framengo , & lhes parecia afronía de feu àemfomroM go
braçoofazerem-fefenhores da campanha , fem ganharem a 'vemador GerJ
Fortaleza. Antevio o inimigo a pratica,& temerofo da ouza^ o j a o,
dia íe recolheo com todos os feus dentro da força, bufcando
nas paredes os reparos, & no jugar das peças os defviosj& lhe
aproveitou, para fe não ver enveftido ao mefmo tempo,que
fe vio cercado. O movimento de noíTas arliias lhe não deixa-
va mais efperança, que a dos focorros, q lhe prometia o maf j
Sc naõ fabia apartar a vifta,donde a cevava a efperança.Con-
íideraraó os noíros,que a dilação do cerco, daria tempo a dif'
poíiçaó dos focorros , Sc fe refolvèraó em mandar dous cor-

reyos

. i^P'. ■ . i"" ' ■■■ ' '•■ 1' ^. y^VjM/i ^f;:j?j»^?'j*?i'*!íj!'

Tofnão ao Inmi'
go hum carai^e"
Uo de rminiçoeSf
dr ^Mantimentos.

Tomao huA lacha
^ue njínhaparao
Framengo.

i ''■

cheião os corrC'

572 QÀsr^oro LusiTjno 1^45

reyosá Bahia, expondo ao Governador Gèral do Eflado o
curfo dos fucçeíTos , & o motivo dos receos , pedindo-lhe fa-
vor, que ós armafle contra o futuro. Juftificàraó a petição c5
a neceíTidade, & a rebeldia com a oppreffaô . No entretanto
fe occupáraó em conduzir armas, muniçoés3& mantimentos,
que a pouco cufto lhe ofFerecéo a ventura , em hú cara velaõ,
que o inimigo mandava de focorro à FortalezarVinha fubin-
do pelio rio, & aíTaltado dos noííbs, o largarão os Framengos
com as vidas: Parece, que com a mão da culj^a nos offèrecia o
Olandès os inftromentos da pena , foccedendo aos morado-
res, o que acontece aos verdugos, que he, veftirem-rej& fulr'
tentarem-fe á conta dos condenados. Erão entre os cercado^
res,& os íitiados os encontros tantos,como erão as oecazioés,
& as occazioés, como eraõ os díasj com aqnella differença, q
le acha entre o goIpe,& o reparojfempre o inimigo ficava de
peor partido. Navegava húa lancha com onze Framengos ás
ordens de hum a;ndante ; oy to mancebos Portuga ezes a en-*
veftiraõ em húa canoa, com oyto tiros matàraõ da primeira
carga féis Olandefes, & os onze Olandefes ( que primeiro a
deraõ)a nenhum dos noffos matâraó,nem ferirão j&coníiftio
a rezaõ,em que o deíànímado não faz tiro certo,& o deftimí-
do não faz tiro errado. Os cinco que não matou o fogo , ma-
tou o ferro, & íervio a lancha aos noíTos de triumpho , & de
íbcorro. No mefino dia luccedeo outro encontro entre húa,
S^outra gente, com igual numero, mas com defigual forte, q
os Olandefes deixarão vinte mortos, & dos noflbs não ouve
morto, nem ferido. Cada dia acontecia o meíino, & erão os
fucçeíTós tão femelhantes, que nos referidos fe podem lèr to-
dos.

9 9 Chegarão os dou^s^Qrreyos á Bahiajrelatàraõ ao Go-
vernador do Eftadó fua^enibaixadas, que ouvio crédulo, &
vingativo.Vivia magoado, tinlirõ-no gravemente ofFendido
as cavilaçoés Olandefas. Louvou nos moradores o animo, &
a cautela, & para que não defiftiíTem da empreíà, lhes afliftio
com as efperanças,& com o focorro , tanto a hií mefmo tem-
po, que com hum mefmo deípacho defpedio aos enviados c5
a promefía, & com ordem para a execução, a qual mandou,
pellos mefmos, ao Capitão Nicolao Aranha j [_ alojava- fe no

Rio

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1^4^

fpAXJ^^BLLiv^Xo n.

V

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Rio Real por Cabo de quatro Companhias] q-iie os fcguiíTe •
com a rua,& a do Capitão Frarlciíco de Matos5& qiic os por-
tadores Ihemoftrariaõ pella importância , quanta avia de Ter
a prefteza da marcha: Ouvio Nicolao Aranha a informaçaói
leo as ordens,& fem dar hum dia ao apreílo, os deu todos ao
obediência .Em V inte &: fete do Mez de Julho partio do Pvio
Reali venceoasoppoOçoés do tempo (eraderigoroíiíTimo jc^^^^v,^^j>j7^,^
invernoj atropellou os eftorvos do mato, que por vsxw^^X^i^ ufco^oCaptloNi
partes rompeoj confcguio a paíTagem dos rios,crecidos,& fu- <:olc.o Aranha co
riofos: Chegou ao de Saó Franciíco em dez de Agofto ( via- or'^°^'ro.
gem, com que a todos efpantou.J Achou o inimigo cercado
em boa forma,& olhava para cada hum dos íitiantes , admira^
do de como a occazião tinha feyto roldados,aos mermos,que
antes delia, não paíTavão de pacificos moradores.Có bellico-
iacortezia determinou Nicolao Aranha dar noticias defua
chegada ao inimigo: Tinha o Framengo algúas lanchas em-
patadas debaixo da artelharia de fua Fortaleza, para fe apro-
veitar delias jaffi como óobrigaíTe a occazião: Ao Capitão
Francifco de Matos ordenou Nicolao Aranha que foííe com
a fua companhia a por-lhes fogo:Obedeceo prompto, & exe-
cutou bem afortunado^ ardèraõ todas ;& fem o menor peri-
go de feus foldados, fe recolheo a feu quartel j deixando aò
inimigo defatinado pello dano fey tOj & pello dano que naó
fes. %

Ao óutf o dia (contavaõ-fe onZe cie Agófto) man^

ICO

dou Nicolao Aranha apertar o cerco com a fua gente [ eraó
cento,& oytenta homens bem armados ^ entre Portuguezes,
& índios:] PaíTou o Rio, & fe fortificou da parte do Norte, Jperíd o cem h
íia qual a Fortaleza eftava íituâda; có o que franqueou a paf- ^"ríaiez^a.
fagcm a hum groífo de noffii infantaria , & com ella cingio a
fortificação Olandeíà. No dia feguinte mandou õcdupar to-
das as entràdas,&: fahidas da praça coni ertlbofcadas ,& man-
gas volantes, que ferviífemá vigia, &á occazião . Ordenou,
que algúas companhias, por lugares diverfos, picaífem ©ini-
migo, o qual, ou por conhecer o lanço , oU por temer o laço,
não quiz fihir aos rebates;(Na9 obrigações de Capitaó^efcó-
deo a fraqueza de receofo. ) Tinha entendido, que a reputa-
ção das armas fe fuftenta mais com a opinião , que com a for-

corros.

.974 C^ST%Joro LUSITJNO 1645

ça, (o pego eílimafe fem fando,em quanto o não mede a fon-
da,) & nao quiz dar á prova o pulfo de feu braço, nem o nu-
mero de lua gente. Por informações fabiáo os noííbs o nume-
ro j porém naó a callidade do poder contrario . Náo pode a
duvida atalhar a ouzadia, com que os aproxes fe fora o arri-
mando á Fortaleza, até fe verem taó adiantados,que lhes óeÇ-

icma4he os jo- cubriáoascazas,nas quaesas nofíasballasfaziâoomayor da-
no, com o melhor emptego.Succedeo, terem as íintinellas do
exercitOjVifta He hum barco longo, q a boga furda fubia pel-
lo Rio com efperançasjde que ajudado da noite meteííè fo-
ro^ corro aos cercados: Antes de acabar o dia, chegou o avizo ao
Cabo Portuguez,& ao Ajudante Francifco Rodrigues ordé,
para que apreftaíTe duas canoas, com vinte & cinco Toldados
de fatisfação , & que a todo o rifco enveftiíTe, & rendeíTe o
barcoj fobre o qual arribou j& a pezar de toda a refiftencia o
entrou,& rendeo : Vinhaõ o ComiíTario de Sergipe delRey,
• & o Fifcaldaquella praça com treze homens do mar, & ou-
tros tantos foldados j deíles morrerão féis na defenfa, dos ou-
tros nenhum j ainda que bem fangrados, pedirão quartel. C5
a prefa,& fem perda,íe recolheo o Ajudante com os íeus.

I o I A importância da Fortaleza defvelava grandemen-
te o cuidado do governo Olandès, para lhe náo faltar com os
focorros, que lhe diíEculta vão perdas tão coníideraveis , &

£ lhe defvia ou- continuas . Empenharão o refto , no aprefto de húa náo, &
dous barcos, que defpediraó do Arrecife com infantaria , ar-
mas, muniçoés,& mantimentos. Em vinte&oyto de Agos-
to chegou efte focorro aviftar a Fortaleza, & a fer vifto das
noíTas íintinellas,que logo fizeraõ avizo ao Caboto qual cer-
to, de q pellos defvios do focorro avião de caminhar ao fim
da em prefa, mandou fazer preftés algúas canoas, guarnecidas
de infantaria felc£ia,& refoluta: Sahiraó ao mar largo, a buf-
car as embarcações contrarias : Viraó-fe emproadas , & ate-
morifadas da ouzada enveftida, fem acordo para medir a de-
íigualdade das embarcaçoés,& do poder, fe fizeraõ em outro
• bordo, .até que engolfadas fe perderão de viftaj efíimando
por ventagem, o não deixarem nas mãos da noFa gente o fo-
corro.Taõ fogeito,como ifto, vive p difcurfo dos homens ao
medo.Saó canoas,h«ns vazQ§/ey tos de hum fó tronco,taõ li-
mitados

tros.

\:.A. ..c^j»

1645. ':^J^TELLIJ%OrL 57^

mitados^Sc incapazes para abordar qualquer outra eivsbaf ca-
ção, que o naó podcriaó intentar, fem íc perderem : ( Com o
inimigo as deixar chegar, as tinha vencido) mas íiia cobardia
lhe não deixou advertir efta ventagem. Vião os fitiados a íiv
talidade, com que a forte lhes deíviava os auxílios; o aperto,
em que o cerco os hia pondo(não he apertado, o que maisie
chega, fe não, o que melhor cinge.)Em toda a circunferécia
não tinha a circunvalação a menor rotura. Por hisi parte in-
tentou o Olandès romper as trinchei ras:Qiiiz fali ir da Forta-
leza com mão armada para cometer o aíial to j porem os noí-
fosmofqueteirosQdeílros na pontaria j de quatro tiros, lhe
deixarão quatro mortos , atravefiados na porta ; com o que
efcuzaraõ aos mais a Tahida . A vezinhança , & a promptidaó
não conrcntia,que o Olandès apareceíTe na muralha ,íe não
para deixar nella a vida; com o que fe impedia ao inimigo o
uzo de fua artelharia:Derengano,com que o Comtudor,pri^
vado dos inftroraentos da defenfa, fe refol veo em fe aprovei^
tar da manha, & com ella fiarão tempo , oque não podia eí-
perar do braço. Deitou fora hum bolatim , & por elle man-
dou dizer ao Capitão Nicolao Aranha^ que lhe beijava as
mãos, & eítiraava muyto fua vezinhança. St mu yto mais efti-
maria o fervir-fe delle,pois fabia,como taó grande Toldado,
que as leys das armas faziaõ contrários, porém não inimigo
Refpondeo-llie o difcreto Capitáo,qae obrigado de fua cor-
tezia^ lhe aconfelhava, entregaíTe a Fortaleza antes,que a oc-
cazião lhe fizeíTe inimigos, todos, os:que via contrários. Naó
cefíaraó as hoílilidades ; & continuarão os recados de ambas
as partes, fe bem, que de hua as,formava a defefpe.raçaó,& da
outraodeíprezo. , ;Ju>j jq k'j.í^.:^ :.') í^sí^íut-

102 O dia treze de Setembro, 'emqtie as ârmás andavão
mais quentes , mandou Nicolao Aranha hum tambor,& hum
official com embaixada aoComendor, quefeus foldados o
importuna vão, enfadados de tanta dilação, por licença para
levarem a Fortaleza á efcala, o que lhe não poderia nísgar, fe
logo a não entregaíTe apartidojpara o qual , o achariaõ favo-
■ravel; que lhe avertia ferem muy poucas as paIaVias,aondc a-
viamuytas ,& boas mãos. A adilaçaõ do tempo fiava o ini-
migo a efperança de melhor fortuna . Naó fe perfuadia , que
I. . li 2 os

Cuj.i falta def.
ccrjh^vu aosjitiã'
dos.

'pAz.em os nojfos
cmhãíXaàA rc"
quercdo n entre"
g/i^aque fcftf.
pende €0)7} diU"

imi. :m > <^^f^^'i9m^:):iiii^m.íúÊ^M!mtn''â

s^pes.

57é C^ST^WTO LUSITJVO 1645

os do Governo empenhados na importância da confervaçaõ
daqiielJe prezidio , deixaíTem de mandar a favor delle , hiimí
tal íbcorro, que foíTe para os Framengos remédio, & para os

Portuguezes ruina: Comeftedircurforefpondeoardiloza

^ á embaixada , dizendo, que a entrega fe não podia fazer pel-

lo V Oto de hum, quando naquelk praça eftavaó tantos, &

taõ calhficados Capitães, &foIdados, que fopoftoelleCo-

mendor era cabeça , nada poderia fazer fem eftar unida á-

quelle corpo. Que íè deíTe, aos que^efe^ava ver rendidos,

ao menos o tempo, que fe dá aos condenados, por não pare-

^ cerem condenados , antes de rendidos ; Sc lhe pedia trez dias

de tregoasjpara que nelles podèíTe Gonferír,& aírentar,o que

fe devia fazer. Succedeo nefta meíma hora chegar ao Rio de

HerimeMuí lhe ^^0 Fráncifco Henrique Hus,(com aquelles rendidos nas ca-

ferjptadea entre zas de Dona Anna Paes, que os noíTos Governadores das ar-

ga^& com i re- mas mandayão priíioneiros, para a Bahia ) o qual informado

da embaixada , & da refpofta , fe entre-pos por medianeiro

do n^ocio a beneficio dos cercados . Efcreveo ao Comen-

5, dor, & com licença noíTa lhe falou defta forte: A afortu-

,, na atribuo o trazerme minha defgraça a efte lugar nefte

jj tempo, porque íirvacom oconfelho aôs amigos, aquenao

j, poíTo fer bom com a peíToa . Qiie fado he, o que detém

jj a entrega defta Fortaleza, fem forças , para a defenfa,fem

jj fundamentos, para a efperança ^ fado parece o de cami-

^^ nhar á perdição, tendo aos olhos o-precipicio. O poder

jj da Companhia de Olanda ( neftas Capitanias) naò fóef-

jj tá diminuido, fenaó quaíi acabado , & tanto, que ogri-

j^ ta o miferavel cftado, em que me vejo, defpois, que em

^j duas batalhas campaes perdemos a flor da milicia em dous

^j mil, & tantos mortos ; & priíioneiros Eu, & quaíi todos

jj os que ficamos vivos, com toda a bagagem, & íreyen de

jj dous exércitos : Dano , que não deixou no Arrecife , nem

jj gente para a reforma , nem meyos para a confervação. Pois

j^ íe na praça do Arrecife falta o cabedal para a defenfa pro-

^^ pria , como fe pode efperar , que delia fayaó focorros pa-

jj ra fuílentar as Fortalezas externas?0 golpe recebido na ca-

^, beça cauza defmayos em todas as mais partes do corpora di-

jj laçaó do tempo reforça o perigo^ & efperar o rigor da efcala,

he

(rn.

he empôdir todo o favor da fortuna, porqie a bom livrar 55
igualará a poucos^com a minha, fendo taó infclice , que a pa-
deço por fervir, a quem fe não lembra de procurar minha li- 7?
berdade, eftilo de mercadores , cujo trato he vender, & não "
rcfgatar; ter conta com as prefas,& não com os prefos, fendo 55
tão inútil para com elles o ferviço, quenelle í'e perdea vida, ■>■>
fem fe ganhar honra,porque fó a alcança, quem á da por fêr- "
-vir a Principes^&a perde,quem a arriíca por confcrvar a Pi- '>
ratas.Eftas rezoés ditas com authoridade,& ouvidas com ref- 7?
pey to podèraõ tanto, que logo o Comendor j com todos os
léus, tratarão de entregar a Fortaleza.

105 Fey tas as capitulações, &aííinadas por os Cabos
mayores fahirão da Fortaleza, na forma delias , ( em dezano-
ve de Setembro) duzêtos & feífenta & feis 01andefes,&: Frá-
cezcs: oinco Indios,& vinte & quatro mulheres,dezoy to me- CjtpmiUo-fe asa
nmos, & outros tantos elcravos . Os otticiaes vivos com íuas
infignias, os foldados em forma de guerra, até certos paflbs,
aonde foráo deíannados : Deixa vaó na Fortaleza fetenta &
{qiç. Framengos enterrados,que no tempo do cerco morrerão
de bailas : Dez peças de alcance todas de bronze \ grande fo-
ma de pelouros forteados, fufficiente pólvora , & murraó > &
abundância de mantimentos: Aos enfermos, mulheres,& me-,
líinos fe deu embarcação, para paíTarê á Bahia com feus mo-
veis. Alguns dos foldado3,fe alliít irào debaixo de noffas ban-
deiras ; os mais fe paífarão á outra parte do tio em rezão de
marcharem para a Bahia,como rendidos j& quatorze, dos de-
zoy to efcravos, que fe lhe jiilgáraó. Poílas as couzas nefte ef-
tado aparecerão ao mar hiia náo , & trez lanchas , que com
meyo pano v inhão arribando fobre a Fortalezajconheceraó-
fe,ferem vazos Olandefes 3 & fe teve por fem duvida, que vi-
nhaó em focorro feu . PorconfelhodehumFramengo man-
dou Nicolao Aranha defparar húa peça, fobre cujo feguro í ^-^"^ /^"^ f ^^^
largarão todo o pano bufcando a barra , para embocarem o conTlutosmC-
Rio.Conferio-fe entre os noíTos Cabos a utilidade , que nos fis não poderão
T::fultaria, fenos ficaíTe nas mãos efte focorro 3 & o modo co- tomar.
mo fe avia de tomar : Refolveo-fe , que fopofto a Fortaleza
não tinha pólvora de ley, & a náo fer alterofa, convinha não
a deixar chegar a tiro ; mas que fefoííe enveftirj emquant©

li 3 na-

dejl a facção.

V. '\

^■

J78 C^ST(l(lõTO LUSITJNO ^ .1645

iiavegâva pello rio . Efquiparaõ-fe dous barcos , cam alguas
canoas guarnecidos de valentes mofqueteiros, que a boga ar-
rancada enveftirão o íníniigp ; deràõ-Ihe húa carga cerrada
com tal efFeytò, que a na'ò Olandefa favorecida do vento , 8c
da corrente, viróii a proa, 8c com às lanchas tornou a derrota
de Pernambuco, fem que fua artelharià deixaffe defeftejar a
forte, em quanto teve viílà do lugar do perigo . O fogir de
noíTas mãos lhe pareceo victoria. Ç5 mais fundamento, a fef-
tejáraó os noíFos recolhéndo-fe fem morto,nem ferido.

104 O Author do Valeròfo Luzideno ^ irão devia tef
noticia do rnilyto, que obrou (para a entrega da Fortaleza)*

^/.TJf!^-'^^^^ chegada, & diligencia de Henrique Hus,pois o calla:(Difcul-

jpao a diftancia dò lugar de fua habitação, á do fucçeíro)Ou- Frey M
tros motivos efcreveo, que teve á dita ehtrega,dos quaes nãò ^^V-Í^^g
faz menção,quemfe achou prefente, na relação,que delia eff
creveojou por lhe ferem efcódidos,ou pellos julgar apochry^
fos3 não duvidamos do muyto, que alcança de Deos a deva-
ção das almas,& do quanto as obriga quem a inculca; porém
íàbemos, que não faz Deosmil^gres fem porque : Quando
'^ quer dar os fins,difpoem os meyosi & o que pellos humanos
fe pode confeguir, efcuza os milagroíbs 1 Com mais eviden-
cia nefte cazo, em o qual o motivo relatado pello fobre-dito
Author, foy tão occulto ao Here;e, que nem o avia de con-
vencer do erro , nem enformar do caftigo ; & a doutrina Ca-
^ ' thohca nos éiiíiria, que para convencer incrédulos obra Deos

a feus olhos as maravilhas ; & focorre aos fieis cõ milagres nas
cccazioés,& apertos 5 aonde não chegaõ as forças humanas.
Advertimos também, que em àlgiiâs circúnftancias,nos apap»
tamos de fua relação, porque âs achamos menos certas.

1015 Foy a reftauração defta Fortaleza, utiliííima para

bsprogreíTos denoíTas armas;comofoyde perniciòfiffimas

. V confequencias para o Framengo. Era fronteira, & chave de

■fí^rrir^rmle^^ ^^^'^ outfa Campanha, porque abria , &fecliávà o tranfito
^^]cíoríà, de Pernambuco, para a Bahia,& ao contrario ': Depofito áo

principal fuftento para os exércitos ; porque deftas partes fc
conduziaõ Òs gados , de que abunda aquelle terreno ; & fem
dominar aqueílepofí:o,ninguemfe podia fervir das rezes,que
ahmentaváo,aquelles paftos. À utihdade foy a todas as luzes

grandej

/.

i^4'>

IP^Í^TE /. LIF^ VL

379

grande j ou fe tome pella parte da defenfa , ou pella xla con-
quifta. A fortificaçaõ,& numero dos Olandefes realçou muy^
fo ao valor dos moradores , que no fitio provarão de deí^
tímidos, & de foldados. Nenhúa ví6toria mereceo tanto a-
plauzo jporque nenhúa fe alcançou com menos cufto;&: por^
que deixou nas mãos dos vencedores a compra,& o preço,c5
a gloria de renderem inimigos com a vifta,& có o braço. Qui^
zeramos dar a cada hum , o que neftã occaziáo mereceo , íem
que a fucceíTaó no referir deixafie de igualar aquelles, que fe
igualarão no valor, no zelo, & na conílancia. Com melhor
pena efcreveo então feus nomes a fama,do que agora o pode
fazer à hiftoria j mas fe aquella os fubio novoo, elta os dilata-
rá iió tempo. Servirão nefta occazião com armas, & fuítento,
os Capitães, que com Nicolao Aranha vierão da Bahia: Dos
moradores o Capitão André da Rocha,Francifco Velànes,os
dous Irmãos Britos, Valentim da Rocha João Velho,Gafpaf
Gonçalves Névoa, Manoel Gonçalves Mar^agaô^ & outros,
cujos nomes, fepultâdos lio efqUecimento tiverãò a fortuna
de foIdados,a qual à falta do premio amortalha nos fervíços*
Os moradores, fiados nâ força de feus braços,pediraò ao Ca-
pitão Nicolao Aranha , que lhes maridaíTe arrafar a Fortale-
za, para que ao inimigo fe cottaífe a efperança , & àos vezi-
nhos o receo . Executou-fe como fe |)edia : As dez peças de
bronze fedepoíltaraõ em lugar feguro para fe paíTaré a Per-
nambuco com mais comodidade. Ordenado tudó, o qlié po-
<lia fervir á conveniência dos moradores , marchou Nicolao
Aranha, com a fua gente para a Várzea , a dar conta aos nof-
fos Governadores do fucçeíTo, & do defe;o,qiie tinha de fer-
vir á liberdade.

1 06 Em quanto o braço dos moradores , das fobre-di-
tas capitanias , trabalhava na reftauração de fua liberdade,a-
cudia João Fernandes Vieira a da faude de todos. Titiha vií-
to,& via cada hora, que faó as mortes, às feridas , as doenças^
& as miferias certiífimos efFey tos das guerras , & das campa-
nhas, & determinou, que por aírerito,& obrigação fe acudif-
fe a feu remédio com o neceíTario focorro. Levantou húa ca-
2a de iVíifericordia á imitação das do Reyno , & das que avia
antes do Olandès fe fazer fenhor da terra (de nenhúa deixou

I14 omi°

Afrâptda a Pof^
talei^a marchaNi
tolao Aranha pA^
râ à t^ar&ea.

3?o CJsr<iiioT&LmiTjm 164^

o inimigo memoria em todas aquellas capitanias )iia qual Te
r; exercitaíTe a piedade chriftã, por diverfas peíToas adidas a
differentes empregos.CoRÍignou ordenado para hum Capc-
láó,quetodos osdiasdilTeííeMiffa aos enfermos, & lhes ad-
miniiiraíTe os Sacramentos, com obrigação de affiílir aos en-
terros dos mortos j que logo proveo em peffoa benemerita^í
en;o nome não fabemos , ou porque nâo íeí-viíTe á vaidade^-
ou porque o negaíTem á memoria. Determinou porçaó para
medico , furgíaõ , botica , & fervos, que affiíliílèm ás neceí^,
íidades, & limpefa dos enfennos . Repartio os gaftos pellos
moradores,como o permitia a poíTibilidade década hunr.EÍ^
' colheo para primeiro Provedor da Caza a Cofme de Craílo

Pafíbsjpor concorrerem em íiia peíToa todos os requifítos pa-
ra o cargo 5 para enfermeiros a Manoel João de Neyva, & a
Mathias Henriques moradores nos Apupucos jafli tambeni
mordomos da Cadea,& da bolça, acomodando os officios da
charidade, ao zelo, & a inclinação das peíToas, que para elles
efcolhiaj obra, que para todas as mais partes do Eftado j fer^
vio de exemplo á imitação.

107 No mayor fervor deíla occupaçaõ cíiegàraô á Yar-*
2ea os Meftres de Campo André Vidal de Negreiros,&Mar-
tim SoaresMoreno de volta da emprefa de Nazarethycom to-
dos os eftrangeiros rendidos . Confultáraõ com o Governa-
dor o premio,que poderia correfponder ao ferviço deXheor
che^aoaelkAn- dozio Eftrater,em quanto a Mageftade delRey de Portugal,
âreviàd^é-Mar lhe não faziamercè, (como efperavaó lhe fÍ2eííe)& atentan-
iim Soares de vol ^Q ^Q ^çfqQ ^ que tinha de fervir aoditofenhor naempreía
udeNa^aretk da liberdade, lhe deraÕ o pofto de Meílre de Campo de du-
V ^ ' zentos, & cincoenta eftrangeiros, [q rendidos nasoccazioés
referidas aíTentàraò praça de foldados] com prome{í*a,de que
fc lhe agregariaõ a feu tçrço todos os mais , que pello tempo
adiante quizeíTem fervir em o noíTo ejçercito ; Por Sargento
Mayor lhe nomearão hum Francês, Catholico Romano, por
nome Francifco de laTour,& deixaraõ(por lhe fazer honra)
á fua defpoziçaõ, & efcolha , a devizão das Companhias , &
I>ão o pojio de nomeação dos oííiciaes delias. Naõ foy o Governador Joa6

^/./í^íií anfi>o Fernandes Vieira de voto, que dos eftrangeiros feformafíè
dos qtrxnietros a, ^ ir r ^ • ^' m ii ' n

Theodoiio Ejira- ^<^^5^ leparadOiíe nâopque íe dividifíemjpeUos mais,&quea

Tlico-

I í 45 ^7>J^TE 1. LIV<Hp VI, 381

Theodo2Ío Eftratcr, lhe formaflem hum de Portuguezes , &
Eftrangeiros: Fundava feu parecer na experiência de muy-
tos annos, que com o trato lhe tinha enfinado a inconftancia,
& pouca fidelidade da gente do Norte ; & dizia , que de na-
ções entre as quaes cada dia fe mudava de Seyta,faltando á fé
Di vma, mal Tc podia efperar, que não mudaíTe de fenhor/al-
tandoá fé humana, pois era certo, facilitar-fe o mudar de le-
quito com o variar de religião j&que com innumeraveis exê-
plos fe poderia provar , que fua inconftancia era mais cuftu-
me,que eleiçá o, fendo para elles o intereíTe, a adoração de
fua fidelidade, & a ruina de muytas emprefas , porque unidos
cmefquadroés feparados, lhes ficava lugar para fepaíTarem
aos inimigos de feus condutores j o que não poderiaõ fazer,
fe a prudencia,& a cautela os formaíTe entrefachados com os
naturaes. A eftas efficazes rezoés fe oppoíeraõ os dous Mef-
tres de Campo dizendo,que o eftilo da milicia,tinha aprova-
do o contrario, com rezoés mais forçofas . As naçoés dividi-
das em efquadroês, & terços feparados , pelejão com emula-
ção, & efta os acende na coragem^ & lhes dá mayor valor , &
esforço, unidos na obfervancia de huns mefmos preceitos, &
eílilos j porque fopofto, que a arte da milicia feja húa fó para
todos, com diverfos modos fe exercita entre efta , & aquella
Haçâo,&mixtas nos efquadroês confundiriaó a intelligencia
das ordens, com adiverfidade daslingbas,&eftranhezados
Cabos. Venceo-fe ©Governador de fua cortez amizade , &
não da força da inftancia j & o tempo moftrará os males,que
occaziona o fuperior,que fogeita a rezão á cortezia.
m: , 1 08 Suítentava o inimigo ( hum tiro de mofquete da
Villa de Olinda)húa pequena força chamada de Sãda Cruz;
limitada no âmbito, grande pello fitio£ tinha-a fundado fua
conveniência no mefmo pofto, aonde eftivera a guarita , que
chamavão de João de Albuquerque, que he em húa reftinga
de área, có que a natureza dividio as agoas do rio , das ondas
4o raar,hiia legoa do Arrecife ] & inexcufavel trãfito para a
comunicação, & ferviço do Arrecife para a Villa,& delia pa-
ra o certaój já nefte tépo, cortada pella noíTa oppofiçaó def-
de a occazião , em que o Capitão Barboza com os trinta fol-
dados de fua Companhia a occupou ( como fica dito em o

/'

í^^

CASTl(lor o LUSITANO

numero fcíTenta, & nove defte livro:)Para a continuação dos
progreílbs de noíTas armas , era a força caminho ; & ganhada
^ por ellas, feria para as do inimigo eftorvo.RefoIveraó os nof-
^íí^M-y? opj € j, Q2ho5^ em que fe levafiè por entreprefa. AíTentáraó o té-
po,& o modoj& com uniiorme parecer mandarão a Iguas co-
panhias , q fe pafíaífem da outra parte do Rio, por aquelle íi-
tio,que chamão o Buraco de Santiago^ & de embofcada cor-,
tafíbm todo o focorro , que do Arrecife íe podeíTe intentar
pello vao , que de baixa-mar dá o Rio5naquelIa parte . PoRa
por obra efta diligencia/ahiraó os Meftres de Campo André:
Vidal,&:TheodozioEftratercomogroírodefeusterços,re-f.
folutos em levarem o forte á efcala : Adiantou-íe o Eftrater,i
pello conhecimento que tinha com o Comèndor Oíandès, a
perfuadir-lhe a certeza de fe perder, & a conveniência da en-
trega antes,que contra elle fe deíembainhaííe a eípada:ínfor-í
mou-o do poder, advertio-lhe o numero,& callidade da gen-
te, cuftumada a vencer exércitos , &: a ganhar Fortalezas de
mayor porte, a cujo valor, a reííftencia não fervida de outra
cou2a mais, que de irritar a cólera , & delculpar o efírago;
G que não podia duvidar, dizendo-lho como amigo, & como
.teftemunha j& que fe não enganaíTe com as efperanças do fo-
corro, porque a noíTa diligencia lhas tinha cortadas aquele
entregaífe como foldado, & não quizeífe morrer como lou-«
C03 porque com juizo, nenhum chega a morrer obfi:ínado,&
fem elle, a temeridade condena, & não honra , pois he certo,
que melhor reputada fahe das occazioes a rezão, que obede^
ce, que a defefperação, que reíifte . Verificava a vifía tudo^
quanto referia a verdade , & fem dilação fe entregou o Fra-
mengo a partido, que fe lhe fes com avantejados favores.En-
tregou o Forte com féis peças de artelharia , fobejas muni-
ções, & fufficientes mantimêtos , neceíTario tudo para os foi*-
dados Portuguezes, que nella ficàraõ de guarnição. O Cabo
rendido com todos os feus,(daquelle fepultou o nome, quem
aeftes cfcondeo o numero ) aífentáraõ praça no terço de
Thêodoíio Eftrater, primeiro convidados de noífa fortuna^
que de fua affeyção.Guarnccida a força com hua companhia
de foldados, para rebaterem o inimigo, fe intentaífe reeupe*
ralla,fe voltarão os noíTos para o fcualo;ainento. '>

i . ip9 Os

11

($4-Ç

fjT^rEi.Liriio n.

38?

1 09 Os Governadores Olandefes , que afllíliáo no Ar-
recife, cortados de tantos golpes, quantas eraó as perdas , &
danos recebidos^ confideravão a preíra,com que noffas armas
caminhavaó á ultima ruina defeu império. Mandarão hiia
embaixada ao Meftre de Campo André Vidal de Negreiros,

cuja luihncia fe reíumia em proteftos,& iufli fica coes, com q ,> ,

- ç, j . ^ rr 3 rr ^ rc ^ Manda o Olm^

arguiaojòccondenavaoosprogreíios de noílas empreitas, a dès embaixada ao

rebelião de feus fubditos, a perda defeus exércitos , as mor- Mcjlre decamk
tes, & priíbés de feus cabos , os danos de íeus comércios , os ^«^^^ Vidal. '
roubos de íuas fa2endas,a quebra de fua reputação, & a inju-
ria dos llluftriííimos Eftados, que a elle Meftre de Campo fe
imputava toda a culpa, como total cauza de todos os males,
pois quando o poíio, o preceito, & a rezão o obrigava a feli-
citar a paz, & a focegar os tumultos dos moradores levanta-
dos, influía na guerra, fomentava a rebelião , era parcial nos
infulcos, & Capitão dos Agreíroresi& que já, que fuás obras
o declaravão mortal inimigo, não fe negaíTe ás obrigações de
foldado,na comutação dos priíioneiros , mandando-lhe o feu
General Henrique Hus, com os principaes Cabos, que lhe ti-
nha retiudo , em recompenfa do Capitão Mayor jeronymo
de Pay va, que tinhaò prcfo no Arrecife . Mais colérico , que
corrido deixou a embaixada ao Meftre de Campo André Vi-
dal, fogeitando a impaciencia,ao decoro, & ao privilegio dos
embaixadores. Hum coração grande tem capacidade,para a-
lojar dentro em fi o agravo, & a vingança. Naõ há couza,que
mais irrite o fofrimento, que adefcarada fegurança, com que
o de vaíTo fe inculca innocente, & o agreíTor ofFendido . Mas
ainda aíTi não pode o Meftre de Campo diíTimular com a de-
fenvolcura de femelhante atrevimento. A rezão não dá li-
berdade ao juizo para deixar de entender^como para querer,
: ou não qu erer a tem a vontade. Não quiz André Vidal fiar a
refpofta á memoria, &ácortezia do enviado, & tomou por Refpcnde for ep.
fegLiro expediente o fazella por efcritoj para que,nem a adu- críto.
laçaó,nem o pejo podeífe viciar , o que referiíTe o papel , no
qaal fe continhaó as feguintes rezoés,como então fe difia.
.110 Se o efpanto não fora refulta da eftranheza , todos „
nosadmiramos.VV. mercês de minhas refoluçoés , &: eu de „
feus tratos : Mas como eftes çm V V . mercês íaó falfos por „

UZO,,j

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■■J.^'»Í#^'J

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CJSr^WTO LUSITjKO 1 64$

5; nzo, &aqiiellasem mimjuftificadas por cu ftu me, nenhum
5, fundamento poderá ter, nem em mim'o eípãto, nem em V V.
j, mercês a admiração. Mandou-me ofenhor António Telles
5, da Sylva Governador do Eftado^que vieííè a eíla Capitania,
5, foccegar os tumultos da rebelião, por VV . mercês lho pedi-
5 5 rem.Dei fuás ordens á execução j cheguei a eftes lugares, nos
5, quaes náo achei defobedientes, achei desforçados, não achei
„ rebeldes, quecaftigar, achei opprimidos , que favorecer . A
), obediência, quefe deve aofenhor^ não íe deve ao tirano : As
3, leys da politica civil (primeiro as introduzio no mudo a for-
^, ça, que a rezão) obrigão a obedecer ao Príncipe natural , &
jy não ao Príncipe intruzo. V V. mercês matão por officio, rou-
j, baó por còveniencia^ injuriaõ por gofto:Digaõ-meifaõ Frin-
,, cipes, ou Piratas.^ Sa5 íenhores, ou tiranos ? A obediência em
5, tanto he legal, em quanto ferve ao fuperior legitimoj não eiif
,y quanto adula a fenhor intruzo . Em VV. mercês , não fó he
„ falfo o domínio, fe náo o trato: Que herança , ou que direito
„ lhes deu efte império? Que engano nãoiníentão em todas
^, fuás acções? pois como julgaõ , que a hum governo falfo de-
jj vem os homens húa fidelidade verdadeira.^ Atrayçaó mais
yy V il, he a que refulta da ingratidão , porque íè fabrica com as
„ mãos do beneficio. A neceffidade obrigou a VV. mercês , a q
j, pediíTem ao Governador Geral do Eílado favor para a pazi-
j, guarem os Portuguezes de fcu domínio . Viemos em feufo-
j, corro, Eu, & os foldados, que me aííiftem , & defcubrimcs o
j, traydor intento defta petição, fendo todo o fim della,intro-
^ duzir-nos nefta Capitania,para que nella cercados de fuás ar-
jj mas nos confumiíTe o ferro, a fome , & o defterroj trayção q
jj todo o mun<io vio á luz das chamas, em queno porto de Ta-
jj mandaré arderão os vazos, que nos conduzirão por ordem,&
jj mandado de fua cavilaçaõ, que temerofa,de que logo defcu-
j^ briíTemos o engano, nos tirou os meyos para oregreíTo j&
^ fendo Eu nefte particular o mais queixofo, me querem per-
^^ fuadir o mais culpado . Muy to cega a malícia: A cegueira da
^^ natureza, não deixa ver aos outros^ porém a da malícia, nem
j^ aos outros,nem a fi mefmosjaquella curaíTe com os remédios,
^^ eíla aumentaíTe com as prqfperidades . Ponderem V V. mer-
^^ cês, de que parte falta a verdade , & deíTa acharáó a trayçaó,

' A

1^4'? fAT(rB L Lin{0 VI. 585

A Magcílade delRey meu feníior Dom João o Qíiaito , nos
ordena, que em tudo confer vemos a paz, n amizade, & a cor- ,j
reípondenciacomosOlandefesjporque fopoem igualdade ,j
no trato, porém íe nelie he tanta a diffcrença como a diftan- ^^
cia entre hum animo real , & hum coração mercantil 5 como ,,
pode fer, que fe não dé por ofíendido , medindo-íe o agravo ,j
pello exceílo dos extremos ? Mayor ferviço lhe faço cm me ,^
oppor á injuria , que em obedecer ao mandato ; porque fei, „
que da falta das noticias nace a diíFormidade dos preceitos.E ,,
quando levado deftc diâ:amen peque, na interpetraçaó de ,,
íiias ordens, pagarei com a cabeça, a falta da obedienciaj po
rém ficarei com a gloria de a faber dar,por ganhar o perdido^
na reputação de hum Rey, que cõ fidelidade firvo j & no cul- ^^
to de hum Deos , que fideliííimo adoro : Só morrerei com aj^
cnveja de não fer eu o primeiro, que defembainhei a cípada,
para vingar huns, & outros agravosj mas também com a dita ^
de fer o íègundo, a refpeyto de hum varaõ , que não tem pri
meiro, (O que nenhum accidente me poderá tir-ar.)Em quã- .
to ao requirimento de trocar prifioneiros, fácil fora o defpa-
cho, fendo todo o intereífe noíTo, pois nos pedem quatro ca-
bos atroco de hum capitão, quatro Framerigos por hum Por- ,
tuguez, dando a huos, & outros feu intrinfeco valor ; porém ^^
o General Henrique Bus com todos os mais rendidos,há dias .
queforâo remetidos á Bahia á difpofiçaó do Governador ^
Geral do Eilado, aonde chegou , menos o Sargento Mayor ,
Joaó Blar, a quem os moradores de hum lugar matarão com
quatro bailas, porque lhes devia mais, que húavida,& já que
os prifioneiros referídos,fe não remetem,(por fogeitos a ou
tra jurisdição) aconfelharei que VV. mercês os mandem pe-)
dir á Bahia, que com facihdade fe daraõ a todo o barato ^ por
naó fer fazenda de ley. Os que eftaó em noíTo poder lião tem,
gofto de voltar, porque militão entre nós , mais por fua con-
veniência, que pornoífa neceíTidade ; que naó neceífita de
rendidos, quem os pode render; Gom eíla refpofta dgípa-
chou André Vidal ao Enviado. - "

III Nefta occaziáo fuccedeo navegat hua lancha da
Ilha de ítamaracà para o Arrecife carregada de fazendas^ era
Portuguez o piloío,tomoU a cofta doPáõ Amaíelío,& varoit

Kk com

.'jiiM'j ^ij*¥Mii^.m.mmÉ.}fM

^U

CÂsr(^wfo LusiTjno

1645

com a lancha em terratDcrao logo fobre eíla os foídados,dije
Tomãojts m/as ,, ,^eíle fitio eftâváo de pofta ^M ficaraÓ fenhores da prefa,-
cha inimiza k ^ das peííoas, qué neila v mhao, (^erao trez J udeos mercado-
-vifa do pÁòÃ' res,& alguns Olattdéres.)DosJ udeos erão dous bauptifados
em Lisboai defpois circuncidados em 01andaj& então, blas*-
femos apoftatas em Pernambuco : O terceiro , nacido na ce-
gueira do Judaifiíio,em que tinha vivido até aquelle tempo.
Chegados á prefença dos noffos Governadores , remeterão
os Olandéfes á Bahia, & condenarão á morte os dous Judeos
apoftatas por fertfença do Auditor Gèral ,& Os depoíitáraõ
lia Capeíla de Saõ João,com guardas^ & Religiofos da Com-
panhia para que os réduziíTem á verdadeira fé,&encaminhaP;
fempellosmeyos de fuafaívação: Sentia niuyío o Governa-
dor da liberdade, que aqtíellas aímas fe perdeffem : ObrigoU
ao Padre Msftre Frey Manoel do Salvador , qiíe com feu ef-
pirito, & z^Io lhes prégaíTe , & os reduziíTe: O qde fes com
tanta erudição,& fervor, que convencidos dos erros, abraça-
rão a verdadeira fé, & confeflaraõ, que fó na ley Evangelicsi
fe poderiaõ falvar j & a Chrifto Senhor noíTo por filho de
Deos, verdadeiro Meííías,& Redemptor do mundojprégan-
do o que criáo, até o ultimo golpe do fiiplicio , em que os a-
éompànhod o mais luzido da noíFa gente : O terceiro Judco^
quediíTemos, o era por nacimentò, pedio , que o catequizai^
dadeira fe dous fem, qUe fe qucria bauptizar: Parecco impulfo do exemplcr,
chrifidos-mvos &foy ardildoengano^porquecomafegurança deconverti-
A^ejlatas. ^^^ pode fugir para o Arrecife a cõtinuar os erros de fua pro-

fiíTaõ; Èc foy tanto o^zelo , & piedade chriftã dos Portugue*
zes que neftes dias efqueceo em tudo oexercicío das arma%
engolfados na converçaõ, & íàl vação daquellas aímaSi

í 1 2i Em todas as idades foy efte o primeiro intento das
empreías Luíítanasj por todas as rezoés taõ gloriofas , q naõ
oiíve nãção,a que não ferviíTe de regra feíi exempIoi& de al-
vo para a en veja, a muytas.Não foraó poucas,as que não dif-
As enifrefdi Lu- tirtguiraõ o intereíTe , da fama 3 en vejáraò a fama pello iníe*
fttmas tem fcr reíe; emulos dos fins, porém não dos meyos. O Sol cega com^
fim a, exalfacao ^ j^^_^ porém não com O curfo , com efte trabalha , & com a-
^^•^ ' quella refplandece:Naó o pode efcurecer a fombra , porque

íiaó chega taó altOj&: cevafe na perfia inútil^ de o feguir,real-

çando-lhe

efse a ver

"»i>^iiri^-."«;-x. o^■x

16 \^ T-A^ELLIV^O n, 387 ^

çando-lhe os claros j com as oppoíiçócs das trevas . Níiõ po-^
dèraó os emulos de noíTa gloria efcurecer os claros de noíía
fama^ porém nunca dcixáraó de feguir a períia de a derdoii-
' ror com fua pena: Vem afombra da felicidade no vidro da
cobiça, & não a luz da fé, [ á qual por meyos de noíías con-»'-
quifcas fe reduzio tanta gentilidade]no chriftaõ do zeIo:Vem
as riquezas, que acquirião os foldados,& não vem as trevas
da gentilidade, que os Miniftros Evangélicos deílerráraó; sé
quererem cõfeíTar, que o fim primário das conquiftas de Por-
tugal foy fempre o zelo de dilatar a fé, & converter almas, &
não a ambição de dominar, & de eílender o império . Em to-
das as conquiftas da Coroa Portuguèza,fe eftendeo mais a cõ«
verçaó, que o dominio; penetrando mais certão a prégaçã&j
que as armas,como fe v è nas partes do Brazil,& agora na ref^
tauração de Pernambuco, que ao mefmo tempo , que os fol^
dados trabalhavão com o braço em fe reftituir no ufurpado^
trabalhaváo os Miniftros Evangélicos em converter JudeoSj,
Herejes,& Gentios. A hum fó Sacerdote, religiofo da ordem
de Saó Paulo , permitio a impiedade herética , que habitaíTe
dentro do Arrecife, & nelle trabalhou de forte , que reduzio
á Fé Catholica Romana fete Judeos,muy tos Gentios,& não
poucos Here)es.Com os pregoes da verdade immudeílè a ca-
lumnia* •

- 113 Horas tem o braço de foccegó^não affi a cabeça. À
natureza,que no corpo humano lhe deu a fuperioridade,& o
governo, lhe não permitio defcanfoj fempre nella trabalha o
^uizo j adormeííém os fentidos, mas não bafta o fono para in- Confere os úoffos
terromper os cuidados . Suípenfo eftava oexercicio das ar- '^'^^^^^^^''^^^^
mas entre os nofíbs^porém os Governadores delias fem inter- ^^^^^^'^F^^''^'
rupçaõ de tempo laboravão nadefpofição de feus progref-
fos,& intentos. Cófideravaó, o quanto importava para o fim
da emprefi,não deíiftir da continuação da guerra: Chamarão
aconçel ho 03 principaes Cabos do exerci to^propoferaò o ne-
gocio , & como os votos eraò refulta de variòs affeâ:os,fora5
diverfos os pareceres, ainda q ditados pello valor, pella pra-
tica, pella mduftria,& pello zelo de todos . Muytos convie-
raó,que fe reforraaífe o Arrayal velho,& que fortificada nel*
le a noífa gent c, fahiílé a infeftar,& reprimir o inimigo,aprd^
; i K.ic 2 veitando

CÀsr^oroLvsiTAKo

veitaíido as occazioés, que lhes àt^Q o tempo. Afgtins apro-
vâraó o voto^Sí reprovarão o íitiotDiziáo, que para efte fim
íèria mais útil o mais vezinho , & que fe devia efcolher a pa-
ragem, que chama vaó de Joaõ Velho Barreto.Outros tiuhaó
para 11, que o mefmo lugar,aonde de prefente fe alojaváo,er2t
o mais conveniente para o fim,que fe pertendia , & todos au-^
thorizavão fuás opiniões com os fundamentos de feusdiâ:a-
mês. O Governador João Fernandes Vieira com melhor ef-
colha, porque com mais advertência diíre,que não convinha
acurralar o poder na circunvalaçaõ de hum Arrayal,porq in-
Seiue-fe o puré- clufo nelle fer viria á defenfa,& não á cõquifta , & feria obrar
cer do Governa,- cótra a téçaó de invadir,levâtaF paredes para guardar^&cor-
àot da liberdade, (ar q fig ás viâ:orias cô a niefma eípada,com q fe vencerão as
batalhasjdãdo a entéder aoFramcngOjOU que noífa offenfa fe
fatisfazia cõ tão pequena vingãçâ,ou q noíTo valor temerofo
á2i vezinhãça de fuás praças fazia pé atraz nâ corrente de feus
progreíTos.Qiie féu parecer era, q noífo poder cingiífe todas
as forças inimigas,em quartéis tão vezinhos,qfe não perdefsé
de vifl:a,né os inimigos, né os parciais, & q na meíma divizáo
íicaíTe o poder unido:Que para guarda de armas,& muiiiçoés
& màtimétos, fe edificaífe húa Fortaleza debaixo de cuja vif-
^■\ ta,& amparo ficaíTe toda a circiiferécia , da qual,como do co-
raçaõ,fe cómunicaífe eípiritos a todo o precinto do cerco-Ef-
te voto tiveraó D. António Phelipe Camaraó,Hêriquc Dias,
& logo o feguiraó todos os mais Cabos.

114 Conformes nefte parecer fe aplicarão os noíTos ca*
bos a execução delle. Repartira6-fe os fitios q efcolheo, por
conveniétes a arte^pellos Capitães, q tinha efcolhido á opi-
nião,na forma feguinte.A paragé, q fe dizia de Sebaftião de
Carvalho,fe deu a D. António Phelipe Camarão para quar-
tel de feu terço, por fer entre todas a mais arrifcada. Por mais
Bxecuta-fe , é' importãte,& vezinha fe entregou aHêrique Dias, a q fe cha*
em ([ue forma, niava de Joaõ Velho BarretOi[Ficava a tiro de peça da Cida^
de Mauricea , & em tal eminência, que delia não podia fahir
peíToa que não defcgbriíre]fervialhe de trincheira,pella fré-
^ • te, oRioCapeberibe,queporaquelIapartefevadea deba*

xa-mar. Nosíitios das Salinas, carreira dos Mazombos, &
Villa de Olinda- fe coníiernáraõ trez eftancias,nas quaes

fe

.^\J^■.:^^^J^wt*iM^ «^^

1^4^ , <fJl(rElLlF'JlOFL 589

fc avião de fortificar os Capitães da terra , & os da Ealiia, pi-
ra que hims induílriaOem aos outros, 110 terreno, & nas vere-
das delle. Mais fe mandarão guarnecer as Eftancias da Villa
até o Rio Doçe^ por cujos arrabaldes,&: pella praya do mar,
fe crdenoUjandaílcm fempre as tropas de cavallo5que avia,cõ
algãas Companhias volantes, que ferviíTem deguarniçáo,&:
fintinellas, nas diílancias, que não permitião , quartéis . Do
remanecente de officiaes, & foldados fe formou hum groffo,
que affiítiíTe aos noílbs Governadores , para darem focorro a
todas as partes, aonde o pediííc a neceífidade, & a occazião,
fítiados em pofto conveniente, até que tiveííem alojamento,
certo na Fortaleza, que fe avia de fazer.

1 1 5 Sobre a efcolha de lugar para a íituaçaõ da Forta-
leza ouve a mefma diveríídade de pareceres, queunioodo
Governador João Fernandes Vieira , cujo voto foy feguido Bfioihe-fi fnio
de todos, porque o formava a pratica do terreno, & o eíludo?^^^ hu&Fonde-^
do juízoj era o mais empenhaí3o,avia de íer o mais comteni- ^^'>^y^í°^ ^^'^^
plarivo. Moftrou com evidentes rezoês, que húa eminência,
que a natureza levantara pegado ao Engenho , que fe dizia
do Bribao, hiia legoa do Arrecife , tinha todos os requifitos
para affento da Fortaleza; & a mayor rezão da conveniência
era, cortar a eleição pelio particular da peífoa , que votava.^
porq deftruia fértil iííimos cana veaes de trez engenhos feus*
Humeftrangeiro, perito na arte da fortificação, deliniou a
planta do edifício , com a ^randefa , & capacidade , que lhe
pintou o defejo: Em os últimos de Setembro fe lhe pos a pri-
meira mão. Para trabalhar oa obra concorreo o Governador
com todos feus cfcravos; & á fua imitação os moradores com
todos os que tínhão,que ajudados das companhias por giro,
derão principio, & fim á obra em trez mezes , tempo em que '
àii tes,& le aperteiçoou, com reparos , plata-formas efplana-
das, contra efcarpias, pentes, cavas, trincheiras, paliçadas,&
tudo o mais conccrnente,& proporcionado coma mageftade
da praça j& também acabada, que a olhava a arte com admi-
raçáo,& o ódio c6 o receo.Oyto peças de bronze, que o ini-p^.^-^^^-^^^ ffj^^
migo nos deixou no Porto do Calvo fe poferaò nella; com as t„etos da póvoa -
quaes fe deu a primeira fal va em dia da circuncizão , do anno caí do ArrayaL
de mil & feifcentos & quarenta & feisifeílejando o myílerio, '^^'^^'.

Kk3 que

-^f^.

iíM

if ','fnii ^.im*jmjMxmjiMmA

390 C^STflUOTO LUSITJNO 1^45

que lhe deu o nome de Fortaleza de Bom Jesvs ; a cuja fom-
bra os moradores edificarão hiia povoação , para a qual con-
correrão, de muytas partes , ofííciaes macanicos de todas as
artes , de que neceffitava o ferviço publico j & formarão em
pequeno campo hum viftofo lugar, ao qual deraó nome de
Arrayal novo, a diffèrençâ do antigo.

1 i 6 Viajoaõ Fernandes Vieira ociolas as armas de íeus
foldados; confiderava, que da natureza toma a politica as re-
gras mais certasi& que o ferro da efpada , com a ferrugem íe
corta, & com o uzo fe alimpa; determinou buícar occazioés,
para que o exercicio deílerraíTe o ócio; & não podeíTe o Fra-
joaõ Fernandes mengo apelar de íeu temor para noflb defcanfo; nem dár-lhe
ritira hufca. oc- ^om elle tempo, a que melhoraíTe dos golpes, que o atormé-

caiiaoparaexer- tavãoiDifcorriaconíisomefmoíbbrequal das fortificações

Citar os jolaados. ... j . , .^ ., r rr rri i r-

inimigas poderia canir,com melhor lucçeíio,o àílalto de nol-

fas armas :Medíoíua memoria, a cada hua das Fortalezas do
Arrecife, como verfada em tôdas:Cotejôu-lhes os fitios, a ar-
telharia, Sc os prezidios,& aííentou configo, que a Fortaleza
chamada das Cinco Pontas, fituada na pray a do mar fobre a
Bar'*eta,hum tiro de mofquete da Cidade Mauriceã erâ,â que
com menos r ifco fe podia ganhar,(íe pello eícuro de húa noi-
te, fe envefi:iíre á efcala . ) Com efta íbpofiçãõ mandou fazer
os apreftos neceflàrios com tal fegrèdõ,que vendo todos pre-
parar o tiro, não ouve quetn âtinaíTe com óalvo. A nenhúa
peíToa compnicou o intento; porque lábia , que mais feguro
efiiá o fégredo no peytó, que ò efconde , que na boca , que o
calla. Pofta a gente, que lhe pàreceo neceífaria , junto ao Rio
Capeberibe, hú tiro de pèçâ do lugar deftinado para o afíal-
to, chamou a íi ós Meílres de Campo, & lhes comunicou feii
defignio, pára o qual nãô pedia confelho , fe não para o mo-
ntentâgm ara. ^Q^comqueíèáviáde obrar; deículpaudo orecato, com o
receo de que fe adiantaíTe àlgUm avizo tray dor , a prevenir o
inimigo. Era Theodozio Èíírãter õ rtiais moderno, & falou
prinieiro;poréni com animo tão fiel,& tão bellicofo,que foy
feu parecer o ultimo; (formado de rezoés equivalentes ás fe-
guintes.)
5, 117 Nenhum de vofías Senhorias pode ter informações
„ mais frefcas , nem mais certas do eftado , em que hoje eftá a

For-

Fo

CO Pontas,

:%jtí^^^0)j^*«^áih ■«^"«.

64^

^A^E1.L1V(^ VL "

391

Fortaleza das Cinco Pontas , do que eu; porque hámuyto ^^X^i^s com cfue
pouco tempo, que o vi como Toldado , & o examinei, como ^ J^^, Ejira-
pretendente. Naõ duvido do valor , & da fortuna de Cabos -^

taó Excellentes,nemdaou2adia,&dobraço de foldados taó
dei tímidos, que a Fortaleza fe não ganhe ; mas julgo por cer-
to, que a empreía nos há de cuftar trezentos , ou quatrocen-
tos Toldados; porque ainda, que Tubamos os muros , Tem que
Tejamos Tentidos, (o que há de Ter impoííi vel pella v igilancia
dos contrários, agora mais viva, porque mais receoTa ) o nu-
mero, & callidade do prezidio he de gente taó eTcolhida,que
não há de virar o rofto a contenda, com a ventagem,de acha-
rem as munições, & as armas táo preíles , que para cada hum
as ter á mão não Terá neceíTario mais,que eftender o braço;&
o partido tão deíigual, que haó de pelejar firmes,& os noíTos
pendentes. O campo da batalha, dentro de Tuas meíinas mo-
radas,que Tabem a olhos fechados, & que nós naõ poderemos
atinar no eTcuro da noite, com todos elles abertos: Elles deT' '*
tros nos lugares donde mais a Teu Talvo nos podem oíFender, "
nós Tem luz, & Tem noticia, que nos enfíne a deTviar . O bre
ve, & inTalivel do lbcorro,indubitavel pella promeíra,& pel- "
la V ezinhança;& quando a conTuTaõ do repente , & a turba- "
çaõ do Tobre-Talto os leve a deTcTperaçaõ , primeiro os ave-"
mos de ver mortos,que rendidos; o que não poderá Tucceder '*
Tem que Teja á cufta de muytas vidas,& de muy to Tangue noT-
fo;& porque os golpes haó de buTcar os priineiros , certo he, "
que haó de Tangrar aos mais valentes ; & dado cazo , que ga-
nhemos a Fortaleza a todo o cufto ; como a poderemos TuT-
tentar cercados de todas as mais Torças do inimigo } Quê nos
há de prover de muniçoés,&mantimentos.^Que exercito nos
fica por terra, para nos Tocorrer á cTpada ? Que armada por
mar para a diverTaó das armas inimigas / Pois o panhalla com
perda, para a largar Tem crçdito, nem poderá Tervir a reputa-
rão, nem a conveniência. Além de que, a perda da Fortaleza
he para o inimigo golpe, que pode curar facilmente; a perda "
do melhor deite exercito, Terá Terida , de que nunca podere-
mos convaiecer ; porque a Talta de hum edifício Te remedea,
ou com Te reedificar , ou com outro o Tuprir ; & a de hú Ca-
bo expertOj& de hu Toldado pratico hámiíler muy tos tem-

Kk 4 pos, "

392 C^ST^IOTO ZVSITJNO 16^^

3) pos,muytas occa2ioês,&miiy ta fortuna parafe remedear.
» As regras da milieia nos enfína a difFerença,que há entre a ef-
j, colha, & a neceffidadejporq efta não deixa eleiçaõ.& aquella
55 tem liberdade para bufcar o melhor fitio , o melhor tempo,
5) & a melhor parte, ajadando-fe as forças , da induftria , q faõ
3> os mais poderofos auxiliares,que temas armas: Coniellas na
jj mão nos achará a opportunidade,& nos dará fem perigo, o q
35 na prefente occaziáo naó poderemos avançar fem perda. Em
5, quanto ao que voíTas Senhorias me dizem , que o valor dos
)y foldados fem o exercício das armas íe debilita,& que o braço
j, que fe nãoagilita,entorpece: Digo,que eftamos fenhores da
yy campanha com húa , & muytas oppoíiçoés do inimigo , que
5, nos dará fertiliííima colheita de occazioês em toda aparte,
5, & em todo o tempo, fem que haja lugar para fe introduzir o
5^ ócio, &fopofto, que a todos fera notório efte movimento,
5, não he credito, voltar fem algum cfFeyto : Advirto a voíTas
„ Senhorias que o Framengo a efta hora , & em toda efta cofta
;,, não poíTue mais, que as praças do Arrecife, Cidade Mauri-
5, cea, Rio de Saõ Francifco, Faraiba,& Rio Grandc,& que to-
5, do o baftimento delias fahe da Ilha de Itamaracá,de que eftão
5, fenhoresj fe nefte lhe faltar o dominio,em todas lhe há de fal-
,j tar o fuftento: Nenhum golpe lhe cortara mais deprefía a vi-
jj da,que,o que mais lhe entrar pella gargantaj& aífi fou de pa-
^^ rccer,queíem largaremos as armas ^ aproveitemos omovi-
mento^& trocando-lhe os fins,demos fobrea Ilha de Itamara^
cá, que fem duvida a acharemos taó falta de reíiftencia, como
alhea de noíTa refoluçaõ.

118 De forte fe a;uftou efte parecer cõ o juizo do Go-^
vernador,& dos Meftres de Campo,que eftes o confirmarão,
& aquelle o aprovou. A todos movia o zelo^ a nenhum cega-
va a emulação, Naõ tem replicas o voto acertado aonde to-
dos conhecem,& defejaõ o acerto . Naõ faltou ao acordo, a^
^eftm deten- quella preftefa, com que fe facilitão osfucçefíbs. Defevefe a
çaje executa, marcha fó aquellas horas , que foraô precifas para dar forma
á fuftituiçaõ da aufencia, que o Governador, Meftres de Ca-
po, & exercito aviaõ de fazer daquelle lugar, aonde o gover-
no devia ter promptos os íbcorros, fe os pcdiííem as eftãcias:
Eftas fe guarnecião de fufficientes prezidios com ordem,que

fc

3)

J)

35

.ÍK^IL^;

ídnoel
Valer.

P

fefiaírem a obediência do Governador dos Minas Fienri*
qne Dias, a cuja difpoíiçaó ficava a Q^^ç-n^-à do fitio, íc o ini-
migo convidado daoccaziaõ intentaíTealguanovidade.Dií^
poUas as couzas na forma dita , marchou o Governador com
os Meftresde Campo André Vidal de Negreiros,& Theodo-
zio Eftrater, &: Dom António Phelipe Camarão. (Infiro,das
relações não fazerem memoria neftaoccaziáo do Mefíre de
Cam po Martim Soares Moreno , nem para feguir a marcha,
nem para governar neftaaufencia, que fem duvida oteriâo
íèus achaques de cama. ) No argumento, & conclufaó^e
Theodozio Eftrater temos referido a cauza , que defviou do
aíTalto a Fortaleza das Cinco Pontas ^ & refutada , a que lhe
deu o Padre Meftre Frey Manoel do Salvador no feU Valero-
fo Lucideno:Equivocou-fe na occaziáo, & no motivo^ porq
nem o Mulato, de que fala, fugio neíle tempo para o Arreci-
fe, nem foy a cauza de fe mudar de intentoiPorém não faltou
traydor, (fem íer mulato na cor j ainda que denegrido da en-
V eja, & da emulação) que vendo a marcha, & fabendo a ten-^
çaó,avizpu logo ao Arrecife o intento de noíTas ârmasj& deu
tempo ao Framengo pára âpreíiar duas náos, ^ algúas barcar
ças de remo, que mandou á Ilha, de focorro com tanta brevi?
dade , que fe não chegou a tempo para fe rebater ainvazãoj
chegou a ter parte no motivo da retirada.

1 1 9 Em catorze de Setembro chegou a nova gente á
Villa de íguaraçia, aonde noíTos Governadores mandarão a- ^
penar todos os barcos, lanchas, canoas, & jangadas, para que
a certa hora efti veíTem preftes na barra do Rio Catuama ; Sc ,
fem detença marcharão por terra a bufcar a Iliia pella banda,
que olha para o Norte. Eftava por aqUella parte defendida a ^%;* ^ ^ojfo e*
paffagem do rio, que divide a Ilha da terra firme , com hua ^f «^^^-''^«^'■^-
náo Framenga bem artelhada, & melhor guarnecida de Ôlá- ^^"
defes,&: Indios^Sc fem a não fe render, não fe podia â paíTagé
franquear . Para efte eífeyto mandarão apreíiar hum barco
grande, & hum batel com Cem homens de guarnição , ás or-
dens do Capitão Simaó Mendes^ com preceito de vencer,ou
morrer na demanda. De boga arrancada enveftiraò , & abal-
roarão a náojua qual acharão tão dura refiftencia , que reba-
tidos delia voltáraóatrasjjuáo para deixarem a emprefa,fe

não

lill

luimiilli
IRRiiff

394

CAsr^^oro wsitjno

3^645

não para reforçai é o impetu : Bebiaó novo furor íio próprio
fan2uc,& acefa a vingança na chama da coragem a inveRiraõ
íegunda vez com dobrado animo,& reíolução tao hrme,que
a entrarão, & renderão á ciifta de muy to íangue de Olande-
fes, aos quaes deu o conílíâ:o, a beber a morte em tragos dif-
ferentes; porque a huns tirou a vida o fogo, a outros o ferro,
& á may or parte a agoa , afogando-fe na efperança do reme^
dio. Quinze fe renderão, & fe lhes deu quartel. Os índios có
barbara efcolha, aconfelhados da culpa, bufcàraõ na morte a
mais breve pena.Deixou a entreprefa da náo a paíTagem fra-
ca, da terra para a Ilha,á qualpaflaraõ os noíros(nos vazos, q
a diligencia tinha prevenido^ com trabalho, porque cora va-
PéiP o rlo,& CO. g^^' ^*^^^^^ P^^^^ numero da gente ; ( Avia-fe engroíTado com
mete a mprefa. melhor de quatrocentos moradores da terra, que fe encorpo*
ràraõ no efquadráo,) quanto pello rio ter quafi meya legoa
de canal , & efperar-fe a conjunção da maré . PaíTada toda a
gente a outra parte, & formada na Ilha,fem rumor,nem tiro.
(porque não foíTe fentida do inimigo)Deu nas mãos das nof-
fas fintinellas húa Framenga,que vinha fugída,Sc como a cau-
^a a trazia efcandalizada fe offereceo aos noífos Governado-
res, a que fem ferem fentidos, meteria os foldados Portugue-
zes dentro das trincheiras dos feus, porque fabia o eftado em
que ficavão os Olandefes, & fuás fortificações . Cotifiado na
guia mandou o Governador da liberdade, picar a marcha dá^
do-fé nefte dia a vanguarda ao Meftre de CampoTheodozio
Eftrater,qu e a pedio com empenho j&Joaô Fernandes Viei-
ra lha concedeo com fobroço.

I iò Tinha ]i entrado a noite , quando a íioíTa gente a^

bailou do fitiú, aonde fe formara: Com o mayor groíTo foy o

Meftre de Campo Theodozio Eftrater , levando a vanguar-

JE que tempo & ^ ^^^ feauimento da Olandefa; & o Sargento Mayor Anto-

com que modo. . ^^. ^ ^ ^ 1 1 n - i ^ r

nio Dias Cardozo com hum batalhão de moradores em teu

alcance* O Governador João Fernandes Vieira, & o Meftre
de Campo André Vidal de Negreiros com o reftante, de que
fe formava a retaguarda,forão feguindo o trilho dos de hum>
& outro efquadrão . Avia-fe de atraveíTar a Ilha por trcz le-
«oas de diftancia de Norte ao Sul para fe bufcar a Villa , aon-
de o inimigo tinha a fua Fortaleza, Sc o feu alojamento . Re-

folyeraõ-fe

*^4l

^JllTE L LIF(lO ri.

39^

folveraô-fe qne fe mediíTe a marcha pellas horas da noite . SI
pella diílancia dá terra, de íbrte , qne febre a madrugada íe
chegaflè a aviftar a povoação: A Framenga,que guiava ao El-
tratcr, ou por ignorância, ou por malícia, o levou por cami-
nho aíTi torcido, & defviado, que era manhã clara,& não via,
a que parte ficava o lugar. O Sargento Mayor rriais pratico no
terreno,&: menos confiado nas promefías da Eílrangeira, def-
V iou-fe do erro, com deixar de fegnir o deívio, & ao romper
da itianhã , fe achou junto ás trincheiras do contrario, fem ter f
vifta, ou noticia, nem de fua vanguarda , nem do elquadrãò
da retaguarda, em que vinhãoo Governador ,& André Vi-
dal de Negreiros: Fes conta da gente com que fe achava , dif-
polla em forma prolongada para cingir a praça por aquella
parte.Succedeo naquella hora fahirem da Vilía algiias índias,
luias a marifcar, outras a biifcar agoa , & darem de rofto com
â noíla gente: que até aquelle tempo não era fentida J Vol-
tarão todas de carreira para dentro da Fortificação levantan- AntonioÍDíásCa¥''
do o grito, até vmde o fubia o medo : Os noíFos , que fe viraÓ "^^^""^^^
defGubertos,feguiraõ as índias, aumentando a vo;í dú rebate, ^^- "*
tom o efttondo da in vazáo,que fervio de cortar o fono,& in-
troduzir o fobre-faito nos vezinhos,& foldados do prezidio;
Aquelle mefmo tumulto, que chamoU o inimigo para a de-
fenfa,chamou também para o avanço ao Governador 3 & ao
Meftre de Campo André Vidal, que coni o efquadráo da re-
taguarda chegavão pella outra parte ás trincheiras da po-
voação, & prefumindò a cauzá do referido alvoroço tocarão
a enveftir, & fem reíiftencia a ganharão, com os almazens das
muniçoés,& mantimentos do inimigo , que por acudir á par-
te,aonde o chamava o brado,defemparou o lugar aonde com
mais dano o feria o golpe . O Sargento Mayor , que com os Ao mefmo temft
feus foldados fora em fegUimento das índias pellas portas das ^ ^^Z*^ o Go-ver-
trinchciras,que eftavâo abertas, os repartio em mangas, com *^^J^^^ f^^^ °^^^^^
ôrdem,que paííaíTem á efpada a todos os Indiosjque fe aloja- ^
tão por aquella parte, dentro da fortificação como auxilia-
íes,& confederados do inimigoj o que fe obrou com d efira-
gd, que permitio o repiente,& o indefenfo . Chamados do ef-
troiido das armas, & da voz do efpanto vierâo acudindo Ef-
trág€Íros,& naturaes^aíTí da Fortakza,eQmo de outros quar-

igisj

39^ C^^^'\^orO LVSITAKO 1645

teis, a tomar as bocas das rnas, porque o deftroço não pene-
traíle o interior da Villa: Com a oppqzição fe intenfoii o fo-
chegâ Theodo^io j-^j-.g^ {q aumentarão os golpes eom a chegada de Theodozio
wrrTfe^mirai Eftrater,aquemadefconfiança da detença obrigava araoí-
lonalcT^a, trar, que não tivera parte nella, nem o deícuido , nem a oiali-

cia.Carregado o inimigo do temor y & dos golpes fe foy reti-
rando para a fombra da Fortaleza , bufcando o amparo de;
fua artelharia (jugava dezoyto peças) com a qual nos fes cõ-
fideravel dano^porque os noíTos, embebidos no goílo da vic^
toriajdefpreza vão o perigo das bailas*

121 Ganhada a primeira fortiíicaçáOjíe mandou foFtat.
lecer o interior delia, porque o inimigo perdeffe a eiperançà
de a recuperar ; o que o Sargento Mayor executou com to-
da a prefl:eza,& arte, de forte, que fazendo a Glandes algúas
Combatem os mf' invertidas para a cobrar, foyfempre rebatido, &caíl:igada
Jos o torte. ^- ^ rigurofaméte, qiie aconfelhado da perda defiftio da per-

íia: Não defiftiraó os noíTos de continuar a emprefa , profe-
guindo no ataque da Fortaleza, qne eftava cingida de repeti-
das eftacadas,& dilatado foço . Com 2 reíiftencia fe acendeo
o furor da conquifta^ (Durou o combate da primeira hora da
manhã atè ás cinco da tarde. ^ Com incanfavel braço rompe-
rão os noífos por todas as oppoíiçoés da reíiftencia, até pore
as mãos na porta da Fortaleza, a tempo , que muy tos delles
metidos nas cavas procurarão fubir , & ganhar òs balíaartes.
Em quanto o exercito intétava a efcala da força,fahio o Go-
vernador João Fernandes Vieira fora das trincheiras a orde-
joar, que fetenta feridos no combate', feconduziífempara a
terra firme, (prevenção naõ fó de pratico foldado, fe não tã-
bem de General piedofo,& difcreto, que no mayor favor da
ventura, fe não fiava nas promeíTas da dita) Quem mais fe fia
da fortuna menos a conhece,& fó o necio faz confiança, do q
ê intmigo qudfi ^^^ ^^^^^ experiencia.O inimigo/ignorante no dano,que fua

rendido foítafo' i, • ^ • t r • \ i r i /r

hre os 7MÍfos cha~ attelharia nos tinha kito) vendoj que a ouzadia dos noUos^

nudo de fua de- fem reparar no perigo, intentava a efcala, fes fina es de rendi-

fordem. do pedindo bom quartel . Viaó-fe os aíTenos , porem não íe

percebião as palavras , que as vencia o eftrepito do combate*

Fefte^àrão os noíTos a chamada com o pregão da viâoria , &

como fe a dcfordçm não chamara pella ruina > fe derão a rou^

bar.

bar, perdendo com o defmancho aquelle valor,que lhes dava
a forma. Foraó os Toldados da Bahia os primeiros , que a de*
íbbediencia levou ao faço ^ & a mayor parte dos outros , que /O
pcrfuadio o exemplo , até as próprias armas largarão para fe
aplicarem com todas as mãos ao roubo, daíidooccaziáo ,a
que obraíTe a cobiçd".)0 que não poderá a mayor defgraça.Os
índios defenganados, deque a nenhum fe avia dedarquar^
tcl,& que defejavaó morrer vingados,animàraõ,com a defor-* 4
dem dos noíTos, a floxidão dos Framengos , a não perderem
a occazião, que lhes dava o tempo para melhorarem de for-
tuna: Sahiraó de tropel,deraó fobre os defgarrados [ poucos
achàraó unidos] com tal furor , & animo , que foy neceílario
aos oííiciaes Portuguezes todo o coraçaõ,& todo o braço pa-
ra lhe fuftentarem o impetu : O valor de húa parte , a muíti- >
dão da outra concorrerão a fazer taõ languinolenta a peleja,
que no terreno delia fc viaó fetenta mortos de húa , & outra
gente.Tinha o Governador João Fernandes Vieira ordena-
do ao Sargento Mayor, que com alguas companhias de feu
ter ço guarneceíTe as trincheiras ganhadas pella parte exter-
na, aonde eílava formadoj para rebater todo o focorro , que
defórapodia vir ao inimigo j& foy o total remédio para naõ \
fu j7Írem os noíibsique a náo fer aíTi fora irreparável o dano q
nelles fizera o Framengo ^ achando-os fem armas , & fem or-
dem,taó cortados do medo , que feus mefmos Cabos cõ as ef-
padas nas mãos os náo podiaó deter, nem com o preceito,né
com o golpe. Tanto pode na guerra hum accidente, que tro-
ca as mãos a fortuna*

122 Aquella meíina oppoflção,que deteve á fugida dos
Portuguezes, cortou o fio a viâ:oria dos Framengos. Pareceo
ao inimigo,que era ardiljO que fora neceííidade:Aííalrado áo
receo, fufpendeo o curfo do furor. Vio a diligencia com que EetiraÕ-feóf mf-
o Sargento Mayor detinha , 8c formava aos que fogiaó ( ipã-fe^^" i^^W^^^'
receo-lhe a difpofição do reparo, preparação para a envefti-
da;j&: temendo, que os noflbs o cometeíTem fegundavez á
efe ala, fe retirou á Fortaleza: Conhecerão os noíTos Gover-
na dores pelio effey to a cauza , & confirmarão ao inimigo na
fofpeyta,com tanto arteficio,que o Sargento Mayor,feguin*
do as ordens recebidas j fe foy retirando na retaguarda do

Li exer-

9m^f¥mm¥ÊsmmÊ!i

^^^

1'i^^^^^^

598 C^ST<!iWTOLUSlTJNO 1645

exercito cora pafí^j taó vagarofo , que fazia crer ao inimiga
não fe deixara empreíà,fenáomudar-fea forma á enveftida:
Indiíftria, com que íe deu occaziaó,& tempo,para que muy-
tos moradores da Ilha fe libertaíTem da fogeiçaó , em que ví-
viaõ, retirando íiiasfamilias 5 moveis, & gados áfombra de
noíTas armas, que íuftentavaó o engano do Olandès forma-
das, á ília vifta, alguas companhias com aparência de frente,
em quanto foy neceífario para íe coníèguir o referido. Neíle
tempo aparecerão duas náos Olandeíàs de mar em fora y &
duas barcaçaSj que com todo o pano emproa vaó a IlhaiCon-
^eíèuràiaõ os noíTos virem de focorro aos íeus , & aílentàraó,
que naõ convinha eíperalas , com gente desfalecida de onze
horas decombate,& de vinte & quatro de jejum cortada do
infortúnio j& fem forças, nem ouzadia para offenfa, Sc para a
jreíiítencia j fendo forçado hum,& outro modo depeíe;a,íe as
jiáosdo inimigo chegaflem a occupar o porto da paííagera.
Tomada eíla refolução mandou o Governador duas compa-
nhias, que aíTeguraíièm o traníito do rio , 8c ti veíTem preftes
pafaÕ'fe h terra todos os barcos para que naquella noite fe pofeíTe toda a gé-
firme,femperda. ^-^ ^^ outra parteiPaíTou ordem ao Sargento Mayorpara que
com a gente, que tinha formada marchaííe,fervindo de reta-
guarda ao exercito.Concedeo-íè a primeira viagem aos feri-
dos, moradores da Ilha , & fuás famílias: A íegundaaos folda-
dos. A terceira aos eícravos, moveis,& defpojos. A ultima ao
Sargento Mayor com o batalhão da retaguarda j& deípois de
todos fe embarcou o Governador Joáo Fernandes Vieira,cu-
ja aííiítencia naó deu lugar a menor dcfconfiança dos íeus, nc
aminima defordem da gente, dizendo a todos com alegre
femblante,que paííàíTem leguros de os bufcar o inimigo,por-
que naquella hora o defvelava o receo de fcr enveítido j & q
a nenhum entriíleceííe a infelicidade do fucçeíTo , entenden-
do,que a fortuna lhes guardava a YÍâ:oria,& a vingança para
melhor occaziaõ.

123 Com alguas horas de deícanro,& de refeyçaõ mar-
charão os noíTos para a povoação de Iguaraçú, levando con^
íigo os defpo;os,que tiràraó da Vilía, & de feus contornos^os
feridos,que eraô fetenta, velamen, mantimentos , & artelha-
ria (eraõ quatro peças) que tiràraõ da náo que rendèraójdei*

xando

xandoocarcoconfumidodofogo.-Emígnirnçu fizerão al-
to, & rezcnha da gente , & pellas Jiílas viraó , que na batulha ///J.^J;'/^'^^'^^/
ficaraóieíicnta mortos, a fdber catorze Poitiigiiezes de '^^- aonde f"z(ã w-
rioj terçosj doze índios do terço do Camaraó^&do terço de to^é- examinado 'p
TheodozioEllrater, trinta & quatro Eilrangciros ,Tu;a in- wíwíto áagcnte,,
clin2çáo,&cuíl:ume de roubar nos tirou a viâ:oria das mios,
com a deíordem,& com o exemplo. Dos que íe retirâraÓ, íè-
te defte terço, íe acharão fem armas, porém náo íem mochi!-
las bem clieyas; porque dando á pilhagem o tempo , que ou-
Yeraó de dar a obediência largaváo as armas , mas não o rou-
bo,para íal varem as vidas j (por taó vil preço vendem as na-
-çoh fetentrionaes a vida,& a honra ) Seu Meftre de Campo
TheodozloEftrater, os condenou a morrerem arcabuzeá-
dos jaoque acudirão osnoíTos Governadores ('demaílada-
mentepiedofos) ordenando, quedosfetepadeceíTe o mais
cuIpado,& aos féis fe perdoaílè . Perdeo o inimigo nefta oc-
cazião por cima de duzentos foldados entre Olanderes,& ín-
dios: Os feridos foráo tantos, q fe lhes não deu numero.Dei-
xou o aífalto a todos os Framengos taó medrofos , & alhea-
dos, que os vio o focorro com efpant03 & aos mortos,& feri-
dos com magoaj aumentando-lhe a dor, onãofervir ahuns
de remédio, nem aos outros de defenfa. Kíía , & outra couza
nos refukou da occazião,porque fervio aos inimigos de con*
fufaõ,& aos próprios de doutrina»

124 Deixara a contingência de o fer, íe cortara os íuc-
çeflbs pella medida dos merecimentos; porque então não fo-
ra cazo, fora certeza :Pode a fortuna dar, ou naõ dar as vito-
rias, porém não pode dar , nem tirar o merecimento das ar-
mas. A forte do vencedor 3 naó efcurece o valor do vencido5
porque muy tas vezes o fica o melhor foldado » A fortuna da
como quer,8(: não como deve; & por eííarezão fe chama di- jy^n} conta âeaU
ta Pcllo carro do triumpho puxa mais vezes a ventura,que ò^/íáj farúcuUri^
mérito. Ninguém pode duvidar, quemayor gloria adquire o ^^^^^ dejle fuc-
que vence a deígraça, que o que triumpha do inimigo . Efta F^^^i
jíão poderá negar a rezão,& a memoria aos Portuguezes, no
fucçeífo referido, pois nelle pode feu valor fazer da ruina re-
médio, reparando o golpe do revez, com o efcudo da induf'
tna3 refultandíi-lhes mayor louvor de levantarem o cahido.

Li 2 ào

'U-

fx

" t

400 C^Sr^^IOTO LUSITJNO ^1645

^o qae poderá refultar fe abatéràó ò levantado . A fí mefino
fe excederão os foldados, & a íi mefmos os cabos mayores, &
menores do elquadrão . Com o deíprefo do perigo íe acredi-
ta o íubido do valor . Ao Governador João Fernandes. Viei-
Tãj buícou o pey to hiia baila, que fem fe atrever ao dano , a
pos a Teus pés o refpeyto : Com outra lhe leváraõ hua madei-
xa dos cabellosj parece, que como ao outro Samfaõ , lhe buiP-
cavaneiles a força. AoMeftre de Campo André Vidal de
Negreiros deu hum pelouro nos fechos da piftola ; como fe
forâo fobejas as armas aonde eraó tantas as forças . Ficou fe-
rido o Governador dos índios Dom António Phelipe Ca-
marão , efmaltando-fe com íèu íàngue o fino ouro de feu va-
lorí Duas bailas ferirão âo Capitão AíTenfo da Sylva j teme^
rofo do braço o buícava de companhia o perigo . O Sargen-
to Mayor António DiasCardozo foy nefteíucçeíro o alvo
^ da enveja,& do efpanto de húa 5 & outra gente; por entre

chuveiros de bailas andou todo o tempo da batalha no mais
arrifcado delia, com tamanho coração, &prefteza, que ne-
nhúa o pode ferir, porque nenhúa o pode aííegurar com
pontaria certa. Os mais cabos, & officiaes com a generali-
dade das proezas empediráo as particularidades da lem-
brança : Parece que todas as quis dar a memoria aomuy-
to , que ncfta occazião obrou , & niereceo , o Padre Frey

' . JoavO da Refurreiçáo ( em tudo filho do Patriarcha Saõ Ben-

to) neila íè adiantou aos íbldados no pulfo ,& aos Sacer-
dotes, no zelo. Com as armas cortava fem reparo; & pellas
bailas entrava fem medo. Á charidade com que acudia

oquenelle obrou ^ coufeííar OS moribundos, lhe fazia defprezar os perigos,

o Padre Fr. loao . ^ - • n • r t 1 1 i o ■»

dãReãirreiçaÕ tanto animo, que o innuia nos loldados com a exor-

tação, & com o exemplo. Com a claridade do Sol com-
para ( algum Author . ) Efta verdade ; & não fey fe o ref-
plandor deíla verdade , teve ( para cegar a outro ) a pro-
priedade do Sol . Com igual defejo moftráraô os Padres
Francifco de Avelar, &Joaò de Mendoça, que erão ver-
dadeiros filhos de hum pay,que foube fer foldado, & San-
to.

II "> Deteve-fe anoíTagenteem aVilladelguaraçíi a-

quelletempo, que foy neceflario para fortificar ,& giiar-

- necer

Frey M
Call.fag.
col. 2 é
26c. col.

I «I

!l'li!

A

1^4^ TAliTE-l.LirTxP VI. 401-

pccer a povGaça6,& os cain!nho3,quc podião fervir as corre-
rias do iniaiigo, quando intenraííe íahirdaílha a infcrtar a
terra íirme: Poíías as couzas na melhor forma cj foy poíllvel,
Sc o noffo exercito em marcha, chegou ao alojaméto da Vár-
zea, aonde a prefcnça dos Governadores comunicava alenta-
dos cípiritos aos Toldados, que guarneciaó as Eftancias , para
fahirem vic^oriofos dos rebates, affaltos ,& encontros , em q
cada hora vinhaó abraços com o inimigo, que acurralado
nas Fortalezas do Arrecife padecia as condições de vencido,
& as defcomodidades de cercado . Com favoráveis fucçeííbs 25^^;;^,? o-hJ de
nos encaminhavaó as armas ao fim defe;ado, mas para que os toâas as capná^_
homens fe não efvaeceíTem com as profperidades: [ parece fe nks.
leçea Deos da humana fobcrba ] Permitio o ceo , que na Ci-
dade da Paraiba deffe hum mal contagiofo, que pellos effey-
tos pareceo ramo de pefte: Ateava-fe fem reparo , crecia fem
tempo , & matava fem remédio . Começava em cerração do
peyto, & logo a defluxão fe manifeftava em pontadas,& com
dores de pleoris : A alguns matava de repente j a outros em
poucas horas j aos que menos apertava , não paíTavaó de trez
^ifs. Os Médicos, que não conhecião a cauza do mal naõ lhe
fabiáo aplicar remédio^ aífentando entre íi o fer ar inficiona-
do , & corrupto j & com mais certeza , quando viraõ a preíTa,
com que foy contaminando húa, & outra vezinháça até che-
gar ao noíTo alojamento de Pernambuco.Morreraõ em todas
as partes ionumeraveis peífoas fem diftinçaõ de PortUgue-
íeSjFramengos, índios, & Efcravosj aos que não matou aíli-
gio, com univerfal pafmo , confiderando, que naõ avia mais
diftancia entreamorte, & a vida, da que fe achava entre os
mortos, & os vivos; parecendo a todos , que era chegado o
nlcimo fim dos mortaes.Teve eftemal principio em os últi-
mos de Setembro, & durou até os primeiros de Dezembro;
(perto de trez mezes) foy perdendo a força com a duração,
& com a experiência dos remédios, fendo efficaz , a mais co-
pioía, & mais repetida fangria, livrando muytos (ou por vir-
tude do remédio, ou por remiffaó da enfermidade . ) Muyto
fcjitirão os noíTos Governadores o golpe,que efte mal deu no
exercito, que levou a muytos, cuja falta a íàudade fentio, co-
mo de comoanheiroSjSca occazião como de foldados.

LI 3 126 Myf-

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..ammmm

wmmmm

46'* CJST^WTO LUSITANO 164$

116 Myfterioschamão as fagradas letras aos fegfedos
dos Principes,& como my fterios(eiTi feii tanto) os devctii cõ-
Vãjjecotadehud (]^erar os particulares : Qitaedo os fuperiores os comuniCa

informação júri ' - ' - - - -

âicA que os natu-

informação juri' ^ -^ g ç^^^ Miriiftros, náo podç fef acertado, (dado cazo,que

raes mandkraoâ fc>ta licito) iletn á èllcs O tevelallos, nem aos fubditos o infe-
dRey Dom loao» filos, afgunfíentaíidodoseíFeytos para áscaiuas j porque as
erra o engaiiO^ quatido O não prohiba o refpeyto : E muyto
menos fe.permite aos EfcritoíeSjqiié aos curioíosj porque eA
tes falâõ corno quem fofpeyta, & aquelles devem referir , co-
mo quem fàbe: Se nos governos não tivera inconvenientes, o
licito, naó forao myílerioíbs os fegíedos,& como eftcs fe fú-
daò nas mayores rezoés de Eftado , devem os Chrotliftas ef-
crever os fucçéíTos, fem íe empenharem em lhes àdevirihàr a
rezão.Nefte enl ^ a hiftoria moftra aos Portuguezes doBra-.
2il viâioriofos , livres ^ 8c fenhóres da campanha ^ cercado o>
Olandès dentro das fortificações do Arrecife [ ou foíle por
fe inculcar a fidelidade na obediência jou por fe agradccer,na
recomendação, ©beneficio ; ou também por fe fobornarem
os foGorros com os fer viços j ou (como fe praticava) por jt a-
padrinhârem com os progreífos. [ Fizeraó os moradores\le
toda a forte, & eftádo hum mânifefto,oii inftromento )uridi-
co por todos âffinadojpara enviaré á Mageftade de feu Rey,
difculpando-fe de faltarem á obediência , que devião afeus
Reaes decretos, com as tiranias, com q os Olandefes os obri-
garão a tomar as armas,& com as rezoés,que ti veraó, para ac-
clamarem a João Fernandes Vieira por feu Governador : O
muy to, que lhe devia a liberdade do Eftado , & a reputação
do Rey no; O v alor, a fidelidade, a prudência, &a induftria,
com que tinha folevados os povos daquellas Capitanias da
tirana fogeição,em que os tinha poftô o Olaiidès: A fazenda,
que tinha deípendido no íuftento dos exercitos:Os rifcos , a
que expofera a vida nas batalhas, devendo-fe á fua conftan-
eia,&áfua fazenda as viéiòrias, pormeyo dasquaes fe viaó
aquelles Povos, no eftado prefente,có liberdade para o exer-
eicio da religião,& pára as Utilidades da coroa : E fecha vão o
difcurfo,niariifeftando a confiança,em que vivião,de que fua
Real clemência , & magnanimidade os não avia de defempa-
íarj quando de fua grandeza eíperavão os focorros necef*

farios

à matéria delia,

1^4^

^AXrn 1. LiT\o VI.

405

farios pára levarem ao fim hua cmprefa de tanto ferviço para
Deos, como gloria para a Naçaò, em que mais os empenha-
va o zelo da fé, que a confervaçáo das fazendas: O qne todos
jiiràraõ fer affi^& tomavão a Deos por tcftimunha,de que em
tudo deíiaó verdade, & o firmarão de fuás letras, &íinaes.
FeíTe efte papel, & fe aíTinou em os fete de Outubro de mil
&feifcentos& quarenta & cinco annos : Aílinàraõ em pri- jm^^^g p^Hoi
meiro lugar todos os cabos, & officiáes da milícia : [ excepto m^^ Efrãdos àa,
o Governador, & os trez Meftres de Campo. ] Em fegundo Càptanu,
lugar as Camarás de todo o contorno fem faltar Miniíi:ro al-
gum deli as: Em terceiro, todo o Eftado Eclefiaftico,affifu-
periores,como fubditos^aíTi Clerigos,como Religiofos.Ulti--
mamente todos os moradores principaes do recôncavo , que
foraó feíTenta & quatro : E reconhecidas as firmas por hunet
tabaliáo publico ^ fe remeteo efte inftromento áú Governa-
dor Geral do Eftado António Telles da Sylva , para que a
enviaííe a Portugal,felhe pãreCeífe.Se a curiozidade do Ley-^
tor defejar ver os nomes de todoá os que aflitiàraó, & a mate-
\dcinocl ria do manifefto mais pot extetifo^ tudo achará no Author
^•-47- do t^alerofo Luzideriò folhas duzentas 5 & quarenta & fete^
que nós deixamos, por carta de nomes.

i 27 Dilataó-fe noíTas relações em darem álaftima os
motivos da honra.Referem a folevaçáo do Rio Grande co^
mo fuccedeo: Nós a relatamos como , & qUando, pella infor^
mação do fuccedido, que chegou á noticia dos Governado-
res da liberdade hum meZ adiante (como parte integrante do
tempo da hiftoria. ) Com eftillo, não laftimado , fe hão fefti-
vo, a defejoefctever: Porque fabe ofofrimento converter
em gala o luto do martyrio. As adverfidades ^ que para o im- ^^j^^esqué adu'
paciente faó caftigo, para o conftante faó mérito í Com mais ^^J ^L^^v-^^c*"^"-
luzimento vence ^ quem não teme morrer , que quem pode ^^
matar.Em o que temos efcrito deixamos eftampados fauftos
fucçeíros,& increhiveis vi6ioriasde noíTas armas: Agora te-
ceremos a coroa deftas vidorias, & íiicçeífos com os procedi-
mentos dos moradores da Capitania do Rio Grande^ na ac--
clamaçaódaliberdade,emaqualdefpois de vencer o braço,
venceooefpirito. Em os outros lugares viráó-fe as proezas
dos moradores como de moradores , nefte as veremos como

LI 4 de

4'3í

CJST^WTO LUSirj-NO

1645

M 'i

de moraJoreSj & como de martyres : O tormento martyrizaj
porém , íó a caaza do tormento he, a que forma o merecimé -
to do martírio. A cauza remota do que padecéraõ,os que ha-
bita vão aqaellaCapitaoíajbemfey,quefoy arertauraçaõda
, , liberdade; mas também fey, que, todos eícrevem, que a cauza
i próxima de fua morte , foy à defenfa da religião , & profiílào'
* dafé. Duplicaraó-fe as coroas com os motivos, & cada hum
dos motivos mereceo fua palma:Não as dá tão viçozas o fan-
gue, que derrama o amor da pátria , como o fangue que ofFe-
rece a defenfa da fé^porque efte refrefca com o humor da pa-
ciência, & aquelle abrafa com o fervor da cólera: Rez oés que
me perfuadem a efcrever o muyto,que aqiielles vezinhos pa-
decerão, não com a pena do tormento, fe não com a tinta do
triumpho,& tão gloriofo,que vencida a tirania , da conftan-
cia, fe julgou toda a vicloria á paciência : Dá vozes o fangue
do marty rio,com tantos aíTcntos de gloria, qne nunca os fará
diíTonar , o horror da pena,que os eícrever.

128 Setenta legoas do Arrecife para o Norte defagoa
110 mar o Rio Grande, ficando-lhe a Cidade da Paraiba qua-
renta & cinco legoas para o Sul . O cabedal da corrente lhe
deu o nome, & o tomou de fua vezinhança húa povoação de
Portuguezes, que allí edificou a conveniência da barra ^ & a
fertilidade da terra :Nella fabricou o Olandès húa Fortaleza,
quando fe fes fenhor de toda a Capitaníajtanto mais cuftofa,
quanto mais longe dos focorros, pella diítancia do Arrecife:
Rezão, que o fazia abfoluto, & infolente no trato , & no im-
Nda chegou aos pcrio a O Governador delia, a quem nefta occazião não fabe-
moradores a mu- j^^g outro nome mais, que o appellido do Gafmão , ao qual

cia do alevanta- r ^- c - 1 1 «j -r /i

luas tiranias íizerao bem conhecido; [lupolto que em outro

lugar o achamos com o nome de Jorge Gafmão ] porque fa-
bia, que em igual diftancia ficava aos miferaveis fubditos á
Bahia, para o remedio,& o Arrecife para a queixa. A todas as
mais partes do império Olandès chegou á noticia da foleva-
ção, ou guiada da diligencia do avizo , ou do brado das vic-
torias. Ao Rio Grande por nenhúa via chegou, tanto,porque
empedida da diílancia, quanto porque cortada da cautela; E
parece fatalidade de hiia defgraça, o não ter parte nella, nem
ainda a fofpey ta da culpa.Naó delinqniraõ aquelles morado-
res

ifMiiífir

:§. í9.

^64.^ fAXTE 1. Lirtp VI. 40^

!cs contra os dominantes, nem com a imaginação porque â
igjnorancia os cíco2ava da malícia: Mas que importa , íe para
o tirano tanto vai a culpa,como a innocencia. Vi viaó aqueilcs
moradores íbccgados : O cuílume da fogeiçaó , os tinha eí-
quecidos àà Iib£rdadei& como não conhecerão diiterença na
forma, ]i nào eftranhaváo a de opprimidos.Succedeo.em de- \
2aíeis de Junho, o trágico golpe de Cunhaír,( relatado em o *
'■^^y numero oy tenta & quatro dcíkíex to li vro,& no hvroquar- ^^^ "^^^J osqusr
' to numero dezanove.") Ouvio-fe no Rio Grande com eípan- ° ^IJ/S ^"^^
to, a crueldade do íucçeílb^poíe da parte do paímo a ignora-
cia do motivo; & fem, que algum atinaffe a cauza , laiiimoU
a todos o golpe. Foy cazo, & pareceo myfterio, chegar-lhe a
nova do fado, para introduzir o receo , efconderfe-lhe á fem
rezão, para defviar o remédio; porque fe entenderão , que 0
governo Olandès mandava degolar a todos os PortugLtzes
de feii dominio,ou fe defenderão com alguns, ou fe retirarão
comosoutros, pois para ima, & outra couza os apadrinhava
a comodidade do terreno,&a vezmhança do perigo : O Fra^
niengo, que os defejava ver enredados lio laço, fingia defvia-
los da rede, abominando a crueza, com os ameaços da vingã-
ça: Acufava aos agreffores de levantados , rebeldes , & inimi-
gos,que por fugirem ao caftigo de fuás maldades,fe aviaó paf^
íado aos Tapuyas,& fal vagens; ajudados dos quaes cometiaô ^^^^^ndô cõ diÇ.
aquelles míultos ; porém, que já os fenhores do governo, ef-^^^^ 1^'^ 7^^"
candalizados de tamanho exceílo, taziao diligencia para pre- conÁen
derem, & enforcarem a todos : Ouvia-o a fofpey ta , fem to-
mar pé a creduhdade. Creceo o receo, com as evidencias do
* engano; que chegou a todos com a voz, de como, os mefmos
01anderes,& Tapuyas, que tinhaõ aíTolado Cuhhaíi, vinhaó
marciíando para o Rio Grande ;& tinhaõ eícaladohúacazã
forte do engenho de João Laftáo , aonde fouberaò , eftávaó
recolhidos alguns Portuguezes ; aos quaes matarão com bar-
bara crueldade : E ao eRrangeiro pello fer, leváraó prefo(cò
áleivofo feguro) pára a Fortaleza, em a qual defpois lhe ti-
rarão a v ida: Virão os ir.oradores, que os mefmos, que acufa-
vão o crime cooperavaó no deliâ:o,& conhecerão claramen-
te a ficção, com que crtranhâvão o exceíFo: Ti verão por íènl
duvida o perigo j Separa ãcOiífiíTaó do engano pedirão ao

>'<U ■ I J]".Hi^^l"IÍNlÍWiM<ilBI

Os moradores pe'
netrsi o míento,
^ fe fortíficíio.

Arguindo a ãif'
JimulaçôiÕ o fal'
Jíficado trato da

tyrania.

406 c^^sT^iofo LUSITjNO -1 64^

Comendor, & Governador da Fortaleza, & da Capitania
lhes dc(!f<^ focorro contra os Olandeíes , 8c Tapuyas levanta-
dos : Defcaradamente íahiraõ efcufos.Confultáraó entre íi o
remédio, & reíolvéraõ fortificar-fe no modo poffivcl. Deter-
minarão fitio, & nelle fizerão hú cerco de páo apique capaz
de os recolher com famihas, &eícravo3. T eraó os Portupiie-
zesfetenta. jProveraó-fe de mantimentos , principalmente
de farinha, & agoa. As armas não paííâvão de dezaíete efpin-
guardasj alguas efpadas , poucos chuços , & copia grande de
páos toftados: Pólvora, murráo, & pelouro em tão pequena
cantidade, que fervia mais a opinião, que a defenfa.

1 :29 Aquelle Olandès chamado Jacobo , ( fementido
por nacimento, fal vagem por habitação, cruel poruzo,&:
jjarbaro por trato) de quem efcrevemos , que có os Tapuyas
defuaparciaUdade regou deinnocente fangue a povoação
de Conhaiij &que defpois marchava para executar o mefmo
na Goyana de que o defviou íeu próprio medo , fugindo das
fombras, que fua imaginação lhe reprefentava , até que dei-
xada a confer vá dos Olãndefcs, fe embofcou no interi or dos
matos agora (fegunda vez perfuadido,& chamado do Fra-
mengo,que governava a Capitania do RioGrande)deceo do
certáo com muyto mayor copia de Alarves para executar
nos vezinhos da terra, o que não pode confepuir no deftric-
to da Paraiba, afíiítindo-lhe húa partida de Olandefes , man-
dados para eíte fim pello Governador da Fortaleza . A fua
chegada íè adiantarão os moradores Portuguezesjfortifican-
do-fe no fobre-dito pofi:o,que fe chamava do Potogi, na for-
ma referida^ &aosfeusTapuyas, o Jacobo com os Olande-
fes de fua conferva,para verem, & notarem o modo da forti-
ficação, o numero da gente, o animo , 8c as armas dos Portu-
guezes. Cheirarão íimuladosj 8c com magoa fingida lhes lou-
varão o acerto da refolução tão honrada , como era o defen-
derem-fe da ferocidade do Gentio,encarniçada em matar, Sc
comer gente. Abominou fua própria deshumanidade,oíFere-
cendo-fe para o auxilio da contraria defenfa . Condição he
das feras mais nocivas, darem a beber o veneno com a mão
do afagojcomo o he de hum coração ílngello o não crer, que
opoííixaverdpbrado. NãQaífi quando aíliígileza fe aconv

panha

I Ó4^ ^A^È 1. Lty(^ VI. 407

Tjanha da prudência, porque fe arma da cautela , quê íabe r^-
•bater, a perfídia. Muy tos ti verão o offcrecimento por v erda-
<3eiroj& querião, que fe fiaíTe do inimigo jporém ôs mais foí^
peytoíos do engano, lhe refpondèraõ ao derénteiidido,dize-
do, que a obrigação dos Principes, era deféder aos Vàíiallosj
& qUepoisèllesPortuguezesoerãódeOlanda,devião ellcs
Framengos defendell os de tod os íeu s inim i g os j porque com
efta rezão os fervião com os ordinários tributos : E que fe o^
Olandefes companheiros dos Tapuy as erãò rebeldes , como
dizião, os devião deftruir, & tratar como abanidosj& quan-
do o não quizeíTem fazer, lhes deífem a elles Portuguez^s li-
cença, & armas; [que P^f^cfteferviço as queriaó comprar]
te não fó fe defendirião , fe não, que fe obrigavâô, a qúe ilê^
íihum efcapàíTe, ou da rnorte, ou da prifaó . Da refpolh iilfe- xão dando creM-
rio o tray dor que tudo, quanto aos Portuguezes fobejava àc to às re&oes com
animo, lhes faltava de armás.Diflimulou a confiança, & pro- ^«^ ° inimigo os
fegu 10 nas aparências dizendo, que fc defendéíTem como và- ^n^'^"-^.
lerofos,porque lhes advertiá,que os Tapiiy as decião efta ^t%
em mayornumero,do que tinhaó vindo em todas as paffadas:
Ao que os moradores (entendidos da tenção ) tornarão a di-
7er,que para fe defenderem, & deftruirem aos Gentios ( fof-
fem^quantos foírem)tinhão armas,& muniço&s de fobep. Ao
que náo deferio o fementido Hereje , paífaíido a dizerj, que
tios Olandefes levantados não tinhaó que temer ; porque to-
dos eraó fogidos com medo doseditaes , que por rebeldes os
condenavão á forca;& que elle hia para a Fortaleza , & delia
os proveria de muniçoés^& armas , para fe defenderem ; [em
quanto do Arrecife não vinha focorro , para íahirem a caftif
gar a in folencia dos Brazilianos] & defpedi ndo-fe , marchou
para a Fortaleza , que diílava féis legoas pella corrente do

110.

130 Pará examinar o falfò, tem força os áfgtimentos da
malicia,& não os da rezaó i com eftes fe apura o verdadeiro,
com aquelles fe defcobre o fingido : Argumentava entre os
noííosaíjnp^ilezademuytos emravor da credulidade, õc co- ^. , ^/
mo os íundamentos erao da rezao, diziao, que ekavao certos
em naó terem cometido crime algum contra os Olandefes; &
que aonde não ^via culpa ^ nem oíFenfa , não avia de que to-
mar

I ' > 1

4^^ C^ST^^IOTO LUSlTJ^rO ,^4^

mat fatísfação, nem por caftigo, nem por vingança : A malí-
cia argumentava com melhor forma:0 Olandès naó tem mais
ley, que fua cobiçaj efta, cevaíe na fazenda ; fabe , que temos
fazenda.^ por nos roubar há de fazer o poffi vel, para nos tirar
a vidai para que com a morte dos roubados, fe enterre o deli-
â:o,& a queixa.E quanto mayor era o cabedal dos Portu^ue-
zes, mais força tinha o folegifmo para provar a concluíaõ.
Perfiava entre os moradores a innocencia , & a defconfiança,
quando o faólo aprovou por meIhor,a ultima inferência. Vi-
íac fi ^^^ ^^ meíiiio Jacobo capitaneando hum groííb de Olande-
C^^l-yT^wL' íes,Tapuyas,&P queenveftindo a paliçada com

dos do inimigo, beílico furor,fes todo o poíli vel pella romper: Imaginou ,que
o repente,& o poder a levaíTe fem reíiílencia: Porém,achou-
nos cercados táo promptaj& valer cfa defeníà^que fe retirou
deílroçado,& vencido . Confuzo o deixou o fucçeíTo , porq
lhe náo achava cauza odifcurfo : A piedade chriílã lha def'
cubrio no futuro martyrío 5 parecendo a muy tos , moílrar o
ceo que os naó avia de levar á morte a v iolencia j fc na5 a vó-
tade. Açonfelhou-fe o inimigo com a obftinaçaõ, & có a per-
da ; pedio á força focorros, á arte induftriajSc fabricou fobre
Carros alguns caftellos de madeira, dos quaesaviaò de atirai:
com feguro , & pontaria , os mofqueteiros com que os guar^
j^uefe retira ve "^^^^j ^ ^^)^ fombra podeíTem os machados romper as efta^
cído,& confufo. cadas. Naõ tirou o inimigo defte militar arteficio outra cou*
za mais , que a dor com que vio tudo deftruido (mortos , &
feridos muytos dos feus;) & o aplauzo, com que os cercados^
gçlcbrara õ a vidoria; a qual fes mais alegre, o náo ficar algú,
nem ainda com a mais leve ferida. Seguido deite brado os dei^
xou o inimigo temerozo,que na fugida o feguifíe o braço,cGí?'
mo o feguia o grito. As circunftancias do cazOjO fiferaô pare*i;

cer milagre.

Naõ atribuioa antiguiaade, a Proteu mais formas,
das que O Aleivozo Jacobo reprefentou de figuras neftaoc-
Folta fobre osVor caziaó. Ao outro dia apareceo fobre os fitiados com todos os
tuguez.es fingin- k\is{vtí}L\áos OS intentos da guerra comfeftivas demonftra-
do'fe auxiliar, çoés de paz )& como fe com aquelle focorro lhes v iera a dar
os parabéns da viâoria, fe foy chegando á eftacada com pen-
fameato de fe introduzir dentro delia , confiado nas aparên-
cias

i6^% TJ^ITELLIF^O Fl. 409

cias de amigo. Os Portuguezes , que não rcmião a força, lhe
caiilgáraò a manha: Com as armas de fogo, Sc de arremeço, o
fizeraó deter,&: afaílar da circunvalaçaó , porque como a ral
amigo,o qucrião de longe. AíTi como na memoria dos homés
fica mais vivo o agravo^que o beneficio^affi também fica mais
\ivaa figura do que eícandalifa, que a do que afaga; rczão,,
porque as pinturas dotemor,naótemlonges. Naódefiílio o
Olandès do arteficio, antes deitou novo fiador ácavilaçáo:
Mandou dizer aos cercados^ que fe admirava , de como os ti- «^^ ^^'^ ^frovêl
nha cegos o medo, pois o não conheciaò porauxiliar,8c ami- ^^^^^ ^-^ ^'^^í^
go; que elle por compnr lua palavra (^ ou vmdodi/er na ror- '

taleza, que efíavaõ á bataria com os Alarves : ) pedira ao Co^
mendoraquelleefquadraó, para os virfocorrer com toda á
preíra,& o deixava fufpenfo a novidade de experimétar ini-
migos, aos mefmos que o deviaó receber gratos; & íe o rcceo
os tinha cegos,que abriffem os olhos da confiança,& recebeí-
fem o focorro, antes , que feus foldados prefumiíTem do en-
gano, que era rebelião;porquenefi:es termos os mandaria a-
vançar , & publicaria o dano , a huns fem culpa , & a outros
fem queixa. Os cerGados,que entenderão a ficção, & o inteii-,
to lhe refpondèraó, que nenhúa mafcara podia cobrir , nem
efconder tray çào tão defcarada : Qiíe elle era o mefmo , que
nos dias pafiados os quizera enganar com fingidas promeíTas;
& que nos ícguintcs os pertendera deílruircom repetidos Entende os Por''
combates,&aíIi mefino o que conduzia os Tapuyas para a ^^%^^\^^ °
€mprefa:Eque fe defenganafle qúenão avia de reprefentar '^^^ °^^
no Rio Grande a cruel tregedia, que reprefeDtára,có aquella
nieíiTta figura, no lugar de Cunhau;porque fe a confiança Ihêf
deu cor ao primeiro engano, o conhecimento ^ &á expe-
riência de feu fementido trato lhe não avia de confentir o fe-
gundo; parao.que avertidos, & magoados eltavão refolu-
tos cm não largarem as armas , fem primeiro perderem as vi-
das,que queria tirar a todos, para lhes roubar as fazendas»

1-^2 Com a repofta dos fítiados fedeu o Olandès por
oíFendido, avaliando porinjuna,onão ofFerecerem todos a
cabeça ao corte defuaefpada: Chamou rebeldia á defenfa
natural: Cufuima a tyrania condenar a jufta defenfa, por irt-
folente defobediencia.O poderofo imagina,que o feu queret

Mi« he

ençd-

'V. !ll

4tè c^sr^ióro LvsiTAm ^^45

heley univeríal.Cego daira,mãndon o Framengo repetir os
recados, fazendo piedade da prefuaçaõ, que toda fe refumias
em ferina vingança. Vendo, que naó enganava com a fingida
compáixaó,quiz vencer cõ efpantoíbs medosj porém aquella
conftancia, que não fabe temer o golpe , menos teme o amea-
ço. Refpondcraó os valerofos cercados, que não perdeífe
tempo em prefumir de feus braços , que por algum meyo a-;
Viaó de largar a efpada j nem que,com ella na mão, aviaõ de
dar as vidas por tão vil preçojcomo o de fuás palavras; que íe
aproveitaffe das forças , & que entendeíTe , que nas batalhas
o morrer era forte,& não preceito j como no tribunal das ar-t
mas o matar, era julgado por valor, & não por deliâ:o . Aca-!
bou de entender o inimigo,que nada avia de cõfeguir a caiH
■Declara- fe oinu tela,& remeteo o pleito á batalha \ enveftio á eftacada c5 re^
migo, & os com- petidos affaltos , & pcrfiados combates , em quanto lhe não
^étnZlna^''' chegaVa aartelharia,quetinha mandado vir da Fortaleza:
Chegou efta, & preparada para jugar, & deftruir aos mifera-:
veis cercados, ( para tormento mais dilatado os dcfejavâ , O
Oíandès tomar a todos vivos) lhes feshúa embaixada, dizé-
do,que a vifta os defenganavà da certeza de fua ruina ; que íq
entregafíem; fobpena,de que a todos, os que tomaíTe com vi-»
da, com mulheres,filhos,& efcravos entregaria aos falvagens^
pára quê os defpedaçaírem,& comeíTem v ivos^ & que fe deft
confiavão, de q entregando-fe os não trataria como a Vafíal-
los^Sc amigos, fem Gonfentir,que fe lhes fízeíTe o menor agra-
vo^ capittilaífem a forma, em que fe que rião entregar, & que
ém penhor de fuâ palavra^ lhes daria os reféns , que apontaífe
à éfcolhâ. Os Portuguezes, quefe viaó femmeyos para a de^
fenfa^ fem fuftento para a perfia, & fem eíperança de focor-
ro^apelàraó da incerteza do remédio, para a contingência
do perigo. Naó temiaó os golpes do conflido , que os pode^
ria laftiitiar no corpo; receavão os do ameaço , que cortando
por mulheres, & filhos,Os feria nalma.Entregaraô-fe apartida
debaixo de feguros paíTa-portes , porque dados em nome do
Principe de Orange,& dos Eftados de Olanda,)urados,& fir*
mados de todos os officiaes da milicia,com promeíTa de os de-»
,. ^ fend€rem,& confer varem nos foros,em que fempre viverão:

tugue^es aparti' ^ P^ra que parecêíTem mais firmes lhes vendeo o mimigo as

ié4í ?^2^T^ /. LIT^O VL 4? i

condições mais caras: A pezo de ouro lhes dcudcfpoisos
pafla-portes5& os obrigou,a que dcíTem reféns de comprireru
kiteiramente,da fua parte,o capitulado , pedindollies a Eíte-
váo Machado de Miranda^Francifco Mendes Percyra,Simão
Corrêa, João da Sylveira, & Vicente de Souza Pereira jaós
quaes levou logo o inimigo para a fua Fortaleza , como em
penhor de feu dinheiro, [eraó os principaes j Aos Olandcfes,
que dizia deixar em reféns, deixou por guardas, & efpias dos

rendidos.

133 Quaíi trez mezes fe alojarão aquelles moradores
dentro da cerca referida, computando-lhe os dias , que corre
do fim de Julho(tempo em que ao Rio Grande chegou a no-
va da aíTolaçáo de Cunhau) até os trez de Outubro feguinte:
Aos dous do dito,chegàra á Fortaleza João Bolaítrater , hum

dos trez do Concelho Supremo, para fazer dar á execução ^

_, . _ , ■* »*• -n A T J ^^^ Comas condícoes

no Rio Grande como Mmiítro, o que no Arrecite decretara ^^^^ /^^ '

como Juiz:Que todos os Portuguezes de Íqiq annos para ci- ^^^ ^ olmdês.
ma fe paífaíTem á efpada fem excepção de peíToa . Inaudita
crueldade : Nenhúa mais alhea do íer humano , porque ne-
nhiia menos racional. O Bruto mais bruto,& mais feroz ma^
ta com difi:inção,refervando os indivíduos de fua efpecie:Po-
rèm os Bárbaros Olandefes decretàraó,que morreííem os ho-
mens, fó porque eráo homens , fem mais cauza , que o fexo,
que lhes deu a natureza : Mais feras , que homens faó os ho-
mens, que em matar homens excedem ás feras.Como Vaflal-
lo3, &:comohofpedes,fealojavão na Fortaleza o Padre Vi-
gairo da fregueíia,Ambrozio Francifco Ferros, AntonioVil-
lela Cide o moço, Francifco de Bafto,Jozeph do Porto,Dio-
go Ferreira,com os cinco,que os moradores rendidos no cer-
co ,deraó cm reféns, & outros muytosj aos quaes mais illuftre
memoria efcreveo os nomes: Tambemjoáo de Luftár Navar-
ro,& António Villela Cide o velho, que o inimigo tinha em
prifaó: A todos mandou vir diante de íi João Boleílraíer ; & <

lhes diíTe , quea campanha eftava livre dos índios falvagens,
& nella prezidio para fegurança de todos os moradores j que
foíTem tratar de fuás fazendas, vifto eftar aquella praça falta
de mantimentosj& para que o executaíFem com mais animo,
mandava hua cópanhia de foldados cm fua guardai& q para a

Mm 2 CO-

4 1 :j CJsr(]\ioro Lvsirjno i %

comodidade de todos, lhe parecia bem , que foíTem pello
rio, a outro dia, (que fe contavaó trez de Outubro ) 8c
neile achariaõ barcos prevenidos de todo o neceffario para
a viagem.

134 Trez legoas da Fortaleza pella ribeira do rio aci-
ma èftava hum porto chamado Hiomavaçu,meya legoadif-
tante do cerco, aonde aííiftiaó os rendidos . Nas matas cir-
^ l^ ^^Z^Ketfí^ cunvezinhas ^ mandarão os Olandefes embofcar duzentos
do,& perjuro. índios Alarves, do fequito do May oral Paroupava, efíi-
íiiado do Framengo no gráo,em queeftimava a PeroPo-
ty : ( A hum , & outro índio igualava a Ç^áç: do Tangue
Portuguez ) com pado de lhes entregar os de toda a Ca-
pitania : [Com eftas vicèimas, fuftentava o Hereje o cul-
to daquelles ídolos. ] No dia , & na forma relatada, fe em-!
barcàraõ todos os moradores, que alojava a Fortaleza: Na-*
vegàraô até o porto de Kiomavaçíi , aonde os dei tàraõ
em terra, rodeados da companhia Glandefa, cujo Capi-
tão os mandou defpir á todos^ & que fe pofeíTem de joe-
lhos: Parece , que com efte mandato queria a tirania ti-
rar á paciência o fer de virtude ; & fes com que a obe-*
diencia a dupIicaíTe. Sem repugnância obedecerão todos,
poftos os olhos no ceo, ao qual fe ofFereciáo em íacraíi-
cio, certos de fer chegada fua ultima horaj Sc para que a
ferocidade do verdugo fifeíTe mais fenfivel o martyrio , &
mais horrivel o trago , derão íinal aos lalvagens embof-
cados : Sahiráo dos matos com geftos , & gritos tão medo-
Fmencu com i "^"^os, quc cauzarião efpanto âo infenfivel , quanto mais
11$ m(los efperaõ aos humanos, deftinados para ferem a prefa daquelles Ti-
V martyrio. gres ^ cingidos dos quaes a nenhum lembrava o amor da
vida, a todos, íi, o pedir ao ceo perdão de culpas, ofFere-
cendo a Deos , em defconto delias, a amargura daquella
hora , que a crueza lhe dilatava , para que cada hum dos
padecentes bebeíTe hua morte em cada inftante de vida.
OíFendido o Hereje, do Catholico fofrimento , que via
iios padecentes, lhes difpoz a palma, com a meíma diligen-
cia de os privar da coroa: Mandou a hum predicante de
fuás diabólicas fey tas, que entraíTe a prégar-lhes, prome-
tendo certezas de gloria , & eíperan^as de vida , aos que

cofl^

i64^ ^'<PJ^TE1.L1F'^0 Fl. 41^:

convertidos aos heréticos erros apoflataíTcm da verdadeira
religião : Porém os Toldados de Chrifto, com novo cípirko,
•vencerão a nova bataUia,& com pa!avras,&acçoés abomina- ,

raó a cegueira hereticaz&os condenados erros de fiias íevtas,

c n* j • - _<■ j tr' í^ ^1 1 E ânimo com Gue

conreíiando acTritos,qucmorriaonapureza dareCatiioli- , 2

ca,que cré,&enfina aSanda Igreja de Romaj & que de rodo
o coração deteílaváo todos os artículos , que fe deíviavão de
fcus fa grados decretos, pella obíervancia, &confií]àó dos
quaes,eftaváo preftes a dar húa,& mil vidas, fe as tiveraõ. Vé-
cido,& defprezado o Hereje,da Pieligioíà conítancia,tomoa
por fua conta o defagravo das fey tas, & a vingança das inju-
rias j &r como Juis em cauza própria atormentou com as mãos
(de todos , a aquelles fieis Tervos de Deos com tal deshumani-
dade, que a cada hum delejava prolongar a vida porque nel-
laachaiTem fentimento todos os mart)rios da crueldade; que
afirme confi:anciadosCatholicos(córuperior auxilio) não
fó fofria, mas deíprezava,animando~fé huns aos outros,a vé-
Cer a tirania com a certeza do premio. De caníado desfalcceo
o braço da herética crueza, porém não o valor da Catholicá

paciécia:Retirâraó-íe os Oládeles, 8^ entrarão de refresco os ^, , . . '
*1 , í. - í 1 11 > Dado avidapellâ

Alarves , & nao achando naquelles corpos parte, que de no- r- \

Yo podeíTem atormentar,os forão cortando,& dividindo por

todas as juntas ; até queneíte martyrio derão as almas a feu

criador, envoltas nas confiíToês da fé, & nas galas da efperan^

■ça. Horriveis,à fua vifta,deixou a crueldade aquelles corpos^

tanto, que nem ainda tinhaõ forma de troncos : A mu y tos a-

brirão, para lhes tirarem as entranhas ; defpois de lhes cor-^

taremi as cabeças, as pernas, & os braços, porque o não pa^

reòeffem , ás cabeças tiràraõ as partes que lhe dão a forma^

como olhos,l5ngoas , narizes,& orelhas ^ aos braços as mãos,

ás mãos os dedos; & porque tiveffe a crueldade de todos,

parte no todo; não ficou Gentio , que nãocortaflè a fua

parte. . ■ =-;•■ /'-, -•'" '

1:5^ Em qbVriBàíííâôiilíVáTèfòddacle daquell^

'baros fe deleitava na vifta do cftrago^ foráo os Glâdefes buf-'

car nova matéria , para novo facraficio. Chegarão á cerca , a-

onde tinhão reclufos os fetenta Portuauezes , não como ren-

didosjfe não como prefos, & feguindo feu aleivofo trato, lhes

Mm 3 diíTeraó

4H C^STi^l OTO LUSITANO .3^4^

difíeraõ da parte do Governador da Fortaleza , que tinhaõ
^ ^ ordem da companhia^ para fe fazer entre todos húa concor^
lacta emana aos ^^'^^ "eceflaria para o bem comum, em a qual fe avrao de af^
que fieiras 'àen- ^"3^" ^^ partes ^ para o que convinha , que com toda a brevi-
iroÁo cerco, dâde chegaíTem á FortãIcza,& com elles Olandeíes fe foíTem
embarcar ao porto dè Hioma vaçu,aonde tinhão barcos pref-
tes,para fazerem o caminho com menos moleftia. Falava-Ihe
( jEÍle engano aos ouvidos , mas ao coração lhes falava a verda-

de,que os chama váo pafa os degolarem . Tempo , & lugar ti-
veráo para fugirem á morre, porém penhum eftímava tanto
a vida,como eílimava o amparo de fuás familias,que nem fu-
gindo ppdião livrar, nem ficando poderiaó defender, em re-
aão de que com a entrega da fortificação, a tmhão feito das
armas. Pode o amor das mulheres, & filhos empedir-Ihes a
fuga,mas não pode efcuzar-lhcs a deipedida : Com os braços
<enlaça vaõ as queridas prendas , que fo avião de levar na me-
moria, com a dor de as perderem de vifta para fempre ; porq
ginda que a perfídia lhes propunhájque o apartamento era fp
de hum lugar para outro , o coração lhes dizia , que era a aa-
fencia de hum para outro mundo : Todos choravâo a magoa^
porque a todos feria a perina , â huns pello que deixavâo , a
outros pello que perdião,&: truncadas as palavras , dos fufpi-
ros, le aumentava a intenfaó,eom fe nãapoderexplicaf a laf-
íima: Apartiados affi, huns de outros , em nenhúa das partes
deixou o fentimento olhQs para a v ifta , íe não para as lagri-
v^ itlas- & por ellas íè v ianque o coração as chorava: [O amor, &

âaniargura o arrancava dopeyto para o trazer aos olhos.]
Ferderaó huns, $^ outros o objedo pella interpoíiçaó da dif-
taricia da terra,& todos os poleraõ no ceojos que ficavaõ pe-
dindo pe]la vida caduca; og que híaõ atendendo fó á eterna.
Com lagrimas indiftiníias choravâo as culpas próprias ,& as
culpas alheas:(Exercicio nunca interrumpido por tempo de
trez mczes, que efiiveraõ retirados dentro da eftãcada j íem*
pre penitentes,^ fempre refigiíados na vótade divinajpróp-
tos a beijar o açoute da juftiça ã toda hora, que os buícaííè o
golpe) Chegarão ao lugar, que para a navegação , era porto,
5í para o martyrio teatro ; ferviíido-lhes o efpanto do q viaó,
de lhes pintar as_£ÍrcjíQi5í|nGÍas dofupliciojque efperavão.

proief/ã-

,64^ ^JXTE1.L1V(^ VL ~ 41^

Em V02 alta fizeraó todos a proteftaçaõ da fé , publicando,
já quafi entre os verdugos, que criaõ em tndo, o que a Saneia ^^ ^
Madre Igreja de Roma manda crérj& deteftavão as infernacs ^^ ^n^] ^^ ^^q^
fey tas, de Lutero, CaIvino,&: todos os mais Herejes, & apoí* tholtca.
tatás, que fe apartaváo, do que os verdadeiros fieis criaõ, &
confeíTavaói porque fó na ley de Jes v Chriftp-, como a enfina
a Igreja Romana,re podiaó os homens falvar: Aqui fe uniraó
Herejes,& Géti os a ferir,& cortar pellos fieis fervos de Deos
com tanta ira,& deshumanidade,que fe encontravão muytos^
ferros a abrir húa mefiiia ferida; ÁíTanhados da confiíTaó da
fé,q ouviaò fe apreíTaváo a tirar vidas,8c lingoas, q a pronú-
cia V áo j & abriao tantas mais bocas,q a repetião, quãtos eraõ
os golpes, pellos quaes o fiel fangue agritava j em que conti-
nuarão , até que de todo m defemparou o fangpe , & os dei-
xou a vida. * ' , \.

156 Eftreinece a mão,ao pegar da peiiiiâ para referir os
particulares deite aâ:o, tão horrendos, que á mefma cruelda-
de fe fazião eftranhos . Para o inartyrio não podiâo fer mayo-
resos tormentos ,& nas injurias,dava a tyraniá novos fios á inauditos torme-
efpada, para fazer os tormentos ma yores, porque de hú gol- *°^'> ^'^^P^ í/-*
pe penetra vao o cor po com a reriaa,& a alma com arronta. A. ^^^^ Bar acho
hum mancebo cazado, por nome António Baracho , ao qual
a natureza,& a fortuna enriquecerão de apofta , amarrarão a
hum tronco j & defpois de cruelmente âtormentado,& efcar-
flecido,lhe cortarão a lingoa,& a parte v iril, trocando,a infa-
me deshumanidade , a cada hua das partes o lugar , que lhes
dera a natureza: Já feu corpo, pella matéria , não tinha parte
fem ferida, & ainda aífi fe armou a atrocidade contra a armo-
nia da figura, denegrindo 'lhe todo o corpo com ferros abra-
fados, & tirando -lhe o coração pellaseoftas, defejofos , fein
duvida, de verem o tamanho de hum coração , em que coube
o fofrimento de tantos martyrios. ComMatheus Moreira,
ozarâo a mefma tyraniajporque fe deleytavão nas repetições
da may or crueza, até que deu os últimos alentos na pronun-
eiaçáo deitas palavras: Bem-dito,& louvado feja o Sãâiiffimo
Sacramento: E feria permiíraódivina:Paraqueahummefmo ^^^^^f-^ grande
tempo viíTe o Herere,parafuaconfu2ão,efte divino myfierio ,", J' ^^^t/^ f
\p may or de noíia le^ no coração que tirava , & na boca, por ^^

Mm 4 onde

.^j i<i"Li 'A mnwmKmmm

416 C^STRjon LUSITANO^ I-

onde £iííia. Os tormentos,& injurias, com que^ifahiõ a vida
ao Padre Vigairo daquelk fregueíia Ambrozio Francifco
Ferros, foraõ com tanto mais exceffo , quanto mayor era ó
ódio, que tinhaó aos Sacerdotes, & o deíprezo, coque olha-
vão para os Miniftros dos Sacramentos , que nega íiia perti-
naz cegueira; Ainda que a piedade quizera particularizar os
tormentos, que padeceo ; o pejo me naõ deixa dizer as inju-
rias,com que a perfídia o atormentou.

137 Ou de canfadosiou de confundidos pedirão os ver-
dugos ao Capitão Oládès defíe a yida a oyto mancebosj (ad-
mirados da FortaIeza,^com que triumphavão de afrontas , 8c
martyrios^ fe já naõ foy ardil da crueldade,defejora de os pri-
T^ãlcrofa confia- var da coroa, com lhes deixar a vida, ou de lhes tirar a vida^
aa dcoytonian- quandodefmereceííèm a coroa*)ConcedeooCapitáo,o que
cíoos martynjã- ç^ |i^^ pedia, porém com protefto, de que a nenhum tempo
peãa pAiria. tomariaó armas contra Olanda, fe não contra Portugal . Ou-
vida a condiçaõ,daquelles invécíveis efpiritos , reíponderaó^
que ihes rendiaó as graças da nova occazião,em q os punhaõ^
para acrecentarem húa coroa a outra coroa, premio, em cuja
comparação naõ vinha a fer nada o preço de húa vida cadu-
ca jporque fe com a darem pella eterna , a efperaváo eterna
na gloriaj não lhes poderia negar efclarec ido nome, quem
foubeíre,que a engeitavaó por não faltar a fé humana , efco-
Ihcndo a morte por naõ dizerem,nem ainda com a boca, que
aviaõ de tomar armas contra fua pátria 5 fendo para fua efti-
inaçaò a mayor dita, o morrerem por fervirem a feu Deos , á
fua pátria, & a feu Rey. Vio-íe a diligencia defprezada , a in-
terceçaõ corrida^ & eítimulado o furor,inventou novos mar-
tyrios, com que aos olhos, huns dos outros, foy defpadaçan-
do os corpos,que animava a inveníível 'coníl:ancia,até os dei-
xarem fem figura , & fem v ida . A hum dos oyto mancebos^
chamado João Martins , a cuja vifta marty rizarão os (ttc:;
(prefumindo derrotada fua Fortaleza com os tiros do mortal
ejlrago, que v io nos companheiros) perfuadiaó, que confer-
vaíTe a vida atroco da promeíía de aíTentar praça em ferviço
de Olanda. Com alegre , & defenfadado femblante rcfpon^
deo, quefenão rendiaa fidelidade de hum Portus;uez Ca-
tholico Romano a taõ vil partidojquando vióioriofode fuás

TH

164^

^J^B 1. LIF^O VL

417

inftancias efperava eterniiar, com íua moi;te ^ a gloria de feii

nome, confiado na mifericordia divina, que levaria fua alma

ao loaro da vida eterna. Aqui íeacendeo mais a ira, porque ,

aqui le vio mais onendida á indukria : Marty rizava o odio,a ^^^^^^^^ ^ ,,/^.

çoIera,& a vingança j & não ficou tormento , que naó execú^ mo a todos-.

taíie a tirania, paííando além da morte a crueIdade,com que

líie fizeraó em miúdas partes o corpo. IndefculpaVel defcni-

do foy o de noíTos Efcritores,eni não alcançarem os nomes dé

tão efclarecidos fogeitosj que era juftiça , eternizar a patriã

os nomes de patricio3,que com feu procedimento illuftráraõ

a Nação tanto mais,que todos os Gregos, & Romanos,qiian^

to os excederão na cauza porque morréraõ,&: nos martyrios^

4jue tolerarão.

138 Defpois do referido, andarão aqiielies deshiimá-
íios verdugos , fazendo rifo do eftrago , que ás mermas feras

cauzára horror . A hiia mulher cazada com Manoel Rodri- .

.T. í li -• 1 u' r Horrendas trilei

guês Moura, que levada do amor co;ugal acompanhara a feu ^^^^^ ^^^^^^

inando,& o chorava defpadaçado,cortâraó os pés,& as mãos^ ^^^ ^- ^^ viWh
porque fe não podeíTe apartar da cauza de fua magoa , & en-
tre os corpos defanimados, bebeííe a morte no fangue das fe-
ridas, & no horror da companhia : Martyrio, em que duroii
trez dias, até dar alma a feu criador. A húa menina dedous
annos tirarão dos braços da máv , & com apóftàdo tiro , a eí-
trelaraó no tronco de húa arvore . A outra criança partirão
em duas partes de alto abaixo, com o golpe de hum alfanje^
A húa donzella de gentil forma, v enderaó a hum índio , por
hum cão de caça. Não achando já o braço colizà èm que por
cleíTe defcarregar o golpe,largáraõ aos índios os defpojos,qué
eraó as ultimas cortinas da hòneftidade, & com eftarem bem
cortados dos golpes, deixarão muy to mais cortados a todos
os prefentes,quãdo ao tirallas , viraò rodeados de afperos ci-
licio3,& de duras cadeas aquelles ditofos corposjdifpondo-os
a virtude da penitencia jpara a paciência do marty rio:Difpo- •

íição ccnfe^uida em todo o tempo , que viverão dentro dà
cftacada^ & favor pedido eiii quotidianas prociíToens , por eA
paço de trez mezes , a hum devoto crucifixo ^ com lagrimas,
& preces feitas a aquella Imagem^ que com o exemplo õs ani-
mava à imitaçãojccmo fe com taó anticipadas vefjporas fole>

tiizafíeíii

il

if
i

41S C^ST^oro LVSlTJKO 1645

nizaíTem aquelle dia de feu traníitOjque fiiccedeo em trez de
Outubro de mil & íeifcentos & quarenta & cinco . Não quiz
o ceo^que faltaílèm fieis teítemunhas ás particiiíandades,que
temos referido, porque não podeíie efconder a malícia as cir-
çunftanoas, que a condenaváo: Permitio, que dous morado-
res fogiíiem da eftacada a tempo,que delia fe diviíou a tropa
Olandefa, que conduzío os moradores para o martyrio,& lè-
guindo-os até o lugar delle ( efcondidos do mato ) v iraó , &
ouvirão tudo, o que temos relatado.

139 Coroado o exacrandoado comede gloriofo fim,
caminharão os 01andefes,& Tapuyas com erpantofo tumul-
to, para o lugar,at)nde eftavão as mulheres, filhas,& parentas
dos mortos,(recolhidas détro da eftacada^ lutando com as in-
certezas da efperança, & com as vehemencias da fofpey ta )
vivamente aíliâas com o receo defua perda,& feu defampa-
2[4 Adores' com o i^^- Viraõ o efquadrão inimigo, & de fua defordcm inferirão^
fc^o mm dehU. o que logo experimentáraó,porque defpois de lhes intima-
rem, na morte dos feus , a falta da defenfa ( com que de todo
defraayarão ) as invadirão juntamente brutos,& cruéis; por-
que com acção indiftinta fatisfizerão á cólera , & á torpeza^
dando a beber a todas, de hum fó trago, a dor, & a injuria, sé
que a força reparafle na refiftencia, nem a brutalidade no eí^
tado; ícrvindo-fe das queixas,& das lagrimas, como de infen-
ti vos para a violência: Nunca a demafia andou tão deíenfrea-
da , porque nunca fe viomais livreodeíàforo, com que a la-
cívia rompeo pellas leys do pejo,&da laftima.Roubada defta
maneira, a honra, & a eftimação do frágil fexo ^ lhe não dei-
xàraó,que fencir na perda da fazenda, que lhe levàraó Com
tanta vileza,que nem com que podeíTem cobriras partes,quc
a mefma natureza efconde, lhes deixarão. Com lagrimas inu-
tis choravão o defamparõ,& a deshonraj&corridasde íi meí^
masjcnvejavaõ o eftado dos mortos.Pedirão liccftça para lhe
• darem fepultura ; que não podcraó alcançar, fe não defpois

de paíTados quinze dias ; para que a corrupção não deíTe lu-
gar á piedade;& as feras o tiveífem,de lhe darem em fuás en*
\Tmortos ^^^^^^ ^^^"li3s horrivel fepulcro.Mas o fceojqúe dos eílorvos faz au-
xílios , & dos defviòs eftradas , moftrou nefta occazião , que
para favorecer a verdade,& publicar o modo, o tempOp& ef-
tado

1^4^ ^AT(rELLir(l^ VI. ■ 41-9

tado da viíEtoria de fcns fervos permitio os meybs , que pam •
â crcondcr,& deftruir, bufcavão feus inimigos.

