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Full text of "Civilizando Angola e Congo : os missionários do Espírito Santo no padroado espiritual português"

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Civilizando  Angola  e  Congo 


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Mgr.  A.  Le  Roy, 

Superior  Geral  da  Congregação  do  Espirito  Santo, 


Concedo  licença  para  a  publicação 
do  opúsculo  intitulado  «Civilizando 
Angola  e  Congo»  se  a  autoridade  ecle- 
siástica julgar  conveniente. 

Braga,  17  de  Agosto  de  1922. 

P:  Moysés  Alves  de  Pinho. 


IMPRIMATUR.  Bracarae,  die  17  Au- 
gusti  1922. 

Corrêa  Simões,  Vicárias  Gene  ralis. 


CIVILIZANDO 


ANGOLA  E  CONGO 


Os  Missionários  do  Espirito  Santo 
^       no  padroado  espiritual  português 


BRAGA 
Tipografia  Sousa  Cruz 

1922 


31/ 


^   ^ 


No  campo  do  Apostolado  contemporâneo 


Europa  colonizadora  de  nossos  dias  já  não  entende 
a  missão  que  tem  a  desempenhar  entre  as  raças 
inferiores  com  a  mesma  simplicidade  interesseira 
com  que  a  ia  entendendo  em  séculos  transactos.  Ao 
mesmo  passo  que  a  Igreja  indefectivel  na  sua  visão  caridosa 
de  almas  a  servir  e  a  amar,  porque  indefectivel  na  fé,  foi 
desempenhando  sempre  com  mais  ou  menos  êxito  a  função 
salvadora,  os  colonizadores  de  nacionalidade  vária  acostuma- 
ram-se  a  não  considerar  nas  respectivas  colónias  senão  minas 
a  explorar  e  a  exgotar;  e  franceses,  ingleses,  homens  da 
Holanda,  que  não  só  espanhóis  e  portugueses,  terrorizaram 
os  filhos  humildes  e  tímidos  da  Costa  Africana  com  razzias 
de  um  trafico  ignóbil,  e  depois  continuaram  a  dizimar  as 
robustas  raças  do  interior  com  drogas  e  álcool  dum  comércio 
interesseiro  e  envenenador. 

Depois  de  cruzadas  de  humanidade  e  amor  como  a  do 
grande  apostolo  inglês  William  Wilberforce,  a  atmosfera  foi-se 
purificando,  de  forma  que  hoje  a  escravatura  não  seria  já  tole- 
rada; e  o  próprio  trafico  do  álcool  para  indígenas  foi  quasí 
inteiramente  proscrito  pelas  Nações  Aliadas,  arredada  da 
Africa  a  competição  do  comercio  alemão. 

Ao  menos  em  teoria,  Deus  louvado !  a  colonização  é  hoje 
inseparável  do  protectorado,  entendido  na  acepção  de  obriga- 
toriedade de  protecção  ao  indígena.  Quer  dizer,  o  ideal  evan- 
gélico, a  verdadeira  civilização  ganha  terreno...  apesar  da 
queixa  universal  contra  a  maldade  dos  tempos. 


E'  precisamente  por  isso  que  as  Missões  em  terras  de 
colonização  europeia  teem  tomado,  nos  últimos  tempos,  uma 
expansão  tão  extraordinária  e  de  tanta  intensidade  de  vida, 
sejam  de  que  religião  forem,  e  de  qualquer  nacionalidade  que 
procedam,  não  só  com  simpática  tolerância,  mas  ainda  com  o 
bafejo  do  favor  positivo  dos  poderes  interessados  em  coloni- 
zação. 

Em  1885  a  Conferencia  de  Berlim  estipula  que  todas  as 
potencias,  que  exercem  direito  de  soberania  nos  territórios  do 
Sertão,  protejam  e  facilitem  todas  as  instituições  religiosas, 
creadas  com  fins  como  o  da  conservação  de  populações  nativas, 
melhoramento  das  condições  morais  e  materiais  da  existência, 
supressão  do  tráfico  escravista.  Em  1890  o  acto  geral  da  Con- 
ferencia de  Bruxelas  acaba  de  colocar  as  emprezas  missiona- 
rias de  qualquer  denominação  e  procedência  ao  abrigo  <la 
legislação  internacional  no  Continente  Negro.  Emfim  o  artigo 
438  do  Tratado  de  Paz  de  Versalhes  reconhece  esta  disposição, 
como  do  Direito  das  Gentes,  e  explica  o  modo  de  aplica-la 
às  missões  de  procedência  alemã. 


Coincide  com  esta  atitude  do  poder  secular  nos  últimos 
tempos  a  expansão  extraordinária  das  missões  evangélicas 
protestantes.  Os  obreiros  evangélicos  desta  denominação  su- 
biam em  numero,  de  1815  a  1915,  os  brancos  de  176  a  31:000, 
os  indigenas  habilitados  de  O  a  112:000!  Metodistas  america- 
nos e  suissos,  a  <'Church  Missionary  Society»  dos  Anglicanos, 
Luteranos  alemães  e  Presbiterianos  escoceses,  lançaram-se 
todos  sobre  a  Africa,  sem  consideração  de  linguas  e  bandeiras, 
sobre  a  Austrália  e  as  ilhas  oceânicas,  no  afan  de  proselitizar 
infiéis. 

E  ilude-se  quem  desdenhosamente  queira  minimizar  este 
esforço  do  Cristianismo  errático  e  incompleto,  e  ver  nisto  tudo 
um  empenho  mercantil  apenas.  Entre  os  evangelizadores, 
cavalheiros  e  senhoras,  não  deixa  de  haver  muito  zelo  (por 
vezes  amargo  e  fanático)  e  muita  inteligência  e  coragem.  O 
que  sobretudo  somos,  os  católicos,  modestamente  obrigados 
a  reconhecer  é  que  os  cristãos  dissidentes  na  America  e  na 
Inglaterra  compreendem  muito  melhor  que  os  dos  países  cató- 
licos a  necessidade  de  cooperar  com  o  missionário  na  salvação 
do  mundo.  Os  católicos  dão  esmolas  para  a  propagação  da 
Fé;  os  protestantes  pagam  uma  contribuição  regular  volunta- 


ria.  (1)  Por  isso  mesmo  podem  expandir-se  as  missões  da 
heresia  muito  mais  desafogadas  que  as  ortodoxas,  e  encontram 
mais  naturalmente  candidatos  evangelizadores,  porque  não 
teem  estes  de  expor-se  a  uma  vida  de  tanta  abnegação  e 
abandono  à  Providencia. 

Mas,  se  com  menos  recursos,  nem  por  isso  as  missões 
católicas  teem  afrouxado  no  zelo  salvador.  Apesar  do  desleixo 
dos  teólogos,  de  quem  com  certa  razão  se  queixa  Mons.  Ale- 
xandre Le  Roy  que  teem  teses  para  tudo  menos  para  enunciar 
o  dever  mais  categórico  que  nos  deixou  o  Evangelho :  —  «ide  e 
ensinai  todos  os  povos'>  —  o  povo,  na  espontaneidade  da  sua 
fé,  forneceu  sempre  e  continua  a  fornecer  obreiros  para  a  em- 
preza  santa  e  desdenhada. 

Apesar  da  dispersão  violenta  das  ordens  religiosas  nal- 
guns países,  vimos  multiplicarem-se  ultimamente  pelas  terras 
do  paganismo  além  obras  de  agremiações  missionarias  de  toda 
a  espécie:  de  padres  e  de  leigos,  de  homens  e  femininas. 

As  Missões  Estrangeiras  de  Paris  lançam-se  pela  Ásia  a 
dentro  e  invadem  o  gentilismo  chinês;  as  Missões  Africanas 
de  Lião  tomam  conta  da  Costa  Ocidental  Africana,  da  Libéria 
ao  Niger;  os  PP.  Brancos  de  Lavigerie  encarregam-se  das  po- 
pulações arabizadas,  do  sul  marroquino,  pelas  granjas  do 
Saara,  até  ao  Nilo,  pelas  regiões  do  musulmanismo  e  da  escra- 
vatura; enfim,  para  não  falar  dos  missionários  belgas  de  Scheut, 
dos  ingleses  de  S.  José  de  Mill  Hill,  dos  italianos  da  Consolata, 
e  dos  alemães  Palatinos  e  austríacos  do  Verbo  Divino,  os 
Padres  do  Espirito  Santo  tomam  à  sua  conta  e  evangelizam 
um  terço  das  colónias  africanas,  à  sombra  de  cinco  bandeiras 
colonizadoras  diferentes. 

Para  a  educação  das  meninas  gentílicas  e  formação  de 
mães  cristãs,  multiplicaram-se  paralelamente  as  associações 
femininas  de  evangelização:  Missionarias  Franciscanas  de 
Maria,  Irmãs  de  S.  José  de  Cluny  e  Irmãs  da  Conceição  de 
Castre  rivalizam  com  os  missionários  dos  diferentes  institutos 
e  países  em  dedicação  e  coragem  varonil. 

Seria  evidentemente  gostosa  tarefa  seguir  pelo  mundo 
fora  todos  aqueles  mensageiros  do  bem  e  todas  estas  admi- 
ráveis heroínas  da   salvação  e  educação  dos  humildes.  Mas, 


(1)  Nos  melhores  anos  passados  teni-se  aproximado  de  10  milhões 
de  francos  o  rendimento  da  Propagação  da  Fé  (católica).  Com  o  de  St.* 
Infância,  etc,  dêmos  que  se  elevem  a  20  milhões.  Pois  bem:  em  1915 
as  contribuições  anuais  protestantes  somavam  166  milhões  de  francos! 


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como  a  cada  qual  marcou  a  Providencia  seu  especial  talhão 
na  vinha  das  almas,  limitamo-nos  aqui  à  exposição  da  obra 
que  na  Africa  Portuguesa  realiza  a  Congregação  do  Espirito 
Santo.  . 

Oxalá  que  não  venha  esta  Congregação  a  ficar  sozinha  a 
braços  com  o  cultivo  daquele  vasto  campo,  onde  atéqui  a  tem 
coadjuvado  o  clero  secular,  aliviando-a  da  gerência  de  paro- 
quias já  organizadas.  Infelizmente  vai  rareando  o  clero  desta 
classe,  depois  que  a  Republica  transformou,  a  ensaio,  em 
Instituto  de  Civilizadores  laicos  o  antigo  Seminário  de  Ser- 
nache. 

E'  também  verdade  que  este  -vai  outra  vez  reconstituir-se 
em  Tomar;  mas  será  ainda  muito  o  tempo  porque  se  deverão 
contentar  as  colónias  com  restos  esparsos.  Lamenta-o  Angola, 
e  lamenta-o  ainda  mais  Moçambique,  onde,  além  daquelas 
relíquias,  o  desolado  pastor  recentemente  nomeado,  D.  Rafael 
da  Assunção,  apenas  pode  contar  com  os  seus  confrades 
Franciscanos  da  Beira,  porque  o  advento  da  Republica  expe- 
liu do  Zambeze  os  missionários  jesuítas;  e  a  entrada^de  Por- 
tugal na  grande  conflagração  europêa  levou-nos  a  dispensar 
os  esplêndidos  missionários  austríacos  do  Verbo  Divino  que 
aos  jesuítas  sucederam. 


A  Gonireiação  do  Espirito  Santo. 
Dúplice  Oriiem  da  Associação 


A  Associação  do  Espirito  Santo 

A  Congregação  dos  «farrapeiros  da  Santa  Igreja»,  como 
humoristicamente  lhe  chamou  o  que  mais  tarde  veremos  se- 
gundo fundador,  nasceu  já  com  aquele  selo  de  modéstia  evan- 
gélica de  que  se  gloria,  mas  ainda  não  tão  especializada  como 
a  vemos  hoje  nos  serviços  áà  farrapagem  africana. 

Em  1703  o  Padre  Claude  Poullart  des  Places,  filho  de 
um  advogado  do  Parlamento  da  Bretanha,  associava-se  com 
mais  dois  sacerdotes  para  educar  e  sustentar  estudantes  pobres, 
capazes  de  virem  a  ser  pastores  úteis  na  Igreja  de  Deus  em 
ministérios  humildes  e  de  ajudarem  os  compassivos  directores 
nos  serviços  de  caridade  eclesiástica,  para  que  mais  dificilmente 
se  encontram  obreiros.  A  esta  associação  foram  acrescendo 
pouco  a  pouco  membros  novos,  muitos  pupilos  antigos  do 


Seminário,  educados  e  ordenados  com  as  esmolas  angariadas 
pelos  abnegados  directores. 

Entretanto,  se  a  ideia  das  missões  longinquas  não  foi  o 
motor  original,  vimo-la  dominar  desde  logo  nas  preocupações 
do  apostólico  fundador.  Sentia-se  ele  próprio  mui  levado  a 
«ir  para  os  selvagens^>  e  não  tardou  a  fornecer  de  seu  Semi- 
nário sacerdotes  missionários  a  vigários  apostólicos  da  China, 
de  Tonkim,  de  Sião,  e  de 
varias  colónias  francesas 
de  Africa. 

Foi  durante  o  supe- 
riorado  de  Monsieur 
Bouic,  segundo  sucessor 
de  Poullart  des  Places, 
que  a  associação  se  orga- 
nizou, com  Regra  redigi- 
da, aprovação  canónica, 
reconhecimento  legal  por 
Luiz  XV  (1734).  Depois 
da  morte  dele,  e  sob  o 
governo  de  Monsieur  Be- 
cquet,  terminava-se  a 
construção  na  rue  des 
Postes,  Paris,  do  edificio 
que  ainda  hoje  é  o  Semi- 
nário das  Colónias.  De 
então  por  diante  ficava 
a  habilitação  de  clero 
para  as  missões  da  Afri- 
ca francesa  constituindo 
o  fim  principal  e  quasi 
exclusivo  da  Associação. 


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Becquet  morria  em 
1788.  O  sucessor,  Mon- 
sieur Duflos,  era  eleito  para  assistir  à  dispersão  e  à  tormenta 
revolucionaria.  Em  1805  quando  Monsieur  Bertou  voltava  do 
exilio,  de  Inglaterra,  e  recebia  da  mão  do  superior-martir,  então 
moribundo,  o  múnus  de  reger  a  associação,  achou-se  a  braços 
com  três  dificuldades  quasi  insuperáveis:  reunir  os  membros, 
obter  nova  aprovação  legal  para  a  associação  dissolvida,  enfim 
provê-la  dé  alojamento.  Conseguiu,  à  força  de  muita  fadiga  e 
a  custo  de  muita  amofinação,  o  reconhecimento  do  governo 
imperial  (1804),  a  reintegração  no  Seminário  Colonial  da  rue 


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des  Postes,  enfim  colaboradores  assas  numerosos  para  a 
direcção  do  instituto  antigo  e  de  um  Seminário  menor  desti- 
nado a  preparar  recrutas  para  aquele. 

Sucedia  ao  restaurador  da  Congregação  e  ia  proseguir  na 
reorganização  dela  Monsieur  Fourdinier.  Quiz-lhe  ele  dar  um 
caracter  ainda  mais  apostólico,  tornando  os  membros  não  só 
educadores  de  missionários,  mas  eles  próprios  missionários 
dos  infiéis.  Faltava  pessoal.  Creu  o  superior  obviar  a  essa 
falha  admitindo  na  sociedade,  com  um  ano  em  vez  de  dois  de 
provação,  os  alunos  antigos. 

A  ideia  era  boa;  mas  não  pegou.  Continuaram  os  supe- 
riores seguintes  persistindo  nela,  urgindo-a.  A  Congregação 
foi  definhando,  e  só  conseguiu  viver,  deixando  enxertar  no 
tronco  exausto  o  viço  novo  de  outra  Congregação,  recentemente 
nascida,  e  precisamente  com  o  feitio  novo  que  Fourdinier 
quizera  tornear  na  velha. 


Congregação  do  SS.  Coração  de  Maria 

A  Sociedade  dos  Missionários  do  SS.  Coração  de  Maria, 
ideada  por  dois  seminaristas  creoulos  do  Seminário  de  S. 
Sulpicio,  Frederico  Levavasseur  e  Eugénio  Tisserand,  originá- 
rio o  primeiro  da  ilha  Bourbon  e  o  segundo  natural  de  S. 
Domingos  (Antilhas),  foi  levada  a  termo  por  um  pobre  semi- 
narista, israelita  convertido,  excluído  ao  tempo  do  sacerdócio 
por  uma  terrível  doença  nervosa.  Achava-se  o  humilde  acólito 
director  espiritual  de  um  noviciado  de  Eudistas  em  Rennes 
quando  os  seus  dois  ex-condiscipulos  do  grande  Seminário 
parisiense,  ajudados  pela  iluminação  do  Céo,  o  trouxeram  a 
colaborar  na  empreza  salvadora  dos  negros  (da  qual  ambos 
apostolicamente  se  enamoraram,  por  ambos  terem  sido  testi- 
munhas,  nas  terras  natais  respectivas,  da  abjecção  e  miséria 
a  que  as  populações  negras  iam  votadas). 

Chamava-se  aquele  seminarista,  já  então  genial  director 
de  almas,  e  autor  de  cartas  de  direcção,  que  formam  hoje  um 
pecúlio  ascético  precioso,  Francisco  Maria  Paulo  Libermann. 

Dirigiu-se  a  Roma,  escreveu,  negociou,  orou,  e  por  fim 
obteve  a  aprovação  da  Propaganda  para  o  plano  e  para  a 
Regra  do  novo  Instituto  Missionário,  sendo  mesmo  urgido  a 
tomar  a^direcção  dele,  depois  de  ordenado  sacerdote  por  um 
prelado  benévolo. 

Foi  completar  em  Strasbourg,  diocese  de  origem,  a  for- 
mação sacerdotal,  e  ali  se  ordenou  de  subdiácono  e  de  diácono; 


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um  més  depois  (Setembro  de  1841)  Monsenhor  Miolarid  impii- 
nha-lhe  as  mãos  em  Amiens,  e  dava  ao  novel  sacerdote,  com 
orgulho  e  gosto  paternal,  licença  para  abrir  em  La  Neuville 
uma  casa  de  provação  e  formação  missionaria. 

A  25  de  Setembro  de  1841  o  núcleo  primeiro  da  Sociedade 
AAissionaria  inaugurava-se  ante  o  altar  da  Senhora  das  Vitórias 
em  Paris,  numa  enternecida  missa  conventual,  em  que  celebrou 
o  novo  levita  e  superior  e  eram  assistentes  os  três  restantes 
membros:  P.'^  Levavasseur,  Tisserand  e  Collin. 

Quatro  inezes  após  a  abertura  da  casa  de  La  Neuville,  já 
Levavasseur  partia  evangelizar  a  sua  ilha  de  Bourbon.  Tisse- 
rand embarcava,  pouco  depois,  a  civilizar  e  a  ajudar  as  popu- 
lações negras  de  S.  Domingos.  E  já  antes  se  agregara  à  Con- 
gregação e  partira  em  nome  dela  para  a  Mauricia  um  pároco 
da  diocese  de  Evreux,  ex-medico,  n'vido  de  dedicação,  que 
veio  a  ser  o  Apostolo  Venerado  das  povoações  daquela  ilha, 
que  ainda  hoje  peregrinam  de  todos  os  recantos  dela  em 
romagem  piedosa  e  agradecida  ao  tumulo  do  Padre  Lavai. 

Em  1843  partiu  para  a  Guiné  Francesa  a  primeira  leva 
de  missionários  habilitados  em  La  Neuville,  sete  padres  que 
o  superior  poz  às  ordens  de  Mons.  Barrou,  enviado  pela  Pro- 
paganda como  Vigário  Apostólico  das  «Duas-Guinés»  (Guiné 
e  Senegambia).  Foi  um  tentame  desastroso;  a  falta  de  expe- 
riência tropical  e  de  preparação  para  arrostarem  com  aquele 
clima  fez  do  desembarque  no  cabo  das  Palmas  uma  fúnebre 
marcha  para  a  morte.  Só  escapou  o  Padre  Bessieux.  O  vigá- 
rio apostólico  desanimou,  pediu  a  demissão,  e  foi  para  a  Ame- 
rica do  Norte  a  dispender  no  serviço  dos  humildes  o  resto 
das  forças.  A  Congregação  vitimada  é  que  não  quiz  desmaiar. 
Em  La  Neuville  surgiram  ardores  novos,  que  na  Africa  que- 
riam lutar  e  vencer.  E  em  1846  encarregou-se  a  própria  Con- 
gregação directamente  das  Duas-Guinés,  com  Mons.  Truffet, 
um  membro,  como  vigário  apostólico.  Assim  entrava  a  modesta 
Sociedade  Missionaria  de  posse  da  sua  herdade,  e  a  cumprir 
os  desígnios  que  lhe  assignara  o  Céo,  os  fados  que  lhe  fiara 
misteriosamente  a  Providencia. 


A  fusão 

Ao  expirar  da  primeira  metade  do  século  XiX  temos,  então, 
lado  a  lado,  em  França,  duas  sociedades  missionarias  a  pen- 
der para  a  Africa  selvagem  e  feiticista:  uma  a  sair  do  berço 
e  fervente  de  dedicação  e  de  vida;  a  outra  no  transe  de  uma 


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crise  de  braços,  precisamente  quando  seu  ideal  se  orientava 
mais  definidamente  para  a  intervenção  directa  no  apostolado 
longinquo.  Era  natural  que  as  duas  associações  se  aproximas- 
sem: a  do  Espirito  Santo,  ávida  dum  contacto  com  a  vida,  a 
do  Coração  de  Maria  com  muito  que  aproveitar  das  vantagens 
sociais  e  situação  legal  da  sociedade  mais  velha.  No  dia  do 
Pentecostes  de  1848,  numa  assembleia  geral  no  Seminário  do 
Espirito  Santo,  em  Paris,  resolvia-se  a  união  das  duas  socie- 
dades. A  24  de  Agosto  reuniam-se  no  mesmo  estabelecimento 
representantes  de  ambas,  a  estipular  as  condições  da  fusão, 
terminando  por  enviar  a  Roma  um  delegado,  que  negociasse  a 
aprovação  do  novo  estado  de  cousas.  Emfim,  a  4  de  Setembro 
de  1848,  a  Santa  Sé  sancionava  a  união,  especificando  que  ela 
fosse  feita  pelo  ingresso  da  Sociedade  do  Coração  de  Maria 
na  do  Espirito  Santo,  e  que,  incorporada  nesta,  aquela  deixasse 
de  existir. 

Libermann  ficava  o  primeiro  superior  geral  das  Congre- 
gações assim  fundidas  numa;  mas  foi  somente  sob  o  governo 
de  seu  sucessor  que  Constituições  novas,  gravitando  à  roda 
dos  princípios  da  Regra,  elaborada  pelo  segundo  fundador, 
fixaram  numa  organização  definitiva  de  caracter  religioso  a 
nova  Congregação  do  Espirito  Santo  e  do  Imaculado  Coração 
de  Maria. 

O  Superior  antigo  do  Espirito  Santo,  Monsieur  Monnet, 
que  dera  a  demissão  para  ser  substituído  por  Libermann,  foi 
nomeado  pela  Propaganda  vigário  apostólico  de  Madagáscar, 
tomando  com  ele  a  Congregação  conta  da  evangelização  de 
mais  uma  colónia. 

Desenvolvimento  da  Nova  Sociedade 
Missionaria 


Em  vida  de  Libermann 

Em  1848  a  Congregação  renovada  do  Espirito  Santo 
contava  já  43  membros,  dos  quais  nada  menos  que  34  filhos 
do  enxerto  novo  do  Coração  de  Maria. 

Contavam-se  então  em  França  três  residências:  a  de 
Notre  Dame  du  Gard  (que  substituirá  a  de  La  Neuville);  a 
de  Bordéus,  adquirida  para  cómodo  dos  missionários  prestes 
a  embarcar,  ou  de  volta  da  Africa;  emfim  a  de  Paris,  sede 
administrativa  da  Sociedade,  com  a  obra  anexa  de  um  Semi- 


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nario  colonial,  dirigido  por  membros  da  Congregação,  e  fre- 
quentado por  aspirantes  seculares  ao  serviço  paroquial  das 
colónias  francesas. 

O  vicariato  apostólico  das  Guinés,  adjudicara-o  a  Santa 
Sé,  como  vimos  atrás,  à  Congregação,  em  virtude  das  nego- 
ciações do  Venerável  Libermann.  Nestas  negociações  eviden- 
ciou o  humilde  e  despretencioso  padre  como  a  Providencia  o 
talhara  para  iniciador  dum  movimento  missionário. 

«Chegou  o  santo  Fundador  a  Roma,  diz-nos  o  seu  biografo, 
o  Padre  Laplace,  na  ocasião  em  que  se  celebrava  com  toda  a 
pompa  e  solenidade  a  festa  do  apostolo  S.  Pedro;  dias  depois 
submetia  à  apreciação  da  Propaganda  um  longo  e  assas  notá- 
vel memorial  sobre  a  missão  de  Africa.  Ali  encarava  Libermann 
essa  questão  sob  todos  os  pontos  de  vista,  discutindo  todas 
as  objecções  feitas  contra  esse  apostolado,  e  defendendo  como 
Pai  amantíssimo  os  interesses  dos  seus  queridos  negros.  Nesse 
documento  em  que  enumerava,  sem  todavia  as  atenuar,  todas 
as  dificuldades  que  havia  a  vencer,  e  propunha  os  meios 
que  mais  próprios  pareciam  para  delas  triunfar,  era  o  santo 
Fundador  de  opinião  que  nada  importava  tanto  para  o  bom 
êxito  daquela  obra,  como  o  redigir  desde  logo  um  plano  geral 
que,  pelas  suas  qualidades,  se  tornasse  estável,  e  fosse  seguido 
pelos  membros  do  instituto  com  a  máxima  paciência  e  perse- 
verança. Devia  esse  plano  ter  em  vista  a  instituição  duma 
sociedade  cristã,  das  mais  completas,  no  seio  da  qual  esses 
povos  podessem  adquirir  não  só  a  fé  e  muitos  outros  dons 
sobrenaturais,  como  também  os  conhecimentos  naturais  que 
lhes  faltavam  com  respeito  à  agricultura,  às  artes  e  aos  oficias, 
e  mais  estudos  a  que  se  destinavam.  Queria  ele  que  esse  novo 
ramo  da  Igreja  Católica  não  constasse  somente  de  neófitos 
espalhados  aqui  e  ali,  de  cristandades  isoladas,  de  acampa- 
mentos de  missionários  nómadas,  mas  também  de  catequistas, 
de  apóstolos  e  religiosos  localmente  formados.  Recebeu  o  servo 
de  Deus  na  cidade  santa  o  mais  favorável  acolhimento,  sobre- 
tudo da  parte  da  Sagrada  Congregação  da  Propaganda. 

«Fui  muito  bem  recebido  em  Roma,  dizia  ele,  e  julgo 
poder  dizer  que  a  nossa  ordem  goza  aqui  de  toda  a  conside- 
ração. Todos  na  Congregação  da  Propaganda  nos  estimam  e 
nos  favorecem,  podemos  também  contar  com  a  dedicação  do 
núncio  de  Sua  Santidade  em  Paris,  o  qual  sempre  que  me 
escreve  se  serve  de  termos  próprios  a  animar-me.  Bem  sei  que 
nunca  devemos  contar  com  o  apoio  das  creaturas;  comtudo 
quando  a  Santa  Sé  ou  os  seus  representantes  julgam  dever 
proteger  uma  obra,  pode  toda  a  alma  cristã  ver  neste  facto 


14 


uma  prova  evidente  da  vontade  divina  e  sentir  por  esse 
motivo  uma  grande  e  bem  fundada  satisfação. 

Viu  Libermann  recompensada  a  sua  confiança.  A  entrega 
por  ele  feita  do  seu  importante  memorial  à  Sagrada  Congre- 
gação da  Propaganda  teve  como  resultado  o  estabelecimento 
de  um  novo  vicariato  apostólico,  compreendendo  as  duas  Gui- 
nés e  a  Senegambia,  numa  extensão  de  mil  e  duzentas  léguas 
ao  longo  do  litoral  e  sem  limites  para  o  interior. 

Depois  da  morte  de  Mons.  Truffet,  ocorrida  ainda  em 
tempo  do  Fundador,  conseguiu  este  que  ao  novo  vigário  das 

Guinés  e  da 
Senegambia, 
vicariato  vago 
e  quasi  ilimi- 
tado, se  atri- 
buísse imedia- 
tamente um 
coadjutor.  Foi 
este  Mons,  Ko- 
bés,  sagrado 
emStrasbourg 
ainda  antes  de 
o  ser  o  vigá- 
rio apostólico, 
Mons.  Bes- 
sieux, o  sobre- 
vivente mila- 
groso da  pri- 
meira   leva 

apostólica  (de  quem  já  falamos,  e  que  ainda  se  encontrava  no 
interior  africano,  vindo  a  realizar-se  a  sua  sagração  na  capela 
do  Seminário  do  Espirito  Santo  só  em  Janeiro  de  1849). 

Em  1852,  aos  dois  de  Fevereiro,  falecia  em  Paris  em  odor 
de  santidade  o  Venerável  Fundador  (cuja  causa  de  beatifica- 
ção procede  em  Roma  lenta  mas  segura)  com  o  sonho  apostó- 
lico da  Guiné  a  ocupar-lhe  como  obsessão  os  últimos  pensa- 
mentos. Deixava  seus  filhos  a  braços  com  a  empreza  da 
civilização  cristã  não  só  da  Guiné,  mas,  como  vimos,  da 
Mauricia,  de  Bourbon,  de  S.  Domingos,  de  Madagáscar. 

Tinha  além  disso  o  Venerável  Fundador  concedido  a 
Mons.  Brady,  bispo  de  Perth  na  Austrália,  cinco  missionários; 
mas  a  Providencia  mostrou-se  avessa  à  empreza  de  evange- 
lizar os  esparsos  selvagens  de  uma  vasta  extensão  despo- 


0  fundador  das  Missões  Africanas  do  Esp.  Santo  no  seu  leito  de  morte. 


15 


voada:  o  padre  Bouchet  faleceu  vitima  dum  empreendimento 
generoso  mas  sem  fruto  proporcionado,  e  os  outros  padres 
transferiram-se  à  ilha  Mauricia,  a  ajudar  o  santo  Lavai  na 
colheita  dos  frutos  de  salvação,  que  ele  semeara  e  já  não 
podia  ceifar  só. 


