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MEMORIA
SOBRE
A .bíoluta n«e«!dade, que ha , de Nltrelr.^ nacío„,n puu
a independência e defensa dos Estados
COMA
Descrlpção da origem, actual estado, e vantagem
D A
REAL NITREIRA ARTIFICIAL
D E
BRAÇO DE PRATA:
Lida na Secção pública da Sociedade Real Marítima ,
Militar, c Geográfica de ip de Janeiro de 1802
PELO SOGIO
MANOEL JACINTO NOGUEIRA DA GAMA
Tenente Coro.ef do Real Corpo ,e Engenheiros , Inspector Geral
das Nareiras, e FaWica de Pólvora ia Capitania de Mi.
.1!^'.^'''^' ' ■ ^'P^i^Ao , e Escrivão da Junta da
Reaí Fazenda da mesma Capitania.
LISBOA. M.DCCC.m.
NA IMPRESSÃO REGIA.
POR ORDEM SUPERIOR,
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JL ArecerÁ impróprio , que eu haja de tratar
da Real Nitreira Artificial de Braço de Prata
neste respeitável Congresso , particularmente
destinado ao Desenho , Gravura , e Impressão
das Cartas Hjdrograficas , Geográficas , e Mi-
litares. Observardes Astronómicas , e resolu-
ções, de problemas Fysico-Mathematicos , que
■digáo respeito ao conhecimento da posição dos
differentes pontos do nosso Globo : melhora-
mentos de instrumentos destinados não somente
ás observações Astronómicas feitas em terra,
ou sobre o mar , mas também á perfeição da
Gravura , e Impressão das Cartas : propostas ,
€ descripçóes dos instrumentos , que devem ser
com preferencia empregados nos trabalhos Geo-
désicos : planos da ordem , e individuação ,
com que s e devem fazer todos os trabalhos
re spectivos ao conhecimento , e determinação
dos pontos, ao Desenho, Gravura , e Impres-
são das sobreditas Cartas , são com effeito os
A ii
-.1
I
I
4
objectos próprios desta Real Sociedade , e que
com preferencia devem merecer o cuidado de
cada hum dos seus Membros. Com tudo á
huma Sociedade de homens de Letras , e de
Patrióticos : á huma Sociedade , que como esta ,
tem por ultimo resultado do seu objecto a se-
gurança da Marinha Real , e Mercante , o seu
augmento , o. augmento da industria , e do
commercio ^ a defensa do Estado , e a gloria
da sua Nação , de algum modo pertence todo ,
e qualquer objecto , que possa conspirar aos
mesmos fins. Tal he seguramente o voto desta
sábia , e respeitável Corporação sobejamente
demonstrado pela benevolência , e pelo acolhi-
mento , com que tem recebido muitos traba-
lhos , de que se tem dado conta neste mesmo
lugar , não obstante parecerem alheios da sua
Instituição.
Outras razoes me deliberarão também á
tarefa, que me proponho.
Tendo satisfeito a todos os trabalhos ,
que de ordem desta Real Sociedade me tem
sido incumbidos , ainda não appareceo o meu
nome nas listas até agora publicadas das Me-
morias apresentadas pelos seus Sócios 3 quer
...íSWli^r
'^^"iBRBw^^ajai
K\'K?qC<^Sr
sobre objectos mediata , ou im mediatamente
pertencentes á sua Instituirão, quer sobre obje-
ctos a eJJa estraniios : e sendo estes os traba-
liios , que mais se tem prezado , e com tanta
maior razão, por serem voluntários , servindo
por isso de indubitável prova da appiicação
e dos esforços , que os seus Autliores fazem'
por cooperarem para a gloria , e credito desta
Real Sociedade, devo expor os motivos, que
me tem desviado de liuma semelhante empre-
sa : nenhuma outra maneira tenho para o fa-
zer , do que dando a descripção da Real Ni-
treira Artificial , que por ordem superior me
foi mcumbida , pois que delia naturalmente se
poderá concluir , que satisfazendo ás obriga-
ções de Lente da Real Academia da Mari-
nha , satisfazendo as commissoes desta Real
Sociedade , e satisfazendo aos trabalhos , que
exigia o estabelecimento daquella Real Fabri-
ca , cuja direcção me foi confiada , nenhum
tempo me poderia sobrar para trabalhos de
minha escolha, ainda que por isso, e por vo-
luntários ser-me-hião mais agradáveis, ou mais
bem tratados.
Outra razão nao menos imperiosa me de-
mm
•^n*
liberou a entreter a attencão desta Sociedade.
Tendo de ausentar-me para a Capitania de
Minas Geraes a exercer os diversos empregos,
que o Nosso Augusto Principe , e Senhor pela
sua Real Beneficência se dignou confiar de mim,
era do meu capricho o dar exacta conta do
resultado da commissao do Real Serviço, que
me foi encarregada : era do meu amor, e res-
peito pela Gloria do nosso Augusto Soberano
o patentear áface de toda a Europa, eotrans-
mittir á posteridade mais huma prova dos seus
paternaes cuidados, e das suas iíluminadas idéas
a beneficio de todos os seus venturosos Vassal-
los. E que meio mais apropriado para satisfa-
zer a todos estes fins, do que aquelle, que es-
colhi. Procurando a approvaçao desta sábia
Corporação, e sendo porella correcto, e emen-
dado este meu trabalho , seguramente poderá
correr a Europa , e levar á posteridade mais
huma das immensas provas dos benefícios , que
aNaçáo Portugueza deve ao seu Augusto
Principe , e Senhor.
Por tanto passo ao meu objecto , que di-
vidirei em três Secções.
íía primçira exporei a absoluta necessida-
i
f^-^^,i>mrms»^yK^\if^a^;rjvf;fQrj^m^n^j^^
de, que toda a Nação tem de Salitre, o qual
deve merecer hum dos seus príncipaes cuida-
dos.
Darei noticia das Feitorias de Salitre , que
houve em Portugal , c das descubertas , que
deste se fizerao nas nossas Possessões Ultrama-
rinas, em consequência das ordens de Sua Al-
teza Real , expedidas pela Secretaria de Estado
dos Negócios da Marinha , e Domínios Ultra-
marinos.
Na segunda darei a descripçao da Real
Nitreira Artificial de Braço de Prata.
Na terceira exporei o seu producto , o
seu actual lucro , e o augmento , que se deve
-esperar : terminando com algumas proposições
■relativas ao estabelecimento de outi-as Nitreí-
'tãs, e á sua propagação. ^
ií
s E c q à o I.
S
_ E o Soberano , que conhece a influencia
da agricultura , das manufacturas , e do com-
mercio no augmento da população , na força
dos seus Estados , na riqueza , e independência
dos seus Vassallos j incessantemente se entrega
ao cuidado de os elevar ao maior gráo de per-
feição : Se os estabelecimentos públicos destina-
dos á pública instrucçâo merecem o mais vigi-
lante cuidado do Estado , pela grande depen-
dência , que delles tem : Se a construcção das
estradas , e pontes , o ensecamento dos pânta-
nos , o roteamento dos terrenos incultos , a dis-
tribuição dos baldios , a construcção dos ca-
naes navegáveis , e dos canaes de rega , a na-
vegação dos rios merecem a attenção do So-
berano , que conhece a dependência , que des-
tes objectos tem a agricultura , as manufactu-
ras, e o commercio : Se o Soberano persuadi-
^'^^«^'...W-í:
-^^^i^^^g«sa^iW1^^^fryyi1íii:^^^
9
■do , que as aites , e manufacturas mulriplicao
os meios de fortuna , e concorrem com a dis-
tribuição da riqueza para li uma melhor repar-
tição das propriedades , cessando a desigualda-
de excessiva , fructo da ignorância , e da falta
de industria Nacional : Persuadido , que os po-
vos mais industriosos sao os m.ais felizes , e
poderosos , ou porque tem dentro do seu terri-
tório tudo , quanto lhes he necessário na presen-
ça de huma guerra , ou porque com a sua ri-
queza podem comprar mais munições , mais
soldados , forças maritimas , e terrestes ; ou
porque podem comprar a mesma paz ; ou por-
que cora o seu industrioso trabalho reparao
facilmente as perdas , que experimentarão : em
Jiuma palavra : Se o Soberano altamente per-
suadido , que a balança , e o destino das Na-
ções existe nas mãos daquellas , que se occu-
pão da agricultura , das artes , e das manu-
facturas, procura todos os meios de as condu-
zir a este estado , já creando , e sustentando os
estabelecimentos públicos , de que huma gran-
de parte da Sociedade pode tirar prodigiosas
vantagens , e cujas despezas são superiores ás
forças dos paiticulares : já protegendo ^ e en-
B
10
chendo de príviíegios , e isenções diversas Com-
panhias destinadas a empresas , que se malo-
grarião sem a reunião de forças pecuniárias :
já animando os Emprehendedores de Fabricas ,
e sustentando-os com avultados soccorros , pa-
ra que possão lutar com as desavantagens inhe-
rentes á plantação de hum novo ramo de in-
dustria , sempre acompanhada de riscos , in-
certezas 5 e considemvel empate de fundos : já
estabelecendo per si mesmo aquellas artes , e
manufacturas , que por ignoradas , ou por sum-
inamente dispendiosas não são emprehendidas
pelos particulares , a quem depois as cede :
Com quanta razão nao devem merecer o sei*
particular desvdo , e protecção aquelles esta-
belecimentos , que forem necessários para de-
fender o seu povo das invasões dos outros pó-^
Xõs?
Mas seja qual fór o cuidado , e desvelo ^
que tiver o Soberano em conservar em bom^
estado de disciplina , e de instrucçâo os exér-
citos , que destinar á defensa dos seus Estados :
por muito grandes , e avultadas sommas de di-
nheiro 5 que consuma na sua manutenção , e
preparo , nãq terá enchido os deveres, de So-
ti^tíUímmfif^
11
berano , se não procui^ar todos os meios de ti-
rar partido da força militar em qualquer si*
tuação , em que se possa achar. De que servi^
rá hum exercito sem armas , e sem munições »
que possão disputar em perfeição , em nume-
ro, e em força com as armas, e munições do
exercito inimigo ?
Para evitar as funestas consequências , que
de huma tal falta podem resultar , os Sobera-
nos tem estabelecido Arsenaes Militares , onde
se preparão todas as qualidades de armas ne-
cessárias ao estado actual da arte da guerra :
procurão dentro dos seus Dominios as matérias
primeiras , que servem á sua construcçao : fa-
■zem provisões superabundantes daqueiles géne-
ros , que Jhes recusa o seu território , tendo
sempre em vista os embaraços, que na presen-
'ça de:iiuma guerra soffre a importação estran-
geira , muito principalmente dos petrechos de
guerra : p6e em actividade as suas minas me-
tallicas , e procurão com muita especialidade ,
e desvelo ter de sua própria lavra , e sem de-
pendência dos Estrangeiros o género , que es-
palhando invisivelmente a morte , e o terror ,
põe quasi de nivel o exercito forte, e o fraco,
B ii
,1'-
^^^tfí^0m>f^mW^^^Ê^^S!Ê;^i9mm?^9ámnii^m\\fii ii..iiiíuiiiiiwimww— iw I II II o I iiMi
12
e decide da sorte das batalhas : o género , que
pela sua falta obrigará a depor as armas o
mais respeitável exercito pelo seu numero, pe-
la sua força , pela sua disciplina , e a receber
o jugo do seu adversário-, por fraco, e inha-
bil que seja.