140 Entrarão as magoadas fêmeas no campo do fupli*
cio, & nelle efperimentàríió taõ íuave fragrancia^que vencia
a de todas as flores de hum Abril j (cheiro que naquelle íítiOrvi/^^^^wV^^í com
perfeverou muytos tempos,) & aos corpos,ainda que dividi- f o ^^-^ fnofireu a,
dos, intaâ: os, não fe atrevendo atocallos , nem a corrupção,- acatach do [n*
nem os bichos.Rerpeyto,com que a natureza,Sc as feras con- ^''^A^^-
denàraó a crueldade dos homés; Eftava o Tangue fobre a ter-i
ra tão frefco, como fe as feridas lho não entregarão liquido, . ^

& ella não fora porofa, & feca:Parecc,que com eíte prodigio
moftrava a divina providencia (por tempo cótinuado,)quc a
viveza do agravo,náo dava lugar á diffimulaçáo do caitigojq
o não cuftuma dilatar a juftiça , quando o pede a inocência*
Com outras maravilhas, qujz o ceo moílrar, o quanto Ihefo-
11a agradável a morte daquelles íervos , tomando portefte-
mu nhãs aos verdugos do martyrio : Foy hum deftes notório
a tantos, que o não pode efconder, nem a infedilidade,nem òí
ódio. O Gafmão Governador da Fortaleza,que como temoéi
dito, era cazado com húa mulher Portugueza , lhe eoncedeOr»
podeíTe levar para fua caza algúas das viuvas,que deixou vi-
vas o eftrago. \ Obr"igando-fe a dar conta delias todas as ve-^
'2es,que fe lhe pediíre^']0 que fes compadecida da miferia,&
eftimulada da compunção. Succedeo,que na noite do dia,etTi
que as recolheo na Fortaleza,( que foy o mefmo em que en-i
terràraó os corpos mortos) ouvio, para a parte ^ aonde fe de-
pofitavaó, húa fuaviíTima melodia, de acordadas vozes , que
eomo celeíliaes, moviào , & admiravão : Eípantada de caza
tão novo, chamou o marido, que com outros Olandefes ef-
tava converfando, & todos ouvirão a muzica com hum mef-
mo efpanto. Bufcou logo as mulheres,que tinha recolhido^
&5chcu , que fufpenfas na íiiavidade da armonia , fe efque- ^em 4. as po^t-
ciáo da magoa,& do fono.O que fuccedeono dia do enterro, /^^ negar os He^
tinha fuccedido no dia do martyrio ; como fe o ceo quizeífcc/^-^-
moftrar com húas meímas vozes, que era húa mefma a forte,
das alraas,que recebia, & dos corpos, de que a terra íe entre->
gava .Em o cerco, aonde ficáraó as mulheres,íií has, Sc parert-»
tas dos mortosj foy tão extraordinário o cheiro , em todo ó

tempOj

4^0 C^ST<!iIOTõ LUSITJNO . 1^45

tempo, qne durou o martyrio, que igualmente rufpeiidia os
dircurros,& occupava os rentidos.Muzicas, & cheiros dedica
a veneração aos Bemaventurados.

141 Em omeíÍTiodia, trez deOutubrOj&nomeíffio
cerco, (antes que nelle fe devulgaíTem ^s novas fobre-ditas)
aonde as guardas não permitiáo á dor^que cauzavão os prefa-
gios do golpe, nem o alivio da queixa, nemodeíafogo das
lagrimas, (condenava-fe por delido o natural fentimento)re
recolheohúa filha de Diogo Pinheiro, de oy to annos deida-

j^em duvidar os ^^5 ^^ interior de hum apofento, para chorar fem perigo a
Caíholícos. contingência do dano, aond*e achou húa fermofa Senhora c5

hum azorrague na mão,que com venerável gravidade lhe dif-
fe: Naó chores filha, que com efte açoute,que aqui vez , haõ
de ler caftigados os Minifi:ros da crueldade , que logo ouvi-
rás: E defapareceo. Sahio a menina efpantada,& medroza j &
perguntada axauza, relatou o referido.Teve o cazo fiel pro-
vança,porque em breve tempo degolou o fio da efpada a to-
dos osagreíTores, como nos dirá efta narraçaõjádiantando-íe
na paga, aquelle pérfido Jacobo,que fe adiantou na ciilpajao
qual o dito Gafmaó Governador da Fortaleza matou ás pu*
iihaladas^ & íopofto, q o matador naó teve efte motivo, teve
o morto contra Ci efta cauza . Outras muy tas demonftraçoés
prodigiofas publicou a fama nefta occaziaó,que não efcreve-
mos, por menos averiguadas, não por menos dignas defta
memoria^ as referidas, foraó autenticadas por teftimunho, &
;u raméto de vinte & cinco mulheres,[defpois deitadas na Pa-
raiba por mandado de Joaó Boleftrater , author de tamanha
crueldade] taó confumidas,& desfiguradas,que fe via em ca-
neferidasporte- ^^ húa O retrato da morte5& da miferiai& taó barbaramente
Jiemunhas de cre roubadas , que as náo podiaõ ver os olhos fem pejo , & fem
ditOj& dcvijia., magoa: Aeftas, & a outras quepodèraóeícapar detoda a
Capitania do Rio Grande , recolheo a charidade dos mora-
dores,com filhos,& filhas j agafalhando , & cubwndo a todas
com amor,& com decência.

1 42 Sopofto,que o mez de Outubro nos deu o terceiro
dia, para nclle fe executar a crueldade referida no Rio Grau-
de,deu todos os mais para nellcs fe fentir a nova em cada húa
das outras Capitanias. He a da Paraiba confinante , porém a-

partada.

partada para o Sulqnarenta & cinco legoas: Caminho, cm 4
fe deteve a nova até os dezoyto ^ ouvindo le primeiro da
queixa, que da relaçãojporque a oppofiçaõ dos dom!nios,&
a afpereza do terreno , empediraõ o caminho com odefco-
modo,& com o receoj o que náo Te achava no mar, de que os
Oládefes eraó abfolutos fenhorcs,pello qual, facihtada a bre-
vidade, chegarão as mulheres, filhas, & parentas dos mortos^
primeiro a informar os olhos de húa, & outra gente có a pie-
doía vifta de íua mireria,que os ouvidos, com a eftu penda re-
lação do fucçeííb, fielmente copiada por Lopo Curado Gar-
ro,hum dosnoflbs trez Governadores, que tinha a feu cargo
a defenfa da Cidade . Em vinte & trez de Outubro a efcre-
veo,& adefpedio para Pernambuco ,& em os primeiros de
Novembro chegou ás mãos do Governador João Fernandes
Vieira, & do Meftre de Campo André Vidal de Negreiros.
Em o numero oy tenta & oy to defte fexto livro,difi*emos,co-
mo tendo os noíTos Governadores noticia do aperto^ em que
eftaváo os moradores do Rio Grande (no mefmó tempo, em
c]Ui deípediaó hum focorro, para a Paraiba ) encomendarão
90S Cabos delle, principalmente aos Capitães João Barboz%
Pmto,& Dom Diogo Pinheiro Camarão , como mais práti-
cos naquelle terreno,que da Paraiba paíTaíTem ao Rio Grán*
de (tanto,que os fucçeíTos lhe deíTem lugar ) para eximirem
os moradores da aflicção, & rilco, em que eftavão \ &.unidos
com elles fizeíTem ao inimigo toda a hoftilidade poííivel,cõ-
duzindo os gados de toda a campanha para fuftento do exer*
cito de Pernambuco.Coiii gente da Paraíba engroffárajõ o fó.
corro , &com tile partirão defpois dos quinze de Outubròj
& pella difticuldade da marcha chegarão á campanha do Rio
Grande em 0$ primeiros dias deNovembro,hum mez defpois
do cftrago, que deixamos referidoj & fopofto,qtie nos adia-
tamos no tempo, por não quebrar a ponta defte fio , diremos
aqui, O: que obrarão, & ficaremos livres defte defvio,para ca-
liíinharemos fem ellç.,pella eftrada da hiftoria.
.n.i;4.9i Quvio a noífà gente a laftimoíà relação dofucçef-
f>5 a, crueldade de Olandefes ,& índios ; õ aleivofo trato de
liun%& outros; & irados contra íi mefmos, pella tardança;
& contra os inimigos, pella ofFenfa , perdiaõ a paciência em
çO».^í>ji.ií Nn con-

A inforír.açAo I
das quaes ft ma-
dou AO Governa'
dor dá liberdade y

JDeffois deteren
viado o Jocorro^q
nao ch^^oíf a tê'

Se xão farafen'
tiroejlrago.

. 4^^ C^STllôTô WSÍTJ^O

confiderareíAjque lhes faltará témpò para a V ifigança, & íhes
fobejava para a injuria ; náo podendo aproveitar o ípcorro
para o remédio, fe não para o fufragio . Fizeráó alto na pd-
, voaçaó de Cunhaii ^fortificara ó-fe no E ngenho do 1 ugar,(em

. ' ôutraoccaziâofepulcrojagoraálòjamentoj) porque fahiffeõ

caftigo do mefmo lugar, aonde fe executou o agravo : Todas
as horas o lembrava o íitio,& náo deixava a magoa, defcanfaf
a irâ, com que os noíTos taIavâo,& abrafaváo tudo7o que por
_ aquellas pa rtes tocava aos Olandéfes, & Ind i os , não avendò

hora em que á Fortaleza do inimigo não chegaíTem correyos
de fua perda,& de noíTa v ingançajcom que irritaido fe apreí*
tava com todo o poder, para aífaltar os noífos, certo , de que
â. fortificação do alojamento os não poderia defender,condé^
íiada pello fitio. Succedeo,que hua noite ou viraò as íintinel-
E (jue 4;W4^o/Í3s,que OS nolFostínhaópofto ao largo, grande tropel, &ru-
do favor do ceo, morjCOmode gente, que marchava furtiva; deraõ rebate ; to-
^ de hm grade eou-fè entre os noílbs armai informarão as ílntinellas, do que
'vtcJoru afoU- tinhão OU vido, preparou-fea gente para rebater o aíTalto, &
Bcfta forma eftivera5,até que amanheceo o dia j defcubrio-fc
© campo,& naô fe achou, nem indicio,nem rafto de Inimigo*
Procedeo-fe nas feguintes noites, com dobrada vigilaiicia,&!:
cuidado5& fliccedeo o mefmo, que na primeira : Aonde não
Êhegouadiligencia,chegou odifcurfo,inferindo-fe myfte-
íio, ÁQ engaínoj& aíFentando entre fi, que era fuperior avizo,
mudàraõ de alojamento, fem dilação;& efcolhèraô hum poA
to regulado,^ medido para a defenfa , aonde fe fecharão c5
fortificada circunferécia. Mal tinhão acabado a fortificação^
quando a inimigo com todo o poder de Eftrangeiros, Natu-
raeã, & Tapuyas deu fobre O Engenho de Cunhaii, que a-
chou des-oC(ínpadoj & entendido o lugar, aonde os noífos fe
alojavão , os bnfcoti , & envéftio com o orgulho, que rece-
beo da prefuinçaõ , de que o temor de íiia&armas noà defalo-
jaria com facilidade, porém em breve tempo fe defenganois
muyíoá fua cufiía; porque vencida a ouzadia da inva2aõ, daí
valor, & da refiftencia, perdeo o aíTalto, & a flor de fua gen-
te, ^eixando-nos nas mãoshua efclarecida vitoria, que feè
mais gloriofâ o medo, com que desbaratado fogio, & foy tãí-
to, que fem atender a ordejm,riem a honra entrou em fua fof^i-

i^^f tificaçaõ,

rae toda a cam
panha.

tificaçaõ, fem muy ta parte dos íbldados, & fem a mayor par-
te das armas. Senhores da campanha , continuarão os noíTos
na vingança, até o tempo , em que chegou á Paraíba D. An-
tónio Phelipc Camarão, mandado pellos noffos Governa-
dores João Fernandes Vieira, & André Vidal de Negreiros,
mo vidos da relação referida,& de novas rezoés, como eícre- -

veremos a feu tempo j que agora com o relatado , temos co- Continuando na.
Ihido todas as pontas dahiftoria, que contem efte Texto Xi- hojiilidade atê a
vro, em que damos conta dos movimentos , que cauzou a fo- '^"^g^j^ do en-
levação dos moradores em todo o dominio Olandès j & co- ^^^^°'
mo no difcurfo da narração, fe forão colhendo os fios da hif-
toria, ( por tantas partes, divididos quantos forão os lugares^
que deí-uniraõ os íucçeíTos com a diftancia, das partes,&: cò-
plicação do tempo) & os deixamos unidos no troçai da rela-
ção; daremos principio ao livro feptimo, unidas as fontes na
corrente defta efcritura.

Nn2

CAS-

■4

.yj.iji .iriii|jiuifl|TO

STRIOTO

PARTEI. LIVRO VIÍ.

UZO, he o meftre5que melhor enfína
a perícia das artes. A efpeculação eníí-
na a entender, a pratica a obrar: Na
guerra, mais enfína hum dia de praxe,
quemuytos de teórica . Cheos de va-
lor eftaó os animos,& de proezas os li-
vros j mas que importa, íe para a imi-
tarão faltar o movimento dò braço ;& para o robufto do pul-
fo, a continuação do exercício? Gom a experiência fe facíli-
tão os aâ:os; rezãó, porque a melhor doutrina he a da expe-
.^ , riencia. Nos livros venle os fucçeírospíntados,nasocca2Íoés,
.^^..,\; vivos:& vav muvto do vivo ao pintado:& como nas batalhas
fimo os preceitos ^^o lempre diverlos os accidentes , te os nao aVertir a expe-
i guerra. rieacia,mal os pode adevínhar o diícurfo. O que lido recrea,

experimentado efpanta; quem aprende em perigos alheos,
nunca chega a faber, como íe defprezão os propriosj& pofto
na occazião, fe não foge tímido, eímorece bifonho. Com
grande coração, ferefolvèraó os moradores de Pernambuco,
a tomar as armas emdefenfa da liberdade, começarão are-
parar-fe com o animo, com o braço , & com a induílria; em
húa , Sc outra occazião os enfinou de forte a experiência , &
em muy tas a continuação do exercicío,que ]i defprezavão o
mefmo inimigo,que antes temião;)á os nãofatisfazia a defen-
fa, anelando vivamente a ofFender com a invazão ; como lo-
go diremos em os feguintes livros defta hiftoria, nos quaes,fe
verá como não fó introduzirão nos contrários temor, fenão
também pafmo.

2 Em quanto aos noíFos Governadores não chegava a
^ infor-

jfliftir

1045 f A\rÈ /. Liriio Fii. 415

informação da ferina crueza , que o Franiengo U2óii com os
moradores do Rio Grande • & de como o Ibcorro chegara a
tempo de ver o langue , &: náo de rebater o golpe , & fe oc- ,
cupaváo oâ noflbs em caítigar o crime , Tem que a hoíiilidade
pcrdoaíTe a couza, qu e pertenceíTe a naturaes,& eíl:rarihosi&
efperavaóoccazião, para que animados com novo ibcorro,
& mayor poder inveftiíTem os Olandefes, dentro de fuás for-
tificaçoés,& como em prophecia, bufcava lua magoa na cam Os mfos Gonjef-
panhà de Pernambuco , todos os camitihos, põt onde podtíie '''■^'''' f ^^^'^^ ^
confeguir o ultimo defejo da viíigança: Cortava a eipada até ^^^'^'^ ^° im^igo.
onde chegava o bra.^ o , de íofte, que â todos ^ os que dêfen-
dião as Fortalezas do Arrecife, aos qUaes náo podia cortar
ofcrro,apertava o laço,táo cini^idos os Framengos do cercòj
& do perigOj que p^sideciaõfem remédio j pórque naõ tiilhaò
modo^ nem via para âcucfiíém á fome, & á {tàç. , que ós aper-
tava. Succedeo, que naprimeirò domuigo de Outubro, eiii
í|ue a igreja fóleniza a fefta do Rozario,a celebrou Henrique
Dias,& os Negros de feu terço, có asdemoftfaçoés poffiveis
(todos fabeiii , qiJé para ôs Negfos \\t a féfta do RòzMo ,^
alvo das fcítaá. ) Acabada â *ieiiidade fe refiroii Henrique
Dias da Villa de Olinda (aotlde fe feftejòu õ dia) para o feU
quartel j& òU que íoíTe poravizo, ou por inferência, aVértio
aos Capitães das eítancias vezinhas, que eftiveíTem com vigi-
lância,poiqiie fem duvida fahiriá aquella lioite o Olaiidès, a q ^^^/ effrmids
dar algúa aflaltada j como de fa£l:o láhi© , ajudad^ dà efcuri- '4a necejjidadefai»,
dade da noite, por entre as margens do Rio Bebetíbe : Divi- keabujcarume^^
dio o poder em dous traços , & com dous efquadroés come- -
teo as eftancias daquellã paragem por duas partes , adiantatl-
do-fe á en veftida^ os clarins encontrados , & ás cargs^ v^gàSj
para que primeiro confundiífem , do que cometeflem . Naó
foy pequena a defordem, que cauíou em os lioífos , orutiiór ^ ' ^
encontrado, & o fébate indiferente, porque fem dífciplina^
íè foraò retirando, até o pófto de João Soares de Albuquer- f y

que,aonde cobrados da confufaó, tomàraõ melhor confelhoj
& voltarão fobre o inimigo a tempo, que marchavaõ em feU
focorro trinta índios do terço de Doiti António Phelipe Cá^
niaraó,que chamadosdo eí\rondo,publÍGavão O auxilio coiii
lium clarim, que feguião ^ cujo eco bailou para éípalhar os
— Nn3 Olan*

4^6 C^ST<!ilOW ÒUSITJMO 164^

Olandefes pello mato,& para retirar os noíTos do confliâ:o,
imaginando todos , contrários , aos que fó para o Olandès o
erào, mas para os r!oíros,amigos50s quaes feitos em hum cor-
po, Te foràó efperar o inimigo de embofcada debaixo de fuás
E Ce recolhe caf- ^^^^^^ Fortalezas j donde os aíTaltàraó , ao tempo que fe re-
ngado. colhiâo, com dano feu, & perigo noífo ; efte por rezão da ar-

telharià, aquelle pellos mortos , & feridos , que deixarão , &
recolherão.

3 Apoftavaõ os noíTos foldados valentias, que tinhaõ
mais de temeridadc,que de ouzadia:Concorrião, de húa par-
te a neceíTidade, da outra a vigilância 5 cauza , porque nem o
segunda, vez. re- Framengo deixava de fahir, nem de pagar: Conheceo-fe pelr

*' mortos j aferi- ^ t)ufcar agoâ do Rio Beberibe ^ á parte j aonde

amare nao

ehegâ ã falgar fua corrente: A forte,& a kàt os avia de obri-
gar á repetir a fahida j certeza,que có vidou aos Capitães Frã-
cifco Ramos, João Barboza,& Manoel Soares, a efperallo de
çmbofcãda com os foldados de fuás companhias ^ & foy afll,
que o Õlandès fe veyo meter no laço, de que não pode fahir,
fem deixar Oy to mortos5& nove efcravos, dos que trafiaõ pa-
ra carregarem a agoa.No alcance perdeo mais, que na peleja;
Bcferecolheo com tantos feridos, que fenão entrarão car-
, regados de agoa, foraô bem cobertos de fanguc.
■ 4 Em quinze de Outubro/ahiraó do Arrecife dous Ne-

gros, hum crioulo ,&; outro Mina : Foraõ aprefentados ao
Governad0f,&affirmàraó> que ó Framengo determinava fa-
■ hir a noite feguinte com poder de foldados,& gafi:adores,a fa-
'Fogem dous Nê^ ^er lenha aa paragem das Salinas, com tenção de nella fabri-
gros do Arrecife, catem hum forte capaz de boa guarnição , & ártelharia , par2^
que défalôjáda daquelle íitioa noíTa gentejficaífem lènhores
do pofto,& do terreno neceíTario para fuás còrreriaslOuvida
a informação,mandàraó os noíTos Governadores chamar aos
Capitães António GonçalvesTiçaõj António Borges Uchoaic
Domingos Fagundes, Fraricifcó Ramos , João Soares de Al-
buquerque Joaõ Barbozâ, Paulo Vellozo, & Paulo da Cii-
F r r fíir^ nha,& com.unicado có elles o dezenho do inimigo , & O mo-
fe fcuher^oosin- ^^ ^^ oppofiçaó , OS dcfpediraó com as ordens néceíTariasj q
tentos do Ff ame- cll^s.Gom pontualidade cxecutàraõ . Defcoberto o campo,&:

ié4'5 ^BA^TELLIV^ VIL '427

embofcada a gente paíTáraõ toda a noite , cotn dobradas íin-

tinellas, até que ao primeiro romper da alva, derão os noííos

defcobridores avizo, de que nas cazas de Francifco do Rcí^o

efta va húa grande partida de Olandefes^ & Negros formad os

" em duas alas, & que íeis batedores de cavallo armados de cia- G)uiexecutíioar-

viiias, & piftolas vinhão defcobrindo a campanha pella par-^íãdo as mjjas

té chamada a carreira dos Mazombos. Não perderão os noÇ~ cH andas.

fos a occaziáo, & o tempo; deraõ fobre os féis de cavallo, cã-

hiraò mortos os doUs, os quatro fogirão a redeá foi ta , a dar

rebate aos feus,& avizo do lugar,aonde forão aííaítados.Sem

detença os enveftio o inimigo por duas partes , dividida fua

gente em dous batalhoésj a confiança do poder , & o pouco

receo da noíTa prevéção òs meteo nas etnboícadas, que muy- CV '

to a tempo fe defcobriraó . Suftentou-fe o combate em igual -^ . , >

1 , ^ -111 /- 4 n rv Si frevemdos osnoi

balança, por mais de duas horas, lem que baítáíle para o aflo^ r^^^^^ rebatem.

xar, nem poder de húa parte, nem a valentia da outra ■. Ad--
vertioodano, oque nàoprevenio a fornia . AíTentáraô os
noíTos as embofcadas em íitios oppoílos , de forte , que cfu-
ladas as bailas não podiaõ deixar de ferir aos parciáés jconhe-
cido o erro, fe atalhou o perigo ^ com õs Capitães Portugue-
' zes mandarem enveftif á cfpada. Achou ò preceito prompta
a obediência , & efquecido o furor da difciplina, foy tão im-
petiiofo o avanço, que fe conhecéo o Inimigo peíla fogida;
mas não pella reílftencia . Seguirão òs noflbs o alcance corri
obftinada perfia , pois fem tepararem nas bailas , que defpe-
dião as Fortalezas inimigas, os forão fangrando acé as portas ^ ^^f^'4 retirar
delias: PaíTou-fe õ Inimigo ao Arrecife com menos vinte & '^^^^í^^'^^-
•trez foldados ^ que deixou mortos , & trinta & dous efcravos
prifioneiros^ algúas armas, & todos os iriftromehtos, que po-
dião ter preftimo, para a roça,& para a fabrica; que aos nof-
fos ferviraó de defpojo , & de téítimunha, com que feâpre-
fentàraó aos Governadores feiii perda, & com miiy ta repu-
tação.

5 Não intentava o Inimigo fortida , que lhe não fahiíTe
cara; porém como via a perda com os olhos da neceílidade,
não reparava no preço,porque a efperança;Ihe vendia o rc- *
médio. Com hua partida de foldados Olandefes,& índios
bufcou as cazas de Sebaílião de Car vai ho, aonde os lioíToâ tx^,

^" Na 4. .nbs^

'ven

nciào.

^

nliaó húa trincheira defaiTiparada de prezidío , & fó affiRida

de duas íiotinéllas, as quaes em vendo ao Framengo tocarão

Coo mejmo juc' ^Ym2i.^{Q^QÚiiiv2iò : Oiivio o rebate O Capitão Coime do

cello Lhe cajtí7a _,'^ ^ r • no i

rad fimelhmus ^ego, (era, o q hcava mais perto) & com a gente que achou

^enj amentos. prompta/ahio ao encontro do Inimigo , que valeroíàmente
enterteve, até que de fuás eftancias chegarão os Capitães J e-
ronymo da Cunha do Amaral , & Sebaftiáo Ferreira com a
gente de fuás companhias,que unidos com os qne pelejaváo,-
carregàrao dfftal forte ao Framehgo, que por fogir aos gol*
pes, largou atrincheira,&:bufcouoamparo deiiiasForta^
íezas : Quatro mortos,&muy tos feri dos lhe cuftoiíaemprííf
faj & aosnoíTos ocaíligo, trez foldados, feridos levemen-*
te. ■-:i-

6 Outros fucçeíTos , & encontros femeíhantes , ( erao
quotidianas as pendências) fe vião cada dia,que deixamos de
referir,não por de menos conta, fe não porque foraó fem co-
to. Andavaó osPortuguezes taó fenhores da fortuna, que

^* ^.^^^ ^ faziaó do perigo defenfado,& das temeridades credito.Peílas
luargés da cava , que cingia a Fortaleza dos Aífbgados, tra-
zia o Inimigo alguns cavallos,em fua opinião feguros de noP^
fos affaltosjporque cobertos com o amparo de fua artelharia|
& imaginava o pafto taó livre derifco, quenámefma para-
gem tinha ii^uytas pipas de agoa doce , de que muy to neceí^
íitava: Andàraó tam ouzados alguns foldados noíros,que hwt
noite lhe foraó roubar os cavallos , & lhes deftamparaó cin-
coenta vazos, entre pipas,,8c quartos.Por muytas vezes ,Ihes
foráo roubar os gados,queapafccntavão debaixo da artelha^^
na das Cinco Pontas. Os fervos, & efcravos , que o Olandès
tinha coofigo , & fahião das Fortalezas a fazer qualquer fern
viço, logo mudavão de fenhor, porque deixavão defer dos)
Framengos,& ficavaó fendo dos foldados de Henrique Dias;:
para os quaes era omefmo vellos, que cativallos , bebendo &>
inimigo oefpanto na temeridade , & o temOr no defprezo^
naõ fazia difcurfo, que não formaíTe a defefperação í Qiicm
em nenhum lagar fe achava feguro , era força que em todos-
fe imagrnaíTe perdido j & com mayor cauza, quando antes de
invadido fe via defpojado . A todos íe comunicava o temor;
aos de mais baixa forte fazia a neceffidadejmais corpulento o

niedoj

Bm nenhud par
te vivia feguro.

'^A^^.^V. m.

164^ ^JX^E L LlVtp riL ^ 4^9

medo, porque os alcançava menos, o remédio da fome, & da

fede, que padeciaò: Com efta rezão fogião muytos efcravos

do Arrecife,perfuadidos,que não poderiâo eícapar das mãos

dos Portuguezes, ou por entrega da penuria,ou por conquir-i

ta da efpada. Todos, os que a guerra privava de liberdade/e

aprelentavão aos noíTos Governadores, condenados poreG-?

pias, aos quaes,derpois de ou vidos, repartiaó pellos folda-^.

dos, de que aviaó fido prifioneiros , para que a ganância lhes Temot com que

avivaíTe a diligencia; & pella mefma rezào diffimulavão com ^^'^^J^^^ J^ Fw^'
,, ^ . i r, r ^• ' í n/aoano aparte.

aquelles, que os cativavao,& os eicondiao, porque por hum^. •'^ ^

Sc outro modo fe confeguia o mefmo intento, porém á data,
& à diíTiiTiulaçaó, precedia fempre o exame, íe pertenciáo a
particulares fenhores, ou por compra , ou por herançaj porq
nefte cazo, fe lhes reftituiaó, com tanto , que pagafíèm o me-
recido do achado . Os negros , que conhecidamente eraó en-
cravos dos Inimigos,re mandavaõ vender para as defpezas da
guerra, com o que,nem fe faltava á jurtiça,nem á commifera-
ção.Pcllo conforme depoimento deftes, 8c de outros muytos
de toda a forte , fe inteirarão os noíTos do mirferavel eftado,
em que fe achava o Framengo, dentro das praças do Arreei-;
fe, apertado da fome, da fede ; & do temor j eiii que o punha
fua defco afiança.

7 Defenganado o Inimigo, peíla continuação dosfuc-'
çeíros,de que fua força não bailava a defendello de nofia ou-
2adia,&quefeu poder o não avia de melhorar, apelou para
as artes de fua mdicia,(em q fe achava mais defcro,que nas ar-
mas) Sc ordio íiúa trayçaó de tal callidade, que o mefmo fora
vella lograda, que deixar-nos deftruidos . Temos dito como
os noíTos Governadores deraó a Theodozio Eftrater o pofto
deMeíiredeCampodos Eftraneeiros , que formavaó hum ^ , • • j /-

11 o 1-1' -1- r> O Inimiço deíco'

terço de duzentos, & oy tenta homes de nações diverfas,mas ^ado do poder, fe
todas do Norte:Sobre efte fundamento cftribou a confiança, cjuer -vder da
com que o Framengo intentou corrompellos:Conhecia a na- ■^^^;'f'«^-
tural inconílancia da gente daquelle clima, & a propençaõq
tem a faltar a fé, por qualquer pequeno accidente. ( inclina,
çaó, a experiências alcançada do Governador Joaó Fernan-
des Vieira,&: rezão,porque defconfiou fempre de fua fideli-/
dade.) Formou o feu Concelho Supremo hum alvará de per-
dão,

%

%

! !ll

450 c^sr^oTõ wsiTJKâ 1^4^

, daõ, & de pfomeíTas, em nome dos Eftados ; affirmavão nel-^
kjque avião por abfoltas a todas as peíToas de qualquer cal-
lidade, que foíTem [ ainda que tiveflem militado em ferviçó
da Companhia ] de todo o delido , culpa , ou crime cometi-
dos contra os mefinos Eftados , &contra a Com panhia , cora
tanto, que fe tornaíTem á praça^ou poftojque avião deixado;
& com promeíTa de ferem melhorados ,( como fe ouveíTem
fervido fem falta, & fem interrupção) com aquelles acrecen-
tamentos,que coubeífem na efphera de cada hum^ & a todos,
os que cm ferviço dos meíiiios Senhores Eftados , obrafTera
algum feito em utilidade de fuás armas , & dano dos Rebel-
des, fe lhes faria mercê com refpeyto á callidade do ferviço,
Sc da peífoa.Fizeraõ muytas copias,& por diíferentes vias, fe
mandarão lançar em diverfoslugares:Muytas derãonas mãos
Modo com qtiè a das noífas íintinellas, que fem dilação paííaraó ás dos Gover-
dtfpoem. nadóres da liberdadejos quaes,Gom juizo taó uniforme pene-

trarão os intentos do Inimigo , que por hum mefmo concei-
to conhecerão o alvo, & recearão o tiro, porque fabião , qne
não averia meyo entre a noticia, 8í atrayção dos Eftrãgeiros.
(Não obftante a eftimação, que delles fazia noíTa confiança^
nem a pontualidade , com que fe adiantavão nas pagas a to-*
dos os mais foldados.) O infiel,& vil, do beneficio,& da cor-
tezia, faz eftimulo para a perfídia, & para o atrevimento*

8 Tiverão os Capitães Olandefes,que entre nós milita*
V ão, noticia do perdáoy & das promeíTas, & foy a obrigação,
a primeira couza, que fua infidelidade perdeo de vifta: Cor-
romperão a muytos,com muyta facilidade: A todos achava
difpoftos a perfídia: Conferirão entre íi,como a feu falvo nos
poderião perjudicar commayor dano^ (adiãtava-fe feu ódio
TrãtmâoA com os com os eftimulos de fua efperança ) & aíTentáraõ , em que fc

Efrrangetros^que efperaíre occazião, na qual noífos mefmos foldados,& noífas
miLitciVAo entre • r rr ' n i/v ij*

próprias armas roílem os mltromentos de nolla total perdi*

çaó. Comunicarão os intentos [os motores da trayção]com
osprineipaes Cabos do Arrecife, aproveitando-fedaquelle
tempo,quenoíracõfíança lhes dava,parafatisfazcremafuas
obrigações; porque as horas, que lhes cabiaó de pófta,gafta-
vaó em concertar a maldadejfuccedendo alguas vezes paí^
farem ao Arrecifcj a concertar o preço da venda,& da entre-
gas

nos.

1645

(PJ^EI.LIP^Õ Vil,

*>

gaj donde \'oltavão tanto a tempo, que nunca os achava me-
nos a ronda, ao mudar das fintinellasj antes com a vigilancja
da perfídia ,tiravão todaafoípeyta á imaginação da talra;
Admiráveis faó os mc}'Os que toma a divina providencia
para defviar os homés dos laços,qUe lhes arma a nsaldade dos
homens : Da divifá do perigo, faz fégúro, & da oírenla repa-^
ro. AíTentàraó, que nos encontros, em que íè achaíicní,[an-*
tes da occaziaõ deíejada]os do Arrecife naó fariáo tiro com-
pontaria, nem os que entre nós militaváo com balia , dando-^
fe a conhecer por hum papel dobrado, que trariao nas tran-*
ças dos chapeos, na forma, em que os litigantes os trazem nò /^
cinto, em quanto não fuccedeíTe batalha , em que os Eftran-
geiros que milita vaó entre nós, levaíTem a vanguarda^Sí uni^^
dos com a do Inimigo v iraíTem, encorporados, fobre os noí^
íbs. Aquella natural inclinação, fe já naó he altiva vaidade, q;
os Portuguezes tem a feguir qualquer novidade no trajar , fes
com que todos os noíTos foldados ifnitaílèm aos Olandefes^
atribuindo a cótrafenhaágalátar ia, pó\lo todos nos chapeos. ^f ol^adefeshuf
femelhantes papelinhos,com o que Gonfundida a malicia.náoi '^'''■° °^'^^^^"F^
pode diitmguir os livres, dos condenados , & por eíté meyo^^^^^.^-^^-^ ^^^^
^úiz o ceo, atalhar aquelle dano, o qual o Governador josiôuffeyto.
Fernandes Vieira hia enfraquecédo, aconfelhádo daíbfpey-
ta, mas com tal cautela, que não podèraò os Eftrangeiros irti'
ferir a menor defconfiança: Cortou-lhe parte da força, man-
dando húa companhia de Olândeíes no íbcorro, que deu a
Paraíba; outra para o prezidio de Tejucupapo j & certo nã
rebeldia,& incerto na oeca^iãõ mandou,que em nenhuni ê*!^
contro pelejaífe o terço unido, fe iiao difperfo , & entr^teciP
do com os Portuguezes em forma,que de nenhúa forte rivef-
fem occazião, nem para a fogida, nem para a ofíenfa. ; i

"^9 EntreosCapitfães vivos do terço dos Eftrangeiro^
militava hum, chamado Nicolás ( Olandès de naçaó. ) Efte
tal, ou por mais ardilozo, ou por mais refpey tado , fe fes ca^^
beça da trayça6,& como em tal, fecomproméntèraõ todos^j
íiando-lne as difpofiçoés do intento,& as condições do pac- RatiJicaÕ o p.iSfo

to, com obrigação, que tudo avia de conferir , & firmar com ^^^^ à- outros^
^s do Concelho Supremo 5 o que fatísfes aviftando-fe comf^^^^^^^''^^^
elles alguas vezes,até fe coflcluk,3s: affentar â tray ^áo,ajui%-^f ^^/IvL^!^^

I!

43^ C^S7%I0TÚ LVSlTJm 1^45

dos no dia, no modo , & na parte: Em nove dó mez deNo-
vembrOjdefte anno,fahio do Arrecife,pella parajem dos Af-
foaados,JorgeGaíiTiaó( tirado do pofto de Comendor do
Rio Grande , para governar as armas Olandeías^ com mil, &
tantos infantes; & íem fer fentido , (feria ajudado das fmti-
nellas infiéis) fe embofcou de noite jiito ao Engenho de An-
tónio Fernandes Peíroa,aproveiitando-fe das cazas do Enge-
nho , que eftavaó hermas demtiytos tempos , para fahir da-
quelle pofto, a bufcar-nos no dia íegoínte , em que a Igreja
canta por vefporas^ o tranííto do Gloriofo Saó Martinho
Bifpo Turonenfe, cujo favor fes dia noíTo, o que era vefpora
íiia (os dias que fe exercitou foldado, v efporas forão , de to-
dos aquelles , em que refplandeceo Santo . ) Eftava por fron-
teiro naquelle fitio Pedro Gavalcáti de Albuquerque, o qual
alheo da pèrniciofa v ezinhança, mandou a dous foldados cã
hum Alferes,q ao romper da alva fahiíTem a defcobrir o cam-
po j o que fizeraó diligentes , fem acharem , nem ainda vefti-
gios de inimigo; feguro, que fem receo, os levou a paíTar pel-
ks cazas do dito Engenho, donde afialtados do Oládès,per-J
dèraó a v ida o Alferes , Sc hum dos foldados , mas o outro, a
qu em naó podèraó atalhar a fuga, defparando a arma , tocoa
a rebate, ao qual iacudiraó logo os Capitáts das eftancias vét
zinhas,queeraò António Borges Uchoa , Paulo da Cunha
jsíâpfahío o ml' Soto-Mayor, Joaó Cardozo, Francifcode Lisboa, Joaó Nu*»
píígo com todo o ues Vi£l:oria,& Joaó Ribeiro Villa-Franca,(todps fronteiros
fQáer. ^g praça dos AfFogados ) os quaes afligidos de fuás compar

nhias, fe oppoferáo^ valerofamente > ao efquadraó inimigo,
que confiado no poder, & no paâo, avançava furiofo.
: , i p ] Diftava o noífo Arrayal,do íitio da peleja, pequena
meya legoa: Õu vio-fe nelle a mofquetaria , & fervio aos noí^
fosGovernadorcs de avizo,&: de rebate, para tocar arma, &
fahirem com toda a infantaria, que os pode feguir: Tanto, ^
chegarão ao lugar do cófliâro, ("aonde alguas bádeiras do ter-
ço Eftrangeiro tinhaô acudido com os Capitães, & foldados

ié4^ fAXrELLir(IlOVll. 453

te. Feitas cm hum corpo fcparado, cmprcgavao as cargas cm
os Portuguezes, que engolfados na pendência, nem atendiáo
á divizão do coipo,iiem á deíconformidade do animo. O Sar-
í^entoMayor António Dias Cardozo ,quecom vigilância
incanfavel, & militar deftreza tudo reíiftava ,& tildo aver-
tia, vio, que aquella partida de Olandefes cobria a gente do
Capitão Paulo da Cunha, que com mayor empenho, que ro-
das, carregava o Inimig03& mais atento ao fcguro alheo, que
Uo próprio perigo,a focorreo logo com a companhia do Go-
vernador Toaó Fernandes Vieira, mandando aos Olandefes, ^ fi ^^^l^'[^'^J^
que fe retiraífem atraz, diligencia cazual , que atalhou a tray- ^, ],,,^,,^i.jciue
çaó,naquella hora j & que outra contingência, não menos fa- nao conjmnrAo.
voravel,acabou de cortar, &foy, que o Capitão António
da Sy! va, que com a fua tropa,&: as de outros moradores con-
corréra5,chamados do rebate,cobriraò de maneira os traydo-
res,que fem manifefio rifco de ferem degolados , não pode-'
riaó fazer,a menor acçaõ de ínimigosi

II Já o Framengo a efte tempo, fangrado do noffo fer-
ro,afloxava na períia,que a trayçaó concertada lhe enchia de
cfperanças,&nosfoy]argandoocampo, para ver femudan- ^
cio de fitio, & nós de formajfe facihtava àos traydores a exe-
cuçaò do promeíidojporém tanto,que a experiência lhe mo-
ftrou, evidente o dano,& fem fruito o defejo,allargou o paíTo
á retirada, até fe cobrir da artelharia de fuás Foríalezas,(faI- AUÕ repara è inl
tando ao cuftumado eftilo , que era recolher-fe logo a éllas) ^^^^'' na perda , f
porque õ detinha o confelho de faa efperança.Húa larga ho- ^ "^-^^ ^ ^^^^"
ra fúftentoii o combate; fervio-lhe a Contumácia de irritar
noíTa paciência de modo 5 que íèm reípeyto ao perigo , o en^r,
veftiraò á efpada, provocados do exemplo de feus cabos má-
yoies, que fe encorporavão com elles na vanguarda [temeri-
dade que fó podia achar de culpa no furor. J Cortava fem re-
|)aro o ferro PortUguez , &aconfeIhado o Frafflengo de feu
cfírago, fe recolhêo dentro da cava da Fortaleza ( era a dos
Aífbgados. JNão perdeo occaziaõ a vingança: Vio-nòs a tiro
a Fortaleza,& com cargas de baila miúda, ilos fes menos da-
no, do que fe imaginava * Com rifco defcoberto, nos retira-
mos, fervindo-nos de remédio o mayor perigo, que foy o fo-
ccgOj & forma da retirada cfcuzando os noílòs Governado^
t^fcíi^ Oò fes

1

CJST^WTO LUSITJnp

1645.

fes o deíàtinojcom o valeroío acorda deíeêncorporarem na
ultima fileira da retaguarda^

i 2 Foy efta occaziáo a mais arrifcada , 8c a melhor íuc--
eédidâ de todas j quantas v io aquella guerra, porque com pe-
queno cu ftojfe atalhou irreparável dano . Sete homens nos
matàraõ, entre elles o Alferes Manoel de Souza filho do Sar*
gento Mayor da Bahia j& ferirão á trinta & cinco, os de mais
conta, foraõ os Capitães Paulo ài Cunha , & Pedro Caval-
canti j o A;udánf e Manoel de AbreU, (nefi:a occaziio,gover-
ParticuUndddés "^va a companhia dá guarda de João Fernandes Vieira,cu;o
de fia occa&uo. Alferes de propiedade, íe não achoU nefte encontro , por ef-
tar enfermo) os Alferes reformados An tonío Dias Sa ntiago,
& André Rodrigues, ao qual deu hiia baila nos peytos , que
efmoi^ecida lhe cahio aos pés mais favorável, que nociva [ fo}^
cazo,& pareceo milagre.] Como tambê o pâreceo roçar hiiíi
balia de peça a copa do chapeo, ao Mefi:re de Campo Andrcí
Vidal de Negreiros, fem mais dano, que hum leve afíbmbra-;^
mento dos olhos, q cauzou o ar do pelouro j para queá olhos
viftos fe publicaíTe, que dos mayores pengos , fahia mais ay-'
rofo. Não com menor eípanto deixou a todos,o fahirem fem
lezão de ta5 arriícado choque, o Governador da liberdade
Joaó Fernandes Vieira, & o Sargento Mayor António Dias
Cardozo, difpondo como Capitães, & ferindo como folda-
dos, por entre nuvens de bailas, todo o tempo do conflidoj
valor, que a todos os mais cabos,& officiaes deu motivo para
a imitação, & para o aíTombro, quenaquelle dia cauzara»
aos companheiros.A nenhum deixou afama de fingularizar
o nome,porque em nenhum achou lugar a enveja, para o ef-
curecerjporém,tiverão a fortuna dos beneméritos, aos quaes
a falta do premio, tira íempre o nome jiendo, que o mais cla^*
ro de cada hum, he o que lhe dão fuás obras . Forâo tanto de
todos, os claros defte dia, como o foy o perigo ; & de nenhii
deixou de fer a gloria: A que ncfta adquirio O Padre Fr. Joaõ
da Refurrcição lhe teceo dobrada coroa excedendo-fe aífi
mefmo Religiofo,&: foldado:Scm temor das bailas , confefc
va os cahidos j Sc fazendo-fe temer , os bufcava entre os con-
ífarios.

1 3 Deixou o Inimigo na campanha trinta mortos , qnc

naò

■

y!>| AJiMiffi ,

(

iê4f ^J^EhLlV\0ni. '43^

naõ pode fetír:ir, fendo efte feu mayor cuidado ; & com elle
rctiroii,& efcondeo muy tos maisjos feridos foráo lem luiirse-
ro.pani a noticia. Na retirada foy mayor a perda , pornue , ^ .

erao os golpes da eípada mais certos, que os dos peiouK)>:Us , j^^j^^ i^
mny tos,que atirava o Inimigo,nos não deixavaõ ter conta cÓ iy aparte^
feus mortos5& foráo muy tos homens de conta: Com e]les,&
grande copia de feridos, fe paífaraó para o Arrecife, aonde
iiiorrèraõ tantos das curas , como das feridas. Na paííagem da
Fortaleza dos Affogados para o Arrecife , os efperou Henri-
que Dias de embofcada , & com os feus foldados os fangrou
de maneira, que leváraó tanto, que chorar na defpedida , co-
mo na peleja. Affi pagou oOlandès atrayção, que ordio:
Fruito merecido ,& não efperado, he ocaftigo dotraydor.
Obrigados nos deixou o ceo, a conhecer. mos por data fua, a
viíi:oria,que o he,a que fe alcança do traydor , & da trayçaó.
Naó a deixou avaliar por grande noíTa ignorância, porque fe
naó deixou ver entaó fua maldade , como defpois a manifef-
tou o tempo em diverfa occaziaó: Ainda que a todos efpan-'
tou a nota , cora que os traydores faltarão á fua obrigação,
fcm que bafiaffe toda a diligencia de feu Meftre de Campo
TlieodofioEílrater, para os reduzir de fua contumácia j&
í'opoilo,que no femblante de cada hum, fe podia lèracauza,
iiaò a podia ver , fe naó, quem fofpey taífe o motivo.Mal po-
de conhecer acara do traydor, quem nunca vioa cara da
trayçaó.

■ 1 4 As diligencias de encobrir o peccado, faõ as primei-
ras,que manifeftáoo deli6to:A cobardia,he condição infepa-
ravel da culpa. Tem para íi o criminofo , que a defatenção o
olha com reparo . De tudo fe receavão os Eftrangeiros com-
plicesna trayçaó ordida,& muy to mais fe temião do tempo,
manifefto de fcgredos em toda a idade: Cinco dias defpois da
occazião referida, receberão o pagamento ordinário : Seu re-
ceo lhe fazia crer, que era diííimulação , a confiança , & que os "Eflrmgúros
com as aparências do íeguro, lhes efcondião o laço . O Capi- traydores trcitão
tão NicoIás,& outro do mefmo terço, fe deliberarão em buf- ^f fií^^ recc^fos
car meyo, que apuraífe o defengano , & preveniífe o fcguro. ^y ^^^'^^{/y ^K
Propoferão ao Governador, & aos três Meftres de Campo,
que os foldados de fuás companhias (corridos da catjza , que

Oo 2 no

tíò fucçeíTo paíTado tivera a injuria , para os acéuzaí de fra?-
cós) os períeguiáo^ & importunavaõ a que lhes procuraíTetii
hõa occaziaô tal, quç na opinião de todos os reftauraíTe na
honra perdida ^& que fe não devia perder, a que o tempo
lhes dava, porque íabião de certo ^ que o Inimigo avia de
íahir a pfoveríe de àgoa doce ^ & determina vaó erperalla
de embofcada, & não deixar Olartdès com vida, ou pei??
derem-na todos na occafiaõ, para o que não queriáo de Tuas
Senhorias mais, que a licença. Os Meftres de Campo com
a credulidade de generoíbs, lhes concederão a fuplica. Po-
rém o Governador , ou perfago , ou prudente aflentou con-
fígo , que a petição tinha mais de engano , quç de zelo,
.&foyde contrario parecer , mas fogeitou-fe aos votos dos
mais, perfuadido do Meftre de Campo Theodozio Eftrâ-
ter , declarando-lhe elle o fundamento de fua confiança ,
que verdadeiramente parecia feguro , a quem não alcan^
cava 5 trrar-fe a confequencia de hum principio erra,-^
do.

t ^ Sopunha o Eftrater , que fe no feu terço ouvefe
fe alguns combanidos, os mais não deixarião de fer fieis
foldados , & que fazendo elle a efcolha dos que aviaó de
levar os dous Capitães, lhes cortava os intentos, ( fe aca??
to eraõ traydores os ânimos. J Mandou formar o terço, 8c
aberto em duas alas o efquadraõ, notando os homens, que
o feu Mefire de os dous Capitães ãpontavão , a todos efcuzou , & lhes per-
Campo.que o fof' ^^^^çy fcíTcnta & ttcz Eftrangeiros forteados, que de todas
ry a, je acaute- ^^ companhias efcolheo , Crendo, que defta forte, lhes da-
va foldados fieis para a empreía, Senão companheiros para
a trayçaó: Mas foy a fopoíição falfa, como logo dirá o fuc-
çefíb. Pedirão hum Ajudante Portuguez,que lhes franqueaf-
fe o tranfito pellos prezidios de noífas eftancias , & naquel?
las por onde paíTáraõ , cuidado para os focorrerem no con-
flito ^ oqvi do o rebate ;& marcharão tomando o caminho
do Buraco de Santiago , no qual o noíTo Ajudante os dei-
xou , como levava por ordem , & fe veyo dar conta do que
paíFava , a feus fuperiores . Emboícàraó-íe os traydores entre
os mangues , efperando pella baixa-mar, para que nella defíe
o Rio Beberibe vao á paíTagem j & tanto, que chegou a hora

fe

ié4'5 TA^El.LirilO VIL

fc pofcrão todos da outra banda,& foráo matcbando por en-
tre as Fortalezas do Inimigo, tocando caixa, & dando lalvas,

até as portas do Arrecife, fahindo dclle os do Supremo Con-

,,f ,,, 11» -í/r to^cm duas com'

çelho a rccebellos, para que o exemplo da honra convidalle J^^^^ ^^ ^r

á imitação da perfidia!_Particularidades referidas por húNe- trangeiros para o
gro Mma, que na tarde do mefmo dia fogio da Cidade Mau- Arrecife.
ricea para o noíTo Arrayal , & que defpois ouvio a guarnição
daquellaseftancias, conhecida na mercê que Deos lhes fize-
ra, li vrando-as do perigo, que lhe podèraó occazionar inimi-
gos taó de caza.]

1 6 Aíli como o Governador da liberdade recebeo eíla
noticia, fes as diligencias poíílveis para fe certificar nelia,an-
tes que fe devulgaíTe: Ordenou aos Capitães vezinhos, que
por Toldados práticos mandaíTcm defcobrir a mata pella cir-
cunferência do Buraco "de Santiago,& fe por algúa parte del-
ia fe achava raílodas companhias Efi:rangeiras. Executou-fe publkíi-fe âtuy
a ordem,& não lè defcobrio pefiba algúa.Comunicou o Go- f^Õ.
vernador o fucçeíTo com os Meftres de Campo André Vidal,
&:Martim Soares, & concordarão, em que fedecIaraíTe ao
Meii:re de Campo Theodozio Eftrater : Incrédulo o achou
a nova. Contra a verdade da noticia inftaváo os argumentos
da rezão,& parecia-lhe impoflivel,quc le paíTaíTem ao inimi-
go homens, que de propoíito efcolhcra a cautela , com a fiã-
ça dos penhores, deixando entre nós mulheres, filhos, efcra-
vos,& fazendas condenados á fatisfaçaó da divida. Certifi-
caraò-no do faâo, & da opinião errada, dizendo-lhe , que o
não chamavaó, como a Reo, fe naõ como a Juiz,a quem per-
tencia caftigar o deliâo ; &lhespedia6 fentenceafíè ^<^^^'í^ cometent aTheo-
pcllo merecimento do proceíTo, & quando a piedade nâõ do^io Eftrater o
permitiíTe caftigo adequado , ao menos fe lhe deíTe remedi© cafliç;^o , é' o rc
opportuno: Aoque refpondeo confiado,&confuzo,como ^^^^''*
fie! & corrido: He taó obominavel a culpa , que fó a authori-
dade de voíías Senhorias a pode fazer crehivel , & a duvida-
rão os olhos, ainda quando a viraõ mais atentos, Foraó com-
plices RÍlenta & trez foldados , que efcolhí , com induíhia,
entre os de cinco Companhias de meu regimento ; infalivel
he logo,que cm todo elle naó ha homem,que fiel feja:As leys 5'
damilicia coadenão os delinquentes a morte irrcniiffivel^

O03 não

ii >M,'Í

ÃST!$lpTO WSITãNO '':t645

5> não porque feja pena baftante , fc não porque remedea , ain-
57 da que não íatisfaça5Sç aííí ;ulgo,que todos morrão pello cri-
5> jncj pois a todos eftá provado o delicio , & que não irente a
5? efpada, minha própria peíToa, pois aceitei íerCabo de tal
5í gente, Creceo a trifteza com a paixão, & atalhado o difcurfo,
fe recolheo para fua caza com o feu Sargento Mayor Fran-
cifco de Ia Tour, tão occupado do pezar , que fe v iverão pa-
ra o Tentimento, não vi vião para a comunicação.

17 Semdilaçáomandou João Fernandes Vieira formar
os terços de noíTa milicia,3£ dentro delles o dos Eílrangeiros;
a todos os quaes fe tomarão as armas;dando-fe no mefmo té-
po efcrutinio a fuás cazas, em as quaes íe acharão, não fó cia»-
ros indicios,fe não evidentes provas,de que todos erão com*-
^ ^ plices na trayçáp.Fizerão-íe avízos á Pai-aiba,^ a outras par-
deração ^^^5 aonde alguas companhias de eltrangeiros militavao, para

que com elies fc executaíTe o mefmo, & fe remeteíTem armasj
& foldados ao noíTo Arrayal; os quaes brevemente chega-
rão, & com mulheres,& filhos, (divididos em troços, & com
guardas) fe mandarão para a Bahia á difpofi^aó do Governa-
dor do Efiado António Telles da Sylva*Nãô comprehendec^
^ «ftalevaamuytas Eftrangeíràs Gâtholicas Romanas , que ar
' padrinhou a piedade , obrigada de fuás petições, nem tam-
iem áquelles homens,que a mefma rezão favorecia . Aos que
o Governador João Fernandes Vieira,tinha dado paíTa-por-
tes,[no principio da guerra para viverem entre nós ,& que
íoccupados da cultura de íuas fazendas não tiveraõ parte na
tray ção ] valeo a juftiça, para os naõ expulíarem ; ainda da-
quelles, que nas praças foraõ rendidos, & que fe lhe não pro-
vou o crime,ifentou a neceflldade aos Surgioés,& a dous En-
genheiros , que trabalha vaò em a nova Fortaleza . O Meftre
de Campo Theodozío Eftrater, & o feu Sargento Mayor
Franciíco de la Tour, andados alguns dias, alcançarão licen-
ça para fe paíTarem, a fcrvir na Bahia , aonde o Governador
Geral do Eftado os recebeo com agazalho , & acomodou cõ
honra,nos mefmos poftos, em que tinhaõ fer vido,dandQ-lhes
hum terço de Portuguezes.

, 18 Com eftaforçofa expedição, ficarão os Portugue-
ses livres do perigo, & doreceo, com vivos defejos para a

vin-

1^4^

^AXTE 1. L1V(^ VIL

459

55

3)

V ingança , & animados brios para foprirem o defraudo dós
com oanhciros. Todos íentirão a injuria recebida doOlan- f^'!^ -Jjin e
des na induíirioía malícia, com que perluadéo a trayçaóaos
Eílrangeiros,que entre nós militaváo-& hum Toldado diícre-
to lhe cortou, ao inimigo, a vingança, do mefmo pano da of-
fenfa.Eícreveo aos do governo húa carta fem nome com apa-
rentes avizos, quafi em femelhante forma, Illuftres Senhores, ^^
quem me aviz3,guardarme quer. Naó imagine voíTas Senho- ^^
rias,que entre os contrários Ihcsfaltaó amigos: A violência ^^
tem dominio nos corpos, porém náo nos animos^Sí os afFey- ^^
coados fervem, no que podcm:0 meu, empenhado na repu- ^^
tacão de fuás armas,& confervaçaõ de fuás praças,lhes relata ^^
o perigo, a que hLia,& outra couza eftá expofta . Os Capi-
tães, & foldados Framengos, que neíTa praça entrarão a titu-
Jo de fogidos, foraó com deliberação de traydores,obrigados ^,
do bom trato, q entre nós achàraõ , & das promeíTas de Joaõ ^,
Fernandes Vieira j levão ordem do meímo , para corromperé „
comellas, & com donativos aos Capitães, & foldados, que \j,
fervem a Companhia. O mo4o da paíTagem moftra , que lua „
ida naó foy furto, fe naô padoj & fera deígraça fobrc defere- „
idito perder-fe o Arrecife por fobcja confiança , quando a „
guerra eníina a fiar menos da malicia,que da natureza:Naó fe „
firma o aurhor do avizo : Sabe,que feu zelo dirá a voífas Se- „
nhorias , qual he feu nome . O engenho , que teve induftria, „
para formar o engano, teve ardil para lançar a carta em fitio,
aonde logo foy levada aos do Concelho: Em todas as rezoés
delia achou fundamentos a duvida; &como a credulidade io^^^^''^»^^^'"''
defcurfa va, náo avia circunftancia no fucçeíTojque não pare- ^^ ' ,r"/'^^''7-
ceife prova do avizo. Deitarão eípias pello Arrecife, que ob- ^^"^ , f " ^°
fervaífem os movimentos dos malílnados: Aconteceo encon-
trar húa efpia a dous , em húa taverna , com outros naturaes
(náo companheiros, fc não conhecidos) & a pratica fobre q
ameuda vão os brindes, foy a ordinária entre foldados : Que
os Portuguezes eraõpontuaes nas pagas, fartos nas raçoér, ^

corte? oés no trato;em cujo ferviço era certo o proveitOj^: â-
liviado o trabalho: Deraõ porteftemunha as mãos cheas de
patacíis,que tiravaõ das algibeiras j a farinha , & carne frefca,
que traziaó nas mochillas. No mefmo ponto foraó os do con-

O04 Çelho

àít no ardil do
engmo.

440 c^sr^ioro LvsiTji>io 1645

çelhoíabedores detudojenformou-fe a fofpeyta, com o rc-
ceo, &fahio provado o foborno,& os dousjfentenceados á
forca pcllo imaginado delido: Aos dous Capitães, & aos ou-
tros foldados prenderão ,& fem duvida paííàriaó todos pello
mefmo fuplicio, fe hum tray dor do noíia Arrayal, rtáo fizera
avizo aos do Concelho, da expulfaó dos Eftrangeiros , que
entre nós militavaõ, por fentença de inconfidentes . Muy tos
Portuguezes o deviáo fer no animo,quando avizos^encontra-
dos achavaó credulidade nos Inimigos.

1 9 Nada pinta o temor ,que naó feja ao v alente . C om
hiia leve fofpey ta defconfiou o Framengo de trinta France-
zes,que entre a mais guarnição aífiftiaó na Fortaleza dos Aí-
fogadosjperfuadindo-Ihe a própria imaginaçaó,que avindos
com os Cabos a queriaó entregar aosPortuguezes.Naó fabe-
mos o motivo , foubemos, que por deminuto , &faIfo o per-

imAginaçao do ^^q ^^g ^if^^ ^ memoria,& fó pellos efFey tos o alcançou o dif-
Inimigo jj'^*^^ curfo: Prenderão a todos, tratcáraó quatro,enforcáraó hum;
nenhum confeíTou no tormento, hum fó condenou ojuizo.
Tudo referio hum Negro Mina,que nefta occaziaõ fe paíTou
para a noíTa parte. Eíte falfo receo lhe cuftou ao inimigo bc
caro,porque foy a cauza do dano, que fe lhe íeguio. Obriga-
dos da deícottíiança fobre-dita,mandàraõ os do governo húa
partida de infantaria , para renderem a todos, os que guarne-
ciaõ a Fortaleza dos AfFogados , por inconfidentes : AíTalta-
raõ-nos os Negros de Henrique Dias , matáraó doze, fogiraõ
todos, pagando ascuftas do pleyto,com perderem quanto
traziáo proprio,& alheo,porque levavaó toda fua roupa , &
muy ta boa,& fina de particulares para fe lavar na agoa doce,
pellos convidar o íèguro da occaziaõ^ & foy tanto fcu enga-
no, que na confiança bufcàraó a perda. Providos de. roupa
branca, com abundancia,ficàraó defta vez os foldados de Hé-
íique Dias: Cativarão trez Olandefes, que aprefentados aos
noíTos Governadores, callàraõ a todas as preguntas , &: foraõ
condenados a perpétuos grilhos.

20 Com hum mefmo cuidado, fe acautellava, & deíco-
bria o inimigojporém a ouzadia dos Portuguezes rõpia pella
difiiculdade, tanto que lha moftrava a occazião.Perfuadidos
por Henrique Dias , fe determináo os noíTos Governadores

cm

— ilililt*' ik

r

cm ferir ao Olandès na parte mais fenfivel . Cuftnmava fahir
da Fortaleza dos Affogados a receber,& comboyar os focor- TfTtLuTZ
ros, que do Arrecife lhe mandavão todos os fabados , para o jfogadoy^épZ
fiiílento de toda a fomana , & de todo o prezidio ; nefte tem- deofocorro.
po com mayor numero da rações , porque era mayor o nu-
mero dos foldados, pella defconfiança referi da. Mandarão-fe
prevenir as noíTas eftancias de gente , & de vigilância, para q
por qualquer parte, que o Inimigo determinaíTe ofocorro,
lho cortaffe a efpada: Difpofto já o afíalto,fe teve conta com
a fogida, (como ordinária no inimigo fenáo duvidava )&
para cortar efta fe embofcárão os mefinos Governadores
João Fernandes Vieira5& André Vidal de Negreiros junto á
Fortaleza, com intentos de a entrarem de envolta có os Olá-
àtÇçs^ na occazião, que os recolheíTe deílroçados , & perfe*
guidos. Amanheceo o fabado efcolhido , & o Framengo naã
íàhio no tempo cuftumado , ou porque colheo algum indi-
GÍo,ou porque algum outro incidente lhe alterou a hora, fe
naó com duas de Sol, & com fufficiente efcolta.Deu nas em-:
bofcadas de Henrique Dias; perdeo a mayor parte dos vive-
res: Deixou doze mortos,& trez cativos ; & deftroçado com
leve refiftencia , fogio : Naõ foy feguido pella multidão das
balias, que de todas as Fortalezas inimigas cruza vão o ar . O
íangue que ficou na campanha, fes certas as feridas, porém
incerto o numero. Voltou HenriqueDias para a fua eftancia^ •
aonde no mcfmo tempo chegarão João Fernandes Viera, &
André Vidsl de Negreiros , com a fua gentcjos quaes vendo,
que o Inimigo có a fuga fe defviara do laço , deixarão as em-
bofcadas , & por entre o mato fahiraõ ao lugar do conflito
defcjofos de defembainharem as efpadas ; diligencia, que fe
não chegou á concurrencia do combate , feyvio á congratu-
lação da viâioria.

2 1 Há fucçeíTos tão eftranhos,que não fabe o juizo hu-
mano deixar de os atender, como prodigios : Muytas vezes
fe repetio nefta hiíloria o nome de Sebaftiaò de Carvalho , q
-eícondèramos, fe fora poífivelj mas como ^ As imprcníTas, o
íem divulgado, & outras penas , primeiro que a noífa, odef-
cobriraó : E no que efcre vemos, feguimos memorias , & não ^^^^ elírmhol
fabricam os fucçeíTos . Nap kízx menos lembrado o mthot<
^-:^ da .

44^- C^ST(!(10TdWsiTjNõ 1^45

ida ruina, qúe o da reftauração: A fama,ígualmente v oa com
as azas da generQÍidadcj& da vileza . Foyeíle homem o que
revelou aos Olandefes a primeira determinação da liberda-
de, ficando encarregado nomayor cufío denofíà reftaura-
ção: Bíiícon-o o fegredoj como á fiel , & ;á o achou traydor;
como fe por falta de occaziaõ deixara de o íer até aquelle tê-
po: Inimigo da patria,o mais pernicioíb , que todos os inimi-
gos delia, porque o Inimigo conquifta, o traydor entrega.
Deixou o íobr e-dito hoiuem húas cazas feitas de novo, efpa-
çozas5& bem obradas^ de pedra , tijollo , & cal as paredes, &
i pilares delias j efcadas, & portaes de pedra lavrada j os alicer-
íesfolidos, os madeiramentos firmes (edifício, em que per-
manecia a memoria de feu author , chamadas cazas de Sebas-
tião de Carvalho. ) No tempo, em que fuccedeo,o que cfcre-
veraosjfeapofentava nellas o Capitão Paulo da Cunha, o
qual,na occaz ião q ae acabamos de referir, ouvindo o eftron-
do das cargas,& artelharia , partio com a gente de feu prczi-
dio para a parte,donde o chamava o combate 5 a diftancia do
caminho lhe não deu tempo achegar no da pele;a, & con-
tente com a relação do fucçeíTo, fe voltou logo para o feu
quartel. Trez horas de tempo lhe poderia gaftar a detençal"
Bufcou as cazas com os olhos,& fó as vio com a memoria, re-
duzidos os materiaes a hum cumulo de carvão , & cinzaj ( af-
■* fombrado de que achaíTe o fogo igual obediência nasmadei-

ras,& nas pedras ) tudo confumido taó fem tempo, que a eft^
tar a matéria difpofta , & naturalmente fogeita ao fogo , não
podèra confumir o incêndio em trez dias , o que gaftou em
trez horas. Entrou a coníideração a fazer juizo do cazo , &
todos o avaHáraó por caftigo do ceo, porque fe não deixou
ver o caftigo,re não pcllo eftrago:Moft;rando efte,que aquel-
le fe ofFende tanto de hua trayção ingratajcomo de húa tor-
peza infame.

2 2 Nefte tempo chegou á Bahia bua caravela de focor*

ro, & nella húa companhia de foldados, que traíía do Reyno

para guarnição da mefma praça j íèu Capitão de mar,&: guer-

chega à Bahia ta, Manoel Ribeiro: Para que da Bahia fizeíTe viagem a Per-

híia caravela do nambuco, a proveo com abundância, & deípachou com bre-

^^y-^'-. \idade o Governador Geral do Eftado António Telles dá

Sylva,

1^45 ^AXrEl.Lir(^ VU. 443

SyIva,com exprefía ordem-, que não podendo tomar o porto
de Nazareth arribalTe á Bahia. Tinha entendido, que bufcá-
do qualquer outro porto daquella cofta, daria nas mãos dos
Olandelesj &parecia-Ihe, á fua providencia , infofrivel def-
graça, fazer auxilio contrario, do focorro amigo. Largou pa-
no, o Capitão Manoel Ribeiro^& navegando na direitura do ^ , ^
porto coníignado, aviltou trez nãos Framengas, qnelhede-^J,^^^,^^^-^
raõ caça trez dias,no fim dos quaes,fe achou na altura do Por- da de focorro a.
to do Calvo; arribou a elle, tomou fala dos moradores,& co- iernambttco.
nhecida a opportunidade do focorro , fe deliberou em faltar
ao preceito, por não faltar a neceíTidade. Entrou na Barra
grande; deu rebate de fua chegada com húa carga de mofque*^*
taria; acudirão os moradores daqUelle deílrido , que juntos
com os foldados do focorro,& a géte do mar da caravela, dei^
táraç toda a carga delia fóra,& o Capitão , & foldados para á.v
comboyarem até o Arrayal: Defpachou a embarcação na fe*
guinte noite para a Bahia, aonde chegou a faívamento, como •
também ao Aí ray ai, os mantimétos, munições ,& roupas do
focorro^em húa,&: outra parte foy louvada a refoluçaõ. Naõ^
cuftuma õ mundo arguir a defobcdiencia , do que favorece i .
fortuna; fentençea pello fucçeífo,& naó pella culpa; porquiê
a tira da memoria, a dita. " '

23 Entregou o Capitão Manoel Ribeiro o focorro aos
noíTos Governadores,& com elle diverfas cartas dos Glande-*
fes prifioneiros,que eftavaó na Bahia (efcritas,& enviadas cd
beneplácito do Governador do Eftado.) Entre ellas vinha6
outras remetidas ao Concelho Supremo do Arrecife^húa das ^^^^ eí • "
quaesera de Henrique Hus, outra do Capitão Mayor dos oUnàefa rUi»
Ijidios;& de feu Sargento Mayor,outra. [Lembrado deve ef- dos.aosdo supri"
tar o Leytor que foraó eftas as principaes peífoas, que fe ren- f^o Concelho.
dèraó na occaziaó de Dona Anna Paes.] Teye noticia deftas ,

cartas. Dona Jeronyma de Almeyda moradora no Porto do
Calvo, & entendido,que fe aviaõ de maiidar ao Arrecife, en-
viou com ellas hua para feu marido Rodrigo de Barros,(pre-j
fo defde o principio da conjuração da liberdade;& nefta oct
caziaõ muy to enfermo) com hu focorro de dobrões ; & duas
capoeiras de galinhas de refrefco, rogando ao Capitão Ma-
li oei Ribeiro lhe favoreceíTe o intento. Defejava João Fer-
nandes

m

fdlo

444 c^sr(!Qoro Lusirjm 1^45^

nandes Vieira faber o que no A.rrecife fe paíTava , veo-Ihe a

occaziáo,como lha podia pintar o defejo : Mandou preparar

^£110 jjii ante ^^ ajudante Cardozo, (Na5 tivemos noticia de feu próprio

CaráoToJe mm- \ ^ . r l - -r rr •

dÁraõ as cartas i^o^^e) íogeitOjCm quem íe achavao os requnitos neceííarios

para o negocio, & para o pretextotChegou ao Arrecife, foy
bem recebidoj ainda que com a cautela de entrar cõ os olhos
cobertos:Entregou as Gartas,& pedio licença para entregar a
Kodrigò de Barros o refrefcoj & o focorro, que fua mulher
lhe remetia. Mandarão ao Secretario do Cóçelho Supremo,
que hofpedaííe ao Enviado^ em quanto o naó defpachavaõ.
Náo faltou João Balbéque, (efte era o nome do hofpedeiro)
nem á cortezia, nem ao regallo, os dias que o Enviado fe dq-
teve:Nelles o vifitàraó todas as mulheres dos priíioneirosjde
o q nfTâ no Ar* cuja liberdade fe tratava nas cartas, alegrando a converfaçaõ
vecife. com fucceíTi vos brindes , Cordinario demonftrador da bene-

volência eílrangeira } a que não pode refponder o Ajudan-
te, fem a^oar a alegria , porque não bebia vinho. Então lhe
diííe Margarita Malearmes mulher de Henrique Hus,que e]>
ta va em grandes obrigações ao Governador Geral doEftâ-
do António Telles da Sylva,pellas muytas mercès,& favores,
que feu marido delle recebia,( como nas cartas lhe relatava)
encarecendo o generozoeftilo, com que tratava a todos os
prifioneiros 5 grandeza de animo, pello qual ella media a da
^ peíToa, cujo valor não alterava o Joque de hiia , & outra foi>
tuna; fahindo affi, taó claros os vivos de feu fangue , que ne
a miferia os efcureciajiiem a profperidade os realçava.

24 Lidas as cartas em concelho, & confiderada a maté-
ria delias acharão , q não convinha refponder a ellas, por en-(
tã<>j & com efte acordo, mandarão dizer aõ Enviado, que a
compl ícaçao de negócios , com que de prefente fe achavao,
empedia a brevidade de feu defpacho, ( ouçafe a malicia, c5
Sofpeytao inlmi q^e imaginarão alcançar , fe o Enviado v inha, ou não vinha
go, que vay por p^j, ^^pj^ -^ ^^^g que,fe as ordens, que trazia, lhe permicião a ^
detença de trez dias, efperaíTe , & as levaria; quando não,
fe poderia voltar, por não exceder os termos da licença, cerr
to de que elles, ao tempo apontado,não faltariaÕ com a pon*
tualidadedarepofta-.Naõfelhcefcondeo aonoíFo Ajudan-
te o intento da condicionaI,& niuy to ao defentendido refpòr

áQOy

ejj/ia.

I« ftl. I[

dcOj que os Toldados náo ferviáo como quer!íiõ,re naó como

lhes ordenavão5que trazia o prazo tão curto,qLie náo paílà va , .

de hum dia5& que aíTi lhes pedia licença para lè voltarj & jii-

tamente para poder comprar hiías plumas, de caminho, por

rezão,que delèjava mu yto<,que íuas Senhorias o conheceííem

por íeu obrigado, nas occazioés que deíTe o tempo. Diííimu-

làraó os do governo a incelligencia , com os aplauzos da ou-

zadia: Saõ as palavras o roí to do coração, & viraó ocoraçaó

do Ajudante nas pa!avras:Oqua! comprou as plumas, & com Centile&a^tom f

cilas no chapeo fahio do Arrecife: Poucos paffos fóra ádisf^^^/p^^^ià' ^'

trincheiras vio no caminho hua carta com o fobre-efcrito em jf ^^ caminho

lamengoj delconneceo a ungoa , & a letra , mas nao duvr- *' ^ •^

dou,que para fer achada , a íizeraõ perdida : Chegou ao Ar-
rayal,repetio o que lhe avia fuccedido; & o qUe tinha obfer-
vado; & entregou a carta: Diante dos Governadores , & Ca-
bos mayores, íe abrio publicamente: Acharaõ-íe debaiico da
primeira capa duas gazetas impreílàs em lingoa Framengaj &
húa carta com fobre-efcrito para o Meftre de Campo Theo^
doíio Eftrater^ que fe lhe entregou , & elle leo em voz alta;
cujo arguméto fe refumia,em o afrontarem com apelidos ig-
nominiofos, dando lhe em rofto com a enttega da Fortaleza
de Nazareth , & com fer traydor aos Eftados , á pátria, & á
companhia, fervindo fem pejo, aos inimigos delia 5 & outras
couzas defte lote; porém efcrito tudo em fraze taó barbara, q
igualmente enfaftia va com o eftilo, & com o aíTumpto: Que-
ria o Eftrater defpicar-fe, como fentido, mas os noíTos lhe a^
confelhàraó, que fe vingaíTe, como difcreto * Com a difíimu-
laçaõ da injuria fe defpreza o author da demafia.Por Alberto
Gerardo, que fervia de lingoa,fe mandarão ler as gazetas: Na
parte dellas,que nos tocavaj eraõ táo evidentes as mentiras^
que fe julgou compofiçaó da ignorância, todo aquellc artefi-
cio da malícia*

- 2 5 No porto do Arrecife eftavão furtas, nefta occaziaó^
muy tas náos Oíandefas. Dous foi dados noíros,fi lhos de Per^
nambuco fe oííerccèraó ao Governador da liberdade para as
queimarem;& diziáo,que feria fácil atear-lhe o fogo,&: muy-
to poíFivel confumilas o incêndio , fe o inimigo alheo do in-*
tento, f^ não prevenifle para atalhar o dano . Não paíTou â

Pp no-

w,

44^

CAsr^ioro lusitjno

■1^45.

noticia a tercei rojSc feguros no fegredo, de quem lhes dava a

licença, fe aparelharão com tanta caiitela5& prefteza, que ti-

p^^/o ,a .os mj ^^^^^ Q tempo á curioíidade,& á fofpeyta.-Em hiia ianpada,q

os voem foço . -o r ir-V"^ , ' ^ .^'■

hm nokejs nhos tomarao na Darreta , le embarcarão ( com todos os matenaes
neceíTarios) nos primeiros de Dezembro: Favorece-os tanto
o efcuro da noite , & o furdp do remo , que fem ferem fenti-
dosjfe acha'raó entre as náos inimigas: Efcolheraõ entre todas
as duas mais alterofas [ porque começafle o dano pello mais
feníivel] em cada-qual pegáraó hum arteficiofo cópofto dos
materiaes mais obedientes ao fogo; que ateado nellas, come->
çáraó a arder com tamanhas labaredas, que as via o efpanto,
com os olhos da perda, primeiro , que fe lembraííe do reme-
dio,que pedia o perigo dosniais navios. Innumeraveis bar-
cos fahirão a atalhar o dano,que fora irreparável , fe ouvera
qualquer vento, que aíToprafle o fogo. Com a chama creceo
a confufaõ dos Inimigos de forte,que na menor perda,fe buf*
cava todo o modo para fe atalhar ámayor ruina. A muytas
náos fe cortarão as amarras deixando-as á vontade dos mares,
apelando da voracidade de hum elemento para a cólera do
outro : Os que virão de terra o incêndio, temera5,(pella ve-^
2ÍnhançaJ que paíTaíTe das náos aos edificiosj & fogiraó para
a Cidade Mauriçea: Nenhum fe lembrava da fazenda, cada-^
qual atédia á confervação da vida. Succedéra, o que íe recea-
va, fe a viveza da diligencia não vencera a do fogo, que
no eftrago de hua náo fe confumio , & na menor parte
da outra fe atalhou . Os noflòs dous foldados ^ amparados
da confufaõ , vararão com a jangada na praya, entre a
porta do Arrecife,& o forte de Diogo Paes : Sahirão a terra,
& carrega ndo-a,a paíTáraó da outra parte da reftingua dea-
rea: Lançada outra vez ao Rio Beberibe , vogarão para a ef-
tancia das Salinas: (Aquelles que fahirão feguros no mayor
pcrigoj encontrarão o perigo no mayor feguro. ) Sabião d
lugar, aonde as noíTas fintinellas eftavão depofta.Náofou-
berão o nome , porem gritarão , que erão amigos Portugue-
zes: (Não ouvera defgraças , fe as vencerão as diligencias. )
Era húa das fintinellas foldado bifonho ; aífi como vío a ;an^
gada, & que não derão nome, levou o mofquete ao rofto, feS
íáro^Sc quebrou húa perna a hum dos foldados : Golpe^, que
<;: ' ' lhe

Com ^ue ejfeyto.

lifttM^

1645

f^AXtB i:liv(^o vil

447

corro ao CamA^
raÕ.

lhe posem balanças a vidaj merecia eternJizada , Sc a diligen-
cia da cura o livrou da morte : O Governador João Fernan-
des Vieira os recebeo nos braços , lentido de não poder che-
£far como premio, aonde chegava aeftimaçaó do ferviço:
Uzou a fortuna com eftes dous íbldados, o qUe cuftuma com
todos, os que obraó por offerta, porque não fó lhes negou a
íàtisfaçaó,íe não que também lhes efcondeo o nOme. Deixou
o fucçeíTo taó efpantado ao Inimigo,que temerofo de íeme-
Ihante dano, nunca mais confentio , que dentro da barra efti-
veíTem as embarcações fobre ferro, ordenando , que fó fora
delia podeíTem eftar anchoradas: O golpe corta logo,& aviza
tarde.

26 Chegarão neftá occaziâo avízos de Cunhaíi,pellos
quaes entenderão os noíTos Governadores,que o 01andès,a-
;udado de Pêro Poty, recolhera a íi todo o gado, que paitava
iia campanha,para acudir com elle a fome do Arrecife j& que MarMo osnofos
andava taó fenhor do campo, que roubava , & deftruia á fua Go'vernadores fo
vontade, fem que temeíTe a menor refiftencia ; paífando fuâ
coníiança a ameaçar, não fó as povoações do Rio Grande,fe
nãoasdaParaiba.Refrefcoueítanova ador dapaííada cha^
ga, & pella naò abrir com nova ferida defpacháraõ, (no prin-
cipio de Dezembro) a Dom António Phelipe Camarão cã
o feu terço de índios, & com duzentos Tapuyas auxiliares;
(que tinha mandado do Rio dé Saó Francifco,o íeu mayoral
chamado Rodella , a fervir contra os 01andefes( & em fua
confervaaos Capitães Joáo Baptifta Pinto, João de Maga-
lhães, & António Jacome Bezerra por Cabo das Cõpanhias^
com ordem,que pellos deftridos de Cunhau,& Rio Grande^
caUiigaíTem a ferro,& fogo 01andefes,&índios feus pafciaeSj
de forte, que nenhúa cou z a deixa ffe a efpada com vida, nem
o fogo com prefl:imoj& que com exada diligencia procuraf-
fem recolher todo o gado , aííi remontadOj como domeftico;
&: fe conduziíle para o noífo Arrayal, Sem dilação partioa
noíla gente,provída de mantimentos, muniçoés,& armas,cu-
^a marcha feguiremos até o fim defta expedição, certos, de q
he menor inconveniente na hiftoria, adiantar os fucçeíTos aõ
tempojque romper o fio a intelligencia,& ao gofto. '

2 7 Marchou o foeorro coni a preffa,que a todos dâVã O

Pp2 de-

■ 443 CJST(I(10T0 LVSITMO .^645

defejo de fervír ao remedioj vencendo , mais qlie as ordi-
nárias difficnldades de femelhantes caminhos . Chegarão á
Paraíba , aonde o alvoroço, & ofeftejo os fes efquecer do

trabalho paííàdo . Entcndiaó os moradores, que á fombra

Comelie entre na i 11 i r - /- c i n r -^ -

campanha da p. ^^"f^^J poder ficavao feguros j & delle eíperavao, que a^

raiba, oí^ue lhe ^^^de não abraíaíle como rayo, domaria como freyo. A-

Juccede. juftadas,cojTi os Governadores da Paraíba ,asconvenient

cias da defenfa, & da expedição, continuarão a marcha,

levando coníigo cincoenta homens expertos , & práticos

nas veredas do terreno, guiados dos quaes chegarão ácamr
panha do Rio Grande . Náo ouve vida, a que perdoaíTe
a erpada,nem fazenda, que não confurniíTe o fogo, rece-
bendo os miferaveis pacientes, a hum mefmo tempo a no-
va, & o golpe. Comos fios da vingança cortou a efpada,
Sc o incêndio , por peíToas, & ediíicios, fem diftinção de fe-
xo,nemde idade. Aquelles moveis, que não tinhão valor
para o defpojo, deraò matéria para qeftrago: OuvioíTe
o golpe do caftigo dentro da Fortaleza do Contrario. Ef-
tremeceo ao primeiro grito, & cobrado do medo , determi-
nou íàtisfazer á queixa, com mayorinfolencia,queado a-
gravo : Pedio auxilio á Fortaleía da Paraiba, que agrega-
do á gente, que tinha, fes hum groíTo de oy to centos foU
dados, ( mil & quinhentos diz o Author do valerofo Luzi^
deno ) quinhentos Olandefes , & trezentos índios , poder,
com que fe imaginava fenhor da vi6i:oria, porque fopunha
' débil a refiftencia do reparo: Tomou o pulfo ás forças pello
braço do vulto, & não pello do valor 3 & pagou a condena-
ção , que lhe determinou o erro.

28 Refumia-fe o numero da noíTa gente em feifcen-
tos homens ; duzentos & cincoenta Portuguezes, [com os
moradores agregados, ] & trezentos, & cincoenta índios,
í^ortifca-fe em (com osaiuxiliares , que mandara o Rodella) obedientes
fm alojamento, huns, & outrOs, ao Governador Dom António Phelipe Ca-
marão. Occupáraõ, para quartel, p outeyro dehiia campi-
na , que atraveíTava hum pequeno rio, ( cortava naquella
paragem a eftradà, que vay da Fortaleza,para Cunhaii) que
pella frente lhe fervia de cava , com baftante fundo ; &
parte contraria hum denfo Tabocal em forma

de

ié45 'PJ^BhLlV^onh 449

de trincheira j dentro do TabocaI,& do Rio, Te alojava a nof-
fa gente, com entrada, & fahida para o Norte ^ & para o Suls
Certificado o Camarão da refolução , com que o Inimigo fc
preparava para o bufcar, guarneceo ©alojamento na forma
íe^uinte: Elle com os Capitães João Barboza Pinto, & João
deMagalhaés có as fuás Companhias, & parte de feus índios
tomáraóáfua conta a defenfa da entrada pella parte do Sul,
como mais próxima á inveftida do inimigo^ & a da parte do
Norte deu ao Capitão Jacome Bezerra, com fua companhia^
&: a dos moradores, que fe lhe tinhão agregado: A frente,que
defendia o Rio,g;uarneceo de Indios,como também o Tabo-
cal,que lhes defendia as coftas.

20 Marchava já o Inimigo em demanda do íítio,áònde
á noíía gente fe alojava: As fintinellas, que eftavão ao largo,
derão rebate, & v oltando a cara, o forão dando húas , ás ou-
traSjSí todas fe recolherão dentro da fortificação . Aviftou-á
o Inimigo, &foy vifto dos Portuguezcs com igual refolução Mma de âjjen^
para a enveftida,& para a refiftencia : Sem deter a marcha ^^^yK^J^TÍ^J^
•\ ançou o Olandès a trincheira^ que defendia a entrada pella ^J^^^y^rí^^Z
parte do Sul, cubrindo com ferradas cargas de mofquetaria^
as fileiras de machados,& alfanjes deftinadas,para romperem
a eftacada da trincheira, & franquearem a entrada à fua gen-
te. Os foldados Portuguezes,& Indios,afliftidos,& induftria-
dos do valor, & da pratica de feu Cabo , carregados os mof-^
quetes de baila miuda, & ordenados em fileiras, tanto, que a
primeira defparava, voltava a tomar o lugar da ultima, dan^
do tempo, a que atiraffe a fegundaj efta feguia o cftilo da pri-
meira, & a terceira a da fegunda, de forte ^ que em hum giro
continuado não derão lugar, a que a carga foíTe interrumpi-
da, empregando as bailas no Inimigo, com proporção,& pó-'
taria^á com tal diligencia, acordo, & deftreza, que defatina-
do o Framengo, não pode ver a perda , fe não com os olhos
da tolera, com a qual, em lugar dos mortos, & feridos , metia
no combate novos foldados de refrefco . Sem afloxar de húa,
& outra parte a bataria, continuou o confliâ:o por efpaço de
trez horas; rezão, porque efquentados os mofquetes dos nof-*
fo«,(que fempre erão huns mefmos a fazer os tiros) davão tá-^
manho couce nos peytos dos foldados, que os deitavâõ por

Pp3 terra:

1

Muàa, àe forma.
o Framengo.

t€rra:Era contingencia,& pareceo confelho,para que os não
peícaffem as balias contrarias.

3 o Obftinado no defejo da v ingança deípr ezou o Ini-
migo, o horfor,com que via o campo do combate coberto de
feus mortos,& feridos,& em tãto numero, que a vifta de feus
foldados achava nelles eípanto, & os pés tropeço,&: embara-
ço. Via o Inimigo, que os Portugíiezes com o trabalho , cor-
roboravaõ o pulfo, & que não os avia de vencer a força , re-s
correo a arte: Fes pé atraz , Sc formou-íè em tfez batalhões,
(imaginando, que a divifao enfraqueceíTe a reíiftencia) com
humruftentouocombate,comofegundonos mandou cor-?
tar pello lado direito, por onde nos defendia o rio ( fundo^
para lhe eftorvar a paíTagem ; eftreito,para lhe facilitar o da-
no:) Recebe o muy to confideravel dos índios freçheíros,que
achou promptos á defenía. O terceiro efquadrâo , que pell%
Tabocal do lado eíquerdo bufcava caminho para nos come-
* ter pella retaguarda, cahio em duas embofcadas, que o eípe-»

ra vaó, & deícópofto de duas cargas cerradas, & bem fuccedr-
das, fogio derordenado,Ievando nos m ortos,&: feridos a cau»
2a do temor,& a eícuza da fogida .-Magoado de tantos golpes
, fe deu o Framengo por entédido de feu próprio eftrago: To-

cou a retirar, & achou bem poucos dos feus, que o podeíTemi
feguir^o que vifto pellos nofíos índios, levantarão hum bar-
Renrâ-fe ^^^-baro,& confufo grito,(tocando juntamente feus bellicosinf'
jojio. tromentos , que entre elles he final de enveftir: ) Entendeo

Olandès, que fe defpunhâo a fahir do alojamento , &car-
regalIo,& fe pos em defordenada fuga, na qual todos obede-
cerão ao medo,nenhum avertio a falfidade da cauza,que não
conhecerão fe não dentro de fua Fortaleza ; aonde o feguro
lhes deixou virar a cara,para verem o engano.
5^ 5 1 Não feguirão os Portuguezes o alcance por falta de
munições: Cento,& quinze mortos deixou o Framengo no
campo, [entre Olandefes, & índios] fem aquelles,que efcon-
deo o cuidado,que foraó todos os que pella opinião , & pof-
tonos podíão fazer mais gloriofa a viâoria. Qiiinhentos fe-
ridos confeíTou hum Olandès, que defpoisfepaíTou aosnof-
fos,que levara o inimigo; ( trezentos efcreveo o Author da
vakrozo Luzideno)o fanguejde q ficou banhado o caminho

nos

^g^

i645

<^A^n 1. Lirn^o VIL

45 1

nos cníinou muyto mayor numero: & fe em noíTas memorias

- r ^ r j- • Com a-aecsiraiic^

onaotiverao,rarorov, o que teve cura em luas medicinas, r J j n

porque delpoisleaverigo-ou, que todos OS que lahirao leri- y

dosj ou quafi todos, perecerão, ou na batalha, ou na retira-
da, OU na Fortaleza, ou na viagem, ou no Arrecife . Da noíTa
parte naó oUve mortej nem ferida de conííderaçaò , porque
fó trez foldados o ficarão tão levemente , que fem medicina
os curou a natureza : Ponderação , que fes crer aos naturacs,
não fer cazo o fucçeíTo, fe não caftigo de maó fuperior , dif-
pofto pello ceo, para que os agreíTores da paíTada crueldade
pagaflèm o crime quaíi nomefmo lugar dodeliâ:o* Avizo,
niortaes: Qtie naó tarda Deos com o caftigo , a quem fem te-
mor de Deos fas galla do peccado^efcolhendo para tribunacs
de fua )Uiti ça, os mefmos teatros de fua oíFenfa , para que co^
nheça o efcandalo, que fe piedofo eípera a emmendaicaftiga
rigurofo a pertinácia.

3 2 Foy efta vidoria , em feu tanto , naô ío digna de a-
plauzo, fe não também de nòmcj tomaraõ-no as grandes , da
defigualdade do nuniero,da duração do confliâ:o,da callida-
de do defpojo, & do eftrago do vencido : Eraó os Inimigos,
a terça-parte mais, que os vencedores , guarnecidos de mais,
& melhores armas; poupados, & no terreno de feu dominio. ,
A perfia do combate de muytas horas^o exceíTo da perda tã- ^^^^^T^^^^"^/ i
to, quanto vay de tudo a nada: Os defpojos , toda a difteren- mãoriZ
ça de armas, & munições, & toda a bagagem , & roupas , que
trazia o contrario. O valor dos vidoriofos tão avertido,que
defpois de feílejarem a vi6ioria fe deixarão eftar quatro dias
no campo do combate . Os efFeytos , de tanta utilidade , que
humilhou toda a foberba do InimigOj&aífegurou aos mora-
dores de todo o receo . Em todas as occazioês paíTadas fe ti-
nha moftrado Dam António Phelipe Camarão digno de fua
fama; porém nefta, excedeo feu merecimento , a toda a fama
de feu nome. Em todos os encontros refplandeceo feu valor;
nefte feu valor, & fua virtude, porque [todos os noíTos o có-
feffáraó] foy a vi6i:oria mais reíiílta de fua oração , q de noí^
fo braço. Primeiro, retirado,gaftou mu y tas horas com Deos, Afama.cfue o Ca*
que fahiíTe a pelejar com os inimigos; & como fe da oraçaó ^^^^° mereceo
trouxera certezas da vitoria, lhe leraÓ os feus no femblãte,o ^'/^^^'^^

Pp4 fuc-

!'J

u

4^2 C^ST^WTO LUSITJKO 164$

fucçeíTo do confli£i:o: Difpos como experto Capitão, & pe-
lejou como valente Toldado: Affi louvou, & agradeceo a to-
dos os foldados, & officiaes, o bem, que aviaò obrado , como
fe na occaziaó naó a tivera merecido : A cada hum em parti-
cular atribulo a gloria dâquelle diaj& verdadeiramente, que
fe ou veraó todos neíle combate com tanta gentileza,que naõ
ficou foldado,que podeíTe envejar os louvores, que vira me-
recer aos companheiros.

33 Retiraràõ-fe os noíTos para a Paraíba, obrigados dá
falta de munições j aonde os deix ou, & a fua companhia o
Capitão Joaõ de Magalhães , que muyto á ligeira fe pártid
para o noíTo Arrayal de Pernambuco , a levar a nova da vic-
toria,& duzentas cabeças de gado,(^limitada parte do muyto,
que fe tinha junto, o qual quaíi todo fe remontou com o ef-
trondo do combate) & em primeiro lugar, a pedir munições,
para voltarem fobre a Fortaleza do Rio Grande,aonde o íni-
Kenrao'fe os mj migo cortado do ferro,& do temor fes a mefma diligencia,in-
fosparaa Pnrai- ferindo de feu eftado a noífa refoluça5.Embarco'u,para o Ar-
, ha,&pr£ cm- j-^^jf^ ^g feridos de mais conta para teftemunho do eftado, &
do perigo, em que ficava a força 5 deftituida de prezidio, de
armas,& de munições, expofta á cortezia dos Portuguezes
vidoriofos, vingativos, & fenhores da campanha.Com a vc-
tagem, que faz quem navega, a quem marcha , fe adiantou a
nova do fucçeíTo no Arrecife, á chegada do Capitão Maga-
lhães ao Arrayali aonde alguns Negros,que fe paírára5,a de-
raó conTuTa, não íàbendo eípecificar outra couza mais , que
entrarem trez barcos carregados deferidos, que vinhaó do
Rio Grande,&davaõ por novas, queemhúa batalha foraõ
mortas tantas peíToas , que era geral o pranto na povoação,
. , ^ Da chegada do Capitão Toâo de Magalhães, & do que delia

ror via do Ar* ri°j -^ r ^ r ^

^'eáfccheqou aos relultou, daremos conta a leu tempo, queroy no Fevereiro
nojfos a nova da, ^o Teguinte anno de mil & TeiTcentos & quarenta & Teis^por-
que nos he neceíTario relatar , o que nefte mey o tempo Tuc-
cedeo nas outras partes.

3 4 Partido Dom António Phelipe Camarão com o fo-
corro referido, affentáraõ os noíTos Governadores , que fe a-
lojavaó na Varzea,(conhecendo,que nem a rezão de fokva-
dos,nem a queixa de desfavorecidos os eximia de VaíTallos)

re-

Vícíoria.

íé4^ -fAXr^E I. LIV^^O Vil 453

reprefentar á Mageftade delRey Domjoaõ o Quarto o ef-
tado, em que de preíente fe achava aquella, & as demais Ca-
pitanias da cofta, com miúda relação dos fucçeíTos , & das Çí-
nezas, com que vaílàllos tão zeloíos de feu lerviço , lhe me-
reciaó protecçaó,& auxilio; efte,para o que defcjavão obrar,
aquelle, pello que tinhão obrado . Para negocio de tamanha
importância elegerão dous fogeitos, em os quaes concorriáo
os requiíitos neceírarios,para femelhante cmprego:Foraó ef-
tes Francifco Gomes de Abreu, S^Francifco Berenguerde
Andrada^para cuja viagem ^ íe mandarão apreftar duas cara-
velas,em quedivididos,partiraódoportodeNazareth mea*
do Dezembro defte anno de quaréta & cinco. Andava o ini-
migo í enhor do mar, & a trayçaó tão vigilante na terra, que
naó pode a di ffimulaçàõ , & o recato efcuzar o avizo , que fe
deu ao Olandès: Ainda as duas caravelas não tinhão perdido
a terra de vifta, quando a tiveraó de duas náos inimigas , que
arribando íobre ellas, lhes davaõ caça : A de Francifco Go-
mes de Abreu, melhor navegada,ercapou,& chegou a Lisboa
a falvamento: A de Francílco Berenguer de Aodrada, vio-fe
taó acoffada,que fó lhe deixou a fortuna a efcolha da perdi-
ção. Varou em terra no porto de Tamandaré , aonde fe fal-
vou a gente, & os papeis de mayor importância : A falta de
focorro, & amparo foy cauzâ de fe perder o vazo^com o que
fe perdeo também o negocio j porque Francifco Gomes, oU
foíTe por ambiciofo,ou por remiífo, mais defttuio , do que a-
proveitou. A caravela perdida nos avertio a importância , &
utilidade, quefefeguirh,deaver no porto de Tamandaré
húa Fortaleza, para remédio de femelhantes cazos;& o muy-
to , que convinha fortificar-fe a de Nazareth, & entupirfe o
fundo da Barreta. Tudo fe obrou cm breve tempo,como em
feu lugar fe dirá*

3 5 Em os últimos dias defte anno chegou ao noíTo Ar-
rayal húa apertada ordem do Governador Geral do Eftado
António Telles da S\ lva,pella qual ordenava aosMeftres de
Campo André Vidal de Negreiros, & Martim Soares More-
no, que obrigaíTem aos moradores, a cortar todos os cana-
veaes do reconcavo;& fe alguns recufaíTem , lhos mandaffe
tallar por feus foldadosj fem exceiçaó de fazenda ^ nem de

pefíoa.

leao Fernandes
Fieira maâa. dcM
Enviados aoRey'
rio.

Hum arribou, é"
outro chegou â
Liiboa.

MdndaoGover"
nador Geral do
Ejlado cortar os
Canavcéies dacã''
fanhai

U

J

r

4^54. CAST^oro LUSirAKo 1545

peíToa. Piareceo providencia, &foy idefatino : Affi efraõ os
homens em íeus difcurfos.He limitado o humano juizo : Hãa
vifta efcaíla) pára na menor diftancia j como poderá ver toda
a circunferência? Fundou-fe o decreto cm perjudicar ao ini-
migo, tirando-lhe com a matéria, a eíperança do lucro, que o
fuftcntava na terra j & por efte meyo,obrigado a defemparal-
Ia^& aproveitar aos moradores,encorporando-fe com a noíTa
gente de guerra trez mil & fete centos & cincoentaliomens,
que fe occupavaõ na moenda de cento &cincoéta engenhos,
que tinha a Capitania de Pernambucoj & com o grande nu-
mero de bois,que ficavaó li vres,para fervirem ao fuftento do
exercito: Porém o confelho não comprehendeo, quanto ma-
SemfonderAros y^j. ^j.^ q ^.^^^^ ^^^ ^ utilidade , que fe nos feguia . Para átÇ-
inconvenientes. • t-. ■ n

truir aos Inimigos, era incerto o miÊyo,porque ncava contin-
gente, o deixarem, ou não deixarem a terra : Para os Portu-
guezes era infalivel a perda , porque deftruidos os géneros,
perdião todo o cabedal, para fuftentar a v ida , & para conti-
nuar a guerra. Com outro mayor perigo,que podèra por em
balança a fidelidade dos moradores, levando-os adefefpera-
ção,a bufcar no Inimigo a confervaçaõ , de que os privava o
preceitojpois o braço de que a eíperavaõ, os códenava a per-
derem de hum golpe a vida, a fazenda, & a liberdade. Porém
experimentou neíta occafiaõ o mandato , fem efcufa , & fem
/ re[ hca a obediência daquelles fidelliííimos VaíTallos : Naõ
ouve algum,que efperaífe a força , fendo entre todos o pri-
meiro,quc médio os inconvenientes do comum,&deíprézou
as conveniências do particular , o Governador da liberdade
^eâoheSencU João Fernandes Vieira, cujo exemplo animou o decreto , &
njcitcco CO ojxê- defarmou O reparo:Tanta Opinião tinhão aqueljes morado-
flo de loão Fer- ^^^ ^^0^^ hpmem,(com muyta cauza merecida)que náo dizia,
nem obrava couza, a que faltaííèm, nem com a obediência,
nem com a imitação.

3 6 Entrou o anno de mil & feiícentos & quarenta &
féis , para os fieis alegre , & para os Herejes infaufto . Tinha
chegado a noíía Fortaleza a fua ultima perfeição , (temos di-
diíi do anno deu ^^ como nella fe pos a primeira mão em o Setembro paílàdo,
a Ko-vã. Fortaleza em O numero cêto & quinze do livro fexto)fem q em todo o
apimeirajdva. tempo da obra tiveíTe aFramengo a menor noticia do edifi-

. cio:

nmàes Vieira.

Fm o -primeiro

Tl

/"

cio: O primeiro dia do anno, & do mez , que com O myfterio
lhe deu o nome de Fortaleza eb Bom Jesvs,feflejáraó os noí-
fos com falvas de todaa artelhafia, de que eftava guarnecida:
Das mcfmas cauzas, de que os Portuguezes tiráraó a rezão da
alegria, tirou o Olandès o motivo do eípanto, fobrc-faltado,
& confuzode ouvir, tanto na vezinhança do Arrecife , arte-
Iharia taó groíTa : Novidade , que a confideraçaó temia , & o
7UÍZ0 não atinava:Seguiraó-fe á preplexidade, & receo as có-
iequecias, inferindo os apertos,em quefe aviaó de achar^ ten-
do junto de fuás fortificaçoés,queni lhe punha fitio^ & frey o:

Para ella fe paíTou logo o noííb Arrayal deixando o alojamê-
to da Várzea; & mu y tos particulares levantarão cazas , con?
correndo toda a diverfidade de gente, de que fe ferve a repu-
i)lica, tanto da macanica, quanto da mercancia, de forte, que
em poucos dias fe vio no circulo da Fortaleza húa numerofa
povoação cingida de cavas, trincheiras, & eftacadas, que lhes
íèrviaó de muros para a defenfa , & de termo para a extertf
faó.

97 No mais ferverozo dà obra,chegon nova ao Gover-
nador da liberdade, de como em o porto de Nazarcth deitá^
va ferro húa caravella de mercantes, com alguas munições, &
gence,que mandava o Governador Geral do Eftado ;& hum
barco do mefmo Joaó Fernandes Vieira , que voltava da Ba-»
hia, aonde o mandara carregado de açúcar, com ordem, que
todo o procedido feempregàíTe em roupas para cobrir oà
foldados,que andavão defpidos . Em companhia do Meflre
de Campo André Vidal de Negreiros , partio logo para Na- ^/f^t^^" os mps

2areth, Toão Fernandes Vieira, deixando a Fortaleza do Ar- '^'^^^^^ °^^^J^
^ o 1 TV/f /i j r> raoPotaldeNa^

raya^& o governo das armas entregue ao Meltre de Campo ^^reth.

Martim Soares Moreno. À breve interpolação de tempo, q

ouve entre os noíTos Governadores fahirem para Nazareth^

Sc o Inimigo fahir com poder do Arrecife , fes vehemente a

fofpeyta, dequetraydoresoavizáraó da boa õccazião,que

tinha. (^ A tr ayção convém com a herezia,em fer hum erro de

entend imento pertinaz: A õppoíiçaó lhe ferve de eftimulo:

Vive defobediente a rezão ^ & obra por thema ] O grande

dano, que o Olandès recebia cada hora da eftància de Hen>

fique Dias, achando fempre nçUà caftigo para o atrevimeiv*

tOj

u

4^6 C^ST^sJOTOLUSlTJKO 1646

to, & exame para os deíignios, o tra2Ía inquieto, & defejozo
de reparar hum , & outro golpe com fazer hum reduto en-
tre as íiias Fortalezas dos AfFogados,& das Cinco Pontas.So-
pos a refiikncia ,& julgou, que com a aufencia dos Gover-
nadores acharia a oppofiçaó , ou mais remifíà , ou menos vi-
gilante. Sahio do Arrecife com hum groíTo de infantaria , &
jproveíía-fe o ^^^^^^ ^^ gaftadores, cõ todas as armas,&apreftos neceíTarios,
dances da occa- parafacihtar a obra. A efperteza,& promptidaó das fintincl-
ziao parafa^er las deu rebate a Henrique Dias > & efte ao Meftre de Cam-
hum reduto. po Martim Soares Moreno, comunicando-Ihe peíToalmente
o intento do Olandès ,& pedindo-] he focorro ao primeiro fi-
nal do combate, porque eom os. feusfoldados hiaenveílir o
Framengoj para o que levou do Arrayal as munições necef-
farias.

38 ChegouHenríqueDiasáíuaeí^aíicía; víoqnepof-
tosem arma, o efperavaó feus foldados, com elles paíTou á
outra parte do Rioj & por veredas def uzadasjque o mato eí^
condia ás Fortalezas Inimigas, chegou a aviftar o contrario
fem fer fentido . Tinha formado a infantaria em efquadraó
Henrique mas o cerrado, com o qual cubria os gaftadores,occupadOs em cor-
barata! tar fachina, a carretar materiaes,& abrir fanjas para q reduto,

que intentava fabricar: Dividio Henrique Dias a fua gente
em trez partidas,para que a hum mefmo tempo,& por diver?^'
fas partes deíTem fobre o efquadraó Olandès trez cargas cer-
radas: O não faber o Framengo,a que parte avia de fazer roA
to, com o defatino da vezinhai3ça,& do repente , fes a induA
tria tão bem fortida , queibrevefnenfe vio defcompoftos os
foldados com as bailas, Sc os ga§adores com o eftrondo, de
forte,quehuns,& outros começarão a deixaro campo, que
" de todo lhe fés largar a fegunda carga, fogindo da terceira,
para o abrigo de fuás Fortalezas, as quaes defpediraó de fi hã
chuveiro de balias, de que os noíTos fe livrarão com virar as
coílas ao perigo, fatisfeitos de confeguirem o intento , & de
levarem coníígo a mayor parte dos inftromentos , que olni-
niigo trouxera para a fabrica. A perda contraria , fó quem a
padeceo a foube : Os noíTos de nenhíia fe queixarão, porque
a não tiveraõ. Com toda apreftefa remeteo o Meftre de Ca-
po Martim Soares o focorro pedido3 porém fajtouá marcha

o tem-

^<^i^lA^liJL^'eà Mj^.

16^6

{PJ^TE L LIPXO riL

457

o tempo, que fobejoii á reOrccncia: Chegou á eAnncia de Be-

rique Dias, quando elle com fcus Toldados dercanfavaó do

trabalho, referindo as particularidades do rucçeíFo : Delle ti-

veráoloQ-oavizo os noflbs Governadores :& de Nazareth, . ^

, .,^ 11 j o ^ j Com av tio do CO'

aonde )a os colheo a nova, comprando , & comutando gene- y^^^ p^tem os

ros, para o beneficio da guerra , & dos foldados, tudo á cufta ^^rr^^ Governa*
da fazenda do Governador João Fernandes Vieira j ( dada dores fará oAr-
breviffima expedição ao negocio da fazenda) acudirão ao da ra^d,
guerra;& chegarão ao Arrayal em treze de Janeiro pella me-
ya noitc,que foy efcuriílima : Sem fe apearem,foraõ á eftan-
€Ía de Henrique Dias, do qual fe informarão do referi do en-
contro, & do dezenho inimigo. Hum coração grande vence
as pençoés da natureza, & as contingências da fortuna , ani^
mado do zelo, & do eílimulo.

5 9 Eftes fucçeíTos fizeraõ entrar o Inimigo em novos
difcurfos: Por fuás perdas avaliava noíTas forças , & aíTentou
eonfigo, que noíTo poder lhe impoffibilitava fuás emprefas,
& fuás efperanças. Diícurria fobre o modo, que poderia to-
mar a indufl:ria,para fuprir a falta da vétura j& enganar o va-
lor,& a vigilância dos foldados de Henrique Dias, de cujo ^^^^^^ '"^y-
braço,& efperteza fe não livrava, nem o mais forçofo, nem o noite.
mais efcondidoi&pareceo-lhe, que o favorecia o tempo c5
a efcuridade das noites: Em duas levantou o Reduto perten-
dido, hum tiro de mofquete da fua Fortaleza das Cinco Pon-
tas , efcondendo o rumor dos gaftadores debaixo do eftron-
do da artelharia de fuás praças, quefem interpoloçaó jugou
as ditas noites, varejando a circunferência do íitio , aonde fe
trabalhava. Em vinte & dous de Janeiro,(dia em que o Mar-
ty r Saó Vicente nos oflPerecia focorro como Patraõ , & affif-
tencia como Efpanhol) fahio o Olandès com hum groíTo eí^
quadraò de foldados, & grande numero de gaftadores,a cor-
tar o mato,que pella baftidáo,nem deixava livre o laborar da
artelharia , nem pellas embofcadas,fegura a ferventia do Re-
duto : Mal tinhaó pegado na obra, quando Henrique Dias
f avizado de foas fintinellas ) pegou das armas , & íèrvio de
muytas,& continuas cargas de mofquetaria ao efquadraó Ini-
migo . Deu o eco dos tiros rebate no Arrayal, avizando a hii
mefmo tempo do lugarj^ do conflido . O Governador Joaõ

Qg[ Fer-

Ml..

■45S

CASr(^10T0 LUSITJVO

i6^6

:t

Sahio a roçar o
matOy(^ Hêrique
Dias a fa^r-lhe
offo-xjçao.

O Padre Fr. loaÕ
daKefurreicaÕa-
niníÀ osfoldados.

!■!

.;í"

Uf'

Fernandes Vieira,cujo valor naõ fabia perder, né a occaxiaó,
nem o tépo,yada ordem ao Sargento Mayor António Dias
Cardozo, que o feguiffe com a gente,que achaíTe preftes] fa-
hio com a fua companhia, avertido,que para o locorro fervia
mais a preíTa, que o poder; rezão,com que logo o feguio An-,
tonio Dias Cardozo com algúâs companhias: No tempo, enu
que o combate andava mais acefo , & a falta de pólvora , &
baila hia deixando nas mãos do Inimigo á viâ:oria, chegotií
Joaó Fernandes Vicyra a fuftentar com a vifta o conflito , do^
qual fe começa vão a retirar osfoldados , que faltos de muni-<
çoés ferviaó á barreirâ,&: não á batalha: Era neftas occazioés
certa a prefença do Padre Freyjoão da Refurreição Religio-,
fo Benediâ:ino, de cuja charidade, & valor tem feito efta hift
toria muytas vezes illuítrememoria(Em toda a occafiaó, era
o primeiro,que acudia a confeffar como Sacerdote, a ferir co-
mo foldado,& a animar comoCapitão.)Deu de rofto com ai-,
gúas mangas de Mmas, & alguns Portuguezes , queferetira-
vaõ; deteveos com o refpey to, & com a exortação, dizendo-
lhes:Qiie he ifto filhos ? deixais aos cõpanheiros no perigo?
Defprezais a gloria, & bufcais a infâmia? Quem vos poderá
livrar da opinião de cobardesí* Quereis fepultar com a vileza
de hum dia,as proezas de tantos arinos.^ Não fabeis,que a pal-
ma das viâ;orias fe murcha, hua vez, que lhe falta o valero-
fo humor, que a rega.^ Que ides bufcando.^ A vida f De quò
fogis.^ Da morte? Quem vos diíTcjque a morte não bufca prir
meiro, a quem lhe foge, que a quem a bufcaf Parecevos, quô
a fuga vos livra da efpada?Não por certo: A mefma experiê-
cia vos tem eníínado, que de cara a cara fere a medo, a quem
pellas coftas mata fem reparo.O voflb remédio há de íèr vof-
fo braço. Voltay,voltay abu£car,& imitar ós companheiros^
que vos chamáo com o exemplo , & com a neceííidade : Na^
paííàgem daquelle rio(era o de Beberibe)vos efpera o dano^?
no perigo daquelle confliâ:o,vos efpera a viâ:oria: Vamos to-
dos,que quero mais ofFerecer a vida em obfequio de voíTa fa-.
ma,que confervalla á vifta da quebra de vofía reputação: hr\
vança,avança,que já nos acompanha a fortuna de noíTo Go-
vernador João Fernandes Vieira , elle nos traz focorrode
munições, & de foldados. Saiba o mundo , que os Pretos de.

. Hen-

mr.

t^tl¥>*»^^^

1646

fJXrE 1. LlFlip VIL

459

Henrique Dias na falta das armas vencem com a opinião. ín- „
flamados todos com o ardor deftas rezoés, voltarão com no-
vo alento,[recebido também de nova cauza, porque naquel- Voltaofihreohn
le tempo paíTou ao rc]igioíb,pellas efpadoashum pelouro '^''^á^-
vago, de que efteve arriícado a perder a vida] & entrarão na
peleja.buícando areputação, a vingança,& a vidoria.

40 Já nefte tempo tinha paílado o rio o Sargento Ma-
yor António Dias Car^ozo com trez companhias, em fegui-
mento de Joaó Fernandes Vieira^& de caminho , foy acudin-
do com pólvora, & baila aos foldados, que a não tinhãoj que
eraò pella mayor pard do terço de Henrique Dias , os quaes ^ covermdor
corridos da fuga, avançarão o Inimigo com tanta valentia, q j^^- Fernandes
cfcureceraõ a paíTada nota ; & encorporadas com elles as cõ- vieira chega com
panhias dos focorros , apezar de quatro horas de refiftenciaj/^^oyyo, & fere-
arrancarão o Inimigo do campo j o que vendo as fuás Fortale- ^^r ^ ° ^n^^^gf»-
7as, atentas ao fucçeíTo do conflito , defpararaó toda fua ar-
telharia, cobrindo o alcance de bailas : Sem temor algum del-
las,foraõ os noíTos perfeguindo o Framengo jporém o Gover-
nador Joaó Fernandes Vieira,vendo,que o rifco,era fem frui-
to, mandou tocar a recolher: Obedeceo a cólera á difciplina,
& fe paflbu toda a noíTa gente á outra banda do rio, aonde a-
charaò a )oaó Fernandes Vieira,& os Meftres de Campo An-
dré Vidal, &Martim Soares, que chamados da perfia do cõ-
bate vinhaõ em focorro de noíTas armas, com hum groíTo de
ioldados:Huns, & outros fe recolherão a fcus poftos.Cuf- ,

tou-nos o encontro trez mortos, & quatro feridos do terço 2 / " •
de Henrique Dias, & húa leve ferida, com que fahio o Capi-
tão Sebaftião Ferreira. (Callificado teílimunho de feu cora-
çaó,& de feu braço, que em nenhiia occazião deixou de dar
motivos á enveja,&: aíTumptos á fama:)0 eftrago do Inimigo
foy ^rande,porém a cuftumada diligencia de efconder a nof-
fos olhos os mortos, & os feridos,nos impedio o numerailos. .

41 A mifera vel eftado,fe v ia reduzido o OlandèsrDen-
trò,& fora do Arrecife, experimentava búamefina fortuna;
não lhe deu a calamidade mais apelação , que para a efcolha
do golpe: Fora ao Arrecife encontrava o ferro, dentro delle
operfeguiaafome: Valiahum alqueire de farinha da terra, calUmiãades, ^
que nós chamamos farinha depáo3& osnaturaes imnâÃocdi^ padece o inimigo,

CLq 2 de-

Vifceçoes do Ar-^
recife^ ^ fíijfd
gem de muytos
fam o nojjh AT'
rayal.

Peitos quaes ti-
•vemos aprimei'
ra tiova da, vic-
toria. do Rio Gr a,'

460 C^ST<1(10T0 LUSITJNO 1^4^

dezafeis toíloês : Hum pote de agoa doçe,hiim tofiaõ : Hiia
laranja, hum vintém, que faó preços exceffivos a reípeyto
da terra3 & tudo o mais íe achava taõ caro , que para os ri-
cos era difícil o fuftento, &impoílivel para os pobres. As
vozes da neceffidade períiiadiaò a entrega: Os do gover-
no, faltos do remédio ,temiaõ a rebelião, & todos , fem du-
vida, efcolhèraó entaó, antes o cativeiro, que o fepulcro:
Porém os Judeos em tudo pertinazes, aconfelhavaõ aconf-
tancia , temeroíbs do caftigo , que merecia fua perfídia: Of-
ferecèraó Te a íiiftentar o povo , &a guerra. Ajuntarão en-
tre íi hum groííb donativo, que logo entregarão aos do
Supremo Concelho 5 & nada Te remedeou, porque fervio
á cobiça de poucos, & não fatisfes á fome de algum. Da
penúria refultou a difcençaó entre as nações, de que fe for-
mava aquelle prezidio : Requeria a neceíTidade, & deípacha-
va (no tribunal de todos) a conveniência, tomando-íe por
faudavel expediente, que fe entregaíTea terra, antes que a
força, & a miíeria impoííibilitaflèm os partidos , que podia
tirar a opportunidade : Entre a confufaó, & o medo tiveraõ
alguns occaziâo,para íe paíTarem á noíTa parte: Deíles foraõ
os primeiros,Cinco Negros Minas,que em 2 ç.de Janeiro fo^
giraó do Arrecife,& deraõ,por extenfo,as novas da viâ:oria,
q o Camarão alcançou dos Olandefes, & Brazilianos no Rio
Grande , referida em o numero vinte & nove defte fetimo
livro. Qiiem com melhor tino foube dar rezão do fucçeíro,&_
do focorro,que logo defpedio o Framengo do Arrecife para
o Rio Grande,& do miferavel efí:ado, em que noffas armas o
tinhaó pofto,foy hum Francez , que em vinte de Fevereiro
fahio da Fortaleza das Cinco Pontas , furtado a's Ontinellas
do Inimigo, o qual defpois de eftafdous dias embrenhado no
mato,(tempo fufficiéte,para que a falta fízeífe parecer inútil
a diligencia jfe aprefentou aos nofíbs Governadores; & para
defmentir as fofpeytas de efpia comas evidencias da fuga,pe-
dio foldados,qLie o acompanhaííem até a parte, aonde deixa-
ra efcondida toda a fua roupa, oííerecendo a cabeça ao pri-
meiro indicio de trayçao: Em tudo aacharaó verdadeiro ; &
lhe deraó inteiro credito,ao q cófeífou. Entre outras couzas
diíTe, q muytos foldados, dos q fêrvião ao inimigo, fe tiveraõ

puíTado,

■ítt^r

1646

Tà^TE 1, LlFí^O VIL

4^

paílado, fe os não detivera o medo , porque húa falfa pratica
os tinha perfuadidos, que a nenhum rendido perdoava no0a
vingança, pintando as mortes, que a todos fe daváo5CÓ cruel-
dades tão cípantofas, que íó ouvidas cauzavaõ horror : Para
enfraquecer a opiniáo,& a induíl:ria,mandáraó os noffos Go-
vernadores veftir duas índias , que fe aviaó tomado , & bem
providas de mantimentos, as pozeraõ em parte, donde fegu-
ramente fe podião voltar para o Arrecife,para que com a re-
lação do trato,& com a vifta do favor , pode ffem certificar o
contrario, do que tinha divulgado o aftuciofo ardil do Ini-
migOj& para que o defengano, não pareceíTe laço , mandou
Joaó Fernandes Vieira copiar húa carta em diverfas lingoas,
cm a qual prometia, a todos , os que fe quizeííem paíTar, íe-
jTuro das vidas, & das fazendas, a fabilidade no trato , & me- ^.^
Ihoramento nas pagasj promeífa, que certificou o Francês c5
cartas, que efcreveo a particulares: Húas, & outras fe manda-
rão lançar em partes, aonde com facilidade fofíèm vifi:as.

42 Em a noite de vinte & cinco deraõ todas as Fortale-
2as do Inimigo falva Real j novidade, que deixou a todos os
noíTos alvoroçados, & defejofos de íàber a cauzarNáo tardou
muytos dias a fatisfaçáo defte defejo. Junto á Fortaleza dos
Aííbgados tomáraó as íintinellas hum Framengo , o qual a-
prefcntado aos noíTos Governadores, confeíTou, que o moti-
vo do feftejo,fora a nova(chegára em húa náo de Olanda)de
húa vi6loria, que os feus tiveráo nos Paizes baixos , contra as 2)^^ 0 inímm
armas caftelhanas5& que a náo em que viera o avizo^não tra- hm/alva RcaL
•i\2í mais carga, que armas, muniçoés,& catorze foldados.Re-
xão de eftado dos Principes, he publicar com eílrondo as vi-
torias, por todas as partes de feu dominio, para que cheguô
o brado da fortuna a introduzir nos vezinhos o medo da po-
tencia. No feguinte dia deitou o Inimigo fora do Arrecife
hum paralítico Portuguez,que por impoííibilitado ficara en-
tre elles na occaziáo da conquifta, a cuja miferia favorecera a
humanidade com eímolas,até aquelle tempo ; com aftucia o
mandarão por em fitio,em que facilmente foíTe achado, & de
fuaboca ouviífem os noíTos mais crédulos, a nova de feus
triumphos^ porém não reparou, em que com a mefma fé íe a-
vião de ouvir as de fuás callamidades.Tomoufe-ihe o depoy-

(i.q3 toentOj

jírdildequeuziO.
para, divulgar a
eau^/i.

chega àoArrayal
o Capitão João de
Magalhães ape-
dir (ocorro para,
o Rio Grande.

O qudle-va. An-
dre Vidal de Ne-
greiros.

\6i C^ST(!ilOTOLUSlTJNO i,

mento, & diíTe^que em todas as praças do Arrceife avia doe-
ças,de que morria muyta gente,cauzadas da continuação dos
rebates, & da fome, que era tão apertada , & comua^ qiie an-
da vão os homens como pafmados, comendo, 8c bebendo até
o nocivo para a v ida, com o defejo de dilatar a hora da mor-
te: Qiie pubhcavão efperanças certas de focorro,a que o vul-
go não dava credito algum, antes defconfiados todos, os que
lèrvião, pediáo pagas, 8c embarcações, para as fuás terras ^ o
que folicitavão mais fogofos os Judeos,amedrentados de ve-
rem os ânimos de todos tão cahidos,qUe não avia algum,que
julgaíTe poffivel a continuação da guerra,& confervaçáp das
praças: O meímo ratificou hum Brafiliano , que na feguinte
noite fe tomou ás mãosj& acrecentou, que o Olandès, o mãr
dava efpiar o campo, & reconhecer as veredas, que guiavão,
para a Moribeca,com determinação (como elle dizia ) de fa-
quear a povoaçaó,& retirar-íe a íèu falvo, pello íitio das Cu-
curenas, em lanchas , que prevenidas o avião de efp.erar no
porto da Candelária: Indifferétes no credito,ouviraó os nof-
fosoavizo, & fe acautelláraò para a contingência do fuc-
ceíTo.

4^ Chegou nefte tempo ao Arrayal o Capitão Joaõ de
Magalhães com a nova, & circunftancias do fucçeíTo.do Rio
Grandcjfoy bé recebido, & hofpedado dos Cabos mayoresj
pella peíroa^& aplaudido dos foldados,pello focorro das du-
zentas cabeças de gado. Certificados os noíTos Governado-*
res por tantas vias,do focorro, que o Inimigo tinha manda^
do, & do eftado em que ficavão os moradores daquella Capi-
tania , aífentáraó , que fe lhe devia acudir com tudo , o que
foííe neceíTario, para íe fuftentar a liberdade dos moradores,
& a reputação das armas ; & húa tal peíToa, para o bom fuc-
çeíTo da expedição, da qual, moralmente , fe efperaíTe o fim
defejado. Ãdiantou-feoMeftredeCampo André Vidal de
Negreiros c5 o offerecimento , á confulta,julgando de íi pa-
ra fi, que o negocio íe adequava ápeíToa; todas as do con-
greíTo conhecèraó,que não podia a emprefa levar mayor ho-
mem,pello pofto , pello valor, pello zelo , pella pratica , &
pella fortuna. Apreftado,em breviflimo tempo , fe partio do
noíTo Arrayal em dia do Apoftolo Saó Mathias^ vinte-quat*

tro

"^

i6/^6

^AXrni.Lir(^ vii.

463

^'

trode Fevereiro, de quarenta & féis, levando coníigo qua-
tro Companhias do terço de João Fernandes Vieira , Capi-
tãesJ^aulo-da Cunha Soto-Mayor , António Gonçalves Ti-
Çaó, Francifco Lopes o Eftrella , & o Alferes de Nicolao A-
ranha, porelleeftar enfermo: Do terço de Henrique Dias,
húa companhia de Minas , & outra de Crioulos: Da marcha
de todos nos avemos de apartar agora,para darmos rezão,do
que, no tempo que gaftou nella,fuccedeo em Pernambuco;-
44 A hum mefmo tempo fahio do noíTo Arrayal o fo-
corro para o Rio Grande, & para o Arrecife o avizo de hum
traydor, pello qual informava ao Inimigo da callidade,& nu-
mero das peíToas, do intento da jornada, da hora da partida,
& de todas as circunftancias neceíTarias, para inculcar a falta,
em que ficava o noíTo Arrayal. Certo João Fernandes Viei-
ra na trayção, & incerto no traydor, (^Sopoíto que todos o a-
pontavão com o dedo] não pode deixar de fe doer, pella có- loh Fernandes
tinuaçaõ do mal, vendo, que náo paíTava occazião,em que a Vieira defafice-
perfídia não andaíTe tão prompta, como a lealdade . Impor- 0^^° inimigo,^
tava entender o Framengo, que náo fentiamos a falta do fo- ^ '^^^^^i^^í^e.
corro.PeíToalmente viíitou todas as eftancias, prevenmdo-ãs
de munições, armas,& exortações j com as ordens neceffarias
para todo o acontecimento : Aos Capitães dos prezidios or-
denou5que fe não deíTe húa hora de focego às Fortalezas ini-
migas, picando-as por turno, todas as da noite: Ganhou com
dadi vas algúas efpias, que o forão mu y tos tempos , com efti-
pendio de doze patacas cada mez : Foy por entre os matos,
ver com feus olhos as Fortalezas do inimigo, obfervando as
partes,& os poftos donde , & por onde melhor fe poderião
aíTaltarj o que fes expofto ao rifco , porém fempre vencido
de feu animo: Diligencia,que pos ao Framengo em novo cui-
dadojconfufo de experimentar mayores hoftilidades em me-
nores forças. A primeira noite fe picou o Inimigo com tal vi-
V eza, que não ouve praça fua, que por todas as partes fe não
ímaginaífe efcalada ^ foy tamanho o tumulto , & o receo no
Arrecife,que fe ouviaó entre os noífos os gritos do temor, &
do efpanto^toda a noite paíTárão todos có as armas nas mãos;
não defcançando fua artelharia de laborar em toda elía ; nem
a noíTa mofquetaria de influir em fua cófufaô, q até pella ma-

Qjq4 nhã

I™

*:i

CJST^IOTO LUSITJKO

\6^6

Ji^era. hum re-
duto o Inimigo,
C^ Henlíie D tas
o ejcalii.

OCaphloBomin
gos Ferreira, àc
Jatina. aos oUn-
âefes cÕ huA trá-
vejfura.

nhã fe manifeílou com as vozes dos claríns,&"tambores.Naó
Hiescuítou o noffo cuidado menos defvello nas feguintes
noites: Foy a fegunda, a que mais os affornbrou , porque en^
véftio Henrique Dias cora os foldados de feli terço , o novo
reduto,(que íe cobria com a artelharia da Fortaleza das Cin-
co Pontas j guarnecido de Toldados , &dt 'quatro peças de
ferro coado,dc mais que mediano calibre,que ganhou fem re-
ííítencia, porque os defenfores o largarão muyto antes , que
os obrigafíè o ferro. Como na emprefa fe procurava o efpan-
to, defprefou-fe a viâ:oria, & o defpojo , deixando o reduto
á barreira dos tiros Olandefes, que como o imaginavaõ ga-
nhado, o combatiáo inimigo: MoftroLl-lhes a manhã o enga-
no, & o ludibrio, que os autores celebrarão ifentos de todo o
dano. ' '..

4<5 Em hum íitio, que ficava como centro das trez For-
talezas, AfFogados, Seca,& Salinas,lhefes o Capitão Domin-
gos Ferreira húa pezada traveíTura: Em os troncos das arvo-
res, que ficavaõ mais defcobertos, mandou atar murrocs ace-
fos,& logo dar húa carga cerrada,cõ ordem a feusfoldados, q
dada ella, fe retiraíTem a hum lado. O Inimigo chamado dos
tiros jdivifou as mechas,& perfuadio-fe,que eftavaõ nas mãos
dos mofqueteiros : Apontou para aquella parte toda a arte-
lharia das trez Fortalezas, ás quaes acompanharão logo a do
Brum,a dos Perrexis,& a plata-forma das portas do Arrecife,
não defcanfando de repetir os tiros; que os noííos foldados
defviados do perigo Ihesfaziaó defparar com mais cuidado,
cõtinuando nas cargas de feus mofquetes. Defatinava o Olâ-
dès da conftancia que via, porque não fofpeytava a cauza, a-
chando fundamento,para temer a efcala, na firmeza,com que
apezar de toda fua artelharia, perfeverava a forma . Foy tal a
impreíTaò que fes o engano , que fe ouvia em todas as partes
o grito da perturbação, & do rumor, com que fe defpunha a
reíiftencia ( favorecido o ardil da noífa gente, da efcuridade
da noite, & da congruência do fitio:)Com a claridade do dia
conheceo o Inimigo feu engano, & lhe fes confeílàr o Capi-
tão Domingos Ferreira, que com valor, & engenho, peleja-
va com armas dobradas.Naõ foube o Inimigo dcfprezar a in-
duftria, temendo as veras^que a guerra efcojide dentro das fa-
lácias.

66,6

'TA^TE 1. LIF^^O Fll:\

46^

r'^

lacias.Miiytas noites paílba fcm ver a caraaodefcíinro ,&
uiuyto mais inquiero,na confideração de noíTo deívelo , pa-
recendo-lhe, que delle íe fazia deíenfadoj ou que muy to ma-
y ores forças nos comunicaváo alento j &: na verdade, não er-
rava feu penfamento , porque fe entre nós andavão as armas
tão quentes, não andava menos fervorofa a devação,com que
todos acudião aos Sacramentos , por alcançarem o Jubileu,
que o Summo Pontífice Innocencio Decimo , novamente e-
leito, concedeo a toda a Chriftandade , para que os fieis, em
melhor eftado,pediírem a Deos pello da Santa Madre Igreja,
extirpação das heregias, & paz entre os Principes Chriftãos.
46 Entrou o Março de quarenta &feis,& com elleHé-
rique Dias em peníàmentos de ganhar,& arraiar o Reduto,q
o Inimigo fabricara á fombra da Fortaleza das Cinco Pontas,
ao qual (defpois que os noíTos o invadirão , & largarão ( ti- HeriqueDks in-
nhao Framengo fortalecido em nova formajconftava efta,de tentn ganhar o
húacaza forte,cingida de trincheira degroíTos taboés, entu- Reduto fobre-di-
Ihada de fachinaj&terraj com outra circunvalaçáo depáoa-
pique, que fazia híía robufta eftacadai& húa profunda cava,
que a defendia:Tinha cincoenta foldados de guarnição; vin-
te & cinco para a defenfa da eftacada,& vinte & cinco para a
trincheira; cobertos da artelharia da Fortaleza, & do Arreci-
fe, que defquartinavão o Reduto a tiro de mofquete. Teme-
rária parecia a emprefa , porém aos olhos de Henrique Dias
liada tinha de difficultoza,porque a via có os defejos , de ref-
tituir a feus foldados na antiga poíre,de aíTaltarem feguros ^a
todos, os que por aquella parte hião, & vinhão para a Forta-
leza dos Affogados . Comunicou o intento com o Governa-
dor João Fernandes Vieira:Naõ queria parecer,fe não favor,
pol vora,balla,húa dúzia de machados,& permiUaó , para que
íb os negros de fua obediência tiveíTem parte na emprefa(có-
íiança bem merecida, porque ganhada á força da experiên-
cia: j Era tanta a opinião , que o Governador tinha da capa-
cidade , valor, &: pratica de Henrique Dias , que com hum
mefmo conceito ouvio a determinação,& fopos o fadoiDef-
pedio-o có alegre rofto,& liberal defpacKo:Ordenou a todas comunica a em-
as eftancias, que á hora definida tocaíTem arma ao Inimigo, ^r^y^ aioãoFer-
por todas as partes; & fahio do Arrayal com quatro compa- nandes vieira.

nhias

nmi^

mm

E aos Cabos de

é,66 C-^ST<1(10T0 LUSITjKO 1646

nliias a erperar o íiicçeffo^áe embofcadaj& participar de húa,
& outra fortuna.

47 Contavaõ-fe onze de Março,quãdo Henrique Dias
voltou do Arrayal para a fua eftancia: Chamou feus oíficiaes
a còçelho,propos-lhes a emprefa, com os eftimulos de correr
por obrigação de fua eíl:ancia,pello lugar, & pellos eíFey tos:
Ajuftou-fe á propofta do fuperior , com o defcjo dosfubdi-
tos, & não ouve algum, que não louvaíTe a determinação^ Sc

^ ^^ todos concordarão, que não convinha, de nenhúa forte , en-
provãocomaho^ ^^^^^ ^^ facção a peíToa de feu Governador,cótradizendo-lhe
rofo. as inftanciasjcom tão vivas rezoés, que venceo o juizo, as re-

pugnancias da v ontade. A prudência he arte , não he nature-
za: Não tem cor a difcriçaõ, como a não tem a fuftancia das
couzâs. O diamante tofco fe chama bruto, porque amorteci-
do: Polido pello artifice, realça nos claros . Negro he o Eva-
rio,& burnido reípíandece. Afíi o Governador , como o^ fol-
dados cráo Negros, mas que importa, fe nelies refplandecião
os claros da prudência, para temer a defgraça^ 8c os do valor,
para defprezar o perigo. Obedeceo Henrique Dias,aos feus:
Não tem rezão para mandar , quem não fabe obedecer á re^
zão. Defcobrio-fe o campo, Sc certo, de que nelle não apare-
cia Inimigo,efcolheo Henrique Dias de todo feu terço qua-
tro companhias; a íàber as dos Capitães Yalor,Paes, [efta go-
vernava o feu Alferes ] Gracès , Sc o Capitão May or Antó-
nio Mina,que o era de todos os pretos deíla nação j huns, &
outros eftmiados por fua valentia,& deftreza, apurada em to-
das as occazioés, que fuçcedèrão defpois da batalha das Ta-
bocas; tempo, em que o Governador João Fernandes Vieira
^ os fes livreSjporque já então os vio foldados. Entrou a noite,

&paíráraõ o Rio ás ordens do feu Sargento Mayor Paulo
Dias Saõ Phebiche ( apelido , que tomou do Conde de Ba-
nhollo,com quem podèra partir fidelidade, Sc valor. J PaíTou
Henrique Dias com fó o defejo,porque cõ a peflba, & a mais
gente de feu terço ficou prefi:es,para toda a contingência.

48 Coberto do efcuro da noite, & da baftidão do mato
levou o Sargento Mayor Paulo Dias Saó Pheliche a fua gen-
te até á v iíla do Reduto,aonde chegou pellas onze horas^di-
vifou-fe o vulto de duas íintinellas inimigas, perto da eftaca-

da,

>,J1^..Í^'P

MMMJH

164o

^A^^E 7. LirilO Vil.

4^7

da, as quaes logo tocáraó arma j& Tendo , que cada húa a def-
paroti lem pontaria certa , a fes húa das bailas matando-nos ífn P''' f'"
Jium loldado Mina^porem avançados dos mais,pagàraó com rio, & ganha o
duas mortes, aquella vida: Chamados do rebate , fahirão os ií^i«/í?.
defen fores a receber duas cargas cerradas • & o efpanto da fa-
cilidade, com que os noflbs faltarão a cava,& deraó por terra
com hum lanço da eftacada, abrindo caminho ao furor , com
que os degolarão á cfpada: Sem perder tempo , avançarão a
legunda fortificaçáo5& ganhada a trincheira,enveftiraó a ca-
2a forte,aonde os vinte & cinco de feu prezidio fe tinhão re-

colhido^os quaes entrados pello telhado, & pella porta, a pé-
2ar de toda fua reíiftencia,foraó mortos;golpe de que fó qua-
tro livraraój dous , porque o parecião, & dous, porque o de-
femparáraó.Com facilidade trocarão os noífos então,a vi6io-
ria pello preço: Cuftou-lhe oy to foldados, que logo ficarão ^^^^^_^ , ..
mortos. Chorou-os o fentimento de fe imaginar , que as bal- àoIdlúaXm-
Jas dos companheiros lhes tirarão a vida ; difgraça que occa- tra farte!
zionou a pouca capacidade do lugar, & a muyta efcuridade
da noite: Vinte & quatro foráo os feridos, dos quaes alguns
morrerão: Os de mais conta, & de mais perigo foráo, o Capi-
tão Mina,paírado de húa palanqueta pellospeytos^ o Capi-
tão Garccs,com duas bailas em húa efpadoa : O Capitão va-
lor, com hú pelouro em húa perna ^ & dos officiaes menores,
hum Alferes,& dous Sargentos: Viraõ-fe os foldados fem Ca-
pitães, que os governaíTem jo pleito vencido, a detéça inútil,
o dano certo, (porque as Fortalezas cobriáo o Reduto de
ballas)carregáraó ás coftas os mortos^Sc: feridos,& algum def-
pojo de armas, veftidos , & alfayas i & fe retirarão para a fua
cftancia. O Governador da liberdade, (a quem nunca o me-
recimento achou efcaíTo, nem o ferviço curto) que efperava
a contingência do fucçefíb , fahio a receber os valerofos fol-
dados, levando a cada hum nos braços , com os divídos lou-
vores: Aos feridos recolheo, & mandou curar com vigilantif-
íimo cuidado.