Expansão  póstuma 
da   família    de   Libermann 


o  desenvolvimento  rapidissimo  que  a  Obra  Missionaria 
tomou  depois  da  morte  do  Venerável  Libermann  requeria  uma 
organização.  Foi  esta  a  obra  do  sucessor  imediato.  O  P.** 
Schwindenhammer  fixou  nas  Constituições,  amplificação  do 
quadro  rudimentar  das  Regras  de  BouVc  amalgamadas  com  a 
preciosa  Regra  Provisória  de  Libermann,  as  normas  futuras 
da  vida  social,  que  foram  votadas  no  Capitulo  Constituinte 
de  1853. 

Da  Administração  Geral  destacavam-se  as  provincias,  a 
da  França  e  mais  outras  três:  Africa  Ocidental,  Ilhas  do 
Oceano  Indico,  e  Antilhas.  Cada  uma  destas  ultimas  circuns- 
crições religiosas,  à  medida  que  foi  crescendo,  foi-se  ramifi- 
cando, deitando  gomos  que  pouco  e  pouco  se  diferenciaram  e 
fixaram  em  divisões  eclesiásticas  independentes.  Além  disso 
foram  dando  razão  ao  empenho  de  se  irem  creando  na  Europa 
provincias  novas,  que  recrutassem  pessoal  competente  para 
civilizar  povos  que  exorbitavam  da  esfera  politica  e  colonial 
da  França. 

Nos  vicariatos  apostólicos  das  Duas  Guinés  e  da  Sene- 
gambia  achavam-se  englobadas  a  Libéria  independente  e  de 
lingua  inglesa,  o  território  britânico  da  Serra  Leoa,  e  a  Gam- 
bia, inglesa  também.  Devia,  pois,  naturalmente  surgir  a  ideia 
de  uma  provincia  britânica  da  Congregação,  para  habilitar 
missionários  idóneos  para  a  civilização,  ao  mesmo  tempo  cristã 
e  inglesa,  daquelas  populações.  Era  natural  pensasse  a  Direc- 
ção na  Irlanda,  a  um  tempo  católica  e  ingleza  (ao  menos  de 
lingua...).  Fundaram-se,  depois  em  um  estabelecimento  provi- 
sório em  Blanchardston,  os  dois  florescentes  colégios  de  Bla- 
ckrock  e  Rockwell,  respectivamente  em  1860  e  1864. 

Mesmo  antes  de  a  Alemanha  armar  em  potencia  colonial 
pensou  a  Congregação  em  recrutar  naquele  país  missionários 
africanos.  Estabeleciam-se  dois  núcleos  de  recrutamento,  um 


16 


em  1862  e  outro  em  1864,  ambos  na  diocese  de  Colónia,  des- 
tinados, porem,  ambos  a  serem  de  pouca  duração,  porque 
havia  de  dissolvê-los  o  Kulturkampf  em  1872.  A  província 
alemã,  mui  florescente  antes  da  Guerra  Europêa  e  fornecendo 
missionários  numerosos  ao  Zamguebar  Alemão,  só  devia  resus- 
citar  em  1895. 

Do  estabelecimento  da  Sociedade  em  Portugal,  que  foi 
pouco  posterior  ao  primeiro  tentame  de  penetração  na  Ale- 
manha, veremos  mais  amplamente. 

Nos  Estados  Unidos,  a  Terra  Santa  Generosa  da  Liber- 
dade, pensara  já  o  próprio  segundo  Fundador,  que  não  pudera 
ser  insensível,  em  seu  coração  de  pai  por  adopção  dos  negros, 
aos  milhões  deles  espalhados  pelo  território  da  grande 
republica,  pujante,  viril  e  generosa  mas  ainda  então  por 
libertar  da  nódoa  vil  da  escravatura.  Só  em  1873,  porém,  foi 
possível  a  inauguração  da  hoje  tão. próspera  província  ameri- 
cana, pela  aceitação  de  paroquias  de  missão  na  diocese  de 
Cincinati. 

Emfim,  como  a  actividade  belga,  procurava  nos  trópicos 
um  campo  onde  despejasse  as  inergias  superabundantes  da 
nação,  como  o  vasto  território  do  Congo,  ainda  que  só  em 
1908  houvesse  de  vir  a  ser  atribuído  à  Bélgica,  já  então  fosse 
campo  reservado-  aos  agentes  inoficiais  do  rei  dos  Belgas, 
fundou-se  em  Lierre  em  1901  a  primeira  casa  da  Congregação, 
começando  a  evoluir  a  província  que  em  1904  incorporaria 
também  a  nação  vizinha  e  amiga,  constituindo  provisoriamente 
a  divisão  religiosa  da  Belgica-Holanda. 


Em  territórios  de  Portuial 


Uma.  sociedade  de  bem-fazer  que  olhava,  como  numa 
obsessão,  para  os  filhos  de  Africa  a  salvar,  que  os  fora  procu- 
rar à  ilha  Bourbon,  à  ilha  Mauricia,  àsGuinés,  e  até  ao  exilio  de 
origem  escrava  do  Haiti,  não  podia  deixar  de  volver  os  olhos  e 
a  atenção  para  Portugal,  o  povo  de  vocação  histórica  mais 
denodadamente  africana,  e  ainda  modernamente  das  poucas 
grandes  potencias  em  Africa.  O  Venerável  Libermann  abraçava 
já  no  âmbito  de  seu  zelo  salvador  as  colónias  de  Portugal.  O 
próprio  vigário  apostólico  Barron,  apesar  das  misérias  com 
que  via  lutar  o  pessoal  do  Espirito  Santo  posto  a  seu  serviço 
para  salvar  a  Guiné,  pensava  em  enviar  ao  Congo,  em  1842, 


I 


17 


alguns  dos  missionários.  Mons.  Bessieiíx,  vigário  das  Duas 
Guinés,  e  Mons.  Kobés,  vigário  da  Senegambia,  persegue-os, 
como  um  pesadelo,  também  a  lembrança  daquela  terra  miste- 
riosa, por  cima  da  qual  deslumbrara  já  o  clarão  evangélico 
mas  de  novo  recaída  na  treva  gentílica  tão  depressa! 

Em  1852,  o  bispo  de  Angola  e  Congo— dispunha  ao  todo 
de  cinco  sacerdotes,  quatro  em  Loanda  e  um  em  Benguela, 
para  o  serviço  espiritual  de  tão  vasta  diocese:  assim  o  contava 
o  próprio  bispo  Moreira  e  Reis  a  um  missionário  do  Espirito 
Santo  que,  passando  por  Loanda,  lhe  fora  apresentar  sua 
homenagem. 

Por  isso  submetia  o  P.'  Schwindenhammer  em  1865  ao 
Cardeal  Prefeito  da  Propaganda  um  projecto  de  reevangeli- 
zação  do  Congo  acompanhado  de  um  esplendido  relatório 
elaborado  pelo  Padre  Duparquet,  e  que  foi  tanto  mais  bem 
acolhido  em  Roma,  quanto  ali  andavam  já  havia  anos  excepcio- 
nalmente solícitos  acerca  dos  interesses  espirituais  daqueles 
longínquos  territó- 
rios. Com  efeito,  em 
1855,  pedira  o  rei 
do  Congo  ao  Go- 
verno Português  lhe 
mandasse  missio- 
nários. A  Santa  Sé, 
para  ajudar  o  nosso 
Governo  a  poder 
responder  àquele 
apelo,     lembrou-se 

de  apelar  a  seu  turno  para  os  Capuchinhos,  que  foram  no 
passado  os  evangelizadores  das  regiões  congo-angolanas.  Mas 
aqueles  frades,  mal  feridos  por  toda  a  Europa  pela  passagem 
da  Revolução,  não  se  sentiram  com  vitalidade  suficiente  para 
ousarem  meter  ombros  à  empresa.  A  Propaganda  tenteou 
ainda  o  pulso  de  outra  congregação  italiana,  mas  nessa  igual- 
mente achou  desanimo  ante  o  empreendimento  sugerido.  Era 
pois  como  caído  do  Céo  que  chegava  à  Sagrada  Congregação 
o  oferecimento  de  Schwindenhammer,  avidamente  aceite,  sendo 
logo  o  Congo  confiado  ao  zelo  apostólico  da  Congregação, 
sem  detrimento  dos  privilégios  do  Padroado  Português,  nem 
da  jurisdição  espiritual  do  bispo  de  Angola  e  Congo, 

O  decreto,  que  assim  provê  ao  bem  espiritual  das  nossas 
colónias  da  Africa  Ocidental  (e  que  não  é  senão  a  restauração 
da  prefeitura  apostólica,  em  1640  estabelecida  por  Urbano  VIU, 
a  pedido  de  portugueses  e  congolanos)  deve  ser  lido  e  pon- 


18 


derado.  Salvaguarda  escrupulosa  e  atenciosamente  os  nossos 
direitos  e  pondunores  nacionais.  E'  seu  teor  o  que  segue: 

«Por  fins  do  século  XV  era  a  luz  do  Evangelho  levada 
até  às  populações  do  Reino  Africano  do  Congo;  e  o  próprio 
rei,  entrando  para  o  seio  da  Santa  Igreja  Católica,  (1)  implo- 
rou da  Santa  Sé  a  erecção  de  um  bispado  nas  suas  terras  e 
estados. 

A  sede  episcopal  fixou-se  em  S.  Salvador;  mas,  ou  em 
vista  da  distancia  a  que  este  centro  ficava  do  mar,  ou  devido 
às  dificuldades  de  comunicação  com  europeus,  julgaram  con- 
veniente os  bispos  transferir  dali  a  residência  para  S.  Paulo 
de  Loanda,  cidade  que  os  Portugueses  haviam  edificado  nas 
costas  do  oceano,  uma  vez  conquistada  a  região  de  Angola. 
Com  a  graça  de  Deus  propagou-se  maravilhosamente  a  reli- 
gião; e  dentro  em  pouco  se  achavam  insuficientes  os  obreiros 
evangélicos  para  cultivar  em  toda  a  extensão  a  vinha  do 
Senhor;  e  os  bispos  tiveram  de  restringir-se  às  populações  já 
submissas  ao  governo  de  Portugal.  Os  povos  do  Congo,  outra 
vez  sem  pastores,  imploraram  de  novo  a  Santa  Sé  para  que 
lhos  enviasse. 

Em  1640  Urbano  VIU,  papa,  cedendo  à  expressão  daqueles 
desejos,  enviava-lhes  missionários  de  Itália,  dirigidos  pela 
Sagrada  Congregação  da  Propaganda.  Inaugura-se  uma  pre- 
feitura apostólica  confiada  aos  religiosos  capuchinhos;  um 
dos  religiosos  da  leva  missionária  ia  investido  na  dignidade  e 
armado  das  prerogativas  de  prefeito  apostólico. 

O  zelo  dos  novos  missionários  e  a  benção  divina  fomen- 
taram progressos  tais,  que  a  influencia  da  Missão  nova  come- 
çou mesmo  a  sentir-se  a  dentro  dos  confins  de  Angola  e  seu 
bispado.  Para  prevenir  conflitos  possíveis  e  ocasionadores  de 
grave  detrimento  para  a  Missão,  para  manter  uma  atmosfera 
de  harmonia  e  bom  entendimento,  emitia  a  Propaganda,  a  14 
de  janeiro  de  1726,  instrucções  pormenorizadas  a  respeito  das 
relações  de  uma  e  outra  jurisdicção. 

Entretanto  esta  Missão,  que  de  começo  produzia  tão  ma- 
ravilhoso fruto,  foi  caindo,  definhando,  em  virtude  de  recusa- 
rem as  naus  transporte  de  missionários,  especialmente  italianos, 
e  como  consequência  de  se  abolirem  em  Portugal  as  ordens 


(1)  Alude  ao  bàtismo  de  Joáo  i  e  esposa  Leonor,  assim  chamados 
em  honra  do  nosso  D.  João  ii  e  da  rainha. 


19 


religiosas;  destarte  achava-se  a  Missão,  em  1835,  por  inteiro 
abandonada.  Assim  se  achavam  os  fieis,  que  ficavam  por 
aquelas  regiões,  outra  vez  ao  abandono,  privados  de  qualquer 
socorro  religioso. 

Em  1855  escrevia  o  rei  da  terra  ao  Governo  de  Angola 
que  lhe  enviasse  um  padre  católico  a  bàtisar-lhe  os  próprios 
filhos  e  os  de  seus  súbditos,  deixados  por  bàtisar  desde  a 
retirada  dos  missionários.  Isto  se  fez  com  efeito;  demais, 
começava  o  Governo  de  Portugal  e  a  Santa  Sé  a  pensar  no 
restabelecimento  da  antiga  Missão;  mas  foi  impossível  reali- 
zar-se  um  tal  projecto.  Em  vão  recorria  a  Congregação  da  Pro- 
paganda, no  empenho  de  cumprir  os  desejos  do  Sumo  Pontí- 
fice, a  ordens  religiosas  diversas,  bem  como  a  associações  de 
sacerdotes  seculares:  de  nenhures  surgiam  obreiros  evan: 
gélicos. 

Enfim,  em  data  recente,  propoz-se  aquela  Missão  aos 
Padres  do  Espirito  Santo,  que  possuem  missões  limítrofes 
nas  Guinés;  e  o  Superior  Geral  da  mencionada  Congregação 
requeria  à  Santa  Sé  a  concessão  dela,  em  relatório  de  14  de 
Março  deste  ano. 

A  Sagrada  Congregação  da  Propaganda  julgou  seu  dever 
o  acolhimento  favorável  deste  pedido  inesperado;  antes,  porém, 
de  dar  uma  decisão,  informou  daquele  requerimento  o  Minis- 
tro Geral  dos  Capuchinhos,  pedindo-lhe  categoricamente  res- 
pondesse se  podia  ou  não  fornecer  missionários  à  Missão, 
outrora  confiada  à  sua  ordem,  e  incumbir-se  outra  vez  daquela 
Missão.  Respondeu  o  Geral  em  31  de  Julho  último,  após  ma- 
duro exame  e  consulta  do  procurador  geral  das  Missões  da 
Ordem,  que  se  achava  incapaz,  por  infelicidade  dos  tempos, 
de  prover  às  necessidades  espirituais  dos  povos  em  questão, 
que  renunciava,  por  conseguinte,  a  essa  Missão  e  a  cedia  a 
outros  obreiros. 

Como  consequência,  a  S.  Congregação  da  Propaganda 
achou  que  devia  suplicar  a  Sua  Santidade  se  dignasse  aceitar 
a  renuncia  feita  pelo  Geral  dos  Capuchinhos  e  confiar  à  Con- 
gregação do  Espirito  Santo  e  do  Imaculado  Coração  de  Maria 
a  Missão  do  Congo,  sob  a  imediata  dependência  da  Santa  Sé, 
conservando,  porém,  a  jurisdicção  do  bispo  de  Angola,  nos 
termos  da  instrução  de  14  de  Janeiro,  acima  citada. 

Este  parecer  da  S.  C.  da  Propaganda  foi  apresentado  por 
mim,  abaixo  assignado,  Cardial  Prefeito,  a  nosso  S.  P.  o  Papa 
Pio  IX,  em  audiência  de  10  de  Agosto  de  1865,  e  S.  Santidade 


)"     20 


dignou-se  aprová-lo  em  tudo,  ordenando  se  expedisse  o  pre- 
sente decreto,  não  obstante  qualquer  cousa  em  contrário. 

Dado  em  Roma,  no  Palácio  da  Sagrada  Congregação  da 
Propaganda,  aos  9  de  Dezembro  de  1865. 

Al.  Barnabo,  Prefeito. 
(Logar  do  selo) 

H.  Capalti,  Secretário.» 


6s  primeiros  missionários  do  Espírito  Saato 

em  plaias  aniolanas. 

Padre  Poussot  e  Padre  Espitallié 


Para  a  missão  nova,  que  logo  começou  a  enamorar  os 
entusiasmos  juvenis  dos  cavaleiros  romanescos  do  Apostolado, 
por  lhes  lembrar,  pelas  ruinas  acumuladas  dos  séculos  idos, 
as  igrejas  famosas  e  caídas  do  Norte  de  Africa,  foram  entre- 
tanto nomeados  dois  exploradores :  o  Padre  Poussot,  veterano 
da  Guiné,  já  com  uns  quinze  anos  de  lides  africanas,  e  um 
recruta  em  todo  o  verdor  dos  sonhos  juvenis  de  aventura 
santa,  o  P.'  Espitallié.  Agregou-se-lhes  um  Monsieur  Billon, 
ex-soldado  colonial,  que  a  missão  entusiasmara. 

Fixaram  a  partida  para  os  25  de  Janeiro  de  1866.  E 
entrementes,  como  iam  a  trabalhar  por  súbditos  de  Portugal 
e  convinha  que  as  autoridades  portuguesas  compreendessem, 
desde  o  começo,  que  a  vinda  deles  era  de  amigos,  quizeram 
obter  para  o  Governo  Português  letras  de  recomendação  no 
ministério  dos  estrangeiros  de  Paris.  Obtiveram-nas  efectiva- 
mente, graças  aos  amigos  e  numerosas  relações  do  Geral  Sch- 
windenhammer ;  e  a  4  de  Fevereiro  já  o  Padre  Poussot  escrevia 
de  Lisboa,  cheio  de  alegria  portuguesa  e  de  confiança  no 
porvir. 

Hospedaram-se  os  dois  padres  em  casa  dos  Lazaristas 
de  S.  Luiz.  Depois  da  visita  à  Nunciatura,  aonde  Mons.  Ino- 
cêncio Ferrieri  os  quiz  receber  no  quarto  em  que  se  achava 
doente,  animá-los  e  aconselhá-los,  o  Padre  Miei,  que  os  aco- 
lhera, foi  ele  próprio  apresentá-los  ao  embaixador  francês. 
Recebeu-os  o  secretário  da  embaixada.  Marquês  de  Savoie, 
que  lhes  assegurou  a  benevolência  do  Governo  Português,  a 
quem  foram  já  oficialmente  recomendados. 


21 


Ficava  só  encontrar  navio  que  os  levasse  ao  Congo.  A 
Companhia  de  Navegação  andava  desorganizada,  e  passára-se 
todo  janeiro  sem  um  só  transporte.  A  5  de  Fevereiro  encon- 
trava-se  prestes  a  substituir  a  carreira  nacional  um  navio 
inglês,  o  Lincolnshirc.  Aproveitaram-no  os  dois  missionários 
e,  às  3  da  tarde,  lá  iam  barra  em  fora  com  destino  a  Ambriz. 
Monsieur  Billon  acompanhava-os. 

Aonde  o  vapor  fez  escala  (Madeira,  Principe,  S.  Tomé) 
penhorou  comovidamente  aos  dois  estrangeiros  a  simpatia  dos 
portugueses.  Falam  as  correspondências  deles  muito  especial- 
mente de  como  os  cativou  o  governador  da  ilha  de  S.  Tomé. 
Iam  assim  desenvolvendo  mais  a  ternura  da  Pátria  que,  mesmo 
por  bem  da  causa  de  Deus,  se  tinham  resolvido  a  amar  de 
então  como  sua. 

Chegados  a  Ambriz,  deram-se  os  missionários  pressa  em 
ire  visitar  o  governador  civil  que,  ouvidos  os  objectivos  da 
vinda  deles,  se  deu  por  satisfeito. 

Na  cidade  descansaram  alguns  dias,  a  refazerem-se  das 
fadigas  da  longa  viagem,  hospedados  em  casa  de  um  pobre 
sacerdote  encarregado  de  paroquiar  Ambriz.  Depois  partia  o 
Padre  Poussot  para  Loanda,  porque  não  queria  empreender 
cousa  alguma  sem  previamente  obter  o  beneplácito  das  auto- 
ridades superiores,  eclesiásticas  e  civis. 

Avistou-se  com  o  bispo  de  Angola,  D.  José  Nilo  de  Oli- 
veira, a  3  de  Abril,  primeiro  no  paço  episcopal,  em  segunda 
audiência  no  do  Governador  Geral.  Resolveu-se  que  o  padre 
requereria  por  escrito  jurisdição  na  diocese,  para  se  conformar 
com  a  Instrução  de  1746,  que  regulara  as  relações  do  bispado 
com  a  antiga  prefeitura  apostólica.  O  Governador  foi  por 
igual  benévolo,  seguindo,  aliás,  as  instruções  que  a  este  res- 
peito recebera  de  Lisboa :  —  que  tratasse  os  missionários  por 
modo  digno  e  hospitaleiro.  Prometeu-lhes  todo  o  apoio,  dese- 
jou-lhes  sinceramente  que  se  estabelecessem  e  prosperassem, 
e  encarregou-se  até  de  em  nome  deles  pedir  e  de  obter-lhes  o 
placítum  regiam,  sem  o  qual  a  legislação  do  tempo  não  per- 
mitia estabelecimentos  eclesiásticos  nem  iniciativas  religiosas. 

No  entretanto  era  preciso  esperar,  adiando  a  inauguração 
da  missão  do  Congo.  Foi  resolvido  viesse  de  Ambriz  o  Padre 
Espitallié  com  o  agregado  leigo,  que  tinha  ficado  em  compa- 
nhia dele.  E  todos  três  ficaram  vivendo  no  paço  episcopal, 
que  era  ao  mesmo  tempo  seminário  diocesano,  prestando  os 
serviços  de  que  se  lhes  oferecia  oportunidade,  e  adestrando-se 
para  o  desempenho  de  futuras  funções  de  apostolado,  pelo 
estudo  da  nossa  lingua,  do  nosso  direito,  da  nossa  civilização. 


22 


Alarme  dos  políticos 

Fevereiro  1866 


Debate  nas  Camarás  acerca  dos  missionários 

franceses 

«A  missão  do  Congo  causou  emoção  em  Portugal,  escre- 
via ao  Geral  o  Padre  Duparquet  (um  dos  apaixonados  da 
missão  nova,  o  qual,  se  não  partira  com  os  dois  primeiros 
missionários,  se  não  considerava  senão  como  um  recruta  espe- 
rado, e  considerando  já  seus  os  interesses  do  exercito  novo). 
«Se  pode  ser  útil  à  Congregação  ser  conhecida  naquele  país, 
não  será  notoriedade  o  que  dora  avante  lhe  faltará.  Pronun- 
ciaram-se  quatorze  discursos,  somando  os  da  camará  dos 
Pares  com  os  da  outra  camará:  favoráveis,  hostis,  e  emfim 
moderados,  simplesmente  tolerantes.  Está  com  estes  o  Governo: 
e  foi  este  quem  prevaleceu  por  77  votos  contra  21». 

O  deputado  Pinto  Coelho  tomou  a  defesa  dos  missioná- 
rios e  da  Santa  Sé,  e  fê-lo  com  rara  inteligência  e  coragem. 
Aludiu  à  aceitação  pelo  Governo  Português  da  prefeitura  do 
Congo,  já  em  1640,  e  acrescentava  esta  observação  que  era 
como  um  vesicatório  para  a  exaltação  alucinada  de  um  patrio- 
tismo doentio : 

«Não  tenho  motivos,  nem  creio  que  os  haja,  para  crer 
que  a  Santa  Sé  se  oponha  à  realização  do  nosso  padroado. 
Aquilo  em  que  a  Santa  Sé  não  poderia  consentir  é  que  o 
nosso  padroado  sirva  só  para  impedir  a  civilização  católica 
dos  povos  a  ela  submetidos'^ . 

O  deputado  da  oposição,  Levy  Maria  Jordão,  aproveitou 
da  oportunidade  para  um  ataque  em  forma  ao  Governo  (pois 
que  da  Congregação  fazia,  ao  contrario,  um  esboço  histórico 
muito  benévolo)  que  achava  covarde  na  defesa  da  nossa  di- 
gnidade contra  a  audácia  da  Sé  Apostólica!  «A  Camará,  dizia 
a  proposta  do  deputado,  compreendendo  que  no  proceder  da 
Cúria  Romana,  confiando  as  Missões  do  Congo  à  Congrega- 
ção do  Espirito  Santo,  sem  consentimento  de  Portugal,  ha 
ofensa  contra  a  dignidade  da  nação,  contra  o  seu  direito  de 
padroado  na  diocese  de  Angola  e  Congo,  contra  as  leis  do 
reino  e  contra  a  nossa  suzerania  no  Congo,  passa  à  ordem 
do  dia». 

O  Conde  de  Castro,  ministro  dos  estrangeiros,  respondeu 
pelo  Governo  à  catilinaria  violenta  com  que  o  deputado  da 


23 


oposição  defendia  a  sua  proposta.  O  ministro  não  deixava  de 
achar  digno  de  censura  o  proceder  da  Santa  Sé,  que  assim 
desconhecia  os  nossos  direitos  no  Congo  e  tratava  com  mis- 
sionários estrangeiros  sem  nos  consultar  sequer:  para  Roma, 
porém,  fora  já  a  reclamação  do  Governo  Português,  e  este 
pedia  à  Camará  houvesse  por  bem  confiar  nele  e  esperar  a 
resposta  diploinatica  de  Roma,  para  ver  como  o  Governo  ze- 
lava a  causa  da  honra  nacional.  (1) 

Entretanto,  como  queria  o  deputado  que  o  Governo  tivesse 
tratado  os  missionários?  Que  os  prendesse?!  E  com  que 
direito?!  Os  mares  são  livres.  Que  os  não  admitisse  a  bordo 
de  navios  com  rumo  ao  Congo  ?  Mas  nem  só  barcos  portu- 
gueses faziam  vela  para  a  Africa  Portuguesa. 

O  deputado  António  de  Serpa,  tomando  a  palavra  depois 
tio  ministro,  e  combatendo  a  politica  de  intolerância  pseudo- 
patriotica  do  deputado  da  oposição,  acaba  por  mandar  para 
a  mesa  esta  moção : 

«A  Camará,  ouvidas  as  explicações  do  Governo  e  confiada 
em  que  ele  saberá  defender  a  dignidade  nacional  e  os  direitos 
da  Coroa,  passa  à  Ordem  do  dia». 

Com  a  aprovação  desta  proposta,  a  politica  de  tolerância 
triunfava.  Deixava  a  Camará  ao  Governo  o  cuidado  de  obter 
explicações  da  Cúria  e  de  salvaguardar  a  dignidade  e  os 
direitos  nacionais.  E  como,  aliás,  aprovava  a  acção  do  Governo, 
c  como  o  Governo  declarara  que  lhe  parecia  absurdo  impedir 
a  acç-10  dos  dois  missionários,  é  claro  que  a  Camará  admitia 
os  missionários. 


(1)  O  Padre  Duparquet  parece  lamentar  o  esquecimento  de  consul- 
tar a  Portugal  neste  negocio  da  prefeitura  do  Congo  confiada  à  Congre- 
gação. E  explica  este  descuido  pela  convicção  de  que  Portugal  se 
tivesse  desinteressado  do  Congo.  Ignoravam  em  Roma  que,  desde  1860, 
o  rei  congolês  D.  Pedro  v,  sendo-lhe  a  coroa  disputada  por  seu  irmão 
Álvaro,  recorreu  ao  governo  de  Angola,  que  o  ajudou  a  vencer  o  rival, 
e  nós  estabelecemos  um  forte  em  S.  Salvador.  Ficou  assim  restabelecida 
a  soberania  portuguesa,  esquecida  desde  que,  com  a  supressão  da  es- 
cravatura, o  Congo  deixara  de  enviar  anualmente  a  Loanda  seu  tributo 
de  600  escravos. 

E'  verdade  que  esse  pomposo  nome  de  D.  Pedro  v,  rei  do  Congo, 
não  era  o  de  nenhum  monarca  a  dispor  dos  destinos  do  reino  inteiro: 
«A  Camará,  dizia  nesta  sessão  o  deputado  Seixas,  representante  de  An- 
gola no  parlamento,  não  faria  a  puerilidade  de  o  imaginar,  D.  Pedro 
não  passa  de  um  soba  Catenda,  a  valer-se  do  nosso  auxilio  para  mandar 
na  aldeia.  Mas  as  nações  da  Europa  não  precisam  mais  para  imporem 
protectorados  1» 


24 


A's  portas  do  Gonio 


De  Loanda  outra  vez  para  Ambriz 

Emquanto  se  não  abriam  as  portas  do  Congo,  emquanto 
nâo  mostrava  a  Providencia,  por  uma  oportunidade  que  se 
oferecesse,  a  confirmação  divina  dos  projectos  zelosos  dos 
missionários,  iam  os  dois  padres  estudando  campos  onde  de 
futuro  pudesse  o  zelo  frutificar.  Saíram  de  Loanda  em  direc- 
ção à  foz  do  Bengo,  acompanhados  de  um  comerciante  francês 
estabelecido  na  cidade  e  de  um  seminarista,  de  nome  Carva- 
lho, que  aproveitava  das  férias  forçadas  que  lhe  deixava  o 


LOANDA.  —  Bairro  indígena. 


encerramento  do  seminário  local.  Iam  visitar  o  antigo  convento 
franciscano  de  S.*°  António.  De  pé  só  se  achava  a  igreja.  Em 
redor,  signais  esparsos  de  antigas  culturas  e  grande  variedade 
de  arvores  frutíferas  escondidas  e  abafadas  pela  mata. 

Das  ruinas  tristes  daquela  missão  antiga  dirigiram-se  à 
aldeia  de  Quinfangundo,  onde  havia  cristãos  dispersos,  e  ali 
cantou  missa  um  dos  padres,  emquanto  os  outros  excursio- 
nistas executavam  o  canto  coral,  entremeado  com  as  sinfonias 
triunfantes  de  um  realejo,  que  para  a  função  trouxera  certo 
comerciante  americano  do  sitio. 

Voltaram  ainda  a  Loanda  a  assistir  às  festas  religiosas  e 
oficiais  da  Assunção  da  Senhora,  em  comemoração  da  recon- 


25 


quista,  em  1648,  da  cidade  aos  Holandezes.  Depois  começaram 
a  pensar  na  urgência  de  inn  trabalho  seguido  e  útil,  em  que 
se  empregassem,  emquanto  não  pudessem  iniciar  a  sonhada 
reconstituição  cristã  do  Congo.  Ambriz,  ás  portas  da  vedada 
Terra  Prometida,  pareceu-lhes  ainda  o  que  melhor  havia  como 
campo  provisório  de  acção.  E  oferecia-se  precisamente  então 
uma  ótima  oportunidade  de  se  estabelecerem  lá.  O  pároco 
partia  para  Lisboa,  e  era  preciso  quem  o  substituísse.  O  vigá- 
rio geral,  na  ausência  do  bispo  que  também  recolhera  a  Por- 
tugal, assim  como  o  governador,  aceitaram  o  oferecimento  dos 
padres. 

