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Full text of "Novo guia do viajante em Lisboa, Cintra, Collares, Mafra, Batalha, setubal, Santarem, Coimbra e Bussaco. Precedido d'uma introd. de Julio Cesar Machado"

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NOVO 


GUIA  DO  VIAJANTE 


EM  LISBOA 


CINTRA,  COLLARES.  MAFRA,  BATALHA,  SETÚBAL 
SANTARÉM,  COIMBRA  E  BUSSACO 


PRF.CEDIHO  DT1IA  INTRODICÇÃO 

DE 

JÚLIO  CÉSAR  MACHADO 


QUARTA   EDIÇÃO    MUITO    AUGMENTADA 

E 

Com  um  mappa  de  Portugal 


LISBOA 

Vendc-Nr  por  toOO  réi* 

NA  LOJA  DO  EDITOR  J.   J.   BORDALO 

Travessa  da  Vietnria,  42,  1.° 

1880 


Lembram-se  de  Lisboa,  no  estado  em  que  ainda 
todos  nós  a  conhecemos? 

Tudo  ás  escuras... 

De  tempos  a  tempos  sabia-se  pelas  cartas  do 
a  Braz  Tizana»,  escriptas  no  Porto  por  José  de 
Sousa  Bandeira  sobre  as  informações  que  d'aqui 
lhe  eram  enviadas,  e  que  saiam  primeiro  no  Perió- 
dico dos  pobres,  e  depois  no  jornal  que  tomou  por 
titulo  o  pseudonymo  do  famoso  folhetinista  da  ci- 
dade eterna  —  que  a  camará  municipal  depois  de 
uma  sessão  laboriosa  e  renhida  havia  resolvido  dar 
mais  dois  candeeiros  á  capital.  O  correspondente, 
por  nâo  se  usar  ainda  os  chavões  jornalísticos  de 
« Parabéns  á  illustre  camará»  nem  «Registramos 
este  acto  que  faz  honra  ao  illustre  vereador»  limi- 
tava-se  a  fazer  com  que  o  leitor  se  compenetrasse 
bem  de  que,  estabelecendo  a  arithmetica  no  fim 


4  INTRODUCÇAO 

do  anno  que  tínhamos  mais  dez  candeeiros,  era  o 
mesmo  que  dizer  que  estávamos  dez  vezes  mais 
esclarecidos  do  que  no  anno  antecedente ! 

O  que  nâo  impedia  que,  no  centro  mesmo  da 
cidade,  qualquer  das  ruas  de  maior  transito  pos- 
suísse apenas  um  candieirito,  destinado  unicamente 
a  fazer  sobresair  ainda  mais  o  horror  sombrio  dos 
sitios  menos  favorecidos. 

Um  pobre  homem  que  se  perdesse  de  noite,  por 
essas  ruas  então  barrancosas,  ia  aos  tombos  de 
abysmo  em  abysmo,  escorregando  no  cascalho,  es- 
barrando nos  frades  de  pedra,  caindo  de  ventas 
nos  montes  de  caliça... 

De  meia  em  meia  hora,  um  candieiro  de  luz  in- 
decisa e  débil;  só  o  que  chegasse  para  uma  pessoa 
conhecer  que  se  enganara  no  caminho  e  que  an- 
dava perdida. 

A  ladroíce  pouco  audaz,  mas  frequente.  Covis 
de  larápios  em  cada  beco.  Ladrões  timidos,  neo- 
phytos  inexperientes;  discípulos,  pela  maior  parte, 
de  um  professor  que  não  podia  mecher-se,  —  um 
coxo  que  estacionava  no  Terreiro  do  Paço,  á  porta 
da  aula  do  commercio. 

Toda  a  gente  conhecia  esse  coxo,  director  das 
ladroeiras,  caixa  dos  furtos,  que  mandava  os  seus 


INTRODUCÇÃO  5 

delegados  para  os  diversos  pontos  importantes,  para 
o  passeio  publico,  para  os  theatros  da  rua  dos  Con- 
des ou  do  Salitre,  para  a  porta  das  egrejas;  e  ar- 
recadava depois  o  fructo  de  taes  diligencias,  de 
umas  vezes  recompensando  logo  os  gatunos,  de 
outras  encarregando-se  da  venda  dos  objectos  e 
dividindo  o  producto. 

Pessoa  a  quem  nas  ruas  houvessem  roubado  al- 
guma coisa,  não  ia  procurar  a  policia,  ia  procurar 
o  coxo ;  combinava-se  o  ajuste,  e  o  ladrão  vendia 
ao  roubado. 

A  segurança  dos  prédios  e  garantia  dos  mora- 
dores eram  os  sapateiros  de  escada. 

Em  casa  .que  nâo  tivesse  esse  guarda  amigo,  es- 
tava-se  sempre  em  cuidados  de  não  deixar  aberta 
a  porta  da  rua. 

Os  ladrões  entravam,  então,  pela  janella. 

Um  dos  mais  engraçados  homens  d'essa  época, 
vivo  ainda  hoje,  Domingos  A.,  sabendo  que  esse 
era  o  costume  d"clles,  não  se  deu  sequer  ao  incom- 
modo  de  fechar  a  do  seu  quarto  n'uma  noite  de 
verão,  em  que  recolhera  sem  dinheiro :  unicamente, 
por  precaução  de  scenario,  pôz  um  par  de  pistolas 
á  cabeceira. 

Pelas  duas  horas  da  madrugada  o  ladrão  appa- 


6  INTRODUCÇAO 

receu,  espreitou,  esteve  á  escuta,  ouviu  o  resonar 
com  que  o  dono  da  casa  simulava  dormir,  e  entrou. 
Logo  que  o  viu  entretido  a  abrir  uma  gaveta, 
Domingos  A.  sentou-se  na  cama,  apontou  uma  pis- 
tola, e  disse-lhe  com  seriedade  : 

—  Ponha  p'r'ahi  tudo  que  traz  comsigo  1 
O  ladrão  queria  ajoelhar-se. 

—  Nada  de  attitudes.  Quanto  traz  comsigo?  Con- 
serve-se  de  pé  e  responda! 

—  Dezoito  tostões,  senhor! 

—  Ponha-os  ahi. 

—  Então  hei  de  eu... 

—  Quer  antes  um  tiro  ? 
Gesto  negativo. 

—  Pois  dê  cá  os  dezoito  tostões. 

O  ladrão  despejou  o  bolso  com  ar  mortificado, 
e  ia  de  novo  saltar  pela  janella,  quando,  para  at- 
tender  ás  boas  leis  da  hospitalidade,  Domingos  A. 
lhe  offereceu  um  phosphoro  para  descer  a  escada 
e  o  convidou  gentilmente  a  sair  pela  porta  assegu- 
rando-lhe  que,  por  eguai  preço,  poderia  voltar 
quando  lhe  approuvesse. 

Poucos  assassinatos  todavia;  como  n'esses  tem- 
pos a  politica  andava  fortemente  incitada  e  incen- 
dida, esperava-se  talvez  que  alguma  das  bernardas 


IXTRODUCÇÃO  7 

restaurasse  a  forca  para  remediar  a  falta  (Taquelle 
supplemento  de  cor  local,  que  estava  em  desaccordo 
com  o  chãos  em  que  se  vivia. 

De  vez  em  quando  vinha  algum  episodio  justifi- 
car a  lei  da  harmonia,  e  dar  maior  feição  ao  génio 
melodramático  da  quadra.  Àbriam-se,  por  exemplo, 
as  portas  do  Limoeiro,  e  ahi  rompia  pela  cidade 
inteira  a  vasta  cambada  de  malfeitores.  Ferviam  os 
tiros  por  essas  ruas  :  tropa  para  um  lado,  tropa 
para  o  outro ;  d'aqui  faccinoras,  d'acolá  soldados ; 
vivia  a  cidade  em  sustos. 

Nunca  se  tinha  certeza  de  que  as  lojas  nâo  fe- 
chassem de  dia.  Dormia-se  de  espada  á  cabeceira. 
Houve  quem  enriquecesse  a  vender  apitos !  Até  o 
castello  de  S.  Jorge,  que  era  a  prisão  que  tinha 
melhores  ferrolhos,  poz-lhes  azeite  e  deixou-os  cor- 
rer. Os  presos  em  geral  tinham  um  pé  na  gaiola, 
e  outro  na  rua.  Era  sabido. 

Os  batalhões  nacionaes  alegravam  a  cidade.  Ba- 
taré08s  lhes  chamava  o  povo.  Toda  a  gente  se  far- 
dou. Só  os  officiaes  davam  para  um  exercitosito.  De 
coronéis  podiam  formar-se...  três  destacamen- 
tos. 

A  população  vivia  assombrada;  a  cidade,  apezar 
do  céo  de  anil  e  do  Tejo  de  crystal  dos  poetas,  es- 


8  INTRODliCÇÃO 

tava  feia.  Em  se  saindo  das  ruas  da  baixa,  mudava 
logo  o  aspecto  :  fazia  horror. 

Cordas  á  janella,  com  roupa  a  seccar. 

Gallinhas  ás  portas. 

Um  porco  dentro  da  loja. 

Rebanhos  de  pequenitos  a  brincar  nas  escadas, 
acocorados  nos  degraus  aos  cinco  e  aos  seis,  o 
mais  velho  com  o  mais  novo  ás  costas,  esfranga- 
lhados, sem  meias,  sujos,  de  carinhas  pallidas  e 
amarellentas. 

Garotos  em  bandos,  á  pedrada,  pelo  meio  da  rua, 
saltando,  correndo,  esbarrando  em  quem  passava. 

Ao  portal,  a  mãe  a  remendar  o  fato,  a  filha  a 
fazer  meia;  a  avó,  idiota,  sentada  lá  dentro  a  um 
canto. 

Lojas  térreas,  húmidas,  impossíveis  de  inverno; 
um  cheiro  de  trapo  podre  a  exhalar-se  d'aquillo 
tudo ! 

O  luxo  exterior  das  vivendas  era  papagaios ; 
quem  não  tinha  papagaio,  tinha  uma  arara ;  quem 
não  tinha  arara,  tinha  um  periquito ;  quem  não  po- 
dia sequer  ter  periquito,  punha  um  papagaio...  de 
pau  na  janella  de  sacada. 

Á  hora  do  largar  da  agulha  falava-se  de  janella 
para  janella  como  se  o  facto  de  ser  vizinho  de  ai- 


LNTRODUCÇÃO  9 

guem  auctorisasse  a  travar  conhecimento ;  pedia-se 
um  ramo  de  salsa,  o  sacca-rolhas  emprestado,  fa- 
lava-se  de  uns  e  de  outros,  discorria-se  em  voz  alta 
a  respeito  da  vida  de  cada  qual,  e  ao  cair  da  noite 
fechava-se  toda  a  gente  nos  differentes  andares  do 
seu  prédio  como  objectos  guardados  nas  gavetas 
de  uma  commoda. 

Então  principiava  a  grande  noite. 

Tudo  quieto,  tudo  soturno  e  morto... 

Apenas  o  pregão  de  um  aguadeiro  aqui  ou  alli, 
roncando  lugubremente  : 

— Aúl 

Ninguém  acreditava,  ninguém  suspeitava  siquer 
que  possa  haver  felicidade  no  movimento,  e  que  a 
actividade  agrade  tanto  ás  creaturas  que  até  a  ra- 
zão se  recuse  a  admittir  a  realidade  de  uma  ven- 
tura immovel  e  sempre  egual  por  mais  completa 
que  seja. 

Mas,  Lisboa  não  o  entendia  assim ;  e  para  ella 
o  supremo  bem,  o  bem  por  excellencia  era  n'essa 
época  a  quietação,  o  somno  em  casa,  na  rua  a  paz... 
ás  escuras. 

Hoje,  já  felizmente  o  viajante  não  encontra  em 
Lisboa  as  minas  mais  caricatas  que  archeologicas 
da  cidade  d'esse  tempo. 


10  LYTRODUCÇÃO 

Vieram  as  edificações  novas,  as  praças  largas,  as 
boas  hospedarias,  os  theatros  elegantes  e  bem  ven- 
tilados, os  jardins,  os  squares.  Vieram,  sobretudo, 
escolas  e  asylos. 

Foram-se  com  os  deuses  os  cazebres  do  Loreto, 
o  capote  e  lenço,  as  seges  de  bandeirinha.  Desap- 
pareceram  em  grande  parte  as  ruellas  onde  nunca 
penetraram  nem  o  ar  nem  o  sol.  Já  se  encontram 
pelo  caminho  bancos  de  pedra,  de  ferro,  ou  de 
pau,  onde  uma  pessoa  se  sente.  Já  ha  uma  alluvião 
de  omnibus  em  exploração  permanente;  já  nâo  fe- 
cham as  lojas  ás  Ave-Marias ;  já  ha  policia ;  já  ha 
luz. 

Já  a  população  sae,  e  já  se  deixa  ver  a  horas 
certas  e  nos  logares  da  moda;  tem-se  gracejado 
centos  de  vezes  a  respeito  dos  famosos  corso  ita- 
lianos, onde  não  é  licito  faltar  sem  quebra  dos  me- 
lhores usos  da  signoria;  mas  o  Passeio  Publico  nas 
noites  de  quinta  feira  e  de  domingo  no  verão,  das 
duas  ás  quatro  horas  da  tarde  no  inverno,  assim 
como  as  ruas  da  baixa  e  o  Chiado,  são  variantes 
do  corso  lisbonense ;  e  provam  mais  uma  vez  que 
a  influencia  dos  costumes  modernos  tem  grande 
poder  creador,  e  que  se  tornam  em  um  beneficio 
quando  são  civilisadores  e  quando  concorrem  para 


INTRODUCÇÃO  11 

o  engrandecimento  da  industria  e  do  commercio 
pelo  lado  útil  do  luxo,  do  conforto,  e  do  prazer  de 
todos.  Não  ha  hoje  em  Lisboa  classes  privilegiadas, 
e  toda  a  gente  tem  á  sua  disposição  as  festas,  os 
passeios,  os  espectáculos,  vivendo  independente  e 
livre,  egual  a  todos  pelo  recreio  como  é  egual  pe- 
rante a  lei. 

É  tudo  hoje  differente  do  que  era,  em  Lisboa. 
Ficaram  as  condições  pittorescas  da  cidade,  no 
que  respeita  a  posição,  e  passou  por  cima  de  tudo 
isto  o  sopro  vivificador  do  progresso,  que  ainda 
agora  principia  a  fazer-se  sentir  apenas,  se  quizer- 
mos  comparal-a  ás  capitães  dos  paizes  mais  adian- 
tados da  Europa,  mas  que  faz  com  que  já  lembre 
de  vez  em  quando  por  uma  praça,  por  um  jardim, 
por  um  theatro,  por  uma  serie  de  prédios,  por 
uma  ou  outra  loja,  Paris,  Madrid,  ou  Milão.  Quando 
digo  «já  lembre»  não  é  minha  intenção  pôr  no  es- 
curo a  grandeza  de  Lisboa  e  sua  notória  superio- 
ridade em  dimensões  e  em  população  a  Milão  e  a 
Madrid;  mas  é  que  ellas  toem  comquanto  cidades 
mais  pequenas,  uma  feição  de  adiantamento,  de 
elegância,  um  cunho  de  civilisação  mais  accentuado, 
mais  decisivo  do  que  Lisboa  —  o  que  também  de 
nenhuma  maneira  impede  Lisboa  de  lhes  levar  van- 


12  INTRODUCÇAO 

tagem  em  muitos  pontos  e  de  ser  uma  das  mais 
formosas  cidades  da  Europa,  e  porventura  a  mais 
original  de  todas. 

Talvez  não  haja  hoje  capital  no  mundo,  onde  se 
viva  tanto  á  vontade,  e  em  que  cada  um  possa  me- 
lhor dizer,  escrever,  e  fazer  o  que  quizer ;  vão  uns 
para  os  gosos  do  amor  próprio,  outros  para  os  do 
bem  estar  material,  alguns  para  a  gloria,  os  de  me- 
lhor juizo  para  a  tranquilidade  feliz.  Não  será  uma 
cidade  rica,  mas  é  uma  cidade  já  elegante,  grande- 
mente prendada  pelas  condições  do  solo,  rica  toda 
ella  de  arvores,  de  flores,  de  vegetação,  com  im- 
mensas  quintas,  hortas,  campos  encravados  por 
entre  a  casaria.  Accusam-a  geralmente  de  cidade 
monótona ;  faz  pouca  bulha,  falia  baixo,  e  não  apre- 
goa grandezas  :  — quem  sabe,  porém,  se  isso 
mesmo  é  bom,  para  o  destino  não  se  quesilar  e  nâo 
chegarem  até  nós  nem  o  ciume,  nem  as  inimisa- 
des,  nem  a  inveja  dos  outros  paizes?... 


1 


NOVO  GUIA 

^  f-\     "         1  ****** 


DO 


I 


VIAJANTE  EM  LISBOA 


E  SEUS  ARREDORES 


CHEGADA   A  LISBOA 

0  viajante  que  entra  pela  barra,  mostra  o  passa- 
porte ao  encarregado  da  policia,  que  vae  a  bordo, 
e  quando  desembarca  entrega-o  na  casa  da  policia 
do  porto  (que  é  no  edifício  da  alfandega)  e  vae  bus- 
cal-o,  no  praso  de  três  dias,  ao  governo  civil,  para 
(»  levar  a  visar  ao  seu  cônsul,  sendo  estrangeiro,  e 
n'esse  acto  recebe  um  bilhete  de  residência,  mesmo 
no  governo  civil,  cuja  repartição  se  acha  estabele- 
cida na  travessa  da  Parreirinha,  ao  lado  do  theatro 
de  S.  Carlos.  Chegando  a  Lisboa,  por  outra  qual- 
quer via,  seja  nacional  ou  estrangeiro,  o  viajante  se 
apresentará  no  governo  civil;  no  segundo  caso  re- 
ceberá bilhete  de  residência. 


CORPO  CONSULAR  PORTUGUEZ  EM  LISBOA 


Áustria 

Cônsul  geral  —  Carlos  Krus.  —  Travessa  das  Pe- 
dras Negras,  1. 

Vice-consul — Alessandro  Nobile  de  Fontana.  — 
Belém. 

Chanceller  —  Pedro  Gomes  da  Silv.  —  Travessa 
das  Pedras  Negras,  1. 

Bélgica 

Cônsul  —  Jorge  Torlades  0'Neill.  —  Travessa  do 
Sequeiro  das  Chagas,  1. 

HrazH 

Cônsul  geral  —  Manuel  de  Araújo  Porto  Alegre. 
—  Rua  da  Atalaya,  107. 


DO   VIAJANTE  15 

Cliili 

Cônsul  —  António  Joaquim  de  Oliveira.  —  Rua 
das  Flores. 

Confederarão  Argentina 


Cônsul  — Negrão. 


Confederarão  Saissa 

Cônsul  —  Tlieodoro  Daggller.  —  Chiado,  Cl. 

Estados-lnidoM  da  Anierica 

Cônsul  —  Leivis.  —  Rua  do  Alecrim. 

Franca 

Cônsul  — Girando.  — Rua  Formosa. 

Grâ-Brctanha 

Cônsul — Brâckenburg. — Travessa  do  Âthayde. 

Viee-eonsul  —  Carlos   0'Donnell.  —  Largo    das 
Chagas. 

Cir<kc*ia 

Cônsul  —  Jorge  Torlades  0'Neili.  —  Travessado 
Sequeiro  das  Chagas. 


16  NOVO   GUIA 

Honduras 

Cônsul  geral  —  Carlos  Krus.  —  Travessa  das  Pe- 
dras Negras,  1. 

Ilespanlia 

Cônsul  — Miranda.  — Rua  da  Trindade,  12. 

Itália 

Cônsul  — João  Baptista  Piombino.  — Becco  dos 
Apóstolos,  7. 

Paizes-Baixos 

Cônsul  — H.  C.  Hulsembos.—  Rua  da  Emenda. 

Peru 

Cônsul  —  João  de  Brito.  — Rua  de  S.  Francisco, 
13. 

Confederação  da  Allemanha  do  Norte 

Cônsul  geral  —  J.  Poppe.  —  Calçada  de  S.  Fran- 
cisco. 

Rússia 

Cônsul  geral  — A.  de  Laxmann.  —  Travessa  do 
Corpo  Santo,  27. 


DO  VIAJANTE  17 

Sião 

Cônsul  geral  —  Alfredo  César  de  Andrade. — 
Rua  do  Ferregial  de  Cima,  21. 

Vice-consul  —  Júlio  César  de  Andrade.  — -  Rua  do 
Ferregial  de  Cima,  21. 

Suécia  e  Noruega 

Cônsul  geral  —  Rarão  de  S.  Jorge.  —  Rua  da  Al- 
fandega. 

Turquia 

Cônsul  geral  —  Félix  Wanzeller.  —  Travessa  de 
S.  Francisco  de  Paula. 

Uruçuay 

Cônsul  geral  —  Carlos  Duarte  Luz.  —  Rua  de 
S.  Francisco,  13. 

Venezuela 

Cônsul  geral  —  José  Luiz  Pereira  Crespo.  —  Rua 
Nova  do  Almada,  li. 


HOSPEDARIAS  (HOTÉIS) 


O  viajante  encontra  em  Lisboa  hospedarias  de 
diferentes  preços,  desde  3$600  até  500  réis  diá- 
rios, d'entre  as  quaes  escolherá  a  que  mais  convier 
ao  seu  estado  financeiro.  Ha  d'estes  estabelecimen- 
tos situados  em  proximidade  do  Tejo,  e  outros  no 
centro  da  cidade,  e  nos  logares  de  mais  concorrên- 
cia. Mencionaremos  aqui,  para  commodidade  do 
viajante,  os  nomes  e  locaes  das  hospedarias  mais 
notáveis  de  Lisboa. 

Hotel  Viziense Rua  dos  Bacalhoeiros,  139. 

»  Americano Largo  de  S.  Paulo,  3. 

»  Alemtejano Rua  dos  Arameiros,  11. 

»  Alexandre Praça  dos  Romuiares,  4. 

»  Dois  Irmãos  Unidos.  Praça  de  D.  Pedro,  113. 

»  Nova  Alliança Rua  Nova  da  Trindade,  10. 

»  Durand Rua  das  Flores,  71. 

»  Bragança Rua  do  Thesouro  Velho,  41. 

»  Conimbricense Largo  do  Corpo  Santo,  6. 

»  Bella  Aurora Rua  dos  Algibebes,  110. 


DO  VIAJANTE  19 

Hotel  Probidade Rua  dos  Fanqueiros,  10. 

i     Moniz Rua  Augusta,  243. 

i     Portuguez Rua  da  Conceição  Nova,  53. 

»     Bella  Estrella Rua  da  Prata,  109. 

i     Francfort Rua  Nova  do  Almada,  109. 

»     Das  Varandas Campo  das  Cebolas,  32. 

í     do  Reino Rua  do  C.  de  Santarém,  55. 

»     Luso-Brazileiro  . . .  Rua  dos  Romulares,  35. 

»     Firmeza Praça  de  D.  Pedro,  30. 

i  Universal Travessa  de  Estevão  Ga- 
lhardo, 23. 

»  Gibraltar Travessa  de  Estevão  Ga- 
lhardo, 10. 

»     do  Riba-Tejo Rua  Nova  de  El-Rei,  31. 

»     Peninsular Rua  Nova  do  Almada,  11. 

i  União  de  Cintra...  Rua  do  Jardim  do  Rege- 
dor, 17. 

»     Ultramarino Travessa  da  Vicloria,  7. 

i     Europa Rua  Nova  do  Carmo,  16. 

»     Lusitânia Rua  Nova  de  El-Rei,  67. 

»  Popular Rua  do  Jardim  do  Rege- 
dor, 17. 

»     Encarnação Rua  da  Prata,  250. 

»     Street  Inglich  ....  Rua  do  Alecrim,  47. 

»     Trcs  Coroas Rua  dos  Douradores,  34. 

»     Central. Praça  dos  Romulares,  25, 

»     Pelicano Rua  dos  Fanqueiros,  278, 

i     Duas  Irmãs Rua  do  Arsenal,  146. 

i     da  Esperança Travessa  de  S.  Julião,  11. 


20  NOVO   GUIA 

0 

Hotel  Nacional Travessa  da  Assumpção,  99. 

»     Nova  Alliança Rua  de  S.  Julião,  11. 

»     Terceirense Largo  do  Pelourinho,  13. 

»     Leão  de  Oiro Rua  da  Prata,  20. 

»     Bismark Rua  do  Chiado,  47. 

»     Segurança Rua  dos  Fanqueiros,  121, 

»    Lisbonense Rua  dos  Gapellistas,  7. 

»     Pedro  Alexandrino .  Travessa  de  Santa  Justa,  70. 

»     Heroísmo Largo  do  Pelourinho,  13. 

»     Paraizo Travessa  do  Almada,  12. 

»     Portugal  e  Brazil. .  Praça  de  D.  Pedro,  entrada 

pela  rua  do  Arco  do  Ban- 
deira, 229. 

»     Embaixadores  ....  Rua  Nova  do  Almada,  116. 

»     Pomba  de  Oiro  . . .  Rua  Nova  do  Carmo,  102. 

»     Espafiol Rua  da  Prata,  156. 

»     Portuense Rua  do  Arsenal,  54. 

Grand  Restaurant  Francez  Largo  de  S.  Julião. 


BANCOS  EM  LISBOA 

Banco  de  Portugal.  —  Rua  dos  Capellistas,  148. 

Banco  Lusitano.  — Rua  dos  Capellistas,  85. 

Banco  Hypothecario.  —  Largo  de  Santo  António 
da  Sé. 

Banco  Nacional  Ultramarino. — Rua  dos  Capel- 
listas, 74. 


DO  VIAJANTE  21 

Banco  AUiança  do  Porto  (caixa  filial).  —  Rua  do 
Ferregial  de  Cima,  6. 

Banco  Commercial  do  Porto  (caixa  filial).  — Rua 
da  Emenda,  65. 

Banco  Mercantil  Portuense  (caixa  filial).  —  Tra- 
vessa das  Pedras  Negras,  1. 

Banco  Popular Hespanhol. — Largo  do  Carmo,  lo. 

London  &  Brazilian  Bank  Limited.  —  Rua  nova 
do  Almada,  69. 

Banco  União  do  Porto, — Travessa  de  S.  Nico- 
lau, entrada  pela  rua  do  Crucifixo,  38. 


BANQUEIROS 

Eruz  &  Companhia.  —  Travessa  das  Pedras  Ne- 
gras, I. 

José  Gonçalves  Franco  &  Filho.  —  Rua  dos  Ca- 
pellistas. 

Fonseca,  Santos  &  Vianna.  —  Rua  dos  Capel- 
listas. 

Fortunato  Chamico  Júnior.  —  Calçada  de  S.  Fran- 
cisco, 10. 

Ricardo  Carvalho  &  Companhia.  —  Rua  dos  Fan- 
queiros, 156. 

J.  R.  Branco.  —  Largo  de  Santo  António  da 
Sé,  19. 

Warburg  &  Dotti.  —  Rua  do  Ferregial  de  Ci- 
ma, 4. 


22  NOVO   GUIA 

COMPANHIAS  DE  SEGUROS  MARÍTIMOS 
E  CONTRA  VIDAS 

Companhia  Fidelidade — Marítimos  e  fogos. — 
Largo  do  Corpo  Santo. 

Companhia  Bonança — Marítimos  e  fogos.  —Rua 
do  Ouro. 

Companhia  Segurança  do  Porto  (agencia  em  Lis- 
boa). —  Rua  da  Magdalena. 

Companhia  Garantia  do  Porto  (agencia  em  Lis- 
boa).—  Calçada  de  S.  Francisco,  10. 

Companhia  Indemnisadora  do  Porto — contra  fo- 
gos e  vidas. —Largo  do  Corpo  Santo. 

Companhia  La  Espanola  de  Madrid — Marítimos 
e  vidas. — Travessa  das  Pedras  Negras,  i. 

Companhia  Asseguradora  de  Barcelona,  seguros 
marítimos.  —Travessa  das  Pedras  Negras,  1. 

Companhia  El  Fénix  Espafíol  —  contra  fogos. — 
Largo  de  Santo  António  da  Sé,  3. 

Companhia  La  Atlantique  du  Havre,  seguros  ma- 
rítimos. —  Largo  de  Santo  António  da  Sé,  3. 

Companhia  La  União  de  Madrid,  seguros  marí- 
timos, contra  fogos  e  vidas.— Rua  do  Príncipe,  63. 
Companhia  La  Cataluna,  Barcelona  —  seguros 
marítimos.  —  Travessa  da  Palha. 

Companhia  El  Lloyd  Andaluz,  seguros  marítimos- 
—  Rua  da  Emenda. 

Companhia  London  <&  Lancashire  seguros  contra 
fogos.— Largo  dos  Torneiros. 


DO  VIAJANTE  23 

Companhia  Queen,  seguros  contra  fogos.  —  Rua 
da  Prata. 

Companhia  Sun  Fire,  seguros  contra  fogos.  — 
Rua  da  Magdalena. 

Companhia  Royal,  seguros  contra  fogos.  —  Rua 
da  Prata. 

Companhia  Liverpool,  London  &  Globe,  seguros 
maritimos  e  contra  fogos, — Rua  do  Alecrim. 

Companhia  Norviche  Union,  seguros  contra  fo- 
gos e  vidas.  —  Rua  do  Crucifixo. 

Companhia  La  Baloise,  seguros  maritimos.  — 
Rua  dos  Capellistas. 

É  fácil  termos  deixado  de  mencionar  alguma  com- 
panhia ou  associação,  com  a  brevidade  que  deseja- 
mos dar  á  publicação  d'este  Guia. 


CLASSIFICADORES  DE  NAVIOS 

Vertias  austríaco,  agencia  em  Lisboa  e  Porto. — 
Agente,  Pedro  Gomes  da  Silva.  —Rua  das  Pedras 
Negras,  1. — Peritos  ;  António  José  Sampaio  e  Ale- 
xandre José  da  Costa  —  ambos  no  Boqueirão  do 
Duro  (á  Boa- Vista)  em  Lisboa.  Carlos  Joaquim  de 
Azevedo  Vareta  e  Custodio  Martins  da  Silva  San- 
tos —  ambos  no  Trem  do  Ouro  (Porto). 

Ventas  francez,  agencia  em  Lisboa. —  Agentes, 


24  NOVO   GUIA 

Torlades  &  Companhia. —Travessa  do  Sequeiro  (ás 
Chagas),  1,  — Porto,  Francisco  Urbano  de  Passos. 
—  Rua  dos  Ferreiros  (á  Estrella),  63. 


COMPANHIAS  E  ESTABELECIMENTOS  DE  CREDITO 

Empreza  de  transportes  fluviaes.  —  Calçada  de 
S.  Francisco,  10. 

Compagnie  des  services  maritimes  des  message- 
ries^maritimes.  Carreiras  entre  o  Brazil  e  Rio  da 
Prata.— Travessa  do  Sequeiro  (ás  Chagas),  1. 

Liverpool  Brazil  and  River  Plate  Stean  naviga- 
tion  company  Limited, — Rua  do  Alecrim,  10. 

Ligne  peninsulaire  —  Entre  Havre,  Lisboa,  Ca- 
diz,  Gibraltar  e  Málaga. — Largo  do  Pelourinho,  19. 

Carreira  regular  e  mensal  dos  vapores  entre 
Liverpool,  Pará,  Maranhão  e  Ceará. — Rua  do  Ale- 
crim, 10. 

The  Spanish  d  Portuguese  Screw  Steam  Shipping 
Company.  Vapores  entre  Londres  e  Cadiz.  —  Praça 
dos  Romulares. 

Empreza  lusitana  de  navegação  por  vapor  para 
Africa,  Açores  e  Algarve.  —  Rua  do  Ferregial  de 
Cima,  6. 

Empreza  insulana  de  navegação. — Vapores  para 
os  Açores,  S.  Miguel,  Terceira,  Graciosa,  S.  Jorge 
e  Fayal.  Agencia,  Cães  do  Sodré,  84. 


DO   VIAJANTE  25 

Clyde  Uno  of  Steamers  to  Brazil  &  the  River 
Plate. — Para  Liverpool  e  Glasgow.  Agencia,  tra- 
vessa do  Athayde,  7. 

Linha  dos  vapores  hespanhoes —  Agencia,  rua 
do  Alecrim,  108. 

Rorjal  Cross  Line  of  Steamers.  —  Rua  dos  Capel- 
listas,  120. 

The  Pacific  Steam  Ncwigation  Company.  —  Rio 
de  Janeiro,  Montevideo,  Boenos-Ayres,  Valparaiso, 
Africa,  Islay  e  Calláo,  Cães  Sodré,  64. 

The  Spanish  &  Portuguese  Screw  Steam  SJiip- 
ping  Company. — Linha  de  vapores  entre  Londres 
e  Cadiz.  Praça  dos  Romulares,  6i. 

Companhia  insultam  de  navegação  para  Lon- 
dres p  Madeira.  — Rua  do  Ferregial  de  Baixo,  3. 

Liverpool  and  Maraulmn  Steam  Ship  Company. 

—  Carreira  mensal  de  vapores  entre  Liverpool  e 
Maranhão,  tocando  em  Lisboa.  Rua  dos  Capellis- 
tas,  3i. 

Companhia  Royal  Mail  Steam  Packet.  —  Rua 
dos  Capellistas,  31. 

Compagnie  des  messageries  maritimes.  Paque- 
bots  poste  frança ise.  Ligne  du  Brésil  et  de  la  Plata. 

—  Travessa  do  Sequeiro  das  Chagas,  1. 


26  NOVO   GUIA 

AGENCIAS,  ASSOCIAÇÕES  E  COMPANHIAS 
Companhia  de  Carruagens  Omuihus 

Rua  do  Crucifixo. 

Companhia  Real  dos  Caminhos  de  Ferro 
Portngueze§ 

A  Santa  Apolónia. 

Companhia  de  Lanifício* 
do  Campo  Grande 

Rua  dos  Retrozeiros. 

Agencia  dos  Vapores  de  Belém 

No  Aterro  da  Boa  Vista. 

Associação  Commercial  de  Lishoa 

Praça  do  commercio. 

Associação  dos  Empregados  do  Estado 

Rua  Augusta. 


DO  VIAJANTE  27 

Associação  dos  Empregados  no  Commer- 
eio  e  Industria 

Rua  dos  Douradores,  72. 

Centro  Promotor  dos  Melhoramentos 
das  Classes  Laboriosas 

Largo  de  S.  Domingos. 

Companhia  Perseverança 

Largo  do  Conde  Barão,  13. 

Companhia  do  Ciae 

Rua  da  Boa  Vista. 

Companhia  Lisbonense  de  Tabacos 

Em  Santa  Apolónia. 

Companhia  de  Tabacos  de  Xabregas 

Em  Xabregas. 

Caixa  de  Credito  Industrial 

Rua  dos  Douradores,  92. 


28  NOVO   GUIA. 

Agencia  Primitiva  de  Annuncios 

Rua  Augusta,  270. 

— Gfe$cs>a — 

DESPACHANTES  ENCARTADOS  DA  ALFANDEGA 
DE  LISBOA 

António  Rodrigues  Tocha. 

Guilherme  dos  Passos  Peixoto. 

Manuel  José  Raptista. 

Carlos  Augusto  Chaves  Nunes. 

António  da  Silva. 

Augusto  Radich. 

Domingos  José  Marques. 

Casimiro  Covacich. 

Joaquim  Lourenço  Freire. 

Justiniano  José  Marques. 

João  Carlos  Raposo. 

José  Maria  Raposo. 

António  Jacinto  Martins  Seromenho. 

José  Manuel  do  Valle. 

Januário  Seabra. 

Chambica  Gonçalves. 

José  Rernardino  da  Cunha  Gomes. 

António  Joaquim  Leite  Ribeiro. 

Cândido  António  de  Faria. 

João  Libório  da  Cunha. 


DO  VIAJANTE  29 

José  Ribeiro  Freire. 

João  de  Sampaio  De  Roure. 

Augusto  Victo  Veiga  da  Cunha. 

Duarte  Braga. 

João  Joaquim  da  Silva  Negrão. 

Jorge  Potier  Alvares. 

António  Martins  Fonseca  Cardoso. 

Francisco  José  da  Silva  Granate. 

Raphael  Archanjo  de  Carvalho. 

Francisco  Roberto  da  Pena  Monteiro. 

Caetano  José  Xavier  de  Sousa. 

CORRECTORES  DE  NUMERO 

DE    CÂMBIOS    E    FUNDOS    PÚBLICOS 

Domingos  Chiapori.  — Rua  dosCapellistas,  113, 
João  Eduardo  da  Silva.  —  Rua  dos  Capellistas, 

113. 
Hermano  Frederico  Moser.  —  Rua  do  Ferregial 

de  Baixo,  5. 

DE  MERCADORIAS    E  LEILOES 

António  Gonçalves  Lamarão.  —  Escriptorio  na 
Praça  do  Commercio. 

António  José  de  Abreu. —  Escriptorio  na  Praça  do 
Commercio. 


30  NOVO   GUIA 

António  Joaquim  Xavier  de  Sousa.  — Escriptorio 
no  edifício  da  alfandega  de  Lisboa. 

António  Massa.  —  Escriptorio  na  Praça  do  Com- 
mercio. 

António  de  Oliveira  Guimarães.  —  Rua  nova  da 
Trindade,  12,  e  na  Praça  do  Gommercio. 

António  Victor  Pereira  Merello.  —  Escriptorio  na 
Praça  do  Commercio. 

DE   NAVIOS  È  LEILÕES 

António  José  Gomes  Netto.  —  Cães  do  Sodré,  1, 
e  na  Praça  do  Gommercio. 

Francisco  de  Paida  Gavazzo.  —  Rua  do  Ale- 
crim, 21. 


POLICIA  CIVIL  DE  LISBOA 

COMMISSARIADO    GEEAL 

(No  edifício  do  governo  civil.) 

Commissario  geral  —  D.  Diogo  de  Sousa. 

Ha  três  divisões  de  policia. 

Os  commissariados  acham-se  abertos  desde  as 
nove  horas  da  manha  até  ás  três  da  tarde,  e  des- 
de as  oito  até  ás  nove  da  noite;  havendo  sempre 
em  todas  as  esquadras  um  empregado  de  gradua- 


DO  VIAJANTE  31 

ção  para  receber  e  dar  o  devido  andamento  a  to- 
das as  queixas,  que  se  apresentam  e  digam  res- 
peito ao  serviço  policial. 

Freguezias  respectivas  a  cada  nm  dos  bairros  e  divisões 
de  policia  civil  de  Lisboa 

BAIRRO  ORIENTAL  E  PRIMEIRA  DIVISÃO 
DE  POLICIA 

Anjos  —  S.  Jorge  (intra-muros)  —  Santo  André 

—  Santa  Engracia  —  S.   Vicente  —  S.  Christovão 

—  S.  Lourenço  —  Pena  —  Soccorro  —  Santa  Cruz 
do  Castello  —  Santo  Estevão  —  S.  João  da  Praça 

—  S.  Miguel  — Sé  — S.  Thiago. 

RAIRRO  CENTRAL  E  SEGUNDA  DIVISÃO 
DE  POLICIA 

Coração  de  Jesus  —  S.  José  —  S.  Julião  —  Santa 
Justa  —  Magdalena  —  S.  Nicolau  —  Conceição  Nova 

—  Encarnação  —  Martyres  —  Sacramento  —  S.  Se- 
bastião da  Pedreira  (intra-muros). 

BAIRRO   OCCIDENTAL   E   TERCEIRA  DIVISÃO 
DE  POLICIA 

Santa  Isabel  (intra-muros)  — S.  Mamede— Santa 
Catharina  —  Mercês  —  S.  Paulo  —  Alcântara  (intra- 
muros —  Lapa  —  Santos  o  Velho. 


32  NOVO   GUIA 

ESTABELECINENTOS  FUNERÁRIOS 

São  quatro  os  mais  notáveis  da  capital  :  o  do 
Castro  situado  na  rua  de  Santo  Antão ;  o  do  Bor- 
cken,  no  fim  da  rua  nova  da  Palma ;  um  no  largo 
da  Abegoaria,  junto  á  rua  da  Trindade,  que  fornece 
carros  fúnebres  no  gosto  moderno,  abertos,  com 
colúmnas  e  muito  luxuosos;  e  um  outro  na  rua 
do  Arco  de  Jesus,  ao  pé  da  rua  Formosa. 

Estes  dois  últimos  estabelecimentos  também  agen- 
ceiam  funeraes,  desde  baixos  preços  até  quantias 
elevadas. 


POSTOS  MÉDICOS 

Estabelecidos  nas  principaes  ruas  da  cidade, 
como  rua  Augusta,  da  Prata,  dos  Fanqueiros,  de 
S.  Bento,  etc.  São  destinados  a  fornecer  facultati- 
vos de  dia  e  noite,  aonde  forem  reclamados  com 
urgência,  mediante  uma  retribuição  estabelecida. 

São  de  bastante  alcance  estes  estabelecimentos, 
pois  n'uma  capital  dão-se  frequentes  casos  de 
doenças  repentinas  e  mesmo  desgraças,  que  reque- 
rem os  promptos  cuidados  de  um  facultativo. 


DO  VIAJANTE  33 

CORREIO 


TABELLA  DOS  PORTES  DA8  CORRESPONDÊNCIAS 


Correspondências  do  reino  e  Ilhas  adjacentes 
e  da  posta  interna 


Cartas 
Franquia  facultativa 

Sendo  franqueadas  por  meio  de  sêllos  postaes : 

Até  10  grammas  inclusivamente 2o  réis 

»    20         •  »  50     » 

»    30        »  »  7o     » 

E  assim  por  diante,  subindo  25  réis  por  cada  10 
grammas  ou  fracção  de  10  grammas  que  acres- 
cer. 

Nâo  sendo  franqueadas  por  meio  de  sêllos  pos- 
taes : 

Até  10  grammas  inclusivamente 50  réis 

»    20         »  »  100     » 

d    30         »  »  150     )> 

E  assim  por  diante,  subindo  50  réis  por  cada  10 
grammas,  ou  fracção  de  10  grammas  que  ac- 

crescer. 
3 


34  NOVO   GUIA 

Correspondências  estrangeiras 

Recebidas  avulsas  por  via  de  Hespanha,  qual- 
quer que  seja  a  sua  procedência,  não  transmiti- 
das em  conformidade  com  as  convenções  postaes. 

Cartas 

Até  10  grammas  inclusivamente 200  réis 

»    20        »  »  400     » 

»    30        »  »  600     » 

E  assim  por  diante,  subindo  200  réis  por  cada  10 
grammas,  ou  fracção  de  10  grammas  que  acres- 
cer. 

Recebidas  avulsas  ou  em  malas  por  via  maríti- 
ma, não  transmitticlas  em  conformidade  com  as 
convenções  postaes. 

Cartas 

Até  10  grammas  inclusivamente 100  réis 

»    20        »  »  200     » 

»    30         »  »  300     » 

E  assim  por  diante,  subindo  100  réis  por  cada  10 
grammas,  ou  fracção  de  10  grammas  que  acres- 
cer. 


Recebidas  da  America  do  sul,  ou  para  alli  ex- 
pedidas por  barcos  de  vapor  não  subsidiados  por 


DO  VIAJANTE  35 

governos  estrangeiros,  com  os  quaes  esteja,  ou  ve- 
nha a  ser  regulada  por  convenções  ou  ajustes  a 
expedição  e  recepção  das  correspondências. 

Cartas 

Até  40  grammas  inclusivamente 80  réis 

»    20        »  i  160     » 

»    30         »  »  240     » 

E  assim  por  diante,  subindo  80  réis  por  cada  10 
grammas,  ou  fracção  de  10  grammas  que  acres- 
cer. 

Recebidas  de  Gibraltar,  ou  para  alli  expedidas 
por  via  de  Hespanha. 

Cartas 

Até  10  grammas  inclusivamente 60  réis 

»    20         »  »  120     » 

»    30        »  »  180     » 

E  assim  por  diante,  subindo  60  réis  por  cada  10 
grammas,  ou  fracção  de  10  grammas  que  acres- 
cer. 


CorrcKponclenrluN  rc-isiudus  para  o  reino 
e  ilha*  udjurenlCM 

Franquia  obrigatória  por  meio  de  stMlos  do  correio 

Por  cada  carta  ou  maço : 
Premio  fixo  do  registo 100  réis 


36  NOVO   GUIA 

Porte,  o  correspondente  ao  peso  segundo  a  classe 
das  correspondências. 


Correspondências  apartadas,  nacionaes 

ou  estrangeiras 

i 

Por  cada  carta,  ou  maço  de  impressos, 
e  amostras  de  fazendas 10  réis 


Províncias  ultramarinas 

(N3o  tem  franquia  por  meio  de  sêllos) 

Cartas 

Até  15  grammas,  inclusive 50  réis 

»    22,5       »  »        100    » 

»    30  »  »        150    » 

E  assim  por  diante,  augmentando  50  réis  por  cada 
7,5  grammas. 

Impressos,  lytographias  ou  gravuras  (cintados) 

Até  30  grammas,  inclusive 20  réis 

»    60  »  »        40    » 

»    90  »  »       60    » 

E  assim  por  diante,  augmentando  20  réis  cada  30 
grammas. 


DO   VIAJANTE  37 

Manuscriptos  e  amostras  de  fazendas  (cintados) 

Até  30  grammas,  inclusive 50  réis 

»    60  i  »        100    » 

»    90  »  »       150    ■ 

E  assim  por  diante,  augmentando  50  réis  por  cada 
30  grammas. 

Jornaes  cintados,  cada  folha  de  impres- 
são         10  réis 

Cartas  registadas  :  premio  fixo  do  regis- 
to de  cada  carta,  além  do  porte 100     » 


Tabeliã  dos  portes  a  que  Ueatu  sujeitas  as  corrcspon- 
deneias  franqueadas  originarias  de  •"oriu^ul.  ."Ma- 
deira e  Açores,  coiu  destino  para  Itália  e  para  os  pai- 
zes  a  que  a  Itália  serve  de  intermédio  nos  termos  da 
convenção  postal  de  i  de  abril  de  isso 

CORRESPONDÊNCIAS  ORIGINARIAS  DE  PORTUGAL,  MADEIRA. 
E  AÇORES,  COM  DESTINO  PARA  ITÁLIA 

Cartas  ordinárias  e  amostras  de  fazendas 
por  via  de  Hespanha  e  França 

Franquia  facultativa  em  séllos 

Até  10  grammas  inclusive láO  réis 

E  assim  por  diante,  augmentando  120  réis  por  cada 
10  grammas,  ou  fracção  d'este  peso. 


38 


NOVO    GUIA 


Cartas  ordinárias  e  amostras  de  fazendas 
por  via  marítima 

Franquia  obrigatória  em  sêllos 

Até  15  grammas  inclusive 100  réis 

E  assim  por  diante,  augmentando  100  réis  por 
cada  15  grammas,  ou  fracção  d'este  peso. 

Cartas  e  impressos  registados  por  via  de  Hespanha 
e  França 

Serão  sempre  franquiados  por  meio  de  sêllos,  e 
aos  portes  respectivos  se  addicionará  o  premio  in- 
variável de  100  réis  em  sêllos  pelo  registo. 

N.  B.  Por  via  de  mar  não  se  expedem  corres- 
pondências registadas. 


CORRESPONDÊNCIAS  ORIGINARIAS  DE  PORTUGAL 

MADEIRA  E  AÇORES,  EM  TRANSITO  POR  ITÁLIA,  COM  DESTINO 

PARA  OS  PAIZES  ABAIXO  ASSIGNADOS 

Áustria 

Cartas  ordinárias,  franquia  facultativa  até  ao  des- 
tino, 170  réis  por  cada  fracção  até  10  grammas. 
Cartas  registadas,  idem  obrigatória,  290  idem. 
Jornaes  e  outros  impressos,  idem,  35  idem. 

Greda 

Cartas  ordinárias,  idem  facultativa,  170  idem. 


DO  VIAJANTE  39 

Cartas  registadas,  idem  obrigatória,  290  idem. 
Jornaes  e  outros  impressos,  idem,  35  idem. 

Egypto  (excepto  Alexandria) 

Cartas  ordinárias,  idem  até  Alexandria,  170  idem. 
Jornaes  e  outros  impressos,  idem,  30  idem. 

Alexandria  do  Egypto  e  Tunes 

Cartas  ordinárias,  idem  facultativa  até  ao  destino, 

170  idem. 
Cartas  registadas,  idem  obrigatória,  290  idem. 
Jornaes  e  outros  impressos,  idem,  30  idem. 

Tripoli  da  Berbéria 

Cartas  ordinárias,  idem,  170  idem. 
Jornaes  e  outros  impressos,  idem,  30  idem. 

N.  B.  É  expressamente  prohibido  incluir  nas 
cartas  que  não  forem  registadas,  dinheiro  ou  quaes- 
quer  outros  objectos  de  valor.  As  cartas  não  re- 
gistadas, contendo  qualquer  dos  objectos  mencio- 
nados, serão  retiradas  nas  estações  postaes,  em 
que  forem  lançadas,  e  enviadas  olficialmente  á  di- 
recção geral  dos  correios,  que  procederá  á  sua 
abertura,  e  fará  entrar  nos  cofres  da  fazenda,  á 
qual  íicam  pertencendo,  os  objectos  n'ellas  encon- 
trados. No  caso  de  perda  ou  descaminho  de  algu- 
ma carta  registada,  que  contenha  dinheiro,  jóias, 
ou  quaesquer  outros  objectos  de  oiro  ou  prata,  a 


40  NOVO   GUIA 

administração  geral  dos  correios  só  pagará  ao  re- 
mettente  a  indemnisação  de  5$000  réis.  As  cartas 
que  houverem  de  ser  registadas,  apresentar-se-hão 
fechadas  com  lacre,  que  deverá  prender  todas  as 
dobras  dos  sobrescriptos. 

Os  maços  de  impressos,  manuscriptos  ou  amos- 
tras de  fazendas,  que  contiverem  cartas,  serão  por- 
teados  como  cartas  não  franqueadas  e  remettidas 
ao  seu  destino.  Os  maços  que  contiverem  junta- 
mente impressos,  manuscriptos  ou  amostras,  de- 
verão ser  franqueados  pelo  maior  porte,  que  com- 
petir á  classe  das  correspondências  n'elles  encer- 
radas; não  se  achando  satisfeitas  estas  condições 
os  ditos  maços  ficarão  retidos,  até  lhe  serem  affi- 
xados  pelos  remettentes  os  sêllos  que  lhe  faltarem. 

Nenhum  maço  de  impressos  ou  de  amostras  de- 
verá exceder  o  peso  de  1:000  grammas. 


— <=G=>o<=3a- 


SERVIÇO  TELEGKAPHICO  NACIONAL 

TAXA  DOS  TELEGBAMMAS  TROCADOS  ENTRE  DUAS  ESTAÇÕES 
PORTUGUEZAS 

Dentro  do  reino 

Por  cada  despacho  simples  de  uma  a 

vinte  palavras 200  réis 

Por  cada  serie  de  10  a  mais  das  vinte    100    » 


DO  VIAJANTE  M 

Dentro  do  recinto  de  Lisboa  e  Porto 

Por  cada  despacho  simples  de  uma  a 

vinte  palavras 50     » 

Por  cada  serie  de  dez  a  mais  das  vinte      25     » 

Fazem  parte  do  recinto  de  Lisboa  as  estações 
de  Belém,  Ajuda  e  Bom  Successo,  e  do  Porto  as 
da  Foz  do  Douro,  Mattosinhos  e  Devezas. 

Por  aviso  que  se  pretenda  de  estar  á 
vista  qualquer  navio  de  guerra  ou 
paquete 100  réis 

Para  o  que  se  dará  parte  previamente  nas  es- 
tações principaes  de  Lisboa  ou  Porto. 

Por  cada  despacho  trocado  entre  as  esta- 
ções telegraphicas  e  os  navios  no  mar     600  réis 

Sendo  só  trocado  entre  a  estação  e  o  na- 
vio, sem  que  tenha  de  ser  transmittido 
pelo  telegrapho  eléctrico 400     ■ 


TABELLIAES  DE  LISBOA 

António  de  Abranches  Coelho,  rua  dos  Capellistas, 
109,  loja. —  Cartório  n.°  6. 


42 


NOVO    GUIA 


António  Joaquim  Freire  Cardoso,  rua  do  Ouro,  26, 
loja.  —  Cartório  n.°  8. 

Avelino  Eduardo  da  Silva  Mattos  e  Carvalho, 
rua  do  Ouro,  265,  sobre-loja.  —  Cartório  n.° 
16. 

Camillo  José  dos  Santos,  rua  do  Arsenal,  1.°  — 
Cartório  n.°  13. 

João  António  Godinho  e  Lima,  praça  de  D.  Pedro, 
93,  loja.  —  Cartório  n.°  14. 

Francisco  Guilherme  de  Brito,  rua  do  Ouro,  165, 
sobre-loja. —Cartório  n.°  10. 

Francisco  Vieira  da  Silva  Barradas,  rua  Augusta, 
28,  1.°  — Cartório  n.°  7. 

João  Baptista  Ferreira,  rua  nova  do  Carmo,  102, 
sobre-loja. — Cartono  n.°  9. 

João  Baptista  Scola,  rua  da  Magdalena,  75,  1.°  — 
Cartório  n.°  15. 

Jorge  Camelier,  rua  do  Ouro,  50,  1.°  —  Cartó- 
rio n.°  4. 

Jorge  Filippe  Cosmelli,  rua  do  Crucifixo,  50,  so- 
bre-loja.—  Cartório  n,°  18. 

José  Carlos  Rodrigues  Grillo,  rua  de  S.  Bento,  61, 
loja.  —  Cartório  n.°  12. 

José  Justino  de  Andrade  e  Silva,  rua  da  Magda- 
lena, 8,  1.°  — Cartório  n.°  2. 

José  Maria  Barcellog  Júnior,  rua  do  Ouro,  265,  so- 
bre-loja.—  Cartório  n.°  1. 

Manuel  Augusto  de  Moraes  da  Silva,  rua  Augusta, 
141,  1.°— Cartório  n.°  3. 


DO   VIAJANTE 


43 


Manuel  Bernardino  Soares  de  Brito,  rua  de  Santo 

Antão,  9,  1.°  — Cartório  n.°  II. 
Manuel  Maria  Mascarenhas  Xavier  de  Brito,  rua  da 

Prata,  98,  2.°  —  Cartório  n.°  5. 
Pedro  Ricardo  Cosmelli,  rua  de  S.  Paulo,  238,  so- 

bre-loja. — Cartório  n.°  17. 


TABELLA  PERMANENTE  DOS  CAMINHOS  DE  FERRO 
PORTLGIEZES 


ENTRE  LISBOA  E  O  ENTRONCAMENTO 


Estações 


Preço  dos  bilhetes 
por  classes 


1. 


Lisboa 

Poço  do  Bispo  .... 

Olivaes 

Sacavém  

Povoa  

Alverca 

Alhandra 

Villa  Franca  ..... 