49 Os Capitães das eftancias , ouvindo a artelharia do
Inimigo (era efte o final para a execução das ordens recebi-
das) por todas as partes picáraó o Olãdès com arma tão qué-
te^quelhepareceo aíTaltOjO que fó era diverfaói&por fe de-

fenganar,

X

Por todas aí par-
tes fe toca arma
ao Inimigo.

Acção dejiemiâa
do CapítãoSebaí-
tiaõ lerreira.

De detro dafua
ejíacada dolni-
viigp tirou os ga'
dos.

4^8 C^STKIOTO LUSITJNO 16^6

fenganar, mandava por o fogo ás Taboas , que tinha fal pica-
das de pólvora, para que com fua luz defcobriffem o terreno^
& encaminhaflem as bailas de fua artelharia, aonde as pedif-
fe a neceffidadej remédio, de que fe valeo ò medo , até que a
luz da manhã lhe trouxe, com feguridade, o defengano . Ao
Capitão Sebaftiaó Ferreira morador na fregueíia de S. Loii*
renço (cup valor em todas as occazioés fervia mais á envejaj
que á imitação ) coube em forte tocar arma ao Inimigo pel^
lo forte do Perrexil j [íituado na reílinga de area,que forma o
caminho do Arrecife para a Villa de Olinda ] com trinta folf
dados efcolhidos fe meteo debaixo da artelharia delle, dando
ao Framengo tantas5& taõ bem fortidas cargas,que com hum
mefino juizo fe temeo aííaltado , & rendido . Foy efía, entre
todas as noites, a que mais cófundio, & defvellou ao Olãdèsj
& com mayor cauza , quando com o dia vio certos os funda-
mentos de feu temor no eftrago do RedutOjfucçeíTo , que o
efpantava com o exemplo,& com o avizo.

5 o Apacentava o Inimigo algúas cabeças de gado , de-
baixo da artelharia de fuás Fortalezas: Veyo á noticia do
Governador da liberdade,que no precinto da que chamavão
dos AíFogados, paftava mayor numeroj^: alguns cavallos j &
com intento de perfuadir aos Framengos , que do animo , Sc
ouzadia Portugueza,fe não ifentava , nem o lugar mais arrif-
cado, nem a vigilância mais folicita,chamou ao Capitão Do-
mingos Ferreira^ dê cuja induftria , & valentia fiava a execu-
ção de feu penfamento : Comonicou-lhe o defejo . O Capi*
tão,que não fábia recufar , nem temer jobedíente,& alegre fe
difpos para a emprefa. Efperou a noite j & acompanhado de
feu animo,& das^fombras della,foy reconhecer o fítio. Achou
o gado recolhido, & cercado de húa trincheira depáo api-
que, fem mais entrada,que a de húa porta,unida á da Fortale-
zaíVoltouadarcontaafeusfoldados, infundio em todos o
deftimi do de feu coração, dando-lhes a beber o alvoroço nas
evidencias do perigo.Entràraõ no curral, deitarão fogas ao
gadoj& cortàraó,as que tinhão prefos algús cavallosj & quã-
do já bufcavão a porta para a fahida, forão fentidos,& fe dei-
tarão por terra entre o gado,aonde cfcapáraõ de muytas car-*
gasjque o prezidio da Fortalez a atirou a vulto ^ & muy to ao

lar-

ÉÉ^

'1646

(PA^ÍQ^E 1. LWíip VIL

Ah

' I ij

largo ( não lhe vindo á imaginação , que tinha tio junto cie
fuás armas o alvo de feu dcfejoi^Defpois de algum eípaço íe
tornou a íbçegar o Framengo , tendo para íi , que fe inquie-
tava fem fundamento . Náo fe moverão os noífos fe não átí-
pois , que entenderão do fiIencio,que a todos os da Fortale-
za occupava o defcanfo. Abrirão a porta do cerco, montarão
cm fete ca vali os, trazendo diante vinte & cinco boyes, ( que
eraó todas as cabeças que allí paftavaõ) entrarão pello mato,
& com trez cargas defpertâraó o inimigo : Avertido do rou-
bo , acabou de entender, que não podia fiar de feu feguro, fe
naõ o que lhe permitiífe noíTo atrevimêto. Ficára-lhe ao Co-
mendorhumcavallo, porque-fuaeftimaçaõ o tinha naeftre-
baria: Quiz deitallo ao campo,& mandou a hum Framengo
feucriado,quedormiífeaopéde)le^oqual o fes taõ acautel-
lado,que a íi meííno fe prendeo com a corda do bruto.Foraó Mais grâckfo
duas fintinellas noíras,até a cava da Fortaleza, divifarão hum ^'^^^"^ .
vulto, chegarão com tento,& virão hum homem dormindo,
prefo na corda de \m cavallo,que andava paftando^ cortarão
o baraço^ montarão no cavallo , & defaparecéraó : Acordou "
o Framengo,& quando entendeo o roubo , cõgelado do paf-
mo,& do medo, fe paíTou ao noíTo Arrayal , & deu por no-
vas, que no dia de antes anchorára na barra do Arrecife húa
náo de Olanda, a qual aííirmava,que na altura de Cabo- Ver-
de tivera vifta de hua armada, & lhe contara paíTante de cin-
coenta vellas, mas que não poderá alcançar,fe era Caílelha-
iia, fe Portugueza. O mefmo repetio hum Ingrez, que os fol-
dados de Henrique Dias prifionarão. Noticia, ainda que cõ-
fu fa, baftante para trazer ao Inimigo inquieto , & fobre-fal-»
tado.

5 I Aquelles dias, em que lia campanha 3e Pernambuco
fuGcedeo o referido , gafiou André Vidal de Negreiros na
marcha para o Rio Grande:Scm acontecimento notável che-
gou á Paraíba, aonde achou a Dom António Phehpe Cama-
rão ,com o fèu terço de índios , retirado por falta de muni-
ções, (como fica referido.J Pareceo a muy tos,pelIo que àç:£-
pois fuccedeo, que o deteve até aquelle tempo fuperior dif- If^t^nfa o Gover^
pofiçaÕ.Checrára [pouco antes,que André Vidal de Negrei- ^^àorolUesga^^
ros] á Fortaleza do Cabedello o focorro, que o Olandès má- ^^'' ^ ^''''^'^-

Rr

dára

chega Anâre Vi-
dal a Paraibano'
trata de caíHgar
o atrevimento.

Inàuflria de c[ue
fe aproveita , &
'que executaoCa-
fitao António Ro-
drigues Fidal.

/^jo CAST^^oro LUSITJKO 1 646

dára do Arrecife, para a do Rio Grande , tão deftitiiida de
gente, & de animo, pelloeftragb, que recebeo dos Portu-
guezes na occaííaó atraz efcrita ( que defde entaõ nenhuiB
Framengo foy ouzado a deitar hum pé fóra delia. ) Eera o
Comendor, ou Governador, Olandès, & foldado : Vio-fe cõ
a gente daquelle focorro (ainda, que remetido ao Rio Gran-
de) no porto de fua Fortaleza do Cabedello , & refolveo-fe
em fe aproveitar da occazião, que a fortuna lhe oíFerecia , af-
fegurando-lhe bóa forte o faber,que não era poffivel aver na
Paraiba noticia da nova gentej& por eonfeguinte faltar o re-
paro, aonde faltava o receoT Com prefteza,& cautela embar-
cou em lanchas todo o poder j fobio o rio,com intento de le-
var a Cidade por entreprefa: Sem feríèntido a aviftou ; po-
rém defcoberto de duas fíntinellas noíTas , foy atalhado pella
gente,que acudio ao rebate.Naõ tardou Dom António Phe-s
lipe Camarão em formar embofcadas para o deftruir , ao dç-
fembarcar: Porém elle, ou tknido , ou aconfelhado, virou as
proas ás lanchas,tanto que fe vio fentido,&não parou ,fe não
dentro da fua Fortaleza do Cabedello.

5 2 Achou André Vidal de Negreiros frefca a pratica
defte fucçeíroj& a Dom António fentido,do Framengo naò
voltar caftigado 5 conheceo elle em André Vidal apropria
magoa,!& levados de hum meímo motivo,convierão em hum
mefmo peníàmento: Pellonão prefumir a trayçâo, (certa a-
onde contrataõ Judeos) obfervarão exafiamente o fegredo:
Avia de ter mais parte na emprefa a induftria, que a força, &
ordenarão, que a gente nomeada marchaíTe para o Certão,
porque affi fe enganaíTe a curiofidade,& a fofpey ta. Andado
caminho de nove legoas pella terra dentro , mandarão fazer
alto,& dallí voltarão a marcha para o mar , tão medida pello
tempo, que chegarão de noite a hum íitio perto da hermida
de NoíTa Senhora da Guia, & pouco diftante das Fortalezas
do Inimigo, Sanfto António ^ & Cabedello . Ajuftadas com
o íitio, formára5 trez embofcadas diftin6l:as ^ mas não diftan-
tes; húa de PortUguezes, as duas guarnecerão índios , em fa-
vor das quaes ficàraõ os dous Cabos cõ õ refto da gente: Da-
quelle pofto defpedio André Vidal ao Capitão António
Rodrigues Vidal, ( apelido em q trazia as eftimaçoés de fol-

dado)

-^^ — -

I ^46 TJIITE 1. LIV^O VIL 47 1

dado) com quarenta moradores efcolliidos por ourados , &
práticos no terrenoj& com òrdemjqiie foílem picar o Inimi-
go aTuaforça deSanfto António, porque de feu valor, &
làgacidade fiava o trazello ao laço ; Correípondeo o fiicçeí-
{oi efperança. Marchou o Capitão com a gente confignada,
chegou d viíla do Forte, como a furto, moftrando,que efcõ-
dia o roubo3 aparecia aos Inimigos, como por defcuido , fin-
gindo,que não queria fer fentido : O Framengo , ou porque
defprezou o numero,ou porque temeo o ardil , difllmulou c6
a ira. O Capitão Portuguez, por lhe acender a cólera , come-
teo o Forte a cara defcoberta, Sedadas duas cargas, fe retirou
com os feus, bufcando hum cumulo de área para reparo das
bailas Inimigas, donde com aftuto defprezo o provocava i
-v ingança :Determinou-a a falta do fofriméto, & da imaginai
jção, de que no campo não avia mais gente.Mandou pedir fo-
corro á Fortaleza do Cabedello , & com fcíTenta Olandefes,
& cento & feíTenta índios defembarcou no arcal,tão certo da
vicl:oria,& da prefa, que temendo,lhefugiíre a caça , deu ao
avanço o tempo, que lhe podia gaftar a forma . Entre Olan-
defes, & índios fe adiantava húa feiticeyra Braziliana, que
brandmdo hum alfanje,dizia : Deixaime chegar com eftas I,^^^^^'^
unhas a eíTes caés Portuguezes,que para lhes rom per os cora-
ções, fou Tygre^ligeira onça,para lhes dar alcance3& fequio- ^^ ^
2a fera, para lhes beber ofangue, & defpadaçar as carnes. ^^
Chamavaó-lhe os naturaes Page, que em fua lingoa foa, pro-
phetizai& Anhaguiará,que he o mefmo,que fenhora dos de-
mónios j em cujo auxilio punha a fuperíliciofa gentilidade "'^
daquell es bárbaros, toda fua confiança.

53 Com efi:udado defprezo, efperáraõ os noíTos o Ini-
migo, até que chegando a tiro de mofquete,o receberão com
duas cargas jfingiraõ-fe enganados de fua imaginação, no ex-
ceíTo do nnmero,que os cometia,& como perturbados,fe po-
feraó em defordenado retiro: Ao tempo aflentado, virarão as
coílas com arrebatada fugida^ para que o alvoroço da v i£i:o-
ria, Sc da cobiça não deixaíTe ver ao Framengo o perigo do
alcance :Le vara o os feíTenta Olãdefes a vanguardaj& como, - . .
le ganhada a vice o na, tora o lo a recolher os delpops , le me- ^^^ ^^^j^^ emboít
téraó no cora^aõ das embofcadas , das quaes receberão duas cadas.

Rr 2 car-

) '\

Sahe o Olanâes â
campo , com que

47 2 C^STf^/OTO LUSITJKO 'j6^^

cargas de mofquetaria tanto a tempo, & taó bem emprega-
das, (jue o teftemanháraó cincoenta , Sc oyto mortos , quaít
todos Olandefes: Dos poucos índios, que matáraó eftes pri-
meiros tiros, foy hum a fua feiticeira , que ficou eftendida no
campo, paíTada com duas bailas pellos peytosiOs outros cor-
tados do efpanto, & certos na morte , bufca vão nas agoas do
i mar o fepulcroj reprefentava-Ihes o medo, menos amargofo

o trago bebido nas ondas, que no fangue das feridas j & noíTa
efpada lho fes beberno fatigue das feridas, & na agoa das on-
das. Perfeguidos dos golpes os fepultáraò as agoas. Via o
MeftredeGampo André Vidal de Negreiros, que a todos
hia confumindooavanço,(defejavafaberoeftado,em que
ficavão as Fortalezas do Inimigo ) bradou , que lhe tomaf-
fe hum Glandes vivo: Dous foldados do Camarão, que
feguião a dous, ( os últimos dos feíFenta , com que o Ini-
migo íàhira ) fe deitarão a agoa, & pellos cabellos os ti-
rarão do mar j matáraó hum , do outro fe aproveitou o
Meftre de Campo . Perdeo o Framengo nefta occaziaô os
feíTenta Olandefes,Gom que fahio,& todas as armas; & as lan-
chas, em qu e fe embarcou: Dos índios não fe pode contar o
numero dos mortos; fó quinze nos moftrou o Campo , quaíi
todos os demais efcondeo o mar : A agoa, que os aíFogava,
os cobria : Raro foy, o que falvou a fuga, porque a oppoíir
,, çaó do braço, Sc do terreno,lhes não deixou aberto outro car
minho, fe naõ o da praya.Da íioíTa parte naõ ouve ferido, fo-
jlhni \ ^''^^ ^^ V^^o, que nos enlutou a v laoria , a morte do Sargento Ma-
^^f»%^- y Qj, Francifco Cardozo; (não dizem, de que terço.) Naõ far

ça duvida, o naó deixar efíe encontro ferido algum dos noít
4bs : Naõ pode ferir, quem naó levanta o braço para fe defen-
der; nem defembainhar a eípada, o que põem toda fua falva^
çaó na fugida.

54 De todos foy aplaudida a viâ:oria;ceIebrou-fe com
grandes demonftraçoés de gofto) porque toda da induftria.
Os homens eftimaó mais o vencer com o juizo , que com o
braçQ . Recolhidos os defpojos, fe voltarão os noífos á Pa*
raiba, aonde foraó recebidos com alegres vivas . Naõ
sdu o /«/W^í ^^^^3"Ç3raó no triumpho. Os Capitães grandes naõ fa-
em Tejucíípapo. bem achar defcanfo no dçfeanfo^ nelle fe aprefíáraó para

tornar

í6^6 fAXTB I. Ln/1{0 VIL 473

tornar logo á campanha . Em breviííimo tempo defpedio o
Meftre de Capo André Vidal de Negreiros para o Rio Gra-
de, ao Governador dos índios Dom António Phclipe Ca-
maraò,com o feu terço, aííiftido dos Capitães Paulo da Cu-
nha Soto-Mayor, Francifco Lopes, João de Magalhães, An-
toniojacome Bezerra com fuás Companhias, & a de Nicolao '

Aranha,governada pello feu Alferesj& outra de Crioulos do
terço de Henrique Dias [teve Capitão; & nefta, como em
outras occazioésjlhe não deu nome o defcuido ; como fe o
baço da cara , lhe podeíTe efcurecer os claros do animo.j C5-
cluida efta expedição, fe partio André Vidal de Negreiros
para a campanha de Pernambuco, aíTiftido do Capitão An-
tónio Gonçalves Tiçãp,com a gente de fua companhia. Nos
dias que gaftou a marcha,fahiraó da Ilha de Itamaracá oy ten-
ta foldados Inimigos, entre 01andefes,& índios, era lanchas,
para a paíTagem fobejas,para feu intento precifas; defejav ão
carregallas de mandioca,das roças de Tejucupapo, fertis def-
te género, & acomodadas, pella v ezinhança, para a facilida-
de do roubo,& do remedio(não podia efperar tempo a gran-
de fome,que fe padecia na Ilha:)Defembarcáraó os Inimigos
a furto; com prefteza começarão a executar feu defejo, que zennhh AckoU
lhes atalhou Zenobio Achioli[Cabo da milícia daquelle dif- o rm^e.
tri£lo.] Com trinta foldados os aífaltou; & com tão bóa for-
tuna, que não deixou aos contrários mais acordo , que o de
fugirem para as lanchas, & nellas para a Ilha: Levarão v inte
fcridos,& deixarão no campo trinta mortos,com todos os in-
ílromcntos,St toda â mandioca, que tinhaó arrancado.

5 «5 Inílava a fome de forte , que não deixava avertir o
perigo: Em lanchas, & jangadas tornou a fahir o Olandès da
II ha, com trezentos Framengos,& grade multidão de índios;
encaminharão as proas a húa Ilheta,chamada TapeíToca ( do
deftrido de Tejucupapo) aonde deitarão agente em terra;
de que logo teve avizo Agoftinho Nunes, Sargento Mayor ,^;7,7 W^^^
da ordenança nodeítriâo de São Lourenço deTejucupapo. oAJfaíto,
Com a preíleza,que pedia a occazião,mandou tocar arma, &
com as companhias do Capitão Mayor, & do Capitão Ma-
noel Lopes,& oy tenta homés difperfos, entre pagos, & mo-
radores,marchGu a encontrar-fe com o FramengOjque vinha

Rr3 buf-

474 C^ST<1(10T0 LUSITANO tój^ó

bufcandò as roças,com o qual derão os nofibs, de roílbjentre
huns matos, que cruzavão differéntes caminhos : Favorecia-
nos o ritio5& a pratica do terreno, para q o Inimigo não viíTc
a dirparidade do numero, nem entendeffe a forma do aííalto:
Como de embofcadas recebia os tiros,aumeatando feu eílra*
go com fua mefma reíiftencia.Durou largo efpaço o comba- .
tei& com o tempo creçeo-de maneira o dano, que afíbmbra-
do de feu deftroço fe pos ettx fugida : Bufcou em fuás lanchas
o ultimo remédio, levando çoníigo muy tos feridos : Deixou
E o SargetoMa.' ç;^^^^ quafi oy tenta mortos, & as munições, Sc armas dd
nes o capga. <l"afi todos OS feus,retirados, mortos,& teridos que derao ao
defpojo,;& ao defembaraço . Toda a perda da noíTa parte fe
refumio em hum morto.O que bem confiderado , aííi nefta^
como em outras ôccaziòésfemçlhantes,he força, que o juizo
humano o julgue impoíílyel, fe as olhar como cazos; não affi,
fe as vir como caíligos.Arp rebate acudio o Capitão Mayot
da terra Zenobio Achioli com a gente , que a preíTa lhe dei-
xou ajuntariporém antes de chegar ao pofto do confliâo,en-
eontrou os noíros,que voltavão triumphantes, atribuindo ao
ceo a viâoria, gratos,& alegres. .fií,.j íí ; . >

ty6 Eftimulado o Inimigo da dor dos golpes ^& da ma-
goa das calamidades , determinou envidar em húa mão todo
o feu refto , por confçguir o remedio,& a vingança. Ordená-

n-..r.;^^ .,.>, ^*.>. í'aõ os do Concelho ao feu General do mar João Cornelim
Terceira vc^pro i.^^,. ^ o- ri

ofa o Inimigo a (ou Cornelizent Chietart ) que com cento & cmcoenta lol-

fortuna com me- dados fahiíTe do Arrecife,& levaíTe da Ilha de Itamaracá toda

Ihor forte. ^ gente^que podeíTem efcuzar os pf ezidios,& com efte poder

faltaíTe em Tejucupapo,para que de hum mefmo golpe vin-

gaífe, nos moradores,a in)uria,& carregaíTe as lanchas de mâ-

timentos, para acudir á miferia: Executada a ordem , tomou

o Framengo terra, em húa parte, aonde algús moradores, tra-,

2 i aõ efcra vos, arrancando mandioca de fuás roças. Víraó a

multidão das lanchas,o groflb da gente, o intento da marchai,

a refiftencia inútil, a detença temerária, & a perda certa j de-

famparáraó tudo & correrão a dar avizo aoMeftre deCampo

André Vidal de Negreiros ( chegado de poucas horas a Go-

yana, lugar pouco diftante , aonde fizera alto para fe refref-

car do enfado da marcha . ') Ouvio o rebate com alvoroço

de

ié4í^ fPJXrBI.LlF^llO Fll. 475

de roldado,&: porque a detença lhe não roubafle a occaziáo,
defpedio logo ao Capitão António Gonçalves Tiçaójque
com a fua companhia foffe enterter o Inimigo,em quanto el-
le não chegava com o grolTo da gente , que ficava conduzm-
do.O Framengo, que íó de fiia diligencia fiava fiia dita , car-
regou fijas lanchas da mandioca,que achou preíles, & da frui-
ta de efpinho, de que he abundante o terreno , em taó breve
tempo, que quando chegou o Capitão António Gonçalves
Tição, já navegava de mar em fora , fervindo-lhe a vifta da
nofía gente, de lhe fazer tanto maisfabrofo o furto, quanto,
mais vezinho confiderava o rifco , Não tardou o Meíire de
Gampo André Vidal, em ver na fugida da occazião a cauza
de fua magoa : Húa das lanchas do Inimigo [& naó era a me-
nos carregada^ deixou nas mãos de fua cófiança, todo o. frui-
to de fua diligencia:Apartou-fe da cõferva das outras,& cof-
teando a terra, á v iíla do Páo Amarelo,foy defcoberta de al-
guns pefcadores noíros,que andavão em fuás Jangadas, deita-
do as redes ao mar j trocarão os lanços á pefca, & deixadas as Huns pefcadores
redes en veftiráo a lancha,que logo renderão com a morte de ^^^ defraudão.
trez Olandefes,que fe deitarão ao mar,& com darem quartel
a dous,& a hum Mulato,& hum Negro, que nella ficarão ca-
tivos. Aproveitaraó-fe do refrefco,&: da lancha , que defpois
lhes fervio para may ores empregos.

5' 7 Continuava entre os Olandefes a fome,& a paíTagé
dos foldados , & gente vulgar do Arrecife para o noífo Ar-
rayal,& pella mefma rezão as teftemunhas da falta dos manti-
mentos,que crecia com o tempo ; & Juntamente a impaciên-
cia, com que o vulgo, & gente militar dizia a cara defcober-
ta,que fe largaíTe a praça,quando tinhão na mão a convenié-
cia, de fe adiantarem nos partidos, antes que fem ellcs,os en-
tregaíTe o rigor da fome,& o das armas. Opinião,& pratica,q perúnacia^écA'
os Judeos impugna vão, certos,de que os não efperava menos^/^<7 dos ludeos
caftigo na entrega,que na efcala: Vivião fobrados, & a mife- do Arrecife,
ria os defconhecia cópaffivos. Forão acuzados, de que tinhão
recolhido em fi todos os mantimentos,& que faziáo mercan-
cia da tenacidade: Derão em todas fuás cazas,os do governo,
cm húa mefma hora. Acharão abúdancia de tudoj depositou-
fe em mãos particulares,para focorro da neceífidade comua,

Rr4 &

í 'i

', I

CJSTj^IõXO LVSlTJlbJO

i6é^6

V^inlw de lontí
Fernandes Viei-
ra vencida dos
mais.

FAltavèm o nojfo
Arrayal wanti'
mmtos^é' folda.'
dos.

loao ícrnmâes
vieira acode áfd

te.

& a todos os obrigarão a comprar pello preço, cjiie vendiaô.
Fiâos como Tem pre, pareci a, que obedeciaójraas como a per-
da era da fazenda, facilmente os levou a defefperaçáo ,a lhe
aplicarem o mais violento remédio . Tratarão de amotinar ò
povo, [inclinado a mover-fe com qualquer novidade ] & le-
vantarão contra fi as pedras . Deráo fobre elíes os foldados
do prezidio , & coiit levarem o merecido, parou o tumulto:
Matarão fete, & foraõ tantos os feridos , quea occupaçaó da
cura,Ihes tirou da memoria a da vingança . Com as certezas
deftas revokçoés , & da cauza dellas,íè aumentava entre nós
ã efperança de recuperar a praça,por entrega^ fem o cuílo, &
fem a contingência dos aíraltos,que o Governador Joaõ Fer-
nandes Vieira aconfelhava^ & propunha, tanto menos a per-
da,quanto mayor era a opportunidade5& a rezáo ditava, que
todos,os que tímidos defejavaó a entrega, aviaó de acudir re-
miíFos á defenfa: Foy a opinião vencidaj&o tempo moftrou,
quanto tinha de aíTertadaj &como o deJfenganocaftiga íem-
pre com o arrependimento» -■ ^ -^ . - . . ■^..,.

58 O Meftre de Capo Knht Vidál Í3è Negreiros, def-
poís que entendeonáo fer de utilidade fua affiftencia em Go-
yana, fe paftio pára o Arrayal , aonde chegou em os primei-
ros de Abrilj tépo^ em que nelle fe começava a fentir a falta
demantimentos,& de foldados : Os náturaes , & moradores,
ándavaó já quafí remontados; & alguns dos foldados condu-
zidos da Bahia, fe rinhaó hido paraaqotlla praça.Cõferiraó-
fe os mey os para remedear húa,&outra falta,& fe definio por
mais efficaz, a authoridade , & agrado do Governador Joaã
Fernandes Vieira, cuja peíToa era,a que fó podia concluir ef-
te negocio. Aceitou a diligencia,prometendo correr as prin-
cipaes povoações do reconcavo^como eraõ. Cabo de San6Í:o
Agoftinho, Ipojuca, Sirinhaem, Una, Porto do CaIvo,& ou-
tras,em quanto á conducçaó dos mantimentos.Refolveraó-íè
em que á Bafiia, aonde naõ podia chegar o braço , era neceA
fario, que chegaííe a queixa, avizando ao Governador Geral
do Eftado, dos foldados,que afurto fe tinhaó voltado. Sobre
modo fe apaixonou António Telles da Sylva : Sentio o atre-
vimento, como ofFenfa feyta á pefloa, &ao Eftado. Com fa«
gaddade,mandou tomar a rol os delinquentes^ Sc todos pre-

fos.

■«as

Éiiaii*^

ie^

n"- ^

1646 'Pj^ELLlV^ril. \jj

fos, caftigou aos principaes com forcas , & defter ros ; & aos
menos culpados mãdou voltar logo, para a campanha de Per-
nambuco. A todos os negrosj que achou , Terem dos mora-
dores daqucUa Capitania, mandou prender, & depoíitar,pa-
ra íe entregarem a feus fenhores, ou a quem tiveíTe procura-
ções Tuas. Expediente foy eílc, de confequencias utilliííimas,
•porque para os efcravos foy grilho,& para os foldados freyo.
5 9 Apreftou-fe o Governador João Fernandes Vieira
para a ;ornada,& para de caminho executar o defejo, que ti-
nha de aíTegurar o porto de Tamandaré, com húa fufficiente
força, que igualmente ferviíTe á defenfa da terra, & á da bar-
rasse partio do Arrayal em dez de Abril. Em cftes poucos
dias, que fe deteve, fahio o Inimigo com hum ardil mal ordi-
do, & peor logrado. Deitou fama,que de Olanda lhe chega-
ra avizo, em como ficava,para fazer viagem hiía groffaarma- Ardil com que
d3,quea Companhia mandava para fogeitar os rebeldes ,& /w»?/^o msque-
conquiftar os livres. Na credulidade defta nova fundarão to-^^^^^^V^^^^^'
da a quimera.Fingirão duas cartasihúa da Mageftade delRey
de Portugal Dom João o Quarto,efcrita a Francifcode Sou-
iza Cou tinho,(naquelle tempo refidente em Olanda com ve-
2es de Embaixador )&inclufanel!a outra, que dizia ferdo
Governador do Eftado Antoaio Telles da Sy I va , efcri ta ao
mefmo fenhor, em a qual lhe repetia por nova a acclamação
^a liberdade no Brafil, com todas as circunftancias do fafto,
Sc juntamente o treflado das ordens , que o mefmo Rey def-
pedio logo ao dito Governador Gèral,que naó favoreceíTe a
íolevaçáo, para que feu refidente as aprezentaííe aos Efta-
dos, & por ellas fe entendcfle , que nem confentira , nem fa-
vorecera á dita folevação . Publicarão eftas cartas no Arreci-
fe,& copiadas em muytos treflados, as mandarão deitar em Conhecem os mf.
partes,que facilmente cahiíTem nas mãos dasnoíTas Çíx\úx\ú'f''^ '^í^imsra.
Ias, & delias paflaíTem ás do Governador João Fernádes Viei-
ra. Leraò-fe as cartas, & pellos erros do eftilo , & impoffibili- •
dades do tempo, fe conheceo o engano pella cor do veftido;
& pellas guarniçoés,o intento da ficça6,que era quebrar-nos
o animo,& por efte meyo agoar-nos o calor , com que noíTas
armas o opprémiaõ. Comunicou o Governador da liberdade
as cartas, & o que delias entendia, aos Meftres de Campo , &

Go-

47 S C^SniWTõ LUSITJNO j6j^6

Governadores de Mi'nas,&íiidios3& aíTentáraõ^que as repiil-
taíle o defprezo.Pareceo-lhe a Henrique Dias diícreto o caf-
tigo 5 porém intolerável o íilencio, infofrido na cauza,que fe
dava ao Oiandès, para imaginar , que a diííimulaçáo era cau-
tela do medoj&pedio licença para refponder aosdeíatinos
cia invençâoj&á injuria do conceito, parecendo-lhe queco-
Ercfpe-ade Hen^ nio a ncgriííhos nos poderia enganar^ & elle, como negro^os
nqueVinsaate' q^ena convencer: Concedeofe-Ihe,queo fizeíre,& efcreveo
húa carta (da qual fe colhe,o que coíitinhápj as que fin^io o
Inimigo) com as rezoês feguintes. r .

, 6o Saõ taô conhecidos os arteficios, com que Olandár
Carta de Henri- ^'^^^^'^^^ ^ reputação de fuas armas, que feu engano não en-
que Diãs para os reda, fe não a quem o fabrica. Aqu elle brado de fua potencia,
olandefes, „ que no principio perfuadio á íingileza,defpreza }i hoje a ex-
-55 periencia. Eíles papeis, com que voíTas mercês nós querem
55 intimidar, nas faltas do difcurfo moftráo, quefaó partos da
55 malicia,& não da verdade. O primeiro pregáo,que publicou
55 a emprefa da liberdade,foy o grito,que deu a batalha das Ta-
bocas, pclla viâ:oria, que nella alcançarão os moradores def-
55 ta Capitania, & que Olanda efcreveo com a tinta de feu fan-
55 gue, em trez de Agofto de 1645 . & a data da carta fopofta,
55 [que dizé,efcreveo elRey de Portugal âp feu airiflente Fran-
ciico de Souza Coutinho ] mpftra fer de cinco de Outubro
do mefmo anno j intervallo de tempo , que não paíía de fef-
fentaSc trez diasj tão limitado para hum correyo levar ano-
55 va de Pernambuco á Bahia, & hu navio da Bahia a Portugal,
(ainda, quando não ou vera detença de eferever , defpachar,
55 & fornecer a embarcação)que efcaíTamente o poderá vencer
55 o voo, quanto mais as yokas da navegação , & da jornada.
55 Com rnais certeza fe ajuftaõ entre vofías mercês as partidas
55 da fazenda, que os cômputos do tempo.Os papeis, que affina
55 a mão Rea1,he com a firma de Rey,& não,Sua Real Magefta^
5) de,como voífas mercês firmão eftes papeisiErro he efte muy-
55 to próprio, de quem não tem ley, nem Rey. Se os fios de fua
55 efpada cortão tão mal, como os de feu juizo^ pouco nos fica,
55 quetemerj & muyto menos,vendo,que a mão, que há de dar
o golpe, erra, movendo a pena:Nefta averteneia entendo eu,
5, que voí$as mercês me hão d^ avaliar amigo j ainda que pellas
:\ " obras

i6^6

iPJ^E 1. L1V(^ VIL

479

obras me experimentem contrario.Em fàlfo fabrlcão, fe tem »
para fi , que com embuftes fe melhorão ; em algum tempo ')
os fes diíTimiilar a força; porém já agora,mal os poderá fofrer "
a independência: Refulta delles forão os agravos , & tiranias, '>
que animarão o gemido , cõ que os Pernambucanos nos per- »
fuadiráo á vingança, amim, & ao Governador dos índios D. »
António Phelipe Camarão. Faltámos á obediência , que nos '>
occupava no certão da Bahia , por não faltaremos ás obriga- n
çoés da pátria, refpeytando primeiro as leys da natareza,que n
as do império. Achámos aos opprimidos,viâoriofos , & átí- »
forçados com as armas nas mãos, tão cortados da tirania, que ji
abominavão as memorias da fogeição: Valia-fe a rezão da lê- »
brança,com que repetia as injurias; & ós olhos das ruinas, em j>
que permanecião os eftragos, & com facilidade levarão o fo- j»
frimento \l ultima defeíperação. Aquelle motivo, que nos fes »»
parciaes no agravo,nos fes também auxiliares no caftigo,com )>
refoluçaó taõ deliberada, que primeiro nos há de faltar a v i- »
da5que nos caya da mão a eípada:Mal difcurfa5,fe imaginaó, )>
avemos de crér,que nolTo Rey,& Senhor há de ouvir melhor ?>
a inimigos infolentes, que a VaíTalIos queixofos. Em quanto n
a juftiça lhe não reftituio a coroa, podera-nos affiftir fó com »
a magoa; agora , que íe vé reftaurado no trono , não poderá j»
deixar de nos affiftir com*o braço:Façaõ efte conceito,& dif- i?
correrão politicos: Aonde tropeçarão mais cegos,foy,em nos »
quererem perfuadir, que o governo de Olanda,tão coíído c5 ;>
as rezoés de eftado, andaíTe taõ atrevido, queameaçaíTe com j»
o poder a hum Rey de tamanho coração, que deíprezou o da n
mayor Monarchia de Europa : Pinta-lhe a imaginação , que n
Portugal fe arma contra a acclamação de noíTa liberdade.^ co- »
mo pode deíàgradar, imitação tão generoza, a quem nos deu »
o mais juftificadó exemplo?Mal pinta o retrato,quem fe def- j>
via das cores do originahQuem para fe fuftentar,fe arrima ao >»
engano, cahe com o arrimo.Tenhaõ por certo, que deífe Ar- j>
recife, aonde noífas armas os tem accurrallados , lhes não fica »
mais fahida,que para Olanda;& fe atiraó a outro alvo; baftaó }>
os meus Negros para lho fazer errar ; & dado cazo , que per- „
tendaó vencer noíTa conftancia com fua perfia, lhes poremos ;,
a terra em eftado, q lhes nãopoíTa dar mais, que a fepultura; „

porque „

4^0 C^ST^lOTõ LUSirjNõ 1^46

5, porque faberemos queimar 'lhe em híía noite tudo, quanto
plantarem em hum annoj& para que não duvidem defta ver-
dade, tenhaõ entendidojque he Henrique Dias, o que efcre-
ve, pegando na pena com a meíma mão, com que pega na ef-
pada. Mandou lançar efta carta em parte , aonde logo foy a-
chada, Sc entregue nas mãos dos Governadores do Arrecife,
que corridos dos en'os da íicçaó , & cortados do defprezo da
repofl:a,re apartarão de femelhantes diligencias^aplicando-fe
a outras, de que fe perfuadiaó tirar mais fruito,ainda que foí^
íe com mais rifco.

61 Nefta occazião chegou âo Arrecife hum barco ào
RioGrande,pelloquaI osOlãdefes, que prezidiavaó aqueí-
D. António vhe- la Fortaleza, pediaõ focorro de mantimentos, referindo, co^
lije amarão af- ^^ Dom Antonio Phelipe Camarão entrara fegunda vez na

fola a campanha, , •^ •^- o t> -l^ u j

do Rio Grande c^rnípanha, com os Capitaes,& gente,qUe na raraibti liie dera

ò Meftre de Campo André Vidal de Negreiros , & talara de
maneira a terra de todo o recôncavo , que não deixara edifí-
cio, que naó confumiíTe o fogoj peíToa , que não degolaffe o
ferroj gado, de que fe na5 apro veitaíTe o roubo 5 mantimen-
to, que naó deftruiíTe o braço j& dentro da mefma Fortaleza,
coraça5,que naõ intimidaíTe a ira; pofta em aperto taõ mani-
fefto, que igualmente temia o ferro, & a fome . Chegou efta
noticia ao noífo Arrayal , pellos rendidos , que cada hora fe
paíTavaô^Sc defpois, por correyos noíTos , fe certificou a no-
va, fem particularidade, que mereça outra memoria,porque
o Inimigo as efcuzou, cõ^naõ tet animo para fâhir da fua for-
g:a, nem a defender o fuííento, nem a atalhar o deftroço. Até
á Paraiba conduzirão os meímos Capitães o gado ,de volta
do Rio Grande,donde o mandarão para o Arrayal, a tempo,
quenelletinha entrado hum lote de duzêtas cabeças,tiradas
do deftriâo do Rio de Saõ Francifco. Com eftes pequenos
Bntra'õmmtm€ fQ^orros fe animou a noíTã gente a efperar com bom coração
°^ d° ' ^^" mayor remédio, de q fe encarregara o Governador João

Fernandes Vieira, cU)a opinião tinha ganhado tamanho cre-
âito entre os foldados, que não avia naeftimação de todos
difFercnça entre a promeífà^Sc a cobrança, fe não era aquelle
intervallo de teTnpo,precifamente neceírario,para ajuntar,&
repartir jcfFey to da verdade, com que os tratava, & do amor,

com

J[" '. ."_ (•

>■ ^É !■

1 646 fAT(TB I. LW^%p Vlh 4^ I

com que os favorecia.

61 A ilha de ítainaracá,qne era o celIeiro,donde fe pro-
via de mantimentos o Arrecife,chegoii a eítar tão ex haufta, (
que pedia remedio,a quem cuftiimava dar focorro: Abrangia
a todos a ncceffidade, & todos fe conformarão em arrifcar a
vida pellafalvar da fome. AíTentado o dia, o lugar, & o po-
der, com que feavia de intetar a facção, fiàraó o modo á ob- ^p<:yfA^^ aa fo^

fervancia do feo[redo,& a efte a execução do defignio . Com '^"^/f í° ^'^^^^
, 1 1 r^- - 1 A Til Til 1 ^oabufcar man*

doze lanchas lahirao do Arrecire levando aproa na Ilha ^^íi^isutos.

Itamaracá ;_não fe quizerão efconder á viílá das noíTas íintí-
nel!as,para nos enganarem com as noticias.]Derão rebate no
Arrayal , & como nelle fe cfperaváo as duzentas cabeças de
gado,que do Rio Grande conduziaó os Capitães Paulo da
Cu nha,& Francifco Lopes, (tiradas da boca do Olandès , q
debaixo da artelharia de fua Fortaleza paftavaõ) entrarão os ?

Meftres de Campo em fofpeyta, de que o Inimigo informa-
do da marcha fahia a cortar-lhe o caminho,& a fazer prefa no
gado. Defpediraó correyos a Tejucupapo 5 & a Goyana, a-
onde fmedida a marcha com o tempo )poderiaaver chegado
o fobre-d ito comboy, com tençaó de que a cautela fe adian^
taíTe ao aflàlto, em quanto naõ chegavaõduas companhias a
encorporar-fe com a gente dos Capitães nomeados (diligen-
cia,que nem íervio á fofpeyta, nem á occaíiaõ: ) Chegou o a-
vizo,& o focorro a tempo, qae já o gado tinha partido para
o Arrayal com boas guias,& fufficiente efcolta; deixando-fe,
os Capitães Paulo da Cunha,& Francifco Lopes,ficar na po-'
voaçaó de íguaraçu,a titulo de fe refreícarem da moleftia da
marcha,& dos tempos, já entaõ rigurofiffimos. q

63 Tomàraõ porto na Ilha de Itamaracá as doze laíl-
chas, que tinhaó fahido do Arrecife,aonde as efperava outra .
efquadra delias, já prevenida para efte fim, & por todas fize-
tânoel raõ numero de vinte & fete, (dezafete diz outra narração )c5 ^t^niftoj^

feifcentos foldados, quatrocentos Olandefes,& duzentos ín-
dios: Naõ chegou á noíTa noticia , quem foíTe o Cabo dellaSy^-
mis racionalmente fe pode conjeâ:urar , feria o feu General Ardil com que o
do mar João Cornelizent,ou Cornelin Lid:hart:Mandou ve- Framego nos en*
kjar para húa paragé, que os naturaes chamaó porto de Ma-á'^^'^-.
ria Farinha^ & hum tiro de mofqueteao mar ,paííbu ordem,

Sf que

í(i

Vcftmbarcâ
Tcjucufapo.

M

i4

4â^2 C^ST<!(IOTO LÚSVtjno ' 1646

que anchoraíTem, dando a entender, que naquelle fitío que-
ria defembarcarj (ardil, que logrou, divertindo adefeníada
parte,aonde a receava, com a chamar,para onde a naó temia)
tocàraõasnoflasíintinellasarebate, ouvio-fe emlguaraçu,
aonde defcanfavaó os Capitães Paulo da Cunha , & Francif-
co Lopes, & as fuás companhias, com as quaes marcharão a
efperar de embofcada ao Inimigo, que fem movimento efpe^
rou a noitej& furtado aos olhos de to<Jos fe fes á vella . Com
a 1 uz da manhã fe vio o mar fem embarcação algua j& os nof-
fos Capitães levantarão as embofcajas , & tomarão o cami-
nho do Arráyal,imaginãdo, que o Inimigo avÍ2ado,fe v oltá-
ra para a IlhajSc todos fe enganàraõ^porque o Framengo na-
^^ vegou a vella, & remo o tempo, que durou a noite ; de forte^
que ao amanhecer emproou o porto de Tejucupapo , & fem
dilação deitou a gente em terra,com deíenho de entrar a po-
voação de Saõ Louréço, & pafíar á eípada os vezinhos delia,
para ficar fenhor do Campo,& carregar de mantimétos a feu
gofto.Duas vigias noíTas, que virão defembarcar o Olandès,
& infirirão o intento, fem tocar arma, aíTentàraó, que húa le-
vaíTe avizo á povoação , & outra ficaíTe para obfervar os mo-
vimentos do Inimigo. Os moradores de Saó Lourenço , que
íèriaó até cem homens, com feus Capitães Álvaro de Aze-
vedo, Agofíinho Leytão,& Paulo Teixeira, eftimulados dos
perigo,que lhes punha diante dos olhos a difparidade do po-
der, & a efcaceza do tempo, fe recolherão com fuás familias^
& toda a mais gente da povoação,em hum mey o reduto, cer-»
cado de húa groflà paliçada (prevenida para femelhantes a-
pertos) com todas as armas, fazendas,& mantimentos , que a
limitação do tempo lhe permitio . Era Sargento May or da
■paíTar h eípada g^í^^^^j^^^^cj^ii^^ Agoftinho Nunes, fòldadoanimofo,&pratH
inbos de s ^^ •> Saquem efta occazião fobio muy to n o credito : Ordenou

os 've^inbos de S.
Lourenço,

a hum valente mancebo chamado Matheus Fernandes , que
com outros trinta de feu lote,deftros nas veredas,& armados
de efpinguardasjficaíTem de fora da eftacada, para que, como
íbldados volantes,picaírem o Inimigo,eobertos do mato,per-
Vifeguindo^o com inceíTaveis cargas . Também defpedio huiii
correyo de cavai lo,que pella pofta foíTejpedir focorro ao Ar4
ra) al3(diílava de Saõ Lourenço doze legoas) com firme pro-

pofito

•~ ' ^- -■

646

^JXJ^E 1, LIVT^O riL

483

pofito de fc defender até achegada do focorro . Ordenou
tudo, quanto podia fervir á oíFenía , & á reíirreccia . Dentro
do Reduto mãdou deitar bando,que toda a mulher, de qual-
quer callidade, ertado,& idade, que foííe, que naoccaziáo
do combatejlevantaffe pranto, grito , ou gemido,re paíTaíTe á
erpada.Guarneceoospofl:os,medindoonumeropelIaneceí- ^ a- i 1,1
lidade,& a íufticiencia pella importância ^ ò^ elperou o aliai- ígL^para para
to com animo tão feguro, como fc não ouvera defproporçaó a áefenfa.
entre feíTenta homens, com que fe achava, & feilcentos;
foldados , com que o Inimigo vinha , eftes , armados todos
de armas de fogo ^ aquelles, que nem todos as tinhão de/ '
ferro. /

64 O breve erpaço de temp o, que os nofíbs ti veraõ pa-
ra fe prevenir, gaftou o Inimigo, em marchar formado em hu
batalhão, o qual guiava hum valente Olandès,pellopofio,
que tinha de SargentoMayor de batalha; Vio,que pouco dif-
tante atraveíTavaó o caminho dous Portuguezes , & que com
acellerado paílo hião a meter-fe no Reduto , có o chapeq na
máo,lhes diíTe a vozes: A fenhores Portuguezes, não fujã^,q
todos fomos amigos : Como de Inimigos fogem ^ Pois enjE^en-
dáo, que antes de duas horas os a vemos de fazer,a todos, em- ^v^ mar chão mÃ
pcdaços.Húa das noíTas fintinellas,que por entre o mato naõ da efperar,
deixou nunca a ilharga do efquadrão Inimigo, ouvindo ef-
tas palavrasjcncarou o mofquete , & paíTou com duas bailas,
ao Sargento Olandès pellos pey tos, de que cahio morto, dei-^
xando naquelle lugar fepultada para fempre,a vida , & o no^
me: O Framengo, que fe vio defcoberto pello tiro, mais fen- ,
tio o rebate, que a perda; & porque a vingança não defíe te-
po á fuga. (Imaginava, que o não avia de efperar o medo. )
Sem deter a marcha, occupou com outro official o lugar do
morto. Chegou á paragem, aonde os trinta foldados volan-
, tes o efperavão de embofcada, & recebeo hiia carga com tão
bóa pontaria, que apenas ouve baila, que não tirafíè vida:
Vinte & trez dos feus a perderão nefte lugar: Paíibu adiante,
íem fazer a menor detença ,& os noífos trinta foldados, muy-
to mais ligeiros,a dar-lhe fegunda carga,da fegunda embofca=
da: Foy igual a perda , que recebeo , porém não a paciência.
Creceo com o dano a ira, & com a ira o defejo da vingança,

Sfa que

CAsr(i(ioro lusitjno

queatéentaõlhe não deixou executar a preíía j fem que fe

faltaíTe ádifciplina da marcha, deitou húa companhia de

morqueteiros, que cortaffe os noíTos^porém naõ achou mais,

jvijia o Reduto, o trilho, & fe tornou a encorporar com o eíquadraó,

cr comete a eJU' I . , i ^ / r j r L • rr r> i ^

cadji quanao ;a le delcobria o noíio Reduto , que o Framengo

fem detença enveftio colérico j Sc animofo. Deu a primeira
carga , debaixo de cujas bailas avançarão os gaftadores , com
machados , a cortar a eftacâda , que os noíTos rebaterão com
menos , mas com melhores brâços . Foy toda noíTa a gloria,
& toda do Inimigo à perda: Pello deftroço conheceo a re^
íiílencia, & retirado do a0alto , efperou melhor fortuna,
de melhor hora ; &de diverfa forma, difíèrente fucçeíTo:

Areftftecu ore- Servio-lhe a defenfa de doutrina ; & ordenada fua gente

nra^&acoje ha, p^n^g regras, que lhe dera a repulfa,avançou fegunda vez
a eftacâda , perfiando no combate o furor , & o defejo da
vingança , & da vidoria : Nelle fc vio mais excedido, que
imitado i, aquelle valor, que em todas as idades deu a na-
ção ao fexo mais fraco . Húa mulher com a Imagem de
Chrifto Crucificado nas mãos, andava animando aos fol-
I i dados, em todo o tempo do confliâ:©: Fiada íia cauzada
peleja , prometia o Senhor, com que animava , aos feua
favorável , aos Herejes terrível ; com tanto defprezo das
bailas , que parecia beber feu eípirito na confiança da

rdor das mulher protecção, OU diverfa natarezà , ou cerdífima vitoria.

res Portuguezas E^^^^i^o de bandeira taõ fagrada, adminiftravão todas as
mais , aos foldados , as munições , & as armas , fazendo-íe
parciaes nos golpes , que fe davão , como o faó o inftro-
mento , & o braço: As que efcuzaVa o lugar do comba-
te, iguaes no animo ^pelejavão com fuperiorcs armas, por-
que coni oraçoésjpelejavão . Experimentou, o Inimigo, o
quanto excedião as forças da reííftenciaás da conquifta, no
horror, com q vio a circunvallaçâo da eftacâda, com fegun-
da tríncheira de corpos mortos, íèndo tantos os dos feus,que
alli acabarão, que nem os olhos , nem a confideração os po-
dião contar fem efpanto ; & com elle deixou o comba-^:

te.

6 15 Segunda vez, rebatido o Framengo , fe aconfelhou
com fua mefma defefperação(mais obftinadojque vencido.)

For-

i6^6

fÂl(rÈ I. LIV^O VIL

Forinou de toda a fua gente hum efquadraó cerfaáo ,& ani-
mando aos feus, com a rcprefentação da perda, & da deshon-
ra, infiindio nclles aqiielle defprezo da vida, que cau7.a a ver-
gonha,& a vingãça;& com ellc enveftirão terceira vez o Re-
íiuto: Todos atendião á invazão, nenhum ao perigo: Ajuda-
va-fe a cólera do numero, Tem que a hum braço canfado, fal-
taíTem dous de refrefco, determinados todos a não perder a
vici:oria,fe não perdendo asvidas: Aacufta demuytas che-
garão a róper a eftacada, que fem duvida entrarão , fe aquel- As quães rehatê
lasPortuguezas Matronas, cò animo invéíivel, íe não oppo- o inimigo ^é- lhe
feráo á força contraria,que com varonil pulfo rebaterão me- j^/^^^^ ^ entrai
neando as armas com braço,& animo tão robufto, & deftimi-
do , que não fabia o Framengo determinar , íe o traje defmê-»
tia o fexo, ou fe a natureza errara a forma j& de nenhãa forte
acertava a cauza, que era, unirem-fe em hum coração Portu-
guez, o valor do fangue,& a viveza da fé , contra a perfídia,
8c contra a obílinação Olandefa. A cauza mais piadofa,fe a-
tribuio, entre os noíTos, a eftranheza. Ao favor dos Sagrados
Martyres Saó Cofme,& SaóDamiaó confeífáraõ dever a ma-
ravilha: Tinhão naquelle deftriâ:o fua caza , & conta va-os a
devação, moradores no confliâio , como o erão no templo:
Vio-fe pello efiPey to j porque no mais acefo , & no mais rigu-
rofo do cóbate, derão os noífos trinta foldados volantes hiia
carga ao Inimigo, por hum lado, taõ bem fortida, que defati-
nado, lhe pareceo golpe de mayor focorroj julgou-fe perdi-
do, na imaginação de cortado : Occupado do medo largou o cmt(àdomedo,£
combate , as muniçoês,& as armasi& efquecido de toda a dif- ohrigoíi ao mimi-^
ciplina obedeceo á defordem, porque lha pintava menos pe- g° ^fig^^ ^^^-^1
rigofa a extenção do caminho, que defejava paíTarde voo: ^^^^'^''°
Sem virar a cara,tomou as lanchas , fefle ao largo , & ainda fe
não dava por feguro. Apelidarão os noífos a viâoria jfahiraõ
no alcance dos vencidos,que chegarão a ver,quando já nave-
gavão de mar cm fora: Voltarão ao Reduto ^ recolhendo os
defpojos, que fervirão ao aplauzo, com que forão recebidos
de fuás familias. Setenta mortos deixou o Olandès na circun»
ferencia da efiacada, não entrando nefte numero os de nome,
como foraó trez oíficiaes may ores , 8c outros homens de con-
ta, cujos corpos levou coníigo , ou por diminuir a eftimaçaó

Sf^ . da

CAST(^oro LUSITANO

da viíloriajOU para encarecer o empenho da defgraça.O Tan-
gue, de que fe cobrio o campo, & a eftacada , nos moftrou a
multidão dos feridos.O numero certo,nos efcondeo o relator

, , , „ , do íucçeíTo; Não achamos quem diga,que mortos,& feridosi
Perda de hua,& / rr p . ?^ ^ ^ , j ,. n-

a parte owve da noíla partcj leria tao pequena a perda,que a deíeíti-

mou a lembrança; ou também, porque a fes efquecer a gran->
deza do íucçeflb^mas nunca poderemos eícuzarjdeícoido tão
culpável, como o de não fe fazer lembrança dos nomes das
peíToas, que nefta occa2Íão,merecéraó á naçaó, & á pátria efr
tatuas, em que a fama de feu valor fe etcrnÍ2ára;&: de Matro-
nas tam varonis^ que podéraõ com feu nome dar a PoitiJgal
mais gloria,do que derão a Roma,as que mais celebra a fama,
& de que tanto fe prezou a Antiguidade : Para que em toco
o tempo foubeíTe o mundo, que poderiaó feirar occazipés ás
mulheres Portuguezas , para môftrarem feu valor, nias que
nunca nas mulheres Portuguezas faltou valor, para 3 íiombra^i
fem o mundo, nas occazioés.

66 Poucas horas defpois do íucçeíTo , chegou ao lugar
da contenda o Capitão MayorZenobio Achioli com trezen-
tos homens de focorro: Achou nos aplaufos da vidoria, no-^
vos eftimulos de pena,porque com en veja da gloria, ajudava
a feftejar a dita, culpando as injuftiças do tempo,com as femf
rezoés, com que para huns he efcaíTo , para outros íbbejo. O
próprio de cavallo , pello qual os moradores de Saó Lourenn,
Sem tepo chegou, ço mandarão pedir focorro, chegou ao Arrayal quafi na meí^
com focorroZem' ma hora,em que nelle entraváo os Capitães Paulo da Cunha,
bio Achioli. ^ Francifco Lopes, (que diífemos , fe levantarão da embof-
cada, com que efperavão o Inimigo, imaginando deíèmbar-
caíTe no porto de Maria Farinha)delle entenderão o ardil, cá
que o Inimigo os enganara, ouvindo, como o correyo relata-
va aos noíTos Meílres de Campo, o modo, a hora,& o poder,
com que fahira em Tejucupapo,& a preíTa, com que a neceí^
fidade pedia o focorro; a que naõ faltou o Meíi;re de Campo

^ r r. André Vidal de Negreiros, partindo fem detença, do Ar-.

jOa mcímii forte o ^ > *

André viàd de rayal,com féis companhias:Na manhã o encontrou a nova da

negreiros. viftoriâ.Fes alto em Iguaraçu^mandou alojar os foldados pa-

j ra fe refrefcarem do trabalho, quando lhe chegou avizo, que

o Framengo com o mefmo numero de lanchas navegava ein

de-

,646 • ^A^nj^E L Lir^lO VIL A^7.

dereitura ao porto da mefma povoação : A todos alvoroçou
a nova, feftejando a dita, na occaziáo, que lhes oíFerecia para^
defembainharem a elpada. Formou o Meftre de Campo An*,
dre Vidal de Negreiros duas embofcadas , de toda a fua gen-/
te, certo, que delias não eícaparia inimigo , que lhe podeíTe
tirar das mãos a prefa das lanchas: Porém a fortuna envejofa
de noíTa gloria,nos defviou a occaziaó por hum accidéte ino-
pinado. Por ordem de André Vidal de Negreiros , viera em
fua companhia hum Surgiaó Frãçés,( prevenindo feu cuida-
do a cura dos feridos na fopofiçaõ da pendência )que com fi-
delidade fervia entre nós: Efte tal, vendo abalar ao Meftre
de Campo, fe deixou ficar atraz, tanto, por não fer neceíTa-
rio para a peleja, fe não para a cura,quanto, porque montari;^»
do em húa faca,venceria em menos tempo a diftancia do ca-
minho j tomou-o em noíTo feguimento , & fem querer , errou Jo qud a defgra-
a vereda^deixando a queguiava para as embofcadas, feguio a ^^^^'^^^^f^^^ ^^^
que o levou,a dar nas mãos dos Olãdefes , que poftos em ter-_>
ra fe forma vão para marchar.Como a prifioneiro o examina-
rão, & de fua confiíTaó entenderão o eftrago , que os efnera-
va, Sc o perigo, em que qualquer detença os punha . Tu mui-
tuofarnente fe voltarão as lanchas à Ilha j levando no Fran-
cês Surgião,& medicina, com as ventagens,q faz, a que per-
íe vera, à que cura. Sentio-fe entre os noíTos a defgraça , com
aquelle eftremo, com que magoa a vifta da perda . O Meftre
de Campo, que confiderou inútil fua affiftencia naquelle lu-
gar, o guarnece© da gente neceíTaria , & com a remanecente
fe voltou para o Arrayal. :

6 7 Deixamos pofto a caminho ao Governador Joaõ
Fernandes Vieira, levando configo a companhia de fua guar-
da, com a vagarofa marcha,a que o obrigava,© ir pello certão
de engenho , em engenho, & pellas povoações , de porta cm ^^^^ lernmàes
porta, pedindo, cobrando,& conduzmdo mantimentos para ^ j ^ i^^r
o Arrayal, até que chegou ao porto de Tamandaré (aonde o ^^^ rnmtmem.
Inimigo enveftira os navios,em que,á petição dos Olandefes,
mandara o Governador Geral do Eftado dous terços da Ba-
hia, com os Meftres de Campo Andje Vidal de Negreiros,&
Martím Soares Moreno.) O eftrago , trazia tão v ivo o defe-
co, em João Fernandes Vieira , de fabricar nelle húa Força,

Sf4 em

4S8 lAST^^lOTO LUSlTJnÒ ié^ô

em que as noíTas embarcações achaíTem abrigo , & as contra-
rias receo, que ncnhiia outra couza lhe occupava mais o cui-
dado. Deliberado em p6r cfte penfamento por obra , man-
dou notificar, & pedir a todos os moradores do contorno, q
com os carros, & gente deferviço,quetinháo , acudifíem, a
dar ajuda aos foldados,que avião de trabalhar na fabrica(pri-
meiro regulada com o fitio , & com o intento , pellos Enge-
, , . ^ "heiros mais práticos na arte da fortificação.) A vontade q
%/aLZTer^ ^"^ j°^^' Í.''^"^'' ^ conveniencia,& o reípey to á peffoa,os fes
mmdÀ. . ^^^^^'^ ^ ^^^^ ^^^ ^^^ empenho, que íb adiantava ao tempo:
No entre-tanto acudio o Governador ao mais precifo , que
era a recondução dos foldados fogidos,&á cobrança dos mã-
timentosoíFertados, que pedidos pella neceíTidade , os não
podia negar a rezaõ. A cada hum dos moradores perruadia,a'
prefença,& a pratica, cõ que João Fernandes Vieira os obri-
gava: Dizia, que a liberdade, honra,vida, & fazenda de cada-
quaI,coníiftia na permanência daquelle ex ercitojpara os par-
ticulares, defenfa^ para o reconcavo,muroj& para o Inimigo,
freyojforçade pedras vivas,queaviadeconfervarofuftento
nezoh com què de cada dia , [ expofta á furia das balias, & aos golpes do fer-
Mmdc ofocor. f o] em cuja duração eftribava a falvaçaõ de todos; & que tu*
^o, o que da vão para efte fim, o da va5 para fua própria utih-:
dadci taó longe de fer paga, a refpey to do ferviço , que náo

baftaya todo o cabedal de todos,para o fatisfazer a hum; que
fizefle a vontade, donativo da obrigação, medindo a dadiva
pella conveniencia,& não pella poffibilidade, porque ficaria
a falta efcandaIoza,á yifta do minifiro , que com o exemplo^
livrava de fofpey tofo o confelho; fendo notório a todos , os
difpendios da fazenda, osrifeoá da vida , & as defcomodida-
des da pefíba, com que os tinha fervido, em todo o difcurfo
daquella guerra . Eftas fezoês authorizadas tom a prefença ^
^ com a brandura de JoaÓ Fernandes Vieira, obrarão tanto,
que não deixarão juizo livre, nem vontade defobrigada: To-
dos contribuirão com os géneros , & com a quanridade , que
tmhãoi&compoferaóhum copiofo focorro de açúcar, ga-
dos, ílirinhas, & Ugumes ; naõ fó em hiia , fe naó em todas as
povoaçoês,& freguefias, a que chegou efta negoceaçaÒ.
68 Gfat0j&: alegre fe voltou o Governador daliber-

dade

ié4<5

-^A^El.LlVUp VIL

489

I

dadc para Tamãdaré,deixando aquelles moradores tão obri-
gjados, como fe elles receberão o beneficio. Não obra menos
a benevolencia,de quem manda, porque obriga a v ontade , a
defejar o preceito . Achou a Fortaleza pofta em fua ultima
perfeição: ( Dentro de hum mez/e lhe deu a primeira, & ul-
tima mão:) &: guarnecida de artelharia, munições , & prezi- Guarnece a For-
dio,nãofó fufficiente, fe não fuperabimdante, fe voltou f ^^^ J /^T'
para o Arrayal, aonde loy recebido como alimento, oc cora-^^^^^ ^^^^.^/
çaó daquelle corpo, pello que a todos comunicava de efpiri-
tos,& mantimentos. No dia feguinte foy viíitar as eflanciasja
todas mandou prover de tudo , o que lhe parecia neceffano:
A fabilidade, & vigilância , que influia nos Capitães , & nos
foldados, deliberação para mayores progreffos,inteirados,de
que tinhão em feu cuidado,& em fua lhaneza,certos os fa vo-
res,& os focorros. Satisfeitas as obrigações do officio, lhe pa-
receo forço fo, não faltar ás do eftado. No dia feguinte ( na-
quelle anno, o da fefta do Efpirito-Sanâo ) foy dormir a fua
caza, & no outro, fe voltou para o Arrayal j como fe aquelle
dia de repouzo fora menos feu, que todo hum anno de cam-
panha. Parecia-lhe, que naó nacera para íi, fe não para Os ou-
tros,& que furtava á obrigaçãojhúa hora,que tomava de def-
canfo. y .

6 9 Não era felice o eftado, em que os noíTos fe viaõ, 8c
fazia-o parecer ditofo,a differença da fortuna . As bemaven-
turanças do mu ndo naó tem outro fer, mais que aquelle, que
lhes dá noíTa eftimaçaó,& bafta o poííuillas imaginadas , para
fe não lograrem fem pençoês verdadeiras . Chegarão ao nof- , - ^
fo Arrayal dous Padres da companhia, Manoel da Cofia , & y^/ 4^^^ padres
Joaó Fernandes,enviados da Bahia pello Governador Geral da compa?zhia^ co
do Eftado António Telles da Sy Iva, [efcolhidos para êfta «'^^^■f delRey p^-
miíTaõ, ou por mais promptos , ou por mais aóèivos ] com a- ^^l^^^f-"^^^ ^ Ca-
pertadas ordés de Sua Mageftade,pellas quaes ordenava aos ^"^^
Meftres de Capo André Vidal de Negreiros, & Martim Soa-
res Moreno, que fem dilação, íe partiíTem com os terços de
feu regimento para a Bahia, & largaíTem a Campanha de Per-
nambuco aos Olandefes, porque não convinha á fua reputa-
<ção,que o mundo fofpeytaíTe, que fe viola va,peÍIa fua parte,
a paz, & a amizade aífentada entre fua Coroa, & aquelles Ef- ,

tados.

.;,!

490 C^Sr(^Oro LUSITANO

16^6

I ll

tados. Lidas as ordens, não ouve coração, que o pafmo naõ

Replica ás oydês^o deixaffe indiíFerente,entre a obediência , & a ifençaó, O Go-

Governador lo^o vernadorToaó Fernandes Vieira,ou por mais íentido, ou por
Ferna.des Vieira. • 11 r\ • c r r -1

mais empenhado, rompeo o lilencio, & a luípençao do con-

grefíb com femelhante difcurfo.

70 Se os decretos dos Principes naõ forão de homês,pa-

^' déraó ferabfolutos, & de infalivel obfervácia^porém aquella

^' limitação, que os fes contingentes , os fes também condicio-

'' naes. Infinita he â comprehençaõ de Deos5&: ifentas fuás dií^

" pofiçoés, de que inopinados accidentes, as embarguem : A-

" quella fabiduria, á qual nada fe efconde , as faz irrevogaveisj

" porque fundadas fobre matérias^ que não faõ faliveis, & com

" tudo eníinados da fé, fabemos, que muytas vezes faõ condi-í

" cionaes feus decretos, não,porque os forme a duvida, fe naõ,

\ " porque firvaõ à noíTa doutrina.Sagrado documento,com que

" defengana aos Principes, que governaõ com a limitação de

" homens, cujas Ieys,por eftà rezáo,permitem a interpetração,

" & a defobediencia^quandò Í€ acha nellas , que o mandato fe

^' oppoem ao intento ^ que mal pode dar regras firmes para to-

'* tio o tempo, & para toda a parte , quem não comprehende,

'^ nem as diftanci^s , nem os futuros^ o que cada dia fe experi-

^' menta nas prematicas, que fendo as mefmas, em húa parte, &

" em hum tempo reformáoi& em outro tempo, & outra parte

** diftrahem. Devemos interpetrar as prefentes ordens de Sua

" Mageftade, que Dcos nos guarde, lendo nellas primeiro fua

" tenção^que feu mandado,fendo tão di verfo o eftado das cou-

'' zasj (pella differença do tempo, & pcllo remoto da diftancia,

^' efta, pello que efconde, aquella, pello quemuda ) que fe lhe

" fora prefente húa, Sc outra couza, fem duvida mandara o cõ-

" trario, do que ordena. babemos de fua clemência, & intcyre-

'* za,que todo feu intento fe dirige áconfervação,& conve-

^' niencia de feus Vaífallos : Se Sua Mageftade tivera preíènte,

^' o quanto os progreíTos de fuás armas,tem adiantado a conve-

" nicncia,&confervaçãodefeys fubditos,& as próximas efpe-

^' ranças deespulfarem, deftas fuás terras , a dominante tirania

^' dos pérfidos contrários, cmulos de toda a grandeza, mandara

" profeguir, & não defemparar a emprefa, porque faõ muy cn-

'> eontrados motivos , os que produz a efperança da v i<^oria,

'» ■ ' &

i6^6

^A^E I. LIV(^ VIL

491

& o temor da ruína: Fora, de que os Príncipes governão Teus
Eftados pellas informações de feus Miniíuos , rccebendo-as
huns de outros, fogeitos aos afFe61:os,que as pintão com muy-
to diíFerentes cores, das que tem a verdade^ tanto mais fogei- '
tas ao vício, quanto mais apartadas dos olhos: Se a grandeza, '
& piedade do Real coração de Sua Mageftade, tivera verda- '
deira notícia, do que eftes atribuIados,& leaes VaíTallos Teus, >
tem padecído,& obrado, por fe eximirem do mortal ódio, cõ >
que antes da folevação os determinava confumir acruelda- *
de,& ambição herética, fora poffivel,que nos mandara entre- »
gara mefma efpada, de novo offendida , & irritada de noíTa '
rezão, & de noíTa força ? E quando com todas eftas certezas '
fua deliberação quízera, apurar noíTa obediência, como po- '
dia efperar de nós mais, que eftas repugnancias? A ley da na- ^
tureza, que nos obriga á coníèrvaçáo da vida^nos abfolve de ^
rebeldes,a decretos, que nos entregaõ á morte . Aílí, que me '
parece repliquemos a Sua Mageftade, com â informação do >
eftado das couzas,& dos inconvenientes,que traz configo ef- '
ta refoluçaõ, continuando com a guerra na forma prefente, >
até nova ordem fua:E dado cazo,que confirme feu didamen j '
digo, q não hey de largar emprefa,tanto do ferviço de Deos, 5
& de hum Príncipe taò Catholico,como o he, libertar milha- '
res,& milhares de almas da morte temporal, & eterna , certas, *
na fogeição ao domínio da herezía,& do aborrecimento. Ef- '
te he o meu voto, & meu parecer , cada-qual figa , o que lhe >
ditar fua rezáo,& naó fua conveniência. '

, 71 Achou a determinação do Governador companhia,
na do Meftre de Campo André Vidal de Negreiros j & neu-
tralidade no querer(que não foy no juízo) do Meftre de Ca-
po Martim Soares Moreno:Feíre a replica, com os fundamé-
tos referidos: Remeteo-fe á Bahia, para que levaíTe a aprova-
ção do Governador Geral do Eftado AntonioTclles da Syl-
va; porém elle, ou foífe perfuadido de fuperior impulfo , ou
obrigado de obediente refpey to,refpondeo,que as ordens de
Sua Mageftade fe guardaííem. Entaõ, clara, &defcoberta-
mente,diíreo Meftre de Campo Martim Soares Moreno , q
fe devia largar a Campanha,& retírar-fe a gente^parecer^que
Jiáo admitirão João Fernandes Vieiraj^: André Vidal de Ne-

greiros^

NeatrãlidAde dos
mais^areceres.

492 CASr^^Ioro LUSITAKO

1646

greirosj aos quaes movião huns mefmos fins j fegnindo a re-

2ão,& a vótade,que fempre os unio em toda a matcria: Mar-

tím Soares Moreno naõ falava pellos didamens do juízo , íe

^teje largue a ^^-^ peljos do defcjoiQueria vir ao Reyno pertender, & con*

campanha vota , ^ , ^ 'vir- r>v r ^^ r \ n

Martim Soares denava tudo, o que o podia deíviar.Oeípedio-ie do carg05&
Morem. dentro em poucos dias fes viaajem a Lisboa. AndreVidal,que

penetrou a rezão de feu voto, lhe tirou a mafcara do pretex-
to,& com palavras claras lhe deu em rofto , com o particular
de feus utis,& ratificou fua refòluçaõ, dizendo , que a todo o
tempo defenderia feu zelo de toda a nota,& cenfura.Com a-^
plaudidos vivas congratularão os foldados,& moradores a fi-
lieza, que por elles obraváo Joaó Fernandes Vieira,& André
Vidal de Negreiros, publicando-fe a vozes duas vezes refga-
tados por elles, do cativeiro Olandès , fem que lhes defrau-
daíTe ogofto, adefpedida de Martim Soares Moreno 5 oif
porque não deviaò mais a feus progreííos, ou porque fentiaã
pouco a falta de fua peíToa.Naó difputamos o aííèrto , nem o
erro deftas acçoés,porque como as humanas tomaó o fer do
fim, efte tem dado a melhor foIuça5 ao argumento.

72 Livres por efte meyo,aquellas Capitanias do mof-*^

tal golpe, a que as condenava o referido decreto , olhaváo os^

moradores para João Fernandes Vieira5& para André Vidal

deNegreiroSjComo para inftronientos defuaredenção:Nãa

_ .^ ^ fabião, como pratificaíTem tamanho beneficio,fe não com fa-

radares a loaõ ctmcarem as íuas dilpoíiçoes as v idas , & as razendas , coma

Fernandes vieira devedores, do que eraó,& do que tinhaó . Obfeqnio, de que

a refoluçh, fua confiança recebeo animo para emprender diíficuldadesj

que á mayor fegu rança pareciaó impoffiveis.De Iguaraçíi fo-

rão avizados os dous Go vejnadores , que o Inimigo receofo

de noíTa ouzadia tinha novamente fortificadas aspaíTagésdo

rio por aquella parte,^que cerca a Ilha de Itamaracá,para que

Co írez^Aíaos ãè- Çç^ j^^^ podeíTe atraveífar nas paragens, em que o permite a

fende o Immtço «.^ --j -t-j 1

, *..r.„.... A baixamar, em occaziao de agoas vivas: Levarão a cada-quai

as pajagens d/i ^ ^ i o ■» ■% ^ i

Ilha de itama- "^^ '^^^í C^"^ fuftentavão immovel algúas anchoras ) todas

fãck guarnecidas de foldados , & municionadas de peças, & mof-

quetes, com que ficava aos feus franca a fahida , & aos noíTos

empedida a entrada . Recebida a noticia, acordarão osGor-

yernadoresj que convinha á reputação de noíTas armas, & ao

de-

i6ê,6 TJ<!lTEl.Lir^O F1/. 49:?

defcngano das contrarias , fazer-Ihes entender, quenenhua
prevenção os eximia de noíTa efpadaj que nenhum confclho
os ilentava da nofla conquifta . Confcrio-fe a emprcfa com
Martnn Soares Morenojrefpeitando-fe a peflba pello pofto, ^^^fí^íWmíS
que tivera, o qual entendendo a refolução de Te invadir , ga- ^^/^^//^^^
nhar,& aííblar a Ilha a todo o rifco, condenou o intento por
temerário^ dizia , que os fucçeflbs eníinavão com a melhor
doutrma, porque tinhão de pratica, o que tinhão de eviden-
cia.Que )á,era outra occaziáojfe intétára ganhar aquella Ilha;
& fó fe confeguira o caftigo da confiançarQiie não era confe-
Iho da prudencia,bufcar a dita no lugar do infortunio,o qual
não poderião ver os olhos, femrcfrefcar a memoria do fuc-
çeíTojmoftrando a huns o caminho , por onde fe retirarão vé-
cidos,& a outros o modo, com que ficára5 vidoriofos : Qiie
defprezar os defvios da avertencia,era certo prefagio da def-
graça, & que efta nos efperava infalivel, na diíFerença da for-
tificação inimiga, agora incontraftavel, & na occaziáo paíTa-
da,venfivel.

73 Com animo pacato, ouvio João Fernandes Vieira ^

os fundamentos da opinião contraria, conhecendo a v onta- ^^ '^f.^ V ?"^
de, que íe eícondia no dílcurlo . Kelpondeo as palavras, que ^^- ^
ouvia,& ao animo que falava . A interprefa, que na occaziáo ^^
paíTada fe intentou , foy contra o meu parecer , porque ante- ,>
via os fucçeflbs, nas inconíideraçoés da occaziáo ; & aquelle »
mefmo ju izo, que eu entaó fiz para fe não cometer a Ilha, fa- "
ço agora para fe intentar a emprefa ; porque o efl:ado, o tem-
po, & o modo, me enfináraõ, a que aconfelhe agora , o que „
difuadia entaó, ajudado meu parecer da difFerença dos mo- »»
tivosjque faó muy diverfos , os que convidáo á liberdade de '»
aquerir , daquelles,que propõem a necefíidade de confervar. "
Os lugares das batalhas não faó ceos de eftrellas, para influi- ,,
rem valor, ou cobardia.O mefmo balluarte , que muy tas ve- „
zes reprefentou o valor da refiftencia, íe chora, ultimamente »»
rendido, ao efl:rago da conquifta. Que vistoria fe alcançara, "
ou que praça fe rendera, fe os exércitos ao primeiro re vez da "
fortuna,íe retirarão dos cãpos, aonde o receberão ? Se a dou- ^^
trina , que dão os fucçeflbs , he a melhor doutrina , quafi to- „
dos os da guerra nos aconfelhaõ aprefente deliberação . Im- >5

Tt praticáveis»

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Vencidos das re
zoes de Io ao FeY'
nandes Vieira.

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494 c^sr(^ioro lusitjvo ió^ó

praticáveis forão os confli61:os,rehãa emprefamal fiiccedida,

íervira á dcfeíperaçaó de todas. A reprefentação da oíFenía,

intimada ao agreííor, acende o furor do agravado . A guerra

toma as importâncias, das confequencias , como toma a jufti-

5> ficaçaó,das cauzas.O Inimigo fe fortifica na Ilha,para aííegii-

» rar de noíTas armas os mantimentos, que ella produz j & para

'' poder a feu falvo fahir a roubar os do certão: Se de fua parte

creceo a refiftencia, com a prevenção^ da noíTa aumenta ííè o

empenho, com a importância; efta nos chama ao perigo j & fe

" algum o teme, fuja-lhe com o corpo , fem querer defculpar

" fua comodidade, com noíTadiverfaõ, pois fe fabe,que o rom-

^^ per difficuldades, não he para todosj fabeas vencer , quem té

„ animo para as cortar,& ;uizo,para as avertir.

74 Acháraõ eftas rezoês fatisfaçaó nos companheiros,
& defabrimento nos oppoíl:os,qpello não parecerem , fe de-
raó por convencidos do argumento ; & uniformes no vbto,
' poferaó nas mãos do Governador a difpofiçáo da emprefa,q
ío fiou do Meftre de Campo Ai^dre Vjidal de Negreiros , em
quem reconhecia talento para olnegorcio, & capacidade para
o fegredo.Em treze de Junho fe feííejou o tranzito do gran-
de Padre San6lo Anronio,de cuja mão tinhaõ recebido favo-
res de Portuguez,&: avizos de Sanâo:( Annual agradecimen-
to de João Fernandes Vieira,que de muy tos annos pubhcava
fua devação, na capella do feu Engenho da Varzea,Gedicada
ao mefmo Sanâ:o.) Deu fim á celebridade, 8c fe voltou Joaõ
Fernandes Vieira para o Arrayal, donde fahio , com o Mef-
tre de Campo André Vidal de Negreiros, & quinhentos fol-
dados efcolhidos,& ordenados em oy to companhias , entre-
gues a oyto Capitães [a que a efcolha deu o nome, que nefra
occazião lhes tirou o defcuido*] Com duas peças, húa de de-
2oyto livras de baIla,outra do mefmo calibre,encarretadas, &
conduzidas por tal arte,que com a falta do rumor, efcondiaõ
O movimento á mais atenta aplicação ; ajudada a cautela áo
Comcjueqete- & ^"^^^^^^^ ^^ noite, comdemazia efcura,& chuvofa.Marchâr^ó
como dtfpem a todos de cottferva, com ordens curtas, & prevenções cautas,
como logo veremos, para que nem ainda a fofpey ta podeílè
inferir a tenção. ( Tanto era o receo , de que a tray ção fe a-
diantaíiè a deftruir os intentos. ) Chegarão os batedores á

viita

J

t>h>

ewfrefa.

■^

i

1646

f^AtTELLlV^OVllr

49'

V iília do rio, em lula paragem chamada o porto dos Marcos,
aonde o inimigo guardava o tranfito com luia náo guarneci-
da de Toldados, & artilheiros. Fizerão os noíTos alto , cober-
tos dos crecidos,& deníos mangues, que allí produz a natu-
reza, íem que o Inimigo tiveíTe o menor íentimento de iioíía
chegada j& menos, de húa trincheira, & plata-forma, em que
í"e cavalgarão as duas peças de artelharia: Obra, em que huns
fe occu pavão,em quanto outros,de materiaes difpoftos , for-
marão dous botes,& duas jangadas jfabrica, para que ferviraõ
os páos das redes, em quecuílumão andar as mulheres no-
bres do Braril,que o Governador mandou bufcar a Iguaraçii:
O Miniftro deíla diligencia,que era hum Ajudante,aIheo do
preítimo, julgou o mandado por deliriojporém,quando deí^
pois vio o emprego,& entendeo a rezaõda cautela, fobre feu
^uizo carregou o erro, que imputava ao de fèu Governador.
75 Da Tua companhia efcolheo o Governador vinte &
quatro homens^para guarnecer com doze,a cada hu-m dos bo-
tes (não eraó capazes de mais gente.) A hnm Alferes refor-
mado, por nome AíFonfo de Albuquerque , entregou o pri-
meiro^ & o fegundo, a Francifco Martins Cachadas, Sargen-
to Reformado : Avertio-lhes, que na eleição , podiâo vera
confiança,quedeIlesfazia,& na emprefa o empenho, comq Finte é" quatro
deviaó obrar,para que o feito correfpondeíTe á opinião^ & ■s^foldâdos em dom
todos deu por ordem , que enveftiíTem , & abordaíTem a náo °^" cometem &
com deliberação de a ganharem, ou morrerem nademanda^^ \^ \

Sc que mandava na eftcy ra dos botes as duas jangadas , para
focorro de qualquer incidente ;& que foíTem certos, que da - '

terra os acompanhava feu cuidado, para os favorecer com a
artelharia no confliâ:o, & com o premio na vistoria. Anima- * *

dos do efcu ro da noite (era fobre a manhã) fe foraó os botes ^^' ,

chegando á náo abogafurda: (eftava guarnecida de trinta
foldados Olandefes. ) Não dormião as íintinellas^ defcobri-
raó os vultos, & pedirão nome:Có o de amigos,! fies refpon-
dcoemfualingoa humfoldado noíTo, pornacimento Ale-
mão: Qiie erão Olandefes , tiveraõ para fí os da náo , & lhes
mandáraõjquc bogaíTem ao largo . Apertarão os noííos o re-
mo,bufcando a náo cam repetidas cargas , a qual defengana-
da do errOj& temerofa do perigo^borncou as peças, & com o

Tt 2 tira

m

■%

49^ • C^ST<^10TO LUSITJNO 1646

tiro de hua, fes enípedaços o bote de AíFonfo de Albuquer-
que, que fe tinha adiantado :Salvou-íe a gente com húa das
^ÍTareZlT" jangadas, fem mais dano, que de hum foldadp ferido: Era In-
grez de naçaó. Já nefte tempo a gente do fegundo bote, de q
era Capitão Frãciíco Martins Cachadas abordava a náo pel-
lo outro lado^era alteroza,&pegando-fe pellas cordas ,& ta-
boas do coftado, fobiraó cinco foldados có o feu Capitão: A
a força de braço fe fizeraó fenhores do caftello de proa ( mcr
nos hum,chamado João Gonçalves,ao qual hum golpe de al-
fân)e,que o ferio na cabeça,deitou ao mar, quando faltava o
bordo da náo : Defpois de livrar das ondas , livrou também
da fenda.) Osfete,que ficáraõ no bote, atentos a focor-
rer os companheiros , naò avertiraõ na corrente das agoas,
que os apartou da náo, & do intento. Nefta occaziaó def-
parou a noíTa artelharia da terra , cujas bailas por eleva-
ção, fenão foraõ para ©Inimigo a cauza de feu dano, fo-
raó toda a occazião de feu medo . Taó cortado o deixou
o fobre-falto de ouvir, o que naó imaginava , que fe reti-
rou o Ftamengo aoCaftello da popa 5 porém , vendo que
naò tinha que temer em cinco homens deftituidos de fo-
corro , os enveftiraó os trinta , & fe retiráraój aíTombrados
do valor, com que defendiaõ o ganhado, fe determina-
rão em os matarem ás cargas ; o que entendido pellos cin-
co, avançarão os Olandefes áeípada, com tal furor, que
Com morte, é- matáraó fete, priíionaraõ quinze , & obrigarão, a qiie oyto
j?rifaode iodos os fe deítaíTemao mar, aonde encontràra5 o ferro, & o grilho,
^ J ' de que fogíaó. Aííi ganharão aquelles cinco Portuguezes a

nào pella maneira dita, & a dita por valor inaudito.

76 A todos os da fama deixa atraz o fucçeíTo referi-
do jcfcrito para a duvida,nas partes, aonde fenão conhece
o valor Portuguez , porque nellas ferviráó em todas asida-
desj& ás nações todas,mais ao paímo,que ao credito . Os fei^
tos mais celebrados , derão matéria ao encarecimento da re-
lação jefte o dará â incredulidade do juizoi&parece mais cau-
TonderA-fe ofei- ^^^^ ^^ receo , que novidade do eftilo , não roubar o efqueci-
to. raéto os nomes dos cinco foldados,authores de proeza tão he-

royca , porq em tãtofe dera credito à valentia, em quanto fe
imaginaíre,^ forâo mais^q homens,os authores della.Em feus

nomes

^

497

nomes cevou a fama o liizimcnto de fua pompa . Foraõ eíles
o de Francifco Martins Cachada,que era o Capitáo:Na glo-
ria do ferviço fe cortou o melhor premioJgnacio de Azeve-
do, a quem Joaõ Fernandes Vieira fes Sargento de fua mef-
ma companhia: Deu-Mie o governo de húa^porquc o não po-
de fazer companheiro no governo. Manoel Soares, Fernaò
Loboj&João Laus, he certo, que naõ ficàraõ fem premio,
mas como nenhum podia avultar ávifta de feu merecimen-
to, efcondido neíle o não poderão divizar os Efcritores. Ex-
celência he da grandeza do Solpcfcurecer , fora de fi mefmo,.
fuamefmaluz.

7 7 Amanheceo o dia dezafeis de Julho , & com elle a
náo rendida,comos quinze Olandefes;& fenhoreada dos cin-ç
CO foldados noíTos, que a ganha'ra5 : Logo fe mandou guar-
necer da gente necefíkria, para a fegurança, & para o intento ^^ olandefes de^^
de enveftirem com ella o fegundo navio, com que o Ohinàh.s Jãwparaõ afegu-i
guardava a paífagem, que chamão dé Tapeííuma ; porém os ^^^ ^^"-^
Framengos, que nelle affiftião, aconfelhados do exemplo, fe
adiantarão a por-lhe fogo , & a fogirem a nado para a terra.
Sentirão os noífos o efcape da prefa,& avertidos da cauza, fe
metéraó os Governadores em o batel da náo rendida,com oy-
to mofqueteiros , & a boga arrancada paíTáraõ aenveftir o
terceiro navio, que eílava em guarda do vao , que fe diz de
Entre dous rios, o qual renderão com a vifta,porque os Fra-
mengos, que o guarneciaõ , antes de os cometer a força , de- ^ mêfmopccede
famparáraõ o vazo, & íàhiraó a terra com tal medo,que por ^ ^^^^^^^^\
toda a Ilha forão tocando a rebate , & aprefíàndo a fuga aos
moradores , com a v ezinhança do perigo: Dizião , que efta^^
vaõ cercados de noíTas armas , certificando o aíTalto c5 o ex-.
ceifo do poder, que lhes pintava o temor: Ganhadas as duas
náos a taó pouco cufto , as mandarão os noífos Governado*
res defpojar de velamen, enxarcia,artelharia , maftos , armas,
munições , & mantimentos^ & para que o Inimigo fe não a-
proveitaíTe dos vazos , fe entregarão ao fogo , que em breve
efpaço os confumio.

7 8 Antes, que os noífos envefliífem a primeira náo,mã-
dára5 os Governadores ao Capitão António Gonçalves Tíry
pó,quc com a fua companhia paífaífe á Ilha,& fe erabofcaífe

Tt3 ' em

498

CàST(^OTO lusitjno

1646

'm

em certa paragem,que forçofamentc avia de bufcar o Framé-

go, feacudiíTe em rocorro,aonde o chama íTe o combate: Sue-
intimidados àore cedeo, que rendida a primeira embarcação, mandou ó Capi-
jlj^^^ tao da noíla artelharia teíie^ar a victona . Ouvio ò Inimigo

os tiros naFortaleza daVilia, aonde fe alojava feu mayor
poder: Temco-fe aflaltado , & mandou húa partida de Olan-
defes, & índios para aquella parte , a defcobrir o Campo . O
caminho os trafia fem rodeo, á embofcada: Porém os Tolda-
dos delia mal difciplinados, os livrarão do laço : Ouvirão fa-
lar, fofpeytáraõ o perigo j & fem detença fe voltarão para 3
Fortaleza. Quizeraó os noííbs emmendar o erro, com feguir
ao Inimigo, mas não confeguiráo mais, que o conhecimento
de fer fácil de fe cometer,& difficil de fe emmendar : Melhor
fervio ao Framengo, a falta de noíía difciplina, que a averté-»
cia de fua cautela. Os outros Capitães , com a gente de fuás
companhias, fe dividirão por toda a Ilha -, recolhendo o que
• tinha preftimo , & queimando o quenáo tinha ferviço , dei-
xarão aíTolados os aIojamentos,& aldeãs dos Indios,& tudo o
que podia fer de utilidade ao Inimigo . Mandou o Governan

Ganhada a ilha Jq^ João Fernandes Vieira,tocar a recolher: paíTou-fc a nof-
Je recolhe os nef r ^ ^ r. c \ r • 1 ^ r, 1 wn

y5^, ^ ia gente a terra hrme, & com os defpops das nãos , & da Ilha

marcharão todos para o Arrayal, deixando ordem , & gente,
para que na praya da noíTa parte,aonde chamão os Marcos,fe
levantâífe húa Força,que fizeíTe oppoíição á do Inimigo , fe
intentaífe paíTar a ella. Eftimoii-fe muy to eíla facçaó , tanto
pellas circunftancia%quanto pellas refultas^fazendo may or o
gofto, o pequeno cuftoy qoe foy fò o de alguns poucos feri-
dos levemente. A perda do Inimigo, )i fica relatada.

79 Não tinhaó os noíTos encoftadas as armas, quando
lium Olandès,que entre elles era Condeftavel, fe paíTou , &
referio, que o prezidio da Fortaleza da Villa , & todos os v e-

0 s^rgeto Mayor ^i^hos delia, a tinhão defamparado , & a toda a Ilha , & fe a-
A deixa alolada. - n • 1 / ^ 1 1 i-F 1 , ^ ,

Viao recolhido a lombra da Fortaleza da Barra , que chamao

de Oranje, aonde o mar lhes facilitava a efperança do focor-
ro: (em cazo, que noíTas armas os reduziífem ao ultimo aper-
to)0 Author, & o avizo remeterão com toda a preíTa ao Ar-
rayal, os Portuguezes,que ficarão para affiftir á força, que fe
mandou fazer na praya dos Marcos j ao qual fe feguio a cer-

! teza

1646 ^A^nLLIV(p,p VU, 499

teza de tudo, o que dizia (examinada por alguns Poitugue-
Tts^ que entrarão na Ilha, & virão, o que tinháo ouvido.)Os
Governadores, derpachâraõ logo ao Sargento Mayor Antó-
nio Dias Cardozo, com a gente neceíTaria, & ordem, que re-
tirada a artelharia da Fortaleza, a defmantellaíTe pella impof-
fibilidade de fe confervar fem muy to difpendio, aíTi de fazé-
da, como de reputação jexpofta, com toda a Ilha, áinvazão
do Framengo, por aberta,& cercada de mar, de que elle efta-
va fenhor . Executou o Sargento Mayor as ordens com feii
cuftumado valor,& promptidão. Arrazou a Fortaleza, tallou
a campanha de toda a Ilha, não deixando nella couza, de que
fe podeíTe aproveitar o Inimigo, o qual medrofo, não ouzoii
iahir da fortificação de Oranje em oyto dias, que o Sargento
Mayor gaftou na Ilha ^ donde fahio, levando para o Arrayal
dezoy to peças de artelharia, que achou cravadas ^ com todas
as armas , muniçoés,& mantimentos, de que eftava bem pro-
vida: Tal foy o defatino, com que o Inimigo a defamparou.
Confequencia defta facção foy também, paíTar-fe para o nof
ío Arrayal hum mayoral dos Brafilianos , com quarenta Inr ^
dios de fua jurisdição, que os noíTos Governadores remete- ^^^'^y°^^^ ^"^

- r\ A • 1^1 1- ^ - r Jndios com quA'

lao a Dom António rhehpe Camarão , que com o leu terço f^^f^^ fevaífa k
aífiftia na Paraíba, com cartas de recomendação, para que os mjfa^arte.
trataíTe com particulares favores,& lhes deííe alojamento em
parte,aonde podeíTem grangear a vida,fem fobre-falto das ar-
mas Olandefas. Eíle fucçellb com as circunftancias referidas
fobio muy to a reputação de noífas armas, & as eíperanças da
noíTa gente.

80 Chegou-fe odiado Sando , que naceo Aurorado
melhor Sol, a todos fefti vo, & para o Governador João Fer-
nandes Vieira, por nome,& por voto , mais que todos os do
anno venerado^ (Grécia em feu peyto o fervor do zelo, com
as evidencias do patrocinio)& entregue ao cuidado de o fef-
tejar com a folenidade poífivel , o fufpendeo [ na ante vef-
porá do Sanâ:o , vinte & dous de Junho] húa falva de toda a
3rtelharia,que derão as Fortalezas do Inimigo . Era novida- Fejíeja, o inimi"
^e,& aceridco-lhe o defejo, de faber o motivorEncomendou go achegada das
aos Cabos das Efi:ancias,que fe fizeíTem diligencias,por fe to- ^V^"^^^ "^^olÃ-
mar lingoajque deífe noticias da cauza j& coníignou premio. ^>^/'^''F^»
■'■■■' Tt4 Che-

500 c^STVoro LvsirjKo 1646

Chegou o dia de vinte &qiiatro,fefl:ejpu-fe o Sagrado Pfc-
ciirfor na capela de feu Engenho; ( era da invocação do San-
do) & no mefmo dia fe voltou para o Arrayal com os prin-
cipaes Cabos da miHcia,que affiílirão á celebridade. Não tar-
dou o SidcQ em moftrar , que o devoto obfequio lhe fora gra-
tOjporquelogonofeguinte dia, Iheaprefentáraó os noííos
foldados hum Olandès , & dous Negros , que cativarão de-
baixo da artelharia do Inimigo : Com elles fe fizerão as cuf-
tumadas diligencias, & concordarão , em que ao Framengo
chegarão trez náos de Olanda , com munições , & armas ; &
trezentos & cincoenta foldados , & que fe dizia , da vão por
liov^, que brevemente lhes chegaria húa poderofa armada,
para fe reftaurarem no perdidojfendo efta a cauza da alegria,
ique publicarão as repetidas íàlvas de íuas Fortalezas.No ou-
tro dia,que fe contava vinte & féis , fogio do Arrecife hum
Sargento, Francês de nação , que confirmou o depoimento,
com a particularidade,de que a companhia occidental avifá-
ra, que em breves dias dariaõ á vela duas armadas , húa para
reítaurar a Campanha de Pernambuco, outra para conquif-
tar a Cidade,& Campanha da Bahia, com tanto numero de
gente , de armasjSc Cabos taõ efcolhidos , que nenhum du-
vidava da certeza da promeíra,& da conquifta,

81 Naó era o coração de nofíbs Governadores de limi-
tada efphera: Excedia fua capacidade a toda a extenfaó da
callamidade. Toda rezão da palma íimbolizar as viftorias, he
fobir mais dilatada, quando eftá mais oppremida . Ouvirão
a nova taó pacatos^, que a hum,& outro fobejou o animo,pa-
ra alentar a todo o exercito . Com nova cauza , para novos
brios,deixou aos noíTos, o receberem nefte tempo o focorro
da mão, de que receavão o golpe . Entrou no porto de Ta-
mandaré húa fragata com cento & quarenta foldados Portu-
^ntra hu focorro gi-^ezes:No do Pontal de Nazareth trez caravelas , com infan-
do Reyno emUA' taria, armas,& géneros que hiaó para a Bahia . No mefmo té-
^(ireth, pQ ^ Í3^ navio carregado de vinhos,que hia para o Rio de Ja-

neiro. Todas dfras embarcações fe defenderão dos Olande-
fes, que no mar lhe deraó caça 5 circunftancia , que com a do
tempo, aífi animou aos noíros,que mais pena lhes dava a tar-
dança do InimigOj que todas fuás for^asj&: armas.Chamou o

Go-

^

)/

i64-6 fAl(TB 1. LlV%0 Vil, ^qx

Governador a concelho aquelIaspcíToas , quepodiaõ votar
na matéria: Conferio-fe o eftado preíente, com o ameaço do
futuro j& por conclufaó mais util, & mais íègura, reíbl vcraó,
que fe mandaíTem retirar os moradores da Paraiba, & da Go-
yana para a vezinhança do noílo Arrayal, antes de chegar a
armada Inimiga: porque achando-nos unidos, perderia aef- ''^^^'^^"'P ^f^^'

i Tíif CS moTítdojcs

perança de nos vencer feparados^Sí também , porque á mar- ^^ paratha &
cha da géte,& dos moveis5era mais conveniente no tempo da coyana.
feguráça,que no do temor^Sc que com efta prevenção adian-
tada, fe atalhavão os danos , que cauzaõ no vulgo as coiifu-
foés do medo, com a imaginação do perigo,

8 2 Não íè embarafava o curfo dos progreíTos, com a a-
plicaçaò dos apreftos: Erão diverfos os miniftros de hum, &
outro cuidado,& todos executavão com felicidade , porque
tudo fe difpunha com acerto: Não deixava a diftinçaó , con-
fundir as ordens: Chegava o mez de Junho aos v inte & nove
defeusdias, quando o Capitão Francifco Lopes Eftrella
(guarnecia com a fua gente a eftancia, que chamavão da Bar-
reta) teve avizo , que duas lanchas inimigas a v ela , & remo,
fobião pella corrente dos Rios Tigipi6,& Giquiá , perto da
paragem , aonde fe a;untão,para entrar no mar. Adiantou-fe ^ Capitão Fran^
o Capitão com o melhor de fua cópanhia a efperallas de em- "^^ ^"^^ fí'
bofcada,em hum cotovello,que alli faz a terra: Teve vifta da Unchlloinimt
primeira jfaltou á agoa com trinta foldadçs^deu 4he duas car- go,
gasj abordou-a, & com morte de oy to foldados Olandefes a
rendeo, (concedendo quartel, aos que o pedirão) com elles,
& com toda a carga, (que era de mantimentos) mareou a lã-
cha por entre os Arrecifes , até lançar ferro na Barreta , com
efpanto da Fortaleza das Cinco Pontas,que obfervou na dis-
paridade do numero,& das condições do combate, o exceíTo
do valor jcomo tambem,no defprezo de fua artelharia,a obe-
diência da fortuna. A fegunda lancha,aírí como vio a forte da
primeira, a vela, & remo fogio para o Arrecife, donde tinha
fahido: Dos rendidos , foube o Capitão , que nella vinha o c

Comendor da Fortaleza dos AfFogados com mantimentos
para focorrer a fome, que na dita Fortaleza fe padecia;& era
tal p aperto da neceífidade , que fe nâo reparava na contin-
gência do remédio : Pareceo-lhe ao Inimigo, acharftctr dif-

ferente

A

^02 C^ST<I(1070 LUSITJNO j6^6

ferente fortuna : Defpachon por terra o focorro ás coílas de

Os foldaios de He Negros, com infantaria, que os cònduziíTecMas fahio-lhe er-

nque ias omao ^^^^ ^ conceito. Os foldados de Hérique Diasos efperaraó,

hum com&oy cio ^ % i 111

' Framenqp. embeiçados entre os mangues de hum lamaçal, donde com

repentinas cargas os feriraõ,& fobre-faltàraó de maneira,que
mortos,& feridos os foldados,deixàraó nas mãos dos noílos o
focorro, & os efcravos,que o carregavão,fem q4.ie os podeíTe
divertir da prefa, o chuveiro das ballas,que fobre elles defpa-
ráraõ as Fortalezas dos Affbgados, & Cinco Pontas ( foy en-
tre hiia,& outra o aífalto: ) Perfiou o Comendor em bufcar
nieyoparafocorrcr aneceííidade dosfeus, &fahio do Ar-
recife com quatro lanchas bem artelhadas, & melhor guar-
necidas,fobejo poder para qualquer oppoíjção noíTa. Confia
derou-o affi o Capitão Francifco LopeS)& não quiz pagar as
cuftas de temerario,quando o avizava a defigualdade do par^
tido.Sobiraó as lanchas até a FortaIeza,& nella metéraõ o fo^-
corro.

83 Com fucçeíTos pouco de femelhantcs , fe foy conti-
nuando o exercicio de hLias,& outras armas , até os vinte de
Julho, dia em que o Inimigo eípcrou a noite , & favorecido
da efcuridade delia, fahio com todo o poder, empenhado em
fazer algua bõa forte, & ou que foíTe propoíito de feu deíig-
iiio, ou acazo de fua fortuna , chegou á eftancia , que chama-
vão dos Marcos com determinação de a ganhar: Guarneciáo
JJfalta oinimi^ O pofto os Capitães Francifco Berenguer, António Borges
goaEHamia^dos Uehoa,& Franciíco de Lisboa com fuás companhias : Aviza-
yj^^rfWjC^/í^f f[o&dorebate,quederãoasíintinellas, fe prevenirão para a
caj igd 0. defenfa,&recebéraõ ao Inimigo com duas cargas de mofque^

taria: A promptidão da reíin:encia,& o inopinado da vigilã-
cia,quebrou de forte o animo do Framengo, que defcompof'
to virou as coílas; foy tal feu eípanto, que temeo mayor rui"
na na dcfordem, da que podéra aver no combate Fes alto pa-
ra fe formar, porém os feus mais lembrados do perigo,que da
difciplina, foráo tão remiíToSjque deráo lugar , a que os nof-
fosfaltaíFcm as trincheiras, &efpalhados pello mato oscar-
rcgaíTem com tão pezado golpe , que perdida a obediência,
fogiraó com vergonhofa cobardia , até fe cobrirem daarte-
ihariade fuás Fortalezas 3 não lhes faltando a ordinária cau-
tela

^

i6^6

^A^E 1. L1V(^ Vil,

^o^

tela de retirarem os mortos , por nos efconder a perda ; mas
não a pode encobrir o Tangue , que publicava o dano: Rcti-
raó-fe os noíTos do alcance das bailas inimigas , com hum íol-
dado ferido por hum braço, a tempo que )á os Capitães das
Eftancias vezinhas, &do Arrayal o Governador João Fer-
nandes Vieira, chega vão em feu íocorro . Cõ o gofto do fuc-
çeíTo aliviarão a pena, de íe não acharem no conflicto.

%\ Poucos eraó os dias,que o Inimigo deixaíTe de fahir,
&: menos, os em que a noíTa gente deixou de o caftigar . Per-
fiava em feu dano, ou com intento de nos enfraquecer, ou có
a efperança de fe melhorar. Atenderão os noíTos Governa-
dores a hum, & outro fim,& ordenàraó,que em cada húa das Atalha- fe o m<-
Eftancias, fe aíTeguraíTem os prezidios com cazas fortes , em tento àe ms con-
que fe aquartellaífem,cir cunvallados de cavas, trincheiras, &/^f^^ ^^ muni-
eftacadas, de capacidade, & fortaleza, que ferviíTem á refif-/^^^"^*
tencia,& á oíFenfa j (em cazo , que a confiança de mayor po-
der nos fechaíTe a porta á comunicação dosfocorrosj & para
que na continuação dos aíTaltos não confeguifíe o intento de
nos confumir as mumçoés, ( dano , que fe faz infenfivel , até
fe experimentar irreparável) fe paíibu ordem geral a todos,
que nas occazioés, dada a primeira carga, fc enveíbíTe á efpa-
da;& que no Arrayal eftariaó prevenidas as armas de forte, q
não ou veíTe interpolação de tempo entre o rebate , & o fo-
corro. Era nefte tempo, & por eftacauza,taó formidável ao
Inimigo o nome do Governador João Fernandes Vieira,que
infundia terror em feus contrários: Fora fempre neíle igual a
fortunaaovaIor,&tudoreprefentava ao Inimigo a voz de
feu nome, experimentado nas occazioés, a que nao íàbia fal-
tar fua efpada^ verdade, que de nenhúa maneira podéraó ef-
curecer feus emuIos:Nunca os teve a fombra:Ceva-fe no me-
lhor a enveja. A oppofição das nuvens faz parecer os ravos
do Sol mais claros: Induftria era já de quaíi todos noííbs Ca- ^ ^^'^^ ^^ ^''^^
pitães, o delkuir a refíftencia, & a efperança do Inimigo , có F^^^^f'^^]'''^
mandarem tocar caixas ao largo, fazendo crer ao Framengo, ^^ inimigo.
que o Governador chegava có focorro : O que en vejofo def-
prezava o ardil, o pagava de contado,ou vidoriolb com me-
nos gloria, ou vencido com mais eftrago. Vicio he o da enve-
ja, na competécia infofrivel,na obrigação abominável. A op-

poíiçaò

5^4 c^ST\ioro ws ir ANO 16/^6

poíiçaõ do emulo,he muyto mais fea no ingrato, porque não
fó afpira a deftru ir a vida, fe náo também o credito, de quem
lhe deu o fer. Símbolo da ingratidão faó os vapores: Afpiraó
a efcurecer o Sol, que os levantai& nobiliííima vingança he a
deíle Planeta j caftiga a ingratidão com perfiar na beneficên-
cia.

8 ^ Bem conhecia João Fernandes Vieira, que aos pey-
tos dos benefícios, & das excelências fecriavaó os mayores
emulos: Com alargar mais o braço, lhes fazia o peor dano,
porqu e os formava mais ingratos ; não,porqu e fua generozi-
Cau&a defeavi' dade O intentaíTe , fe não,porque a maliciofa corrupção de
var o odío dose- ç^^^ contrários convertia a medicina em veneno.Olhaõ os in-
^" °^' gratos para a felicidade, que os favorece, como para o delic^

tOi& vigiaõ-fc da grandeza,que os ampara,como de teílimu-
nha de íiia miferia: Pello aumento da eftimação , que todos
fazião dapeíToa de JoaõFernandes,fe media o ódio de al-
guns j & nem elles deixavão de bufcar modo, para o deiftruir;
nem elle de achar meyos, para o naõ crer. Tinhaó fahido cõ
alguns libellos infamatorios , que efpalhados fervirão de cal-
lificar a aprovação, com o falfo da calumnia. Vendo , que cq
as diligencias de lhe efcurecer o credito , lhe realçavão a opi-*
nião , determinarão tirar-lhe a vida , & fepultar em íeu cor-
po a cauza de fua emulaçaô.Por diíFerentes vias,foy avizado
-^,^ ^ , ^ da cõfpiraçãojou porq fe reveIou,ou porque fe inferio . Não
p Ara o matar, ^^"^ ^ paixao, diílimuiar a malícia : Nenhum cazo tes João
Fernandes Vieira dos avizos: Naõ dava credito , ao que náo
dava motivo. Não cabem em hum coração a innocencia, & a
cautela. De íi mefiuo fabia, que era todo para as conveniên-
cias do Eftado,& nada para as da peíToaj & não podia crer , q
lhe procuraíTe a morte,quem nella perdia as efperanças da vi-
da^ porque lhe parecia,que o ódio mais cego, diftingue o re-
médio, da ruína : Julgou por impoíIivel,aver gente taõ deíà-
íizada,que pegaíTe na efpada pellos fios, com que forçoíàmé-
te fe avia de cortar. Sobre efi:a confiança , procedia menos a-
cautellada atrayção; &fe multiplicavão os avizos mais of-
ficiofos , dizendo em hum papel a Joaó Fernandes Vieira,que
olhaíTe por fi, porque o a vião de matar á efpínguarda ^ que
dezanove traydoreSjO tinhão aífi refoluto^ (a cada hum indi-
viduava

1646 ^J^EhLlV^Vn, 505

viduava por feu próprio nome . ) Erão todos os nomeados,
os que delle tinháo recebido mayores benefícios 5 porque íe
apadrinha váo da callidade, & do parentefco ; além daquella ^'^^ÍP^^^^Ç^^, ãeq

- _- ,^. j'r 1-- o • ^^■^^ Fernandes

rezao comua , que a todos tes companheiros , & parciaes em yt^iy^ fo
todas fuás fortunas.Taó fora eftava de dar credito á trayçaò, Xítdo,
que fe perfuadio fer a avertencia, impulfo da vingança , com
mafcara de zelo . Inftava o avifo , & nada obrava o remédio.
Húa das peíToas mais empenhadas nelle ferefolveo a defco-
brir a cara á d iligencia, & de rofto a rofto, manifeftou ao Go-
V ernador a tray çaó , com todas as circunftancias delia . A li-
berdade do delator,avivou mais em João Fernandes Vieira a
prefunçaói &creo fem duvida, que a mal querença bufcava
efte meyo para deftruir aquelles homens com braço mais po-
derofo: Diííimulou o conceito , & deípedio o Fiel , como fe
foratraydor.

86 Os AfFeyçoados impacientes de veiremj que á dila-
ção favorecia o delido, íe valéraó da authoridade do Meftre
de Campo André Vidal de Negreiros , que por mayor ami-
go,& mais intereíTado avia de reprefentar a verdade có mais
efficacia; & convéceria a incredulidade do Governador.Buf-
cou a melhor hora,& lhe diíTe, o que paíTava^Sc que avertiíTe, ^- ^ deíTecn^
que todas as idades derão traydores; porque os há, aonde há dLamddade, ^
homens;& que muytos varões grandes , & Capitães famofos
tinhaó fido miferavel defpojo das trayçoês, em todas as par-
tes,& em todos os tempos 5 & que fò confianças indifcretas
occazionavão o logro das infidilidades j porque o prudente
eftuda os cazos nos exemplos, cuja doutrina fervio fempre á
cautela dos entendidos 5 & que, não receber avizos da prati-
ca, era herezia do juizo: Que não efperaífe o defengano do
próprio fucçeíTo, porque então, nem o arrependimento lhe
feria útil, nem a queixa defculpavel j que o prefervativo dos Em que fe fart'
males, era entre todas a melhor cura. Que lhe parecia bé, co- àanjo. fua. incre*
mo meyo mais feguro , prender os conjurados j & provada a ^^^'■^^<^^^
culpa,por-I hes ás coftas a ley ,&defvialIos da occazião,ou por
morte, ou por defterroj& que avertiíTe fer o animo , que lhe
falava, de am igo bem intéfionado , & zelofo do bem comum: ^f

Atento ou vio Joaó Fernandes Vieira ao Meftre de CampOj • ^,

8c mais eípantado,que creduIo,refpondeo,que tudo^quanto ■

Vv na-

!!■

,^o6 C^ST<H10T0LUS1TAK0 1646

naquella matéria lhe tinhaõ dito, era invenção da malícia, q
a titulo de íegurança , folicitava a defcompoíiçaò de tantos
homens nobres, como eraó os calúniados.Todos os nomeou,
8c concluio dÍ2endo,que fe aquelles, fendo homés de callida-
de, parentes,& obrigados lhe defejavaõ a morte, de quem a-
via de fiar a vida? Que o apurar verdade de tanto pezo , não
podia fer, fem injuria, (carregando a culpa fobre o author da
diligencia ) & que feria intoUeravel defacerto, criar inimigos
com os arguir de infiéis. André Vidal, mais âtalhado,que có-
z>i%í'^«<í,f/4;i^ vencido, com maduro confelho, mandou chamar hum ho-
uíndre Fídal fc mem,que lhe pareceo capaz para tamanho negocio,(cujo pa-
bre a matem, ^^^^^^ ^j.^ y^^ Jq^ conjurados) & recolhido com elle,lhe def-
cobri o tudo, quanto fe praticava : Propos-lhe o dano do co*
mumj o caftigo dos particulares , qUe fulminavâo a trayçaõ,
pois era certo,que em cada hum dos moradores,& foldados a*
vião de achar jaÍ2,& verdugo: Pedio-lhc,(;peIlo que o crime,
& infâmia abrangia aos parentes.) que fizeííe com o feu,fe rc-
duziíre,& confeíTaífe a trayçaõ, com áfegurança do fegredo,
& do premio , que elle prometia , & jurava j & juntamente a

j // ^.rj todos,o perdão da culpa:Defpedio-fe o confidente com pro-
0 que de/la ujul' rr j ^ - r i r i u j xr i ^

fa^ metia de nao raltar, ao que íe lhe ordenava. Voltou ao outro

dia, & difle ao Meftre de Campo,que no parente não achara,
fe não fidelidades, eípantos da mentira, & efcandalo do alei*
ve.Deu logo André Vidal contaa Joaó Fernandes Vieira do
negocio, & da reíulta delle: Agradece© o cuidado; ainda que
julgou fuperflua a diligencia: Mas em breves dias coníèíTará
muytoáfuacafta, de que parte eftava o erro. ^

87 Poucos dias erãopaíTados do mez de Julho, quando
o Governador da liberdade fahio de íeu Engenho , [ que íe
chamava de Saô Joaõ Bauptifta ] feguido da companhia or-
dinária de fua guarda ; que logo deixou atraz a ligeireza do
cavallo, em que montava: Tanto avante como hum tiro de
peça, aonde principiava acerca de hú bafto canaveal, que la-
deava o caminho por húa parte, o efperavão de emboícada
trez Mamalucoscom trez efpinguardas , que a hum mefmo
Jurao aefpm- ^ ^^^p^ \\^ç encararão aos pey tos,com tanta dita do Gov erna-
nador loao Fer- "°^ > 4"^ ^^ "^^ tomou togo , cu;as bailas lhe paflarao hum
nandes Vieira, hombro de parte a parte, & não foy o pey to, porque tanto

fobio

1646 TAXTB L LIF^O VIL '^o; '

fobio o tiro, quanto naquelle inftante deceo o ca vaílo [ não
foy menos a contingência de perder , ou naõ perder a v ida:]
O certo he, que a providencia, que a duas efpinguardas em-
pedio o fogo, defviou as bailas da terceira, para que nem a-
quella vida perigaíTe , nem tanta confiança crecefíe . Meteo
o Governador maõ á efpada, avançou o vallo do cerco , que
por nenhãa parte pode vencer o cavallo. Os foldados, que .
pouco diftantes o feguiaó, chamados do tiro , & informados
do cazo faltarão a cerca, alcançarão ao agreíror,que fem dila-
ção fizeraó empedaçosjCuja efpinguarda conheceo o Gover-
nador,& por ella o author do crime^ ao qual a tinha dado no
principio da folevaçâo. Poferaõ os foldados fogo ao cana-
veal, para q nelle morreíTem queimados os outros dous Ma-
mai UCOS3 porém elles podèraó fahir pelía outra parte antes,
que o fogo os atalhaíFe, & foraó viftos de algúas peíFoas , que
como o notáraój ignorantes da cauza , não os obrigou o fuc-
çeífo, a que lhes feguiífem o paífo»

88 Voltou o Governador para fuâcaza,qdifl:avameya
kgoa do Arrayal, para fe curar da ferida 5 mal fe tinha apea- ^^^^^^Ç^o , que o
do,quando mãdou retirar todos os barcos , que ferviaõ á p^{;.f"'f'f''^''^l^^^<'
fagem do rio,que entre o Arrayal, & fua caza fe entrepunha ^ ^''^''-^ -
(antevendo , o que defpois fuccedeo . ) Com a ligeireza de
roim, voou a nova, &recebeo-fe no Arrayal com alteração
tão cega, que fe defprezavaâ obediencia,por fatisfazer á vin-
gança.Officiaes,& foldados correrão á caza do Governador,
pedindo com tumulto,os nomes dos traydores,para os quei-
marem: Os que tinhaó cavalIõs,montára5 a bufcar os Mama-
lucos, que não acháraó . Foy mercê do eco , não fc terem di-
vulgado os nomes dos dezanove da conjuraça5,que a não fer
aííi, fora o caftigo mais efcandalozo, que a culpa^ porque de-
fenfreada a ira, cortara fem diftinçaó, por innocentes, &cri-
minofosj & padecerão comos culpados, os vézinhos . Com
mayor perigo obrou a noticia nas eftancias: Os Capitães , &
os Soldados,occupados do fenrimento,& da cólera as defam-
paràvão, fem aver , quem fe lembraíTe do Inimigo : Corriaò
todos para a caza de feu Governador com hum mefmo ani-
mo. Deraó-lhe a nova a tempo,quecom hua fangria fe prin-
cipiava a cura. Saltou da cama (menos atento á confcrvaçaõ

Vva ' da

fitii

50^ C^ST^Ior o LUSITANO 1646

da V ida, que ao bem da pátria ) montou , & fahio ao encont
Afoccegala^ aco- ^j,^ j^^ foldados, que encontrou na paíTagem do rio^ detidos
de o mefmo Go- nrijt/^ a ^ • •-

/ {. pella lalta dos barcos: Com rolto alegre mmorou a opinião^

Si arguio o arrebatado defatino, de deixarem feus poftos,ar-
tiícados á in vazão do Inimigo: Com cortezia, & brandura os
reduzio de furioíbs a obedientes^obrigando-os,a que doma-
da a cólera, fe fogeitaíTem ádiíciplina , & voltaffem a guar-
necer feus quartéis, &eftancias : Satisfeitos das difcretas re-
2oés, com que os perfuadio, fe v oltáraõ,fendo a promeíTa de
fe caftigar o deliíto cò todo o rigor,a q mais os foçegou. To-
dos amavaó ão Governador, como a pay, & em todos obrava
a obediência cora os eft remos de filialj& não com a tibeza de
ferviL

B9 Socegado ò tumulto 'pelíameíma cauzâ da altera-
ção, fe voltou o Governador para fua cazâ a continuar a ca-
raj& em breves dias íè v io de todo convalecido ^ mais adido
á virtude da medicina, que aos confelhos da vingança . De
feus Inimigos queria a êmmendâ ,& não a ruina. Mandou-os
chamar á íua câza. Naó rècuzáraõ a ordem, certos na clemen-
Capga fddââs ^ia: Sopofto,que fe fuás conveniências lhes repreíentavão a
gravidade do deíiâio^ fuás eíperanças lhe facilitãvão o per-
dão i Gõm àfpereza, lhes afeou a ciilpa i Acuzou a infâmia,
com a recordação dos beneficios j & a perfídia, com aomena-
gem do juramento: Exagerou a maldade , com o v íflçuío do
parentefcojVencida da n[ialiçia,a; obrigação do íângue. Com
as evidencias da trayção, lhes prpy ava a vileza, & ultimamé-
te lhes diííe, que fopofíoj^^çpfitàí^feu Governador, por elles
inefmos acclamado, tinha braço para os punir, Be como Joaõ
FernándesVieira,efpada para os caftigar ,netn de hiia,nem de
outra couza fe queria valer , p» qUe conbeGeíre o mundo sk
differença,que vay ,de hú coração vil , a huânímo generofo:
& q nunca permiti íTe o cep,^ íeu \^alor fe marichaíTe cõ a opi-
nião de vingativo, nem q por íua caiiza fe derramáíTe fangue
de Catholicos,quãdo fua fama refplandécia efmaltada com o
dos Herejes. Avertio-l hes, qUe tornaíTem. fobre íi, & confide-
raífem, que a maníldaó, & a amizade, que agora com tanta
liberalidade lhes dava o perdão, os obrigava ao arrepen-
dimento , Sc á emmenda j certos ^ eiii. que os deíprezos

' da

traidores.

^

i6^6 ^AtjBl.Lm\OVlL 509

da piedade, eraõ os mais rigurofos fifcais dajuíliça. Emmu-
decidos da culpa, & do pe)o,íahirão confundidos da prefen-
ca do Governador, mas não fahiraó outros, como defpois
moftrou o tempo. Condição própria he do ingrato, aumen-
tar os agravos, com a prefcnça dos benefícios.

90 Temos dito, que foraó dezanove os da conjuração,
porém não diíTemos os nomes das peíToas , de que fe compôs
efte numero j& terá para fi o ley tor, que he noíTa a falta jpello
que, fatisfazemos á nota, com lhe avertir , que o fogeito que
nos contou as peíToas, reférvou para íi os nomes: Em hum
coração grande, com grande capacidade, tudo faõ primoresj ^_f^^^^í'
fabe perdoar deliâ:os,fem publicar delcreditos . Muy to faz o^ '^'
agravado, que perdoa, a quem o tem offendido^porém muy--
to mais, quando livra o criminofo do caftigo , Sc da infâmia.
Todos efies defanove homés âcuza de infames a perfidia,& a
ingratidão;& os benefícios recebidos, a toda a gente manifef-
tos, os culpara de ingratos,fe os conhecera traydores. A cau*
za, que tiveráo para encorrerem em femelhãtes deli£tos, pre-
guntaráó os curiozos.^ E refponderá a verdade , que nenhúa
outra cauza mais, que o verem-íè precedidos na profperida-
de,que os fuftentava na opinião de honrados. Miferias há de
tão baixa forte , que fe oííendem do focorro, fó porque vé a
neceíTidade, defejozas de confumir o author de íèu remédio,
porque lhe devem a confervação de feu eflado: Aborre íTem,
na cauza do fer que tem,a tefiemunhado que forão.Defeja-
rá faber o ley tor , que conveniência , ou que premio efpera-
vão os traydores, que os podeíTe obrigara refolução tão fea^
Então fe efcondeo, agora a diremos,porque defpois de a en-
cobrir a politica, a publicou o efcandalo . Praticava-fe , que
tinhão aíTentado com os Governadores do Arrecife , entre-
gar-lhe a terra, tirando a vida a Joaó Fernandes Vieira , que
lha defendia j verdade, que fe defcobrio , com fe divulgarem
algúas cartas, que os noííos Cabos mayores tomáraõ a húa
mulher , que foy a terceira de tratos taó infames j as quaes
remeterão ao Governador Geral do Eftado António Tel-
les daSylva, como a juis competente defemelhante cau-
2a. O que defta diligencia fe feguio, não podemos nós
alcançar, ou porque a rezaó de eftado o dilíimulou, ou

Vv3 por-

M<'

^lo C^STíl(IOTO LUSITjKO 1646

porque algua diligencia o efcondeo ; para claro manifefio,

de que foy Joaõ Fernandes Vieira Varaó taõ grande, que

venceo os mais poderofos inimigos, & os mais refinados

traydores , porque lhe naó faltaíTe entre os Capitães

da famaj o fer temido, &envejado; & porque

os excedefle, em fahir viíioriofo da enveja

dos próprios 5 & do poder dos

contrários. .

i

i6j[6

Çit

CASTRIOTO

LVSITANO

FARTEI. LIVRO VIIL

UDO , no âmbito da terra , tem fua
idade: Pençaõ do caduco , Nacem os
imperios,crecem,declinaói& acabaõ^
de accidentes politicos enfermão: Al-
gúas vezes convalecem, até quedo
ultimo achaque morrem, como qual-
quer individuo da natureza. Exem-
plo, que vemos em cada hum dos dias, nace, crece , declina,
& acaba padecendo entre o Oriente,& ò Occazo , tãtos def-
may os, quantos faó os nublados , de que enferma . No Efta-
do do Brafil, naceo o império de Olanda,creceo fem tempo,
enfermou fem cura, cahio fem ruina . Teve a condição dos-
corpos fublunares, que cabem ajudados de feu mefmo pezo.
Foraó mortaes os achaques , & tão inutis os remédios , que o
leváraó mais deprefla áfepultura. Em os fcte livros defta
chronica lhe v imos o nacimcnto, o auge, & a declinação : A-
gora veremos,como acabou ajudado do pezo de fuás mefmas
armas, chamadas para feu reparo, & convertidas em feu total
dano.

2 Hum anno, menos poucos dias, fe tinha paíTado , à^Ç-
pois da batalha das Tabocas , em que o Inimigo começou a
perder terra,& dominio; quando,em vinte de Julho de qua-
renta & feis,aportou na barra do Arrecife o General Sifgif- Tomãô porto m
mundo Vaneícoph com húa poderofa armada , & nella qua- arrecife novos
tro mil infantes,que conduzia Jacob Eftacourt,hum dos prm- '='^^'^^<^°^ ^^^fo-
cipaes da companhia Occidental, peíToa, de que temos feito ^'^'^'' '''^'"''^''^
menção mu y tas vczes(como também do General SifgiíiTiun-
do) em o terceiro livro deila hiíloria: Mandados agora, pello

Vv 4 muyto

r

512 C^ST^WTO LUS1TJ'N0 ,16^6

muyto que obrarão então^ & pello conhecimêto,qne tinhaõ
do terreno, & dos moradores delle , principalmente do Go-
vernador João Fernandes Vieira,[de quem no tempo de Teu
dominío, fizerão a eftimação primeira] com intento, de qne
cobrariaõ o perdido, por força, & por negoceação. Deitarão
ferro com multiplicadas falvas ; defembarcáraõ com muytos
vivasjforâo recebidos comfeftivoaívoroço, eíTeytos naci-
dos da confiança, que a todos prometia, a reftauraçaó de feu
império* Àconfelhâva-fe a cfpefança de todos com feu defe-
jo,&ouvera-fe deaconfelhar com feu eftado, temendo na
cauza delle íua perdição, & não feu aumento . Porque fe na
primeira conquifta acharão tantos fubditos, quantos eraó 05
-homens j agora achavão tantos foldados,quantos erão os mo-
radores. Pello eftrondo da artelharia, & pellas novas antece-
dentes prefumiraõ os noíTos Governadores a cauza , de que
logo os certificarão divcrfas noticias^

^ Com fobeja arrogância , tinhão prometido em Oían-
da, os dous Cabos de fua armada , areftauração do perdido
nas Capitanias defobedientes, fem mais difpendio , que o de-
quatro mãos de papel: Fes Sifgifmundo o de confiado na-

j^efrehenâe aflo' quelle primeiro congreíTo, em que lhe aíTiftiaõ todos, os que

xídh dosfeus. ^i^haó pofto na milicia,& no governo,& diíTe, (olhando pa-
ra huns,& outros) que fe admira va,de que taes, & tantos fol-
dddos fe deixaíTem cercar,& opprimir, de quatro bifonhos,q
nunca viraó guerra; tão fracos de animo , que fóa voz de feu
nome os punha em fogida para os matos , com menos temor
das feras,que dé fuás armas:Obrigando com o eílado prefen-
te, a que a Companhia julgaíTe neceíTaria a affiftencia de fua
peíroa,& o difpendio de armada tão groíTa, para os fogeitar.
Todos ouviraó,&callára5,efperando caftigada foa jadancia
pello mefmo engano de feu defprezo; Mas ainda aííim , hum
dos prefentes, menos fofrido,que os mais , lhe cenfurou a de-
máfia, dizendo ao Sifgifmundo , que não pezava bem os fuc-
çeíTos^quem não fazia differença dos tempos ^ que o prefente
lhe fana entender, que aquelles mefmos homens,que no paf-
fado fogião tímidos, ouvindo feu nomej no prezente, vendo

Sifgifrrdnâofro' fua peflba,a avião de envefl;ir á efpada,com def ufado valor.

mte emmsndar /^t^ilhou Sifgifmúdo a pratica, pedindo hum púcaro de a^oaj

i6^6

TJ^TE 1. L1V%0 VIU,

515

S

/"

Cia.

cjuelheaprefentáraófalobia, por náoaverno Arrecife, fe
náo a que tiravão dos poços,& cacymbas : Defgoílou da be-
bida,& prometeo melhora-los de agoa,mandando-a bufcar á-
quella parte da campanha, aonde aouvefíemais delgada, &
mais fabroía. Sede, que muy tas v ezes lhe apagou o fangue,&
nenhúa, a agoa. Nunca aos prefumidos,lhes íàhem menos cu-
ftofos os defenganos.

4 Inteirados os noíTos Governadores do poder)& defe-
nhos do Framengoj (Eftes eraó de fe rellituir na campanhaj
aquelle conftava de dez mil homens , computando os do pre-
2Ídio,& os do focorro) & que Sifgifmundo,como tão exper-
to foldado,para a reftauraçaó, fe não avia de defviar dos paf- ^prejlao-feos mf
fos da primeira conquifta, efperando de femelhante àiCpori-f"/?^^^ ^ rejijíé'
ção femelhante fortuna : Tratarão de emmendar as defordés
paíradas,como cauza total dos paíTados infortunios,para que
o Inimigo achaíTe na emmenda de noíTo erro, o caftigo de feu
engano, affi como achara então em noíTo defazo,fua viótoria.
Defpacháraó ordé, a D António Phelipe Camarão, q aíTiftia
na Paraíba, & a todos os Cabos de infantaria, aííi paga, como
miliciana, que fizeíTem retirar todos os moradores , que por
ftoxidão fe não tinhaõ retirado da Paraíba, Goyana,& íèus
deftriâ:os com todas íiias familias, bens, gados, & mantimen-
tos, aos quaes comboyaíTem, até os porem em feguro,entre o
Arrayal,& a Villa de Iguaraçu ,que deftinavão por fronteira,
para que o poder, que íèparado podia fervir á ruina , unido,
ferviífe á confervação: Proverão aquellas Eftancias ^ que cir-
cuiivallaváo as fortificações do Arrecife, de tudo, o que lhes
pareceo neceíTario para a reíiftencia , medindo os apreftos
pello perigo,& a diligencia pella importância , fem que à fua
conaprehenção faltaíTe o executivo de feu cuidado , com tal
acordo, & focego , que em fuás ordens fe efta va v endo a in-
tey reza de feus ânimos.

ty Notificados os moradores,que comprehendiaõ as or-
dens, obedecerão pontuaes, cerros, de que na execução del-
ias confiília feu remédio. Com prompta diligencia largarão
Engenhos, cazas, & fazcndas,carregando tudo,o que podião Mãdão retirar os
trazer,& efcondendo pellos matos, o que forçofaméte aviào '^lly^Tç^^^'''
de deixar.Ateiitosá fidelidade, defatentosá perda 3 fepofe- '

n

^a,na.

rao

m

5 1 4 C^ST(^oro LVSITJNO

16^6

^

raõ em marcha, aííiftidos de toda a gente de guerra , compa-
nhia,qiie lhes deííerrava o temor,& empedia a defordem.Era
detrintalegoas adiftancia docammho,asnoítes5&osmatos
occazionados á hberdade, que fempre defejaó os cativos ^ &
foraó muy tos os ercravos,que fogiraò, deixando pellaseftra-
das os bens, que traziáo de feus fenhores ; aos quaes não fica-
va mais remédio , que o de enterrarem ,& efconderem pello
mato fuás alfayas , & roupas , mitigando a dor de húa perda
certa, com o pequeno alivio de húa efperança duvidofíi . Era

muy to o numero da gente,& não poucas as miferias,& traba?
lhos, que experimentava© na marcha: Mal, que fó fazia tol-

I era vel, o fer de todos. Ghegáraò á Villa de Iguaraçu,por cu-
jo deílriâ:o íe deixarão ficar alguns, abrigados daquelle pre-»

( xidio:Outrosfeaccomodára6pelIaVar2ea,árombra donof-

ío Arrayali os remanecentes, pafíaraõ a viver nos contornos

^iefe alojaonos da Fortaleza do Pontal de Nazareth 5 & com Ter tanto o nu-

ta^f'^ ^° ^^' ™^^^ ^^ gente,que accreceo á da terra , não fobiraó de preço

^''^^ • os mantimentosi& com individuação, a farinha da terra cor-

reo por menos valia. Sefoy particular favor do ceo,julgue-o

quem fabe, que a mui tida o,he cauza da careftia . A todos en-

fmou a neceffidade a grangearia , & a agricultura , dando-fe

jv^ cada-qual á occupaçaõ de feu génio , com o que , em breve

tempo tiveraó, com que fuftentarfuas familias*

6 A refoluçaô^ que os noíTos Governadores tomáraõ,Ss:
que os moradores feguiraõ , defamparando a Capitania da
Paraíba, & os contornos ,& povoação deGoyana, deixou
perplexo ao General Sirgifmndo. Tinha concebido,que não
tardaria mais tempo em reduzir , & fogeitar a campanha de
Pernábuco, que aquelle, que tardaíTe em tomar porto no Ar-
jrecife j via, que noíTa determinação deílraira feu conceito,&
apelava para mais cuftozo defengano : Naó fe humilha o ích
slfgifmunâo fa- berbo,fe não a golpes. Aos cinco de Agofto fahio do Arrecr-
ÍI ^InZf/niL ^^ ^^"^ milj & duzentos homens , & com penfamento de ga-
^le^oltrM. ' ^ "^^"^ ^ ^^'^^ ^^ Olinda por entreprefa,& franquear aos feus a
agoa delia, & as fahidas, para correrem acampanha ( por to-
das as mais partes,atalhadas com noíías Efiancias.)Fes a mar-
cha pella praya, fervindo-lhe o rio de trincheira ^ com prefti^
mo par a o apartar, porém não para o cobrir, deixando-fe ver

dos

I ^4^ ^A^E I. L1T\0 VI 11. ^15

dos noíTos, feu efquadraõ, luzido, & ordenado de modo, que

enchia os olhos com a forma ^ & os ouvidos , com o toque de

caixas, clarins, &pifanos, de que vinha bem acompanhado.

O Capitão António da Rocha Damas,(achava-re com trinta

foldados na guarnição de húa trincheira, que fe adiantava á ^' Capitães Jn.

.Villa;medindoaoccaziãopelloanimo,fahio logo a receber ;r^;^f;f;

^o Inimigo; a quem feguio com igual prefte2a,& valor o Ca- res l encontrão!'

pitao Braz Soares(Cabo da infantaria,que na povoação efta-

Ya de prezidio ) cuja oppofição , fe não atalhava , detinha o

paíTo do Olandès. Na Eftancia das Salinas, efta va por frótey-

ro o Capitão João Soares de Albuquerque , com a gente da

Moribeca: Ouviõ o rebate, fahio ao encontro com cento, &

oytenta homês, & os Capitães,que achou promptos, que fo-

Taó Francifco Gomes,Manoel de Aguiar,Sebaftião Ferreira,

& AfFonfo de Albuquerque: Tomáraõ o caminho, que guia-

■va para o Buraco Grande de Santiago , por onde fe entra na

•praya, o qual acháraò preoccupado com embofcadas do Ini- *

migo, que não podéraò romper: Era naquella occazião mais

importante a prefteza, que a opinião: Viráraó a marcha para Socóneos o capi-

a paíTagem do Buraco Pequeno : Sahiraõ á praya , que era o ^^^ ^^^^ -^^'^^^■f ^^

campo da peleja, enveftiraó o Inimigo com avanço taõ refo^ Albuciuer<iHe,&

luto,que primeiro o conheceo pello dano,que pella viíla:CÒ '''^^'^'■

húa,& muytas cargas , o defcompoferaó , & confundirão de

forte, que nern a multidão dos Framengos , nem a diligencia

dosCdbos,nemorefpeyto aSifgifmundo,podéraõ efcuzar

adefordem , com que obedientes ao temor,viráraó as coftas

ao conflito, corrêdo a bufcar o amparo da artelharia de fuás

Fortalezas,principaImente, da que fe chamava dos Perrexis,

que era a mais próxima.