Espitallié  foi,  pois,  em  Agosto  de  1866,  ocupar  aquele 
posto  oficial,  seguido  ainda  do  auxiliar  Billon,  que  um  mês 
depois  havia  de  ser  vitimado  por  um  ataque  violento  de  febre, 
deixando  o  padre  só,  sem  uma  dedicação  generosa  e  amiga, 
em  meio  de  paroquianos,  cuja  lingua  começava  apenas  a  bal- 
buciar. 

O  P.'  Poussot,  com  efeito,  seguira  por  então  outro  rumo. 
Em  fins  de  julho  chegara  do  Gabão  e  ancorava  na  baía  de 
Loanda  a  fragata  francesa  Zenobia.  O  capitão  dela,  vice-almi- 
rante  Fleuriot  de  Langle,  após  a  visita  oficial  ao  Governador, 
quizera  ir  ver  ao  Seminário  os  padres  franceses.  Como  estava 
à  espera  de  um  vapor  da  estação  do  Gabão,  que  devia  regres- 
sar de  Mossamedes  e  singrar  em  direcção  do  Zaire,  ofereceu 
o  capitão  ao  padre  passagem  livre  a  bordo.  Foi  em  fins  de 
Agosto  que  o  Curieux  voltou  do  sul  para  seguir  viagem  para 
o  Congo  e  que  Poussot,  aproveitando  agradecido  o  ofereci- 
mento do  respeitável  compatriota,  passou  sucessivamente  em 
frente  de  Ambriz,  Quissembo,  Ambrizete,  chegou  à  Ponta  do 
Padrão.  Dali  seguia  o  Curieux  para  o  Norte.  Foi  o  padre 
desembarcar  à  cidade  de  Banana,  donde  soube  partiria 
uma  chalupa  rio  acima  cinco  dias  depois.  Esta  embarcação 
só  o  levou  ao  Porto  da  Lenha,  30  milhas  para  o  interior; 
dali  seguiu  uma  flotilha  composta  de  duas  pirogas  e  de  duas 
grandes  chalupas  armadas  (para  prevenir  qualquer  ataque  dos 
Mussurungus,  guerilheiros  selvagens  e  rapaces).  Uma  das 
canoas  ou  pirogas  caía,  com  efeito,  nas  mãos  duns  assaltan- 
tes, por  via  da  imperícia  dum  negro,  que,  ao  defender-se, 
deitara  fogo  a  um  barril  de  pólvora.  O  resto  da  equipagem 
chegou  no  mesmo  dia  a  Matera,  aonde  o  missionário  se  entre- 
teve com  o  chefe  da  tribu,  Chimbache,  e  lhe  falou  da  missão 
que  pretendia  vir  a  desempenhar  naquela  terra.  Depois  subiu 
a  flotilha  até  Boma,  centro  do  trafico  português  com  o  sertão,  e 
ali  se  deliciou  o  padre  admirando  naqueles  panoramas  encan- 


26 


tadores  e  adivinhando,  naquelas  populações  pacificas  e  boas, 
excelentes  possibilidades  de  futuras  missões  florescentes. 

Era  preciso,  porém,  aproveitar  da  ocasião  e  descer. 
Tomados  quantos  apontamentos  julgou  pudessem  vir  a  ser 
úteis,  voltou  o  missionário  a  Porto  de  Lenha.  Três  dias  depois, 
seguia  para  S.*°  António.  E  a  três  de  Outubro  pisava  pela 
primeira  vez  terras  do  Sonho,  de  tão  históricas  e  tão  dolorosas 
memorias.  Foi  este  país  o  que  primeiro  recebeu  o  Evangelho; 
o  rei  do  Sonho,  vassalo  do  «grande  rei»,  que  depois  se  cha- 
maria D.  João  do  Congo,  foi  bàtisado  com  sua  corte  muitos 
anos  antes  de  o  ser  seu  suzerano. 

Dos  tempos  de  gloria  só  encontrou  o  Padre  Poussot  a 
famosa  igreja  onde  celebrou  missa,  mas  onde  já  se  não  ajun- 
tavam cristãos,  porque  de  ha  muito  os  não  havia!  O  único 
resto  das  antigas  crenças,  e  este  só  material,  viu-o  o  padre 
em  mãos  do  rei,  na  residência  oficial  de  S.^°  António:  um  cru- 
cifixo antigo,  que  o  rei  pagão  guardava  com  supersticioso 
cuidado  e  mostrava  com  muita  ufania. 

De  Santo  António  era  preciso  voltar  a  Ambriz,  onde  o 
pároco  improvisado  Espitallié,  a  dizer  missa  numa  sala  do 
hospital,  por  falta  de  igreja,  e  a  contentar-se,  aos  domingos, 
com  a  missa  conventual,  solenizada  pela  assistência  ceremo- 
niosa  das  tropas,  mas  logo  seguida  do  desaparecimento  total 
dos  fieis,  anciava  pela  volta  do  companheiro,  para  combina- 
rem ambos  mais  apostolado  e  mais  contacto  com  as  almas. 
Atéli,  só  pudera  o  missionário  comunicar  com  uma  alma:  a 
do  Snr.  Jacinto,  que  hospedava  os  missionários  em  sua  casa 
e  que,  apesar  de  ex-degredado,  os  tratava  com  uma  caridade 
de  santo  e  uma  gentileza  de  cavalheiro.  Agora  queriam  come- 
çar a  reunir  almas  arredias  de  filhos  de  selvagens,  e  i-las 
iniciando  na  arte  de  Jer  e  de  escrever,  e  ao  mesmo  tempo  de 
amarem,  de  serem  boas.  Começariam  a  missionar  modesta- 
mente, até  que  lhes  abrisse  a  Providencia  campo,  em  que 
pudessem  vir  a  ser  mais  largamente  úteis  ao  bem  das  almas 
e  à  Civilização. 


I 


27 


Em  Mossámedes 


■^W^'^  ^■''"' 


o  Padre  Duparquet 

Começamos  agora  a  lidar  com  o  verdadeiro  e  fervente 
cavaleiro  enamorado  das  Missões  Portuguesas,  que  identificara 
com  a  fortuna  delas  a  ventura  de  sua  vida  e  que,  já  mesmo 
em  França  e  em  Cellule,  para  onde  teve  de  ir  preencher  o 
logar  vago  do  Padre  Espitallié,  fazia  de  conta  que  o  seu 
dever  e  principal  labor  não  poderia  ser  outro  que  não  a  pre- 
paração da  sua  futura  tarefa  congo-angolana. 

Passado  um  ano  de  meio  resignada  detenção  na  pátria, 
partia  o  ardente  Carlos  Duparquet  para  Lisboa,  a  caminho  do 
Congo,  em  Setembro  de  1866.  Não  pôde  demorar-se  em  a 
nossa  capital  senão  um  dia  (o  dia  4  de  outubro,  que  os  dias 
2  e  3  passára-os  detido  no  lazareto,  por  motivo  do  cholera, 
que  então  grassava  em 
França). 

Partia  para  o  Congo, 
dia  5  de  Outubro,  a  bordo 
do  vapor  inglês  Yorcks- 
hire,  mas  era  forçado  a 
não  passar  além  da  Ma- 
deira: a  maquina  do  trans- 
porte inglês  desarranjou- 
se,  e  a  equipagem  teve 
de  passar  a  bordo  do 
Dom  Pedro,  em  retorno 
de  Angola,  que  os  recon- 
duzia a  Lisboa. 

O  contratempo  era, 
aliás,  de  alguma  sorte 
providencial.  O  missio- 
nário precisava  realmente 
de  algum  tempo  para  fa- 
zer conhecimento  com 
entidades  varias,  queria 
entrevistar  o  Núncio,  e 
sobretudo  convinha-Ihe 
avistar-se  com  o  bispo 
Nilo  de  Oliveira,  que 
ainda  se  encontrava  em 
Lisboa.     Nos     informes,  P:  Charles  Duparquet. 


'^:. 


28 


que  obtivera  em  seus  empenhados  estudos  do  ano  passado, 
o  padre  colhera  que  um  estabelecimento  mais  meridional  que 
no  Congo,  ai  por  alturas  de  Mossámedes,  não  deixava  de 
oferecer  mais  garantias  de  êxito,  vista  sobretudo  a  maior 
salubridade  do  clima.  E  Duparquet  já  ia  de  França  entendido 
com  os  superiores  para  não  se  prender  com  as  experiências 
dos  colegas  do  Congo,  ou  do  Norte.  Logo  após  a  entrevista 
com  o  bispo,  Duparquet  escrevia  de  Lisboa  para  França: 

«Sua  Excelência  Reverendíssima  animou-me  encarecida- 
mente e  propôs-me  até  um  local,  no  distrito  de  Mossámedes, 
denominado  Capangombé;  e  eu,  inquirindo  doutras  fontes  o 
que  aquilo  realmente  era,  julguei  dever  aceitar  o  oferecimento. 
O  bispo  sugeriu-me  fizesse  um  requerimento,  escrito  em  papel 
selado,  com  o  fim  de  alcançar  o  título  de  pároco  de  Capan- 
gombé. Esta  é  uma  colónia  portuguesa  recente  ainda,  sem 
côngrua  oficial,  mas  com  um  compromisso  escrito  de  os  paro- 
quianos pagarem  equivalente  de  uns  1.200  fr.,  para  sustento 
do  pároco. 

Concedeu-me  também  o  prelado  jurisdição  em  todo  Mos- 
sámedes, e  até  me  autorizou  verbalmente  a  abrir  escolas  e 
internatos'^. 

Munido  de  uma  carta  do  bispo  para  o  vigário  adminis- 
trador de  Angola  e  de  outra  para  um  habitante  de  Mossáme- 
des, capaz  de  o  ajudar  nos  primeiros  tempos  e  primeiras 
necessidades,  outra  vez  embarca  o  nosso  missionário  a  18  de 
Outubro,  e  chega  a  Loanda,  emfim,  aproximadamente  um  mês 
depois.  Ali  foi  acolhido  com  uma  hospitalidade  que  o  como- 
veu, por  parte  do  elemento  civil  como  do  eclesiástico.  O 
Governador  foi  para  com  ele  duma  boa  vontade  rara:  conce- 
deu-lhe,  em  Capangombé,  o  terreno  que  ele  precisasse,  man- 
dou-lhe  dar  travessia  livre  por  conta  do  Estado  até  Mossá- 
medes, e  recomendou-o  por  escrito  ao  governo  particular 
daquela  cidade. 

A  17  de  Dezembro  de  1866  é  que  o  fundador  das  Missões 
Angolanas  do  Espirito  Santo  punha  pé  na  terra  dos  seus 
sonhos,  entrando  em  Capangombé,  acolhido  por  simpatias  de 
todos  os  lados.  Escrevia  logo  ao  Superior  Geral  esta  carta, 
que  é  um  magnificai  de  alegria  e  de  triunfo: 

—  «Cá  estou,  enfim,  a  termo  da  minha  longa  viagem. 
Segunda-feira,  17  deste  mês,  cheguei  à  fortaleza  de  Capan- 
gombé, e  estou  por  ora  a  gozar  a  hospitalidade  de  um  colono 
rico  destes  sitios,  um  Snr.  Brochado,  autor  de  uma  erudita 
memoria  sobre  o  distrito  de  Mossámedes  .  .  . 


29 


.  .  .  «Ainda  não  passei  aqui  tempo  bastante  para  dar  a 
V.  Rev."  informações  particularizadas  acerca  de  Capangombé. 
O  que  posso  dizer  é  que  estou  satisfeitissimo:  não  podia 
encontrar  posição  melhor  para  a  obra  que  empreendi  realizar  . .  . 

«Capangombé,  abreviado  de  Capopangombé,  significa, 
na  lingua  local,  sitio  de  inexauríveis  gados.  A  região  estende- 
se  para  ocidente,  ao  pé  de  extensas  e  altas  serranias,  em  um 
vale  de  aproximadas  dez  léguas  de  comprido.  São  estas  mon- 
tanhas quasi  talhadas  a  prumo  e  dão  origem  a  ribeiros  nume- 
rosos, que  fertilizam  o  vale  inteiro.  Neste  vale  estabeleceram- 
se  já  colonos  da  Europa;  e  apesar  de  haver  seis  anos  apenas 
que  se  lançaram  as  fundações  da  colónia,  não  há  fazer  ideia 
aí  do  trabalho  imenso  já  realizado:  numa  extensão  de  dez 
léguas,  está  o  terreno  quasi  inteiramente  desbravado  e  coberto 
de  plantações  magníficas  de  cana,  café  e  algodão. 

Ha  fazendas  em  que  as  culturas  ocupam  três  léguas  de 
extensão,  ocupando  numero  sem  conta  de  escravos.  Cada 
fazenda  é  uma  freguesia  verdadeira;  disto  provém  dificuldade 
considerável  para  o  ministério  religioso,  pois  é  quasi  impos- 
sível reunir  tais  multidões  para  a  instrução  e  para  os  ofícios 
divinos.  E  comtudo,  bem  necessitados  se  acham  estes  pobres 
trabalhadores  de  que  se  ocupem  deles.  As  creanças,  princi- 
palmente, estão  com  grande  precisão  de  quem  as  instrua; 
algumas,  já  grandes,  carecem  ainda  por  completo  de  ideias  e 
conhecimentos  religiosos  .  .  . 

«Todas  as  tardes  vêem  juntar-se  ao  meu  redor  as  crean- 
cinhas  todas,  e  com  elas  os  escravos,  para  aprenderem  .  .  . 

.  .  .  «Há  trabalho  imenso  a  realizar,  mas  há  também  obs- 
táculos consideráveis  a  superar,  visto  o  espaço  vastíssimo  por 
onde  anda  dispersa  esta  população.  Para  a  evangelizar,  não 
há  senão  passar  sucessivamente  por  todas  as  fazendas,  e  para 
isto  não  chegará  nunca  toda  a  actividade  de  um  só!» 

O  trabalho  extasiava  a  generosidade  ardente  do  jovem 
apostolo;  mas  começou  a  sentir  desde  o  principio  a  angustia 
caridosa  dos  apóstolos  de  todos  os  tempos:  —  Ai !  A  seara  é 
grande,  mas  são  poucos  os  obreiros! . . . 


Nos  vales  paridisiacos  da  Cheia  (Mossúmedes). 


31 


Primeiros   passos    da    Gonjgrejèação 
no  continente  português 


Desacorçoando  das  missões  portuguesas. 
Mortes.  Retiradas. 

Os  primeiros  meses  da  vida  missionaria  em  Mossámedes 
aproveitou-os  Dnparquet  para  reconhecer  a  região.  Aprovei- 
tando da  volta  ao  interior  de  alguns  soldados,  que  tinham 
vindo  trazer  preso  um  chefe  da  Huila,  dirigiu-se  o  padre  para 
o  planalto  da  Chéla  e  explorou-o  com  entusiasmo.  Ao  voltar 
a  Mossámedes  (antes  a  Capangombé)  encontrava  um  compa- 
nheiro recem-chegado  do  Gabão,  um  Monsieur  Crétin,  ainda 
estudante,  que  os  superiores  maiores  lhe  enviavam  para  lhe 
temperar  a  solidão. 

Mas  quando  tudo  simulava  paz  e  parecia  favorecer  o 
encetamento  da  organização  é  que  principiava  a  tribulação  e 
a  dura  prova.  A  passagem  de  Duparquet  por  Lisboa  e  o  em- 
barque dele  para  a  Costa  Ocidental  angolana  tinham  feito 
reviver  nas  Camarás  as  recriminações,  que  um  ano  atrás  havia 
suscitado  a  partida  para  o  Congo  de  Poussot  e  Espitallié.  O 
deputado  Levy  levantava  outra  vez  o  clamor  de  alarme  contra 
os  estranjeiros;  Lopo  de  Ávila  apoiava  a  interpelação  e  susten- 
tava-a.  A  questão  era  deferida  ao  Conselho  da  Coroa,  onde 
ficava  empatada,  para  libertação  do  governo,  que  assim  calara 
a  oposição;  mas  em  Angola  os  missionários,  emquanto  não 
positivamente  aprovados  da  metrópole,  ficavam  tão  inteira- 
mente tolhidos  em  seus  movimentos  como  se  condenados. 
Foi  por  isso  que  Duparquet  se  resolveu  a  vir  a  Lisboa  a  ver 
se  aviava  a  legalidade  da  sua  empresa;  legalidade  sem  a 
qual,  apesar  da  manifesta  bóa  vontade  de  governadores  e  de 
vigários  gerais,  e  até  do  bispo,  não  havia  dar  um  passo  para 
a  frente;  porque,  como  dizia  ao  missionário  o  governador 
geral,  havia  nele  (e  nos  outros  funcionários)  dois  homens:  o 
privado,  que  estimava  imenso  o  padre,  o  publico  e  o  oficial, 
que  dele  era  forçado  a  desconfiar,  por  imitar  a  metrópole! 

Foi  a  caminho  do  reino  que  o  missionário  ruminou  a 
ideia  da  organização  futura  da  obra  definitiva  do  Espirito 
Santo  em  domínios  portugueses:  era  preciso  que  o  desenvol- 
vimento e  a  estabilização  da  obra  missionaria  fosse  feita  por 
mãos  de  nacionais. 


32 


Missionários  estranjeiros,  por  amor  do  Evangelho  e  fé 
sobrenatural,  podem  ter  um  patriotismo  de  cidadãos  adoptivos, 
para  não  comprometerem  por  politica  (o  que  seria  criminoso 
e  Ímpio)  os  interesses  do  Salvador.  Mas  o  patriotismo  fervente 
do  missionário  em  circunstancias  normais,  quer  dizer,  traba- 
lhando no  país  de  sua  nacionalidade,  é  um  estimulante  que  a 
Igreja  abençoa,  porque  dá  mais  eficiência  ao  trabalho  sobre- 
natural, apaixonando-o. 

Em  Lisboa,  então,  vinha  o  zeloso  amigo  de  Angola  resol- 
vido a  não  se  poupar  a  esforços  para  assegurar,  ao  mesmo 
tempo,  a  liberdade  de  trabalho  para  si  e  a  fundação  de  um 
núcleo  de  sucessores  da  sua  obra  civilizadora  e  apostólica. 

Depois  de  se  acautelar  com  boas  e  favoráveis  disposições 
dos  membros  principais  do  ministério  (contava  mesmo  com  a 
dedicação  do  ministro  dos  Estrangeiros,  Casal  Ribeiro)  o 
Padre  Duparquet  pôs-se  em  campo  para  encontrar  local  apro- 
priado à  fundação  projectada  de  um  estabelecimente  recruta- 
dor  e  habilitador  de  missionários. 

Por  sugestão  do  célebre  lexicógrafo  Roquete,  com  quem 
travara  relações  amigas  em  Lisboa,  foi  procurar  em  Santarém 
um  edifício  que  servisse  de  internato  a  alguns  jovens,  que 
viessem  a  deixar-se  empolgar  pela  ideia  religioso-patriótica 
do  apostolado  colonial,  e  que  em  família  se  moldariam,  sob  o 
influxo  de  aspirações  comuns,  ao  modo  da  vida  peculiar  que 
haviam  de  seguir,  ao  mesmo  tempo  que  assistiriam  às  aulas 
do  seminário  patriarcal,  para  assimilarem  os  conhecimentos 
necessários  ao  estado  eclesiástico.  O  «Padre  Manoel»,  ex- 
carmelita,  director  espiritual  do  seminário,  encarregara-se  ele 
mesmo  de  arranjar  casa  e  alugara,  com  ardente  dedicação, 
para  os  missionários  a  residência,  vizinha  do  seminário,  do 
Dr.  Velhinho. 

A  3  de  Novembro, de  1867,  chegava  de  França  o  Padre 
Carrie,  com  dois  escolásticos  franceses,  os  srs.  Dissan  e  Ru- 
Ihe,  escolhidos  para  pedras  de  fundamento  do  futuro  escolas- 
ficado  português.  Os  professores  e  reitor  do  seminario-liceu 
preparavam  aos  recem-vindos  a  mais  cordial  acolhida.  Um 
dos  mestres  levou  a  benevolência  afectuosa  ao  extremo  de  ir 
cada  dia  dar  aos  estranjeiros  duas  a  três  horas  de  aula  de 
português  gratuita,  afim  de  os  habilitar  a  aproveitarem  mais 
depressa  dos  cursos  públicos. 

Em  fins  de  janeiro  do  ano  seguinte  (de  1868)  chegava  à 
Casa  do  Congo  (assim  se  intitulara  o  germenzinho  de  viveiro 
de  missionários)  o  primeiro  candidato  português,  o  Sr.  Poli- 
carpo dos  Santos,  aluno  do  seminário  patriarcal.  Em  março 


33 


seguinte  entravam  mais  doze;  e  mais  seriam  admitidos,  se 
não  fora  a  exiguidade  de  instalações  na  casa  provisória.  Aí 
ficaram  até  ao  fim  do  ano  lectivo. 

No  principio  do  seguinte,  a  25  de  Outubro  de  1868,  che- 
gava a  Santarém,  em  vez  do  Padre  Duparquet,  que  tinha  ido 
a  França,  o  Dr.  José  Eigenmann  a  tomar  conta  da  província 
nascente.  Duparquet  conseguira  que  o  deixassem  livre  e  à 
disposição  das  missões  portuguesas  em  embrião,  e  o  grande 
e  inteligente  sacerdote  suisso,  seu  sucessor,  vinha  presidir  à 
organização  da  sociedade  missionária  no  continente  desta 
nação,  que  de  agora  em 
diante  ele  ficará  a  estre- 
mecer como  sua  pátria 
verdadeira. 

O  número  crescente 
dos  alunos  exigia,  como 
íamos  dizendo  atrás,  um 
edifício  mais  vasto.  O  P.' 
Eigenmann  obteve-o  em 
setembro  de  1869,  alu- 
gando em  condições  fa- 
voráveis a  casa  do  fale- 
cido General  Guerra,  a 
qual  não  tinha  pretenden- 
tes, por  o  rumor  público,; 
supersticioso,  a  supor  fre- 
quentada por  almas  pe- 
nadas ! 

Mas  pouco  tempo 
serviu  a  habitação  nova. 
Os  negócios  da  missão 
do  Congo  e  Angola  fica- 
vam empatados  oficial- 
mente, apesar  dos  esfor- 
ços supremos,  em  Lisboa, 
do  Padre  Duparquet.  De- 
salentado, este  partia  pa- 
ra Zanzibar,  em  fins  de  1869.  E  a  «Casa  do  Congo»,  que  para 
o  Congo  tinha  sido  fundada,  começava-se  a  recear  viesse  a 
nâo  ter  razão  de  ser. 

Como,  ao  mesmo  tempo,  se  houvesse  oferecido  à  Con- 
gregação aparente  oportunidade  de  uma  obra  a  iniciar  às 
portas  da  Africa  e  da  Espanha,  em  Gibraltar,  resolveu  a  Casa- 
Mãe  transferir  para  ali  o  instituto  de  Santarém.  Entregues  às 


P/  José  Eigenmann. 


34 


famílias  os  alunoside  idade  excessivamente  tenra,  partiram  os 
outros  para  Espanha,  acompanhados  do  director  (1). 

O    Padre 
Poussot    que, 
exausto     dos 
trabalhos     do 
sertão  de  An- 
gola,    conva- 
lescia em  San- 
tarém,   partiu 
então  para   a 
pátria.   O    P.^ 
Carrie  tinha-o 
ido  substituir 
na    Africa, 
acompanhado 
deumP;Dhy- 
èvre ;    reforço 
aliás  caído  do 
Céu  por  sobre 
a  triste  missão 
de  Angola,  ti- 
tubeante   em- 
bora sobre  seu 
futuro,   mas 
que  principia- 
va a  necessi- 
tar   pessoal 
que  mantives- 
se   as    obras 
e  ncetadas, 
quando  via  os 
obreiros  da 
primeira  hora 
retirarem   uns 
após    outros: 
A'  sombra  da  cruz  e  da  palmeira.  Poussot  exgo- 

tado  de  fadi- 
gas, Duparquet  desanimado  com  as  peias  que  lhe  quebranta- 


(1)  Além  do  Sr.  Alexandre  Rulhe,  originário  da  França,  mas  que, 
de  então  para  futuro,  se  considerou  português  (e  nas  provas  do  liceu 
obtivera  distinção  em  tudo,  excepto  em  francês!)  iam  com  Eigenmann 
para  Gibraltar  os  Srs :  Santos,  Mendes,  Pereira,  Silva  e  Antunes. 


35 


vam  o  ardor,  enfim  Espitallié,  que  em  Março  de  1869  falecia, 
vítima  primeira  do  apostolado  angolense,  e  era  enterrado  em 
Loanda  com  as  honras  e  sentimento  devidos  a  um  estranjeiro 
benemérito ! 

Era  a  primeira  vítima  do  esforço  missionário  do  E.  Santo 
na  colónias  de  Portugal.  O  companheiro  que  lhe  veio  de  Am- 
briz  a  abençoar  a  tumba  com  lágrimas  de  irmão,  o  P.''  Lapeyre 
(que  em  1868  substituía  o  P.^  Poussot  doente  e  repatriado) 
achou  mais  necessário  continuar  em  Loanda  o  ministério  do 
morto  que  ir  em  Ambriz  proseguir  com  o  seu. 

Foi  em  Loanda  que  o  vieram  encontrar  os  missionários 
novos,  os  P.'"  Carrie  e  Dhyèvre.  E  vinham,  sem  saber,  para 
o  substituir,  como  ele  substituíra  Espitallié.  A  19  de  Janeiro 
de  1870  finava-se  o  P.'  Lapeyre  no  hospital  aonde  tantos  ou- 
tros fora  antes  consolar  e  ajudar  a  uma  morte  boa.  Angola 
sacrificava  mais  um  dos  que  a  vinham  lentamente  redemir. 


Os  Padres  do  Espirito  Santo 
acabam  de  renunciar  a  colónias  nossas 


Lândana  e  o  Congo  a  fugir-nos 

A  27  de  Julho  de  1870  era  o  êxodo  da  «Casa  do  Congo», 
A  razão  mais  óbvia  da  ruína  desta  casa,  como  já  dissemos, 
era  a  impossibilidade  temida  de  nunca  haver  Congo  a  evan- 
gelizar ...  ao  menos  Congo  português,  aonde  fossem  aceites 
padres  da  Congregação. 

Já  vimos  desacorçoado  partir  para  Zanzibar  o  próprio 
^namorado  do  Congo»,  Duparquet.  A  19  de  Maio  de  1870, 
vimos  também  partir  de  Loanda,  malsinados  e  perseguidos 
de  injustas  suspeitas,  os  Padres  Carrie  e  Dhyèvre,  que  se 
dirigem  ao  Loango,  e  daí  a  Paris,  estudados  de  caminho  os 
empórios  do  Zaire  e  Lândana  e  Cabinda,  e  visitados  o  maior 
número  que  puderam  de  povoados. 

A  Casa-Mãe  decretava,  em  11  de  Agosto,  a  supressão  da 
Missão  do  Congo  e,  a  30  do  mesmo  mês,  enviava  Carrie  à 
Missão  francesa  do  Gabon,  deixando  ao  conselho  dessa  mis- 
são estudar  a  oportunidade  de  utilizar  a  vocação  congolana 
do  padre,  para  organizar  sucursais  do  lado  do  Zaire,  mas 
fora  da  esfera  portuguesa  de  influência. 


36 


Movida  pelos  relatórios  do  Padre  Carrie,  a  Casa-Mâe 
resolvia,  em  Novembro  de  1872,  deixar  reorganizar  o  Congo 
em  missão  independente  da  do  Gabon,  e  escolhia  Lândana 
como  sede,  mas  só  movida  a  isso  pela  suposição  errada  de 
o  grau  5  de  latitude  sul  ficar  fora  completamente  do  domínio 
português. 

O  Padre  Duparquet,  que  uma  carta  do  superior  do  Zan- 
guebar,  Baur,  nos  descreve  crivado  de  furúnclos  e  em  via  de 
ficar  paralítico,  voltara  a  restabelecer-se  à  Europa,  e  achava-se 


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Lândana.  —  Missão  dos  Padres  do  Espirito  Santo,  construida 
por  irmãos  auxiliares. 


em  França,  quando  a  Casa  de  Paris  dava  nova  licença  de 
viver  ao  Congo,  com  que  o  padre  sempre  sonhara.  Viu-se 
logo  com  saúde  e  vigor  novo,  e  pediu  para  voltar  «aos  seus 
primeiros  amores*. 

Até  fins  de  1875,  continuou  a  funcionar  e  a  desenvolver- 
se  pacificamente  em  Lândana  a  missão  francesa,  defendida 
pelo  agente  francês  Rouvre  nas  dificuldades  com  os  ngangas 
(feiticeiros)  e  sobretudo  contra  o  chefe  Matenda  que,  depois 
de  vendido  à  missão  o  terreno  respectivo,  a  queria  expulsar, 
por  lhe  dizerem  os  ngangas  que  era  à  vinda  dos  Padres  e  à 


37 


erecção  da  capela  que  se  deviam  os  flagelos,  então  ocorridos, 
de  uma  catastrófica  estiagem  e  de  uma  peste  de  bicho  de  pé! 

No  fim  do  mesmo  ano  deu-se  um  alevantamento  dos 
indígenas,  no  sufocar  do  qual  colaboraram  todas  as  influên- 
cias europêas  que  nas  margens  do  Zaire  trabalhavam,  irmã  e 
independentemente,  como  em  terra  de  ninguém. 

Os  chefes  duma  expedição  exploradora  alemã,  Drs.  Fal- 
kenstein  e  Pechnel  voltam  de  Chinchoxo,  a  pedido  do  Padre 
Duparquet,  com  os  seus  soldados  e  armamento.  O  P.''  Carrie, 
que  a  sua  coragem  fez  escolher  para  chefiar  o  ataque  aos 
indígenas,  declinou,  em  vista  dos  Cânones  e  da  sua  missão 
de  paz,  a  eleição  honrosa.  Foi  Falkenstein  que  tomou  o 
comando.  Atrás  caminhavam  os  escravos  da  Casa  portuguesa, 
com  as  respectivas  mulheres,  carregando  cestos  de  balas  à 
cabeça;  seguiam  os  homens  da  Casa  francesa,  depois  os  da 
holandesa,  e  enfim  os  da  missão.  Esta  caravana  dirigia-se  em 
estratégico  silêncio  para  a  aldeia  de  Mvulu. 