Este o motivo , por que o Salitre , eíe-
mento essencial da Pólvora, tem merecido hum
particular cuidado a todos os Soberanos , man-
dando examinar attentamente se a natureza lho
concedco no seu território , animando com pré-
mios , e soccorros pecuniários a extracção do
natural , espalhando as luzes necessárias para
se estabelecerem. Nltreiras Artiíiciaes , e man-
dando estabeleceilas por sua própria conta , e-
despeza.
Assim vemos qua?i todos os Estados díí
Europa aprovisionados de Salitre do seu pró-
prio território ; Hespanha, França , Alemanha ,.
Suissa , Turquia , Prússia , Rússia , Suécia ,
Dinamarca, possuem Nitreiras em maior, oir.
menor quantidade : a Ásia abunda muito em
Salitre : a Africa o possue , e não menos a
America. Parece que a natureza a todos con-
çedeo elemento tão essencial á sua defensa > e
^ilÊIF^^m^i^i^L^tl^^l^
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15
quando mesmo pela aspereza do clima , e sua
localidade a algum negasse as Nitre iras natu-
raes , descubrindo-lhe os processos occultos ,
que seguia na formação do Salitre , fazendo4he
conhecer , que as substancias animaes , as ve-
getaes , e a athmosfera encerravão os seus ele-
mentos , pôz a todos em estado de possuírem
]ium tão precioso género.
He certo, que algumas Nações, despre-
zando as Nitreiras naturaes , ou artiíiciaes do
seu território, tem confiado o aprovisionamen-
to de tão essencial género ao commercio, per-
suadidas , de que possuindo riquezas , nunca
terão necessidade de Salitre : he certo , que a
barateza deste género na Província de Patná,
em Bengala , em Cambaia , em Paliacate , Cos-
ta de Coromandel , em Barbaria , Tunes , Ar-
gel , tem feito , com que algumas Nações tra-
tem o Salitre como hum género de commer-
cio summamente lucrativo, tirando delle o ne-
cessário para a sua Pólvora , vendendo o ex-
cedente , e desprezando as Nitreiras naturaes ,
ou artificiaes , unicamente pelo motivo do seu
maior custo. Esta foi a conducta da Hollanda ,
por algum tempo senhora do commercio d©
14
Salitre em Bengala , e de que a seu arbítrio fi-
xava o preço ás de mais Nações , até que em
1732 foi obrigada a ceder hum terço aos In-
glezes, e o outro terço aos Francezes sem lu-
cro algum. Tal foi a França até a época da
sua revolução , nao obstante que sempre con-
servou, procurou augmentar (i) , e fazer mais
(i) Turgot, célebre Ministro das Finanças^ de Luiz XVI. ,
l>em mostrou o seu desejo do bem público , e do augmento"
das rendas do Estado com as providencias , que deo a respei-
to da colheita de Salitre em Franqa, e da factura da Pólvora
por conta do Estado. A Companhia encarregada da compra
do Salitre , e da factura da Pólvora , tirava immenso lucro
deste privilegio exclusivo, que apezar de se figurar muito in-
teressante ao Estado , lhe fazia huma bem insignificante eco-
nomia, e pezava muito, e desigualmente sobre parte da Na-
ção Fraiiceza. A colheita de Salitre no espaço de pouco mais
de meio século tinha descido de trinta e sinco mil a dezoito
mil quintaes por anno , pois não era promovida pela Com-
panhia , que preferia a compra do Salitre da índia , que lhe
ficava maií barato , do que o nacional , tendo só em vista o
seu interesse sem se importar , com o que succederla , se a
guerra viesse a interceptar a importação do Salitre estran-
geiro.
Turgot augraentou o preço do Salitre bruto , para animar
a sua colheita: procurou conhecer os processos seguidos pelas
Nações, que abundavão deste género: aproveitou-se das ex-
periências dos Prussianos , e Suecos : fez «olher , e traduzir
os seus methodos 1 para 05 fazer públicos na França :_ espa-
WWKrU^Jk^
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productívas as suas Nitreiras ; tal a conducta
dos Inglezes ; tal a nossa tem sido.
Esta conducta , que tão fatal hia sendo á
Képublica Franceza , e que ainda he seguida
peJa Inglaterra , não pôde deixar de ser ex-
posta a funestas consequências. Se a Inglaterra
em outro tempo fomentou o Salitre nacional :
se em 1625-, i<$2Ó, e 1634 Carlos L deo al-
gumas providencias a respeito das Nitreiras ar-
tifíciaes , o seu espirito me parece mais cir-
cunspecto , e patriótico , do que quando em
1640, abandonando as mesmas Nitreiras, per-
mittio a importação de Pólvora , e Salitre :
mais constância na primeira empresa : provi-
dencias mais luminosas , e apropriadas : pré-
mios concedidos aos que fizessem Pólvora com.
ihou por todas as Pròrincias instrucções impressas sobre a ar-
te de formar Nitreiras: deo- fundos á Academia das Jclencias,
para propor hum premio sobre tão importante matéria; man'
dou pessoas hábeis á índia para examinarem as causas , que
fazem o Salitre tão abundante , e tão barato naquelle paiz,
e para se instruírem no modo de promover a sua formação ,
e de se fazer a sua colheita. Com estas, e outras providen!
cias, em pouco tempo sublo a colheita do Salitre de dezoito
toil a vinte e sete mil quintaes por anno ; e se continuasse o
mesmo zelo , em poucos annos não somente se colheria o
necessário ao consumo da Franija, mas poder.se-hia exportar,,
llv
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\i>.
■,vi
16
Salitre nacional , como se concedeo em 1730
aos que a fizessem com Salitre importado , teriao
certamente produzido o desejado effeito. Fran-
queada a importação do Salitre , e Pólvora ,
permittida a factura desta a qualquer particu-
lar (o que certamente foi o resultado das di-
ligencias , e ambiciosas vistas dos Commerci-
antes), qual d elles deixaria de exportar de Ben-
gala todo o Salitre por hum insignificante pre-
ço ? Qual prefereria o Salitre do seu território ,
que dar-lhe-hia se não perda , ao menos hum
lucro incomparavelmente menor ?
He certo , que até agora tem havido a-
bundancia de Salitre , e Pólvora em Inglaterra ,
a ponto de repartir com outras Nações , e com
summo interesse tão essencial género : he cer-
to j que a superioridade da Marinha Ingleza,
actualmente sem rival, pode servir de garante
sobre a conservação desta vantagem ; mas as
revoluções politicas abalao os mais firmes Co-
lossos : e huma vez cortada a importação do
Salitre , a Inglaterra receberá a lei do seu ad-
versário.
O premio de duzentas libras esterlinas
promettido em 1763 pela Sociedade destinada
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17
a animar , e promover as Artes , ao primeiro
que fabricasse em Inglaterra dez mil arráteis,
de Salitre , abona a minha opinião.
Os muitos portos da França no Oceano ,
e Mediterrâneo : as suas respeitáveis forças na-
vacs : o seu gi-ande commercio marítimo , tam-
bém poderião afiançar-lhe a acquisiçao de Sa-
iitre estrangeiro. Com tudo nós vimos a sua
Marinha destruída , o seu commercio interrom-
pido , os seus portos bloqueados. Ella certa-
mente deporía as armas , se de todo tivesse
abandonado as suas Nitreiras , se nao recorresse
ao seu território , se não apromptasse de pro-
pría lavra , e com incrível actividade todo o
Salitre , que lhe foi necessário , c em cuja falta
tmha fundado a Inglaterra as maiores esperan-
ças da victoria.
Portugal , bem como a Inglaterra , já te-
ye Feitorías de Salitre. O Alvará do Senhor
Rei D. João IV. de 26 de Julho de 165-4, e
a Apostila de 10 de Março de 16$^ (i) , as-
sim o provão ; mas talvez seguindo os passos
da sua antiga alliada, abandonou as Nitreiras
ií ») ii^eja-se a Copla no fim.
i8
do seu território , á ponto de que já delias mo
havia lembrança.
Mas graças aos Paternaes cuidados do
nosso Augusto Príncipe e Senhor : por ordem
sua se acha estabelecida a Real Nitreira Arti-
ficial de Braço de Prata , feliz presagio , de
que possuiremos mais hum ramo de industria ,
e com elle de nossa lavra , e sem dependência
dos Estrangeiros o mais essencial artigo para
a nossa defensa. Altamente persuadido ^ de que
a Agricultura, as Artes, as Manufacturas, e
o Commerçio fórmao a felicidade dos seus
Vassallos , á que unicamente se consagra , re-
parte os baldios , promove a construcçao das
estradas , e a navegação dos rios ; ampara , e
soceorre os Emprehendedores de Fabricas , lo-
go que por aígum motivo desfallecem ; poe
em respeitável estado os Arsenaes do Exerci-
to, e Marinha ; tira do abatimento, sustenta
á custa da Real Fazenda , e eleva ao melhor
estado, já pela independência, que nos dá, já
pelos seus avultados lucros a Real Cordoaria ^
em cujo seio se comprehendem muitas Artes >
e . Manufacturas ; manda lavrar as ricas Minas
de Ferro ^ e as de Carvão , que se achavâo
■ÉfcWI»J^*IMWI«tFVW«W
^'"Hvi'>,-:«j ;ífii.rrfi. 'i'í-vv4>i
^ív
infelizmente abandonadas ; detennina a plan-
tação de bosques ; em huma palavra , busca
por todos os modos a riqueza , e independência
de seus Vassallos.
Não satisfeito com as descobertas , que
cm consequência de suas Ordens se fizerao de
abundantes Nitreiras naturaes em a Ilha Bra-
va, nas Capitanias da Bahia, do Maranhão ^
do Seara (i) , do Piauhi , de Minas Gera es ,
de Goiazes ; acautelando com summa prudên-
cia os males , que se poderão seguir da falta
de hum género tão necessário , não obstante
existir nos seus Domínios , por isso que são
separados pelo mar , protege , c sustenta a Real
Nitreira Artificial , de cuja direcção tive a
honra de ser encarregado , e de que passo a
dar conta.
í"
(i) Além de pequenas porqÕei! de Salitre y que tem vindo
de diversas Capitanias do Brazil, e de Cabo. Verde , em pro-
va de haver nellas este género tão lecommendado aos Gover-
nadores pelo Ministro, e Secretario de Estado da Marinha, e
Domínios Ultramarinos, tem já vindo da Capitania do Seara
%6 avrobas e jo arráteis de Salitre de segunda cozida, preparado
pelo Sargento Mór Feijó , que se acha encarregado das Ni«.
tí€iras d«sta Capitania.
I
C 12
ao»
s E c q A O n.