7 AíTombrado Sifgifmundo do fucçeíTo, (nunca o che-
gou a fofpeytar feu difcurfo)aírentou configo,que ou aquel-
la não era a mefma terra, ou aquelles eraõ outros homés^por- .

que fora defteconceito,nâofabia com outro, diffinirfua for- ^'■''''1'^' ' ^T
tuna. Hum groffo focorro,que lhe chegou do Arrecife, o co- ^^^^^^>^^>-
brou da fufpenfaó, para fe deliberar . Deu á fua gente nova
forma,& fegunda vez intentou romper os noífos , que firmes
no pofto da peleja,o receberão coin a primeira carga j & logo
á efpada o enveíliráo, & rompéraó,dando a conhecerjao Ge-
neral

5i6 CASr^OTÓ ÍVSlTjnO 1646.

neral Sirgiíinundo^que muytas vezes obedecia a difparidade
do numero á defigiialdade dos golpes; A hum mefmo tempo,
Socmtdotnten fe vio Sifeifmundo desbaratado,& feridoiachou na defgraça
marcha^ a defculpa, & foy o primeiro,que fogio para o abrigo de luas

Fortalezas: Igualmente corrido ,& irado d izia para os feus, q
a morte fogia dos Portuguezes , porque aborrecidos da vida,
a defejavão.Com efte defvio imaginou fazer menos defairo-
fa a arrogância de fuás promeflas -..Terceira vez formado, in-
tentou com a perfia obrigar a fortuna ; que não deixou mu-
datja firme conftancia , com que os noíToSjfazendo frente ao
InimigOj fuftentáraõ o pofto. Prefumio vencer cançados, aos
que não podia romper animofosjporque não fabiajque obra-/
ço Portuguez com o trabalho corrobora o pulfo : Já tocava a
enveftir,^: a darnos c5 a terceira fúria, terceira viâoria, quã-
do a tirou de noíTas mãos a vifta do Governador João Fer-
nandes Vieirajque em noíTo focorro chegava do Array al^dó»
de fahira á primeira voz do rebate : Cauzou fua vezinhança
tamanha alteração nos Olandefes5que efquecidos da difcipli-
na, & da vergonha fogiraõ para o Arrecife , dentro do qual,
os não defamparava o medo : Ainda affi, não deixava Sifgjf-
mundo os difcurfos de fua arrogancia,tendo por certo,q nef-
ta occazião o não encontrara a fortuna , fe a não obrigara a
enveja de feus emulos,& a defeíperação de feus Inimigos 5 8ç
que fem duvida o efperava fcu favor, em batalhas de mayor
fama,defprezando, o aliiftir-lhe em occaziocs tão peque*
nas. ~ .

I 8 Por informação defapaíxonada, íe avízou aos noíTos
Governadores, que paíTado o choque, curatido-feo General
SifgifmundOjdiíTera para os circunftantes,que nunca fua opi-
nião fe enganara cõ mais defculpa, que náquelle dia ; porque
õ que díp mÂf" iiunca podéra imaginar,que a brandura do quejo5& das man-
^ teigas de Olanda j com que criara os mochachos de Pernam-
buco, os fizeíTetáo deftimidos, & tão robuftos, que com tan-
ta gloria vencefíemja quem fempre v encera jdeixando-lhe a-»
quella primeira occazião nas mãos a mais honrada fama : Era
foldado,& fabia conhecer entendido, que dos primeiros fuc-
çeffos recebem opinião as armas, & que a reputação delias fe
peza na balança da foftuna,Sc não na da Juftiça . Alguns fol-

dados

recife.

^

r6^6 ^àXTEÍ LIV^OVÍU. t^ij

dados nos deixou cila occaziáo feridos; hum dellcs foy o Ca-
pitão Francifco Gomes , a quem húa baila buícou por hum
artelho. Os mortos foráo quatro. Náo fe pode fkber com cer-
teza a perda do Inimigo, cuidadofo na obfervancia de nos
efconder feu dano. O deixar na praya alguns mortos, nos fes r » r - r

entender,que os não pode retirar a todos, & q foraó muvtos: ^f ^ ^ , "^^ ^
o A • -r c ^ -jr- .^ outra gente,:

& muytos deviao ler os reridos,porque nas retiradas íao mais

certos os golpes, que nas enveftidas . Com húa meíma rezaõ

fc afligiaó os vencidosj&fe congratula vaõ os vécedores,dig-

nos verdadeiramente, de que melhor pena efcreveíTe , o que

neíla occazião ganharão de gloria. A indifíèrença do animo,

& do perigOjfes a todos iguaes no triumpho. Os Capitães, &

officiaes merecerão a coroa duplicada, mas não diíFerente: Sé

largarem da mão a efpada,fatisfes cada hum ás obrigações da

iníignia; de forte, que em toda a duração da peleja os não a-

charaõ menos os fpldados, nem para á difciplina, nem para o.

9 Naõ deixava fua vaidade, a Siígírmundo , formar juí-
zo, que não foíTe em Êivor de fua foberba . Para fazer prová-
vel fua opinião, efperou oyto dias; (tempo, que lhe pareceo
baftante, para nos diminuir a v igilancia , & a íbrte ) & orde-
nou a feus Cabos que com dobrado poder cometefícm a en^
treprefa da Villa,para colher do fucçeífojíè era fua, ou de to-
dos a defgraça . Sahiraõ do Arrecife em doze de Agofto mais
confiados, porque com mayor numero. Os Capitães do prc- ^^^^ sifgifmã*
zidio, (aíTima fe nomearão ) que não fabião perder occaziaõ f^''£f^2'' ^f^
de hon ra,& a faziaó de a bufcar deftros , & promptos , como ^ ^^ ^^'■

enfayados no choque paíTado, fahiraó ao encontro do Inimi- ^

go, com tanto valor,& forma, que lhe reprimirão o orgulho,
& cortarão ò paífo, de forte, que em fua efpera lhe defpofe-
raõ fua total ruina , porque ouve tempo, para que o focorro,
que da Eftancia das Salinas fahio em noíTo favor, rompeífe as
embofcadas, com que o Framengo o determinava empedir,&
fízeíTe caminho de húa , para outra viéioria, obrigando ^^ Suueàdheowe!'*
Olandès^a que viraífe as coftas,& nos deixaíTe o campo muy- mo.
to á fua cufta,& fem perda noíTa. A brevidade do tempo, que
durou o confliéio, fes menor o dano, & fem duvida o fucçef-
íb,p orq já a experiência tinha eníinado a huns^o como aviaò

Xx de

5 18 C^ST(^IOTO LUSITANO

i6aS

de fopir, a outros, o como aviaó de vencer.

I o Naó fabia Sifgifmundo atinar outra rezáo para tan-
to infortúnio, fe não era occuíta influencia , que por aquelle
íitio encontrava o progreíTo de fuás armas:Mudou-Ihe o cur-
Í0. Ordenou,que na feguinte noite fahiíTe hum groílo de mil
infantes pella Fortaleza dos AíFogados a ganhar a noíTa Ef-
inunta ganhar ^gj-j^jg^ qy^ chamavão de João de Aguiar: Ao romper do dia

çuíar. acertarão a paliar por aquella parte os noílos delcobridores

do Campo, íèntiráo as emboícadas do Inimigo , tocáraó ar-
ma j ou vio-fe na Eftancia o rebate^ a elle fahirão com increhi-
vel preíleza os Capitães António Borges Uchoa,&Francifco
de Abreu Lisboa com osfoldados de fuás CompanhiasiPoq-,
cosem numero, mas tantos mais no animo , que de cara a cara
enveftiraò ao Olandès, & lhe detiveraó a marcha, até que fe
' encorporou com elles Dom António Phelipe Camaraõ,com

a gente de fua Eftancia,que fe dizia Giquiá .Já nefte tempos
fe aphcava o Ftamengo mais ao reparo, que á oíFenfa, porém
fuftentava o pezo da batalha com valor, & forma, Chegáxaõ
os Capitães da Eftancia do Mendoça , Cofme do Rego Bar-
íOs, & Francifco Berenguer de Vilhena, a picar o efquadrão
Inimigo por hum lado, (defpois que com militar acordo lhes
mandarão tocar arma pella retaguarda , &pello outro lado)
com que defatinado o Oládès, não fó perdeo o animo, fenão
também a ordem, & juntamente aquel4a deliberaçaó,que pe-
dem os infortúnios: Sua ambiguidade lhe cauzou feu mayor
dano, porque deu tempo, a que nos chegafíè focorro do Ar-
osnofos Gover- tayal, com as peíToas dos Governadores Joaó Fernãdes Viei-
nadores lhe faie ra , & André Vidal de Negreiros,& húa partida de foldados,
'Virar as cofias, ^ye q Sargento Mayor António Dias Cardozo foy meten-
do no combate, por todas as partes : Com os braços crecião
os go1pes,&: experimentava o Framengo , que fe davão com
mayores forças: Era o remédio retirar-fe,& o fes obrigado da
neceíTidade, perdendo o pofto, porém,não de todo,a forma.
Cobrio-fe com a artelharía de fua Fortaleza,debaixoda qual
íè formou? Deixarão os noílbs de feguir o alcance , & fizerão
alto, aonde os não podiãoofFender as bailas: Ouvirão a de-
niafia, com que a liberdade militar oâ provocava a defprezar
o perigo já qual fe reípondeo, que o fogir , & gritar era pró-
prio

í6^6

fJ^lTE 1. Lir^O VIU.

^19

prio degallínlias^que rahiíTcm a cam po dcrcoberto,& ]hc fa-
riaõ conhccep a diitancia,que avia entre as Iingoas,&:asniàosj
dequecllesreeícuzavaó, com dizer, que os loldados pelcja-
vtáo em campo aberto, como homens, &náo por entre boí^
quês, como feras. O cobarde burcado,foge,deixado,chama.

1 1 O Governador João Fernandes Vieira,cm cujo ani-
mo teve fempre mais dominio aopiniáo,queoperigo, inío-
frido na injuria, prompto na vingança diíle, que a artelharia
do Inimigo era eípanta -velhacos , & valhacouto de tímides, ^o enve/lem ãe^
que íe caííigaíTe a fantaílica confiança daquelles Framengos baixo de fuaaríe"^
atre\ idos , porq inta6i:os do noíTo ferro,como aquella fruita, l^^fi^-
quefóferida, fica callada. Mandou que feavançáíTe de cor-
nda,em forma prolongada, porque as bailas da artelharia ini-
miga,os naó podeíTem bufcar com põtaria certa5Com ella de-
raó os noífos a primeira carga, & com a efpada na mão enveí^
tiraó o Inimigo , o qual, primeiro ferido do efpanto, que do
fcrro,com tumijlto,& defordem fe lançou á cava da íiia For-
taleza, fem que o confufo tropel da fuga reparaíTe nosmuy-
tos, que na agoa da cava bebião a morte : Com efie dano fe
paíTáraó á outra banda da Fortaleza, feguidos da perda, & da
injuria, com que os noíTos, a gritos oscondenavão defi^cosj
que não fabiaó fuíl:entar o defafio na mefma paragem,aonde
o pedio o feguro.[Náo ouve o cobarde, o que lhe diz a hon-
ra, fe não o que lhe dif o coração:] Viraó os noífos,que a di-
ligencia era infrutifera, a detença inútil, a voItá forçoza,& a
parte arrifcada, ScpaíTou-fe palavra, queefpaIhados,&de
corrida fe retiraíTem: Induftria , que igualmente fervio a ef-
torvar-nos o dano,& aumentar no Framengo o aíTombro, cõ
que o tinha fufpenfo o deftimído de noíTo animo , & o def-
prczo de fua artelharia^ fem achar outra rezaó , para taô ex-
traordinária temeridade , fe não prefumir , que ou os Portu-
guezes naó fabiaó eftimar a vida, ou a tinhaó dobradajque de
outra forte, parecia impoíTivel arrifcala por gofto , quando a
todos he taó árduo o dalla por neceffidade : Em parte nos a-

cufava a verdade,porque o motivo deíía occazião, fov mais ^ /• j /? ^
j -111 1 . o ' V . Com feu dejtroço.

da temeridade, que da prudência^ & tanto, que a meíma vic- ^ affombro.

toria não baftou para defculpar o exceífo. A milagre atribui-
rão muy tos o cazo 3 ;ulgavaõ , que fem elle fora certo o def-

Xx2 troçoj

mã

t^2ò CAST(í(ioro LusirjTsíO 1646

troço, & impoííivel o triumpho, com que fe recolherão : O
dano foy taó pouco, que contra-pezado, com o que o Ini-
migo recebeo , nada avu Itou . Porém o certo he, que a fama,
não tira para Tuas azasjtaó luftrofas penas da prudencia,como
•/ da temeridade.

11 A relação defte fucçeíTo acabou de confundir a es-
perança de Sifgifmundo . A dor dos golpes,Ihe fes conhecer
o incurável das feridas. Determinou mudar demeyos, para
experimentar fe confeguia por arte, o que não podia alcãçar
- cr r " por força. Em quinze de Agofto pella meya noite fahio do
âlelfmàmí Arrecife,o mefmo Sifgifmundo,com toda a gente,que tinha;
An. paflbu o vao dos AíFogados,& fes alto no paço,q chamão de

Francifco Barrciros,(paço dizem os naturaes, áquellas cazas,
em que fe recolhem,& purgaó os açucares ) íitio, que diftava
boa meya legoa da nofía Eftancia da Barreta , em que afíiftia
por fróteiro o Capitão Franciíco Lopes.Fortificou-fe o Ini-
inigo,cobrio-fe,plantou artelharia,com determinação de fuf-
tentar o pofto.Logo que noíTas fintinellas o aviftáraò, derão
rebate, & fe recolherão ácaza forte da Eftancia. O Capitão
Francifco Lopes fe preparou para efperar o afíalto , com fef-
Aproveita-fe de fent%foldados de fua obediência^ & alguns moradores, q fes
todo ofu poder^ auxiliares o perigo, com animo de fe defenderé a todo o po»
dr mdííJirU ^^^ contrario: Amanheceo o dia, Be não apareceo o Inimigo,
porque efcondido em diverfas emb<j^cadas,(eíperava , que
noíTo orgulho nos meteíTe no laço) que formaváo dous mil
Framengos , & grande numero de índios : O conceito, erâ
igualmente da defconfiança , Se: da pratica 5 porque todos,
os que ficaífem na rede, avia de achar menos na Eftancia;
& temia , que juntos lhe defeudeíTem ó pofto . Vio o Capi-
tão Fraticifco Lopes , que o Inimigo náo aparecia , & fôf-
peytou a cauza t Mandou trinta foldados,que foíTem deíc:o-
brir o Campo, & reconhecer o poder,& o defignio do Glan-
des; o que fizeráo ouzada,& ditozaméte, porque cõfeguirão
o intento, & livrarão do perigoiCom as noticias,que deraõ,
mandou o Capitão Francifco Lopes avizo ao Arrayal,dó-
de fem detença lhe mâftdáraó quatrocentos foldados de fo-
corro : Chegou efte á nofía Eftãcia , aonde enganado da cau-
tela, có q o Sifgifmundo procedia, fe voltou para o Arrayal,

ten-

.k

■.i6\^r6 TJl(r£/.L!P\0P7n. iÇ-V

tendo para Ci o cabo,(não labcmos, quem foíTe) que Tua tcn-
çció não paílava da fortificação , que levantava . Vio o Glan-
des, o que queria: Mandou dons mil íoldados com duas pe-
ças de campanha,que foílem aííaltar a caza forte da noíTa Ef-
tancia, certo na viâoria, que lhe aíTegurava o poder : Porém
acharão os Framengos taõ dura reíiftcncia, em taó defígual
partido, que fe apartarão do combate com maniíeílo dano.
Retiraraó-repella prayaatè junto ao mar, aonde formados
efti verão toda a noite com demonftraçaó de fegunda envef-
tida, para encobrirem com íèmelhante aparência, no va,&di'
verfa facçaó, Tinhaó mandado húa companhia ao Engenho
de Saõ Bertholameu a faquear, & tomar lingoa , tudo confe-
guiraó,&: trouxeráo prefos ao Senhor do Engenho , Fernaõ ^elhe'palènp&
do Valle, & a Francifco Bezerra,q fe hofpedava em fua caza; rafiquear 0 En-'
8c que defpois no Arrecife, primeiro o bufcou a morte, que a ?.^^^^ ^^ SaõBer^
liberdade. Confeguido o intento , fe encorporou a compa- '^'^^^-
jihia com o efquadraój & efte com o Siígifmundo,o qual for-
tificado, & guarnecido o fitio do paço, &defenhadanelle ^
húa Fortaleza , fe retirou para o Arrecife.Refpiraraõ osmo^
radores daconfufaó, emqueostinhapoftoa vezinhançade
tamanhfâ poder [já todos,os daquelle deftrido retira vaó fuás
familiás,&: feus moveis ao efcondido dos matos: ] Os da Mo-
ribecacommayorcuidado, porque com mayorreceo ,Iem*
brados, de que o mefmo Siígifmundo,por aquelles paíTos ga-
nhara, no tempo paíTado, a campanha,& que por elles inten-
taria fegunda vez bufcar a mefma fortuna.

1 3 Magoados deixou o fucçeíTo aos íiofíbs Governa-
dores, na confideraçâo , de que o Inimigo com hum engano
obrara mais, que com todas fuás forças -, com a que de novo
tinha feyto,julgára5 inútil a noíTa Eftãcia da Barreta,eegâ cõ
a oppoíiçao do Inimigo.Mandáraõ ao Capitão Frãcifco Lo-
pes, que arrafaíTe a caza forte,& queimaíTe os quartéis ^ & cò Mandatos mps
a gente fe fofle para os Guararapes, (montes, que defpois fi- Governadores rc

zeraó mais conhecidos,noflàs viâ:orias,do que até então fuás ^^^^^^^fi'''"'^ ^^
r o í^ \ 1 n • Barreto, para os.

alperezas,& alturas) com ordens , que no polto mais conve- Guararapes.

niente levantaíTe húa tal fortificação, que uniformemétefer^

viíTedefeguro, paraosfoldados, &defreyo para osinimi*

gos (fe acazo por aquella parte intentaífem fahir á cãpanha)

Xx3 com

^

com encarecidas avertencias,qne do menor movimento fi-
-zeíTe avizo,& emffiendaffe o erro, pois a experiência o eníí-
naya, que tinha contra fi Inimigo, igualmente manhoíb , &
-foldado j& que as próprias deícanfiãçasepão as melhores ar-
mas, para fe v encerem ãlheas cautelas. ■ - i • ' '

1 4 Poucos dias de defcuido baíláo para amortalhar hua
J^mbrança. A memoria fuftenta-fe da recordação^ o efqueci-
«mento da negligencia.Em onze de Setembro, na primeira ve-
dada noite, fahió o Inimigo do Arrecife, &pelia praya do
^mar,tomou o caminho da Jangada,quatro legoas da Barretaj
^m toda efta diftancia deixou o caminho feguro com diverfas
Remtçao cí?«? ^«í embofcadàs. Antesdameya noite teve o Capitão Francifco
ph.ra. o Cafítao Lopes avizo da marcha do Framengò com incerteza,do que
Francifio Lofes, intentava,& do poder,que trazia. Faltou á obrigação de pru-
*^^' dente,&: de foldado, em não mandar logo avizo ao Arrayalj

& bufcava deípois na ignorância, a deiculpa ào erro, fendo,
que na milícia, os erros da ignorância, faó os mais feos. Algus
o qaizeraó defculpar có a fobegidãõ do aniftio, &agravaraó-
lhe a culpa: Na guerra não he útil a confiança, que íè não íb-
geita á obediência. Que eftava aufente de feu quartel,âífirmá-
raó muy tosi& mais o acufàraôjque fc não defculpa hJ©m erro
com outro mayor : Prezidio fem Capitão , he corpo fem ca-
beça^Sc não fora muy to rigor da juftiça, fe por efte crime lhe
apartarão a cabeça do corpojporque de lemelhãtes faltas rc-
fultáraó fempre laftimofos fucçeíros,& irremediáveis danos:
C4«z^íif(?<ji;í/wi Vio-feneftaoccazião. Ao romper da manhã deu o Inimigo
go fique ar a fo. fobre a povoaçaõ da Jangada.O repente da in vazão não dei-

'voacao da lança* * ^ 'i*^ *^ r ^ r r ,

^a/ xou tempo aos moradorcs,nem para a derenfa, nem para a re-

tirada^com o que o Olandès pode a feu falvo uzar de íiia for-
tuna,& de noíTo defcuidor^^ueou, o que quiZjdeftruio,o q
achou, & fó lhe fogiraõ da&máos alguns foldados de cavalloj
que defmontados fe falváraó em hum batel, ainda que perfe-
guidos das balias até ó ultimo alcance.

15 O Capitão Francifco Lopes, acompanhado da fu a
gente, & de alguns moradores,acudio aoeftrondo dos tiros,
& mandou avizo aos noífos Governadores ; tudo taõ fora de
tempo,que fervio a diligencia de teílemunhar o deílroço , &
4« arguir o defcuidí^. De volta caminhava já o Framengò, 8c
' '' che-

^

'chegou a feguilo com a vifta. Ao rebate, q no Arrayàl deu o
correyo (foy pellas nove horas do dia)fahio o Meftre de Gá- ^^ ''^''/^ "/"
po André Vidal de Negreiros com toda a infantaria, & porq %oíros.
a de Dom António Phelipe Camarão eílava pofia em arma,
por ficar mais vezinha, lhe ordenou por hum bolatim,que cõ
ella fe adiantaífe a entreter o Inimigo: Naõ fe perdeo tempo
^éntre a ordem,& a marcha, que foy taó picada, quanto expe-
rimentou o Framengo, conhecendo fua prefença , primeiro
pellas bailas, que pellas peíToas: Virou a cara ao encõtro por
levar nas coftas o perigojporém o Camarão lho moftrou aos
olhos com húa carga, da qual cahiraó mortos catorze Olan-
defes,& entre elles hum foldado , que fes parecer de grande
efíimaçaó (ou pello fangue, ou pello pofto) o empenho,com
que a todo o rifco fe avançáraó,a tirar-lhe o corpo: & fó con- ^ ^

/•- j.| 111 ^',,0 Camarão o poe

leguirao, o deixalo acompanhado de outros muy tos ( tendo ^^^ nnCeravelfo'

jáaeftetempo osfoldados do Camarão feita húa boa feara^/W^.
delles pello Campo.) Com a detença crecia o eftrago, com o
eftrago o horror do InimigOj& concebeo tal receo , que buf-
cando a falvaçáo na fuga, foy largando as armas , & o roubo
por aligeirar o paíTorC^iem mais, que todos fe imaginou per-
dido, foy o feu General Sifgifmundo : Como foldado media
o tempo pella diftancia do Arrayal,& temia,que o aícançaíTe
o focorro, certo,q dos feus não ficaria peíToa com vida: Pro-
meteo grandes prémios, a quem pofeíTe em falvo fua peííoa,
porque lhe faltava a agilidade,com que os feus fem ordem al-
gúa, corriaó a meter-fe na Barreta, até que dentro de fua for- .
tificação, fe v io fora do rifco, mas não do medo.

16 Succedeo-lheaSifgifmundo,oquefuccedeáquelIes,
que efcapaó de algum infortúnio, que virão o rofto, para ve-
rem o lugar do perigo: Afli como entrou na Fortaleza , fobio
ao alto delia, & olhando para o lugar do conflicí:o,vio que o
Meftre de Campo André Vidal de Negreiros lhe vinha no
alcance com húa groíTa partida de foldados, & diííe para o^sifgifmunâò fe
feus: De boa efcapámos . Enfinado da experiência aíTentou ''"'^''''^ ''''''''
configo,que aonde noíTa defenfa tinha prompto o focorro,
não poderia fua conquifta tirar outro fruito mais,que feme-
Ihantes danos : Que ao largo nos avia de fazer a guerra com
iiielhor forte, porque fendo fenhor do mar, & fua, a efcolha

Xx4 das

P i

' c

1; iv

/

^14 C^STKfOTO LUSlTAno -1646

; <2a3 emprefaSjas podia cometer com as ventagens de efconder

os defignios, ck impoíribilicar os focorros . Com efta rcÍGÍu-
ção ordenou ao feu Sargento Mayor,que fe chamava Andre-
zon, (homem que por feu braço merecera o pofto , & a eíli-
maçaó, que tinha) que com húa efquadra de náos de guerra,
,. & mu y ta,& bõa infantariajfoíibrobre a povoação do Rio ce

quã re tra o g.^ prancifco, & nella , & todo feu dcfl:riâ:o afíblafle tudojO
manda jacfue ar o • i o n- n i i

Rio de s.Francif' <^^^ V líle com v ida, & com preítimo , recolhendo todos os

€0. mantimentos do roubo ; & chamando a íi todos os gados da

;>campanha: Facçaõ duas vezes util a Tuas armas , porque com
ella fe fornecia,& nos debilitava: Debaixo defta publ icida-
■de efcondeo o fegredo da emprcfa mais importante,(que foy
a preparação de vazos ,& géneros , que naquelle porto to-í
niou, na viagem, que fes á Bahia, como adiante diremos:)Sa-
hio AndrezoH do Arrecife, tomou a barra , que emproava,
nos primeiros dias de Outubro: Ao rebate,que deu fua vifta,
fe retirarão todos os moradores com tudo, o que podéraó le-
var para aoutra parte do Rio,aonde eftava o Meftre de Ca-
po Francifco Rebello com o feu terço em defenfa do termo
da Bahia, mandado pello Governador Geral doEftado An-

f^tnleíI^T '^^"^^ ^'^"^^ ^^ ^^^''^' ^ ^°^°^ recolheo,& agafalhou -, & em
RdellLho. ^^'^'^^^^ defenfa chocou,& venceo ao Andrezon 5 v iétoria, pella
qual coníèguio o ficar íenhor da campanha, & dos gados del-
ia j dequedefpos com mais triumpho, que piedade 5 porque
, ^ feiB atender á fome do Arrayal , o mandou conduzir para a
fartura da Bahia.

1 7 Como defefperado, contava Sifgiímondo, pello fio
dos fucçeíToSja continuação dos infortúnios faccurralado no
Arrecife, em quanto para o Rio de Saõ Francifco navegava o
feu Sargento Mayor Andrezon:) Não fofria feu coração ver-
fe defprezado no tempo,em que fe imaginava mais temido^Sc

jrtíeíaSipfirmt-^^^^^^^^^^^^^^^^^^Ç^^ fervia de verdugo a fua confiança,
do fortificar' feju potque experimentava,que noíTo valor igualava fua força,&
to a iguaraçk noíTa vigilância fua induftria: Excogitava modos , com que
fizeííe fua defgraça menos publica,&: ordinariamente a eícó-
dia entre as fpmbras da noite: Em húa de Outubro , que por
mais efcura lhe pareceo mais acomodada , fahio com todo o
poder, & com deíignio de ganhar , & fortalecer hum poílo,

entre

/

1 6 0,6 fpA^E L LlV(!{p VIU. ^ 2 5

entre a Villa de Iguaraçii,& a Ilha de Itamaracá [fitio impor-
tante para abrir, & aíTegurar o caminho , por onde deíejava
fahir a cõqtiiftar a campanha.1 Foy íentido das noíTas vigias,
mas tão fora de tempo,que o achou fortificado,& coberto,»
diligencia, com que os Capitães Francifco Barreiros , & ou-
tros acudirão ao rebate, coma gente de fua obediência . Na
defigualdade do partido, fe vio a do valor , có que os noílos
enveftiraõ a pey to dercobertOj& com que os Inimigos fe de-
fenderão entrincheirados,& favorecidos de algúa artelharia,
que ji tinhão aíTentada. A inutilidade da perfia, fufpendeo o
choque, com igual perda, infenfivel para o Inimigo, pello in-
terefíe de ficar com o pofto, cuftozo para os noíTos , obriga-
dos a fazer-lhe oppofiçaó.

18 Com o fucçeíTo referido, fe aplicou Sifgifmundo ao
aprefto de fua armada: O para que, callava ainduftria j& con-
fentia,que a fofpeyta publicaífe, que era para ir fobre o Rio
de Saó Francifco;porquc lhe fervia a fama de encobrir a ver- ^^-,
dadeiCom a falta das occazioés fc embotava o fio de nofía ef- ^ ^^a ^ 1^ ^-^
pada, & o ócio dos foidados, relaxava o rigor dadifciplina y,^ j^^^^ y^^^i
militar.Os nofíosGovernadores,que não fofrião,que ao Fra- marcha faro, a
mengofedeííe tempo, para convalecer das feridas, zfíentí- ^^^^^^^»
raó bufcar occazião, & parte,em que o cortaíTe a fome , & o
ferro. Naó fe deu mais tempo á execução , que o precifo pa-
ra o aprefto. Com mil infantes marchou o Meftre de Cam po
André Vidal de Negreiros para a campanha da Paraiba,em os
primeiros de Novembro, A rezão de noíTas armas bufcarem
iiefta parte feu emprego,era pella grande copia de gados,que ^ ^^^^fi"^^^-
o Inimigo apacentava naquelle deftriâ:o , defamparado dos
moradoresi& pella noticia, de que á fombra de fuás Fortale-
zas fe alojavão mais de trezentos Indios,feus auxiliares: Com
efte golpe, fe cortava pellas forças doOlandès no Arreci-
fe,& na Paraiba. Chegou o Meftre de Campo com delibera-
ção de aíTaltar os índios, antes que a noticia de fua vinda os
acautellaíTe, porém vio-fe encontrado do parecer dos íeus:
Com difficuldade, venceo a determinação , os confelhos da
prudencia^gaftou-fe na contenda o tempo,que fe avia de dar
á refoluça5i& faltou a occazião, quando ferefolveo aem-
prefa, porque os índios fe recolherão as praças do inimigo.

com

#,

^0.6

CAST^Oro LUSITANO

1646

rctít.

com todos os gados, que podèraõ levar: Na guerra íàõ com-
panheiras a prefteza,& a dita j airrerolução,&adelgraçâ:
Ordinariamente fuccedecompor-le a fealdade da fraqueza,
com os infeites da prudência . Rezáo tinha André Vidal de
Negreiros para ver a cara da cobardia jio parecer,com que os
feus lhe defviaraò a vidoria, porém ajuntando o fofrimento
á magoa,culpava fua cortezÍ3,comb oppofta, nefta occaziaõ,
á fua fortu na; mandou fazer o dano poííi vel em toda a Capi-
tanía;& mais queixozo dos feus, que dos contrários , fe reti-
rou para o Arrayal com alguns cativos j unico fruito deifta
jornada.

1 9 Deixou efta occaziâo tão cortado, como corrido ao
Meílre de Campo André Vidal de Negreiros: Não fabia a-
partar a imaginação, do fucçeíío j & de como fe poderia ref-
taurar no credito, & no gofto , era toda a occupação de fea
Intenta afalt Ar a ^iícúvÇo. AíTentou configo cometer a Força, que o Olàndès
í'<?r/í?/f^<2^áij4r- tinhanaBarreta(feytojuizo de como feavia de combaterj
dos focorros, que podia efpcrarjS^: do modo, com que fe lhe
poderíáoempedir.) Comunicou o penfamento comoGo-
%^ernador João Fernandes Vieira,o qual,confiderando as dif-
ficuldades da emprefa Jhe pareceo árdua : Para o convencer,
lhe praticou André Vidal, o como a tinha difpofta ( tudo fa-
bia facilitar a grandeza daquelle coração.)0 Governador, q
alcançou o empenho,ainda que para elle náo concorreo com
o voto , fervio com o confelho: Diífe-lhc que no íilencio , &
focçego da n^ite , por não fer fentido , plantaífe a artelharia
na parte competente,& fua gente, formada,& repartida para
o aíTalto, efperaíTe o romper da manhã, para que a hum mef-
mo tempOjfe viíTe o Framengo combatido,& aíTaltado.Dous
golpes, que lhe farião perder o animo , & o fono : Confelho
tão regulado pella forma, em que fe achava a Fortaleza, que
pareceo defpois,a todos, dado mais pella viílra, que pella fof-
peyta; porque o Olandès eftava tão defcuidado , & defpro-
vido, como que dormia no feguro de fuás paredes, & na cer-
teza,& vezinhança dos focorros do Arrecife; aonde,nefte té-
po, fe empregava todo o cuidado em apreftar a armada , que
já cílava de verga-dalto para o Sifgifmundo fazer viagem ao
Rio de Saõ Francifco^ como fe dizia.

20 Em

I ^47 ?AXrE LLiniP Vllh 5 27

20 Em dous de Janeiro de mil Scfeiícentos & quaren-
ta & fete, fahio André Vidal de Negreiros do noíTo Arrayal
com mil infantes, duas peças deartelharia, ceíloés, pas , &
mais petrechos neceíTarios para as cavalgarjO que fes nas rui- ,
nas da caza forte (que os noíTos arrazáraó, quando fc parti- ^
raó daquella Eftancia, para os Guararapes.) No mefmo tem-
po fe abriraó cavas, & levantarão trincheiras para cobrirem,
&: repararem a Infantaria das balias contrarias: ( feguio neíla
cmprefa o Meftre de Campo Teu próprio diâamen;) A a pri-
meira luz da manhã fe começou a bataria da noífa partCj fem
que a artelharia do Inimigo fizeíTe tiro,porque a tinha defca-
valgada,& as carretas incapazes para o exercicio delia: Pcllas
dez horas do dia pode jugar, & o fes com tantas balias , que
nãoavia,paraos nofíbs, lugar feguro, fe não dentro das ca-
vas. O Governador dos índios Dom António Phelipe Ca-
maraó,que com a fua gente trabalhava por levar a cava a de-
fembocar na porta da Fortaleza,deu corji tanta agoâ, que co-
bria os joelhos dos foldados , impoíribilitando-os pára nãí>
poderem carregar os mofquetes , fem que huns íliftentaíTem
as armas dos oatros^cauza da remiíTaõj com que fe combatia
a força.

11 O General Oíandès, aíli como no Arrecife teve re-
bate do perigo, em q eftaváo os feus, defpedio focorro, mais
apreíTado, que opportuno,imaginando,que fe poderia intro^
duzir na Fortaleza pella Ilheta do Cheira dinheiro , aonde a-
chou a oppofiçaó, que o Meftre de Campo André Vidal de^^
Negreiros, lhe tinhâ prevenidO) & com o avizo , engroíTado to,
de forte,que o Framengo não fó teve contra íi a refiftencia,
fe não também a enveftida,que o fes retirar,& fogir, a bufcar
outro caminho: Achou-o a importância do negocio, em man-
dar dobrado poder em lanchááj que por mar meteíTem ofo-
corro3porém,não lhe fuccedeo, como o imaginou, porque fe
tiáo acharão a oppofíção da efpada, acharão o furor de noíTa
artelharia,que muy to á fua cufta os fes apartar da Fortaleza,
a cuja v ifta eftiveraó até baixa-mar, tempo,em que fe defco-
briraó os Arrecifes, aonde defembarcáraó agente, com or-
dem,que hum,& hum, os tomafíem de corrida, porque os naõ
pefcafiem juntos, as bailas dos noíTos tiros. A efta induftria a-

talhou

m

528 CASr^OTO LUSITAUO 1647

talhou a valerofa ouzadia dos Portugueses; fera terem conta
com os pelouros,que fobre clles choviaõ as peças da artelha-
ria, & mofquetes do Framengo ; os da gente de Dom Antó-
nio Phelipe Camarão, que da íua cava os defcobrião, aííi co-
mo corriaó, os matavão com horrível ejftrago , & tanto , que
fazendo-fe a gente do íbcorro cm hum corpo, bufcáraó o re-
verfo da Fortaleza , que a refpey to nofíb, lhe fervia de mu-
^ ro: O Meftre de Campo André Vidal de Negreiros ( que te-
ve avizo, do que paíTava) á força do braço abrio por entre os
' mangues, que por aquclla parte produzio a natureza, larga

eftrada, ainda que molefta,pello grande lamaçal,que tinha,&:
com os faldados entrou por ella, com intento de acabar cora
as ultimas relíquias do focorro Olandès; porém v endo elle o
trabalho,& conhecendo o defignio, teve tempo para fobir os
íèus á Fortaleza , levados por cordas , com a brevidade , que
/ lhes facilitou, o medo,& o perigo.

2 2 Naõ ouve elemento, de que fe não valeíTe a ira, & o
furor de húas,& outras armasjpara fuftentarcm o combate,&
a refiftencia.Pellas duas horas da tarde fahiraõ da barra dou»
pataxos,cofleando os Arrecifes,& varejando (com pou co ef-
feyto) as noflasEftancias por aquellas partes, que íedefco-
Terfia tmàsfo» \)x\io.Commz.yot dano os bufcavão as bailas da noífa arte-
coner. lharia,porque com hua, dada ao lume da agoa , fe hia apique

hum dos pataxos,& outro á vontade dos mares , ao qual ou-
tra balia levara o mafto, & a vela grande ; & a neceílidade do
reparo os tirou do combate. Tempo cófideravel gaíláraõ em
fe reparar; & junto da noite bufcáraó o mefmo pofl:o,acom-
panhados de mais oyto navios bem guarnecidosj&: petrecha-
dos, cora intento de coníèguirem aintroducçaó do (ocorro.
O Meftre de Campo André Vidal de Negreiros , que nunca
fes thema do empenho, affiftido fempre da rezáo, vio a força
focorrida por mar; confiderou, que ao outro dia, o feria tam-
tevtão osHoífos ^^"^ P°^' terra,& qo valor igualmente refplandece em ceder
dcerco^ép retu afortuna, como também a perícia, em difpor a batalha, & em
temer a contingência; íe deliberou em fe retirar a tempo, que
o Siígiímundo lhe não podeífe cortar,nem o paflb,nem o cre-
dito,que íè ganha nas retiradas bem fuccedidas . A a primeira
noitejfetirou todo o trey m da artelharia, com todos os petre-
/- - chos

VAO,

1^47 ^A^EhLlV(^vm, Ç29

chos da efcala , &: fem lhe ficar o mais pequeno material do
cerco, deixou o íitio,regu indo a marcha da fua gente com
tal íocego,& ordem, que o não chegou afofpeytar o Inimi-
go. Naó perde a gloria , com não poder confeguir , quem a
ganha em fe laber retirar. Cuílou-nos o intento nove mor-
tos, Sc vinte & quatro feridos : Pequeno dano em compara:-
ção, do que recebeo o Inimigo,que fopofto naõ tivemos no-
ticia do numero,a tivemos do lutOjCom que o chorou no me-
lhor partido, a peyor forte.

23 O General Olandés, que na adverfa 5 & na profpera
fortuna, fe via da mefma forte laftimado (porque na igualda-
de da perda^não via nunca, em os feus , diíFerença de venci-
dos a Viâioriofos:) Determinou bufcar noíTasefpadas, aonde
cortaíTem menos agudas^embotados os fios, ou pello ocio,ou q olãdes fkhedo
pello vicio. Pareceo-lhe,que na Bahia as avia de achar , como Arrecife com to*
as imaginava. Sahio pella barra do Arrecife, [nem o mez , né (^^Ji*^ armada^
o dia, podemos colher com certeza , & fó por conjeduras di-
remos, que em algum de Fevereiro] com toda fua armada, &
nella toda a flor de fua Infantaria ; mantimentos , munições,
& petrechos, não fó para hua larga viagem , fenão também
para húa dilatada campanha. Mandou velejar para o Rio de
Saó Francifco, aonde tomou porto, & velas, fem fahir a ter-
ra: (Importava-lhe para feu intento:)Achou de verga-dalto,
fornecidas,& preparadas todas as náos de guerra daquellaEf-
quadra, com que do Arrecife fahira o Andrezon, com o me-
lhor de fua Infantaria , guarnecidas (já pouco neceíTaria n^Tomâ o Rio de si
terra, porque no melhor fítio della,tinha o Andrezon acaba- Framifio.
da, & perfeita húa Fortaleza, á qual para grande, nada falta-
va, porque concorrerão a formala,a natureza,& o arteficio.)
Eraó eíles navios a melhor porçaõ de fua armada , & o tellos
preftes naquelle porto, o mayor fegredo de feu intento,por-
que, fe fahira do Arrecife com o poder juntOj por elle fe avia
de fofpeytar a emprefa,ã qual podia danar muy to a anticipa-
çaó da noticia. Sahio daquelle rio,mandãdo,que fe emproaf-
fe a altura da Bahia^ viagem , que avemos de feguir, por não
cortaremos duas vezes o fio da hiftoria; & no fim da jornada,
fe dará conta , do que fuccedeo em Pernambuco , o tempo,
que durou aquella emprefa.

Yy 24 A

9HPVW

53^ C^^T(!(10T0 LUSlTJnO ,647

2 4. A confeguir hum de dous fins, fes Siígifmundo efta
viagem, certo, de que fem duvida, alcançaria algum dellesj&
com não pequena cfperança de fahir com ambos: O primei-
ro, era ganhar á praçajo regundo,di vertir os locorros de Per-
mvega pau a "^mbuco. Tinha entendido , que fem auxilio da Bahia feria
Bahia. impofíível pcrfeverar nofía repugnância, & que pedindo-o a

voz da fteceílidade , de articulada com o medo da perdição,
t>s avia de alcançar , até onde chegaíTe o poífivel. Aviftou a
Bahia,entrando fua armada pella enfeada delia com formidá-
vel moftra de feu poder ,tal,que enchia os olhos de efpanto,
& os ouvidos de pavor,com as armas pintadas nas bandeiras,
& com o eftrondo das fal vas^mas também com alvoroço dos
foldados, que confiados na fortificação , no prezidio da Ci-
dade,& na efperança daviâoria defprezavão o poder . Ou
por a vizo, ou por inferência, conheceo hua, & outra couza o
General Olandès. Furtou o corpo á prova, efperando, que o
tempo o melhoraíTe na occaziáo,& nó partido. Tomou ter-
ra, trez legoas da Cidade , em hum fitio chamado Taparica,
convidado de hum poftò, aonde levantou húa Força, capaz
de alojamento para os foldàdòs,& de muyta,Sc boa artelharia
para a deféfaiEm circulo do Forte ,fabricou quatroRedutos,
tyeita gente em em tal forma, que occu pavão às eminenciãs,donde a Fortale-
?^rr^,^y?ycr//i za podia receber danoj & dos vazos de fua armada fes hum

fca.

(Gordão pella parte do mar , que lhe fervia de muro. Pareceo
então ^ que baftava empedir ao Framengo a marcha para
a Cidade com húa Eftancia , que os noíTos guarnecerão , &
fortificarão em oppofiçaó dó Ólandès , na qual os terços da
Cidade affiftião por giro: Porém o dano nos informou logo
do erro: Não deixou o Inimigo, em todo ô contorno. Enge-
nho, nem fazenda, que não roubaíTe ^ & defiiruiíTe j nem por
toda a coftà embarcação, que não perfeguiíTe, ou tomaíre,c5
o que ao paííb,que na Cidade crecia o numero dos retirados,
crecia também a falta dos mantimentos 5 & o conhecimento
da defatençáo, que deu cauza a tão perniciofos effeytos.

25 Os males curados faó mais cufíofos , que os preve-
nidos. O Governador Geral do Eftado António Telles da
Svlva, em cujo animo teria algúa vez parte a temeridade,po-
rém nunca o medo, inftigado agora da reputação , & da ma-

[oa,

I (<47 "PA^TE 1, LIF^O VIU, ^31

goa, fc deferminou em dcíalojar , a todo o rlfco , ao Framcn-

Êro.infofnvel pella vezinhança, pclla detença, & pcllas info- ^(A^'^f-7^' ^ ^f*
p. T^ -n-r r . i i •».*/- 'Vernador em de-

lencias. rara juitihcaríeii intento, mandou chamar aos Mel- calejar oFrame"

três de Campo Francifco Rebello , João de Araújo , Theo-^^.
dozioEítrater, & ao Sargento Mayor AíTenfo da Sylva , aos
quaes dechrou ília refoluçaõ com íemelhantes palavras:Bem „
creyo, que não averá algum de tão expertoSj& valerofos Ca- „
bos, que não defeje caftigar a nova injuria , com que a fober- „
ba Olandefa nos defpreza , bufcando-nos os olhos , para nos „
fazer mais fenfiveis os agravos j com tanta defeftimaçaõ de
noíTo braço,que fem medo do golpe , fe vem meter na efpa-
da. NoíTa confiança o deixou tomar pofto; & cre feu atrevi-
mento, que foy noíTa impoffibilidade 5 a vifta o julga ; & fe a
ella faquea a terra, & rouba o mar, deixará de nos avaliar co-
bardemente receofos, quando nos experimenta , com tanta
dcmazia fofridos/ Seu intento eftá declarado : Quer facilitar
a emprefa, com nos enfraquecer as forças. De noíTa floxidáo
recebe vigor fua efperança , & quebras noíTa reputação. Em „
que opinião nos há de ter, quem nos olha offendidos , & nos „
vé focegados? Dirá, que ou a honra nos efqueceo,ou o valor j,
nos faltou. Efte povo , que nos fuftenta para fe alimentar de „
noíTos movimentos , como poderá receber efpiritos anima- „
dos, donde os condena a mortecidos?Não fera facil a efte po- „
vo, o defobrigar-fe de acudir, a quem prefume , que ou naõ „
quer,ou o não pode defender? O Inimigo,q nos provoca,he „
aquelle mermo,que no anno de mil & feifcentos S^òyto def- ,,
baratou noíTo braço nefta mefina terra 5 fangue deitão ainda j,
os v ivos para a lembrança de feu deftroço 5 frefcas vemos a- „
gora asfepulturas de feus mortos para a memoria de noífo „
triúpho.Pois,em que reparamosPEm eftarem mais, ou menos „
diftantes,menos, ou mais fortalecidos: Accidentes faó, com q „
a evidencia nos eníina,que a fortificaçaõ,& o defvio naõ he, „
de quem mais ouza, fenão, de quem mais teme . A a efcala a- „
vemos de romper por feus reparos, fazendo-Ihe conhecer , q „
a efpada Portugueza não fó corta fem reparo , mas que não „
há reparo que não corte. Por minha conta efteve a determi- „
naçaÕ3 ^ difpofiçaò corre pella de voífas mercês. A manhã há „
de fer o dia do aíTalto, Sc nelle elpero , que há de confeífar o „

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532 CAST^moTO LUSITAKO 1647

» Olandès, que excede a força de iioíTo braço á confiança de
)) feii atrevimento.

16 O Meftre de Campo Francifco Rebello (por anr*
parecer do Mef. thonomafia o Rebellinho) a quem as proezas em toda a

tre de Capo Fr a,' •- r - j /i V r - i

cifcoRebetio. occaziao hzerao grande, neíta , livre feu animo de todo o
" efcrupulo, falou como Confelheiro, & como foldado: A
refoluçaõ de Vofía Senhoria he verdadeiramente filha de
feu defíimído valor, & de feu ilkiftre fangue j porém, fo-
pofto o lugar que occupa , deve fogeitar-fe ás obrigações do
pofío, porque afortuna do fucçeííb não fe há de atribuir a
António Telles da Sylva, fenão ao Governador do Eftado,
& como tal, nos chamou aefte concelho, &deve cada-qual
de nós dizer , o que entende nefta matéria , como fiel VaA
falo delRey, & particular fervidor de Vofía SenhoriaiHe cer^
to, que o poder do Inimigo com a diíparidade nos vence,
& com a fortificação nos arrifca . Infiro de mim para todos,
que não averá Portuguez, que eftime mais a vida, que a
honra 3 alcançala para o nome , he perdela fem fruito ; por-

* que em nada aproveita ao eftado ; & he couza muyto diver-

* fa fervir com a vida, ou fervir com a utilidade; em aíà*
' ber empregar , confifte o fervir . O Inimigo he foldado pra-

" tico, valente , & ardilofo , foge á diftancia , aonde em defr
" coberto o pofla ferir o golpe , & àrma-nos o laço , aonde^
^' a feu falvo efpera colhemos o pé . A principal força , que
" he feu quartel, fe rodea de quatro Balluartes, ou Redutos
" aríelhados de reforçadas peças, com tal arte, que delles fe
** defquartinão os ângulos da força principal, cru zando-íè as
" bailas de toda fua artelharia por toda a circunferência da
" Fortaleza, que avemos deefcalar,expoftos ao dano da re-
" fiílencia , que nos há de achar de rofto; & da defenfa , que
" nos há de ferir de través , ou pellas coftas : Se nos retirar o
" primeiro dano , ficaremos com perda , & fem reputação; fe
" nos empenhar a perfia, poderemos confeguirhum dedous
" fins, ou a morte, ou a viâoria , & cada-qual delles entregará
" nas mãos do Inimigo efta Cidade, q desáparada do prezidio,
" fenão poderá defender, oudeftruidonocõbatc,ou occupa-
-** do na confervação doacquirido . De húa , & outra maneira
"ficará o Olandès fem ofreyo, q o domaj & fua armada inteira

>>

para

/'

para correr a' eniprefa, a que afpira. Em fua preíleza, coníllte "
fua mayor importancia,& diílimula o que dcfeja, para que as •>■>
inoftras da dilação nos levem ao combate, com tão defigual 5>
partido: Cortar-lhe os intentos he a mina , que fará voar fua ?>
induftria: Sobre elle cahirá o rayo, fe ajudados do tempo , & ?>
da prudência o fizeremos confumir, & defefperar, fufientan- 3>
do inteiro o poder,& a reputação de noíTas armas, que o Fra- ?>
mengo eftima mais pella opinião , que pella força ; & fe com •>■>
efte avanço lhe deremos occazião, a que nos conte , adare-75
mos, a que nos defpreze. 55

27 Ouvio o Governador António Telles da Sylva as
vivas rezoés do Rebellinho , authorizadas com fua grande
opinião; confiderou, que os mais Cabos aviaõ defeguirfeu
parecer,& atalhou a conferencia,confirmando-fe em feu pri-
meiro intento, do qual fe feguirão irreparáveis danos: Os ca- ^^'''I^P^ Gover-
pricnos da loberania tem tanto de nocivos , como tem de ab- ^^^^^ -^
lolutos; formados da vontade, não íè íabem fogeitar á rezãoj
fe os dita o juizo, perfíftem no engano,incapazes de fobordi-
iiaçaó . Pos o Governador os olhos no Rebellinho , a quem
encaminhava a pratica, ScdiíTe, que fenaquelle congreíToa-
via, quem bufcava defvios,parafogir ao choque, que fe ficaf*
fe em fua caza, & não quizeífe defviar a empreía; que ãs mais
difficultozas eraò, as que apeticiao os corações grandes,& q
fó em vencer inconvenientes, coníiftia o vencer ; & porque
conhecia bem os ânimos , dos que tinha prefentes , lhes não
queria dilatar a occazião da viâoria^que ao outro dia fe avia
de dar o aíTalto; & que fe a Fortaleza fe ganhaíTe , feria de to-
dos a gloria, & quando fenão confeguiíTe, fó a elle fe avia de
por a culpa. Prometeo , a quem lhe aprefentaíTe a cabeça de
Siígifmundo, premio da fazenda Real,& gratificação da fua.
Entendido o Meftre de Campo Francifco Rebello , de que
fobre fcn parecer cahia a ceníura , refpondeo , que nunca te-
mera Olandefes, quem como elle contava as viâioi^as pellas
occazioés; porém, que apontava os inconvenientes da em-
prefa,& as confequencias de hiia, & outra fortuna ; para que
fua fenhoria efcoIhelTe , fe convinha mais ao Eftado vencer
fem perda, ou perder fem fruito.Mas fopo]ío,que feu zelo,&
fua experiência fe avaliavaó por fraqueza, faberia moftrar,
í^^^ Yy 3 que

«*»•

^3"4 C^ST^l^lOTO LUSITjKO

que não poupava a vida, quem não temia a morte ; & que o
fucçeíTo diria, o como íabia morrer, por faber aconfelhar.

28 Inflamado nos eílimulos da honra, & certo nos peri-
gos da vida,fahio oRebellinhoda junta^&fem demora par-
tio para a fronteira com os mais Cabos,qiie fe acharão na có-
ferencia, refolutos todos em fervirem á temeridade, por não
Contra v^^ ente- faltarem á obediência. Efcolhèraó mil & duzentos íoldados,
Vf "^ ■ Sc coná elles, ao romper da manhã íeguinte,avançáraõ a For-
taleza inimiga, que os recebeo com nuvens de balias, por en-
tre asquaes romperão as paliçadas, &fobiraõ as trinchei-
ras, bufcando os golpes do ferro,dentro dos incêndios do fo-
go, taó ai voroçados,& deftimidos, que o Framengo occu pa-
do do aíTombro, defconheceo os aíFeétos da en ve^a. Via, que
tropeçavão na própria emulação, & julga va-os ifentos da ju-
risdição da morte. Não era menos o valor , com que o Inimi-
go fe defeíidia, ajudando-fc da força,da mduftria,& da defef-
peraçaõ. A cerração do fumo, o eílrondo dos tiros,o eco dos
golpes,o aíTobiar das ballas,o gemer dos feridos,o bradar dos
Cabos, o agonizar dos moribundos, enchia o de horror o còr
bate 5 com igual laftima, porque com igual perda . Os noíTos
foldados mais cegos, como mais empenhados , nãofabiãoa-
Vertir, íènão em como fe avião de adiantar : Porém a fortur
HuahalU doim- Ya^oM envejofa do esforço, ou Mimada do eftrago , enca^
nos defiroça ' minhou hum pelouro aos pej? tos do Meílre de Campo Fran-
cifco RebelIo,que lhe tirou a vida, & deu fim á batalha,por-
que a hom mefmo tempo cahio feu corpo defanimado , & fir
cou o da noffa gente vencido. Os meíinos,que no combate o
não perdiáo de vifta, bebendo em feu exemplo efpiritos pa^
ra a imitação, vendo-o defunto,entre outra multidão de cor*
pos mortos, receberão coíifelho para a retirada, que poferaõ
em execução com taniar»ha dor, como rifco; era tile de innu-
meraveis bailas, que os feguiaõ 5 eraaqudla ^ por fer terror
dos inimigos o Cabo, que deixa vão morto.

29 Quinhentos para feifcentos homens perdemos no
aíTalto; dano, que fervio áe medida ao defatino. Naõ baftou,
que fua valentia, os coroaíTe de humana gloria , para que ília
falta deixaflè de cauzar a todos intenfa pena: O5 companhei-
ros os chora vão faudofos, os do povo tímidos , o Gov erna-

dor

1647

^fAT(TEI.LlFllO VIU.

^3^

dor confufo,& todos arrepcndidos,ainda que não todos cul-
pados . Para fazer a perda lamentável , fobciava a do Mcílre ^^'^^ ,f "^J'-'^-'
J, -r r> I 11 • j • • centos Vortugue '

de Campo francilcoKebello,cnjo nome como demmutivo ^^ .

de Rebellinho,foy em todo o tempo merecedor de ília fama,
Sc de melhor fortuna: Nunca o articulou, entre os Inimigos,
fenão o efpanto, entre osnoíTos o refpeyto . Era íeu valor
■igual á fua induftria, & fua difciplina mayor , que fua induf-
íria, & que feu valor.Em fua gineta achavão os foldados mu'
ro, &:em fua efpadaliçaó: Defendia enfmando, &enílnava
ferindo: Em fim, que foy para noífas armas irreparável a per-
da defte varaõ, porque fe contentou aquella idade com dar
•hum fó Rebellinho. A morte de António Gonçalves Tiçaó,
&: de outros Capitães,&ofíiciaes fes entaó mais fenfivel o da- ^^{^^ ^^^^^ "^^^

&A r r 1 r jl- pitão AntontoGo -

agora a magoa deíeeíconderem íeus nomes debaixo^ , ^ - /,

da terra,que cobrio léus corpos.Sahio rendo o Sargento Ma- ^^^^^^ officmes.
•yor Aífenfo da Sylva,com outros muy tos ofEciaes ,& folda-
tdos, femelhantes na gloria, de femelhantes na forte. Com lu-
to, & fangue chorou o Inimigo a v iâ:oria, faltou-lhe a condi-
ção de vencer. , porque a não deixava ver, a confideraçaõ de
eícapar. . :;..i í:,.^ .;..j „..,

<- 30 Chegarão avÍ2o a Portugal, que mandara o Gover- ^ -

nador Geral do Eftado, da poderofa armada, com que Sifgif-
mundofeíituataá vifta da Bahia, aomefmo tempo , que de iVcw^^ elKey o
Olanda fe efcrevia preparar-fe nova frota,para fe mandar ao ^^^^^ ^^ ^'^"'*'
Braíil. Novas húa, & outra, có que a neceííidade pedia prop- ^^. J^ híl amiA-
-to,&efficaz remédio: Nada remiífo em lho aplicar , nomeou ^^^ ^^^ mcmànM
o Senhor Rey Dom João o Quarto de Portugal, para Gene- BrafiL
Tal do mar ao Conde de Villa-Pouca António Telles da S)4- >^ -"kasie/
-v^: Confígnou-Ihe Cabos, gente,muniçoés,& vazos, de que ,. -^
ie compôs hiía groífa armada para irdefalojar a Sifgifmun-
do. Voou a nova ao Arrecife; fofpeytáraõ os do governo em '
ília cabeça o golpe, & mais certos no temor, que na efperan-
íça, defpacháraó hum correyo á Bahia, ordenando ao feu Ge-
iieral Sifgifmundo,levaíre ferro,& navegaíTe para Pernambu-
-^co, porque a divifaó do poder , não occazionaífe a perdição
-de todos . Conformou-fe o avizo com o defcjo do General
.Olandés,& fem dilação embarcou a artelharia, pos fogo aos
quartéis, recolheo a gente, largou pano , & tomou a derrota
, Yy4 de

:i I

ÍHH««

Sífgifmundo lar
ga ojitio^érfe rC'
Tira a, Pernam
huco.

536 C^ST^IOTO LUSITJNO 1647

de Pernambuco, aonde chegou (no fim defte anno de feifcé-
tos & quarenta & fete) taó corrido, como delle fahira ufano.
Em feu recebimento teve mais parte o luto , que o alvoroço,
porque fe recebiaó os vivos, que chegava o, com as lagrimas,
[ com que os olhos choraváo os mortos,que não viaó.Eíle foy
. (brevemente relatado) o fucçeíTo da jornada,que Sirgifmun-
. do fes á Bahia (como alheo de noffo aíTumpto. ) Agora dire-
mos, o que paíTou na campanha de Pernambuco o tempoj
que delia nos apartou a v iagem de ida, eftada, & volta.

3 1 Naó pajGTáraõ muy tos dias, entre aquelle em que os
noííbs Governadores ti veraõ certeza , de que Silgiímundo
Ília com a fua armada fobre a Bahia, & outro,em que lhe che-
gou avizo da Paraíba, queoOlandès Teoccupava emgran-
gear,& plantar cana, cultivando aqpelles canaveaes,que em-
pedidos da chuva não acabou de confumir o fogo, quando os
Fay o Mcpe de j^oradores fe retirarão; (como deixamos dito") & que a grarp-

Cãpo André Vi- • i ■ . n - ^ ^ /- ^ ^

âd de Neqrãros g^^"^ "^^ ^^ '^^uto crecimento, que eítavao em v efporas de
^ Paraíba, lançar a moher o Engenho de Cunhau ( dezoyto legoas da

Paraíba.) Convinha á perfeveràça,& reputação de noíTas ar-
mas, cortar de hum golpe a poíTe, & a efperança do Inimigo:
Para oquefahio donoíTo ArrayaljCm dezafeis de Mayo, o
Sargento Mayor António Dias Cardozo com trezentos &
trinta & fete homens , todos foldados do terço do Governa-
dor João Fernandes Vieira: Aííi como entrou naquella Ca-
pitania, defpedio ao Capitão Cofme do Rego Barros com
cento & feíTenta foldados, ^ ordê, que aífaltaífe, & dcftruif-
fe o Engenho de Cunhau5& todo feu deftrido. O Inim!go,q
nos termos do feguro, não vivia fem receo , eftava fortífica-
do,& guarnecido de muyta, & bóa infantaria; & taó vigilan-
te, que recebeo os noíTos com as armas na mão.Com valor,&
difciplina o enveftiraó os Portuguezes; húa, & muytas vez'es
repetirão o aíralto,& de todos os rebateo o Olandès ; peleja-
vão pella vida, cuja duração confiftia fó na defenfa. Viraõ os
noíros,que a per fia os não melhorava na forte,deixáraó o có-
bate, em que perderão dous homens : Abrafáraó o Engenho
com todos os materiaes da fabrica , & do lucro; tallarão a cã-
o ire filia dejla panha;& com duzentosboiz,&muytos efcravos fe voltarão,
-vuum. para onde os efperava o feu Cabo, a tempo^que pellas outras

partes

ii

1^47 ^A^TELLIV^OVIIL 537

partes tinha já tudo confumido o ferro , & o fogo com feme-
Ihante eftrago.Encorporados deraò v olta para o Arrayal,em
o qual entrarão com duzentos prifiôneiros, a mayor parte ef-
cravos foragidos , & algúas mulheres eílragadas, que viviaõ
entre os OlandefeS, & Indiosj & por cima de trezentas cabe-
ças de gado vacum jfocorro para todos opportuno, & para
os íbldados grato.

32 Em todo o tempo que durou a gucrrajfora o Rio de
Saó Francifco o çurral,donde fe conduzião as carnes,que fuí-
íentavaó o noíTo Arrayal, não era focorro , que baftafíe para "
todo o anno,& para toda a gente, mas efcuzava a neceffidade ^^^^^'fi ^ f^^*^
nas mais apertadas faltasiGrande foy,a que fe começou a fen- ^'' ^^^''^I^J
tir, dei pois que o Inimigo o fenhoreou , affipello gado que comoferemdea.
recolhia para íi , & para o Arrecife, como também pello que
ós moradores retiravão para a parte da Bahia.O Governador
Joaó Fernandes Vieira, fobre cujos hombros carregava a fal-
ta,& a queixa, acudio a remedear a fome, com mandar vir to-
dos os gados, que tinha pellas matas de fuás fazendas, de que
fe foy dando ração aos foldados, cortada, mais pello pezo do
aperto, que pello do eftilo. A feu exemplo , acudirão todos
os moradores do recôncavo com os focorros que podião, cõ
o que ceifou a queixa , porém não a fome [forçoía entre tan-
ta gente,& por tão dilatado tempo:] Era a neceffidade de to-
dos,& todos fe acomodavão com a neceffidade : Naõ tinha a
penúria, de quem formar queixa, & na igualdade da miferia
achava preceitos a paciência. Saó os apertos,a pedra, em que
fe dão os melhores fios ao entendimento. A neceffidade adel-
gaça muy to os difcurfos . Conferirão os Governadores Joaõ
Fernandes Vieira, & André Vidal de Negreiros, como fe po-
deria acudir á fome, de forte, que lhes não faltaífe a brevida-
de'do remedioi& aírentáraõ,q fe bufcaífe no mar, em quanto
faltava na terra. PaíTáraõ ordem, que todos os pefcadores íe
obrigaífem a pefcar naquelles mares, que fenhoreavaó noífas
Fortalezas, como feguro de os guardarem, & favorecerem
noífas armas. Executou-fe affij dava-fe á Infantaria raçaó de
peixe, que fatisfes, em quanto oMeílre de Campo André
Vidal de Negreiros não punha em execução a promeífade
conduzir gados^a todo o nfcoj para o fuítento do exercito.

33 -^vi-

538

farte o MeBre

CJST^IOTO LUSITjNO i ^47

Avizou-fe,qiie no Ceará Monm(Iugar íitiiado miiy-
to acima do Rio Grandcjcorrendo para o Norte) paftava co-
piofa multidão de gados. Refolveo-fe oMeftrede Campo
André Vidal de Negreiros em oíFerecer fua peííoa para via-
gem,& condução taódifficultofa. O zelo do bem comum o
dTcLloZ7d7e ^^^^^ ^^^^"^ ^"^^'^ V^^^""' outros,que para íi: Apreftack) de tu--
FídalparaoCea-^'^^^^^^^^^?^'^^^^^ neceíTario para a jornada , partio do
râ Morim. ArrayaljCm vinte & quatro de Agofto, com oy to centos in-
, fantes, & noventa cavallos: Poílo em marcha, venceo o cami-
nho, que o deteve com vários empedimentos , aííi do tempo,
como do cazo; por todos rompeo v alente,induftri ozo,& fo-
frido. Entrou na Capitania do Rio Grande, tallando, & deA
\ • truindo tudo,o que pode alcançar o ferro, & o fogo,em quã-
tonaó voltava do Ceará Morim o Capitão Joaó Barboza
Pinto, que por feu mandado fora conduzir os gados daquella
pajte: Chegou , com os que pode ajuntar, & encorporadas as
partidas,& o poder,marchou o Meftre de Campo para o Ar-
rayal com fetecentas cabeças, muy tas mulheres,que libertou
da força, & da injuria^Sf não poucos moradores , que bufcá-,
raó o abrigo de noíTas armas, para fògirem a feu falvo , da ti-
rania Olandeía.Na Campanha deixou mortos fetenta inimi-
gos, entre Framengos, & Braíilianos. Chegou á viftado nof-
- fo exercito, aonde foy recebido com alvoroço de eíperadoj

& acclamaçaò de vivas, como as tinhaõ eíludado as efperan-
ças,que a todos fuftentavaõ, na dilação de taò a vantejado fo-^
corro.

34 NâoTedefcuidou o Framengo, de aproveitar a oc-
caziaõ,que lhe dava o tempo: Efpreita-as a conveniência ; &

Jprovehafeoim ^^ "Í^ ^^^^ P^^^^*" a vingança.Teve avizo da jornada , que o
Tnigo de fm aU' Meítre de Campo André Vidal de Negreiros fazia ,& do po-
der que levava^confiderou noíTa reíiftencia enfraquecida, &
por confeguinte feu partido avantejado^ provou a forte em
aigúas aíTaltadas, que fes a difFercntes Eftancias noíTas , & de
todas voltou caftigádoi& arrependido de crer, que a faíta da
gente,entre os nolTos, fe contava pello numero,quando a não
achava no braço :Naó deixava de nos cuftar mortos, & feri-
dos, a refiftenciai& por empedir a continuação do dano , or-
denou o Governadorjoaõ Fernandes Vieira (em cujo pey to

wtg
fencia.

OS

1^47 fJTlTE /.L1P1{0 Flll. -539

os trabalhos aiimentavão os efpiritos) que todas as noites/e

tocaíTe arma pellas Fortalezas do Inimigo;o que fe executou ^''^''. ^^/'^^^^'^^

1 1 ^ 1, , I Fietra lhes re-

com tal ardor,que pellas horas contava os rebates , com que > ^^ intentos.

fe via obrigado, a paíTallas todas com as armas na mão . Em
quanto durava o dia, os trazia naó menos inquietos,mandan-
do-lhes armar cilladas, em que ordinariaméte cahiaó, ou per-
dendo a vida,ou ahberdade,& juntamentea lembrança,&: o
atrevimento de nos aíTal tarem as Eftancias , aflbmbrados de
lhes moftrar a experiência, que então padeciaó cerco mais a-
pertado, quando o noíTo Arrayal eftava mais deminuido ; o
que nefte tempo era aíTi, não fó pelloo-grofíb , que delle le-
vara o Meftre de Campo André Vidal de Negreiros, fenão
também pella muyta gente,que andava fogida,& licenciada^
falta,que fazia mais fenfivel o dilatado cinto da noíTa frõtey-
ra, que formava hum circulo de fe is legoas de âmbito.

35 Era pratica corrente entre inimigos, & amigos, que , <

no porto de Lisboa eftava húa armada para fazer v iagem ao
Brazil em focorro de Pernambuco, nova,que de húa, & outra
parte, fazia crer o defeio do remédio , & o temor do caftigo, .
(^com aquelle exceílo de poder, com que hum , & outro afte- ^^^^ ^ ^^^^ ^^
dco avultaó as couzas,que pintão.) Os noíTos Governadores, armada rortw
como mais empenhados , eraô os mais crédulos; fundavaõ a gue^a,
certeza na juftiça, & na rezáo,com que deviâo fer focorridos
de hum Principe, a que fervião defentereírados,& fieis; obri-
gado por conveniência, a eftimar as vidas dos fubditos , que
por feu ferviço as arrifcavaõ confiantes, atropellando pello
defraudo de familias, & fazendas,por reftituirem a feU legiti-
mo fenhor o domínio, & as tçrras ufurpadas . A alegria, com
que fe ouvião, & davão as novas, lhes tiravãò toda a duvida,
& aííi era tamanho o alvoroço em toda a noíTa gente,que dif^
corriaõ,& difpunhaó o cerco, o aíTalto, a v iâ:oria,& o trium-
pho. Conferindo as conveniências de fe combater primeiro
efta, ou aquella Força ;efperando na repartição dos deípojos,
não a forte, fenão aefcolha. Comdiverfo penfamento en-
travão os noíTos Governadores em negocio taõ importan-
te;parecia-Ihes,que em breve tempo chegaria a Frota efpera-
•da, a combater o Arrecife pella parte do mar,& que neceífa-
riameute fe avia de fazer o mefmo pella da terra , & defeja-

vaó,

HPi

wr

540 C^S7%10r0 LÚSITJNO

1647

vaõ, que as prevenções fe adiantafíem á occaziaõ.

36 Vezinho da povoação de Santo António , ou Cida-
de Maurtcea (como lhe deu por nome a vaidade3& a liíonja)
há hum íitio, ao qual os naturaes chamaõ a Seca, a efte tal di-
vide da Campanha hum rio, não muyto largo, (a balia de há
mofquete o alcança de ribeira a ribeira ) nem muyto fundo
(de baixa-mar fe paíTa com agoa pello joelho. ) No dito pof-

Tj^emosnojjosa, ^^ |.jj^|^j q Inimigo a Fortalcza,que tomado o nome de Sitio,
Fortaleza da b<t- j. . , ^ l! J r V J a' r " -cr

teria Cem que os ^^ dizia da becajcom ella derendia de nolla oppoíiç3o,nao lo

immígos ofmtaõ, a dita Cidade, fenão também o Arrecife , por ficarem defco-
bertas,húa3 & outra povoação, a qualquer bateria,q da noíla
parte fe lhe quizeíTe por: Re^oés,queperfuadirão aos noííos
Meftres de Campo Joaõ Fernandes,& André Vidal,a entra-
rem em penfamento de levantarem hua Força , donde vare-
jarem a fobre-dita Fortaleza, & praças do Inimigo . Refola-
tos no intento, conferirão entre íi o tempo,omodo, &:a par-
te j& preparados os materiaes,& inftromentos neceíTarioSjfa-
liiraódoArrayal( deixando nelle a guarnição ordinária ás
ordens do Capitão Joaó Soares de Albuquerque) em o prin-
cipio de Outubro: Marcharão com o reftante da gente até a
Eftancia do Governador Henrique Dias : Comunicaraó-lhe
a tençaõ : Aprovou o intento : Éfcolhida a paragem , deraõ
principio á obra,& os Governadores ao exem|)lo , fendo os
pnmeiros,que pegarão nas enxadas,a cuja imitação o fizeraõ
todos os oííiciaes,Sí foldados, taô fófregos do trabalho , que
de nenhúa íbrte quizeraó admitir a companhia dos efcravos,
que os moradores oíFereciaõ para ajudarem, no que foííè ne-
ceíTario, O íllencio, com que íe obrava, era tão obfcrvado, q
nem voz, nem golpe, ouvio o Inimigo, em todo o tempo,
que durou o trabalho; & para que o Framengo não podeíTe
ver o edifício , que fobre-fahia por cima do arvoredo, o co-
briaó os nGÍros,todas as manhans de ramos frefcos: Arteficio,
com que deílnentiraó os olhos mais atentos,de forte, que por
nenhum dos fentidos, pode o Olandès formar a menor Xo^-
peyta da fabrica, fendo tanta fua vezinhança, que entre os
noíTos, íè percibião as praticas de fuás vigias.

37 Em trinta de Outubro eflava a Fortaleza poíla em'
fua ultima perfeição com todos os reparos 3 & de cava cfpa-

çoza.

■■■

i64r ^JXTE1.L1F(]10 VIIL 541

çofa, Sl fi]nda,que enchia de agoa o inefmo rio, que fe entre-
punha, & apartava a noíTa, da contraria: (eíbcadas, trinchei-
ras,& plataformas, em que jugaváo miiytas,&: boas peças da
artelharia,& tudo em tal forma, que fe podia defender a toda ^^'^^'f^^^ft
a mvazao do Inimigo por qualquer parte , que a quizefle ^^- aprinieirafdva,
vcftir. Na madrugada de féis de Novembro mandarão os nof-
fos Governadores queimar hum pataxo,que o Olandès tinha
no rio, como atalaya de noíTos movimentos;Pegou o fogo, &
as labaredas do incêndio ferviraó de luminárias á marcial al-
vorada, com que a nova Fortaleza ao fom de caixas, trom->
betas, & charamelas deu os bons dias ao Framengo com trez
cargas cerradas de artelharia,& mofquetaria, que fazião mais
horriveis as vayas, que o confufo grito dos foldados dava aos
moradores da Cidade, & do Arrecife, que defatinadosdo ef-
trondo,& do fobre-falto bufcaváo abrigo, (incertos no fegu-
ro ) de noíTas bailas. Os Judeos mais tímidos, como mais cul-
pados, tropeçando em fua mefma diligencia , defemparavaõ
as cazas fem coração, porque o deixavaõ, aonde lhes ficavaó
as fazendas [corriaõ alheos de parar em algúa parte,fem mais
tino, que o da fuga, & da indeliberação da efcolha. j As mu-
lheres com as crianças nos braços vagueavaõmaisindicifas,
■ porque mais defanimadas; nenhúa delias fabia , para onde a
levavaó os pés. Os foldados,& officiaes, que na opinião dos
íeus,era5 os mais deftimidos,olhavão para a Fortale2a,aírom-
brados de averé primeiro pello eftrago,que pello vulto. Em
tudo femelíiante, foy a inquietação, que o repentino tumul-
to cauzou emas náos,queanchoravào na barra do Arrecife,
porque, affi como ficavãomais defcobertas aos tiros, ficavão
mais fogeitas ao dano.Os Governadores,& principaes Cabos
Olandefes não fazião difcurfo para o remédio , que lhes não
reprefentaíTe fua total ruina. AíTentáraó por ultima refolu-"
ção defpachar hua fumaça ao General Sifgifmundo,pintãdo-»
lheocftado,emqueficavâo,&aperdiçaõ,quetemiãojCom v;

ordem,qu e a toda a preíTa navegaílè em feu focorro , antes q ^^ ^^'^^^ ^^^^^
chegaffe a armada Portugueza, que por horas fe efperava , & ^t JX'^'
que o lucçedo retendo os avertia, que não tardarião mais té- nerd sifgifmun*
po em íè renderem aos combates da terra , do que tardaíTem d9. "

01 PortLiguezes em os cercarem por mar . Confeíravão,& ar- '
* ' Zz guíaó

54' C^ST<!(10T0LUSITJH0 ^6^j

guiaó o defatinado erro de arrilcarem o certo, por ganharem
o contingente.

38 Com defefperação fe confumia o inimigo, vendo-fe
cada dia mais atribulado,&: menos defendido: A ouzídia,& o
íitio lhe difpunhaò os aíTaltosj quafi todas as noites os pade-
^ ciaaCidade, & o Arrecife: Em mu y tas chegava o nolToatre-

' Jj° JJ^ JÍO9 YiiYiento a tentear as eftacadas de fuás fortificações , & efoe-
do Conde de Naf ravao, a em que desteitas, & entradas , le aviao de v er logei-
/«/. tos a outro dominio: Nefte receo os confirmou húa noite,eai

queosnoíTos Governadores mandarão a dous Cabos refor-
mados com cem Infantes efcolhidos, que foffem aíTaltar o Pa-
ço, em que vivera o Conde de NaíTauJoão Mauricio,íituado
Ua etitrada da Cidade Mauriçea j edifício viftofo , & de cuí^
„-, tofa fabrica: Tinha de guarnição duas companhias deOlan-
defes dentro de boas trincheiras; feguro , em que defcançava
fua confiança: Com deftimido braço as romperão , & ganha-
rão os noíTos^Sc com leve refiftencia do pre2Ídio,que aos pri-
meiros golpes fogio com feus Capitães , a meter-fe dentro da
Cidade; (menos vinte & quatro Framengos , & hum de feus
Capitães bem fangrado, aos quaes a falta da vida , & do mo-
vimento não deixou íeguirafuga dos mais. j Saquearão os
noíTos o Paço,& cõ os deípojos, &: infignias dos oiiiciaes,que
nelle deixarão os do prezidio, fe retirarão á nova Fortaleza,
fem receberem o menor dano das bailas, có que todas as For-
talezas contrarias os bufca vão. Forão recebidos de todos c6
feftivo alvoroço,que fazia mais aplaudido a tumultuofa con-
fufaõ,&: grita, em que o medo tinha pofto aos moradores da
Cidade,& do Arrecife; tão certos em fua ultima ruina, que a
prefumiraó, como fe a experimentarão.
G r 5 9v\ i Continuarão da nofíà parte os aíTaltos confi a mefma
fortuna,& a bateria da nova Fortaleza com omefitio eífeito;
até os últimos dias de Dezembro defte prefente anno , quan-
$ntra siprifmu- ^^ Sifgifmundo com toda a fua gente, & armada tornou por-
do noArncifecÕ ^^ "^ Arrecife: Ouvio, da boca de todos , nolTos progreíTos,
afuA armada. & feus infortúnios. Vio com efpanto a nofía Fortaleza,& có-
fiderou com a tenção,o como fenhoreava,& defcobria tudo,
quanto fuás fortificações guarda vão ; ou ío0e induftria para
anunar,ou penfamento para feguir,prometeQ aos do Conce-
lho

^

L,--^

1647 ^J^^TE hLlV^\0 VIIL <^43

lho Supremo 5 que dentro em trez dias avia decaíligar aos
Portuguezcscomíuasmefmasannas, porque, ganhada afua
Forca leza,abri ria porta fegura^Sc franca,para Ihesconquiftar
a campanha. O primeiro fiador,que deu á promeíTa, foy man-
dar, que todas as peíToas , que não podiaõ tomar armas , 011
pella idade,ou pello fexo, fe retiraílem a hum porto,que cha-
ma vaó a Boa Vill:a,para que com ella tefíimunhaíTcm o com-
plemento de fua palavra . A v igilancia dos noíros , a que na-
da fe efcondia, apontara a artelharia toda para aquella parte, oquefa^.^écomo
&com vozes, & bailas deraó tal varejo aos aííiítentes, que Ihejmcede,
ícm diítinçaó de peííba fogiráo todos , com a dcfordem, que
Ihescauzava o defatino, fazendo muytoSirgirmundo5& os
ícus Cabos , por não ferem os últimos, que deixavão o íitio^
íèguindoao mulherio, quebufcava o abrigo da Fortaleza das
Cinco Pontas , a qual, com o corpo, os reparava por aquella
parte: Nella eíliveraó todos,até que a eícuridade da noite os
animou a deixar o pofto j o que de dia fenaó atreveo a fazer
algum, aííombrados todos da pontaria , com que na tarde, as
noíTas bailas fizerão empedaços, a quantos intentarão retirar
os corpos mortos de alguns ca vallos feridos de noíTos pelou-
ros. Os artelheiros, defpois que não yiraó peíToa , a que en-
caminhaíTem os tiros, os empregarão nos edifícios mais v ifto- *
fos da Cidade, & do Arrecife,&: poucos deixaria em pé a mi-
ra, fenáo fora ncceííario poupar a pólvora.

40 Cada dia,eíperava a noíTa Força)que Sifgifmundo cõ
todo feu poder a enveftiíTe , ou por fitio, ou por aflalto. Era
notória a todos a p/omeífa , & a todos enganou a efperança:
Naò fe regulou fua altiveza pellos preceitos da experiência:
Em nenhiia parte nos bufcou a efpada,que o não cortafíè, ou .
o ferro,ou o medo. Na margem do 1 io,que fe oppunha i nof-
fa Fortaleza, mandou levantar húa trmcheira, obra, com que ^^"^'^^^^ ^^^^■'r-'
lahio húa noite ajudado do efcuro,& de innumeraveis gaíla- caoàAmíTAb&u^
dores: Guarneceo^a de groíTa artelharia, & dos melhores foi- y/^.
dados, com penfamento de nos deftruir,fem fe arrifcar. Man-
dou aíTeiiar alguns trabucos (engenhos, que inventou a hof-
tilidade, para deitar dentro nas praças,©» por elevação , gra-
nadas, bombas ,& outros arteíicios de fogo , inftromentos da
mortCj de que os homens fe aproveitão contra a vida dos ho-

Zz 2 mens:)

<i

544 c^sT(nioTa Lwsmm) 1647

mens:) De todos fe valia oFramengo para nos defalojar;
porém anoíTa vigilância deixou quaíi infrutífera fua dili-
gencia , fabiaó achar remédio contra o dano , ou fogindo,
avizados do eftrondo, ou atalhando os eíFeitos do golpe,
com materiaes contrários ao incêndio ; porém náo fc 11^-;
vravão do continuo defvelo, cm que os trazia efte cuida-
do: De receo tãomolefto osifentou hum valerofo folda-
do , por nome João Laus , o qual borneou húa peça, com
pontaria táo certa a hum dos trabucos, que ao tempo,
*' que feu artifice lhe quiz dar fogo, o fes tm miúdos pe-
daços. Já nefta occazião íe governava Siígifmtfcido mais
pella defconfiança, que pella intelligencia : Fes credito
da perfia , & mandou vir- da Paraiba novo engenheiro,
pratico naquelle género de artelharia , qiie chegou a fuf-
tituir o lugar do morto , & a continuar nos tiros dos tra-
bucos, mas não com a certeza dos tiros , porque era ma-
r^ yor o dano , que delles recebião os feus , do que cauzavão
aos noíTos . O deíèngano trocou os intentos de Siígifmun*
do, aplicando o cuidado de nos oíFender, aos mcyos de fe re-
parar , com o que de todo fe retirou da emprefa: Informados
da paufa, & dos avizos, fe retirarão t^bem os noíTos terços,
para o Arrayal, deixando na Fortaleza o prezidio neccíTario
/^ com ordem, que fe regulaíTem os tiros pella falta da pólvora,
mas com tal arteficio , que o Framengo naõ inferiíTe a falta
pella fufpenfaó, fazendo-lhe entender [com as ordinárias
cargas, ao meter , & tirar as companhias de guarda, ] que o
não atirar mais, era eícolha,& não preceito*
jr\ 41 Em aquelles dias, levados da efperança,& do de-

fejo, fobiaó os foldados , & os moradores ás coroas dos mon-
Dívulgdfe em tes , donde melhor fe deícobriaó os mares., para occupa-
^^'^"^/'^""yJ^rem os olhos, em bufcar a armada, que vinha do Reyno,

checada a Bahia ri-j í oi • r - ^ i

a armada Poríu-V^^^^^^^^^^ "^ tempo, &doavizo, que ou leria chegada,
gue:^a, OU eftaria vezinha : Cada-qual queria fer o anuncio de

nova taó grata, & todos, os primeiros na dita de verem
com feus olhos o focorro, a que fiavaô fua redempçaó.
Entrou o anno de-mil & feifcentos & quarenta & oyto,
Sc com elle ojdefengano , de que naõ era chegado o fim
de feus trabalhos, com a nova, que logo fe divulgou , de

aver

^

1^4^

TA^TELLIF^O VllL

545~

aver chegado á Bahia a Frota cfperada, com navegação taõ
alhea de Tua elperançajComo apartada de feiís olhos.porqiie,
nem do Arrecife, nem das eípias, que o Inimigo trazia pello
mar para efte fim, foy deícoberta: Pella derrota inferirão to- .a
dos,que aquelle poder era mandado a focorrer a Bahia,& não
a remir a Pernambuco . Allí mais fe defanima a efperança c5
a fiilta da promeíTa, aonde achava mais fundamento a defcõ-
íiançai golpe foy efte,-que a todos os Toldados, moradores,& \

íiaturaes auxiliares, daquellas Capitanias, penetrou o íntimo
do coração ; & podéra acabar com o animo , & fidelidade de ^^
todos, vendo cada hum o pouco cazo,que no Reyno fe fazia
^e fer viços, que merecião eftar vivos na memoria , &: na efii^
inaçâo de todos. Porém aquelle valor , & aquella confiancia
apurada a golpes de infortunios,& defprezos, tão fora efteve
de fraquear na lealdade, que defiaconfideração tomou mo-
tivo,para fe empregar com mais fervor nos ferviçGs (como fe - ' '*

o coração Ikes diífera) q fó para feus braços guardava o ceo
o fim de tão perfiada guerra5& para fua cabeça a coroa de ta*
manha viâ:oria, como aquella , com qiie defpois derão fim á
emprefa j & não faltou entre os noíTos, quem o diíTeíTe , & re- •

cebeíTe os parabéns de tonto efquccimento , como fe v io no
defvio daquella armada, encaminhando o focorro, aonde ò
pedia mayor neceífidade, & não a Campanha de Pernambu-
co, aonde o fio das viâorias defviava os auxilios 5 enfinaíydo
a experiência , que não he neceffario ajudar , a quem fempre
fabe vencer : N unca a fidelidade difcorreo com fio mais del-
gado: Nunca no valor relplandecéráo quilates mais fobi-'
dos»

42 Tinha partido do Arrayaí para a Campanha do Ríoj
Grande (em vinte & trez de Novembro de mil & fcifcentos
& quarenta & ítt€) o Governador dos Minas HenriqueDias ^^^^j^^^:^^^; ^^
com o feu terço,& alguas companhias do terço de Dom An- bíoí para o Rio
tonio Phelipe Camarão j & porque no principio de Janeiro Gr Ande,
de quarenta & oy to entrou naquella Capitania , guardámos
para efte lugar a narrativa defta expedição, com o para fcu
próprio tempo . Chegara o Meftre de Campo André. Vidal
de Negreiros , & referira, o quanto convinha ao útil, & á re-
putação de noílas armas , que o Inimigo não firmaíTe o pé no

Zz3 re-

54'^ CASrf!(lOTO LUSITANO ^648

recôncavo <3aquellas cainpinas , aonde a diíláncia o deixava
tornar aírento com menos rcceo de noíraefpada;& era necef-
fario fazer-lhe conhecer,que em toda a parte,© avia de alcan-
çar o braço de nofíb valor. Com efía rezão jpartio Henrique
Dias no tempo referido^ com a gente, em que no Arrayal fe
reparava menos, para queefcòndida a falta, fenão divulgaíTq:
o intentOj& entraíTc naquella Campanha com o partido de
fer primeiro deícoberto pello dano, qiie pellas noticias.(Co-í
mo o rayoj que primeiro abraíà, do que aviza.) Correo Hen-
rique Dias o deftrido do Rio Grande^por tudo, o que tinfaa
¥i da, cortou a eípada; tudo, o que tinha prefi:imo,cDnrumiaí
o fogo: A viftou hum íitío, que chamâo os Guarairas , aonde
D Inimigo fuílentâvahúa caia forte no centro de húa lagoa
larga, & funda,dentro da qual,c6mo em Ilha', íe aloja vão to-s
o que Ihefuccede ^^^ ^g Indios,& efcravos, qne o Olandès occupava nas roças,
f,a Campanha, ^ lavouras daquelle terreno; & íe recolhiáo os fruitos, & os
roubos, de que fe fuftentavão , guardados , & defendidos de
quarenta Olandefes , que com outros foldados índios guar^.
neciào a fortificação: Conftava efta, da caza forte cercada de
^ duas trincheiras bem obradas.

43 Coníiderou Henrique Dias o numero da gête,o de-*
fenfaveldo fitio, por arte, & por natureza; a difficuídade da
emprefa, & quando o difcurfo lha pintava com mayor car-»
Ganha a fortifi- ^^"^^> ei\tão a v io feu animo com mayor empenho.Ordenoa
tõdasGu4rai» ^^"^ foldaàQs;& com palavras, & rofto foçegado , lhes diífe o
caminho, & ò modo,por onde, & como aviáo de avançar, &
ganhar a fortificação : Não lhes interpondo duvida entre o
enveftir,& vencer,os meteo no aíTalto.Lançáraô-fe á agoa,&:
com ellâ pella cinta,â cometerão á eícala;que o Inimigo efpe-
rou com valor,&: difciplina,defendendo'fe com as ventagens
do fido, & do reparo, de homens 5 que metidos até a cintura
1 pel la agoa, Sc pello lodo;Sc que para carregarem os mofque-t
tes, lhes era forçado, porem as armas huns fobre os hombros
dos outros. A todos fervio o empedimento,de eftímulara co-
ragem; Sc a agoa , de acender o fogo da cólera : Tomáraó os.
noíTos terra , & fna igualdade do terreno, fc v io logo a defi-
gualdade do valor, porque apezar de dura refiftencia, ganha-
rão a trincheira exterior;entre efta,& a ícgunda,paílou o có-

bate

li'*" '

1^48 ^AXTElLimpVm. ^47

bate a fer batalha, porque fe pelejava em campo rafo, coirt
igual furor, mas com tão defigual pulfo, que deixou o Inimi-
go a fegunda trincheira nas mãos dos noíTos. Foy o Capitão
André Al veres o primeiro , que a fobio , & não forão fegun-
dos no valor, os que o feguiraó, tanto mais claros nas armas,
quanto mais negros , os fazia parecer a efcuridade das fom-
bras. O Cabo Olandès, que vio perdidos os reparos defua
mayor confiança, temeo a morte na reíifíencia, & a prifaõ na
entrega,& com cinco companheiros , furtados aos olhos dos
feus (para que não deixaíTem a peleja , & elles ti veíTem tem-
po de executara fuga) fe meteo em húa canoa, & falváraó as
vidas: Efcaláraó os noíTos acaza forte comtibia reíiftencia,
mas não com menos ira, vendo,que a efpada cortava por def-
mayados, mas não por rendidos. Todos acabarão na conten-
da, fem que o ferro ifentaíTe eftado , fexo, nem idade j ajuda-
va-fe a cegueira da cólera, da efcuridade da noite, & entre os
defenfores acabarão muy tos efcravos, & muy tos delles , mu-
lheres,& meninos.Durou o conflido defde a prima noite até
pella manhã. Com a claridade do dia, fe pode diftinguir o es-
trago; & o conhecimento dos efcravos mortos deixou aos
noííbs tão magoados, como arrependidos pella crueldade, &
pella perda . Morrerão nefta occaziáo todos, quantos Olan-
àç.í^s^ Indios,& Negros avia na fortificação [ fal vo os cinco,
que fogirão.] Dos noíTos perderão a vida trez foldados,hum
pardo, & dous pretos,& ficarão muy tos feridos. Gaftou-fe o
dia (que foy o de féis de Janeiro, de mil & feilcentos & qua-
renta & oy to) em recolher os deípojos, curar os feridos , en-
terrar os mortos,& tomar refeição do trabalho entre as con-
gratulações da viâ:oria.

44 Em fete do mefmo,marchou o Governador Henri-
que Dias para o Engenho de Gunhauj aonde achou ao Olã-
dès bem fortificado, & com muy ta gente deprezidio , &não ^^ Cunhah lhe
menos foberbo pella ditofa refiftencia, com que fe avia defé- X}!Kr
dido do Meftre de Campo André Vidal de Negreiros , nos
dias paíTados: Eftava o fucçeíTo frefco na lembrança 3 &a re-
cordação da vidoria o fazia olhar có defprezo,para a callida-
àt^^ numero do poder, com que os noííbs o bufcavão : Via
húa partida de Negros,& outra deIndios,&não os lábia con-

Zz^. íiderar

• outra.

mm

y \ 549 c^^r^^oTo Lusirjno 1648

íiderar emperrados , valentes ,& deftros. Em oppòíição do
Inimigo, fes Henrique Dias alto, & por hum trombeta , em-
baixada ao Framengo, cuja fuftancia era , que íem dilação íc
rendeíTe , & fe Ihefaria bom partido , antes que os feus che-
gaíTem a defembainhar a eípada, porque com ella na níão, né
a obediência os obrigava , nem a commiferaçaó os detinhaj
que acharia teftimunhadefta verdade, no fucçeffo do dia an-
^ tecedente, acontecido nas Guarairasj exemplo , com que de-
fenganadaraente íe poderia aconfelhar fua deliberação 5 que
fe aprovei taíTe com prudência, da efcolha y que em fua mão
punha a fortuna. Perplexo ficou o Framengo com arefolu-
' ção da propofta^ ouvida dos foldados,com efpanto,& dos cf-
cravos, com temor . Nofemblante de todos leo o Capitão o
receo do combate,& o voto da entrega: Dpfconfiou da defé-
fa, & valeo-fe da indufi:ria,efperando,que desfizeífe o tempo
DOS feus,as nuvens do páírao.Com palavras equivocas refpõ-
deo pello Enviado cõ tal làgacidade, que delias fe podia co-
lher a entrega , & a reíiftencia . Conhcceo Henrique Dias o
ardil,i& o intento; &; de hum golpe deuipor terra com todo o
- artefado.No meímo ponto,mandou fegunda embaixada , c5
avertencia, que a não fazia o receo, fenão a piadadei& com o
defeiígano, que o tempo,que dilataífea entrega, o veria gaf-
tarnas dil igencias da Gonquiíia : Tardou com a repofta, & o
Governador Henrique Dias , fem gaftar palavras , mandou a
feus foldados, que toda a lenha , que eftava junta para o fer-
v^iço do Engenho, chegaíTem á fortificação inimiga , em cir-
culo. Executoo-fc com eftranha preíle2ai& fem duvida, que
Volta pura o Ar- ^^^^ ardera^ fe aô tempo,de fe lhe por o fogo ^ não fahira de
rayd'vitoriofo^é' dentro húa mulher Portugueza, cazadacom hum Framengo,
com defpojos., pedindo a Henrique Dias quartel para os cercados: Conce-
deo-lheas vidas^Sc lhe abrirão ás portas. Saquearão os noíTos
; asfazendas, muniçoés,& armas: Arrafáraô a fortificação,& o
Engenho: Leváraõ prifioneiros a todos os rendidos; & aíTo-
lada a campanha , voltarão para o Arrayal , aonde chegarão
em prôfpero fucçeíTo , & fizerão entrega aos Goveroadores
João Fernandes Vieirá,&: André Vidal de.Negreiros,dos ca-
tivos,&: armas, ficando-fecom os mais defpojos.
■: 45 Tinha iiiccedidb ,jque o Senhor Re}' Dom Joaõ o
-í fÉ?i s\' Quarto

■« ') -K'.

Quarto de faudofas memorias, fempre cuidadofo do bem de
feiís Vaffallos, Ce deliberara em mandar ao Braíil húa peiToa,
que com prudência, valor, &arte,conrervaíre os moradores ^"'^^'^J^^^y '^
(^naquella nobre porção da America , que continha em íi as ^^ ueneT^es por
Capitanias folevadas) fem defemparar aos naturaes , nem of- Mepe de Campo
fender aos Olandefes , obrigado de Reaes eftimulos para não General da nojfn
faltar a amizade dos aliados,nem à confervação dos fubditos. ^'^^í'^»^*^
Concorrião na peíToa de Francifco Barreto de Menezes to-
dos os requiíitos,que podia defejar a efcolha,& que avia mif-
tera importância do negocio: Deu-Ihe o titulo deMeftre
de Campo General com fub ordinação ao Governador Ge-
ral do Eftado (que já então era António Telles da Sylva, &
por feu Tenente, lhe nomeou a Phelipe Bandeira de Mello.
Sahio Francifco Barreto de Menezes da barra de Lisboa com
trezentos foldados; munições, armas, & tudo o mais, q pare-
ceo conveniente para o fim pretendido : Navegou até a altu-
ra da Paraíba com viagem favorável , aonde deu nas mãos de
hua armada Olandefa, que com avizos certos o efperava:Naá
foy a prefa fem batalha , nem a batalha fem fangue de húa,&
outra parte^em defenfa do focorro,&da liberdade,o deu Frã-;
cifco Barreto de Menezes neíta occaziâo , porque ferido , o
levarão pri íioneiro para o Arrecifej aonde o tratarão com o
refpeyto devido á fua callidade, á fiia opinião, & ao feu pof-
to,&comorefguardo,que lhes enfinava a importância da jv4-r;/W«; o r^-
pefíba,& a efperança do refgate . Do grilho foube Francifco tivão os olmÀe-
Barreto de Menezes fabricar a Iiberdade5 & em vinte & qua-/^^-
tro de Janeiro defte anno fogio do Arrecife para o noíTo Ar-
rayal, ajudado de hum Framengo , que de guarda , fe fes me-
dianeiro. Foy recebido de todos com notória alegria , & dos
Mcftres de Campo João Fernandes Vieira , & André Vidal
de Negreiros cõ tanto gofto, & refpeyto, que o agafalháraõ,
hofpedáraó, & ferviraó, como fe devia a fua peíToa , Scnãoá
lua fortuna^ o que elle foube eílimar com tal fidalguia , que
fem lembranças de fuperior,os tratava companheiros.

46 Andava por efte tempo entre Framengos, & Portu-
guezes muy valida húa nova vaga, de que em os portos de
Olanda fe preparava húa groíTa armada,empenhados neIJa os
Eftados, a Companhiaj^: os Judeos, fazendo todos o ultimo

esforçoj

i55'o C^ST(!(10T0LUSITjN0 1648

esforço, para que de húa vez fefogeitaíTe a campanha das
Capitanias íblevadaSjOpprimida a rebeldia da potencia. Os

Divulgãje A no' Y^^àAos concorrerão com as melhores náosj a Companhia c6
/ ta de huaçran- ■>, - ti i ' r • \ '

■ dearmada4 >« ^ "^^^^^^ g^^^i «« J"^^^^^ ^om O mayor donativo^ fazia o bra-
hirade oUnda. do defta nova , o poder defta armada tão crecido, qiie na voz
do exceíTo, achava a incredulidade de muytos, baftantes fun-
damentos. Os Governadores João Fernandes Vieira, & An-
dré Vidal de Negreiros (que nenhúa couza refolviãofemo
parecer deFrancifco Barreto de Menezes)defe)avão grande-
mente joeirar a verdade defta f^íi ma, para medir por ella, TfL
prevenção. Alguns Framengos, que heftaoccazião íepaíTá-
raó do Arrecife, teftificáraó a certeza com a individuação do
numero dos vazos, & da gente;& também do tempo,em que
tinha dado á vela, que fora no Dezembro próximo paíTado;
& que os do governo por horas efperavão , que chegaíTe ao
ArrecifeiConfirmou efte depoimento hiia caravela deavizo,
mandada de Lisboa,que tomou porto no Fótal de Nazarethj
acrecentando, não aver duvida , em que a dita armada nave-
gava em direitura ao Braíil, mas que fenão fabia, a que porto
fe encaminhavaj ainda que o difcurfo períuadia a miiy tos fec
V ' a Bahia o alvo daquelle tiro; fopofto que outros julgavão a
con trario, em rezão da armada de Portugal, que guarnecia a-
quella praça,por todas as rezoês formidável ao Inimigo . C5
, .. ... *' juizo mais certo entêdérão os noflbs Governadores, que fem
Governadores^ o <^"^i^^? viuha O Olandès em direitura a Pemambuco;& com
golpeie' fe repa- incançavd cuidado , &prefteza fe aplicarão a prevenir ,&
difpor tudo, o que pareceo neceílàrio , & conveniente á op-»
poíição,& á defeníà: Virão o muy to,que ferviria a feu inten-
, '^ to, ladear a Fortaleza da bateria de duas plataformas contra o
' Arrecife; porém não tinhão artelharia groffa para o eíFeyto
pretendido: Viáo as munições efcaíTas , os mantimentos limi-
tados, a géte diminuida, a occazião forçofa, & o remédio tão
^ difRcil,& tão apartado,que fó na Bahia o livrava húa tíbia ef-
perança: Porque a dilação não fizeííe inútil o focorro,dcfpa-
cháraõ, em treze de Fevereiro, ao Capitão Paulo da Cunha
com requirimento , & fuplica ao General da armada Portu-
gueza (que eftava furta na enfeada da Bahia ) António Tel-
les Conde de Villa-Pouca , para que na informação, viíTe in-

excufiivcl

rao.

^

1648 ' fÃXTEL Lirí{o mi. Ç51

excufavel o anxilio.Foy Paulo da Cunha recebido com hon-
ra, ouvido com piedade,porém deípachado com efperanças.
Fes os mefmos officios có o Senado da Camará , pedindo aos
MiniftrosdellejfoíTem medianeiros para com o Conde ^&
compadecidos para com os naturaes, & vezinhos,favorecen-
do aos Toldados Portuguezes com a interceííaó , & com o ío-
corro de mantimentos, & gados , pois de hua, & outra couza
fobejava tanto na Bahia.Fes tão pouca impreíTaó em aquelles
duros corações a fomiíTaó , & a miferia, que né palavras fou-
berão gaftar com o Enviado: O que nefta hiftoria referimos,
porque a memoria de tamanha crueza íirva de condenar em
todas as idades femelhante deshumanidade.Partio-fe Paulo
da Cunha fem alcançar outra couza mais,que patente de Sar-
gento Ma vor do^terço de André Vidal de Negreiros j como
fe no titulo de hum pofto, levara o focorro de todos , chegou
ao Arrayal.

47 Em quanto o Capitão Paulo da Cunha fe occupa-
va na fobre-dita miíTaõ , navegou a armada Olandefa pellos
mares do Brafil^ & o tinha feito pellos do Norte com diverfa
fortuna. Sahiracom oytenta,& tantas embarcações, & nellas

/"

\

^

Ncfuèga. a. nrmA'

nove mil homens de guerra: Na paíTagem do Canal, a encon-^ ,

p.,,- " r "... . -«<« immiqA com

trou a runa de hua tempeLtade, com tal vehemencia , que ne dwería fortuna

os maftos podéraõ refiftir aos ventos,nem os lemes aos mares,
o deftroço foy de todos, a perdição de muy to3,lki ns,porqae
as ondas os fomergirão,outros,porque na terra fe defpedaçá-
rão, & naó poucos, os que derrotados tomarão diverfos por-
tos pellas coftas de França , & Portugal ^ os que livrarão me-;
lhor,fe encorporáraó com a fua Capitanea,acabada a tempef-
tade, & feguirão fua v iagem até a altura de Pernambuco,dó--
de fe defcobriraò em o principio de Fevereiro : Tomáraã »/~^
porto no Arrecife,com feíTenta náos,feis mil Infantes, & trez cy^^ao ArrecU
mil homens do mar^Sc tantas bandeiras flâmulas, & galharde-y^^ com que náos,
tes, que bem moftravão na alegria , feftejarem a mayor dita, & gente.
no efcape da mayor perda : Entrarão , dando , & recebendo
falvas de toda a artelharia das náos,&: das Fortalezas^ouvidas
dos feus com alvoroço, & dos noíTos fem efpanto 3 porque a
huns,&: outros fe pintava o eftrondo com as cores de fuás ef-
peranças. Vinha por General da armada hum Framengo cha-
mado

m

mM

5^2 C^ST<11WT0 LUSITJ^O 1648

madoVcingocli Prcfídente noSupremo da Companhia, o
qual, tanto que deíembarcou,fes entrega do baftão de Gcne^
ral das armas a Sif^ifmundo Vaneíchoph , peííba muytas ve-

V íes referida n o difcuríodeftahiftoria, como figura principal
defta tragedia.Muy tos dias feftejou o Inimigo a grandeza do
focorro, julgando-fe Iivreda opprefiaó, em que eftava, & íe-
nhor do imperio,que perdéra.Os noííbs,com efperança mais
certa de fahirem com feu intento, ( porque fundada em me-
lhor cauza) fopeaváo o ameaço da tribulação com Tua ordi-
nária conftancia, fiados na rezão, & na juíliça^Sc muy to mais
na fé,com que fabiaó, obrigar-fe Deos a favorecer , a quem
pella defender fe arnica.

48 Náo fei eu, quando a fidelidade Portiígucza fe via
mais apurada , nem, quando a paciência militar mais fofrida:
Nunca o valor dos homens fqbre-fahio mais efclarecido, que '
neíla occaziaó . Tudo, quanto a antiguidade nefta matéria
'Mmhdvel pe> nos deixou efcrito para aíTombro, chegará,quando mais,a fer
ia.de, valar & fombra, do que efcreveraos. Que Vaffallos ouve no mundo,
nmbucams. ^"^ ^^^ ^^^^^ ^ Vaíjallos íe poflao comparar com os mora-
dores de Pernambuco, que no mayor desfavor dos Príncipes,
na mais dilatada perfia das tribulações , perdeíTem fazendas,

defeft imaííem patrias,& ofFereceíTem vidas^por náo faltarem
á fidelidade de feu Monarchaj avaliando por menos fenfiveí,
a perpetuidade do perigo , &: a continuação da perda , que a
obfervancia da lealdade/Digaó-me os noticiofos.em que ida-
de ti verão os Principes femelhantes fervos? A que gente não
alterou o animo, nem a falta do focorro , nem o dcfprezo do
ferviço, nc a defefperação do premio para abrir em fen pey-
to a menor brecha, por onde podeífe entrar o mínimo penfa-
mento de infedilidade ? Que corações achou a experiência
(entre os de todas as naçoês)fempre firmes no ferviço de fua
patria,quando por efpaço de vinte &quatro annos,húas ve-
zes fogeitos á tirania, outras á ncceffidade,Caovernados por
inimigos,& por naturaes) conftantes nos infortúnios , vigo-
rofos nos trabalhos, incançaveis na tolerância ,defprezados,
famintos,&: defpidosj rogados da abundância , & da comodi-
dade, fem que por imaginação claudicaíTem na firmeza de
leacs, mais promptos em dar a vida , que em refol ver a tray-

^

II? 4^ TA^ni.LlFíip FUI, ^55

ça5 í* Refolutos em tomar as armas a beneficio de fua liber-
dade,rem império, que os obrigaíTe ; fem efperança , que os
perfuadiíTe; & fem premio , que os dirpofeffe , continuarão .
hum, &muytos annos, de noite, & de dia comas armas a's
coftasjfem recuzarem as marchas,rem fogircm ás expedições,
fem temerem os perigosj vencendo as oppoíiçoés do tempo,
& da fortuna j nas ditas comedidos , nas defgraças animados,
nas ordens obedientes, nos trabalhos alegres, nos caftígos re-
portados, na difcipHna obfervantes, nas occazioés valentes;
nunca vencidos do medo, fempre vencedores do perigo:
Nos encontros mais arrifcados , íem terem conta com o nu-
mero , a tinháo fó com a honra; avahando o poder inimigo
por contrario , mas não por deíigual,olhavão o exçefíb para
o vencer, nunca para o recear. Que valor foy femelhãte a feu
valor ? Julgava fua oufadia , que nem as bailas dos inimigos
ferião, nem fuás efpadas corta vaõ , tão fenhores do próprio
perigOjSc do poder alheo,que nunca a deígraça os achou fem
animo, nem o infortúnio fem ordem. Em fim,que em todas as
idades, & a todas as nações do mundo podem fervir os Per-
nambucanos de exemplo na fidelidade jU o valor, na conftan-
cia, na difciplina, & no fofrimentoj que íião importa,que os
antigos foíTem primeiros no tempo, como fiquem excedidos

da ventagem; pois hecerto,quc não adianta a idade, fenã o o
mericimento.

49 Nas circunftancias da occaziâo prefente,fe nos eílaõ
vindo aos olhos as provas defte argumento. Aquella efperan-
ça (fundada na rezâo, & na juftiça , com que os moradores íe
faziaõ certos no focorro da armada Portugueza ) cortada do
defvio tanto á vifta dos olhos,que fidelidade não deílruiria?
Por o focorro á vifta da neceífidade , para faltar com elle na Provada a golpes
occaziâo, fenão he defprezo da ruina, parece gofto da defef da fortuna ^dr de
timação . Em tanto o VaíTalIo eftá obrigado ao ferviço do defprez.o.
Principe,em quanto o Príncipe trata da confervação do Vaf-
fallo. A fuperioridade he contrato, có mutua obrigação,pro-
metida com reciproco juramento. Chegara a nova da pode-
rofa armada , com que vinha o Inimigo para deftruir , & aca-
bar com todos os Pernambucanos , & fenhorear-fe das terras
da C oroa de Portugal. Deliberaõ-fe em as defender ; pedem

Aaa focorro

'I i,'i

m

m

554 C^S7%I0T0 LUSIT^JSIÇ 1648

focoiTO aMiniílros, q feni cufto o podião dar, & onegáraõ,
que conceito a viáo defazcr? Náofei,quepoíra aver impa-
ciência mais defculpavel , nem mudança menos deílcaL Sem
culpa dos Cabos fe entrcgaõ as praças,que fe confideráo Tem
focorro. Que fera, feas deíamparar odefprezo ? Naó eftá
obrigado á temeridade, quem fatisfaz com obedecer áre-
záo. Entrou a armada Olandefa pella barra do Arrecife, for-
midável a toda a coníideração,pella opinião,& pello numero
da genteja deíigualdade de hum,& outro partido,aconlelha-
va na fogeiçáo o remédio, & contudo , nem os Pernambuca-
nos faltarão á fidelidade, nem variarão na conftancia j nem o
defprezo os defconfiou, nem o perigo osdiíruadio,nem o de-
femparo os rendeo: Antes mais que nunca leaes, conftantes,
& valerofos os vio aquella guerra: O difciplinado, & o defti-
niido,moíi:rava no rofto de qualquer Toldado o alvoroço , c5
que defejava ver-fe na occazião: Os Governadores aíegreSjSc
"vigilantes difpunhaó, & preveniaõ com defafogo , & foçego
tudo, o que á vitoria, Scádefeníà lhes pareceo necefíàrio,
vViraõ, que quanto mais íe eftendião os braços de fua limita-
da potencia, tanto mais fe adelgaçavão,& perdiaó o vigor j&
que curtos,& unidos ao corpo do Arrayal , ficariaó mais ro-
buftos,& mais preftes para ferir, aonde o pediíTe aoccaziãoj
mandarão arrafar todas asEílancias, & tirar todos osprezi-
dios dellasj& aíTi mais a Infantaria, q fe aquartelava em Igua-
' Acodem âdefen- raçíi, Páo Amarello, Juguaribe, Paratibi, & Villa de Olindaj^
fá no âefumfAYo com refoluta deliberação de exporem o negocio a hum lati-
do focorro. çq ^j^ fortuna, oíFerecendo batalha ao Inimigo, quando,& a-

onde a quizeíTe dar. Decretarão, que nenhum morador paf-
faííe os termos da Villa de Sirinhaem , & que entre ella , & a
Moribeca,fe fizeffe o alojamêto mais diftáte.Mádáraó,que fe
eonfervaíTe a Fortaleza do Arrayal , & a da Bataria , tirando
defta a artelharia, que tinha de bronze , para a Fortaleza do
Pontal de Nazareth,queneceílítava delia: Cõ ordem ao Ca-»
bo,que todas as noites dormiíTe fora, não deixando para fua
guarda, mais que as vigiasjmas com tal cautela5que o não en-
tendeíTe o Inimigo.

5 o Era a campina da Várzea a de mayor recheo , pel-
lo numero,& callidade dos habitantes , como também pellas

fa-

'^

fazendas, &:cabedaes;& por eftarezáo mais cxpofta ácobi- ^
ça, & á invazão do FramengOi& que pella condição de aber- ^iff l2lL
ta, & vezinha nos poderia obrigar (em cazo , que o Inimigo retirar os mora-
a aíTaltaíTe^a dar-Ihe íocorrojcom o perigo do Framengo nos dotescircunvcTj'
di vidir5& por atalhar a contingência de femelhante dano , fe ^^^^ í'^^^ ^ -^^Z
mandarão retirar todos os moradores delia, para o Arrayal. ^'^^
Obedeceo-fe em todas as partes á ordem,& uniraò-fe ao cor-
po do exercito Dom António Phelipe Camarão, Henrique '
Dias, João Soares de Albuquerque, Cofme do Rego Barros,
An tonio Borges Uchoa, com toda a gente de feus prezidiosj
& affim mais, todos os moradores da Várzea , deixando arra-
iadas as outras Ei^ncias. Com pratico difcurfo antevião os
Governadores, que o Olandès, fahindo do Arrecife,poderia
encaminhar a marcha de feu exercito , ou a Nazareth , ou á ,^
Moribeca,ou á Jangada,& que para eftes incidentes eráo ne-
ceíTarias eftas prevençoés.Defpediraõ vaírios officiaes da mi-
lícia, com apertadas ordens, para reconduzirem todos os Tol-
dados, que pella campanha andavão licenciados ,& fogidos;
& para fazerem recolher ao Arrayal todos os moradores do
reconcavo,que podeíTem tomar armas,com bandos públicos,
de perdão Gèral para os homi2Íadosi& graviífimas penas pa-
ra os remiíroSjSc rebeldes.Executaraó eftes Miniftros o man-
<3ato com tanta fagacidade,& promptidáo,que nos primeiros ^ retonãuí^ir &}
dias de Abril fe fes no Arrayal moftra de toda a noííà gente, f^^^^^^^^o numc^
^ fe acháraó trez mil & duzentos homens de peleja, a faber, '"*' ^^^°^''^'
mil & oy to centos do terço de João Fernandes Vieira ; fete ""'""
centos & cincoenta do terço de André Vidal de Negreirosj
trezentos & cincoenta do terço de Dom António Phelipe
Camarão; trezentos do terço de Henrique Dias . Entrando
neíla conta, os que fica vão nos prezidios.

51 Não perdia o Inimigo tempo, porque todo, o que
tirou ás correrias,& aíTaltoSj^deu ao exercicio das armas:To- oecupacoh dolm
dos os dias exercitava nellas os foldados , procurando , que mJ, *
«os feus fe igualaíTe a deftreza, & a difciplina ao numero j &
além de muy tos, fe fizeífem práticos: Efta era toda a occu pa-
ção de Sifgifmundo, & de feus Cabos , para aumentarem fua
potencia: A dos Confelheiros do Supremo,por outra vereda,
bufcava o mefmo fim ; Excogitaváo enganos, arteficios, & a-

Aaa2 parencias^

párencias ,córn que defraudar a dos Portugaezcs. Sahiraõ
com hum ardil proveitòfo em mitro tempo , porém no pre-
fénte defprezado com a expèrktieia dê cavillôzo . Forma-
rão hum ampliffimo peídâõ , que copiado innumeraveis ve-
zes mandarão efpalhar por èodâs as partes , pello qual pro-
metiãoefquecimento de culpas, & lembrança de prémios,
'^^ pàrá todos aquelles,qtíerédulEÍdos, foíTem ao Arrecife em
termo de dez dias tomar pâíTa-portes de aliados, & juramen-
to de fieis.Entédiaõ, que o temor de fua potencia faria obrar
í) ardil com efficacia : Paflbu o tempo, & virão não fer de ef-
feytb algum, â diligencia : Tiverâo para fi, que fora defcon^
Fuhlkat os do Co fiai1ça,& ííâo defprezo , porque fe fizera geral a promeíTa, &
verm hum fer- não fâlâva cóm peffoas determinadas . Mudarâó-lhe a forma,
daõ gerai ^ dèntro em Gartas,que maiídáraó a particulares fu periores,

remetéíàó o perdaó, & em termo certo pedirão as repoftas.
Eftampáremos aqu i as formtílas^ de algúâs^traduzidas de Fra*
tnengoemPórtugueZy^^'''^*'^^*''"^ >6i.ufariwq^ ^

5^í A càrta,que efèreve4ô j & mandarão por modo de
^"off/sTá' ètíibàikâdã(inclufanelta o perdão) aos noíTos Governadores

Cãirta.

*ve aos

hos com ãe. J^^õ Fernandes Vieirav& André Vidal de Negreiros, conti-
, nhà éftãs fòrmàes palavras. Por ordé particular, q tivemos,
mádàda a NóSypellos Pôderofos Eftados Geraes, S. Alteza o
' ''^f'\ ^ Principe de Grãge, & a Geral Outrogada Cópánhia Occidé*-
' ' "" ' ^^ tâl ja Nós leeinetida cõ o poder já chegado,& outro,q eftamos
, efperando^^àta proceder cõtra os q fe eximirão do noíFo do-
,, miriiOjCóriforme a dita ordé, (;á outra vez a todos intimada)
j, efe q mandão ôs ditos Senhores q a qualquer peíToa de qual-
j j quer nação^eílâdo j& cód i ção4feja5outroguemos em feu no-
, Me perdaõ gérál de rebelião, deíbbediencia, confpiraçaô, &
, qualquer outro delido, ainda q feja hua, & muy tas vezes co-
metido Em cõf^rimento do q,ò temos affi cõcedido,& publi-
/^ u, cado5& o notóamos a VV.Senhorias có ínfali vel certeza,de

a;^. '^ tado^a nofla parte fera côprido exaâ:améte \ & fobre efta
declaração efperamos féis dias ,pella repofta de VV. Senho-
" rias.Feita em o noíTo Cóçelho do Arrecife cm dous de Abril
de mil & feifcentos & quarenta & oyto. hao 'B<lejlrater.

" Benrque HafntL TedfoíBakes. ^eíloSecretano/ofiÕl^afhehes^
Forma do^erâaõ 53 :Ifícluíà 5 ncfta Carta, vinha km copia do edital^

^éral. LhiUX • Cu)o

164^

'^ÃXtEylLIV^OVlU.

i'>r

cujo teor era o feguinte. O Prefidéte,& mais Cõfelheiros, »
que rcprefentaõ o Supremo Governo nas terras cóquiftadas, j>
Sc por conquiftar neiie Eílado do BrafihEm nome, v da par- ?>
tedosllluftriífimos, altos, Scpoderofosfenhores osEiiados ?>
Geraes das Províncias unidas , o Senhor Príncipe de Orange, jy
Si Geral Outrogada Companhia das índias Occidentaes ; a «
todos, os que eííiverem prefentes, ou ouvirem lér, faude. Fa- ?>
zemos faber, que por quanto a noíTo cargo elH a reAauraçaó n
do miferavel ellado deíiia terra ; cauzado pcllo levantamento >,
dos moradores de Pernambuco , aííi Portuguezes , como ou- )>
tros, que com elles fe uniraó , todos os quaes, contra o jura- )>
mento da fidehdade, fe apartarão da nofià obediência , & até ,1
agora vivem protervos na rebeliaójcauzajporque tem encor- j,
rido em perdimento de fazendas, & v idasj &em mavores pe- ))
Kas pellos enormes crimes,& exceífos, que tem cometido có- ),
tra a noíTa naçaó, durante o tempo defte alevantamento ; & ?,
não obltante o fobre-dito, a clemência dos Senhores Eftados ,>
Geraes, Sua Alteza o Senhor Príncipe de Orange , inclina- ,»
dos á humanidade, & Nós ao bem, Sc confervaçaó dos mora- j,
dores deftas Capitanías,em obfervancia das ordens recebidas „
£antes de íahir á campanha a potencia de noíTas armas, Sc por „
evitar as extorçoés , que confígo traz a guerra , em dano das „
gentes,& das terras 1 de novo offerecemos geral perdaó de „
todos os crimes, & exceífos cometidos, de qualquer género, „
Sc callidade,q fejaó (excepto a peíToa de Theodoro Vanho- „
och Eftrade) a todos aquelles,que dentro em dez dias deíif- „
tirem da rebeliaó,fobmetendoíJe a hofíb domínio com pro- „
t«íi:o,& juramento de fidelidade, acudindo,no dito termo,a „
pedir paífa-portes , Sc aceitação de fieis Vaírallos,có os quaes j,
íe faraó capazes de os tomaremos debaixo de noíía pro- „
tecçaõ,& amparo para os conferváremos cm fuás fazendas,ef- „
tados,& honras;& para os defenderemos em paz,& juftiça de ,^
todos aquelles,que os quizerê opprimir, vexar, ou qualquer „
outro agravo fazer j na forma , em que o fazemos a todos os „
VaíTallos dos Eftados^para o que fe aprefentaráó diante nós, „
ou diante noíTos Comendores (pellas freguefias de feus def- ,,
triâ:os)todas as peíToas de dezafeis até feíTenta annosj& a to- „
dos, os que aífim o naó fizerem dentro do dito tempo , ave- „

Aaa3 mos,,

mm

J!>etermina-fe a
repjla.

' RepoHa, dos Go-
vernudores IoaÕ
íernxnàes Viei-
ra^ & André Fi'
dd de Negreiros.

5?

^^g • CAStf^Oro LUSITANO 1648

mos por cxcluidos defta clemência , & graça oíFerccída por
Nós, & em nome dos muy Altos, & Poderofos osfenhores
Eftados GeraeSjSua Alteza, & Companhia Occidental. Mai*
declaramos, que findos os ditos dez dias ufaremos do poder,
que por mar ,& terra temos; o qual para efte fim agora nos he
mandado,& ainda para o diante ^fperamos, que venha, além
dos foldados, & auxiliares, que de antes tínhamos para cafti-
gar, deftruir , & aíToJar a todos os rebeldes , fem diftinção de
peíToa, fexo, nem idade, mandando ajuntar os índios Tapu-
yas,& Pytyguares noíTos confederados com geral licença,pa-
ra que poíTaõ profeguir na extinção de vídas,&fa2endas,fem
detença, termo,nem diflimulaçaõ algúa. Proteftando da noí^
íà parte,diante de Deos,& do mudo , Teremos innocentes em
todas as miferias,calIamidades,mortes,deshonras,injurias,fur-
tos, & exorbitâncias, que refijltarem de fenão aceitar o per-
dão ofFerecido pornoíTa clemência, & piedade. Dada era
noíTo Concelho, no Arrecife de Pernambuco , a dous de A-*
bnl de mil & feifcentos & quarenta & oy to annos,

^tefidenteP^ángoch,

^4 Viraõ os noíTos Governadores Joaõ Fernandes Viei-
ra, & André Vidal de Negreiros a carta , & o edital do per-»
daõ. Comunicarão có Francifco Barreto de Menezes, o que
fe devia fazer , & aflentou-fe , quedeffem conta ao Sargento
Mayor António Dias Cardozo,& aos Governadores de Mi-
nas, & índios Dom António Phelipe Camarão , & Henrique
Dias; & defcutida a matéria, íe de terminou, que Joaõ Fernâ-»
des Vieira , & André Vidal de Negreiros , como cabeças do
€xercito,& dos moradores, refpondeíTem á carta . Dom An-
tónio Phelipe Camarão , pello que tocava a todos 0$ índios;
& Henrique Dias, pellos Negros, que refpondeíTem particu^*
lares cartas dentro do tempo cófignado;comunicando-as pri-
meiro com Francifco Barreto de Menczes.Tomáraõ tempo,
&refpondéraónefta forma. Repofta dos Governadores
Joaõ Fernandes Vieira,& André Vidal de Negreiros.

.5 y As artes,de que VoíTas Senhorias fe valerão fempre,
fa5, as de que ufáo agora , com a difFerença , que no tempo
paíTado ferviaó ao engano , & no prefente ao avizo , porque
aquellaconfian^a,queachavaónafingilezajdçftruio já aca-

villaçaõ

^

164.^

fJílTE l LW%p VIU.

villaçaõ de fua malícia: Ao mais bruto animal enfina a natu- '*
reza a conhecer o laço, q algúa vez lhe tirou a liberdade,abo- '*
minando o cibo , com que o defeja perfuadir a aftucia do ca-
çador. O Piloto menos experto fabe fogir do baixo , aonde
húa vez tocou , por mais que o efcondaõ as aejoas : Com efta '»
avertencia fe refponde a efta embaixada, & nella nos conhe-
cerão VoíTas Senhorias eníinados de fua mefma diligencia.O ^^
ultimo ponto de feu decreto íèrá o primeiro de noíTo reparo, „
& o verdugo de feus enganos. Bem moftra a pouca fé, que té x» ^
€om Deos,quem fe vai de Deos para faltar á fé . Que credito '♦
efperaõ, dem a fuás palavras , aquelles mefmos homens , aos *'
quaes nunca guardarão palavra , nem fatisfizeraó promeíía? „
Mal negocea,quem imagina, que com a lembrança das ofFen- ?>
fas obriga. Quem nunca tratou verdade, como há de perfua- '>
dir,que naó foy fempre métirofo?Se todo o mudo fabe o fal- '*
íificado de feu trato, como eíperaõ,que o mundo os teftimu- ^|
nhe verdadeiros.^ Em que parte delle deixou de fer cavillozo
feu eftilo? Em que tempo compriraõ, o que juráraó.^ Dizen- «
no as gentes a gritos , de efcandalizadas : Neftas Capitanias
com mais crecido brado , porque nellas com mais defpejado
cxceflb. Com lagrimas de fangue choraó, Cunhaíi, Rio Grã- \\
de, Várzea, Ipojuca,& quafi todas as povoações defte recori- >»
cavo,a íingileza,com que créraõ fuás promeíras,& o rigor,cõ
que pagáraó fua incauta credulidade 5 & quem a todas as ho-
ras ouve o laftimofo gemido, que acufa , náo pode em algiia, ,,
dar aíTenfo ao afago, que engana: Se feus defejos lhe perfua-
dem outra couza, he fem duvida, que aíii como nos querem »>
deftruir a liberbade, nos querem também tirar o juizo ; & fó
tirando-nos o juizo,nos mudaráó a vontade.Tem para íi,que
os moradores deita Capitania faõ troncos fem fentimento ^i
para as chagas, fem ;uizo para as curas ^ Naó fe cura5 as feri- »»
das com o mefmo ferro,que as abre. Porque não podem exe- »»
cutar a vingança, efcondem aefpada debaixo do perdaó ; &
para que nos cufte mais a pena , nos querê véder pafía-por- "^
tes do tormento. Se nos deíejaò beber o íangue , a que fim
prometem confervar-nos a vida,^Se nos querem roubar as fa- »»
2endas, como fe offerecem a guardar-nos os bens ? Chamão- "
nos para a injuria cora a voz da honra? Clemência chamaõ a '*

Aaa^ im-„

5 ^^ QAST(!iloro LUSlTMa t ^48

" impiedade? Nunca mais cega fua paixão. Que clemência, ou
" que favor há de efperar a ofFença, fe experimentou no fervi-
jj ço exorbitantes tiranias ? Quem nos maltratava fogeitos, co-
5, mo nos há deeftimar rebelados.^ Mu}/ to há,que pafíbu o tem-
»' po, em que oarteficio Olandésconquiftava com palavras,
" porquehámuytOjquepaíTouotempo, em que acandideza
^ 'I catholica fe fiava de herejes, imaginando homens , aos mef*
„ mos,que a Igreja em todo o tempo intitulou feras,
♦» 5Ó Não achatnos menos disformidades nos ameaços,que
" -nas promeflas: Reconhecemos o valor , & difciplina da na-
" çáo Oiandefa, avaliada nefte feculo pella da mayor opinião,
j^, Certos eftamos na potencia de fuás armadas, & não fe nos ef-
„ conde a do focorro,quc condu2io , a que agora eílá furta na
" barra deíTe Arrecifej&: com tudo, eftamos tão longe de a te-
" mer, que choramos com igual laftima o infortúnio , que no
^* Canal a defraudou , pella gloria , que nos deminuio. Efperi-
9, mentado tem os íenhores Olandefes, que a efpada Portugue-
9> za não neceííita de fe meditjpara cortar; & que o braço deftes
" moradores aonde não chega com a força,chega com o defejo;
" verdade relatada, & ouvida por tantas bocas , quantas fa^ó as
„ feridas de feus contrários j& quando em algúas falte ;á a voz
9) do fangue,para o dizerem,não a verá poucas, qué o digaõ por
9» íinaesrQuanto mais, que reduzido noíTo poder a hum corpo
" (como eftá hoje) igualamos a Voífas Senhorias em o numero
^j da gente , & os excedemos muyto em callidade, valor,& pra-
„ tica jcom aquella diíparidade,que fe acha em defender o pro-
5» priOjOU cóquiftar o alhcoj em fervir por paga, ou pelejar por
'» honraj em defender a vida,ou em vencer o foldo. No provi-
" mento das munições, cõ teremos menos, eftamos mais fobra^
,^ dos,porque uíàmos mais efpadas, que mofquétes , & em nof-
9, fas mãos, obra mais o ferro, que o chumbo.
" 57 Emquantoaosauxiliares,dcqucVoflàs Senhoria»
" fazem tanto cabedal, de melhor partido eftamos com os pou-
^^ cos,que temos, do que VoíTas Senhorias nos muytos, que cõ-
5, tão^porque a multidão dosbrutosfa^ mayor carruagem,mas
»> não faz mayor exercito- bufcaráô as occazioês para o dei J3o-
'* jo , mas não para a batalha ; & bem fc pode defcartar delles,
9, 4"^^ ^^^ ^^o longe da vidloria.Efta nos promete hil Deos, a
» quem

quem fervímos , cu)a ley guardamos Icm erros ^ eúja honra" »>
defendemos com zelo; cujos agravos eíperamos çafl:igar,ço- >»
mo Mmiftros de fua juftiça; a qual terá em Teu favor , quem '»
defende o próprio ; & contra fi, quem tem roubado , 3^ q^er '^
roubar o alheo . Frívolo he o pretexto de querer cobrar o íi
divido: Se VoíTas Senhorias diíicrem , que alguns partícula- ji
res, lhes devem algúas quantias de dínheíro,pQnhíi'fe a cauza »
em juízo,&fe lhes pagara o julgado. Nunca as armas dçraó )i
bõa rezão do dereitorFogir á fentença da ley, para a efperar )>
das armas, he extorçaó da vioIencia,naóheeftilodajuítiça: »
Se Voflas Senhorias quizerem litigar o pleito , neíle tribunal v
nos acharáó conformes,& fora delle,taõ eneótrados, qi?e def- }>
de efte ponto os efperamos em campanha com fprça§, & ani- n
mo, para darmos húa, & muytas batalhas , Sc nellas as v idas j>
pella cauzai& fe nos faltar a viâ:oria,não nos há de faltar ter- j?
ra para as íepulturas, nem honoríficos epitáfios para a memo-
ria^que fabem as idades eternizar.o jiordejdc qugm fabe mor- m
reremdefeafa da pátria. Arrayalemfetede AbrildèJEniJ & >i
íeiícent os & quarenta & oyt04itu( ouú Kí^ávjííú ií^^-m^ijí^^ i>
Os AfeHresdeCampo^ Governadores 'daAcchma^^QÂ^Mèrdiide» j?
[iiloao Fernandes Vieira, André Vtddds MegKmQs,., i ji jjj ^
.5S RepoíkdeDom António PhelipÊCâiaiaTO,: Tu- ^»
do, quaníjo Voffas Senhorias pertendem conquií^ar com fo- ^^'H ^^ P".^
•lhas de papel, lhes avemos de defender com as das efpadas ^ & \clm.rao.
para quem as fabe empunhar, como fabem os meus folgados,
^em a fer rediculos feus perxloés,& fuás promeíTas; Ninguém "
quer dever o mefmo,qae pode cobrai'. Éftes feus papeis, a- '
(Chados, como perdidos,mais tem de pérdidos,d;Q qiíiiÇ t^ii? de
achados; Quem vir tanta efcritura , ha de imaginar que Vof-
fas Senhorias com ellas,querem fazer renovação de prazo era.''
terra, em que não tem domí nioi& neíie cazo erraõ os termos '•'
^udiciaes, porque ofFerecem a pençao^eomo en!fiteuit£is,& pe-
dem obediência, como fenhorios. Outro erro: pizem , que a *
Companhia Occidental heoiatrogada \ & outcog^ó-nos íua '*
companhia.^ Poderá a Companhia de Olanda fer companhia '*
das Indias^porém os meus índios ©ftão muy longe 4^ Compa- ^■
■nhia de Olanda : Senella fe achaó os índios Tapuy^s ,^ Py- "*
tiguaícsj he,porque faó de hijamefma,man.ada^Saí.V2igens, & "

wfmmm

r\

tomo reffoâe
HeYifitDiat.

3»

5>
9>

9>

^éi c^sr^oro lusitjno

Herejes; Sc com hua mcfma cegueira deíacataõ as Imagens de
Noílb Redemptor,& de íèus Sãâos, o culro da Igreja, Sc feus
3, preceitosj & não faz muy to em faltar á fé humana^qucm falta
« á Divina.Os meus índios faõ fieis a Deos,& leacs a íeus Prin-
cipesi &: com efta luz, taó fora eftaó de faltarem , ao que de-
vem, que fó devem arguira VoíTas Senhorias do pouco juí-
zo com que falão, pois lhes fazem proteftos , com os erros de
9» Proteítantes.Falem-lhesVoflas. Senhorias em fua lingoa,pois
" íabem,que à occupaçaó das armas lhes náo deixa tempo para
" as letrasj& tenhaó entendido, que cftes papeis nas fuás mãos^
„ não tem mais preftimo,que para fervirem de cartuxos a feu?:
9> mofq^etes,& com elles determinaõ, & prometem dar a Vof-
9» fas Senhorias a repofta na campanha j& a minha he, que aca-
*' bem de entender, que para noíTos defejos faõ feus ameaços
j,eftimulosi& quanto mais fua arrogância os faz prefumir de
»} foldados, tanto mayor faz noíTa opinião , & nofla efperança:
5» Toda a mayoridadedo vencido,cede em gloria do veneedor*
•' Naò dilatem a batalha, íe eftaó certos na viéloria y(\úe as im-
" paciências da cólera não fofrem as dilações da íléjma j &me
„ eícandaliza a pouca conciencia,com que faltão á obrigação
M de fervirem á Companhia Occidental, que os conduzio tom
" trabalho immenfo, & os fuftentá com difpendio exceífivo.
" Dom António Thelipe Camarão Governador dós Indtos, - %
„ 5 9 Repofta do Governador Henrique Dias. Efta va;-
9» riedade,&: multidão de papeis , que os meus foldados achaõ
»> pellos caminhos, & que VoíTas Senhorias mándaó deitar nel-
'* les, faõ folhas, de que fempre conhecemos a flor. Não lhes tê
jj cnfinado a experiência, que o negro , nem recebe outra cor,
j, nem perde a que tem.^ Para que gaftaó fua tinta,pintando feu
»» defejo neftas cartas,fe as cartas fe daõ a conhecer pella pinta?
'* O que Voífas Senhorias imaginão foborno,neftes cartaíes de
" perdão, he para cada hum dos meus Negros , quartel de defa-
„ fio.Mataríe-haó facilmente,com quem lhes falar em domínio
99 Olandès: Com toda fua rudeza,não deixarão de reparar , cm
" ^"^ gc*^^^) 4"^ ^^ toáo perdeo o caminho da graça , ofFereça
^ tantas graças,& perdoes. Matéria , de que todos fazem rifo:
„ Já VoíTas Senhorias poderão ter alcançada de fuás inclina-
„ çoés,que nem perdoáo a Framengosjnem de Framengos que-
rem

^

??

5>

164S (pJl(r£ 1. L1V\0 VIU. t^6^

rem perdaõj Sr defte propoííto ningiiem os há de tirar, porq
bafta, ferem negros, para ferem emperrados: Olhem, que faõ
negros , & que nem todos faó boas peças. Naó fe canlcm có ■>•>
efta invenção de enganos,porqiie lhes não há de fahir a forte n
favoraveljfe de entre elles,lhes fahir cm pretojque eíles meus i)
morenos naó tem por bóa forte, fenáo, a que fazem nofan-'>
gue Olandés ^ Sc eil:ejão certos , que nenhum de nós per- '>
deo a cor com feus ameaços , porque os coníidcramos de '> "
olanda j & menos com fuás promeílàs, poique as de olan-'>
da, não tem aveço , nem dercito . De quatro nações fe com- '>
põem efte regimento . Minas , Ardas, Angolas , & Crioulos: '? y^
Eííes, faó taó mal criados, que não temem, nem devem:" \.
Os Minas, taó bravos, que aonde não podem chegar com"
o braço , chegaó com o nome . Os Ardas, tão fogofos, que "
tudo querem cortar de hum golpe : Os Angola^, taó ro- "
bufios, que nenhum trabalho os caníàí Coníiderem ago- '>
ra,fe romperão a toda olanda, homens, que por tudo"
rompem . O poder da gente , armas , & munições, que Vof- "
íàs Senhorias repetem para lhes cauzar temor, fervio de "
os alvoraçar. A crueza dos Tapuyas não podia fazer im- "
preífaó em foldados, que por natureza faõ nus, 3^ criís. "
Se VoíTas Senhorias confulráraó comigo efta induftria, de "
que uzão, efcuzára-lhes a diligencia , com os avertir, que "
eíta gente não he, a que fe leva por arte, & aífi lhes a- "
confelho, que fe valhaóda força ; conviden-nos com hâa "
pendência, que pello intereíTe de íe verem veílidos, &"
calçados , fe meteráõ nella a todo o rifco ; más também "
lhes aífeguro, que fem os matar a todos, nunca fe haòde^'
verhvres de contrários. »

Henrique Vias GoVemador dos ISJe^rns.
60 Foraõ remetidas eftas repoftas ao Arrecife por
hum Enviado, que as entregou nas mãos dos Superiores
daquelle governo : PaíTadas pellos olhos , as não fabia crer
o juizo : Naó fó encontravaó fuaefperança com odefen-
gaao , fenaó também fua opinião com o defprezo. Con- ,
fideráraó a ifençaó, & o defenfado do eftilo , & affentá-^J r^ remeti Tr.
raó configo, que a femelhante confiança não podião íú- tusrepoJlASãoAt
tar fundamentos folidos, (a elles Olandefes occultos) ou reafs,

fa-

5^4 QAST^^oro LVSITAKO

fabricados pella trayçaô , ©u pello focorro: Para hua, &
outra fofpeyta achava feu difcurfo motivo na vezinhan-
ça de nofla armada, & na fogida de Francifco Barreto de
Menezes 5 porque fenão perfuadiaõ , que fem nova cauza,
perfeveraíTc noíTa conflancia á vifta defua potencia . Muy-
tos dias, os teve indecifos a fuípenção , até que cer-
tificados 5 de que da noílà parte não avia noyi-
vidadc , íe refolvéràô em íahir a campo.
Em quanto fe apreftaó para efte fim,
defcanfará minha pena, pois o
^ damos ao oy ta vo livro

deftahifioria.