Ao  chegar  ali,  bastou-lhe  uma  descarga,  para  pôr  em 
fuga  os  inimigos  surpresos:  destes  morreram  uns,  foram  ou- 
tros capturados,  viram  todos  incendiadas  as  cubatas. 

Como,  apesar  deste  castigo,  tanto  a  Missão  como  os  mais 
europeus  de  Lândana  continuavam  a  desconfiar  do  indígena, 
o  P.'  Duparquet  pediu  ao  Almirante  Ribourt,  que  passeava 
patrocinadoramente  os  mares  costeiros  do  Gabão,  fizesse 
algumas  demonstrações  em  frente  a  Lândana.  A  missão  con- 
siderava-se  pura  e  simplesmente  francesa. 

O  P.'  Duparquet,  vice-prefeito  da  missão,  era,  em  fins  de 
1876,  substituído  nesse  posto  por  Carrie,  porque  o  chamava  a 
França  o  empreendimento  de  trabalhos  novos  no  Cabo,  des- 
locados mais  tarde,  por  circunstâncias  que  veremos,  para  o 
nosso  território  de  Angola. 

E  a  missão  do  Congo  ia  continuar  a  evoluir  em  linhas, 
que  não  contavam  com  o  nosso  domínio.  O  Padre  Augouard 
(o  futuro  vigário  apostólico,  de  fama  retumbante,  do  Congo 
Francês)  vinha  da  sua  missão  de  Stanley-Pool  a  receber  de 
Carrie  a  tarefa  de  resuscitar  a  antiga  cristandade  de  Santo 
António  do  Congo.  Partiam  de  Lândana  a  21  de  Setembro  de 
1881,  a  bordo  do  navio  francês  Lebourdonnais;  os  dois  padres, 
vinte  e  sete  marinheiros  em  grande  uniforme  e  o  comandante 
do  navio  (um  bretão  de  nome  Penfentenio)  faziam  em  Santo 
António  sua  entrada,  em  verdade  solene !  O  rei  indígena,  real- 
mente hipnotizado,  prometeu  amizade  à  França. 

Era  tempo  de  Portugal  abrir  os  olhos !  Vamos  ver  que  os 
abriu,  de  facto,  e  que,  aliado  com  os  missionários,  ia  enfim 


38 


asseverar,  perante  o  mundo,  o  propósito  de  não  abandonar 
indolente  estas  regiões  esperançosas  a  influências  canalizadas 
para  a  França. 


O  P.^  Garlos  Duparquet  a  Jravitar 
para  Angola 


Em  1877  vimos  o  Padre  Duparquet  retirar  do  Congo.  A 
presença  dele  em  Paris  lembrou  à  Administração  Central  an- 
tigos projectos,  em  que  n  Congregação  se  empenhara  e  em 
que  o  padre  lhe  fora  instrumento  férvido  e  activíssimo.  Difi- 
culdades de  vária  ordem,  e  maior  de  todas  a  difidência  do 
Governo  Português,  ciumento  de  seu  padroado,  tinham  inibido 
o  padre  de  realizar  em  Angola  um  tentador  esquema  de  colo- 
nização missionária,  iniciado  em  1865.  Julgou  agora  poder 
retomá-lo  mais  a  sul  e  partiu  a  explorar  a  região,  que  se 
estende  entre  os  rios  Orange  e  Cunene. 

A  5  de  Março  de  1878  embarcava,  em  Londres,  para  o 
Cabo.  Chegava  à  colónia  no  momento  mais  esperançosamente 
embalador  para  os  seus  projectos:  quando  a  Colónia  estendia 
o  seu  protectorado  sobre  os  territórios  de  entre  os  dois  gran- 
des rios,  ao  mesmo  tempo  que  sobre  as  repúblicas  do  Orange 
e  do  Transval. 

Esplendidamente  acolhido  no  Cabo  por  Mons.  Leonard, 
bem  aconselhado  e  informando-se  por  todos  os  meios  sobre 
as  condições  de  vida  e  viagem  no  interior,  começa  a  aviar 
preparativos,  manda  construir  um  magnífico  carro  bóer  (o 
«Rafael!»)  e  começa  as  explorações. 

Fixa-se,  enfim,  e  resolve-se  pelo  Damaraland,  e  funda  a 
missão  do  Omaruru.  Funda-a . . .  para  os  seus  colegas,  Padre 
Hogan  e  Irmão  Onuphre;  êle  continua  a  bater  o  mato,  em 
Julho  de  1879,  acompanhado  de  seu  novo  amigo  Manoel  da 
Silva  (1). 

Duparquet   partia   para   o   Ovampo,   sem    pensar   ainda 


(1)  Este  Manoel  da  Silva  devia  ser  um  caracter  dos  em  que  se 
comprazia  Duparquet,  que  se  não  dava  com  o  banal,  nem  em  pessoas 
nem  em  situações.  Parece  que  nesta  viagem  o  Manoel  chorou  muito, 
por  se  apartar  pela  vez  primeira  da  sua  mulher,  a  linda  Malina,  com- 
prada, havia  pouco,  em  troca  de  um  cão  I 


39 


dirigir-se  a  territórios  de  domínio  português :  era  para  sul  do 
Cunene.  e  o  convénio  de  1891  ainda  nSo  definira  dogmática- 
mente  os  limites  ingleses  da  Africa  do  sul.  Sempre  em  terri- 
tório inglês  (cria  ele)  chegou  à  região  do  Cuanhama. 

Ainda  voltou  ao  Ovampo  mais  tarde,  visitando  então  o 
rei  dos  Cuanhamas,  e  captivando-lhe  de  tal  forma  a  devoção 
que  o  rei  o  fazia  acompanhar  em  todas  as  voltas  por  uma 
pessoa  de  confiança,  que  não  deixasse  outra  tribu  conquistar 
o  padre,  furtando  assim  aos  Cuanhamas  a  esperança  da  pro- 
metida missão  e  escola.  Nesta  segunda  visita  (que  foi  em  Ju- 
nho de  1880)  preocupava-se  principalmente  Duparquet  com  a 
via  de  comunicação  com  a  Europa.  Talvez,  pensava  ele  já, 
dirigindo-se  às  autoridades  de  Mossámedes,  se  pudesse  ao 
menos  obter  licença  de  passar . . . 

Entretanto  os  confrades  deixados  em  Omaruru  viam  des- 
encadeadas sobre  eles  tempestades.  Os  luteranos  da  missão 
prussiana  achavam  a  vinha  do  Senhor  estreita;  e,  como  os 
padres  não  lhes  obedeciam  às  intimações  de  retirar  como  tar- 
dios, desencadearam  os  ciosos  alemães  contra  a  missão  cató- 
lica, por  intrigas  e  sobretudo  por  intimidações  à  bruta,  os  reis 
gentios.  Quando  voltou  de  Ovampo  o  director,  ainda  peora- 
ram  as  coisas  para  a  pobre  missão,  nova,  mas  já  tão  esperan- 
çosa. O  protectorado  da  Colónia  do  cabo  retraía-se  de  Dama- 
raland,  escarmentado  com  a  embrulhada  da  guerra  dos  Zulus; 
e  a  guerra  carniceira  desenfreou-se  entre  Damaras,  Herreros  e 
Hotentotes,  tornando  aos  mesmos  europeus  impossível  o  su- 
bsistir, por  lhes  matarem  (respeitando-os  pessoalmente)  todos 
os  serviçais  indígenas. 

Era  preciso  lançar  vistas  sobre  centro  mais  seguro  que  o 
Damaraland.  O  Padre  Duparquet  partiu  para  Betchouanaland 
(aonde,  fadado  a  aventura,  se  vê  uma  noite  roubado  no  acam- 
pamento, ficando  reduzido  às  roupas  do  corpo!)  afim  de  estu- 
dar uma  possível  esfera  de  acção  à  sombra  do  pavilhão  britâ- 
nico. Ao  mesmo  tempo,  ouvindo  de  disposições  melhoradas  do 
Governo  Português,  foi  despachar,  do  Cabo  para  o  ministro 
da  marinha  de  Lisboa,  um  relatório  circunstanciado  do  que 
era  possível  realizar  no  sul  de  Angola:  era  lá  que  o  seu  ideal 
luzia,  lá  o  iman  daquela  alma! 

Os  colegas  ainda  tentaram  aturar  em  Omaruru.  Acabaram 
de  expulsa-los  os  protestantes!...  Depois  de  uma  passagem 
pela  baía  das  Balêas,  haviam  de  ir  parar  só  no  Humbe, 
fixando-se  nas  margens  do  Cunene.  O  Padre  Duparquet  partia 
novamente  para  a  Europa,  e  viria  abrir-lhes  caminho,  já  do 
lado  de  Mossámedes  e  da  gloriosa  Huíla. 


41 


Retirada  de  Gibraltar. 
Outra  vez  no  continente  de  Portuia 


o  Padre  José  Eigeiíniann  depressa  se  encheu  de  Gibral- 
trar  e  da  Espanha  (ou  *portas>  dela).  Se  o  ideal  missionário 
não  tinha  em  Portugal  os  ardores  vivos  da  era  dos  Descobri- 
mentos, em  Espanha  pareceu-lhe  se  tinha  apagado  quasi  irrc- 
missivelmente. 

O  abandono  de  Gibraltar  era  decidido  em  conselho  da 
Congregação,  em  Paris,  em  Março  de  1872.  E  a  razão  dá-a 
Monsenhor  Scandela,  em  circular  de  maio  do  mesmo  ano,  aos 
íieis  de  Gibraltar: 

«Após  uma  experiência  de  passante  de  um  ano,  os  Padres 
da  Congregação  do  Espirito  Santo,  convencidos  de  que  a 
cidade  de  Gibraltar  não  convinha  aos  fins  do  Instituto,  recru- 
tamento de  vocações  religioso-missionárias,  declararam-me  não 
podiam  continuar  mais  tempo  na  direcção,  etc». 

Com  o  mesmo  séquito  que  levara  (Policarpo  dos  Santos, 
agora  ordenado  de  menores,  Rooney,  o  aspirante  José  M.  An- 
tunes e  dois  candidatos  a  irmãos  auxiliares,  Silva  e  Pereira) 
o  padre  tentou  outra  vez  a  implantação  em  Portugal. 

No  primeiro  tentame,  o  que  mais  o  impressionara  na 
mentalidade  de  cá  não  fora  a  improdutibilidade  de  vocações 
missionárias;  fora  a  indisposição  pública  para  o  sustento  c 
habilitações  dessas  possíveis  vocações.  Viu  dum  relance  o 
perspicaz  e  inteligente  suisso  que  não  havia  remédio  senão 
ir  ganhando,  na  educação  de  estranhos,  o  pão  dos  filhos,  que 
à  Congregação  fosse  Deus  dando.  Começou  fogosamente  a 
lançar  as  bases  de  um  colégio. 

Era  inevitável  viesse  este  a  absorver  o  pessoal  português 
que  a  Congregação  fosse  creando,  e  que,  instituído  para  sus- 
tentar vocações  missionárias,  as  fosse  tragando  mal  amadu- 
recidas e  as  impedisse  de  ir  dar  à  Africa  frutos  de  civilização. 
Como  tudo  em  Portugal,  a  sociedade  missionária,  nascida 
para  a  Africa,  viria  a  andar  fora  da  linha  da  própria  compe- 
tência, ao  menos  parcialmente. 

Mas  o  que  havia  de  fazer  o  activo  fundador  da  província 
portuguesa  do  Espirito  Santo,  em  face  de  um  público  obsti- 
nado na  mania  de  descarregar-se  sobre  o  Estado  (Providencia 
automática)  e  que  ainda  não  compreendia  os  sacrifícios  nem 
as  responsabilidades  de  um  povo  crente  a  quem  Deus  confiara 
os  destinos  de  milhões  de  almas,  dando-lhe  domínio  sobre  elas?! 


42 


A  8  de  Outubro  de  1872  estabelecia-se  o  P."  Eigenmann 
num  prédio  da  rua  do  Carvalhal,  na  cidade  de  Braga,  com  os 
escolásticos  vindos  de  Gibraltar,  mais  dois  novos  recrutas 
colhidos  à  passagem  no  Seminário  de  Santarém,  os  Srs.  Gui- 
marães e  Antero,  dos  quais  o  último  ia,  poucos  meses  depois, 
dar,  no  hospital  de  Braga,  a  alma  ao  Creador  pelas  prosperi- 
dades do  Instituto  em  Portugal. 

Começaram  logo  a  admitir-se  alunos,  internos  e  externos. 
O  P.*'  Eigenmann,  além  dos  escolásticos,  tinha  a  ajuda-lo  no 
ensino  o  P/  Luiz  Maria  Ramos,  que  se  oferecia  para  profes- 
sor gratuito  de  retórica  e  filosofia,  e  de  mais  dois  sacerdotes, 
os  P."'  Gomes  e  Gonçalves. 

Em  Julho  e  Agosto,  foram  animadores  os  resultados  nos 
exames  públicos.  Por  isso,  pela  Páscoa  do  ano  seguinte,  subia 
já  a  quarenta  o  número  dos  alunos  (externos  todos).  Era  for- 
çoso encontrar  local  mais  espaçoso.  Encontraram-no  ao  fundo 
da  cidade,  na  quinta  das  Hortas,  onde  entraram  após  as  férias 
grandes  de  1873. 

Dois  anos  mais  tarde  já  não  cabiam,  porém,  na  proprie- 
dada  arrendada.  Tinham  atingido  o  número  de  90  os  alunos 
admitidos,  e  eram  aluvião  os  pedidos  de  entrada.  Eigenmann 
alçava-se  cada  vez  mais  alto  nas  aspirações  dum  zelo  imenso, 
mas  não  havia  desencantar  terreno  que  lhe  amparasse  os 
voos . . . 

Enfim,  no  começo  de  1877,  aparecia  um  brazileiro  rico, 
que  lhe  vendia  uma  propriedade  sita  ao  cimo  da  rua  de  S. 
Vicente,  no  ponto  mais  alto  e  mais  desafogado  da  cidade, 
com  boa  quinta,  água  farta,  e  uma  esplêndida  pedreira. 

E'  claro  que  principiaram  logo  as  construções.  A  14  de 
Maio  de  1877,  lançavam-se  os  fundamentos. 

Em  Outubro  de  1878,  encetou-se  já  o  fervilhar  da  vida 
colegial  no  estabelecimento  novo;  entretanto,  como  a  parte 
construida  não  bastava  a  toda  a  população  escolar,  ficavam 
nas  Hortas  as  classes  primárias,  sob  a  direcção  do  Padre 
Santos  (um  recruta  da  Caso  do  Congo,  já  ordenado)  e  o  Pa- 
dre Tomás  Hossenlop,  trazido  atéqui  pela  inospitalidade  do 
clima  do  Gabon  para  os  seus  tentames  de  apostolado. 

O  pessoal  todo  da  comunidade  (não  contando  os  profes- 
sores de  fora,  padres  e  leigos)  era  este:  Padre  Eigenmann 
(superior),  P.''  Tomás  Hossenlop,  Wunenberger,  Kempf,  Ver- 
dier,  Santos,  Rulhe  e  Rooney;  Irmãos  Alvares,  Paulo,  Pedro, 
Rodrigo  e  Gerard.  Havia  10  aspirantes,  6  eclesiásticos  e  4 
leigos. 

Este  núcleo  de    10  aspirantes  era  o  verdadeiro  coração 


43 


do  estabelecimento.  Mas  o  coração,  naquele  maquinisnio  gi- 
gante, não  crescia  em  proporção  com  o  vasto  organismo.  No 
princípio  de  1885  era  já  de  150  o  número  de  alunos;  os 
seminaristas-missionários,  afogados  no  meio  deles  (bem  que, 
desde  1882,  com  uma  direcção  especial,  presidida  pelo  P/ 
Costes)  não  passavam  de  uma  dúzia.  Os  candidatos  para  a 
vida  de  irmãos  auxiliares  eram  ainda  menos.  Eigenmann, 
fogoso  e  ardente,  impacientava-se  com  o  andar  lento  da  obra 
principal  que,  bem  o  sabia  ele,  de  seu  esforço  esperavam  a 
Congregação  e  a  Providência.  Procurou,  ao  menos,  iniciar 
uma  instituição  especial  e  separada,  onde  a  escola  missionária 
se  pudesse  desenvolver.  Negociou,  ajudado  por  Fernando 
Pedroso,  para  lhe  ser  cedido  o  convento  das  extintas  ursuli- 
nas  em  Viana,  o  qual  foi  visitar  com  o  Geral,  Padre  Emonet, 
que  eiTi  Janeiro  de  1885  vinha  ver  a  província  portuguesa  da 
Congregação  e  os  encantos  do  nosso  país. 

Mas  ficou  para  mais  tarde  a  realização  desse  empenho, 
primacial  para  uma  associação  missionária,  de  dois  viveiros 
paralelos  de  civilizadores,  de  padres  e  de  leigos,  destinados 
à  Africa  Portuguesa. 


O  P.''  Duparquet  outra  vez  em  Aniola 


/ 
Aceite  por  Portugal  e  oposto  à  invasão  protestante. 
Fundação  definitiva  da  Missão 


Na  segunda  excursão  de  Damaraland  ao  Ovampo  vimos 
o  P.'  Duparquet  preocupado  com  estabelecer,  por  território 
português,  uma  saída  para  a  costa  e  ligação  para  a  Europa. 
Fez,  nesse  intuito,  solene  aliança  com  uma  colónia  bóer,  que 
topou  naquela  excursão  e  que  obtivera  do  governo  de  Mossá- 
medes  licença  de  estabelecer-se  em  fazendas  na  Huíla. 

Quando,  gostoso  destes  resultados,  regressou  a  Omaruru, 
esperavam-no  informações  da  Casa-Mãe  de  que  um  adido  da 
embaixada  portuguesa,  por  nome  Andrade,  aparecera  na  dita 
Casa  Mãe  a  pedir  missionários  para  Angola  em  nome  da 
Junta  de  Missões  Africanas  de  Lisboa,  e  do  secretário  dela, 
Fernando  Pedroso. 

Partia  o  padre  de  Omaruru  e,  chegado  que  foi  a  Cape- 
town,  escrevia  um  relatório-requerimento  ao  ministro  da  ma- 


44 


rinha  de  Lisboa,  com  aplauso  e  apoio  do  cônsul  geral  portu- 
guês no  Cabo,  Carvalho  de  nome. 

O  relatório  chegava  a  Lisboa  quando  a  questão  das  mis- 
sões estava  em  maior  favor  nos  meios  oficiais,  aterrados  por 
ver-nos  assediados  de  ambas  as  costas  africanas  pelas  fileiras 
protestantes  inglesas. 

O  requerimento  do  missionário  foi  entregue  à  comissão 
do  ultramar,  com  o  apoio  do  ministro. 

Mudava  então  o  ministério;  mas  Júlio  de  Vilhena,  saindo 
ministro  da  marinha,  declarava  um  ainda  mais  decidido  apoio 
às  missões  que  o  seu  antecessor. 

«Preferia,  dizia  ele-  a  Junta  das  missões,  que  os  missio- 
nários fossem  portugueses;  mas  achava  que  seria  loucura  não 
utilizar  mesmo  os  estranhos,  uma  vez  que  estes  se  podiam 
opor  às  missões  protestantes». 

A  17  de  Maio  de  1878,  embarcava  Duparquet  na  cidade 
do  Cabo,  para  vir  a  Lisboa  dar  expedição  ao  negócio  que 
tanto  lhe  interessava  o  zelo.  De  passagem  pela  Madeira,  indo 
hospedar-se  a  casa  dos  Lazaristas  (os  amáveis  hospedeiros 
tantas  vezes  procurados,  sobretudo  em  Lisboa,  por  quanto 
padre  do  Espirito  Santo  era  trazido  a  Portugal)  soube  o  mis- 
sionário da  nomeação,  para  Angola,  de  D.  José  Sebastião 
Neto,  e  de  que  se  não  falava  senão  do  zêlo  auspicioso  do 
novo  prelado.  Foi  mais  uma  estrela  a  tremeluzir  no  futuro, 
vaga  mas  ardentemente  sonhado,  pelo  apóstolo  africano. 

Chegado  a  Lisboa,  foi  apresentar-se  logo  ao  ministro  da 
marinha,  acompanhando-o  Fernando  Pedroso.  Este  falou  a 
Vilhena  do  relatório  e  propostas  enviadas  do  Cabo  pelo  padre 
e  das  quais  o  novo  ministro  ainda  não  fora  informado.  Prometeu 
tomar  imediatamente  conhecimento  deles  e  estar  habilitado  a 
responder  no  dia  seguinte. 

E  no  dia  seguinte,  ao  chegar  outra  vez  ao  ministério  da 
marinha,  achou  de  facto  o  padre  aos  da  Comissão  das  Missões 
nas  últimas  conclusões  de  um  exame  de  questão.  A  delibera- 
ção foi  acolhedora  para  o  missionário.  O  ministro  referendava 
as  conclusões  da  comissão.  Duparquet  e  os  padres  do  Espirito 
Santo  eram  admitidos  a  missionar  em  Angola,  com  a  caução 
única  de  ser  português  o  superior. 

Daqui  por  diante  é  um  rosário  de  triunfos.  Aparece  o 
Rev.  P.'  José  Maria  Antunes,  vindo  de  pouco  da  França,  dos 
seus  últimos  estudos:  uma  ordenança  régia  de  28  de  Julho 
nomeava-o  pároco  de  Huíla,  outra,  assinada  por  D.  Luiz  no 
dia  antecedente,  autorisava  o  governador  geral  de  Angola  a 


45 


conceder  à  missão  católica  de  Mossámedes,  a  organizar  pelos 
Padres  do  Espirito  Santo,  o  terreno  necessário.  Uma  portaria 
da  mesma  data  completava  aquelas  ordenanças,  autorizando  a 
Missão   a  alirir  escolas  e  outros  estabelecimentos  de  ensino. 

A  5  de  Outubro  de  1881,  partia  de  Lisboa  a  primeira  leva 
missionária.  Graças  à  afanosa  dedicação  de  Pedroso  (cuja 
memória  de  católico  da  velha  Escola,  mas  com  rasgo  e  decisão 
de  um  novo,  não  pode  apagar-se  no  coração  dos  que  a  cru- 
zada missionária  enleva)  era  decretada  passagem  gratuita  para 
todo  o  pessoal  missionário  e  respectiva  bagagem,  sendo  esta 
além  disso,  dispensada  de  direiros  alfandegários. 

O  bispo  D.  José  acolheu  os  missionários  que  a  Provi- 
dência lhe  enviava,  com  alvoroço  afectuoso  de  irmão,  investiu 
com  amor  o  Padre  Antunes  nas  funções  de  pároco  da  Huíla, 
reconheceu  a  Missão  de  Mossámedes  como  obra  distinta  da 
paróquia  e  mais  vasta  do  que  ela,  deu  aos  missionários,  para 
as  primeiras  necessidades,  tudo  o  de  que  pôde  dispor:  caixas 
de  paramentos,  livros,  enfim  negociou  com  o  governador. 
Ferreira  do  Amaral,  a  passagem  do  Seminário  de  Loanda 
para  as  mãos  dos  Padres  da  Huila,  com  os  subsídios  que 
constituíam  a  dotação  daquele  estabelecimento. 


Missão  da  Huíla,  —  Campos  e  sementeiras. 


46 


«D.  José   Neto,   escreve   Duparquet   aos   Superiores   de 
Paris,  a  27  de  Novembro  de  1882,  o  nosso  excelente  prelado, 
acaba  de  nos  chegar  a  casa  com  os  alunos  do  seu  seminário. 
Deve  ficar  comnosco  uns  poucos  de  meses,  o  que  será  uma 
benção  para  a  casa,  porque  é  um  bispo  santo  este.  Dorme 
num  taboado,  e  às  4  h.  da  manhã  já  está  de  pé  para  a  oração 
com  os  Irmãos . . .  Dirigiu  à  Propaganda  de  Roma  um  pedido 
pessoal  de  subsídios  para  as  nossas  obras  daqui*»  . . . 
O  P.'  Antunes  dizia  do  bispo  noutra  carta : 
. . .  «Felizmente  nós  sabíamos  que  o  bom  prelado  não  era 
exigente,  mas  de  uma  simplicidade  de  franciscano  verdadeiro». 
Do  governador  escrevia  o  Padre  Duparquet : 
«O  acolhimento  não  foi   menos  animador  por  parte  do 
governador  geral.  Depois  de  nos  convidar  a  almoçarmos  com 
ele,  concedeu-nos  2:000  hectares  de  terreno . .  . 

. . .  Depois  de  me  pedir  que  instalássemos  na  Huíla  uma 
estação  metereológica,  forneceu-me  para  isso  a  maior  parte 
dos  instrumentos». 

Mas  a  benevolência  das  autoridades  portuguesas  paten- 
teou-se  mais  dedicada  ainda,  quando  se  tratou  de  ir  escolher 
o  terreno  obtido.  Os  missionários  começaram  a  procurar  um 
sítio  que  pudesse  convir  às  obras  projectadas.  Mas  os  boers 
já  tinham  empolgado  tudo  o  que  servia;  e  quando  o  P.'  An- 
tunes apresentou  os  documentos  da  concessão  dos  2:000 
hectares,  responderam-lhe  que  já  nem  um  restava  disponível! 
Os  boers  abusaram  da  liberalidade  com  que  o  governador  de 
Mossámedes  os  deixara  talhar,  por  mão  própria,  cada  família 
os  seus  300  hectares  e  assenhorearam-se  de  todo  o  terreno 
arável  nas  vertentes  dos  dois  rios.  Palanca  e  Moucha.  O  go- 
vernador do  distrito  reservara  o  direito  de  propriedade  pro- 
priamente dita,  concedendo  o  usufruto  dos  terrenos,  e  deixando 
para  oportunidade  futura  o  deferimento  de  requerimentos 
posteriores,  que  depois  fariam  os  colonos;  estes,  porem,  con- 
sideraram-se,  de  então  por  diante,  em  terra  conquistada.  Foi 
providencial  ter  de  intervir  então  o  Governo,  protegendo  a 
concessão  feita  à  Missão,  não  fossem  pouco  a  pouco  os  sul- 
africanos  considerar  tudo  aquilo  como  simples  colónia  bóer. 

Quando  ouviu  da  contenda,  o  governador  geral  mandou 
logo  a  Mossámedes  o  procurador  da  Coroa,  com  poderes 
plenos  para  tirar,  se  preciso  fosse,  o  terreno  aos  colonos  do 
sul;  estes  já  tinham  sido  levados  a  uma  atitude  mais  transi- 
gente.  Viram  a  opinião  pública  tão  sobresaltada,  a  inquirir  se 
aquilo  ali  seria  já  colónia  holandesa,  de  forma  que  não  seria 


47 


já  possível  à  autoridade  dispor  duma  quinta  para  uma  escola, 
que  enfim  se  dobraram,  declarando  ao  comandante  da  Huíla 
desistir  das  primeiras  pretenções. 


Rev.  P.'  José  Maria  Antunes. 

Era  princípio  de  1882,  quando  chegava  o  agrimensor  ofi- 
cial a  delimitar,  no  vale  do  Moucha,  a  propriedade  do  centro 
missionário,  donde  tanto  progresso  havia  de  irradiar,  não  só 
sobre  o  resto  de  Mossámedes,  mas  para  Angola  inteira.  Era 


48 


um  oásis  fadado  para  fonte  de  prosperidades,  como  toda  a 
cordilheira  da  Chéla,  dominando  magestosa  o  vale  do  Zam- 
beze. Impacientes  de  progresso,  os  missionários  estenderam- 
se  logo  a  um  posto  novo,  comprando  o  Muniíno,  propriedade 
sita  a  uma  hora  de  distância.  E,  trabalhando  todos  com  ardor 
de  construtores  conscientes  de  uma  cidade  nova,  começaram 
de  abater  florestas  e  de  transformar  a  argila  em  tijolo,  no 
mesmo  fôlego  com  que  iniciavam  na  civilização  e  no  trabalho 
os  filhos  do  sertão,  que  vinham  a  transfigurar. 


Missões  do  clero  secular 


D.  José  Sebastião  Neto, 
S.  Salvador  do  Congo. 
O  Padre  António  Barroso. 

A  ida  para  a  diocese  angolana  do  grande  homem  e  santo, 
que  foi  o  bispo  D.  José  Sebastião  Neto,  foi  o  início  duma  era 
de  renovo  espiritual  para  a  nossa  Africa  Ocidental. 

Com  o  bispo  novo  desembarcava,  a  5  de  Setembro  de 
1880,  em  Loanda,  o  P."  António  José  de  Sousa  Barroso,  que. 
após  alguns  meses  de  serviço  paroquial,  ia  partir  para  o 
Congo  a  reconstruir  sobre  ruínas  tocantes  de  antigo  labor 
português  nova  missão  portuguesa  do  nosso  padroado  religioso. 

Principiou  em  S.  Salvador  com  três  companheiros,  edifi- 
cando provisoriamente  algumas  choças  de  barro  e  colmo.  Um 
dos  companheiros  sucumbiu  dentro  em  pouco;  outro  teve  de 
regressar  à  pátria  para  não  o  seguir  na  tumba;  com  o  P.' 
Barroso  ficava  só  o  P.'  José  Sebastião  Pereira  (que  mais  tarde 
será  bispo  de  Damão). 

Os  nossos  missionários  tinham  diante  de  si  e  a  defron- 
tar-se  com  eles  uma  outra  missão  já  organizada,  inglesa  e 
protestante,  e  a  essa  tinham  de  reconquistar,  para  o  restituir 
a  Portugal,  o  domínio  moral  exercido  sobre  os  congoleses  e 
e  sobre  o  rei  deles  (então  um  tal  D.  Pedro  de  Agua  Rosada, 
calculador  e  interesseiro). 

A  Acta  de  Bruxelas  e  a  Conferência  de  Berlim  tinham 
escancarado  as  portas  do  mundo  bárbaro,  colónias  de  Portu- 
gal e  outras,  à  propagação  de  toda  e  qualquer  confissão  cristã, 
chegara  o  momento  de  a  nossa  civilização  religiosa  ter  de 


49 


começar  a  tazer  suas  provas,  em  competição  com  a  de  nossas 
irmás  da  Europa. 