D
IvuLGADA a particular attenção, que Sua
Alteza Real entrou a dar ao Salitre nos íins
do anno de 1797 , mandando expedir ordens
pela Secretaria de Estado dos Negócios da
Marinha , e Domínios Ultramarinos a todos
os Governadores dos seus vastos Domínios ,
para que fizessem as indagações necessárias so
descobrimento de tão interessante objecto : co-
nhecidos os Reaes desejos de Estabelecimentos
de Nitreiras Artificiaes dentro deste Reino, já
pela publicação , que por ordem sua se fez de
Memorias , que expunhão os actuaes methodos
de construir as mesmas Nitreiras , já pela cons-
trucção , que pela mesma Secretaria se man-
dou fazer (i) de huma pequena Nitreira Arti-
(i) Estas ordens forao expedidas pelo Illustrlssirao e Ex-
celieiítissimo Senhor D. Kodrigo de Sousa Coutinho , então
"^ ^^l^ll
ir
Mal , para servir de ensaio na Quinta (i) de-
nominada do Arco do Cego , e outra na Ri-
beira de Alcântara (2) : Hum Negociante des-
ta Cidade combinado com Luiz Thomaz Reg-
nault , emprehendeo estabelecer junto do Poço
do Bispo , e á borda do Tejo , em o sitio de-
nominado Braço de Prata, huma Nitreira Arti-
ficial, a que deo principio em Janeiro de 1798;
fez conduzir muitos barcos de terra de entulhos ,
€ de lama , bem como os resíduos da queima ,
, que soffreo o palácio do Conde de Valladares ^
formou dentro de hum Armazém algumas pi-
lhas,-ou montes quadrangulares, deixando ain-
da grande quantidade de terra , e lama sem
disposição ; assentou vinte e quatro tinas , para
servirem árega das pilhas, que fazia com agua
Ministro , e Secretario de Estado dos Negócios da Marinha,
« Domínios Ultramarinos. Nada tem escapado ás superiores
luzes , e ao assinalado patriotismo deste sábio e incançavel
Ministro , unicamente oceupado do Servi<;o de Sua Alteza
Real , e de tudo o que pôde contribuir para a seg-uranqa>
prosperidade , e independência da Nação Portugueza.
{O Debaixo da direcção do R. P. M. Fr. José Marlanno
da Conceição Veloso.
(2) Debaixo da direcção de João da Silva Feijó , que
passou depois paia a Gapit.«im» do Seara.
!!■
i
m
Jí
11
passada por iamâ , de qué enchia as mesmas
tinas ; e passados alguns mezes , se dirigio ao
Ministro , e Secretario de Estado da Marinha.
Em Agosto do mesmo anno , tendo noti-
cia do bom estado , em que se achava este
Estabelecimento , me dirigi á Braço de Prata
cheio de satisfação de ver peks sábias Provi^
denciás , e pelo imperioso exemplo do nosso
Soberano encaminhados os seus Vassallos a em-
presas de tão grande importância para a nossa
defensa.
Regnault , director deste estabelecimento ^
me fez ver as pilhas , que havia construído , e
expôz o methodo , que tinha seguido , o qual-
me pareceo conforme aos prineipios Químicos ,
e ao que se acha escrito sobre a formação de
Nitreiras Artificiaes , e que já entre nós era
conhecido , em consequência da publicação ^
que se havia feito por ordem do nosso Sobe-
rano para instrucção pública. Parecêrão-me
com tudo summamente grandes as pilhas , e
com pouco accesso ao ar athmosferico no seu
interior : pareceo-me também , que havia al-
guma falta de substancias animaes , não obs-
tante as razões ^ que em contrario me ponde--
sp?l
f-* jEWTífca* ■
''^^^''■;''^T^%::'
•íffr^inrii-r-viií-
■BHintqij
^3
rou o seu director, cuja prática, e observação
me fazião algum pezo.
Conduzio-me ás casas da sua residência ,
e mostrou-me dous , ou três alguidares com al-
gum Salitre , que disse já ter obtido. Nao sei
expressar o transporte de alegria , que sentio
a minha alma com avista de Salitre, não por-
que reputasse mjsteriosa a sua formação ; não
porque desconfiasse do bom êxito das Nitrei-
ras Artificiaes ; mas por ser o primeiro , que
se me dizia fora delias obtido em Portugal.
Qualquer que fosse o objecto das confe-
rencias , que o Negociante, e Regnault tive-
rão com o Excellentissimo Ministro , e Secre-
tario de Estado da Marinha , em 14 de Agos-
to de 17^8 tomou Sua Alteza Real conta des-
te Estabelecimento , mandando pagar ao Nego-
ciante toda a despesa, que havia feito, a qual
era , segundo a sua conta , de 997<j)p^o reis
ordenando , que continuasse á custa da sua
Real Fazenda , e fazendo-me a honra de me
encarregar da Direcção deste Estabelecimento ^
e de vigiar , e fiscalizar sobre os interesses da
Real Fazenda.
Ficou Regnault no lugar de Mestre da
msmm
^4
Ueal Fabrica , yencendo diariamente 2^^400
reis • e entrou Narciso António da Silva no
lugar de Administrador , não só para se encar-
regar da parte económica da mesma Fabrica ,
assento de todas ;as despesas , e arrecadação
dos seus -utensílios , mas para se instruir nos
processos convenientes ao bom êxito das Ni-
treiras Artiíiciaes , de cuja instrucçâo muito
positivamente foi incumbido o sobredito Mes-
tre.
A admiração , que me causou a desistên-
cia , que o Negociante , e Regnault íizerão da
sua louvável empresa , se desvaneceo , logo
que me disse Regnault , que resolverão não
continuar o Estabelecimento projectado , sem
que Sua Alteza Real lhes concedesse privile-
gio exclusivo para fazer Salitre em Portugal ;
outro igual privilegio para fabricas de Potas-
sa ; as rendas destinadas para a limpeza das
ruas desta Cidade ., e sua calçada , ficando a
ellas obrigados ; e hum empréstimo de 250 ou
300 mil cruzados , segundo a minha lembrança.
Não era possivel , que tão ambiciosas pro-
posições fossem acceitas ; ellas provão , que
erdinariamente os Negociantes só especulâo os
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ineios de aiigmentar conslderaveímente a sua
fortuna; que lhes não importa a quantidade de
numerário, que saJie da sua Nado , para en-
-riquecer as estranhas ; não se lembrao de fo-
mentar a industria Nacional, senão em quanto
<ÍeJla podem tirar maior lucro , do que da in-
dustria Estrangeira ; não se lembrão do aua-
mento da população ; não ol hão para a inde-
pendência do Estado; somente o Supremo Go-
verno he que attende a estes tão interessantes
objectos.
Continuou o trabalho da Real Nitreira ;
forcejei , quanto pude , por aprontar semprJ
tudo o que pedia Regnault , com o fim de
■evitar as desculpas , que podésse dar do mão
successo deste Estabelecimento , tendo sempre
em vista a conducta de ium homem, que tal-
vez não quereria se divulgassem tão interessan-
tes Estabelecimentos , na certeza de que o máo
successo desta Fabrica serviria de estorvo á
plantação de outras , assim como já havia fei-
to parar as duas pequenas Nitreiras de ensaio
acima mencionadas, por se julgarem supérfluas ,
ficando assim illudidas as sábias vistas do nosso
Augusto Soberano, e os sacríficios da Real Fâ-
-^'vs':^*i
:*^í:&^.,g^^^Smf^vf0^m:*»ííl0'Jl
^6
zenda. Cresceo a minha desconfiança com os
mysterios , e segredos de Regnault , e com a
absoluta opposiçâo , que fez á instrucçáo do
Administrador , que tão positivamente lhe ha-
via sido ordenada , a ponto de lhe occultar os
seus areometros , para evitar que por elles não
construísse hum , que projectara para seu uso ;
.cresceo a minha desconfiança peia opposiçâo ,
que sempre mostrou a fazer-se hum ensaio das
terras da Nitreira , para conhecer-se o seu es-
tado , e a sua riqueza salitrosa , não obstante
os desejos do Excellentissimo Inspector deste
Real Estabelecimento , dando em desculpa,
que a putrefaçao ainda não estava completa,
çern se lembrar do Salitre , que muitos raezes
gates me liavia mostrado.
Áttendendo porém ,' a que sem paciência ,.
e sem tempo não se podia obter , o que devia
ser obra da Natureza ; que em todas as partes
da Europa , onde havião Estabelecimentos des-
ta qualidade , gastarão muito tempo as terras
novas a nitrificar-se , suspendi o meu juízo,
até que tivesse mais sólidos fundamentos. Es-
tes com effeito apparecêrao ( I ) por occasiao
(i) Persuadido Regnault de ter acabado a sua pensão dia-
í^SÍBÍí'**?^-^"-;;- '•íil'-í'MSl,'-;^-*^|^r^.-)rr -f^^" '^^í-.*
^■y^aTiffng^
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27
da ordem , que recebi em 17 de Janeiro de
1800 para fazer parar o trabalho da Real Ni-
treira , que até então havia dispendido 3829(^5' 1 3
reis, como consta dos Livros dos assentos res-
pectivos. ;^,
Por novas Ordens , que recebi em 9 de
Março do mesmo anno , continuou o trabalho
deste Estabelecimento sem a presença de Reg-
nault. Immediatamente emprehendi hum ensaio
das terras , para conhecer qual era o seu esta-
do de Nitrificaçao. Fez-se este ensaio em casa
de A^Ianoel Ferreira da Camera e Betaneourt,
cujos talentos , e luzes são bem conhecidos ; e
delle resultou concluirmos, que aNitreiraReal
ainda se achava muito atrazada , se bem que
íiâo nos devíamos desanimar , pondo-se em
prática todos os meios mais próprios á Nitriíi-
cação.
Passei a fazer todas as alterações , que
julguei convenientes ; diminuio-se a grandeza
das piilias ; çonstruírão-se outras de novo com
íta de 2(;^4po reis, entrou a declamar contra este Estabelecí-
nieuto , dizendo , que nunca se obteria Salitre ; que havia
obstado á sua formaqao ; e que as terras alli accurauladas , sé
SLervirlão pára al^um jardim.
D ii
1L%
a cautela de se separarem as suas camadas por
meio de grades de madeira , para que ficasse
livre o accesso do ar ao seu interior j entrei a
fezer grande uso de sangue de boi , e de uri-
na na sua rega , e construcçao feita por ca-
madas de terra dos entulhos , e lamas com
sufíiciente parte calcarea , e Tabaco podre , sen-
do cada camada de per si regada com bastan-
te sangue, e urina, para entreter a humidade
conveniente á putrefaçao j e para conciliar na-
casa das pilhas o gráo de calor necessário,
nâo somente sefizerao pequenos montes de Ta-
baco podre nos espaços intermédios , mas pro«^
curou-se conservar fechadas as portas da mes-
ma casa , o mais que permittia o trabalho ,
sendo aliás muito conveniente o conservar-se a
ar quasi estagnado , para se evitar a perda do
azoto antes da sua combinação com o oxigeno*
Por este methodo era de esperar a forma-
ção do Nitrato de Potassa ou Salitre , e dos
Nitratos térreos : a putrefação das substancias
animaes , e vegetaes feita em huma athmosfera
húmida , e quasi estagnada , não podia deixar
de dar origem á formação do Acido Nitrico^,
© qual combinando-se comi a Potassa , que en--
1^
^9
contrasse, ou com as terras calcarea , e mag- . mi
nesiana , formaria o Salitre, e os Nitratos ter- m
reos , que facilmente se mudarião em Nitrato
de Potassa. Com effeito passados alguns mezes
de trabalho , depois de remechidas as pilhas
por muitas vezes , com o fim de apresentar á i!(
athmosfera differentes superfícies , entrei a achar '
nas terras algum sabor salitroso , ainda que
muito carregado de Sal marino ou Muriato^
de Soda.