PARTE I. LIVRO IX.

RIBUNAL do poder he o das armasí

Tribunal da rezaò he o da juftiça. A

huiTij&outro fe reduzem todas as dif- "...

ferenças dos mortaesjporque todas a-

cabajou a efpadajOU a pena.Nos pro- J guerra, &aju^

çeíTosdas armas, trabalhão muytos/^f'* ^ff^ trihu^

officiaes3nosproceíros daiuftiçaaiaó """''l ^'^ 'i''' fi

poucos miniftros. Em o das armas, fentencea a fortuna , em oí'""^'^'^' ^' '^^

da juftiça^ a ley. Ao melhor pleyto fe chama vencimento, aífi
na campanha, como nos tribunaes. Trez annos avia,que Por-
tuguezes , & Framengos Iitigava5 fobre o dominio das Capi-
tanias folevadas,como fe tem moftradono difcurfo defta hif^
toria, com aquellas côtrariedades de enveftidas, aíTaltos, cho-
ques, combates, correrias , ardis, & pendências , de que cada
húa das partes fe pode,& foabe aproveitar^ & de que fe com-,
põem o proçeíTo da demanda,como fe vé na matéria dos qua-í
tros livros precedentes, avendo muyto poucas occazioês,em
que a efpada Portugueza deixaíTe de provar a melhoria de
fua cauza. Agora nefte, & no livro feguinte veremos os au-
tos concluzos,& fenteceada a cauza em duas inftancias,como
o foraõ duas batalhas campaesj confirmada a fentença por híi
acordaõj & executada por liquidação , &poírei condenados
os Framengos nas cuftas. •.,'. ^

,^'2; No mais vivo emprego das prevenções , com que o
Inimigo fe difpunha para a conquifta , & os noííbs para a de-
fenfa,chegou ao Arrayal de Pernambuco (conta vaõ-fe quin-
ze de Abril) hum correyo mandado da Bahia pello Generat
da armada Pveal António Telles Conde de Villa-Pouca, corít-
y- -■ Bbb húa

t^66 c^sr(í(ioro LusiTjvõ . 1548

hua ordem aos Meftres de Campo Joa5 Fernandes Vieira, &
André Vidal de Negreiros, para que entrega ffem o governo
das armas a Frãcifco Barreto de Menezes, & lhe obcdeceíTcm
como a feu Meftre de Campo General,nomeado, & provido
por fua Mageftade, dizendo , que fopofto, os accidentes lhe
íiifpendéraõ o exercicio , náo lhe derrogarão a mercê , que o
dito Senhor lhe tinha feito, quando o mandou fervir aquellc
cargo.

5 LimitadiíTima he á cõprehençaõ dos mortaesiObraõ
pella informação dos fentidos, façis de enganar de qualquer
aparência, & de qualquer diftancia ; & fe no prefente obraõ
com efta limitaçaó,que fera nos futuros, & nos longes,aonde
nada fe vé? Húa hora de tempo bafta para trocar a fuftancia
dãs couzas,& dos cazos : Rezáo , porque hum mefmo decre-
tò,que em hum dia,& em húa parte fervio ao reparo , cm ou-
tra parte, & em outro dia da forças á rui na, Obcdecelo, quã-
dodeílroe, he vingança , náo he obediência; embargaIo,he
fidelidade ,' náo he rebeldia . A prudência lénas ordens dos
Príncipes o fim , & nâo a forma j & o fim do Icglflador he o^
útil, náo he o perniciozo. Fov efta occaziaó o eipelho, cm q
efta matéria fe vio mais clara. Concorriaó na peflba do Mef-
tre de Campo General Francifco Barreto de Menezes pren-
das de call idade, valor,& prudência, para o luziméto de ma-?
yores poftos:Qi^iando Sua Mageftade o defpachou naquellc
governo,entendeo,que a necefíidade o pedia:Quando o Có-
de General o mandou obedecer , não vio , que o eftado das
couzas o recuzava. Por horas fe efperava , que o Inimigo fa-
hifíe a campanha, com a mayor potencia de fuás armas , que
tinha vifto o BraíiltPara oíferecer,ou efperar batalha com târ
tadifparidadedepoder, era ncceíTa ria toda a difpofiçaó da
pratica,& da induftria , que fó fe acquire com a experiência^
conhecendo có ella a deftrezá dos cabos , a ouzadia dos foi-
dados, o génio dos naturaes,o preftimo dos moradores,as c5-
diçoés do terreno, o modo de pelejar do contrario, as armas,
de que uzava o Inimigo,& outras circunft anciãs, que averti-
das a judaó, & ignoradas danaó ; nellas efta vão taõ prefentes
os Meftres de Campo João Fernandes Vieiraj&Andre Vidal
de Negreiros , como criados naquella guerra , & exercitado»
r. < nella,

1648

fJ^TE L L1V\0 IX. 5 ^y

nella, por erpaço de cinco annos. De tudo eflava falto o co-*
nhecimento doMeftre de Campo General Franciíco Bar-
reto de Menezes, pello tempo de trex mezes lhe não ter
dadooccaziaó para Te fazer fenhor das fobre-ditas couzas.
O vulgo , que fe deixa levar das primeiras aprehençoés, tu- ^
multuava inquieto, com fe imaginar governado pello diâ:a-
mcn do mefmo Conde General , de quem, em tão manifefto
aperto , fe via desfavorecido , & fe imaginava defprezado,
acufando defofpeytofa a novidade navezinhança doperi-
gOi& também , porque aconfelhado da affeyção, não fabia ,
como fogeitaífe o amor á obediência j & fem duvida fe amo-
tinara, fe a pmdencia dos Meftres de Campo , & a generoza
modeftia , & difcreta capacidade do Meftre de Campo Ge-
neral não vencerão os montes de inconvenientes, que ain-
tempeftiva ordem trazia coníigo. Emobfequio da união fe
facrificáraõ as oppofiçoés da altiveza,& da defcõfiança jporq
fe conformarão de forte aquellas vontades, que o Meftre de ,/^" (nctãât^»
Campo General aprovava tudo,o que os Meítres de Campo nientes.
difpunhaó; & os Meftres de Campo, em nada falta vão á
obediência , que lhe deviaò , recebendo nefta forma as ar-
mas outro Governador, porém não outro governo : Remé-
dio, com que fe atalharão as ruínas , que refultaó das fedi-
çoés.

' 4 Pedindo efta â rezaõ, que demos íiefte lugár cõtita ào
cftado das armas , pois fe faz memória da entrega do baftaó
20 novo Governador delias. Tomou João Fernandes Vieira
íòbre feus hombros a emprefada liberdade , quando nas Ca- Emrega-fe ogo2
pitaníasfogeitas ao Olandès,eftava a liberdade tão perdida, '^'<^^f^oa FrãcTfco^
como efquecida aefperança de fe recuperarem no domínio ^'^^^^^<>->à' em §^
de feu Principe natural. Avaliou feu efpirito fer fácil o mef- ''
mo, que a todo o juizo humano parecia impoííivcL Contra
toda a opinião fe pos em campo , afliftido da confiança , que
tinha em Deos,do zelo da Religiaó,& do bem da PatriaiSem
arinas, & foldados venceo olnimigo, que o bufcava com foi-
dados, & armas, na batalha das Tabocas. Defpois unido com
o Meftre de Campo André Vidal de Negreiros, ganhara 5
a viâioria , que perdeo o Framengo no Engenho de Dona
Anna Paes3&: nove Fortalezas, com ou tros redutos , & cazas *

Bbbi fortesj

mâ

^'

••Jtí^^

568 C^ST(!(IOTO LUSITJNO

fortesj&emhuns, & outros perto de oytenta peças de arte-
Iharia de divcrfos calibres, amayor parte de bronze 5 Sca.
efte refpeito armas, munições, & petrechos de guerra erti
tanta quantidade , quanta baftou para fuftentar a guerra vi-
va, em cinco annos continuos: No difcurfo delles liberta-
rão da fogeiçaô Olandefa cento, & oytenta legoas de cam-
panha , que fe contaó do Seara Morim até o Rio de Saó
Francifco , com morte , & prifaõ de dezoyto, para deza^
nove mil contrários. Dos moradores (efquecidos de ho-
mens , á força de tiranias , & iu jurias , recebidas do inimi-
go ) fizeraõ foldados taõ animoíbs , & deftros , que a fi meí^r
mos, fe defconhcciaõ : Naó foy menojs a differença, que
fe vio no recibo, & na entrega: Para fuftento do exerci-
to entregarão mantimentos para dòus mezes ; para pagas:
dos foldados vinte & quatro contos em fer, dezoyto mil
cruzados em efFeytos , & em dividas , com fácil , & certít
cobrança . A gente taõ difciplinada , & fogeita , que cal-
lava , & fofria . O inimigo affi reprimido > & cortado, que
em todo o tempo de feu governo nem alcançou viáoria)
na terra , nem fes prefa em algum dos noffos portos de mar^
Os moradores tratados com aquella cortezia , prudência^
&; afabilidade, que pode faborear todas as defcomodida-^
des da guerra , tanto , que os pedidos, os obriga vão , a que
com fuás fazendas acudiíTem voluntariamente ; & faziaó
vaidade de fervirem, como íe o fizeraõ por divida, cotu
as peííbas , em toda a occaziaõ : Ultimamente, bem fe po-
de dizer, que na entrega, que fizeraõ ao Mèftre de Cam-
po General Francifco Barreto de Menezes, deraõá coroa,
terras, &Vaírallos, que podeíTe governar 5 & não, fó o go-
verno de VaíTallos, & terras; pois he certo, que fem àiC-^
pendio da faienda real, de fuás mãosrêcebeo a Coroa, &t
o Governador em feu nome i húa , & ouíra couza : E afeui
Príncipe deraõ a gloria de ofer de VaíTaUos taõ obedien-í
tes , & leaes, que podem fer para todos os fubditos dou-;
trina, Separa todas as idades exemplo, .fincai
( 5 Obrigados da fubordinaçaõ , & do rogo continua*
raõ os Meftres de Campo com as preparações , que enten-^i
déraõ,podiaõ fervir a qualquer refolução noííà^ Scencon^.
.ç23íi'' í ■ ccIcJtí trar

.U.

*ii

1648

^J7(TS7.LIV^ IX. j

%h

t^

trar todas ás do Inimigo (certos na invazao, incertos na
parte, & no tempo : ) Gaftava o Olandés , naquelles dias , o
tempo em fuperlriciozas expiaçoésj&inutis prcçes,com que
implorava o auxilio do céo contra o meíiiiocéo . Como fe J^^f^^fL "''
Deos podèra fer injufto,o bufcaváo para author da injuftiça: campo.
Cegueira herética, ou malicia diabolica.Publicáraó ;ejum de
trez dias, com preceito , que nelles foíTem ouvir feus diabóli-
cos predicantes,os quaes exortavão para o roubo,para a v in-
gança, para o racnlegio,& para a deshonra : Ao Gentio, à&{-
pertaváo a ferocidade,prometendo-lhe a fal vação por meyo
do ódio, da crueldade, do furto, & da abominação , eníinan-,
do a todos, que executadas eftas culpas contra os fieis , eráo
virtudes . Diabólica he a doutrina , que pellos caminhos do
inferno bufca a falvação,& pellos da perdição o remédio. Os '^^
exteriores todos erâo da confiança, porém os remorços da
conciencia, lhes não deixaváo fahir do coração, o temor do
caftiga^iíiíiífl moo

6 Áchavá-feSirgifmundo,General de hum exercito nu-
inerofo,& luzido : cabos peritos, & v alerofos ^ officiaes pra-
ticos,& deftimidos; foldados de varias nações, porém exerci-
tados em húamefmadifciplinajdefi:es,eraòmuy tos, os que ^ j r
tinhão (pellos annos,& pello uzo^ inteiro conhecimento da uV^ 1°^^ r
terra; enlinados nas occazioes, do proceder de nona gente,
&: do eftilo , & modo de noíTas armas . Sabia com individua-
ção, quaes, & quantos erão os no (Tos cabos , officiaes, & fol-
dados,& as noíTas armas, & munições 3 comparação , que em ^
íeu animo devia criar (além de fua natural arrogância ) efti-
mulos para o defprezo , & não para o temor j & não foy afli,
porque a imaginação lhe pintava a contingência do fucçeíTo
com fombras taó agigãtadas, que feu coração o temia,& não
fe deliberava em fahir a campo. Os do governo infofridos na
dilação, o arguíaój os cabos o murmuravão^a plebe[ com fua
coftumada liberdade] o defcompunha; & todos com hum
meímo conceito calumniavaõ fua detença . Picado de tantas
partes,fahio do Arrecife pella húa hora defpois da meya noi-
te,hua fefta-feira dezafete de Abril de mil & feifcétos & qua-
renta & oyto, com fete mil & quatrocentos combatentes, a-
liftados em íeis terçosjdos quaes eraó Coronéis Vanelles,Ke-

Bbb3 vert,

Í!Í

1570 X^sr^IQdrCr LVSITJKO 1648

vert, Guilhelme Autim, Vandebrand , Oletz, &: Brinc : As
c5panhias,de que íe formavâo, eraõ feírenta,& hiiaj & de re-
tém deixava ao Coronel Henrique Hus (já livre de noíTo po^
der) com mil infantes,& ordem, que em tempo certo fe foíTe
encorp orar com o exercito nos montes Guararapes, comoí
defpois fes. Soldados auxiliares, entre Negros , & índios, mil
& quatro-centosj& fcte-centos gaftadoresj & para que Hen-^,
riqiie Hus não perdefle tempo, lhe deixou ordem feçreta , q
, com o feu terço foíTe faquear, & palTar á efpada toda a gente
^A daVarzea,deftituidadetodoofocorropenaopporição,que
imaginava, lhe avia de fazer toda a noíTa gente no primeiro,
dia de fna marcha: Foy errado o conceito , & inútil a ordem. .
Os efcravos,que carregavão a bagagem, & a ociofa multidão
de gente,que com a certeza da viâ:oria, & efperança dos def-
pojos levava a cobiça, & a curiofidade , fazia vulto de outro
exercito, & tudo junto, hum corpo de doze par? treze mil
homens. Levava féis peças de artelharia com milniçoês, ar-r
Marcha fará ^ mas, & mantimentos de fobre-felente, & muy ta cantidade de
Barreta, algemas, gnlhos, cadeas, & cordas para prender , & maniatar

^-^ oscativos.(Demonftraçáofeguradevencerab;atalha,coma

qual, fe fenáo enganava a íi,enganava aos fçH5.)Com bellico-
fa oftentação de caixas, clarins, falvas,& vozes fe formou, &
pos em marcha para a fua Fortaleza dos AfFogados, meya le-
goa para o certão, fobre o Poente, aonde fes alto : Levava a
vanguarda o Coronel Vanelles com o feu terço : Foy recebi-
do da Fortaleza com tantas falvas,& vÍYás,que parecia adian-
tar-fe o triumpho á batalha.

7 Naquelle lugar declarou Sifgifmufidò a íèus Cabos
mayores o fio de fua determinação, que era occupar a Mori-
beca, povoação íituada quaíi nas fraldas desmontes Guará-
VechraafeuíCa J^^peSjCaminhãdo da Fortaleza dos AfFogados para o Sul, cin-
bos o intento. '^ co legoas do Pontal de Nazareth , & trez do noíTo ArrayaL
Deu a rezaó de feu intento, dizendo, que na Moribeca , (po-
V oaçaó de cem vezinhos,trez legoas dos AíFogados,do Nor-
te para o Sul) fe avia de alojar, & fortificar o exercito,para q
daquelle fitiofedefpediíTem partidas, para onde as chamaf'

femaconveniencia,&aconquifta, feguindo nclla os paíTos
da primeira guerra j facilitando-lhe a mefma fortuna , a arma-

da,

^

t6^S y]^J(!(rELLlV(í(plX, t^rt-

da,que por mar fe avia de por fobre o porto de Na2areth,pa-
ra que pella cofta feguifle os paíTos, com que o exercito mar-
ehafíe por terra, fem fe perderem de vifta . Dirpofiçaó , que
ao juízo dos homens prometia felices fucçeííbs; & muyto
mais aos Cabos Olandefes, que já os conta vão infaliveis. Po-
rém aquella providencia, a cujos olhos nada fe eíconde,por
fua inmenfa comprehenção, o tinha difpofto muyto de ou-
tra maneira, como fe verá no proçeíTo defta narração.
li' 8 As noflas fintinellas , que com vigilância cuidadofa
obfervavaõ o menor movimento do Inimigo, derão rebate
aos frontey ros com a noticia do poder,& da marcha: Com as
armas nas mãos os achou o rebate j & correyo prompto para
fazerem avizõ ao Arrayal , aonde logo íè tocou arma, & com
prefteza increhi vel fe formou a noíTa gente em húa campina ^^Jí^ rehate m
pouco difl:ante,& nella os achou amanhâ,formados , & com ^^^^y^^-» ^f°^'
as armas as coitas , clperando a ordem^ que aviao de leguir, ^^^ •' •'^ * -
Com a claridade do dia, fe deícobrio hum groífo efquadraõ
interpofto entre a noíTa gente,& o íitio, em que fe alojava o
Capitão António Borges Uchoa,aquemfàzía frente com
demonftração de querer en veftir aquella Eftancí a. Induílria^ rs>
de que fe v aleo para encobrir a paíTagem de feu exercito pa-
ra a outra parte do rio, pello yao dos AíFogados; o que con- ^ '
feguio furtado a noíTos olhos, cuja vifta nos cegava o vulto,
com que o fingimento, nos defviava os olhos, & a fofpeyta.

9 O Meftre de Campo General Francifco Barreto de
Menezes, como Governador, & foldado chamou a concelho
os Cabos mayores , & em feus pareceres deixou a determina- „ , ^
çao, do que le avia de íeguir na occaziao prelente . Sogeitou cenerd h -
a fuperioridade á efcolha da experiência . Faltava-lhe o co- ^a. a concelho o
nhecimento do terreno,& do eftilo,& como Varão Género- cjue nelk re^re^
fo , & Sábio, dcfejava mais acertar obediente , que errar ào-fi^^'^-
minante. Foraõ os do congreflb João Fernandes Vieira, &
André Vidal de Negreiros, o Tenente General Phelipe Ban-
deira de Mello, António de freitas, & Sylva, que o tinha fido
na Bahia, & o Sargento Mayor António Dias Cardozo: Fal-
lando com todos, difíe Francifco Barreto de Menezes, que a
neceflidade,& a cauza,com a prefença lhe efcuzava a relaçaój
& a pouca experiência daquella guerra lhe cagava o voto,

Bbb 4 que

^o

'I

■llp'"

^72 c^sT^ofanjsii^mo ie^s

que no confiiíiio o achariaõ coiii a eípada nâ mão cõpanhei^
ro, & difciplinadoj mas que na difpofiçáo, o deviaõ confide-
rar obfervantej& depcndènte:Que o inimigo com força de^,
coberta fahira a campo, pujante, & infolente, em forma, que
íeu defignio naó podia fer táo disfarçado, q de feus moviméi
tos, fenáo podeíTe inferir ília tenção .O poder ,« com que de
prefente fe acha vão , tinha já contado a forma, & calhíicadò
^ o exercício. A certeza,de que a conveniência era, aqueayja
de votar na matéria, lhes intimava a importância, pois tbdos
conheciaó, que a confervaçaó de fuás vidas, & pátria ^ nm €1^
nha mais fiador, que o próprio bfaço,nem mais tluraçáo^que:
a da defenfa,porque o Framego, naó Minha tanto a cõqu i ftar-
com a mão da cobiça, como v inha a deftruir com a da vingâ-
çaj que votaírem,& fe refolveíTem, com a preíTajque lhes da-
va o tempOjpara que o Glandes não fizeíTe illaçaõ de noflfa
detença,para fuaconfiançaiSc que efperava no favor do ceo,
cuja era a cau2a,lhe daria luz para votarem na matéria com o
defcjado acerto.

10 Na5 eraõ muy tos os votos,& ainda affi dífcordáraã
nos pareceres: A menor parte foy de opinião , que fenão de^
Tarècey âoi Ca' ^^^ ^^^^ falvaçaõ de to.dos,á fortuna dehúa batalha, com po-
li,/, der taõ inferior ao do Inimigo^ que moralmente fenáo podia
^ ^fperar fi;m ditofo, pois era força dalla, ou recebella em cam^
po aberto, aonde o Framengo fe podia ajudar de todo o feu
poderjque o noffo fe retiraífe para o Gabo de Sanâ:o Agofti-
nho,terreno,em que favorecidos dos matos,& do tempo,po-
. . deriamos confumir o Olandès . Os Meftres de Campo Joaõ
Fernandes Vieira,& André Vidal de Negreiros,aos quaesfe-
guio o Tenéte General, que fora da Bahia^ António de Frei^
tas,& Sylva,difcoi:réraó com diverfo fentimento.Diziaõ,que
feu ju izo não achava meyo, entre a retira da,& a perdição j&
que fó hua batalha lhes poderia abrir caminho para o remé-
dio : Porque executando-fe a retirada,era forçòfo deixar nas
mãos do Inimigo as fortalezas, asfamilias, &as fazendas,
Voiõ dos AdeBres único Cocorro das vidas; & o deftroço, avia decalHficarpor
de Capo loaS Fer- fogida,a mais induftriofa retirada; & concebida efta opinião,
André vidd de P^^P^^^^^ > & contrarios , era certo , que os inimigos nos a-
Megreiros. ^^^^ ^^ feguir defíimidos , &: os amigos nos aviaõ de deixar

def-

1^4^ TAXTEl.LirXO IX. 57^

de fconííaclos, Tendo indecoroíò remédio , o que pella culpa
conduzia ápenna: QLienabatallia,ou fe avia de alcançar a
vi6i:ona, ou perder a vida j& em cazo, que a fortuna adverfa
nostiraffe a forte de vencer juftificados, não poderia tirar-
nos a gloria de morrer valerofos, como fieis a Deos , obriga-
dos á nação, devedores á pátria, & leaes ao principe.

1 1 Ouvio o Meftre de Campo General as opiniões , &
acoílou-fe ao v oto do Meftre de Cãpojoão Fernandes Viei- ' -

ra, & André VidaI,porque aífi o entendia,& defcjavajalegre,
em receber o confelho dos mefmos ânimos, a que fiava a exe-
cução : Entrepou a feu cuidado a difpoíição da guerra , & a ^""^ elUsrefolve

c II 1, 1- 1 ^ r ^ . ^ . tP ^ r r Francííco Barreto

lorma da batalha,obngaao de lua experiência , & de lua ror- X ^^/„^^ ^
tuna, refervando para íi o domínio de fazer executar as ov- jmmigo.
dens. Foy a primeira, que fe deu aos efquadroés , que chega-
dos ao conf] iâ:o,dada a primeira carga fe meteíTe mão á efpa- y
da,& fe enveftiíTe o Inimigo.Defpedirão ao SargentoMayor
António Dias Cardozo para a fronteira,aonde eftava Antó-
nio Borges Uchoa , com preceito de efpiar, & de defcobrir a
marcha,& a determinação do Framengo: Em quanto efta di- ordens que Je dao
ligenciafe fazia, exortarão aosfoldados comrezoés taó yi-f^^^^^J ^-r--^
vas,q dilatados osçoraçoés,naõ cabião na eftreiteza dos pey-
tos.Refrefcáraó-lhes alembrança, das mu y tas vezes, que ti-
nhaó vencido aos mefmos Olandefes,que agora os buíca vão,
nos quaes ( com fua vifta) obraria mais o medo,que o nume-
ro ^ & fizeraó-lhes avertir , que na prefente occazião não ti-
nhão donde efperar focorro,fenão de feu mefmo braço , & q
não deviáo obrar menos em beneficio de frias peííoas,do que
tinhão obrado em obfequio dos parétes, naturaes,& amigos,
que o mais certo caminho das vi6i:orias era, o que moftrava 4
confiança pofta em Deos,& na juftiça: Chegou nefte tempo ;"

o Sargento Mayor António Dias Cardozo , & informou de . .

•n T • • 1- II Tl 1 Avtxoj efue traz,

Vil ta, que o inimigo hia marchando para a Barreta j aonde a ^ s ar acto Mayor

fua vanguarda ficava ás cargas com os noííos frontcy ros . Có Antomo duíCat

efta nova fe mandou recolher toda a noíTa gente para o Ar* do^-

i*ay ai , a defcanfar do trabalho, de a ver eftado a may or parte

da noite, & da manhã, formada,& com as armas nas mãos, cõ

ordem, que tomaíTem a quotidiana refey ção,em quanto não

chegava ayizo, do Capitão Befthplaraeu Sp^res Canha ,d(2^

fx " fuc-

fr^.^'

i !

i

.' 574 C^STfJlWTO LUSITJNO 1648

fuccedido na íua Eftancia da Barreta( reformada paraefta oc-
caziaó,& guarnecida com oytenta homens dafregueíia de
Ipojuca.

I 2 Chegou a vanguarda do exercito inimigo a picara
Eftancia da Barreta , & o Capitão delia Bertholameu Soares
Canha, enganado da imaginação, que lhe pintou fercome^
timento de duzentos Olandefes , que de ordinário o inquie-
Manda o Inimigo tavão , com defe jos de oscaftigar, osfahio a receber fora da
ficar ^-Ey^^Wrf fortificação com quarenta &feisfoldados, deixando ordem
a dous Alferes feus , que com o reftante da gente fenão mo-
veíTem do pofto^que defendião, fem expreíTa ordem fua ^ &
èonfiado nas íintinellasjque deixava ao largo, de que ©Ini-
migo lhe não poderia cortar a retirada, fe empenhou com tá-
ta demazia, que o arrependimento o não pode livrar do peri-
go: Primeiro fe vi o cortado,que enveftido. Quando chegou
a defcobrir o poder contrario , foy a tempo, que ouvio os ti-
o CafitMBertho' ro5 (não das fintinellas, fenão de innumeraveis índios, que o
lamtu Soares CA'¥t2im'&ngo tinha mandado,por entre os matos, a cortar-lhe a
nhafe perdeaji, retirada ,& a combater-lhe O alojamento, Sepelejavão com
& aJiíitEjiancía. ^^ foldados, que O defendiaõ.) O mefmo, que para os noíTos
era final da batalha, foy para o General SiígiíiTiundo avizo
do conflito , de que avertido , carregou os quarenta , & féis
foldados com aquelle impetu, a que o incitava a muItidáo,&
o defejo. O Capitão Bertholameu Soares Canha, falto de té-
po , &de palavras para a exortação , animou os feus com o
exemploj& com a efpada na mão fe meteo pello efquadrão
inimigo com tal valentia, & deftreza, que fe deu a conhecer,
a Çi^ pello eftrago,& aos íeus, pella imitação: Não ouve entre
elles, quem não vendeífe húa vida por muytas, de forte, que
primeiro o Olandès os vio mortos,que rendidos^ alguns,que
dentro de hum alagadiço efcapáraõ com vida , foy com tanta
disformidade, pellas muytas feridas,que como a corpos deíà-
nímados os olhava a colera:0 valerofo Capitão Bertholameu
Soares Canha cercado de índios domefticos , & Tapuyas, os
.jpan a c mjeu £^^-^ afaftar , ou cahir com os golpes de fua efpada,até que 09
çof^ rompeo com elpanto dos Olandeíes, & aflombro dos bárba-

ros, Eftimou-fe o valor; & fe lhe deu quartel , contra o pare-
cer de muy tos, que com baixos elpiritos deíprefaõ a honra,

por

i_

I64S

^ji;(rE 1. LiF^o IX.

'y^^

por feguirem a vingança. Os que forão enveflidos na Eílan-
cia, fuftentáraò o combate com admirável conrtancia,até que
vencidos do exceíTojbufcáraó nos matos o reparo, que lhes
faltava no alojamento, deixando na pendência alguns dos
feus, mortos, & cativos.

1 5 Celebrou o Framcngo efte fucçeíTo por faufto prin-
cipio de fua emprefa . Quarenta,& fete mortos ferviraó á vi- ^
£i:oria, & fete cativos ao triumphojcftes mandou enforcar no p^^^^ dehíia é*
mato a vingança: Pequena recompenfa do eftrago, que noíTa outra parte.
cfpada f es em fua gente^melhor o ponderava Sifgifmundo: A
experiência lhe tinha moftrado,que ferida anofíà gente da-
quelle golpe, fe devia temer aíTanhada, & não julgar-fe ven-
cida. Com efte penfamento diíTe aos feus, que lhe parecia bê
fe recolhefem ao abrigo de fua Fortaleza da Barreta , para q
na feguinte noite, favorecidos das fombras delia, marchaffem luiios encctraãos
ao amanhecer,fobre a Moribeca, porque não fendo aífi, fabia ^J sifgíJmuào^&
que os Portuguezes avertídos, & có as armas nas mãos, (irri- °^r^'.
tados com a vifta do fangue v ertido) como feras , de entre os
matos os avião de aíTaltar , & deftruir.Porém feus cabos , fo-
berbos com aquelle pequeno favor da fortuna , defprezáraó ^

o confelho, dizendo, que não convinha, o marchar furtivo, á
opinião de tamanho exercito, & q de noite , chamaria a fof-
peyta do medo, a q'.Tem de dia afaftava a cauza do efpanto.
Cedeo o General ao voto da multidão, fem perder o receo,q
tinha concebido. Formado,& com as armas na mão paííou o
Olandès, naquelle íitio, o reftante do dia, & toda a feguinte
noite. Mandou Sifgiíinundo vir do Arrecife a Henrique Hus . , , »

com os mil foldados (que diíFemos, lhe confignara para aflb- ,^^". '^ f^ ^^^^^

N r j 1 • r ' -a J da Vir Henrique

lar a Várzea ) a hm de marchar com mais leguro , a viíta do ^^^ cõofeu ter"

noíTo Arrayal; efcrevendo-lhe a rezão , com que mudava de ço.

parecer: Refolução mais favorável á noíTa conveniencia,que

0 própria fegurança,porque comella nos confer vou unidos,

& fes aos feus mais defgraçados.

14 Eraò duas horas da tarde Ltempo,em que a noíTa gê- ^

íe recolhida ao Arrayal começava a tomar ração para acudir

á fome] quando chegou avizo da Barreta , que o Framengo

nos tinha degolado o prezidio daquella Eftancia, & cõtinua-

M^covsx a marcha pello caminho da Moribeca. Não ouve fol-

dado ,

t^yS C^SWJOTO nJSlTAKO i'6^

dado noíTo, a quem a nova não alvoroçaíTc; ( o golpe os cha-

-Chegx avi^o ^^ jy^^aá vingança: a marcha á batalha ) fem fazerem cazoda
Jnayal da per- ^ r \ /■ i- • t i \ n •

d^ daEHãcLda porçao,qLiefedava(que era hua pequena cantidade defan-

Barreía. ... nha depáo, efcafíà, por culpa dos aíTentiftas obrigados a
dalla) tomarão as armas, & formados marcharão com todo o
poder [cóftava de dous mil Sc quinhentos homens Portugue-
2es,Negros,&Indios.]Para guarnição dos prezidios deixarão
na Fortaleza do Arrayal a Manoel Ribeiro com a gente pre-
. GÍfamente neceíTaria : Na força da Bataria , a Diogo Efteves
Pinheiro com menos Toldados, dos que pedia a defenfa, por-
que fe avia de ajudar da induftriaj moítrando-fe de dia j & fa-
hindo-fe de noite a tomar litio,que lhe não impediffe a efco-
Iha de fervir á occaziaó com a conveniência , ou da retirada,
ou da aííiftencia. «>

i^ Neíle dia,leyava a vanguarda o Meílre de Campo
André Vidal de Negreiros, & nella hia encorporado o Mefr^
tre de Campo General Francifco Barreto de Menezes . Mar-
^archít o mffo^ chou-fe a paíTo largo. Chegarão a hum lugar, que deixou in-
exercíto,& em f ^ifFcrente a efcolhajporque nclle fe dividia a eftrada em dous
^ ' caminhos, que guiavâo a hum mefmo fim. Duvidou-fe,pot

qual fe a via de marchar^ou ve pareceres encontrados: Mádoii
o Meftre de Campo General fazer altõ,atè a chegada do Me*
ftre de Campo João Fernandes Vieira,que v inha na retaguar-
da reconduzindo a gente,& aífegurando os poftos; & ;á fe a-
diantava á mareha do Inimigo,que formado, & immovel deu
Jugar, a que noíTa retaguarda lhe fizejfife frente ; porém a ref«

peyto dos lados,fe adiantava o Framengo na vezinhança dos

montes Guararapes : Chegou Joaõ Fernandes Vieira ,& o

Meftre de Campo General lhe declarou a duvida, &pedio

. parecer,naõ òbíiiante , que ode todos era , que fe caminhaílè

'^^ pello caminho'! que fe chamava de Obura,opinia5 , q o MeA

tre de Campo Joaó Fernandes Vieira reprovou, & perfuadio

o Meftre de Ca- q contrario com femelhantcs fundamentos : O Inimigo não

po João ^amn- j^^ menos pratico, que valerofo: fe pello caminho de Gbura

des rietra eleqe . i r» i H n ,»-w

o caminho^ quefe ^ Duícamos, O acharcmos lituado no melhor poíi:o:0 tempa,

devejegtiir. „ que o adiantou na marcha, o adiâtou na efcolha^ & a opinião
5, de tão grande Cabo nos enfina á crer, que não avia de errar
„ na eleição^ conio também^ não deixa^.a efta hora deter efte

53

■v.

ca-

164S <PJ7(rELLlF^0 1^.) ^yy

caminho (como certo ) guarnecido de mnytas , & copiofas />
embofcadas, fendo os matos, que o ladeaó,tão difpoftos para ?>
cilladas, que perfuadem a mefma defatençáo; 8c quando fuc- ,>
cedeílè defprezar Sifgifmundo efta ventagem de íuas armas „
(o q fenão pode prefumir , de quem fabe,q não há força fem ,,
arte) bafta para nos deftruira natureza do terreno, cõ a mui- „
tidão dos lamaçaes,& alagadiços , que forçofamente avemos „
depaffar, os quaes em muytas partes deixão tamanha eftrei- „
tcza nos caminhosjque nem cófentem ordem, nem forma; de „
feitos, que nos levão vencidos á menor oppofiçaõ do Olan- „
dés: Se por qualquer deftes accidentes nos deftroçar,ou quá- „
do menos, defcompofer o Inimigo, como,ou quando,nos po- „
deremos formar,ou refazer? O focorro donde nos há de vir? „
Quando o não acharmos em noíTa mefma difciplina,que ani- „
mo nos deixará o eftrago para eíperar a viâoria f Pois fialo a „
milagre , fera tentar a Deos com tão fobeja confiança . Naõ „
cnlodemos com a dema2ia,a famajque nos acquirio a pruden- „
cia, que fera culpa da eleição , fepultar o valor nos lamaçaes „
de Obúra. Naó demos occazião, a que diga a olandefa arro-
gancia,que noíTo erro efcOzòu feú braço.para nos vencer.
<j 16 Chegou nefta hora o Sargêto Mayor António Dias
Cardozo,&como verfado no terreno, & pratico nas veredas
delle, feguio o parecer do Meftre de Campo Joaó Fernandes
Vieira, o qual (defpois de ouvidas fuás rezoés) profeguio fo*
bre a matéria, dizendo : .A marcha do Inimigo , nos informa „
de feu intento, porque nos moftra o caminho , que feguio na „
primeira conquifta, & he fem duvida, fazer-fe fenhor das po- ,
voaçoés da Moribeca, & da Jangada,&: franquear por húa,& ,
outra a entrada do certãoj o que com facilidade fe pode ata-- ,,
Ihar fem rifco,porque hua,&: outra povoação, com qualquer „
prezidio fe poderá defender aquelle tempo,que nos pode de* „
ter o rodeo pello caminho mais feguro; além de que,defendi- „
das do Rio da Moribeca, aquellas povoações, que pella fren^ „
te do Inimigo as ladea , cuja paíTagem fe empede,por q fenão „
poder vadearrCom lhe mandar deftruir a ponte,que a facili- „
ta,fica o Framengo atalhado,&: Sifgifmundo confufo, vendo- „
fe entre a oppofiçaõ , & o riíco, em que o há de por aquelle „
Rio,& efte exercito.Em quanto á fegunda con veniencia,que „

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' ^y% CAS7\Iõro LVSlfAKO 1648

35 perfiiadia a feguir o outro caminho,que he, a abundada das
5> agoas, não peza mais, que os inconvenientes aporitados,por-
5> que eftes faó certos, & o de faltar a agoa , mal entendido 3 Sc
5> eu que fey as còdiçoês do terreno, me ofFereço a levar a mar-
« cha por onde, fem que a agoa nos falte, tomemos íitio,que a-
55 Io;ados nelle, guardemos as cofias dos moradores , & abata-
5' mos o orgulho dos inimigos , cortando-lhes a comunicação
5> de fuás Fortalezas. Ouvio o Meftre de Capo General a Joaõ
Fernandes Vieira coiti a opinião , que tinha de feu valor , &
Jprova. o ene- ^ ç intelligencia ; & como, fe êm fua direcção tivera pof-

%d o parecer de , & ' ' r r • /r o j

João Fernandes ^^ ^ connança, mandou que íeu voto íe íeguiíle j & ordenou
rieira. a hum Ajudante,que com vinte foldadõs fe adiantaíTe a cor-

tar a fobre-dita ponte.Hua, & outra couza fe pos em^ execu^
ção: Marchou o exercito para os montes Guararapes , aonde
íe experimentarão todas as utilidades do eanfelho, fem que
fe achaíTe o menor defraudo,entre a promeíra,& a livrança.
17 Situou a natureza os montes Guararapes, trez para
^ quatro legoas do Arrecife caminhando de Norte a Sul j trez
do noífo Arrayal, quaíi para o Poentej da Barreta duas, cor-
VifcripçaÕ dos rendo do Norte o Poente.Do monte, aonde fe começa a era-
montes GMTAra' ^^^^^ ^ ^^^^^ ^^^ ^ ^^^^ ^^^^^ diftancia de trez quartos de le-

goa de Lefte a Oefte, campina rafa, de muy tos lodaçaes,& a-
lagadiços.Dos montes para o certaó,vão continuando as fer-
ranias com mais,ou menos altura^& digo ferranÍas,porq mais
o parecem, que montes,pello lobído, agreíle, & afpero dei-
les: Alguns formão tamanho corpo,que parece levantão a ca*
beça fobre as nuvens,& pella mayor parte, faõ de cadencias^
que efpantão a vifta,& a confideração com o defpenho,& c5
o profundo; tanto,que fuás concavidades querem perfuadir,
que não paraõ fenão no centro da terra, Das eminências del-
les fe defcobrem dilatadas , & fertis campinas por grande dif-
tancia de certâo, que igualmente fufpendem , & recreaõ ; &
olhando para a parte do mar,fe vem muy tas legoas de cofta,
& golfo, em forma,que primeiro fe acaba a vifta , que o obje-
â:o: O terreno deftes montes, em partes hc íaibro, em partes
terra folta, como área ; & em muy tas , pedras def-unidas tao
põderozas, & maçiffas, que pella cor , & pezo, querem pare-
cer ferroj rezâo,porq as agoas das invernadas tem feito nelles

que-

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0.O

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164? TA<^E1,L1V%0 IX, * ^^579

quebradas, grutas, & barrancos em tanto numero , & altura,
que fenão oíliaó fem mcdo,& Tem perigo j o de caminhar por
clles de cavallo,he temeridade,depé,atrevimento: Todos laõ
ercaIvadosj& o natural delles tão efcaíTo , que fe criaó algúa
arvore, he infrutifera,& agrefte: As fraldas deftas ferranias íe
cultivão, & acodem com osfruitos, ajudadas da humidade^
que recebem dos montes.

18 Guararapes,nalingoadoGentio,heomeíÍTio,que
efi:rondo,ou eftrepito,que cauzaó os inftromentos de golpe,
como fino, tambor, atabale,& outros- & o rumof , que fazem ^ ^^/'^^ '^"^^Z*
as agoas pellas roturas, & concavidades delles lhes deu o no-''" ^ °^^^^^^^^
me de Guararapes : O ultimo deftcs montes , fahindo dellcá

para o mar, affenta o pé fobre hum meyo circulo de terra chá
pella parte do Sul, que também o cerca pella do mar, ( pella
terra fica unido a outros montes) cingido pella parte da ca-
pina, de hum dilatado alagadiço, cauzado de húa lagoa , que
lhe dá principio, forojando-fe húa faxa de terra folida , que
terá de largura pouco mais de cem paíTos , entre o alagadiço,
&: o mÕte,para a qual fe entra por hú boqueirão, que formou
a natureza entre a lagoa, & húa lingoâ de mato,que deçe àç>
dito monte: Pella dita boca entrou a noíTa gente,& fe alojou
naquella faxa de terra com as comodidades , & fortificações,
que lhes dava o fitio, não fendo a menor, o ficar efcondida
aos olhos do Framengo,porque fó dos montes nos podia def-
cobrir . F aça o Ley tor memoria das particularidades referi-
dasjpara entender com ma is clareza as circu nftancias da bata-
lha, que logo avemos de relatar: A povoação da Moribeca[q
o Inimigo intentava poíTuir, como fundamento de feu defig-
nio] fica húa legoa dos montes Guararapes ( pequena, pello
numero das cazas, que a formáoj grande, pello dos vezinhos, Tamhe dapotjoa*
que a cercão em particulares vivendas. ) O terreno fertillif- P^ dAMorikca.
íimo pella abundância, & bondade dos fruitos,& das crias^re-
talhado de pequenos rios, cujas agoas leva ao mar,o que chá-'
mão da Moribeca,que banha, & dá nome á po yoação.Tudo,
requifitos de grande conveniência para o intento, de Siígif»
mundo.

19 A paíío largo marchou o noíTo éxetcito, aconfelha-
do da importácia de fe adiantar, furtado aos olhos do Framê-

Ccc 2 go»

•-^

4M

Mmde:^oytodeA'
bril chegou ^&fe
alojou a noJf4gê-
te.

Bertholameu Soa
res Canha, é" hit
efcravofeu che-^
gaoao Arrayal.

<^

Com feffentâfol-
dados fe manda
fícar o Inimigo.

t^è ' C^Sr<^10TõLUSlTJK0 Í<54S

go. Sábado dezoyto de Abril arroftáraõ os noíTos os montes
Guararapes ,& íeguindo a direcção do Meftrede Campo
Joaõ Fernandes Vieira, entrarão pelloboqoeiraó , os terços,
& a bagagem, & fe alojou a gente em forma prolongada. Pcl-
ias dez horas da noite eftavão os poftos fortificados, & guar-
liecidos, 8c as fintinellas repartidas por aquellas partes , don-
de podíaõ defcobrir os movimentos do Inimigo, que naquela
la tarde tinha marchado pello areal da praya, com mu 5 to
pouco avanço: Na mefma hora fe ordenou ao Sargento Ma-
yor António Dias Cardozo, que com vinte homens efcolhi-
dos fofíe vigiar o Inimigo, com avertenciajqueo não perdeA
fe de vifta, até q a claridade do dia feguinte lhe podelle mof-
trar o intento, pella marcha. No domingo,ao romper da alva,
chegou ao noíTo alojamêto hum efcravo do Capitão Bertho-
iameu Soares Canha,com cinco feridas, que recebera no cho-
que da Barretajo qual pello diícuríb daquella noite teve mo^*
do,para efcapar de entre os Framégos , cuja fogida deu moti-
vo,a q as fintinellas do capo tocaífem a rebate,& pofeífem to-
do feu exercito em arma, cõ o fobre-falto de fe imaginar en-
veftido da noíTa gête . Quafi ao mefmo tempo chegou o mef-
mo Capítaó Bertholameu Soares Canha , a quem a turbação
doFramengo, porcauza do dito rebate, deu lugar a romper
as prifoísj Sf íahio muytoafeufalvo, do exercito contra^
rip , Referio o poder , & o penfamento do Olandès com tu-
do, o que até aquella hora tinha fuccedido. Foy ouvido con^
fegredp,& avizado com preceito , que nenhúa couza diíTeíTe
diante dos foldados , no tocante ao exceíio , que o exercita
inimigo nos fazia em numero.

20 Neftecomenos, chegou António Dias Cardozo em
companhia das fintinellas , todos com avizo , que o Olandès
continuava formado no mefmo lugar,aonde ao principio da
noite fizera alto, fem outro movimento mais , que o nacido
da fogida do fobre-dito efcravo. Os Meftres de Campo (cir-
cunfpedos por comprehençaò , & vigilantes por oílicio, era
todos os accidétes da guerra) ordenarão ao Sargento Mayor
António Dias Cardozo,que aos vinte homés, que efcolhéra,
aiuntaíTe quarenta índios do terço de Dom António Phelipe
Camarão, & os induftriaífe j para que formados em hú corpo

fi-

t64S '^fAXJiRLLlV\0 2X. 581

fizeíTcm frente ao Inimigo, dcfcobrindo-fe ao tempo , que o
V iflem marchar, com hãa carga cerrada , & fe retiraííem fem
virarem a cara, nem perderem a ordem. Apouco eípaçode
tempo, tocáraó arma as noíTas fintinellas avizando da marcha
do Olandèsi & Juntamente os feíTenta mofqueteiros , que em
obfervancia da ordem, que tinhaó recebido, deraó a primei-
ra carga na vanguarda do Inimígo;& com tanto acordo,& fe-
gurança fe foraó retirando,que prefumio o contrario , pello
defi:imido,& ordenado de feu valor, ferem reliquias do cho-
que paíTado^com o que irado, os mandou avançarj porém el-
les fem perderem o compaíTo da retirada, né o emprego dos
tiros, de rofto a rofto lhe foraó reprimindo o orgulho j com
tanta gentileza, que aíTombráraõ-aos contrarios,Sc alegrarão
aos próprios: Defta forte vieraó trazendo o Inimigo até o
boqueirão do noíTo alojamento, no qual recolhidos , deixou ^-

oFramengodeosfeguir. . v.

21 Já nefta hora occupava a noíía Infantaria toda a la^
deira do monte em forma de peleja : Pella frente, que fazia
rofto ao Inmiigo, fe deixava ver de feus efqUadroês a refolu-
ção,& a forma, que Sifgifmundo olhava, confundido de feia ^ ,

inefmo engano. Perfuadido de fua arropancia,8cde noílb def- ^/ ^o nim ^
. -i^ j-ir j^o -u o pio ^ & forma

vio, julgava, que nos aet;mha leupoder^ & que vmna a ven^ àamíTa gente,

cer fem peleja, & a triumphar fem batalha , & não fabia for-
mar opinião em contrario : Enganados do meííno conceito
perderão as cores muytos de feus foldados . Conhecéo pella SíMírnunàofor»
tibeza, &: ao tempo de os formar foldado , os animou Gene- ma^ & anima, aoí
ral, provocando^os á batalha com a exortaçáo,& com a ordéifeits foldadss.
Correndo os efquadroés, dizia a todos : Aquelle pequeno
vulto de gente, que eftais vendo, hc mais aparência, que fuf-
tancia: Vedes homens,porém não vedesfoldados: Vedes cor- ,^
pos, porém não vedes efpiritos, porque todo fe compõem de j>
moradores do certão, que a efta hora tem o coração nas mu-
lheres, nos filhos,& nas fazendas j cujo braço exercitado na
agricultura,não tem pulfo para fuftentar a efpada: Em tanto
lhes vereis as caras,em quanto os não ameaçar o ferro . A to
dos trouxe alli a violência, a nenhum a vontade: Vem a afllf- >*
tir, & não a pelejar : Acompanhão por cortezia ; logo os ve^ '*
reis fogij por neceífidade j o animo òs tem rendidos j ainda"

Ccc3 que'^

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exercito.

ç82 CJST<1(10T0 LUSITJNO 164B

i, qiieos vejais contrariosj no cortar de voíTasefpadas achareis
j, corpo, mas não tirareis fangue, porque congelado nasveasj
j, não há de acudir ás feridas j & para que vos certifiqueis , que
), primeiro os há de correr o efpanto , que o còníliáo , tenho
„ dado ordem a eftes índios ( que fó para efte efíèyto vem enj
j, noíTa companhia eftes Bárbaros) que tanto, que os virem fo*
„ gir,efpantados da primeira carga,lhes dem caça pellos matos,
,i a que fé haó de acolher,para q nenhum fique com vida, pois
j, noíTa dita op aju ntpu aquÍ5& de húa vez, ficaremos fenhores
j, de íuas famil ias,& de fuás fazendas, fer vindo-nos de húa , 8c
3, outra couza,com o jufto titulo,que nos tem dado fua proter-
„ via, oíFendendo rebeldes,a quem deviaó fer vir humildes.
22 Coroavaõ-íè aseminencias dos montes , de Olande-
fes,que feus Cabos defíribuiráo,medindo o numero pella ca-
o^/^/áf^íÕ^í-y?» pacidade do terreno, & importância dopofto( occupada a
campina pella frente do repetido boqueirão , do mais luzido
de fua Infantaria. ) Formava o todo^hua viftoza , & formidá-
vel obftentaçaó de aparatos bellicos. O ferro dos mofquetes,
clavinas,chuços,efpadas,alfanges,& picas com os reflexos do
Sol ( já nefta hora com algúas de curfo fobre feu orízonte) a
huns fervia de efpelho, a outros de efpanto . A multidão da
genterecreava,vifta,& encolhia, confiderada: A variedade
de bandas,pl umas, & armas, tanto dos capitães,como dos fol-^
dados, arremeda vão húa primavera agradável , &prometia5
hum inverno horrivel. As bandeiras (eraõ feíTenta & húa re*
fendidas de azul,& gemado) defenroladas das aftes, & movi-
das do vento, ufanas voavão, tremulas fogiaõ: Os inftromen-
tos bellicos, como tambores ,pifanos,& clarins com a voz de
Marte chama vão a morte , porque , fé aonde íè toca vão, in^
fureciaò para a batalha, aonde o ecco os repetia, chamavao
para a fepultura. As féis peças de artelharia, com toda a car-
rn3gem,compunha5 temerozo folio ao Eftandarte General,
cortado de carmezim azul, brofladas nelle , com riqueza , &
arteficio, as armas dos Eftados , & a empreía da Companhia
Occidental, que dividia hum leaõ rompente, com tal viveza
da arte,que por obra fua o podia perfilhar a natureza,porque
o não podia moftrar a extençaô da feda , fem os movimentos
da viração. O Generálj& Coronéis montados, & vcftidos ao

luz-trofo,

164S ^J^ElLlF^OlX. 583

lLiz-troro,& valente, vagavão por entre os erqiiadroês,em tu-
do fuperiores aos Toldados, Em cada húa das coiizas achaváo
'OS olhos muyto que ver5& os corações muyto que recear.

2 3 Em nove cíquadroés, formou o Inimigo fua gente, a ,;^__,
qual fe compunha de Francezes, A.lemaés,Ungaros, Polacos,
Ingrezes , Suecos , & outras nações da Europa , não fendo a '^^^ i-^^irnimo.
fjnenor porçaó , a dos Olandefes . A vanguarda fiou a dous
Regimentos, hum de nove centos, outro de oyto centos fol-
gados os mais práticos, valerofos,& confidentes, que mihta-
vão debaixo de fuás bandeiras : Os mais , todos eraõ vetera-
nos,que tirou dos prezidios de fuás praças , fuprindo a falta
com os bizonhos,que aquelle anno conduzira do Norte a fua
irota.Os Indios,que não tinha difciplinado a arte, como Ta-
J)uyas,& Py tiguares deixou em troços foItos,& volantes,pa-
fa que melhor podeífem fe guir feu eflilo de pelejar j entre os
^uaes fe ouvíão innumeraveis bozinas,& atabaques,que acõ-
panhavão bárbaros gritos. Huns , &: outros tão certos na vi-
â:oria, que entre os defpops da batalha feacháraõ alfayas,
moveis, & ferviços de cazas mudadas; demonfi:ração clara,q
vinhaô a povoar, &: não a contender . Os penfamentos tão
idiverfos,dos q cauzão as cãpanhas , que traziaõ para o enter-
teniméto,&paraodefenfado,bugios,faguins, & papagayos;
occupação toda da paz,nada da guerra. Não podemos alcan-
4çar, có individual efpecificaçaõ,os poftos, em q pelejaváo os
Coronéis referidos. Em hua algibeira do Coronel Brinch[q
morreo nefta batalhai fe achou húa plana , pella qual confta-
fVa o numero da gente , de que íe compunha o exercito inimi-
go (exclufa a multidão de officiaes macanicos, tendeyros,
taverneirosjpadey roSj& vagabundos, que faziaó não peque-
no vulto.

24 A noíTa gente tinha o numero na fufi:ancia,& não na
ãparenciajfe contada era menos,era de mais conta, pellas cal-
lidades de fer toda p r itica, valerofa , & Portugueza , ou por
iiacimentO) ou por trato ;& armada da jufi:iça defuacauza,
era melhor armada. As armas ofFenfivas,comoefpadas, picas,
&mofquetes trazia o exercicio taó luz-trofas, como puídas; Suftãcu do nojfo
& não avia occazião,de q não fahiíTem claras : As defenfivas, exercito.
fabia muy to bem o Framengo,quc todas eraó de pro va,porq

Ccc4 fc

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íli

^n

, 1

Afitmado ecm a

ví.

584 CAsr(^oro wsirj'no

íè os pey tos, & os capacetes não eraó de aço pellâ matéria , o
eraó pella fortalezajCom que expúnhaõ ás bailas, & aos gol-
pes todas as partes do corpo. Sem plumas,porque firmes^rem
bandas,porque conforines3 fem arrogaiicia,porqiie valentes;
fem defprezo, porque timoratos^ fem defconfiança , porque
fieisj fem altiveza, porque foldadosj fem ambição, porq def-
pidosjfeníi fegunda tenção , porque defcalços j fem demazia,
porque famintos^ fem competencias,porque menos. Apenas
fe achava em toda a nòíTa bagagem húa raçaõ de farinha de
páo para cada hum dos noíTos.Sabião , como fieis catholicos,
que fe empenha Deos, em fuílentar, a quem o fervej o que fe
experimentou, em breves horas, na abundância , com que 09
focorreo o cuidado inimigo . Naó avia entre nofíàs armas pe-
ça de artelharia j rejeitou -as a preíTa, & não as achou menos o
triumpho, conduzidas do Framengo , para mayor realce da
viâ:oria. O Meftre de Campo General Franciíco Barreto de
ifia do Meftre Menezes, veftia o femblante das cores de feu animo , & nellc
de camp Gene. vião todos, vencidos feus contrários, não obftante,que opa-
vaI recer de alguns cabos lhe queria mudar o feu. Acófelhaváo,

que a batalha fe negaíTe^ou quãdo menos fe difiriíTciopinião,
que defprezou, contente deter da fua parte , nefte voto , aos
Meftres de Campo Joaó Fernandes Vieira , & André Vidal
de Negreirosj& com elles ordenou, que ao prmieiro final , íè
avançaííè o Inimigo por entre as bailas de fua primeira carga,
até que aofegundo, fe defparaíTem os mofquetes da nofía
parte em diftancia aííi proporciona<la,que fe naó perdeíTe ti-
ro. Tocava naquelle dia a vanguarda aoMeftre de Campo
André Vidal de Negreiros, & fe lhe mandou , que com o fea
terço,& parte do de Joaó Fernandes Vieira cometeíTe o Iní-

na'oáv7nco7om "^^^^ P^ ^^^'^'^ ^^^ ^^^ ^ '^^^ efquerdo, & por contra lado
aparecer de feus Dom António Phelipe Camarão com feu terço de índios.
Ao Meftre de Campo Joaó Fernandes Vieira,que cõ as trez
partes de feu regiméto bufcaífe o Inimigo pello alto-dos mó-
tes,& por feu contra lado Henrique Dias com a fua gente. Ao
Capitão de cavallos António daSylva, Cabo de duas tropas,
que com ellas,& o Tenente Domingos Gomes de Brito,acu-
diíTem, aonde fua aííiftencia fofíe mais neceííària . Com a ef-
pada na mão perfiava o Meftre de Campo General Frãcifco

Barreto

x.r

o qual deter mi'

^eabos.

wm

1648

(pAXrEhLW^piX.

5^^

TocãÕ os exérci-
tos aenVÉjhr.

Barreto de Menezes, fer companheiro dos Toldados na pele*
jaj porém cedeo o valor á rezáo . Dillèraó-lhe os Mcftres de
Campo, que ooflBcioda cabeça era governar as partes da-
qnelle corpojque a obediência tinha por fua conta,trabalhar
com os braçosj o mando, com a cabeça, & que faltando a dif-
poííçaó defta, ficaria defanimado o movimento daquelles.

25 Tocou-fe a enveftir, comaquelles inftromentos, &
vozes, que inventou o furor , para influir na obediência , &
na ira: Moveraó-fe huns , & outros efquadroés j com mais li^
geireza os Portuguezes,porque com menos corpo,& mais ef^
pirito: Recebeo-os o Inimigo com valor , & dilciplina j mas
não lhes retardou o paíTo, com toda a refiftencia ^ nem coiii
duas cargas de artelharia, & mofquetaria , que nelles defpã-
rou. Efquccidos do perigo, atentos á invazão, rorapiaó os
noífos por nuvens de fumo,& bailas, que efcurecião o ar, fem
que algum levaíTe a arma ao rofto.Quando ouvirão o final ef-
perado,que fe deu a tempo,que a proporção da difiancia não
deixou perder tiro,deraõ conformes húa carga,com tal efFey-
to, que a turbação , & defordem dos efquadroés contrários,
moftráraó clafamente,quc podéra mais a perda,que â ordem .
Pafibu-fe palavra,que envefi:iírem á efpada, & achou a Voz a .
obediência tao prompta , & a occaziao tao opportuna , que ^,^^,^ ^-^,^^
em breve tempo romperão os efquadroés inimigos , fazendo pe/ks efcjuadroH
cadahum dos Portuguezes caminho tão largo , quanto o mt- contrarm.
ília a extenfaó da efpada.O Gentio aliado com o FramengOj
Vendo,que nem as armas , nem a multidão dosfeus baftava,
para deter o impetq, com que os noííbs os a vã ça vão, & rom-
piaó, conceberão tamanho medo,que largando os pofl:os , &
as armas fe poferaõ em defatada fogida j & tal foy feu efpan-
to,que no centro dos matos fenão da vão por feguros , Qiiafi
meya hora fuflientou o Inimigo a refiftencia em duvidoza ba-
talha, porém aquelle tempo,que fua difciplina,& feu valoro
teve firme, tiveraó os noííbs para os cortar no razo,&: no mo-
te com taes,& tão pezadosgolpes,que primeiro os efpantoti •
O eftrago,que o conflido: Viaó na oppofiçaõ a morte certa,
& foraó largando o campo,& defembaraçando os montes c5
retirada mal fuccedida , porque adifpofição das ladeiraSjOS
fobmetia debaixo das eípadas ,4 nelles defcarregáraó có tão

âlen-

«■

Osiiítmlffos def-
har^tados Urgao
os montei.

Socorre Iodo Ver'
nandes vieira ao
MefiredeCam^o
André VJdaC^

O mefmo ^^ o
Capitão António
da. Sylva.

Perde o Inimigo
ofeu EHandarte
General.

álenttadp piiIfo,q fenáo viadiftinçaõ entre fcrir,8í matar. II-
luíire exéplo davão os Meftres de Capo Joaõ FernaderViei-
ra , & o Governador dos negros Henrique Dias aos fens 5 &
náo era menos illuílre a imitação , que o exemplo . Já ncftc
tempo o cortar náo era vencer, fenâo deftruirj porque não a-
via inimigo, que o pareceíTe, fenão na retirada.

26 Naó andavão as armas menos quentes na campina,
aonde os Meftres de Campo André Vidal de Negreiros , &
D. António Phelipe Camarão hiaó ganhando terra ao Ini-
migo, que elle perdia, mas não a difciplina , nem o animo j' a
defigualdade era dos puIfos^Sc começou a fer mayor a do nu-
mero , porque todos os Framengos , que vencidos deíxavão
os montesjfe foraô encorpora fido com os fens, que pelejavaõ
no rafo. O Meftre de Campo Joaõ Fernandes Vieira, q lhes
vinha no alcance, fem abaixar a efpada , correo com os fais
íbldados a unirfe com os de André Vidal de Negreiros,& aííi
carregarão o Framengo , que conheceo os braços pellos gol-
pes.Suftentáraõ o pofto cõ a obftinação. Si. náo có a efperan^
Ça,porque fe faziáo rofto ao perigo , era cònftragidos das re*
prehençoês,&: ameaços de feus cabos, que os obrigaváo cona
a injuria , & com o exêploj porém o amor da vida , 3<: o hor-
ror dos mortos os fes efquecer da obrigação,& da honra: Aos
poucos,que detinha a multidão (que o valor a nenhum ) fc5
virar as coftas o Capitão António da Sylva,que chamado dá
occaziaó acudio ao lugar do cóbate, rompendo pelío Inimi-
go có o trilho, & cõ a lança, de forte, que feria , & atropella-
va rendidos, aos que fó nas armas pareçiáo foldadds : Já os
noíTos achavão nos inimigos defvio feiá reparo, matando, &
ferindo íèm diftinção de oppoftos a rendidos. Cedeo a mul-
tidão ao valor.Não podéraó os Olandeles foportar o pezo
de noíTas armas: Perderão de todo a obediência, & a difcipli-
na, rotos,& desbaratados fe poferaõ em defordenada fogida,
deixando-nos no campo a artelharía, a bagagem, & feu Êftã-
darte General,o qual tirou das mãos de feu Alferes hum Sar*-
gento do terço de Joaõ Fernandes Vieira, a quem o aprefen»
touj chamava- fe AíFonfo Rodrigues.

27 Não há vo2,que mais afíegure a vidoria, que a do a-
plauzojcom que fe canta o triun3pho:Na campanha não:Baf'

ta

ta hum pequeno defcuido, para trocar as mãos a fortuna . As
alegria,& a cólera faõ os affed:os , que mais fe apoderaõ do
juizo. O prazer, com que os noíTos apelidaváo a viâoria,foy
acauza,dequeoInimigo fecobraflenouzo defuaartelha-
ria^Sc o ou vera de fer de noíTa perdição . A nenhum deixou
a alegria acordo, nem para retirar, nem para guarnecer a ar-
telharia, de que nos fes fenhores a batalha , & muy to menos,
para acudir, & atalhar a defordem, com que os foldados do
Camarão, & de Henrique Dias fe engolfarão em roubar j & Oslíegròs^é^irt^
como na fortificação da plata-forma,donde jugavaó as peças, ^^''^. ^'os aniJcU
eftava o recheo do exercito^ era o roubo no mefmo lugar , a- ^ ^^^ '"^'^'
onde fe avia de por a guarda j & parecia guarda, o que era ra-
pina:Roto, (como temos dito ) o Framengo, fogião os con-
trários, para onde os levava o temor,& a efperança^húa gran-
de partida foy cofteandoo monte,a qual atalhada dos noíTos^
fe deitou ao alagadiço; (fazialhes a morte mayor horror fan-
grada, que bebida.) porém hiia carga de mofquetaria, que os
alcançou quafi fobmergidos, fe§,com que fuás vidas foíTem
defpo;o de dous elementos: Os de outra partida , que com as
azas do temor fogiaõ por aquella faxa da terra,quc ficava en-
tre o alagadiço,& o monte, feguidos,deixáraõ as arraas,& al-
cançados, as vidas, fem aver algúa, a que perdoaííe a noíTa ef.
pada: Foraõ tantos os mortos em húa,& outra parte , que da-
va feu fangue outro parecer á terra , & outra cor a agoa* Já
não âviarefpiraçáo com alentos para feguir ; já não avia bra-
ço com forças para matar. Efpantou-fe então a e xperiencia,
como agora a confideraçaó, do trabalho, que foportáraõ os
Portuguezes nefte dia, pois quando o fim do conflicio os cõ-
vidava com o defcanço, então o rebate os metia em nova ba-
talha.

•28 Efcondido aos oÍhos,& ás noticias da hoflagente,tí-

nha o Framengo em hum Valle, que faziaó as fraldas de dous

inontes,hum efquadrão de refervajcatorze companhias o for- Co agenie ãere^

mavão; o Coronel Henrique Hus o regia ; mandado vir ào-ç'^^ f^ ^° '"'* *

.' n n r^ •> • N ^r Frumento no per»

Arreciie para eite hm , ( como ja avertimos j com o qual íe ^^^^ ^ ' -

encorporáraó todos, quantos Olandefes o confliâ:o deixou

com vida : Seguia-os o noíTo alcançe^Henrique Hus,que vio

em huns, & outros igual defordem, nãoperdeoaoccazião.

m

lÉV

I

WÊ

¥

5 8S QAST^OTa LUSITJ^O 1 648

que lhe ofFerecia a fortuna. Vio, que o tempo,que lhe gaftaf-
fe a compoíiçaó dos feus, o dava também , para fe formarem
os noíTos, [com ordem do feu General Sifgifmundo,que deC-
baratado fe tinha recolhido a aquelle ultimo refugio. ] Sahio
a encontrar,& a rebater o impetu do alcançe/obio o monte,
cobrou a artelharia perdida,& favorecido delIa,foy carrega-

Reflimefíe m Cm ^"^ ^^ "^^^^^""^ ^''^P^' "" ^^'^"^ ^^ Henrique Dias^que lhe fazia

artelharia. ^^^^ ^°™ militar retirada ; foy focorrido de algiias compa-

nhias,que a cazo o podéraõ fazer; porémj não era baftãte tãa

pequena oppofição para tamanho poder ; fopofto , que lhe

detinhaõ o curfo, (com que ;á decia pello monte , dando , $0

recebendo cargas com difciplinâ)& acordo)não lhe corta vão'

o paíTo. Os noífos Meftres de Campo, que no baixo ouvirão

o eftrondo dos tiros, levantarão os olhos, viraõ a peleja, mas

. não poderão conhecer (pella diftancia ) de que armas era o

melhor partido j antes que entendeíTem, que os feus erão , os

que neceffitavão de focorro, os avançou pello rafo Sifgiíítiã-

o GeneralSifgtf <^0)Com toda fua gente novamente formada, & com novafii-;

nmndofor outra ria jque brevemente lhe fes quebrar a valentia, com que os

f Arte vay ganha- noíTos O foraõ receb€r,& foy tal a oppofição , ( paíTou de re-

ào terra, fíftencia a enveftida,) queprcíiimio Siígifmundo , que ou a

noíTa gente bebera novos alentos no trabalho de todo aquel*

le dia,ou fe avia poupado fó para aquella hora.

29 Aoscftimulosdaoccaziaófobejavaõ os doexem*

piojcom quejoâo Fernandes Vieira, André Vidal de Negrei-

ros,& os foldados de feus terços avançarão o Framengo,buf-

cando os poftos mais arrifcados: Na competência da oufadía

Os nojfos Meftres íè moftra va a do valor : A todos exortava a vifta , a poucos a

Àe Campo o rece- enveja,porque não ouve foldado,que não defprezaífe o peri-

hcmy & rebatem. go.Os Olandefes refolutos em morrer,ou vencer(ambiciofoí

da viáoria ) defeftimavaó a vida; nas pontas de noíTas efpar

das os metia fua colera^por ellas bufcavaó a vingança , & nel-

las acha vaô o caftigo.Cahião os primeiros ,& logo os fegun-r

dos fuftituiaõ o íugar . Sifgifmundo impaciente de fe ver re-^

batido,prefago de fua defgraça , acuíava a fortuna ; mas nãa

abaixava a efpada;com ella na mão feria, & exortava , apimã-

do aos feus com a lembrança da honra,& da in;uria;cftremos,*

com que os perfuadia , a que nefta occaziaõ obrafíèm como'

va-

i6^S

fJTlTB I. L1J\0 IX,

Ç89

valentesj 8c certo, que em nenhum dia mcreceo á fama mais
cfclarecido pregaõ de General,& de foldado . Perfiava o có-
fli£i:o,derprézando-fcoerpanto,quecau2ava a todos ocon-
fuío eítrondo dos inftromentos marciaes:0 retumbar das pe-
ças, o fuzilar dos tiros, o retinir dos golpes , os gritos dos ca-
bos (fem o gemer dos feridos , & dos agonizantes ) cauzava
luia pavorofa diflbnancia. O fumo da polvora,& o pó da ter-
ra não deixava diftingair a amigos de inimigos , porque tira-
vão a jurisdição aos olhos: Húas com outras femoftravaó as
armas,porquefócomaluzdostiros fedeixavaó verasefpa-
dasj era tamanha a confufaó, que pellos golpes, & pellos puí-
fos fe conheciaó os braços, & não pellas peííoas : A nenhum
deixava a vezinhança efcolha,& cada-qual fe valia da arma,q
lhe permitia ufar a diftancia , Sc tal-vez inutis, ainda as mais
curtas , fe vinhaõ a braços j aproveitando-fe o dezatino de
unhas,& dentes . A multidão dos corpos mortos ,( que para
liuns era cumulo,para outros vallo) a todos irritava, a nenhu
compungia: O menor numero dos Portuguezes,lhes não dei-
xava cahir os braços,porque animados de invenciveis efpiri-
tos fe moftravaõ incanfaveis. Aos dous Hercules Portugue-
zes Joaó Fernandes Vieira5& André Vidal de Negreiros não
pode chegar entaõ,nem a emulação,nemaenve)a;fuas proe- Perfado cvhu,
fas callou naquellc dia a admiração , para agora as ouvir a in-
credulidade, porém diffimula-as a pena , porque a limitação
do voo não chega a taõ alto aíTumpto: Quanto obráraò 5 &
quanto merecerão, fó por inferências fe poderá alcançar:Có-
íidere-fe a duração do perigo , & logo fe verá o muyto , que
obrou o esforço. Ao Meftre de Campo João Fernãdes Viei-
ra chegou hum valente Olandès, a pegar com a mão efquer- /j
da nas rédeas do cavallo, & levantando o braço direito para
o matar de hum golpe, antes que deíTe a ferida , recebeo húa
cutilada, que juntamente o partio,& apartou . Era mais for-
içofo o braço, foy mais ligeiro o movimento. Aííi o achou to- ca^os.pdrtkuU'
do o tempo do confliâ:o entre as efpadas , & balias , fem que rcs dejk encotroi
algum deiles materiaes o feriíTcjque fe o não temiaó, parece,
cjue o refpeytavão.Hum pelouro lhe furou a orelha do caval-
lo,não pello ferir , fenão pello galantear . Em nada des-feme-
Ihante, vio a occazião ao Meftre de Campo André Vidal de
:t . _ Ddd Ne-

iiin

jo

«I

Irtcifco "B Arreto

AntonioBias Car
do^o o executa.

^ 90 C^ST^lOTõ LUSITJKO j 648

Negreiros : Ferio-lhe húa balia o cavallo , em que montava,
paíTou-fe a outro,& deixou o ferido para o ver defpadaçado
de outra balla,& nelle o quãto o refpeytava a fortuna. A hú,
& outro acertarão muytos pelouros , que paráraò nos vefti-
dos:Unia-os a amizade,& naõ os fabia diftinguir a forte.

30 O Meftre de Campo General , que pelejava com os

braços de todos^Sc a todos affiftia com os focorros, & com as

^^•^^"^j v^^ ^"^ "O "^^^s travado da pendência, vinha Henri-

deMenez,es mã- que Hus carregando a Henrique Dias pella ladeira do mon-

da cortar o pajfo te, ainda defpois de focorrido j [porque a nofía gente fe era

aHenn^ue Hus. poderofa para O deter,não baftava para o avançar] & conhe-

ceo,queopenfamentodo Olandès, era lançar-nos fóra do

' ■ boqueirão , aonde pelejava a mayor força dos exércitos ; fes

avertencia ao Sargéto Mayor António Dias Cardozo do in-

tento,& do perigo j o qual o atalhou com tal difpofiçaó, que

fem fe afloxar o combate da frente , a fes por aquelle lado , §

olhava para o monte, recebendo a Henrique Dias,& a gente,

que com elle refiftia, & fe retirava : Encorporados defta for^

te, rebaterão a confiança Olandefa , tão aceíà, que nos metia^

os mofquetes nos olhos 5 mas reprimida com tal valor , & for-

ma,que obediente o Inimigo á difciplina,& á efpada foy per--

dendo terra: Sifgifmundo,que a tudo atendía,vendo à força^

& a deílre2a,que o defcópunhao,& a vetagem do íitio , em 4

os noífos pelejavão (fortificados por hum lado do bofquç^

pello outro da lagoa5J& ^ue a pequena abertura da entrad*

para os poucos era útil, para os muytos nociva , com o q nos

ficava inferior no partido, determinou vencer com a arte , as

oppofiçoés da natureza. Fes pé atraz,tocandí> a retirar: For?

o General sifgif^^^ ^^ ^^"^ P^^^^^ regras, que lhes enfinavãq os reparos dos

mu^do fe retira. noíTos. Apareceo a(]^uelle teífeno [que atuns , & putros deí^

cobrio a feparaçâo dos exércitos] feito hum lago de fangue,

& hum mote de corpos mòrtosieípcâaculQiy ifta , horri vely

á confideração,miferaveL

31 Em tanto durou a fufpenfaõ das armas , em quantos?

fe deu nova forma aos combatentes . Tocoíj o Framengo a:

Com nova forma enveítir-avãçou furiofo o boqueifão,^em o qual não fò achou

comete o boc^uei- refiftencia, fenâo repulfaj os mais atrevidos eraõ os m»is caf-

tigados, porque nenhum deixava de pagar , o defejo de ven-

rao.

Ger:

>'*

OO

1648 fpAX^El.LIFT^O IX. 591

cer: O lugar^que defoccupavão os mortos,& fcndos,cnchia5
outros faós, & folgados^ o deftroço dos primeiros acendia o
furor dos ícgundos: O horror da batalha, a todos fervia àcc£-
timulo, a nenhum de efpanto . Os Portuguezes em vez de a-
floxarem com a perfia , fe irrita vão com a pertinácia: Os fu-
mos da ira cegavãoos olhos paraa laftima. As gentilezas , cõ
que os noíTos cabos rebatiáoj&fangravão o Inimigo,náo dei-
xarão individuar, nem á occaziaó a femelhança, nem á hifto-
ria a competência i porque aííi como o vigor em todos nacia
de húa mefma cauza , affi parecião os golpes de hum mefmo
braço. Em ganhar ,& defender o boqueiráo,coníifl:ia a vito-
ria de hua, & outra gente , & ambas defprezavão o perigo,
por confeguir o intento. Cinco horas avia, que durava a ba-

talha,& nellas fe virão os noíTos algúas vezes táo apertados, , ^^■'^^ ^"f^ Jf,^
2 , ^ 1. 1 -r» f 11 TT • • • duYnr a batalha

que le temerão perdidos: Porem aquelles Heroes mvenciveis cinco horas.

João Fernandes Vieira, & André Vidal de Negreiros , que
com a propriedade de rayos bufcavão a reíiftencia mais du-
ra, pararõperem mais violentos, ( allí os achava a neceífida-
de, aonde mais nos arriícava a falta do focorro ) que para fua
cfpada, não avia reparo,nem para feu avanço,empedimcnt05
por tudo rompiaó, a todas as partes cortavaõ, fem perderem
tempo, nem golpe. Entre muytos, que nefte combate deixa-
rão a vida,a facriíicáraò pella liberdade,& pella pátria, no al-
tar da fama,os Capitáesjoaó Rodrigues,&Domingos daCo-
fta,porém á cufta de tanto íangue 01ádés,q com húas mefmas
lagrimas os chorava da noíTa parte a falta,&:da outra,a perda.
32 Já o Inimigo cortado do ferro, & do medo,com a ti-
bcfa tinha perdido a obediência; nem a gritos , nem a golpes
podiaõ Sifgifmundo, & feus cabos, fazellos entrar no confíi-
Sto'. Sem tocar a retirar, o fizerão todos os feus a tempo , que
andavão as armas,& os mofquetes tão efquentados,que nem
as mãos os podiaõ fofrer , nem os braços os podião fuílentar.
Com muytadifficuldade pode o General Olandès atalhar ^ (;;^„j ^i^^„y^jpj^^^
fuga dos feusj chegarão a obedecer á diligencia, cm taõ apar-y^^^-^^ lar^ão os
tada diftancia,que ti verão os noíTos lugar, & tempo de refpi- inimigos o camfo.
rar.Deixou a ira abrir os olhos a Sifgifmundo,& conheceo o
dano,que tinha recebido pella falta, que lhe fazião os mor-
tos, & pella qudxa, com q[felaíHmavaó os feridos; fendo

Ddd2 aiujto

«■

^or arte.

592 C^SV^IOTO LUSITJNO 1648

muyto poucos, os que fem ella , os podiaó ouvir, &hum
delles , o mefmo Sirgifmundo , a quem htía baila bufcou pel-
lo artelho do pé, com golpe taó nocivo, que fe alli lhe
*^ não tirou a vida, lha deixou para fempre em muletas: A-
companhava-o na dor , & na forte o Coronel Authim paí^
fado pello pefcoíTo , de húa baila, ( ferida , de que convale-
eeo) Sc para fempre oavizou, que não eftivera longe da<
morte, quem a tivera na gargantaj aumentou-fe a Siígifmun-
do a magoa com a certeza, de que feus Coronéis Henri-
que Hus , & Vanelles ficavaó mortos no campo do comba-
Cortado ^^ ft^y- te, & O ficaria também Kever ,fe hum Capitão do terço de
da,felívraojm']o2iò Fernandes Vieira, o não tira ta das mãos dosfoldados,
mgo do alcance (defpojado ;á das gallas,& das iní]gnias)& o naó aprefentára
ao feu Meftre de Capo , em cuja prefença achou feu pofto,
honra,& fua vida, fagrado.Com a falta deftes, vio também a
de cento & oy tenta officiaes de Sargento paracima, q faziaõ
numero com os mortos,&adetrinta&:trez bandeiras , con»
o Eftendarte General , que da mão do feu Alferes arrebata-
rão os noíTos: A grande multidão dos feridos,lhe dava o ma-
yor cuidado,porq no embaraço de fua livrança, via occazio-
nada a ultima ruina de fua gente, & lhe foy neceíTario todo
o coração, & toda a induftria para fahir de tamanho aper-
to* Ardiloía meftra foy fempre a neceííidade:De faõs,& fe-
ridos formou hum efquadraó, a cujo vulto fiava a perfuafaã
do engano, era efte moftrar , que ainda nos avia de enveftir^
Aparencia,q nos teve ordenados atè o.fim do dia:Efte,o dei-
xou aproveitar da noite, que efperava,parà fogira feu fal vo.
33 A nova forma, que Sifgifmundo dava aos feus, fazia
crer aos nóífos,que ainda tinhaõ inimigos^que vencerj par%
o que fem kfgârem as armas, nem os poftos , efperavaõ o co-?
,^rr^ bate.Era pellas quatro horas da tarde, & a cótinuaçaó do tra-
refeyçaõ, ér def- balho,& falta de rcfeyção, os tinha quebrantados, & desfale-

Tomto os mt

canjo.

eidos nas forças,aiilda que inteiros íio animo. Acudio-fe a ca-
da hum com húa pequena cantidade de açúcar desfeito cm a-
goa,focorro , mais para refrefcat, que para refazer ; podia-fe
tomar por receita, como medicina, não por raçaó, como fuf-
tento : Fraco , mas fufficiente remédio paraicorpos , que íe
alimentavão de tamanhos efpiritos . Em troços os tinha:

par-

partidos a ordem dos Meftres de Campo com prematica, cjue
dada a primeira carga/c rompeflb á efpada. Acabava-Te o dia,
& a paciência dos noíTostCom militares deíafios provocarão
ao Inimii^o hãa,& muytas vezes a aceitar batalhaj porèra elle
alhco de remelhantepenfamento, como fe fora infeníivel, fe
confervava immovel,porque furtado a noíTos olhos , cobria
com o corpo de fua gente , a diligencia de retirar os feridos - -i
mais perigofos para a Barretaj& forão tantos,que carregarão
cinco barcas em repetidas viagens da Barreta para o Arreci-
fe. Entrou a noite com tamanha tempeílade,deagoa3tro voes,
& vento, que parecia repetir-fe entre os elementos o paílado
confliâ:o. Não perdeo tempo Sifgifmundo-.Mandou mil foi- Foge' slfgifmun'^
dados,que fe adiantaffem a guarnecer o caminho , de embof- ào-^Ara. a. Barre
cadas, para defenderem a marcha, em cazo, que os noíTos lhe ta,:^ríado^vif'^
deíTem alcance; coberto do efcuro5& acompanhado do filen- ^^ -

cio, fe pos em fogida pella rneya noite. Acazo o picarão v in-
te foldados pella retaguarda, (que para o efpiar no pofto, fa-
hiràodonoíTo alojamento) feguiraó-lhe o trilho, &imagi-
nando,que mayor poder o carregava, fogio com tal deíatino,
que deixou muytos feridos , & as poucas armas , que levava,
para caminhar mais ligeiro.

34 Comaluzdamanhã, fahiráòosMéftresdeCampo
João Fernandes Vieira,& André Vidal de Negreiros a certi-
fícar-fe, ou da fuga, ou da forma do Inimigo.(Duvidou-fe de
liúa,& outra couza por noticia,& opinião. ) Acharão a cam-
panha coberta de defpojos fem inimigos;& defta vez a viâ:o-
ria fem batalha, ogofto fem receo, & o triumpho íèm con-
trario. Correrão a congratular-fe comoMeftre de Campo
General Francifco Barreto de Menezes , a quem fe deviáo os (^^'^'^^^oos nojjos
primeiros v ivas,pello que nefta occaziáo obrara feu valor,^:
fua comprehenção . Acclamou-íc por todo o alojamento a
victoria, com todas as demonftraçoés de alegria, & de gratifi-
cação a Deos,confeírando,recebella da mão doAltilíimo,
Correo a nova por todo aquelle defi:ri61:o , & o mefmo alvo-
roço, que acreía, a duvidava f condição , que traz confígo a
poíre,do que muyto fe defeja quãdo maisfe duvida:]Aquel-
3es moradores, que poucas horas antes, fe conflderavão con-
denados á morte, & ao grilho, vendo-fe com liberdade certa,

Ddd3 en-

a. vicíoria.

i$94 C^ST^OfO LU^ITJNO

engrandecião a Miíericordia Divina, concorrendo pai^a húas
mefmas lagrimas, a compunçáo5& a alegria. Dcçéraó dos ma-
tos, os mais v ezinhos, a dar , & a receber parabéns de tama-
nha dita,que lhes aumentava a viftadoperigOjnahorribili-
dadc do eftrago : Não fe via pello campo da batalha outra
^ couza niais,que armas deftroçadas , & corpos mortos, & dif-

Mayor amj a o ^^j-j^^g envoltos em feu mefmo fangue, empoçado cm mu v-
^ tas partes, o quai a terra ;a nao bebia por congelado : Elpec-

taculo tão horrendo, que o via a laftima efquecida da of-
fenía.

9 5 Deixou o Inimigo no campo, mil & duzentos mor-
tos^ entre elles, dous Coronéis: Tenentes, Capitães, Ajudã-
tes. Sargentos, & Alferes, fizerão numero de cento & oyten-
ta,fem entrarem nefta foma, os que efcondéraõ os matos,que
perda do inimi- forão muy tosj& muytos aquelles, que por falta de cura mor-
go de/pois da ba- réraõ na Barreta, & no. Arrecife . Não fe dá numero aosferi-
tdha. doSjporque a cautela, os não deixou contarmos de mayor poA

to, foraõ o General Siígifmundo por hum artelho ^ o Coro-
nel Authim pello pefcofíbi& outros officiaes menores : Dos
foi dados, a poucos deixou de affinalar o nofíb ferro . Os def-
pojos não parecerão de exercito guerreiro, fenão de Cidade
pacifica: Cantidade de ouro, & prata em moeda,&: peças^ca-
vallos ajaezados com riqueza, & primor : veftidos de guerra^
& galla j fedas de arteficio,& valor: Chapeos,& plumas de ef-
tima: Sedas , & olandas em roupa , & em peça, muy ta copia;
Muytos efpadins , pey tos , efpaldares , & capacetes de preço
pella tempera,& pellas guarniçoês.(Forão os foldados de D.
António Phelipe CamarãO)& de Henrique Dias, os que mais
fe aproveitarão do melhor, porque a todos fe adiantarão no
faço:) Duas peças de bronze,com armas de fogo, & ferro em
grande cantidade: Munições de toda a forte,em numero cre-
cido:Mantimentos para o fuftento, & para o regalo,em muy-
ta abundancia:Húa botica de toda a variedade de medicamé-
tos.Ultimamente hiia foma grande de varias priíbês para ma-
siiatar dativos , que em fua determinação avião de feros fol-
dados ,& moradores, a que fua vontade concedeíTe a vida:
(Mais alta providencia trocou as fortes) Entre os priíionei-
rosj foy o feu Coronel Kever o principal.

56 Cuf-

Ci

I é 48 ÍPJ^E 1. L1F(^0 IX. ç 9 5

36 Cnftou-nos a viâ:oria oytéta & quatro mortos; [eK-
cluíos os reffenta & cinco do choque da Barreta]os de pofto,
forão os Capitães João Rodrigues,&Domingos da Coftaj&
o Alferes Manoel Ferreira de Lemos,que viera da Bahia c5 ^^^ ^ qumtA-
hum focorro de pólvora. Os fcridos,pafíara5 de quatro cen- heaprâAdanof-
tos, a faber, quafi trezentos do terço do Meftre de Campo y^í/^ríe.
João Fernandes Vieira; cento , & tantos do terço de André
Vidal de Negreiros: Era força , que dos terços de Henrique
Dias, & Dom António Phelipe Camarão ouveíTe mortos, &
feridos, que não avia de defigualar a forte, aos que igualou o
conflito; mas aquelle cuidado, que os meteo na batalha,lhes ♦^
faltou com efta gloria (não he menor, neftas occazioés , a do
que morre, que a do que v ence. ) Concedeo-nos o ceo efta
vi(5i:oria em o domingo da Pafchoella dezanove de Abril do
anno de 1 6 4-8 . Faufto para todo o Eftado do Brazil 5 porque
nella efcreveo noíía efpada com o fangue Olandès a fenten-
ga de pleito tão renhido . Útil para o Reyno de Portugal,
porque lhe julgou o domínio, &fobio a reputação. O dia
pello titulo, fervio ao feftejo , pello mifterio, á confiança. O
prazer da v iâ:oria,guardou o tempo para a manhã da Senho-
ra dos Prazeres; porque fe v ifíe no titulo a cauza, com qUe o .
ceo,& a terra concorrerão para o feftejo: Confideraçáo, que
fes crer aos fieis , deverfe a gloria do triumpho a Chrifto Se-
nhor Noííò, & fua Sanâ:iffima Mãy. Com efte conceito mã-
dou o Lecenciado Domingos Vieira de Lima ( Provifor, &
Vigairo Geral das Capitanias intereíTadas) que no Domin- Devota padadel
go feguinte,fe expofeíTe o Sanâ:iflímo Sacramento em todas com que fe dão a.
as Matrizes..dellas, & fe rendeífem a Deos as graças de vence- ^"^^^/^/'"^^
Herejes, á vifta de hum myfterio, em que triumpha a fé. J^ '^^^^'^ cán^ií'^

rem

Em todos os conventos de Religiofos fè imitou a piadade,&
fe autho rizou a gratidão , com fermoês doutos , & devotos,
ponderando a grandeza do beneficio,& as òircunftancias, c5
que fe devia medir o agradecimento. Doutrina , que moveo
os auditórios a lagrimas de compunçaó,& alegria.

37 OsMeftresdeCampo,officiaes,foldados,&mora'>
dores,que fe acháraó na batalha , deraó novos empregos á fa- ^,,,,^y^, ,.,',,
ma. Os cazos particulares fes o valor comuns , porque todos ^^ Capitães^&Jol
obráraó maravilhas. A todos deve a pátria gratas memorias, dados,

Ddd4 & '

I i

59^ C^'ST(pylOTOLU$lTJ1S[Õ

10^2

H ao menos àtvl-
dos aos ReligioJoSy
& Sacerdotes.

Capitães^ que fe
acharão no cÕjHw
cto ào terço de
Joad Fernandes

Vieira,

Vo terço de An-

tonio Vidai de Ne
greiros.

Sc a Monarchia incorruptíveis eílatuas.O Meftre de Campo
General Francifco Barreto de Menezes riada ficou devendo,
nem a feu rangue5nem á noíTa efperança.Joaõ Fémádes Viei-
ra,& André Vidal de Negreiros, vencerão neíla occaziáo o
impoffi vel, de fazerem mayores feus nomes . Os Governado-
res de Indios,& Negros, Dom António PheIipeCamarão,&
Henrique Dias, fizerão conhecer ao mundo,que o valor não
he herança, fenáo excelência. O Sargento Mayor António
Dias Cardozo,immortaIi2ou neíla occazião fua capacidade,
& feu braço. Os Tenentes Generaes , António de Freitas da
Sylva , & Phelipe Bandeira de Mello moílráraõ , quanto íeii
merecimento fe adiantava a fua opinião. Os Capitães , & of-
ficiaes menores, enfináraó a todos, como em h5.a mefma mão
cabiaõ as armas,& as infignias . Os clérigos , & os Religiofos
do Patriarcha Saó Bento, Carmo,Companhia de Jes vs,& do
Patriarcha Saó Francifco, acreditarão aquella piadade,&: va-
lor, com que os primeiros filhos de feus inftitutos deftruiraõ
herezias,& adminiftravaõ Sacramentos. Os nomes de alguns
deixou então de publicar o defcuido,& agora o tempo,
com aquella injuria , com que nos eícondeo os authores
de fingulares proezas. Repitiremos , os que nomeou a lem*
branca.

38 Capitães do terço do Meítre de Campo joaõ Fer-
nandes Vieira. António de Caftro, Amaro Cordeiro, Antó-
nio da Rocha Damas, António Borges Uchoa.Affonfo de Al-
buquerque, António Rodrigues Vidal, Bertholameu Soares
Canha, Brás da Rocha , Brás de Barros Teixeira , Cofme do
Rego, Domingos Ferreira, Francifco Berenguer , Francifco
de Lisboa, Francifco Barrciros,Gregorio Fragozo,Joaõ Soa-
res de Albuquerque , Joaõ de Pontes , Manoel Moniz, Ma-
noel de Abreu, Manoel Lopes,Paulo Teixeira,PheIipc Fer-
reira, Sebafciaó Ferreira , Vicente Curado ; & Domingos da
Con:a,Sc Joaõ Rodrigues,que morrerão na batalha.Do terço
do Meftre de Campo André Vidal de Negreiros , foraõ os
Capitães,que fe acharão na batalha, António Curado Vidal,
António Rodrigues Franca,Antonio da Sylva, Amador Ro-
drigues, António Dias Santiago, Francifco da Rocha , Joaõ
Batboza Pinto , Joaõ Lopes, Lorenço Carneiro, Man oel de

Aguiar,

6

Aguiar, Pedro Cavalcanti de Albuquerque. Capitães de ca;-
vallos António da Sy Iva ,& feu Tenente Domingos Gomes
de Brito. Os nomes dos Capitães dos terços de Dom António
PhelipeCamaraó,& Henrique Dias,oupellafombra,ou pç\- ^^P^^^^^ ^^ ^^-
lo aíTombro, fizeraó (fem duvida") mais luztrofa a hiftoria, fe '^^f,^^&Gover-

r M ^r^ 111 -r nadares 4e IndtoS

OS nao elcondera a noíia pena , a que delles nao res memo- ^ j^^^as
ria.

99 Pellas mãos da incredulidade, federaõ,& receberão
as novas da viâ:oria na Bahia 3 como fonho as avaliava , quem
com mais atenção as ouvia, até que com certeza,asdevulgou cheçra âBahia &
o Conde de Villa-Pouca,que entaó governava o Eftado,por mvadAvíãoria.
correyo,que teve deZenobio Achioli^a quem aííi o ordenara
o Meftre de Campo General Francifco Barreto de Menezes,
remetendo-lhe poreíla via,com algúas bandeiras Olande-
fas, os mais certos teftemunhos da verdade . Fora o fucçeíTo
tão alheo da efperança de todos , & do conceito de António
Telles, que informado na deíigualdade do poder de húas, &
outras armas, tinha affentado coníigo , como por impoíTivel,
deixar de vencer o Framengo , & tão firme eftava nefta opi- . .
niaó,que mandara ao Capitão Pedro de Miranda com dozé-
tos Toldados, em cinco companhias,que foíTe aflegurar a paf- ,^^
íàgem do Rio de S. Francifco,para que eftiveííe franca á gé-
te,que podeíTe efcapar das mãos do Framengo , & vieíTe fo-
gindo para a Bahia. Quanto mais inopinada foy a viâ:oria,tã-^
to mais feftejada foy do Conde General,de todaarmada,foI-
dados,& povoj enchendo os ares de vivas, as roas de feftas,&
os Templos de lagrimas , com que gozofos , & compungidos
tributa vão a Deos as graças de tamanho beneficio. O mefmo
efFeyto cauzou a nova em todas as povoações do Eftado. ^

40 Algum breve defcanfo tomou o viâ:oriofo exercito
no mefmo lugar do confliâ:o,pondo em arrecadação aquelles .

defpoios,q pertenciaõ ao fifco Real: Entregaraó-fe ao The» f^ ^"'^^ ^°j'°^
r/'Tr .^^p .- enterrar os mor"

2oureiro,por conta,& pezo, as armas, muniçoes,&mantime» tos^&curarosfe'
tos . Deu-fe fepultura aos corpos dos fieis , com as honras ridos.
funeraes , que prometia o tempo , & o lugar j não lhes faltan- ;

do com a ultima piadade de faudofas lagrimas , &: com os fu-
fragios poífiveis. Com muyta diligencia,& zelo, fe emprega-
rão todos na cura dos feridos , exercicio, & cuidado,que to^

máraõ

^9S

CAST^IOTõ LUSITAKO

'164-8

io para o Enge
nhoNovo.

-4nira5 muy to por fua conta os moradores dos lugares vezi-
nhos, levando-os para fuás cazas na forma , em que o oermi-
tiaõ as feridas, aonde os ferviraõ com remedios,& regaÍos,até
a perfeita convalencia: Emprego, em que mais que todos , fe
cíineráraó os vezinhos da Moribeca, fiados na fegurança de
terem fuás fortificações bem guarnecidas:Os feridos mais pe-
rigofos pedirão,para fuás cazas, os moradores de Sanâ:o An-
tónio do Cabo, para ondelhes facilitava o moviméto,a pou-
ca diíl:ancia,(que fera hiía Icgoa de Nacente para o Poente,&
levados em redes,erâ a mudança fem rifco) aonde todos affif-
tiraò a fuás curas , com aquelle defvelo, & competência, a q
cftavão obrigados, & lhes avertiaó, & lembra vão as feridas,
que recebéraõ,a beneficio de fua liberdade. Ordenado todo,
Marcha o eaerã' o que convinha ao bem de vivos, feridos,& mortos,& refref-
■ cada a gente, marchou o exercito para o Engenho Novo, íi-
tuado dos montes Guararapes para o Norte, no caminho do
Arrayal, aonde fizeraõ alto.

•?4m Em vinte de Abril dia deNoíTa Senhora dos Praze-
res de manhã, entrou Siígifmundo no Arrecife,aondefe vio
li vre,mas nãodefaíTombrado denoíTas armas,& de fua perda,
que lhe dobrou o fentimento com os prantos , que cauzáraó
as mortes,& as feridas naquelle povo,aonde não ouve peíToa,
a quem não alcançaíTe a magoa, & o luto. Vio a todos tão
queixofos,& cabidos de animo , quetemeo por mais perni-
ciofos eíFeytos, os da defconfiança,que os do deílroço^exco-
gitava o reparo, & conferido feu penfamêto com feus cabos,
aíTent ára5,que o mais breve feria o mais efticazi & o mais fa-^
cil, a entreprefa da Villa de Ohnda,fem prezidio para a refií-
tencía,nem promptidão para o focorro , em quanto onoílb
poder, lhe ficava tão remoto 5 & ferviria o bom fucçeíTo de
divertir as queixas, & enxugar as lagrimas do magoado po-
vo^& também de tirar, em parte, aos foldados o medo con-
cebido,& a defconfiança ganhada no fucçeíTo paííado.Efco-
IheoSifgifmundo feiícentos homens , dos que vio mais ani-
mados, deu-lhes por Cabo ao Capitão NicoIas(aquelle Olã-
dés,que com duas companhias de Eftrangeiros fe avia paííà-
do para o Arrecife, como fe referi o no li vro feptimo , nume-
ro quinze defta hiftoria. ) Na tarde do mefmo dia fahiraõ do

Ar-

Entra Slfgifmu
dono Arrecife.

r*

r\

MAnàa ganhar a
Villa de Olinda,

164S TAXrEl.LIV(!{p IX, t^^^

Arrecife, marcharão pella praya , entrarão pella ViUa fem a-
char peíroa,qiie os encontraíTe, porque alguns foldados , que
nella ficáraó,re tinhão recolhido no Reduto,que chamavaó a
Guarita de João de Albuquerque,forti ficado com húa trin^
cheira,& guarnecido de cinco peças de artelharia, pequenas,
& de ferro. Virão os defenfores o Iniraigo,& defampáraraõ o
Reduto,certos no aíTalto, incertos no focorro: Com grandes
demonflraçoés de gofto, feftejou Sifgifmundo o fucçeíTojen-
carecendo os intereíres,& conveniências de ficarem fenhores
da Villajfabendofuainduftria exagerar a opportunidade da
emprefa pella bondade do íitio, excelência das agoas, & pu-
reza dos ares,de que neceííitava a cura5& a convalecencia dos
feridos,que logo determinava conduzir, para o dito lugar.

42 Chegou a nova defte revés da fortuna ao Engenho
Novo com aquella preíTa, com que voão as do pezar j mal fe
poderá dizer, o que cauzou a todos,& menos, o que com ella
receberão Francifco Barreto de Menezes , João Fernandes cÕavi:(p da per"
Vieira,& André Vidal de Negreiros : No mefmo inftante, fe àamarchao mjfo
tocou arma,& marchou o exercitOi& no mefmo dia , que era ^^^"^° f^^^
vinte & hum de Abril pella tarde,fe alojou no Arrayal,& de-
céraõ dos montes os moradores d^ Várzea , que com fuás fa-
milias efperavão entre osbofques ofucçeíTo dos Guarara-,
pes. Ao outro dia mandarão os noíTos defenrrolar as bandei-
ras Olandefas em partes, onde foíTem viftas do Inimigo,para
que refrefcada a magoa com a lembrança da perda, que as bã-
deiraslhes traziâo á memoria , amortalhaíTem no eftendido
delias a pequena efperança , que lhes cauzára o favor da for-
tuna na entreprefa da Villa : Não tardou muy to a forte em
nos confundir efte leve prazer c5 outro mayor pezar. Aquel-
la nova Força chamada da Bataria, em que fe fundava toda a
efperança de fe ganhar o Arrecife , pello dano irreparavel,q
delia recebia todas as horas , ( Já diíTemos em a livro oy tavo
defta narração numero trinta & féis, que pello modo , com q ^ ' . .

P , ,* , , ., r ^ 1 - rr OccupA olnimitro

lora obrada,parecera obra milagrola,) acharão os noílos per- ^ ^^ V ^^^^^^/^^^
dida,& occupada do Inimigo, fem, até aquella hora, fe alcan- àA Bateria, y
Çar o como, nem o quando^nem faberem atinar,fe o chamara
o avizo, fe o defamparo. Sahiraó os noíTos Meftres de Cam-
po a reformar as Eftançias de aoyos prezidioSj&: virão a dita

Força

^

*^

! ,: ;Ai

%/^

«

tmda.

600 . C^íST^^WTOLVSlTjnO 1648

Força da Bataria prezidiada de Olãderes.Coníidere-fe a dor,
que lhes cauzaria golpe tão fenfiveí ! Cortou-lhes as cõfequê-

- cias de fuás erperanças5& todo o fruito de fua indiifína. Fre-
fo o CapitãO) a quem íè fiou a defenfa, (com prezidio,não fó
baftante para hum aíTalto, fenão também para hum cerco) 8c
examinada a cauza/ahio abfolto na fentençajmas na opinião
do vulgo, nunca ficou limado da culpa: Quem melhor dis-
corria, mais condenava a aqaelle Capitão , que perdia hua
praça,ou por temer o Inimigo, cobardejou pello defprezar ,
confiadoi& fahindo delia fem combatejnem ferida, provava,-
que a não perdéra,fenão que a entregara,

43 Magoados os noíTos cabos mayores de facçeíTo tã-
to mais infelice, quaíito menos efperado , tratarão de empe-
nhar o reílojpara lhe cortar as efperanças da ditai& P^ra que
ã dilação lhe não deíTe mais horas de gofto jafíentou oMef'
Eecuperaõos noT- ^^^ de Campo General,João Fernandes Vieira,& André Vi--
ps a viU de o- dal de Negreiros,que com toda a prefi:eza,& a todo o rifco fe
defalojaíTe o Inimigo da Villa de Olinda, pella importãcia de
fe lhe não dar tempo á convalecencia das feridas , nem a ga-
nhar íangue para acometer novas emprcfas,Eícolheraõ-fe pa-»
ra a facção os Capitães António da Rocha Damas , do terça
de João Fern andes Vieira 5 Matheus Fagundes , do terço de
Dom António Phelipe Camarão jHenrique Dias com os fol-
tlados de feu terço,& Brás de Barros por Cabo de cópanhias
(tinha-o fido da guarnição da¥ilia.)que todos faziaõ nu me-

> 10 de trezentos homens, ao qual feordenoi3,qíueganhaíre a
praça ao Inimigo,& que foífe ília a difpofição . Em v inte &

' dons de Abril pella tarde fahiráo os noíTos do Arrayal , mar-
charão furtivos , & chegarão já de noite a humfitio,meya le-
goa da Villa,que chamavão de António de Sá Maya j[pello a-
V er poííuidoi com boas fintinellias5& práticos deícobridores
do campo, fe alojarão nelle.

44 Em a feguinte madrugada amanhecerão os noíTos
fobre a Vilia: Mandou o Capitão Eras de Barros adous foi*
dados deftros nas ruas,& becos delia, que exploraíTem, o que
na povoação avia: Succedeo, que na fUa de São Fedro derâo
de rofto com as fintinellas contrarias,as quaes vendo-fe aíTal-
tadasjtocáraõ a rebate com tirosj& v ozeSjSc de corrida toma-
rão

raó a vcreda,qne guia para a Igreja do Patriarcha Sa5 Bento,
fcguidos das noíTas efpiasaté a fortificação de João deAlbu-
qiierquc,(;i diíIèmos,q eftava fituada no caminho da praya,
da Villa para o Arrecife ) aonde fe alojava o Capitão Nico-
lás, com os ditos feifcentos foIdados:Ouvio Brás de Barros os
tiros & vozes do rebate , fofpey toii o empenho das duas íln- BartfdTalofl
tinellas, apr eíToii a marcha, chegou á vifta do Inimigo, & de imZgol &lhs
paíTo lhe deu algúas cargasj meteo-fe debaixo de fua arte]ha-/á»í o alcance.
ria , cometeo o aíTalto , dizendo aos feus : Avança , avança, á
cfpada filhos. Vozes forão eftas, que affi cortarão ao Inimi-
go, como fe fora o mefmo ferro: (Arma foy a noíFa cfpada, q
feria Framengos com o corte,& com a vifta:)Os que fe aloja-
vão fora da fortificação, fogiráo com defordemj os que den-
tro a guarneciaõ, com defatinoj deixando-nos na mão o Re-
du to,& a trincheira, como fe para efte fim a guardarão. En- .
tráraò os noíros,& voltarão fobre os Olandefes a artelharia
do Forte,& com as bailas os bufcáraó , & feguiráo, até onde
curfavão as peças . Foy em feu alcance hum troço de folda-

dos nofíbs,& tantos matava o furor, quantos alcançava o bra-
çoi não ouve inimigo,quc fe lembraíTe da refifi:encia, nem do

reparoj affi recebiaó o golpe, como feeíliveraõ obrigados a ,^

não defender a vida i todos parecião Olandefes, fem algum
moftrar,que era inimigo. Continuou o eftrago,até onde che-
gou o alento: Faltos delle, fizerão os noífos alto no meyo da
praya, não fó para defcanço, fenão também para defafio.

45 O Inimigo,que do Arrecife vio o confliclio, fera dif-
tinguir o deftroço , com prevenida ligeireza defpedio duas
partidas de foldados, em focorro dos feus , aos quaes acháraó Soccniâo o Tr^
)i recolhidos a húa de fuás Fortalezasi& tão fora eftivcraó de ^^^^^» ^^" ' '
lhes comunicar animo,que lhes bebéraõ o mcdo,de forte,que/* ^^■^''^^^^■^*
' com exceffivo numero,não ouve quem fe atreveíTe, a provar
a mão com os poucos Portuguezes, que na praya os convida-
vão com o vulto,& com o íitio: O mais , a que fe atreverão,
foy, fahirem a recolher os corpos mortos dos feus , que cahi-
raó mais perto da Fortaleza. Cêto & feíTenta Framengos dei-
xou eftirados no capo o chumbo,& o ferro j& a efte refpey to
íe podem orçar os feridos^q forão muy tos,nos moftrou o fan-
gue^ o quantos foraó, nos efcondeo o Inimigo : Cuílou-nos

Eee . efte

, nao oííSLS

m

602 CAST(^ioro LVSnAKO

16^%

RecolheO'fe fem
perda de hun , ó"
outra farte.

y

Sifgifmundo pe>-
de os fem fríjio'
neiros.

Chtfra ao Arreei"
fe humfocorro de
oUnda.

efte defejadõTucçeírojfete feridos, o de mais conta,& de ma-
yor perigo,foy o CapitáoMatheiís Fagundes,pafíàdo de húa
baila pellos joelhos: Deixoii-nos o Framengo quafi todas as-
armasj de munições, mantimentos,& moveis^não levou cou->
2a algúa, não porque o cegaíTe a ira, fenaò porque o aconíe-:
Ihou o medo. Grande foy a eftimaçaój& gofto , com que en-
tre os noffos fe feftejou a v iíioria , & a reftauração da praça,
porque foraõ grandes os inconvenientes,que com hua,& ou-
tra couza fe atalharão, naõ fendo o de menor pezo, a fegurã-
ça da campanhâ,expoftâ ás correrias do Glandes por aquella?
porta.Guarneceo-fe a Villa^ medindo-fé o prezidio pella im-
portância, & ficou tâo abatido o orgulho Frametigo,camo o
deixou a renovação da primeira chaga , com efta íegunda fe#

rida.

46 Pella Eftancia das fãlinas(em vinte & oy to de Abril)
mandou Sifgiímundo hum bólatim,& carta, em que pedia os
priOoneiros, deixado em noííàcleiçaó os partidos^ com avcr-
tencia,que as mefmas condições fe achanaó da fua parte,quã-
do fe trocaífe a fortuna: Grdenou-fe ao bolatim , que entre-»
gaíTe a carta j fem lhe permitirem, que entralTe na Eftancia , o
mandarão voltar com repofta de palavra, Sc que a feu tempo
fe refponderia:Entre os priííoneiros,efpecificava os trez Co>
roneis, moftrando, ou com âftucia , ou com ignorância ,que
não fabiade Henrique Hus, & do Vanelles, ferem mortos no
confíiâ:o. G Coronel Kever , que era fó o prefo , íè pos a bõ
recado na Fortaleza de Nazareth, até que ouve occaziaóde
fe remeter á Bahia , &: defpois para o Reyno . O mais, que o
Glandes lhe pode alcançar, por então, foy licença para que
hum Gentil-homé de fua caza ò fervife na prifaó . Era o Co-
roneI,peífoa de callidade, ^ de eftimação entre os feus.

47 Entre as náos da armada Glandefa, que íè derrota-
rão no Canal, ( como efcrevemos no livro oytavo , numero
quai-enta Sc fete) tomáraõ algúas , difFerentes portos , aonde
fe reparáraó;& defpois fahiraó na demanda do BraíihEm húa
delias navegava hum Coronel^ homem de grade opinião por
dotes da natureza,& da fortuna; (o defcuido,& o tempo nos
roubou feu nome. ) Cõ algúas das embarcações defgarradas,
que recolheo , aportou na barra do Arrecife pellos últimos

dias

dias de Abril defte prefcnte anno . Foy recebido com menos
alvoroço,que defmayo: Os lutos manifeftavaõ a trifteza j os
empraftos adefgraça. ínformou-fedacauza,&efquecidoda \

compaixão, cenfurou a fraqueza de todos com eícaiidalofa
arrogância (logo o veremos mais caftigado , que efvaecido.)
Chegou á vifta de Sifgifmundo ; gaftou poucas palavras de
comprimento ,& paíTou logo ás da altiveza, dizendo,que nii- ^
ca imaginára5efperalIo mayOr torméta no porto, que na v ia-
gem. Que ;uizo (dizia o Coronel) fe avia de perfuadir , que ^ f. t j » r
quatro moradores bifonhos , defpidos, & famintos , aviaõ de fy^nha a fraque*
contraftar o poder de húa armada, a que toda a fúria dos ele- ^^â dosfem.
mentos não o podéra deftruir? Quem avia de imaginar , que
hua frota, em que fe empenharão igualmente os Eíl:ados,a
Companhia, & os particulares, com terror da Europa,não fi-
2era mais, que fervir com miíeravel efi:rago,aos triumphos da
America? DiíTe , que a perda do cufto (ainda , que lamenta-
velj fe poderia reftaurar, mas que a da reputação , como, ou
quando,fe eíperava refazer , fe para as nações do mundo fe-
ria, em todo o tempo, ouvido com irrizáo, & defprezo,a pó-
pa,& o gafto, com que Olanda levara a fepultar fua opinião
nos matos do Braíil. Que elle vecdadeiraméte creia, de exer-
cito igualmente luzido,& numerofo,não poder fer vencido,
& deftroçado, fenão em cazo, que os Portuguezes os achaf-
fem maniatados, ou a dormecidos . Sufpenfo, & reportado,
ouvio o General Sifgifmundo ao demafiado Coronel , eníi-
nado a fofrido de golpes , St de experiência tão frcfca, que
ainda deita vão fangue as feridas . Com moderação de enten^
dido, lhe refpondeo , que não era para elle novidade , o que ^ „^^ ^^^ reCpon^
ouvia,porquedemuytos annos tinha alcançado reprender, ^^ j^/j^/^^^^í,,
ou efcuzar o mundo as acções pellos fucçeíTos , & não pellos
acertos,porque nunca fucccdéra averdefgraça femnota, né
dita fem aprovação; mas queria, que fe entendeíTe , que não
tinha feu valor, &feu cuidado permitido a menor occazião
de queixa á Companhia, de céfura aos Eftados, nem de mur-
muração aos povos; antes a todos merecia muy to,porque,fe \
perdera húa batalha , ganliára húa Fortaleza com a qual não
ío fe recuperava a perda da Companhia, fenaõ também a re-
putação dos Eftados: A Fortaleza da Bataria (profcguia Sif- ,
^:- .-) ^ Eee2 gifmuíido)

! 'I

:'|Ji':ít

«

6o4 CJST<I(10TO LUSITjno Í6'^^

gifmundo ) que tirei dasimãos dos Poftuguezes , emporta
maisj que o domínio de toda a campanha ; efta de nada nos
ferve,íem aconfervaçaó do Arreei fe,o qual não fe podia fuf*
tentar com a oppofiçáo daqueiIa:Que.em quanto ao defpre-
20, com que avaliava os Portiigue2es, clles reíponderião por
íi mefmos ; que de feus foldados , era ki m Henrique Dia^
Governador de hum terço de iMegros deTpidos , & defcal-»
ços, como os knaginava ; que âhiSe a chocar com elles , Sc
defpois os eftimaffe , pello que mereceièm; 8c do que lhe
Mc^a-occmode- ^"^*^^^^^^ ^ inferiíTe pellos negros, que homens eraõ o^
fengam.éro que ^^^"^«5 j defengauo , para que lhe ooncedia a efcolha ,&<»
Ihefuccede, numero dos foldados , que quizefíe levar: Mas que fe guar-:
dafíè, não vieíTe com as mãos amatradas , Íevando-as fol^
tas. ■ . -nsqí:'. ' ^

48 Com aquelle defprezo, com que os impruden*
tes defeftimâo os vencidos, ©uvio o Coronel a Siígifmun-
do ( Capitão a quem fucçefíos illuftres tinhaó feito , gran-
de na opinião de todos ) aceitou o oíFerecimento com alti^
veza,& efperança de v erificar fea conceito: Efcolheo os foU
dados , de que tinha mais fatisfaçaõ ; gaftou alguns dias em
os exercitar nas armas-^ & apreâado de tudo , o que lhe pa*
receo neceíTario, fahio do Arrecife com dçus mil infantes
(em vinte & hum de Mayo dia da Afcença5 do Senhor, com
efperança de achar emfeu favor a veneração do myfterio,
- em que os fieis fe aviaó de occupar. ) Marchou para a Eftan-
cia de Henrique Dias: A poucos paíTos , deu com as fuás
íintinellas ,& as feguio , até fe recolherem dentro das trin-
cheiras 5 que achou vigilantes,& guarnecidas com tal força j
& arte,qual não imaginavaíFoy recebido de húa,&muytas
cargas de mofquetes bifcainhos, cuja pótaria,& alcance dei>
ribou não poucos;& avizoua todos,o quanto lhes convinha^
porem-fe bem ao largo . Já a efta hora o Coronel Glandes
eftava menos quente, St ficou de todo frio, quando viò,
que Henrique Dias fahia das trincheiras com todos os feus,
os Negros de He a enveftilb na campanha . Furiofa foy a peleja , & contu-
uque masocaf- ^32 ^ pcrfia, fem que nenhúa das partes perdcfíe palmode
gano. terra {_ contrapelando-fe o exceíTo do valor com o do nu-

mero. 3 ferviào as cargas ao combate có as ballasjSc ao avizo
. ; , com

164S 'P JXTE L LlV^llO IX. 6o<^

com oeílrondo; chamados dellc, acudiraõ(das Eílancias das
Salinas, emqiieeftava porfronreyro o Capitão Francifco
Eerenguer)duas cõpanhiasj& da Eftancia do Paço,qi]e guar-
necia a gente da Paraíba, os Capitães António Rodrigues
Vidal, Manoel Moniz,& Joaõ de Pontes : Carregarão o ini-
migo pellos lados,&Henrique Dias pella vanguarda com tão
pezado ferro , que lhe fizeraó largar o campo,& virar as cof-
ias, fem que a preíTa lhe deífe lugar a retirar os mortos ( def-
pois de os tcré ligados pellas cinturas com fogas,para os leva-
rem arafto) fogio para a fua Fortaleza da Barreta,aonde ven-
cido,&obftinadoefcondia o medo próprio, condenando a
fraqueza, & a pouca difciplina dos feus.

49 Abrigado da Fortaleza,não receou o Coronel pro-
var fegunda vez a fortunada multidão dos feus fiava o àcC-
troço dos noíFos, impaciente, de que tão poucos venceíTem a
tantos. Deu noya forma a fua gente,& intentou infundir-lhe peyfa oh/linAolo,
outro animo:Em íèu crecido numero , lhe reprefentou fua
mayor afronta. Da opinião perdida , fazia argumento para
os empenhar na honra^ dizia , que a fraqueza era nas mulhe-
res dote, nos homens crime,& nos foldados infâmia : Que na
milícia o fogir, era labeo, q fó tirava o faber morrer:E quan-
do já lhe pareceo, q a vergonha os eftimulava para a vingan-
ça, tocou a enveftir . Horrível foy o combate pello eílrago,
Sc pella tenacidade. A continuação das cargas, a hum mefmo
tempo abria, Sccondenfava os ares com o fumo, & com o es-
trondo. O General Sífgifmundo , que eftava na cama,& com
o fentido no confli6i:o, inferio o fucçeífo pella duraçaõ,& te-
meo o focorro pello tempo : Deípachou húa ordem ao Co-
ronel, que logo fe retiraíTe , antes que a gente do noífo Ar- Co avi^o desif-
rayal deçeíTe a enveftillo^ o que não poderia tardar,prompto KÍÍ^^'^^° P ^^'
fempre para focorrer os feus : Que fe livraíTem das mãos dos ^^^^'^^J'-^'^'
Portuguezes , paíTando-fe logo á outra báda do rio pella pó-
te,que lhes mandavalançar, porque antevia, o que poderia
fucceder, certo , dequevendo-fe os Portuguezes com mais
poder,debaixo da Fortaleza o avião de enveftir , & desbara-
tar,porquc era gente, quenemfomava partidas , nem temia
balias. Ajuftou-fe o preceito do General como.defejo do
Corone];Com a obediência cobrio o temor , & fem detença

Eee3 pos

^1

6o6

CJST<]lIOTO LVSITaKO

1648

pos em falvo o corpo , mas não o juizo , confuzo, de não
laber )ulgar os fucçeffos ai heos, fenão pella experiência pró-
pria.Os noíTosMeftres de Campo, queno Arrayal ouvirão
os ecos dos tiros , que retumbavão por todo o recôncavo,
mandarão tocar arma, & com a gente mais prompta fepoíe-
ráo em marcha: Naõ deixavão de avertir,que poderia o Ini-
migo chamallos para húa parte , & aíTaltallos por outra , po-
rém venceo o valor a forpeyta,& Joaõ Fernandes Vieira,to-
Bfcafa das maos da a oppofíção da cautela ; chegou á Eftancia de Henrique
de loão Fernan- Dias,mas a tempo,que feu auxilio fobejou á viâ:oria,porque
já no campo, fenâo via mais,que o deftroço da batalha , & os
aplauzos do triumpho, com que fe recebeo o focorro. Gran-
des diligencias fes o Meftre de Campo Joaó Fernandes Viei^
ra,para que o Inimigo,que ;á tinha paflado o rio, tornafíe á
campanha; porém elle com as lições defezudo, fenão deu
por entendido do defafio. PaíTado de húa balia pella gargan^
ta, ò carregarão os feus maniatado : Foy caftigo do cazo ; &
pareceo comprimento do ameaço de Siígifmundo.Dos mor-
tos,& feridos do contrario,fenão fonbe então o numero;def-

hua , ^ outra gê-

des Vieira.

Com que perda âe . c íV' " -r • o j-j r j

,-_ pois conieíiarao OS prilioneiros,&rendidos,que tora grande

te.

■^

o dano,qiie recebera: De que fe recolheo com perda muy to»
confíderavel, podia fer bóa prova,a que ouve da noíTa parte,
que foraófete mortos, entre ellesdous Alferes do terço de
Henrique Diâs;& mais dous foldados,que defpois morrerão,
do numero de vinte Be cinco feridos,

50 Duro frey o foy em todo o tempo para o Olandès a
Eftancia de Henrique Dias: Era a mais vezinha ao Arrecife,
em tal íicio, & em tal forma, que não fahia Framengo por a-
qiiella parte, que não cahiíle nas mãos de feus foldados . Me*
tidos pellos lodaçaes até a cinta, fe embofcavaõ entre os mã-
gues, taõ perto de fu as fQrtificaçoês,qne não movia o Inimi-
go hum pé, que o naó fentiíTem: Nelles tinhaõ focorro,& íe-
guro todos, os que fe queriaò paíTar á noíTa parte ; & morte,
ou cativeiro, os que fahiaó a fazer qualquer ferviço.Infofri-
do de jugo taó pezado,& dano taó certo,fes Sifgilrnundo to-
do o poffivel pello atalhar, feín nunca o poder confeguir:C5
os golpes creciaó as queixas dos feus,& não pafíava hora,fem
que vacillaífe nos meyos, que podia ter o remédio, 8c fe algii

ef-

'4WI

I64S

ÍP Jl^ra L LIV(^ IX.

607

cfcolhia, lho reprovava o valor, & a cautela, dequeíempre
o achava prevenido .Refolveo-feSiígiímundo em fiar o ne^
gocio á perfia, porque quando o não alcançaíle ditofo ,0 cò- , ^'^^ (/í^/^*'
lèguiria importuno. Em dezoyto de Agoílo aíTaltou a fobre- ^^-^ /-^^^^ ^ w,
dita Eftancia có dous mil Toldados, que a enveftiraó com de- taticia dcHemi-
fatada fúria: Defendeo-le Henrique Dias com o derenfado,q que Dias.
cauza o pelejar por regalo , & o vencer por cuftume.No ma-
yor empenho do combate , chegarão os focorros das Eftan-
cias vezinhas.Deixou o Framégo a expugnaçaó , avertindo,
que elle fó era, o que pagava as cuftas da demanda : Cincoé-
ta mortos lhe ficáraó no lugar do combate ,& fe retirou com
grande numero de feridos. Da noíTa parte foy a perda taó pe-
quena, que a naô eftimou a lembrança . Outras muy tas vezes
intentou o Olandès o mefmo, fempre com o mefmo fucçef-
fo. A continuação do caftigo lhe tirou do penfamento a per-
fia do intento , mas naó da memoria dos Pretos, a vingança. ^
Não fabiaó dar quartel,porque fua crueldade, fó com tirar a
vida, fe fatisfazia : Mayor feu ódio , porque pafiava além da El/e^ oscajliga. et
morte. No principio da guerra, a todos, os que matava íeu 4»ri) ferro.
furor, cortava fua barbaridade as cabeças, & com ellasanda-
vaó pellas portas dos moradores, das quaes fenáo apartavão,
fem algum eftipendio.Cuftou muy to aos Meftres de Campo,
& a feu Governador,apartallos defta ferocidade , & reduzil- ^
los, em algúa parte, aos preceitos da miliciai& foy neceíTaria
a doutrina de todos os dias,Dara tirar cuftumes de muytos
annos. Avertimos, q em os mezes de Junho, & Julho não ou-,
ve fucçeíTo, ('mais que o referido) que mereceífe particular
lembrança. - '-■"

51 Defcanfáraõ osPortuguezes no ociodas viâ:orias,
& os Framengos nos braços do defmayo. Não tinha acabado Entra em o noífo
o mez de Julho, quando chegarão ao noíTo Arrayal quinhé- Arrayal [ocorro
tas cabeças [de gado, tiradas de Sergipe delRey \ Sc logo em degadosi&genu.
. V inte & quatro de Agofto, o Meftre de Campo Francifco de
Figueiroa com hum terço de quatro centos infantes(feu Sar-
gento Mayor Jerónimo de Inojoza) fruito das diligencias do
Mefíre de Campo General Francifco Barreto de Menezes,& ■ y* •
focorro,que mandava o Conde General AntonioTelIes.Co-
mo foldado conGderon a falta da gente , & de mantimentos,

Eee4 que

éoS

CJST^WTOLUSITJ KO

1648

que fe poderia feguir a hua batalha campal, & como Gover-
nador do Eftado , a obrigação que tinha , de acudir á confer-
vação,& ao remédio dosVaííallos de Teu Rey. Ao tempojque
^ ^ o Meftre de Campo Francifco de Figueiroa , com a fua gea-
^e ma^a o o- ^^ aviftou a noíTa Fortaleza do Arrayal , ouvio o eco dos ti-

de ae Villa'Foti' n • r ti r ^ ri

ca^Generd da ar ros,;& vio o tumo da polvorajque íe levantava lobrea Forta-

mada. lezados Affogados,emcuja vezinhança chocavão naquella

Iiora, os noffos com o Inimigo, defejou, com o focorrojdarfe
a conhecerão Framengo, primeiro pella eípada,quepe]lo a-
" vizo^porém o feu terço era de Toldados do Reyno , inexper-

tos no eftiío daquella guerra, & todos vinhaó canfados da
marcha; com não poucos enfermos fe recolheo ao Array al,a-
onde chegou a tempOjque pode receber as boas vindas,& dar
os parabéns da vidoriaaos do confli6i:o,que vencido o Glan-
des, fe tinhaó retirado.

5 1 Enfermou neftes dias o Governador dos índios D.
António Fhelipe Camarão, Varaó grande em nação humil-
de: Correyo da morte foy a doença, & por ella conheceoo

Bnfermd 'D.Ân' fim de fua vida, que foube immortalizar , como a feu nome.

toniojhelife Ca- -^^^ f^^ grande vida a duração do tempo^ fopoftojque a po-
de fazer larga; a occupaçaó do tempo he , a que faz húa vida
g rãde^porqu e a v ida dos mortaes, não fe mede pello que du-
ra,raede-fe pello que obra : Computada a vida defte Heroe
peílo que obrou , foy de muy tos annos. Naceo índio, porém
entre os índios o mais nobre.O nacimento lhe deu o nome de
^'V> Poty : [que na lingoa do Gentio he o mefmo,que Camarão.]
OBauptifmo lhe deu ode António. No tempo deMathias
de Albuquerque , era já refpeytado entre os feus por mayo-
íal de muy tos;& com muytos auxiliares o veyo focorrer , &
fervir á naçãOj quando o noíTo poder fe alojava no Arrayal
velho, chamado de Pernam-piorim , Illuftre prova de fideli-
dade,& amor, com que fervia á naçaõ,& ao Principe, oíFere-
cer-lhe aefpada,quando os perfeguia a fortuna. A mefma ad-
verfidade,de que o mais Gentio fes cauza para a rebeldia,fes
o Camarão motivo para a liãça.Eui íèrvir á Igre;a,&:á Coroa
ganhou luzido credito de foldado,& de Religiofo;& taò ob-
íer vante de fuás obrigaçoês,que nunca o vio diftrahido,qué
* fempre o venerou foldadc^Todos os dias ou via MiíTa , & re-
' ? - fava

marao.

^

\

fava o officio de NoíTa Senhora, modefto, & devoto.Gaftav^a
muy tas horas naoraçaõ, a que fe aplicava, ainda entre ús ^ff]. '^^^^^^^^^j
mayoreseftrondos da guerra: Para fahn- aos rebates ,& para ^ "^''^'^^ '^^'
entrar nas batalhas, primeiro Te fortalecia com os Sacramen-
tos, que com as armas:Nas occazioés mais arrifcadas recorria
ao favor divino, pedindo auxilio a duas Imagens do Senhor,
Sc da Senhora,que entre as roupas trazia de contino fobre o
peyto.Em quanto foldado, não ouve Capitão mais amado,
nem mais obedecido,porque não ouve Capitão, que achaíTe
mais império na afabilidade,que no dominio,do que efte V a-
ierozo Capitão. As emprefas o erperavaó fempre com as vi-
torias j& ganhou tantas vi£i:orias,quahtas foraó as occazioés,
em que pelejou.Para feu genio^era o ócio martyriò , & o tra-
hú\io defcanfo : Avaliava a penalidade por deleyte, & as oc-
cazioés por dita. Seu nome,como memorial de fuás proezas,
íè ouvia entre os noflbs com refpeyto , & entre os inimigos
com efpanto 5 &dilatou-o de forte a fama , qu€ chegou aos
Ouvidos de feu Rey ta5 diftahte, quanto o apartavaó os dila-
tados mares,que dividem a Amelica da Europa: Sem petição
'odefpachou feu mericimento. Deu-lhe elRey Phelipe o
Quarto, o habito de Chriftb, o titulo de Dom, & o pofto de
Governador,& Capitão dèral de todos os índios da Ameri- Mercês, que lhe,
ca. Zelou o decoro,que íè devia ao pofto,que occupáva,com fi^ ^^^^y-
toda a circunfpecçaõ, quelheeniinavafeuclarojuizo.com
^s peffoas grades, cftranhas,& de refpeyto falava fempre pot
interprete (ainda que fabiá a lingoa Portugueiajporque en- ^^^
tendia fer a impropriedade, & inculto das vozes, fifcal do a-
Jiimo,& difcredito da pefíba : Na arte da milicia,foy iníigne,
na do governojclaro . Com os feus, era fácil no trato ; com os
fuperiores, grave na convèrfaçaõjcom os eftranhos,afavel no
agazalhoj mas taõ medido com todos, qiie obrigava a amor,
& reverencia. Em todo o tempo, & lugar o achou o ferviço

3de Deos prompto,& o culto dos Sandos liberal. Vi veo,como
<3ifcreto , porque foube v i ver para Deos,& para os homens:
Morreo,como Chriftaój porque fe foube aproveitar de to-
'dos os remédios , que ajudão a falvaçaô : Na vida, adquirio
gloriofo nome; na morte, moftrou,que pafíara á eterna vida Suamorte,
(como piadofaméte fe pode crer de hú Chriílaõ , que morre

com

Smenterfo.

r-

'Ml

Succeâe-lhempo
ãofeuprimoT)om

DíogoPinheiroCa
murAÕ.

Faltao os manti-
mentos no Arra.-
yal,(jr no Arreei'

6ío CÀSr(!{10T0 LVSITAKO r6^%

com moílras de arrependido,&: Sacramêtado,)Intáfí:o quaíi,
do ehi]mboj& do ferro fahio de innumeraveis combates , &
batalhas^ &: entregou o efpirito a íèu Criador , poucos mezes
defpois da dos Guararapes, em fua própria cama ; para qiiç
lhe não faltaffe a fua morte, o pafecer fonp. - - -rr -^ r

53 Do repouzo do leytofoy levado ao da fepultura , q
fe lhe deu na Igreja do Arrayal, com a funeral pompa , que
cuftumava a piadade,& a milicia5& comaquelle concurfo, a
que obrigava o amor5& o reípey to. Com a grandeza poííivel
fe lhe fizeraõ as exéquias, fendo as do fenf imçnto , íguaes ás
da perda: A de feu valor choravaó os cabos; osfoldados, a dè
fua difciplinaj os moradoreSj^a dê fua defenfa^ os^Indios, a dè '
fua honra^ os foldados de fç|i terço, a de feu remédio jtrazenr
do-lhes amagoa á lenibránça,naquella hora5as muytas veze%
que nelle acharão O! amparo da-yid^ , & o foçpffo da miferia.
Com eftas memorias o n|[p perderão de vifta^ quando já o ef-
condia a terra, porque; íè o não viaó os olhos , fe deixava ver
nas lagrimas. Em todos os prefentes crecia o fentimento com
a repetição das cauzasj& nejlas^achavão todos hum cõtinu^ ,
defpertador das faudades . No lug^r lhe fuceetdeo feu primo
Dom Diogo Pinheiro(rião íey^ífe por mércé delRey , íe por
nomeação doMeftrede CãnJpo. General Francifco Barreto
de Menezes j fey que fe lhe tinha feito mercê dp habito de
Sãtiago)fqldado valerofo,& pratico,como criado na melhor
efcola, & na melhor doutrina,qne he a do exemplo^em parte
G imitou ,€01 nada o excedeoiRezão, em que fe fundarão os
índios daquelle terço, para nunca enxugarem as lagrimas , q
lhes cauzava a perda;jppfique çífeiíiáp pámp.jf§íiãsp á vifta da
reftauraçaõ. ;t .! • --^ - "^''.' ^ -«-s-f . .^.: -v/-

5 4 Grande falta <3e mantimentos Fe começava a fentir
entre os npíros,porque ao paífp que eftes creeiaõ , aquelles íè
atenuavão. Acabara 'íè o gado,que viera dq .Sergipe,' & não ar
via géneros para fuprir a M;ta. As fârinhas(com a retirada dos
moradores na occazião dos Guararapes) faltarão agora,por-'
que então fenâo plantou a mandioca,de que fe fazem. As ro-
ças, que naquelle tempo eftavaõ já plantadas , forão no pre-
fente , remédio opportuno, mas não fufficiente. A neceífida-
de pão refpey ta dom inio3tudo fazia comum a penúria. Sem

1648

¥JXrE 1. LlF(!ip 7X

611

^^

diftinçaõ de próprio, &alheo femádavão preparar farinhas
para o exercito: Os moradores,fe ou veraó nefte aperto coni
tanta fidalguia,quelargáraó fuás roças aos Toldados . Não fe
achava o Olandès em ílias Fortalezas menos faminto j mas
remedeava-fe com mais facilidade5& menos cufto : Có as em-
barcações do Reyno,qiie por aquelles mares tomavão as fuás
fragatas, provia os celeiros, & aumentava os tefourOs. A-
plicava-fe a efta guerra como de mais proveit05& menos pe-
rigo. O General Siígifmundo, inquieto com a lembrança dos
Guararapes, & da perda, aííi da reputação, como do poder,
que lhe reprefentava a rezão, que os Eftados , & a Cópanhia
poderiaó ter para o privarem do cargo, ou acuzado dos emu-
los,ou da defgraça, defejava atalhar eftas queixas,êm quanto
tinha poder , para foldar eftas quebras .Ajuntou as náos,que
tinha, forneceo-as de mantimentos,& munições para muy toá
dias,& com bóa guarnição de infantaria, fcerto, de que a ar-'
mada de Portugal tomara a derrota do Reyno) íe embarcou,
& tomou a da Bahia. Com tempo favorável entrou naquella
enfeada, deitou gente em terra , & com fortuna de pirata , & 'DellefaheSifgif*

-. c, 1 r 1 1 1 1 /- 1 -r-» 1 n - 1 fnudo CO armada^

deltreza de loldado, deu lobre os Engenhos,& cazas dos mo- ^rjjaydeílruiroí

radores,que ficavão mais perto da agoa. [O repente da inva- contornos da Ba'

2aó os tinha índefenfos: "] Encheo as náos de defpojos , fem b('^-

batalha^ deu á vela, fem detença^ & navegou fem contrafte.

Deixou aíTolado tudo, o que pode alcançar o braço,porque

foy fem comparação mayor a perda , que o roubo ( vinte &

dous Engenhos , íicáraõ de todo arruinados : ) Entrou pella

Barra do Arrecife com algúas embarcações , que lhe cahiraó

nas mãosj foy recebido com aplauzos de viâ:oriofo , & bem

affbrtunado.

5 5 Enformado o Meftre de Campo General Francifco
Barreto de Menezes da viagem do Inimigo,& da aufencia da
parte principal de feu poder j&avertido dos Meftres de Cã* Francifco Barre-
po,que não avia,que recear na campanha, convieraó,em que ^^ ^^e Meneses 4-
íe deífe licença aos foldados da terra, para que foíTem defcan- ^^^^ °^ ^^^''^ ^^
Çar a fuás cazas, aonde, fem o trabalho de guardas,& vigias fe
poderiaó refazer nas forças neceífarias para as occazioés mais
precifas,quando para ellas os chamaírem;& com o reftante da
gente guarnecerão as Eftancias : Valeraõ-fe defte meyo para

atalhar

>.i'ii

-^

exercito.

éi2 QAST<!{loro LUSlTAno 1^49

"atalhar gaftos.Nefta fufpenfaó de armas ti verão os morado-
res tempo , & lugar para cultivarem fuás fazendas^reparando
Q arruinado, & reftaurando o perdido, cauza da farturaj&a-
bundancia, com que Deos acudio á neceífidade-mais precifa,
como diremos no anno feguinte cõ o favor do ceo^em o qual
entraremos referindo os aííentos, que fetomáraõ no Reyno
em ordem ao bem do Eftado do Braíil.