*Em  situação  tão  desigual  e  desvantajosa  (escreve  p  P." 
Sebastião  de  Oliveira  Braz)  só  a  firmeza  de  vontade  inque- 
brantável e  finura  de  tacto,  de  que  deu  provas  o  inexperiente 
Padre  Barroso,  poderiam  abrir  caminho. 

«Nada  do  que  encontrou  no  Congo,  à  sua  chegada,  era 
de  molde  a  estimular-lhe  os 
brios.  Nem  fundas  tradições 
católicas,  nem   influência 
portuguesa.    D.    Pedro    de 
Agua  Rosada,  sem  ser  um 
revoltado   contra    a    metró- 
pole, ia  aceitando  as  blan- 
dícias da  missão  protestan- 
te, com  bem  manifesto  de- 
trimento  da  fidelidade  que 
os    seus    maiores    sempre 
observaram  para 
com   os   reis   de 
Portugal. 

«Percorrendo 
a  região  em  que 
o  zelo  e  esforços 
do  Padre  Barro- 
so iam  dar  as 
primeiras  pro- 
vas, não  encon- 
trou senão  ruí- 
nas atestando  no 
seu  mutismo  o 
descalabro  do 
predomínio  que 
a  crença  católica 
ali  tivera  em  tem- 
pos idos. 

«Lembro -me 
ainda  de  que, 
num  dos  seus  re- 
latórios para  o 
então  ministério  da  marinha  e  ultramar,  a  sua  alma  ardente 
de  patriota  e  de  padre  cheio  de  zelo  pela  causa  de  Deus,  não 
podendo  recalcar. a  mágua  que  tantos  padrões,  quasi  de  todo 
apagados,  lhe  sugeriam,  rompia  nesta  afirmação  dolorida :  — 


D.  António  de  Sousa  Barroso, 
organizador  das  missões  seculares  do  Congo. 


50 


«Nunca  a  Cruz  mutilada  de  Alexandre  Herculano  me  pareceu 
mais  bela  e  verdadeira». 

«A  contrastar  com  tudo  isso,  havia  apenas  uma  vontade 
que  nunca  fraquejou,  e  faculdades  de  trabalho  que  nunca  sou- 
beram o  que  era  fadiga,  e  só  uma  organisação  privilegiada 
comportava. 

«Ao  lado  duma  residência  para  a  missão  toda  em  madeira, 
a  cuja  montagem  ele  já  presidiu,  surgiram,  como  por  encanto, 
da  sua  fecunda  iniciativa,  uma  capela  para  os  actos  do  culto, 
uma  escola,  um  hospital,  um  observatório  metereológico  e  os 
primeiros  lineamentos  duma  granja,  que  era  escola  de  traba- 
lhos agrícolas  para  subtrair  à  preguiça,  ingénita  no  preto,  os 
alunos  da  missão,  e  simultaneamente  provisão  de  vegetais, 
legumes  e  frutos,  para  alimento  do  pessoal. 

«Só  por  um  assombro  de  actividade  e  uma  quasi  multi- 
plicação da  própria  personalidade,  o  missionário  Padre  Bar- 
roso podia  acudir  a  tantas  ocupações,  sem  prejuízo  do  bom 
andamento  de  qualquer  delas. 

«As  observações  meteorológicas,  pontualmente  feitas, 
eram  exactas  e  apreciadas  em  Loanda.  A  escola  progredia,  e 
a  capela  era  frequentada.  O  movimento  hospitalar,  principal- 
mente na  cura  de  pústulas  e  febres  palustres,  era  importante, 
e  o  grangeio  das  hortas  e  pomares  avançava  animadora  e 
proficuamente. 

«Com  estes  impobros  labores,  tinha  o  missionário  Barroso 
de  acumular  uma  missão,  tão  delicada  como  difícil,  mas  indis- 
pensável para  o  triunfo  do  seu  zelo  apostólico  e  patriótico, 
que  era  subtrair  o  rei  D.  Pedro  de  Agua  Rosada  ao  ascendente 
que  sobre  ele  tinha  tomado  a  missão  inglesa,  e  afervoral-o  no 
amor  de  Portugal  e  abrir  caminho  à  expansão  comercial  por- 
tuguesa, então  quasi  nula  naquela  região. 

<E  tão  avisadamente  e  diplomaticamente  se  houve  o 
Padre  Barroso  que,  sem  atritos  com  a  missão  rival,  antes 
vivendo  amistosamente  com  ela,  conseguiu  anular-lhe  todo  o 
prestígio  sobre  D.  Pedro  e  contraminar-lhe  por  completo  a 
acção  desnacionalizadora» . 


O  P.*  Barroso  lamentou  frequentes  vezes  a  falta  de  irmãos 
leigos,  que  pudessem  acompanhar  na  educação  do  indígena  a 
acção  espiritual  do  padre,  e  iniciar  aquelas  gerações  indolen- 
tes no  trabalho  indispensável  à  continuação  do  viver  culto. 
Também  sentiu  e  advogou  em  Portugal  a  necessidade  de 
completar  o  trabalho  do  missionário  com  a  acção  de  missio- 


51 


nárias,  educadoras  da  futura  mãe  cristã.  Este  último  deside- 
ratum  veio  depois  a  ter  satisfação  nas  missões  do  Congo. 

Em  1885,  apesar  da  carestia  lamentável  do  pessoal  e 
recursos,  ousava  o  valente  missionário  abalançar-se  a  uma 
fundação  nova,  a  de  Mandimba,  a  primeira  de  um  vasto  plano 
que  não  terá  infelizmente  ocasião  de  realizar;  porque,  voltando 
à  metrópole  a  restabelecer-se,  depois  de  oito  anos  de  Congo, 
não  o  deixarão  voltar  à  missão  do  seu  amor.  Será  preciso 
deixar  ir  sem  ele  para  o  Congo  os  dois  filhos  do  rei  preto 
Agua  Rosada,  os  quais  ele  trouxera  a  Portugal,  para  os  edu- 
car, mas  também  como  um  penhor  dado  ao  rei  e  ao  povo 
congolês  de  que  voltaria  para  eles.  Voltou  à  Africa,  mas  como 
prelado  da  outra  costa,  e  os  seus  amigos  do  Zaire  tiveram  de 
curtir  saudades  dele,  que  ainda  duravam,  quasi  religiosas, 
quando  D.  António  Barbosa  Leão  foi  em  visita  pastoral  per- 
correr aquelas  regiões. 

As  missões  do  clero  secular  do  Congo  continuaram  a 
desenvolver-se,  e  subsistem  ainda,  agrupadas  em  redor  dos 
três  centros  principais:  S.  Salvador,  Mandimba  e  Lunuango, 
apesar  da  extinção  do  Seminário  em  Sernache.  Mas  não  ha 
dúvida  que  foi  uma  perda  incalculável  para  elas,  a  do  apos- 
tólico fundador,  logo  a  seguir  à  do  prelado  do  Congo  e  An- 
gola, que  em  1883  recebera  ordem  ele  também,  de  retirar. 

Ha  uma  carta  deste  último  príncipe  da  Igreja,  que  nos 
mostra  como  se  apreciavam  mutuamente  os  três  grandes  mis- 
sionários daquela  quadra  de  esperança  missionária.  Dê-se  nos 
vénia  que  a  reproduzamos : 


Carta  de  D.  José  Sebastião  Neto  a  Júlio  de  Vilhena, 

Ministro  da  Justiça  e  Negócios  Eclesiásticos    0) 

11, mo  g  Ex."'"  Sr. 
Loanda,  13  de  Junho  de  1883. 

Surpreendeu-me  novamente  e  lançou-me  em  grande  confusão  a 
carta  de  V.  Ex.*,  de  4  de  maio  último.  E,  apertado  por  V.  Ex.*  para  que 
siga  para  o  reino  com  a  possível  brevidade,  e  do  mesmo  modo  instado 
pelo  Núncio  de  Sua  Santidade,  receio  bem  incorrer  no  desagrado  de 
S.  Magestade,  de  V.  Ex.*  e  do  Sr.  Núncio,  regeitando  a  mitra  do  pa- 
triarcado, pois  noto  que  não  ha  disposição  para  se  me  admitir  conside- 
rações, que  desejaria  bem  que  fossem  atendidas. 


(i)  Vem  reproduzida  no  i.o  rol.  da  obra  de  J.  de  Vilhena  An/es  da  Republica  a  pa^s. 
»a3,  124. 


52 


Pois  quê,  Ex.f^o  Sr.,  entre  tantos  prelados  do  reino  e  ultramar, 
ilustres  pelo  seu  saber  e  virtude,  ha  de  ser  preferido,  para  a  mais  alta 
dignidade  da  hierarquia  eclesiástica  em  nosso  reino,  o  mais  indigno  de 
todos  eles? 

Sua  Magestade,  V.  Ex.''  e  o  Sr.  Núncio  o  teem  de  certo  ponderado, 
e  a  mim  só  me  compete  obedecer.  Partirei,  pois,  logo  que  possa  deixar 
os  negócios  da  diocese  em  boa  ordem,  e  sobre  tudo  depois  de  ver  se 


D.  José  Sebastião  Neto. 
O  cardial  recolhido  á  sua  célinha  de  frade. 


I 


53 


posso  deixar  a  governar  a  diocese  o  superior  da  missão  Congo,  António 
José  de  Sousa  Barroso,  aluno  do  real  colégio  de  Sernache,  rapaz  pru- 
dente c  inteligente,  que  daria  um  excelente  bispo  para  esta  diocese ; 
porèni.  mais  inteligente,  e  igualmente  prudente,  mas  dum  curso  muito 
desenvolvido  em  scièncias  naturais  e  belas  artes,  o  pároco  de  Huíla,  José 
Maria  Antunes,  natural  de  Santarém,  se  me  não  engano,  superior  da 
missão  do  real  padroado  português  naquela  localidade. 

Não  veja  V.  Ex.*  nesta  insinuação,  de  que  eu  peço  mil  desculpas, 
mais  que  o  desejo  ardente  que  tenho,  como  metropolita  desta  diocese, 
de  que  seja  nela  colocado  quem  tenha  a  necessária  força  de  vontade 
para  realizar  três  importantes  obras,  que  havia  projectado,  e  que  con- 
tava ver  realizadas  com  meios  que  já  me  tinham  sido  prometidos  pela 
Propagação  da  Fé,  e  com  donativos  particulares  obtidos  no  reino.  Sei 
quanto  V.  Ex.*  é  apaixonado  pelas  nossas  colónias,  por  isso  lhe  quero 
fazer  conhecer  quais  sejam  essas  obras,  a  fim  de  fazer  interessar  nelas 
o  digno  ministro  da  marinha  e  ultramar. 

As  obras  são  as  seguintes:  uma  escola  profissional  para  pretos; 
um  asilo  para  raparigas  pretas,  que  mais  tarde  devem  unir-se  em  matri- 
mónio com  os  alunos  da  escola  profissional  e  abrir  assim  um  exemplo 
de  moralidade  pela  constituição  da  família  cristã,  que  é  coisa  quasi 
desconhecida  nesta  província  entre  os  pretos;  e  um  outro  asilo  para 
raparigas  brancas,  expostas  ao  perigo  da  prostituição,  as  quais,  sendo 
entregues  à  direcção  das  irmãs  hospitaleiras  portuguesas,  dariam  exce- 
lentes auxiliares  de  civilização  em  missões  bem  organizadas,  ou  boas 
mães  de  família,  unidas  em  matrimónio  com  os  nossos  colonos. 

Quanto  à  eleição  do  vigário,  pode  V.  Ex.*  estar  seguro  de  que  me 
não  comprometo,  sem  ouvir  a  opinião  do  governo,  pois  que  desejo  que 
o  sujeito,  que  houver  de  eleger,  não  mereça  menos  confiança  ao  gover- 
no do  que  a  mim. 

Sou  com  a  máxima  veneração  e  reconhecimento 

De  V.  Ex.» 
Mt.o  At.o  Ven.^i'  C.°  Obg."^° 

José,  bispo. 


A  missão  francesa  do  Gonio  torcida 
outra  vez  para  Portuial 


Vimos  que  a  missão  do  Congo,  primeiro  concebida  como 
portuguesa,  supressa  pela  inviabilidade  que  lhe  adviera  da 
desconfiança  do  Governo  Português  para  com  os  padres 
estrangeiros,  só  resuscitara  mais  tarde  como  dependência  da 
missão  do  Gabon,  e  que,  mesmo  em  Lândana,  se  julgava 
operando  em  solo  de  padroado  da  França.  Não  se  perca  de 
vista  que  só  pelo  convénio  de  1886  é  que  se  fixaram  os  con- 
fins do  que  é  nosso  e  do  que  é  francês  no  Congo. 


54 


O  terreno  da  missão  de  Lândana  tinha  sido  adquirido 
simplesmente  por  contrato  com  os  indígenas,  figurando  no 
documento  nomes  de  residentes  franceses,  apenas  como  testi- 
munhas  da  identidade  entre  a  cruz  que  firmava  o  documento 
e  a  assignatura  do  chefe  Matenda.  O  contrato  fez-se  na  Casa 
Francesa  de  Lândana,  eram  francesas  as  testimunhas,  e  o 
signatário,  Charles  Aubert  Duparquet,  representava  a  Missão 
Francesa  do  Loango. 

Em  1884,  tentaram  os  portugueses  de  Lândana  a  asserção 
dos  direitos  do  nosso  Governo.  Moveram  a  um  vizinho  da 
missão  para  ele  reclamar  o  terreno  como  sua  herdade,  levando 
a  reclamação  ao  delegado  português,  estabelecido,  havia 
pouco,  em  Chinxocho.  O  P.'  Carrie  não  aceitou  a  arbitragem 
do  delegado.  Este  referiu  o  caso  ao  governador  de  Loanda. 

Achava-se  então  surto  no  porto  da  capital  angolana  um 
navio  francês,  comandado  por  Courthville,  amigo  do  Pf  Car- 
rie. Foi  o  comandante  a  conferenciar  com  o  nosso  governador 
e  obteve  que  fosse,  até  nova  ordem,  considerado  independente 
o  território  de  Lândana,  até  se  provar  (o  que  o  governador 
considerava  certo)  que  aquele  território  ficava  para  norte 
de  5^  12'. 

Partiram  para  o  Congo,  em  seguida,  o  navio  de  Courth- 
vile,  «Le  Segond»,  e  a  canhoneira  portuguesa  «Sado»,  com 
um  grupo  de  oficiais  franceses  e  portugueses  respectivamente, 
que  iam  calcular  exactamente  aquela  latitude.  Bem  depressa 
vinham  a  concordar  que,  de  feito,  o  governador  errava :  que  a 
missão  estava  a  sul  do  5"\2'. 

Em  1885  (ou  um  ano  mais  tarde  que  essa  contenda)  caía 
sobre  os  missionários  do  Loango  o  duche  frio  do  tratado  de 
Berlim:  Lândana  era  portuguesa,  porque  encravada  no  enclave 
de  Cabinda.  Dora  avante  haviam  de  ter  sentido  o  P.^  Carrie 
e  os  seus  colegas  que  não  eram  os  missionários  desejáveis 
naquelas  partes;  que  os  deveriam  substituir  colegas  de  todo 
novos  e  sem  ligações  com  a  missão  de  Loango,  que  conti- 
nuava francesa. 

Entretanto  o  P.*  Carrie,  que  aliás  precisava  de  assegurar 
protecção  europêa  para  a  sucursal  de  S.*""  António  (esta  por 
sem  dúvida  em  território  português)  resolveu  ir  ter  com  o 
governador  de  Angola,  já  então  F.  J.  Ferreira  do  Amaral,  e 
exprimir-Ihe  desejos  de  cooperar  com  a  máxima  lealdade  com 
o  clero  secular  português,  já  então  em  via  de  meter  ombros  à 
tarefa  da  civilização  de  Africa,  como  atrás  vimos. 

Correra  rumor  que  pretendia  o  Governo  enviar  sacerdo- 
tes a  S.***  António  e  mesmo  a  Lândana ;  para  evitar  qualquer 


I 


55 


desinteligència,  propunha  o  missionário  francês  se  escolhesse 
antes  um  dos  padres  do  Espirito  Santo  para  cada  localidade. 
Ferreira  do  Amaral  exigia  que  os  padres  candidatos  a  essa 
escolha  fossem,  então,  portugueses,  ou  ao  menos  nacionalizados. 

Carrie,  ao  dar  aos  superiores  conta  desta  entrevista,  ter- 
mina com  esta  reflexão,  que  patenteia  estarem  dissipadas  já 
então  (era  em  Agosto  de  1885)  as  dúvidas  sobre  o  futuro 
português  dos  territórios  em  que  trabalhava: 

«Confiemos  que  dentro 
em  poucos  anos,  nos  pos- 
sam os  nossos  estabeleci- 
mentos de  Portugal  forne- 
cer missionários  daquele 
pais**. 

No  ano  seguinte,  erecta 
em  vicariato  apostólico  a 
prefeitura  do  Alto  Congo, 
ou  Congo  Francês,  partia 
para  França,  para  voltar 
para  Loango  já  sagrado  bis- 
po, o  antigo  superior  de 
Lândana.  Em  1887,  era  ele- 
vado à  dignidade  de  prefei- 
to do  Congo  o  P.' Campana, 
ficando  contudo,  eclesiasti- 
camente,  ainda  essa  missão 
a  depender  do  vicariato 
francês.  Um  ano  mais  tnrde 
é  que  a  Propaganda  desli- 
gava a  prefeitura  e  a  cons- 
tituía eclesiasticamente  in- 
dependente, sob  a  designa- 
ção, ao  princípio  de  Baixo 
Congo,  depois,   eliminadas 

a  estações  de  Nemlas  e  Boma,  e  transportado  o  material  mis- 
sionário do  território  belga  para  Cabinda,  com  o  nome,  em 
fim,  de  Congo  Português! 

Era  em  1891.  A  prefeitura  contava  já  três  missões.  A  de 
S.*°  António  tinha  desaparecido,  mas  abrira-se  em  princípios 
de  1890  a  de  Luali.  Alargava-se  ao  mesmo  tempo  a  vigilância 
do  prefeito  apostólico  e  a  sua  solicitude  ao  gérmen  doutra 
missão  nova,  tão  longe  do  Congo  como  é  Loanda,  aonde  o 
prelado  de  Angola  convidara  a  exercer-se  o  fervor  apostólico 
da  Congregação, 


Padre  Pascal  Campana, 


56 


Loanda. 
Esboços  da  Missão  da  Lunda 


o  bispo  de  Angola,  (1)  D.  António  Leitão  e  Castro,  que- 
ria dotar  com  um  capelão  o  hospital  de  Loanda  que  já  o  an- 


,  ji^ti.i'*^  t 


Malange.  —  Exames  na  missão. 

tecessor,  D.  José  Neto,  havia  dotado  com  um  corpo  de  enfer- 
meiras  franciscanas.    F.   Pedroso  soube  desse  empenho  do 


(1)  Bispo  de  Angola  e  depois  de  Lamego,  D.  António  Tomás  da 
Silva  Leitão  e  Castro,  antes  de  ir  para  a  Africa  ocidental,  foi  superior  do 
Colégio  das  Missões  Ultramarinas  de  Sernache  do  Bom  Jardim. 

Foi  muito  amigo  das  Missões  e  especialmente  da  da  Huíla,  onde 
esteve  por  várias  vezes  e  durante  bastante  tempo.  Depois  de  alguns 
anos,  foi  transferido  de  Angola  para  Lamego  onde  faleceu  pobríssimo  ; 
pois  dava  aos  indigentes  tudo  quanto  recebia  para  sua  côngrua. 


57 


prelado  ultramarino  e  escreveu  logo  para  a  Casa-Màe  do  Es- 
pirito Santo,  urgindo  a  aceitação  daquele  cargo,  vista  a  impor 
tância  da  posição  para  as  missões  da  Africa  ocidental.  Um 
padre  Gautliier,  que  se  aprestava  a  partir  para  a  Huíla  íoi 
encarregado  de  ir  satisfazer  aqueles  empenhos  auspiciosos.  O 
P.  Faxel,  da  missão  supressa  de  Santo  António  do  Zaire, 
recebeu  ordens  de  esperar  em  Banana  a  chegada  de  Lisboa 
do  P."  Gaulhier  e  de  fazer-lhe  companhia. 

Chegaram  os  Padres  a  Loanda  no  fim  de  Janeiro  de  1887. 
Alojados  a  principio,  no  hospital  e  depois  na  parte  abando- 
nada do  antigo  seminário,  foram  depois  viver  em  pensão,  paga 
pelo  Governo  a  Gauthier  na  qualidade  de  capelão  hospitalar, 
ao  P:  Faxel  na  de  capelão  da  fortaleza  de  S.  Miguel. 

Aquele  hospital-monumento  (como  lhe  chamam  as  cartas 
pasmadas  dos  dois  missionários)  de  nada  menos  que  600  camas, 
absorvia  boa  parte  do  dia  e  dos  cuidados  dos  padres,  mas 
não  bastava  ao  zelo  ardente  que  traziam.  Foram-se  empre- 
gando, sobretudo  aos  domingos,  na  visita  das  aldeias  vizinhas, 
e  fundaram  uma  escola. 

Três  anos  após  a  chegada,  estavam  já  os  Padres  de 
Loanda  assas  robustamente  enraizados,  para  poder  lançar  um 
rebento  da  missão  a  80  légoas  pelo  sertão  dentro,  no  interior 
de  Malange.  Para  lá  partiam,  em  caravana,  o  P.'^  Kraft,  o  P." 
Espinasse,  o  Irmão  português  Adriano  e  o  Irmão  indígena 
Paulo.  Iam  guiados  pelo  padre  prefeito  (o  do  Congo,  já  disse- 
mos)'ÍRev.  P/  Campana.  O  governo  prontificava-se  a  subsidiar 
6  missionários,  ma§  não  fora  possivel  achá-los.  Iam,  para 
compensação,  os  melhores  alunos  de  Loanda,  para  servirem 
na  qualidade  de  professores-catequistas. 

Em  1893,  nascia  a  estação  nova  de  Calulo  ou  Libolo,  diri- 
gida pelos  padres  Kraft  e  Sousa. 

Em  1897,  o  distrito  de  Loanda  era  oficialmente  separado 
do  distrito  de  Lândana. 

As  missões  da  Lunda  (que  aliás,  mais  próximas  da  Sé  de 
Loanda,  precisavam  menos  de  ajudar  a  administração  dioce- 
sana com  a  instituição,  anormal  em  Angola,  dos  prefeitos 
apostólicos)  ficaram  também  um  distrito  eclesiástico  autónomo, 
com  o  P.'  Moulin  por  superior  principal,  ou  sub-prefeito. 

Neste  mesmo  ano  a  missão  de  Loanda  fora  completada 
por  uma  escola  do  sexo  feminino.  Ramada  Curto,  então  go- 
vernador, vira  passar,  em  direcção  a  Malange,  três  irmãs  de 
S.  José.  Dirigiu-se  ao  superior,  P.'  Carlos  Wunemburger,  que 
as  guardasse  ali,  em  virtude  das  funções  que  exercia  de  pro- 


58 


curador  das  missões.  Como  o  padre  escrupulizasse,  o  gover- 
nador telegrafou  ao  ministro  e  mandou-as  ficar! 

A  Loanda  e  a  Malange  tinham  acrescido  as  missões  no- 
vas de  Calulo  e  de  Canamboa,  quando,  em  1900,  o  P;  Victor 
Wendling  substituia  o  P;  Moulin  nas  funções  de  vice-prefeito 
ou  superior  principal. 

Evolução  da  Gimbebásia 

o  P.^  Duparquet,  quando  nomeado  prefeito  apostólico  da 
Cimbebásia,  tinha  diante  de  si  a  esboçar,  por  seus  esforços  e 
aos  encontrões  da  sorte,  uma  entidade  jurídica  vaga  e  informe. 
Ainda  mesmo  quando,  firmado  nas  boas  disposições  do  nosso 
governo,  voltou  a  Angola,  parecia-lhe  que  esse  canto,  em 
verdade  vasto,  da  imensa  Africa  não  havia  de  ser  senão  um 
distrito  dum  campo  de  acção  transcendente.  Humbe  queria- 
Ihe  parecer  um  centro  de  onde  as  forças  da  prefeitura  revolu- 
cionariam o  Ovampo  e  passariam  a  influir  sobre  os  destinos 
de  Betchuanaland. 

Em  1885  o  gentio  do  Humbe  levantava-se  contra  os  bran- 
cos e  contra  a  missão,  O  comandante  do  forte,  Fonseca,  sus- 
tenta um  mês  e  meio,  com  um  punhado  de  recrutas  indígenas 
e  meia  dúzia  de  portugueses,  as  hordas  compactas  dos  selva- 
gens. Na  missão,  presidida  então  pelo  P.'  Charles  Wunenbur- 
ger,  missionários  e  rapazes  se  defendiam  com  armamento 
fornecido  pelo  comandante.  Era  nos  últimos  dias  de  Outubro. 
Enfim,  em  meados  de  Dezembro,  depois  do  sacrifício  do  capi- 
tão Andrade  e  seus  trinta  soldados,  esmagados  como  heróis 
pela  vaga  dos  selvagens,  ao  tentar  uma  sortida,  chegava  reforço 
de  Mossámedes  e  vingava  os  europeus.  O  Rev.  P.'  Antunes, 
que  seguira  com  a  coluna  expedicionária,  voltou  à  Huíla  com 
os  missionários  do  Humbe,  achando  que  seria  impossível  a 
prosecução  ali  do  trabalho  missionário. 

E'  mister  advertir  que  o  pessoal  desta  missão  do  Humbe 
não  foi  o  que  viera  de  Omaruru,  mas  sim  um  destacamento 
já  enviado  da  Huíla  e  que  viera  a  ocupar  o  logar  vago  pela 
retirada  do  P.'  Hogan  e  Lynch  e  do  Irmão  Onuphre  para 
Kakélé,  nos  Amboelas,  ao  mesmo  tempo  que  o  prefeito, 
Duparquet,  se  estabelecia  em  S.  Miguel  do  Cuanhama. 

Foram  estas  últimas  as  duas  primeiras  estações  da  missão 
definitiva  da  Cimbebásia.  Entretanto,  nenhuma  delas  havia  de 
subsistir  por  muito  tempo.  Cuanhama  era  destruída  em  1885 
pelo  gentio  revolto,  e  o  pessoal,  P.'  L.  Delpuech,  Irmão  Lu- 


59 


cius  e  Irmâo  Géraid,  trucidado!  Nos  Amboélas,  Kabélé  victi 
mava  um  atrás  do  outro  aos  Padres  Hogau  e  Lynch,  iriutili 
zava  sucessivamente  os  irmãos  Onuplire  e  Rodrigo,  e  ia  viti- 
mando o  Padre  Sclialler  se  não  chegassem  a  tempo  os  Padres 
Lecomte  e  Génié  a  rende-lo.  Sublevações  do  gentio,  febres, 
incêndios,  tudo  se  acumulava  para  tornar  inviável  a  situação 
dos  missionários;  não  sendo  o  menor  dos  elementos  dessa 
situação  impossível  o  isolamento  absoluto  do  mundo  civilizado; 
só  para  chegar  a 
Huila  em  busca 
de  provisões, 
gastou  Lecomte 
quasi  duas  se- 
manas, perdendo 
primeiro  o  boi- 
cavalgadura, 
achando-o  outra 
vez  para  deixá- 
lo  roubar  pelo 
lião,  dormindo 
ele  próprio  uma 
noite  encostado 
a  uma  árvore, 
para  que  o  lião, 
que  rugia  em  re- 
dor, o  não  pu- 
desse apanhar 
por  detrás. 

Era  tempo 
de  procurar  local 
mais  convenien- 
te. Em  julho  de 
1887  era  escolhi- 
do, a  dominar 
um  planalto,  um 
sitio  denominado 

Cassinga  e  começaram-se  a  transplantar  para  esse  refúgio, 
enfim  de  paz!  os  restos  das  atormentadas  fundações  do  arro- 
jado Duparquet. 

Começava  agora  a  acção  definitiva  e  fecunda  das  missões 
de  Benguela,  essas  que  os  fundadores  conheciam  sob  a  desi- 
gnação de  Cimbebásia. 

O  prefeito  apostólico,  desde  novembro  de  1887,  era  o 
P.'  Schaller.  Duparquet,  precisado  de  repouso,  pedira  para  ir 


Chefe  das  tribus  guerreiras 
do  sul  do  Cunene. 


60 


terminar  seus  dias  em  Portugal;  depois,  reaceso  de  novo  num 
arranco  senil  de  zêlo,  quiz  ir  ainda  auxiliar  o  seu  amigo 
Carie,  já  então  elevado  à  dignidade  episcopal  e  vigário  apos- 
tólico do  Congo  Francês,  aonde  o  nosso  santo  aventureiro  ia 
finar-se  a  24  de  Agosto  de  1888. 

Dois  anos  antes,  e  prestes  a  dar  a  demissão  da  prefeitura 
Cimbebasiana,  fora  visitar  aquele  apêndice  longínquo  dela 
estabelecido  em  Mafeking,  na  Betchuanaland ;  entregava-o  em 
mãos  dum  irlandês,  o  P.'  Fogarty,  para  este  a  fechar  por 
inviável  três  anos  depois,  desesperançado  de  abrir  caminho 
em  terra  que  o  protestantismo  de  todo  avassalara. 


No  forte  Roçadas,  Cuanhama. 
Observatório  sobre  um  tronco  de  imbondeiro. 


61 

Progresso  no  Continente 


Mais  colégios:  Porto  e  Açores. 

Procuradoria. 

Escola  Agrícola  Colonial. 

Seminário  de  Missões. 

No  princípio  do  ano  escolar  1886-1887  prendia-se  a  Con- 
gregação  com  mais  um  colégio  público.  Um  Abbé  Six,  clérigo 
francês,  como  seu  nome  indica,  dirigira  por  largos  anos  em 
Gaia  um  estabelecimento  de  ensino,  e  agora  liquidava,  ofere- 
cendo aos  padres  do  Espírito  Santo  a  empresa  e  o  material 
escolar.  A  razão  que  movia  o  P."  Eigenmann  a  aceitar  era 
sobretudo  o  receio  que  outra  empresa  viesse  estabelecer  se  na 
Capital  do  Norte  e  lhe  furtasse  os  alunos  que  atéli  for^m 
afluindo  a  Braga. 