Carregado 

Azambuja 

Ponte  de  Reguengo 

Bant'Anna 

Valle  de  Santarém 

Santarém 

Valle  da  Figueira . 
Matto  de  Miranda. 
Torres  Novas 


£120 
£140 
1190 
£350 
|420 
£500 
*590 
3700 

£040 
0160 

£420 
£420 
|590 

£780 
£950 


£090 
£110 
£150 
J270 
£330 
£390 
£4H0 
1550 

1810 

£900 
1£110 
l  1110 
1£240 
I 
l  1520 


,<i70 
£080 
£110 
£190 
£240 
1280 
£330 

0580 
0650 
0790 

0990 

; 


44 


NOVO   GUIA. 

ENTRE  LISBOA  E  PORTO 


Estações 


Preços  dos  bilhetes 
por  classes 


1. 


3.a 


Lisboa 

Entroncam.  !£hefada 
/Partida 

Thomar  (Payalvo) 

Chão  de  Maçãs 

Casarias 

Albergaria 

Vorrnoil 

Pombal 

Soure 

Formoselha 

Taveiro 

Coimbra ' 

Souzella 

Mealhada 

Mogofores 

Oliveira  do  Bairro 

Aveiro 

Estarreja 

Ovar 

Esmoriz 

Espinho 

Granja 

Valladares 

Villa  Nova  de  Gaya 


20030 

2£290 

20460 
20650 
20840 
80070 
30220 
30520 
30820 
40010 
40130 
40260 
40480 
4^640 
40790 
50160 
50450 
50690 
50900 
60020 
60070 
60200 
60300 


10580 

10780 
10920 
20060 
20210 
20390 
20500 
20740 
20970 
30120 
30210 
30310 
30490 
30610 
30720 
40020 
40240 
40430 
40590 
40680 
4^720 
40830 
40900 


10130 

10280 
10370 
10470 
10580 
10710 
10790 
10960 
20130 
20230 
20290 
20370 
20490 
20580 
20b6O 
20870 
30030 
30170 
30280 
30340 
30380 
30450 
30500 


ENTRE  LISBOA  E  BADAJOZ 


Lisboa 

E.itroncam.!Shegda|. 
( Partida    ) 

Barquinha 

Praia 


20030 

20100 
20250 


10580 

10640 
1$750 


10130 

10170 
10250 


DO   VIAJANTE 


45 


Estações 


Tramagal 
Abrantes. 
Bemposta 
Ponte  de  Sor 

Chança  

Crato 

Portalegre  . . 
Assumar 
Santa  Eulália, 

Elvas 

Badajoz , 


Preços  dos  bilhetes 
por  classes 


1.» 


2^4G0 
2ò560 
2ò780 
3*100 

3„4S0 
36780 
■i^ilO 
4^300 
4  £650 
5S010 
5^340 


1*920 
1*990 
2*170 
2*420 

2-5710 
2^*40 
3  MOO 
3*340 
3*620 
3*900 
4^150 


U370 
1*420 
1  *550 
1*730 
U940 
2*100 
2*280 
2*390 
2*590 
2á7^0 
2*960 


BILHETES   ESPECIAES   A   FREÇOS   REDUZIDOS 

1.°  Bilhetes  de  3.a  classe  de  ida  e  volta,  válidos  desde 
os  sabbaios  até  ás  segundas  feiras,  e  desde  as  vésperas 
doa  dias  santificados  até  ao  immediato  a  estes  de  Villa 
Nova  d'1  (*aya  a  todas  as  estações  até  Ovar. 

2.°  Bilhetes  de  todas  as  classes,  diários  de  ida  e  volta, 
com  abatimento  de  20  por  cento. 

De  Lisboa  a  todas  as  estações  até  Santarém,  e  vice- 
versa. 

1 )  ■  Villa  Nova  de  Gaya  a  todas  as  estações  até  Aveiro 
e  vice-verga. 

De  Coimbra  a  todas  as  estaçàes  até  Pombal,  e  vice- 
ver.-a. 

De  Coimbra  a  todas  as  estações  até  Villa  Nova  de  Gaya 
e  vice  versa. 

De  Elvas  a  Badajoz,  e  vice- versa. 

3."  Bilhete*  collectivofl  de  3.a  classe  a  6  réis  por  pessoa 
o  kilometro,  pari  grupos  nunca  inferiores  a  20  passageiros 
das  estações  comprehendidai  entre  Villa  Nova  de  Gaya  e 
Soure  inclosivé  para  ns  compreheodidaa  : 

1.°  Entre  Ponte  de  Sor  e  Elvas  inclusive  ou  vice-versa 

2.°       »       Entroncamento  a  Lisboa     »  »       » 


46  NOVO   GUIA 

CAMINHO  DE  FERRO  DO  SUESTE 

Estação  principal,  Praça  do  Commercio  (ponte 

dos  vapores),  escriptorio  da  direcção,  no  edifício  da  secretaria 

das  obras  publicas 

Serviço  dos  vapores 


Estações 

Preços 
de  Lisboa 

Estações 

Preços 
do  Seixal 

Ké 

Proa 

Ré 

Proa 



: 



__ 

50 

30 

Cam.°  de  ferro . 

50 

30 

Cam.°  de  ferro . 

150 

100 

50 

30 

150 

100 

150 

100 

SUL    E   SUESTE 


Barreiro 

Lavradio 

Alhos  Vedros 

Moita 

Pinhal  Novo  (Entronca 

mento) 

Palmella 

Setúbal 

Poceirão 

Pegões 

Vendas  Novas 

Montemor 

Casa   Branca   (Entron 

camento 

Alcáçovas 


Distan- 

Preço dos  bilhetes 

cias 

por  classes 

Kilom. 

1.» 

2.a 

3.* 

, 

. 

_ 

2 

£170 

$140 

$100 

5 

$170 

$140 

$100 

8 

$240 

$190 

$140 

15 

$420 

$320 

#230 

23 

$620 

$480 

$330 

28 

$750 

$570 

$390 

30 

$800 

$610 

$420 

42 

1$100 

$830 

$570 

57 

1$480 

10120 

:>760 

78 

1$930 

1$460 

$990 

91 

2$310 

10740 

10170 

103 

2$610 

10970 

10330 

DO   VIAJANTE 


47 


Estações 


Distan- 
cias 

Kilom. 


Preço  dos  bilheteí 
por  classes 

1." 


Vianna 

Évora 

Villa  Nova. 

Alvito 

Cuba 

Beja 

Baleisào  . . . 
Quintos. .  . . 
Outeiro 
Figueirinha 
Carregueiro 
Casevel 
Azareja 
Vai  Pereira 


111 

23810 

23120 

13430 

117 

2£960 

23230 

13500 

117 

23990 

23250 

13510 

125 

3,5190 

2  MOO 

13620 

138 

3  £490 

2^630 

13770 

154 

33920 

23950 

13980 

166 

4  5220 

33180 

23130 

174 

4  5420 

30330 

23230 

170 

43330 

33360 

2  5190 

4  5610 

33460 

2  5310 

191 

43860 

3  5650 

2*400 

200 

5  .120 

33840 

2  5580 

136 

3  5460 

1610 

1*750 

141 

33590 

2,3710 

13820 

N.  B.  Todos  os  bilhetes  comprados  em  Lisboa  teem  o 
augmento  de  150  réis  para  o  vapor  na  1."  e  2.a  classe,  e 
100  réis  na  3.a  classe. 

Para  a  linha  de  Quintos  só  ha  comboyos  ás  terças,  quin- 
tas, sabbados  e  domingos. 


48 


NOVO   GUIA 


PREÇOS  DA  COMPANHIA  DE  CARRUAGENS  LISBONENSES 

Estação  central.  —  Largo  de  S.  Roque.  Estação  filial.  —Rua  direita 
d'Âlcantara,  50  a  53.  Estações  telegraphicas.  — Travessa  de  Santa 
Justa,  85.  —  Rua  de  S.  Bento,  25  (próximo  á  calçada  da  Estrella). 

Tabeliã  de  preços 


DEMARCAÇÃO  para  0  SERVIÇO  ordinário  das  carruagens 

Dá-Fundo,  largo  d'Ajuda,  largo  do  Calhariz  e  egreja  parochial  de 
Bemfica,  largo  de  Carnide,  calçada  de  Carriche  (Nova  Cintra), 
Ameixoeira,  largo  da  Charneca,  alto  da  Portella,  largo  dos  Olivaes. 


SERVIÇOS 

PREÇOS 

TREU 

CBAR-Á-BANCS 

TREU 

4  pessoas 

2  pessoas 

9  pessoas 

Dentro  da  demarcação 

POR  DIA 

Todo  o  dia,  desde  o  romper  do 
sol  até  á  meia  noite 

Manhã,  desde  o  romper  do  sol 
até  ao  meio  dia .......... 

$$000 

2$000 

3$000 

$400 

3$500 

1$800 

2$500 

$300 

6$000 

3$500 

4$500 

$800 

Tarde,  desde  o  meio  dia  até  á 

Cada  hora  de  serviço,  antes  ou 
depois  das  horassupra 

ÁS  HOKAS 

Desde  o  romper  do  sol 
até  á  meia  noite 

Terceira  e  seguintes,  não  ha- 
vendo interrupção       

Meias  horas  depois  das  2    . . . 

1$300 

"  $400 
$200 

1$200 

$300 
$200 

-$- 

-$- 

-$- 

Fora  da  demarcação 

Alérn  dos  preços  acima  estipu- 
lados paga-se  mais : 

Por    cada  légua  fora  da  de- 
marcação   

$400 
$200 

$300 
$200 

$600 
$300 

Por  cada  meia  légua  mais  ... 

DO   VIAJANTE 


49 


PREÇOS 

* 

SERVIÇOS 

* 

TKEM 

TREM 

CHAR-Á-BANCS 

í  pessoas 

2  pessoas 

9  pessoas 

Serviço  especial 

Ostra— Dia  todo,  levar  e  tra 

zer,  desde  o  romper  do  sol 

6£500 

?i3500 

10£200 

Ir  levar  ou  buscar    

5^800 

4£000 

3  ,200 

Collares  —  Dia  todo,  levar  e 

8^600 

6£<i00 

13á00n 

Levar  ou  buscar    

tíà-200 

1  00 

9^600 

Mafra — Dois  dias,  ir  n'um  dia 

1-2^000 

9£000 

18^000 

Um  dia,  ir  levar  ou  buscar. . . 

8^000 

6*>Í00 

12^000 

Ericeira  — Dois  dias,  ir  n'um 

dia  e  voltar  no  seguinte    . . 

1i$2f»0 

1 1 àOOO 

22^000 

Ir  levar  ou  buscar. 

10*300 

8*400 

IGjàOOO 

Mafra,  Ostra,  Lisboa  —  Três 

dias,  indo  de  Lisboa  a  .Ma- 

fra, no  dia  seguinte  a  Cin- 

tra, e  no  terceiro  para  Lis- 

16^800 

ispoo 

•27  £000 

Estoril  E  Cascaes  —  Dia  todo. 

levar  e  trazer,  desde  o  rom- 

per do  S(  l  até  á  meia  noite 

6^000 

íiáOOO 

9^000 

I  ,:;oo 

4jà000 

7^000 

Qieli  z  ou  Bellas— Para  qual- 

quer d'estas  localidades  Dão 

augiwnlam  os  preços,   por 

dia,  dentro  da  demarcarão. 

uma  vez  que  os  trens  não  ia 

çani  serviço  em  Lisboa. 

Cami.mio  di  Ferro  -  levar  ou 

bQKftl 

H-200 

1  ,000 

-£- 

Tiikvtro  —  levar  e  buscar  . . . 

IJ500 

i  boo 

-è- 

Bajli  —  levar  e  buscar. . . . 

,  000 

■1  ,'.0<» 

l— 

1  1800 

1  ij.'i00 

"*-    1 

OU                                             NOVO   GUIA 

Aluguer  aos  niezes 

SERVIÇOS 

* 

PREÇOS 

TREM             TREM 
4  pessoas     2  pessoas 

78£000 

70$000 

ESTABELECIMENTO  DE  CARRUAGENS 
DE  CAMPOS  JÚNIOR 

Rua  do  Arco  do  Bandeira,  n.°  187 


Ha  um  variado  sortimento  de  trens,  como  se 
fossem  particulares,  commodos  e  elegantes,  sendo  : 
caleches,  coupés,  victorias,  phatons,  char-a-bancs, 
etc,  próprios  para  visitas,  theatros,  casamentos, 
baptisados,  passeios  ao  campo,  banhos,  e  todos  os 
mais  serviços. 

Também  se  alugam  trens  aos  mezes.  Os  preços 
são  os  mais  rasoaveis,  e  nâo  superiores  aos  dos 
outros  estabelecimentos. 


DO  VIAJANTE  51 

Tabeliã  dos  preços  dos  trens  de  aluguer 

PREÇOS  DOS  TRENS  DE  PRAÇA 


Designação  do  serviço 


DENTRO  DA  CIDADE 

Corrida 

Ás  horas  : 

Cada  hora 

Cada  V  ■,  hora  mais 

Cada  l  |  de  hora  mais. .  .  . 

FORA   DA  CIDADE 

Yumr.  área  de  10  kilometros 
a  contar  do  ponto  de  parti  ia 

Ás  hora-  : 
Cada  r  j  de  hora  de  ida  . . . 
í  Sada  Vi  de  hora  de  espera. 

De  volta  para  a  cidade  . . 


Preços 
de  dia 


300 

400 
200 
100 


150 
100 


Preços  de  noite 


Até  a 
1  hora 


320 

210 
105 


155 

100 


Da  1  hora 
até  ao 

romper  da 
aurora 


620 

820 
410 
205 


305 
100 


do  que  fòr  contado  pela  ida 


OBSERVAÇÕES 


que  forem  transportados  mais  de  dois  passagei- 
ros, augmenta  o  preço,  por  cada  um  que  exceder,  no  equi- 
valente a  metade  do  que  fica  estabelecido  para  dentro  da 
cidade,  o  para  fora  com  respeito  a  ida  e  volta. 

Qualquer  espaço  de  tempo,  maiox  de  cinco  minutos,  que 
exceda  aquelle  que  se  contar  na  forma  da  presente  tabeliã, 
será  tido  como  um  quarto  de  hora,  para  ser  pago  n'essa 
conformidade. 

O  preço  da  passagem  de  noite  só  tem  logar  quando  ac- 
cesa  a  illuminação  publica  no  ponto  da  partida. 


52  NOVO   GUIA 

COMPANHIA  DE  CARRUAGENS  OMNIBUS 

Largo  do  Pelourinho  n.os  16  e  17 

Tabeliã  das  viagens,  horas  e  preços  de  diferentes  carreiras, 
dependentes  das  alteraçôss  que  o  serviço  possa  exigir 

Carreira  de  Belém.  —  Verão  —  25  viagens  das  7 
horas  da  manhã  ás  10  da  noite. 

Inverno  —  20  viagens  das  772  da  manhã  ás  7d/2 
da  noite. 

Termo  médio  entre  viagem  é  de  á/a  hora. 

Preço  80  réis  de  dia,  120  á  noite;  estação  em 
Alcântara,  preço  50  réis. 

Carreira  de  Bemíica.  —  Verão  —  5  viagens  das  7'/4 
da  manhão  ás  73/4  da  noite. 

Inverno  — 3  viagens  das  7'/4  da  manhã  ás  6'/2 
da  noite. 

Preço  — Dia  120  réis,  noite  160  réis.  Estações 
ás  portas  60  réis  dia,  80  réis  noite. 

Carreira  do  Lumiar.  —  Idem. 

Carreira  do  Poço  do  Bispo.  —  Idem.  Preço  80  réis 
dia  e  noite,  estação  a  Xabregas  60  réis. 

Carreira  de  Oeiras.  —  Verão  e  inverno  —  1  viagem. 
Ida  ás  3  horas  da  tarde,  volta  ás  7  da  manhã, 
preço  240  réis.  Estações :  Alcântara  50  réis,  Belém 
80  réis,  Pedroiços  120  réis,  Cruz  Quebrada  160  réis. 

Carreira  de  Cintra.  — Extraordinárias.  — Preço  600 
réis  por  pessoa  ida  ou  volta ;  ida  e  volta  1$000  réis. 

Alugam  carruagens  para  differentes  pontos  — 
médio  do  preço,  o  completo  da  carruagem. 


DO  VIAJANTE  53 

HOTÉIS  E  CASAS  DE  PASTO 

Grande  Hotel.  —  Rua  do  Chiado,  72.  Ésemcon- 
tradieção  a  primeira  casa  de  pasto  de  Lisboa,  tanto 
pela  boa  sociedade  que  a  frequenta,  como  pela 
perfeição  de  seus  diversos  e  exquisitos  manjares. 
É  seu  proprietário  o  bem  conhecido  Matta.  For- 
nece jantares  diplomáticos,  ceias  para  bailes,  etc. 

Restauram  Central,  —  Rua  do  Oiro,  entrada  pela 
travessa  da  Assumpção,  90. 

União.  —  Rua  da  Conceição  (vulgo  rua  dos  Re- 
trozeiros),  149. 

Irmãos  Unidos.  — Rua  das  Gallinheiras,  1 1 ;  tam- 
bém tem  entrada  pela  Praça  de  D.  Pedro,  113. 

Garcia.  —  Pasteleiro  na  rua  da  Prata,  2G7. 

Estreita  de  Oiro.  —  Rua  da  Prata,  289. 

Peixe  assado.  —  Bua  larga  de  S.  Roque,  72. 

Gaito.  —Rua  dos  Algibebes,  91. 

Antigo  Cambalhota.  —  Rua  Oriental  do  Passeio. 
145,  entrada  pela  escada. 

Antigo  Magina.  —  Pateo  do  Duque  (atraz  do 
theatro  de  D.  Maria),  tem  também  entrada  pela 
rua  de  Santo  Antão,  9. 

Toboas.  —  Travessa  de  S.  Domingos,  47. 

Manuel  Lourenço.  —  Rua  da  Prata,  100. 

João  do  Gallo.  —  Rua  da  Prata,  54. 

Chuça.  —Rua  da  Prata,  53. 

Antigo  Penim.  —  Travessa  do  Regedor,  18;  en- 
trada pela  escada. 


84 


NOVO   GUIA 


Estrella  de  Prata.  —  Rua  nova  do  Amparo,  7. 

Romão.  —  Rua  do  Arco  do  Bandeira,,  10.  Afa- 
mado pelos  bons  pasteis  e  boas  ostras. 

Central.  —  Rua  do  Amparo,  28. 

Martins. — Rua  Augusta,  214. 

Ha  ainda  outras  casas  de  pasto  em  diversos  pon- 
tos da  capital  que  não  vâo  aqui  mencionadas. 


BOTEQUINS  OU  CAFÉS 

Café  Central.  —  Rua  do  Chiado.  Fornece  almo- 
ços de  garfo,  ceias,  etc.  É  frequentado  pelos  rapa- 
zes da  melhor  sociedade,  os  quaes  alli  se  reúnem 
á  noite  até  alta  hora.  Tem  gabinetes  reservados. 

Áurea  Peninsular.  —  Rua  do  Oiro ;  tem  bilha- 
res e  diversos  jogos. 

Antigo  Tavares.  —  Rua  larga  de  S.  Roque ;  tem 
bilhares. 

Café  Camões.  —  Largo  de  Gamões. 

Café  Freitas.  —  Praça  de  D.  Pedro. 

Café  Europeu.  — Praça  de  D.  Pedro.  Tem  bilha- 
res. 

Café  Suisso.  —  Largo  de  Camões.  Tem  jogos. 

Martinho.  —  Largo  de  Camões.  Ponto  de  reunião 
dos  litteratos  e  politicos. 

Antigo  Marcos  Filippe.  —  Largo  do  Pelourinho. 


DO  VIAJANTE  55 

Martinho  da  Neve. — Debaixo  da  arcada  da  Praça 
do  Commercio,  no  fim  da  rua  da  Prata. 

Mar  rave.  —  Travessa  de  Santa  Justa ;  tem  bilha- 
res. 

Antigo  Barnabé.  —  Largo  de  Santa  Justa ;  tem 
bilhar. 

Café  Eléctrico. — Rua  de  S.  Julião  (vulgo,  rua 
dos  Algibebes) ;  tem  bilhares. 

Café  Francez.  —  Rua  do  Alecrim ;  tem  bilhares. 

Café  Montanha.  —  Travessa  da  Assumpção.  É 
um  magniGco  café,  elegante,  muito  frequentado,  e 
tem  seis  bilhares  no  andar  superior.  Fornece  co- 
midas frias,  etc. 

Café  do  Commercio.  —  Praça  dos  Romulares,  6. 

Antigo  Bernardo.  —  Praça  dos  Romulares,  H. 

Café  Pr  ice  (taberna  ingleza).  —  Cães  do  Sodré, 
76.  Fornece  almoços  e  mesmo  jantares  â  ingleza; 
é  notável  pelos  seus  bifes,  e  muito  frequentada  por 
estrangeiros  e  maritimos. 

Café  Gibraltar  (Restauram).  —  Cães  do  Sodré, 
39.  Tem  bilhares,  comidas  frias,  e  bem  decorados 
gabinetes  para  senhoras. 

Cajé  Oriental  (Restaurant). — Rua  dos  Algibe- 
bes, 134. 

Café  Casino  (antigo  Café  Concerto).  —  Estabe- 
lecido no  mesmu  Casino,  largo  da  Abegoaria;  é 
espaçoso,  elegante,  tem  bilhares  e  diversos  jogos. 
No  andar  superior  dão-se  bailes  mascarados,  con- 
certos, etc. 


56 


NOVO    GUIA 


Salão  Britannico. —  Praça  de  D.  Pedro.  Tem 
bilhares. 

Brasserie  de  Vienna. — Rua  do  Príncipe,  47. 
Comidas  frias,  sorvetes,  refescos,  vinhos,  cerveja 
da  Baviera,  etc.  Tem  diversos  jogos. 

Deposito  de  cerveja  da  Baviera.  —  Rua  do  Prín- 
cipe, 72.  É  administrada  pelo  fabricante  de  cerveja 
Jansen,  e  fornece  refescos,  cervejas,  etc.  É  deco- 
rada com  todo  o  aceio  e  elegância.  Tem  bilha- 
res. 

Deposito  de  cerveja.  —  Rua  do  Thesouro  Velho. 
Cerveja  da  Baviera  da  fabrica  de  Jansen,  refrescos, 
etc.  É  um  bello  estabelecimenlo  muito  frequentado 
e  tem  diversos  jogos. 

Mayllard.  —  Deposito  de  cerveja.  Rua  de  S. Bento. 

Bolla  de  prata.  —  Calçada  do  Carmo,  106.  Tem 
bella  soda  Water. 

Ha  mais  outros  botequins  ou  cafés  menos  im- 
portantes que  aqui  não  mencionamos. 


PHOTOGRAPHIAS 

Sifca.  —  Photographo  de  suas  magestades.  Cal- 
çada das  Necessidades. 

Photographie  Universelle.  —  Rua  Oriental  do 
Passeio,  52.  Os  trabalhos  d'este  estabelecimento 
são  de  muita  perfeição. 


DO   VIAJANTE  57 

Aux  arts  reunis.  —  Rua  nova  dos  Martyres,  46. 
Tira  também  retratos  a  óleo. 

Rocha.  —  Praça  da  Alegria,  111. 

Photographia  Nacional. — Damião  da  Graça. 
Praça  da  Alegria,  106. 

Photographia  Luso-Escoceza. — Rua  do  Arsenal, 
108. 

Schenk.  —  Rua  do  Teixeira,  a  S.  Pedro  de  Al- 
cântara. 

Loureiro.  —  Calçada  do  Duque,  18. 

Bastos.  —  Calçada  do  Duque,  25. 

Gomes.  —  Travessa  das  Portas  de  Santa  Catha- 
rina,  9. 

Photographia  Central. — Largo  da  Abegoaria 
(junto  á  rua  da  Trindade),  4. 

Rocc/iini.  —Rua  larga  de  S.  Roque,  entrada  pela 
travessa  da  Agua  de  Flor,  1. 

Henrique  Nunes.  —  Rua  das  Chagas. 

Gomes.  —  Rua  nova  da  Palma. 

Pardal. — Roa  de  S.  Paulo. 

Photographia  Lusitana. — Rua  do  Moinho  de 
Vento,  junto  ao  passeio  de  S.  Pedro  de  Alcântara. 

Marron.  —  Rua  do  Caldeira. 

Lusitana.  —Madeira  &  Lima.  Rua  do  Thesouro 
Velho,  24. 

Serra.  —  Calçada  do  Combro,  29,  defronte  da 
egreja  dos  Paulistas. 


58  NOVO   GUIA 

DIVERTIMENTOS  PARTICULARES 

Sob  este  titulo  daremos  noticias  das  principaes 
assembléas,  academias  philarmonicas  e  litterarias, 
onde  o  viajante  pode  ser  apresentado  por  qualquer 
sócio. 

Club  Lisbonense.  —  Establecido  no  largo  do  Car- 
mo. Reunião  ordinária  todos  os  dias,  jogo,  leitura 
de  jornaes,  chá,  etc.  No  inverno,  bailes,  que  são 
dos  mais  esplendidos  da  capital  e  onde  concorre  a 
mais  escolhida  sociedade. 

Grémio  Litterario. — É  a  reunião  nocturna  dos 
litteratos,  cavalheiros  distinctos  e  mocidade  estu- 
diosa. Possue  uma  bella  bibliotheca,  jornaes  nacio- 
naes  e  estrangeiros,  scientificos  e  políticos,  jogo, 
etc.  Largo  do  Barão  de  Quintella ;  actualmente  no 
palácio  que  pertenceu  ao  conde  do  Farrobo. 

Club  Portuguez.  —  Travessa  de  Santa  Justa, 
70. 

Assembléa  Lusitana.  —  Largo  dos  Torneiros,  2. 

Assembléa  Familiar.  —  Rua  do  Alecrim. 

Recreação  Phylarmonica.  —  Rua  do  Arco  de 
Bandeira,  226. 

Sociedade  Alumnos  de  Minerva.  —  Rua  da  Ata- 
laia. 

Sociedade  8  de  Junho.  —  Rua  de  Nossa  Senhora 
da  Conceição,  48. 

Academia  Lisbonense.  —  Rua  da  Atalaia,  138. 

Academia  Fenians. — Calçada  dos  Caldas,  166. 


DO   VIAJANTE  39 

Ha  na  capital  outras  reuniões  menos  notáveis, 
philarmonicas  e  litterarias,  que  offerecem  distrac- 
ção aos  seus  sócios  e  convidados. 


BANHOS  PÚBLICOS 

A  cidade  de  Lisboa  é  tâo  pobre  de  estabeleci- 
mentos de  banhos  públicos,  como  Portugal  é  rico 
de  aguas  minera»   . 

O  Tejo  offerece  suas  aguas  aos  banhistas  da  ca- 
pital, que  nas  differentes  barcas  destinadaas  a  ba- 
nhos, ahi  vão  dar  allivio  a  suas  doenças,  ou  diver- 
são ao  espirito. 

Estas  barcas,  que  mais  propriamente  se  po- 
dem denominar  banhos  fluctuantess  servem  de  uti- 
lidade a  quem,  por  economia,  ou  outro  qualquer 
motivo,  não  pode  frequentar  as  bellas  praias  de  Pe- 
droiços,  Paço  d' Arcos,  Cascaes,  etc,  e  estacionam 
em  geral  em  frente  do  cães  das  Columnas  (na  praça 
do  Commercio)  ou  da  praça  dos  Romulares.  Al- 
gumas são  decoradas  com  bastante  aceio,  tendo 
abordo  todas  as  commodidades  como  :  piano,  bu- 
fete para  almoços,  etc,  n'este  numero  cita-se  com 
preferencia  a  que  denominam  Deusa  dos  Mares. 

No  sitio  de  Rilhafoles,  próximo  ao  campo  de 
SanfAnna,  existe  o  melhor  estabelecimento  de  ba- 
nhos da  capital;  é  sem  contradicção  o  primeiro  em 


60  NOVO   GUIA 

attenção  á  diversidade  de  banhos  que  offerece,  ao 
seu  aceio,  e  boa  ordem. 

Aqui  apresentamos  uma  tabeliã  de  preços,  e  a 

designação  das  diversas  qualidades  de  banhos  que 
alli  existem. 

PKEÇOS  DOS  BANHOS 
Tépidos 

GERAES 

Banho  de  immersão  de  agua  simples 200 

(Emolliente 300 

n            ,               )  Aromático 300 

ComP°stos Gelatinoso 600 

( Sulphureo 480 

Duche 400 

I 

LOCAES 

fEm  agua  immovel 200 

Horisontal 400 

|  Descendente 400 

Semicupio-pe-                               _        Si      leB 300 

diluvio  —  comf                     (Vaginal  p        n  t  400 

duche lAscendente]                 c.  m^  S  °  *  "  onn 

Rectal    *SimPles 300 

^ecm    (Composto  ...  400 

Movei 300 

Frios 

GERAES 

Banho  de  immersão  com  duche jSe  c^orro-  jjOO 

( De  chuva  .  300 

It\          j    *          £'         \Dechorro.  300 

Descendente  em  forma    ^     ,  onrk 

f  De  chuva  .  300 

Transversal  em  forma  de  onda. . . .  400 


DO   VIAJANTE  61 
LOCAES 

[Em  agua  immovel 200 

Semicupio  — pe-\Horisoutal 200 

diluvio  —  com  ^Descendente 200 

duche i  Vaginal  *  £imPles 20° 

(a         a     *         b        I Composto  ...  240 

\  Ascendente  <,                 OJ     s  OArk 

Eectal    J  Simples  200 

1               /  Composto  . . .  240 

Vapor 

SECCOS 

Em  estufa  de  ar  quente  com  affusòes  de  agua  fria 

(Banho  Russo) 720 

Em  estufa  de  ar  quente  alternado  com  banho  de  im- 

mersâo,  ou  duche  de  agua  fria 800 

HÚMIDOS 

(Simples 500 

Geral j                     <  Emolliente 600 

|  Composto.  ,Aromatico 600 

Local  por  meio  I  Simples 500 

de  duche  fixoj                     » Emolliente 600 

ou  movei . . . .  ( Composto  .  |  Aromatico 600 

Fumigações 

GERAES 

prtm„rta.OQ           *  Emolliente 500 

Compostas  •  •  •  • ,  Sulphuroso 500 

LOCAES 

n           .              \  Emolliente 500 

Compostas  •  •■  •  ,Sull,iull.090 500 

0  estabelecimento  dos  banhos  sulfúreos  do  Ar- 
senal da  Marinha  sito  junto  ao  largo  de  S.  Paulo 
é  dirigido  pelo  doutor  Agostinho  Vicente  Loureiro, 

e  pode-se  affiançar  que  no  seu  género  é  de  bas- 


62  NOVO    GUIA 

tante  importância,  pois  reúne  a  todas  as  condições 
necessárias  que  a  hygiene  prescreve,  a  commodi- 
dade  e  a  ordem  que  a  boa  sociedade  requer. 

Os  doentes  que  soffrem  do  rheumatismo,  gota, 
nevralgias  e  especialmente  de  enxaquecas  pertina- 
zes, doenças  cutâneas,  chlorose  e  diversos  acciden- 
tes  escrofulosos,  podem  recorrer  com  confiança  á 
benéfica  influencia  d'estas  aguas  superiores,  não 
somente  a  todas  as  aguas  mineraes  do  reino,  mas 
a  quasi  todas  as  aguas  da  Europa,  no  tratamento 
das  mencionadas  doenças.  À  experiência  de  muitos 
annos  tem  demonstrado,  que  13  a  21  banhos  sul- 
fúreos do  arsenal  curam  ou  aliviam  mais  efficaz- 
mente  as  dores  rheumaticas  e  nevrálgicas,  que 
longos,  penosos  e  dispendiosos  tratamentos.  Todos 
os  médicos,  que  tiveram  occasião  de  os  applicar, 
estão  de  accordo  sobre  a  sua  decidida  superiori- 
dade. 

Dão-se  no  mesmo  estabelecimento,  os  banhos 
das  aguas  salino-muriaticas  da  fonte  de  S.  Paulo, 
análogas,  mais  fortes  que  os  banhos  do  Estoril,  e 
muito  efficazes  contra  as  doenças  cutâneas :  assim 
como  os  banhos  simples  ou  de  limpeza  por  pre- 
ços muito  módicos. 

PREÇOS 

Banhos  sulfúreos  do  arsenal 

Tina 400  réis 

Jorro  ou  de  chuva 500    » 


DO   VIAJANTE  63 

Banhos  salino-murial  icos 

Tina,  l.a  classe 240  réis 

i     2.a  dita 200    » 

Jorro  ou  de  chuva 300    » 

Banhos  simples 

l.a  classe 160    » 

2.a  dita 120    » 

Jorro  ou  de  chuva 200    » 

Banhos  em  domicilio 

Vinte  e  cinco  litros  de  agna  sulfúrea  .  100  » 
De  vinte  e  cinco  a  setenta  e  cinco. . . .  300  » 
Por  cada  vinte  e  cinco  litros  a  mais. .       100    » 

0  estabelecimento  fornece  roupa  aos  banhistas 
que  a  desejarem. 

O  doutor  José  Romão  Rodrigues  Nilo  também 
possae  um  bom  estabelecimento  de  banhos  na  rua 
nova  de  S.  Domingos  n.°  22,  próximo  á  Praça  de 
D.  Pedro ;  eis  aqui  a  tabeliã  dos  seus  preços : 

Banhos  simples 

Banho  de  tina  simples,  avulso 300  réis 


64  NOVO   GUIA 

Assignatura  de : 

6  bilhetes  (6  banhos) 1$440  réis 

12  bilhetes  (12  banhos) 2$500    » 

Banhos  compostos 

Banhos   aromáticos,  tónicos,  emolien- 
tes, sulphureos  (caldas),  avulso. . . .       450    » 

Assignatura  de  6  bilhetes 2$250    » 

Assignatura  de  12  bilhetes 3$750    » 

AT.  B.   Os  banhos  compostos  encom- 

mendam-se  de  véspera. 
Banho  de  chuva  ou  irrigação,  duche, 

avulso 200    » 

Banho  de  bomba  simples  (duche  horí- 

sontal) 700    » 

Banho  de  bomba  composto 800    » 

Duche  ascendente  (para  hemorrhoidas, 
descida  ou  prolapsus  do  útero  e  do 

recto) 800    » 

Banho  de  vapor  simples 640    » 

Banho  de  vapor  composto 770    » 

Banho  de  bomba  de  vapor  (duche). . .   1$000    » 

Fumigação  sulphurosa 800    » 

Fumigação   de  composição  mercurial, 

etc 1$000    » 

Banho  de  estufa  secca 1$000    » 

Banho  semicupio  simples 200    » 


DO  VIAJANTE  65 

Banho  semicupio  emoliente,  calmante, 

e  sedactivo 300  réis 

Pediluvio,  lavagem  de  pés 100    » 

O  estabelecimento  tem  cadeirinhas  de  aluguer. 


A  terceira  casa  de  banhos  é  situada  no  largo  do 
Poço  do  Borratem  n.°  4 ;  está  montada  com  bas- 
tante aceio,  e  é  muito  frequentada.  É  dirigida  pelo 
Doutor  Brilhante. 

A  tabeliã  dos  preços  é  a  que  segue : 


p,    .  ,    i  Frios 240 

De  immersao  ÍMoni08 240 

^       ,     .         *  Duche 200 

Decadentes.. /Dechuva 2(X) 

Geraes.{  (Simples 600 

i  JDe  vapor  . . .  <  Aromáticos 700 

D     .  (Terebinthinaceos  700 

Banhos..  (Ruggos « 700 

/  IPediluvios 200 

'  Locaes.  ]  Semicupios 200 

( Fumigações 200 

» 


O  estabelecimento  oííerece  gratuitamente  a  roupa 
necessária. 

5 


66  NOVO   GUIA 

CASA  DE  BANHOS 

No  Hotel  Central,  cães  do  Sodré,  esquina  da 
Praça  dos  Romulares. 

N'este  estabelecimento  ha  banhos  frios,  quentes, 
de  agua  doce,  salgada  e  mineral. 

Os  quartos  são  decorados  com  todo  o  aceio  e  o 
serviço  excellente,  offerecenclo  todas  as  commo- 
didades  aos  banhistas. 

Preços  regulares. 


BANHOS  DAS  ALCAÇABÍAS 

Rua  do  Terreiro  do  Trigo,  n.°  80.  É  o  estabele- 
cimento mais  antigo  de  Lisboa,  e  foi  construido 
sobre  as  ruinas  de  uma  casa  de  banhos  árabe.  São 
recommendaveis  para  moléstia  de  pelle,  dores  rheu- 
maticas,  affecções  nervosas,  etc.  Possue  três  qua- 
lidades de  agua  mais  ou  menos  saturadas  de  en- 
xofre. 


DO   VIAJANTE  ()7 

PALÁCIOS  REAES 
Paço  e  quinta  da*  Necessidades 

0  terreno  que  occupa  este  palácio  e  quinta,  foi 
comprado  por  D.  João  v,  que  reedificou  a  ermida 
que  ahi  existia,  da  invocação  de  Nossa  Senhora  das 
Necessidades,  elevando-a  á  eathegoria  de  capella 
real  e  mandou  construir  junto  d'ella  o  palácio  que 
hoje  existe.  O  edifício  que  fica  ao  lado  da  quinta 
foi  dado  para  habitação  dos  padres  da  congregação 
do  oratório,  depois  do  terremoto  de  1755  :  foi 
n'este  convento  que  tiveram  as  suas  sessões  as 
cortes  constituintes  de  1821.  Actualmente  tem  ha- 
vido importantes  melhoramentos  n'estes  paços  e  o 
terreiro  que  se  estende  pela  frente  da  fachada  prin- 
cipal foi  modernamente  alindado ;  tem  uma  fonte  e 
um  gracioso  e  elevado  obelisco  de  uma  só  e  excel- 
lente  pedra.  O  palácio  encerra  muitas  preciosida- 
des, entre  as  quaes  uma  rica  livraria,  abundante 
de  manuscriplos  raros,  códices  estimados  e  edi- 
ções não  vulgares,  bem  como  um  museu  impor- 
portante. 

A  quinta  tem  espaçosas  ruas,  onde  podem  rodar 
carruagens ;  copia  de  plantas  exóticas  e  variedade 
de  flores,  cysnes.  pavões,  viveiros  de  pássaros  e 
estufas.  A  abundância  de  aguas  e  arvoredo  tornam 
este  sitio  aprasivel. 


68  NOVO    GUIA 

Palácio  da  Bempos&a 

Foi  edificado  por  D.  Catharina  de  Portugal,  viuva 
de  Carlos  n,  rei  de  Inglaterra,  pelos  fins  do  sé- 
culo xvii.  Nada  tem  de  notável  como  obra  d'arte, 
e  a  sua  situação  no  principio  da  estrada  d' Arroios, 
junto  ao  Campo  de  SanfAnna  é  desagradável. 
D.  João  vi  alli  costumava  residir  e  alli  morreu  a 
10  de  março  de  1826.  Uma  das  fachadas  do  pa- 
lácio deita  sobre  extensa  quinta.  Actualmente 
foi  cedido  para  estabelecimento  da  escola  do 
exercito. 

Palácio  e  quinta  de  Belém 

D.  João  v  — o  rei  edificador  —  deu  começo  a 
este  palácio,  que  seus  successores  continuaram, 
muito  irregularmente;  contém  todavia  bellos  salões, 
aonde  o  imperante  costuma  dar  seus  bailes ;  um 
espaçoso  jardim  e  uma  vasta  sala  de  manejo  de 
cavallos.  Antigamente  havia  uma  collecçâo  de  feras 
nos  pateos  d^ste  palácio.  Ao  norte  fica  o  jardim 
botânico  e  a  Quinta  de  cima —  outra  habitação  real, 
das  que  fundou  D.  João  v.  Do  lado  do  sul  fica  o 
largo  de  D.  Fernando  e  o  bello  cães  de  Be- 
lém. 

É  a  residência  do  Senhor  D.  Fernando,  e  de  sua 
esposa. 


DO  VIAJANTE  G9 

Palácio  da  Ajuda 

0  real  palácio  da  Ajuda  é  actualmente  a  residên- 
cia do  chefe  do  estado,  el-rei  D.  Luiz  i,  de  sua  es- 
posa D.  Maria  Pia  de  Saboya,  e  do  Senhor  infante 
D.  Augusto. 

Foi  D.  João  vi  quem  lançou  a  primeira  pedra 
d'este  edifício  sobre  as  ruínas  do  Paro  velho,  que 
ardeu.  Apenas  um  terço  do  palácio  está  concluído, 
mas  essa  parte  é  tão  vasta  que  seria  digna  morada 
de  qualquer  monarcha.  É  todo  de  mármore  e  com- 
prehende  extensas  galerias  e  salas  mobiladas,  mui- 
tos quadros,  elegantes  torreões  e  um  vestíbulo  com 
muitas  estatuas  allegoricas,  obra  do  celebre  Ma- 
chado de  Castro,  de  Barros,  Aguiar,  Faustino  José 
Rodrigues  e  outros  esculptores  nacionaes.  As  pin- 
turas das  salas  são  dos  pincéis  de  Cyrillo  Machado, 
Sequeira,  Taborda  e  dizem  que  também  do  Vieira 
portuense.  Os  primeiros  archilectos  foram  li$è  da 
Costa,  os  dois  Fabri,  Manuel  Caetano,  e  o  ultimo 
António  Francisco  da  Rosa.  Tem  uma  magnifica 
bibliotheca  pertencente  a  el-rei,  confiada  ao  cuidado 
do  sábio  Alexandre  Herculano ;  nos  restos  do  Paço 
velho,  que  lhe  fica  ao  sopé,  se  conserva  ainda  o 
theatro,  aonde  se  representou  pela  primeira  vez  a 
opera  italina  em  Portugal. 

Este  paço,  por  occasião  do  consorcio  de  sua 
magestade  soíTreu  notáveis  melhoramentos,  tan- 
to em  adorno  de  salas,  como  em  muitas  obras 


70  NOVO   GUIA 

praticadas  no  largo,  em  frente  do  real  aposento. 

Ha  projecto  de  acabar  a  fachada  que  se  acha  por 
concluir,  ficando  d'este  modo  o  palácio  da  Ajuda 
um  dos  mais  notáveis  da  Europa. 

N'este  palácio  ha  actualmente  uma  notável  gale- 
ria de  pintura,  tendo  muitos  quadros  dos  melho- 
res auctores  e  de  subido  preço. 

Palácio  de  Caxias 

Nada  tem  de  notável  esta  residência  real.  A  quinta 
annexa  tem  uma  magnifica  cascata  e  um  mirante 
d'onde  se  avista  o  Oceano,  a  grande  distancia,  e 
que  serve  de  baliza  aos  práticos  da  barra. 

Palácio  de  Queluz 

Está  situado  em  logar  quasi  deserto,  duas  léguas, 
dez  kilometros,  ao  norte  de  Lisboa.  Foi  fundado 
por  D.  Pedro  m  e  compoe-se  de  differentes  corpos 
de  edifício,  obra  de  diversos  archi tectos.  É  sobre- 
carregado de  decorações  de  todos  os  estylos,  ador- 
nado de  estatuas,  vasos  e  columnas  em  profusão  e 
communica  com  uma  espaçosa  quinta  e  os  mais 
bellos  jardins  de  todo  o  reino.  Na  sua  capella,  tam- 
bém magnifica,  ha  uma  formosa  columna  de  aga- 
tha,  presente  do  Papa  Pio  vn  a  D.  João  vi.  É  no- 
tável uma  sala  do  palácio  toda  forrada  de  gigantes- 
cos espelhos,  e  por  todo  elle  se  encontram  óptimas 


DO  VIAJANTE  71 

pinturas  e  riquissimos  adornos.  Ahi  nasceram 
D.  João  vi  e  seu  filho  D.  Pedro  iv,  e  falleceu  este 
ultimo  em  uma  camará  que  ainda  hoje  se  conserva, 
adornada  do  mesmo  modo  que  estava  em  24  de 
setembro  de  1834. 

Ao  sul  do  Tejo  tem  sua  magestade  o  palácio  e 
quinta  do  Alfeite,  e  em  Cintra  e  Mafra  outras  resi- 
dências reaes. 


CAMARÁS  LEGISLATIVAS 

No  vasto  edifício  do  extincto  convento  de  S.  Bento, 
estão  as  salas  das  sessões  e  os  archivos  das  duas 
camarás  legislativas  dos  pares  do  reino  e  dos  de- 
putados da  nação;  foram  construídos  em  1834, 
sob  a  direcção  do  archivista  João  Vicente  Pimen- 
tel Maldonado  (distincto  poeta  lyrico).  A  sala  dos 
deputados  é  espaçosa  e  bem  ornada  e  ahi  teem  lo- 
gar  as  sessões  reaes.  Tem  galerias  publicas  e  re- 
servadas para  ambos  os  sexos,  corpo  diplomático 
e  família  real.  A  sala  dos  pares,  é  de  moderna 
construcção,  e  de  bastante  elegância  e  até  magni- 
ficência. 

Municipalidade 

Antigamente  no  recanto  occidental  do  Terreiro 
do  Paço,  entre  a  rua  do  Ouro  e  a  do  Arsenal. 
Actualmente  o  município  está  por  empréstimo  junto 


72  NOVO   GUIA 

ao  estabelecimento  do  ver-o-peso,  na  Ribeira  Ve- 
lha, isto  depois  do  incêndio  do  Banco  de  Portu- 
gal, por  que  no  local  d'esse  edifício  se  está  edifi- 
cando os  novos  paços  do  concelho. 

Ministérios 

Ha  sete  secretarias  de  estado,  que  todas  estão 
collocadas  em  o  Terreiro  do  Paço,  nos  vastos  lan- 
ços do  edifício  que  circundam  a  praça.  No  lado 
septentrional  está  o  ministério  da  justiça  e  no  Oc- 
cidental as  repartições  dos  negócios  estrangeiros, 
secretaria  do  reino  e  o  concelho  de  estado ;  obras 
publicas,  fazenda,  marinha  e  guerra. 

Vribunaes 

Supremo  tribunal  de  justiça. — Primeiro  tribu- 
nal do  paiz.  Recebe  em  revistas  as  causas  que  fo- 
ram julgadas  em  2.a  instancia  pelas  relações  do 
reino.  Reune-se  no  Terreiro  do  Paço  entre  a  rua 
do  Ouro  e  a  Augusta. 

Supremo  conselho  de  justiça  militar.  —  Com- 
põe-se  de  duas  secções,  uma  do  exercito,  outra  de 
marinha,  formada  cada  uma  de  seis  officiaes  gene- 
raes  e  um  relator.  O  local  das  suas  sessões  é  no 
Arsenal  da  Marinha. 

Relação  de  Lisboa.  —  Também  no  Arsenal  da 
Marinha,  sobre  a  porta  principal.  Recebe  por  ap- 


DO   VIAJANTE  73 

pellação  as  causas  julgadas  pelos  juizes  de  direito 
ou  correccionaes  do  seu  districto. 

Tribunaes  do  commercio  de  I.a  e  2.a  instancia. 
—  No  torreão  oriental  do  Terreiro  do  Paço,  sobre 
a  praça  do  Commercio  ou  Bolsa. 

Juizes  de  direito  de  i.a  instancia. — Ha  seis  em 
Lisboa  e  dão  audiência  no  extincto  convento  da 
Boa  Hora,  bem  como  os  juizes  de  policia  correc- 
cional e  dos  órfãos ;  ahi  funccionam  também  os  ju- 
rados. 

Auditório  da  marinha.  —  No  Arsenal. 

Relação  ccclesiastica. — No  palácio  do  Patriarcha 
a  S.  Vicente. 

Tribunal  de  contas.  —  Largo  do  Pelourinho. 


ESTABELECIMENTOS  PÚBLICOS  DE  EDUCAÇÃO 

Ha  em  Lisboa  muitas  escolas  de  instrucção  pri- 
maria e  secundaria,  pagas  pelo  estado,  por  asso- 
ciações piedosas  e  por  particulares. 

Escola  Polytecliiiica 

Este  edifício,  antigo  collegio  dos  Jesuitas,  trans- 
formado depois  em  collegio  dos  nobres  e  academia 
real  de  marinha,  foi  em  1836  destinado  para  a  Es- 
cola Polytechnica,  e  em  1813  devorado  pelas  cham- 


74  NOVO   GUIA 

mas.  Está  reedificado  e  continua  a  servir  para  a 
referida  escola.  É  situado  na  antiga  rua  do  Colle- 
gio  dos  Nobres,  hoje  denominada  rua  direita  da 
da  Escola  Polytechnica. 

N'este  edifício  está  hoje  estabelecido  o  museu, 
vulgarmente  chamado  —  a  historia  natural. 

Escola  Meaico-Cirnrgica 

Edifício  annexo  ao  Hospital  de  S.  José.  Esta  es- 
cola, que  tem  tido  três  reformas  durante  o  presente 
século,  — a  l.a  em  1825,  a  2.a  em  1836,  e  a  3.a 
em  1844,  hoje  rivalisa  com  as  melhores  da  Europa. 
Tem  um  excellente  amphitheatro  anatómico,  livra- 
ria medica,  gabinete  pathologico,  horto  botânico  e 
herbario. 

Escola  de  ptaarmacia 

No  mesmo  edifício  da  antecedente.  Os  estudan- 
tes d'este  curso  lectivo  frequentam  as  duas  pri- 
meiras cadeiras  do  3.°  anno  da  escola  medico-ci- 
rurgica. 

Instituto  agrícola  e  escola  veterinária 

Na  Cruz  do  Taboado. 

É  mantida  por  conta  do  estado.  N'ella  se  aprende 
não  só  veterinária,  como  agricultura  pratica  e  tudo 
o  que  é  necessário  á  vida  rural. 


DO  VIAJANTE  7o 

Aula  naval 

No  Arsenal  da  Marinha. 

Escola  de  construcção  naval 

No  mesmo  edifício. 

Escola  do  exercito 

No  palácio  da  Bemposta. 

Aula  do  conimercio 

No  Instituto  Industrial  á  Boa  Vista. 

Conservatório  real  de  Lisboa 

No  extincto  convento  dos  Caetanos. 

Este  conservatório  tem  nove  aulas  de  musica 
para  ambos  os  sexos— aulas  de  mímica,  dai: 
esgrima,  recta  pronuncia,  historia   e  declamação. 
Ensina  também  ali  o  latim,  italiano  c  francez. 

Anla  do  museu  nacional 

No  edifício  do  convento  de  Jesus  ha  um  curso 
de  jntroducção  á  historia  natural. 


7G  NOVO   GUIA 

Instituto  Haidusírial  e  Cozaiísaereial 
cie  Lisboa 

Este  estabelecimento,  um  dos  de  maior  utilidade 
que  hoje  existem  em  Portugal,  foi  creado  em  30 
de  dezembro  cie  1852,  e  tem  tido  diversas  refor- 
mas que  progressivamente  o  teem  desenvolvido. 
Ha  n'elle  onze  cadeiras ;  nove  industriaes,  e  duas 
do  curso  do  commercio.  É  seu  director  o  nosso 
primeiro  chimico  A.  A.  de  Aguiar;  secretario,  Júlio 
César  Machado  ;  e  lentes  o  conselheiro  J.  V.  Damá- 
sio, F.  de  F.  Benevides,  Luiz  de  Almeida  e  Albu- 
querque, J.  H.  da  Veiga,  T.  A.  da  Fonseca,  M.  J. 
Ribeiro,  H.  Midosi,  R.  J.  Pequito,  F.  R.  Garcia, 
J.  de  Castro ;  director  da  officina  de  instrumentos 
de  precisão  José  Maurício  Vieira.  É  cursado  o  Insti- 
tuto Industrial  por  grande  numero  de  alumnos, 
havendo  annos  de  chegar  esse  numero  a  quinhen- 
tos. O  instituto  tem  também  um  museu  importante. 
As  aulas  sâo  nocturnas;  de  dia  funcciona  apenas 
alli  a  secretaria  e  a  officina. 


Aula  de  geometria  e  mechanica 
applicada  ã»  arte» 


Está  estabelecida  esta  aula  no  mesmo  edifício 
da  aula  do  commercio,  annexa  ao  Instituto  Indus- 
trial de  Lisboa. 


DO   VIAJANTE  77 

Corso  superior  de  letras 

No  edifício  da  academia  real  das  sciencias. 

Este  curso  foi  instituído  por  el-rei  D.  Pedro  v, 
e  é  frequentado  por  estudantes  da  melhor  socie- 
dade; n'elle  se  dão  excellentes  prelecções  scienti- 
ficas  pelos  homens  mais  competentes  do  paiz. 

Collegio  dos  aprendizes  do  Arsenal 

Compôe-se  de  60  alumnos,  sendo  20  filhos  de 
militares,  20  filhos  de  operários  do  arsenal  do 
exercito,  10  expostos  da  Misericórdia  e  10  da  Casa 
Pia. 

Frequentam  as  aulas  de  primeiras  letras,  dese- 
nho linear  e  ornato,  arithmetica,  geometria  e  me- 
chanica  applicada  ás  artes,  grammatica  e  francez. 
Aprendem  no  arsenal  do  exercito,  á  sua  escolha, 
differentes  oíficios  mechanicos. 

Este  collegio  admitte  pensionistas  particulares. 

Collegio  militar 

EM  MAFRA 

Neste  collegio  se  educam  a  expensas  do  estado 
os  filhos  dos  militares  e  dos  que  teem  feito  ser- 
viços relevantes  ao  paiz,  tendo  preferencia  os  fi- 
lhos dos  que  falleceram  em  combate. 


78  NOVO   GUIA 

Academia  das  bellas-artes  de  Lisboa 

No  extincto  convento  de  S.  Francisco  da  Cida- 
de, é  o  local  desta  academia,  fundada  em  1837 
pelo  ministro  do  reino,  Manuel  da  Silva  Passos. 

Tem  esta  academia  muitos  quadros  notáveis,  de 
differentes  escolas,  sobre-saindo  os  seguintes: 

Portnguezes  —  Sete  quadros  do  Grão  Vasco,  em 
madeira,  que  são:  Fugida  para  o  Egypto,  Baptista, 
Circumcisão,  Adoração  dos  Reis,  Menino  Jesus, 
Apresentação  no  Templo,  o  Menino  entre  os  Dou- 
tores :  todos  notáveis  pelo  desenho  e  colorido, 
mas  que  denotam  pouco  estudo  de  óptica  e  pres- 
pectiva.  Três  quadros  do  Vieira  Lusitano:  Santo 
Agostinho,  Sagrada  Família,  S.  Bruno,  —  Quatro 
de  Bento  Coelho. 

Um  baptismo  de  Santo  Agostinho  por  Affonso 
Sanches  Coelho.  S.  Bruno  em  adoração,  do  grande 
Sequeira.  O  Senhor  preso  á  columna,  que  uns  at- 
tribuem  a  Campello,  outros  a  Gaspar  Dias;  e  cinco 
quadros  de  Pedro  Alexandrino. 