56 Com o principio do anno mil & feiícentos & quaré-
ta &nove, o teve a nova Companliia Geral do comercio do
t'c O' Te no Braíil. Já no mez de Dezembro fe praticava na matéria por
Reyno as pcrdas converfação:AquelIeshomêsdenegocio,qHe viviaó na Coi^»
do contraio.^ tz^Sí quaíí todos os dias,fc encontravão na rua, conferiaó en^
tre fi a atenuação do contfa6i:o , repetindo as perdas , como
principal cauza, com a laftima de fei* raro o navio , que efca-
pava das mãos dos 01ãdefes,ou ao fahir do porto de Lisboa,
ou ao prepaíTar as Ilhas, ou na altura de Pernambuco , com o
que, nem avia fazendas para a comutação, nem vazos para as
conduzir.PaíTou a pratica, de entretenimento acuidado , &
eRe a excogitar remédios para tanto dano ; & já quando en-í
trou Janeiro 5 fe tinha adiantado íBuy to efta matéria no de-
fejo de todos,fem que algum atinaíTe meyo,que parecelTe fó-
Jido, porque os difficultava o Framengo com a mafcara de
Amigo,& Aliado. As efquadras de Piratasjque fuftentava na
cofta de Portugal ,& altura das Ilhas, dizia, que eraó de Vaf-
fallos defobedientes, & levantados contra as Provincias uni-
das, em cujos roubos não tinhaõ culpa os Eftados [obrigados
a guardar as pazes da Linha para o Norte.] Da Linha para o
Sul, infeílaváo os mares a cara defcoberta,como em mares , q
não comprehendiaõ as capitulações das pazes: Nelles erão
mais os coírarios,porque nelles erão mayores , & mais feguras
as prefas. Erão fenhores dos principaes portos , aonde os na-
vios de fuás efquadras tinhaõ á mão os mantimentos, & o de-
pofito das fazendas, de forte, que fem as levarem a OIanda,&
íem gaftarem tempo, defcarregavão huas, & fahiaó ás prefas
de outras: Navegavão as nofías embarcações com a fíngileza
Jpõuõ-feascaw dos antigos Portuguezes,& com aquella paz,que os eníinava
:^asdeilas. a prregar de generos, & na5 de armas ; deftas carregavão as

fragatas Olandefas^para fobprefarem aquellas3 & não era ne-

ceíTario

,,/?

1649 ^J^ÈhLmi^lX. <5i5

ceíTario mais, para renderem hum navio mercante, que ve-.
rem-no com os olhos: Amainava aotirodehúapeçajentre-
gava-fe á vifta de húa lancha^Sc fe em alguns vazos por indu^
ílria dos mercadores avia petrechos para.areíiftencia,náo
queria ufar delles a malicia, com que alguns Meftres, a titulo
de fornecimento, tomavão fobre os navios mayores cantída-
des de d inheiro,das que podião pagar vindo a raIvamento,&:
como deixavão a ganância fegura no porto , donde lahiaõ)
faziáo conveniência da perdição, bufcando occazioés para fe
entregarem aos coíTarios ^ porque defta forte ficavão livres
dos acrédores, defpojados das fazendas, & dos cafcos \ 8c por
eftes dous meyos fe vião os homens de negocio totalmente
perdidos,& o comercio de todo acabado.

57 Defcorria-fe com variedade fobre a materia,& co-
mo a Coroa não avia de faltar a prometida amizade , deixou
correr o reparo por conta dos particulares : Aproveitou-fe o
difcurfo do exemplo; & da mefma cauza do dano tirou o c5-
tra veneno. Dizia,que affi como a Companhia de Olanda cõ Coferê-feorme-
o cabedal de particulares unidos formara o poder^ cõ que ar- <^i<?.
, niava para o roubo ; affi em Portugal fe lhe podia fazer op-
' pofição pello mefmo eftilo ; & que com elle fe reftauraria o
comercio em Portugal,& fe diminuiria o de Olanda , pois a
rezão ditava,que com noíTa cÓ veniencia fe defraudaria muy-
to fua ganância. A grades Miniftros parecerão bem eftes dif-
curfos. Comunicaraó-fe ao Principe,com a eíperança das co-
fequencias, tanto para o Reyno,como para as conquiftas,dó-
de tiravão os gaftos , & utis, com que os Framengos fe arma-
rão, Sc enrequiciaó.Difputou-fe a materia,em repetidos c5-
greíTos de Miniftros, & contratadores ; levou a aprovação de
todos, o meyo apontado: Entrarão a dar-lhe forma,& venci*
das as difficuldades fe reduzio a efpeculação a pratica^Sc nef^ ,^
te mez dejaneiro fe v io formada a Companhia Geral do Co^ ^ ^
mercio do Brafil, com todas as condições, & preceitos , q pe^ Cor^pJhia docs.
diaó,a adminiftração dos cabedaes,& o aprefto dos comboísj w^mo GhaL '
tendo por fiador de fua verdade , & confervação, a protec-
ção do Principe,o favor dos grandes,& os interefes do povo;
com o que fe comunicou em breve tempo com as partes in-
tereíTantes, não fó do Reyno próprio, fenão também dos eí^

Fff tranhos.

m^H^

'«I

éi4 CAST(^oroLusirjno i.

tranhos, chegando a huos por empenho, a outros por comu-
tação ,& a todos por noticias, levadas mais, que por nofía di^
ligencia, pellas muytas que fcs o Framengo para empedir os
progrefíbs deUa, que )i perfágo temia,Sc defpois fentio , co-
mo diremos no difcurfodefta narração, que me chama com
os movimentos de Pernambucb.

* 5 S Chegado, que foySifgifmtitido de volta viagem da

3ahia , deu cauza com fua báa force, a que os do governo fe

imaginaíTem reftituidos a fuás antigas proíperidades , das

quaes os rucçeíTos próximos os tinháo privados. Defafocega-

:Entra o Inimigo va-os O interefe,& a efperança(aíFeâ:os,que nunca foube do?

em novos penfi- minar a capacidade do efvaecido.) Acendeo-fe entre os parr

mentos ^^ í^%«{A ticalares o defejo,& a pratica de intêtarem fegunda vez a ío-

ur A campanha, ^^j^ - ^ ^^ campanha de Pernambuco, & das Capitan ias con-

finantes; diziaõ elles ,.que a fortuna fe pagava da períia> & fé
adulava de a eíperarem inconftante;pode o fervor do defejo>
tirar-lhes dos olhos o perigo, Sc da lembrança o eftragb , pin^
tando-Ihes o fucçeífo, das cores da vontade : A quem cegou
mais a paixaõ, foy ao Coronel Brinc. (EraTenente General,
& governava as ^rmas pello empedimento de Sifgifmundo,^
o não deixava andar fem arrimo ) pareceo-lhe,q poderia me-
recer a propriedade do lugar , fe enmendafíe as quebras da
poílo, & da pe0ba;& levado defta ambição aprovava a opi-
niaô,& influía no parecer do vulgo , com o que fe adiantava
muyto nos votos , porque tinhíi os d;ei plebe , não poucos da
milicia, & alguns do governo , Fundava a confiança . de me-
lhor fucçeífo , na préfumpça5 de çiimendar os erros , que q
o Coronel s ' c ^^^^^^^ Sifgifmundp cometera na occaziãopaírada,quedel-
os fomenta, ^^ (p prefumido CoronelJentendia,& çenfurava: Nefte tem-
po fogiráo do noífo Arrayal para o Arrecife dous Italiano?
com alguns Negrosj publicarão, que a may òr parte da noíTa
gente andava remontada por falta de pagas, & de mantimen-r
tosj & que a mefma falta avia, entrenós, de mwniçoês , & ar-
mas j noticias , com que o Brinc esforçou muyto fuaperten-j
ção, exagerando a opportunidade,& condenando o ocio,em
que tanto numero de foldados Olandefes paíTavão os dias c5
gafto,& fem utilidade. Os do governo namorados das rezoês,
&: da viveza do Coronel,lhe defãPpoder,para que diípofef-

v/^

11

,164.9 1>AÍ(TEI.L1J\0 IX, 615 ■

fe, o que dizia, & intentava. r

5 9 Fogofo, & altivo, o Coronel Brinc , com fe ver ab-

foluto na fiiperioridade do mando/e avaliava fenhor da mcí^

ma fortuna. PaíTou ordem , que fe reco! heíTem todos os na- jprejlosyciue fas^

V ios, que anda vaõ a corço, para fe aproveitar á^i mçWíor gí- fará a con^uijia.

te. Mandou fazer grande numero de pratafanas,&: chuços de

ponta,& córte^com que dizia,fe aviáo de rebater as nofías ef- /*

padasj& todas as horas do dia gaftava em exercitar os mais

robuílos foídados no meneo dellas.Pareceo-lhe tempo de fa-

hir a campo,& ou que foífe cortezia,ou obrigação,deu conta

de feu intento ao General Siígifmundo (que já fabía as neí^o-

ciaçoés,&deíignios do Coronel. ") Ouvio-o com diírimula- ^ r r •

- r\ • ^ 1 rr rr 11 r> Helprexaos fm*

çao, para que lobre a novidade aílentaíle melhor o efpanto, davas condlhos

Sc foy fama, que lhe refpondeo: Creyo de V.M. pella gran- de Sífgtfmundo.

de opinião, que tenho de feu vaIor,& de fua capacidade,que »>

me dá conta de femelhante emprefa, bufcando em minha ex- "

periencia mais confeIho,que a provaçaó,porque a confidero '*

mais árdua, do que apode comprehender o melhor juizo. |*

Naó me da lugar, o que entendo,a que prefuma de V.M, có- »

fultaífeefte negocio com fua capacidade, fenãocom os im- "

pulfosdefeu valor, porque as refoluçoés da cólera pertence '*

ao tribunal da temeridade, & não ao da prudência: Aquella |[

ouzadia, que inflama os corações grandes, íabe bufcar a glo- ),

ria entre as defatençoes do perigo j mas não fabe coníiderar »»

os inconvenientes, que fehãode vencer para a tal gloria fe '*

alcançar. As batalhas tem principío,& fimj mas as vitorias té "

hum fó fim, ao qual a capacidade humana nunca foube dar „

principies certos^ rariflimas vezes fuccedem , como as pinta >»

a difpoíiçaó^fempre como as dá o cazo. Efte jogo da fortuna '»

me tem enfinado efta guerra,com melhor lição, que todas as "

da Europa , em qne me achei foldado , Capitão, & Generalj [*

& por efta rezaõ digo , que a tenho para não aprovar nego- >>

cio, que depende de muy ta ponderaçaò,& confelho : O meu "

he, que V.M. fe retire de taó máo penfamento,& de taó lou- "

ca refolução,porque entendo,que conftragido de fatal deíli- ]*

no, caminha a noífa á ultima perdição. Qiie impulfo pode a- „

ver mais cego, nem mais mfano, que aquelle, que lhe tira dos »

olhos o precipicio , & da memoria o exemplo ? Ainda corre '»

FíFj ían-"

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95
95
95

'Mfegue feupfò'
frio dióiament

Coma noticia àe
feuinteto fepre-
f/irao para. o re»
hatCyOS nojfos.

6 lê C^STf^lOTO LUSITJKO

fangue das feridas, ainda não eftaõ enxutas as lágrimas, com
que nos deixou a ultima batalha, que dêmos aos Portugue-
zes,& quer V.M* rubricar fua dita com as tintas de nofía deí-
graça ? Sahimos vencidos, & cortados de feu ferro, quando
nosavàntejâvatantoa deíigualdade do numero, & da con-»
fiança, & agora , que o poder , & a confiança do Inimigo fe
adianta com hua viâ:oria , Sc com mais hum terço de Infan-
taria, & que noíTo poder íè diminuío na terça-parte, & as.
duas j que nos ficáraó , com o animo poftrado aos pés do
medo, efpera V. M. melhorfortuna?Leva os mefmosfol-
dados, que então foraõ vencidos, a contender com os mef-,
mos homens, que ficáraõ vi£toriofos,& efpera melhor for-
te ^ Julgo, fer pronoftico de noífa perdiçaò,bufcar V.M. pa-
ra a melhor forte , o teatro,donde a fortuna reprefentou nof-
fa mayor defgraça ; & tenho por infalivel , que refrefcada
a lembrança dofucçeíTo, coma vifta do lugar do conflic-
to, influirá em huns , & outros,os meímos efpiritos . O cuf-
to nos eníina o modo de guerrear com húa naçaó, que to-
da a Afia prefumio invencivel,que he confumilla, ajuda-
dos do tempo , & não fiados no braço j & V. M. fe deíen-
gane, que não há de trazer a capa, donde Sifgifmundo a
deixou . Porém o Coronel arrafi:ado de íeu empenho,& de
fuaambiciofa pertençaó , naó convencido , fenaó protervo,
impugnou todo o difcurfo de Sifgifmundo,& refolveo a exe-
cução de feu didamen j ao que ofagaz General não replir
cou, porque fe lhe não imputaíTe a fraqueza, ou a enveja.So
feafi:irma,que pafíbu o defengano a tomar forma degalan-
teo, apoílando dinheiro confideravel, fobre qual dos pare-
ceres fahiria mais certo*

6ó Devulgou-fe entre os noíTos a tençaõ, Sc o á-
prefto dó Inimigo, Sc com o confelho dos Meftres de Cam-
po,mandou o General Francifco Barreto de Menezes deitar
bando por todas as partes do recôncavo com graves penas,,
que qualquer foldado, ou official,que tivefíe aíTentado pra-
ça,acudifíe á bandeira, debaixo de que militava, em tépo de-
terminado.Obedientes,& alvoroçados concorrerão todos c5
notável promptidaó . Carregava a diípofiçaó de todo o ne-
ceíTariofobre os hóbros de Joaó Fernandes Vieira , Sc André

Vi-

m\

iiiill

1^49 !PJ1(TELLIF^0 IX. 617

Vidal de N egreiros:0 Meyo mais efficaz,para não temerem
aos homens, era, terem da fua parte a Deosj & com implorar
íeu favor, derão principio a fua agencia . Pedirão a todos os
Parrochos, que nas fuás Igrejas fizeíTem rogativas ao ceo pel-
lo bom fucçeífo j & obrigaííem aos Freguezes, a que cada dia
com preçes,& jejuns pediflem ao ceo,os ajudaííe . A todos os
foldados perfuadirão, que fe chegafièm a Deos por mevo do ^ ^ • . ,
bacramento da penitencia, & íe fortaleccílem com oútíco- gartrocuraoofx''
munhaó. Ao Vigai ro Geral Domingos Vieira de Lima pedi- ^w do ceo.
ráo, mandaíTe expor o Sanciiííimo Sacramento em todas as
Matrizes por trez dias continuados, para que diáte o Senhor ''^
dos exércitos fe cantaíTem asiadaynhas demanhã,&dctar-
de,con fiados , em quenomyfterio , aonde Deos fe via mais
oílxndido da pravidade herética, o acharia mais propicio a
veneração cathohca. Rezáo,em que fe devia fundar a coníiã-
ça do auxilio , & do perdaò , pella diíTerença de filhos, ainda
que deftrahidos, fieis, a inimigos,ainda que poderofos,incre-
dulos.

"61 Co diligencia tão fanâ:â, não faltarão os noíTos Ca-
bos a toda, a que humanamente fe deviáo aplicar: Avizados,
ou por conjeduras , ou por noticias , de que o Framen^o fe
determinava em buícar o mefmo fitio , para nos oíFerecer fe- ^ í°go acodem a
gunda batalha ; & que avia de feguir o mefmo caminho dos ^°^f as pre-ven'»^
Guararapes,que na occá^iáopaífadatomárajmandáraófor- ^^^^ ^«^-^^«'^^t
tificar, & guarnecer as trinchéiras,por onde forçofamente a-
Via de marchar^S^ com particular atenção , as que chamavão
dos Barachos,& do Moinho Novoj ordenado aos moradores
circunvezinhos aíriftiíTem aos Prezidios com peíToas,& man-
timentos, aíTi como os obrigava a occazião:Nos Guararapes,
aonde eftavão por fronteiros os Capitães Phelipe Ferreira,
& Francifco Barreiros , ambos do terço de João Fernandes
Vieira,engroííáraó os prezidios,& as munições para a defen-
fa de qualquer invazão, & incidente . Paífáraó ordem ao Ca-
pitão da Moribeca Bertholameu Marques, q mandaíTe sjuar-
áecer a ponte de Saó Bertholameu de prezidio, & fintinellasi
& que a qualquer rebate tocaíTe arma , com trez peças de ar^
telharia, que tinha na povoação , para que fem detença acn *
diílèm os moradores dos lugares vezinhos com armas,&Dafti-

FÍÍ3 ínentos.

6 1 8 QÁrr^^ono LVSiTAno

1649

111

mentos. Em fim,naõ ficou couza, que a taò expertos Cabos
pareceíTe conveniente , a que fenáo acudiffe com diligencia»
& acerto.

61 Em dezoy to de Fevereiro de mil & feifcêtos & qua-
renta & nove, dia efcolhido pella determinação co Framenr
, . . , 20, fahio do Arrecife o Coronel Brinc com cinco milhomés,

Sahe o Intmtop do^, iruj riij iro

A r^fp ^^P de guerra, todos loldados eícolbidos por vaJeroios,ocpra-

Mf^ÉCijc a cxc- o ^ _ ^ , ■% . -t^ -w-, .

'cutar (eu intento^ ticos,atenaenao mais a cailidadc, q a multidão: Exercito na
com que gente^ & opinião de todos may or,que na occazião paírada,porque to-
com ^ae forma, do para pelejar, fem vulgoparafogir. Carregavão abagagé
fete centos gaftadores,entre ella alguas tendas de campanha,
para os Coronéis, & Cabos mayores , que eráo os feguintes:,
O Coronel Brinc General de todos jo Coronel Brand brandj
o Coronel Guilhermo Autliim^Sí o Coronel Eitz : O terça
do Coronel Kever governava o Capitão Nicolás: Os outros,
diverfos Tenentes Generaes,& Sargentos Mayores. Defpre-,
20U a turba dos índios 5 levoíi fó duzentos, efcolhidos pelío
• feu May oral Fero Poty: Dos homens do mar formou hú ter-
ço de trezentos foldiados, por Coronel, o feu mefmo Almirã-
te j & duas companhias de Negros,homens de confiança :Re-
' duzioefta gente a doze eíquadroeSj que diverfificavaó doze
bandeiras j numero limitado, masjefcolhido , ou para engran-
decer â viâioria, que efperava, ou para nos eíconder a gente,
que trazia^ todos melhor arma4os , que veílido s: Tratava de
vencer,&não de efpantar. A fuà vanguarda conftava dos
homens mais corpulentos , robuíios ^ & deftros, armados de
pratafanas, alabardas, & chuços^para defcomporem, & reba^
terem os golpes de noíTâs efpadasj & de femelhante gente cór
poz as frentes d'e todos os efquadroés. Deixou as fuás praças
*^^ guarnecidas com os homens de menos conta , aííl pello nu-
mero, como pella eftimaçaõ;.P^ão lhe efquecéraõ féis peças
de artelharia,& bronze, cu;a coadução entregou ao Almirá-
te com a fua gente do mar . Nefta forma , Sc no dia referido
pella manhã, fahio do Arrccife,dada ordem á fua vanguarda,
que marchafíè para a Barreta, o que fes todo o exercito com
marcial eftrondo de clarins, trombetas,& tambores.

65 A noíTa gente, certa na fahida do Inimigo, & próp-
ta para acudir, aonde a chamafíè o r€bate,eíperava as ordens,

&

llí

1649 ^A^E 1. Lir(^ IX. 619

& eftas o avlzo das fintiiicllas. Pellas de^ horas do dia,dezoy--_;

to de Fevereiro, chegou avizo ao noíío Arrayal,mãdado pcl-

lo Capitão Frãcifco Barreiros,fronteiro dos Guararapes, em ^^V '^ ^^^^ ^^

T • I r • n o 1 II- onopexercito.

como o Inimigo marchava em direitura aBarreta, & dalh

pordiantefoycontuiuando osavizos,aíiicoino oFramengo
le adiantava nos paíTos , até que ultimamente diíTe , que fem;
entrar na Barreta, tomara o caminho dos Guararapes. Naõ
foraó duas, fenão húa mefma couza receber-fe a noticia , &
tocar-fe arma no Arrayal. Acudirão os Toldados a fuás bádei-
Fas,& os Meftres de Campo ao General Francifco Barreto de
Menezes, que os chamou a concelho, &nellererolveraó,rtm
controveríia , que fe TegniíTe o Inimigo até lhe dar batalha.
Confta va o noíTo poder de dous mil & feifcentos homens en-
tre Portuguezes,Minas, & Indios,com o qual íe marchou lo-
go na forma, & ordem feguinte . O Meftre <3e Campo Fran-
cifco de Figueiroa, de quem era naquelle dia a vanguarda,c5
trezentos homês do feu terçoj logo André Vidal de Negrei-
ros com trezentos homens , com que o feu terço fe achava, a ^^^^^^ & forma,
efte feguiaDom Diogo Pinheiro Camarão com o feu terço ^"^ ^^^ ^^^'^ ^^
de trezentos & vinte índios; logo o terço de Henrique Dias
com trezentos & trinta foldados:A retaguarda levava o Me-
ftre de Campo Joaõ Fernandes Vieira com mil Sc trezentos
&cincoenta homens do feu terço. Além defta Infantaria, le-
vávamos as tropas de cavallos, que governava feu Cabo An-
tónio da SyIva,cujo numero nos efcondeo agora o tempo,Sc
entaó o defcuido, fem lugar certo: Nefta forma marchou o
exercito Portuguez có ligeiro paíTojpello caminho dos mon-
tes Guararapes.

- . ^4 Pellas quatro horas da tarde do mefmo dia , chegou
a nofíà gente ao primeiro monte,chamado na lingoa Brafilia- """^
na Mote Utizeiro, nome,que tomou de húas arvores,q nelle <^^ega. a, avrffar
produza natureza, cujo fruitohe de cor amarella, agradável °^^°^^^^ Guará,
^ vifta,& fuave ao gofto , ainda que agrefte . Já nefta hora ti- ^
nha o Inimigo occupado os montes vezinhos, & as fraldas
delles por aquella parte,que fazia frente ao boqueiraó,aonde
íiâ occaziáo paíTada carregou a mayo.r força da batalha: Efta-
va fortificado,& íituado com efcolha ; & ordenada fua gente
cm nove efquadroés,guarnecidos de mu y tas embofcadas, q a

FfF4 arte,

rapes.

.f^

nandcs Vieira,

670 c^sr(^ioro lusitjko 1649

arte, &a conveniêcia repartio pellos lugares neceíTanosiAíIl
como a noíTa vanguarda chegou ao dito monte,& defcobrio
a difpoíiçaó, & forma do Inimigo, mandou o Mcftre de Ca-
po General fazer alto, para que entre os Cabos fe defini íTe,
porque parte, como,& quando fe avia de enveftiro Framen-
go. Foraó os pareceres diverfos , mas todos fe reduzirão aa
voto dos Meftres de Campo André Vidal ,& Francifco de
Figueiroa,que era bufcar-fe o inimigo pella frente.Comuni»^-
Determina- fe a cou-fe a refoluçaó com o Meftre de Campo Joaõ Fernandes
batalha^ compa- Vieira,que chegara naquelle tempo5&foy de contrario parerí
recer de loaoTer- ^^j.^ dando as rezoés,que o moviaô,defl:a maneira. Ainda que
o Inimigo, pello aberto do terreno , faça cara a todas as par-
" tes, aquella,que nos olha,fe há de julgar por frente,&na for-
'^ ma defta íituaça5, lhe avemos de confiderar a retaguarda , &
^' os lados; o que fopofto me parece,que de nenhúa forte con-
" vem bufcallo por aquella parte , porque nos fica fuperioir
''no fitio,& nas vcntagens do terreno, de forte qne nos obriga
" a enveftillo por vereda tão eftreita, que não confente forma^
" caminho mais certo para nofíà perdição, que para noífa efpe^
" rança,porque não fera poffivel,que deixe de cftar guarnecí-r
" do pellos Iados,de copiofas embofcadas^Sc quando com bom
" fucçeíTo cheguemos a defembocar os matos, nos efpera peri-.
'' go mais certo no empinado da ladeira, & quebradas da ter-
" ra, por onde forçofamente ayemos de avançar debaixo de
'* fuás mefinas armas, expoftos ás bailas de fuaartelharia, apon-
■" tada para a parte,por onde nos efpera.Os mefmos perigos,&
'^ inconvenientes acharemos por cada hum dos lados,dos quaes
'* nos livramos, febufcáremos oFramengo pella retaguarda^
•" para onde nos chama o terreno com as comodidades de aloja-
" mento fcguro, & abundância de agoa;& para defcançáremos
'^ efta noite,moIeftados agora do calor do dia,& da picada mar-
" cha; &: )i que eftà em noíía mão a efcoIha,pegucmos na forte,
'* que nos dá afortuna, pois he certo, que melhor cfcolhc,
" quem na dilação fe eífegura, que quem no repente fe arrifca.
" 65 Naõ faltou inftancia a efí:e argumento : Ouve quem
diíle , que com a menor detença nós fazíamos o mayor dano,
irfipurrníiâodeal' V^^^^^^ davamos tempo, a que o Olandés fahiíTe do Arrecife
guns. ' a ganhar-nos as forças3& a faquear,& defi:ruir as vezinhancas;

\r

ao

li

1649^ TãT{TE lLlFÍ(p IX ' ^?t:

ao que replicou Joa5 Fernandes Vieira moftrando com evi-
dencia, que nem ao Inimigo ficara poder para repartir , nem
gente, que ti veíTe animo para o fazer j além de que acharia as
Roffas praças tão bem guarnecídas,&com tanta vigilância, q
íèouvera de defejar,© que fe receava: Qiie a Várzea era a ve-
zinhança mais próxima, & de mais cabedal para o roubo , &
para a ru ina, & que todos fabiaó,que o retiro dos moradores
a deixara femcouza, que podcíTefervir, nem ao furto, nem -^
aoodioicom o quea detença de toda a maneira, & em toda
a parte nos era de grande conveniência , porque com ella fe

dava,naquelle lugar, tempo , a que fe encorporaíTem com a
noíTa gente os moradores de todo o circuito , fabendo , que

nelle nos alojávamos aquella noite, & no mayor numero dos
foldados,mais occazião,a que o Olandés fe perdeíTe. A todos Elogofeguiâosde
convencerão , & contentarão as rezoés dejoaõ Fernandes í*'^^-^-
Vieira,& obrigarão ao Meftre de Campo General , a que fe
acoftafíè cõ feu parecer, em execução do qual, virou o exer-
cito a cara para o Engenho Novo : Entre elle , S>í o dos Gua-
rarapes fe alojou a noíTa gente aquella noite com as comodi-
dades prometidas; & guarnecidos os poftos do prezidio , fe
poferaó fmtinellas ao largo pello Meftre de Campo Francif-
co de Figueiroa, cujo era o dia: F6ra o alojamento,ficáraó de
pofta os Capitães fronteiros dos Guararapes, Francifco Bar^
reiros,& Phelipe Ferreira, os quaes toda a noite gaftáraó em
picar o Inimigo, tocando-lhe arma por diverfas partes^Sí tão
defvelado a paífou, que em toda ellà lhe não fahiraó as armas
da mão. Conferio o Meftre de Campo General, como, & a q
hora fe avia de enveftir ao Framengo , & refolveo-fe , que a ^
occaziáo diria o quando, & que o modo avia de fer a pey to
defcoberto.

6 6 Amanheceo o dia dezanove de Fevereiro, & mãdou
Francifco Barreto de Menezes, que os Meftres de Campo có
os feus SarPentos Mayores, & o Tenente General com o Ca- ^f ^^ ^J""'/]'

& „ . ■' . t o 1 ri-rp L CO Barreto de Me"

pitao de cavallos António da Sylva fahiflem a reconhecer a ^^^^^ reconhecer

forma , & a fituaçaó do Inimigo: fobiraó a hum monte fron- ojítio, & formA

teiro,& delle v iraó tudo , o que dezejavão : Para mayor cer- do inimigo.

teza deceraõ o monte até o rafo, que fe unia ao outro monte,

occupado do Framengo^ o qual demaziadamente acauCella-

do

«■

^2 2 CASr^oro LUSITANO 1649

do tocou arma5& mandou fazer tiro aos noíTos com duascar-;
gas cerradas : Todos ouvirão o eftrondo , & ninguém vio q
perigo: Defpois de bem notado tudo, quanto os Cabos per-
tendião, v oltáraò , & referirão ao Meftre de Campo Geue-'
ral, que o Olandés perfeverava no fitio , & na forma , que ti-
nha o dia de antes, & que o poder, pello que parecia, era por
cima de cinco mil homens, além dos índios, Negros, & gafta-
dores^ féis peças de ar telharia, algúas tendas armadas em va-
rias partes,& hum efquadraó feparado,que guardava a agoa,
de que bebia o feu exercito. Conferio-fe o q fe devia obrar:,
Refol veo-fe, que não convinha, vifta a í]tuação,& poder có-
. trario, enveftillo, & muy to menos expor-lhe aos olhos airi^
íirioridade de noíTo exercito, efcondido á fua vifta pella in-
terpofíçaó dos cana veaes, que o cobriaõ, que fó em cazo,que
fe moveíTe, ou para ir adiante, ou para voltar a traz ( o q for*
çofamente avia de fazer )fe devia enveftir j & que no entre-
tanto importava , da noíía parte , a vigilância, para que a ne-
gligencia não foíTe motivo de perdère-mos a occaziaõ.

6j A efta hora feachavão dentro do nq/To alojamento
não poucos moradores das povoações circunvezinhas com
jv«^„/7.;. ,.^ .,' armas,& mantimentos, & muy tos de feus Capitães mótados,
o faz, deccr dos ^^^. *^ vmhao oíFerccer ao Meftre de Campo General : Ad-
wo/ítes, miúo o focorro, louvou a deliberação , & para moftrar , que

eftimava o auxilio, mandou lançar bando,que nenhua pefíba
fahiíle do alojamento fem ordem fuajSc como nenhum,dos q
entravão, fahia, foy avultando mais o corpo do noíTo exerci-
to. Pellasoy to da manhã fe ordenou ao Capitão António
Rodrigues Franca , que de feu mefmo terço [eira o do Meftre
de Campo André Vidal de Negreiros , por lhe pertencer a
vanguarda daquelle dia ] lhe deíTem quatro companhias , &
com ellas foíTe picar o Inimigo , que fem duvida fe moveria,
provocado de lhe tocarem arma, & aífi fuccedeo,levado ào
primeiro impetoj mas tornando fobre íi, conheceo a perten-
ção da induftria,& voltou com prefteza a occupar os poftos,
que avia deixado, fem que o noífo Capitão deíiftiífe de o pi^
car até a húa hora defpois do meyo dia, que o Framengo im-
paciente de noífa fleima,foy defocupando o alto dos montes^
& decendo ao baixo,para fe formar em efquadraó cerrado.O

Ca-

ié49

^Jl(rE 7. L7/^Ó IX.

623

íx?

Capitão Franca, aíli como vio aballar o Olandés , teve para
íi, que fe retirava para o Arrecife, ( conceito formado iliais
do defejo, que do juizo) com fuma prefteza avizou ao Mef-
tre de Campo General, do que entendia: Crédulos os nofíbs
foldados na verdade da noticia condenaváo a detença, como
cauza de lhe fogir das mãos a vidoria . Das trmchciras do
noíTo alojamento á ladeira , & rafo , aonde o Inimigo fe for-
mou, feria diftancia de hum tiro de mofquetc. Vio Francifco Ze7enl7/í/é'
Barreto os foldados alvoroçados,& fogofos, mandou tocar a afirma, com ''me
enveílir, final, a que obedecerão mais de voo , que de i^2i^o'. Je hâ de fa^er.
Relatarei a ordem,que eftava dada, para que melhor fe cnté-
da a narração da peleja. O Meftre de Campo André Vidal de
Negreiros com o feu terço,& algiias companhias mais,& com
as duas de cavallosjque entre nós avia, tinha por ordem, qué
bufcaífe o Inimigo pello alto da meya ladeira, que occupava,
& por contra lado o Sargento Mayor António Dias Cardo-
20 com quatro troços do terço de João Fernãdes Vieira:Eni
fua efcolta o Mefi:re de Campo Francifco de Figueiroa com
o feu terço. Ao Meftre de Campojoão Fernandes Vieira ef-
tava ordenado,que enveftiíTe o Inimigo pello rafo , a ganhar
o boqueirão, de que tantas vezes fizemos memoria com oy-
to centos homens do feu terço,& por cótra lados Dom Dio-
go Pinheiro Camarão com o feu terço de Indios,& Henrique
Dias com o feu de Negros.O Meftre de CampoGeneral Frá-
cifco Barreto de Menezes , que já com a experiência do ter-
reno,& da milicia daquellas partes fe podia aproveitar da dif-
ciplina, adquirida em outras guerras, ficou aífiftido dks com-
panhias auxiliares, com que acudirão os moradores,& algúas
pagas, para focorrer, aonde lhe pareceífe neceflario 3 & ver-
dadeiramétc,que com efte dia, lhe podia coroar a fama o no-
me de Capitão,& de foldado,porque nelle moftrou fua efpa-
da, até onde podia chegar o valor,& fua difciphna,que a não
podia fobir mais a arte.

68 Naó teve ò Inimigo noticia de noíTa refoluçaõ, fe-
não, quando lha deu avifta, defcobrindo o avanço a tempo, o Meftre de c5-
queaenveftida obufcava pellas partes definidas. Defejou/^ ^°^° Feman-
voltar aos poftos,que deixara , porém atalhado de noíTa dili- '^''. ^''.''^ 'H"
gencia, lhe fer vio o arrependimento de caftigo, porém , não ^!Z7intmgo!

de

624 CAS7%I0T0 LUSITANO a6^^

de eiimenda. Foy João Fernandes Vieira o primeiro 5 q che-
gou a medir o braço có o Framengo, ajydado da mayor preC-
teza,& da menor diftancia. Avançou o boqiieiraó,que achou
defendido3& fortificado com fete batalhões, duas peças de
artelharia por frente, no rafo , & quatro por lado, no monte.
Orgulhofo,& deftimido o fahio a receber o Olandès , imagi-
nando deter-lhe o paíTo com a violécia das cargas,que os noí^
fos foraó recebendo com igual marcha, defprezãdo as bailas,
como fe defprezáraó as vidas.O General contrario,que da la-
deira vio o pouco cazo, que noíTo v alor fazia de feu poder^
, o temeo deftroçado,& o engroíTou com hum batalhão mais,

que fe encorporou com os fete , que tinha na defenfa do bo-
queirão; aqui carregou o mayor pezo da batalha , porque na
poíTe defte íitio cóíiftia toda a efperâça da vi6ioria.Em igual
balança, fuftentava o combate,de húa parte o valor,da outra
o numero: O fangue de hua,& outra gente moftrava o furor
de todos,de nenhum a vantagem,efperando a vidoria, os ini-
_^ migos,pelIa conftancia, os noíToSjpello coftume.O Meftre de

Campo João Fernandes Vieira pofto diante dos feus folda-
dos, lhes fervia de admiração, & exemplo; para a imitaçãcr
exortava o braço, para a difciplina o preceito : Não ouve al-
gú, q não defejaíTe o exceíTo, que bufcava na competencia.O
Furor ^ ^f^,^^^^ Inimigo animofo, &difcipli nado pelejava a pé quedo, mof»
macia daf eleja, trando bem no valor,& conftancia da refiftencia,que o alen-
tava a lembrança da honra, & a defenfa da vida . No mais tra-
vado da pendência topou húa balia com o Meftre de Campo
João Fernandes Vieira , com dano tâo leve,que fes final, mas
não ferida, para que certificaíTe a nódoa o intento da baila,
Conheceo no avanço a fortuna,&: lía detença o perigo, leva*
tou a voz, & mãdou enveftir á efpada. Não parte mais furió^
fo o penhafco defatado do monte, do que partirão os hoíTos
a ferir o Inimigo , aíTombrado da facilidade, có que fe vio ro-
to.Aquelles chuços,& pratafanas, de que os batalhões cõtra*
rios fe armavaó para apartarem de fi o noíTo ferro , rendidos
ádeftreza de noíTa efpada, abrirão caminho largo, para feu
deftroço^porq rebatidos , ou defviados os primeiros golpes,
não lhes deixavão lugar, nem tempo para os fegundos.Muy-
tofangue^Sc vidas cuftava ao Framengo a contumácia, &

muyto

•/"

fios

ié49 ^A^Bl.LlV(!(piX. ^25

muy to mais a preíía, com que fe vio desbaiatado5&: rot05& o
boqueirão ganhado, &occLipado o pofto, da noíTa gente, íc- ■^''^ v '^Z^^'-^^^'
nhoreada do fitio,&daartcUiar!a,que o Inimigo nos deixou j c&mpo. "^
porém, não de todo a pendência, já então inútil para a repu-
ta çaó,& para a efperança.

i 6 9 Com a força, & com a induftria buícava Joa5 Fer-
nandes Vieira, neíta occaziãojaonde melhor empregaíTe a ef»
pada,&a vifl:a:(Com húa,& outra couza vencia ) Avertio,
que picando ao Inimigo pella retaguarda, ficaria de menor
partido: Apartou do corpo da batalha dous troços de folda-
dos,para que hum pella retaguarda, outro por hum lado , lhe
tocaíTem arma; o que fizerão cõ promptidaó, & fortuna. Oc-
cupado nefta facçaó fe lhe meteo o cavallo em o olho de hum
lamaçal, de forte,que quaíi fomergido , fenão pode arrancar *
delle^ faltou da félla,& como fc nada faltara a fua peíToa, & a
feu cargo,tendo confígo fua efpada, & feu braço, coberto de
húa rodella tornou a bufcar feu primeiro pofto , na frente do
poder contrario,que já o achava menos. Aqui montado em
outro cavallo, terçando a efpada, levantou a voz,& diíTe pa-
ra os inimigos : Há Framengos rendei-vos á efpada deJoaÕ ralero^^confim-
Fernandes yieira,que naceopara voíTo açoute. Chamados çade loãoFernã"
do grito,& a vertidos da peííòa , fizeraõ pontaria nelle vinte des vieira.
clavinas; defvioú a fortuna as bailas; parece que obrigada da
eftranha ouzadia : Delia tomou principio noíTa viâ:oria, & o
Olandès occazião , para defpois publicar no Arrecife , que
Joaó Fernandes Vieira ficara morto na campanha;nova,con(i ' '"'
que os do governo contra-pezavão a magoa de fua perda:
Foy de todo hum exercito, & fe equiparava,com a de varaõ
taõ grande.

-- 70 Poroutraparte,comamefmaforte,avançouoMeA
tre de Campo André Vidal de Negreiros o Inimigo : Pello
alto da meya ladeira, em que eftava formado, o enveftio, & o ^/ ., i
Olandès o efperou com tal determinação , que lhe deteve o j„fmLopclla fui
paíTo; perfeverou na conftancia, em quanto não experimen- tarte.
tou os fios de noífa efpada, que a hum mefmo tempo o ferio,
& rompeo pella frente, a pezar das armas , que imaginou in-
contrafia veis ; da mefma forte o cortarão pello lado efquer-
do 03 Capitães Fiácifco Berenguer> António Borges Uchoa^

.1

Gg^

Ma-

m

Ó mefmo fa:{em
Francifco de Fi'
guetroa^ António
Dias Cardo7^o,(jr
os mais Cabos.

VesharatãooJfíi-
, wíçro^ é^ opoê em
fogida.

João 'Fernandes
yietra lhe ganha
a artelhana. do
monte.

III

Mathens Fagundes, & Eftevaõ Fernandes , governados pel-
lo Sargento Mayor António Dias Cardozo^a tempo,q pello
lado direito o enveftio António da Sy Iva com as duas tropas
de cavállos^ que valerõfameritecom aslançasj& tropel rom-
perão por armas,& defenfores. OMeftre de Campo FranciA*
CO de Figueiroa5Gom a gente do feu terço, fes nefta occaziaó
entender ao Inimigo, que a efpada Poitugueza corta pello
repãro,& pello perigo. Em todos fe via a emulação , em ne*-
n'hum a enveja j porqueem c<3das as partes andava igual a va-s
lentia, imitando o coraçaõ,& o braço de feusCabos,q igual-f
mente dirpunhão,& cõf taváo.Já o Inimigo^roto por muy tas
partes,nos olhava com medo,&fe revolvia confuzo,bebendo
ôdefàlento na vifl:a do eilràgó j & perdida a difciplina dos
féus còm o aniiííôj(rurdos á obediência, atentoisá fugajlargá*
raó o pofto, & virarão as caílasylevando fòbre ellas os peza-r
dos golpesdé ftõíTo ferro j âò qiial os fogeltava o terreno,que
era por huni monte abaixo, çaminhõy por onde os corpos dè
feus mortos lhes embarâçavâô GSpés,Scentorpeciaõo tinoj
perigo, dó quál nenhum podia fogir, apertado do alcance,
íem que ódefvio o não fizeííedefpenharpellas quebras jfra^
gâs,& roturas dó ftíonte^ qtíê ou o detinhaõ aeíperar o gol*
pe j õú o guia vaõ â morifef da queda.

71 Em quanto fuccediá o referido^ pella parte do mon-
te, ganháraj& guarnecera o Mcftre de Campo Joaõ Fernan^?
des Vieira o boqueirão , & affêgurára a defenfa.com as diias
peçàs de artelharia áú Inimigo, que ficáraó em noíTo poder.
Sobio o monte, aonde ò FrafflÊíígo tinbaa bataria das quatro
peças , & hum groíTáde Infafítâtia, com icm reparos,que en*
veftio cõ alentos de esforçado,& viâ:oriofo. Achou ao Olanr
dès com poupado braço, Be fíelle valerofa refiftencia: A a vif-
ta do eftrágô da fua própria gcte pelejavaõ os.Olandefcs fem
éfperança da viâoria, &com defprezo da vida ; naó ouveal*
gum,que à dezejaíTe guardar, todos faziaó muyto pella ven*
derjnâo fabia o furor repatar no dano, fenão na vingança j 8c
crecia a perda com aperfia : Deixou-fe ver o combate , do
Meftre de Campo André Vidal de Negreiros, que pello mo-
te fronteyro vinha no alcance dos Olãdefes vencidos,& des*
baratados 3 & com intento de levar aos noíTos focorro,hiaa

pafíkr

."^ti^i

1^49 fÀ^ELLlV%0 IX, 627

paíTar de hum monte, a outro monte, quando defcobrio no
Valle hum efquadraó inimigo,formado das relíquias de feii
deftroço,baqueados os foldados delle, por não ferem viftos,
elperandoaííijnoíTo defcuido para executarem fuatençaó.

André Vidal de Negreiros, em cujo animo ardeo fempre o ^ , ,,. , , f
y r c ^ 1 r ■ André Vidal de

valor lem rumos de receo, comhummeímoimpetu ^'^^^^- jsieareiros o vai

nhou a efpada, & levantou a voz dizendo aos poucosjque 2^- foccorrcr , & fe
chava configo(toda a fua gente vinha efpalhada, fem mais ti- '^c atdha.ào de
no,que o de matar,&ferir.) A a efpada foIdados^Sc para o Ca- ^^.^ . ^/í»^^'''^''
pitaó de cavalíos António da Sylva : Avance V. M. o Inimi- ^^^^^êP'
go,& não fe dé quartel, a quem vencido o defpreza . Duvi-
dou o Tenente Manoel de Araújo o avanço, pella difpari-
dade do numero, da forma,& do tempo; (até aquelle inftan-
te não tinha o Inimigo deíparado arma) conílderou, que aos
montados avião de bufcar todos os pelouros , & receofo da
certeza do perigo, olhou parao feu Capitão,o qual o enten-
deo,& o obrigou dizendo,que na guerra em não temer o pe-
rigo,fe verificava o nacer honrado^Sí apertando as pernas ao
cavallo, feguido de todos osfeus , enveftio o efquadraõ con-
trario,que abrio á força de braço. André Vidal com aquelles q ^^^/ ^ ^
íbldados, que lhe deu o repente [fatisfeito, de que hia coníi- ajudado da ca-
go] recebida a primeira carga doFramcngo, fera VsiQ.ázx'^ aliaria.
tempo, a que deffe a fegunda, o enveftio, & cortou com tão
forçofos gol pes,que por onde não partião, deftroncavaó. Vi-
nha mais diftante o Sargento Mayor António Dias Cardozo,
fuprio a tardança com a intelligencia; cortou pella fralda do
monte,que lhe ofFerecia caminho mais curto , & de lado deu
húa carga cerrada no efquadraó inimigo com taó bom em- ^^'^^^^"'^o ^0 .

pres;o,que lhe fes virar as coftas pella ladeira do monte con- ^ '^''^^^^''^%^^»
^ ^ '^ f^ ... ^ n ■ r pemao Frame-

XXZXIO ; a noíia cavallaria , que por aquella parte razia frente, goemfofrida. '

fem poder v oltar,porque lho empedia húa grande quebrada

<3o monte, efperou, fem movimento, húa carga do Olandés

com tamanho dano, que delia cahiraó mortos o feu Tenente -

Manoel de Araújo, quatro foldados , féis cavalíos , & algu ns

feridos; porém os mais feguindo o alcance aos Framengos fi-

2eraó tal eftrago,ã fobejáraõ mortos á vingança.No tépo, q , ,, ^

n > . j - j • 1 1 L II - 1 ^^t^o batalhão

eite combate andava mais travado , vinha hum batalhão do ^-«/W^ rompem

Inimigo em favor dos feus , bufcando-nos por hum lado , & outros Çapths.

Ggg 2 fem

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\r o ^ft•^^

i

628 C^ST^pTO lUSlTJNO ^649

fem duvida nos dera miiyto trabalho^íe os quatro Capitães
Francifco Berenguerj António Borges Uchoa , Matheus Fa-
gundes 5 & Eftevão Fernandes com as fuás companhias em
bum corpOjíènão adiantarão a recebello com taõ furiofo en-,
,^^^ contro^queofizeraõvoltarjS^fogir.

ja: iComo fe a natureza os produzira, davão aqueíles
montes inimigos; doeftrago dehunsefquadraés naciaõ ou-
tros : Hum tinha o Framengo de referva, & por bõarezão a-
via de fer da gente mais efcolhida, o qual vigilante em noííbi
dano efperou a occazião mais opportuna.Nomais baralhado
doconflido corria por hum monte a cortar-nos pella reta-s
guarda; avertio-o o Meftre de Campo Francifco de Figoei-^
o Meftre de Cã- roajfobio o monte,recebeo-o na ladeira dellecom húa carga
j>o Francifco de de moíquetaria,aííi lograda,q fem detença o fes mudar de in-
Fíguetroa desha- tento:Fofi;io defordenado, & medrofo, primeiro de noíTa ef-
drao de referva. P^^^^qde lua perda: bcguio-lhe o alcance hua turma demor
radores,q fem cõfideração cortavão por fogeitos,& rebeldes»
Em todas as partes achava o Framengo húamefina fortuna,
porq em todas fe coníiimava a viâ:oria , co hua mefma crue*-
2a:Para os miferaveis vencidos €ra ali vâo o morrer 5 tal era o
..«;■. horror de feu eftragoiPara os vencedores deleyte o matar^tat
manha era a fede de ília vingança.Os q fe fingiaó mortosjdei-
tados entreos mortos, melhor aífeguravâo a vida cõ a feme-
Jhançajque com a fuplica. Os que fogiaõ , tantas vezes traga^
vão a morte, quãtas tropeçavão em corpos ícm v ida . Para os
que agonizavão , erao gemer reclamo de noíTa ira, & de nof
fa efpada . Affi mefma fe defconhcciaa natureza na fealdade
dos golpes, & das feridas, com q os corpos pareciaó troncos,
hús fem cabeças, outros fem braços, & todos 5é figura. O fan-
gue era em tanta demaíia,q fobejava a fede da terra, na qual a
^ifta achava tãta cauza para o horror,como para a cópaixaò.
73 O Meftre de Capo João Fernandes Vieira(q deixa-
loaõ Fernandes ^^^^ no mote pelejado a peyto defcoberto cõtra o efquadrão
vieira fe faz fe^ inimigo,q guardava aartelharia, & a bagagem ) aííiftído dos
nhorda arteiha-^ feus,obraváo demaneira,q os não fabia o Inimigo ver fem paf
deílrorTdafefif. ^^^'^ valor, cõ q refiftia, fazia noífa oppoíiçaó mais furiofa;
tcncia. ^ OS reparos,donde peIejavâ,noíra ouzadia mais firme. Con-

tendiaó as duas nações mais bellicofas , pella reputação , &

pellas

v\..

V^

i649 TJ\TE/.L1F^0 IX, 629

pellas vidas: Acendia-fe a coragem com a refírtenciaiNaó ccC-
iàvaainduftria, &aforça debnfcar meyos para a contraria
mina, fe bem, q com diverfa fortuna,porque íiiperada a mul-
tidão, do valorj&a ventagem, do braço foy rota, & ganhada
a fortificaçaó,& a gente contraría,& íe fizcraó os Portugue-
2es fenhores da bagagem,& da artelharia inimiga, com morte
do Coronel Brinc General do Olandés nefta emprefa: Anda-
va montado compondo, & ordenando os feus, como valero-
fo Capitão, & defiro foldado , quando hua baila o matou, &
logo outra ao cavallo. Ao feu Almirante do mar tirou a vida
outra baila, bera junto da fua artelharia. Pêro Poty mayoral
dos Indios,có forte mais favorável, ficou priíioneiro: Ganha-
da a artelharia , & pofta em fua guarda a gente neceíraria,foy
João Fernandes Vieira,feguindo a viâ:oria,com tanto eftrago
do lnuiiigo,que o não fabia ver a vingança fem laftima j en-
golfado no alcance o vio perto de íi hum batalhão de Olan-
defes,&fem algum deíembainhar a efpada, felhe renderão
todos,pedindo bom quartel, que a generofa valétia de Joaõ
Fernandes Vieira lhes concedeo . Naõ tinha fios fua efpada
para cortar fracos, nem réndidosj obftinados,& rebeldes, Cu
í 74 Ainda a efta hora durava o confliâ:o nas fraldas dos
montes:Com a efpada na mão fazião maravilhas osMeftres
de Campo André Vidal de Negreiros, Fráncifco de Figuei-
roa, & o Sargento Mayor António Dias Cardozo, fem que
deveíTe nada a feu exemplo , a imitação dos foldados. Joaõ
Fernandes Vieira(com a propiedade de ray o,que íem defcã-
farentra,& fahe pellas paredes de hum edificio) rõpendo-as
todas, fe foy unir com os ditos Cabos,a tempOjque o Inimigo
afloxando no combate nos hia deixando a viâioriajopprimi^
do da noífa violência, largou o campo, & virou as cofias , c5
o que em todas as partes íe via eftrago fem batalha: Não avia
contrario , que o quizeíTe parecer: As armas,que os acufavão
inimigos,deitavão longe de íi,para que os não avertiíTem op-
poftos:Os cançados,& feridos veftidos da fomiífaõ,fazião da
neceffidade virtude; os mais^ defatinados , & perfeguidos do
liorror,do eftrago,& da sobra do ferro,corrião a precipitar-íe
pellas quebradas, & grutas dos montes,nas quaes primeiro a-
chavão a fepultura,que a morte: Deftes,poucos foraó,os que

Ggg 3 acer-

E cÕ morte doCe*-
neral das armas ^
Ó' do AlmiraH"
te do mar>

Rende h'um ef*

quadrao OUndeS
jó com â "Vifla.

■■>

Cori^ a pyefenc/t
de loíio Fernan-
des Vieira, fe d):,
fim á batdha^é*
fe confurrfítanjí*
aorta.

é 3 o C^ST<1(10T0 LUSITJNO

1649

li

âcertáraõ vereda, fem perígo,deixando as armas, que o dek-
)o da vida lhes fazia largar, como embaraço da fuga . Os nof-
fos que por todas aS partes íèguião o alcance, já cat i vaváo cò
defprezo, jámatavão fem cólera : A cavallaria feguida dos
moradores,que fe achavão montados , os perfeguirão có for-;
ças poUpadas,até as portas defua Fortareza da Barreta, aonde.
o Cabo conheceo os feus,para os recQlher,pella lingoa , mas
não pellas caras, afeadas , & disformes do fangue , & das feri-
das.Nos Indios,&Negros do Gamarão,& de Henrique Dias,:
experimentarão os triftes vencidoSjmais vivaa perfeguiçaó,
& a crueza, porque a fangue frio matáraó ( naquelle , & nos
dias feguintes) muy tos 01andefes,que os matos efcondéraõ,
& livrarão do primeiro ferro. Parece, que não viraó os olhos»
campo de batalha, em que (em feu tanto) fe confideraíTe ta-
manho eftrago*

75 O Meftre de Campo General Francifco Barrt to de
Menezes, a quem deve Portugal 5 & o Brafil muy to do bom
._ ^ fucçeírodeftedia,pellobraço,&pellavigilancia,comquesé
toabraça,& hâ- iiT^phcaçaogovetiíãva, & teria (vendo-o hummefmo tempo
ra a todos os Câ^ fuperior,& cópanheiro em todos os lugares da batalha)mof-
bosy&joldados. trou neftâ occazião o juizo ^ & a deftreza , com que ufava do
baftão,& da efpada : A prefençâ o fes teftimunha fiel do va-
lor de feus Cabos,& da valentia de todos j & a cãdâ hum em
particular, gratificava o ferviço com os louvores , & com os
braços, magoado de não poder mêdir-ihes os prémios pellos
merecimentos: Ao menor foldado honra và,& engrandecia c5
o favor,& com o gabo, fazendo-lhe enteiiderj que o metia no
coraçãojgenerofidade de difcreto,de que fo os necios faó ef-
caíTosj porque nunca sígota o cabedal, & por íer género de
honra,que mais fe eftima,& que menos cufta.Iguaes todos no
goftOj como o foraó no perigo,íè davão reciprocos parabéns
da vistoria* ,

j6 Durou a batalha,das duas até as oytò horas da noite;
tempo, em que os noífos foldados fe recolherão a feu aloja-
mento, aonae/em lembrança do trabalho,fefi:ejavão a v i61:o-
FefíeJA-fe â vi- ria com univerfal confiíraó,de que fó a Deos fe devião as gra-
aorta. ças de tamanho beneficio^ eraõ muy tas as circunftancias, que

concorrerão a fazella parecer milagrofa.Toda a noite fe paf-

foii

%

iH

as

1 649 ' ^^AXTE L Lir^ IX. 6^1

fou com oderveIlo,quecaiizaadeniafiada alegria. A relação
do perigo a fogentava o fono : A memoria do trabalho não
deixava lembrar o repouzo, & muy to menos as vozes , & ef-
írondo dos inftromentos bellicos , que em toda a noite não
deixarão de publicar o triumpho. Para a refeyçáo da nature-
za lhes deixou o Inimigo grande copia de fuftento, em que a-
charão o neceíTario para raós,& feridos (para todos avia tu-
do.). Fazia mais faborozo o defcanço , o íeguro dos rebatesj
porque feu braço os tinha livres de toda a imaginação de fo-
bre-lalto.

77 Fes efl:a vidoria, memorável o dia dezanove de Fe-
vereiro, a todos os moradores daquellas Capitanias : Nelles
os libertou o ceo do jugo,& da tyrania herética. O Provifor, ^^^'-^ ^^^°^
& Vigairo Geral Domingos Yfeira dê Lima , que nefta occa-"^'^'^''^'*^'
ziaó aííiftio no exercito, defpachou ordem a todos os Parro-
chos das Matrizes de fua jurisdição,q no Domingo feguinte
ti veíTem nellas o fenhor manifefto todo o dia , para que affi
como na aflição o acharão as rogativas expofto , afíi também
o tiveflem manifefto nas gratificações . Não faltarão as Reli-
giões a tão devido agradecimento, como tão intereçadas no

beneficio^moftrando no aplauzo da viâoria o zelo, com que
affiftiraó na batalha: Nella forão os Religiofos do Patriarcha
S.Bento, os primeiros, pelloinftituto, &pelIapofíe: Nadas
Tabocas fe acháraó 5 & em todas as mais affiftirão com o fer-
vor,& pontualidadcjque a todos foy notório. Emulos de feu
zelo forão,na prezente occaziaõ, os Religiofos de S. Francif-
co, do Carmo, & da Companhia de JesvsiPeregrinos fe mof-
tráraó também os defcalços Capuchinhos de Saò Francifco,
pois fendo eftranhos , obráraó, como fe forão naturaes. Em
todos os Conventos fe derão a Deos as graças de fua infinita
piadade com publicas prociíroés,& fermoés fefti vos,& devo-
tos, nos quaes os Pregadores có efpirito, & engenho moftrá-
raõ claramente aos fieisa obrigação,quetinhão de fervirem
a hum Deos,que tão piadofamente os favorecia , dando-lhes
¥ici:orias, não proporcionadas com as humanas forças, fenão
com feu poder infinito.

78 Com o preço da viâ:oria não teve comparação o
cufto, ainda que foíTe muy to coníideravel a perda.Quarenta ^^^^^ ^^ ^€*

Ggg4 Sc^^"^"'

ÇMT!{10TO LUSlTJnO

164^

8c fefee mortos detnos á terra, entre elles ao Sargento Mayor
^ do terço de André Vidal de Negreiros, Paulo da Cunha : O
Oapitaó Teneríte:de cavallos Manoel de Araiijo. Capitães
'fétidos, Gdfníe do j^^^ morreo em breves dias.Manoel

4^ AbréUj|?atíloT€^ixeira,Joaó Soares de Albuquerque, Je-
-tony mo da Cunha do Amaral, Eftevaõ Fernandes , todos da
■ terço doMeftre de Campo Joaõ Fernandes Vieira : Do ter-
ço de Aodre Vidal de NegreiroSjManoel António de Carva-
lho, Joaó Lopes, o Governador dos Negros Henrique Diasy
eftes com os mais feridos chegarão a fazer numero de duzen-
tos & Cetcj raro foy, o que morreo das feridas pello ddigente
cuidado, que fe pos em fua cura, & convalecencia : Efmera*
raõ-fe os moradores em húa, & outra couza,

j^ Deixou o FramengQípor cima de dons mií homens
Mortos, &ferL Hio^^os. Hum delles foy o feu Coronel General Brinc, q nef'
dosdoimmigo. íaoccaziaó governava as armas, outro o feu Almirante do
mar, que em defenfa da fua artelharia perdeo a vida coma
V alente foldado. Os feridos, fenão foraõ todos, os que livra*
raõ da morte, ficáraõ muy to poucos por affinalar : O de ma-
yor nome foy o Coronel Guílhermo Authim atraveíTado
pello pefcofíb de huaballa,que fem lhe fazer nova chaga, lhe
abrio fegunda vez a ferida, que recebera na batalha paíTada.
Não ouve, quem defíe numero certo aos prifioneiros 5 íeria^
^ porque fó de Pedro Poty mayoral dos índios fes cazo a vin-
gança:Dousannos,&meyo'viv€oprefo em duros ferrosa,
Trifíoneiros , & defpois dos quaes o embarcarão para o Reyno ; viagem , que
defpojos^que dei- j, Jq acabou,atalhado da morte. Entre todos os defpojos , fo-
xou o Framengo. j.^- ^^^ bandeiras,o de mayor efi:imaçâo,& o de mayor preço
o Eftãdarte General,que ficou em poder do Meftre de Cam-
po Joaõ Fernandes Vieira, a quem oofFereceo a obrigação
do feu Alferes, que a força de cutiladas o tirou das mãos do
Alferes Glandes. Os de mais utilidade , féis peças de artelha-
ria,& bronze 5 armas de toda a forte, fem numero; munições
de todo o género, mais que muy tasj mantimentos em grande
copia : Os de mais gofto , a copiofa multidão de pratafanas,
chuços,& alabardas,em que os noíTos viaõ deftroçada,& ren-
dida a fèus pés toda a confiança inimiga.

80 SobioeftefucceíTo a opinião do valor Português,

&

|i

Sc a reputação de noffas armas tanto fobre íí mefina, que lhe
àbateo feus v oos a fama; curtas lhes parecerão as azas para o
dilatado de tanta proeza. Menos as poderá alcançar húa fó
pena,& de tão limitada efphera5COmo a minha^mas porque a
verdade não fique offendida do eftilo , nem defluz-trada da
fofpey ta,a remeterei ao teftimunho dos mefmos inimigos , &
ferão as palavras dos eftranhos , como forão dos eftranhos os
hyperboles. Aquelles officiaes Olandefes , que efcapárão da Tcjlmunho, quê
batalha, dizião^que nunca virãô, nem ouvirão , o que experi- deur o Framengo
mentárão nefta occazião, porque nuca fe vira gcnte,que Tem ^^ ^# '^^^''^•
ter conta com o num ero , nem com o perigo , romper formi-
dáveis efquadroés , fem temor de bailas , & fem fazer cazo de
piques, prataíanas, chuços, & dârdos,que abatiaõ com as ef-
padas, como fe á fua vontade obedecerão os pulfos alheos,&
propriosi& a morte,& a fortuna efti verão ás fuás ordens; que
entre as outras gentes, anda vão os exércitos á v ífta mezes, &
annoSjpaíTando os dias em leves eícaramuças,até que ultima-
mente fe dava húa batalha campahE que não poucas vezes fe
desfaziaó os exércitos com mutua retirada, temendo-fe de
híia5& outra parte a contingência de hum confliâ:o:Mas,que
os Portuguezes (como fe tiverâo vidas de prazo ) não gafta-
vão mais tempo em enveftir hum exercito, que aquelle, que
tardavão em aviftar o inimigo ; fem aver confideração , nem
reparo, que lhes detiveíTe oimpetu; o que teftimunhavão
duas batalhas, que dcrão, Sc vencerão no difcurfo de dez me- "^

2es,entrando nellas, como fe entrarão em algum jogo fefti vo j
Sc concluiaó, que em nenhúa parte dava a natureza femelhã-
tes homens,próvida em ferem poucDs,que a não fer aííim,feu
coraçaõ,& feu braço os tiverão feitos fenhores do âmbito da
terra.

8 1 O General Sifgifmundo ( com mais larga experien-
€Ía)diíre aos do concelho do Arrecife, [còmunicãdo-lhe elles
noíTa viâ:oria,&:fuadefgraça] que os fenhores da Compa- -^^l ^ ^^■^''
iihia Occidental,não tinhão que efperar outros fucçeíTos de
gente tão arrifcada,nem de emprefa tão cuftoza,em que fem-
pre hiaó a perder, como a todos eníinavão as experiências de
dous annos,em que fuftentáraõ a guerra com armadas copio-
faSjSc repetidas3Com difpendio de milhões j perdendo bata-
lhas,

^34 QASr^oro LUSITJNO

1649

charso

Cm

lhas, armas, fortale2as,& gente em tanto numero , qne paffa-
vaó de féis mil íoldados , íó os mortos á efpada , & nelles os
melhores Cabos, Capitãés5& offiçiaes da milícia^que naquel-
la idade dera o Norte5& que,affi como a Suas Senhorias o di^
zia, o tinha efcrito a Olanda, como também o muy to, que fi^
2era,por diíTuadir ao Coronel Brinc de enipreía tão laílirao-
fa, moftrando-lhe fua perdição com rezoés tão claras, & açt
gumétos tão evidétes,que fem querer, lhe pronofticára nelles
a morte,& o fucçefib j& que como experimentado lhes acon-
felhava, que com homens taô valentes,& defl:emidos,fe avia
de contender de longe, olhando-os, como a leoês , pois com
elles feaão avia de guerrear com força , fenão com induftriaj
certeza,que tinha conhecido a Europa, a Africa, a Aíia,& a*
gora a America , para que todo o mundo o teftimunhafle.

B 2 Acharaó-fe neíla occaziaó o Meílre de Campo Gsr
nerai Francifco Barreto de Menezes. Os Meftres de Campo
Calos ^ que Je a- João Fernandes Vieira, André Vidal de Negreiros, &FraíTrr
mfa oc' eifco de Figueiroa: Q Tenente General Phelipe Bandeira de
Mello: Os Sargentos Mayores, António Dias Cardozo do
terço de Joa(5 Fernandes Vieira^ Paulo da Cunha ( que moí*
reo na batalha) do terço de André Vidal de Negreiros jjero-
nymo de Inopza do terço de Francifco de Figiieyroa . Os
Governadores de índios,&Minas Dom Diogo Pinheiro Ca-
marão,&: Henrique Diajs: O Capitão de cavallos António da
Sylva,& Manoel de Araújo, que deixou a vida no conflióio.
Capitães de Infantaria doterço do Meftre de Campo Joaõ
Fernandes Vieira, feu Alferes João Fradique , que Regia a
companhia de faa guarda: Francifco Berenguer, João Soares
de Albuquerque, António de Caftro , Jeronymo da Cunha
do Amaral, Aífonfo de Albuquerque , Cofme do Rego Bar-
itas, Francifco de Lisboa, Berthoíameu Soares Canha, Fran-
cifco Barreiras , António Borges Uchoa, João de Albuquer-
que, António Rodrigues Vidal,Manoel Moniz, Vicente Cu-
^ rado Moutinho , Braz de Barros Teixeira , Domingos de Sá
Barboza, Paulo Teixeira, Gonçalo Pereira Fidalgo , Braz da
Rocha, Manoel de Abreu, Francifco Ramos,Manoel Lopes,
Amaro Cordeiro , Domingos Ferreira, Gregório de Caldas,
Suiiaó MendesjPhelipe FerreirapEílevaó Fernandes, Gregó-

rio

m

™

/

i($4^ ^A^TELLIV^^ IX. 635

rio Fragofo de Albuquerque , Sebafliaó Ferreira , António
da Rocha Damas,& João de Pontes. Do terço do Mcftre de
Campo André Vidal de Negreiros os Capitães, Joaó Barbo-
sa, António Curado Vidal, António Rodrigues Fraca, Joaò
Lopes, Manoel de Aguiar , Manoel António de Carvalho,
António da Sylva, Amador Rodrigues, Francifco da Rocha,
& António Rodrigues Santiago. Capitães do terço de Fran-
cifco de Figueiroa , Pedro de Miranda , Fcrnaõ de Mello dc;
Albuquerque, Dom Joaó de Souza, Amaro Velho Cerquei-
ra, Francifco Coutinho , Miguel Fernandes, Clemente da
Rocha, Jacinto da Cruz, & Joaó Luis. Dignos de igual me^
mòria fc fizeraó nefta occaziaõ os Capitães dos terços de D.
Diogo Pinheiro Camaraó,&c Henrique Diasj& bem quizera
eu, que a imprenfa lhes reftituiíTé a kmbrança,que lhes tirou
â enformaçaõ; mas yk que eftálhes efcódeo os nomes das pef-
foas, publicaráõ fempre, occazioés femelhantes , o daquellas
duas naçoéá, nos índios, o valor das índias j nos Minas , as mi-
iias do valor: Também faltarão nas lifi:as os nomes de alguns
Capitães^ ou porque o ai vóroço os não a vertio50u porque a
fragilidade das memorias os efqueceo.
i" 83 Em o dia vinte de Fevereiro fahio o Sol a fazer mais
dar o noíTo triumpho,moftrando a campanha coberta de def-
pojos. Occuparaó-fe os Miniftròs da fazenda em receber gé-
neros, ^ os da milícia em repartir, & acomodar feridos,& dar ^^^ (^'enterrap^
fepultairà a mortos. O Corpo do Sargento Mayor Paulo da feos mortos, & e/->
Cunha fe levou á Igreja Matriz da Várzea, aonde fedeu i J^i^rcha a nofa.
terra com os funeraes da piadade , & da milicia , deixando a K^"^^?'^*'^ ° ^^'
falta de fua companhia a todos magoados,& faudofos. Rece- ^'^^^ '
bido por entrega tudo, o que pertencia á fazenda Real , fe-
pultadosos mortos, & acomodados os feridos, marchou o
noíTo exercito para a Fortaleza do Arrayal , aonde foy rece-
bido com falvas dos prezidios, (alegres aos noíTos , & formi-
dáveis ao Inimigo) & com tumultuofa acclamaçaó de vivas, ,
^ue fem defcanço davão os moradores,q feguros na fiança da
V iâ:oria tinhaó já deixado os matos,& efperavão os reftaura-
doreâ de fua liberdade para os acclamar por taes.

84 No feguinte dia mandou o Glandes embaixada , em
^ue pedia fuipenfaó de armas para dar fepultura aos corpos

de

CuraÕ-Je os feri'

L.

6'^6

Qmr(^oro lusvtmo

i6\^

de fcus mortos , que ficáraõ febre a terra no campo da bata-

mortos.

^

General Francifco Barreto de Mer^ezes ao Sargento May or
António Dias Cardozo,qnefoíre (com alnfantaria^qiielhe
pareceffe9efperarj& receber ápraya osMiiViftros daquella
flinçaó, & os acompanhaíTe na forma do eftíloyaté os Guar^-,
t^^çt^ aonde com a gente da fronteyra, & feu Capitão Fran-^
cífco Barreiras, affiftiíTem aos Miniftros Qlandeíes o tempo^
que o enterro os detiveífe . Executou o Sargento Mayor as^
ordens, efperou quechegaíTem osFramengos, os quaes dçí
zembarcáraó perto do íitio dabatalha:Eraõ:niuyjX)s gaftado-
res,& por feu Cabo hum Capitão de clavinas ^ dosque ç.^c^r
Ce lhe cmcede. páraó do confíiâ:o,& hum Judea rico,chamado Moy fen Na^
varro,que a titulo de língoa, falava bem Portuguez ,.0 trazia
a eÍirioridade,& a duvida. Saudaraõ-fe os Cabos: Sepultou o
Framengo os feus mortos com efpãto, & magoa da multidão,
& do eftrago , que nos miferaveis corpos (defpdjadós. de toda
á cobertura) fes a ira , & o ferro. Satisfes com pique devia i
piadade, & com as lagrimas entre as peíianas pos! os olhos nq»
o que pãjfao os Sargento Mayor António Dias Cardozo, & apontando com
Cabos de bua, & ^ ^^^^ ^^^,^ ^ boqueira5,aonde.o fangue cobria a- terra,diífe
(comefpirito da vingança) que ainda eíperava morrer na-f
quelle Iugar,aonde tantos homensgrandes de 01anda>& Fra-
ca acabarão a vida com tantos foldados defama, por-fetal dé-
ftino de fua adverfa fortuna : Ao que o Sargento Mayor reft
pondeo,(ao defentendido) que tão honrada defe;o,era filho
de peyto tão generofo. comomoílrava fero feu, com tanta
rezão fentido de naó acabar a vida entre os homens grande^
que fó íheíicava,para o martyrio de hum continuo arrepen-
dimento. Ao que tornou o Capitão Olandès : Ouvi dizer a^
meu Coronel, antes de governar as armas nefta OGeaziaó,que
os Portuguezes eraõ nos combates tão furiofos, que de força
os avia de condenar o juizo.por homens , ou brutos, ou borr
racRos, pois affi defeftimavão as vidas , como.os irracionaes,
que não conhecem, o que valem. Refpondeo-lhe o Sargento
Mayor á ilação, metendo-lhe em caza o antecedente: Naõ
teme perder a vida^ fenão quem infiel, tem parafi, que não
• > ■ ' há

QUtra^AYte^

a

-sti

1649

fJ^TElLIF^O IX.

^V

há outra vida; quem íabe, que na morte a melhora em fabef
morrer, moílra quanto a íabe eftimar . Os fenhores Framcn-
gos fogem de a perder,porque fem ella não íe podem embor-
rachar , & ró para efte fim fazem conta da vida \ & delles fe
conta, que o fazem por galla, &:otem porfefta j&nãodos
Portuguezes, que abominaó, como afronta , a torpeza de fe-
melhante vicio;& como o effeyto da mfamia he perder o juí-
zo, fó daquelles, aos quaes o vinho deixa tantas vezes infen-
fatos, fe pode dizer,que faó muy ta.s vezes brutos:0 querellos
reportados , tiranicamente opprimidos , he fopollos mfenfí-
"veis, que de outra maneira,forçofamente fe avia de crér,que
gente taó generofa mais facilmente paííà pello trago dehúa
inorte,que pello fofnmento de hvia tirania. O Framengo,que
nas repoílas achava matéria para os incêndios da paixão,buf-
cava meyos para fe diíTimular convencido , & continuou di-^
7endo.lVíuy ta cauza tem os foldados Portuguezes para fefte-
.Jaremtaógloriofas viítoriasj ninguém poderá com ellesde
ufanos,& contentes; & tem rezão, vifta a difparidade das ar*
mas, & do numero. Arguio-lhe o Sargento Mayor a fopoíi-
Çáo da falta: Não fei (lhe refpondeo)que os foldados Portu-
guezes fição muy to cazo de vencer , a quem lhe não fabe re-
ííftir, porque conhecem , que a gloria do vencedor fe mede
pella refiílencia do vencido. Se os Portuguezes pelejarão c5
gente de outro valor, fizeraõ mais eftimaçaó da vidoria: Sei*
gu ir a quem foge, he caça, não he conflido j he jogo , não he
batalha. Bem entendia António Dias Cardozo ocontrario^
do que falava,mas por mortificar o Olandès o dizia:Naó po-
de o Fraraengo diííimular a cólera, que lhe excitou a injuria:
Abrafado em ira perguntou ao Sargento Mayor, fe eraó fuás
aquellas palavras, ou fe as ouvira aos foldados? Refpondeo,q
os foldados as d iziaó : Com defcfperaçaó começou o Olan-
dès a chorar como menino : Tratou de defculpar , o que não
podia defender,dizendo, que fe na primeira baralha rompera
o noífo primeiro impetu a fortaleza de feus cfquadroés, na
fcgunda refiitiraó taõ valerofamente , que primeiro virão a
campanha juncada dos feus mortos,que largaílem o pofto; o
que fizeraõ pouco experimentados no modo de pelejar da
noíTa gente, obrigados a fogir,piimeiro de fua perda,que da

Hhh noíTa

638 C^S7%10T0 LUSlTAno 16^^

nofla erpada,& que a deílgualdade do eftrago nacera da dif-
ferença do eftilojque osfeus efquadroés da vão as cargas, fem
pontariai os Portuguezes,em mangas, fem perderem tiro5mas
que dállí pordiante lhes aviáo de imitar o modo,& feria muy
deíTémelhante o fucçefíb; ao que fahio o Sargento May cr di-
zendo, que a concluzaõ aíTentava fobrepremiíTas falfas, em
parte fophifticas , em parte impoíííveis j que era impoffiveí,
pelejarem os Olandefes erpalhados^Dorquèneífta forma cada
foldado necefli ta va de hum Capitão j& cada hum dos Portu-
^ guezes,era Capitão de íí mefmo:Que era fophiílico fopor, q

a fu a gente fe avia de melhorar fem forma, quando com toda
fua forma nos não podia refiftir.Odvio o Olandès, &: calloui
com o que fe deu fim ao argumento, & ás inílancias.

85 Tinha o Cabo Olandés remetido os corpos dos íeus
Cabos para o Arrecife,& fepaltados os mais,& vendo,que o
ráy^O/i/^oo- Judeu tinha alcançado licença parairaonofíb Arrayal,ati-
landh •veronof tulode aíreyção,& curioíidadc, a pedio ao Sargento Mayor, /
áplrr^e^"' ^^^^ ^ acompanhar,dizendo hum j & outro,que queriaõ ver
com íèus olhos gente tão valerofa, que na valentia excedia
os termos da credulidade : Efte foy ó pretexto , outra era a
eauzâ * Entrarão no Arrayal cobertos os olhos, aonde o Ju-
deu pedio,o deixaíiem ver, com os feusjfoldadosjque podiaõ
fer efpanto do mufido.Concedeofe>lhe,5c apeando-fedo ca-
valIo,fenão fartava de abraçar os foldados,hum,por hum, tra-
tando a todos corn honoríficos epitetosj o de Sol (dizia elle)
era, o que fó convinha a gente ^ em cu;a comparação toda à
outra vinha a fer fombra^ Avia entre os noífos, muy tos,queo
conhecerão, & tratarão antes da guerra , dos quaes foy rece-
bido com àgafalho , & bem correfpondido de feu alvoroço.
Mal fofria o Capitão Olandès os hyperboles , com que o cõ-
panheiro nos engrandecia,& cóm téção de os abater , chegou
á prefença de Francifco Barreto d€Menezes,que com os Ca»-
bos mayores o éfpera va em hua fala alta: Sobio, 8c com cerc
monias de fomiíTaõ o íaudob, & aos mais , & profeguio, com
o quepaffa com ^"^"^° dobrado, dando a todos os pezames da morte do Sar-
FrancifcoBarre. gento Mayor Pauloda Cunhaypor fe perder nelle hum gran-
tode Meneies, de tafulj& úo muyto , que fentia a do Governador da liber»-
dade Joaõ Fernandes Vieira morto no avanço da fua artelhaí-

na.

■35—

649

!?^^T£ 1. LIF^O 7X

<5g9

»

ria, peíToa, a cujo valor deviaõ os moradores todas fuás boas
fortunas5& as armas de Portugal a reputaçáo,em que eftavão
naquellas partesj dcígraça , que elle íentia , como amigo, 8c
foldadojfopoftojque no Arrecife ativeraõ por tamanha di-
ta,que fe davão os do governo huns aos outros, os parabéns,
porque na perda de femelhante homem, nos vinhaacuftara
vidona, mais do que valiaj & que fuás Senhorias deviâo tol-
krar a defgraça como certos , que não dava a guerra outros
fruitos,mais que fcridas,& mortes: f Era aííi, que no Arrecife
corria vulgarmente,que o Meftrede Campojoaò Fernandes
Vieira ficara morto na batalha,nova , q fe motivou da cauza
referida em o numero feífenta & nove defte livro. O Meftre
de Campo General entendido na ironia dos pezames, cortou
o Olandès com os mefmos fios de fua malicia . Rezão tem os
fenhores Olandefes ( Iherefpondeo ) de nos darem a nós os „
pezames,& aííi os parabéns da morte do Sargéto Mayor Pau- „
lodaCunha,foIdado tão valente, quefempre fes jogo de ,,
matar Framégos,& nefta tafularia empregou o tépo,& o cui- ^,
dado ;& quando não fora homem de muita eftimação por ,,
fua grande callidade, & por fuás proezas , baftava fer Portu- ,,
guez, para que fua morte foífe fentida; porque avaliamos em „
mais a vida de qualquer, que todas quantas vi6i:orias nos po- ^^
dia dar a fortuna . Porém aconíblaçáo , Sc a alegria, com.^,
4]ue no Arrecife fe fefteja a morte do Meftre de Campo
Joaô Fernandes Vieira , aífenta fobre falfo , porque nefta ^^
prefente hora eftará defcanfando em fua caza , fem ferida, ^^
nem achaque, que lhe deminua o gofto de matar, & deftruir ^^
Olandefes, dando novos fios á fua efpada,para continuar em ^^
exercicio tão faborofo para feu genio.O Judeu [não menos j,
crédulo na morte publicada, que feu companheiro^ teve pa-
ra fi, que era engano , o que ouvia , & com disfarfe cortezão o qual o dejima^
procurou a veriguar a verdadeiDiíTe que fempre fora amigo, g^"^ damortede
& apaixonado do Meftre de Campo Joaó Fernandes Vieira, ^°^''. ^-^^^^«^^^
& que nenhum favor poderia receber mayor de Suas Senho- pTfl^^l ^^^ ■* '
rias, q o concederem-lhe licença para o ver, fe foífe poífivel j
porque fe lhe acabava o termo,que lhes davão as ordens,que
traziaõ , as quaes moftráraó logo j (efcondendo as fecretas,
que lhes concedião todo o tépo , q foíTe neceflàrio para apu-

Hhha rarem

k

CJST(l(10TOLVSlTjnO 164^,

tAtèm a verdade ) aindajque para eonfeguir cauzâ,qu(5 tanta
defe)avaj fe exporia a todo o rifcQ,

, 86 Mandou Francifco Barreto de Menezes chamar a
Meftre de Campo Joaó Fernandes Vieira ao feu Engenho
Cuid viãd. oS ef^ ^^ ^^õ Joaó ( não muy to díftante:) Chegou, como alheo da
fanta. Cíau2a: Foy recebido do Judeu com fefta^&i do Capitão Oíâ-i;

dès com pafmo: ( com o ver fe lhe qUebravão os olhos , que
nellepunha)0 melhor, quepodcj efcondeo o Capitão Olã-f
dès'o coração entre as palavras , dizendo que feftejava gratv?;.
demente velio com taõ difFerente forte, da que fe contava no
Arrecife, aonde fe dizia , que ficara morto na batalha > Se 0$
3, íènhoresOlandeíes(lhe refpondeo Joaó Fernandes Vieira)
5, dizem, q dei a vida pella vi&oriajfallão pella boca defeu de-?
' ' jf fejo j fe o crem,he negoceação de feus deli6i:os,porque fe per*
j) fuadem,que acabaria feu caftigo com minha v idatMas defen-
5, ganê-fe, q fe até agora fui íeu açoute, vivo, daqui pordiãte o
,5 ferei,como refucitado: Porq fabe Deos refucitar mortos para
3j caftigar foberbos.Có femelhãtes deíprezos os tratava a nofík
géte,não ignorando o valor5& difciplina da NaçãOjq todo o
mundo reípeitava,mas queriaó abater os fumos de fua altive*
za.PaíTou a pratica a matérias jòcofas, com q os noíros Cabos
os entretiverão: Agafalharaõ-nos cõ abúdãcia3& hohrajaté q
ao outro dia fe voltarão para o Arrecife , aonde o defengano
fes tãta impreífaó nos do go verno,q foy may or a triftezà, que
cauzou a verdade, q toda a alegria,q tinha introduzido a foí-
, pèyta,porqueacauzadopezaréracerta5&adogoftoduvi^
doía* í.

87 Entre o receo, & a niagoa paíToii o Inimigo alguns
mezes. Todo o feu cuidado occupava a dor^ que lhe deixa-
rão golpes taó feníiveis, que nem o tempo os efquecia, nem
a efperança os curava : Via em feu eftrago noíTa confiança,&
sjíffeçaodehuas tântoffiais a temia ^quanto mais a eonííderava . Parecia-lhe,
' qu e não faria pouco em defender fuás Fortalezas j & todo fe
aplicava a reformação delias, & a exercitar fua gente na arte
da milícia. As mefmas diligencias fe faziaó da noíTa parte,com
diverfa rezão, fe bem , que com a meíma doutrina ^ que a to-
dos acófelha igual vigilãcia, & cautela no fegUro , & no peri-
|o.Proveraó-fe as Eftancias com avertencia, & cuidado : Naõ

fe

•i(?49

fAi(rn i.Liv\Q /x

641

•ikw.ivA

fe fiaváo nos favores da fortuna; a mayor dita os defconíia*
va mais, & como fe efperáraó feus revezes, adeílravão os fol-
dados cada dia, porque o ócio os não levaíTe ao vicio j com q
de húa, & outra parte vivia a guerra nas difpòfiçoés, fopofto
^ue amortecida nos defmayos do furor. Para íàhir a publico,
íè fazem os enfayos , & os da guerra liâo faõ pacificp^^ainda
gue fenão moftrem encontrados^ rht^Ti-^n r . ^ ■ . •> : / . •" iy»
• 88 Em quanto em Pernambuco fuccedia o referido,ca-
minhava no Rey no á fua execução o aíTento , de que oS na-
vios mercantes navegaíTem em frotas; comboyados por conta Sahe do Reyn&
da Nova Companhia Gèral.Em quatío de Novembro dé mi! primeira frotx
Jc feifcentos & quarenta & nove í^hio de Lisboa a primeira '^^^J'^''''^'' ^^t
frora,feu General o Conde de Caftellomelhor Joaõ Rodri- '
guês de Vafconçellos [ a quem ElRey Dom João ò Quarto ^/^
mandava governar aquelle Eftádo} & por feu Almirante Pe-
dro Jaques de Magalhães , Cabo? , já então de fama , & que
defpois occupáraõ os mayores poftos da guerra . Com pf of-
pera v iagcm os viraó naquelles mares,Naturaes,& Eíitrãgei-
ros, colhendo huns aspremiíTasdeíuasefperanças nofegu-
ro do comercio , outros confirmando os receos , de que buf-
eaváo feus portos com fegunda tenção; Efte cOidado fervio
ao Olandès de freyo, para que não ouzaffe levantar o braço
os mezes, que a frota tardou em v oitar para o Rey no.

89 Vio-feSifgifmundo livre da >cauza,que lhe tomava
a refpiraçaò ,& quiz experimentar o eftado de fua fortuna.
Em vinte & cinco de Agofto mandou hum groíTo de Infan- SifgifmUõ ml*
taria, que pella Eftãcia do Mendoça (aonde eftava por fron- ^'* ^Z^'^'^'" ^^f'
teiro o Capitão António Borges Uchoa ) tomaíTe o pulfo á *ç^"m ^ue^fui*
noíTavigilancia. Pella Fortaleza dos AfFogados, como ttiaisp/^. '

proxima,fahiooFramengo:Prefumiaremiíraó emnoíTo cui-=
dado pella continuação do ocio,& pella confiança das vi(^o-
rias; mas achou as vigias defpcrtas, & as armas promptas:C5
ellas na mão,fahio a recebello o Capitão, & agente do prezi-
dio, a qual, como inúdação reprimida,rompeo pello Inimigo
cõ tal vioIencia,q fem efperar fegundogolpCjvirou as coftas,
deixando fete mortos, que lhe não permitio retirar a preífa
do alcance ; & nos muytos feridos , com que fe recolheo , le-
vou a melhor cura de feu engano.Muy tas vezes,& por di ver-

Hhh3 ias

642 C^ST<!IÍÕTÕ lUSITMo 164^

fas partes cxperimentoa o Olatidès o mefrao ^ & com dizer,
que em todas ellas levou O caftigo cortadopor feu atrevimé-
tOj as deixo referidas todas.

çú ' Efâ a Fortaleza dos AfiPogados a que (entre todas as
do Inítnigo) ficava mai5^pella terra dentro , 8c aili a cercavão
âo largo muy tas Eftãcias noíTas : A que chamavão do Aguiar
Mafída cometer era a mais próxima^ fítuada pella frente para o certáo era pa^
4 do Aguiar , & f^pcm. que náo deixava liberdade ao Inimigo para as corre-
^/ '' tias- que delegava razer;ai-0ubar a campanha^pella grande co*

modidade,que nos offei:ecia;o mato para as embofcadasj que
a toda a hora achava o Framengo formadas,& vigirantes[bar-
bilhò infoportavel para nações^ que vivem de piratas por in-^
cíinâçaó,& ipor òftíciOi] Eftàva por frònteirG,8c Capitão da
Eftancía Manoel de Aguiar, oGaraíIà de alcunha, quando o
Inimigo em Tete de GutuM fahio conrpoder , Sí cora rcfo-
luçâó de rendei a Eftancia>oú quando menos de roçar-lhe o
mato da citcurfetenciá pata ã poder bater com artelharia da
fua Foítaiézà. Tocáraõ armaasílntínellas^fahio o Aguiar cã
os feus fotdâidôâ ( todos doiterço de André Vidal de Negrei-
ros) Scaffirebateo o I^imigòjqueièm muy ta reííílêcia o p o»
cm desbaratada fogida, com tabta perda de mortos , & ferir
dos,que nos fazia entender, quetiâo paílavãfeu intento , de
confeguir íèu dano: Ardia no peyto daquella gentep fogo dâ
<íobÍçâ com tanta vive2a,quecorifumia nelle toda a lembran-
ça do pèdgô/ >fmisr

91 Em quinze de Dezembro fes o Oiandès hum groíTó
de toda a gente,qu e pode efcuzar nas fuás praças , impacien-
te, de que feus foldados , reduzidos a viver das pagas , íènão
podeíTem alentar com algum roubo fnão avia parte por on-
de achaíTe vereda feu deíe^o,'porque em todas encontrava a
'^^ oppoítçaõ de noíTas armas.) Embofcou-fe em hum mato v c-
zinho ás fàlinas,que lè diziaó de Francifco do RegorFoy fen-
tido: Deraõ âs vigias rebate, & correrão a dar informação do
^clfZ Z^!Z1 íugars&:domodo,emqueviraóoInimigo,aoGapitaÓ An-
fortmti. tonio Ferreira machado, fronteiro uaquella Eftancia.Sahio

acompanhado do Capitão Apolinário Gomes Barreto, & da
gente de fuás companhias.Com valor,& deftreza enveftiraõ
o Framengo, que nefte dia moftrou o muyto , que tinha de
^é^i induf-

induftriofò , Bz de foIdado.Pof algum tempo rcbateo o encó-
tf(>; largarão os nofíõs os mofqiietes, & tanto,que defembai-
íiháraô as efpadas, os fizeraó virar as coftas. Mais dano rece- ^.^ ,
béraó na fuga, que na f efiftencia^ porque na reíiftencia pele-
Javaõ com ordem^Sc tíó alcance ( que os feguio até o abrigo
de fuás Fortalezas) morriáõfem tino , & pagáraõ por fobido
pttçó â vida do Capitão Apolinário Gomes, que nos deixa-
rão morto no campo ^nelle achámos dezafete Oiandefes mor-
tos: Muytos de vião ferjOS que retirarão) quando deixou tan-
tos a oGcupação . Do numero dos feridos poderia íàber, quê
os recolheo,que nós, nem ainda dos mortqsj nem dos feridos
da noíTa parte tivemos noticia certa. "^•'^"'

92 Cortado de nofíb ferro) & de fua fortuna com reve-
2€Sj8c golpes tàÓ repetidos fè vio Sifgifmundo doudojSc de-
fenganado.Muy to á fua cufta tinha entendido, que para nof-
fo braço era o reparo incentivo, & a refiftencia reclamo, & q
nenhua coufa valia o poder , & a induftria , tanto que chega-
Váò à medir as efpadas. Parecia-lhel, que fazendo-nos a guer-
ra lerita,&: ao krgo nos poderia confumir,a;udado da diftan-
da,&: do tempo, mas acha va-fe Mto de gête,&: de munições;
&femefperança defocorros deOlánda impoíTibiirtada de
guerra mais vezinhaj efta lhe cometia a cabeça , & para a de-
fender fe valia aquella republica de todas as partes do corpo:
Más porque temia que nõíTodifcarfoinferiíTefeu eftado, o
quiz divertir com mandar hua pequena efquadra ao Rio de /^mda hua ef-
SaóFranciíco. EícõndeOan€i:effidade,que oconftrangia a ^^^^'>^'^^° ^^^ ^^
bufcar mantimentos,com a voz, de que a mandava a deftruir ^-^^^^"r^^^
os moradores . Êm os últimos deite anno de mil & feifcentos
& cincoétâ fahio da barra do Arrécife,& deu á vela. Não va-
leo a Sifgiímundo a induftria para a duração do íegredo:Lo^
go ao outro dia avizáraô alguns confidentes ( todos feguem
a melhor fortuna) ao Meftre de Campo General Francifco
Barreto de Menezes,da tenção do Framengo. Conííderou a
importância do intento, duas vezesutil ao Inimigo,húa,por-
que fe fornecia, outra, porque nos atenuava(era o R ío de S.
Francifco a parte donde a noíTa gente tirava a melhor porçaò
do fuftéto:JDeliberou-fe em mandar,quem empedifíè a per-
tençãodo Olandès* Confultou aos Meftres de Campo João
' • -í Hhh^ Fer-

li.ii"

iP

^

do^o avaienco'
trar fem temfo.

'Jpurâ TrãHcifco
Carreto de Me-
TiCzes hua fof,
peyta^ij^ lhe cau-
jíiiva. âferfidâo
Inimigo.

,'~\

Animo àefleunt'
do de der uns foi.
dados nojpiS.

C^ST^IOTO LUSlTJm g^^p

Fernandes Vieira , & André Vidal de Negreiros , aprovára5
a cautelaj& a peíToa do Sargento Mayor António Dias Car*
dozoj para a execu ção dei b . E-rn cinco dç Jânei ro fahio àei^
Arrayál com quinhentos foJdadosjSc inat eha stão ligetra, qiié
)i aos quinze eftava dentro, dos limites daqu.ella Gapitaniíi:^
da qUal achou já retirado o Ff amengp} tão obediente apayb
2o,quefe lhe deu,que nada çpnfegUíOjdQ que intentou. Náq
íabia António Dias Gardozo, pelejar fem vencer ,& não fen-
tio menos fogir-lhe o Inimigo^ que roubar-lhe a viíi:oria::; A-
braíbu tudo , quanto podia fer de preftimop^ra o Inimigof ;
recolheo tudo, o que lhe páreceõ útil para os feus j Stíe vol-
tou para o Arrayal jmagoíido de obrar fó o fácil.

9 3 Abraços corii ftu defengan.o andava lutando Sifgií^
mundo, fem que algus dos feus ouzaííem fa;hirdas fuás forti-
íicaçoés/enão a furto j& fc os noflbg ps colhíaõ' com elle nas
mãosjO que delles mais cprria,€ra5p quje melhor livrava .Vèn:-
cia npíía vigilanciaa toda aíiia diligencia^ Se hps. mais dos 4ias
fuccedia o mefmó. Prefumiraõ os nPÍTos Meftres de Gampo
de ufo tão conforme , nâo fer cázO) fenãp conítlhp, & para a
examinarem^mândáraõ (crn íeis de Marçp) ao Sargento Ma-
yor Jacome Bezerra éom trezentos íoldados , Sc prdem, qu0
com elles fe embofcaíTeyéntreas FprtakzaSíGineoppnta^^Ãf"'
fogados, 8c Barreta,á eípera de Olandeíes j íitip , em que nã<i
poderiaõ faltar, em rezáp, que era paífagem fprçpfa , para a
condução dos mantimentos ) que dp Arrecife lhes entravãq
pella Ilha do Gheiradinheiro. Emboícada a noífa gente,def>
cobrirão as firitinellas húa embarcação deremP ,quefahif4
do Arrecife,& trazia a proa na mefmailha. A dpze foldadpí
feu s mandou o Sargento May Pr, que a nadp , Sc cpm as efpa^
das na boca a foíTem enveftir: Sem rçplicà o exe€utára63& ccí
morte de féis Olandefes a rendéraõ,& nella a mulher do Go-
mendor da Fortaleza da BarretarViõ da Fortaleza o roubo,
& fahio com deliberação de cobrar a prefa, ou deixar a vida:
Nada executou, porquefoccorridos osnoíToSjíe retirarão o$
contrarios,& com elles o Gomendor( perdido o credito de ar
mantc,& de valente , porque á vifta da efpoía cativa , nem a
pode livrar, nem foube morrer.) Reformou o Sargento Ma?
yor as embofcadasjtendo para íi, que o Frajnégp aíTiftido das

OMtras

HHi:

outras Fortalezas bufcaria fegiinda vez a )oya perdida 5 mas-
nãofoy aííi, porque enfinado a fefudo, perdeo de todo as co-
legas de arrifcado. Dous dias perfiftirão os noflbs em efpe-
rar j no fim dos quaes os mandou Francifco Barreto recolher,
inteirado deoccaziáotãoclara, queoufo de fogir entre os
inimigos era achaque do coraçáo,& não efcolha do juizo.

9 4 Naó pode fofrer horas de defgraçado, o que as teve
de venturofoj o ambiciofo de melhor forte, todas as gafta em
excogitar meyos para atrahira fi a fortuna. Parecia-lhe a Sif-
gifmundo,que tanto tardaria em fe melhorar, quanto tardaf-
fe em romper aquelle precinto de noííàs Efi:ancias,que junta-
mente o cingia, & apertava. Em a manha do fetimo dia de A*
bril de mil & feifcentos & cincoenta & hum,deitoa fora tre-
2éros Infantes [deviaõ fer foldados efcolhidos,& refolutosQ
O melhor fempre he o menos. Sahiraó pella Força dos Afíbr
gados: Confiftia obom fucçeíTo de feu intento em aíTaltaré
a Eftancia do Mendoça,fem ferem fentidos,& não fe logrou.
Foraó defcobertos das noíTas íintinellas,dcraô rebaté,fahio q
Capitão da Eftancia com a fua géte a receber o Inimigo ; por
largo efpaçoefteve igual a pendencia,faltava-lhe o fiel aba-
lança das cargas,empunhára5 os Portuguezes o da efpada, 8c
logo fe inclinou a viítoria á noíTa parte. Virarão as coftas , &
deixarão quinze mortos pellas cuftas j mais leves as no0as,
que naó paíTáraó de féis feridos.

95 Ou da queixa,ou do zelo teve o Meftre de Campei
General a vizo, de que o Inimigo andava tão fenhor d^ cam-
panha do Rio Gráde,como fe a ella não poderá chegar a nof-
fa efpadaj & convinha,que a permiífaõ naó paíTaíTe a defpre-
20, & o refpey to fe confervaíTe com o medo do caftigo,&: fe-
«áo eftragaíTe na confiança da diíTimulaçáo.Com (> voto dos
Meftres de Campo nomeou Francifco Barreto ao Capitão
João Barboza Pinto, valerofo,pratico, & refoluto . Sahio do
•Array ai, em dezafeis de Julho com trezentos foldados,& or-
dem, que fem perder hora de tempo marchaíTe ao Rio Gran-
dc,&nioíl:raíIè ao Inimigo, que a efpada dos Portuguezes a
toda a parte chega, Sc por tudo corta. Atormentados os Olã-
defes, & índios da nova do eftrago, fe recolherão a hiia forti-
fica çaójque tinháo no íitio das guarairas: Aonde preíTumiraõ

ade-

■litl!

líd E/?ancU da
Mendoçaferdeo
IniMigo reputa"
íÇaÕyé' gente.

■í'

\

No Rh Cr ande 0
Cítfiiga, loão Bar»
hoi^A Pinto,

li!

6^6 C^ST(!(1070 LVSITAKO . 1^52

a defenfa, acharão a entrega , porque enveftida , & ganhada
perderão todos a hberdade, & fó alcançarão a mercê da vida,
Correo Joaõ Barboza Pinto toda a Capitania, & como rayo
abrardu a terra de modo,que nelía naõ deixou homem rebel-
de,nem couza util.VoItou para Pernambuco com alguns ga-
dos,& oy tenta & trez cativos Framengos, Negros, & índios.
^6 Ferido por todas as partes vio Sifgirmundo o corpo
de feu dominío; queixofo da fortuna, que fó em fe lhe mof-
trar adverfa,tinha conftancia: Hiia pequena fombra lha pin^
o rnifmolhe fuc j-qu propicia:Diflèraó-Ihe,que todas as noites fahia de noíTas
doAmiar"^ Eftancias hua companhia de ronda 2 defcobrir o campo, teve
' para íi que a hora, & o numero lha entregariaõ nas mãos. Ef-
colheo cento & cincoenta foldados,formon trez embofcadas
com tal cautela,que lhe pareceo, não pafTavão as noticias a
terceiro,& contente do imaginado fegredo , fe dava a fi ipef-
mo os parabéns de nos colher no laço.As noíTas íintinellas, q
o Inimigo fopunha muy to apartadas, eftavão tão veíinhas,
que YÍraó,& notáraõ até a menor circunftancia das embofca-
das. Sem tocar arma, deraõ conta ao Capitão mais próximo
V fera Manoel de Aguiar:)Com a gente de feu quartel deu fo^
* bre o Inimigo,que defarmado do ardil, fe valeo da força, &
pelejou valerofamente.Tempo cõíideravel durou o choque
em igual Marte, porém como os golpes de noíTa efpadá eraô
mais pezados,inclinou-fe para a nofíà parte a vi£l:oria:Sobida
com o pezo dos mortos,& efmaltada com o fangue dos feri-
dos, a deixou o 01andès,com laftima de Sifgiímundo,q nefta
occazião conheceo a limitação dos humanos juizos 5 que pre?
fumem jurisdição nos íuturos/ó refervados a divina compre^
hençaõ.

9 7 Aqueíle mato,que repetidamente diíIèmos,creara a

íiatureza entre a Fortaleza dos Affogados , &a Eftancia do

Aguiar era a pedra de toque,em que melhor fe via a impaciê-

Terfiá o Inimigo cia 01andefa,& noíTa defenfadada confiança,perfiando a cõ-

em feu dímo, dr tumacia do Inimigo em o roçar,& a nofía vigilância em o de-

"^aã ^^ ^^^ fendenEra de cada dia o dano , que o Framengo recebia , &

julgando por menos cuftofa a perda de hum choque , que a

de muy tos afíaltos, fe determinou cm o roçar a todo o rifco.

Em o primeiro de Novembro j fiou o intento a hum Cabo

(en-

i6^

^AXTEl.Lir^^ IX? 6^7

(entre os feiís o de mayor opiniaój Dcraõ-Ihe foldados,que
em nijmero,&callidade Iheaffeguravaó obomfucçeflbi &
tantos gafladores, que femedifiè o tempo da roça pella du-
ração do combate.Confiados no poder fahiraó os OlandeíeS
a cara defcoberta: Foraó viftos do Capitão da Eftancia Ma-
noel d' Aguiar(cujo animo acháraó fempre as occazioés íeiíi
duvida^) íèguido dos feus, faltou fora das trincheiras,&: com
húa mefma corrente emlreftio,& rópeo o Inimigo, que aíTom-
brado da temeridade, nem fe achou com juizo para o confe-
Iho , nem com animo para a refiftencia.Perfcguido de noífos
golpes fogio a bufcar o abrigo de fua artelharia. Deixou féis
mortos , retirou muy tos feridos 3 quatro foldados noíTos o fi-
carão. *
98 Seis mezes deixou o Olandès defcànfar íioíTas ar*
masjfufpenfaó,quelhe aprovavão, as perdas: Não aííi aos
noífos foldadosjq como não fabiaõ viver fem pelejar, fe lhes
fazia intolleravel afalta das õccàzioês. Como defgoftados os
via.o Meftre de Campo General^ entendido na difficuldade^
com que fe reprime a incIinação,&: o cuftume. Para lhes ma-
tar defejos, determiíióu em o primeiro deMayo dar hum
Santiago verde ao Inimigo. A todas fuás acções dava o me-
lhor parecer ,& cõm o de feus Cabos fahiaó mais fermofas;
Aífentou-fe^queó Sargento Mayor António Dias Cárdôzo
com quatro centos foldados do feu terço fêembofcaffe en-
tre as Fortalezas dos AfFogados,& Bàrreta,&: picaíTe o Inimi-

j f^ 1 ' rr 1 II T-, * iíiii"! (oiiíirreto provo»

go,provoGando^o a fahir fora delIãs.Fõrmou o Sargento Ma^ car o immtgo, a
y or as embofcadas,& picou o Inimigo com algiias mangas de ^uíjuc^effo.
foldados. Vio o Coméndor da Barreta,que a occazião o con-
vidava com o melhor partidoj fahio com alvoroço , enveftiô
com orgulho, que os noífos reprimirão, (guardadas as coftas
das embofcadas) com tanta gentileza, que o Coméndor da
Fortaleza dos Affogados fõccorreo aos feus có promptidaõ,
■& podetj fahiraó os noífos das embofcadas, & em efquadraõ
unido fizeraò frente a hú,& outro Inimigo: Travou-fe a pe-
ieja,âccêcleo-fe o furor, durou tempo confideravtl o choque
com indiíferente fortuna.Mais de hora, & meya perfiou a ira,
f tão quétes os animos,como as armas.)Com a refiítencia crc-
ceo o vigor da noífa gente, & carregou ao InimigO;^ de forte,

que

'!i Ji,

::l^^:'

í;M,

Manda FramiC-
coBarretoprcvo'

^4^ CJ^T<^IOTOLUS&JNO 1652

que obedeceo o mayor numero , ao oielhor bracb : Roto , Sc
deíordenado oFramengo, bufcou na fogida o remédio , &
nella achou o eftragojlevava nas cofias os golpes denoffas eí-
padasj perdeo as armas,& o tino , & fem íaberem como^huns
fe deitarão ao Rio, aonde mais deprcíTa bebéraõ a morte, ou-
tros correrão a bufcar o amparo nas fuás Fortalezas , deixan-
do no campo quinze mortos5& pelios matos muytos feridos,
aonde os mais delles perecerão . Recolheraó-fe os Portugue-
zes ao Arrayal alegres, como viâoriofosj mais agradecidos á
occaziaõ pcllos meter no choque , que por lhes dar a wiàa'

na.

^ç Com noticia certa,de que os Olandefes tinhaono
Rio Grande muyto páo Brafil para levarem ao Norte, & que
^jntoníõDlasCãr reformadas as roças, crias,& plantas colhiaõ mantimentos, q
do^o 'v&y âo Rio mandavão para o Arrecife, fe determinou o Meílre de Cam-
frandeioí ne/k p^yQç^ç^^l^çç^ aconfelho de Joaó Fernandes Vieira, &
J^^^' André Vidal de Negreiros) em mandar ao Sargento Mayor

António Dias Cardozo,& quinhentos foldadosdo feu terço
a recolher aquelle género , & tudo o mais , que tiveíTe preâi-
mo;&abrafar, o que fenáo podeíTe conduzir. Em vinte de
May o fahio do Arrayal com tanta alegria dos foldados , que
feavaliavão ditofos, os efcolhidos para femelhantes expedif
çoés. Entrarão na campanha do Rio Grande fem ferem ef-
perados: Renderão muy tos Negros^ dos índios fe caftigáraq .
os contraírios3& fe favorecerão os neutrais, Deílruiraó as ro-
.., ças, lavouras, canaveaes,& abiguarias.Confumio o fogo gra-
de cantidade depáo Brafil; & deixando no fangue , &nas
cinzas o mais horrivel pregaó de noíTo fiiror , & feu caftigo,
fe voltarão para o Arrayal, fem dilação, nem perda,aonde os
foldados feftejáraó a reílituiçâo , & poíTe de não pouparem
inimigos.

100 Foy efte golpe dos mais fenfíveis, que recebeo o
*^^ Framengo, porque o ferio na garganta,&: na bolfa,& não cÓ-

r^r^ j valeceo delle em todo hum anno,tempo,em q em tudo fe ne-
Sufpcfio ãasar' .. . „ ,. , ^ ' . -"o

mlsinimwas.é' §^" ^ ^^^^ ^ occaziao,que podia dar matéria, tm argumento a
forque cm\a. noífa hiftoria. Gaftava os djas em confiderar,& fentir o mile-
ravel eftado, a que o tinhaõ reduzido noíTas armas. Via o Sií^
gifmundoopouco, que podia obrar: Não fofriaõ os do go-
verno

■ n-

if^5

TA^EI.LIF^O IX.

<^49

/"

verno a inutilidade do cxceíTo no diípendiojque faziaõ á cõ-

panhia as pagas ordinárias, o fuftento da gente, aconfcrva-

ção, & reparo dos navios,feiii que do mar ( por refpeyto das

frotas) nem que da terra (por cauza das Eftancias) podeííem

efperar o menor lucro. Só hum meyo lhes reprelentava fua

idea, que poderia abrir caminho, para melhorarem de fortu-

na,& era,ganharem-nos a Fortaleza do Arrayal : ImpoíTivel

lho propunha a experiência, mas odefejo iho pintava fafti-

vel. Contra o que entendiajfe cõformou Slígifraundo com o

parecer dos mais^ por fua conta corria a forma , pella do go-^

verno a determinação. Entendeo,que fem ganhar primeiro a

Eftancia do Aguiar, fenão poderia dar fim á pertenção, & q

fem artelharia fenão avia de ganhar,(o que eftorvava o mato,

que fe entrepunha no meyo da Eftancia do Aguiar , & a fua

Fortaleza dos AíFogados, donde fe avia de bater. J Aplicou a

diligencia á execução do penfamento ; & em onze de Março

de mil & feifcentos & cincoenta & trez , fahi o a campo com

poder proporcionado ao intento . Eftava por fronteiro na

Eftãcia do Aguiar o Capitão AfFonfo de Albuquerque, her- ^^ ^H^ ^^ ^^

deirodaquelle valor, que fes grande o nome, & o apelido, ^f/^^'^'^^^^^^^

Pellas fete horas da manhã defcobrio o Framêgo , & o fahio ^Iflnio?^ ^^^

a receber com a gente de feu prezidio , com tal forma ,& de-

fenfado, como fe o defprezára, ou o defconhecéra. Ajudado

o Olandès de fua artelharia, & de fua multidão nos efperou

conftante, & diíciplinado:De hua,& outra parte era igual o

furor,& não deíigual a refiftencia. A oppofiçaó acendia a ira,

o dano a vingãça ^ porém a difFerença de huns, & outros bra-

|;os , moftrou,que os do Olandès rendidos ao trabalho a flo-

xaváo na defenfa , quando os dos Portuguezes fortalecidos

da continuação os carregavão com tão agudo ferro,que os fi-

7eraó largar o campo,& o intento,fem mais acordo, que para

retirarem os mortos, & os feridos ; trez ác^ts nos cuftou o

choque,

I o I Pello cuidado, & forma , que Sifgifmundo punha
em ganhar aquella Eftancia, conhecerão os noíTos o empe-
nho, mas nunca atinarão a rezão j ( & verdadeiramente mal ^^'^ ^^ ^efeng^:
podiafofpcitarodifcurfo,que intentaífebufcar-nos no Ar- ZJTyJZ^^f
rayal , quem Icnao dava por feguro de noífas armas no Ar- ma mllas.

lii recife)

,JíP1í;!J

^

(\

e-.

é^o C^ST^IOTO LUSITJ^NO 1653

recife) com tudo fervio-nos a perfia de confeIlio,& pello dos
Meílres de Campo João Fernandes Vieira , & André Vidal
de Negreiros, mandou o General Francifco Barreto de Me-
nezes engroíTar o prezidio de forte, que fempre nelle aííiílif-
fem cinco companhias , & por Gabo delias o Gapitáo Paulo-
Teixeira,merecedor defta , & de mayores confianças . [ Para
os fins, que determina a foberana providencia correm íuave-
mente,ainda as mayores oppofiçoés. ]AqueIIas diligencias,
que o Inimigo fazia em ordem a noíTa ruina, ferviraõ aos me^
yos de noífa confervaçáo. Em dezoy to de Junho, mãdou Sif-
gifinundo (íbbre a madrugada) embofcar cento,& cincoenta
homens de poílo, vivos,&Teformados,(para o que logo dire-
mos)& ao fepótar do Sol fahiraõ, pella Força dos AíFogados
com refoluçaó de cófeguirem,ou morrerem na emprefa . Era
efi:a roçar o mato, & ganhar a Eftancia do Aguiar: OíTo , era
que fempre pegava , fem nunca fazer prefa,& quanto mais
nelle íe enfanguentava,mais o roía.Tinha-lhe prometido fua
imaginação,qiie a noíTa gente, para o rebater , avia de atra-
, a „,; . V eíTar pello meyo das fuás embofcadas, das quaes cortada, &
do Jzuiar cõ do- vencida, lhe ficaria nas mãos a Eíiancia, falta de prezidio ; &
brada guarnição, roçada a mata, fem reíiftencia fe daria a mão com a fua For-
taleza dos AíFogados , para coníeguir tudo, o que quizeííè
emprender : Porém fahio-I he o conceito errado, como fahem
aquelles,que á re veria do juizo forma o defejo. ( Naó alcan-
çara Sifgifmundo até aquella hora, que a Eftancia tinh?da-
brada guarnição, da que cuftumava.) O Gapitao Paulo Tei^
xeira,que fe achava com muy tà,' & bóa gente,fahio da Eftan-
cia, ronipeo as embofcadas, cnveftio o efquadraó Inimigo, q
âíTombrado dè o bufcar tanta mais gente , do que imaginava,
frio na refiftencia, remiíTo na defeníà,fogio cortado de íeu ef-
panto, & de noíTos golpes, taó vergonhofamente , que não
baftou a cauza,paralhe deminuir a injuria . Determinou ref-
taurar-fe na honra , & pellas trez da tarde , com dobrado po-
der,& arrogante fúria, voltou a profeguir no intento da ma-
nhã . No mefmo pofto encontrou a mefma oppofiçaõ: Suftê-
trí^^d^^r^ '•*^" ^ avanço aquelle tempo,que duráraó as cargas , mas tan-
fa. to,quefentioocórtedenoíraefpada ,deixou ocampo,&a

vidoria, contente com retirar os feus mortos , por nos demi-
nuir

i^^3

ipJXrEiLir^^õix,

6^1

n

mti-"

miir o trÍLimpho, coroado nefte dia com dobradas palmas.

I o 2 Naò intentava Sifgirmundo facção , a que Tua for-
tuna o não levafíe vencido^em toda a parte punhaõ os feus os
pés a medo,porque em toda a parte os perfeguia a fombra de
noffa efpada,ou vifta^ou fonhada. Crecia no Arrecife a fome
com a falta dos mantimétos:Era a barra, a porta por onde lhe
podia entrar o fuftento: AcabaraíTe o das prefas^ o de Olanda
não chega va5& avia mezes^que fenão tinha yifto embarcação
do Norte:Forçado da neceííídâde apreftou algiias embarca-
ções para mandar ao Pi.io de S.Francífco,com gête de guerra,
que a feii falvo cõduziíTe os gados daquella campanha ás em-
barcaçoêsj& nellas ao Arrecife.Por ordem do Meftre de Ca-
po General aíiiftia a defenfa daquelles moradores^o Capitão mUa Sifgifr,...-
Francifco Barreiras com a fua companhia , com ã refreava âs ^^ ^^^ ejquadra,
correrias do Inimigo ; deraõ-Ihe rebate,das que fazia o Olan- ""^ ^^^ ^' ^ ^""^^

dès,recolhendo gados,& mantimentosíBufcou-o o noíTo Cá- ^^^f '^"^^'•^'^^^
pitão acompanhado da fua gente,& de alguns m.oradores: A- " ^*
viftáraó-fe na paragem,que fe diz Sanâ:a Izabel.Não era òtÇi-
gwú o partidoja ventagem,que o Framengo nos fazia no nu-
merojlhe faziaó os Portuguezes no valor.Foy o encõtro per-
íiadojporque o fuftentava de hfla parte a continuação de vé-
cer,& da outra a vergonha de fogir; porém como o Inimigo
vio,que a refiftencia \\i^ aumentava o dano, deixou o campo,
mas não a ordem^com q fuás cargas nos detinhaõ o paíTo.Suc-
cedeo, quehua baila perdida paíTou âo Capitão Francifco
Barreiras^ golpe,de que logo cahio morto ; o que viílo pellos
feus foldados, cegos da ira, & eftimulados da perda, affi fan-
gráraõ o Inimigo, que moftráraõ, có quanto mais furor fe pe-
leja pella vingança, que pella vitoria. A trinta ^Çàc Olan-
defes tiráraô a vida,& a muytos o fangue,de que ficou cober-
to o terreno do conflia:o,& do alcance. Perdemos nefte cho-
que o fobre-dito Capitão, & trez foldados j doze nos deixou
feridos.Chegou a nova ao Arrayal^Sí a morte do Capitão en-
lutou o gofio da vi6i:oria. Mereciaó fuás prendas todo o fen-
timento,que cauzou fua falta»

103^ Sintomas de morte faõ nós enfermos, os delirios,
moílraò , que o mal fe apodera da cabeça , parte principal de
hum corpoj dóde fe lhe comunição os efpiritos vitaes. Como

In 3 fre-

i|M;

#

652 ^ QASr^OTO LVSITAKO 1653

frenético o Inimigo, corria a defpenhar-fe , levado dothema,
que aprehendéra de roçar o mato,que não deixava defcobrir
a no0â Eftancia do Aguiar : Emprefa alhea de toda a rezaõ^
ínjíjíe em roçar porque o lie apetecer, o que dana , & fogir ao medicamento^
^uu^é tmpre ^"^ ^"^^* ^°"* trezentos homens fahio pella parte dos AíFo-
iiga. as cujíaí gados à intentar O córte da mata entrepofta » Guarnecia a Ef-
tancia o Capitão Franciíco Pereira Guimarães com fetenta
foIdados(por ordem do Meftre de Capo General, fe tinhaõ
retirado as mais companhiastNaõ avia difcurfo , que não jul-
gaíre,eftar o Framengo convakcido da !òcura,com tantas , &
taó copiofas fangrias:) O mefmo foy ver o deftemido Capi-
tão ao Inimigo, que avançalío , rompello > & deftruillo com
perda de trez feridos, hum Capitão,hum AÍferes,& hum foi-
dado:Em doze de Novembro fuccèdeo o choque; de que o
Framengo fahio bem fangrado , mas nada convalecido : Em
breves dias voltou com o mefmo intento, & quinhentos fol^
dados: Sâhio-lhe ao caminho o Capitão Manoel de Aguiar;
com leve reíiftencia o desbarâtou,& íèguio , matando , & fe-
rindo, fem algum lhe v irar a cara, que todos levavaõ no abri-
go de fua Fortaiezaí Laftímadò) & confufo o deixou o
cazo, porém não arrependido.A breve duração de
feu império, moftrou, nefta contumacia,que lur.

ta va já c om a morte; deixou de perfiar,por-
que lhe faltou o tempo,& naõ porque
cobrafle juizo,que delirante,© le-
vava ao ultimo pafíb de feii
dominio.

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PARTE I LIVRO X.

N T RE todos os affe£i:os humanos,
nenhum mais impaciente, que a efpe-
rança. Naófabe acomodar-fe com as
dilações do tempoj&quanto mais ve-
zinha a poíre,mais intenfa,© dezejo. A
efperançado lavrador, mais o inquie*

ta na fega, que na feara, porque fe vé
mais perto da colheita na eira , que no campo . Fundados na
;uftiça da cau2a,re pozeraõ os moradores de Pernambuco em
campo contra a potencia Olandefa , com efperança certa, de
que aviaó de confeguir a reftauraçaõ de fua Hberdade, & de>
falojar o Inimigo do intruzo domínio daquellas Capitanias.
A favorável corrente dos fucçefíbs, os adiantava nos defejos ;

& o curfo das Yíâ:orias,os levava ao fim erperado.Viaõ-re tão
perto da poíTe , que os martyrizava a dilação , infofridos de
íiáo chegarem com a mão , aonde chegaváo com os olhos.
Murmuravão a detença, acufando por floxidaõ a prudência.
As incomodidades da campanha,lhes efcondiaó os perigos da
empreía: Diziaõ, que íe enveftifiecõ o AáPêeifea todo o rif^
CO, que morrer por morrer, antes no aíTalto com gloria , que
íio Arrayal commiferiaiqueas vidas, que confumiao tempo
fem fruito, melhor fe empregariaõ no combate com uíiHda-
de,& com honra . Naõ penetravão eftas queixas o coração
dosfuperiores, comoferiaõ o do Meflre de Campo João
Fernandes Vieira,porquefeconíiderava cabo, companheiro, ^ez,oes\ forque
& motivo.Tinha íido cauzafem quanto á ultima difpofição] ''^^pe de Capo
para os moradores tomarem as armas, influindo em todos cõ ^rteir^d^^^av
a perruação3& có o exemplojO defe;o,& a efperaRça da liber- dTfim7gí7rl

IÍÍ3 dadc.'

> é^4 CAST(^oro Lvsirjno 165^

dade. Rezaõ , que o fazia author da pena , & reo da queixa:

' EftimuloSjque o obrigavão a enveftigar com mais cu idade os

meyos por onde melhor fe poderia confeguir a execução de

fua promefía . Efta era toda a occupaçáo de feu juizo , & de

,- .-.^v . feudefejo.

2 Propos-Ihe eíle cuidado (no tempo confignado para a
navegação das frotas do Reyno ) o remédio único para che-
gar ao fim pretendido.Era o mez de Dezembro , o em que as
frotas ('pello curfo de fuás viagens) furcavão aquelles mares:
Tinha aíTentado coníigo (fundado em certas noticias, & lar-
gas experiências ) que para acõquifta do Arrecife, & de íuas

/' praças, valia pouco toda a hoftilidade da terra , faltando pOf

der,que lhe empedifíe os focorros do mar.Sopunha os cabos,

que conduzi a5 a frota , naturaes, para a cõmiferaçaõ, Portu^

gueZes,para a ouzadia, & foldados,para a recompença, gran-

' de pella eftimação dos deípojos . PaíTava a coníiderar nos a-

preítos^neceíTarios para a occaziaó, ( que a todo o juizo def-

mayavãojá primeira vifta. J Sabia,que a facção a muytos avia

de parecer temerária, a não poucos impoííivel,& a alguns inr

tempeftiva . Porém como no íèyo daquelle coração fe per-

diaõ todas as diíficuldades , não ouve repugnância , que nâa

Tr opõem ao Me- venceíTe fua refolução . Determitioufe, [aconfelhado de fua

fire de Capo Ge- confiança] cm comunicar ao feu Meftre de Campo General

neral os meyos Francifco Barreto de Menezes efte penfamento ( conhecia

farae/iefim, e^v feu animo valor para defeftimar o perigo, & viveza de ej^

pirito para comprehenderas conveniências do faâ:o, & para

íbbre-fahir animofo em tamanho negocio . OíFereceo-lhe o

tempo huaoccaziaõ opportuna,para ter audiência, & para

não fe arrifcar o fegredo, & com refpeyto , & confiança lhe

falou nefta forma.

3 A muy ta experiência, & grande capacidade de VoíTa
" Senhoria me efcuza a repetição dos fucçeíToSjpello difcurfa
'' de fete annos & meyo, acontecidos nefta, .& nas Capitanias
" confinantes, enformado de todos,ou por relação, ou por vif-
" ta de olhos ; com o que he força,tenha entendido a cauza , &
" o intento,que nos moveo,a tomar as armas , & a continuar a
" guerra com os difpendios^& perigos, que a todo o mudo faõ
" notórios, & a Vofík Senhoria manifcftos .Aquelles annos,
?' que

1(5^3

fPJÍlTE 1. L1F(!10 X

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que o Inimigo nos fes a guerra por invazão , com a força de ?»
leu poder conquiftou a terra com facilidade , porque nos a- n
chou bifonhos; confervou-a fem rifco, porque não teve op- >i
poíição. Levantáraõ-íeos vezinhos defta Capitania , crecé-
raõ as occazioés,& com ellas a pratica,& ouzadia , de forte q
de moradores fes foldados: Ambiciofos dos triumphos , & a-
lentadoscoui os defpojos,bufcavão os perigos taódeftemi-
dos, quanto VoíTa Senhoria os vio,entrando em batalhas for-
midáveis, pella difparidade do poder5& íàhindo delias viíèo-
riofos, pella do valor. Em todas as artes he o exercicio o mef-
tre,que melhor enfinaiA natureza com elle fe corroborarem »
elle fe entropeçe. No defcaníb perde o ferro os Iuzimentos,q rf \
adquire no trabalho. Os foldados,que pello perigo das bata- ■)»
lhas corria5,como por eftrada, ao fim de feu defejo,atalhados ?,
agora de noíTo defvio, levão com impaciência fufpenfaójque ji
lhes tira das mãos o premio de feu trabalho. O Inimigo, com )>
induftria, tem em ócio noíTas armas,negando-fe ás oqcazioés, >,
cm que as podéra-mos exercitar (fagacidade politica; dar té-
po a floxida5,&tirallo a pratica.) Ardil entédido de todos,
os que militaó nefte exercito , & cauza de fua murmuração.
Dizem que o Framengo nos efpãta com quatro paredes, que >>
o recolhem,& não o defendem , porque elle há de fer, o que j,
há de guardar as paredes de fuás fortificaçQêsj& que parece „
encanto temer acurralado, inimigo fempre vencido, a cujo „
medo, as fortificações fervem mais de o efcõder, q de o guar- „
dar. (A todos he manifefto,quedosprezidios toma nome a ;,
fortaleza das praças; & quando nellas fe recolhem guarni- „
^oés deíanimadas , não vem a fer mais , que íepulcros de cor- „
pos mortos.) Prometem, que com a efpada na mão os haó de „
réder, feguros, de que não deixará de cortar pella dureza das „
pedras,ferro,que nuca deixou de entrar pello aíTo das armas;
que o Framengo não fe defende com feu braço,fenão com o
de noíía floxidaó:Qiie efperar do tempo a entregaj&querer,
que nos rogue a viítoria, he o mefmo que perdelIa;í'<:por ef-
te caminho nunca fera fem noíTa culpa,quando todos fe ofFe-
recem a ganhalla á cufta de feu fangue , & de fuás vidas; & q „
fendo a fortuna tão aveíTa, que mate a todos a conquifta, fi- ,,
caráó melhorados na forte^ porque no aíTako morrerão com „

Íii4 pref-,,

))

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)i

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CASt^^pfd 'iMiTjm)

t^ií

5' preÍLimo , &: nos aldjamentos, fem nome3 pois a íSmá o tomm-
55 doconflici:o,&náodoleyto.

4. Scnhorjdircurfos faõ eíles, qiie pezados na balança da-
35 rexaõ levaó tras-íi o ínaisdefintercíradb7nizo,& o írsais tibio
55 zeIo;&eu, como VoíTa Senhoria tem alcançado^entro neftaáíí
?5 confideraçoés duas vezes fentido^Sc mais que toâos^ defvela-)
>5 doj & a continua aplicação defte negocio me tem defcobertó
35 hum ditofo meyo, pello qual chegaremos com facilidade á
35 conclufaó deíle empenho. Já de hoje pordiànte poderemos
» efperar,que navegue por efta altura a frota do Reyno , com*
33 boyada pellas embarcaçoêsjque a Companhia do Comercio
35 Geral Ihetem eoníignado , & que forçofamente haõ de pai*
35 rar á noíía vifta, em quãto métem^Sc recolhem os navios mer-
35 cantes, pertencentes aos portos defta CápitaníatSe VoíTa Se^
33 nhoria com fua authoridade,& os moradores delia com foa a^
3> fiicçâo reprefentárem aos Cabos da armada a miferia , a que
" eftamos expoâ(js,&lhes tcquererèm feu favor, pedindo-lhes,
33 fe deixem eílaralgtins dias á vifta dó Arrecife, [íenáo como
33 inimigos^comòV^eíHÍrâes- J& nós por terra avançaremos com
55 as praças do Framéngo;&} entêdo do prefente eftado das cou-
5' 2as,que ou fe renderá aírombrado,ou fe defenderá taõ remií*
35 fo,que a pou co cufto nos reílaurarémos no dom ínio uíurpa-
. 5) ^o: E não faça duvida a VoíTa Senhoria a falta dos apreílo%

" porq eu os quero tomar por mrnha conta,aíriftindo-me Voííà
" Senhoria com as ordens neceíiariasj a quem peço, coníidere'
3' neíla matéria com a atenção, que pede a importância della^
" crendo,que me drz;ò corâçaò,(iaâo fey,fe movido de fuperior
^ " impulfoj que tfeii*É)eosg0ardado para VoíTa Senhoria o re^
" mate deíia empre'fâ,fea ultima coroa deitas vi£lorias.

^*'^^" Coma ténçâò,&alvoroço,oiivio o General ao Meí^

tre de Campo,moftfandõ no femblante a aprovação do inté-

Francifco Barreto to,que logo publicara foldado , fe lho permitira a obrigação

de Meneses o oh- de General : Com efta, lhe refpondeo, fcr a matéria de
fí-; & promete ., ^ - ^, ' . ^ i, . ^ . -

fér a. emprefaem P^ ' ^"^ '"^^^ queria muyta coníideraçao, fenao ta-

concelho. ^^m inuy to confelhoj&: que antes de fe refol ver,o avia de pe-

dir áquellas peíToas,que o podeíTem dar,porque tiveíTem par-
te na aprovação,osmefmos, que a aviaó de ter no perigo; &
foílè de todos a gloriàj ou a condenação do fucçeíTo3que dos

fe-

lfe.U

r^53 fJXTEI.LlF^O X 657.

felices não coftuma o mudo pedir conta , & dos adverfos náo
quer ouvir defculpa. AíTiftia nefte tempo Francifco Barreto
de Menezes no Pontal de Nazareth , Sc com elle alguns Ca-
bos mayores , Sc os Meftres de Campo André Vidal de Ne-
greiros , & Francifco de Figueiroa . PaíTáraõ-fe alguns dias,
(poucos para a nota , muy tos para a eíperança, ) Sc agitado
Joaó Fernandes Vieira de feu fogofo efpirito, foy fegunda
vez com o mefmo requirimento ao Meftre de Campo Gene-
ral . Conheceo na preíra,fer a negoceaçaó influencia dos fol-
dados,& dos moradores, Sc fopofto, que era a todos fuperior
no cargo, era também dependente da obediência de todos(q
talvez chega a tumultuar, ou detida, ou irritada: J Vio,que o
penfamento era apadrinhado por Joaó Fernandes Vieira,cu-
;a opinião (ganhada por tantas cauzas,& cazos) o propunha,
Sc fuás refoluçoés, para todos,eraõ como oráculos de fua ref-
tauraçaó, & aflentou de íí para íí , que menos fe arrifcava na
contingência de hum infortúnio , que no perigo de húa in-
dignação popular * Confcrio com Joaó Fernandes Vieira as
cõtradiçoés,que a feu parecer faziaió a execução impoffivelj
facilitou-lhas com demoftraçoés taó claras, que deixarão a
emprefa fem duvida ; Sc rematou a pratica dizendo , que alli
fe achavaó os trez Meftres de Campo com Sua Senhoria,que
os chamaíTe a concelho, & propofeíTe o negocio , Sc fe refol-
veria com o parecer dos mais votos£era efta a determinação
do General] & afíèntáraõ lugar, Sc dia conveiiiente , para a
importância do negocio,& do fegredo.

6 Alguas legoas diftante de Nazareth, 'Sc CetQ ào Ar-
rayal, eftá húa hermida da invocação de Saó Gonçalo,em fi- t
tio apartado de toda a comunicação pello folitario do lugar, c/ja^a os tref
para a qual chamou Francifco Barreto no dia feguinte aos Mefires de capa
trez Meftres de Campo, com pretexto de romaria . A titulo ^conferemia.^
de paflarem a fefta, fe recolherão nella,apartãdo de fi os cria-
dos, com apparentes motivos. Pedio íilencio ,& fegredo ^ & ■
dizem, que fallou nefta forma : He de tanto pezo o negocio, „
que hoje nos traz a efta hermida , que de propozito bufquei ,3
nella,direcçaõ,& patrocinioj&: tudo efpero achar na caza de ,i
hum Sancto, que nos aífifte milagrofo,& nos favorece Portu- „
guez» Có felices progreíTos de noíTas armas, nos encaminha-,)

vaó 3,

/^

v^

5> vaõ os dias, a facudir de nofíbs hombros o jugo Olandès , &
5) não rey,que moçaõ interior nos cortou o paíTo, com que fcr
)i guiamosadita. EmnolTa fortuna vio o Inimigo fua ruinaj &
jí recolhido em fuás Fortalezasjnos deixou na caaipanha,fenãõ
)) como vencidos, como defprezãdbs , pois dominando , o qne

V oGcupa, fe dá por feguro de tudo, o que em feu dano intenta
,9» noíTo defe;o, fem perder as efperanças, de fe ver cobrado em
,?j todo o domínio perdido'. Eníinou-lhe o tempo, de noíTa fio-
,» xidaó,que fuás praças feizentão de noíTa temeridade; como
..?).que lhe parece vive feguro,& fe verá vingado, tendoem^ím
5> auxílio o tempo, que nos diílràhe,& cófomej & os focorrosj
» quede Olanda efpera, & que nós lhe náo poderemos empe--

V dir. O mefmo tempo nos traz ás mãos o manifefto de feu en^
« gano. Na frota, que por horas efperamos do Reyno , temosj
3> quem lhe corte a comunicação dõ mar; & nos Cabos , que a
5> conduzem,quem nos favoreça por terra : Nefía fuppoíiçaõ
j) queroj que voíTas mercês me digaõ fe lhe parece , que nos a-
í j preftemos para a conquiílado Arrecife^Sc dasFortalezasjque
5) oguarnecem. . ,

7 Oavio-fe a propoftá corri a di veífidâde de affeâ:os,q
Tamer do Mef- ^^^^^ "«s Homês o inopinado, & o prevenido. O Meftre de
ire de Capo Fra- Campo Frãcifco de Figueiroa(emcujo peytonão tinha en-
cifco de jEiguei' trado efte negocio, nem ainda por curiofidade) vencido das
« íombras delle,o refutou comfemelhãtes rezoés. Senhor: Vo-
5) tarei na matéria com o defejo de acertar , a que me obriga o
>-> zelo do fer vi ço de Deos,do meu Rey,& do bem defte povo.
j; A emprefa tem menos de difficuldades,que de impoíllveis,&
5) o arroílallosferá impulfo da defefperação , & não confelho
» da prudencia.O Inimigp,com as Fortalezas, de que fe cerca,
5J intGÍras,& guarnecidas de artelharia , & foldados , não deixa
)5 brecha,por onde poíFa entrar a menor confiança : A opinião
5) de fuás armas por valor, & difciplina, ganhada com tanto fa-
>j vor da fortuna, tem fido o terror da Europa , & o açoute òa
9) America, de que fenão ifentou a Afia . Se corpo a corpo os
f-i vencemos tantas vezes na campanha, foy porque contendia-
j> mos com homens;porém enveílillos dentro de fuás praças,fe-
5) rá contender com pedras duras;& o bufcallas para nellas par-
» tir as cabega?,que feráj fenão ^cçaõ de IoucoS;,que frenéticos
^r'-'^ ' ' . ía-

voa.

J>

D>

3>

fazem gofto de dar com as cabeças pellas pedras. Conquiftal- ■>)
las por aíralto,menos neceíTita de braço,que de voo:Por fitio, 7»
que exercito temos para a circunvalação , &queartelharia ,>
para bater tantas praças.^ Que celeiros para fuftentar o afíe- 5>
dior" Que thezouros para pagar aos Toldados ? Que apreftos •,->
para os aproxes ? Que engenheiro para as minas ? Que fo- •>-,
corros para as perdas.'' E quando nada faltára,com que arma- 5>
da o avemos de cingir por mar, ta5 vigilante , & poderofa, q 5>
íirvadecadea para empedirosfocorros, &defreyo para a- ?>
talhar as oppofiçoés. A dedução de huns para outros fucçef- •>■,
fosj então he legitima, quando em nada variaó as circunftan- «
cias^porém aqui, aonde faõ tâo diverfos os accidentes, como
poderemos inferir do braço,que nos tirou viftoriofos detá-
tos confli6í:os,que nos aflegurará o triumpho defta emprefa?
As batalhas campaes daõ-fe em húa hora, & quando mais em ?>
hum dia: Os cercos não feacabaõ em húa fomana; & muy tas ?)
de fitio confome igualmente o cabedal , & as peííbas: O nu- n
mero da nofíà gente he tão deminuto, a refpey to do Inimi- «
go,que para elle,a falta de muytos foldados naõ fera perda,& ty
para nós, a vida de hum homem nos fará falta , Efte limitado «
poder que temos, refpey ta-íe mais pella opinião , que pello ?>
numero.Se o Inimigo cm hú avanço nos deftruir húa , & ou- 55
tra couza,que nos deixa para lhe defenderemos a campanha? ■>•>
Naó fey que rezáo nos poíTa obrigar, a perderemos volunta- jj
rios tudo, quanto ganhámos ditofos . Será cegueira fem def- ?>
culpa,em jogo tanto da fortuna , parar em húa maó, o que fe 5» .
tem ganhado em muy tas. Digo, o que me parece, & conven- 5,
eido de melhor opinião, não defenderei o qUe digo. „

8 Seguia-fe o voto do Meílre de Campo André Vidal ^,^^^ ^.^^ ^^
de Negreiros,& em breve periodo recopilou feu parecer nef- câpo André vi-
ta forma. Na matéria, que VoíTa Senhoria nos propõem, vo- àdàe Negreiros.
tara minha experiência, meu defejo,&meu juizo j o que fera ?>
mais por obedieBcia,que por neceífidade.Os Olandefes, que ,>
veiUps repartidos por todas eftas Fortalezas fao os mefmos,q ,>
fempre vencemos juntos, em muytos encontros, & batalhas^ ,>
& feitas bem as contas,menos devia efpantar feu numero nas ,>
partidas,que na foma.O valor, que o não foube temer unido „
em hú corpo, porque o há de recear dividido em tantas par- „
' tes? ,,

66o. C^S7%10T0 LVSITAKÕ t6\^

íjtes ? Os muros que os recolhem, em tanto o defendem , errir
í> quanto noíTa refoluçaõ os não avança^ mais guardados os teai
5> nofía omiíTaó, que fuás forças,Seguindo o didamen de minha
5) experiência, tenho para mim, que contra fi levantou aspe-
j) dras, de que fe cingio; porque obedientes ao cuftume, fer vi-
j> ràõ fuás fabricas a feus corpos de tumulo,& a noíTos efpiritos
j> de trono.Se hei de dizer,o que alcança mbu ;uizo,poíro affir-
j) mar, que a emprefa tem menos de perigo 5 que de receo^ §s
j) quantas mais forem as difficuldades,com que nos efpera a cõ-
i) quifta,tantas mais feraõ as palmas,com que nos chamará a vi-
3) iftoria.Se vota meu deíejo, digo,que;ámequizera ver noaft
5í falto das fortificações inimigas j & que cada inftante de detê-?
55 ça fera para mim de penoíiíílma mortificação. Naõ faberei o
55 que digo, mas digo o que finto.