O  P.''  Hossenlop  vinha,  pois,  de  Braga,  com  os  P.'''  San- 
tos e  Décremps,  a  inaugurar  o  novo  colégio,  que  devia  prepa- 
rar para  exame  de  instrução  primária,  ensinar  as  três  primeiras 
classes  do  curso  dos  liceus,  e  depois  mandar  os  alunos  para 
o  Espirito  Santo  de  Braga.  Era  o  colégio  de  Santa  Maria,  que, 
um  ano  depois,  vinha  funcionar  para  o  coração  do  Porto, 
largo  do  Coronel  Pacheco,  onde  o  encontrou  a  revolução 
de  1910. 

Em  Braga  os  pensionistas  cresciam  numa  progressão 
ininterrupta.  Já  em  1886  o  número  total  de  internos  e  externos 
atingia  282;  e  as  obras  adiantavam,  não  obstante  um  começo 
de  incêndio,  pegado  pelo  arder  inesperado  de  sacos  de  cal,  e 
que  nas  férias  de  1886  ameaçou  reduzir  a  cinzas  os  vastos 
edifícios  em  progresso. 

A  parte  do  estabelecimento  reservada  para  seminário 
apostólico  entrou  de  povoar-se  esperançosamente  de  recrutas 
missionários.  Eram  já  25  em  1887.  Dirigia-os,  substituindo  o 
Padre  Costa,  o  P.'  Victor  Wendling.  Os  do  aprendizato  de 
auxiliares,  guiados  agora  pelo  P.'  Rooney,  após  a  retirada  do 
P.""  Hossenlop  para  o  Porto,  eram  20,  e  já  12  saídos  daqui 
andavam  evangelizando  nas  colónias  portuguesas. 

Tratava-se  de,  em  qualquer  parte,  desencantar  um  local, 
em  que  tecnicamente  se  podessem  instalar  oficinas  e  casa  de 
lavoura,  que  preparassem  os  auxiliares  convenientemente  para 
o  mister  deles,  de  civilizadores  pelo  trabalho.  Já  vimos  como 
nisto  se  empenhava  o  inteligente  provincial,  e  como  se  esfor- 


62 


çou  por  obter  para  tal  fim  um  convento  abandonado  de  ursu- 
linas  em  Viana. 

Em  1887  Monsenhor  Quesada,  capelão  da  Condessa  de 
Camarido,  inspirava  àquela  senhora  á  lembrança  de  oferecer 
para  a  obra  das  Missões  Ultramarinas  as  vastas  propriedades 
de  Cintra.  A  10  de  Dezembro,  inaugurava-se  solenemente  a 
Escola  Agrícola  Colonial,  sob  a  presidência  do  núncio  apos- 
tólico Vanutelli.  Ficava  dirigindo  o  estabelecimento  o  P.' 
Rooney,  com  o  P.'  Labrousse  por  colaborador,  e  com  mais  30 
alunos  acrescentados  aos  vindos  de  Braga,  e  um  orfanato 
apenso,  de  16  rapazinhos  (que  não,  havia  de  durar  muito  por 
impecer  a  obra  principal). 


p,. . 

jT^i-iiíj 

Ttm 

i 

Formiga  (Ermezinde).  —  O  que  foi  seminário  colonial, 


Faltava  constituir  em  obra  autónoma  a  escola  eclesiástica 
de  missionários.  Levou  muito  mais  tempo,  mas  foi  enfim  le- 
vada a  efeito,  em  Outubro  de  1894,  no  convento  de  eremitas 
de  S.  Agostinho  na  Formiga,  a  dois  passos  de  Ermezinde  e 
duas  léguas  do  Porto.  O  P.'  Alexandre  Rulhe,  superior,  tomava 
a  direcção  do3  teólogos  e  filósofos,  o  P.'  Victor  Wendling 
continuava,  como  em  Braga,  a  dirigir  os  alunos  dos  cursos 
inferiores.  Em  1895  eram  em  número  de  30  os  segundos;  os 
primeiros  eram  6  nos  bancos  do  seminário,  mas  tinham  qua- 
tro colegas  empregados  nos  colégios  da  Congregação,  e  dois 
mais  adiantados  haviam  partido,  para  Paris  um  e  o  outro 
para  Roma. 


63 


Além  dos  dois  colégios  que  mencionamos  e  das  duas 
escolas  de  missionários,  obra  essencial  da  Congregação,  havia 
a  funcionar  em  Portugal,  em  ordem  inversa  das  datas  de  fun- 
dação, a  residência  de  Campo  Maior,  no  Alentejo,  a  procura- 
doria das  Missões  em  Lisboa  e  o  colégio  Fisher,  em  Ponta 
Delgada.  Em  Campo  Maior  comprava  a  Condessa  de  Cama- 
rido  uma  vasta  casa  de  residência,  onde  fossem  habitar  mis- 
sionários exaustos  que  serviriam  de  capelães  a  um  asilo  de 
velhos,  que  ali  fundara  a  condessa  e  que  entregara  à  direcção 
das  Irmãs  da  Imaculada  Conceição.  Ali  foi  colocado  o  P." 
Stoll,  ex-missionário,  e  o  P.'  Policarpo  dos  Santos,  a  quem  a 
vida  colegial  no  Porto  não  satisfazia  a  vocação  de  pregador 
rural. 

Em  Lisboa  fundava-se,  em  Janeiro  de  1892,  uma  procura- 
doria e  hospedaria  de  família,  para  os  africanos  à  espera  de  em- 
barque, e  vinha  de  Cintra  o  P,'  Rooney,  dando  lá  logar  ao 
ex-prefeito  cimbebasiano  P.""  Schaller,  e  com  Rooney  o  perseve- 
rante Padre  Grappe,  que  aqui  havia  de  aguentar  (caso  único!) 
até  à  Revolução  Republicana. 

Um  ano  antes  (Junho  de  1891)  tinha  o  P.''  Schurrer  sido 
enviado  de  Braga  pelo  Dr.  Eigenmann,  com  os  P.''  Cancela  e 
Faxel,  a  fundar  nos  Açores  um  colégio  religioso  a  pedido  de 
umas  senhoras  aparentadas  com  o  Bemaventurado  Fhiser  (o 
mártir  da  fé  católica  de  Inglaterra).  O  colégio  ficou-se  denomi- 
nando Instituto  Fhiser,  foi  em  seguida  dirigido  pelo  P."  Du- 
noyer,  deu  origem  a  algumas  vocações  missionárias,  e  subsis- 
tiu até  1907,  data  em  que  o  fechou  o  último  director,  Padre 
Félix  Girollet. 

Campo-Maior  fechara  pouco  antes  (1906)  desamparado  o 
asilo  pelo  falecimento  da  condessa  fundadora. 


64 


Decadência  momentânea  da  Província 

Portuiuesa. 

Novo  alento  e  ruina 


Ao  separar-se  do  colégio  de  Braga  a  escola  eclesiástica 
de  missionários,  a  província  portuguesa  da  Congregação  atin- 
gia um  grau  notável  de  prosperidade.  Era,  aliás,  a  época  em 
que  a  Congregação  entrava  numa  fase  nova  de  progresso  e 
de  vida,  a  que  a  eleição  de  Mons.  Alexandre  Le  Roy  (vigá- 
rio apostólico  do  Gabon)  poria  a  coroa  em  1896. 

Em  Fevereiro  de  1896,  inicia va-se  em  Cintra,  na  «Quinta 
de  Baixo»,  da  condessa  de  Camarido,  o  instituto  para  formação 
superior  dos  formiguenses,  para  quem  o  ter  de  ir  a  França 
acabar  de  habilitar-se  era  desastroso  e  para  muitos  fora  fatal. 
Sob  a  direcção  do  P.'  Dunoyer,  missionário  recem-chegado  do 
Amazonas,  o  primeiro  ano  de  Cintra  correu  cheio  de  esperan- 
ças com  5  rapazes  por  primeira  fornada. 

Mas  em  Julho  deste  ano  fora  Eigenmann  chamado  a 
França,  para  exercer  as  funções  de  consultor  geral,  e  era-lhe 
dado  por  sucessor  no  cargo  de  provincial  um  santo  de  menos 
rasgo,  bondoso,  mas  de  espírito  tímido,  o  P/  João  Alexandre 
Rulhe,  cuja  administração  não  foi  afortunada.  O  curso  supe- 


Cintra.  —  A  antiga  Escola  Agrícola  Colonial  Missionária. 


65 


rior  de  Cintra  feneceu.  A  Formiga  esteriliza-se  de  timidez 
estreita  e  murchavam  seus  frutos. 

Os  colégios,  o  do  Porto  sob  a  direcção  do  P."  Scliurrer, 
e  sob  a  de  Hossenlop  o  de  Braga,  continuavam  a  progredir. 

Também  se  não  deu  o  retrocesso  na  Escola  Agrícola  Colo- 
nial, no  gozo  de  subsídios  governamentais,  que  nem  as  medi- 
das financeiras  do  «Governo  de  Salvação  Pública»  atingiram,  e 
que  a  nova  lei  de  recrutamento  militar,  de  Dezembro  de  1895, 
dispensara  do  serviço  activo.  Em  1896  contavam-se  15  irmãos 
empregados  na  direcção  dos  diferentes  serviços  e  oficinas,  e 
eram  60  os  aprendizes  missionários  das  diversas  secções. 
Nos  últimos  dois  anos  (de  maio  1894  a  maio  1895)  tinham 
partido  prontos  para  Congo  e  Angola  dez  missionários  auxi- 
liares. Aquela  frequência  e  aquela  medida  anual  de  forneci- 
mentos missionários  não  se  desmentiram,  antes  foram  conti- 
nuando, modesta  mas  perserverantemente,  até  à  ruína  de  1910. 

Em  1901  chegava  outra  vez  de  França  para  dirigir  a  pro- 
víncia portuguesa  o  grande  lidador  que  a  fundara.  O  bondoso 
Rulhe,  que  o  abalo  da  peste  bubónica  de  1899,  e  da  consequente 
requisição  da  Formiga  para  lazareto,  acabara  de  inutilizar, 
recolhia  a  França,  volvida  já  a  borrasca,  e  só  voltava  para 
morrer,  em  Campo  Maior,  em  1904.  Eigenmann  vinha  substituí- 
lo;  e  vinha  a  tempo,  para  arrostar  com  a  tempestade  maior 
do  movimento  anti-congreganista  de  1901.  Tudo  começava 
novamente  a  florescer.  O  viveiro  missionário  da  Formiga  ia 
já  galgando  para  a  centena. 

Em  1904  é  nomeado  provincial  um  português  e  um  mis- 
sionário de  prestígio  e  de  valor.  O  Rev.  P."  José  Maria  Antu- 
nes restaurava  em  Cintra  o  complemento  da  Formiga,  que  só 
lá  passara  num  clarão  de  relâmpago  em  1896;  e  dois  anos 
depois  (1908)  estabelecia  em  Carnide,  para  remate,  o  curso 
teológico.  Na  Formiga  fazíam-se  obras  que  permitiam  abrigar 
cento  e  cincoenta  estudantes  de  preparatórios. 

Estava,  pois,  encaminhado  tudo  para  a  província  portu- 
guesa tomar  à  sua  conta  o  abastecimento  das  nossas  colónias 
com  padres  missionários,  como  já  as  ia  provendo  farta  e  conso- 
ladoramente  com  professores  leigos  e  mestres  de  arte  e  ofícios 
saídos  da  Escola  Agrícola  Colonial.  E  foi  precisamente  então 
que  tudo  naufragou  na  tormenta  política  levantada  a  pretexto 
de  uma  simples  muda  de  regime! 


66 


As  Missões  :  Gonio,  Lunda,  Gunenç 

e  Gimbebásia 

no  último  decénio  da  Monarquia 


Assegurado  a  Portugal,  pela  Conferência  de  Berlim,  o 
encravamento  de  Cabinda,  separada  do  Congo  a  administração 
missionária  de  Loanda  e  Lunda,  separada  a  Cimbebásia  (as 
missões  de  Benguela)  da  missão-mãe  da  Huíla  e  deixada  esta 
a  ocupar-se  exclusivamente  de  Mossámedes,  entravam  as 
quatro  divisões  missionárias  do  Espirito  Santo  da  Costa  Oci- 
dental  no  período  definitivo  do  desenvolv'imento  e  da  vida. 

O  Congo  tinha  principiado,  como  atrás  vimos,  simples- 
mente como  parte  da  missão  francesa  do  Gabon.  Desmembrou- 
se  depois,  ao  atingir  um  certo  grau  de  desenvolvimento;  mas 
o  superior,  o  P.'  Carrie,  continuou  a  considerá-la  como  missão 
francesa  em  terra  de  ninguém.  Com  Portugal,  quando  muito, 
via  uma  conveniência  de  entender-se  relativamente  a  Santo 
António,  e  outras  sucursais  de  Lândana,  que  pudessem  vir  a 
fundar-se  a  sul  do  Zaire. 

Não  é  nada  de  estranhar,  pois,  o  que  Nuno  Quiriol  conta 
em  1880  dum  negrito  da  missão  de  Lândana,  que  o  saudara 
com  um  espevitadíssimo:  «Bon  jour,  monsieur»! 

Não  ha  dúvida  que  o  P.'  Carrie  e  o  P."  Augouard  se  jul- 
gavam num  campo  de  labores  por  Deus  e  pela  França. 

Foi,  como  vimos,  no  prefeiturado  do  P.'  Campana  que  a 
Conferência  de  Berlim  (1885)  confirmou  as  justas  pretensões 
de  Portugal.  Começaram  a  enviar-se  para  o  Congo  irmãos 
portugueses.  O  primeiro  padre  que  foi  juntar-se  a  estes  foi  o 
P.''  Magalhães,  em  1897.  Já  então  tinha  a  missão  atingido  o 
estado  de  desenvolvimento,  em  que  hoje  está,  com  a  fundação 
da  Lucula  em  93. 

A  28  de  Janeiro  de  1902,  enfim,  era  o  P.'  Magalhães  no- 
meado prefeito  apostólico.  Começaram  depois  a  chegar  pa- 
dres, primeiros  frutos  do  viveiro  da  Formiga,  e  os  irmãos  de 
Cintra  quasi  a  abundar;  de  sorte  que  o  sucessor  do  prefeito 
Magalhães  se  virá  a  achar,  como  veremos,  com  um  pessoal 
de  grande  maioria  portuguesa. 

* 

Na  vice-prefeitura  da  Lunda,  ou  distrito  missionário  se- 
parado em  1897  da  prefeitura  do  Congo,  vimos  já  as  estações 


67 


missionárias  de  Loanda,  Malange  e  Libolo  (ou  Calulo)  au- 
mentadas duma  estação  que  durou  pouco  (a  residência  de 
Canamboa)  governadas  por  um  superior  principal  a  quem  o. 
bispo  de  Angola  e  Congo  dava  benevolente  beneplácito,  ao 
mesmo  passo  que  a  Sé  Apostólica  lhe  concedia  o  poder  de 
crismar  e  exercer  funções  de  prefeito  apostólico.  Foi  o  P." 
Wendling  o  primeiro  que  exerceu  com  alguma  permanência 
esse  cargo,  que  em  Outubro  de  1899  recebia  das  mãos  do  Rev. 
P;*  Antunes  (então  em  funções  de  visitador  por  mandato  da 


Rev.  P/  V.  Wendling,  prefeito  do  Seminário  das  missões, 

depois  vice-prefeito  da  Lunda, 

com  os  outros  membros  do  júri  de  exames  em  Malange. 


Casa-Mãe)  e  das  do  bispo  Dias  Ferreira  para  efeitos  de  go- 
verno eclesiástico. 

Já  por  ocasião  da  visita  religiosa  às  missões  da  Lunda 
tinha  o  P.'  Antunes  explorado  as  regiões  de  Alêm-Cuango  e 
estudado  as  possibilidades  do  estabelecimento  ali  da  acção 
missionária.  Em  1900  o  P.'  Wendling  levava  por  diante  esse 
projecto,  enviando  os  P.'*  Francisco  Pereira  e  Inácio  dos  San- 
tos a  fundar  o  Mussuco.  Este  ficará  o  mais  extremo  elo  da 
cadeia  de  missões  da  Lunda. 

Malange  ficara  de  1900  por  diante,  o  centro  administra- 
tivo desta  divisão  missionária,  Loanda  tivera  de  servir  também 


68 


interesses  estranhos  à  circunscrição;  vista  sua  posição  de 
capital  da  colónia,  teve  de  aceitar  funções  de  procuradoria  de 
, todas  as  missões  angolanas,  e  de  contentar-se,  na  Lunda,  com 
uma  posição  secundária.  Em  1904,  tomava  conta  do  cargo  de 
procurador  o  P/  Lourenço  André,  a  seguir  à  partida  do  P.' 
Carlos  Wunenburger  para  a  Huíla  e  ao  rápido  interregno  do 
P.'  Reymann.  O  P."  André  ficava,  ao  mesmo  tempo,  superior 
da  missão  de  Loanda,  aonde  poucos  meses  depois  lhe  advinha 
o  P/  Manoel  Alves  para  colega. 

Em  1906,  chegava  a  Loanda  D.  António  Barbosa  Leão, 
sucedendo  a  D.  António  Gomes  Cardoso,  que  só  dois  anos 
(de  1902  a  1904)  dera  seu  zelo  e  sua  bondade  à  vasta  diocese 
que  a  Santa  Sé  e  Portugal  lhe  confiaram. 

Um  dos  primeiros  actos  do  novo  pastor  foi  a  transferên- 
cia, da  Huíla  para  a  capital,  do  seminário  diocesano,  ficando 
assim  mais  sobrecarregados  de  ocupações  os  dois  missioná- 
rios do  Espirito  Santo  em  Loanda,  convidados  a  colaborar  na 
educação  do  clero  africano. 

O  rasgo  administrativo  e  o  espirito  prático  do  prelado 
novo  trouxe  também  às  missões  de  Angola  a  vantagem  apre- 
ciável de  esclarecer  a  posição  relativa  dos  missionários  da 
Propaganda  Romana  e  do  poder  espiritual  do  Padroado  Por- 
tuguês. Propôs  e  fez  aceitar  simultaneamente  à  Santa  Sé  e  ao 
Governo  um  acordo,  pelo  qual  a  primeira  consentia  em  reco- 
nhecer a  jurisdição  do  bispo  de  Angola  e  Congo,  só  limitada 
pelos  confins  políticos  daqueles  domínios  (sem  embargo  da 
coexistência  de  prefeitos  apostólicos  em  duas  circunscrições 
do  bispado)  e  o  bispo  da  diocese  prometia,  como  represen- 
tante do  Padroeiro,  respeitar  os  poderes  espirituais  conferidos 
aos  prefeitos  pela  Santa  Sé.  Além  disso,  conferia  funções  de 
vigários  gerais  e  de  párocos  a  prefeitos  e  a  missionários  res- 
pectivamente, e  estes  aceitavam,  como  subordinados,  aquelas 
funções,  no  mesmo  espírito  com  que  atéli  as  tinham  exercido 
os  missionários  da  Huíla  e  da  Lunda,  não  presididos  por  pre- 
feitos directos. 

Os  P.''  Magalhães  e  Lecomte,  prefeitos  respectivamente 
do  Congo  e  da  Cimbebásia,  aceitaram  com  entusiasmo,  ou 
moveram  a  Propaganda  a  que  aceitasse,  uma  posição  que, 
sem  lhes  diminuir  nada  os  meios  de  eficiência,  arredava  de 
vez  as  suspeições  originadas  em  título  de  dignidade  extra- 
nacional,  encardinando-os  no  maquinismo  português  de  colo- 
nização civilizadora  e  cristã. 


D.  António  Barbosa  Leão. 


70 


* 


A  Cimbebásia,  após  as  provações  sangrentas  dos  tempos 
heróicos,  entrava  no  caminho  do  progresso  intenso.  Em  1889 
acrescentava-se  à  estação  de  Cassinga  uma  nova  em  Caconda, 
que  havia  de  ser  largo  tempo  o  centro  principal  de  irradiação 
missionária  em  Benguela.  Inaugura-se,  entretanto,  também  aqui 
por  catástrofes  a  vida  apostólica.  O  Irmão  Carlos  Podão 
perdia-se  no  mato,  para  não  mais  o  encontrarem;  vinha  um 
lião  à  cerca  mesmo  da  residência  missionária  a  arrebatar  para 
um  festim  o  Irmão  Angelo,  salvando-se  lhe  do  corpo  apenas 
a  cabeça  e  metade  do  tronco,  que  o  fero  rei  dos  bichos  guarda- 
va para  posterior  repasto. 

A  3  de  Abril  de  1892,  o  fundador  de  .Caconda,  o  grande 
missionário  P.'  Ernesto  Lecomte  era  nomeado  prefeito  apostó- 
lico em  sucessão  do  P.''  Schaller,  que  retirava  de  vez  para 
Portugal.  Abriam-se  centros  novos  de  civilização  em  Massaca, 
Bailundo,  Catoco,  Bié,  Cuanhama.  Nesta  última  localidade, 
o  gentio  era  insubmisso  e  corajoso.  Vimos  já  o  desastre  do 
primeiro  ensaio  da  missão  entre  os  da  tribu.  Pois  o  P.^  Le- 
comte não  se  aterrou,  e  não  desistiu  da  evangelização  daque- 
les bárbaros,  nem  mesmo  após  novo  tentame  de  destruição 
do  posto  missionário,  em  1903,  em  que  uma  bala  indígena 
vitimou  de  novo  um  europeu,  o  auxiliar  Dionísio  Duarte,  nem 
tão  pouco  depois  do  desastre  da  expedição  portuguesa  do 
Cuamatui ;  ficou  a  missão  intemerata  no  seu  posto,  contribuindo 
não  pouco  para  assegurar  a  submissão  definitiva  do  Cuanha- 
ma, firmada  em  1908  pela  vitória  de  Roçadas. 

Do  Cuanhama  devia  sair  um  posto  missionário  de  alto 
alcance  patriótico,  para  Ximboro,  sobre  o  Cuango,  a  entestar 
com  o  domínio  alemão  de  além-Cunene,  e  destinado  a  calar 
de  vez  as  repetidas  tentativas  de  pretensão  germânica  a  terri- 
tório nosso;  (1)  mas  a  falta  de  pessoal  e  de  dinheiro  não 
deixou  a  Lecomte  ver  realizado  em  vida  o  projecto  que  o  ten- 
tará; porque  a  9  de  Setembro  de  1908  rematava  no  Bié  aquela 


(I)Em  1901  penetrava  no  território  do  Cuanhama,  um  destacamento 
alemào,  armado,  equipado,  bandeira  ao  vento.  Sabendo-o  pelos  indíge- 
nas o  Padre  Lecomte,  dirige-se  «o  chefe  da  missão  portuguesa*  ao  en- 
contro dos  alemães,  empunhando  a  bandeira  da  nação  que  representava, 
em  face  daquele  protesto  corajoso  e  veemente,  os  colonos  de  Dama- 
raland  recolhiam  para  lá. 


Padre  Schaller, 

prefeito  apostólico  da  Cimbebásia  e  depois  Superior 

da  Escola  de  Cintra. 


72 


generosa  existência  benfazeja,  depois  de  assegurar  a  Portugal 
a  ocupação  pacífica  e  benquista  de  vastas  regiões  e  enriquecer 
a  literatura  colonial  com  estudos  filológicos  utilíssimos.  (1) 

*        * 

A  missão  de  Huíla,  fundada  pelo  Rev.  P.^  Antunes  ao 
mesmo  tempo  que  se  lançavam  as  bases  da  prefeitura  apos- 
tólica da  Cimbebásia,  serviu  a  esta  última  incipiente  missão 
de  ponto  de  apoio;  e  ao  mesmo  passo  que  os  missionários  do 
Real  Padroado  se  ocupavam  da  paróquia  e  do  seminário,  os 
seus  colegas  e  confrades  missionários  da  Propaganda  tinham 
em  S.  José  da  Huíla  uma  procuradoria  para  abastecer  as  fun- 
dações iniciadas  da  Cimbebásia.  Uma  vez  que  o  estabelecimento 
em  Cassinga,  e  posteriormente  em  Caconda,  deu  firmeza  sufi- 
ciente às  missões  de  Benguela  para  dispensarem  a  base  no 
Cunene,  principiaram  os  dois  grupos  de  missões  do  Espirito 
Santo  a  seguir,  independentemente,  os  respectivos  destinos.  O 
P.'  José  Maria  Antunes  começou  a  estender  a  activa  eficiência 
dos  seus  missionários  em  direcção  ao  Humbe,  fundando  |au, 
Tivinguiro,  Quiíta,  escaladas  a  dias  de  marcha  em  direcção  ao 
sul.  Foi  em  Quiíta  que  morreu,  em  1896,  o  primeiro  colaborador 
do  P.'  Antunes,  o  P.'  António  José  Marques,  vítima  das  fadigas 
de  uma  nova  fundação,  de  que  fora  incumbido,  a  dos  Cambos. 

Em  1899,  uma  exploração  dos  P.'^  Severino  da  Silva  e 
Manuel  Braz  levaram  a  cadeia  das  estações  missionárias  do 
Cunene  até  à  Hinga;  retirando  para  o  norte  de  Humbe  (quando 
constataram  achar-se  na  esfera  de  acção  do  P.'  Lecomte  e  da 
missão  do  Cuanhama,  porque  na  margem  esquerda  do  rio 
Cunene)  e  estabelecendo  a  missão  em  Tipelongo. 

Quando,  em  1904,  o  Rev.  P.'  Antunes  era  nomeado  pro- 
vincial dos  estabelecimentos  continentais  da  Congregação, 
deixava  em  mãos  de  seu  sucessor,  o  Rev.  P.*"  Bonnefoux,  oito 
centros  de  irradiação  missionária:  Huíla,  Munyino,  Quiíta  e 
Vimanaia  (estes  quatro  agrupados  a  distância  relativa  de 
poucos  quilómetros),  Tinvinguiro,  Jau,  Cambos  e  Tipelongo. 


(1)  Método  de  leitura  em  português  (Caconda,  tip.  da  Missão,  1905) ; 

Eíongiso  limputu  (Método  de  aprender  português,  para  uso  dos 
povos  Vimbundu); 

Eíongiso  laputu  (para  uso  do  Quanhama) ; 

Mo  Vengia  Kulilongeça  iputu  (para  Ganguelas  e  Amboelas) ; 

Vida  de  Cristo,  em  mbundo;  a  mesma  em  ganguela;  catecismos 
nas  mesmas  línguas;  cartilha  da  doutrina  cristã  em  mbundo  e  portu- 
guês; narrativas  do  antigo  testamento  em  mbundu  e  em  ganguela,  etc. 


7.^ 


A  República  e  as  Missões 


As  missões  religiosas  do  Espirito  Santo  nâo  sofreram  em 
Africa  metade  dos  infortúnios,  que  temeram  quando  se  ouviu 
da  revolução  de 
1910.  Elas  esta- 
vam resolvidas  a 
nâo  fechar,  uma 
vez  que  os  trata- 
dos internacio- 
nais, desde  as 
conferências  de 
Berlim  e  de  Bru- 
xelas, obrigam 
os  governos  co- 
loniais a  acatá- 
las:  mas  conta- 
vam com  a  hos- 
tilidade declara- 
da das  autorida- 
des republica- 
nas. Sucedeu  ao 
avesso.  E'  ver- 
dade que  em  Ma- 
lange houve  uns 
desentendimen- 
tos efémeros  com 
a  autoridade  lo- 
cal da  parte  do 
P.'  Sousa  (antigo 
missionário  da 
Lunda,  restituído 
a  ela  pela  revo- 
lução de  Outu- 
bro, após  muitos 
anos  de  profes- 
sorado em  Santa 
Maria  do  Porto). 
Caconda  e  o  Bai- 
lundo  houveram 

que  ser  evacua-  Família  indígena 

das    por    algum 

tempo,  em  virtude  da  irritada  opinião  pública,.,  de  ex-degre- 


74 


dados.  Mas  a  autoridade  colonial  quiz,  desde  o  princípio,  pôr- 
se  ao  lado  dos  missionários  e  patrociná-los. 

O  primeiro  governador  geral,  Manoel  Maria  Coelho,  or- 
ganizou mesmo  uma  ajuda  da  parte  do  governo  colonial  às 
missões,  para  suprir  os  subsídios  do  governo  metropolitano 
retraídos.  Estes  mesmos  tornavam  a  ser  postos  em  vigor  no 
ano  económico  1914-1915,  em  vista  da  insistência  dos  gover- 
nadores da  Província,  e  duraram  até  à  nova  regulamentação 
de  Janeiro  de  1920. 

Como,  aliás,  o  pessoal  missionário  era  acidentalmente 
augmentado  pela  vinda  para  as  colónias  de  alguns  padres  dos 
estabelecimentos  fechados  na  metrópole  ou  dos  dados  prontos 
pelas  casas  de  estudo  (a  Formiga  começara  a  dar  as  primeiras 
ceifas,  exactamente  então,  que  ia  cair!)  as  missões  atravessa- 
vam, antes,  uma  era  curiosa  de  prosperidade,  que  era  pena 
tivesse  de  ser  efémera. 

Em  1911,  tomava  o  P.'  Luiz  Cancela  posse  do  distrito 
religioso  da  Lunda,  em  vez  do  P.'  Wendling,  que  voltava  ao 
Cunene,  donde  viera  em  1899.  Em  1912,  a  circunscrição  au- 
gmentava-se  do  posto  novo  dos  Bângalas. 

No  Congo,  Cunene  e  Benguela  o  número  de  sucursais  ia 
crescendo  sempre. 

Os  únicos  dissabores,  que  haviam  de  comprometer  a  sério, 
por  algum  tempo,  a  acção  missionária,  haviam  de  advir-lhe  da 
guerra  e  da  traição  alemã.  No  Sul  de  Angola,  para  tranquilo 
viver  das  partes  meridionais,  tanto  das  missões  filhas  da 
Huíla  como  de  Caconda,  esperava-se  pela  redução  definitiva 
dos  Cuanhamas.  Em  1914  preparava-se  uma  expedição  em 
forma,  que  os  levasse  a  termos  de  não  desejarem  mais  incur- 
sões nem  assaltos;  mas  quando  os  6:000  homens  do  Coronel 
Roçadas  chegavam  ao  Cuamato,  ataca-os  à  traição  uma  força 
alemã,  por  que  ninguém  esperava  e  para  que  não  vinham 
preparados  (pois  não  estávamos  ainda  em  estado  de  guerra 
com  nação  alguma  europêa). 