Tendo feito grande uso do Tabaco podre ' \]
na construcção das pilhas , já com o fim de i
ajudar a putrefaçao , já com o fim de augnien-
tar o calor , já finalmente com o fim de intro-
duzir-lhes bastante Potassa , na persuasão, de ' I
que delia abundava o mesmo Tabaco, confor- \
me a opinião dos Químicos , que o haviap
analysado , tive occasião de persuadír-me do
erro , em que me achava analysando as suas
cinzas : em vez de Potassa achei huma grande
quantidade de Muriato de Potassa (i) : entrei
^ ^ ' :'/
(i) Penso, que na factura do Tabaco- em rolo fazem no :(
Brazil algum uso da agoa do mar ; ou talvez, que a recebeo ij
no seu transporte a- esta Cidade : para me decidir , mandei
vir hiim» porção de Tabaco em folha , e ejn rolo preparada, (
à :.
30
a recear o uso, que havia feito do Tabaco po-
dre , visto que tinha introduzido nas pilhas
hum sal neutro, que talvez complicaria , quan-
do não obstasse o successo desta empresa j via-
me com huma grande provisão do mesmo Ta-
baco , que entrava a parecer-me inútil j e para
me decidir no embaraço , em que me julgava ,
recorri ás leis das afjBnidades dobradas : consul-
tando as taboas das affinidades dadas por Four-
croy , resolvi o problema , suppondo o Nitrato
Calcareo , e o Muriato de Potassa ; achei a
somma das affinidades divellentes igual á som-
ma das affinidades quiescentes : o mesmo mç
aconteceo , suppondo o Nitrato de Animonia-.
CO e o Muriato de Potassa ; felizmente não
parando aqui , consultei as taboas das affinida-
des incertas por Morveau nos Annaes de Qui«
mica ; resolvi por ellas os mesmos problemas ;
e achando no primeiro caso a somma das affi-^
nidades quiescentes igual a 76 , e a das divel-
sem agoa salgada , e condiazído Com toda a cautela , paia exa-
minar se com effelto contém o Muriato de Potassa , como
achei no Tabaco podre : brevemente darei conta do resultado
desta analyse , pois acabo de receber o Tabaco , que mandai
ník ^e "Gabo Verde.
-^."SSSCr -^:_ ,ir >■- - - — "-
■-v*-<jb^TBate- •
V-r.-^^--._^U
31
Jente» igual agi; no segundo caso aquellas
igual a 7O5 e estas a 79 , dei por acertado o
uso, que fiz do Tabaco podre, no que ainda
mais me confirmei com o resultado de huma
experiência , que para esse fim passei a fazer
directamente.
Tomei este trabalho , e me tenho demo-
rado com a sua exposição , por que reputo o
Tabaco podre em muito valor para a Real Ni-
treira ; com elle se promove a putrefaçao ; evi-
ta-se a grande despesa , que exigiria a compra
de Potassa (i) , em razão do seu grande con-
(i) Não esqueceo ao Illustrijslmo e Excellentissimo Se-
nhor D. Rodrigo de Sousa Coutinho o auxiliar a Real Nitrei.
ra com Potassa a bom preço : com este fim me ordenou , que
examinasse o prec^o , por que nos ficaria a Potassa extrahida
do sarro do vinho, tão abundante no nosso paiz, e que quasi
geralmente he desprezado , por se ignorar o seu préstimo.
Mandei vir do Porto huma porção de Sarro , e fiz varias ex-
periências : delias conclui , que cem arrobas de Sarro de vi-
nho davão trinta arrobas de Potassa cauitiea ; e que só neste
objecto se podia ter hum lucro de 124 por cento, como mos-
trei na conta, que dei em 51 de Dezembro de 1799.
Suppondo o consummo da Potassa em Portugal ser de doze
mil arrobas por anno ( o que certamente he muito pouco ,
Jembrando-nos das muitas Fabricas de Estamparia, Branquea-
ria, e Tinturaria, que temos, do grande consummo, que só-
mçntc delia faz a Fabrica dos Vidros, e do consuramo Faima»-
mÊÊÊÊmÊÊÊmÊmmm
3^
summo nas Branquearias , Vidrarias , Saboarias ,
&c. 5 sempre tem considerável preço ; evita-se
a despesa de combustivel , objecto , que seria
de summa ponderação.
ContinuGu~se o trabalho das piUias, e fiz
conduzir para a Nitreira algumas terras de en-
tulhos e provenientes de ruinas de edifícios
velhos , e dos que forao abatidos pelo terremo-
to de 1755': terras tiradas das Cavalharices do
Regimento do Cães , que para isso forao des-
calçadas , e outra vez renovadas á custa da
Real Nitreira , reputando-as pelo voto unanime
de todos os Químicos , como as mais apro-
priadas a este género de Estabelecimentos ; ai-
trei a prover-me de tinas de madeira , dispon-
do-me para principiar a lexiviaçao j fiz assentar
pelo methodo de Rumford huma Caldeira de
ceutíco êcc.) he de admirar, que não tenha havido quem em»
prehenda entre nós huma Fabrica dePotassa, que certamente
dará grande interesse ao Emprehendedor , e não pequeno á
Nação , por nella ficar todo o cabedal , que annualmente le-
vão os Estrangeiros em troco de Potassa. Para que lhes ser-
virá o Sarro , que comprão no Douro , principalmente os In»
jlezes, e mandão conduzir do Porto? Certamente lhes serve
para extrahirem delle a Potassa , e o Tartarito acidulo de Po-
tassa , que depois nos vendem com grande lucro seu.
-«iSn . — i.t'ê<íf
33
Cobre de ires palmos de altura , cinco de diâ-
metro no fundo ,65-6 i de diâmetro na bo-
ca , cuja caldeira leva proximamente 44 almu-
des de liquido : fiz peio mesmo methodo as-
sentar outra , que leva 65- almudes , acommo-
dada porém a grellia , e o fogão ao uso do
Tabaco podre , que devia servir de combustí-
vel : assentou-se outra Caldeira pequena de cin-
co almudes , para servir aos ensaios , e ajudar
também a evaporação : construio-se huma (bran-
de barraca cuberta de palha, para nelia se re-
mecherem as terras , que se fossem tirando da
superfície das pillias , e as terras das cavalhari-
ces , com o fim de acabarem de se oxigenar
e para nos seus lados se assentarem as tinas de
lixiviação : assentárão-se estas , dispostas conve-
nientemente á passagem das agoas , e ,á sua
concentração.
Concluídas estas disposições , principiou a
lavagem das teiras , e a evaporação das lixí-
vias , que chegadas ao gráo conveniente de
concentração, e de pureza, passarão ás tinas ^
que forão destinadas na mesma casa das Cal-
deiras para a cristalização, e principiou-se a
colher Salitre neste Real Estabelecimento,
34
Para nao augnientar mais a extensão des-
ta Memoria , deixo de referir os processos,
que se seguirão até á cristalização do Salitre ^
e os meies, que se pozerao em prática, para
evitar alguns embaraços , que occorrêrao : se-
ria repetir operações Químicas muito triviaes ,
ç que se devem julgar sabidas ; pela mesma
razão deixo de entrar em as theorias da for-
mação do Salitre, na analyse do Acido Nítri-
co, na anaijse das substancias animaes, e ve-
getaes , que sê empregão na construcçao das
plliias , e em outros objectos , que só servi-
rião para ostentar conhecimentos Quimicos.
Por tanto findarei esta segunda Secção,,
fazendo unicamente menção do dia 13 de A-
gosto-dfe 1801 3 dia, em que havendo Sua Al-
teza Real incorporado com a Fabrica da. Pól-
vora , e Refinação do Salitre a Real Nitreira^
Artiiicial de Braço de Prata , a ella foi o H-
lustrissirao e Excellentissimo Senhor D. Ro-
drigo éè Sousa Coutinho , que em satisfação
das ordens do nosso Augusto Príncipe e Se-
nhor havia sustentado , e promovido este Real
Estabelecimento , de que fora até então Inspe-
ctor y em companhia do Illustrissimo e Excel-
¥»fcÍTt.fa.i
■»."J <»1* ti *'L n,f ^ '*!»- •
-5»!ie*»BÍBfc:
35*
lentíssimo Senhor D. João de Almeida de Mel-
lo e Castro, a cuja inspecção devia passar.
Acharão estes Excellentissimos Ministros
e Secretários de Estado a Real Nitreira Arti-
iicial na sua actividade de costume ; acharão
as duas Caldeiras grandes , e a pequena em
evaporação, sendo duas sustentadas unicamen-
te pelo fogo do Tabaco podre , aquelle mes-
mo Tabaco , que antes do Estabelecimento da
Real Nitreira era julgado inútil , e fazia an-
nualmente de despesa 600 a 700 mil reis á
Real Fazenda , por cuja conta se mandava
queimar no Alfeite (i) . Acharão muitas tinas
com SaUtre cristalizado , e vários caixões com
Salitre anteriormente obtido ; examinarão os
diários , que se fazem na mesma Nitreira , dos •
quaes constava ter-se obtido entre 10 a 12 ar-
robas de Salitre por semana , o que me fez
avaliar em 40 arrobas o seu producto mensal y
visitarão a barraca das tinas de lixiviação ,
:bem como a palhoça a ellas destinada , e ao
(i) Ao estabelecimento da Real Nitreira se deve esta
economia; delia porém me não sirvo para mostrar a sua titU
íidade á Real Fazenda, como adiante se verá,
£ U
i?i'<
3á
complemento da oxigenação das terras das pi-
lhas , e de cavalharice ; acharão 1 6o tinas de
madeira arranjadas competentemente para a li-
xiviação das terras , e concentração das lixí-
vias , além de outras occupadas com escumas ,
ou enterradas , para deposito das lixívias con^
centradas , e das agoas , de que se faz
uso 5 passando todas de 270 ; entrarão na casa
das pilhas j e não obstante o perigo , e incom-
modo , a que se expunhão , pelo nauseoso , e
insoportavel cheiro desta casa , em consequên-
cia da podridão das substancias animaes , e ve-
getaes, que nella tem lugar, virão, e obser-
varão as pilhas ^ que se achavao construídas ,
e as; que se renovavao.
Satisfeitos com a boa ordem deste Real
Estabelecimento , e com a vista , e exame da
ssu producto salitroso , que então era de 40
arrobas por mez ; e que attendida a despesa
annual da mesma Nitreira , ficava custando
eada arroda de Salitre 375'! reis ^ se retira-
rão , deixando-nos muito satisfeitos com as suas
obrigantes expressões , e tendo, annuido a al-
gumas propostas , que fiz relativas a objectos ,
que julgava necessários para o progresso da
Nitreira, sendo as princlpaes duas barracas in-
dispensáveis para se aiigmentar o numero das
pilhas , e segurar-se as futuras colheitas de Sa-
litre , cujas barracas não obstante terem sido
logo mandadas fazer , até ao presente nem
principiadas estão , com bastante prejuízo das
futuras colheitas , e mágoa minha , se bem que
já devia ter-me acostumado a semelliantes de-
moras , que desde a origem deste Estabeleci-
mento me tem atormentado , e a que certa-
mente he devido o não estar em muito maior
adiantamento (i).
li
(i) He inexplicável a difficiildade , que se encontra na
plantação de hum novo Estabelecimento. Apezar das ordens
mais positivas , que constantemente deo o Excellentissimo
Inspector desta Real Fabrica desde o seu principio , para s©
apromptar tudo o que fosse necessário para o bom êxito desta
empresa , forão tantas as demoras na sua execução r passava-se
tanto tempo em se ministrar , o que se pedia com prejuízo,
real da economia da mesma Fabrica i fizerão-se tantos pro-
nosticos do seu máo successo í exagerárão-se tanto as despe-
sas, que se fazião : que por vezes teria desanimado , se não
fosse o desejo de fazer este serviqo a Sua Alteza Real , se
não podésse responder , que nenhum lucro pessoal tirava da
sustentação desta Fabrica, pois que na sua despesa não tinha
parte alguma : e se não fosse vigorosamente animado pelas
sábias, e patrióticas reflexões de hum Chefe, que desprezava
38
Continuou o trabalho da Real Nítreira
até ao presente do mesmo modo ; e findou-se
o anno de 1801 com a despesa de 2670818
reis 3 sendo a total despesa desde a origem
deste Estabelecimento , como consta dos respe-
ctivos Livros, que nelle servem, de 7202536
reis , e ficando encaixotadas , e promptas a se-
rem transportadas á Real Fabrica da Refina-
ção de Alcântara 210 arrobas de Salitre.
as vozes da ignorância , e da calumnia , persuadido do bom
successo do seu projecto, e fundado nois conhecimentos, que
tão amplamente possue.