9 Vio o Mefi:re de Campo General o intento, por hum
o que [ente , ài^ ^q^^q concedido, & por outro negado j & com ogofto de en-
oMefire e apo jçnder,que levava o pleyto vencido.pedio ao Mefire de Cá^
João Fernandes t - ^^ j w- • r i • v/r

Vieirií. P^ J^^° ^ ernandes Vieira , que com leu parecer decidiííe a

„ cauza: Gbedeceo, & diífe. Põem Voífa Senhoria em quefiaõ
„ matéria, em que nunca meu difcurfo pos duvida . Entrou o
" Framengo nefl:a Capitania, feguindo, íèm defcançar, o favor

de fua dita, até fe fazer fenhor do que defejava. Em feus pro4;

grefíbs teve mais parte noíFo caftigo,que fua fortuna. Oppri^ ;
„ midostle fua tirania,& animados,parece, que de fuperioraaí ■
5> xilio, tomámos as armas, & nos oppofemos á emprefa de nof-
" fa liberdade:Deu-nos o ceo a primeira vidoria, quando todo
" o humano juizo nos vaticinava a ultima ruina : C5 a fegunda,
„ confirmámos noflà efperãçaj & feguindo o caminho, que nos
5) mofi:rava5 os fucçeíToSjCada dia fe melhorava noíTo partido,
" já com a recuperação das praças, já com a pratica da milicia,
" já com a ouzadia,que nos influiaõ as fortunas, correndo fem^'
j, pre ao fim de noíTo defejo, fem largaremos da maõ a efpada,
5, nem dos olhos o ínimigo,confiados, em que não ficaria nefte
5' Eftado reliquia de taó perniciofo contagio.Entrou Vofia Se-
" nhoria a governar as armasj com a direcção de fua doutrina,
^^ & de feu valor alcançámos tão grandes vitorias , como a fà-
,, ma publica,em as quaes perdeo o Framengo tudo , o que ti-
%■> nha de força, &; de reputação : Quando a ventura^ por eftes

meyos

5>
9>

3>

1(5.5 B ^A7(rÊ 1. L1P%Õ X. 66 1

meyos nos rogava com o Arrecife , não fey , que feitiço nos >,
deteve o paíTo , que nos levava á recuperação, & á polTe da- »,
quella praça:Deíla há de fer refulta a paz,que he o fim, a que „
fe encaminha a guerra. De que nos ferviraô as vidoriaSjfenão „
colheremos osfruitos delias? Que utihdade nos fica de tanta )>
nioleíHa, difpendios,& rifcos da vicla,fenão cortaremos a oc- ,,
caziaó delles?Se deixaremos o Inimigo em fua caza,intaâ:o na ,,
cabeça^que nos importou ferillo nos braçosf Com eftranhos „
fucçeflbs moftrou o ceo, o quanto obrava em noíTo favor,& \i
queremos por termo aos favores do ceo có noíTa tibezar' En- í|
lcndo,que permite Deos em noíTos juizos fobejas defconfiá- >)
ças em caftigo de altivas prefunçoés; Entaõ nos defamparaj „
quãdo em noíTos difcurfos nos não lembraiNada fia de Deos, ,,
quem tudo quer fiar de fi:E quando os fucçeíTos faó feusjnão >,
fe indigna mehos de húa defconfiança, que da may or offenfa. „
Se medimos a emprefa,cõ o que fomos em nós^ tudo nos def- „
•viaj porém fe entramos nella com a ponderação , de que te- „
mos noíTa confiança cm Deos^ nada nos defcorçoa:Certos,de »,
que fomos fieis,que contendemos com herejes, & que temos „
hum fenhor,que não falta ao fiel,que o buíca ^ que nos fica, /,
que temer.^ Por ventura os muros das fortificações inimigas i^
faó de diamante,para que fe ifentem do ferro,& da minaPSaó „
Immortaes feus defenfores,para que os não oííenda o golpe, „
& a baila? Saó os contrários innumeraveis , para que os não ,^
diminua a morte, & o trabalho? Saõ invenciveis, para que os ,>
não renda o perigo,& o niedo/Pôis com que rezão deixamos vi
tm fuás mãos a elcolha da occaziaó, &do tempo para lhe fa- 1^
geremos guerra? Há de eftarem feu querer o movimento de „
noífas armásí' A occaziaó nos perfuade, a que o defalojemos, ,3
& deftruamosi Qiie melhor tempo que efte, em que fe acha ^
falto de gente,&: de focorros? Que occaziaó maisTavoravel, „
que a prefentc^ em que a frota de Portugal, que efperamos, „
lios pode dar focòrro , & genteí* Todos íabembs, que as fra- „
gatas contra rias,poucaS,& mal guarnecidas,como inutis á de- „
fenfa, andàó efpancãdo os mârésiembufca dos foubos:E quã- „
do chamadas da neceíTidade aviftem a noíTa frota, que animo „
teraõ para a enveftir, coííarios,que fó vivem de roubar ? Ifto „
aíllj que nos ata as mãos^A íniaginação de faltarem apreftos.^ „

Kkk Eííà„

1*^

66h CAsr^oTo Lvsirjno 1655

" EíTa não he certa, porque quando não fejaõ faciç , não ferap,
jj impoffiveis.Eu me obrigo , com a verdade , que feropre fe a-r
„ çhou em minhas promeffas , a prevenir todo o necefíario c5,
»» abundanciaj& com fegredcNão fiemos noffo defejo ao tem-
" po,que fera fiallp ao mayor inimigo j porque fóelie fera po?^
" derofo para nos donromirjSi: fará,o que o Framengo,com to-
^^ das fuás forças, não^ode fazer.Moftre a eípada Portugueza,
5, que em nenhum tempo perde o corte , & que no defcanço fe
91 afia para cortar melhor na occaziaó: Demos o ultimo realce
^ á noífa fama,& ficará duas vezes grande o nome Portuguez j
"huapello valor, c5 que vence batalhas3 outra pella ouzadiajj
„ com que efcala Fortalezas.

10 OMeftre de Campo General, que rio dizer de João
^Acofiã'fe com o Fernandes Vieira,ouvia o que defejavajCÓ alegre rofto apro?
fm parecerão Me ^^^ p^^ parecer j& gratificou fea zelo ; & para confirmar a
ãredeÍApo Gè- - l r • n-n- i- r i

nerdi&ferefd' ^^^^^j coque O tazia, pos aqueJias mltancias , que podia íol-

veampr^fk. ^ tar facilmente a verdade; &cõque ficaria mais clara afoliv-

^\^^ çaõ das duvidasi Vejo Cdiíreelle)jque efi:amos faltos de pol-

„ vora,balla,& corda; fey, que não eftaó prevenidos os manti-

.9» mentos para a gente,aííí da milícia, como do íerv iço, de que

p neceífariamente nos avemos de aproveitar ., Conheço a falta

!' de materiaes, & inftrumétos,que há para os apreftos de hú íir

^^ tio;0 têpo tanto adiante,& as partes, donde nos poderemos

99 prover, taõ difl:antes,que primeiro fe paíTará a occazião,quç

?» nos chegue o neceíTario . A o que o Meílre de Campo Joãp

'* Fernandes Vieira lhe refpondeo, fe achava Sua Senhoria ou^

, tro inconveniente áemprefa?Naõ( lhe tornou ©General.)

9^ Logo [diíTe Joaó Fernandes Vieira ] corre fem duvida noííà

?> determinaçaó,porque eu tomo pof minha conta toda a prer

f? paraçaõ neceíTaria , & có a necefíaria prefteza, & confiança

'* em Deos denão faltar couzaalgúa,em ordem ao fim pretenr

„ dido,concedendo-me Voíía Senhoria as ordens cõpetentçs*

Có públicos louvores agradçceo Franciíco Barreto ao Meír

tre de Campo Joaó FernaníJes Vieira o ferviçò , que fazia a

Deos,& á patria;& não fó Ihç prometeo,para efte particular^

, os poderes que tinha, fenáo tambê as affiftencias de fua pcf-

foa,quando a conveniência as pediíTerTomou a feu cargo q

cuidado de eípiar a frota , &: a diligencia de obrigar ao Gq^

via/í neral

L

■ I

ié55

^J^T£1.LIF<I(0 X.

66^

neral delia a fahir em terra, & a pedir-lhe focorro, Sc compa-
nhia para o tempo dos aíTaltos: Conformes todos nefte pare-
cer fe apartarão a prevenir armas, & a defmentir foípey tas.
/i 1 1 Tinha fahido de Lisboa a frota (comboyada pellos
tóvios de guerra da Companhia Geral do Comercio) em ^^^^f^^^^f

j^^uj -yc r-r o- o tubro Jahira de

quatro de Outubro de mil & feifcentos & cmcoenta & trez: n^hoa afretada
Seu General Pedro Jaques de Magalhães : Almirante Fran- CotnpmhU,
cifco de Brito Freire. Tomara Cabo-Verde , & allí fe lhe a*
gregáraõ os navios mercantes,dos portos de Entre-Douro,&
Minhoj [primeiro avizados do tempo , & da altura , em que
fe âviaõ de encorporar] & de conferva navegarão na derrota
do Brafil. Adiantou Pedro Jaques de Magalhães alguns avi-
2 os,qu e fes ao Meftre de Campo General Francifco Barreto
de Menezes,pellos quaes lhe dava conta, que de viagem para
a Bahia determinava recolher a fi os navios mercátesjque nos
portos de feu domínio eftíveíTem carregados paraoReynoj
& os que vinhaódelle,metellos nas barras, para onde traziaó /)
fua defcargaj & que para húa, & outra couza eftiveíTem pre*
venidos, porque não avia de fazer detença naquelles mareai
Em fete de Dezembro recebeo Francifco Barreto de Mene- ^
2es o primeiro avizo,de que deu part^ a todos,porque todo^
erão intereíTados nelle: Feftejáraõ os Meftres de Campo grá*
demête a nova pella rezão commua (guardando para fi a par- .
ticular, para elles de mayor negocio, que todo o portante da
frota:) Com diveríos,& alheos pretextos de feu intento,fe a-
plicáraõ com mais fervor á continuação dos apreftos ^ reco-
lhendo em vários almazens os géneros ,& materiaes, que dê
húas, & outras partes fe conduziaó , ou por compra , ou por
data j& algúas por empreftimo. O v ulgo , que praticava , no
que via,difcurfava fobre a cauza-.Todos atina vão com a guer-
ra, porém nenhum com a parte.

1 2 Em V inte de Dezembro apareceo a frota á v ifta de
Pernãbuco.Có os olhos do receo a virão os Olandefesj có os
da efperança os moradores : Tem o coração humano muy- chegãlviftxàe
to de perfàgo: Occultas influencias lhe anticipaó hum con- Permmhuco.
fufo fentímento de males , & bens futuros . Qs Cabos Olan-
deíes (alheos de toda a noticia de feu dano , fó acufados dos
remorfos da própria conciencia ) ordenarão a húa efquadra,

Kkk 2 que

(^ CAsr(^ioro lusitano

16^3.

Ao Gensrd ãefla
TKanda Fracifco
Barreto de Ale-.
ne:^es os par abes
da viagem.

T/tga a eorts^A
fahindo a terfa^
é^fi lhe pede att
xílio para a em-

Efcu^a-fe cÕ as
ordens^ que tvai^
encaniradof àpe

iifAOé

quetinliaõn(>mar,que fahiíTe a reconhecer o numero dos*;
vazos, & a força delles . Compriraò as fragatas inimigas hua'^-
&ourracoiJza, até chegarem a bataria com alguns navios
de guerra 5 que as fizeraó apartar arrependidas, quando jd
os navios mercantes eftavão furtos na forma conveniente^-
para o feguro dos que aviíiõ de entrar, & fahir nos portos da-i
que!!a Capitaníaj&para a comutação de generos,8c fazendas
da Companhia,& de particulares. Logo.Fracifco Barreto de^
Menezes aíTentou com os trez Meílres de Campo, q fe devia;
fazer todo o poííiveI,para tétear o animo do General da fro-;
ta,& que feria muy to a prepofito para o intento, obrigalJo, é
fahir a terra. Defpedio o Meftre de Capo General hú En via-
do,q da fua parte, & dos officiaes,exercito, & povo lhe ácÇÍQ
os parabés da viagetn , & lhe pediíTe licença para fatisfazer á^
efta obrigação peíToalmenteiO General da fróta5grato,& õf-
ficiofo fe meteOjCom o íeu Almirante, em hu efquife,^& nave-
gou para terra, mandando vogar para o Rio Doce , aonde d
foraò receber Francifco Barreto de Menezes, Joaõ Fernãde^
Vieira,Andre Vidal de Negreiros, & Fracifco de Figueiroa.
Dcu-íe o primeiro têpo aos braços,& ás faudaçoésj& logo fe
paíTou á pratica do neg^cio.Propos Fracifco Barreto arefor;
}ução,q fe tinha tomado, os fundamentos,fobre q eílribava a
confiança,com q todos efperavão o favor,& ajuda de Sua ^qt?
nhoria^pois oaííiftillos naquella empreíà,era ferviço d^DeosJ
&c utilidade.do Reyno,interefe da Còpanhia, & único remé-
dio dos Pemãbucanos: Que negallo femrifco, & fem dilpefi-
dio,na prefente occaziaõ, feria perdeIla,com a reputação das
Armas Portugue2as,& o credito de Cabos de tãto nomejpois
quem os não viíTe (na prefente miferia)laíl:imados , & cõpa-i
decidos,os não avia de crer valerofosj & perdida a reíliaura-
çaò de cativeiro taõ duro, por culpa de Sua Senhoria , lhe
iiaó ficava rezaõ para fe defculpar, nem para com Deos/nera
para com os homens. ^

1 3 O General da Àrtiiada, indccifo entre a comife-
raçaõ,&a homenagem , moftrou , que a obediência Ihea-
tava as mãosá piadade, & diííe , que elle não trazia ordem
de feu Reypara aminima hoítilidade; nem daCompahia
Geral para o menor defvio daquella frota , obrigado por

ITSÍ^PGk

:a

ié^3 fJl{T£r.LlFiIlOX. 66^

juramento áconrcrvaçáo,& breve derpacho delia ^ que de fa-
zer o contrario , fe poderia feguir exaíperar-fe o Inimigo, 8c
alterar as pazes com o ReynOj&pagar elle có a cabeça a dcfo-
bediencia , & o dano , porque fenâo avia de julgar por leve
culpa, a q cometefíè em offenfa de nação tão bellicofa . Op-
poferaó-fe os Meftres de Campo á rezão,com importunas in-
ftancias, tomando por fundamento a occazião , Sí a mifcria.
Vio João Fernandes Vieira,que nenhum argumento conven-
cia, (guardara para ultimo ataque a rezão mais forçofa, ) & ^^-^^ ^°^^° . ^^^J_
lhe diíTe, que fe Sua Senhoria faltava a petição tão jufia, não ^'^'^ .^ letra^cr
faltaria Deos em lhe pedir conta de tantas almas, quantas feu
defamparo deixava expoftas á prevaricação da fé^ & pois ef-
ta lhe eníinava a grandeza da perda, pello infinito do preço,
pagaria a culpa pella medida delia: Que o temor de perder a
cabeça, não podia fer cauza baftante para negar o auxilio , q
fe lhe pedia , valendo mais hua alma , que muy tas mil vidasj
quanto mais,q arrifcar a vida por fcrvir a Deos , & a fua igre-
ja, era ganhalla,& não perdella, tanto , porque neíle mundo
a guarda,quanto, porque no outro a coroa . Fes tamanha im-
preífaõ efta avertencia no General,& Almirante da frota,aííi
pella gravidade da matéria , como pella eíiicacia, com que o
relator a propunha,que cruzadas as mãosjmoftráraó os ditos ,
Cabos, que moção fuperior os convencéra:Conformes,& de
companhia foraõ todos,para a Villa de Olinda, aonde convier .
raó,emque ao outro dia íechamaíTem a concelho todos os >
officiaes da primeira plana, como Meílres de Campo , Tenê-
tes Generaes,& Sargétos Mayores, para que multiplicados os
requirimentoSjachaíTe fua defobediencia defculpa, na inftan-

cia.

14 Amanheceo o dia de vinte & cinco de Dezembro,
■predefinido para o primeiro paíTo da redempção do mundo,
que o filho de Deos feyto homem nelle,deu com feu nacimé- ÃjutÀo-fe em co-
to. Sérvio a fefta á doutrina , & o myfterio ao pronoftico de çelhoos céos de
humfimditofo, tomado de hum principio faufto, para are-^'^^»^^^'''''^'
dempção daquella parte da America, tyranizada pella heré-
tica perfídia. Acudirão os chamados , & foraó os do congref- ^
fo,o General5& Almirante da frota^o Meftre de Campo Ge-
neral Francifco Barreto de Menezes j os Meftres de Campo
- Kkk 3 Joaõ

666 C^Sr<l(lOTOLUSlTjmO f6j3

Joaó Fernandes Vieira, André Vidal de Negreiros, Sc Fran-
cifco de Figyeiroa; o Teiíente General PheJipe Bandeira de
MdlojSc GsSargentos May ores António Dias Cardozo,An-
•ParecemdosCa tonio Jacome Bezerra,& Jeronymo de Inojoza . Quando dá
"' conferencia fe efperava a determinação aplaudida , fe defen-

-tranháraõ em dificuldades os primeiros votos , ou porque a
.emulação os produ2Ía,ou porque a defconfiança os formava:
Nos concelhos, pede-fe parecer ao júiíz o, & não á vontade,
porque não tem claros.ÇiQoa o parecer dos Meftrfes de Cam-
po André Vidal , & Francifco de Figueiroá ficou o negocio
vencido5&: Francifco Barreto com lugar para efperar a deter-
minação do General, & Almirante da frota: Porém elles dif-
feraó,que não aviaõ de refolver Couza algúa , fem primeiro
VotodeiohFer-^^^^^''^}^^'^ O parecer do Meftfe de Campo João Fernandes
mndes Fieira, Vieira, em cujo pey to nacera,&: fe alimentara o proceíTo da^'
quella cauza.Pedio-lhe o Meftre de Campo General,q.déíre
j, feu parecer: Votou, &diíre:Temosnefte concelho os Minif-
5, tros Mayores, & do mayor poder ,que noíTa liberdade po-
ji dia defeiarj& quando imaginei, que a rezão vécia toda a da-
„ vida, vejo fallar na matéria com tanta variedade,que me per-
,) fuado,fedefconheceafuftancia,&-as circunftancias da em:
„ prefa. A expugnação das praças Okndefas podia fer volun*
„ taria, em quanto eíle congreííb a não publicou forçofa:NeI-
55 le fe devulgou o inténtOj& pública a GÕferêcia,qué não v é, q
„ neceírariaménte fe há de executar a determinação? Em fe ret
,) cufar coníifté noíTa ultima perdição. Que conceito há de fa^
,, zer de noíTas atmas oínimigo,fe aícan^ár,que fe lhe não atre^
„ V e o noíTo mayor poder PDeíprezará o que teme,conferva-
. 5, rá o que pofíiie^Sc conquiftará o que deíeja. Até agora nos ar
„ tou as mãos aírnpofíibilidade de o cingirem por miar 5 agora,
5, que noíTa fortuna nos oíFerece,© quedefejavamo?, defpreza-
„ mos a dita.'' Como,ou quando efperamos cobrar femelhante
>, oGcaziaó? Entendia eu,que para oque fe há de obrar forço-
„ famente, naó fe votava fe há, ou não há de fer, fenâo porque
„ meyosfehádeconfeguir:Demos cazoque feja tanta noífa
defgraça, que não ganhemos o Arreeiféj ganharemos algúas
de fuás Fortalezasj& ficará noíTo partido melhorado , o po-
der inimigo enfraquecido , & o mundo certo , que he noíTo

valor

j>

5>

1^55 'PJ^E h LIF^O X, 667

valor mayGf, que noíTa fortuna; & quando menos , ficará ef-
te povo com a efpcrançajde que o Inimigo a tormentado de
noíTos golpes, virá facilmente em algúa congruência útil.

1 5 Concordarão todos na conquifta das praças inimi-
gas,& paíTáráo os Gencraes a tratar do modo^â: da parte,em
que fe avia de empregar o primeiro golpe,com moral certe-
za, de que fcrifie,&náo refvalaíre[prerentes na máxima, de
que as armas recebem opinião dos primeiros fucçefíbs.] Vo-
tarão nefte particular por fua ordem,& foraõ taó di verfos os
pareceres, como os votantes.DifFerente de todos falou Joaó
Fernandes Vieira: DiíTe, que para o fim defejado, fe devião
arrimar á Fortaleza das Salinas, que chamavão de Francifco
do Rego, porque era a de menor força, a de melhor terreno,
& a de mayores confequencias: Com ella fe ganhava a paífa-
gem do Rio, fe defempedia o caminho da Villa,fe defquarti-
navaõ as Fortalezas do Perrexií,Brum,&Buraco de Santiago;
& delia fe poderiaõ v arejar o Arrecife,& a barra: Pella diftá-
cia, longe dos focorros,& pello fitio , fácil para fe empedirê.
Eráo a todos tão patentes , como verdadeiras as convenien-
cias,& náo ouve algum , que fuftent^fíè parecer em contra-
rio, antes aprovarão efte,pello mais acertado.
í 16 Conferio-feo modo, & fe refalveo , que a primeira
diligencia foflè,efpalharem-fe cartazes em todas aslingoas
das naçoés, que militavão com o Framengo , pellos quaes fe
prometeíTe premio,ou caftigo,aas que foírem,ou não foífem
da noíTa parcialidade ; o que não deixaria de obrar muyto, á
V ifta de noííb poder,& refoluçaó. Or denou-fe , que todas as
faluas da armada,& barcos particulares fizeíTem todos os dias
demonílraçaó, de trazerem gente dá armada para terra, em
repetidas viagens, de forte, que o Inimigo contando as parti-
daSjfomaíTe hum exceíTi vo numero de combatentes; & que fe
tornaíTem a levar da terra para as náos, tanto que foífe noite,
para que no outro dia reprefentaífem a mefma ficçaó , & que
ultimamente, aquella Infanraria,queefcufaífe a guarnição da
armada, ficaíTe em terra ás ordens do Almirante Francifco de
BritoFreire.Avertio-fe, que os navios mercantes de menos
toneladas fe mandaíTem ( com fufficiente guarda) para os
portos do Sul, para onde era fua direita defcarga [ os quaes

Kkk4 to-

^e todos apro-
'vão^ ^fe deter'
mina a facção.

Convém^ em que
fe lhe d} princi*
piopeUaFortde*
\A do Rego.

Como fe difpoem
A cÕquifla do Ar*
recife por mar^
& terra.

todos aportarão a falvamento: jQue os demay or vult05& ah
gua força, com os de guerra, formaíTem hú precinto, em for-*
ma prolongada, que recolheílè dentro em íí a Barra, & a Bar-
rota do Arrecife : Que no feyo deftemeyo circulo andaílem
alguns pataxos,& embarcações deremo aos bordos , naquel-
les fundos, em que podeíTem boyar:Que preparaíTem cincç),
ou féis fumaças artelhadas ,& guarnecidas , que de noite , aQ
modo de ronda, correíTem aquelle mar, que cingiííe a circun-
ferência da armada . Que por feu turno fe deílinaíTem duas
companhias de Infantaria, para guarda das prayas do Norte,
& do Sul do Arrecife^ tudo a fim de que, nem por mar , nem
/^ por terra; nem de noite, nem de dia podeíTe entrar p menor
focorro ao Framengo.Que em terra fe occupaíTem cabos,fol'
dados,& moradores , em preparar o neceíTario, para as bata-
rias,& ataques, & tudo o mais concernente, para os íitips das
Fortalezas . Pedirão ao Meftre de Campo João Fernandes
o Mejtreàe Ca^ yi^ifa^ que na noite feguinte,fahiíre(com os homens,que ef-
po oao ermfí- ç^ij^^ff^^ ^ reconhecer as praças do Inimiffo,com as fortifica-
des Fiara reco- - , ,/ i o r i • i i i i - o j

ííheceasFortak' Ç^es delias, tçrreno,entradas,& lahidas de cada nua , & tudo

zíts inimigas, o mais neceífario,para a intelligencia de noífa difpofiçaó.Pe-
dio dous engenheiros ,efcolheo alguns poucos foldad os ,&
fes taò exaâ:amente a diligencia , que não ouve efíacada de
Fortaleza cótraria, que não tocaífe com fuás próprias mãos;
de algúas foy fentido , & com fe deitar por terra com os feus,
* fe livrarão de chuveiros de balias, que o Inimigo defparavaj^
&: foccegado o ai voroço,continuava na diligencia com tanto
defprezo do ri fço, que vifto,foy admirável; & ouvido, incrc-
hi vel. Sobre a madrugada fe recolheo , & repetio ao Meftre
de Campo General Francifco Barreto de Menezes tudo, o q
cxaminou,& defcobrio ; o que elle agradeceo , & louvou c5
as honras, & encarecimentos , que merecia tamanho feryiço.
FeíTe avizo a todos os fronteiros,que fem defcanfar picaíTem
o Olãdès por todas as partes, porque não podeíTe fofpeytar,
a qual delias fe encaminhava o primeiro golpe de noílà ef-
pada.

1 7 Admirará, o que a diligencia dos nofíbs venceo de
tempo. Pronoftico foy de fua bõa forte,correrem com facili-
dade os meyos, para o fim efperado. Entrou o Janeiro de mil

"! !i .

8c CóCcçntosSc cincoenta & quaÉro,predefinido pclla divi-
na providencia para a total liberdade daquellas Capitanias: ^^^^^^f-fi ^^
o • ri ..., -rn ^-, ordens daaaf.

Cl aos cinco le deu principio a manireíta expugnaçao das

Fortalezas inimigas: Nefte5& nos dias íeguintes fahiraó das
embarcações, por muytas vezes, não poucos barcos carrega-
dos de infantaria, & petrechos de guerra ^ as bandeiras tendi-
das, tocando caixas,& dando falvas de mofquetaria^hunSjpo*
ílos em terra , volta vaõ as faluas a bufcar outros, feguindo o
eftratagema das ordens dadas.Os navios da armada formarão*
o circulo, & executarão tudo, o que ficara ordenado. As de-." '•
2oy to fragatas Olandefas , que pella forma dita reconhece-
rão a determinação (poftas ao largo) foltáraõas vellas, & fe ' \
engolfarão de forte,que deíàparecéraó. Seguros com a parti-
da de hua,& prefença de outra armada,fahiraó dos portos de
Sirinhaem,Rio Fermozo, Tamandaré, &Camaragibe as em- ,-,
barcaçoês,que eftaváo apreftadas para o Reyno,& todas en- '
tráraõ na barra de Nazareth , aonde também ferviraó , por
mar, á conducção dos foldados, petrechos,& géneros preve-
nidos por aquellas partes, para a occaziaó do cerco. PaíTou-
fe ordem aos fronteiros,que fe avezinhaffem com fuás guar-
nições ás Fortalezas contrarias de maneira, que ficaíTem fuás
Efiancias trezentas braças delias em fitios , que as cobriíTem
os arvoredos dos bofques,& nefta forma fizeíTem coílas á có-
ducção da artelharia, & materíaes neceíTarios para as plata-
forinas,& reparos , com que fe aviaõ de bater as Fortalezas
do Rego,& de Àltenar. Em féis de Janeiro, pellas dez horas
da noite deraó duas fumaças Olandefas nas mãos dos noíTos
exploradores('vinhão da Ilha d' Itamaracá carregadas de páo
Brafil:) A niayor ficou rendida com doze Fratnengos, & algus
Indios;& a outra carregada deIndios(deminutos,& sagrados
de noíTa mofquetaria) nos fogio por mais ligeira,& favoreci-
da das fombras da noite.Defte dia até o de onze fe occupou
a noíTa gente em levar a's mãos nove peças de bronze , cinco ^^^vafe a arte*
de vinte & quatro livras de baila, húa de vinte & duas,de de- ^^^''^'* ?^'''* j''^'
xoyto & de quatorze as trer , fem que o Inimigo , com toda J^ ^g^^, °^ ^ ^^^
fua vigilância, tiveíTe o menor indicio de noflb trabalho, né
de noíío intento, fenão foy por dous foldados,& hum rapaz,
^ tomoujdos quaes entendeo, por relação confufa, que noíTa

de-

y

670 C^ST^WTO LUSITJNO

determinação era conquiftallo por íítio, imáginatido elle até
enta5,qoe avia de fer por aíTalto.

18 Certificado Sirgirmundo,cpm os Cabos da milicia,&
Miniftros dos concelhos, de noíTa determinação, & duvido-
íos da parte efcolhida para fe dar principio á emprefa , fe fe-

certo o mjiígo, fQJy^j.35 emacudir a todas com o neceílarip para a defenía;
minAcaoJe vre- não fendo baftante a defcófiança) em qOe tumultuava o vol-
fAYA 'para a de- go, para lhe deminuir o animo, nem divertir a diligencia, c5
fenfa. que de noite, & de dia vigiavão fuás praças , & noíTos movi-

mentosjporém era tanto mayor a noíTa cautela,que nunca os
pode defcobrir, fendo,que fenão defcanfava na occupaçáô,
Sc fervor, com que fe conduzia o neceíTario para íè combater
a Fortaleza das Sali nas, aiffiftindo, com fua preíença em toda
a hora,& parte,o Meftre de Campo General Francifco Bar-
reto de Menezes ao íilencio, com que íe obrava ( era tanto,
que parecia mais influencia , que preceito. ) Aos treze man-
dou ajuntar o exercito á furdina [cóftava de dous mil & qui-
nhentos foldados]fórademil Infantes, que guarneeiaõ as
Fortalezas do Arrayal,Villa de Olinda,Páo AmaréIlo,&Bar-
reta; (& não a Fortaleza dos Affbgados ^ como erradamente
diz hiia relação impreíTa , porque nefte tempo â tinha o Fra-
mcngo em feu poder, bem gdaniecida,& fortificada* • ' ;:* 'I

1 9 Em quatorze de Janeiro^ dia em que tocava a Váfl-*
guarda ao Meftre de Campo João Fernandes Vieira ,0 cha-

rmrapoem cer- mou Francifco Barreto de Menezes, & lhe ordenou,que fof-
co àFortale^ado fecom o feu terço por fitio , 8c bataria á Fortaleza das Sali-
nas,que fe dizia de Franciíco do Rego,condenada ao primei-
ro furor de noíTas atinas, dizendo-Íhe, que a feu braço, 8c fua
fortuna fiava o logro de fuás efperanças; & que a efte fim ef-
colhera aquelle dia,por conhecer o quanto importava,tomar
a viâoria o principio daquella mão,da qual o tomara a guer-
ra. Rendeo-lhe o Meftre de Campo João Fernandes Vieira
as graças da eftimação, que delle fazia. Deu conta afeusof-
ficiaes,& foldados, da ordem recebida, com tanta alegria , 8c
ai voroço,como fe naquelle ferviço levara o premio de todo
feu merecimento. Via confeguido,o que mais defejava,&não>
cabia em íi mefmo com o gofto , que tinha : Aíli como o fen-
tiajO manifeftavajdando a todos o parabém de fua liberdade,

&

íoao PerniHdes

Rego.

L

& da redempçaõ de fua pátria : Com a certeza dá vldoria os
exortou á peleja, dizendo, que os não animava ao defprezo
do perigo, porque o interefe de cada hum, avia de fer em to-
dos o mayor eftimulo de lua ouzadia : Se o cativo em Argel ■>>
(dizia aquelle grande Varaõ ) náo teme o deípenho das mu- 5>
ralhas mais fobidas, porque coníidera no falto o mey o de fua. )>
libcrdadejfendo as fortificações do Inimigo a vereda,poron- ».
de nos chama a liberdade , quem há de temer o avanço por •>•>
mais altas,que as reprefente a vifta? O conhecimento de nof- ■>■>
íb preftimo nos efcolheo para efte primeiro ataque, façamos ■>•>
certa a opinião, com nos excederemos a nós mefmos neftes í>
últimos progreíTos: Ouçafenoeco a grandeza do gol pe,que 5>
Gom a ultima palma fe tece a coroa de toda a vida. A opinião '>
que nos fes primeiros na hora, nos cfpera adiantados na glo- -»
ria.Sacrifiquemos o q fomos, áquelle poderofiíTimo fenhor,a "
quem tudo devemos, com refignação de ofFerecéremos a vi- 5)
da,que nos dá, a feu fer viço, & de fua Igreja : Confiados em '>
fiia clemencia;( de que temos certa a remuneração no ceo, 5>
quando nos falte a da terra:) & eu prometo a cada hum(com 5'
a vcrdade,que cuíiumo) dos quenefta occaziáo morrerem, '> ^ ^
húa miíía pella alma,além,da que ferapr^e mandei dizer pellos '>
que nefta guerra perderão a vida ^ & para que nefta emprefa '>
nos aíTifta a mão,divina,eatreraos nella compungidos , &'de- •>•>
votos,dando-lhe principio com as.oraçoés do Padre noffo, & '> r'^
Ave Maria. De joelhos, & com alguas lagrimas de compun- '» *

ção as rezáraõ todos, quando já faltava toda a claridade do
dia, tempo efperado para a marcha , que logo fes com o feu
terço em direitura ao fitio das Salinas, feguindo-o oMeílre
de Camoo General com todo o cxercito.quefe alojou pelio. . ,
reverlo das batarias. , _ .

ao As fombras, & filencío da noite chamavãò i execu-
ção das ordens: Carregarão os gaftadores oy to ceftoés fey tos
por conta, os quaes fe aíTentáraó, encherão, & terraplenarão ^"^^^^''fi^^ f^-
a tiro de piítoia da Fortaleza inimiga, & aííi mefmo grande ^c r..,./
copia de facos, que fe encherão de área , & terra para reparo
de quatro meyos canhões de vinte & quatro livras, com que
fe avia de bater a Força, todos levados ámão,difi:ancia dehu
tiro Je mofquete (fem rumor , que o Framengo podeíTe fen-
"í:^^ tir)

as cavas.

I

6/1 C^ST<!ilOTOLUSlTJ^O 1654

tir) com quinhentos mofqueteiros de guarnição. Aflentou-
fe a explanada5& nella a artelharia, & fe deu logo principio à
cava,que fahia dos lados da pIata-forma,na qual fe trabalhei»
com tanto cUÍdado,que antes de amanhecer a tinhaó defem-
bocado no Riò, de forte , que ficou a Fortaleza cercada do
ambitOjque forma vão Rio, bataria,& cavas , das quaes fe deí^r
quartinava a porta da Fortaleza a tiro de pedra . Abriraõ-fcL
eftradas encobertas para o-ferviço da gente ,& comodidade?'
dos foldadosj & foy couza increhivel o íilencio, com que tra-
balhava a multidão dos gaftadores, tantOjque não teve o Ini^;
migo indicio,de que podeíTe formar a menor fofpey ta.Os ta*i
' boés,& pranchas, de que fe fizeraó as plata-formas, donde a*
viáo de jugar as peças, fe apontarão , & poftos os pregos
nos furos fe ordenou,que a cada hum eftiveífe hum foldado
com hum feixo na mãp,& a certo final fe pregaífem com tan-f
ta uniformidade5que o golpe demuytas , pareceífe de húa fd
mão.Rompeo a manhã de quinze,Sc as noftas fíntinellas, que
eftavãô á falia com as do Olandèsjlhe derâó os bons dias , & a
Sem qo Inimiga noífa artélharia a primeira fal va5tudo tanto a hum mefino té-
0 fofpeytajfe. po, que lhe pareceo ao Inimigo fonho,o eíkepito,que ouvia.
Perdia o juizOjquandoviOj&experimeiitou noíTo trabalho,
'"& feu perigo j& mayor fora feu efpantOjfe V ira na Portugue-
■^ za devação feu cafi:igo,& noífa confiança.Era aquelk dia,dia
"i do Gloriofo Padre San£i:o Amaro, a quem na emprefa toma-»
mos pôr guia,que aílí como fabe dar pernas,& braços a eftror
peadòs,affi faberia quebrallôs a infiéis inimigos.
j ' '^àt Com igual furor continuava a bataria de hua, & ou-»

tra parte, fe bem que com defigual eíFey to yporque os noífos
Intenta o inimi» pelouros fe armavâo das aftilhas de feus reparos,com que ma-»
go [ocorrer a fm tavão,& feriâo gente; não aííi as fuás bailas, que a terra, & a*
Fortalei^a, com f rèa da noíFa fortificação recebiaj& fepúltava. Mais de íèifcé-
Jticcejfo. tas bailas groífas defparáiraõ as fuás Fortalezasj fobre a noífa

bataria-.Ncíla fua Força fe defendião cento & tãtos foldados
com o feu Capitão Ugo Máyòr,Cabo de opinião entre elles,
a qual aumentou nefte dia com duas fahidas animofas , ain da
que inutis.Nãò deixava á noífa mofquetaria aparecer nos al-
tos da fua Fortaleza homem, que não pefcaíTe.No mais vivo
da contenda intentarão cinco Olandefes ctitrar na Fortaleza

(man-

1_

!^

i,é^4 fJ^TÊ r:LlP%0 X. (5;^

(mandados Tem duvida comnlgnm avizo) porém osnoííbâ
Toldados o empediraó com morte de quatro, Sc fogida de hCw
Siígiímiindo, que entendia, o quanto lhe importava acon-
fervaçáo daquella praça,preparou hum copiofo focorro com
tanta diligencia , que pellas trez horas da tarde avizáraó as
noíTas fintinelías, que o Framcrigo por mar,& terra v inha a •
focorrer a Fortaleza. O Meftre de Campo Joáo Fernandeâ
Vieira, que nas occazioés vira fempre reprefentadas as viâ:o-'
rias, avaliou aquellahora pella de íua melhor fortuna. Vio,q
por terra marchava hum efquadráó coberto da artelharia de
todas fuás Forças, para franquear a porta da Fortaleza fitia-
da, ao focorro de gente, munições, & mantimentos, que era-
lanchas navegava a ella: (Já vinte Framengos tinhaó faltado
em terra.carregados de cunhetes de pólvora, & baila ) quan-
do os n o íTos foldados animados do preceito , & do exemplo
com a eípada na mão defcobrindo a hum mefmo tempo o
pey to ás ballas,& o braço aos golpesjfahiraó de feus reparos^ .
& en veftiraó o focorro,& a efcolta com v alor táo ouzado, q
os vinte , largando a carga,fe acolherão ás lanchas com agoa
pello pefcoçoj&ellas ao Arrecife com deixarem aígúas enca-
lhadas ,que pagáráo por todas. O efquadráó da terra, como ,
tinha o caminho mais defembaraçado, affi teve mais franca a-,
fogida. Desbaratado defta forte o intento,& o focorro,fe re-
tirarão os noííbs a feus alojamentos, com tanto defenfado , q
por baixo das trincheiras inimigas fizerãofeu caminhorDeA
prezo, de qu e o Framengo tombou occaziáo para dizer , fora
valentia mayor, que todo o encarecimento , pois chegava cõ
as obras, aonde íenão podia chegar com a imaginação. Neíla;
occaziáo nos ferirão ao Capitão Sebaftiáo Ferreira,& ao fea
Alferes^nella padeceo o Inimigo muyto dano de mortos, &
feridos,& tanto, que nunca mais fe atrcveo a comprar a opi-
nião pello preço.

2 2 Entrou com a noite o Meftf e de Campo André Vi-
dal de Negreiros, a quem a vanguarda cabia por turno: Con- Comhmâ Anãre
tinuaraó-fe os aproxes: (fem que de húa, & outra parte afio- ^^^^^ de Negra-
xaíreabataria:)0 Capitão inimigo aconfelhado de nolTo ^'^^^'/^^^^^^^^^^
valor,& de fua defconfiança, não quiz efperar o aíTalto . Fes ^ fortlu^l^í^
chamada,& fe rédeo com honeftos partidos^Entregou a ^ov-pArtido,

LU taleza

i;

im

ÍHtmtão os nop-
Jos tomar hu>Jò-
corfo, que à caw'
teUào lhe fogCí

O Mcjire de Ca-
fo lom Fernan-
des Fieira cerca,
& Fortaleza de
Alienar.

laleza ás trei horas da madrugada de dezafeis de Janeiro, da
qiial fahio com oytenta & fetc Olandefes, com feu Capitão,
& dous Alfeíes 5 hum A;udârite,& féis foldados feridos , dei-
xando denti"o quatro mortos, quatro peças de artelharia, ar*
mas, muniçoés,& mantimentos em fufficiente copia.Cuftou-
nos,a vistoria cinco mortosj&quatorze feridos . Gaftáraó-fc
;as hora9,que faItâvão,pàra entrar o diâ, em reparar , & guar-
necer a Foftãíezã, (duas companhias felhemetéraô deprc-
zidio) & em fe diípór o modo^ com qtie fe avia de enganar
hum focorrò , que por relação dos rendidos avia de mandar
Sifgifmundo do Arrecife.Ordenou-fe ^que fe continiiafíe có
a bataf ià^parâ qtie o Inimigo não entêdeíTe a entrega da For*
talezâ. A demàíiâda cautela fruftrou a induftria. Não fabe o
coração humano defmentir as cores de feus afíè£ios;com o q
diíTimula, aviza. Navegava o focorro em bateis ^ Sc chalupas,
Vaz os que podião boyar em meiíos fundo, aos quaes a arte-
lharia não faria tanto dano por de menos corpo i Eftranhou
o Cabo o defafoçègò -, com que da Fortaleza o olhâvao , fof-
pey tou o pefigo,mandou fufpènder o remo ^ & por entre os
mangues pode conhecer o engano : Virou a proa para o Ar-
recife, aonde chegou alcançado de alguns pelouros j que lhe
ferirão fete foldados. Com a perda defta força,ficou o Inimi*
go tão quebrado de animo , ( peíla ver em tão bfeve tempo
rendida,& contraria,) que defconíiou de poder confervar o
Arrecife^

25 Gaftoú-fe o dia cm apreftos para fe cercar,&: bater n.
FortaÍezâ,que chama vão de Altenar, quaíi meyo quarto de
legoa para o Sul, da Fortaleza rendida , fituada na frente do
Arrecife. Cabia-lhe aoMeftre de Campo João Fernandes
Vieira o entrar de guarda j&pellas trez horas da tarde mar-
chou com o feu terço para aquelle lugar,com ordem do Mef-
tre de Campo General,que íitiaíTe a Fortaleza pello eftilo, q
ièguirá rtos ataques da rendida jcm quanto ao tempo,que no
mais, o deixava á difpofição de fuá efcolhá.[Hãofey a rezáo,
mas fey a penâ,que intentou defraudar a gloria de João Fer-
nandes Vieira,negando-lhe efta honra*] Efcureceo a noite,&
carregarão os gaftadores ceftoés, facos, madeiras , & artelha-
íiai&como efta Fortaleza de Altenar tinhaa toefraa fituação

na

i6?4

ipAj(rE 1. UV\0 X.

^75

na fórmaj& no terreno, que a das Salinas, teve as-mefmas cir-
cunftancias no cerco, fenão , q de mais amais , mandou João
Fernandes Vieira duzentos moíqueteiros diante dos traba-
lhadores, em rezão,que aviaó de abrir o foço em defcoberto
(tinha o Inimigo roçado o mato,duzentos paíTos em circulo
da fua Fortaleza.) Abriofe^húa cava,a tiro de piílola da for-
tificação contraria , capaz de alojar dons mil homens, cuja
circunferência defembocava no rio, de húa , & outra parte.
Feííehiiaeri:radaencoberta,que corria da cava para o mato,
aonde fenecia, com o que ficava a Fortaleza cingida ,& pri-
va da de todo o focorro por terra. Formáraó-fe asefplanadas
com os reparos cuRumados, cavalgáraó-fenelia féis meyos •
canhões, & fendo afll, que trabalha vão nefta circunvalação
mais de nove centos gaftadores,&: que o Inimigo avizado do
ílicçeíTo da Fortaleza do Rego, avia de eftar com vigilância
itiaís atenta; primeiro na manhã o informou a vifta, & o da-
no, do que percebefíe algú leve indicio^da occupaçaó de to-
da húa noite.

'24 Já pellosOrizontes clareava o dia, quando ao Fra-
mengolhe chegarão a dar a primeira alvorada as vozes das mUasIíTm*
fintinellas,& as bailas da artelharia: Vio-fe cercado, antes de 'do]atgarJ7or^
o ter entendido,& ardia no furor,com que acuzava noíTa dif- talc^a ãx Barre-
ílmulação,&: preílefa,& fua defatençáo.No defejo da vm^ã- ^^ de que d. dío"
ça achava fatisfaçaõ fua afronta .'Bailas fem conto,defta,& de g° ^"j^^^^^^^fi ^:
todas as mais praças inimigas nos bu fcáraó todo aquelle dia ^^^'^'■
nos alojamentos, pagando a noífa bataria a hua.o que recebia
de todas.Mandára o General Olandès largar a fua Fortaleza
da Barreta, com ordem aos feus , que entregues os quartéis
•ao fogo, fe retiraííèm para o Arrecife có a artelharia ,& mu-
nições.Naõfabemos,fe porá vizo,feacazo,ordenáraõ os nof-
fos a Dom Dio^o Pinheiro Camarão,que a foíTe aífaltar, ou
empedir a retirada do Inimigo . Sahio com trezentos índios
do feu terço jfeguio o caminho da Barreta , deu de rofto com
húa caza forte,que enveíl:io,& ganhou femdiflicu]dade,por-
que a gente, que a guarnecia, fogio para a fua Força da Bar-
reta,aonde feguido dos nofíos, foy de novo avançada; era de
noite,& o eítrondo das armas,& dos gritos, que ufava aquel-
le gentiojcomo tambe a ordem,que tinháo,para fe retirarem^

* í^ LII2 aíH

ílijill;

■m

6j6

CJSV1(10T0 LUSITJNO

^

aííí os eficheo de medo, q cm qualquer fombra viàõ a mortej
& imaginando, que lhes fogia, a bufeavão lançando-fe pellas
cortinas da Força,para acabaré mais deprefía,hu ns eílropea^
dos do defpenho, outros aíFogados no rio. Aííife ganhou
aquella Fortaleza inteira, fem nos cuftar morte , nem ferida.
2$ O General Siígifmundo j que dos fucçefíbs fazia a-
vizos, temendo ocurfo de noíTos progrefíbs, mandou lar*
sara Fortaleza, que chama vã o do Buraco de Santiago . coai
a Fortaleza do^^^^^ ^^ prezidio,que pegando togo aos alojamentos, fe
buraco de sãíU' redraíTe para o Arrecife, com tudo, o que nella avia: [De
g"' tudo necefíitava . J Obedecerão os feus com fobeja diligen-

cia, porque a prefía lhes fes deixar a artelharia y que eráo féis
peças de ferro coado. Não defcanfavão as hoftilidades noa-
^-x taquedaFortaIezadeAltenar,nem o Comedor delia Dom-
berguén( Sargento Mayor do Coronel Authim, que com
duzentos foldados fe defendia aftuto,& valente) de pedir:
focorro j o qual lhe entrou pop mar no dia dezaíete de Janei-?
ro pella tarde, fem que toda nofía diligencia lho podefíe im-s
pedir. Tinha a Fortaleza a porta metida no rio, com duas
eftacadas depáo apique, queporhum, S^ioufoladò pene-?
tra vão até o largo delle j & toda a artelharia , & mofquetariai
do Forte da Bõa Vifta , que a guardava j & defendidas as lã-,
chás por todas as partes, ajudadas do vento, & da maré
lhe meterão por vezes^naquçlla tarde/ocorro de gente , mu-
niçoés,& refrefcos.

16 Chamado deftas noticias, & da importãcia de íenâa
Áíuda de aloia- <^i^2itar a conquifta,[detida agora pella difficuldade de fe im-
rnento^Francifco pedirem OS focorros aos íitiados] mudou o Meftre de C am^
Barreto de Me' po General feu quartel para junto á noíTa bataria : Conful-
ne:^es, toucom os Meftres de Campo o modo, que poderia averj

para que aquella comunicação íe cortaírei& fe aíTentou, que
em anoitecendo fe formaíTe húa plata-forma na margem áa
rio,quatrocétospésdaFortaleza,capazdejugarê nella qua-
tro peças de artelharia de vinte & quatro, vinte, dezoy to, &
quatorze livras de balla,coberta,& reparada cem cefloés ter-
ra plenados,tanto a refpey to daForça da Bóa Vifta, como da
de Akenar , & em tal forma , que ferviíTe para cortar os fo-
corros, & para deftruir os para-pey tos do Inimigo. Ayião de

tra-

«^x

f"

h6<^4.

^AXTÉ lXin{Õ X

^77

trabalhar ospaftadores defcobertos ds balias inimigas :& o
pcripo lhes infundia tal rcceo, que tíbios, fe aplicavão á cxe- ^^''^"'^^f 7^ «'^
cuçao do intento. OsMeltres de Campo João Fernandes /^,^ ^^ ^/^^^^^
Vieira, & André Vidal de Negreiros, que entenderão a cau- &fe lhe cm^edê
7a da pereza, fe adiantarão com muy tos foldados a dar prin- osjocorros.
cipio á obrajexemplo,que não deixou no coração dos gafta^
dores a menor lébrança do perigo, fendo aíli, que em toda a ^
noite choverão nuvês de balias fobre a parte,aonde fe forma-
va a bataria,cõ dano tão peqiieno,q o não a vertio o cu idado.
27 A as efperanças, & ao tempo, fe adiantavão os ata-
ques da FortalezaicíFey to f em muyta parte) do valor,&: ze-
lo,com que o Governador Henrique Dias aííiília aos Minas
de feu terço, que incanfaveis trabalhavão nos aproxes, com
ÒQ.{^)o^ de que as cavas defembocaíTem na porta da Fortale-
2a,para que fe aíTaltaíTe por ella,& pellas brechas , que tinha
feyto a noíTa artelhariajSí quando não eíliveíTcm capazes, fe
abriíTem minas, [facilitava-as o engenheiro Dumon, Francês
de nação, que era Capitão dosmineiros, &commuytosfe
paíTára para a noíía parte , á vifta de nofias promeílàs , & de
fua fortuna] para as quaes dava lugar , o terreno, por folido,
& feco.Continuavaahoftilidadeportodos aquellesmeyos,
& modos, de que fe podia valer a força,&: a induftria de cer-
cado res,& cercados; com a refiítencia crecia a contumácia da
expugiiação,& da defenfa . A artelharia , & mofquetaria de
luia)& outra parte laborava fem defcanço, mas com deOgual
dano, porque com defigual tino. A Portugueza5reparada,&
coberta,atirava com pontaria; de outra maneira a contraria,q
falta de reparos, nem acertava tiro,nem fe podia guardar das
bailas; a mayor parte de fuás eftacadas , & para-pey tos tinha
voado a nolTa artelharia, & com ella toda a efperança, que o
Inimigo podia ter de focorro 5 porque defcoberta a entrada
aos pelouros da nova bataria, primeiro as lanchas avião de
fervir a fua laíl:ima,que a feu remédio . Com o dia dezanoví
dej
pés

r

eJaneiro,aaianhcceo o coração do Inimigo poílrado ^q^ ^'l^otinatfe os
ès do medo;juntamente combatido de noíTas armas , & de ^2^^''^^^""

fuás defcõfianças, chegavão a tumultuar as de feus foldados: tregaõl
Sem refpey to,nem obediência á fuperioridade, & á rezão re-
queriáo a entrega;(Tinha lavrado no animo de todos a ima-

LU 3 ginação,

tales^a, é" aen'

6-/% C^ST!(/OTO LUSITJMO ,i^^4

ginação , de que ftiinada a Fortaleza fe lhe avia de dar fogo,
& voallos a todos,porqye os Negros de Henrique Dias, aífi
ú tinháo dito na noite antecedente aos índios auxiliaresjque
.eftaváo na Fortaleza, { gente por natureza cruel,& cobarde,
os quaes fem mais rezão, que (eu niedo,íè tinlião lançado to-
dos ao rio naquella noite:) Ateado a íèus corações o temor,
com que os feus índios tinháo fogido, de forte creceo o mo-
tim,que apezar d^s Cabos fizerlo chamada, [pondo nos al-
tos da Fortakza húa bandeira branca,] que não avertida,<ia^
noííos, fe repetio muytas vezes5& com muy tas vozes.

28 Sahio a capitular hú Ajiidan te chamado Vanagqen,
ao qual deráo titulo de Capitão para authorifarem a peífoa.
Foy levado ao quartel do Meftrede Campo General (neft^
manhã aífiftido dostrez Meftresde Campo, por fer a pri-

Cmàiçoes^ com f jj^eij-a vez5que Francifeo de Figuejroa fe achou na expugnar
fãbe os rendidos. - j 11 , . jj j v - r - • ^. ° -

' çao daquellas praças, impedido de nuas l€Zoes,que o tiverao

de cama ffrieldade de animo di? ião alguns que erão;) AíTen-
tou-íè a entrega5& para fe capitularem as condições, fe man-
doii em reféns ao Olandès o Capitão Alexaiidre de Mout
ra: Foraô os partidos da entrega , que fahirisiõ da Fortaleza
com bandeiras tendidas, armas ,& bagagem até paíTarem pel-
lo noffo exercito , aonde largariaõ as bandeiras , ■8c poderiaõ
V ender as armas ao Provedor da fazenda Real , que ^s paga^
ria, fem dilaçáoj& que fe lhes daria paíTagem para o Rey no;
Queaviaõ de entregara Fortaleza com toda a artelharja, &
munições, que nella tinhão. Pellas nove horas da nojtc fahi^
raô, o Comendor , hum Sargento Mayor , quatro Capitães,
(hum delles fqy, o que a^iiftou os partidos ) hum Ajudante,
^ quatro Alferes, o Engenheiro principal do Arrecife , & du-
zétos & vinte & í^ete. foldadps: Os índios tinhaó fogido a na-
do. Deixáraó-nos a Fortaleza (que 1 ogo guarnecemos ) cora
dez peças de artelharia, nove de bronze, & hua de íèrroj mu-
nições, & mantimentos em grande copia. Cuftou-nos acon-
quifta defta Força, que era formada de quatro meyos baluar-
tes, a vida de Jacome Rodrigues, Alferes do Capitão Ma-
noel Lopes, com mais a de quatro íbldados , & o fangue de
Perda de hua & dezaíeis feridos . Perdeo o Framengo emíua defenfa trinta
ema, gente. & hum foldadps, que dentrp, Açlla deixou mortos, & fahio

com

U

^I^^^

fpAXrn 1. Liv(^ X

6yg

^om vinte feridos. O melhor de feus defpojos forão cinco bã-
deiras, deis qiiaes era hua da companhia da guarda do Gene-
ral Sirgirmú'do,& duas do terço do Coronel Authim : repre-
fentando nellas,ou fiia authoridade, ou fua aííiftencia, com q
imaginavão animar os feus á dcfenfa . Todos os rend idos fe
mandarão pafíar á noíTa armada j pellas embarcações delia fe
repartião com benevolência , & comodidade ^ lugar , donde
podéraó ver com feus olhos a difpoOçáo,& vigilância, com q
guarda vaõ aqueiles mares/endo impoíTi vel romper por ellas,
nem focorro,nem avizo para os feus, fem lhe cahir nas mãos,
como tinha fuccedido a todos, os que fe tinhâo mandado do A dejla. Fortde*
Rio Grande, Paraiba, & Ilha de Itamaracá , que fe perderão, ^^ ^'^^^^ ^^ M-
ou por arribados,ou por fomergidos,ou por entreprefos. confiança o r-

29 Com a perda defta praça fe acendétíiõ no Arrecife
as defconfianças,q ardiâo entre o povo, íbldados, & officiaes
da milicia5& do governo , Avia quem aífopraflè o fogo , ou
por occulta negoceaçío,ou por declarada conveniência .Di-
-2Ía-íe, que os foldados no iikimo aperto a vião de íàqu ear o
po vo,& entregar a praça:Qiie o povo, fe avia de levantar cò-
çra os foldados,& abrir as portas aos cercadores:E q povo,&
íoldados,determinavão prender os officiaes damilicia, Sc os
Miniftros do governo , & defpois de lhes roubarem as cazas,
os avião de entregar aos Portuguezes; tratando cada-qual
deRes eftados debufcar meyos para melhorar íeu partido:
Sedições, que naquellaoccaziaõ poderão defcorçoar oani- y^P^^^T ^^op
mo mais deftémido ; tanto affi,q.uc fendo ode Siígiíinundo-^^^^ ^ Fortaíe--
grande, receava mais fua gente , que noíTas armas: Occupa- z,a das Cimovon"
vaó-fe eftas em abrir torneiras na Fortaleza de Altenar , para tas.
nella virarem toda aartelharia contra a das Cincopontas; ^
(coração aonde fe cõferva vaõ os efpiritos, que fe defundiaõ
por todas as mais praças do Inimigo,por fua grandeza,& por
feu edifício. ) A efte alvo fe encaminha vaõ os apreílos , em
que toda anoíTa gente trabalhava para a epiiibat-er: (Situada
. duzentas braças do Arrecife para o Sul.

50 Em o dia dezanove de Janeiro, defpois de entrada a
iioite,mandou o Inimigo largar a fua Fortaleza dos AíFoga-
dos, edificada hum quarto delegoado Arrecife para o cer- v^^/''*f^'' /"^
t£i9. Ketirou parte da ârtdhariaj arderão os quartéis, òc eira- tde^a dos Afo-^

LIlz|. CdiàdiSj gados.

6^0 CMT^IOTO LVS1TJ%^Ô -^6^^

tadas, vendo-fe na Itiz daqu ella chama ácòfrupçlo, que ti-
nha feito a defconíiança em todo aqnelie corpo , pois checa-
ra a ponto,qiie por confervar a cabGça,entrcgava as mais par-
tes delle ao ferro , & ao fogo. Na tarde defte dia entrara de
guarda o Meftre de Capo André Vidal de Negreiros', & por

íua corjta corria aíTentar o cerco á Fortaleza das CincopoH'
tas:Sobr.e ella eftava hua eminência, que cm tempos paiTados
tivera hum Reduto,a que charaavão do Milhou [ficava a ca-«
valleiro da Fortaleza, & fervia de eftorvar o dano, que delia
podia receber: Agora para o mefmo fim o reedificava o Ge-
neral Sifgifmundo.]Deu-fe avizo ao General Francifco Bar-
reto de Menezes,& elle aos Meftres de Capo, & fe aílèntoi?,
foâ^os nojfos cef- que André Vidal de Negreiros eícolheíTe mil homens do fem
'\l ^^ ^^''"' t^^i^Ço, & do terço de joaõ Fernandes Vieira,&: com elles fof-
fon oí. ç^ ganhar aquelle pofto, & deíàlojar àéh o Inimigo , a todo

o ri fco- por fer para noíTa conqniíla neceíTario , & para a de-
fenfa da Fortaleza, importante, (em quanto no íitio da For-
ça fe hia trabalhando nas cavas , plata-formas^ & mais ata-
qucs.

3 1 Em a noite de vinte pârà vinte h. hum, fahio André
Vidal de Negreiros com o Sargento Mayor António Dias
Cardozo,& a gente referida; tomou o caminho da Fortaleza
-^ . . .dos Affbgados(occu pada iá de noíTas armas ) a tempo, oue

gHre\cã^asfor' ^"^ moltrava o togo, em que ardiâo trez cazas tortes, com as
to, & lhe ganha, quaes O Olandès franqueava as ferventias do Arrecife para d
uinàrcviáat&e* vaodos AfFogados, & pára a Ilheta do Cheiradmheiro:(o
^2^neu ào Mi' mefmo Olandès as mandou queimar haquella noite. ) Pello
íitio da Fortaleza fobre-difa,paírou André Vidal de Negrei-
ros á Cadpina, que chamão do Taborda j & pellas nove ho-

tas atra veíTou porbaixo da arteíhâria das Cincopontas, para
Cahir fobre o Reduto do Milhou,que o Inimigo tinha levan-
tado naquelle dia, comosmateriaes juntos para as trinchei-
ras, & eftacadasjde que o queria cercar.O inform/e da fortifi-
cação obrigou a Sifgifmundo , a que difpofeífe, que dentro
do Reduto ficaíTe húa companhia de guarnição j& na diftan-
cia,que avia entre elle,& as Cincopontas vinte foldados, de^
OIandefes,& dez Indios,como íintinellas volantes, para daré
avizo de qualquer novidade. Eftes aíTi como fentíraó a noffa

gente

L„

gente tocáraõ arma, &fogírão, os dez Framengos para a
Forraleza,os dez índios para o Reduto, bufcando hús,& ou-
tros o valhacouto,que lhes ficava mais perto . Inveftíraó os
noíTos o Reduto a peyto defcoberto , que fe defendeo vale-
rofamente, ajudado de duas peças de artelharia , que da For-
taleza varejava o campo com nuvens de baila miuda . Porém
como o valor , & a deílreza dos noíTos Cabos rompia có ma-
yor impetu pella mayor refiftencia, em breves Iioras fobiraò,
& ganharão o Reduto: Senhores delle , vio o Inimigo tão fi-
iialga a piadade,como experimentara terribel o furor do af-
falto. Cócedéráo a vida a quarenta & dous Olandefes, & aos
dez Indios,q rendidos pedirão bom quartel,entre elles o Ca-
pitão do prezidio,que era hum briozomãcebo filho do Co-
ronel Brinc. Acháraó-fe da parte do Inimigo cinco mortos,&
cinco feridos.Perdemos no aíTalto , cõ dous foldados, ao Ca-
pitão João Barboza Pinto, que deu nefla occazião com a vi- ^oru do Capt'
da o ultimo realce a todas as proezas delia : Sua morte, illuf- p^^^^
trou fua fama ; & com feu fangue eícreveo o epitáfio de feu ,

fepulcro i para que em todas as idades fe viílb o muy to , que
cm toda a vida derramou , pello valor , com que na morte o
deu.

3 2 Com increhivel preíleza caminhava a çircunvala-
ção da Fortaleza das Cincopontas a feu ultimo fim; o de fua
confervação temeo, agora mais que nunca, o General Sifgif-
mundo, vendo cercada a Fortaleza,& em noífo poder,a emi-
nência, & o Reduto do Milhou . Intentou defalojar-nos , &
temeo o fucçeíTorQuiz tentear noírodefignio,& mandou a
hum índio rebelado pornome António Mendes, que tios pi-
caíTe com vinte foldados: Chegarão a tiro de piftola da forti-
ficação,donde a mofquetaria os fes voltar de carreira,rdeixã- ^^^'^^^^ ^'^íg[f'
do cinco mortos,& recolhendo não poucos feridos 1 obriga- ^^*^ orecuperar
dos do delprezo, com que, pella hmitaçao do numero,os nao Milho» é' fe re^
bufcoua efpada. O General Siígifmundo, que mediaoenv tira,
penho pella importancia,fahio do Arrecife com todo o po-
der,para nos avançar^mas chegando á fua Fortabza das Cin-
copontas, ou aconfelhado , ou arrependido fe tornou a reti-
rar ; era evidente feu defl:roço,& julgou difcreto, que perdi-
do, por perdidojantes como prudente, que como temerário.

33 Em

CÕÍmua lo ao Ter
nandes

éS2 C^SlXloro LUSITANO 16'^^

33 Em vinte&tre2deJancIro,porIhecabera vãgiiaí-
da, entrou o Meftre de Campo João Fernandes Vieira a cõ-
y-uirTos ^^""^^ 03 aproxes^CNáo era o terreno capaz de artelharia; &
AProxes das cin- ^^^ ^ra neceíTarioadiantallos:) Eícureceo a noiíe, & mandou
€o^or.taí.^ o Meftre de Campo a cincoenta efpingiiardeiros, qu e deita-

dos debruços foíTem diante das gaftadores, & lhes aíFeguraí-
íèm o campo5diligenciajcom que liizio tanto o trabalho, qs*©
fe adiantarão as ca vas duzentos paíros,& no remate delias, íe
fes hõa traveíTa com torneiras de iacaria, capaz de alo;ar cem
mofquete!ros,que logo a guarnecérão,& com a primeira luz
do dJa,tirárão todo o meneo da artelharia contrariaj porque;
ainda os artelheiros não chegavão á peça , quando deixaváa
a vida(ficavão em defcobcrto ás ballas^Sc não íe perdia tiro:);
Osjudeos do Arrecife ( villiíBma nação entre todas asdOf
mundo) idolatras cm toda a parte de fuás conveniências ,82
fazendas, tímidos , & induftriofos avulta vão as perdas,& en-
careciáo os danos j fopunhão infaliveis as ruinas , & nelksa^
mJudeosperfm- T^a, & a vingança dos vencedores. Com eftes.difeyrfos acon-
âemaentrcga do felhavão a entrega . Pode tanto ília perfuação , que amotina-
Afvectff. ^Qg Qg foldados,& o povo.a requerião aos fuperioresrObede-^

eérão a força, defenganados do pouco, que contra ella podia
obrar a r€záoi& fizeráo chamada.

34 Erão trez horas de tarde do dia vinte &trez,quan^

do o Mèftre de Campo João Fernandes Vieira fes avizo ao

General Frãcifco Barreto de Menezes, de que o inimigo p©-

*. j r-r-r - ^í^ fufpenfaõ de armas,para mandar hum Enviado . Na emi-

fede Síf^lfmu- . í^ n ^ 1.* r, 1 ^- ^ 1 *

do fufhenfao de i^cncia do Milhou eítava o Meítre de Capo GeneraI,oecupâ4

aymas j>ãra tra- oo Cm aíTentar a bataria á Fortaleza das Cincopontas, aonde

tarda entrega do recebeo ao Capitão Voutér VaulóComendor da dita For-

Arrecíje. taleza, mãdado pello General Si/gifmundo , & pellosdo go-

verno,com carta para Francifco Barreto,cuja fuftancia fe re-

fumia em lhe pedirem^deíTe audiência ao Embaixador, parai

lhe propor o negocio,qtie vinha tratar.De pé,o ouuio o Me*

fire de Campo General, (era parte , donde fe deixava vera

diligencia, com que fe eontinuavão os pafíòs da conquifía:)

Máxima difcreta da fagacidade militar j ^níinuar os partidos

da paz,com o eftado da guerra.Faíou o Enviado,& difrc,quG

Sua Senhoria nomeaíTe trez deputados^para virem á falia cõ

outrosi»

L

1(554-

fpJ^El.LlF^Õ X.

éS3

t-^

outrosjquefahiriaõ do Arrecife a proporem conveniências
^ntre húas5& outras armas, aíTmandò dia,hora5& íítio; & có-
cedendo fufpenraó de toda a hoftilidade em todo o tempo,q
duraffe o negocio:Tudo concedeo o Meftre de Campo Ge-
neral com Iimitação,que ceíTaíTe o movimento das armas em Com <^ue limitar
todo o tempo, que duraíTe a conferencia , mas não em toda a f^'^fi^^( cecede-
parte,porque fó fe avia de entender da FortaIe2a das Cinco-
pontas até a Villa de Olinda, & que no fcguinte dia vinte &
quatro de Janeiro nomearia os deputados, Si o lugar das vif-
tas.

95 No mefmo ponto fes avÍ2ô a Pedro jaques de Ma-
galhães General da armada, dando lhe conta do fuccedido,
& de que a fufpenfaó das armas fénão eftendia ao mar, pellas
noticias que tinha, que o Olandès mandava vir ao Gòronel
Authim f peíToajCUJa falta conhecera tarde) com toda a gen-
te,que tinha no Rio Grande, &Paraiba,& com ordem, que ^^ *"^° '^'^^X*

cntraíTe no Arrecife a todo o rifco^Sc porque conhecia bem T"^^" ^T/

ni i^i ^ n ^ i- 1 to ao General aA

ozo trato dos Olandefesjrogava muy to a Sua Senho- armada.

ria mandafle dobrar a prevenção , & a vigilância em toda a
armada, pello muyto, que importava cortar aquelle focor-
ro^ & não fuccedeíTe ao Framengo defviar com engano o aol-
pe, que não podia reparar com a força: Ao Meftre de Cam-
po João Fernandes Vieira ordenou,que paraíTe na cótinUa-
ção dos ataques;porém qtie afliftiífe cõ toda a gente á guar-
nição delles. Aquella noite nomeou para o congreíTõ ao Me-
ftre de Campo André Vidal de Negreiros, ao Capitão de ca-
vallos Affonfo de AIbuquerque,& ao Ou vidor Geral Fran- ^^-^^^ » ^^' ^
cifco Al veres Moreira , & por Secretario a Manoel Gonçal- ""T^' ^"''^ " ''"*

., /-. 1 \i. . ^ ^ . * 'cordodASCApitw

ves Corrêa, que o era da milicia:Os quaes no fegumte dia,q Uçoes.
erão vinte 3c quatro de Janeiro , forão para o pofto deftina-

do,aonde já os efpera vão os deputados do 01ãdès,Gisberth
With Prezidente do Concelho Politico^ o Capitão Comen-
dor das CincopontasVòuter Vaulo;o Tenente General Vá-
der Vant,& por Secretario Breílj fuperior dos Efcabinos.

36 Cógregadososoyto, tomouamãoGisberthWuith,
[falia va entre os feus melhor o Português ] & deu principio
á conferencia di2cndo,que os Senhores do Supremo eftavãõ
certos,em que 0$ muy tos Poderofos, & altos Eftados Geraes

ti-

fi ti

i*

é§4

CJSTf^oro LusiTjno'

1^54

Iro^ojfa das Ola

I"^

tinhãõ aíTiftentes na Corte do Senhor Rey de Portugal D.
João o Quart05para fe ajufiarem con venieneias fòbre as prar
ças do BraOl conquifladas da Linha para o Sul, que breve-
mente fe c0ncluináo,& que parecia rezão fe eíperafíe ( com
fuípenfaó de armas ) aqueila coocluzaõ ^ da qual fe poderia
feguir hiia paz fçgura,femas extroçoés,&danos de húa guerr
ra viva, a todos contingentej& nociva. Pratica, a que os nof-
fos deputados cortáràó o fio^^eílranhando a novidade , & di-
2endo5quenáotrazíaõ eomiííaô do feu General Francifeo
Barreto de Menezes para outra couza mais,que para capitu-
, „ larem a entrega do Arreeife,& das m^is praças , inidftamente
folMch dos nof' ^^lí^^p3das,& nao para admitirem outra algua pratica^ & qug
' ' fona dita entrega fe avia de fallar,& concluir fem ambages,

nem defvios [era hú fabado pellâs dez horas da manhã,quan-
do eíla matéria fe tratava.] Refpodéraó os Olandefes , <^ não
era aquelle o negocio, quefe avia de definir com refoluçoés
tão apreíradas3& que o tomallas em matéria tão ponderofa^
não fó pedia profunda con fideraçaó, fenão também maduro
confelho; além de que , não podiaò elles difirir a ponto taõ?
cíTenciaí, íem ordem de feusíuperiores, que voltariaõ adar-
Ihes conta,& na íègundafeira feguirítey dariaó a refpofta que:
Teâè ít^p t ^^ ^^^^ ordenaíTe: Ao que diflèraó os noíTos deputados , que
avisar è aos feus íe <3efenganaírem,porque na mefma hora feaviaó de refolvec
Jupetíous^damfn^ entrega,quando naõ, que em tempo efta vão para tomaré
fa refokfão.^ por força, o que naõ queria largar a vontade,& que lhes lem-
bravaõ a perda^Sc o eíl:rago,a que fe expunhaó . Timidos, 8c
fufpenfos os deixou a refoíuçaó. A experiência íhes tinha en-
fmado , que fenaô entrepunha tempo entre o aaieaço , & o
golpe de noírasarmas.Sogeitáraó a fagacidade áconvenien'^
cia,Si: obedientes^ pedíraõ horas para avizarem ao feu gover-
no a grande diíFereíiça , que achavaõ entre a iiia propofia, &
a noíTa determinaçaó.Permitio-felhes a dilação por horas có-
^ r 7T ' ^ tadas. Foraõ o With, & o Breft com a informação, & ficarão
'cede por horas co- ^°"^ °^ noíTos deputados o Capitão Vauló,& oTenente Ge-
tadaí. neral Vandre-Vant : Temiaõ o effeyto , que em noíTa impa-

ciência poderia cauzar fua detença, '8c com fua prefença dei-
tarão hum fiador á tardança.

37 Pouco mais de húa hora fe tinha paíTado, quando

chc-

chegou hum gentiI-homcm,qne vinha do Arrecife com re-
cado aos nofloSjquenáocftranhaíTcm a dilaçaójfea ouveílc, ^^/^'^-'"''^y^ '^ ^«-
porque a cauzava o apontamento das capitulações, com que í'^^'* ^^ ^-^'^(^ct-
íc avia de fazer a entrega: Pellas ttez horas da tarde chegarão ' ^^^
com as capitulações, & dous Notários pubhcos para as tra-
duzirem de Framengo em Portuguezj occupaçaó,que durou
até as dez horas da noite, em que fahiraõ do congreíTo , huns
para o Arrecife,outros para o quartel do Meftre de Campo
General Francifco Barreto de Menezes , a quem entrega raó,
partidos, & condições, que ofíerecia, & pedia o Olandès:
Para feefcolher,& reprovar, o que delias nos convinha, òu
não convinha, chamou a concelho os trez Meftres de Cam-
po com todos os officiaes mayores^ & por envolverem pon-
tos tocantes ao dér"eito,& alguns articulos a conciencia, cha-
mou também aqueílas peffoas , que as podião decidir , & na
mefma noite ferefpondeo a todas as claufulas offerecidas,
definidos os artigos,que fe recebião, & òs que fe regeitavãoj
& nefta forma fe entregarão no feguinte dia pella manhã aos
deputados Olandefes, que com os noíTos fe ajútáraõ no mef-
mo lugar,em vinte & cinco de Janeiro , que fuccedeo fer em
Domingo: Nefte mefmo dia efcreveo Sifgifmundo Vanefcop
General das armas Olandefas hua carta a Francifco Barreto
de Menezes com avertencias de difcret03& fomiíToés de ren-
dido, pella qual lhe pedia licença, para que hum feu Tenen-
te Coronel com a peíToa , que Sua Senhoria nomeaífe , con-
feriíTem,& refolveíTem as conveniências dos officiaes , & gé-
te da milicia: Petição, que Francifco Barreto defpachou be-
névolo, & cortcs,& nomeou da fua parte ao Meftre de Cam-
po André Vidal de Negreiros, para que na mefma junta,elle,
& o Tenente General Vandre-Vant, -nomeado pelloSifgiA
mundo,trata{íem o negocio,como deputados da conferencia
geral, & defta particular.

38 Cóferiraó-fe os capítulos de hua,& outra parte, &: cõ
negar, & conceder de ambas fe ajuftáraõ. Altercáraó-fe os ^ ^ ,

pontos de mayor duvida , & vencidas todas , fe mandarão as ^ fonicoh
condições aos fuperiores , para que com fua aprovação fe ef4
creveífem,& difpofeíTem por capitulosj& refolvendo,que ao
outro dia fe aíFinaíTem pellos Gcneraes, & deputados, fe

Mmm apar-

i

m^

CJSTi(íoTo Lusrrj no

i<^54

àiíaTtái^iao todos pellas onzeda noite ; & fe firmarão a(|^igUg|
tio dia feguintSrViíite & íeis de. jameiíiQ A€Íb &^^

^í^íítt ■■''Ovf fui?' o

?-i:r

I /^ UE o SeiíhorMeftredçÇaiiípo General FfançifcO)
v^ Barreto de Menezes,dá por elquecidas Codâs às hof-,
filidades executarás por parte dos Vafíallos do§ Senhores^
Eftados Geraes dasprovincias ijnidas,& da Conipanhia^Oc-,
cidental,oufoírenipormar,ou pQrterracótraaNaçaõPoi:-??,
ttígueza,as quae&fehaõ de reptitarjComo fe nuncafoffem çof
metidas : & que iiefte acordo fe comprebeíidaó todas as. n^
çoés de qualquer efí:ado,S< religião, que fejao, aijida que fofí

fem rebeldes á Gorpa; de PortugaljOU corítra ella eomtteffeí^^
tray ção: E que o mefmo entendem dos Judeos,<|qgíe%é||^:
Arffeifej& na Cidade Mauriçeajenalqiianto podenii^ '
3. !-?.'. i -^oijQoncede a todos os .VaíTaUos dQs,Senhores.|l^,ftadosi
èérà^lSc mais peíFoaSjque eftaó á fua obediência,, iqdj^.qs^
bÊ3íismoveis>jqi3eàâ:ualmente eftiverem poffuindoí ; r ■ s
? 3 Concede, de todas as embarcações, que eftaõ dentro^
^a bárrá do Arrecife,aquellas, que eftiyerem fuíÇcientcs pa^
ra paíTar a Linha com aquella artelharia,q]ue ap Senhor Me^
ftre de Campo General parecer baíiante para ília defenfa,CQ,
tanto,que não feja de bronze [exeepto^a qmppçrólf^i?J^J^-•
nhõtGeneral SHgiíinundo. / H : 5 íT h.; b
- 4> A todos os VaíTallos dos ^itos Senhores Efi:ados, qod
fôremcazadcís ç(Sm; mulheres Portuguczas, ou Pernambucar
nâsconcedè^aS|eoíTaõ levar config0 , querendo ellas , & que
astaes fejaõ tíataásts , eoraò^feíbraõcazadaseonEí P^í^rtugue-'

zes.

■'^i

n^=oni

'S^^' 0^^détriOdõs,<)squeqúizeremficarnaterfa,obe-
dientes ás armas, & domínio Portuguez, que no tocante á re-
ílgiao Vivira'Ôí peílo eftilo , que vivetn toxiosros Eftrangeiros

èm Porttigàljhbpreíente tempo\r -' ' s :

6 Qiie os fortes fituados na circOr>ferencia do Arrecife,

Be Cidade M-atiriçea, a faber o das Cincopontas, da Eóa Vif-
ta, do Mofteiro de Sando Antonio,Caílello da Cidade,For-
^a das Trez pontas, do Brum,& feu Reduto, Caílello de Saõ

■/: Jorge,

Jorge, o do mar ^ &: todas as mais ca^as fortes , & batarias feí
entregarão ás ordens do Senhor Mcftre de Campo General,
Francifco Barreto de Menezes , tanto que por húa , & outra
parte Te firmarem eftes capítulos ^ com toda a artelharia , &
munições, que nellaseftáoj& da meíiiiá íòrte as Praças do
Arrecife,&: Cidade Mauriçea.

-. ;7 Goncede,que os VaíTallos dos Senhores Eílados Ge-
tãés,moradores no Arreeife,& Cidade Mauriçea poderão ft,-
çar nas ditas Praças por tempo de trcz me2€s,com tanto, que
entregarão as armas , & quando fe quizerem embarcar (^ain^-.
da que feja antes dos trez mezçs) lhas mandará entrçgar,para
fc aproveitaram delias na oççamo ^ & fe concede aos ditos,
poíTaõ comprar âos. Portugueses, nas ditas Praças, todos oi
niantimentosjque lhes forem neçcíTarios para ièu fufl:entQ,&:
para a viagem* .

-.^. Em quanto ásalheaçoês, eomutaiçoês , negoceaçoésj
Bc vendas,qUe 03 ditos VaíTallos d<ís Senhores Eftados fizeré
denífo do tenno dos trez mezes, declara a Senhor Meftre de
Campo General Francifco Barreto , que feraõ feitas na fq%
ma5que aponta enioaritiçuioonzç; ^ . '' ,

K,J^ j Quç o Senhor Meftre deC^íílpo General Francifco
Barreto de Menezes poderá aíliftíf com o feu exercito, aon-
de lhe parecer melhor, çorti tat cõdiçãQ,que os Vafíallos doá
Senhores Eítados Geraes , nlo feraó vexados , nem moleft^-
dos,de nenhãa forte, de Portuguez algum de qualquer eftà-
do,pofto,& caliidàde,que feja,

I o Concede o Senhor Meftre de Campo General a to-
dos os Vaffallos dos Senhores Eftados Geraes , & a todosj os
que militaó debaixo de fuás b3ndeíras,que pofíaó levar cpn-
ílgo os papeis,que tiverem, &: lhes pçrtecerem por qualquer
via,que feja, o que fe lhes concede iia forma, em que lhes fe-
raó entregues feus bens moveis, yjiivi :

I I Que poderáó deixar os bens moveis , & de raiz, qué
por jufto titulo lhes pertécerem,& de que eftiverem de pof^
fe aâ:ualmente(fe os náo poderem vender no tempo config-
nado) a feus procuradores, que poderáó conftituir , de qual-
quer naçaó,qUe fejaó, dos quaes feraó correfpódidos na for-
ma do eíliilo.

Mmm2 i^ íteitt

68 S^

CASVÈjoro LUSlTjnO

i;, I

iS?

12 Item lhes concede todos os mantimenr os fecos , 8i
rriolhado3,quede prefente eftáo recolhidos em feusalmazés
para fe fervi rem delles na terra , & na viagem , largando aos
foldados , os de que neceffitarem para feu fuílento quotidia-
no, & para a navegaçaõ^que fizerem: Mas não lhes outorga o'
dito Senhor Meííie de Campo o maíTame para os aprefto»
dos navios de fua viagem, por quanto fe obriga a dar-lhos a-
parelhados,ao tempo de fua partida para Olanda. ^ r

1 5 Qiíe no tocante ás dívidas,& pertençoês da fazenda,
que os VaíTallbs dos Senhores Eftados Geraes querem repe-
tir aos moradores Portuguezes, lhes concede o dereito de os
obrigarem para diante de Sua Mageftade o Senhor Re}/ Dom

, Joaó , em cujos tribunaesCe poderio decidk.

I ^ Mais concede, que todas as embarcações pertencen*'
tes aos ditos VaíTalIos, que chegarem a efte porto do Arreci-
fe no termo dos primeiros quatro mezes, defpois deftas capi-
tulações (tempo, em que não poderáõ ter noticia delias j fe
poderáó voltar, fem que padeção retenção , nem agravo ai»
gum.

I ^ Item concede o Senhor Meftre de Campo General
âosditos VaíTalIos dos Senhores Eftados Geraes , que poffaõ
mandar chamar os feus navios , que trazem pella cofta , para
que nefte porto do Arrecife poífaõ embarcar , & levarnelles'
íuas peíToas, & os bens aíTima outorgados.

1 6 Em quanto ao que os fobre-ditos VaíTalIos pedem
# íbbre não perjudicar efte contrato ás conveniências , que eí^

^tiverem a;uftadas, entre o Senhor Rey de Portugal, & os Se-
nhores Eftados de 01anda,antes de chegarem á fua noticia
eftas capitulações , não concede o Meftre de Campo Gene-
ral, porque fenão entremete nos taes acordos , & tem exerci-
' to, & poder para confeguir por armas a reftauração das Pra-
gasj<]^ue fe lhe entregaõ a partido.

\4rtigo$

,"^54

'¥Aí(rEiLJ7\o:^.

'.IS

'Mí'Í *»»,•

C/DàíI

«Ofi oLruyiiii

\Artigos Militares,

i T\ ROMETE o Senhor Meftre de Campo General ef-
X Quecimento de todas as offenfas^que os Portugiiezes,
& Pernambucanos hajaõ recebidos das armas Olandefas em
^jualquer parte50u por qualquer modojque foíTe.

2 Concede o mefmo Senhor a todos os foldados aíTiílê-
tes no Arrecife, Cidade Mauriçea, & Fortalezas adjacentes,
que poíTaõ fahir delias com todas as honras militares , que fe
cufiumaõ conceder aos rendidos,como faó, mecha acezajbal-
la em boca, bandeiras tendidas, &c. com a limitação , que ao
paíTar pello exercito Portuguez apagaráó logo as mechas,&
tiraráõ as pedras ás efpinguardas,& clavinas, & entregues as
armas, fe recolherão emalmazem particular , qual o fenhoc
Meftre de Campo ordenar, tomando por conta de feu cu io-
dado o mandar-lhas entregar,quando fe embarcaremi& fó fi-'
caráó com fuás armas todos os officiaesda tnilicia de Sargeíf^l
to para cima: E que embarcados huns,& outros feguiráó fua
direita viagem aos portos de Nantes, Arrochèlla, ou á qual-
quer dos Eftados de Olanda, fem tomarem porto algum do'
Reyno de Portugal^ para firmeza do que deixaráõ,elles Vaf-
fallos dos Senhores Eftados Geraes, em reféns trez peífoasj a
faber, hum official may or da milícia , hum dos Governado-
res do Supremo,& hum dos mayores homens do negocio.

3 Que toda a gente de guerra, cabos,ofEciaes , & folda^
dos fe embarcarão juntamente com o Senhor General Sifgif-
mundo,& faraó viagem em fua companhia, com tal códiçãò,
que primeiro deixaráõ entregues ás ordens do Senhor Mef-
tre de Campo General as Praças do Rio Grande, Paraíba,
Itamaracá,Ceará, & Ilha de Fernão de Noronha,com todau
artelharia,mnniçoés, & petrechos de guerra , q tinhaô em íi^
ao tempo q chegara áquella cofta a armada de Portugal,que
eftá no porto,&: no cercoj & que para fiança de tudo afllma
dito entregarão os reféns, aííima apontados.

_ 4 Concede o Senhor Meílre de Campo General ao Se-
nhor General Sifgifmundo Vanefcop, que defpois de entre-
gues todas as Praças, Sc Forças afllma ditasjcom toda a arte-

Mmm 3 Iharia,

/>

W'

y^

6^o :c^sT!(/oxa,wsiTjno

Iharia, qne tínbaõ ao tempo referido, v inte peças c!ella,& de
bronze de quatro até dezoytõ livras de baila, além das peças
de ferro,que forem neceíTarias para a defenfa dos navios,que
levar em foa companhia , as qqaes fe lhe darão có as carretas,
Sc munições neceíTarias: As de mais , com todas as armas , Sc
munições, que neílas fe acharem , fe entregarão ás ordens do
Senhor Meftre de Campo General,como fica dito.

^ QueòditoSenhorlhes concede as embarcações ne-
ceffarias, n^ conformidade referida.

6 CoDcede também o Senhor Meftre de Campo Gene-,
ral,para toda a gente da miliciaj os mantimentos neceífarios
Ba forma , que eftão concedidos a todos os Yaífallos dos Se-
nhores Eftados Geraes em o íirtieulodQZ€,& declara, qnâo
fcndo bíi%nteí jpromete dar-íhes os íufficientes. ,

'; ,7 . Concede mais ao Senhor General Sifgifmudo VaneP
cop,que poífa ter, alienar ^ embârcar,oii vender ,quaefquer
bens moveisjou dé raiz, que feus forem i& affi mais todos os,
efcravbs,que poíTue com jufto titulo : E que do inefmo favor,
gozaráó todos os officiaes vivos da milícia^ & q ieljes, & o Se-
nhor General Sifgifmundo poiíaó morar nas cazas , em que
vivem,até a hora de fua partida.

. 8 Item eõcede a todos os íbldados enfe^-mos, & feridos,
íç poíTaõ çurarno hofpital,em que de prefente eftão, até que
teiíhaõ faude,pará fe poderem embarcar.

9 Que em quanto osfoldados do Senhor General Sií^
gifmundo eftiverem em terra, não ferão moleftàdos, nem of-
iendidos por peífoa, nem por v ia algúa, da gente Portugue-
2a, nem dá terra3& em cazo, que algum o feja , dará parte ao
Senhor Meftre de Campo GÊneral, para mandar taftigaros
agreíforés,

10 No tocante a íè embarcarem jútos com osfoldados,
qtíe de prefente eftão no Arrecife, Cidade Mauriçea^& mais
Praças, & Forças rendidas^ aos q fe renderão arites deftas ca-
pitulações, não «concede o Senhor Meftre de Campo, porq
tem já dado complemento, ao que com elles capitulou fobre
a fua entrega.

Hl Que o Senhor Meftre de Campo General concede
perdão a todgs os índios rebelados.affiftentes no Arrecife,&

Praças

1^54 ^^AXtET.LlV^ X; '691

Praças adjacente?, erpecialmente a António Mendes^ & da
nicfma forte aos Mulatos, Negros, & Mamalucos • mas não
lhes concede a honra mihtar de fahirem com armas.

Qiie tanto, que forem aílinadas eílas capitulações,

12

fe entregaram ás ordens do Senhor Meftre de Campo Gene-
ral as Praças do Arrecife, Cidade Mauriçea,& mais Fortale-
2as,& Redutos defta Capitanía,com toda fua artelharia,mu-
niçoés, & petrechos, & que o dito Senhor fe obriga a dar
guarda ao Senhor General Siígifmundo para fegurançade
fua peíToa, & dos mais Cabos , & Miniftros do governo , em
qualquer alojamento, que efcolherem, todo o tempo conce-
dido neftas capitulações.

•!. -i 5 E fobre todos eíles capituIo's , & condições aílima
referidas fe obrigão as Senhores do Concelho Supremo
refidentes no Arrecife, a entregar também, ás ordens do Se-
nhor Meftre de Campo General Frãrícifco Barreto de Me-
nezes, as Praças; da Ilha de Itaiiiaracá) da Ilha de Fernão de
Noronha, CearájRió Grande , & Paraiba com fuás Fortale-
2as,& ar telharia na forma dita: Mas que o dito Senhor Mef-
tre de Gampo General fera obrigado a mádar ao Ceará hãa
náo fufficiente, para nella fe embarcarem os foldados, & mo-
radores, VaíTallos dos ditos Senhores Eftados Geraes,com os
bens permitidos no fegúdo articulo deftas capitulaçocs.Mas
declara o dito Senhor Meftre de Campo General , que não
fera obrigado a dar mantimétos para a viagem das ditas pef-
foas,que fe embarcarem do Ceará para Pernambuco.

14 Concede o dito Senhor aos Vaífallos dos Senhores
Eftados Geraes todos os navios, & embarcações, que tiverc
pellos portos do Rio Grande, Paraiba , & Ilha de Itamaracá
para fua viagem,&: condução de feus bens, fendo capares de
paíTara Linha,mas declara,q nãolevaráó artelharia de bron-
zej&deferro,fóaqueprecífamente for neceffaria para fua
defenfa. Fey ta efta concordata na Campanha do Taborda.
Segúdafeira , pellas onze da noite,vinte & féis dejaneiro de
•1654. annos.

I Francifco 'Barreto de Meneses
Mtflre de Campo GeneraL

I O General Sifgifmundo
Fanefcop.
~ 2 OMeJlre

/"

4» !'

<?9S C^ST<!lloro LUSITJNÚ

2 O Mejlre de Capo André Ft" ■'■^^jfjtsher Wit.

dal de Negreiros. 3 O Tenente General Fandre*

^ O Capitai ^^onjp de uAh Vant. ví^nfii ,

hiipercjue^'^^'^y-:^^^tT'^'^'0^^^

4 O Capite Manoel ÓÕ^abes ter Faulk ' "^^'^^ '^

Corrêa^ Secretario,

^ O Ouvidor ^& auditor Gi-
rai Frãcífco jíheres Mq «
reifa,

39 Amanhcceo a terçafeíra, vinte Sc fete de janéír a, &:
nella o Meftre de Campo General Francifco Barreto duas
vezes fenhor da fortuna, hua por Menezes , ôutra por Gene-
fal-.Dia de muy tos pertendido,& fó para fua fortuna guarda-^'
do. As glorias do niuhdo, nãolevão tanta eftimação por gra-
des, como por uiiicas.Neíle dia fe vio , como aquèlla diftan-
<:ia,qué forma a rezão entre o levantado,&: o abatido, naõ he
maís,qué hurtiàrtéraiâo da vaidade, pois no breve eípaçodé
hua hora fe detao ias mãos o tronO}& o grilho.Duas aparecias
teve de felice5para os vi6i:oriofos,a recuperação daquelle do-
mínio, (tanto para o Reyno , como para o Eftado ) acabar
íiella o mayor defe;o,&:excedcr a dita a toda a erperança. Vê-
tedores,&: vencidos madrugarão naquelle dia, huíis, porque
os d^fpertou o alvoroço da pofícj outros,porque os afiigio a
vezinhança da peida. Reprefentaçâo defenganada das vezes
do mundo,que|)ârá alegrar a huns, magoa a outros: Sem efíà
oppofição nâopòdéra nelle a ver dita . Tocava ao Meftrede
Campo João Fernandes Vieira a vanguarda na manhã da-
quelle dia,& não menos o dia daqGella poíre(para que tama^
hha obra tomaíTe o fim da mão, que lhe dera principio:)Or-
denou-lhe o Meftre de Campo General, que foíTe tomar en-
trega da Fortaleza das Cincopontas,da Cidade Mauriçea, &
do Arrecife. Sahio do Alo/amento com mil & quinhétos ho-
mens de feu terço, [deixando os mais , para que com eíles íe
engroflaflc odo Meftre de Campo André Vidal de Negrei-
ros] & marchou diante da fua gente com húa pica ao hom^
bro: Ao paffar pella porta da Fortaleza das Cincopontas , rc*
cebeo a entrega , defarínou o prezidio j & a guarneceo com

duas

i«5Í

fáttÈ f. Liniõ a.

69,

duas companhias do fciitcfço,&:húa dos Toldados de Henri- ■^^■^^ Pemanâcs
que Dias: Deixou nella o Inimigo vinte & duas peças de ar- ^^^^^tGwafojje
telhana, as dezaleis de bronze,&as leis de terro. cincopontas

40 Entrou em húa planicia , que faz o terreno, entre a
Fortaleza das Cincopontas, & á Cidade Mauriçea j fes altOj
formou a fua gente , & mandou recado ao Governador da^'
quella Praça,que mãdaílb fahir a guarnição,que nella eftava,
para ferdefarmada na forma das capitulações í Obedece-
rão ; & ao entrar pello noíTo efquadraõ, os foy defarman-
do a todos o Sargento Mayor António Dias Cardozo:
AíTí como entregarão as armas,fe ficáraõ entre os Portugue-
2es,com trato tão aRiigavel,que nem pareciaó eftranhos/nem
inimigos j eíFeytos de hum bando , que o Meftre de Campo-
General mandara lançar c5 graves penas , em que encorreria p^^ cidadeMaíí^
qualquer peíToa , que fizeíTeo mais pequeno agravo ao me-ricea.
nor eftrangeiro.Feneceo o aâ:o,& marchou avante o Meftre
deCampoJoaó Fernandes Vieira, a quem todos os rendidos m^^^vko

òlhavâo com admiração,& reverencia^paíToU a ponte,& mã-
douaffegurar a entrada do Arrecife pella parte de dentro c6
dgúas companhias da ordenança , & guarnecer as ruas , que *
guia vão á praça mayor da povoação , com foldados pagoS) ^
para onde marchou j & formado nella, defarmou o Sargento
Mayor toda a Infantaria contrária j aííi paga, como auxiliar, yH
& miliciana. Allí lhe entregarão fetenta , &trez chaves,^ CO
tílias a poííe de todos os lugares fortes , almazens de armas,' .c^^^ jsasfor-
baltimentos, géneros , & velames : Pos guarnição nas partes rna-^cns.
convenientes, & guardas nas paragens,que as pedião j & reti-
rados os rendidos a féusapoíentos, mandou avizo de tudo o
que tinha obrado , ao Meftre de Campo General Francifco
Barreto de Menezes^ pello Sargento Mayor António Dias
Cardozo,em como Sua Senhoria tinha tudo á fua obediência
foccegado,& pacificôi- "''c*»* '^^ '^''■'->-> í* "
~- 41 • Aííicomo Francifco Barreto defpedio ao Meftre
de Campo João Ferriandes Vieira,mandou também ao Mef-
tre de Campo André Vidal de Negreiros , que com a gente'
do fcu regimentOj marchaífe pella Bõa Vifl:a,8c gíiarneceíTe â' ^^^^^ ^^'^^-^í áô
Cidade Mauriçea,tomando entrega da Fortaleza de Saneio ^H^^^rosfe en*
Antonio,& Gaftdlos de mar , & terra : Achou empedido o %lflta!r'
"'■ tran- ''

.l\h*JVit^

^94 C^STÍ{IOTO LUSITMO

tranfíto pell à Bóa Viíla , eitt tç.%^o <íãs mai-és 5 V ofoc^ atrárj,
fegíiioocaminho,queIévata João Fernandes Vieira, & deu
à execução as ordens, que recebera, toiítjand o poflè dáqueU;
las PraçasjSc deixando-as cot» guarnição, Da mefiná TQrre,&
ao meíbio tempo fe mandou ao Meítre de Carnpò Ff afícifcQ
de Fígúeirpá^qUecom ofeii terÇo marchafíe pella; parte das^
Salinas ã guarnecer,& tomar poíTe das Fortalezas do Bruni,
. (neftà achou vinte & cinco peças de artejharia , as vinte &
Jumlade ornas, ^"^^ ^^ bronze,dqas de ehtínibo,& huâ de fèrro)& outras de
, " menos porte,qáe por àquelía corda tinlia o framengo-^o i^ye
fes com tão bóa ordem,<][t?è íènão deU occazião,n€m ao atre^
YimentOj nem â queixa j avendo-fe húa ,& outra gente GQflp^>
tanta prUdenciajque parecia obrar o.eftudo,Sí nâo o cíiza^ "
42 Quafi todoodia de vinte Sc íefe ft gaftoUneíl^S;
occup3çpésmiJitareSj nas ultimas horas dellerecebep ©Me-:
ftre de Campo General FranciíèoBarreto de Menezes p avi-.
o Mejíre de Ca- zo dp Meftre dé Campo João Fernandes Vieira íFprçad o áo
pó General fa^ tempójdilátpU fu^ entrada para p feguinte dia vinte ^ pyto
^Zmtfe'^'' ""' ^e J^í^^'^^' eni queíahiP de íèu quartel cPtn i authorid^^^,
de GenerâI,Sc cpm as gaías de fpídádo;& cerf pj que nefía 00-
cazião moftrQU fua pefloa, que nelíã fe via o bafíáb authori-;
zadp, & a fprtuna merecida , Ppftp áçavailp , Sç aíTíftido dps"
ÇabpSjSc da cavaUar íajqueiíiílitava, caoiHnhpu para p Arre-
cife: Na entrada da Cidade Maurtçea o fatóo a receber p Ge--
neral Sifgifmundp Vanefcpp, a pé cpmpcahidp, humilhado.
._ cprtip fogeitpjtriâe cpmò deígi^açadp j veftindp-fe fcti fem-
blante das cpres de fua fprtuna (dpsafFeâps dp cpriaçãp f&
euftuma v eílir p rpftp dps hpmèns:) Apeou-fè Frãciícp Bar-
tetp de Menezes eftíinadodõ fuíçeíTp a defprezar fobera» '
nías á viftá das miferiâs, em quç asçpnvierte amenpr aceidê*
te do têpp, Allí fe virão ambp^ ps Oen^taes em igual pafípy
hú, porque P defmpntotí a corteziaiOUtrp,pprque p deímon^
tou a fortuna. A fuá mãP direita deu Franicifco Barreto a Sif-
gifmundo Vânefcop,& nefta fprnia, caminharão para o Ar-
recife pella ponte,que o divide da Cidadeí No meyp delia, o
efperavãp PS Mirtiftros dp Concelho Supremo,& Folitico,q
recebeo cpm agríído,^: cortezia^& ps fpy levando pellas por-
tas de fuás çazas> em quie. 0^ pbrigoij a ficar j menos o Prefide-

te

6^4

^JÍiTE 1. Lir^ X.

^95

te do Politico , que refiftindo ao favor , o acompanhou até o

palácio principal da povoaçáo,quc o efperava, rica,& vifto-

iamente adornado. Em todo o difcurfo da marcha não defc^-

fáraó as Fortalezas, & companhias de repetir falvas, cujo el-

trondo fervio nefta occazião áquelle império de repiques, &

de ílnaes, porque huns o acompanhaváo ao tumulo , outros

ao trono. Ali í lhe oíFereceo o IVIeftre de Campo João Fernã-

des Vieira as chaves, como inftromentos da poíle , com dif-

tinta relação da forma, em que as recebera em feu nome j &

foy cor rerpódido com as gratificações dividas^ & bem fepo- /^

de dizer, que da mão dejoaõ Fernandes Vieira recebeo

Francifco Barreto aquelle domínio j &4Qpj:pa4ç, Portuga

aquelle império. r ■ ; ^ i . ;

< 45 O numero dos rendidos, queâmmaraoaáarmas,foy

o feguinte:Mil & duzentos foldados pagGS,em dezanove cõ? "^

panhias, em que entravão oy tenta & cinco Irldios,& vmteScN»merodos te»'

dous Negros. Naó foraó parte nefta conta,mais de trezentos,/^^^''-^'

que fe renderão na entrega das Fortalezas do Rego,& de AU

tenar j nem também oy to centos & cincoenta,& dous Índios, ^

que fe aviaó retirado para o Ceará, como nem os moradores,

(que eraó muy tos, os que toma vão armas auxiliares)nem os

foldados, & moradores,quedefpoisfe renderão nas Ilhas , «Sc

Fortalezas,quefe entregarão. Acháraõ-fe no Arrecife cento „ .; .

. '^ 1 ^ 11 • 1 1 1 r ^^ ãrtelhariA, .

& Vinte & trez peças de artelharia de bronze j de rerro.cento ^^^ armaí^&dos

&fetenta,&paraellas porfima de féis mil bailas de toáo o ynantimemos.
calibre,& a efte refpeyto as demais muniçoés,& armas:Gran-
de diverfídade de inftrumétos, & petrechos de guerra,& ma-
teriaes para elles,como ferrojchumbo, pregaria, madeiras, fc*
chos,cronhas,&c:Airi també para apreftos das embarcações,
& da artelharia,breu,enxarcias,vellame,maftos,vergas,lemcs,
& tudo o mais,que podia fer neceíTario para os exércitos da
terra, & armadas do mar. Mantimentos detioda , ^ ij9í",te, par^^
mais de hum anno, com abundância. : ,;, ^ ,, ,, , í
44 Os Olandefes (pérfidos por natureza 5 que o faõ em
toda a fortuna ) naquelle mefmo ponto,em que fe deu prin-
cipio á pratica da entrega,ordenáraó [& quando menos con-
fentiraõ"] q hum feu Tenente Coronel chamado Nicolásjde pememldo trata
cuja pefíba , & trayçoés fizemos alguas vezes memoria nefta dos oUndtfes.
:.^; ■- re-

/l

■£^6 C^ST(I(IOTO LUSITAKO

relação, fahifle do Arrecife (com titi]Io5& aparências de fc,,
ga) em hiia jàngada,que fem rumor , nem vulto podia facilf '
mente efcapar á vigilância da noíTa armada/avorecido da ef-
curidade da noite5aporíou a ilha de Itamaracájavizou o efia-
do das couzaSj& perfuadio a muy tos moradores, & índios, 9
fe embarcafíem com todos feus moveis , & fogiffem em duas
fragatas,que eílavão no portoj o que fizeraó levando coníi-.
go todos os efcravos, que avia na ílha i Foy á Paraíba, deu o
meímo avizo , & aconfelhou aos foldados, que obrigafíem c5
re2oés,quando não com violência, ao Coronel Authim Go-
vernador daquelía Capiranía,& Fortaleza , a q fizeíle o mef-
moj& fe embarcarão com todo o recheyo , munições , & ar-
mas,que poderão levar. Oiiafi com femelhante avizo, & fuc-,
Çeffo deixarão os Framengoá a Fortaleza do Rio Grande , o
que fe fez, fem que nos chegaíTe a menor noticia.

45 Em o primeiro dia de Fevereiro ordenou Francifca
Barreto de Menezes ao Meftre de Campo Francifco de Fi-
gueiroa,que com oy to centos &cincoen ta foldados dofeu,
&do terçodoMeftrede Campo João Fernandes Vieira,foí-
^râmlfco ãeTl' fe tomar entrega da Ilha de Itamaracá,Paraiba, & Rio Gran-
gueiroa tomafof^Q-, Defarmou os rendidos da ííha , que erão quatro centos
fe àAsmaiiCap- foldados,& numero crecido de moradores : tomou entrega
kÁas, "^^ ^ ortalezas, com trmta & trez peças de artelharia , quaíi

todas de bronze, & copia grande de munições, armas, & baf-
timêtosíGuarnecidas aquellas Forças,paírou á Paraíba, 30ÍI-
de achou as du^s Fortalezas da Barra em poder de cincoenta
Portuguezes,que o Inimigo tinha prefos, & os foltou, fazen-
do-lhes entrega delias, & fó os Framengos cazados, & herda-
dos na terra ficarão nelía : Guarnecidas as ditas Forças, mar-
chou para o Rio Grande, achou a Fortaleza defamparada,&
na terra alguns poucos Olan^efes cazados ; & Portuguezesi
alguns, que a fuga do Framengo fes de cativos livres. Com as
mefmas circunftancias fe tomou entrega da Ilha deFernãa
de Noronha . A a Capitania do Ceará fe mandou a náo na
forais capitulada , & nella vieraó os rendidos para o Arre-
cife. .

46 Entregue o Arrecife , & apofentado nelíe o Mcftre
de Campo General, Francifco Barreto de Menezes, fe defpe-

dirap.

\l^

16^4 sa^JT^TElLlF^OX. ê'^f ■

diraõ, o General da armada Pedro Jaques de Magalhães , & ^
Francifco de Brito Freire feu Almirante comos maisCapi- ^^íf^''^'f!^^r^
taes da trota, a cup auxilio deve Portugal a remtegraçao de y,^^ ' ^^^^,
ília coroa, naquella porção de fuás conquiílas, que fe bé foy hú.
oucramáo,aqucpreparou5&poIío aquclla preciofa pedra,
bem fe pode dizer que foy a daquella armada , a qne a engaf-
tou. Reconhecidos a efta verdadc,não fabião Francifco Bar-
reto de Menezes , João Fernandes Vieira , André Vidal de
Negreiros com todos os mais Cabos, & moradores, palavras
com que gratificar tamanho beneficio : Deu armada á vella
para a Bahia feguida de bençãos,& rogativas de todos os foí-
dados,& vezinhos- aonde entrou com as novas da viâ:ona,&
com todos os vazos da frota j& deu âquella Cidade o melhor
dia,que teve defpois de fua fundação.

47 ^ Em trez de Fevereiro fahio do Arrecife hila carave-
la de a vizo para o Rey n o por ordem do Meftre de Campo
General Francifco Barreto de Menezes,& nella o Meftre de sahm do Jm^
Campo André Vidal de Negreiros com a alegre nova da ref- cife deus avi^^s
tauração de todas as Capitanias occupadas pello Olandès^ /^^^ « Rcyr.o.
peflba efcolhida para reprefentar à Mageftade delRey Dom
João o Quarto o fucçeíTo, & a defculpa,com que os morado-
res delias excedendo a permiíTaó da defenfa,fe movéraó á có-
quifta,para que Sua Mageftade não ouviíTe o fucçeíTojfem as
cauzas,& pezafle mais a defobediencia,que o feryiço 5 o que
não feria, chegando aos ouvidos daquelle Principe a nova,&
acauzadadeículpai&comohúa,&outracouza tinha paíTa-
do pella mão do dito Meftre de Campo, daria inteira rezão
dos motivos occultos,&manifeftos, que concorrerão para a
dcterminação,com a fidelidade de parte,& teftimunha.Sahio
na efteyra de André Vidal de Negreiros outro vazo menor,
& nelle o Padre Frey Joaó de Fvefurreição Religiofo do Pa-
triarcha Saõ Bento afllftente,que avia fido a todo o proceíTo
da guerra defde o primeiro moviméto até o ultimo paílb del-
ia, mandado pello Meftre de Campo João Fernandes Vieira,
interefíado, cm que Sua Mageftade premiaíFe os grandes fer-
viços do tal Religiofo 3 muy tas vezes referidos no difcurfo
defta hiftoria. ■»

48 Navegarão eftas duas embarcações por diíFerentes

Nnn ru-

n

1

69S

CJSi^çíxmw^M^m

i

Tl"

rumoSj& tomáraõ a barra deXisboar dtB teni fflefmo dia,qu^
Dosquaes s.Ma- ^^^ ^^ dezQyto de Março daqtieíle mefeio at>np, G Meíkq
^^^,^ de Gampo AndreVidalde Negreiros pe lias féis horas .da ;tar<:^

de:0 Padre Frey João húa hora deípois,MaRd<íti Aodrq ^||
dal deitar ferro com refoluçáo de ficar ajquella noite na ç^^
ravela , & fobir para cima no dia feguinte dcfembarcando ^
horas , que da ca^raveia entraííe no Paço,& nelle ,iem deten«
'Ça,nem comunicação algua,fe aprefentaíTe a Sua Mageftadç#
Sem abaixar vela entrou o Padre Frey João , & fobio^ & m.
prepaffar conheceo a caravela do Meftre.de Gampo, que efr,
tava fobre ferro,pareeeo-Ihe , que o levava diante , 3í: pçlla
alcãçar no Paço,& nelle o patrocínio defeii negociojentroq!
peitas dez da noite,fallou com o íecretario do expedientejSc
não achando noticias do Meftrede Campo André Vidal de
' Negreiros 5 pareceo Ihecrimç dètef anova^Scengeitaradi-
ta^que lhe offerecia a fortuna»Teve audiência de Sua Magefi
tade, deu-lhe.aínovâ,q.ellerecebeo, como beneficio da mão
de Deos , alcançado pello glóriofo Saõ Jozeph Eípofo da
Senhora, queiba devação feílejtava no dia feguinte, em que
faziaannos j çr€ndo,queaíri corno lhe dera náçimento^para
fe rcftaurar no Reyno, affi em fua vefpora lhe trazia a nov3t
dareftauraçãoda melhor peça de fuás conquiílas. Ao outro
áia rctificou anova, & a alegria o Meílrç Aq Campo André
Vidal de Negreiros, que logo fe de viilgou por toda a Gort§
iCíOm tanto ai vor oço,que a feíie ja va ogofto- de todos , ^ não
acabava dea Oí^r o efpanto de muytos.Hum dos dias feguiivr
tes, foy Sua Mâgeftade em prociífaõ á Sé à dar as graças dg
mercê taõ gfánde^ r :%íà^i^.. ■■múmmh

s«i4^;fc3Efiè het) fim,queteve ointruzo imperioBelgico níii
qnèlla parte da America :Nella vio poôrada aos pés da efpa-
Tonderat-fe aí áa Portuglíezà flia reputaçaó,feu poder,&: fiia fortunaj tudí^
*vezes do mundo-, ^^^^^^^ ^^ Europa, fazendo crer ao mundo,qtie afpirava a
todo O íènhoriodelIe:Ghegáraõ as armas defta bellicoía na-
ção a fe fazerem crer invenfiveis,& os golpes de feu braço in^
curaveis:Opinião,cõ que os PrincipeSi tapavão a boca a feu?
VaíTalIosnas queixas mais vivas,porquedas feridas mais fen-
íiveis: A defpertall^os defte enganofo fonho bradou efte fuc-
çeíTo com efpantofo gritojfazeíido entéder aos mortaes, que

' i- j

em

í

16^4 fJ^EhLlVnp:^. 699

em fua profpcridnde obrava mais noíTa culpa, que fua poten-
cia,& menos fua inclun:na,que nofla defatenção. A evidente^
expericncivisomoíirouoBrafiljque a hum golpe do braço
Portuguez cahio por terra todo aquelle artefaâo de fua tira-
nia. Cortou-lhehúa parte muyto grande daquelle corpo, o
r)oííoferroj& como truncado o veraòjá agora, as nações da
Europa,menos formidável: Sobio de falto, & cahio de golpe
toda a machma de fua politica; aífentou fobre falfo , & arrui-
nou com feu pezo. Vinte & quatro annos gaftou feu cuidado
em fe fabricar trono , & em poucas mais horas , fe vio levado
ao tumulo:Teve as códiçoes de império, porque com o meí-
mo nome fobio,& declinou. Sifgifmundo , que lhe deu prin-
cipio, lhe deu fim.Perdeooqueadquirio,&n,ioadquiriotá-
to como perdeo.De húa mefma gente recebeo o nacimento,
o auge,& a declinação. Vidloriofo ,& vencido o levará efta
mefma pena a todas as partes do mundo,aonde chegar fua co-
municação,para que feu efpanto ache o tumuIo,aonde achou
o berço,& por feus merecimentos, achará em todas compla-
cência, em neahiía compaixão; que a cahida do infolente a
todos alegra,porque a todos vinga. Melhorou o Framengo,
o que no Brafil adquirio,& fó para o deixar melhorado.o au- »
mentou:Tem íeusefcrupulos a fortuna. Muy to foy, oque ^^/^,,^^y^,^,
Olanda na conquifta do Braíil adquirio por roubo, & muy to
mais o que deu por entrega. PaíTaraò de vinte mil homens 03
que lhe confumio a defenfa (não falíamos nos difpendiosda
conqu ifta, que não ti veraó conta ) em duas partidas perdeo
cinco mil,que forão as dos Guararapes: Succeffivamente foy
expulfado de duzentas legoas decofta,que deixou comas
Fortalezas,que nellas levantou, & poíTuio. Em húa tarde nos
rendco as Fortalezas do Rego,a de Altenar,a dos Aftogados,
a das Cincopontas, a de Sanào António, a da Bóa Vifta, a do
Brum, a da Seca, a dos Perrexís, a do Buraco de Santiago; os
Ca ftellos do mar,& os da terra ; a Cidade Mauriçea, & o Ar-
recife com todos os fortins,plata-fGrmas, & batarias , de que
fe guarnecião;& cortou tão largo a cfpada Portu^ueza , que
juntamente rendeo húa Fortaleza no Rio Grande, duas na
Paraibá; com as das ilhas de Itamaracá , Rcrnão de Noronha^
& a Capitania do Ceará3 tédo-lhe já a efte tempo cahido das

Nnn2 iiiãos

Vuiea.

70a c^sr(^o^ú:msm4no ^i

itíãosas Fortalezas de Nazareth^^ do Rio de S, FrmdfcOy do^
Porto do Calvo , de Joa5 de Albuquerque , com a Afilia de,
Olinda:Em todas nos deixou mais de feiícentas peças , quaíl
de bronze todas. As armas,muníçoés, & géneros foraó cm tá-t
ta copia,que excederão o nDracro5&; a eftimaçaó:Cotejeaa-;
rifmetica o ganbo com a perda, & v erá para qual das partes:
pende a balança.Perdeo o Framengo a bolfa nos gaílos,&Ia-f
croS:,que te ve na tomada de Pernábuco,porque perdeo a ÍqC-
fenta por cétoPQue perderiajquando fera lucro gaftou muy
tas vezes mais?

- f i^íO Aquelia potencia^que o vulgo, no Brafif, julgava iiH
fupara vel,affiftida dos progreíros,das fortiificaçoés,das arma-*-
das,do roubo,& do comercio,pos debaixo dos pés o coração
de hum homem,porque a excedeo a grandeza de feu animo,
affiftido do inveníivel efpirito,qUe o movia.Foy efte o gran-
0 que deve ana. de Joaõ Fernandes Vieira Varaó mayor, que íèu nomcNef-
fãQ^& o Reyno a te Heroí competirão a capacidade,&vO vaIor,porque fua ca-:
João Fermndes |)eçá foy a medida de feu braço, obrando a força , o que deli-
íiiava o penfamentoj& feu cabedal tudo, quanto lhe propôs
o defeio.Necefíiítava de apreftos, pedíaos á fua fazenda j fal-
ta vaò-Ihe foi dados, faziaos fua pratica^ defejava leoés , crea-
vaos feu exéplojpertendia vi£torias,dava-lhas a fortuna . Sa-
hio a campanha acompanhado de íi mefmo, & fahio com o ^
intentava . Naó ouve occaziaõ ^ em que o venceííè o poder;
em todas defprezou o perigojeffi muy tas focorreo a faltarem
aíguas atalhou os infortúnios. Naó ouve concelho, que não
deveíTe as refoluçoés a feu parecer; não ouve deftroço , em q
não influiíTe feu braço j nem tivemos vi6toria, que não illuf-
trafíè, oii fua efpada,ou fua difpoíiçaõ.O principio daquella
guerra,refulta foy de feu impulfo; a continuação dasarmas^
efFeyto foy de fua conftancia jo fQcorro,q a frota deu para fe
concluir a emprefa^in vençaõ foy de fua induftria j 0\ cercar as
Fortalezas do Arrecife, eleição foy de fuaouzadia ; o tomar
poíTe das Praças contrarias, merecimento foy de fua efperan-
ça.Naó faltou a fua grandeía, a emulaçáo^a feus progreíros,a
enveja; a fua liberdade,a ingratidaója fua cortezia , o atrevi-
mentoj&afua fidelidade, atrayção. Verdadeiramente to-
do,& em tudo hum vivo retrato da quelle Caftrioto taõ coi-

nhecido

1^54 fAt^ÊLimiO X. 701

nhecido por fuás obras, que fe foy primeiro no tempo, teve
em Joaõ Fernandes Vieira fegundo novaIor,&na fortuna.
5i I A cfte Herói (apuradas bem as caufas , & melhor as
rezoés, com que o Sereniífimo Príncipe Dom Pedro falando
nefte Varaó, o nomea Herói de nofla idade, como alguas ve-
zes lhe ouvi : Condição verdadeiramente de hum Principc
perfeyto, não fe lembrar do ferviço,fem honrar o merecímé-
to) devem as idades a mais viva lembrança : a Nação Portu-
gueza a mayor iama3 a America toda,o melhor nomeio Rey-
no de Portugal o comercio mais útil; a Coroa Lufitana a
porção mais rica; as Portuguezas armas o pregaó mais vivo;
os Principes Lufitanos o premio mais grato . Os quilates de
feu merecimento relata fiehnente efta hiftoria, que fervirá á
pofteridade de manifeflojem que fe veja a rezão , com que a
fama o deve collocar entre os feus Capitães. Com lhe dar oc-
cazioês para o ferviço, o bufcáraó os prémios, & foube Joaõ
Fernandes Vieira achar occazioés, para fazer dos premios,os
mayores fer viços,como diremos na fegunda parte de fua hif-
toria, que fendo Deos íèrvido, daremos á eííampa muyto
brevemente.

jTttí/o, o que nefle Volume/e contém , affi^ em quanto a hlBoria, como

emquantoasfentençasf&ííspalaVi^aa^Eu o^tegador Geral Frey

^phaeldelesVs humildemente fogeito â correcção,^ jui^o da Sanc^

ta Madre Igreja de ^m<t^^ protejlo querer ^^ fepuir emtudo^

^ em todo o tempo fem decretos ^ & fuás determmaçoesjcon

mo fiet^^ humilde filho feu,

I

V

Nnn3

INDEX

n:.je^:j

O^SSilK ^

DAS PESSOAS, E COUSAS MAIS NOTÁVEIS DESTA

hiftoria, pella ordem do Abecedario.

A.

tregou por tray ção
hii Reduto ao Ini-
migo livro 2. n. 19*
Guia ò exército O-
landèspàra a Fortaleza do Ar-
'rayallív.3.n.6. ^««"^^

Aàrão Catres General domat^y
Dá batalha a Dom António de
O quendoliv.3.n. 29 .Envolto
ílo feu Eftandarte General fe
de ita ao mar, & morre aíFogadd

Dom Jjfonfo Henriques pYtmeU
ro ^^y de í^ôrí»gd/,Defcobre hun)
fegredo c5 a cautela de o efcon^
^derliv.2.n.i. ^^«í^^
O alferes reformado Affonfêdè
Albuquerque , VaypÒr Capitão
de hum bote abordar húa náo

Olandefaliv.7.n.7$>

O Capitão Jjfonfo de JHuqueY-

^tte,RetÍrá-fe da Villa de S.Lou-
renço liv. 3 . n. 8 3 . Acha-fe no
choque da Prayaliv.S.n. 6. De-
fende a Eftãcia do Aguiar a to-
do o riíco liv.^.n. 1 00.

J^jlmho Nunes Sarmento Ma-^

'■■''' I

jor da Ordenarjça ^ Com a gête da
terra vence ao Olandès, &lhe
mata oytenta homens liv. 7.0.
ç 5 .Defende-lhe a povoação de
S.Lourenço dom admirável dif-
poííçaó,&: valor n* 64,

O.Capuão y^goílmho LeitãoyCõ
outros defende a povoação de
S.Lourenço ao Olandès liv. 7-
Í1.Ó3.

Mhuquerques , Senhores da
Capitania de Pernambuco liv.
i .n. 1 4*

Votn ^teixoy Leva focorro á
Paraíba , & morre na emprefa
iiv.^fU.^é.

^//fwdr, Fortaleza dolnimi-
gaiíercada pellos noíTos liv. 10.
n.2 3.Rende-fe â partido num.

O Capitão t>. Jlonfo Ximeties^
Socorre os moradores do Porto
do Calvo na retirada para a La-
goa liv. 3. n.i 31.

Jlvar o Frogofo de Albuquerque^
Nomeado Capitão de Sirinhac
Jiv.é.n.43.

\Al(fjatnentOy O de noíTo exer-
cito

eito nos montesGiiararapes liv.
9.n.i 9. T

Amador de Araújo, Nomeado
CapitáoMayor da povoação de
Ipojucaliv. 5.11. So.Choquacó
Henrique Hus, & fe retira li v.6.
n.4. Vay difpór o cerco à For-
taleza de Nazareth n. 47.

S. J'mcrr o ^ Em feu dia fedeu
principio áconquifta do Arre-
cife liv. lO-n. 20.
- O ajudante Amaro Qordeiro^
Guia a noífa gente para dar fo-
bre o Inimigo , fem fer fentida
liv. 6. n. 5 5.

O Capiíão André Aheres^ So-
be primeiro ,,hú Reduto do Ini-
inigoliv.S.n. 43.
• André P tas Ferreira^B.tnà'\ào
dopofto de Capitão Mayorde
Pernambuco liv. 2 .n.4.

André Marhn^oíto por Go-
vernador da Fortaleza do Ar-
rayal liv. 3 .n.76. Defende-a do
eerco, que lhe pos o Olandès n.

O (Capitão André Tereira Te-
w«fl?o,Envefte o InimigOjSi mor-
re vingado liv. 2.n.2o.

André ^drigues Alferes ^Dz-
lhe hiia baila nos peytos, Sc fem
dano lhe cahe aos pés liv. 7.0.
12.

André Vidal de Negreiros Te*
vente General da 'Bahia^ Vé a Per-
nambuco, a q,& cò que pretex-
to liv. 5. n. 33 . AíTaltaosCer-
cadores da Bahia , & os defcom-

pocmliv.^.n. 136 . Porellçef-
creve Joaó Fernandes Vieira ao
Governador Geral do Eftado
liv.5 .n.34. Vem cm focorro dos
moradores de Pernambuco, li v .
6.n.4 1 .Bufca a Joaó Fernandes
Vieira para que , & o que paíTa
n. 46. Com duas companhias do
feu terço fe mete na batalha de
DonaAnna Paes n. 54. Com
o feu terço adianta o cerco
da Fortaleza de Nazareth, &
manda embaixada aos cerca-
dos num. 71 .Refponde a húa
carta do Olandès liv. 6. num.
iio.Da-lhe húa baila daarte-
Iharia inimiga pello chapeo,y&:
lhe não faz dano liv.7 .n. 1 2 ,Of-
ferece-fe para ir focorrer o Rio
Grande liv. 7. n. 43. Com que
poder chega á Paraiba5& fe une
como Camarão , & ordena caf-
tigar o atrevimento do Olan-
dès: Em que forma o difpoem,
& manda picar o Inimigo, con;
que effcito liv . 7 . num. 52.
Em hua embofcada mata todos
os contrários, Be lhes toma as lá-
chaSjde que defembarcarãoiEn-
trando na Paraiba comaplaufos
de viftoriofo num. 53. Man-
da talar a cápanha do Rio Gra-
de, com que gente , & fucçeíTo
num. 154. De volta para oAr-
rayal bufca ao Inimigo^ porque
cauza,& com que fucçeíTo liv.
7.n. 5 6. Parte de Goyana para
o Arrayaljaum. 58. Vay focor-
Nnn4 rer

rcr a povoação de Saõ Looreti-
g03& quanto fentenaô chegar
ao tempo da bataliia.nmri: èé.
Replica a hóa ordem delRey,
8c fe reíol ve em feguir a guerra^
Biim. 72. Avizá ao Governa-
dor Joaõ Fernandes Vieira, que
tray dores o querem matar.n.8 6.
Socorre aEftaneia da Moribeca.
Mv.8.n. £ 5 . Vay á campanha da
Paraibaja qDc,& o que íaz.n. 1 8
Intéta tomar ao Inimigo a For-
taleza da Barreta. n. i ^.Sahe do
ArrayQl,& lhe põem íitio.n. 20^
Rebate os focorros,que lhe vem
do Arrecife. ní2 1 . Manda abrir
húa eílrada por entre os mãgesj
fera efteito. Vé a Fortaleza fo-
corrida , Sc fe retira do íitio. n.
S22. ¥ay á Capitania do Ceará
Morimjcom q poder, para q.n*
^5. 'Na primeira batalha dos
Guará rapes comete o Inimigo
pellos mõtes5& o desbarata.liv.
p.n.2 ó.Oppoem-fe a todo o fu-
ror inimigo,& húaballalhema*
taocavallo.n. 29. Na fegunda
batalha dos Guararapes avãça,
& rompe o Inimigo, pella fua
parte. n.yo.Seu parecer fobrefe
ganhar, ou não, o Arrecife. Iiv.
lo.n. 18. Continua os ataques
das Fortalezas contrarias, n. 22.
Defaloja oFramenao da cminê-
cia do Milliou. n.5 1 .Parte a dar
a nova da reftauraçaó do Erafil^
aelReyD. Joaó o Quarto fua
^iagemj&íiicçcíTo. n.4-7.

A.
']^ri«f?j,0 de i64^.f€*dcfiprií3í»
cipio em Pernambuco á Accla?-
maçaõ daiíberdade.li v . 5 Uium*
70 . no mefmcíjfe deu bátalhí^
das Tabocas, li v. 6. ní^2 i.^citl
da primeira batalha dos Guará-
rape&foy ode 1 648.hv.^.n.25
O da fagunda foy o de 1649.
liv.9.n. 68. No de 1654. fccò--
quiftou j & rendeo o Arrecife
com tudo o que o Olãdès tinha
noBraííl.liv.io.num 20.&C.N0
mefmo teve aMageftade do Se-
nhor Rey Dom Joaõ o Quartc»'
anova.liv.io.n.48.

Santo JntonWjFavGce que avi*
za aos moradores, que fe retire.
liv.5.n.67.68.

Antomo de Àlbuperqm fjover
nad0r,&Capitão Mayor da Pa^
raiba.liv.^. n. 35 . Sahe a rebates
o Inimigo,que cerca as Fortale-
zas da barra, n.70.0 que faz dti*
ranfe o cerco. Vè as Fortaleâ
zas rendidas , & trata de defen-
der a Villa.n.71.

OQapitco yintomo Andre^QoT-'
ta o Inimigo , que encontra fo-
gindo.liv.3.ri.54. He o primeis
ro,quefobe a trincheira dehã
Reduto inimigo.n. 64. Sahe ao
encontro do Inimigo , & o rom-
pe na margem do RioBebenbe,
n.67.

António 'Barhalho , Prefo pello
Inimigo por inconfidente, liv,
5.n.7g.

AntonioBárach^TuátcQ efqut#

íicos

A.
íitos tormentos no RioGrande»
liv.6.n.i36. "

O (Capitão António (Borges Uchoa^
Rebate o Ininfíigo ; có que fuc-
çeíTo.liv. S.n.io. Com outros
Capitães encontrão, & desbara-
ta© hum efquadraóOlandès.liv.
ç.n.yo.

• António de bulhões ^ Prefo pel-
lo Olandés , por inconfidente.
liv.5.n.73.

■^ Dom António Coutinho, Rompe
jpellos efquadroés do Conde de
NaíTaii com deftémido valor*
Iiv.3.n.i2p.

António Dias Cardozo , Parte
paraPernambuco,com q ordens,
liv.^.n. 36. Avifta-fe com João
Fernandes Vieira , & mandão
quatro foldados á Bahia, a que.
n.37. Falacó os moradores cò-
fidentesj a que fim^n. 42 . Ouve
íuasrezoés,& as desfaz. n.43.&
44.0 que paíTa com hú Envia-
do dos traydores n.47. Faz húa
carta a Joaó Fernandes Vieira;
com que induftria. n. 48. Muda
de alojamento por defmentir os
traydores.n. 49. Recebe patente
de SargentoMayor do exercito.
liv.i5.n.84.Manda defcobrir o
campo na occazião das Tabo-
cas.liv.ó.n.i 9. Forma embofca-
das para receber ao Inimigo, n.
2 í .Corta a tenção do Olandés,
com a oppofiçaó , & induftria,
comqueefcóde a falta das mu-
nições, n. 2 3. Com valor j&có-

prehençaõ acode a todas as par-»
tes da batalha, n. 2 5. Prova de
foldado,& de Capitão, n. 122»
Saquea, &:abrafa a Ilha de Ita-í
maracá.li V .7. n. 79. Ordena, &
peleja,como fempre.li v .8 .n. i o
Vayfobre a campanha do Rio
Grande,o que lhe fuccede.n.3 1
Vay efpiar o Inimigo , com que
ordens.liv. 9.h. 1 1 . Volta có in-
formação de vifta.n. 14. Avifíi
de fua determinação , & de fua
força ; & recolhe ao Gover-
nador Henrique Dias dentro òú
exercito,& rebate a Henrique
Hus.n.20.Véceo Olandés, deA
pois de muytas horas de bata^
Iha.n.^i.Com os Capitães de
feu regimento rompe os efqua-
droés inÍEpigos.n,7o.Socorre ao
Meftrede Campo André Vidal
deNegreiros. n> 71-*; AíTifte ao
enterro dos Olandefes j & o
que paíTa com o Cabo dos gaf-
tadores inimigos.n, 84. Vay ao
RiodeSaõFrancifco. n.92,Ef-
pêra de relanço os inimigos,&os
rompe, & desbarata.n. 1 00. De^
farma as guarnições das Praças
Olandefas ^ aíTegura o Arreci-
fe , & defarma o prezidio delle.
liv. io.n.40.

O Qapitão Jntonio ^drigues
Vtdal^YdLy por Cabo de húfo-
corro á Paraiba , & leva patente
de Governadores a trez homens
nobres daquellâ Capitania, que
lhes entrega,& com elles affen-

tâ

*■

ta a Accíamaçaó da liberdade.
liv.í.iium.SS. Valor com que
rompe por todo o poder do
Framengo . num. 90. Na bata-
lha dos Guararapes , focorre aô
Governador Henrique Dias.
liv.^.n.48,

^ O (^apttão^ntonlo de Freitas da
Sjlva 5 Atormentado pello Fra-
mengo, rime a vida a dinheiro.,
liv.g.n.^í.

O Çàpuão jíntonk Gomes Ta»
hrda^ Grafvemente ferido pello
Framengo,cóvalece.liv.6.n.6o.
Occupa o Engenho do More-
no por ordé de Joaó Fernandes
Viéira.livr 6. n. 1 5 .Retira-fe do
Inimigo,por hua ordem.n. 1 9.

O Capitão j4ntonio GÕ^ohes Ti-
tdo.Axmz embofcadas na Ilha de
Itamaracá5a que fim,& com que
cffeyto. IÍV.7. n. 7^* Acópanha
aro Meftre de Campo André Vi-
dal, da Paraiba para o Arrayal.
11.54. Morre valeroíàmente na
Bahia afíaltando a fortificação
do General Siigifmiindo. li v ^ 8.

n.29. ,^^ÍHJ

O (jpttãi) Jntonto iè Lhna^ Na
guarnição da Fortaleza da terra
o defamparaó os feus.li v.2.n, 2 3
Rebate o Inimigo , & a defende
de hum grande aíralto.n.24.
Defende- fe do cerco, com que o
Inimigo o aperta. n. 2 5, Entrega
a Fortaleza a partido.n. 26.

jíntomo Mendes de J^eVedoj
Prefo pello Olandès com acha-

que de íncon fidentc.íi v.5 .n.7 5«
Morre prefo no Arrecife, n.76-

O (Capitão António Machado^,
Rebate o Inimig03& apõem em
fogid3.1iv.9.n.9r.

António ISlunes JCimeneSy Prefo
do Framengo por inconfidente
feu.liv.5.n.73.

O Qapítdo jíntmm lacome !B?-
^ena^ Vay ao Rio Grande. íivJ
7.n.54.

Dom Antonit) de Oquendo , De
viagem paralndias mete focor-
rõ em pernambuco.liv. g.n.2 3é
A armada Olandefa o comete
na altura de Pernambuco.n,29.
Fica viâioriofo : Com que fuc-
çeíro,& com que perda. n. 3 1 « ;

Dom António OrtiSy Por Italia-
no eícapa da morte.liv.3 . n.45 ,

Dom António Theltpt Camarão^
Com o feu terço aíTola tudo ,0
que entende fer de Framengos.
lív.3.n. i2 2.Chegaaaviftar-fe
com João FernandesVieira.liv,
6 .n.44 .Fronteiro na Eftancia5q
fe dizia deSebaftiaõ de Carva-
lho, o que obra.n. 1 1 4. Vay em
focorro de Cunhaú.liv.7.n.26.
Chega á Paraiba, engroíTa o por
der,& parte para Cunhau.n.28,
& 2 9. Particularidades, que ne£-
ta occaziaó illuftráraõ feu no-
me, n. 3 2. De fuás viftoriasdão
nova no Arrecife os barcos dos
Olandefes mortos, & feridos na
batalh3.n.3 3.Efpera o Inimigo
de embofcada,porém elle lhe fo-

■Bsn^

A.

ge.n.f^ r. Afíalta,&: deftroe fegu-
da vez a campanha do Rio Grá-
dc,& manda para o Arrayal os
gados, & deípojos , & fe fica na
Paraiba. n. 6 1 . Com outros Ga-
pitàes desbarata todo o poder
contrario, liv. 8. n. lo. Segue o
alcance do Inimigo; cóqueef-
trago.n. 1 5, Refpóde a húa car-
ta dos Olandeíes. n. 58. Enfer-
ma de morte . Sua callidade , e-
xercicios,virtudes, & mercês, q
recebeo dei Rey ; & Tua morte,
liv. 9. n. 5 2. Seu enterro.n. 53.
hi.jO Captfão António Cheiro de
Lacerda^ Desbarata o Glandes.
IÍV.3 .n. I o. AíTalta húa triíicheí=-
ra do Inimigo. n. 1 4.& 15.