Estrangeiros  —  Uma  Virgem  de  Raphael  (talvez 
o  único  quadro  d'este  auctor  que  existe  em  Lis- 
boa.) Um  S.  Jeronymo,  que  se  julga  ser  de  Miguel 
Angelo;  e  um  Jesus  Christo  descendo  ao  Limbo, 
do  mesmo  pincel.  Descimento  da  Cruz,  de  Júlio 
Romano.  Crucificação  de  Vandyck,  Calvário  e  Je- 
sus crucificado,  de  Gresbante.  Espirito  Santo,  de 
Trivisani,  Annunciação,  de   Guersini.   Outra  de 


DO   VIAJANTE  7ÍJ 

Massuche.  A  cabeça  do  Salvador,  de  Alberto  Da- 
rer.  Paisagens  de  Salvador  Rosa  e  de  BreucjheU 
Senhora  da  Conceição,  de  Sebastião  Conca ;  e  uma 
coroação  de  espinhos,  da  escola  holandeza. 

Na  aula  de  esculptura  ha  alguns  bustos  collos- 
saes  notáveis,  de  auctores  portuguezes :  um  Ca- 
mões (de  Assiz)  Affons,o  de  Albuquerque,  e  Infante 
D.  Henrique  (de  Aragão)  D.  João  de  Castro  e  Vasco 
da  Gama  (de  Schiappa)  Albergaria  (de  Cesarino). 
O  viajante  que  quer  visitar  a  academia  deve  pro- 
curar qualquer  dos  empregados,  que  lhe  facultará 
a  entrada  e  lhe  dará  de  bom  grado  os  esclareci- 
mentos que  desejar. 

Está  aberta  das  9  da  manhã  ás  2  da  tarde,  e 
de  verão  até  ás  3. 

Sociedade  (iromotora  das  bellas  artes 

No  mesmo  edifício  da  Academia  das  Bellas  Ar 
tes.  Ê  o  seu  presidente  o  marquez  de  Sousa.  Faz 
exposições  de  bellas  pinturas  asquaes  obteem  boas 
vendas. 


80 


NOVO    GUIA 


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DO  VIAJANTE  81 

FAMÍLIA  REAL  PORTUGIEZA 

S.  M.  F.  El-Rei  o  Senhor  D.  Luiz  i,  31.°  rei  de 
Portugal,  nasceu  a  31  de  outubro  de  1838,  casou 
(por  procuração)  em  Turim  a  27  de  setembro  de 
1862,  e  pessoalmente  em  Lisboa  a  6  de  outubro 
do  mesmo  anno  com 

S.  M.  a  Rainha  a  Senhora  D.  Maria  Pia  de  Sa- 
boya,  princeza  italiana,  nasceu  a  16  de  outubro 
de  1847. 

S.  M.  El-Rei  o  Senhor  D.  Fernando,  pae  de  El- 
Rei  o  Senhor  D.  Luiz,  nasceu  a  29  de  outubro 
de  1816. 

O  Serenissimo  Senhor  Infante  D.  Augusto,  ir- 
mão de  El-Rei  o  Senhor  D.  Luiz,  nasceu  a  4  de 
novembro  de  1847. 

A  Senhora  Infanta  D.  Maria  Anna,  irmã  de  El- 
Rei,  nasceu  a  21  de  julho  de  1843. 

A  Senhora  Infanta  D.  Antónia,  irmã  de  El-Rei, 
nasceu  a  17  de  fevereiro  de  1845. 

(Ambas  as  Sereníssimas  Infantas  estão  casadas.) 

S.  M.  I.  a  Senhora  D.  Amélia  Augusta,  de  Ra- 
viera,  avó  de  El-Rei,  viuva  do  Imperador  o  Senhor 
D.  Pedro  iv,  Duque  de  Rragança,  nasceu  a  31  de 
julho  de  1812. 


6 


82  NOVO   GUIA 

FILHOS  DE  EL-RE1  O  SENHOR  D.  LUIZ  I  E  DA  RAINHA 

S.  A.  o  Príncipe  Real  o  Senhor  D.  Carlos  Fer- 
nando, herdeiro  e  successor  á  coroa,  nasceu  a  28 
de  setembro  de  1863. 

S.  A.  o  Senhor  Infante  D.  Affonso  Henriques, 
nasceu  a  31  de  julho  de  1865. 

BAIRROS  DE  LISBOA 

ADMINISTRAÇÕES 

Bairro  oriental.  —  Rua  do  Bemformoso  n.°  163 
— -  Compõe-se  das  freguezias  dos  Anjos ;  S.  Jorge 
(intra-muros)  Santa  Engracia;  S.  Vicente;  Santo 
André  e  Santa  Marinha;  S.  Christovão ;  S.  Thomé 
e  Salvador;  S.  Lourenço;  Soccorro;  Pena;  Santo 
Estevão;  Santa  Cruz  do  Castello;  S.  João  da  Pra- 
ça; Sé;  S.  Thiago  e  S.  Martinho;  e  S.  Miguel. 

Bairro  central —Rua  do  Príncipe  n.°  51  — 
Compõe-se  das  freguezias  da  Encarnação ;  Marty- 
res ;  Sacramento  ;  S.  Julião ;  Magdalena ;  S.  Nico- 
lau ;  Santa  Justa ;  S.  José ;  Coração  de  Jesus  ;  Con- 
ceição Nova;  e  S.  Sebastião  da  Pedreira  (intra- 
muros). 

Bairro  occidental  —  Calçada  da  Estreita  n.°  47 
—  Compõe-se  das  freguezias  de  Santa  Isabel  (in- 
tra-muros; S.  Mamede ;  Mercês ;  Santa  Catharina  ; 
S.  Paulo ;  Santos ;  Alcântara  (intra-muros)  e  Lapa. 


DO  VIAJANTE  83 

JORNALISMO  DE  LISBOA 

Diário  do  Governo.  —  É  a  folha  official  do  go- 
verno portuguez.  Não  tem  politica  e  n'ella  se  en- 
contram somente  documentos  officiaes,  noticias 
estrangeiras  e  annuncios. 

Jornal  do  Commercio. —  Como  o  seu  titulo  in- 
dica é  destinado  ao  commercio  do  paiz,  occupan- 
do-se  todavia  de  politica;  é  noticioso,  e  publica 
longos  folhetins.  N'este  jornal  tem  escripto  e  ainda 
escrevem  auctores  de  boa  nota,  taes  como  Latino 
Coelho,  Ribeiro  Guimarães,  Pinheiro  Chagas,  etc. 

Revolução  de  Setembro.  É  o  órgão  que  ha  mais 
antigo  do  partido  progressista.  O  seu  redactor  con- 
stante tem  sido  o  conselheiro  António  Rodrigues 
Sampaio,  caracter  firme  em  seus  princípios,  bom 
escriptor,  e  actual  ministro  do  reino.  O  seu  folhe- 
tinista é  o  chistoso  escriptor  Júlio  César  Machado» 
digno  successor  do  chorado  Lopes  de  Mendonça. 

Diário  de  Noticias.  —  Jornal  o  mais  popular,  o 
mais  lido  e  o  mais  noticioso  que  em  Portugal 
existe.  Não  tem  còr  politica  e  só  se  occupa  dos  acon- 
tecimentos do  (ha  que  narra  detalhadamente.  Pu- 
blica sempre  grande  numero  de  annuncios  que 
n'esta  folha  obteem  muita  publicidade,  e  os  seus 
folhetins  são  variados  e  alguns  de  notáveis  escri- 
ptores. 

Diário  Popular.  —  É  quasi  da  Índole  do  antece- 
dente, porém  occupa-se  de  politica.  Os  seus  fo- 


84  NOVO   GUIA 

lhetins  dos  domingos  são  do  talentoso  escriptor 
Eduardo  Augusto  Vidal,  poeta,  escriptor  de  thea- 
tro,  e  folhetinista  de  muito  mimo. 

A  Nação.  —  Antiga  folha  do  partido  realista;  tem 
tido  bons  escriptores  que  defendem  as  suas  idéas, 
as  quaes,  em  geral,  só  fazem  echo  nas  provindas. 
Occupa-se  também  de  assumptos  religiosos. 

Diário  Illustrado.  —  É  um  diário  popular,  noti- 
cioso e  com  gravuras;  está  ainda  na  infância  e  pode 
vir  a  ser  de  muita  importância  no  jornalismo  da 
capital.  Publica  folhetins  de  bons  escriptores. 

Jornal  da  Noite.  —  É  noticioso,  e  publica  de 
tarde  os  acontecimentos  do  dia.  Occupa-se  de  po- 
litica e  offerece  folhetins  interessantes.  O  seu  re- 
dactor é  o  antigo  escriptor  António  Augusto  Tei- 
xeira de  Vasconcellos,  bem  conhecido  nas  lettras 
do  nosso  paiz. 

O  Partido  Constituinte,  a  Gazeta  do  Povo,  e  a 
Crença  Liberal,  são  jornaes  politicos  e  noticiosos, 
os  quaes  também  publicam  folhetins. 

O  jornalismo  litterario  de  Lisboa  é  actualmente 
bastante  pobre.  Compõe-se  apenas  de  três  jornaes, 
que  são  os  seguintes  : 

Jornal  das  Damas.  —Redactor  Barboza  Nogueira. 
É  uma  revista  de  litteratura  e  modas,  a  qual,  além 
de  escolhidos  artigos  de  litteratura,  publica  todos 


DO  VIAJANTE 


80 


os  mezes  bellos  figurinos  gravados  e  illuminados 
em  Paris,  e  lindos  debuxos  e  moldes  para  cortar 
fato  de  senhora.  Gollaboram  para  esta  elegante  pu- 
blicação, além  de  outros,  os  escriptores  queri- 
dos das  bellas  :  Júlio  César  Machado  e  Luiz  de 
Araújo. 

Lettras  e  Artes.  —  Redactor  Rangel  de  Lima.  Jor- 
nar  litterario  redigido  por  distinctos  escriptores,  e 
illustrado  com  bellas  gravuras  e  excellentes  lytho- 
graphias. 

Ê  um  jornal  que  pôde  competir  com  as  melho- 
res publicações  estrangeiras. 

Boletim  do  Clero  e  do  Professorado.  —  Redactor 
Moreira  de  Sá.  Jornal  dedicado  ao  clero  e  aos 
professores,  noticioso  e  litterario. 

Existe  ha  bastantes  annos  e  na  sua  especialidade 
tem  prestado  serviços. 

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TYPOGRAPBIAS 

Não  nos  esquecemos  das  typographias  que  ha  em 
Lisboa,  e  por  isso,  dando  o  primeiro  logar  á 
Imprensa  Nacional,  collocaremos  em  seguida  o  ele- 
gante e  bem  montado  estabelecimento  typographico 
de  Castro  d-  Irmãos,  onde  as  impressões  são  bem 
acabadas,  e  o  serviço  é  feito  com  toda  a  regulari- 
dade. 


86  NOVO    GUIA 

Este  estabelecimento  está  situado  na  rua  da  Cruz 
de  Pau,  próximo  ao  alto  de  Santa  Gatharina. 

A  typographia  e  fundição  de  typos  de  Lallemant 
frères,  na  rua  do  Thesouro  Velho,  é  também  um 
estabelecimento  de  primeira  ordem,  bem  montado 
e  apto  para  impressões  de  luxo.  A  sua  especiali- 
dade são  cartazes  elegantes  e  variados,  e  impres- 
sões a  cores,  a  oiro,  prata,  etc,  executados  com 
toda  a  nitidez. 

A  typographia  Universal  é  egualmente  um  bom 
e  vasto  estabelecimento,  com  boas  machinas  e 
onde  as  impressões  são  feitas  com  aceio  e  brevi- 
dade. 

Tem  capacidade  para  imprimir  jornaes  de  grande 
formato,  os  preços  são  commodos,  e  todas  as  re- 
clamações bem  attendidas. 

É  n'esta  officina  que  se  imprime  o  Diário  de 
Noticias,  jornal  muito  lido,  e  do  qual  já  nos  occu- 
pamos. 


BIBL10THECAS  E  ARCHIVOS 

Bibliotheca  publica. —No  convento  de  S.  Francis- 
co. O  local  é  péssimo  para  um  estabelecimento 
d'esta  ordem,  mas  está  votada  a  quantia  necessá- 
ria para  edificação  de  uma  outra  casa.  Contém  mais 
de  110:000  volumes  impressos,  e  10:000  manus- 
criptos,  além  de  140:000  volumes  das  livrarias  dos 


DO  VIAJANTE  87 

extinctos  conventos  e  uma  collecção  de  mais  de 
25:000  medalhas  antigas.  De  entre  os  manuscri- 
ptos,  300  são  da  celebre  livraria  de  Alcobaça.  Pos- 
sue  hoje  mais  a  rica  livraria  de  D.  Francisco  de 
Mello  da  Gamara  (vulgo  do  Cabrinha)  que  o  go- 
verno comprou  por  vinte  e  cinco  mil  cruzados, 
onde  ha  edições  de  livros  portuguezes  de  primeira 
raridade.  Entre  os  livros  mais  celebres  que  se  en- 
contram n'esta  bibliotheca,  nota-se  a  edição  dos 
Lusíadas  de  1372;  as  cartas  familiares  de  Cicero, 
edição  de  Spira,  em  pergaminho,  1469;  Forusju- 
dicum  (Fuero  jusgo)  dos  visigodos,  primeira  tra, 
ducção  em  lingua  castelhana  e  códice  raríssimo ; 
uma  bíblia  manuscripta  em  hebraico,  illuminada 
obra  do  século  xm ;  a  primeira  edição  da  bibliaj 
impressa  pelo  próprio  Gultemberg  em  Moguncia- 
1154,  e  muitas  outras  bíblias  em  pergaminho,  de 
grande  valia ;  a  vida  de  Vespasiano,  exemplar  úni- 
co, impresso  em  Lisboa,  149G  ;  Yita  Christi,  idem; 
Plotinio  de  Florença,  monumento  admirável  de  Lou- 
renço de  Medicis ;  o  livro  do  Tosão  de  oiro  e  mui- 
tos manuscriptos  raros.  As  salas  de  leitura  estão 
abertas  todos  os  dias,  não  feriados,  das  9  horas 
da  manhã  ás  3  da  tarde;  e  na  sala  dos  manuscri- 
ptos vê-se  uma  bella  estatua  de  mármore  da  rainha 
D.  Maria  i  fundadora  d'este  estabelecimento,  obra 
do  celebre  Machado  de  Castro,  auctor  da  estatua 
equestre  de  D.  José  i. 
Bibliotheca  da  Ajuda.  —  Já  d'ella  falíamos,  quando 


88  NOVO   GUIA 

tratamos  do  palácio  a  que  está  annexa.  Ê  particu- 
lar, mas  o  seu  digno  bibliothecario  facillitará  sem 
duvida  a  entrada  a  qualquer  estrangeiro  ou  nacio- 
nal, que  a  deseje  visitar. 

Possue  códices  de  grande  valor.  El-rei  D.  Fer- 
nando a  nada  se  tem  poupado  para  a  enriquecer,  e 
segundo  a  opinião  geral  é  a  mais  rica  das  biblio- 
thecas  de  Portugal. 

Além  d'esta  livraria  real,  ha  outras  particulares 
em  Lisboa,  algumas  das  quaes  possuem  mais  de 
dez  mil  volumes. 

Archivo  da  Torre  do  Tombo.  —  No  extincto  convento 
de  S.  Bento.  Entrada  pela  calçada  da  Estrella.  — 
Foi  para  ali  transferido  o  archivo  real  da  torre  do 
Castello,  onde  estava  e  que  caiu  pelo  terremoto 
de  1755.  Ê  aonde  estão  depositadas  as  chancella- 
rias  dos  reis,  authographos  das  leis,  mercês  e  tra- 
tados, desde  o  principio  da  monarchia.  Ha  ahi  cu- 
riosidades que  o  antiquário  se  não  deve  dispensar 
de  ver,  visitando  Lisboa. 

Archivo  militar.  —  No  principio  da  calçada  de  S. 
Francisco.  Ha  ali  preciosos  documentos  relativos  á 
arte  de  guerra,  e  ás  nossas  gloriosas  campanhas 
de  outras  eras  e  muitos  mais  haveria,  se  o  espi- 
rito de  rapina  que  tem  invadido  todos  os  cantos 
de  Portugal,  não  tivesse  também  vasculhado  este 
inoffensivo  deposito  de  memorias  honrosas. 

Archivos  das  duas  camarás  legislativas.  — Em  S.  Ben- 
to, no  palácio  das  cortes.  Ahi  se  depositam  os  au- 


DO   VIAJANTE  89 

thographos  das  leis  das  mesmas  cortes  e  tem  egual- 
mente  uma  pequena  bibliotheca. 


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SOCIEDADES  SCIENTIFICAS 

Academia  real  das  sciencias.  —  Fundada  em  1778 
pelo  duque  de  Lafões,  debaixo  da  protecção  da 
rainha  D.  Maria  i.  Foi  reformada  a  sua  instituição 
no  anno  de  1852.  Tem  ás  suas  disposições  o  con- 
vento de  Jesus,  e  a  sua  bibliotheca,  bem  como  o 
museu  real. 

Sociedade  das  sciencias  medicas.  —  O  titulo  d'esta 
associação  indica  bem  o  objecto  de  que  se  occupa, 
e  assim  também  a  Sociedade  pharmaceutica  lusi- 
tana. 

Associação  jurídica,  ou  dos  advogados.  —  Praça  de 
D.  Pedro  n.°  36. 


MUSEU  REAL 

O  museu,  ou  gabinete  de  historia  natural,  foi 
transferido  do  palácio  da  Ajuda  para  o  convento 
de  Jesus,  e  está  actualmente  no  edifício  da  escola 
polytechnica.  No  ramo  mineralógico  possue  algu- 
mas raridades,  bellos  mármores,  pinturas  antigas, 
ricas  conchas,  muitas  aves  e  algumas  curiosidades 
de  recordações  históricas. 


90  NOVO   GUIA 

MUSEU  ARCHEOLOGICO 

No  edifício  (em  ruinas)  do  Carmo. 


IMPRENSA  NACIONAL 

Na  travessa  do  Pombal,  ao  collegio  dos  Nobres. 
Pertence  ao  estado  e  ahi  se  imprimem  todas  as 
peças  ofíiciaes.  Tem  uma  fundição  de  typos,  lytho- 
graphia  e  fabrica  de  cartas  de  jogar ;  prensa  hy- 
draulica,  etc.  É  um  estabelecimento  único  no  seu 
género  em  Portugal. 


TEMPLOS 

A  enumeração  de  todos  os  templos  de  Lisboa 
seria  um  trabalho  fatigante  e  de  nenhuma  utilida- 
de para  o  forasteiro  que  visita  esta  capital ;  limi- 
tar-nos-hemos  pois  a  dar  breve  idéa  das  principaes 
egrejas  que  adornam  Lisboa  e  Belém,  aquellas  que 
o  viajante  deve  de  preferencia  examinar. 

Sé  de  Lisboa.  —  Em  logar  elevado,  mas  inferior 
ao  castello  de  S.  Jorge  e  não  distante  d'elle,  está 
situada  esta  cathedral,  cuja  origem  se  perde  na 
noite  dos  tempos,  o  que  tem  dado  logar  a  exten- 


DO  VIAJANTE  9i 

sas  controvérsias.  Monumento  de  vários  séculos, 
ella  apresenta  incontestáveis  signaes  da  sua  vetus- 
tidade,  e  mostra  claramente  que  tem  passado  por 
successivas  transformações,  sem  perder  comtudo 
alguns  dos  caracteres  primitivos.  O  primeiro  bispo 
de  Lisboa  foi  D.  Gilberto,  um  inglez  dos  que  au- 
xiliaram AíTonso  Henriques  na  conquista  d'esta  ci- 
dade, e  o  seu  cabido  estabeleceu-se  em  1150.  Foi 
esta  egreja  suffraganea  em  Braga  até  ao  reinado 
de  D.  João  i,  que  a  elevou  a  jerarchia  de  metro- 
politana ;  e  D.  João  v  lhe  mudou  o  titulo  de  cathe- 
dral  em  Basílica  de  Santa  Maria  Maior,  creando  a 
dignidade  patriarchal.  Em  1344  soíTreu  muito  este 
templo,  por  occasião  de  um  horrivel  terremoto, 
sendo  então  reedificada  a  capella  mór  por  el-rei 
D.  Aflonso  iv,  cujo  cadáver  ahi  jaz,  bem  como  o 
de  sua  esposa.  D.  Fernando  i  lhe  alterou  depois  a 
frente  principal,  ficando  quasi  como  ainda  hoje  se 
vê;  e  passado  pouco  tempo  foi  lançado  de  uma 
das  torres  abaixo  o  bispo  D.  Martinho,  castelhano 
de  nação,  pelo  povo  indignado,  que  começava  a 
clamar  pela  sua  liberdade  e  se  dispunha  para  o 
grande  dia  de  Aljubarrota.  O  incêndio  que  succe- 
deu  ao  terremoto  de  1755  devorou  grande  parte 
d'este  edifício,  que  foi  reedificado  ainda  em  tempo 
do  marquez  de  Pombal,  porém  em  menor  escala. 
Ainda  hoje  se  vêem  na  sacristia  fragmentos  das  co- 
lumnas  do  primitivo  templo,  que  era  outr'ora  o 
maior  de  Lisboa. 


92  NOVO   GUIA 

Em  uma  das  suas  capellas  estão  os  ossos  de 
S.  Vicente,  padroeiro  de  Lisboa  e  do  Algarve ,  em 
outra,  de  remota  antiguidade,  vê-se  o  tumulo  de 
um  Barthoiomeu  Johanes,  cuja  effige,  grosseira- 
mente trabalhada,  descança  n'um  velho  e  também 
grosseiro  mausuleu.  No  claustro  conserva-se  um 
corvo,  em  memoria  d'aquelles  que  guardaram  e 
respeitaram  no  promontório  sacro  o  corpo  do  mar- 
tyr  S.  Vicente ;  e  é  por  isso  que  nas  armas  da  ci- 
dade de  Lisboa  se  vê  um  corvo  á  proa  e  o  outro  á 
popa  do  navio  que  occupa  o  escudo.  Em  outro  claus- 
tro, o  das  capellas  chamadas  affonsinas,  existe  uma 
cadeira  de  pedra  com  a  data  de  1629,  epocha  talvez 
em  que  foi  reparada,  por  que  segundo  as  melhores 
conjecturas  deve  ella  alli  existir  desde  o  principio 
da  monarchia,  quando  os  nossos  reis  administravam 
justiça  em  publico,  e  ouviam  os  requerentes  nas 
cathedraes.  O  aspecto  severo  d'este  templo,  incute 
sentimentos  religiosos ;  é  dos  muitos  poucos  que 
ainda  hoje,  em  Lisboa,  não  parecem  mais  uma  sala 
de  divertimentos  profanos  do  que  um  logar  de 
oração. 

Dasilica  do  Coração  de  Jesus  (vulgo  Estreita).  O 
mais  sumptuoso  templo  da  capital,  mandado  cons- 
truir por  D.  Maria  i,  em  1779,  e  concluído  em  dez 
annos,  pelo  risco  de  S.  Pedro  em  Roma.  Tem  um 
elegante  zimbório  que  se  avista  fora  da  barra,  o 
qual  remata  por  um  enorme  globo  de  metal  e  uma 
cruz  de  ferro,  que  mais  de  uma  vez  tem  sido  da- 


DO  VIAJANTE  93 

mnificada  pelo  raio.  Hoje  tem  conductores,  bem 
como  as  torres,  egualmente  garbosas  e  elevadas. 
Ha  no  interior  da  basílica  uma  pasmosa  variedade 
de  requissimos  mármores  de  varias  cores  e  o  so- 
berbo mausoléu  da  real  fundadora,  na  capella  mór. 
No  convento  annexo  existem  freiras  bernardas. 

S.  Vicente  de  Fora.  —  Jazigo  da  familia  de  Bra- 
gança. Àffonso  Henriques  lançou  a  primeira  pedra 
a  este  edifício,  em  commemoração  da  tomada  de 
Lisboa  e  por  ser  em  sitio  extra-muros  da  cidade 
se  dominou  de  Fâra,  como  aindo  hoje  se  chama. 
Achando-se  bastante  damnificada  em  tempo  de  Fi- 
lippe  ii,  mandou  este  abater  a  velha  fabrica,  e  no 
mesmo  local  alçar  o  grandioso  templo,  que  ainda 
existe,  apezar  do  violento  abalo  que  lhe  deu  o  ter- 
remoto de  1755.  A  egreja  serve  de  parochia  e  o 
convento  é  residência  do  patriarcha.  Já  ahi  esteve 
a  patriarchal  por  alguns  annos,  mas  os  seus  legí- 
timos possuidores  eram  os  cónegos  regulares  de 
Santo  Agostinho. 

Mosteiro  de  Belém.  —  (vulgo  Jeronymos,  por  ha- 
ver sido  oceupado  por  frades  de  S.  Jeronymo.) 
Fora  de  Lisboa,  no  seu  antigo  termo  de  Belém, 
está  situado  este  maravilhoso  templo,  que  é,  sem 
contradicção,  o  mais  formoso  edifício  monumental 
da  velha  cidade  e  suas  visinhanras.  Também,  como 
as  precedentes  egrejas,  serve  de  freguezia  sob  a 
invocarão  de  Santa  Maria  de  Belém.  — Foi  mandado 
construir  por  el-rei  D.  Manuel,  no  logar  em  que 


94  NOVO   GUIA 

embarcara  Vasco  da  Gama,  em  agradecimento  a 
Deus  pela  descoberta  da  índia,  mas  não  logrou 
vêl-o  concluído  o  seu  fundador.  Os  seguintes  reis 
continuaram  a  obra,  mas  já  não  proseguiu  o  mesmo 
primor  nos  ornatos,  nem  se  deu  á  fabrica  o  de- 
senvolvimento que  talhara  D.  Manuel;  a  capella- 
mór  é  de  um  género  de  architetura  inteiramente 
differente  do  corpo  da  egreja  ;  quanto  ás  columnas 
da  nave,  não  vimos  obra  tão  primorosa  e  arrojada 
em  nenhuma  das  afamadas  cathedraes  da  Europa 
que  temos  visitado.  Os  estreitos  limites  de  um 
Guia,  mal  podem  comportar  a  descripção  circums- 
tanciada  de  tantas  bellezas  de  architectura,  pintu- 
ras, riqueza  de  mármores,  ornatos  de  prata  e  de 
madeira,  que  encerra  o  famoso  mosteiro.  Por  de- 
traz  do  altar  mór  está  o  caixão  que  encerra  o  ca- 
dáver do  infeliz  D.  Affonso  vi  e  outros  dois  com 
os  corpos  do  principe  D.  Theodosio  e  de  sua  irmã 
filhos  também  de  D.  João  iv,  que  não  sabemos  por 
que  não  estão  unidos  aos  outros  principes  da  casa 
cie  Bragança;  em  duas  capellas  lateraes  estão  os  tú- 
mulos dos  filhos  de  D.  João  m  em  numero  de 
oito  e  um  cenotaphio  contendo  ossos,  que  um  dos 
Filippes  quiz  fazer  crer  aos  portuguezes  serem  de 
D.  Sebastião.  Em  sepultura  raza  jaz  o  arcebispo 
de  Braga  D.  Duarte,  também  filho,  mas  natural 
de  D.  João;  está  depositada  ahi  a  rainha  D.  Ga- 
tharina,  portugueza  mulher  de  Carlos  n  de  Ingla- 
terra, e  em  ricos  túmulos  o  cardeal  rei  e  vários 


DO  VIAJANTE  95 

infantes  de  Portugal.  Na  capella-mór  os  reis  D.  Ma- 
nuel e  D.  João  ih,  e  suas  respectivas  mulheres  as 
rainhas  D.  Maria  e  D.  Catharina,  ambas  castelhanas. 
O  exterior  da  egreja  é  irregular,  mas  assaz  formoso  ; 
o  portal,  sobre  tudo,  é  digno  de  admirar-se.  Em  o 
convento  que  fica  unido  ao  templo,  está  hoje  a  Casa 
Pia,  estabelecimento  de  caridade  onde  se  sustentam 
e  educam  creanças  desvalidas  e  a  escola  de  sur- 
dos mudos. 

Este  magestoso  edifício  está  tendo  valiosos  me- 
lhoramentos, e  dentro  em  breve  a  sua  sumptuosa 
fabrica  ficará  completa,  segundo  o  risco  primitivo 
e  com  todas  as  bellezas  da  arte. 

S.  Domingos.  —  É  a  mais  vasta  egreja  de  Lisboa, 
situada  ao  lado  da  praça  de  D.  Pedro.  Pertenceu 
á  ordem  dos  pregadores,  e  hoje  serve  de  parochia 
de  S.  Justa  e  Rufina. 

S.  Roque.  —Egreja  que  pertenceu  aos  jesuítas, 
celebrada  unicamente  pela  capella  de  S.  João  Da- 
ptista. 

Esta  riquíssima  capella,  mandada  construir  em 
Roma  por  D.  João  v,  e  obra  dos  melhores  artífi- 
ces da  época,  é  adornada  de  preciosidades,  taes 
como  granito  oriental,  porphyro,  alabastro,  ame. 
thysta,  coralina,  etc.  Tem  três  quadros  em  mozaico 
representando  o  baptismo  do  Redemptor,  a  An- 
nunciação  e  a  descida  do  Espirito  Santo,  conside- 
rados como  obras  primas  dns  melhores  artistas 
italianos.  Veiu  toda  a  capella  desmantelada  e  encai- 


96  NOVO  GUIA 

xotada,  de  Roma,  depois  de  n'ella  ter  officiado  o 
Papa;  foi  patenteada  ao  publico  em  1751.  Este  ca- 
pricho real  custou  quatorze  milhões  de  cruzados ! 
Vale  a  pena  admirar  essas  columnas  de  lápis  laz- 
zuli,  esse  pavimento  *de  mármore  e  porphyro,  es- 
ses tocheiros  gigantes  de  prata  doirada,  esse  altar 
de  apurado  trabalho  e  as  outras  riquezas  d'este 
singular  monumento. 

Junto  a  esta  egreja  de  S.  Roque,  no  edifício  que 
foi  antigamente  collegio  dos  jesuitas,  está  o  reco- 
lhimento dos  engeitados,  que  só  se  patenteia  ao 
publico  uma  vez  por  anno,  no  dia  dos  Santos  In- 
nocentes,  a  28  de  dezembro. 

Santo  António.  —  Próximo  á  egreja  da  Sé,  no  lo- 
cal onde  nasceu  Santo  António  de  Pádua.  É  ca- 
pella  da  camará  municipal,  e  está  conservada  com 
bastante  aceio. 

Martyres. —  Como  S.  Vicente,  esta  egreja  foi  fun- 
dada peio  primeiro  rei  portuguez,  em  memoria  da 
conquista  de  Lisboa  e  para  servir  de  jazigo  a  guer- 
reiros estrangeiros,  mortos  n'essa  empresa.  É  a 
mais  antiga  parochia  de  Lisboa. 

Encarnação.  —  Próximo  dos  Martyres  está  este  ele- 
gante templo,  é  espaçoso  e  tem  objectos  de  arte 
dignos  da  contemplação  do  viajante. 

Loreto. —  Defronte  da  Encarnação ;  freguezia  dos 
italianos  residentes  em  Lisboa.  Ardeu  duas  vezes» 
em  1651,  e  1755,  e  posto  que  reedificada  sum- 
ptuosamente, com  o  auxilio  do  Papa  e  do  rei  Por- 


DO  VIAJANTE  97 

tuguez,  não  possue  perfeições  artisticas  iguaes  ás 
que  perdeu. 

Graça.  —  Antigo  convento  de  eremitas  de  Santo 
Agostinho,  está  situado  em  logar  deleitoso  sobre 
um  dos  grandes  montes  de  Lisboa.  A  egreja  ê 
vasta  e  tem  alguns  quadros  de  valor,  porém  o  que 
encerra  de  mais  precioso  sâo  os  ossos  do  Ínclito 
AíTonso  de  Albuquerque,  o  maior  capitão  do  seu 
século,  um  dos  maiores  de  todas  as  edades.  É  na 
sachristia  que  está  o  tumulo  d'este  governador  da 
índia,  a  cuja  sombra  ainda  hoje  pedem  justiça  os 
malabares. 

Monte. —  De  todos  os  logares  elevados  da  cidade, 
e  do  Tejo  também,  se  notam  para  o  oriente  de  Lis- 
boa três  montanhas  muito  salientes,  no  cimo  de 
cada  uma  das  quaes  se  enxerga  um  templo :  é  a 
Graça,  de  que  já  falíamos,  a  Penha,  de  que  trata- 
remos adiante,  e  o  Monte,  de  que  nos  occupâmos 
agora  ;  de  todos  elles  se  disfructa  uma  perspectiva 
magnifica  da  cidade  e  do  rio,  em  dias  claros  se 
descobrem  perfeitamente  as  ameias  e  torres  dos 
castellos  de  Cintra.  O  que  se  avista  de  qualquer 
d'estes  cabeços,  pode  considerar-se  como  o  reverso 
da  medalha,  a  respeito  do  que  se  observa  em 
S.  Pedro  de  Alcântara.  Quanto  á  egreja  da  Senhora 
do  Monte,  foi  ella  edificada  em  1243,  porém  caiu 
pelo  terremoto  e  ergueu-se  de  novo.  Pertencia, 
como  a  Graça,  aos  eremitas  agostinianos.  Conser- 
va-se  ahi  a  cadeira  de  S.  Gens,  onde  elle  pregava 


98  NOVO   GUIA 

ao  povo,  sendo  bispo  de  Lisboa,  segundo  a  tra* 
dicção. 

Penha  de  França.  —  Também  antigo  convento  de 
agostinhos.  É  muito  concorrida  esta  egreja  pelos 
navegantes  que,  em  occasião  de  perigo,  fazem  vo- 
tos a  Nossa  Senhora  da  Penha  de  França,  grande 
protectora  dos  homens  do  mar. 

Santa  Crnz  do  Castello.  —  Dentro  do  castello  de 
S.  Jorge.  É  uma  das  mais  antigas  freguezias  de 
Lisboa,  que  já  existia  como  egreja  no  anno  de 
1168.  Ficou  muito  damnificada  pelo  grande  terre- 
moto de  1755. 

Conceição  velha. —  Antiga  synagoga  de  judeus  em 
Villa  Nova  de  Gibraltar,  transformou-se  em  egreja 
christã,  quando  a  villa  foi  sequestrada  pela  cidade 
de  Lisboa,  e  o  bairro  da  judearia  acabou.  Passou 
a  ser  collegiada  da  ordem  de  Christo.  Está  situada 
na  rua  da  Ribeira  velha.  Os  delicados  lavores  em 
pedra  da  portada  d'este  templo  são  dignos  de  con- 
templação do  artista  e  do  antiquário ;  é  o  mesmo 
género  do  mosteiro  de  Belém,  fundação  do  mesmo 
rei  venturoso  que  mandou  descobrir  a  índia. 

Magdalena.  —  Antiquissima  parochia  de  Lisboa, 
situada  no  largo  do  seu  nome,  ao  cabo  da  rua  da 
Conceição  ou  dos  Retrozeiros,  apezar  dos  incêndios 
por  que  tem  passado,  ainda  conserva  um  portal  que 
denuncia  grande  vetustidade  e  também  é  digno  de 
ser  contemplado  pelo  viajante. 

S.  Nicolau.  —  Esta  egreja  parochial  que  foi  fun- 


DO   VIAJANTE  99 

dada  em  1720,  está  situada  em  um  pequeno  largo 
entre  a  rua  da  Prata  e  a  dos  Douradores ;  foi  com- 
pletamente destruída  pelo  terremoto  de  1755,  e 
reedificada  em  1776.  Tem  óptimas  pinturas,  de 
artistas  portuguezes  contemporâneos,  porém  apre- 
senta um  aspecto  tão  garrido,  que  só  conduz  a  pen- 
samentos profanos.  Esta  freguezia  possue  ricos  pa- 
ramentos, assim  como  uma  custodia  de  grande 
preço  e  estima. 

S.  Julião. —  Já  em  1200  era  parochia,  e  ahi  foi 
baptisado,  segundo  a  fama,  o  pontifice  portuguez 
João  xx  ou  xxi.  Destruida  pelo  terremoto  e  de 
prompto  reedificada  pelas  esmolas  dos  fieis,  tornou 
a  arder  no  dia  4  de  outubro  de  18 1G,  por  occasião 
das  exéquias  da  rainha  D.  Maria  i.  Acha-se  con- 
cluída a  nova  fabrica,  em  que  ha  grande  profusão 
de  mármores  variadíssimos,  duas  ricas  columnas 
na  capella  mór,  e  preciosos  lavores  em  pedra. 

Santa  Engracia.  —  Próximo  de  S.  Vicente.  É  de 
forma  obicular  e  gigantesca;  nunca  se  completou, 
apesar  das  enormes  sommas  n'ella  despendidas,  o 
que  dou  Lugar  ao  porvcrbio :  —  É  como  as  obras 
de  Santa  Engracia  —  applicado  a  qualquer  cousa 
que  parece  interminável.  Ha  uma  lenda  acerca  d'esta 
construcção,  que  justifica  o  porveFbio.  Diz-se  que 
um  Simão  Perez  Solis,  condemnado  á  morte,  inno- 
centemente,  por  um  desacato  perpetrado  na  antiga 
egreja,  dissera  sobre  o  patíbulo  —  que  em  memo- 
ria da  sua  innocencia,  nunca  aquella  obra  se  aca- 


100  NOVO   GUIA 

baria.  A  profecia  foi  feita  ha  mais  de  dois  séculos  ! 

Ruinas  do  Carmo.  —  Ainda  é  bello  ir  contemplar 
as  formosas  ruinas  d'esse  antigo  templo  da  Senhora 
do  Vencimento,  que  o  condestavel  D.  Nuno  Alvares 
Pereira  fundou  para  os  religiosos  carmelitas  e  para 
seu  ultimo  repouso.  A  portada,  as  columnas  que 
dividem  as  naves  e  outros  restos  do  gothico  mo- 
numento, ainda  satisfazem  a  curiosidade  do  artista 
e  do  homem  de  bom  gosto.  No  antigo  convento, 
unido  á  egreja,  está  o  quartel  da  guarda  munici- 
pal de  Lisboa. 

Dos  antigos  conventos  de  Lisboa  alguns  servem 
de  parochias,  n'outros  estão  repartições  publicas  e 
quartéis  de  tropa,  outros  finalmente  venderam-se 
a  particulares.  O  convento  do  Espirito  Santo,  ao 
Chiado,  é  hoje  palácio  dos  barões  de  Barcelinhos ; 
o  dos  Paulistas  tem  uma  companhia  da  guarda 
municipal,  e  teve  uma  de  sapadores,  porém  a 
sua  egreja  serve  para  o  culto  Divino  como  pa- 
rochia ;  o  de  Jesus  tem  a  academia  das  scicncias, 
todavia  a  egreja  também  serve  de  parochia;  no 
de  S.  Francisco  está  a  Bibliotheca  publica  e  a 
academia  das  bellas  artes;  no  de  S.  Bento  as 
cortes  e  o  archivo ;  no  de  Xabregas  uma  fabrica  de 
algodões.  O  que  ainda  se  conserva  é  o  da  Madre 
de  Deus,  de  freiras,  em  cuja  sacristia  ha  dois  qua- 
dros attribuidos  ao  Grao-Vasco,  e  a  historia  de 
José  no  Egypto  por  André  Gonçalves.  Também 
alguns  foram  damolidos  e  n'este  numero  entra  a 


DO   VIAJANTE  101 

Trindade,  sobre  sujas  ruinas  se  assentou  parte  da 
casaria  da  rua  do  mesmo  nome,  abaixo  de  S.  Roque. 

Além  das  freguezias  já  mencionadas  existem  em 
Lisboa  outras  muitas,  assim  como  grande  numero 
de  egrejas,  hospícios,  capellas,  ermidas  e  conventos 
de  freiras,  que  fora  ocioso  enumerar. 

Os  francezes  têem  uma  egreja  nacional  em  Lis- 
boa, a  de  S.  Luiz  na  rua  de  Santo  Antão;  e  os 
inglezes  catholicos  as  do  Corpo  Santo,  e  Inglezi- 
n/tos,  e  S.  Patrício;  e  os  protestantes  uma  capella 
e  cemitério  em  separado,  próximo  ao  passeio  da 
Estrella. 


OUTROS  EDIFÍCIOS  PÚBLICOS 
Aqueci uct o  das  aguas  livres 

Esse  bello  monumento  de  publica  utilidade,  a 
que  vulgarmente  chamamos  —  arco  das  aguas  li- 
vres—  foi  concluído  em  vinte  annos,  sob  a  direc- 
ção do  engenheiro  Manuel  Maio,  e  resistiu  ao  grande 
choque  do  terremoto  de  1755.  O  aqueducto  começa 
a  três  léguas  de  distancia  da  cidade  e  em  toda  a 
sua  extensão  tem  127  arcos  de  excellente  pedra, 
porém  os  35  que  formam  uma  ponte  sobre  Alcân- 
tara, a  mais  comprida  de  todas  as  pontes  do  mundo, 
mas  sobre  um  rio  quasi  sem  agua,  esses  35  arcos, 
alguns  dos  quaes  tèem  uma  altura  prodigiosa,  são 
o  assombro  dos  estrangeiros,  que  não  encontram 


102  NOVO   GUIA 

entre  as  obras  dos  romanos,  uma  construcção  tão 
atrevida  como  esta.  O  aqueducto  entranha-se  na 
cidade  pelo  lado  do  noroeste,  e  ahi  toma  o  nome 
de  Amoreiras,  de  um  largo  contíguo  em  que  ha 
plantações  d'esse  género,  e  junto  ao  qual  ha  uma 
espécie  de  arco  de  triumpho,  de  architectura  dórica, 
com  uma  inscripção  lapidar  que  refere  a  historia 
da  construcção  do  aqueducto,  e  é  datada  de  1738. 
Ao  sair  do  largo  das  amoreiras  para  o  sul,  existe 
uma  vasta  mãe  de  agua,  que  apresenta  exterior- 
mente a  apparencia  de  uma  grande  torre  quadran- 
gular :  é  toda  construída  de  óptima  cantaria  e  con- 
cluiu-se  em  1834.  É  esta  uma  das  visitas  que  re- 
commendamos,  especialmente  ao  curioso  tourista, 
e  se  no  verão  der  um  passeio  pelo  interior  do  ex- 
tenso aqueducto  encontrará  tal  fresco,  passará  al- 
guns minutos  tão  agradavelmente,  que  por  certo 
nos  agradecerá  a  lembrança. 

Arsenal  do  exercito 

O  arsenal  do  exercito  em  Lisboa,  situado  na 
parte  mais  oriental  da  cidade,  e  á  beira  do  Tejo  é 
um  edifício  de  agradável  apparencia,  e  vulgarmente 
conhecido  pelo  nome  de  Fundição,  para  o  distin- 
guir do  arsenal  da  marinha,  também  á  beira  do 
rio,  mas  a  meio  comprimento  da  cidade,  e  a  que 
se  chama  somente  o  arsenal.  O  estabelecimento 
de  que  trata  este  artigo  divide-se  em  vários  corpos 


DO   VIAJANTE  103 

de  edifício;  a  fundição  de  cima  chamada,  onde  se 
fundem  as  peças  de  artilheria,  é  contigua  ao  palácio 
do  inspector  e  fica  situada  no  campo  de  Santa  Clara ; 
no  mesmo  campo  estão  as  ferrarias,  e  o  deposito 
dos  reparos  e  petrexos  concernentes  á  artilheria; 
e  mais  distante,  a  Santa  Apolónia,  o  laboratório 
de  fogos  de  artificio.  A  entrada  principal  do  edi- 
fício junto  ao  rio  tem  uma  bella  fachada,  com  co- 
lumnas  da  ordem  corinthia,  e  tropheus  militares, 
tudo  de  bem  lavrada  pedra.  Esta  construcção  data 
de  1760;  é  uma  das  obras  do  grande  Pombal.  No 
pavimento  inferior  da  casa  são  os  vastos  armazéns 
de  deposito  e  no  superior  encontram-se  grandes, 
salas,  com  muita  claridade,  onde  estão  dispostas 
em  tropheus  marciaes  armas  de  todos  os  tempos, 
brancas  e  de  fogo,  o  que  é  assaz  curioso  para  o 
antiquário ;  e  ahi  se  encontra  também  a  celebrada 
peça  de  Diu,  que  tem  de  comprimento  21  palmos 
e  3  pollegadas,  e  de  circumferencia  na  culatra  9 
palmos  e  9  pollegadas,  e  na  bocca  7  palmos  e  7 
pollegadas.  Este  canhão  foi  achado  pelos  portugue- 
zes  em  Diu,  quando  se  apossaram  da  cidade  pela 
morte  do  Sultão  Badur;  pertencera  ao  sultão  de 
Babylonia,  e  Rumecan  a  trouxe  comsigo  quando 
veiu  pôr  cerco  a  Diu.  Todas  as  dependências  d'este 
arsenal  podem  ser  examinadas  pelo  viajante,  apenas 
com  o  encommodo  de  pedir  licença  ao  inspector  ou 
ao  olficial  de  dia. 


104  NOVO   GUIA 

Arsenal  da  marinha 

Á  beira  do  Tejo  e  com  porta  principal  para  o 
largo  do  Pelourinho.  Occupa  parte  do  local  onde 
estava  o  palácio  dos  nossos  reis  antes  do  terremo- 
to, e  ainda  muita  gente  lhe  chama  a  Ribeira  das 
naus,  em  lembrança  dos  passos  da  Ribeira,  e  do 
estabelecimento  naval  que  ahi  estava  contíguo,  e 
que  tinha  aquella  denominação.  É  uma  elegante 
construcçao,  obra  do  marquez  de  Pombal,  como 
tudo  que  se  admira  solido  e  grandioso  na  Lisboa 
moderna.  Tem  um  famoso  dique,  todo  forrado  de 
cantaria ;  dois  estaleiros,  óptimos  armazéns,  a  ex- 
tensa sala  do  risco  onde  estão  as  escolas  naval  e 
de  construcçao,  e  onde  se  fez  a  grande  exposição 
da  industria  nacional  em  1849.  Ha  ahi  uma  cor- 
veta para  ensino  dos  guarda-marinhas,  que  merece 
vêr-se.  Ao  fim  d'essa  sala,  para  o  sul,  está  o  tele- 
grapho  central  do  reino,  e  é  ahi  que  se  fazem  os 
signaes  dos  navios  que  entram  ou  saem  do  Tejo. 
e  que  estão  á  vista  das  fortalezas  da  barra;  este 
arsenal  communica  com  os  edifícios  da  parte  Occi- 
dental do  Terreiro  do  Paço.  Ahi  estão  a  contado- 
ria e  pagadoria  de  marinha,  a  repartição  do  major 
general  da  armada  e  a  superitendencia  do  mesmo 
arsenal. 

Este  importante  estabelecimento  do  estado  tem 
soffrido  notáveis  melhoramentos  taes  como  :  uma 
longa  e  espaçosa  ponte  de  ferro,  um  solido  guin- 


DO    VIAJANTE  105 

daste  a  vapor,  um  bom  ramal  de  caminhos  de  ferro 
americanos,  etc,  etc. 

Como  complemento  a  esta  noticia,  daremos  aqui 
a  nota  dos  navios  da  nossa  armada. 

\avios  armados  e  desarmados 

Nau  Vasco  da  Gama. — Desarmada. 

Fragata  D.  Fernando.  —  Servindo  de  escola  de 
artilheria,  no  Tejo. 

Corveta  fíartholomeu  Dias.  —  No  Tejo. 

Corveta  Estephania.  —  No  Tejo. 

Corveta  Duque  da  Terceira. — Em  Angola. 

Corveta  Duque  de  Palmella. — Em  Macau. 

Corveta  Infante  D.  João.  —  Em  Gôa. 

Corveta  Infante  D.  Henrique.  —  Em  Angola. 

Corveta  D.  João  i.°  —  No  Fayal. 

Corveta  Marianna. — Em  Moçambique. 

Corveta  Sagres.  —  No  Tejo. 

Corveta  Sá  da  Bandeira.  —  Desarmada. 

Canhoneira  Rio  Minho. — Em  Cabo  Verde. 

Canhoneiea  Tejo.  —  Em  Cabo  Verde. 

Canhoneira  Guadiana.  —  Desarmada. 

Canhoneira  Zarco.  —  No  Tejo. 

Canhoneira  Douro.  —  Em  construcção  no  arse- 
nal. 

Vapor  índia.  —  No  Tejo. 

Vapor  Mindello.  —  No  Tejo. 

Vapor  Lynce.  —  No  Tejo. 


106  NOVO    GUIA 

Vapor  Argus.  —  No  Algarve. 
Vapor  Tete.  —Na  Africa. 
Vapor  Sena.  —Na  Africa. 
Barca  Martinho  de  Mello.  —  No  Tejo. 
Escuna  Conde  Penha  Firme.  —  Na  Africa. 
Escuna  Napier.  —  Na  Africa. 
Brigue  Pedro  Nunes.  —  Desarmado. 
Ha  mais  outras  embarcações  de  pequeno  lote 
que  não  se  mencionam  aqui,  por  brevidade. 

Alfandega  de  Lisboa 

Do  lado  opposto  do  arsenal  da  marinha  e  com- 
municando  também  com  o  Terreiro  do  Paço,  mas 
pelo  lado  oriental,  está  o  grandioso  edifício  da  al- 
fandega, construcçâo  do  grande  homem,  muito  di- 
gna de  ser  visitada  pelo  forasteiro,  que  não  tenha 
mesmo  de  entrar  lá  por  causa  de  negócios,  mas 
tão  somente  para  a  revista  da  sua  bagagem.  Fa- 
mosos armazéns  e  salas  occupam  os  dois  pavi- 
mentos de  uma  ampla  quadra,  fresca  sempre  pe- 
las aguas  de  um  tanque  com  seu  pequeno  repuxo 
e  por  formosos  salgueiros  que  sombreiam  commo- 
dos  assentos.  Tem  logo  ao  desembarque  esta  alfan- 
dega, dois  telheiros  de  ferro  com  columnas  do 
mesmo  metal  de  agradável  apparencia.  A  entrada 
é  sempre  franca  pela  arcada  da  Praça  do  Gommer- 
cio. 

Esta  alfandega  tem  actualmente  um  ramal  de 


DO   VIAJANTE  107 

caminhos  de  ferro  americano;  e  está  mais  aug- 
mentada  com  varias  casas  e  armazéns  que  perten- 
ceram ao  ministério  do  reino. 

Próximo  ao  Terreiro,  no  chamado  Jardim  do  Ta- 
baco, possue  esta  alfandega  excellentes  armazéns 
de  deposito,  para  os  géneros  que  não  podem  esta- 
cionar na  alfandega  grande. 

Alfandega  municipal 

Caminhando  para  leste  pela  chamada  rua  da  Al- 
fandega e  não  mui  distante  do  seu  termo,  encon- 
tra-se  o  largo  do  Terreiro  do  Trigo,  no  centro  do 
qual  está  um  vasto,  elegante  e  solido  edifício,  cons- 
truído, ainda  por  Pombal,  para  deposito  de  trigos, 
depois  transformado  em  alfandega  de  cereaes  e  que 
ultimamente  pela  reunião  d'esta  casa  fiscal  com  a 
alfandega  denominada  das  Sete  Casas,  tomou  o 
nome  de  Alfandega  Municipal.  É  ahi  que  se  des- 
pacham todos  os  objectos  de  consumo  do  municí- 
pio, menos  o  peixe  que  tem  uma  administração 
separada,  no  cães  da  Ribeira  Nova,  mas  cujo  edi- 
fício nada  tem  de  notável. 

Cordoaria 

Singelo  mas  assaz  extenso  edifício,  mandado 
construir  pela  rainha  D.  Maria  i,  á  margem  do 
Tejo,  entre  a  Junqueira  e  Belém.  É  ahi  a  fabrica 


108  NOVO   GUIA 

de  cabos  e  lonas  para  fornecimento  da  armada  e 
tem  uma  ofíicina  de  instrumentos  mathematicos. 

Casa  da  moeda 

Adiante  do  largo  de  S.  Paulo,  caminho  de  oeste. 
Tem  uma  excellente  machina  de  cunhar,  a  vapor, 
e  existiam  ahi  guardadas  algumas  preciosidades 
dos  extinctos  conventos  e  egrejas  profanadas ;  taes 
eram  —  uma  cruz  de  oiro  de  12  marcos  e  4  onças, 
que  D.  Sancho  i  deu  a  Santa  Cruz  de  Coimbra  em 
1212;  uma  cruz  grande  antiquíssima,  outra  de  oiço 
com  pedras  preciosas  e  uma  grande  pyxide  com 
pedraria,  tudo  do  convento  de  Alcobaça ;  um  gran- 
de cofre  de  prata  para  a  semana  santa,  no  gosto 
gothico,  que  pertencia  aos  freires  de  Thomar.  A 
custodia  da  Patriarchal,  que  custou  um  milhão  e 
duzentos  mil  cruzados ;  a  da  Bemposta,  que  tem 
dezesete  contos  de  réis  no  pezo  de  metal,  fora  os 
diamantes  e  mais  pedraria ;  a  de  Belém,  mandada 
fazer  por  D.  Manuel,  do  primeiro  oiro  que  veio 
do  Quilôa ;  o  precioso  cálix  de  Thomar,  dois  de 
Coimbra,  o  sceptro  real  de  oiro  do  Tejo,  etc. 

Palácio  da  justiça 

No  extincto  convento  da  Boa  Hora,  acima  da 
Conceição  Nova.  Nada  tem  de  notável.  Ahi  estão 
todos  os  julgados  da  primeira  instancia  em  Lisboa, 
menos  o  commercial  e  os  militares. 


DO   VIAJANTE  109 

Quartéis  de  tropa» 

Os  mais  notáveis  são:  dois  na  calçada  da  Ajuda 
—  Lanceiros  da  rainha,  e  infanteria  n.°  1  —  o  de 
Campo  de  Ourique,  de  infanteria  16 ;  o  de  Vai  de 
Pereiro,  caçadores  2;  o  de  Alcântara,  construidu 
para  o  batalhão  naval,  hoje  extincto;  está  occupa- 
do  pelos  inválidos  da  marinha ;  e  o  do  castello  de 
S.  Jorge,  onde  está  caçadores  o.  Os  demais  cor- 
pos da  guarnição  de  Lisboa,  e  varias  companhias 
da  guarda  municipal  de  pé  e  de  cavallo,  estão  alo- 
jados em  edifícios  dos  extinctos  conventos. 

Está  quasi  concluído  em  Campolide  um  espaçoso 
quartel  para  artilheria,  com  todas  as  commodidad»< 
necessárias. 