Em  Naulila,  onde  se  deu  essa  agressão  covarde,  foi  uma 
sabotagem  dos  elementos  de  civilização!  O  preto,  vendo  ani- 
quiladas as  forças  que  o  vinham  forçar  ao  respeito  e  à  ordem, 
principiou  a  destruir  tudo  o  que  era  europeu,  menos  algumas 
missões  luteranas,  que  acompanharam  os  invasores. 

Foram  duas  correntes  de  portugueses  a  encaminhar-se 
em  ondas  para  os  dois  refúgios:  do  Evale  (missão  do  Cua- 
nhama)  e  do  Tipelongo,  uma  de  cada  lado  do  leito  do  Cunene, 
e  representando,  por  conseguinte,  uma  as  missões  de  Benguela, 
outra  as  do  Cunene.  Em  Evale  (no  Cuanhama)  sobretudo,  foi 


75 


o  prestígio  de  Monsenhor  Luiz  Keiling  c  o  de  seus  missioná- 
rios (P/  Devis,  P/  Vieira)  que  tiveram  em  cheque  os  selvagens 
ávidos  de  sangue  português,  até  chegar,  em  1915,  a  coluna 


Família  cr  is  ia. 


¥ 


salvadora  e  vingadora  do  General.  Pereira  de  Eça,  que  desba- 
ratou por  completo  o  gentio  posto  contra  nos  em  pé  de  guerra 
pelo  alemão,  de  traiçoeira  vizinhança.  Das  missões  prussianas 


76 


vindas  com  os  armadores  da  cilada  de  Naulila,  uma  foi  redu- 
zida a  cinzas,  todas  abandonadas,  ao  chegar  das  nossas  tropas. 

Pacificada  a  região,  tiveram  ainda  assim  de  ser  abando- 
nadas as  duas  missões  históricas,  porque  uma  estiagem  tre- 
menda (e  a  fome,  consequência  dela)  tornaram  a  vida  impos- 
sível. A  do  Tipelongo  refugiou-se  no  Tiúlo;  a  do  Evale  foi 
temporariamente  suspensa. 

Depois,  com  paciência  heróica,  que  só  o  trabalho  asso- 
ciado, a  evangelização  em  família  torna  possível,  tem-se  indo 
cicratizando  a  ferida  e  até  desenvolvendo  vida  nova,  que  seria 
muito  mais  intensa,  entretanto,  se  não  houvesse  estancado 
tanto  tempo  a  fonte  de  pessoal  missionário  aqui  na  Europa 
devastada. 


Estado  actual   das  Missões 

CONGO.  " 

Proseguem  prósperas,  bem  que  tolhidas  em  seu  desen- 
volvimento desejável,  por  impossibilidade  de  augmentar  os 
quadros,  as  quatro  divisões  missionárias  da  Costa  Ocidental. 

O  Congo,  administrado  por  Monsenhor  Faustino  Moreira 
dos  Santos,  conta  as  seguintes  estações  ou  missões  centrais : 
Lândana,  Cabinda,  Lukula,  Luali,  Matembo  (Mayombe). 

Lândana  {\\xwá2íúdi  ^m  1872). 

Missionários  europeus:  sacerdotes,  3;  auxiliares,  4;  sacer- 
dotes indígenas,  1  ;  auxiliares,  1;  irmãs  da  missão,  4;  auxilia- 
res (feminininas)  indígenas,  2;  escolas,  2;  alunos:  sexo  mas- 
culino, 112;  sexo  feminino,  106;  1  escola  de  professores  rurais 
(catequistas)  alunos,  14;  1  grande  seminário;  1  pequeno  se- 
minário: alunos  9;  escolas  de  artes  e  ofícios:  encadernação, 
alfaiataria,  sapataria,  de  ferreiro,  funileiro,  marceneiro,  carpin- 
teiro e  pedreiro;  atelier:  costura  e  bordados  para  raparigas; 
escolas  rurais,  18  (catequese  e  português);  dispensários,  1; 
aldeias  cristãs,  8. 

Cabinda  (1891). 

Missionários:  sacerdotes,  2;  auxiliares,  1;  irmãs  auxilia- 
res, 3  (portugueses  todos);  escolas,  2;  alunos,  140;  carpinta- 


» 


ria  e  sapataria;  escolas   rurais  (catequese   e   português)   5; 
aldeias  cristãs,  4;  dispensário,  1. 

Ijikula  (1893). 

Missionário:  sacerdote,  1;  auxiliar,  1;  (náo  tem  oficinas); 
escolas  de  catequese  e  português,   11. 

Luali  (1890). 

Aldeias  cristãs,  3;  escolas,  4. 

(Missão  em  via  de  transformar-se  em  sucursal). 

Matembo  (Maiombe). 

Missionários:  sacerdotes  europeus,  1 ;  indígenas,  1 ;  auxi- 
liares europeus,  2;  (não  tem  oficinas:  estão  em  via  de  forma- 
ção); aldeias  cristãs,  2;  escolas  de  catequese  e  português,  8. 


MISSÕES  DE  LOANDA 
E  LUNDA. 

Este  grupo,  administrado  pelo  Rev.  P.*"  Luiz  Cancela, 
compreende  as  missões  de  Malange,  Libolo,  Mussuco,  Bânga- 
las,  e  a  Procuradoria  de  Lo  anda. 

/.*  Missão  de  Malange. 

Missionários:  sacerdotes,  3;  auxiliares,  3;  irmãs  da  mis- 
são, 4;  escolas,  2:  do  sexo  masculino,  alunos,  150;  do  sexo 
feminino,  alunas,  66;  escola  profissional  de:  tipografia,  enca- 
dernação, carpinteiro,  marceneiro,  ferreiro,  serralheiro,  sapa- 
teiro e  alfaiate;  estação  missionária,  1;  escolas  de  catequese  e 
português,  5;  dispensários,  2;  aldeias  cristãs,  5. 

2.**  Missão  do  Libolo. 

Missionários:  sacerdotes,  2;  auxiliares,  1;  escolas,  2:  do 
sexo  masculino,  alunos,  46;  do  sexo  feminino,  alunas,  25; 
escola  profissional  de:  carpintaria,  marcenaria,  forja,  serralha- 
ria, alfaiate,  pedreiro,  e   serração  mecânica   e  moagem  por 


78 


força  hidráulica;  escola  agrícola,  1 ;  escolas  rurais  de  catequese 
e  leitura,  4;  estações  missionárias  com  catequistas,  2;  dispen- 
sário, 1  ;  aldeias  cristãs,  6. 

3f  Missão  do  Mussuco. 

Missionários:  sacerdotes,  2;  auxiliares,  1;  escolas  da  mis- 
são: do  sexo  masculino,  alunos,  100;  do  sexo  feminino,  alu 
nas,  110;  escola  profissional  de:  carpintaria,  marcenaria,  fer- 
reiro, alfaiate,  pedreiro  e  sapateiro;  escola  agrícola,  1;  escolas 
rurais  de  catequese  e  português,  15;  dispensário,  1;  aldeias 
cristãs,  4. 

4.''  Missão  dos  Bângalas. 

Missionários:  sacerdotes,  2;  auxiliares,  1 ;  escola  da  mis- 
são: do  sexo  masculino,  alunos,  40;  do  sexo  feminino,  alu- 
nas, 33;  escola  profissional  de:  carpinteiro,  marceneiro,  ferreiro, 
alfaiate,  pedreiro  e  sapateiro;  escola  agrícola,  1 ;  dispensário,  1; 
aldeias  cristãs,  2. 


Lunda.  —  Tiro  que  valeu  (P."  Mailloux). 


79 


MISSÕES  DO  DISTRITO 
DA  HUILA, 

Este  grupo,  sob  a  direcção  do  Rev.  P:  Bonnefoux,  com- 
preende as  missões  da  Huila,  Jqu,  Chivingiro,  Quiíta,  Gamhos, 
Munyino  e  Tyiulii  (que  substituiu  a  missão  do  TipelongoJ  e 
provisoriamente  as  freguesias  da  Huila.  do  Luhanoo,  da  Hiim- 
pata,  e  da  Chibia. 


/."  Missão  da  Huila  (1881). 

Missionários:  sacerdotes,  5  (um  deles  o  pároco  da  Chibia); 
missionários  auxiliares,  11;  irmãs  da  missão,  5;  escola:  alunos 
internos,  89;  externos,  62;  alunas  internas,  60;  externas,  35; 
aldeia  cristã,  1 ;  escola  agrícola,  1 ;  escola  profissional,  1 ;  dis- 
pensário, 1 ;  1  anexa  na  Ehima  (Quipungu)  com  aldeia  cristã 
e  escola;  2  escolas  de  catequistas;  esplendida  tipografia. 

2."  Missão  do  Jau  (1889). 

Missionários:  sacerdotes,  1;  auxiliares  I;  escolas  para 
rapazes  e  raparigas  com  90  alunos;  aldeia  cristã,  1. 


3."  Missão  do  Ctiinv ingiro  (1892). 

Missionários:  sacerdotes,  3  (um  deles  é  pároco  da  Hum- 
pata);  auxiliares,  2;  escolas  para  rapazes  e  raparigas  com 
122  alunos;  escola  de  agricultura,  1;  escola  profissional,  1; 
aldeia  cristã,  1 ;  dispensário,  1 ;  aldeias  evangelizadas,  com 
catequistas,  5. 

4:'  Missão  de  Quiíta  (1893). 

Missionários:  sacerdotes,  2;  auxiliares,  0;  escolas  para 
rapazes  e  raparigas  com  78  alunos ;  escola  agrícola,  1 ;  aldeias 
cristãs,  1 ;  dispensário,  1 ;  aldeias  evangelizadas,  7. 

5."  Missão  dos  Gambos  (1894). 

Missionários:  sacerdotes,  2;  auxiliares,  1;  escolas  para 
rapazes  e  raparigas  com  69  alunos;  aldeia  cristã,  0;  escola 
profissional,  1;  dispensário,  1;  aldeias  evangelizadas,  12. 


80 


6f  Missão  do  Tyiulu  (1916). 
(Transferida   cio  Tipelongo  (1900). 


Missionários:  sacerdotes,  2;  auxiliares,  1 ;  aldeia  cristã,  0; 
dispensário,  0;  escolas  para  rapazes  e  raparigas  com  20  alu- 
nos cada  uma;  um  dos  missionários  é  provisoriamente  encar- 
regado da  missão  e  cristãos  do  Cuanharaa  e  Evale,  a  160  quil. 
de  distância. 


Z.*'  Missão  do  Munyino  (1898). 

Missionários:  sacerdotes,  2:  um  pároco  da  Huíla,  outro 
pároco  do  Lubango;  auxiliares,  2;  escola  agrícola;  aldeia 
cristã;  dispensário. 


MISSÕES  DE  BENGUELA. 
CIJBANGO 

(ou  Cimhehásia) . 


Compreende  o  grupo  as  missões  seguintes:  Huambo,  Ca- 
çoada, Bié,  Cubango,  Bailando,  Cutchi,  Sambo  e  Gualangue : 


Huambo  (1911): 

3  padres,  2  auxiliares  portugueses,  25  catequistas,  outras 
tantas  escolas. 


Caconda  (1890): 

2  padres,  3  auxiliares,  2  irmãs  europêas,  2  irmãs  indíge- 
nas, escola  do  sexo  m\asculino  e  feminino,  2  dispensários  e 
15  escolas  rurais. 


Bié  (1892): 

2  padres,  1  escola  interna  e  20  rurais. 


81 


Cubango  (1894): 

3  padres,  3  auxiliares  portugueses,  1  indígena,  1  escola 
interna  e  38  rurais. 


Bailundo  (1896): 

3  padres,  4  auxiliares,  1  internato  de  90  alunos,  e  60  es- 
colas rurais  de  catequistas. 


Cw/c/z/ (1897): 

3  padres,  1  auxiliar,  1  internato  e  11  escolas  rurais. 

Sambo  (1912): 

2  padres,  1  auxiliar,  escola  interna  e  8  escolas  rurais. 


Gualangue  (1922):  Missão  em  via  de  organizar-se;  inau- 
gurava-a,  a  2  de  Fevereiro,  Mons.  Keiling,  abrigando-se  numa 
cabana  provisória,  estabelecendo  um  sistema  de  irrigação  e 
plantando  uma  horta  e  um  terreno  de  2  hectares  de  trigo,  ao 
mesmo  passo  que  deixava  abertas  5  escolas  de  catequistas, 
além  da  escola  da  missão,  destinada  a  habilitar  professores 
para  o  futuro. 


O  estado  da  antiga  Cimbebásia,  das  missões  de  Benguela, 
é  dos  mais  florescentes;  é  a  missão  do  Espirito  Santo  mais 
moderna  e  progressiva.  Além  das  escolas  internas  e  rurais,  de 
rapazes  e  raparigas,  apresenta  esta  circunscrição  missionária : 
7  carpintarias,  7  forjas,  7  alfaiatarias,  3  sapatarias,  3  fábricas 
de  cortição,  3  de  tijolo,  1  tipografia,  8  quintas  modelos  e  8 
dispensários. 

Administra  este  grupo  Mons.  Luiz  Keiling. 


Vê-se  que  as  tradições  de  inteligência  e  rasgo  do  P.'  Le- 
comte  continuam  mantidas.  E'  a  missão  moderna  e  civilizadora 
em  todo  seu  esplendor  e  arrojo. 


82 


A  Missão  moderna 


Para  darmos  uma  ideia  do  sistema  particular  de  evange- 
lização seguido  na  Africa  Portuguesa  pelos  Padres  do  Espirito 
Santo,  não  ha  melhor  que  o  excerto  que  segue,  de  uma  comu- 
nicação (de  22  de  Dezembro  de  1896)  do  P,"  Lecomte  á  Socie- 
dade de  Geografia  de  Lisboa  : 

ORGANIZAÇÃO    DA    MISSÃO 

A  missão  moderna  em  Africa  não  se  limita  a  uma  simples  cate- 
quese dos  povos.  A  experiência  dos  séculos  passados  demonstra  que, 
se  se  podem  conseguir  assim  resultados  admiráveis,  como  aconteceu 
no  antigo  reino  do  Congo,  estes  resultados  não  são  duradouros,  abs- 
traindo-se  mesmo  das  causas  que  originaram  a  decadência  e  abandono 
daquelas  primeiras  missões.  Apesar  das  minhas  simpatias  pela  raça 
negra,  cumpre-me  reconhecer  que  se  encontra  ela  num  grau  manifesta- 
mente inferior  às  demais  raças.  Por  outra  parte,  a  sua  constituição 
civil,  os  seus  costumes,  todo  o  seu  modo  de  viver  conservam  os  pretos 


mãmm 


■?«iit 


#♦ , 


Civilizando  pelo  trabalho. 
Irmão  auxiliar  dirigindo  uma  sapataria. 


83 


tào  afastados  dos  princípios  lixados  pelo  dogma  e  peia  moral  cristã, 
que  parece  bem  difícil  leva-los  à  compreensão  daquelas  verdades,  sem, 
até  certo  ponto,  reformar  as  suas  condições  sociais.  E'  preciso,  numa 
palavra,  transforma-los  em  homens  decentes,  homens  dignos,  não  direi 
antes  que  faze-los  cristãos,  visto  ser  a  religião  que  mais  eficazmente 
inílue  em  leva-los  a  esta  transformação,  mas  sim  a  par,  e  ao  mesmo 
tempo  que  se  farão  cristãos. 

Sendo  assim,  como  realmente  é,  a  missão  deverá  constituir  não 
somente  um  centro  de  instrução  religiosa,  mas  além  disso  um  foco  de 
civilização,  dando  o  exemplo  e  promovendo  o  desejo  e  o  amor  do 
asseio,  do  arranjo,  de  um  certo  bem  estar,  que  levam  por  consequência 
o  indígena  à  aplicação  ao  trabalho  agrícola  e  industrial,  fonte  única  de 
onde  poderá  auferir  os  recursos  indispensáveis,  com  que  supra  as  suas 
novas  e  legítimas  necessidades.  Se  é  sempre  verdade  ser  a  ociosidade 
a  mãe  de  todos  os  vícios,  é  certo  que  na  Africa  o  é  mais  que  em  parte 
alguma.  Pode  realmente  dizer-se  que  a  escravatura  e  a  poligamia,  os 
dois  mais  consideráveis  obstáculos  a  toda  a  civilização  e  evangelização, 
são  principalmente  filhas  do  ócio  e  da  indolência.  E'  com  o  fim  de  nada 
fazer  que  o  gentio  se  rodeia  de  escravos  e  resiste  a  separar-se  das  suas 
mulheres,  pela  falta  que  lhe  fariam  em  suas  culturas. 

Tocando  à  missão,  como  já  disse,  dar  o  exemplo  do  trabalho  e 
organizar  uma  obra  duradoura,  deve  antes  de  tudo  instalar-se  em  con- 
dições que  lhe  permitam  atingir  esse  fim.  A  escolha  do  sitio  é  um  dos 
pontos  de  maior  circunstancia.  Tomamos  em  consideração  não  somente 
a  salubridade,  mas  a  qualidade  e  a  extensão  dos  terrenos  aráveis,  a 
facilidade  de  irrigação,  os  recursos  locaes  para  as  diversas  obras, 
a  abundância  e  barateza  dos  produtos  do  país,  procurando  até  enlaçar 
o  útil  com  o  agradável,  tais  como  um  sitio  pitoresco,  um  panorama 
desenvolvido,  sem  perder  de  vista  a  proximidade  de  um  centro  popu- 
loso sobre  o  qual  se  possa  exercer  influencia. 

Mal  se  imaginará  quanto,  numa  mesma  terra  e  em  curta  área,  as 
condições  de  clima  e  salubridade  diferem,  pela  escolha  do  local  em  que 
vão  erguer-se  as  edificações.  Ha  por  vezes  uma  diferença  de  10  graus 
de  temperatura  a  menos  ou  a  mais  entre  o  fundo  do  vale  e  as  eminên- 
cias próximas.  Um  local  será  ou  não  saudável,  segundo  o  abrigo  ou  ex- 
posição a  ventos  impregnados  de  miasmas.  Tentativas  de  colonização 
ficaram  frustadas  inteiramente,  porque  se  não  atendeu  a  estas  indispen- 
sáveis previdências.  Outros  inutilizaram  uma  situação  excelente,  com 
abrirem  levadas  ou  canais  sobranceiros  às  habitações.  Em  regra  não 
nos  fixamos  após^^uma  primeira  exploração;  limitamo-nos  a  construir 
abrigos  provisórios  e  começamos  a  instalação  definitiva,  somente  depois 
dum  ano  ou  dezoito  meses  de  residência,  e  a  maior  parte  das  vezes  em 
ponto  distinto  do  da  primeira  escolha,  consoante  as  indicações  forneci- 
das pela  experiência.  Um  dos  nossos  primeiros  cuidados  é  arrotear  uma 
horta,  que  em  pouco  tempo  nos  fornece  todos  os  legumes  e  hortaliças 
da  Europa;  logo  em  seguida  lavra-se  um  campo  de  trigo,  ao  mesmo 
tempo  que  se  trata  da  creação  de  galinhas,  patos,  gansos,  coelhos,  suí- 
nos, etc.  Uma  vez  segura  a  existência,  podemos  mais  a  sério  dedicar- 
nos  às  construções.  Importa  preparar  instalações  convenientes;  a 
própria  saúde  o  exige,  e  de  resto  não  teríamos  influencia  sobre  os  pre- 
tos, se  nos  vissem  habitar  em  miseráveis  choupanas. 

Respeitam-nos,  estimam-nos,  e  dão-nos  sua  confiança  na  proporção 
úu  que  nos  vêem  fazer. 

As  edificações  levam  sempre  alguns  anos,  visto  fazermos  quasí 
tudo  por  nossas  mãos,  não  sendo  precisos  os  indígenas  senão  para  pre- 


84 


parar  rudes  materiais.  As  casas  teem  que  ser  bastante  vastas,  porque, 
além  da  residência  dos  missionários,  são  precisas  capela,  escola,  dor- 
mitórios, armazéns,  oficinas  e  salas  diversas,  etc. 

Cada  missão  tem  um  carro  do  sistema  bóer,  aperfeiçoado  por  um 
dos  nossos  irmãos  auxiliares,  sendo  os  primeiros,  sob  seu  plano  e  direc- 


I 


P,'  E.  Lecomte. 
Um  «grande  português» . . .  nascido  em  França. 


ção,  construídos  em  Lisboa,  e  tão  apreciados,  que  a  casa  construtora 
tem  exportado  para  Africa  vários  outros  vagons  do  mesmo  modelo. 
Para  o  carro  são  necessários  bois,  que  não  podem  ser  menos  de  doze 
juntas.  A  despeza  é  um  tanto  forte,  mas,  mediante  ela,  achamo-nos  desde 


85 


logo  independentes  dos  caprichos  dos  indígenas  no  tocante  aos  diversos 
transportes  do  servit^o  diário.  Acrescem  aos  bois  algumas  vacas,  cabras, 
carneiros,  e  eis  conciuido  o  indispensável  provimento  pecuário. 

Com  respeito 
à  mobiiia,  utensí- 
lios e  material, 
além  dos  artigos 
caseiros,  de  cape- 
la, farmácia,  biblio- 
teca e  escola,  leva- 
mos instrumentos 
de  carpinteiro,  fer- 
reiro, pedreiro,  e 
ferragens  conve- 
nientes para  as 
obras.  Visto  os  di- 
versos elementos 
materiais,  exigidos 
para  se  instalar 
uma  missão,  diga- 
mos qual  deve  ser 
o  seu  pessoal  diri- 
gente; compõe-se 
pelo  menos  de  dois 
padres  e  dois  ir- 
mãos, acompanha- 
dos por  seis  jovens 
já  educados,  que 
auxiliam  imenso  os 
trabalhos,  e  dentro 
de  poucos  meses 
formarão  a  primei- 
ra aldeia  cristã. 
Compreende  mais 
quinze  rapazes  se- 
mi-educados  numa 
missão,  cujo  mister 
será  o  desempenho 
dos  serviços  do- 
mésticos, e  vão 
constituir  em  breve 
o  núcleo:  da  futura 
escola. 


Igreja  de  Lândana, 

monumento  arquitetónico,  obra  dos  Irmãos 
auxiliares. 


RELAÇÕES    COM    OS    INDÍGENAS 

Ao  mesmo  tempo  que  se  procede  a  estes  trabalhos,  estabelecem- 
se  relações  com  os  naturais  do  sitio.  Ordinariamente  é  com  uma  certa 
desconfiança  que  nos  vêem  estabelecer  morada  entre  eles,  não  tendo  eu 
encontrado  senão  uma  só  excepção,  que  foi  no  Bailundo.  Receiam  que, 
como  tantos  outros,  os  vamos  explorar,  e  mais  não  sejamos  que  os  pre- 
cursores de  uma  ocupação  militar.  Em  vendo  que  os  tratamos  com 
amor,  justiça  e  desinteresse,  lhes  prestamos  os  serviços  ao  nosso 
alcance,  lhes  medicamos  os  doentes,  entendem  que  somos  influenciados 


86 


por  motivos  diversos  dos  comerciantes.  Explicamo-lhes,  então,  para  que 
vimos,  damo-lhes  a  conliecer  a  utilidade  da  instrução,  a  vantagem  de 
ensinar  a  seus  filhos  a  falar,  ler  e  escrever  a  língua  portuguesa,  o  que 
a  todos  cativa  e  atrai.  Em  seguida  manifestamo-lhes  as  idéas  religiosas 
que,  sem  estes  preâmbulos  seriam  para  eles,  pôde  dizer-se,  incompreen- 
síveis. Passamos  depois  ao  trabalho  de  escola  e  ao  catecismo  com  os 
rapazes  que  levamos  comnosco:  persuadimos  facilmente  alguns  semi- 
civilizados  a  que  nos  entreguem  os  filhos,  e  pouco  a  pouco  a  descon- 
fiança geral  desaparece,  com  mais  ou  menos  rapidez,  de  modo  que  em 
pouco  tempo  se  nos  torna  iilipossivel  atender  a  todos  os  pedidos. 

Os  alunos,  geralmente  internos,  são  vestidos  e  alimentados  à  custa 
da  missão.  Os  pais  vêem  visita-los,  e  eles  mesmos  indo,  quando  con- 
vém, às  suas  aldeias,  não  deixam  de  contar  o  que  na  missão  lhes  foi 
ensinado;  as  suas  mães  também  afluenr  várias  vezes  aos  exercícios  da 
igreja,  apresentando  para  o  baptismo  os  seus  filhinhos,  e  aproveitam  os 
missionários  zelosamente  todas  as  ocasiões  para  divulgar  as  primeiras 
noções  do  cristianismo.  Os  discípulos  sem  custo  se  vão  acostumando  à 
vida  da  missão.  De  resto,  suaviza-lhes  a  educação  quanto  possível, 
evitando-se  as  correcções  corporais,  expuisando-se  os  díscolos  que  se 
não  domam  pela  persuasão.  No  princípio  não  se  apertam  com  trabalhos 
manuais,  cujo  amor  e  gosto  lhes  surge  mais  tarde  espontaneamente  ao 
estímulo  do  amor  próprio  e  pela  vergonha  de  verem  o  europeu,  o  pró- 
prio sacerdote,  manejar  assiduamente  o  machado  e  a  enxada;  nasce  até 
a  paixão  do  trabalho  e  chegam  a  produzir  um  resultado  muito  superior 
ao  dos  rapazes  resgatados,  com  os  quais  força  é  usar  de  uma  disciplina 
mais  severa. 


ALDEIAS    CRISTAS 

Referi-mc  já  a  uma  aldeia  cristã.  Os  seis  jovens  que  de  primeiro 
nos  acompanham  construem  para  logo  suas  casas,  e,  concluídas  estas, 
vão  buscar  as  noivas  deixadas  no  asilo  das  raparigas  da  missão  de  onde 
vieram.  No  mesmo  dia  realizam-se  os  seis  casamentos,  e  um  sistema 
especial  de  vida  começa  para  estas  famílias  assim  formadas.  Escolhemo- 
las  de  entre  as  melhores  e  mais  prestimosas;  trabalham  toda  a  manhã 
por  conta  da  missão,  c  de  tarde  em  proveito  seu,  ganhando  de  150  a 
250  reis  diários,  e  mesmo  mais  os  que  souberem  um  ofício,  como  serra- 
dores, carpinteiros,  carreiros,  etc.  As  mulheres  ocupam-se  nos  amanhos 
caseiros,  auxiliam  a  lavra  agrícola,  e  nas  horas  ainda  disponíveis  apli- 
cam-se  a  lavar,  engomar,  costurar,  etc.  Ha  cuidadosa  inspecção  em  que 
na  aldeia  se  não  introduzam  as  superstições  gentílicas,  a  embriaguez, 
a  vadiagem,  e  guiam-se  na  gerência  dos  seus  lucros,  havendo  seu  livro 
de  receita  e  despeza  regularmente  escriturado,  e  os  saldos  que  existam 
aplicamse  à  compra  de  um  objecto  útil  ou  de  uma  vaca,  o  que  é  para 
eles  de  maior  satisfação  e  lhes  dá  as  honras  e  vantagens  de  proprietá- 
rios. Ha  rapazes  destes,  casados  de  pouco,  e  já  possuidores  de  cinco 
ou  seis  vacas,  com  os  respectivos  bezerros,  sem  que  por  outro  lado 
nada  lhes  falte  para  as  suas  habituais  comodidades.  Podem  dizer-se  e 
são,  verdadeiramente  felizes. 

As  raparigas  indígenas  aproximam-se  pouco  a  pouco  das  pretas 
cristãs,  e  pedem  para  aprender  a  costura  e  a  doutrina,  formando  des- 
tarte uma  pequena  escola  de  pretinhas  externas,  nos  pontos  ohde  não 
não  pôde  haver  asilo  de  irmãs.  ^\ 

Por  este  processo  fica  a  instrução  evidentemente  incompleta,  tnas> 


87 


sempre  é  um  bem  que  se  realiza,  emquanto  os  recursos  não  dão  para 

""  'ofrt"al'"pas"ad^^  quatro  anos  na  missão,  regressam  às 

*       ,  Jint^m;.  do  Geralmente  no  cumprimento  de  seus  deveres  cris- 

tos Em 'cíS  o' 1  Idade  de  se  estabelecerem.,  trata-se  de  instruir  a 
f^orLiní  escolha  e  de  casa-los  segundo  os  ritos  da  igreja  católica. 
:í.'"'  !L  ^la  n.  íixa  se  na  no^sa  aldeia?  Da  melhor  vontade  os  aceitâ- 
Sr  e"lofo"ql  a  ín  a^i^un^certo  número  de  famílias,  Podem  agrupar- 
reiorniando  novas  aldeias  cristas,  com   um  dos  seus  camaradas  poi 

'^'''^^Poder-me  há  alguém  perguntar  se  por  vezes  não  ha  insucesso  ou 
acceocôes  nest^ponto.  Certo  é  que  há;  contudo  posso  afoutamente 
r.ncar  uue  uma  terça  parte  é  excelente,  a  outra  terça  parte  muito  acei- 
;rvel^  e  só  os  den  a  ,^Vque  exigem  mais  paciência  e  sacrihcio  para  deles 
se  obter  onvenie  te  resultado' Alguns  dos  rapazes  resgatados  lembra- 
?am-srde  fugir  mas  logo  depois,  com  toda  a  humildade,  vieram  supli- 
a  a  readmiisVo.  A  expulsão^é  sem  dúvida  o  -^'f.  f^^^^^^^^^^^^^^^í^^^^  'l 
ihes  pôde  infligir:  só,  porém,  o  aplicamos  muito  por  excepção,  c 
nuando  a  utilidade  pública  assim  o  exige.  .  ^-      -      «oí«.^nfo 

^  Pelo  que  se  vé,  estas  missões,  estas  aldeias  cristas  sao  realmente 
focos  de  civlização,  e  a  maior  parte  dos  antigos  alunos  sao  como  cen- 
telhas de  luz  a  esclarecer  suas  respectivas  aldeias.  Alguns  temos  que 
\lzem  um  verdadeiro  proselitismo  e  combatem  sem  medo  nem  respeitos 
fumano"os'costumes'bárbaros  e  ridículos  das  suas  je-as.  No  pon  o  de 
vista  de  suieicão  ao  governo,  pode  dizer-se  que  toda  «sta  genic  jica 
In^eirJínente  Lportuguezada,  e,  em  caso  de  necessidade,  pôde  prestar 


Mons.  Luiz  Keiling. 