1S»<fi^i,r.^^■.^.,,■\■■.-
'•-4tM,±AtX»i^'
39
HOasSBBBSBSSBa
s
s E c q  o iir.
Endo a collieita mensal de Salitre na Reaí
Nitreira Artificial de Braço de Prata de 40
arrobas , como já tem sido , e pôde continuar
a ser constantemente, huma vez que haja tra-
balho seguido 5 que se empreguem terras pró-
prias y que se construao as duas barracas , e
que haja huma , ou duas caldeiras de reserva,
para se nao interromper , como já aconteceo ,,
a evaporação , no caso de se inhabilitar algu-
ma das outras , que devem estar em contínuo
trabalho j e sendo a despesa média de hum
anno 1 800634 deduzida da total despesa , que
se tem feito em quatro annos seguidos desde
1798 até fim de 1801 (i) , ficará cada arroba
(r) A. despesa do anno de 1798 foi de .
. 1708} 90.
de 1799 • . .
. 205J12J.
de 1800 . » .
. 76800J.
de 1801 . » "
2670818.
Despesa dos 4 annos .
. 72025560
S por consequência a despesa media de hwra
anno será de ,. *. . ,...»«.
, iSoo6j4..
f'^m^:m^^i:
40
de Salitre bruto feito ria Real Nitreira impor-
tando em 3751 reis (i) , eterá a Real Fazenda
hum lucro de 212 porcento, reduzindo aPol-
(r) No tempo da luminosa administração de Necker no
$. XI. do Regimento das Nitreiras , e Fabricas de Pólvora,
publicado em 5 de Setembro de 1779, se promette pagar aos
Salitreiros , que fornecerem Salitre Nacional obtido das Ni-
treiras Artiíiciaes a lo soldos por libra de pezo ; o que dá
2560 reis por 32 libras de pezo ; e fazendo a reducqao das
libras Francezas aos arráteis Portuguezss, suppondo que 1,022
libras de pezo de França corresponde a 1,094 arráteis de Por-
tugal , temos que j4,2j arráteis Portuguezes de Salitre se
compravão por 2560 reis, e por tanto cada arroba Portugueza
custava 2592 reis, com tanto que não desse de quebra na re-
finação de três lavagens mais de 25 por cento.
No anno de 1800 comprou o nosso Governo 57J quiu-
taes de Salitre vindo de Goa por 126125 59 reis , e por tanto
cada arroba custou jjoj reis.
No Moniteur de 16 de Junho de iSoj numero 267 se lê,
que o Governo Francez acaba de estabelecer o preço de dous
francos por cada kilograma de Salitre , que os Salitreiros de
França levarem aos Estabelecimentos Nacionaes. Fazendo a
reducção da moeda Franceza á nossa, suppondo hum franco
igual a 160 reis, e dos kilogramas a libras Francezas , na hj'-
pothese de ser hum kilograma — 2,044 libras Francezas, re-
■duzindo também as libras Francezas aos arráteis Portug^uezes,
temos que o Governo Francez compra cada arroba de Salitre
por 4680 reis, não obstante as Nitreiras Artifieiaes da França
serem tantas , e se acharem estabelecidas ha tanto tempo.
He de admirar , que o primeiro Salitre , que se obteve
íiaE.eaI Nitrçira Artificitl jáe Brgço.de P«ta j venha a tio
ífiA^áM
4f
vora as 4S0 arrobas de Salitre produzidos na
Real Nitreira em lium anno , sendo esta ven-
dida pelos actuaes preços, como passo a mos-
trar. Sendo certo , que com 75: arrobas de Sa-
litre refinado , > dez arrobas de enxofre puro , e
quinze arrobas de carvão , se fazem cem arro-
bas de Pólvora da melhor qualidade (i) , dan-
do 25- por cento de quebra na refinação do Sa-
litre bruto da Real Nitreira (2) ,0 que he
muito de sobejo , calculando o preço de cada
arroba de carvão a 480 reis , e o do enxofre
refinado a ^60 reis (3) , orçando a despesa do
baixo preqo. Consta-me , que ha pouco se comprarão 500 e
tantos quintaes de Salitre por 5000 reis cada arroba , preço
reputado bom em tempo de guerra,
(i) Dose ultimamente adoptada 11a Real Fabrica de Bar-
carena pelo Inspector do Arsenal Militar o CavaUeiro de Na-
pion , a quem se deve a aetual perfeição da nossa Pólvora ,
como era de esperar das suas grandes luzes , e superiores co-
nhecimentos Quimicos.
(2) Esta quebra he superior á que tenho achado , e á que
se achou na Real Fabrica de Alcântara , segundo a informa-
ção , que a esse respeito deo o Coronel Raposo.
(j) Nos Armazéns de Alcântara se achão 14210 quintaes
de Enxofre, que custou a 480 reis por arroba; mas quero sup-
pôr a 960 reis para maior segurança, e para a despesa, e que-
bra no seu refino. O carvão fica á Real Fazenda por 120 reis
cada arroba : mas eu o avalio pelo quádruplo , attendendo á
F
mig0g/00imtmmm
combustível, e mao de obra das duas Fabricas
do refino de Alcântara , e Pólvora de Barcare-
na , em Jium conto de reis para a factura de
■470 arrobas de Pólvora , e dando de quebra
10 arrobas nas 480 arrobas de misto (i) , te-
remos
perfeição , com que actualmente se prepara , e á que em
grande parte se deve a bondade da Pólvora. Estes preqos fo-
rão deduzidos dos Livros, que servem na Real Fabrica de Al-
cântara: o augmento, que lhes dou, também respeita á per-
da, que costuma haver em ser moido, e peneirado, a qual an-
da em I quarto porcento no Enxofre; 2 por cento no Carvão ;
I oitavo por cento no Salitre , segundo as informaíjôes , que
obtive, quando visitei a Fabrica de Pólvora de Barcarena, e
examinei os iseus processos.
(i) Também me constou , que a perda da Pólvora depois
das tarefas promptas até embarricar-se , costuma ser de 2 poF.
«ento : o orçamento , que faqo, he certamente muito forte;,
pois elle suppÕe, que nas duas Fabricas se faz de despesa an-
nualmente para se fabricarem 220000 arrobas de Pólvora , 155-
mil cruzados: pelo exame, que fiz na Fabrica de Pólvora de-
Barcarena, a despesa annual me consta-, que anda por 25 mil-
cruzados : a despesa da Fabrica do refino de Alcântara certa-
jiiente he muito menor; por tanto poderia suppôr, que a de
ambas nao excede a 50 mil cruzados : más para evitar toda,
e qualquer objecção , que possa ser lirdida por aquelles, que
são inimigos de Estabelecimentos novos , e de que pouco , ,
«u Hada entendem, fiz o sobredito orçamento.
Mr.-ÍJtVa
^^^'i^jímJim
43
480 arrobas de Salitre bruto, que sendo re-
finado com a quebra de 25' por cento ,,
darão .... 3 60 arrobas
1800634
Enxofre refinado , . 48 . .
46080
Caryão .... 72 . .
345'óo
480
Combustível, e mão
de obra das duas
Fabricas .......
1000003
Quebra • na factura da
Pólvora ... 10 . .
0
Custo das 470 arrobas 2881 274
As diversas qualidades de Pólvora , sendo boa
a proporção dos elementos , que a compõe , e
sendo estes bem preparados , e conveniente-
mente trabalhados , só dependem da grande-
za , e perfeição do seu grão : esta se obtém
por meio de crivos , ou peneiras de differente
malha ; ao mesmo tempo que se faz a Pólvora
de guerra , se faz a fina , e a superfina : so-
mente ha hum pequeno , e insignificante traba-
lho de se alizar , e lustrar os grãos da fina , e
superfina , depois de terem passado pelas pe-
neiras da malha , que lihes he própria.
F ii
'1"^' "• " '""^'^"^" ' ' -i. .rui- r-, - -|^,
WÊÊÊ
MMHMMMMi
tf
44
Por tanto pa^so a calcular o valor das
470 arrobas de Pólvora , suppondo , que se
obtém 314 arrobas de Pólvora fina, e 156 ar-
robas de Pólvora de guerra , visto que são di-
versos os preços (i) , por que actualmente se
vende, não contando a sua venda por miúdo,
que deixa muito maior lucro , e visto que na
factura da Pólvora se obtém hum terço de Pol-
Yora grossa , e dous terços de Pólvora fina.
314 arrobas de Pólvora fina a
1^235' reis por arroba . . 60397^0
156 arrobas de Pólvora de guer-
ra a 18375- reis por arroba . iSóó^oo
Preço da venda das 470 arro-
bas de Pólvora ..... 89062^0
Custo • . 2881274
6025016
(i) Por huma relação, que me foi dada na Real Fabric»
de refinaqã.o de Alcântara em 9 de Janeiro de 1802, os pre-
gos, por que se vendia então a Pólvora, erao os seguintes.
Feio grosso.
J Barril de 2 arrobas de Pol-
vora 6na . J97J0 reis.
J Dito de Pólvora de
guerra . J6750 reis.
Feio miúdo.
i Arrátel de Pólvora do Prín-
cipe ., . . II 70 reis.
I Arrátel de dita fina 750 reis.
I Arrátel dita de^guerra 675 reisí.
têUSm
lllgpll^-l
■iiii wtL^iaiaaiW
mtmn
4f
Lucro , que dá por anno a Real
Nitreira ^025016
Cujo lucro corresponde a 205?
por cento.
Tomando porém o anno de 1801 , que foi o
da maior despesa , teremos que as 480 arro-
bas de Salitre custarão . , . . 2670818
Por tanto as 470 arrobas de Pól-
vora , que com elle se pode
fazer, custarão 375'i45'8
E sendo o preço da sua venda . 8006200
O lucro , que dá a Nitreira por
anno , sendo avaliada a sua
despesa futura pela do maior
anno, será S^S4^^
Cujo lucro corresponde a 137
por cento.