Prisões 

Limoeiro.  —  Antigo  palácio  da  moeda,  dos  infan- 
tes, ou  de  S.  Martinho.  Ali  residiu  o  rei  D.  Fer- 
nando o  famoso,  e  ali  diante  dos  olhos  da  feiticeira 
Leonor  Telles  de  Menezes,  matou  o  Mestre  de 
Aviz,  depois  D.  João  i,  o  impudico  gallego  João 
Fernandes  Andeiro,  conde  de  Ourem.  Hoje  é  a 
prisão  publica  de  Lisboa. 

Aljube.  —  Logo  abaixo  do  Limoeiro.  Foi  antiga 
prisão  de  ecclesiasticos  e  depois  serviu  success 
vãmente  para  reclusão  dos  condemnados  a  traba- 
lhos públicos,  e  das  mulheres.  Ú  pequeno  edifício. 
mas  conserva-se  em  bom  estado. 


110  NOVO   GUIA 

Castello  de  S.  Jorge.  —  Prisão  dos  militares. 

Galé.  —  No  Arsenal  da  Marinha ;  era  o  presidio 
dos  condemnados  a  trabalhos  forçados. 

Cova  da  Moira.  —  Servia  para  detensâo  dos  pre- 
sos sentenciados  a  degredo,  emquanto  não  partiam 
para  os  seus  destinos. 

Torre  de  Belém.  —  Também  prisão  militar,  quan- 
do ha  grande  numero  de  presos.  Tem  uma  for- 
mosa sala  para  detensâo  dos  ofíiciaes  generaes. 
Das  outras  bellezas  da  torre  fatiaremos  na  defeza 
de  Lisboa. 

S.  Julião  da  Barra. — Prisão  de  estado  com  hor- 
riveis  calabouços,  onde  ás  vezes  cumprem  senten- 
tenças  de  prisão  temporária  os  ofíiciaes  militares. 

Caes 

Tem  Lisboa  oito  grandes  caes  de  embarque  e 
desembarque,  que  são  os  de  Belém,  Ribeira  Nova, 
Caes  do  Sodré,  Arsenal,  Caes  das  Golumnas, 
(Terreiro  da  Paço),  Alfandega,  Caes  de  Santa- 
rém, e  Fundição ;  e  quatro  menores  —  o  da  Cor- 
doaria, de  Alcântara,  de  José  António  Pereira,  e 
do  Terreiro. 

Aferro  da  Boa  Vista 

Este  aterro  começa  no  Caes  do  Sodré  e  chega 
já  quasi  até  Alcântara.  Está  ainda  em  construcçâo 


DO   VIAJANTE  111 

e  logo  que  se  ultime,  será  um  dos  melhores  pas- 
seios da  capital. 

É  uma  longa  e  bella  planice  arborisada,  com  as- 
sentos de  madeira,  bem  illuminada,  á  margem 
do  Tejo  e  decorada  com  bellos  prédios  e  muitos 
estabelecimentos  importantes,  como :  serralharias, 
officinas  de  fundição,  serragens  a  vapor,  estaleiros, 
vaccaria,  (onde  se  vende  leite  fresco,  sorvetes  etc.) 
O  estabelecimento  do  gaz,  a  abegoaria  da  cidade 
etc.  Armazéns  de  bebidas,  depósitos  de  madeiras, 
fabricas  de  túmulos  etc,  etc. 

Este  sitio  é  muito  frequentado  por  carroagens  e 
omnibus  que  transitam  para  Alcântara,  Belém,  Aju- 
da, Pedroiços,  Oeiras  e  Cascaes. 

Ha  o  projecto  de  estabelecer  aqui  uma  linha  fér- 
rea até  Cintra. 

Cal  deira  * 

Em  construcção  ha  duas  caldeiras  ou  dokas, 
junto  ao  Cães  de  Santarém,  assim  como  no  Arse- 
nal da  Marinha  ha  outras  duas  para  as  embarca- 
ções do  estado ;  posto  que  meio  atulhadas  de  lodo 
ainda  servem  de  grande  refugio  contra  os  rigores 
do  inverno. 

Jardim  botânico 

Contiguo  á  casa  que  serviu  até  1836  de  museu 
de  historia  natural,  palácio  velho  ao  lado  da  Ajuda. 
Foi  fundado  em  tempo  de  D.  Maria  i,  para  instruo- 


112  NOVO    GUIA 

ção  dos  príncipes,  e  teve  por  primeiro  director  o 
celebre  doutor  Vandelli,  lente  jubilado  da  universi- 
dade de  Coimbra ;  depois,  em  1810,  o  doutor  Fé- 
lix d' A  velar  Brotero,  um  dos  melhores  botânicos  do 
mundo.  É  logar  agradável  e  ameno,  e  tem  sido  en- 
riquecido com  uma  collecção  selecta  de  plantas  exó- 
ticas. Na  entrada  da  parte  do  sul  estão  duas  curiosas 
estatuas  de  cantaria,  já  muito  arruinadas,  attribuidas 
aos  fenicios  e  desenterradas  em  1785  nas  visinhanças 
de  Portalegre;  bem  como  uma  enorme  estatua  de 
Hercules.  Tem  este  jardim  bellos  repuchos  e  bacias 
de  agua,  duas  magnificas  estufas  e  varias  obras  em 
mármore,  dignas  de  ver-se. 

Telegraphia  eletrica 

Estabelecida  na  Praça  do  Commercio,  no  mesmo 
local  da  repartição  das  obras  publicas. 

É  do  serviço  do  estado,  porem  também  recebe 
communicações  para  particulares,  pelo  preço  que 
mostra  uma  tabeliã  existente  no  mesmo  estabeleci- 
mento. Tem  estações  em  diversos  pontos  da  capi- 
tal onde  recebe  e  expede  telegrammas. 

Fontes  c  chafarizes 

São  muitas  as  fontes  e  chafarizes  que  abastecem 
d'agua  a  cidade  ;  trata-se  de  a  encanar  para  as  ha- 
bitações, mas  entretanto  são  mais  de  três  mil  gal- 


DO    VIAJANTE  ii3 

legos  que  a  fornecem  aos  moradores ;  em  caso  de 
incêndio,  cujo  local  é  annunciado  por  um  certo  nu- 
mero de  badaladas  nas  torres  das  egrejas,  correm 
os  aguadeiros  com  os  barris  a  accudir,  emquanto 
outros  gallegos  das  companhias  dos  bombeiros  arras- 
tam os  carros  das  bombas  e  escadas.  Ha  um  ins- 
pector dos  incêndios  para  dirigir  superiormente 
esses  trabalhos. 

Os  chafarizes  e  fontes  mais  notáveis  de  Lisboa, 
são: 

A  samaritana.  —  É  um  monumento  dos  velhos 
tempos,  d'uma  architectura  grosseira,  mas  que  atráe 
pela  sua  vetustidade  e  singeleza  a  attenção  de  cu- 
riosos. Vê-se  ali  em  relevo  na  pedra  aquella  pie- 
dosa historia  da  Samaritana,  de  que  faliam  os  livros 
santos.  Está  situada  no  caminho  da  Madre  de  Deos. 

Chafariz  <TEl-rei.  —  Tem  nove  bicas,  e  é  d'onde 
se  toma  a  melhor  agua  para  embarque.  É  situado 
ao  Terreiro. 

No  largo  de  S.  Paulo.  —  Um  obelisco  demasiada- 
mente grande  para  o  tamanho  da  praça  em  que  está 
collocado ;  tem  quatro  bicas,  e  é  de  moderna  con- 
strucçâo. 

Janellas  Verdes.  —  Um  dos  mais  bem  acabados 
chafarizes  de  Lisboa,  ornado  d'uma  bella  estatua, 
em  frente  do  palácio  do  marquez  de  Pombal. 

Alcântara  —  Defronte  do  quartel  dos  inválidos  de 

marinha  ha  um  chafariz  recentemente  construido 

e  que  o  mau  gosto  fez  coroar  d'um  Neptuno. 
8 


114  NOVO   GUIA 

Necessidades  —  Tem  este  largo  uma  fonte  com 
grande  tanque  e  gracioso  obelisco,  a  que  já  nos  re- 
ferimos no  artigo  Palácios  reaes. 

Belém.  —  Próximo  ao  mosteiro  dos  Jeronymos 
está  um  outro  chafariz,  de  forma  piramidal,  que  é 
dos  mais  engraçados  em  architectura  que  possue 
Lisboa  e  seus  subúrbios.  Foi  construído  moderna- 
mente. 

Pedroiços.  —  N'este  encantador  logar  ha  um  ou- 
tro chafariz  egualmente  esbelto  e  de  gosto  não  vul- 
gar, ainda  de  mais  moderna  data. 

Esperança — Retrocedendo  para  o  interior  da  ci- 
dade, cuja  orla  seguimos  até  aqui,  encontramos 
o  chafariz  do  Largo  da  Esperança,  adornado  de  co- 
lumnas  e  ampla  escadaria. 

Thesouro  Velho.  —  De  moderna  data  foi  feito  para 
substituir  o  chafariz  do  Loreto. 

Carmo.  —  Ê  d'uma  estructura  original  e  embel- 
leza  muito  a  praça  que  lhe  deu  o  nome. 

Rua  Formosa.  —  No  centro  d'um  largo.  É  espa- 
çoso e  abundante  em  agua. 

Chafariz  da  rua  d'Alegria.  — De  aspecto  acanhado, 
porem  abundante  d'agua. 

Rato.  —  No  largo  d'este  nome  ;  é  de  soffrivel  ap- 
parencia. 

Rua  do  Arco  —  Pequeno  e  sem  prespectiva. 

Praça  das  Flores — É  do  mesmo  gosto.  Foi  cons- 
truido  para  substituir  um  outro  que  havia  junto  ao 
arco  do  rua  de  S.  Bento. 


DO    VIAJAXTE  115 

Das  Amoreiras.  —  Construído  no  centro  do  largo 
d'esta  denominação,  é  elegante  e  possue  boa  agua. 

Da  Eslrella.  —  Construído  junto  ao  convento  as- 
sim chamado.  Nada  tem  de  notável. 

De  S.  Pedro  de  Alcântara.  —  Construído  moderna- 
mente no  fim  da  calçada  da  gloria,  em  substituição 
d 'um  outro  que  havia  junto  da  alameda. 

Em  toda  a  cidade  e  seus  arrebaldes  ha  outros 
mais,  pouco  dignos  de  nota,  assim  como  vários 
marcos  fontenarios  nos  passeios  e  nos  logares 
mais  públicos  da  cidade. 


ESTAÇÃO  DO  CAMINHO  DE  FERRO  DE  LESTE 

Esta  elegante  e  espaçosa  estação  está  situada 
próximo  a  Santa  Apolónia,  e  pouco  distante  do 
largo  do  Terreiro.  Não  obstante  ter  um  largo  na 
sua  frente,  a  rua  que  lhe  fica  paralella  é  pouco 
larga,  e  se  esta  linha  férrea  tivesse  o  desinvolvi- 
mento  desejável,  por  certo  aquella  artéria  seria 
insuficiente  para  o  transito  publico. 

Tem  esta  estação  uma  magestosa  gare,  e  todas 
as  dependências  necessárias  são  edificadas  com 
elegância  e  solidez.  Dizem  as  pessoas  entendidas 
que  não  é  inferior  a  outras  estações  de  paizes 
muito  mais  adiantados  que  nós. 

D'ali  partem  os  combovos  para  leste  e  sueste, 


116  NOVO    GUIA 

tendo  um  espaçoso  entroncamento,  solidas  pontes 
de  ferro  e  cantaria,  túneis,  etc. 

Houve  projecto  de  fazer  na  frente  d'esta  estação 
um  formoso  aterro  roubando  á  margem  do  Tejo  o 
necessário  espaço  para  uma  bella  rua  que  chegasse 
a  entroncar  com  o  denominado  Aterro  da  Boa 
Vista;  porém  uma  tal  obra  foi  julgada  superior  ás 
forças  do  nosso  município,  e  assim  ficou  aquelle 
terreno  acanhado  e  pouco  elegante. 


DEPOSITO  DA  COMPANHIA  DAS  AGUAS 

É  no  logar  onde  existiu  o  chafariz  da  praia,  e 
que  agora  é  substituído  por  uma  bica  de  pouca 
importância,  que  se  edificou  junto  a  este  deposito 
d'aguas,  o  qual  é  de  perfeito  machinismo,  solido  e 
bastante  espaçoso.  É  uma  obra  importante  e  a 
única  que  n'este  género  existe  em  Portugal  e  por 
isso  muito  digna  de  ser  visitada  por  qualquer  es- 
trangeiro. 

As  duas  obras  hydraulicas  mais  notáveis  de  Lis- 
boa é  esta  e  o  deposito  das  Amoreiras.  Os  arcos 
das  aguas  livres,  fora  da  circumvalação  de  Lisboa, 
egualmente  é  uma  obra  arrojada  e  perfeita,  e  da 
qual  se  falia  mais  largamente  n'esta  guia. 

A  chamada  companhia  das  aguas  já  fornece  esse 
necessário  liquido  a  muitas  casas  e  estabelecimen- 


DO  VIAJANTE  117 

tos,  por  um  preço  muito  rasoavel,  prestando  assim 
um  bom  serviço  á  economia  e  á  hygiene. 


MERCADOS 

Praça  da  Figueira.  —  Bello  mercado  coberto,  so- 
bre os  quatro  lados  de  uma  extensa  praça,  que  fica 
a  par  do  Rocio,  no  topo  da  rua  da  Prata.  Tem  ar- 
vores pelo  centro.  Ahi  se  vendem  aves  de  toda  a 
qualidade,  fructas,  hortaliças,  ovos,  leite  e  flores. 
É  fechado  todas  as  noites,  com  as  portas  de  ferro, 
á  similhança  do  passeio  publico. 

Nas  vésperas  de  Santo  António,  S.  João  e  S.  Pe- 
dro, é  esta  praça  illuminada  e  n'ella  se  vendem 
fructas,  bolos,  flores,  bebidas  e  quinquilharias, 
como  n'um  arraial. 

Ribeira  Nova.  —  Mercado  de  peixe,  mas  onde  se 
encontram  também  fructas  e  hortaliças.  Está  si- 
tuado em  uma  boa  praça  junto  ao  cães  de  Sodré; 
tem  logares  cobertos  como  a  Praça  da  Figueira. 
Na  frente  do  mercado,  junto  ao  rio,  está  a  casa 
fiscal  da  administração  do  pescado. 

Ribeira  Velha.  —  Mercado  de  carnes  de  porco  e 
fructas  seccas  do  Algarve.  É  muito  regular  e  aceiado, 
constituindo  um  dos  lados  da  rua  entre  o  Ver-o- 
Peso  (antigo  local  da  alfandega  das  Sete  Casas)  e 
O  Terreiro  do  Trigo. 


±1$  NOVO   GUIA 


Praça  do  peixe.-  Ao  Terreiro  do  Trigo.  É  um  pe- 
queno mercado  com  mesas  de  pedra,  destinado  ex- 
clusivamente á  venda  do  peixe. 

Vêr-o-Peso.—  Assim  se  chama  ao  mercado  de 
azeite  e  vinho,  por  grosso,  estabelecido  â  Ribeira 

Velha. 

Praça  de  peixe.  — Em  Belém.  E  local  mais  vasto. 
Foi  concluido  ha  poucos  annos  com  bastante  gosto. 


MATADOURO 

Era  antigamente  no  Campo  de  Santa  Anna. 
Agora  acha-se  edificado  com  toda  a  vastidão  no 
sitio  denominado  Cruz  do  Taboado. 

É  um  estabelecimento  notável  e  no  seu  género 
pôde  competir  com  os  melhores  que  existem  nos 

outros  paizes. 

As  rezes  são  alli  desmanchadas  com  todo  o  aceio, 
havendo  um  cirurgião  veterinário  destinado  a  exa- 
minar o  estado  de  saúde  dos  animaes  que,  para 
consumo  da  capital,  se  votam  á  morte. 


ESTABELECIMENTOS  ÚTEIS 

Hospilal  nacional  e  real  de  S.  José.  -  Estabelecido 
no  prolongamento  da  rua  do  Arco  da  Graça. 


DO   VIAJANTE  119 

Este  hospital  é  destinado  aos  doentes  pobres, 
posto  que  também  possue  quartos  particulares  por 
preços  rasoaveis. 

É  de  bella  apparencia,  tem  um  largo  na  sua 
frente,  todavia  possue  poucas  condições  hygienicas. 
Ultimamente  soffreu  notáveis  melhoramentos.  Tem 
uma  escola  medico  cirúrgica,  sendo  seus  professo- 
res as  melhores  reputações  da  capital. 

Hospital  da  Marinha.—  Junto  ao  campo  de  Santa 
Clara.  É  destinado  aos  doentes  pertencentes  á  ar- 
mada real. 

Hospital  da  estrellinba. —  Este  hospital  militar  está 
situado  ao  pé  do  largo  da  Estrella,  e  é  destinado 
aos  militares  doentes. 

Hospital  de  S.  Lazaro.  —  Passado  o  largo  do  Soc- 
corro.  É  destinado  aos  doentes  pobres  que  pade- 
cem moléstia  de  pelle. 

Hospital  veterinário.  —  Annexo  ao  Instituto  Agrí- 
cola. É  do  estado,  todavia  também  recebe  para  tra- 
tamento animaes  doentes,  pagando  seus  donos 
toda  a  despeza. 

Real  casa  pia 

É  estabelecida  no  edifício  do  convento  dos  Jero- 
nymos  em  Belém.  Antigamente  dava  educação  aos 
orphãos  e  desamparados  de  ambos  os  sexos,  hoje 
admitte  somente  rapa/.es  e  em  menor  numero,  onde 
lhes  ensinam  instrucçâo  primaria,  oíBcios  mecha- 
nicos,  etc. 


120  NOVO    GUIA 

No  primeiro  domingo  de  cada  mez  é  patente 
este  Asylo  ao  publico. 

Asylo  da  Mendicidade 

No  extincto  convento  de  Santo  António  dos  Ca- 
puchos ao  campo  de  Santa  Anna. 

Recolhe  um  determinado  numero  de  pobres  de 
ambos  os  sexos  que  alli  sâo  mantidos  por  caridade. 

Asylo  de  Maria  Pia 

Vasto  edifício  situado  a  Santa  Apolónia,  no  qual 
se  abrigam  indigentes  velhos,  cegos  e  aleijados  de 
ambos  os  sexos. 

Actualmente  o  numero  de  asylados  é  de  597. 

Asylo  de  Santa  Catharina 

Estabelecido  no  antigo  edifício  de  S.  João  Nepo- 
moceno. 

Foi  instituido  para  recolher  os  orphâos  das  vi- 
ctimas  da  febre  amarella. 

Asylo  dos  Alhos  dos  soldados 

No  edifício  de  Mafra. 

Asylo  dos  inválidos  do  trabalho 

Sito  na  Fonte  Santa. 


DO   VIAJANTE  121 

Santa  Casa  da  Misericórdia 

No  largo  de  S.  Roque. 

Este  estabelecimento  de  caridade,  educa  orphãos 
de  ambos  os  sexos,  e  recebia  os  infelizes  engeita- 
dos  por  seus  pães. 

Tem  uma  boa  administração  e  um  hospital  para 
os  seus  orphãos. 

N'este  edifício  é  que  se  fazem  as  loterias,  em  fa- 
vor dos  estabelecimentos  de  caridade. 

Asylos  da  Infância  Desvalida 

Ha  em  Lisboa  qoasi  um  bestes  asylos  por  cada 
freguezia,  ensinando  os  filhos  de  pessoas  pobres. 
São  mantidos  por  uma  commissão  de  pessoas  cari- 
dosas. 

Instituto  Vaccinico 

Rua  do  Crucifixo  n.°  100. 

Concelho  de  Saúde  Púnica  do  Iteino 

Annexo  á  Secretaria  do  Reino. 

Ljceu  Nacional  de  Lisboa 

Na  rua  de  S.  José,  próximo  ao  Quartel  General. 

Huartel  general 

Na  rua  de  S.  José,  próximo  á  rua  das  Pretas. 


122  NOVO   GUIA 

Correio  Geral 

Administração  central  do  correio  de  Lisboa,  cal- 
çada do  Combro  (aos  Paulistas). 

O  correio  tem  uma  estação  postal  na  praça  do 
Commercio,  no  lado  oriental,  assim  como  muitas 
caixas  em  diversas  ruas  da  cidade. 

As  estampilhas  de  franquia  vendem-se  nas  lojas 
que  teem  caixas,  assim  como  na  estação  postal  e 
no  correio  geral,  onde  se  seguram  as  que  vão  para 
fora  do  reino  e  se  recebe  dinheiro  e  encommendas. 

Procuradoria  Geral  da  Coroa 

Junto  ao  arco  da  rua  Augusta. 

ifonte-Pio  Geral 

Rua  do  Ouro. 

Observatório  astronómico 

Na-  Ajuda.  É  rico  de  instrumentos  mathematicos 
e  administrado  por  capacidades  scientificas  de  pri- 
meira ordem. 


DO  VIAJANTE  123 

LOCALIDADES  DAS  REPARTIÇÕES  PUBLICAS 

RECAPITULAÇÂO 

Academia  real  das  sciencias. —  Rua  do  Arco. 

Academia  das  bellas  artes.  —  Extincto  convento 
de  S.  Francisco. 

Administração  geral  dos  correios.  —  Calçada  do 
Combro. 

Administração  económica  das  cadeias  civis  de 
Lisboa.  —  Limoeiro. 

Administração  geral  da  casa  da  moeda  e  papel 
sellado.  —  Rua  da  Moeda. 

Administração  da  real  casa  de  Bragança.  — Ne- 
cessidades, ou  na  rua  do  Duque  de  Bragança. 

Administração  geral  da  imprensa  nacional.  — 
Travessa  do  Pombal. 

Alfandega  grande  de  Lisboa.  —  Terreiro  do  Paço. 

Alfandega  municipal.  —  Largo  do  Terreiro. 

Archivo  da  torre  do  Tombo.  —  Calçada  da  Es- 
trella. 

Archivo  militar.  —  Calçada  nova  de  S.  Fran- 
cisco. 

Arsenal  da  marinha.  — Largo  do  Pelourinho. 

Arsenal  do  exercito.  —  Largo  da  Fundição. 

Bibliothcca  nacional.  —  Ex-primeiro  convento  de 
S.  Francisco, 

Banco  de  Portugal.  —  Rua  dos  Capellistas. 

Camará  municipal.  —  No  Ver-o-pezo. 


124  NOVO   GUIA 

Commissão  permanente  das  pautas.  —  Na  Alfan- 
dega de  Lisboa. 

Commissão  administrativa  da  casa  pia.  —  Ex- 
iincto  convento  dos  Jeronymos. 

Conselho  de  estado  —  Necessidades,  (as  secções 
no  Terreiro  do  Paço). 

Conselho  de  suade  naval  e  do  Ultramar.  —  Hos- 
pital da  marinha. 

Conselho  de  saade  publica.  —  No  ministério  do 
reino. 

Conselho  de  administração  da  marinha.  —  Ter- 
reiro do  Paço. 

Conservatório  real. — Rua  dos  Caetanos. 

Escola  polytechnica. —  Rua  Direita  da  Escola  Po- 
lytechnica. 

Escola  do  exercito.  —  Remposta. 

Escola  naval.  —  Rua  do  Arsenal. 

Escola  de  commercio.  —  No  Instituto  Industrial. 

Escola  medico-cirurgica. —  Hospital  de  S.  José. 

Estação  de  saúde.  —  Relem. 

Estado  maior  general.  —  Terreiro  do  Paço. 

Governo  civil.  —  Travessa  da  Parreirinha. 

Governo  diocesano  do  Patriarchado.  —  S.  Vi- 
cente. 

Hospital  nacional  e  real  de  S.  José.  —  Calçada 
do  collegio  de  Santo  Antão. 

Hospital  da  marinha.  —  Campo  de  Santa  Clara. 

Hospital  militar.  —  Estrellinha. 

Hospital  de  alienados.  —  Rilhafolles. 


DO   VIAJANTE  123 

Hospital  de  lázaros.  —  Rua  de  S.  Lazaro. 

Inspecção  geral  dos  theatros. — Rua  dos  Caeta- 
nos. 

Intendência  das  obras  publicas.  —  Terreiro  do 
Paço. 

Juizes  de  direito  e  orfanológico.  —  Extincto  con- 
vento da  Boa  Hora. 

Junta  do  credito  publico.  —  Terreiro  do  Paço. 

Junta  geral  do  districto. — Rua  da  Parreirinha, 

Junta  do  deposito  publico.  —  Calçada  nova  de 
S.  Francisco. 

Lyceu  nacional. — Rua  de  S.  José. 

Major  ia  general.  — Arsenal  da  Marinha. 

Policia  correccional.  —  Extincto  convento  da  Boa 
Hora. 

Policia  do  Porto.  —  Na  alfandega. 

Praça  dos  leilões.  —  Calçada  nova  de  S.  Fran- 
cisco. 

Procuradoria  geral  da  fazenda.  —  Terreiro  do 
Paço. 

Quartel  general  da  i*  divisão  militar.  —  Rua 
de  S.  José. 

Santa  casa  da  misericórdia.  —  Largo  de  S.  Ro- 
que. 


126  NOVO   GUIA 

DEFESA  DE  LISBOA 
Castello  Alie  H,  «ffoirge 

Cidadella  de  Lisboa,  em  um  alto  que  domina 
parte  da  cidade,  e  onde  se  encontra  a  celebre 
porta  de  Mem  Moniz,  na  qual,  segundo  a  tradição, 
se  atravessou  um  valente  guerreiro  d'aquelle  nome, 
para  facilitar  ás  hostes  de  Áffonso  Henriques  a  en- 
trada da  cidade.  A  parte  militar  do  castello,  com 
presidio,  quartel  de  tropa,  e  baterias,  está  conser- 
vada com  o  maior  aceio  e  bom  gosto ;  o  antigo 
bairro  que  ainda  se  conserva  de  pé,  quasi  todo  an- 
terior ao  terremoto,  e  que  fica  fechado  pelas  mu- 
ralhas e  porta  do  castello,  é  de  mesquinha  appa- 
rencia,  mas  digno  de  ser  contemplado  pelo  anti- 
quário. 

Tora^e  «Se  S.  Vicente  de  JSeleni 

Uma  légua  distante  do  Terreiro  do  Paço  para  o 
occidente;  a  sua  construcçao  foi  projectada  por 
D.  João  it  e  seu  plano  incumbido  a  Garcia  de  Rezen- 
de, pagem  da  escrevaninha,  porém  coube  a  D.  Manuel 
a  gloria  de  a  concluir  na  mesma  época  e  gosto  em 
que  edificou  o  convento  de  Belém,  que  não  lhe  fica 
distante.  Foi  construída  no  meio  das  ondas,  mas 
hoje  está  na  ponta  de  uma  lingua  de  areia,  que  as 
aguas  para  alli  tem  empurrado.  É  digno  de  visitar- 


DO    VIAJANTE  127 

se  este  precioso  munumento  pela  belleza  da  sua  ar- 
chitectura,  os  relevos  e  bastiães,  as  guaritas  de  pe- 
dra com  differentes  lavores  nos  ângulos,  as  cruzes 
de  Christo  que  por  toda  a  parte  se  mostram  em  re- 
levo recordando  o  monarcha  venturoso,  que  foi 
grande  mestre  d'essa  milícia  antes  de  ser  rei,  os 
seus  mil  ornatos  graciosos,  e  as  ondas  beijando- 
lhe  a  base,  e  a  brisa  susurrando  por  entre  as 
ameias,  e  a  linda  vista  do  Tejo,  da  cidade,  das 
montanhas  de  além  e  do  oceano.  Como  ponto  mi- 
litar não  é  de  grande  importância  esta  torre,  po- 
rém soccorre-se  com  a  bateria  addicional  do  Bom 
S?(Ccesso.  Uma  das  curiosidades  mais  dignas  de 
ver-se  na  torre  de  Belém  é  a  Saio  Regia,  cujo  te- 
cto é  elíptico,  e  aonde  dois  visitantes  collocados 
nos  focos,  que  ficam  nos  ângulos  oppostos  da 
casa,  podem  conversar  em  voz  baixa  e  communi- 
car  mutuamente  as  suas  idéas,  sem  que  outra 
pessoa  collocada  no  meio  da  casa,  e  por  conse- 
guinte mais  perto  de  ambos,  possa  ouvir  uma  só 
palavra. 

Torre  Velha.  —  Do  outro  lado  do  Tejo,  fortifica- 
ção arruinada,  aonde  está  estabelecido  o  Lazareto, 
e  que  nada  tem  a  observar  nem  pela  arcliitectura 
nem  pela  importância  militar. 

Torre  de  S.  Julião  ou  S.  Gião  da  Barra.  —  Castello 
situado  na  foz  do  Tejo,  com  uma  povoação  adja- 
cente, e  prisões  medonhas,  que  já  por  largos  annos 
estiveram  cheias  de  martyres  políticos.  Conslitue 


128  NOVO  GUIA. 

a  defeza  de  Lisboa  pelo  iado  do  mar,  cruzando  os 
fogos  com  a  Torre  do  Bugio. 

Torre  de  S.  Lourenço  do  Bugio. — Ilhote  isolado  en- 
tre as  vagas,  como  uma  vedeta  de  Lisboa.  Entre 
estas  duas  torres  estão  os  cachopos  que  formam 
as  duas  barras  de  Lisboa ;  a  do  sul  ou  barra  gran- 
de, e  a  do  norte  ou  corredor.  É  uma  bonita  cons- 
trucção,  que  tem  como  S.  Julião,  um  bom  pharol, 
o  qual  serve  de  marca,  combinado  com  outros 
fora  da  barra,  para  se  poder  de  noite  tentar  a  en- 
trada do  Tejo. 

Fora  da  barra  ha  a  fortaleza  de  Gascaes,  que 
pouco  ou  nada  poderá  valer  para  salvar  Lisboa  de 
uma  invasão  pelo  lado  do  mar. 

Á  margem  do  Tejo  ainda  ha  do  lado  do  sul  o  cas- 
tello  de  Almada,  fronteiro  a  Lisboa,  e  outras  for- 
tificações arruinadas  de  um  e  outro  lado,  que  não 
têem  importância  alguma  militar,  nem  são  objectos 
dignos  de  attrahirem  as  vistas  do  forasteiro. 

As  linhas  destinadas  a  defender  Lisboa  pelo  lado 
da  terra,  oceupam  a  extensão  de  duas  léguas  em 
semi-circulo,  apoiando  as  extremidades  no  Tejo 
sobre  a  Madre  de  Deus  e  Alcântara ;  estão  porém 
em  grande  parte  arruinadas,  e  despidas  da  guar- 
nição e  artilheria.  Mais  longe  defendem  Lisboa  as 
formidáveis  linhas  de  Torres  Vedras,  ante  as  quaes 
recuou  Massena  com  um  poderoso  exercito  de  sol- 
dados de  Napoleão;  estas  linhas  apoiam  a  direita 
no  Tejo  e  a  esquerda  na  praça  de  Peniche  sobre 


DO    VIAJANTE  129 

o  oceano,  cortando  a  passagem  para  a  capital 
n'uma  cordilheira  de  montanhas. 

Para  não  demorar  a  impressão  d'este  Guia  de- 
mos já  um  mappa  da  força  militar  de  Lisboa. 

População 

Lisboa,  considerada  só  da  linha  de  circumvalação 
para  dentro,  como  a  reduziu  um  decreto  do  go- 
verno, não  conta  mais  de  duzentos  mil  habitantes ; 
incluindo  Belém,  e  o  demais  termo  da  cidade  orça 
por  260,000  a  300,000  pessoas.  A  linha  de  cir- 
cumvalação, quando  estiver  concluida,  ha  de  ser 
um  bonito  passeio  para  rivalisar  com  as  Barreiras 
de  Paris. 

Cemitérios 


Prazeres.  —  Chama-se  assim  o  principal  cemité- 
rio de  Lisboa,  por  ter  sido  aproveitado  para  este 
destino  o  campo  de  Nossa  Senhora  dos  Prazeres, 
onde  havia  uma  ermida  em  que  se  venerava  a  Vir- 
gem d'esta  invocação,  tornada  hoje  n'uma  bella  cae 
pella  do  mesmo  cemitério.  Tem  ruas  orladas  de 
eyprestes,  e  preciosos  monumentos  funerários  d- 
riquissimos  mármores  e  de  custoso  trabalho ;  no- 
tável entre  todos  se  torna  o  jazigo  pertencente  á 
família  Palmella,  onde  repousa  o  cadáver  do  pri- 
meiro duque  d'este   titulo,  um  dos  maiores  di- 


130  NOVO  GUIA 

plomaticos  da  Europa.  Alli  sepultam-se  os  finados 
da  metade  occidental  da  cidade. 

Alto  de  S.  João.  —  Cemitério  da  parte  oriental  de 
Lisboa.  Menos  rico  em  monumentos  fúnebres,  mas 
notável  pela  capella  aonde  se  depositam  os  finados 
antes  de  passarem  ao  ultimo  jazigo,  porque  é  ador- 
nada de  primorosos  mármores,  obra  moderna  que 
se  deve  á  municipalidade. 

Ajuda.  —  Terceiro  cemitério  catholico  de  Lisboa, 
onde  se  enterram  as  pessoas  fallecidas  do  concelho 
de  Belém.  Nada  tem  de  notável  em  comparação 
com  os  precedentes. 

S.  Luiz.  —  Cemitério  privativo  dos  francezes,  junto 
á  egreja  do  mesmo  nome. 

Os  Cyprestes. — Nome  vulgar  que  se  dá  ao  cemi- 
tério dos  Inglezes,  junto  ao  passeio  da  Estrella. 
Annexo  a  elle  está  a  egreja  do  culto  protestante. 

Cemitério  dos  Judeus.  —  Ao  Colleginho. 

Cemitério  dos  Allemâes.  —  Rua  do  Patrocínio,  á 
Boa-morte. 

Vai  Escuro.  —  Cemitério  de  irracionaes. 


DO  VIAJANTE  131 

PASSEIOS  E  JARDINS  PÚBLICOS 
Passeio  Publico 

Entre  o  largo  de  Camões  e  a  praça  da  Alegria 
está  situado  o  principal  passeio  de  Lisboa,  que  não 
tem  outra  denominação  particular.  Contém  alguns 
jardins  que  cortam  ruas  sombreadas  por  arvoredo 
e  duas  bellas  estatuas  representando  o  Tejo  e  o 
Douro,  de  cujas  marmóreas  urnas  gotejam  limphas 
sobre  os  lagos.  A  rua  principal  é  interceptada, 
logo  ao  principio,  por  uma  énome  bacia  de  pedra 
que  serve  para  receptáculo  das  aguas. 

No  lado  opposto  á  entrada  principal  ha  um  ou- 
tro lago,  com  uma  cascata,  tendo  aos  lados  duas 
escadas  que  conduzem  a  um  terraço,  que  fica  su- 
perior á  cascata.  Este  passeio  é  frequentado  pela 
melhor  sociedade  da  capital,  que  nos  dias  aprasi- 
veis  da  primavera  e  do  estio  ahi  vae  gosar  o  bal- 
sâmico aroma  das  flores  e  os  melodiosos  sons  de 
uma  musica  marcial.  Nas  noites  de  verão  é  illumi- 
nado  a  gaz ;  dão-se  alli  fogos  de  artificio,  concer- 
tos, e  tem  um  café. 

•Jardim  do  H.  Pedro  de  Alcântara 

Este  passeio  de  muito  menores  dimensões  do  que 
o  antecedente,  avantaja-se-lhe  comtudo  na  belleza 
do  local  e  graça  de  accessorios.  D'alli  se  disfrueta 


132  NOVO   GUIA 

um  dos  mais  variados  panoramas  da  cidade,  termi- 
nando por  uma  nesga  do  Tejo.  Sobranceiro  ao  jar- 
dim, propriamente  dito,  que  tem  uma  bonita  cascata, 
um  pequeno  repucho,  e  alguns  bustos  de  romanos 
notáveis,  ha  um  passeio  bem  assombreado  de  arvo- 
redo, cercado  de  grades  de  ferro  do  lado  da  rua 
e  de  solidas  muralhas  no  declive  da  montanha  em 
que  está  assente.  É  delicioso,  por  uma  noite  de 
luar,  ir  alli  respirar  os  hálitos  da  briza,  perfuma- 
dos das  mil  flores  do  jardim,  e  ver  a  baixa  e  as 
montanhas  circumvisinhas  illuminadas  por  myria- 
des  de  luzes  das  suas  habitações.  O  jardim  debaixo 
está  fechado  depois  do  pôr  do  sol,  porém  a  alla- 
meda  superior  é  publica  toda  a  noite. 

Jardim  de  Si.  Roque 

Foi  construido  no  largo  da  mesma  denominação 
e  tem  no  centro  um  modesto  monumento  que  os 
italianos  residentes  em  Lisboa  fizeram  alli  erigir, 
afim  de  commemorar  o  enlace  da  rainha  D.  Maria 
Pia  com  o  nosso  rei. 

Este  jardim  é  pouco  frequentado,  e  apenas  á 
poética  hora  do  fim  da  tarde  alli  se  encontra  al- 
guma ama  secca  ou  criadinha  sopeira  que  disfar- 
çadamente derriça  o  policia  civil  alli  estacionado, 
emquanto  as  crianças,  confiadas  ao  seu  cuidado, 
rebolando  na  relva,  esmagam  os  narizes  muito  á 
sua  vontade. 


DO  VIAJANTE  133 

jardim  da  Praça  do  Príncipe  Real 

Situado  n'um  dos  pontos  mais  elevados  da  ci- 
dade, gosa  perfeitos  ares,  é  desafrontado,  e  á  noite 
alli  se  respiram  no  estio  gratas  aragens.  Tem  no 
centro  um  espaçoso  lago,  com  um  jogo  de  agua 
de  bello  effeito.  No  verão  de  manhã  e  mesmo  de 
tarde  é  pouco  frequentado,  por  causa  de  ser  muito 
exposto  ao  sol,  todavia  no  inverno,  e  mesmo  no 
verão  pela  noite  n'elle  passeiam  muitas  familias 
moradoras  n'aquella  localidade. 

Jardim  da  Praça  das  Flores 

Na  praça  d'esta  denominação  ha  um  pequeno 
jardim  com  um  acanhado  lago.  Este  vergel  é  fre- 
quentado apenas  pelas  creanças  dos  moradores 
d'aquelle  sitio,  as  quaes  passam  alli  as  suas  horas 
de  folgança. 

Passeio  da  Estrella 

Este  passeio  é  de  certo  o  mais  elegante  da  capi- 
tal :  uma  montanha  erguida  pela  mão  do  homem, 
d'onde  se  devassa  uma  parte  da  cidade  e  do  Tejo  ; 
uma  gruta  cavada  também  pela  mão  do  homem,  nas 
entranhas  da  terra;  um  pavilhão  chinez,  aonde  es- 
taciona aos  domingos  uma  banda  de  musica  militar; 
taboleiros  de  verdura  e  de  flores,  ruas  de  bello 


134  NOVO   GUIA 

arvoredo,  lagos  e  assentos  —  eis  ahi  o  passeio  da 
Estrella,  que  toma  esta  denominação  da  formosa  ba- 
sílica que  lhe  fica  defronte  e  que  ainda  será  ornado 
com  a  estatua  da  fundadora  d'aquelle  magnifico  tem- 
plo, a  rainha  D.  Maria  i,  obra  do  fallecido  João  José 
d' Aguiar,  que  foi  lente  de  esculptura  na  extincta  es- 
cola da  Ajuda. 

Passeio  da  Junqueira 

Situado  á  margem  do  Tejo,  e  muito  mais  extenso 
do  que  o  antecedente,  entre  Alcântara  e  Belém, 
avulta  o  copado  arvoredo  d'este  passeio,  orlado 
de  palácios  e  casas  elegantes ;  termina  no  poente 
pelo  vasto  edifício  da  Cordoaria. 

Jardins  do  Aterro 

No  aterro  da  Boa  Vista  ha  dois  bonitos  jardins, 
com  frondoso  arvoredo,  bellas  flores  e  commodos 
assentos,  os  quaes  são  muito  frequentados  em  as 
noites  de  verão. 


DO  VIAJANTE  135 

THEATROS 
D,  liaria  11.  —  Declamação  portugucza 

Este  theatro  foi  levantado  no  mesmo  local  onde 
existiu  o  palácio  dos  Estaus,  depois  a  inquisição, 
a  regência,  e  ultimamente  o  thesouro  publico,  edi- 
fício que  foi  destruido  pelas  chammas,  em  1836. 
O  theatro  foi  concluído  em  1847,  e  bem  que  infe- 
rior ao  de  S.  Carlos  em  grandeza  e  solidez,  exce- 
de-o  comtudo  em  elegância  e  luxo  de  ornatos.  A 
fachada  principal  que  embelleza  a  praça  de  D.  Pe- 
dro tem  seis  formosas  columnas,  coroadas  por 
uma  empena  onde  se  vê  um  alto  relevo  represen- 
tando Apolo  e  sete  das  Musas,  desenho  de  Fonse- 
ca, executado  por  Aragão,  Cezarino,  Lata,  e  Gag- 
giani ;  as  duas  Musas  que  faltam  n'aquelle  grupo 
— Melpomene  e  Thalia  —  estão  aos  lados  da  esta- 
tua central  que  representa  o  poeta  Gil  Vicente ; 
esta  foi  modelada  por  Assiz,  e  executada  por  Ce- 
sarino  ;  aquellas  são  dos  cinzéis  de  Caggiani  e  La- 
ta, Pedro  de  Alcântara,  e  Eça.  Esta  fachada  princi- 
pal do  edifício  tem  entrada  para  o  camarote  real; 
a  do  largo  de  Gamões  para  as  platéas  e  camaro- 
tes ;  a  do  Pateo  do  Regedor  para  as  varandas  e 
palco:  e  a  do  largo  de  S.  Domingos  também  com- 
munica  com  a  caixa  do  theatro.  O  salão  ao  nível 
da  primeira  ordem  de  camarotes,  tem  varandas 
que  communicam  com  a  segunda  e  terceira  ordens, 


136 


NOVO  GUIA 


e  portas  para  o  terraço  superior  do  vestíbulo  do 
largo  de  Camões.  Tem  frizas,  camarotes  de  pri- 
meira, segunda  e  terceira  ordem,  e  uma  sumptuosa 
tribuna  real. 

S.  Carlos.  —  Opera  italiana 

Urn  dos  melhores  theatros  de  segunda  ordem 
na  Europa,  e  onde  se  encontram  decorações  como 
em  nenhum  outro.  Foi  construído  em  seis  mezes 
pelo  architecto  portuguez  José  da  Gosta  e  Silva, 
sob  a  inspecção  de  Sebastião  António  da  Cruz  So- 
bral, e  a  expensas  de  uma  companhia  de  opulen- 
tos negociantes,  a  cuja  frente  se  achava  o  barão 
de  Quintela  (pae  do  fallecido  conde  do  Farrobo),  An- 
tónio José  da  Cruz  Sobral,  Bandeira,  e  Machado.  A 
primeira  representação  n'este  theatro  teve  logar  no 
dia  29  de  abril  de  1793,  para  festejar  o  nascimento 
da  princeza  da  Beira,  D.  Maria  Thereza,  primeira 
filha  de  D.  João  vi.  —  No  tecto  do  salão  de  entrada 
ha  a  notar  um  bello  quadro,  representando  o  pre- 
cipício de  Faetonte,  obra  do  delicado  pincel  de  Cy- 
ryllo  Wolkmar  Machado;  o  pavimento  é  de  már- 
more branco  e  azulado,  disposto  em  xadrez.  A  sala 
do  espectáculo  é  elíptica;  tem  120  camarotes  dis- 
tribuídos em  cinco  ordens,  e  urna  tribuna  grandiosa 
para  o  Soberano  nos  dias  de  grande  gala.  Este  edi- 
fício é  construído  de  cantaria  á  prova  de  fogo ;  os 
seus  corredores  são  todos  de  abobada,  as  escada- 


DO  VIAJANTE  137 

rias  de  pedra,  e  em  tão  grande  numero,  que  no 
caso  de  sinistro  dariam  prompta  saída  a  todos  os 
expectadores  dos  camarotes.  Está  situado  em  uma 
praça  quadrada  e  bastante  larga  para  o  livre  tran- 
sito de  carruagens  e  pessoas  a  pé. 

Theatro  da  Trindade 

Elegante  edifício  modernamente  construído  na 
rua  da  Trindade.  Tem  um  bom  salão  para  bailes 
de  mascaras,  é  muito  concorrido,  e  sempre  mimo- 
seia  o  publico  com  espectáculos  variados  e  des- 
lumbrantes. 

Destina-se  em  geral  a  comedias,  farras  e  operas 
cómicas. 

Tlieatro  do  Gymna«io 

Este  theatro  é  destinado  á  comedia  e  á  farça  Iy- 
rica.  De  pequena  dimensão,  é  porém  construído 
elegantemente  e  tem  alcançado  até  hoje  o  favor  do 
publico. 

A  companhia  é  limitada,  e  possue  alguns  artis- 
tas de  merecimento. 

Foi  Q'este  theatro  que  debutou  o  actor  Taborda, 
do  tempo  em  que  alli  se  reuniu  um  grupo  de  acto- 
res apreciáveis.  Era  então  muito  frequentado  pelo 
publico  que  gostoso  assistia  ás  representações  de 
chistosas  comedias. 


138  NOVO    GUIA 

Theatro  da  Rua  dos  Condes 

Este  theatro  velho  e  de  triste  apparencia,  é  des- 
tinado aos  espectáculos  que  se  dão  no  Theatro  de 
Variedades,  e  como  elle  é  frequentado  por  igual 
classe  de  espectadores. 

Os  nossos  principaes  actores  aprenderam  n'este 
theatro,  como:  Emilia  das  Neves,  Tasso,  Rosa, 
Theodorico  etc.  Hoje  nâo  conta  nenhum  artista  de 
notável  merecimento. 

Theatro  de  Variedades 

O  antigo  theatro  do  Salitre  acha-se  actualmente 
crismado  com  este  titulo,  todavia  é  sempre  o  mes- 
mo theatro.  frequentado  por  espectadores  de  baixa 
classe,  promptos  a  promover  rixas  e  continuadas 
troças.  Varias  sociedades  teem  administrado  aquella 
empresa,  porém  o  mau  fado  constantemente  as 
persegue. 

O  género  d'este  theatro  é  comedias,  farças  e 


magicas. 


Theatro  do  Príncipe  Real 


Estabelecido  no  fim  da  Rua  Nova  da  Palma.  É 
destinado  a  comedias  e  dramas.  As  companhias 
que  tem  tido  são  pouco  notáveis,  e  em  geral  é 
frequentado  pela  classe  pouco  elevada  da  socie- 
dade. 


DO  VIAJANTE  139 

Casino  Lisbonense 

No  largo  da  Abegoaria  (á  Trindade).  É  uni  es- 
paçoso salão  próprio  para  bailes  mascarados,  bem 
decorado,  e  no  qual  se  teem  dado  representações 
de  zarzuelas  e  concertos  vocaes  e  instrumentaes. 


CIRCOS 
Praça  do  Campo  de  SantMnria 

È  o  único  monumento  do  tempo  do  governo  de 
D.  Miguel.  Ha  ali  corridas  de  touros  no  gosto  pe- 
ninsular, quasi  todos  os  domingos  de  verão.  Co- 
meçou a  servir  em  1832.  O  seu  rendimento  reverte 
a  favor  da  casa  pia. 

Circo  de  Price 

Rua  do  Salitre,  em  frente  do  Theatro  de  Varie- 
dades, 

Uma  companhia  equestre  trabalha  nVste  ele- 
gante circo  todos  os  invernos,  e  é  frequentado 
pela  melhor  sociedade  de  Lisboa ;  os  espectáculos 
são  á  noite.  Também  dá  bailes  mascarados  na  época 
do  Carnaval,  e  algumas  vezes  espectáculos  dramá- 
ticos pela  companhia  do  theatro  da  rua  dos  Condes. 


140  NOVO  GUIA 

PRAÇAS  E  RUAS  MAIS  NOTÁVEIS,  MONUMENTOS, 
PALÁCIOS  E  QUINTAS 

A  cidade  baixa  ou  nova,  edificada  por  ordem  do 
marquez  de  Pombal,  sobre  as  ruinas  deixadas  pelo 
terremoto,  é  um  paralellogramo  regularissimo  de 
ruas  cortadas  em  ângulos  rectos,  e  terminadas  ao 
sal  pela  praça  do  commercio,  e  ao  norte  pelas  pra- 
ças de  D.  Pedro  e  da  Figueira.  As  ruas  transver- 
saes  de  leste  a  oeste,  começando  na  praça  do  Com- 
mercio denominam-se :  Rua  Nova  de  El-Rei  (vulgo 
dos  Capellistas,  por  ser  especialmente  dedicada  ás 
lojas  de  sedas,  bijouterias  e  modas). — Rua  de 
S.  Julião  (vulgo  dos  Algibebes,  porque  quasi  todas 
as  suas  lojas  são  occupadas  por  vendedores  de  fato 
feito).  —  Rua  da  Conceição  (vulgo  dos  Betrozeiros, 
pelo  motivo  que  a  denominação  indica.  —  Travessa 
de  S.  Nicolau  —  Travessa  da  Victoria  —  Travessa 
da  Assumpção  —  Travessa  de  Santa  Justa,  que  ter- 
mina em  um  largo  da  mesma  denominação,  e  fi- 
nalmente a  Rua  da  Bitesga,  e  a  Travessa  do  Am- 
paro, communica  o  Rocio  com  a  Praça  da  Figueira. 
As  ruas  do  sul  a  norte  são,  começando  de  oeste : 
—  Rua  Áurea,  ou  do  Ouro,  Rua  Augusta  ou  dos 
Mercadores,  e  Rua  Bella  da  Rainha  (vulgo  da 
Prata)  que  partem  da  Praça  do  Commercio  (vulgo 
Terreiro  do  Paço)  as  duas  primeiras  a  entestar 
com  a  Praça  de  D.  Pedro  (vulgo  Rocio)  e  a  ultima 
com  a  Praça  da  Figueira  (mercado  publico). 


DO   VIAJANTE  141 

Ainda  mais  a  leste  está  a  Rua  Nova  da  Princeza 
(vulgo  dos  Fanqueiros)  onde  se  vendem  chitas,  algo- 
dões e  linhos),  que  vae  passar  ao  lado  da  praça  da  Fi- 
gueira, e  terminar  no  largo  de  S.  Domingos.  Além 
d'estas  quatro  ruas  principaes,  ha  ainda  outras  qua- 
tro alternadas  com  aquellas,  que  começam  somente 
na  rua  dos  Retrozeiros,  e  vão  terminar  na  linha 
norte  do  paralellogramo.  Entre  a  rua  dos  Fanqueiros 
e  a  da  Prata,  está  lançada  a  rua  dos  Douradores; 
entre  a  da  Prata  e  a  Augusta,  a  dos  Correeiros 
(vulgo  Travessa  da  Palha) ;  entre  a  rua  Augusta 
e  a  do  Ouro,  está  a  Rua  dos  Sapateiros  que  ter- 
mina por  um  arco  comtnunicando  com  o  Rocio, 
cuja  denominação  Arco  do  Bandeira  é  vulgarmente 
dada  a  toda  a  rua.  Além  da  rua  do  Ouro  fica  a  rua 
do  Crucifixo,  que  fecha  o  paralellogramo  por  oeste. 
D'ahi  a  cidade  sobe  por  um  lado  para  o  Chiado  e 
bairro  Alio,  por  outro  para  a  Magdalena  e  Sé,  por 
um  terceiro  para  os  montes  de  SanfAnna  e  da  Co- 
tovia, e  pelo  quarto  desce  para  o  Tejo.  Imagine- 
mos o  desembarque  no  Terreiro  do  Paço,  e  per- 
corramos a  cidade  baixa. 

Praça  do  Commercio  (vulgo  Terreiro 
cio  Paro) 

É  uma  praça  regular  e  grandiosa,  como  não  vi- 
mos ainda  outra  na  Europa,  cercada  de  três  lados 
por  soberbas  arcadas,  que  sustentam  os  edifícios 


142  NOVO   GUIA 

onde  estão  collocadas  as  principaes  repartições  do 
estado,  como  já  indicámos  n'outro  logar,  a  leste  e 
oeste  terminam  estes  grandes  corpos  por  dois  for- 
mosos torreões,  local  da  Bolça  (praça  do  commer- 
cio  propriamente  dita).  Qualquer  d'elles  tem  ópti- 
mas columnas  sustendo  os  pavimentos  superiores. 
Entre  os  dois  lances  que  formam  o  lado  septen- 
trional  da  praça,  na  entrada  da  rua  Augusta,  estão 
feixes  de  primorosas  columnas,  sustentando  uma 
arcaria  de  bem  lavrada  pedra,  sobre  a  qual  se  levan- 
ta a  bella  plata-fórma  da  torre  que  hade  rece- 
ber o  relógio  e  sino  da  cidade.  Do  lado  opposto 
está  o  rio  e  um  amplo  cães,  terminado  por  duas 
columnas  de  mármore  inteiriças. 

Tem  esta  praça  585  pés  de  comprimento  de  nas- 
cente a  poente,  sobre  536  de  largura.  Está  arbo- 
risada  e  bem  illuminada. 

O  mais  bello  ornamento  d'esta  vastíssima  praça 
é  a 

Estatua  equestre  de  D.  José  í 

Monumento  erguido  pelo  povo  de  Lisboa  ao  rei 
sábio,  que  mandou  reedificar  a  cidade  destruída 
pelo  horrivel  terremoto  de  1755.  Bem  no  centro 
da  praça  está  collocado  o  formoso  pedestal  que  sus- 
tenta a  estatua,  cujo  cavallo  e  cavalleiro,  em  bron- 
ze, pezam  80.640  arráteis !  e  tem  de  altura  31  e 
meio  palmos ;  o  pedestal,  de  mármore,  tem  de  al- 
tura 32  palmos,  de  comprimento  27,  e  de  largura 


DO    VIAJANTE  143 

18.  É  em  tudo  superior  á  famigerada  estatua  eques- 
tre de  lord  Wellington.  O  desenho  e  esculptura  da 
nossa  memoria  (como  lhe  chama  vulgarmente  o 
povo)  é  do  celebre  Joaquim  Machado  de  Castro,  e 
a  fundição  da  estatua  foi  feita  no  arsenal  do  exer- 
cito, sob  a  inspecção  do  tenente  general  Bartholo- 
meu  da  Costa;  foi  inaugurada  em  1775,  vinte  an- 
nos  depois  do  terremoto,  e  ainda  em  vida  do  rei 
a  quem  era  dedicada.  Por  seis  degraus  de  pedra 
se  sobe  á  plata-fórma  que  sustenta  o  pedestal,  en- 
tre dois  grupos  alegóricos  ao  nascente  e  ao  poente, 
representam  estes,  de  um  lado  um  mancebo,  tendo 
em  uma  das  mãos  a  palma  do  triumpho,  e  com  a 
outra  dirigindo  o  cavallo  que  piza  aos  pés  os  inimigos, 
tudo  cercado  de  tropheos  de  guerra ;  do  outro  lado 
a  fama  embocando  a  tuba,  cercado  também  de  tro- 
pheos, e  com  um  elefante  ao  pé,  e  um  homem 
prostrado,  alusão  esta  que  ainda  ninguém  soube 
explicar  rasoavelmente. 