O Capita o António da ^cha Dá-
wkM^Sahe a ter o encontro a Sif-
giíiTiundojCÕ que valor , & fucr
çeffo.liv.S. n. 6. Acha-fe na res-
tauração da Villa de Olinda.liv.
9.n,49. r>^i-,r

O Capitão António ^drigues
s^^awcííjPica ao Inimigo, & fatis*
faz ás ordens do feuGeneral.Iiv*

jintonio da Sylva Capitão ^^ d <
ho da CíjV^j/Zâ^icí jCazualméte cor-
ta hum atreiçoado intento dos
Eftrangeiros, que militavaó en-
tre nós.liv.7. n. 10. Nos Guara^
íapesrompe o Inimigo por há
lado.iiv.^.n.y.Ajudaadesbarar
AÍar o 01andès.n.26.Recebehúa
carga cerrada,&: avança hunj ef-
quadraõ Olandès.n.7 1 .

'Jínfonio Ti lies da 5';/i>j,Cliegà
à Bahia por Governador Geral
do Eftado.liv. 5. n. 22. Mand^
embaixada ao Arrecife;a cauza,
& forma delia. n. 23. O que faz
com a refpofta dos Olandefeç.
n.24. Trata em húa carta por
Senhoria ao Conde de Naífaúi
a rezão porque.n.25 . Refpont
de a húa carta de João Fernan-
des Vieira por António Dias
Cardozo.n.35. Dá audiência a
dous Embaixadores do Arreci-
fe.n.5 2. Em particular ouve t
Theodofio Eftrater, o que lhe
refpóde.n.5 9.0uve a dous Em-
baixadores Ólandefes ; ^ connp
osdefpacha. n. 89. Chegaõ-lhe
as novas do fucçeíTo de Taman-
daréjO que fobreifíb ordena, &
determina.liv.6.n.6§. Manda
focorro ao Rio de Saó Franeif-
co.n-^.Manda que osmorado-
res da Capitania de Pernamba-
CO tallem todos os canaveaes do
açuGar.Uv.7.35 . Caftiga os fol-
dadosfogidos da campanha d^
Pernambuco para a Bahia.n.5 8.
Manda,por ordem delRey, que
os terços dc- André Vidal , Sc
Martim Soares deixem acápa-
nha de Pernambuco, & fe retire
á Bahia.n.6 9 .Determína,que fe
defaloje o General Sifgifmun-
do da fortificação , em que efta-
Vaá viftadaBahia.liv.S.n. 25.

Antonto TeiÍBS Conde de Ftlla-
Toucay Nomeado por General

da

áa armada, que elRey manda ao
BrafiLIiv. 8.11.30. SahedoRçy-
11O5& toma porto na Bahia,quã-
ào íe efperava em Pernambuco.
n.4 1 .Admiração , com que ou-
ve a nova da batalha^Sc vidoria
dos Guararapes.il V .9.n.3 9.Mâ
da hum focorro a Pernambuco.

■ O Capitão JpoUnariO Gomes !Bar*
feto ^Morre em hum choque das
Salinas.Iiv.^.n.pi. ^^

Jpupucõs poVoaçãoy Dibílruidà
por Henrique Hus.liv.ô.n.g/.

ArmadayQo que fahio' o Olã-
dès para conquiftaraBahia.Iiv.
«i:.n.24.

^;í Amada de Tortugãl , Que ref-
•tãíUrou a Bahia.liv; im.16.

Armada Caílelhana](j)viç nefta
occaziáo Jevou Dom Fradique
de Tolledo.liv. I .n.26.
V Almada de Olanda^Qne veyo
fobre Pernambuco, hv. i .n.3 1*
Segredoj com que fe preparou,
& arribou fobre o Arrecife, liv.
a.n.io.

Armada do Conde daTorre^Sa-
he de Lisboa para a Bahia. liv. 3.
n. í 41 . Difcurfos fobre paíTar á
vifta de Pernambuco.num. 142.
Encontro entre as armadas de
Poftugal5& Olanda.n. 1 45 . A
<ie Portugal deita no porto do
Touro a Luis Barbalho.n.147.

yfrmada do ^ejnOj General o
Conde de Villa-Pouca^entra na
Bahia.Uv.S.n. 41.

dehíía armada^ C^eía-
hio de Olandà, entra no Arre-
ciíe.liv.9.n»47.f

t^rniM, Que fe ganharão ao
Inimigo nas batalhas das Tabo-
cas,& de Dona Anna Paes.liv.^
n.59,

J.rnao de Ohnda y Qom dous
filhos feus fegue a Joaó Fernan-
des Vieira.liy.é.n. 5.

Atrayal, Fortaleza, Sc povoa-
ção feita hiia legoa do Arrecife,
liv.3.n.5 .Ganhada , &arrafada
pello Olandès.n.95.

^0 mjjo Afrayal «oí'o,Chegoi3
a nova do efírago do Rio Grait-
<3e.liv.ó.n.i42. Nelle fe fente
grande fomcj como fe remedea*
liv.9.n.54.

O Capitão Ajfenfo da Syhafií^
he a rebater o Òlandès na occa-
2iaõ, em que o Códe de Naffau
aíTaltou a Bahia.liv.j.num. 136.
Veyo da Bahia com André Vi-
dal de Negreiros , & fe acha na
batalha do Engenho de Don^
Anna Paes.liv.ó.n. 515. AchaXe
noaíTaltodaílha deítamaracáé
n. 1 24. Duas bailas o topaó,fem
lhe fazerem dano. num. 124.
Tcdo já o pofto de Sargêto Ma-
yor,feachanoafíalto, qíèdcti
naBahia á fortificação de Sifgit
mundojde que fahio ferido. íiv«
S.n.29.

B.

BAHlJfiwz altura , & def-
cobriméto. liv. i .n. 1 1 . Sua

fun-

. ^^

ftiiidaçaÕ , & a cauza , que para
elia teve o Principe.n. 1 9. 0 O-
landès a ganha por entreprefa.
iiv2 4.Dom Fradiqne a rcftaura.
n.20.0 Conde de NaíTaú acer-
ca^Sc fe retira deftroçado.liv. 3.
n. 1 3 5 .0 mefino fuccede a Sif-
gifmundo.Uv.S.n.iS.

'Bútha^ar (^arlos , Príncipe de
Caftella feu nacimêto.liv.2.n.5.

bandos y que Joaó Fernandes
Vieira Governador daliberda-
de manda deitar por todo O re-
concavo.liv»5.n.7o.
. r (Batalhas das Tabocae^luW .6.
n.22.23. &:c. Circunftancias, q
aiizeraõ parecer milagrofa.n.
í27.DerpojosdelIa.n.33.
í" !Síítí//^^a,DoEngenhodeDóí-
lia Anna Paes,& fuás particula-
' ridades.n.52.&53. &c. Comq
perda de gente,& reputação do
Oládès.n. 60. Cazos eftranhos,
queem favotdps fieis feviraõ
nelia.t3.6'2. ^^ ■
.ii Batalha naVal , Entre í*ortu-
guezes , & Olandefes dada no
porto de Tamandaré, & luas
, «particularidades . liy%.6.n.* 67»

,'• .'Batalha prmê^U àúsGuarara'-
pes^ Duração , & fucçefíb delia.
IÍV.9. n.25 . &c . Èfpantofas cir-
-cunftancias defta primeira bata-
lha dos Guararapesdiv.^.n. 29.
Deftroçado fe retira,&fbge Siíí-
girmundo,quádo,como, &pQr-
<[ue. n.33.&34. .

^s.taíhafe?íédados GtkraHpely
Sua dirpoíiçâo,cxecuçaó,Sí:ruc-
çcflb.liv. 9. n. 68. &c . Horror^
& eftrago, que neila padece o
Olandès.n.ya»

íBf ^ír/^e, Rio de Pernambu-
co.liv.i.n»!/.

O fadre Fr. 'Belchior^ Sua prof
fiffaójfuas prendas, & valor.liv.
3.11.44.

S. Bento^ E fua Religião fcs
ffiuy tos ferviços a Deos no Bra-
Íil.liv.3.n*i9. )

O Capitão Bento Maciel^ De-
fende a Fortaleza do Pontal de
Nazareth a todo o poder Olan-
dès.lty.3.n.38.&39^
- O Capitão Bertholamm Soaret
£"ff«/;4, Recebe patê te paraofer
defoldados pagos. li v. ^.n. 81*
Perde-fe a íi, & á fua Eftâcia pof
demafiada ouzadia. liv. 9. n. 1 2.
Pele;acom efpantofo valor c5^
tra todo o poder Olandès , & o
cativáoinal ferido com morte^
& prifaó dos feus.n. 1 3. Os feus
fóldados (parte delles) defende
a Eftancia da Barreta até a ulti^
ma poífibilidade.n 1 2. Foge da
prifaó jchega ao noífo exercito,
%í dá novas do fucçeflb. n. k^^

Bolça da (^ompanhta Ouidentaí^
Quando,&como teve principio
em Olanda, & feu principal in-
tento.liv. j n.23.

^ondade^ Dà terra doBíafiL
liv. i.n. 13.

O Capitão Braz Soares Senhor
Ooo d4

B.

da llhi de San&a lifarid , morre

como valente, mas não como

fGldado.liv.3.n.45.

O Capitão ^ra^ de Sarros^ v ay

a recuperar a Villa de Olinda.

]iv.9,n.43.Com quedifpoíiçaõ

valor5& fucçeíTo a ganha. liv.p»

«44.

Srafd, os grandes interefles^

que delle tira a Coroa de Portu-

gal.Iiv.i.n.^o.

iSraJilianòs^ eftrago^que pade*

cem na Paraiba.liv.7.n.5 3.

O Coronel 'BrinCf mete citi pra-
tica o intentar-fe orenhorio dá
campanha . Daõ-lhe o goverdo
das armasj cõ ellas perfuadeaos
jdo governo, que aíliin íe ideter-
mine. Oque ordena aeíle finii
& como dá conta a Sifgifmúdo*
liv.9.n. 5 8- Sahé do Arrecife jcõ
que poder^Sc em que dia. liv. 9.
nó 2 .Marcha para a Barreta- &
dahi para os Guararapes. n» 63.
Sitio, & forma, era que fe orde^
Ba.n.64. Picado dos noífos , lap-
gâ os montes.riiéy, Antes de fè
imaginar aflaltado, íè véconíe?
tido.n.68.Empenha feumayor
poder em reíiftira Joaõ Férnan?
des Vieira. n. 6 8 . Morre flâde-
fenfa de fua artelharia.n. 7|.

Cl A'BO de Sanão , Jgoflkho,
fua altura, & fituaçáo.liv..
2.U. 80, Nelle padecem osino^

íadores grades çalaíiiM^dgs. M

^}.\Cahos da armada Oiãde/a^ que
veyofobre Pernambuco. Úvli.

Os Cahos Portugueses , confe^
rem entre fi o modo de fazer a
guerra ao.Olandèsj o querefol-
vem.liv.6.n.ii3.&:ii4.

C^peh^mhé yKio de Pernambu^
<x>.liv.i.n.i2.

CamàraÕ^&fem Índios^ íè oííèh 1

recém aMathias de Albuquer^

que para ferv ire na guerra. liv*

3*0, ^%,\&i fe lhe dá eftancia. n.

la.Ganhaõ hum focorro,que o

Glandçsmaiida pormar^n. 5 3.

Acaba de confumir hum t^rço

de quatrocentos Olandefes, já

deftroçado por outros Capi*-

tães.n.5 4 . AíToIa tudo^ quanto

topa pertencente aOlandefe^

ji. 1 22.Retira-f€ cora efpantoíà

difciplinain»! a3,Efpera todo o

poder Glandes, Scenveíle; .Bi

fliercès,qjie elRey lhe faz. iium.

137. ;t5.'kíf:;

Capítmas , em que os Reys
de Portugatdevidiraõ a coftado
BrafiLlív. i .n. 1 2. Quãtas faò da
Coroa, quantas de fenhores. n.

■■. Hapkms^^ homens nobres, ^
feguem a João Fernandes Viei-
ra na emprèfa da liberdade; & o
íiumero dâ gente popular Jiv. 5».

^4|';/|^|,^quf.|ejachaõ naoçj-

caziaõ

Captrãfs^Quc nas Salinas et
peraõ O ím migo, 8^ odc4)arà-
táón.ií^.

Cabuãeí^Q{]e vaõ em focorro
do Rio Grande liv.y.n^^ .

Cj//)iVfí, Que duas vezes ven-
cem, & desbaratáó a Sifgifimrn-
do-qi3aes, & quantos' foraã irv.

Copkães , Q^ie fe acháraô «â
primeira batalha dos Guarara^
pes.ltv.^.Ti.^^. '.-

Capitães, Qiie fé adiátaé na
iegunda batalha dos G«araía-
<pes.n.8r. .' •'

O Qapi€a@ Oíandcs qne veai -á
■«íiterrar os íeus mortos aoaGuar
rârapesj& pratica, que tem com
o Sargéto Mdyor A.ntOHÍoDias
Cardozo.Iiv.^.t4.8/}.. O q mais
pa-íia.u.85.&c* ■;/■•■•,. í '.-.•.
^ Vários Tarion ê^héúé^At^rtci^
Se com hdi efquadra , o que ísz
íios Engenhos da ^akiíiXiy.^.^

• (^(ttalunha levartí!ada,Ícdèfo-
èediente a feii ReyJiv. 5 .n. 1 2.
<■ €jp'Uu}atnes^ Com que £e efí*-
<tfega o Arrecife,& todas asFa&
íalezas do domínio Oládès. liví

Ca^o w«j»íi9 particui-ar ^ueeedi-
jdo a hum foldado noíTo . iiv, 3.

:dera-da povoação deS.Louren^
^ço.liv, 3,, n . § 3 . Sendo hum dos

Cl

Conçelheiros do *^íécmô ¥o
Âitccifc.n. 86.Rendidoporhu
íòidado, lhe íogç por efigano.ii
S^.Tem certas noticias da che-
gada áe Dom Lii is de Roxas j o
que faz.num. 1 06 .Sahe da Pará^
poeira, para í^ ertcorporâf com
Siígifmúdo.ií.ioS.Acha-fecor-^
tado da nofla gent e.n . 109, Dg
vencido o faz nofla dcígraça v i-
e^orioro.Ti. i io. V}â:orioíò,&
affoffibradoíe refira para oícii
ailojamcn,l;0.n.i 12^

wmdo^ V^encidos por Manoel
Dias de Arídráda.ii-v.3; tt^^^^
Sahe ao encontro ao éaíAâraõ^
o.que fu<ícèdej*i . . í 43 vLar ga %
Fortaleza da Parapoeira, & íe
Êètir^ deígoítado.m i 25.
■:■ ;OCapUaÕ>Omfl'oPão de^nrroi^
Socorre a Sifijihaem, porqifô
(^pdém3'& com qae foeçeíro. liv*

'■' Chrijlovãd Lks, Acelama aS
beAde-no Porto do Calvo,^
de^bamtâ àoíDbndes cuj hm
eínbofcadâ.U v.6.â.9!2 . Poécet^^
eoi Fori^lezs do Iniimgo ; a^
j^rto^em que à p oem.n .-94^
- '-^újíjud~tiit-eiCar.dt3^o,V2tj cotfl
ÊmbaixadaaoAf recife , fobre
'quej^í oqiie pa-ííà .íiv.y.n.a 2.
De volta acha no caminho liua
earta3 0'queGon(tinha.n4 24*
■ Ú Comendor da Fortaleza do$
^Jffo^ados perde hum fo corra,
quelevava por niar,para os feus..
O002 liv*

Í)ona Qar^y mulher de Dom

António Phelipe Gamarão tnó-

tada em hitm Gavalloy& araiada

o acompanha em km. hata&a.

■iiv.^.n. 127. ■'•i^^jn-^ç.Y ■

Ciram Florim , Gomeíidor da
Fortaleza do Porto do Calvo a
f fítrega a partido Jiv.6.n .9 $ .
, rCompaiihia; do Comercio Gè*
:;fal deípede de Lisboa a pri*
Éfi€ÍrafrotaJiv.9,n.88.

(Concelho; o de^ortugd, Em Mâ-
árid cõnrulta a dRey , paraa
armadajque avia de recuperar o
Brafil , ao Conde de Linhares,
pntrega o baftaõ de General
w Conde .daiEíarrc,Jiy..2^niMi,

!EOí?'f í",h'l-ír!*

.vj.-f j<.*ri ijf-j

.,,2..^,,.

í? GíM^ííí/of da Fortaleza da
parreta^vé cativa fua-mulher, o
■^uefez.liv.9.n.95/ 'í^* >■%
p^f O Conde de íBanholo l^mi^
jíntonk Vicencio Sam 'PhlichCf
diega ao A?rrayal em &corro
iibfíb j& íè apofenta ieiá rancho
|>^articular cõ m íeus^^ Italíaaos^
íiv, 3 . n 1 3;^ . T raVa :còím[pa^
dencia com o Framefígpwà* ^4.
^Aprefta-fe pararítiar a Forta^
leza de Orange na Ilha de Ita-
ínaracá, o q lli fucct^devU^t^
42.ETnpede aos. Port-ugiiezes <9
aicançe^que queriaõ dar ao; Im*-
inigo -na oecaztáo de Pernam--
Morim. n. 47. Vay em focorro
da Paraiba,em qóe forma.n.72.
Deixa os moradores ^ntregJips

á vota de do Inimigo^ S^iàqwea^-
da a Cidade íè VQÍta4i.7 3V&74
Cte^a âo Porto d<> Calvo , órq;
nellè lhe fuccede.n.95.C€)m íta.
tetjírad^deixanasfmáo^ doFra-
meiígoa Villa, 8c aviâ:oria.iii
9?9 : ElRey de CafteHa o no-
meoii, (Sôveirriador das anuas.
Iiv> 9>ílUlá« 14. Manda a Ma-
noel Dias de Andrada reba-
ter aseorrerias do Inímig0,&
levanta húa Fortalessa no Por-
to do Calvo.n. i j 5 . Manda tal-
lar a campanha do Inimigo . n.
* 1 6,M^da áfíolar t^do > o^í^ê
he dos índios rebeldes ,rn, 122,
Maadaikftruir a campanha do
iiio Grande , n. 1^4. Prepara-fe
para rebater ao Conde de Naí-
faij, n. 1 56. Manda por o fogo
i Villa do Porto do CalvQ, por-
que rezão, & offerece bataJha
ao Coiádede Nãflan, o que íuc-
cede. n * 1 2.S. Foge vergorihofa*
mente J3.i^}i» Nao pára ,,faãa
dentro da Bahia. n. i33.&i:|4.
0Cmie díMaJfãú 5 chega ao
Arrecife com hua poderoía ar?
«lada d€ Olanda . Vay por mar,
& por terra fobre o Porto do
Caívo;; CG qiacfucçefíb. liv.g.n.
1 25 .Máda fazer húa'grâde For-
taleza Ho Bio de Saõ Francifco,
aoBde chegou em íègoimento
do Conde deBanholo. n.135.
Vay fobre a Cidade da Bahia,
deíembarGa,&:aiarcha, com que
n, 1 3 4. & 13 5. Põem
cerco

<5èrto d Cidade, afíaitado muy-
■^tas vezes dos cercados . n . í 56.
•Sat€ a Cidade, & manda embai-
xada ao Governador dellajare-
f)ofta, q leva. n. 1 57. Caftigado
dos fitiados fe retira, & fogepa-
á-a o Arrecife ; em que forma. n.
€ 3 8. Por efpias dobles fabra tu-
*áo, o que o Còde da Torre paf-
áavanaBahia.n.i43.Hum, &
filtro fepreparaõ para batalha
naval.n.144. Fica vencedor o
Olandès, & o de NaíTau manda
enforcar algús Cabos feos j por-
que.n. 1 45 . Manda dar as boas
vindas ao Vizo-Rey do Eftado
Dom JorgeMafcarenhas.n. 15^
'Concede,& nega afmas aos mo-
rador^s^com que intento, liv. 5 .
H.S.Recebea nova da Acclama-
^áo do Reyno com grande al-
voroço.n.ij.Mãda fixar qnar>
teis de feftas.n. 1 8. Mãda dar os
^zames ao Marquez de MȐc-
Alvão pella privação do go ver-
no, & os parabéns aos novos
Governadores, & o^ue pede.ti.
1 ^.Pretexto, com que defculpa
-•afíèntar tregoas cótra noíTas cò-
Veniencias , & manda varias -ef-
quadras a entreprefarem vartos
portos das conquiftas de Portu-
gal .n. 2 o. Sete muyto o tratallo,
António Telles da Sylva Go-
vernador do Eftado,por Senho-
ria. n.2 5 .Limitaõ-lheos da Co-
panhia o ordenado, n. 25. Sahe
com húa vil inve^iva para zj(\-

tar dinheiro , -Sc íè defpede dò
Arreei fe.n.2 9. .y

Companhia Occidental deOian»
da, quando teve principio.liv. i

£òmp//w /á«rí-,com outro Fra-
mengo nos entregaõ ao Olan'
dèsportrayção.liv.2.n.i2.

Hum foYonel O lande s ^ chega
^ Arrecife com as náos derro-
tadas da armada antecedente.
liv.9.n.47. O que lhe fuccede.
n.48.&:a.^'. ■•- .-ui^v, ]

JSiC(>fme^S.Í>amaÕ^2àx6ú-
ros da Villa delguaraçu ^ porq
cauza.li V. i .n. 1 5. A fcu favor fe
atribulo o alimento da Ghriftã-
dade naquellas partes.n. 20. As
portas de foa hermida fe abri-
raSporfiem âoccaziáo dekia
batalha.liv.é.n.92.

O Çaf>ít/ío Qofinf de (jofiío, H^
Víà a Capitanea de Dom Anto-
nto de Oquendo j com que re-
folttçáo,& perigo. li v. 3 . n . 3 o.
' O CitffitaÕ Cofme do ^J^e^o , fica
*êt fintinclla no Engenho do
Covas.liv.6.n.5. O Inimigo o
aíTaita, & defaloja. n. 6.

€««Wj Povoação aíTolada
pelloO landès.liv.6.n. 1 4.Def^
truida,&abrafada por Henrique
Dias. liv. 8. n.44.

D

D.

sAUOK, Capitão dos

engenheiros , acoiifclha ,

Ooo 3 que

x|uç fe raiii£ a Fortaleza 4e AV
tenar.liv.!0.n.2^,. i - ,;jj.:
^.. 2)í/y^ííZí/aí par^ o,aji)Aaii)enta
^a^-capitiilaçoés , ^!5<(^U£ fteo-
trega o Arrecife.liv.i o.n.|5 .Q

píj^ li V .9. II, , =1,8. E.do exei^ci to
Olandès* a, ^i ?j., ,E íaB3l>em íie>
e,5cexcko PArtuguez4i.54.

^í?/J?í^"í3í ida primeira baí;a|l3a

dos Guararapes.liv.9.ií.3é,D.qf

|)ojcíS)& perda jd^^^agák pufra

gente da %UBda J3^a|l|^^|^

,X3uaj-aEapes^ .7 8..t .í^-w-ípi-^?' *ísí'

piogo íCdrWáo apejída a li-
bex'dade eaa G^y ai>a.'U v jS.mB^.

Í)iogo Luu de,Q'Uy/ira Gó^eri
mdoy.doEUado^çm. avizo da ar-
mada, que o OJandès fax cm O-
landa para conquiâar o Brafit
li\í.a.;ii; a.EortiíicaaJ^alíáaa :&ç
mãd aibí tiíicaraVili^fÍê::]|*pnã-
bucQ-n.^jJSáanda ||a|a|Qf^

a Peraambiaço.B.i^^ - .^ « i^f j C i ,

Z)/o^í) ?<?^í afíiftc cgmiiíeb a

fc>xtiôcaj^ag^(|e PerfíaniLlf gpjliv,

; Dom Tíiogõ ^mhéro Camâme
leva hum focprxp á Paraiba, Bç.
aoPvioGrande.IiVi6.num.142.
Rende hua ca«â forte , & ganha
a Fortaleza da Barreta.li v. i o,n.

0 Capitão p^Qjnmgos 2)i0.íúii£

■- ood' "^

, 3|.:$í,H^ tijiiiP 4GS!priiíH;kos,iqu«

, Jiv^^ .11.8x3.0 Çpíide. 4e NafíSi
.,e çftim a5'& .Ama dpr 4e A r a« j%
,9 faz Capiííãí? .<íe tóa cõpaiithi^*
j!i,.§ i^Ai'ma |.fta pompanhia C9
açma% que toma ao Ojandès^íi^
8;it..yay Í10 alcance, do Fr amç%
ígoJiv.'6.n.44rMafeI]a pasrá%
Jl^i^geinho :àçiy&m Anna Psici^
11.5 í , Atr^v^ffadí? de Ma jjai^
^JVr^n.j^o. , •,,f,,^Híf
r ' .Mõmhigos,, Fnnm^^^ QaUhí^í^
paííapara olaimigp.Ii v,. 3 .0^344
M^rj e ejiforçad^^ ^íquaríeia»-
dpnp poxt,0-.doiÇa!vp*ii^ lés*

. r : o Câ^tcté T)ômípjg-!s í'€frma44

dofla .peiHÍe-g vida pella pati;ii

Bos Guajar^p€S.Jà.v.9.íJ.,3 í . ^

^Ç-Ça0t,ão^mm^&sF4rmr4€0

dès.jív.7;. n^5 . J^a-Ilie gadps^,
-^ cavallps ded^ítr-o das ^diÇâf
4âs de fu,aí í;-prt,ateas. law^p,*; ^vj^

^á«'o {/i^V^/ jiaaíidatexpjor oSaníÇr
ri^Bo dçni ípdasas freguefias dg
fiia juíi&diiçãpjiem ac^áo dcgrat

,ças.Iw.:9.,n,77,

FpKtalexa de Alienar a deíendql
Ji V. i a.:n„ 2ij. Rende <a Fmtakz*
a^3ttiid.aBi^;:|-7^ ,

■T^uart-e Coelio dn ^Ih^mcfuf
cpjiqiiifi-a ,a Çapi taíiíadeteíil^,

bucoj

D

buGO, edifica a Villa de Iguara •
çú. liv. f.rí, i^. Como Senhor
Donatário íe máda aíTiftir á re-
cuperação de Pernambuco. liv.
5.num.2 3. Defembarca no Rio
Grande,com focorro, & fe aloja
comfeu Irmão Mathias deAI-
buquer<jue.n.32.

E.

ELOGIOS merecidos de
Cabos,&: foldados nas ba-
talhas das Tabocas, & de Dona
Anna Paes.liv.6.nuni.32.& 5 1 .
Naó menos divídos a todos,nas
batalhas dos Guararapes . liv. 9.

Í1.37.& 69. .^..r.,1, -..

' Engenhos de ííç«cá>^J tjtiantos
ouve na Bahia, & Pernambuco.
liv.i.n.20.

EfcraVosíXowhdiõ afeusfenho-
res,& aos Olandefes j porq cau-
2aj&: avizão a Mathias de Albu-
querque de eftarem osFramen-
gos borrachos.liv.i.n. 22.

Efpêrança he o afFeâ:o ttiais
impaciente.li V . I o.n. I .

EHancm^ com que os Pòf tu-
'guezes cingem as Fortalezas do
Framengo.liv.3.n.i 2.

Eflancia do Capitão Eftevão
>AÍveres.Hv.3.n.i2.

O Capitão EfteVão de TaVora
<x)mdoze íbldados rebate qua-
ítrocentosOlandefes.liv.3.n.54.
Foy o primeiro,que fobio o Re-
duto do Inimigo em Nazareth.
«1.59.

O Capitão EUeVão Fernandes
pica o Inimigo com valor, &
difciplina. liv. 9.n. 66. Acompa-
nhado de outros rompe hum cf-
quadráo inimigo, n.7 1 .

F^flrangeiroi^os que militavão
entre osPortueuezes tratão de
os entregar ao Inimigo; a forma
em que o determináo fazer. liv.
7.n.8.Como, & quãdo o execu^
tão.n. I o.Duas companhias del-
les fe paíTaò para o Arrecife^cõ
queengano.n.15.

O Exercito ^oHugue^ marcha-
pára os Guararapes j có que po-^
der,& forma.liv.9.num.8.E dos
Guararapes para o ArrayaL n.
4o.Marcha fegunda vez para 05
Guararapes. n. 62. Seu alojamé-
to,em que parte, & como.n,63,-
Segue o parecer de Joaó Ferná-
des Vieira.num.ó^.Marcha dos
Guararapes para o Arrayal. n.

83- ■^, , ■'■':■ ■■/■■

O Eiercitò Úfkndès íahe da
Arrecife; cõ que marcha , & po-^
der.liv. 9 .n. 6 . Foge para o Ar-
recife.n.33.&4i:.

^Extrkoês ; que padecem os
moradores no faço da Villa de
Òliiida.liv.2.n.2i.

F.

FElTlCEY^A^rafirúna
promete deftruir os Portu-
guezes.liv.7.n.52. Morre atra-
VeíTada de duasballas.n.5 3.

Fe

F.

Fertãos , os que ouve na pri-
meiria batalha dos Guararapes.
liv.9:n.36.&na 2. n.78.

'Dom Fernando 4^ ^tba-A^uero
\'ay em focorro da Paraíba. liv,
3 .13.7 2 .Rompe pello efquadraõ
inimigo.n. 99.

Fernno ^drigttes Bulhões mor-
j€ enforcado pello Framengo»
' liv..6.n.9a.
■ ' Fot tale%a^ a que çbamâo da
terra em Pernambuco, fe defen-
de a hum aíralto,que o Framen-
go lhe dá.liv.2.n.24.0 Inimigo
a cerca.n.a 5 . Réde-fe a partido.

. - Furtale^a do Arrayal , edifica-
da por Mathias de Albuquer-
que . Iív.3.n.5.0 Inimigo a cer-
ca5Com quefucçefíb.D.89. 0 q
padecem os fitiados.n^ço. Ren-^
á^-í^ ao Inimigo 5 com ;quepar^

tidos.n.9 1. ' ^' ' r^<í : ■ ^r'-^-
Fortale^a do hom lesVSiÇua. po*
vòaçaò fe edifica.liv.5. n. 115.
Dá a primeira falva 5 & paíTa-fe
para a fombra delia o noíTo e-
xercito.liv.7.n.36.
; -^ Fortaleza ^que ch<ima\úo da Ba-
taria fe edifica , com que induf*
tria.liv.8.n.56.Pello dano, pel^
Ias chamas,& pello medo a def-
cobriraõ os Olandefes.n.37.

1 O Qapitão Franáfco Barreiras
toma hum barco dos Inimigos.
liv.6.n.72.Peleja com o Framê-
go. liv.8 .n. 1 7. Vence o Oládès
110 Rio de Saó FrãcifcOjSc mor-

F;^.

'^ "í^ ^^

renoGòftíli<f^o.liv.9.n. 102.

Franáfco de Abreu Lnboa re-^
bate o Inimigo , com que valor.
liv.B.n.io.

FrancifcoBarreto de Memxfíi
ElReyonomea Meílre de Gã-
po General dacãpanhadePer-
nambuco.Iiv.B.n. 45.Nâ altura
daParaiba peleja com húa ar-
mada Olandeí^ , & vayprifío-
nciro para o Arrecife,donde fo-
ge para o noílb Arrayal. n. 45.
Por ordem do Governador da
Eflado foy obedecido na cam-
panha.liv.9.n.2. Sua grande ca-
paçidade5& modeftia vence to-
das as repugnancias.n-, 3. ChamaL
a cõçelhojSc para as difpofiçoés
da guerra fogeita íèu parecer aos
da experiencia.n.9. Segue o mir
Ihor parecer . Acoftando-fe aos,
mais votos.n. i o. & 1 1 . Com ar
vizo de que o Framengo mari'
cha para os Guararapes, difpoé
o feguillo.n, 1 3 .Manda marchai^
o exercito em feguimento do
Framengojcom que ordem, por
der,&forma.n. 1 4. Na vereda da
marcha fegue o parecer de João
Fernandes Vieira.n. 16* Manda
erpiar,& picar o Inimigo , porq
gente,& com que ordem. n. 20.
Com alegre rofto anima, & dif-
poem os feus^, para a batalha, n.
24.Aírenta com os feus Cabos
a forma da batalha , & conftrã-
gido da rezão,não entra no con-
fli(fio.n.24. Comprehençíiõ,cõ

que

^B"

quefocorreatodas as partes da
batalha.n.29.Manda ao Gover-
nador do Eftado as novas davi-
â:oria,& algúas bãdeiras ganha-
das no combate, n. 59. Marcha
do Engenho novo para o Arra-
yal, porque cauza.n.4:>.Aírenta
em concelho, queíe recupere a
Villade OHnda.n. 43. Alivia os
gaftos do Arrayal , em que for-
ma.n. 5 5. Com vigilante cuida-
do fe prepara para dar a fegun-
da batalha ao Inimigo. n. 6 1 . &
6 2. Tê avizo da marcha do Ini-
migo para osGuararapes, &o
fcgue.Com que forma,& gente,

6 como fealoja.n. 6 3. Máda re-
conhecer o Inimigo,& o que re-
folve. n. 66. Como difpoem a
batalha.n. 67. 0 muy to , q obra
eom o juizo, & com o braço . n.

7 5 .Gu ve a hum Capitão Olan-
Qcs^Sc o confunde.n.8 5 . Para o
défenganar chama ajoaõ Fer-
nandes Vieira, n. 86. Manda ao
RiodeSaò Francífco aoSargê-
to Mayor AntonioDias Cardo-

-'2o.n.92. Manda aíToIar a cam^
panha do Rio Grande; porquê,
&porque.n.95. Manda provo-
car o Inimigo, n. 98. Segunda
vez manda talar a campanha do
Rio Grande , com que motivo,
& com que gente.n. 1 00. Refor-
ma a Eftancia do Aguiar de Ca-
bo,& de guarniçaõjporque caii-
2a.n, I o I . Recebe o parecer de
Joaó Fernandes Vieirajqueper-

F.

faade a conquifta do Arrecife,
liv. I o.n.4. & 5 . Propõem o ne-
gocio em concelho, como, 8c a
quem,n.6.ConcIue com os Ca-
bos a emprefa.n. 10. Recebe o
primeiroavizo da Frota Portu-
gueza.n.i i. O que faz á viftada
Frota.n. 12. Manda vifitar os
Cabos da armada, & os efpera,
&agafalha pedindo-lhes ajuda
para a conquifta do Arrecife. n.
1 4. Com o parecer de todos os
Cabos fe difpoem a emprefan.
1 6. Aííifte ás conduções dos a-
prefl:os,&dá principio ao cerco
da primeira Fortaleza n. 18 &
1 9. Muda feu quartel para a ba-
taria da Fortaleza de Altenar.
n. 26. Ouve hum Enviado do
Olãdès, fobre que, & o que ref-
ponde.n. 34. Para as condições
da entrega do Arrecife nomea o
dia, lugar, & GomiíTarios. n. 35*
Manda tomar poíTe doArrecí-
fe,& de todas íuas Praças.n. 4 1 .
&c Das Capitanias adjacentes
manda tomar entrega.n.45 .Faz
avizo a Sua Mageftade de tudo
ofuccedido.n.47.

O Cafttão Francífco 'Berenguer
de Andrada fogro , & cõpanhei-
rodejoaõ Fernandes Vieira.liv.
5.n.63.Foy eleyto para ir á cor-
te de Lisboa, o que lhe fuccede.
liv.j.n. 34. Acompanhado de
outros Capitãà;s rebate , & reti-
ra ao Olandès, aonde, como, Sc
quando.n.83. Socorre a Henri-
Ppp que

■ p^

que E^ias, em quç par te,^ CQ^Oi

qu eeííçy to Ji v . 9 ,n .^^S^nEiej^^te^

draóOJandè;^*íi.7íi,^^-i g^jj^gH |
Francifio deBd%^^éyé^Mr^
ínijrante da Ff Qtaji^i^.^. 10.
.. : iFrmcifco C4rdo^,^0i(imte
guia a noffa vangtiarda paf^ naô
ftr içt^id^di^Inijiiiigp^feY ^6.ti.

O OpirãoFrãcifco(^^^
rador na, Paraíba íèrve aos vezii-
ríhos com hum l?gii|^íTíJ(Blli(^

Cardoso momjmm^^^m áè

Paraiba.liv.y.n.^^. '

O Padre Prarí^ijco Ferros mor-
re a tormentos confefíandò a Fe

Catli<>Uea4i%4 1^."5 ^ . r^;^
^l FrtíPiffiõ GodmM h€)metíí nè--

Vre Gódenado á|^i^pJte|>ib
tnengo.liv.6. n« 4i ' i!, "f
► : : Q Qtp^ítao^r^cffyGiímgs Mji'_

ba peílo Mefo e de (Jgfjappjoá^
Fernandes Vieira.liv.é,:^u^i|^^§
Sua valentia , ScfiM ÍQffjpíll -n^
9 o. Acode aoconH^^liifiÉíf?
cedeo na praya do Ar1:ecif|,||i.
8vn.^í::ío::í '^.^tí^m'%h\ ,'^^ti4'-i'%x^ '■''■••
, Fr-á^à0^Jd0lMi^0!0PiééM^^
âe Campo i^^i^çm^m fe tèrçp
de íbcorro a Peiríí^níibwcí)iU^f!,

11.5 1 . Rompe j&4eftr<íç^^W
cfqii ad r aõ ^que cy^kndès t i nlia
de referva. num. 7 2 .Contradiz á
propoíla deieeõnquitol^Â*^

"'Xi

Fr

r€ci%çpi^q^|:çzo|s*|Hv. I p ^
;?,lj^ic^^e|i|r^g;s| de aígúf s Pra-^

2asdiftantes.n.45.

4:ça^gçi|ia 4o^Í9p^|E|4ç^liiifi.
j .niím^5 4* Eiper^plni^igo de
emboícada , íem efifeyto . q. 6 3,
JEnganapíè com os intçntos dê
Siígifinundpjivp 8^11^ í^çPecca
de cpn£iadp 5 ^ fyh% 4 ofengs-
çaõ de Qçibp^ a.fj ^i^emedea ó

|^^% f^gi^jbiía ]anc;Jia -apjFra*
íneng9;0^^va|^ç^ çâíli
cias .liv.j.n.Ss. >
;^^ :0:ptftt^o.J^íancifco^4^ Matos
^Uèiii\a alguas lanchais do Fra^
mengo debaixo daFortaleza d^

■y^'-\rsi

Cachada corá doze honjêstáj^pr»
4a^|^*;^ç4^ Olandeía , tócom
:<|i|.atra§QHTtp3nheiros a entr|ij&
l^p<^e.liy*7 jji;^^ i Ponderaríe a
éftranhefa defta facçaõ. n. 78,
.^;^£ap^ Fr^ájco Monteiro
^^e^erf4,CGttjete com ouzadia, o

n^a^. - • ,. ' ■ '■«■■ •: ^

Frm^0^^m^ ÇapíttíÕ de def-
ço^r^r o campp£^r&^& lhe íuc-
cede na marcha das Tabocas pa*
fa p EngçiÉP^ ^è Dona Anna

íiellà

m

neíh inimiga; com qne forte. n.
53. Em companhia de outros
desbarata o Inimigo. li v. 7. n.

■ ' 'Otâf^tdò^Francifco ^elto, ou
^btllinho mata hum Olandès a-
pertado entr^ os braços.liv.3.n.
1 5 . E já Meftre de Campo re-
frea a ouzadia Olandefa no Rio
deSaó Frácirco.liv.8.n.i7.Cõ-
tradiz a opinião doGovernador
Geral do Eftado , em que mate-
ria,&em queforma.n.2 6.Parte
defconfiado a cometer por obe-
diência hua temeridade,& mor-
re na emprefa atraveflàdo de
húa baila. n. 28. Pondera-fe a
perda.n.29.

' O ^judãte Francíjcô^odrtgues
com duas canoas rede hum bar-
co longo.liv.6.n. 1 00.
^' O QapttãiFranàfco Serrano go-
verna' a Fortaleza do Arrayal,
& a defende com perda do Ini-
ínigo.liv.^.n.^. ' '

Francifco de Fafconçellorí lléVa
hum focorro do Reyno, &fe
perde por defgraça.liv. 3. num.

o CapiíúÕ ^Õ Francifce dè Sou-
^a efpia o Porto do Calvo, a q
íim5& com que fucçeífo.liv. 3.11.
107.

^om Fradtcjue de Toledo vay
reftaurar aBahia.Iiv . i. num.

Franctfco de la Tours Francês
fidcliíTimo á na jaó Portugueza.

Iív.6.n. 43. Recebe pateritè'dè
Sargento Mayor dehum terço
de Eftrangeiros. n. 1 07. Paííà-íe
á Bahiaja rezáo porque,& lá cõ^
tiniia no pon:o.liv.7.n. 1 7.

O QapitaÕ Francifco TaVaref
defampara a dcféfa do Rio Do-
çejComOj& porque.h v .2 .n. 1 6*

Frederico 'Èrander^burg deita
gente no Páo Amarello.liv.2.n.
8.Defembarcando nelle fe for-
ma, & marcha para Pernãbuco.
Iiv.2.n.i4.&c.

2)otn Fradique mete em o nof*
fo Arrayal hú focorro, que traz
daBahia.Iív.3.n.ó6.

ií.h'

Oibn£Fblno3 doínomioi r. >

GJ^^S Capitão fáMóc&
duas bailas no aífalto de
hum Reduto do Olandès. li v.7.
n,28.

Gafpar Cadena forma hua cõ-
panhia na acclamaçaô da liber-
dade , que na Paraiba fe fes. li v.
6.n.8^*-v

Gafpar^ Pereira prefo pello
Olandès por inconfidente.liv, 5,

n.73ii''^^^-^^.?í-^^,,>^^í,íi :

GerVítfio Qarpenter confelheí-
rõdoSupremo.liv.3.n.8(5.
V Gentio do 'Brafd^ dizé que não
tem em fua lingoa trez letras,
como fe há de entender. Sua ma-
licia,&inclinaçoés.liv. i.n. 13*

^ ToVoação de Goyana apelida

a liberdade,&: fe levanta cótra o

Ppp 2 Fra-

I

G.

Flamengo . As cabeças da fole-
yaçaó qviaes foraõ. liv- 6. n. 8o.
Çoiiío Deos os \'ivr%j4^s.íXijL€^^

íioGentiO.n.87, ; "^' -: ■;:-';

GoveniãdQYfs do Arrecifa msinr
<3aó retirar a SirMrmundo de fo-
bre a Bahia; o porque, liv, 8.n,
5.0 Dizem-lheascauzas. 11^37.
jíitentaõ enganar os Portugue-
zes , com flias cuftumadas perfí-
dias, n.'5 i . Efcrevem hua carta
aos Cabos Pprtuguezes , o que
conte, n 5 2.& 53 Qne repofta
levão. n.5.^.55 . &c. Sobre o re-
foluto delia formão vários, &
errados juizos n, 60 Trataõfe-
gundavezde fenhorear a cam-
panha.liv.9.num.5 S.Entraõ em
penfamento de nos ganharem a
Fortaleza do BomJesvs,& o Ar-
rayal.n. i o i .Daó obediencia,&
entregaó as Praças a Francifco
Barreto de Menezes . liv. 10. n.

- . (jO\^f!ynadoyes Donatários^ abfo^
Iq tos,Sc infplentes nas_pa|te§ da
Brafíl liv. I . n. 1 8. - -rhh^v
ç Gov^rw^í/orÉ-í nomeados po£
Joaó Fernandes Vieirajpara a^
clamarem a liberdade na Capi-
tânia daParaiba liv.6.n.88.

O Governador Olmáes da Capi-
tania da faraiba aífalta os mora-
dores pormar,& por terra; c;om^
que fucçeífo.liv 6 n 90.& 9 1 ,, ,

Os Governadores da liberdade^-
Joaó Fernandes Vieira , & An-
dré Vidal de Negreiros a.flklt4P,

allha de Itamaracá.li^? 6.1): 12 r é
Retiraó-Í€,em que fqçma , & cõ
que íliççeííb . n. i;2-2..Marcha6;
para a Villa de íguaraçu ; o que
nelJa fazem. n. 1-^5. Desfazem
hua opinião falfa^que o InimigO'
efpalhou.liv.7.n 41 .Sabem por-
fama5& por avizo a nova da vi-
toria do RioGrande alcançada
por Dom António PhelipeCa-
qiaraó.n.43.Cpm novo focorra
lhe ordenáo 3 torne a bufcar à
Inimigo.n. 43. Remedeaó afo-
me,& a fuga dos foldados ; & fa-^
2em queixa ao GovernadorGén
ral do Eftadodos foldados, que
anda vão. na Bahia fogitivos. n^
58.Mãdaó focorro á Povoação
de Saò Lourenço, & fefiejaõ a
nova da viâ:oria,que neUaalcát
çáraó os Portuguez es. n. 66. Re:^
íblvem ganhar a Ilha deltama-
racá;porquerezão.n.72.Coma
nova das armadas Olandeías, Sç
feu poder, fe armão paraad^i
fenfa n. 8 1 . & 84 . O que orde-
mÕ3& difpoem, liv. 8. n. 4. Sof
çpríem a Èftancia do Aguiar,ç5
quefucçeíTo.n.io. Mandaõ lar-
gar a Èftancia daBarreta , porq
cauza^n. 1 3,Spcorrem a fome do
cKemtp; com que difpendio, &:
induftria. n.3a. Chegalhe avizp
da armada, que fe prepara em
Portugal, & p que fobre ella difr
correm.n.35 Levãtaó húa For-
taleza em oppoíiçaó , da que o
Framengo nnj:ia,,Que çjiam.asiô

M

daSeca.l.S.n. gó.ComqindLif-
tna,& com que intento, n.37.
Mandaó aííàltar, & faquear o
PaçodoCondedeNaíraíi.n.38.
Prova fingular de fua lealdade^
&: valor. num. 41. Recebem a
Franciíco Barreto de Menezes
com alvoroço,& rerpeyto.n.45
O que ordenão para a defenfa,
& com que aplicação, & animo.
D. 49. Mandão retirar a gente da
Várzea , & de alguns prezidios
para o Arrayal j & com que nu^
mero de gente fe achaó.n.50.
Formaõ a gente para feguirem ò
Inimigo.liv.p.n.S.

(5«<7>'<.}r<ij ganhadas pello Go-
vernador dos Minas Henrique
Dias em que forma.Iiv. 8.11.45.
. Guararapes motesy fua diícripr!
çaõ.liv. (p.n. 16. 8c 17. Em que
parte delles íè alojou o noííb e-
xercito.n. 18.

Gutlhelme P^andreVet y^y por
Embaixador á Bahia.liv.5 .n.5 2.

Graç^^quc fe daò a Deos em
todo o Eftado pellas viâ:orias
alcançadas.Iiv. i o.n.30.

H. .

OM^ Henrique Infante de
' 'Portugal^quem foy , aonde
viveo.liv. I .num.3.Foy Author
dos primeiros defcobrimentos
de noíTas conquiftas.n.4.

Eí^ey Dom Henrique de (Por-
tugal ^{hã morte ^ 8c osefFeytos
della.liv. i.n.2r.

H.

Henrique Dia^ : Matbiasde
Albuquerque o fes Capitão de
todos os Negros.liv.3 . n. 8. De
liúa embofcada aíTalta os Olá-
defesj&os rompe, & desbara-
ta, num . 6j . Proeza fua muy-
to fingular. num . 129. Vay a
infeftar a campanha de Pernam'
buço. n. i54.0quencllaobr3.
n.i56.Chegaápreséçade ]oa5
Fernandes Vieira.Iiv.6.num.44.
Fica ferido na batalha do Engje-
nho de Dona Anna Paes. n. 60,
Dafe-Ihe aEftancia de Joaó
Velho Barreto.n. 1 1 4. Faz com
os feus foldados a fefta do Rofa-
rio,&o quefuccede.liv.j.n. 2,v
Succede-lhé hua bõa occaziáo
em dano do Olandès.n, 1 9.T0-
mahum comboy ao Inimigo n:
ao.Deftrofa húa partida de O-**'
^ IandeíeSjComo,aonde, & quan-
do.n.38. Desbarata hum groíTo
do Inimigo,que intentava roçar
o mato.n.39. Os feus fe retirao
faltos de pólvora, & animados,
voltaõ ao combate.n.39 . AíTal-
. ta,ganha,&arrafa hum Reduto-
dolnimigo.n.44. Cófóosfeus
Negros o torna a ganhar, n.40.
Seus foldados lhe não confentê,
quearrifque fua peíToa. n. 47.
Refpondealiúaficçaõ Olande-
fa.n.6o. Vay tallar a campanha
do Rio Grande, quando , & cõ
que gente. liv.S.n. 42. Admirá-
vel vaIor,& ouzadia de feus fol-
dados.n.43.Das. Guarairaspaf-
Ppp 3 fa

k

1^.

cãçaõ;còm que circunftancias.n.
44 . Refponde a húa carta dos
-Óianderes.n.5 9. Reprime o or-
gulhojcom q o Inimigo ganha
terra.liv.^.n. 28. Retira-fecom
dirciplina,& v alor , & fe encor-
póracom o exercito.fí. 30. C5
o fcu terço fe acha na entrepre*
fa da Villade Ohnda.n.45. Ca-
iliga a altiveza de hum Coro-
nel Olandès^de que forte, & fo-
corndo das Eftancias vez i nhãs,
Si do Arrayal,o acaba de desba-
ratar.n. 48. Seus Negror não Ta-
biaodar quarteja Olaníiès al^

,-,«*£í^';í' >>s .^-j

gum.n.50.

Henrique JFítírGéétíètáVdzs
árôiàs OíandeMVây fóbrelpo-
juca5Como,& porque .li v. 5 . n.
85, Afíalta a Povòaçáo,& o q
nella fa7.Iiv.6. n. 3 . Choca com
Amador de Araujo^Sí lhe fegue
oalcançe. n. 4. Marcha em de^
manda de Joaó Fernandes Vieb
ra.n. 1 9. Chega ao Ri^Tapicu-
tÁ]o que lhe íuccedeMs?íÍ^^efíe
aflaltado de noíTas emboítadás,
que o deíàtinão.n;íè3^# â4.Co-
mete a batalha,húa^&6Utra vez j
Sc fe retira vencido. n.í5 .& 26.
Perfia,& não melhora de fortu-
na, n . :íi8 , Foge desbaratadòi á,
3 1 .Có perfídia trata as povoà^
çoés cófederadas.n.q 7. Marcha
para o Engenho deDona Anna
Paes:Oquene]lefaz.n.38.Mã-
da prender todas as mulheres

■jíf

in tento.n .49 .Determina paíTar
á cfpada todos os moradores, n,
5ò.Cercado do exerétto1?ôrtlí|
guei íè quer defender èoúfé^
fidia.n.5 5 .Pede quartel, & poí^
quecau za.n.5 ^ -Sahe rendido á
mefcé da vida.n.57. O que paf^
íà com Joaó Fernandes Vieira I'
n. 5 8 .0 qual o manda para aBa»^
hia com os mais rendidos, n.ó^i
De caminho perfuade aos feusj
que entreguem a Fortaleza do
Rio de Saó Franciíço . n. 1 oil
Efcreve aos feus fobre fua li*
berdade.li v.j .n . 2 2 . 0 General
Sifgifmundo o deixa no Arreci-
fe com hum terço de guarniçãoi.
liv.9. n . 6. Acha-fe na primeira
batalha dos Guararapesj&nellá
morre.n.28.

Henrique Telles de Mello a-
mortalha o corpo de Doiii Lui$
de Roxas.liv^3.n.i i 3. s|jí;álod
. H enrtíjueVamol chcg^ àityhv^
féciíe cóni bua podero^ arma*
da.liv.3.n.i25. . , \ ^r^r
' O rlermitão de SârMá Lu^ta
enforcado por Henrique Hus.
liv.6.n.4. JV , -

HjipodtoJlcnfode Fercofafgi^^
ciai no levantamento de Siri-
nhaem.liv.ó.n. 43.
; Hyfloria tem por alma o cona»
putodostempos.liv.3.n.57. '
■•->^ ^' ^' I.

1'JQO'B Eftacourt',hú dos trez
do Concelho Supremo, liv.

3-

^.nuin.S6; Chega ao Arrecife
çpip húaarmada.Iiv. 841.2.
:-c lacobo Olandès de naçãp y çõ
perfidia aflbla o lugar de Cii-
nhaCi.li V. 3 .n .6 5 . Deçe dos mo-
tes Gom os Tapiiyas,para afíblar
^ Goyana,& a Paraíba, liv. 6. n.
Sé.&S/. Trata de enganares
Portuguezes no Rio Grande.n.
-1 29.Furtivamente os afíàlta, &
fe retira vencido.n. 1 30. Segu-
da,& terceira vez os comete , cõ
o mefmo fucçefíb. n. 1 3 1. Com
falfas promeflas, & fingidas ç^h
pitulaçoêsosganha.n.i 32. v
•1 lans Qorndifent LiHar zxúmz
SOS feqs foldados naoccazião do
Porto do Calvo.liv.3.n.98.De^
iembarea em Ipojucay& carrega
.■de mantimentos j com qu^ iridiJL*-
ílriaj&prefla.liv.j.n.^é. ' J
í iacòme^e^erra Sargento Ma-
^or efpera ao Olandès, 4? eiur
4)oícada.liv.9.n.93. / > *
i: pona leronyma de almeida mã-
jda huni rçftefço ^^^ ff hl marido.

lÍV.7.n.22. a:~i n - ,.;,.

t ; O Capitão leronymo 4a 'Sylht
'cm hum encontro carrega o Ini-
,niigo.Uv.6.n.2 4.Morrededuas
.bailas .n.25.

; leronymo SerraÕ de TayVaC^-
bo de hum focorro, que o Go-
vernador do Eftado manda a
Pernambucojentraem Taman-
daré liv.5.num.4 1 . AíTaltado da
perfidia Olandeíà Te defende a-
-técahir rendido de canfado*n.

^7.

'• leronymo de Cadena^ hum dos
trez Governadores da Paraihi*
liy.6.n.88. . , ^^:;

leronymo de /nojosa Sargento
Mayor do terço de Francifço.de
FjgueiroaJi V. 9 .n. 5 1 . f

IguaraòFtlUfÇúz. fundação.
liv.2.n. 1 5 . Deftruida pello O-
lanidès.liv.3.n.4o.

O 'Padre Mejlre Frey Ignacio
da ordem do Patriarcha S. Ben-
to vem a Pernambuco , a q ne-
gocio5& com que pretexto, Ji^*
5-n.33.

, Ilha da Madeira feu defcobrí-
menÊo,poyoação,& nomediv. 1.
n.2.&c.

^-yllhado^B^into Soneto vquan-
do5& por qijenÊ^jç 4f!Ícoberta#

' llhadeltamaracâ fe lentra , Èc
ganhá.liv.6.n. 1 1 ó. Por defordé
dos foldados fe perde. ,n* ^í 2 1 .
Segunda vez fe ganha , com que
íuGçeííb.Iiv.7.n,78. -^ ,,^ >,

• /«rfíojjos do Camarão aífaltaõ
,0 Iiiii|itg^ com valor5& dita. liv.

y V; /gfd^Sçherejes coiídenados a
motmmmi efpadajiv. 6. n. 5 7 .
_ : O Infante de Portugal D. Hen"
-rifte-, fe lhe ofFerece hum Pilo-
to Caftelhano, para que. liv. i;
n. 4. Manda defcobrir allhada
,;Madeira.n.5.. 'UiT}r'^\o.iy.^^y '
\r..01nfmte Dom Sancho filho
d)elRey de Aragaõ deixou hum
legadp para refgatp de cativos.

liV.I.n.3. ÍOAO

. loaÕ^me[íe IrmaÕ do Conde

de NaíTaUvíiía vida, Tua morte

en terro5& íepultura li v . 3 .num.

154.&C.

; O^adreloaÕ de Ar anjo afíifte

na batalha das Tabocas : O que

obra.liv.6.n.24.

O Capitão loaÕ (Bârhdho , feu
vaIor5&fortuna.liv.3.n. 129.

O Sítr^entoMayor loao 'BLir^ af-
iai ta ao Capitão Cofme do Re*
gOj&odesbarata.liv.é.n.é Pré-
de algúas mulheres nobres da
Várzea, com que ordem, & para
que fim.n.50. Morre de hum ti-
ro, quando hia rendido para a
Bahia, n 63. : í.:

-n: loão'Bcirl(j^a^ & outros des-
barataõ o Olandès. liv. 7. n. 3.
Vay ao Rio Grande a. que fim»
,Duni.26. Vay conduzir gados ao
Ceará-Morim. num. 33. AíTola
a campanha detenarabuco.liv.
59 .n. 9 5 .Morre no aíTaltó doMi^
Ihou.liv. io.n.31.
' f>omlodo de ^BenaVidesCsho
da Frota de índias perde alguns
navios da prata.Iiy. i .n.27. . r
;- • loão (Boíejlraier Vay aO Rio
Grande,& máda degolar osmor
radores. Iiv.6.n.i33.

loaô Fernandes. Vieira y fua pa--
tria,nacimento,& criaçaõ.liv.i:.
3n.8.& 9,Embarca-fe para o Bra^
fil.n. i o. Soldado debaixo da bá-
deira da nobreza^ feu Capitão
AíFonfo de Albuquerque.liv.2.
n.9. OíFerece-fe a Matinas de

I

[uerque para guarnecer
hua Fortaleza , quando todos a
deíàmpara6:0 pofto , que nella
lhe dá o Capitão António de
Lima. n. 23'. Rebate o Inimigo
do primeiro aíTalto.n. 24.Defe- ,
de-íe do íitío,que o Inimigo lhe
pos.n.íc; . Entregue aForíaleza
a partido, faívou as bandeiras
delPtcy, có notório riíco de fiia
vida.n.27.Recebéo deMathias
de Albuquerque a gineta deCai?
pitão de aíTegurar o campo, liv*
3. n.S.Com que annos5& com q
valor exercita o carg0.num.4H*
Desbarata, acõpanhado de ou-
tros Capitães, os defcobri dores
do Immigo.n. 87. Cativo peíío
Olandès fereígata. n. 92. Nos
trabalhos eftuda a emprefa da
liberdade . liv. 5 . n. lijÇbedece
á fortuna , & emprega a^fua na
utilidade do proxima.n. 2 .& no
ferviço de Deos.n.3. Lanço de
' fua piadade,& largueza.n.4 De
ília benevolência, n.5 . Como fe
dilpoépara a emprefa dalibef?
ídade.n. 6 . Caza com Dona Ma-*
ria Cezar. n. 7. Cauza próxima
para fe refolver a fahir a campo.
n.2 8.Prevençoés,quefaz.n. 30.
•Fia ao ceo a execução de feu in-
tento.n. 31 .Continua nos apre-
ílo5,& em felicitar animos.n. 3 2
-Dá conta aoGovernador do Ed-
itado, a Dom António Phelipe
'Camaraõ,& a Henrique Dias de
feu intentOj& pe de a;u d a .n . 3 4 .

Maa-

Manda^qèatro Toldados áBahia.
n.q/ Dá cota de fua refoluçaõ
ultima.n ^S.Abre-fecóosprin-
cipaes moradores . n.39. O qtíe
rcfulca de fe declarar, n. 4 1 . De
muytos fevétrahido.n. 45. Se-
gunda vez os chama , argíie , &
confunde.n. 49 . Com os Glan-
de fes íe porta diíTimulado, &
prudente.n.5o.Na5 defcanfa de
prevenir o neceíTariojpara a em-
prefa.n.ji .Arepofta, qiiellie
manda o Governador Geraldo
Eftado,& por quem. n 54.Cau-
23S, que oforção afahiracam-
panha • n. 5 5 . Nomea Capitães
por todas as fregueíias do do-
mínio Olandès.n.5 ó.Occazião,
que lhe offereceo a dita, para fe
mal-lograr a trayçáo.n. 57. De-
clara-fe com todos os morado-
res, perfuadindo-os , a que o íi-
guaó.n. 5 8. Todos o acclamaó,
& ;uraó por Governador de fua
liberdade, n. 60 Pello deftruir,
trabalhão os traydores.num.6 1 .
Naõ obedece ao chamado dos
ijovernadores Olandeíès.n.éi.
Põem em cobro fua peíToa , fa-
milia,& bens.n 6 2 . Anda,&dor-
me,de mato, em mato. num. 6 3 .
Chegaó-lhe novas de virem em
feu foccorro o Camarão, & Hé-
rique Dias.n. 64. Faz concelho
no Engenho de Luis Braz Be-

o

2erra.n.69. A géte, que ofegue,
& bandos , que mãda deitar pel-
las fregueíias. n. 70. Manda fi-

xar nos lugares mais puHiè^í
hum edital : A matéria dclle. n.
78. Por outto edital, promete
premio,a quem lhe aprcfcntar a
cabeça de qualquer dos Gover-
nadores do'Arrecife.n. 79.Man-
da tomar ármasía todos osítió-
radores.n. 83 .Marcha para o fí-
tio,que chamâo de Vafco Pirc-sj
8c delle para o de Maciape . lí.
84.& 85, Dá a António Dias
Cardozo patente de feu Sârgé-
toMayor.n.Só.PaíTa para a po-
voação de^Saõ Lourenço, n.87.
Marcha para o Engenho de Ar-
nao de Olanda, Sc defte para o
Engenho de Manoel Fernandes
CovasJiv.5.num.5.0 que nelle
paíra.n.8»'Chama a íi a gente da
Moribeca n. ro.Manda fixar e-
ditaes nas Praças àó Arr-ecife:0
quecontem.n. 1 3. MaTclm-para
o monte dasTabocas.n. 1 5^ei-
lefe fortifica : E reduz humA-
poftata á verdadeira Religião,
n. 17. Sabe, que os traydores o
queré matar. n. 18 Temavizo,
de que o Framengo obufca. n.
1 9. Manda formar os feus , & os
aníma.n. ao Quer entrar na ba-
talha, & os feus o detém, n 22.'
Os feus lhe cftranhaõ a demazia.'
n.24. Faz hiia devota promeífa
á Máy de Deos, Sc retira ao Ini-
migo.n.26, Não confente ,que
lhe figaõ o alcance. n. 2 7 .Mete-
fe no mais pcrigofo do cõbate,
n.-28.Para nova batalha, manda

Qgq

prc-

preparar os fbldadosi' ti. :29vj8e
30. Dà atodps ias çongtatwh^
çoés da Iiberdade.n.5 ji .íManda
foçõrro a Iguaríif íiin i 40. Mar-
cha para ò JEngenko d;e Bakíie-
2ar5QQnçaIvesMo]rça^ji& no de
António Nunes Xituenes rece-
bemos Oo veÊnadór^es de índios,
^ Minas,n.44. ^ay l0bre.apQ^
yoaçaõ de San<3:o Aotonid 4o
Caíl;:|0;O que f«ccede;. ni 45-!&
4^. Manda principiar o cerco á
Fortaleza de Nazareth . n. 47^
Marpiía a bjaícar o Franjengo;
porqge cauza.n.5 i vEreve deíé-
ça,qiLije faz no Engeahí) .de rPe-
àro daiGunha.íJ.^ 2^ ^GomieiJ
çícemplo pafíàõ osfeus-a vao o
Rio Q^pÁmbeiii^miAvi&áiO
Engenho de Djoaa Afina Paes;
& p que ofdenai n; ^j. Manda
in vcfe o Inimigoi 11.54. ^'^^^
càT^as caz^s doEíigfinào.n.^ 5
ísjellas odeterínina queimar.n.
55. Vè diante de fia Henrique
Hus reodido : Q quafe diz. iti
58. Gque ordenaínaqueUe %
tio.nnni.5 9 . Man3a:c^minhars0
exercito para o íeq Eisgenhp 4e
Saó Joaõ; forma em qw0 fe exe?
cuta-nó 3 .Gomo fentií»^ nora
da perfídia de Tamandaréinvé 8
Faz bú pedido aos moradores^
porque cauza : E feíleja q naci-
mento da SenhQra.n^75 .Manda
pagar aos Eftrangeiros, Rendi-
dos na Fortaleza de Nazareth,
os íoldos vencidQs.n.76rEin feu

nomeííie^íikna p^íiêMaEôftalá*
55a dqrBoiitofadqiGalvo.n^95 ^E'-
4ifiGa:hiiactei daMizerieordiac
fiv fi èé .^iReproya &2çm[ei étmm^
Uilç& \dQ Eârangeirosííl ^ i o^.
ErBçura: a conMerçio 4le!a]guns
|udeosín.,i jti . Seu parecer no
modcdeife continuai ja^guerra*
:h^ 1 1 ^.rBoT feuivoto.fe ediácaa
Fojrtaleza dorBom Jesys.n.ii 1 5.
Detecmina efcalar a F?áEtalez«
das GÍ5Bcop0ntas.n . i 1 6 . Gor^
melhor VQtoafíalta , Scfaquea a
IJIia deltamaraçá . n. i.iá. &a
Retira^ej&he o ultimo ie tm-
do^ jique paiTa para a tenra^rmei.
n . a 22 .Manifqfta as f ezoés, que
^í^^epara tomar armas cõtra os
OiandeÍESvn. i sé.Gom qu-e ex*
tremps recebe ia nova do eftra*
godoRioGrande:E o íbcorroj
que aiitec^dentemente tinha
mandadp a aquelles moradores*
í3. í 42 .A cauza de não chegara
|:empo.n. 143. Indicio , porque
fpípeyta hua trayção íiv, 7.11.7*
& 1 5 .Averiguada a trayçãô á
manifefta a Theodofio Eftrater
nuip. j 6 , & 17. Efpera o Inimi-
go de embofcada.n. 20. Manda
por fogo á armada Olandefa, cõ
qm fuGçeírQ.n.24. Manda dous
Enviados ao Reyno.n.94. Gen-
fura húa ordem do Governador
Gèral do Eftado , & primeiro q
todos a executa, num.:^ 5 . Vay a
Nazareth.num.57.VoIta para o
ArrayaLn.jS.Gom fua vifta íe

ani-

r I

animão osfoldados de Héríquc
D)as.n.4o. Aflige ao Framengo
com incanfaveis rebates, n. 44.
Dá liccnça,& munições a Hen-
rique Dias para afiàkar hú Re-
duto.n.^ó.E com repetidos af-
faltos.n.50. OfFerecefTe para fa-
zer hú pedido pellas portas dos
moradores.num.^S.Edificahúa
Força no Porto de Tamandaré.
n. 67. & 68. &c. Replica ahúa
ordem delRey.n.69. Intenta af-
faltar a Ilha de Itamaracá . n. g.
Difpoem a facção 5 como a fe-
gue,&: executa.n 75 . &c. Levá-
ta hua Força no Porto dos Mar-
cos.n.78.Manda faquear a Ilha,
& arrafar a Fortale2a.n.7^. Fef.
teja o dia doBaptifta.n.So.Gha-
111a a concelho fobre a defenfa.
n.8 1 . De ouvir feu nome fe ef-
panta5 os Inimigos, n. 82. Avi-
2aõ- no,que aigús traydores ma-
quinaõ contra fuavida, n. 85.
&c Com trez efpinguardaslhe
atiraõ,& o ferem. n. 87. Sangra-
do fe levanta 5 &foccega o tu-
multo da gente.n.88.Como caf-
tiga os traydores. n . 8 9 . Valor,
comqueenveíle o Inimigo de-
baixo de fuaartelharia. li v. 8,n.
j I. Manda picar o Inimigo por
todas as partes, n . 34. Obedece
a hua ordem do Códe de Villa-
Pouca.Iiv.9. n.3. &c. Pella qual
entregua ogovernoa Francifco
Barreto de Menezes.n. 4. Efco-
Ihe a melhor vereda para a mar-

1

chadoexercito.n.i5.& 16. Na
batalha dosGuararapes rompe

0 Inimigo pella fua parte, & fo-
corre as mais. n.26. Valor com q.
fe oppocm a Sifgifmúdo, & ma-
ta hum Olandès de hum golpe,
n. 29 . Sem Jhe fazer dano oto-
paõ algúas bailas; fullcntando o
mayor pezo da batalha, n. 5 1 ^
Socorre aEftancia deHerique
Dias,íem fruito.n. 48. Aconfe-

1 ha a parte por onde fe há de co-
meter o Inimigo, n. 64 Síó^.
Envefte o Inimigo,& fuftenta o
pezo da batalhajSí manda rom^
per áefpada. n. 68. Temerária
ouzadia , & rifco em que efteve
fua V ida. n.69, Ganha a artelha-
ria dolnimtgo.n.7 1 .&c- Rende
hum efquadraó inimigo com a
vifta.n.79. O Inimigo o té por
morto,& como fe defengana. n.
86. Períliade ao Meftre de Ca-
po General a conquifta do Ar-
recife.Iív.io.n.2.3.&4.Dá as
rezoês para atai conquifta. ni
ç.Perfuade os Cabos da Frota
para acoíiquiíla do Arrecife, n*
1 3 . Por feu parecer fe determi-
na a emprefa . n. 1 4. PeíToalmé-
te reconhece todas as Praças do
Inimigo, n. 1 6. AíTenta bataria,
& dá principio ao cerco da For-
taleza do Rego.n. i 9. Modo, &
forma,em que o faz.n. 20. Re-
bate, &deftroe hum focorro
Olandès.n.2 1 .Cerca a Fortale-
zade Altenar.n. 23 . Aperta os

Qqq 2 ata-

!ii

•ataques da Fortaleza dasCinco-
pontas.ti. 33. Avíza aoMeftre
de Campo General da chama-
da,quefazoInimigo.n.34,T<)-
ma entrega do Arrecife, n., 39.
Defarma a guarnição da Cida-
de Mauriçea, & do meímo mo-
do a do Arrecife . n, 40. Manda
por fua via a nova da reftaura-
çã.o de Pernambuco a Sua Ma-
-geftade.n.47.

O Capitão loão Gonçalves ^ar-
co^ o foy dos defeobrimentos do
Infante D.Henrique. liv. i .n. f.
Aprefenta hum Piloto Cafte-
Iha no ao ínfantp. n , 40. Toma
poíTe da íiha da Madeira.n.^ .&
5. Nome 5 que lhe pos jelRey, &
lhe dá a Capitania da Ilha. n. 7.
Funda a Cidade dq^ Funchal.

O faãre loao Gomes de Aguiar
prefo pellos Olandeíçs, porin-
confidente.liv.^.n. 74^í =.
: loao de Moraes Pil^|g jÇaíJç-
Ihano . Ji V. I .n.2. r ^> «^ ^ =•» -;

^ \^ r ■■'■

o Capitão hão de Matos defêr
de a Fortaleza da Para\ba.hv.3Í
n./i.PaíTado de hua balia pel-
los olhos acaba a yicj^j^y. ó^jp*

l^>.

o;.i=

, loãnne Mendes de Vafcmçellos
foy o primeiro, que na Bahia a-
pelidou ao Seriniffimo Duque
de Bragança por %jf .4ç gQítW-
gal liv.5.n,i4. ; -í -' - i,

hão Lãus, bornéa húa peça,
3i faz em |)çd^QsJi]aíji, trabuco

do Inimigo.Uy.8.n.4p. r

hS^erm^ Cortt'^e4l, Gover-
nador do Cabo-Verde aviza! a
Perp^^íbueo da,3ppâd^,(^lan-
•£lela!i,|jv^2.n.6í r>K ^inutífiÉi ?'

O Qapttão hão ^aehQthalj fe- ,
rido, & morto napQcaíLiãpj.dâs
Tabocas. li v.6, n.a3* ;o .. ,^.-.,

T>om hão Sennijfimo Vuqttede
!^r^9^C(?,aGclamado Rey de Por-
tugal.liv. 5.n. 9. Antecedentes
difpoíiçoés.n. lo^VejDja Alma-
jda^porque rezão^n. J n. Na Ci-
dade da Bahia he acclamado de
todos por feu legitimo Rey.n.
15. Recebe a nova dareftaura-
çáo de Pernambuco, liv» iQ^m»

- El^ey Dom haÕ o Terceiro re-
forma as liberdades dos Capi-
tães Donatários do EfedQvdo
Brafil.liv. I ,n. 18. . u * ■. -

OQapítaÕ haZ de Magalhah
parte do Rio Grade, para o Ai:^
rayaMiv.8.n. 33. Chega ao Âf-

j^ayal cpm a nova. dí^yi^jW^Q
^|Caíiiarão.n.42> '.v.-'. ,<- Vi.i...r^,

âj- O Capitão loaÕ de TontesíocQt'
re a Henrique Dias.Iiv. 8.n. 48.
..:^ ; o ÇaptíaÕ haÕ.JSlmes da Mata
com vinte foldados faz rofto a
t.qdaap4deí Qlaiidès, liy.4.i>.

- 'DomhrgeMafcarenhas Mar-iç
que^ de Monte- jibaÕchQgz á Ba*
hia por Vizo-Rey do Eftado.
liv, 3.n. 154. Manda infefíar a
cam^anh^.^çJP4rnãbuco.n.i ç5

Chega-

Chega-lheanova da acclama-
çáo do Rcy Ho:0 que faz.li v .5 .
Í1.I4.&C. ' ' ' ' '■'

loroeGafmaÕ Governador da
Capitania do Rio Grande per-
tende deftruir os moradores.liv.
é.n. 128. Entra no governo das
armas Olandefas, & fahe do Ar-
recife , & de embofcada nos eí^
pera^no Engenho do PeíToa.liv.

O fadire Frey loaÕ da ^fur-
reiçao Monge Benediâ:ino na
òccaziáo das Tabocas,confeíra,
peleja, & anima. liv. 6. n. 24. &
2 5 .Quem foy, & o muy to, que
obrou .n. 5 5 .& 6 1 .0 que obrou
na entreprefa da Ilha de Itama-
racá.n. 12 4.N0 choque dos Af-
fogados fe excede a íi mefmo.
Iiv.7.n.i2. Anima osfoldados
de Henrique Dias, n. 3^ . Vem
ao Reyno trazer a nova a Sua
Mageftade da Reftauraçâo de
Perna mbuco.liv. i o.n.47.

■ loaõ ^drigues de Fafconçellos
Qonde de Cajlello-M elhor vay por
Governador Gèral doEftado,
&por General da primeira Fro-
ta da Companhia Gèral do Co-
inercio.liv.9.n 88.

■ O QapitaÕ loaõ ^drigues per-
de a vida na primeira batalha
dos Guararapes. liv.9. n.3 1.

O Capitão loaõ Soares de ^Ibu"
merque fe encorpora com João
Fernandes V ieira. liv . 6. n. i o.
Apelida a liberdade em Siri-

I

nhaem. n. 41. Moftra fcu valor,
&ouzadia naoccazião do En-
genho de Dona Anna Paes. n.

55-

O Capitão loaõ Vafcfues morre

atraveíTado de húa baila na oc-
cazião de Pernam-Morim . liv.
3.n.27.

loaõ Fícencio Sao fheltche (/)«-
de de 'Banhollo vay em focorro
doBraril.liv.3.n. 25.

Ipojuca; o que padece. liv. 5.
n. 1 1 9. Apelida a liberdade.liv.
5.n.82.

^onal^h%l Clara Eugenia go-
verna os Eftados de Flandes.liv.
2.n.2.^ -'

SJf .5-J 4 T J

IndmWKireaíègntáÕ, q
fe prendão os amotinados com
João Fernandes Vieira. Iiv.5.n.
61. Em a Povoação de Ipojuca
morrem alguns a ferro.n. 82. 0
que fuccede a trez,que fe toma-
rão em húa lancha. liv.6.n. 1 1 1 .
No Arrecife amotinão o Povo.
liv.7.n.57.

♦ulhdjBÍru v^i-í

tyÍGÒJS^^^rz onde Ma-
thias de Albuquerque fe
determinava retirarjem que par-
te eftaó.liv.^.n. 95.

Legoaí de Cofta , que tem a
Coroa de Portugal na America,
liv. I. ri. II.

Lisboay nella fe ouve a perda

de Pernambuco.liv. 3. num. 2 2.

Qqq 5 Nella

Sfí^

fe trata o remédio :das
quebras do Comercio. li v. 9. n.
56<Como fe remcdea n*. 57. Sa-
he de Lisboa a primeira Frota

àz Companhia.n.8 8ti^ r. 'y'":^:^

Lopo Curado Garro \mm Aos

jrez Governadores da Paraíba*

li V .5 .n.88. Faz húa relação do

fucçeíTo do Rio Grande, & a

iíianda aos noílbs Gaviérflado-

rcs.liv.6. 0.142. ' , :"->*r H ■■'•-•

Lõtírem^imhac General das

■ jarínas OlandefaSjmorre no aíTal-

tOjque deu á noíTa Fortaleza do

ArrayalJív.-9,n:^:76il^sQM ^■>

O Capitão LQureff^m^^netYQ de
'Jfaujo capitula a entrega dafor
taleza do Pprto do Cal voJiv. 5 .
n. ^ 5 . Toma €n!tr€ga.dellâ.n .9 6.

iSiT^Z^az/rf wo, povoação do re-
côncavo, fe prepara para reba-
ter o Olandès.liv.j.n.ó^, To-
tóa as armas,& V aferaíàmeilí^rfe
-defendem. n.Ó4v&c* ■■>.M4ivf,í,.-. . ^
. Luís íSa^ W^Vsâlente,^: bem
aíFortunado.liv.^.n.^í/Etttregâ-
Ihe Mathias de Albuquerque
liua ERancia.nirm. í 2. Aíialta as
trincheiras do Inimigo, na po-
voação de San<9:o Antomo . U.
1 5 . & 1 4 vCom doze Toldados
defende húa trincheira a todo O
podetcontrario.n. 1 7. Em hum
acazo mata trinta Olandefes . n .
54. Governa aFortalezado Ar-
rayal,& a defende a todo o po-
der Olandès. n. 63 . Mathias de
Albuquerque lhe dá patente de

Mefírè deiCampo.ííiíé7^. Sahea
xortaro paíToa Sifgifmundo. n.
76. &78.& 79. OGeneralío
manda enveftir o Framégo , po^-
Tém íègue melhor expediente.
IÍ.S I . & 8 2 Com fenfi vcl golpe
corta ao General Olandès.n.Si^
Deíèmbareano Porto d© lou*
ro 5 para que efíèyío.num. 1 47^.
Marcha quatrocentas kgoás c5
^fuagente.íi. 148. Deftroe tu-
do, o que acha nocaminhcr. n.
149 . Perfeguido de trez mil
Olandefes paíTa o Rio de Saõ
Franci&oy Sõ^ntra mBahíà;».
150.. ?f,n /f :•■■'';: ryjúmM oh
Vom íjúh df^oxaf^mti ar-
mas,& gê te defembarcajna Cof-
ta de Pernambuco.li V .g.n. 1 05.
Sahedo Porto do Calvo a cor-
tar o paíTo ao Coronel Chrifto-
vaõ u\ichitofls; n. 1 08 . Deter-
miha dar-lhe batalha , & para i£-
fo ordena ,& anima os íèus.num.
109.. Nella o mata hóa baia
traydora, Sc íe perde a viâoria
já quaíi ganhada.n. 1 1 o.Refuta*
fe hua opinião j que o condena
de temerario.n. 1 12. O feu re-
trato mandou por entre os Ca-
pitães da fama oCondedeNaf-
íaii. n. 1 1 2. Manda-fe fepultar
feu corpo , âoaxde, &;por quem.

M.
JCMIM defcobreallha
da Madcii"a,Sí: os mares 6

le-

4e vão isprayas de Aíg^l^i vf^i -

,n.2o.

■[''■ '':>r^ f. o!lf;í"^ r »■"

íUacw/j^ Engenho sdcwReligio-
iÍQS de S.Benco.li V . 3 ^11.76.

• .O.Qapkãj Manoel de Aguiar ^
trompe hõacmborcada do Inimi-
go . liv.9.num.96.:Enifegnndo
-choque põem o Olandès em fo-
-gida .n . 9 7 . Terceira vex the fuc-
cede o meímo . n. 1 05.
• O Ca^itAoManoel ^arho^a; feus
•princtpios, & fuás primeiras ac-
g:o€3.hv.6. n. 6<p.
' ^om Manoelí^ecti.,-^ Mamei
íãeSà perdem a vida na 'Eftâficia
do M^ndaça.liv.3. ^'à^^.
.' vM^noei Dias éaFrMca tmi-à
'ffiatav ilhas em dano do Okn-
■dès.lÍY, 3 .n .7 . AiTaka a trincshet-
fada povoação de «Saiido Atí"
tonio.n. 14. _^ " \

^■■,: -.Mamei í>'méè ^fálfaãàtèm-
lhe, & anima -os fotdados fògi-
dos pella morte de D. Luis de
Roxasdi V. 3 .n . 1 1 2 ,Sahe a teba-
íetó Inimigo, & o desbàfata. n.
1 1 5 .Uza de hum ardi!,côm que
^faz retirarão Framengo.n.M d.
'Obriga ao Conde de Nafíâà a q
le retire. n. 1 29,. : ..u.'>
-Í..0 Mferes Mdmêl Ferreira dt
.Lemos ^moxto na primeira bata-
lha dos Guararapes.Iiv 9. n. 36.

Dom Manoel de Meneses Ge-
jneral da armada Portugucza , q
foy reftaurar a Bahia. liv. i .n. 16

Manoel de Ar avj-i Tenente ^^
'(jap^Uãõde caValhs , fonape pello

*-íi

.Inimigo , 8r morre de húa baila
na íegtinda batalha dos Guara-
rapes.Iiv.9 iU 71. /.,. 't>, >
ir- O Capitão Manopl Moni^ Co •
corre a Henrique Dias na dos
GuaFarapes.liv;9.n. 48.

O Tadre Manuel d€ Moraes, fró-
te iro de hua Eftancia , com os
Indioisde fua doutrina. liv. 3.n.
1 2. Duas vézesapoftáta , fe re-
duz á verdadeira Religião. Hv.^
Tl. 17. Có hua imagem de Chrif-
toerucificado anima os folda-
dos na das Tabocas, n.26.

Ò Qapitão Manoel fachtco^ en-
trega a Fortaleza do mar ao Ini-
«yi^õJcoTitra o parecer de íeuTs
íbldados .li v . 2 .n . 2 9 . & 30.

VÊ*<adreFrey Mamei da l^ia-
dade Religiofo de Saó Frãciíco,
morre de húa baila no cerco da
Paraibá.liv.2.n.35. ..v ri

O CafHta^ Manoel ^ielh^Szí[t
âo Inimigo na occazião de Per-
nam Morim.livi3.n.47i .-.,

O £apU4o Manoel ^beko me-
te hua data vela de focorro em
Nazareth. liv.7.n.2 2. Defem-
barca o focorro, Sc o mete no
.Arrâyãlin.23í fjt -; ^t/ i*

>0'Badre M eJkíFKMdfioddo
'Salvador fe engana no tempo,em
qtie diz,que o Framego ganhou
aParaiba.liv. 3.n. 57 Livraos
moradores do Porto do Calvo
de hua grade tribulação, n. 1 02.
Enterra o corpo de Dom Luís
deRoxas n. 103. Defcompofto

pello

pello Olãdès em odlo da fé. liv.
6.n. 1 1 .Engana-fe no dia da ín-
vazão de Cunhaii. n. 14. &nos
motivos da entrega daFortaleza
do Rio de Saô Francifco.n, í 04
Converte dons Judeos here;es.
n. I i I .E no Arrecife traz á ver-
dadeira fé aigús Judeos, & Olá-
defes.n. 112. Refuta-fe, no que
cfcreve da Ilha de Itamaracá. n.
1 18.

O Capitão Manoel Soares ^8c ou-
tros aíTaltaõ o Inimigo,& o def-
troçaó.liv.7.11.3.

Marco António filJio do Cõde
deBanholIo herdeiro das con-
diçoés de feu pay.liv.3. ^-H 2.
Margarita Duquesa de Man*
tua, governa o Reyno de Por-
tugal.Iiv.^.n.io.

Margarita Malearmes^mvAl^iQt
de Henrique Hus lou va entre
os feus ao GovernadorGèral do
Xílado António Telles da Syl-
va.liv./.n. 23.

M arta May de Deos Sanãíf-
[ma favorece os fieis, m batalha
das Tabocas.Iiv.é.n.^é.'

O QapitaÕ Martim Ferreira de-
famparado dos feus larga a de-
fenfadoRioDoçe.liv. 2.n. 16.
O MeBre de QãpoMartim Soa-
res Moreno mandado cm focorro
de Pernambuco.liv.6.n.4i.Mã-
da dar obediência ao Governa-
dor da hberdade Joaõ Fernan-
des Vieira, n.47 . Aperta o fitio
da Fortaleza de Nazareth.n.70.

"M.
Fica porGo vernador dás âmaé,
& da Fortaleza do Arrayaí. liv.
7.n. 57.Manda focorro a Henri-
que Dias.n.^S.He de parecer,^
fe deixe a campanha livre ao

-Framengo.n. 7i:.Paríe'para o
Reyno.n.72.

Mar tpios^ que padecem pi
Ia fé trez mancebos Português
zes.liv.3a1. 120.

Martim Fragoso apelida a li-
berdadeema povoação deGo
yana.Iiv.6.n. 8.

O Capitão Matheus Façtindef
fe acha na recuperação da Viliá
de Olind^. liv. 9. n. 43. Sahe ãm
aíTalto gravemente ferido.n.45 •
Em companhia de outros Car
pitães rompe, & põem em fogí-
da hum efquàdráo Olandés.ik
7'-

Mathéus Moreira morre as mãos
dos Herejes confeíTando a ver-
dadeira fé.Iiv. 6. tf. 136.

O Capitão Matheus ^card^
morto na batalha das Tabocas.
Iiv.6.n.25.

MatUas de ^Ihtiqtterque Go-
vernador das armasichega a PeF-
nambuco.liv.2.num.4.Feíl:ejao
nacimento do Príncipe de Ef-
panha . n.^. Chama a concelho,
O que nelJe refolve n.7. Com a
nova de aparecer a armada Oíá-
defa,diípocm a refiftcncia. n. 9.
Retira-fe do Rio Doce aefpe-^
raro Inimigo no Rio Tapado,
Bcxíúh fe acha fem gente para a

re-

M
refiílencia.n. 1 7. Rctira-fe para
o Arrecife.n.ío.Manda.pórfo'-
gp aps navios , & almazeiís dos
Portu2;uezes.n.2 £ .Do Arrecife
íè retira para o mato. 3 1 . Nelle
confuka , & refolve o modo da,
deíbnfa.liv.^.n. 3. Manda fazer
a Fortaleza do Arrayal.n, 5 .Re-
bate todo o poder do Framégo-
11.7. Manda aflaltar a fortifica-
Çnõ do Arrecife, n. 1 4. Ordena
ao Capitão PedroTeixeira^que
leve hum focorro.iv 24. Sahe a
cmpedir aFortaleza^que o Ini-
migo levanta na Seca, & impor-
tunado da temeridade manda
picar o Inimigo. n. 25. Corta a
cobiça Olandefa com valor , &
ind.uuria.n.2 7.Viéarder aVilIa
de Olinda, & faz diligencias por
apagar o fogo^ Sc paga o Frame-
go parte da rujna. n.28. Manda
í ocorro á Paraiba.n. 36. Enten-
<Je, queo Framengo determina
íitiar a Fortaleza do Arrayal n.
^ 2 . Manda tomar hum focorro
inimigo.n.5 3. Socorre o Pontal
de Nazareth.n.5 9.Manda aíTal-
íar hum Reduto dp Inimigo, n.
59. &:6o. Segunda vez manda
aíTaltar o dito Pveduto.n.(54.Tõ
a-vizo do cerco da Fortaleza da
Paraiba.n.72. Manda rebater o
Framengo , que vem ganhando
a campanha. n. yó. Efcolhe pof-
to para focorrer as Fortalezas
do Arrayal , & de Nazareth. n.
7^.Veíre atribulado ejRtca^Ã

M

I

certezas de inimigos , Sc fofpey-
tas de tray dores. n. 86. Manda
ao Conde de Banhollo, fe retire
para a Lagoa n. 93. Manda re*
bater o Framengo, que o bufca.
n.94. Deíampara acompanha,
& fe rçtira para a Lagoa. n. (^6,
De caminho ganha o Porto do
Calvo.n.ioo.& 101. Manda en-
forcarj& fazer em quartos a Do-
mingos Fernandes Calabar, 8c
marcha para a Lagoa.num. 1 02*
Embarca-fe para o Reyno.num.
105.

O Capitão Maíhiaf de Mhuquer^:
(jue Maranhoii fronteiro de húa
Eftancia com a gente daParai-
ba.liv.3.n.i2. AíTalta derelan-»
ço, & confome o Olandès nas
Olarias. n. 24*

2f<ar;o?wjjarrafl:adas,& defcõ-
pofias pello OIãdès.hv.6.n.2 9.
' -O Capitão Mt^nel de Jbreutc-
bate o Inimigo.liv. 3. n. 18. Em
outra occazião faz omefmo. n*
47. ,

Falor com que as mulheres da po-
voarão de S. Louren^Q pelejaó cõ
oÓIandès.liv.7.n.64. 8c6^.

Mulheres^ ameaçadas dolni-
migo^fe laílimao, & afligem. liv*
6,n 12.

As w«//^cfíj;parentas dos mo-
radores do Rio Grande, que o
Inimigo raartyriza j padecem
mayores tormétos: Em que for-
ma.íiv.ó.n. 139. Moftroudhea
o ceo, o quanto lhes fora grata a
Rrr morte

m

jiiorte dosfeus íieís.num. 140.&:
,14 1 Os moradores rédidos por
.lEapitulaçoés na Fortaleza do
Arrayal fe reígataõ como cáti-'
ros em Argel.Iiv. ^ .11,9 2 . Em q
forma acclaríiao a liberdade. liVi.-
-^.n.yo.Defprezaó osdeGretosi
do Olandès.n.7' 5 .Os do Rio de
S.Francifcõ põem eérco á For-
taleza do Framêgo.liv.6.n.i 04»
Os da líha de Itaníiaraeá fe rèfi-
raõ da fogeiçaô Olãdefa.n. i 2-^.-
O que padece os da Capitania
doRioGrande.n. 128.& líà^s
P fuplicio qife padecem.». 1 34
|g 13 5 Defpois demortosjfe â-
chaó léus corpos cingidos de ci-
ítcips.n. 1 38. De fuás mortes fe
fes hum inftrpmempfc^u^e fe má-
jdou ao Arrayal. m^^2-,

Mortheca povoação da Capi-
tania de Pernambuco ganhada
pello inimigo.Iiv.3.n.8o. Pade-
éè grarides perfeguiçoês do O-
íandès.n. I í 5?. Suâ fituaçâo . liv*
^.n.29.

Mortos nas batalhas dos Gua-
rarapes3quaes3& quantos foraô.
liv.^.n.^ó. v/lf^.^ ;.

Moyfen ISlaVarrõ Iddett decrén *
f4 vem porlingoaaffiftiraoen-^
terro dosOlandefes mortos na
fcgiída batalha dos Guararapes.
iiv.^.n.S 4. Alcança licença pa-
ra ir ver o noíTo Arfayal , & pe-
de,quelhe moftre oMeftre de
Campo João Fernandes Viei-
ra, n.85.

reth a feu patrocínio fea^
tribue huiií favorável , fuc^eíTo.
KV.3.H.39. 'Wfm3lÓ3R^4-

yf Fortaleza dèHé^úHthÍQ
J^ntrèga a partido.liv, 3 . n,f 5 .

TVf^m j os de HenriqueDiâs
não dáo €[uaFtel a Inimigo algo.
liv.9.n.5o.

- O Capitão ISlkoUo Aranha vay
da Bahia émfòcorro dos mora-
dores do Rio dé S* Francifco,&
manda queimar as èmbarcaçoiês
do Inimigo debaixo de fua For-
tãl eza.Uv.é .n. 9 9 .Aperta o cer*^
éòjem qósmóradòíes a tinhaõ.
ii. I oo.Naõ deixa íàhir , nema-
pârecer inimigo.n. 1 o i . Manda
embaixada aos cercados, que fe
tntreguem.n.i 02 .Toma entre-
ga da Fortaleza . n. < 03. A peti-
ção dos moradores arrafa a For-
taleza, n. 10^.

O CapttâÕ Nkolao , ou Wcolâs
Olãdèsjque milita entre os Por-
tUguezes^ machina contra elles
ííua trayçâodiv.y.n. 8. Formáj
dmqueadiípoem. n. 10. Teme
fer defcobertOj& fe paíTa para ó
Arrecifè.n. 1 4 .Toma a Villa de
Olinda por entreprefa.liv^ 9. n.
4 1 .Perde tudo, o que tinha ga-
nhado com todas íuas armas, &
muytos Olandefes. n. 44. Com
grandes íbcorros fe não atreve
a cobrar o perdido.n.45.

tíobre^a^c^xxt fe achou na ba-
talha das Tabocas.liv. 6. n. 3^,.

E

E nas dos Guararapes.Iiy..

* 'IVoVdj, as da perda de Pernâ-
buco fe pnblicaó cm Lisboa , &
cm Madrid. liv.^.n. 22.

^ mV a cia armada do Conde da
Torre canza diverfos eíFeytos em
Pernambnco.Ii v.3.n. 140. E di-
verfos conceitos , quando paíTa
de viagem n.i^f .

Vivulga-fe a mV a de hua po-
derofa armada de Olanda.liv.7.
11.46.

O Capitão Num deKfello perde
arLiaEriancia.Iiv.3.n.44.

LJKDJ fenhora do
mar,& do comercio.liv.i
Tl. 2 2. Em Oláda fe dá principio
á bo]ça,ou Gópanhia Occiden-
tal.liv. 2. n. 23. OccupaaBahia
porenrreprefa.n. 24. Faz prefa
em algus navios de prata daFro-
ta de Caftella.n. 27. Determina
fenhorearoBraíil.n.28. Manda
novos Cabos,& nova armada a
Pernambuco.liv.3.n.i 27.
' Olandès com húa poderofa ar-
mada navega em direitura ao
.Braíil.liv.2.num.8. Arriba fobre
Pernambuco . n, 10. Manda em-
baixada as Fortalezas do mar,q
fe entreguem. n.i i . Bate os Caf-
te]Ios5& o Arrecife.n. 1 2 Com
danoconfideravel fe retira do
combatCj&defembarca noPa'ò

Amarello. n. 1 4. Marcha para a
Villa de Olinda picado, & re-
ceozo. n. 1 6 . Paíla o Rio Doce
defamparadodadePenfa. n. 17.
Sem reílftcncia paíTa o Rio Ta-
pado, n. 1 7. Marcha para a Villa
de01inda,&aganha.n. 18. C5
q eftrago.n. 1 9. Comete a For-
taleza da terra , & fe retira com
perda confideravel.n. 24. Pocm
cerco á Fortaleza da terra, &: a
rende.n. 25. & 26. Não guarda
as capitulaçoés.num. 31. Intenta
ganhar-nos a Fortaleza do Ar-
rayalliv.3.n.7.Fortiíica-fe no
Arrecife, & na Villa de Olinda.
n.9. Arma húa embofcadaaos
Portugiiezes n. 1 8.Aííaita,a Ef-
tancia do Riò Doçe,& húa trin-
cheira: & atemorizado foge. n.
19. Levanta húa trincheira no
íitio,que chamão a Seca. ri. 2 5 .E
na Barra da Ilha de ítamaracá
húa Força.n.26. Máda queimar
a Villa de Olinda, n. 27. Choca
^com a armada de Dom AntOf
niodeOquendo. n. 30. Saquea
à Villa dé ígdaraçíi . n. 40. Ga-
nha a Eftancia dos Afrogados.
n. 43. Também a de Nuno de
MeIlo,& a do Mendoça . n. 45 ,
AíTalta a Fortaleza doArrayah
n.46.Rouba , & aíTola a povoa-
ção da Moribeca, & o Engenho
de Dona Carhcrina.num.49.0
mefmo faz no Engjenho àos
Guararapes. n . 5. Intenta fitiaf
ao largo a Fortaleza do Arrayal.
Rrr 2 n.

o.

JR.-5 1 . Perde hum importãte fo-
CGrro,& foge para o Arrecife.ií»
53 .Intenta faqucar a povoação
de Sando Amaro. n. 54. Toma
no mar huiii focorro^que hia do
Rey no.niim.5 5 .Fefíe fenhor da
Fortaleza do Rio Grande.Ti.5 ó
Com aparências de ir fobre a
Paraíba, arriba íobre o Pótal de
Nazareth.n.58. Perigo, em que
fe vio.n.6 1 .Manda reconhecer
a Fortaleza do Arrayal.n.62.&
5 3. Quer faquear o Engenho de
António Cavalcanti, & fe per-
de.n.67. Com novos Cabos, 8c
nova armada bufca a barra da
Paraiba.n. 69. & 70* Marchaá
povoação de Saõ Louíenço,a q
íim . n.8 6 . Vay có toam o poder
para a Várzea, n. 87. Rende as
Fortalezas do Arrayal,&deNa-
zareth.n.88.&c.Manda ganhar
o Porto do Cal vo.n. ^j. Vence
a oppofição,& ganha a Villa. n.
9 9 . Altera-fe com a chegada de
Dom Luís deRoxas.n.i 19. &c.
Tyrano ufurpador das terras
doBrafil.liv.4.n.2.&c.Ç)ppofto
á verdadeira Religião n. 4.&C.
Inimigo da juftiça.n. 1 2.&C.CÓ-
trarioá verdade. n. i5.Excef-
fivamente cruel. n. 22. &c. Bef-
tialméte torpe.n.25.&c. De in-
faciavelcobiça.n. iS. &c. Com
feu braço fabricou fua ruina. n.
54.Toma hua náo, que navega
da Bahia para o Reyno.liv. ^.n.
aa.apodera-fe de Angola.n.26.

& 27. Alguns traydorcs^ o av^
Zaõ dos intentos dejoão Fet na-
des Vieira.^n,45 .Faz diligencias
por aver á mão a António DiaS
Cardozo.n. 50. MandaEmbaW
xadores á Bahia.n.5 2. Recebei
repofta. n. 5 9 .Diffimula comaè
noticias de rebeliaó.n.óo.Máda
chamar a João Fernandes Yieh
ra,o qualfeefcuza, &fedecla-
ra.n.é i . Tem avizo de marcha-
rem para Pernambuco o Cama^
raõ, & Henrique Días.num^ó ifs
Refol ve-fe a prêder a Joaó Fer-
nandes Vieira, n . 62. 0 que fa^
para efte fim. 66, Manda feguc^
da embaixada 4 Bahia. n. 71 * G,
que dirpoem em todas fuás Pra-
ças.num. 72. Comete partidosa
João Fernandes Vieira .0*7^.
Manda prender a todos os cõí*
pirados.n.7 3 . Ordens, & decrd^
tos,que publica, num.74 & 75:;^
Quatro mil florins promete a
quem matar a João Fernandes
Vieira.n, 79.0muyto, que o
altera a fole vação de Ipojuca.n.
8 3. Terceira vez manda Embai-
xadores â Bahia. n. 88.Quere-
pofta tem da embaixada, n. 9 1 .
Manda afíaltar a Joaó Fernan-
des Vieira pello Sargento Ma-
yor JoãoBlar.Iiv .6. n.2.Des-
humanodecreto,que publica n.
1 1 .A gente,armas,& munições,
que perde nas Tabocas, n. 36.
Manda focorro a Sifgiímundo.
n.37.Determina, que todos os

Por-

o.

Portuguezes Icjaó mortos á ef-
pada.n.4o.TemcaFrota de Sal-
vador Corrca.n. 65 .& óó.Coin
perlidia,tTianda queimar os na-
vios Portuguezes no Porto de
Tamandarè . n. 67. Intenta ata*
Ihar alolevação da Paraíba, n.
j^. Acompanhado do Gentio,
deçe fobre Goyana.n.87.& 88.
Perde húa batalha na Paraiba.n.
90. Cercado no Rio de S. Fran-
cifcOjdetermina entreter, & não
entregar. n.i 01. Entrega a For-
taleza.n. 1 09 .Perde a Força^que
fe dizia de Sanâia Cruz n. 1 08.
Efcreve bua carta ao Meftrede
Capo André Vidal de Negrei-
ros.n. 1 09.Crueldades,que exe-
cuta no Rio Grande, num. 135.
Martyrios,& afrontas, com que
mata os Portuguezes.num.i 96.
Fome que padece.liv.j.n. 2. Sa-
he a bufcar agoa, levalangue.n.
^.Sahe a fazer lenha, &náofoy
a bom mato.n.4. Comete a Ef-
tãcia de Sebaftião de Carvalho,
n. 5. Corrompe os Eftrangeiros,
que militáo entre nós.n. ó.&j.
Bufca occazião para a oíFenfa,&
fica caftigado. n. i^.Defconfia
dosfeus.n.i8.& 19. Ouve hum
Enviado Portugue2.n.22.&29
No caminho lhe deita húa car-
ta.n. 24 Ve arder algúas náos de
fua armada ; como , & cõ quã-
taalteraçáofua. n. 2^5. NoRio
Grande, o caftiga Dom Antó-
nio PhelipeCamaraõ,n. 28. A

gétc^que perde ncíla occazião
n.3o.&3 1 .0 quanto o confun-
de a primeira falv a da Fortale-
za do Bom Jcsvs. n. 36. Intetíta
fazer hum Reduto ; có que fuc-^
çeíTo n.36.&c. Como o fabrica
em duas noites.n.39. Calamida-
des,q o afligem, n. 4 1 . Falia fa-
ma,queefpalha. n.42. Padece
hum engano, que o perturba, n.
45.Fortifica-fe temerofo,deq
o aflaltem. n. 48. & 49 . Intenta
ganhar a Cidade da Paraiba , &
faheacampo,&ficanelle.n.5 i.
&c.Diligencias,que faz por má-
timentos.n 5 5. &c. Ardil, com q
engana aos Portuguezes. n. 63,
Marcha para S.Lourenço 5 rui-
na,<][ueahi padece.n.63.&c.De
Olanda, lhe chegão novas de
grandes focorros. n.So.Comete
a Eftancia dos Marcos , & fica
vencido n. 8 3. Foge fó de ouvir
o nome de João Fernãdes Viei-
ra, n. 84 Muda de Cabos, com q
tenção.liv.8. num. 2.Anima-fe
a bufcar- nos j porque cauza n.
34.1magína-fe perdido; porque
rezão n 38; Fica vencido na ba-
talha primeira dos Guararapes.
li v. 9,0.25 .Com que efl:rago,&
mortes.n.27. Senhoreaó-fe da
noíTa Fortaleza da Bataria, n.42
Eftrago, & medo ; com que nos
deixa a Villa de Olinda , n. 45.
Perde a fegunda baralha dos
Guararapes,n.79, Seudefenga-
no o faz pregoeiro do noíTo va-
Rrr 3 lor.

li

1"

Iof.ii.8o. Falta, no que pode "ás
capitulações da entrega do Ar-s
recffe.n.44. > £{.dnÉ;qfíK)Ci

Oiariãi lugar em que o Inimi-
go perde ffiuyta gente. liv. 3.11.
134. - -^ ->è.Qi.n.Oâ

VilU de Ollndi^ ícu principío|,
Sl íituação.li V. I ; mi6. Ganha-
da pelloOlandès.liv. 2.11. 18.. &
.1 9. Abraíada peilo Framengo.
li V 3 M, 30 Nclla fe torna a for-
íiiiGar.lív.p.n. 43 Recuperada
pellas anuas Porctiguezas : Co-
niOj&quando.n.45. .,. ,,,

:J^e ^Anhciguiarà nomt de
húã grande íèiticeira Bra-
filiaíiaJiv.^.n.^ 2.& 5 3. ■
•!'f^do Amarelh^ fua íítuação. liv.
!2.n.8. Neíla parajem defembar-
con o Inimigo para tomara Vil-
]ade01indain.9.r

^araihaj Cidade, & Capita*
nea do Brafil , afíaltada do Olá-
dès liv.3,ni7o. O qual ganha as
Fortalezas da Barra. n. 7 1 . E lo-
go a Cidade, & toda a Capita-
nia n. 74. Como Deos a livra
das mãos dos Tapu^aBj^ Olan-
defes.liv.ó.num 87. Como nef-
ta Cidade reaccIam.ou a liber-
dade, n. 88 & 89 . Osnaturaesa
povoaó. n. 9i.Comoa deixaó,
& as firas cazas, & fazendas, liv.
8.0.15;.
- O QãftUQ ^áfchoai de Freitas

B.

apelida liberdade em o lugar de

Goy.aíia:!iv.6,n.8.oiv«n^') V3
à$,:U.(^apíiã$. 'í^afchod 'J^ertiravãt
pe,Sc' desbarata;, feiíccotos Ofe
deles com o íeu CeneraMiv.; ^;

á O Capitão 'Paulo da Qunha aíFo*-
Ia a campanha do Inimigo.li v.3^
n. 1 5 I . Encorpora-fe com a^ê-
te de Luís Barbalho.n. i 5 2. Seí<
guda vez volta a infeftar a mefr
ma campanha.n. 1 5 4..O muy tcx^
que obra.n. 1 5é.Socorre os mo-
radores de Sirinhaem » liv. 6.0 .
42 . Sucçeffo raro , que vio nas
mefmas cazas de feu aldjamen-
to liv 7. n. 2 1. Vay á campanha
do Rio Grande, n. 54. Efperaé
Inimigo de embofcada mim-ó^-i
Vay pedir focorro á Bahia , &
volta com patente de Sargento
Mayor.Iiv. 8. n. 45. Morre na
fegunda batalha dos Guarara:?
pes.Iiv.9.n.78. n^úymqiè

^auh DíasSa^õTheliche Sargê-
to Mayor do terço de Hériqne
Dias ganha hum Reduto ao Ini-
migo, & morre na emprefa. liv.
7.11. 48.

Taulo de Linge O landes de
nação mandado por Governa-
dor da Fortaleza a Capitania
da Faraibadiv.6. n. 7 9, Artes de
queuza para enganar os mora-
dores.n. 8 í . Elles o entende, &
diffimulaó. n. 82. Retira-fe para
a Fortaleza,& larga a Cidade da
Paraiba.n. 83. Fortifica -fe den-
tro

p.

tio da fiia Fortaleza.n. 112.

O Capífão 'Paulo Teixeira , Sc
outros efperáo cm a povoação
de Saõ Lourenço ao InimÍ2o,&
o rebarem.liv.7.n.63.

'PeccadoSj os dos moradores
de Pernambuco os entregarão á
fcrvidáo.liv.i n.30,

^edfo Jberes Qabral primei-
ro defcobridor daquella parte
da America que chamão oBra*
íil.Iiv. i.n.i I.
• ^ edr o Cavalcanti rehíítG olni-

iTiigOj& o desbarata.il V. 7 n. 9.
•10.

^edro 'Barbosa Tenente da
Fortaleza do mar a defende va-
lerofamente liv. 1 . n. 12. Op-
pofto ao parecer de feu Capi-
tão,que a queria entregar.n.2 9.

'Fedro Ce^ar Governador de
Angola aíTaltado do Olandès fe
retira.liv.^'.'*!. 26. Livra a vida,
& perde a fazenda em húa tray-
çáo^que o inimigo lhe arma. n.
27.

Tedro Corrêa Sargento Mayor
do Eftado pello Governador
delle vay fortificar Pernambu-
co.liv.l.n.g.

• Tedro Qorrea da Gama Sargé-
to Mayor do Eftado cazualmé-
tedeílroça o Inimigo, liv. 3.11.
54.Defende a Fortaleza doPò-
tal de Nazareth.n.58.

Tedro da Cunha de Ãndradaío.
refgata do poder Inimigo por
cinco mil cruzados.liv. 3.11.92.

P.
^edro laques de Magalíxui Al-
mirante da primeira frota da
Companhia Geral do Comer-
cio.liv. 8. n. 88. Sahe de Lisboa
por General da mefma frota.liv.
1 o.n. 1 0.& 1 1 . Defembarca nó
Rio Doce còm o feu Ahniraa-
te.n. 1 2. Convencido da rezáo,
& da miferia, concede feu favor
aos moradores.n .13. Confulta
com os Cabos do exercito , &
determinão a conquifta do Ar-
recife.n.2 9.Vi6i:oriofo , & con-
tente parte para a Bahia com o
reftante da frota.n./j-y.

'Pedro da Sylva de alcunha o
Molle Governador doEftado vé
fobre a Cidade da Bahia biia po-
derofa armada.liv. 3 .n. i'^^. Re-
bate o primeiro aíTalto. n. 145.
Deípreza húa embaixada do
Framengo.n. 137. Da-lhehCia
aíTaltada, & o desbarata , & faz
retirar.n. 138 Capitães com q
feacha.num.135.

Pernambuco '^ o que fígnifica
na lingoa do Gentio liv. i.n.17
'Pernambucanos excelentes na
fidelidade.liv. 5 .n.86. Singulares
na obediência, li v.7.n. 35. Lou-
vados por Sifgiímundo de vale-
rofos,& praticos.liv.8.n.8.Mof-
traó o delgado fio de feu ani-
mo.n.4i.E defuaconftancia.n.
48. & 49. O quanto feftejaó a
vitoriados Guararapes. liv. 9.
n. 3 9 .Cnidado, & zelo com que
acodem a enterrar os mortos, &

a cu-

I

a curar os feridas, ii. 40. Sua fi-
dalga liberdade, n. 54. Acodem
aos Guararapescom manrimen?
íQs,armas5 & peílbas . n. 6j. Se-
JÉr guem o alcance do OJandès v é-
cido.n.72.

TeUe-^ a que deu nas Capita-
nias folevadas , & com que da-
Ko.liv.ó.n. 125.

Ei^y Th.elipe o Tercem de Caf-
ttlk faz tregoas com Olandajem
qne forma. liv. r.n.2 2.ElRey
Phelipe o Q^iarto manda pre-
|?arar armada para a reftaura-
çio da Bahia. liv. i .rt.2 2. Faz a-
-vizo a Diogo Lui§ de Oly veira.
liv.2.n.2.

a Pernambuco com opoflo de
Tenente General.liv. 8.n. 45, í

íP/Viír Glandes de naçaó pof-
topor Governador do Porto
do Calvo fe perde a íi,& a terra.
]ív.3.n.ioo.

I^orto do G/Vojfua íituaçaõ, &
fortunas.rív,3.n.68.79;.& 102.
Nelle fe acclama a likerdade.li v
6.n.93,

^íiy^í-^^r/f^é-j/uáindefculpaViel
©miiTâõ.Uv.2.n. 14. Sua conílá-
íe fidelidade, n. 2 8. Valentia, &
fortaleza de dous mãcebos Por-
íuguezes.liv. 3. n. 1 o. Com que
Valor fc cobrão no perdido . n.
ao.Singeleza,& valente confia-^
^a de luim Portuguez, &Ouza-.
dia,com que todos defprezão os
pcrigos.n, 89. Tolerância 5 <iom

p;

que foffetíi ásneGeffidades.n.pQ
&c. Valentia com que fe cobrao
em húa trincheira perdida.liv;^
n,22 jE com que tomão hum
comboy ao inimigo, n. 87. Per-
da,que receberão na batalha daar •,
Tabocas.liv.6. n. 33. Partícula- '
res acções de íèu esforço» jp. 34^' ;
& 3 5 .Conílancia , com que pa-
decem j & daõ a vida pellafç, % .
pellapatria.n. f34,Cazos parti-
culares, em que Ríoftraõopou^
co^que temem os perigos, li v.7» -„
n.4.&é.Defviaõ húa trayção -,
cora fe veílirem das cores delia.
n.8.Ardil,Gom que hum PortUf -
guez mete em defcon fiança tc&
do o poder Olandès.n. 1 8. Anif-
mo deftemido de deus Portu.-
guezes.n. 50. Cinco Portugue-
zes abordaó híía náo Olandefa,
&a rendem, n. j6. Com aíTom-
bro das nações, ganhaó a vi£l:o-
ria dos Guararapes.liVi^i 01*33?, .
Aííi mefmo a Villa de Olinda,
n.44. Doze, com as eípadas na
boca,fe deitão á agoa,& ganhaõt :,
hualancha.n.93.

Providencia^ a dos homens cõ?*
denada pella de Deos. liv . 4. rv
32.

^ortvgal^ em fuás conquiftas tê
por fim a dilatação da fè, &não
adoimperio.Iiv.ó.n.i 12. -,

Q

VBVE\ Coronel Oládès
rendido nos Guararape^

prcfo

O

a

prefo cm Nazarcch, S: remetido
a Portugal.liv.9.n.45.& 46.

R.

OCATlTAM^helinho pe-
leja com o Olandès. liv.3.
n lo.SaheacortaropaflbaSif-
girmúdo na occaziáo de ganhar
a pampanha.n.77. Obriga a Sif-
gifmundo, a que fuja do Porto
do Calvo.n. 1 07. Sahe a tallar a
campanha de Pernábuco. n- ii .
Vay á campanha da Paraíba . n.
1 24.

^y^'-i os de Portugal deraõ a
conquifta do Brafil a diíFcrentes
VaíTallos.liv. i ,n. 1 4.Devem fa-
zer mercê de terras5& domínios
com muy ta cautela, n. 14. Re-
formáoas alçadas dos Donata-
rios.num. \ 8 .Mandaõ edificar a
Cidade da Bahia li v. 2 . n. 1 8.

(?^íitt/o,oda Villa de Olinda,
fe defende valeroíaméte na pri-
meira invazão.liv.2.n 19.

^Itgiofos^ o fruito, que fazem
na conversão do Gentio Braíi-
liano.liv.i.num. 2 o. Os quefe
acháraó na batalha dasTabocas.
liv.6 n.45.0s que aííiftiraõ nas
batalhas dos Guararapes. liv. 9.
n. 37. com quepiadade agrade-
cem a Deos a mercê das vido-
rias.n.77.

(^f^o, Fortaleza do Arrecife
cerca^a,&ganhada pellas armas
Portuguezas.liv, i o.n,29.

R.

^zjta, Eílrangeiro de nação
£ivorece os Portuguezcs , & os
íegue na acclamação da liber^
dade.liv.6.n.86.

í2^o Gravide padece miferavel
eftraoro.liv.^.num 65. Acclama
aliberdade liv.6.n. i27.Suafi-
tuaçaójSc altura. Náo lhe chega
a nova dafolevaçáo de Perná-
buco.Conhece feu perigo^ & fe
prepara.num.i 28. Entrega-fe.a
partido.n, 1 32.OS vezinhos pa-
decem pella fé. n. 1 3 3 . & 1 34.
OsagreíTores o pagão n. 143.
RíodeSaÕ Franctfco^ptWádi a
liberdade.lív.6.n. 97. Seus mo-
radores põem em cerco a Forta-
leza do Framengo.n.98. Parti-
cularidades fuccedidas nelle. n»

O Capitão ^drigo de (Banos pre-
fo pello Olandés.liv.5 num 7 3,^

mpdrigode 'Barros 'Pimentel tã-
bem prefo pello Framengo liv.
6.n.93.

O Qapitão ^que de barros Saa
he a rebater o Inimigo, liv. 3. n»
18.

S JCE^VOTES, quQÍkíi'
chaó na batalha dasTabo-
cas.liv.6.n.35.

Salvador de J^eVedo com que
refolução fe oppoem a todo o
poder Olandès.liv.n. 18.

Salvador Corrêa de Sà parte da
Bahia para o Rey no, 6c mete hu

4*

■J--Ô'.

^hc<^rqcm Tamandaté,^>á vif-

4or da Ilha de Itainamcáià df Í€-
de a todo o poder Olandès, Ii.v .
2. n. 26. Segunda vez fevé aíTal-
tadp,&: larga a Ilha ao f ramen-
go.liv.3 11.50. .
. , .Salvador {Pereira prefo peHo
Olandès por inconiide.ace.liy.

, , ;.-i Vom Sancho hf ante Je^ragao
,,4e,ixa hum lega-do 3 :^vprdos

„jÇ^tÍ VÒsJiv à •^i^i.ijà k ^-<Í! .

-~ ii-jÇ QapitãorS^^ ^ {^a .ia-
fea bijrcacalnkiatg^pjjcmorre
çiij húa eixibo fcada .íiy . 3 . n . 1 8.
^^p , ^f I dy?í ^ de;Car)} ufU fa z li uas
j^^^azas nQva^5q,ue|è^bjTaíàó com
jaííbmbro de todos : Çoii)o , 8c
j)orqueJiy.7.n.2 2.
, ^^ íQ ,ÇapJtaÕ Sehajimo Ferreira
:^\ít ferido de hum cdioquç. livi
,.7 q, 40. Com que valorpeleja
^m^±?ccazjac>dãBaÍiiaÍv:. 8 11.6.
vf^' .^ Q^p^itm S:e^^^uf,deSQum
Jaz perder oFra^IngQ^&bna
, Fortalcza^dequ^^-^a jenhor.liv
3 n.iop.^ • 1JS iêIbiií& iqg '

' ôí^K^í/o,he almâ dás eUiprcEfe.

o CapttãQ SimaQ deFiguéredO'
^ílroçao Inmiigo , & o fegue
atéa Yjlla de GJinda liv.^^^i
i9.Deícobreocampo. liy^Svn.
5 Coiifeíra,&: peleja : Na òcca-
2ia5 das Tabocas, n.24. .>p.

t^'J^mm AMW^ Governador

. daíÍ|)0ta]te^jjd€tCabedello, 2t

:deferid(^a:3i%iiÍBOn4oi Ik,3.n.

o Capitão Sim4():^^etíiÍíes^or'
í3á^|£ rende jbua i&KKDíandeía,
hv4^mi9. - '- f ^ .fí.oJbfí3^' :

, Simão fteitá^ ^::Séatlião de
Çuimmmpfcíbs pello Glande,
^ porque çauza.lm5,n, 73. ;

j^/K/w^tf^w fe Jevanta contrao
Olandès. li v.é,íi,4i.iSe«s mora-*
dores fe fenhoreaõ da Fortaleza
dosOIandeíes.n. 4^ò*;,f^ s
*jí Sjfxi/rnundo Fanfcopb fàhtâc
01âda,& entra no Arrife por
GeneraJ de mar,& tèrra^Jiv.3,ni
93. Vay íbbre a Paraíba wfi.í, 35.
Põem litio á Foftakzâ do Ca-
bedello; & reíiftido fe retira c5
perda. n.37,Vay íobreia Fofta*
lezadoPontal de l<azaiíeth..n*
3 i>Man da -deitar gèíite em ter-^
ra.nu«L3p. Volta a por cerco á
fortaleza da Paraíba nv7P,vGa^
nha a-Çidade j ^guarMecidaíà-i
iieâ ganhar á camf anha.. n^^^".
Picado de alguns Capitães Por-
tyguezesfe retira para o Arre-
,ifâife.n^77 & 78,Manda diverías
partidas de Ola íidefes a con qu i*
^ftar, & faquear. o recôncavo . n;
8^3i Afiâkado faz ako,&com fo*
corro da A rrecife fe faz fenhoí
da povoação de Sars^o Antó-
nio do Cabo .n .85. Difpocm o
C€rco,qiie quer por á Fortaleza
do Arrayd.n .86 . Falta á fé pu-
blica

na

S;
blica na violação das condições
com que a Fortaleza fe lhe en-
trega.n. 91. & 9i.Aperta o cer-
co á Fortaleza de Nazareth. n.
94.íntenta ganhar a povoação
de Sirinhaem5& fe retira deftro-
çado.n. 94. Mandaprezidiara
Fortaleza de Nazareth, &pór
porterraado Arrayal.num.96.
Pello feu Almirante do mar mã-
da ganhar o Porto do Calvo. n.
97.Vay por terra, & acha o lu-
gar defpovoado.num. 103 .Que
faz n. 104. Com intento defe
encontrar com D. Luis de Ro-
xas bufca o Porto do Calvo. n.
1 07. Em Saó Gonçalo de Una,

0 vencera os Portuguezes. num.

1 í I . Foge; para Sirinhaem af-
fombrado de feu engano.n. 116
Eftranhos marty rios com que a-
tormenta os moradores, n. 1 1 8.
& 1 1 9, Nova tirania , de q uza
para roubar. n. 121. Leváta húa
Fortaleza noRiodeSaõ Fran-
cifco, & fortifica a Cidade de
Sergipe de ElRey.n. 13 3. Volta
de Olanda por Governador das
armas Olandefas : Com que po-
der entra no Arrecife, liv. 8. n.
2 . Arroganciaj& defprezo, com
que fala na guerra. n. 5. Faz dif-
ferente conceito vendo a dif-
pofição, com que os Portugue-
zes o elperaó.n.6.Sahecom po-
der,&: intento de ganhar a Villa
de Olinda : O mal, que lhe fuc-
cede.n.6. Vencido,& defefpeta-

S.

do feretira . n. 7. O que diz dos
Portuguezes. n. 8. Saheparao
mefmo fim com mayor poder,
& foge com mayor preíía. n. 9»
Manda aíTaltar a Eftancia do A-
guiar.n. i o.Sahe com mayor po-
der,^ por engano logra feuin-
tento.n. 1 2. Com que induítria
manda faquear o Engenho de S.
Bertholameu.num. 1 3. Saquea a
povoação da Jangada, n um. 1 4,
Foge vencido, & deílroçado. n.
1 5 . Máda húa efquadra ao Rio
de Saõ Franciíeo. d. 17. Dá prin-
cipio a húa Fortaleza na vezi-
nhança do Arrecife.n 1 7. Apre-
fta a fua armada, num. 1 8. Man-
da focorro á fua Fortaleza da
Barretâ. n. 2 1 .Sahe do Arrecife
com todo o podef.n. 23 . Entra
na enfeada da Bahia , & fe forti-
fica trez legoas da Cidade. n. 2 4.
Defende-fe de hum tern vel af-
faIto.n.28.& 2 9.Levanta-feda-
queíle lugar , & navega para o
Arrecife aonde entra coberto
deluto.n.^o.PromeíTaSjquefaz
aosfeus para os divertir dore-
ceo. n. 39. Diligencias, que faz
por arrafar a noffa Fortaleza da
Bataria,& larga a emprefa.n.40.
Para fahir a campanha uza de
antecedentes fuperftiçóés here-
ticas.liv.9. n. 5 . Teme a contin-
gência da batalha,&fahe do Ar-
recife jcom que Cabos,& gente.
n. 6. Dá conta a feus Cabos do
intento de fua marcha n.7.Paíra
Sff 2 o vao

b'Yao âos AfFogados 5 cotri qoè
mdiiftria.n.8 .Manda piear a Es-
tancia da BarreÊa.n. 1 2v PerfiiÉ'^
de aos feus a cautela, & lhe re-
provãó o medo » ntif^i Marcha
para os Guararapes , 8è íàz alto
no areal da prayía. n. ir 9. Cofiti-
náa a marcha picado de feíTcnta
foldados PorttigUézeSj&Indios.
num.2õ Forrriâ a Tua gente, &a
eíjforta para ã batalha, n.íâi. &
23. Per dè o campo , Sc nellè feu
Eftandarte General, n. 26. Re-
forma a fua gente, Si fegúda vez
comete a bataIha.B.a8. Reíifté-
cia, que ó rebátfevi^^ . Deíeí^
perado fe retira .nV 30. Coda lio-
V a forma comete terceira vez o
conflidoa 3 í . Oefobededdo
dos feus fe retira deftí-òcado , &
ferido.n. 3 2 . Com aparências de
pelejar, efpera a noite para fo-
gíf . n. 33 , Mortos , que deixou
no campo,&: feridos,que levou,
ií. 3 «5 .Chega ao Arrecife, & a-
pofíkííb da Villa de Olèda,&da
Fortaleza da Batarià^n.^ i .Pede
os íeus prifioneiroè^)í;4é. Ouve
à hum feu Coronel^que o ârgue
de fraco,& lhe relpondé prudé-
te.n 47.Câíl:iga-ocom ôcufto
de hum defengano.n. 48 Bem
caftigado omanda recolherrAf
falta a Eftãcia de Hérique Dias.
r1.50.C0m poderofa armada fa-
quea os contornos da Bahia, n.
54. Com que rezoés pertende
defuadir ao Coronel Brittc de

Íeu:deíatiííitlb4âfdfftiàt .5 9.^^-
xagera,por palavra , & poref-
^^#^íê *vâlór da nação Portu-
guêza.n.8i.MUnda pedir fufpê-
ção de armas pára éntòrrarem
feusmortos.n. 84. Manda affal>-
tair as Eftancias doMenddça, &
do Aguiar . li. 89.& 91 Manda
hua efquadraao Rio de S.Fra»-;
ciíco.n.92. Perfia «ttiíèudanoí
num. 94.&C, Eníinadoa golfes,
deixa a perfia. n. 9&íConíkan^
gido dos do governo intenta
ganhar a Eftancia do Aguiara q
fim, & o mal que lhe fuccede na
emprefa.n.ioí Manda condu-
zir mantimentos do Rio de Saõ
Frãciíco.n. I o^ ■ Teme nòv| in-
irazão,& o quefaz.iiv.io.n; 1 8.
Socorre a fua Fortaleza do Re-
go:Perdea,& defconfia de fe có^
ícrvarno Arrecife.n;a24íMan-
da largaras fuás Fortalezas i^ da
Barreta, & a do Buraco de San-
liago.n.25 .Teme igualmente a
fedição dos feus,& as armas dos
contrarios.n. 29. Manda largàt
a fua Fortaleza dos AfFogados.
n*30.Perdea de Altenar. n. 3 1 .
Intenta cobrar a eminência do
Milhou. n. 5 2 . Pede fufpenfaô
dearmas,para tratar da entrega
do Arrecife, n. 34. Sahe à rece-
ber ao Meftre de Campo Gene-
ral Francifco Barreto de Mene-
zes,como vencido,&rendido.n.
39.

á^ccorríi^qiieDom Luis de Ro-
xas

xas conduzioao BrafiMiv. 5. n.

j 05 . >ii ^4í-lí^jèls^ibq-,
■iíyèocorro que dexPernatnbuco
fe manda á Paraíba, liv.é.n. 88.

.Soldador devem fereftima-
do^ide^Cabos liv. 3.11.32.

,ÍÍ)ms Soldados ^ortu^ue^es
põem fogo á armada do Inimi-
go, Defgraça, que lhes fuccede
ao retirarem-fe.liv.y.n.^^.
^r.Tfinta Soldados com induftria
atemorizão o Olandès.liv. 7 . n.
49. Os do Arrayal Te amotinão
contra os traydores.n.88.

T.

MOCJS: Defcreve-fe o
monte defte nome li v .6.
n.i6.

Ta^uyas húa efpecie do Gen-
tio do Brafil barbaros,& cruéis.

liv.é.n. 134.

T^mífííiací^. A dos Portugue-
ses bem fuccedida.liv./.n. 1 1 .

Teodósio Efirater vay por Em-
baixador á Bahia liv.5 .n.^ 2.Té
audiência particular do Gover-
nador do Eftado.n.^ 3 Segunda
vez volta á Bahia , & fe declara
como Governador. numer. 71-
& 9o.Satisfaz a fua promeíra,&
a fua opinião, liv. 6. n. 70 Per-
fiiade os feus a entrega da For-
taleza de Nazareth.n.73.com q
condições, a entrega, n. 74. Os
Governadores da liberdade lhe
daó o pofio de Meftre de Cam-

po dos Eílrangeiros. fium. 1 07.
Perfuade aos feus a entrega do
Forte de Sanita Cruz. n. 108,.::
Aconfclha aentreprefa da Ilha
deltamaracá. n. 1 17. Condena
fete foldados feus á morte. numV
123. Sofpeyta nos feus animo
traydor.liv.7.n. 15. Conhece a
trayçáo,& fe culpa de confiado,
n. 2 6. He de voto, que todos os
paíTem á efpada. n. 1 6 . Recebe
húa carta infamatoria : O q faz.
n.24. Com licença dos Gover-
nadores da hberdade paíTa para
aBahia.n.27,

Thome de Sou^a primeiro Go-
vernador Geral doEftado do
Brafil 5 & fundador da Cidade
daBahia.liv. i.n. 19.

Trabalhos enfinão melhor ,que
omelhormeftre.liv.5.n.2.

Traydores defcobrem ao Olã-
dès o fegredo da folevaçáo inté-
tada: Trabalhão pordeftruira
emprefa.liv.^ . n. 6 1 . Metem no
concelho Olandès hum memo-
rial contr^ João Fernãdes Viei-
ra.n.64 Pe^em aoFramengo,q
os não defcubraó por taes.num.
é^.Doustomaó por fua conta
faber de tudo , & avizar ao Fra-
mengo.n. 77. Amotinão os fol-
dados contra João Fernandes
Vieira, liv.6. n. 7. Determinão
dar-lhe veneno.n.9. A cara def-
coberta o querem matar. liv. 6.
num. 1 8.Mandaó-lhe atirat á ef-
pinguarda: Có que eíFeyto . liv.
Sír3 7.n.

7.ti.S7.Comò el!e os confunde,
&caí]:iga.n 89. Date conta dos
motÍYos,q os fizeraó tfaydores.
r-.po.

Tr íkinaes, parecidos os da j nf-
tií:a3& os das arínas.liv.9.n. i .
V.
Qpuão Valencilk morre
na occaziaó de Dom An-
tónio de Oquendo.
• Valentim da (^C'cha fita Capitão
do Rio de S.Francifco.l.ó.n. 96
Acciama na mefma Capitania
a hberdade.n.97. Livra húmo-
raxlor da mão doOládès.n.97.
Fangoch, hú dos primeiros da
Cõpanhia Occidental, entra no
Arrecife cô búa poderofa arma-
da de Olanda.liv .8.n.47.

Vaídot , Sargento Mayor de
João Blar morre de hua baila.
3iv.é.n.26.

ú Capiitíõ Valor fahe ferido em
hua perna,defpois q moftrou o
nome no animo.Iiv.7.n.28.

UgoMâpr Comedor da For-
taleza do Rego a defende 5 &a
cntrega.n.2i.&!2 2.

^íj«g«f/j capitula a entrega da
Fortaleza de Altenar.l. i o.n.24
Várzea aíTolada pello Olandès.
liv.ó.n.iS.

^ícwj entregaõ os Pernambu-
canos ao 01andès.liv.i.n.'29.

Viclort.:i ganhada por valor, &
perdida por defgraça. liv.3.n.7.
&16. (3,

Victorta das Tabocas.Iiv.6. n.
Victoria alcançada na Paraiba

F I

V2:

comcirctififtancias de efl:ranha:i
liv.6.n.9o.Mayor,a q na meítuí
Capitania alcãçou o Camarão^
dos 0]andcíès.liv.7.n.28 y&Q 9;^
Circuftancias,4 teve de grande.^
n.32. Milagrofa pareceoí>íâqo^'
moradores de S.Lourençcxèicã-
çáraó cótra o Olandès. n. 64. &
65. A q osPortuguezes alcançá-i
raóde Sifgifmúdo.liv.8 n.8. AÍ
primeira vidoria dos Guarara-
pes.liv»9. n. 29. Có q perda do
Inimigo a alcãçou o PortugueZ.
n.35.&:36.

Fictoria^^ triumpho, com q m
Portuguezes recuperaõ a Vílla
de Olinda. li v.9.n.45.

Segunda Victor ia dos Cu arara'
pesAiv.^. n. 75. Sua duração, &
perfia.n.76.&77.
' 0^adreVdhena\c\z á Bahia
a nova da acciamaçaõ delRey»
Iiy.$.n. 14.

Vandre- Vant vay por efpía,&
Embaixador do Arrecife, á Ba-
hia.Iiv.5.n.7i.

ZBlSlomo Jchicli Capi-
tão Ma yor da ordenança
áa povoação de S. Louréço,dá
fobre o Olandès, & o faz retirar
defcópofto.I.7.n. 54. Socorre à
feuSargéto Mayor, fem têpo.n.
55 Chega a focorrer os morado
res,quãdo já celebravão a vióèo*
ria.n.66.Por ordem deFrãcifco
Barreto de Menezes mãda a no-
va da vi61:oria dos Gqara rapes i
Bahia.liv.io.n.39,
M.

RevcrèndiíTimo P. M.Fr. Jcronymo de Santiago , & o Muyto
' Reverendo P/M. Frey Francilboda ViílcaçãoD Abbadedo
Moíleiro de Travaiica , vejaó efte livro intitulado CaUrioto Lufita-
«o, compofto pello muyto Reverendo P. Pregador Geral Fr. Ra-
phaeldeJesvs,&enformem,retemalgúa copla contra -noíla Sanita
FéGatholica50ubóscun;unies.Tibaés,em io.de Fevereiro de 677.

Fr.CjiprtanodeMendoça Geral de S3enio.

CEKSV(IiA t)0 M.^I^.M, F(í(.F%AnclSQO ^A
if^iJitajaÕ 2)om J.bhade de S. Sahadorde TraVanca Mofityro da Ordem
• "ii -4o fatriarchd SaÕ 'Bento^ ® TroVincialj quefoy da me fina Ordem

noEHadodoBrafíL

-o

..^ttM

A

OR mandado do noíTo R^everendiffimo P.M.Fr.Cypriano de
MédoçaDom AbbadeGèral de N.Congregaçaó, ly com íin-
gulât atén^aó efte livro intitaládo Cáftnóto Ltífetano compofto peU
lo M.R.P.Prègadof Gétal Fr.Raphael de Jesv's:0 eftilo,có q eícre*'
ve,he taó feUjComo fempre o foy,ò cferftq pregou nosímais authori*
zados púlpitos defte Reyno,& em alguns de Gaftella. A matéria de
feu aíTumpto (psllas citcunftancias^a mayoi"', que viraó os homens
em muytas idades,porque contem em íi as perfiadas guerras,& pro-
digiofos fticçeíTos , que nellas acontecerão por tempo de vinte, &
quatro annos nas Capitanias da Bahia,Pernambuco,Paraiba, & Rio
Grande entre OlãdefeSj& Lufitanos, até que o braço deftes expul-
fou aquelles de tudo,o que no Braíil tinhaô ufurpado:Materia,para
occuparmuytosengenhosj&muytoslivros^ que oauthor recopila
nefte volume com tanta erudiçaò,verdade, & deftreza , que nelle fe
vé a brevidade clara,& a hift;ofia indeminuta: [materia,em que po^
de votar a experiência de doze annos,qqe peregrinei pellas Capita-
nias daquelle EftadoQ E porque nelle náoachey coufa algúa, qud
encontre noíía Sanâ:a Fé,& bons cuftumes , antes parecermeobra,
que pode defpertar em todos o agradecimento, que a Deos fe deve
pellos extraordinários benefícios , que naquella guerra fes a naçaõ
Portugueza,entendo fer digno de fe dar áeftampa . Efte he meu pa-f
recer.Saó Salvador de Travanca.Em 20. de Fevereiro de 1 677,

O Doutor Fr.Ftancifco da FifitacaÕD. Jbbade de TraVaca^

ã $■■■

li

leronymo de Santiago Céral.qfie/jy de noffa Congregarão,

p OR mandado do noflb Reverendiffimo P. M. Fr. CypriaBo de
Mendoça Dom Abbade Géral da noíTa Ordem, ly cotnatejnçaã
eíle iivro intitulado Çafirioto Lufitano compofto pelloM. R. P. Pre-
gador Géral Fr.Raphael de Jesvs, & delle colhi , que aífi eomo fea
Author,com uni verfal aplauzoprégou nos mais authorizados púl-
pitos deíle RejnOjalTi com a mefma deftreza defcreveo os progreí»
íbs das armas Portuguezas na America, voando fua pena,aonde nâd
chegou fua voz,& batalhando nos empregos de fcu talento o mo-
ral, o bellico, & o Politico com partido igual, & com tanta confo-
uancia, que o formidável da guerrajque ainda lido efpantajfuaviza-
áo com a elegância de feu eftilo eníina,& recrea j& como naó tenha
couza (conforme meu ent^der) diíTonante da pureza de noíTa Sá*
àz Fè,& bons cuftumes,me parece fer digno de fe dar á eftampa, &
útil para perfuadir á imitação com a reprefentaçaõ de tantos exem-
plos.Tibacs 28.de Março de 1 6yj.

O ^outor FrJeronymo de Santiago,

m

M/f/^.

U-, r>j ^*f- ib-

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