Na primeira hypothese em hum anno , dous
mezes, e dez dias , ficará paga toda a despe-
sa , que consta dos Livros da Real Nitreira
ter-se feito desde o seu principio ate o íim do
anno de 1801 , que Jie como já disse de
72025-36 réis. Na segunda hypothese são ne-
cessários hum anno , quatro mezes , e vinte e
três dias.
il
4é
Siíppondo porém , que o actual preço,
por que se vende a Pólvora , passa a ter hum
abatimento de 30 por cento , isto lie , que a
Pólvora fina se passa a
vender por . . . 13912 reis ^ por arroba
a de guerra por . 12666 reis ^ por arroba
as 470 arrobas de Pólvora darão . 6^44^00
Custo na primeira hypothese . . 2881274
Lucro, que corresponde a 120 por
cento • 34^3^^^
E na segunda hypothese , em que se toma a
despesa do anno maior com o mesmo abati-
mento de 30 por cento na venda da Pólvora,
dará de lucro annual .... 2$^S°4'^
que corresponde a 6^ por cento.
Em tal caso na primeira hypothese com
o abatimento de 30 por cento , em dous an-
nos e vinte e oito dias ficará paga a despesa
de 72025-36 reis feira até o fim de 1801.
E na segunda hypothese , em que se to-
ma a despesa annual futura pela maior , que
houve nos quatro annos antecedentes , e com
o mesmo abatimento de 30 por cento na ven-
da da Pólvora , sao necessários dous annos,
nove mezes , e nove dias.
TT
jmim
■■
N
47
He certo , que a despesa da Real Nitreí-
ra desde o seu Estabelecimento não he somen-
te de 72025-36 reis ; esta he a despesa , que
me consta peJos Livros dos assentos da mesma
Nitreira ; neJla não entrão os custos das ferra-
mentas, tinas, e caldeiras, que tem sido mi-
nistradas pelo Arsenal Real da Marinha ; bem
como a despesa da construcção da barraca ,
cuberta de palha, ou caniço, pois que não te-
nho noticia do seu custo : este porém não pô-
de ser muito : as tinas quasi todas forão feitas
de pipas velhas , e que já não podião ter ou-
tro uso 3 estou persuadido , de que não passará
de 800000 reis: mas quero suppôr francamen- -
te 3600000 reis..
Também he certo,, que se comprou o ter-
reno , em que existe a Real Nitreira com dous,
Armazéns e algumas barracas por 22000000
reis. Mas como hum destes^ Armazéns , e o
melhor não foi entregue ao serviço da Real
Nitreira , por se achar no tempo "'da compra
arrendado a hum Negociante de Vinhos por
450000 reis por anno ; e findo o arrendamen-
to, teve outro destino, reputarei a compra fei-
ta por causa da Real Nitreira , ou em seu pro-.-
MMwniniii
Vi
48
veitOj somente em 15'ooocoo reis, descontan-
do 7000000 reis pelo valor do Armazém ,
que não occupa.
Em tal caso temos
Despesa feita na Real Nitreira . 72025-36
Despesa orçada , e feita na Ribeira . 3600000
Compra do terreno, e Armazém . 15000000
Despesa total ... 25802536
Nâo obstante porém este Capital empregado
pela Real Fazenda , o lucro , que annualmente
pode dar a Nitreira Artificial , a que foi desti-
nado , vale bem este desembolso.
- Com effeito 2593042 reis , que annual-
mente pode dar (i) a Real Nitreira, como já
tenho mostrado , lie o juro de 5 por cento de
51860840 reis, ou de 129 mil e tantos cruza-
dos, mais do dobro, do que tem desembolsa-
do a Real Fazenda : e com esta renda annual de
259 3042 reis ficará paga da quantia de 25 8025 3 6
(i) Tomando-se a despesa annual futura pela maior , que
tem havido nos annos antecedentes, e suppondo-se , que haja
hum abatimento de trinta por cento no preqo , porque actu-
ahnente se vende a Pólvora: de propósito escolho o caso mais
desfavorável.
! —.JUJa!— ■■l.._JLJ Ji!^-^^
49
reis em nove annos, onze mezes, e doze dias;
ficará com o Armazém , barracas , terreno,
em que existe a Real Nitreira , e todos os-
utensilios ; e continuará , passado este tempo ,
a perceber a sobredita renda liquida annual-
mente.
Se porém quizermos que a Real Fazenda
receba não somente o Capital , que tem des-
embolsado , mas também os seus respectivos
juros de 5 por ^ , nem assim mesmo se pode-
rá deixar -de reconhecer a utilidade deste Esta-
belecimento. Por quanto he claro , que sup-
pondo c o Capital desembolsado , e que deve
canhar o juro r correspondente á unidade no
fim de cada hum anno , a fórmula conhecida
c ( H- r)« mostrará o valor do Capital, ju-
ros , e juros de juros no fim do numero ';/ de
annos.
Também he claro , que pagando-se an-
nualmente huma certa porção a com o fim de
se conseguir , passado o mesmo numero n de
annos, a amortisaçao da divida, a somma da
progressão geométrica,
H ^? ( I : I 4- r : ( i-H r ) 2 : (i + ;.) j : . _.
G
mostrara quanto se tem pago com a annuidade
a em ;; de annos.
Ora a som ma desta progressão lie
a( I -j-r ) -^ ; e como suppomos , que com a
r
annuidade a se amortisa a divida , teremos
r
cr(,i -\-rf =:a (i-hr )1.a
c r >-' a a ^ cr
e tomando os logarithmos
nl.{i-^r)=-l.a --l.{a ^cr)
^__ l.a-l.^a-cr^
mas como no nosso caso temos c = 25'8o25'36
a-=- 2593042
r~ .... 0,05"
fazendo as substituições, teremos
7.25^9:^042 -/. 1 302915'
" /. 1,05
6,4l38oQS' "6,1149161
OP211893
2988934 _
;? —
tv.K^p^
*CXHMNMâè«MMMir .
Logo em 14 annos, hum mez , e 8 dias
a Real Fazenda perceberá o Capital , que des-
embolsou , e o seu respectivo juro de 5- por
~ ; e passado este tempo , lhe ficará de graça
tudo o que pertence á Real Nitreira , e conti-
nuará a perceber delia a renda annual e hqui-
da de 255)3042 reis.
He claro , que no espaço de vinte annos ,
seis mezes , e onze dias , continuando a mesma
renda annual , perceberá a Real Fazenda o
Capital 328025-30 reis , e seu respectivo juro
de 5- por cento. Em tal caso ficará a Real
Fazenda embolsada também da quantia de
7000000 reis , que deduzi do total da com-
pra , que fez , visto que a Real Nitreira não
occupa hum Armazém , que entrou na mesma
compra ; e passados os vinte annos, seis me-
zes , e onze dias , terá huma renda liquida , e
annual de 25-93042 reis , e deverá ao Estabe-
lecimento da Real Nitreira o possuir tudo , o
que por causa delia comprou.
O progresso , que seguramente se deve
esperar desta Real Fabrica, visto que as futu-
ras colheitas de Salitre devem ser muito mais
ricas , e pelo menos as supponho de éoo ar-
G ii
w
robas annualmeníe (i) , liuma vez que a eílas
se attenda convenientemente , que lucro não
promette á vista do exposto , e de ter suppos-
to somente 480 arrobas de Salitre ? As terras
das Nitreiras Artiíiciaes cada vez se tornao
mais ricas , se bem que não sejão inexhauri-
veis , tendo mostrado a experiência , que pas-
sados dez annos j nada produzem ; mas duran-
te este tempo , se deve ir fazendo provisão de
novas terras, que durarão por seu turno outro
tanto tempo.
Penso ter-me demorado sobejamente na
demonstração do lucro, que dá a Real Nitrei-
m ^ estou persuadido , de que ainda que ella
nao desse presentemente nem dous por cento
(i) Por huma participação , que me fizerao os dous Ad-
ministradores da Real Nitreiía Narciso António da Silva ,. e
Anton-io José Tbomaz da Gosta , de que dei conta á Real Jun-
ta da Fazenda do Arsenal do Exercito , consta , que a lava-
gem das terras da Real Nrtreira, que se achavão nítrificadas ,
produzio 515 arrobas e 24 arráteis de Salitre bruto. Espero,
que as futuras colheitas sejão mais productivas , e sem inter-
rupção r pois que a primeira lavagem foi da terra de 20 pi-
lhas, ou montes, que enchiao o único Armazém que havia,
e agora se achão construidas no antigo Armazém , e ivovo Te-
lheiro, mandado fazer pela mesma Real Junta» h pilhas.
3&?fi''^sssara'i ■
4^
s
ss
de toda a sua despesa , ninguém seria de vo-
to , que fosse abandonada ; todas as Fabricas
no seu principio dao perda j isto he , não dão
lucro algum do Capital empregado.
A importância porém , que dou a termos
Salitre de nossa lavra , he tão grande , que
não posso deixar de demorar-me ainda sobre
este objecto.
O Decreto de 165-4 do Senhor Rei Dom
João IV. e a Apostila de 16^9, provão, que
já possuímos Feitorias de Salitre. Qual seria o
motivo de tão funesta perda ? Talvez que dk
ainda possa ser a causa de tornarmos a aban-
donar tão útil, e necessária empreza ; o lucro
apparente muitas vezes decide de estabeleci-
mentos importantíssimos -, assim creio, que a-
conteceo no tempo daquelle Monarca. O po-
der ter Pólvora mais barata feita com Salitre
estrangeiro , resolveo a Carlos I. a abandonar
as suas Nitreiras , provavelmente allucinado
pelas razoes dos Negociantes Inglezes , que na
franqueza do commercio do Salitre , e Pólvo-
ra vião meios de ganhar extraordinariamente ,
e de supprir as necessidades , que o Estado'
tinha destes géneros , fícando-lhe também por
menor preço , do que d'antes.
/.
54
O mesmo penso ter acontecido no tempo
do Senhor Rei D. João IV. Monsenhor Assi ,
que á custa de summo trabalho , e despesa tem
feito huma collecçao de importantissimos ma-
nuscriptos , teve a bondade de communicar-me
huma copia do assento da Pólvora , e Cobre
feito no anno de i ó^^» , pelo qual Simão Fer-
reira Luçano, e outros se obrigarão a fornecer
por anno a Sua Magestade dous mil quintaes
de Pólvora a preço de 17200 reis cada quintal
Portuguez , que importarão em 34400000 reis :
este diminuto preço da Pólvora estrangeira ,
deixando certamente grande lucro aos Negoci-
antes importadores , foi talvez julgado também
conveniente a Sua Magestade , a quem pro-
vavelmente a Pólvora feita com Salitre das suas
Feitorias , que havia animado pelo sobredito
Decreto de 16^^ , ficava por mais de 4300
reis cada arroba.- Que prejuizos porém se não
seguirão deste apparente lucro ? Perdêrão-se as
Feitorias de Salitre , a ponto de já não haver
a menor lembrança delias ; perdeo-se a inde-
pendência de tão essencial género para a nossa
defensa , objecto , que devia merecer muita con-
templação, até porque pelas condições 9 e 10
do contrato, que então íizerão, ficarão os Ne-
Í:»Í '*»■!»*> «*■-•■- «:-^.2^í'íC'';'- 'JiCÍJSVaí-
'ÍTl I ■ mmmàiimmffmwm^
Si
gociantes importadores desobrigados do forne-
cimento da Pólvora , havendo guerra com Hol-
landa , e Hamburgo , e estando bloqueados os
nossos portos ; perdeo-se este ramo de indus-
tria Nacional ; por anno se perderão sem lucro
algum dos Portuguezes 34400000 reis ; o que
não succederia , fabricando-se a Pólvora com
Salitre de nossa lavra ; pois que ainda no caso
de ficar muito mais cara , o seu custo não sa-
hia das mãos dos Portuguezes , no que muito
interessa o Estado , augmentando-se a povoa-
ção com os meios de subsistência; augmentan-
do-se o consummo dos géneros ; augmentan-
do-se as rendas do Estado.