As  faces  do  pedestal  adjacentes  aos  grupos  são 
lizas ;  a  que  olha  para  o  interior  da  cidade  tem  um 
baixo  relevo,  cuja  alegoria  o  auctor  explica  assim : — 
E  o  objecto  principal  a  generosidade  regia,  virtude 
personalisada  na  figura  de  uma  donzela  com  as  ves- 
tes e  insignias  reaes  na  attitude  de  descer  do  sólio, 
como  para  acudir  e  remediar  a  lamentável  catastro- 
phe  da  capital  destruida  pelo  terremoto;  ao  lado  tem 
um  leão,  symbolo  da  mesma  virtude.  Outra  figura  fe- 
minina, a  cidade  de  Lisboa,  é  facilmente  conhecida 


144  NOVO   GUIA 

pelo  escudo  de  suas  armas,  isto  é,  o  navio  com 
dois  corvos  á  popa  e  á  proa ;  vê-se  caída  e  em  de- 
liquo,  para  significar  o  desastre  que  soffrera :  o 
governo  da  republica,  trajando  como  os  guerreiros 
antigos,  a  está  amparando  com  a  dextra ;  a  este 
trava  do  braço  esquerdo  o  Amor  da  Virtude,  ver 
presentado  n'um  menino  alígero  cercado  de  gri- 
naldas de  louro,  que  o  guia  perante  o  throno  para 
expor  os  intentos  e  sollicitar  os  meios  de  progre- 
dir na  reparação  da  cidade,  ao  que  a  generosidade 
regia  benignamente  defere.  O  commercio  abrindo  os 
seus  cofres  franqueia  as  suas  riquezas.  Posteriores 
a  esta  figura,  que  tem  aos  lados  a  cegonha  e  duas 
mós,  que  sâo  seus  symbolos,  vemos  mais  duas  fi- 
guras, representando  a  architectura,  que  mostra 
a  planta  da  cidade  e  a  Providencia  humana,  que 
se  distingue  pela  coroa  de  espigas  de  trigo  e  pelo 
leme,  e  umas  chaves  na  mâo  esquerda :  vem  am- 
bas concorrer  com  sua  perícia  e  direcção  a  levan- 
tar Lisboa  do  meio  das  ruínas  em  que  jazia  sepul- 
tada. 

A  outra  face  do  pedestal,  que  olha  para  o 
Tejo,  e  que  é  convexa  como  a  que  lhe  fica  opposta 
e  acabamos  de  descrever,  tem  esculpidas  as  armas 
reaes,  e  abaixo  d'ellas  uma  moldura  oval,  onde  o 
grande  ministro  restaurador  da  cidade  mandou  col- 
locar  a  sua  effigie  em  bronze,  a  qual  foi  arrancada 
em  1777  para  lhe  substituírem  outra  lamina  com 
as  armas  do  senado  da  camará  de  Lisboa.  D.  Pe- 


DO   VIAJANTE  14o 

dro  iv,  mandou  restituir  ao  seu  logar  o  retrato  do 
marquez  de  Pombal,  o  que  se  effectuou  a  12  de 
outubro  de  1833. 

Praça  de  D.  Pedro  (Rocio) 

Também  formosa  e  regular,  e  da  forma  de  um 
paralellogramo;  tem  o  centro  empedrado  de  preto  e 
branco,  o  que  faz  muito  bom  eíT^ito,  apezar  das 
censuras  dos  críticos ;  o  seu  comprimento  e  largura 
lá  está  escripto  também  em  pedra,  por  braças  e 
por  metros.  No  meio  da  praça  está  o  monumento 
de  D.  Pedro  iv  erecto  em  1870  o  qual  consiste 
num  amplo  e  elegante  pedestal  com  uma  impo- 
nente columna  de  fino  mármore  que  termina  com 
a  estatua  do  imperador  fundida  em  bronze. 

Na  base  d'este  monumento  estão  quatro  collos- 
saes  estatuas  alegóricas,  representando  a  prudên- 
cia, a  justiça,  fortaleza  e  a  temperança.  A  segunda 
parte  é  decorada  com  dezeseis  escudos  «las  princi- 
paes  cidades  de  Portugal.  O  pedestal  quetÈ  quadra- 
do contem  quatro  inscripções  com  letra  de  bronze. 
O  terço  inferior  (lesta  columna,  circumdado  por 
uma  coroa  de  louro  está  decorado  com  grinaldas 
e  coroas,  e  quatro  figuras  da  fama  em  baixo  rele- 
vo, ligadas  com  festões  pendentes  das  mãos.  As 
quatro  parles  do  capitel  teem  os  brazões  das  ar- 
mas de  Portugal.  Em  cima  se  eleva  um  pequeno 

pedestal  terminando  por  um  hemispherio  sobre  o 
10 


146  NOVO   GUIA 

qual  assenta  a  estatua  do  imperador  coroado  de 
louro,  com  o  uniforme  de  general  e  manto,  tendo 
na  mâo  direita  a  carta  constitucional,  e  apoiando  a 
esquerda  na  espada. 

Os  lados  do  nascente  e  poente  da  praça  tem 
bella  casaria  simétrica  ;  ao  sul  está  o  arco  do  Ban- 
deira, também  ladeado  de  moradas,  e  ao  norte 
O  rico  theatro  de  D.  Maria  n,  de  que  já  tratámos 
em  logar  competente.  A  leste  d'este  edifício  fica  o 
largo  e  egreja  de  S.  Domingos,  e  a  oeste  o  largo 
de  Camões,  com  lindos  prédios,  que  seguem  pela 
rua  de  Camões  ao  passeio  publico.  Sobranceiro  ao 
Rocio  vê-se,  em  uma  eminência,  o  convento  do 
Carmo  e  as  formosas  ruinas  da  egreja  que  lhe  era 
annexa. 

Esta  praça  perfeitamente  arborisada  e  illuminada, 
contém  grande  numero  de  commodos  bancos  de 
madeira. 

Praça  de  Luiz  de  Camões 

Esta  moderna  praça  está  situada  no  fim  da  rua 
do  Chiado,  sendo  fechada  por  uma  gradaria  de 
bom  gosto.  No  centro  foi  inaugurado  em  1867  um 
monumento  ao  grande  poeta,  executado  pelo  escui- 
ptor  Victor  Bastos.  Consta  de  uma  estatua  ingente 
de  Luiz  de  Camões,  avultando  no  seu  pedestal,  es- 
culpidos em  mármore,  as  estatuas  dos  mais  notá- 
veis poetas  e  prosadores  já  fallecidos,  que  sâo : 


DO   VIAJANTE  147 

Fernão  Lopes,  Pedro  Nunes,  Gomes  Eannes  de 
Azurara,  João  de  Barros,  Fernão  Lopes  de  Canta- 
nheda,  Vasco  Mousinho  de  Quevedo,  Jeronymo 
Corte  Real  e  Francisco  de  Sá  de  Menezes. 

Esta  praça  é  uma  das  mais  elegantes,  pois  é  guar- 
necida de  bellos  edifícios,  e  está  bem  illuminada, 
arborisada,  e  com  grande  numero  de  bancos  para 
commodidade  do  publico. 

Praça  da  Alegria 

Na  parte  superior  do  Passeio  Publico,  não  é  tão 
regular  como  as  já  nomeadas,  mas  tem  bellas  ha- 
bitações de  particulares,  é  arborisada  e  tem  assen- 
tos. 

Praça  do  Príncipe  Real 

Acima  da  antecedente,  e  em  logar  bem  arejado. 
Ahi  esteve  a  antiga  basilica  de  Lisboa,  incendiada 
e  reduzida  a  cinzas  no  século  passado.  Depois  co- 
meçou-se  a  erguer  no  mesmo  logar  o  Erário  /toro, 
que  nunca  passou  dos  sólidos  alicerces ;  ultimamente 
destinaram-n'a  para  a  construcção  de  um  mercado 
publico,  mas  o  que  subsiste  por  agora  é  um  beilo 
e  espaçoso  lago,  pertencente  á  companhia  das 
aguas  que  alli  tem  um  abundante  deposito.  Esta 
praça  é  bellamente  arborisada  e  guarnecida  de  ban- 
cos de  madeira. 


148  NOVO   GUIA 

Largo  do  Pelourinho 

Menor  que  o  Rocio,  e  quadrado.  Tem  de  um 
lado  o  vasto  edifício  do  Arsenal  da  Marinha,  e  da 
Camará  Municipal  ainda  em  construcção ;  no  centro 
tem  uma  singular  columna  de  mármore  de  uma 
só  pedra,  em  forma  de  rosca  e  oca,  coroada  por 
uma  esphcra  armilar  de  metal.  Era  ahi  que  se 
executavam  as  sentenças  de  morte  proferidas  con- 
tra os  nobres,  porém  ha  alguns  annos  que  lhe  ti- 
raram os  ferros  que  indicavam  essa  ominosa  ser- 
ventia. 

Praça  da  Figueira 

(Vide  Mercados.) 

Praça  dos  Romnlares 

(Vulgo  Cães  do  Sodré.J  Empedrada  similhante- 
mente  ao  Rocio,  e  arborisada ;  é  muito  frequentada 
pelos  negociantes  e  homens  do  mar,  em  consequên- 
cia da  sua  posição  á  margem  do  Tejo,  e  porque 
ha  ahi  mais  de  um  escriptorio  de  agencia  commer- 
cial  e  maritima.  Tem  dois  bons  cafés,  hotéis,  bilha- 
res,  etc. 

Largo  de  S.  Paulo 

Também  empedrado  em  mosaica  e  com  um  obe- 
lisco no  meio  (vide  Fontes  e  chafarizes).  É  muito 


DO   VIAJANTE  149 

regular,  porém  menor  que  o  Rocio.  Em  um  dos 
lados  tem  a  egreja  paroctiial  de  S.  Paulo ;  nos  ou- 
tros três,  boa  casaria.  É  arborisado. 

Largo  do  Rato 

Em  continuação  do  caminho  para  o  norte.  É  es- 
paçoso :  tem  um  chafariz  ordinário,  e  o  grande  pa- 
lácio dos  marquezes  de  Vianna,  onde  se  encontram 
algumas  salas  das  mais  bem  mobiladas  de  Lisboa. 

Largo  das  Amoreiras 

Largo  adiante  do  Rato.  É  sitio  muito  ameno, 
plantado  de  arvores  do  seu  nome,  e  ornado  com 
assentos  de  pedra.  Ahi  se  sente  o  murmúrio  das 
aguas  livres  que  se  precipitam  pela  mãe  oVagna. 

É  costume  antigo  fazer-se  n'este  largo  uma  feira 
annual. 

Campo  de  SaiifAnna 

Largo  bem  arborisado,  com  boa  casaria,  e  a 
praça  de  toiros,  de  quê  falíamos  no  artigo  Circos. 
Fizeram-lhe  ultimamente  consideráveis  melhora- 
mentos. Ahi  tem  logar  todas  as  terças-feiras  a 
venda  de  trastes  usados,  livros  truncados,  ferra- 
gens, etc.  É  conhecida  esta  reunião  semanal  pelo 
nome  de  feira  da  ladra. 


150  NOVO  GUIA 

Laiso  do  Carmo 

No  centro  da  cidade,  muito  alegre  e  arborisado ; 
com  um  bonito  chafariz,  as  ruínas  da  egreja,  e  um 
palácio  em  que  está  o  Club  Lisbonense.  A  associa- 
ção dos  architectos  está  nas  ruínas  da  egreja. 

Praça  da  Ribeira  Nova 

(Vide  Mercados.) 

Largo  das  Necessidades 

Defronte  do  palácio  real ;  tem  um  chafariz  com 
uma  bella  agulha  de  mármore  que  dizem  ser  de 
muito  valor. 

Largo  do  Barão  de  Quintella 

Só  notável  pelo  palácio  que  foi  do  conde  do  Far- 
robo,  que  é  na  realidade  elegante,  e  que  entesta 
com  a  egreja  da  Encarnação.  Entre  esta  e  o  Loreto 
fica  o  Largo  das  duas  Egrejas,  e  um  bom  palacete, 
que  lhe  fica  ao  sopé,  onde  esteve  algum  tempo  a 
assembléa  da  Península,  hoje  extincta. 

A  Praça  das  Flores,  o  Largo  da  Graça*  o  do 
Corpo  Santo,  o  de  S.  Roque,  e  outros  muitos  de 
Lisboa,  mais  ou  menos  regulares,  nada  tem  que 
prenda  a  attenção  do  viajante.  No  largo  do  Calha- 


DO  VIAJANTE  151 

riz  ha  a  notar  o  palácio  e  jardim  dos  duques  de 
Palmella. 

Entre  os  palácios  particulares  de  Lisboa  e  seus 
subúrbios,  merece  a  preferencia,  quanto  a  nós,  o 
dos  condes  da  Ribeira,  á  Junqueira,  e  depois  o  dos 
condes  da  Povoa,  hoje  casa  de  Palmella,  ao  Rato. 
Ahi  perto  também  o  que  pertenceu  aos  condes  de 
Cêa.  São  notáveis  os  dois  do  marquez  de  Pombal, 
ás  Janellas  Verdes  (actual  residência  de  sua  ma- 
gestade  imperial  a  duqueza  de  Bragança),  e  na  rua 
Formosa;  o  do  Bandeira  (conde  de  Porto  Covo),  á 
Lapa,  acompanhado  do  bello  jardim,  cuja  entrada 
é  franca ;  o  do  marquez  de  Castello  Melhor ;  o  do 
marquez  de  Borba,  a  Santa  Mart/ui,  onde  também 
já  residiu  a  imperatriz  do  Brazil,  viuva ;  o  do  mar- 
quez de  Abrantes,  a  Santos,  que  já  foi  egualmente 
habitado  por  aquella  excellente  princeza ;  e  o  de 
Xabregas,  dos  marquezes  de  Niza,  fundado  pela 
rainha  D.  Luiza,  mulher  de  D.  João  n. 

Entre  as  casas  de  mais  magestosa  apparencia 
em  Lisboa,  sobresae  a  do  Èraganza  Hotel,  na  rua 
do  Ferregial  de  Cima.  que  se  enxerga  desde  longe 
no  Tejo ;  algumas  casas  modernas  na  rua  da  Trin- 
dade, onde  existiu  antigamente  o  convento,  e  por 
outros  sitios  da  cidade,  isoladas,  atraem  também  a 
attençâo  do  forasteiro,  sobre  tudo  no  sitio  da  Jun- 
queira, em  que  ha  lindas  habitações,  distinguin- 
do-se  entre  ellas  o  palacete,  jardim  e  torreões  do 
visconde  da  Junqueira.  A  nova  rua  do  Duque  de 


152  NOVO    GUIA 

Bragança,  aberta  por  entre  as  ruínas  do  thesouro 
velho,  e  dos  paços  dos  duques  de  Bragança,  esta 
nova  rua  orlada  por  modernas  arvores,  tern  do  ou- 
tro lado  uma  suecessão  de  casas  regulares  e  da 
mais  bella  apparencia  similbantes  ao  hotel  de  Bra- 
gança. Esta  rua  termina  no  picadeiro  de  S.  Carlos, 
onde  está  a  porta  para  o  tablado  do  theatro. 

Além  d'esta  rua,  e  das  três  principaes  da  baixa 
—  Augusta,  Áurea,  e  da  Prata,  que  já  menciona- 
mos, são  muitas  as  ruas  de  Lisboa,  as  que  se 
distinguem  por  sua  regularidade  ou  suecessão  de 
edifícios  elegantes.  O  Chiado,  é  dos  logares  mais 
frequentados  pelo  bom  tom  da  capital ;  ha  ahi  boas 
casas,  mas  nada  de  especial  a  mencionar;  e  ou  se 
suba  pela  rua  larga  de  S.  Roque  para  os  aprazíveis 
sitios  de  S.  Pedro  de  Alcântara,  Collegio  dos  No- 
bres, e  Rato,  ou  se  prosiga  para  o  occidente  pelo 
Calhariz,  Paulistas  e  Poço  Novo,  encontra-se  aqui 
e  alli  um  palácio,  uma  casa  nobre,  um  jardim,  tem- 
plos ou  de  pé  ou  em  ruinas,  ou  funecionando  ou 
profanados,  porém  tudo  entermeado  com  casas  de 
modesta  apparencia. 

É  digno  de  nota  o  lindo  palácio  do  visconde  da 
Gandarinha,  situado  na  rua  do  Sacramento,  á  Lapa. 
Elegante,  commodo,  com  um  bello  jardim  na  frente, 
no  gosto  inglez,  é  uma  vivenda  modello  que  tal- 
vez não  tenha  segunda  em  Lisboa. 


DO   VIAJANTE  153 

Lapa  —  BuenoM-Ayres 

São  sitios  muito  da  paixão  dos  estrangeiros, 
principalmente  dos  inglezes  :  o  ar  é  alii  mais  sau- 
dável do  que  na  baixa,  ha  mais  quintaes,  e  pouco 
susurro  de  povo  e  rodar  de  carruagens. 

Os  montes  ao  oriente  são  pouco  povoados,  e  mes- 
mo a  Graça  é  um  bairro  pouco  frequentado  pela  gen- 
te dos  outros  sitios  da  cidade.  Se  sois  admirador  de 
antigualhas,  amigo  viajante,  embrenhae-vos  pelos 
beccos  de  Alfama;  é  um  labyrintho  inestrincavel 
de  vielas  escuras,  mas  dar-vos-ha  uma  idéa  da  ci- 
dade antiga,  porque  essa  parte  não  caiu  com  o 
terremoto.  Lá  achareis  a  portada  de  umacapella 
de  outros  séculos,  o  troço  de  fuste  antigo,  um  pe- 
daço de  cornija  encrustado  no  frontão  de  uma  bo- 
dega, e  a  escada  exterior,  e  a  gelozia  patriarchal, 
e  a  estreita  adufa,  finalmente  uma  cidade  á  parte; 
porém,  se  não  tendes  queda  para  antiquário,  então 
confentae-vos  em  mirar  do  largo  do  Terreiro  a  en- 
trada d'esse  labyrintho,  porque  a  lama  «lura  ahi 
todo  o  anno,  e  o  sol  apenas  por  momentos  penetra 
nas  miseráveis  habitações  da  pobre  gente  que  lá 
vive.  Voltae  depressa  ao  bairro  aristocrático,  ten- 
des a  rua  d<>  Alecrim,  com  daas  lançadas  sobre  as 
ruas  do  Arco  Grande  e  do  Arco  Pequeno ;  a  rua 
do  Arsenais  que  passando  pelo  largo  d»  Corpo 
Santo  une  o  arsenal  ao  cães  do  Sodré,  as  ruas  das 
Flores,  da  Emenda,  de  S.  Francisco,  que  mostram 


154  NOVO   GUIA 

edifícios  modernos ;  e  para  oeste,  pela  beira-mar,  a 
Boa-Vista,  que  é  como  uma  grande  artéria  da  ci- 
dade, e  a  rua  de  S.  Bento,  que  tem  uma  milha  de 
extensão. 

Das  quintas,  palácios  e  monumentos  que  ficam 
extra-muros  da  cidade,  trataremos  quando  dirigir- 
mos o  viajante  para  Cintra,  (Mares,  Mafra,  etc,  ctc. 

Agora  conduziremos  o  curioso  viajante  a  fa- 
zer em  nossa  companhia  alguns  passeios,  dando- 
nos  o  gosto  de  sermos  o  seu  cicerone,  e  antes 
d'isso,  será  conveniente  que  elle  faça  uma  idéa  da 
perspectiva  da  cidade. 


ENTRADA  EM  LISBOA 

É  de  um  apreciador  estrangeiro  a  rápida  des- 
cripçâo  que  em  seguida  aqui  damos,  e  por  isso 
pode-se  julgar  imparcial.  A  impressão  agradável 
que  elle  diz  ter  sentido,  já  nós  a  tivemos  quando 
pela  primeira  vez  entrámos  a  magnifica  barra  de 
Lisboa,  presenciando  o  magico  e  bello  espectáculo 
que  se  apresentava  a  nossos  olhos. 

Era  ao  declinar  de  uma  bella  tarde  de  maio, 
uma  pequena  trovoada  havia  produzido  alguma 
chuva  que  refrescando  a  atmosphera  caía  branda- 
mente como  fios  de  prata  que  se  destacavam  atraz 
das  escuras  nuvens  que  bordavam  o  horisonte. 


DO  VIAJANTE  155 

A  belleza  e  a  poesia  d'este  final  da  tarde,  as 
saudades  da  pátria  e  o  nosso  génio  observador, 
tornaram  este  quadro  para  nós  de  tal  encanto  e 
magia,  que  difficil  será  esquecel-o. 


Nada  ha  mais  grato,  nada  ha  mais  pittoresco  e 
delicioso  aos  olhos  do  que  pela  primeira  vez  con- 
templa tal  espectáculo,  que  o  magnifico  panorama 
que  representa  a  cidade  de  Lisboa,  magestosamente 
recostada  próximo  das  ondas  que  a  sorriem  mei- 
gamente, em  qualquer  ponto  de  onde  se  chegue  ao 
seu  excellente  porto,  que  affirmam  ser  um  dos  me- 
lhores do  mundo.  O  viajante  apreciador  não  pôde 
deixar  de  ficar  agradavelmente  surprehendido  ao 
estender  as  vistas  sobre  as  bellezas  que  se  offere- 
cem  ao  seu  olhar  observador ;  nem  pôde  extremar 
nenhuma  com  especialidade,  pois  que  são  tantas 
que  apenas  a  imaginação  as  pôde  conceber. 

Se  ao  aproximar-se  da  cidade  se  entra  pela  barra 
que  forma  o  caudeloso  Tejo,  o  deslumbrante  mar, 
a  rica  e  variada  paizagem  que  o  panorama  da  barra 
apresenta,  faz  recordar  as  formosas  bailias  de  Ná- 
poles e  Constantinopla.  Deixando  a  barra  e  pas- 
sando á  margem  do  Sul  o  pontal  de  Cacilhas,  do- 
minado pelo  Castello  de  Almada,  á  esquerda  as 
longiquas  serras  de  Cintra  com  as  altas  torres  do 
seu  magestoso  palácio  real,  se  antevem  por  entre 


156  NOVO   GUIA 

as  torres  do  Bugio  e  de  S.  João  da  Barra,  apre- 
sentando-se  á  vista  um  novo  e  magnifico  espectáculo 
que  consta  de  grande  numero  de  pequenas  e  pit- 
torescas  povoações  que  esmaltam  graciosamente  as 
campinas  desde  a  Cruz  dos  Arrependidos,  situada 
ao  lado  de  S.  Julião,  até  á  mourisca  torre  de  S. 
Vicente  em  Belém,  um  dos  mais  bellos  monumen- 
tos que  de  seu  género  se  conserva. 

Infinidade  de  quintas  de  recreio,  cujos  frondosos 
arvoredos,  bellos  jardins  e  elegantes  edifícios,  pa- 
tenteiam a  nobresa  e  o  gosto  dos  seus  possuido- 
res, destacando  entre  elles  o  palácio  da  Ajuda  que, 
posto  ainda  não  esteja  concluído,  revela  a  grandeza 
e  o  animo  de  seu  edificador. 

São  também  notáveis  por  sua  belleza  os  sitios 
de  Caxias,  S.  José  de  Ribamar,  Boa  Viagem,  Pft 
droiços,  Oeiras,  Paço  de  Arcos,  e  finalmente  a  po- 
voação inteira  de  Lisboa,  formando  montanhas  de 
casas,  cujos  limites  se  perdem  no  horisonte. 

Á  medida  que  o  viajante  se  adianta,  tendo  já 
passado  a  barra  e  a  torre  de  Belém,  vae  desco- 
brindo a  parte  baixa  da  cidade,  o  magnifico  Ter- 
reiro do  Paço  (Praça  do  Commercio)  uma  das  mais 
espaçosas  e  regulares  da  Europa,  com  o  seu  gran- 
dioso monumento  que  parece  querer  aproximar-se 
do  Tejo  para  saudar  o  viajante  curioso,  servindo- 
lhe  de  pomposo  cortejo  o  resto  dos  edifícios  que 
se  estendem  pela  margem  do  rio  até  Alcântara. 

Além  da  citada  torre  de  Belém  e  do  zimbório 


DO   VIAJANTE  157 

da  egreja  da  Estrella  (convento  do  Coração  de  Je- 
sus) outros  dois  objectos  notáveis  captivam  ainda 
a  attenção  do  viajante  ao  sulcar  as  aguas  de  Be- 
lém ;  é  o  convento  dos  Jeronymos  (Santa  Maria  de 
Belém)  monumento  gothico  do  melhor  gosto  pos- 
sível, e  o  aqueduto  das  aguas  livres,  obra  atrevida 
e  collossal,  e  tão  aprecida  no  seu  género  como  a 
que  os  romanos  legaram  á  posteridade. 

A  aridez  das  praias  e  das  montanhas  do  lado  do 
sul  (Outra  Banda)  apenas  interrompida  por  peque- 
nas casas  e  povoações  de  pouca  importância,  con- 
trasta notavelmente  com  as  bellezas  que  fitam  di- 
tas, contribuindo  a  dar  mais  realce  ao  quadro  que 
descrevemos. 

Se  em  vez  de  entrar  pela  barra  o  viajante  corta 
diagonalmente  o  rio,  embarcando  em  Aldeia  GaL 
lega  ou  em  Valle  do  Zebro,  depois  de  haver  atra- 
vessado os  areaes  do  Além- Tejo,  não  deixa  de  ser  por 
isso  menos  encantador  o  aspecto  que  apresenta  a 
elegante  cidade,  cuja  magnificência  se  ostenta  de 
uma  vez  e  em  toda  a  sua  extensão,  por  esta  parte, 
sem  que  jamais  os  olhos  se  saciem  de  admirar  tanta 
e  tanta  belleza  aglomerada  no  recinto  d'aquella  gi- 
gantesca matrona,  assentada  magestosamente  á 
borda  do  caudaloso  rio  que  brandamente  lhe  beija 
os  pés,  dormindo  ao  murmúrio  de  suas  correntes 
cryslalinas,  e  por  ultimo,  se  ávido  de  emmoções 
o  estrangeiro  quizer  embarcar  na  Azambuja  ou 
em  Villa  Nova  da  Rainha,  situada  ao  norte,  d<  - 


158  NOVO   GUIA 

cendo  pelo  Tejo  n'um  pequeno  barco,  ainda  po- 
derá experimentar  uma  agradável  surpreza,  por- 
que a  capital,  similhante  a  um  avaro  em  vez  de 
mostrar  as  suas  riquezas  de  uma  só  vez.  as  vae 
apresentando  uma  a  uma,  dando-lhe  o  necessário 
tempo  para  se  admirar  detalhadamente  as  suas  per- 
feições. 

Uma  vez  chegado  a  Lisboa  por  qualquer  dos 
pontos  mencionados,  e  depois  de  ter  desembarca- 
do no  Terreiro  do  Paço,  a  admiração  do  viajante 
sobe  de  ponto  ao  ver  na  magnifica  praça  o  sum- 
ptuoso monumento  que  a  decora,  isto  é,  a  estatua 
equestre  do  rei  D.  José  i,  os  edifícios  que  a  cir- 
cundam, e  o  magestoso  arco  da  rua  Augusta,  digna 
do  nome  que  tem  pela  sua  extensão,  formosura  e 
regularidade. 

Passeios  dentro  da  eidade 

Para  commodidade  do  viajante,  que  não  possa 
demorar-se  muitos  dias  em  Lisboa  vamos  apresen- 
tar-lhe  aqui  o  itenerario  de  quatro  passeios  que  co- 
meçam e  acabam  no  Terreiro  do  Paço,  dentro  dos 
quaes  encontrará  tudo  que  ha  de  notável  a  ver  in- 
ter-muros  da  cidade,  buscando  informações  sobre 
os  logares  ahi  apontados  nos  respectivos  artigos 
d'este  guia.  Tendo  vagar  pode  duplicar  o  numero 
dos  passeios,  dividindo  cada  um  d'elles  em  dois  no 
logar  que  vae  marcado  com  este  signal  * 


DO   VIAJANTE  159 


PRIMEIRO  PASSEIO 


Terreiro  do  Paço.  —  Secretarias,  Camará  Munici- 
pal, Thesouro,  Telegraphia  eléctrica,  Obras  publi- 
cas— onde  se  podem  ver  alguns  modelos,  e  a  planta 
do  palácio  d' Ajuda— Praça  do  Commercio.  Estatua 
equestre,  Cães  das  columnas,  e  dos  vapores,  Alfan- 
dega, Rua  Augusta,  Rocio,  Theatro  de  D.  Maria, 
Passeio  Publico,  Theatro  da  rua  dos  Condes,  Circo 
de  Price,  Theatro  das  Variedades,  Largo  do  Rato, 
Palácio  do  Marquez  de  Vianna,  Largo  das  Amorei- 
ras, e  Mãe  d'agua. 

*  Campo  d"Ourique  e  o  quartel  d'infanteria  n.°  16, 
Egreja  de  Santa  Isabel,  Largo  do  Rato  —Palácio  do 
duque  de  Palmella  —  Imprensa  nacional,  Palácio 
que  foi  do  conde  de  Cea,  Escola  Polytechnica,  Praça 
do  Príncipe  Real,  Asylo  das  donzellas  orphãs,  Pas- 
seio e  jardim  de  S.  Pedro  d'Alcantara,  Misericór- 
dia—  Egreja  de  S.  Roque,  casa  da  loteria  e  roda 
dos  expostos  —  Rua  de  S.  Roque,  Egrejas  da  En- 
carnação e  do  Loreto,  Martyres,  Theatro  do  Gym- 
nasio,  Largo  do  Carmo,  com  o  chafariz  e  as  mi- 
nas da  antiga  egreja,  Theatro  da  Trindade,  Ca- 
sino Lisbonense,  Bibliotheca  publica,  Academia 
das  Beilas-Artes,  Theatro  de  S.  Carlos,  Hotel  Bra- 
gança, Calçada  de  S.  Francisco,  Egreja  da  Concei- 
ção Nova  —  Terreiro  do  Paço. 


160  NOVO   GUIA 

SEGUNDO  PASSEIO 

Terreiro  do  Paço,  Largo  do  Pelourinho,  Arse- 
nal, Largo  do  Corjpj^  Santo,  Cães  do  Sodré,  Rua 
do  Alecrim,  Palácio  que  foi  do  conde  do  Farrobo, 
Palácios  do  duque  de  Palmella,  ao  Calhariz,  do 
conde  Sobral,  Correio,  Conservatório,  Museu,  Aca- 
demia das  Sciencias,  Convento  de  Jesus,  Egreja  dos 
Paulistas,  Cortes,  Torre  do  Tombo,  Convento  das 
Francezinhas,  Hospital  militar,  Largo  da  Estrella, 
Passeio  da  Estrella,  Convento  do  Coração  de  Jesus, 
Cemitério  e  Capella  protestante,  Cemitério  de  Nossa 
Senhora  dos  Prazeres. 

*  Palácio  e  quinta  das  Necessidades,  Ponte  d' Al- 
cântara, Quartel  dos  inválidos  da  Marinha,  Egreja 
de  S.  Francisco  de  Paula,  Quartel  de  Infanteria  n.° 
2,  Chafariz  das  Janellas-verdes,  Palácio  do  mar- 
quez  de  Pombal,  Egreja  de  Santos  o  Velho,  Calçada 
do  Marquez  d' Abrantes,  Aterro  da  Boa  Vista,  Cha- 
fariz e  convento  da  Esperança,  Fabricas  de  fundi- 
ção, Gazometro,  Abogaria,  Casa  da  moeda,  Praça 
de  S.  Paulo,  Rua  do  Arsenal,  Pelourinho,  Egreja 
de  S.  Julião,  Terreiro  do  Paço. 

TERCEIRO  PASSEIO 

Terreiro  do  Paço,  Rua  da  Prata,  Egreja  de  S.  Ni- 
coláo,  Praça  da  Figueira,  Egreja  de  S.  Domingos, 
Hospital  de  S.  José,  Escola  medico-cirurgica,  Asylo 


DO   VIAJANTE  161 

do  Amparo,  Hospital  dos  Lázaros,  Campo  de  Santa 
Arma,  Praça  de  Touros,  Palácio  da  Bemposta,  com 
a  Escola  militar,  Asylo  da  mendicidade,  Hospital  de 
alienados,  Convento  d' Arroios,  Cemitério  do  alto  de 
S.  João. 

*  Convento  das  Commendadeiras  de  Santos,  Col- 
legio  dos  aprendizes  do  Arsenal,  Caldeiras,  Cães  do 
Tojo,  Santa  Apolónia,  Estação  dos  caminhos  de  ferro 
de  leste,  Arsenal  do  exercito,  Fabrica  a  vapor  para 
moer  trigo,  Deposito  d'agua,  Banhos  thermaes  das 
Alcaçarias,  Alfandega  municipal  e  suas  dependên- 
cias, Egreja  da  Conceição-velha,  Terreiro  do  Paço. 

QUARTO  PASSEIO 

Terreiro  do  Paço,  Rua  dos  Fanguiros,  Egreja  da 

Magdalena,  e  uma  inscripção  romana  na  esquina  da 

travessa  «lo  Almada,  Egreja  de  Santo  António,  Sé 

cathedral,  Aljube,  Limoeiro,  Caslello  de  S.  Jorge, 

Recolhimento  do  Menino  Deus,  Egreja  da  Graça, 

Quartel  de  Infanteria  n.°  10,  Egreja  do  Monte,  Rua 

da  Cruz  dos  Quatro  Caminhos,  Egreja  da  Penha  de 

França. 

*  Largo  da  Graça,  Convento  das  Monicas,  Egreja 

de  S.  Vicente,  Campo  de  Santa  Clara,  Palácios  do 

Conde  de  Barbacena,  do  Marquez  de  Lavradio,  e  do 

Cordes,  Fundição  de  Cima,  Obras  de  Santa  Engra- 

cia,  Hospital  da  Marinha,  Rua  do  Paraíso,  Portas 

da  Cruz,  Rua  do  Vigário,  Egreja  de  S.  Miguel,  de 
11 


162  NOVO   GUIA. 

Santo  Estevão,  e  S.  João  da  Praça,  Palácio  do  Du- 
que da  Terceira,  Cruzes  da  Sé,  Rua  das  Canas- 
tras, Rua  dos  Bacalhoeiros,  Casa  dos  Bicos,  Rua 
dos  Capellistas,  Terreiro  do  Paço. 

Tendo  dado  noticia  de  todos  os  objectos  que  po- 
dem intressar  o  viajante  dentro  dos  muros  de  Lis- 
boa, passamos  a  tratar  dos  seus  arredores,  como 
complemento  que  são  da  mesma  cidade,  e  que  não 
devem  deixar  de  ser  visitados  pelo  curioso.  Come- 
cemos por  atravessar  o  Tejo,  e  passeiar  por  es- 
ses bellos  plainos  da 

Ontra-Banda 

Saindo  do  Terreiro  do  Paço  em  um  vapor,  che- 
ga-se  com  poucos  minutos  de  viagem  ao  cães  de 
Cacilhas,  do  outro  lado  do  Tejo;  ahi  inúmeros  ra- 
pazes vos  offerecerão  burrinhos,  que  é  a  viatura  or- 
dinária d'este  sitio,  e  são  seguros,  fortes  e  tão  bons 
como  os  do  Egypto ;  montareis,  e  deixando  pelas 
costas  o  magnifico  Tejo  e  o  soberbo  panorama  da 
cidade  que  orla  a  outra  margem,  o  cães  de  Cacilhas 
onde  foi  assassinado  o  general  Telles  Jordão  em  1833, 
e  o  pequeno  fortim  adjuncto,  ireis  por  entre  casas 
de  mais  ou  menos  formosa  apparencia,  lindos  jar- 
dins e  valiosas  quintas,  disfructar  a  óptima  vista  do 
castello  de  Almada,  ou  a  Fonte  da  Pipa,  d'onde  se 
fornecem  de  agua  muitos  navios,  e  também  dos  pre- 
ciosos vinhos  encerrados  nos  armazéns  contiguos; 


DO    VIAJANTE  163 

ahi  perto  é  a  fabrica  da  Margueira,  bello  esta- 
belecimento fabril,  e  mais  longe  fica  o  Pragal, 
e  o  Caramujo,  e  a  Cora  da  Piedade,  ludo  logares 
pittorescos,  de  ares  salubres  e  abundantes  comestí- 
veis. A  morada  e  quinta  real  do  Alfeite  é  de  todos 
o  mais  agradável,  e  depois  a  quinta  da  princeza,  na 
Amora*  Quem  do  alto  do  castello  de  Almada,  lança 
a  vista  para  o  outro  lado  do  rio,  e  abraça  n'um  re- 
lancear toda  a  senhoril  Lisboa,  desde  Xabregas  até 
Belém,  e  até  á  barra,  pode  dizer  que  viu  um  dos 
mais  grandiosos  quadros  que  a  Europa  apresenta 
no  seu  género.  E  se  alongando  a  vista  pel  i  Tejo 
abaixo,  transpozer  com  os  olhos  a  torre  do  Bogio, 
enxergará  lá  fora  o  Oceano  em  toda  a  sua  mages- 
tade  e  inúmeros  barcos  de  vários  tamanhos  e  es- 
truturas, que  se  confundem  no  horisonte,  como  uma 
pequena  mancha  do  firmamento  ou  do  mar.  Saindo 
de  Cacilhas  e  Almada  pela  margem  sul  do  Tejo, 
encontram-se  algumas  insignificantes  povoações  [tara 
o  Occidente,  encravadas  em  areiaes,  Porto-Brandão, 
a  Trafaria,  Caparica,  e  outras  ainda  menos  impor- 
tantes ;  para  leste  do  pontal  de  Cacilhas  ha  as  po- 
voações de  pescadores  do  Barreiro,  Seixal  e  Ar- 
rentela,  o  paiz  vinhateiro  do  Lavradio,  Valle  de  Zebro, 
e  muitos  outros  logares  até  Alhos  Vedros  e  Aldea- 
gallega.  Nos  dias  das  festas  particulares  de  cada 
uma  d'estas  terras  o  seu  aspecto  é  risonho,  as  suas 
galas  brilham  á  luz  do  sol ;  no  resto  do  anno  é  mi- 
serável a  apparencia  das  pobres  villas  e  aldeias,  não 


164  NOVO   GUIA 

pagam  em  graças  ao  forasteiro  o  trabalho  da  jor- 
nada. 

Cercanias  de  Lisboa 

AO   ORIENTE 

Se  partindo  do  Terreiro  do  Paço,  pela  beira  do 
rio,  o  viajante  se  dirigir  ao  nascente,  ou  vá  n'um 
pequeno  bote,  em  omnibus,  em  carro,  ou  nas  mo- 
dernas carruagens  ou  mesmo  a  pé,  disfructará  sem- 
pre uma  agradável  vista,  bellos  edifícios,  hortas  ver- 
dejantes, aguas  mansas  e  puras,  e  uma  agradável 
temperatura.  Passando  os  edifícios  das  duas  alfan- 
degas—  de  Lisboa  e  Municipal,  —  e  vendo  do  largo 
do  Terreiro  começarem-se  a  emaranhar  os  beccos  da 
.velha  Alfama,  sobre  os  quaes  campêam  as  torres 
de  Santo  Estevão,  segue-se  o  bello  sitio  do  Jar- 
dim do  Tabaco  até  Santa  Apolónia,  rastejando 
pelo  Arsenal  do  Exercito,  e  vendo  no  alto  a  Fun- 
dição e  o  Hospital  da  Marinha,  e  mais  longe  as  mi- 
nas de  Santa  Engracia.  e  as  torres  de  S.  Vicente. 
Gomtemplareis  neste  transito  os  restos  de  vastos  pa- 
lácios, que  pertenceram  á  antiga  nobreza  de  Por- 
tugal; a  monumental  fonte  da  Samaritana,  de  que 
já  falíamos;  conventos  magestosos  de  Freiras  e  Com- 
mendadeiras,  como  o  de  Santos  e  o  da  Madre  de 
Deus,  collocados  em  sitios  deleitosos,  e  que  encer- 
ram em  si  preciosidades  artisticas ;  Beato  António, 
Xabregas,  o  Poço  do  Bispo,  os  Olivaes,  Braço  de 


DO  VIAJANTE  165 

Prata,  agradáveis  vivendas  de  estio,  onde  se  encon- 
tram ricas  quintas,  com  valiosas  vinha?,  pomares  e 
olivedos,  e  as  decantadas  horta  de  Chellas,  por 
onde  espairece  aos  domingos  a  população  miúda  da 
capital.  O  que  por  ahi  não  ha,  como  nos  boulevards 
e  barreiras  de  Paris,  é  divertimentos  públicos  de 
funambulos,  musicas,  jogos,  etc.  apenas  o  clássico 
chinquilho  para  passatempo  do  homem  de  trabalho ; 
nem  tão  pouco  um  restauram,  por  ordinário  que 
seja,  apenas  em  modesta  bodega  na  porta  de  cada 
quinta,  encontrareis  quando  a  fome  ou  a  sede  vos 
apertar,  um  pouco  de  peixe  frito,  saltada  e  vinho  or- 
dinário ;  nenhum  refresco,  nenhum  comestivel  mais, 
mas  um  ar  tão  puro  e  suave,  que  aduba  essas 
mesquinhas  iguarias. 

AO   OCCIDENTE 

Se,  em  vez  de  seguirdes  a  direcção  do  nascen- 
te, inclinardes,  ao  contrario,  para  oeste,  asseguro- 
vos  que  não  achareis  menos  poesia  n'esse  passeio 
desde  o  Terreiro  do  Paço  até  Belém,  estrada  a 
mais  concorrida  das' que  partem  de  Lisboa,  ador- 
nada de  magestosos  edifícios,  lindos  jardins,  palá- 
cios sumptuosos  de  mais  recente  data,  templos, 
fabricas,  fortificações,  e  alamedas.  Começaes  no 
Arsenal  da  Marinha;  a  praça  e  arvoredo  do  Cães 
de  Sodré,  estendendo-se  a  vista  pela  ponte,  Rua  do 
Alecrim  até  S.  Roque;  o  cães  da  Ribeira  Nova, 


166  NOVO   GUIA 

em  que  ha  tanto  movimento,  e  lá  em  cima  os  al- 
tos de  Santa  Calhar ina  e  das  Chagas,  no  ultimo 
dos  quaes  está  situada  a  freguezia  dos  maritimos. 
A  Boa  Vista,  as  Janellas  Verdes,  abrindo  ruas  para 
o  bairro  da  Lapa ;  a  Pampulha,  e  a  ponte  de  Al- 
cântara; o  Calvário,  onde  foi  o  jardim  mytholo- 
gico,  com  suas  cocheiras  reaes ;  e  o  passeio  da 
Junqueira,  e  a  Cordoaria,  e  o  largo  de  Belém, 
hoje  de  D.  Fernando  n,  ladeado  de  viçosas  arvo- 
res, regular  e  com  um  óptimo  cães,  tendo  em  uma 
extremidade  as  cavallariças  reaes ;  fronteiras  ao 
rio  as  calçadas  que  sobem  para  a  memoria,  egreja 
engraçada  que  fizeram  erguer  no  logar  onde  el-rei 
D.  José  recebeu  um  tiro,  e  para  a  Ajuda  e  Jardim 
Botânico.  Entre  essas  duas  estradas  fica  o  palácio 
real,  chamado  de  Baixo.  Proseguindo  com  a  excur- 
são ainda  para  oeste,  e  sempre  á  beira  mar,  pas- 
saes  pelo  mercado  do  peixe,  o  gothico  mosteiro  dos 
Jeronymos,  e  a  torre  de  Belém,  já  sobre  a  agra- 
dável praia  de  Pedroiços,  onde  as  senhoras  tomam 
banhos  de  agua  salgada  todos  os  annos ;  ahi  perto 
se  encontra  a  soberba  quinta  do  duque  de  Cadaval. 
Depois  a  ponte  d'Algés,  lá  em  cima  os  pittorescos 
logares  de  Linda  a  velha,  Linda  a  Pastora,  e  Car- 
naxide todos  esses  sitios  apraziveis  que  o  viajante 
contempla  logo  ao  entrar  no  Tejo ;  e  já  e  fora  da 
barra  Oeiras  e  Carcavellos.  Ahi  nâo  ha  a  solidão 
melancolicamente  suave  do  arrebalde  oriental,  o  ar 
é  mais  cortante,  as  vagas  vem  com  ruido  quebrar-sc 


DO    VIAJANTE  167 

nos  cachopos,  o  oceano  estende-se  ao  longe  na  sua 
frente,  e  tudo  concorre  a  marcar  estes  logares  com 
o  sello  de  uma  imponente  grandeza.  As  quintas  do 
Marquez  de  Pombal,  em  Oeiras,  são  d'aquelles  lo- 
gares que  nenhum  viajante  que  chega  a  estas  praias 
deve  deixar  de  visitar.  A  estrada  divide  em  duas 
esta  propriedade,  legada  a  seus  netos  pelo  grande 
ministro,  que,  grande  como  era,  nâo  se  esqueceu 
de  si  e  dos  seus.  Entre  muitas  bellezas  ha  ahi  no- 
tável, na  parte  meredional,  a  chamada  gruta  dos  poe- 
tas, que  tem  os  bustos  de  Homero,  Virgílio,  Ca- 
mões e  Tasso ;  o  palácio  em  cujo  pavimento  infe- 
rior ha  estatuas  do  celebre  Machado  de  Castro,  e 
alguns  objectos  de  uso  do  marquez  no  andar  supe- 
rior; a  grandiosa  adega,  em  cujos  toneis  gigantes 
o  povo  crè  que  pena  a  alma  do  Richelieu  portu- 
guez ;  na  parte  septentrional  ha  a  decantada  cascata 
de  Taveira,  com  muito  verso  insosso  e  prosa  torpe, 
e  tanto  em  uma  como  em  outra  das  quintas,  gra- 
ciosos jardins,  selvas,  lagos,  estatuas,  regatos,  pon- 
tes, e  grutas.  D'ahi  á  torre  de  S.  Julião  da  Barra 
é  um  pequeno  passeio. 

Já  que  n'este  passeio  nos  achamos  no  aprazivel 
e  hoje  muito  frequentado  bairro  de  Belém,  citare- 
mos aqui  ao  cançado  viajante  o  Club  Hotel,  magni- 
Oco  estabelecimento  com  saída  e  cães  sobre  a  ma- 
gnifica praia  de  banhos  do  Bom  Successo,  torna-se 
muito  recommendavel  não  só  pela  sua  posição 
excepcional  e  salubre  como  pelos  commodos  que 


168  NOVO   GUIA 

offerece  ás  pessoas  ou  famílias  que  desejarem  to- 
mar os  banhos  de  mar  ou  permanecer  no  campo, 
reunindo  assim,  todas  as  vantagens  para  aquelles 
que  preferirem  viver  confortável  e  economicamente 
no  campo,  perto  da  cidade,  n'um  estabelecimento 
que  lhes  offerece  a  independência  domestica  sem 
os  encommodos  e  maiores  despezas  que  fariam  em 
casa  sua. 

A  sua  collocaçao  topographica  e  a  salubridade 
d'aquelles  sitios  dão  toda  a  garantia  para  se  poder 
aconselhar  ás  pessoas  que  precisarem  restaurar 
a  saúde  a  sua  residência  n'aquella  localidade, 
como  o  attestam  os  médicos  mais  conhecedores 
d'ella. 


Meza  redonda  e  jantares  particulares. 


Pastelaria  aonde  se  acceitam  encommendas  para 
todas  as  qualidades  de  iguarias. 


Salão  commum  circumdado  de  terraços  com  so- 
berba vista  sobre  o  Tejo,  casa  de  leitura  e  café, 
jardim,  casa  de  banhos,  cavallariça,  e  cocheira. 


Communicações  diárias  por  terra  e  por  mar  com 
Lisboa  por  preços  diminutíssimos,  todas  as  meias 
horas. 


Serviço  telegraphico  permanente  com  Lisboa  e 


DO    VIAJANTE  169 

os  paizes  estrangeiros  na  estação  próxima  ao  esta- 
belecimento. 


Estabelecimentos  de  carruagens,  cavallos  e  ju- 
mentos de  aluguer  muito  próximos. 


No  cães  de  Belém  e  na  praia  da  Torre,  exis!em 
embarcações  para  passeios  e  pescarias,  podendo-se 
embarcar  no  cães  do  mesmo  hotel. 


Annexo  a  este  hotel  ha  um  grande  deposito  de 
vinhos  nacionaes  e  estrangeiros  das  casas  mais 
acreditadas. 


Fallam-se  vários  idiomas. 


Preços  rasoaveis  e  por  convenção. 

AO  SEPTENTRIÃO 

É  por  este  lado  que  se  dirige  a  maior  chusma  de 
passageiros.  Do  largo  de  S.  Sebastião  da  Pedreira 
partem  duas  estradas,  sempre  concorridas,  que  se 
dirigem  —  a  da  direita  (estrada  do  Rego)  pelo  Campa 
Pequeno,  ao  Campo  Grande,  ao  Lumiar,  e  a  Odi- 
relias;  a  da  esquerda  (estrada  de  Palhavã)  pelas  La- 
ranjeiras  a  Bem  fica,  Alo  da  Porcalhota,  e  estrada 
de  Cintra  e  Bellas.  Também  pelas  Amoreiras  se 
pôde  ir  pelo  delecioso  sitio  de  Campolide  (campo 


170  NOVO   GUIA 

de  lide)  e  Sete-Rios  encontrar  Bemfica,  e  por  Ar- 
roios (de  outro  lado)  sair  ao  Campo  Pequeno ;  maus 
caminos  transversaes  unem  entre  si  todos  estes  pon- 
tos. Daremos  uma  breve  idéa  do  mais  notável  que 
ha  a  observar  em  todos  elles,  porque  os  sens  prin- 
cipaes  edifícios  e  paisagens  não  foram  ainda  men- 
cionados, como  succedeu  a  quasi  todos  os  monumen- 
tos de  Belém  e  de  Xabregas,  que  sob  diversos  tí- 
tulos figuraram  no  corpo  d'esta  obra. 

Campo  Pequeno.  —  Terreno  irregular  que  é  todavia 
muitas  vezes  para  o  exercicio  de  tropas,  orlado  de 
palácios  e  quintas,  e  onde  vem  desembocar  as  es- 
tradas de  Arroios,  do  Rego,  e  do  Campo  Grande. 
Ahi  se  vê,  ao  cabo  da  primeira  das  estradas  men- 
cionadas, um  tosco  monumento  da  paz  feita  n'este 
logar  entre  el-rei  D.  Diniz  e  seu  filho,  depois  Af- 
fonso  iv,  por  intervenção  da  esposa  de  um  e  mãe 
de  outro  —  a  rainha  Santa  Izabel. 

Campo  Grande.  —  Vasto  Passeio  murado,  muito  re- 
gular, com  ruas  de  arvoredo,  jardim,  chafariz  e 
campo  cultivado.  Pertence  á  camará  municipal  de 
Lisboa,  mas  o  seu  transito  é  livre.  Ahi  se  faz  an- 
nualmente  uma  feira,  no  mez  de  outubro,  a  qual, 
se  está  bom  tempo,  torna  este  sitio  por  alguns  dias 
o  rendez-vons  da  gente  da  capital,  ao  domingo  prin- 
cipalmente para  os  que  não  podem  ir  em  outro  dia. 
De  um  e  outro  lado  do  campo  ha  bellas  casas,  quin- 
tas, jardins  e  vivendas  camprestes,  como  na  estrada 
que  ahi  conduz  do  Campo  Pequeno. 


DO   MA  JANTE  171 

A  melhor  casa  de  pasto  que  ali  ha  é  a  Flor  do 
Campo. 

Lumiar.  — Esta  aprazível  povoação,  de  pouco  mais 
de  dois  mil  visinhos,  tem  muito  risonhas  quintas, 
entre  as  quaes  destaca  a  do  duque  de  Palmella, 
que  possue  uma  extença  collecção  de  plantas  exó- 
ticas, e  um  bem  mobilado  palacete  annexo.  Des- 
cendo a 

Calçada  de  Carriche,  encontra-se  uma  formosa  quinta, 
baptisada  com  o  nome  de  Nova  Cintra,  e  a  melhor 
casa  de  pasto  extra-muros  de  Lisboa.  Ruas  de  bem 
copado  arvoredo,  solitários  carramancheis,  uma 
serra  com  bello  caminho  praticável  por  entre  cana- 
viaes,  no  alto  d'ella  um  mirante  para  descançar  no 
fim  daquella  ascenção,  agua  purissima  e  sempre 
fresca  rebentando  em  abundância  ao  lado  de  ópti- 
mos fructos  e  flores  variegadas  —  eis  ahi  a  Nova 
Cintra,  que  bem  merece  o  seu  atrevido  nome.  A 
mesa  é  bem  servida  em  pequenas  salas  de  uma  ha- 
bitação unida  á  quinta,  ou  em  algum  dos  kioskos, 
ou  mesmo  nas  ruas  de  arvoredo. 

Dirigindo-se  d'este  logar  para  Odivellas,  encon- 
tra-se no  caminho  um  tosco  munumenlo  e  a  sua 
historia  escripta  e  figurada  em  azulejo ;  é  a  memo- 
ria de  um  desacato  e  roubo  perpetrado  no  convento 
de  Odivellas,  e  do  supplicio  atroz  do  delinquente. 

Odivellas.  —N'este  logar  só  ha  de  notável  o  con- 
vento de  freiras,  afamado  pela  óptima  marmelada 
que  ahi  se  fabrica,  pela  recordação  de  antigos  oit- 


172  NOVO   GUIA 

tetros  e  da  galanteria  de  D.  João  v — rei  edificador 
e  freira  tico.  Do  antigo  edifício  só  resta  hoje  a  egreja, 
onde  repousam  as  cinzas  do  monarcha  D.  Diniz, 
fundador  do  mosteiro.  A  capella  que  contém  o  seu 
tumulo  é  um  vâo  escuro,  onde  apenas  cabe  o  mo- 
numento, cujos  lavores,  que  parecem  obra  de  sub- 
til artífice,  hoje  mal  se  podem  ver,  por  que  es- 
tão cobertos  de  estuque  í  O  átrio  da  entrada  é  de 
architectura  gothica,  e  n'uma  parede  do  mesmo  se 
vê  embebida  uma  bala  de  pedra  de  mais  de  cinco 
palmos  de  circumferecia,  por  baixo  da  qual  se  lê 
a  seguinte  inscripção :  —  Este  pelouro  mandou  aqui 
offerecer  a  San  Bernardo'  dom  Álvaro  de  Noronha 
por  sua  devoçam,  que  he  dos  quom  que  lhe  os  tur- 
cos combateram  a  fortaleza  Durumuz  semdo  ele  ca- 
pitam dela,  na  era  de  1557. —  Junto  ao  convento 
está  um  outeiro  do  lado  de  Lisboa,  sobre  o  qual 
se  vem  estendendo  a  povoação  de  Odivellas,  e  ahi 
um  arco  de  pedraria,  que  a  tradição  popular  de- 
nomina Monumento  de  D.  Diniz,  cuja  origem  se 
ignora,  e  ha  mesmo  fortes  conjecturas  de  que  seja 
posterior  a  D.  João  i  a  sua  construcção. 