88 


valiosos  auxilíos.  íja  entre  eles  apreciáveis  atiradores,  e  não  raro  tenho 
visto  em  exercício  de  tiro  ao  alvo  aparecerem  rapazes  que  vencem  admi- 
ravelmente os  soldados  mesmo  europeus. 

Quando,  ha  três  anos,  a  missão  de  Cassinga  foi  agredida  por  mais 
de  mil  guerreiros  do  Cuanhama,  munidos  de  espingardas  aperfeiçoadas, 
foram  repelidos  por  uns  trinta  dos  nossos  rapazes,  alguns  de  treze  ou 
quartoze  anos  apenas,  e  imperfeitamente  armados.  Depois  disto  o  go- 
verno enviou  vinte  armas  Martini,  que  são  todavia  muito  poucas  para 
tanta  gente,  e  tenciono,  pedir  mais  algumas.  Ainda  agora,  em  rumores 
de  guerra,  saem  a  dar  caça  aos  salteadores  os  nossos  cristãos,  ali  esta- 
belecidos com  suas  famílias,  embora  muitas  vezes  em  número  somente 
de  três  ou  quatro. 

As  missões  valem,  pois,  por  verdadeiras  cidadelas,  sendo  respei- 
tadas como  tais  :  não  ha  tribu  que  não  perca  a  vontade  de  nos  atacar,  ao 
saber  que  temos  em  casa  doze  espingardas,  com  gente  competente  para 
as  manejar.  Constituímos  assim  uma  segura  protecção  para  os  povos 
vizinhos,  os  quais,  em  caso  de  alerta,  prontamente  se  refugiam  na  mis- 
são com  pessoas  e  fazendas. 

Em  locais  onde  haja  caça,  sabem  os  nossos  rapazes  tirar  vantagem 
de  sua  competência,  para  fornecer  a  aldeia  de  ótimas  provisões. 


No  continente  da  República. 
Ruínas 


Se  as  primeiras  autoridades  republicanas  das  colónias 
apreciaram,  como  o  tinham  feito  as  monárquicas,  a  evidente 
obra  civilizadora  das  missões  do  Espirito  Santo,  não  sucedeu 
o  mesmo  na  Metrópole;  ou,  se  as  daqui  tinham  bom  senso  e 
clarividência  suficiente  para  também  verem  que  educar  selva- 
gens, nem  é  obra  reacionária,  nem  constitue  ameaça  para  as 
Instituições  democráticas,  alijaram  para  cima  da  Opinião  Pú- 
blica (que  em  democracia  é  dever  respeitar)  a  responsabilidade 
da  extinção,  na  Pátria,  dos  missionários  que  esta  precisaria  lá 
fora.  E  assim,  levados  na  onda  de  uma  suposta  opinião  pú- 
blica (que  era  a  opinião  daqueles  portugueses  que  se  supu- 
nham mais  desvairados  que  os  próprios  africanos)  os  nossos 
políticos  chegaram  a  este  paradoxo:  perseguir  e  impedir  em 
Portugal  o  recrutamento  dos  mesmos  missionários  que  nas 
colónias  continuavam  subsidiando  e  protegendo,  como  impres- 
cindíveis! 

Começara  já  o  novo  ano  escolar  1910-1911,  quando,  a  4 
de  Outubro,  triunfou  em  Lisboa  a  revolução,  que  havia  no  dia 
seguinte  de  implantar  entre  nós  o  regime  republicano.  Os  dois 
colégios  de  Braga  e  do  Porto  dispersaram  logo,  com  pouca 


89 


esperança  de  reabrirem,  porque  lhes  era  assíis  notória  a  anti- 
patia dos  vencedores;  mas  a  Escola  A^^ricola  Colonial  de  Cin- 
tra, o  viveiro  eclesiástico  de  missionários  da  Formiga  e  o 
complemento  deste,  que  era  a  casa  de  Carnide,  com  o  curso 
teológico,  pudera  haver  quem  contasse  para  eles  com  a  boa 
vontade  criteriosa  do  governo  novo,  uma  vez  passada  a  exal- 
tação da  primeira  tormenta. 


Colégio  do  Espirito  Santo. 


Entretanto  os  pequenos  da  Formiga  e  de  Cintra  eram 
entregues  às  famílias,  até  ver.  A  Carnide  chegava,  no  dia  5, 
uma  desgrenhada  malta  de  revolucionários  civis,  perguntavam 
pelo  armamento,  obrigavam  os  ^frades»  a  render-se,  e  leva- 
vam-nos,  alunos  e  professores,  presos  para  Artilharia  1.  Da- 
quele quartel  eram,  quatro  dias  depois,  transferidos  para  Caxias 
(com  melhoria  de  rancho  e  de  carcereiros). 

Postos  em  liberdade  a  15  de  outubro,  punham  as  autori- 


90 


dacies  às, portas  da  fronteira  ao  P/  Dunoyer,  por  estrangeiro, 
convidando  os  demais  a  reintegrarem  os  respectivos  lares. 

Os  edifícios  que  pertenciam,  como  propriedade,  a  mem- 
bros do  Instituto,  foram  confiscados:  eram  só  dois,  mas  os  de 
maior  valor:  o  colégio  do  Espirito  Santo,  em  Braga  e  as  vastas 
instalações' da  Escola  Agncola  Colonial,  em  Cintra.  Como  a 
prov/ncia  francesa  da  Congregação- tinha  enterrado  na  funda- 
ção dos  dois  importantes  estabelecimentos  ponderoso  capital, 
entregaram   os  membros  não  portugueses  uma  reclamação  ao 

tribunal  de  Haia, 
a  qual  nuncache- 
gou  a  ser  deba- 
tida, graças  a  um 
acordo  entre  os 
delegados  do  go- 
verno e  a  Casa- 
Mâe  do  Instituto, 
e  pela  arbitração 
daquele  a  esta 
de  uma  insignifi- 
cante indemniza- 
ção, que  não  co- 
briria o  simples 
valor  do  recheio 
de  qualquer  das 
casas. 

As  outras 
casas,  sem  ex- 
clusão da  Procu- 
radoria das  Mis- 
sões em  Lisboa, 
pertenciam  a 
particulares  e  fo- 
ram entregues 
aos  senhorios,  que  procurassem  para  elas  inquilinos  (confisca- 
da pelo  governo  toda  a  mobilia  dos  proscritos). 

^  Os  aspirantes  missionários,  ao  ver  tão  turbado  o  porvir, 
foram  esquecendo  a  estrela  do  sublime  ideal.  Só  alguns  mais 
tenazes,  ou  menos  tolhidos  pelo  amor  egoísta  e  enervante  de 
tristes  pais,  resolveram  exilar-se  e  foram,  como  destroços 
dum  naufrágio,  procurar  em  França,  na  grande  nação  republi- 
cana que  não  soube  perder  o  entusiasmo  apostólico,  uma 
atmosfera,  em  que  a  vocação  santa  pudessse  desabrochar  e 
produzir  enfim  seu  fruto. 


O  último  director  do  Colégio  do  Espirito  Santo, 

Rev.  Henrique  Blériot 

e  o  assistente,  Rev.  Félix  Girollei. 


9 


Os  mais  pequeninos,  os  inocentinlius  da  Formiga,  acha- 
ram no  sul  da  França,  no  colégio  de  S.  Pé  e  à  sombra  do 
báculo  paternal  do  bispo  de  Tarbes,  um  cantinho  onde  fo- 
mentassem o  desenvolver  da  vocação  sagrada.  Os  mais  \^eIhos, 
os  de  Carnide,  passaram  a  Paris,  terminaram  os  estudos  apostó- 
licos, e  são  os  mais  dèlcs  missionários  de  Portugal  além-oceano. 

Mas  a  França,  boa  e  acolhedora,  não  era  por  condições  físi- 
cas o  ambiente  feito  para  organismos  tenros  de  meridionais  na 
fase  do  crescimento.  O  clima  devastou-os.  A  experiência  não  pu 
dera  proseguir-se  mais  aturada,  sem  desprezo  pela  vida  humana. 

Em  1913,  achava-sc  um  refúgio  em  Fispanha,  c  vinha  de 
Paris  o  Rev.  P.'  Cardona,  com  o  antigo  professor  do  Espirito 
Santo  Rev.  P."  Fonseca  e  alguns  padres  novos,  a  fundar  em 
■Samora,  adjunta  ao  seminário,  uma  academia  de  lengoas,  para 
poder  sustentar  ali  mesmo  um  nuclen/inho  de  estudantes  mis- 
sionários, que  se  fossem  recrutando  pelas  aldeias  da  nossa 
terra.  Ali  se  encontravam  os  padres,  com  um  rebanhozinho  de 
doze  portugueses,  quando  o  decreto  de  20  de  Janeiro  de  1920, 
do  ministro  das  colónias  Rodrigues  Gaspar,  permitindo  às 
Missões  delegar  pessoal  para  recrutarem  e  habilitarem  alunos, 
os  animou  a  virem  viver  para  o  seio  do  território  da  República 
e  para  mais  perto  das  populações,  do  meio  das  quais  hão  de 
sair  os  recrutas  desejados. 


92 


Em  Braia  de  novo 
Reedificando  uma  irande  ruina 


Em  Janeiro  de  1920,  começavam  os  Padres  do  Espirito 
Santo  a  reunir  em  Braga,  numa  quinta  que  já  faziam  de  renda 
no  tempo  do  colégio,  alguns  rapazinhos,  em  cujas  almas  tenras 
parecia  ter  pegado  a  semente  do  ideal  de  apóstolos.  Antes  do 
fim  de  Janeiro,  atingiam  o  número  de  quinze. 

Passava  um  ano.  A  população 
bracarense  e  a  opinião  portuguesa 
acolhera  a  iniciativa  com  evidente 
simpatia,  evidenciada  positivamenie 
e  efectivamente  por  um  esboço  de  coo- 
peração pecuniária.  Findo  o  ano  lec- 
tivo, em  vez  de  seguirem  para  Espa- 
nha, para  o  asilo  de  Zamora,  os  no- 
vos aspirantes  das  missões  africanas, 
vinham  ao  contrário,  de  Zamora,  a 
ajuntar-se-lhes  os  refugiados  lá. 

Em  Outubro  iam  abrir-se  as 
aulas  no  edifício  do  colégio,  que 
então  liquidava,  de  S.  Tomás  de 
Aquino;  a  quinta  do  Charqueiro  re- 
servava-se  para  um  tentame  de  res- 
tauração da  Escola  Colonial,  profis- 
sional e  agrícola,  com  que  Cintra 
povoara  de  missionários  auxiliares, 
pedagogos  e  mestres  de  ofícios,  as 
colónias  de  Portugal,  e  com  que  é 
preciso  continuem  a  dotar-se  as 
missões  de  Angola  e  Congo,  se  que- 
remos dar  consistência  à  obra  civilizadora  missionária,  dando 
à  religião  a  base  sólida  do  trabalho  humano. 

Hoje  vão  em  cincoenta  os  alunos  do  colégio  de  estudos 
eclesiásticos  e  são  quinze  os  aprendizes-missionários  da  Es- 
cola Profissional  Missionária  em  embrião. 

Os  recursos  materiais,  que  não  ha  pensar  em  obter  por 
meio  de  colégios,  porque  nem  ha  pessoal  para  tanto,  nem  as 
leis  vigentes  os  tolerariam,  nem  seriam  desejáveis  para  uma 
associação  que  tem,  primeiro  que  tudo,  de  acudir  às  missões 
despovoadas  das  colónias  —  e  os  colégios  seriam  sorvedouro 
hiante  de  pessoal  —  em  Portugal  os  recursos  indispensáveis 


Creanças  gentias. 


93 


íêem  até  hoje  vindo  do  patriotismo  generoso  dos  que  não 
querem  ver  morta  lá  fora  a  nossa  eficiência  espiritual.  Os  an- 
tigos alunos  dos  colégios,  muitos  a  ocupar  hoje  na  sociedade 
loirares  de  notável  destaque,  têem  sido  dos  mais  pressurosos 
nà^  cooperação,  para  que  resurjam  dentro  em  pouco  hostes 
novas  de  apóstolos  de  F\)rtugal,  que  possam  ir  render  os  an- 
tecessores, os  quais  vão  caindo  nas  lides  excessivas  a  que  teem 
andado  abandonados,  e  que  possam  dispensar  o  envio  de 
mais  colegas  estrangeiros,  generosos,  abnegados,  exilados  vo- 
luntários das  respectivas  pátrias,  para  ajudarem  a  nossa  a 
não  perder  os  centros  de  civilização  com  que  a  dotaram  já. 

Nem  podemos  quedar-nos  no  que  está  feito.  Não  progre- 
dir é  morrer!  E  não  morrem  nem  esmorecem  as  empresas, 
estranhas  à  nossa  civilização,  que  o  Protestantismo  continua 
a  lançar  à  conquista  da  humanidade  que  nos  povoa  os  domí- 
nios. E'  urgente  que  o  esforço  missionário  da  ReligiãQ  católica 
portuguesa  não  se  deixe  vencer  na  forçada  competição  do 
proselitismo. 

Os  Padres  teem  uma  revista  («Missões  de  Angola  e 
Congo»)  para  lembrarem  aos  portugueses  (crentes  ou  não)  a 
necessidade  de  organizarem  o  auxílio  pecuniário,  que  valorize 
as  dedicações  pessoais  nascidas  da  Fé. 

Vamos  forçar  o  Mundo  Civilizado  à  convicção  de  que 
Portugal  Civilizador  ainda  não  morreu. 


Creancinhas  cristãs  e  Rev.  P.'  Cancela  com  o  P.'  Barros  (indígena). 


94 


iPIpêndlcG 


O   Instituto   do  Espirito  Santo 
0   o   recrutamento   de   ínissíonários 

Seminário  das  Missões 

Lembrani-se  ainda  muitos  com  saudade  do  «Seminário  das  Missões» 
no  convento  antigo  da  Formiga,  onde  o  Rev.  P.^  Xavier  Kauffmann,  o 
popularíssimo  por  aquelas  redondezas  Padre  Xaviel,  começava  enfim  a 
colher  frutos  regulares  de  largos  anos  de  experiência  de  direcção. 

Em  1910,  naufragado  o  viveiro  esperançoso,  foi  aproveitada  com 
avidez  aquela  experiência  para  a  direcção  de  uma  escola  missionária  na 
Bélgica.  A  de  Portugal  levou  dez  anos  a  resolver-se  outra  vez  a  tentar 
reimplantação  entre  nós.  Funciona  em  Braga,  de  ha  dois  anos  a  esta 
parte. 

O  Instituto  tem  por  fim  essencial  e  exclusivo  formar  e  educar,  tan- 
to física  como  moralmente,  para  a  vida  missionária  os  jovens  que  a  qui 
zerem  abraçar  nas  missões  portuguesas  de  Angola  e  Congo. 

Todos  os  patriotas  que  estão  ao  par  do  problema  colonial,  confes- 
sam a  necessidade  urgente  de  mandarmos  missionários  portugueses 
para  as  nossas  colónias. 

Vêem  por  isso  os  Padres  do  Espirito  Santo  pedindo  a  todos  os 
portugueses  que  se  interessem  por  esta  Obra,  de  alcance  ao  mesmo 
tempo  religioso,  social  e  patriótico  : 

1.°  —  Dando-a  a  conhecer  no  meio  em  que  vivem,  sobretudo  di- 
fundindo a  revista  «Missões  de  Angola  e  Congo»,  que  propagandea  o 
ideal  missionário. 

2S  —  Procurando-lhe  bons  recrutas. 

3.0  —  Fundando  bolsas  (4.000^00).  ■ 

4.°  —  Assegurando  anualmente  a  pensão  (200|00)  ou  meia  pensão 
(lOOlOO)  ou  um  quarto  de  pensão  dum  aspirante. 

5.0  —  Proporcionando-lhe  donativos  em  géneros,  roupas,  livros,  etc. 

Para  eles  será  certa  a  benção  do  Salvador:  *Quem  ajudar  o  após- 
tolo na  sua  missão  de  apóstolo,  receberá  a  recompensa  do  apóstolo». 

Condições  de  admissão 

1.0  —  Saúde  e  compleição  robusta,  índole  boa,  isenção  de  defeito 
físico  notável. 

2."       Idade  não  inferior  a  10  anos,  nem  superior  a  15. 

3."^  Inteligência  mais  que  mediana,  juizo  são,  espirito  dócil  e 
aptidões  pronunciadas  para  os  estudos  e  vida  missionária. 


95 


4.^  -  Exame  de  instrução  primária  (2.°  grau)  ou  habilitação 
para  èle. 

5.^    -  Ser  filho  legítimo  e  de  família  bem  reputada. 

Documentos 

1.°  —  A  carta,  em  que  o  aspirante  pede  admissão,  exprimindo  o 
seu  desejo  de  ser  sacerdote  e  missionário,  deve  ser  acompanhada  duma 
carta  de  recomendação  do  pároco  ou  doutro  sacerdote  que  bem  o  co 
nheça. 

2.*^    -  Deve  trazer  consigu,  muA  vez  admitido  : 

a)  Certidão  de  idade,  em  papel  selado  e  reconhecida  por  tabelião. 

b)  Certidão  de  baptismo  e  confirmação. 

c)  Diploma  ou  atestado  dos  exames  feitos. 

d)  Atestado  de  vacina  e  de  boa  saúde. 

e)  Consentimento  ^dos  pais  ou  tutores,  em  papel  selado  e  reconhe- 
cido pelo  tabelião. 

Pensão 

Se  as  famílias  têem  posses,  devem  pagar  a  pensão  de  seus  filhos, 
que  se  avalia  em  200$00  anuais. 

A's  que  têem  poucos  ou  nenhuns  meios,  o  Director  fará  as  redu- 
ções precisas  é  possíveis,  valendo-se  da  generosidade  do5  benfeitores 
das  Missões  e  do  Instituto. 

Umas  e  outras  se  comprometem  a  nào  desviar  os  seus  filhos  da  car- 
reira missionária ;  com  efeito,  apesar  das  próprias  necessidades  no  mo- 
mento presente,  Portugal  não  pode  abandonar  as  suas  colónias  á  invasão 
protestante  e  estrangeira :  fornecer-lhe  missionários  católicos  e  portu- 
gueses à  altura,  é  o  fim  único  desta  obra  e  de  quantos  a  favorecem. 

Despesas  de  viagens  e  de  correspondência  ficam  sempre  a  cargo 
da  família. 

Na  entrada,  cada  aspirante  entregará  a  quantia  de  20;?00  para  gas- 
tos de  instalações  e  imprevistos. 

Enxoval 

2  fatos  novos  e  completos  —  8  camisas  com  colarinhos  cosidos  — 
8  ceroulas  -  6  guardanapos  grandes  —  6  toalhas  de  rosto  -- ■  12  pares 
de  meias  —  12  lenços  de  mão  —  3  pares  de  lençóis  ~  3  travesseiros  e 
3  travesseirinhas  —  2  cobertores  —  2  camisolas  de  lã  para  o  inverno  - 
I  capote  —  2  blusas  de  riscado  —  4  gravatas  —  2  pares  de  botas  - 
l  par  de  tamancos  —  1  par  de  chinelos  —  1  chapéu  —  1  boina  ou  boné 
-  escovas  de  fato,  de  dentes,  de  cabelo  e  de  calçado  ~  2  pentes  ~-  1 
espelho    -  1  coberta  branca  para  a  cama. 

Observações 

\.°  —  Além  do  enxoval,  o  aspirante  deverá  trazer  os  livros  de 
aula  que  tiver. 

2.°  —  A'  medida  que  se  forem  rompendo  os  diferentes  artigos  do 
enxoval,  a  família  é  rogada  para  os  substituir  por  outros. 


96 


3.0  —  Toda  a  roupa  deverá  vir  marcada  a  linha  com  o  n.°  indicado 
pelo  Director  no  acto  da  admissão. 

4.0  —  As  entradas  não  se  efectuarão  senão  no  princípio  do  ano 
lectivo. 

5.°  —  Peias  férias  grandes,  os  jovens  poderão  passar  em  casa 
algum  tempo,  conforme  determinarem  os  Directores. 

Os  pedidos  devem  ser  dirigidos  ao  Director  do  «instituto  das  Mis- 
sões». 49,  Rua  Visconde  de  Pindela  —  Braga. 


Estudos  Superiores  e  Técnicos 


A  Escola  das  missões  é  destinada  a  dar,  durante  5  anos,  aos  can- 
didatos missionários  habilitação  correspondente  ao  curso  secundário. 

Seguirão  ainda  dois  de  estudos  filosóficos,  durante  os  quais  se 
ministram  aos  estudantes  ensinamentos  práticos  em  relação  com  o  viver 
colonial.  Enfim,  coroa-se  a  carreira  de  preparação  eclesiástica  missio- 
nária com  um  curso  teológico  de  4  anos. 


Escola  profissional  das  Missões 


Entre  os  que  modernamente  se  interessaram  por  missões  é  já  di- 
tado indiscutido  que  o  padre  não  fará  obra  de  dura,  se  o  não  coa- 
djuva o  missionário  profissional  a  transformar  o  preto,  pelo  hábito 
incutido  do  trabalho  disciplinado. 

E'  por  isso  que  o  Instituto  Missionário  do  Espirito  Santo,  reconhe- 
cendo, como  todos  os  que  se  interessam  pelas  colónias  portuguesas,  a 
necessidade  urgente  de  para  já  mandarmos  missionários,  não  quiz  dei- 
xar essa  obra  incompleta,  contentando-se  com  o  recrutamento  de  ^mis- 
sionários eclesiásticos:  quiz  também  formar  e  educar,  física  e  moral- 
mente, missionários  auxiliares  leigos  que,  pelo  ensino  primário  na 
escola,  ensino  técnico  na  oficina,  e  direcção  da  actividade  agrícola  do 
selvagem,  o  ajudem  a  ingressar  na  civilização  portuguesa  e  cristã  e  a 
fixar-se  nela. 


Condições  de  admissão 

l.o  —  Saúde  e  compleição  robusta,  índole  boa,  isenção  de  defeito 
físico  notável. 

2.°  —  Idade  não  inferior  a  15  anos. 

3.0  —  Juizo  são,  espírito  dócil,  gosto  pelo  trabalho  e  aspirações  à 
vida  missionária. 

4."  —  Saber  ler  e  escrever. 

5.0  —  Ser  filho  legítimo  e  de  família  bem  reputada. 


97 


Documentos 


1.-  —  A  carta  em  que  o  aspirante  pede  admissão,  exprimindo  o 
seu  desejo  de  ser  missionário,  deve  ser  acompanhada  duma  carta  de 
recomendaçáo  do  pároco  ou  de  outro  sacerdote  que  bem  o  conheça. 

2."— Deve  trazer  consigo,  uma  vez  admitido: 

a)  Certidão  de  idade,  em  papel  selado  e  reconhecida  por  tabelião. 

t>)  Certidão  de  baptismo  e  confirmação. 

c)  Atestado  de  bom  comportamento  (do  patrão  ou  do  pároco). 

d)  Atestado  de  vacina  e  de  boa  saúde. 

e)  Consentimento  dos  pais  ou  tutores,  em  papel  selado  e  reconhe- 
cido pelo  tabelião. 


Obrigações  das  famílias 

Os  pais  comprometem-se  a  não  desviar  os  seus  filhos  da  carreira 
missionária ;  com  efeito,  apesar  das  próprias  necessidades  no  momento 
presente,  Portugal  não  pode  abandonar  as  suas  colónias  à  invasão  pro- 
testante e  estrangeira :  fornecer-lhe  missionários  católicos  e  portugue- 
ses à  altura,  é  o  fim  único  desta  obra  e  de  quantos  a  favorecem. 

Despezas  de  viagens,  ficam  sempre  a  cargo  da  família. 


Enxoval 

2  fatos  novos  e  completos  —  8  camisas  com  colarinhos  cosidos  — 
8  ceroulas  —  6  guardanapos  grandes  —  6  toalhas  de  rosto  —  12  pares 
de  meias  —  12  lenços  de  mão  —  3  pares  de  lençóis  —  3  travesseiros  e 
3  travesseirinhas  —  2  cobertores  —  2  camisolas  de  lã  para  o  inverno  — 
1  capote  —  2  blusas  de  riscado  —  4  gravatas  —  2  pares  de  botas  — 
1  par  de  tamancos  —  1  par  de  chinelos  —  1  chapéu  —  1  boina  ou  boné 
—  escovas  de  fato,  de  dentes,  de  cabelo  e  de  calçado  —  2  pentes  — 
1  espelho  ~  1  coberta  branca  para  a  cama. 


Observações 

l.<^  —  Alem  do  enxoval,  o  aspirante  deverá  trazer  os  livros  de 
aula  que  tiver. 

2.0  —  A'  medida  que  se  forem  rompendo  os  diferentes  artigos  do 
enxoval,  a  família  é  rogada  para  os  substituir  por  outros. 

30  _  Toda  a  roupa  deverá  vir  marcada  a  linha  com  o  n.o  indicado 
pelo  Director  no  acto  da  admissão. 

Os  pedidos  de  admissão  dirigem-se  ao  Director  do  «Instituto  Mis- 
sionário».  18,  Rua  Bento  Miguel  —  Braga. 


ERR^T/^S 


Pag.  73  : 

«E'  verdade  que  em  Malange  houve  uns  desentendimen- 
tos...». .  

Os  desentendimentos  em  Malange  não  datam  da  procla- 
mação da  República  nas  colónias.  Foram  já  em  1914,  por 
ocasião  dos  arrolamentos,  a  que  energicamente  quiz  opôr-se 
o  R.  P.  Sousa,  e  que  seguiram  a  aplicação  às  colónias  da  Lei 
de  Separação.  No  Libolo,  porém,  houve  desde  os  primeiros 
tempos  da  República  perseguição  local,  que  aliás  a  autoridade 
centra]  repudiou,  destituindo  sucessivamente  dois  administra- 
dores zelotes. 


Pag.  74: 

«O  primeiro  governador  geral,  Manoel  Maria  Coelho,  etc.>\ 

Estas  linhas  não  presentam  bem  em  foco  o  delineamento 
dos  factos.  O  governador  Manoel  Maria  Coelho  não  arbitrou 
subsídios  às  missões  tirados  do  orçamento  colonial :  obteve 
do  Governo  da  metrópole  que  os  subsídios  continuassem. 

Foi  em  1914,  ao  aplicar-se  às  colónias  a  Lei  de  Separação 
que  os  subsídios  às  missões  foram  suprimidos;  o  governador 
de  então,  hoje  alto  comissário  de  Angola,  Norton  de  Matos, 
que  num  relance  de  olhos  de  águia  vê  as  situações,  não  quiz 
o  desastre  da  nossa  influência  espiritual  na  província,  e  deter- 
minou continuar  o  auxílio  às  missões  por  conta  dos  fundos 
da  colónia. 

Durou  esta  situação,  com  um  breve  interregno  de  indeci- 
são, até  ao  regulamento  de  Rodrigues  Gaspar  (Janeiro  de  1920) 
ultimamente  melhorado  por  diploma  do  mesmo  ministro  ,das 
colónias  em  26  de  Agosto  de  1922;  nestes  dois  decretos  or- 
ganiza outra  vez  o  Estado  a  dotação  das  missões,  estabeleci- 
das as  condições  em  que  elas  hão  de  funcionar. 


IMDEX 


No  campo  do  apostolado  contemporâneo    .     . 5 

A  Congregação  do  Espirito  Santo.  Dúplice  origem  da  Associação: 

Associação  do  Espirito  Santo 8 

Congregação  do  SS.  Coração  de  Maria ,.y     .  10 

A  fusão.     ,     , •     •  11 

Desenvolvimento  da  Nova  Sociedade  : 

Em  vida  de  Libermann ,  12 

Expansão  póstuma •     .     .     .  15 

Em  territórios  de  Portugal 16 

Os  primeiros  missionários  do  Espirito  Santo  em  plagas  angola- 
nas. Padre  Poussot  e  Padre  Espitallié 20 

Alarme  dos  politicos  (Fevereiro   1866).   Debate   nas   Câmaras 

acerca  dos  missionários  franceses 22 

A's  portas  do  Congo  : 

De  Loanda  para  Ambriz 24 

Em  Mossâmedes.  O  P.'^  Duparquet •     •     •  27 

Primeiros  passos  da  Congregação  no  Continente  Português. 

Descorçoando  das  Missões,  mortes,  retiradas    ....  31 
Os  Padres  do  Espirito  Santo  a  renunciar  a  colónias  nossas. 

Lândana  e  Congo  a  fugir-nos -35 

O  P.«  Duparquet  a  gravitar  ainda  para  Angola 38 

De  Gibraltar  outra  vez  para  Portugal 41 

O  P.^  Duparquet  outra  vez  em  Angola.  Contrapõe-no  Portugal 

à  invasão  protestante :  fundação  definitiva 43 


100 


Missões  do  clero  secuiar, 

D.  José  Neto.  AntónSo  Barroso 48 

A  missão  francesa  do  Congo  a  torcer  outra  vez  para  Portugal  .  53 

Loanda.  Esboços  da  missão  da  Lunda 56 

Evoluir  da  Cimbebásia.    .         ,    .     .  58 

Progressos  no  Continente :  colégios,  procuradoria,  escola  colo- 
nial, seminário 61 

Decadência,  novo  alento  e  ruína  em  Portugal. 64 

As  missões  (Congo,  Lunda,  Cunene,  Cimbebásia)  mio  último  de- 
cénio da  Monarquia 66 

A  República  e  as  Missões , 73 

Estado  actual  das  Missões : 

Congo 76 

Loanda-Lunda 77 

Huíla 79 

Cimbebásia  (Benguela- Cubanigo) 80 

A  missão  moderna 82 

No  Continente.  Ruioa£ 88 

Em  Braga.  Reedificando  a  grande  ruina 91 

Apêndice:  instituto  Missionário  do  Esp.  Santo,  94  95,  96,  97 


Tipogratía  Sousa  Cruz  —  Rua  Nova  de  Soma 
BRAGA  -  t922 


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1 


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