He certo , que depois se remediou em
parte este grande mal , fabricando-se a Pólvora
em Portugal ; mas continuou a nossa depen-
dência , sendo-nos necessário o Salitre Estran-
geiro; continuou o nosso prejuízo com a perda
do numerário , que este exige , ficando delle
privados todos os Vassalios Portuguezes , que
se podião occupar no fabrico do Salitre Na-
cional.
Desde Julho de 175-3 > ^^ ^"^ passou a
Fabrica da Pólvora a ser administrada pela
N
Real FazeJida até 1793 , se comprarão aos
Estrangeiros ii585'2 quintaes de Salitre bruto,
que pelo menos a preço médio de 16^000 reis
por quintal , nos levou de Portugal 1 853 63 2000
reis j ou 4 milhões e 634 mil cruzados.
Nos quatro annos de 1797 a 1800 com-
prárâo-se 1795*8 quintaes, três arrobas, e onze
arráteis de Salitre bruto, parte do qual chegou
a custar a 22015' reis por quintal, que a pre-
ço médio de 16000 reis , nos levou de Portu-
gal 287331340 reis, ou 718 mil cruzados, (i)
Por tanto nos levarão os Estrangeiros em
44 annos mais de 5" milhões , 3 5' 2 mil cruza-
dos , deixando-nos em troco de tão considerá-
vel somma hum género , de que nem já exis-
tirá o fumo. Que vantagens não teria recebido
Portugal , tendo-se derramado pelos seus habi-
tantes tão grande porção de numerário em tão
curto intervallo de tempo? (2)
(i) Por informações, que obtive dg Real Fabrica de R€^
finaí^ão de Alcântara.
(2) Espero , que estas razoes bastarão para convencer a-
quelles , que sem reflexão alguma , somente dizem , que
a Real Fazenda perderá em fomentar o Salitre Nacional todo
o excesso do Jucro, que podia ter, vendendo a Pólvora, que
fabricasse com Salitre estrangeiro , por ser este mais barato t
Felizmente o nosso Augusto Príncipe e Se-
nhor tem começado a dar seguro remédio a tão
grande mal. A Real Nitreira Artificial de Braço
de Prata he huma das muitas provas das suas
Paternaes , e Sábias Vistas : ella nos augura ver
estabelecer outras , que possao dar de nossa la-
vra todo o Salitre , de que necessitamos : pelo
que parecerá impróprio ;, que eu inste sobre
objecto , que tanto está na Real Lembrança ;
mas a obrigação , e a lealdade de hum Vas-
sailo , que , como eu , tem a honra de ser em-
pregado no Real Serviço , e que tanto deve á
Beneficência de Sua Alteza Real, me obrigao
a terminar a presente Memoria com as seguin-
tes proposições.
I.» Que se mande estabelecer por conta da
Real Fazenda 42 Nitreiras Artificiaes de ma-
neira , que possa cada huma dar 40 arrobas
de Salitre por mez»
Este numero he muito accommodado á
que a Real Fazenda consome muita Pólvora em defensa do
Estado , e que em toda a que consome , tem hum prejuizo
real, por lhe ficar mais cara. Por6n se ainda não bastarem,
penso que se convencerão da utilidade , do que aponto na
seguLute nota.
H
^"S
•iÍikMirt«^>«<ifeM-i«Ma«
MHUSMM
grandeza, e povoação de Portugal : 12 Nitrei-
ras na Estremadura 5 dasquaes podem ser mui-
to bem 8 ou 10 nos subúrbios de Lisboa; 10
na Beira ; 10 no Minho ; 2 em Traz dos Mon-
tes y 8 no Além-Téjo , e Algarve , nenhum pe-
zo faraó a estas Províncias , e dar-nos-hiáo o
necessário Salitre para o fabrico annual da Pól-
vora j de que necessitamos , e que reputo em
20160 arrobas , tomando hum meio entre as
quantidades de Pólvora fabricada nos annos de
^7985 I75>9 5 e 1800; evitando assim a perda
de 200000 cruzados , que annualmente absor-
verá a compra de 5000 quintaes de Salitre Es-
trangeiro, orçado a 16000 reis por quintal, (i)
(i) Sem que a Rtal Fazenda se encarregue da plantaqao
destas Fabricr.s, póde-se conseguir tambera aintroducção des-
te novo, e interessantíssimo ramo de industria pelo seguinte-
modo.
Proponha-se Privilegio exclasivo para no espaço de lOj^
ou ij annos alguma Companhia Nacional prover a PoNora,,
de que necessitar o nosso commercio da Costa de Africa, sen-
do esta feita na Real Fabrica de Barcarena eom Salitre obtido<
«m Portuj-al das Nitrei ras ArtifiGiaes , que fabricar a Hiesma
Companhia , e das terras salitresas, que descobrir, pagando
iómente a despesa do seu fabrico.
Nao faltaráõ Companhias, que ambicionem este Privile--
fio , quç ceitamente lhes fará ganhar bum grosso cabedat,,
"^
f9
Todas estas 42 Nitreiras exigiráó somen-
te 672 homens de trabalho , que pouca falta
farão á Agricultura , e além de nos darem
hum tão precioso género , augmentaráô com o
seu producto as rendas do Estado ; sustentaráo
vendendo a Pólvora, que fabricar com o seu Salitre, que segu-
ramente lhe ficará por muito baixo preço , em consequência
das economias , que ha de saber fazer na sua acqfciisiçSo , a-
prontando tudo , quanto for necessário sem perda alguma
de tempo , perda , que de ordinário infelizmente não he at-
tendida nas Administrações por conta da Real Fazenda; mas
o Estado tirará a vantagem de se poder prover de Salitre na-
cional , findo o tempo do Privilegio , por se achar a Nação
instruida , e em posse deste noTo ramo de interesse.
o commercio tirará a vantagem de ter Pólvora para as
negociações da Costa de Africa, onde he indispensável hum i
tal género , sem passar pelos embaraços , que actualmente en-
contra na sua acquisição , mormente em tempo de guerra
cm que a defensa píiblica não pôde dispensar a Pólvora , de í
que necessitão o$ Commerciantes , a quem por este motivo
se tem por vezes permittido a ruinosa faculdade de a comprar
aos Estrangeiros. *
A Real Fazenda ficará com o grande lucro , que ainda
pôde tirar da venda da Pólvora, que fabricar, em todo oBra- f
zil , e nas restantes Colónias ; inipondo-se á Companhia a f
obrigação de vender á Real Fazenda , passados seis annos ,
o Salitre, de que necessitar, sendo fabricado no Reino, pe- -,
Io preço médio deduzido da compra feita aos Estrangeiros i
nos quatro últimos annos antecedentes ao Estabelecimento ;
da Companhia. |
H ii ,
/
'^*'''*'''K*'**NÍBHPÍaMa««QkMi«w»«*«inMi«MMa^
IHI
tmm
■6o
672 homens , em beneficio do augmento da
•povoação , consummo dos géneros , e vanta-
gem dos Direitos Reaes.
Estas mesmas Nitreiras servirão de esco-
las , em que se espalhem os conhecimentos
práticos , que são necessários a tao importante
objecto 3 na França, Prússia, Alemanha , &c.
os mais rústicos camponezes sabem conhecer
as terras salitrosas ; formar suas Nitreiras , lí-
xiviar as terras , e obter o Salitre bruto , que
passão a vender ás Fabricas de Refinação.
Ao Estabelecimento de Braço de Prata se
deve o termos já o seu primeiro Administra-
dor Narciso António da Silva instruído de ma-
neira , que pôde com muita vantagem ser em-
pregado na plantação de semelhantes objectos.;
á sua intelligencia , zelo , e probidade certa-
mente deve muito a Real Nitreira ; o segundo
Administrador António José Thomaz da Cos-
ta já possue bastantes idéas, e se tem feito re-
commendaveí pelo seu zelo , e actividade ; não
falio nos muitos trabalhadores , que alli tem,
visto como se preparão as terras , como se li-
xivião 3 e se obtém o Salitre bruto : assim he ^
que as luzes práticas se tornaQ vijlggres.
I ^^«y.,*»»!» jT
i»»ikjj* -.L^i-:»-,-*.»!?
2.3 Que se faça reviver o Alvará do Se-
nhor Rei D. João IV. de 26 de Julho de 1654
e a Apostila de 10 de Março de 16^^ , com
as alterações próprias dos actuaes conhecimen-
tos.
3.* Qiie seprometta comprar nos primeiros
4 ou 5 annos todo o Salitre bruto , que fize-
rem os particulares pelo dobro do preço , em
que importar o feito por conta da Real Fa-
zeada.
4.^ Que ao primeiro Lavrador , que trou-
xer á Fabrica da Refinação 40 arrobas de Sa-
litre bruto obtido das terras das suas alpendra-
das , curraes ,^ ou abeguarias , dispostas conve-
nientemente , ou á imitação do que praticao os
Lavradores do Cantão de Appenzel em Suissa ,
não somente se pague o dito Salitre pelo dor
bro do preço do fabricado nas Reaes Nitrei-
ras ; mas se lhe dê hum premio pecuniário , q
outro honorifico , que lho. seja proporcionado-
5.^ Que se mande fazer huma viagem per
lo Reino , com o intuito de se descobrir ter-
renos salitrosos , muito principalmente nos si^
tios , em que já houvérao Feitorias de Sali-
tre..
/
)■ .1
6^
A sua existência he , quanto a mim , quasi
certa , não só por ter havido as sobreditas
Feitorias , mas pelo clima de Portugal muito
apropriado a formação natural do Salitre , e
análogo ao de Hespanha, onde, segundo Bow-
les , hum terço das terras incultas , e o pó das
estradas das Províncias Orientaes , e Meridio-
naes contém Salitre natural , de que tirão os
Hespanhoes bastante lucro ; o que não obstan-
te, se estabeleceo em Madrid em 1778 huma
muito considerável Fabrica de Salitre.
A descoberta de terras salitrosas será de
summa importância , já por ser mais barato o
Salitre delias obtido , já porque depois de li-
xlviadas as terras , podem ser utilissimamente
empregadas na formação das Nitreiras Artifí-
ciaes, sendo muito próprias a Nitriíicação.
6.* Que se prohibao dentro das Cidades os
matadouros de gado , sendo permittidos sómen-.
te nos subúrbios , e junto das Nitreiras Artifi-
ciaes.
São bem constantes os incommodos , quô
causa ao olfato , e á saúde o matadouro do
Campo de Santa Anna ; quem passa por este
sitio , bem sente a abundância de vapores nau-
mm
^^fíTZ
^3
seosos , que nao podem deixar de prejudicar á
saúde ; também são attendiveis os incommo-
dos, e desgraças, que causao os gados condu-
zidos pelo interior das Cidades. As Nitreiras
tirarão grande vantagem de todos os residuos,
e immundicias destes matadouros.
7-^ Qiie sejáo renovadas as terras das se-
pulturas das nossas Igrejas. O péssimo estado ,
em que estão quasi todos os Templos , princi-
palmente os antigos , pela grande quantidade
de miasmas , que se desprendem das sepultu-
ras , merece particularíssima attençao , pelos
males, que causao á saúde pública.