Aqui  termina  toda  a  curiosidade  para  o  pas- 
seante  que  sae  de  Lisboa  n'esta  direcção ;  volta- 
remos pois  a  S.  Sebastião  da  Pedreira,  e  ahi  to- 
mando a  estrada  de  Palhavã,  onde  se  vê  o  palá- 
cio que  serviu  de  habitação  aos  meninos  de  Palhavã 
—  príncipes  que  envelheceram  e  morreram  com 
esse  epitheto  pouco  honroso,  em  razão  do  seu  far 


DO  VIAJANTE  173 

nienle,  —  dirigiremos  os  passos  para  a  melhor  e 
mais  elegante  estrada  de  Portugal,  caminho  de 
Bemfica  e  Cintra. 

Laranjeiras.  —  Quinta  que  foi  do  conde  de  Far- 
robo,  na  estrada  real;  sitio  muito  ameno.  Tem  pa- 
lácio, um  theatro  sumptuoso,  lagos,  pontes,  grutas, 
cascatas,  kioskos,  pavilhões  chinezes,  jaula  de  fe- 
ras, baloiços,  abundante  arvoredo,  flores,  prados, 
torreões,  lindas  ruas,  bella  gradaria  sobre  a  es- 
trada, portões  elegantes,  estufas,  em  fim  um  com- 
nosto  aprazivel.  Ha  pessoas  difficeis  de  contentar, 
que  nada  d'isto  acham  bonito,  poético,  pittoresco ; 
não  somos  d'esses,  e  temos  fé  que  o  visitante  des- 
apaixonado será  da  nossa  opinião. 

O  escriptor  Gomes  de  Amorim  fallando  d'e 
bella  quinta,  descreve  a  sua  decadência  da  seguinte 
maneira : 

a  Quem  não  a  conheceu  nos  seus  tempos  felizes?! 
Era  a  primeira  maravilha  dos  arredores  de  Lisboa; 
já  tinha  um  gazometro  e  ainda  a  cidade  olo  sabia 
o  que  era  gaz !  tanques  e  lagos,  em  que  podiam 
fazer-se  pequenas.naumachias;  um  canal;  uma  ponte 
pênsil  atravessando  o  lago  maior ;  jaulas  de  feras; 
viveiros  de  aves  raras;  estufas  onde  se  viam  pri- 
morosamente cultivadas  plantas  de  todas  as  zonas; 
jardins  magníficos;  mattas  excelsas;  caramanchões 
e  pavilhões  chinezes;  ehaieU  mysteriosos;  labyrin- 
thos  encantados  —  delicia  das  Ariadnes,  e  dos  The- 
seos  que  as  acompanhavam  sem  fio  guiador;  — 


174  NOVO   GUIA 

theatro  admirável;  palácio  soberbo...  tudo  possuía 
aquella  vivenda  digna  de  príncipes,  que  pertencia 
a  um  dos  homens  de  mais  gosto  e  de  maior  génio 
artístico  que  tem  tido  Portugal !  Alli  se  deram  mui- 
tas vezes  tão  explendidas  festas,  que  assombraram, 
pela  sua  sumptuosidade,  os  embaixadores  das  na- 
ções mais  opulentas  e  poderosas  da  Europa  í  As 
rainhas,  os  reis,  os  príncipes,  os  homens  illustres 
nas  letras,  nas  artes  e  nas  sciencias,  todas  as  ce- 
lebridades contemporâneas,  que  residiam  no  paiz 
ou  vinham  visital-o,  iam  alli  pagar  o  tributo  da  sua 
admiração,  receber  uma  homenagem  ou  um  cum- 
primento. 

Todo  o  povo  de  Lisboa  conhecia  a  quinta  das 
Laranjeiras,  e  nenhum  viajante,  por  mais  humilde 
e  obscuro  que  fosse,  deixava  de  ir  vel-a,  uma  vez 
ao  menos. 

Facilitava-se  a  entrada  a  todos,  pobres  ou  ricos; 
a  um  rancho  de  dez  pessoas  do  mesmo  modo  que 
a  um  só  visitante.  Em  tudo  ostentava  a  sua  bizar- 
ria e  magnificência  o  creador  de  tantas  maravilhas ! 
Lisboa  amava-o ;  sabia  que  elle  acudira  á  causa  li- 
beral em  perigo  com  os  milhões  dos  seus  cofres ; 
vira-o  dar-lhe  expectaculos  scenicos,  no  theatro  de 
S.  Carlos,  com  pompa  digna  dos  imperadores  ro- 
manos ;  no  conservatório  de  musica,  na  inspecção 
dos  theatros,  em  toda  a  parte  onde  fosse  necessá- 
rio fazer  serviços  ás  artes,  estava  costumada  a  en- 
contral-o;  e,  diga-se  a  verdade  toda,  deslumbra- 


DO   VIAJANTE  175 

va-a  com  o  esplendor  das  festas  que  dava  nas  La- 
ranjeiras, é  a  fama  d'ellas,  retinindo  dentro  e  fora 
do  paiz,  lisonjeava  o  amor  próprio  e  a  vaidade  na- 
cional. 

Os  que  não  iam  aos  seus  bailes  grandiosos,  con- 
tentavam-se  com  ouvir,  nas  noites  caladas  e  sere- 
nas, rugir  ao  longe  os  leões  do  Quintella.  Havia 
amadores  que  todos  os  dias  iam  ver  as  jaulas,  con- 
tender com  os  bichos  e  tirar-lhes  ás  vezes  um  olho, 
com  a  ponteira  da  bengala  ou  do  chapéo  de  sol, 
para  divertir  a  família;  outros,  cortavam  ramos 
das  plantas  raras  para  fazer  bengalinhas  aos  meni- 
nos que  levavam,  e  todos  depenavam  as  flores, 
como  se  aquillo  fosse  nosso!  Mas  ninguém  era  ex- 
pulso, como  aliás  mereciam  alguns ;  nem  se  fecha- 
vam as  portas  —  como  hoje  se  faz  em  differentes 
quintas  —  para  punir  uns  pelas  faltas  dos  outros. 
A  ultima  fera  que  existiu  nas  jaulas  era  um  leão, 
cego  pela  brutalidade  de  um  visitante,  que  não  fi- 
cou sem  o  outro  olho  foi  porque  depois  da  perda 
do  primeiro  nunca  mais  se  chegou  ás  grades  I 

Um  dia  o  vento  da  adversidade  soprou  furioso 
sobre  o  homem  que  creára  aquelle  paraíso.  A  or- 
chestra,  composta  de  creados  seus,  a  quem  elle 
mandava  ensinar  musica,  emmudeceu ;  as  gôndo- 
las em  que  passearam  rainhas,  afundaram-se  nos 
lagos  ;  rompeu-se  o  gazometro,  deixando  o  thea- 
tro  em  trevas ;  entupiu-se  a  canalisaçâo  que  ali- 
mentava os  jogos  de  aguas ;  morreram  as  aves  e 


176  NOVO   GUIA. 

os  animaes  ferozes ;  cairam  as  jaulas  e  nas  estufas 
sem  vidros  pereceram  todas  as  plantas !  As  multi- 
dões, que  tinham  assistido  ás  festas  portentosas, 
olhavam  de  longe,  consternadas,  para  o  desabar 
de  tamanha  grandeza. 

O  chalet  mysterioso  da  matta,  surdamente  ac- 
cusaclo,  nâo  se  sabe  por  quem,  de  ter  sido  teste- 
munha e  confidente  de  insólitos  excessos,  incen- 
diou-se  uma  noite  por  si  mesmo  1  E  houve  quem 
afíirmasse  ter  sido  o  fogo  do  céo  quem  abrasou 
aquelle  fragmento  de  Sodoma  f — Era  quasi  todo 
de  ferro,  e  o  artifice  francez  ou  belga,  que  viera 
collocal-o  no  seu  logar,  recebera  pelo  seu  trabalho 
seis  contos  de  réis  í — Todos  se  compadeciam  de 
tantos  e  tão  repetidos  desastres ;  só  o  principal  in- 
teressado assistia,  com  estóica  indifferença,  ao  es- 
boroamento  das  suas  maravilhas !  Após  o  chalet, 
foi-se  o  theatro  —  outra  obra  prima !  —  Elle  estava 
â  mesa,  no  Farrobo,  quando  lhe  entregaram  um 
telegramma.  Leu-o,  dobrou  placidamente  o  papel, 
metteu-o  no  bolso  e  continuou  a  jantar.  Nenhum 
musculo  se  lhe  contrahiu,  nenhum  signal  exterior 
denunciou  a  natureza  da  noticia  que  recebera.  De- 
pois do  café,  disse  friamente,  acendendo  um  cha- 
ruto : 

—  Ardeu  o  theatro  das  Laranjeiras. 

De  volta  a  Lisboa,  tentou  restaural-o ;  apezar  de 
ver  afundados  os  seus  haveres  por  successivos  in- 
fortúnios, gastou  ainda  dez  ou  doze  contos  de  réis, 


DO    VIAJANTE  177 

erguendo  as  paredes  do  novo  edifício.  Vão  esforço  ! 
Os  tempos  de  prosperidade  tinham  passado ;  e  das 
festas  e  banquetes  opulentos  restava  apenas  por 
memoria  a  ingratidão  dos  que  os  tinham  comido. 
Vieram  os  achaques  da  velhice,  enfermidade  grave, 
e  a  morte  por  íim  privou  o  paiz  de  um  cidadão 
distincto,  que  lhe  fora  útil  por  differentes  modos, 
e  uma  vez  em  circunstancias  bem  graves!» 

Quinta  do  Udi. — Na  mesma  estrada,  mas  do  lado 
opposto.  Entrada  franca ;  logar  aprazível,  mas  com 
menos  trabalho  de  arte  que  a  precedente,  é  com- 
tudo  assaz  digna  de  ser  visitada  pelo  viajante  cu- 
rioso. 

Sete  rios. —  Posição  deliciosa,  onde  se  apartam  as 
duas  estradas  de  Campolide  e  Bemfica.  Antes  de 
seguirmos  a  ultima  que  nos  hade  conduzir  a  Cin- 
tra. Collares  e  Mafra,   derradeiros  marcos  d'i 
peregrinarão,  vamos  fazer  um  pequeno  desvio  para 
Campolide. —  Bem  arejada  altura,  para   onde  OS 
médicos  mandam  mudar  de  ar  os  que  padecem  do 
peito  em  Lisboa.  Dahi  gosa-se  uma  vista  encanta- 
dora. Campos  liem  cultivados,  pelo  meio  dosquaes 
nascem  espontaneamente  diversas  boninas,  quintas 
engraçadas  e  casas  bem  construídas  a  par  de  pobres 
tugúrios  de  pastores,  e  do  fundo  do  quadro  o  so- 
berbo ãqueducto  das  aguas  livres,  com  seus  arcos 
atrevidos  sobre  o  valle  e  o  pobre  ribeiro  de  Alcân- 
tara, dando  um  aspecto  magestoso  a  este  pittoresco 


logar. 


12 


178  NOVO    GUIA 

N'este  sitio  está  quasi  edificado  um  bello  quar- 
tel para  artilheria. 

Bemfica.  —  O  mais  engraçado  de  todos  os  arra- 
baldes da  capital,  com  mais  de  três  mil  habitantes. 
É  todo  cheio  de  palácios,  entre  os  quaes  destacam 
os  da  infanta  D.  Isabel,  e  do  marquez  de  Fronteira, 
encravados  em  formosas  quintas,  que  o  forasteiro 
pôde  visitar  sem  difficuldade ;  ha  egualmente  ahi 
boas  quintas  de  outros  proprietários,  e  jardins  de 
utilidade  e  recreio.  Bellas  casas  de  campo  orlam  os 
lados  da  estrada,  ricos  pomares  e  alegretes  exalam 
a  fragancia  de  suaves  aromas,  formosos  pontos  de 
vista,  deleitosas  avenidas,  o  ar,  o  céo,  tudo  contri- 
bue  a  tornar  este  logar  excepcional.  Afastado  da 
estrada-  está  o  convento  de  S.  Domingos  de  Bem- 
fica, tão  poeticamente  descripto  pelo  nosso  Frei 
Luiz  de  Sousa,  onde  elle  viveu  largos  annos,  e  foi 
sepultado,  bem  como  o  foram  João  das  Regras,  D. 
João  de  Castro  e  seu  filho  D.  Álvaro.  Foi  convento 
de  dominicanos,  hoje  é  propriedade  particular  de 
um  estrangeiro. 

Luz.  —Foi  n'este  logar  que  se  estabeleceu  o  col- 
legio  militar,  que  está  em  Mafra.  Ainda  ahi  se 
vêem  as  ruinas  da  egreja  e  convento  que  foi  dos 
cavalleiros  de  Ghristo,  e  depois  das  freiras  da  Con- 
ceição; caiu  pelo  terremoto,  menos  a  capella 
mór. 

Queluz.  —  Palácio  e  quinta  real,  de  que  falíamos 
no  artigo  competente.  Fica  fora  da  estrada  de  Cin- 


DO  VIAJANTE  179 

tra,  em  logar  ermo  e  desagradável.  Ha  aqui  um 
bello  e  commodo  hotel. 

Bellas.  —  Também  fora  da  dita  estrada,  para  a 
direita,  e  a  duas  léguas  de  Lisboa,  como  Queluz. 
Tem  uma  preciosa  quinta  pertencente  ao  conde  de 
Pombeiro,  herdeiro  do  ultimo  marquez  de  Bellas, 
onde  annualmente  se  festeja  o  Senhor  Jesus  da  Serra, 
com  arraial,  bodo,  e  todo  o  género  de  folia  popular. 

Ramalhão. — Deixando  os  caminhos  de  Queluz  e 
Bellas,  e  tornando  a  enfiar  pela  estrada  real,  des- 
cança-se  na  estalagem  do  Cacom :  e  seguindo  por 
entre  logares  mais  ou  menos  aprazíveis,  mas  bem 
lavados  <le  ares,  chega-se  á  quinta  e  palácio  do  Ra- 
malhão, <jue  era  propriedade  da  Imperatriz  rainha 
D.  Carlota  Joaquina,  mulher  de  D.  João  vi,  e  que 
ultimamente  foi  posta  em  praça,  a  quem  mais  desse. 
Alii  esti  ve  reclusa  a  mesma  senhora,  por  não  querer 
jurai*  as  bases  da  constituirão,  em  1822;  e  do  mesmo 
logar,  em  1832,  habitou  D.  Carlos,  o  pretendente 
de  Hespanba,  datando  do  Ramalhão  o  protesto  que 
fez  contra  o  direito  de  sua  sobrinha,  Izabel  u.  O 
sitio  é  muito  ameno,  arborisado,  e  abundante  de 
aguas  crystalinas. 

Perto  do  muro  da  quinta,  mesmo  sobre  a  estrada, 
se  vê  um  tumulo  de  pedra,  com  uma  cruz,  que  a 
tradição  diz  ser  o  jazigo  de  dois  irmãos,  que  mu- 
tuamente se  assassinaram,  porém  SÓ  um  cadáver  se 
encontrou  lá  dentro,  quando  ha  annos,  se  quiz  apu- 
rar este  ponto. 


180  NOVO  GUIA     . 

CINTRA 

É  bello  este  gigante  de  rochas,  reclinado  á  beira 
do  mar,  que  parece  ameaçar  o  céo  com  os  dois 
punhos  cerrados  —  o  castello  mourisco,  e  o  .castello 
christão.  Se  o  nevoeiro  encobre  uma  parte  da  mon- 
tanha, como  succede  muitas  vezes,  então  o  apro- 
ximar da  villa  é  mais  romântico  ainda ;  as  bellezas 
meio  occultas  de  paizagem  desafiam  mais  o  desejo, 
similhante  á  formosa  Dione  do  nosso  immortal  Ca- 
mões, que 

Nem  tudo  deixa  ver,  nem  tudo  esconde : 

Quando  mais  tarde  derretendo-se  o  nevoeiro,  um 
sol  puro  começa  a  doirar  tantas  maravilhas,  quando 
se  arranca  a  mascara  boreal  a  essa  formosura  do 
dia,  apparece  aos  olhos  do  viajeiro  o  mais  lindo, 
sumptuoso  e  poético  quadro,  que  nunca  olhos  mor- 
taes  contemplaram. 

Oh  Cintra  I  Oh !  saudosíssimo  retiro 
Onde  se  esquecem  magoas,  onde  folga 
De  se  olvidar  no  seio  a  natureza 
Pensamento  que  embala  adormecido 
O  susurro  das  folhas,  co'o  murmúrio 
Das  despenhadas  lymphas  misturado  f 
Quem  descançado  á  fresca  sombra  tua 
Sonhou  senão  venturas?  Quem,  sentado 
No  musgo  de  tuas  rocas  escarpadas, 


DO   VIAJANTE  181 

Espairecendo  os  olhos  satisfeitos 

Por  ceosj  por  mares,  por  montanhas,  prados, 

Por  quanto  ha  ahi  mais  bello  no  universo, 

Não  sentiu  arrobar-se-lhe  a  existência, 

Poisar-lhe  o  coração  suavemente 

Sobre  esquecidas  penas,  amarguras, 

Anciãs,  lavor  da  vida  ? 

(Garret) 

É  assim;  parece  que  todos  os  males  esquecem 
neste  Éden  de  Portugal,  o  prozaismo  da  vida  com- 
mum  não  penetra  entre  as  bellezas  naturaes  d'este 
encantador  logar !  Porem  o  viajante  não  quer  ouvir 
declamações  entbusiasticas,  quer  uma  GtHa  para  o 
conduzir  pela  mão  a  contemplar  cada  uma  das  ma- 
ravilhas de  Cintra,  e  o  nosso  dever  é  satisfazermos 
o  seu  desejo ;  vamos  pois  visitar  sucessivamente 
todos  os  sitios  notáveis  da  villa  e  seus  contor- 
nos. 

Cintra  está  situada  a  cinco  pequenas  léguas  de 
Lisboa  ;  ainda  antes  de  ahi  penetrar,  vindo  da  ca- 
pital, encontra-se  a  magnifica  quinta  dos  marque- 
zPs  de  Vinima,  que  prepara  o  viajante  para  o  pai- 
nel que  *ae  contemplar:  é  como  a  sala  de  espera 
dfl  um  palácio  de  fadas,  diz  logo  ao  visitante  :  Estás 
áã  portas  de  um  paraiso.  Descrever  a  amenidade  do 
sitio,  a  abundância  de  aguas  puríssimas,  a  pasmosa 
vegetarão,  o  luxo  dos  ornatos,  é  cousa  difficil,  se 
não  impossível,  e  teríamos  que  repetir  idênticas  pa- 
lavras ao  chegar  a  cada  uma  das  quintas  de  Cintra  ; 


182 


NOVO   GUIA 


deixando  esta  recomendada  ao  forasteiro,  demos  a 
nossa  enlrada  na  villa. 

Está  ella  situada  na  falda  de  uma  serra,  que  ou- 
trora se  chamou  Montanhas  da  Lua,  e  que  termina 
no  cabo  da  Roca,  ao  noroeste  de  Lisboa ;  tem  4,500 
habitantes.  Do  lado  do  sul  o  solo  é  árido  e  requei- 
mado ;  penedos  de  lava  e  píncaros  esburgados  e 
acastellados  dâo  ao  todo  uma  apparencia  sombria 
e  de  pavorosa  belleza.  Com  tudo,  como  debaixo  d'esse 
céo  tudo  prospera  até  sem  assiduos  desvellos,  ahi  se 
encontram  prados  de  animada  vegetação,  searas  de 
trigo  e  milho,  mas  poucas  arvores,  que  pela  maior 
parte  são  oliveiras  e  sobreiros  ;  piteiras  gigantescas 
acompanham  a  orla  da  estrada.  Para  o  lado  da  villa 
veem-se  bellos  jardins,  abundante  relva,  frondoso 
arvoredo,  crescendo  por  entre  massas  informes  de 
fragmentos  graníticos.  Em  torno  das  habitações  acu- 
mulam-se  os  carvalhos,  pinheiros,  limoeiros,  laran- 
jeiras e  figueiras  ;  sobre  os  muros  e  terraços  osten- 
tam-se  sombrias  romeiras,  vides  carregadas  de  ca- 
chos, rosas,  dhalias,  e  mais  flores  odoriferas  e  visto- 
sas; por  toda  a  parte  susurram  regatos  límpidos  que 
saem  das  fendas  das  montanhas  e  serpeam  por  en- 
tre tapetes  de  verdura ;  nos  jardins  medram  arbustos 
tropicaes  até  alcançarem  a  corpolencia  de  arvores. 
A  villa  em  si  é  pequena,  tem  ruas  estreitas  e  mal 
gradadas,  edifícios  pela  maior  parte  de  mesquinha 
apparencia.  Na  praça  irregular  onde  está  situado  o 
palácio  real,  vô-se  uma  bonita  fonte,  e  não  dis- 


DO  VIAJANTE  183 

tante  o  Pelourinho,  de  vetusta  e  elegante  archite- 
ctura. 

Palácio  real 

Na  villa,  entre  a  montanha  e  o  valle.  Parece  in- 
contestável que  esta  habitação  fosse  algum  tempo 
a  Alhambra  dos  reis  mouros  de  Lisboa,  como  o  in- 
dica a  architectura  árabe  de  algumas  das  suas  par- 
les, taes  como  as  chaminés  similhantes  a  minaretes, 
os  repuxos  e  aguas  correntes  repartidos  por  todo 
o  edifício,  e  mais  particularmente  os  nomes  árabes 
que  ainda  conservam  alguns  aposentos  do  palácio. 
A  irregularidade  do  todo,  mostra  que  diversos  fo- 
ram os  seus  constructores  e  em  épocas  differentes. 
Cada  passo  que  se  dá  neste  palácio  cheio  de  remi- 
niscências históricas,  faz  lembrar  esses  edificadores 
reaes  e  o  tempo  em  que  viveram.  D.  João  i  o  re- 
edificou quasi  totalmente.  D.  Duarte  ahi  residia 
quasi  sempre.  D.  AÍTonso  v  veio  ao  mundo  neste 
palácio  e  n'elle  falleceu.  D.  João  n  o  continuou,  e 
D.  Manuel  o  concluiu.  D'ahi  partiu  D.  Sebastião  para 
a  triste  jornada  de  Africa.  D.  AíTonso  vi  gemeu  oito 
annos  em  um  pequeno  quarto  desta  habitação  real, 
tornada  em  cárcere,  e  ainda  hoje  se  pode  ver  o  la- 
drilho do  pavimento  desse  quarto,  gasto  pelo  passear 
do  infeliz  esposo  e  rei.  A  sala  das  armas  ou  dos 
servos,  assim  chamada  pelas  cabeças  de  veados  en- 
fileirados que  ahi  Be  vêem,  mandada  edificar  por 
D.  Manuel,  contêm  os  brasões  das  famílias  nobres 


184  NOVO   GUIA 

portuguezas,  em  numero  de  74  escudos,  achando-se 
raspados  os  de  Távora  e  Aveiro,  por  haverem  sido 
justiçados  os  seus  possuidores,  como  cúmplices  no 
attentado  contra  a  vida  do  rei  D.  José  i.  A  agua  que 
repuxa  abundantemente  por  todos  os  pavimentos  do 
palácio  produz  n'um  dos  gabinetes  uma  admirável 
chuva  através  de  crivos  imperceptíveis,  que  á  von- 
tade se  podem  pôr  em  acção.  A  sala  das  pegas  tem 
pintados  muitos  destes  pássaros,  e  da  bocca  de  cada 
um  d'elles  sae  uma  fita  com  a  divisa:  —  Por  bem. 
É  obra  de  D.  João  i,  ou  de  sua  mulher  D.  Filippa 
de  Lencastre.  Conta-se  que  surppehendendo  a  rai- 
nha a  seu  marido  no  acto  cie  abraçar  uma  dama  do 
Paço,  este  dissera  :  —  É  por  bem  ;  palavras  que 
depois  se  tornaram  o  moto  ou  divisa  d'aquelle  mo- 
narcha  cavalleiroso.  Também  se  encontra  no  palácio 
uma  grandiosa  chaminé  de  mármore  com  relevos 
de  Miguel  Angelo,  presente  do  papa  Leão  x  a  el-rei 
D.  Manuel,  e  para  aqui  transferida  do  paço  de  Al- 
meirim. Até  a  cosinha  é  grandiosa  n'esta  habitação 
encantada ;  é  alta,  espaçosa  e  abobadada,  com  cha- 
minés em  forma  de  pão  d'assucar,  de  altura  desco- 
munal, as  quaes  se  avistam  de  grande  distancia.  A 
actual  familia  real  portugueza  costuma  passar  uma 
parte  de  verão  n'esta  residência. 

Palácio  acastellad©  tia  Pena 

Em  um  dos  mais  altos  píncaros  da  serra  está  si- 
tuado este  castello  gothi-mourisco7  que  pertence  a 


DO  VIAJANTE  185 

El-Rei  D.  Fernando.  Enxerga-se  este  monumento  de 
bom  gosto  de  um  principe  artista,  em  grande  dis- 
tancia, tanto  do  mar  como  dos  montes  de  Lisboa  e 
de  outros  muitos  logares  da  Extremadura.  Fora  ahi 
antigamente  o  convento  da  Pena  ou  da  Penha,  edi- 
ficado por  D.  Manuel,  n'esse  logar  onde  elle  pas- 
sava largas  horas  a  aguardar  o  regresso  de  Vasco  da 
Gama  com  as  novas  da  índia  descoberta.  A  egreja 
ainda  está  de  pé,  cuidadosamente  reparada  no  pri- 
mitivo estylo,  e  serve  de  capella  ao  novo  palácio. 

O  convento,  que  el-rei  comprou  depois  de  secu- 

tsado  em  grande  ruina.  acha-se  transformado 
em  um  castello  feudal,  no  gosto  da  architectura 

mando-gothica,  que  floresceu  no  século  xn.  Tor- 
res, cupolas,  muralhas  e  ameias,  uma  ponte  leva- 
diça,  fosso,  pateos  e  passagens  estreitas,  tudo  or- 
nado dos  mais  bellos  relevos,  apresentando  ao  vi- 
sitante extasiado  prodígios  de  cinzel ;  salas,  quartos, 
corredores,  escadas  e  mirai  m  labyrintho,  os- 

taado  todas  as  galas  da  esculptura,  e  mobiladas 
com  cadeiras,  tremós,  mesas,  commodas,  camapés 
dos  séculos  que  passaram;  capricta  s  de  phantas- 
lica  poesia  desenhados  em  pedra  por  todas  as  por- 
tas, jancli  .iucs,  arcadas,  e  lanços  de  muro: 

ahi  i>  palácio  acasleUado  da  Pena,  que  venera 
a  religiio  do  passado,  reproduzindo  os  formosos 
produetos  da  imagioaçio  de  nossos  avós,  e  que 
parece  fabricado  por  mãos  de  fadas,  ou  antes  sus- 
penso por  milagre  nas  pontas  dos  rochedos.  De 


186  NOVO  GUIA 

guarda  á  porta  principal  do  castello  está  um  caval- 
leiro  agigantado,  trajando  ao  uso  da  idade  media, 
e  mostrando  no  seu  escudo  as  armas  do  barão  de 
Echwege,  digno  galardão  dos  trabalhos  d'aquelle 
insigne  engenheiro  na  direcção  das  reaes  obras  de 
Cintra.  Todo  o  castello  está  como  enclausurado  en- 
tre os  cabeços  da  serra,  e  massas  colossaes  de  ba- 
salto ;  mas  as  suas  torres  elevam-se  acima  de  tudo 
isto,  e  não  lhe  fica  interceptada  a  vista  do  Oceano 
até  ao  mais  distante  horisonte ;  as  montanhas  da 
Estremadura  e  do  Alemtejo,  as  torres  e  o  zimbó- 
rio de  Mafra,  os  mais  altos  edifícios  de  Lisboa,  e 
as  risonhas  planices  que  lhe  cercam  a  base,  (Ma- 
res e  a  sua  Varsea,  e  a  praia  das  Maçãs.  Um  largo 
caminho,  em  parte  murado  e  em  parte  aberto  na 
rocha,  conduz  por  grande  rodeio  o  viajante,  desde 
a  villa  até  aos  pináculos  da  serra ;  encontra-se 
abundante  plantação  de  pinheiros  aos  lados  da  es- 
trada, aqui  uma  gruta  com  diliciosa  agua,  ali  um 
commodo  assento  á  sombra  de  secular  penedo ; 
mais  acima  um  lago  com  lindos  adornos,  flores 
odoríferas,  aves  não  vulgares,  até  que  se  chega  á 
ponte  levadiça  que  acaba  na  portada  principal  do 
castello,  sobre  a  qual  se  vêem  esculpidas  as  armas 
de  Portugal  e  Saxonia.  Ahi  ha  três  mil  pés  de  al- 
tura acima  do  nivel  do  mar.  Quando  já  as  sombras 
pousam  sobre  os  valles  visinhos,  ainda  reflectem 
amortecidos  os  últimos  raios  do  sol  n'esta  solidão 
visinha  do  céo.  Ainda  se  conserva  na  egreja  do  cas- 


DO  VIAJANTE  187 

tello  a  maior  preciosidade  do  antigo  mosteiro,  que 
é  bem  digna  de  se  ver :  um  sacrário  de  alabastro 
tão  precioso  e  transparente,  que  fechando-se-lhe 
uma  luz  dentro,  deixa  coar  luz  bastante  para  ao 
pé  d'elle  se  poder  ler.  É  todo  entalhado  de  relevos 
representando  os  passos  da  Paixão,  cercados  de 
festoes  de  flores,  com  suas  columnas  de  mármore 
negro. 

Castcllo  de  mouros 

Na  serra,,  a  pouca  distancia  do  palácio,  também 
reparado  por  el-rei.  Tem  dentro  uma  cisterna  bem 
conservada  e  com  boa  agua.  Ê  muito  digno  de  vi- 
sitar-se.  Cavando-se  ha  poucos  annos  nas  minas  da 
mesquita  antiga,  encontraram-se  alguns  cadáveres; 
e  o  barão  de  Echwege  ignorando  se  eram  de  mou- 
ros ou  christãos,  mandou  (com  auctorisação  supe- 
rior) lavrar  na  pedra  da  sepultura  que  hoje  os  co- 
bre —  uma  cruz  e  um  crescente  —  como  emble- 
mas das  duas  religiões,  e  por  baixo  estas  pala- 
vras :  —  O  que  ficou  junto,  Deus  separará.  Muitos 
dos  visitantes  deixam  também  escriptos  n'essa  pe- 
dra alguns  trechos  de  poesia  ou  prosa  análogos  ao 
objecto.  Por  ali  perto  se  vêem  lindos  pavões,  e  ri- 
cos avestruzes,  ostentando  as  galas  de  suas  pen- 
nas,  o  veado,  a  corça,  a  lebre,  a  gazela  saltando 
sobre  os  precipícios  da  serra,  cisnes  e  patos  ba- 
nhando-se  nas  aguas,  o  cavallo  gosando  de  uma 
silvestre  liberdade,  e  mesmo  o  boi  erguendo  a  cer- 


188  NOVO   GUIA. 

viz  com  orgulho,  porque  n'estes  logares  todos  pa* 
recém  felizes  í 


Convento  ele  Santa  Cruz 

Lidando  por  entre  os  abrolhos  da  serra,  ora  su- 
bindo ora  descendo  Íngremes  ladeiras,  enxerga-se 
sobranceiro  á  estrada  de  Collares,  este  pequenino 
convento,  onde  viveram  monges,  e  que  hoje  pobre 
e  arruinado  está  entregue  á  guarda  de  um  velho 
leigo,  coxo  e  apatetado.  —  Por  ordem  de  D.  João 
de  Castro,  fundou  D.  Álvaro  de  Castro,  seu  filho, 
este  mosteiro  humilde  para  Franciscanos,  no  anno 
de  1560.  É  um  recolhimento  pobrissimo,  cuja  fa- 
brica custou  cem  cruzados.  Dizia  Filippe  n  que 
duas  coisas  tinha  nos  seus  reinos  de  grande  cele- 
bridade, o  Escurial  por  muito  rico,  e  este  conven- 
tinho  por  muito  pobre.  —  As  cellas  são  tão  estrei- 
tas, que  mais  se  podem  chamar  sepulturas  de  ho- 
mens vivos ;  as  paredes  que  as  dividem  são  de 
barro  e  palha,  forradas  de  cortiça,  a  qual  serve 
também  de  forro  ás  portas.  O  refeitório  é  tão  pe- 
queno, que  apenas  tem  quatorze  palmos  de  com- 
prido e  sete  de  largo ;  serve-lhe  de  mesa  uma  la- 
gea  tosca,  levantada  um  palmo  do  chão,  que  para 
este  eífeito  mandou  arrancar  da  serra  o  cardeal  in- 
fante D.  Henrique.  Eram  os  guardanapos  da  mais 
áspera  estopa,  os  vasos,  de  que  se  serviam  os  re- 
ligiosos, do  mais  grosso  barro,  guardando-se  ahi 


DO    VIAJANTE  189 

sempre  abstinência  de  carne,  e  não  se  comendo  no 
advento  e  quaresma,  coisa  que  fosse  ao  lume.  — 
Na  cerca  vê-se  a  cova  de  Santo  Honório,  ou  bento 
Honório,  na  qual  viveu  trinta  annos.  Foi  peniten- 
cia longa  e  áspera  para  culpa  mui  leve,  se  6  ver- 
dadeira a  tradição. ' 

Conta-se  que  Honório  indo  pelos  campos,  encon- 
trara uma  rapariga  formosa,  que  o  obrigou  a  pa- 
rar, pedindo-lbe  que  a  conl  ie.  Recusou-se  o 
o  monge  a  ouvil-a  n'aquelle  logar,  e  mandou-a  para 
o  convento,  onde  alguém  poderia  eonfessal-a;  mas 
a  rapariga  insistiu  e  continuou  a  perseguil-o.  Sen- 
tiu Honório  que  aquella  formosura  o  tentava,  e  fez- 
lhe  o  signal  da  Cruz,  crendo  que  o  diabo  tomara 
a  forma  de  moça  para  vir  seduzi l-o.  A  rapariga 
fugiu,  e  o  santo  homem  recolheu-se  áquelle  retire 
onde  se  martyrisou  trinta  annos,  para  expiar  a  ten- 
tação que  tivera  ! 

Peninha 

É  outro  convento  da  serra,  que  pouco  ou  nada 
de  curioso  tem  a  apresentar  ao  visitante,  que  se 
aíadiga  para  lá  chegar,  por  caminhos  tortuosos  e 

ásperos,  açoitado  quasi  sempre  pela  ventania. 

Penha  Longa 

Outro  convento ;  está  no  mesmo  caso. 


190  NOVO   GUIA 

EKuinas  de  Monserrate 

Descendo  um  caminho  irregular,  aqui  e  ali  mar- 
cado com  cruzes  de  pedra,  chega,  quem  vem  de 
visitar  o  corrventinho  de  rocha  e  de  cortiça,  ao 
principio  da  estrada  de  Coilares;  cortando  porém 
á  esquerda  d'ella,  acha-se  nas  ruinas  de  Monser- 
rate, logar  assim  chamado  de  uma  ermida  de  Nossa 
Senhora  de  Monserrate,  que,  no  anno  de  1540, 
edificou  um  clérigo  chamado  Gaspar  Preto,  man- 
dando vir  de  Roma  a  imagem,  de  alabastro,  da 
Senhora.  Aqui,  em  um  pequeno  monte  despegado, 
que  se  avança  como  atalaya  do  resto  das  ondula- 
ções da  serra,  estão  as  ruinas  de  uma  casa  de 
campo,  imitando  um  castello  antigo. 

Foi  edificada  esta  casa  por  um  inglez  chamado 
Bekfort,  ainda  ha  poucos  annos,  de  sorte  que,  por 
vicio  de  construcção,  e  não  pela  muita  antiguidade, 
está  em  ruinas.  Qual  fora  requeimada  por  vento  pes- 
tífero na  viçosa  edade  da  sua  vegetação,  ainda  nes- 
tas estragadas  ruinas  sobresae  a  formosura  e  bri- 
lho do  seu  tempo  de  gloria.  Uma  bella  lameda  de 
arvores  nos  conduz  á  casa,  cercada  de  uma  grada- 
ria de  ferro  de  três  pés  de  altura,  cingindo-lhe  a 
parede  cedros,  que*  sombreando-a,  lhe  não  rou- 
bam, pela  boa  disposição  em  que  estão  collocados, 
os  lindos  pontos  de  óptica  que  disfructa,  tanto  para 
o  lado  da  serra,  de  que  é  dominada,  como  para  a 
parte  do  mar  e  valle  de  Coitares.  A  primeira  torre 


DO   VIAJANTE  191 

ê  destinada  para  os  quartos  de  cama,  seguindo-se 
em  baixo  casa  de  jantar,  etc. :  a  outra  torre  con- 
siste em  uma  bella  sala  de  musica,  de  forma  re- 
donda, communicando  com  outras,  tudo  no  melhor 
gosto  e  distribuição.  Tinha  a  casa  duas  entradas 
principaes,  que  se  dirigiam  a  um  vestíbulo  em 
octogono,  que  partia  para  os  diíTerentes  ramos  do 
edifício.  Os  aposentos  para  os  criados,  cocheiras, 
e  cavallarieas,  furmam  outro  corpo  de  edifício  ao 
lado  do  caminho  que  conduz  á  casa.  Os  apriscos, 
abegoaria  e  casa  do  caseiro,  são  feitas  com  egual 
esmero  de  gosto,  buscando  a  arte  meios  de  em- 
belesamento  na  sua  simples  e  rústica  architectura. 
Consistia  a  quinta  em  bello  bosque  de  antigos  car- 
valhos, que  vinham  terminar  junto  á  casa  em  um 
pomar  de  larangeiras  e  tangerinas.  Na  encosta  so- 
branceira ao  valle  aonde  esta  assentado  este  pomar, 
se  vê  uma  cascata  de  enormes  calhaus,  que  para 
alli  foram  conduzidos  expressamente,  esforçando-se 
por  este  modo,  com  tanto  trabalho,  o  artificio  hu- 
mano em  imitar  a  simplicidade  das  bellezas  da  na- 
tureza, sempre  magestosa  e  bella  nas  obras  da  sua 
creação.  Toma  esta  represa  as  aguas,  que  no  in- 
verno e  principio  da  primavera  descem  do  alto  da 
rra,  e  formam  uma  catarata,  que  se  despenha 
por  um  leito  pedregoso,  que  forma  a  parte  mais 
baixa  do  valle  d'esta  malta. 


192  NOVO   GUIA 

PenBia  Verde 

Esta  celebre  quinta  foi  mandada  plantar  por 
D:  João  de  Castro,  o  honrado  vice-rei  da  índia,  e 
legou-a  a  seus  herdeiros  com  a  condição  expressa 
de  não  se  plantar  ahi  arvore  alguma  de  fructo,  mas 
tão  somente  objectos  de  recreio ;  dizia  elle  que,  nem 
da  terra  queria  paga  pelos  serviços  que  lhe  fazia. 
Na  casa  annexa  encontrara-se  ainda  algumas  anti- 
guidades indianas,  e  o  retrato  de  D.  João  de  Cas- 
tro, tirado  do  natural.  Sentimo-nos  tomados  de  res- 
peito ao  dar  de  rosto  com  aquelle  olhar  grave,  com 
aquella  physionomia  varonil  e  franca.  Voltando  á 
quinta,  ainda  nos  parece  que  o  vice-rei  incorrupti- 
vel,  o  homem  probo  por  excellencia,  gyra  por  en- 
tre esses  troncos  carcomidos,  essas  arvores  sem 
fructo,  e  parámos  silenciosos  diante  da  cruz  de  ou- 
tras eras,  que  contemplou  ajoelhado  o  vencedor  de 
Diu. 

Regaleãra. 

Quinta  pertencente  cá  baroneza  do  mesmo  titulo; 
muito  amena,  e  abundante  de  aguas  erystallinas. 
Tem  uma  rica  cascata,  e  preciosos  mármores,  pra- 
dos sempre  verdes,  copado  arvoredo,  tudo  bello  e 
risonho.  Ê  um  dos  mais  predilectos  passeios  da 
gente  que  passa  o  verão  em  Cintra,  e  com  razão, 
que  nada  ha  mais  agradável  do  que  este  encanta- 
■  dor  logar. 


DO   VIAJANTE  i9){ 

Setiáes 

Formoso  campo,  que  termina  em  um  bom  palá- 
cio, pertencente  outr'ora  ao  marquez  de  Marialva, 
depois  ao  de  Louriçal,  e  hoje  dizem  que  ao  de 
Loulé.  Abi  assignaram  em  1808  a  convenção  qut; 
salvou  Portugal  da  invasão  franceza,  os  generaes 
Wellington  e  Junot.  No  campo  passeiam  á  tarde 
muitas  famílias,  e  é  outro  t  logar  de  rendez-vous 
como  a  Regaleira,  com  a  differença  de  este  ser  in- 
teiramente publico,  e  a  Regaleira  fechada  por  mu- 
ros e  portas,  que  só  se  transpõem  com  licença  dos 
habitantes  da  casa. 

Quinta  do  marquez  de  Pombal 

É  notável  entre  todas  as  ruas  de  arvoredo  que 
aformoseiam  este  logar,  uma  a  que  chamam  o  Pas- 
mo dos  Amores,  porque  é  de  tal  forma  coberta 
pelos  ramos  e  folhas  das  arvores,  que  nem  ao 
meio  dia  penetra  ali  o  sol.  Tem  também  além  da 
grande  abundância  de  aguas  puras,  uma  agua  fér- 
rea muito  estimada  para  enfermidades  de  estômago. 

Quinta  de  D.  Caetano 

Aqui  se  tomam  banhos  de  jorro  da  mais  crys- 
talina  agua  doce ;  é  n'este  logar  que  começou  ver- 
dadeiramente, ha  poucos  annos,  o  tratamento  de 
13 


194  NOVO    GUIA 

varias  enfermidades  pela  hydropathia,  ou  liydrosu- 
pathia,  em  Portugal.  Quanto  a  amenidade  do  sitio 
é  o  mesmo  que  as  precedentemente  indicadas,  e 
taes  outras  muitas  quintas,  que  não  mencionare- 
mos por  evitar  prolixidades  —  seus  donos  sâo:  os 
duques  de  Palmella,  de  Cadaval,  e  de  Lafões,  conde 
de  Redondo,  Reis,  e  outros. 

Palácio  e  quinta  do  duque  de  Saldanha 

Este  palácio  é  construído  em  um  género  estra- 
vagante  de  architectura,  que  logo  dá  na  vista  ao 
forasteiro ;  por  isso  o  mencionamos  em  separado, 
posto  que  nada  de  curioso  tenha  a  observar. 

Fonte  da  $a»uga 

Ás  abas  da  villa  está  esta  pequena  fonte,  cuja 
architectura  nada  tem  de  notável,  mas  afamada  pela 
salubridade  e  fresquidâo  da  sua  agua,  que  é  sem- 
pre fria  de  neve,  ainda  no  pino  do  meio  dia,  no 

mais  calmoso  verão. 

\ 

©s  Pisoes 

Fonte  e  passeio  agradável,  adiante  da  Regaleira, 
no  principio  da  estrada  de  Collares. 

Santa  Eufemia 

Logar  de  romaria  e  devoção  na  serra. 


DO   VIAJANTE  19^3 

Outras  muitos  logares  de  menos  nomeada  dei- 
xamos de  mencionar,  alias  teríamos  de  escrever  um 
livro  só  a  respeito  de  Cintra. 

HOSPEDARIAS 

Victor,  a  mais  antiga  e  mais  afamada  da  villa; 
Durand,  também  acreditada  ha  longo  tempo ;  Ho- 
tel d'Europe,  moderna  e  dependente  da  hospeda- 
ria do  mesmo  nome  em  Lisboa ;  François,  fora  da 
villa,  em  S.  Pedro  de  Penaferrim,  e  outras  de  me- 
nos luxo.  Antes  de  fechar  este  artigo  ainda  copia- 
remos duas  palavras  do  principe  Lichnowski,  ex- 
trahidas  das  suas  Recordações  de  Portugal,  pelas 
quaes  se  verá  que  até  os  estrangeiros  apreciam  es- 
tas agradáveis  paragens. 

«Quanto  mais  tempo  me  demorava  em  Cintra, 
tanto  mais  aprasivel  me  parecia,  e  mais  sonhada- 
mente  romântica ;  até  que,  quando  finalmente  me 
foi  forçoso  partir,  repassou-me  um  tão  intimo  des- 
gosto, que  de  todo  se  tornou  manifesto  para  mim, 
que  alli  havia  muito  mais  do  que  aquillo  que  a 
principio  haviam  descoberto  meus  olhos  profanos. 
O  pesar  da  minha  separarão  era  a  vingança  do  en- 
cantamento que  eu  desconheci.  Essas  frescas  vere- 
das cobertas  de  folhagem,  o  crescimento  mages- 
toso  e  exuberante  da  vegetação ;  as  cascatas  e  fri- 
gidos regatos,  as  montanhas  e  penedias,  a  pers- 
pectiva das  campinas  e  do  Oceano,  tudo  isso  nunca 


196  NOVO   GUIA 

o  esquecerei,  e  com  a  auctoridade  de  Byron  e  de 
Camões,  com  a  opinião  dos  poetas  e  dos  litteratos 
de  todos  os  tempos  proclamarei  Cintra  o  mais 
bello  de  todos  os  sítios  da  terra.» 

Ha  projecto  de  construir  um  caminho  de  ferro 
de  Lisboa  a  Cintra,  o  qual  porá  este  aprasivel  si- 
tio em  constante  contacto  com  a  capital. 

Ouçamos  o  que  diz  o  já  citado  escriptor  Gomes 
de  Amorim  a  respeito  de  uma  villa  que  próximo 
de  Cintra  se  projectava  construir,  a  qual  daria  muita 
importância  áquella  localidade  : 

«Depois  do  almoço  partimos  para  a  villa  Este- 
phania.  A  estrada  nova  de  Mafra  é  a  que  alli  con- 
duz, correndo  sempre  em  plano  direito.  Apezar  de 
não  ter  ainda  arvoredos  que  lhe  dêem  sombra,  o 
que,  em  Cintra,  é  uma  falta  de  côr  local  insuppor- 
tavel,  tornou-se  esta  estrada  passeio  predilecto  da 
população  elegante!  Será  de  um  kilometro,  pouco 
mais  ou  menos,  a  distancia  que  separa  as  duas  vil- 
las ;  no  caminho  ficam  a  quinta  dos  banhos  do  dou- 
che  e  a  escola  do  conde  de  Ferreira;  pouco  adiante 
da  povoação  nascente,  está  a  praça  de  toiros,  re- 
centemente construída.  Entra-se  para  a  villa  Este- 
phania  por  duas  ruas,  em  embryão,  dando  a  pri- 
meira accesso  para  as  casas  chamadas  do  quarteirão, 
que  são  dez,  e  communicando  a  segunda  com  as 
outras  treze  ou  quatorze,  que  se  acham  espalhadas, 
sem  symetria  ou  ordem,  a  noroeste  das  primeiras, 
A  posição  é  óptima ;  pôde  afíirmar-se  que  é  muito 


DO    VIAJANTE  197 

superior  á  de  Cintra,  que  lhe  fica  ao  sudoeste.  Está 
livre  dos  nevoeiros,  no  começo  da  charneca,  que  a 
lava  com  os  ventos  do  norte  e  a  perfuma  com  os 
cheiros  agrestes  e  salubres  de  seus  mattos  floridos. 
As  casas  da  villa  nova  Estephania  foram  todas  co- 
meçadas, haverá  uns  dezeseis  annos,  por  uma  com- 
panhia, que  principiou  também  em  Pedrouços  os 
aterros  para  o  caminho  de  ferro  de  Cintra.  Foi  pena 
que  essa  empresa  não  levasse  por  diante  o  seu  pro- 
jecto!  O  traçado  d'aqueUa  via  era  excellente!  A 
companhia  dissolveu-se  e  as  casas  ficaram  por  con- 
cluir. Quando  ultimamente  se  fez  leilão  d'ellas,  já 
dezeseis  invernos,  assalariados  por  Cintra  invejosa, 
lhes  tinham  mettido  os  tampos  dentro!  Foi  uma 
lastima!  Eram  bonitas  e  venderam-se  baratíssimas. 
As  casas  da  villa  Estephania  olham  todas  para  a 
villa  e  serra  de  Cintra;  dir-se -hia  que  contemplam 
a  sua  vizinha  com  ar  de  provocação  insolente.  E 
Cintra  não  deve  deixar-se  adormecer  com  o  orgu- 
lho das  suas  opulências,  se  quizer  conservar  a  sua 
superioridade.  A  escola  primaria  e  a  praça  dos  toi- 
ros—  duas  grandes  necessidades  para  os  portugue- 
zes!—  approximam-se  da  villa  Estephania;  a  quinta 
do  douche  deixou-se  partir  ao  meio  para  lhe  dar 
uma  estrada ;  a  estação  do  caminho  de  ferro  Lar- 
manjat  vae  senlar-se-lhe  ás  portas  do  seu  elegante 
quarteirão;  a  Granja  está  do  seu  lado;  Mafra  vê-a 
mais  de  perto  e  tudo  isto  quando  ella  não  tem  ainda 
um  único  habitante  í  Que  será  então  depois  de  re- 


198  NOVO   GUI  A 

edificadas  as  suas  formosas  casinhas,  ajardinados 
os  seus  terrenos,  e  provada  a  excellencia  e  supe- 
rioridade de  seus  ares  seccos  e  sadios?!  Já  Setiaes 
deserto  não  ouve  accordar  deliciosamente  os  seus 
eccos  pelas  vozes  melodiosas  de  encantadoras  pas- 
seantes;  em  vez  das  frescas  alfombras,  com  que 
afagava  outr'ora  os  pés  delicados  de  tantas  visita- 
doras,  só  cria  hoje  ignóbil  feno  para  sustento  de 
brutas  alimárias!  Passou  de  moda;  esqueceu;  foi 
trocado  por  uma  estrada  sem  verdura  e  sem  som- 
bras!... Acautela-te,  oh  Cintra!  Tu  podes  também 
ser  olvidada  um  dia  e  substituida  por  uma  rival 
desdenhada  agora!» 


COLLARES 

Esta  villa,  distante  cinco  léguas  de  Lisboa,  e  uma 
de  Cintra,  nas  faldas  de  cuja  serra  está  edificada, 
contém  mais  de  dois  mil  habitantes.  O  termo  d'esta 
povoação  produz  muita  excellente  laranja  e  fructa 
de  caroço,  o  afamado  vinho  tinto  do  seu  nome,  me- 
lhor que  o  mais  puro  Borgonha  e  Bordeaux.  A 
Várzea  é  o  mais  encantador  sitio  de  Collares ;  o 
rio  das  Maçãs  deslisando  suavemente  na  sua  base 
por  entre  viçosos  pomares,  e  sob  um  continuo 
toldo  de  verdura,  forma  como  uma  lagoa  no  sitio 
chamado  Tanque  da  Várzea ;  ahi  sente-se  o  doce 


DO  VIAJANTE  199 

murmúrio  das  aguas,  o  susurro  das  frondosas  ar- 
vores embaladas  pelo  vento,  uma  multidão  de  pás- 
saros com  seus  afinados  gorgeios;  vê-se  o  firma- 
mento e  o  arvoredo  espalhando-se  na  lisa  superfície 
do  lago,  ao  longe  a  serra  de  romântico  aspe- 
cto, uma  primavera  perenne,  um  Éden,  um  verda- 
deiro paraiso.  A  Mata  é  um  logar  também  delicioso ; 
um  denso  bosque  de  castanheiros,  que  fica  sobran- 
ceiro á  villa ;  e  o  Passeio  dos  Amores,  onde  pôde 
encontrar-se  logar  mais  digno  de  tal  nome. 

As  quintas  dos  seus  arredores,  muitas  em  nu- 
mero, são  também  afamadas  pelos  saborosos  fru- 
ctos  que  produzem,  pela  vegetação  gigantesca  que 
apresentam,  pelas  aguas  claríssimas  que  em  todas 
as  direcções  as  cortam ;  entre  todas  ellas  gosa  de 
uma  bem  merecida  celebridade  a  Quinta  do  Dias, 
passeio  obrigado  para  qualquer  que  vae  visitar  Gol- 
lares;  dedicar-lhe-hemos  duas  linhas  especiaes. 

Depois  de  percorridas  em  diversas  direcções  as 
compridas  ruas  de  arvoredo,  tendo  gosado  a  fra- 
grância de  varias  flores  em  bonitos  jardins,  e  con- 
templado os  tanques  cheios  de  ornatos,  e  abundan- 
tes de  agua,  —  com  a  alma  cheia  de  suave  melan- 
colia, pelo  susurro  das  cascatas,  o  ciciar  das  folhas 
e  troncos,  a  melodia  dos  rouxinoes,  —  sobe-se  a 
um  alto  mirante,  d'onde  se  descobre,  como  de  to- 
das as  eminências  d'estes  contornos,  um  quadro 
sempre  rico  de  galas  naturaes  e  adornos  da  mão 
do  homem,  e  todavia  variado  sempre. 


200  NOVO   GUIA 

N'aquelle  mirante,  meio  arruinado  como  toda  a 
quinta,  se  acham  milhares  de  nomes,  acompanhados 
de  pensamentos  vários  como  as  imaginações  que  os 
pruduziram,  por  que  todo  o  visitante  ahi  escreve  ao 
menos  as  iniciaes  de  seu  nome,  e  raro  deixa  de  lhe 
antepor  algum  desvario ;  força  é  confessal-o,  a  Índole 
poética  da  nação  não  se  patenteia  ahi  por  bons  ver- 
sos, nem  mesmo  por  fluente  prosa,  —  frivolidades 
é  o  que  se  encontra  ;  pois  o  logar  é  dos  mais  pró- 
prios para  inspirar  um  poeta  1 

A  praia  das  Maçãs,  por  baixo  de  Collares,  e  ba- 
nhada pelo  mar,  é  um  passeio  muito  frequentado 
no  tempo  de  banhos,  apesar  de  algumas  desgraças 
já  ahi  haveram  succedido,  pela  bravura  das  ondas 
contra  os  penhascos  da  serra.  Duas  meninas  de  boas 
familias,  e  os  homens  que  lhes  davam  a  mão  no  ba- 
nho, foram  victimas  do  furor  das  vagas,  escapando 
uma  outra  que  com  elles  estava  na  agua.  Este  triste 
successo  teve  logar  não  ha  muitos  annos. 

Próximo  de  Collares  ha  ainda  dois  sitios  que 
atraem  a  curiosidade  do  viajante,  chama-se  o  Fojo 
e  a  Pedra  tfAlvidrar.  O  primeiro  é  uma  aberta  ou 
abysmo  cavado  perpendicularmente  na  rocha  pela 
natureza,  e  teem  a  configuração  de  um  funil,  onde 
penetra  o  mar  subterraneamente  com  medonho  es- 
tampido, e  se  acoutam  aves  aquáticas,  e  outras  que 
os  habitantes  teem  por  agoureiras,  e  que  com  seus 
agudos  gritos  teem  espavorido  mais  de  um  viajante. 
O  segundo  é  uma  immensa  penedia  suspensa  sobre 


DO    VIAJANTE  201 

o  abysmo,  não  perpendicular  e  lisa,  como  muita  gente 
tem  dito  e  até  escripto  —  que  a  olhos  vistos  se  co- 
nhece a  sua  inclinação  e  ressaltos, — mas  ainda  é  um 
grande  atrevimento  o  que  pratica  quasi  toda  a  po- 
bre gente  da  visinha  povoação  de  Almoçageme,  que 
desce  e  sobe  a  Pedra  cFÂlvidrar,  com  a  maior  li- 
geireza !  Se  escapa  um  pé  a  qualquer  d:estes  des- 
graçados, vae  fazer-se  em  pedaços  sobre  penedos 
da  base,  onde  o  mar  ergue  flocos  de  espuma.  É  cu- 
rioso e  ao  mesmo  tempo  repugnante  esse  espectá- 
culo !  Firmes  nos  dedos  grandes  dos  pés  e  nos  das 
mãos.  sem  assentarem  os  calcanhares,  esses  homens, 
e  até  creanças,  deslisam  pela  penedia  afoutamente, 
e  trepam  em  seguida  com  a  mesma  rapidez. 

Quando  se  falia  das  bellezas  de  Cintra,  entende-se 
que  vão  incluidas  as  de  Collares  e  seus  arredores, 
porque  a  distancia  é  curta  de  uma  a  outra  villa,  e 
ainda  que  a  estrada  não  seja  óptima  é  comtudo  tâo 
povoada  de  casas,  quintas  e  jardins,  que  parecem 
encurtar  ainda  mais  a  distancia.  O  burrinho,  que  é 
o  vehiculo  usado  n'estas  peregrinações  de  Collares 
e  da  serra,  transporta  com  facilidade  e  economia  o 
viajante  de  um  a  outro  logar. 


■afiu 

A  três  léguas  de  Cintra  e  a  cinco  de  Lisboa,  está 
situada  a  villa  de  Mafra,  em  uma  planície  escalvada, 


202  NOVO   GUIA 

estéril,  e  deserta;  681  pés  acima  do  nível  do  mar. 
Esta  villa  é  notável  pelo  seu  sumptuoso  palácio  e 
basílica,  de  que  vamos  dar  uma  resumida  noticia. 

Acerca  da  origem  da  fundação  d'esta  egreja, 
diz-se  que  D.  João  v,  para  que  o  céo  lhe  conce- 
desse um  herdeiro,  fizera  voto  de  lhe  levantar  uma 
abbadki,  no  logar  em  que  existisse  o  mais  pobre 
convento  do  reino.  Depois  do  nascimento  de 
D.  José  i,  achou-se  que  ao  noroeste  de  Lisboa, 
havia  uma  cabana  habitada  por  poucos  frades  ar- 
rabidos,  que  reunia  as  condições  requeridas  pelo 
voto  do  monarcha.  Pouco  tempo  depois,  no  dia  17 
de  novembro  de  1717,  D.  João  v  foi  n'esse  mesmo 
logar,  lançar  a  primeira  pedra  dos  alicerces  da 
symptuosa  basílica  que  ainda  hoje  se  admira. 

A  fachada  principal,  que  olha  ao  poente,  divi- 
de-se  em  três  partes ;  no  meio  está  o  frontispício 
do  templo ;  para  o  sul  a  parte  do  palácio  denomi- 
nada residência  da  rainha ;  e  para  o  norte  a  outra 
parte,  chamada  residência  do  rei ;  ambas  tem  qua- 
tro pavimentos,  coroados  de  espaçosos  terraços, 
que  seguem  as  fachadas  do  palácio  em  dois  magní- 
ficos torreões,  que  se  elevam  cem  palmos  acima 
do  nivel  dos  terraços. 

Além  dos  torreões,  erguem-se  também  sobre  a 
frontaria  principal  o  zimbório  e  as  torres  lateraes 
da  egreja,  que  tem  314  palmos  e  meio  de  altura, 
desde  o  chão  até  á  grimpa,  e  são  rematadas  por  uma 
cruz  de  ferro,  que  com  os  respectivos  ornatos  peza 


DO    VIAJANTE  203 

226  arrobas,  e  está  elevada  sobre  a  cúpula  33  pal- 
mos. Cada  uma  das  torres  tem  um  carrilhão  com 
51  sinos,  que  pesam  14:300  arrobas.  O  sino  gran- 
de, que  dá  as  horas,  pesa  800  arrobas,  e  tem  de 
diâmetro  li  palmos  e  meio.  Estes  carrilhões  são 
de  singular  e  custoso  artificio,  tocam  differentes 
peças  de  musica  antes  de  darem  as  horas;  foram 
fabricados  em  Liège  e  importaram  com  o  transporte 
e  collocação  em  perto  de  três  milhões  de  cruza- 
dos. 

Nos  dois  palácios,  apezar  das  muitas  salas,  não 
se  nota  uma  só  que  corresponda  a  tanta  grandeza. 
A  sala  do  throno  tem  pinturas  a  fresco,  e  é  ornada 
com  grandes  cortinas  de  veludo  e  damasco.  Toda 
a  obra  de  alvenaria  é  excellente,  e  toda  a  madeira 
empregada  é  da  melhor  do  Brazil. 

No  frontispício  da  egreja  ha  seis  columnas  de 
trinta  palmos  com  capiteis  dóricos.  Tem  quatro 
estatuas :  as  que  estão  collocadas  aos  lados  da  ja- 
nella  principal  são  de  S.  Francisco  e  de  S.  Domin- 
gos, e  as  outras  duas,  de  Santa  Clara,  e  de  Santa 
babel.  Este  frontispício  termina  em  um  frontão, 
em  que  ha  um  grande  ovado  de  jaspe,  ornado  de 
flores  e  anjos,  que  circumdam  as  figuras  de  Nossa 
Senhora,  e  Santo  António,  que  de  joelhos  adora  o 
menino  Jesus. 

Nas  capellas  da  basílica,  e  no  vestíbulo,  chamado 
Gallilea,  estão  38  estatuas  de  mármore  e  de  jaspe, 
algumas  das  quaes  são  de  primoroso  lavor,  e  repre- 


204 


NOVO    GUIA 


sentam  os  fundadores  das  ordens  religiosas.  Umas 
tem  17  palmos  de  alto,  e  outras  11.  Cinco  portas 
dão  entrada  para  o  átrio,  cujo  pavimento  tem  116 
palmos  de  comprimento,  e  32  de  largo ;  e  três  do 
átrio  para  a  egreja. 

Ao  entrar  no  templo  fica  o  espectador  maravi- 
lhado a  contemplar  a  profusão  e  variedade  de  már- 
mores de  todas  as  cores,  primorosamente  lavrados ; 
os  bellos  mosaicos ;  os  estuques  apainelados ;  as  pre- 
ciosidades das  madeiras,  o  vistoso  dos  pavimentos, 
os  ornatos  e  accessorios  em  harmonia  com  tanta 
magnificência  e  riqueza.  Tem  esta  basílica  277  pal- 
mos, contados  da  porta  principal  até  ao  fundo  do 
altar-mór,  e  no  corpo  da  egreja  contam-se  75  pal- 
mos e  meio  de  largo. 

Tem  principalmente  dignas  de  menção,  entre  ou- 
tras, as  seis  columnas  de  mármore,  de  36  palmos 
de  altura,  que  estão  aos  lados  das  três  capellas  prin- 
cipaes,  e  muitos  baixos-relevos  de  mármore,  obra 
de  esculptores  portuguezes  (dirigidos  pelo  romano 
Giusti),  substituindo  os  quadros  das  capellas.  O  re- 
tábulo do  altar-mór  consta  de  um  bello  quadro  da 
escola  romana,  que  representa  Nossa  Senhora,  e 
Santo  António  —  padroeiros  titulares  da  casa ;  po- 
rém sobre  todas  estas  preciosidades  artísticas  avulta 
gigante  o  magestoso  zimbório,  que  se  levanta  do 
meio  do  cruzeiro.  Tem  a  cúpula  dobrada,  como  a 
da  egreja  de  S.  Pedro,  em  Roma,  isto  é,  tem  duas 
cúpulas  concêntricas  com  escadarias,  que  dão  ser- 


DO    VIAJANTE  205 

ventia  para  a  varanda,  que  circunda  o  zimbório  pela 
parte  de  fora  ;  e  d'onde  se  gosa  deliciosa  vista,  não 
só  para  o  interior  do  paiz,  como  também  para  o 
oceano.  O  remate  da  abobada  é  de  uma  só  pedra, 
e  tem  na  circumferencia  8  janellas ;  esta  pedra  tem 
44  palmos  em  redondo  e  13  de  alto. 

No  interior  d'esta  grande  fabrica  ha  muitas  ca- 
pellas  notáveis,  principalmente  a  chamada  dos  de- 
functos,  toda  forrada  de  mármore  negro,  a  da  en- 
fermaria, a  dos  prçsos,  a  capella  real,  etc. 

Os  limites  d'esta  obra  nâo  nos  consentem  parti- 
cularisar  mais  as  grandezas  d'este  edifício,  comtudo 
recommendamos  ao  estrangeiro  que  veja  os  para- 
mentos que  ainda  restam,  e  que  são  todos  de  seda, 
porque  a  austeridade  dos  religiosos  arrabidos  não 
lhes  permittia  usar  de  metaes  preciosos,  e  que  ainda 
assim  custaram  mais  que  todo  o  edifício  f  Veja  tam- 
bém a  casa  da  livraria,  que  Gca  no  dormitório  da 
parte  do  nascente,  e  tem  de  comprimento  381  pal- 
mos, e  de  largura  43;  podendo  conter  mais  de 
-25:000  volumes. 

Esta  immensa  obra  foi  delineada  pelo  architecto 
alemão,  João  Frederico  Ludovici,  no  estylo  d'archi- 
tectura  italiana  clássica.  Trabalharam  diariamente 
na  sua  construcção  de  20  até  25:000  pessoas,  e 
consta  pelos  róes  de  junho  a  outubro  de  1730  que 
n'esta  época,  estavam  empregadas  n'este  serviço 
45:000  pessoas,  incluindo  7:000  soldados ;  e  em 
maio  de  1731  ainda  trabalhavam  15:470  operários, 


206  NOVO   GUIA 

bem  que  a  egreja  tivesse  sido  sagrada  em  22  de 
outubro  de  4730. 

Tem  este  edifício  886  salas  e  quartos,  5:200 
portas  e  janellas  e  86  fontes  alimentadas  por  diver- 
sas nascentes. 

Cerca  todo  o  palácio  pela  parte  do  nascente  uma 
tapada  que  comprehende  o  circulo  de  três  léguas; 
é  abundante  em  caça,  em  fructas  e  hortaliças,  e  tem 
uma  caudelaria  real. 

Remataremos  este  artigo  dizendo  duas  palavras 
sobre  a  Granja-modélo  de  El-Rei,  porque  a  respeito 
da  villa  nada  mais  ha  a  mencionar  —  nem  ao  menos 
tem  uma  hospedaria  decente  para  receber  o  viajante. 

Conta  pouco  mais  de  três  mil  visinlios. 

Na  Tapada  real,  visinha  ao  templo,  se  fundou  a 
Granja-modêlo,  estabelecimento  agrícola  de  espe- 
rançosos resultados. 

Concederam-se  terrenos  a  alguns  habitantes  da 
villa,  mandaram-se  vir  da  Inglaterra  instrumentos 
aratorios  de  commoda  e  adequada  applicação :  gran- 
des tractos  de  terreno,  ha  pouco  incluídos  em  só  pro- 
ductores  de  sarças  e  arbustos  nocivos,  se  acham  já 
roteados  e  supplantados  por  úteis  sementeiras  e 
fructifero  arvoredo. 

Ouçamos  algumas  palavras  do  sr.  i.  Herculano, 
sobre  este  objecto : 

«  Ao  lado  dos  paços  monásticos  de  Mafra,  monu- 
mento de  uma  era  de  vãs  grandezas,  vae-se  alevan- 
tando  sem  ruido  o  monumento  modesto,  mas  elo- 


DO    VIAJANTE  207 

quente  e  santo,  da  idéa  progressiva  da  actualidade. 
Ao  lado  d'es$as  pedras  amontoadas,  d'esses  torreões 
gigantes,  macissos  e  pesadamente  estúpidos,  ser- 
peiam já  os  prados  virentes  por  veigas  e  valles,  co- 
bertos ainda  lia  pouco  de  abrolhos  e  urzes.  Contras- 
tando com  os  lanços  de  muralhas  caídas  da  ochre, 
que  amarrelleja  bestialmente,  como  um  cordão  de 
ouropel  enfiad-i  em  diamantes,  por  entre  a  còr  se- 
vera dos  mármores  tisnados  pelo  tempo,  véem-se 
ao  longe  verdejar  os  pinheirinhos,  que  coroam  as 
alturas  ao  norte  e  oriente  cTaquelle  edifício  mons- 
truoso, hybrido  e  extravagante  como  uma  pseudo- 
poetica  da  Phenix-renascida.  As  folhas  da  terra  cul- 
tivada dilatam-se  pelas  chapadas  e  encostas,  várias 
na  còr  segundo  a  altura  das  searas,  ou  conforme  a 
qualidade  do  solo. » 

Na  estrada  entre  Cintra  e  Mafra,  enconíra-se  a 
pequena  povoação  de  Pêro  Pinheiro,  de  cujas  pe- 
dreiras se  extraíram  e  extraem  ainda  excellentes 
mármores  de  varias  cores,  que  muito  serviram  na 
edificação  do  templo  de  Mafra,  bem  como  o  már- 
more negro  de  Collares,  que  ali  se  admira  abun- 
dantemente. O  resto  do  caminho  é  pouco  engraçado. 

De  Lisboa  para  Mafra  a  estrada  é  a  mesma  de 
Cintra  até  ao  Cacem,  onde  se  toma  nova  direcção 
por  trilhos  menos  bem  gradados  do  que  a  estrada 
real  de  Cintra,  que  é  a  melhor  de  Portugal,  como 
já  dissemos. 


208  NOVO   GUIA 

Acabando  a  breve  descripção  de  Cintra,  Collares, 
e  Mafra  vamos  occupar-nos  com  alguns  pontos  mais, 
distantes  da  capital,  que  todavia  são  dignos  da  at- 
tenção  do  viajante  curioso. 


SETÚBAL 

A  sete  léguas  de  Lisboa  ao  sul  do  Tejo  está  a  ci- 
dade de  Setúbal  situada  nas  risonhas  margens  do 
rio  Sado,  navegável  por  embarcações  de  grande  lote. 

Setúbal,  modernamente  elevada  á  cathegoria  de 
cidade,  não  diremos  que  seja  de  grande  importân- 
cia em  população,  ou  movimento  commercial,  toda- 
via, a  sua  proximidade  com  a  capital,  e  sobretudo 
o  seu  ramal  de  caminhos  de  ferro,  deu-lhe  ultima- 
mente mais  animação. 

A  cidade  é  toda  edificada  á  beira  do  rio,  apre- 
sentando por  este  modo  um  bello  e  continuado  litoral. 
Ao  lado  do  nascente,  pouco  menos  de  um  terço,  de- 
nomina-se  Fontainhas,  o  centro  chama-se  Setúbal, 
e  a  extrema  esquerda  intitula-se  Troino,  bairro  ha- 
bitado por  pescadores. 

A  gare  do  caminho  de  ferro  foi  construída  no  sitio 
de  S.  João,  onde  existiu  um  antigo  convento  de  re- 
ligiosas, e  transformado  hoje  em  casa  de  habitação ; 
na  cerca  do  referido  mosteiro  fizeram  uma  praça 
de  toiros,  que  na  estação  própria  é  bastante  concor- 


DO    VIAJANTE  209 

rida,  não  só  pelos  naturaes  cTaquelles  sítios,  como 
pelos  habitantes  da  capital  que  amara  tão  feroz  e 
grosseira  divisão. 

Ao  lado  direito  encontra-se  uma  estrada  pouco 
extença  que  communica  com  o  rocio,  ou  campo  do 
Senhor  do  Bom  Fim,  cuja  ermida  construída  no 
fundo  é  de  pobre  apparencia,  mas  tem  um  rico  in- 
terior posto  que  bastante  damnificado.  Esta  ermida 
é  notável  pela  grande  devoção  dos  setubalenses,  e 
com  especialidade  pelos  marítimos. 

O  campo  do  Senhor  de  Bom  Fim  é  digno  de  apre- 
ciação pela  sua  extença,  e  por  ter  no  centro  o  jar- 
dim publico,  orlado  de  magestosas  arvores  secula- 
res, com  uma  fonte  de  crystallinas  aguas,  etc. 

A  praia  é  magnifica  pela  sua  magnitude,  e  pela 
limpidez  das  suas  aguas;  tem  um  forte  chamado  de 
S.  Filippe  o  qual  defende  a  entrada  do  porto.  A  barra 
tem  uma  torre  de  construcção  antiga. 

Setúbal  tem  algumas  egrejas  de  boa  apparencia. 
porém  a  mais  digna  de  nota  é  sem  duvida  o  con- 
vento de  Jesus,  cuja  construcção  se  assemelha,  ain- 
da que  mui  inferiormente,  á  egreja  dos  Jeronymos 
de  Belém,  e  é  de  crer  que  a  sua  fundação  seja  de 
egual  data. 

A  primeira  rua  que  se  encontra  á  entrada  do 

campo  é  bella,  bastante  longa  e  arborisada.  Ahi  foi 

construído  o  theatro  chamado  Bocage,  de  soffrivel 

apparencia,  e  único  que  existe  em  Setúbal.  Tem  um 

commodo  hospital,  com  uma  bella  egreja.  Possue 
14 


210  NOVO   GUIA 

um  bom  quartel  na  praia  em  frente  do  cães,  um 
bonito  largo  chamado  Palhaes  e  a  praça  do  Sopa],- 
hoje  denominada  praça  do  Bocage. 

A  sua  alfandega  é  muito  decente,  e  em  toda  a 
cidade  existem  muitas  casas  de  commercio  nacio- 
naes  e  estrangeiras. 

É  uso  fazer-se  em  Setúbal  uma  feira  de  differen- 
tes  mercadorias,  no  dia  de  S.  Thiago  (em  agosto), 
a  qual  é  muito  concorrida. 

Próximo  á  torre  e  barra  de  Setúbal  encontra-se 
uma  praia  chamada  o  portinho  da  Arrábida,  que  dá 
accesso  para  a  serrania  da  mesma  denominação,  onde 
ha  um  convento  antigo  e  muitas  outras  curiosidades 
dignas  da  attenção  do  viajante  curioso. 

Do  lado  opposto  a  Setúbal  existem  as  ruinas  de 
Catubriga,  vulgarmente  chamada  Tróia,  onde  em 
escavações  profundas  se  teem  encontrado  vasos,  me- 
dalhas e  outros  muitos  objectos  de  remotíssima  data, 
verdadeiras  jóias  para  os  archeologicos. 

Ê  este  um  dos  logares  que  não  deve  ser  esque- 
cido por  quem  se  propozer  a  visitar  a  pátria  do  nosso 
estimado  poeta  Bocage. 

Setúbal  tem  bellos  pontos  de  vista,  taes  como 
S.  Paulo,  Bramcanes,  e  os  moinhos,  onde  foram 
construidos  os  cemitérios  um  para  nacionaes,  muito 
decente  e  com  uma  ermida  de  recente  construcçâo, 
e  outro  para  estrangeiros,  egualmente  de  boa  ap- 
parencia.  Nos  seus  arredores  se  encontram  lindas 
e  vastíssimas  quintas,  que  produzem  abundante  e 


DO  VIAJANTE  211 

saborosa  fructa  de  todo  o  género,  asism  como  a  ex- 
cellente  laranja,  tradiccional  por  sua  bondade  e  que, 
tanto  apreço  tem  para  exportação. 

O  trajecto  de  Lisboa  a  Setúbal  faz-se  hoje  com  a 
maior  commodidade.  O  viajante  embarca  n'um  va- 
por que  conduz  ao  Barreiro,  (lado  opposto  lo  Tejo) 
entra  em  seguida  na  bella  e  magnifica  es'  çâo  dos 
caminhos  de  ferro,  e  em  breve  tempo  é  transpor- 
tado a  Setúbal,  d'onde,  se  quizer,  pôde  voltar  sem 
encommodo  no  mesmo  dia  a  Lisboa. 

Na  antiga  praça  do  Sopal,  hoje  praça  de  Rocage, 
está  edificado  um  modesto,  mas  elegant  monu- 
mento erigido  ao  poeta  improvisador,  que  )olo  seu 
merecimento  honra  a  terra  em  que  nasceu. 


SANTARÉM 

Quasi  no  centro  da  província  da  Extremadura, 
sobre  a  margem  direita  do  Tejo,  obra  de  15  léguas 
distante  da  sua  foz,  está  assentada  a  nobre  cidade 
de  Santarém,  n'uma  situação  elevada,  deliciosa  e 
pittnrescn.  Este  local  montuoso,  contrastando  com 
a  margem  esquerda  do  rio  mui  baixa,  produz  uma 
bellissima  prespectiva. 

Comprehende  a  cidade  três  grandes  bairros.  O 
maior  que  chamam  Marvilla,  fica  na  parte  superior 
e  plana  na  montanha,  contigua  a  extensos  olivaes. 


212  NOVO  GUIA 

por  onde  abrem  aprasiveis  caminhos  as  estradas  que 
conduzem  ao  alto.  Esta  parte  é  guarnecida  de  cerca 
ameiada  com  torres  e  cubellos,  e  em  alguns  sitios 
com  barbacans ;  e  do  mesmo  modo  a  Alcáçova,  cas- 
tello,  ou  cidadella  árabe,  que  coroava  a  altura  mais 
próxima  ao  Tejo.  Da  parte  que  esta  olha  para  a  ci- 
dade, que  é  do  lado  do  poente,  ha  vestigios  de  for- 
tificações muito  modernas,  abaluartadas  com  gua- 
ritas nos  ângulos,  e  que  parecem  ser  obra  do  rei- 
nado de  D.  Affonso  vi. 

O  primeiro  nome  de  que  ha  memoria  que  os  an- 
tigos lusitanos  dessem  a  esta  cidade  foi  Scalabis,  e 
também  Scalabicastrum.  O  segundo  Julium  Prce- 
sidium,  em  obsequio  ou  honra  a  Júlio  Gesar,  quando 
já  toda  a  Lusitânia  estava  constituída  colónia  ro- 
mana, e  se  dava  por  grande  distincçâo,  este  titulo 
ás  suas  melhores  cidades  e  villas ;  e  foi  pelos  fins 
do  7.°  século  da  era  vulgar,  que  um  successo  ma- 
ravilhoso e  de  grande  assombro  deu  o  nome  de 
Santa  Irene,  depois  Santarém  a  esta  muito  nobre 
e  sempre  leal  cidade  que  conserva  vae  já  por  12 
séculos,  como  lustre  epitaphio  da  santa  virgem 
Irene. 

De  qualquer  lado  que  se  queira  entrar  para  a 
cidade  ha  de  subir-se  primeiro  uma  das  nove  cal- 
çadas que  ali  conduzem,  e  se  denominam  : 

l.a  Da  Atamarma,  nome  que  se  lhe  corrompeu 
de  Temarma  que  tinha  no  tempo  dos  mouros,  que 
no  seu  idioma  arábico  é  o  mesmo  que  dizer  aguas 


DO  VIAJANTE  213 

amargosas.  Ainda  hoje  próximo  d'esta  calçada  ha 
vestígios  d'uma  fonte  de  taes  aguas. 

2.*  De  Santa  Clara  que  começa  como  a  primeira 
na  povoação  do  bairro  da  villa  denominada  Ribeira. 

3.a  De  Sâo  Thiago,  a  qual  hoje  está  quasi  intran- 
sitável, que  começa  junto  da  egreja  de  Santa  Iria  no 
dito  bairro,  e  acaba  na  porta  d'Alcaçova,  outr'ora  o 
castello  da  cidade. 

4.a  DWlfange  que  principia  no  bairro  assim  cha- 
mado. 

5.a  De  Nossa  Senhora  de  Vallada,  Madre  de  Deus, 
ou  omnias,  que  começa  nas  omnias  e  acaba  na  rua 
do  Pereiro. 

6.a  Junqueira  que  também  começa  nas  omnias  e 
finda  no  sitio  de  S.  Lazaro. 

7.a  Do  sitio,  ou  das  Pedreiras  que  conduz  dire- 
ctamente de  Lisboa  a  Santarém,  acabando  ao  pé  do 
hospital  civil. 

8.a  De  S.  Domingos. 

9.a  Do  Monte  ou  de  Nossa  Senhora  do  Monte. 

Tinha  a  cidade  oito  portas,  de  algumas  das  quaes 
ainda  ha  vestigios.  Atamarma  por  onde  no  dia  8  de 
maio  de  1147  entrou  D.  AíTonso  Henriques,  dando 
batalha  aos  mouros,  e  tomando  a  villa;  Leiria  junto 
da  egreja  de  Nossa  Senhora  da  Piedade ;  Mansos, 
onde,  em  uma  capellinha,  está  a  Senhora  do  Bom 
Successo ;  Vallada  ou  da  Madre  de  Deus ;  São  Thia- 
go junto  á  que  fechava  o  castello,  a  que  actual- 
mente se  chama  Alcáçova ;  do  Sol  no  mesmo  cas- 


214  NOVO    GUIA 

tello,  a  qual  fica  sobre  um  eminente  despenhadeiro 
que  cáe  sobre  o  rio  Tejo,  e  ali  justiçavam  os  mou- 
ros os  criminosos,  lançando-os  ao  mesmo  rio  :  d'Àl- 
fange,  antes  Alhance;  de  S.  Geno,  por  haver  en- 
trado por  ella  o  santo  d'este  nome ;  do  postigo, 
outfora  Postigo  de  D.  Margarida,  mãe  de  D.  Fran- 
cisco de  Távora  e  Castro,  que  casou  com  o  1.° 
conde  d'Unhâo  Fernão  Telles  de  Menezes  da  Sil- 
veira, cuja  primeira  senhora  tinha  uma  casa  junto 
da  mesma  porta.  Em  todas  as  grandes  terras  que 
eram  fechadas  chamavam-se,  por  costume,  ás  por- 
tas postigos.  Estas  portas  e  os  muros  da  villa  fo- 
ram obra  dos  romanos,  e  depois  dos  Godos  que 
lhes  deram  nova  força  com  fortes  baluartes. 

Santarém  ainda  actualmente  apresenta  demons- 
trações da  antiguidade  da  sua  fundação.  Por  ella 
passava  a  via  militar  romana,  que  ia  de  Lisboa  a 
Mérida,  resultando  do  itenerario  de  Antonino  que 
a  distancia  entre  a  primeira  e  Santarém  era  de  52 
milhas,  que  com  pouca  differença  são  as  14  léguas 
que  hoje  se  contam  entre  ambas.  O  architecto  e 
pintor  Francisco  de  Hollanda  diz  que  em  seu  tem- 
po ainda  se  conheciam  vestigios  da  ponte  por  onde 
a  estrada  militar  passava  sobre  o  rio,  e  esta  obra 
que  devia  ser  grandiosa,  como  todas  as  dos  roma- 
nos, sem  duvida  que  não  pôde  resistir  á  corrente 
impetuosa  do  Tejo,  e  á  abundância  d'arêas  com 
que  a  obstruiria  e  prepararia  a  sua  ruina.  Se  po- 
rém hoje  nada  existe  que  annuncie  a  grandeza  ro- 


DO   VIAJANTE  21fí 

mana,  bastantes  sâo  os  testemunhos  que  provam 
o  demónio  dos  árabes.  Os  edifícios  de  que  já  faltá- 
mos ;  o  gosto  da  architecturacom  columnas  esguias 
e  circumdadas  de  arabescos  e  florões,  que  se  acham 
ao  longo  das  cercas  e  no  interior  da  cidade,  os  seus 
arcos  e  postigos  mostram  a  importância  d'esta  terra 
em  poder  dos  mouros,  de  que  a  libertou  pela  pri- 
meira vez  D.  Affonso  vi  de  Castelía  em  1093.  Cer- 
cada porém  novamente  pelos  árabes,  e  vendo-se 
os  moradores  faltos  de  viveres  tiveram  de  render- 
se  aos  bárbaros,  de  cuja  tyrannia  a  resgatou  para 
sempre  em  maio  de  i  1 47  o  nosso  illustre  D.  Af- 
fonso Henriques,  que  lhe  concedeu  grandes  privi- 
légios e  exempçôes. 

Da  estação  do  caminho  de  ferro  (na  Ribeira)  para 
Marvilla  deve,  quem  se  prepozer  visitar  Santarém, 
caminhar  por  uma  das  duas  calçadas  —  Atamarma, 
ou  Santa  Clara.  —  Querendo  antes  tomar  alguma 
refeição,  tem  na  Ribeira  ama  Hospedaria  —  deno- 
minada do  —  Joaquim  Curto. 

Antes  de  entrar  em  qualquer  das  duas  ditas  cal- 
çadas, encontrará  o  magestoso  chafariz  chamado  de 
Palhaço  —  com  duas  bicas,  por  onde  corre  fina  e 
potável  agua. 

Na  Ribeira  ha  um  monumento,  que  por  antigo,  é 
digno  de  verse.  — A  torre,  ou  pedestal  denominado 
de  —  Santa  Irene,  Santa  Iria,  edificado  na  praia 
junto  do  Tejo,  sobre  o  tumulo  da  mesma  Santa.  — 
Segundo  nos  diz  a  historia  de  Santarém  — foi  a  Rai- 


216  NOVO  GUIA 

nha  Santa  Isabel,  mulher  de  El-Rei  D.  Diniz,  quem, 
no  anno  de  1295,  mandou  levantar,  d'alvenaria,  o 
dito  pedestal  alto,  e  no  anno  de  1644,  o  senado  da 
camará  de  Santarém,  a  requerimento  do  povo,  o 
fez  guarnecer  de  cantaria  lavrada,  dando-lhe  mais 
altura.  No  remate  d'este  se  collocou,  e  ainda  hoje 
existe,  uma  imagem  da  referida  Santa,  feita  de  pe- 
dra, que  tem  6  tya  palmos  (Valtura,  e  a  defende  da 
chuva  uma  formosa  bandeja  ou  cupola  de  metal  la- 
vrado. 

Examinado,  detidamente  que  seja,  o  monumento 
de  que  acabamos  de  tratar,  deve  o  viajante  dirigir-se 
a  Marvilla  pela  calçada  da  Atamarma. 

Os  edifícios,  templos,  monumentos  antigos  mais 
principaes,  e  os  melhores,  excellentes  e  mais  no- 
táveis pontos  de  vista,  que  ahi  ha,  são  os  seguin- 
tes que  o  viajante  deve  procurar  pela  ordem  com 
que  vão  indicados,  a  fim  de  aproveitar  bem  todo  o 
tempo. 

No  fim  da  calçada  d'Atamarma,  ao  entrar  para 
a  cidade,  encontrará  a  porta  denominada  Atamar- 
ma, e  depois  irá  ver: 

1 .°  —  O  edifício  dos  Paços  do  Concelho  na  praça 
e  igreja  de  Nossa  Senhora  de  Marvilla. 

2.°  —  O  edifício  do  extincto  convento  do  Carmo 
onde  estão  —  a  Repartição  dos  pesos  e  medidas  — 
Administração  Central  do  Correio  —  Typographia  do 
Governo  Civil  —  Estação  do  Telegrapho  eléctrico  — 
Recebedoria  da  Comarca  —  Repartição  de  Fazenda 


DO  VIA  JANTE  217 

do  Districto  —  Dita  do  Concelho  —  Direcção  das 
Obras  Publicas,  todas  no  primeiro  pavimento  —  e 
no  segundo  —  Governo  Civil  —  Administração  do 
Concelho  e  sala  das  sessões  da  Junta  Geral  do  Dis- 
tricto ao  pé  de  cuja  sala  ha  uma  linda  varanda,  e 
d'ella  se  gosa  um  magnifico  ponto  de  vista. 

3.° —  Torre  denominada  das  cabaças,  onde  está 
o  sino  do  relógio  da  Camará  Municipal. 

Esta  torre  tem  de  altura  até  á  cimalha  22  bra- 
ças; e  nella  está  collocado  um  grande  sino,  cujo 
som  é  repercutido  por  sete  bilhas  quebradas  de- 
penduradas em  varões  de  ferro  por  cima  da  cúpula 
onde  está  o  sino,  o  qual  só  corre  quando  ha  novi- 
dade extraordinária,  ou  em  occasiões  de  publico 
regosijo.  Foi  sem  duvida  com  o  fim  de  repercutir 
o  som  que  ali  se  pozeram  as  bilhas ;  o  vulgo  po- 
rém quer  induzir  do  seu  numero,  que  o  intuito  era 
representar  os  sete  membros  da  Camará.  As  bilhas 
intitulam-se  cabaças,  e  d'ahi  veio  o  nome  corrente 
de  torre  das  cabaças. 

4.°  —  Edifício  de  S.  João  d'Alporão  (hoje  thea- 
tro),  segundo  a  tradição  é  obra  dos  Mouros  ou  Go- 
dos. 

o.°  —  Alcáçova  —  Ahi  existe  a  igreja  da  real  col- 
legiada  que  deve  ser  vista  —  a  Porta  do  Sol  e  cas- 
tello  de  que  acima  faltámos. — Em  qualquer  des- 
tes sitios  o  ponto  de  vista  é  encantador,  —  mor- 
mente em  occasião  de  cheias. 

6.°  — Edifício  do  extincto  convento  da  Graça 


218  NOVO  GUIA 

cuja  igreja  é  uma  das  melhores  de  Santarém,  se- 
não a  mais  bella  de  Portugal. 

7.° —  Alto  dos  Capuchos,  junto  ao  Cemitério,  as- 
sim denominado  —  Portas  de  Valiada,  oiteiro  da 
Forca  —  o  primeiro  e  terceiro  sitios  também  sâo 
óptimos  pontos  de  vista. 

8.°— -Igreja  de  Santo  Estevão  do  SS.  Milagre  da 
Hóstia.  Quem  vier  a  Santarém  no  domingo  da  Pas- 
choella  e  nos  dois  dias  seguintes  tem  occasião  de 
ver  este  prodígio. 

O  Milagre  da  Hóstia  succedeu  em  1247  em  uma 
casa  depois  ermida,  no  anno  de  1654,  situada  na 
Rua  das  Esteiras. 

9.°  —  Edifício  e  egreja  da  irmandade  da  Miseri- 
córdia —  o  frontispicio  é  todo  de  cantaria  e  obra 
de  gosto.. 

10.°  —  Porta  de  Mansos,  hoje  conhecida  por  arco 
de  Bom  Successo. 

1 1.°  —  Sacapeito  —  Monte  de  Cravos  —  Monte  do 
Abbade,  lindos  pontos  de  vista. 

12.°  —  Edifício  do  extincto  eonvento  do  Sitio 
hoje  Hospital  civil. 

13.°  —  Alto  casai  da  Rafôa,  também  óptimo  pon- 
to de  vista. 

14.°  —  Praça  de  Touros,  matadouro,  no  edifício 
do  extincto  convento  de  S.  Domingos. 

15.°  —  Alto  de  Nossa  Senhora  do  Monte  —  sobre 
o  norte  e  poente,  e  é  mais  que  muito  lindo  ponto 
de  vista. 


DO   VIAJANTE  219 

16.°  —  Edifício  do  famoso  collegio  dos  padres  da 
extincta  companhia  de  Jesus  —  hoje  Seminário  Pa- 
triarchal.  N'este  mesmo  edifício  ha  um  magnifico 
templo,  e  estão  estabelecidas  as  aulas  do  Lyceu 
Nacional.  — é  tudo  digno  de  ver-se. 

Igreja  de  Nossa  Senhora  da  Piedade  no  edifício 
do  extincto  convento  da  Piedade,  cuja  igreja  é  de 
exquisita  architectura. 

17.°  —  Edifício  dos  extinctos  conventos  da  Trin- 
dade e  S.  Francisco,  hoje  constituem  ambos  o  quar- 
tel de  cavallaria  n.°  4  —  Junto  da  igreja  d'este  ul- 
timo ha  uma  capella  onde  está  o  tumulo  de  D. 
Duarte  de  Menezes,  obra  de  delicada  archite- 
ctura. 

18.°  — Alto  do  oiteiro  de  S.  Bento,  óptimo  e  en- 
cantador ponto  de  vista  que  domina  até  grande  ex- 
tensão, e  d'onde  se  ?ô  a  estação  do  caminho  de 
ferro  na  Assacaia  do  Bairro  da  Ribeira. 

iV.B.  O  viajante  desce  em  seguida  á  calçada  de 
Santa  Clara,  e  lá  vae  outra  vez  para  a  estação  do 
caminho  de  ferro  na  Ribeira,  afim  de  ser  condu- 
zido n'um  wagon  até  onde  l/ie  parecer  ou  lhe  con- 
vier, e  sempre  se  lembrará  com  indisivcl  saudade 
dos  encantadores  e  surprehendcntes  pontos  de  vista 
que  gatou  Ha  antiga  scalabis. 


220  NOVO   GUIA 

BATALH4 

O  brasão  da  architectura  gothica  em  Portugal,  e 
o  mais  singular  entre  os  edifícios  grandiosos  das 
Hespanhas,  é  o  real  mosteiro  de  Santa  Maria  da  Vi- 
ctoria,  chamado  vulgarmente  da  Batalha.  É  o  pa- 
drão magnifico  levantado  á  honra  da  religião,  ao 
valor  portuguez,  e  á  independência  e  gloria  nacio- 
nal pelo  defensor  da  pátria,  o  monarcha  cavalleiro, 
D.  João,  o  primeiro  do  nome,  e  o  decimo  na  serie 
dos  nossos  reis.  Objecto  de  vangloria  para  os  por- 
tuguezes  e  de  assombro  para  os  estrangeiros,  me- 
receu que  o  descrevesse  a  elegante  penna  de  fr. 
Luiz  de  Sousa,  e  d'essa  descripção  copiamos  o  se- 
guinte : 

« Da  parte  de  fora  da  egreja  ha  duas  estradas, 
uma  que  faz  a  porta  principal,  e  outra  a  travessa, 
que  toma  o  topo  do  cruzeiro  fronteiro  ao  altar  de 
Jesus...  O  portal  e  o  frontispicio  da  principal  me- 
recia só  um  livro  pela  qualidade  da  obra,  se  hou- 
véramos de  particularisar  tudo  o  que  n'ella  ha  de 
columnas,  de  figuras,  de  lavores  e  variedades  de 
feitios,  desde  a  primeira  pedra  que  descobre  sobre 
a  terra  até  o  remate,  que  levanta  grande  altura  so- 
bre a  maior  aboboda.  Porque  cada  palmo  tem  tanto 
que  ver  de  delicadeza  e  artificio,  de  trabalho  e  ma- 
gestade,  que  considerado  com  attenção  impossibi- 
lita o  engenho,  e  embota  a  penna,  para  o  declarar- 
mos e  se  entender  com  todas  suas  partes.  Só  um 


DO  VIAJANTE  221 

espelho,  que  se  abre  no  alto  em  meio  do  frontis- 
pício, para  dar  luz  dentro,  parece  que  se  não  podia 
obrar  com  mais  subtileza  e  cuidado  em  trancinhas 
de  agulha  ou  em  lavor  de  cera,  ou  no  espelho  de 
uma  viola :  e  quadra-lhe  bem  esta  ultima  compara- 
ção pela  forma  circular  e  redonda,  e  pela  represen- 
tação e  miudeza  de  feitio.  Os  vãos  que  na  viola  fi- 
cam abertos  para  dar  logar  ás  vozes,  que  forma  no 
interior,  ficaram  cá  cerradas  de  vidraças...  debuxa- 
das todas  de  cores  finas  e  pinturas  varias  de  armas 
e  devisas  do  reino,  de  tenções  e  emprezas  de  el-rei. 
E  como  são  muitos  os  vãos  porque  o  circulo  é  muito 
dilatado,  communica  dentro  muita  claridade,  e  pega 
com  a  graça  das  cores  o  que  ellas  lhe  diminuem  na 
pureza  da  lua.  Mas  faz  pasmar  a  firmeza  com  que 
se  mantém  obra  tão  miúda  tantos  annos  ha  em  lo- 
gar tão  alto.  Não  espanta  menos  firmeza,  numero, 
e  grandeza  de  outras  vidraças  que  dão  luz  á  egreja 
e  cruzeiro.  Só  no  corpo  da  egreja  abrem  30  fres- 
tas, todas  tão  rasgadas  de  alto  a  baixo,  e  ao  res- 
peito e  proporção  tão  largas  que,  em  noite  clara, 
sendo  a  casa  tão  descompassada  de  grande...  e  a 
luz  das  vidraças  em  parte  embotada  com  a  pintura 
e  cores...,  pode-se  estar  n'ella  não  só  sem  pavor, 
mas  como  em  meio  de  uma  praça.  NIo  será  desa- 
gradável declararmos  a  medida  de  algumas  que  fi- 
zemos tomar,  para  credito  do  que  dizemos,  por  mão 
do  architecto.  No  alto  da  nave  do  meio  ha  16  frestas, 
a  8  por  banda,  que  sobem  18  palmos  até  os  capi- 


222  NOVO   GUIA 

teis,  e  tem  de  largura  9,  dividida  cada  uma  com  2 
pilares,  de  grossura  de  um  palmo  cada  pilar,  para 
firmeza  das  vidraças.  Assim  ficam  em  cada  fresta  7 
palmos  de  vidro  e  luz,  que,  multiplicados  pelos  18 
de  altura,  fazem  126.  As  duas  naves  teem  ambas  12 
frestas:  4  do  sul,  em  que  fica  encostada  a  capella  do 
fundador;  e  8  a  contraria.  Cada  fresta  22  palmos  de 
alto  e  7f/«  de  largo.  E  porque  também  são  divididas 
a  2  pilares  de  grossura  de  pa.lmo,  como  as  da  nave 
do  meio,  ficam  com  54/a  palmos  de  vidro,  e  vem  a 
ter  cada  fresta  por  esta  conta  121  palmos  de  aber- 
tura e  luz,  e  outras  tantas  de  vidraça.  Da  mesma  al- 
tura e  largura  d'estas  ha  outras  duas  frestas,  que 
acompanham  a  porta  principal,  uma  de  cada  lado, 
e  fazem  o  numero  que  dizemos  de  30.  E  vem  a 
ser  uma  tamanha  quantidade  de  vidraças,  que  por 
cousa  prodigiosa  se  pode  ter  entre  as  que  mais  es- 
pantam d'esta  casa.  Ajudam  a  claridade  outras  três 
no  cruzeiro,  das  quaes  só  uma  que  fica  sobre  a 
porta  travessa  sobe  42  palmos,  e  tem  de  largo  14 ; 
lavrada  toda  de  uma  artificiosa  rede  de  pedraria,  e 
os  vãos  tomados  de  suas  vidraças.  Estas  com  as 
da  capella-mór  e  collateraes,  afora  o  espelho  do  fron- 
tispício da  porta  principal,  que  allumia  por  muitas, 
fazem  a  casa  por  extremo  alegre  e  muito  clara  e 
bem  assombreada.  O  que  me  faz  cuidar  que  sendo 
assim  que  n'esta  mesma  conjuncção  teve  também 
principio  o  famoso  templo  da  sé  de  Milão  (chamam- 
lhe  lá  il  Domo)  o  qual  se  começou  a  fabricar  em 


DO   VIAJANTE  223 

vida  do  pontífice  Urbano  vi,  que  presidiu  na  egreja 
de  Deus  li  annos  até  o  de  1389,  e  ficou  com  taxa 
de  escuro  e  melancólico ;  deviam  esmerar-se  os  ar- 
chi tectos  d'este  nosso  em  a  fazer  por  contraposição 
em  todo  o  extremo  claro  e  bem  assombreado.  De- 
fendem os  milanezes  e  seus  artífices,  attribuindo  a 
conselho  e  bom  juiso  o  que  foi  defeito  e  culpa  ;  e 
dizem  que  como  geralmente  é  havido  por  mais  grave 
e  de  mais  pessoa  o  homem  carregado  e  feio,  as- 
sim faz  mais  devoção  a  igreja  sombria  e  escura. 
Mas  não  me  convencem,  porque  dado  que  o  argu- 
mento seja  verdadeiro  quanto  aos  homens :  aos  tem- 
plos, que  são  retrato  do  céo,  e  assento  da  luz  eterna 
não  parece  razão  haver  nenhum  commercio  com  o 
horror  das  trevas.  E  tornando  á  historia,  estão  es- 
tas vidraças  todas  tão  fortes  no  assento,  tão  crys- 
tallinas  na  vista,  e  tão  vivas  nas  cores,  que  pas- 
sando já  de  duzentos  annos  que  servem,,  parecem 
na  representação  obra  moderna. 

Cobre-se  esta  igreja  e  abobada,  que  já  dissemos 
era  de  pedraria,  com  um  telhado  também  de  pe- 
draria, composto  de  umas  grandes  lage.as  direitas 
e  adelgaçadas  em  corpo  e  grossura,  que  ficam  ar- 
remedando uns  meios  taboôes  grossos;  e  come- 
çando a  assentar  na  parte  inferior  umas,  e  sobre- 
pondo outras  até  o  alto,  fica  armado  um  telhado 
immortal,  que  sofre  sem  damno  e  sem  perigo  ser 
passeado  e  corrigido;  e  para  as  immundicies  que 
os  longos  annos  fazem  crescer  se  varre  e  alimpa  á 


224  NOVO   GUIA 

vassoura.  Cerca-o  em  roda  uma  grinalda  de  pedra- 
ria formada  em  laços,  e  seus  florões  altos  a  espa- 
ços, com  que  fica  como  coroado,  e  de  toda  a  mais 
obra  do  alto  differençado. 

Para  se  poder  ver  e  gosar  esta  grande  machina 
toda  por  junto,  ha  duas  serventias,  que  do  baixo  da 
igreja  levam  ao  mais  alto  do  telhado  d'ella:  estas 
sâo  abertas  na  grossura  do  muro  do  cruzeiro,  en- 
trando pela  porta  travessa  á  mão  esquerda,  e  fica 
uma  junto  da  porta,  outra  junto  ao  altar  de  Jesus : 
ambas  vão  em  caracol  e  com  120  degraus,  que  tem 
cada  uma,  vencem  a  maior  altura.  Mas  além  des- 
tas ha  outra  subida  por  dentro  do  convento  fácil  e 
suave  por  escadas  largas  e  bem  lançadas :  e  recebe 
a  vista  particular  deleitação,  estendendo-se  de  cima 
por  uma  serra  de  penedia,  que  das  serras  ordiná- 
rias não  differe  em  mais  que  em  ser  esta  lavrada 
e  polida  á  força  da  arte,  e  as  outras  informes  e 
descompostas  e  ao  natural :  nas  quaes  assim  como 
ha  desegualdades,  ora  com  valles  fundos,  ora  com 
picos  e  rochedos  que  se  vão  ás  nuvens;  da  mesma 
maneira  se  vêem  n'esta  suas  differenças:  porque 
em  umas  partes  se  levanta  a  penedia,  como  na 
igreja,  em  outras  abate,  como  no  refeitório,  capi- 
tulo e  adega :  logo  por  outra  parte  sobem  coruchéus 
mui  altos,  e  de  obra  tão  espantosa  que  egualando 
as  da  natureza  na  eminência,  deixam-na  muito  atraz 
no  que  é  artificio;  porque  vão  fabricados  por  tal 
ordem  que  dão  fácil  subida  ao  alto ;  mas  não  sem 


DO  VIAJANTE  225 

medo,  pelo  muito  que  alevantam.  D'estes  ha  três, 
um  que  fica  sobre  o  zimbório  da  capella  do  funda- 
dor, fazendo-lhe  uma  forma  de  pavilhão ;  com  o  faz 
o  zimbório  á  mesma  capella,  e  é  por  extremo  for- 
moso, porque  sobe  pyramidalmente  50  palmos,  e 
leva  uma  sacada  em  roda  de  4  palmos  de  praça, 
guarnecida  de  seu  parapeito  lavrado  em  rede,  e 
coroado  de  umas  metas  como  flores  de  liz,  o  que 
tudo  junto  faz  uma  machina  muito  crespa  e  vis- 
tosa. Outro  tem  seu  nascimento  quasi  sobre  a  casa 
que  chamam  da  prata,  entre  a  crasta  e  sachristia, 
e  tem  de  altura  63  palmos.  Não  faz  menos  repre- 
sentarão de  grandeza  a  torre  dos  sinos  e  relógio, 
conformando  n'ella  com  tudo  o  mais  do  edifício.  » 


Longo  seria  enumerar  n'um  Guia,  todas  as  bel- 
lezas  d'este  admirável  monumento,  e  por  isso,  fi- 
nalizaremos com  a  descrípção  dos  túmulos  reaes  e 
particulares  que  existem  no  real  mosteiro  da  Ba- 
talha. 

Á  entrada  da  porta  principal,  ao  fundo  da  escada 
está  a  sepultura  do  quinto  architecto  Matheus  Fer- 
nandes, (que  no  tempo  de  El-Rei  D.  Manuel  foi  o 
mestre  da  capella  imperfeita)  está  com  sua  mulher 
Isabel  Guilherme,  e  o  licenciado  Miguel  Henriques, 
sua  mulher  Antónia  de  Vivar,  e  suas  filhas.  Tem 
na  campa  dois  craneos  esculpidos,  cada  um  com 
sua  epigraphe  em  letra  gothica,  a  da  parte  de  cima, 

d\z  =  vós  outros  fjNP  passaes,  a  Deus  por  nós  ro- 
15 


226  NOVO   GUIA 

gae  =  e  a  de  baixo  diz  =  não  deixeis  de  bem  fazer 
porque  assim  haveis  de  ser. 

Ao  lado  direito,  pegada  á  parede  da  capella  real, 
está  uma  grande  campa  inteira,  lavrada,  que  cobre 
a  sepultura  de  Diogo  Gonçalves  de  Travassos,  va- 
rão que  devia  ser  de  raras  qualidades,  visto  que  o 
sábio  infante  D.  Pedro,  duque  de  Coimbra,  o  tinha 
feito  aio  de  seus  filhos,  e  regedor  de  suas  terras. 

Á  porta  da  capella  real  está  uma  campa  de  pedra 
liza,  que  cobre  a  sepultura  de  um  soldado  do  ba- 
talhão dos  namorados,  homem  muito  valente,  e  que 
foi  inseparável  de  el-rei,  na  batalha  de  Aljubarrota, 
defendendo-o  de  seus  inimigos,  corajosamente,  sem- 
pre a  seu  lado. 

No  meio  da  capella  real  está  uma  grande  campa, 
inteira,  de  mármore  branco,  dentro  da  qual  se  ac- 
commodam  ambos  os  moimentos  de  el-rei  D.  João  i 
e  da  rainha  sua  mulher  a  senhora  D.  Filippa,  filha 
do  duque  de  Alemcastre,  ingleza,  tem  na  orla  do  tu- 
mulo a  legenda  em  letra  gothica ;  do  lado  do  rei, 
diz — par  bien  —  e  do  lado  da  rainha  diz —  il  me 
plait.  Nas  duas  faces  lateraes  e  maiores  da  caixa 
se  acham  esculpidos  em  letra  alemão  minúscula  os 
dois  extensos  epitaphios  de  el-rei  e  da  rainha.  Na 
face  do  poente  que  é  a  cabeceira  do  tumulo  estava 
em  relevo  a  cruz  da  ordem  da  jarrateira,  circulada 
da  liga  com  a  sua  letra — honny  soit  qui  mal  y 
pense — de  que  ainda  se  vê  uma  parte,  porque  o 
resto  foi  destruído  pelos  soldados  francezes  que 


DO    VIAJANTE  227 

n'este  mesmo  logar  abriram  um  rombo.  Sobre  o 
o  monumento  estão  em  relevo  inteiro  os  vultos  de 
el-rei  e  da  rainha,  ambos  com  coroa  real  e  guar- 
dadas as  cabeças  por  dois  torreões  de  mármore, 
gentilmente  lavrados,  em  cujas  summidades  da 
parte  de  fora,  se  vêem  respectivamente  os  seus 
escudos  de  armas.  O  do  sr.  D.  João  i  tem  as  qui- 
nas direitas,  assentadas  sobre  a  cruz  de  Aviz  dos 
castellos.  e  a  coroa  real.  O  da  sr.a  D.  Filippa  é 
partido  em  dois,  tendo  á  direita  o  escudo  das  ar- 
mas de  seu  marido,  e  á  esquerda  o  seu  próprio 
brazão,  que  é  esquartelado,  e  tem  nos  lados  res- 
pectivamente oppostos  os  leões  e  as  flores  de  liz. 

No  primeiro  tumulo  do  lado  do  poente  está  o 
infante  D.  Pedro  duque  de  Coimbra,  tão  sábio 
quanto  infeliz,  que  regeu  o  reino  na  menoridade 
de  seu  sobrinho  AíTonso  v,  e  veiu  acabar  desgra- 
çadamente na  infausta  batalha  da  Alfarrobeira.  A 
par  da  caixa  do  seu  tumulo,  para  a  parte  interior 
do  arco  está  outra  com  as  cinzas  de  sua  mulher 
D.  lzabel  filha  do  conde  de  Urgel  D.  Jayme,  tem 
na  orla  do  tumulo  em  letra  gothica  a  legenda  — 
de  zil—  segunda  filha  de  el-rei  D.  João  i. 

Segue-se  no  segundo  arco,  o  mausuleo  do  cele- 
bre infante  D.  Henrique,  duque  de  Vizeu,  nome 
immortal  para  a  historia  da  navegação  :  tem  hm 
orla  do  tumulo,  em  letra  gothica,  a  legenda —  Ta- 
lant  d<>  bien  feer  —  terceiro  filho  de  el-rei  D.  João. 