As Nitreiras podem tirar grandíssima uti-
lidade destas terras ; em 1798 somente duas
das Nitreiras de Paris em cada década fazia
30000 libras de Salitre das terras dos Cemité-
rios, e velhos Edifícios , ou 100 arrobas, 11
arráteis, 5 onças Portuguezas por dia. (i)
(i) Deux des pias grandes Fabriques de Salpetre de Paris
entre plusieiírs autres, tirent de laterre desCimítieres e des
vieiix batiments, impregnes de Salpetre, et livre chaque De-
cade la quantite enorme de trente mil livres de Salpetre pur.
Fragmens sur Paris 179S, T. 2. pag. 108.
Por Aviso do ExceJIentissimo Inspector da Real Nitreira
em data de ^ de Dezembro de 1798 , me foi remettido estJ
mÊtSÊBtmmBssmm
KMMI
lOMi
64,
8.^ Que sejâo obrigados os donos dos ani-
maes , que morrerem , a fazer conduzillos , e
enterrar em sitio próximo ás Nitreiras ; e os
animaes , que apparecerem mortos peias ruas ,
ignorando-se seus donos , sejao mandados se-
pultar nos mesmos sitios por aquelles , a quem
toca providenciar sobre objecto tão importante
á saúde pública.
Deste modo nao se encontrarão , como
acontece repetidas vezes nas ruas desta Cidade ,
e suas visinhanças , cadáveres podres , e dela-
cerados pelos cães , que incommodao a vista ,
o olfato , e a saúde dos que passão ; e ter-se-
hão terras muito apropriadas ás Nitreiras.
9.» Que sejão transportadas para as Nitrei-
ras todas as lamas , e imimundicias á custa da
repartição , a que toca este ramo de Pohcia.
Nos subúrbios de Lisboa podem muito
bem escoiher-se 8 ou 10 sitios para deposito
das lamas , e immundicias ; e nelles com gran-
Exíracto , e recommendado o seu exame. Quanto não he pa-
ra admirar o zelo , e actividade de hum Ministro , que no
meio de tantos , e tão grandes objectos do Real Serviqo se
não esquecia de ministrar luzes, que podcssem cooperar para
o progresso da Real Nitreira 1
--<^'**' -^•fMi^Pwpias
6ir
de vantagem se estabeleceráo outras tantas Ni'
treiras.
io%* Que sej ao transportadas para as Ni-
treiras pela repartição das Obras públicas to-
das as terras de entulhos , e edifícios arruina-
dos 3 que os Mesti'es das Nitreiras julgarem
convenientes ; sendo esta despesa feita pela
mesma repartição , no caso de lhe competir,
ou pelos donos dos chãos entulhados , e que
devem edificar , não se lhes permittindo outro
yasadouro.
11.^ Que seja permittido o tirar-se as ter-
ras das cavalhariças , adegas , palheiros , abo-
goarias , edifícios velhos , e subterrâneos sem
prejuízo de seus donos , quando os Mestres
das Nitreiras julgarem , que são convenientes ,
para serem lixiviadas no mesmo sitio , ou trans-
portadas ás Nitreiras.
I2.« Que não seja permittido a Caíceteiro
algum o trabalhar em calçadas , principalmen-
te de cavalhariças , sem primeiramente dar
parte aos Mestres Salitreiros de seus Bairros ,
para examinarem , se lhes convém , ou não , as
terras das mesmas cavalharicas.
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Com estas , e outras providencias , que
ratas do Nosso Augusto Principe e Senhor
teremos seguramente de nossa lavra todo o Sa-
rtre necessário; e em pouco tempo os mesmos
l^avradores, e Camponezes abastecerás a Real
Fabnca de Refinaria de Salitre , sendo então
dwnecessaría a administração das Nitreiras Ar-
tiliciaes por conta da Real Fazenda.
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Ahãrâ do Senhor Rei D. João IV. sobre as
Nitreiras , e fabrico do Salitre em PortU"
gal , com huma' Apostilla da Senhora Rai-
nha Regente Dona Luiza de Gusmão , ex-
trahidos dos Registos da Secretaria da
Junta dos Três Estados,
E
U ElRd faço saber aos que este Alvará
virem , que tendo consideração ao muito , que
se necessita neste Reino de Salitre, para se fa-
bricar Pólvora , tão necessária para sua defensa,
e de suas Conquistas , e ter a experiência mos-
trado de annos a esta parte , que ha terras
dentro nelle , que tem bastante virtude para se
fabricar , e ter sido de tanta utilidade , a que
se formou da mesma terra, até agora , que se
entende será de grande proveito continuar-se
no ministério de material tão importante nos
tempos presentes , e escusar , o que se manda
vir da índia todos os annos ^ e o que se com-
I ii
À
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pra aos Estrangeiros, introduzíndo-se Feitorias
de Salure nas Cidades, eViliasn^ais a pC
«ito para se fundarem oíficinas, em que se be-
neficie, encaminhando aos naturaes ao lavarem •
tíe. por bem , e me praz , que por ora se fa-
^o a. Atas oíHcinas de Salitre somente nas
Comarcas de Alemquer, Leiria, e Setúbal: e
a respeito do que delias resultar , se estenderá
peias mais do Reino pela maneira seguinte -
■Primeiramente , que em cada Cidade, Yilla,
^ Lugar das ditas Comarcas , as quaes forem'
commodas para isso , haverá huma pessoa,
q^^ possa lavrar Salitre ; e para ter melhor
effeito , há por bem , que as taes pessoas,
Çue o fizerem , seus filhos , é criados , que se
occuparem neste mister , sejao isentos de ir a>
aiardos , e ás fronteiras , e nao sejáo occupa-^
das em outra Occupado , e nem se lhes possa
tomar suas cavalgaduras , e carros , e se lhes.
Hao possa lançar decima , nem meneio de>a^
^ancia , que tiverem do dito Salitre ; e sendo-
ihe necessário tomar as terras, que forem pro-
prias para este material em qualquer parte
que^se acharem , as possão tomar sem contra-'
^i^^jao alguma . ç se em algumas as houver.
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6^
recorreráo ao Juiz de Fora , ou ao Provedor
da Comarca , que tomando a informação ne^
cessaria , julgará se faz damno ; e fazendo-o ,
a nâo poderáo tirar j e não o fazendo , se lhes
não poderá impedir tirar a dita terra , pagan-
do-a a seu dono por seu justo valor : sobre o
que poderá haver aggravo , e recorrer-se ao
Conselho da Minha Fazenda ; e para se poder
continuar este mister , irá o Mestre do Salitre '
por todas as partes das Comarcas referidas , e
verá a quantidade delle ^ que se poderá fazer j '
e obrigará a pessoa , que tiver este Privilegio 3
a dar cada anno o Salitre , que lhe parecer,,
pode lavrar conforme a conveniência , que pa- ,
ra isso houver ; o qual será refinado a conten-
to do Tenente General de Artilharia , e appro-
vado na Torre da Pólvora , onde se ha de en- \
tregar ; e se o não quizerem dar refinado, se 1
llies pagará por cada quintal metade do pre- j
ço , que se dá pelo refinado , sendo de quali- . \
dade do que se faz nesta Cidade ; e o. Mestre
o refinará á sua custa : e sendo caso y que nas
taes partes não haja Caldeiras ,. se farão á cus-
ta da Minha Fazenda do tamanho , que forem
uecessarias y e as ditas pessoas- serão obrigadas
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a pagallas logo, ou darâò fíânçã a as pagarem
em Salitre na primeira até segunda entrega • e
se qualquer Cidade, Villa , ou Lugar das so-
breditas Comarcas for sufficiente de dar quan-
tidade de Salitre, a pessoa, que nelle o fabri-
car , escolherá huma casa , que seja própria
para este ministério , pagando os alugueres del-
ia a seu dono por seu justo preço : e onde
houver pouco , cada hum o poderá fazer em
sua casa , como se faz em França , Alemanha
e Polónia • por quanto por este Alvará não
dou casa para se fazer Salitre, e se não licen-
ça para se poder fazer : e poderão todas as
pessoas , que o fizerem , tomar lenha em qual-
quer parte, que se achar, só para esta Fabri-
ca , com tanto que não façãó prejuízo ás mi-
nhas madeiras , nem tão pouco ás arvores de
fructo , posto que sejâo de particulares ; mas
sendo arvores seccas, ainda que sejão Minhas.,
as poderáô cortar , e levar sem pagar nada'
por ellasi e assim mesmo as arvores de parti-
culares , que não forem de préstimo , as pode-
ráô cortar , e levar , pagando-as a seu dono
I^elo seu justo preço ; e se os taes donos im-
pedirem algumas, dizendo lhe fazem prejuízo.
7í
o Juiz de Fora , ou o Provedor da Comarca
fará acerca disso o que se dispõe nas terras,
e julgarão se se deve tomar , ou não ; e o
Mestre do Salitre irá ás Comarcas referidas
ensinar as pessoas , que o quizerem apren-
der ; e mando ás Justiças delias náo impidao
fazer vestoria , e ver a quantidade de Salitre,
que se poderá fazer em qualquer parte, a que
elle for : e as pessoas , que aprenderem , e se
quizerem obrigar á sua manufactura , farão
obrigação nos meus Armazéns da Tenencia
diante do Tenente General de Artillieria , na
forma deste meu Alvará , obrigando-se a dar
a quantidade, que o mesmo disser , e a cada
huma das ditas pessoas se lho. dará a copia au-
thentica deste Alvará , para delle usarem j por-
que só os que fizerem a tal obrigação , goza-
ráo dos Privilégios nelle concedidos : á qual
eopia se dará também inteiro cumprimento^
como se fora o próprio por mim assignado.
Pelo que mando , &c. Luiz da Costa o fez
em Lisboa aos 29 de Julho de 16^^. ts Rei,
s Marquez Almirante. =5.
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Or quanto pelo Alvará acima copiado;
mando , que somente nas Comarcas de Alem-
quer, Leiria, e Setúbal -possa hayer Feitorias
de Salitre , tendo respeito ao que ora me re-
presentou o Conselho de Minha Fazenda sobre
o motivo , que convinha obrar-se neste Reino
o mais Salitre , que ser possa , para que não
^aja falta deik , pelo muito que se necessita:
Hei por bem , e mando , que nas mais Co-
marcas do Reino possa haver as taes Fabricas
pelo modo , e fôrma , que pelo dito Alvará
mando, que as haja nas três Comarcas referi-
das, sem nenhuma alteração , nem innovaçao
do disposto nelle; e as pessoas, que nellas as-
sistirem, serão approvadas pelo Mestre do Sa-
litre daTabrica desta Cidade , o que constará
por Certidão do Tenente General de Artilha-
ria Rui Corrêa Lucas, ou de quem seu cargo
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s-ervir ; e com esta Apostllla , que não passará
pela Chancellaria , se cumprirá o dito Alvará ,.
como nelle se contém. Luiz da Costa Corrêa
o fez em Lisboa a lo de Março de 165-5^^
K Rainha. =: Marquez Almirante. =5
* N. B.
António Rotier , Francez de Nação , em
2641 foi o primeiro , que fez hum Contrato
€om ElRei , para lhe dar Salitre feito no Rei-
no : em 1642 associou por novo Contrato a
Manoel Mattheus , Polvorista de Sua Mages-
tade ; em 1648 Francisco Roberto ^ também
Francez , e Administrador da Fabrica de Sali-
tre de Torres Novas , encarregou-se igualmen-
te da de Lisboa , e celebrou njoyo Contrato
em 16^0 ; associou a Francisco de Tour , e
renovou o Contrato com novas condições.
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