O  terceiro  tumulo  indo  para  o  poente  é  do  in- 


228  NOVO   GUIA 

fante  D.  João  mestre  da  ordem  de  Santiago  e  con- 
destavel  do  reino,  que  teve  por  mulher  sua  sobri- 
nha D.  Izabel  filha  de  D.  Affonso  conde  de  Bar- 
cellos,  1.°  duque  de  Bragança,  e  neto  do  grande 
D.  Nuno  Alves  Pereira.  A  direita  do  tumulo  de  seu 
esposo  está  o  jazigo  d'esta  senhora,  a  letra  da  di- 
visa D.  João,  na  orla  do  tumulo  em  caracter  go- 
thico,  diz  —  fai  bien  raison — 4.°  filho  de  D.  João  i. 

No  quarto  monumento  do  lado  do  nascente  re- 
pousam as  venerandas  cinzas  do  infante  santo  D. 
Fernando,  mestre  que  foi  da  ordem  de  Aviz,  exem- 
plar de  resignação  christã,  e  de  todas  as  virtudes. 
Morreu  captivo  em  Fez,  sendo  as  suas  relíquias 
remidas  das  mãos  dos  infiéis,  e  trazidas  a  este 
reino  no  tempo  de  D.  Affonso  v  sobrinho  do  in- 
fante—5.°  filho  de  D.  João  i. 

Na  capella  que  está  pegada  á  porta  travessa,  a 
qual  tem  o  altar  de  mármore  branco  lavrado  de 
mosaico,  com  o  retábulo  da  mesma  obra,  cuja  ca- 
pella el-rei  D.  João  i  doou  a  D.  Lopo  Dias  de  Sou- 
sa, valeroso  mestre  da  ordem  de  Ghristo,  o  qual 
dizem  que  está  na  mesma  capella,  no  tumulo  de 
mármore  branco.  No  grosso  da  parede  d'esta  ca- 
pella ha  um  arco,  e  dentro  se  levanta  o  bello  e 
magnifico  mausoleo  de  Diogo  Lopes  de  Sousa,  con- 
de de  Miranda  e  4.°  regedor  da  relação  do  Porto, 
obra  de  mosaico  em  mármore  preto ;  assenta  so- 
bre três  leões  de  bella  escultura,  cujas  mãos  re- 
pousam sobre  uns  ouvados  de  mármore,  preto,  e 


DO   VIAJANTE  229 

tem  por  cima  do  mausoleo  o  escudo  das  armas 
d'esta  illustre  família,  e  a  coroa  ducal  (o  que  já 
nâo  existe  porque  os  soldados  francezes  na  inva- 
são de  1810  o  estragaram);  é  d'esta  família  que 
descende  a  casa  do  duque  de  Lafões. 

Na  capella  do  lado  da  Epistola,  está  o  tumulo 
de  madeira  de  D.  João  n,  onde  por  mais  de  300 
annos  se  conservou  inteiro  o  corpo  d'este  sobera- 
no. Quando  em  1810  o  exercito  francez  invadiu  o 
reino,  a  soldadesca  desenfreada  violou  o  sagrado 
dos  túmulos,  e  apenas  de  entre  as  ruinas  se  pode- 
ram  depois  salvar  os  restos  informes  do  corpo  do 
monarcha,  que  os  religiosos  de  novo  encerraram 
no  antigo  deposito  que  mandaram  reformar. 

Na  capella-mór  junto  ao  supedaneo  do  altar, 
embutida  nos  degraus  do  mesmo,  está  uma  arca 
de  mármore  com  dois  vultos  da  mesma  pedra  em 
cima,  que  figuram  el-rei  D.  Duarte,  e  a  rainha  D. 
Leonor  sua  mulher,  com  uma  inscripção,  latina, 
cuja  traducção  é  a  seguinte  — Aqui  jazem  Duarte  i 
Rei  de  Portugal  e  Algarves,  e  a  Rainha  Leonor 
sua  mulher. 

Na  capella  do  lado  do  Evangelho  está  um  tu- 
mulo pequeno  de  mármore  branco  lavrado  por  to- 
das as  faces  de  flores  em  relevo,  e  em  cada  face 
o  escudo  das  armas  reaes  assentadas  sobre  a  cruz 
de  Aviz.  Dizem  ser  do  príncipe  D.  João  filho  de 
D.  Affonso  v  e  da  rainha  D.  Izabel,  que  morreu 
sendo  menino. 


230  NOVO   GUIA 

O  tumulo  que  está  próximo  á  sachristia,  dizem 
ser  de  um  cardeal  da  casa  do  duque  de  Aveiro. 

Na  casa  da  capella  estão  dois  túmulos  de  ma- 
deira, no  da  direita  está  D.  Affonso  v  e  a  rainha 
D.  Izabel  sua  mulher,  no  da  esquerda  está  o  prin- 
cipe  D.  Affonso,  filho  de  D.  João  11,  herdeiro  da  co- 
roa, que  morreu  caindo  de  um  cavallo  nas  margens 
do  Tejo,  junto  a  Santarém,  contando  apenas  deze- 
seis  annos  de  edade,  e  sete  mezes  de  casado. 


COIMBRA 

Coimbra  está  fundada  no  coração  da  monarchia, 
servindo  de  remate  á  coroa  da  Europa,  que  é  Por- 
tugal. Esta  cidade  estava  antigamente  no  sitio  onde 
hoje  se  encontram  as  minas  de  Gondeixa-a- Velha, 
e  esteve  subjeita  por  largo  tempo  ao  império  ro- 
mano. 

A  Universidade  de  Coimbra  é  o  primeiro  objecto 
que  atrae  os  olhos,  com  a  sua  magestosa  torre,  e 
com  o  observatório,  que  coroam  aquelle  monte  de 
casas. 

É  edifício  importante  e  por  isso  revistado  por 
todos  que  passam  por  esta  bonita  cidade. 

Á  direita  do  Campo  de  Santa  Clara  está  a  cha- 
mada quinta  das  Lagrimas.  Este  nome  só  por  si  é 
bastante  para  fazer  bater  o  coração  e  dispertar  a 


DO    VIAJANTE  231 

curiosidade.  O  velho  palácio  d'esta  quinta  foi  o 
theatro  d'aquella  poética  catastrophe,  tão  bem  can- 
tada pelo  immortal  Camões. 

No  fim  da  quinta  das  Lagrimas,  fica  a  fonte  dos 
amores,  monumento  eterno  da  desgraça  de  D.  Ignez 
de  Castro. 

O  aspecto  melancholico  dos  cedros,  sentinellas 
mudas  aquém  a  natureza  confiou  a  guarda  d'esta 
fonte ;  o  escuro  da  rocha,  a  doçura  com  que  insen- 
sivelmente correm  as  aguas,  tudo  insinua  na  alma 
o  grande  segredo  da  melancholia. 

Junto  a  esta  fonte  ha  uma  tosca  lapide  onde  se 
lêem  os  formosos  e  sentidos  versos  com  que  Ca- 
mões immortalisou  aquelle  manancial. 

Esta  quinta  é  hoje  propriedade  de  um  íoglez 
abastado. 

Das  ruinas  do  mosteiro  de  Santa  Clara,  hoje 
somente  existe  os  restos  da  egreja  para  os  quaes 
está  apontando  o  dedo  do  tempo,  como  para  o  ter- 
rível desengano  de  que  tudo  acaba  no  mundo. 

O  templo  está  submergido  no  areal  e  as  suas 
columnas  estão  sepultadas  até  aos  capiteis.  Da  ca- 
pella-mór  apenas  existe  o  arco  grande;  sumiu-se  o 
altar  e  o  retábulo  serve  de  entrada. 

O  novo  mosteiro  de  Santa  Clara  foi  edificado  em 
I(H9  no  monte  da  Esperança,  tí  grandioso  edifício, 
e  está  situado  fronteiro  a  Coimbra,  olhando  para  o 
oriente. 

O  convento  tem  dois  vistosos  mirantes,  cada  um 


232  NOVO   GUIA 

na  sua  extremidade.  O  templo  é  vasto  e  magestoso, 
sendo  a  sua  architectura  no  estylo  romano.  Os  re- 
tábulos dos  altares  são  todos  de  meio-relevo,  dando 
a  conhecer  este  edifício  pela  magestade  e  grandeza 
que  respira,  ser  obra  real. 

Na  capella-mór  está  depositado  o  soberbo  ataúde 
de  prata  que  mandou  fazer  á  Rainha  Santa  Isabel, 
esposa  de  D.  Diniz,  o  bispo  de  Coimbra  D.  Affonso 
de  Gastello  Branco. 

A  ponte  é  um  dos  logares  mais  apraziveis  e  vis- 
tosos de  Coimbra.  A  mansidão  com  que  correm  as 
aguas,  os  salgueiros,  os  alamos  que  lhe  guarnecem 
as  margens,  debruçando-se  sobre  a  sua  corrente, 
como  quem  se  está  mirando  no  espelho  límpido 
das  aguas ;  as  quintas  da  Boa  Vista,  das  Cannas, 
das  Lagrimas  e  da  Alegria,  que  alvejam  ao  longe 
por  entre  os  frondozos  olivaes ;  os  cyprestes  que 
simelham  pyramides  e  obeliscos ;  a  torre  de  Santa 
Cruz  que  se  ergue  das  ameias  da  cidade ;  os  sum- 
ptuosos edifícios  de  S.  Bento,  de  S.  José,  dos  Ma- 
riannos,  e  o  Seminário  do  Bispo,  que  coroam,  cada 
um  o  seu  outeiro;  emíim  os  barcos  que  correm 
pelo  rio  em  todas  as  direcções,  offerecem  aos  olhos 
um  quadro  que  eleva  os  sentidos  e  que  se  nâo 
pode  desenhar  com  o  pincel. 

O  Mondego  tem  a  gloria  de  conservar  o  seu 
nome  desde  a  serra  da  Estrella,  onde  nasce,  até  á 
villa  da  Figueira,  d'onde  se  precipita  no  seio  do 
Atlântico. 


DO    VIAJANTE  233 

Este  rio  das  Musas  não  foi  privado  d'essas  so- 
berbas heranças  que  a  natureza  deixou  aos  seus 
grandes  filhos  da  Ásia  e  da  America.  O  nosso  Mon- 
dego possue  também  areias  de  oiro,  e  é  sem  du- 
vida o  rio  mais  rico  e  formoso  que  banha  o  nosso 
território;  é  todo  portuguez,  porque  nasce  em  Por- 
tugal, e  n'elle  se  entrega  ao  Oceano. 

O  Mondego  na  primavera  e  no  verão  passa  hu- 
mildemente por  baixo  da  ponte,  espreguiçando-se 
por  cima  das  áreas,  que  parecem  campos  de  oiro; 
todavia  na  estação  das  tempestades  enche-se  de  so- 
berba e  arrogância  e  invade  os  campos,  estraga 
hortas,  inunda  as  quintas,  derrota  as  arvores,  e 
leva  em  suas  aguas  triumphantes  os  despojos  das 
terras  assoladas.  Muitas  vezes  salta  por  cima  da 
ponte,  e  d'alli  continua  entre  estragos  e  minas,  até 
ir  sepultar-se  nas  praias  do  Oceano. 

A  Sé  velha,  esta  cathedral  gothica  é  em  tudo 
original,  única  na  architectura  e  única  na  edade, 
pois  é  um  representante  do  império  dos  godos, 
que  ainda  resta  na  corte  estrangeira  depois  de  extin- 
cta  a  sua  nação. 

Este  mahometano  convertido  ao  christianismo, 
como  outros,  é  o  Adão  e  o  patriarcha  de  todos  os 
edifícios  de  Coimbra. 

ks  suas  paredes  construídas  todas  de  cantaria, 
vistas  exteriormente  parecem  mais  as  muralhas  de 
um  castello,  que  as  faces  de  mu  templo.  O  edifício 
é  quadrado,  tem  um  arco  sobre  a  porta  principal 


234  NOVO   GUIA 

com  uma  tribuna  em  cima,  debaixo  de  outro  arco 
de  igual  feitio  e  com  grades  de  pedra.  Além  d'esta 
não  tem  mais  janellas  algumas,  porém  somente  es- 
treitas frestas.  Não  tem  torres,  nem  remate  algum, 
porque  se  reconheça  ser  cathedral  de  christãos ; 
apenas  se  vê  sobre  a  cúpula  uma  pequena  cruz  de 
ferro. 

Ao  lado  esquerdo  do  templo  fica  outra  porta 
também  com  um  arco  de  mármore  lavrado  em  re- 
levo ;  é  cercado  por  uma  silva  de  flores  mimosas, 
e  por  isto  se  conhece  o  quanto  gostavam  os  archi- 
tectos  godos  das  miudezas  e  ornatos  exquisitos, 
tanto  nas  gravuras  de  oiro  e  prata,  como  nas  de 
pedra. 

De  uma  e  outra  parte  do  arco,  sobre  o  qual  está 
outra  varanda  com  quatro  pequenas  colnmnas,  que 
lhe  sustentam  a  abobada,  está  uma  capellinha  tam- 
bém de  mármore  :  n'uma  fica  a  imagem  de  S.  João, 
n'outra  a  de  S.  Zacharias;  é  o  pae  e  o  filho,  que 
estão  de  sentinella  á  porta  do  templo. 

A  prespectiva  da  egreja  vista  de  noite  causa  um 
terror  magestoso  a  quem  a  contempla ;  porque  o 
escuro  das  cantarias,  e  ervas  que  nascem  pelas  suas 
juntas,  dão-lhe  uma  apparencia  d'aquelles  castellos 
de  génios  e  fadas,  de  que  tanto  se  falia  nas  histo- 
rias de  cavallaria. 

Junto  ao  Museu  está  um  espesso  bosque  de  lou- 
reiros de  uma  decrépita  velhice.  Uma  antiga  tra- 
dicção  faz  anterior  a  sua  origem  ao  estabelecimento 


DO   VIAJANTE  235 

da  companhia  de  Jesus  n'esta  cidade.  Estas  arvo- 
res, como  os  velhos  pães,  que  sobrevivem  a  seus 
filhos,  viram  nascer  e  acabar  esta  família  de  sábios. 

Poucas  pedras  restam  já  do  Castello  de  Coimbra, 
cuja  origem  se  perde  na  noite  dos  séculos,  e  que 
o  theatro  glorioso  da  acção  mais  heróica  da  fideli- 
dade portugueza  que  tanto  renome  deu  a  Martim 
ás  Freitas,  seu  governador  e  alcaide,  cujo  facto  é 
bem  conhecido  na  historia  de  Portugal. 

Mais  algum  tempo  e  estas  relíquias  da  antigui- 
dade deixarão  de  existir,  e  de  recordar  ao  viajante 
as  nossas  gaandezas  passadas. 

Do  alto  do  penedo  da  Saudade  destaca-se  aos 

olhos  um  formoso  panorama.  Que  perspectiva  tão 

vasta,  que  espectáculo  tão  bello !  Como  é  formoso 

o  valle  das  Oliveiras  que  se  estende  aos  pés  do  pe- 
nedo! 

Aos  pés  de  um  outeiro,  junto  da  quinta  do  Ci- 
dral,  está  um  viçoso  e  fragrante  bosque  de  laran- 
geiras.  A  pouca  distancia  rebenta  a  fonte  do  Cidra] 
que  leva  aos  campos  visinhos  a  abundância  e  a  pu- 
reza de  suas  aguas. 

O  Convento  de  Santo  António  dos  Olivaes  fica  na 
despedida  de  um  monte  a  pouca  distancia  de  Coim- 
bra. A  paragem  é  encantadora  pela  vista  dilatada 
do  que  alcançam  os  olhos.  Daqui  se  avista  o  Mon- 
dego, uma  légua  depois  de  ter  já  passado  pelas 
ameias  da  cidade.  D'aqui  se  descobrem  soberbas 
montanhas. 


236  NOVO   GUIA 

A  rainha  D.  Urraca  foi  quem  deu  este  sitio  e  a 
ermida  de  Santo  Antão  aos  filhos  da  pobreza.  As  ar- 
vores da  paz,  que  abrigam  esta  solidão,  deram-lhe 
o  nome  de  Santo  António  dos  Olivaes,  que  ainda 
hoje  conserva. 

Na  visinhança  do  Convento  de  Cellas  fica  entre 
um  olival  uma  pequena  ermida,  que  vista  de  longe 
parecer  vir  para  nós,  levantando  a  torre  e  a  cruz 
acima  das  pontas  das  arvores. 

É  tradição  que  alii  fora  sacrificada  n'uma  cruz  a 
virgem  do  bosque. 

Todo,s  os  annos  no  fim  da  primavera  vem  enra- 
mar de  flores  os  habitantes  da  cidade  esta  ermida, 
theatro  de  tão  doloroso  martyrio.  Santa  Comba  é 
ornada  com  grinaldas  de  rosas,  e  estes  tributos 
puros  e  innocente  são  o  emblema  da  castidade  da 
virgem,  e  da  coroa  immortal  que  recebeu  no  céo. 

O  palácio  do  infante  D.  João  ainda  existe,  ainda 
está  de  pé  aquelle  gothico  edifício  que  foi  o  thea- 
tro da  morte  da  infeliz  D.  Maria  Telles  de  Mene- 
zes, victima  da  perfídia  de  sua  irmã,  a  rainha 
D.  Leonor.  O  Aqueduto  de  S.  Sebastião  passa  em 
frente  do  Jardim  botânico,  e  é  sustentado  por  vinte 
e  um  arcos  de  grande  altura ;  reputa-se  uma  das 
maravilhas  da  cidade  de  Coimbra. 

No  reinado  do  rei  D.  Sebastião  é  que  se  levan- 
tou este  magestoso  edifício,  não  sem  grande  resis- 
tência dos  cónegos  de  Santa  Cruz,  a  quem  foram 
tiradas  as  fontes  que  para  elle  dão  agua. 


DO    VIAJANTE  237 

A  população  da  cidade  de  Coimbra  é  pouco  no- 
tável, e  a  affluencia  dos  estudantes  á  sua  Univer- 
sidade é  que  lhe  dá  a  importância  que  tem. 

Em  Coimbra  ha  as  seguintes  hospedarias  : 

Hotel  do  Paço  do  Conde.  —  Rua  da  mesma  deno- 
minação. 

Hotel  do  caminho  de  ferro.  —  Rua  do  Visconde 
da  Luz,  8. 

Hotel  Mondego. 

Novo  Hotel  Central. 

O  limitado  espaço  de  uma  guia  não  dá  logar  a 
longas  descripções  e  por  isso  iremos  avante  até  ao 
Bussaco,  essa  agradável  floresta  tão  frequentada 
hoje  por  todas  as  pessoas  de  verdadeiro  gosto. 


BUSSACO 

É  do  chronista  carmelitano  Fr.  João  do  Sacra- 
mento a  descripção  que  em  seguida  damos. 

Depois  da  serra  de  Cintra,  não  lia  outra  em  P 
tugal  mais  afamada  pela  escripta  e  pela  pintara, 
que  a  de  Bussaco. 

Escriptores  e  artistas,  prosadores  e  poeta-,  pin- 
tores e  gravadores,  assim  nacionaes  como  estran- 
geiros, se  teem  inspirado  da  magnificência  d'aquella 
grandiosa  paizagem,  e  reproduzido  em  paginas  bri- 
lhantes, cm  painéis  famosos,  esta  maravilha  da 
nossa  terra. 


238 


NOVO    GUIA 


Os  começos  do  convento  do  Bussaco  remontam 
apenas  ao  meado  do  século  xvn.  Singelamente  no- 
los  conta  o  chronista  fr.  João  do  Sacramento.  Diz 
elle,  que  andando  o  provincial  da  ordem  dos  car- 
melitas descalços,  e  em  busca  de  sitio  deserto,  para 
fundar  uma  casa  eremitica  para  os  seus  frades,  suc- 
cedera  ir  um  d'elles  visitar  o  bispo  conde  de  Coim- 
bra, D.  João  Manuel  a  quem  communicára  o  in- 
tento. 0  prelado  como  de  súbito,  respondeu :  — 
«  Tenho  eu  na  serra  de  Luso  umas  mattas  e  terras 
a  que  chamam  Bussaco ;  se  ao  padre  provincial  lhe 
parecera  mandal-as  ver,  e  lhe  forem  de  seu  agrado, 
dera-as  eu  de  boa  vontade  á  relegião,  pelo  inte- 
resse de  ter  no  meu  bispado  um  convento  tão  único 
e  observante.  Avise  o  padre  reitor  ao  padre  pro- 
vincial que  as  mande  ver,  que  pôde  ser  lhe  sirvam, 
e  se  evitem  com  maiores  conveniências,  os  reboli- 
ços da  serra  de  Cintra. »  Era  n'esta  que  elles  ti- 
nham posto  a  mira,  antes  de  terem  noticia  do  Bus- 
saco. 

Foi  logo  este  padre  dar,  com  alvoroço,  tão  boa 
nova  ao  seu  provincial,  e  ambos  com  outros  rele- 
giosos  e  sendo  um  d'elles  architecto,  se  foram  a 
inspeccionar  o  sitio. 

Subindo  todos  á  serra,  viram  em  Bussaco  tanta 
variedade  de  arvores,  abundância  de  fontes,  formo- 
sura de  valles,  e  eminência  de  montes,  que,  alem 
de  summamente  pagos  do  que  viram  se  admira- 
vam por  extremo  de  que  a  benigna  e  soberana  Pro- 


DO    VIAJANTE  239 

vidência  houvesse  reservado  para  ermo  da  sua  or- 
dem aquelle  sitio,  que  julgavam  pela  oitava  mara- 
vilha do  mundo. 

Veio  depois  o  padre  geral,  e  não  menos  agra- 
dado e  admirado  do  sitio,  disse  para  os  compa- 
nheiros com  devota  alegria  :  —  «  Aqui  é  vontade  de 
Deus  que  se  funde ;  murem  este  sitio,  que  tem 
n'elle  o  melhor  deserto  da  ordem.  Porque,  se  agora 
inculto,  rudo  e  tosco,  é  o  que  admiramos,  cultivado 
será  um  paraizo  terreal. » 

Dados  os  agradecimentos  ao  bispo  conde,  tratou 
este  logo  de  reduzir  a  doação  a  publica  forma. 

Como,  porém,  esta  propriedade  era  da  mitra, 
não  se  podia  doar  pura  e  simplesmente,  só  por 
subrogação  se  permittia  alienar,  nos  termos  do  di- 
reito canónico  e  civil.  Foi,  por  tanto,  avaliado  o 
Bussaco  em  180^000,  por  ser  infructifero  e  de 
pouco  rendimento  (diz  a  licença  regia)  comprando 
o  bispo  outros  bens  no  valor  de  187#000  reis, 
para  encorporar  nos  da  mitra  em  logar  do  Bus- 
saco. D'este  contracto  se  fez  escriptura  em  1 1  de 
maio  de  1628. 

Trataram  logo  os  frades  de  edificar  no  alto  da 
serra  o  seu  convento,  a  que  se  lançou  a  primeira 
pedra  no  dia  7  de  agosto  do  mesmo  anno,  com  a 
invocação  de  mosteiro  de  Santa  Cruz. 

Está  Bussaco  situado  na  vistosa,  altíssima  e 
verde  serra  que  uns  chamam  de  Luso,  outros  de 
Carvalho,  e  alguns  do  Cântaro,  por  se  não  expres- 


240  NOVO   GUIA 

sar  bem  cora  um  singelo  appellido,  e  quasi  neces- 
citar  de  nomes  dobrados,  todo  um  monte  de  ma- 
ravilhas. 

Diz-se  do  Cântaro,  pela  piedosa  matrona,  que 
atravessando  em  certa  occasião  a  serra,  lhe  falle- 
ceu  um  criado  á  sede,  por  cujo  respeito  deixou 
alli,  em  perpetua  misericórdia,  um  cântaro  de  agua 
para  refrigério  dos  viandantes. 

Chama-se  do  Carvalho,  de  uma  vilía  d'este  nome 
existente  ao  pé  da  mesma  serra,  que  a  deu,  ou 
recebeu  da  nobre  familia  d'este  appellido,  de  que 
parece  ascendente  a  instituidora  da  referida  pie- 
dade, visto  ficar  a  provisão  do  Cântaro  ao  cuidado 
dos  senhores  d'esta  villa.  Intitula-se  de  Luso,  de 
uma  antiquíssima  cidade  do  mesmo  nome,  que  di- 
zem fundara  alli  a  meia  descida  da  serra  para  a 
banda  do  poente,  olhando  ao  mar,  um  rio  de  pró- 
prio appellido.  Da  sua  existência  parece  dar  ainda 
testemunho  um  curto  logar  a  que  também  chamam 
Luso ;  que  os  tempos  se  não  tragam  reduzem  a 
pequenas  as  coisas  grandes,  os  povos  a  ermos,  as 
cortes  a  aldeias. 

Nasce  a  do  Bussaco  como  legitimo  e  avultado 
parto  da  serra  da  Estrella ;  e  desenvolvendo-se  li- 
geiramente das  mantilhas  para  crescer  em  grande- 
zas próprias  levanta  o  pé  bem  a  vista  de  Penacova, 
defronte  do  canal  por  onde  no  plácido  Mondego 
entra  o  caudaloso  Alva,  tão  rico  de  cabedaes,  que 
desempanha  a  fama  de  serem  os  rios  de  Portugal 


DO   VIAJANTE  241 

minas  de  oiro.  Assim  gigante  se  anima  a  Carreira, 
que  logo  nos  primeiros  passos  despreza,  soberba- 
mente, subir  um  a  um,  contendendo  como  emulo 
das  serraniaa  mais  altas,  ser  coroa  de  todos.  Ga- 
nhando por  degraus  de  três  legoas  continuadas,  de 
oriente  a  poente;  assombrosas  alturas,  se  olha  no 
fim  ao  espelho  do  Oceano,  quasi  vaidosa  de  ser  o 
Mondego  pequeno  christal  para  o  especioso  de  tão 
avultada  estatura.  Descorre  todo  este  dilatado  com- 
primento, rompendo  para  todas  as  quatro  partes  da 
terra  em  despenhados  precipícios,  e  quebradas  maio- 
res de  legoa,  por  entre  fragosissimos  penhascos, 
pelas  roturas  dos  quaes  se  divisam  as  agoas  cor- 
tando profundo  valles,  quasi  murmurando  de  ver 
a  serra  humilhar  os  mais  elevados  cabeços,  com 
mais  presumpção  que  jurisdicção ;  pois  nem  o  au- 
ctor  da  natureza  a  concede  aos  grandes  para  atro- 
pellarem  os  pequenos,  nem  os  superiores  a  devem 
tomar  para  ultrajarem  os  inferiores.  Completa  de 
todo  a  subida,  vae  a  serra  parar  e  descansar  no 
cume  que  propriamente  se  diz  Bussaco,  o  qual 
remata  uma  cruz,  que  chamavam  Alta,  em  razão 
da  sua  eminência  dominar  ainda  as  maiores  altu- 
ras d'esta  serra,  e  por  ventura  quantas  o  reino 
Portugal  conhece. 

O  pico  ou  cume  do  Bussaco  é  de  sorte  elevado, 
que  descobre  grande  parte  do  reino,  e  (Telle  é  des- 
coberto. Descortina  para  o  oriente  a  serra  da  Es- 
treita e  a  de  Castello  Rodrigo  posta  em  distanc 
10 


242  NOVO   GUIA 

de  trinta  léguas ;  para  o  sul  do  Minho ;  e  não  fal- 
tou já  lince  que  alcançasse  ou  o  presumisse  ver 
a  de  Marvão,  desviada  d'alii  quarenta  léguas,  para 
o  norte  a  de  Grijó,  em  distancia  de  quinze ;  e  para 
todas  as  partes  as  cidades,  villas,  e  logares  inter- 
médios, sitos  no  território  dos  sete  bispados,  Coim- 
bra, Leiria,  Guarda,  Vizeu,  Lamego,  Porto,  Braga. 

Para  a  parte  do  poente  carece  a  vista  de  termos 
mais  que  nos  limites  da  própria  potencia,  porque 
sobre  as  buliçosas  ondas  do  inquieto  elemento,  se 
não  descança,  limita-se.  Vêem-se  nos  dias  claros, 
sulcar  suas  aguas  varias  embarcações  para  diffe- 
rentes  rumos  e  postos,  agradável  objecto  aos  que 
de  terra  o  contemplam ;  e  porventura  mais,  quan- 
do furiosas  ou  crespas  ameaçam  algum  naufrágio 
pela  tyranna  condição  de  crescer  o  gosto  do  seguro 
próprio  á  vista  do  perigo  alheio. 

Estas  são  as  vistas  d'esta  atalaya  do  mundo,  ou 
sentinella  do  céu,  ao  longe. 

As  de  perto  são  taes,  que  se  duvida  as  possam 
os  olhos  encontrar,  egualmente  dilatadas  e  delicio- 
sas, na  circumferencia  do  orbe,  porque  do  alto  do 
Bussaco  se  devisam  muitas  e  apraziveis  serras; 
dilatados  e  viçosos  montes ;  fertilissimos  e  amenos 
campos,  cortados  de  vários  e  formosos  rios.  Avis- 
tam-se  assim  mesmo  vários  arneiros,  prados,  bos- 
ques e  valles  retalhados  de  caudalosas  ribeiras, 
vestidos  todos  da  verde  gala,  que  a  cada  um  des- 
tes bem  dispostos  corpos  talhou  o  auctor  danatu- 


DO   VIAJANTE  243 

reza.  Donde  vem  a  parecer  que  não  ha  paiz,  qua- 
dro ou  perspectiva,  onde  o  mais  licencioso  pincel 
sobornado  do  gosto  ou  do  empenho,  se  occupasse 
em  bem  assombradas  delineações,  ao  valente  ou 
mimoso,  que  os  horisontes  do  Bussaco  não  com- 
prehendam  ao  natural. 

De  toda  esta  estendida  e  formosa  planta,  colhem 
as  almas  devotas,  recolhidas  em  si  mesmas,  co- 
piosos e  importantes  fructos  de  superiores  consi- 
derações para  se  moverem  ao  amor  do  Omnipo- 
tente, que  assim  dispoz  o  terreno  para  habitação, 
regalo  e  commodo  de  suas  creaturas.  Nas  mesmas 
penhas  da  montanha  é  grandemente  de  louvar  o 
Creador,  porque  entre  ellas  se  acham  jaspes  e 
mármores  tão  finos,  e  de  cores  tão  vivas,  que  pa- 
rece brilharem  brutos  com  o  lustro  de  polidos. 
Pelo  menos  a  serem  assumptos  da  industria,  ou 
matéria  da  arte,  serviriam  de  credito  aos  edifícios 
como  pedras  de  singular  valor  na  sua  esphera. 

Mas  quem  poderá  decifrar  em  números,  ou  nu- 
merar por  seus  nomes,  não  já  os  indivíduos,  mas 
ainda  as  espécies  de  arvores  que  o  auctor  da  na- 
tureza clausurou  no  recinto  do  Bussaco  ?  Alem  das 
plantas  conhecidamente  vulgares,  se  desentrenha 
o  terreno  na  producção  de  lentiscos,  azereiros,  azi- 
vinhos,  adernos,  espinheiros,  cedros,  plátanos,  ci- 
namomos, etc;  e  com  tal  feracidade,  que  a  mais 
vasta  QOticia  dVsta  frondosa  republica  o  não  po- 
derá notar  de  mesquinho  na  esterilidade  de  alguma. 


244  NOVO   GUIA 

Descorria  em  certa  occasião  o  sitio  o  reveren- 
díssimo padre  fr.  Jeronymo  de  Seldanha,  D.  abba- 
de  geral  da  ordem  de  S.  Bernardo,  acompanhado 
do  prior  actual  da  casa  fr.  Paulo  do  Espirito  Santo ; 
e  notando  a  fecundidade  da  natureza  na  procrea- 
ção  de  tão  bastos  e  diversos  arvoredos,  a  censura 
de  não  produzir  alli  o  teixo,  arvore  de  mais  gala 
que  serventia,  e  de  qualidades  tão  nocivas,  que 
dizem  ter  na  sombra  antipathia  com  a  saúde,  e 
ainda  com  a  vida  de  todos  os  animaes.  Galava-se 
o  prior  á  queixosa  censura  do  geral;  mas  chegando 
á  fonte  que.  chamavam  Fria,  lhe  deram  a  resposta 
três  plantas  da  mesma  espécie  que  buscava.  Vendo 
a  satisfação  do  queixume,  e  o  desvanecimento  da 
opinião  de  que  era  singularidade  de  Alcobaça  pro- 
duzir a  tal  planta,  teve  de  confessar  a  Bussaco  por 
um  mappa  do  arvoredo  do  mundo.  Já  arruadas 
á  corda,  já  em  mattas  cerradas  é  tal  a  multidão 
de  arvores,  que  havendo  tempestade  que  prostrou 
mil  paus  dos  mais  soberbos,  não  fez  ao  resto  do 
vegetal  corte  sensível,  apparecendo  depois  vestido 
como  se  não  fôra  roto  da  tormenta. 

Das  hervas  cheirozas,  como  legação,  madresilva, 
trevo  real,  betonica,  e  tantas  outras  que  na  penna 
não  cabem,  se  ornam  os  estrados,  e  tecem  as  al- 
catifas dos  montes  e  valles,  onde  por  ostentação 
da  pompa  ou  vaidade  do  caduco  de  suas  verdu- 
ras, se  tenta  a  descançar  a  primavera  quasi  todo 
o  anno.  As  medicinaes,  pela  qualidade  da  agua, 


DO  VIAJANTE 


245 


terra  e  ar,  são  de  sorte  profícuas  á  restauração  da 
saúde,  que  Grisley,  insigne  herbolario  italiano,  em 
um  tratado  que  da  matéria  compoz,  afíirma,  que 
havendo  perigrinado  a  maior  parte  da  europa,  en- 
contrara na  serra  de  Bussaco  quasi  todas  as  her- 
vas  que  descreve  Laguna  sobre  Dioscorides,  com 
a  excellencia  de  serem  vigorosas  sobre  as  que  a 
herbolaria  conhece.  O  mesmo  contesta  a  pharma- 
copólea,  signaladamente  de  Phillipodio;  e  quando 
não  cante  a  victoria,  pôde  Bussaco  jactar-se  de 
competir,  inculto,  com  os  celebres  parques,  ou 
jardins  de  Pavia  e  Veneza  cultivados  para  o  mesmo 
intento  e  fim.  Das  flores,  já  domesticas,  já  mon- 
tesinhas, perpétua  caçoila  do  sitio,  iremos  semean- 
do algumas  pelos  lugares  que  descorrermos. 

Sustenta-se  esta  innumeravel  família  da  grande 
mãe  (como  á  terra  chamavam  os  antigos),  que  lhe 
dá  além  de  outras  aguas,  oito  fontes  perennes.  A. 
de  Nossa  Senhora  da  Expectação,  a  do  glorioso 
archanjo  S.  Miguel,  a  do  nosso  patriarcha  Elias,  a 
de  nossa  madre  Santa  Thereza,  a  de  S.  Silvestre, 
a  do  Carregal,  a  Fonte  Nova,  e  ultima,  rainha  das 
mais,  a  que  chamam  Fria,  que  temperada  de  in- 
verno escusa  neve  de  verão. 

Foi  esta  fonte  obra  do  bispo  conde  D.  João  de 
Mello,  traçada  de  forma  que,  coberta  de  uma  abo- 
bada, estribada  em  um  arco  aberto,  rebocado  de 
embrexados,  tem  o  nascimento  a  vista  patente,  ou 
por  blasonar  de  puramento  claro,  ou  por  ser  tau 


246  NOVO   GUIA 

vistoso,  que  por  entre  miúdos  sexos,  pretos  e  bran- 
cos, sentados  em  doiradas  areias  não  receia  de  ap- 
parecer  ao  registo  e  exame  dos  olhos.  Desce  do 
lugar  da  sua  origem  por  um  calejão  ou  parapeito 
levantado  da  terra,  entre  duas  largas  escadas  por- 
tilhões  de  cantaria,  e  repuxos  abertos  nas  mesmas 
pedras;  na  descida  dos  quaes,  fervendo  as  aguas 
em  túmidos  e  prateados  cachões,  causam  de  uns 
em  outros  tão  agradável  como  buliçosa  queda,  até 
chegarem  a  uma  taça  de  onze  bicas  de  bronze,  sen- 
tada no  meio  de  um  formoso  taboleiro,  rematado 
tudo  em  um  chuveiro  de  innumeraveis  e  quasi  im- 
perceptíveis desaguadoiros.  Baixa  d'aquL  na  mesma 
forma,  a  outros  três  taboleiros  lageados,  e  che- 
gando ao  quarto  para  um  chafariz  de  oito  bicas  de 
bronze,  do  qual  se  torna  a  despenhar  por  canos 
cobertos;  a  larga  distancia  se  recolhe  n'uma  gran- 
de pia  coroada  de  uma  cruz  de  pedra,  acompa- 
nhada de  duas  pyramides  da  mesma  matéria.  En- 
canada novamente  por  alguns  passos,  rebenta  em 
um  espaçoso  tanque  d'onde,  fechada  como  antes, 
vae  terminar  no  beneficio  e  cultura  de  um  dilatado 
pomar,  povoado  de  varias  arvores  de  excellentes 
espécies  de  fructos.  Os  lados  das  escadas  e  divisas 
dos  taboleiros  são  ornados  de  curiosos  embrexa- 
dos  pretos,  debuxados  em  campo  branco,  que  na 
obra  fazem  agradáveis  visos  sem  excederem  a  mo- 
déstia do  lugar. 
N'esta  deliciosa  paragem  está  quasi  erecto  um 


DO   VIAJANTE  247 

monumento  para  commemorar  a  grande  batalha 
que  alli  se  deu ;  consta  d'um  formoso  e  imponente 
oblisco;  rematando  por  uma  bella  estreita  de 
crystal  de  lindo  effeito,  obra  portugueza  e  de  muito 
apreço.  As  inscripções  sâo  fundidas  com  o  bronze 
d'uma  das  muitas  peças  tomadas  n'aquelle  mesmo 
sitio  ao  exercito  francez. 

Este  monumento  é  mais  um  isentivo  para  cha- 
mar ao  Bussaco  a  attençâo,  não  só  dos  bons  por- 
tuguezes,  como  dos  curiosos  estrangeiros,  que  sai- 
bam apreciar  devidamente  o  que  é  bello. 


MOEDAS  PORTUGUEZAS 


Dobrão  de  oiro 30$000  réis. 

Dobra 16&000  » 

Meia  dobra,  ou  peça 8#000  » 

Meia  peça 4$000  » 

Coroa  de  oiro 5$000  » 

Meia  coroa 2$500  » 

Quinto  de  coroa 1$000  » 

Coroa  de  prata 1$000  » 

Meia  coroa 500  » 

Crusado  novo 480  » 

Doze  vinténs 240  » 

Seis  vinténs 120  » 

Tostão 100  » 

Três  vinténs 60  » 

Meio  tostão  . 50  » 

Pataco  de  bronze 40  » 

Vintém  de  cobre 20  » 

Dez  réis 10  » 

Cinco  réis 5  » 

Três  réis 3  » 


DO  VIAJANTE  249 

TEM  CURSO  FORÇADO  EM  PORTUGAL 

Soberanos  inglezes  de  oiro 4£500  réis. 

Meios  soberanos %yloO    » 


MOEDAS  ESTRANGEIRAS 

As  moedas  que  nâo  tem  curso  legal,  são  troca- 
das conforme  está  o  cambio,  todavia  aqui  daremos 
uma  tabeliã  das  mais  conhecidas  moedas  estrangei- 
ras, com  o  seu  próximo  valor  em  dinheiro  portu- 
guez. 

Hespan  bolas 

Onça  de  oiro 14#600  réis. 

Meia  onça 7?>300    » 

Quarto  de  onça 3;>6o0 

Pezo 920 

Meio  pezo 400 

Pezeta 160 

Reale  de  velon 50    » 

Reale 40    » 

As  moedas  equivalentes  das  republicas  do  Mé- 
xico, Chile,  Colombo,  Peru,  Buenos-Ayres.  Equa- 
dor, e  Nova  Granada,  regulam  pelos  mesmos  va- 
lores. 

Brasileira*» 

Peça  de  oiro 8/>000  réis- 


250  NOVO   GUIA 

Meia  peça 4$000  réis. 

Moedas  de  40000 4$500  » 

Pezo  de  prata — 920  » 

Francesas 

Peça  40  francos '  6$400  » 

Napoleão  ou  Luiz 3$200  » 

10  francos  em  oiro 1$600  » 

Piastra  de  prata 860  » 

Peça  de  2  francos 320  » 

Franco 160  » 

30  Sous  (moeda  antiga) 240  » 

15  sous  (idem) 120  » 

Meio  franco 80  » 

Quarto  de  franco 40  » 

Quinto  de  franco 30  » 

10  Gentimetros  em  cobre 15  » 

5  Centímetros 71/2  » 

1  Centimetro - .  1  '/a  » 

Inglezas 

Libra  sterlina 40500  » 

Guinéo  de  oiro  — 4$000  » 

Meio  guinéo 20350  » 

Meia  libra 20250  » 

Coroa  de  prata 900  » 

Meia  coroa 450  » 


DO  VIAJANTE  251 

Shilling 180  réis. 

Meio  shilling 90       » 

Terço  de  shilling 60       j> 

Quarto  de  shilling 45 


i 


Penny,  de  cobre 15       > 

Meio  penny 7  l/t   » 

Liard  ou  Farthing 33/4  » 

I>os  Estados  Unidos 

Águia  de  oiro  (40  dollars) *  8*5000  » 

Meia  águia 4£400  * 

Pataca  de  prata 900  » 

Meio  dollar 450  » 

Quarto  de  dollar 225  • 

Decimo  de  dollar 90  » 

Vigessimo  de  dollar 45 

Centessimo  de  dollar,  em  cobre  ...  9  » 

Hollandezas 

Florin  ou  gulden 400    » 

Centímetro 4    » 

Estas  sâo  as  novas  moedas  de  Hollanda,  as  an- 
tigas trocam-se  na  mesma  proporção. 

na  Kutssa 

Franken  da  Republica ^240  réis. 

Cada  cantão  tem  sua  moeda  particular. 


252  NOVO   GUIA 

Austríacas 

Soberano • 5$600  réis. 

Ducado,  de  oiro    1$920  » 

Rixdale,  de  prata 880  » 

Florin 440  » 

Holpekopf,  (10  kreutzers) 80  » 

Prnsnianas 

Rixdale  ou  fhaler •. . .  550  » 

RusBtanas 

Imperial,  de  oiro 6$500  » 

Meio  imperial 3$250  » 

Peça  de  3  roubles 1$950  » 

Rouble,  de  prata ■ 650  » 

Dinamarqaezas 


Ghristiano,  de  oiro , 3$400 

Ducado 1$500 

Rixdal,  de  prata 900 

Romanas 

Pistola,  de  oiro 2$800    » 

Sequim 1$900    » 

Meia  pistola 1$400    » 


DO   VIAJANTE  253 

Meio  sequim í>:;0  réis. 

Escudo,  de  prata 900    » 

Napolitanas 

Doppia,  de  oiro 4>000  * 

4  ducados 2;>700  » 

2  ducados > 1  \:riO  » 

Ducado  real,  prata G74  » 

1:2  carlins 880  i 

Tarim 7*>  ■ 

Turca** 

Sequim,  de  oiro [#Í20  » 

Meio  sequim 560  o 

Rouble  ou  quarto  de  sequim 280  » 

Piastra 320  ■ 

~^g^~ —    - 

PEZOS  E  MEDIDAS 
Portugueza* 

COMPARADAS    COM   O    SYSTEMA   MÉTRICO  DEGJMAL 

Pesos 

Toneliada  —  13!/i  quintaes...     7í):í  kilograsimas 

Quintal  —  4  arrobas 58,74  _ 

Arroba  — 22  anateis U,68572 


254  NOVO    GUIA 

Arrátel  —  2  marcos 459  grammas. 

Libra  (de  boticário)  l'/2  marco —  344,19680 

Marco  —  8  onças 229,46440 

Onça  —8  oitavas 28,68305 

Oitavas  —3  escropulos 3,58538 

Escropulo  —  24  grãos d,  19513 

Grão 5  centigram. 

Isto  é  approximação ;  eis-aqui  com  mais  exacti- 
dão esses  valores,  invertendo  a  ordem  precedente. 

,,      .  CO  CO  CO 

«-*  •  i  Valor  eí     •—         cn       cq       cn 

Denominação  dos  pezos  em  -g    2      3,    ^     ,2 

"Rranra  em  £      g        c     .5       2 

*rança  Grammas         %    j=     O    5    » 

Quintal  métrico 100000—    6  24  14  3    2 

Myrigramma 10000—        21  12  5    7 

Kilogramma 1000-          2    2  6  17 

Hectogramma 100 —               3  3  16 

Decagramma 10 —                  2    8 

Gramma 1 —                      20 

Decigramma 0,1 —                     2 

Centigramma 0,01 —                 — 

Milligramma 0.001—               — 

Medidas 

Eis  as  denominações  e  valores  das  medidas  fran- 
cezas,  tomado  o  metro,  o  are,  e  o  litro,  como  uni- 
dades de  cumprimento,  superfície,  liquidos  e  grãos. 


DO  VIAJASTE  233 

Comprimento  —  Myriametro 10000  M. 

Kilometro 1000 

Hectometro 100 

Decametro 10 

Metro 1 

Decimetro 0,1 

Centimetro 0,01 

Millimetro 0,001 

Superfície       — Hectare 100  A. 

Are 1 

Centiare 0,01 

Líquidos,  etc.  — Hectolitro 100  L. 

Decalitro 10 

Litro 1 

Decilitro 0,1 

Centilitro 0,01 

Medidas  antigas  partuguezas 

Légua— 3  milhas Kil.  6,1728 

Milha— mil  passos »  1,8518 

Braça — 2  varas Met.  2,2 

Vara— 3,333  pés »  1,1 

Pé  — 12  polegadas »  0,33 

Palmo— 8  polegadas »  0,22 

Polegada- 12  linhas d  0,027:; 

Linha— 12  pontos »  0,0023 

Ponto >  0,0002 

Moio— GO  alqueires Hect.  8,28 


256  NOVO  GUIA 

Alqueire Hect.  13,8 

Quarta »  3,45 

Oitava »  1,720 

Maquia »  0,8625 

Salamin »  0,4312 

Tonel~2  pipas '»  8,4750 

Pipa— 25  almudes »  4,2375 

Almude— 12  canadas Lit.  16,95 

Pote — 6  canadas »  8,475 

Canadas— 4  quartilhos »  1,4125 

Quartilho »  0,3531 


FIM 


ÍNDICE 


DO  QUE  CONTEM  ESTE  VOLUME 


Introducção 3 

Chegada  a  Lisboa 13 

Corpo  consular  portuguez 14 

Hospedarias  (hotéis) IN 

Bancos  de  Lisboa 20 

Banqueiros 21 

Companhias  de  seguros  marítimos  e  de  fogos  22 

Classificadores  de  navios 23 

Companhias  e  estabelecimentos  de  credito. . .  24 

Agencias,  associações  e  companhias 26 

Despachantes  encartados  da  alfandega  de  Lis- 
boa   28 

Correctores  de  numero 29 

Policia  civil  de  Lisboa 30 

Freguezias  respectivas  a  cada  um  dos  bairros 

e  divisões  de  policia  civil 3! 

Estabelecimentos  funerários 32 

Postos  médicos » 

Correio 33 

Serviço  telegraphico  nacional 40 

Tabelliães  de  Lisboa i  l 

Tabeliã  permanente  dos  caminhos  de  feno  por- 
17 


Pag. 

tuguezes , 43 

Caminho  de  ferro  do  sueste 46 

Preços  da  companhia  de  carruagens  lisbonen- 

ses 48 

Estabelecimento  de  carruagens  de  Campos  Jú- 
nior    50 

Tabeliã  dos  preços  dos  trens  de  aluguer 51 

Companhia  de  carruagens  omnibus 52 

Hotéis  e  casas  de  pasto 53 

Botequins  ou  cafés 54 

Photographias 56 

Divertimentos  particulares 58 

Banhos  públicos 59 

Palácios  reaes 67 

Paço  e  quinta  das  Necessidades , » 

Palácio  da  Bemposta 68 

Palácio  e  quinta  de  Belém » 

Palácio  da  Ajuda 69 

Palácio  de  Caxias 70 

Palácio  de  Queluz , » 

Camarás  legislativas 71 

Municipalidade * . .  » 

Ministérios 72 

Tribunaes » 

Estabelecimentos  públicos  de  educação 73 

Escola  Polytechnica » 

Escola  medico-cirurgica 74 

Escola  de  pharmacia » 

Instituto  agrícola  e  escola  de  veterinária. ...  » 

Aula  naval 75 

Escola  de  construcçâo  naval » 

Escola  do  exercito » 

Aula  do  commercio » 


Conservatório  real  de  Lisboa 75 

Aula  do  museu  nacional * 

Instituto  industrial  e  commercial  de  Lisboa. .  70 
Aula  de  geometria  e  mechanica  applicada  ás 

artes » 

Curso  superior  de  lettras 77 

Collegio  dos  aprendizes  do  arsenal » 

Collegio  militar » 

Academia  das  Bellas  Artes  de  Lisboa 78 

Sociedade  promotora  das  bellas  artes 79 

Guarnição  militar  da  capital  do  reino,  em  tem- 
pos normaes 80 

Família  real  portugueza 81 

Bairros  de  Lisboa 82 

Jornalismo  de  Lisboa 83 

Typographias 85 

Bibliothecas  e  archivos 86 

Sociedades  scientificas 89 

Museu  real » 

Museu  archeologico 90 

Imprensa  nacional > 

Templos » 

Outros  edifícios  públicos 401 

Aqueduto  das  aguas  livres 101 

Arsenal  do  exercito 102 

Arsenal  da  marinha 104 

Navios  armados  e  desarmados 105 

Alfandega  de  Lisboa 106 

Alfandega  municipal 107 

Cordoaria » 

Casa  da  moeda 106 

Palácio  da  justiça • » 

Quartéis  de  tropa 109 


Pag. 

Prisões 109 

Cães 110 

Aterro  da  Boa  Vista » 

Caldeiras Hl 

Jardim  botânico » 

Telegraphia  eléctrica 112 

Fontes  e  chafarizes » 

Estações  dos  caminhos  de  ferro  de  leste 115 

Deposito  da  companhia  das  aguas 116 

Mercados 117 

Matadouro 118 

Estabelecimentos  úteis » 

Hospital  nacional  e  real  de  S.  José » 

Hospital  da  marinha 119 

Hospital  da  Estrellinha » 

Hospital  de  S.  Lazaro » 

Hospital  Veterinário » 

Real  Casa-pia » 

Asylo  da  Mendicidade 120 

Asylo  de  Maria  Pia » 

Asylo  de  Santa  Catharina » 

Asylo  dos  filhos  dos  soldados » 

Asylo  dos  inválidos  do  trabalho j> 

Santa  Casa  da  Misericórdia. ..-.-.., 121 

Asylo  da  infância  desvalida » 

Instituto  vaccinico » 

Conselho  de  saúde  publica  do  reino » 

Lyceu  nacional  de  Lisboa » 

Quartel  general » 

Correio  geral 122 

Procuradoria  geral  da  coroa » 

Monte-Pio  Geral • » 

Observatório  astronómico » 


Pag. 

Localidade  das  repartições  publicas 123 

Defesa  de  Lisboa 126 

Castello  de  S.  Jorge » 

Torre  de  S.  Vicente  de  Belém » 

Torre  velha 127 

Torre  de  S.  Julião  da  Barra » 

Torre  de  S.  Lourenço  do  Bugio 128 

População 129 

Cemitérios » 

Cemitério  dos  Prazeres » 

Cemitério  do  Alto  de  S.  João 130 

Cemitério  da  Ajuda » 

Cemitério  de  S.  Luiz » 

Cemitério  dos  Inglezes » 

Cemitério  dos  Judeus » 

Cemitério  dos  Alemães » 

Vai  escuro » 

Passeios  públicos  e  jardins 131 

Passeio  Publico » 

Jardim  de  S.  Pedro  de  Alcântara » 

Jardim  de  S.  Roque 132 

Jardim  da  Praça  do  Príncipe  Real 133 

Jardim  da  Praça  das  Flores » 

Passeio  da  Estrella » 

Passeio  da  Junqueira 134 

Jardins  do  Aterro » 

Theatros 13;> 

Theatro  de  D.  Maria  n » 

Theatro  de  S.  Carlos 13C 

Theatro  da  Trindade 137 

Theatro  do  Gymnasio ■ 

Theatro  da  Rua  dos  Condes 138 

Theatro  de  Variedades » 


Pag 

Theatro  do  Príncipe  Real 139 

Circos  » 

Praça  do  Campo  de  SanfAnna » 

Circo  Price » 

Praças  e  ruas  mais  notáveis,  monumentos, 

palácios  e  quintas 140 

Praça  do  Commercio .  • 141 

Estatua  equestre  de  D.  José  i 143 

Praça  de  D.  Pedro 146 

Praça  dé  Luiz  de  Camões. 146 

Praça  da  Alegria 147 

Praça  do  Principe  Real » 

Largo  do  Pelourinho 148 

Praça  da  Figueira » 

Praça  dos  Romulares » 

Largo  do  Rato 149 

Largo  das  Amoreiras » 

Campo  de  SanfAnna » 

Largo  do  Carmo 150 

Praça  da  Ribeira  Nova » 

Largo  das  Necessidades » 

Largo  do  Rarâo  de  Quintella » 

Lapa  —  Ruenos  Ayres 153 

Entrada  de  Lisboa 154 

Passeios  dentro  da  cidade 158 

Primeiro  passeio 159 

Segundo  passeio 160 

Terceiro  passeio » 

Quarto  passeio 161 

Outra  Randa 162 

Cercanias  de  Lisboa 164 

Campo  Pequeno 170 

Campo  Grande » 


Pag. 

Lumiar 171 

Calçada  de  Carriche » 

Odivellas » 

Larangeiras 173 

Quinta  do  Lodi 177 

Sete  Rios » 

Campolide » 

Bemfica 178 

Luz » 

Queluz » 

Bellas 179 

Ramalhâo » 

Cintra 180 

Palácio  real 183 

Palácio  acastellado  da  Pena 184 

Castello  de  mouros 187 

Convento  de  Santa  Cruz 188 

Peninha 189 

Penha  Longa » 

Ruinas  de  Monserrate 190 

Penha  Verde 192 

Regaleira » 

Setiaes 193 

Quinta  do  Marquez  de  Pombal » 

Quinta  de  D.  Caetano » 

Palácio  e  quinta  do  duque  de  Saldanha 194 

Fonte  de  Sabuga » 

Os  Pisões j> 

Santa  Eufemia » 

Hospedarias 195 

Collares 198 

Mafra 261 

Setúbal 208 


Pag. 

Santarém 211 

Coimbra 230 

Bussaco 237 

Moedas  portuguezas 249 

Moedas  estrangeiras 250 

Pesos  e  medidas 254 


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UNIVERSITY  OF  TORONTO  LIBRARY 


D?  ovo  guia  do  viajante  em  Lisboa 

757 

1880 


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